"Você tem dois caminhos na vida... Tentar ser feliz apesar de tudo, ou desistir e se abrigar sob a mediocridade da tristeza."
Sinto-me extremamente leve. Pareço estar flutuando, mas não sei para onde estou indo. Vozes distantes parecem me chamar por trás de um infinito de neblina que me mantém presa onde estou. Uma pontada e me sinto um pouco mais ligada ao meu corpo. Olhei para baixo tentando ver onde estava enquanto flutuava naquela névoa. Meu corpo estava pálido e sem vida sobre uma mesa de cirurgia. A mesma que eu sonhei ter meus pacientes um dia. Eu queria ser a médica e não a paciente. Sorri para meu corpo como se aquilo fosse uma despedida. Cada vez mais era puxada para além daquele névoa. Um choque e em uma fração de segundo tudo ficou negro. Escutei o som de meu coração enquanto tudo sumia mais uma vez.
- Desfibrilador! Nós a estamos perdendo. – Outro choque e eu já me sentia mais viva. O som do aparelho ao nosso lado denunciou meu coração. Ele voltou a bater. Quem diria que uma biopsia podia ser tão perigosa? Isso foi o suficiente para fazer meu coração parar de bater por um tempo e eu quase me juntei ao meu pai no paraíso.
Eu tenho um sério problema renal. Eu não tenho como sobreviver com apenas a hemodiálise e eu já passo por isso há um ano. Minha única esperança é uma cirurgia, mas eu não tenho um doador. Não estou nem perto de conseguir um. Meu sangue é um tipo complicado e não há doadores compatíveis. Não tenho nenhuma expectativa e os médicos não sabem exatamente o que eu tenho. Meu pai morreu com os mesmos sintomas, então eles suspeitam que seja genético. Eles nunca descobriram o que meu pai tinha. Eu sei que eles não vão poder me salvar também. Ultimamente minha única alegria tem sido passar meu tempo com meu amigo enfermeiro do hospital. Nós nos conhecemos desde o primeiro dia de hemodiálise. Ele me apóia e eu queria poder ser normal e saudável para amar ele. Tenho me apaixonado cada vez mais e às vezes penso que pode ser recíproco, mas quem em sã consciência se apaixonaria por alguém tão problemática quanto eu? Eu o olho de longe, sabendo que nunca vou poder estar com ele, pois em breve eu irei morrer. Não tenho medo da palavra, só tenho medo de deixar para trás os meus sonhos e quem eu amo, quando o verbo realizar a sua ação. Tenho medo de nunca ter a chance de dizer para , meu enfermeiro, que eu o amo.
Os dias passavam tão indistintamente. Eu começava a desconfiar que tudo aquilo pelo que eu passava estava acontecendo em um período muito menor de tempo. Mas quando entrava em meu quarto o sentido voltava, e eu via o tempo passar com mais sanidade. Como se a presença dele me tornasse real e completa. Como se o simples fato dele compartilhar o mesmo ar que eu, tornasse tudo mais real, por isso mais doloroso. Se simplesmente ele não existisse, morrer não seria uma pena tão grande. Se a esperança de ser amada por ele não me desse esse impossível desejo de viver, eu poderia morrer em paz, e não passar por toda essa agonia. Às vezes penso que seria mais fácil simplesmente me matar e acabar com toda essa tristeza que tem me corroído. Nesses momentos, como um instinto de preservação, minha mente me ilude mostrando . Crio possibilidades, esperanças que depois de algum tempo pensando sobre, acabo me convencendo que são meras fantasias de minha cabeça.
Eu tinha a chance de realizar o que minha mente lutava para impedir, mas meu corpo clamava pelo descanso. Eu precisava atender a esse pedido. A carne não sustentava mais meu espírito. Pelo menos eu não queria sentir dor. Escrevi minha última carta, ela era endereçada a . Depois de deixá-la em seu armário no hospital, fui para casa terminar o que eu comecei. Tranquei-me em meu quarto. Em minha mão haviam um copo de água e a cartela de remédio. Engoli todos pensando apenas no alívio que seria para minha mãe, e para mim mesma, a minha morte.
