Fanfic finalizada

Eu acho que pirei

Quando eu te vi logo pensei
É o amor que eu sempre sonhei
Meu coração então disparou
Quando você sorrindo me olhou



O que é a vida?
se perguntava enquanto encarava a chuva torrencial que caía do lado de fora de uma delicatessen em Toronto, no Canadá. Era algo perto das três da tarde, mas o céu estava tão escuro quanto devia estar as nove da noite. Depois de muito ponderar, resolveu que se tivesse que esperar, seria melhor esperar sentada. Do lado de fora havia um banco de ferro sob a cobertura larga, na calçada da loja, ao lado de uma daquelas máquinas onde se coloca uma moeda e se ganha um brinquedo. Até aquelas máquinas pareciam mais atrativas naquele país.
Era a segunda semana de em seu novo – temporário – lar. Anos de total e plena dedicação acadêmica, anos de noites mal dormidas e de queda de cabelo devido o estresse tinham tido algum resultado. Logo após a formatura havia sido convidada para levar seu projeto de mestrado para uma universidade no exterior. Aparentemente muito se queria saber e se aprofundar sobre manejo e cuidado de pacientes com transtorno sem uso de medicamentos. Suas ideias de pesquisa eram embasadas no trabalho da vida de um psicólogo finlandês, logo, quando recebeu o convite, aceitou sem pensar. Acreditando que iria para a Finlândia, país que nutria muita afeição e curiosidade.
Mas a realidade era diferente da idealização. Seu destino, na verdade, era o Canadá. Mesmo não sendo a primeira opção, era uma boa opção. E não demorou muito para que começasse a criar suas fanfics, afinal, teria chance de cruzar em uma calçada qualquer com sua maior obsessão em forma de jogador de hockey: . Para o jogador de hockey americano, mas que jogava em Toronto, não era apenas um jogador comum, era tudo. Era um homem doce e gentil, um ativista que trabalhava sem cessar na causa das crianças com câncer. Era também um jogador incrível, um dos maiores ídolos do esporte, mesmo ainda tendo só vinte e cinco anos. era a representação do homem perfeito, idealista, focado, ligado a família, apaixonado por crianças. não era uma adolescente e a fase de pensar que se estivesse em um jogo, a veria do gelo e se apaixonaria por ela já haviam passado há muito tempo. Mas mesmo assim, se flagrava constantemente se imaginando em situações aleatórias onde poderia conhece-lo, cruzar com ele. O destino é tudo. Era o que Bernard Cornwell sempre dizia em seus livros, e o que mais acreditava no mundo.
Mas durante o processo de mudança, a adaptação a nova cultura, a nova língua e o sentimento de se perceber longe de sua rede de apoio logo tomaram a cabeça de , a impedindo de pensar em qualquer outra coisa. Não sobrava tempo para ler as notícias sobre o time, sobre , ou notícias sobre qualquer outra coisa. Mal tinha tempo para falar com seus amigos e família, todo seu tempo era consumido por horas e mais horas de estudo.
Aparentemente não era fluente na língua o suficiente para entender o que era dito nas aulas, precisava gravar o áudio e transcrever tudo toda noite, para que assim tentasse entender pelo menos alguma coisa. Não era a criatura mais sociável do mundo, e agora socializar era ainda mais difícil. A dificuldade para compreender e se expressar tornavam evitativa quando o assunto era socializar com qualquer ser vivo. Preferia andar de cabeça baixa, em silêncio, evitando chamar atenção para si.
