Capítulo Único
A sexualidade sempre foi algo a ser discutido assim como a opção sexual, principalmente na escola. Muitas pessoas nunca precisaram de algo para ter certeza de que são heterossexuais, mas e se no fundo você sempre achou que era uma coisa é no final era outra completamente diferente? Eu tenho uma namorada, Susan. Nós namoramos há um tempo, nossas famílias se dão muito bem, o que é bom para nós dois, mas ambos temos um problema: Ela não gosta de mim. E nem eu dela. Ela gosta de uma garota e bom, eu gosto do meu melhor amigo, Matthew. E nós não fazemos idéia alguma de como contar isso para eles. E não faço a mínima idéia de como contar isso para ele.
- Alô? Terra chamando Thomas! – Susan balançava a mão em frente ao meu rosto.
- Hã? Ah, desculpa. Eu estava viajando. – Neguei com a cabeça várias vezes e ri. – Qual é o plano mesmo?
- O plano é o seguinte: Vamos ao acampamento que os terceiros anos estão organizando. Você vai levar o Matthew e eu vou levar a Tracy, mas se nossos pais perguntarem você vai comigo e vice-versa, tudo bem?
- Certo. – Concordei com a cabeça e sorri com aquela ideia.
Por incrível que pareça, acho que se eu e Susan falássemos que nós dois iríamos assaltar um banco juntos nossa família apenas diria ”Voltem antes do jantar”. Toda essa liberdade as vezes era legal, mas as vezes eu acabava me sentindo estranho, como se estivéssemos usando aquilo a favor de uma mentira. Mas não era isso. Ambos sentíamos medo. Medo de não ter mais aquilo. O engraçado de tudo era que eu e Susan começamos a namorar de repente, sem nenhum dos dois saber realmente o que era namoro em si. Todos falavam que nós éramos um casal lindo e acho que nós dois acreditamos tanto nisso que se tornou realidade. Nunca houve um pedido oficial de nenhum dos lados, mas em nossa mentira, eu pedi com direito a flores e tudo mais.
Eu não ligo de ver Susan com Tracy, muito pelo contrário. Acho muito bonito as duas juntas. A forma como elas se tratam, o carinho que as duas tem uma pela outra. Eu queria poder tratar Matthew assim, mas infelizmente eu nunca contei dos meus sentimentos para ele. Quem sabe um dia? Não sei. Ainda preciso de um pouco mais de coragem para falar algo assim e não quero que seja do nada. Quero que seja algo tranqüilo.
...
Com as malas prontas e já dentro do carro, ouvíamos Queen como se fosse a última coisa a se fazer no mundo. O bom era que meus pais também gostavam e deixavam aquilo tudo mais divertido.
I want to break free
I want to break free
I want to break free from your lies You're so self satisfied I don't need you
I've got to break free
God knows, God knows I want to break free
Cantarolávamos fazendo várias poses dentro do carro e rindo algumas vezes. Papai sempre fazia umas caras engraçadas que deixava qualquer um com a barriga doendo de tanto rir. Ao chegarmos em frente ao acampamento, me despedi dos dois com um abraço apertado. Susan já estava lá e me esperava junto de Tracy e Matthew. Como sempre eu era o atrasado.
- Eu sei, eu sei. Desculpa. Eu não queria atrasar, mas minha mãe quis sentar e me dar uma aula de como usar repelente e eu definitivamente não estava nem um pouco a fim de ouvir. – Levantei os ombros e ri.
- Nós te amamos assim mesmo. – Matthew brincou, passando seu braço por meus ombros e começamos a andar. – Você vai ser meu colega de quarto, né? Não deixei ninguém ficar comigo por sua causa.
- Se outra pessoa fosse provavelmente eu a tiraria de lá só pra ficar contigo. – Pisquei para o garoto, mas em seguida pensei como aquilo soou de outra forma.
- Hummmmmm. Bom saber. – Matthew deu uma risada sapeca, fazendo com que eu sentisse meu rosto esquentar de vergonha.
Em certos momentos parecia que ele sabia que eu gostava dele, mas em outros momentos ele se fingia de bobo, ou realmente era bobo. Matthew era gay e assumido para a família, o que sempre me admirou bastante já que eu ainda estava pensando em como contar isso para a minha e obviamente ele sabia sobre mim. Nós já ficamos algumas vezes, mas nada muito sério. A minha capacidade de fazer as coisas e no outro dia agir naturalmente era o que eu mais admirava e odiava ao mesmo tempo em mim. Eu poderia roubar um carro que no outro dia se me perguntassem eu mentiria com meu melhor sorriso, mas infelizmente a gente não pode mandar no coração. Não é?
O lugar onde estávamos era bastante bonito. Sempre gostei de viver no meio da natureza e principalmente tirar fotos dela. Com minha câmera, enquanto andava pelos lugares, sempre parava para poder tirar uma foto ou registrar o momento dos amigos. Matthew sempre brincava de que eu deveria fazer um ensaio nu dele no meio da natureza. Ah se eu pudesse.
- Aqui. Tira uma foto nossa aqui. – Susan chamou minha atenção e parou em frente a uma pedra junto de Tracy e a abraçou por trás fazendo com eu tirasse a foto delas.
- Essa foto ficou muito boa. – Sorri ao olhar na tela e mostrei para elas. – Essa você pode revelar e colocar em um porta-retrato.
- Até que sua ideia não me é ruim. – Tracy encarou Susan com um sorriso bobo no rosto.
- Vocês se olham de um jeito tão apaixonante que me da inveja. – Brinquei cutucando elas e voltei a andar pelo lugar em busca de mais paisagens para tirar foto.
- Acho que agora é uma ótima hora para aquele ensaio. – Matthew apareceu enquanto eu andava pelo local.
