Prólogo
– Jordan, aonde você está me levando? – Ela perguntou sentindo seus saltos fazerem um barulho depois de pisarem em uma superfície lisa, se ela não estava enganada, provavelmente feita de pedra – Nós temos que voltar para a festa, Cassandra provavelmente está a minha procura. – Ela sabia que ele estava aprontando algo, pois desde que chegaram suas mãos suavam.
– Calma. – Ele respondeu tentando se equilibrar enquanto cobria o rosto da namorada com as mãos. – Será que você não pode relaxar por dois segundos? – Ele tirou suas mãos de cima dos olhos dela. Ele a segurou pelos ombros e a fez girar lentamente para que ficassem cara a cara.
– O que foi amor? – Ela perguntou cruzando os braços sentindo o vento frio da noite bater em seu corpo. Ela olhou em volta e viu que estavam no terraço da galeria em que ela trabalhava e estava acontecendo a festa do ano. Ele sabia que esse era o seu lugar favorito e se a havia trazido até lá era porque queria falar algo importante – Jordan, por que você me trouxe aqui? – Ela virou sua cabeça para frente, não avistando mais seu namorado, ela olhou para baixo e o viu de joelhos segurando um anel em suas mãos – Oh meu Deus!
– Eu não consigo pensar em mais ninguém com quem eu queira dividir a minha vida, então, estou aqui, de joelhos, lhe implorando para que aceite ser minha para sempre. Lilah, você aceita se casar comigo?
– Mas é claro que sim. – Ela respondeu, deixando as lágrimas caírem por seu rosto. Ele colocou o anel em seu dedo e se levantou, pegando-a pela cintura e dando-lhe o beijo mais demorado possível.
– Lilah! – a única voz que ela não queria escutar no momento estava chamando seu nome em alto e bom som.
– Lá vem a rainha do gelo. – Ela disse separando-se dele.
– Cuidado com o que você fala, ela ainda é minha mãe. – Ele sussurrou em seu ouvido, segurando-a pela mão.
– Lilah! – Ela gritou mais alto, fazendo com que a garota rolasse os olhos.
– Sim. – Ela respondeu soltando a mão do noivo e indo em direção à mulher que vinha conversando com outro homem que ela não conhecia.
– Vocês já terminaram? – Ela pegou a mão da menina, vendo o diamante refletir em seu dedo. – Oh, parabéns, minha querida. – Ela a abraçou tão forte que a menina podia jurar que ela queria matá-la – Mas tenho um problema, – Ela a segurou pelos ombros – e você vai ter que arrumar uma solução.
A garota sorriu, mas sabia que a partir dali sua vida não seria fácil nem que por um segundo.
Capítulo 1
Contei as malas para ter certeza que não iria esquecer nada, eu sabia se pelo menos passasse por minha cabeça esquecer algo, Lilah iria falar até a próxima encarnação e a ladainha dela era a última coisa que eu queria escutar, principalmente em tempos como esses quando tudo parecia estar dando errado e era tudo minha culpa, segundo ela. Lilah estava a uma semana de se casar, o convite tinha chegado há duas semanas, devo ressaltar o quanto fiquei surpresa já que ela tinha avisado a todos da família, menos a mim. Então quando o envelope dourado se destacou entre as cartas que o carteiro tinha me entregado numa segunda-feira à noite fazendo com que eu quase engasgasse com minha comida, eu sabia que algo tinha acontecido. Provavelmente vovó deveria ter batido na casa de Lilah às duas da manhã fazendo o maior barraco quando soube que eu não tinha a menor ideia sobre o seu casamento. Ela sabia que não éramos próximas, mas era o casamento dela, pelo amor de Deus, que tipo de irmã não chama a outra para o próprio casamento?
Sorri, imaginando vovó às duas da manhã gritando com Lilah, uma briga com ela e você sairia perdendo mesmo que estivesse certo. Ela era uma mulher geniosa para sua idade, principalmente quando se tratava das suas netas favoritas.
Nossos pais tinham morrido quando ainda éramos crianças, era Natal e estávamos na casa de vovó enquanto nossos pais estavam voltando de viagem de sua segunda lua de mel. Quando a campainha tocou nós corremos até a porta alegres porque iríamos ver nossos pais depois de duas semanas, mas em vez disso dois homens de terno entraram e abraçaram vovó, Lilah segurou em minha mão forte porque ela sabia que algo estava errado e a próxima informação faria com que nossas vidas mudassem para sempre. No momento não percebemos, mas mudou muito mais do que queríamos.
Lilah superou logo no primeiro ano porque gostava de lembrar que papai e mamãe iam querer que nós continuássemos nossas vidas, levando-os conosco dentro de nossos corações. Ela cresceu tirando notas boas na escola e, quando chegou ao ensino médio, entrou no clube de debate, namorou o um dos caras mais populares e saiu da escola como a melhor aluna do ano. Todos tinham orgulho dela, da sua superação, já comigo todos tinham pena porque a morte dos meus pais tinha me afetado tanto que eu nunca mais passei a usar uma roupa colorida outra vez. Vovó entendia que cada um tinha seu tempo, ainda mais sendo um acontecimento marcante. Ela sabia que era passageiro, mas não sabia que o passageiro iria demorar tanto tempo. Então quando voltei para visitá-la depois de um ano ela se surpreendeu com o quanto eu tinha mudado.
Lilah nunca tinha entendido, e acho que até hoje ela pensa que uso as mesmas roupas e nunca consegui atingir nenhuma meta na vida. Ela ficaria surpresa o quanto eu consegui na vida, muito mais do que eu imaginei.
Lilah era a única que ainda visitava vovó no Natal, mas ia embora antes da meia noite porque queria chegar a tempo para a celebração na casa do seu, agora, futuro marido. Eu aparecia dias depois, quando o trabalho me permitia.
Nossa relação passou de irmãs para duas estranhas em menos de um ano depois da morte dos nossos pais, cada uma tinha seguido seu caminho e, quando Lilah foi para faculdade na Europa, nós perdemos qualquer contato. Na última vez que visitei minha avó, ela comentou sobre o namorado empresário e o emprego dos sonhos em uma galeria que eu tinha esquecido o nome. Ela disse que quando tentava falar de mim com Lilah, ela mudava de assunto e ia embora no minuto seguinte.
– É tudo isso, senhorita Hart? – O homem perguntou colocando a última mala no vagão. Eu estava pegando o trem de Londres até Oxford, uma cidade no interior da Inglaterra para uma casa onde aconteceria o casamento do mais novo casal feliz. Eu tinha vindo a Londres uma semana antes para ajudar uma amiga em uma de suas exposições de moda, mas com uma semana tão agitada que nem vi o tempo passar e acabei perdendo o prazo para comprar o ticket, acabei atrasando um dia. Lilah tinha me ligado hoje pela manhã gritando porque ela tinha perdido seu precioso tempo me esperando na estação quando ela tinha um casamento para planejar, eu apenas ignorei e desliguei na cara dela. Fazia anos que não nos víamos e a única coisa que ela conseguia fazer era gritar comigo? Nós não podíamos apenas nos comportar como adultas?
– É tudo sim. – Falei dando um sorriso breve. Meu celular começou a tocar dentro do bolso, mas eu não precisei pegá-lo pra saber quem era.
– Eu juro que se sua irmã ligar outra vez eu pego esse trem com você. Como foi que você conseguiu crescer com aquele monstro?
– Ela não é tão mal assim. – Fiz uma careta.
– Ela não é... Oh, por favor. – Ela fez uma careta – Ela não ia chamar a própria irmã para o casamento dela. A própria irmã. – Ela aumentou o tom de voz – E você ainda acha que ela não é tão mal assim? O que não seria tão mal assim seria se ela caísse quando estivesse andando em direção ao altar. – Sorri vendo as caras e bocas que Linda fazia – Você tem certeza que não quer ficar por aqui? Eu vou te tratar bem e prometo não te comer. – Ela falou me puxando para um abraço.
– Eu adoraria, mas Lilah precisa de mim. – Falei me desfazendo do abraço – Na verdade eu sei que ela não vai nem notar minha presença, porém, vovó faz questão que eu esteja lá e eu também quero estar lá.
– Você quer?
– Claro que sim. É o casamento da minha irmã, Linda, por mais que tenhamos nossas diferenças eu sempre desejei todo o bem para Lilah.
– Aposto que ela só lhe desejou o mal. – Ela falou entre os dentes, mas antes que eu pudesse retrucar, o apito do trem soou avisando que estava prestes a partir – Obrigada por vir me ajudar. – Ela falou, dando-me outro abraço.
– De nada, qualquer coisa é só me ligar que eu venho correndo – Falei me separando dela. O apito soou avisando que o trem estava prestes a sair.
– Qualquer coisa me liga que eu vou correndo com um taco de baseball pra abrir o crânio da sua irmã e procurar um cérebro.
– Até mais, Linda. – Falei, pegando minha mala de mão e entrando no trem.
– Qual a cabine, senhorita?
– 23.
– No final do corredor, a direita.
– Obrigada. – Entrei no pequeno corredor de cabines. Cheguei à cabine 23 e logo quando abri a porta, avistei um homem de terno, de cabeça baixa, sentado em um dos bancos – Acho que entrei na cabine errada. – Dei um passo para trás, porém ele segurou em minha mão, fazendo com que eu ficasse no meio da porta.
– Não, não. As cabines desta seção cabem duas pessoas, se você quisesse ficar sozinha teria que pagar pela a seção A. – Ele falou com uma calma que eu pude jurar que ele pensava que estava falando com uma criança – Se você tiver problema comigo aqui, eu posso arrumar outra cabine.
– Não, não. Você pode ficar, eu só estou um pouco... Um pouco surpresa. – disse dando um passo para frente fazendo-o dar dois para trás – Desculpe se o ofendi, – Falei sentando no banco em frente ao seu – não foi minha intenção. – Ele se sentou no banco à minha frente e colocou os óculos outra vez.
– Mas é claro que não, – Ele levantou o olhar, pegando o livro ao seu lado – Eu não me ofendo com tão pouco. – Ele sorriu voltando sua atenção ao livro em suas mãos. Dei uma pequena olhada para o livro que ele segurava e dizia na capa "Romeu e Julieta", um tanto quanto estranho para um homem que usava um terno, normalmente eles seguravam um jornal e falavam alto no celular sem nem ao menos importar se tinha alguém ao seu lado. Tomara que ele não comece a falar alto, pensei tirando meu celular do bolso. 15 chamadas de Lilah e mais duas mensagens de voz que eu não precisava nem fazer força pra saber de quem era.
Respirei bem fundo e encostei a cabeça na parede que ficava atrás de mim. Eu estava começando a acreditar que Lilah estava pegando tanto no meu pé porque ela simplesmente estava com muito tempo livre. Eu não via outra razão para que ela me ligasse de cinco em cinco minutos perguntando se eu já havia chegado. Se ela estava tão irritada com o fato de ir me buscar na estação, por que não mandava alguém no seu lugar? Ela nem ao menos me queria lá, por que ela está tão irritada com o fato de eu ainda não ter chegado? Provavelmente vovó estava fazendo com que ela pelo menos fingisse que se importava.
Eu poderia estar sendo dura, apesar de tudo, ela era minha irmã, porém vindo de Lilah, você poderia até esperar qualquer coisa até que ela me apresente como sua prima distante já que tinha contado uma história de ter virado órfã quando nossos pais morreram.
Ela não era maldosa porque queria, só que estava no seu DNA ser um pouco irritante. Deus sabe o quanto eu posso ficar parecida com ela com um pouco de esforço até vovó se policiava para que essa parte da nossa genética que estava presente em abundância em Lilah não ficasse tão amostra.
Escutei um grito vindo de longe afastando meus pensamentos da minha querida irmã por um tempo e fazendo com que eu olhasse para o homem à minha frente. Eu não tinha percebido, mas ele era bem bonito.
– Você escutou isso também? – perguntei para ter certeza de que não tinha sido coisa da minha imaginação.
– Escutei sim. – Ele respondeu. Escutamos outro grito, agora um pouco mais alto e logo depois um barulho de tiro. Ele se levantou de uma vez e foi em direção à porta – Eu vou ver o que é. – Ele disse abrindo a porta e se virando para mim – Você vai ficar bem aí sozinha? – assenti vendo-o desaparecer pelo corredor. Que tipo de ser humano pergunta a uma garota que acabou de conhecer se ela vai ficar bem sozinha? Um que quer entrar em suas calças, a voz maldosa de Linda e de suas incontáveis regras de como saber que um homem quer entrar em suas calças. Mas esse era um caso diferente, ele estava apenas sendo gentil e provavelmente quando descobrisse o que estava acontecendo iria tentar salvar sua vida e me deixaria aqui para descobrir do modo mais cruel.
– Venha comigo! – Ele entrou de uma vez dentro da cabine e me pegou pela mão sem a menor cerimônia e me arrastou pelo corredor até o vagão das malas.
– O que você está fazendo? – perguntei tentando segurá-lo pelo braço, porém ele era bem mais forte do que eu, e conseguia me arrastar como se eu fosse uma mala vazia – Você não pode simplesmente ir arrastando as pessoas sem nem ao menos dizer o porquê. – Ele me ignorou – Ei, eu estou falando com você.
– Eu estou salvando você, será que você poderia ficar quieta um segundo.
– Me salvando? – perguntei, vendo-o abrir a porta do vagão de carga – Me salvando de que? – perguntei quando ele praticamente me jogou para dentro do vagão e fechou a porta atrás dele.
– Dos ladrões que estão no trem.
– Tem certeza que são ladrões? – perguntei cruzando os braços.
– Acho que eu consigo reconhecer um ladrão quando me deparo com um – Ele perguntou incrédulo olhando para mim.
– Você não acha que seria melhor entregar nossos pertences para eles?
– Mas é claro que não, eu tenho muito a perder. Escutei vozes perto da porta do vagão e logo um deles tentando mexer no corrimão. Olhei para o homem que olhava assustado para os lados tentando arrumar uma saída para fugir dos ladrões.
– O que você está fazendo? – debochei encostando-me na parede de madeira do vagão.
– Eu estou tentando arrumar um jeito da gente sair daqui. – Ele disse andando de um lado para o outro.
– A gente? – perguntei me afastando da parede – A gente não vai a canto nenhum, porque a gente não existe.
– Eu estou tentando te salvar e é assim que você me agradece?
– Por mim, eu tinha ficado dentro da cabine. Não é como se eu tivesse alguma coisa a perder.
– Mas eu tenho.
– E o que eu tenho a ver com isso? Eu nem te conheço.
– Senhorita Cane, querida, eu sei que você está aí dentro. – Engoli o seco – Abra a porta, prometo que não lhe faremos nenhum mal.
– Você...
– Não, meu sobrenome é Hart, não Cane.
– Eu sei que você está aí dentro, eu já procurei esse trem inteiro e você só pode estar aqui. – Ele bateu com força na porta fazendo com que a mesma balançasse.
– Dá pra você pensar mais rápido? – perguntei andando em sua direção – Eu não quero estar aqui quando eles descobrirem que essa mulher que eles estão procurando não está aqui.
– Eu estou tentando, mas a única saída é abrir a porta e se deixar levar por eles.
– Se eu não me engano, a pelo menos, uns dois minutos atrás você disse que tinha muito a perder.
– Bem, eu não vejo nenhuma saída e você?
– Eu também não. – Cruzei os braços, andando de um lado para o outro – Não é como se a gente pudesse pular do trem em movimento por esse portão que eles usam pra colocarem as malas aqui dentro.
– Brilhante! – Ele disse fazendo com que eu parasse e o encarasse – Vamos! – Ele andou em minha direção, me pegando pela mão.
– Vamos para onde? – perguntei vendo-o me arrastar para o portão que ficava na lateral do trem – Se você não percebeu, essa frase foi puro sarcasmo. Você não conhece sarcasmo não?
– Até conheço, e estou mais familiarizado com ele do que você imagina, porém seu sarcasmo serviu de uma boa ideia. – Ele abriu o portão do vagão.
– Eu não vou pular. – Falei dando dois passos pra trás.
– O máximo que pode acontecer é você morrer.
– Eu não posso morrer agora. Eu ainda tenho muita coisa pra viver, muitas histórias pra viver. Eu nem dormi na casa de um estranho porque não tinha como voltar pra casa ou muito menos bebi até parar no hospital. – Ele olhou para mim e riu – Estou falando sério! Eu ainda não vivi as melhores coisas da vida.
– Garanto que se a gente sobreviver eu tomarei um porre com você e até resolvo seu problema em dormir com um estranho.
– Dormi na casa de um estranho, não com um estranho. – Ele deu de ombros e se virou para a mata que passava por nossos olhos. A porta do vagão foi arrombada e logo pudemos ver os ladrões nos olhando com sorrisos nos rostos, provavelmente pensando que nenhum maluco pularia de um trem em movimento ainda mais para cair no meio da mata. Mas antes mesmo que eu pudesse soltar a mão do desconhecido ao meu lado e me render, ele me agarrou pela cintura e pulou fora do trem e a única coisa que eu consegui fazer foi fechar os olhos e rezar para que saísse viva e inteira.
Capítulo 2
– Ei! – Escutei uma voz de longe me chamar e, a única coisa em que eu estava pensando era por que meu braço ardia tanto – Acorda! – senti meus ombros sendo balançados e lentamente abri meus olhos sentindo a luz machucá-los. Eu estava no céu ou algo parecido? Porque o homem que estava a minha frente passando a mão carinhosamente em minha bochecha parecia um anjo. – Você está bem? – Mas não demorou muito para que dois chifres aparecessem e eu lembrasse que esse anjo estava mais para demônio que veio atormentar minha vida.
– Não, eu não estou bem. – Falei afastando-me dele e levantando em um pulo. – Mas é óbvio que eu não estou bem, eu acabei de pular de um trem em movimento. – Continuei olhando para ele.
– E sobreviveu! – Ele disse, se levantando – Imagine aí como seus filhos vão rir quando você contar essa história pra eles. – Ele continuou tirando seu terno e revistando os bolsos – Graças a Deus! – Ele tirou uma caixa do bolso do terno e colocou no bolso da calça – Vamos. – Ele disse começando a andar para o lado oposto de onde o trem tinha ido.
– Vamos pra onde? – perguntei, vendo-o virar-se pra mim.
– Eu vi uma cidade pela janela do trem enquanto você meditava, se a gente for andando agora a gente pode conseguir um lugar pra dormir e um curativo para o seu braço antes do anoitecer. – Ele apontou para o arranhão no meu antebraço. Então é por isso que meu braço está ardendo tanto, pensei, tocando na ferida – Não seria nada ruim se você começasse a andar, não é tão longe. – Ele entrou um pouco na mata e puxou uma mochila de lá.
– Ei! Como é que você sabia que isso estava aí? – perguntei, vendo-o colocar a mochila nas costas.
– Eu joguei antes da gente pular do trem e antes que você fale mais alguma coisa, você não viu porque estava paquerando com os ladrões. – Ele riu e voltou a andar.
– Paquerando com os ladrões? – perguntei incrédula, seguindo-o – Eu não estava paquerando com ninguém.
– Me pareceu, já que vocês trocaram olhares tão profundos. – Ele olhou para trás – Eu jurava que você iria correr para os braços dele e se deixar levar pela vida do crime com seus seis filhos.
– Seis filhos? – andei um pouco mais rápido para poder alcançá-lo – Da onde você tirou isso?
– Das fotos do seu casamento com o camarada Mark.
– Quem é Mark?
– O ladrão, seu futuro marido.
– Você sempre tira sarro da cara de desconhecido?
– Não só de desconhecidos, mas de conhecidos também. Você deveria ver o que eu faço com meu irmão. – Ele sorriu, fazendo com que eu sorrisse também e por um momento esquecesse que ele tinha feito com que eu pulasse de um trem em movimento.
– Eu tenho pena dele.
– Por quê? Eu não sou tão mal assim, sei até fazer piadas se você quiser.
– Não é por isso.
– Então por quê?
– Ele teve que crescer com um ser tão desprezível como você. – Ele me olhou boquiaberto.
– Você sempre maltrata desconhecidos?
– Só aqueles que me fazem pular de trens em movimento. – Ele riu.
– Isso acontece com muita frequência?
– Tão frequentemente como me estressar. – Respondi, sentindo uma gota de sangue chegar ao meu mindinho. Eu não tinha percebido antes, mas minha ferida estava sangrando.
– Você está sangrando. – Ele pegou meu braço – Eu pensei que estava apenas arranhado.
– Então somos dois. – Respondi, voltando meu olhar para ele que jogava a mochila no chão e começava a tirar a blusa social. Eu deveria ter o alertado ou o repreendido, porém eu estava muito curiosa para saber o que tinha debaixo daquela blusa desde que ele me pegou pela mão e me arrastou para o vagão de carga. Mas para a minha decepção, ele usava uma camiseta por baixo. Ele puxou a camisa de uma vez fazendo com que ela rasgasse, pegou um pedaço e enrolou em meu braço.
– Você é médico? – perguntei vendo-o pegar sua mochila do chão.
– Não, mas se você quiser, eu posso ser. – Ele se aproximou de mim. Revirei os olhos e comecei a andar, deixando-o para trás.
– Você não tem senso de humor? – Ele gritou, fazendo com que eu olhasse para trás.
– Até tenho e posso garantir que sou mais familiarizada do que você. – Sorri e continuei andando. Escutei sua risada atrás de mim, mas não me dei ao trabalho de olhar pra trás.
Continuei andando vendo o sol desaparecer aos poucos atrás da montanha verde à minha frente, o interior da Europa tinha uma beleza única onde não se achava em nenhum lugar do mundo. Era como se os moradores das cidades preservassem a história na arquitetura, fazendo com que os turistas voltassem no tempo ao visitarem as cidades. Nas montanhas ainda existiam ruínas de castelos, casas e vilarejos que tinham anos de existências e que ninguém teria coragem de tocá-las a não ser que fossem para representá-las em alguma série ou filme. Era uma parte da história que não iria sair dali porque apenas sua existência já contava a história de uma era inteira.
Olhei mais uma vez para trás e avistei o desconhecido a alguns passos de mim. Ele usava uma blusa branca e contava os trilhos do trem mostrando o quanto ansioso ele era, o que era muito raro para caras que usam ternos para ir trabalhar. Normalmente homens como ele eram bem confidentes sobre eles mesmos, pois já tinha atingido sua meta de vida e tudo isso dava para se dizer era apenas pelo terno que ele usava, porque segundo Linda: homens que não se sentem confortáveis em seu ambiente de trabalho nunca usariam uma calça mais justa e com a medida perfeita para que não arrastasse no chão enquanto eles andavam.
Homens que usam roupas sob medidas normalmente são donos de cargos mais elevados e têm a confiança e a arrogância de que nunca vão sair de uma sala sem fechar um negócio milionário. Então demonstrar que estava ansioso seria uma falha para um homem como ele, porém, eu não sabia que tipo de homem ele era. Na verdade, eu não sabia nem seu nome, como eu saberia que tipo de homem ele era? Se ele era decente ou não? Minha linha de raciocínio foi interrompida quando eu bati com força em uma espécie de placa de boas-vindas em forma de um urso gigante.
– Ai! – Falei dando dois passos para trás – Quem diabos colocou essa placa aqui? E pra que um urso desse tamanho?
– Para que os visitantes vejam de longe e não acabem que nem você, esbarrando nas coisas porque estava olhando estranhos. – o vi passar por mim com um sorriso no rosto.
– Olhando estranhos? – perguntei um pouco mais alto para que ele ouvisse, já que ele decidiu acelerar o passo – Eu não estava secando estranhos.
– Então qual a sua desculpa para estar olhando para trás todo o tempo?
– Eu estava preocupada.
– Preocupada? – Ele olhou para mim incrédulo – Há menos de dois minutos você estava reclamando porque eu te fiz pular de um trem, agora você está preocupada comigo?
– Estava me certificando que você estava atrás de mim, para que eu não andasse por toda a Europa sozinha.
– Qual a diferença entre ir comigo e ir sozinha?
– Bem, você iria me defender, óbvio.
– Pra você ser mal agradecida outra vez? – Ele abriu a porta do que aparentava ser um bar – Eu passo. – Ele esperou que eu passasse para deixar que a porta fechasse – Boa tarde, meu caro. – Ele falou encostando-se ao bar – Você por acaso não tem nenhum meio de transporte que possa nos levar para Oxford hoje? E quem sabe uma cerveja também?
– Boa tarde, meu caro. – O homem disse colocando uma cerveja em cima do balcão – Se vocês querem chegar a Oxford ainda hoje, terão que pegar o trem. – Ele olhou para mim e fez uma careta. Provavelmente ele estava pensando a mesma coisa que eu: nunca mais pegar um trem na vida. – Acho que nós preferimos outro meio de transporte.
– Bem, então vocês podem perguntar ao velho Earl se ele está disponível, às vezes ele leva pessoas quando vai a Oxford todas as manhãs buscar verduras frescas para o restaurante da sua mulher.
– E onde eu posso encontrar esse Earl?
– Você está falando com ele. – Ele se apoiou no balcão – Eu posso levar vocês para Oxford, por certa quantia é claro.
– Quanto o senhor quer?
– 500 libras.
– 500 libras? – gritei, chamando a atenção de algumas pessoas que estavam no bar.
– Nós aceitamos. – Ele disse, fazendo menção de tirar sua carteira do bolso. Segurei-o pelo pulso, fazendo com que ele olhasse para mim – O que foi?
– Eu não tenho dinheiro, deixei tudo no trem.
– Para sua sorte, minha querida, eu tenho o suficiente para nós dois. – Ele tirou a carteira do bolso e jogou as notas em cima do balcão – Você por acaso não teria quartos para passarmos a noite?
– Pra sorte de vocês, eu tenho um quarto de casal sobrando. – Ele falou pegando uma chave debaixo do balcão – Aqui está.
– Com licença! – Falei, me aproximando do balcão – Por acaso você não teria outro quarto sobrando?
– Vocês não estão juntos?
– Obviamente que não. – Ouvi o indivíduo ao meu lado riu pelo nariz, porém ignorei.
– Eu tenho outro quarto sobrando, mas esse é um quarto de solteiro.
– Ela vai ficar com ele. – Ele se levantou, pegando as chaves em cima do balcão – Ela tem vasta experiência em se virar sozinha. Os quartos são lá em cima? – o homem assentiu e ele continuou seu caminho sem nem ao menos olhar para trás uma vez.
– Espere um minuto. – Falei seguindo-o – O que você quis dizer com isso? – continuei, enquanto subia as escadas – Você não pode simplesmente falar com uma pessoa assim e sair andando, não é correto.
– Uh! – Ele se virou para mim do topo da escada – Veja como eu ando e desprezo suas regras de etiquetas. – Cheguei ao topo da escada vendo-o andar até o final do vasto corredor cheio de quartos – Sou um fora da lei, um cavalo batizado, alguém, por favor, me ajude a me tornar um homem educado. – Ele colocou a chave na fechadura e a girou fazendo com que a porta abrisse.
– Muito maduro da sua parte. – Falei, procurando meu quarto no corredor.
– Boa noite, vovó. – Ele fechou a porta antes que eu pudesse responder. Soltei todo o ar pela boca enquanto colocava a chave na maçaneta. Só mais um dia, depois você estará livre dele, pensei girando a maçaneta. Mas no mesmo instante eu desejei que não tivesse visto.
– Ai meu Deus! – coloquei minhas mãos tampando meus olhos enquanto me afastava da porta. Eu não sei de onde ele veio, mas quando eu menos esperei suas mãos estavam em meu rosto segurando-o para que eu o olhasse para ele.
– O que foi dessa vez? – Ele procurou o meu olhar e eu apenas apontei para o quarto, impossibilitada de dizer uma palavra.
– Lá. – Ele me soltou e andou até o quarto, ele nem se incomodou em entrar no quarto, apenas fechou a porta e se virou pra mim.
– Não sei porque o escândalo com algo tão natural. Todo mundo faz sexo.
– Eu sei disso. Eu só fui pega de surpresa.
– Então pra que fazer esse escândalo?
– Eu não fiz nenhum escândalo, eu apenas me assustei.
– E acordou todos os hóspedes. – Olhei para ele de boca aberta.
– O que você queria que eu fizesse? Que eu aplaudisse? Não sei você, mas não é todo dia que eu acho outro casal fazendo amor em cima da cama que deveria ser minha.
– Ah não, Johnny! De novo não. – O velho Earl apareceu segurando uma cerveja na mão
– Desculpe, pai. – O tal de Johnny saiu arrumando a calça com a cueca na mão e a uma moça envergonhada segurando na outra.
– Olha senhorita, esse era o único quarto que sobrou, se você quiser outro quarto, receio que esse era o último.
– Mas...
– Ela dorme comigo. – Ele me interrompeu.
– Eu não vou dormir com você, eu nem te conheço.
– Então faça proveito da sua cama recém batizada. – Ele disse andando em direção ao seu quarto. Mordi o lábio e bati o pé no chão.
– Espera! – disse me virando para ele – Eu fico com a cama.
– Tudo bem. – Ele abriu a porta do quarto. Andei em passos largos até o quarto passando por ele até entrar no mesmo. O quarto era razoavelmente grande, tinha uma cama de casal, uma janela que dava pra ver a lua e as montanhas e um banheiro que não tinha uma porta, apenas umas cortinas e bem transparente, se devo ressaltar. Que espécie de hotel não tinha uma porta no banheiro? Um que ficava em cima de um bar, pensei.
– Você deveria tomar um banho. – Ele começou fechando a porta atrás de si. Arregalei os olhos virando-me para ele incrédula.
– Não, eu passo.
– Por quê? – Ele cruzou os braços – Por querer que você morra de uma infecção enquanto não chegamos naquela droga de cidade no quinto dos infernos?
– Oxford não é no quinto dos infernos.
– É uma cidade universitária, por aí você tira. – Ele se jogou na cama.
– Ei, você disse que eu podia ficar com a cama.
– Mas eu nunca disse que eu não estaria nela também.
Capítulo 3
– Ei! Eu estou de toalha. – Falei, vendo-o entrar no quarto. O velho Earl nos acordou às sete da manhã para que estivéssemos prontos às nove para ir com ele até Oxford. Porém, o que eu não esperava, era acordar para tomar um banho tão gelado que eu sentiria meus ossos quase congelando debaixo da minha pele e ainda mais ter que usar a mesma roupa desde que eu entrei naquele trem.
– Posso lhe garantir, não tem nada aí que eu não já não tenha visto. – Ele se jogou na cama – Vai usar a mesma roupa pela terceira vez? – olhei para ele e disse:
– Oh, me desculpe, senhor qualquer que seja o seu nome, por não ter pensando em jogar uma mala para fora do trem enquanto um bando de ladrões tentava me matar. Essa é a única roupa que eu tenho, Sherlock.
– Vou fingir que essa sua tentativa fracassada de sarcasmo não aconteceu e vou lhe ajudar. – Ele pegou sua bolsa e jogou para mim – Você pode pegar uma blusa minha, a calça você pode ficar com a sua. – Ele se levantou.
– Pra que você tem calcinhas dentro dessa bolsa? – perguntei, vendo-o abrir a porta – Quer saber de uma coisa? Eu prefiro nem saber.