Era só a segunda semana e já estava exausta.
Por isso, naquela tarde de terça-feira, depois de chorar de exaustão, resolveu que tudo aquilo seria um problema para sua eu do futuro. Pegou algum dinheiro, vestiu um casaco grosso e caminhou pelo quarteirão onde morava. A faculdade havia cedido um apartamento para a aluna intercambista se alojar no período em que estivesse fazendo seu mestrado. Felizmente era bem no centro, rodeado de lojas, restaurantes, lojas de cacarecos, padarias e todo tipo de mercado. Naquela tarde especialmente, se viu tentada a entrar na delicatessen, os queijos expostos e os doces cremosos em potes de vidro capturaram sua atenção.
E agora, após comprar mais do que seria aconselhado, estava presa do lado de fora. Odiava o hábito de andar por aí com guarda-chuvas, e naquela tarde, ao conferir o céu, pensou que teria tempo de ir e voltar sem ser atingida pela chuva que o tempo escuro prometia. Falhou. A chuva era forte demais para que tentasse voltar utilizando a proteção das marquises. As sacolas de papel cheias de compras da delicatessen também não apoiavam sua decisão, por isso resolveu se sentar no banco frio de ferro, assistindo a chuva. O celular estava sobre a cama, preso ao carregador, e analisar qual era o padrão de escoamento das aguas fluviais naquela rua era o que mais tinha de divertido para fazer. Depois poderia comer alguma coisa ou ler os rótulos dos produtos comprados, mas só depois, quando se certificasse de ter dividido o tempo com perfeição para que tivesse algo para fazer até a chuva passar.
Não demorou para que sentisse uma presença próxima. Olhando de soslaio reconheceu a figura sendo outro cliente que também estava na delicatessen e que aparentemente enfrentava o mesmo problema que ela. puxou as sacolas para mais perto e se arrastou para a ponta do banco, dando espaço para ele caso quisesse se sentar, mas não sorriu ou socializou. Primeiro, por não ser adepta a socializar com homens que não conhecia. Segundo, por não estar com paciência para socializar com pessoas que não falassem sua língua materna.
O homem pareceu não querer a incomodar, afastou-se alguns passos, ainda com suas sacolas em mãos e passou a fazer o mesmo que : observar a água que escorria pelo asfalto.
Ele era grande, possivelmente maior do que os homens comuns, tinha cabelo castanho que escapava da touca roxa que usava, formando cachinhos na nuca. Usava um pequeno brinco de argola nas orelhas, com o que parecia uma cruzinha pendurada. Usava também um conjunto de moletom branco e tênis igualmente brancos, mas não parecia desleixado, o conjunto parecia ter sido pensado em cada detalhe. Umas duas pulseiras podiam ser vistas no braço esquerdo, assim como um anel prata no dedo indicador e o que parecia ser o final de uma tatuagem que ele devia ter no antebraço. Era o que em seu país se considera branco, mas em Toronto não devia ser. começou a tentar imaginar o que ele devia estar fazendo ali, quem ele era e qual era sua história, apenas para passar o tempo. Adorava jogar aquele jogo com pessoas desconhecidas, mas era melhor quando tinha companhia.
O vento mudou seu curso de repente, direcionando uma lufada de ar que transferiu parte da chuva para onde o homem estava. Ele se afastou rapidamente, girando em seu próprio eixo e se encolhendo, dando as costas para a chuva. riu abafado, atraindo a atenção dele, que ergueu as sobrancelhas e pareceu sorrir também.

