Finalizada em: 11/04/2021

Capítulo Único

Roma, 06:30

Fui despertada instantaneamente naquela manhã, alguns vestígios do nascer do sol entravam pela janela, iluminando a pequena suíte de hóspedes em que me encontrava. Cores de um céu levemente rosado apareciam pouco a pouco, lembrando do quanto Itália era linda. Levantei, esfregando os olhos, e segundos depois, fui direto ao encontro do banheiro para uma ducha rápida, energizante, e só depois de me sentir plenamente apta em dar bom dia para as outras pessoas daquela casa, me direcionei à cozinha.
estava de costas, apoiada sobre a bancada, e em frente ao fogão, foi preciso apenas alguns segundos para que eu entendesse o que os dois irmãos estavam fazendo, então, peguei uma maçã sobre a bancada e cumprimentei a morena com um beijo no rosto.
— Bom dia, flor do dia. - proferiu enquanto eu sentava sobre a mesma bancada em que ela se escorava. — Dormiu bem?
— Como o belo anjo que sou. – respondi, brincalhona, e mordisquei a maçã, verdinha e azedinha, do jeito que eu gostava. — Vocês sempre acordam cedo por aqui?
— É claro que sim. – respondeu de maneira afetada e roubou a maçã de minha mão, mordiscando-a. - A vida é curta, você sabe, e não podemos nos dar o luxo de desperdiçar sequer um segundo.
— O que minha poeta irmã está querendo dizer é que temos um dia longo pela frente. – respondeu o comentário de e eu lhe lancei um beijo pelo ar, dando-lhe “bom dia”. — Não é todo dia que a nossa prima viaja do México até a Itália para nos ver, e nada mais justo do que aproveitar cada minuto desse final de semana ao seu lado.
Eu sorri com o comentário no mesmo momento em que o barulho da chaleira no fogo cessava. Em um recipiente apropriado, depositou os ingredientes necessários para uma boa e energizante dose de café, minutos depois, o aroma da cafeína já podia ser sentido em todo ambiente. abaixou-se e no pequeno armário da bancada, pegou três canecas decoradas com símbolos de Harry Potter, instantaneamente pude lembrar o quanto era bom compartilhar uma paixão com seus primos.
as trouxe para si e as encheu com o líquido que havia acabado de preparar.
— Café da manhã? – questionou-me.
— Com toda a certeza. - peguei uma das canecas já cheias e entregou a outra para a irmã. O líquido escuro estava quente e o vapor que subia exalava cafeína nobre. Assoprei aos poucos e dei um gole generoso, sentindo o gosto familiar só que mil vezes melhorado. — Você me mima demais, Luján.
— Não seja tola, eu gosto apenas de chocar os convidados com a minha cordial hospitalidade. - rebateu , satisfeito, enquanto se espreguiçava ao mesmo tempo em que eu dava mais um gole generoso no café.
Um sorriso bobo apareceu em meu rosto
— Já disse o quanto amo isso? - argumentei de forma animada e isso trouxe risadas entre meus primos. Eles foram os únicos nos últimos meses a ver esse meu lado e eu não poderia estar mais grata por tê-los comigo. — Se eu pudesse, levaria toda a cafeína italiana comigo.
— E como eu supriria meu vício, tesoro? – proferiu, sentando-se ao lado vazio de , com a própria caneca em mãos. — Quais os planos para hoje? – questionou, dando um gole, e eu vi o sorriso sapeca surgir no rosto de sua irmã gêmea.
— Diferente de você, maninho, gosto de tudo muito bem organizado e já planejei nosso final de semana. – proferiu, e eu notei o rapaz rolar os olhos, também. – Ah, , gostaria que você compartilhasse desse ideal comigo, organização, sabe? Assim como esses tais “poderes de gêmeos” que você tanto cisma que deveríamos ter...
— Muito engraçadinha, irmãzinha. - franziu o cenho e eu me segurei para não rir. De fato, entre os três, era o mais desorganizado, ele somente nunca admitiria aquilo. — Eu já deveria ter desistido de você e , por serem tão más comigo.
— Você não faria isso, tenho certeza. – respondi.
E depois de mais alguns minutos conversando sobre o nosso final de semana, seguimos para um roteiro de visita incrível feito por com direito a visita ao Coliseu, Fontana di Trevi e até mesmo à Basílica de São Pedro.
Eu tinha certeza que aproveitaria cada segundo daquele dia.
(...)


