Última atualização: Fanfic Finalizada

Capítulo Único

Eu continuo olhando para aquele pequeno número branco
Você deixou aqui no verão
Pendurado no meu guarda-roupa
Você ainda quer isso?
Você ainda quer isso?

Estou sentado à beira da enorme cama de casal, com meu violão sobre o colo e o caderno de composições ao lado. Encaro o vestido branco, perfeitamente embalado na capa de transporte transparente e pendurado na porta do guarda roupa.
Era o vestido que ela usaria em nosso casamento.
A etiqueta presa à capa, com os números 17.10.20 elegantemente escritos em cursiva branca, parece quase reluzir diante de meus olhos marejados.
Perdi as contas de quantas vezes me encontrei quase na mesma posição de agora, sentado à cama, encarando o vestido e a pequena etiqueta, sentido toda minha alegria ser consumida por uma tristeza sem igual.
o encarava por horas, desde que buscara o pacote na estilista. Acho que agora tomei o posto dela.
Para todos digo que estou aguentando, que estou seguindo em frente e que logo irei superá-la, mas isso não passa de uma mentira. A dor da partida de ainda é tão presente que me consome, pouco a pouco, tomando tudo de mim.
Me pergunto toda hora em que momento ela deixou de querer isso, esse futuro, a vida ao meu lado, e me culpo por ter sido tão desligado a ponto de não ter percebido. Quer dizer, ninguém deixa de querer um futuro ao lado de outra pessoa, assim, do nada, certo? Sempre há sinais. Por isso, me culpo a todo momento por não ter percebido que, para , já não existia mais um nós.

Eu só quero vê-lo
De volta no seu corpo
Ver você dançar por aí e
Dizer que sinto muito

Estou revivendo nossa última dança enquanto dedilho meu violão.
São meados de agosto e estamos em um baile de gala. Não lembro de quem era o baile, mas me lembro perfeitamente dela. está deslumbrante em um vestido longo e vinho, e é inevitável para mim, assim como para qualquer outra pessoa da festa, desviar meu olhar dela.
“Por que eu sinto como se todos aqui só tivessem olhos para nós?” Ela pergunta, me olhando com aqueles olhos doces que tanto sinto falta.
“Porque você está linda e é quase impossível desviar o olhar.” Respondo, sentido meu coração bater mais forte a cada momento, totalmente entregue àquela mulher. abaixa a cabeça levemente e sorri tímida.
Em meio a melodias suaves, passos de dança, algumas poucas conversas e muitos sorrisos trocados, eu me sinto leve, como toda vez que estou ao lado dela. Por esse, e outros inúmeros motivos, claro que pedi em casamento. Ela era linda, doce, gentil e tornava até mesmo meus piores dias mais leves, me fazendo rir e sempre se mostrando ao meu lado, não importando o que fosse. E aqui, vendo esse brilho no olhar dela, enquanto giramos pelo salão, tudo o que eu mais desejo é que o casamento chegue logo.

Em meio à recordação, enquanto nos encaramos, digo que sinto muito, ainda que ela não possa escutar. E é exatamente isso que eu sinto. Sinto muito por não ter sido bom o suficiente para que ela quisesse continuar comigo, sinto muito pelas vezes que a decepcionei de alguma forma, sinto muito pela minha vida corrida de cantor, mas, principalmente, sinto muito por não ter conseguido dizer tudo isso a ela quando eu ainda podia.
Claro que tentei ligar, mandar mensagem, ir até a porta da casa dela... Tentei, inúmeras vezes! Mas, claro, ela não me atendeu, retornou, respondeu ou qualquer coisa do tipo. Tudo o que eu queria e precisava era falar com ela, tentar entendê-la, e foi tudo o que eu não consegui. Talvez ela já tivesse seguido em frente.

Eu continuo olhando para aquele pequeno número branco
Aquele da foto
De quando perdemos a paciência