- Eu não vou tirar foto sua pelada aqui, ta bom? – Revirei os olhos para ele e neguei com a cabeça. – Além do mais, ta fazendo muito frio aqui. Você iria congelar.
- Nah. Você sempre estraga as oportunidades que eu te dou. – Ele resmungou e escorou em uma árvore.
- Como se eu nunca tivesse visto você pelado, não é? – Brinquei e o encarei, posicionando a câmera a sua frente e tirando uma foto sua.
- Mas mesmo assim. O que é bom é pra ser visto mais vezes. – Ele brincou, gesticulando com a mão no ar. – Deixa eu ver. – Me chamou fazendo sinal com a mão.
Entreguei a câmera para que ele pudesse ver sua foto e dei um sorriso quando vi que ele estava pronto para tirar uma foto minha.
- Incrível como você sempre sai bonito nas fotos. – Ele negou com a cabeça.
- Como se você não saísse também. – Brinquei com ele e mostrei a língua. – Eu preciso de um banho. Bem quente. E uma cama.
- Bom, somos dois. – Ele se espreguiçou e passou o braço por meus ombros novamente – Vamos andando, mocinho. A noite vai ser longa hoje.
A noite vai ser longa? Como poderia interpretar aquilo? Vindo de Mathhew eu podia esperar qualquer coisa naquele momento...
Eu nunca havia tomado um banho tão quente em toda a minha vida e minha vontade era de ficar debaixo do chuveiro pro resto dos dias, mas infelizmente eu não podia. Já bem agasalhado eu estava sentado em minha cama, passando as fotos que havia tirado para o lado e escolhendo quais ficariam e quais iriam para o lixo enquanto esperava Matthew sair do banho. Nossas camas eram uma de frente para outra, o que me fazia ficar aliviado por ter duas camas em vez de uma só. Ao vê-lo sair do banheiro apenas de calça e uma toalha nos cabelos, mirei a câmera e tirei uma foto, rindo com a pose que ele havia feito.
- Desculpa. Eu não resisti. – Ele brincou, terminando de secar os cabelos e vestir uma blusa.
- Me deixa tirar mais fotos de você. – Comentei, esperando que ele guardasse duas coisas e comecei a tirar algumas fotos.
Várias poses eram feitas por Matthew. Algumas a minha ordem, outras por livre e espontânea vontade dele e por incrível que pareça todas haviam ficado ótimas.
- Minha vez de tirar algumas fotos suas. – Ele parou a minha frente e estendeu a mão para mim.
- Não mesmo. – Neguei com a cabeça várias vezes. – Nem adianta vir com essa cara de cachorro sem dono.
- Merda. Achei que isso iria funcionar. – Resmungou fingindo estar triste – Mas não desvia do assunto. Me dá sua câmera.
- Não senhor. Ela ta acabando a bateria. – Falei escondendo a câmera atrás de mim.
- Deixa de ser mentiroso e me dá essa coisa. – Ele sentou em cima da cama e começou a apalpar minha cintura, fazendo com que eu começasse a rir.
- Para com isso. Eu não vou te dar a câmera. – Disse em meio aos risos, me contorcendo pela cama. A todo custo eu tentava tira-lo de cima de mim as era meio que impossível.
Cada movimento que eu tentava fazer para tirá-lo de cima de mim ele achava uma oportunidade de fazer ainda mais cócegas pelo meu corpo. Eu já estava sem ar de tanta risada dada e quando finalmente parou, respirei fundo e fechei os olhos, os abrindo e dando de cara com ele me encarando. Em poucos segundos nossos lábios estavam grudado dando início a um beijo.
Suas mãos passeavam pelo meu corpo em meio ao beijo e aquilo me deixava nervoso, mas ao mesmo tempo com vontade de fazer algo, enquanto sentia seus toques, o puxei involuntariamente para que pudesse deitar na cama e ficar por cima de mim. Agora era eu que vagava com minha mão pelo seu corpo. Seus braços estavam quentes por conta do banho que acabara de tomar. Seus cabelos ainda pingavam um pouco, mas eu não ligava para aquilo, muito pelo contrário achava excitante. Deslizando meus dedos por suas costas, repousei minha mão em sua bunda onde apertei com vontade, rindo em meio ao nosso beijo, mas ao sentir sua boca ir em direção ao meu pescoço, a risada se tornou um ofego. Ele sabia que eu era sensível e sabia que aquilo me deixava vulnerável. Mordi o lábio com certa força e inclinei o pescoço para o lado deixando com que ele continuasse a fazer aquilo. Ele sabia como me deixar louco. Sabia mesmo como me deixar em suas mãos. Segurei em seus cabelos e os puxei de forma suave, sorrindo ao ouvir um pequeno ofego dele junto. Seus beijos começaram a descer por meu pescoço até chegar a meu peitoral por cima da blusa, que ele mesmo retirou com cuidado. A cada beijo que era distribuído meu corpo reagia cada vez mais e minha mente se perdia, fazendo com que eu não soubesse mais o que falar ou o que fazer.
- Eu te amo. – Murmurei sem perceber em meio as sensações que sentia.
- Hã? – Matthew levantou a cabeça e me encarou sem entender muito? – Me ama?
- Que? – Abri os olhos e arregalei os mesmos, querendo dar um tapa em minha própria testa ao perceber a burrada que eu havia feito. – Hã? Não. Que? É.. Não. Que isso. Eu falei que o tempo ta mudando. – Comecei a falar mais do que devia pelo nervoso que estava sentindo.
- Você... – Apontou para mim sem entender muito bem.
