Capítulo Único
“I remember when you used to be my every other thought, but now my calendar's so full, it's easier to move on. Sometimes I swear I pass your SUV on Sunset Boulevard...I don't fuck with change but lately I've been flipping coins a lot!”
Eu olhava meu celular pela décima vez naquele dia, esperando por algo que jamais viria: a coragem de mandar algo, ou o milagre divino de me mandar algo, nem que fosse um xingamento ou um “saudades de você, baby”. Mas, ele sentia minha falta? Ou me odiava mais que tudo? Minha intuição me dizia que era um misto dos dois.
A reunião provavelmente ainda duraria mais uma hora, ou uma hora e meia, e eu mal conseguia prestar atenção na mesma. A minha sorte é que a minha sócia prestava atenção e anotava tudo, dessa forma eu não perdia nada. Eu finalmente havia conseguido realizar meu sonho de me tornar uma empresária bem sucedida e famosa no ramo da mora; era meu sonho desde os quinze - mesma idade em que conheci o . Nós éramos melhores amigos desde o ensino médio, seguimos assim até entrarmos na faculdade, quando enfim começamos a namorar. Sim, o velho clichê “o meu melhor amigo é o meu amor”.
Nós nos formamos na primavera de 2015 em Administração. O pai de era dono de uma construtora e seria um dos funcionários da empresa, e eu também. E de fato, eu até assumi o cargo que me foi designado e trabalhei lá de 2015 a 2019, quando finalmente consegui juntar o dinheiro suficiente para abrir minha loja e consegui arrumar uma investidora - minha sócia - e as coisas acabaram acontecendo muito rápido. Eu consegui alcançar todo o sucesso que almejava em quatro anos, e então as coisas entre e eu foram ladeira abaixo.
Nós mal nos víamos, mal nos falávamos. Ele logo subiu dentro da empresa do pai e assumiu um cargo importante, enquanto eu vivia mais fora da cidade/país do que dentro de casa. As coisas entre nós logo começaram a esfriar e quando estávamos juntos, as brigas, que antes eram corriqueiras, ficaram frequentes.
Até que um dia, cheguei em casa e as coisas de estavam todas dentro de malas e espalhadas pela sala. Meu coração foi do peito à garganta e começou a bater lá.
Andei em passos delicados até o quarto, tentando não fazer barulho enquanto arrastava minha grande mala prata. Encontrei-o sentado em nossa grande cama de casal com a cabeça enfiada entre as mãos. Meu coração saltava com força e rapidamente, enquanto eu engolia em seco.
- ? - chamei-o - Aconteceu alguma coisa querido? Você vai viajar?
Ele ficou em silêncio alguns segundos, fazendo com que eu o chamasse novamente.
- Eu vou embora, ! - ele cuspiu as palavras enquanto se punha rapidamente de pé - Não tem mais sentido a gente continuar juntos! Você ficou mais de três meses fora! Eu mal vejo você!
Eu assenti positivamente com a cabeça enquanto sentia minha cabeça ficar zonza.
- Você quer o divórcio, é isso? - eu me apoiei na parede - E você vai para onde?
- Vou ficar num apart até achar um apartamento! E, sim, eu quero o divórcio!
Eu assenti novamente, ainda meio zonza.
- Assim? Sem nem ao menos conversar? Sem uma chance… - passei a língua pelos lábios.
- Você quer conversar? Ok, então me convença de que vale a pena dar uma chance pro nosso casamento!
Foi a vez de passar a língua pelos lábios e cruzar os braços abaixo do peitoral. Senti vontade abraçá-lo e beijar seus lábios sem hora para largar. Mas seria o momento? Sem pensar muito, eu assim o fiz, beijei-lhe os lábios com urgência, enquanto agarrava-lhe os cabelos. Senti suas mãos segurarem minha cintura com firmeza e lembrei-me de quando ainda estávamos na faculdade e ele me pediu em namoro no meio do pátio, ajoelhado… Lembrei-me de quando eu escrevia cartas e cartas de amor para ele, só para vê-lo sorrir com as minhas declarações; lembrei-me de quando eu só conseguia pensar em vê-lo nas aulas e aos finais de semana; lembrei-me de quando ele me pediu em casamento e de como a cerimônia havia sido linda... lembrei-me do quanto eu o amava. Só não sabia o que fazer para salvar nosso casamento.
Assim que desgrudamos nossos lábios, ele me soltou, encarando-me com os olhos marejados. Eu odiava vê-lo sofrendo, e saber que eu era a causa daquele choro me fez querer chorar também.
