Capítulo 1
o céu.
Assim, afastando de leve as cortinas.
Eu queria entrar,
coração ante coração,
inteiriça
ou pelo menos mover-me um pouco,
com aquela parcimônia que
caracterizava
as agitações me chamando
Eu queria até mesmo
saber ver,
e num movimento redondo
como as ondas
que me circundavam, invisíveis,
abraçar com as retinas
cada pedacinho de matéria viva.
Eu queria
(só)
perceber o invislumbrável
no levíssimo que sobrevoava.
Eu queria
apanhar uma braçada
do infinito em luz que a mim se misturava.
Eu queria
captar o impercebido
nos momentos mínimos do espaço
nu e cheio
Eu queria
ao menos manter descerradas as
cortinas
na impossibilidade de tangê-las
Eu não sabia
que virar pelo avesso
era uma experiência mortal.
Os versos de Ana Cristina César tinham acabado de ser declamados com uma entonação repleta de confiança e sentimento. Não era por nada que tinha se tornado a integrante mais ativa e admirada do grupo seleto de apaixonados por poesia que se reuniam em um café subestimado da cidade para beber um pouco e apreciar a arte literária.
Todos ali se conheciam e sabiam ao menos um contexto geral da vivência dos colegas. Diziam ser útil, uma vez que a literatura era apenas um trampolim que arremessava o ser humano para diferentes destinos, sendo que a passagem de ida dependia intrinsecamente da subjetividade íntima de cada interpretação.
Era exatamente por esse conhecimento tão particular que o homem de mandíbula bem marcada e barba por fazer há alguns dias tinha causado imediato estranhamento entre todos ali. Sempre estiveram abertos a novos participantes, mas, ao contrário do que gostariam, as entradas eram raríssimas.
— Heitor, você conhece o cara novo? - perguntou ao se acomodar em uma poltrona alta e roubar um amendoim da mesa em que o amigo estava.
O rapaz balançou a cabeça, negando enquanto seu rabo de cavalo ondulava no mesmo ritmo do movimento.
— Não faço ideia de quem seja. Chegou tem um tempo, sentou ali no canto e ficou observando. Pareceu bem impressionado com a sua amostra grátis de talento.
A mulher riu da mania que o amigo tinha de massagear seu ego. Talvez soasse mal admitir em voz alta, mas aquela era uma das coisas que ela adorava em Heitor. Ela poderia estar destruída da pior forma e ele ainda diria o quanto ela era maravilhosa, acreditando verdadeiramente nisso.
— Bom, acho que isso significa que alguém tem que tomar a iniciativa de dar as boas-vindas - respondeu com uma piscadela antes de se dirigir ao lado oposto do ambiente, caminhando certeira em direção ao seu objetivo com o queixo erguido como de costume.
— Eu não sou a melhor pessoa do mundo com fisionomias, mas o seu rosto é definitivamente novo - começou, chamando a atenção do homem.
Ele sorriu. Um simples sorriso que parecia iluminar o ambiente mil vezes melhor que aquelas lâmpadas amareladas que já deveriam ter sido trocadas há muito tempo por opções mais econômicas.
— . - Ele estendeu a mão em um cumprimento. — Você foi incrível ali em cima.
— e grata pelo elogio. Mas me conta: como você veio parar no nosso querido fim de mundo?
— Curiosidade, apreciação, busca por inspiração… - Ele deu um sorriso de canto. — Todas as alternativas são verdadeiras.
— Bloqueio criativo? Ora, ora atraímos um escritor?
— Compositor, para ser mais exato. Com uma canção pela metade que parece se recusar de todas as formas a ser finalizada.
— Sendo assim, talvez você queira ouvir a próxima. O Heitor é um tanto excêntrico, mas tem um gosto incrível para poesia.
O homem no palco levou as duas mãos aos seus cabelos, reforçando a pressão de seu rabo de cavalo antes de ajeitar o microfone a uma altura coerente à sua.
do homem
é sua incompletude.
Nesse ponto
sou abastado.
Palavras que me aceitam
como sou
— eu não aceito.
Não aguento ser apenas
um sujeito que abre
portas, que puxa
válvulas, que olha o
relógio, que compra pão
às 6 da tarde, que vai
lá fora, que aponta lápis,
que vê a uva etc. etc.
Perdoai. Mas eu
preciso ser Outros.
Eu penso
renovar o homem
usando borboletas.
As palmas silenciosas eram suficientes para arrancar uma reverência torta de Heitor, orgulhoso pela exibição bem sucedida.
Quando conseguiu, finalmente, recompor-se após o momento de orgulho completo do amigo, percebeu o olhar de sobre si, parecendo sorrir para ela. A realidade era que ele estava impressionado com a paixão que todos ali compartilhavam. E esse sentimento intenso ficava ainda mais bonito quando refletido nas íris dela.
— Eu disse que ele era bom - comentou na intenção de quebrar o gelo.
— Tem razão. Talvez eu tenha conseguido alguma inspiração afinal.
o fitou em um misto de curiosidade e algo que quase parecia um flerte.
— Espero que isso não signifique que não o veremos mais por aqui.
sorriu abertamente ao ouvir aquelas palavras.