- Nah, nada. Sabe, eu tenho que – Levantei da cama, colocando a camisa novamente e calçando os chinelos. – A Susan me chamou. Você ouviu? Eu ouvi. Eu vou lá. – Falei as pressas, tropeçando tanto nas palavras quanto nas coisas no chão do quarto, saindo de lá o mais rápido possível. Pronto, era só o que me faltava. Maldita hora que não consegui segurar a língua. E SE ELE BRIGASSE COMIGO? E se ele já tiver alguém? Esse nossa amizade acabasse? Meu Deus... Eu fiz uma merda... E DAS GRANDES!
...
Eu não devia ter aberto o bico. Não devia ter falado nada. E agora? Como olharia no rosto dele sem ele acabar me achando um idiota? Ai meu Deus... Eu acabei de estragar uma amizade que poderia ser para vida inteira. Deitado agora na cama de Susan meu pensamento vagava por tantas explicações que eu teria que dar para o término de nossa amizade para minha família, ou para os outros.
- Susan? Você ta aí? Você viu o Thomas? – Matthew batia na porta, parecia preocupado. – Se você vir ele, fala pra ele voltar pro nosso quarto... Obrigado.
Não... Eu não poderia voltar para o quarto depois do que aconteceu. Eu não conseguiria agir naturalmente, não com ele. Não depois de ter me declarado sem querer. Suspirei passando a mão pelo rosto e cocei o cabelo de forma nervosa pensando no que eu iria fazer. Talvez eu devesse ficar na cama de Susan até o final do acampamento ou simplesmente ligar para minha mãe e pedir para ir embora. Seria muito arriscado a segunda opção.... Eu poderia encher minha cara na festa que estava rolando. Seria bem mais interessante. Depois eu voltaria para o quarto e tudo ficaria tranqüilo.
Um, dois, três, quatro... Depois disso eu não fazia a mínima idéia de quantos copos eu havia bebido. Se tinha uma coisa que eu achava superchato eram as festas que serviam um monte de bebida e nada de comida. Definitivamente era o pior tipo de festa para se ir. Tudo o que eu queria agora era voltar para o quarto e dormir profundamente em minha cama até alguém achar que eu entrei em coma e tentar me acordar. Meu objetivo era chegar até o quarto, mas esse também era o meu obstáculo. Escorando em alguns lugares ali, tropeçando em alguns aqui senti um braço passar por minha cintura e ao saber quem era, suspirei.
- Você não tem que fazer isso – Resmunguei enquanto ele me ajudava a andar sem tropeçar.
- Ou eu faço isso ou você vai acabar dormindo no chão e se machucando. E não quero isso. – Matthew comentou enquanto me carregava.
- Hum...mandão. – Mostrei a língua para ele e ri.
- Dá um tempo, Thomas – Disse o garoto enquanto me carregava para dentro do quarto, fechando a porta.
- Você ta com raiva de mim? – O encarei enquanto ele me sentava na cama, começando a rir de sua expressão.
- Se eu to com raiva de você? É óbvio que eu estou. – Revirou os olhos e passou a mão pelos cabelos de forma nervosa, bufando.
- Você fica tão bonitinho com raiva. – Inclinei a cabeça para um lado com um sorriso bobo no rosto.
- Alá, olha só você. – Ele apontou para mim – Como você pode fazer tudo isso e ainda continuar com uma cara fofa? Uma cara que me da vontade de te amassar igual eu gosto de amassar banana pra comer com leite. – Bufou começando a andar de um lado para o outro. - Não dá pra ficar com raiva de você.
- Desculpa. – Murmurei quando o ouvi falar sobre estar com raiva de mim. – Eu fiquei com medo.
- Medo de que? - Parou a minha frente, me encarando sem entender muito.
- Medo de você me rejeitar. – Suspirei decidindo colocar para fora o que estava me dando angústia. – Você já viu como a Susan e a Tracy são fofas juntas? O modo como elas se tratam? Que dá pra perceber que ali existe realmente amor entre elas e que é verdadeiro? As vezes me da uma vontade de ter isso para mim, mas a única pessoa com quem eu gostaria de poder construir algo desse tipo é você – Apontei para ele – Mas eu sempre tive medo de me declarar. Medo de não ser o suficiente ou medo de você rir da minha cara. – Apontei novamente vendo ele rir de mim – Como você ta fazendo agora! Está vendo????
- Thomas. – Matthew colocou uma das mãos em meu rosto e acariciou minha bochecha. – Você nunca me deu a oportunidade de responder de volta.
- Responder de volta? O que? – Segurei em sua mão que estava em meu rosto e senti meu coração bater mais forte. Ou ele iria dizer que eu sou idiota ou algo mil vezes pior.
- Que eu também te amo. – Sorriu e apertou meu nariz – Ah, qual é! Você achou que depois de todos esses anos eu iria ser um vagabundo sem sentimentos? Garoto! Eu estava querendo fazer uma coisa bem bonita para falar contigo, mas você me atropelou e no final de tudo eu não tinha reação nenhuma para falar que eu estava pensando nisso a anos. Desde o nosso primeiro beijo eu já senti algo diferente e com o passar dos anos isso só foi crescendo. Eu sei que deveria ter falado isso antes, mas eu também tinha medo. Principalmente com relação a você e a Susan. Mesmo que seu relacionamento fosse de mentira eu não queria interferir, mas eu sei que aquilo ficaria bem chato e eu provavelmente sentiria ciúmes, não que eu não sinta – Levantou o dedo indicador, rindo – Mas você me surpreendeu de uma maneira tão repentina que eu não sabia o que fazer ou dizer. Mas agora – Ele segurou com as duas mãos em meu rosto. – Eu. Também. Amo. Você. – Murmurou me dando alguns selinhos nos intervalos das palavras.