, após o serviço, foi para seu armário pegar suas coisas para finalmente poder voltar para casa. Dentro dele havia a carta que enderecei a ele. A curiosidade aumentou quando ele viu que eu escrevi a carta. Abriu a carta e a leu: “Eu não sou uma pessoa perfeita. Há muitas coisas que eu gostaria de ter feito. Então eu tenho que dizer antes de ir. Eu apenas quero que você saiba o quanto eu amei você. Morrer vai ser o descanso que meu corpo tem pedido e os médicos impedem. Eu pensei ter encontrado uma razão para mim, para lutar pela minha vida, uma razão para começar de novo e simplesmente tentar. E a razão era você... Eu queria viver pensando que um dia eu poderia estar contigo. Essas ilusões já não são o bastante, não quero que o meu atestado de óbito seja indeterminado como o de meu pai. E eu não suporto mais viver assim. Adeus , talvez um dia, se meus sonhos se tornarem realidade, eu possa reencontrar você de alguma maneira. Eu te amo. .”
entrou em desespero, correu para pegar minha ficha e encontrar meu endereço de alguma forma. Encontrou-o nos meus documentos do hospital. O lugar não era longe e ele correu o mais rápido que pôde.Não sabia o que eu pretendia fazer, cada segundo era importante. Derrubou um homem que saía do apartamento, entrando sem dar explicações. Arrombou a porta da casa e começou a procurar pelos cômodos. Chegou a uma porta trancada e a arrombou. Ele me viu deitada no chão. Ao meu lado um copo e uma cartela de comprimidos vazios. Nesse mesmo instante ele percebeu o que eu havia feito. Prestou todos os primeiros socorros que o caso exigia e me carregou nos braços pela casa. Levou-me ao hospital o mais rápido que conseguiu. Fui tratada, o tempo e o remédio não foram suficientes para me matar. Aquilo, no início, poderia ter me deixado ainda mais triste. A tentativa frustrada de suicídio só causou ainda mais dor corporal, mas de alguma forma meu coração agradecia ainda batendo. Ele era a parte de minha carne contra a minha morte. Ele sabia o quanto eu queria ficar com e parecia sentir o mesmo. Eu o sentia saltar de alegria dentro de mim cada vez que eu pensava, tocava, via ou ouvia . Meu coração não escondia seus sentimentos... Diferente de mim.
Acordei sentindo algumas dores e um pouco tonta, mas achei que estava tendo alucinações quando vi segurando minha mão, dormindo sentado em uma cadeira ao meu lado. Senti um calor bom percorrer todo meu corpo, partindo do meu coração. Ele disparou e o monitor cardíaco denunciou fazendo um barulho irritante. Meu enfermeiro acordou assustado. Seus olhos se voltaram para mim na mesma hora.
- Você está se sentindo bem?
- Só um pouco tonta e dolorida.
- Vai passar. Eles vão fazer o transplante, conseguiram um doador.
Não consegui deixar de chorar de alegria nesse momento. Pensei que poderia estar morta agora, mas eu não sabia exatamente porque não estava.
- Como eu cheguei ao hospital?
- Eu li a sua carta, acho que mais cedo do que você esperava. Fui até sua casa e trouxe você.
- Acho que no fim foi o melhor. Eu teria perdido a chance de fazer o transplante. E de... , você leu minha carta, sabe como me sinto sobre você. Agora que eu vou ter uma chance não me sinto egoísta em querer estar contigo.
- , eu não posso. Não agora. Preciso que você espere, deve ser só um mês. Mas eu vou voltar, sua cirurgia é amanhã.
- Você vai estar aqui amanhã?
- Não posso.
- E porque não?
- Não trabalho mais nesse hospital.
- Por quê? – Comecei a entrar em desespero, pois queria ele ao meu lado nesse momento tão complicado. Queria ter a esperança de olhar nos olhos dele quando acordasse da cirurgia.
