Capítulo Único
A caneta deslizou gentilmente pelo papel, formando na folha uma caligrafia elegante e bela. “Querida ...”, escreveu, mas, olhando o papel novamente, ela começou a duvidar da forma de tratamento a usar. , apenas, era impessoal demais, ao passo que Querida parecia querer, de alguma forma, tomar à força a proximidade que ambas tinham, tempos atrás. Depois de hesitar por alguns segundos, riscou o papel, puxando outra folha. Não falava com ou desde que tinha deixado a cidade, embora antes fossem mais unidas do que irmãs.
nunca tinha imaginado o quão difícil era escrever uma carta. Ela tinha certeza que, se pudesse dar um telefonema, então toda a conversa seria muito mais fluida, mas o único telefone se encontrava no escritório da madre superiora e as alunas apenas podiam usá-lo em emergências. Embora, infelizmente, e a madre discordassem quanto ao real significado de “emergência”.
Ela voltou a escrever, deixando de lado a preocupação inicial sobre a forma de tratamento destinada a alguém que já foi sua melhor amiga. Ela iniciou a carta, deixando um espaço para que pudesse decidir depois. Já estava cansada de riscar folhas e jogá-las fora. se lembrava da fogueira como se a festa tivesse acontecido ontem e não há um par de anos. Foi com essa memória que ela recomeçou sua carta.
“Lembra de como costumávamos passar a noite festejando e nos divertindo? As festas ao redor da fogueira, as cervejas que roubávamos do gabinete do meu pai?”
O sol já tinha se posto, a maioria dos banhistas também tinham se retirado. A noite caiu, mas o grupo de estudantes não pareceu notar. Continuaram bebendo e conversando, divertindo-se. Sob a luz tremulante do fogo, ela movia seu corpo junto ao de . Não era uma dança propriamente dita, as duas apenas cantarolavam qualquer coisa enquanto mexiam seus corpos para combinar com a melodia inventada. Elas não faziam nenhum sentido, mas seus namorados assoviavam e as incentivavam a continuar com gritos de júbilo.
A praia estava vazia, combinando com as garrafas de Pabst Blue Ribbon na areia. Os cachos loiros e longos de , um penteado que espelhara nos cabelos de Brigitte Bardot, se agitavam enquanto ela movia a cabeça. Os quadris moviam-se sensualmente de um lado a outro, cantarolava Bang Bang, as pernas nuas faziam passos desconexos de dança. Ela ainda usava o traje de banho, apesar de a brisa marítima ligeiramente gélida fazer sua pele se arrepiar. , da mesma forma, movia-se ora perto da amiga, ora mais afastada.
Seus respectivos namorados sentavam-se ao redor da fogueira, sorrindo, relaxados, enquanto observavam as duas. A cena não era incomum. Frequentemente os sete dirigiam até a praia, faziam uma fogueira e se divertiam com as bebidas e cigarros que roubavam dos pais. , Jack, Leo e Johnny eram veteranos, tinham dezoito anos. Aquele era o último verão para que aprontassem o que bem entendessem. As outras três integrantes do grupo eram , e a tímida , que, apesar de ter uma garrafa de cerveja em mãos, parecia tão deslocada do resto quanto um peixe fora d’água. Ao final da performance improvisada, e abraçaram-se, curvando-se e agradecendo as palmas dos quatro rapazes.
— Você estava ótima, gata. — A boca de achou o pescoço da loira, que soltou um risinho estridente.
— E então? Acha que eu tenho talento para ser cantora? — Ela perguntou, coquete, passando os braços ao redor do pescoço do namorado. O contato do corpo era intenso devido ao pouco tecido de seu traje de banho e o torso desnudo do veterano.
não aprovava o desejo de ser cantora de sua namorada, assim como o pai dela a proibia veementemente de tentar seguir a carreira musical. Mulheres fáceis, diziam ambos, cantoras e atrizes eram mulheres fáceis. Não importava se, no fundo da mente deles, Jane Fonda ou Marilyn Monroe ocupassem seus pensamentos. As mulheres que queriam ao seu lado eram sempre bem-educadas e castas. Cantoras eram para se divertir, esposas respeitáveis não deviam nem usar tanta maquiagem. Por isso, não respondeu e apenas beijou os lábios rubros, já um tanto borrados, da garota em seus braços.
Ele era, por fora, um rebelde; ao menos era isso o que a jaqueta de couro, deixada dentro do carro, sugeria. Embora, no fundo, fosse tão hipócrita quanto seu pai engomadinho. Alta, no entanto, parecia não se importar. Quando estava sóbria, os dois costumavam brigar por conta disso, mas era verão e ela queria se divertir longe das reprimendas moralistas do pai e das matronas que reprovavam cada passo que dava na rua.
No fundo, a culpa não era de por ser tão mal vista. Desde que sua mãe decidira se divorciar e voltar a Massachusetts, toda a cidade a olhara torto. Também, pudera! Era, tal e qual a sua mãe, uma beldade de cabelos loiros e olhar dissimulado. As matronas tinham pena de seu pobre pai, que se esforçava dia e noite para dar freio a uma rebelde descarada. E, enquanto a noite chegava ao fim, e seu namorado se afastaram do grupo, mas , atenta ao desconforto de , logo afastou-se de o suficiente para sentar-se ao lado da melhor amiga de infância.
— Ei, quer ir embora?
não era desinibida como ou mesmo tão espontânea como . Não, era dona de uma inteligência espantosa, uma disposição dócil e o temperamento mais gentil que se pudesse imaginar. Ela não era tão delicada quanto gostava de pensar, mas era sensível. Por isso, sempre que a notava assim tão desconfortável, ela sempre fazia a mesma pergunta a .
Se perguntasse a qualquer um dos outros rapazes, talvez eles não convidassem para ir junto. Não que ela não fosse bonita, era linda e angelical, mas era tímida e não conseguia se soltar como as outras duas. E, consequentemente, ela também não se interessava em namorar Johnny ou Leo. Os rapazes apenas a convidavam porque e não deixariam a amiga na mão, mas tinham se cansado de investir na bela anjinha para se importarem com ela. E, se uma mulher não servisse para namorar com eles, então para que serviria?
era a primeira a admitir que eram quatro babacas, mesmo que um deles fosse o seu namorado e outro fosse o de ; os quatro eram babacas esnobes, mas eles as levavam para as melhores festas e eram bonitos de se ver. No fim, eram apenas ferramentas, úteis como um vestido bonito ou a meia-calça certa.
— Não, está tudo bem. — negou prontamente. Sua amiga geralmente não queria incomodá-la, ela quase nunca dizia que queria ir embora. abanou a cabeça, estava se divertindo e não queria ir embora, mas não queria deixar sua melhor amiga daquela forma.
, no entanto, parecia ter outros planos. Ele puxou a namorada pela cintura, sentando-a no colo dele. A loira sentiu a ereção dele incomodando-a, mas não disse nada. A mão calejada tocou-lhe um seio, por cima do tecido do biquíni, a outra segurava a sua cintura de modo dominante. detestava quando ele a apalpava daquela forma, como se ela não servisse para nada além de satisfazer seus desejos.
— Deixe-a em paz. — Ele sussurrou no ouvido dela. — Ela já disse que está bem.
— Você deve ser cego para não ver que ela não está bem! — A loira retrucou, desvencilhando-se do namorado e indo na direção da melhor amiga. — Venha, vamos procurar pela .
— Ah, gata… — franziu o cenho, fechando a cara. Ele detestava ser contrariado.
A jovem deu de ombros, pegou a mão direita de e pôs-se a procurar , que, pelos risinhos agudos, não deveria estar longe. encarou a amiga de modo agradecido, sendo respondida com um breve sorriso espoleta, marca registrada da loira, que apenas continuou andando apesar dos gritos de lhe dizerem para voltar.
O namoro dos dois era inconstante. Brigavam com frequência porque era muito à frente de seu tempo para um rebelde de araque como . Discordavam em quase tudo. era dominador, mas esquecia-se que sua namorada não era nenhuma moçoila submissa. No fim, por mais que se dessem bem nos assuntos mais físicos, não tinham nada em comum. A relação vivia por um fio, mas gostava disso. Gostava do imprevisto, do incomum, da falta de rotina. E, também, não conhecia outro rapaz que pudesse ser tão atraente quanto seu namorado. Era algo superficial, era conveniente aos seus planos. Era apenas isso.
e Jack, por outro lado, eram a imagem do casal perfeito. Eles não terminavam todo final de semana, como e . Eles se davam bem, suas famílias aprovavam o relacionamento, mesmo que a família de consistisse apenas em seu pai, um viúvo ainda jovem que fazia as matronas suspirarem. Por isso, e sempre se sentiam culpadas quando os interrompiam, porque eles sempre pareciam em seu próprio mundinho recheado de paixão e pombas brancas.
— ! — chamou de longe, não se atrevendo a chegar muito perto. Ela fez uma concha com as mãos ao redor da boca para gritar o resto do recado. — Estamos indo!
já tinha se vestido quando reapareceu, seus cabelos castanhos e encaracolados caindo por sobre os ombros bronzeados pelo sol, o biquíni meio torto, mas um sorriso estonteante no rosto. A loira rolou os olhos, rindo, e apenas murmurou para que a amiga se apressasse e trocasse de roupa. Os rapazes pareciam meio mal humorados, mas nenhuma das três ligava.
O Cadillac vermelho de cortou a estrada, em um curto trajeto de cerca de vinte minutos de volta para casa. A cor da paixão era a sua preferida, usava vermelho nos lábios, no lenço que amarrara no cabelo, para que não embolasse, nas unhas. Os faróis altos, o rádio ligado, e imitavam uma plateia gritando e torcendo enquanto a loira cantava, em alto e bom som, Please Mr. Postman.
Ela amava cantar. Cantarolava enquanto estava na escola, quando cozinhava, mesmo enquanto estava no banho. Era bastante afinada para quem nunca tinha tido aulas de canto antes, mas tampouco era tão boa quando uma cantora profissional. Tinha os discos de diversas cantoras, como Doris Day e Nancy Sinatra, outros eram de grupos como o que cantava no rádio agora, The Marvelettes. Os de Elvis, que pegara da coleção de sua mãe, ainda estavam guardados no fundo do armário, porque sabia que seu pai se chatearia. Ele não podia ouvir sequer uma música do Rei do Rock sem lembrar-se de Eleanor. A música movia a jovem, era certo.
Havia tanta alegria de viver nela, tanta espontaneidade, talvez por isso era tão mal vista. Era uma moça que tinha feito as pazes com seus próprios defeitos e os aceitava como algo que a fazia única. Seu pai, há muito, notara que tinha o espírito livre demais. Ele tentava podá-la e colocá-la de castigo, mas era irrepreensível, não porque fosse perfeita, mas porque as composturas que ele lhe passava não faziam efeito.
Seu pai podia não gostar da companhia com a qual ela se cercava, os rapazes de jaqueta de couro e a atitude rebelde, a filha despreocupada do viúvo inconsequente, mas o que ele podia fazer quando passava os dias, às vezes as noites, no hospital, trabalhando? vivia como queria e, ao contrário da crença popular, era mais responsável do que deixava transparecer. Para começar, era sexualmente ativa, sim, mas jamais fazia sexo com o namorado sem o preservativo. Ela era filha de um médico e a mera ideia de engravidar e pôr tudo a perder lhe fazia arrancar os cabelos. Ela tomava conta da casa, já que seu pai fazia plantões e mais plantões, cuidando desde a limpeza até as refeições e, apesar de não ter as melhores notas da turma, sua situação escolar não era desesperadora.
Quando precisava de dinheiro, trabalhava como garçonete. Aproveitava para cantar para os clientes, os que não viravam a cara para ela por causa do escândalo ambulante que era. A boa gente da cidade preferia que seus filhos e filhas ficassem a salvo da influência da loirinha. Era a filha pródiga de um bom homem, diziam. Para , era apenas uma garota normal, vivendo de forma normal. Não merecia ser culpada pelos “crimes” da mãe, muito menos julgada por ser menos comedida do que o que achavam de bom tom.
No verão, o calor de Junho corava suas bochechas e fazia o cabelo loiro colar na nuca. O sol grudava as roupas, que já eram justas, na pele ligeiramente bronzeada. Ela assoviou uma música enquanto levava os pedidos para as mesas, sorrindo para os pais de quando passou por eles. Os , apesar de tudo, gostavam de . Eram vizinhos de a vida toda, as meninas cresceram juntas e Katherine, mãe de , praticamente a adotou quando Eleanor foi embora. Embora fosse, aqui e ali, levemente criticada por seu comportamento, Katherine jamais ralhava com ela apenas para ser desagradável, ela se importava com a menina tanto quanto com a sua própria filha.
— Está de bom humor hoje, passarinha. — Katherine observou, fazendo a loira sorrir. pôs uma mão na cintura, parando ao lado da mesa onde Robert e Katherine almoçavam.
Katherine a chamava de passarinha desde que se entendia por gente. O apelido derivava do fato da menina estar sempre cantando, mas, ultimamente, também podia ser atribuído ao fato de que queria bater asas e voar dali.
— O verão sempre me deixa de bom humor. — Ela sorriu alegremente, tirando seu bloquinho do bolso do avental e a caneta de detrás da orelha. — O que vai ser?
A outra fechou o cardápio com um estalo, sorrindo para o seu marido e em seguida se dirigindo à garçonete.
— O de sempre. Aliás, quer jantar lá em casa hoje? É noite da pizza.
A loirinha sorriu e concordou, anotando o pedido costumeiro e deixando a mesa dos de lado. jantava com os algumas vezes, quando seu pai ligava e avisava que faria um plantão à noite ou que não voltaria para casa até de madrugada. As duas famílias ainda eram bastante próximas, apesar de Eleanor ter partido sem olhar para trás.
Vez ou outra, no entanto, precisava ficar sozinha e se refugiava em sua cozinha para fumar um cigarro ou comer algo que não deveria, como chocolate. Ou, então, saía com o namorado e seus amigos para comer em alguma lanchonete e assistir a um filme no cinema drive in que gostavam tanto de ir. Claro que quase nunca assistiam ao filme, achava o escuro e o carro fechado a oportunidade perfeita para seus avanços sexuais e por que ela não gostaria disso? Sentia-se bem com a adrenalina de, talvez, ser pega. O perigo a excitava mais do que algum dia poderia.
— Boa noite, sr. . — Ela acenou para o viúvo com uma mão, empurrando a bicicleta com a outra.
— Boa noite, . — Ele respondeu com um aceno, fazendo-a sorrir. Ele sorriu de volta.
O pai de estava no final dos trinta anos; era um homem bonito, sempre charmoso e bem-vestido, que sorria quando ela passava. Surpreendentemente, ela sempre o achava fumando em seu portão no horário que ela voltava para casa. Por isso, o ritual era repetido toda noite.
Seu pai não gostava de . costumava brincar e dizer que era porque o sr. roubara dele o título de arrasa corações, que antes pertencia ao pai, desde que se mudou para a cidade, dois anos antes. No entanto, se havia algum tipo de desentendimento entre os dois, ela não sabia e nem se importava, porque o flerte era inocente. Seu namorado jamais saberia, jamais saberia, ela e jamais teriam algo além dos sorrisos e dos cumprimentos que trocavam à noite. Ela costumava fazer isso sempre, era como se divertia em uma cidade pequena. Os sorrisos para o professor de inglês bonitão, os risinhos que soltava sempre que algum cliente costumeiro a elogiava no restaurante, a forma como ela, por vezes, mostrava um pouco a mais do decote do uniforme para se divertir com as reações dos rapazes. Era divertido. Ela era jovem, bonita e vaidosa, esse tipo de coisa era como uma brincadeira. Aqueles flertes não a levavam a lugar algum e ela jamais tinha desonrado seu compromisso com .
As mulheres solteiras costumavam estar sempre em cima de . Ele era viúvo, afinal. Tinha um bom dinheiro, casa própria, um jeito charmoso de falar. Eventualmente, ele arranjava uma namorada. sempre reclamava de como seu pai estava saindo com essa ou outra mulher. E, para , a memória da mãe ainda era muito presente para aceitar que seu pai amasse outra pessoa. E, por esse motivo, vez ou outra os dois brigavam e acabava dormindo na sua casa.
Se fosse para ser bem sincera, gostaria de dormir com alguém como ao menos uma vez. E como sinceridade não era bem o seu forte, ela jamais admitiria isso em voz alta. Ao menos onde pudesse ouvi-la. Jamais conversaram sobre isso, mas ela conhecia a amiga o suficiente para saber que sua amizade estaria acabada se ficasse com o pai dela. Por isso, ela passou direto, sem tentar parar e puxar uma conversa como teria feito com qualquer outro.
“Nós tínhamos só dezesseis anos, mas os rapazes sempre assoviavam e nos notavam. Até mesmo os mais velhos. Lembra, ? Lembra de quando roubamos uma viatura com os veteranos? Os professores diziam morreríamos cedo se continuássemos daquela forma. Bem, eles não estavam errados, estavam? De um modo ou de outro, eu morri.”
— Eu ainda não acredito que você me convenceu a fazer isso. — sussurrou para a amiga de infância que, levemente alcoolizada, riu baixo.
— Nós só vivemos uma vez. — repetiu o argumento da loira.
Era estúpido. Era realmente estúpido, mas os rapazes logo iriam embora. Alguns iriam para as mesmas faculdades que seus pais estudaram, outros aprenderiam sobre seus futuros ofícios com seus pais, assumindo negócios de família. De qualquer forma, a idade adulta se aproximava em uma velocidade alarmante para e seus amigos. E, como os adolescentes que eram, eles queriam se agarrar àquele fiapo da juventude, àquela sede de perigo e irresponsabilidade que logo teriam que deixar de lado assim que o verão se findasse.
Os trotes dos veteranos eram amplamente conhecidos na cidade. Algumas vidraças quebradas, uma ou outra casa coberta de papel higiênico não era nada. Todo ano os jovens achavam modos cada vez mais ousados de fechar a vida escolar. E quando ouviu o plano que o namorado lhe disse, ela soube, imediatamente, que tinha que participar. E lá estavam as três arriscando-se desnecessariamente quando disseram que iam apenas tomar um milkshake. De certa forma, nenhuma delas mentiu para os pais naquela noite.
Então, as três tinham apenas que fazer sua parte enquanto os veteranos roubavam a viatura estacionada fora da lanchonete. Era simples e fácil. , atrás das amigas, rezava para tudo dar certo. Foi quem andou primeiro, inclinando-se contra o balcão enquanto aguardava a sua vez de ser atendida. Os policiais sorriram para ela e aproveitou para fazer o mesmo.
— Boa noite, rapazes! — A loira cumprimentou, bastante simpática.
— Como vai, ? — O mais velho sorriu para ela enquanto o outro policial, um novato ainda verde, olhou para um tanto embasbacado. Ela o conhecia de vista, sempre o servia no restaurante.
— Viemos comprar uns milkshakes. — A loira deu de ombros e , um tanto nervosa, ergueu a voz e completou:
— Nós vamos ver um filme!
fez força para segurar uma risada, sorriu amarelo e apenas continuou, um tanto ansiosa, a observar a interação. e logo emendaram uma conversa, fazendo com que os dois policiais ficassem conversando mesmo enquanto elas esperavam os milkshakes ficarem prontos.
— Espero que respeitem o toque de recolher, moçoilas. — O mais velho sorriu de forma simpática, seus olhos se demorando um pouco no belo sorriso de sua amiga.
— Quem somos nós para desrespeitar os homens da lei? — rebateu, os lábios pintados de vermelho se abrindo em um sorriso ainda mais charmoso enquanto seus olhos verdes pareciam faiscar.