Ele também me amava. Era uma sensação tão difícil de explicar. Um misto de euforia com um turbilhão de sensações novas que eu nunca tinha experimentado. Matthew era a primeira pessoa pela qual eu havia me apaixonado. Para minha família, Susan era essa pessoa, mas eu estava farto de tanta mentira. Nós estávamos fatos de tanta mentira. E eu tinha uma idéia. Essa idéia ou daria errado ou daria muito certo. Mas não custa nada tentar, não é?
...
- Você tem certeza de que isso vai funcionar? – Susan balançava a mão de forma nervosa.
- Certeza eu não tenho, mas espero que funcione. Você decorou a sua parte, né? – Olhei o papel para me certificar pela última vez.
- Sim. Ouvi a música umas quinhentas vezes e é capaz de eu cantar ela de trás para frente.
- Ótimo. Era tudo o que eu precisava ouvir. – Sorri e segurei em sua mão com firmeza. – Independente do que aconteça hoje, saiba que foi muito bom ser seu namorado. Ou quase namorado. – Brinquei com Susan a abraçando.
- Foi bom ter um namoro de mentirinha com você também. – Ela retribuiu meu abraço, beijando minha bochecha,
Respirei fundo e encarei a porta onde dava para o quintal. Estava tendo um churrasco e como sempre, minha família e de Susan estavam juntas. Era o momento perfeito para que pudéssemos ter uma conversa com todos juntos. Encarei a garota e demos nossas mãos, passando pela porta. Encarei Matthew que estava ao lado do rádio e fiz um sinal para que ele colocasse a música e comecei a cantar.
I want to break free (Eu quero me libertar)
I want to break free (Eu quero me libertar)
I want to break free from your lies (Eu quero me libertar das suas mentiras)
You're so self satisfied I don't need you (Você é tão autossuficiente, eu não preciso de você)
I've got to break free (Eu tenho que me libertar)
God knows, God knows I want to break free (Deus sabe, Deus sabe que eu quero me libertar)
Enquanto cantava, apontei para Susan e olhei para todos que estavam ali. Alguns não entendiam muito bem o que estava acontecendo, mas logo iriam entender. Segurei na mão de Susan e a puxei, a levando até Tracy e fui até Matthew, pegando em sua mão e o puxando para onde estávamos.
I've fallen in love (Eu me apaixonei)
I've fallen in love for the first time (Eu me apaixonei pela primeira vez)
And this time I know it's for real (E desta vez, eu sei que é de verdade)
I've fallen in love, yeah (Eu me apaixonei, sim)
God knows, God knows, I've fallen in love. (Deus sabe, Deus sabe, eu me apaixonei)
I've got to break free (Eu tenho que me libertar)
I want to break free, yeah (Eu quero me libertar, sim)
I want, I want, I want, I want to break free (Eu quero, eu quero, eu quero, eu quero me libertar)
A música havia acabado e os olhares de todos ali presente estavam somente em nós, que agora éramos quatro. Dei a mão para Matthew e Susan deu a mão para Tracy e respiramos fundo, dizendo juntos:
Nós somos gays!
Aquilo foi como se um peso enorme tivesse sido tirado de nossas costas. Alguns nos olhavam de forma surpresa, mas outros sorriam para nós. Acho que eles nos entendiam ou pelo menos simpatizavam com a idéia ou aceitavam a nossa escolha.
- Assim como a letra fala, nós queremos nos libertar. Há muito tempo atrás nós entramos em um relacionamento achando que aquilo era a coisa certa, que era normal para nós, mas com o decorrer do tempo percebemos que foi um erro. Não erro de ser coisa ruim, mas um erro de que nós não entendíamos os sinais. Sinais de que gostávamos de pessoas totalmente diferentes. Sinais que indicavam que o amor era totalmente diferente do que estávamos imaginando. Cada um de nós se encontrou, uns mais antes do que nós e agora, depois de tanto tempo conseguimos perceber o real motivo do amor. O amor está em pequenas coisas, pequenos gestos, pequenas palavras, pequenos atos... Uma simples arrumada na gola do casaco ou levar o lanche que esqueceu de volta pra que a pessoa não fique com fome... São coisas mínimas. Nós escolhemos esse dia, pois decidimos passar por isso juntos, como sempre passamos. – Segurei na mão de Susan com força. – Nós amamos pessoas diferentes e é isso que nos torna diferentes agora. Gostamos de duas pessoas do mesmo sexo, mas esperamos que isso não interfira no amor de vocês por nós. – Terminei de falar, sentindo meus olhos marejar. Enfim nós podíamos respirar tranqüilos.
De antemão esperávamos todas as reações ruins. Algumas pessoas chorando, se lamentando ou até mesmo nos xingando, mas nada disso aconteceu. Fechei os olhos esperando todos xingamentos possíveis, mas me surpreendi ao sentir um abraço. Era minha mãe. Abri os olhos e vi que não era somente ela, mas todos que estavam ali nos abraçavam com um sorriso imenso nos lábios. Não entendi muito bem o que estava acontecendo, talvez fosse um sonho, mas ao ouvir minha mãe e meu pai falarem, eu tive a certeza de que não estava sonhando.
- Nós te aceitamos do jeito que você é, filho. Não importa quem você ame quem você namore, qual o trabalho que tenha, onde você more. Você nunca vai deixar de ser nosso filho. – Mamãe dizia, passando a mão pelos meus cabelos enquanto me encarava.
- Nós sempre teremos orgulho de você, Tommy. – Papai fez a mesma coisa e me deu um beijo na testa.
