Era um pub qualquer, com pessoas normais e lá estava eu novamente, olhando as pessoas a minha volta; algumas bêbadas antes da hora, algumas dançando, outras querendo um par para apenas uma noite. Meus olhos vagavam por cada pessoa que estivesse ao meu alcance, tentando descobrir os motivos para estarem naquele lugar. A maioria, assim como eu, aposto que estavam aqui para tentar esquecer; esquecer o trabalho, estudos, namoradas, ex-namoradas, esposas, amantes, filhos, problemas...
Foi quando meus olhos captaram os lindos olhos azuis de uma garota em minha frente, do outro lado do bar. Seu olhar, naquele momento, estava para o copo em sua frente. Era um olhar vago que não demonstrava exatamente o que sentia, como já era de se esperar, vindo dela. Por alguns instantes eu apenas olhei, mas eu não queria apenas olhar. Queria algo a mais... Sempre algo a mais com ela.
Alguns passos para chegar onde ela estava, apenas alguns passos, mas a incerteza não vai me deixar chegar, muito menos pensar no que eu poderia dizer, ao menos. Tão poucos passos e minhas pernas conseguem falhar, nem me mexer eu conseguia. Exatamente o efeito que ela sempre me causava. Não podia deixar esse momento escapar, não de novo, como já fiz tantas vezes.
Ela estava sozinha do outro lado do bar, olhando vagamente para as pessoas se acabando de dançar na sua frente, com um pequeno sorriso em seus lábios. Um sorriso melancólico, eu diria. Se estivesse com mais luz à sua frente, ou se ela virasse um pouco o rosto, eu poderia dizer que ela estava com inveja das pessoas que estavam a sua frente. Elas estavam conseguindo o que queriam ali, ela não. Claro, sempre insatisfeita com o que tinha. Sempre difícil de ser lidar e agradar.
Quem sabe se eu beber mais uma dose, eu consiga ter a coragem de ir até lá e falar tudo o que eu sempre quis. Mas nos próximos segundos eu posso perdê-la, não consigo mais esperar, nem mais um minuto.
Quero te dizer que você não sai do meu pensamento, nunca saiu pra falar a verdade; não consigo mais pensar no que eu preciso te dizer desde àquele dia. Isso já está começando a me torturar, a cada segundo que passa e eu não tenho a coragem suficiente para ir até você, e, dizer as poucas palavras que eu preciso, que eu quero. Não importa mais se você vai me querer ou não, - acho que nunca importou, na verdade - mas não aguento mais ficar pensando em como seria se eu falasse com você, pelo menos. Como seria sua reação, aonde nós poderiamos ir.
Faço meu máximo pra esquecer as palavras que eu te disse, e você acreditou. Acreditou tanto que nem sabia mais quem eu era. Penso se não seria melhor se eu te tivesse de volta em meus braços, mas foram tantas decepções que eu te causei que minha insegurança se volta contra mim novamente. Me fazendo continuar sentado.
Olhares cruzados com um moreno não muito longe. Perco meu ar. "Não dessa vez!", pensei comigo.
Levantei de sopetão, quase derrubando o banco no qual me sentava. Atraí alguns olhares reprovadores, outros questionadores. Não liguei, meu caminho era outro.
Alguns passos para chegar do outro lado do bar. Alguns passos e sentiria o cheiro dela de perto. Respirei o máximo de ar que eu consegui em alguns pucos segundos e me sentei do seu lado.
Ela olhou em minha direção. Arregalou os olhos e eu prendi o ar. Suas feições foram relaxando, e logo voltaram a incrível superioridade que apenas ela possuía. Sorriu irônica.
- ... - Foi tudo o que disse, com um suspiro no final.
Ergui uma sobrancelha. Ela rolou os olhos. Ri pelo nariz.
Nossos contatos depois... Depois de tudo, sempre foram meio assim. Mínimas palavras, olhares irônicos, e frases não ditas. Mas hoje eu iria mudar isso.
Reconheci as primeiras notas de The Reason e levantei lentamente. me acompanhou com os olhos curiosos. Estendi a mão em sua direção, um pedido sem palavras para que ela cedesse essa dança. Ela levantou, sem segurar minha mão. Olhei incrédulo para ela, que continuava com os olhos em mim. Discordei com a cabeça, mas com um sorriso no rosto.