– Ufa! Porque se eu te dissesse teria que te matar. Não demore muito, Watson. – Ele disse fechando a porta. Olhei para as calcinhas dentro da bolsa vendo que ainda estava com as etiquetas. Pelo menos são novas, pensei, pegando uma calça e uma blusa dentro da bolsa e as vestindo. Até que as roupas não estavam tão diferentes das que eu estava, apenas um pouco mais frouxas, mas nada que me obrigasse a ter que andar segurando as calças. Coloquei a mochila nas costas e tranquei o quarto. Lilah, a essa hora, deveria estar indo a loucura pela minha falta de responsabilidade de não atender suas ligações. Vovó, provavelmente estaria na décima cerveja e não passavam nem das nove ainda porque, para Lilah, ser uma megera vinha naturalmente.
– Finalmente! – Ele levantou da cadeira – Vamos?
– Sem tomar café?
– Tem umas barrinhas de cereais dentro dessa bolsa, você pode comer no caminho. – Ele abriu a porta e esperou que eu passasse para poder soltá-la. O velho Earl estava encostado em um clássico Porsche, se você pode chamar aquela lata velha de clássico.
– Pelo amor de Deus, não me diga que a gente vai pra Oxford nessa lata velha. – Falei, derrotada.
– Esse é um clássico. – Ele falou apontando para o carro.
– Clássico? Isso aí tá mais pra uma antiguidade. Você tem certeza que isso aí não deveria estar em um museu?
– Ei, – velho Earl começou – Essa belezura aqui pode ir até a China se vocês quiserem.
– Contanto que me deixe em Oxford antes, você pode ir até o Pólo Norte. – Falei abrindo a porta, entrando no carro.
– Mas como você é rabugenta, senhorita. – O estranho entrou no carro, no banco de trás ao meu lado.
– Se você estivesse com fome, com sono, sem dinheiro e tivesse a irmã que eu tenho, eu lhe garanto que você não estaria diferente. – Respondi, cruzando os braços. Earl deu a partida no carro e eu comecei a rezar para que Oxford não fosse tão longe. Abri a bolsa e peguei a primeira barrinha que eu vi, a fome era tanta que eu estava pouco ligando para que sabor fosse aquele.
– Então, o que vocês vão fazer em Oxford? – o velho Earl, perguntou.
– Meu irmão vai se casar no final de semana. – O estranho respondeu.
– Isso é incrível! O homem só se sente completo quando acha a metade da sua laranja.
– Coisa boa então que eu não gosto de laranja. – O estranho resmungou.
– Ah, mas você vai gostar! – o velho Earl respondeu – Basta só achar aquela que te completa e faz sua vida mais doce. – Eu quase engasguei imaginando o velho Earl falando uma coisa dessas para alguma mulher. Ela provavelmente iria sair correndo por causa da tanta breguice – E você, senhorita?
– Oh não, eu não tenho tempo para namorar.
– Não. O que você vai fazer em Oxford?
– Minha irmã vai se casar.
– Mas que maravilha, dois casamentos em Oxford. Qual o nome dos pombinhos? Eu tenho duas melancias dentro do porta-malas, vocês podem levar para eles como um presente. Eu posso até colocar os nomes deles se vocês quiserem.
– Jordan e Lilah! – Falamos os dois ao mesmo tempo. Olhei para o estranho que olhou para mim também. Oh não!
– Lilah é sua irmã? – Ele perguntou mais assustado do que deveria estar. Não era que eu não tenha percebido antes, eu até tinha, mas não tinha dado muita atenção ao fato de quanto o estranho com que eu estava viajando era bonito. Muito bonito. Se ele não fosse tão irritante eu até jogaria um charme para ele.
– Para o desespero dela, sim. – Ele sorriu de lado e eu pude jurar que senti um pequeno formigamento nas pontas dos dedos.
– Vocês dois estavam destinados a se encontrar. Ah, não! – olhamos a parte da frente do carro.
– Oh não. – O carro parou do meio da estrada e o velho Earl saiu do mesmo, seguido pelo estranho e por mim. Earl abriu o capô e a fumaça saiu, fazendo com que eu tossisse.
– Pelo amor de Deus! Por favor, me diz que essa lata velha tem conserto.
– É um clássico. – Earl respondeu.
– Então deveria estar em um museu, não circulando e decepcionando as pessoas por aí. – Falei colocando as mãos na cabeça, me afastando do carro – Ai, meu Deus! – coloquei as mãos em meus joelhos – Lilah vai me matar.
– Calma. – O estranho começou.
– Isso é fácil pra você dizer, sua irmã não é uma megera.
– Quando chegarmos a Oxford, Lilah vai entender. Eu explico para ela.
– Entender? – ri sem humor.
– É. Não precisa, você está dando chilique sem motivo.
– Sem motivo? Você quer um motivo? Isso seria impossível porque não existe apenas um. Por onde eu devo começar? Oh claro! Meu trem foi assaltado e eu quase morri tentando pular do mesmo. Eu estou no meio do nada com um estranho que eu não sei nem ao menos o nome, e que é o perfeito exemplo que estar sozinha é bem melhor do que estar mal acompanhada, porque vamos combinar, desde que pulamos daquele trem, você está sendo um imbecil comigo e eu nem ao menos sei o porquê. Oh, e sem falar que eu estou faminta e essa lata velha tratou de não funcionar. Oh meu Deus! Lilah vai me matar porque eu arruinei o seu casamento. Ela vai começar com aquela história outra vez e eu vou ter que escutar a mesma baboseira que ela repetiu durante todos os anos até o final do colégio. – Falei apoiando minhas mãos no joelho. Comecei a ofegar como se tivesse acabado de correr uma maratona sem parar. Oh não, estava acontecendo de novo.
– Senhorita, – o velho Earl colocou a mão em meu ombro – você está bem? O reboque vai chegar daqui umas quatro horas, sua irmã vai entender.
– Quatro... Horas? Eu não tenho nem duas horas! – Falei sentindo o ar fugir de meus pulmões cada vez mais rápido – Eu... Não... Lilah... Deus!
– Ela está tendo um ataque de pânico. – O estranho falou andando até mim. Ele me pegou pelos cotovelos fazendo com que eu ficasse pé. Eu ainda ofegava e estava tão concentrada na minha futura morte que não percebi o estranho se aproximando, e quando eu menos esperei, seus lábios estavam na minha bochecha. Lilah saiu dos meus pensamentos quando lábios do estranho encostaram nas diferentes partes da minha face, fazendo com que eu me concentrasse mais no quanto eu queria que suas mãos estivessem segurando minha cintura em vez dos meus cotovelos. Ele se afastou depois de um tempo, eu estava tão assustada que não consegui nem ao menos formular um palavrão, quanto mais uma frase, perguntando por que diabos ele fez isso e por que ele tinha parado.
– Eu precisava te distrair, essa foi a única solução.
– Eu consigo pensar em algumas outras soluções. Você podia ter, não sei, gritado. – Earl falou, se sentando em cima do capô do carro.
– Eu não podia fazer isso. – O estranho se virou para ele.
– Mas beijar pode? – Ele pegou uma maçã dentro do bolso e deu uma mordida.
– Não importa. – Falei me afastando dele – Obrigada, eu acho. Não se preocupe, isso não vai acontecer novamente.
– Vão ser longas horas, acho melhor você ir se preparando para mais uns beijinhos. – Ele deu uma piscadela. Eu ainda estava decidindo se jogava minha bota na cabeça dele ou se apenas ria desse sarcasmo fora de hora.
– E por isso eu vou passá-las fazendo algo de útil.
– E o que a senhorita pretende fazer? Jogar cartas? Oh, eu conheço um jogo que um estranho nos ensinou no bar que é bom para passar o tempo.
– Isso não será necessário, eu não vou esperar porcaria de reboque nenhum. Nem que eu ande até Oxford, eu chego nesse casamento ainda hoje.
– Você vai andar até lá?
– Melhor do que ficar aqui. – Pensei em ir pegar minha mochila no carro, mas me lembrei que havia deixado tudo dentro do trem e a mochila que eu estava carregando era do estranho – Muito obrigada pelos seus serviços, senhor Earl. Eu até lhe daria uma gorjeta, porém não tenho nenhum centavo. Estranho, bom te conhecer, te vejo no casório. Peace out! – girei meus calcanhares em direção a estrada que não havia nenhum sinal de civilização e comecei a andar. Meus pés poderiam até sangrar, mas eu não daria o gostinho para Lilah encher a boca e dizer que a culpa da sua infelicidade era minha. Eu apenas imaginava o inferno que vovó estaria passando por não conseguir falar comigo, e isso era bom de alguma forma, porque vovó veria que tinha algo de errado e colocaria até a marinha atrás de mim. Eu era uma grande fã de séries policiais, então poderia imaginar o que estava acontecendo com Lilah e vovó nesse exato momento e também não poderia descartar a ideia de que essa poderia ser a última viagem da minha vida.
– Você anda rápido. – Soltei um grito, pulando para o lado. O estranho estava ao meu lado com a bolsa nas costas e uma barra de cereal na boca.
– O que diabos você está fazendo?
– Você não estava pensando que eu ia te deixar andar sozinha até Oxford? – Na verdade, graças a Deus que não, pensei.
– E o velho Earl?
– Ele vai ficar bem, não é a primeira vez que isso acontece com ele.
– E precisava me assustar desse jeito?
– Bem, descobri em nosso pouco tempo de convivência, que te assustar é a coisa mais engraçada do mundo. Você pula como um gato assustado.
– Não vamos tornar isso um hábito, por favor. – Falei, voltando a caminhar com ele ao meu lado.
– Então, há quanto tempo você não vê sua irmã? – Ele perguntou, porém, eu o ignorei. Falar da minha situação com Lilah para um estranho que ainda mais era seu cunhado poderia me colocar em maus lençóis, mais do que eu já estou – Digo, vocês não são muito apegadas, isso é certo. Lilah nunca mencionou que tinha uma irmã, a não ser que você tenha feito algo de muito ruim, algo como roubar o namorado dela? Ou será que você é adotada? Aposto que é adotada, ou filha de mães diferentes que eram inimigas no colégio. – Apenas continuei olhando para frente. Uma hora ele desistiria e iria ficar calado – Já devo até imaginar Lilah puxando suas chuquinhas porque você ganhou o presente que ela queria, deve ter sido um ambiente interessante de se crescer. Jordan e eu quase não brigamos, somos tão unidos como se fossemos irmãos.
– Vocês não são irmãos?
– Meio irmãos. Meu pai e minha mãe se conheceram no colégio, se apaixonaram, casaram e se separaram. Então anos depois meu pai conheceu a mãe de Jordan e eles se casaram. Eu fui morar com meu pai logo quando completei 16 anos para ajudar nas galerias, Cassandra odiou a ideia e isso me fez adorar cada segundo dentro daquela casa. Cassandra pode ser uma megera quando quer, no caso, 24 horas por dia, sete dias por semana durante 12 meses sem parar. – Ele olhou para mim – Então, quem era a madrasta malvada dentro de casa? Sua mãe ou a da Lilah?
– Por que você diz isso?
– Bem, não é claro para você? Lilah e você não tem nada em comum, absolutamente nada. Nem sequer uma característica física.
– Lilah lembra muito minha mãe, eu já sou muito parecida com meu pai. Papai tinha essa mania de tomar café no meio da madrugada para ajudar em seu sono, nós pegamos isso dele. Acho que deve ser a única coisa que temos em comum.
– Café para ajudar a dormir? Não deveria ser ao contrário?
– Papai dizia que café agia diferente nos membros da nossa família. Praticamente virou uma tradição tomar café antes de dormir, pelo menos pra mim. – Olhei para ele – Eu não deveria estar contando isso para um estranho.
– Nós vamos ser da mesma família, tecnicamente.
– Eu acho que não. A situação entre mim e Lilah é complicada.
– Então vocês são filhas de mães diferentes?
– Não, nós somos irmãs do mesmo pai e da mesma mãe.
– Então por que vocês não se falam? – respirei fundo.
– É uma longa história.
– Eu não sei você, mas eu estou caminhando até Oxford e eu gostaria de tornar esse tempo o mais agradável possível. – Eu ri – Uma história viria a calhar.
– Você já deve saber que nossos pais já não estão mais conosco, certo? – Ele assentiu – Lilah e eu lidamos de formas diferentes a perda deles. Lilah virou o exemplo de superação. Na escola, ela era conhecida como a garota que deu a volta por cima e até ganhou uma medalha por isso. – Ri sem humor – Já comigo foi outra história, eu simplesmente não conseguia não pensar neles e seguir em frente, não parecia uma opção. Então, eu deixei isso transparecer no modo como eu me vestia e Lilah não gostava disso, dizia que nossos pais não aprovariam essa minha nova fase rebelde que não tinha nada de rebelde, por sinal. Não era como se eu estivesse quebrando as vidraças pela cidade e escutando rock pesado enquanto fumava maconha e bebia vodca, eu só gostava de passar mais tempo fazendo coisas que para mim eram construtivas. Ler livros e ir para galerias na cidade vizinha checar os novos artistas parecia mais sensato que sair pela cidade desfilando meu novo namorado. Ficar em casa lembrava muito deles, então eu fazia de tudo para passar mais tempo fora, a biblioteca pública virou meu refúgio de todos os dias.
– Parece que vocês duas compartilham a mesma paixão pela arte.
– Lilah é pintora?
– Não, ela é caça talentos da galeria da nossa família. Foi assim que ela e Jordan se conheceram. A mãe dele, Cassandra, pediu que ele cuidasse da parte financeira da galeria, já que a cada dia Lilah descobria novos artistas que pareciam agradar ao público. Lembro-me bem que a mãe de Jordan falava tanto de Lilah, que no momento que ela tocava no nome da mesma, ele se levantava, mas bastou conhecê-la para se apaixonar por ela.
– Lilah conseguiu tudo que queria então. Um emprego dos sonhos e o futuro marido perfeito.
– Aí que você se engana. Cassandra nunca pensou que Jordan se interessaria por Lilah, pra ela foi uma decepção saber que ele não tinha escolhido a filha de sua melhor amiga, uma dessas patricinhas ricaças viciadas em festas. Ela fez de tudo para separar os dois, mandou Lilah para filial da galeria em Nova York fazendo com que os dois se separassem. Jordan sofreu no começo, tentou até esquecê-la, porém ele já estava perdidamente apaixonado por ela. Então como um irmão que odeia ver o outro sofrendo, eu troquei de lugar com Jordan e passei a administrar a galeria em Londres para que ele pudesse ir para Nova York.
– Isso foi muito gentil da sua parte, mudar de cidade só pra ver o seu irmão feliz.
– Nova York nunca foi minha cidade preferida, podia ser quando eu tinha 21 anos e estava pronto para ir de bar em bar até chegar em casa, mas não agora.
– Fico feliz que Lilah esteja feliz.
– Na verdade, só falta uma coisa pra vida dela ficar completa.
– O quê?
– Descobrir quem é Zoe Cane. Lilah é obcecada para descobrir quem ela é, principalmente se isso for calar a boca da sua futura sogra.
– Acho que Lilah vai morrer esperando, porque, pelo o que eu sei, Zoe Cane é praticamente um fantasma. Entra e sai da galeria e ninguém nem ao menos percebe.
– Eu já tentei descobrir quem ela é, porém desisti na primeira semana. Jordan também, mas a corrida entre Cassandra e Lilah está a todo vapor. – Rolei os olhos – Só agora eu fui me tocar: Zoe Cane estava naquele trem. Será que eles a pegaram?
– Tenho certeza que não.
– Como é que você pode ter tanta certeza assim?
– Teriam helicópteros por toda a Europa procurado por ela. Imagina quanto prestígio uma pessoa receberia se mostrasse ao mundo quem é Zoe Cane?
– Eu até gosto de não saber quem ela é.
– Não vá me dizer que tem uma paixãozinha por ela. – Olhei para ele – Eu não acredito, você nunca nem viu a mulher.
– Mas isso não me impede de imaginar. – Ele sorriu e me deu um empurrão – Ela deve ser uma mulher bem interessante, sabe? Os quadros delas são espetaculares, quando o primeiro chegou lá na galeria, até eu parei o que estava fazendo para poder apreciar. Ela provavelmente deve ser muito feia, porque se ela for linda, eu a peço em casamento no dia que eu a conhecer.
– Já vi muitas meninas loucas por cantores, mas sua paixão platônica está ganhando de lavada.
– Um bar! – Ele gritou do nada.
– O quê?
– Um bar! – Ele apontou para o estabelecimento que ficava ao lado de um motel. Olhei para o estranho e em um impulso me joguei em seus braços. Senti suas mãos rodearem minha cintura e me abraçarem forte e foi aí que eu me apressei para me separar dele.
– Desculpe, eu...
– Vem! – Ele me pegou pela mão e me arrastou em direção ao bar. Ele abriu a porta e esperou que eu passasse para fechar a porta atrás de si.
– Qual a coisa mais forte que você tem nesse bar? – perguntei, me sentando em um dos bancos perto do balcão. O barman arregalou os olhos e riu.
– Uísque.
– Eu quero uma dose. Na verdade, faça um duplo, por favor. E ele está pagando. – Ele colocou um copo no balcão e o encheu pela metade. Segurei o copo em minhas mãos e o virei sem a menor cerimônia. O líquido desceu ardendo pela minha garganta.
– Eu vou querer o mesmo. – Ele sentou ao meu lado com um sorriso de lado. Eu não sabia o porquê, mas eu tinha uma certeza de que eu iria ver esse sorriso até demais nas próximas horas.
Não sei ao certo em qual dose eu estava ou muito menos que horas eram, a única coisa que eu sabia era que o senhor atrás do balcão nunca foi tão engraçado ou que o estranho com o qual eu viajava – que eu continuava esquecendo de perguntar o nome – já tinha me salvado de cair do banco pelo menos umas cinco vezes.
– Seis! – o estranho ao meu lado disse, tomando mais uma dose de whisky – Se você contar a vez que eu te salvei daqueles ladrões do trem, sete.
– E muito obrigada por aquilo. – Respondi, apertando o seu braço. Eu provavelmente demorei tempo demais, pois o estranho me olhou com o sorriso de lado. Oh, aquele sorriso de lado que em pouco eu já tinha adorado odiar – Você poderia ter me deixado lá.
– Que tipo de monstro você acha que eu sou? – Ele perguntou, apontando para si.
– Daqueles que assustam as criancinhas no Halloween sem a ajuda de nenhuma máscara.
– Eu não sou um monstro. – Ele respondeu fazendo bico – E eu não podia te deixar sozinha.
– Mas você também não tinha que voltar pra me resgatar.
– Isso é verdade. – Ele virou outro copo – Mas a verdade é que você me intriga. – Eu quase cuspi tudo de volta no copo, porém fui corajosa o suficiente para engolir.
– Eu te intrigo? Por quê? O que foi que eu fiz?
– Não é todo dia que uma mulher aparece com uma bolsa da Louis Vuitton, vans e tinta no cabelo. – Ele riu dando um gole na sua bebida – É uma combinação um tanto quanto exótica, pode-se dizer. – Olhei para ele.
– Tinha tinta no meu cabelo? – perguntei, segurando o riso – Por que você não me disse? – Falei dando um empurrão nele.
– Porque eu não sabia como você ia reagir. Vai que você jogava aquela bolsa em mim. E acredite, eu sei que aquela bolsa é pesada.
– Eu provavelmente teria ido ao banheiro mais próximo e tentaria tirar a tinta.
– Mas se você tivesse ido os ladrões teriam te pegado. – Ele deu uma piscadela.
– Verdade. Então estranho, – segurei em seu braço de novo – obrigada por salvar minha vida mais uma vez, eu não sei o que faria sem você.
– Provavelmente estaria em alguma igreja pegando a certidão do seu casamento com Mark. – Ele deu uma piscadela e pediu outra bebida. Eu não sabia muito do estranho ao meu lado, porém à medida que o tempo ia passando a minha vontade de descobrir mais sobre ele crescia. Eu juro que nas últimas horas, principalmente com o tanto de bebida que ambos consumimos, eu tentei descobrir mais sobre ele, porém ele sempre virava o jogo e fazia com que eu falasse sobre minha vida. E isso me incomodava, e muito. Eu não era o tipo de pessoa que saía contando sobre minha vida pra qualquer estranho, principalmente um no qual eu não sabia nem o nome, porém toda vez que ele perguntava algo, a conversa fluía como se fossemos velhos amigos que acabaram de se encontrar em um bar em vez de dois estranhos que estavam indo pro mesmo casamento.
A verdade era que o estranho com que eu viajava era um quebra-cabeça, um daqueles bem complicados, com mais de 500 peças, mas que provavelmente era uma obra de arte depois de montado. Oh, e como eu estava com vontade de montá-lo.
Com as peças que eu já tinha, eu podia dizer que ele não era má pessoa, aliás, era a segunda vez que ele pagava as despesas que eu fazia – que segundo o barman, não era uma das pequenas – sem pedir nada em troca. Claro, eu fiz questão de dizer que pagaria tudo depois que chegássemos a Oxford, porém ele só deu de ombros e ordenou outra bebida. Eu até tentei brigar para fazê-lo aceitar meu acordo, mas a única coisa que ele fez foi jogar a cabeça pra trás e soltar uma gargalhada, fazendo com que eu desse um soco em seu braço.
– Você não quer jogar uma partida de bilhar? – Ele perguntou, tirando o copo de minhas mãos – Acho que você já bebeu muito por hoje.
– Eu não sei jogar. – Falei, fazendo bico. O que diabos estava acontecendo comigo? , pensei.
– Eu te ensino. – Ele disse me ajudando a levantar.
– Ou eu posso. – Olhamos para frente, dando de cara com o nosso amigo do trem.
– Mark! – o estranho disse.
– Como é que você sabe meu nome? – Ele perguntou com os olhos arregalados – Quer saber, isso não vai importar quando eu acabar com você. – Ele puxou o estranho pelo colarinho e deu-lhe um soco, fazendo com que eu gritasse. O estranho limpou o sangue que escorria de seu lábio e riu.
– Isso foi no mínimo... Bonitinho! – o estranho provocou. Ele então deu um soco em Mark fazendo com que ele cambaleasse para o lado. Os dois começaram a se atacar dando socos e chutes aonde conseguissem acertar, porém o estranho teve mais sorte e acertou a costela de Mark que andou para trás. Foi aí que eu percebi que ele segurava algo em sua mão.
– Quando eu acabar com você, vou levar sua namoradinha comigo. – Ele disse, rodando a faca em sua mão – As coisas que eu vou fazer com ela. – O estranho partiu pra cima dele com tudo, sem ao menos se importar com o fato de que ele estava segurando uma faca e o nocauteou. Ele deu o último chute no nosso querido amigo Mark e depois pegou em minha mão, arrastando-me para fora do bar. Ele olhou para o lado e reconheceu os amigos de Mark, que pareceram nos reconhecer também.
– O que nós vamos fazer agora? – perguntei para ele.
– Vem comigo! – Ele segurou firme em minha mão e começou a apressar o passo em direção às casas que estavam em nossa frente. Entramos em alguma ruela qualquer, seguindo sempre reto, atrás de um lugar para se esconder. Porém, quando menos esperamos, um grito fez com que nós dois parássemos e olhássemos para trás. Mark e seus amigos estavam a alguns metros de nós e pelo sorriso que ele tinha nos lábios, eles sabiam que não tínhamos escapatória. O estranho começou a correr, me levando junto. Nós entramos em mais algumas ruelas na esperança de despistá-los, porém Mark e seus amigos estavam determinados a nos seguir. Entramos numa ruela que nos levou a um pequeno bosque, porém, quando as árvores acabaram o desespero bateu. Nós estávamos a alguns metros de um penhasco.
– Quem em sua sã consciência constrói uma cidade perto de um penhasco? – Falei, massageando minhas têmporas.
– Vai ver eles têm um espírito aventureiro. – Ele respondeu sarcástico – Acho que aqui eles não vão nos achar.
– Eu realmente espero que...
– Casal 20, cadê vocês? – Escutamos a voz de Mark. Foi impossível conter o grunhido.
– Dessa vez, sem erro, a gente vai morrer.
– Espero que você me recompense por todas essas loucuras que eu estou fazendo por você. – Ele pegou em minha mão.
– Mas eu não pedi pra você fazer nenhuma loucura por mim.
– Nem eu! Mas parece que esse é o único jeito que você vive sua vida: Uma aventura atrás da outra.
– Minha vida é bem pacata, muito obrigada.
– Não parece. Pulou de um trem, se meteu em uma briga e agora vai pular de um penhasco.
– Pular de onde? – E sem resposta alguma, ele apenas me puxou pela mão e quando eu menos esperei, estava caindo em queda livre até pararmos dentro do rio.
Capítulo 4
– Como se não bastasse um trem, agora você me fez pular de um penhasco. Seu idiota! – Dei um empurrão nele fazendo com que ele caísse na água. Ele me olhou incrédulo enquanto eu saia da água e secava minhas roupas.
– Oh, me desculpe por salva sua vida. Outra vez! – Ele se levantou, torcendo sua camisa e mostrando um pouco do seu abdômen. O estranho não tinha um tanquinho daqueles que dava para ver aqueles seios quadradinhos, mas tinha aquele V que indicava o caminho da felicidade. Não sei se ainda era a bebida que estava fazendo efeito, mas eu bem que queria descobrir onde o final daquele caminho dava – O que você está olhando?
– Hum? – perguntei, olhando para o seu rosto.
– Você está olhando para o meu corpo? – Ele sorriu de lado.
– O que? Mas é claro que não. Eu tô vendo os seus machucados.
– Eles são no rosto.
– O quão bêbado você está para não sentir que aquele ladrão te cortou com uma faca? – Ele olhou para baixo vendo o corte em sua costela.
– Pensei que tinha sido da queda. – Ele olhou para mim, levantou o dedo e disse: – Culpa sua! Tudo isso foi culpa sua.
– Minha? O que foi que eu fiz?
– Você saiu dizendo que ia andando até Oxford, se nós estivéssemos ficando com o Earl, nada disso tinha acontecido.
– Eu não pedi que você viesse atrás de mim. – Falei, saindo por completo da água. Como ele ousava dizer que isso era minha culpa? – Você veio atrás de mim porque quis! – Falei, avistando uma floresta à minha frente. Eu era muito fã da natureza, mas entrar em uma floresta quando estava prestes a escurecer com um estranho e mais alguns ladrões atrás de mim não era meu plano ideal de se conectar com a mãe natureza. Porém, era entrar na floresta e achar alguma alma caridosa que quisesse ajudar dois estranhos sem nada no bolso perseguidos por ladrões ou morrer a beira do rio esperando por resgate que nunca iria chegar.
Comecei a andar por dentro da floresta, tomando cuidado para não pisar em nenhum bicho venenoso.
– Claro, eu não ia deixar você sozinha no meio do nada. – Escutei gravetos serem quebrados atrás de mim indicando que o estranho estava me seguindo.
– Mas deveria ter deixado já que a única coisa que você fez foi reclamar.
– Porque você é um pé no saco! – Virei-me para ele, de boca aberta – E quer que tudo seja feito do seu jeito. Agora eu entendo por que Lylah não quer papo com você.
– Mas... Mas... Não se preocupe, eu não te incomodarei mais. – Falei, começando a andar sem olhar para trás. Eu estava tão furiosa que eu preferia morrer sozinha a ficar mais um minuto com esse mal-educado. E logo agora que eu estava começando a simpatizar com o estranho ele me soltava uma dessas. Mesmo sem saber, ele tinha tocado em uma ferida aberta e tinha colocado um pouco de álcool em cima. Lylah ainda era um assunto que mexia muito comigo principalmente o fato de não sermos tão apegadas uma a outra. Por um bom tempo eu me culpei por essa nossa falta de comunicação, só Deus sabe o quanto eu tentei explicar para Lylah que eu não era nenhuma rebelde sem causa apenas uma artista mal interpretada, porém toda vez que uma conversa começava nós acabávamos brigando e nos afastando mais e mais.
Eu não queria que minha relação com Lylah fosse assim, na verdade, eu sempre pensei que seriamos quase inseparáveis na medida que fomos crescendo. Ela cuidaria de mim e eu cuidaria dela, como sempre foi. Eu não esperava que em menos de um ano minha irmã tivesse se transformasse na única pessoa do mundo com quem eu não podia conviver.
Eu nunca quis ser uma daquelas irmãs que não se falam, porém Lylah fez de tudo isso um pouco impossível, e até eu também.
– Ei! – Escutei a voz dele vindo de longe, porém não liguei nem ao menos em me virar. Eu sabia que ele era um estranho – que iria fazer parte da família, mas ainda sim um estranho – e eu não deveria ligar para o que ele pensa, porém na situação que eu me encontrava e adicionando a quantidade de álcool que eu tinha consumido, o que ele tinha dito tinha me atingido como um soco no estômago. – Ei! – Ele me chamou novamente, mas eu estava mais concentrada em achar um jeito de sair dessa floresta – Eu estou falando com você.
– Eu sei que você está! – Gritei, me virando para ele – Mas o que faz você pensar que eu quero falar com você?
– Uou! – Ele levantou os braços – Eu estou aqui para ajudar.
– Mas não parece! A única coisa que você fez foi me puxar por toda a Europa para um bando de enrascadas e ainda por cima é um grosso comigo. Você me fez pular de um trem, entrar em uma lata velha que não funcionava, ser perseguida por bandidos e ainda me fez pular de um penhasco sem saber se eu iria morrer ou não. – Ele estava prestes a me interromper, mas eu continuei – Eu sei e acredite que eu estou muito agradecida por tudo o que você fez por, de fato tudo isso é minha culpa, mas em nenhum momento você pediu minha opinião ou perguntou se eu estava bem. Você...
– Desculpe. – Ele me interrompeu quase como sussurro, porém eu ainda consegui ler seus lábios antes dele abaixar a cabeça. Eu o olhei com os olhos arregalados e com a boca entreaberta me sentindo a pior pessoa do mundo por estar gritando com ele dessa maneira. Tudo bem que ele tinha sido um grosso, mas eu também não tinha sido um poço de educação – Desculpe eu ter sido um grosso...
– Grosso, mal-educado, cretino, imbecil, cavalo, filho de uma...
– Entendi. – Ele disse, me interrompendo – Todos esses anos dentro daquela empresa lidando com Cassandra me fizeram criar essa espécie barreira contra mulheres que estão no controle. – Rolei os olhos, mas antes que eu pudesse falar, ele continuou – Eu detesto a ideia de não saber com que eu estou lidando e com você isso é mais frequente do que eu gosto de admitir. Eu ainda consigo prever alguns movimentos de Cassandra, mas com você, eu nunca sei se você vai jogar uma pedra na minha cabeça ou me beijando como se não houvesse amanhã.
– Eu não tenho intenção nenhuma de lhe beijar. – Falei, me virando para a floresta novamente. Eu podia sentir minhas bochechas queimarem só de imaginar ele me pegando pelos braços e me beijando novamente, porém ele não precisava saber disso, ou melhor, ele nunca iria saber disso nem que hoje fosse o último dia de nossas vidas.
Minha mãe tinha me avisado que nossos pensamentos eram fortes agentes em nossas vidas, principalmente, os negativos. "Pense positivo, minha querida filha, nossos pensamentos podem mudar o nosso destino", ela dizia. Mas na situação que eu me encontrava, pensamentos positivos estavam fora de cogitação e com isso, um tempo agradável para viajar no meio de uma floresta também.
Tão forte quanto meus pensamentos negativos, a chuva começou a cair sobre nossas cabeças fazendo com que um grunhindo saísse de meus lábios.
– Tem certeza de que não quer me beijar? Com essa chuva parece que não vai haver amanhã. – Ele disse e mesmo sem estar olhando para ele eu sabia que ele estava com aquele sorrisinho de lado que eu detestava.
– Obrigada pela oferta, eu estou realmente tentada, porém minha resposta ainda é não.