Olhei para o lado e vi que Susan chorava. Não um choro de tristeza, mas um choro de alívio. Um choro de emoção. Um choro de liberdade. Abracei com força papai e mamãe e trouxe ainda comigo Matthew para o abraço, feliz por tudo ter terminado de uma maneira boa. Da maneira como eu nunca havia imaginado que aconteceria. Se você ama alguém, diga para ela o quanto antes. Não espere que tudo isso lhe consuma e você acabe perdendo quem realmente gosta. Acredite no seu potencial. Seja você mesmo, independente do que os outros vão achar.
- Alô? Terra chamando Thomas! – Susan balançava a mão em frente ao meu rosto.
- Hã? Ah, desculpa. Eu estava viajando. – Neguei com a cabeça várias vezes e ri. – Qual é o plano mesmo?
- O plano é o seguinte: Vamos ao acampamento que os terceiros anos estão organizando. Você vai levar o Matthew e eu vou levar a Tracy, mas se nossos pais perguntarem você vai comigo e vice-versa, tudo bem?
- Certo. – Concordei com a cabeça e sorri com aquela ideia.
Por incrível que pareça, acho que se eu e Susan falássemos que nós dois iríamos assaltar um banco juntos nossa família apenas diria ”Voltem antes do jantar”. Toda essa liberdade as vezes era legal, mas as vezes eu acabava me sentindo estranho, como se estivéssemos usando aquilo a favor de uma mentira. Mas não era isso. Ambos sentíamos medo. Medo de não ter mais aquilo. O engraçado de tudo era que eu e Susan começamos a namorar de repente, sem nenhum dos dois saber realmente o que era namoro em si. Todos falavam que nós éramos um casal lindo e acho que nós dois acreditamos tanto nisso que se tornou realidade. Nunca houve um pedido oficial de nenhum dos lados, mas em nossa mentira, eu pedi com direito a flores e tudo mais.
Eu não ligo de ver Susan com Tracy, muito pelo contrário. Acho muito bonito as duas juntas. A forma como elas se tratam, o carinho que as duas tem uma pela outra. Eu queria poder tratar Matthew assim, mas infelizmente eu nunca contei dos meus sentimentos para ele. Quem sabe um dia? Não sei. Ainda preciso de um pouco mais de coragem para falar algo assim e não quero que seja do nada. Quero que seja algo tranqüilo.
Com as malas prontas e já dentro do carro, ouvíamos Queen como se fosse a última coisa a se fazer no mundo. O bom era que meus pais também gostavam e deixavam aquilo tudo mais divertido.
I want to break free from your lies You're so self satisfied I don't need you
I've got to break free
God knows, God knows I want to break free
Cantarolávamos fazendo várias poses dentro do carro e rindo algumas vezes. Papai sempre fazia umas caras engraçadas que deixava qualquer um com a barriga doendo de tanto rir. Ao chegarmos em frente ao acampamento, me despedi dos dois com um abraço apertado. Susan já estava lá e me esperava junto de Tracy e Matthew. Como sempre eu era o atrasado.
- Eu sei, eu sei. Desculpa. Eu não queria atrasar, mas minha mãe quis sentar e me dar uma aula de como usar repelente e eu definitivamente não estava nem um pouco a fim de ouvir. – Levantei os ombros e ri.
- Nós te amamos assim mesmo. – Matthew brincou, passando seu braço por meus ombros e começamos a andar. – Você vai ser meu colega de quarto, né? Não deixei ninguém ficar comigo por sua causa.
- Se outra pessoa fosse provavelmente eu a tiraria de lá só pra ficar contigo. – Pisquei para o garoto, mas em seguida pensei como aquilo soou de outra forma.
- Hummmmmm. Bom saber. – Matthew deu uma risada sapeca, fazendo com que eu sentisse meu rosto esquentar de vergonha.
Em certos momentos parecia que ele sabia que eu gostava dele, mas em outros momentos ele se fingia de bobo, ou realmente era bobo. Matthew era gay e assumido para a família, o que sempre me admirou bastante já que eu ainda estava pensando em como contar isso para a minha e obviamente ele sabia sobre mim. Nós já ficamos algumas vezes, mas nada muito sério. A minha capacidade de fazer as coisas e no outro dia agir naturalmente era o que eu mais admirava e odiava ao mesmo tempo em mim. Eu poderia roubar um carro que no outro dia se me perguntassem eu mentiria com meu melhor sorriso, mas infelizmente a gente não pode mandar no coração. Não é?
O lugar onde estávamos era bastante bonito. Sempre gostei de viver no meio da natureza e principalmente tirar fotos dela. Com minha câmera, enquanto andava pelos lugares, sempre parava para poder tirar uma foto ou registrar o momento dos amigos. Matthew sempre brincava de que eu deveria fazer um ensaio nu dele no meio da natureza. Ah se eu pudesse.
- Aqui. Tira uma foto nossa aqui. – Susan chamou minha atenção e parou em frente a uma pedra junto de Tracy e a abraçou por trás fazendo com eu tirasse a foto delas.
- Essa foto ficou muito boa. – Sorri ao olhar na tela e mostrei para elas. – Essa você pode revelar e colocar em um porta-retrato.
- Até que sua ideia não me é ruim. – Tracy encarou Susan com um sorriso bobo no rosto.
- Vocês se olham de um jeito tão apaixonante que me da inveja. – Brinquei cutucando elas e voltei a andar pelo lugar em busca de mais paisagens para tirar foto.
- Acho que agora é uma ótima hora para aquele ensaio. – Matthew apareceu enquanto eu andava pelo local.
- Eu não vou tirar foto sua pelada aqui, ta bom? – Revirei os olhos para ele e neguei com a cabeça. – Além do mais, ta fazendo muito frio aqui. Você iria congelar.
