Última atualização: 28/12/2017

Prólogo

Lucy não conseguia reprimir suas lagrimas naquele momento, havia adiado a verdade por tanto tempo que agora parecia tão certo continuar assim. Mas sabia que não poderia alimentar a mentira, não mais. Havia chegado ao limite, assim como ele. O homem a sua frente era completamente diferente de quem ele habituava ser, ela não poderia o culpar por isso, havia o transformado naquilo e precisava pagar por preencher o seu coração de odiosidade. O horror estava estampado em seus olhos, sua respiração era célere e falha, a verdade não deveria doer tanto, não é mesmo? Mas ainda assim corroía cada fragmento do seu corpo. Ele estava no seu cume da alienação e estava preste e cometer o maior erro da sua vida, que no momento, parecia à coisa certa a se fazer. Os olhos delas se arregalaram ao ver a arma apontada novamente sobre seu coração.
- Não, por favor! – ela suplicou entre sussurros.
- Eu vou destruir o seu coração, assim como fez com o meu.
O barulho se espalhou por todo o galpão e no instante seguinte ela era apenas um corpo frio atirado no chão e ele era um homem vingado.



Capítulo 1 - Memórias.

Agachei-me com cuidado depositando na lápide as flores preferidas dela, sem ao menos perceber uma lágrima foi junto, e depois mais uma e então eu já não conseguia mais contá-las. Era inevitável não chorar todas as vezes que vinha visitá-la, tendo que me lembrar de tudo que passou. Que passamos. Limpei inutilmente algumas lágrimas com a palma de minha mão e com a mesma passei por cima de seu nome bem desenhado. ‘Lucy Benette’ disse em meio aos soluços e então já não conseguindo me aguentar firme, me sentei ao chão.
- Oi Mamãe, como à senhora está? – disse sentindo minha voz oscilar. – Se te serve de consolo não estou muito diferente de você. – acariciei a sua foto preta e branca e então me permiti sorrir um pouco. Lembrar que nem tudo foi só dor era bom em momentos como esse. – Eu só queria que soubesse que você venceu, estou indo para Manhattan para recomeçar. O John me matriculou em uma dessas escolas para esnobes que eu sempre detestei, disse que depois que eu me formar vou ter a minha própria casa, como a gente sempre sonhou e eu só preciso me dar bem com minhas notas. – sorri novamente me lembrando dos nossos planos em comprar uma casa longe daquele lugar onde chamávamos de lar. – Também quero que saiba que isso não é uma despedida, eu vou sempre te levar comigo, onde quer que eu vá. E eu vou visitá-la sempre que eu puder, eu prometo. – novamente eu estava começando a chorar. Eu nunca tinha ficado tão longe dela como agora.
E então um vento forte passou por mim espalhando algumas pétalas e trazendo algumas folhas secas. Olhei para o céu sorrindo para mim mesma sabendo que de alguma forma, ela estava feliz em me ver parti.
– Eu também te amo.


DOIS ANOS DEPOIS:


- Pai, olha o que eu fiz pra você. – Brooke deixou de lado seu lápis de colorir e se levantou levando consigo seu desenho. Era um trabalho de escola, mas havia horas que Brooke tentava o aperfeiçoar, ela queria mostrar ao pai o quanto amava sua família, mesmo com todos os desentendimentos.
- Pra mim, pequena? Que lindo! – Thiago desistiu de acender o seu cigarro para dar atenção a sua princesa. Colocou Brooke em seu colo analisando o desenho. – Quem são?
- Eu, você, a mamãe e o Charlie – apontou para o cachorro em seu desenho.
- Olha, nós temos um cachorro!!! – Thiago fingiu surpresa enquanto via Brooke esconder um sorriso. – E ele fala. – notou um balão no desenho
- Mamãe disse que se eu for bem na escola, nós podemos adotar um.
- É mesmo?
- A-ham – Brooklyn assentiu olhando seu pai. – Ela também disse que se adotarmos um cachorro talvez nós vamos parecer uma família de verdade. – Pode ser que para uma criança de nove anos, essa frase não surta tanto efeito quando surtiu para Thiago. Afinal, o que havia de errado com Lucy? Ela precisava dizer umas coisas dessas na frente de Brooklyn. Precisava mesmo levar isso para o lado pessoal, aquilo era a gota d’água. Thiago de modo gentil retirou Brooklyn de seu colo e a mesma o olhou confusa vendo seu pai ir para o hall da cozinha. Ela não deu muita importância ao fato até ouvir seus pais debaterem. A cada grito, Brooklyn se arrepiava, suas lágrimas tinham vida própria e já manchavam todo o desenho o transformando em um grande e feio borrão colorido. Ouviu a porta se fechar atrás de si e então seus olhos correram até seu pai que estava entrando na sala novamente. Thiago andou até sua menina se agachando e a olhando com brandura, seus olhos varreram até o desenho e então sentiu uma culpa enorme em si. Brooklyn não precisava estar no meio de tudo aquilo, não merecia sofrer com a inconsequência dos pais.
- Escuta princesa, nós precisamos conversar. – limpou algumas lágrimas de Brooke. – Às vezes, quando um casal se ama muito pode haver um pequeno desentendimento, e talvez eles precisem ficar um tempo afastados um do outro. – Brooke virou seu rosto para seu desenho e começou a rabiscar algo que não sabia o que. Thiago não sabia como iria contar para sua menina que sairia de casa, nem ao menos sabia como deixaria o seu maior tesouro. Mas levar Brooklyn com ele só teria mais problemas. Por Deus como ele a queria, mas ela deveria ficar com a mãe, pelo menos até ele estiver estabilizado e com recursos para dar a ela uma vida de princesa. – O papai vai fazer uma viagem e não sabe quando volta.
- Você não vai voltar. – Brooklyn deixou as palavras que tanto lhe doíam sair pelos lábios. – Mas se é isso que você quer papai, eu vou com você. – Brooklyn se levantou ajeitando o vestido e olhando para seu pai decididamente dos seus atos. Ela amava sua mãe, mesmo, mas Lucy tinha seus vizinhos que eram um amor, além da avó de Brooklyn que basicamente moravam com eles. No entanto, Thiago só tinha a ela. Há onze anos quando Lucy engravidou ele havia deixado sua cidade natal para fazer sua própria família. Meses depois seus pais faleceram em um acidente de carro e por ser filho único não tinha ninguém para se apoiar a não ser em Lucy. Brooke sabia que seu pai ficaria sozinho por ai, e ela não permitiria que isso acontecesse. Thiago sorriu abraçando sua menina, tendo certeza naquele momento que tinha criado a melhor filha do mundo.
- Muito bem, arrume suas coisas!
Memórias Off:


- Brooke?
John me trouxe de volta a realidade e estava um charme. Todo engomadinho e descabelado. Coloquei meu livro sobre a mesinha do centro e me levantei.
- Ai meu Deus, será que você sair casado desse evento hoje? – andei até ele ajeitando sua gravata.
- Estou com os dedos cruzados. – disse e cruzou os dedos.
- Eu tenho mesmo que ir? – fiz minha melhor expressão de cansada.
- Você sabe que sim, vou fechar um negócio importante hoje.
Apenas suspirei e depositei as mãos na minha cintura, ele ficou me analisando atentamente.
- O que foi?
- Você estava viajando, são efeitos desses livros que você não larga? – andou até o armário tirando um vinho branco de lá. Mas não me pergunte o nome por que eu não entendo de bebidas.
Inspirei todo ar possível.
- Na verdade estava pensando no Thiago e na Lucy. – John engasgou ao me escutar, sabia que aquele assunto o deixava desconfortável. – Você sabe o que aconteceu, não sabe? Por que eles brigavam tanto? – tentei mais uma vez arrancar informações dele.
- Eu já te disse tudo que eu sei. – deixou seu copo sobre a bancada e se afastou me dando as costas.
- Você tem que se lembrar de alguma coisa, qualquer coisa. – implorei ao segui-lo.
- Brooklyn, por mais próximo que eu fosse dos seus pais, eles mantinham as aparências perto de terceiros, sempre pareciam felizes e de bem com a vida que levavam. Foi uma surpresa quando soube que Thiago havia abandonado vocês, tentei falar com ele, mas não tive sucesso, e sua mãe... – se virou pra mim.
- Minha mãe?
Ele negou.
- Você se parece tanto com ela.
- O que mais me assusta são essas lembranças confusas e fora de ordem que chegam pra mim do nada. Me confundem e eu fico sem saber o que pensar, ou reagir.
- Você ouviu o que Mariah te disse varias e varias vezes, ainda está apegada ao seu passado. Você não conseguiu seguir em frente. Está assustada com a partida do seu pai, a morte da sua mãe, os maus tratos do Willy.
Willy... Só de ouvir aquele nome eu me arrepiava. Os piores momentos da minha vida vinham como pesadelos na noite, e eu não conseguia escapar.
- Você está segura agora. – ele me trouxe a realidade de novo me puxando para um abraço, senti seu carinho por mim. - Tudo isso passou e você precisa seguir em frente.
- Eu sei. – me soltei do seu abraço forçando um sorriso. – Preciso me arrumar. – dei uma sacudida em meu corpo para tentar espantar a tristeza que me cercou.
- O que? Não vai de calça jeans e camiseta? Estou chocado! – riu de mim.
- Às vezes eu tenho que fazer certos esforços.
- Encontro você lá? – ajeitou as mangas da camisa social por baixo do blazer.
- Claro, vou dar uma passada na casa da Emma, ela já deve estar me esperando.


Hoje era o último dia de férias, semana que vem às aulas voltariam e logo estaria terminando meu último ano na Trinity School e então entraria na faculdade. Se mamãe pudesse me ver agora, eu sei exatamente como estaria. Sentada em sua cama, ela viria até mim e pentearia meus cabelos e depois o prenderia em um rabo de cavalo, me daria o seu melhor sorriso de orgulhosa e me abraçaria. Eu sentia tanta a falta dela, mas ao mesmo tempo sei que o que aconteceu foi o melhor. Ela sofreu muito depois que papai nos deixou e com a chegada de Willy as coisas só pioraram. Começar uma nova vida não foi o suficiente, conheci pessoas novas, desabafei com minha psicóloga, fiz vários amigos, tenho minhas provas e agora preciso me preocupar com minhas notas para conseguir uma boa recomendação da minha professora de literatura. Minha vida era tão corrida que não sobrava tempo para pensar no que aconteceu, mas mesmo assim, as lembranças estavam tão vivas como nunca estiveram antes.
Essa noite, deixando de lado o meu clássico estilo de camisetas com desenhos extravagantes e minhas calças jeans que nunca saem de moda, resolvi usar um vestido Valentino. Ele é branco com um rendado transparente na parte das costas, com uma saia mais ou menos rodada que iam até a metade das minhas coxas e terminava com uma bainha de rendado transparente, e apesar das mangas longas eu tive que colocar um sobretudo cor salmão. E já que não me dou bem com saltos, coloquei uma sandália rasteira e disso eu não abro mão.
- Quem é você e o que fez com a minha amiga Brooklyn? – Emma não evitou sua expressão de surpresa ao abrir a porta do seu quarto. Então seus olhos foram até meus pés. – Ah, ai está você.
Sorri ao passar por ela me sentar em sua cama.
- Tudo na vida tem um limite.
- Podem te tirar do Brooklyn, mas não podem tirar o Brooklyn de você.
Apenas me limitei a piscar para ela e encarei o chão. Ela me analisou alguns segundos antes de ir para frente do espelho.
- Me deixa perguntar mais uma vez. – começou a retocar o batom.
- Hm?
- Então, eu posso pegar o Brian sem nenhum problema? – se virou pra mim. – Não vai ficar chateada?
- É, acho que não tem problema. – tentei parecer confiante nas palavras.
- Acha? Do tipo, não tem certeza?
- Do tipo... – mordi meu lábio encarando o chão novamente. – Acho que do tipo, Brian e eu ficamos juntos por um tempo, não houve uma vinculação sentimental da minha parte e foi por isso que terminamos. Eu não vou sentir ciúmes nem nada do tipo. – andei até ela arrumando meu cabelo. – Até por que não gosto dele. Só acho curioso ele ter se aproximado justo da minha melhor amiga.
- Você acha que ele só está tentando te atingir? – questionou.
- Acho que ele é um idiota. – me virei pra ela.
Emma respirou fundo.
- Brooke, você é a pessoa mais doce e gentil que eu conheço. Mesmo se eu estivesse enfiando uma faca na sua barriga você diria que não está doendo.
Pensei sobre isso, em como a Emmalyn tinha toda a razão, eu tinha essa coisa de colocar as necessidades dos outros na frente da minha, e isso não era legal!
- Emma...
Não sabia o que dizer.
- Mas você não gosta dele, não é? – se virou para o espelho novamente, e eu acatei no mesmo instante.
- É, não! Integralmente, sem nenhum sentimento.
- E a gente nem vai namorar ou coisa do tipo, vamos nos pegar e depois esquecer a existência um do outro.
- Parece um bom plano. – sorri de lado, não querendo sorrir.
- E nós vamos encontrar o seu par perfeito hoje.
A encarei.
- Eu não estou procurando por ninguém. – deixei claro.
- Todo mundo está procurando por alguém.
- Mas não em um evento social – adverti.
- Eu sei que esses eventos costumam ser uma chatice. Mas todos os gatinhos da alta sociedade e da cidade vão estar lá, ou grande parte. Você vai conhecer alguém, e vai seguir em frente.
- Quer saber, se você parasse de falar nesse assunto, eu já tinha seguido em frente.
- Me deixe ver você. – repousou as mãos em meu ombro. – Está linda Brooklyn, e vai pegar muitos gatos hoje.
Rolei os olhos.
- Você nunca desiste em querer me ver com alguém, não é? – a segui para fora do quarto.
- Meu objetivo de vida.


The Quin é com certeza um dos hotéis mais bem localizados de Nova York e por isso figurões como John sempre realizam suas reuniões de negócios neste hotel. Manter as aparências nessa cidade é necessário e você sempre vê um ou dois famosos circulando por aqui. Sem falar nas pessoas mais importantes que precisam ser impressionadas. Como o presidente, ou os donos do Madison Square Garden, o que eu não sei por que raramente vou a shows. Emma adora esse lugar por que simplesmente podemos ir a 5º avenida e voltar sem sermos notadas de tão perto que fica. O lobby é fantástico, vários quadros coloridos na parede com quadros de famosos como Barack Obama e Elvis Presley. Alguns dos meus amigos estavam no lounge sentados nas poltronas se embebedando. Eu tentava ao máximo prestar atenção na conversa deles, mas eu ainda estava com a cabeça nas nuvens.
- Estão ansiosos pela volta as aulas? – Elijah perguntou tomando um gole de sua bebida.
- Não me importaria de prolongar as férias por mais uma semana.
- Isso por que você já entrou pra Morgan State. – Emmalyn rolou os olhos pra mim.
- Não sei não, ainda estou analisando minhas opções. A senhora Hill disse que tenho grandes chances de fazer o curso especial de Harvard para tirar qualquer duvidas.
- Ela quem está te plantando duvidas, sempre quis ir pra Morgan e agora está pensando em Harvard?
- Sei que se sairá muito bem, independente da faculdade que escolher. – Elijah me abraçou por trás e depositou um beijo em meu rosto. – Eu e os caras vamos lá fora tomar um ar, tudo bem?
Assenti.
- Claro.
O vi me soltar e sair com os meninos me deixando a sós com Emma que me olhava com cautela.
- O que?
- Nada. – negou. – Onde será que o Brian está?
- Eu não faço ideia. – disse sem interesse algum.
- Vamos pegar mais uma bebida?
Enlaçou seu braço ao meu me puxando até o bar que ficava na parte de trás do saguão do hotel. Eu sabia que Elijah e Emmalyn não se davam muito bem, não mais, os dois tiveram um romance de verão a um ano e desde que voltaram quase não se falam. Mas eles nunca nos disseram do por que:
Emma havia sumido tinha exatos meia hora e eu não aguentava mais esses eventos sociais onde falam apenas de negócios, negócios e mais negócios. Olhei a minha volta procurando por um rosto conhecido, mas eu não via ninguém.
- Nossa, que perfume maravilhoso. – ouvi alguém assoprar em meu ouvido, o odor do álcool exalando fortemente misturado com um sotaque que eu não fazia ideia de onde vinha.
- Pois é! Me disseram que era repelente contra cantada cafajeste, mas pelo visto não funciona.
Ele deu uma risadinha de convencido e eu me limitei a rolar os olhos o ignorando completamente.
- E você? Não está com o namorado por quê? – sorri sarcástica.
- Essa é uma daquelas táticas em que você pretende saber se eu estou namorando ou não?
- Talvez.
Virei-me para ele pronta para mais uma má resposta que estava na ponta da língua, mas fiquei um pouco surpresa por ele ser tão jovem, talvez um ano mais velho que eu, não tinha como saber. Estava todo engomadinho e por isso não poderia ser um penetra apesar de nunca ter o visto por aqui antes. Era branco, um pouco alto, cabelos negros, olhos claros e tinha uma boca bem rosada. Não tinha como não reparar já que ela ficava bem diante dos meus olhos. Ele deu um meio sorriso antes de continuar a falar.
- Ou eu só queira saber alguma coisa sobre você, seu nome, por exemplo.
- Fala sério. – disse entre um sussurro rolando os olhos.
- Mora na cidade?
Não o respondi.
- Estuda? Trabalha? É católica.
O encarei novamente, ele estava sendo evasivo.
- Por que não gosta de falar sobre você?
- Por que eu não sou da sua conta.
Ele fechou a boca no mesmo instante me encarando silenciosamente.
- Ta, acho que você não vai cair no meu charme.
- E você jura que alguém já caiu?
Ele semicerrou os seus olhos claros para mim e por algum momento eu achei que ele fosse continuar com todo aquele papo furado, mas sabiamente resolveu me deixar sozinha e com um sorriso de quem sabe que perdeu ele se retirou. Obrigada!
Josh havia voltado uns dez minutos depois e estava sozinho. Me fazia companhia enquanto debatíamos sobre a volta as aulas o que seria interessante já que era o nosso ultimo ano na Trinity depois cada um de nós seguiríamos rumos diferentes na vida. Emma queria ser psiquiatra, adorava isso, dar conselhos e ajudar os outros a dar um rumo na vida, essas coisas. Josh quer ser advogado como os pais. Os pais de Ed queriam que ele fosse dentista assim como eles, mas sei que Ed tem planos para sair do armário para a família e logo tentará uma vaga na Julliard já que ele quer tanto ser um artista, eu ainda não sei qual é o talento magico dele para simplesmente querer entrar em uma das faculdades mais importante do país, mas no fundo eu sei que na verdade, ele só não quer sair de Nova York, ele adora esse lugar. John me importunava às vezes querendo que eu fizesse publicidade para ajudar com os negócios da família. Ele tem uma agencia onde gerencia todos os tipos de negócios, desde comerciais, produção de vídeo, publicidade, agência de talentos. Ele é o melhor no ramo dele, pessoas do país inteiro procuram por seu trabalho e em parte, eu sei que ele gostaria que eu continuasse o trabalho da vida dele. John é viúvo e antes que sua mulher o deixasse ele não pode ter filhos, com medo de se apaixonar ele não se casou novamente. Por um tempo eu realmente achei que essa seria uma boa ideia, mas quando estava no primeiro ano comecei a ler mais livros do que eu poderia imaginar para as aulas de literatura da Sra. Hill, Eu simplesmente me apaixonava cada vez mais pelas palavras, andava com um dicionário comigo para traduzir as que eu não sabia o significado. Eu via a mágica que era pode escrever e inventar um mundo fantasioso e ainda sim, quando fechava os olhos fazer tudo parecer muito real. Acho que com tudo que aconteceu comigo, na minha vida, aquela era uma forma de me fazer botar pra fora meus sentimentos confusos, raivosos, ternos e ás vezes, apenas às vezes eu podia criar um mundo, talvez uma espécie de bolha, onde meus pais ainda existiam em minha vida e éramos a melhor família de todas. Em fim, estávamos no meio dessa discursão quando vi Emmalyn e Brian nos fundos do hotel, bebiam e jogavam conversa fora. Tudo bem, até ai normal. Tentei não demonstrar emoção alguma para Josh, mas falhei ao ver minha melhor amiga e meu ex-namorado se beijando intensamente.
- Você está bem? Ficou pálida uma hora para a outra. – Josh se acercou de mim.
- Sim, eu... Eu só preciso ir ao banheiro. – lhe dei um meio sorriso tentando convencer que estava tudo bem quando não estava nada bem. Assim que cheguei ao banheiro segurei com tanta força o mármore que poderia quebrá-lo a qualquer instante, minha respiração estava falha, meus olhos estavam molhados. Eu não podia estar com ciúmes, eu terminei com ele por que não gostava dele, então isso não era ciúmes! Não podia ser.
- Noite difícil? – Aquele mesmo garoto do bar me abordou encarando meu reflexo pelo espelho. Olhei para o chão não sabendo o que expressar. Há meia hora eu era a garota “incantavel” e agora estava chorando em um banheiro de um hotel caro.
- Um cisco... Foi um cisco. – tentei disfarçar enxugando meu olho.
- Claro que foi. – sua voz era irônica.
- Vem cá, isso aqui não é um banheiro feminino? – Mudei de assunto me virando pra ele.
- Bem observado.
- , eu...
Uma garota saiu de algum lugar do banheiro e parou pra me encarar.
– Você esta chorando?
- Foi um cisco! – Ele riu de mim.
- Um cisco? Deixa-me ver... – ela me analisou curiosa. – Ele te traiu?
- O que?
- Não corresponde o seu amor?
- Descobriu que ele é gay?
- Não estou entendo.
O tal do , que segurava uma bolsa, sentou em um banquinho ao lado de mim. Por que ele estava com uma bolsa? Ele é gay? Mas e aquela cena no bar? Talvez ele só estivesse brincando com a minha cara, não seria a primeira vez que isso aconteceria. Acho que ele só está um pouco bêbado de mais.
- Pode se abrir com a gente, somos as melhores pessoas do mundo em questão amorosas. Já quebramos a cara milhares de vezes em relação a isso. – me trouxeram de volta a realidade.
- Eu não vou falar nada. – bufei diante aquela ideia obscena.
- Ele tem razão, pode desabafar. Só tem a gente aqui, e não vamos contar para ninguém.
Os dois me encaravam inquietos, como se estivessem esperando uma confissão pretensiosa, talvez não tivesse nada de ruim em contar a eles como me sentia, provavelmente eu não os veria mais. E eu precisava desabafar com alguém naquele instante que eu não conhecesse.
- Talvez eu tenha dado carta branca pra minha melhor amiga ficar com o meu ex-namorado, e agora que eu os vi junto eu estou me sentindo estranha.
- Pode ser ciúmes. – A garota se virou para .
- Não gosto dele. – afirmei.
- Como pode saber que não gosta dele, se está com ciúmes dele? – contestou.
- Não estou com ciúmes.
- Então pode ser orgulho.
Orgulho? Será?
- Orgulho? – repliquei.
- Querida, quando vimos algo ou alguém que era nosso em posse de outra pessoa, nós sentimos nosso orgulho ferido, como se esse algo ou alguém, devesse pertencer apenas a você, mesmo você não querendo mais esse algo ou esse alguém.
Era uma possibilidade.
- Eu não sou egoísta. Quero que ele seja feliz.
- Mas não com a sua melhor amiga. – andava de um lado pro outro. – A amizade é um circulo que nunca deve ser ultrapassado. Existe uma linha tênue entre dividir os segredos e dividir os ex-namorados. Você ficaria com algum ex dela?
- Claro que não! – me senti ofendida.
- Por que não?
- Por que é uma... – me voz perdeu o volume. – Uma traição.
- Você está se sentindo traída?
- Eu sabia que eles iriam ficar.
- Mas não sabia que se sentiria dessa forma.
- Foi um risco que eu assumi. – dei de ombros.
- Você me parece àquelas pessoas que tem um coração maior do que a razão. – que tinha seus olhos pregados em mim me fez pela primeira vez em sua presença, me senti corada. Ele me olhava como se me enxergasse por dentro. – Tem medo de se expressar e achar que vai machucar alguém?
- Eu a amo. – expliquei. – Não seria egoísta a privar disso?
- Você não pode colocar a necessidades de outra pessoa antes da sua e achar que foi por amor.
Ele tinha razão?
- Pode ser o álcool falando, mas eu acho que todo mundo precisa ser egoísta uma vez na vida, não da pra viver só realizando a vontade dos outros. Quando talvez, eles não fariam o mesmo por você.
- você está um ótimo conselheiro hoje. – A garota sorriu para ele. - A proposito, eu sou Helena.
Acenei para eles.
- Brooklyn.
Os olhos de se arregalaram e eu me perguntei se tinha algo de errado com a minha aparência.
- É um nome bem interessante. – me pareceu intrigado.
- Obrigada? – não sabia o que responder.
Uma garota entrou no banheiro e encarou .
- Tudo bem, já estou de saída.
Ele concertou a bolsa em seu ombro e saiu com a Helena me deixando sozinha novamente.


- Brooke, aonde você vai? – Esbarrei com Emma no caminho para fora do hotel.
- Me deixa em paz.
Eu não deveria estar brava com ela. Mas ela é a minha melhor amiga, deveria ter se tocado sozinha que essa história não acabaria bem.
- Brooklyn. – chamou meu nome quando já estava fora da pub.
- Eu não estou feliz que você tenha ficado com o Brian. Pronto, falei. – me sentia mais leve.
- Por que não? – me encarava confusa.
- Eu só não gostei, ta legal?
- Por que não me falou antes? Eu não tinha ficado com ele.
Pousei as mãos na cintura.
- Está tudo bem!
- Não fala que está tudo bem, se não está. – se aproximou de mim. – Por que não me falou antes?
- Por que antes eu achava que não me importava, por que antes eu não achava que fosse ver tal cena. Por que antes eu achei que você pensaria: Opa, ela é a minha melhor amiga, por que mesmo eu vou ficar com o ex dela. Por que eu tenho essa coisa de colocar as necessidades dos outros antes da minha.
Vi seus olhos cristalinos, ela estava quase chorando.
- Eu não queria te falar dessa forma, mas algo me fez pensar que eu ficaria me martirizando se eu não te contasse. Você queria tanto ficar com ele que não parecia certo atrapalhar isso! – respirei todo o ar possível. – Mas, está tudo bem! Não vamos deixar de ser amigas por que você vai pra cama com o meu ex-namorado. Mas agora, você vai pra cama com ele, ciente do que eu realmente acho!
Ela não reagiu ao meu desabafo, apenas ficou ali me encarando. Neguei com a cabeça e lhe dei as costas procurando por um taxi.
- Desculpa. – a ouvi dizer. – Queria que tivesse me dito isso antes, quando pedi a sua opinião e não agora que nós já ficamos.
- Como eu disse, está tudo bem. – continuei andando.
- Sei que não está tudo bem. – se apressou em ficar na minha frente. – Mas agora eu não posso fazer mais nada.
- Emmalyn, eu preciso ir pra casa.
- Volta com ele. – disse rapidamente, seus olhos caiam algumas lágrimas. – Você vai pra minha casa com ele e eu me viro depois.
- Está doida? Eu não gosto dele!
- Você gosta sim.
- Não, não gosto. E mesmo se eu gostasse, ele deu em cima da minha melhor amiga. Eu não quero ver a cara dele nem pintada de ouro. Odeio ele.
- Se odiasse não se importaria tanto. Para de mentir pra si mesma. – Me impediu de passar.
- Não me importo com ele, entenda isso! Estou me importando que você sege a minha melhor amiga e tenha ficado com ele. – não fazia sentindo. – Quero que ele se exploda.
- Brooklyn, realmente pra mim, não tinha nada de mais em ficar com o Brian. Principalmente por que você não sente nada por ele, como você disse. Agora, se isso te fez mal, deveria ter me dito. Não agiu como minha amiga quando escondeu isso.
Agora a coitada da situação era ela!
- Eu também achava que não tinha nada de mais! E eu não estava me importando de verdade, se você não falasse sobre ele, eu nem lembraria que Brian existia. Mas você tem razão, eu não agi como amiga quando deixei o que pensava de lado para que você ficasse com ele! Não agi como amiga quando não te contei que me importava, por que eu quis que você ficasse bem, queria que ficasse com quem quisesse.
Seus olhos estavam arregalados, ela ainda chorava. Ameacei sair novamente, mas ela me abraçou.
- Me desculpa, eu não quero perder a sua amizade nunca. Realmente achei que não se importava.
Retribui seu abraço carinhosamente.
- Amo você pra sempre, e isso nunca vai mudar.
- Eu nunca iria fazer algo pra te magoar, me perdoa.
- Não tenho que te perdoar, eu também errei em não ter te contado.
- A culpa é toda minha, eu deveria ter me tocado que era errado.
Segurei seu rosto entre as minhas mãos.
- A culpa é nossa, minha, sua e dele. Mas vamos superar isso.
- Prometa que isso não vai acabar com a nossa amizade, E que daqui pra frente vai sempre me dizer como se sente.
- Prometo.
- Eu te amo. – ela me abraçou de novo.
- Amo você também.
E essa foi à consequência de ter guardado uma coisa pra mim e ter fingindo que não me importava.



Brooke analisou seu pequeno quarto olhando a sua volta. Ela sentiria falta dali, da sua casa, principalmente de sua mãe. Mas a decisão já havia sido tomada. Pegou sua lancheira e andou até a mesinha ao lado da cama puxando o porta retrato consigo.
- Família. – sussurrou olhando para a foto, onde estava Brooke, Lucy e Thiago felizes.
- Brooke! – Lucy a chamou se escorando na porta. A menina olhou para a mãe no mesmo instante. – Por que não foi se despedir do seu pai?
- Como assim, mamãe? – quis saber.
- Seu pai, acabou de ir embora. Ele nos deixou! – andou até a cama e se sentou. – Disse que você não quis se despedir.
- Não, mãe. Ele vai me levar com ele. – disse andando até a porta e ouviu um suspiro de sua mãe. – Aposto que ele está me esperando na rua. – deixando o quarto ela foi até a porta de saída ouvindo os passos de sua mãe atrás de si. Mas para a sua total infelicidade o velho carro de seu pai não estava ali. No mesmo instante seu porta retrato foi parar ao chão e seus pés correram até o quarto de seus pais. Brooklin não acreditava que Thiago havia a enganado de tal forma. Ela acreditou que ele iria a levar consigo. Abriu o guarda-roupa vendo somente as roupas de sua mãe ali entre o vazio onde estava ocupado por pertences de Thiago.
- Princesa... – ouviu Lucy a chamar, mais não quis saber. Apenas sentou-se ao chão chorando. – Eu sinto muito.

