Capítulo Único
“On a starry night
Hope my you sleep tight…”
— Mão direita no verde, amor! — gritei depois de girar a setinha no tabuleiro do Twister.
— Ah, não! Tem certeza? — Jungkook analisou sua própria situação controversa no tapete de bolinhas coloridas.
— É o que diz aqui. — confirmei dando uma risada e erguendo o tabuleiro. — Bom, não vai dar pra você ver porque está aí de bunda pra cima, então você vai ter que confiar em mim.
— A omma falou “bunda”! — os gêmeos disseram em coro e soltaram uma gargalhada.
Jungho e Jungmi tinham dessas. Alguns movimentos deles eram naturalmente sincronizados e, não raro, os dois falavam a mesma coisa ao mesmo tempo. Prestes a completar 5 anos de idade, Coisa 1 e Coisa 2 dividiam o mesmo neurônio na maior parte do tempo e, naquele momento, uniram forças para derrotar o pai na nossa noite de jogos em família.
Jungho estava pendurado numa das pernas de Jungkook, disputando com ele o “pé no amarelo”, e Minnie estava embaixo dele tentando se equilibrar de cócoras com a “mão no vermelho”. Eu ficava responsável por girar a roleta e indicar os comandos, tarefa que eu mesma me dei apenas para poder me deliciar observando o nosso pequeno e maravilhoso caos. A sala se enchia de riso e Jungkook ficava bicudo sempre que perdia, mas aquele era o meu maior sonho bem diante dos meus olhos: as três pessoas que eu mais amava na vida ali, engalfinhadas umas nas outras e tentando todas as artimanhas possíveis para ganhar no Twister.
— Minnie, coloque seu pezinho esquerdo no azul, meu bem. — pedi.
Jungmi pôs o pé errado na cor certa porque ainda se atrapalhava um pouco com as noções de direção, algo que eu já havia notado nas aulas de balé, mas eu não poderia deixar a minha pequena dançarina desnorteada perder, por isso repeti a ordem baixinho:
— O seu outro pé é o esquerdo, vida! — sussurrei e ela rapidamente fez a troca.
— Eu ouvi isso! — Jungkook protestou de cabeça para baixo, apoiado nas palmas. — Se errar o comando, está fora! Não vale!
— A omma é o juiz! — Jungho replicou. — Ela que decide!
— Obrigada, filho! Minnie segue no jogo. — cheguei um pouco mais perto da minha família aninhada e sugeri uma ideia para o menino. — A propósito, o appa tem cócegas no joelho.
Entendendo imediatamente o plano maléfico, Jungho usou a vantagem da mão livre para atazanar o pai com as “cosquinhas”. Jungkook queria reclamar, pedir para o juiz fazer alguma coisa, mas toda vez que a boca abria com seus dentinhos de coelho, tudo o que saía eram risadas. E o som parecia música para mim.
— Jungho! Não faz assim! O appa vai cair! — meu marido implorou e meu filho riu igualzinho a ele, encolhendo o nariz. Como era possível que duas pessoas se parecessem tanto?
Era fato que o homem da minha vida estava duplicado, aquela versão pequenininha de Jungkook que fizemos estava agora empenhado em vencê-lo com a arma secreta que eu revelei. Os joelhos de Jungkook foram enfraquecendo, o rosto foi avermelhando e ele riu tanto que perdeu as forças, desviando-se de Jungmi embaixo dele antes de virar e cair de barriga para cima, derrotado.
— Amor! — ele me censurou enquanto se recuperava e os gêmeos pulavam, comemorando a vitória. — Você não leu as regras do jogo?
— Eu li, mas elas eram chatíssimas. — larguei o tabuleiro e deitei no tapete junto com ele. — Então fizemos as nossas.
— E esqueceram de me avisar? — Jungkook fez um bico e juntou as sobrancelhas. Eu precisava admitir, era uma delícia vê-lo emburrado.
— Foi. — selei o beicinho. — Agora que já gastamos a energia das Coisas, vamos prepará-los para a cama, ok?
— Não. — Jungkook me devolveu o selinho e levantou-se, fazendo sua voz de monstro. — Eu vou prepará-los para o jantar! Venham aqui que eu vou cozinhar vocês dois! — e saiu correndo atrás dos nossos filhos pela sala.
Depois do jogo e de quase uma hora de cantoria para acalmar as crianças, Jungkook e eu estávamos no nosso quarto cumprindo a nossa rotina antes de dormir: eu, com um banho quente — que ele quase sempre invadia —, e ele, com alguma leitura rápida. Desliguei o chuveiro e procurei pela toalha, dando pulinhos para dispersar o frio e enxuguei o corpo diante do espelho, notando as mudanças que as minhas duas Coisinhas causaram nele. Os seios e os quadris estavam maiores, as pernas não respondiam mais tão facilmente ao balé que eu nunca deixei, mas Jungkook não se importava. Pelo contrário, me olhava com o mesmo desejo adolescente sempre que eu me trocava na frente dele.
— Feche a boca, lutador. — saí do banheiro e joguei a toalha no meu marido embasbacado. — Você já me viu fazer isso um milhão de vezes.
— E por que é que eu nunca me canso? — ele riu safado, me chamou com os dedos e bateu no próprio colo, indicando meu lugar.
Atendi prontamente ao convite, caminhando completamente nua e cheirando a óleo de banho para os braços dele. Jungkook, ao contrário de mim, não tinha mudado quase nada. Continuava lindo, com os olhos de jabuticaba mais maduros, os cabelos ondulados mais compridos e mais algumas tatuagens, entre elas o dia de nascimento dos gêmeos no peito descamisado. Os livros escolhidos antes da cama também eram uma constante: apoiado em dois travesseiros e vestindo um calção curto, meu J lia, com a cara mais séria e o cenho franzido, um encadernado dos Vingadores.
