Postado: 05/10/2017

Capítulo Único

— Eu assinei com o Alavés, parto em duas semanas para Vitoria.
A expressão de Enzo era séria, seus olhos focados na feição de . Se ele tinha certeza de alguma coisa naquele momento, era de que não se arrependeria de sua decisão profissional.
— Fugindo, Enzo?
Sentada ao lado de Enzo, parecia relaxada. Como se tivesse um poder especial a respeito de Enzo, a moça lia suas atitudes de uma maneira que ele não conseguia compreender totalmente. Mesmo que Enzo se negasse a acreditar que era tão transparente quanto costumava pintá-lo, ele sabia que não conseguiria esconder da amiga nem sequer um alfinete.
— Fugindo do quê, ? Não é como se eu fosse ficar no Real para sempre, você sabe disso.
Virando-se para a moça, Enzo pôde vê-la revirar seus olhos em uma demonstração de seu desacordo com o que havia sido dito. Se parcial ou totalmente, ele não poderia dizer.
— Você sabe que é verdade, !
— Por favor, você sequer acredita no que está dizendo?
, eu preciso me destacar.
parou sua mão, cheia de pipocas que iam de encontro à sua boca, e levantou sua cabeça, olhando diretamente para o jogador.
— Precisa sim, concordo — a moça parou por um instante, como se refletisse se realmente deveria dizer as palavras que pareciam entaladas em sua garganta. Quando abriu seus lábios novamente, pareceu ter certeza de que não deveria esconder nada do que pensava.
— Ir para Vitoria não vai mudar os fatos. Você fez isso com você, precisa aprender a sair da sua zona de conforto, Enzo. Enfrentar as consequências.
Respirando profundamente, Enzo deu de ombros, preferindo ignorar aquelas palavras. Ele teria de lidar com elas em algum momento, mas não naquele. tinha a habilidade de transformar quase tudo em uma grande coisa. Ele não estava disposto a discutir suas atitudes com ela. Ele teria três lindas temporadas para deixar tudo para trás, não precisaria lidar com a mulher que o envolvera em sua teia de sedução, nem com o homem que ela namorava. Em Álaves, ele seria unicamente Enzo Fernandez, sem bagagem, sem preocupações e o melhor: sem problemas.

Se perguntassem a quando ela se descobrira tendo sentimentos por Enzo Fernandez, ela não saberia dizer ao certo. Porém, ela poderia dizer quando descobrira que todas aquelas sensações iam muito além do que as sensações causadas por um adorável amigo. Era amor em toda a extensão da de seu significado, amor em cada pequena e dolorosa partícula de seu corpo. Em seu fixo posto de melhor amiga, podia ver os romances cada vez mais destrutivos que Enzo parecia adentrar. Sabia que a rotatividade se devia às dúvidas. Essa não era a parte da situação que a entristecia; o que mais a machucava era saber que, mesmo que a fila andasse muito mais do que Enzo sequer poderia imaginar, ela jamais ocuparia aquele tipo de posto. Ela via cada uma das mulheres que passavam por sua vida e sabia que nunca ocuparia por nenhum segundo o lugar que qualquer uma delas deixaria. Ela era , a pequena e intrometida . A moleca sabichona que o ajudava com os deveres, que se intrometia em cada um de seus assuntos. Não era como se ela houvesse planejado ter aqueles sentimentos, e o bom Deus sabia o quanto ela lutava para chutá-los para fora, já que obviamente nunca conseguiria nenhum gol na rede que demarcava o centro do coração daquele ser humano. O amor era uma droga necessária, mas amor unilateral era como um tiro no pé. Sentada em sua cama, ela remoía as palavras ditas por ele na noite anterior. Nem que ela ficasse em sua cabeça por horas e horas aquela decisão seria revogada. Ele tomara aquela decisão como uma premissa de como seria sua carreira dali em diante. Enzo era bom no que fazia, mas havia muitos jogadores bons mundo a fora. Ele teria de mostrar que estava muito além do que seu sobrenome poderia evocar. Ela entendia aquilo, ou melhor, sua mente entendia. Mas seu coração? Era como se alguém o estivesse espremendo e espremendo, de uma maneira que ela já não conseguia bater de maneira compassada. Soltando um suspiro, se jogou para trás. Ela não sabia como, no entanto teria de dar um jeito naquele sentimento. Três horas era um longo tempo a percorrer para se fazer uma visita e o pior: amizades geralmente não sobreviviam àquele tipo de amor que ela sentia. Mordeu seu lábio inferior e puxou a coberta para que essa pudesse cobrir seu corpo. Ela decidiria como resolver seus problemas, mas não naquele momento, não naquele dia.