- Eu te amo, ! Nada mudou quanto ao que sinto por você, só que… - eu pausei, buscando as palavras certas, mas não consegui achar nada.
- Amor? Eu também sinto, ! Também amo você, mas se somente amor fosse suficiente, quantos casais já separados ainda estariam juntos? Amor não resiste a tudo, não. Amor é jardim. Amor enche de erva daninha. Amizade também, todas as formas de amor.
Eu não soube o que falar. Não me sentia no direito de lhe pedir nada.
- Mas nós ainda podemos tentar, conversar, não sei, ! - segurei suas mãos numa tentativa de lhe mostrar que ainda queria.
- Mas eu não quero conversar! Não vai adiantar, ! Você sabe disso! Vamos adiantar as coisas. Vamos ser honestos, hum? Eu entro em contato com você para verificarmos as coisas do divórcio! Eu também estou com a cabeça fervendo, preciso ficar sozinho um tempo!
Eu assenti, ainda atônita. Quem sabe dali algumas semanas ele pensava melhor, enquanto estava sozinho e resolvesse me dar mais uma chance, não?
Não, eu estava enganada. Estávamos há quatro meses separados, e eu somente conversava com seus advogados para resolver as pendências do divórcio. As únicas notícias que eu tinha dele eram pelas redes sociais, e através de sua mãe, que continuou minha amiga. Nos falávamos todos os dias quase.
Às vezes, no caminho para casa, eu tenho a impressão de às vezes ver o SUV dele parado em frente à empresa.
E eu sentia a falta dele, algumas vezes mais que outras, mas eu sempre pensava nele.
***
“You don't have to subtweet me, my number's always been the same.But all's been said and done, will we ever really close this case? Yeah I will always be here for you but I could no longer stay, still my body goes in shock every time I hear your name.”
“Afinal, o que é seguir em frente? É passar os finais de semana enchendo a cara, para fingir que esqueceu um amor falido?”
Eu segurava meu celular na mão direita enquanto bebericava o meu vinho. Eu havia postado uma foto nos stories da minha taça de vinho, apenas a taça e uma música que eu gostava muito, nada demais. Dez minutos depois, lá estava ele, postando aquela frase num fundo preto.
Eu senti minha garganta apertar e quis chorar. Porque ele simplesmente não falava aquilo para mim? Ao invés de ficar postando nas redes? Eu sabia que ele havia se tornado um homem amargurado, sabia que ele andava cada vez mais mal humorado, quase não saía, ficava trancado no quarto do novo apartamento… Mas por que não falar essas coisas diretamente para mim? Não poderíamos ser amigos? Éramos exatamente isso antes de começarmos um relacionamento.
Dali a uma semana eu seria madrinha de um casamento. Uma das minhas melhores amigas da época da faculdade (minha e de ) iria se casar e eu havia sido chamada para ser madrinha dela. Ela me disse que havia pensado em chamar para ser o padrinho junto comigo, mas devido a todo o clima da separação, seria impossível e provavelmente ele não aceitaria. Eu, claramente, aceitei o convite e entraria no salão com o irmão de , que era um dos melhores amigos de na época. Os dois andavam afastados depois da faculdade, mas eu soube que depois do nosso divórcio e do convite de casamento de , houve uma reaproximação.
- E então? Muito nervosa com a aproximação da data? Imagino que sim! - eu questionei enquanto colocava mais um copo de vinho.
- Ai, amiga! - suspirou do outro lado da linha - Estou sem dormir há dias! E mal como, morrendo de medo de não caber no vestido!
era meio paranoica com essas questões de peso, estava sempre se achando gorda, daí ela vivia entrando nessas dietas malucas, e eu revirei os olhos, sorrindo.
- Já te falei que você está maravilhosa e não há chances de isso acontecer magra do jeito que está! Você precisa relaxar ou ficará cheia de espinhas, e eu tenho certeza que não é isso que você quer, não é? – brinquei.
- Ai de jeito nenhum, amiga! - nós rimos e de repente ela ficou séria - Amiga, você sabe que essa semana nós entramos em contato com os convidados para confirmar a presença deles, não é?
- Sim! Você me disse que faria isso! E o que que tem? Aconteceu alguma coisa?
Sentei-me de volta no sofá por cima das pernas e tomei um gole do meu vinho.
- E o confirmou a presença dele, amiga.
Engasguei-me com o vinho que ainda descia pela garganta e comecei a tossir freneticamente, enquanto depositava vinho sobre a mesa de centro.
- ? Ai, amiga, tudo bem? Você está bem? ? - ouvi me chamar no telefone.