— Não. Com certeza vocês continuarão me vendo.
conhecia bem o som das travas metálicas que enclausuravam seu violão sob o grosso couro preto. Era um ruído singelo e, ao mesmo tempo, quase reconfortante. Era a evidência sonora de mais um dia trabalhando com aquilo que ele tanto amava.
Colocou a mochila verde musgo nas costas e agarrou o instrumento com a mão direita, preparando-se para deixar o estúdio com os primeiros acordes da melodia criada ainda sendo incessantemente repetidos em sua cabeça. Seus dedos livres moviam-se involuntariamente, acompanhando o ritmo como se as cordas ainda se fizessem presentes ali. Já estava tão acostumado com o atrito ao raspar suas falanges contra os fios que quase não os percebia mais.
Era só mais um dia normal em uma sucessão de dias normais. Até que, de repente, não era mais. Uma cabeleira estranhamente familiar tinha acabado de alterar o status daquele momento, deixando-o interessante como há muito já não o era.
Levou um total de seis segundos para pensar se deveria ir até ela e dizer um “Oi! O que faz aqui?” da forma mais forçosamente casual possível. Em mais dois, já estava ao lado dela, cutucando levemente seu ombro e vendo aqueles olhos grandes o encarando de volta.
— ? Que coincidência! O que faz aqui?
O rapaz sorriu, agradecendo por poder pular a introdução à conversa fiada.
— Estou trabalhando logo ali em algumas composições para o álbum de um colega - apontou o prédio que estava alguns metros atrás dele. — E você?
— Estávamos saindo do colégio - respondeu, fazendo com que o homem à sua frente se sentisse um idiota por não ter assimilado a existência de um garoto de cabelos cacheados ao lado da mulher. — Esse aqui é o .
O menino tinha os mesmos olhos grandes e brilhantes da mulher, fazendo com que a conclusão óbvia soasse dentro dele.
— Oi, ! Como você está?
— Bem e você? - A curiosidade permanecia desenhada nas marquinhas de expressão em sua testa. — Isso é um violão?
abaixou os olhos enquanto balançava sutilmente o instrumento em sua mão.
— É, sim. Você gosta?
soltou um grunhido cansado.
— Se você tem algum compromisso, fez a pergunta errada - comentou, apenas alguns segundos antes do filho começar a disparar uma sucessão de palavras.
— Eu gosto muito de música! Eu gosto de MPB, gosto de rock, gosto de pop… Na verdade, eu gosto de muita coisa.
O sorriso de se alargou na face ao ver a empolgação do garotinho em seu monólogo sobre os gêneros musicais. meneava a cabeça levemente, sabendo que o filho não pararia tão cedo. Aquele pequeno questionamento por “educação” era motivação suficiente para que o pequeno decidisse expressar sua estranha e ao mesmo tempo calorosa relação com a música.
— Minha mãe diz que eu batucava em tudo quando eu era pequeno, sabe? Saía batendo na mesa, na pia, nos braços do sofá… Mas eu ainda batuco e ainda sou pequeno. Acho que algumas coisas não mudam muito.
— Uau! - exclamou. — Você parece mesmo um musicista nato. Já pensou em tocar alguma coisa?
soprou um cacho mais longo que parecia perseverar na missão de cair em frente ao seu olho. Mal podia ver a hora de cortar os cabelos e poder se livrar dos incômodos de sua juba - era um leãozinho, de acordo com a mãe.
— Eu toco flauta na escola, mas é muito chato. Todo mundo toca também e eu queria alguma coisa diferente. Não gosto de ser igual todo mundo.
— Entendo - o homem concordou. — Também não curto fazer o mesmo que a maioria. Ser diferente é mais legal.
— Pois é! - deu um gritinho de animação. — Daí eu tentei tocar gaita, mas acabei com crise de asma porque soprei muito forte. Queria tocar piano, mas o professor do colégio era muito chato e bravo. Agora, eu pensei que seria muito legal aprender a tocar violão. Você pode me ensinar?
arregalou os olhos levemente, sendo pego de surpresa pelo pedido. Estava achando a conversa fofa e era incrível ver uma criança interessada pela arte desde cedo, mas definitivamente não tinha percebido a chegada desse momento.
— , não é assim que as coisas funcionam - o repreendeu. — O trabalha criando músicas e não dando aula, entendeu? E o que já combinamos sobre pedir as coisas para os outros?
O menino abaixou a cabeça:
— Que a gente só deve incomodar os outros se precisar de ajuda - murmurou. — Mas, mãe, eu preciso de ajuda para aprender!
— Eu ensino - interrompeu o sermão.
— Sério? - O choque dos dois foi instantâneo.
O rapaz sorriu de lado, enquanto erguia os ombros.
— Sério. Não posso dizer não a alguém que quer tanto aprender. Não posso negar o conhecimento àquele que o busca. Você deveria saber disso, .
— Não venha com esse discurso de mestre para cima de mim - ela estreitou os olhos. — Não é justo. E nós não vamos te incomodar com isso.
— Fui eu que sugeri. Se fosse incômodo, eu teria mudado de assunto ou fingido ter compromisso agora. Eu realmente estou me oferecendo, ok? O garoto só quer fazer música.