Memórias Off.



Capítulo 2 - O Canadense.

- Brooke, verdade ou consequência?
Encarei Ed assim que me sentei ao lado dele, de frente para Emma, sem entender nada até ver a garrafa de Heineken apontada para mim.
- Ah não, não estou brincando. – neguei no mesmo instante.
- Está sim. – Emma debateu.
- Não estou não. – neguei novamente.
- Você se sentou na roda, então está brincando. – disse suave, mas eu sabia que ela estava um pouco apreensiva.
Desde o ocorrido no Quin, Emma não tem se desgrudado de mim, acho que a cada segundo ela tem se certificado de que eu não estou com raiva, e eu realmente não estou. Olhando para tudo que aconteceu agora vejo que exagerei em certos aspectos.
- Verdade ou consequência? – Ed reforçou a pergunta.
- Eu nem sabia que isso era uma roda. – sussurrei.
- Pois é, mas é. Anda, escolhe logo. – Ed me apressou.
- Ta, é... Consequência. – tomei um gole da minha Fanta, mas engasguei ao notar que escolhi errado. – Não, espera...
- Tarde de mais. - Ed olhou cúmplice para Emmalyn e então me encarou novamente. – Eu te desafio a beijar o Josh. E na boca. – Então ele fez biquinho ao debochar de mim.
- O que? Não! Josh é meu melhor amigo, nada a ver. – olhei nervosa para Ed ao protestar.
- Você escolheu, e agora vai ter que cumprir.
- Ele nem está aqui, aliás, por que estão brincando de verdade ou consequência, se só estamos em três?
- Isso realmente não importa. – Ed se levantou. – Amanhã, no primeiro intervalo você vai beijá-lo.
- O que? – engasguei novamente.
- Está tarde, tenho que ir para casa. Nos vemos amanhã? Mal posso esperar. – E então saiu, simples assim.
Encarei Emma que estava se esforçando para não rir.
- Acha isso engraçado? – tomei mais um gole da minha Fanta.
- Você sabe como o Ed é.
- Mas o que ele pretende com isso?
- Talvez ele não seja o único que queira te ver com alguém. – ela se levantou.
Bufei bem alto.
- Mas Josh é só um amigo.
- Talvez ele não te veja apenas como uma amiga.
Franzi o cenho na mesma hora. Como assim? Levantei-me e andei até ela que olhava toda a Manhattan pela varanda do meu quarto.
- O que quer dizer com isso?
Depois de alguns segundos em silencio, ela negou com a cabeça e se virou para mim.
- Está realmente tarde e eu deveria ir, amanhã temos aula. – ela pendurou a cabeça de lado e passou sua mão em meu rosto. – Você realmente está bem? Sobre o Brian.
Coloquei minha mão sobre a sua.
- Quantas vezes eu vou ter que te dizer que sim, ein? – lhe dei um meio sorriso.
- Eu não quero perder sua amizade nunca. – reforçou.
Juntei nossas testas e encarei seus olhos.
- Melhores amigas, para sempre. – então rocei meu nariz ao dela. – Nada vai atrapalhar isso, muito menos o babaca do Brian.
Ela gargalhou ao se afastar de mim.
- A gente se vê amanhã então. – andou até a porta e me analisando mais uma vez, ela saiu.

Em fim, amanhã teríamos as aulas de volta e seríamos os veteranos, o que não deveria contar muito para uma escola tão religiosa, mas na verdade, conta sim. Sempre contou. Em qualquer lugar, na minha antiga escola no Brooklyn, em filmes, livros, aqui. Não me declaro uma pessoa popular por que para mim esse termo se quer é válido. Mas tenho que admitir que desde que comecei a andar com Josh, Elijah e Ed, tenho sido convidada para todo o tipo de eventos que o corpo estudantil (e rico até as cuecas) da Trinity faz. Nunca foi minha intenção ser parte disso, nunca quis ser rica e patricinha, como a Emma é. Ganhei todas essas coisas de uma forma tão fácil, mas a que preço? Se eu pudesse escolher ainda viveria com meus pais no Brooklyn, não tínhamos a vida que levo com John, mas eu era muito mais feliz, pelo menos eu acho que sim. Mas tudo que eu realmente quero é ficar sentada em algum canto sozinha e lendo.



- Willy, para você está machucando ela – supliquei a Willy enquanto me agarrava em seu braço que estava apertando o pescoço de minha mãe.
- SUA VADIA, VOCÊ É UMA VADIA! – ele gritava com ela me ignorando e ela não conseguia dizer nada a não ser tentar respirar.
- Eu vou chamar a policia se você não soltá-la. – pedi mais uma vez, mas ele não se afastou. – SOLTA ELA – gritei chorando e batendo em suas costas. – Você está machucando ela. – o choro já estava embargado em minha garganta e só quando eu vi os olhos de minha mãe perderam a cor que eu senti um medo se apossar de mim. Olhei para o lado encontrando um pedaço de vidro que havia sido quebrado quando Willy jogou minha mãe sobre o espelho da parede. Segurei com toda a minha força sentindo cortar a minha mão e então me aproximei de Willy novamente enfiando aquele pedaço de vidro em seu pescoço. No mesmo instante ele a soltou pousando sua mão sobre o local ferido e gritando de dor. Minha mãe começou a tossir desesperadamente puxando todo o ar necessário e eu a puxei pra perto de mim a ajudando sair de lá.

Com um sobressalto eu acordei notando meu corpo todo soado. Minha cabeça latejava, minha respiração estava acelerada. Que merda foi essa? Eu não me lembrava disso, mas eu sei que realmente aconteceu por que depois daquele dia me mandaram para a Inglaterra por seis meses, até receber a notícia da morte da minha mãe e vir morar com John. Que droga, como eu poderia ter esquecido isso? Willy tinha chegado mais cedo do trabalho naquele dia e estava furioso, mais do que o normal, mas por quê? Por que eu nunca sabia de nada do que estava acontecendo mesmo estando no meio de toda aquela merda de confusão?



- Meu Deus, você está horrível! – John não soube ser discreto ao me ver entrar na cozinha. Fazendo a Nana rir.
- Um pouco de descrição é bom John. – Ela o repreendeu.
- Se a diretora da Trinity te ouvir falar o nome de Deus em vão você estaria bem encrencado há essa hora. – me sentei na bancada.
- É por isso que você estuda lá e não eu. – Nana não disfarçou outro riso ao ouvir John e veio até mim.
- Café?
- Por favor! – apoiei minha cabeça em minhas mãos massageando minhas têmporas.
- Bem, eu vou começar o meu dia. Boa aula pra você. – me deu um beijo no rosto e se retirou.
- Foi dormir tarde? Está com cara de que não dormiu bem. – John perguntou curioso.
- Não. – dei um gole no café. - Eu tive um pesadelo com o Willy e Lucy.
John parou sua xícara suspensa no ar bem a caminha da sua boca e me encarou. Ele sempre tinha essas reações estranhas quando eu tocava no assunto.
- Ah é?
- É. – concordei.
- E era sobre o que?
- Foi um dia antes de me mandarem para Inglaterra. Ele tentou matar Lucy e eu enfiei um pedaço de vidro no pescoço dele.
John abriu a boca meio chocado com isso.
- Você nunca me disse isso.
Dei de ombros.
- Pensei que já soubesse. – me levantei jogando minha mochila em minhas costas. – Eu preciso ir.
- Tudo bem. – ele também se levantou. – Quer que eu fale com Mariah?
- Não, ela ainda está de férias, não quero incomodar. – mordi meu lábio. – Talvez eu passe na biblioteca depois da escola.
- Você vai ficar bem? – a voz estava carregada de preocupação.
Apenas concordei em silêncio. Ele me deu um abraço breve e deixou um beijo em minha testa.



- Até que em fim você chegou.
Mal passei pelos portões e Ed já estava agarrado aos meus ombros me guiando para dentro da escola.
- Ed... – censurei.
- Josh está bem ali. Você quer beijar ele agora ou depois no intervalo?
- Que tal em momento algum?
- Temos um acordo, não seja covarde.
- Não temos nada!
- Temos sim. – Ele viu alguém atrás de mim. – Emma, diz para a Brooke que ela tem que beijar o Josh.
- Você tem que beijar o Josh. – apontou para mim e andou até a fonte do pequeno pátio se sentando ali. A seguimos.
- Fala sério, somos só amigos. – tentei me defender.
- Não existe amizade entre homem e mulher, entenda isso.
- Você é meu amigo.
- Mas eu sou quase uma mulher. – deu uma voltinha.
- Se não fosse pelo seu amiguinho no meio das pernas. – Emma implicou, não evitei uma risada.
- Detalhe. – estreitou os olhos para ela.
Depois disso eu não escutei mais a conversa por que tentei reconhecer um carinha que havia acabado de passar pelo corredor da Trinity, ocupado de mais com seus cadernos e folhas, ele parecia perdido e me parecia conhecido. Espreitei meus olhos, mas não sabia quem ele era.
- Quem é? – Ed sussurrou em meu ouvido, olhando na mesma direção.
- Não sei!
- É um gato. – eu conhecia aquele olhar, ah não!
- Senhorita Bennette, ai está você. – a coordenadora Murphy se acercou de nós
- Está me procurando? – fiquei confusa.
- Sim, temos um aluno novo e eu gostaria que você apresentasse a escola para ele.
- Por quê?
- Por que é a melhor aluna da Trinity, vamos não debata comigo. – ela saiu pisando na frente e antes de segui-la até a sala de espera da diretoria vi um sorriso abusado de Emmalyn e Ed.
- Salva pelo gongo. – o escutei gritar.
Fiquei me perguntando desde quando sou e melhor aluna daqui, nem de longe sou eu. Emma é mil vezes mais inteligente, será que eles já viram essa menina resolvendo cálculos? Eu mal sei quanto é dois mais dois.
- Senhor , quero te apresentar à senhorita Bennette, ela irá te guiar em uma tour pela nossa escola e tirar quaisquer dúvidas se tiver alguma.
- Perfeito. – o garoto disse firme em um sotaque carregado.
- É com você. - Ela me deu uma piscadela e nos deixou a sós.
Ao sair eu pude finalmente ver quem ele era. O tal bêbado e talvez gay do Quin, e pela sua expressão de surpresa ele também me reconheceu.
- Brooklyn? – perguntou.
- Achei que estivesse bêbado de mais para se lembrar.
- Não tem como esquecer um nome como esse. – deu um sorriso rápido.
- , certo? – sorri sem graça.
- Exatamente. – por que ele tinha que me olhar bem dentro dos olhos? Não sou boa com contatos visuais. – Você sumiu depois da nossa conversa.
- E eu esperava que você fizesse o mesmo, mas... – resolvi mudar de assunto quando seus olhos me fuzilaram. - Bem, parece que estou encarregada de te mostrar a Trinity School. – dei de ombros.
- Parece que sim. – então apontou para a porta de saída e fomos para o corredor.
Ele guardou suas coisas quando começamos a andar em silêncio.
- E sua amiga?
- Elena? – ele me olhou rapidamente. – O que tem ela?
- Também irá estudar aqui?
- Nah! O lance dela é cantar na banda de garagem que ela tem.
- Ela tem uma banda?
- Tem! – e ele continuava a me encarar. Cocei a garganta ao descermos as escadas.
- Bem, a Trinity tem um currículo impecável, como já deve saber nosso nível é K-12 e as regras são bem rigorosas, o uso do uniforme é indispensável por que a escola é meio que religiosa, não que alguém ligue pra isso a não ser os professores, mas...
- Me deixa adivinhar, você é a garota prodígio?
- O que? Não! – neguei e continuei rapidamente. – Então, o corredor da direita vai te levar as salas com as aulas normais como Inglês, matemática avançada, história, e o da esquerda é informática, aula de musica...
- Se você não é a garota prodígio então por que eles fariam tanta questão de que me mostrasse à escola?
Ele me interrompeu.
- Acho que é só pra fazer você se sentir bem-vindo, talvez.
- Sei.
Cocei a garganta mais uma vez e voltamos a subir as escadas que iam para o refeitório.
- Está no último ano? – perguntei.
- Sim. – outra palavra monossílaba, legal!
- Tem alguma faculdade em mente? – arrisquei mais uma pergunta.
- Já tenho que me preocupar com isso?
- Os professores pegam pesados com os veteranos por causa das cartas de recomendação para a faculdade.
- Aposto que a sua já está pronta. – implicou. - E você? Já tem alguma faculdade em mente? – me perguntou.
- Estou avaliando minhas opções.
- Oxford? Harvard? Yale? Qual delas?
- Na verdade, nenhuma delas.
- É mesmo? – pareceu surpreso.
- Sim. E você tem pelo menos algum curso em mente?
- Meu pai quer que eu faça direito, mas eu não sei se é a minha praia.
- Ah! – evito olhar pra ele. – Aqui é o...
- Refeitório. – me interrompeu olhando pelos vidros redondos da porta. – Deu pra notar.
- Nossa escola tem o melhor cardápio da cidade.
- Aposto que sim.
Ele é tão evasivo nas respostas dele.
- Você não me disse que curso pretende fazer. – continuou. – na faculdade.
- Hm, literatura inglesa.
- Mesmo? Bem, até isso é melhor do que direito.
- Acho que direito não é muito a sua cara. – tentei me enturmar, já que ele não curte direito. Continuei a andar.
- E o que seria a minha cara? – ficou intrigado ao me seguir.
- Não sei, moda? Artes cênicas, musica talvez? – dei de ombros.
- E por que essas são as minhas únicas opções? – ele arqueou a sobrancelha.
Viramos à direita até a biblioteca.
- Faz o seu estilo.
- Me conhece há dois minutos e já está julgando pela aparência? – ele parou de andar.
- Não é isso. Mas eu pensei que você... – corei.
- O que? – Ele esperava pela a resposta enquanto ajeitava a alça da mochila nos ombros. – Espera, você acha que eu sou gay?
Me senti completamente vermelha, sua voz era de indignação e depois ele começou a rir, que bom que achou isso engraçado.
- Bem, você realmente deu em cima de mim no bar, mas estava bêbado. E depois você me deu aqueles conselhos nada típicos de “homens” em um banheiro feminino, e você segurava uma bolsa.
- Suspeito. – tinha um sorriso escancarado no rosto.
- Me desculpe.
- Está tudo bem!
Os olhos dele me observavam avidamente, como se me vigiassem para que eu não fugisse, era uma sensação estranha de se sentir, e eu estava me sentindo encurralada. Desviei o olhar rapidamente.
- Chegamos ao meu lugar favorito desta escola. – apontei para a biblioteca feliz por mudar de assunto.
- A biblioteca? – arqueou a sobrancelha.
- É aqui que você sempre vai me achar. – por que eu disse isso? - Quer dizer... – ai meu Deus. – É que quando eu não estiver na sala, eu...
- Eu entendi. – ele ainda sorria. Merda. – Vou me lembrar disso.
- De onde você é? Por que esse sotaque não é daqui. – novamente troquei de assunto.
- Você percebeu né. – convencido. – Canadá.
- Está longe de casa.
Ele concordou em silêncio ainda me encarando.
- Aqui é minha casa agora.
De alguma forma eu percebi certa magoa no seu tom de voz, mas antes que eu pudesse perguntar se tinha algo de errado, o sinal bateu.



- Como ele é? – Ed mal esperou eu me sentar para me encher de perguntas.
- Quem? – me fingi de desentendida.
- Não banque a sonsa, por favor.
Rolei os olhos, mas me divertia com a situação. Ed é de longe a pessoa mais curiosa que eu conheço e se tratando de meninos então, vixe!
- Ahhh sim. – tirei meu caderno da bolsa e depositei sobre mesa. – Você deve estar falando do , o novato que veio do Canadá.
- Ele é do Canadá? Fala sério. – os olhos dele brilhavam. – Meu primeiro gringo.
- Ele não é gay, só pra você saber.
-E daí? Eu também não era até o primeiro ano, só pra você saber – ele riu. – Ah, ali está o seu premio. – Acenou para Josh e Elijah que logo ocuparam seus lugares atrás de nós.
- Beleza? – Elijah nos cumprimentou.
- Tenho e você? – Ed brincou.
Josh me deu um beijo no rosto e depois bagunçou o topete de Ed.
- Oi Josh, quer uma bala de menta? – Ed rapidamente lhe entregou uma.
Josh o olhou confuso.
- Por quê? Estou com alito ruim? – ele tentou cheirar a própria boca.
Ai, Ed. Merda. Escondi meu rosto com as mãos.
- Não, nada disso. Não posso ser legal com meus melhores amigos?
- Então por que você não me ofereceu uma? – Elijah se opôs.
- Desculpa Elijah, era minha última. Fico te devendo essa.
- Me paga uma cerveja mais tarde que fica tudo bem.
- O que tem mais tarde? – tentei mudar de assunto.
- Nós vamos ao Birdland, quer vir? – Josh me convidou.
- Pode ser, mas vou chegar atrasada por que vou passar...
- Na biblioteca. – Os três disseram juntos e começaram a rir. De mim! Não debati, apenas virei para frente na hora em que a professora de história chegou.
Ah claro, o primeiro dia de aula. Pra onde vocês viajaram? O que vocês fizeram? Agradeceram muito a Deus por estarem vivos? E blá, blá, blá. Ed, Elijah, Josh e eu resolvemos dar uns de antissociais e começamos a jogar forca. Não demorou muito para que Ed voltasse a me perturbar sobre o canadense.
- Ai meu Deus, eu achei o Twitter dele. – sussurrou para mim. – “Saudades do meu Canadá.” Tadinho, deve estar precisando de alguém para consolar ele.
- Você não presta.
- Acho que estou apaixonado. – não evitei uma risada.
- Ed, sua vez. – Josh chamou a atenção dele que rapidamente pegou o caderno fazendo as anotações da brincadeira.
- Ok... É um país. – deu a pista.
Fiquei olhando distraidamente para minhas mãos me perguntando como eu beijaria Josh. Se ele ficaria com raiva de mim. Ai não, isso não. Espero que ele entenda que foi tudo uma brincadeira de mal gosto de Ed, sei que se eu não o fizer, ele nunca mais me deixará em paz.
- Brooklyn, tem alguma ideia do que é? – Josh me trouxe a realidade.
- Me deixa dar uma olhada. – puxei o caderno e com um segundo já sabia a resposta. Quando ele cismava com algo era difícil alguém tirar da cabeça dele. – Canadá.
Os meninos ficaram surpresos com a minha rapidez e contaram as setinhas.
- Isso, deu certinho. Está certo Ed?
- Nossa como ela é boa, não é? – Ed comentou cheio de cinismo e eu estreitei os olhos para ele.
- Bixa má. – sussurrei em seu ouvido e ouvi sua risadinha afetada.


- Não, você não vai fugir. – Ed me segurou pelo cotovelo assim que sai da sala.
- Edward! – o chamei pelo nome todo sabendo que ele odiava.
- Você não fez isso, fez? – me arrastou pelo corredor.
- Combina com você. – o provoquei.
- Você ficou sabendo do aluno novo? – Ele perguntou para Emma assim que ela nos encontrou. - Já adicionei no facebook, e o segui no twitter.
- Novo recorde? – não disfarcei um riso.
- Estamos na mesma classe. – ela jogou o cabelo para o lado e saiu rebolando na nossa frente.
- Que sortuda filha da mãe. – a seguimos.
- Sortuda? – ela parecia indignada. – Se lembra de que por sua causa me trocaram de turma no primeiro ano e desde então eu estudo sozinha? – ela o encarou.
- Uma coisa não tem nada a ver com a outra. – deu de ombros. – como ele é?
- Muito gato e nem um pouco gay.
- Você não pode ter certeza disso.
- Eu vou pegar um iogurte, vocês vêm?
- Não mesmo senhorita. – Ed me segurou pele braço mais uma vez. Rolei os olhos. – Onde está o Josh?
- Bem ali. – Emma apontou para ele, escorado no seu armário com Elijah e algumas meninas da nossa turma.
- É agora. – Ed disse decidido. – No mínimo 10 segundos.
- Não, gente. Não!
Os dois não me escutaram e me arrastaram até eles que nos olharam confusos quando chegamos. Abri minha boca para falar algo, mas eu não consegui. Que merda. Ok, não tinha pra onde fugir, então...
Segurei o rosto de Josh com minhas mãos e colei meus lábios aos dele. Senti a surpresa dele com esse ato repentino e ouvi Elijah falar alguma coisa que não entendi direito. Quando ia me separar Josh enfiou sua língua dentro da minha boca, como assim? Ele queria aprofundar o beijo? Afastei-me no mesmo instante o vendo de olhos fechados que se abriram logo depois, sua expressão era confusa e eu não sabia para onde olhar então apenas sai dali.
- Brooke...
Emma me gritou, mas eu a ignorei.


No caminho até a biblioteca me esbarrei com alguém, pousei minha mão sobre o ombro o sentindo doer.
- Wow, olha pra onde anda.
Mesmo sem olhar eu reconheci o sotaque dele.
- Desculpa Canadá, eu não vi você. – o nome dele me fugiu a mente nesse momento.
- Tudo bem. – o olhar dele suavizou ao notar que era eu. – Você está bem? Se machucou?
- Estou bem.
Então lhe dei as costas, mas ele me chamou.
- Espera! Eu acho que estou meio perdido. – me virei para ele arqueando a sobrancelha. – Você poderia me dizer onde fica a sala de informática?
Sorri para ele e olhei o chão alguns segundos antes de responder
- Está bem atrás de você.
Ele olhou para a porta com uma expressão de surpresa e depois soltou uma risada.
- É mesmo, é a sala.
- Como eu disse. – acenei para ele e lhe dei as costas mais uma vez.
- Mas só que eu...
Parei mais uma vez e cruzei os braços para encará-lo. Mais uma vez.
- Você o que?
- Eu queria saber se pode me ajudar com o computador.
- Você não sabe mexer em um computador? – perguntei incrédula.
Ele rolou os olhos, mas ainda sorria.
- Óbvio que eu sei, mas e se eu estragar algo?
Estreitei os olhos e passei por ele entrando na sala.
-É só apertar esse botão atrás do monitor e vai ficar tudo bem com o resto. – A tela do computador se acendeu.
- Você é demais, obrigado!
- Não tem de que, Canadá. – ele se sentou na cadeira e começou a navegar na internet. – Toma cuidado com o que você pesquisa, os computadores são monitorados.
- Eu só vou mandar um e-mail para minha família, meu celular descarregou. Mas pode deixar vou me lembrar disso.
- Quer ajuda pra entrar no site? – impliquei.
- Engraçadinha.
Lhe dei um sorriso e deixei a sala.



Não havia um livro naquela biblioteca que eu não tivesse lido, o que me deixava sem muitas opções, mas a minha terapia para tudo sempre foi ler. Então me contentei com a Megera domada e me sentei. Uma cadeira se arrastou ao meu lado e eu vi Josh me encarar pacientemente.
- Josh...
- Ed e Emma me contaram tudo. – se apressou em dizer.
- Me desculpa. – me virei para ele.
- Não, nada a ver pedir desculpas, eu conheço Ed desde pequeno, sei que quando ele coloca algo na cabeça, ele não tira até conseguir. Não foi culpa sua.
- É, Ed pode ser bem persuasivo quando quer.
Ele me deu um meio sorriso.
- Eu queria me desculpar por tentar...
Corei no mesmo instante, sabia sobre o que ele falar.
- Só que eu pensei que você queria... Quer dizer, beijo é beijo, não é?
Fiquei encarando minhas mãos por que eu não sabia o que dizer.
- Olha pra mim, fala comigo. – pediu.
- Josh você é o meu melhor amigo e eu não quero confundir as coisas entre nós.
- Brooke, como eu disse, beijo é beijo e isso nunca vai definir o nível da nossa amizade.
- Então você sai por ai beijando as pessoas sem ter interesse nelas?
- Bem, ás vezes eu só quero me divertir. – ele me dá um sorriso tímido. – Mas você é com certeza a mulher mais interessante e misteriosa que eu conheço e eu sou um filho da puta de um sortudo de poder ser seu melhor amigo. Você sabe que sempre vai poder contar comigo, e eu não me importo que você me beije ás vezes, ainda sou homem.
- Josh. – corei ao empurrá-lo pelo ombro. – Obrigada por ser meu melhor amigo.
O puxei para um abraço.
- Me diz que você vai dar o troco no Ed.
- Com certeza!
- É assim que se fala.
- Ai estão vocês.
Ed, Emma e Elijah entraram na biblioteca.
- Onde mais Brooke estaria?
- Acho que vou ter que trocar meu esconderijo secreto.
- Muito secreto, onde todos os alunos precisam vir para estudar. – Emma debochou.
- Podemos ir para outro lugar? – Elijah pediu. – Eu passo grande parte do meu dia aqui, não quero estragar meu tempo livre aqui também.
- Vamos? – Josh me levantou.
- Vocês são muito chatos.
Declarei ao sair da biblioteca sendo seguida por eles.
- E feios. – completei.
- O que? Ah, olha só pra você...
- Brooklyn? – quase esbarrou em mim novamente.
- Oi. – Os olhos deles estavam grudados em mim como se só estivesse apenas eu ali.
Senti a mão de Ed me apertar no mesmo instante. Cocei a garganta.
- Canadá, estes são meus amigos. Emma, Ed, Elijah e Josh. Pessoal esse é o do Canadá.
- Canadá é com certeza o meu país favorito. Depois dos Estados Unidos, é claro. – Ed se apressou em cumprimentá-lo.
- É um prazer conhecer os amigos da Brooklyn. – deu um aceno para eles.
- Me chama de Brooke. – pedi.
- Brooke. – repetiu meu apelido. – Legal. Ei, não estamos na mesma turma? – se dirigiu a Emmalyn.
- Estamos sim. – abriu um sorriso absurdo para ele.
Emma e Ed estavam totalmente enfeitiçados pelo Canadá e nem disfarçavam.
Então Josh passou o braço por meus ombros e Elijah ficou bem ao meu lado.
- Prazer cara, mas nós estamos atrasados pra próxima aula. Seja bem-vindo.
- Jura? Eu não ouvi o sinal tocar. – ele franziu o cenho.
- É que nós sempre chegamos antes.
Eu fiquei confusa com toda aquela história, como assim?
- Aaaaah. – Ed pareceu se recordar de algo. – Mais tarde nós vamos ao Birdland, aparece por lá. – deu uma piscadela para que concordou.
E antes que eu pudesse falar mais alguma coisa, eles estavam me arrastando para a sala.
Quando Ed no acompanhou recebeu uma expressão estranha de Elijah e Josh.
- Que foi?





- Cheguei!
Anunciei ao entrar e fui direto para a cozinha pegar qualquer coisa pra comer.
- Oi querida, como foi o primeiro dia de aula? – Nana perguntou.
- Muito chato. – peguei uma maça. – Eles só ficam fingindo que querem saber onde passamos as férias.
- Ué, não fizeram vocês se ajoelharem no canto da sala para pedir perdão pelos pecados?
A olhei seriamente, mas a piada realmente tinha sido boa.
- Não, mas com certeza estão planejando alguma viagem para ver o papa.
- Ah! – ela suspirou. – As piadas infinitas que podemos fazer com a sua escola.
- Não é? Eu nem preciso ir à igreja mais.
Ela concordou no mesmo instante ao terminar de lavar as vasilhas.
- Por que será que de todas as escolas John preferiu a Trinity? – fiquei curiosa em saber.
- Deve ser por que é uma das melhores escolas de Nova York. – ela me olhou. – E por que é a única escola que a bíblia é uma matéria.
Dessa vez não consegui segurar o riso.
- Pra ser sincera, cada vez eu acredito menos em Deus.
De repente o ar não era mais de diversão.
- Por causa do que aconteceu com o seus pais? – seu olhar era de pena e eu odiava isso. Por isso nunca falava disso a não ser com Mariah e John.
- Sim e não, sabe? Não estou só pensando em mim, mas obviamente existem mais pessoas sofrendo nesse mundo do que feliz.
Ela concordou em silencio.
- Quer saber, se eu tivesse criado um mundo todas às pessoas iriam ser felizes ou... Todas as pessoas iriam ser tristes, sem meio termo.
Ela deu um meio sorriso para mim.
- Acho que isso se chama livre arbítrio. Deus fez o mundo e é o grande criador, mas ele te da à escolha de querer ser uma pessoa boa ou ruim. Infelizmente nem todos preferem ser bons. Vai chegar uma hora que você vai entender que algumas perguntas não têm respostas.
Concordei com ela.
- Bem, por que não vai tomar um banho enquanto o almoço não fica pronto? Estou fazendo Almondegas.
- Tudo bem! – Ela saiu da cozinha
Estava pronta pra ir para o meu quarto quando John entrou.
- John, chegou cedo.
- Pois é, acabei esquecendo o carimbo para as folhas de admissão em casa, vou aproveitar para almoçar. Que cheiro maravilhoso!
- Almondegas. – disse com agua na boca.
- Hmmmm, Nana adivinhou. – Ele lambeu os lábios. – Você não ia para a biblioteca depois da aula?
- É, eu ia, mas o pessoal quer ir ao Birdland mais tarde, então resolvi ir no caminho.
- Em plena segunda-feira? – me olhou torto. - Não sabia que gostava de Jazz.
- Não tenho nada contra. – dei de ombros. – Então você está contratando na Brion Ross?
John se sentou ao meu lado e me encarou alguns segundos.
- Estou. – passou a língua nos lábios. – Por quê?
- John eu poderia...
- Não Brooklyn. Já tivemos essa conversa.
- Mas eu...
- Eu já disse que não. – dessa vez seu tom era rude e seu olhar frio. Decidi não insistir, por enquanto.
- John, tão cedo? – Nana entrou na cozinha nos interrompendo.
- Decepcionada?
Brincou e ela concordou indo direto ao forno.
- Vou por um prato pra vocês.
- Obrigada Nana. Já disse que você é a melhor?
- Me agradeça me dando um aumento.
- Eu vou tomar um banho. – dei um beijo em Nana e fui para o meu quarto.



