Fanfic finalizada

Capítulo Único

Crescer com um modelo não é fácil. Ainda mais quando esse modelo parece inalcançável.
Howard Stark nunca percebeu o que fizera com o filho, ou pelo menos nunca chegou a compreender o motivo. Pais sempre querem o melhor para seus sucessores, lhe sonham futuros grandiosos, pessoa de influência e que deixam sua marca no mundo. O próprio homem se encaixava naquelas definições: era um engenheiro mundialmente famoso, o principal fornecedor de armas do governo americano, e ainda tivera papel crucial na criação do primeiro super-herói da história. Era ambicioso, claro, mas Howard sonhava aquele destino para seu filho. Não de sua própria trajetória, e sim que ele tivesse uma integridade semelhante à daquele que ele aprendera rapidamente a admirar e respeitar.
Se Tony se assemelhasse minimamente com a lenda que era Steve Rogers, aí sim ele se consideraria um homem de sucesso na vida.
Não chegava a ser um desejo consciente, na maior parte das vezes. A frequência com que citava o herói já era grande mesmo antes do nascimento do filho, e então narrar aqueles acontecimentos passaram a ter tons mais educativos, uma imagem em que a criança deveria se espelhar. Deveria ter sido algo inofensivo, algo para o próprio bem de Tony, por isso Howard nunca entendeu a forma inesperada que o filho crescera, se tornando um jovem rebelde e inconsequente. Ele tinha tantos recursos, tanto apoio e espaço para se tornar grandioso, então onde foi que ele errara? Vez ou outra as palavras de Abraham Eriksen voltavam a sua mente, que o segredo estava no coração, não no soro. Talvez ele estivesse fadado ao fracasso mais uma vez.
Falhara com Steve.
Falhara com seu próprio filho.

If you need me call me
(Se precisar de mim, me ligue)


Foi quase como levar um soco no estômago receber a notícia de que Steve Rogers havia sido encontrado no Ártico. Quantos anos faziam? Setenta? Seu pai passara a vida inteira em busca daquele homem sobre quem ele nunca calava a boca, e agora eles estavam na mesma cidade, dois contemporâneos. Fury chegara a chamá-lo no prédio da S.H.I.E.L.D. em Manhattan para se apresentar à lenda viva, mas Tony nunca chegara a entrar na sala. Aquilo era estranho demais. Parecia que alguém estava ilustrando as histórias de seu pai em frente de seus olhos, a fisionomia do soldado completamente preservada, sem parecer ter envelhecido um dia quando na verdade quase se passara um século.
- Algum rosto conhecido pode ser bem-vindo, Stark – insistia o Diretor – Mesmo que seja conhecido pela sua descendência.
Aquela colocação fez com a irritabilidade do engenheiro tomasse novas proporções, ele deixando o prédio em segundos. Já não bastava ser envolvido naquela história, ainda tinha que estar lá como um substituto de seu pai. Howard estaria reluzente se ainda estivesse vivo, contente como nunca antes em saber que não esteve errado em insistir nas buscas pelo Capitão, que ele estava ali, vivo, mesmo depois de tanto tempo. Tony, em contrapartida, só queria ser esquecido, excluído daquela narrativa. Quanto mais distância, melhor.
Mas claro que o destino tinha como passatempo contrariá-lo.
Embora duvidasse que em suas características como deus Loki tivesse algo a ver com destino.
Eles podiam ter tido um início mais amigável, Tony tinha completa ciência disso. Só que tinha algo dentro de seu ser, um instinto quase que primitivo que agia apenas de assistir Steve respirar, implorando para que implicasse com ele. O Capitão, claro, não demorou muito para começar a revidar. Não dava para dizer o que o soldado realmente esperava de sua pessoa, alguma recepção calorosa em nome de seu pai e todas as histórias maravilhosas que fora obrigado a ouvir enquanto crescia. Se ele esperava algo daquele gênero, dava para explicar muito bem a notável frustração com que se dirigia a Tony.
Não dava para mentir e dizer que se dera bem com Howard desde o começo, ou que a amizade que nutriam era a melhor possível, mas fora marcante o suficiente no ambiente em que estavam. Steve dificilmente podia se comparar ao homem nos mais variados aspectos, desde a forma que se portavam com os outros assim como a forma que viam a si próprios e como agiam diante disso. Howard gostava de ter as coisas sob controle, mas não era muito fã de alguém lhe gritando ordens, por isso tinha uma certa tendência a rebeldias – certo, Steve às vezes também tinha aquele seu lado dando o ar da graça, mas não com tanta frequência –, ele sabia agir com seriedade quando necessário, mas sua essência era muito mais relaxada, pelo menos quando envolviam mulher. Havia ali um contraste muito grande de confiança também, algo que não mudara mesmo depois da transformação. Pelo que ouvira e lera a respeito do engenheiro, ele havia mudado muito nos últimos anos, mas aquela continuava sendo a imagem que Steve tinha dele: o sorriso travesso fácil, as piadas que o deixavam sem graça, os conselhos que apenas o deixavam ainda mais confuso.
Deus, Tony não era em nada parecido com Howard.
Só que isso não significava que não podiam ser amigos.