— Por favor, mãe - quase suplicou, utilizando de sua melhor feição de dó para amolecer o coração da progenitora.
— Como posso dizer não e parecer uma madrasta má de conto de fadas?
O garoto deu pulinhos e abraçou a mãe, passando seus braços pela cintura dela.
— Obrigado por não ser a Goethel. Quando começamos?
não conseguiu segurar o sorriso. Nos momentos em que pensou que a carreira de compositor não seria suficiente ou sequer possível, o homem tinha cogitado inúmeras vezes encontrar um espaço em aulas particulares para crianças e adolescentes. Sempre teve uma parte de si que se encantava verdadeiramente pela pureza e vitalidade das atitudes infantis. Seria incrível ter a possibilidade de trabalhar com um outro olhar sobre aquilo que às vezes poderia acabar caindo na rotina e perdendo um pouco do brilho dos velhos tempos.
— Eu ainda tenho que finalizar algumas coisas aqui na gravadora e acompanhar as primeiras demos. Sábado, pelo fim da tarde, é um bom horário para vocês?
— É perfeito! - respondeu de prontidão, atravessando a fala da mãe. — Pode ser lá em casa?
— Não sei - respondeu, direcionando seu olhar para , buscando o convite que ele realmente desejava ouvir. — Pode ser na sua casa?
prendeu o lábio inferior entre os dentes antes de dar a sua resposta.
— Claro que pode. Inclusive, seria uma honra te receber para o jantar. Ensinar qualquer coisa para esse leãozinho demanda uma energia sobrenatural para que você realmente o acompanhe.
— Eu sou ligado no duzentos e vinte - comentou, dando de ombros, sem realmente entender o que aquela expressão usada pelos adultos realmente significava. Tudo o que o pequeno sabia era que a mesma tinha sido utilizada para fazer referência a ele inúmeras vezes.
Entre risos pela espontaneidade do garoto, e trocaram números de celular, sob o pretexto de que poderiam precisar entrar em contato com o outro para planejar melhor as coisas e trocar endereços para as aulas de violão.
Quando o músico finalmente se despediu de ambos com um aceno e buscou seu caminho até a estação de metrô mais próxima, a mulher expirou com um pouco mais de força, chamando a atenção do pequeno que jamais deixava um detalhe sequer passar e, com toda a sua esperteza, já a fitava com um sorriso quase malicioso nos lábios.
— Você gosta dele.
quase se engasgou com a própria saliva ao ouvir aquelas palavras saírem da boca de seu filho como se representassem uma absoluta e incontestável verdade.
— Eu mal o conheço. Pode parar de colocar minhocas nessa cabecinha - ordenou, bagunçando os cachos do garoto.
— Mas queria conhecer. Não fui eu que convidei o cara para jantar…
Com um leve empurrão, ela deu fim àquela conversa, lembrando-o de que já estavam muito atrasados para o jantar com seus padrinhos.
As janelas da cozinha estavam abertas para permitir que a brisa do fim da tarde amenizasse o calor da estação. O ar externo trazia consigo a suave melodia de algo que tocava no rádio antigo que a vizinha guardava por ser um presente cheio de apego sentimental, dado pelo marido muitos anos antes. não reconhecia a música, mas apreciava as notas doces que embalavam seus últimos instantes de preparação para as aulas que daria na segunda-feira pela manhã.
estava sentado ao seu lado, tentando resolver seu dever de matemática enquanto tamborilava a extremidade de seu lápis-borracha contra a própria boca. Aquele era o momento mais difícil do final de semana. Ainda não estava completamente convencido de que aquelas expressões algébricas seriam mesmo importantes em algum momento de sua vida. Queria poder fazer só os deveres de ciência naturais. Esses, sim, eram interessantes de verdade!
— Mãe, por que eu não posso voltar a estudar os peixes?
— Porque você já estudou e sabe toda a matéria. Por outro lado, ainda falta um exercício que sua professora pediu - a mulher respondeu, apontando para sua apostila.
— Eu odeio números. - Bufou, enquanto deitava pesadamente a cabeça sobre a mesa da cozinha.
— Não é o único. Por que acha que eu me formei em Letras? Mas, até lá, tive que fazer muitas contas e desenhar muitos triângulos. Então, trate de continuar.
— Eu vou morrer. Você não se importa com o meu sofrimento.
revirou os olhos para o drama do filho, juntando seus próprios materiais e guardando os diários de sala na bolsa de pano que usara initerruptamente pelos últimos três anos. Já estava desbotada em alguns pontos e encardida em outros, mas ainda servia para sua função e isso bastava. Com uma criança em casa e um aluguel mensal a pagar, trocar de bolsa era o último de seus objetivos para os gastos.
Enquanto resmungava a cada movimento de seu lápis sobre o caderno, a mulher checou o relógio repetidamente, sentindo-se ridícula por estar tão ansiosa para uma coisa tão simples. Era profissional em criar expectativas impossíveis de serem atingidas e versões que só aconteciam nas histórias em sua cabeça. Talvez fosse o principal ônus da vida mergulhada continuamente na literatura.