— Uou, parece que agora é oficial, então.
Parada à porta do quarto, observava o cômodo quase vazio. Duas malas cheias de roupa se posicionavam à esquerda da porta, alguns dos enfeites se encontravam em caixas, videogame e TV de plasma pareciam nunca ter estado ali.
— Olha só quem resolveu aparecer? — disse Enzo, puxando a moça para um abraço. Após o anúncio de sua mudança, as coisas pareceram ocorrer rápidas demais. Veronique havia encontrado um apartamento para que ele ficasse, móveis haviam sido comprados, sua TV, despachada e, então, ele escolhera o carro que levaria consigo. As roupas foram parar em malas, os enfeites, em caixas. Sua apresentação oficial foi feita, e havia praticamente sumido no processo. Ele entendia, claro que entendia que ela tinha milhares de coisas a finalizar na faculdade. Era seu último ano, no final das contas, ele a vira ficar mais louca com sua apresentação final do que com o ingresso que a presenteara no dia de seu aniversário.
— Que horas você vai? — a moça se livrou de seus braços, se jogando em sua cama, algo muito próprio dela.
— Você tem ideia do que eu fiz nesses lençóis? — provocou Enzo, vendo a careta que se formava na face da garota.
— Você não é nem louco de trazer mulher para cá. Tia Veronique nunca permitiria isso — retrucou após pensar por alguns instantes, pouco antes de puxar o travesseiro para seu colo. — Toda vez que venho aqui me sinto de volta ao colégio, todas aquelas noites que tive que te ajudar para que você não reprovasse em alguma matéria — murmurou , olhando para as fotos que preenchiam o espaço de sua mesinha de cabeceira.
— Já eu me lembro de todas as vezes que tive que te chutar daqui para poder ficar com uma garota legal. Você nunca se tocava — resmungou, puxando o travesseiro das pernas de e colocando-o sob seu próprio colo. — Você sabe que vamos nos ver tipo sempre, não é? Dona Veronique não vai deixar que eu fique por lá por mais tempo do que ela possa suportar — ele viu sua careta se transformar em uma gargalhada. tinha uma boa risada. A risada dela conseguia despertar a dele. E, claro, também tinha a capacidade de enervá-lo.
— Enz — murmurou .
— Eu sei, eu sei. Nada de exagero, nada de escândalos, nada de se envolver com as namoradas dos caras do time e blá, blá, blá — resmungou o jogador, vendo quando os olhos da moça se reviraram.
— É, tipo isso — resmungou , se impulsionando para fora da cama antes de voltar a falar. — Eu vim me despedir, você vai ter muito trabalho pela frente, literalmente. Se cuida, não quero ouvir falar de nenhuma lesão nos próximos três anos. E Enz? — deu uma pausa antes de se aproximar, erguendo o rosto de Enzo para que esse ficasse na altura que ela desejava. — Você é muito melhor do que pensa — deu um beijo em sua testa e virou as costas, mas, antes que ela pudesse pensar em sair do quarto, o jogador a puxou para um abraço.
— Apoio incondicional, lembra? — sussurrou no ouvido da moça, lembrando-a da promessa há muito feita.
— Certamente. Espero você sentado naquela mesinha com a minha foto no final do ano. Estarei lá quando for sua vez de brilhar — passou os braços pela cintura de Enzo e se recostou em seu peito. Ficaram daquela forma por um tempo, um silêncio quase absoluto, apenas suas respirações podiam ser ouvidas. Enzo não tinha o que dizer, tinha coisas demais a dizer, mas sabia que aquele não era momento, nem o lugar.
— Olha só que bonitinhos, só não tiro uma foto porque talvez eu vomite antes disso. Eca, Enzo, tanto gata por aí e você fica agarrando a ? Quesito caindo, hein — a voz de Theo se fez presente, com todo o nojinho característico dos quinze anos. O garoto bateu a porta e saiu correndo assim que percebeu que não deixaria aquele comentário passar. A moça se livrou de Enzo e correu em direção à porta.
— Moleque, volta aqui! — gritou, correndo pelo corredor, enquanto a risada de Enzo podia ser ouvida do quarto.
! Você é mais madura que isso — gritou antes de sair atrás das duas crianças.
— Madura uma ova — gritou a moça da onde estava. Quando os encontrou, um Theo se contorcia de tanto gargalhar enquanto uma fazia cosquinhas em sua barriga.
— Você vai me matar — reclamou o garoto em meio às gargalhadas.
Da porta, Veronique observava a cena em silêncio, ao passo em que pedia para Enzo fazer o mesmo. tinha aquela capacidade de transformar seus filhos em crianças, uma característica que Veronique apreciava. Suas crianças estavam crescendo rápido demais, ela não gostava daquilo.
— Deixe a criança respirar, — interferiu após alguns minutos, se aproximando dos dois. A moça adquiriu uma coloração avermelhada em sua bochecha, se afastando rápido demais, o que a fez se chocar contra Enzo, que se aproximara furtivamente.
— Até porque agora é nossa vez. Agora, Enzo! — anunciou Veronique, atacando o filho mais novo enquanto seu mais velho atacava . As gargalhadas eram tão gostosas de se ouvir, que Zizou se deixou ficar em silêncio, observando a cena que se desenrolava em sua sala. Uma despedida muito mais que favorável, antes que Enzo entrasse naquele carro e eles dirigissem por três horas antes de chegarem ao seu destino.

— E o que isso significa? Você não vai chegar a tempo? — sentada na cadeira giratória, levantou sua mão, impedindo que uma camada de pó fosse aplicada em seu rosto. Aquele era seu grande dia, ela não deveria estar atendendo aquele telefonema e estragando tudo.
— Aconteceram imprevistos por aqui. Deise está no hospital, não posso deixá-la aqui sozinha — a voz de Enzo parecia esboçar pesar, e talvez, de fato, ele se sentisse mal por não poder chegar a tempo. Mas tudo o que conseguia entender foi: não vou, Deise vem primeiro. Maldita Deise.
— Não é como se ela não tivesse pais, não é? — questionou, utilizando de toda sua calma para não gritar com ele.
, você está sendo egoísta. Ela é minha garota. Você não deixa sua garota sozinha no hospital e vai a uma maldita festa a quilômetros de distância — o pesar parecia ter se transformado em uma espécie de indignação, como se ela fosse a errada da situação.
— Eu? Maldita festa? Não é como se eu tivesse passado um maldito mês na faculdade para ter essa festa, Enzo. A única coisa que eu te pedi nesses últimos seis meses foi para que viesse pra droga da minha formatura! Deise? Você e ela que se explodam — rosnou antes de finalizar a ligação.
Respirou profundamente algumas vezes, antes de assentir para que a moça finalizasse sua maquiagem. Não iria chorar, não naquele dia tão importante. Enzo e sua garota que se explodissem juntos em qualquer lugar que fosse. Ela tinha um discurso a fazer, uma dança a dançar. E não precisaria dele para nenhuma daquelas coisas. Desligou o celular e focou em repetir em sua mente as palavras que teria de dizer a todos os seus colegas dali a pouco mais de uma hora.