— Você está se adaptando bem aos óculos? — admirei Jungkook com as lentes prescritas para leitura, arrumando o cabelo dele. Não eram muito grossas, tampouco o grau era alarmante, mas eram, sem dúvida, uma marca do tempo naquele rosto tão lindo e que eu amava tanto.
— Quase não lembro que estou usando. — ele trocou o encadernado por mim, colocando-o sobre a cômoda e me ajeitando nas suas pernas. Jungkook tinha um carinho gostoso que ele fazia nas minhas coxas e me deixava borboleteando.
— Então você vai conseguir ver o que eu estou prestes a fazer sem eles? — perguntei sugestivamente enquanto espalhava beijos lentos pelo seu pescoço, pretendendo estendê-los por todo o corpo tatuado.
— Não preciso de olhos para te ver, . — Jungkook arrancou os óculos de si. — Eu te sei. Todinha, lembra? — suas mãos subiram pela minha cintura e meu busto.
Aquela era a nossa maior verdade. Ele me sabia. Ele era o toque certo, no lugar certo, sempre. Jungkook puxou meu cabelo levemente, inalando forte o perfume que ele adorava, e me deu um beijo apaixonado que me fez sacar na hora o que aconteceria a seguir. Alguns anos de casamento e dois filhos depois, as preliminares ficaram mais rápidas, mas tão gostosas quanto sempre foram. Encurtamos o caminho, mas o destino ainda era fabuloso e me fazia ver estrelinhas todas as vezes que ele fazia de mim o que eu era: dele.
As manhãs seguiam sua rotina doce na nossa casa grande e cheia, tão organizada quanto era possível por causa dos nossos mini moradores. Éramos um bom time, Jungkook e eu, e conduzíamos o lar como uma coreografia — às vezes, com passos precisos, às vezes com alguns fora de tempo ou para o lado errado, mas nunca sem deixar de dançar. Eu geralmente precisava de uns minutos e uns beijinhos a mais para conseguir tirar o Jungkook manhoso da cama, mas não daquela vez. Era aniversário de Jungho e Jungmi e criamos a tradição de acordá-los exatamente na hora em que vieram ao mundo, às 8:02. O pai das crianças ficava tão ansioso pela data que mal dormia na noite anterior, por isso, muito antes do horário do grande evento da nossa vida, já estávamos de pé na cozinha, arrumando as guloseimas preferidas dos gêmeos para o café da manhã.
— Pronto para acordar a gangue? — perguntei ao meu marido quando ele tomou o último gole da sua vitamina de banana.
— Eles é que têm que estar prontos para mim. Eu sou o líder dessa facção criminosa. — Jungkook limpou o bigode e rodou os ombros, dando soquinhos no ar e fazendo efeitos sonoros para eles.
— Pois vamos logo apresentá-los ao novo integrante da quadrilha. Digo, da família. — terminei minha salada e deixei as louças na pia.
Agora que Coisa 1 e Coisa 2 estavam completando 5 anos, decidimos atender a um desejo antigo depois de ponderar bastante e concluir que eles tinham idade apropriada para o presente que vinham pedindo. Entramos no quarto medindo os passos e sentamos no chão, no espaço entre as camas que eram quase rentes ao piso, escolha proposital para evitar acidentes e incentivar a independência deles. Jungmi dormia mais espalhada, o cabelo preto cheio de nós de tanto se mexer durante o sono, e Jungho ressonava fechado num casulinho, todo bochechudo. Eu quis chorar contemplando os meus dois pedacinhos ali, nos seus breves e marcantes cinco anos de existência, saudáveis, lindos e impossíveis.
— Parabéns pra você… — Jungkook e eu começamos juntos. Infelizmente para os aniversariantes, eu não era tão afinada quanto o pai deles, mas eu tinha parido aqueles dois. Era bom que se contentassem com a minha voz não muito angelical.
Os gêmeos se mexeram na cama, esperando as almas voltarem aos respectivos corpinhos. As carinhas acenderam conforme a ficha foi caindo e eles bateram palmas, pularam, nos abraçaram apertado… A bagunça já estava boa o suficiente até que o presente deles… latiu.
— O que tem nessa casinha? — Jungmi gritou a pergunta e juntou as mãos no coração.
Jungkook esticou-se para pegar a caixinha de transporte e cuidadosamente abriu a portinhola, tirando de lá de dentro um lindo filhote de Doberman vestido com uma roupinha listrada e com olhos lindos, enormes e curiosos, como os de todos naquela família.
— Um cachorrinho, Minnie! — Jungho constatou eufórico. — Nós ganhamos um cachorrinho!
— É o Jeon Bam! Ele chegou! — Jungmi correu para conhecer o novo amigo e foi seguida pelo irmão.
Os três filhotes — Jungho, Jungmi e Bam— gastaram tempo se reconhecendo e se cheirando, fuçando uns aos outros. Sorri apreciando a cena e pensando que agora eu tinha três para cuidar. Quatro, se eu contasse com meu marido, que também entrou na festa, brincando com o cachorro na mesma empolgação que as crianças. Bam já parecia à vontade, abanando o rabinho e ansioso por atender todos os comandos e gracinhas que Jungkook e os gêmeos sugeriam, todos ao mesmo tempo. Jungho colocou as duas mãos no rosto do pai, esquecendo de respirar entre as palavras, e fez uma promessa tão solene quanto conseguiu:
— Appa! Appa! Eu e a Minnie vamos cuidar muito dele! Gamsahabnida!