O barulho que fez ao deixar a mesa agitado e derrubando tudo foi o que a fez despertar de seus devaneios. Era sempre assim ao se livrar da matemática diária: uma grande folia, como se seu time favorito tivesse acabado de conquistar a taça do campeonato. riu sozinha, sabendo que havia se decepcionado com muitos dos cenários que criava em sua mente, mas jamais poderia ter imaginado uma alegria que chegasse sequer aos pés do que era ver aquele garotinho correndo e gritando em volta da mesa. Não existiam letras e histórias capazes de retratar a verdadeira sensação de completude ao encontrar orgulho e um amor inenarrável em um pedaço serelepe de si.
Fez questão de observar de longe se o dever estava realmente completo, preocupada em fazer seu papel de mãe presente, mas, ao mesmo tempo, permitir que ele se sentisse independente e responsável o suficiente pelas próprias obrigações.
— Já está na hora da minha aula, mãe? - mal conseguia lidar com a própria ansiedade embolada em uma animação gigantesca.
segurou os braços do filho, virando-o para que olhasse para o grande relógio preto que ficava pendurado na parede da cozinha. Estava determinada a conseguir ensiná-lo a ver as horas por meio dos ponteiros.
O garotinho levou alguns instantes, virando a cabeça de forma a tombá-la sobre os ombros. Estava se esforçando para lembrar. O ponteiro grande era dos minutos e, o pequeno, das horas.
— Faltam dez minutos? - Arriscou.
— Doze - a mãe corrigiu. — Mas as pessoas sempre arredondam, então você não deixa de estar certo. Dá tempo de tomar um banho.
— Ah, não. - Choramingou. — Eu tomo mais tarde.
— Eu não vou ter que pedir mais uma vez, vou?
O olhar sério da mulher era o suficiente para que ela sequer precisasse pronunciar outra palavra. Imediatamente, ele já tinha sumido dali.
Logo, o pequeno estava de volta, com os cachos ainda úmidos e uma camisa nova que, de acordo com ele, estava sendo guardada para uma ocasião muito especial. Fez questão de abrir a porta com o mais largo sorriso assim que ouviu a campainha tocar.
— Você veio mesmo!
sorriu para o garoto, enquanto adentrava a residência.
— E você parece surpreso. Não foi o que combinamos?
— Meu pai combinou várias coisas e não apareceu em quase nenhuma - o garoto admitiu.
— Eu sinto muito. Você é um garotinho bem legal. Tenho certeza de que foi ele quem perdeu.
sorriu de canto, sentindo uma vontadezinha de chorar. Sabia o quanto o relacionamento - ou a falta dele - com o pai era impactante no desenvolvimento de . Ele recebia todo o amor do universo da mãe, dos avós e dos tios mais próximos, mas a sensação de rejeição ainda era um fantasma rondando aquela mente jovem demais para ao menos ter noção de como lidar com aquilo.
Sentaram-se no sofá cinza da sala. Após afinar o violão, posicionou o instrumento sobre o colo do garoto, mostrando a ele onde seus dedos deveriam ficar para que tocasse uma simples nota. O mais novo assentia a cada instrução, completamente imerso naquele momento de atenção e aprendizado.
Os minutos se passaram tão rápido que se assustou quando a mãe apareceu para chamá-los para o jantar. Choramingou sobre não ter aprendido a tocar sequer “Ciranda, Cirandinha”, sendo consolado pelo seu mais novo professor, que reafirmava continuamente sobre a importância de se conhecer o instrumento e as posições devidas para que melhores resultados fossem obtidos quando ele pudesse finalmente puxar um som.
— Você fez nhoque - disse ao chegar na cozinha e sentir o cheiro da comida prestes a deixar o forno. — O nhoque dela é muito bom. Eu só não falo alto porque ela é meio metida - murmurou para , arrancando risos do homem.
Jantaram em meio a conversas - geralmente iniciadas pelo garoto - e perguntas - adivinhe de quem - que deixaram as bochechas de rosadas levemente acima do normal algumas vezes. Fora quem perguntara sobre cor favorita, comida que mais gostava e várias curiosidades aparentemente inofensivas antes de lançar um “Você tem namorada?” seguido de um “A minha mãe também não. Que curioso!”.
— Acho que está ficando meio tarde - o pequeno ponderou. — Foi muito legal a aula. Espero que a gente possa fazer mais vezes. Eu ainda quero tocar uma música, mesmo que seja uma boba.
— Não existe música boba - começou e o garoto logo emendou, completando a ideia junto com ele. — Existe progresso. Um passo de cada vez.
O garoto sorriu e avançou, pegando o homem de surpresa ao envolvê-lo em um abraço da mais sincera gratidão. retribuiu o gesto, bagunçando os cabelos do pequeno que logo correu escada acima.
— Desculpa por isso - pediu. — Ele é uma criança muito carinhosa e nem sempre sabe ponderar como isso vai ser recebido pelos outros.
— Ele é ótimo. De verdade. Sinto muito pela ausência do pai dele. Não deve ser fácil dar conta de tudo sozinha.
A mulher deu de ombros, colocando uma mecha do cabelo atrás da orelha.
— Nunca foi fácil - admitiu. — Mas é com ele que eu me preocupo. Sempre morri de medo de que ele pudesse se sentir sozinho ou como se não fosse bom o suficiente para alguém. As coisas que aconteceram entre nós estão completamente fora do alcance do , sabe? É de partir o coração toda vez que ele comenta sobre o pai, quase como se quisesse me fazer acreditar que já se acostumou e não dói mais.