Assim que sai do taxi meus olhos se encontraram com o de Brian, ótimo, eu deveria saber que ele estaria aqui também. Fingi que não o vi e segui caminho até a entrada do Birdland. Eu nem precisei olhar para perceber que ele estava logo atrás de mim.
- Brooke! – me chamou.
Respirei fundo antes de me virar para ele.
- Você já voltou das férias, que legal.
Resumindo a história: Eu terminei com o Brian duas semanas antes das férias de verão, mas ele não aceitou muito bem. Pediu que eu pensasse melhor durante as férias e depois que eu voltasse à gente poderia conversar novamente. Eu nunca tive a intenção de voltar com ele, mas ele acabou com qualquer chance de um termino amigável ao enfiar a língua dentro da boca da minha melhor amiga.
- Como foi na Austrália? – perguntou quando notou meu silencio.
- Eu não fui para Austrália.
- Ah não? Mas você disse...
- Eu sei o que eu disse.
Sua expressão era confusa.
- Então para onde foi?
- Pro Quin, semana passada. Eu te vi lá, aliás.
Os olhos dele se arregalaram rapidamente, de confusão para surpresa.
- Então você sabe, sobre eu e a...
- Pois é, eu sei! – deixei meus lábios em uma linha reta.
- Brooke. – apareceu e eu agradeci aos céus por isso.
- Canadá!!! Vamos entrar?
Puxei sua mão e entramos.
- Você acabou de me salvar. – o agradeci.
- Quem é?
- Meu ex, Brian.
- O cara que ficou com a sua melhor amiga?
- Esse mesmo.
Não tive tempo de procurar meus amigos, sentamos na primeira mesa vazia por que eu estava com tanta raiva que minhas pernas tremiam.
Brian sentou em uma mesa ao nosso lado e eu sei que era para me vigiar, ele sempre foi ciumento.
- Ele não para de olhar pra você.
realçou o óbvio.
- Ótimo. – rolei os olhos.
- Qual é o lance afinal?
- Eu já disse, ele ficou com a Emma.
arqueou as sobrancelhas.
- Emma é sua melhor amiga?
- É.
- E você está falando com ela, mas não está falando com ele?
O encarei.
- É complicado.
- Você tem certeza que não gosta dele? Se não gostasse não estaria espumando pela boca.
- Que? Nada a ver. – rolei os olhos. - Acho que se eu gostasse dele eu estaria sentada lá com ele e não aqui com você.
- Não, você estaria agindo exatamente como está agindo nesse exato momento.
- Você quer mesmo falar sobre ele?
- Não é errado você está se sentindo assim, é normal! Ele ficou com a sua melhor amiga, tudo bem! Mas pelo visto ele está querendo uma segunda chance com você.
- Do que está falando?
- Do jeito que ele te olha só mostra que ainda gosta de você.
- Que seja, nunca vamos voltar de qualquer forma.
- Tem que parar com isso. – apontou o dedo no meu rosto.
- O que?
- Você está se fazendo de forte pra não ir até ele e ouvir que ele tem para falar.
- Quem esta julgando agora, uh?
- A questão é que ele é um idiota e você não quer mais sair com idiotas.
- Ele é mesmo um idiota.
- Bem observado.
- Você é um idiota. – bati de leve em seu ombro.
- Mas tenho ótimos conselhos, e uma intuição aguçada.
- E o que a sua intuição está te dizendo? – não escondi um sorriso.
- Que você teve um desapontamento no seu relacionamento, e agora está com os escudos armados pra não se deixar levar por qualquer cantada barata.
Fiquei quieta, novamente ele estava me mostrando algo que eu não queria ver.
- Você devia parar de me fazer parecer uma garota mimada.
- E você devia parar de me olhar como se eu fosse seu amiguinho colorido. Talvez eu queira mais do que te dar conselhos.
- Você não está afim de mim. – rolei os olhos.
- E o que te faz pensar isso? – me encarou seriamente, mas seus lábios apontavam diversão.
- Qual é!
- Você é uma garota inteligente, bonita, engraçada, aparentemente cai fácil na minha lábia, eu não poderia querer mais.
- Caio fácil? Você não deve estar se lembrando dos foras que eu te dei no bar do Quin, está? – ambos rimos.
- Eu estava bêbado, nem me lembro do que eu disse. – ele riu mais. – Mas estou feliz de ter te conhecido. Não foi fácil sair do Canadá direto para Nova York.
- Eu imagino que sim. – pousei minha mão sobre a sua. – Mas você pode contar comigo sempre que precisar. Apesar de ter sido um idiota monossílabo hoje mais cedo. E eu não sou nenhum prodígio. – Ele ampliou seu sorriso.
- Acho que fiquei intimidado.
- Aí está você, estávamos te esperando.
Josh apareceu ao meu lado sorrindo, mas ficou sério ao ver ao meu lado, depois seus olhos se escureceram ao ver minha mão sobre a dele. Tirei no mesmo instante.
- Chegamos há uns dez minutos.
- Vieram juntos? – arqueou a sobrancelha.
- Não, me encontrou na entrada e me salvou do Brian.
Apontei discretamente para a mesa ao lado.
- Aquele babaca. – ele rangeu os dentes.
- Brooke, . – Ed apareceu de algum lugar. – Venham, vão liberar o karaokê.
Ed me puxou pela mão.
- Espera. – pedi assim que notei que ficou para trás. – Você não vem?
- Vai na frente, eu vou depois.
- Ta bom. – lhe dei um sorriso simples e fui até o palco com meus amigos.




Ed e Emma cantavam Sorry do Justin Bieber e tentavam dançar ao mesmo tempo o que não faziam muito bem, resultando em algo bem engraçado. Eu tentei ao máximo me divertir, mas Brian estava há alguns passos de mim. Rolei os olhos...
- Você está com raiva de mim? – perguntou como se fosse ingênuo.
- Por que eu estaria com raiva de você? – arqueei a sobrancelha sendo irônica.
- Por que você me viu com outra garota...
- Te vi beijando a minha melhore amiga. Você quis dizer! – o corrigi sem tirar os olhos do palco.
- Isso! – sua voz era de insegurança.
- Não temos nada Brian, você pode ficar com quem quiser.
- Mas o que nós tivemos, eu...
- Espero que tenha aproveitado, por que não vamos ter mais nada.
- Então você ficou com raiva?
Sério?
- Você beijou a minha melhor amiga não só na minha frente como na frente da Trinity inteira. Você não vê a gravidade dos seus atos?
- Não achei que estivesse lá.
- E você achou que Emma não me contaria? Ou algum dos meus amigos? Realmente achou que eu não saberia?
- Eu entendo a sua raiva Brooklyn, mas eu agi por impulso, não sei. Achei que se você visse que estava me perdendo você voltaria atrás na sua decisão. E por que você não está com raiva da Emmalyn? Ela é tão culpada quanto eu sou.
- Você não vale tanto assim, a ponto de estragar uma amizade.
Os olhos deles estavam arregalados, um pouco surpreso com o que ouviu.
- Brooke, sei que você já sabia da minha reputação quando aceitou sair comigo.
- E com quantas meninas você fez o mesmo teatrinho?
- Eu nunca me senti bem com uma garota dessa forma. Só você.
- Fala sério. – cruzei os braços diante o peito.
- Você realmente é diferente de todas as garotas com quem eu sai, e se eu pudesse teria evitado essa cena que você viu...
- Não, foi bom ter acontecido Brian Scott. Ficou mais fácil terminar com você de vez.
- Então você não tinha nenhuma intenção de voltar comigo?
- Não! – fui direta.
- Você está dizendo isso por causa do beijo, eu sei.
- Não estou não.
- Então isso quer dizer que está com ciúmes.
Esforcei-me pra não rolar os olhos.
- Eu vou me fingir de desentendida.
- É por que faz sentido o que eu falei, não é?
- Só não quero continuar um assunto que não vai nos levar a lugar algum.
- Você está saindo com outra pessoa? É isso? – segurou meu braço. O Brian ciumento apareceu seja lá onde quer que ele estivesse.
- E se for? – puxei meu braço no mesmo instante
- Responda. – sua voz tinha um tom autoritário, e meio que me assustou.
- Eu não te devo explicação de nada, se enxerga. – Sai pisando firme até a saída.
- Não, espera! – Me alcançou, mas não tocou em mim. – Me desculpe, eu não sei o que esta acontecendo. Só de pensar em você com outro...
- Realmente não me importa.
- É só que agora eu... Eu, eu tenho uma noção de como você pode ter se sentindo quando me viu com a Emma.
É sério isso?
- Você não pode ter uma noção do que eu senti, por que eu não tenho sentimento em relação a você. Nada! É vazio. Não tenho ressentimentos, nem mágoas, e às vezes nem lembro que você existe.
- Eu...
- Você é um problema seu! – me alterei, mas logo tratei de abaixar o tom por que tinha algumas pessoas a nossa volta.
- Eu só estava com medo de te perder, eu nunca fiquei sério com ninguém antes. E essa tática de provocar ciúmes... Meus amigos, sempre deu certo pra eles. E pra muitas pessoas!
- Então você é a maior prova de que nem todo mundo merece o amor que recebe.
- Brooke...
- Me esquece Brian.
Retirei-me do Club.
Para o meu ego, foi bom saber que apesar de tudo, ele ainda tinha alguma esperança de ficar comigo, e para o bem do meu ego, foi melhor ainda tê-lo rejeitado, sabendo que depois dessa noite, qualquer chance de me envolver com Brian Scott novamente era nula.
Mandei uma mensagem para Emma dizendo que iria embora mais cedo enquanto esperava um taxi. Estava frio e amanhã ainda era terça-feira. Vi sair acompanhado por April Granger do terceiro ano e estavam se divertindo muito. Os braços entrelaçados e estavam muito próximos. Fiquei encarando aquela cena até ouvi uma buzina tocar. Era Josh.
- Quer comer alguma coisa?
- Você leu meus pensamentos.



Eu não sabia que estava com tanta fome até o meu lanche chegar. Comi minhas batatas fritas em segundos enquanto sentia o olhar de Josh sobre mim.
- Pode perguntar seja lá o que esteja enfurnado na sua cabeça. – o peguei de surpresa.
- Não é que... Você e o canadense se deram bem né?
Fiquei surpresa em saber que esse era o assunto, achei que falaria de Brian ou do beijo.
- É, acho que sim. – dei de ombros.
- Rápido de mais. – acho que comentou mais para ele do que pra mim.
- O que quer dizer com isso? – o encarei seriamente.
- Eu me lembro de quando você chegou à escola, parecia um gato encurralado e com medo do mundo. Não deixava ninguém se aproximar até que Emma não te deu muitas opções.
Sorri ao me lembrar desse dia, Emma disse que sempre que me via no canto, sozinha, ela tinha uma tremenda vontade de conversar comigo, de ser minha amiga. No começo achei que fosse por pena, mas ela realmente é uma garota especial e Brian jamais irá estragar isso.
- Eu não sou mais aquela garota com medo do mundo Josh, eu cresci, amadureci e enfrentei os meus medos. – nem todos. Acrescentei mentalmente.
- É, com certeza você não é. – não sei por que, mas eu não gostei do tom de voz dele.
- Você tem algo pra me dizer? – cruzei meus braços, olhos fixos aos deles.
- Primeiro o Brian, a ultima pessoa do mundo que eu pensei que você fosse se interessar, e agora um cara que você nem conhece...
- Espera, você acha que eu gosto dele?
- Eu sei que você gosta.
- Isso é ridículo! E como você mesmo observou, eu nem conheço o cara. É essa ideia que você tem de mim? – meu tom era de espanto.
- Não, Brooke! Não me entenda mal, mas eu só estou dizendo o que está bem obvio.
- E o que é?
- Que você se interessou pelo cara.
Bufei bem alto.
- Se toca Josh, ele está com a April! – disse a primeira coisa que veio em mente. – E ele não faz o meu tipo de qualquer forma. – me levantei e estava brava. – Já que insiste, você pode pagar a conta. – peguei minha bolsa e o meu lanche e sai da lanchonete.





Quando entrei no prédio não segurei um riso ao notar que John, Nana e o Paterson, nosso porteiro, estavam sentados no chão da recepção jogando uno. E pela expressão em seus rostos, eles se divertiam muito.
- Brooke, chegou cedo. – John olhou para seu relógio no pulso. – Ainda são oito e meia.
- Estou meio cansada.
- Quer que eu prepare alguma coisa para você comer? – Nana mencionou a se levantar
Neguei.
- Comi um Hamburgão do caminho.
- Então quer jogar com a gente querida?
- Quero sim. – Sorri ao meu sentar entre ela e Peterson.
- Nos conte como foi seu primeiro dia de aula. – Peterson pediu ao dar as cartas. Todos me olhavam em expectativas.
- Descobri que eu sou a melhor aluna da Trinity. – informei.
- Não! Isso é sério? Quem poderia imaginar? – John debochou de mim.
- Eu não sou a melhor aluna daquela escola, eu nem acredito em Deus e isso deveria ser levado em conta.
- Os que eles com certeza levam em conta são as suas doze notas A+ seguidas no ultimo ano.
- Na verdade, eu tirei B- em matemática avançada. – O corrigi.
- Não teve nenhuma novidade na escola? Por que suas notas até eu posso adivinhar. – Nana disse com um tom entediado.
- Vocês não me deixaram terminar. – Joguei um oito azul em cima do oito amarelo da Nana. – Então, como eu ia dizendo, descobri que eles acham que sou a melhor aluna da Trinity e por isso tive que mostrar a escola para um aluno novo.
- Hmm, fez novas amizades? – Agora Nana parecia interessada.
- Mais ou menos.
- Estranho. A Trinity geralmente não aceita alunos para o ultimo ano, a formação acadêmica dele não estaria completa ao modo de ensinamento da escola. – John ficou confuso.
- Talvez ele estivesse há muito tempo na fila de espera.
- Pode ser. – ele deu de ombros.
- Ou ele quer ser Padre. – Peterson brincou.
- Pode ser também. – John disse sério, mais seus lábios puxavam para um sorriso, assim como Nana.
- E ele veio do Canadá, então não tinham muitas opções. – John jogou um +2 para Nana que olhou bravo para ele. – E como foi seu dia Sr. Peterson?
- O de sempre. – disse simplesmente e depois pareceu se recordar de algo. - Ah! Comprei suas rosas favoritas e pedi Nana para colocar em um vaso no seu quarto. Desta vez com agua pra não murchar.
Todos riram e eu tive a certeza de que se lembraram de quando eu trouxe as rosas vermelhas pra casa e as coloquei em um vaso sem água, o que as fez murchar em tempo recorde.
- Sr. Peterson você é um gênio – disse com ironia.
- Já me chamaram muito disso.
- De gênio?
- Não, de Sr. Peterson.
Sorri novamente
- E ele é bonito? – Nana chamou minha atenção.
- Quem?
- O aluno novo.
- Bom, é! Mas é uma beleza normal.
- E vocês se deram bem? – Agora foi à vez de John perguntar.
- Por que não nos daríamos bem? – Arquei a sobrancelha para ele.
- Por que você às vezes é bem fechada em relação às pessoas.
- Eu o levei para conhecer a escola e não para um encontro, posso me virar quanto a isso.
- Só amigos, então? – Peterson me encarou.
- Não estou entendendo esse interrogatório. – Joguei minha ultima carta sendo a primeira a sair, como sempre. – Eu vou subir. Estou cansada.
Me levantei e sai sem olhar pra trás, mas sabia que eles estavam fofocando o que me fez revirar os olhos.


***

- É aqui que eu moro. – a menina com quem eu havia passado uma grande parte da minha noite sinalizou para um prédio muito alto localizado no centro de Manhattan. Ele se virou para mim com um sorriso misterioso. – Você quer subir? Os meus pais estão viajando, estou sozinha em casa.
- Eu adoraria, Alice...
- April! – me corrigiu e eu concordei.
- Isso, eu adoraria April, mas está meio tarde.
- Tem certeza?
Sob seus cílios eu pude ver seus olhos queimarem de desejo. Sua respiração estava acelerada e suas pernas se cruzavam constantemente. Eu até gostaria de subir, mas a minha mãe ficaria muito preocupada, então era melhor não contrariar.
- Infelizmente eu tenho. – lhe dei um meio sorriso, um pouco sem graça em ter que recusar seu pedido.
Ela ficou alguns segundos em silencio apenas me encarando e então tirou o cinto de segurança e montou em mim com certa dificuldade. No instinto empurrei o acento para trás para que ela pudesse se sentir mais a vontade sobre mim enquanto ela trabalhava em retirar o meu cinto de segurança. Sua boca buscou a minha com certa urgência e minhas mãos pousaram em sua cintura a empurrando em direção a o meu quadril. Seus lábios eram tão macios e convidativos, nossas línguas se enroscavam em uma dança sincronizada e eu estava começando a ficar muito excitado. Se ela continuasse eu teria que repensar no seu pedido. Quando pensei em subir minha mão até seus cabelos ela se afastou, mas ainda conseguia sentir a sua respiração quente em meu rosto.
- Isso é pra você ter uma ideia do que vai perder.
Um sorriso de lado surgiu em seu rosto e ao se aproximar novamente ela me deu um selinho demorado. Depois pegou sua bolsa no banco de trás e abriu a porta.
- Até amanhã, !
Esperei ela sair do carro e entrar no prédio para poder soltar a minha respiração. Assim que ela sumiu de vista me joguei para trás pousando minha mão sobre a testa e fechando os olhos. Que garota!


***


Abri meus olhos rapidamente ao sentir um tremor em meu corpo, tinha alguma coisa errada. Olhei a minha volta analisando a situação. Meu quarto estava escuro e silencioso, mas eu conseguia ver algumas coisas, como a porta do closet, minha escrivaninha, a porta da sacada e o teto. Parecia tudo em ordem, exceto pelo fato de que meu corpo não se mexia, apenas meus olhos. Comecei a entrar em pânico mentalmente, minhas pernas e braços não respondiam ao meu comando, ao invés disso, meu corpo todo tremia por dentro, com uma rapidez avassaladora. De repente parou e meu corpo ficou instável. Não me lembrava de ter dormido de barriga para cima, mas aqui estava eu, com os olhos esbugalhados de medo e confusão. Então eu senti algo em cima das minhas pernas, olhei rapidamente para baixo e não tinha ninguém, apenas a sensação estranha de que algo estava subindo em cima de mim. O pânico tomou conta mais uma vez e comecei a tentar me debater, até conseguir recuperar o controle de alguns movimentos e no fim eu consegui me mexer por completo. Sentei-me na cama ligando o abajur em cima do criado mudo e vasculhei todo o meu quarto com os olhos e não tinha ninguém, só a sensação de ter alguém comigo. Levantei-me com cuidado, sentindo meu coração bater aceleradamente e fui até o closet, respirei fundo antes de abri-lo e me certificar que também estava vazio, exceto pelas minhas roupas, sapatos e outras coisas. Talvez tivesse sido só um sonho ruim, eu sempre tenho sonhos ruins. Só que desta vez foi muito diferente. Desta vez foi real e intenso, geralmente eu sonho com coisas que me aconteceu no passado, lembranças dolorosas. Mas este sonho foi muito diferente de qualquer coisa que eu já tenha sonhado.
Um barulho na porta me fez pular de susto, me virei quase de imediato sentindo um estalo em meu pescoço.
- Brooklyn, ainda está acordada? – John colocou apenas a cabeça para dentro quarto.
Esperei minha respiração se acalmar para poder lhe responder. Meu coração parecia querer sair da boca.
- Acabei de... Acordar. – apoiei minhas mãos no joelho.
- Aconteceu alguma coisa? – seu semblante era de preocupação, me sentei na cama mais uma vez e o vi entrar o quarto.
- Acho que só tive outro pesadelo. – pisquei varias vezes olhando para as meias em meus pés.
- Com seus pais? – ele se sentou ao meu lado.
- Não, desta vez foi com outra coisa.
- E era sobre o que?
- Não me lembro. – menti por que eu não saberia explicar.
- E por que você acha que foi um pesadelo?
- Por que eu não sei se eu sonhei ou se foi real.


Capítulo 3 - Demônios.

A Chuva caia sem parar pelas ruas de Manhattan e eu estava com a menor vontade de sair da cama hoje. Ainda estava meio transtornada pelo sonho que tive há algumas semanas e que se repetiu por mais três vezes. Eu tinha medo de dormir em algumas noites, pegava alguns livros e os relia, estava ficando cansada de mais, mas ainda assim me esforçava muito para não me prejudicar na escola e que ninguém percebesse. Por mais que eu quisesse pensar em qualquer outra coisa, eu não conseguia. Espreguicei-me e bocejei lentamente, sabia que estava atrasada para o colégio, mas eu não me importava. Depois de relutar bastante eu decidi me levantar e andar até a janela, abri um lado da cortina e fiquei olhando a chuva cair maravilhosamente do lado de fora.
- Está atrasada de proposito. – Nana entrou no quarto colocando uma bandeja sob a cama e meu estômago roncou. – Como você não pode faltar aula eu decidi adiantar o seu café da manhã, passar seu uniforme e deixar em cima da cama pra você não perder um segundo se quer. – adentrou meu closet.
Sorri pra ela e me sentei à cama me deliciando com um pouco de suco de laranja que eu simplesmente amava. Ela voltou na mesma hora em que John colocou a cabeça para dentro do quarto.
- Ainda não levantou? – Ele entrou e se escorou na penteadeira pegando uma de minhas fotos com Lucy. Ele sempre olhava aquela foto.
- Vocês não estão vendo toda aquela agua caindo do céu? – apontei para fora. – É um sinal claro de que devo ficar na cama e dormir por mais dez horas. Aliás, você deveria dar folga para a Nana.
- Só por que nos meus dias de folgas eu gosto de ir à praia ou fazer caminhada? – Nana disse com um tom de deboche que com certeza aprendeu em convivência com John. – Você é muito boa pra mim.
- Desde quando você acredita em sinais? – John largou o porta retrato e se sentou na cama. – Todos já estamos cientes do seu ceticismo.
- É... – dei uma pausa para mastigar e engolir meus waffles. – Mas eu adoraria saber quem coloca a água dentro do coco.
John rolou os olhos ao ouvir minha piada.
- Ou como vivemos em uma bola flutuante. – Nana disse baixinho enquanto guardava algumas de minhas roupas e eu balancei a cabeça exageradamente para John em sinal de concordância com o que ela havia falado.
- É um ótimo tema para o seu próximo trabalho anual, o que acha? – John se levantou da cama e lhe dei uma risada sarcástica ao me levantar também.
- Se a Trinity descobrir que eu tenho dúvidas sobre a existência de um ser supremo eles me expulsam e ainda alegam que foi por justa causa. – me arrastei até o banheiro. – Vou tomar um banho.
- Espera ai. – ele me olhou cauteloso. – Você tem duvidas se Deus existe ou não?
O encarei processando aquela pergunta.
- Bem, eu... Eu não sei. Ás vezes eu sei que ele não existe, mas ás vezes eu paro e penso que pra mim seria mais fácil acreditar nisso por que teria uma justificativa de tudo que aconteceu comigo.
Ele concordou em silencio ainda me encarando.
- Estou tentando entender se é um fato ou se eu só estou querendo me cegar diante essa situação.
John me deu um sorriso simples e andou até a mim me dando um abraço apertado.
- Talvez ainda aja esperança pra você.






- Não olha agora, mas o seu gatinho não para de olhar pra você.
Encarei Emma tentando processar aquela frase. “Não olha agora”, mas eu precisava olhar. Me encolhi na cadeira da lanchonete e olhei por cima do meu ombro. Era Josh, e ele realmente me olhava.
- Ele não é meu gatinho. – me apressei em dizer.
- Só por que você não quer.
- Ele é meu melhor amigo.
- O que isso tem a ver? Vocês podem se pegar e continuar amigos, dá certo para muitas pessoas.
- Tipo você e Elijah? – ela abriu a boca para me responder, mas pensou melhor e ficou quieta.
Rolei os olhos. Vi passar por mim, e não disfarcei ao sustentar o olhar dele.
- Uuuuh, que tensão! Por que não vão procurar um quarto?
Olhei Emma boquiaberta.
- Do que está falando?
- Dessa troca de olhares com o Canadense, admite vai, você está muito afim dele. Assim como todas as meninas da Trinity.
- Olha, em primeiro lugar eu não estou afim dele e depois, ele está saindo com a April Granger.
- É sério? – Emma olhou para a mesa do lado notando que os dois estavam sentados juntos. – Ela é muito bonita.
- Eu sei. – disse em um tom um pouco irritado.
- Mas você é mais, sem falar que ela é muito fácil. Ele vai enjoar dela rapidinho.
- Bom saber que eu posso ser a segunda opção de alguém.
Emma rolou os olhos e depois jogou seus cabelos castanhos e brilhosos para trás dos ombros.
- Você não precisa fazer drama. É só ir até lá e perguntar se ele quer sair com você.
- Por que eu o chamaria para sair?
- Por que ele foi o primeiro garoto depois do Brian, que você se aproximou.
- Eu pensava que ele era gay.
- Isso não é uma desculpa. Você está fazendo de novo, está retalhando suas emoções por que você não quer se envolver.
- Ele é um colega, eu mal o conheço. Não tenho sentimentos por ele.
- Eu conheço você Brooke, morre de medo de se entregar, de se apaixonar. Eu não entendo isso.
- Você sabe que eu tenho certos problemas em confiança.
- Você nunca vai poder confiar no cara se você não o conhecer melhor.
- Qual a parte de que o Canadá está saindo com a April você não entendeu?
Olhei para o meu iogurte sem a menor vontade de tomar.
- Quer saber, isso nem é um pretexto para não ir falar com ele. Você está com medo.
- Eu estou com medo? Eu estou com medo do que exatamente?
- De gostar dele, está com medo de sentir algo por ele.
- Não, nada haver. – me mexi desconfortável. – Eu nem penso nele dessa forma. – dei de ombro
- Por que você é assim, certinha e medrosa.
- Eu não sou certinha. – contrapus, pendendo minhas costas no acostamento da cadeira.
- Não é certinha? – Perguntou indignada, e eu rolei os olhos. – Você não fuma, não bebe, nunca brigou com John, nunca tirou uma nota baixa, nunca fugiu de casa pra ir a alguma festa, você nunca vai a uma festa sem a gente te arrastar. – Ela se aproximou de mim cochichando. – Você é virgem.
A encarei.
- Você falando dessa forma...
- Não estou dizendo que você precisa mudar quem é, por que nós te amamos do mesmo jeito, mas se você continuar fechada para relacionamentos você vai acabar como a minha tia Dulce e seus trezes gatinhos.
- Você não tem uma tinha chamada Dulce.
Ela deu de ombros.
- Você devia mesmo ir falar com ele.