Ouvir Jungho agradecer em coreano fez uma das lágrimas que eu estava segurando escapar, tímida, discreta e quentinha. Jungkook fazia questão de ensinar a língua nativa aos nossos filhos e, não raro, eles diziam que me amavam com saranghae. Eu tinha um pouco de medo que eles avançassem na fluência ao ponto de eu não saber mais do que eles estavam falando, mas Jungkook me assegurou que o tal “idioma secreto” deles não seria usado para me esconder nada nem para acobertar nenhuma danação. Desconfiava bastante desse trato, é claro, mas a relação entre eles e sua herança coreana era tão bonita que eu jamais poderia me opor ao fato de eles aprenderem os costumes que, afinal de contas, faziam parte de quem eles eram.
— Omma! Eu amei muito! — Jungmi me deu um beijo morno na bochecha.
— Que bom, minha delicinha. Mas não esqueçam… — parei o discurso no meio para receber outro beijo, dessa vez de Jungho. — Um bichinho requer muita responsabilidade. Eu e o appa vamos ajudar, mas vocês é que precisam tomar conta do Bam, certo? — lembrei os dois, que balançaram as cabeças, assentindo.
Descemos para a cozinha naquela algazarra, houve vídeos, fotos, mais parabéns e foi uma verdadeira luta conseguir fazer os gêmeos comerem qualquer coisa, tamanha era a animação de ambos. Jungkook mostrou a eles a quantidade de comida que deveriam colocar na tigela do Bam e, com paciência e firmeza, explicou uma coisa ou outra sobre a atenção que um filhote exigia. A paternidade combinava com ele, as crianças sempre paravam para ouvi-lo e tinham um misto de admiração e encantamento quando o olhavam, como se ele fosse, genuinamente, o super-herói delas. Esperei Jungkook terminar de falar como era importante limpar bem as patinhas do Bam e me despedi da minha família para cuidar dos afazeres da festa de aniversário que decidimos fazer no dia seguinte, para aproveitar o final de semana. Ainda faltavam alguns doces e outras providências que eu resolveria com Dayse e Namjoon, a minha dupla salva-vidas. Ganhei vários carinhos antes de sair de casa e entrei no carro com um único pensamento.
Eu tinha mesmo escolhido o homem certo.
— Muito bem, amor. — Dayse apertou os braços do namorado quando Namjoon depositou as últimas sacolas no chão da nossa sala. — Você conseguiu não derrubar nad-
A frase foi interrompida por dezenas de continhas espalhadas pelo piso. Namjoon se atrapalhou e deixou o chaveiro de miçangas da Dayse cair e se partir em bolinhas coloridas e dois pedaços de acrílico que antes serviam de base para uma pequena foto dos dois.
— Falou cedo demais, Day. — suspirei. — Junta isso, Nam. Antes que os gêmeos apareçam e confundam com os M&M’s que vamos ter amanhã no aniversário deles.
— Oba! Vai ter M&M’s? — Jungkook pôs a cabeça no corredor com os olhos arregalados, enquanto Dayse estalou os dedos e apontou a bagunça que Namjoon apressou-se em arrumar.
Meu marido foi aumentando à minha frente conforme se aproximava e eu notei que, além da inseparável camisa cinza oversized — que apesar de larga ainda marcava o maravilhoso peito cada dia mais imenso — e a calça de moletom, Jungkook trazia fivelas de borboleta no cabelo e esmalte de glitter nas unhas. E em várias outras partes do corpo.
— Você está lindo. — elogiei quando ele me alcançou e me selou com os lábios doces e melados. — Surpresa de morango é mesmo a sua cor de batom.
— Ah, isso… — ele limpou o excesso no dorso da mão e riu tímido. — Jungmi queria brincar de salão de beleza.
— E você não sabe dizer não para ela. — estreitei os olhos.
— Nem eu, nem o Jungho. — ele sorriu largo. — É a vez dele ser atendido agora.
Jungkook começou a puxar as presilhas do cabelo, juntando-as numa concha na mão riscada. Assobiou longo e contínuo, bem alto, fazendo Namjoon e Dayse olharem na direção dele completamente confusos. Contei 15 segundos mentalmente e, de longe, pezinhos nervosos foram chegando mais perto e Minnie apareceu, vermelha por causa da corrida.
— Sim, appa? — ela prontamente se pôs ao lado do pai.
— Suas borboletinhas, princesa. — ele depositou as fivelas nas maõzinhas dela. — A omma amou o penteado que você fez, pode guardá-las agora, tá?
— Tá. Omma! — Jungmi sorriu e eu me agachei para beijá-la. Depois, ela abraçou Dayse e Namjoon.
— Meu amor, a tia Dayse e tio Namjoon compraram tudinho do jeito que você queria. — roçamos os narizes. — Faça o que o appa pediu e chame o seu irmão para agradecer, tá bem?
A pequena saiu dando pulinhos no lugar, cantarolando uma música inventada que dizia que “a tia Day e o tio Namu eram mais legais que dinossauros”. Era a obsessão dela no momento: braquiossauros, tiranossauros e outros tipos que ela aprendeu com o pai e eu não sabia identificar. Minnie e Jungkook ficavam ofendidíssimos quando eu me referia às miniaturas que eles colecionavam como “pescoçudinhos”, me corrigindo com termos científicos. Informação demais para a minha cabeça de mãe, que além de 36 preocupações diferentes, também precisava armazenar nomes de constelações, porque assim como a irmã, Jungho tinha achado seu campo de interesse e ele abrangia planetas, astronautas e tudo o mais relacionado ao universo. Felizmente para nós, os irmãos Jung convergiam num interesse em comum, que seria o tema da festa do dia seguinte: completamente doutrinados pelo meu marido, ambos eram fissurados no Homem-Aranha.