Levei-a até a pista de dança. Coloquei suas mãos em meus ombros e ela não tirou. Coloquei minhas mãos em sua cintura e ela não resistiu. Sorri com o pequeno avanço... Acho que foi a música que ela tanto gostava que acabou por completar o momento.
Ficamos nos mexendo, apenas. Nossos olhares se encontraram, em algum momento, e não paramos de nos encarar. Aquele olhar continha raiva, remorso, tristeza, saudade, amizade, amor... Tantas emoções que nós não conseguiamos falar, tantas emoções que apenas os olhos conseguem nos dizer inteiramente.
Abaixei um pouco minha cabeça, para conseguir chegar perto o bastante do ouvido dela. Cantei em uma voz baixa, mas clara:
- "I'm sorry that I hurt you, it's something I must live with everyday". - Separei-me um pouco dela para poder olhar em seus olhos agora confusos - Desculpa, .
Ela olhou um pouco assustada, sem saber o que dizer ou falar. segurou um poco forte demais minha camisa, mordeu o lábio - um sinal claro de insegurança que ela possuía - e negou com a cabeça. Começaram a surgir sinais que ela poderia chorar a qualquer momento. Segurei firme em seus braços, que agora caiam ao lado do seu corpo.
- Acredita em mim pelo menos dessa vez? - Minha voz saiu muito fraca. E além do mais eu estava implorando para ela. Por ela. Pela primeira vez na minha vida eu implorava por uma mulher. Não qualquer uma, claro. Mas .
Ela colocou uma das mãos na cabeça, tirando um pouco da franja que insistia em cair em seus olhos. E a outra estava em sua cintura, ela estava confusa e insegura. Pude ver uma pequena lágrima cair e meu coração parou de bater por instantes.
Ela olhou para os lados, procurando por alguma coisa. Olhou para mim novamente e fechou fortemente os olhos. Inalou uma enrome quantidade de ar e, no momento em que eu pisquei, ela saiu correndo.
Olhei um pouco mais pro lado e pude ver Clarisse - a irmã dramática e frescurenta - me censurando com um olhar.
Tentei colocar meus pensamentos em ordem. Ok, parte 1. procurar ... Depois eu resolveria o que fazer.
Andei no meio de um pequeno grupo que dançava e quase fui atacado por uma ruiva. Se fosse outro dia... Continuei andando focado na pessoa que eu queria e precisava achar.
Abri a porta de entrada e vi uma garatoa morena com casaco preto a envolvendo. Ela mantinha seus braços ao redor do corpo e um olhar perdido na rua a sua frente. Fui até seu lado e me sentei no pequeno muro que protegia algumas flores na entrada do pub.
Ela nem seguer olhou em minha direção. Fungou um pouco alto demais e riu ironicamente.
- Quer saber de uma coisa, ? - Pergunta retórica. - Eu passei os últimos meses muito bem sem você, sabe? Mas você sempre resolve aparecer nas piores horas, ou meus momentos de fraqueza, como preferir chamar... E sabe as palavras certas que tem que falar. E as coisas sempre colaboram pra que você consiga o que quer. É frustrante, sabe. - Me olhou com os olhos vermelhos.
- Devo me desculpar? - Perguntei sem saber o que falar, como sempre.
- Argh, e ainda usa esse tom de "eu não fiz nada, sou inocente". Isso irrita, . - Disse irritada.
Levantei devagar. Olhei para a rua deserta e voltei meu olhar pra garota ao meu lado, um pouco abaixo de mim.
- Bom te ver - Dei um beijo no topo da sua cabeça e fui andando pela rua.
"Ótimo, além de tudo eu tenho que voltar a pé", resmunguei em pensamento.
Meus passos eram curtos e lerdos. Não tinha um bom motivo pra chegar em casa, como sempre. Entrar, tirar a roupa e deitar embaixo das cobertas. Isso era basicamente minha rotina depois do trabalho. Estava farto de como minha vida estava perdendo a graça; e tudo porque eu não conseguia tirar uma garota da minha cabeça.
