Última atualização: 15/04/2018

Capítulo Único

O sacolejo do navio era leve, mas repetitivo, obrigando vários passageiros a se debruçarem nas apertadas cabines, correndo para os seus respectivos banheiros. Um caos total. Estômagos fortes eram artigos de luxo por todos os corredores da embarcação.
Após dias em terra firme aguardando para embarcar no S.S. Lincoln, mal podia acreditar que passaria seu primeiro dia agarrado ao vaso sanitário da cabine 413. Se aquilo não era um gigantesco sinal de que uma maré de azar havia se apossado de sua vida, ele realmente não sabia o que era. Provavelmente uma piada de mau gosto de alguém lá em cima, para ser o menos pessimista possível naquele momento de tanto transtorno estomacal.
O rapaz revirou os olhos entre uma fisgada abdominal e outra.
- Eu nem deveria estar aqui - reclamava, lembrando-se de todo o caos das últimas semanas.
ainda recordava vividamente do rosto delicado de , sendo capaz de reconstruir com precisão cada detalhe dele em sua mente: os cabelos que nasciam com frizz na região da testa, a pintinha perto da orelha esquerda, as bochechas que se enchiam quando ela sorria e o brilho em seus olhos ao tratar daquilo que amava. Se havia algo que tinha a oferecer ao mundo era sua paixão por aquilo que fazia. Provavelmente fora essa intensidade que fizera com que ele se apaixonasse perdida e cegamente por ela.
Até dois meses atrás, estavam juntos, com sorrisos tão largos que irritavam corações amargurados e invejosos que os viam tão felizes com a companhia um do outro. Precisavam de muito pouco e ao mesmo tempo tinham muito. havia sido literalmente a única a apoiá-lo quando teve a ideia maluca de abandonar a faculdade de direito para seguir seu amor por informática em um curso de ciência da computação. esteve lá a cada prova e cada conquista da mulher ao longo de sua formação universitária dentro da medicina. Eram o alicerce um do outro, nos bons e maus momentos. Os pais já preparavam o casamento deles, mesmo que os filhos ainda não cogitassem assumir esse título. Afinal, não era como se precisassem de um status relacionamento diferente; estavam juntos de qualquer forma e era isso que importava.
Mas o verbo não poderia ter sido conjugado mais adequadamente; tudo aquilo agora era passado e queria poder vomitar tudo o que sentira nas últimas semanas junto com os ovos mexidos do café da manhã.
Aquela viagem era o percurso dos sonhos deles e não um destino a se cumprir sozinho. Após meses de economia, finalmente haviam conseguido comprar os bilhetes. Quase deram uma festa ao descobrir que viajariam juntos. Quão irônico agora era o fato de ele estar trancado sozinho enquanto a festa de boas-vindas acontecia no convés principal?
se levantou a contragosto, ciente de que não havia mais nada para pôr para fora. Ao menos, nada no estômago.
Escovou os dentes na tentativa de se livrar daquele gosto incômodo que contaminava sua boca. Jogou água gelada no rosto, passando um pouco do líquido no redemoinho de seu cabelo que custava a ficar no lugar. Se estivesse ali, teria feito uma piadinha qualquer sobre seus fios indomáveis. Céus, como ela fazia falta.