- Não podemos ter relacionamentos com pacientes. – Ele disse e deu um pequeno risinho que parecia triste e abalado. Já eu senti uma bomba de esperança explodir em meu coração, não conseguindo conter o meu maior sorriso do último ano.
- Como assim?
- Eu sinto o mesmo que você. Quando li sua carta, o meu mundo desmoronou. Pensei em alguns momentos que você morreria sem eu ter dito o que eu sinto. Eu morreria por você e você nem sabia disso. , eu sinto que nós temos uma ligação muito forte. Todo o tempo que passamos juntos... Conhecer você me fez ver a pessoa maravilhosa que você é. Eu faria de tudo para ter você ao meu lado.
- Parece um sonho, se eu não estivesse sentindo tanta dor provavelmente acharia que realmente é. Você não sabe como isso está me fazendo feliz. Você agora é a minha razão para continuar vivendo, quero viver para compartilhar isso. – Depois de tudo o que foi dito não havia mais nada que fosse possível expressar com palavras. Os olhares, lágrimas e expressões valiam mais do que qualquer coisa que fosse dita naquele momento. O silêncio não era desconfortável, era como se representasse a pausa para um novo capítulo que começaria nas nossas vidas. Era o início de algo bom e feliz e eu mal podia esperar para começar.
se despediu de mim com um beijo em minha testa. Disse que viajaria durante um mês para resolver problemas de família, mas que voltaria para resolver tudo o que aconteceria entre nós dois. Eu não sabia ao certo como isso aconteceria, o reencontro, mas sabia que seria um dos dias mais felizes da minha vida que estava prestes a começar.
O dia que eu tanto esperei, da minha cirurgia, havia finalmente chegado. Eu mal podia conter a felicidade, porém ao mesmo tempo fiquei triste por não poder ver por tanto tempo. Fui levada para a sala de cirurgia em uma maca, minha mãe segurava minha mão apertado. Ela que sempre foi minha companheira e melhor amiga, era a única coisa que eu sentia naquele momento. Fomos separadas quando entrei na sala iluminada. Uma luz forte brilhava sobre minha cabeça. Enfermeiras preparavam o material, enquanto minha mente vagava para um lugar que eu não conhecia. Ela vagava para onde estava. Recebi a anestesia e comecei a sentir a sonolência me puxar para o vazio e tudo ficou escuro.
Acordei com uma mão segurando a minha. Por um momento pensei que fosse , mas era minha mãe. Ela estava dormindo, mas acordou quando sentiu o movimento de meu corpo tentando achar uma posição mais confortável. Conversamos por algum tempo. Ela disse que a cirurgia havia sido um sucesso e que não houve problemas de rejeição, contudo eu teria que tomar os remédios para evitar isso para o resto da minha vida. Era um pequeno preço a pagar pela felicidade que me esperava. Permiti-me a ter esperanças pela primeira vez em muito tempo e a sensação era ótima. Mamãe disse que teria alta na próxima segunda feira, mas que deveria ficar um tempo em repouso quando chegasse a casa.
No mês em que estaria longe, minha ansiedade me fez ficar sonhando acordada. O que acabou fazendo com que o tempo corresse a nosso favor. Eu esperava impacientemente por uma visita, um telefonema, uma carta, qualquer coisa que dissesse que ele estava voltando para mim. Como um milagre ele apareceu em minha porta. Minha mãe estava no trabalho. Ela não se preocupava e nem me sufocava tanto desde a cirurgia. Isso foi bom, pois não precisaria dar explicações. Com ele a luz voltou para minha vida. Tudo parecia mais iluminado e colorido com ele na sala.
- Senti sua falta. – As primeiras palavras saíram de minha boca.
- Também senti a sua, queria voltar logo para resolver o que eu tinha deixado inacabado. – Ele acariciou meu rosto com umas das mãos e com a outra me puxou para um beijo. E aquele beijo dizia muitas coisas sobre nós dois. Tudo o que sentíamos um pelo outro simplesmente transbordou. Eu sentia como se tivéssemos sido feitos um para o outro, como se fossemos destinados e algo forte nos ligasse. Ele partiu o beijo e me disse o que eu queria tanto ouvir.