Levantei os braços enquanto ainda tossia e sentia todo um choque percorrer meu corpo. Me acalmei e então fui aos poucos parando de tossir, mas ainda sentia todo o meu corpo ficar quente.
- Me desculpe, - dei uma pequena tossida - Vou desligar, preciso me acalmar! Depois volto a te ligar!
E assim eu o fiz. Desliguei o telefone e fiquei encarando o nada, pensando em como seria rever depois de quase seis meses, já divorciada, sem nenhum vínculo que nos prendesse mais.
***
“I've heard you've done some changing, I've been rearranging... Wish that I could know but I just don't know!Never get that time back, fear we'd fall in old traps, why can't we just let go? Staring at a fork in the fucking road…”
A cerimônia havia sido belíssima. As palavras ditas pelo padre, pelo noivo, pela noiva... A família de ambos estava tão feliz que o sentimento parecia ser palpável, era como se nós pudéssemos tocar a felicidade dos presentes ali. Eu havia chorado como uma velha senhora que havia ficado para titia. Meus olhos estavam inchados quando finalmente cheguei ao salão onde seria a festa, depois de tirar pelo menos umas cinquenta fotos para o álbum do casamento.
e eu também tínhamos um álbum de casamento. Aonde será que ele estava? Fiz uma nota mental de procurar quando estivesse em casa…
Encontrei vários amigos da época da faculdade, nos abraçamos, rimos, relembramos os velhos tempos, revivemos várias memórias e então eu dancei até meus pés doerem e eu ficar exausta.
Durante toda a festa meus olhos buscaram por ele, , mas eu não o vi em momento algum. Será que ele realmente havia ido ou será que estava me evitando? Ele havia me visto? Será que preferiu ficar em casa ou será que ele apenas mentiu para os noivos para não ficar feio?
Sentei-me numa cadeira qualquer na mesa em que eu havia sido colocada. De repente eu o vi… na pista de dança, a alguns metros da mesa onde eu estava. Conforme sua mãe havia me dito, diferentemente de quando estávamos juntos, o cabelo dele agora estava mais volumoso, maior, ele havia decidido assumir os poucos cachos que seu cabelo fazia. Ele parecia mais forte também, afinal de contas ele estava malhando mais e mais pesado, quando não estava trancado no quarto. Lindo! Não havia outra palavra que pudesse descrevê-lo ali, com a camisa branca desabotoada mostrando um pedaço do peito, as mangas dobradas até o cotovelo, a calça social slim cinza, uma taça na mão. Ele conversava com Déreck, irmão de . Ele sorria, mostrando os dentes, deixando uma de suas covinhas na bochecha aparecerem, os dentes impecavelmente brancos. Como pode? Ele estava ainda mais bonito!
Eu simplesmente não conseguia desviar os olhos dele, estava travada, hipnotizada. Meu coração batia rápido e minhas mãos começavam a querer suar.
Foi aí então que o seu olhar encontrou o meu, e o seu sorriso se desfez. Sua feição passou de divertida para pesarosa, triste, em segundos. E eu simplesmente me levantei, ainda estática, encarando-o.
Caminhei até ele, como se estivesse sendo levada por uma força muito maior que eu. não se mexeu, seu olhar desceu sobre meu corpo e voltou para minha face, provavelmente ruborizada pelo suor e por estar vendo-o.
- Quanto tempo! - eu disse simplesmente - Achei que nunca mais fossemos nos ver, !
Eu engoli seco, sentindo um vômito se formar em minha garganta. Havíamos nos tornado dois estranhos e aquilo me magoava.
- Eu também achei! Afinal de contas a sua agenda é sempre tão cheia, não é? Se você não tinha tempo para mim quando éramos marido e mulher, imagina depois da separação!
Senti uma pontada no meu estômago, como se fosse um soco. Passei uma mecha de cabelo para trás da orelha.
- Porque não podemos esquecer tudo o que houve de ruim entre nós e ficar apenas com as coisas boas que nós dois vivemos, ?
- Porque não é tão fácil assim, ! Eu ainda estou magoado com tudo o que você deixou que virássemos! Como se a gente não fosse importante, como se o casamento sempre fosse um plano B! Você nunca quis se casar! Eu que atropelei tudo, ignorei isso, achando que talvez a rotina do casamento fizesse você gostar, mas eu me enganei! Sabe, , eu acho que mesmo se a sua carreira de empresária não tivesse dado certo, e por um acaso do destino você tivesse que ficar trabalhando na empresa do meu pai, o nosso casamento teria acabado da mesma forma.