- Eu te ajudo. – se antecipou em me ajudar a tirar um livro de uma das estantes da biblioteca.
- Esta alto de mais. – ele conseguiu pegar. – Obrigada.
- Você sabe agradecer então? – Acompanhou meus passos quando o deixei pra trás.
- O que quer dizer?
- Você ás vezes é arrogante comigo, e outras não.
- Bem vindo ao mundo feminino.
Ele sorriu.
- Por que toda essa pressa?
- Preciso ir até a secretaria pegar a postila da para a aula de Álgebra.
- Quer companhia?
- Por que eu te chamaria para ir ate a secretária? Você acabou de me chamar de arrogante.
Passei a mão pelo cabelo tentando conter a minha diversão em ter aquela conversa.
- Já que perguntou... – ele tinha um sorriso nos lábios enquanto me induzia a caminhar com ele. – Eu diria que as razões para um convite seriam por que sou gente boa, bacana, simpático, que apesar da sua arrogância e antipatia, eu sempre lhe tratei bem. Independente de tudo.
- Direto! Assim como quando me chamou de arrogante, aliás, obrigada pela “antipatia”, vai entrar para a lista dos defeitos que você está encontrando em mim.
- Como você pode perceber, eu sou sim muito sincero, o mundo precisa de pessoas assim e não de mentes inférteis como a maioria. Mas... – ele suspirou ao inclinar sua cabeça e me olhou atentamente. Ele é tão lindo. - Isso talvez não seja seu defeito e sim uma das suas qualidades que lhe deixa um pouco mais interessante. – sua voz era serena e traiçoeira.
Ele me achava interessante? O que? me acha interessante? Isso está vindo de um cara que está saindo com a garota mais desejada da Trinity? Ele notou meu silêncio repentino e minha confusão obvia, e ai deixou um sorriso cafajeste escapar dos lábios. Ele é muito convencido.
- Desculpe se falei de mais. A culpa é sua, pois se me tratasse como todas as garotas eu não estaria aqui, falando de mais. E tentando me explicar.
Respirei fundo tentando assegurar de que minhas palavras daqui em diante seriam extremamente calculadas. Não sou as “outras garotas”.
- Não precisa se desculpar. Gosto das palavras, principalmente as que são usadas para me definir. – Comecei a andar o deixando pra trás. – Agora eu sou uma pessoa arrogante, antipática, porém interessante. Sua mudança de humor está me confundindo!
- Não, me entenda. – me alcançou. - Você foi arrogante algumas vezes, e antipática, porém você é carinhosa e divertida quando quer. Isso te torna uma pessoa diferente. Nem sempre má, mas nem sempre boa.
- Carinhosa... – pensei sobre tal palavra. – Eu poderia me acusar de muitas coisas, menos de carinhosa!
- Você se conhece melhor do que eu, isso é apenas uma das poucas expressões que eu identifiquei pelos poucos momentos que conversamos. Posso estar enganado ou não, não sei, vamos ver com o tempo.
- Dizem que às vezes as pessoas são exatamente aquilo que aparentam ser! Acho que esse é o meu caso. Não gosto de fingir sentimentos em relação a ninguém. Eu sou assim, mas pelo que vejo você meio que gosta desse tipo de personalidade. Na verdade, ainda estou tentando te entender.
Ele me encarou com uma expressão sombria, e continuo a sorrir.
- Não vai ser fácil me entender. – ele passou seus dedos longos por seus cabelos brilhosos. Eu queria que fosse eu a fazer isso. – Gosto de pessoas divertidas, e você me faz sorrir com os seus sacarmos. Este é o ponto.
- Me acha divertida? – arqueei a sobrancelha. – Talvez tenhamos um progresso.
- Digamos que isso me fez querer me aproximar de você, por isso nos damos bem. – Mordeu seu lábio enquanto me encarava. – Mas ainda te acho arrogante. – Começou a andar na minha frente.
- A sinceridade sempre é bem vinda. – sorri e depois o acompanhei. – Mas cuidado com as suas palavras, como sabe, eu sou arrogante. E no momento estou me segurando para não mandar você ir pra um lugar bem chato.
- Acho que já estamos nele. – e aquele sorriso que não saia dos seus lábios havia se engrandecido.
- Sei que é mais inteligente do que isso.
- Bem, eu adoraria continuar a discursão, mas acho que chegamos à secretaria.
Olhei para a porta esperando que alguém saísse dali de dentro e me puxasse, para ter que evitar uma despedida constrangedora.
- Por mais que seja difícil admitir, você é divertida. – tinha um tom brincalhão. – Considere um elogio vindo de mim, isso não é frequente.
- Acho que é por que você tem uma queda por mim. – brinquei. – Torna minha presença mais tolerante. – eu disse isso mesmo?
Seus olhos escureceram em tempo recorde.
- Não coloque palavras em minha boca. Não sou tão fácil quanto aparento.
- Você ficar afim de uma pessoa não significa que você é fácil.
- Eu costumo flertar, flertes são sempre bem vindos. – escorou a mão na parede e continuou a me olhar daquele jeito.
Mordi meu lábio me divertindo em jogar o mesmo jogo que ele.
- Então, eu opinei errado sobre o fato de você ter me achado um pouco interessante, mesmo sendo arrogante e antipática. Me achado engraçada, abre aspas – carinhosa – fecha aspas, por que essa personalidade eu desconheço. Resultando em eu ter confundido uma “queda por mim” como um simples flerte? – Rolei os olhos – É verdade, onde eu estava com a cabeça quando imaginei isso?
- Acho que tira conclusões precipitada de mais das pessoas, até por que você parecia relutante em me deixar me aproximar antes. Acabamos de nos conhecer...
- Isso é meio irrelevante agora, não acha? – dei de ombros. – Pelo menos eu vou ter a liberdade de conversar com você sabendo que seus interesses são inteiramente mútuos. Ou seja, amizade! – molhei os lábios. – Pode ficar tranquilo. Sei ser amiga de alguém.
- Isso foi desnecessário.
- Depende do ponto de vista.
- Geralmente flertes são indicações de interesse, você nem se quer entendeu o que eu quis dizer quando os mencionei, fora que depois já veio me pré julgando, dizendo que meus interesses são mútuos... – fingi que não estava nem ai, mas não conseguir segurar o riso, e quando fiz menção pra entrar na secretaria senti seu braço me puxar de volta. – Creio que está querendo jogar. Um motivo para se sair bem na conversa, esperta. Porém meio desnecessário.
- Você estava relutante em dizer que tinha certo interesse, eu só dei um empurrãozinho.
- Isso quer dizer que se eu te convidar pra sair, você vai aceitar?
- Não! – disse de uma forma bem direta e óbvia para que ele não insistisse, mas eu deveria saber que isso não o impediria de continuar tentando.
- E eu posso saber por que estou sendo rejeitado tão friamente?
- Por que além de você não fazer o meu tipo, você já está saindo com a April.
Ele me olhou daquele jeito desconfiado, com total confiança de que fazia o meu tipo. Assim como fazia de todo mundo.
- Você sabia que muitas garotas desta escola adorariam estar no seu lugar?
Minha nossa, como ele era convencido.
- Ótimo! Então você não precisa de mim.
Ele me encarou silenciosamente por alguns segundos.
- Eu não desisto fácil.
- Continue tentando.
Com uma piscadela eu lhe dei as costas.




- Você se recusou a sair com ? – A foto de Ed surgiu na tela do chat.
Ignorei e continuei com minhas pesquisas.
- Qual é o seu problema? Ele é tipo, o garoto mais desejado da escola no momento e está querendo sair com você e você o rejeita?
- Você leu a parte em que ele está saindo com a April?
– Lhe respondi ligeiramente.
- A April? Esquece. Ele deve estar só se divertindo.
- Bem, comigo que ele não vai se divertir.
- Autocontrole gata, sempre admirei isso em você. Mas “libera” logo pra você saber o que é diversão de verdade.
Enrubesci no mesmo instante, cruzando meu olhar até os fundos da sala. Concluí a conversa do chat e entreguei meu dever para a professora me retirando da sala.
Tropecei em Brian.
No mesmo instante esperei que ele fosse tirar um papel do bolso e começar a ler um pedido de desculpas, mas ele só me olhou silenciosamente e saiu andando corredor a fora.
No caminho até o corredor dos armários vi que haviam publicado algo no mural de noticias e fui dar uma olhada.
Ah! A semana das oficinas estava chegando. Teríamos fotografia, teatro e artes.
- Já sabe qual vai fazer? – Elijah apareceu ao meu lado olhando o nome dos inscritos em cada categoria.
- Vou me inscrever em fotografia, não sou boa com os outros dois. – tirei uma caneta do meu estojo e escrevi meu nome.
- Brooklyn Bennette não sendo boa em algo? Difícil de acreditar. – Suas palavras estavam cheio de sacarmos e eu lhe dei um empurrão de leve.
- Saíram a inscrições para as oficinas? – Josh se pôs entre nós dois olhando as opções. – Por que não colocaram musica de novo?
Dei de ombros.
- Pelo menos o Ed vai gostar de uma das opções.
- Finalmente vamos saber se ele tem talento para a Juilliard. – Josh disse e depois se inscreveu em arte.
- Arte? Você não sabe nem escrever o seu nome direito. – Elijah implicou com ele.
- Ai estão vocês, o que estão fazendo? – Ed se acercou de nós.
- Inscrições para a semana das oficinas. E olha o que vai ter esse ano. – apontei para a folha.
Ed deu uma olhada e eu pude jurar que seus olhos brilharam.
- Não acredito. Deus ouviu as minhas preces! Finalmente! Será que vai vir algum olheiro da Juilliard?
- Eu espero que não. – Elijah se escorou na parede.
- E por que você está me gorando?
- Não é isso, mas... Sabemos que você não sabe cantar, muito menos dançar. Qual talento você vai usar para impressionar os olheiros?
- O meu talento é natural, qualquer um que me olhe pode perceber isso. – passou a mão no topete.
- O único talento que todos percebem que você tem é irritar os outros. – Falei ao me afastar do grupo sabendo que eles vinham logo em seguida.
- O que?
- E fazer fofoca!



***

- O que é isso? – apontei para as pessoas aglomeradas no mural da escola.
- Abriram as inscrições para a semana das oficinas. – April respondeu enquanto estava agarrada ao meu braço.
- E como funciona isso exatamente? – fiquei intrigado e andei até o mural.
- Você escolhe uma categoria e pratica ela em grupos, a escola diz que melhora o nosso percentual em atividades extracurriculares.
April deu uma olhada nas opções e então acabou se escrevendo em artes.
- Isso vale nota? – perguntei meio contrariado em querer participar disso.
- Tudo que você faz aqui vale para alguma coisa.
Pensei em me escrever em artes junto com April, mas o nome da Brooklyn em fotografia me chamou atenção. Me inscrevi no mesmo instante recebendo um olhar de reprovação de April.
- Fotografia? Não é só olhar para alguma coisa e tirar foto. Isso aqui é a Trinity, você ao menos sabe o que é uma foto panorâmica?
Perguntou como se eu fosse um ignorante. Mas eu não a respondi, apenas fiquei encarando o nome da Brooklyn na lista e deixei um sorriso escapar ao recordar a nossa conversa mais cedo.
- Gosto de desafios.

***

Após o término das aulas decidimos ir até o Central-Parker para jogar mais conversa fora. Sentamos no gramado e começamos a jogar banco imobiliário. Não sei como e nem quando, mas acabei pegando no sono no meio do jogo. Acordei sentindo cócegas no meu braço, na coxa e na minha bochecha. Eles estavam me pintando e eu estava cansada de mais para protestar.
- Ela acordou e não nos xingou. Ok... Estou preocupado. – Ed parou de fazer um coração na minha coxa e me encarou.
- Você está bem? – Emma perguntou com o cenho franzido.
- Não, na verdade. – fui sincera.
- O que houve?
- Não estou dormindo muito bem esses dias. – me levantei e me escorei em um tronco qualquer.
- E por que não? – Elijah parou de jogar e também me encarou, assim como Josh.
- Estou tendo uns pesadelos estranhos esses dias.
Pela primeira vez decidi conversar com alguém sobre isso. Pelo menos até Mariah voltar da Itália.
- Quer nos contar o sonho? – Emma pediu.
Encarei meus amigos ainda sonolenta e muito confusa. Bocejei antes de começar a falar.
- Eu acho que me vejo dormindo, não como se eu saísse do meu corpo, mas eu meio que acordo na consciência, sabe? Me vejo deitada na cama, olhando a minha volta, o meu quarto escuro...
- E o que tem de estranho nisso? – Josh perguntou.
- O estranho é que eu não tenho controle sobre os meus movimentos, eu não consigo me mexer, só os olhos. E então meu corpo começa a tremer, mas por dentro. Entendem? E quanto mais eu tento recuperar meus movimentos eu vou ficando sufocada. – Todos me olhavam atentamente. – Na primeira vez eu senti algo subindo na minha cama, por cima das minhas pernas, com muito custo consegui me recuperar e levantar. E quando isso acontece, não consigo pegar no sono de novo, com medo de acontecer mais uma vez.
Fiquei olhando para a grama verde e cheirosa me sentindo estranha por saber que eles não iriam me entender e começar a me achar esquisita.
- Por quanto tempo você fica sem se mexer? – Elijah perguntou ao juntar as pernas e cruzar os braços em volta delas.
- Não sei! Ás vezes uns dois minutos, ás vezes cinco. Só sei que algumas vezes demora mais que outras.
- E acontece com que frequência? – tornou a perguntar.
- Quatro vezes em quase um mês.
- Estranho... – ele sussurrou para ele mesmo.
- Você sabe de alguma coisa sobre isso? – Perguntei me sentindo desperta de repente e a atenção de todos agora era de Elijah.
- Isso se chama paralisia do sono. – Ele tirou o celular do bolso e começou a pesquisar algo. – Ou deveria ser. Olha, é uma coisa muito comum de se acontecer, mas não com frequência. – me entregou o celular com a pesquisa aberta. – Geralmente quando estamos pegando no sono ou já em um sono profundo, nossa mente meio que desliga o nosso corpo, para que não aconteça algo enquanto estivermos dormindo, como nos debater e essas coisas. Costuma durar por volta de alguns minutos e como eu disse, não acontece com frequência, embora aconteça com 99,99% da população em geral.
- Credo. – Josh disse meio atordoado.
- Esses sintomas de sentir o corpo tremer ou sentir alguém subindo nas suas pernas é desconhecido por mim e por pessoas que desenvolveram essas pesquisas.
- Isso por que tudo tem que ter uma explicação cientifica. – Ed se intrometeu na conversa.
- O que quer dizer?
- Quero dizer que deveríamos fazer uma seção espirita. – Ele se levantou juntando suas coisas.
- Você está dizendo que ela está sendo assombrada? – Josh, Elijah e Emma se levantaram e ficaram encarando Ed com descrença.
- Não sejam bobos, não existe isso de “fantasma”. Até existe, mas eles não podem fazer muita coisa.
- O que é então? – Me levantei e o encarei.
- Já ouviu falar em demônios? – arqueou a sobrancelha.
- O que?
- E qual a diferença entre fantasmas e demônios? – Josh quis saber e eu também.
- Pelo amor em amigos, vocês nunca assistiram filme de terror não? – depositou uma de suas mãos na cintura e outra coçou a testa. – Olha, “fantasma” são pessoas que já viveram no nosso mundo e morreram. Eles não têm intuito de querer fazer mal a alguém, no máximo querem visitar algum parente, matar saudade, essas coisas. Não que seja possível, é só uma teoria. – começou a andar de um lado para o outro. – Mas um demônio é algo que nunca foi humano. Que tem um poder sobrenatural e pode nos fazer mal através do medo.
Fiquei encarando Ed pensando na possibilidade de ser a minha mãe, ela poderia estar se comunicando comigo? Mas por que agora? Depois desses anos, logo agora...
- Fantasmas podem ser uma teoria e um demônio não? – Elijah perguntou a Ed.
- Vocês nunca leram a bíblia? – ele rolou os olhos. – Me admira que a Trinity ainda aceitem vocês lá.
- Pensei que estava se baseando em filmes.
- E no que você acha que os filmes são baseados? – disse com muita convicção.
Ouvi Emma bufar bem alto ao meu lado, mas não consegui tirar os olhos de Ed.
- Não dê ouvidos a ele, não vê que ele só está querendo te assustar?
- Acontece que eu já estou assustada Emma. Eu não durmo há semanas. – passei minhas mãos pelo meu rosto me sentindo frustrada.
- Eu só quero ajudar, ou alguém tem uma ideia melhor?
- Invocar um demônio é a sua ideia melhor? – Josh perguntou incrédulo.
- Não vamos chegar tão longe, está legal? Podemos jogar aquele tabuleiro de Ouija e saber se tem algo no seu quarto e tentar saber o que ele quer de você. Ou você pode continuar tendo seus pesadelos e descobrir isso sozinha.
- E se não de certo? – perguntei em um sussurro.
- E se der? – Ele rebateu.
- Esse é o problema. – Josh pendurou a mochila nas costas. – Se der certo.
- Deixa de ser medroso. – Ed caçoou dele. – O que você me diz?
Olhei todos me sentindo dividida. Se eu não acreditava em Deus, obviamente não acreditava em demônios. Mas ao mesmo tempo se eu pudesse ter certeza de que o mal existe, então é sinal de que o bem também pode existir. E talvez eu tivesse mais uma chance de falar com a minha mãe.
- Na minha casa. Às onze e meia em ponto.
Josh soltou um gemido de frustação ao meu lado, mas eu sabia que por seu meu melhor amigo, ele não me deixaria na mão.
- E o John? – Emma perguntou.
- Com ele eu me viro.
- Você tem certeza disso? – Elijah segurou minha mão. E eu só pude negar silenciosamente.




Menti para os meus amigos dizendo que iria embora, mas toda aquela conversa só me deixou mais curiosa. Então resolvi ir até uma biblioteca mais próxima e pesquisar um pouco sobre o assunto. Conheço Ed, e sei que ele não tem medo de coisas que ele entende. Então se eu vou mesmo fazer isso, preciso ter um mínimo de conhecimento e tentar não ficar com medo. Meio confusa, andei até o recepcionista com uma aparência de simpático sem saber o que falar.
- Boa tarde. – disse com a língua presa.
- Olá, boa tarde! – abriu um sorrisão ao me ver. – Posso ajudar você?
- Por um acaso você tem algum livro que fale sobre demônios ou entidades do mal?
Ele realmente não esperava por essa. Uma menina com um uniforme escolar, que deveria estar querendo ler sobre romances e essas coisas, querendo saber sobre coisas sobrenaturais? Isso não é normal, não é?
- Você pode se especificar? – quis saber, já sem um sorriso no rosto. É... Eu causo esse efeito nas pessoas.
- Bem, eu... Eu queria entender melhor sobre... Essas coisas, se realmente existem e...
- Entendi – me olhava com cautela. – Você me parece confusa. Por que não começa tudo do começo?
- Como? – agora fiquei confusa.
Ele se levantou e deu uma volta na sua mesa e começou andar até uma parte da biblioteca que tinha uns computadores para pesquisas. Eu o segui bem quietinha.
- Você pode ler vários relatos sobre casos demoníacos, como assombrações ou até mesmo possessões. Se não quiser perder tempo, você pode assistir há um filme. Mas antes de querer tentar acreditar na existência, por que não procura saber por que eles existem?
Olhei para ele, depois para o computador e depois para ele de novo.
- Você acredita nisso? – fiz soar como se fosse uma pergunta inocente.
- Eu acredito em muitas coisas. – disse simplesmente e me deixou ali sozinha, com o computador.
Ok...
Agora que já estou aqui, não vou desistir. Sentei-me de frente pra tela e abrir o Google. Sobre o que eu poderia começar a pesquisar? Decidi ser bem direta.

Por que os demônios existem?


Eu deveria saber que haveria varias teorias sobre isso, mas todas tinham um mesmo ponto de conclusão. Um dos anjos de Deus queria ser mais poderoso que ele e se rebelou levando consigo outros anjos. Lúcifer era o anjo mais lindo e perfeito de Deus, talvez sua melhor criação. Mas não demorou muito para que ele quisesse ser melhor que Deus e logo conseguiu dividir os anjos, travando uma luta. O que mais me chamou atenção era que a classe de Lúcifer era de um querubim, a classe mais alta dos anjos, e ele foi derrotado por um Arcanjo, O Arcanjo Miguel. A classe mais baixa. Eu simplesmente não conseguia parar de ler, mas ao mesmo tempo não conseguia acreditar que tudo aquilo aconteceu a anos luz antes de mim, antes de todos que eu conheço. Quando estava lendo sobre o diluvio, meu celular tocou. Era John.
- John? – não tirei meus olhos da tela.
- Onde você está? – seu tom era de preocupação. Droga, eu me esqueci de avisar.
- Em uma biblioteca... – olhei a minha volta percebendo que eu não sabia o nome e só ai eu notei que havia anoitecido. – Eu não vi a hora passar.
- Você e esses livros... – eu sabia que ele estava me censurando.
- Me desculpe, já estou indo pra casa.
Fechei minhas pesquisas e me levantei com minhas coisas.
- Nana fez lasanha.
Minha barriga roncou no mesmo instante.
- Isso não foi justo. – eu sabia que ele sorria.
- Tomara que não tenha acabado quando você chegar.
E Desligou.
Ele estava me provocando! Encarei meu celular por uns instantes e depois fui até o recepcionista que sorriu novamente ao me ver.
- Encontrou o que queria?
- Não consegui ler tudo que eu gostaria, mas foi um começo, Obrigada! Quanto eu devo?
Ele deu uma gargalhada e eu não entendi.
- As pesquisas são de graça. – disse em fim e eu fiquei sem graça.
- Beleza, então... – arrumei minha bolsa nos ombros e lhe dei um aceno torto. – Obrigada.



***

Olhei minha mão entrelaçada à mão de April procurando sentir algum tipo de carinho diferente, mas eu sabia que tudo que eu sentia por ela era atração sexual. Mas por que eu não conseguia olhá-la de outra forma? Talvez por que eu não estava pronto para querer algo serio? Ou por que ela foi à primeira garota com quem fiquei quando cheguei aqui? Poderia ser isso. Não quero limitar as minhas opções, quero conhecer outras garotas e me divertir. Mas ao mesmo tempo, eu não conseguia parar de olhar para ela. Talvez a menina mais linda que eu tenha conhecido. April me deixa louco em todos os sentidos e mesmo assim, meu coração ainda não batia forte ao ouvir seu nome e eu não ficava ansioso pra vê-la. Quem sabe com o tempo? Quem sabe quando nos conhecermos melhor?
- Você não quer mesmo subir? – balançou nossas mãos e sua voz estava dócil.
- Você sabe que eu adoraria, mas amanhã temos aula. Se eu subir, dormir vai ser a ultima coisa que vamos fazer.
Ela me deu um sorriso tímido, sendo que de tímida não tinha nada, e me beijou. Segurou meu rosto com carinho e me abraçou. Eu gostava disso que tínhamos e eu gostaria saber até onde poderíamos chegar e saber se posso sentir algo mais intenso por ela.
- Até amanhã. – se despediu com um selinho e a vi passar pela porta giratória.
Ao me virar me esbarrei com alguém.
- Wow.
Era Brooklyn, e de alguma forma, meu sorriso foi espontâneo.
- Aonde vai com tanta pressa Canadá? – perguntou ajeitando sua mochila. Ela ainda estava com o uniforme tradicional da Trinity e eu supus que não tinha ido para casa depois da escola.
- Vim deixar a April em casa, e você? O que está fazendo aqui? – dei um passo para a direita a bloqueando na hora em que ela tentou passar.
- Bem, eu moro aqui. – segurou meu ombro e eu achei que ela fosse me abraçar, mas me girou para que eu saísse do caminho dela.
April e Brooklyn moram no mesmo prédio? Isso não vai dar certo.
- E então, já conseguiu visitar todos os pontos turísticos de Nova York? – perguntou de repente.
- Alguns, na verdade. – dei de ombros. – Mas eu estou mesmo é doido por uma comida caseira. Minha mãe não cozinha nada e na correria da mudança ainda não contratamos uma empregada.
Ela concordou em silêncio e depois encarou o prédio, depois voltou a olhar para mim com uma expressão estranha.
- É seu dia de sorte. – pôs as mãos na cintura. – Nana fez lasanha. Quer subir?
Eu amo lasanha, é sério. Mas aceitar aquele convite não tem nada a ver com a comida. Eu não sabia explicar, só não consegui dizer não. Ela me deu as costas e eu a segui.
- Oi Sr. Peterson, como vai? – ela parou para falar com o porteiro e eu estranhei.
- Com dor nas costas, e você?
Ele a tratou com intimidade? Fiquei mais confuso ainda.
- Com fome, Nana fez lasanha, vamos subir?
Ela também estava o convidando? Convidando o porteiro do prédio?
- Não posso. – ele soltou um suspiro longo. – Hoje meu turno é à noite. – lamentou.
- Tudo bem, eu trago para você.
Ele sorriu de uma forma carinhosa para ela e só depois foi notar minha presença.
- Quem é esse? – perguntou como se eu não estivesse ali.
- Aquele meu colega de que eu falei outro dia. – ela cochichou só que eu escutei. Então ela falou de mim? E para o porteiro? Interessante.
- Ahhh. – deu uma risadinha e depois dotou uma postura mais rígida. – É um prazer... – se dirigiu a mim, estendendo a mão. A apertei.
- , .
- Meu nome é James, mas todos me chamam de Peterson.
Disse como se tivéssemos alguma intimidade. Dei um sorriso breve para ele.
- Bem, nós vamos subir. Até mais tarde.
Ela caminhou até o elevador e eu novamente a segui.
- Convidou o porteiro? Achei que o convite tinha sido exclusivo pra mim.
- O nome dele é Peterson. E pode ser uma surpresa pra você, mas eu trato todo mundo da mesma forma.
- Estou chocado e decepcionado. – coloquei minha mão no coração e ela me olhou com censura. - Então você falou de mim para o porteiro? – perguntei assim que as portas se fecharam e com sorte estávamos sozinhos.
Ela rolou os olhos.
- Não foi nada importante.
- Não estou dizendo que foi... – cruzei minhas mãos atrás das costas e me escorei na parede. – Mas se você tiver pensado melhor na proposta de sair comigo...
Ela me encarou.
- Será que só rola esse tipo de assunto entre nós? – perguntou.
- Esse tipo de assunto?
- Você tentando jogar seu charme pra cima de mim. - ela cruzou os braços diante o busto.
Então ela acha que eu tenho charme? Outra coisa interessante. Passei a língua nos lábios.
- Gosto de flertar com você. – lhe dei o meu melhor sorriso. Eu sabia que ser direto a afetava, por que ela encarava tudo, menos a mim. E pensava bem antes de continuar a falar. – Mas também curto uma boa conversa civilizada.
- E o que tem em mente?
- Podemos tentar a boa e velha abordagem. Por exemplo: Como você está? Como foi o seu dia? Sentiu saudades de mim?
Ela soltou um sorriso de uma forma convencida, parecia que estava caçoando de mim.
- Dispenso. – seu tom era cheio de desinteresse.
- Por quê?
- Esse tipo de assunto não desperta o meu interesse. Ninguém realmente quer saber se estamos bem, é só uma politica social idiota, um pouco de educação e muito interesse na vida particular alheia.
- Você é muito reservada. – notei naquele instante.
- E você muito dramático. – ela rolou os olhos.
- Por que eu sou dramático se é você quem está dispensando o assunto?
- Chega dessa conversa antes que eu me arrependa de ter te convidado.
Decidi ficar calado, mas não consegui tirar um sorriso do rosto. Por quê? Notei que estava demorando chegar.
- Você mora na cobertura? – estávamos indo para o ultimo andar.
- Sim e é bom se comportar, se não quiser aprender a voar.
Segurei um riso ao sairmos do elevador e mesmo estando no hall já podia sentir o cheiro maravilhoso da lasanha.
- Pode ficar a vontade, eu vou guardar as minhas coisas. – E sumiu.
O apartamento de Brooklyn era gigante e muito acolhedor. Tinha uns quadros de mulheres negras penduradas na parede branca do hall e uma mesa com um vaso de rosas vermelhas. E depois me deparei com a sala cor de nude, tinha uma televisão de plasma enorme e um sofá preto em forma de um “U”, uma mesinha de centro com mais rosas vermelhas e um tapete de pele branco.
- São as favoritas da Brooke. – fui pego olhando para as flores. Me recompus do susto e me virei para encarar o homem alto a minha frente. – E você é...?
- , do Canadá. – Brooklyn voltou, seja lá de onde ela estava e ainda de uniforme.
O homem me olhou surpreso por alguns segundos e depois olhou para ela de volta.
- Isso é muito interessante.
- Nem começa. – Ela lhe apontou o dedo indicador e ele se calou.
Uma mulher mais velha, com roupas sociais pretas, apareceu na sala.
- Nana, o vai jantar com a gente, pode colocar mais um prato na mesa? – ela pediu com uma educação e carinho no seu timbre.
- É claro querida. – a mulher sorriu e depois voltou para dentro.
- Eu sou John Henson. Todos os amigos de Brooke são bem vindos em minha casa. – O homem me cumprimentou.
- Obrigado. – foi o que eu consegui dizer.
Pensei que o sobrenome de Brooklyn fosse Bennette. Ou será que ela não usa o Henson? Estranho.
- Nunca o vi tão calado e na sua, deveria vir aqui mais vezes. – Ela me provocou.
- Isso é um convite? – Rebati ao me recompor.
Ela rolou os olhos como sempre fazia quando estava comigo e me deu as costas. Eu a segui.


***

- Essa lasanha está maravilhosa Nana. – tive que dizer.
- Eu tenho que concordar. – disse ao meu lado. – Não me lembro de qual foi à última vez que comi uma comida tão boa.
- Realmente, eu cozinho muito bem. – Se gabou ao se sentar-se à mesa e separou um prato para si. Reparei que a encarou confuso, com certeza pelo fato de Nana está comendo com a gente, o que ela fazia todos os dias.
- Então , Canadá? É uma grande mudança. – John puxou um assunto.
- Meu padrasto abriu uma filial aqui em Nova York e decidiu tomar conta dos primeiros passos pessoalmente. – deu uma garfada na lasanha.
- E com o que seu padrasto trabalha? – ele parecia curioso.
- Ele é dono da “Food of Year” uma empresa que exporta comida do Brasil para o resto do mundo.
- Olha que legal. – John me olhou. – Graças ao padrasto do temos nosso alimento.
- Pensei que fosse graças a Deus. – Nana não segurou um riso ao me escutar.
- Seu estoque de piadinhas céticas não acaba nunca, não é?
Dei de ombros.
- É espontâneo.
- Mesmo? – sua voz era sarcástica. – Jurava que você tinha um caderninho cheio de anotações.
- Desculpe se eu te decepcionei.
- Você é cética? – me perguntou e eu o olhei.
- Sou.
Disse de forma simples e direta. piscou uma vez ao continuar a me encarar e depois franziu o cenho.
- Mas e a Trinity?
- O que tem a Trinity?
- Você mesma me disse que é uma escola religiosa.
- Ela foi fundada por padres ou algo assim, e acho que até hoje a igreja é dona de certa parte. Mas o que leva aquela escola adiante é o dinheiro não a nossa crença. Eles não podem nos obrigar a acreditar ou seguir uma religião específica.
Ouvimos duas batidas na porta e logo o senhor Peterson estava entrando. Abri um sorriso.
- Brooke me disse que Nana fez lasanha e eu não resistir. – se explicou.
- Sente-se James, venha conhecer o convidado especial da Brooke. – John pediu e ele não pensou duas vezes.
- Eu pego um prato pra você. – pedi como uma desculpa para não perceber que fiquei sem graça com o comentário.
- Ahh, o amigo da Brooke! não é isso? – perguntou ao se sentar e concordou. – Já nos conhecemos no saguão.
- Ele estava dizendo que o pai tem uma empresa de exportação de alimentos.
Peterson olhou para surpreso.
- Ah é?
- E ele é mais bonito do que você tinha nos falado Brooke. – Nana comentou quando voltei à mesa. me olhou de um jeito curioso e convencido e eu praguejei Nana por isso.
Afundei-me na cadeira já sem fome e muito arrependida de ter trago .
- Você está solteiro, ? – Peterson perguntou e aquilo foi à gota d’agua.
- Gente, chega né. – pedi, revezando o olhar entre o três.
- Na verdade, eu estou saindo com uma garota. Mas só por que Brooke rejeitou todas as minhas tentativas de levá-la para sair.
- Convidou Brooke para sair e ela não aceitou? – John tinha um tom de surpresa.
- você precisa ir agora, não é? – me levantei o puxando pelo braço. Ele estava no meio de uma garfada quando o puxei.
- Mas eu...
- Agora. – o arrastei atrás de mim ouvindo os três rindo.
- Eu posso pelo menos mastigar a comida direito?
- Você pode fazer isso enquanto anda. – continuei o puxando.
- Seja bem-vindo para voltar quando quiser . – John gritou da sala de jantar.
- Acho que eles gostaram de mim. – comentou presunçoso quando abri a porta.
- Não, eles gostam de me deixar sem graça. É diferente!
- Seu pai disse que posso voltar quando eu quiser. – se escorou no batente da porta e abriu um sorriso de lado. Por que tão gato e convencido?
- Tchau .
Bati a porta na cara dele.
- Eu gostei dele. – Nana apareceu atrás de mim.
- Isso por que você não o conheceu melhor. – a olhei.
- E você já o conheceu melhor?
Não a respondi por que ela já sabia a resposta, Existem poucas pessoas que me conhecem tão bem quanto Nana e ela sabe que eu tenho dificuldades de deixar as pessoas se aproximarem de mim, então acho que pra todos, ter convidado para jantar foi um progresso e tanto.