No matter where you are
(Não importa onde você esteja)


Não havia começado a nevar ainda, mas o frio marcava presença desde o começo do mês, por isso Tony não sabia dizer se o tremor de seu corpo era pela baixa temperatura ou por estar caminhando no lugar onde estava. Um pouco mais de três décadas e ele continuava a detestar aquele lugar, mais do que deveria. Ninguém deveria gostar de cemitérios, mas Tony sentia que tinha uma aversão ainda maior àquele em especial, sua vontade de dar as costas e voltar para casa toda vez que apenas cogitava a possibilidade de uma visita.
Mesmo depois de tantos anos, o homem ainda era bastante precavido em relação às suas visitas. Dificilmente aparecia no dia do aniversário de morte dos pais, ciente de que as chances de ter um paparazzi a postos eram bem maiores. Naquele ano, em especial, ele decidira deixar de lado tal protocolo. Estava em um período tão confuso e conturbado que acabara se enrolando, sem contar que sua agenda exigente não lhe deixava muitas opções. Fazia um pouco mais de seis meses da confusão do Triskelion e a Projeto Insight, e toda a reviravolta da HYDRA ter se escondido na sombra da S.H.I.E.L.D. Diante de tal ameaça, eles não tiveram muita escolha senão reativar a Iniciativa Vingadores, mesmo sem supervisão. Alguém precisava lidar com a bagunça feita, e não parecia muito certo deixar o Capitão lidar sozinho com tudo, já que todos tinham sua parcela de culpa.
Sem contar que eles não tinham exatamente coisas melhores para fazer. Tony e Bruce continuavam a trabalhar juntos na Torre, Natasha esteve envolvida no episódio e estava disposta a continuar até o final, e Clint... Bem, ele provavelmente devia ter planos para migrar para o sul ou hibernar em seu ninho. O retorno de Thor fora um ponto decisivo para retomarem a equipe, já que todos tinham uma péssima experiência com o cetro perdido e deixá-lo nas mãos da HYDRA não parecia a ideia mais inteligente do ano.
Então, sim. Os Vingadores foram reunidos, e por isso Tony estava ali no dia exato, já que não pode aparecer antes e não poderia vir depois, já que saiam em missão no dia seguinte.
As lápides brilhavam com timidez, parecendo tão incertas como o homem diante delas sobre o que fazer. Mesmo antes do acidente, Tony sempre achara um tanto idiota quem ia para esses lugares conversar. Sequer dava para chamar aquilo de conversa, já que não teria resposta – e se tivesse, definitivamente iria sair correndo, tanto pelo susto como por não querer aturar nenhum sermão de seu pai. Para o engenheiro tal prática parecia perda de tempo e energia, não tinha como tirar proveito disso. Porém, lá estava ele, religiosamente cumprindo sua visita anual para duas pessoas que nunca saberiam que ele estava ali.
Era muito mais fácil julgar os outros quando não se incluía na equação.
- Não esperava te encontrar aqui – uma voz conhecida se pronunciou ao seu lado, um pouco mais atrás. Tony estava tão distraído em seus pensamentos que sequer notara a figura se aproximando. Steve só se permitiu se adiantar para as lápides para depositar as flores que trouxera quando o engenheiro notou sua presença, depois de lhe dar um tempo para se recuperar do leve susto.
- Posso dizer a mesma coisa – devolveu Tony, assistindo Steve voltar para o lado com um suspiro. As mãos do soldado escondidas nos bolsos de seu casaco tremiam, e não era pelo frio. Era nervosismo.
Eles moravam temporariamente no mesmo prédio e nem por um segundo lhe passou pela cabeça que Tony, o filho do casal, tiraria o dia para uma visita. Desde que fora resgatado, algo como dois anos atrás, Steve sempre prestava uma visita em respeito à memória dos dois, mesmo não tendo conhecido Maria, e nunca esbarrara com Tony por ali. Seu lado mais implicante acreditava que ele realmente não fazia as visitas, mas agora Steve se questionava se não fora apenas a escolha de dias e horários que impediram seus encontros passados. Todas aquelas oportunidades, e eles tinham que se encontrar logo naquele dia, quando o remorso em seu peito parecia mais concentrado e incontrolável. Era difícil olhar para Tony no dia-a-dia e ignorar a voz de Zola em sua mente, explicando alguns fatos curiosos dos anos que esteve no gelo. Aquela deveria ser a maior saia justa da história, e o soldado não sabia o que fazer. Não tinha como saber como o engenheiro reagiria àquela revelação, muito menos se era realmente importante contar. Sem saber, não tinha como sofrer por aquilo, certo?
- Eu nunca disse isso antes, mas… Eu sinto muito por eles, Tony. Sinto muito mesmo.
- É... – suspirou Tony, sentindo que já estava bom para o dia. Aquela conversa ele definitivamente não queria ter, então, sem mais delongas, ele girou os calcanhares e passou a se direcionar para onde estacionara seu carro – Eu também.