- Nah. Você sempre estraga as oportunidades que eu te dou. – Ele resmungou e escorou em uma árvore.
- Como se eu nunca tivesse visto você pelado, não é? – Brinquei e o encarei, posicionando a câmera a sua frente e tirando uma foto sua.
- Mas mesmo assim. O que é bom é pra ser visto mais vezes. – Ele brincou, gesticulando com a mão no ar. – Deixa eu ver. – Me chamou fazendo sinal com a mão.
Entreguei a câmera para que ele pudesse ver sua foto e dei um sorriso quando vi que ele estava pronto para tirar uma foto minha.
- Incrível como você sempre sai bonito nas fotos. – Ele negou com a cabeça.
- Como se você não saísse também. – Brinquei com ele e mostrei a língua. – Eu preciso de um banho. Bem quente. E uma cama.
- Bom, somos dois. – Ele se espreguiçou e passou o braço por meus ombros novamente – Vamos andando, mocinho. A noite vai ser longa hoje.
A noite vai ser longa? Como poderia interpretar aquilo? Vindo de Mathhew eu podia esperar qualquer coisa naquele momento...
Eu nunca havia tomado um banho tão quente em toda a minha vida e minha vontade era de ficar debaixo do chuveiro pro resto dos dias, mas infelizmente eu não podia. Já bem agasalhado eu estava sentado em minha cama, passando as fotos que havia tirado para o lado e escolhendo quais ficariam e quais iriam para o lixo enquanto esperava Matthew sair do banho. Nossas camas eram uma de frente para outra, o que me fazia ficar aliviado por ter duas camas em vez de uma só. Ao vê-lo sair do banheiro apenas de calça e uma toalha nos cabelos, mirei a câmera e tirei uma foto, rindo com a pose que ele havia feito.
- Desculpa. Eu não resisti. – Ele brincou, terminando de secar os cabelos e vestir uma blusa.
- Me deixa tirar mais fotos de você. – Comentei, esperando que ele guardasse duas coisas e comecei a tirar algumas fotos.
Várias poses eram feitas por Matthew. Algumas a minha ordem, outras por livre e espontânea vontade dele e por incrível que pareça todas haviam ficado ótimas.
- Minha vez de tirar algumas fotos suas. – Ele parou a minha frente e estendeu a mão para mim.
- Não mesmo. – Neguei com a cabeça várias vezes. – Nem adianta vir com essa cara de cachorro sem dono.
- Merda. Achei que isso iria funcionar. – Resmungou fingindo estar triste – Mas não desvia do assunto. Me dá sua câmera.
- Não senhor. Ela ta acabando a bateria. – Falei escondendo a câmera atrás de mim.
- Deixa de ser mentiroso e me dá essa coisa. – Ele sentou em cima da cama e começou a apalpar minha cintura, fazendo com que eu começasse a rir.
- Para com isso. Eu não vou te dar a câmera. – Disse em meio aos risos, me contorcendo pela cama. A todo custo eu tentava tira-lo de cima de mim as era meio que impossível.
Cada movimento que eu tentava fazer para tirá-lo de cima de mim ele achava uma oportunidade de fazer ainda mais cócegas pelo meu corpo. Eu já estava sem ar de tanta risada dada e quando finalmente parou, respirei fundo e fechei os olhos, os abrindo e dando de cara com ele me encarando. Em poucos segundos nossos lábios estavam grudado dando início a um beijo.
Suas mãos passeavam pelo meu corpo em meio ao beijo e aquilo me deixava nervoso, mas ao mesmo tempo com vontade de fazer algo, enquanto sentia seus toques, o puxei involuntariamente para que pudesse deitar na cama e ficar por cima de mim. Agora era eu que vagava com minha mão pelo seu corpo. Seus braços estavam quentes por conta do banho que acabara de tomar. Seus cabelos ainda pingavam um pouco, mas eu não ligava para aquilo, muito pelo contrário achava excitante. Deslizando meus dedos por suas costas, repousei minha mão em sua bunda onde apertei com vontade, rindo em meio ao nosso beijo, mas ao sentir sua boca ir em direção ao meu pescoço, a risada se tornou um ofego. Ele sabia que eu era sensível e sabia que aquilo me deixava vulnerável. Mordi o lábio com certa força e inclinei o pescoço para o lado deixando com que ele continuasse a fazer aquilo. Ele sabia como me deixar louco. Sabia mesmo como me deixar em suas mãos. Segurei em seus cabelos e os puxei de forma suave, sorrindo ao ouvir um pequeno ofego dele junto. Seus beijos começaram a descer por meu pescoço até chegar a meu peitoral por cima da blusa, que ele mesmo retirou com cuidado. A cada beijo que era distribuído meu corpo reagia cada vez mais e minha mente se perdia, fazendo com que eu não soubesse mais o que falar ou o que fazer.
- Eu te amo. – Murmurei sem perceber em meio as sensações que sentia.
- Hã? – Matthew levantou a cabeça e me encarou sem entender muito? – Me ama?
- Que? – Abri os olhos e arregalei os mesmos, querendo dar um tapa em minha própria testa ao perceber a burrada que eu havia feito. – Hã? Não. Que? É.. Não. Que isso. Eu falei que o tempo ta mudando. – Comecei a falar mais do que devia pelo nervoso que estava sentindo.
- Você... – Apontou para mim sem entender muito bem.
- Nah, nada. Sabe, eu tenho que – Levantei da cama, colocando a camisa novamente e calçando os chinelos. – A Susan me chamou. Você ouviu? Eu ouvi. Eu vou lá. – Falei as pressas, tropeçando tanto nas palavras quanto nas coisas no chão do quarto, saindo de lá o mais rápido possível. Pronto, era só o que me faltava. Maldita hora que não consegui segurar a língua. E SE ELE BRIGASSE COMIGO? E se ele já tiver alguém? Esse nossa amizade acabasse? Meu Deus... Eu fiz uma merda... E DAS GRANDES!