Subiu até o convés principal na intenção de encontrar algo para preencher o vazio que tinha se instalado em seu estômago. Depois de todo o enjoo, a fome machucava e ele pensou que a festa pudesse ser um bom local para encontrar alguns aperitivos.
- Com licença, com licença - pedia repetidamente ao passar pela multidão que chacoalhava seus corpos na pista de dança improvisada. A música era alta e animada e dava mesmo certa vontade de esquecer todo o resto e só aproveitar o momento.
Seu estômago, no entanto, roncou alto mais uma vez, fazendo-o se lembrar de que nem tudo era tão fácil de esquecer.
Avistou finalmente uma longa mesa coberta com uma toalha azul clara, parecida com a que sua mãe usava e reutilizava em todos os seus aniversários quando criança. Alguns canapés e salgadinhos preenchiam os pratos e vasilhames, acompanhados de alguns sanduíches de frios com molhos finos.
se esticou para pegar um deles, quando, simultaneamente, foi empurrado pela frente por um esbarrão. Xingou mentalmente pela dor do choque de sua coxa com a quina da mesa.
- Perdão! Eu sempre digo que não se deve andar de costas e olhe só o que eu fiz! - A voz feminina matraqueava, desesperada em se desculpar. estava paralisado. Virou-se bruscamente, encontrando os olhos assustados daquela que tanto amava.
- ? - Perguntou com a voz um tanto trêmula, como se pudesse cometer algum engano com aquele rosto que já havia decorado milimetricamente em sua mente.
- - ela respondeu, categoricamente, tentando ao máximo agir como se aquilo não a afetasse por um segundo sequer. Se havia algo que sua profissão lhe ensinara, essa coisa era como não deixar que seus sentimentos transparecessem em momentos inconvenientes.
- O que faz aqui?
- Aparentemente o mesmo que você. - Ela riu tão fraco que qualquer outra pessoa não perceberia. - Decidi aproveitar a viagem que havia planejado para ocupar as minhas merecidas férias após tantas noites viradas em plantões na ala pediátrica.
respirou fundo, tentando controlar a avalanche de sentimentos que o atingia repetidamente a cada segundo observando-a. Queria abraçá-la como se nada tivesse acontecido. Queria segurá-la em seus braços como se tudo estivesse bem e assim fosse permanecer. Infelizmente, tinha que controlar os seus braços e o seu coração.
- Confesso que não esperava por esse encontro - ele admitiu.
- Nem eu. Pelo jeito, pensamos mais parecido do que achávamos. Você sabe como eu queria fazer esse cruzeiro. Não seria um rompimento estranho que me faria abrir mão dele - disse, com pesar, fazendo com que sentisse uma pontada no coração como se uma adaga tivesse perfurado seu peito.
Olharam um para o outro, contemplando aquele embaraçoso momento de silêncio entre um misto de vergonha e angústia. Não queriam ir, mas não queriam e não podiam mais ficar. Ao não dizer nada, deixavam pairar no ar tudo que guardaram nos últimos tempos e sabiam o que o outro queria conseguir dizer.
- Vou para o meu quarto. Estou cansada demais. - Foi ela quem tomou o primeiro passo. - Boa festa e boa viagem, .
O rapaz sentiu o coração apertar, uma dor muito semelhante à de quando ela o deixou. Vê-la dar as costas a ele continuava sendo incrivelmente destruidor.
- Bom descanso - murmurou, tentando sorrir. E virou-se para pegar alguns sanduíches, segurando uma lágrima e sabendo que não tinha mais apetite algum.