A cena que os policiais causaram ao descobrir que a viatura deles estava desaparecida divertiu as três pequenas foras da lei. As três riram, embora o riso de soasse nervoso. Eles perguntaram às garçonetes se viram qualquer coisa e elas se despediram inocentemente. Lá fora, de braços dados, as três caíram na risada, sentindo a excitação que tudo aquilo causara. Como a sensação de algo tão errado podia ser tão prazerosa? Mesmo a bondosa se sentia estranhamente matreira, embora nunca tivesse sido o tipo de pregar peças. Talvez fosse porque tinha as amigas junto de si ou, quem sabe, no fundo tinha uma sementinha má?
Alguns quarteirões depois, passou com as sirenes ligadas, buzinando para as garotas enquanto acelerava pela rua principal.
— Ele é tão idiota. — disse e a namorada do idiota em questão riu.
— Foi legal, você não pode negar isso! — Ela sussurrou enquanto abraçava sua amiga de infância.
— Um dia, vocês serão presas e eu irei com vocês porque não sei dizer não.
— Somos inteligentes demais para sermos presas. — respondeu.
— E foi só um trote. Não vai dar em nada. O tio do é o chefe de polícia, ele não ia prender o próprio sobrinho. — A loira deu de ombros, levando o canudo do milkshake até a boca e tomando um gole.
E embora o trote em si não tivesse resultado em nada de muito sério, era inegável que a arrogância do grupo de amigos em breve acarretaria em algo grave. Elas subiram na viatura, depois de correr até o veículo parado. Sim, um dia algo daria errado. Eles só não sabiam o que.
Na verdade, não chegou a demorar muito. Com as aventuras dos veteranos, , Jack e os rapazes costumavam ficar mais ausentes. E enquanto a ausência do namorado não incomodasse muito , para a história era outra. Jack, por pura insistência dos rapazes, vez ou outra arriscava-se em corridas de rua. Não por dinheiro, mas pela emoção. E não gostava nada disso. O seu Jack agora tinha a atenção de outras garotas e o ciúme corroía a moçoila de sangue quente. Não que a culpasse, Jack parecia gostar demais de toda a situação.
— Toma um cigarro. — ofereceu-lhe, esperando que aquilo a acalmasse, como costumava fazer com ela.
aceitou o cigarro de mal grado, acendendo-o e tragando profundamente enquanto olhava Jack de papo com alguma garota mais velha.
— Olhe para ele! — A garota apontou. — Ele nem esconde que está adorando isso. Imbecil!
— Por que não conversa com ele? — , franzindo o nariz para a fumaça do cigarro, perguntou-lhe.
— Eu já conversei. — Seu tom era brusco e ela tragou longamente mais uma vez, expirando a fumaça lentamente pela boca. — Ele é um idiota, isso que ele é!
— . — chamou, conhecendo a índole da garota mais do que qualquer uma. — Faça o que quiser, mas tente não fazer um escândalo.
— Ele merece um escândalo! Acha que é certo me deixar aqui enquanto ele flerta com aquela vagabunda peituda? — Ela parecia ainda mais inquieta e suspirou.
— Não, mas estamos no meio de uma festa. Vocês podem fazer isso em casa. Ou no carro.
— Para você é fácil falar, ser sonsa é o seu ponto forte. — arqueou as sobrancelhas, como se pedisse uma explicação, mas meteu-se no meio.
— Chega, não precisamos brigar. Você quer ir embora, ? — A morena balançou a cabeça energicamente, negando-se a ir. — Vamos, por favor. Você está bêbada.
— Eu não estou bêbada.
— … E é isso que você sempre diz quando está bêbada. — completou. — Vem, vamos embora. Eu vou avisar o e já volto.
Deixando as duas amigas sozinhas, procurou seu namorado, que bebia com os amigos em um canto mais afastado. Ela passou os braços pelas costas dele, abraçando-o por trás de maneira íntima.
— As garotas e eu vamos embora. — Sussurrou no ouvido dele. se virou e a puxou para perto.
— Fica mais um pouco, gata.
— Melhor não. — Ele franziu a testa.
— É de novo? — A loira rolou os olhos para cima. Detestava quando ele queria discutir por nada, ele só fazia isso bêbado.
— Não, nós só estamos cansadas. Eu trabalho amanhã.
— Fica mais um pouco. — insistiu, apontando para seus amigos. — Todo mundo aqui quer ver você mais um pouco. — E então ele desceu as mãos por sua cintura, o que a fez dar um passo para trás.
— , eu estou indo embora. A gente se fala amanhã.
— Depois não reclama! — Ele ameaçou, gritando as palavras enquanto ela se afastava com a boca apertada de tanta raiva. Foi só para não parecer uma hipócrita que não seguia o próprio conselho que ela evitou fazer uma cena.
Lá fora, fumava outro cigarro, parada contra a luz, os cabelos castanhos caíam sobre seus ombros, ela parecia ainda mais bonita do que antes.
“Nós achávamos que éramos invencíveis. Lembra disso? Eu lembro de tudo, as memórias são meu consolo aqui. Lembro de , de como ela era linda, mesmo bêbada, bambeando enquanto andava com seus saltos na mão. E então ela começou a chorar, nos olhando com aqueles lindos olhos de corça que ela tinha, gritando o quanto odiava os rapazes.”
— Eu os odeio! — Ela continuava gritando mesmo dentro do carro. — Odeio todos eles! Se não fosse aquele filho da puta do Johnny, Jack não estaria desse jeito!
tentava acalmá-la, mas o que poderia fazer além de dirigir? Elas mal tinham entrado no carro, acabaram dando uma volta pelo quarteirão, tentando gastar a bebida de para que o pai dela não percebesse nada.
— Nós terminamos. — revelou bruscamente. — E ele queria me fazer ciúmes que eu sei!
— … — suspirou. Ela odiava ver que o relacionamento de sua amiga, antes tão bonito, agora nada mais era que um punhado de cacos quebrados. — Você quer se vingar dele?
limpou o rímel que escorria de seus olhos, firmando nela seus olhos esverdeados.
— Você faria isso por mim? — Perguntou de modo meigo.
— , eu não acho que isso seja sensato. — interferiu.
— Sabe, está certa. — A loira começou, girando o voltante e fazendo um retorno na rua vazia. — Eles estão agindo como idiotas. foi tão… — Ela se impediu de xingar e as encarou pelo retrovisor. — Não vai ser nada muito sério, .
— É, ! — pelo menos tinha parado de chorar diante da perspectiva de uma vingança contra o ex-namorado. — Nós só vamos… Furar os pneus dele ou algo assim.
— Ou atropelar a caixa de correio dele. — deu de ombros.
— Eu não consigo acreditar em vocês duas, ainda mais com essas mentes criminosas que carregam nas belas cabecinhas. — O tom de era desanimado, mas ela não podia deixar as duas loucas por conta própria.
— Não precisa me elogiar. — piscou para a amiga, que apenas escondeu o rosto nas mãos, pensando onde tinha errado para merecer duas amigas como elas.
O que as duas aprontaram foi algo diabolicamente simples. Se o carro de Jack era seu orgulho e o motivo de ter tantas garotas aos seus pés, então era o carro que deveria sumir da equação. E em vez de amassar o carro dele, como sugeriu – e prontamente negou, dizendo que jamais amassaria seu amado Cadillac apenas para se vingar de um babaca –, elas simplesmente fizeram uma ligação anônima de uma cabine para a casa dele.
— É a mãe do Jack? Oi, aqui é uma amiga. — fez uma voz anasalada, as duas amigas atrás dela rindo baixinho. — Não sei se a senhora sabe, mas seu filho está metido em umas corridas ilegais todos os sábados debaixo do viaduto.
Ela desligou rapidamente, virando-se para as outras duas e caindo na risada em conjunto. limpou as lágrimas dos olhos, desta vez de tanto rir, e abraçou as duas amigas.
— Eu não sei o que eu faria sem vocês.
ficou sabendo por , alguns dias depois, que Jack tinha perdido o carro quando seus pais descobriram que ele estava usando-o para participar de corridas. Ele estava de castigo até o final do verão. Sorrindo, ela disse simplesmente:
— Que chato!
“Isso é o que nos faz garotas, não é? Nós queremos o paraíso, mas nos contentamos com o amor de um homem. Nós colocamos o amor em primeiro lugar, até morreríamos por isso. E somos amaldiçoadas por tudo isso, porque nós preferimos o amor a permanecer juntas.”
Com Jack de castigo, inicialmente ficou feliz. Ela não tinha que olhar para ele a todo momento quando saía com os amigos, podia flertar com caras sem se preocupar. Mas era quando a noite chegava que toda a animação se esvaía.
— , vamos lá, não chore. — pediu, acariciando os cabelos da garota deitada em seu colo.
— Você tem que decidir se o odeia ou se quer voltar para ele. — disse simplesmente, deitada na cama enquanto escolhia um disco para colocar na vitrola.
— Você não está ajudando, . — a interpelou, mas a loira deu de ombros.
— Eu não estou tentando ajudar.
— Eu percebi.
A loira deu de ombros e colocou um dos discos do Elvis na vitrola, fazendo a voz macia e grave do rei do rock ecoar pelo quarto. O ritmo animado de Jailhouse Rock começou a tocar alto.
— Desliga isso! — pediu, fungando.
— Não!
improvisou uns passos de dança enquanto cantava alto. Puxou a amiga, usando um tanto de força, para dançar com ela. , por um momento, continuou sentada no chão, observando as duas amigas dançando, um tanto desajeitada e mais animada do que antes.
A loira girou a outra, que deu uma pirueta um tanto desajeitada, mas insistiu. Rodou-a para um lado, segurou suas mãos enquanto giravam pelo quarto, até que soltou uma risada. As três se puseram a dançar animadamente, cada uma de um jeito, em seu próprio estilo, até que a música mudou e as três se jogaram no chão, rindo. ainda não tinha superado o término, mas era uma questão de tempo. Tinha as amigas para ajudá-la.
“Nosso fim começou antes do verão, antes mesmo que eu errasse com . Todos ao nosso redor percebiam, menos nós, mas estávamos felizes demais, nos divertindo demais. Faltávamos as aulas, bebíamos com meu chefe no restaurante… Acho que deveríamos ter imaginado. A gente só tinha dezesseis anos, mas nos achávamos as donas do mundo.”
— Esse bar é uma espelunca. — reclamou, observando o local onde e Leo insistiram em levá-las.
— Seja um pouco mais tolerante. — Leo pediu, piscando para ela.
— É, gata, aqui eles não pedem identidade. — beijou-lhe o pescoço e ela suspirou, cedendo um pouco.
reaplicou seu batom vermelho, observando-se em seu espelhinho. simplesmente a puxou para uma mesa, onde o resto dos amigos os esperavam. Observou Charlotte sentada no colo de Johnny e imediatamente olhou para , que desgostava da garota.
— O que é? — A loira indicou Charlotte com a cabeça e viu corar de irritação.
— Ah, não. — Murmurou baixinho. — Johnny está namorando ela?
deu de ombros, tentando esconder o descontentamento. Charlotte e tinham uma briga que ninguém sabia, com certeza, de onde surgiu, as duas apenas não se gostavam e evitavam a presença uma da outra como o diabo foge da cruz.
— Com sorte, vai se cansar dela tão rápido quanto se cansou da última. — se meteu, olhando o desafeto de com olhos críticos. — Esses namoricos de verão nunca duram muito.
— Achei que você deveria ser a romântica do grupo. — provocou.
— Não, essa é a que ainda espera por seu príncipe encantado.
— Eu odeio vocês. — A garota citada suspirou e levantou o queixo, sentando-se na mesa mesmo que a contragosto.
No fim, a bebida acabou deixando todos ligeiramente mais amigáveis – todos exceto , que detestava álcool e não se forçava a beber.
— Você não bebe, ? — Charlotte perguntou, olhando-a discretamente. tinha à sua frente uma lata de Coca Cola.
— Não.
— Quer um pouco de licor de cereja? — ofereceu. Era a bebida preferida das duas, de e , que costumavam roubar goles do licor de cereja de Katherine sempre que ficavam na casa dos .
— Você sabe que ela não gosta, . — meteu-se.
— Ah, sim, todo mundo sabe. — Charlotte fez questão de usar um tom desagradável, arrastando suas palavras um pouco. Ela levantou-se e pôs se a dançar, chamando o namorado.
— Tira ela daqui, Johnny. — A filha do médico pediu, apontando uma Charlotte bastante bêbada que tentava dançar sensualmente no meio do bar.
— Eu gosto de quando ela está assim. — Johnny piscou para os rapazes, que riram.
— Vocês são uns nojentos. — constatou, irritada.
— Além disso, ela é gostosa. — elogiou a garota bêbada, que agora se aproximava de novo da mesa, movendo os quadris.
— O que você disse? — ergueu as sobrancelhas, questionando-o em um tom exageradamente doce.
— Que ela é gostosa. — Ele riu. — Mas você é mais, gata.
— Tira suas mãos de mim. — Ela o empurrou, aproximando-se mais de .
— Você vai querer brigar agora?
— Eu só te disse para não me tocar. — Ela rebateu, sem se intimidar com o tom mal-humorado de . — É você quem quer brigar.
Os amigos se entreolharam, subitamente silenciosos. As brigas entre e eram tão constantes quanto o sol e a lua. Ela detestava a persona que ele assumia quando bebia e ele detestava o modo como ela sempre parecia querer provocá-lo.
— Então fique aí! — Ele se levantou bruscamente, indo buscar mais bebida.
também se levantou. O modo como ele gritou com ela fazia seu sangue correr mais rápido, mas ela tentou se controlar e não fazer nada estúpido. rapidamente a segurou pela mão.
— Não, não vá embora. Sente de novo. — Ela viu a amiga suspirar e apenas disse:
— Não deixe estragar a sua noite.
Ela sentou-se novamente, bebendo seu licor e observando seu namorado, que agora dançava com Charlotte. Johnny parecia não ligar, flertando com – mesmo que ela demonstrasse pouquíssimo interesse em ser cantada por ele. , embora tentasse consolar a amiga, não pôde fazer nada contra a vontade dela. não era a namorada que chorava enquanto seu namorado a fazia de “palhaça”. Ela bebeu mais, preocupando as duas amigas.
E embora tivesse fama de irresponsável, não era de todo assim. Ela jamais bebia tanto, costumava divertir-se sem ficar bêbada justamente porque era ela quem dirigia e tinha ciúmes de seu carro. E talvez porque não estivesse se divertindo, vendo ignorá-la e fazer-lhe cara feia, que ela precisou beber para se sentir melhor. O fato é que praticamente trocava as pernas quando e se cansaram de ver a amiga se enchendo de bebida.
— Agora chega, . — tirou o copo de licor da mão dela, olhando-a com carinho. — Vamos para casa.
— Casa? — riu, levantando-se da mesa. Ela girou e a saia do vestido rodou, expondo as pernas bronzeadas. — Eu quero ficar aqui. Quero dançar. Dance comigo, !
A loira puxou a amiga com a força que apenas um bêbado teria, girando-a como tinha feito no quarto dela, alguns dias atrás. Era o verão, as férias de verão. E ela não deixaria o maldito abalá-la. lançou um olhar de súplica para , que balançou a cabeça negativamente. estava agindo como uma tola. Mesmo assim, era uma tola que parecia divertir-se o suficiente para querer estragar o momento.
— Meia hora. — Ela disse a .
— Você está parecendo a minha mãe, se ela não tivesse me abandonado. — Ela riu de sua própria desgraça e se afastou dela por um momento, prestando também atenção na amiga. — Leo, me dá um cigarro.
“Arrependo-me mais de certas coisas do que de outras. Arrependo-me de ter dançado na mesa do bar, naquela noite fatídica, mas não muito. Eu só… Eu não sei. Sempre fui egoísta, sempre tive a necessidade de me destacar, então, quando eles gritavam meu nome, eu só conseguia ir adiante, cada vez mais. Eu nunca mais consegui beber licor de cereja depois de tudo aquilo. Eu me arrependo disso, apenas: de ter magoado vocês.”
O amigo de seu namorado sorriu e lhe deu um cigarro, que ela colocou preguiçosamente nos lábios pintados de vermelho vivo. Ela simplesmente aguardou enquanto ele o acendia com seu isqueiro de prata e em seguida tragou elegantemente, soprando a fumaça enquanto olhava o local. Ela viu e como ele parecia atrair cada vez mais garotas para perto de si, sem sequer se lembrar dela. Então era assim que ele queria? Dois podiam jogar daquela forma.
Ela segurou a barra do vestido, pisando no vão entre as pernas de Leo e então subindo na mesa. Derrubou algumas latas vazias no chão e riu, sem se importar. Os cabelos longos e cacheados se moviam como se fosse um véu, acompanhando cada movimento sensual que ela fazia, de acordo com o ritmo da música que saía do jukebox. Suas pernas estavam à mostra, uma vez que ela segurava a saia no meio das coxas. Uma alça do vestido tinha descido pelo ombro e o cigarro em sua mão criava uma imagem de uma mulher sensual, não de uma garota de dezesseis anos. Ela parecia mais velha, mais madura e chamava atenção de toda e qualquer criatura do sexo masculino que se encontrava ali.
Quando percebeu que o que os homens encaravam era a sua namorada, ele dirigiu-se diretamente a ela, puxando-a de cima da mesa sem o mínimo de delicadeza.
— Chega dessa merda! — Ele a sacudiu pelo braço, fazendo-a sorrir ironicamente.
— Oh? Do que? — e logo apareceram, ambas encarando a briga um pouco culpadas. Se elas não tivessem pedido a para ficar, então aquilo não aconteceria.
— Eu estou cansado de você! — sibilou, furioso, encarando a expressão plácida no rosto da namorada. — Fica agindo como uma puta onde todo mundo pode ver!
— Você preferia que eu agisse como uma puta só para você? — Ela riu. — Não seja egoísta, .
O aperto dele se intensificou e ela o empurrou, se soltando dele com brusquidão. Ele tentou puxá-la de novo, mas suas amigas entraram na frente.
— … Chega. — lhe disse, a voz firme.
— Sai da frente. — Dedo em riste, ele o apontou para , que mal se moveu. — Sai da frente, todo mundo aqui sabe que você é outra puta!
— ! — o chamou, voz aguda e bastante nervosa enquanto tentava impedir a loira de pular em cima do namorado.
Foi só então que Johnny e Leo vieram para ajudar, tentando conversar com o amigo bêbado. e viraram-se imediatamente para .
— Ei, está bem? — esticou-se para acariciar o rosto da amiga, que balançou a cabeça.
— Eu estou bem. E você, ? — A amiga sorriu e disse que não se importava com o que tinha dito. — Eu devia socar ele!
— , saia, por favor. — Leo virou-se para ela.
— Eu saio se eu quiser. — Ela respondeu séria, olhando para trás dele, para onde a encarava com raiva.
— Você vai piorar as coisas, . — Ele disse, sério. Ela fungou, dando as costas para eles.
— Não precisa mais falar comigo! — Ouviu gritar. Ela se virou e deu-lhe o dedo do meio, o que o fez xingar.
Ela apenas não se importava mais. deixou o bar para trás, tendo as duas amigas em seu encalço. era um babaca. Ele podia agir como quisesse e apenas esperava que ela não se importasse? Ou que talvez se pusesse a chorar? Ela não faria nada disso. Ainda estava espumando de raiva quando abriu a porta do carro, mas a segurou delicadamente pela mão.
— Eu dirijo. Me dê as chaves.
entregou as chaves a contragosto, murmurando algo como “cuide bem do meu bebê”. Ela se sentou nos brancos de trás com ao seu lado, deitando no colo da amiga e fechando os olhos por alguns segundos. Ela podia sentir a pequena e delicada mão de acariciando seus cabelos, como uma mãe ou uma irmã faria.
Ela se sentiu mal pelas coisas que dissera. Não porque se achasse merecedora de tal grosseria ou porque realmente fosse tudo aquilo que ele dissera, mas porque todos tinham visto. E não precisava de nenhum outro rumor correndo sobre ela. Já era o suficiente tudo que ouvia, aos cochichos por onde quer que passasse, por causa de sua mãe.