- Não diga isso, ! Por favor! - eu revirei os olhos, começando a ficar levemente irritada - Porque você tem tanta mágoa de mim?
- Não tenho mágoa de você. Só ainda não me considero maduro o suficiente para entender que a sua carreira se tornou mais importante do que o nosso casamento!
Eu engoli o choro que se formava em minha garganta.
- E por que a gente não sentou e conversou antes de você decidir me deixar?
suspirou pesadamente, passou uma das mãos pelos cabelos, bagunçando-os. Senti vontade de tocá-los, para me lembrar a textura deles.
- , sinceramente? Eu tentei diversas vezes, mas você estava sempre tão absorta no trabalho, ou tão cansada… Eu te chamei e gritei, mas você não ouviu, você estava perto e longe, isso era estranho. Eu tinha você pra mim, mas não comigo.
Nós dois nos encaramos por longos segundos, até que ele desviou o olhar.
- Espero que esteja tudo bem com você! - eu arrisquei.
Ele assentiu com a cabeça, me olhando rapidamente.
- Bom, eu já vou indo! Tenho um evento amanhã e já está bem tarde! Ainda preciso pegar a estrada!
Ele ficou em silêncio, então eu entendi que era realmente a hora de ir embora.
me chamou e eu me virei frente a ele novamente, encarando seus olhos.
- Eu espero que você seja cada dia mais bem sucedida na sua marca. De coração! E espero que algum dia, você possa parar um pouco e apreciar a vida!
Foi a minha vez de assentir e fitá-lo.
Dirigi alguns quilômetros, e quando estava quase na entrada da cidade, senti meu peito apertar. Algumas lembranças da época em que éramos felizes, e eu, invadiram minha mente com força. Decidi parar o carro num posto de gasolina qualquer para respirar. Acabei chorando um pouco mais do que o planejado, encarando a bifurcação da estrada, pensando que assim como aquela estrada, se eu poderia ter feito outras escolhas? Será que eu poderia ter tomado outro caminho?
***
“I struggle, I juggle, I could just throw a line to you, but I should let sleeping dogs lie.'Cause I know better, baby! I write it, erase it, repeat it, but what good will it do to reopen the wound? So I take a deep breath and I save as draft…”
“Eu não quero que você se esqueça de mim. Eu tenho medo de que toda essa distância te faça esquecer dos nossos beijos, das nossas risadas, dos nossos planos, de mim. Sei que não daríamos certo, mas seríamos um belo erro. Querendo ou não, a gente é assim mesmo. Se alimenta de esperanças sobre algo que não tem nenhuma chance de dar certo. Se alimenta de amores inexistentes e de palavras que não dizem nada. Somos assim. Criamos coisas nas nossas cabeças, ilusões e mais ilusões, pra fugir da realidade que nos quebra e que nos destrói pouco a pouco, todos os dias. Te amava, ou amei, ou amo, não sei a ordem. Mas se você voltar, vou sentir de novo, como se estivesse olhando o céu pela primeira vez e fica difícil não olhar para trás, sabendo que você está lá.”
Digitei, li, reli, digitei novamente, apaguei tudo e fiz tudo de novo.
Não chorava mais, mas ainda sentia meu peito pesado. Queria muito poder resolver tudo, queria muito que houvesse mais uma chance para mim e para .
Reli a mensagem novamente. Eu não tinha mais o número, mas sabia o e-mail profissional e pessoal; provavelmente ainda eram os mesmos.
Respirei fundo. Estava muito grande? Eu deveria mandar somente um “Sinto muito, , por tudo! Nos dê mais uma chance, por favor.” ou algo como “Sinto sua falta, . Podemos recomeçar?” ou então: “Se ao menos pudéssemos ser amigos, !”
Mas aquele texto dizia as coisas mais profundas que eu sempre quis dizer a ele, desde que ele saiu de casa. Foi aí então que a voz dele ecoou na minha cabeça: “Amor? Eu também sinto, ! Também amo você, mas se somente amor fosse suficiente, quantos casais já separados ainda estariam juntos? Amor não resiste a tudo, não. Amor é jardim. Amor enche de erva daninha. Amizade também, todas as formas de amor.”
Fechei o e-mail e salvei como rascunho. Ainda não era o momento. Mas quem sabe algum dia? Quando eu estivesse pronta de verdade para me dedicar a em tempo quase integral, ou quando não sentisse mais raiva de mim e entendesse a minha carreira. Quem sabe poderíamos ser maduros o suficiente para sermos os velhos bons amigos de sempre, de anos atrás!
