R Adventure seeker on an empty street
Just an alley creeper, light on his feet
Salvador — Bahia

Bernard observava o mapa em suas mãos e tentava esconder a euforia em seu peito. Não sabia definir qual era a felicidade de fazer o que realmente queria, estar indo embora, pelo mundo, inclusive. Nunca foi de ficar em um único lugar, liberdade era a palavra ideal para defini-lo e nunca soube dizer o porque de todo esse amor por viajar. Mas apreciava o novo, apreciava não estar preso em um lugar que, de fato. Não queria estar. E agora com a mochila verde musgo em suas costas ele estava indo atrás da sua felicidade. Afinal, sempre achara que o mundo era pequeno demais para si e os teus Keeds pretos. Ele encarou pela ultima vez o marcador vermelho no mapa em suas mãos e pisou porta a fora. Estava em solo firme em Salvador. Mais especificamente na Praia da barra, sempre quis estar ali, observou ao redor e notou a imensidão do mar. Em Belo Horizonte o máximo de imensidão que tinha eram as montanhas e a lagoa da Pampulha. Mas ali, não.
Era o terceiro destino em um mês e aparentemente o melhor, até agora. Foi empurrado minimamente e virou-se para olhar encontrando os fios cacheados, um olhar tímido o encarar.
- Perdão, eu sou totalmente pisciana mesmo. Deveria ser menos lerda.
- Tudo bem.
- Não, é serio. Eu te machuquei? Não me acostumei com aquele bando sumindo de perto de mim.
- Bando?
- Eu vim com uns amigos.
- Ah, mora na cidade?
- Não, eu até gostaria. Mas não fui abençoada com tal fato. Mas e você, fala muito pouco.
Ele riu percebendo que não houve tempo de falar, já que era interrompido pela menina tagarela em sua frente.
- Eu vim com uns amigos também.
- Nós estamos fazendo um mochilão — Soltaram em uníssono e gargalharam.
- Eu sou Nicole.
- Prazer, Nicole. O meu nome é Bernard.
- Nome diferente no meu círculo.
- Sou completamente diferenciado.
- E leonino, imagino eu.
- Ei! O que tem contra?
- Nada! Eu tenho até a favor. Enfim, eu preciso ir.
- Foi bom conhecer você, Nicole
Observou a garota ir embora e os cabelos caírem sobre seus ombros a medida que ela olhava de um lado para o outro em busca dos amigos. Saiu rapidamente dos seus devaneios quando ouviu o amigo gritar atrás de si. Mas decidiu não dar atenção. Preferiu apenas acenar sinalizando para onde estava indo e caminhou pela praia. Sentia a leveza nos ombros, parecia que tinha tirado o peso que carregou durante os vinte e quatro anos de sua vida. Não sabia se era, de fato, o melhor plano a ser seguido. Mas agora, longe de casa, preferia ficar por ali. Longe de todos os problemas. O curso dos seus sonhos tinha tornado-se um pesadelo, toda a pressão, o psicológico, a perda da mãe. Tudo tinha levado todo o resto por agua abaixo. E agora, um ano depois, estava recomeçando longe da cidade que lhe trazia tantas lembranças. E aquilo era suficiente, por ora.
It ain't much I'm asking, I heard him say
Gotta find me a future move out of my way
Rio Grande do Sul — Canoas

O futuro parecia ter muito a lhe dar, mas o futuro parecia estar longe demais. O que lhe importava era o agora. E o que o agora o importava. Era possível que um lugar fizesse tanto frio e residir no Brasil? Achava, no mínimo, impossível.
Caminhou pelos gramados do Parque Getúlio Vargas e não acreditou no que via em sua frente.
- O que você ta fazendo aqui?
- Eu, guri?
- Adotou o sotaque.
- Eu acho que tu ta me seguindo.
- Eu estou apenas viajando pelo Brasil.
- Mesmos lugares, acho que temos uma coincidência.
- Akai-to
- A guria é cult
- Mas falando sério, me dê teu mapa.
Ele tirou o papel amassado de seu bolso e entregou Nicole, que encarou a lista minuciosamente e gargalhou alto em seguida.
- Nossos locais são os mesmos.
- Eu fiz essa lista sozinho!
- Eu também, mas me diga. O que te trouxe até esses destinos?
- Eu sempre quis mais do que só minha cidade tem a oferecer. Sempre quis o mundo, sabe? Conhecer vários estados, países, nações e essa lista era meu ponto.inicial, mas eu não esperava encontrar uma certa garota.
- Estamos quites. Eu amo Belo Horizonte, mas…
- Você ama o que?
- Belo Horizonte?
- Fala sério.
Ele riu desacreditado.
- O que tem demais lá? Ah, e porque não está em sua lista?
- Porque eu vim de lá.
- Você é mineiro?
- Belorizontino — Ele utilizou uma sigla inexistente e gargalhou do olhar da garota sobre si. Não acreditava de verdade ser possível encontrar Nicole tão distante, se viveram na mesma cidade. E acima de tudo, tinham a mesma perspectiva de vida e de futuro. Riu de como as coisas eram engraçadas, de como ele estava se sentindo e percebeu que de forma confusa ele estava pensando na garota que havia conhecido a menos de duas semanas em uma viagem.
- Estava pensando, já que iremos fazer o mesmo caminho, podemos ir juntos.
- Juntos do tipo?
- Mesmo carro.
- Estou com dois amigos
- Eu com três amigas.
E com um olhar sabiam o que fazer
It ain't much I'm asking, if you want the truth
Here's to the future
Quatro meses haviam passado desde que se conheceram e algo estranho havia mudado em Bernard. A súbita vontade de ter tudo não havia diminuído, muito pelo contrário. Mas não se via no futuro, longe de tua juventude, sem Nicole.
Goiás era o novo destino e a garota tamborilava os dedos no painel do carro e Bernard a observava. Era incrível o quanto ela era tudo que ele buscou por muito tempo e agora a tinha ali.
Eu acredito no destino. Acredito que quando uma coisa tem de ser, o universo faz com que ela seja. Sei lá, é como se o mundo atraísse uma coisa a outra. Você pode ir estudar fora, conhecer o mundo, casar, ter filhos. Ele pode namorar com a cidade toda, jurar amor eterno pra meia dúzia de mulheres e até pensar em montar família com alguma delas. Não importa porque se for pra ser, vocês se trombam de novo e a vida coloca tudo no lugar certo.
Pode ser amanhã ou depois ou no mês que vem. Pode ser que seja no meio de uma festa lotada ou em um corredor vazio. Pode ser que já seja, vocês só não saibam ainda. Mas vai ter alguma coisa ali, no modo como tudo parece se encaixar quando vocês tão juntos e na maneira como o beijo de vocês combinam. Vai ter alguma coisa que vai fazer você entender o porquê dele ter demorado tanto. E talvez demore um pouco mais, ainda, mas não importa, ele vem, pode deixar, dia desses ele chega, muda tudo do lugar, ajeitar sua vida na dele e faz o resto todo fazer sentido. E tudo fez sentido quando ele encontrou Nicole. E ao sentir a mão dela o envolvendo, ele queria tudo e tinha. O mundo estava em suas mãos.

Nota da autora: Sem nota.