Em algum momento durante a ida para casa, adormeceu no colo de . Quando ela acordou, estava enfiada em uma camisola de , dormindo ao lado da amiga. Ela ergueu-se da cama cuidadosamente, sentindo a boca seca e a cabeça latejar, como acontecia sempre que ela bebia demais. Ela se perguntou se tinha ligado para seu pai e se ele sabia onde ela estava, mas, pela ausência de , imaginou que a amiga tivesse avisando o nobre doutor. Era provável que sim, afinal sempre tivera muita consideração por toda e qualquer pessoa que não fosse Charlotte.
Ela desceu da cama cuidadosamente para não acordar a amiga. Na ponta dos pés, foi até a cozinha. Ela precisava de um copo de água. Abriu a geladeira, ainda um pouco tonta, e serviu-se como pôde. Ela queria um remédio para aquela dor de cabeça, mas estava adormecida e ela tinha certeza de que seria assassinada se acordasse a amiga.
suspirou, encostando-se na bancada e levando aos lábios o copo cheio de água gelada. Quando a luz da cozinha acendeu-se subitamente, ela virou a cabeça rápido demais e sentiu que seu crânio inteiro pareceu latejar.
— . — O sr. olhou-a da porta da cozinha. — Que bom que está melhor.
— Boa noite, sr. . — Ela olhou-o, consciente de seu estado deplorável, dos cabelos embaraçados e da camisola de seda de .
— Ressaca? — Ele riu quando ela fez uma careta depreciativa.
— Está assim tão óbvio?
— Ficou óbvio quando tive que carregá-la para dentro de casa. — A garota quase engasgou com a sua água.
— O senhor…? Oh, Deus. — Ela fechou os olhos com força, levando uma mão ao rosto, tentando escondê-lo com a vergonha que a acometeu. Agora ela estava ainda mais ciente de seu estado deplorável, que começou horas atrás quando ela foi levada para dentro de casa nos braços do pai de sua amiga.
— Contanto que não faça nada parecido novamente, acho que podemos manter isso em segredo. — Ele encostou-se na bancada ao lado dela, que finalmente tirou a mão de frente do rosto.
— Eu estou envergonhada. Eu nunca bebi assim antes, eu juro. — E, realmente, jamais tinha perdido a medida quando bebia. Ela não era como , ela sabia quando parar.
— Acontece com todos nós. — Ele tirou um cigarro do bolso, acendendo-o por alguns segundos. — Precisa de alguma coisa?
Ela sentiu-se um tanto incomodada com a presença dele tão próxima. Não de um jeito ruim, diga-se de passagem. Ela simplesmente não sabia como agir. Em sua cabeça, os rapazes de sua idade e os homens da idade dele tinham mundos de diferença entre si – futuramente ela aprenderia que não era bem assim. Ela flertava com rapazes, apenas nunca tinha flertado de verdade com homens mais velhos – pelo menos não quando tinha algum interesse real neles.
— A minha cabeça está me matando. — Ela sussurrou. — O senhor tem algum remédio para isso?
— O senhor? Deixe disso — Ele riu. — Sim, acho que eu tenho. Segure para mim.
Ela tomou o cigarro dos dedos masculinos, sentindo as pontas dos dígitos tocarem a pele dele rapidamente. E foi o suficiente para que se sentisse ainda mais atraída por ele. O pai de sorriu de modo leviano e afastou-se.
ficou sozinha na cozinha, respirando fundo e prometendo a si mesma que tomaria o maldito remédio e subiria para o quarto de sua amiga novamente. Ela não podia ficar ali, jogando conversa fora com um homem que era estritamente proibido para ela. Era perigoso, e se descobrisse? Ela sabia o quanto sua amiga era possessiva com o pai, o quanto ela ainda se magoava com a morte da mãe, mesmo que a tragédia tivesse ocorrido quando ela ainda era uma criança.
Ela olhou o cigarro, tentada a tragar. Tinha começado a fumar no ano passado, quando começara a roubar os cigarros do pai. Desde que ele descobrira e a alertara sobre os malefícios do cigarro – mesmo que ele mesmo continuasse a fumar –, lhe dissera que ela deveria comprar seus próprios cigarros com seu próprio dinheiro, se quisesse continuar fumando. E foi isso que ela fez. Andava para todo o lado com seus Camels, fumando sempre que conseguia. Por isso, ela tragou o cigarro que deveria apenas segurar e soltou a fumaça lentamente, acalmando-se um pouco.
Quando o pai de voltou, achou a garota fumando e a observou. Ela o encarou e então olhou novamente o cigarro, desculpando-se com um gesto.
— Sinto muito.
— Não, tudo bem. — Ele tirou outro cigarro do bolso da camisa, acendendo-o para si. Lado a lado, eles fumaram por alguns instantes, até que ele a ofereceu um comprimido. — Dipirona.
— Obrigada. — Ela pôs o comprimido na boca, engolindo-o com a água restante em seu copo. Pensou em dizer a ele que tinha que dormir, até que o viu abrir a boca:
— Se não se importa, pode fumar comigo? — Ele abriu um sorriso charmoso. — Eu detesto fumar sozinho.
Ela não tinha como dizer não àquele sorriso, que lhe chegava aos olhos. A loira viu-se concordando, tragando longamente para manter a cabeça sobre os ombros.
— Por que bebeu tanto hoje? — Ele perguntou e ela o olhou de lado. — Algo deve ter acontecido.
— Eu não posso ter perdido o controle? — Ela perguntou em tom jocoso, ganhando um sorriso duvidoso em resposta.
— Você não se parece com alguém que perde o controle. — Ela riu.
— Eu… Meu namorado e eu, nós… Tivemos uma briga. Na verdade, é bastante possível que eu esteja solteira.
— Sinto muito em ouvir isso. — Ela pensou que ele não se parecia com alguém que se sentia mal por ouvir aquela notícia. O sorriso dele nem tinha vacilado. — Foi feio assim?
— Não, o que foi feio foi o tanto que eu bebi… — riu pelo nariz, deixando um pouco de fumaça escapar.
— Não precisa se envergonhar. — Ele tocou o ombro dela com a mão livre e ela elevou os olhos para ele, esquadrinhando seu rosto para tentar adivinhar suas intenções.
— Acho que eu preciso subir.
A verdade? não estava assustada, ela tinha tido sua cota de homens mais velhos que tentaram dar em cima dela no restaurante, ela sabia sair daquela situação lembrando-os que tinha idade para ser filha deles – naquele caso, literalmente. Ela tampouco se importava que fosse descobrir qualquer coisa agora, porque ela estava dormindo. Ela tinha medo era do que faria sem pensar nas consequências. Era um impulso seu – vindo dos genes de sua mãe – fazer algo inconsequente quando estava magoada, não se importando se isso fosse magoar outra pessoa como efeito colateral. Naquele momento, apenas faria sexo com o pai de sua amiga por dois motivos: o primeiro era porque ele era realmente atraente, charmoso e tudo o mais; o segundo era porque morreria de ódio se soubesse. O primeiro motivo podia ser válido, mas o segundo era, ela achava, o que a moveria no momento. E, se ela fizesse isso pelo segundo motivo e magoasse sua amiga, então se sentiria mal depois.
— Precisa? — tocou o queixo dela com um dedo, fazendo seu coração saltar.
Resistir não era fácil. Os meses de paixonite platônica cobravam seu preço. Todas aquelas vezes que ela sorria para ele, com os hormônios à flor da pele, todas as vezes que ela se virava para vê-lo novamente, todas as vezes que eles trocavam olhares furtivos… Tudo isso se assomava até resultar naquele momento.
— A vai me matar se eu fizer isso. — Ela disse sinceramente, embora não tivesse tentado mover a mão dele ou sequer se afastar. No fundo, ela não queria se afastar dele. Ele era o fruto proibido e ela sempre se imaginara como Eva, prestes a mordê-lo, ansiosa por mais.
— Meu pai tinha um ditado… — Ele deixou de lado o cigarro, tomando o queixo delicado dela entre seus dedos, impulsionando-o para cima para que seus olhos se encontrassem. — O que os olhos não veem, o coração não sente.
Ele inclinou a cabeça, tomando os pequeninos lábios carnudos com um quê de selvageria, o que a excitou. deixou de lado as preocupações sobre as consequências daquilo, sentindo a cabeça nublando-se cada vez mais com o prazer que tirava daquilo. Ele a abraçou pela cintura, juntando os dois corpos, pressionando-a contra a bancada. Ela sentia o quadril dele no dela, o gosto de tabaco no beijo dele, a ponta da barba arranhando a pele delicada de seu rosto. O beijo voraz a fazia ansiar por ar.
Era errado? Sim. No momento, no entanto, toda e qualquer definição de certo ou errado tinha sido arrebatada de sua mente. Havia apenas os lábios de , a língua dele movendo-se junto da dela, as mãos dele segurando seu quadril. Quando ela precisou de ar e afastou a boca da dele, sentiu um beijo quente na curva de seu pescoço, tocando seu ponto fraco. Se havia qualquer chance de oferecer resistência à sedução do viúvo, esta tinha ido pelo ralo naquele momento. A boca quente do homem moveu-se pelo seu pescoço e em direção à clavícula, ligeiramente coberta pela seda. Ele abaixou a alça do traje de dormir, puxando o tecido até que um de seus seios fosse exposto. O ar, mais frio que sua pele, a fez reagir e o mamilo enrijeceu. Ele sorriu para ela. Ela fez o mesmo, enterrando-se mais em sua cova.
Quando ele a segurou pela parte de trás dos joelhos e a sentou na bancada da cozinha americana, ela segurou-se em seus ombros, inclinando-se para ele novamente e pronta para retomar o que faziam, quando o copo pousado ao seu lado rolou e espatifou-se no chão. O som pareceu ecoar de modo ensurdecedor no silêncio da madrugada e ela ouviu passos no andar de cima.
Os dois se afastaram como se tivessem levado um choque. Ouviram atentamente, esperando para que pudessem continuar, mas o som da porta se abrindo fez a garota pular da bancada – onde não havia cacos de vidro – e correr para subir as escadas, ajeitando a camisola no caminho.
— ?
Uma ainda grogue de sono a interpelou do meio do corredor mergulhado em sombras. fez um sinal para que ela fizesse silêncio.
— Eu quebrei um copo, desculpa.
— Eu ouvi. — bocejou. — Vá limpar, senão meu pai me mata. — Sua amiga virou-se e voltou para quarto.
E apesar disso, nem ela e nem tiveram a coragem de continuar. Eles limparam os cacos de vidro e ela subiu as escadas, enfiando-se na cama, mas sem conseguir dormir.
“Apesar de tudo, eu tenho memórias belíssimas de nós três. Oh, deus! Acabei de me lembrar do Grand Hotel, que nada tinha de grande! Lembra-se de como nós entrávamos pelos fundos, durante a noite, para nadar? E de como, uma vez, os policiais quase nos pegaram porque o gerente noturno nos ouviu? Foi ali que as coisas começaram a degringolar de vez, não foi?”
Nos dias seguintes, evitara a todo custo, não se deixando levar pelos pedidos de desculpas ou pelas promessas de que ele mudaria. Ela ouvia aquilo em toda briga e já estava cansada. Muito cansada. Achava, também, um tanto hipócrita de sua parte voltar a namorar com um rapaz sendo que seus pensamentos estavam sempre no pai de .
— . — O tom de era sério. Ela o encarou quando ele a segurou pelo braço. — Dessa vez é sério, eu vou mudar. Por você.
— Você não vai mudar por mim. — Ela tentou puxar o braço, mas ele não cedeu. — , encare as coisas! Você vai embora no outono para a sua faculdade, não é mesmo? É melhor terminar com isso agora.
— Eu voltaria aqui todo final de semana, nós combinamos isso.
— Sim, combinamos antes, quando eu achava que isso aqui tinha qualquer chance de dar certo. — O aperto de em seu braço se intensificou. — Me solta!
— , não, olhe para mim. — Ela empurrou-o com força, dando as costas a ele. — !
Os gritos dele a perseguiram enquanto ela voltava ao restaurante. Seu chefe, um homem simpático e de meia-idade, saiu do escritório para investigar a fonte de todo aquele escândalo em plena segunda-feira.
— ? O que está acontecendo? — Ele olhou da garçonete, visivelmente tensa, para o rapaz que gritava impropérios do lado de fora.
— Ele não sabe lidar com términos muito bem, eu acho. — Apesar de tudo, seu característico deboche fez-se presente.
Ela fungou, tentando não se abalar com a cena que ele fazia, voltando a trabalhar. Sorrir para os clientes era o mais difícil. Sorrir era uma tarefa árdua, até que apareceu com os pais.
— Eu passei pelo na rua e ele estava todo vermelho. Vocês brigaram de novo? — , em vez de olhar o cardápio, tinha os olhos na melhor amiga.
— Pior: terminamos. — Ela sabia que seu chefe não gostava muito quando ela se punha a conversar em vez de trabalhar, mas acabou cochichando mesmo assim.
— Ah, mesmo?
Ela conhecia o tom de descaso de . Era o mesmo que ela usava quando não acreditava em algo que tinha se disposto a fazer ou quando Katherine começava a lhe dar uma compostura sobre ser “preocupada” demais.
— Dessa vez é para valer. — viu-se dizendo, explicando-se para a morena. — Ele vai para a faculdade de qualquer forma, então por que insistir? Imagine só de quantos chifres me livrei!
e Katherine entreolharam-se e sorriram, eram mesmo parecidas. O humor da garçonete também melhorou um pouco com os ali. As três amigas tinham combinado de dormir na casa de , que ficaria vazia durante a noite, já que seu pai pegaria o plantão noturno novamente.
Na volta do trabalho, ela não viu o pai de no portão e, por um momento, se sentiu decepcionada. No momento seguinte, no entanto, recobrou o tantinho de responsabilidade que persistia em dizê-la que era melhor daquela forma e seguiu pela rua, empurrando a bicicleta.
A distância do restaurante para a sua casa era curta e seu pai já tinha lhe dito para gastar menos gasolina com o carro. Durante o verão, ela tinha usado a bicicleta para ir ao trabalho e seu carro era apenas para sair com as amigas à noite.
— Então… — , deitada de modo sedutor em cima do sofá, fumava um cigarro e tentava imitar alguma atriz de Hollywood. As duas amigas riram. — Você e , acabou mesmo?
— Pra valer. — respondeu, servindo uma dose de Campari para cada uma, apesar dos protestos de .
— É a quinta vez que vocês terminam “pra valer”. — Ela arremessou um cubo de gelo no meio da testa de , o que fez gargalhar.
— Ei, os comentários maldosos são o meu charme. — gracejou. — Mas tem razão. Vocês já terminaram “de vez” outras vezes.
rosqueou a tampa da garrafa novamente, dando de ombros. Ela tinha certeza de que eles não voltariam, dessa vez. andava cada vez mais irascível e, no começo, lhe desculpara o comportamento levando em conta toda a mudança que estava para ocorrer na vida dele. Mas ele passou a beber mais, flertar com garotas descaradamente e também a tratava mal diversas vezes. Até mesmo seu pai tinha notado e ele mal ficava em casa.
— Vamos beber e esquecer de . — pediu, jogando-se no sofá, na TV um filme estava para começar.
— Eu não vou beber isso. — protestou depois de cheirar o copo com a bebida.
— Então eu bebo! — A outra morena tomou o copo e virou todo o Campari de uma só vez.
A loira apenas rolou os olhos, vendo as duas discutindo por algum problema idiota. Era engraçado como e era tão diferentes e mesmo assim se davam tão bem. tinha uma personalidade maternal e naturalmente cautelosa. Ela era sempre a voz da razão entre duas adolescentes loucas.
Elas assistiram ao filme e comeram batatas fritas enquanto conversavam sobre os planos futuros. descobriu que tinha conhecido um cara ligeiramente mais velho enquanto trabalhava no rinque de patinação e ela jurava que ele era incrivelmente gostoso e solteiro.
— Nós vamos sair na sexta. — Ela confidenciou.
— Você literalmente terminou um namoro alguns dias atrás. — riu e acusou, o que fez rolar os olhos.
— O melhor jeito de esquecer aquele idiota é beijando outro, todo mundo sabe disso. E, ah, eu disse para o meu pai que vou dormir na sua casa. — Ela avisou .
— Por que na minha? — O “pai de ” ainda a fazia estremecer.
— Porque seu pai nunca está em casa e ele não liga que eu durma aqui. — Ela explicou, enfiando várias fritas dentro da boca. — E, além do mais, a estará fora da cidade.
— Pelo amor de Deus, tenha modos. — A reclamação de passou despercebida pela outra.
— Tudo bem. — disse simplesmente, dando de ombros.
Ela não imaginava que aquilo aconteceria, no entanto. Na sexta, ela tinha voltado para casa e tinha acabado de tomar um banho, afastando o calor que, apesar da noite já ter caído, persistia. tinha passado na casa dela a caminho de seu encontro, dizendo que estaria de volta à meia-noite. E, se ela bem conhecia , isso significava que ela voltaria às três da manhã. Se voltasse.
Deitada no sofá, tentando assistir a um filme enquanto estava com ela ao telefone, ela ouviu a campainha tocar.
— Espere, deve ser a . — Ela anunciou para , que tinha ido passar o fim de semana com o tio, na casa de veraneio da família.
Não era na porta, mas alguém parecido. Ela encarou o pai de por um momento, entrando em pânico uma vez que percebeu que ele logo veria que sua filha não estava dormindo ali.
— Ah, sr. . — Ela fez um esforço para sorrir, fechando o espaço da porta com o próprio corpo. — A esqueceu alguma coisa em casa?
— De me dizer onde ia de verdade, talvez. — Ele acendeu um cigarro enquanto ela observava. — Eu sei que ela não está aqui, .
Por um momento, ela hesitou. Se ela dissesse que não estava lá e sua amiga ficasse de castigo, então provavelmente teria que lidar com o péssimo humor dela depois. Por outro lado, parecia saber que sua filha não estava ali.
— Não vai me convidar para entrar? — Ele tirou o cigarro da boca e lhe mostrou o mesmo sorriso charmoso de antes.
— Não vai querer saber onde a está? — Ele negou com a cabeça. — Por quê?
— Porque eu já sei. A ouvi no telefone, mais cedo. — Ele a encarou e ela finalmente abriu a porta, dando-lhe passagem.
Ela deixou-o no hall de entrada, indo diretamente até o telefone vermelho na sala. Tomando o fone nas mãos, ela engoliu em seco. É claro que imaginava o motivo pelo qual ele estava ali. Se não estava ali pela própria filha, então era por ela. E a única coisa que ele podia querer dela era continuar o que tinham começado na outra noite. mentiria se dissesse que não estava ansiosa ou que não tinha fantasiado sobre o que poderia acontecer depois de tudo aquilo.
— ? — Ela falou no fone, observando enquanto ele a seguia. Ele parecia tão bonito parado no meio de sua sala, seus olhos verdes, o cabelo perfeitamente arrumado. Ele era incrivelmente sexy para um pai. — Podemos terminar a conversa depois?
— Depois? — Houve uma pausa, mas a loira não percebeu. Ela viu o sorriso charmoso dele se transformar em algo mais lascivo. — Oh. , é o que está aí?
— O quê? — Ela voltou a atenção para a ligação. — Não, não é o , eu só não posso conversar agora.
— Aconteceu alguma coisa?
— Não. — Ele aproximou-se dela, colocando uma mecha de seu cabelo loiro atrás da orelha. — Eu explico depois.
Ela pousou o fone no gancho, os olhos fixados nos dele. Que Deus a perdoasse porque certamente não o faria.
— Eu não consegui esquecer aquele beijo. — Ela murmurou, arrancando um sorriso dele.
— Eu ia dizer isso agora. — A garota sorriu, passando os braços ao redor do pescoço dele e aceitando o beijo de com bastante gosto.