Mas não agora. Agora aquelas palavras ficariam ali, salvas no rascunho do meu e-mail, para um dia serem endereçadas a ele.
Eu olhava meu celular pela décima vez naquele dia, esperando por algo que jamais viria: a coragem de mandar algo, ou o milagre divino de me mandar algo, nem que fosse um xingamento ou um “saudades de você, baby”. Mas, ele sentia minha falta? Ou me odiava mais que tudo? Minha intuição me dizia que era um misto dos dois.
A reunião provavelmente ainda duraria mais uma hora, ou uma hora e meia, e eu mal conseguia prestar atenção na mesma. A minha sorte é que a minha sócia prestava atenção e anotava tudo, dessa forma eu não perdia nada. Eu finalmente havia conseguido realizar meu sonho de me tornar uma empresária bem sucedida e famosa no ramo da mora; era meu sonho desde os quinze - mesma idade em que conheci o . Nós éramos melhores amigos desde o ensino médio, seguimos assim até entrarmos na faculdade, quando enfim começamos a namorar. Sim, o velho clichê “o meu melhor amigo é o meu amor”.
Nós nos formamos na primavera de 2015 em Administração. O pai de era dono de uma construtora e seria um dos funcionários da empresa, e eu também. E de fato, eu até assumi o cargo que me foi designado e trabalhei lá de 2015 a 2019, quando finalmente consegui juntar o dinheiro suficiente para abrir minha loja e consegui arrumar uma investidora - minha sócia - e as coisas acabaram acontecendo muito rápido. Eu consegui alcançar todo o sucesso que almejava em quatro anos, e então as coisas entre e eu foram ladeira abaixo.
Nós mal nos víamos, mal nos falávamos. Ele logo subiu dentro da empresa do pai e assumiu um cargo importante, enquanto eu vivia mais fora da cidade/país do que dentro de casa. As coisas entre nós logo começaram a esfriar e quando estávamos juntos, as brigas, que antes eram corriqueiras, ficaram frequentes.
Até que um dia, cheguei em casa e as coisas de estavam todas dentro de malas e espalhadas pela sala. Meu coração foi do peito à garganta e começou a bater lá.
Andei em passos delicados até o quarto, tentando não fazer barulho enquanto arrastava minha grande mala prata. Encontrei-o sentado em nossa grande cama de casal com a cabeça enfiada entre as mãos. Meu coração saltava com força e rapidamente, enquanto eu engolia em seco.
- ? - chamei-o - Aconteceu alguma coisa querido? Você vai viajar?
Ele ficou em silêncio alguns segundos, fazendo com que eu o chamasse novamente.
- Eu vou embora, ! - ele cuspiu as palavras enquanto se punha rapidamente de pé - Não tem mais sentido a gente continuar juntos! Você ficou mais de três meses fora! Eu mal vejo você!
Eu assenti positivamente com a cabeça enquanto sentia minha cabeça ficar zonza.
- Você quer o divórcio, é isso? - eu me apoiei na parede - E você vai para onde?
- Vou ficar num apart até achar um apartamento! E, sim, eu quero o divórcio!
Eu assenti novamente, ainda meio zonza.
- Assim? Sem nem ao menos conversar? Sem uma chance… - passei a língua pelos lábios.
- Você quer conversar? Ok, então me convença de que vale a pena dar uma chance pro nosso casamento!
Foi a vez de passar a língua pelos lábios e cruzar os braços abaixo do peitoral. Senti vontade abraçá-lo e beijar seus lábios sem hora para largar. Mas seria o momento? Sem pensar muito, eu assim o fiz, beijei-lhe os lábios com urgência, enquanto agarrava-lhe os cabelos. Senti suas mãos segurarem minha cintura com firmeza e lembrei-me de quando ainda estávamos na faculdade e ele me pediu em namoro no meio do pátio, ajoelhado… Lembrei-me de quando eu escrevia cartas e cartas de amor para ele, só para vê-lo sorrir com as minhas declarações; lembrei-me de quando eu só conseguia pensar em vê-lo nas aulas e aos finais de semana; lembrei-me de quando ele me pediu em casamento e de como a cerimônia havia sido linda... lembrei-me do quanto eu o amava. Só não sabia o que fazer para salvar nosso casamento.
Assim que desgrudamos nossos lábios, ele me soltou, encarando-me com os olhos marejados. Eu odiava vê-lo sofrendo, e saber que eu era a causa daquele choro me fez querer chorar também.
- Eu te amo, ! Nada mudou quanto ao que sinto por você, só que… - eu pausei, buscando as palavras certas, mas não consegui achar nada.