Tony saiu de seu devaneio com um pulo, despertado pela voz de Parker que conversava com Sexta-Feira sobre qualquer coisa que ele não queria prestar atenção. O jovem herói ainda usava o agasalho de sua escola, e tinha sua mochila nova - já tinha perdido a conta de quantas foram naquele mês - nas costas, um sorriso animado no rosto que foi aos poucos desaparecendo até que tivesse uma careta confusa no lugar.
- Sr. Stark? Tá tudo bem? – perguntou o garoto, genuinamente preocupado. Tony tinha um olhar estranho e vago, o rosto apoiado no balcão da cozinha comum da equipe e uma caneca que ou estava vazia ou não tinha mais um líquido quente no seu interior ao seu alcance. Assim que notou que não estava mais sozinho, ele até tentara disfarçar, esfregando os olhos para parecer mais desperto, só que o estrago já estava feito.
Parker não iria mais sair do seu pé.
- Sim, pirralho – resmungou ele, esticando a mão para pegar sua caneca e fazendo uma careta desgostosa quando sentiu a bebida já gelada contra seus lábios. A última coisa que ele precisava era de café frio – Já terminou o dever?
- Sim, estava indo treinar um pouco… Precisa de alguma coisa? – Peter insistiu, suas mãos se movendo em uma velocidade tão rápida e ansiosa que chegaram a deixar o engenheiro tonto – Quer que eu chame o Happy ou a Srtª Potts?
- Não, tô legal. Só vai trabalhar.
- Qualquer coisa, pode me ch…
- Parker, vai logo! – grunhiu Tony por fim, se pondo de pé para fazer mais café e dar mais moral ao seu tom de ameaça, que fora bastante efetivo.
- Tá, legal! – devolveu Peter na hora, erguendo as mãos em sinal de rendição enquanto recuava para deixar a área de convivência – Tô indo, viu. Até já fui.
Estando mais uma vez sozinho, Tony se permitiu voltar ao seu estado lastimável, onde não sabia tomar uma decisão se quer.
E se fosse ao cemitério e encontrasse com Steve lá, o que ele faria?

No matter how far
(Não importa a distância)