— Desculpa se eu estiver sendo muito invasivo, mas eu tenho a impressão de que isso é exatamente o que vocês dois estão fazendo. É como se estivessem tão preocupados em parecer forte pro outro que se esqueceram do próprio peso que carregam. Você é uma mãe incrível e ele é um garoto maravilhoso. Talvez devessem dar um pouco mais de crédito para vocês mesmos.
engoliu em seco, piscando repetidamente na direção da luminária da cozinha, na tentativa de evitar que as lágrimas, que já faziam seus olhos arderem, decidissem correr pela face.
— Você é psicólogo também? - A voz dela saiu cortada, mais fraca do que ela desejava.
— Sou filho do que eles chamam de ‘mãe solteira’ também. Conheço um pouco da sensação. E ela é uma mulher absurdamente forte. Vocês são muito parecidas nisso.
A mulher piscou com força, esfregando o rosto com as pontas dos dedos e sentindo as unhas levemente tortas arranhando a própria pele delicadamente em alguns pontos. Tudo o que mais queria naquele momento era mudar de assunto.
Incapaz de pensar em algo que não soasse completamente estúpido, tomou a pior iniciativa possível: ocupar-se com a louça suja empilhada sobre a pia.
Enquanto a água escorria e batia sonoramente perceptível contra a cuba, ela sentiu a aproximação do rapaz, que trazia em mãos o pano de prato bordado que encontrara pendurado em um pequeno suporte ao lado da geladeira. Antes que pudesse dizer qualquer coisa, ele já estava secando a porcelana molhada recém-repousada no escorredor.
— Não precisa fazer isso.
— Em qual das portas? - tinha simplesmente ignorado-a.
— Segunda porta, da esquerda para a direita. - Apontou.
Um silêncio estranho pairou entre eles, de uma forma que certamente estava longe de ser desconfortável como aparentava. A situação simplesmente parecia simples, cotidiana, como algo que poderiam fazer a qualquer hora e lugar com toda a naturalidade do mundo.
— Não foi assim que eu imaginei - a voz grossa dele cortou o ambiente, tornando-se o foco de tudo.
— Imaginou o quê?
— Nosso primeiro encontro.
riu, fechando a torneira antes de se virar para fitá-lo.
— Quer dizer que andou ocupando seu tempo pensando sobre isso?
sorriu daquele mesmo jeito que tinha captado completamente sua atenção desde a noite de poesias.
— Achei que estivesse óbvio. Acabei tendo meu primeiro encontro com o antes de ter um contigo propriamente. Não que eu esteja reclamando. Ele é incrível.
— Ele é mesmo - concordou. — Mas eu estou exatamente aqui, agora admitindo vergonhosamente que talvez também tenha imaginado esse momento. E, do jeito que eu imaginei, você me convidava para sair.
— Que coincidência! Acho que imaginamos a mesma coisa.
— Você está bonitona - comentou, rodando a mão da mãe para que ela acompanhasse o movimento com o próprio corpo e pudesse dar uma voltinha.
— Que engraçado. Você sempre disse que detestava esse vestido.
— Era para te irritar. - revirou os olhos. — É a minha função como filho ser chato de vez em quando.
— Peste - disse, arrancando uma risada safada da criança. — Sua madrinha deve chegar logo. Comporte-se, não abra as gavetas sem que te peçam, não coloque os pés no sofá e escove os dentes depois do jantar. Entendido?
— Sim, capitão. - Bateu continência antes de acenar para a mãe e anunciar que esperaria a tia na calçada.
encarou o próprio reflexo no espelho de moldura antiga do banheiro. Detestava aquela borda lascada e como fazia até a imagem parecer mal cuidada e abandonada. Mas, naquele momento, sequer se preocupou com aquilo. Era a primeira vez em muito tempo em que se sentia verdadeiramente bonita. Não precisava forçar, não precisa tentar se convencer de que deveria amar o que via. Naquele momento, ela simplesmente estava satisfeita com o que via de uma forma que há muito não estivera. Acima de tudo, estava feliz e a felicidade ficava linda estampada em seu rosto.
abriu a porta para acenar rapidamente, enquanto sua madrinha buzinava um cumprimenro do carro. Costume estranhamente incompreensível esse de se comunicar por buzinas, podendo significar praticamente qualquer coisa, desde um xingamento até um ‘Oi!’ para um conhecido que deu a sorte - ou o azar - de cruzar caminhos naquele exato instante.
Não demorou muito até que chegasse com o seu carro - pouco usado, de acordo com o próprio, devido aos inúmeros problemas no tráfego na grande cidade, em especial nos horários de pico.
O homem fez questão de sair do carro para abrir a porta para a sua acompanhante, arrancando um sorriso da mesma, após aquele gesto premeditado que vinha de mãos dadas com um elogio clichê. Exatamente do jeito que o script pedia.
— Para onde vamos? - Ao virar o corpo em direção ao banco do motorista, sua visão periférica pôde perceber que os assentos traseiros estavam ocupados pelo já conhecido violão e alguma outra coisa, encoberta de forma a impedir que ela pudesse reconhecê-la.