- Amor? Eu também sinto, ! Também amo você, mas se somente amor fosse suficiente, quantos casais já separados ainda estariam juntos? Amor não resiste a tudo, não. Amor é jardim. Amor enche de erva daninha. Amizade também, todas as formas de amor.
Eu não soube o que falar. Não me sentia no direito de lhe pedir nada.
- Mas nós ainda podemos tentar, conversar, não sei, ! - segurei suas mãos numa tentativa de lhe mostrar que ainda queria.
- Mas eu não quero conversar! Não vai adiantar, ! Você sabe disso! Vamos adiantar as coisas. Vamos ser honestos, hum? Eu entro em contato com você para verificarmos as coisas do divórcio! Eu também estou com a cabeça fervendo, preciso ficar sozinho um tempo!
Eu assenti, ainda atônita. Quem sabe dali algumas semanas ele pensava melhor, enquanto estava sozinho e resolvesse me dar mais uma chance, não?
Não, eu estava enganada. Estávamos há quatro meses separados, e eu somente conversava com seus advogados para resolver as pendências do divórcio. As únicas notícias que eu tinha dele eram pelas redes sociais, e através de sua mãe, que continuou minha amiga. Nos falávamos todos os dias quase.
Às vezes, no caminho para casa, eu tenho a impressão de às vezes ver o SUV dele parado em frente à empresa.
E eu sentia a falta dele, algumas vezes mais que outras, mas eu sempre pensava nele.
“Afinal, o que é seguir em frente? É passar os finais de semana enchendo a cara, para fingir que esqueceu um amor falido?”
Eu segurava meu celular na mão direita enquanto bebericava o meu vinho. Eu havia postado uma foto nos stories da minha taça de vinho, apenas a taça e uma música que eu gostava muito, nada demais. Dez minutos depois, lá estava ele, postando aquela frase num fundo preto.
Eu senti minha garganta apertar e quis chorar. Porque ele simplesmente não falava aquilo para mim? Ao invés de ficar postando nas redes? Eu sabia que ele havia se tornado um homem amargurado, sabia que ele andava cada vez mais mal humorado, quase não saía, ficava trancado no quarto do novo apartamento… Mas por que não falar essas coisas diretamente para mim? Não poderíamos ser amigos? Éramos exatamente isso antes de começarmos um relacionamento.
Dali a uma semana eu seria madrinha de um casamento. Uma das minhas melhores amigas da época da faculdade (minha e de ) iria se casar e eu havia sido chamada para ser madrinha dela. Ela me disse que havia pensado em chamar para ser o padrinho junto comigo, mas devido a todo o clima da separação, seria impossível e provavelmente ele não aceitaria. Eu, claramente, aceitei o convite e entraria no salão com o irmão de , que era um dos melhores amigos de na época. Os dois andavam afastados depois da faculdade, mas eu soube que depois do nosso divórcio e do convite de casamento de , houve uma reaproximação.
- E então? Muito nervosa com a aproximação da data? Imagino que sim! - eu questionei enquanto colocava mais um copo de vinho.
- Ai, amiga! - suspirou do outro lado da linha - Estou sem dormir há dias! E mal como, morrendo de medo de não caber no vestido!
era meio paranoica com essas questões de peso, estava sempre se achando gorda, daí ela vivia entrando nessas dietas malucas, e eu revirei os olhos, sorrindo.
- Já te falei que você está maravilhosa e não há chances de isso acontecer magra do jeito que está! Você precisa relaxar ou ficará cheia de espinhas, e eu tenho certeza que não é isso que você quer, não é? – brinquei.
- Ai de jeito nenhum, amiga! - nós rimos e de repente ela ficou séria - Amiga, você sabe que essa semana nós entramos em contato com os convidados para confirmar a presença deles, não é?
- Sim! Você me disse que faria isso! E o que que tem? Aconteceu alguma coisa?
Sentei-me de volta no sofá por cima das pernas e tomei um gole do meu vinho.
- E o confirmou a presença dele, amiga.
Engasguei-me com o vinho que ainda descia pela garganta e comecei a tossir freneticamente, enquanto depositava vinho sobre a mesa de centro.
- ? Ai, amiga, tudo bem? Você está bem? ? - ouvi me chamar no telefone.
Levantei os braços enquanto ainda tossia e sentia todo um choque percorrer meu corpo. Me acalmei e então fui aos poucos parando de tossir, mas ainda sentia todo o meu corpo ficar quente.
- Me desculpe, - dei uma pequena tossida - Vou desligar, preciso me acalmar! Depois volto a te ligar!