– Isso foi sacanagem. – Ele falou e por seu tom de voz teve certeza de que ele ria.

Os dois usavam o acessório tão familiar e conhecido: máscaras cirúrgicas. Mais uma onda de Covid–19 parecia assolar a cidade naquele momento e simpatizou um pouco mais com ele por ter consciência e se proteger e proteger os outros.

– Você achou mesmo que fosse conseguir ficar seco? – brincou, torcendo para não ter dito nenhuma palavra errada na língua dele.
– Eu sempre tenho esperança. – Ele negou com a cabeça, analisando os pontos onde a chuva o tinha atingido. – Mas acho que vou sobreviver.
– Só não deixe o vento te perceber de novo. – sorriu com os olhos, encolhendo o corpo e apoiando o peso do tronco nas mãos apoiadas no banco.
– Eu realmente acreditei que conseguiria entrar e sair antes da chuva. – Confessou o homem, voltando a olhar o céu escuro.
– Achei que só eu tivesse desafiado o clima desse jeito. – Disse ela se familiarizando com a voz dele e com seu sotaque rápido. – Obrigada, agora me sinto um pouco menos tonta. – inclinou a cabeça sobre o ombro.
– Disponha. – Ele riu outra vez e percebeu isso graças a forma com que seus olhos se apertaram e o riso em sua voz. – Posso? – Perguntou indicando com a mão livre o lugar disponível no banco de ferro e ela assentiu com a cabeça. – Nossa, isso está gelado.
– Vai esquentar rápido. – sorriu outra vez, baixando a cabeça.
– Está esperando há muito tempo? – O outro cliente perguntou ao apoiar as compras sobre a perna e as costas ao banco de ferro.
– O suficiente para perceber que vocês têm um ótimo sistema de escoamento de água aqui. – Comentou, ainda com olhos na chuva e ele riu abafado.
– É sério? Está prestando atenção nisso? O que você faz? Trabalha na prefeitura?
– Eu só estou entediada. – deu de ombros, sorrindo envergonhada. – Sem meu celular, só restava isso ou ler todos os rótulos do que tem na sacola. Mas isso era o que eu pretendia fazer em seguida.
– Socializar não passou pela sua cabeça? – Ele quis saber, e pela sua voz e como seus olhos castanhos estavam estreitos, estava sorrindo.

fingiu tossir, como se limpasse a garganta para dizer algo importante, depois o imitou, recostando-se ao banco e puxou o moletom que usava, ajeitando-o. O homem dirigiu seu olhar para o moletom, onde estava escrito clube dos antissociais sobre o peito, do lado esquerdo, no idioma dele. Ele baixou a cabeça e riu, pelo espaço de pele descoberto pela máscara, percebeu que estava vermelho como um tomate maduro.

– Em minha defesa, eu tenho um igual a esse. – Ele apontou depois que endireitou sua postura e voltou a olhar . – Desculpe te incomodar.
– Não é incômodo. – Negou . – Fiquei com pena por você ter se molhado. Sempre é tempo de fazer uma boa ação. – Sorriu ela – Ainda mais nessa época do ano.
– Obrigado, então. – Ele assentiu sorrindo.

Fez-se silêncio enquanto, agora, os dois observavam a chuva e a água no asfalto.

– Então, achou mesmo um bom sistema de escoamento de água? – Ele voltou a falar.
– Acho que sim. – deu de ombros de novo. – Está chovendo muito e, olhe só – ela apontou para a rua. – Nem sinal de alagamento.
– Isso é bom. – Ele concordou, lembrando de todas as cenas de enchentes que via na TV. – Uma vez eu fiquei ilhado na casa da minha avó. Choveu por uns três dias.
– Isso sempre acontecia onde eu morava. – Contou. – Acho que é por isso que ficava ansiosa toda vez que chovia. Mais uma razão para eu ficar feliz com o sistema bom de escoamento daqui.
– É.

O homem esticou as pernas, depois cruzou os tornozelos.