— Para o parque. Com direito a cesta de piquenique e uma noite de céu especialmente limpo para que as estrelas possam aparecer. Chega até a parecer quase proposital.
O caminho até o local de destino foi tranquilo e repleto de pequenos sorrisos que se manifestavam nos lábios ou se mantinham presos em suas próprias mentes, que explodiriam a cidade se pudessem demonstrar a quantidade de reações físico-químicas que aconteciam a cada segundo que passavam juntos. A conversa era leve e sem nenhum tipo de objetivo final além de conseguir saber algo novo sobre a pessoa por quem se passa a demonstrar interesse.
estendeu um edredom antigo sobre a grama do parque, permitindo que o aroma de amaciante subisse devido à recente lavagem. posicionou a cesta e se sentou sobre uma almofada redonda bordada com algo que parecia um sol de amarelo intenso e talvez um tom mais vívido do que o normal.
O homem seguiu seus movimentos e, em seguida, começou a retirar do fundo recipiente de vime aquilo que trouxera: água, vinho tinto, queijos diversos, mini torradas com patês, coxinhas - sugestão de , que fizera um alarde sobre serem as favoritas da mãe -, pequenas porções individuais de quiches de massa folhada, morangos cobertos com chocolate e brownies de chocolate amargo com amêndoas.
Serviram-se, degustando cada um daqueles sabores tão familiares e, ao mesmo tempo, ainda tão marcantes e satisfatórios para o paladar. Quem diria que uma massa frita recheada com frango e catupiry continuaria a ser uma das melhores coisas da vida adulta, mesmo tendo se consolidado como salgadinho da vez em festas infantis?
— No que você está pensando? - perguntou antes de pegar outro morango.
— Julgar-se-ia bem mais corretamente um homem por aquilo que ele sonha do que por aquilo que ele pensa.
A mulher não foi capaz de conter a risada que veio em seguida.
— Não sabia que gostava de Victor Hugo.
— Gosto. Mas confesso que só usei a citação para te impressionar.
— Qualquer um que tenha se disposto a ler um livro de mais de mil páginas já me impressiona. Mas me ganhou por ter gostado. Bem-vindo ao Clube! Somos eu, você e algum familiar remanescente do autor.
— É o suficiente. Inclusive, sem saber, você acabou de tirar um peso gigantesco das minhas costas.
A mulher franziu a testa, inclinando levemente a cabeça como se aquilo facilitasse de alguma forma sua compreensão acerca do que ele realmente queria dizer com aquela declaração esquisita.
— Sabe como a maioria dos caras compra flores para o primeiro encontro? Achei meio impessoal demais e arrisquei.
Dito isso, retirou algo que ainda estava escondido no fundo da cesta: uma edição especial de ‘Os Miseráveis’ em capa dura com tantos detalhes que mal sabia por onde começar a olhar e admirar.
— Um amigo meu trabalha em um cargo importante na editora. Essa versão ainda está em pré-lançamento. Eu realmente espero que você prefira isso a flores ou a vergonha vai ser enorme depois de todo esse discurso.
— Isso é simplesmente incrível. Eu nem consigo encontrar palavras para te agradecer. Meu Deus, ! Você é um anjo!
— Só de ver seus olhos brilhando desse jeito, eu já estou imensamente feliz.
sorriu e fitou o chão, alisando uma porção do tecido do edredom que estava logo ao seu lado. Desde quando ficava envergonhada desse jeito? Forçou-se a olhar para cima, mirando de forma direta e intensa nos olhos daquele homem que tinha conseguido deixar sua marca por sua mente desde o primeiro instante.
Chegava a ser engraçado. Sempre que alguém falava dessa conexão diferente que poderia acontecer à primeira vista, ela ria. Achava que era o exagero de um coração recém-apaixonado, decidido a se jogar de cabeça, corpo e alma. E, agora, ela sabia que estava muito perto de descrever o que sentira naquele Café exatamente da mesma forma.
— Não vale! - Ela reclamou antes de arremessar uma bolinha de guardanapo amassado em sua direção. — Eu vi o violão no carro. Você não vai negar o meu pedido, vai?
— O que você não me pede sorrindo que eu não faço chorando? - brincou e se levantou, caminhando por entre a vegetação até recolher o instrumento de seu automóvel.
se aconchegou na própria almofada, trocando as pernas de posição por alguns instantes para evitar que os seus pés continuassem experimentando a sensação desagradável de dormência, como se pequenas formigas picassem sua pele, espalhando micro-choques por toda a superfície. Expirou todo o ar de seus pulmões com força o suficiente para fingir que poderia liberar uma parte da ansiedade que se apoderava de seu estômago, em uma sensação esquisita e estranhamente pouco confortável.
se ajeitou, sentando com as pernas cruzadas e apoiando o violão sobre uma delas. Pigarreou levemente, limpando a garganta e piscou em sua direção. A pose autoconfiante, no entanto, limitava-se ao exterior. O homem estava longe de estar tranquilo como tentava fazer parecer. Parecia exatamente o tipo de momento em que o destino faria uma corda estourar ou sua voz desafinar até romper o tímpano de uma pobre e indefesa vítima. A vida costumava fazer esse tipo de coisa para puxar o tapete nos bons momentos.