*****


, sentada em uma espreguiçadeira branca, degustava um drink colorido decorado com um daqueles mini guarda-chuvas cafonas. Era visualmente ridículo, mas uma tentação para seu paladar. Era doce apesar do sabor do álcool, fazendo com que a bebida fosse ainda mais perigosa. Mastigou o pedacinho decorativo de abacaxi que enfeitava a borda do copo, indo de volta ao balcão para pedir outra bebida. Por que os americanos inventaram refil daquele veneno glicêmico que era a coca-cola e não pensaram em reposições alcoólicas? Incrivelmente mais atraentes e gritantemente mais úteis em momentos como aqueles.
estava sentado em um dos degraus azulejados da piscina, aproveitando a hidromassagem - não poderia estar em outro lugar, considerando que não sabia nadar. Estava estrategicamente posicionado diretamente em sua frente com uma bermuda vermelha já encharcada. Aquela cena e aquela peça de roupa faziam com que ela lembrasse diretamente da vez em que haviam cedido ao desejo após algum tempo na piscina da casa de campo dos tios dele. O local estava vazio, perfeitamente disposto apenas para os dois e o que bem entendessem fazer. Foram dias loucos de memórias incríveis. Estaria sendo uma grande mentirosa se dissesse que não sentia falta daquilo. Sacudiu a cabeça, tentando afastar aquelas imagens de sua mente.
acenou ao perceber o olhar dela sobre ele. respondeu cordialmente, virando-se para retornar ao seu drink.
A mulher abriu o livro de suspense que levara para a viagem, buscando ao menos um pingo de concentração. Já havia lido o primeiro parágrafo da página cento e sessenta e três ao menos uma dúzia de vezes e não tinha assimilado uma palavra sequer dentre as quinze linhas dele.
- Esse é o livro que eu te dei de dia dos namorados, não é? - O rapaz havia se sentado na cadeira ao lado dela, enquanto secava o corpo em uma das toalhas fornecidas pelo navio.
- Sim - respondeu simplesmente, fingindo que a leitura era interessante demais para que ela olhasse para o abdômen ainda permeado por gotículas da piscina.
- E você está gostando? É uma boa história? Tive medo de não fazer seu estilo quando comprei, mas é você mesma quem sempre diz que devemos estar abertos a mudanças e novas experiências.
- É como você disse: uma nova experiência. Mas eu estou gostando. Infelizmente, os problemas no hospital acabaram não me dando tempo o suficiente para terminar a leitura ainda. Eu caía e dormia em qualquer canto que encontrava. Foram semanas complicadas.
a fitou com um meio sorriso, na busca de transparecer a solidariedade que queria mostrar.
- Que fim teve o caso da pequena Holly? - Foi a pergunta que ele fez ao se lembrar de todas as noites mal dormidas da ex-namorada, ocupada demais com os próprios pensamentos e frustrações para conseguir desligar sua mente e dormir. Queria ter um botãozinho de on/off para controlar o funcionamento da própria cabeça.
- Bom, depois de dias enfurnada em salas abarrotadas de livros e computadores, na companhia de outros vários especialistas, acabamos descobrindo a pesquisa de procedimentos cirúrgicos abdominais de um russo. Era uma ideia muito nova e muito embrionária, ainda em fase de testes, mas que já apresentava alguns resultados bem positivos. Era arriscado e perigoso demais, mas a mãe dela reconheceu que qualquer mísera esperança de salvá-la era algo ao qual deveríamos nos agarrar. Ela provavelmente não teria mais uma semana sequer de vida sem que fizéssemos algo.
fechou os olhos, afetado por aquela história que acabara por presenciar enquanto namoravam. Lembrava-se do desespero de ao admitir que não sabia o que fazer. Ninguém sabia. Ele só conseguia imaginar a dor daquela mãe, disposta a entregar a própria filha para um procedimento teste sem expectativa de resultados em troca de uma fagulha de esperança que fosse.
- Como foi?
- Foi um dos momentos mais tensos de toda a minha carreira e, possivelmente, de toda a minha vida também. Depois da minha primeira cirurgia, não pensei que veria minha mão tremer ao segurar o bisturi novamente. Nunca estive tão nervosa como naquele instante. Por sorte, Deus, destino ou mérito nosso, deu tudo certo. Holly se recuperou após a cirurgia um tanto mais rápido do que esperávamos em nossas projeções mais otimistas. Meus professores e colegas de trabalho mais experientes sempre disseram que cedo ou tarde encontramos na carreira um paciente que nos afeta diretamente e nos marca como nenhum outro seria capaz de fazer. Holly foi a minha, sem sombra de dúvidas.
O rapaz sorriu verdadeiramente, buscando a mão de . A mulher retirou seus dedos do alcance rapidamente quando percebeu a intenção do ex-namorado. Não queria se deixar levar pelo calor de seu toque ou a textura conhecida de sua pele. Não tinha confiança em sua própria força para evitar uma recaída perto daquele que tanto amou.
- Perdão - ele pediu, visivelmente envergonhado. - Ainda não me acostumei com esse distanciamento.
- Tudo bem - ela respondeu simplesmente e, sem quaisquer outras palavras ou reações, voltou a abrir o seu livro, declarando a conversa por encerrada.
suspirou, frustrado. Cada vez que parecia estar conseguindo se reaproximar dela, ela conseguia escapar para ainda mais longe. Era cansativo e destrutivo, mas ele não conseguia simplesmente dar as costas e seguir em frente de vez. O que podia fazer, no entanto, era retornar ao seu quarto e evitar que olhares curiosos vissem sua situação e passassem a cochichar pelos cantos sobre o quão idiota ele era.