— Me expliquem o que aconteceu aqui. — Dayse pediu quando Jungmi sumiu casa a dentro. — Vocês instalaram um chip neles? Isso não é ilegal?
— Do que você está falando? — perguntei.
— A Minnie brotou aqui como se alguém tivesse chamado, mas eu não ouvi o nome dela. — Namjoon observou, terminando de reunir os restos do que uma vez foi um chaveiro.
— Mas eu assobiei, ué. — Jungkook explicou como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.
— E daí? — nosso casal de amigos desdenhou em conjunto. — Como é que você sabia que a Coisa certa ia aparecer?
Jungkook não respondeu, limitou-se a soprar de novo o ar prolongado num silvo que ecoou pelo ambiente todo e trouxe Jungho mais suado, mais vermelho e num intervalo de tempo menor do que a irmã:
— Tô indo, appa! — ele gritou do meio do caminho.
— Que bruxaria é essa? — Dayse indignou-se. — Você adestrou cada um numa frequência?
— Eu também não entendo. — dei de ombros. — Eu só sei que funciona.
Jungmi apareceu novamente, mesmo sem assobio, e foi xeretar as sacolas com os doces, anunciando as novidades ao irmão. Eles reconheciam as embalagens, mas estavam aprendendo também a juntar as letras e a fazer as primeiras leituras intuitivas, familiarizando-se com os nomes escritos nos chocolates e outras coisas que eles consumiam em ocasiões especiais como aquela. No entanto, não demorou muito até eles se estranharem e começarem a brigar pela mesma coisa.
— Os gêmeos estão com defeito. — constatei ao ver os dois pequenos se empurrando por causa de um pacote de balas. — Nós precisamos de filhos novos.
— Se você quiser aproveitar o Namjoon e a Dayse de babá, a gente pode tentar fazer um bebê agora mesmo. — Jungkook cochichou no meu ouvido e me puxou pela cintura.
— Como? — Jungmi desistiu de lutar com o irmão para prestar atenção no nosso diálogo.
— Como o que, meu amor? — perguntei, me encaixando no abraço de Jungkook.
— Vocês disseram que iam fazer um bebê. — ela repetiu naturalmente e Jungho chegou na conversa. — Como se faz um?
Céus. A fase das perguntas.
— Te vira, super-appa! — soltei meu marido e dei dois tapinhas no peito dele.
Jungkook tossiu. Gaguejou. Coçou a nuca. E depois de articular palavras e tentar formar frases, apelou para o padrinho das crianças.
— O tio Namjoon! — ele estalou os dedos e apontou o amigo. — O tio Namjoon e o seu QI de 148 pontos com certeza têm uma resposta adequada para isso!
— M-mas é claro… — Namjoon desbotou e imediatamente começou a mover as mãos, como fazia sempre que qualquer explicação lhe era exigida. — Ahn… Bom, quando a mamãe e o papai se amam de verdade, o papai coloca sementinhas na mamãe.
— Que tipo de sementes? — Jungho interrompeu, sentando-se na frente do tio e usando os pezinhos de almofada. Jungmi fez o mesmo.
— Er… — Namjoon olhou Dayse como um pedido de socorro e depois chacoalhou a cabeça, acomodando um pensamento que tinha acabado de surgir. — Sementinhas especiais que fazem o bebê crescer na barriga da mamãe. Como um Pokémon evoluindo dentro da pokebola!
— Por isso que a mamãe fica barriguda e redonda? — Minnie quis saber.
— Isso! — Namjoon respirou visivelmente aliviado, tornando a ter o tom caramelado da pele. — Exatamente isso!
A mais nova parecia convencida, mas Jungho tinha uma ruguinha na testa.
— Você e a tia Dayse se amam? — ele perguntou.
— Sim. — Namjoon fitou a namorada rapidamente e sorriu para ela. — Muito.
— Então por que vocês não têm um bebê?
Foi a vez de Namjoon tossir. Gaguejar. Coçar a nuca.
— Porque, meus pimpolhos… — Dayse resolveu salvar o namorado. — Eu quero casar antes de ter bebês e o seu tio Namjoon ainda não me deu nenhum anel.
— Tia Day! — Jungho pulou como se os fiozinhos em sua cabeça tivessem batido um no outro e chocado uma ideia que o fez esquecer o papo dos bebês. — Eu fiz um desenho dos anéis de saturno! Você quer ver?
— Claro que eu quero, lindo. Vem com a gente, Minnie. — Dayse tomou os dois pela mão e lançou um olhar ameaçador para Namjoon. — Pokémon na pokebola, Kim? Francamente. — e saiu resmungando.
— Salvo pelo desenho do Coisa 1! — Jungkook caçoou do amigo. — Hyung, cá entre nós, está passando da hora. Faz dias que você tem o anel, agiliza logo esse pedido!
— Eu sei. — Namjoon sorriu tranquilo. — Eu já falei com o responsável pelo planetário lá no museu, ele disse que vai fechá-lo só para mim e a Day quando eu quiser.
— E o que você está esperando? — empurrei o ombro dele.
— Nada. Só é divertido irritá-la. Ela fica linda. — Namjoon cutucou as próprias covinhas.
— Vai brincando de irritar Dayse Moonson que em breve nós vamos comparecer a outro evento com você num terno. O seu velório. — ameacei.
— Falando em terno… — Jungkook torceu o bico e ensaiou uma careta me mostrando o visor do celular e a chamada recebida. — Eu tenho que atender esse almofadinha. Já volto.