Pela dácima vez, Enzo tentava fazer com que ela atendesse. Não era como se ele quisesse tê-la chamado de egoísta. Droga, ele sabia que ela não era. Ele só queria que ela entendesse que tinha muito mais coisa em jogo do que aquilo. Deise precisava dele de uma forma que não precisava. Eles eram amigos, ela deveria entender. Deise era diferente para ele, talvez ele não pudesse dizer que a amava, mas definitivamente tinha alguma fagulha ali.
— Alguma coisa errada, Enzo? — Deise parecia preocupada com ele, seus lindos olhos azuis se focavam em sua expressão.
— Não, tudo certo — tocou a passagem em seu bolso,antes de colocar o celular junto a ela. Ele não iria a lugar nenhum naquela noite. atenderia em algum momento. Caso contrário, Luca a faria atendê-lo de alguma maneira. Sorriu para Deise e se sentou na cadeira ao seu lado.

subiu as escadas com cuidado, segurando a barra de seu vestido. Agradeceu a docente e tomou seu lugar. Ajeitou o microfone para que ficasse a altura de seus lábios e procurou por sua família em meio a multidão. Sorriu para os , que se uniam aos Zidane naquela noite, antes de dar início a seu discurso.
— Hoje é o primeiro dia de nossas vidas. Até aqui, a única coisa que tivemos que nos preocupar foram as nossas notas. A partir de hoje, nos tornamos responsáveis por algo muito além disso. Enxugamos lágrimas, precisamos de ombros para chorar. Sorrimos por motivos bobos, gargalhamos de nervosismos. Agradeço imensamente a todos que participaram de nossa jornada e peço que mantenham seus braços abertos para nos ajudar a passar por essa nova etapa que bate em nessa porta. Hoje, estamos dando o primeiro passo para o mundo. É o momento de viver intensamente. Como eu disse, esse é o primeiro dia de nossas vidas. Então, galera, vamos viver e, acima de tudo, vamos dançar. Solta o som, DJ — finalizou fazendo com que uma gargalhada geral se espalhasse pelo salão, ao que o DJ respondeu prontamente dando início à batida da primeira dança. Correndo até sua mesa, puxou seus pais para a pista, em seguida voltando para puxar Zinedine e Veronique. Até Luca entrou na brincadeira, sendo girado pela moça.
— Sem lágrimas essa noite? — questionou o rapaz, apontando para a cadeira que não havia sido ocupada.
— Lágrimas? Luca, esse é o primeiro dia da minha vida, você acha mesmo que eu vou passá-lo chorando? — replicou, dando um sorriso antes de Luca girá-la, se movimentando na batida da música.
— Ele vai se arrepender, — sussurrou o rapaz, puxando a moça para mais perto.
— Luca, não hoje, tudo bem? Nesse momento eu quero me esquecer que ele existe. Agora, dança e fica quieto, ou cai fora — finalizou, soltando suas mãos da do rapaz, que a puxou de volta para si, um acordo silencioso de que respeitaria sua decisão.

Entretanto, uma noite se transformou em quinze dias, quinze dias em um mês. Um mês em dois e, logo, se completavam três meses. Enzo sentia o impacto de ter magoado sua melhor amiga. Ligações ignoradas, Instagram sem nenhuma atualização. Silêncio quase absoluto. A não ser por Luca, ele a marcava esporadicamente em alguma foto. Mas aquilo não o satisfazia, não mais. Deise havia partido assim como chegara, rápido demais. Sua carreira exigia tal coisa, não era amor entre eles. Apenas um desejo aplacado após quase cinco meses juntos. E então ele ganhara o fim de semana livre. Era o momento de voltar para casa, momento de se desculpar com . Droga, ele perdera um dos momentos mais importantes da vida dela. Ele prometera estar lá e não estivera. Óbvio que ela estaria fula da vida com ele.

Nunca em sua vida se imaginara tão atolada de trabalho. Ela não tinha nem ideia de por qual pilha iria começar. Eram tantos manuscritos para serem analisados, que ela acreditava que mesmo que passasse o resto da semana trancada em seu quarto, não conseguiria terminar. Talvez aquele fosse o contra de se trabalhar em casa: era como se ela trabalhasse vinte e quatro horas por dia. Finalizou as anotações no manuscrito em sua mão e o fechou, colocando-o no canto da mesa. Suas costas doíam, suas mãos se movimentavam de um jeito estranho e seu estômago pedia comida ruidosamente.
— Parece que alguém está com fome — se virou para a porta, ajeitando seus óculos de leitura. — Oferta de paz? — murmurou Enzo, mostrando as sacolas em sua mão.
O logo da pizzaria favorita de estava bem visível ao centro. A moça deu de ombros e se virou novamente para seu trabalho, ouvi-o caminhar pelo corredor antes de soltar sua respiração. Não era como se seu coração compreendesse a extensão da traição que ele havia feito como sua mente compreendia. Então, era entendível que ele batesse mais forte ao sentir o cheiro daquele homem. respirou profundamente, tentando se controlar antes de puxar um novo manuscrito da pilha. A leitura teria de acalmá-la, sempre a acalmava. Em pouco tempo, Enzo voltava com pratos e talheres, colocando tudo na mesinha que a mãe a obrigara a ter no quarto. Abandonando o manuscrito na mesa, ocupou a cadeira à frente de Enzo, puxando o primeiro pedaço da caixa. Comeu-o com o prazer de um morador de rua com sua primeira refeição da semana. Não falaram durante a refeição. A caixa já estava vazia, quando voltou a se sentar em sua cadeira giratória.

Enzo limpou a sujeira que haviam feito, antes de se sentar na cama da moça. O silêncio era algo estranho a ele, principalmente aquele estranho silêncio desconfortável. Uma caixa acima da cama chamou a atenção do jogador. Puxou a caixa para si e focou seus olhos nas costas de .
— Posso abrir? — questionou, observando-a se virar para ver ao que ele se referia. Ela assentiu positivamente antes de focar novamente no livro em suas mãos. — O que é? — questionou antes de abrir a caixa.
— Álbum de formatura — respondeu a moça, fazendo com que o interesse de Enzo se dissolvesse. Ele sabia que não havia sido intencional, mas era como se ela houvesse jogado água fria nele.
... — começou, esperando que ela se virasse para ele, mas ela não o fez. Respirou profundamente e tentou novamente. — ? — mais uma vez não obteve resposta. Levantou-se da cama e se aproximou da cadeira, a girando para que a moça ficasse de frente para ele. — Me desculpa. Droga, eu fui um maldito otário. Eu deveria ter chamado os pais da Deise e vindo aqui, participado da sua festa. Me desculpa, me desculpa. Se você quiser, eu me ajoelho aqui e agora, faço qualquer coisa que você quiser. É só dizer. Eu voltaria no tempo se pudesse, mas eu não posso — a feição de era uma folha em branco para ele. Era como se em três meses muitas coisas houvessem mudado.
— Se você pudesse voltar no tempo, Enzo, você faria a mesma coisa de novo. Afinal, é você, você sente muito, mas aposto que não se arrepende. Para você, fez todo o sentido não ter vindo, ter colocado uma prioridade acima da minha formatura — Enzo se preparava para interrompê-la quando a moça levantou uma das mãos, indicando que não havia finalizado. — Eu sou sua amiga. A droga da sua amiga há mais tempo do que qualquer outra pessoa, mas a sua garota vem antes. Eu te conheço, Enzo — anunciou, dando uma pausa antes de continuar. — Te conheço e, por te conhecer, eu vou deixar passar. Não vou esquecer, não perdoei totalmente, mas vou — Enzo mal esperou que finalizasse antes de puxá-la para seus braços. O cheiro de seu perfume impregnou suas narinas, seus cabelos sedosos receberam um carinho de suas mãos.
— Eu senti sua falta, — anunciou e apertou ainda mais a cintura da moça.
— Pena que não senti a sua — provocou , ganhando um beliscão na cintura. — O quê? Luca te substituiu muito bem nesses meses. Sério, posso até adotá-lo como melhor amigo de agora em diante — provocou novamente, tendo seus cabelos desarrumados no processo.
— O segundo projeto não pode suprir o primeiro. Aceita que seu melhor amigo sou eu — anunciou Enzo, apertando a bochecha de . Eles estavam bem, Enzo agradecia por aquilo.