Eu não devia ter aberto o bico. Não devia ter falado nada. E agora? Como olharia no rosto dele sem ele acabar me achando um idiota? Ai meu Deus... Eu acabei de estragar uma amizade que poderia ser para vida inteira. Deitado agora na cama de Susan meu pensamento vagava por tantas explicações que eu teria que dar para o término de nossa amizade para minha família, ou para os outros.
- Susan? Você ta aí? Você viu o Thomas? – Matthew batia na porta, parecia preocupado. – Se você vir ele, fala pra ele voltar pro nosso quarto... Obrigado.
Não... Eu não poderia voltar para o quarto depois do que aconteceu. Eu não conseguiria agir naturalmente, não com ele. Não depois de ter me declarado sem querer. Suspirei passando a mão pelo rosto e cocei o cabelo de forma nervosa pensando no que eu iria fazer. Talvez eu devesse ficar na cama de Susan até o final do acampamento ou simplesmente ligar para minha mãe e pedir para ir embora. Seria muito arriscado a segunda opção.... Eu poderia encher minha cara na festa que estava rolando. Seria bem mais interessante. Depois eu voltaria para o quarto e tudo ficaria tranqüilo.
Um, dois, três, quatro... Depois disso eu não fazia a mínima idéia de quantos copos eu havia bebido. Se tinha uma coisa que eu achava superchato eram as festas que serviam um monte de bebida e nada de comida. Definitivamente era o pior tipo de festa para se ir. Tudo o que eu queria agora era voltar para o quarto e dormir profundamente em minha cama até alguém achar que eu entrei em coma e tentar me acordar. Meu objetivo era chegar até o quarto, mas esse também era o meu obstáculo. Escorando em alguns lugares ali, tropeçando em alguns aqui senti um braço passar por minha cintura e ao saber quem era, suspirei.
- Você não tem que fazer isso – Resmunguei enquanto ele me ajudava a andar sem tropeçar.
- Ou eu faço isso ou você vai acabar dormindo no chão e se machucando. E não quero isso. – Matthew comentou enquanto me carregava.
- Hum...mandão. – Mostrei a língua para ele e ri.
- Dá um tempo, Thomas – Disse o garoto enquanto me carregava para dentro do quarto, fechando a porta.
- Você ta com raiva de mim? – O encarei enquanto ele me sentava na cama, começando a rir de sua expressão.
- Se eu to com raiva de você? É óbvio que eu estou. – Revirou os olhos e passou a mão pelos cabelos de forma nervosa, bufando.
- Você fica tão bonitinho com raiva. – Inclinei a cabeça para um lado com um sorriso bobo no rosto.
- Alá, olha só você. – Ele apontou para mim – Como você pode fazer tudo isso e ainda continuar com uma cara fofa? Uma cara que me da vontade de te amassar igual eu gosto de amassar banana pra comer com leite. – Bufou começando a andar de um lado para o outro. - Não dá pra ficar com raiva de você.
- Desculpa. – Murmurei quando o ouvi falar sobre estar com raiva de mim. – Eu fiquei com medo.
- Medo de que? - Parou a minha frente, me encarando sem entender muito.
- Medo de você me rejeitar. – Suspirei decidindo colocar para fora o que estava me dando angústia. – Você já viu como a Susan e a Tracy são fofas juntas? O modo como elas se tratam? Que dá pra perceber que ali existe realmente amor entre elas e que é verdadeiro? As vezes me da uma vontade de ter isso para mim, mas a única pessoa com quem eu gostaria de poder construir algo desse tipo é você – Apontei para ele – Mas eu sempre tive medo de me declarar. Medo de não ser o suficiente ou medo de você rir da minha cara. – Apontei novamente vendo ele rir de mim – Como você ta fazendo agora! Está vendo????
- Thomas. – Matthew colocou uma das mãos em meu rosto e acariciou minha bochecha. – Você nunca me deu a oportunidade de responder de volta.
- Responder de volta? O que? – Segurei em sua mão que estava em meu rosto e senti meu coração bater mais forte. Ou ele iria dizer que eu sou idiota ou algo mil vezes pior.
- Que eu também te amo. – Sorriu e apertou meu nariz – Ah, qual é! Você achou que depois de todos esses anos eu iria ser um vagabundo sem sentimentos? Garoto! Eu estava querendo fazer uma coisa bem bonita para falar contigo, mas você me atropelou e no final de tudo eu não tinha reação nenhuma para falar que eu estava pensando nisso a anos. Desde o nosso primeiro beijo eu já senti algo diferente e com o passar dos anos isso só foi crescendo. Eu sei que deveria ter falado isso antes, mas eu também tinha medo. Principalmente com relação a você e a Susan. Mesmo que seu relacionamento fosse de mentira eu não queria interferir, mas eu sei que aquilo ficaria bem chato e eu provavelmente sentiria ciúmes, não que eu não sinta – Levantou o dedo indicador, rindo – Mas você me surpreendeu de uma maneira tão repentina que eu não sabia o que fazer ou dizer. Mas agora – Ele segurou com as duas mãos em meu rosto. – Eu. Também. Amo. Você. – Murmurou me dando alguns selinhos nos intervalos das palavras.
Ele também me amava. Era uma sensação tão difícil de explicar. Um misto de euforia com um turbilhão de sensações novas que eu nunca tinha experimentado. Matthew era a primeira pessoa pela qual eu havia me apaixonado. Para minha família, Susan era essa pessoa, mas eu estava farto de tanta mentira. Nós estávamos fatos de tanta mentira. E eu tinha uma idéia. Essa idéia ou daria errado ou daria muito certo. Mas não custa nada tentar, não é?