– Aquilo ali é uma cabana? – Olhei para ele com o cenho franzido. Virei meu rosto para a direção que ele olhava. – Nós estamos salvos. – Ele passou por mim pegando em meu pulso e me arrastando em direção a cabana.
– Oh não, não! – Falei, me soltando de sua mão. – Eu não vou entrar nessa cabana com você.
– E você vai ficar na chuva?
– E se tiver alguém aí dentro?
– Melhor ainda, nós podemos sair dessa floresta.
– Mas e se a pessoa em questão não quiser nos ajudar e sim nos matar.
– Você anda assistindo muitos filmes. – Ele tentou pegar minha mão de novo, porém eu a puxei novamente.
– Por isso eu sou uma pessoa prevenida.
– Faz dois dias que você viaja com um estranho que você nem sabe o nome.
– Mas...
– Você vai e ponto! – Ele me pegou pelo braço e começou a me arrastar em direção a cabana.
– Você não pode me arrastar como se eu fosse uma mala.
– Uma mala seria mais agradável, ela não iria ficar reclamando o tempo todo. – Abri minha boca incrédula e dei um soco em seu braço.
– Seu grosso! – Falei, batendo nele mais forte – Você é um bruto! Aí como eu te odeio.
– Até parece! – Ele se virou e em movimento rápido me pegou em seu colo.
– Me coloca no chão! – Falei olhando para ele. Ele virou o rosto para me responder e eu pode dar uma olhada de perto em seu rosto. Eu não tinha reparado antes, mas os olhos do estranho eram de um verde bem intenso, sua boca era de um vermelho chamativo que pareciam implorar para serem beijados uma vez atrás da outra. Ele analisava meu rosto do mesmo jeito que eu analisava o seu, eu esperava que ele soltasse uma daquelas respostas cheias de sarcasmo com aquele sorriso de lado para que eu pudesse ver de perto e odiar o fato de que eu adoro quando ele fazia isso. Mas não, ele apenas olhou para frente e engoliu o seco e subiu a escada que levava para a varanda da casa.
Ele me colocou no chão e antes que eu pudesse protestar ele estava forçando a maçaneta até que ela abrisse a porta e quando a fez, ele entrou com tudo dentro da cabana e me deixou do lado de fora.
Olhei em volta vendo que a chuva não dava sinal de que iria cessar tão cedo e eu realmente não estava no humor de ficar sozinha para morrer de frio então eu entrei na cabana fechando a porta atrás de mim.
– Eu te disse que não tinha ninguém aqui. – Ele falou fazendo com que eu olhasse para ele. A cabana não era lá as das maiores, mas era bem aconchegante. A sala e a cozinha ficavam no mesmo cômodo, do lado esquerdo tinha um sofá que ficava em frente a uma lareira, à minha frente uma mesa de madeira, algumas prateleiras nas paredes e embaixo um balcão, uma pia e até uma geladeira. Havia uma porta aberta do lado direito que eu suspeitei que seria o único quarto da cabana.
– Mas poderia ter.
– Não é temporada de caça ainda.
– E como você sabe disso? Assistiu muitos filmes sobre caça do seu apartamento na cobertura?
– É isso que você pensa de mim? – Ele riu – Que eu sou um riquinho mimado, filhinho de papai?
– É isso que seu terno de mais de 800 euros diz.
– Terno de 800 euros? – Ele riu sem os dentes – Alguém já te disse que você é muito irritante? – Dei de ombros – O gato comeu sua língua por acaso? – Dei de ombros novamente – Oh, e além de me chamar de filhinho de papai, vai me dar o tratamento de silêncio agora? – Dei de ombros mais uma vez – Ah, é assim que você me agradece depois de tudo que eu fiz? Tudo bem, a partir de agora você ache jeito de se salvar porque eu cansei. – Ele disse andando em direção ao quarto.
– A saída é pelo outro lado! – Gritei para que ele pudesse ouvir. Ele parou de andar e se virou para mim.
– Quando a chuva passar, eu faço questão de sair por aquela porta e não voltar mais. – Ele recomeçou a andar.
– A porta da rua é serventia da casa! – Gritei antes de escutar a porta bater com força.
Peguei o cobertor que havia em cima do sofá antes de me deitar no mesmo e sentir todo o cansaço do dia.
Eu não sei exatamente o que me acordou, mas algo me dizia que o frio que quase congelava meus ossos era o principal motivo. Sentei-me no sofá sentindo tudo a minha volta rodar e logo depois minha cabeça doer. Massageei minhas têmporas, juntando força para me levantar, mas no momento que eu o fiz, me arrependi. Todo o meu corpo estava dolorido como se um caminhão tivesse passado por cima de mim ida e volta, e em vez de um grunhido, uma tosse saiu por minha garganta.
Como se não bastasse tudo que eu passei, eu ainda tinha pegado um resfriado. Olhei para os lados percebendo que a cabana estava silenciosa. Oh, não, não, não!
Levantei-me rapidamente andando em direção ao quarto, ignorando minha cabeça latejando e meu corpo dolorido, a procura do estranho. Eu sabia que eu tinha sido muito dura com ela, mas eu realmente não esperava que ele fosse me deixar sozinha no meio do nada especialmente contando com todas as vezes que ele me salvou.
Entrei no banheiro, encontrando o mesmo vazio, sai para a sala novamente e andei em direção a porta, abrindo-a. Porém não havia nenhum sinal do estranho. Pronto! É agora! Dessa vez eu realmente vou passar dessa para a melhor porque por mais durona que eu seja, não tem nenhuma chance de eu escapar de Mark e seus amigos dessa vez. Ah não ser que eu conseguisse fazer um acordo com ele, além do mais, eles estavam atrás de Zoe Cane e eu sabia onde encontrá-la. Ou eu podia apenas chorar e esperar algum urso me fazer de prato principal e até esperar um milagre onde Lylah percebesse que tinha alguma coisa errada e mandasse alguém me resgatar.
Mas antes que eu pudesse me jogar no chão e esperar que a morte viesse me levar, uma silhueta vinha andando em direção a cabana por entre a floresta e até mesmo com a falta de luz, eu reconheci quem era. Senti meus ombros relaxarem dando a graças a Deus por ele não ter cumprido o que falou e me deixado sozinha. Eu vi que ele segurava alguma coisa em cada mão, mas eu realmente não esperava que ele estivesse fazendo isso sem camisa. Eu juro que tentei não olhar, mas eu ainda sou mulher e o estranho com que eu viajava ainda era atraente, tão atraente que quando ele levantou o olhar e olhou diretamente em meus olhos eu senti todo os pelos do meu corpo arrepiarem e minhas bochechas esquentarem.
– Pensei que você iria dormir até amanhã. – Ele falou alto o suficiente para que eu escutasse.
– Pensei que você tinha ido embora. – Ele riu.
– O meu senso de cavalheirismo não deixou. – Ele passou por mim segurando dois peixes em anzóis.
– Onde você conseguiu isso? – Perguntei, seguindo-o para dentro da cabana.
– Eu pesquei. – Ele respondeu colocando-os em cima da pia.
– Quem te ensinou a pescar?
– Minha mãe.
– Sua mãe?
– Eu não tive pai até os 16 anos, quando ele pagou alguém para que eu não fosse direto para a cadeia. – Ele disse virando-se para mim.
– Pensei que ele precisava da sua ajuda na galeria.
– E precisava, eu até trabalhei lá um tempo, porém quando Cassandra me pegou dentro do armário com uma de suas curadoras, meu pai percebeu que eu não precisava de um trabalho, mas sim de um internato.
– Ele te colocou em um internato?
– E ainda um só para garotos.
– Deve ter sido uma experiência um tanto quanto... Interessante.
– E foi. Foi no internato que Jordan e eu nos aproximamos depois de um dos mauricinhos amigos dele tentar arrumar briga com ele. Eu o defendi e ainda levei a culpa.
– Levou a culpa? Por quê?
– Você sabe. Eu estava lá, minha ficha estava mais do que suja e eu esperava ser expulso por aprontar mais uma. – Ele riu.
– E você foi?
– Oh não, meu pai fez questão de pagar para que eu ficasse lá até me formar, mesmo com todas as confusões que eu me metia. Foi por isso que eu fiz questão de pegar até a velha da diretora só para irritá-lo antes de sair daquela espelunca. – Ele cruzou os braços e olhou para mim – Tem umas roupas limpas dentro do armário, você pode usá-las e acredite ou não, tem água quente então você pode ir tomar um banho enquanto eu preparo o jantar. – Ele se virou para o peixe.
– Obrigada. – Eu disse antes de andar em direção ao quarto. O quarto era pequeno, tinha uma cama de casal com um pequeno criado mudo do lado e um guarda-roupa pequeno. Andei até a cama vendo uma muda de roupa, pegando a mesma junto com a toalha e indo em direção ao banheiro.
Acredite ou não, a água do chuveiro estava realmente quente. Por um momento eu pensei que o estranho estivesse mentindo só para que um entrasse no chuveiro de uma vez para que eu morresse de frio, mas o estranho com que eu viajava parecia superar minhas expectativas a cada minuto que passávamos juntos. Por um momento eu realmente pensei que ele iria me deixar sozinha para que Mark e seus amigos me encontrassem, mas no mesmo momento eu me arrependi. O estranho não tinha arriscado a minha vida, mas também, a sua. Ele poderia ter pegado suas coisas e ido embora na primeira oportunidade que ele teve – que foram muitas, devo ressaltar -, mesmo assim ele não o fez. Até mesmo quando Mark disse que iria me levar, o estranho lutou por mim e até se machucou por isso. Quem faz isso nos dias de hoje? Se fosse outra pessoa, teria me entregado e ainda teria pedido dinheiro em troca. Por isso eu deveria agradecê-lo, porque ele talvez não soubesse, mas eu sabia que tudo isso era minha culpa.
Desliguei o chuveiro, me enxugando logo em seguida. Coloquei as roupas que o estranho tinha separado para mim e sai do banheiro. O estranho estava sentado de um lado da mesa e já comia o seu peixe enquanto o meu estava no lado oposto. Não era que eu não estava agradecida ou não era acostumada a agradecer estranhos, o problema era que com o estranho que eu viajava, tudo parecia um pouco mais complicado e ao mesmo tempo tudo mais simples. Era como se as palavras estivessem na ponta da língua e mesmo que não parecessem as mais educadas, ainda não pareciam boas o suficiente.
Porém, eu respirei fundo e tomei coragem.
– Eu queria dizer.... – Eu comecei, mas ele me interrompeu.
– O jantar está na mesa. – Ele disse sem levantar o olhar.
– Eu...
– Eu consegui achar uma lata de ervilhas nesses armários, não é muito, mas é alguma coisa.
– Olha...
– Eu achei até alguns temperos.
– Eu estou tentando te agradecer, dá pra você calar a boca um segundo? – Ele me olhou assustado.
– Você não cansa de ser mandona não?
– Não! Você não cansa de me interromper. – Falei, pegando a cadeira e arrastando para perto dele – Desculpe! Eu sei que as vezes eu posso ser mandona e chata, mas você tem que entender, eu não planejei nada disso e eu não gosto quando as coisas... – senti minha cabeça rodar, mas continuei – quando as coisas não saem como o planejado. Lylah, ela... – senti minha garganta arder e logo em seguida eu comecei a tossir muito. Por que quando estamos a ponto de fazer algo bom, algo tem que entrar no meio?
– Você está bem? – Ele saiu da cadeira e se ajoelhou em minha frente pegando em minhas mãos – Nossa! Suas mãos estão geladas. – Ele levou uma de suas mãos para minha testa – E você está com febre. – Ele se levantou – Vamos, acho melhor você ir para o quarto.
– Eu estou bem. – Respondi, levantando-me. Talvez eu não deveria ter levantado tão rápido, pois logo o lugar estava girando o que resultou no estranho me pegando no colo e me levando para o quarto.
– Eu vou pegar o chá que eu fiz pra você. – Ele falou depois que me colocou em cima da cama, embaixo de umas camadas de cobertores. Ele desapareceu pela porta e eu me encolhi mais um pouco na esperança de que me aquecer. O estranho voltou e entregou o chá para mim e me observou tomá-lo até a última gota.
– Espero que você melhore. – Me deitei novamente na cama.
– Eu seriamente duvido.
– Vamos lá, Watson! Eu não te fiz pular de um trem e de um penhasco pra você deixar um resfriado te derrubar. – Sorri, tossindo mais uma vez. Meu corpo estava todo mole e meus olhos pesavam. Me abracei mais uma vez na esperança de que meu corpo aquecer mais um pouco já que os cobertores não estavam fazendo seu serviço direito, porém foi em vão – Eu poderia... Não, não! Acho melhor não.
– Diz.
– Não é uma boa ideia.
– Nós só vamos saber quando você disser.
– Foi só um pensamento, na verdade uma jogada que sempre usava com as garotas quando íamos a casa de praia que sempre funcionava, mas eu acho melhor não. – Rolei os olhos e o cutuquei no braço esperando que ele falasse – É uma péssima ideia.
– Na situação que eu me encontro, qualquer ideia é bem-vinda. – Ele hesitou um pouco, mas logo continuou:
– Eu usava aquela velha cantada "se você está com frio deixa que eu te esquento". – Eu tentei segurar o riso, mas não consegui e junto com ele mais algumas tossidas.
– Quando eu penso que você não pode me surpreender, você me manda mais essa. – Me sentei na cama – Deita aí, Sherlock. – Ele me olhou e mordeu o canto da boca – Vamos logo, eu estou com frio aqui. – Ele se deitou esticou um dos braços, me deitei em seu peito sentindo sua pele quente em contato com meu rosto e logo senti todo o meu corpo ficar mais aquecido. Era uma cantada e uma péssima, porém, se ela funcionava com as outras mulheres, eu não estava em posição nenhuma de argumentar com nenhuma delas.
Na verdade, eu as entendia. E como entendia.
Capítulo 5
Apertei os olhos mais uma vez, sentindo o calor e a luz na minha cara. Por que, em nome de todos os arcanjos, eu deixei a janela do meu quarto aberto? Eu sempre a fechava para que essa cena deplorável de ter o sol quente em meu rosto me lembrando que eu não tinha dormido o suficiente, exceto quando a Linda me levava para sair e em meio de tantos estranhos e conversas eu me deparava bebendo mais do que deveria e acabava ou na cama de um estranho ou no meu quarto com a roupa e maquiagem do dia anterior. Será que eu tinha dormido com algum estranho noite passada?
Porém, eu logo lembrei de que não estava em Nova York, e muito menos com Linda, eu estava indo para o casamento da minha irmã com um estranho que eu não sabia nem o nome e estava prestes a entrar na família.
Me sentei na cama, sentindo minha cabeça girar um pouco, dando uma boa analisada em onde eu estava. Isso, definitivamente não era meu quarto ou muito menos o quarto da cabana na qual eu estava. Era um quarto, de uma casa típica do interior da Europa, iguais ao que eu fazia questão de ir quando me faltava inspiração e preferia ficar sozinha. As paredes eram brancas, uma porta de madeira que dava para um corredor e mais uma ao lado da cama que eu presumi que fosse o banheiro.
Levantei-me, passando pela frente da cama indo em direção a porta. Abri a mesma e coloquei a cabeça para fora vendo um corredor bem iluminado pelo sol. Uma senhora apareceu do nada fazendo com que eu me desequilibrasse e abrisse a porta por inteiro. Ela olhou para mim e disse:
– Você acordou. – Ela limpou as mãos no avental e andou em minha direção – Bem que o médico disse que você estaria melhor quando acordasse. Como você está se sentindo?
– Bem, eu acho. – Perguntei, cruzando os braços – A senhora pode me dizer onde é que eu estou?
– Oh, você não sabe. Quando vocês vieram pra cá você estava dormindo. Venha minha filha, eu vou lhe contar tudo. – Ela me puxou pelo braço e me levou pelo corredor até chegarmos à cozinha. – Sente-se. – Ela apontou para a cadeira da mesa. A mesa estava posta com o café da manhã e logo eu pude escutar meu estômago roncar – Pode comer o que quiser, pelo jeito você está com fome.
– Obrigada. – Ela colocou um prato em minha frente com algumas torradas e eu tomei a liberdade de pegar uma xícara de café.
– Nós ficamos muito preocupados com você. – A senhora sentou na cadeira a minha frente – Quando Carlos chegou aqui com você naquele estado e disse que tinha achado vocês dois quase congelando na cabana de caça eu quase tive um infarto. Principalmente por sua causa.
– Minha causa? – Perguntei, tomando um pouco de café.
– Sim, você estava muito febril e todos nós pensamos que poderia ser algo grave já que você estava delirando e falando coisas sem sentido. Mas, Ernesto, o médico aqui da vila disse que era só um resfriado e que logo você estaria boa.
– Quanto tempo eu fiquei apagada?
– Uns dois dias.
– Tudo isso?
– Foi um resfriado e tanto. – Ela riu. – Mas o seu amigo não saiu do seu lado um dia, ele fazia questão de ficar com você. – Agora foi minha vez de sorrir. Não sei ao certo o porquê, mas isso tinha mexido com algo dentro de mim.
– E onde ele está?
– Carlos o levou para pescar depois de muita luta. Ele queria estar ao seu lado quando acordasse pra que vocês fossem logo para o casamento de Jordan e Lylah. – Ela riu – E a história de vocês não poderia ser mais engraçada.
– Ele contou?
– Pra chegar na razão por que vocês estavam na cabana de meu marido no meio de uma tempestade tinha que ser uma bela de uma história. – Ela colocou os cotovelos em cima da mesa – Então, seu amigo, ele é um rapaz muito bonito. Vocês dois já deram uns abraços eróticos? – Eu cuspi todo o café.
– O que?
– Pelo visto não, né? Oh minha filha, você está perdendo um partidão. Aposto que ele sabe fazer direitinho.
– Com aquele corpo acho que ele não sabe fazer nada de errado. – Era pra ser um pensamento, mas saiu como uma frase e a senhorinha olhou para mim com um sorriso de lado. – O que? A senhora mesmo disse que ele é muito bonito.
– Acho que sem camisa fica ainda muito melhor. – Ela apontou para a porta atrás de mim que se encontrava aberta. De longe pude ver duas pessoas vindo em direção à casa – Vamos!
Ela se levantou e eu fiz o mesmo. Saímos para a varanda da casa e descemos os três degraus até a grama.
E lá estava ele, conversando com um senhor enquanto segurava meia dúzia de peixes em uma mão e a uma vara de pescar na outra. E da mesma maneira que eu o analisava, ele voltou o olhar para mim, me analisando também. Eu já tinha conhecido homens ao logo da minha vida, homens que me surpreenderam ao logo da medida que eu os conhecia, porém, o estranho com que eu viajava estava ganhando de lavada de todos eles. Sim, ele era arrogante e um pouco convencido, mas ele era também gentil e tinha aquela aparência de filhinho da mamãe. E eu adorava um filhinho da mamãe, e fazia as palavras de Linda as minhas: não se engane com filhinhos da mamãe, eles podem ser amantes ardentes na cama. E como eu queria que essa regra se aplicasse ao estranho com qual eu viajava. Ele colocou os peixes dentro da cesta que o senhor ao seu lado carregava e colocou a vara em cima da mesa antes de parar em minha frente.
– Desculpa não ter pedido sua opinião sobre o assunto, mas você estava meio ocupada no momento.
– Tudo bem.
– Está tudo bem agora, até você jogar na minha cara que eu só te coloco em enrascada.
– Mas não é como se eu estivesse mentindo.
– Mas eu só estou tentando ajudar.
– Mas não parece.
– Você é muito mal-agradecida.
– Você que é vive colocando minha vida em risco.
– E te salvando também, não vamos esquecer disso. – Ele se aproximou – Talvez se você estiver achando ruim, devesse fazer alguma coisa e não ser uma donzela indefesa.
– Eu não sou nenhuma donzela indefesa.
– Não está parecendo.
– Uou! Uou! Frida, você está vendo isso? – O senhor falou se colocando no meio de nós – Acho que esses dois precisam de um banho no lago para acalmar os nervos.
– Eu acho que você tem razão, eu vou preparar a cesta. Você vem? – Ela olhou para mim e eu assenti. Frida me puxou de volta para a casa – Vocês sempre brigam assim?
– Na nossa situação, isso é constante. – Respondi, ajudando-a a colocar as coisas na cesta.
– Implicância é uma defesa contra atração. Vocês se sentem atraídos um pelo outro, mas se implicam pra esconder isso.
– Às vezes implicância é só implicância mesmo. Ele só me meteu em enrascada.
– Mas salvou sua vida também. – Ela pegou a toalha e saiu de casa – Você alguma vez o agradeceu por isso?
– Eu até tentei, mas eu acabei ficando doente. – Respondi, olhado para frente. Carlos e o estranho já estavam no meio do caminho. – É porque é difícil pra mim, sabe? Falar sobre sentimentos é meio que uma coisa nova. Arrependimento, saudades, raiva e essas outras coisas. Eu nunca fui muito boa com isso. Normalmente, eu me expresso de outras maneiras.
– Tipo pintando?
– É. – olhei para ela – Como a senhora sabe?
– Minha filha. Ela costumava pintar quando não sabia que palavras usar. Uma vez nós brigamos e ela pintou um quadro pedindo desculpa para nós. Eu chorei muito, porque o quadro era lindo e eu percebi que minha filha merecia mais do que esconder o talento aqui nessa cidade.
– Ela se mudou?
– Faz um tempo. Ela foi morar em Nova York para fazer faculdade, mas decidiu ficar para ver se conseguia seguir com a carreira de pintora. Se você quiser, eu posso te mostrar o ateliê dela depois que voltarmos.
– Eu iria adorar. – Olhei para frente sentindo meus olhos lacrimejarem. Não por causa do sol, mas sim pela paisagem que estava a minha frente. O lago tinha uma água cristalina em um tom de azul, dava até para ver a areia no fundo indicando que não era tão fundo. Havia uma cachoeira e algumas pedras ao redor e Carlos estava em pé em uma delas e, quando eu menos esperei, pulou com tudo na água. Parecia uma paisagem saída de uma pintura, quase boa demais pra ser de verdade.
– Ele não vai se machucar? – Perguntei, enquanto descíamos a pequena ladeira de grama indo para a borda de areia.
– Ele faz isso desde menino, não tem uma vez que ele se machucou. – Ela estendeu a toalha e colocou a cesta em cima dela – Você não vai tomar banho?
– Oh não, eu não tenho roupa. – Respondi me sentando na toalha.
– Nem eu. – Frida tirou a roupa e ficou apenas de calcinha e sutiã. Assim como se fosse a coisa mais normal do mundo enquanto eu morria de vergonha de ficar só de toalha. Não que fosse um problema ficar pelada na frente de um homem, mas quando as luzes estavam apagadas ficava mais fácil deixar tudo pra imaginação.
E falando em imaginação, não precisei nem usá-la, porque andando até mim com um sorriso no rosto e água escorrendo pelo peitoral estava o estranho, que ficava mais sexy a cada segundo. Às vezes, eu até achava que tudo que ele fazia era em câmera lenta para tornar a vontade de seduzi-lo ainda maior. Ou era só a minha imaginação fértil ou a minha carência fazendo com que eu visse coisa onde não tinha.
– Hein? – Ele disse por fim e eu foquei em seu rosto.
– O que? – Perguntei, esperando que ele reformulasse a pergunta outra vez, porque eu não tinha prestado atenção em nenhuma palavra que ele tinha dito.
– Você não vai entrar não?
– Não, eu não tenho roupa pra tomar banho.
– Isso não pareceu ser um desafio pra Frida. – Ele apontou para Frida que jogava água no marido.
– Pois é. Pena que eu não sou a Frida.
– Nossa! Você é mesmo uma chata de galocha.
– O que? – Levantei-me – Do que você me chamou?
– Chata de galocha. – Ele cruzou os braços – Não vamos fingir que você não é porque você sabe que é.
– Só por que eu não quero tomar banho?
– Não! Porque você não aproveita. Onde está aquela garota que estava bebendo todas no bar e gargalhando alto, tendo o melhor momento da vida dela? – Ele disse com um sorriso maroto em seu rosto – Vamos lá, donzela indefesa. Não ligue para o que os outros pensem pelo menos uma vez. Entre no lago, ninguém aqui vai te julgar.
– Eu estou bem, obrigada.
– Mas você é chata mesmo! Anda, vamos. – Ele se aproximou de mim fazendo com que eu desse dois passos para trás. Na verdade, dois passos em vão, pois logo ele me pegou pelas pernas e me colocou em seus ombros fazendo com que eu encarasse suas costas.
– Me solta! – Ordenei.
– Não! Você tem que aprender a ter um pouquinho de aventura nessa sua vida sem graça.
– Acho que nós dois sabemos que eu tive aventura o suficiente nos últimos dias.
– E nós dois sabemos que, provavelmente, foram os dias mais divertidos de toda a sua vida. Vai dizer que não gostou? – Ele parou no começo do lago e me coloco no chão. Ajeitei minha roupa, encarando-o indignada – Responde! Gostou ou não gostou?
– Por que eu deveria responder?
– Porque eu estou pedindo, por favor, que você responda. É só um sim ou não.
– Tudo bem. – Olhei para ele cruzando os braços – Devo admitir, foi uma aventura e tanto. Eu gostei, exceto a parte de ser perseguida por ladrões.
– Está vendo? Agora tira a roupa.
– O que? – Talvez tenha sido o tom autoritário misturado com aquele sorriso maroto que fez com que eu me arrepiasse da cabeça aos pés.
– É. Ou você acha que vai tomar banho de roupa? – Ele se aproximou, ficando perigosamente perto – Ou você quer que eu tire?
– Sai daqui, seu tarado. – O empurrei – Se vira.
– Você fala como se eu já não tivesse visto você de toalha. – Ele rolou os olhos.
– Vira! Agora! – Ele se virou de costas.
Respirei fundo, tirando os tênis primeiro, depois as calças e por último a camisa branca de botão. O vento frio entrou em contato com meu corpo fazendo com que eu me arrepiasse e quase desistisse, mas o estranho estava certo. É como Linda sempre dizia: se você quer que as coisas melhorem, o primeiro passo tem que ser seu. Ninguém pode viver a sua vida além de você. Joguei minha roupa em cima da toalha, olhei para o estranho, ainda de costa e não resisti. Passei por ele, dando um tapa em sua cabeça e corri para a água.
– Isso foi injusto! – Ele gritou, correndo até o lago. Olhei para trás com um sorriso antes de mergulhar no lago. Voltei a superfície encarando agora o estranho que me olhava com braços cruzados.
– O que? Dois segundos atrás você estava dizendo que eu não sabia aproveitar e agora estou aproveitando.
– Não às custas dos outros.
– Nossa! Mas como você é um chato de galocha. – Imitei-o, vendo-o segurar o riso. Fiquei em pé e repeti o mesmo ato de Frida jogando água no estranho.
– Isso vai ter volta. – Ele falou, ameaçando correr atrás de mim. Tentei nadar para longe, mas ele foi mais rápido e me pegou pela cintura virando-me para ele. Suas mãos quentes em contato com minha pele fria fizeram meu corpo arrepiar. Dei dois passos para frente, quase colando nossos corpos. O estranho estava mais irresistível com aqueles olhos encarando minha boca enquanto a sua se mantinha entre aberta quase como se fosse um convite para ser beijada.
– Vem pegar! – Empurrei-o fazendo com que ele caísse na água. Corri na direção contrária, porém não demorou muito para que ele me alcançasse e nós começarmos tudo de novo.
Era noite quando decidimos voltar pra casa dos Castellano’s. Fomos o caminho inteiro apostando corrida pra ver quem chegava mais rápido. Frida me emprestou uma roupa de sua filha para que eu não tivesse que ficar com as mesmas. Nestor emprestou as suas para o estranho e eu devo admitir, quando ele entrou na sala de jantar com aqueles cabelos molhados e camisa flanela com os três primeiros botões abertos eu senti um pequeno formigamento na ponta dos dedos. Deus, que homem era aquele que ficava mais sexy todos desarrumado do que com um terno de 800 euros? Me pergunto como ele ficaria pelado, suado e em cima de mim.
– Tudo bem pra você? – O estranho me cutucou fazendo com que eu acordasse do transe. O jantar já estava servido e eu estava imaginando o estranho pelado. Pontos para a carência.
– O que? – Respondi, começando a comer. E Deus, como Frida cozinhava bem.
– Carlos vai pra Oxford amanhã pela manhã e disse que poderia nos levar.
– Mas nós não sabemos onde vai ser o casamento.
– Correção: você não sabe. A casa é da minha família, eu sei o endereço.
– Então não vejo problema nenhum.
– Então pela manhã levo você e o comigo. Aee! Finalmente vocês vão chegar nesse casamento.
– Quem? – Perguntei, confusa – Alguém mais vai com a gente?
– Não.
– Então quem é ?
– Eu sou. – O estranho ao meu lado falou.
Então foi aí que me ocorreu: nesses dias que passamos juntos, não tivemos nem a curiosidade de perguntar o nome um do outro. Na verdade, eu estava achando muito interessante não saber o seu nome. Dava um ar de mistério à história.
– Vocês ainda não tinham se apresentado? – Frida perguntou, segurando o riso.
– Na verdade, não. Acho que passamos tanto tempo discutindo e fugindo que nem nos demos o trabalho de fazer apresentações.
– Ela tem razão. – Ele se virou pra mim estendendo sua mão – Eu sou , muito prazer.
– , prazer. – Apertei sua mão.
– Vocês dois são uma comédia. – Soltei a mão do estranho e continuei a comer. Frida e Carlos eram casal adorável e o fato de que eles nos acolheram e, principalmente, terem cuidado de mim fazia uma vontade de agradecê-los aumentar. Contudo, eu não sabia como. Na verdade, sabia sim, e era a única coisa que eu sabia fazer direito.
– Onde fica o ateliê da sua filha? – perguntei a Frida enquanto eu e o estranho – ou melhor, – terminávamos de lavar a louça. Foi praticamente uma briga com Frida para que ela deixasse que nós fizéssemos alguma coisa, Carlos precisou convencê-la que nós só queríamos agradecer de alguma forma.
– Você quer que eu te mostre? – Perguntou, se levantando.
– Eu adoraria. – Limpei minhas mãos no pano ao meu lado e olhei para o estranho – Você termina?
– Pode ir. – Coloquei a mão em seu ombro em forma de agradecimento e sai da cozinha acompanhada por Frida. Entramos no corredor onde ficavam os quartos e ela parou em frente a um que ficava antes do meu.
– Aqui costumava ser o ateliê da minha filha. – Ela abriu a porta.
– Mas tem uma cama aqui. – Falei, seguindo-a para dentro dele. Havia uma mesa cheia de matérias de pintura de um lado e uma cama do outro, a frente tinha uma janela que dava para ver a lua e as montanhas e sem falar nos vários quadros tanto em branco como pintados. O cavalete ao lado da mesa segurava uma tela em branco.
– Ela costumava ficar até tarde pintando então nós só colocamos uma cama aqui. – Ela pegou uma foto em cima da mesa. – Ser pintora sempre foi o sonho dela, por isso quando decidiu juntar suas coisas e tentar a vida em Nova York nós demos o maior apoio. – Ela abraçou a foto – Mas isso não significa que nós não sentimos sua falta.
– Sei como é esse negócio de saudades.
– Sua mãe também fica no seu pé pra voltar pra casa?
– Meus pais morreram quando eu ainda era pequena, Lylah e minha avó são tudo que eu tenho.
– Me desculpe.