– Também tem essa coisa de aquecimento global. Pelo que dizem vai acabar deixando o mundo todo alagado. – Ele comentou depois de alguns segundos contemplativo.
– Provavelmente. – Concordou ela. – Ou pelas enchentes ou pelo aumento do nível dos oceanos. Tuvalu está desaparecendo. Sabe? Oceania, Polinésia. Maldivas.
– Vagamente. – Ele inclinou a cabeça sobre o ombro rapidamente. – Como assim, desaparecendo?
– É, as geleiras derretem, o nível do mar sobe...várias ilhas sofrem com a mesma coisa. – Explicou ela.
– Como você sabe dessas coisas? Você é tipo do Greenpeace ou coisa assim? – Ele quis saber, apoiando um dos braços no encosto do banco e girando o tronco na direção de , que riu.
– Não, mas eu tentei. – Confessou erguendo um dedo. – Eu queria ser bióloga, antigamente. Mais exatamente bióloga marinha, ir para a Antártica, ficar numa estação de pesquisa por seis meses. – sorriu com a lembrança do sonho de adolescente.
– O emprego perfeito para uma antissocial. – Ele riu alto. – E você queria estudar, tipo, gelo, ursos e essas coisas?
– Não tem urso na Antártica. – negou.
– Claro que tem.
– Não tem não.
– Tem sim, é obvio que tem. – Ele insistiu e o encarou sem dizer nada, até que ele ficasse desconfortável. – Tá. Você deve saber mais que eu. Mas mesmo assim. – Ele balançou os ombros. – Por que você queria ir pra lá? Além da razão óbvia, é claro.
– Por que eu não ia querer? – Ela ergueu os ombros e riu, como se fosse óbvio. – Na verdade, quando eu era criança, sempre assistia um filme com a minha mãe sobre cães que ficavam presos lá, porque acompanhavam os cientistas dessas estações. – Confessou e o viu jogar a cabeça para trás e rir alto.
– Eu sabia. – Se gabou. – Eu já vi esse filme. Na verdade, já vi todos os filmes sobre cachorros que existem.
– Não entendi esse tom na sua voz. – fingiu estar afetada, estreitando o olhar.
– Que tom? – Ele riu, girando mais o corpo para o lado dela, se aproximando mais.
– Esse seu eu sabia. – Apontou ela. – Não é tão óbvio. – Discordou rolando os olhos e bufando teatralmente.
– Para me defender, foi só porque eu não consigo entender bem alguém que passaria seis meses entre gelo e cientistas. – Disse ele depois de erguer as mãos em rendição.
– Qual é o seu problema com cientistas? – arqueou uma sobrancelha. – Se não estou errada, você devia fazer o tipo atleta na escola, provavelmente era do time. Aquela coisa bem clichê. – Falou ela e foi a vez de ele arquear uma sobrancelha e baixar um pouco o queixo. – O que foi? Um nerd roubou sua namorada?
– Por que eu não poderia ser o atleta e também ser inteligente? – O homem cruzou os braços sobre o peito. – Você está generalizando.
– Sabe quem diria que estou generalizando? Um jogador, super clichê. – rolou os olhos e riu. – Quem foi sua última namorada no colegial? Uma líder de torcida? – Perguntou cruzando as pernas e apoiando os braços no encosto do banco.
– Não. – Ele (aparentemente) fingiu estar ofendido. – Mas é claro que não. – estalou a língua no céu da boca, reprovando a resposta dele. – E você? Aposto que era uma daquelas pessoas super competitivas que namorava alguém do mesmo clube, de preferência alguém menos inteligente que você.
– Eu não sou esse tipo de monstro. – abriu a boca, chocada, mas era provável que ele não percebesse sua expressão, a não ser que estivesse muito atento aos olhos dela. – Eu nem mesmo namorei durante a época da escola.
– Isso é ainda pior, você sabe, não é? – Ele inclinou a cabeça sobre o ombro e riu.
– Como isso pode ser pior? – Ela arregalou os olhos. – Sabe, você realmente devia levar para a terapia essa sua questão com nerds e pessoas inteligentes. Sabe, há tratamento. – Ela falou, tocando o ombro dele teatralemente.
– A vida é assim, pessoas que não gostam deles, e pessoas que querem passar seis meses só com eles, como é o seu caso. – Ele brincou, sorrindo.

Por um breve lapso de tempo, os dois se encararam sem nada dizer. A mão direita de ainda estava sobre o ombro esquerdo do homem, que a olhava nos olhos em silêncio. Quando pareceram se dar conta do silêncio e do tempo que ficaram se encarando, se afastou, endireitando a postura e ele tossiu, limpando a garganta e esticando a coluna.