Dessa vez, ela não tinha que se preocupar com dormindo no andar de cima e seu pai não voltaria para casa até a manhã do dia seguinte. Os dois tinham todo o tempo do mundo para aproveitar e ela queria se entregar à tentação ao menos uma vez. Ela só precisava experimentá-lo uma vez e então jamais faria aquilo de novo. Se ficar se agarrando com o pai de uma de suas melhores amigas se tornasse usual, então sua amizade não resistiria. Sim, uma vez seria o suficiente.
As mãos dele a seguraram pela cintura, trazendo seu corpo para mais perto. Um suspiro deixou os lábios ligeiramente inchados da garota quando o beijo se quebrou. Deus… Ela sabia que Ele não ajudava seus filhos em atos pecaminosos, principalmente com o pai de sua amiga, mas ela queria que Ele não deixasse aquele momento terminar. A boca dele beijou o espaço entre sua nuca e a orelha, lábios molhados e quentes depositavam beijos lentos e sensuais em sua pele. inclinou a cabeça para trás, garantindo ao homem livre acesso àquela área.
— Vamos para a cama. — Ela murmurou e ele observou-a por um momento, um sorriso lentamente formando-se em seus lábios.
— Precisamos ter pressa? — Ela negou com a cabeça. — Então deixe-me aproveitar.
poderia jurar que ele tinha beijado, mordiscado e chupado cada centímetro de sua pele, passando pelos ombros, pela clavícula, pelo alto de seus seios e o vale entre eles, exposto pela blusa de alcinhas.
— O sofá. — Ele sussurrou contra a pele dela, fazendo-a acordar de seu devaneio prazeroso. Ela anuiu e seguiu-o até o sofá.
Ele sentou-se primeiro, puxando-a delicadamente pela mão até que ela estivesse confortavelmente sentada em seu colo. já estava excitado e isso era fácil de perceber, principalmente quando ela estava na posição em que se encontrava. Foi a vez de iniciar o beijo, pressionando os lábios contra os dele.
Ela não era nenhuma pudica, não conseguia ser hipócrita como as boas garotas que fingiam não gostar de sexo apenas para alimentar a imagem de uma mulher de virtude. Qual era o problema de gostar de sexo? As mãos dela subiram pelo pescoço do homem, segurando seu rosto entre elas. O rosto dele estava liso, ao contrário de quando se beijaram na casa dele. Ela também sentia o cheiro de sua colônia. Ele tinha se arrumado para ela? Isso era adorável.
— Eu não conseguia parar de pensar em você. — A mão dele desceu pela sua cintura, acariciando as coxas enquanto ele subia o tecido de sua saia.
sorriu de maneira coquete sentindo os dedos dele em sua pele. Os olhos fecharam-se por um momento, a boca se abriu um pouco. Ela ainda ouvia a voz dele.
— Desde que eu te beijei… — Ele pontuou a frase um beijo em seu ombro, fazendo-a tremer, ansiosa por mais. — Eu percebi que eu queria mais.
As mãos dele seguraram na barra de sua calcinha, puxando o tecido para baixo. ergueu os quadris por um momento, permitindo que ele as abaixasse.
— Eu também. — Concordou com voz fraca e rouca.
Ela ouviu o som de uma risada baixa e grave, o que a fez abrir os olhos verdes e encará-lo. Viu o rosto dele chegar mais perto do seu, uma de suas mãos segurando em sua nuca, o polegar cuidadosamente pousado na lateral de seu rosto. Ela fechou os olhos novamente, aguardando o beijo que se seguiria, mas ele simplesmente manteve o rosto perto do dela, seu hálito batendo contra sua boca… Ela estava aguardando, cheia de expectativa. E, então, a mão que ainda repousava no alto de sua coxa moveu-se, tocando-a intimamente naquele ponto delicado.
Se antes ela estava molhada e pronta para ele sem sequer ter sido tocada, agora ela movia inconscientemente os quadris conta a mão dele. Com o rosto tão perto do dela, capturava cada expressão, cada franzir dos lábios, cada respiração entrecortada que ela soltava sem conseguir se conter. Ele sentia os seios dela subirem e descerem conforme ela arfava, o rosto corado, o lábio inferior que ela mordia para deter um gemido de escapar. Segurava a cabeça dela no lugar, impedindo-a de virar para o lado ou afastar dele a deliciosa expressão de prazer que ela tinha no rosto. Ele queria olhá-la, guardar em sua memória cada pedaço dela.
Ele não era nenhum exemplo de autocontrole, só gostava de ver como ela se retorcia em cima dele, rebolando sobre a mão dele, deixando de lado qualquer racionalidade.
Não era certo. Ela sabia que não era. Sabia que poderia ficar com a consciência pesada depois de tudo, mas ela simplesmente não se importava. Era demais pedir que ela se preocupasse com os sentimentos da melhor amiga enquanto estava à beira de um orgasmo.
— … — Murmurar o nome dele foi como um truque de mágica. Ela sentiu dois dedos a penetrarem, o que a fez puxar o ar intensamente pela boca. O aperto que ela tinha nos ombros dele se intensificou, mas não se moveu.
Apenas os dedos dele se moviam contra ela, marcando um ritmo forte e constante que a fazia gemer. Ela tinha que admitir, ele era bom. Ela estava prestes a gozar e ele nem tinha tirado as calças ainda. Quando o momento tão esperando chegou, sentiu seu corpo tremer delicadamente. Ela parou de mover os quadris, um suspiro longo escapando de seus lábios enquanto seu corpo inteiro relaxava e em seguida explodia de prazer.
sorria. Ele deixou de segurar-lhe a nuca e passou a mão pelos cabelos dela, acariciou seu rosto e beijou-a demoradamente.
— Agora podemos ir para a cama.
Ela o levou pelo corredor, abrindo a porta de seu quarto e deixando que ele entrasse. Por um momento, distraiu-se com a decoração em tons de vermelho e branco e os pôsteres de cantores e bandas que ela gostava, mas seu olhar logo achou a garçonete novamente.
— Venha. — Ele a chamou com o braço esticado, gesticulando para que ela fosse até ele.
, no entanto, deu a volta na cama. Ela sorria de lado, como quem tinha maquinado algo em sua mente perversa.
— Por que não se deita? — Ela sugeriu, sentando-se na cama.
Quando percebeu que ele estava se despindo, foi até a beira da cama, pondo-se em seus joelhos para levantar. Em seguida, ela o ajudou. Primeiro, foi-se embora a blusa branca de algodão. Depois, as calças. Quando ele se sentou, ainda de cuecas e sapatos, ela encostou-se em suas costas largas, mantendo-se sobre os joelhos.
Suas mãos deslizaram pela extensão dos ombros de , notando o arrepio na pele dele tão logo ela arranhou-o de leve. Sorrindo para si mesma, ela passou a distribuir diversos beijos por seus ombros fortes. deixou de lado os sapatos e as meias, virando-se rapidamente e capturando a ninfeta em seus braços, deitando-se com ela na cama.
— Você é sórdida. — Ele arrancou uma risada dela, que se debateu debaixo dele, tentando se libertar. — Isso não se faz.
— É mesmo? — Ela mordeu o lábio, sustentando o olhar dele. — Então porque não me dá uma lição?
sorriu. Ele era pai de uma garota com a idade dela, sabia algo sobre disciplina e como fazer garotas más se comportarem, mas aquilo era diferente. Ele abaixou o rosto, beijando-a profundamente.
— É exatamente isso que eu pretendo fazer.
“Sei exatamente onde errei quando me envolvi com o pai de . Aquele era um limite que eu não deveria ter cruzado, mas… É isso que nos torna garotas. Eu vi meu paraíso nele, no modo como ele me ouvia e não debochava de minhas aspirações. sempre foi gentil e respeitoso comigo, mesmo que depois eu tenha descoberto que ele tinha feito exatamente a mesma coisa com outras garotas como eu. Não é estúpido? Nós buscamos tanto o amor, esse amor de matar e morrer, e ele nunca dá certo. Nossa amizade acabou e nos separamos porque eu botei o amor de um homem antes de . Agora que lembro disso, é até engraçado. Eu não chorei por ele, apenas chorei por ela.”
remexeu-se na cama, embrenhando-se no abraço de . Ela sorriu para ele, satisfeita e relaxada depois de mais um encontro às escondidas. Ela tinha esperado as amigas dormirem, no andar de cima, apenas para se esgueirar até o quarto dele.
— Eu tenho que subir antes que elas notem que eu sumi.
Desvencilhando-se dos braços dele, ela se levantou da cama e começou a recolher suas peças de roupa pelo chão. tinha as mãos debaixo da cabeça, um sorriso tão satisfeito quando o dela no rosto.
— Quando eu vou te ver de novo? — Ela virou-se para ele, rindo.
— Já está ansioso para a próxima?
— Você pode me culpar? — Ela riu e balançou a cabeça.
— Eu não sei, o verão está acabando. Logo a escola vai começar e eu vou ter menos tempo.
Quando ela terminou de se vestir, acenou para ele e deixou o quarto. Pé ante pé, ela subiu as escadas sorrateiramente, quando a luz acendeu-se.
— ? — Ela olhou a amiga no topo da escada. — O que foi?
— O que você estava fazendo?
— Eu vim beber água. — respondeu automaticamente, retomando seu curso escada acima.
— Sério? Você estava com tanta sede que levou mais de meia hora para beber água?
Ela estacou, encarando a amiga. Sentia o rosto quente com a vergonha, chateada consigo mesma porque ela sabia o quanto magoaria .
— …
apareceu atrás dela, ainda um pouco sonolenta.
— , o que está acontecendo? — Ela olhou de uma para a outra.
— É isso que eu estou tentando descobrir. — O olhar de falcão de cravou-se no rosto de uma vez mais. — O que você estava fazendo lá embaixo?
, por sua vez, não respondeu. Era bem óbvio o que tinha acontecido e ela se descobriu envergonhada demais para sequer falar, algo que nunca antes tinha acontecido.
— ? — a chamou, mas ela continuou olhando para baixo. — Ah, não! !
Depois de interromper a ligação das duas, na primeira noite que eles dormiram juntos, apenas disse a que um convidado tinha chegado e que eles tinham dormido juntos. Apesar da insistência de , ela não tinha revelado quem era o cara misterioso. Ela não tinha contado nem para sua amiga de infância, receosa da reprimenda que, certamente, levaria.
sentiu as lágrimas quentes descerem pelo rosto. Ela não se importava que era plena madrugada ou que sua voz havia subido algumas oitavas, ela só tinha que tirar aquilo de seu peito.
— Eu não acreditei, sabia? Eu não acreditei que você faria algo assim comigo! Eu pensei: , sua boboca, jamais foderia com o seu pai! Eu achei que você fosse minha amiga!
— , se eu puder me explicar…
— Explicar o que? Que você deu em cima do meu pai? Que você estava transando com ele? Eu sabia! Eu sabia que tinha algo de errado com o seu “cara misterioso” quando você não nos disse quem era! — Ela limpou as lágrimas com as costas das mãos.
A cena fez aparecer na sala e acender a luz do andar de baixo.
— O que está acontecendo aqui? , o que é isso?
— Por que você não me explica, papai? — retorquiu de modo irônico. — Desde quando você anda transando com a minha melhor amiga?
O rosto de ficou pálido. Ele olhou as garotas, ponderando seu próximo passo. E, como era homem, seu primeiro instinto foi negar.
— Você está sendo ridícula.
— Eu estou? — Ela riu. — Eu não acredito em você. Eu não acredito que você fez isso de novo, dormindo com uma garota com idade para ser a sua filha! — Ela se virou para a . — Você não foi a primeira, sabia? Meu pai costumava transar com a minha babá enquanto eu dormia.
— !
— Ele gosta de garotas jovens, eu acho. — Ela continuou sem se importar com os olhos brilhantes de lágrimas de ou os protestos de para que calasse a boca. — Não que eu não entenda, você é a mais bonita que ele já fisgou. Eu só tenho pena de você, porque quando ele se cansar, vai te deixar de lado como se fosse um lenço usado!
permaneceu em silêncio. Ela sabia que estava errada e não conseguia dizer nada para se defender. No fundo, ela sabia que merecia ouvir tudo aquilo.
— Essa vagabunda não vai mais dormir no meu quarto. — A morena anunciou, dando as costas para os três e batendo a porta.
— Eu não posso ficar do seu lado agora, . — estava decepcionada como ela sabia que a amiga ficaria. Ela olhou os dois e fez o mesmo percurso que .
Se o rosto vermelho de vergonha e raiva fosse qualquer indicação de seu humor, se sentiu ainda pior quando não tentou se defender das acusações da filha. Ela pegou a chave de seu carro em cima da mesa e não disse nada, dirigindo até a sua casa no meio da madrugada. Quando ela chegou, acordou o pai com o barulho da porta batendo.
— ? ! — Ela não deu ouvidos a ele e correu para o quarto, o rosto lavado de lágrimas.
Não demorou muito para que o honrado doutor descobrisse o que tinha acontecido, cortesia de . E, logo, toda a cidade ficou sabendo tanto da predileção por jovens garotas do viúvo quanto da imoralidade da garota, que tinha puxado a mãe, segundo a cidade, até no gosto pelo escândalo.
— Eu sei que você deve me odiar, mas isso é para o seu bem.
Ela encarou o pai, suas malas já estavam no vagão bagageiro do trem e ela tinha apenas uma valise na mão enquanto esperava. No fundo, não podia culpar seu pai. Ele tinha tentado fazer o que era melhor para ela desde que sua mãe tinha se divorciado dele. Naqueles dois anos, ele tentou criá-la sozinho o melhor que pôde, deu-lhe um carro, independência e tudo que ela sempre quis. Ela apenas não soube aproveitar.
Mesmo sabendo disso, sentia o ódio queimar a sua garganta e não respondeu. Era orgulhosa demais para chorar na frente dele.
— Isso é para o seu bem. — Ela rebateu, ainda furiosa. Quando o apito do trem soou, ela entrou no veículo sem olhar para trás ou se despedir do pai.
acomodou-se em sua poltrona, respirando fundo e tentando se acalmar. Ela olhou pela janela do trem, vendo seu pai ainda parado na estação. E ela viu duas figuras atrás dele, meio escondidas pela multidão.
a encarava de longe, com seus altivos olhos de corça. A fita em seu cabelo e seus cachos balançavam com o vento leve, a expressão dela era de desprezo e mágoa. , ao seu lado, tinha dois fios de lágrimas escorrendo dos grandes olhos amendoados. Ela sentiu seu coração se encolher ao ver as duas amigas ali, vendo-a partir.
“O que nós nos tornamos? Como chegamos a esse ponto? Uma geração nova em folha, mas falhando miseravelmente em tudo. A geração de rainhas da beleza depravadas, como a madre superiora nos chama. E eu entendo o motivo. Eu não sei em que parte eu me tornei tão insensível ou quando foi que eu decidi que os sentimentos de vocês não importavam, mas isso aconteceu. E eu também jamais esperei que fosse me dedurar para o meu pai. Mesmo aqui, eu ainda não entendo o que aconteceu conosco, mas eu quero pedir perdão. Às duas.”
leu a carta, deixando a caneta de lado por alguns segundos, se certificando de que não havia nenhum erro ali. Dois anos passaram sem que ela tivesse contato com as amigas. Ela estava prestes a deixar o internato e já era verão novamente. Na manhã seguinte, seu pai a buscaria para retornar à cidade natal.
— Você nunca me falou de nenhuma delas. — Ela ergueu os olhos para a figura que assomava-se atrás dela, encarando o homem com um sorrisinho. Ele lia a carta por cima de seu ombro.
— Eu não queria me lembrar. — A resposta não o desencorajou.
— O que aconteceu depois?
— Eu fui mandada embora. — remexeu-se desconfortavelmente. — Eu acenei para elas, mas elas nunca acenaram de volta.
Ela omitiu a parte que chorou, magoada, quando viu suas amigas permanecerem imóveis. Ela chorou porque sabia que jamais voltaria para lá. Ao menos, a antiga jamais voltaria para lá. Era a mesma coisa, não?
Paul a encarou, pousando a mão em seu ombro. As malas dela já estavam no carro dele e ela tinha pedido um tempo para terminar aquela carta. Ela queria deixar algumas palavras para as suas antigas amigas.
— Você está pronta?
— Sim, eu só vou colocar isso em um envelope e nós postamos no correio amanhã. — Ela tranquilizou o homem com um sorriso.
O professor de história beijou-lhe o topo da cabeça e pôs o seu chapéu, fechando a porta atrás de si. suspirou e pegou a caneta de novo.
“Eu queria ter uma de vocês comigo. As duas, se eu tivesse essa sorte, mas acho que vocês já sabem. Eu nunca vou voltar. E, para ser bem sincera, sei que estou cometendo os mesmos erros de novo. Nós queremos o paraíso, mas ele nunca vem. Nós colocamos o amor em primeiro lugar, mas esta é a nossa maldição. A maldição de Eva. Uma vez que provamos o amor, nosso fruto proibido moderno, nós queremos sempre mais. E não adianta chorar. É isso que acontece conosco. Eu quero me desculpar, mas não posso dizer que eu estava louca de paixões ou temporariamente insana. Eu sabia onde estava me metendo, mas, ao mesmo tempo, também não tinha ideia. Não agora. Eu sei muito bem o que estou fazendo dessa vez. Não sou a mesma tolinha que se encantou por um homem mais velho que a venerava. Não, não é isso. Eu estou sendo terrivelmente prática. Paul me levará para Hollywood e eu realmente espero que a próxima vez que ouvirem meu nome seja nas rádios. Quero que ouçam a minha voz e se lembrem de mim. E, se acharem no coração de vocês a vontade de me perdoar… Então me escrevam de volta. Eu amo vocês.”
A carta começara sendo para os olhos de , apenas, mas mudou de ideia no meio do caminho. Ela devia explicações a , também. Ela voltou ao espaço que tinha deixado antes, quando não conseguia se decidir entre “” e “Querida ”. Com um sorriso amargo, ela simplesmente escreveu: Às únicas amigas que eu já tive.
Como prometido, ela pôs a carta no envelope, endereçou-o e colou os devidos selos, admirando o envelope branco por um momento. No momento seguinte, ela se ergueu, enfiando a carta no bolso. Ela observou por um momento o quarto estoico e sem enfeites que tinha sido o seu lar nos últimos dois anos. Seu pai a procuraria na manhã seguinte naquele quarto e o acharia terrivelmente vazio.
Seu pai não tinha ganhado uma carta, ela apenas esperava poder falar com ele no telefone uma vez que chegasse na Califórnia. Ele não podia fazer nada quanto a isso. Ela já tinha dezoito anos, era uma mulher adulta e podia decidir seu próprio caminho. Paul era apenas um meio para conseguir o que ela queria: uma carreira de cantora. E ele a amava tanto, era sempre tão rápido para aceitar as suas sugestões. Mesmo que ele fosse um homem adulto, o professor de história do internato, e relativamente bonito, ele sempre comia na palma de sua mão. Tinha se demitido naquele mesmo dia e planejado com ela a fuga para Hollywood. Ele acreditava no talento dela. E ela gostava dele. Não era uma paixão avassaladora, não era um amor épico, não era um amor de matar e morrer… Mas ela acreditava que era amor de qualquer forma.
fechou a porta do quarto depois de apagar as luzes. Ela estava certa quando achou que jamais voltaria para casa. Ela simplesmente se negava a admitir a derrota. Sempre tinha sido uma péssima perdedora. E, assim, ela foi embora, deixando o quarto vazio e a antiga vida para trás.
nunca tinha imaginado o quão difícil era escrever uma carta. Ela tinha certeza que, se pudesse dar um telefonema, então toda a conversa seria muito mais fluida, mas o único telefone se encontrava no escritório da madre superiora e as alunas apenas podiam usá-lo em emergências. Embora, infelizmente, e a madre discordassem quanto ao real significado de “emergência”.