Acendi algumas velas e as espalhei por todo o canto, arrastei meu criado mudo até o centro do quarto para que pudéssemos sentar em volta dele. Fiz algumas pesquisas sobre como esses jogos funcionavam e confesso que quase voltei atrás, mas já era tarde de mais. Recebi uma mensagem de Ed dizendo que todos estavam subindo e eu fui esperar eles na porta sem fazer barulho para não acordar John.
- Que cheiro de queimado é esse? – Ed disse assim que eu abri a porta.
- Shiii. – pedi silencio. – John está dormindo.
- E Nana? – Emma perguntou assim que entrou, seguida por Josh e Elijah.
- Está com o senhor Peterson.
- Você tem certeza de que quer fazer isso? – Josh verificou de novo.
- Tarde de mais para voltar atrás. – Ed tirou o tabuleiro de Ouija da bolsa.
- Onde você conseguiu isso? Nem sabia que era fabricado ainda.
- Meu tio tem uma loja de brinquedos. – Ed me seguiu até meu quarto assim como os outros. – Vejo que já estava entrando no clima.
O quarto estava escuro, exceto pelas velas que queimavam pelo quarto. Apontei para o meu criado mudo e Ed logo estava colocando o tabuleiro em cima.
- Sentem em volta da mesa. - deu as instruções e logos todos o fizeram.
- Isso não é uma mesa. – Elijah observou.
- Estou sendo criativo. – disse rápido. – Quero que desliguem o celular de vocês, se livrem de qualquer coisa que faça barulho.
Colocou seu dedo apontador sobre a prancheta que estava em cima da letra “G”.
- Coloquem o dedo índice na prancheta, um de cada vez. – E foi o que fizemos e eu estava começando a ficar nervosa e mal tínhamos começado. - Pressionem a prancheta com firmeza, mas sem muita força, ou ela não se moverá facilmente se vocês colocarem muita força sobre ela. – E começou a mover a prancheta em círculos pelo tabuleiro. - Seguinte, para fazer isso dar certo temos que ser paciente. Ás vezes o espirito é tímido e demora se comunicar.
Elijah tentou disfarçar uma risada, em vão. Recebeu um olhar bravo de Ed.
- Às vezes a prancheta pode se mexer rápido, outras de vagar. O importante é obter respostas.
- Você já jogou isso? – Emma perguntou, mas Ed não a respondeu.
- Vamos rezar a oração “Pai Nosso” duas vezes.
Eu só sabia aquela oração por que minha avó me ensinou a rezar quando era menor, junto com a oração do anjinho da guarda, só que dessa eu não me lembrava mais. Fizemos a oração duas vezes seguida como Ed instruiu.
- O que você quer perguntar, Brooke?
Quero saber se é minha mãe, quero saber agora. Mas eu li na internet que devemos começar com perguntas simples, pra não espantar o espírito. Respirei profundamente pensando na minha pergunta.
- Tem algum espírito presente? – sussurrei sentindo minha barriga dar voltas e não era fome.
- Você precisa falar mais alto. – Ed me censurou.
Tudo bem, eu consigo fazer isso. Respire, respire!
- Tem algum espirito presente? – disse um tom mais alto e claro.
Todos ficaram olhando a prancheta, mas ela não se mexeu.
- Faça outra pergunta. – Emma me incentivou.
- Você é um espirito bom ou ruim? – perguntei novamente, mas o tabuleiro não se mexeu. – Qual o seu nome?
Decidi ir mais direta, mas não teve resposta alguma. Olhei para os meus amigos que me encaram com pena. É claro, se não tem espíritos aqui, eu só posso estar ficando doida por achar que esses pesadelos são reais.
- Acho que isso já foi longe de mais. – Josh ameaçou se levantar.
- Não! – Ed o interrompeu. – Você não pode tirar o dedo se não, não dará mais certo.
- Só que isso já não está dando certo. – Ele rebateu. – Brooke... – me olhou cauteloso.
- Tem uma coisa que eu quero tentar antes de desistir.
Na pesquisa que eu fiz, dizia que se eu quisesse falar com algum parente morto eu deveria deixar algum objeto de posse dele. Olhei para Josh que com custo se sentou de volta no seu lugar sem ter movido o dedo. Retirei a escova de cabelos de minha mão da gaveta do criado mudo.
- O que você quer fazer com isso? – Emma me perguntou.
Respirei fundo fechando os olhos tentando me concentrar em todas as lembranças boas que tive com ela, todos os carinhos e risos.
- Tem algum espirito presente? – Tornei a perguntar alto e claro ainda de olhos fechados.
De repente meu dedo na prancheta começou a se mexer junto com os outros e o espanto neles eram evidentes assim como em mim. Deu certo?
- Ed, isso não tem graça. – Josh disse encarando a prancheta que foi direto para a palavra “Yes”.
Encarei Ed esperando que ele dissesse algo.
- Não sou eu. – me encarou alguns segundos e parecia apreensivo.
- Brooke, continue...
- Qual o seu nome?
A prancheta voltou a se mexer indo para as letras. “L” “U” “C” “Y”
- Quem é Lucy? – Elijah perguntou.
Minha respiração falhou no mesmo instante! Mãe?
- Muito engraçado Ed. – Josh retirou o dedo e se levantou.
- Josh, não. – disse, mas já era tarde.
- Você não quer continuar com essa palhaçada não é?
- Gente. – Ed se levantou. – Eu fiz o “sim”, mas eu não escrevi Lucy.
Josh bufou.
- Eu deveria saber que você só tentaria nos fazer medo.
- Eu estou falando sério. Por que eu escreveria Lucy? Esse nome nem é bonito.
Todos se levantaram e eu permaneci sentada.
- Você sempre faz isso! Não sei por que ainda caímos nas suas pegadinhas.
- Será que vocês podem acreditar em mim?
Do nada, as velas se apagaram e Emma soltou um grito rápido e agudo. Levantei-me ainda estática com tudo aquilo.
- Gente, eu juro que não fui eu. – Ed sussurrou.
Elijah se deslocou ao meu lado indo até a varanda, puxando a cortina.
- Foi o vento.
Todos respiraram aliviados ao notar que eu tinha esquecido a porta da sacada aberta, mas o que não explicava o nome “Lucy”.
A luz do quarto se ascendeu e todos deram um pulo de susto com a claridade, até ver John parado na porta com uma cara nada boa.
- O que está acontecendo aqui?




- Você perdeu o juízo Brooke?
John estava tão bravo andando para os lados, como eu nunca tinha visto antes. Ele parecia se esforçar para não gritar comigo.
- Eu...
- Você não tem noção do perigo desses jogos? De brincar com esse tipo de coisa?
- Como eu poderia ter noção?
- Aaaah é, você é cética. Não acredita nessas coisas. – seu habitual tom de deboche. – Mais um motivo para querer saber por que você resolveu jogar esse jogo.
Limpei algumas lagrimas que surgiram nos meus olhos e me sentei na beirada da cama encarando meus pés.
- Há algumas semanas eu ando tendo os mesmos pesadelos. – John parou na minha frente esperando a continuação. – Eu estou acordada e me vendo dormir aqui no quarto. E eu não consigo me mexer ou falar, apenas observar a minha volta e ouvir. – o encarei, e seu rosto estava embaçado pelas lágrimas que surgiram do nada em meus olhos. – John eu sinto alguém subir pela cama, nas minhas pernas, eu sinto meu corpo tremer e meu coração disparado.
John estava estático e quieto. Me olhava petrificado, como se tivesse esquecido de como se fala. Ele piscou algumas vezes saindo do transe e negou algumas vezes com a cabeça.
- É só um pesadelo.
- E por que eu sinto que não é? Por que quando eu consigo me mexer é como se tudo tivesse realmente acontecendo? Parece que eu sinto algo em cima de mim, que gosta de me deixar imóvel e muda. Isso não tem nada a ver com as minhas lembranças com Willy e meus pais, isso é outra coisa. Muito pior. – passei minhas mãos pelo meu rosto tentando tirar alguns fios que teimavam em cair nos meus olhos. Com o rosto molhado não ajudava muito. John soltou um suspiro profundo e se sentou ao meu lado. Parecia mais paciente.
- E por que o jogo? – perguntou com cautela.
- Eu contei para os meus amigos e eles acharam que eu poderia estar sendo assombrada.
- Só que isso não funciona assim Brooke. – John enfiou o rosto nas mãos e parecia estar escondendo algo.
- Como... Como você sabe?
Depois de alguns segundos em silêncio, ele soltou outro suspiro e me encarou.
- Quando eu tinha vinte anos eu gostava de desenhar como passatempo e eu comecei a notar que coisas estavam sumindo do nada. – começou a encarar suas mãos. - Uma vez um pincel desapareceu da mesa enquanto eu estava desenhando. Deixei o pincel de lado e fui desenhar com outro. Quando me virei para pegar o pincel, cadê? Procurei pelo meu quarto inteiro até me conscientizar que o pincel simplesmente havia sumido. Intrigado, continuei o desenho sem o tal pincel. No dia seguinte o achei dentro da geladeira. Esta foi à primeira situação em que eu comecei a questionar se eu estava vendo coisas. E isso só piorou.
Ele parou de falar e eu tive certeza que ele estava ponderando se iria continuar ou não a história. Só que ele começou e teria que terminar.
- Nessa época, meus pais viajavam muito. E eu ficava no apartamento com o Jacke, o cachorro mais inteligente que eu já tive. E um dia, ao voltar da faculdade, do elevador eu pude ouvir o Jacke latindo. Quem tem cachorro por muito tempo, sabe distinguir o “tom” do latido do cachorro. E aquele era um tom agressivo. O Jacke latia ferozmente. Mas não havia ninguém em casa por que meus pais e meus irmãos estavam viajando. Eu entrei correndo pra ver. Ali, no meio da sala estava o Jacke. O pelo arrepiado. As orelhas levantadas, olhando fixamente para a parede. Ele estava em frenesi. Latindo como se visse claramente alguma coisa. E o Jacke recuava e avançava latindo. Era como se ele visse algo se aproximar. Eu olhei e vi que no canto da sala a cadeira de balanço que minha mãe tinha estava balançando.
Ele se levantou e parecia indignado.
- Maluco… Eu só podia estar maluco. Eu olhei para a cadeira e ela balançava sozinha. O Jacke não subia nela. Nunca. E não havia ninguém em casa. A pergunta é: Quem balançou a cadeira? E eu comecei a achar que a resposta só podia ser que a “coisa” que balançou a cadeira estava sendo vista pelo Jacke. E eu não via. Parece que a coisa correu para a varanda quando eu entrei. Como eu sei? – me perguntou quando notou que eu já iria fazer essa pergunta. - Porque o Jacke acompanhou com a cabeça e foi latindo atrás. O Jacke sempre vinha me receber na porta. Neste dia ele correu latindo e parecia ver alguma coisa. Ele enfiou a cabeça pela grade da varanda e continuou latindo. Um comportamento muito, muito estranho.
Ai ele parou de falar do nada e ficou encarando a minha foto com Lucy.
- Não tem mais? – perguntei. Eu precisava saber, aquilo não era suficiente para mim.
Ele continuou a encarar a foto por um longo período e quando eu achei que ele não fosse continuar...
- Eu tentei acalmar o Jacke, mas ele estava muito agitado. Pensei que talvez ele pudesse ter entrado em algum tipo de delírio causado pela ausência da minha mãe, de ter ficado sozinho em casa. Seja como for, eu passei, daquele dia em diante, a ficar de olho no Jacke e no comportamento dele. Não contei para ninguém o ocorrido, achei que se eu não contasse, poderia fingir que não aconteceu. Até que a coisa se repetiu dias depois. Mas com um modo bem diferente.
Finalmente tirou os olhos da foto e me encarou.
- Eu cheguei de um passeio com meus amigos e era tarde da noite. Ao chegar ao corredor ouvi a televisão bem alta. Achei estranho, porque eu mesmo tinha desligado a tevê antes de sair. Quando eu entrei, o que eu vi nunca mais esquecerei: Ali estava o Jacke. Sentado no sofá. Vendo tevê como um ser humano. Parecia em transe. Eu entrei lentamente e quando vi a tevê mostrava um desfile de cachorros. Foi à cena mais bizarra que já presenciei. Como meu cachorro tinha ligado à tevê? Quando eu falei com o Jacke ele pareceu “acordar”. Saiu da posição que estava e veio balançando o rabinho. O controle remoto estava sobre a estante. No alto, ao lado da tevê. Até hoje não compreendi direito aquela cena. Naquele dia e no outro, quando vi o Jacke dando o primeiro “pití” para a parede, senti que tinha alguma coisa na casa. Eu comecei a me acostumar com aquela sensação. Até que aprendi que aquilo não era exatamente uma... Imaginação.
- Então aconteceu com você também? Isso significa que você acredita em mim? – tive que me levantar por que eu estava muito elétrica. Ele não se mexeu.
- Durante vários dias eu fiquei trancado no meu quarto, desenhando como de costume e sentia claramente que alguém se aproximava atrás de mim. Eu olhava para trás achando que era a Ivana, minha irmã menor que gostava de me ver desenhar, mas não era. Não tinha ninguém. – Essas últimas palavras eram um mero sussurro. - A sensação era muito clara pra mim. Ela tinha um começo, um meio e um fim. Em geral a “coisa” ficava por trás de mim, como se projetasse o corpo para frente sobre meu ombro. Em muitas vezes eu olhava de canto e via o vulto. Mas se me virasse, não tinha nada. E as coisas continuavam a sumir.
Ele voltou a andar pelo quarto, mexendo nos meus livros, na penteadeira, na cadeira da escrivaninha, como se estivesse vendo tudo pela primeira vez. Mas eu sabia que ele só estava evitando me olhar.
- Um dia eu chamei meu irmão no quarto e falei com ele da “coisa”. Contei que o quarto estava assombrado. Ele não acreditou é claro. Mas bastou ele não acreditar para que o rádio que estava ligado mudasse de estação, passando sozinho por várias estações até pegar uma música antiga que tocava. A música tocou e nós ficamos ali em silêncio, os olhos arregalados, fixos no botão. A música acabou e o botão rodou. Rodou uma, duas, três vezes e voltou para a estação que estava. Dali a um tempo eu comecei a me conscientizar de que havia uma “entidade” naquela casa além da minha família. Fosse como fosse, ela não parecia ser hostil. Meus irmãos e meus pais viajavam e eu ficava sozinho em casa. Tentava prolongar minhas saídas até o quanto desse. Mas de madrugada eu sentia um medo filho da puta. – Encarei John chocada com o palavrão, ele raramente usava esses palavreados, se é que usava. - Várias vezes ouvi risinhos no corredor e sussurros na sala. Isso sempre acontecia quando eu estava quase pegando no sono. Um dia eu ouvi uma porção de vozes. Parecia uma reunião na sala. Acordei e assim que abri os olhos às vozes pararam e só havia o silêncio. Eu ficava quieto, como que petrificado quando isso acontecia. Geralmente perdia o sono e ficava com o ouvido em pé ouvindo os barulhos da noite. O vento nas árvores lá fora. As ondas quebrando na praia. Eu ia pegando no sono quando as tábuas estalavam e aí eu arregalava os olhos novamente. Era a noite toda lutando com o medo, mas eu não viajava. Eu ficava lá, impelido por um misto de curiosidade e racionalidade. Cada neurônio meu arrumava uma bela justificativa para cada uma daquelas coisas. – Foi então que ele me olhou, depois de muito tempo falando. - Eu não queria aceitar.
Eu o entendia, não só sobre essa questão.
- Quando eu estava desenhando, sentia aquela “coisa” chegando. Um dia eu resolvi conversar com a tal entidade. Estava sozinho mesmo… Então não tem problema dar uma de pirado quando se está sozinho, né? – acho que ele deu um breve sorriso. - A coisa veio chegando. Parou em cima do meu ombro direito, como sempre. Eu parei. Olhei para trás. Não havia nada e comecei a falar: “Caro senhor fantasma. Ou senhora. Eu não estou vendo você. Mas eu sei que você está aí. Eu sei que você gosta de me ver desenhar. Eu sinto a sua presença. Eu queria pedir que o senhor, ou a senhora, não ficasse atrás de mim, olhando o meu processo de desenho, porque isso está me incomodando e eu não estou conseguindo me concentrar.” Eu falava aquilo calmo, mas por dentro estava com muito medo e simultaneamente me sentindo um débil mental. Mas e se tivesse uma resposta? Continuei: “Então seria pedir demais se eu desenhasse primeiro e você admirasse o trabalho depois dele pronto? Eu prometo que termino o desenho e deixo o trabalho sobre a mesa por algum tempo, tá bom? Não precisa responder! Eu considerarei que você entendeu e que é um fantasma educado”.
Tive a vontade de rir ao imaginar John tendo uma conversa com uma “entidade”. Mas me segurei por que eu não queria que ele parasse de falar.
- A coisa foi educada e depois daquele dia, parou. Então nós -eu e o fantasma- convivemos bem por um tempo. Mas eu arrumei uma namorada espírita. A... – Ele iria falar o nome dela, mas pareceu se lembrar de algo e parou no meio da frase. Seus olhos pregados em mim, a boca meio aberta. Ele continuou:
- Eu não sabia que ela era espírita. Achava que era maluca mesmo. Eu gostava da voz dela. Quando eu a levava lá em casa, eu saía do meu quarto para pegar alguma coisa e ela ficava lá, sempre que eu voltava ela estava falando baixinho. Eu pensava que ela estava cantando. Mas um dia as coisas ficaram muito estranhas. Estávamos nos beijando quando ela arrepiou. Deu um pulo. Os olhos arregalados. Eu fiquei muito confuso. E ela começou a falar, desandou a falar igual uma maluca, e eu não entendia nada. Ela falava sem parar e quando dei por mim, ela estava discutindo com… Ela mesma! Pior, era uma cena de ciúmes daquelas cabulosas! Eu comecei a suar frio. Eu a segurei por que ela estava tremendo, pálida e gritando. Achei que ela ia ter um ataque. Ela correu e bateu a porta do armário. Ficou segurando a porta e eu ali, bolado, sentado na beira da cama olhando espantado. A porta do armário começou a socar, Como se algo estivesse ali dentro. Ela segurando a porta, como se impedisse de sair algo ali de dentro e eu muito confuso. A porta foi batida varias vezes, como se alguém estivesse batendo nela e eu estava convicto que era a “entidade”. Ela começou a rezar. E segurar a porta. As batidas diluíram progressivamente até que pararam. Ela voltou exausta. Suada. Sentou na cama e disse que eu tinha que ir urgente com ela num centro espírita. Não quis explicar muita coisa. Limitou-se a dizer que havia uma entidade mesmo ali e que ela estava obcecada por mim. Que era alguém que me conhecia de outro plano. E que era altamente ciumenta. Foi ai que eu entendi que a coisa estava ficando pior. Decidi ir com ela e dias depois, lá estava eu, num centro espírita pela primeira vez na vida. – Me indicou a cama e eu sentei relutante, porém eu não sabia o que via por vi e nem quanto mais tempo àquela história duraria. Então resolvi o fazer.
- Era um lugar no centro de Miami, não lembro nada de como cheguei lá. Só lembro que tinha um cheiro de rosa e ficava tocando sem parar aquela musica bonita pra caramba de um filme chamado “Em algum lugar do passado”. Tinha um monte de banquinhos compridos, as pessoas ficavam nos banquinhos e lá na frente à luz era mais fraca. Havia pessoas que usavam jalecos brancos e essas pessoas levavam cada um dos muitos ali dos banquinhos lá pra dentro. Até que me chamaram e eu fui. A pessoa me colocou de frente para um cara que estava de cabeça baixa, era um sujeito de uns 40 anos, com a barba por fazer. Achei que ele tinha cara de bêbado, mas não parecia estar bêbado não. Parecia estar dormindo. Ele não me olhou nos olhos, eu tentei olhar, mas os olhos dele estavam estranhos. Pensei se ele era cego ou algo assim. Ele pegou minhas mãos de uma maneira grosseira e com um tipo estranho de giz fez um “X” em cada uma. Aí começou a falar um monte de coisa que eu confesso, não entendi merda nenhuma. – outro palavrão - Só entendi que “eu tinha que estudar muito para entender.” E que “não era para deixar isso de lado. Que eu TINHA que estudar.” Aí ele falou qualquer coisa sobre “papai do céu”. E me virou do tradicional jeito grosseiro, começou a me dar um passe e eu não senti absolutamente nada. Então veio um cara mais velho com um jaleco e me levou de volta ao meu lugar no banquinho. Depois disso as coisas diminuíram bem. A “entidade” parece que resolveu dar um “tempo” depois do confronto com a minha namorada “XMen”. - ele fez uma piada? - Mas eu terminei o namoro logo depois com medo de tudo voltar a acontecer. E é isso.
- Isso? Então você nunca mais viu ou sentiu a entidade? – fiquei muito curiosa.
- Uma vez você me perguntou por que eu acreditava em Deus e eu não te respondi, mas não era por que eu não tinha uma resposta, era por que eu precisava que você acreditasse por você mesma e não por mim ou por seus amigos.
- O que você quer dizer com isso?
- Não é que eu não acreditava em Deus, mas com vinte anos todo mundo quer curtir, ir para uma festa, ficar doido e voltar pra casa de madrugada. Ninguém quer ir à igreja, ficar duas horas em pé e ver alguém lendo algo que você pode ler depois, mas sempre deixa pra mais tarde. Depois que tudo isso aconteceu eu resolvi que devia seguir uma religião e rezar. – ele voltou a me olhar e seus olhos tinha uma serenidade que eu não sabia de onde vinha. – Eu não me considero alguém muito religioso e de muita fé, mas quando eu rezo eu sinto uma paz interior que eu jamais poderei explicar. Ás vezes até sinto que algo está me vigiando, cuidando de mim.
- A entidade?
- Não. – ele negou com um sorriso. – É uma coisa boa, boa de uma forma diferente.
- Como você pode saber disso?
- Por que eu não me sinto incomodado como me sentia com a entidade. Eu sinto paz, e uma calmaria enorme.
De repente ele agarrou as minhas mãos e se virou para mim.
- Me prometa que você nunca mais vai brincar com esses jogos? Você pode não acreditar, mas não corra o risco. Por favor, me prometa.
Como eu poderia prometer? Eu queria muito continuar, eu queria saber se era Lucy a falar comigo. Eu não podia...
- John...
- Me prometa Brooklyn.
- Acho que mamãe está tentando falar comigo.
Outra vez ele voltou a ficar estático, olhos cravados em mim. Sem reação alguma.
- Como...
- No jogo, eu perguntei qual era o nome do fantasma presente e ele escreveu “Lucy”.
Ele piscou deliberadamente muito confuso com a situação.
- E se for um dos seus amigos?
- Impossível! – mordi meu lábio brevemente antes de continuar. – Eu nunca falei da Lucy para nenhum deles.


Essa história é um fato real que aconteceu com Philipe Kling David




Capítulo 4 - Deus não existe!

Apesar de todos os meus esforços para continuar aquela conversa com John, ele fez de tudo para ficar afastado de mim. Saia mais cedo para o trabalho e ficava até mais tarde na agência. Ás vezes eu o flagrava parado na porta do meu quarto, me vigiando dormir. Mas eu resolvi dar um espaço para ele. Se havia alguma coisa a ser dita, ele diria no seu tempo. Por mais que eu estivesse curiosa. Quanto aos meus amigos, resolvemos não voltar a jogar por hora. Emma teve um comportamento estranho de inicio, mas parece que agora tudo voltou a normal. Inclusive minhas noites de sono.


“Era uma noite, e eu dormia.
E nos meus sonhos revi.
As ilusões que sonhei!
E no meu lado senti...
Meu Deus! Por que não morri?
Por que do sono acordei?”



Não parava de reler a anotação que fiz do texto de Álvares de Azevedo, um escritor brasileiro, no canto de uma folha do meu caderno de literatura quando a senhora Hill entrou na sala.
- O romance “Os sofrimentos do jovem Werther”, do escritor alemão Goethe, é um dos marcos fundadores do Romantismo Europeu e exerceu grande influência sobre os maiores escritores que conhecemos. O que se passa na história?
A professora revezava os olhares para os alunos esperando uma resposta, mas ninguém se prontificou a dizer. O que era interessante já que a professora pediu para que lêssemos o livro antes de sairmos de férias alegando que ele seria estudado quando voltassem às aulas.
- Senhorita Bennette?
É claro que iria sobrar para mim. Endireitei-me na cadeira para poder responder.
- A obra fala sobre as cartas que Werther, um jovem escritor e pintor, escreveu para um amigo. Por meio delas, ficaram sabendo da sua chegada a um vilarejo alemão, do despertar de sua paixão não correspondida por Carlota que se casa com Alberto, e como Werther torna-se amigo do casal. O que acentua ainda mais sua frustração amorosa resultando em um suicídio.
Eu podia sentir o olhar de todos os alunos em mim.
Esquisita!
Deviam estar pensando isso. Que tipo de pessoa passa as férias fazendo trabalho escolar? Eu sei a resposta: O meu tipo.
- Correto! Como sempre senhorita Bennette. – me deu um olhar breve e depois continuou. - A obra literária...
- Como você consegue ser você? – Ed me cutucou.
- Ela pediu para ler o livro antes das férias, não se lembra?
- Eu não lembro nem o que eu comi no café da manhã.
Não evitei um sorriso lacônico e me virei para a professora novamente.
- Existem duas cartas deixadas por Werther, uma antes de se apaixonar por Carlota, logo antes de sua chegada ao vilarejo. E outra é escrita quando ele já está perdidamente apaixonado. Façam um resumo completo sobre elas, que deverá conter uma opinião clara de como Werther se sente na primeira e carta e depois na segunda carta. Quero o resumo para a próxima aula.
Todos bufaram baixinho em forma de reprovação. Se não leram o livro durante as férias, teriam que ler agora. Ninguém aqui gostava de ler livros tanto quanto eu. E nem era uma tarefa tão difícil assim. E não adianta pegar resumo de internet, eles sempre sabem.
- Brooklyn, podemos conversar? – a senhora Hill me chamou antes de sair da sala. Olhei para os meninos.
- Vejo vocês depois. – acenei para eles.
- Boa sorte. – Ed me desejou e saiu.
- Esta tudo bem, senhora Hill? – perguntei.
- Tudo ótimo na verdade. – ela se levantou de sua cadeira para sentar-se à mesa e ficou um pouco mais alta do que eu. – Eu gostaria de saber se você pensou no que te falei sobre Harvard.
Ah! Era isso.
- Senhora Hill...
- Brooklyn, eu já sei o que vai falar. Mas antes que me dê uma resposta contundente, tem algo que você precisa saber. Enviei seus últimos trabalhos anuais e suas notas passadas em uma carta de recomendação para Harvard. Eles amaram, é serio. Assim como eu amei! Disseram que você é tipo de pessoa que eles procuram para a faculdade, e que seria uma honra te ter com eles.
Fiquei muito surpresa com o que ela havia acabado de falar.
- Só tem mais uma coisa... – me avaliou antes de continuar. – Eles querem mais um trabalho para ter certeza.
- Como assim mais um trabalho?
- Só para garantirem sua vaga. Normalmente você teria que terminar o ano letivo aqui, mas se você fizer o trabalho com o tema certo, você pode conseguir o curso especial e começar a faculdade antes disso. – ela se levantou e se aproximou de mim. – Você é tão capaz. A melhor aluna que já tive! Sua paixão por literatura me faz lembrar o porquê eu escolhi essa matéria para lecionar.
- Eu nem sei o que dizer...
- Me prometa que vai fazer o trabalho. Faça o melhor trabalho da sua vida! Você não precisa escolher agora, mas se tudo ocorrer como eu penso, Harvard vai te procurar mais cedo que imagino.
Eu sei que seria uma honra entrar pra uma das melhores faculdades do mundo, é o sonho de muitos alunos daqui, e eu não achava justo por que novamente eu estava me vendo em uma situação em que eu ganho algo que eu não desejei. Sei que deveria estar feliz, mas eu não conseguia. Eu amo literatura, mas eu não quero Harvard.
- Eu prometo que vou pensar.
Ela me deu um sorriso breve e voltou a se sentar na sua cadeira. Retirei-me da sala e fui até meu armário.
- O que a senhora Hill queria? – Josh perguntou ao acercar-se junto com os meninos.
- Idolatrar a aluna preferida dela, óbvio. – Ed se intrometeu na conversa.
Rolei os olhos ao guardar meu livro e fechar o armário.
- Não é tão difícil ler um livro, sabiam?
- Quem disse que eu não leio? – Ed cruzou os braços me encarando.
- Revistas e sites de fofoca não conta.
- Ah, então... – descruzou o braço. – Deixa pra lá
- Ela disse que Harvard me quer. – dei uma olhada rápida neles e comecei a andar pelo corredor.
- Como assim Harvard te quer? – Josh indagou.
- Não acredito que ficou surpreso. – Elijah comentou atrás de mim.
- Estou surpreso por estarmos no começo do ano letivo. Ainda nem fizemos as provas.
Virei-me para eles.
- Ela enviou meus trabalhos anuais e minhas notas dos anos passados para eles, e parece que eles amaram.
- Claro que amaram. – Ed passou seu braço pelo meu ombro. – Você é a melhor em tudo que faz.
- Não acho isso. – o afastei. – Eu só me esforço para alcançar meus objetivos.
- Determinação. Você é meu exemplo de vida.
Não dava para dialogar sério com Ed.
- Você não cansa nunca? – Elijah perguntou para Ed que o olhou torto.
- De que?
- De ser você. – todos riram.
- Vocês não podem me odiar por ser o mais bonito, o mais engaçado...
- Te odiamos por outro motivo, não se preocupe. – Josh deu um abraço em Ed amenizando a piada.
- Oi, Brooke! Posso falar com você? – Emma se aproximou de nós e parecia preocupada com algo.
- É claro que sim!
O sinal bateu indicando o fim do intervalo.
- Hm... Eu te ligo depois. – e se afastou me deixando muito confusa.
Josh segurou a minha mão.
- Vem!