Quando aceitara assistir aquele jogo, ela nunca imaginara que poderia ficar tão irritada no processo. Ela não entendia nem metade do que acontecia em campo, mas podia ver claramente que Enzo não se sentia muito bem. A careta de dor que ele fazia todas as vezes que seu pé tocava o chão era um indício bem claro de uma bela lesão. E de lesões ela entendia. Theo costumava listá-las com uma animação irritante. E, nos últimos meses, ele parecia sentir um extenso prazer em passar algum tempo em sua casa. Isso possivelmente envolvia sua vizinha adolescente. Mordendo o lábio inferior, ela observava o passar do jogo. O apito que indicava o final trazia consigo um resultado favorável e um Enzo sendo atendido pelos paramédicos. Ela viu quando Veronique correu para fora da cabine VIP, indo em busca de notícias do filho. Logo se viu sob a companhia de Theo e Elyaz enquanto Zinedine corria atrás da esposa. Tudo em câmera lenta, até que as notícias se assentaram. Ele havia lesionado o joelho, passaria por uma cirurgia e ficaria cerca de um mês em recuperação antes de voltar aos campos. Conhecendo-o como conhecia, ela tinha certeza de que ele não teria a melhor das reações.

Ele não viu muito bem o que havia acontecido, mal se lembrava do atendimento médico. Porém ele se lembrava da sala de cirurgia, de seus pais olhando para ele preocupados enquanto discutiam sobre quem iria ficar. Os meninos precisavam voltar, a escola começaria na manhã seguinte. Seu pai teria de viajar na manhã seguinte, sua mãe não poderia deixar os meninos sozinhos, mas se negava a deixá-lo sozinho. E, então, entrara no meio, se oferecendo para ser sua guardiã. Eles confiavam nela. Em poucas horas, tudo havia sido ajeitado. Ele estava em seu próprio quarto, e ocupava o quarto vizinho. Suas chaves haviam sido confiscadas, alguém trocara a senha de sua TV.
— Você vai mesmo ser esse bebê chorão? — Sentada na poltrona à esquerda do sofá, mexia em seu celular, mandado mensagens para alguém. Enzo não se surpreenderia se fosse sua mãe. Elas pareciam se falar o dia todo.
— Bebê chorão? Você tem noção que eu vou perder o fim dessa temporada? , eu passei meses a fio dando o melhor de mim para isso? Não é justo! — reclamou, jogando o controle na mesinha de centro.
— Muito maduro da sua parte, não é? Faltam dois jogos, Enzo, dois. Você só vai precisar de um mês de recuperação. Já pensou se fosse pior? Pode ir parando com a autopiedade, luta para acelerar essa recuperação e arrasar na próxima temporada — a moça falava sério, deixando o celular de lado antes de ir para sua cozinha. Não demorou muito para que ela voltasse com seu jantar. — Come todos os legumes, sua fisioterapeuta disse que vão ajudar na sua recuperação. E Enzo? Sem essas reclamaçõezinhas desnecessárias. O Ibai vai levar três meses para voltar ao campo — deu a tacada final, fazendo com que Enzo se afundasse no sofá antes de puxar o garfo. Ele odiava cenouras, mas iria comê-las.

o observava dormir. Se ele pudesse vê-la, a taxaria como uma pessoa maluca, talvez ela o fosse. Entretanto, ele parecia tão sereno e tão agradável que ela poderia beijá-lo. Contudo, obviamente não iria. Enzo estava exausto após o treino daquele dia e, mesmo que ele tivesse prometido que a levaria ao aeroporto, ela não o acordaria para tal. Soltando um suspiro, levou seus lábios a testa dele, deixando um beijo leve ali antes de se afastar.
— ‘Tá ficando cada vez mais difícil, Enz. Será que você não pode, sei lá, ficar mais feio? Mais idiota? Esse coração precisa parar com essa idiotice de bater mais forte perto de você. Estranho, não é? Eu amar você assim. Eu juro que estou tentando, mas ‘tá difícil, muito difícil — mordendo seu lábio inferior, puxou sua mala de rodinhas, deixando o quarto do amigo.
Assim que ouviu o barulho da porta se fechando, Enzo abriu seus olhos. Seu coração disparado, seus lábios entreabertos em surpresa. o amava romanticamente falando, ela realmente o amava. Isso era mais que estranho, ele mal conseguia acreditar no que seus próprios ouvidos haviam escutado. Ele não soube ao certo quanto tempo levou para se acalmar, mas havia passado tempo demais para que ele fosse atrás de qualquer explicação. Ele nem sequer sabia se queria uma explicação.