Ela voltou a escrever, deixando de lado a preocupação inicial sobre a forma de tratamento destinada a alguém que já foi sua melhor amiga. Ela iniciou a carta, deixando um espaço para que pudesse decidir depois. Já estava cansada de riscar folhas e jogá-las fora. se lembrava da fogueira como se a festa tivesse acontecido ontem e não há um par de anos. Foi com essa memória que ela recomeçou sua carta.
“Lembra de como costumávamos passar a noite festejando e nos divertindo? As festas ao redor da fogueira, as cervejas que roubávamos do gabinete do meu pai?”
O sol já tinha se posto, a maioria dos banhistas também tinham se retirado. A noite caiu, mas o grupo de estudantes não pareceu notar. Continuaram bebendo e conversando, divertindo-se. Sob a luz tremulante do fogo, ela movia seu corpo junto ao de . Não era uma dança propriamente dita, as duas apenas cantarolavam qualquer coisa enquanto mexiam seus corpos para combinar com a melodia inventada. Elas não faziam nenhum sentido, mas seus namorados assoviavam e as incentivavam a continuar com gritos de júbilo.
A praia estava vazia, combinando com as garrafas de Pabst Blue Ribbon na areia. Os cachos loiros e longos de , um penteado que espelhara nos cabelos de Brigitte Bardot, se agitavam enquanto ela movia a cabeça. Os quadris moviam-se sensualmente de um lado a outro, cantarolava Bang Bang, as pernas nuas faziam passos desconexos de dança. Ela ainda usava o traje de banho, apesar de a brisa marítima ligeiramente gélida fazer sua pele se arrepiar. , da mesma forma, movia-se ora perto da amiga, ora mais afastada.
Seus respectivos namorados sentavam-se ao redor da fogueira, sorrindo, relaxados, enquanto observavam as duas. A cena não era incomum. Frequentemente os sete dirigiam até a praia, faziam uma fogueira e se divertiam com as bebidas e cigarros que roubavam dos pais. , Jack, Leo e Johnny eram veteranos, tinham dezoito anos. Aquele era o último verão para que aprontassem o que bem entendessem. As outras três integrantes do grupo eram , e a tímida , que, apesar de ter uma garrafa de cerveja em mãos, parecia tão deslocada do resto quanto um peixe fora d’água. Ao final da performance improvisada, e abraçaram-se, curvando-se e agradecendo as palmas dos quatro rapazes.
— Você estava ótima, gata. — A boca de achou o pescoço da loira, que soltou um risinho estridente.
— E então? Acha que eu tenho talento para ser cantora? — Ela perguntou, coquete, passando os braços ao redor do pescoço do namorado. O contato do corpo era intenso devido ao pouco tecido de seu traje de banho e o torso desnudo do veterano.
não aprovava o desejo de ser cantora de sua namorada, assim como o pai dela a proibia veementemente de tentar seguir a carreira musical. Mulheres fáceis, diziam ambos, cantoras e atrizes eram mulheres fáceis. Não importava se, no fundo da mente deles, Jane Fonda ou Marilyn Monroe ocupassem seus pensamentos. As mulheres que queriam ao seu lado eram sempre bem-educadas e castas. Cantoras eram para se divertir, esposas respeitáveis não deviam nem usar tanta maquiagem. Por isso, não respondeu e apenas beijou os lábios rubros, já um tanto borrados, da garota em seus braços.
Ele era, por fora, um rebelde; ao menos era isso o que a jaqueta de couro, deixada dentro do carro, sugeria. Embora, no fundo, fosse tão hipócrita quanto seu pai engomadinho. Alta, no entanto, parecia não se importar. Quando estava sóbria, os dois costumavam brigar por conta disso, mas era verão e ela queria se divertir longe das reprimendas moralistas do pai e das matronas que reprovavam cada passo que dava na rua.
No fundo, a culpa não era de por ser tão mal vista. Desde que sua mãe decidira se divorciar e voltar a Massachusetts, toda a cidade a olhara torto. Também, pudera! Era, tal e qual a sua mãe, uma beldade de cabelos loiros e olhar dissimulado. As matronas tinham pena de seu pobre pai, que se esforçava dia e noite para dar freio a uma rebelde descarada. E, enquanto a noite chegava ao fim, e seu namorado se afastaram do grupo, mas , atenta ao desconforto de , logo afastou-se de o suficiente para sentar-se ao lado da melhor amiga de infância.
— Ei, quer ir embora?
não era desinibida como ou mesmo tão espontânea como . Não, era dona de uma inteligência espantosa, uma disposição dócil e o temperamento mais gentil que se pudesse imaginar. Ela não era tão delicada quanto gostava de pensar, mas era sensível. Por isso, sempre que a notava assim tão desconfortável, ela sempre fazia a mesma pergunta a .
Se perguntasse a qualquer um dos outros rapazes, talvez eles não convidassem para ir junto. Não que ela não fosse bonita, era linda e angelical, mas era tímida e não conseguia se soltar como as outras duas. E, consequentemente, ela também não se interessava em namorar Johnny ou Leo. Os rapazes apenas a convidavam porque e não deixariam a amiga na mão, mas tinham se cansado de investir na bela anjinha para se importarem com ela. E, se uma mulher não servisse para namorar com eles, então para que serviria?
era a primeira a admitir que eram quatro babacas, mesmo que um deles fosse o seu namorado e outro fosse o de ; os quatro eram babacas esnobes, mas eles as levavam para as melhores festas e eram bonitos de se ver. No fim, eram apenas ferramentas, úteis como um vestido bonito ou a meia-calça certa.
— Não, está tudo bem. — negou prontamente. Sua amiga geralmente não queria incomodá-la, ela quase nunca dizia que queria ir embora. abanou a cabeça, estava se divertindo e não queria ir embora, mas não queria deixar sua melhor amiga daquela forma.
, no entanto, parecia ter outros planos. Ele puxou a namorada pela cintura, sentando-a no colo dele. A loira sentiu a ereção dele incomodando-a, mas não disse nada. A mão calejada tocou-lhe um seio, por cima do tecido do biquíni, a outra segurava a sua cintura de modo dominante. detestava quando ele a apalpava daquela forma, como se ela não servisse para nada além de satisfazer seus desejos.
— Deixe-a em paz. — Ele sussurrou no ouvido dela. — Ela já disse que está bem.
— Você deve ser cego para não ver que ela não está bem! — A loira retrucou, desvencilhando-se do namorado e indo na direção da melhor amiga. — Venha, vamos procurar pela .
— Ah, gata… — franziu o cenho, fechando a cara. Ele detestava ser contrariado.
A jovem deu de ombros, pegou a mão direita de e pôs-se a procurar , que, pelos risinhos agudos, não deveria estar longe. encarou a amiga de modo agradecido, sendo respondida com um breve sorriso espoleta, marca registrada da loira, que apenas continuou andando apesar dos gritos de lhe dizerem para voltar.
O namoro dos dois era inconstante. Brigavam com frequência porque era muito à frente de seu tempo para um rebelde de araque como . Discordavam em quase tudo. era dominador, mas esquecia-se que sua namorada não era nenhuma moçoila submissa. No fim, por mais que se dessem bem nos assuntos mais físicos, não tinham nada em comum. A relação vivia por um fio, mas gostava disso. Gostava do imprevisto, do incomum, da falta de rotina. E, também, não conhecia outro rapaz que pudesse ser tão atraente quanto seu namorado. Era algo superficial, era conveniente aos seus planos. Era apenas isso.
e Jack, por outro lado, eram a imagem do casal perfeito. Eles não terminavam todo final de semana, como e . Eles se davam bem, suas famílias aprovavam o relacionamento, mesmo que a família de consistisse apenas em seu pai, um viúvo ainda jovem que fazia as matronas suspirarem. Por isso, e sempre se sentiam culpadas quando os interrompiam, porque eles sempre pareciam em seu próprio mundinho recheado de paixão e pombas brancas.
— ! — chamou de longe, não se atrevendo a chegar muito perto. Ela fez uma concha com as mãos ao redor da boca para gritar o resto do recado. — Estamos indo!
já tinha se vestido quando reapareceu, seus cabelos castanhos e encaracolados caindo por sobre os ombros bronzeados pelo sol, o biquíni meio torto, mas um sorriso estonteante no rosto. A loira rolou os olhos, rindo, e apenas murmurou para que a amiga se apressasse e trocasse de roupa. Os rapazes pareciam meio mal humorados, mas nenhuma das três ligava.
O Cadillac vermelho de cortou a estrada, em um curto trajeto de cerca de vinte minutos de volta para casa. A cor da paixão era a sua preferida, usava vermelho nos lábios, no lenço que amarrara no cabelo, para que não embolasse, nas unhas. Os faróis altos, o rádio ligado, e imitavam uma plateia gritando e torcendo enquanto a loira cantava, em alto e bom som, Please Mr. Postman.
Ela amava cantar. Cantarolava enquanto estava na escola, quando cozinhava, mesmo enquanto estava no banho. Era bastante afinada para quem nunca tinha tido aulas de canto antes, mas tampouco era tão boa quando uma cantora profissional. Tinha os discos de diversas cantoras, como Doris Day e Nancy Sinatra, outros eram de grupos como o que cantava no rádio agora, The Marvelettes. Os de Elvis, que pegara da coleção de sua mãe, ainda estavam guardados no fundo do armário, porque sabia que seu pai se chatearia. Ele não podia ouvir sequer uma música do Rei do Rock sem lembrar-se de Eleanor. A música movia a jovem, era certo.
Havia tanta alegria de viver nela, tanta espontaneidade, talvez por isso era tão mal vista. Era uma moça que tinha feito as pazes com seus próprios defeitos e os aceitava como algo que a fazia única. Seu pai, há muito, notara que tinha o espírito livre demais. Ele tentava podá-la e colocá-la de castigo, mas era irrepreensível, não porque fosse perfeita, mas porque as composturas que ele lhe passava não faziam efeito.
Seu pai podia não gostar da companhia com a qual ela se cercava, os rapazes de jaqueta de couro e a atitude rebelde, a filha despreocupada do viúvo inconsequente, mas o que ele podia fazer quando passava os dias, às vezes as noites, no hospital, trabalhando? vivia como queria e, ao contrário da crença popular, era mais responsável do que deixava transparecer. Para começar, era sexualmente ativa, sim, mas jamais fazia sexo com o namorado sem o preservativo. Ela era filha de um médico e a mera ideia de engravidar e pôr tudo a perder lhe fazia arrancar os cabelos. Ela tomava conta da casa, já que seu pai fazia plantões e mais plantões, cuidando desde a limpeza até as refeições e, apesar de não ter as melhores notas da turma, sua situação escolar não era desesperadora.
Quando precisava de dinheiro, trabalhava como garçonete. Aproveitava para cantar para os clientes, os que não viravam a cara para ela por causa do escândalo ambulante que era. A boa gente da cidade preferia que seus filhos e filhas ficassem a salvo da influência da loirinha. Era a filha pródiga de um bom homem, diziam. Para , era apenas uma garota normal, vivendo de forma normal. Não merecia ser culpada pelos “crimes” da mãe, muito menos julgada por ser menos comedida do que o que achavam de bom tom.
No verão, o calor de Junho corava suas bochechas e fazia o cabelo loiro colar na nuca. O sol grudava as roupas, que já eram justas, na pele ligeiramente bronzeada. Ela assoviou uma música enquanto levava os pedidos para as mesas, sorrindo para os pais de quando passou por eles. Os , apesar de tudo, gostavam de . Eram vizinhos de a vida toda, as meninas cresceram juntas e Katherine, mãe de , praticamente a adotou quando Eleanor foi embora. Embora fosse, aqui e ali, levemente criticada por seu comportamento, Katherine jamais ralhava com ela apenas para ser desagradável, ela se importava com a menina tanto quanto com a sua própria filha.
— Está de bom humor hoje, passarinha. — Katherine observou, fazendo a loira sorrir. pôs uma mão na cintura, parando ao lado da mesa onde Robert e Katherine almoçavam.
Katherine a chamava de passarinha desde que se entendia por gente. O apelido derivava do fato da menina estar sempre cantando, mas, ultimamente, também podia ser atribuído ao fato de que queria bater asas e voar dali.
— O verão sempre me deixa de bom humor. — Ela sorriu alegremente, tirando seu bloquinho do bolso do avental e a caneta de detrás da orelha. — O que vai ser?
A outra fechou o cardápio com um estalo, sorrindo para o seu marido e em seguida se dirigindo à garçonete.
— O de sempre. Aliás, quer jantar lá em casa hoje? É noite da pizza.
A loirinha sorriu e concordou, anotando o pedido costumeiro e deixando a mesa dos de lado. jantava com os algumas vezes, quando seu pai ligava e avisava que faria um plantão à noite ou que não voltaria para casa até de madrugada. As duas famílias ainda eram bastante próximas, apesar de Eleanor ter partido sem olhar para trás.
Vez ou outra, no entanto, precisava ficar sozinha e se refugiava em sua cozinha para fumar um cigarro ou comer algo que não deveria, como chocolate. Ou, então, saía com o namorado e seus amigos para comer em alguma lanchonete e assistir a um filme no cinema drive in que gostavam tanto de ir. Claro que quase nunca assistiam ao filme, achava o escuro e o carro fechado a oportunidade perfeita para seus avanços sexuais e por que ela não gostaria disso? Sentia-se bem com a adrenalina de, talvez, ser pega. O perigo a excitava mais do que algum dia poderia.
— Boa noite, sr. . — Ela acenou para o viúvo com uma mão, empurrando a bicicleta com a outra.
— Boa noite, . — Ele respondeu com um aceno, fazendo-a sorrir. Ele sorriu de volta.
O pai de estava no final dos trinta anos; era um homem bonito, sempre charmoso e bem-vestido, que sorria quando ela passava. Surpreendentemente, ela sempre o achava fumando em seu portão no horário que ela voltava para casa. Por isso, o ritual era repetido toda noite.
Seu pai não gostava de . costumava brincar e dizer que era porque o sr. roubara dele o título de arrasa corações, que antes pertencia ao pai, desde que se mudou para a cidade, dois anos antes. No entanto, se havia algum tipo de desentendimento entre os dois, ela não sabia e nem se importava, porque o flerte era inocente. Seu namorado jamais saberia, jamais saberia, ela e jamais teriam algo além dos sorrisos e dos cumprimentos que trocavam à noite. Ela costumava fazer isso sempre, era como se divertia em uma cidade pequena. Os sorrisos para o professor de inglês bonitão, os risinhos que soltava sempre que algum cliente costumeiro a elogiava no restaurante, a forma como ela, por vezes, mostrava um pouco a mais do decote do uniforme para se divertir com as reações dos rapazes. Era divertido. Ela era jovem, bonita e vaidosa, esse tipo de coisa era como uma brincadeira. Aqueles flertes não a levavam a lugar algum e ela jamais tinha desonrado seu compromisso com .
As mulheres solteiras costumavam estar sempre em cima de . Ele era viúvo, afinal. Tinha um bom dinheiro, casa própria, um jeito charmoso de falar. Eventualmente, ele arranjava uma namorada. sempre reclamava de como seu pai estava saindo com essa ou outra mulher. E, para , a memória da mãe ainda era muito presente para aceitar que seu pai amasse outra pessoa. E, por esse motivo, vez ou outra os dois brigavam e acabava dormindo na sua casa.
Se fosse para ser bem sincera, gostaria de dormir com alguém como ao menos uma vez. E como sinceridade não era bem o seu forte, ela jamais admitiria isso em voz alta. Ao menos onde pudesse ouvi-la. Jamais conversaram sobre isso, mas ela conhecia a amiga o suficiente para saber que sua amizade estaria acabada se ficasse com o pai dela. Por isso, ela passou direto, sem tentar parar e puxar uma conversa como teria feito com qualquer outro.
“Nós tínhamos só dezesseis anos, mas os rapazes sempre assoviavam e nos notavam. Até mesmo os mais velhos. Lembra, ? Lembra de quando roubamos uma viatura com os veteranos? Os professores diziam morreríamos cedo se continuássemos daquela forma. Bem, eles não estavam errados, estavam? De um modo ou de outro, eu morri.”
— Eu ainda não acredito que você me convenceu a fazer isso. — sussurrou para a amiga de infância que, levemente alcoolizada, riu baixo.
— Nós só vivemos uma vez. — repetiu o argumento da loira.
Era estúpido. Era realmente estúpido, mas os rapazes logo iriam embora. Alguns iriam para as mesmas faculdades que seus pais estudaram, outros aprenderiam sobre seus futuros ofícios com seus pais, assumindo negócios de família. De qualquer forma, a idade adulta se aproximava em uma velocidade alarmante para e seus amigos. E, como os adolescentes que eram, eles queriam se agarrar àquele fiapo da juventude, àquela sede de perigo e irresponsabilidade que logo teriam que deixar de lado assim que o verão se findasse.
Os trotes dos veteranos eram amplamente conhecidos na cidade. Algumas vidraças quebradas, uma ou outra casa coberta de papel higiênico não era nada. Todo ano os jovens achavam modos cada vez mais ousados de fechar a vida escolar. E quando ouviu o plano que o namorado lhe disse, ela soube, imediatamente, que tinha que participar. E lá estavam as três arriscando-se desnecessariamente quando disseram que iam apenas tomar um milkshake. De certa forma, nenhuma delas mentiu para os pais naquela noite.
Então, as três tinham apenas que fazer sua parte enquanto os veteranos roubavam a viatura estacionada fora da lanchonete. Era simples e fácil. , atrás das amigas, rezava para tudo dar certo. Foi quem andou primeiro, inclinando-se contra o balcão enquanto aguardava a sua vez de ser atendida. Os policiais sorriram para ela e aproveitou para fazer o mesmo.
— Boa noite, rapazes! — A loira cumprimentou, bastante simpática.
— Como vai, ? — O mais velho sorriu para ela enquanto o outro policial, um novato ainda verde, olhou para um tanto embasbacado. Ela o conhecia de vista, sempre o servia no restaurante.
— Viemos comprar uns milkshakes. — A loira deu de ombros e , um tanto nervosa, ergueu a voz e completou:
— Nós vamos ver um filme!
fez força para segurar uma risada, sorriu amarelo e apenas continuou, um tanto ansiosa, a observar a interação. e logo emendaram uma conversa, fazendo com que os dois policiais ficassem conversando mesmo enquanto elas esperavam os milkshakes ficarem prontos.
— Espero que respeitem o toque de recolher, moçoilas. — O mais velho sorriu de forma simpática, seus olhos se demorando um pouco no belo sorriso de sua amiga.
— Quem somos nós para desrespeitar os homens da lei? — rebateu, os lábios pintados de vermelho se abrindo em um sorriso ainda mais charmoso enquanto seus olhos verdes pareciam faiscar.
A cena que os policiais causaram ao descobrir que a viatura deles estava desaparecida divertiu as três pequenas foras da lei. As três riram, embora o riso de soasse nervoso. Eles perguntaram às garçonetes se viram qualquer coisa e elas se despediram inocentemente. Lá fora, de braços dados, as três caíram na risada, sentindo a excitação que tudo aquilo causara. Como a sensação de algo tão errado podia ser tão prazerosa? Mesmo a bondosa se sentia estranhamente matreira, embora nunca tivesse sido o tipo de pregar peças. Talvez fosse porque tinha as amigas junto de si ou, quem sabe, no fundo tinha uma sementinha má?
Alguns quarteirões depois, passou com as sirenes ligadas, buzinando para as garotas enquanto acelerava pela rua principal.
— Ele é tão idiota. — disse e a namorada do idiota em questão riu.
— Foi legal, você não pode negar isso! — Ela sussurrou enquanto abraçava sua amiga de infância.
— Um dia, vocês serão presas e eu irei com vocês porque não sei dizer não.
— Somos inteligentes demais para sermos presas. — respondeu.