Lembrar da briga que colocou um fim a tudo é fácil, afinal, recordá-la é tudo o que tenho feito desde que foi embora. Quero lembrar de como tudo começou, mas não consigo, não importa o quanto eu tente.
Apesar de não ser a nossa primeira briga, aquela foi, de longe, a mais séria e a que mais me afetou. Afinal, foi por causa dela que meu mundo desmoronou. Foi por causa daquela briga idiota, que nem me lembro por qual razão começou, que foi embora.
Flashbacks do pior da minha vida vêm como uma enxurrada para me atormentar. Me lembro da discussão, das ofensas proferidas em meio ao álcool e ao pouco juízo de ambos. E, enquanto vou revivendo aquela discussão sem falas, composta apenas por gestos e insinuações de gritos, sinto meu peito ser tomado por uma sensação de buraco por saber o que vem a seguir.
A imagem de jogando as coisas dentro de uma mala, largando o anel de noivado sobre o aparador ao lado da porta do quarto e saindo sem sequer olhar para trás parece tão viva que sinto como se quase pudesse tocá-la.
A dor da partida vem quase que instantaneamente. Uma escuridão toma conta de todo meu ser, levando tudo de bom que já houve em mim um dia e deixando apenas tristeza e solidão no lugar. Não importa quantas vezes eu reviva essa discussão, essa cena. A sensação de impotência diante da partida de é sempre a mesma, assim como o que sinto depois.
Meses já haviam se passado e nada havia mudado. Parecia que meu coração se recusava a deixá-la ir embora e que meu interior tinha se acostumado com aquela sensação de falta de vida, de felicidade. Eu estava aguentando. Mas até quando? Até quando eu conseguiria suportar a dor da partida de sem me tornar uma versão ainda pior de mim mesmo? Eu já estava há meses sem sair de casa, sem conseguir compor algo que meu empresário gostasse. Minha aparência mais se parecia com a de um mendigo, já que a minha barba estava há quase meses sem ser feita e o cabelo nunca mais ouviu falar de um corte. Eu estava... completamente destruído, interna e externamente.
Acho que só não levou consigo minha vontade de viver por conta dos meus fãs. Eles não sabiam, mas eram a única razão pela qual eu tentava ao menos não me entregar totalmente ao álcool e à depressão. E por eles decidi dar um basta nisso tudo.
Após ouvir muitas vezes “você precisa superar e seguir em frente”, me permiti um último momento de autossofrimento. Lhe escreveria uma música: Dress seria meu adeus a ela.
Sim, Dress, em homenagem ao vestido que tem sido a recordação diária de todos os nossos momentos, em homenagem ao vestido de noiva à minha frente. E, por isso, eu me encontrava encarando-o uma última vez, pendurado no guarda roupa, com meu violão sobre meu colo e o caderno de composições ao lado.
Ao contrário de todos os meus outros processos de composição, e ao de muitos outros artistas, dessa vez eu começaria pela melodia. Precisava de uma melodia somente, pois sabia que a letra viria fácil. Era de que estávamos falando. Estávamos falando de e meu amor sem igual por ela.
E então, como um relâmpago atingindo a plantação em um dia sem chance de chuva, assim, do nada, sou atingido pela melodia perfeita. A melodia de minha última dança com começa a ser dedilhada em meu violão sem que eu nem me dê conta; quando vejo, já estou tocando a música completa, tendo a sensação de ter a melodia perfeita.
Os versos da música surgem tão facilmente que quase não percebo que estou cantando-os e demoro a começar a tomar nota.
Cada palavra ali mexe comigo de alguma forma, trazendo consigo inúmeras lembranças que, por meses, tentei esquecer. E por alguns minutos, sinto que não conseguirei terminar a música, devido ao peso em meu peito e às lágrimas que descem sem impedimento pelo meu rosto. Sei que é desse fim que preciso - que nós precisamos -, mas é difícil demais continuar a escrever quando até o ar me falta, à medida que meus sentimentos são postos para fora, em forma de uma canção de despedida.

Talvez seja hora de guardar seu vestido
Mesmo que eu não queira, querida

Assim que finalizo a música, a releio, tendo a certeza de que não deixei nada de fora e de que ela poderia, finalmente, ser minha despedida a ; o encerramento que não tivemos. Me levanto da cama, deixando o caderno de composições e o violão de lado. Caminho até o guarda-roupa e respiro fundo, antes de pegar o cabide do vestido.
Passei tanto tempo apenas o observando a distância, que é até estranho pegar a peça em minhas mãos. Porém, diferentemente do que imaginei, ele não parece mais pesar uma tonelada, devido às recordações que carrega.
Não posso negar que uma parte de mim queria continuar guardando aquela peça de roupa, teimando que ainda voltaria e seríamos felizes. Mas havia a parte que eu tentava me agarrar agora, a parte que sabia que isso seria tolice e que era hora de seguir em frente.
Com o vestido branco nunca usado em mãos, caminho até a caixa de doações perto da porta. Pensei muito se realmente faria aquilo, para finalmente decidir que estava na hora de simplesmente deixar o passado ser passado, parar de “aguentar” e seguir em frente, assim como imagino que seguiu.


Fim



Nota da autora: Oie!
Juro que eu queria algo mais amorzinho, mas a música pedia algo mais triste... BTW, espero que tenham gostado!
Não esqueçam de me falar o que acharam nos comentários, adoro lê-los!
Milhões de beijos!





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Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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