– Então... – Ela tentou puxar assunto, temendo que se criasse uma atmosfera estranha ali. – Você gosta de cães.
– É. – Ele riu de forma genuína. – Muito. Eu adoro. Tenho um, inclusive. Se chama Felix.
– Como esperado. – riu, erguendo os ombros.
– Como assim?
– Você. Seu perfil diz isso.
– Como assim? Você está me analisando? – Ele girou o tronco na direção dela outra vez. – Bem que me disseram para não confiar em estranhos.
– Não estou, mas isso é gritante em você. – Apontou .
– Do que está falando? Que perfil? – Ele quis saber.
– Bem, você é fácil de ler. – Começou a explicar , cruzando as pernas outra vez e girando o tronco sutilmente na direção dele. – Você tem essa aparência grande e até um pouco bruta, mas parece ser uma pessoa detalhista, principalmente se observar tudo que está usando hoje. Acessórios e tudo mais. Além disso é simpático, parece ser doce e gosta de animais. Provavelmente é o filho preferido da mãe, e a pessoa que sempre escuta dos outros que é diferente do que esperavam. – afastou os cabelos do rosto. – Quer dizer, quem te encontra por aí não imagina que você é mais delicado e doce do que bruto e durão.
– O que te faz pensar que eu não sou um cara durão? – Ele estufou o peito antes de perguntar.document.write(Anna), erguendo os ombros ao terminar.

Ele riu.

– Certo, talvez e só talvez, você tenha um pouco de razão nisso. – Ele se rendeu. – Eu gosto da geleia daqui, e minha mãe também. – Ao mencionar a mãe, riu e ergueu os ombros novamente. – Isso não é justo. Você saber tudo isso de mim e eu não saber nada sobre você.
– Teoricamente, isso é a minha leitura, não é como se eu tivesse alguma vantagem sobre acessar informações que você não tem. – Disse, apoiando a cabeça em uma das mãos e o cotovelo no encosto do banco. – Você deve ter sua leitura também. Eu aposto que tem.
– Claro que eu tenho. – Ele a olhou, aproximando-se mais e falando mais baixo. – Eu não me sento com qualquer um, querida.
– Então, me diga por favor. – Pediu ela, sorrindo.
– Tá legal. – Assentiu, esticando os braços e estralando os dedos. – Primeiro, você não é daqui, pelo sotaque, mas o sotaque é misturado demais, então provavelmente ou você morou em muitos lugares a vida toda, ou não é de um país onde o inglês é primeira língua. Você saiu sem o celular e não está preocupada, acho que então não deve ter ninguém lá te esperando, deve morar sozinha. Isso reforçar minha teoria de que não é daqui. Esse lugar é perto da Universidade, você é muito inteligente, então provavelmente tem ligação com o campus. Não é caloura, não se comporta como uma, ou se veste ou fala como uma. Então, ou é aluna de pós-graduação ou cientista da Universidade. E não deve ter parentes por perto ou namorado, senão estaria mais ansiosa para ir para casa, ou teria trago o celular. Somado ao fato de você ser uma cientista, e a isso que acabei de falar, provavelmente é solteira.
– Uau. – se surpreendeu.
– Espera, não terminei. – Avisou ele, erguendo um dedo e voltando-se mais para perto dela. – Você também se mudou recentemente, porque aqui sempre chove nessa época do ano e você parece estar vendo chuva aqui pela primeira vez. Apesar do moletom, não parece ser antissocial, só do tipo que se cansa rápido conversando com gente sem assunto. Mas até gosta de conversar, na escola devia ser a nerd legal que era popular, e agora na Universidade também deve ser bem conhecida.
– Eu ainda estou um pouco ferida com a parte do não tem ninguém esperando em casa. – Comentou, , fingindo estar mais ressentida do que realmente estava.
– Desculpe, eu só... – Ele tornou a ficar vermelho. – Só quis dizer que você devia morar sozinha. – Ele tentou se explicar, sorrindo nervoso.
– Tudo bem, no fim das contas não está errado. – Ela deu de ombros. – Acho que me acostumei a ficar sozinha.
– Não tem como alguém como você ficar sozinha. – Disse ele sem pensar muito. – Você tem essa coisa... magnética.
– Que coisa? – ergueu uma sobrancelha.
– Ah, essa... você é inteligente, engraçada...
– E você só conversou comigo por alguns minutos. – sorriu, inclinando a cabeça sobre o ombro e o olhando nos olhos.
– Pois é, imagine o que aconteceria se fosse por mais tempo... – Ele sorriu, acompanhando o olhar dela.