Havia algo errado, e podia sentir mesmo que Enzo não estivesse dizendo. Ele estava ali, sentado em sua cama como sempre ficava. Porém parecia distante, inquieto. Como se escondesse algo que precisasse muito saber.
— Desembucha — anunciou , girando sua cadeira para ficar de frente para ele. As bochechas de Enzo adquiriram uma tonalidade avermelhada, e seus lábios se fecharam em uma linha reta. Ele respirou fundo algumas vezes procurando pelas palavras certas.
, aquele dia antes de você vir embora. Eu te ouvi — o coração de pareceu parar naquele momento, seus olhos ficaram sem ter para onde olhar, seus lábios abertos em surpresa. — E eu pensei muito, muito mesmo nisso — a moça continuou a olhá-lo, esperando que ele continuasse, esperando que aquilo fosse um pesadelo. Seu despertador tocaria e ela iria acordar. Estaria tudo como ela deixara, Enzo não estaria ali. — Eu não quero te magoar, não mesmo. Mas eu e a Deise estamos juntos de novo. Eu a amo — ela piscou os olhos algumas vezes, absorvendo as palavras que Enzo havia dito.
Ela nem sequer havia tomado coragem para se declarar, mas estava levando um fora. Ninguém poderia ter uma sorte tão grande quanto a sua.
— E eu acho que seria melhor pra todos nós se nós dois ficássemos um tempo sem nos falarmos — finalizou, esperando por uma reação que não veio. Ele sentiu alívio por ela não ter começado a chorar. Ela não saberia como lidar com as lágrimas de , nunca havia aprendido. Os minutos se passaram lentamente, como se quanto mais precisavam de sua rapidez, ele decidisse que daria o contrário. O clima constrangedor fazia com que Enzo sentisse vontade de ir para sua própria casa. Ele estava na porta, pronto para partir, quando ela pareceu recuperar sua voz.
— Boa sorte, Enzo — aquelas três palavras não pareciam ter muito significado naquele momento. Mesmo assim, ele as aceitou, assentiu e partiu.
Se ele tivesse ficado por mais dois minutos, teria visto desabafar em sua cama, suas lágrimas escorrendo por sua face. Ela só não sabia se eram lágrimas de mágoa ou de raiva.

Tempo. Quanto tempo uma pessoa poderia precisar para se acostumar com a ideia de que sua melhor amiga estava apaixonada por ele? não tinha ideia, mas o que poderia dizer era que o tempo de Enzo era bem mais do que ela poderia imaginar ser possível. Ele não atendia suas ligações, assim como ela não atendera as dele um dia. Mas ela sabia que ele e Deise estavam bem, ela vira mais fotos escandalosas do que gostaria de ter visto. Então, ela se cansou de dar um tempo. Dois meses eram muito mais do que ela gostaria de ter dado. Ela fez sua mala e partiu para Vitoria, e nunca se arrependeu tanto de algo como aquilo. Ela tinha uma chave do apartamento dele. Ele estava no treino, mas Deise, a nobre Deise, tinha um plano diferente daquele que denotava apenas esperar. Ela tinha companhia masculina e movimentos muito explícitos em pleno sofá. É claro que ela tinha de contar a ele. Ele era a droga de seu melhor amigo. E, então, ela esperou, e ele chegou. Deise foi a vítima, ela, a vilã.
— Quão baixa você pode ser, ? Eu te disse que precisava de um tempo para processar e então você invade meu apartamento e acusa a minha mulher sem provas, sem nada? Quer que eu acredite? — dizem que palavras doem. Bom, nunca ouviu nada tão verdadeiro. Aquilo doeu muito mais do que deveria ter doido. Mas o amor fazia aquilo com as pessoas.
— Você é um belo de um babaca, Enzo. Eu fiz minha parte, certo? Espero que a quantidade de chifres que você recebe não passe a pesar em suas costas — e, então, ela partiu. Ele não veio atrás. Ele não ligou. Ela não ligou.
Ela percebeu que o tempo que uma pessoa precisava era bem mais do que ela poderia imaginar. Então, veio o escândalo, aquele em que Deise fora flagrada em férias privativas com um modelo. queria rir da situação, mas sentiu pena de Enzo. Não o suficiente para ligar para ele, porém o suficiente para sentir uma dorzinha em seu estúpido coração.

Enzo se arrependeu de não ter ido atrás dela no minuto em que ela saiu pela porta. Ela era sua melhor amiga acima de todas as coisas, entretanto ele não poderia voltar atrás, e não voltou. E então ele se sentiu um idiota total quando as fotos de Deise vazaram para a imprensa. Ele quis ligar para ela. Deus sabia quanta falta dela ele sentia. A poeira abaixou, mas, mesmo assim, ele não tinha tempo. Os treinos tomavam todo seu dia, suas noites eram passadas em banhos gelados. Logo, foi a vez dela de aparecer nos noticiários. Enzo nunca se sentiu tão gelado quanto no momento em que seu celular tocou naquele dia. Jornais de Vitoria não noticiavam acontecimentos de Madrid, a não ser que fossem feios demais.
— O que aconteceu, mãe? — sua mãe parecia nervosa no telefone, como se nem mesmo ela soubesse o que havia acontecido de fato. Três carros haviam colidido na pista escorregadia. Chovia, eles não tinham visão o suficiente. O carro de havia ficado prensado em meio aos outros dois carros. O impacto havia sido forte, e os médicos não sabiam dizer se ela ficaria bem. Aquela era uma noite crucial para ela, o que os médicos chamaram de a noite D. Enzo não soube ao certo como dirigiu até Madrid. Ele ultrapassou sinais, pegou multas. Quando chegou à sua casa, mal conseguia pensar.
— Como ela está? — suas mãos foram para os ombros de seu irmão. Luca parecia estar em outro mundo. Olhos vermelhos e inchados, Enzo podia ver o que se passava pela mente de seu irmão. Luca estava com tanto medo quanto ele de que ela não conseguisse sobreviver.
— Eles disseram que ela está passando bem pela noite, temos de esperar até amanhã para saber com certeza se ela vai sobreviver. É horrível, cara, ela ‘tá toda entubada. Eles a induziram ao coma, disseram que é a melhor chance do corpo dela conseguir se recuperar. Mas eles não deram certeza de se ela vai conseguir sair dele, entende? Pode ser que ela não acorde — a voz de Luca não passava de um sussurro, o que deixou Enzo ainda mais temeroso.
Aquela foi uma das noites mais difíceis pela qual Enzo já passara, não havia nem comparação com aquela que ele passara com Deise. A sala de espera do hospital nunca pareceu tão apática, e seus pais e os pais de pareciam estar desesperados. Cada vez que o médico aparecia, eles temiam que notícias ruins pudessem aparecer. Entretanto, diante de todas as expectativas, ela acordou. Não só acordou, como teve uma das melhores recuperações vistas por ali. Ela se esforçava, se forçava. Ela perdoara Enzo mais uma vez.
— Strike dois, Enzo — ela anunciou no dia em que ele a ajudou a arrumar suas coisas para sair dali. Ela não aceitara sua ajuda durante a recuperação, o fizera volta a Vitoria, anunciando que cada vitória do Álaves seria uma vitória particular dela. Ela estava bem, eles estavam bem, e ele agradecia muito por isso.