– Tudo bem, eu já me acostumei. – Ela colocou a foto em cima da mesa outra vez – Qual o nome da sua filha mesmo?
– Joana Castellano. – Ela me olhou confusa – Por quê?
– Por nada. Quando a senhora falar com ela outra vez, por favor, diga a ela que ela é muito talentosa.
– Com certeza. Se você me der licença, eu estou muito cansada.
– Claro.
– Você não vem?
– Não, vou ficar mais um pouco.
– Tudo bem. Boa noite. – Ela segurou meu rosto e deu um beijo em minha testa. Vi Frida sair do ateliê e me virei para a tela em branco. Peguei a paleta em cima da mesa e apliquei as cores que eu queria. Enchi um copo d'água do banheiro e o coloquei ao meu lado. Sentei-me no banco em frente à tela ao cavalete que segurava a tela pegando o primeiro pincel.
As primeiras pinceladas nunca eram precisas, na verdade, eu nunca as entendia. Era como um quebra cabeça que eu teria que encaixar a medida de cada passada de pincel e cor usada. Uma explosão de emoções que se encaixam à medida que a inspiração tomava de conta. E quando ela tomava de conta, vinha de uma só vez, deixando meu coração todo por aberto e um sorriso frouxo no meu rosto porque eu estava passando para o papel o que eu estava sentindo naquele exato momento.
Não que eu soubesse o que exatamente era, mas algo me dizia que era o misto de liberdade e surpresas que eu presenciei nos últimos dias. E até mesmo sobre um certo estranho que tinha deixado um nó no meu cérebro por ser exatamente tudo que eu não esperava que ele fosse. Limpei o pincel logo depois de assinar o nome que eu não via fazia algum tempo já que a inspiração estava em falta por longo seis meses.
– Belo quadro. – Alguém disse atrás de mim.
– Pelo amor de Deus! – Falei, pulando da cadeira e me virando para ele. Limpei o pincel no pano ao meu lado – Mas você não sabe não assustar as pessoas? – Levantei-me do banco – O que você está fazendo aqui?
– A luz estava acesa. – Ele entrou no quarto – Pensei que era o meu quarto. – Ele passou por mim indo em direção ao quadro que eu acabara de pintar.
– Não é! Você pode ir agora.
– Você pintou isso? – Ele olhou para mim e depois para o quadro – Uau! Você é muito talentosa.
– Obrigada. Vamos agora? – Falei segurando-o pelo braço, tentando, em vão, puxá-lo.
– Você já cogitou seguir uma carreira? Lylah pode te ajudar. Você ficaria rica.
– Obrigada, mas não, obrigada.
– Sabe o que esse quadro lembra? – Ele estava me ignorando enquanto eu ainda tentava puxá-lo para fora do quarto. – Os da Zoe Cane. Até parece que vocês... - O estranho olhou para o canto do quadro. Puta merda! Soltei-me de seu braço, vendo-o virar-se para mim.
– Você é Zoe Cane! – Ele apontou pra mim. Burra! Dez mil vezes burra! Quase três anos escondendo de todos quem era de verdade, deixei-me descuidar dessa maneira. Ele provavelmente contaria até para o papa e eu teria que viver minha vida trancada dentro de casa com medo de sair. E toda a vida pacata, sem flashes, e gente querendo se meter na sua vida iria pelos ares.
– Primeiro, se você contar pra alguém, eu juro que eu mando te matar. – Falei apontando o dedo pra ele – Eu contrato o primeiro mercenário e mando te cortar em pedacinhos.
– Uou! Eu não vou contar para ninguém, eu juro.
– Acho bom.
– Mas eu quero saber o porquê.
– O porquê de que?
– De você querer se esconder. Eu sempre pensei que fosse porque você fosse deformada, mas como, claramente, você não é eu quero saber o motivo. – Ele se sentou no banquinho. Olhei para ele ainda um pouco aflita, mas para o inferno com isso, eu precisava conversar com alguém. Sentei-me na mesa e respirei fundo.
– Lembra quando você disse lá no lago que eu ligava muito pra os que os outros pensavam?
– Eu estava apenas brincando, você sabe.
– Sei! Mas o pior é que é verdade. – Abaixei a cabeça antes de encará-lo outra vez – Lylah deixou esse buraco dentro de mim, entende? Depois de tudo que nós passamos, e nossas vidas terem se transformado numa novela mexicana eu meio que odiei alguém tentando saber sobre mim. Imagina como foi pra eu fazer novas amizades, ou pior, manter um relacionamento sério com alguém. Eu sempre achava que qualquer coisa que eu fizesse ou dissesse seria um motivo para crítica porque Lylah sempre me criticava em tudo.
– Então é por isso que você tem aqueles ataques de ansiedade? Por conta do que sua irmã fez com você?
– De certa forma, sim. Eu não a culpo completamente, porém sempre achei que Lylah poderia ter sido um pouco mais compreensiva em vez de querer me obrigar a ser que nem ela. Lylah, um exemplo para outras pessoas, namorada do quarterback que superou a morte dos pais e continua firme e forte com sua vida. – Ironizei – O que ela nunca entendeu foi que eu não nasci pra isso, sabe? Ficar me exibindo pros outros, mostrando do que sou capaz e quão melhor eu sou.
– E onde Zoe Cane entra nisso?
– Eu comecei a pintar enquanto dividia um apartamento com Linda. Eu sempre deixei claro que não queria que minha vida ou minha cara estivessem nas capas de revistas, queria que fosse sobre a minha arte. Em uma dessas noites quando nós chamamos alguns amigos pra uma pequena festa, nós ficamos super bêbadas. Um amigo pediu um dos meus quadros e eu simplesmente dei. – olhei para , que me olhava atento. – No outro dia ele me ligou dizendo que seu pai, John-Lee Novak, tinha gostado do quadro e queria conhecer a dona dele. Eu pirei! Porra, John-Lee Novak, um dos maiores colecionadores de artes estava interessado em uma obra minha. Foi uma honra!
– Imagino. Quando John apareceu na galeria, Cassandra tremia na base. O cara simplesmente tinha aquela presença de parar o mundo e fala de arte como se escrevesse poesia.
– Pois é! No dia que eu ia me encontrar com ele, tudo que eu vivi no colegial voltou como um filme. Eu não queria nada daquilo de novo foi aí que eu pirei. Foi meu primeiro ataque de ansiedade. Linda não sabia o que fazer, mas Charles, filho de John, sabia. Eles me ajudaram a me acalmar e nós fizemos um acordo: as únicas pessoas que saberiam quem era Zoe Cane seríamos nós três. John ficou decepcionado por não conhecer sua nova artista favorita, mas gostou da ideia do mistério por trás dela.
– Devo admitir, acho que todo nós gostamos. É um toque a mais na sua arte. Você é extremamente talentosa, e não precisa da validação de ninguém. Nem mesmo da sua irmã.
– Eu sei, demorou um tempo pra eu perceber isso. Eu precisei entrar em terapia pra me ajudar nessa parte da minha vida.
– Todo artista tem seus demônios. – Ele riu, fazendo um sorriso brotar em meus lábios – Então por que você não disse a verdade depois que tudo melhorou?
– Ah, eu sinceramente gosto das possibilidades. Eu só queria que todo mundo percebesse que qualquer um poderia ser Zoe Cane, desde o mendigo do banco de praça ao filhinho de papai com seu terno de 800 euros. – Ele sorriu. E Deus tenha piedade, o sorriso daquele homem era ainda mais lindo quando ele ficava sem jeito. – E também porque é um nome meio caipira. – Falei, vendo-o rir junto comigo – Zoe era o nome da minha bisavó por parte de pai, Cane é o nome de solteira da minha mãe.
– Você tem razão, é bem caipira mesmo. – Olhei incrédula para ele. Desci da mesa, ficando de frente pra ele.
– Você é um grosso! – Falei, ameaçando dar-lhe um tapa. Mas antes que minha mão chegasse em seu peito, ele segurou meu punho, puxando-me para perto. Seu corpo estava colado ao meu e suas mãos em minha cintura.
– Um grosso bem charmoso, pode admitir. – Ele aproximou seu rosto do meu quase tocando nossos lábios.
– E um convencido. – Sussurrei.
– Que está prestes a te beijar. – Foi um aviso, mas mesmo assim a surpresa estava estampada em meu rosto. Seus lábios sobre os meus enquanto minhas mãos seguravam seus braços esperando que aquilo fosse mais do que um selinho demorado. Eu então, dei o primeiro passo para que aquilo se transformasse em algo que estava esperando desde que ele me beijara perto da lata velha do senhor Earl.
A regra do filhinho de papai se aplicava ao estranho. O jeito que ele segurava minha cintura com uma mão e meu pescoço com outro enquanto explorava cada canto de minha boca fazia com que eu arrepiasse da cabeça aos pés. Poderia ser a carência ou a atração quase que inegável que existia entre nós, ou até um pouco dos dois, que estava tornando o beijo ainda mais prazeroso.
Era calmo, mas cheio de desejo. Nossas bocas pareciam como velhas conhecidas pelo jeito que se encaixavam. E quando ele começara a morder meus lábios em respostas as mordidas que tinha dado eu senti minha sanidade indo embora por completo.
Puxei-o mais para perto fazendo com que eu ficasse na ponta dos pés e segurasse o cabelo de sua nuca puxando-os de leve. Senti suas mãos segurarem minha bunda fazendo com que eu pulasse em seu colo e logo em seguida senti a mesma entrar em contato com uma superfície dura presumi que estava sentada na mesa e provavelmente com o jeans totalmente sujo de tinta.
Mas valia a pena. E como valia.
Senti suas mãos tocarem minha pele por debaixo da blusa e eu entendia o que estava prestes a acontecer e não tinha nada que me impedisse de continuar.
– Implicância é uma defesa contra atração. – Assustei-me com a voz vindo do corredor e logo empurrei o estranho para longe de mim. Levantei-me da mesa, com a mão em minha boca. – Não parem por minha causa. Boa noite. – Olhei para ele que olhava para mim e logo o quarto foi tomado por risadas.
– Eu acho melhor a gente ir dormir. – Ele falou, olhando para mim. Abaixei a cabeça encarando o chão, mas logo prestei atenção no objeto caído no chão. Oh, não!
– Droga! – Abaixei-me pegando o porta-retratos em minhas mãos.
– Quem é?
– É a filha deles. – Respondi, me levantando – E nós estragamos a lembrança que eles tinham dela.
– Aposto que eles devem ter umas mil fotos delas. Eles nem vão se importar.
– Mas eu sim. – Olhei para o cavalete e mais algumas telas em branco – Eu já sei.
– Ei! – Ele segurou meu braço – Eu... Bem, eu não sei o que dizer.
– Então não diz nada. Vai lá dormir. Boa noite.
– Boa noite. – Ele deu um beijo em minha testa e saiu.
Virei-me para o cavalete, pegando uma tela em branco.
Eu sabia o que fazer.
Capítulo 6
Acordei de um jeito que fazia tempo que eu não acordava: coberta de tinta e com o pincel na mão. Não sei bem quantos quadros foram, mas eu simplesmente não conseguia parar de pintar. Quase seis meses sem uma criação nova e agora, do nada, mais de cinco quadros.
Talvez, era isso que estivesse faltando. Um pouco de aventura misturada com perigo e mistério que minha vida tinha se transformado nos últimos dias. Linda e Charlie ficariam orgulhosos quando visse o meu progresso depois de meses com bloqueio criativo.
Quando entrei no quarto , já não estava lá. Era estranho chamá-lo pelo o nome já que tinha me acostumado de chamá-lo de estranho. Havia uma muda de roupa e eu presumi que fossem para mim. Não demorei muito no banho porque antes mesmo de entrar no chuveiro minha barriga anunciou – e bem alto – que eu precisava de comida. Encarar a mesa farta de Frida fez com que meus olhos brilhassem e minha boca salivasse. Eu coloquei tanta comida no prato que até eu fiquei assustada quando comi tudo aquilo sozinha.
– Nossa filha comia desse mesmo jeito depois de passar a noite pintando. – Carlos disse. Eu parei de comer no mesmo instante olhando para eles.
– Eu estou parecendo o Godzilla que aterrissou na mesa do café da manhã de vocês.
– Godzilla? – começou – Godzilla é apelido. Você está parecendo um furacão arrastando tudo que vê pela frente.
– Ei! – dei-lhe uma cotovelada – Isso é jeito de se falar com uma dama?
– Uma dama não comeria o tanto que você está comendo.
– Já te ocorreu que existem vários tipos de damas?
– Pensei que vocês dois tinha se resolvido ontem à noite. – Carlos falou fazendo com que eu sentisse minhas bochechas queimarem. Então eu lembrei o porquê de eu ter ficado acordada até tarde.
– Falando em ontem à noite, eu tenho uma coisa pra mostrar. – Falei, me levantando – Vamos gente, levanta! – falei indo em direção ao corredor. Parei em frente ao quarto que eu dormir vendo-os logo atrás de mim. – Primeiro quero agradecer muito a vocês dois, Frida e Carlos, por terem acolhido a mim e ao estranho, quero dizer, . Tenho que me acostumar que agora você tem nome. Vocês dois são uns anjos, eu espero que vocês sejam muito felizes e que vejam sua filha logo. – Abri a porta do ateliê, entrando no mesmo. – Bom, eu espero que vocês gostem. Faz tempo que eu não pinto então não sei se ficou bom. – Terminei, mostrando a eles as telas expostas. Eram três telas: a primeira que eu fiz que lembrava muito a paisagem do lago no qual eles nos levaram; a segunda um casal, inspirados neles e por últimos uma releitura da foto de suas filhas do retrato que nós quebramos. Ainda tinham mais duas encostadas na parede, mas essas não tinham tanto valor sentimental como as outras. Eram apenas telas que vieram entre uma inspiração e outra.
– Oh meu Deus! – Frida falou – Isso é Joana? E esses dois somos nós?
– É. Eu decidi pintar Joana porque ontem eu meio que quebrei o retrato dela. – falei, mostrando o porta-retratos quebrado.
– Nós quebramos, na verdade. – falou.
– Não ficou muito bom, como eu já disse, mas foi feito de coração. – falei olhando para os dois que olhavam o quadro de perto.
– Você é muito humilde minha querida, – Frida começou – isso daqui é uma obra de arte. Joana que me desculpe, mas acho que tenho mais uma pintora favorita para colocar no meu coração. – Frida juntou as mãos e me olhou como se olhasse para uma filha matando sua mãe de orgulho.
– Obrigada. – Zoe Cane era mais do que acostumada a receber elogios, eu sempre ficava atenta à o que a crítica falava, mas a nunca teve alguém falando o quanto ela era talentosa. Tanto Linda como Charles falavam, porém eles eram meus amigos e eu já estava acostumada com eles – Fica como uma lembrança de dois estranhos que balançaram um pouco o mundo de vocês, que tal?
– E como balançaram. – Frida falou, andando até nós – Não se preocupe, nós não iremos contar o seu segredo para ninguém, senhorita Cane. – Arregalei os olhos – Oh querida, se você não quer que as pessoas saibam quem você é de verdade, não deveria assinar seu nome.
– É só que...
– Eu sei. Privacidade.
– Exato.
– Não se preocupe, se depender de nós, Zoe Cane nunca pisou aqui.
– Muito obrigada, Frida. – a abracei – Passei todos esses anos escondendo quem eu era e em menos de um dia, três pessoas já descobriram meus segredos.
– Três pessoas que você pode confiar, certo, ?
– Claro. – Ele afirmou.
– Se vocês não se importam, eu queria que vocês enviassem aqueles dois quadros pra esse endereço. – Estendi o papel para eles – É o endereço da galeria do meu amigo. Ele vai saber o que fazer.
– Mas é claro. – Ela olhou para nós – Foi um prazer conhecê-los.
– O prazer foi nosso, – começou – e muito obrigada por nos acolher, principalmente ter cuidado da .
– É mesmo, muito obrigada. Vocês foram um amor.
– Nós que agradecemos e esperamos que vocês venham nos visitar. – Os dois saíram do quarto.
– Já sei onde vou me esconder quando não tiver inspiração. – falei, seguindo-os em direção a porta.
– Pode vir quando quiser. – Frida abriu a porta – Vem cá me dar um abraço! – Frida me puxou, quase me esmagando. Depois me soltou, segurando minhas bochechas – E saiba que a onde quer que sua mãe esteja, ela está muito orgulhosa.
– Obrigada!
– Muito obrigado mesmo! – disse abraçando Frida enquanto eu abraçava Carlos.
– Agora vamos, porque estamos atrasados e a noiva é uma histérica. – Ele olhou para mim – Desculpe.
– Não é como se o senhor estivesse mentindo. – Ele deu de ombros e foi em direção ao seu caminhão.
Oxford não ficava tão longe da vila onde os Castellanos moravam. No caminho, Carlos vinha explicando porque nunca tinham saído da sua cidadezinha já que o estranho perguntou: como alguém conseguia morar numa cidade tão pequena? Frida e Carlos gostavam da vida pacata que levavam, lá eles conheciam todos os habitantes e foi lá que eles se conheceram. Frida tinha uma plantação de rosas linda que ficava na estufa perto de sua casa e era por isso que Carlos conhecia o caminho que nós íamos tão bem. Frida era que estava fornecendo as rosas para o casamento de Lylah e Jordan. Foi um tanto quanto chocante descobrir que Lylah não tinha mandado trazerem rosas no jatinho particular do seu futuro noivo direto de Amsterdã. Talvez Lylah, tenha mudado, nem que seja só um pouquinho e nós poderíamos nos comportar como adultas e conversar.
– Hein, ? – Carlos perguntou, chamando minha atenção.
– O que?
– Quanto tempo que você não fala com sua irmã?
– Uns 6 anos, quase 7.
– Nossa! Por que tudo isso?
– É complicado.
– E o que os pais de vocês acham disso? Eles não te obrigam a se verem no natal?
– Eles morreram quando ainda éramos pequenas. Quem nos criou foi nossa avó.
– E o que ela acha disso?
– Ela não gosta, mas ela também não pode nos obrigar a nada. Às vezes eu acho que é melhor assim.
– Você não deveria dizer isso, ela pode ter sentido sua falta nesse meio tempo. Ela é sua irmã.
– Eu duvido muito.
– Mas ela te chamou pro casamento.
– Porque eu aposto que minha avó fez um escândalo.
– Ou porque ela queria ver você.
– O senhor não conhece minha irmã.
– Talvez. Mas você não acha que ela tenha mudado nesses seis, quase sete anos, que vocês não se viram?
– Não! – respondi tão rápido que gargalhou ao meu lado.
– Pois eu acho que sim.
– O senhor sempre pensa o melhor das pessoas?
– Querida, com tanta coisa ruim no mundo a gente tem que acreditar no potencial das pessoas. Segundas chances existem pra serem usadas, não para ficar só na teoria. – olhei para .
– O que? – ele perguntou, olhando pra mim.
– Lylah, ela mudou?
– Eu não sei como ela era no passado, então não tem como dizer se ela mudou ou não.
– Quase vadia, sem coração, que só liga muito para que os outros pensam e super controladora.
– Não mudou muita coisa, mas posso garantir que ela está bem melhor. Acho que o amor faz isso com as pessoas.
– Está vendo, Carlos?
– Mas ele disse que ela melhorou. Por que você não pode aceitar o fato de que ela sente sua falta?
– Porque ela não sente!
– Está bem. Agora a pergunta que não quer calar: e você? Sente falta dela? – abaixei a cabeça. Tinha vezes, em datas comemorativas ou mesmo no meio da noite em que eu me perguntava como Lylah podia estar. Se tinha conseguido tudo que queria, se era feliz e, principalmente, se sentia minha falta do jeito que eu sentia a dela. Poxa, nós éramos irmãs, pelo amor de Deus! Tivemos momentos ruins, muito quebra pau, mas, uma vez ou outra, nós levantávamos as bandeiras brancas e tínhamos momentos como uma verdadeira família. Era nesses momentos que eu tentava me agarrar, porém, parecia que minha cabeça não me deixava esquecer os maus momentos.
– Às vezes.
– Está vendo?
– Isso não prova nada. – Foi quase inevitável não bocejar. O balançar do carro somado à noite mal dormida fazia com que meus olhos ficassem mais pesados.
– Parece que alguém não dormiu noite passada.
– Eu estava muito inspirada! Não consegui parar, se tive quatro horas de sono foi muito.
– Pode dormir, Oxford ainda fica longe.
– Mas...
– Encosta ai no seu super herói e dorme, donzela indefesa.
– Eu já disse que não sou nenhuma donzela indefesa. – Bocejei de novo.
– E o bonitão aí também não gosta do título de herói, mas tem se comportado como um desde que te conheceu. – Eu queria cavar um buraco e enfiar minha cabeça dentro. Carlos parecia falar exatamente o que precisava pra fazer as pessoas desconfortáveis.
– Pode encostar aí, eu odeio dormir dentro de carro. – falou apontando para seu ombro.
– Normalmente eu recusaria, mas eu não estou conseguindo mais segurar meus olhos. – Apoiei minha cabeça no ombro do estranho e deixei o cansaço tomar contar do meu corpo.
Acordei um tempo depois com a risada de Carlos tomando conta do carro. Não sei ao certo quanto tempo eu dormi, mas parecia que não tinha sido o suficiente. Eu ainda tinha aquela vontade de me jogar em uma cama e dormir mais um pouquinho.
– Bem a tempo! – Carlos disse enquanto eu coçava os olhos e sentava direito.
– Eu dormi muito? – perguntei, olhando para os dois.
– O caminho inteiro e ainda soltou um: , eu não consigo viver sem você. – Arregalei os olhos. Carlos e seguravam o riso, porém Carlos soltou a primeira gargalhada.
– Seu imbecil! – dei um soco em seu braço – Onde estamos? E por que estamos parados?
– Nós chegamos.
– Essa é a casa da sua família? Essa mansão? – perguntei, vendo a mansão através do portão de ferro. A casa tinha pelo menos uns 15 quartos, parecia uma casa antiga da era vitoriana com aquele jardim enorme na frente. – Acho que não estou vestida apropriadamente. Na verdade, acho que não tenho uma roupa apropriada nem pra dormir.
– Deixa de besteira. – Ele disse, dando-me um empurrão – Todo mundo por aqui é muito humilde. Tirando a Cassandra e a sua querida irmã, obviamente.
– Não sei porque não estou surpresa com essa revelação. – Respondi. se inclinou para fora do carro para poder conversar com o porteiro.
– Olá, senhor . – O porteiro na torre de vigilância disse logo depois que ele colocou a cabeça pra fora – Um pouco atrasado, o senhor não acha?
– Oh, Stan, se você soubesse o que eu passei. – Ele respondeu olhando para o senhor – Será que você pode abrir o portão e pedir pros rapazes nos ajudarem, tem um caminhão para descarregar.
– As flores da senhorita , certo?
– Exatamente. – Ele assentiu e logo o portão se abriu. Quando o caminhão começou a se mover eu tive um pique de realidade e finalmente percebi que estava prestes a ver minha irmã na qual eu não via por seis longos anos e ela provavelmente estava muito puta. Muito puta não, cuspindo fogo pela boca que nem um dragão.
Pelo o que eu me lembrava, Lylah detestava quando as coisas não saiam do jeito que ela queria, e meu pequeno desaparecimento com certeza não estava em seus planos.
Porém, de certa forma, eu não estava nem um pouco ligando. Na verdade, eu estava pouco me fodendo. Lylah não tinha nenhum direito de me tratar mal e se ela o fizesse, eu tinha todo o direito de a mandar tomar naquele canto.
Isso mesmo. A que tinha medo da irmã e fazia tudo para agradá-la tinha morrido naquele mesmo dia que ela me colocou pra fora do seu mundo. Eu era uma nova pessoa agora, e estava muito feliz pela pessoa que eu tinha me tornado. E se Lylah não gostasse, bem isso já não era problema meu. Ela pode ir pro raio que a parta. Paramos em frente à casa e logo saiu do carro estendendo a mão para me ajudar a sair.
– Obrigada, estranho. – falei, assim que desci do carro.
– Eu tenho nome, sabia? – ele disse, sorrindo.
– Eu sei, mas estranho é bem mais legal, não acha?
– Não.
– Estraga prazeres. – Dei um empurrão dele.
– ! – um rapaz apareceu na porta. Dava para perceber que ele era o futuro marido de Lylah, a semelhança entre ele e estava escrita por toda a sua cara e em sua voz – Cara, que bom que você está bem. Nós sabemos o que aconteceu, papai ficou louco atrás de você. – Ele abraçou o irmão – Estão com você?
– Claro. – O estranho bateu no bolso da calça e Jordan pareceu aliviado.
– E essa? Quem é? – ele olhou pra mim – Sua namorada?
– Claro que não. Eu sou...
– ! – eu sabia quem era e não foi nem preciso desviar o olhar pelo tom de autoritária. Fazia um tempo e Lylah não tinha mudado muito, só seus cabelos que estavam maiores fazendo com que ela parecesse mais ainda com mamãe. Eu sempre soube que ela ficaria parecida com ela, mas a semelhança chegava a ser assustadora agora. Ela parou em minha frente batendo o pé no chão e tinha os braços cruzados – Por que você não estava na estação quando seu trem chegou? Por que diabos você está no caminhão das flores? Você quase estragou tudo, está feliz? Por sua causa eu perdi mais de três sessões no salão, tudo pra você não estar naquela droga de estação.
– Olá Lylah, muito bom ver você também. Faz quanto tempo mesmo? Oh, acho que 7 anos. Eu estou passando muito bem, se você me permite falar, e desculpe estragar sua vida mais uma vez. Acho que eu não sei viver sem ter o desprazer de foder com ela.
– Olha o jeito que você fala comigo.
– Olha o jeito que você fala comigo, sua patricinha mimada. Porra, Lylah! Faz 7 anos que a gente não se vê e é desse jeito que você me recebe? A porcaria do meu trem foi assaltado e eu tenho certeza que você sabe disso a essa altura do campeonato. Eu tive que pular daquele trem pra chegar na porcaria do seu casamento. – Apontei pra ela – Eu passei por maus bocados e você nem pra perguntar como eu estou. Será que você pode deixar de ser uma vadia egoísta pelo menos uma vez na vida? E pensar que eu cogitei a ideia que poderíamos ter uma relação de irmãs outra vez, mas vejo que seu gênio de vadia, que só liga pro que os outros pensam, não mudou nem um pouco. Nem se você quiser eu olharei pra sua cara depois que isso aqui terminar.
– Isso aqui tem nome, e é o meu casamento.
– Meus pêsames para o noivo, então, porque pra te aguentar, tem que ser um santo mesmo.
– Sua punk esquisita! – ela gritou.
– Patricinha mimada! – gritei de volta.
– Isso sim tem gostinho de casa! – a senhorinha com um copo de uísque na mão falou. Não pude deixa de sorrir, fazia quase um ano que eu não a via.
– Vó! – falei indo em sua direção, dando-lhe um abraço – Eu senti sua falta. A senhora não acha que é muito cedo pra beber? – perguntei, olhando para o copo em sua mão.
– Isso é o que seu desaparecimento fez comigo. – ela olhou para – Nós ficamos sabendo o que aconteceu. Oh, minha querida, nós ficamos extremamente preocupados. Liguei para Linda e ela disse que você tinha ido no trem que foi assaltado, mas você não estava nele quando chegou na estação então presumimos que você tinha arrumado um jeito de escapar.
– E arranjei. – olhei para que sorria. Lylah olhou confusa para nós dois.
– Espere um segundo. – Ela falou e eu não pude evitar de rolar os olhos – Vocês dois estavam juntos o tempo todo?
– Estávamos. Eu fiz que com que a pulasse do trem comigo. – Ele falou fazendo com que Lylah ficasse chocada. – Você deveria ser mais compreensiva, Lylah. Nós não fizemos de propósito.
– Passou 5 dias com minha irmã e acha que a conhece hein, ?
– Claro que não, mas pelo visto, nem você conhece a irmã que tem. – Lylah abriu a boca incrédula.
– ! – pelo cabelo preto, o vestido apertado e o enorme chapéu em sua cabeça presumi que aquela seria a madrasta de , a famosa Cassandra – Meu querido, nós quase mandamos o FBI atrás de você. – Ela falou descendo as escadas e parando em frente a ele – Você está bem?
– Acho que o FBI tem assuntos mais importante pra tratar do que o meu desaparecimento.
– Nós ficamos realmente preocupados. – Ela olhou para mim – E você, querida? Quem é?
– Eu sou , irmã da noiva. – Ela olhou para Lylah e depois para mim.
– Irmã de Lylah? É um prazer finalmente conhecê-la. Eu sou Cassandra. – Ela estendeu sua mão.
– , muito prazer.
– Vocês estavam juntos esse tempo todo? – ela apontou para mim e depois para .
– É, nós escapamos juntos no trem.
– Oh, fico muito triste pelo o que aconteceu, principalmente com você, minha querida. Mas pelo visto você é dura na queda. Vamos, você vai ficar no quarto de hóspedes ao lado do da sua irmã.
– Mas a Carrie está lá.
– Sua madrinha pode ficar junto com as outras, ela não é da família. – Lylah rolou os olhos e se virou para o noivo. – Greta, ajude Carrie a tirar suas coisas do quarto de hóspedes e levar para um dos quartos que sobrou junto com as outras madrinhas.
– Claro, senhora. Com licença. - Cassandra era incrivelmente bonita e extremamente intimidadora, eu entedi por não podia prever seus passos. Aquela mulher podia matar com o olhar. – Richard, chegou! – um homem tão alto quando Cassandra se levantou do sofá e olhou para mim.
– Pelo o que eu me lembro de , ele era mais alto e tinha um pinto no meio das pernas.
– Richard, tenha modos! – Cassandra o repreendeu e logo vi passando pela mesma e indo abraçar o homem.
– Meu filho, que susto! – o senhor falou, soltando o estranho – Como foi que você conseguiu escapar daquele trem? Você está bem? Quebrou alguma coisa?
– Eu estou bem. E nós pulamos do trem.
– Nós? – ele olhou para mim – Não sabia que você estava namorando.
– é irmã da Lylah.
– Mas veja que coincidência. Acho que se nós tivéssemos pedido para que vocês viessem juntos não daria tão certo.
– Pois é, senhor, seu filho salvou minha vida. – Comecei – Me colocou em várias enrascadas no meio do caminho, porém estou aqui viva.
– Como se você não tivesse gostado.
– Gostado não, agradecida sim.
– Sempre soube que ele tinha pinta de herói, mesmo sendo o maior fã dos vilões de quadrinhos.
– Menos pai. – Ele olhou para mim – Cadê todo mundo? Vovó está por aqui?
– Não, eles só chegam hoje à noite. Oh, quase que eu me esqueço, feliz aniversário. – o senhor abraçou o estranho novamente.
– Oh é verdade! – Cassandra começou – Ficamos tão preocupados que esquecemos do seu aniversário, você não se importa se nós fizermos apenas um jantar simples?
– Faça o que quiser, Cassandra. – Ele passou pela mesma indo em direção a escada. Subiu de dois em dois e logo o vi desaparecer.
– Você deve estar cansada né querida? – assenti – Greta, leve para o quarto dela.
– Muito obrigada por me receberem.
– Claro. É finalmente um prazer conhecer alguém da família além de sua avó. Oh, e não se preocupe com suas malas, nós trouxemos.
– Verdade? Pensei que os ladrões tinham levados todas as malas.
– Aparentemente não. Eles deixaram todas as malas no vagão, você acredita nisso? Ladrões que não roubam.