E assim eu o fiz. Desliguei o telefone e fiquei encarando o nada, pensando em como seria rever depois de quase seis meses, já divorciada, sem nenhum vínculo que nos prendesse mais.
A cerimônia havia sido belíssima. As palavras ditas pelo padre, pelo noivo, pela noiva... A família de ambos estava tão feliz que o sentimento parecia ser palpável, era como se nós pudéssemos tocar a felicidade dos presentes ali. Eu havia chorado como uma velha senhora que havia ficado para titia. Meus olhos estavam inchados quando finalmente cheguei ao salão onde seria a festa, depois de tirar pelo menos umas cinquenta fotos para o álbum do casamento.
e eu também tínhamos um álbum de casamento. Aonde será que ele estava? Fiz uma nota mental de procurar quando estivesse em casa…
Encontrei vários amigos da época da faculdade, nos abraçamos, rimos, relembramos os velhos tempos, revivemos várias memórias e então eu dancei até meus pés doerem e eu ficar exausta.
Durante toda a festa meus olhos buscaram por ele, , mas eu não o vi em momento algum. Será que ele realmente havia ido ou será que estava me evitando? Ele havia me visto? Será que preferiu ficar em casa ou será que ele apenas mentiu para os noivos para não ficar feio?
Sentei-me numa cadeira qualquer na mesa em que eu havia sido colocada. De repente eu o vi… na pista de dança, a alguns metros da mesa onde eu estava. Conforme sua mãe havia me dito, diferentemente de quando estávamos juntos, o cabelo dele agora estava mais volumoso, maior, ele havia decidido assumir os poucos cachos que seu cabelo fazia. Ele parecia mais forte também, afinal de contas ele estava malhando mais e mais pesado, quando não estava trancado no quarto. Lindo! Não havia outra palavra que pudesse descrevê-lo ali, com a camisa branca desabotoada mostrando um pedaço do peito, as mangas dobradas até o cotovelo, a calça social slim cinza, uma taça na mão. Ele conversava com Déreck, irmão de . Ele sorria, mostrando os dentes, deixando uma de suas covinhas na bochecha aparecerem, os dentes impecavelmente brancos. Como pode? Ele estava ainda mais bonito!
Eu simplesmente não conseguia desviar os olhos dele, estava travada, hipnotizada. Meu coração batia rápido e minhas mãos começavam a querer suar.
Foi aí então que o seu olhar encontrou o meu, e o seu sorriso se desfez. Sua feição passou de divertida para pesarosa, triste, em segundos. E eu simplesmente me levantei, ainda estática, encarando-o.
Caminhei até ele, como se estivesse sendo levada por uma força muito maior que eu. não se mexeu, seu olhar desceu sobre meu corpo e voltou para minha face, provavelmente ruborizada pelo suor e por estar vendo-o.
- Quanto tempo! - eu disse simplesmente - Achei que nunca mais fossemos nos ver, !
Eu engoli seco, sentindo um vômito se formar em minha garganta. Havíamos nos tornado dois estranhos e aquilo me magoava.
- Eu também achei! Afinal de contas a sua agenda é sempre tão cheia, não é? Se você não tinha tempo para mim quando éramos marido e mulher, imagina depois da separação!
Senti uma pontada no meu estômago, como se fosse um soco. Passei uma mecha de cabelo para trás da orelha.
- Porque não podemos esquecer tudo o que houve de ruim entre nós e ficar apenas com as coisas boas que nós dois vivemos, ?
- Porque não é tão fácil assim, ! Eu ainda estou magoado com tudo o que você deixou que virássemos! Como se a gente não fosse importante, como se o casamento sempre fosse um plano B! Você nunca quis se casar! Eu que atropelei tudo, ignorei isso, achando que talvez a rotina do casamento fizesse você gostar, mas eu me enganei! Sabe, , eu acho que mesmo se a sua carreira de empresária não tivesse dado certo, e por um acaso do destino você tivesse que ficar trabalhando na empresa do meu pai, o nosso casamento teria acabado da mesma forma.
- Não diga isso, ! Por favor! - eu revirei os olhos, começando a ficar levemente irritada - Porque você tem tanta mágoa de mim?
- Não tenho mágoa de você. Só ainda não me considero maduro o suficiente para entender que a sua carreira se tornou mais importante do que o nosso casamento!
Eu engoli o choro que se formava em minha garganta.
- E por que a gente não sentou e conversou antes de você decidir me deixar?
suspirou pesadamente, passou uma das mãos pelos cabelos, bagunçando-os. Senti vontade de tocá-los, para me lembrar a textura deles.