Não era como se não sentisse um pouco de dor, mas ela tinha muito trabalho a fazer. E, então, quando ela se atualizasse de tudo que havia perdido, fotos de Enzo com sua nova namorada apareceram na rede. Tão superficial quanto Deise, tão bonita quanto todas as outras que haviam passado pela vida dele. Por um efêmero tempo, ela acreditara que estava sendo correspondida, mas Enzo parecia ter ideias diferentes das suas. Muito diferentes. Poderiam chamá-la de masoquista, mas quando ele a convidara para jantar com sua família em um jantar onde apresentaria Carmen, ela aceitara. Talvez como uma tentativa de finalizar tudo aquilo. Como ela odiava amor unilateral.

— Eu acho que posso estar apaixonado por ela — Enzo pensou muito antes de dizer aquelas palavras, mas Luca não parecia nada chocado em ouvi-las, como se esperasse por elas. — Por que você não parece surpreso? — questionou, curioso, observando a face do irmão.
— Era para estar? Da forma com que vocês agem um perto do outro, um a respeito do outro? É meio impossível não perceber — explicou Luca, se jogando em sua própria cama.
— Não é tão óbvio assim, eu mesmo só percebi a alguns dias, e nem vem que eu sou um cara esperto — resmungou Enzo, se espreguiçando na cadeira.
Era bom dizer aquilo pela primeira vez, colocar para fora para dar início ao processo de esquecimento.
— Se é tão esperto assim, me permita dizer: o que diabos você ‘tá fazendo, Enzo? Para que trazer essa Carmen para cá? Quando você vai atrás da ? — as perguntas de Luca saíram de seus lábios como uma cascata de água rápida demais.
— Eu não vou. Eu não quero perdê-la, cara. Ela é a minha melhor amiga, nem que eu tivesse a certeza de que ela é a mulher da minha vida me declararia. A Carmen é ótima — Luca olhou o irmão, esboçando uma feição de incredulidade.
Nunca ouvira tanta baboseira quanto aquela. Do lado de fora do quarto de Luca, pensava a mesma coisa. Suas mãos se fecharam em punhos, seus dentes se infiltraram em seu lábio, mordendo-o para que não saísse um gritinho de frustração. Sua vontade era de socar Enzo com tamanha intensidade que ele nem sequer se lembraria quem ela era. sorrira tanto naquele jantar, que suas bochechas doíam quando ela foi pra casa. No entanto, naquele dia, diferente de todos os outros, ela chorara. Chorara tanto, que quando parara de chorar, seu rosto estava inchado, seus olhos, vermelhos, seu nariz escorrendo. Ela nunca quis tanto poder mandar em seu coração como naquele momento, queria que a razão pudesse assumir. Mas a razão não dominou, e ela chorou ainda mais, se culpando por ser tão tola.

Enzo percebeu em pouco tempo que tentar se apaixonar por alguém para se esquecer de sua real paixão não dava certo. Mesmo assim, ele não terminou com Carmen. E Carmen não terminou com ele. Enzo tinha nome, tinha talento e dava a ela a fama que ela não poderia conseguir sozinha. Carmen se apaixonou por ele a seu modo, o queria em sua vida, mesmo que soubesse que ele não era totalmente dela. Enzo aprendeu o que era fingir. Ele fingia que não se importava por ter se afastado, ele fingia que não se importava em ter Carmen todos os dias em sua cama. Ele fingia que gostava de beijá-la. Até que não conseguiu mais. Sua quota mais longa foram seis meses. Seis longos e exaustivos meses antes que houvesse o break, antes que ele terminasse com ela, antes que ele fosse para casa.

Zinedine não conhecia Olly Murs, mas ele tinha certeza de que ouvira os comentarem sobre gostar dele. Então, quanto fora ofertado convites para o show para os integrantes do time, ele pegara alguns. Quando entregara a , nunca imaginou que ela fosse ter a reação mais engraçada que ele já a havia visto ter. Sim, era fã de Olly Murs. Acompanhara-o em sua jornada pelo X-Factor e quisera adotá-lo instintivamente. Claro que com acompanhar ela queria dizer assistir sua trajetória através de vídeos na internet. Mesmo assim, ainda era acompanhar. E quando ele fizera aquela parceria com Demi Lovato, ela quase sentira as batidas de seu coração ultrapassarem os níveis aceitáveis para uma pessoa normal. Ela nem sequer se importava de ser a vela oficial em meio aos casais oficiais e não tão oficiais do Real Madrid. Não se importou nem quando Luca deu com o pé para trás de última hora, anunciando um compromisso inadiável e a abandonando. E lá estava ela, seu melhor sorriso, talvez suas melhores roupas e, com certeza, no melhor dos ânimos.
— Meu Deus! É ele, é ele — sua excitação era tão grande com a chegada de Olly que ela não o viu chegar.
Enzo cumprimentou os antigos colegas de time e se aproximou do lugar em que estava. Ela não se afastou dos outros como costumava fazer para ter um pouco mais de privacidade, o que indicava que ela não se importava, desde que pudesse ter uma visão privilegiada do show.