Ri para dentro ao ver quem estava ligando. O destino se encarregou de colocar um antigo batedor de volta na nossa vida quando a Kim Enterprises estabeleceu uma filial em Nova York. Kim Taehyung visitava o empreendimento anualmente e, como os pais dele e de Jungkook eram amigos de longa data, o encontro em que os dois selaram as pazes continuou se repetindo sempre que ele vinha para a cidade. A amizade improvável acabou se consolidando, mas eu não me espantei que eles tivessem começado a se dar bem de um tempo para cá. Taehyung estava tão feliz e realizado quanto nós ao lado da linda esposa, Kim Yuna, também sua CMO, e de alguém que estávamos loucos para conhecer.
— Eles vêm mesmo para a festa amanhã? — Namjoon perguntou.
— Vêm. E foi o Jungkook mesmo que convidou, acredita? — sorri com o canto da boca.
— E não é mesmo que eles ficaram amigos! Eu ainda custo a entender. — Namjoon encostou-se no balcão americano no lado oposto ao que eu estava.
— Você está é com ciúmes do seu amigo, Nam. — acusei, oferecendo uma bebida. — Já faz uma vida toda desde aquela confusão, Jungkook e Taehyung se adoram agora.
— Como você sabe? — ele aceitou o kombucha, mas teve dificuldades para abrir.
— Digamos que eu já ouvi ele chamá-lo de… como é mesmo que vocês falam? — molhei a língua com a palavra vindo na pontinha. — Taehyung-ssi?
— Ele não faz isso! — Namjoon trincou o queixo, ultrajado.
— Por que você acha que ele não quis atender na sua frente? — respondi, percebendo que ele havia perdido para a garrafa e fazendo as honras por ele.
— “Taehyung-ssi”… — Namjoon repetiu com desdém antes de dar um gole. — É como se trata um amigo próximo, mas eu não tô nem aí. Na verdade, é louvável essa atitude. — ele começou a mexer as mãos novamente, “professorando” para disfarçar o ciúme. — Nós, enquanto sociedade, precisamos aceitar nosso passado e aprender com ele. Tem uma pintura lá no museu que…
— Desculpa, “Namjoon-ssi”, mas eu vou te deixar falando sozinho agora. — interrompi, fingindo um bocejo e os dois rimos.
No dia da festa, nosso time estava todo escalado para entrar em campo e fazer com que os 5 anos do Coisa 1 e da Coisa 2 fossem um acontecimento perfeito e memorável para eles. Jungkook e eu estávamos a caminho da nossa última e crucial tarefa da lista: buscar uma das atrações principais, o bolo.
A Suga, confeitaria recém-descoberta por mim e meu marido, era a alternativa ideal para o bolo dos gêmeos, empreitada que envolvia recheio de sorvete, camadas de chocolate e o Homem-Aranha. Dona Aurora, nossa primeira opção, julgou que o projeto era muito engenhoso e superava a sua especialidade em doces caseiros, nos deixando como indicação a chef emergente no mercado, Lana Campbell — com quem eu, óbvio, rapidamente fiz amizade. As duas borboletinhas sociais que éramos logo acharam afinidades e outros tópicos para conversa além do fantástico bolo dos sonhos de Jungho e Jungmi. E um desses assuntos era o fato de que ambas amávamos homens coreanos.
— Lana! É a ! — anunciei do balcão vazio para minha mais recente amiga, que havia concordado em abrir mais cedo apenas para pegarmos nossa encomenda.
— Um minuto, dona bailarina! — ela gritou de volta da cozinha.
Jungkook não demorou muito para ficar entediado: batia os dedos no vidro, usando a aliança para marcar o ritmo das batucadas, e logo achou uma música para soltar a voz e preencher o silêncio do local. Ele cantava o tempo todo em casa, era a nossa “artilharia pesada” contra as crianças, mas eu ainda me via encantada com a voz doce e o timbre aveludado, perfeitamente modulado em todas as notas que ele arriscava. Ficava feito boba usufruindo do meu privilégio de ouvir aquele dom tão de pertinho. Tão só pra mim.
— Tudo. Você é excelente em tudo! — constatei com um bico que Jungkook desmanchou com um beijo.
— Olá, casal Jeon! — Lana surgiu ligeiramente despenteada, com o rosto vermelho e metade do batom faltando. Mas o bolo estava intacto. E belíssimo. — Aqui está. Coloque na geladeira e só tire quando for servir, tá bem? — ela orientou. — Ou o sorvete vai derreter e esse Homem-Aranha vai ficar flutuando numa sopa de mingau.
— Amor, quem tava can… tando? — um rapaz branco como eu nunca tinha visto na vida apareceu atrás dela, arregalando os olhos rasgados quando percebeu que ainda havia gente ali. Eu e Jungkook apenas rimos, porque os lábios rosados dele deixaram bem claro onde o batom de Lana tinha ido parar.
— Ele. — Lana apontou o cantor em questão. — Amor, esses são o Jungkook e a . — ela nos apresentou e apertamos as mãos. — O gatinho curioso aqui é meu namorado, Min Yoongi.
— É um prazer conhecê-los. — ele se deu conta de que ainda estava segurando a mão do meu marido. — Você tem uma bela voz. Já pensou em gravar uma demo?
— Eu? — os olhos cor de âmbar cresceram. — Num estúdio e tudo o mais? Imagina. — Jungkook sorriu, tímido, balançando a cabeça e me procurando para um abraço lateral. — Eu só canto para a minha esposa. E para os gêmeos.
— Bom, se você funciona com gêmeos, eu tenho um. — Yoongi riu com dentes curtos. — Posso ir buscá-lo lá em Daegu.
— Não liguem para o Yoongi. — Lana interrompeu, arrumando os fios soltos do coque dele. — Ele é produtor e é movido a música. Mais um agudo daqueles, Jungkook, e ele te escreve uma agora mesmo.