Essa havia sido a caminhada mais longa do pub até minha casa que tinha feito. E isso que eu a faço desde os meus quinze anos. A rua estava completamente deserta, como sempre.
Subi a pequena escada que tinha na entrada e vasculhei meus bolsos a procura da chave. Uma sombra no balanço me chamou a atenção. Parei de procurar - até porque já tinha achado - e fui até lá ver o que era.
estava sentada no balanço azul, mexendo os pés lentamente sobre a terra, fazendo com que o balanço se mexesse lentamente.
- Eu sempre gostei daqui. - ela deu de ombros.
Eu cheguei mais perto, tentando entender o que se passava na cabeça daquela garota. A qual eu nunca entedi, ou vou entender.
- Como chegou tão rápido? - perguntei olhando para a rua.
- Minha irmã de trouxe. - Ela sorriu.
Aquele sorriso não era irônico, pela primeira vez em meses. Não continha raiva, desespero de me ver longe, ciúmes, ou qualquer outro sentimento que ela pudesse nutrir por mim. Sorri vitorioso.
- Não conte vantagem antes da hora. - Ela disse com sua voz de tédio.
- Não é por você estar aqui... Bom, também, mas o seu sorriso... - Deixei a frase morrer.
Ela sorriu envergonhada. Envergonhada? Sabe a quanto tempo eu não via esse sorriso? Sabe a quanto tempo eu queria voltar a ver esse sorriso? Muito, muito tempo...
- Você não presta - ela disse por fim.
Fiz uma reverência, dizendo obrigado ao, hm, elogio. E me sentei ao seu lado, no balanço vermelho.
- Eu sempre gostei mais do azul. - ela disse depois de um tempo.
- Eu também. - rimos. - E isso já gerou várias brigas...
Peguei-me lembrando do passado. Um passado onde nada disso existia. Nada de brigas, de amor, ódio ou qualquer sentimento parecido. Apenas duas crianças querendo se divertir em seus balanços, querendo um pouco de paz longe das famílias malucas que tinham.
- Nem me lembre... - silêncio. - Hoje, eu não sabia o que te dizer.
- E agora sabe? - Perguntei, já que demorou pra responder.
- Não... - Olhou pra mim. - Como tudo isso foi acontecer?
- Medo? - Perguntei inseguro.
- Bem a sua cara mesmo, mané. - disse de uma forma divertida.
- Me perdoa? - Perguntei.
Sabia que essa seria a pergunta do jogo. Não sabia qual seria a resposta ou se eu gostaria, mas precisava fazer. Isso estava me matando por dentro e, sinceramente, eu estava muito curioso.
- Não. - disse simplesmente.
Mordi meu lábio e olhei pra baixo. não aguentaria ouvir mais nada. Ainda mais se ela começace com o "desculpa por isso". Quando resolvi me levantar, ela disse:
- Não, não desculpo. Por nada do que você me fez passar durante vários meses, . - disse com um tom de raiva na voz. - Eu juro que eu não entendo o porquê de você ter feito eu passar por tantas coisas - decepção - foram tantas promesas que eu até perdi a conta, e nenhuma delas foi cumprida - suspirou. - Mas, quer saber? Eu gosto muito de você e tenho um carinho completamente diferente por qualquer pessoa que eu já tive na vida, sabe. Então eu estou disposta a esquecer tudo isso, mas você vai demorar pra recuperar minha confiança ou tudo o que nós já tivemos...
Não podia acreditar que ela estava falando isso pra mim. Eu que esperei tanto tempo só imaginando como aquela noite poderia ser, não imaginava que poderia ser tudo isso. Sorri largamente. Mais do que havia sorrido nos últimos meses.
Fui até ela, que parou de falar e a beijei. Beijei como nunca. Com amor, saudade e tudo o que eu passei nos últimos meses valeu a pena.
Nada poderia tirar aquele momento de mim, nem mesmo ela com sua mania de falar mais que a boca. Eu não podia conter o quanto eu gostei de tudo isso.
Nem nos meus maiores delírios de como isso seria, eu imaginei nós dois novamente, como no primeiro beijo.
Nesse momento eu estava feliz. Muito feliz.