O que Enzo podia dizer com certeza era que naqueles seis meses o cheiro dela não mudara em nada. De seu corte de cabelo, no entanto, ele não podia dizer o mesmo. A cada música, cantava mais alto; a cada palavra de Olly dirigida à plateia, ela gritava junto as outras fãs. Ele suspeitava que suas bochechas deveriam estar avermelhadas. Os casais por ali se divertiam com suas reações, e ele mesmo o fazia. Mas então Olly Murs anunciou um especial, uma música nova. Como se algo chamasse por , ela olhou em sua direção. Não havia um sorriso em seus lábios, nem sequer um brilho em seus olhos. E então ela o ignorou, focando em Olly Murs. Enzo nunca se sentiu tão confuso, ela nunca antes o havia tratado daquela forma. Não era como se eles fossem completos estranhos, mesmo que seis meses houvessem se passado desde sua última conversa. Mesmo que seu coração estivesse batendo mais forte apenas com sua presença ali. Quando deu o ingresso a ele, Luca deveria saber. Ele sempre sabia daquelas coisas que Enzo se negava a ver. E, então, o show acabou. Ele havia dito a Luca que levaria com ele, algo que talvez não fosse tão fácil quanto ele pensara a princípio. Mas ela se virou para ele novamente, seus belos olhos se focando nos seus.
— Vamos — foi tudo o que disse, antes de seguir até a porta.

não tinha certeza de quando havia tomado aquela decisão, ela nem sequer se imaginou fazendo aquilo. No entanto, ela fez. Enzo caminhava ao seu lado, o silêncio que se instalara entre eles nos últimos meses os seguindo. Faltava pouco para que eles chegassem ao elevador que os levaria ao estacionamento VIP. O silêncio permanecia quando a ação impensada ocorreu. empurrou Enzo para a parede, seus olhos se arregalaram quando a moça aproximou os lábios de seu ouvido.
Shout it out, sing it loud, I've got something to say, you're the one that I want and I'm screaming your name. Can I kiss you? 'Cause the night is closing in não esperou que Enzo a respondesse, aquele nunca foi seu intuito. Seus lábios se aproximaram dos lábios do jogador, ela e hesitou por apenas alguns segundos, ponderando sobre o que estava em jogo, até decidir que já ponderara demais. Podia sentir a respiração dele batendo em seu rosto, seus olhos se encontraram, e ele parecia confuso, mas ela não se importou. Em questão de segundos uniu seus lábios. Os lábios de Enzo eram quentes, doces. Pelos primeiros três segundos, ele parecia petrificado, se sentia em Harry Potter, beijando uma pedra, mas então ele pareceu entender. Seus braços envolveram a cintura de , aproximando o corpo dela do seu. Seus lábios se moviam em sincronia, e os lábios de se entreabriram, dando a passagem que Enzo pedira. Um pigarro foi tudo que ela ouviu antes de se separar bruscamente de Enzo.
— As dúvidas que você tem te fazem inseguro. Eu não me importo com a sua insegurança, mas eu não vou esperar para sempre. Uma temporada, Enzo, gol ou impedimento. Você quem decide.

Enzo Zidane Fernandez nunca havia recebido um ultimato de uma garota. Pelo menos, não um que ficasse em sua memória. Bom, pelo menos até aquele momento. obviamente havia deixado claro que se cansara daquela situação. Ela queria uma resposta, dera um prazo para recebê-la. Ele só não sabia se estava pronto para aceitar a decisão que poderia tomar. Era difícil se descobrir tendo sentimentos amorosos por alguém que sempre havia visto como uma irmã, mas ela não era sua irmã, e deixara isso bem claro naquele dia. Soltando um suspiro, Enzo se deixou cair em sua cama. Seu quarto parecia o mesmo, suas coisas nem sequer haviam sido mudadas de lugar. Mas havia algo diferente ali, possivelmente ele. Possivelmente seu coração.

Ela se arrependeu de sua ação impulsiva ainda naquela noite, em seu caminho para casa, ocupando o banco traseiro do táxi que havia conseguido.
— Burra, burra, burra. O que você estava pensando, ? Hum? Aquele é o babaca do Enzo, o idiota que ficou seis meses sem falar com você. Qual é, coração, você não cansa de ser trouxa não? — a moça socava seu travesseiro inúmeras vezes, se amaldiçoando em voz alta. Só de relembrar a forma como ela havia empurrado Enzo para a parede e o agarrado fazia com que suas bochechas se avermelhassem. Se ela soubesse como fazer um buraco negro, provavelmente criaria em um apenas para sumir do mundo por toda eternidade.
— Filha? ‘Tá tudo bem? — colocando a cabeça para dentro do quarto da moça, a mãe de procurava compreender o que acontecia com sua filha.
— Mãe, eu sempre fui burra assim? É possível que a burrice tenha sido herdada da genética do papai? Aliás, ainda temos aquela casa na Alemanha?
— Okay, okay. O que está acontecendo com a minha preciosa filha? — a mais velha adentrou o quarto e se sentou na cama, deixando que a filha afundasse a cabeça em seu colo.
— Eu dei um ultimato nele, mãe. Eu só estou tão cansada dessa situação, sabe? Amor não correspondido é uma droga. E eu sei que ele não me deu esperanças nem nada, mas a senhora sabe, não é? Eu sou uma idiota que não consegui desistir.

Um sorriso surgiu nos lábios da mulher mais velha conforme ela acariciava os cabelos de sua filha. gostava de ter certo controle sobre sua vida, e se ver tão abertamente fora de lugar fazia com que sua mãe se divertisse.
— Minha filha não é burra coisa nenhuma. Nossa genética é muito boa, mocinha. Então quer dizer que enfim você colocou o Enzo contra a parede?
Os olhos de se arregalaram ao ouvir a mãe pronunciar o nome de Enzo, o que fez com que sua mãe revirasse os olhos quase que instantaneamente.
— Eu conheço a filha que tenho, mocinha. Cada pequeno suspiro que eu ouvia de você no decorrer dos anos — anunciou a mulher, cutucando a bochecha da filha. — Por favor, não é, filha? Pensou mesmo que sua mãe não saberia? Além do mais, já passava da hora de você dar um fim a isso. Não quero ver minha filha tristinha, trancada nesse quarto o dia todo. Você fez o que precisava fazer, meu bem, agora é com ele — a moça assentiu, afundando seu rosto na barriga de sua mãe e deixando que esta fizesse carinho em seus cabelos.

Enzo não tardou a perceber que o tempo não passaria lentamente apenas porque ele desejava que isso ocorresse. Os dias se transformavam em semanas, as semanas em meses, e logo ele teria o fim de seu contrato. Sua carreira havia obtido o destaque que ele desejava, a resposta que ele daria a estava na ponta de sua língua. E, então, ele novamente teve uma escolha à sua frente, o contrato parecia pulsar em sua mão, seus olhos brilhando, tamanho o choque pelo valor oferecido. Ele teria a chance de retornar ao time que era gerenciado por seu pai, a chance de voltar a conviver diariamente com a mulher que ele sabia amar. Enzo saíra do Real Madrid em busca de um novo começo, agora poderia voltar a ele em busca de reencontrar a pessoa que ele deixara para trás.