- , você quer namorar comigo?
- Sim! Mil vezes sim!
- Pedir você em namoro parece tão pouco perto do que eu to sentindo agora... Você é o meu sonho. Faço tudo por você, cada passo meu agora estará diretamente ligado a você.
- Eu penso da mesma forma, acho que doeria se me separassem de você agora. – Nós dois compartilhamos um sorriso de compreensão e passamos o resto de nosso tempo juntos conversando. Minha mãe chegou a casa e ainda estava lá comigo. Ela não parecia estar surpresa. Cumprimentou-o e deu um beijo em minha bochecha antes de ir para o quarto trocar de roupa. Ele se despediu, disse que havia perdido a hora, mas que me levaria para um passeio no dia seguinte. Disse que eu deveria me preparar para uma surpresa. Eu mal podia esperar para estar perto dele mais uma vez.
No dia seguinte chegou cedo para me buscar. Conversou com minha mãe enquanto esperava que eu me trocasse. Por mais que eu perguntasse para onde íamos, ele não me contava. Mas não importava o lugar, contanto que ele estivesse comigo. Seguimos por uma linda estrada margeada pelo gramado e pequenas árvores. Ele continuava calado para qualquer pergunta sobre o nosso passeio. Até que chegamos a um lindo e grande lago esverdeado pelo reflexo do sol e as algas. Havia grandes árvores ao seu redor. Era o lugar perfeito. Caminhamos até um pequeno barco a remo de madeira; junto a ele havia uma grande cesta de piquenique. Ele remou até o meio do lago. Lá abrimos um guarda sol branco e encaixamos no meio do barquinho. Ficamos conversando talvez horas sobre nada de importante enquanto comíamos. Quando o barco já estava ficando desconfortável, voltamos para a terra e continuamos a conversar sob uma grande árvore.
- Qual problema você teve que resolver nessa viagem? – Eu só queria puxar assunto, mas ele pareceu nervoso com a pergunta.
- Eu... Não era nada de importante. Um tio precisava de ajuda, pois estava com problemas de saúde.
- Entendo... Aquele tempo todo sem fazer nada foi muito chato. E eu morria de ansiedade para saber se você voltaria ou não. – Ele pareceu mais calmo com a mudança de assunto.
- Para mim também foi horrível. Ainda mais por finalmente saber que o que eu sinto por você é recíproco. Isso me deixou louco e eu queria voltar antes, mas não pude.
- Eu entendo completamente. Agora temos o resto de nossas vidas para ficarmos juntos. Um mês não vai fazer diferença com todo o tempo que temos pela frente.
Ele sorriu para mim o sorriso mais lindo e deitou em meu colo. Olhamos para o céu. As nuvens passavam por nós fazendo sombra nos morros a nossa frente. Pareciam grandes pedaços de algodão doce sobre toda aquela imensidão azul. Aquilo me deu tanta paz, bservar tudo e ao mesmo tempo sentir o calor do sol, que apesar de não estar diretamente sobre nós aquecia nossos corpos, era sensação mais maravilhosa combinada a estar com deitado sobre mim.
Voltamos para casa e ele me beijou antes de abrirmos a porta, um beijo leve, mas intenso. Envolvi seu pescoço com meus braços e nos aproximei ainda mais. Nada pode descrever a sensação de amar e ser amada. Eu não conheço filme, música ou livro que tenha conseguido ser fiel ao que estava sentindo naquele momento. Partimos o beijo e nossas despedidas foram ditas por nossos olhares tão profundos um sobre o outro. Um sorriso me escapou, convidando-o a sorrir também. Abri a porta e disse tchau.
Passamos um ano maravilhoso. Nossa vida juntos não podia ser melhor, tudo estava dando certo. Eu e já estávamos conversando sobre casamento. Mas eu achava que nada seria mais forte do que o que eu sentia por ele. Nenhum casamento mudaria nada em nossa relação que já tinha todas as características desse tipo de comprometimento. Nós éramos como almas gêmeas que se encontraram, juntando-se e voltando a sua verdadeira forma de uma única. Definitivamente éramos uma só alma.