- , sinceramente? Eu tentei diversas vezes, mas você estava sempre tão absorta no trabalho, ou tão cansada… Eu te chamei e gritei, mas você não ouviu, você estava perto e longe, isso era estranho. Eu tinha você pra mim, mas não comigo.
Nós dois nos encaramos por longos segundos, até que ele desviou o olhar.
- Espero que esteja tudo bem com você! - eu arrisquei.
Ele assentiu com a cabeça, me olhando rapidamente.
- Bom, eu já vou indo! Tenho um evento amanhã e já está bem tarde! Ainda preciso pegar a estrada!
Ele ficou em silêncio, então eu entendi que era realmente a hora de ir embora.
me chamou e eu me virei frente a ele novamente, encarando seus olhos.
- Eu espero que você seja cada dia mais bem sucedida na sua marca. De coração! E espero que algum dia, você possa parar um pouco e apreciar a vida!
Foi a minha vez de assentir e fitá-lo.
Dirigi alguns quilômetros, e quando estava quase na entrada da cidade, senti meu peito apertar. Algumas lembranças da época em que éramos felizes, e eu, invadiram minha mente com força. Decidi parar o carro num posto de gasolina qualquer para respirar. Acabei chorando um pouco mais do que o planejado, encarando a bifurcação da estrada, pensando que assim como aquela estrada, se eu poderia ter feito outras escolhas? Será que eu poderia ter tomado outro caminho?
“I struggle, I juggle, I could just throw a line to you, but I should let sleeping dogs lie.'Cause I know better, baby! I write it, erase it, repeat it, but what good will it do to reopen the wound? So I take a deep breath and I save as draft…”
“Eu não quero que você se esqueça de mim. Eu tenho medo de que toda essa distância te faça esquecer dos nossos beijos, das nossas risadas, dos nossos planos, de mim. Sei que não daríamos certo, mas seríamos um belo erro. Querendo ou não, a gente é assim mesmo. Se alimenta de esperanças sobre algo que não tem nenhuma chance de dar certo. Se alimenta de amores inexistentes e de palavras que não dizem nada. Somos assim. Criamos coisas nas nossas cabeças, ilusões e mais ilusões, pra fugir da realidade que nos quebra e que nos destrói pouco a pouco, todos os dias. Te amava, ou amei, ou amo, não sei a ordem. Mas se você voltar, vou sentir de novo, como se estivesse olhando o céu pela primeira vez e fica difícil não olhar para trás, sabendo que você está lá.”
Digitei, li, reli, digitei novamente, apaguei tudo e fiz tudo de novo.
Não chorava mais, mas ainda sentia meu peito pesado. Queria muito poder resolver tudo, queria muito que houvesse mais uma chance para mim e para .
Reli a mensagem novamente. Eu não tinha mais o número, mas sabia o e-mail profissional e pessoal; provavelmente ainda eram os mesmos.
Respirei fundo. Estava muito grande? Eu deveria mandar somente um “Sinto muito, , por tudo! Nos dê mais uma chance, por favor.” ou algo como “Sinto sua falta, . Podemos recomeçar?” ou então: “Se ao menos pudéssemos ser amigos, !”
Mas aquele texto dizia as coisas mais profundas que eu sempre quis dizer a ele, desde que ele saiu de casa. Foi aí então que a voz dele ecoou na minha cabeça: “Amor? Eu também sinto, ! Também amo você, mas se somente amor fosse suficiente, quantos casais já separados ainda estariam juntos? Amor não resiste a tudo, não. Amor é jardim. Amor enche de erva daninha. Amizade também, todas as formas de amor.”
Fechei o e-mail e salvei como rascunho. Ainda não era o momento. Mas quem sabe algum dia? Quando eu estivesse pronta de verdade para me dedicar a em tempo quase integral, ou quando não sentisse mais raiva de mim e entendesse a minha carreira. Quem sabe poderíamos ser maduros o suficiente para sermos os velhos bons amigos de sempre, de anos atrás!
Mas não agora. Agora aquelas palavras ficariam ali, salvas no rascunho do meu e-mail, para um dia serem endereçadas a ele.
Fim
Nota da autora: Oieee! Espero que tenham gostado! Qualquer coisa me chama no twitter que eu tenho mais de 20 fanfics no site!
Nota da scripter: Oi! O Disqus está um pouco instável ultimamente e, às vezes, a caixinha de comentários pode não aparecer. Então, caso você queira deixar a autora feliz com um comentário, é só clicar AQUI.
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