A mente de poderia explodir de tamanha a quantidade de pensamentos que a dominavam. Ela se sentia apreensiva ao mesmo tempo em que se sentia liberta. Ela era dona de si, conhecia suas escolhas e não se arrependia delas. Como uma vitrola quebrada, seu notebook repetia incessantemente a música que parecia marcar a escolha mais impensada que ela fizera em toda sua vida. Aquele era o dia que marcava o final de toda sua luta contra si mesma. Quando o relógio marcasse meia noite, ela já não poderia esperar por Enzo. Ela não se permitiria pensar nele, a página seria virada, seu coração e sua mente teriam de aceitar de uma vez por todas a decisão que ele tomara. A moça soltou o ar que segurava, esboçou um sorriso e uniu suas mãos, entrelaçando seus dedos. Cinco minutos nunca pareceram demorar tanto tempo para passar.

— Você acha que ela vem? — Enzo mordia seu lábio inferior enquanto Luca parecia entediado demais com a situação toda.
— Você não me pediu para dar um jeito? Ela obviamente vai estar lá, mesmo que você não mereça — resmungou Luca, se impulsionando para fora do sofá enquanto se servia de uma lata de soda.
Enzo assentiu brevemente, unindo suas mãos. Podia sentir o suor se acumulando naquela região, o nervosismo dominando seu corpo. Ele havia traçado um plano, um pouco clichê, talvez com uma semana de atraso, mas esperava que desse certo.
— Enzo? ‘Tá na hora — ao ouvir as palavras do pai, Enzo se levantou do sofá que ocupava, seguindo-o em direção à sala onde ocorreria a coletiva de imprensa. Ele seria apresentado como o mais novo jogador do Real Madrid. Sentou-se na cadeira destinada a ele e deixou que os repórteres dessem início à rodada de perguntas. Seus olhos procuravam pela moça que deveria estar ali, seu coração batendo mais rápido a cada fileira que passava e ela não estava. E então ele a viu. Ela parecia em choque, não acreditando exatamente no que via, mas não necessariamente parecia triste ou com raiva por vê-lo ali. Um caderninho em sua mão, óculos em seu belo rosto. Ele mal podia acreditar que havia sido o babaca do ano por tanto tempo.
— Enzo? — seu pai chamou sua atenção, passando a palavra a ele.
— É um imenso prazer estar retornando pra casa. Darei o meu melhor para ser aquilo que o time precisa, para conquistar tudo aquilo que pudermos. Honrarei a camisa que vestirei, conto com todos para que eu consiga me adaptar novamente — suas palavras eram meio avoadas, seus olhos ainda focados na figura dela. Levantou-se para aceitar a camisa que seria dele a partir daquele dia e sorriu para as fotos que estavam sendo tiradas. Viu se levantar, parecendo pronta a caminhar em direção à saída mais próxima. Mas então Luca estava lá, sussurrando algo em seu ouvido, fazendo com que ela ficasse.
— Eu sei que isso provavelmente vai parecer um pouco incomum e peço que me desculpem se acreditarem ser impróprio, mas sabe como é, você luta contra uma coisa por anos e então chega um momento que não dá mais para segurar — os fotógrafos já guardavam suas câmeras e repórteres começavam a retirar o microfone quando aquela declaração de Enzo pareceu fazê-los mudar de ideia.
— Um tempo atrás, uma garota me deu um ultimato. Achei estranho, achei louco, fiquei louco tentando compreender o que ela queria de mim, tentando compreender o que queria de mim mesmo — Enzo deu uma pausa, observando o rosto de engolindo em seco antes de continuar. — E então, os meses se passaram, e eu já não conseguia esconder de mim o que ela representava, o que ter um “nós” representaria na minha vida — o jogador fez um sinal para que Luca pudesse dar play ao instrumental da música que escolhera para aquele momento. Eu não sou nenhum cantor, minha voz é extremamente desafinada, mas eu não consegui pensar em nada que pudesse expressar tão bem o que eu quero dizer para ela. Então, me desculpem por isso — Enzo deu uma risada nervosa, dando início as primeiras palavras da música.

não tinha muita certeza do que estava acontecendo naquele momento. Em um segundo ela esperava que aquela coletiva de imprensa se finalizasse para no seguinte ser bombardeada por um Enzo cantando a música que não saíra de sua mente por meses. Ready To Love de Olly Murs. Ele era desafinado, mas, naquele momento, tudo que conseguia pensar era o quão fofo ele ficava com suas bochechas coradas e seus olhos envergonhados. Ela sorria como a boba apaixonada que sabia ser. Ouviu a gargalhada de Luca a seu lado, porém mal conseguia retirar seus olhos de Enzo. Então, ele terminou, e todos os olhos pareciam estar nela. Ela sentiu suas bochechas adquirem a quentura característica de sua vergonha, e logo ele desceu de onde estava e seguiu em sua direção. A distância não era grande, seu coração pareceu gritar, tamanha a velocidade em que batia. Se fosse fraca, tinha a certeza de que teria um infarto cardíaco.

, shout it out, sing it loud, I've got something to say, you're the one that I want and I'm screaming your name. There's a room in my heart, do you wanna stay?
Enzo se sentia apreensivo, mas então ele ouviu a gargalhada dela e, no minuto seguinte, as mãos quentes da mulher que ele amava tocavam seu rosto, puxando-o para baixo. Seus lábios se encontravam depois de tanto tempo. E foi como uma explosão de sabores. era doce, seu lábios eram quentes, macios, delicados. Seu coração batia acelerado, suas mãos envolvendo a cintura delicada. Como plano de fundo daquele momento, havia risadas, palmas, e eles juravam que ouviram um gritinho animado. Afastaram-se por alguns segundos, seus olhos se encontrando, as respostas nítidas bem ali, sem que precisassem dizer qualquer palavra. Eles tentariam ser um “nós” a partir daquele momento, e o tempo diria se seriam um bom nós ou se voltariam a ser apenas dois indivíduos em busca da felicidade.


Fim



Nota da autora: Sou o tipo de pessoa que enrola pra tudo nessa vida, com essa história não foi diferente. Ela ficou bem clichê, bem pequena, mas talvez um pouquinho boa. Quero agradecer a Ju e sua paciência para com minha enrolação. Então, obrigadinha. Como não sou muita boa nisso, me despeço. Beijinhos de luz para todos.

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