Pub The Nag’s Head, 23:45

As luzes de Roma brilhavam mais que o normal naquela noite, o céu estrelado misturava-se perfeitamente com o ambiente e traziam a sensação de conforto que eu tanto precisava naquele momento, e, por um milésimo de segundo, toda a frustração dos últimos dias havia se esvaído.
Era querer demais ficar aqui para sempre? Sim, era. Franco Colucci e Miguel Arango atravessariam o oceano atlântico inteiro em um barquinho de papel se fosse preciso para me buscar e diriam que a desilusão amorosa é uma merda, mas ainda assim, superável, e, fugir dos problemas não era a resposta. De certa forma, eu sabia que eles estavam certos.
Respirava um pouco de ar puro no terraço do pub, de lá conseguia vislumbrar o alto do museu Giardini, um dos pontos turísticos que havia visitado mais cedo naquele dia. De fato aquele lugar era magnífico e agora eu finalmente entendia o motivo de minha tia ter se apaixonado pelo lugar à primeira vista.
– Você já foi mais divertida, sabia, Colucci? – o silêncio foi quebrado assim que apareceu no terraço, então senti seu braço me envolver pela cintura e abraçar-me por trás. Eu sorri, apoiando minha cabeça em seu ombro. — E se esgueirar pelos cantos não faz muito o seu estilo.
– Não é como se eu tivesse motivos para não se esgueirar, você sabe, ou até mesmo motivos para comemorar. – respondi, sem graça. Aquele horário me fazia sentir um pouco a falta de quem não queria, e como se soubesse disso, reprimiu um sorriso.
— Ok, você está oficialmente me obrigando a encher aquele cara de porrada...
Com o comentário, meu humor voltou aos pouquinhos.
— Se isso vai fazer você ficar feliz, não sou eu que vou intervir... – sorri, dando de ombros, e piscou para mim. Eu adorava a forma singela que ele e tinham de me fazer rir nas situações mais inusitadas possíveis. — Como me encontrou aqui?
— Sabe, você sempre teve essa tendência de se enfiar em lugares altos e assustadores...
— Não é verdade, não são assustadores. Além disso, gosto da vista que esses lugares me oferecem. - fiz biquinho, me soltando de seus braços, e gargalhou. — Onde está ?
— Ah, você sabe como ela é, sempre manda a gente fazer o trabalho sujo. - ele fez um tipo de careta e eu gargalhei pelo ato. — Venha, talvez a gente chegue a tempo de pegar alguma cerveja.
— Certas coisas, nunca mudam. – eu sorri, agradecendo mentalmente por termos dezessete em um lugar que permitia maiores de dezesseis anos ingerirem bebida alcoólica, mesmo que fosse apenas cerveja e vinho.
— Não mudam mesmo. - ele indagou. — Vamos, estamos esperando uma pessoa e tenho certeza que ela vai animar essa festa. A diversão começa agora, mio cario.
— Por curiosidade, quem exatamente estamos esperando? – questionei, e eu sabia que se a estivesse aqui, ela sorriria marota igualzinha ao que seu irmão havia acabado de fazer.
— Alguém que com certeza, você vai gostar. – respondeu e eu não pude deixar de desconfiar de suas palavras, algo me dizia que aquilo não cheirava nem um pouco bem, porém, não tive tempo de protestar, pois no mesmo instante, o moreno nos puxou para a porta e fomos correndo em direção ao pub onde encontraria seu amigo e .

(...)


A primeira coisa que chamou minha atenção foi a jukebox encostada ao canto do pub, talvez havia sido a falta de empolgação inicial que me fez passar sem perceber ela antes, mas agora de todo aquele lugar, ela era o objeto que mais chamava a minha atenção. Mencionei aquilo aos gêmeos e ambos sinalizaram com a cabeça para que eu fosse até lá e desse play em alguma música, enquanto isso, encontraria o tal “amigo” na porta de entrada e pegaria cervejas geladas para nós duas.
Coloquei alguns trocados na máquina e comecei a escolher a música. Sorri ao achar uma diversão aceitável no meio de toda aquela bagunça antiga.
— Perfeito. – os gêmeos estavam certos, minha vida mudaria dali a poucos meses e eu teria duas opções, ou me divertia com tudo aquilo ou me afundava nos meus próprios problemas e naquele momento eu soube que escolheria a primeira opção.
Sorri travessa e apertei o play, sentindo instantaneamente a música fluir por todo o meu pequeno corpo.