Todos se quietaram quando a supervisora chegou com o técnico em fotografia que nos daria aulas por duas semanas. O nome dele é Jeremy Lee, quarenta e três anos, casado há vinte anos, duas filhas gêmeas de cinco anos e trabalha no ramo fotográfico há doze anos. Fizemos uma dinâmica rápida de apresentação formal e ele nos pediu para ficarmos em dupla. Todos os alunos se deslocaram até seus parceiros e eu vi Brian vindo em minha direção, mas , que eu não falava desde o jantar na minha casa, estacionou na minha frente, com aquele sorriso arrogante e convencido.
- Acho que somos uma dupla.
Olhei a minha volta notando que todos estavam com seus pares e que eu não tinha outra opção.
- Parece que sim. – dei-lhe uma olhada rápida e me sentei novamente.
- Epa, que desanimação é essa? Pensei que fossemos amigos agora. – se sentou ao meu lado.
- Ainda estou decidindo se você merece a minha amizade.
Virei para o técnico em um sinal claro de que não queria mais conversar e sim prestar atenção na aula. Ele começou a passar alguns slides com diversas fotografias de todos os tipos e ângulos.
- A prática da fotografia envolve muito mais do que simplesmente apertar o botão de disparo de uma máquina fotográfica e a fotografia acontecer. Essa mágica requer a sensibilidade, técnica, criatividade, capacidade de observação, integração e subjetividade. Através da fotografia podemos desenvolver uma linguagem pessoal para dialogar com o mundo à nossa volta. Para a primeira aula de vocês, eu pensei em algo mais voltado para a diversão. Vocês terão a oportunidade de fotografar tudo que veem e se divertirem ao mesmo tempo. A fotografia será um recurso facilitador para experimentarem uma nova percepção de si e do mundo à sua volta, aliando essas novas experiências a práticas cotidianas que envolvem a tecnologia digital. Desta forma, os objetivos dessa oficina se traduzem em acrescentar uma nova forma de expressão artística no processo global do aprendizado; desenvolvimento de qualidades como a observação, a sensibilidade, a percepção, o poder de decisão, a criatividade, a objetividade, o espírito de equipe, a integração com o meio ambiente, conhecimento da tecnologia e etc.
Ele deu uma pausa para tomar um pouco de água.
- Como eu disse, hoje teremos mais ação do que aula preparatória. E por isso quero que combinem com parceiro de vocês um horário cabível para ambos e se encontrem para fotografar tudo que vocês acharem que signifique mais do que uma visão normal poderia demonstrar. Como crianças, animais, até mesmo uma flor. Tudo pode ser visto de várias maneiras e a fotografia é só mais um meio para facilitar isso.
Ele olhou para uma das alunas que levantou a mão.
- Sim?
- Ainda não recebemos as câmeras.
- Na verdade receberam sim, mas como esse vai ser um trabalho externo, fora da escola. Vocês poderão trabalhar com os celulares de vocês. Quero que aprendam a essência de uma foto, reconheçam a particularidade de cada momento que pode ser retratado por uma lente. Quero que se esforcem o máximo que puderem e aquele que fizer o melhor trabalho ganhará uma Câmera Nikon D3200. Fotos com até 24,2MP e vídeos em Full HD, lente intercambiável, ajustes manuais e bateria recarregável.
Ele tirou a câmera de dentro do armário mostrando para todos os alunos e o sinal tocou.
- Não se esqueçam de revelar a melhor foto de vocês e trazerem para mim amanhã. Estão dispensados.
Juntei minhas coisas rapidamente ansiando muito comprar uns muffins de chocolate e quando iria sair da sala ouvi uma risadinha convencida.
- Que horas eu posso te pegar? – se apoiou no batente da porta me atrapalhando passar.
- Como é que é? – perguntei só para saber se tinha entendido direito.
- Para o trabalho, você não ouviu o técnico?
- E por que você teria que me “pegar” se podemos nos encontrar?
- Por que eu tenho um carro. – disse como se aquilo me impressionasse.
- E eu posso pagar um taxi. Empatamos.
- Não exatamente...
Rolei os olhos e empurrei a mão dele o fazendo se desiquilibrar, me dando espaço para passar. Ele me seguiu.
- Então voltamos para a parte em que você me trata com apatia?
- Estou te tratando da mesma forma que eu trato todos, já te disse isso.
- Eu gostaria de pensar que seu mau humor não se restringe somente a mim, mas eu já notei que é um problema exclusivo comigo. E eu adoraria saber o por que.
Virei-me para ele abraçando minha apostila.
- A essa altura do campeonato você ainda não percebeu que eu não sou exatamente uma pessoa fácil de lidar?
- Estou me habituando a isso. – ele cruzou os braços diante o peito e tinha alguma coisa diferente no olhar dele. Não era aquele de sempre, convencido e nada modesto. Era... Diferente! – Tem algo em você que não me deixa me afastar, apesar de todas as suas tentativas.
Pronto! Ele disse o que precisava para me deixar desconfortável, desviei meus olhos para qualquer coisa que não fosse ele.
- Então se acostuma comigo agindo dessa forma a qualquer hora inesperada do dia.
- Eu posso lidar com isso. – abriu um sorriso sacana.
E o convencido estava de volta.
- Já te disseram que tentar entender você é como tentar matar a sede com a agua do mar?
- Não, mas vou anotar no meu caderno de reclamações.
- Deve ter bastantes anotações ai em. – lhe dei as costas caminhando em direção ao refeitório.
- Quase todos seus.




Joguei minha mochila no sofá e fui direto para a cozinha, encontrando Nana e John almoçando juntos. Eles ficaram em silencio no momento que entrei. Estranho
- Qual o cardápio do dia? – fui direto para a forma em cima da bancada.
- Você tem uma sessão com Mariah amanhã. – John disse atrás de mim.
Paralisei no mesmo instante.
- Ela não iria voltar só no final do mês? – virei-me para ele.
- Depois do que aconteceu, ela decidiu se adiantar.
- Não acredito que contou pra ela.
De repente fiquei sem fome e me retirei da cozinha. Claro que ele me seguiu.
- Você precisa conversar com alguém.
- Então por que você não fala comigo? – exclamei. – Ao invés de ficar até mais tarde na agência, por que não se senta e me conta o que sabe sobre os meus pais? Por que ao invés de conversar com uma estranha, eu não posso conversar com alguém que sabe mais da minha vida do que eu?
- Ela não é uma estranha.
- Talvez não pra você. – peguei minha mochila e andei em direção ao meu quarto.
- Depois de dois anos, você ainda não se acostumou?
- Com o que? – meu tom era de indignação e muito interrogativo. – Em conversar com uma pessoa que só sabe dizer “você ainda não seguiu em frente”, “você precisa seguir em frente”. Você que não precisa pagar tão caro para alguém me dizer uma coisa que eu já sei.
- Brooke...
- Que resposta ela pode me dar? Ela sabe por que meu pai foi embora? Ela sabe por que Willy matou minha mãe? Em dois anos, você não acha que eu já deveria saber a resposta?
Ele deu um passo pra trás, mantendo o contato visual.
- Você vai falar com a Mariah e isso não está em discursão. – e me deu as costas, voltando para a cozinha.
Fui para o meu quarto pisando firme, estou precisando colocar meus pensamentos em ordem.
Eu odiava não ter respostas, pensar em várias teorias sobre tudo e ainda assim não chegar a uma conclusão. O que será que aconteceu de tão ruim? E eu quero mesmo saber? Talvez o meu pai só se apaixonou por outra mulher e nos deixou, me deixou! E Willy é um psicopata inconsequente que não mede seus atos, tirando a vida da minha mãe. Essa era uma teoria muito boa, mas nada convincente. Meu pai me amava acima de tudo, e minha mãe foi o grande amor da vida dele. Então eu voltava para a estaca zero. Desliguei o chuveiro e dei uma olhada para a banheira. Eu estava mesmo precisando relaxar. Coloquei o meu roupão e fui preparar um banho para mim. Usei um pouco de espumas de lavanda e sais de banho e certifiquei de que a água estava morna. Peguei uma toalha colocando sobre o banquinho. Puxei meu travesseiro inflável e liguei meu Ipod, logo Shawn Mendes estava tocando e eu estava começando a me sentir relaxada. Fiz um coque em meu cabelo e retirei meu roupão entrando na banheira me deitando e ali permaneci até adormecer. Comecei a pensar na existência de um segundo plano, outra vida. Uma encarnação. Se Deus pode existir, então podemos ter outra chance. Eu sempre quis acreditar que eu teria outra vida. Onde meus pais me amariam e eu teria a família mais humilde do mundo, com bons amigos, um namorado que me amaria tanto quanto eu o amasse, ou mais. Eu adorava imaginar que isso era possível, que pessoas como eu, teriam outra oportunidade de concertar os erros, e saberia escolher melhor em quem confiar. Tinha que ter alguma saída para mim, deveria existir outra história bem mais contada, eu não podia ficar presa nessa vida sem ter uma vida melhor a minha espera no futuro. Isso se, Deus realmente existir.







***



Brooklyn abriu a porta de fininho pensando que por alguma ironia do destino, Willy estivesse dormindo e ninguém precisaria saber que ela havia voltado tarde de uma noite de estudos na casa de sua amiga mais próxima.
- Já voltou Brooklyn? – Willy estava sentado na poltrona em frente à lareira esperando ansiosamente por aquele momento. Ele perguntou sem mover os olhos ou o corpo, sua voz exalando ironia. Brooke olhou para o relógio e já eram dez horas da noite. Não estava cedo.
- Eu... – tentou dizer.
- Quem deixou você sair?
- Minha mãe... – não conseguiu terminar de responder por que Willy já havia se levantado e estava indo em sua direção. A fuzilava com os olhos enquanto pensava: “quem essa garota pensa que é para fazer suas próprias vontades?” Afinal, ele agora era o pai dela e ela precisava o obedecer. O medo era visível. Ele a agarrou pelo braço esquerdo e a puxou para longe da porta, em direção ao sótão.
- Me solta. – ela tentou o empurrar, mas Willy era visivelmente mais forte.
- Vem, vem comigo. Vou te ensinar a me obedecer de uma vez por todas. - Ele a jogou escada a baixo a fazendo machucar as costas e ralar os braços.
Willy trancou a porta e desceu as escadas.
- Não adianta gritar, sua mãe se dopou e está dormindo que nem um bebê. – arregalou os dentes, feliz pela situação. Quando Brooklyn tentou se levantar ele a chutou nas costelas a fazendo cair novamente e gemer de dor.
- Você sentiu isso? Ah, que alívio, sentiu sim. Agora se levante. – A puxou pelo braço sem se importar se ela estava machucada. Lágrimas se acumulavam nos olhos de Brooke enquanto tencionava seus músculos. – Você sabia que agora eu sou seu pai. – Willy endureceu a voz fazendo com que Brooklyn o olhasse morbidamente.
- Você nunca vai ser o meu pai. – rangeu os dentes, deixando bem claro.
Willy deu uma risada ponderando sobre o que ela havia favado.
- No fundo você tem razão. – A analisou de cima a baixo. – Se eu fosse seu pai não estaria pensando em fazer uma coisinha com você. – Ele a viu arregalar os olhos e se afastar no mesmo instante, sem se importar com a dor que sentia. – Guarde o medo para quando eu deixar você mole nesse chão, ai você vai ter motivos pra chorar. Agora, onde nós estávamos? – puxou as duas mãos de Brooklyn a jogando contra a parede – Ah, é! – prendeu sua cintura – Você saiu com aquele menino que vive atrás de você, sem me avisar e eu não gostei nem um pouco disso. Bom, vou ter que garantir que não ocorrerá de novo. – Ele segurou o rosto dela obrigando o olhar. Willy estava apenas sendo Willy, mais desta vez com mais prazer em vê-la com medo. Brooke estava atenta a qualquer movimento involuntário, com medo de que ele a machucasse não apenas fisicamente.
- Isso é meu! – ele disse ao colocar sua mão direita no seio esquerdo de Brooke. E apertou.
- Na-ão – gaguejou sentindo a dor e a repulsa falar mais alto. Willy apertou mais ainda sua mão fazendo movimento circulares. – Quando aquele seu amiguinho tocar você bem aqui, vai se lembrar de que já tem um dono.
Brooklyn já não conseguia ver Willy através de suas lágrimas, mas sabia que ainda não havia acabado. Mal havia começado. Willy arrastou sua mão pelo braço de Brooke, a repousando em sua bunda, fechou seus olhos apreciando aquele momento. Há muito tempo queria uma desculpa para fazer isso e agora estava aproveitando sua chance. Em um movimento rápido, Brooke se soltou e o chutou bem no meio de suas pernas, em seu órgão mais sensível. Willy se inclinou para frente sentindo uma dor horrível.
- Sua vadia!!!
Ela o encarou.
- Nunca mais você vai tocar em mim.




***


Um barulho incômodo começou a zumbir em meu ouvido, abri meus olhos tentando me acostumar com o clarão do ambiente, estava vendo tudo embaçado e minha mente ainda estava processando onde eu estava. Ah sim, eu adormeci na banheira e tive mais uma lembrança com aquele maldito. Olhei a minha volta notando que meu celular estava tocando, deve ser isso que me despertou. Peguei meu roupão e sai da banheira, andando até meu celular que parou de tocar no mesmo instante que eu o peguei. Era um número desconhecido e havia quatro chamadas perdidas, devia ser importante. Quando pensei em ligar de volta, o celular voltou a tocar. Atendi na mesma hora.
- Alô?
- Até que em fim você resolveu me atender.
Não precisei perguntar quem era para reconhecer a voz do Canadá, que não tinha mais tanto aquele sotaque carregado.
- Devo me preocupar em como conseguiu meu número? – andei de volta até meu quarto ainda me sentindo sonolenta.
- A Emma esteve aqui te procurando e eu pedi a ela.
Parei no mesmo instante.
- Emma... – fiquei confusa. - Aqui onde? – ouvi a risada dele.
- Você deveria ter me encontrado no Central Parker há meia hora, e como você não apareceu, eu resolvi fazer uma visita domiciliar.
Olhei para o relógio notando o quanto de tempo eu perdi dentro da banheira.
- Eu acabei dormindo. – me expliquei.
- Tudo bem, mas desce de uma vez. Antes que eu acabe aceitando os convites do porteiro para subir até ai.
- Eu já vou. Fique onde está.
- Você tem cinco minutos. Tic, Tac!


Minutos depois, lá estava , me esperando do lado de fora do elevador. Com as mãos enfiadas no bolso da calça jeans e mostrando seus dentes perfeitos. Ele notou que eu estava parada no mesmo lugar o encarando e quando eu percebi que ele estava entrando, sai andando até a portaria o deixando para trás.
- Caminho errado, o meu carro está lá no estacionamento. – ele me fez parar. Virei-me para ele e arquei a sobrancelha. – Cortesia do James.
Olhei para Peterson que fazia sinal com as mãos de duas pessoas se beijando. deu uma acenada descarada para ele.
- Ele gosta de mim.
- Quem não gosta? – disse com sarcasmo e andei até o elevador novamente.
- Aparentemente, você não gosta.
- Eu não tenho nada contra. – o vi entrar e as portas de fecharem.
- Muito menos a favor.
Respirei fundo encarando a minha frente.
- Gosto de ser imparcial.
- Acho que eu já notei isso. – ele parou na minha frente, me obrigando a fazer contato visual com ele.
- O que foi?
- Nada, só... Você. – tinha um sorrido de lado. E eu me esforcei para não rolar os olhos. Chegamos.
O carro do desgraçado era incrível, preto e muito brilhoso. Impossível não chamar atenção com ele e era o que eu menos queria.
- É um Bugatti Veyron Supersport – se plantou ao meu lado. – Damas primeiro. – E abriu a porta.
Deslizei facilmente no banco do carona me sentindo muito confortável e chegando a uma conclusão. tinha motivos para se gabar da forma como se gabava.




- O que tem em mente? – perguntou ao me seguir.
- Pensei que poderíamos começar com o Sheep Meadow, há vários turistas e podemos fotografar eles sem parecer dois estranhos.
- Então vamos fotografar turistas? – o modo como ele perguntou, me fez parar para analisá-lo.
- E o que você tem em mente?
soltou um suspiro breve e depois deu uma olhada rápida para o lado. Retirou o celular do bolso e mirou em minha direção. Então eu entendi que ele estava tirando fotos de mim.
- O que está fazendo? – tampei meu rosto com minha bolsa.
- O técnico pediu para fotografarmos algo que mostre muito além do que realmente estamos vendo. – ele começou a andar em círculos a minha volta e continuava a tirar fotos.
- E o que está vendo em mim com o seu celular que não consegue vê com seus olhos? Espinhas?
- Eu vejo alguém que esconde quem realmente é por trás de todo esse sarcasmo. – ele abaixou o celular para me encarar. – Do que você tem medo?
Dei de ombros tentando fingir que nada daquilo fazia sentido.
- É isso que você vai dizer quando mostrar essas fotos?
Ele arqueou a sobrancelha.
- Está me subestimando?
- Sarcasmo é uma das maneiras mais sutis de insultar um idiota sem ter que chamá-lo de imbecil.
- Não, eu não caio nessa. Se você quiser me chamar de imbecil você simplesmente vai chamar.
Fiz uma careta pra ele e depois encarei o chão. Droga!
- Olha Canadá, tem assuntos que não é da sua conta. – coloquei uma mexa de cabelo atrás da orelha. – Sem ofensa.
- Você não me ofende. – se aproximou de mim. – Só me deixa cada vez mais curioso!
- Curioso sobre o que? – enruguei a testa.
- Sobre quem você realmente é. Seus amigos podem acreditar nessa fachada, mas eu já percebi que é só uma casca calejada.
- Você não sabe nada sobre mim. – dei um passo pra trás.
- Não, mas eu sei que vou saber. Um dia! – deu uma piscadela e seguiu caminho até o gramado.
- Você não tem nada melhor pra fazer, do que tomar conta da vida dos outros?
- E o que você sugere?
- Hm, não sei... Que tal ser um garoto solitário em uma nova cidade onde ninguém te conhece?
Ele sorriu sem mostrar os dentes.
- Sabe o que é mais solitário? Estar em uma cidade onde todo mundo sabe o seu nome, mas ninguém sabe quem você é de verdade.
Trinquei os dentes e passei por ele pisando firme. era a segunda pessoa que conseguiu me tirar do sério hoje. Mas algo bem fundo em mim sabia que o motivo de eu estar mexida dessa forma, era que em anos, alguém finalmente notou que eu sou mais do que eu realmente mostro ser.





John estava escorado no batente da porta do meu quarto quando eu subi as escadas. Parei no último degrau e o encarei confusa com aquilo. Ele descruzou os braços que estavam diante o peito e se aproximou de mim me envolvendo em um abraço. Retribui com todo carinho do mundo. Não gostava de discutir com John, mesmo que isso quase não acontecesse. Eu sempre vou ser grata por tudo que ele fez por mim desde que minha mãe morreu. Minha única família.
- Você me lembra muito a sua mãe. – paralisei ao ouvi-lo. – Ela era uma mulher muito forte e determinada. Sempre correu atrás dos seus objetivos sem esperar que alguém estendesse a mão para ela. Ela estaria tão orgulhosa da mulher que estar se tornando. Tão independente e inteligente. – Me deu um beijo na testa enquanto pousava suas mãos em meu rosto. O fitei. – Tudo que eu faço é para o seu bem, mesmo que não pareça agora. Um dia você vai entender.
Depois de me olhar profundamente, ele saiu, me deixando sozinha e sem palavras. Talvez ele tenha falado mais da Lucy agora do que eu poderia me lembrar. No fundo eu só queria tomar um banho e dormir.




***


Aos poucos fui acordando e me recompondo da noite que tive. Vi April deitada sobre meu peito, usando apenas o lençol da minha cama, em um sono profundo. Puxei meu braço com cuidado para não acordá-la e fui ao banheiro doido por uma chuveirada quente. Cinco minutos depois ela entrou no Box completamente nua.
- Por que não me chamou? – se aproximou de mim, ficando debaixo da ducha.
- Não queria te acordar. – peguei o sabão e comecei a passar pelo belo corpo que ela possuía.
- Hmmm. – sorriu para mim e me deu um selinho. – Por que não passamos o dia deitados na sua cama?
- Por que temos aula, e meus pais chegam de viagem daqui algumas horas. – peguei minha toalha e enrolei na minha cintura. Deixei o banheiro.
- Quando você vai me apresentar para os seus pais? – paralisei ao ouvir tal pergunta.
Por que eu apresentaria April aos meus pais?
- Eles são muito ocupados. – pensei em uma desculpa qualquer.
- Sei... – ela voltou para o quarto. – Podemos chegar atrasados e esperar eles chegarem de viagem.
Que garota insistente.
- Não dá, tenho a oficina de fotografia na primeira aula. Não posso deixar a Brooklyn na mão.
- Brooklyn? – começamos a vestir nossos uniformes. – Brooklyn Bennette?
-Sim, somos parceiros. Você a conhece? – parei para encará-la.
- Claro, estudamos na mesma escola há dois anos. – vestiu sua saia me tirando o prazer de ver sua lingerie.
- Vocês são amigas, então?
Ela me deu um olhar engraçado e depois vestiu sua meia até o joelho.
- Eu até que gostaria, mas as únicas pessoas que ela deixou se aproximar todo esse tempo foi a Emmalyn Monroe e o trio.
- Trio? – ajeitei minha gravata.
- Elijah Harris, Josh Hunter e Edward Roettinger. Eles são o trio. Os garotos mais legais da escola, segundo os alunos da Trinity.
- Como assim? – fiquei intrigado.
-Tudo começou quando Edward decidiu assumir que é gay, beijando um garoto na frente de todos os alunos e professores da Trinity. Mesmo tendo uma família com muita grana não foi o suficiente para a escola aceitar um escândalo como esse. – ela arrumou sua bolsa. – Estava tudo certo para a expulsão dele quando Elijah e Josh o defendeu na frente de todo o corpo estudantil e até fizeram um discurso legal sobre como ser diferente pode te fazer uma pessoa melhor e que isso não te torna menos humano. Afinal, se fosse um garoto e uma garota não teria tanta proporção e isso é uma injustiça, não é?– ela me encarou. – Eles nos fizeram perceber que não havia nada de errado em sermos nós mesmos e que ninguém deveria nos dizer o que é certo ou errado. Conseguiram convencer 90% dos alunos a protestarem contra a expulsão dele e funcionou. Depois disso, eles viraram “as pessoas com quem você definitivamente deve fazer amizade”. Maaas... Parece que ninguém é bom o suficiente pra isso. A não ser a Brooklyn e Emmalyn.
Fiquei bem impressionado com o que ela disse sobre os amigos da Brooklyn. Foi uma iniciativa bem legal da parte deles.
- E o que a Brooklyn teria de especial pra isso?
April penteou os cabelos enquanto parecia se lembrar de algo.
- Ela era bem esquisita quando iniciou seus estudos na Trinity. Não falava com ninguém, não se aproximava de ninguém. Talvez fosse isso. Ela era diferente e é isso que chamou a atenção deles, eu acho. – ela deu de ombros. – Vamos comer alguma coisa? – Ela já estava pronta enquanto eu ainda calçava meus sapatos sociais.
- Eu já vou indo.
A vi sair do quarto e no mesmo instante alcancei meu celular. Fiquei passando e repassando as fotos de Brooklyn que eu havia tirado na tarde passada tendo mais certeza ainda de que ela escondia algo que mais ninguém parecia perceber.




***




- Fotografia do grego [fós] ("luz"), e [grafis] ("estilo", "pincel") ou grafê, significa "desenhar com luz e contraste". Por definição é essencialmente a técnica de criação de imagens por meio de uma exposição luminosa, fixando-as em uma superfície sensível. A primeira fotografia reconhecida remonta ao ano de 1826 e é atribuída ao francês Joseph Nicéphore Niépce. – Ele apontou para o nome do cara escrito bem grande no quadro negro. - Contudo, a invenção da fotografia não é obra de um só autor, mas um processo de acúmulo de avanços por parte de muitas pessoas trabalhando juntas ou em paralelo, ao longo de muitos anos. Por um lado os princípios fundamentais da fotografia se estabeleceram há décadas e, desde a introdução do filme fotográfico colorido, quase não sofreram mudanças, por outro, os avanços tecnológicos têm sistematicamente possibilitado melhorias na qualidade das imagens produzidas, agilização das etapas do processo de produção e a redução de custos, popularizando o uso da fotografia.
Ele guardou seus livros e nos olhou.
- Agora que já vimos um pouco da história da tecnologia fotográfica, eu gostaria de ver as fotos que tiraram com os celulares de vocês.
Enquanto ele chamava as duplas eu peguei minha fotografia preferida de um casal de velhinhos sentados no gramado rindo um para o outro enquanto estavam rodeados por crianças e olhei para que estava alheio a aula desde que entramos, ele não falou uma palavra comigo, e isso era bem estranho. Será que eu fui muito rude com ele ontem?
- Senhorita Bennette, senhor ? – ele nos chamou logo em seguida e nós fomos até o centro da sala ficando de frente para os alunos. – Nos conte sobre as fotografias de vocês.
Olhei para me questionando se ele gostaria de começar, mas o mesmo apenas continuava alheio à situação a sua volta. Encarei os alunos.
- A minha fotografia representa um casal que mesmo no auge da idade, parecem felizes com a vida que levam um com o outro. Esses podem ser seus netos ou crianças quaisquer, mas o que importa é a simplicidade em que eles conseguiam fazê-las sorrirem e vice-versa. Nos mostra que não precisamos de muito para sermos felizes se estivermos rodeados pelas pessoas certas.
- Muito bem senhorita Bennette, é uma ótima foto. – fui aplaudida por alguns segundos e então chegou à vez de que me encarou antes de levantar a sua foto, me deixando completamente paralisada. A sala inteira ficou em silencio naquele instante.
- Senhor , a sua melhor foto é da senhorita Bennette?
concordou com um aceno.
- E pode nos dizer o por quê?
A foto ampliava o meu rosto, e desfocava tudo a minha volta. Eu estava com um meio sorriso e um olhar sereno. Eu sabia muito bem o por que. Foi na hora em que eu tirava fotos do casal de velhinhos. A felicidades que os cercavam me deixou feliz também.
- Vocês claramente não podem ver o que eu vi nesse momento. Mas neste instante, Brooklyn não conseguia desviar o olhar de uma cena comum de um casal rodeado de crianças. Fiquei me perguntando o “por que”. Era como se ela estivesse conhecendo ali, o verdadeiro significado da felicidade. Que é quando você está com alguém que ama. – ele me encarou. – A Brooklyn é alguém que consegue transparecer vários tipos de sentimentos, principalmente o sarcasmo, para poder esconder quem realmente é. Por quê? Isso é um mistério pra mim.
Por alguns instantes a sala ficou preenchida de silêncio.
- Você tem algo a dizer, senhorita Bennette? – o técnico perguntou enquanto eu só conseguia pensar em todos os piores nomes que definiam naquele momento.
Senti uma lágrima escorrer pela minha bochecha enquanto não conseguia tirar os olhos da maldita foto. Quem ele pensa que é para me expor daquela maneira na frente de todos? Em um ato não pensado, tomei a foto de suas mãos e a rasguei em pedaços, os jogando ao chão. Quando dei por mim, minha respiração estava acelerada e todos me olhavam assustados. Sai da sala no mesmo instante.
Parei no meu armário e me escorei nele mal conseguindo me manter em pé. Por que fez isso? Eu não entendo! Como ele consegue notar o que ninguém notou em anos? Logo o sinal bateu e o corredor começou a ficar lotado. Me recompus enquanto procurava meu livro de matemática avançada.
- Pelo visto eu fui um pouco longe de mais. – estacionou ao meu lado e eu me segurei para não gritar com ele.
- Parece que você não conhece a palavra “limite” – minha voz saiu dura e um pouco rude.
- Se isso te afetou deve ser por que no fundo eu tenho um pouco de razão, não é?
- Ter razão não te dar o direito de fazer o que fez. O que você queria com isso? – o fitei. – Me humilhar?
Ele franziu o cenho.
- Você acha que não demonstrar quem você realmente é, é algo incomum? Você não pensa que metade desta escola não tem segredos escondidos por ai?
- Ótimo! Vai se preocupar com a vida de outra pessoa então. – fechei meu armário com força. – E me deixa em paz.
- Meio difícil já que teremos que nos encontrar mais tarde. – Ele piscou pra mim. – O técnico quer mais um trabalho em dupla. – jogou sua mochila sob os ombros. – Ele não vai considerar a minha foto depois do que você fez. Nos vemos no Central Park? – sorriu e eu quis arrancar aquele sorriso do rosto dele. – E vê se não atrasa. – Então me deu as costas, seguindo corredor a fora.
Não sei por quanto tempo eu fiquei olhando caminhar, mas logo o sinal bateu e essa era a minha deixa para tentar pensar em outras coisas.