Estavam perto, os rostos próximos um do outro, as respirações alinhadas e reguladas, ambos sorrindo e com olhares fixos um no outro. Por algum tempo, o próprio tempo pareceu parar. Era como se tudo tivesse culminado naquele instante, naquele lugar, naquelas pessoas. Todas as jogadas do destino, as idas e vindas, todos os percursos e caminhos levavam para aquele momento, do lado de fora da delicatessen, em meio a chuva torrencial naquela tarde de terça-feira.
Tendo rapidamente contemplado essa verdade, ambos sorriram e como da primeira vez, se endireitaram, sem jeito.

– Nossa, eu nem tinha reparado. – Ele rompeu o silêncio ao erguer os olhos para o céu. – A chuva parou.
– Eu nem percebi. – Confessou , observando o céu que ficava cada vez mais limpo. – Bem, acho que... é isso, então.
– É, eu acho que sim. – Ele assentiu pensativo, encarando o chão. – Meus pais estão me esperando com a geleia. – Ele sorriu timidamente, tocando a sacola duas vezes.
– É, devem estar ansiosos. – sorriu. – E também o Felix. – Lembrou ela e o fez sorrir.
– Sim, certamente. – Ele ficou de pé, mas pareceu não ter pressa de ir. – E você deve ter muito o que estudar.
– Tenho, sim. Nossa. Muito. – Ela assentiu.
– Então, até outro dia? – Ele arqueou uma sobrancelha.
– Até outro dia. – assentiu, sorrindo.
– Até outro dia. – Ele repetiu, e devagar começou a se afastar.

Enquanto o assistia partir, ainda paralisada com a experiência de ter estado com ele, repensava se não devia tentar alcançá-lo, perguntar seu nome, seu telefone e tentar vê-lo outra vez. Por Deus, como queria vê-lo outra vez. Mas ao mesmo tempo, algo lhe dizia que o destino era tudo, e que se os dois tinham sido colocados juntos uma vez, e se fosse para ser, seriam colocados outra. E também, que o encontrou serviu para mostra-la que encontros reais aconteciam, que era possível se encantar por pessoas comuns, por um cara aleatório que estava comprando geleia para a mãe, e isso era fantástico. E também, que provavelmente tinha pirado um pouco.
Do outro lado, atravessando a rua em direção onde seu carro estava estacionado, ele já não conseguia parar de pensar em como seria se voltasse lá e pedisse o telefone dela. Já planejava passar mais vezes por aquela rua e por aquela delicatessen, torcendo vê-la novamente. Precisava reencontrá-la, queria, imaginava e sonhava, mesmo tendo acabado de deixa-la ali. Seria mais fácil voltar agora e dizer isso a ela, pedir o telefone e talvez, quem sabe, convidar para um jantar, mas não queria parecer bobo ou forçar algo. Acreditava que o destino sempre se encarregava de fazer a coisa certa, no momento certo, e aquele encontro certamente era uma obra desse tipo.
Quando entrou no carro, ele colocou a sacola no banco do passageiro, e pela janela a viu pela última vez, ainda sentada, pensativa, admirando o céu. Não conseguiu contemplar muito, foi interrompido pelo toque do celular.

– Sim. – Disse ao atender a ligação da mãe.
, onde você está? – A mãe falou alto do outro lado. – Você disse que seria rápido, parou de responder mensagens e atender o telefone. Nós ficamos preocupados.
– Desculpe, eu fiquei preso na loja por causa da chuva e acabei tendo um encontro importante. – Sorriu o jogador, olhando por um última vez para .
– Que tipo de encontro importante? – A mãe quis saber.
– Do tipo muito. – sorriu de maneira genuína. – Muito importante.





FIM (?)





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