You know when you're close you really turn me on-
(você sabe que quando você está perto de mim, você me dá tesão)
That's why I want you so bad when you're gone
(É por isso que sinto tantas saudades quando você vai embora)



Balançava meu quadril para um lado e para o outro enquanto permanecia de olhos fechados, a voz de Cherie fazia com que eu entrasse em um completo transe de êxtase e aos poucos pude ver as pessoas do pub se levantarem e começarem a se balançar comigo ao ritmo de You Drive Me Wild. Eu não esperaria menos que isso, afinal, a música era eletrizante e se permitir enlouquecer ao seu ritmo era necessário.
Eu soube disso assim que entendi que não havia nada a perder. Sorri e senti alguém se aproximar por trás, não precisei nem virar para saber quem era. Com o sorriso satisfeito, lá estava com duas cervejas na mão.
A morena me entregou uma e deu um gole na sua.
— Bela escolha de música, amore mio! – falou, dando passagem para a música em seus ouvidos.

Come on, come on and take me home
(Venha, venha e me leve pra casa)
Please stay with me, don't leave me alone.
(Por favor fique, não me deixe sozinha)



O refrão estava próximo e começamos a dançar The Runaways de uma forma frenética e sexy, como se isso fosse possível. Ríamos com as cervejas em mãos e balançávamos os quadris de um lado para o outro com um dos braços um pouco levantado enquanto o outro estava próximo de nossas bocas, fazendo a long neck virar um singelo microfone.

You drive me wild
(Você me leva à loucura)
Oh, you know you do
(Oh, você sabe que sim)
You drive me wild
(Você me leva à loucura)
You know I need you
(Você sabe que eu preciso de você)