Os meses passavam e eu me sentia cada vez mais feliz. Todo aquele passado, toda aquela neblina parecia se dissipar por causa do sol que agora me prendia em sua órbita. era o astro mais brilhante no universo de minha vida. Ele me deu apoio do meu curso técnico de enfermeira. Acho que ele foi a minha inspiração. O curso levaria dois anos. Ele me dava dicas e me ajudava sempre que eu precisava. Quando conclui o curso, ele e minha mãe estavam lá. Ambos sorriam para mim e me davam força enquanto recebia meu diploma. Comecei a trabalhar em um hospital a quinze minutos de casa. E agora que tínhamos certa estabilidade, eu e finalmente poderíamos nos casar e sermos felizes para sempre.
Fomos à igreja marcar a data. Escolhemos cores, flores, padrinhos, madrinhas, músicas e tudo o mais que um casamento precisa. Escolhi meu vestido de noiva. Era lindo e tão armado quanto uma nuvem, e um branco puro e brilhante. Simples, porém elegante. Eu mal podia esperar pelo dia de usá-lo.
- ... Vamos nos casar daqui a dois meses, o que você acha disso? - me disse com o sorriso mais lindo do mundo.
- Tem como eu não achar maravilhoso? Isso será o símbolo de nosso eterno amor um pelo outro e nossos amigos participarão de tudo isso.
- Então eu tenho que te dizer uma coisa antes desse dia chegar.
- Não vai dizer que não quer mais casar comigo vai?
- Não, claro que não!
- Então o que é?
- Eu andei tanto tempo procurando, sem nem ao menos saber disso. Eu estava procurando você inconscientemente todo esse tempo que eu não te conhecia. Eu estive fazendo pedidos às estrelas, mas eu nunca poderia ter imaginado... Que eu pararia justamente onde você está depois desta jornada solitária. Eu olhei em seus olhos, tentei te alcançar para segurar a sua mão. Aí foi quando eu percebi que eu nunca poderia entender o que eu sinto por você, pois vai além do meu limite humano e provavelmente explodiria por causa desse sentimento. Você quer ser minha e meu único amor? Você quer jogar esse jogo e dar as cartas? Você quer correr ou você ou quer ficar por perto? Porque eu vou estar onde você estiver, não importa o que aconteça. Enquanto eu fizer você feliz, vou estar perto de você, porque não posso tirar meus olhos de você. Eu já disse que morreria por você uma vez e estou confirmando isso mais uma vez, pois eu preferiria a morte a ver você infeliz. Por tudo isso vou te perguntar pela segunda vez. , você aceita se casar comigo?
- Sim, eu aceito quantas vezes isso for possível! Faço minhas as suas palavras. Vou amar você para sempre, não apenas até que a morte nos separe, mas além de tudo isso. Se existe um paraíso, um dia, estaremos ainda juntos nele.
Duas semanas se passaram, mas parecia desanimado. Não infeliz, ele parecia cansado. Não parecia bem, então pedi que ele fosse ao médico e o mesmo lhe disse que fizesse alguns exames de rotina.
Ele voltou estranho depois que recebeu os resultados. Não me beijava mais e também não sorria. Eu não entendia o porquê e fiquei muito preocupada. Insistia que ele me contasse, mas ele dizia que estava tudo bem. Alguma coisa me dizia que algo estava errado. Um dia insisti mais uma vez para que ele me contasse e a resposta foi tudo menos o que eu esperava.
- O que você tem, ? Por que não me conta?
- Eu já disse para você que eu não tenho nada! Por que você faz tanta questão de me irritar?
- , eu não... Eu só estou preocupada com você.
- Preocupada? Você está me sufocando. Eu não agüento mais, esqueça toda essa história de casamento, porque não vai acontecer mais.