- Adivinha quem é. – Alguém tampou meus olhos, mas obviamente eu reconhecia aquela voz.
- Seria o melhor amigo do mundo? – Sorri no mesmo instante. Ele se sentou na minha frente e me entregou uma garrafa com um papel dentro. – O que é isso? – estreitei os olhos para ele.
- Um presente. – comprimiu os lábios. – Abre.
O olhei desconfiado, mas decidi abri. Derramei o papel em minhas mãos e o desenrolei.
Fiquei surpresa.
Era um desenho meu.
Eu estava escorada em uma das estantes da biblioteca e tinha um livro em mãos. Eu não sabia que ele tinha esse dom para desenho.
- Josh, isso ficou incrível. Obrigada. – me joguei em cima dele e o abracei apertado.
- Olha, será que eles resolveram assumir o namoro em publico?
Ouvi a voz enjoada de Ed e logo rolei os olhos.
- Acho que assumiram quando Brooke beijou Josh na frente de todo mundo. – Elijah estava junto e se sentaram ao nosso lado na mesa do refeitório.
- Como é que é?
- Eu vou pegar um sanduíche natural, vocês querem? – Josh se levantou aos risos e nós concordamos. Assim que ele saiu eu encarei os dois.
- Relaxa! Apoiamos Vocês. – Elijah acariciou o meu rosto.
- Fale por você – Ed o interrompeu. – Se eu fosse a Brooke já teria me jogado pra cima do gato gringo.
- ? – Elijah perguntou ao me encarar e eu me senti sem graça.
- Ééééé. Ele anda arrastando uma asa para a Brooke, mas a princesa está se fazendo de difícil.
- Que ele use a asa dele para voar pra bem longe de mim. – bufei. Ed tinha que me fazer lembrar desse garoto.
- Bom... – Elijah passou o braço pelo meu ombro. – Eu sou time Josh. Só pra você saber.
Sorri para ele.
- Somo só...
- Amigos? – arqueou a sobrancelha para mim. – Sei. – passou a língua nos lábios e seus olhos desceram até minhas mãos. – Adorei o desenho, anyway.
- Ai, me deixa ver. – Ed o tomou das minhas mãos. – Que declaração de amor maravilhosa!!! – Sua voz era melosa. – Por que não me faz um desses? – se virou para Elijah que deu de ombros.
- Talvez o dia que você se chamar Emmalyn, ele faça. – impliquei e eu sabia que ele não esperava isso vindo de mim.
- Uuuh, parece que a Brooklyn também sabe revidar. – Ed brincou. – Quer saber, quando vocês dois assumirem que se amam, eu apresento o meu namorado pra vocês. – apontou para Elijah e depois para Emma que estava do outro lado do refeitório com a turma da sala dela.
- Primeiro você precisa arranjar um, não é? – Impliquei com Ed também.
- Tem alguém com a língua afiada hoje. – me encarou.
- Antes eu preciso saber se ele é bom o suficiente pra você. – Elijah o puxou pela mão e brincou com o topete de Ed.
- Que maneira mais sutil de dizer que está com ciúmes. – o empurrou para longe.
Parei de escutar os dois e encarei Emma.
Recordei-me do Canadá dizer que ela havia ido me procurar, mas eu não liguei de volta. O que será que ela queria? Quando mencionei me levantar e ir até ela, Josh voltou com os sanduíches.




- O que está fazendo? – John parou na porta do meu closet e se escorou no batente. O olhei de relance e depois continuei a jogar minhas roupas pelo chão.
- O que será que se veste para ir a uma sessão psiquiátrica? – eu pude ouvi os olhos dele se revirarem. – Tudo branco parece um pouco fora de moda para mim.
- Que tal algo bem quente, por que o dia está bastante frio.
- Acho que poderia ter pensado nessa possibilidade sozinha. – peguei um vestido e coloquei a frente do meu corpo, e depois uma blusa de manga. Mas nada parecia bom o suficiente.
- O que você está vestindo está ótimo.
O que eu vestia, era uma Skinny Jeans preta, com um leve rasgado no joelho esquerdo e uma blusa de moletom.
- Então vai ser um casaco da Jocelyn Westwood, a minha bolsa Cashhimi e... – dei uma olhada para a parte alta do closet, onde ficava parte dos meus sapatos. – Minhas botas Carmelinas.
Com tudo em mão, voltei para meu quarto sendo seguida por John.
- Você não se veste assim nem quando temos eventos importantes. – joguei minhas coisas na cama, me sentando sobre ela e coloquei minhas meias.
- Bem, acho que é valido dizer que essa é uma ocasião importante.
Depois de calçar minhas botas, eu vesti meu casaco e soltei meus cabelos.
- Uaaau Brooke. – Nana apareceu na porta do quarto.
- É para uma ocasião importante. – andei até minha penteadeira e resolvi usar meu batom nude. Pelo espelho vi Nana e John se olharem. – Não precisa me buscar. – me virei para eles. – Vou me encontrar com o para um trabalho da Trinity.
Nana soltou um risinho na mesma hora. A encarei.
- Então essa é a ocasião importante.
Dei de ombros.
- Um trabalho da Trinity sempre é importante. – passei por eles, indo até a sala.
- Não adianta se esquivar, eu conheço você muito bem pra dizer que se arrumou toda para esse garoto.
- Está delirando.
- Você gosta dele? – John perguntou e eu o olhei com uma expressão incrédula.
- É obvio que não.
- Por que se você gosta, eu aprovo.
Os dois estavam se divertindo com a situação.
- Sinto em te decepcionar, mas não passa de um arrogante, galanteador e muito convencido. Conheci pessoas bem melhores e que mesmo assim não conseguiram me conquistar.
- Calma, só estamos brincando. – Nana tentou apaziguar a situação.
- Eu vou pegar o meu casaco. – John trocou um último sorriso com Nana e saiu.





John parou o carro em frente ao centro psiquiátrico de Manhattan e permaneceu imóvel no banco, sem emitir um som. E eu não tinha nada pra dizer que já não tinha dito. Ele não me ouvia, achava que a melhor coisa a ser feita, seria eu me abrir com Mariah sobre meus problemas pessoais. Só que eu não achava isso, não chegava nem perto do que eu realmente penso que poderia ser a solução dos meus problemas. Mencionei sai do carro.
- Espera. – segurou a minha mão e eu o olhei. – Não quero que se sinta pressionada.
- Não acha que é meio tarde pra isso?
- Olha, dê uma chance a ela, tente confiar nela, tenho certeza que vai se sentir mais confortável depois disso.
Dei de ombros.
- Vou tentar. – mencionei sair do carro e novamente ele segurou minha mão.
- Você vai ficar bem? – me analisou.
- Se eu não ficar, eu finjo.
E sai.
Mariah Evans é a melhor psiquiatra de Nova York, e a amiga mais próxima de John. Os dois se conhecem há muito tempo e por isso, imagino eu, John tenha me pedido para participar de seções semanais com ela. Já ouvi dizer que quando “botamos tudo para fora”, nos sentimos mais leves. Mas comigo não funciona bem assim. Quanto mais eu falo sobre meus medos e pesadelos, mais eles me assombram.
- Brooklyn. – Mariah veio me receber na recepção pessoalmente.
Estava linda e radiante depois das férias, pele bronzeada e os cabelos pretos brilhantes batendo soltos em seus ombros. Ela me deu um abraço nada típico de uma profissional. – É muito bom ver você de novo.
- Você está ótima Mariah. – caminhamos até sua sala. Ela me deu um sorrisão.
- Essas férias me fizeram muito bem, eu recomendo a você, Deveria conhecer a Itália.
- Se você conseguir manter John nos Estados Unidos, eu também adoraria conhecer. – brinquei.
- Voltamos ao caso “John super protetor?” – me sentei no pufe gigante e branco assim como quase toda a sala, enquanto ela se sentou na minha frente, cruzando suas pernas.
- Ás vezes é meio sufocante, mas eu o entendo. – deitei meu corpo, me deixando de uma maneira mais confortável e encarei o teto.
- Vamos começar da onde paramos? O que tem feito desde então?
- Estudando, lendo, saindo com meus amigos, tendo os mesmo sonhos, tentando descobrir se minha mãe esta querendo entrar em contato comigo, essas coisas...
Eu pude notar que ela não se sentia nenhum pouco surpresa. Com certeza John deve ter lhe falado a respeito.
- É muita coisa para digerir. Como está se sentindo?
Respirei profundamente.
- Eu não sei... Cansada, talvez. – continuei a encarar o teto branco e muito familiar. – Só estou cansada de nunca obter as respostas das minhas perguntas.
- Entendo...
- Não, você não entende! E nunca vai entender. Ninguém vai.




Avistei fotografando algumas crianças que brincavam com seus balões e corriam em círculos cantando uma cantiga. Ele estava tão distraído que mal notou minha aproximação. Coloquei minhas mãos no bolso do casaco e o deixei se dar conta da minha presença. O que não tardou.
- Ai está você. – se virou para mim e seus olhos mudaram de cor a me ver. – Está bonita.
Pousei minhas mãos sobre minha cintura.
- Vejo que não me esperou.
- Não estava nos meus planos ir te buscar hoje. Você fez alguma coisa no cabelo?
Franzi o cenho e neguei.
- Não, não fiz. – passei a língua nos lábios. – Então... Crianças?
deu uma olhada rápida para elas que não pareceram se importar com a nossa conversa.
- É, eu... Elas me lembram de uma fase onde tudo era mais fácil.
- Eu não consigo imaginar você tendo dificuldade em conseguir algo. – debochei.
- Por que não imagina isso?
- Ah – dei de ombros. – Talvez pelo seu carro, ou pelo seu ego inflável que demonstra o quanto você pode e consegue o que quer.
- Pode parecer que não, mas eu não tenho tanto poder de escolha.
- Está falando sobre se mudar para os Estados Unidos ou sobre a faculdade? – tentei entender, ele deu de ombros. - O que foi? É tão difícil assim contar para o seu pai que não quer fazer Direito? – lembrei-me da nossa conversa sobre algo parecido.
- E por que isso seria uma coisa difícil?
- Se fosse fácil, você já teria dito para ele. – cruzei os braços diante o peito. – Ou você já disse? – arqueei a sobrancelha.
Ele me encarou por alguns segundos.
- Não. – Seu tom de voz era rude, e isso era um sinal nato de que eu tinha cutucado a onça com a vara curta.
- É bem chatinho quando alguém se intromete na nossa vida sem ser chamado, não é?
- Você ainda está chateada com o que aconteceu mais cedo na escola?
Mordi meu lábio.
- Chateada não é bem a palavra que eu usaria, mas... Não! Eu não estou. Não mais!
Tirei meu celular da bolsa e comecei a fotografas as crianças que antes estavam sendo fotografadas por ele.



e eu não voltamos a falar sobre esse assunto, nos focamos em tirar fotos de tudo que pudesse ter algum significado e depois de duas horas decidimos ir embora. parou o carro no estacionamento da Shake Shack e eu não entendi o porquê daquela parada.
- O que está fazendo? – perguntei quando ele abriu a porta do carro para mim.
- Tentando ser educado.
- Por que começar agora... – sai do carro sem tocar nele. - E então? – perguntei.
- Por que não comemos alguma coisa? – sugeriu enquanto andava na minha frente. – Oi, você pode me trazer um café? – pediu gentilmente a uma garçonete.
- Café? – o segui. – Pensei que os canadenses gostassem mais de cerveja.
- Estou tentando me encaixar na cultura americana.
- Isso explica o fato de estar perdendo seu sotaque?
- Acho que é mais a convivência.
- Se você quer se enturmar deveria começar a usar casacos nessa época do ano.
- No Canadá é bem mais frio do que isso. – se explicou. – Estou me sentindo no verão.
Encontramos duas cadeiras e uma pequena mesa de metal esverdeada do lado de fora do estabelecimento, era formidável e cheirava muito bem. Uma moça trouxe o cardápio, o café do e já que eu estava aqui mesmo, iria comer alguma coisa.
- Eu vou querer um cheeseburger e batatas fritas no óleo de amendoim. Pode me trazer também um copo de suco de laranja.
Ela anotou meu pedido em uma caderneta e se virou para . Quando seus olhos o viram ela trepidou um pouco. Seja discreta!
- Só o café.
Não pude deixar de notar que a garçonete demorou a tirar os olhos de e o que pareceu uma eternidade ela finalmente se afastou. Senti-me ridícula por notar isso e me repreendi mentalmente. tomou um pouco do seu café antes de escorar suas costas na cadeira e me encarar. E eu me repreendi ainda mais por ter o achado lindo.
- Por que Brooklyn?
Olhei para ele confusa.
- Como assim?
- Por que se chama “Brooklyn”?
Dei de ombros.
- Acho que é pelo fato de eu ter nascido lá.
- É mesmo? Eu nasci em Ottawa e nem por isso esse é o meu nome.
- Bem, obviamente nossos pais não são os mesmo.
Ele deu um sorriso breve.
- Não que eu ache que esteja errado, mas... – ele suspirou. – Eu percebi que talvez eu tenha cruzado um pouco a linha e ter falado de mais durante a oficina de fotografia.
- Isso quase soou como um pedido de desculpas.
Ele deu um longo gole no seu café sem tirar os olhos de mim.
- Foi mal. – comprimiu os lábios em um sorriso nada convincente de que realmente se sentia mal.
- Isso não é um pedido de desculpas. – Usei um tom repreendedor.
- Essa é a sua opinião. – debateu.
- Eu quero um pedido de desculpas verdadeiro. – enfatizei e ele deu mais um gole no seu café.
Rolei os olhos.
- Você vai acabar vendo seu cérebro, de tanto que revira os olhos.
- Um comentário sarcástico?
- Estou aprendendo com a melhor.
Optei por não o responder e ficar em silêncio. Mas óbvio que isso não o impediu de ficar em silêncio também.
- Vamos fazer um acordo.
Franzi o cenho.
- Que tipo de acordo?
- Eu te conto um pouco da minha vida no Canadá e você me conta um pouco da sua vida antes de eu chegar aqui.
- ...
- Quando você estiver preparada e quando confiar em mim. – me interrompeu. – Temos um acordo? – estendeu a mão em minha direção e eu a olhei.
- Por que você iria querer saber sobre a minha vida? – questionei.
- Por que eu adoro mistérios e é tudo o que eu vejo quando olho para você. – me encarou seriamente. – Uma garota misteriosa. – abaixou sua mão.
- E se não for o que você pensa? Talvez seja só uma história triste e sem sentido.
- Então vai ser bom pra você pode tirar um pouco do peso das costas e talvez começar a amolecer um pouco seu coração.
- Está me chamando de insensível?
- Talvez. – deu de ombros. – Mas todas as pessoas que se tornam insensíveis tem motivos para isso.
Abaixei meu rosto e fiquei encarando minhas mãos.
- Eu só quero saber quem é a verdadeira Brooklyn Bennette. O que me diz? – voltou a estender sua mão.
Será que isso seria uma boa ideia? Não sei se eu iria querer corromper com o meu passado. Não quero que ninguém tenha pena de mim ou qualquer sentimento parecido. Mas ver parado ai na minha frente me fazia pensar que se tiver outra visão dos fatos, poderia me ajudar a chegar alguma conclusão.
- Brooklyn?
Olhei para o lado e avistei Emma parada há poucos metros de mim. Tinha uma expressão estranha.
- Emmalyn? O que faz aqui? – me levantei e fui até ela.
- Eu estou tentando falar com você há dias, mas eu... – olhou para e depois para mim. -Podemos conversar?
Afastamo-nos um pouco da lanchonete e durante esse processo eu podia sentir que Emma estava apreensiva, talvez um pouco ansiosa? Ela ficou de frente para mim e parecia tentar encontrar as palavras para serem ditas.
- Você está começando a me deixar preocupada. – a analisei.
- É sobre o jogo de Ouija, eu... – parou de falar e começou a beliscar os próprios dedos.
- Emma, tudo bem! Seja lá o que estiver te incomodando você pode me falar. – tentei tranquiliza-la.
Ela olhava para todo o canto daquele local menos para mim, estava inquieta e tinha um semblante carregado. Será que ela estava sendo assombrada como eu?
- É que... – ela finalmente me encarou. – Fui eu quem escreveu o nome Lucy no tabuleiro. – disse muito rápido, mas ainda assim eu consegui entender todas as palavras. Então foi como se o mundo tivesse parado. Eu não via nada mais a não ser uma Emmalyn se sentindo culpada na minha frente. Primeiro eu senti raiva por ela ter me feito acreditado que minha mãe queria falar comigo, depois eu fiquei confusa em como ela poderia saber sobre Lucy se eu nunca tinha tocado no nome dela para nenhum dos meus amigos. Eu tinha que fazer a pergunta de um milhão de dólares.
- Como você sabe sobre a Lucy? – minha voz era gélida, sem emoção alguma.
Ela suspirou.
- Teve uma vez em que fomos para a casa do Ed e você adormeceu no meu colo e de repente começou a falar. De inicio eu pensei que estava falando comigo, mas depois você começou a falar sobre essa “Lucy” e eu percebi que você estava sonhando. – prendi minha respiração. – Teve outra vez em que nós ficamos estudando até mais tarde na sua casa e acabamos adormecendo. Eu acordei com você conversando com alguém. Achei que fosse o John, mas não tinha ninguém ali, além de mim. E novamente você voltou a falar o nome “Lucy”. Eu percebi que não poderia ser apenas alguém da sua imaginação, que essa Lucy realmente deve existir. Eu fiquei semanas, meses até, esperando você me contar quem era, mas você nunca disse. Aliás, você nunca sequer me disse algo sobre o seu passado. E quando o Ed propôs o jogo eu achei uma chance perfeita para fazer você falar. – ela suspirou outra vez. – Mas fora a suas reações estranhas, você não tocou no assunto. Me desculpe Brooke, eu sei que errei em ter escondido isso e que provavelmente eu deixei você pensando muitas coisas, eu só não encontrei outra saída para fazer você falar.
- E por que você não me perguntou quem ela era? Por que, realmente eu comecei a achar que alguém poderia estar tentando falar comigo, comecei a pensar que...
- Me desculpe Brooke, eu só não sabia o que fazer.
Eu não tinha palavras para descrever o quanto eu estava com raiva. Por algum segundo eu tinha uma ideologia na cabeça e agora tudo se esvaiu. Não dava para acreditar que Emma tinha feito isso comigo.
- Podemos conversar outra hora? Estou ocupada agora.
Não esperei por uma resposta.
Dei-lhe as costas e andei até novamente, que me encarava enquanto comia minhas batatas que veio junto com o lanche.
- Espero que não se importe. – disse assim que eu me aproximei.
- Tudo bem, eu perdi a fome. Podemos ir para casa? – coloquei minha bolsa em meu ombro.
- Você está bem? – franziu o cenho a se levantar.
- Não, na verdade! – forcei um sorriso para e ao fundo eu avistei um senhor de idade sentando no chão segurando um cartaz qualquer. Provavelmente um mendigo. Andei até ele sabendo que vinha logo atrás, mas não me importei. Dei a ele o meu lanche e mais alguns dólares que eu levava comigo. O senhor olhou para mim surpreso e me deu um sorriso enorme em forma de agradecimento.
- Deus te abençoe. – disse e não esperou muito para devorar o lanche.
Fiquei o encarando comer por alguns segundos até conseguir dizer:
- Deus não existe!


Capítulo 5 - Doces ou travessuras!

Estava tentando repassar toda a matéria de física quântica mentalmente, quando começou a acenar para mim, me fazendo notar que estava olhando em sua direção, eu só não prestava atenção. Graças às novas mudanças, o primeiro teste de nível seria oral e com todas as turmas do último ano juntas. Talvez eles queiram comparar a capacidade de alguns com o fracasso de outros. Quem sabe, fazer certos alunos (eu) notar que tudo que envolva cálculo talvez não seja exatamente o fim do mundo. Confesso que eu não estava tão confiante assim.
- Senhorita Bennette, sua vez. – O professor Walter me chamou e com alguns incentivos de Ed eu me levantei para ficar no centro da sala.
Alguns desenhos começaram a se formar na tela branca e logo ficou claro que era uma caixa no meio de plano inclinado. Ai não.
- Nesse experimento podemos ver uma caixa de madeira e dentro dela um bloco de pedra. Está bem no alto de um plano inclinado. Você poderia nos responder por que a caixa não desceu o plano até seu ponto mais baixo? – ele me questionou e eu quase dei um mortal de felicidade por não precisar resolver um cálculo. Quase.
- A inclinação da rua não é suficiente para que a componente Px do peso seja maior do que a força de atrito estático máxima.
Ele olhou para uma das folhas em cima de sua mesa e voltou apertar um botão para a tela branca e então apareceu um homem empurrando a caixa.
– Observe que o desenho representa uma pessoa que aplica um empurrão em um corpo para que ele suba o plano inclinado. O que você diria sobre, supostamente o movimento do corpo fazer com que não exista atrito entre o ele e o plano?
- O corpo adquire velocidade cujo valor diminui á medida que ele sobe o plano. Se o corpo sobe e depois desce o plano, o módulo da aceleração de subida é igual ao módulo da aceleração de descida.
- Muito bem, pode se sentar. –me indicou o meu lugar e eu voltei muito feliz com o meu desempenho. Só espero que as próximas perguntas sejam tão fáceis quando esta.
Logo depois foram às vezes de Ed, Elijah, Emma, Josh e depois de mais alguns alunos, finalmente havia chegado à vez de . Eu não sei por que, mas fiquei bastante surpresa por notar que o nível de inteligência do Canadá seja tão bom quanto à dos alunos da Trinity. Ele respondeu as perguntas sem ao menos vacilar ou pensar nas repostas. Talvez eu tenha o subestimado.
- Será que eles irão demorar a dizer as notas? – perguntei ao sair da sala com meus amigos.
- O teste acabou de acontecer apressadinha. – Elijah riu do meu desespero.
- É que eu não sei se fui bem.
- O máximo que pode acontecer é você fazer uma recuperação e Harvard notar que você não é tão boa quanto eles pensam. – Ed fez suas habituais brincadeiras sem graça.
- Ed... – Josh usou seu tom repreendedor.
- Relaxem amigos, gosto de fazer piadas em momentos como esse. – abraçou-me pelo ombro e ampliou um sorriso.
- Então me diga quando começar, por que isso não foi engraçado. – o empurrei de leve.
- Para quem não quer entrar em Harvard, você ficou muito tensa. – Josh observou.
- Ei Josh, Elijah...
Peter os chamou e os meninos foram até ele me deixando as sós com Ed.
- Todo mundo sabe que você tirou uma nota boa, mas quanto ao gringo... – Ed olhou para que deixava a sala com April e alguns amigos dela que eu sempre detestei. – Não sei você, mas eu fiquei surpreso ao vê-lo responder as perguntas tão confiante.
- Não é apenas em Nova York que tem escolas boas. – comentei ao abrir o meu armário para guardar meu livro de física quântica.
- Oi! – April se aproximou de nós. Ela começou a nos entregar convites com desenhos de caveiras e abóboras bem legais. – A minha prima esta dando uma festa de Halloween hoje à noite. Estão todos convidados. – ela foi simpática. – Podem entregar para Josh, Elijah e Emma?
- Obrigada, mas nós já temos uma festa para ir. – Ed deu uma olhada para o convite e depois sorriu falsamente para ela.
- Ah. – fez uma expressão de decepcionada. – Bom, fiquem com o convite. Se resolverem ir vocês só poderão entrar com ele.
- Espera. – Ed a chamou quando ela mencionou sair. – O vai?
April o olhou como se não tivesse entendido a pergunta.
- Vai sim – franziu o cenho para ele. – Por quê?
- Bom, talvez nós possamos dar uma passada na festinha da sua prima um pouco, não é Brooke?
April me encarou no mesmo instante com uma expressão interrogativa. Por que Ed tinha que dizer aquilo como se tivesse insinuando algo?
- Hm...
- Vamos pensar no assunto. Prometo. – Ed cruzou os dedos e sorriu. Ela tentou sorrir, mas saiu falho. – Tchauzinho. – acenou para ela.
- Isso foi muito desnecessário. – o encarei séria.
- Que? Ela precisa saber que tem uma concorrente a altura.
- Pela décima vez, eu não estou interessada no . – tentei não parecer rude.
- Quem disse que eu estou falando de você? Deixe um pouco para as amigas, ok? – piscou para mim e saiu rebolando.
Neguei com a cabeça e esbocei um sorriso ao segui-lo.
- Bom, vocês tem uma coisa em comum. – ele me olhou.
- É mesmo? O que é?
- Ambos são convencidos.
Ed permaneceu inabalável diante o meu comentário.
- Parece que eu tenho uma alma gêmea. – alisou o topete e eu me esforcei bastante para não rolar os olhos.
- Você mal tem alma, quanto mais gêmea. – Ele estreitou os olhos em minha direção e iria rebater, mas Josh e Elijah chegaram no mesmo instante.
- Sabe aquela festa maneira que o Peter dá todo ano de Halloween na casa dele? Não vai rolar. – Josh trouxe a péssima noticia.
- Por que não? – Ed perguntou em seu tom de desespero. – A festa dele é a melhor da cidade.
- Parece que os avós dele chegaram de viajem e irão ficar até semana que vem.
- E agora? Eu não quero ir nessas festas ridículas em que batizam as bebidas e tem gente transando por todo o lugar. – Os informei.
- Então que bom que fomos convidados para a festa da prima da Granger. – Ed me olhou de esguelha com um sorriso sapeca e entregou os convites dos meninos. – Parece um lance mais “exclusivo”, mas acho que vai ser legal.
- Só tem um problema. – Elijah leu algo no convite me encarou. – É a fantasia.
E de repente todos me encararam.
Talvez seja por que eu me recuse a usar fantasias já que elas são usadas de forma errada. Respondam-me uma coisa: Desde quando Coelhinhas da playboy são assustadoras?
- Eu não preciso ir.
- Nem pensar, se um não for ninguém vai. Você sabe disso.
- Eu não vou deixar vocês perderam a festa por minha causa.
- Então está resolvido, você irá com a gente. – Ed me contrariou.
- Não comprei uma fantasia. – foi a melhor desculpa em que pensei naquele momento.
- Vamos falar com a Emma e ir fazer compras. – segurou em minha cintura me puxando até a sala ao ouvirmos o sinal. – Programa de meninas. Adoro!!!





“Algumas teorias sugerem que a origem das comemorações do Halloween tenha surgido entre o povo celta, através das festividades pagãs do fim do período de verão e início do inverno, o “Festival de Samhain”, que acontecia no final do mês de outubro. Acreditava-se que nesta data, os espíritos dos mortos regressavam para visitar as suas casas e também poderiam surgir assombrações para amaldiçoar os animais e as colheitas. Todos os símbolos utilizados pelos celtas tinham como objetivo afastar os maus espíritos. A origem católica do Halloween coincide com a festa de Todos os Santos, sendo determinado pela Igreja Católica o dia 2 de novembro como o Dia dos Finados. Antigamente, no dia 31 de outubro, acontecia uma vigília de preparação denominada “All Hallow’s Eve” (Véspera de Todos os Santos). Após transformações, a expressão permaneceu na sua forma atual.”


O Técnico de fotografia havia escrito isso no quadro obviamente pensando que ninguém sabe o significado de um dos melhores feriados dos Estados Unidos, depois do dia de Ações de Graça é claro. Ou ele só não tinha mais nada para fazer já que todo mundo estava ajudando a enfeitar a escola que mesmo sendo contra, não teve como negar. Uma saída boa foi pedir para fotografar nós mesmos fazendo todo o trabalho enquanto ele se empanturrava de rosquinhas de doce de leite.
- O que você prefere: Batman ou Super Man? – tirava algumas fotos minha, enquanto eu tentava fazer olhos medonhos em uma abóbora.
- Como assim? – perguntei sem tirar os olhos do legume em minhas mãos.
- Para usar como fantasia de Halloween.
- Ah, não sei! É como se estivesse me pedindo para escolher entre o Capitão América e o Homem de Ferro. – ele ficou em silencio ponderando sobre o que eu tinha dito.
- É uma boa comparação. – mais alguns segundos de silencio. – Então, qual prefere?
Eu o olhei e ele bateu uma foto no mesmo instante.
- Acho que... Capitão América.
- Mas eu perguntei sobre o Batman e o Super Man.
O encarei seriamente.
- Por que você não usa o que te deixar mais confortável?
- E o que você sugere?
Já que ele não iria para de falar e me distrair, resolvi pegar minha câmera e tirar fotos dele também.
- Eu não sei se você sabe ler, mas está escrito no quadro um pouco sobre a história do Halloween. Tenta se inspirar.
começou a fazer poses engraçadas. E claro que eu não contive algumas risadas.
- Por que não me diz qual a sua fantasia, podemos ir combinando. – ele colocou suas mãos em sua nuca e abriu aquele sorriso prepotente. Aproveitei a câmera para olhar pra ele sem parecer suspeita.
- Isso seria impossível já que eu não tenho uma. – ele franziu o cenho.
- Como assim?
Abaixei a câmera e a coloquei sobre a mesa voltando a furar minha abóbora.
- Dizem que os Celtas criaram isso de se fantasiar por que os mortos poderiam sair dos seus túmulos e assustar a vizinhança. Então é como uma forma de camuflagem para as pessoas não serem mortas.
- Obrigado pela aula, mas como você mesma observou, está tudo escrito no quadro.
Ele se aproximou de mim, ficando ao meu lado e muito próximo. Eu podia sentir a respiração dele batendo em meu rosto.
- Acontece que eu não acredito nisso. E nem você e quase todas as pessoas do planeta.
- Ta, mas a diversão não é pedir “Doces ou Travessuras”?
- Na verdade não. Deveríamos nos fantasiar de mortos vivos e sair perambulando por ai como se realmente fossemos zumbis e não enchendo a cara e dançando em cima de uma mesa. É quase uma falta de respeito com os mortos.
Terminei mais ou menos o olho e decidi acender uma vela dentro.
- Você classifica isso como “diversão”? – disse ao me seguir. Virei-me para ele.
- É. – disse convicta. – Afinal, não é por isso que o Halloween existe?
Ele ficou me observando pegar a vela e colocar na abobora e quando dei uma olhada rápida para ele, estava com uma expressão estranha.
- Vamos fazer. – disse após alguns períodos quieto.
- Fazer o que? – franzi o cenho.
- Nos fantasiar de Zumbis, assustar as pessoas... O que mais estiver no código de conduta moral do livro do Halloween. – parecia empolgado. – Vamos fazer.
- Você enlouqueceu. – constatei.
- Por quê? A ideia foi sua. Só quero coloca-la em pratica.
- E o que a sua namorada acharia disso? – cruzei os braços e encarei seus olhos claros que pareciam vividos.
Ele deu de ombros.
- Provavelmente vai estar ocupada de mais enchendo a cara e dançando em cima de uma mesa.
Não evitei um sorriso.
- É realmente legal de sua parte querer fazer isso por mim Canadá, mas meus amigos já têm planos para mim essa noite.
A expressão alegre dele aos pouco se fechou.
Era muito legal ver alguém se esforçando para fazer algo que me agradasse e eu tinha que reconhecer que é o tipo de pessoa que eu deixaria entrar na minha vida. Pousei minha mão em seu ombro o pegando de surpresa.
- Obrigada.