— Eu só preciso do meu bloco de folhas amarelas. — Yoongi concordou, puxando a namorada para si. — E da minha Lana.
— Prometo pensar com carinho se você me ajudar a levar esse negócio para o carro. — Jungkook estudou o bolo e Yoongi se prontificou em auxiliá-lo.
O bolo balançou a viagem toda e meu coração vinha na boca a cada curva, mas conseguimos a façanha de transportá-lo inteirinho até o grande quintal da nossa casa, onde a festa já estava toda montada. Os brinquedos, os doces, a decoração, tudo já estava lá. Aliás, tudo menos os gêmeos, que estavam no andar de cima com a avó. Quando soube que os dois estavam prontos e ocupados com o Bam, resolvi me aproveitar da vovó Jeon para tomar um banho, fazer uma maquiagem e trocar minha calça jeans e camiseta por uma roupa mais digna da celebração da vida dos meus filhos.
— Eu vou me aprontar num minuto. — avisei Jungkook com um abraço por trás e um beijo na nuca. — Daqui a pouco vai começar a chegar gente, recebe todo mundo que eu já venho te salvar, tá bem?
— Não demora. — ele se arrepiou com meu outro beijo, agora no 7 tatuado atrás da orelha e à mostra pelo rabo de cavalo. — Você é cota sociável de nós dois. E eu também preciso me arrumar e ficar bonitão. — ele sacudiu a própria camiseta.
— Você é um bonitão. — ele me virou e eu ganhei um selar. — E eu te amo.
O vestido que eu escolhi já estava separado e engomado em cima da cama, eu só precisava pensar num par de sapatos que aguentasse o tranco sem maltratar meus pés. Fui para o banho levemente preocupada quando não vi a roupa de Jungkook pronta da mesma forma, mas fiz uma varredura mental e lembrei que todas as camisas sociais dele estavam passadas, então ele provavelmente escolheria alguma no closet e me apareceria lindo cheiroso como de costume em menos de 15 minutos. Depois de arrumada, desci com Jungho e Jungmi e encontramos alguns convidados, entre eles um sorriso quadrado ao lado de um tão quadradinho quanto.
— Tio Taetae! Tia Yuna! — as crianças correram para abraçar o casal.
Yuna sorriu largo ao me ver, fazendo de longe um “joinha” para o meu vestido. Ao menos alguém havia notado a minha produção, porque Jungkook e Taehyung estavam ocupados tentando equilibrar o ataque dos gêmeos. Ela continuava linda e elegante e, graças ao seu trabalho, que exigia proficiência em inglês, conseguíamos conversar sempre que nos víamos. Algumas pessoas achariam estranho ser amiga da atual do seu ex, mas não era o nosso caso. Yuna sabia que eu não representava ameaça alguma, tanto por ser perfeitamente segura de si e do amor de Taehyung — visível e incontestável no modo apaixonado como ele olhava para ela — quanto por entender que o que tivemos há muitos anos foi apenas uma curva que precisava acontecer para que estivéssemos todos ali naquele momento. A presença e a amizade dos Kim eram uma grata surpresa dos reveses da vida para nós.
— Oi, Yuna! Que bom que vocês vieram! — a abracei rapidamente e pus a mão nas costinhas da bebê em seu colo. — E essa gostosura?
— Ei, Taya! — Yuna sussurrou para a filha, beijando o cabelinho dela. — Meu amor, tem alguém aqui querendo te conhecer!
A neném de olhinhos diferentes me encarou meio atônita, talvez porque seu um aninho de vida já fosse o suficiente para fazê-la estranhar aquela língua diferente da que ele ouvia em casa, e decidiu que o melhor a fazer era deitar a cabeça no peito da mãe e se aconchegar nela. Ele estava com um vestido enorme, cheio de babados, um meião branco com sapatos de lacinho e a chupeta tinha o formato de um urso. Taehyung contemplou esposa e filha com o sorriso iluminando-se ainda mais:
— Não é a coisa mais linda do mundo? — o papai coruja me perguntou depois de me abraçar.
— É sim! — fiz uma gracinha para a boneca e ganhei uma gargalhada atravessada na chupeta. — A Taya é a mãe toda! — concordei, acrescentando Yuna no elogio.
— Agora eu tenho duas mimadinhas. — Tae acariciou o rosto da esposa com uma mão e a cabeça da bebê com a outra.
— Essa menina ainda nem fala e já faz o que quer de você, senhor Kim. — Yuna levantou Taya e aproximou o nariz do bumbum dela. — Oh-oh… Temos uma situação aqui.
— Opa! Código marrom! — Tae pegou a pequena no colo, fazendo voz de bebê para conversar com ela. — O appa resolve isso rapidinho, não é, princesa? Aliás, onde eu posso resolver isso, Jungkook-ah?
— Lá em cima, no quarto do Coisa 1 e da Coisa 2. — Jungkook tirou a bolsa de Taya que estava nos ombros de Taehyung e colocou sobre os seus. — Eu te levo até lá, também estou precisando me trocar, não é, Taya? — ele brincou com o nariz da bebê.
Yuna e eu dividimos um olhar e um riso abafado. Aquele bromance entre nossos maridos era algo que nenhuma de nós poderia prever. No entanto, a intimidade crescente dos TaeKook não era a única coisa incomum naquela noite: Jungkook tinha subido para se vestir, mas já fazia mais de uma hora e ele não tinha voltado. Taehyung desceu sozinho e não sabia dele, assim como Dayse e Namjoon, e não havia sinal do meu lutador pela casa. Já aflita, fui até a área em que armamos os brinquedos infláveis para procurar.