Eu entrei em choque, minha garganta fechou em um nó apertado, eu não conseguia respirar e ofegava para que entrasse algum ar. Tudo parecia estar ficando embaçado. As lágrimas pareciam a corrente de um rio, continuas e salgadas como o mar de tristeza que me afogava naquele momento. Ele caiu sentado chorando e segurando a cabeça como se sentisse dor. Não sei quanto tempo ele ficou assim, mas ao que me pareceram segundos ele levantou e saiu sem dizer nenhuma outra palavra. Eu fiquei parada em estado de choque, esperando acordar de um pesadelo horrível, mas eu não acordava. Tudo parecia cada vez mais real e eu compreendi que ele não voltaria.
Não consegui dormir naquela noite e no dia seguinte tentei ligar para a casa de . Na vigésima tentativa a mãe dele atendeu, disse que ele havia se mudado e que sentia muito pelo casamento. A única coisa que eu conseguia fazer depois de ter total certeza de que ele não me amava mais era simplesmente chorar. Chorava o dia inteiro até ficar cansada demais e dormir. Minha mãe se desesperava com minha tristeza. Ela dizia que eu tinha que me recuperar, que as coisas melhorariam, e que aquele tinha sido apenas meu primeiro amor, meu primeiro namorado. Mas eu sabia que não era só isso. Ele era minha alma gêmea, minha metade, e agora que ele tinha partido, metade de mim tinha ido junto. Eu duvidava que eu pudesse viver partida assim. Faltando metade de mim. Eu sentia com se minha capacidade de respirar tivesse ido com ele. Todos aqueles pensamentos suicidas voltaram. Meu coração me deixou e não tinha mais nada que me impedisse de realizar isso, mas eu pensava nos pacientes que eu atendia todos os dia no hospital. Talvez aquela fosse a solução para mim. Então liguei para o hospital e expliquei a situação. Eles pareceram entender, pois em deram uma semana de folga. Aquele era o tempo que eu teria para reaprender a andar com apenas metade de mim. Precisava me reerguer e isso não seria fácil, entretanto pelo menos dessa vez eu tentaria de verdade.
Após aquela semana eu voltei ao trabalho. Minha única razão para não estar a sete palmos abaixo da terra, mas por algum motivo aquele lugar, a minha casa, tudo ali me lembrava . Sentia-me sufocada pela presença dele. Dois meses depois de nossa separação, resolvi me mudar. Eu iria para uma pequena cidade da qual havíamos comentado uma vez. Ela era uma lembrança dele, mas não algo que me machucaria como onde eu estava naquele momento. Minha mãe entendeu meus motivos, mas não iria comigo. Ela tinha o emprego dela e entendeu que eu precisava desse tempo sozinha.
A mudança foi rápida e eu trabalharia no maior hospital da cidade. Chegar a um lugar novo me deu esperança de poder pelo menos viver uma vida de fachada. Onde ninguém saberia quem eu sou, nem sentiria pena de mim. Um lugar onde eu teria chances de me reconstruir, de juntar todos os minúsculos cacos que quebrou e largou com tanta facilidade.
Eu havia chegado há uma semana e era meu primeiro dia em meu novo emprego. Era um hospital muito bom, apesar de ser em uma cidade pequena. Fui ao primeiro quarto onde estaria o meu primeiro paciente. Entrei, tentando não fazer muito barulho. Peguei a ficha do paciente, pulei a parte do nome e fui direto para o quadro médico. Ele tinha um grave câncer no cérebro e tinha apenas um rim. Achei o caso curioso e comecei a devanear se ele tinha sofrido algo parecido comigo para ter apenas um rim. Escutei ele bocejar e se mexer como se estivesse acordando.