*****


Aportaram em uma cidadezinha litorânea na qual o foco total da população e da economia era o turismo e o comércio voltado aos viajantes que desembarcavam em suas paradas no porto. Várias lojinhas permeavam o local, sendo a maioria delas voltadas para atividades artesanais. adorava aquelas coisinhas. Ficava boquiaberta com a destreza e o talento manual daqueles trabalhadores. Mesmo sabendo da precisão que ela mesma tinha que praticar como cirurgiã pediátrica, ainda ficava encantada com os detalhes daquela arte. Queria ter desenvolvido algum dom desses ao longo de sua vida, mas o fato era que suas mãos sequer sabiam segurar um lápis direito. Era uma exímia profissional ao segurar um bisturi, mas mal sabia desenhar um boneco palito com mínima simetria.
Experimentara ao menos uma dúzia de brincos antes de escolher um par adornado por pedras azuis ovaladas encrustada a detalhes em tons de turquesa e verde. De alguma forma, eles pareciam ter realçado o seu olhar. Ou era só uma lábia muito convincente da vendedora.
Estendeu seu cartão de crédito para a vendedora super comunicativa, segurando o pequeno embrulho florido com sua mais nova aquisição entre os dedos.
A comerciante tentou uma, duas, três vezes. A máquina simplesmente não encontrava sinal na área.
- Ah - murmurou meio decepcionada. - Tudo bem. Fica para uma próxima vez. Não trouxe dinheiro além do cartão.
A vendedora olhou para a outra mulher com um semblante que parecia quase que pedir desculpas, mas estava mesmo era decepcionada por não conseguir sua venda e, por consequência, sua comissão.
- Aqui - a voz masculina pronunciou atrás das duas.
estendeu algumas notas, recebendo o olhar agradecido da comerciante e um contorcer confuso de sobrancelhas vindo de .
Saíram da loja e caminharam juntos até um quiosque de alimentação próximo, pedindo dois sucos de abacaxi com o dobro de gelo para tentar suportar aquele sol escaldante que queimava seus couros cabeludos.
Sentaram-se em uma mesa para seis pessoas, escolhendo cadeiras totalmente opostas. não queria aquela proximidade e não queria contrariá-la ou parecer invasivo ou mesmo insistente.
- Por que fez isso? - tomou a iniciativa de quebrar o silêncio.
- Porque eu queria ajudar. Fala sério, não é como se eu fosse morrer de fome por te pagar um par de brincos feitos à mão.
- Eu não quero que você fique alimentando algo que não existe mais entre nós, .
- Não estou alimentando nada. Você adorou os brincos e não tinha dinheiro vivo na hora. Pelo amor de Deus, você precisa parar de ser tão paranóica. Foi só um gesto de consideração. É o mínimo que eu posso fazer para quem dividiu os últimos anos da vida comigo. Não precisa se martirizar e nem tentar me odiar menos por isso. Eu não fiz isso pensando em ganhar algo em retorno.
- Desculpa. Eu ainda estou tentando me acostumar com tudo isso e retornar a erguer minha redoma intocável. Não te odeio, , e nem poderia. Mas você sabe como eu detesto ter que sentir.
O rapaz respirou fundo, passando as mãos pelos cabelos de forma nervosa. Aquela inquietação descabida que tomava conta de seu corpo estava lhe causando uma profunda irritação.
Eu vou te deixar em paz. Não quero mais te atrapalhar.
E ao dizer isso, deu as costas para ela, decidido a deixar aquilo para trás de vez.

*****


Outra festa acontecia no convés principal do navio. ainda carregava sob os olhos cansados as marcas escuras da noite mal dormida. Nem toda a maquiagem do mundo conseguiria esconder o sono que sentia. Era como se seu corpo estivesse praticamente em transe. Escolhera uma sandália sem salto pelo receio de se desequilibrar. Ao menos os sapatos ficaram incríveis com o vestido azul claro soltinho de mangas bordadas.
A decoração do ambiente fora cuidadosamente escolhida entre objetos que variavam do branco ao dourado, lembrando um pouco um réveillon - muito - antecipado. A pista de dança abrigava principalmente casais que se adequavam melhor àquelas músicas lentas que chegavam até a dar certa tristeza na mulher. Só não voltava para o quarto porque o isolamento era ainda mais deprimente e ainda tinha esperanças de que o buffet compensasse aquilo tudo. Riu sozinha ao perceber que suas últimas esperanças literalmente eram relacionadas a comida àquela altura do campeonato.
Conversou um pouco com uma criança de uns sete anos que tinha se sentado ao seu lado, observando enquanto os pais dançavam suavemente na pista.
Você é casada também? - A pequena perguntou, com os olhinhos brilhando enquanto balançava as curtas pernas que ainda não alcançavam o chão ao se sentar na cadeira branca.
- Não. Eu não tenho ninguém. - tentou sorrir.
- Que pena! Você é uma moça tão bonita! Minha mamãe diz que a gente precisa se amar para que alguém ame a gente.
- Sua mãe tem razão, linda. Mas ela também devia te dizer que a gente pode ser feliz sozinho.
- Mas você parece tão triste - a menina avaliou.
respirou fundo, sorrindo ao pensar como os pequenos sempre acabavam a surpreendendo com a sua inteligência e a capacidade de decifrar o que os adultos sentiam quando eles mesmos não queriam admitir isso.
- Eu estou triste porque eu tinha alguém que eu amava muito e que me amava muito também. Eu perdi essa pessoa e a minha tristeza é na verdade saudade. Eu sou feliz comigo, mas sinto falta dele. Quando a gente se completa, encontra alguém que nos transborde.
Então você era feliz, mas com ele era muito feliz - a pequena concluiu, arrancando um sorriso de .
- Isso mesmo, linda.
- Volta com ele. Ser muito feliz é muito bom.
Os pais chamaram a criança para dançar. Ela saiu correndo sem sequer se despedir de , que apenas permaneceu ali sentada, brincando com os próprios anéis coloridos. O tempo não passava, mas pesava.
Assustou-se ao captar a imagem de encostado às grades do navio, com um copo de whisky nas mãos. Ele só tomava aquilo quando precisava fugir de si mesmo. Estranhou a cena, sentindo o coração apertar. Ele tinha o rosto perdido, sem qualquer resquício de luz ou mesmo uma reação. Provavelmente, já havia bebido demais. Ela engoliu em seco. Eram tão felizes, por que tudo aquilo acontecera afinal? Mal sabiam explicar o porquê de tudo ter desmoronado.