– Vai ver eles estavam procurando outra coisa.
– Vai ver. – ela se virou para mim – Agora, Greta, irá lhe mostrar onde você vai ficar. Pegue o dia para descansar porque a noite nós teremos um jantar.
– Muito obrigada, outra vez. – Virei-me para minha avó que estendeu o braço para mim. Greta nos guiou escada a cima dizendo a quem cada quarto pertencia.
– Esse é o seu, o do lado é o da senhorita Lylah e o do final do corredor do senhor . – Greta abriu a porta do quarto. Era grande, como esperado, havia uma janela enorme ao lado da cama que levava uma a uma varanda. Do lado havia uma porta que Greta que levava ao closet e depois ao banheiro – Fique à vontade, suas malas estão no closet.
– Obrigada, Greta. – Ela saiu do quarto e eu me joguei na cama.
– Você tem certeza que está bem? – minha avó perguntou. Apoiei-me meus cotovelos para encará-la – Não quer que eu chame um médico?
– Já disse que estou bem.
– Você vai me contar essa história todinha, senhorita . Principalmente se tirou uma lasquinha desse gostosão que você estava viajando.
– Vó! Pelo amor de Deus! – falei, me sentando na cama – Não tem nem quinze minutos que eu cheguei e a senhora já está me fazendo perguntas inapropriadas.
– Mas é verdade! Você viu aquela bundinha? Se eu fosse mais nova, esse não me escapava.
– Alguém já te disse que a senhora é muito saliente para sua idade?
– Estou velha, não morta. Olhar não arranca pedaço. – Ela segurou meus ombros – E, além do mais, só quero que você seja feliz.
– Não preciso de um homem pra ser feliz.
– Eu sei que não, mas é bom ter alguém pra fazer nosso coração bater mais forte e um sorriso frouxo brotar nos lábios.
– Acho que a bebida está finalmente batendo. – Me afastei dela indo em direção a minha mala.
– Pode ser, mas eu quero saber o que aconteceu. Pode contar tudo. Pular de um trem, ? Não é muito a sua cara. – Olhei para ela e respirei fundo.
– Eu sei, mas foi preciso. – Abri a mala procurando por meu kit pintura primeiro socorros – Vó, eles estavam atrás de Zoe Cane. – falei, olhando para ela.
– O que? Mas como? Ninguém sabe quem é Zoe Cane.
– Bem, alguém sabia que ela estava naquele trem. Sabia não, tinha certeza.
– Foi por isso que você pulou?
– Na verdade, não. – Peguei o kit e fechei a mala. – Pra ser bem sincera, eu não tinha intenção nenhuma de pular de trem algum. Zoe Cane é um nome fictício, não existe nenhum registro de quem ela é de verdade.
– Então se eles não sabiam que você é Zoe, por que pulou então?
– que saiu me arrastando pro vagão de malas sem meu consentimento. Não, foi até os ladrões virem atrás de nós e perguntarem se Zoe Cane estava lá que eu pirei, e abri minha boca. A senhora lembra quando vivia me dizendo que um dia minha boca grande ia me colocar em uma grande enrascada? Nós pulamos daquele trem porque eu abri a minha grande boca.
– Bem feito. – Ela se jogou em uma poltrona perto da janela – E você sabe por que ele fez isso?
– Fez o que? Por que me arrastou com ele? – ela assentiu – Na verdade, não sei. Por que a pergunta?
– Porque sejamos sinceras aqui, minha querida, ele iria se dar muito melhor sozinho do que acompanhado.
– Eu nunca pensei por esse lado.
– Pois deveria. O que ele fez não é algo que se espere das pessoas hoje em dia, vivemos em uma sociedade tão egoísta que é cada um por si e o resto que se exploda.
– Também não é assim.
– Se fosse ele no seu lugar, você voltaria?
– Bem... – olhei para ela – Provavelmente não, eu entraria em pânico e salvaria minha vida.
– Está vendo. – Ela cruzou os braços – Agora a pergunta que não quer calar é: por que o gostosão do futuro cunhado da sua irmã decidiu levar você com ele? – olhei para ela – Você não perguntou?
– Bem, óbvio que eu pensei sobre o assunto, mas nunca cheguei a conversa com ele sobre isso. E, além do mais, eu estava muito ocupada ficando bêbada, pulando de um penhasco e fugindo de um ladrão chamado Mark.
– Então você sabe o nome do cara que estava atrás de vocês?
– Sei. Numa brincadeira de , nós descobrimos o nome do chefe do bando.
– Então acho melhor nós falarmos com Richard, ele pode falar com a polícia. – ela andou em direção à porta.
– Vó, espera! – levantei-me fazendo com que ela olhasse para mim – Deixa quieto, quando eu voltar pra Nova York peço pro Charlie ver isso direito. Eu não estou com um pingo de paciência para esse assunto, tenho coisa mais importante pra resolver. Sem falar o chilique que Lylah vai dar quando descobrir que o casamento dela virou um romance policial.
– Hum... Então teve romance com o bonitão? Ele é o assunto mais importante que você tem que resolver, hein? Vai atrás dele pra acertar as coisas e dar umas beijocas.
– Não. – Ri, sentando-me na cama novamente – Preciso arrumar um lugar pra pintar.
– Pintar?
– É, eu... – fui interrompida pela porta do meu quarto sendo praticamente escancarada. Pulei da cama encarando nada menos do que um Charlie ofegante segurado a porta do meu quarto. – Charlie? – perguntei, me levantando – O que você está fazendo aqui?
– Vim pro casamento do filho do amigo do meu pai. – Ele andou até minha direção, me abraçando pela cintura a ponto de quase esmagar meus ossos – Quando eu cheguei e vi sua avó e ela me contou que você tinha desaparecido. Eu quase tive um ataque. – Ele me soltou.
– Oh, que lindo, você estava preocupado.
– Claro que não. Estava pensando na maior fonte de dinheiro pra minha galeria, senhorita Cane. – Ele disse e eu dei um soco em seu braço – Claro que eu estava preocupado! A Linda quase pega um trem e vem pra cá, mas aí ela ainda tem alguns dias da exposição e preferiu não vir pra não irritar os chefes deles mais um pouquinho.
– Seu pai é amigo de Cassandra?
– Não, de Richard. Eles frequentaram faculdade juntos. – Ele me olhou confuso – Como você sabe de Cassandra? Espere, como você chegou aqui? Como escapou daquele trem? Por que você escapou daquele trem? Por que não disse que Lylah York era sua irmã?
– Charlie, respira! – segurei em seus ombros. – Uma coisa de cada vez. – Andei em direção à porta, fechando-a. Virei-me para os dois. – O mais importante agora é que eu preciso arrumar um lugar pra pintar.
– O que? – Charlie sentou na cama e minha avó fez o mesmo - Você voltou a pintar?
– Sim. – Um sorriso habitou em meus lábios – Acho que era isso que estava faltando na minha vida.
– Escapar de um trem prestes a ser assaltado?
– Não, aventura. – Sentei-me na poltrona em frente pra eles. – Vamos começar do começo, depois que Linda me deixou na estação.... – contei a história inteira para eles, desde que pulamos do trem até a minha recém chegada a mansão dos . Charlie e minha avó se entreolhavam uma vez ou outra e soltavam uma risada, Charlie por ser sempre inapropriado, soltava um comentário escandaloso fazendo com que minha avó desse um beliscão nele.
– Isso dói viu, Annie. – Ele massageou seu braço – Mas eu concordo com sua avó, ele se daria muito melhor sozinho, ainda mais viajando com você.
– E o que você quer dizer com isso?
– Que você é fresca. – Abri a boca indignada. – Ah, , você sabe que é sim.
– Querer as coisas do meu jeito é frescura?
– É, e parece que é genética. Lylah também tem.
– Falando em Lylah, como você a conhece?
– Ah, ela sempre me perguntou como eu conseguia que Zoe Cane fizesse todas as suas primeiras exposições na minha galeria. Passou meses me perturbando pra que eu conversasse com você e te convencesse a fazer uma exposição na galeria que ela trabalha.
– A da madrasta do . – Ele olhou desconfiado para mim.
– É, como você sabe disso? Você conhece ?
– Ele é o estranho da história.
– Ele é o estranho da história? – ele gritou.
– Sim.
– Você tirou uma casquinha dele? Por favor, me diz que você pelo menos deu umas beijocas nele. Eu tenho tentado por anos, mas ele não joga no meu time.
– Voltando para Lylah, como você não desconfiou que ela era minha irmã?
– Ah, porque você quase nunca fala dela e, quando falava era só por cima, nunca mostrou foto nem nada. Sem falar que Lylah usa York em vez de . Como que eu iria saber que vocês duas eram irmãs? Só que falando disso agora, até que vocês são meio parecidas. – Abaixei a cabeça – O que você vai fazer agora?
– Não sei, cirurgia plástica talvez.
– Não. – Eles riram – Em relação ao seu estranho. Digo, ele sabe seu segredo agora, ele e aqueles dois caipiras.
– Ei! Eles cuidaram de mim, mais respeito.
– Tanto faz.
– Ele não vai contar. – Disse convencida.
– Como você sabe disso?
– Eu apenas sei.
– "Apenas sei"? Apenas sei é uma ova. Não querendo te alertar, mas alguns membros dessa família são obcecados por Zoe Cane, rola até uma aposta pra quem descobrir primeiro quem ela é. Eles têm um corredor com obras de arte e adivinha quem é a maior ganhadora de espaços na parede? Você!
– Ele não vai dizer, eu sei que não. Eu o ameacei.
– Uau! Nossa! Meu Deus! Uma ameaça de , a Rainha tremeu na base agora!
– Odeio quando você brinca de engraçadinho.
– Não estou brincando, estou falando sério. , você tem que falar com ele.
– O que? Agora? Certamente que não! Eu estou cansada, preciso dormir.
– Mas você não veio dormindo no caminho?
– Quem te disse isso?
– , minha florzinha, você não pode entrar dentro de um veículo que dorme o caminho inteiro.
– É verdade. Lembro de uma vez que você não queria dormir e seu pai te pegou no colo e foi dar uma volta de carro. – Annie começou – Funcionava sempre, então seu pai passou a fazer isso quase todas as noites.
– Papai e seus jeitos estranhos de consertar as coisas.
– Mas todo mundo nessa família é estranho hein? – Annie deu outro beliscão nele – Pelo amor de Deus, para com isso!
– Então deixa de falar besteira. – Ele deu língua pra ela. Annie voltou seu olhar para mim – Ele está certo, você sabe, né?
– Sei. – Me levantei – Posso fazer depois de dar um cochilo? Juro que não passa de meia hora!
– Claro, querida, por que não? Ai enquanto você tirar um cochilo, ele falou até pro papa que no seu tempo livre você é uma das maiores pintoras da atualidade. – Charlie completou – Cê ta louca? Vai logo atrás desse boy!
– Mas que saco! – andei até a porta. – Eu chego lá e falo o que? "Olha aqui, bonito, se você contar meu segredo eu corto seu pinto?"
– Corta o pinto acho que não, ainda quero ver se consigo que ele venha jogar pro meu time. – Rolei os olhos – Diz que conhece uma mãe de santo, e das boas, que pode jogar uma praga nele.
– Essa é sua ideia de ameaça? Uma praga? Da onde você tira essas coisas?
– Provavelmente do arsenal de histórias inacabadas da minha mãe. Ela adora essas lendas urbanas e coisas estranhas. – Respirei fundo e disse:
– Eu sabia que isso ia acontecer um dia.
– Que você ia ser perseguida por ladrões, pular de um trem e ainda deixar um gostoso e dois caipiras descobrirem seu segredo?
– Não. Que alguém um dia ia descobrir quem eu sou e provavelmente não seria alguém que eu confio.
– É só trazer ele pro nosso lado e pronto.
– Como eu faço isso?
– Promete uma grana.
– Você acha que é uma boa ideia? – olhei para ele que assentiu – Você tem razão, dinheiro resolve muitas coisas, não creio que com ele não vai ser diferente. Olha só pra família dele. – Abri a porta.
– . – Dei um pulo colocando a mão no peito encarando parado em minha porta.
– O que você está fazendo aqui?
– Eu vim ver como você está e não deixei de escutar uma parte da conversa. – Ele entrou e meu quarto – Não se preocupe, eu não dou a mínima para Zoe Cane ou quem ela é.
– Pensei que você tinha dito que a achava interessante. – Cruzei os braços.
– Mas foi antes de saber que ela era você. Uma decepção como era de se esperar. – Abri a boca incrédula, mas logo me recuperei. Como assim antes de saber que era eu? Uma decepção? – Eu não vou contar a ninguém o seu segredo, se você pintar um quadro pra mim.
Se eu tivesse uma arma provavelmente despejaria o pente todo no homem que estava na minha frente. E pensar que eu achava que estava enganada sobre ele, mas pelo visto, eu estava errada. E como estava. E ainda mais queria que eu pintasse um quadro para ele? O que esse brutamonte pensa que é? Como se eu fosse algum tipo de escrava dele.
– Essa vai ser uma tarefa meio que difícil, , porque eu não tenho onde pintar. Vai ter que esperar a próxima exposição. – Disse, sentido meu sangue borbulhar.
– Não precisa se preocupar com isso, eu já tenho o lugar.
– Eu não vou pintar em nenhum lugar perto dessa casa. Não quando eu sei que toda a sua família tem uma aposta pra descobrir quem eu sou.
– Eu não sou burro, minha querida donzela indefesa. – Ele olhou para mim e eu juro que quase senti minhas entranhas congelarem de tão frio que seu olhar foi – Eu tenho um apartamento aqui, você pode ir lá pra pintar.
– Passa o endereço que nós vamos com ela. – Charlie falou.
– Eu prefiro ir com ela, meu pai já sabe que eu vou dormir lá hoje à noite. Eu disse que vou encontrar uma amiga depois do jantar.
– E como você planeja fazer com que eu saia despercebida? Lylah provavelmente não vai me deixar em paz.
– Eu conheço saídas alternativas onde ninguém vai perceber que você saiu. Eles podem distrair todos os outros enquanto você sai.
– Parece que você planejou tudo.
– Não brinco em serviço. – Ela andou até a porta – Estão todos de acordo? – Annie e Charlie assentiram. Ele olhou para mim.
– Claro.
– Está bem. Até o jantar. – Ele fechou a porta depois de sair.
– ...
– Será que eu poderia dormir agora? – perguntei, interrompendo qualquer falatório sobre o que acabara de acontecer. Andei até a cama, deixando-me esconder debaixo das cobertas.
– Você se importa se nós ficarmos?
– Pode ficar e aproveita pra fechar as cortinas, por favor. Aos poucos o quarto foi ficando escuro e logo o sono tomou conta de mim. E a decepção também.
Capítulo 7
– Eu não acredito que eu vou ter que usar um vestido longo! Isso não era um jantar simples? – Falei, fechando a porta do meu quarto. Já era noite e Charlie tinha me ajudado a me arrumar. Eu não estava com um pingo de paciência pra aguentar gente fresca, comida ruim e, o principal de tudo, o aniversariante. O jeito que ele me tratou a tarde fez com um ódio súbito se formasse dentro do peito, quem ele pensava que era pra falar comigo daquele jeito? Ainda mais exigir que eu pintasse um quadro pra ele como se eu fosse sua pintora particular? Era só o que me faltava mesmo!
– Cassandra disse que o jantar era simples, mas os convidados não. – Revirei os olhos.
– Isso ainda nem começou e eu já quero voltar pra debaixo das minhas cobertas. – Grunhi, me agarrando mais ao braço de Charlie.
– E sei porque você está mal humorada.
– Eu não estou de mau humor.
– Claro que está, . – Charlie me ajudou a descer as escadas – Foi o jeito que seu estranho falou com você.
– Ele não é meu estranho e eu não me importo com o que ele fala, ele só salvou a minha vida.
– Claro que importa, , tem alguma coisa entre vocês dois.
– Tem sim, a minha vontade de esganá-lo.
– Ou beijá-lo. Você sabe o que dizem, entre o amor e o ódio, a linha é tênue.
– Não tem de linha nenhuma. – Ou talvez tivesse porque na hora que eu entrei no salão, meu coração derreteu dentro do peito. estava dançando com uma senhorinha, a rodopiando por todo o salão, com o maior sorriso no rosto. Ele vestia um terno e devo ressaltar que ele ficava muito gosto dentro dele. Por que, senhor? Por que ele tinha que ser um imbecil?
– Eu acho que você deveria falar com ele.
– E dizer o que?
– Não sei, só sei que vocês não podem ficar desse jeito.
– E você queria que a gente ficasse como? Nós dois tínhamos um casamento em comum, já chegamos nele. Pronto, finito, acabou.
– Nossa, ! Você está tão azeda, parece até que... Vocês dois transaram?
– Mas é claro que não!
– Então por que você está tão puta?
– Porque eu pensei que sabia quem ele era, mas estava enganada, ele acabou sendo bem pior.
– Não acho que seja uma má pessoa, só acho que algo aconteceu pra ele entrar em modo de maior imbecil de todos os tempos. Pode ter sido...
– Você deve ser .
– Ai que susto! – falei, colocando a mão no peito. Jordan estava parado ao meu lado.
– Desculpa, acho que você já teve sustos suficientes por uma vida.
– Com toda certeza. – Me ajeitei.
– Eu sou Jordan, irmão de e noivo de Lylah. – Ele estendeu a mão.
– Eu sou , é um prazer te conhecer. – Apertei sua mão.
– O prazer é meu, Lylah fala tanto de você.
– Fala? – perguntei, surpresa.
– Fala, ela sempre conta as histórias de quando vocês eram pequenas. Eu sempre quis te conhecer, mas ela disse que vocês duas não se falavam.
Eu só fiquei olhando para o meu futuro cunhado com a cara mais surpresa que eu podia fazer. Lylah falava de mim? E falava coisas boas de mim? Vovó sempre dizia que Lylah evitava falar de mim e aqui estava o seu futuro marido falando totalmente o contrário?
– Eu não sei nem o que dizer, eu sempre pensei que Lylah me odiasse. – Respondi sincera.
– Lylah não te odeia, ela sente muito a sua falta. Ela...
– Jordan, o que você está fazendo? – Lylah apareceu ao lado do noivo – Seu tio está te procurando. Vamos! – Lylah puxou Jordan pra o outro lado do salão.
– Ai, Lylah! Foi um prazer, . – Jordan disse antes de desaparecer entre a multidão.
– Isso foi estranho! – Charlie disse. – Muito estranho.
– Acho que ele disse isso pra fazer eu me sentir melhor.
– Ou pode ser verdade.
– Lylah sente minha falta? Ela nem me queria em seu casamento.
– Ou...
– Chega de 'ou' e 'mas', vamos pro bar que não dá pra aguentar essa gente toda sóbria.
A festa de aniversário de foi exatamente do jeito que eu esperava que fosse: um poço de chatice e tédio. A bebida estava ótima, champanhe é sempre bem-vindo, muito obrigada, mas a parte da comida deixou a desejar. Era aquele tipo de comida chique que vinha em pouca quantidade me fazendo desejar comer uma pizza. O que eu não faria por uma pizza agora.
Charlie se juntou a minha avó e os dois fofocaram a noite quase toda, claro que eu me juntei a eles em alguma parte, mas nada era interessante o suficiente pra me tirar a atenção do fato que tinha me tratado daquele jeito. Eu sei que não deveria está ligando pra o que ele fala, aliás, ele era um estranho, mas mesmo assim, doeu um pouco. A quem eu quero enganar, doeu muito.
– Eu vou ao toalete, volto já. – levantei e fui em direção ao lugar que Charlie tinha me indicado. No caminho de volta algo me chamou atenção, era o único cômodo iluminado e como eu sempre deixei minha curiosidade falar mais alto decidi que ia ver o que tinha por lá. Talvez eu não tivesse feito isso, porque no momento que eu entrei no largo corredor, eu quase cai pra trás. Eu pensei que essa história de obsessão pela Zoe Cane fosse mera brincadeira, ou até exagero, mas a quantidades de quadros meu naquele corredor me disse ao contrário. Tinha quadros desde a minha primeira exposição, quadros que eu tenho certeza que não foram eles que compraram. Claro que tinham obras de outros artistas, mas Zoe Cane era a vencedora ocupando mais da metade do corredor.
– Assustador, né? – dei um pulo para frente, me virando para trás. estava parado atrás de mim, todo gostoso naquele terno e com uma caixa de pizza na mão.
– É, muito. Eu sei que você falou, mas mesmo assim, ainda assusta. Me faz pensar que ter me escondido atrás da Zoe Cane foi a coisa certa a se fazer.
– Mas você nunca teve vontade? – ele perguntou se sentando em um banco que tinha ali perto.
– Vontade de que?
– De falar pra todo mundo a verdade sobre você.
– Já sim, mas nunca é o tempo certo, sabe? Falar a verdade sobre Zoe Cane, na verdade, é sobre timing ideal. Quando eu sentir que é o certo, eu vou contar tudo. – Me sentei ao seu lado – Ou talvez alguém faça por mim, já que aqueles capangas do trem tinham certeza que Zoe estava naquele trem.
– Meu pai está vendo isso. Ele falou com uns amigos dele que são policiais e eles estão atrás desses caras.
– Menos mal, acho que nunca ia conseguir dormir direito quando voltasse pra casa sabendo que tem uns loucos atrás de mim. – Respirei aliviada – É de que essa pizza?
– A pura maravilha de uma pizza de mozzarella. – Ele disse e eu até senti minha boca salivar – Você quer um pedaço?
– Por favor! – foi uma súplica e riu abrindo a tapa da caixa. me entregou um guardanapo e eu peguei um pedaço da pizza, dando a primeira mordida. O criador da pizza foi a melhor pessoa que Deus colocou no mundo – Isso aqui é a comida dos deuses!
– Eu concordo! Eu pedi pra Cassandra servir umas pizzas, mas ela está dieta então todo mundo tem que estar de dieta também. Aquela comida não dá nem pra forrar o estômago.
– Por isso que eu não gosto de festa de gente rica, a comida é boa, mas vem em pouca quantidade.
– Nas suas exposições sempre tem comida de "gente rica".
– Porque o Charlie é uma diva, mas logo depois que tudo acaba, eu pego as minhas coisas e vou direto na Patsy comprar uma tamanho família. Claro que eu passo a semana comendo e claro que eu tenho que queimar tudo na academia.
– Sabia que eu pensei que você era daquelas que comia e não engordava?
– Ah não, querido, meu metabolismo é lento, mas eu sou daquele tipo de pessoa que vai um dia pra academia e não vai dez. – ele riu – Agora que eu sei que existem pessoas atrás de mim, talvez eu faça alguma luta quando voltar pra casa, já que eu passo a maior parte do meu tempo sozinha.
– Mas você não precisa ficar sozinha. – Olhei para ele, que tinha aqueles olhos brilhando de cachorrinho sem dono e eu até esqueci o por que eu estava chateada com ele – Você mora em Manhattan?
– O que? Como você sabe?
– Patsy's, uma das melhores pizzas do Upper West Side. Toda segunda eu saio do escritório e vou direto pra lá, os donos até já me conhecem.
– Você mora em Manhattan também? – perguntei confusa – Mas você não trocou de lugar com seu irmão, pra ele ir pra Nova York e você pra Londres?
– Mas isso foi há anos, eu voltei pra Nova York no começo do ano. Cassandra estava muito cansada da vida por lá e decidiu vir morar em Londres, meu pai que também já não aguentava Nova York decidiu vir pra cá.
– Cassandra é assustadora, não consigo nem olhar pra ela.
– Você não sabe o quanto. – Ele olhou no relógio enquanto eu amassava o guardanapo – Acho melhor nós irmos.
– Irmos pra onde?
– Pro meu loft.
– Mas é o seu aniversário. Ah, parabéns! Você nem pra dizer que era o seu aniversário.
– Claro, como eu pude esquecer? No meio de pagar hospedagens, pular de trens e penhascos e te salvar de ladrões, não imagino como eu esqueci de mencionar que eu estava ficando mais velho. – Ele falou com aquele tom sarcástico e de que era superior a todos que me deixou louca. E de repente eu lembrei o porquê de estar tão chateada com ele.
– ...
– E vou avisar a eles para distraírem Lylah. – Sai sem nem ao menos olhar pra cara dele e tracei meu caminho de volta pro salão. Annie e Charlie estava em uma mesa junto com Lylah e alguns outros convidados, andei até eles a ponto de escutar uma parte da conversa de Lylah
– Já está tudo pronto casamento, o padre só vai chegar aqui no domingo.
– No domingo? – perguntei confusa - Não deveria ser sexta?
– Sexta? Mas é claro que não, . O padre só pode vir no dia do casamento que é no domingo.
– Seu casamento só é no domingo? Mas na carta que você me mandou dizia que eu tinha que estar aqui uma semana antes por isso eu ia pegar o trem da sexta, mas ai eu perdi a noção do tempo e peguei o de sábado.
– Que isso, , perdeu a noção? No convite dizia claramente que o casamento de Lylah York e Jordan seria em uma tarde maravilhosa de domingo.
– Maravilhosa tarde de domingo? Por que isso me soa familiar?
– Papai e mamãe se casaram em um domingo. – Ela me olhou.
– Acho que com tanta papagaiada não deu pra ver direito. – Lylah fez cara feia – Mas no papel dizia que você me queria aqui antes, eu pensei que era na sexta. Quando você ficou puta quando eu perdi o trem, presumi que eu estava atrasada.
– Presumiu errado. E que história de papel? Do que você está falando?
– Você mandou uma carta pro meu apartamento e disse pro porteiro que era urgente. Como eu já não estava lá e eu confio no velho Gary, pedi que ele abrisse e lesse. Na carta dizia que precisava que eu viesse mais cedo, por isso eu larguei Linda sozinha em Londres e peguei o primeiro trem pra Oxford.
– Eu não sei do que você está falando. Eu não te pedi nada, , por mim você só chegaria aqui no dia do casamento.
– Então se não foi você, quem foi? – olhei para minha avó e Charlie que olhava para qualquer canto, menos pra mim – Eu não acredito! Vocês dois armaram isso?
– Mas é claro que não! – Charlie respondeu rápido demais.
– Nós nunca faríamos uma coisa dessa. – Annie completou.
– Vamos cortar a besteira que eu já percebi que vocês estão mentindo. – Cruzei os braços – Por que vocês fizeram isso?
– Nós não fizemos isso. – Minha avó começou, mas Charlie parece que se deu por vencido.
– Quer saber? Fizemos mesmo e olha que eu não me arrependo. Conta pra ela Anne! – olhei para minha avó que tomou o conteúdo de seu copo inteiro.
– Eu encontrei Charlie em Nova York enquanto fazia compras e ele disse sobre uma curadora que queria muito que você fizesse uma exposição. Ele me mostrou a galeria e era onde Lylah trabalha. Você não vê?
– Não e por favor, seja bem clara, porque eu não sei porque a senhora faria uma coisa dessas.
– Você e Lylah tem mais em comum do que pensam. Lylah queria que você fizesse uma exposição na galeria dela. Ela aprecia sua arte e, no caso, aprecia você. Já está mais do que na hora de vocês tratarem desse assunto como duas adultas.
– Que assunto? – Lylah perguntou com cara de poucos amigos – E por que faria uma exposição na galeria? Você por acaso pinta?
– Não! – todos nós falamos ao mesmo tempo. – Mas é claro que não, eu faço móveis. – Completei.
– Móveis? Vovó disse que você trabalha em uma biblioteca.
– Faço móveis pra biblioteca.
– Trabalho interessante. – Ela tomou o copo de champanhe e depois olhou para frente – Ah, não!
– O que foi? Você está se sentindo bem?
– A prima biscate do Jordan está aqui e ainda está de conversinha com ele. Você acredita que ela uma vez deu em cima do Jordan na minha frente? Parece que eu tenho chama pra biscate. Você lembra daquela ... – Lylah parou de falou e olhou para mim – Não importa! Eu vou acabar com a festinha dela. – E simplesmente saiu em direção a Jordan e a sua prima.
– Vocês têm noção do que vocês fizeram? – me virei para ele – Eu poderia ter morrido por culpa de vocês!
– Nós queríamos que vocês se resolvessem, Lylah sente tanto sua falta.
– Acho que todo mundo nessa casa está alucinando. – Respirei fundo – Eu tenho que ir, estou indo pro loft do senhor arrogante.
– Não fica com raiva da gente, nós tivemos as melhores das intenções. – Charlie disse – Quem é que ia adivinhar que tinha um bando de ladrões querendo te pegar?
– Eu sei que sim.
– Você vai ficar bem?
– Me perguntem amanhã, acho que mais do que nunca eu vou precisar dessa madrugada pintando.
– Eu já deixei suas coisas com o seu estranho.
– Ele não é meu.
– Se você diz. – Charlie tomando sua bebida – Vai logo, antes que todo mundo tire os olhos da senhorinha dançando Anaconda.
– Até amanhã. – Abracei os dois e segui em direção à porta da frente. já estava me esperando do lado de fora da casa quando eu sai, eu não consegui nem ao menos olhar pra cara dele. Tudo que eu mais queria era que ele me deixasse no loft e eu não tivesse que olhar pra cara dele até a próxima encarnação.
O loft dele não ficava muito longe, na verdade, Oxford era uma cidade relativamente pequena e feita mais para os universitários. comentou por alto que não queria muito longe de casa então escolheu um lugar perto.
– É aqui! – era um prédio antigo, mas parecido com um galpão.
– Mas isso é um galpão.
– Na verdade, eu o transformei em um loft. Você não sabe como é ruim ficar na mesma casa que Cassandra. – Ele desceu do carro e eu o segui. abriu a porta e ligou a luz. O lugar era grande e tinha dois andares, no andar debaixo parecia um local onde se daria uma festa. Tinha um bar, uma cozinha, vários sofás espalhados, uma televisão e várias prateleiras de música e livros – Aqui normalmente é onde eu dou as festas, os sofás são para os bêbados ocasionais que não tem como voltar pra casa. – Ele foi em direção a uma escada – Aqui em cima é onde você vai ficar. – O segui pela escada e o cômodo de cima que era um quarto – Eu comprei um cavalete e algumas telas. Espero que você se sinta em casa.
– Parece muito com o meu loft, na verdade. – Respondi, olhando em volta. O meu era menor, claro, mas a parte da cama junto com as coisas de pintura todas no mesmo cômodo deveria ser algo que os pintores tinham – Pode ficar à vontade. Eu não comprei tintas porque eu não sabia quais você ia usar pra pintar o meu quadro. – E então eu lembrei de mais um motivo porque eu estava com raiva dele e eu tive a maior vontade de socá-lo.
– Não precisa, eu tenho umas aqui. – falei andando em direção à mesa que ficava perto do cavalete – Se precisar eu vou comprar mais. – Coloquei minha bolsa em cima da mesa e me virei pra ele. – Você já pode ir.
– É assim que você me trata depois de tudo que eu fiz?
– O que você espera? Um “obrigada”? Então, , muito obrigada. Era só isso? Agora você já pode ir.
– Prefiro quando você me chama de estranho. – Ele riu – Eu sei porque você está assim.
– Ah, sabe?
– Sei. Foi pelo o que eu disse.
– Então por que disse?
– Porque eu queria te machucar.
– Me machucar? Por que? O que foi que eu te fiz?
– Escutei você dizer aquilo sobre mim, sobre não confiar em mim e que iria me pagar para que eu ficasse calado.
– E você esperava o que? Que eu simplesmente confiasse em você, alguém que eu mal conheço?