O mundo estava caindo aos pedaços mais uma vez, mas tinha algo no ar que dizia a Tony que daquela vez era para valer. A ameaça que enfrentava era de um nível que nunca tinham visto antes, e, mesmo que não fosse admitir em voz alta para não abalar os colegas, Tony estava com medo. A imagem de um deles sendo morto como se não passasse de um brinquedo sendo desmontado por seu dono parecia impressa em suas retinas, atormentando seus pensamentos quando acordado e assombrando seus sonhos quando raramente conseguia dormir um pouco.
Thanos não era apenas uma ameaça para a Terra, mas para o Universo como um todo. Ainda não conseguiam entender suas motivações, e no fundo nem importava. O fato era que ele não pararia até tudo ser destruído e queimar diante de seus pés, e eles precisavam de alguma forma impedir isso. Se ele conseguisse reunir todas as joias na Manopla, seria o fim definitivo e sem volta.
Parecia um bom momento para uma ligação, certo?
O aparelho de tecnologia ultrapassada passeava pelos dedos do engenheiro inconscientemente, enquanto ele tentava pensar nas estratégias mais variadas o possível para evitar mais catástrofes do que já haviam acontecido. Tony tinha algumas suspeitas do paradeiro de Steve, mas não estava em posição de fazer apostas tão altas, muito menos de recusar pessoas. Seria muito bem-vinda qualquer ajuda de Wakanda, e o engenheiro precisaria de muita maturidade e autocontrole para aceitar quem isso também significava. Seu rancor em relação a Barnes até tinha diminuído, depois de muito tempo tentando se convencer de que ele não optara por matar seus pais, mas também não significava que ele seria o primeiro da sua lista de convidados para festas do pijama, ou que entraria na lista de algum jeito. Steve que era um caso completamente diferente. Era possível entender suas motivações em algum nível? Sim, só que isso não diminuía o peso da traição.
Durante todos os dias seguintes, Tony manteve o aparelho por perto, quase que como um Plano B. Chegara algumas vezes a apanhá-lo e selecionar o único número salvo da lista de contatos, mas sempre voltava atrás. Por isso sua surpresa em avistar, junto com o exército de T’Challa, Steve no campo de batalha, tão irreconhecível que demorou muito para ligar a figura ao nome, tanto pelas mudanças em seu rosto como pelas mudanças no uniforme, que chegava a lembrar os clássicos do Capitão América, mas que não transmitiam a mesma confiança e familiaridade de sempre. Os tons excessivamente escuros mais a barba grossa e os fios mais compridos davam uma imagem sombria ao soldado, e, de alguma forma, Tony se sentiu um pouco culpado por isso, o que apenas o deixou mais irritado. Steve que cometera um erro grave, não ele. Não era só porque não tinha feito a maldita ligação quando precisara que tudo aquilo podia de repente ser sua culpa, não fazia sentindo. Ele que escolhera aquele caminho, ser um fugitivo, se distanciar o máximo possível da figura do Capitão América, Tony não podia ser responsabilizado. Alguém só precisava avisar sua mente masoquista disso.
Durante os preparativos, eles acabaram se aproximando, já que a estratégia do dia precisava ser compartilhada com os superiores, com o intuito de que os líderes soubessem como agir com o restante dos soldados e respectivas equipes. Tony notou mais alguns dos fugitivos, mas sua atenção na maior parte do tempo era de Steve, que parecia estar passando por um conflito semelhante. Ele queria falar com Tony, ser menos covarde e dessa vez se despedir pessoalmente, de repente até aceitar de bom grado a surra que o engenheiro deveria ter planejado lhe dar nos últimos anos. Se aquilo fizesse Tony ter mais paz e diminuísse por menor que fosse a quantidade o remorso que habitava seu peito, Steve estaria mais que satisfeito.
- Eu não liguei – comentou Tony baixo para ele em algum momento, mostrando que não estava disposto a ser o primeiro a dar o braço a torcer, mesmo o braço do soldado já estando no chão de tão torcido. Por isso Steve apenas soltou uma risada leve pelo nariz.
- Não precisava – lembrou ele sério, mesmo com um vestígio de sorriso querendo se desenhar em seus lábios – Disse que estaria aqui caso precisasse de mim, e sempre vou estar.
A conversa se resumira apenas àquilo, e ambos ficaram satisfeitos. Algumas coisas não precisavam ser ditas, e, as que precisavam, não eram para aquele cenário. O que importava é que tinham entrado em um entendimento, mesmo que silencioso. Erros haviam sido cometidos, e eles não precisavam ser esquecidos, pelo contrário. O importante era aprender a lidar com aquilo, superar o obstáculo, e eles tinham tempo para aquilo.
Só precisavam vencer aquela guerra.

Ain’t no mountain high enough
(Não há montanha alta o suficiente)




Fim



Nota da autora: Tô nesse mundo pra sofrer por Stony sim, aceitei isso em 2012, vlw flw.
E SIM, TENHO ESPERANÇA QUE MEU STONY VAI SE RESOLVER, NÃO QUERO SABER DOS INFORMANTES QUE TÃO FALANDO QUE ELES NÃO SÃO MAIS AMIGOS, VÃO TER QUE VOLTAR A SER, senão mamãe fica chateada <3





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