Capítulo Único
“Perhaps one day, in a year or even in a century, you’ll turn up at my door and let me show you what the world has to offer.”
Quando você vive para sempre, para o que se vive? Quando você já viveu tudo que poderia, porque continua vivo? Eu tinha vivido os gloriosos anos 20, vi o mundo eclodir nos anos 40, as revoluções dos anos 60, a paz dos anos 70, as músicas irritantes dos anos 80, a tecnologia tomando conta dos anos 90 e a confusão que virou aos anos 2000 e algo.
Mas nem sempre era fácil vagar pelas ruas. Muitos dias eu me sentia sozinho em meio a multidões. Outros, precisava segurar a minha ânsia por sangue e lembrar que, mesmo que no fundo eu fosse um animal, eu ainda vivia no meio de humanos.
Eu ainda precisava ser civilizado. E a verdade, era que eu gostava.
Ir de bar em bar, conhecer moças bonitas que facilmente eram hipnotizadas. Era sexo e sangue fácil. Duas coisas que havia aprendido a apreciar em toda a minha vida como vampiro.
Mas por algum motivo, essas coisas agora pareciam vazias. Desde que eu a havia conhecido, meu novo sonho era poder mostrar a todo o potencial que o mundo tinha. Levá-la para Paris, andar pela Muralha da China, provar temperos da Índia, curtir uma Lua de Mel no Brasil.
Mas por mais que eu estivesse apaixonado por ela, me odiava.
Eu havia sido o responsável por ter mudado a vida dela completamente. Tinha sido eu a transformá-la em vampira e ela não tinha me perdoado. Mesmo sendo apaixonada por ser uma vampira, ela ainda não tinha me perdoado.
Ou pelo menos eu achava que ela não tinha.
Bati na porta da casa dela em Mystic Falls. Era claro que eu poderia simplesmente entrar, mas aquela era . E ela sabia que eu não a procuraria que realmente não fosse sério. Já estava esperando seu comentário sarcástico quando abrisse a porta, mas não foi o que recebi.
— ? O que… como isso aconteceu?
— … Me ajuda, love…
E então eu apaguei.
Ainda estava tonto quando senti uma toalha molhada sendo colocada em minha testa. O corte no meu tronco ardia. Apenas vultos do que tinha acontecido naquele dia vinham na minha mente: o bosque, a bruxa, a dor.
Não fazia ideia de como tinha ido parar ali ou em que lugar estava. Me sentia seguro, mas tudo doía. Tentei abrir os olhos, mas tudo estava turvo.
— Não mexe. — a voz dela estava firme. Aquilo era uma ordem. Normalmente eu não deixava que mandassem em mim, mas aquela mulher era algo diferente. — está a caminho para tentarmos descobrir o que aconteceu.
— ...
— Shhh. Não se mexe. Vai ficar tudo bem.
Escutei passos se afastando e eu estava sozinho de novo. Sentia o corte latejando, minha cabeça acompanhando no mesmo ritmo do meu coração que deveria estar batendo.
Já fazia muito tempo desde que sentira meu coração bater pela última vez. Muitos dias eu nem sequer lembrava que já havia sido humano. Era fácil se perder quando você não tinha nada a perder.
Devo ter desmaiado novamente pois acordei com vozes no cômodo vizinho. Mais uma vez tentei abrir os olhos e levantar, sem sucesso.
— , você está louca se acha que vou ajudá-lo.
— , por favor. Ele veio até mim, não posso simplesmente deixá-lo morrer.
— Ah, você pode sim. Iria resolver boa parte dos nossos problemas.
Escutei mais passos e senti a cama se mexer.
passou os dedos lentamente nos meus cabelos. Queria poder ter aquela sensação todos os dias da minha vida.
— Ela está certa… — falei com a voz quase sumindo.
— Shh… Você não vai morrer.
— Sua vida seria mais fácil.
— Não teria a mesma graça sem você.
Abri meu olhos com aquela fala. Dessa vez tive forças para olhar em seus olhos azuis. Aquela cor que me trazia paz apenas por me lembrar dela, por ser ela.
— Me perdoa. — vi seus olhos encherem de lágrimas quando soprei aquelas palavras.
— …
— Me perdoa, love. Por favor. — Fechei os olhos novamente mas apenas porque não conseguia ver a expressão de dor em seus olhos.
Eu não era santo. Havia matado muita gente nessa vida e sabia que não mudaria tão cedo. Mas desde que a conhecera, eu queria ser diferente. Queria fugir da minha natureza, daquela vida que havia sido a única que eu conhecera por séculos.
— ... deixa eu falar. — ela parou apenas para me olhar. — Quando eu estou com você, eu sinto que minha humanidade não está morta. Sinto que ainda posso sentir e me importar. Você é a única coisa que me faz querer importar com alguém. Você me faz ser humano.
As lágrimas começaram a sair dos seus olhos novamente. Quis tocar seu rosto e secar suas bochechas, mas não consegui me mexer. Um acesso de tosse veio e não conseguia respirar.
— , por favor. — escutei ela falando e a bruxa entrou no quarto.
— Saiba que estou fazendo isso pela minha amiga.
Em algum momento eu desmaiei novamente.
Quando acordei já não sentia mais dor. O quarto estava todo bagunçado. me olhava com uma cara fechada e eu já tinha aprendido a ignorar suas expressões. Infelizmente não poderia discutir com ela se quisesse que confiassem em mim.
Tentei levantar e dessa vez consegui. Olhei para e ela estava assustava.
— , com quem você se meteu dessa vez? — continuou com a expressão tensa.
— Com ninguém. Eu juro que estava apenas caçando quando um grupo de bruxos me atacou.
— Por que eu não acredito nisso? — A morena cruzou os braços.
— Não preciso que você acredite, só espero que você aceite os meus agradecimentos. Às duas. — Olhei para que estava tremendo.
Ela se aproximou de mim e, por algum motivo, me abraçou.
— Você me assustou.
— Me desculpa. — beijei o topo da sua cabeça e deixei que ela recostasse em mim.
Agora eu me sentia completo. Em alguns minutos eu iria embora daquela casa novamente e passaria um bom tempo sem vê-la. Mas naquele instante, eu iria aproveitar o calor do seu corpo porque ela estava ali. E estava tudo bem.