– Eu te dei mais de uma prova que você podia confiar em mim. – Ele levantou o tom de voz – Eu salvei sua vida mais de uma vez, eu poderia ter te abandonado no momento que nós pulamos daquele trem, mas não o fiz. Se eu quisesse ganhar uma grana sobre o seu segredo, a primeira coisa que eu teria feito era ter soltado pra toda a minha família que você é Zoe Cane. Acredite, é uma bolada e tanto.
– Eu entrei em pânico, ok? A única coisa que eu quero na vida é pintar e eu sei que quando todo mundo descobrir quem eu sou, eu provavelmente não vou conseguir mais. É muito fácil falar quando estávamos só nós dois, vai que você decidiu ganhar uma bolada.
– Eu já sou bem rico, não preciso de mais dinheiro. – Olhei para ele – Eu sou muito explosivo, quase não penso antes de falar quando estou com raiva. Eu te dei mais de uma prova de que não quero ferrar com tua vida, na verdade, a única coisa que eu fiz foi te salvar. Escutar você falar que ia me pagar e que eu sou parecido com o tipinho de gente que só liga pra grana machucou entende? Então eu quis te machucar de volta.
– Mas você também tem que me entender, eu não te conheço. O pouco que eu conheço, não é suficiente. E eu já te disse, eu tenho problemas com intimidade e confiar em novas pessoas.
– Você pode confiar em mim.
– Estou vendo isso agora. – Sorri para ele – Desculpe por duvidar de você e obrigada por tudo que você fez por mim desde que nos conhecemos. Eu sei que você ia se dar muito melhor sozinho.
– Ia mesmo, você é uma chata de galocha. – Dei um soco e seu braço – Vou deixar você trabalhar agora. Vê se não estraga o meu quadro. A não ser que você não queira pintá-lo, já que eu disse isso só pra te machucar.
– Se eu tiver de bom humor, guardo um pra você, está bem, estranho?
– Funciona pra mim. – ele respondeu saindo, mas antes eu precisava perguntar algo:
– Por que?
– Por que o que? – ele se virou para mim.
– Por que me levou junto com você já que sabia ia se dar melhor sozinho?
– Você me intriga, , e uma pessoa como você, uma obra de arte em forma quebra cabeça vale a pena ser montado. E além de tudo, você me parecia o tipo de pessoa que precisava de um pouco de aventura. Boa noite, donzela indefesa.
O pior – ou melhor – era que o estranho, ou melhor dizendo , me intrigava também. E isso não era a única coisa em comum, eu também o achava uma obra de arte, uma daquelas bem complicadas de entender, mas que faz o coração bater mais forte. E ele, definitivamente, fazia meu coração bater mais forte.
Capítulo 8
Me olhei no espelho checando se não tinha nenhum rastro de tinta pelo meu corpo. Eu tinha dormido entre pincéis e tintas outra vez e por conta de me mexer tanto na cama, tinha tinta até no meu pensamento se duvidasse. Mas tudo isso tinha valido a pena, eu tinha pintado pelo menos uns sete quadros e parecia que a inspiração não parava de vir. Saber que meu bloqueio criativo tinha finalmente tinha acabado trazia uma enorme felicidade dentro do meu peito. Linda e Charlie iam ficar felizes, tão felizes quanto eu.
Sai do quarto e desci as escadas de dois em dois, na cozinha se encontrava um , só de calça de moletom preparando o café. Ele tirou a torrada da boca e sorriu pra mim de boca fechada. Deu uma vontade enorme de ir lá, e morde-lo, mas eu não o fiz.
– Bom dia. – eu disse, me aproximando da bancada na cozinha. Sentei-me frente a ele enquanto ele colocava algumas coisas no prato.
– Bom dia. – ele respondeu colocado o prato e uma xícara de café a minha frente – Coloquei tudo que tinha na geladeira porque eu sei que você vai dar uma de Godzilla e comer tudo mesmo.
– Que bom! Pode me passar aquele smoothie também e quem sabe aquelas torradas no seu prato também.
– É sério?
– Claro que não, acho que isso é o suficiente. – comecei a comer – Onde foi que você dormiu?
– No sofá, é claro. – ele apontou para o sofá no meio da sala – Então, a noite foi produtiva?
– Oh, , foi incrível! – eu pude sentir meus olhos brilharem – Faz meses que eu não pinto desse jeito e desde que essa aventura começou eu não consigo parar de pintar. Capaz de quando eu voltar pra casa vou ter mais quadros do que eu posso carregar. Eu não vejo a hora pra todos verem o que eu fiz, tenho a sensação que essa será uma das melhores exposições que eu fiz em anos. Provavelmente lerei as críticas eu mesma em vez de pedir para Charlie ou Linda.
– É muito bonita.
– O que?
– A maneira como você fala sobre sua arte, dá pra ver o que quanto você realmente ama o que faz.
– Acho que eu nunca amei tanto algo em minha vida. É uma das únicas coisas que eu não preciso de muito esforços pra fazer porque eu sinto o maior prazer fazendo. É como se fosse tão natural como se respirar. – respondi olhando para ele. me encarava com um sorriso nos lábios – O que? – ele continuou imóvel – ? – falei estalando os dedos na sua frente. Ele se moveu muito rápido e derrubou o prato no chão fazendo uma bagunça.
– Porra! – ele se abaixou, começando a pegar tudo do chão.
– Você quer ajuda? – perguntei, me inclinando em cima do balcão.
– Não precisa, eu peço pra uma das empregadas da mansão pra vir aqui e arrumar tudo. – ele falou se levantando – Eu acho melhor nós voltarmos, Lilah já deve te procurando.
– Acho que ela deve estar muito ocupada infernizando a vida de todo mundo.
– Acho que ela sente aquela saudade de infernizar a sua vida. – ele disse, colocando a camisa e pegando as chaves.
– Provavelmente, não tem ninguém pra ela descarregar a raiva mesmo.
– Você realmente acha isso?
– O que?
– Que Lilah sente raiva de você?
– Você acha que o jeito que ela me tratou foi puro amor? – perguntei, abrindo a porta.
– Mas também não foi ódio. – ele fechou a porta atrás de si – Eu acho que ela estava era preocupada. – segurei a porta do carro e me virei para ele – O que? Eu sei que Lilah não é um amor de pessoa, mas eu conheço meu irmão, , ela não ia casar com uma pessoa se que ela não tivesse algo de bom no coração. Acho que Lilah ainda não conseguiu demostrar isso pra você.
– Acordou inspirado hoje, hein, estranho?
– Você não imagina o quanto. – abriu o carro e nós entramos. Ele deu a partida e eu me virei para ele.
– Você acha mesmo que ela só não consegue demostrar?
– As pessoas tem variadas formas de demonstrar o que sentem, algumas não são tão boas com palavras, algumas não são boas com gestos. Você mesma, tudo que você sente você coloca no papel. As vezes o ser humano bota os pés pelas mãos e acaba machucando os outros.
– Já pensou em ser psicólogo? Você é bom com as pessoas.
– Irônico, na empresa quem lida com os clientes é o Jordan, porque eu sou péssimo com pessoas. – ele olhou para mim – Vai ver é porque eu sou bom só com você. – ele sorriu e olhou pra frente – Acho que você deve conversar com sua irmã, só vocês duas. Colocar as cartas na mesa, botar tudo o que sentem pra fora e aí sim podem decidir se não querem se ver nunca mais na vida. – ele abaixou o vidro, acenou pro porteiro que abriu o portão.
– Nem lembro quando foi a última vez que eu tive uma conversa civilizada com Lilah.
– Se você não lembra quer dizer que faz muito tempo. – ele parou o carro em frente a mansão e nós descemos.
– Prometo que vou tentar ao máximo, é só que a Lilah traz à tona a pior parte de mim. – começamos a andar em direção à entrada – Essa é a parte da genética que eu não pude escapar.
– . – ele me chamou e olhei para ele – Já que nós estamos fora de perigo, que tal nós dois...
– , onde você estava? – Lilah apareceu na minha frente com cara de poucos amigos – Tive que procurar por você pela essa casa inteira e se você não percebeu, ela é enorme.
– Lilah, você não precisa fingir que se importa comigo pros outros, acho que os anos sem nem ao menos dizer que tinha uma irmã já deu o recado.
– Se você não lembra, eu ainda sou sua irmã mais velha. Vê se fala direito comigo!
– E isso não te dá o direito de falar comigo do jeito que tu quer. Pra ter respeito tem que respeitar também.
– Ela estava comigo, decidi levá-la para um café pra comemorarmos o fato de que finalmente estamos a salvo. – interrompeu fazendo com que Lilah olhasse pra ele.
– Só vocês dois? – ela cruzou os braços e o olhou desconfiada.
– É. Algum problema?
– Não, não sabia que vocês eram tão amigos.
– Depois da aventura que passamos, pode se dizer que somos algo pelo meio.
– Vocês dois não vão? – Jordan apareceu atrás de Lilah com uma toalha ao redor do pescoço.
– Pra onde? – perguntei, confusa.
– Pra piscina.
– Piscina?
– É, Cassandra e seus desejos mirabolantes no meio de um inverno inglês. Não se preocupe, tem aquecedor, você não vai morrer congelada.
– Espero que não. Da última vez eu precisei de alguém pra me salvar. – Olhei para que abaixou a cabeça sorrindo.
– Nós vamos esperar vocês por lá. Tchauzinho! – Jordan passou o braço pelo pescoço de Lilah e a arrastou pelos corredores da casa.
– Pra quem está tentando fazer as pazes com a irmã, você está falhando miseravelmente nesse quesito.
– Está vendo? – apontei para o casal que acabara de sair da sala – Lilah traz o pior de mim. – Me virei pra ele. – Então, o que você ia falar antes da Lilah chegar? – ele sorriu, abaixando a cabeça em seguida.
– Parece que eles roubaram a minha ideia. – ele levantou a cabeça – Te encontro na piscina. – ele deu um beijo na minha bochecha e subiu as escadas de dois em dois. Devo ressaltar que eu fiquei olhando pra escada com um sorriso, esperando que ele voltasse e beijasse em outro canto. Um pouquinho mais pra direita, com direito a seus braços ao redor da cintura e minhas mãos bagunçado seus cabelos.
– O que foi isso?
– Puta merda! – dei um pulo pra trás colocando a mão em meu peito – Porra, Charlie, perdeu a noção?
– Não, mas parece que quem se perdeu foi você.
– Que?
– Nas gostosuras do . – Charlie levantou os braços e balançou os ombros – E então, pegou o boy?
– Ontem foi uma noite muito produtiva. – Charlie olhou para mim com os olhos arregalados – Eu passei a noite toda pintando e dormiu no sofá.
– Ah, que saco, ! – ele bateu o pé no chão – Pensei que vocês tinham se pegado, já tô shipando esse casal.
– Seria um saco se eu não conseguisse mais pintar. – segurei em seus ombros – Charlie, eu pintei pelo menos uns sete quadros e se duvidar vou pintar mais hoje à noite.
– Hoje à noite? Depois da despedida de solteira?
– Despedida de solteira?
– É, era pra ter sido há uns dois dias, mas você desapareceu e Lilah ficou uma pilha. Ela ficou muito preocupada, pra falar a verdade. Engraçado, né?
– Engraçado? Por quê?
– Você sempre fala que sua irmã não liga pra você, mas do jeito que ela estava parecia que ela realmente estava preocupada. – ele deu de ombros e estendeu uma sacola pra mim.
– Que isso?
– Comprei um biquíni pra você.
– Ah não, Charlie, você sabe que eu não sou fã de piscina, lagos e afins.
– É, mas quando você estava sozinha com o , tomou banho no lago de calcinha e sutiã. , sua calcinha era branca?
– Charlie!
– Oh, então era.
– Mas é claro que não.
– Só estou curioso. – peguei a sacola de suas mãos e deu uma olhada o biquíni – Comprei um que eu não usaria, porque normalmente é esse que você ia querer.
– Como sempre.
O biquíni que Charlie comprou chegava bem perto de algo que eu compraria, às vezes eu esquecia que Charlie me conhecia melhor do que ninguém, talvez até melhor do que eu mesma. E isso me levava a questionar sobre o que ele tinha dito sobre Lilah, Charlie não mentiria pra mim, não quando ele era um dos primeiros que disse detestava minha irmã depois de tudo que ela fez. Talvez , Charlie e até Jordan estivessem certos, Lilah estava sim preocupada comigo e sentia minha falta. Não de um jeito meio obscuro de me maltratar outra vez, mas outro, aquele que nós tínhamos quando éramos crianças.
– , é um biquíni, não um traje espacial.
– Calma, Charlie! – falei, me enrolando em uma toalha. A piscina ficava na parte de trás da casa, o ambiente era todo climatizado pra ninguém morrer congelado.
– Até que fim! – abri a porta encarando um Charlie molhado dos pés a cabeça – A água está ótima, se me permitirem ficarei nessa piscina até todos os meus dedos enrugarem.
– Eu não vou entrar ok? – falei, olhando pra ele.
– Aposto que quando você chegar por lá vai mudar de ideia.
– Você sabe que não. No máximo eu vou ficar com os pés dentro d'água.
– Por que você não pode se soltar só um pouquinho, hein, gatinha?!
– Porque eu não sou assim, Charlie, você sabe. Eu não sou bem resolvida que nem você.
– Acho que você não tem ideia do próprio potencial, . Olha o jeito que você bate de frente com sua irmã depois que ela te trata mal, eu aposto como a de uns sete anos atrás não faria isso. Talvez, você devesse se rebelar em outros aspectos da sua vida também.
– O que você quer que eu faça? Pule na piscina sem roupa?
– Se você fizer, eu juro que faço também. – Charlie se virou pra mim com um sorriso no rosto, segurando em meu braço. Na piscina, Lilah estava agarrada em seu noivo enquanto conversava com suas amigas, minha avó estava sentada em uma das espreguiçadeiras com um copo de coquetel na mão.
– Bom dia, minha neta linda.
– Bom dia, avó mais linda ainda.
– Neta linda e super chata. – Charlie tirou os chinelos e pulou na piscina espirrando água pra todo canto – Vem logo, .
– Eu já disse, não vou entrar nessa piscina nem fodendo.
– E eu já disse, , larga de ser chata. – Charlie falou jogando água em mim – Vem logo, a água está ótima.
– Mas é isso que ela é mesmo, uma chata de galocha. – apareceu ao meu lado apenas de shorts. Às vezes a vida não era justa, ou talvez fosse porque eu estava vendo de camarote toda aquela gostosura que eu vi naquele dia no lago e pode apostar da segunda vez é ainda melhor.
– Odeio quando você me chama disso. – falei, cruzando os braços e fazendo uma careta.
– Não é como se fosse mentira. – ele tirou a toalha dos ombros e colocou em cima da espreguiçadeira – Você é uma chata de galocha. – se virou em direção à piscina e Charlie me olhou com malícia nos olhos, eu sabia o que ele queria dizer. Andei de fininho atrás de até que ele se virou pra mim e antes mesmo que ele pudesse falar, eu já o estava empurrando em direção à piscina arrancando gargalhada de todos.
– Quem é a chata de galocha agora? – ele olhou pra mim, colocando os cabelos pra trás. Oh não, esse sorrisinho de lado com certeza não significada nada bom.
– Você me paga! – ele nadou até a borda e eu comecei a dar passos pra trás. Na hora que ele saiu só levou alguns segundos pra que eu começasse a correr em volta da piscina – Volta aqui!
– Vai ter que me pegar, garanhão. – falei tentado correr cuidadosamente pra não cair, a última coisa que eu precisava era cair na frente de todo mundo. Ainda consegui dar umas voltas pela piscina antes de me pegar pela cintura, me pegando em seu colo logo em seguida. Automaticamente, lembrei de quando estávamos na floresta, o quão perto estávamos e como eu desejava beijar aqueles lábios rosados dele. A vontade parecia ter aumentado especialmente depois de eu saber o quão bem ele beijava, o quão bem ele me beijava. Eu queria sentir seu corpo tão perto do meu outra vez e dessa vez eu não queria que ninguém atrapalhasse.
Ele olhou pra mim, com um sorriso de lado e eu sabia que ele estava tramando alguma coisa.
– Não, não! , não me joga dentro dessa piscina, por favor. – falei, vendo-o se aproximar da parte do fundo.
– Quem disse alguma coisa sobre te jogar? – ele respondeu e eu senti um alívio tomar conta do meu corpo. O que não demorou muito, já que pulou na piscina comigo em seu colo. Voltei a superfície vendo que todas estavam rindo, até mesmo Lilah.
– Você é um idiota. – falei, empurrando-o. apenas riu, arrumando seu cabelo.
– Não vai me dizer que não gostou? – ele disse sorrindo e se aproximando de mim.
– Não.
– Não sabia que você estava namorando, . – uma garota perguntou, se aproximando de nós. Eu conhecia aquele sorrisinho que ela tinha nos lábios, foi aí que eu soube que eu não era a única interessada no irmão do noivo.
– Não estamos, somos parceiros no crime ou melhor dizendo, em fugir dele. – respondi, tirando a toalha.
– Você é irmã da Lilah, certo? – ela perguntou, cruzando os braços.
– Certo, e você é?
– Melhor amiga dela, quase irmã, Carrie. – eu conhecia o joguinho de Carrie, eu convivi com garotas como ela no colegial. Usavam algo pessoal pra abalar minha confiança, no caso, usando sua amizade com Lilah ou, como ela mesmo disse, quase irmandade. Só que o que Carrie não sabia é que esses joguinhos não me abalavam e eu tinha melhores coisas para se preocupar do que patricinha querendo competir por atenção de homem e lugar na vida da minha irmã.
– Então você deve conhecê-la tão bem quanto eu. Com licença. – virei em direção a Charlie que estava encostado na borda conversando com minha avó. Joguei a toalha pra fora da piscina, parando em frente à Charlie – Bem que você disse que a água estava ótima.
– Não muda de assunto, aquela oferecida está dando em cima do seu boy. – abaixei a cabeça, rindo.
– Ele não é meu, Charlie.
– E aquele beijo na bochecha que eu vi hoje foi o que?
– Teve beijo na bochecha? – minha avó se sentou na espreguiçadeira – Ou melhor teve beijo em outros lugares? O que foi que vocês dois fizeram ontem? , vocês dois...
– Eu passei a noite inteira pintando, – a interrompi – vocês dois tem uma mente muito poluída. Um homem e uma mulher não podem ser só amigos?
– "Só amigos" não se olham desse jeito.
– Acho que vocês estão vendo coisa onde não tem.
– Ou talvez a única coisa que não quer ver é você. – Charlie deu um sorriso de lado.
– Zoe! – senti duas mãos em minha cintura fazendo com que eu levasse um susto.
– , não me chama assim, alguém pode escutar. – sussurrei para ele, que apenas riu.
– Eles estão longe. – ele se soltou e foi para o lado de Charlie, se apoiando na borda também – Então hoje à noite você vai ou não vai dar uma de Hannah Montana?
– Hannah Montana?
– É, virar uma estrela quando a noite cai.
– Gostei da comparação, . – Charlie falou, olhando para ele, especificamente para seu tronco nu.
– Claro que vou.
– Depois da despedida de solteira de Lilah?
– Eu realmente tenho que ir pra isso?
– Lógico que sim. – Charlie olhou pra mim com cara de poucos amigos – , essa é a melhor parte dessa história toda de casamento. Ver uns caras gostoso dançando no seu colo.
– Mas e a parte de duas pessoas se amarem tanto a ponto de entregar suas vidas completar uma pra outra até que a morte os separe?
– Essa parte fica debaixo da despedida de solteiro, da boca livre e da bebedeira.
– Charlie, você é a pior pessoa.
– Eu sei que você quer dizer melhor, então, de nada, , eu sei que você me ama.
– Você pode pintar outro dia. – minha avó falou – Nós ainda temos alguns dias antes do casamento.
– E seria até melhor você guardar toda essa inspiração pra quando voltarmos pra casa, chegar aqui com duas malas e voltar com quadros debaixo dos braços com certeza vai levantar suspeitas. – Charlie continuou.
– É verdade. – eu disse – Nós ainda temos que arrumar um jeito de levar os quadros sem ninguém perceber.
– Eu posso ajudar se vocês quiserem. – disse, fazendo com que nos olhássemos pra ele – Eu conheço um cara que pode levá-los pra Londres em um caminhão, de lá posso pedir pra um amigo que tem um jatinho pra levá-los pra Nova York.
– Você faria isso? – perguntei, mordendo o lábio, tentando esconder o sorriso.
– Claro, acho que faço parte do time de Zoe Cane a partir de agora, vocês não acham? – ele olhou para mim e a única coisa que eu consegui pensar foi que a minha vontade de agarrá-lo apenas crescia dentro de mim. continuava me provando de que toda aquela arrogância dele não era a única coisa que ele tinha dentro de si, debaixo de toda aquela fachada ele também poderia ser um cara incrível que sempre ajudava aqueles que precisavam. Tipo pintoras fugindo de ladrões ou pintoras querendo esconder seu segredo de famílias obcecadas por ela.
– É, algo do tipo. – Charlie falou me tirando dos meus pensamentos.
– Então eu falo com meu amigo, e depois nós combinamos de como vamos fazer.
– Pode ser. – eu me aproximei dele – , você não precisa fazer isso.
– Talvez, mas eu quero te ajudar.
– Acho que você deveria colocar "salvando no meu tempo livre "no seu currículo, virou praticamente rotina você me tirar de enrascadas.
– Eu odeio rotinas, mas essa não me parece tão mal se eu vou ter a chance de te ver todo dia. – ele riu e se aproximou – , eu estava pensando...
– , nós temos que ir. – Lilah interrompeu mais uma vez e eu tive vontade de matá-la.
– Ir? Ir pra onde? – perguntei me virando para ela.
– Você tem que provar o vestido para o casamento.
– Mas eu tenho um vestido para o casamento.
– Que é azul, igual ao das minhas madrinhas.
– Lilah, ninguém vai perceber.
– Mas eu vou, eu quero que meu casamento seja perfeito e se você usar...
– Está bem, Lilah, tanto faz. – falei, irritada saindo de dentro da piscina – Eu vou tomar um banho e trocar de roupa. – enrolei a toalha em meu corpo.
– Vê se não demora.
– Mas é claro que não, eu não gostaria de irritar vossa majestade.
– ...
– Te vejo em meia hora.
Eu juro que eu poderia ter a paciência de mil monges, mas Lilah ainda conseguiria me irradiar com apenas um olhar. Não era ódio, era mais irritação pelo jeito que ela falava comigo e me tratava. Parecia que ela não conseguia ver através daquela imagem que ela tinha de mim, mas quem era eu para falar alguma coisa? Quando pra falar a verdade, eu também não conseguia vê-la de outra forma além da Barbie insuportável que gostava de mandar em todo mundo.
A única maneira que nós conseguiríamos começar a consertar da nossa falta de comunicação, seria, na verdade, se comunicando. Só que uma conversa poderia mudar muita coisa e a nossa nos levaria pra dois lados: o primeiro, colocarmos tudo na mesa – tipo mais de sete anos de desentendimentos – e finalmente nos acertamos ou a segunda opção esquecer que um dia fomos irmãs. E mesmo que eu não quisesse admitir, essa conversa me assustava porque no nosso caso a dúvida era melhor que a certeza e a certeza de que Lilah não queria mais olhar na minha cara iria doer muito.
Coloquei o secador da pia, dando uma última arrumada em meu cabelo. Deus como era bom finalmente poder usar minhas roupas, e principalmente calcinhas que não eram compradas da sessão de vovozinha da cidade do lado ou de dentro da bolsa de estranhos.
Sai do banheiro dando de cara com Charlie, esparramado em minha cama.
– Lilah está a ponto de ter um colapso nervoso porque você ainda não desceu. – eu apenas rolei os olhos, andando em direção à porta.
– Depois desse casamento eu vou precisar de pelo menos duas semanas em um SPA pra me recuperar de tanto estresse. – abri a porta, esperando Charlie passar.
– Você só precisa respirar fundo. Coloca tudo pra dentro, depois assopra tudo pra fora.
– Acho que nem essas tuas técnicas de yoga vão me deixar mais calma.
– Não, mas quem sabe uns beijinhos de um certo... Oi, ! – logo quando estávamos dando a volta no corredor, estava vindo na direção oposta.
– Oi. Lilah pediu pra eu vir chamar vocês.
– Você também vai?
– Já cansou da minha cara assim tão fácil, ? – ele perguntou com um sorriso de lado.
– Devo ser honesta?
– Muito engraçada. Vamos? – ele ofereceu seu braço e eu coloquei a mão na curva do mesmo.
– Então por que você está indo conosco?
– Lilah odiou o terno que eu escolhi pro casamento e disse que eu preciso de um novo. O que é bem estranho já que ela tinha gostado quando eu a mostrei no outro dia.
– Lilah muda de humor como troca de roupa.
– Vamos logo, vocês parecem umas lesmas. – Lilah falou logo quando descendo o último degrau da escada.
– Acho que não vai caber todo mundo dentro do carro. – Carrie falou, olhando diretamente para nós dois.
– Bom, o Jordan, e a tem que ir.
– E eu também porque vou provar meu terno. – Charlie falou. Lilah se virou pra amiga e disse:
– Desculpa, Carrie, mas dessa vez você vai ter que ficar de fora.
– Oh, claro, tudo bem. – foi possível ver que Carrie estava desapontada.
– Então vamos logo. – Lilah segurou na mão de Jordan e arrastou para fora da casa. Passamos por Carrie que fez a pior cara pra mim, mentalmente, eu acho que ela queria me colocar dentro de um trem de volta pra bem longe de .
Quando chegamos na loja, Lilah já foi logo me puxando para um provador do lado oposto dos meninos. Ela falou alguma com uma das vendedoras antes de me levar uma sala de espera onde normalmente as famílias das noivas esperavam enquanto elas se trocavam. A mesma vendedora chegou minutos depois com um vestido vermelho nos braços.
– Lilah, eu não acho que esse vestido...
– Só coloca pra ver como fica, por favor. – Lilah fez uma cara super fofa fazendo com que eu sorrisse.
– Tudo bem. – peguei o vestido das mãos da vendedora e fui em direção ao provador. Era um vestido vermelho, tomara que caia e tinha uma pequena fenda na parte da frente, não era exatamente do meu gosto, mas eu tinha que admitir que era um vestido lindo. Sai do provador segurando a parte da frente do vestido vendo Lilah esparramada no sofá, olhando as unhas.
– Você fecha pra mim? – perguntei, virando de costas pra era e ficando de frente pro espelho. Lilah se levantou e fechou o vestido.
– O toque final. – Lilah amarrou meu cabelo em um coque e eu olhei para o meu reflexo no espelho. Se o vestido era lindo apenas no cabide, ficava ainda melhor no corpo de uma pessoa, melhor ainda no meu corpo. De alguma forma, parecia que tinha sido feito pra mim.
– Eu comprei esse vestido pro jantar de ensaio, mas ele não cabe mais em mim. Carrie queria ficar com ele, mas eu pensei logo em você. Não sei porque, ele é a sua cara. – ela olhou para mim pelo reflexo do espelho – Você mudou muito desde que eu te vi pela última vez, eu estava até com medo do vestido não caber em você, mas coube e eu nunca te vi mais linda. – ela segurou em meus ombros olhando pra mim pelo espelho – Papai e mamãe ficariam orgulhosos de você.
– Papai e mamãe ficariam orgulhosos de você também. – olhei para ela pelo reflexo do espelho – Você continua uma insuportável, mas olha tudo que você conquistou. Cursou uma faculdade incrível, tem um emprego no qual fiquei sabendo que é muito boa e vai casar com um cara que te ama. – sorri pra ela – Lembra quando a professora te deu a medalha como melhor aluna e mamãe decidiu fazer um bolo de chocolate, todo final de semana durante um ano inteiro? Aposto que se ela estivesse aqui, ela faria um todo dia.
– Juro pra você que está sendo uma luta não comer um bolo de chocolate todo dia. – ela riu.
– Lilah, – virei-me para ela – você não acha que nós deveríamos...
– Lilah, parece que temos uns problemas com os doces. – Jordan entrou no provador e eu me afastei dela – Desculpa, eu não sabia...
– Não, Jordan, tudo bem. O que você disse?
– Cassandra falou que tem algum problema com os doces. Nós temos que voltar pra mansão agora.
– Você volta com o ? – ela perguntou sem olhar pra mim.
– Claro, eu peço pra ele me levar.
– Vou falar com a vendedora que você vai ficar com ele, não precisa se preocupar com pagamento, ele já é seu. Te vejo na mansão então. – Lilah saiu do provador sem nem ao menos olhar pra trás.
– Cadê a Lilah? – entrou dentro da sala fazendo com que eu me virasse para ele.
– Ela teve que ir embora, resolver alguma coisa do casamento. – cruzei os braços – Olha quem está com um terno de 800 euros, gostando de finalmente poder ser você novamente? – ele sorriu.
– Na verdade, – ele pegou a etiqueta – 545 euros. – ele deu um passo na minha direção – Você fica falando do meu terno, mas aposto que o seu vestido foi mais caro que minha coleção jaquetas de couro.
– Coleção de jaqueta de couro? Mas e os ternos?
– Esses são presentes, a maioria da Cassandra que acha que jaquetas de couros são muito informais para o trabalho em uma empresa. Eu não sou muito fã deles.
– Que ironia! Você fica muito gostoso dentro de um. – arregalei os olhos me dando conta do que eu tinha falado em voz alta – Digo, você fica bem neles. É isso, você fica bem neles.
– Você acha que eu fico gostoso em um desses? – ele começou a andar em minha direção em consequência eu comecei a andar pra trás, batendo as minhas costas em uma das paredes.
– Melhor ainda sem um. – falei, com um sorriso maroto. Ah, quem eu queria enganar, tinha alguma coisa entre eu e , e eu estava disposta a jogar todo o charme pra cima dele. Tudo bem, eu não era a melhor no jogo de sedução, mas eu conhecia alguns truques que eu poderia usar. Ele colocou as mãos na minha cintura e me puxou pra mais perto, olhando para os meus lábios.
– Você não deveria falar isso.
– Por que não? – subi minhas mãos por meus braços parando uma em seu pescoço e outra nos cabelos da sua nuca.
– Porque eu estou me segurando pra te beijar desde que a gente chegou aqui.
– Engraçado, eu estou esperando você me beijar desde a gente chegou aqui.
– Ah, está?
– É, mas já que você é tão lesado, acho que eu que vou ter que dar o primeiro passo. E sem mais nem menos, eu o beijei. E Deus como era bom beijá-lo outra vez. Era exatamente como eu me lembrava, mas ainda mais excitante do que da primeira vez. beijava de um jeito que levava uma garota a loucura, especialmente, me levava a loucura. O jeito que ele me apertava a minha cintura enquanto alternava entre me beijar e morder meus lábios inferior só fazia com que eu o agarrasse mais pelos cabelos da nuca. Era como se todo beijo que nós dávamos fosse o primeiro e último, por isso era um mix de emoções, arriscando até a dizer um paradoxo de tais. Um pouco de medo, mas também determinado; romântico, mas ao mesmo tempo cheio de tesão; inocente, mas ao mesmo tempo malicioso. gemeu contra meus lábios e eu posso dizer que isso foi uma das coisas mais sexy que eu já presenciei.
– Você vai me deixar louco, Cane. – ele falou logo depois que nos separamos ofegantes.
– Sabia que não gosto de quem me chama pelo meu nome artístico? – eu falei enquanto ele beijava meu pescoço – Mas vindo de você até que é um pouco sexy.