Mas não dessa vez. Algumas coisas não dependiam simplesmente de sorte. Algumas coisas tinham sido feitas para simplesmente ser. Independentemente do que raios isso realmente significasse.
Com as notas doces de uma melodia que pouquíssimas pessoas eram capazes de dizer honestamente que desconheciam, deu início à canção. Elvis era mesmo um desgraçado quando o assunto era amolecer os corações alheios.
— Wise men say only fools rush in.
But I can’t help falling in love with you.
Quando deu por si, já estava sorrindo e parecendo uma idiota. Estava ficando cada vez mais acostumada a se parecer com uma.
— Shall I stay? Would it be a sin?
If I can’t help falling in love with you
Like a river flows surely to the sea,
Darling, so it goes. Some things are meant to be. Take my hand, take my whole life too.
For I can’t help falling in love with you.
Assim que terminou a música, fez questão de aplaudi-lo lentamente, sem ser capaz de tirar o largo sorriso dos próprios lábios por um segundo sequer. Existia alguma possibilidade de alguém ser realmente tão milimetricamente maravilhoso e ainda por cima cantar Elvis Presley como algum tipo de ser humano propositalmente construído para simplesmente ser perfeito? Sequer era justo.
— Quer que eu te leve para casa?
— Já quer se livrar de mim assim? - levou a mão ao peito, fazendo-se de ofendida.
riu, erguendo as mãos em sinal de rendição.
— Jamais. Se pudesse, eu não te levaria para casa nunca.
A mulher sorriu de canto.
— Sendo assim, acho que podemos ficar mais um pouco.
E quando o rapaz finalmente aproximou o corpo do seu, ela soube que “mais um pouco” com certeza não seria o suficiente para todo o tempo que queria estar ali.
Aquele já deveria ser o décimo jantar pós-aula aos sábados. Ou décimo primeiro. já tinha perdido a conta, principalmente quando e riam alto na sala a cada piada que o mais velho fazia ou a cada nota errada do pequeno - que não poderia estar mais animado por estar finalmente tocando algo. Era natural e já fazia parte do dia-a-dia. Estranhas eram as noites em que só duas cadeiras eram ocupadas em volta da mesa de jantar.
— Só errei cem vezes hoje. Já sou quase o próximo Ed Sheeran - brincou, ao ocupar seu lugar à mesa.
— Ele fala isso todo dia - acrescentou.
— Posso ser fã em paz? Quando você coloca aquele álbum dos Backstreet Boys para tocar eu não reclamo.
quase engasgou com o suco de laranja que tomava, rindo de uma forma completamente desajeitada.
— Não ouse fazer piada - ameaçou entre dentes, fuzilando o rapaz com seu olhar —, ou já pode ir se considerando um homem morto.
— Eu? - O homem se fez de desentendido, mordendo a própria boca para disfarçar o riso. — Eu jamais faria uma coisa dessas.
— You are my fire. - usou sua melhor voz de integrante de boyband contra a mão que segurava em frente ao rosto, como o microfone totalmente improvisado que todo mundo já tinha utilizado em algum dia de suas vidas.
— Você vai ficar de castigo se cantar mais um verso - a mãe retornou com as ameaças, arrancando risadas altas do filho.
— Não temo o seu poder, mulher. - Ao receber um olhar duro, ele magicamente mudou de opinião. — Ok, talvez um pouco. Pode ser bastante também.
— Acho bom mesmo - disse enquanto recolhia as louças para levá-las até a pia. — Agora, você já sabe.
— Banho e cama. - revirou os olhos. — Boa noite, mãe. Boa noite, .
— Boa noite, mini Ed. - Os dois se cumprimentaram com um toque longo e trabalhoso no qual vinham treinando há um tempo.
— Boa noite, filho.
Com o som do chuveiro à distância, sorriu de lado, enquanto caminhava até ela e tomava suas mãos na dele.
O rapaz levou seus dedos até a face da mulher, permitindo que as costas de sua mão experimentassem a textura da pele que ele passara a conhecer muito bem. Já tinha decorado a sensação daquele toque e, mesmo assim, sentia-se inebriado a cada vez que o concretizava novamente. Ainda mais quando seus lábios se encontravam como se tivessem sido criados perfeitamente para aquele encaixe.
— Já está ficando tarde - murmurou, contra a boca de .
— Eu sei. - Ela respirou fundo. — Fica.
E, com um sorriso sincero, ele aceitou a oferta.
estava exausta após um longo dia de trabalho, acompanhado pelas pastas de provas que ela carregava sob o braço para correção. Só conseguia pensar em retirar o molho de chaves do bolso da mochila e poder, finalmente, estar no conforto de seu lar.
Ao se aproximar da porta ouviu cochichos de uma voz conhecida. Enquanto sua mão rodava a maçaneta, seu cenho se franzia, buscando entender o que raios estava aprontando.
— ? Por que não acendeu as luzes? - perguntou ao se deparar com os cômodos escuros da casa. — O que é que você está aprontando, hein?