It feels like we've been out at sea, whoa
(Parece que estamos no mar)
So back and forth that's how it seems, whoa
(No vai e vem, é o que parece)
And when I wanna talk you say to me
(E quando eu quero falar você me diz)
That if it's meant to be it will be
(Que se for para ser, será)
Whoa oh no
(Oh, não)
So crazy is this thing we call love
(Tão louca é essa coisa que chamamos de amor)
And now that we've got it we just can't give up
(E agora que a conseguimos, não podemos desistir)
I'm reaching out for you
(Estou tentando chegar até você)
Got me out here in the water
(Me deixou aqui na água)
And I
(E eu)


Continuou observando enquanto ele tomava o último gole da bebida forte, inclinando-se para deixar o copo sobre uma pequena mesa posicionada perto de onde ele se encontrava. Queria correr até ele, segurá-lo em seus braços e dizer que se arrependia de todas as brigas. Queria dizer que poderiam tentar mais uma vez. Queria gritar a Éolo, Bóreas, Zéfiro, Euro e Noto que ainda havia chance de recuperar tudo aquilo que construíram juntos. Não era o fim. Não precisava ser. Não podia ser.
Foi então que a cena mudou bruscamente, com uma movimentação estranha: começava a cambalear, tentando se segurar às grades. Quando as pessoas ao redor perceberam o que poderia vir a acontecer já era tarde demais. O rapaz havia caído na água e um tumulto se formara, permeado por gritos que pediam ajuda e socorro ao homem caído no mar.

I'm overboard
(Eu estou ao mar)
And I need your love
(E preciso do seu amor)
Pull me up
(Me traga para cima)
I can't swim on my own
(Não consigo nadar sozinho)
It's too much
(É demais)
Feels like I'm drowning without your love
(Sinto como se estivesse me afogando sem seu amor)
So throw yourself out to me
(Então se atire a mim)
My lifesaver
(Minha salva-vidas)