- Você tem certeza de que isso vai funcionar? – Susan balançava a mão de forma nervosa.
- Certeza eu não tenho, mas espero que funcione. Você decorou a sua parte, né? – Olhei o papel para me certificar pela última vez.
- Sim. Ouvi a música umas quinhentas vezes e é capaz de eu cantar ela de trás para frente.
- Ótimo. Era tudo o que eu precisava ouvir. – Sorri e segurei em sua mão com firmeza. – Independente do que aconteça hoje, saiba que foi muito bom ser seu namorado. Ou quase namorado. – Brinquei com Susan a abraçando.
- Foi bom ter um namoro de mentirinha com você também. – Ela retribuiu meu abraço, beijando minha bochecha,
Respirei fundo e encarei a porta onde dava para o quintal. Estava tendo um churrasco e como sempre, minha família e de Susan estavam juntas. Era o momento perfeito para que pudéssemos ter uma conversa com todos juntos. Encarei a garota e demos nossas mãos, passando pela porta. Encarei Matthew que estava ao lado do rádio e fiz um sinal para que ele colocasse a música e comecei a cantar.
I want to break free (Eu quero me libertar)
I want to break free from your lies (Eu quero me libertar das suas mentiras)
You're so self satisfied I don't need you (Você é tão autossuficiente, eu não preciso de você)
I've got to break free (Eu tenho que me libertar)
God knows, God knows I want to break free (Deus sabe, Deus sabe que eu quero me libertar)
Enquanto cantava, apontei para Susan e olhei para todos que estavam ali. Alguns não entendiam muito bem o que estava acontecendo, mas logo iriam entender. Segurei na mão de Susan e a puxei, a levando até Tracy e fui até Matthew, pegando em sua mão e o puxando para onde estávamos.
I've fallen in love for the first time (Eu me apaixonei pela primeira vez)
And this time I know it's for real (E desta vez, eu sei que é de verdade)
I've fallen in love, yeah (Eu me apaixonei, sim)
God knows, God knows, I've fallen in love. (Deus sabe, Deus sabe, eu me apaixonei)
I've got to break free (Eu tenho que me libertar)
I want to break free, yeah (Eu quero me libertar, sim)
I want, I want, I want, I want to break free (Eu quero, eu quero, eu quero, eu quero me libertar)
A música havia acabado e os olhares de todos ali presente estavam somente em nós, que agora éramos quatro. Dei a mão para Matthew e Susan deu a mão para Tracy e respiramos fundo, dizendo juntos:
Aquilo foi como se um peso enorme tivesse sido tirado de nossas costas. Alguns nos olhavam de forma surpresa, mas outros sorriam para nós. Acho que eles nos entendiam ou pelo menos simpatizavam com a idéia ou aceitavam a nossa escolha.
- Assim como a letra fala, nós queremos nos libertar. Há muito tempo atrás nós entramos em um relacionamento achando que aquilo era a coisa certa, que era normal para nós, mas com o decorrer do tempo percebemos que foi um erro. Não erro de ser coisa ruim, mas um erro de que nós não entendíamos os sinais. Sinais de que gostávamos de pessoas totalmente diferentes. Sinais que indicavam que o amor era totalmente diferente do que estávamos imaginando. Cada um de nós se encontrou, uns mais antes do que nós e agora, depois de tanto tempo conseguimos perceber o real motivo do amor. O amor está em pequenas coisas, pequenos gestos, pequenas palavras, pequenos atos... Uma simples arrumada na gola do casaco ou levar o lanche que esqueceu de volta pra que a pessoa não fique com fome... São coisas mínimas. Nós escolhemos esse dia, pois decidimos passar por isso juntos, como sempre passamos. – Segurei na mão de Susan com força. – Nós amamos pessoas diferentes e é isso que nos torna diferentes agora. Gostamos de duas pessoas do mesmo sexo, mas esperamos que isso não interfira no amor de vocês por nós. – Terminei de falar, sentindo meus olhos marejar. Enfim nós podíamos respirar tranqüilos.
De antemão esperávamos todas as reações ruins. Algumas pessoas chorando, se lamentando ou até mesmo nos xingando, mas nada disso aconteceu. Fechei os olhos esperando todos xingamentos possíveis, mas me surpreendi ao sentir um abraço. Era minha mãe. Abri os olhos e vi que não era somente ela, mas todos que estavam ali nos abraçavam com um sorriso imenso nos lábios. Não entendi muito bem o que estava acontecendo, talvez fosse um sonho, mas ao ouvir minha mãe e meu pai falarem, eu tive a certeza de que não estava sonhando.
- Nós te aceitamos do jeito que você é, filho. Não importa quem você ame quem você namore, qual o trabalho que tenha, onde você more. Você nunca vai deixar de ser nosso filho. – Mamãe dizia, passando a mão pelos meus cabelos enquanto me encarava.
- Nós sempre teremos orgulho de você, Tommy. – Papai fez a mesma coisa e me deu um beijo na testa.
Olhei para o lado e vi que Susan chorava. Não um choro de tristeza, mas um choro de alívio. Um choro de emoção. Um choro de liberdade. Abracei com força papai e mamãe e trouxe ainda comigo Matthew para o abraço, feliz por tudo ter terminado de uma maneira boa. Da maneira como eu nunca havia imaginado que aconteceria. Se você ama alguém, diga para ela o quanto antes. Não espere que tudo isso lhe consuma e você acabe perdendo quem realmente gosta. Acredite no seu potencial. Seja você mesmo, independente do que os outros vão achar.