— E foi só um trote. Não vai dar em nada. O tio do é o chefe de polícia, ele não ia prender o próprio sobrinho. — A loira deu de ombros, levando o canudo do milkshake até a boca e tomando um gole.
E embora o trote em si não tivesse resultado em nada de muito sério, era inegável que a arrogância do grupo de amigos em breve acarretaria em algo grave. Elas subiram na viatura, depois de correr até o veículo parado. Sim, um dia algo daria errado. Eles só não sabiam o que.
Na verdade, não chegou a demorar muito. Com as aventuras dos veteranos, , Jack e os rapazes costumavam ficar mais ausentes. E enquanto a ausência do namorado não incomodasse muito , para a história era outra. Jack, por pura insistência dos rapazes, vez ou outra arriscava-se em corridas de rua. Não por dinheiro, mas pela emoção. E não gostava nada disso. O seu Jack agora tinha a atenção de outras garotas e o ciúme corroía a moçoila de sangue quente. Não que a culpasse, Jack parecia gostar demais de toda a situação.
— Toma um cigarro. — ofereceu-lhe, esperando que aquilo a acalmasse, como costumava fazer com ela.
aceitou o cigarro de mal grado, acendendo-o e tragando profundamente enquanto olhava Jack de papo com alguma garota mais velha.
— Olhe para ele! — A garota apontou. — Ele nem esconde que está adorando isso. Imbecil!
— Por que não conversa com ele? — , franzindo o nariz para a fumaça do cigarro, perguntou-lhe.
— Eu já conversei. — Seu tom era brusco e ela tragou longamente mais uma vez, expirando a fumaça lentamente pela boca. — Ele é um idiota, isso que ele é!
— . — chamou, conhecendo a índole da garota mais do que qualquer uma. — Faça o que quiser, mas tente não fazer um escândalo.
— Ele merece um escândalo! Acha que é certo me deixar aqui enquanto ele flerta com aquela vagabunda peituda? — Ela parecia ainda mais inquieta e suspirou.
— Não, mas estamos no meio de uma festa. Vocês podem fazer isso em casa. Ou no carro.
— Para você é fácil falar, ser sonsa é o seu ponto forte. — arqueou as sobrancelhas, como se pedisse uma explicação, mas meteu-se no meio.
— Chega, não precisamos brigar. Você quer ir embora, ? — A morena balançou a cabeça energicamente, negando-se a ir. — Vamos, por favor. Você está bêbada.
— Eu não estou bêbada.
— … E é isso que você sempre diz quando está bêbada. — completou. — Vem, vamos embora. Eu vou avisar o e já volto.
Deixando as duas amigas sozinhas, procurou seu namorado, que bebia com os amigos em um canto mais afastado. Ela passou os braços pelas costas dele, abraçando-o por trás de maneira íntima.
— As garotas e eu vamos embora. — Sussurrou no ouvido dele. se virou e a puxou para perto.
— Fica mais um pouco, gata.
— Melhor não. — Ele franziu a testa.
— É de novo? — A loira rolou os olhos para cima. Detestava quando ele queria discutir por nada, ele só fazia isso bêbado.
— Não, nós só estamos cansadas. Eu trabalho amanhã.
— Fica mais um pouco. — insistiu, apontando para seus amigos. — Todo mundo aqui quer ver você mais um pouco. — E então ele desceu as mãos por sua cintura, o que a fez dar um passo para trás.
— , eu estou indo embora. A gente se fala amanhã.
— Depois não reclama! — Ele ameaçou, gritando as palavras enquanto ela se afastava com a boca apertada de tanta raiva. Foi só para não parecer uma hipócrita que não seguia o próprio conselho que ela evitou fazer uma cena.
Lá fora, fumava outro cigarro, parada contra a luz, os cabelos castanhos caíam sobre seus ombros, ela parecia ainda mais bonita do que antes.
“Nós achávamos que éramos invencíveis. Lembra disso? Eu lembro de tudo, as memórias são meu consolo aqui. Lembro de , de como ela era linda, mesmo bêbada, bambeando enquanto andava com seus saltos na mão. E então ela começou a chorar, nos olhando com aqueles lindos olhos de corça que ela tinha, gritando o quanto odiava os rapazes.”
— Eu os odeio! — Ela continuava gritando mesmo dentro do carro. — Odeio todos eles! Se não fosse aquele filho da puta do Johnny, Jack não estaria desse jeito!
tentava acalmá-la, mas o que poderia fazer além de dirigir? Elas mal tinham entrado no carro, acabaram dando uma volta pelo quarteirão, tentando gastar a bebida de para que o pai dela não percebesse nada.
— Nós terminamos. — revelou bruscamente. — E ele queria me fazer ciúmes que eu sei!
— … — suspirou. Ela odiava ver que o relacionamento de sua amiga, antes tão bonito, agora nada mais era que um punhado de cacos quebrados. — Você quer se vingar dele?
limpou o rímel que escorria de seus olhos, firmando nela seus olhos esverdeados.
— Você faria isso por mim? — Perguntou de modo meigo.
— , eu não acho que isso seja sensato. — interferiu.
— Sabe, está certa. — A loira começou, girando o voltante e fazendo um retorno na rua vazia. — Eles estão agindo como idiotas. foi tão… — Ela se impediu de xingar e as encarou pelo retrovisor. — Não vai ser nada muito sério, .
— É, ! — pelo menos tinha parado de chorar diante da perspectiva de uma vingança contra o ex-namorado. — Nós só vamos… Furar os pneus dele ou algo assim.
— Ou atropelar a caixa de correio dele. — deu de ombros.
— Eu não consigo acreditar em vocês duas, ainda mais com essas mentes criminosas que carregam nas belas cabecinhas. — O tom de era desanimado, mas ela não podia deixar as duas loucas por conta própria.
— Não precisa me elogiar. — piscou para a amiga, que apenas escondeu o rosto nas mãos, pensando onde tinha errado para merecer duas amigas como elas.
O que as duas aprontaram foi algo diabolicamente simples. Se o carro de Jack era seu orgulho e o motivo de ter tantas garotas aos seus pés, então era o carro que deveria sumir da equação. E em vez de amassar o carro dele, como sugeriu – e prontamente negou, dizendo que jamais amassaria seu amado Cadillac apenas para se vingar de um babaca –, elas simplesmente fizeram uma ligação anônima de uma cabine para a casa dele.
— É a mãe do Jack? Oi, aqui é uma amiga. — fez uma voz anasalada, as duas amigas atrás dela rindo baixinho. — Não sei se a senhora sabe, mas seu filho está metido em umas corridas ilegais todos os sábados debaixo do viaduto.
Ela desligou rapidamente, virando-se para as outras duas e caindo na risada em conjunto. limpou as lágrimas dos olhos, desta vez de tanto rir, e abraçou as duas amigas.
— Eu não sei o que eu faria sem vocês.
ficou sabendo por , alguns dias depois, que Jack tinha perdido o carro quando seus pais descobriram que ele estava usando-o para participar de corridas. Ele estava de castigo até o final do verão. Sorrindo, ela disse simplesmente:
— Que chato!
“Isso é o que nos faz garotas, não é? Nós queremos o paraíso, mas nos contentamos com o amor de um homem. Nós colocamos o amor em primeiro lugar, até morreríamos por isso. E somos amaldiçoadas por tudo isso, porque nós preferimos o amor a permanecer juntas.”
Com Jack de castigo, inicialmente ficou feliz. Ela não tinha que olhar para ele a todo momento quando saía com os amigos, podia flertar com caras sem se preocupar. Mas era quando a noite chegava que toda a animação se esvaía.
— , vamos lá, não chore. — pediu, acariciando os cabelos da garota deitada em seu colo.
— Você tem que decidir se o odeia ou se quer voltar para ele. — disse simplesmente, deitada na cama enquanto escolhia um disco para colocar na vitrola.
— Você não está ajudando, . — a interpelou, mas a loira deu de ombros.
— Eu não estou tentando ajudar.
— Eu percebi.
A loira deu de ombros e colocou um dos discos do Elvis na vitrola, fazendo a voz macia e grave do rei do rock ecoar pelo quarto. O ritmo animado de Jailhouse Rock começou a tocar alto.
— Desliga isso! — pediu, fungando.
— Não!
improvisou uns passos de dança enquanto cantava alto. Puxou a amiga, usando um tanto de força, para dançar com ela. , por um momento, continuou sentada no chão, observando as duas amigas dançando, um tanto desajeitada e mais animada do que antes.
A loira girou a outra, que deu uma pirueta um tanto desajeitada, mas insistiu. Rodou-a para um lado, segurou suas mãos enquanto giravam pelo quarto, até que soltou uma risada. As três se puseram a dançar animadamente, cada uma de um jeito, em seu próprio estilo, até que a música mudou e as três se jogaram no chão, rindo. ainda não tinha superado o término, mas era uma questão de tempo. Tinha as amigas para ajudá-la.
“Nosso fim começou antes do verão, antes mesmo que eu errasse com . Todos ao nosso redor percebiam, menos nós, mas estávamos felizes demais, nos divertindo demais. Faltávamos as aulas, bebíamos com meu chefe no restaurante… Acho que deveríamos ter imaginado. A gente só tinha dezesseis anos, mas nos achávamos as donas do mundo.”
— Esse bar é uma espelunca. — reclamou, observando o local onde e Leo insistiram em levá-las.
— Seja um pouco mais tolerante. — Leo pediu, piscando para ela.
— É, gata, aqui eles não pedem identidade. — beijou-lhe o pescoço e ela suspirou, cedendo um pouco.
reaplicou seu batom vermelho, observando-se em seu espelhinho. simplesmente a puxou para uma mesa, onde o resto dos amigos os esperavam. Observou Charlotte sentada no colo de Johnny e imediatamente olhou para , que desgostava da garota.
— O que é? — A loira indicou Charlotte com a cabeça e viu corar de irritação.
— Ah, não. — Murmurou baixinho. — Johnny está namorando ela?
deu de ombros, tentando esconder o descontentamento. Charlotte e tinham uma briga que ninguém sabia, com certeza, de onde surgiu, as duas apenas não se gostavam e evitavam a presença uma da outra como o diabo foge da cruz.
— Com sorte, vai se cansar dela tão rápido quanto se cansou da última. — se meteu, olhando o desafeto de com olhos críticos. — Esses namoricos de verão nunca duram muito.
— Achei que você deveria ser a romântica do grupo. — provocou.
— Não, essa é a que ainda espera por seu príncipe encantado.
— Eu odeio vocês. — A garota citada suspirou e levantou o queixo, sentando-se na mesa mesmo que a contragosto.
No fim, a bebida acabou deixando todos ligeiramente mais amigáveis – todos exceto , que detestava álcool e não se forçava a beber.
— Você não bebe, ? — Charlotte perguntou, olhando-a discretamente. tinha à sua frente uma lata de Coca Cola.
— Não.
— Quer um pouco de licor de cereja? — ofereceu. Era a bebida preferida das duas, de e , que costumavam roubar goles do licor de cereja de Katherine sempre que ficavam na casa dos .
— Você sabe que ela não gosta, . — meteu-se.
— Ah, sim, todo mundo sabe. — Charlotte fez questão de usar um tom desagradável, arrastando suas palavras um pouco. Ela levantou-se e pôs se a dançar, chamando o namorado.
— Tira ela daqui, Johnny. — A filha do médico pediu, apontando uma Charlotte bastante bêbada que tentava dançar sensualmente no meio do bar.
— Eu gosto de quando ela está assim. — Johnny piscou para os rapazes, que riram.
— Vocês são uns nojentos. — constatou, irritada.
— Além disso, ela é gostosa. — elogiou a garota bêbada, que agora se aproximava de novo da mesa, movendo os quadris.
— O que você disse? — ergueu as sobrancelhas, questionando-o em um tom exageradamente doce.
— Que ela é gostosa. — Ele riu. — Mas você é mais, gata.
— Tira suas mãos de mim. — Ela o empurrou, aproximando-se mais de .
— Você vai querer brigar agora?
— Eu só te disse para não me tocar. — Ela rebateu, sem se intimidar com o tom mal-humorado de . — É você quem quer brigar.
Os amigos se entreolharam, subitamente silenciosos. As brigas entre e eram tão constantes quanto o sol e a lua. Ela detestava a persona que ele assumia quando bebia e ele detestava o modo como ela sempre parecia querer provocá-lo.
— Então fique aí! — Ele se levantou bruscamente, indo buscar mais bebida.
também se levantou. O modo como ele gritou com ela fazia seu sangue correr mais rápido, mas ela tentou se controlar e não fazer nada estúpido. rapidamente a segurou pela mão.
— Não, não vá embora. Sente de novo. — Ela viu a amiga suspirar e apenas disse:
— Não deixe estragar a sua noite.
Ela sentou-se novamente, bebendo seu licor e observando seu namorado, que agora dançava com Charlotte. Johnny parecia não ligar, flertando com – mesmo que ela demonstrasse pouquíssimo interesse em ser cantada por ele. , embora tentasse consolar a amiga, não pôde fazer nada contra a vontade dela. não era a namorada que chorava enquanto seu namorado a fazia de “palhaça”. Ela bebeu mais, preocupando as duas amigas.
E embora tivesse fama de irresponsável, não era de todo assim. Ela jamais bebia tanto, costumava divertir-se sem ficar bêbada justamente porque era ela quem dirigia e tinha ciúmes de seu carro. E talvez porque não estivesse se divertindo, vendo ignorá-la e fazer-lhe cara feia, que ela precisou beber para se sentir melhor. O fato é que praticamente trocava as pernas quando e se cansaram de ver a amiga se enchendo de bebida.
— Agora chega, . — tirou o copo de licor da mão dela, olhando-a com carinho. — Vamos para casa.
— Casa? — riu, levantando-se da mesa. Ela girou e a saia do vestido rodou, expondo as pernas bronzeadas. — Eu quero ficar aqui. Quero dançar. Dance comigo, !
A loira puxou a amiga com a força que apenas um bêbado teria, girando-a como tinha feito no quarto dela, alguns dias atrás. Era o verão, as férias de verão. E ela não deixaria o maldito abalá-la. lançou um olhar de súplica para , que balançou a cabeça negativamente. estava agindo como uma tola. Mesmo assim, era uma tola que parecia divertir-se o suficiente para querer estragar o momento.
— Meia hora. — Ela disse a .
— Você está parecendo a minha mãe, se ela não tivesse me abandonado. — Ela riu de sua própria desgraça e se afastou dela por um momento, prestando também atenção na amiga. — Leo, me dá um cigarro.
“Arrependo-me mais de certas coisas do que de outras. Arrependo-me de ter dançado na mesa do bar, naquela noite fatídica, mas não muito. Eu só… Eu não sei. Sempre fui egoísta, sempre tive a necessidade de me destacar, então, quando eles gritavam meu nome, eu só conseguia ir adiante, cada vez mais. Eu nunca mais consegui beber licor de cereja depois de tudo aquilo. Eu me arrependo disso, apenas: de ter magoado vocês.”
O amigo de seu namorado sorriu e lhe deu um cigarro, que ela colocou preguiçosamente nos lábios pintados de vermelho vivo. Ela simplesmente aguardou enquanto ele o acendia com seu isqueiro de prata e em seguida tragou elegantemente, soprando a fumaça enquanto olhava o local. Ela viu e como ele parecia atrair cada vez mais garotas para perto de si, sem sequer se lembrar dela. Então era assim que ele queria? Dois podiam jogar daquela forma.
Ela segurou a barra do vestido, pisando no vão entre as pernas de Leo e então subindo na mesa. Derrubou algumas latas vazias no chão e riu, sem se importar. Os cabelos longos e cacheados se moviam como se fosse um véu, acompanhando cada movimento sensual que ela fazia, de acordo com o ritmo da música que saía do jukebox. Suas pernas estavam à mostra, uma vez que ela segurava a saia no meio das coxas. Uma alça do vestido tinha descido pelo ombro e o cigarro em sua mão criava uma imagem de uma mulher sensual, não de uma garota de dezesseis anos. Ela parecia mais velha, mais madura e chamava atenção de toda e qualquer criatura do sexo masculino que se encontrava ali.
Quando percebeu que o que os homens encaravam era a sua namorada, ele dirigiu-se diretamente a ela, puxando-a de cima da mesa sem o mínimo de delicadeza.
— Chega dessa merda! — Ele a sacudiu pelo braço, fazendo-a sorrir ironicamente.
— Oh? Do que? — e logo apareceram, ambas encarando a briga um pouco culpadas. Se elas não tivessem pedido a para ficar, então aquilo não aconteceria.
— Eu estou cansado de você! — sibilou, furioso, encarando a expressão plácida no rosto da namorada. — Fica agindo como uma puta onde todo mundo pode ver!
— Você preferia que eu agisse como uma puta só para você? — Ela riu. — Não seja egoísta, .
O aperto dele se intensificou e ela o empurrou, se soltando dele com brusquidão. Ele tentou puxá-la de novo, mas suas amigas entraram na frente.
— … Chega. — lhe disse, a voz firme.
— Sai da frente. — Dedo em riste, ele o apontou para , que mal se moveu. — Sai da frente, todo mundo aqui sabe que você é outra puta!
— ! — o chamou, voz aguda e bastante nervosa enquanto tentava impedir a loira de pular em cima do namorado.
Foi só então que Johnny e Leo vieram para ajudar, tentando conversar com o amigo bêbado. e viraram-se imediatamente para .
— Ei, está bem? — esticou-se para acariciar o rosto da amiga, que balançou a cabeça.
— Eu estou bem. E você, ? — A amiga sorriu e disse que não se importava com o que tinha dito. — Eu devia socar ele!
— , saia, por favor. — Leo virou-se para ela.
— Eu saio se eu quiser. — Ela respondeu séria, olhando para trás dele, para onde a encarava com raiva.
— Você vai piorar as coisas, . — Ele disse, sério. Ela fungou, dando as costas para eles.
— Não precisa mais falar comigo! — Ouviu gritar. Ela se virou e deu-lhe o dedo do meio, o que o fez xingar.
Ela apenas não se importava mais. deixou o bar para trás, tendo as duas amigas em seu encalço. era um babaca. Ele podia agir como quisesse e apenas esperava que ela não se importasse? Ou que talvez se pusesse a chorar? Ela não faria nada disso. Ainda estava espumando de raiva quando abriu a porta do carro, mas a segurou delicadamente pela mão.
— Eu dirijo. Me dê as chaves.
entregou as chaves a contragosto, murmurando algo como “cuide bem do meu bebê”. Ela se sentou nos brancos de trás com ao seu lado, deitando no colo da amiga e fechando os olhos por alguns segundos. Ela podia sentir a pequena e delicada mão de acariciando seus cabelos, como uma mãe ou uma irmã faria.
Ela se sentiu mal pelas coisas que dissera. Não porque se achasse merecedora de tal grosseria ou porque realmente fosse tudo aquilo que ele dissera, mas porque todos tinham visto. E não precisava de nenhum outro rumor correndo sobre ela. Já era o suficiente tudo que ouvia, aos cochichos por onde quer que passasse, por causa de sua mãe.
Em algum momento durante a ida para casa, adormeceu no colo de . Quando ela acordou, estava enfiada em uma camisola de , dormindo ao lado da amiga. Ela ergueu-se da cama cuidadosamente, sentindo a boca seca e a cabeça latejar, como acontecia sempre que ela bebia demais. Ela se perguntou se tinha ligado para seu pai e se ele sabia onde ela estava, mas, pela ausência de , imaginou que a amiga tivesse avisando o nobre doutor. Era provável que sim, afinal sempre tivera muita consideração por toda e qualquer pessoa que não fosse Charlotte.