- Bom dia senhor... – Virei a página para ler o nome e qual foi minha surpresa ao ler o nome completo de na ficha. Entrei em estado de choque, parecia que tudo girava. Olhei para frente e ele me encarava. Havia uma intravenosa no pulso, mas ele parecia bem. Apenas pálido e com aparência cansada. As lágrimas voltaram ao meu rosto e eu comecei a entender o que havia acontecido. Agora tudo se encaixava. A briga sem sentido, a mudança repentina. estava doente e não queria que eu soubesse. Ele não queria que eu sofresse, mas não compreendia que eu queria apoiá-lo, como ele me apoiou quando estive doente. Eu senti meu coração se debatendo em meu peito. Como se ele tivesse voltado ao lugar antes vazio e frio. Ao mesmo tempo em que estava feliz em vê-lo, morria por dentro por causa da situação em que nos encontrávamos.
- ... Você... – Não conseguia falar direito. As lágrimas e a emoção não deixavam.
- ... Eu... Perdoe-me, eu não queria que você sofresse. Eu achei que seria mais fácil se eu saísse da sua vida dessa maneira. Não queria que você me visse morrer. Achei que seria mais fácil se você sentisse ódio de mim por ter de abandonado. Você então poderia ser feliz, casar, ter filhos... Viver por nós dois mesmo sem saber. Pois quando eu fui embora, minha alma e coração ficaram com você. E eu não queria que isso acontecesse quando eu morresse. Não queria que você se prendesse a minha memória, que você achasse que devia algum tipo de fidelidade ou amor a um morto. Por mais que tivesses prometido um amor além da vida. Não acho que seria justo você se sacrificar por mim se eu não estaria mais ao seu lado. Só queria que você fosse feliz.
- Eu jamais seria feliz, jamais amaria outra pessoa. Nunca poderia ser feliz sem você. Minha vida parou no momento que você saiu pela porta de minha casa e me abandonou. Eu tentei me reerguer, mas o equilíbrio não tem como ficar perfeito quando falta um pedaço seu. O pedaço que você levou quando me deixou. O meu coração.
- , você entende que eu não vou viver por muito mais tempo? Que isso não é o melhor para você, que seria melhor se afastar e tentar ser feliz sem ter que passar por isso?
- Eu entendo, mas acho que seria pior não viver os meus últimos momentos...
- Não são os seus últimos momentos! Por favor, não diga isso. Eu não lutei tanto para que você vivesse para você jogar tudo fora! E parte minha ainda vai viver em você, eu sou parte de você e você é parte minha!
- O que você quer dizer com isso?
- Você não leu a minha ficha? Não notou nada de estranho nela? Não tem nada faltando?
Eu fiquei estática no mesmo instante. Lembrei do que tinha lido. Peguei a ficha mais uma vez e a situação e o tipo sanguíneo batiam. Um jorro de compreensão inundou minha mente naquele momento.
- Então o transplante... Foi você?
- Entenda que eu te amo, não queria perder você. Eu fiz o possível para te manter viva, então por favor não acabe com isso. Prometa que vai viver por nós dois... Prometa ! – As lágrimas não paravam descer pelo meu rosto.
- Eu prometo viver por nós dois, mas ainda não acabou. Você ainda está aqui comigo. Eu quero estar do seu lado até o fim.
Com isso decidimos que eu viveria por nós dois e que aproveitaríamos tudo até o final. Que faríamos daquele tempo o melhor que passamos juntos. Eu não me preocupava mais com o que aconteceria. Casamos uma semana depois do encontro no hospital. Aquele foi um dia bom do . Porque ele tinha dias bons e ruins. Fico feliz que ele tenha aproveitado o momento tanto quanto eu, aquilo foi muito importante para nós dois. Para marcar o que sentíamos e provar isso de uma maneira concreta. Apesar da verdade no nosso amor.