– Tudo vindo de mim é sexy. – ele sussurrou em meu ouvido.
– Baixa a bola, garotão.
– ... – antes que ele pudesse falar alguma coisa, a vendedora entrou na sala tossindo alto.
– O senhor não pode ficar aqui. – olhou pra ela, rolando os olhos, e depois virou pra mim.
– Juro que estou a ponto de desistir de te chamar pra sair.
– Você ia me chamar pra sair?
– Ia não, eu vou. – ele parou – Quer sair comigo?
– Hum...Qual a proposta exatamente? E é bom ser uma boa, viu .
– Hum... Que tal pizza e vinho?
– Você definitivamente sabe como conquistar uma garota.
– Talvez eu só seja bom na conquista quando o assunto é você.
– Eu aceito. – falei, me aproximando dele. A vendedora pigarreou alto fazendo com que eu olhasse pra ela, envergonhada. De certa forma, eu tinha até esquecido que ela ainda estava aqui – Desculpe pela inconveniência, senhora. – falei, me separando dele – Eu vou tirar o vestido e a senhora pode embrulhar pra mim?
– Claro, a senhorita Lilah já havia pedido.
– Perfeito então. – ela olhou para que apenas estava encostado na parede. Ele olhou pra mim e depois pra vendedora ainda não entendendo.
– O que?
– Eu só vou sair quando o senhor sair daqui. – ela cruzou os braços.
– , é melhor você ir, eu tenho que trocar de roupa e você também.
– Tem certeza que não quer ajuda? – ele disse sorrindo de lado.
– Não, arreda o pé daqui, .
– Seu pedido é uma ordem, senhorita. – ele andou até a saída, mas antes de sair se virou pra mim e disse: – E a propósito, você ficou linda nesse vestido. E saiu me deixando com um sorriso bobo nos lábios.
– Seu namorado é muito bonito.
– A senhora me ajuda a tirar o vestido? – mudei de assunto, tentando esconder o fato das minhas bochechas queimarem.
– Claro. A senhora me ajudou a tirar o vestido e o levou para embrulhar. Minutos depois eu estava vestida com minhas roupas e saindo do provador a ponto de encontrar no caixa conversando com Charlie.
– Finalmente, pensei que você tinha morrido lá dentro. – Charlie falou se virando pra mim – conseguiu falar com o amigo dele e ele disse que pode vir aqui daqui a dois dias pra levar os quadros.
– Sério? Isso é incrível! Acho que eu estou finalmente curada.
– Então quer dizer que seu bloqueio criativo foi pro espaço?
– Por enquanto pode se dizer que sim.
– Amém! – Charlie me abraçou – Vamos ficar ricos novamente. – Charlie jogou as mãos para cima me fazendo rir. A vendedora passou por ele, olhando-o de lado e depois se virou pra mim.
– Aqui o seu vestido, senhorita.
– Muito obrigada. – ela me entrou a sacola e depois saiu – Às vezes você me envergonha. Levanta dai agora!
– Faz parte. – ele se levantou – Então, estamos prontos pra ir?
– Por mim. – pegou a sacola e foi em direção a saída. Charlie pegou outra sacola também e nós fomos atrás dele.
– Eu já chamei o motorista da mansão pra vir buscar a gente. – disse assim que chegamos na calçada.
– Tem como a gente passar em um lugar antes?
– você quer ir? – Charlie perguntou.
– Numa padaria.
– Numa padaria? Pra que?
– Preciso comprar um bolo de chocolate.
– Pra que?
– Eu só preciso.
– Tudo bem então.
Depois de cuidadosamente colocar o bolo dentro de uma das geladeiras dos , eu e Charlie fomos para o meu quarto. deveria ir junto, mas Jordan decidiu que precisava da ajuda do irmão organizando a despedida de solteiro dos meninos que também seria hoje a noite. Charlie e eu conversamos até que os dois caíram no sono acordando só horas depois com Annie gritando que nós precisávamos nos arrumar pra despedida de solteira de Lilah. Depois de jogar praticamente meio litro de água no meu rosto, e passar mais de meia hora debaixo do chuveiro eu decidi que era hora de sair do banheiro apenas pra encontrar Charlie, em pé ao lado da minha cama com um uniforme igual ao da Britney Spears em Baby One More Time.
– O que é isso? – perguntei, parando na sua frente.
– O seu uniforme, e antes que você fale qualquer coisa, todas as garotas estão usando um.
– Tudo bem. – peguei o uniforme das mãos deles e o joguei em cima da cama.
– Você não vai argumentar?
– Não. – comecei a colocar a saia.
– Por que não?
– Porque não.
– , você está de bom humor e isso só aconteceu há 300 anos, então pode ir falando.
– Acho que você estava certo.
– Eu sempre estou, mas me lembre outra vez por que eu estou certo dessa vez.
– Lilah, eu acho que ela também quer que essa birra que a gente tem acabe. – coloquei a blusa – No provador hoje, eu não sei direito explicar, mas eu senti como se nós fôssemos irmãs outra vez. Fazia um tempo que eu não conseguia olhar pra ela além de uma Barbie barraqueira e hoje eu pude ver através disso.
– Isso é incrível! Eu fico muito feliz por você, sério. Você tinha que ver como ela ficou quando descobriu que você não estava naquele trem, ela chorou como um bebê, .
– Lilah chorou? Vovó não disse nada.
– Foi porque sua avó não viu. Eu a peguei chorando em uma dessas noites, ela sente sua falta. – me sentei na cama, colocando as meias três quartos – Eu sei que vocês tiveram suas diferenças e Deus sabe que eu odeio tudo que ela fez com você, mas eu acho que Lilah percebeu que tudo que ela te fez passar aqueles anos foi pura futilidade e quase a custaram a relação de vocês. Eu não sei ao certo o porquê dela te tratar do jeito que ela tratou quando você chegou, mas as pessoas têm jeitos diferentes de mostrarem tudo o que sentem. Com Lilah por causa da voz irritante e o tom de mandona acho que tudo que ela diz não sai da forma que ela está sentido.
– Tudo que aconteceu esses anos não é só culpa dela, Charlie. Um relacionamento, qualquer que ele seja, foi feito de duas pessoas e vamos combinar que eu também não fui a irmã do século. Eu a empurrei pra longe de mim por conta de ela lidar com a dor de uma forma diferente da minha. Eu preferi pintar e me afundar no meu mundo de adolescente metida a artista mal compreendida que esqueci de me comunicar com a minha própria irmã. Toda essa confusão deveria ter sido resolvida com uma conversa, mas nenhuma de nós queria ser a primeira a pedir desculpa. Orgulho, meu caro, belo filho da puta que veio pra destruir relacionamento desde que o mundo é mundo. – comecei a calçar minhas botas de cano baixo – Acho que ela não é a única que precisa de desculpar, eu também preciso.
– E quando você vai fazer isso?
– Não sei, só não hoje. – me levantei da cama – Hoje nós vamos nos divertir e tomar todas.
– Finalmente, hein, , pensei que tinha te perdido no meio desse teu bloqueio criativo. Estava com saudades da minha parceira de festas.
– Agora eu estou de volta, querido. – me sentei em frente ao espelho – E quero que você faça minha maquiagem.
– Seu pedido é uma ordem.
Charlie sabia como fazer uma maquiagem sensacional, todos os anos andando com drag queens o ajudaram bastante nesse quesito. Melhor ainda era que ele sempre fazia algo que eu gostasse, algo simples, mas que chamava a atenção. Charlie era mestre em fazer as pessoas olharem com outros olhos para algo que eles não olhariam duas vezes e vamos combinar que eu adorava ser cobaia dos seus experimentos.
Charlie era o único cara entre várias mulheres que ia pra despedida da Lilah, ele disse que poderia ter ido com os garotos e apostado cada litro de silicone que as strippers tinham em cada peito porém Lilah tinha garantido que na despedida dela teriam strippers e vamos combinar, quem não queria ver um cara gostoso tirando a roupa na sua frente?
Quando chegamos no clube, nós nos dividimos em grupos, Lilah e algumas amigas ficaram no canto só bebendo; enquanto eu, Charlie, Annie e Peggy, uma das primas de Jordan, decidimos ficar na primeira fila do show. Claro que quando tudo começou eu e Charlie já estávamos um pouco alterados por conta da quantidade de álcool e gritamos como duas loucas quando o primeiro stripper começou a tirar a roupa. Não sei de onde veio, mas Peggy colocou uma pilha de dinheiro em cima da mesa e nós começamos a jogar para o cara. O cara, adorando a atenção que estava recebendo, desceu de cima do palco e dançou em cada um de nossos colos, recebendo algumas notas presas na sua tanga.
Olhei para o lado vendo Lilah e suas amigas – lê-se Carrie – olhando abismadas para nós, claro que com toda a cara de pau recém retomada da minha pessoa, eu levantei, fui em direção às meninas e peguei Lilah pela mão. Lilah fez de tudo para fugir de mim, mas ela não conhecia o meu eu bêbada e ela não sabia o quão forte eu podia ser. Então eu a arrastei para a primeira fila e a coloquei sentada ao meu lado.
– Ai meu Deus, , ele vai ficar pelado. – Lilah sussurrou ao meu lado.
– E? – perguntei, tomando uma dose e depois olhando pra ela – Nunca viu um homem pelado, não? Lilah, não acredito que você vai casar com um cara e não sabe o calibre dele.
– Mas com o Jordan é diferente, ele é meu noivo.
– E isso já diz tudo, minha querida, – Charlie começou – ele vai ser o único pinto que você vai ver daqui pra frente então aproveita a vista. – em outra ocasião eu repreenderia Charlie, mas no momento, eu só joguei a cabeça pra trás e dei uma gargalhada alta – Aqui um pouco de coragem e falta de vergonha na cara. – ele estendeu duas doses pra ela.
– Não, obrigada.
– Lilah, larga de ser certinha. – falei, cruzando os braços – Você só casa uma vez na vida, a não ser que você queria casar mais de uma.
– Não, não.
– Então toma logo isso e relaxa. Deixa de ser tão tensa uma vez na vida e deixa o álcool falar mais alto. – Lilah trocou as doses e tomou uma atrás da outra.
Acho que foi nesse momento que tudo começou a sair do controle, as amigas de Lilah se juntaram a nós, fazendo nossa mesa de taradas aumentar de tamanho, algumas delas até se deixarem levar pelos strippers pra cima do palco fazendo com que nós gritássemos ainda mais alto.
Não sei de onde as notas de dinheiro vieram, mas a cada lap dance que cada uma da nossa mesa ganhava o cara saia com a tanga cheia.
– Eu não acredito que você ainda não deu um pega no . , aquele boy está na tua. – Charlie colocou o copo em cima do balcão. Lilah e as meninas ainda estavam na frente do palco e uma delas estava ganhando uma lap dance. Lilah parecia estar se divertido muito pela bebida em sua mão e as gargalhadas que dava.
– Isso não é totalmente verdade. – falei, me virando pra ele.
– Então você deu uns pegas nele?
– Dois beijos conta como pega?
– Vocês já se beijaram duas vezes?
– E eu posso dizer, a regra do filhinho de papai de Linda se aplica em todos os sentidos ao nosso querido . O jeito que ele me beija e pega na minha cintura, eu fico toda arrepiada só de pensar. – estiquei os braços pra ele – Eu poderia beijá-lo até meus lábios ficarem inchados.
– Faz um tempo que você não fala de um cara assim.
– Faz tempo que ninguém me faz sentir assim. Daria quase tudo pra ter uma sessão de amassos com ele agora. – me virei pra ele – Obrigada, Charlie, passei a noite sem pensar no cara e agora vem você pra ferra com tudo.
– Bom, eu não ia falar nada, mas Peggy estava dando a ideia de invadirmos a despedida de solteiro dos meninos. – olhei para Charlie que sorriu malicioso.
– Eu acho essa uma ideia ótima. – tomei mais um shot.
– As meninas disseram que é no bar no final da rua.
– Então o que nós estamos esperando? Vamos mostrar pra esses boys quem é que manda. – tomei mais um shot e peguei a garrafa de champanhe em cima do balcão.
– Vamos, garotas, levantem. – falei, chamando-as com o dedo indicador – Nós vamos embora.
– Ah não, aqui está tão bom.
– Está a ponto de ficar melhor. Que tal nós invadirmos a despedida de solteiro dos meninos?
– Mas e a nossa?
– Foda-se a nossa, acho que aqui já deu o que tinha que dar. E eu aposto que tem algumas gatinhas aqui que estão loucos para conhecer os amigos ricos, muito bonitos e gostoso do Jordan.
– , quem te disse isso? Você já viu todos eles? – Peggy perguntou ao meu lado.
– Nunca na minha vida, mas juntando rico, bonito e gostoso na mesma frase chama a atenção de qualquer um.
– Então vamos lá, garotas. – Carrie falou, levantando-se da mesa.
– O que vocês fizeram com essas garotas?
– É o efeito dominó, Peggy. Basta uma perder o controle pra todas seguirem os passos da amiga e vamos combinar, elas estavam precisando. – falei, começando a andar até a saída. Todas as garotas estavam conversando com Charlie e rindo alto.
– Então vamos, meninas, vamos mostrar para siliconadas quem manda naqueles boys. – Charlie falou começando a andar.
– Ei, mas eu também tenho silicone! – uma das amigas de Lilah gritou, se não me engano seu nome era Ava.
– Então não tira a roupa, querida, se não a gente te deixa por lá mesmo. – tal comentário poderia sair como ofensa, mas com tudo mundo já estava com uma quantidade de álcool aceitável no sangue, todo mundo caiu na risada.
– , eu não acredito que nós vamos mesmo invadir a despedida de solteiro dos meninos. – Lilah passou o braço por meu ombro – Ai meu Deus, o Jordan não pode me ver nesse estado.
– Claro que pode, Lilah. Se ele já te ama no seu melhor, imagina no seu pior.
– É, mas ele não conhece esse meu lado.
– Você não contou pro Jordan como você era no colegial?
– Contei, mas eu não contei sobre todas as festa e definitivamente sobre a bebedeira. – Lilah não era só conhecida como a garota exemplar que superou a morte dos pais, virou aluna exemplar e namorada do quarterback, ela também tinha fama de sempre ganhar todas as apostas que incluíam bebidas nas festas. A garota parecia um barril e como Lilah detestava trabalhar, usava o seu talento pra arrancar dinheiro dos caras do colégio. E pode apostar que ela ganhava uma grana.
– Não se preocupe, Lilah. Se ele te ama com todas as suas frescuras, pode ter certeza que ele te ama de qualquer jeito, até vestida de Britney Spears e bêbada.
– Ah, , o Jordan é incrível. Eu gostaria tanto que vocês se conhecessem melhor, principalmente agora.
– Por que vocês dois vão casar?
– Não, porque você parece que vai entrar pra família também. – olhei pra ela com os olhos arregalados – Ah, , dá pra ver a um quilômetro de distância que você e o tem uma química, dá pra sentir no ar que vocês dois estão a ponto de se agarrarem. – abaixei o olhar, balançando a cabeça – Mas vocês já se agarraram! Eu sabia! – ela apontou pra mim – e , debaixo de uma árvore se beijando! – Lilah começou a cantarolar e dançar no meio da rua.
– Lilah, cala a boca!
– Você está ficando vermelha! Então é verdade, – ela começou a gargalhar – olha pra você virando um pimentão. , você está pensando no que eu estou pensando? – ela segurou meu braço e sussurrou perto do meu ouvido.
– Seria a primeira vez.
– Você quer fazer a versão maior pra dezoito anos da música com o senhor , não quer? – ela olhou pra mim com um sorriso de lado – Não te culpo, não sei o , mas o Jordan é um arraso na cama. – ele me abraçou pela cintura.
– Muita informação, Lilah, muita informação mesmo. – ela deu de ombros enquanto nós paramos em frente à boate.
– Eles vão deixar a gente entrar. – Charlie falou, se virando para nós fazendo com que todas as meninas soltarem um grito de comemoração.
– A gente vai poder subir em cima do palco? – eu perguntei, fazendo com que todas olhassem pra mim – O que foi, gente? Se é pra invadir, pelo menos faz o negócio completo.
– Se vocês quiserem, eu posso falar com o gerente. – uma garota apareceu ao nosso lado, aparentemente, ela trabalhava na boate – Vocês podem entrar na hora do nosso número da Britney.
– Vocês tem um número da Britney?
– Não é Baby, One More Time, mas é I Love Rock 'n' Roll.
– Se estiverem de acordo, eu topo. E vocês, meninas?
– Eu estou dentro. – Charlie disse.
– Eu também. – Peggy falou. Olhei para Lilah que se desfez do meu abraço e andou pra perto das suas amigas.
– Se vocês não quiserem, tudo bem, a gente não vai forçar vocês a nada. – eu falei, cruzando os braços. Todas elas se olharam e por um momento eu achei que elas iriam desistir, até que Ava deu um pulo pra frente e disse:
– Foda-se! – e todas as garotas se juntaram a ela.
– Me lembrem toda vez de sair chamar vocês. – Peggy disse enquanto seguíamos a mulher para a parte de trás da boate.
– Pode ter certeza que você vai ter muitas histórias pra contar depois. – falei, segurando a porta pra todas as meninas passarem. A mulher, que se apresentou como Alyssa, nos levou até o camarim e lá ela explicou para garotas o nosso plano, claro que todas adoram a ideia e tentaram ensinar pelo menos alguns passos antes de nós entrarmos no palco.
Algumas garotas ainda precisaram de um pouco de coragem então Alyssa pediu uma rodada de tequila. O álcool realmente faz milagres, porque nem em um milhão de anos todas essas garotas estariam conversando com um bando de strippers como se fossem antigas amigas e isso incluía Lilah.
As meninas foram para a entrada do palco para quando a música começasse a tocar elas começarem sua rotina, nós entraríamos logo no primeiro refrão. Todas as meninas iriam na frente e eu Charlie seríamos os últimos, claro que nenhuma de nós tiraríamos a roupa, mas eu ainda arriscava dizer que Charlie tirava a blusa.
Quando o primeiro refrão começou e as meninas começaram a entrar, eu pude escutar um grito vindo da frente algo como "Ai meu Deus, Lilah" e quando nós saímos, pude ver Jordan em frente ao palco com os braços abertos tentando impedir dos caras de verem Lilah.
– Larga de ser babaca e aproveita. – falei dando um empurrão nele. Jordan me olhou incrédulo e eu até estava a ponto de continuar quando olho pro lado vendo, nada mais nada menos, do que o irmão do noivo – ou melhor dizendo o estranho – me olhando com um sorriso de lado. Dei uma piscadela pra ele e voltei pra junto das meninas dançando juntas até o final da música.
– Isso foi incrível! Quero de novo! – Ava falou se jogando no sofá junto com algumas meninas – Vocês dois estão contratados pra todas as despedidas de solteiras que eu for! – Ava aponto para nós.
– Tendo bebida e lap dance pode me chamar que eu vou. – Charlie falou.
– Me chama também. – Peggy disse se jogando no sofá.
– O que foi que você fez com minha noiva, ? – Jordan chegou com Lilah do lado.
– Eu? Eu não fiz nada. – olhei por cima do ombro de Jordan vendo começar a andar em nossa direção com os outros caras.
– Pois continua a fazer nada porque não vou mentir, eu estou adorando.
– Jordan! – Lilah o repreendeu.
– Oi, ! – ele falou parando ao lado do irmão.
– Estranho.
– ! – Carrie passou por mim se jogando nos braços de – Você gostou da nossa apresentação?
– Claro, quem não gostou, pra falar a verdade. – ele olhou pra mim.
– Jordan, sei você gostou tanto desse lado da Lilah, espera até ela te contar o que ela fazia no colégio pra ganhar uma grana.
– ! Você é a pior pessoa.
– E essa é a minha deixa. Até mais pombinhos. – passei pelos dos casais e fui em direção ao bar, Charlie apareceu ao meu lado.
– Lá vai ela se jogar pra cima do seu boy de novo.
– Ele não é meu, eu já te disse. – virei-me pro bartender – Me traz uma água, por favor.
– Ai é? Então por que ele está olhando pra cá? – virei-me pra trás vendo se desfazendo dos braços de Carrie e vindo até mim. – Ou melhor dizendo, vindo pra cá? – apoiei os braços no bar atrás de mim agradecendo ao bartender pela minha água – Já vi que estou sobrando aqui. Fui! – Charlie se levantou do banco indo em direção às outras meninas. sentou onde ele estava e se virou pra mim.
– Eu sempre adorei essa roupa. Eu sempre tive uma queda pela Britney Spears.
– Que tarado! Vai lá com a Carrie, ela parece muito com a Britney. – falei, começando a me afastar dele.
– Volta aqui! – ele me puxou pela cintura fazendo com que eu ficasse no meio das suas pernas – Eu não parei de pensar em você a noite toda. – joguei a cabeça pra trás, gargalhando alto – Não acredita em mim?
– Bem difícil, olha ao teu redor, , essas mulheres não passam despercebidas por ninguém, até eu não parei de olhar.
– Tudo bem, não a noite inteira, mas uma boa parte sim. – ele me puxou pra mais perto – Principalmente depois de vocês entrarem.
– Gostou? Ideia da Peggy. – olhei para o lado vendo Peggy se deixando levar pelo charme de um dos amigos do Jordan – Pelo visto você não foi o único. – passei os braços pro seu pescoço, encostando nossos narizes. sorriu antes de encostar nossos lábios e finalmente me beijar. Acho que era a primeira vez que nós beijamos de um jeito tão romântico, normalmente o jeito que a gente se beijava era cheio de desejo e segundas intenções, esse era diferente.
– Desculpa atrapalhar. – a voz de Jordan ecoou pelos meus ouvidos fazendo com que eu me separasse dele – Mas será que a gente pode ir embora? Tá tudo mundo cansando e vai ser difícil levar esses marmanjos todo pra casa que eles estão hospedados.
– A gente podia ir pro meu loft. – falou se levantando e se separando de mim – Leva todo mundo pra lá, é perto.
– É melhor mesmo, imagina a gente e as meninas entrando em casa bêbados? Não, não, Cassandra mata todo mundo por acordá-la no meio do sono de beleza.
– Então fechou. Não tem muitos quartos, mas tem espaço pra todo mundo.
Foi uma luta tirar tudo mundo de dentro da boate, a maioria das meninas e dos meninos queriam ficar mais um pouquinho pra ver o sol nascer, mas até o dono da boate queria o resto da noite pra dormir então expulsou todo mundo de lá. Todo mundo se dividiu em grupos, alguns dos amigos de Jordan voltaram pra casa onde eles estavam hospedados enquanto todas as garotas e Charlie decidiriam ir pro loft de . Aparentemente elas estavam bêbadas, mas não o suficiente para cair nos braços de um estranho.
teve que ir na frente com Charlie e algumas das meninas pra que ele organizasse a casa e impedisse alguém decidir dormir em seu quarto, imagina se alguém decidir entrar por lá e dar de cara com vários quadros de Zoe Cane espalhados pelo quarto. Lilah, Jordan e eu estávamos em um táxi indo para a casa de .
– Essa noite foi incrível! – Lilah disse jogando os braços pra cima. Ela estava deitada em meu colo enquanto Jordan estava no banco do passageiro. – Ah, , eu sinto tanto sua falta. Eu sinto falta de te chamar de punk esquisita e pegar no seu pé. Oh, você lembra daquela vez que nós dois saímos escondida da vovó praquela festa do seu paquera super esquisito?
– Alf?
– Esse mesmo. Ele estava numa banda e ia tocar a música que fez pra você e como a vovó não deixou nenhuma de nós irmos, você teve a grande ideia de a gente juntar forças e fugirmos juntas. Eu sinto sua falta, .
– Deve ser muito difícil não ter ninguém pra maltratar todo dia.
– Não, não. Eu queria que nós fôssemos amigas, como antes, mas eu faço tudo errado. Eu não sei me expressar e acabo fodendo com tudo.
– Lilah, você acabou de falar um palavrão?
– Ai meu Deus, eu realmente estou bêbada. – ela colocou as mãos na frente do seu rosto – Mas eu falo sério, eu sinto sua falta.
– Eu também sinto sua falta, Lilah.
– A gente já chegou. – Jordan abriu a porta do carro e ajudou Lilah a sair. Na sala estavam espalhados vários colchões e algumas das meninas já estavam dormindo, e devo ressaltar que duas estava dormindo abraçadas a Charlie. estava em pé na cozinha, apenas de calça. Por um breve momento eu imaginei como seria acordar todo dia de manhã com a visão de , só de calça, na cozinha fazendo café da manhã e posso até arriscar que não me parecia má ideia.
– Vocês podem ficar no quarto de hóspedes. – falou olhando para Lilah e Jordan enquanto eu tirava os sapatos – pode ficar no meu quarto.
– E você vai dormir onde?
– Eu me arrumo por aí.
– Esse me arrumo por aí ele quer dizer que vai dormir com a . – Lilah falou, apontando o dedo pra ele.
– Lilah! – a repreendi.
– O que? Vamos, Jordan, deixem o casalzinho sozinho.
– Tudo bem. Boa noite, gente. – Jordan saiu abraçado com Lilah.
– Então... Boa noite. – falei, sem graça.
– Boa noite, . – ele disse se virando para a geladeira.
– Eu tenho uma coisa pra se mostrar. – eu sabia que eu ia me arrepender, mas quando eu vi, eu já estava falando. Maldito seja o álcool!
– Agora?
– É, agora. E você vai ter que ficar com os olhos fechados.
– Eu vou ganhar uma lap dance? – ele parou em minha frente.
– Bem que você gostaria, hein? – falei, segurando em seus ombros, virando-o fazendo com que ele ficasse de costas pra mim. Fiquei na ponta dos pés, colocando as mãos em seus olhos.
– Misteriosa.
– Você sabe que sim. – comecei a andar em direção ao seu quarto – Primeiro, você não pode rir. Segundo, você não pode rir.
– Você não está bem.
– Claro, eu estou usando uma roupa de colegial na despedida de solteira da minha irmã levando um estranho que me ajudou a pular de um trem para ver o seu quadro enquanto fico paranoica caso alguém decida descobrir o que eu faço no meu tempo livre.
– Meu quadro? – ele perguntou enquanto eu empurrei a porta do seu quadro e o coloquei na frente da peça que estava em cima do cavalete.
– É, o seu quadro. – tirei as mãos de cima dos seus olhos. Ele deu dois passos pra frente e depois se virou para mim.
– Isso aqui sou eu? Você está dizendo que eu sou duas caras?
– Não, é desse jeito que eu te vejo. Meio dark pelo lado de fora que representa esse seu jeito meio arrogante que você tenta passar, mas uma explosão de cores do lado de dentro, que no caso representa o seu verdadeiro ser. Acho que você quer passar essa imagem de sem coração, quando você na verdade é um cara que sente tudo no último volume da intensidade.
– Por que tenho a impressão que ainda não está terminado? – ele se virou pra mim.
– Porque eu ainda não te conheci por inteiro, alguns dias fugindo de ladrões não foram o suficiente pra te conhecer por completo.
– Então você quer?
– Quero o que?
– Me conhecer por completo.
– Quero, por incrível que pareça, eu realmente quero.
– Bom, porque o sentimento é recíproco.
E assim do nada ele segurou meu rosto, passou um braço pela minha cintura e me puxou para um beijo. Um beijo tão profundo que fez com que eu quase caísse para trás, graças a Deus eu estava com os braços ao redor do seu pescoço porque provavelmente eu teria caído. Não sei ao certo se o que estava acontecendo entre nós iria acabar quando esse casamento acabar, ou se vai durar, mas o que era bom mesmo era sensação de que, aqui e agora, ele me queria tanto quanto eu o queria.
– , seu estúpido, onde é que você guarda a vodka, Jordan e eu... – Lilah parou de falar assim que nos viu juntos. Acho que pra ela o choque não foi nem o fato de nós dois estarmos nos beijando, foram os quadros espalhados pelo quarto, e bem pior o nome que tinha neles – Zoe Cane.
Capítulo 9
– , aconteceu um desastre! – abri os olhos, sentando-me na cama e dando de cara com Charlie em pé ao lado da mesma.
– Puta que pariu! Todo mundo já sabe? – perguntei, aflita. Eu sabia aonde isso ia dar. Fiquei acordada durante a noite inteira, pensando em como sair da situação em quem eu estava. Era manhã quando eu decidi deitar na cama, em vez de tentar abrir um buraco na terra e desaparecer por ele. Mas é claro que, mesmo depois de tudo, algo ruim ia acontecer. Inocente era eu, que pensava que eu finalmente estava a salvo.
– Claro! Lilah gritou pra todo mundo. – foi impossível conter o grunhido. Agora, mais do que nunca, eu tinha que sair dessa casa correndo e com a roupa do corpo se fosse preciso.
– A gente tem que arrumar um jeito de sair daqui. – joguei as cobertas pro lado, me levantando e indo em direção a minha mala – Acha que pode nos ajudar?
– Se o pode ajudar? – ela parou em minha frente – Do que você está falando?
– Do que você está falando? – me virei para ele.
– Arruinaram o vestido de noiva de Lilah.
- Lilah descobriu que eu sou Zoe Cane. – falamos os dois ao mesmo tempo.
– Arruinaram o vestido de Lilah?
– É, mas isso pode ficar pra depois. – ele me pegou pelas mãos, me sentando na cama – Lilah descobriu que você é Zoe Cane? Como?
– Bom, foi mais ou menos assim...
Flashback
– Por que aqui está lotado de quadros da Zoe Cane? – e eu nos entreolhamos, tentando achar uma resposta. Não era a primeira vez que alguém fazia uma pergunta dessa para mim. Eu sempre arrumava um jeito de desviar da resposta, só que era de Lilah que estávamos falando, e eu simplesmente congelei. Por mais que eu achasse as palavras, Lilah me conhecia muito bem e sabia quando eu mentia.
– Era seu presente de casamento. – respondeu, olhando pra mim – Eu achei uns quadros da Zoe Cane e, como eu sei que você é uma grande fã, decidi que daria pra vocês.
– Ah, muito obrigada, . – ela falou olhando em volta. Lilah olhou alguns quadros e depois se virou para nós, com o cenho franzido. – Mas, espera um segundo! Como você conseguiu os quadros da Zoe Cane? Faz mais de um ano que ela não pinta nada novo.
– São quadros velhos.
– Pensei que sua família havia comprado todos.
– Não todos. – andou até Lilah, pegando-a pela mão – Vamos, Lilah, eu vou te mostrar onde fica a Vodka. – ele começou a puxa-la em direção à porta.
– Eu queria ver os outros quadros. – ela se soltou dele e voltou a andar em direção aos quadros – São bem diferentes do que ela já fez.
– Outro dia, Lilah, agora vamos. – parou em frente a ela, empurrando-a em direção à porta.
– Por que você está me empurrando, ? Da para você me soltar? – ela se soltou dele, olhando pra mim. Depois de um tempo olhou para os quadros, para a mesa cheia de pincéis sujos e tinta fresca e depois para mim, fez isso pelo menos duas vezes antes de abrir a boca e arregalar os olhos – Você é Zoe Cane! – ela apontou pra mim, andando em minha direção.
– Não sei do que você está falando. – foi à única coisa que eu consegui dizer e senti que não saiu convincente o suficiente – Um bando de pincéis sujos e alguns quadros não provam nada.