Ela desceu da cama cuidadosamente para não acordar a amiga. Na ponta dos pés, foi até a cozinha. Ela precisava de um copo de água. Abriu a geladeira, ainda um pouco tonta, e serviu-se como pôde. Ela queria um remédio para aquela dor de cabeça, mas estava adormecida e ela tinha certeza de que seria assassinada se acordasse a amiga.
suspirou, encostando-se na bancada e levando aos lábios o copo cheio de água gelada. Quando a luz da cozinha acendeu-se subitamente, ela virou a cabeça rápido demais e sentiu que seu crânio inteiro pareceu latejar.
— . — O sr. olhou-a da porta da cozinha. — Que bom que está melhor.
— Boa noite, sr. . — Ela olhou-o, consciente de seu estado deplorável, dos cabelos embaraçados e da camisola de seda de .
— Ressaca? — Ele riu quando ela fez uma careta depreciativa.
— Está assim tão óbvio?
— Ficou óbvio quando tive que carregá-la para dentro de casa. — A garota quase engasgou com a sua água.
— O senhor…? Oh, Deus. — Ela fechou os olhos com força, levando uma mão ao rosto, tentando escondê-lo com a vergonha que a acometeu. Agora ela estava ainda mais ciente de seu estado deplorável, que começou horas atrás quando ela foi levada para dentro de casa nos braços do pai de sua amiga.
— Contanto que não faça nada parecido novamente, acho que podemos manter isso em segredo. — Ele encostou-se na bancada ao lado dela, que finalmente tirou a mão de frente do rosto.
— Eu estou envergonhada. Eu nunca bebi assim antes, eu juro. — E, realmente, jamais tinha perdido a medida quando bebia. Ela não era como , ela sabia quando parar.
— Acontece com todos nós. — Ele tirou um cigarro do bolso, acendendo-o por alguns segundos. — Precisa de alguma coisa?
Ela sentiu-se um tanto incomodada com a presença dele tão próxima. Não de um jeito ruim, diga-se de passagem. Ela simplesmente não sabia como agir. Em sua cabeça, os rapazes de sua idade e os homens da idade dele tinham mundos de diferença entre si – futuramente ela aprenderia que não era bem assim. Ela flertava com rapazes, apenas nunca tinha flertado de verdade com homens mais velhos – pelo menos não quando tinha algum interesse real neles.
— A minha cabeça está me matando. — Ela sussurrou. — O senhor tem algum remédio para isso?
— O senhor? Deixe disso — Ele riu. — Sim, acho que eu tenho. Segure para mim.
Ela tomou o cigarro dos dedos masculinos, sentindo as pontas dos dígitos tocarem a pele dele rapidamente. E foi o suficiente para que se sentisse ainda mais atraída por ele. O pai de sorriu de modo leviano e afastou-se.
ficou sozinha na cozinha, respirando fundo e prometendo a si mesma que tomaria o maldito remédio e subiria para o quarto de sua amiga novamente. Ela não podia ficar ali, jogando conversa fora com um homem que era estritamente proibido para ela. Era perigoso, e se descobrisse? Ela sabia o quanto sua amiga era possessiva com o pai, o quanto ela ainda se magoava com a morte da mãe, mesmo que a tragédia tivesse ocorrido quando ela ainda era uma criança.
Ela olhou o cigarro, tentada a tragar. Tinha começado a fumar no ano passado, quando começara a roubar os cigarros do pai. Desde que ele descobrira e a alertara sobre os malefícios do cigarro – mesmo que ele mesmo continuasse a fumar –, lhe dissera que ela deveria comprar seus próprios cigarros com seu próprio dinheiro, se quisesse continuar fumando. E foi isso que ela fez. Andava para todo o lado com seus Camels, fumando sempre que conseguia. Por isso, ela tragou o cigarro que deveria apenas segurar e soltou a fumaça lentamente, acalmando-se um pouco.
Quando o pai de voltou, achou a garota fumando e a observou. Ela o encarou e então olhou novamente o cigarro, desculpando-se com um gesto.
— Sinto muito.
— Não, tudo bem. — Ele tirou outro cigarro do bolso da camisa, acendendo-o para si. Lado a lado, eles fumaram por alguns instantes, até que ele a ofereceu um comprimido. — Dipirona.
— Obrigada. — Ela pôs o comprimido na boca, engolindo-o com a água restante em seu copo. Pensou em dizer a ele que tinha que dormir, até que o viu abrir a boca:
— Se não se importa, pode fumar comigo? — Ele abriu um sorriso charmoso. — Eu detesto fumar sozinho.
Ela não tinha como dizer não àquele sorriso, que lhe chegava aos olhos. A loira viu-se concordando, tragando longamente para manter a cabeça sobre os ombros.
— Por que bebeu tanto hoje? — Ele perguntou e ela o olhou de lado. — Algo deve ter acontecido.
— Eu não posso ter perdido o controle? — Ela perguntou em tom jocoso, ganhando um sorriso duvidoso em resposta.
— Você não se parece com alguém que perde o controle. — Ela riu.
— Eu… Meu namorado e eu, nós… Tivemos uma briga. Na verdade, é bastante possível que eu esteja solteira.
— Sinto muito em ouvir isso. — Ela pensou que ele não se parecia com alguém que se sentia mal por ouvir aquela notícia. O sorriso dele nem tinha vacilado. — Foi feio assim?
— Não, o que foi feio foi o tanto que eu bebi… — riu pelo nariz, deixando um pouco de fumaça escapar.
— Não precisa se envergonhar. — Ele tocou o ombro dela com a mão livre e ela elevou os olhos para ele, esquadrinhando seu rosto para tentar adivinhar suas intenções.
— Acho que eu preciso subir.
A verdade? não estava assustada, ela tinha tido sua cota de homens mais velhos que tentaram dar em cima dela no restaurante, ela sabia sair daquela situação lembrando-os que tinha idade para ser filha deles – naquele caso, literalmente. Ela tampouco se importava que fosse descobrir qualquer coisa agora, porque ela estava dormindo. Ela tinha medo era do que faria sem pensar nas consequências. Era um impulso seu – vindo dos genes de sua mãe – fazer algo inconsequente quando estava magoada, não se importando se isso fosse magoar outra pessoa como efeito colateral. Naquele momento, apenas faria sexo com o pai de sua amiga por dois motivos: o primeiro era porque ele era realmente atraente, charmoso e tudo o mais; o segundo era porque morreria de ódio se soubesse. O primeiro motivo podia ser válido, mas o segundo era, ela achava, o que a moveria no momento. E, se ela fizesse isso pelo segundo motivo e magoasse sua amiga, então se sentiria mal depois.
— Precisa? — tocou o queixo dela com um dedo, fazendo seu coração saltar.
Resistir não era fácil. Os meses de paixonite platônica cobravam seu preço. Todas aquelas vezes que ela sorria para ele, com os hormônios à flor da pele, todas as vezes que ela se virava para vê-lo novamente, todas as vezes que eles trocavam olhares furtivos… Tudo isso se assomava até resultar naquele momento.
— A vai me matar se eu fizer isso. — Ela disse sinceramente, embora não tivesse tentado mover a mão dele ou sequer se afastar. No fundo, ela não queria se afastar dele. Ele era o fruto proibido e ela sempre se imaginara como Eva, prestes a mordê-lo, ansiosa por mais.
— Meu pai tinha um ditado… — Ele deixou de lado o cigarro, tomando o queixo delicado dela entre seus dedos, impulsionando-o para cima para que seus olhos se encontrassem. — O que os olhos não veem, o coração não sente.
Ele inclinou a cabeça, tomando os pequeninos lábios carnudos com um quê de selvageria, o que a excitou. deixou de lado as preocupações sobre as consequências daquilo, sentindo a cabeça nublando-se cada vez mais com o prazer que tirava daquilo. Ele a abraçou pela cintura, juntando os dois corpos, pressionando-a contra a bancada. Ela sentia o quadril dele no dela, o gosto de tabaco no beijo dele, a ponta da barba arranhando a pele delicada de seu rosto. O beijo voraz a fazia ansiar por ar.
Era errado? Sim. No momento, no entanto, toda e qualquer definição de certo ou errado tinha sido arrebatada de sua mente. Havia apenas os lábios de , a língua dele movendo-se junto da dela, as mãos dele segurando seu quadril. Quando ela precisou de ar e afastou a boca da dele, sentiu um beijo quente na curva de seu pescoço, tocando seu ponto fraco. Se havia qualquer chance de oferecer resistência à sedução do viúvo, esta tinha ido pelo ralo naquele momento. A boca quente do homem moveu-se pelo seu pescoço e em direção à clavícula, ligeiramente coberta pela seda. Ele abaixou a alça do traje de dormir, puxando o tecido até que um de seus seios fosse exposto. O ar, mais frio que sua pele, a fez reagir e o mamilo enrijeceu. Ele sorriu para ela. Ela fez o mesmo, enterrando-se mais em sua cova.
Quando ele a segurou pela parte de trás dos joelhos e a sentou na bancada da cozinha americana, ela segurou-se em seus ombros, inclinando-se para ele novamente e pronta para retomar o que faziam, quando o copo pousado ao seu lado rolou e espatifou-se no chão. O som pareceu ecoar de modo ensurdecedor no silêncio da madrugada e ela ouviu passos no andar de cima.
Os dois se afastaram como se tivessem levado um choque. Ouviram atentamente, esperando para que pudessem continuar, mas o som da porta se abrindo fez a garota pular da bancada – onde não havia cacos de vidro – e correr para subir as escadas, ajeitando a camisola no caminho.
— ?
Uma ainda grogue de sono a interpelou do meio do corredor mergulhado em sombras. fez um sinal para que ela fizesse silêncio.
— Eu quebrei um copo, desculpa.
— Eu ouvi. — bocejou. — Vá limpar, senão meu pai me mata. — Sua amiga virou-se e voltou para quarto.
E apesar disso, nem ela e nem tiveram a coragem de continuar. Eles limparam os cacos de vidro e ela subiu as escadas, enfiando-se na cama, mas sem conseguir dormir.
“Apesar de tudo, eu tenho memórias belíssimas de nós três. Oh, deus! Acabei de me lembrar do Grand Hotel, que nada tinha de grande! Lembra-se de como nós entrávamos pelos fundos, durante a noite, para nadar? E de como, uma vez, os policiais quase nos pegaram porque o gerente noturno nos ouviu? Foi ali que as coisas começaram a degringolar de vez, não foi?”
Nos dias seguintes, evitara a todo custo, não se deixando levar pelos pedidos de desculpas ou pelas promessas de que ele mudaria. Ela ouvia aquilo em toda briga e já estava cansada. Muito cansada. Achava, também, um tanto hipócrita de sua parte voltar a namorar com um rapaz sendo que seus pensamentos estavam sempre no pai de .
— . — O tom de era sério. Ela o encarou quando ele a segurou pelo braço. — Dessa vez é sério, eu vou mudar. Por você.
— Você não vai mudar por mim. — Ela tentou puxar o braço, mas ele não cedeu. — , encare as coisas! Você vai embora no outono para a sua faculdade, não é mesmo? É melhor terminar com isso agora.
— Eu voltaria aqui todo final de semana, nós combinamos isso.
— Sim, combinamos antes, quando eu achava que isso aqui tinha qualquer chance de dar certo. — O aperto de em seu braço se intensificou. — Me solta!
— , não, olhe para mim. — Ela empurrou-o com força, dando as costas a ele. — !
Os gritos dele a perseguiram enquanto ela voltava ao restaurante. Seu chefe, um homem simpático e de meia-idade, saiu do escritório para investigar a fonte de todo aquele escândalo em plena segunda-feira.
— ? O que está acontecendo? — Ele olhou da garçonete, visivelmente tensa, para o rapaz que gritava impropérios do lado de fora.
— Ele não sabe lidar com términos muito bem, eu acho. — Apesar de tudo, seu característico deboche fez-se presente.
Ela fungou, tentando não se abalar com a cena que ele fazia, voltando a trabalhar. Sorrir para os clientes era o mais difícil. Sorrir era uma tarefa árdua, até que apareceu com os pais.
— Eu passei pelo na rua e ele estava todo vermelho. Vocês brigaram de novo? — , em vez de olhar o cardápio, tinha os olhos na melhor amiga.
— Pior: terminamos. — Ela sabia que seu chefe não gostava muito quando ela se punha a conversar em vez de trabalhar, mas acabou cochichando mesmo assim.
— Ah, mesmo?
Ela conhecia o tom de descaso de . Era o mesmo que ela usava quando não acreditava em algo que tinha se disposto a fazer ou quando Katherine começava a lhe dar uma compostura sobre ser “preocupada” demais.
— Dessa vez é para valer. — viu-se dizendo, explicando-se para a morena. — Ele vai para a faculdade de qualquer forma, então por que insistir? Imagine só de quantos chifres me livrei!
e Katherine entreolharam-se e sorriram, eram mesmo parecidas. O humor da garçonete também melhorou um pouco com os ali. As três amigas tinham combinado de dormir na casa de , que ficaria vazia durante a noite, já que seu pai pegaria o plantão noturno novamente.
Na volta do trabalho, ela não viu o pai de no portão e, por um momento, se sentiu decepcionada. No momento seguinte, no entanto, recobrou o tantinho de responsabilidade que persistia em dizê-la que era melhor daquela forma e seguiu pela rua, empurrando a bicicleta.
A distância do restaurante para a sua casa era curta e seu pai já tinha lhe dito para gastar menos gasolina com o carro. Durante o verão, ela tinha usado a bicicleta para ir ao trabalho e seu carro era apenas para sair com as amigas à noite.
— Então… — , deitada de modo sedutor em cima do sofá, fumava um cigarro e tentava imitar alguma atriz de Hollywood. As duas amigas riram. — Você e , acabou mesmo?
— Pra valer. — respondeu, servindo uma dose de Campari para cada uma, apesar dos protestos de .
— É a quinta vez que vocês terminam “pra valer”. — Ela arremessou um cubo de gelo no meio da testa de , o que fez gargalhar.
— Ei, os comentários maldosos são o meu charme. — gracejou. — Mas tem razão. Vocês já terminaram “de vez” outras vezes.
rosqueou a tampa da garrafa novamente, dando de ombros. Ela tinha certeza de que eles não voltariam, dessa vez. andava cada vez mais irascível e, no começo, lhe desculpara o comportamento levando em conta toda a mudança que estava para ocorrer na vida dele. Mas ele passou a beber mais, flertar com garotas descaradamente e também a tratava mal diversas vezes. Até mesmo seu pai tinha notado e ele mal ficava em casa.
— Vamos beber e esquecer de . — pediu, jogando-se no sofá, na TV um filme estava para começar.
— Eu não vou beber isso. — protestou depois de cheirar o copo com a bebida.
— Então eu bebo! — A outra morena tomou o copo e virou todo o Campari de uma só vez.
A loira apenas rolou os olhos, vendo as duas discutindo por algum problema idiota. Era engraçado como e era tão diferentes e mesmo assim se davam tão bem. tinha uma personalidade maternal e naturalmente cautelosa. Ela era sempre a voz da razão entre duas adolescentes loucas.
Elas assistiram ao filme e comeram batatas fritas enquanto conversavam sobre os planos futuros. descobriu que tinha conhecido um cara ligeiramente mais velho enquanto trabalhava no rinque de patinação e ela jurava que ele era incrivelmente gostoso e solteiro.
— Nós vamos sair na sexta. — Ela confidenciou.
— Você literalmente terminou um namoro alguns dias atrás. — riu e acusou, o que fez rolar os olhos.
— O melhor jeito de esquecer aquele idiota é beijando outro, todo mundo sabe disso. E, ah, eu disse para o meu pai que vou dormir na sua casa. — Ela avisou .
— Por que na minha? — O “pai de ” ainda a fazia estremecer.
— Porque seu pai nunca está em casa e ele não liga que eu durma aqui. — Ela explicou, enfiando várias fritas dentro da boca. — E, além do mais, a estará fora da cidade.
— Pelo amor de Deus, tenha modos. — A reclamação de passou despercebida pela outra.
— Tudo bem. — disse simplesmente, dando de ombros.
Ela não imaginava que aquilo aconteceria, no entanto. Na sexta, ela tinha voltado para casa e tinha acabado de tomar um banho, afastando o calor que, apesar da noite já ter caído, persistia. tinha passado na casa dela a caminho de seu encontro, dizendo que estaria de volta à meia-noite. E, se ela bem conhecia , isso significava que ela voltaria às três da manhã. Se voltasse.
Deitada no sofá, tentando assistir a um filme enquanto estava com ela ao telefone, ela ouviu a campainha tocar.
— Espere, deve ser a . — Ela anunciou para , que tinha ido passar o fim de semana com o tio, na casa de veraneio da família.
Não era na porta, mas alguém parecido. Ela encarou o pai de por um momento, entrando em pânico uma vez que percebeu que ele logo veria que sua filha não estava dormindo ali.
— Ah, sr. . — Ela fez um esforço para sorrir, fechando o espaço da porta com o próprio corpo. — A esqueceu alguma coisa em casa?
— De me dizer onde ia de verdade, talvez. — Ele acendeu um cigarro enquanto ela observava. — Eu sei que ela não está aqui, .
Por um momento, ela hesitou. Se ela dissesse que não estava lá e sua amiga ficasse de castigo, então provavelmente teria que lidar com o péssimo humor dela depois. Por outro lado, parecia saber que sua filha não estava ali.
— Não vai me convidar para entrar? — Ele tirou o cigarro da boca e lhe mostrou o mesmo sorriso charmoso de antes.
— Não vai querer saber onde a está? — Ele negou com a cabeça. — Por quê?
— Porque eu já sei. A ouvi no telefone, mais cedo. — Ele a encarou e ela finalmente abriu a porta, dando-lhe passagem.
Ela deixou-o no hall de entrada, indo diretamente até o telefone vermelho na sala. Tomando o fone nas mãos, ela engoliu em seco. É claro que imaginava o motivo pelo qual ele estava ali. Se não estava ali pela própria filha, então era por ela. E a única coisa que ele podia querer dela era continuar o que tinham começado na outra noite. mentiria se dissesse que não estava ansiosa ou que não tinha fantasiado sobre o que poderia acontecer depois de tudo aquilo.
— ? — Ela falou no fone, observando enquanto ele a seguia. Ele parecia tão bonito parado no meio de sua sala, seus olhos verdes, o cabelo perfeitamente arrumado. Ele era incrivelmente sexy para um pai. — Podemos terminar a conversa depois?
— Depois? — Houve uma pausa, mas a loira não percebeu. Ela viu o sorriso charmoso dele se transformar em algo mais lascivo. — Oh. , é o que está aí?
— O quê? — Ela voltou a atenção para a ligação. — Não, não é o , eu só não posso conversar agora.
— Aconteceu alguma coisa?
— Não. — Ele aproximou-se dela, colocando uma mecha de seu cabelo loiro atrás da orelha. — Eu explico depois.
Ela pousou o fone no gancho, os olhos fixados nos dele. Que Deus a perdoasse porque certamente não o faria.
— Eu não consegui esquecer aquele beijo. — Ela murmurou, arrancando um sorriso dele.
— Eu ia dizer isso agora. — A garota sorriu, passando os braços ao redor do pescoço dele e aceitando o beijo de com bastante gosto.
Dessa vez, ela não tinha que se preocupar com dormindo no andar de cima e seu pai não voltaria para casa até a manhã do dia seguinte. Os dois tinham todo o tempo do mundo para aproveitar e ela queria se entregar à tentação ao menos uma vez. Ela só precisava experimentá-lo uma vez e então jamais faria aquilo de novo. Se ficar se agarrando com o pai de uma de suas melhores amigas se tornasse usual, então sua amizade não resistiria. Sim, uma vez seria o suficiente.
As mãos dele a seguraram pela cintura, trazendo seu corpo para mais perto. Um suspiro deixou os lábios ligeiramente inchados da garota quando o beijo se quebrou. Deus… Ela sabia que Ele não ajudava seus filhos em atos pecaminosos, principalmente com o pai de sua amiga, mas ela queria que Ele não deixasse aquele momento terminar. A boca dele beijou o espaço entre sua nuca e a orelha, lábios molhados e quentes depositavam beijos lentos e sensuais em sua pele. inclinou a cabeça para trás, garantindo ao homem livre acesso àquela área.