Foram três meses. Os melhores meses de nossas vidas. Nada poderia ter sido mais perfeito, o tempo que passamos juntos era para cobrir todo o tempo em que eu estaria sozinha. Pois sem ele era assim que eu me sentia. Aé que na última semana ele já não agüentava mais levantar da cama. Ele ficava muito sonolento com os remédios para a dor. Ficava cada vez mais pálido, mas eu não conseguia vê-lo dessa maneira. Ainda me lembrava do homem cheio de vida com o sorriso encantador pelo qual me apaixonei. No final da semana, era uma sexta-feira, ele parecia estar melhor... Um tímido tom rosado florescia em suas bochechas. Por algum motivo eu senti como se aquilo tudo fosse acabar, que ele ficaria bom e que poderíamos continuar nossas vidas. Eu achei que tudo aquilo tinha sido só mais um teste entre os tantos que sofremos. Nós conversamos a tarde toda. Falamos do que poderia ter sido como se isso pudesse se concretizar. Ele disse que sempre sonhou em ter um filho e que queria que o nome fosse . Eu engoli o choro, pois sabia que isso nunca aconteceria. Ele chegou para o lado da cama e fez sinal para que eu deitasse ao seu lado. Deitei-me com a cabeça sobre seu peito que subia e descia com a respiração dele. E fiquei ali sentindo o cheiro dele me fazer adormecer. Eu estava quase dormindo quando ele sussurrou no meu ouvido:
- Eu te amo. Para sempre...
- Eu também te amo. Para sempre!
Depois disso me aconcheguei ainda mais e dormi.
Acordei no dia seguinte na mesma posição. Desesperada, percebi que o peito de não se movia mais como antes. Tentei acordá-lo, mas ele não reagia. O choro me incapacitou por apenas dois segundos, que foi o mesmo tempo que eu levei para pegar o telefone e começar a ligar para a emergência. Os médicos chegaram, mas já não havia mais nada a fazer. Quando trouxeram a maca para levar o corpo, senti náuseas e vomitei. Mas o choro não parava, eu não conseguia acreditar que ele não estava mais comigo.
Eu vi seu rosto branco e sem vida ser coberto pelos médicos e a dor foi tão grande que cai desmaiada no chão.
Quando acordei estava no hospital. Havia uma enfermeira checando minha bolsa de soro. Quando ela percebeu que eu havia acordado me deu um grande sorriso.
- Parabéns, mamãe! Bom dia!
- O quê? Do que você está falando?
- Você vai ser mamãe! Muitas felicidades, você está grávida. Mas não se preocupe, o estresse não afetou o bebê.
Nesse momento eu lembrei de tudo o que havia acontecido. Agora a morte da pessoa que eu mais amei na vida era um “estresse”. Então eu me dei conta do que ela estava falando. Eu estava grávida. Apesar de toda a tristeza eu sabia que havia me deixado uma parte dele, que para mim era muito mais do que eu podia esperar. Eu teria o nosso filho e ele seria a maior prova de tudo o que vivemos.
foi e é o que me sustenta, e minha nova razão para viver. Sem ele não sei o que teria sido de mim. Não sei como teria suportado todo esse tempo sem . Mas quando eu sinto muita falta dele, eu só preciso olhar para . O mesmo sorriso, os mesmos olhos do pai. Mas isso não me deixa abalada. Agora que tantos anos já se passaram vejo em o avó, o pai, o marido, o homem que Gabriel teria sido. Fico imaginando se ele teria envelhecido da mesma maneira. Os anos passaram tão rápido que quando olho para trás me pergunto se tudo o que eu vivi após a morte de realmente aconteceu. Mas cada vez mais eu sinto que vou revê-lo. Eu sinto que o diário da minha vida esta prestes a se fechar. E talvez quando isso acontecer eu possa revê-lo. Viver em outro lugar o que não tivemos chance. E finalmente reencontrar meu primeiro e único amor.
FIM.
N/A:Prometo que não vou escreve muito!
Desculpa se ficou parecendo uma novela mexicana de tão meloso! Mas a idéia veio e eu não quis ignorar....
Eu queria agradecer a Bruh que me deu a idéia e me pediu pra escrever uma fic triste... se querem culpar alguém culpem a ela! Agradecer a minha prima Clá que teve toda paciência comigo enquanto eu escrevia e me deu muito apoio. Quero mandar a Dany se ferrar pq ela me zoou muito enquanto eu escrevia. E agradecer a quem leu a fic! E eu tbm queria pedir a paz mundial (sorriso de miss e acena* interna neh thais?) beijos queridas!