– Você sempre foi uma péssima mentirosa, , e está fazendo aquele negócio com o nariz que você faz quando mente. – ela começou a rir – É por isso que Vovó tem vários quadros exclusivos da Zoe Cane, por isso que ela sempre está nas suas exposições, é por isso que todas às vezes ela sempre se esquece da mentira que me contou e arruma uma nova profissão pra você. Oh, meu Deus, , você é Zoe Cane! Eu sabia que eu conhecia aqueles traços de algum lugar, são iguais aos que você desenhava no colégio.
– Lilah, vamos. Eu vou te levar pra casa. – pegou no braço dela e a arrastou para a porta.
– Não. Eu quero saber a verdade! – ela gritou, tentando soltar-se dele – Você é ou não é Zoe Cane?
– Eu não tenho que te responder nada, Lilah. Você está bêbada e, como todo bêbado, não está fazendo sentido das coisas.
– Mas é claro. Zoe é o nome da nossa bisavó por parte de pai e Cane o sobrenome de solteira da mamãe. – ela olhou pra mim e depois pra – E, como é que você sabe da verdade? Vocês se conhecem há muito tempo?
– Tudo bem, Lilah, foi você que pediu. – a colocou em seus ombros e a levou para fora do quarto apesar de seus protestos.
End Flashback
– Depois disso, voltou por quarto, e eu decidi que preferia vir para mansão em vez de ficar no Loft. Ele trancou o quarto e depois me trouxe pra cá, passei a noite inteira tentando bolar em um plano e rezando pra Lilah esquecer-se do que ela viu. – abaixei a cabeça. – Eu quero pegar o primeiro trem pra casa e nunca mais botar a cara pra fora. – joguei a cabeça pra trás.
– Ah, , eu acho que você está exagerando.
– Charlie, esse bando de psicopata tem praticamente um museu só de quadros da Zoe Cane. Sem falar da aposta rolando entre eles pra quem descobre quem ela é... Você acha que Lilah não vai querer esfregar na cara da sogra jararaca dela que sua irmã é Zoe Cane?
– Até ontem você estava dizendo que ela queria que vocês fossem amigas novamente.
– É, mas Lilah é humana também. E, eu sei que ela faria isso.
– Como é que você pode ter tanta certeza disso?
– Porque, acredite ou não, era o que eu faria também. Ter uma pessoa questionando minha competência do jeito que eu sei que Cassandra faz com Lilah, na primeira oportunidade que eu tivesse eu a faria engolir todo aquele veneno. – olhei para ele – Charlie, por mais que eu goste de admitir, nós somos muito parecidas. – me levantei – E por isso, que eu sei que talvez se eu pedir pra ela, pode ser que ela não conte nada. Se ela não tiver contado pra ninguém, claro.
– Se você quiser, eu vou com você.
– Aonde é que ela está mesmo?
– Ela está no quarto. – respirei fundo e abri a porta.
– Então vamos lá encarar a fera.
Andamos a passos largos até o quarto de Lilah. Jordan e estavam do lado de fora com o ouvido grudado na porta.
– Ninguém nunca disse pra vocês que é feio ouvir a conversa dos outros? – vi os dois irmãos pularem, se virando para nós.
– Acho que não dói nenhum pouquinho quando sua noiva está a ponto de ter um colapso nervoso.
– Não acho que seja pra tanto.
– Como é que você espera que eu case nessa porcaria, Carrie? Como é que você acha que isso tem conserto? A quantidade de álcool no seu sistema te deu uma estupidez temporária? – escutamos Lilah gritando do outro lado da porta. De repente a porta se abre e Carrie sai do quarto com cara de choro.
– Boa sorte. – ela diz antes de desaparecer pelo corredor. e Jordan foram os primeiros a entrar, depois Charlie segurou em minha mão me puxando para dentro. Anne já estava lá dentro e encarava o vestido totalmente destruído. As alças estavam cortadas, a saia parecia que tinha passado por um picador e, no topo de tudo, estava pintado nas cores do arco-íris. Realmente, isso era um desastre. Lilah encarava o vestido e pelo os olhos e nariz vermelhos, ela estava chorando.
– Lilah... – Jordan foi o primeiro a falar, Lilah virou o rosto para ele com lágrimas nos olhos. Ele tentou andar em direção a ela, mas ela se afastou – Você sabe que se for preciso, eu me caso com você vestindo um saco de batata.
– Mas eu não quero me casar em um saco de batata! – ela olhou para ele – Eu quero me casar o mais linda possível, usando o vestido da minha mãe. Mas, agora está tudo arruinado! – ela começou a chorar e a soluçar alto dessa vez.
– Lilah... – ele tentou novamente.
– Saem todos daqui!
– Lilah...
– Eu juro que se vocês não saírem daqui, eu os arrasto um por um! Vão embora! – os meninos foram os primeiros a sair junto com Anne. Charlie e eu fomos depois.
Me sentei no chão, me encostando na porta enquanto todo mundo desaparecia pelo corredor. Charlie olhou para o lado e estranhou quando não me viu, olhou para trás, se virando pra mim.
– Você não vem? – ele perguntou chamando a atenção de todos.
– Não. – balancei a cabeça, encostando o ombro na porta.
– Mas ela disse...
– Deixa, é coisa delas. – minha avó falou, puxando Charlie e desaparecendo pelo corredor.
– ? – escutei a voz de Lilah do outro lado da porta.
– Eu estou aqui, eu não vou a lugar nenhum.
Flashback (3º pessoa)
26 de Dezembro de 1999
Era o dia depois do Natal e era de se esperar que toda a família estivesse reunida pra abrir um presente. Porém, aquele não era um dia feliz para duas garotinhas. A chuva caía fina, sujando os sapatos que eram apenas usados em ocasiões especiais, e que agora seriam apenas um lembrete de um dia ruim. Além dos protestos da avó, Lilah insistiu muito para que as duas fossem dar o seu último adeus aos seus pais. Era algo que as duas precisavam fazer. Afinal, eram seus pais e nunca mais o veriam.
Lilah engoliu o choro e consolou a irmã que chorava agarrada na foto dos pais. Ela precisava cuidar da irmã a partir de agora, ela era tudo que ela tinha, e tinha que ter certeza que cuidaria dela do jeito que seus pais queriam que ela o fizesse. Lilah não chorou, queria ser forte para a irmã. Entretanto, depois poderia chorar o quanto quiser quando voltasse pra casa e se trancasse no quarto. sempre foi sua prioridade. Agora mais do que nunca.
Quando chegou em casa, colocou a irmã na cama e esperou que ela dormisse.
– Lilah... – – Sim. – ela passou a mão pelos cabelos da irmã.
– Nós vamos ficar bem, certo? – ela perguntou, agarrada na foto dos pais.
– Claro! – ela deu um beijo no topo da sua cabeça – Agora vá dormir. Bons sonhos!
O quarto das duas era separado por uma porta e, logo depois que Lilah a fechou, se deixou cair no chão finalmente deixando as lágrimas caírem. Não soube por quanto tempo chorou, mas logo sentiu que não estava sozinha. Do outro lado da porta, – ... – ela escutou a voz da irmã do outro lado da porta e lembrou-se de algo que seu pai sempre falava para sua mãe depois de alguma briga.
– Eu estou aqui, eu não vou a lugar nenhum.
12 de junho de 2004
A primeira decepção amorosa vinha para todos, sabia disso. Mas, o que ela não esperava era que seu primeiro namorado a traísse logo na primeira semana de namoro. Ela sabia que ele não era nenhum santo, mas, depois dele tanto insistir para tê-la só para ele, pensou que ele finalmente tinha tomado um jeito. Claro, seu coração, um eterno romântico, sempre a classificou como a heroína das comédias românticas que mudava aquele bad boy. Porém, a vida não era uma comédia romântica, e ela não era nenhuma heroína.
entrou em casa batendo a porta em prantos. Sua avó estava na sala tomando o seu famoso drink da tarde, bastou um olhar dela pra sua irmã começar a soluçar alto.
– , o que aconteceu? – Anne perguntou, se levantando.
– Ele me traiu. Disse que o que a gente tinha nem era tão importante! Eu o amava tanto, dói tanto.
– Ah, minha querida! – sua avó estava pronta pra abraçá-la quando Lilah entrou em casa com o namorado dela toda sorridente. Bastou uma olhada dela em minha direção pro seu sorriso desaparecer.
– , o que aconteceu? – ela perguntou andando em direção à irmã.
– Não é da sua conta. – ela respondeu, limpando as lágrimas e correndo em direção a escada.
– Ei, ! Espera! Diga-me o que foi?
– Nada que é de seu interesse! – ela parou no meio da escada e se virou pra irmã – Pode voltar pra sua vidinha perfeita, com seu namorado perfeito e com a porra toda perfeita!
– ...
– Me deixa em paz, Lilah! – entrou no quarto trancando a porta logo em seguida. Sentou-se encostada na porta, deixando as lágrimas caírem. Ela sabia que depois dessa, Lilah provavelmente teria saído com o namorado. Mas mesmo assim, ela tinha que checar.
– Lilah?
– Eu estou aqui, eu não vou pra lugar nenhum. – a outra disse encostada na porta.
14 de junho de 2005
Lilah sempre teve o sonho de cursar uma faculdade em Nova York, a cidade onde tudo pode acontecer! E ela finalmente poderia sair desse subúrbio e viver a vida que sempre sonhou. Porém, todos os seus sonhos foram destruídos quando a segunda carta das três faculdades que ela tinha escolhido chegou, e nela tinha dizendo que ela tinha sido rejeitada.
– Lilah, minha querida. – sua avó passava as mãos pelas costas de Lilah enquanto ela chorava. Já era ruim demais que seu namorado tinha escolhido uma faculdade do outro lado país - ele achava melhor que eles seguissem caminhos diferentes a partir de agora-, tinha que aguentar também ser rejeitada pelas faculdades que ela tanto queria – Ainda falta uma, você ainda pode entrar nessa.
– Mas, e se eu não entrar? – ela olhou pra avó – O que eu vou fazer? Eu só me matriculei nessas três.
– Você pode ir pra faculdade aqui mesmo.
– Nesse fim de mundo, Vó? Eu quero ir para Londres, quero sair daqui e viver a vida que eu sempre sonhei.
– Lilah... – elas escutaram a porta abrindo e uma sorridente entrar. Lilah não queria que sua irmã a visse chorando então abaixou sua cabeça.
– Advinha quem ganhou o primeiro lugar na competição de artes? – entrou na sala com o prêmio em mãos, mas bastou uma olhada pra sua irmã pra seu sorriso desaparecer – Lilah, o que aconteceu?
– Nada que é do seu interesse. – Lilah se levantou e correu para o quarto, se trancando por lá mesmo. olhou pra avó e ela entrego a carta de rejeição a ela. correu pro andar de cima, sentando-se na porta da irmã. A relação delas poderia ser conturbada nos últimos anos, mas o que as duas mais queriam era ver a outra feliz.
– ?
– Eu estou aqui, eu não vou a lugar nenhum.
18 de maio de 2006
Mas logo lembrou-se da sua amiga, que sempre dizia que nem tudo que acontecia era sua culpa. Era engraçado, Lindsay que estava doente, mas era que sentia que sua vida estava sendo tirada dela. E de certo modo estava, Lindsay foi sua amiga desde o maternal, mesmo quando decidiu que não precisava de ninguém. Ela sempre estava pegando no seu pé, pedindo que ela sorrisse mais. Demorou um pouco, mas ela conseguiu e, desde desse dia, não tenho um momento com Lindsay que não estivesse quase chorando de tanta gargalhada. Lindsay tinha um espirito livre que era capaz de animar até a festa de Natal do asilo cheio de velhinhos ranzinzas. E, mesmo em uma cama de hospital, lembrava que a vida continuava e que ela queria ver a amiga sorrindo.
– , você não quer comer alguma coisa? – a avó perguntou do outro da porta. O funeral de Lindsay tinha acabado há duas e ela se manteve no mesmo lugar desde que chegou em casa: sentada, encostada na porta e pensando na vida. – Faz horas que você está ai dentro, e ainda não comeu nada.
– Não, eu estou bem. – respondeu, encostando a cabeça na porta.
– Ah, querida, nós duas sabemos que essa é a maiores mentiras de todos os tempos.
– Eu sei, eu só preciso de um tempo sozinha.
– Tudo bem, mas eu vou voltar viu, ?! E eu espero que você coma, nem que seja uma sopa.
– Tudo bem. – escutou os passos da avó ecoarem pelo corredor e, logo depois, a porta da frente se abriu. Escutou múrmuros e a esperança preencheu seu coração, sabia que Lilah estava em Nova York cursando a sua faculdade dos sonhos e que provavelmente não ligava, mas mesmo assim tinha que tentar.
– Lilah... – falou, com a voz quase falhando.
– Eu estou aqui, eu não vou a lugar nenhum.
E então fez algo diferente. Abriu a porta e abraçou a irmã deixando as lágrimas caírem novamente.
End flashback
– Você lembra da primeira vez que a gente fez isso? – ela perguntou do outro lado da porta.
– Foi no dia do enterro do nossos pais. – respondeu, encostando a cabeça na porta.
– E depois disso, todas as vezes que uma se trancava no quarto chateada...
– A outra ficava do outro lado da porta. – Lilah completou, abrindo a porta e eu pude ver seus olhos vermelhos – Eu faço tudo errado, eu acho até que eu mereço isso do vestido.
– Lilah...
– Eu sou uma pessoa horrível. Olha tudo que eu fiz com você, . Todos aqueles anos achando que minha reputação era mais importante que a minha própria irmã, e acabei te afastando de mim. – ela começou a soluçar – Eu faço tudo errado. Jordan é a única coisa que eu não consegui estragar e o carma está aí pra me mostrar que eu não o mereço.
– Isso não é verdade, é só um vestido. Jordan te ama e você o viu dizendo que se casará com você mesmo vestida em um saco de batata.
– Mas eu queria casar com o vestido da mamãe. – ela olhou pro vestido destruído – Eu sinto muita falta dela, ... Deus sabe o quanto eu chorei por dela não está aqui para me ver casando. E o papai, que nem vai poder me levar ao altar. – ela fungou alto – Jordan é tão maravilhoso que pegou um cadarço de um dos sapatos do papai pra usar no dia do casamento, porque ele sabia que era importante pra mim. – ela abaixou a cabeça – E agora nem me casar eu posso. – ela começou a chorar novamente.
– Aí meu Deus, Lilah! Me mata te ver desse jeito. – a abracei pelos ombros, sentindo-a me abraçar forte pela cintura – A gente vai arrumar um jeito de arrumar esse vestido.
– Arrumar aquilo? – ela se separou de mim – Nem que Jesus Cristo descesse aqui e fizesse um milagre. Melhor, nem que Linda Vanderberg aparecesse aqui essa porcaria teria conserto.
– Linda Vanderberg? Oh meu Deus, é claro, Linda! – me levantei – Fica aqui, Lilah, não se mexe eu volto já.
– , aonde é que você vai?
– Salvar seu casamento, irmãzinha. – dei um beijo no topo da sua cabeça – Agora fica aí dentro que eu volto já. – corri de volta para a sala atrás de Charlie, o encontrando sentado entre e Jordan, junto com os restos dos amigos de Lilah e Jordan.
– E aí, como é que ela está? – Jordan perguntou.
– Charlie, me dá seu telefone. – ignorei Jordan e estendi a mão para Charlie.
– Pra que você quer meu celular?
– Me dá, agora.
– Tudo bem, estressada. – ele me entregou o celular e eu disquei o número que eu tão conhecia.
– Alô, Linda?
– , pelo amor de Deus, você está bem? O que aconteceu?
– Eu preciso que você venha pra Oxford agora e traga aquele vestido que você me prometeu. Nós temos um casamento pra salvar.
– Eu não acredito que você me convenceu a vir ajudar aquele Godzilla em forma de noiva. – Linda disse, quando o carro parou em frente à mansão dos . Logo depois que eu liguei pra Linda, ela pegou tudo que precisava e, quatro horas depois, ela estava dentro de um táxi pra Oxford. Segundo ela, depois do que aconteceu comigo, ela iria passar um bom tempo sem andar de trem.
– Ela é minha irmã, Linda, eu preciso ajudá-la quando ela mais precisa. – falei, abrindo o porta-malas. Linda trouxe uma mala e, segundo Jordan, ela também poderia ficar conosco na casa, principalmente depois dele escutar a notícia que ela poderia salvar seu casamento.
– Foda-se! Olha tudo que ela fez pra você, , ela é um monstro.
– Eu já te disse, Linda. Eu também não era nenhum anjinho.
– Mas também com uma irmã daquela, até o diabo treme na base. – ela resmungou.
– Linda, – a segurei pelo braço, fazendo-a parar – eu preciso que você pelo menos respeite Lilah. Eu sei que todos esses anos eu contei o meu lado da história e, Lilah também não era nenhum anjo, mas as coisas não são quando nós nos vimos pela última vez. Eu sei que pra você vai parecer loucura, mas eu quero pelo menos ter uma relação civilizada com a Lilah. – Linda piscou algumas vezes antes de falar.
– Você sabe o que faz da sua vida, eu só não quero que ela te machuque.
– Às vezes, a gente machuca as pessoas que ama. Isso não quer dizer que nós não as amamos um pouco menos.
– Odeio quando você dá uma de filósofa pra cima de mim.
– Você me ama. – a puxei para um abraço.
– Onde é que eu coloco esse vestido? – Charlie perguntou, segurando a caixa em que o vestido que eu pedi pra Linda trazer estava. Era um da nova coleção de Linda. Ela ainda não tinha exibido, porque ela dizia que o público não estava pronto pra tal pedaço de arte, e eu devo admitir que ela estava certa. O vestido era simplesmente lindo! Pelo menos pelo o que ela me mostrou no papel, e por eu gostar tanto dele, ela disse que eu poderia ficar com ele.
– Cuidado, Charlie! – Linda disse, se virando pra ele – Esse vestido é uma obra de arte.
– Uma obra de arte que pesa uma tonelada.
– Se quiser, nós podemos ajudar. – viramos para o lado vendo os dois irmãos a poucos metros de distância.
– Aí meu Deus! Quem são esses dois pedaços de mau caminho? – Linda sussurrou ao meu lado.
– O da direita é o noivo da Lilah, e o da esquerda o futuro namorado da nossa querida . – Charlie disse, fazendo com que eu arregalasse os olhos.
– Charlie!
– Posso dizer que a família s está arrasando no quesito escolher boy. Nota 10. – Linda sorriu e se virou para os garotos – Olá, tudo bem? Eu sou Linda, amiga da .
– A salvadora do meu casamento. – Jordan estendeu a mão para ela – Eu sou Jordan, esse daqui é meu irmão, .
– O estranho da ? – Linda perguntou olhando pra mim. Vermelha, cor de tomate, era uma cor aceitável para descrever meu estado no momento.
– É, o estranho da . – ele respondeu, olhando pra ela – A gente pode te ajudar com o vestido.
– Acho que seria no mínimo aceitável. – ela sorriu pra ele – Mas só você, estranho da . E você vai pra bem longe porque dá azar ver a noiva antes do casamento.
– Tudo bem, eu vou procurar o papai. Muito obrigada por ajudar minha noiva. – Jordan abraçou Linda e eu juro que ela quase se derreteu nos braços dele.
– Tem certeza que ele vai casar? Eu juro que se ele quiser, a gente pode fugir agora mesmo.
– Se concentra, Linda!
– É mesmo, claro. Estou indo encara a fera. – Linda respirou fundo, fazendo uns movimentos de yoga enquanto ajudava Charlie. Eu apenas balancei a cabeça indo em direção à porta e esperando que eles me seguissem.
Bati na porta e antes mesmo que ela pudesse responder, decidi entrar. Lilah estava ao lado da janela, me olhando aflita.
– Onde é que você foi? – ela perguntou se aproximando – E por que demorou tanto?
– Isso é minha culpa, queridona. – Linda entrou no quarto e Lilah abriu a boca surpresa.
– Linda Vanderberg?
– Essa seria euzinha. Podem colocar ali ao lado do espelho, meninos. – os dois colocaram o vestido em cima da cama – Agora vazem daqui.
– Até eu? – Charlie perguntou – Odeio tenho que fazer a linha interessado naquele papo chato daquelas meninas.
– Você pode ficar, Charlie. – Lilah disse.
– Eu vou atrás do Jordan. – saiu do quarto e Charlie fechou a porta.
– Como vocês se conhecem? – Lilah perguntou.
– Nós dividimos apartamento quando a se mudou pra Nova York, só que depois ela me abandonou porque ela começou a ficar rica depois que virou Zo... – Linda parou de falar – Ela arrumou um emprego.
– Lilah sabe que eu sou Zoe Cane.
– Nossa! Pensei que ia ter que mentir essa viagem inteira, ia ser uma tarefa difícil... Quando você se parece tanto com a . Tem os mesmos olhos de cachorro sem dono que consegue arrancar até os segredos mais escuros de uma pessoa.
– Obrigada por me ajudar, Linda. – Lilah se aproximou dela – Eu realmente espero que um dia eu possa te retribuir.
– Eu posso pensar em uma ou duas coisas.
– Linda, você não acha que Lilah deveria provar o vestido?
– Claro, claro. Charlie você me ajuda a tirar o manequim da caixa? - Linda andou até a caixa e a abriu. Linda puxou o manequim pra cima, ajustando o pedal, e, com a ajuda de Charlie, tirou-o da caixa. Lilah soltou um "Aí meu Deus" e depois, eu vi as lágrimas começarem a cair. O vestido era de um decote de ombro a ombro de manga comprida colado ao corpo até o lho. - Eu te disse, o público não está preparado pra esse vestido. Já deve ser o vigésimo terceiro "aí meu Deus" e a primeira que chora, vinte e três deve ser o meu número de sorte.
– É lindo! - Lilah falou se aproximando do vestido – Eu posso provar?
– Claro que pode. – Linda começou a tirar o vestido do manequim com a minha ajuda e a de Charlie. Lilah tirou a roupa em tempo recorde e logo estávamos ajudando-a com o vestido. Eu sei que Lilah queria muito casar com o vestido da mamãe e tenho absoluta certeza que ela ficaria linda nele, porém o vestido de Linda parecia ter sido feito especialmente para ela.
Lilah encarava o seu reflexo no espelho com um sorriso no rosto e lagrimas nos olhos, quase desacreditada no que estava acontecendo.
– Eu fiz esse vestido pra sua irmã, mas mesmo que eu não goste de admitir, ele foi feito pra você. – Linda falou, fazendo Lilah olhar para ela.
– Acho que Jordan vai ter que guardar o saco de batata. – falei, colocando as mãos em seus ombros. Lilah riu, limpando as lágrimas e então ela fez algo inesperado: se virou e me abraçou forte pelo pescoço. Abracei-a pela cintura sentido as lágrimas contra meu ombro.
– Muito obrigada. – ela se separou de mim – Eu não sei nem como te agradecer.
– Você não precisa, Lilah, – tirei o cabelo do seu rosto – você merece casar sendo a noiva mais linda do mundo.
– Será pra eu conversar sozinha com a minha irmã? – ela se virou pra Linda e Charlie.
– Não. – Linda falou.
– Linda! – eu a repreendi.
– Desculpa, foi reflexo! – Linda levantou as mãos – Nós vamos está aqui fora, pode gritar que eu trouxe meu taco de beisebol. – ela respondeu fechando a porta atrás de si.
– Ela te protege muito.
– É, a Linda me trata com se eu fosse uma irmã mais nova que ela precisa proteger. – Lilah olhou pra mim e começou a chorar – Lilah, meu Deus, o que?
– Eu sou um monstro.
– Lilah...
– Olha, , eu sei que eu não mereço, mas eu mesmo assim vou dizer: – ela segurou em minhas mãos – Eu quero que você me perdoe.
– Te perdoar?
– É, por tudo que eu fiz com você durante todos esses anos. Principalmente depois que nossos pais morreram. Eu só achei que se eu mostrasse para todo mundo que eu estava bem, eu conseguiria segui em frente... Eu começaria a acreditar, entende?! É aquela história: talvez, se você mente pros outros que está bem tempo suficiente, acaba acreditando na sua própria mentira. A verdade é que eu sempre te admirei muito. O jeito que você lidava com a dor... Tinha algo bonito sobre aquilo e saber que você virou uma pintora talentosa me deu até um pouco de conforto. Gosto de pensar que, mesmo que eu tenho você ter passado por um inferno, isso só te fez mais forte.
– Por mais bizarro que pareça, toda aquela sua maldade realmente me ajudou a ser quem eu sou hoje. Óbvio que eu precisei de terapia pra lidar com tudo, mas é como dizem: um artista está a um passo da loucura.
– Ah, , eu sinto tanto. – ela me abraçou de novo – Eu juro que se eu pudesse voltar no tempo, eu faria tudo diferente.
– Que tal nós nos concentrarmos no agora? – me afastei dela – Deixa o passado lá trás mesmo, vamos melhorar o nosso futuro.
– Acho que nós podemos fazer isso sim. – Lilah me abraçou de novo – Eu senti tanto, mas tanto a sua falta. ,se você soubesse...
– Eu também senti a sua.
– Agora eu não vou te largar nunca mais, só na minha lua de mel, é claro. – ela me soltou – E tem mais uma coisa.
– O que foi?
– Fui eu que enviei o bilhete.
– Você? - perguntei, surpresa – Mas vovó disse que ela tinha mandado com o seu nome.
– Eu queria que você viesse antes.
– Mas vovó não precisou fazer um barraco pra você me convidar?
– Na verdade, eu ia te convidar pessoalmente e ela não sabia. Eu queria resolver tudo de uma vez por todas. Daí vovó deu a ideia de mandar o bilhete pedindo pra você vir uma semana antes. Eu fui ao seu prédio várias vezes, mas você parecia nunca está lá, aí eu deixei aquele bilhete. Eu não aguentava mais ficar brigada. É um saco não poder falar com sua irmã, mas ai na hora que eu soube do ocorrido, Vovó que disse que foi pro Charlie. Eu já estava me sentindo um lixo por sempre te tratar mal, imagina se soubessem que a culpa do seu desaparecimento foi minha. Você me desculpa?
– Só se você me desculpar também, vamos admitir Lilah; eu também não fui nenhuma santa. – nós duas começamos a rir.
– Eu não contei pra ninguém que você é Zoe Cane.
– Não? Mas os não tem uma aposta?
– Tem, mas quem liga? - ela jogou as mãos pro alto, andando até a cama - A Cassandra que inventou essa história só pra me irritar e eu fui na dela, queria ver até onde a cobra ia com isso tudo. – ela se sentou na cama – Mas eu quero que você me conte como tudo aconteceu.
– Tudo? Tem certeza? É uma longa história.
– Se você não percebeu, eu tenho a tarde inteira livre.
– Então espera um segundo que eu já volto.
– , você está extremamente misteriosa hoje.
– Ah, Lilah, se fosse só hoje. – abri a porta, vendo Linda e Charlie caírem pra dentro do quarto.
–O que vocês dois pensam que estão fazendo? – perguntei, colocando as mãos na cintura.
– Como se você não soubesse. – Linda se levantou andando até Lilah que se levantou também – Obvio que a gente ia escutar atrás da porta, até parece que você não me conhece.
– Curiosidade matou o gato.
– Nunca gostei de gato mesmo. – Linda deu de ombros, cruzando os braços.
– Muito obrigada, Linda, do fundo do meu coração.
– Eu fiz isso pela , porque ela me pediu. – ela cruzou os braços – Olha, não vou mentir, eu te odiei por um bom tempo por tudo que você fez com minha amiga. Mas, vejo que você mudou e todo mundo merece uma segunda chance. Vem cá, me dá um abraço. – ela puxou Lilah para o abraço – Bem vinda ao time Zoe Cane. – ela a soltou, fazendo Lilah cair na cama – Ufa! Ia ser bem difícil te odiar, eu simpatizei contigo, acredita?! Deve ser o gene , conquista todo mundo com essas carinhas de anjos que vocês tem.
– Fico feliz com isso. Eu sou muito sua fã. Eu já fui a vários desfiles seu. – Lilah respondeu e eu pude ver seus olhos brilhando. Ela adorava conhecer pessoas que admiravam o seu trabalho. Normalmente, Linda saia convidando todo mundo pra sair depois do desfile e com isso acaba fazendo amizade com tudo mundo, ela era uma pessoa amigável e quase nunca ficava chateada, porém quando ela não gostava de uma pessoa era um sacrifício pra mudar de ideia. Charlie e eu nos entreolhamos e ambos caímos na gargalhada.
– Vocês dois a ajudam com o vestido? Eu tenho que buscar uma surpresa. – os dois assentiram e eu saí do quarto. Quando eu virei no corredor que levava a escada, vi Jordan e conversando, os dois olharam pra mim.
– Então, deu tudo certo? – Jordan perguntou quando me aproximei deles.
– O vestido ficou incrível, acho que Lilah não vai precisa do saco de batata, no final das contas. – Jordan respirou aliviado e depois me abraçou pela cintura, me rodopiando no ar.
– Muito obrigada, ! Você é a melhor cunhada do mundo.
– Jordan, dá pra você soltar minha garota. - Jordan me colocou no chão e eu cambaleei um pouco para o lado. Não porque eu estava tonta, mas sim pelas palavras dele. Minha garota? Ai meu Santo Antônio, assim meu coração não aguenta.
– Eu posso ir vê-la agora?
– Não, nós vamos ter uma tarde de irmãs agora. – falei, deixando os dois no corredor e descendo as escadas.
– E o que eu devo fazer a tarde inteira? – ele perguntou, me seguindo.
– Não sei Jordan, vai tomar uma cerveja com teus amigos. – entrei na cozinha indo em direção a geladeira. Peguei o bolo que estava guardado e o coloquei em cima do balcão – Por que você não vai visitar seus amigos, ver como eles estão de uma noite de bebedeira?!
– E se eu não quiser?
– Naquele quarto você não entrar, disso você pode ter certeza. – respondi, colocando os braços na bancada da cozinha. estendeu uns garfos na minha frente, e eu os peguei, agradecendo em seguida.
– Tudo bem, você venceu. – ele levantou as mãos – Eu vou visitar meus amigos. Vamos , eu estou te esperando no carro. – Jordan me deu um abraço antes de desaparecer pelo corredor.
– Às oito. – disse, fazendo com que eu virasse pra ele.
– O que?
– Eu te pego às oito hoje pra nós saímos. – ele se aproximou, ficando em minha frente – Nosso encontro.
– Claro, nosso encontro. – escutamos Jordan buzinando – Eu tenho que ir, te espero na frente de casa então. – ele aproximou nossos rostos, encostando nossos narizes – Te vejo mais tarde. – e então ele me deu um selinho e saiu correndo pelo mesmo canto que seu irmão.
Foi impossível esconder o sorriso enquanto eu levava o bolo de volta para o quarto. Eu não sabia o que estava sentimento, porque de repente eu sentia um formigamento nos dedos. Um certo nervosismo crescendo dentro do meu peito. Fazia um tempo que eu não ia a um encontro, especialmente com alguém que eu sentia atração e, se duvidar, até algo a mais.
– Por que você está com esse sorriso bobo nos olhos? – Lilah perguntou logo que eu entrei no quarto. Ela, Charlie e Linda estavam esparramados na cama.
– Deve ser por conta de um certo . – Charlie falou e eu senti minhas bochechas queimarem – Olha pra ela, ficando vermelha!
– Eu odeio todos vocês!
– Pode ser, mas traz esse bolo pra cá antes e conta os mistérios de sua vida. – andei até a cama colocando o bolo no meio da cama e entregando os garfos pra cada um.
– Então, tudo começou quando eu mudei pra Nova York e fui morar com Linda. Então...
Continua...
Nota da autora: (07/03/24) Sem nota.
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