Quando seus dedos pressionaram o interruptor na parede, a mulher teve que reforçar o apoio sobre seus pés, sentindo que poderia cair para trás a qualquer instante. Em dois banquinhos, retirados da cozinha, sentavam-se , com o violão, e , com um sorriso apreensivo que estava muito longe de ser capaz de demonstrar fielmente todo o nervosismo que ele carregava naquele instante.
— O que é isso? - Sua voz tremia.
— Só ouve - pediu, coçando o nariz da forma que costumava fazer quando estava nervoso.
e o garoto se concentraram um no outro, enquanto o mais velho preparava a entrada das cordas no ritmo com um movimento de pés e cabeça. A mulher teve que segurar as lágrimas antes mesmo de compreender ou ouvir algo. A cumplicidade e parceria que aqueles dois vinham desenvolvendo era uma coisa tão linda que seu coração mal aguentava. Tudo piorava quando ela se lembrava de que o filho estava realizando um daqueles sonhos dos quais ele falava há tempos. Aquele violão em seu colo representava muito para uma mãe que batalhara para criar uma criança sozinha… De uma forma que poucos seriam capazes de realmente compreender.
Foi quando sua atenção foi desviada para aquela voz linda que ela tinha aprendido a reconhecer e adorar em qualquer ocasião.
— Se for ficar, fica de uma vez, não enrola
Porque enrolar é só dentro do abraço
E eu faço questão de ser no meu
Que cabe tu, e é só teu
respirou fundo, recebendo um sorriso de encorajamento e satisfação do garoto.
— Chego a noite em casa
Procurando por você em todo canto
O que é que tu fez
Pra deixar rastros nos meus móveis
E teu cheiro quando canto
Aquela canção que a gente ouviu na cama grudados
E aquele refrão que nos pôs pra dormir embaraçados
Ei você, que se alojou nos meus olhos
E na minha boca, por que não 'tá aqui?
A cama 'tá reclamando, a casa te chamando
Vem logo me ver
'Tô te esperando entrar, não precisa bater
Conforme a música se encaminhava, secava os olhos com as costas das mãos. Nem todas as letras que ela estudara ou todas as palavras de seus livros preferidos seriam capazes de se organizar de forma a expressar todas as emoções múltiplas que ela sentia de uma só vez.
Com o fim da música, olhou a mulher no fundo de seus olhos, tentando controlar as próprias emoções e as mãos que insistiam em tremer.
— No dia em que nos conhecemos, eu estava buscando inspiração para compor. Quando eu mais precisava, você me mostrou a poesia. E, como eu sempre disse, a música nada mais é do que a poesia cantada.
“Mas, uma coisa, eu aprendi quando comecei a me interessar pelo assunto. A inspiração não é algo que se pega de surpresa, como uma gripe, e também não vem quando bem entendemos. Inspiração é sobre sentir e transportar o sentimento para fora. E, desde aquele dia, eu sinto tantas coisas e sinto sempre. Sinto ao seu lado.”
estava pressentindo que logo soluçaria pelo choro. E não seria uma cena nada bonita.
— Você foi a inspiração de muitas letras, mas essa foi a que considerei mais especial, porque tive uma ajuda incrível. - Sorriu alegremente para o pequeno, que ainda não tinha sossegado o brilho dos próprios olhos. — Nós tocamos essa singela canção hoje para demonstrar o nosso amor por você. E eu pretendia, com ela, perguntar se você aceita ser minha namorada e continuar sendo essa pessoa que dá sentido às músicas românticas que as pessoas escrevem por aí.
A mulher mal sabia o que dizer ou como reagir. Estava engasgada e tão intensamente feliz que se sentia prestes a explodir e destruir toda a casa.
— Essa é a hora em que você diz sim - murmurou, tentando incentivar a mãe e capturando sua risada.
— É claro que sim - respondeu com a voz embargada e encontrou seu espaço entre os braços do homem que tinha levado o seu coração sem que ela sequer desejasse se trancar.
Em instantes, estava entre os adultos, fazendo parte daquele abraço da mesma forma intrínseca com a qual fazia parte daquela relação linda que vinha se construindo entre o trio. Pela primeira vez, sentia que sua mãe poderia ser feliz ao se permitir ser amada e estava absurdamente feliz pela felicidade dela.
— Sabia que fui eu que escolhi o nome da música? - O pequeno se manifestou.
— É mesmo? - perguntou, adorando a animação verdadeira do filho. — E qual é?
Olhando para aqueles seis braços misturados, teve certeza de que tinha escolhido o melhor nome possível.
— Nós.
FIM
Nota da autora: Eu jurei que não escreveria ficstapes esse ano. E esse é o primeiro de uns dez.
Para mais informações sobre minhas histórias, entrem no grupo
Outras Fanfics:
01. Middle of the Night
02. Blow Me (One Last Kiss)
02. Stitches
03. I Did Something Bad
03. Take A Chance On Me
03. Without You
04. Someone New
04. Warning
05. You In Me
06. Consequences
06. If I Could Fly
06. Love Maze
08. No Goodbyes
10. Is it Me
10. Simple Song
11. Robot
11. Under Pressure
12. Be Alright
12. Wild Hearts Can't Be Broken
13. Kiss The Girl
13. Part of Me
13. See Me Now
15. Overboard
A Million Dreams
4th of the July
Dark Moon
Not Over
Side by Side
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