Claro. Como eu não pensei nisso antes?
— Jungho! — Jungkook gritou energicamente, metido na bendita roupa de Homem-Aranha e segurando uma das pistolas d’água que eu havia alugado para as crianças. — Eu sei onde a Minnie se escondeu! Vamos até lá e você me dá cobertura!
— Amor… — chamei mais alto e ele tirou a máscara para me ouvir. — O que rolou aqui? — circulei a figura dele no ar.
— Você me disse para colocar minha melhor roupa. — ele se aproximou, vermelho e ofegante, deixando a língua escapar da boca para brincar com o piercing que não existia mais. O primeiro puxão da Jungmi na joia quase trouxe o lábio dele junto e, desde então, era uma vez a charmosa argolinha. — Essa é a minha melhor roupa.
— Eu esqueci de dizer que era a sua melhor roupa de adulto, Spiderkook. — balancei a cabeça para ele, sem conseguir evitar achar fofo. Jungkook seria para sempre o meu menino.
— Isso aqui ficou incrível, ! No meu aniversário, eu vou querer exatamente igual! — ele riu franzindo o nariz. — Hoje é o melhor dia da minha vida!
— Melhor que o dia do nosso casamento? — cruzei os braços e ergui uma sobrancelha.
— Você não me deixou casar vestido de Homem-Aranha! — meu marido fez um bico que evidenciou o buraquinho da joia e eu não resisti, puxando-o para um beijo.
A festa correu perfeitamente bem, as crianças tinham várias atividades à disposição para gastar toda a energia acumulada pelo açúcar e os pais estavam mais do que satisfeitos em ver os pequenos se divertindo e se cansando, o que certamente lhes garantiria uma noite inteira de sono — algo que aprendemos a supervalorizar depois de colocar aquelas pestinhas no mundo. Dispensei os últimos convidados e Namjoon os acompanhou do nosso quintal até o portão principal. Era um dos motivos pelos quais queríamos uma casa grande e espaçosa com uma área verde: realizar as festas de aniversário, os piqueniques, as noites na casa da árvore e tudo o mais que nos desse na telha.
Dayse comandava o desmonte da decoração com a sua habilidade de organização única, dando direções aos carregadores, contando os itens, encaixotando os mais delicados e dando um grito ou outro entre as ações. Terminei de dobrar as toalhas das mesas e ouvi um rangido de molas acompanhado de gargalhadas estridentes. Segui o som e tive um mini-infarto quando vi dois pezinhos agitados e um corpinho pequeno que tinha pulado tão alto que passava da rede de segurança da cama elástica.
— Me diz que aquilo voando ali não é um dos meus filhos. — implorei para a minha amiga.
— Não é só um dos seus filhos, são os dois. — Dayse respondeu. — E o seu marido também.
Respirei fundo e fui caminhando até o trio de terroristas ainda com taquicardia, deixando os sapatos pelo meio do caminho. A grama geladinha e úmida era como uma massagem nos meus pés cansados e, ao colocar os olhos em Jungkook, Jungmi e Jungho completamente esbaforidos de tanto pular, amontoados um no outro, esqueci a bronca que eu ia dar e simplesmente sorri.
— Omma! — Jungmi chamou quando me viu. Os pitós já tinham ido embora há horas. — Eu tô com fome!
— Eu também! — Jungho emendou.
— E eu quero vomitar. — Jungkook confessou, apertando a barriga e fazendo uma careta.
— Nisso que dá se entupir de doce e vir fazer acrobacias numa cama elástica, Jeon. Fiquei tão preocupada com esses dois comendo porcaria que esqueci de vigiar você! — subi os degraus de alumínio que davam acesso à cama e sentei na borda para ajudar os gêmeos a descerem. — Jantar, banho e cama. — ordenei aos pequenos. — E você… — selei os lábios do meu marido suado. — Ajude o Coisa 1 e a Coisa 2 enquanto eu cuido de arrumar tudo aqui fora.
— E depois você cuida de mim? — ele pediu, brilhando os olhos pretos.
— Se você prometer não colocar mais duas pessoinhas no meu útero, eu cuido. — desgrudei a franja dele da testa e ele riu.
Entrei para checar Bam no seu cercadinho e me certificar de que os gêmeos, mesmo no meio de uma festa, lembraram-se de encher a sua tigela e trocar a sua água. O membro da família Jeon que me dava menos trabalho já estava alimentado e dormindo com a linguinha aparecendo entre as pequenas presas. Jungkook foi cuidar dos afazeres que eu lhe tinha atribuído e, algumas horas depois, enfim dei a festa por encerrada. Eu estava exausta, mas feliz. E também muito agradecida pela ajuda dos meus padrinhos mágicos, os DayJoon.
— Agora, só ano que vem. — suspirei enquanto Dayse pegava a chave do carro.
— Pode contar com a gente! — Namjoon prontificou-se e Dayse me deu um meio abraço, cansada demais até para falar.
Tranquei a porta, liguei os alarmes e, ao passar pela cozinha, vi pratos na pia. Os gêmeos tinham jantado, sinal de que uma das missões foi cumprida. Subi para o quarto de Jungho e Minnie e encontrei pai e filhos capotados em uma das camas. O meu menino estava com a calça do pijama ao contrário e a minha garotinha só vestia uma das meias. Jungkook, por sua vez, deveria ter conseguido cinco minutinhos livres e tomado uma ducha, porque cheirava a sabonete e o cabelo molhado estava despenteado. Os três dormiam gostoso. E os três de boca aberta.
— Ei, Spiderkook… — soprei no ouvido dele, fazendo um carinho nas costas nuas. A primeira coisa que ele fez ao abrir os olhos, sonolento, foi procurar por Jungmi e Jungho. A segunda foi sorrir preguiçosamente quando me encontrou. — Tudo bem aí?