- Meu Deus, ele não sabe nadar - gritou em desespero enquanto abria caminho a cotoveladas pela multidão que observava atônita sem tomar qualquer iniciativa.
Percebeu que alguns funcionários começavam a se movimentar, buscando botes e cordas. Mas ela não podia esperar. se atirou ao mar, determinada a salvar .
A água estava tão fria que seu queixo começou a bater instantaneamente. O impacto pela altura da queda não lhe machucara. Estava mais forte, mais resistente e mais determinada. Agradecia à mãe-natureza pela maravilhosa adrenalina que corria por suas veias naquele momento.
Puxou pela gola de sua blusa, mantendo a cabeça desacordada do rapaz acima das ondas. Ele ainda estava respirando, mas precisaria ser retirado daquela água fria logo. Os dois precisavam.
Um bote preso a cordas foi colocado na água. Ela o empurrou até a pequena embarcação, subindo logo em seguida. O vento que encostava em suas roupas molhadas deixava as mesmas ainda mais geladas. Ela tremia. Por frio e por medo.
Uma mulher entregou várias toalhas para , enquanto um rapaz enrolava em um grande cobertor e o levava para a enfermaria.
- Tem alguém de plantão? - perguntou, torcendo os cabelos e a barra do vestido.
- Não. O médico a bordo acabou desembarcando na última parada por alguns problemas pessoais - um dos homens da tripulação alertou, percebendo o grande problema que o S.S.Lincoln enfrentaria se um caso daqueles terminasse de forma fatal em suas mãos.
- Então eu vou - a mulher decidiu, andando rapidamente atrás do homem que carregava seu amor para longe de si.
Fez sinais para que deixassem repousar sobre a maca, cobrindo-o com mais uma manta térmica. Pediu espaço para trabalhar. Ergueu um pouco o ângulo das pernas dele, repousando a cabeça de lado em uma superfície macia e mais baixa. Afrouxou suas roupas, tentando liberar sua respiração.
- Pelo amor de tudo que há de mais sagrado nesse mundo, você não pode me deixar agora - murmurou, chorando, enquanto tentava arejar o ambiente e arrumá-lo da forma mais correta possível.
Sentou-se ao lado da maca, agarrando a mão de entre as suas. Apertava os dedos do rapaz, encostando-os a seus lábios em um sinal de completo desespero. Internamente, desejava poder trocar de lugar com ele. Implorava a qualquer tipo de divindade que existisse por um sinal de que ele ficaria bom. Aquilo não era justo. Depois de tudo pelo que passaram, o final da história deles não podia ser esse. Ele era bom demais e tinha um futuro inteiro pela frente. Era um homem bom, um ótimo filho, um excelente profissional, um amigo maravilhoso e, com certeza, um companheiro incrível para dividir a vida. Aquele não podia ser o fim.
- Você não pode me deixar agora. Não pode, não pode, não pode. - As lágrimas corriam livremente pelo rosto dela, como se estivessem apostando corrida entre si pelas curvas de seu rosto e de seu pescoço. - Eu não posso perder você.
- Claro que pode. Você nem quer ver meu rosto - respondeu, com a voz totalmente rouca.
se sobressaltou, levantando o rosto bruscamente para encontrar os olhos dele encarando os dela. O rosto dele estava pálido como se tivesse sido coberto uma folha de papel, mas ao menos ele sorria. E aquele sorriso nunca tinha sido tão reconfortante como naquele momento.
- Nunca mais me assuste desse jeito - ela reclamou, secando o rosto para retomar a sua típica pose de força inabalável. Em questão de segundos, estava na mesma posição impassível por exceção dos olhos ainda inchados pelo choro recente. O rapaz riu ao perceber que independentemente da situação, ela continuava sempre a mesma: sua .
- Quer dizer que agora você sente a minha falta?
- Cala a boca. - Ela riu, dando um empurrão de leve no braço dele. - Se você continuar com essa gracinha, eu saio por essa porta agora e te jogo de volta ao mar. Espero que isso sirva de lição para que você aprenda a nadar de uma vez por todas.
- Para quê? Tenho minha salva-vidas, não preciso me dar a esse trabalho.
revirou os olhos, rindo de como ele podia ser bobo mesmo após aquele choque.
Será que agora você pode me dar um beijo? - Ele pediu. - É para esquentar, sabe? A água estava absurdamente gelada.
A mulher se inclinou, depositando um beijo suave nos lábios do rapaz. Afastou-se dele enquanto embrenhava os dedos pelos fios de seus cabelos.
- Quer dizer que estamos juntos de novo? - Ele perguntou, ainda com aquele sorriso no rosto.
- Quer dizer que depois conversamos. Agora, descanse. Não pretendo tomar outros sustos por hoje.
- Pode ficar tranquila, meu amor. Não pretendo enfrentar a morte novamente por um bom tempo. E também não pretendo sumir agora que aparentemente eu ganhei outra chance.
Sorriram um para o outro, tendo a certeza de que naquele acordo silencioso, haviam acabado de decidir dar mais uma chance ao grande amor que cultivaram por anos e que não havia secado em meio ao jardim que plantaram. Afinal, água era algo que jamais faltaria para aquelas plantas, fosse literal ou metaforicamente.




FIM



Nota da autora: Eu sei que está curtinho, mas sinto que qualquer coisa que eu acrescentasse transformaria a história desses dois em um drama cíclico que não chegaria a lugar algum. Enfim, só espero que vocês não me odeiem muito depois disso e deixem um comentáriozinho se chegaram até aqui hahaha.
Para mais informações sobre minhas histórias, entrem no grupo.









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