Aquela sensação de liberdade afogava minhas preocupações e tudo aquilo (estar com meus amigos e me divertindo) me fazia lembrar de quando as coisas eram mais fáceis. Eu estava ótima, aquele momento era meu e, como os gêmeos haviam falado mais cedo, a vida era muito curta, não seria um término que me faria desperdiçá-la.
Nesse momento foi chamada por alguém para dançar e deixou sua cerveja comigo, enquanto isso, eu sorria e me remexia a cada verso com as mãos ocupadas e próximas a mim, sentia apenas que alguma coisa estava faltando, . Quando estava prestes a me virar em direção da porta para procurá-lo, esbarrei em alguém, depositando todo o líquido restante das cervejas sobre o abdômen da pessoa.
A camiseta havia ficado transparente e percebi se tratar de um garoto, pois além de ser bem mais alto que eu, os gominhos sutis de sua barriga denunciavam isso. Eu tinha certeza que estava corada pelo ato de derrubar cerveja em alguém e certamente por ficar encarando-o, mas antes que pudesse me desculpar, o cantarolar da música chamou minha atenção.
— Make me tremble, make me shake...– ouvi a voz de cantarolando aqueles versos e por um momento quase relaxei, até perceber que a voz não vinha da pessoa que deixei encharcada e sim de trás dela. Gelei.
Scusi. – sussurrei, olhando novamente de forma lenta para a merda que havia acabado de fazer, e, em um ato involuntário, encolhi meus ombros sem ainda encarar a pessoa em minha frente, e quando finalmente olhei para cima, pude encarar os olhos mais lindos que eu já havia visto na minha vida.
Bem, pelo menos foi o que eu achei até perceber e me dar conta que eu já os conhecia. Merda.
— Olá, , sua recepção é sempre tão calorosa. – seu sotaque inglês era tão encantador que se fosse outra pessoa proferindo aquelas palavras, eu com certeza me derreteria ali mesmo.
Semicerrei os olhos, fixando-os em , e o vi mordiscar o lábio inferior de forma marota e ali eu soube que o motivo do mesmo argumentar tão pouco sobre o “misterioso amigo” era porque se tratava de Bustamante, e eu certamente me negaria a continuar no mesmo ambiente do que meu outro querido primo postiço.
— Essa é a minha velha e singela hospitalidade. – respondi, sem muito agrado, e nem percebi quando a música havia cessado.
— Eu poderia mentir e dizer que senti saudades dela, mas você sabe... Sou muito honesto quanto o que eu sinto.
Franzi o cenho pelo comentário. Era certeiro que minha mãe havia conversado com tia Roberta sobre a circunstâncias de meu término e não havia dúvidas que naquela altura, Bustamante já sabia de tudo. Conhecendo-o como eu conhecia, ele não perderia sequer um segundo de provocação a mim.
— Pensei que os britânicos eram educados. – falei, provocando-o.
— Eu não sou britânico, você sabe, apenas morei lá por alguns anos...
— Então deveria voltar e aprender um pouquinho mais, sabe? - rebati. — Sempre é bom ter um pouquinho de crescimento pessoal...
— Por que você cisma em me dar tanto trabalho, hum? - Xavier rolou os olhos. — Às vezes tenho certeza que você me ama.
— Além de ridículo, agora está delirante. – xinguei-o, e apesar de querer falar um pouquinho mais, fui interrompida.
— “De todos botecos, de todas as cidades…” - a voz aguda de se fez presente e eu quase sorri largo entendendo a referência.
Quase.
— “...De todos os clichês, mais clichês do mundo”. - continuei e a fuzilei com o olhar. — Não precisa fingir, foi fácil entender isso aqui. - apontei para e .
— Vamos lá, ... Você sabe que Xavier é um belo presente quando se trata de diversão. - as bochechas de estavam um pouco mais coradas do que o normal, evidenciando o efeito do álcool de mais cedo. Não bebíamos com frequência e nem em quantidades exuberantes, por isso o pouco que fosse já deixava nossos rostos um pouco mais rosados. — Nada melhor que reunir o quarteto nesse final de semana, você sabe e tem que confessar que estou certo.
Dei de ombros e Bustamante deu um de seus sorrisos provocantes que eu tanto odiava. Eu queria matá-lo mais do que nunca.
Porém, nenhum dos três deu espaço para que isso acontecesse e antes que eu pudesse protestar com todas as minhas forças, segurou a minha mão, carregando-me para a pista de dança ao mesmo passo que e Xavier se aproximavam do bar. Poucos minutos depois, os dois rapazes voltaram com baldes de cerveja, a camiseta de Bustamante já não estava tão molhada quanto antes e mesmo que ainda estivesse, o desgraçado ainda era atraente. Sem ter muito o que fazer e lutando contra tudo em que eu acreditava (aturar Bustamante mais que o necessário) me rendi aos meus amigos e em um piscar de olhos, nosso quarteto se apressou para que cada um tivesse uma cerveja em mãos e com o braço direito levantado, foi a primeira a começar um brinde.
— À , que ela continue sendo sempre doce e gentil como é, que resolva seu gigantesco problema de escolhas e que seu vício com doces diminua. - piscou e lhe dei a língua antes de voltar meu olhar a .
— Que continue tendo a sorte de me ter como amigo... - piscou. — Que não mate nosso amigo e primo postiço Xavier e que, nesse dia, viva intensamente sem pensar que terá algo a perder. - mordeu o lábio inferior e passou a vez para Bustamante que lhe dava o dedo do meio.
— Que seja um pouco mais amável com um jovem tão atencioso e amável como eu... - rolei os olhos e ele piscou. — E que aproveitei o dia hoje, fazendo tudo o que um de nós faria.
— Tenho que concordar com ele, mi amore. - proferiu . — Essa noite foi feita para aproveitar, rir, nos divertir e abraçar os amigos...
— Por favor, nada de abraços. - fiz carinha de nojo e despertei gargalhadas de todos.
Após levantarmos as cervejas e brindarmos, não demorou muito para que nós quatro interagíssemos e curtíssemos aquela noite. Deixei o desconforto de lado e percebi que certas coisas na vida aconteciam com algum propósito, e não havia dúvidas, eu não perderia sequer mais um momento da minha vida lamentando pequenos erros, todas as apostas estavam em mim e apenas eu era capaz de modificar o que estava sentindo, era assim que eu iria enfrentar meus problemas, com meus amigos, como uma família.
Afinal, eu não tinha nada perder.



Fim!



Nota da autora: Sem nota.

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Nota da beta: Eitaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa que eu quero ver o que isso vai dar, hein???? Li essa antes de 04. I Got The Music e já tô ansiosa para ver faíscas! Já adorei os personagens 💙

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