— Eu tô bem porque… Eu sou o JK.— ele balbuciou, bêbado de sono. — E eu amo os meus filhos e o meu você.
— Meu você? — perguntei risonha para o sonâmbulo.
— É, o meu você. — ele confirmou, apertando minha mão.
— Então vem pra cama, vem. O “meu você” precisa de um travesseiro. — beijei o peitoral dele quando ele se virou.
— Noona… — ele me chamou, meio dormindo. — Eles estão crescendo. O que a gente vai fazer?
Cobri os gêmeos, deixando um beijo em cada e guardando o último para o meu marido.
— Vamos fazer o que sempre fizemos, amor. Tentar equilibrar esse arabesque.
Yoongi fez um gesto através do vidro da cabine com isolamento acústico. Tirei os headphones e estreitei os olhos, tentando ver sem meus óculos — que eu tinha esquecido em casa — o que ele estava tentando me dizer. Ele estava com o polegar para cima e me chamava para fora.
— Você é um gênio. — ele disparou assim que eu saí. —Está muito bom, mas podemos inserir alguns adlibs no refrão e regravar algumas partes. Acho que a ponte consegue sair ainda melhor. Você quer ouvir? — ele me perguntou, fazendo anotações e apertando botões na mesa de som.
— Não vai ser esquisito? Eu nunca me ouvi antes… — sentei ao lado dele e apertei os joelhos, sem saber ao certo como me comportar num estúdio de música. Tudo ali parecia caro demais e eu tinha medo até de respirar errado e quebrar alguma coisa.
— Um pouco. Mas como você vai cantar ao vivo usando o meu arranjo de base, é bom que você ouça antes. — ele parou o que estava fazendo para me encarar, falando num bico enorme e parecendo indignado. — Como você pegou o tempo tão rápido? Essa é a primeira gravação e você já se saiu tão bem assim?
— Você parece a minha mulher falando… — ri anasalado. — tem raiva que eu seja “bom em tudo”. — fiz o sinal das aspas.
— Depois dessa música que você escreveu, ela nunca mais vai ter raiva de você. — Yoongi mostrou as gengivas. — Já tem um título?
— My You. — respondi, sorrindo.
Não lembro de um só dia da minha vida em que não estivesse. Ela sempre foi a minha melhor amiga, o meu perfume preferido, o meu abraço mais gostoso, a minha parte doce. Eu sentia que o infinito era pouco tempo para agradecer pela existência daquela mulher, então, no nosso aniversário de casamento, eu pretendia eternizar o meu amor por ela nos versos que eu escrevi e Yoongi ajudou a musicar. Ele também tinha me emprestado um microfone modulado especialmente para o meu tom de voz e uma caixa de som pequena. Assim, quando entrou na nossa sala lotada de velas aromáticas — estranhando, a princípio, a iluminação romântica e o fato de haver três acendedores automáticos para tal —, eu não perdi tempo e soltei o playback (e a voz).
All these times are precious due to you
Four seasons have passed with you
Four scents were left ‘cause of you
piscou devagarinho, sorrindo, e foi se enfiando cada vez mais no cômodo cheio de música com cara de quem queria chorar. Estendi a mão livre que ela aceitou, trêmula, e continuei cantando a letra que eu fiz só para ela:
All the reasons why I sing this song
Thankful to be by your side now
I'll try to shine brighter than now
On a starry night
Hope my you sleep tight
— Meu você. — repetiu prendendo o lábio inferior com os dentes e derramando uma lágrima fininha que eu enxuguei antes que ela chegasse ao queixo. Selei seus lábios demoradamente, aninhando-a no meu peito, mas ela se sacudiu de repente ao lembrar de algo. — Espera aí! Onde estão os gêmeos?
— Para que eles não nos perturbassem… — voltei a guardá-la no meu abraço. — …eu cozinhei os dois. Esse cheiro de assado que você está sentindo é o Jungho. Jungmi é a sobremesa.
socou meu peito de leve, enquanto meus pés nos guiavam timidamente para uma dança. Parecia o certo a se fazer quando ela estava nos meus braços: dançar.
— As Coisas estão com meus pais, boba. — afundei o nariz no cabelo dela. — Temos a casa inteirinha só pra nós. — abri os braços, evidenciando as pétalas de rosa pelo chão.
— Você arrumou tudo! — manteve-se agarrada na minha cintura. — Igual ao dia em que você me pediu em casamento! — ela levantou o rostinho. — E essa música, J? É a mais linda que eu já ouvi!
— Minhas palavras, notas do Yoongi. — beijei a testa dela. — Você gostou?
— Eu amei. E vou amar ainda mais quando você cantar de novo, dessa vez no meu ouvido.
Reiniciei a música, colocando uma das mãos da no meu ombro e segurando a outra na posição de uma valsa. Cantei tudo outra vez, confundindo algumas estrofes, o que fez ela rir e deixar a melodia ainda mais linda. Eu cantaria quantas vezes mais ela quisesse, desde que ela pedisse como estava pedindo ali, intercalando os versos com beijos e sussurros em que me jurava amor eterno. Depois de repetir o refrão olhando em seus olhos cor de mel, emendei, por fim, as últimas palavras num voto que eu deixei no ouvido dela:
— Nós nunca vamos parar de dançar, minha . Eu prometo.
Fim!
Nota da autora: Para você, meu arabesquinho que não resiste a uma dieta sem açúcar, aqui está uma shotzinha para adoçar seu coração!
Nota da Scripter: É sempre um prazer scriptar fic sua, Ilane! Obrigada por mais essa oportunidade <3
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