— Vamos para a cama. — Ela murmurou e ele observou-a por um momento, um sorriso lentamente formando-se em seus lábios.
— Precisamos ter pressa? — Ela negou com a cabeça. — Então deixe-me aproveitar.
poderia jurar que ele tinha beijado, mordiscado e chupado cada centímetro de sua pele, passando pelos ombros, pela clavícula, pelo alto de seus seios e o vale entre eles, exposto pela blusa de alcinhas.
— O sofá. — Ele sussurrou contra a pele dela, fazendo-a acordar de seu devaneio prazeroso. Ela anuiu e seguiu-o até o sofá.
Ele sentou-se primeiro, puxando-a delicadamente pela mão até que ela estivesse confortavelmente sentada em seu colo. já estava excitado e isso era fácil de perceber, principalmente quando ela estava na posição em que se encontrava. Foi a vez de iniciar o beijo, pressionando os lábios contra os dele.
Ela não era nenhuma pudica, não conseguia ser hipócrita como as boas garotas que fingiam não gostar de sexo apenas para alimentar a imagem de uma mulher de virtude. Qual era o problema de gostar de sexo? As mãos dela subiram pelo pescoço do homem, segurando seu rosto entre elas. O rosto dele estava liso, ao contrário de quando se beijaram na casa dele. Ela também sentia o cheiro de sua colônia. Ele tinha se arrumado para ela? Isso era adorável.
— Eu não conseguia parar de pensar em você. — A mão dele desceu pela sua cintura, acariciando as coxas enquanto ele subia o tecido de sua saia.
sorriu de maneira coquete sentindo os dedos dele em sua pele. Os olhos fecharam-se por um momento, a boca se abriu um pouco. Ela ainda ouvia a voz dele.
— Desde que eu te beijei… — Ele pontuou a frase um beijo em seu ombro, fazendo-a tremer, ansiosa por mais. — Eu percebi que eu queria mais.
As mãos dele seguraram na barra de sua calcinha, puxando o tecido para baixo. ergueu os quadris por um momento, permitindo que ele as abaixasse.
— Eu também. — Concordou com voz fraca e rouca.
Ela ouviu o som de uma risada baixa e grave, o que a fez abrir os olhos verdes e encará-lo. Viu o rosto dele chegar mais perto do seu, uma de suas mãos segurando em sua nuca, o polegar cuidadosamente pousado na lateral de seu rosto. Ela fechou os olhos novamente, aguardando o beijo que se seguiria, mas ele simplesmente manteve o rosto perto do dela, seu hálito batendo contra sua boca… Ela estava aguardando, cheia de expectativa. E, então, a mão que ainda repousava no alto de sua coxa moveu-se, tocando-a intimamente naquele ponto delicado.
Se antes ela estava molhada e pronta para ele sem sequer ter sido tocada, agora ela movia inconscientemente os quadris conta a mão dele. Com o rosto tão perto do dela, capturava cada expressão, cada franzir dos lábios, cada respiração entrecortada que ela soltava sem conseguir se conter. Ele sentia os seios dela subirem e descerem conforme ela arfava, o rosto corado, o lábio inferior que ela mordia para deter um gemido de escapar. Segurava a cabeça dela no lugar, impedindo-a de virar para o lado ou afastar dele a deliciosa expressão de prazer que ela tinha no rosto. Ele queria olhá-la, guardar em sua memória cada pedaço dela.
Ele não era nenhum exemplo de autocontrole, só gostava de ver como ela se retorcia em cima dele, rebolando sobre a mão dele, deixando de lado qualquer racionalidade.
Não era certo. Ela sabia que não era. Sabia que poderia ficar com a consciência pesada depois de tudo, mas ela simplesmente não se importava. Era demais pedir que ela se preocupasse com os sentimentos da melhor amiga enquanto estava à beira de um orgasmo.
— … — Murmurar o nome dele foi como um truque de mágica. Ela sentiu dois dedos a penetrarem, o que a fez puxar o ar intensamente pela boca. O aperto que ela tinha nos ombros dele se intensificou, mas não se moveu.
Apenas os dedos dele se moviam contra ela, marcando um ritmo forte e constante que a fazia gemer. Ela tinha que admitir, ele era bom. Ela estava prestes a gozar e ele nem tinha tirado as calças ainda. Quando o momento tão esperando chegou, sentiu seu corpo tremer delicadamente. Ela parou de mover os quadris, um suspiro longo escapando de seus lábios enquanto seu corpo inteiro relaxava e em seguida explodia de prazer.
sorria. Ele deixou de segurar-lhe a nuca e passou a mão pelos cabelos dela, acariciou seu rosto e beijou-a demoradamente.
— Agora podemos ir para a cama.
Ela o levou pelo corredor, abrindo a porta de seu quarto e deixando que ele entrasse. Por um momento, distraiu-se com a decoração em tons de vermelho e branco e os pôsteres de cantores e bandas que ela gostava, mas seu olhar logo achou a garçonete novamente.
— Venha. — Ele a chamou com o braço esticado, gesticulando para que ela fosse até ele.
, no entanto, deu a volta na cama. Ela sorria de lado, como quem tinha maquinado algo em sua mente perversa.
— Por que não se deita? — Ela sugeriu, sentando-se na cama.
Quando percebeu que ele estava se despindo, foi até a beira da cama, pondo-se em seus joelhos para levantar. Em seguida, ela o ajudou. Primeiro, foi-se embora a blusa branca de algodão. Depois, as calças. Quando ele se sentou, ainda de cuecas e sapatos, ela encostou-se em suas costas largas, mantendo-se sobre os joelhos.
Suas mãos deslizaram pela extensão dos ombros de , notando o arrepio na pele dele tão logo ela arranhou-o de leve. Sorrindo para si mesma, ela passou a distribuir diversos beijos por seus ombros fortes. deixou de lado os sapatos e as meias, virando-se rapidamente e capturando a ninfeta em seus braços, deitando-se com ela na cama.
— Você é sórdida. — Ele arrancou uma risada dela, que se debateu debaixo dele, tentando se libertar. — Isso não se faz.
— É mesmo? — Ela mordeu o lábio, sustentando o olhar dele. — Então porque não me dá uma lição?
sorriu. Ele era pai de uma garota com a idade dela, sabia algo sobre disciplina e como fazer garotas más se comportarem, mas aquilo era diferente. Ele abaixou o rosto, beijando-a profundamente.
— É exatamente isso que eu pretendo fazer.
“Sei exatamente onde errei quando me envolvi com o pai de . Aquele era um limite que eu não deveria ter cruzado, mas… É isso que nos torna garotas. Eu vi meu paraíso nele, no modo como ele me ouvia e não debochava de minhas aspirações. sempre foi gentil e respeitoso comigo, mesmo que depois eu tenha descoberto que ele tinha feito exatamente a mesma coisa com outras garotas como eu. Não é estúpido? Nós buscamos tanto o amor, esse amor de matar e morrer, e ele nunca dá certo. Nossa amizade acabou e nos separamos porque eu botei o amor de um homem antes de . Agora que lembro disso, é até engraçado. Eu não chorei por ele, apenas chorei por ela.”
remexeu-se na cama, embrenhando-se no abraço de . Ela sorriu para ele, satisfeita e relaxada depois de mais um encontro às escondidas. Ela tinha esperado as amigas dormirem, no andar de cima, apenas para se esgueirar até o quarto dele.
— Eu tenho que subir antes que elas notem que eu sumi.
Desvencilhando-se dos braços dele, ela se levantou da cama e começou a recolher suas peças de roupa pelo chão. tinha as mãos debaixo da cabeça, um sorriso tão satisfeito quando o dela no rosto.
— Quando eu vou te ver de novo? — Ela virou-se para ele, rindo.
— Já está ansioso para a próxima?
— Você pode me culpar? — Ela riu e balançou a cabeça.
— Eu não sei, o verão está acabando. Logo a escola vai começar e eu vou ter menos tempo.
Quando ela terminou de se vestir, acenou para ele e deixou o quarto. Pé ante pé, ela subiu as escadas sorrateiramente, quando a luz acendeu-se.
— ? — Ela olhou a amiga no topo da escada. — O que foi?
— O que você estava fazendo?
— Eu vim beber água. — respondeu automaticamente, retomando seu curso escada acima.
— Sério? Você estava com tanta sede que levou mais de meia hora para beber água?
Ela estacou, encarando a amiga. Sentia o rosto quente com a vergonha, chateada consigo mesma porque ela sabia o quanto magoaria .
— …
apareceu atrás dela, ainda um pouco sonolenta.
— , o que está acontecendo? — Ela olhou de uma para a outra.
— É isso que eu estou tentando descobrir. — O olhar de falcão de cravou-se no rosto de uma vez mais. — O que você estava fazendo lá embaixo?
, por sua vez, não respondeu. Era bem óbvio o que tinha acontecido e ela se descobriu envergonhada demais para sequer falar, algo que nunca antes tinha acontecido.
— ? — a chamou, mas ela continuou olhando para baixo. — Ah, não! !
Depois de interromper a ligação das duas, na primeira noite que eles dormiram juntos, apenas disse a que um convidado tinha chegado e que eles tinham dormido juntos. Apesar da insistência de , ela não tinha revelado quem era o cara misterioso. Ela não tinha contado nem para sua amiga de infância, receosa da reprimenda que, certamente, levaria.
sentiu as lágrimas quentes descerem pelo rosto. Ela não se importava que era plena madrugada ou que sua voz havia subido algumas oitavas, ela só tinha que tirar aquilo de seu peito.
— Eu não acreditei, sabia? Eu não acreditei que você faria algo assim comigo! Eu pensei: , sua boboca, jamais foderia com o seu pai! Eu achei que você fosse minha amiga!
— , se eu puder me explicar…
— Explicar o que? Que você deu em cima do meu pai? Que você estava transando com ele? Eu sabia! Eu sabia que tinha algo de errado com o seu “cara misterioso” quando você não nos disse quem era! — Ela limpou as lágrimas com as costas das mãos.
A cena fez aparecer na sala e acender a luz do andar de baixo.
— O que está acontecendo aqui? , o que é isso?
— Por que você não me explica, papai? — retorquiu de modo irônico. — Desde quando você anda transando com a minha melhor amiga?
O rosto de ficou pálido. Ele olhou as garotas, ponderando seu próximo passo. E, como era homem, seu primeiro instinto foi negar.
— Você está sendo ridícula.
— Eu estou? — Ela riu. — Eu não acredito em você. Eu não acredito que você fez isso de novo, dormindo com uma garota com idade para ser a sua filha! — Ela se virou para a . — Você não foi a primeira, sabia? Meu pai costumava transar com a minha babá enquanto eu dormia.
— !
— Ele gosta de garotas jovens, eu acho. — Ela continuou sem se importar com os olhos brilhantes de lágrimas de ou os protestos de para que calasse a boca. — Não que eu não entenda, você é a mais bonita que ele já fisgou. Eu só tenho pena de você, porque quando ele se cansar, vai te deixar de lado como se fosse um lenço usado!
permaneceu em silêncio. Ela sabia que estava errada e não conseguia dizer nada para se defender. No fundo, ela sabia que merecia ouvir tudo aquilo.
— Essa vagabunda não vai mais dormir no meu quarto. — A morena anunciou, dando as costas para os três e batendo a porta.
— Eu não posso ficar do seu lado agora, . — estava decepcionada como ela sabia que a amiga ficaria. Ela olhou os dois e fez o mesmo percurso que .
Se o rosto vermelho de vergonha e raiva fosse qualquer indicação de seu humor, se sentiu ainda pior quando não tentou se defender das acusações da filha. Ela pegou a chave de seu carro em cima da mesa e não disse nada, dirigindo até a sua casa no meio da madrugada. Quando ela chegou, acordou o pai com o barulho da porta batendo.
— ? ! — Ela não deu ouvidos a ele e correu para o quarto, o rosto lavado de lágrimas.
Não demorou muito para que o honrado doutor descobrisse o que tinha acontecido, cortesia de . E, logo, toda a cidade ficou sabendo tanto da predileção por jovens garotas do viúvo quanto da imoralidade da garota, que tinha puxado a mãe, segundo a cidade, até no gosto pelo escândalo.
— Eu sei que você deve me odiar, mas isso é para o seu bem.
Ela encarou o pai, suas malas já estavam no vagão bagageiro do trem e ela tinha apenas uma valise na mão enquanto esperava. No fundo, não podia culpar seu pai. Ele tinha tentado fazer o que era melhor para ela desde que sua mãe tinha se divorciado dele. Naqueles dois anos, ele tentou criá-la sozinho o melhor que pôde, deu-lhe um carro, independência e tudo que ela sempre quis. Ela apenas não soube aproveitar.
Mesmo sabendo disso, sentia o ódio queimar a sua garganta e não respondeu. Era orgulhosa demais para chorar na frente dele.
— Isso é para o seu bem. — Ela rebateu, ainda furiosa. Quando o apito do trem soou, ela entrou no veículo sem olhar para trás ou se despedir do pai.
acomodou-se em sua poltrona, respirando fundo e tentando se acalmar. Ela olhou pela janela do trem, vendo seu pai ainda parado na estação. E ela viu duas figuras atrás dele, meio escondidas pela multidão.
a encarava de longe, com seus altivos olhos de corça. A fita em seu cabelo e seus cachos balançavam com o vento leve, a expressão dela era de desprezo e mágoa. , ao seu lado, tinha dois fios de lágrimas escorrendo dos grandes olhos amendoados. Ela sentiu seu coração se encolher ao ver as duas amigas ali, vendo-a partir.
“O que nós nos tornamos? Como chegamos a esse ponto? Uma geração nova em folha, mas falhando miseravelmente em tudo. A geração de rainhas da beleza depravadas, como a madre superiora nos chama. E eu entendo o motivo. Eu não sei em que parte eu me tornei tão insensível ou quando foi que eu decidi que os sentimentos de vocês não importavam, mas isso aconteceu. E eu também jamais esperei que fosse me dedurar para o meu pai. Mesmo aqui, eu ainda não entendo o que aconteceu conosco, mas eu quero pedir perdão. Às duas.”
leu a carta, deixando a caneta de lado por alguns segundos, se certificando de que não havia nenhum erro ali. Dois anos passaram sem que ela tivesse contato com as amigas. Ela estava prestes a deixar o internato e já era verão novamente. Na manhã seguinte, seu pai a buscaria para retornar à cidade natal.
— Você nunca me falou de nenhuma delas. — Ela ergueu os olhos para a figura que assomava-se atrás dela, encarando o homem com um sorrisinho. Ele lia a carta por cima de seu ombro.
— Eu não queria me lembrar. — A resposta não o desencorajou.
— O que aconteceu depois?
— Eu fui mandada embora. — remexeu-se desconfortavelmente. — Eu acenei para elas, mas elas nunca acenaram de volta.
Ela omitiu a parte que chorou, magoada, quando viu suas amigas permanecerem imóveis. Ela chorou porque sabia que jamais voltaria para lá. Ao menos, a antiga jamais voltaria para lá. Era a mesma coisa, não?
Paul a encarou, pousando a mão em seu ombro. As malas dela já estavam no carro dele e ela tinha pedido um tempo para terminar aquela carta. Ela queria deixar algumas palavras para as suas antigas amigas.
— Você está pronta?
— Sim, eu só vou colocar isso em um envelope e nós postamos no correio amanhã. — Ela tranquilizou o homem com um sorriso.
O professor de história beijou-lhe o topo da cabeça e pôs o seu chapéu, fechando a porta atrás de si. suspirou e pegou a caneta de novo.
“Eu queria ter uma de vocês comigo. As duas, se eu tivesse essa sorte, mas acho que vocês já sabem. Eu nunca vou voltar. E, para ser bem sincera, sei que estou cometendo os mesmos erros de novo. Nós queremos o paraíso, mas ele nunca vem. Nós colocamos o amor em primeiro lugar, mas esta é a nossa maldição. A maldição de Eva. Uma vez que provamos o amor, nosso fruto proibido moderno, nós queremos sempre mais. E não adianta chorar. É isso que acontece conosco. Eu quero me desculpar, mas não posso dizer que eu estava louca de paixões ou temporariamente insana. Eu sabia onde estava me metendo, mas, ao mesmo tempo, também não tinha ideia. Não agora. Eu sei muito bem o que estou fazendo dessa vez. Não sou a mesma tolinha que se encantou por um homem mais velho que a venerava. Não, não é isso. Eu estou sendo terrivelmente prática. Paul me levará para Hollywood e eu realmente espero que a próxima vez que ouvirem meu nome seja nas rádios. Quero que ouçam a minha voz e se lembrem de mim. E, se acharem no coração de vocês a vontade de me perdoar… Então me escrevam de volta. Eu amo vocês.”
A carta começara sendo para os olhos de , apenas, mas mudou de ideia no meio do caminho. Ela devia explicações a , também. Ela voltou ao espaço que tinha deixado antes, quando não conseguia se decidir entre “” e “Querida ”. Com um sorriso amargo, ela simplesmente escreveu: Às únicas amigas que eu já tive.
Como prometido, ela pôs a carta no envelope, endereçou-o e colou os devidos selos, admirando o envelope branco por um momento. No momento seguinte, ela se ergueu, enfiando a carta no bolso. Ela observou por um momento o quarto estoico e sem enfeites que tinha sido o seu lar nos últimos dois anos. Seu pai a procuraria na manhã seguinte naquele quarto e o acharia terrivelmente vazio.
Seu pai não tinha ganhado uma carta, ela apenas esperava poder falar com ele no telefone uma vez que chegasse na Califórnia. Ele não podia fazer nada quanto a isso. Ela já tinha dezoito anos, era uma mulher adulta e podia decidir seu próprio caminho. Paul era apenas um meio para conseguir o que ela queria: uma carreira de cantora. E ele a amava tanto, era sempre tão rápido para aceitar as suas sugestões. Mesmo que ele fosse um homem adulto, o professor de história do internato, e relativamente bonito, ele sempre comia na palma de sua mão. Tinha se demitido naquele mesmo dia e planejado com ela a fuga para Hollywood. Ele acreditava no talento dela. E ela gostava dele. Não era uma paixão avassaladora, não era um amor épico, não era um amor de matar e morrer… Mas ela acreditava que era amor de qualquer forma.
fechou a porta do quarto depois de apagar as luzes. Ela estava certa quando achou que jamais voltaria para casa. Ela simplesmente se negava a admitir a derrota. Sempre tinha sido uma péssima perdedora. E, assim, ela foi embora, deixando o quarto vazio e a antiga vida para trás.
Fim
Nota da autora: Acho que não havia outro jeito de prosseguir com uma fic sobre essa música sem invocar um pouco da adolescência, dos erros, dos acertos e das amizades juvenis que desvanecem quando envelhecemos – a não ser que você seja sortuda, como eu, e ainda mantenha suas amigas da adolescência. Para mim, a história sempre esteve muito clara, ao menos como eu imaginei, ouvindo a música várias vezes no Spotify. A decisão de focar um pouco mais nas amizades do que em um romance veio disso, da música em si, que parece tratar mais das garotas do que de namoricos. E, para ser franca, acho que a amizade feminina deveria ser um pouco mais exaltada. Eu agradeço a todo mundo que leu até aqui. Espero que eu tenha suprido as expectativas. Ademais, adeus… Por enquanto.
Outras Fanfics:
Fortune Teller (Outros - Finalizada)
The Swan Dive (Restrita - Outros - Em Andamento)
Mixtape: Coisas Que Eu Sei (Awesome Mix: Vol 6 “Brasil 2000’s” – Finalizada)
09. Thunder (Ficstape EVOLVE)
11. Not Coming Home (Ficstape Songs About Jane)
09. Carmen (Ficstape Born to Die)
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