Depois de fazer um rabo de cavalo em meu cabelo, sai do vestuário usando apenas as minhas roupas de ginástica e fui ao encontro de Ed que me esperava do lado de fora. Começamos a conversar sobre a festa e a minha –não- vontade de ir a essa festa. Claro que ele me persuadiu a ir, dizendo que nunca mais falaria comigo e mesmo eu sabendo que ele jamais faria isso, resolvi não o contrariar. Quando chegamos a pista de corrida eu ouvi alguém gritar “Cuidado”, mas eu não soube de onde veio até uma bola futebol americano voar em minha direção. Ao invés de sair correndo ou tentar me esquivar, eu me petrifiquei e fechei meus olhos aguardando o impacto, que não chegou.
- Essa foi por pouco. – havia acabado de me salvar. E eu só consegui o encarar pensando em como aquilo poderia te tido um final bem diferente e vergonhoso.
-Foi mau ai Brooklyn – uma voz nada estranha soou de longe.
-Você está bem? – perguntou visivelmente preocupado com a minha falta de reação.
-Só podia ser o idiota do Christensen – Ed disse irritado. – Me empresta isso aqui. – ele tomou a bola das mãos de .
-Ei, boa pegada novato. Já pensou em fazer o teste para entrar no time? – disse ainda de longe
- Valeu, mas futebol não é a minha praia.
- Você quem sabe cara. – e seus olhos foram para Ed. - Agora será que pode me devolver a bola?
- Claro, aproveita e enfia ela no seu... – antes que ele pudesse terminar, eu acompanhei seu raciocínio e tampei sua boca.
-Sempre tão gentil com as palavras – Disse ao vir pessoalmente pegar a bola. Ele estendeu a mão em direção de Ed que o olhou intrigado antes de devolver a bola.
- Dá próxima vez olha para onde taca isso. – empurrou em direção ao peito dele que fez uma leve expressão de dor.
- Nossa, ele está com raiva. Que grande novidade. – debochou. – Qual é o seu problema comigo?
- Você já se conheceu? Não é uma pessoa legal. – cruzou os braços.
- Não tem mais ninguém pra infernizar não?
- Provavelmente, só que eu elegi você.
Olhei rapidamente para que também me olhou enquanto tentava disfarçar um sorriso. Ele se aproximou do meu ouvido e sussurrou.
- Esses dois lembra me lembra você, quando te conheci.
Rolei os olhos.
- A única garota que não caiu no meu charme. – me cutucou. – No começo até achei que fosse lésbica.
- Claro. – usei um tom abusado. – Por que esse é o único motivo para alguém não se interessar por você.
Ouvi uma risada abafada vindo dele
- Você nunca me deu um motivo. Você se quer tentou me conhecer melhor.
- Eu conheço agora e a minha opinião ainda é a mesma. – dei de ombros - Poderia ter dito que “o problema sou eu” ou “nós podemos ser amigos” ou “não é nada pessoal”. Mas eu apenas não fiquei interessada. Aliás, você devia me pedir desculpas.
- Do que está falando? – perguntou um pouco confuso, mas se divertia.
- Estou falando das milhares de perguntas íntimas que ficou fazendo.
- E você não me respondeu nenhuma delas, quem deve desculpas agora? - Ele arqueou a sobrancelha para mim
- Você nem me conhecia. – expus a obviedade.
- Eu estava te observando há muito tempo, você estava atraente e parecia interessante. Gostei da maneira em como fazia os seus amigos rirem, imaginei que tivesse senso de humor.
- E cheirar o meu perfume e fazer todas aquelas perguntas devia ser algo engraçado?
- Queria te conhecer melhor. E ás vezes uma abordagem direta é mais eficaz.
- Está querendo dizer que isso de invadir a privacidade de alguém funciona?
O sorriso convencido que ele me deu foi o suficiente para confirmar a minha pergunta.
- As garotas são sensíveis, geralmente querem conhecer um cara que ouve o que elas têm a dizer.
- Nossa, vocês evoluíram mesmo. Até aprenderam a fingir que se importam. – ele estreitou seus olhos em minha direção e resolvi não dar mais trela para esse assunto voltando a prestar atenção em Christensen e Ed que ainda discutiam.
- Eu não ia fazer isso, mas já que vai te irritar eu vou fazer.
- Fazer o que? – perguntei confusa.
- Me inscrever para uma vaga no time.
- Boa sorte. – Christensen disse cheio de sacarmos e depois se virou para . - Me procura se resolver mudar de ideia – O jogador disse e após fuzilar Ed, ele se retirou.
- Ai meu Deus, ele é tão gato. – olhou para Ed no mesmo instante eu pude notar sua expressão de confusão. Não segurei um riso.
- Ed é apaixonado pelo Christensen desde o segundo ano, mas ele acha que a melhor tática é fingir que não está nem ai. Pelo menos quando ele está longe.
- E isso funciona? – Ele me perguntou.
- Tem quase dois anos que ele está tentando.
- Há, há, há. – Ed deu sua risadinha sem graça ao me encarar. – Ele é louco por mim, só... Não sabe ainda. – arqueou a sobrancelha e riu.
- Obrigada Canadá. – me virei para e dei um tapinha de leve em seu ombro. Não sabia qual era o protocolo já que a namorada dele estava há menos de um metro de distancia.
Ele deu um aceno em concordância.
- Pode contar comigo sempre que estiver em perigo. – brincou e eu rolei os olhos. – Ou se quiser sair para jantar ou tomar um sorvete...
- Você poderia apenas dizer “de nada”, mas tinha que fazer isso virar uma cantada.
Ele abriu aquele sorriso que já estava virando o meu preferido.
- Não custava nada tentar. – ficou me encarando e sorrindo com os olhos. Eu quase tive vontade de dizer “sim”, quase.
- Olha só, não é só por que eu tenho fogo que signifique que eu seja vela.
Fechei meus olhos naquele momento, me arrependendo de ser amiga de Edward. E quando os abri, é claro, estava rindo mais ainda do comentário e continuou a me encarar.
- Eu vou indo nessa. – se despediu com uma piscadela e saiu correndo em direção a April que se alongava com as animadoras de torcida.
- Como você não consegue voar no pescoço dele e o agarrar na frente de toda a escola? – me perguntou.
- Ele não está dando em cima de mim de verdade. Parece que me deixar sem graça virou o passatempo favorito dele. – Ed me encarou como se não acreditasse e por um tempo ficou em silêncio.
- Até que eles são um casal bonitinho. – O ouvi tagarelar – Mas eu ainda acho que ele devia ficar solteiro e aproveitar tudo de melhor que a vida tem para oferecer. – não me interessava pelo o que Ed estava dizendo, então só fiquei quieta e comecei a me alongar. - Quem sabe não tentar novas e diferentes experiências sexuais, ein?
- Você é nojento. – deixei claro.
- Vai dizer que não pensou o mesmo? – começou a me seguir no alongamento.
- Não pensei. – falei no mesmo instante. – Acho que é daqueles casos raros que não saem por ai pegando todo mundo e eu acho isso muito legal da parte dele. – joguei meus braços pra cima da cabeça e segurei meu cotovelo esquerdo.
- a moda antiga. – parou de se alongar para poder olhá-lo. – Ele parece mais gostosinho agora que me fez notar isso.
Rolei os olhos e fui em direção à pista para poder correr.





- De quem foi à ideia de pendurar uma foto minha lá em baixo no saguão? – foi à primeira coisa que perguntei quando entrei.
Nana sorriu enquanto colocava um prato sobre a bancada.
- Boa tarde Brooklyn, como foi na escola? – fingiu de desentendida.
- Não desconversa. – me sentei morta de fome.
- John achou que seria legal colocar fotos dos moradores pelo prédio e uma sua não poderia faltar.
- Mas eu estou vestida de árvore.
- É Halloween. – disse como se isso explicasse alguma coisa.
- Mas naquela foto eu estava fazendo teatro no primeiro ano.
- Não interessa, é a única que temos. Não reclame. – me olhou séria. – Eu fiz frango frito com purê de batata.
- Eu vou comer em sinal de protesto a essa foto. – usei um tom emburrado.
- Fique a vontade para repetir. – se sentou na minha frente e ficou me observando comer.
- Fui convidada para uma festa de Halloween, e essa festa é a fantasia. – fui diminuindo o meu tom de voz.
- Ai minha nossa. – ela se levantou e começou a dançar, franzi o cenho.
- O que é isso? – perguntei.
- Isso é a minha demonstração de felicidade em ver você interagindo socialmente.
Arqueei a sobrancelha.
- Eu faço isso todos os dias na escola.
- Não é a mesma coisa. – parou de dançar e rodeou a bancada vindo até mim. – Já sabe qual vai ser a sua fantasia? – os olhos dela estavam brilhando?
- Ainda não. – descansei minhas costas no encosto da cadeira. – Vou sair com Ed e escolher alguma.
- Aposto que foi o Edward quem te fez querer ir, não é?
- Fui ameaçada.
- Sabe que eu sempre gostei dele? – ela piscou para mim e voltou para o seu lugar e eu almocei em silencio enquanto ouvia Nana me dar dicas de fantasia e minha mente gritava em confusão.






- Como sabem, eu planejei uma tarde de meninas incrível. – Ed disse ao sairmos do carro.
- Sim. – concordei. – E como sabe, eu planejei fingir gostar disso. Até trenei essa expressão falsa o dia todo. – apontei para o meu rosto e abri um sorriso e Ed me encarou.
- Aprecio seu esforço. – me deu um aceno cordial e eu arquei a sobrancelha para ele brevemente. – Mas querem saber de uma coisa? Apesar de sentir falta de sair apenas nós três... – entramos na New York Costumes. – Eu gostava mais quando vocês duas se falavam. – se virou para mim e Emma. – Querem me contar logo o que está acontecendo?
Emma e eu nos olhamos rapidamente e permanecemos em silêncio.
-Olhem, a Brooklyn precisa de uma fantasia e a Emma conhece todos os gostos da Brooklyn, ou seja...
- Ai meu Deus, você vai á uma festa de Halloween? – Emma o interrompeu e se virou para mim com seu tom de surpresa.
Dei de ombros.
- Estou praticamente sendo arrastada.
- Pensei que fosse para Ed. Vem comigo, eu sei a fantasia perfeita para você.
Ela me puxou pela mão e de repente era como se nada tivesse acontecido e éramos novamente as melhores amigas enquanto Ed nos seguia caladinho.
- Que tal... Uma caveira sexy do século XXI? – Emma retirou essa fantasia do cabide e me mostrou, era até legal, mas não para mim.
- Bonitinha, se a Brooklyn quiser parecer uma vadia. – Graças a Deus Ed me tirou dessa. – Eu sou mais essa. – Me virei para ele que segurava uma roupa da mulher maravilha.
- Você sabe que a Brooke não gosta de fantasias fora do tema. – Nos deu as costas e começou a procurar por mais.
- Como assim fora do tema? Se ela quiser se vestir de “Ed” já é uma fantasia. – a contrariou. – E seria uma fantasia maravilhosa. – disse mais baixo, só para que eu escutasse. Sorri para ele.
- Longe de mim estourar o seu ego inflável, mas eu conheço Brooklyn melhor que ninguém, então... Xiu.
Resolvi me sentar em um pufe perto dos closets e os observar.
- Não precisam disputar a minha atenção, eu amo os dois igualmente. – cruzei as pernas me divertindo.
- Igualmente? – Ao mesmo tempo, eles apareceram de algum lugar da loja e em encararam.
Concordei.
- Não tem ninguém que você ame mais do que o outro? – Ed quis saber ao se aproximar.
- Tem! – me olharam com expectativa. – O John. - eles rolaram os olhos. – Eu jamais escolheria entre vocês e isso vale para Josh e Elijah também.
- É justo.
Sorri para eles.
- Então... Prima da April? – Emma questionou enquanto continuava a vasculhar o lugar. – Vocês já ouviram falar dessa festa antes?
- Não, mas não temos muitas opções. – Ed apareceu de algum lugar com uma fantasia horrorosa de fada. Pela minha expressão ele soube que eu não gostei. – É difícil tentar agradar você, por que não levanta essa buzanfa e nos ajuda a escolher. – me puxou pelo braço e então me levantei.
- Olha, eu realmente não preciso ir a essa festa. – comecei a andar pelos corredores foleando as fantasias. – John provavelmente está planejando montar uma barraquinha em frente ao prédio e distribuir doces. Eu poderia ficar e ajudar.
- Ai nossa. – ouvi o tom abusado de Ed. - Programa para idoso? Você já teve dias melhores. – sorri para ele.
- É muito divertido. – garanti.
- Eu acredito em você. – Emma disse de algum lugar. – Mas felizmente eu achei a fantasia perfeita. – ela apareceu com a fantasia em mãos. Ed e eu a olhamos ao mesmo tempo e eu tive certeza que o queixo de Ed deu uma leve caída.
- Era disso que eu estava falando!





- Vem aqui, deixei me ver você. – Emma me puxou em um canto e eu a olhei espantada. Será que meu vestido estava rasgado?
- O que houve? – perguntei preocupada.
- Estou tão orgulhosa de você. – me deu um sorriso derretido. – Essa fantasia foi feita sob medida, tenho certeza que em mais ninguém ficaria tão perfeito.
- Para de puxar o meu saco. – pedi já me sentindo sem jeito.
- Você está linda. – garantiu.
- Mesmo vestida desse jeito? – dei uma olhada rápida para minha fantasia e depois para ela.
- Acho que nunca existiu um dia em que eu te olhei e não tivesse te achado linda. – agora seu sorriso era terno. – Brooklyn, você mais que ninguém precisa enxergar isso em você mesma.
- Falar é muito fácil. – dei uma leve mordiscada em meu lábio inferior.
- Se olhar no espelho também. Faça isso com mais frequência que vai começar a entender o que estou falando.
- Ei vocês duas, andem logo. – Ed nos chamou em um tom autoritário.
- Tem alguém aqui achando que só por que está vestido de Potter tem alguma autoridade.
- Estou entrando no personagem. – apontou a varinha em nossa direção.
- Então seja mais legal. – pedi. – O Potter é o meu crush, não me faça desiludir dele.
- Não fazia ideia que você conhecia essa palavra.
- Já te ouvir dizer centenas de vezes.
Ele parou para pensar e depois de cair em si deu uma leve concordada.
Josh e Elijah estavam vestidos como as gêmeas Olsen com direito a peruca e tudo mais, Emma estava vestida de mulher gato e eu devia dizer que ela estava uma gata mesmo. Ed estava de Potter em uma versão gay, mas tão gato quanto o próprio.
- Vocês vieram. – April que estava com uma roupa verde e asas penduradas em suas costas, veio nos receber pessoalmente.
- Não tínhamos nada melhor para fazer. – Ed a respondeu cinicamente e entrou sendo seguido por Elijah e Josh.
- Obrigada pelo convite. – a cumprimentei tentando ser educada e tentando compensar a arrogância de Ed.
- Imagina, o que seria uma festa de Halloween sem uma noiva cadáver.
Eu sei que sou especialista em sacarmos, mas desta vez eu acho que foi muito mais do que isso.
- Eu gostei. – apareceu e ficou ao lado dela, mas sem tirar os olhos de mim. Me senti sem graça. – Eu fiquei imaginando com qual fantasia viria. Estava em duvida entre zumbi e mulher caveira.
- Você quase acertou. – sorri sem graça, principalmente pelo jeito que April me olhava.
- Foi quase. – ele também sorriu.
- E vocês quase estão combinando. – Emma se intrometeu. – Adorei a fantasia de...
- Jack Sparrow. Sou um pirata.
- Uau. – ela me olhou. – Quem sabe você encontrou o seu noivo? Seria um romance proibido e tanto.
olhou para mim e arqueou a sobrancelha enquanto sorria, deixando bem claro que havia gostado do comentário.
- Ela está brincando. – disse rapidamente quando notei os olhares de April. – Boa festa para vocês. – arrastei Brooklyn atrás de mim – Que ladainha foi essa?
- Ed me disse que tem uma quedinha por você.
- Não, ele não tem. – neguei.
- Para de ficar em negação, aceita que você é atraente. Até mesmo fantasiada. Agora vamos curtir a festa.
Esse “vamos curtir a festa” não durou até todos os meus amigos serem pegos pelo protocolo social de conhecer alguém do sexo oposto que seja o suficientemente atraente para não me darem atenção. Com exceção de Edward que está dançando e bebendo desde a hora em que chegamos.





***



A festa estava ótima. Tínhamos música, bebida, as melhores fantasias e eu tinha a garota mais linda ao meu lado. April estava deslumbrante com sua fantasia de Tinker Bell, seu sorriso sedutor e sua simpatia. Mas eu ainda sentia que faltava alguma coisa, intimidade talvez? Quero dizer, ela é legal e tudo mais, mas aquela liberdade de ter uma conversa engraçada e estimulante não tínhamos. Quando estávamos com seus amigos só falávamos de beisebol e festas. Quando estávamos sozinhos não tinha tempo pra conversar. Ao olhar para a festa novamente eu pude notar que Brooklyn estava sendo cercada por um cara, provavelmente bêbado e ela estava claramente desconfortável. Não consegui deixar de sorrir em ver sua resistência, me fez lembrar novamente o dia em que nos conhecemos. Olhei para April novamente e aproveitei que ela estava em um papo animado com seus amigos e me levantei. Eu precisava falar com Brooke.
- Oi meu amor. – passei meu braço pelo pescoço de Brooke que me olhou confusa e depois olhei para o cara que me olhou intrigado. – Tudo bem por aqui?
- Ele é seu namorado?
- Eu mesmo, vejo que estavam falando de mim. – olhei para ela ligeiramente, lhe dei um beijo no rosto e depois o encarei novamente. - Posso te ajudar?
- Só estávamos conversando. – se arredou. – Você é um cara de sorte. – e saiu.
Já longe o suficiente, ela retirou o meu braço do seu pescoço e me deu um olhar contrariado.
- Obrigada Canadá, mas eu sei me defender.
- Eu lembro muito bem. Foi por isso que eu quis que o cara saísse daqui com alguma dignidade. – ela sorriu.
- Parece que vocês homens precisam da ajuda do álcool para falar comigo.
- Talvez eles te achem intimidadora tanto quanto eu acho.
- Eu não sou nada disso.
- Brooke, eu já te chamei para sair sem estar bêbado e você me deu um fora.
- Em minha defesa, você já estava saindo com a April e como eu já disse: você não faz o meu...
- Seu tipo? Sei. – caçoei dela. – Então me aponta um garoto aqui nessa festa que faça o seu tipo e eu te digo o que fazer.
- Você quer me ensinar a dar em cima de um homem? – ela disse desacredita.
- Em primeiro lugar, vamos nos livrar desse tom de voz. – a repreendi. – Em segundo: eu sou um homem, sei do que gostamos.
- Todo mundo sabe do que um homem gosta. – debochou.
- Não estou falando apenas de sexo.
- Ah não? O que mais? – pousou as mãos na cintura me provocando a dizer.
- Também gostamos de uma boa conversa, sabe? Notamos se a pessoa é simpática... – a olhei de soslaio vendo suas sobrancelhas arqueadas e seu sorrisinho de lado. Óbvio que ela estava duvidando de mim. Até eu duvidava. – E você? No que gosta em um homem? – tentei mudar de assunto.
- Ah... – ela se endireitou e olhou para frente, depois colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha e suspirou. – Também curto um bom papo, se a pessoa tiver um sorriso lindo ajuda. – sorri para ela no mesmo instante, mas ela não me notou, apenas continuou a encarar o nada. – Não sei... Que tal um homem com quem se possa confiar completamente, que te passe segurança e que esteja sempre ao seu lado? Um homem inteligente. Pode ser bonito também. – deu um sorrisinho e me olhou.
- E você vai encontrar isso em um homem que você nunca conversou?
- Do que está falando?
- Do seu indeferimento em deixar as pessoas se aproximarem. O que foi? Tem medo de alguém conquistar esse seu coração de pedra? – ela me deu outro olhar de censura e suspirou.
- Homem nunca foi uma prioridade na minha vida. Sempre foi a escola, faculdade, ter um bom trabalho... Pelo menos é isso desde que me mudei para Manhattan
- Ahhh, já sei! Você acha que pode ser aquelas mulheres autossuficientes que não precisam de ninguém.
- Pra falar a verdade, eu acho sim. – sorriu sem mostrar os dentes. – Não, eu tenho certeza.
- Isso é bobagem. Todo mundo precisa de alguém.
- Foi por isso que mal chegou e já está namorando a garota mais gata da Trinity?
Sarcasmo, ok!
- April e eu só aconteceu. – dei de ombros. – Eu nem sei se posso chamar o que nós temos de “namoro”.
- Mas você só fica com ela, então tecnicamente é um namoro.
- Ela ainda não conheceu os meus pais e nem eu os dela. Já dormirmos juntos, mas acho que isso é normal. Eu não sinto ciúmes dela e não faço a menor ideia do que sinto em relação a ela, mas quero descobrir.
- Você pode dizer que estão ficando, não é assim que falam hoje em dia? Sobre relacionamentos sem compromisso.
- E por que você não tenta?
Ela me encarou por alguns segundos quieta.
- Tentar o que? – arqueou a sobrancelha.
- Ficar com alguém sem ter um compromisso.
Ela começou a rir de mim e eu confesso que deixei um sorriso escapar dos meus lábios também.
- O que foi? – perguntei após alguns segundos.
- Que? Você estava brincando, não estava?
- Não, eu acho mesmo que você deveria conhecer alguém.
Aos poucos ela foi parando de rir e ficou me encarando. Após algum tempo sem resposta eu decidi fazê-la falar, mas ela apenas me deu as costas e saiu. Como assim?
- O que está fazendo aqui sozinho? – April se agarrou ao meu braço e me puxou para o meio da pista de dança. – Vem, vamos dançar.
Eu queria dizer não, mas ela estava tão feliz que eu não gostaria de acabar com isso.


***


- Aonde você vai? – Emma interrompeu o meu trajetório até qualquer lugar com uma porta que dê em um ambiente vazio e silencioso.
- Não sei, só quero respirar um pouco.
- O que o fez? – perguntou meio rude.
- Como assim?
- Eu te vi conversando com ele, e agora está com cara de quem quer chorar.
Fiquei surpresa com o quanto ela me conhecia a ponto de reconhecer as minhas expressões faciais.
- Não foi nada, eu só... Isso aqui não é o meu lugar favorito, você sabe. Não me encaixo aqui. – tentei disfarçar.
- O gatinho gringo te disse isso? – agora a voz dela era ameaçadora.
- Não. – soei derrotada. – Ele só me disse que eu deveria conhecer alguém...
- Conhecer um garoto?
- Sim.
Ela me olhou atentamente.
- E o que você disse para ele?
- Comecei a rir histericamente e depois sai andando. O que vou dizer? Que não consigo me interessar por ninguém, por mais que tenha tentado?
- Brooke, você tentou uma vez e até eu sabia que não ida dar certo, já que escolheu o cara mais idiota da escola.
Claro que ela iria ficar ao lado do .
- Você ficou triste por isso?
- Não, não estou triste.
- Está sim, pare de tentar mentir para mim. Vamos sentar e conversar, onde esta o Ed?
- Bem ali. – apontei para o meu amigo gay beijando um cara que eu não faço ideia quem seja.
Ela soltou um suspiro ao encará-los
- Você aqui sofrendo e ele beijando homem.
- Não estou sofrendo. – enfatizei. – Só preciso ficar um pouco sozinha, a gente se fala depois.
Não dei tempo a ela de me impedir ou tentar, sai andando pelas pessoas até encontrar um lugar perfeito para ficar sozinha com meus pensamentos.




***



Eu estava completamente suado dentro daquela fantasia quando ouvi alguém dizer que tinha uma porta que dava para o terraço. Decidi que iria tomar um ar antes de voltar para a festa e para April. Fiquei bastante surpreso ao abrir a porta e ver Brooklyn sentada no rodapé. Ela me olhou ao notar minha presença.
- O que está fazendo ai? Está frio pra caramba aqui fora. – Ela voltou a encarar o céu e sorrio. Sinal de que não estava brava comigo.
- Aqui é mais fácil de ver as estrelas. – disse suavemente.
Eu sabia que devia voltar pra dentro e ir dançar com a minha garota, mas alguma coisa me dizia que ficar ali com Brooke era a coisa certa a se fazer. Fechei a porta sem fazer barulho e subi uns dois degraus para poder sentar ao lado dela. Era alto para caramba, mas isso não pareceu impedi-la de ficar ali, então tentei ser corajoso também.
- É bem alto. – olhei rapidamente para baixo vendo muitas pessoas fantasiadas passando para lá e pra cá o tempo todo.
- É perfeito. – ainda encarava o céu.
- Perfeito pra que? – perguntei confuso.
- Para pensar.
- Pensar é legal, mas as coisas parecem melhores quando você as divide com outras pessoas.
Ela rolou os olhos e sorriu.
- Você é muito insistente. – me encarou.
- Vamos fazer o seguinte, eu vou te contar uma coisa que nunca contei para ninguém e você tem que me prometer segredo. E ai, se por um acaso você se sentir motivada com isso, pode se abrir e me dizer o que estava pensando antes de eu te atrapalhar.
- Sem pressão. – sorriu pra mim.
Endireitei-me no concreto e pensei por onde eu poderia começar.
- Eu quero ser ator.
A princípio ela não teve reação alguma a não ser me encarar, parecia um pouco espantada, mas eu não tive certeza. Até que ela começou a rir, e eu não entendi o porquê.
- Esse é seu segredo? – dei de ombros. – Eu não sei o que dizer, quer um comentário sarcástico? – ainda ria
Estreitei meus olhos sem sua direção e depois continuei:
- Eu quero ser ator, mas eu não posso.
- E por que não poderia? – agora ela parecia desacreditada.
- Pessoas como eu, que nascem na minha família, já tem o destino traçado, você não entende. – me virei de frente para ela. – Tudo que eu ouço desde que me entendo por gente é que eu devo ser um advogado melhor que o meu pai, que o meu tio, que meus primos. Eu tenho que ser o melhor em tudo. Isso me irrita.
Ela já não ria, só continuava a me encarar.
- Eu pensei que seu pai fosse dono de uma empresa que faz exportação de comida.
- A empresa é do meu padrasto, o meu pai é advogado. Meus pais se separaram há uns dois anos.
- E por que você não conversa com a sua mãe ou com o seu pai? – soltei uma risada sarcástica.
- Você não os conhece – neguei rapidamente. – Eles são perfeccionistas e autoritários, mesmo separados. Se você fizer algo contra a vontade deles, irá se arrepender para o resto da vida. – Ela me deu um olhar desconfiado
- Acho que está exagerando.
- Não estou não. Olha, quando eu era pequeno eu tinha muita dificuldade para aprender a ler e a escrever, meus pais tentaram de tudo, até uma professora particular, mas nada funcionava. Eu não entendia naquela época, mas após uma conversa inocente com a conselheira da escola, ela chamou os meus pais para uma reunião e explicou que eu tinha trauma por que sofria muita pressão deles e que na minha idade eu deveria receber apenas apoio e muito carinho. Eles tinham opiniões diferentes sobre isso e no outro dia quando voltei à escola, a conselheira tinha sido demitida.
- Foram os seus pais? – perguntou.
- Tenho certeza que sim. – bufei. – Quando eu tinha dez anos fiz o teste para entrar no time de futebol do clube que frequentávamos, mas eu não era bom o suficiente. Quero dizer... Bom o suficiente não foram às várias explicações que o técnico deu para o meu pai de que eu não estava preparado. Na segunda feira recebi a noticia que estava no time e fiquei muito feliz, até saber que outro garoto teve que sair para que eu entrasse.
- Talvez ele só quisesse te dar tudo, fez de um jeito torto, mas acho que toda forma de amor é válida.
- Por um tempo eu pensei que fosse isso, mas quando eu cresci eu comecei a entender que tudo que eles queriam era um filho perfeito para mostrar para a sociedade, não interessava se eu tinha dificuldade em algo por que eles faziam de tudo para que eu fosse o melhor em tudo, ou se eu não gostasse de alguma coisa que na opinião deles eu deveria gostar por que a alta sociedade gostava. Eu cresci percebendo que eu não era só um filho para eles, mas também uma espécie de troféu. – Suspirei profundamente me sentindo desconfortável com todas aquelas lembranças. – A única coisa boa que eu consigo me lembrar é das aulas de teatro que eu tive na minha antiga escola. Eu adorava a sensação de poder ser quem eu pudesse. E acho que é por isso que quero ser ator, não só para poder esfregar na cara dos meus pais que eu sou grandinho o suficiente para tomar minhas próprias decisões, mas por que atuar foi à primeira coisa que eu consegui fazer por vontade própria e sem ajuda deles. – mordi meu lábio inferior tentando conter a minha raiva e frustação.
Fiquei esperando um discurso vindo da Brooklyn, talvez defendendo os meus pais em como eles não tinha más intenções, mas também me apoiando em seguir o meu sonho e ser verdadeiro comigo mesmo. Só que ela não disse nada, ao invés disso colocou sua mão sobre a minha e a cariciou. Eu não tive noção de quanto tempo ficamos ali, em silencio. Só que eu estava começando a ficar emotivo e eu não queria.
- Você está flertando comigo?
Ela franziu o cenho no mesmo instante e tirou sua mão da minha, coisa que eu não queria que ela fizesse.
- Do que está falando?
- Talvez eu tenha ficado interessante para você agora que sabe que eu posso ser famoso.
Ela deu uma gargalhada tão gostosa que me deu vontade de gravar só pra poder escutar quando estivesse triste.
- Quando o seu visto vence mesmo? – não segurei um sorriso.
- Felizmente você vai ter que me aguentar por muuuuito tempo.
- Na verdade só até o fim das aulas. Depois, se tudo for como eu planejo, vou me mudar para Baltimore para fazer faculdade na Morgan State University.
- Posso saber por que a Morgan State? Está na cara que você tem potencial para faculdades maiores e melhores.
Ela pôs uma mexa do seu cabelo atrás da orelha e encarou o céu novamente.
- Eu recebi uma proposta muito boa de Harvard, mas eu quero a Morgan State por que foi a faculdade que minha mãe estudou.
- E tem alguma chance da sua mãe está te forçando a fazer isso... – tentei brincar, mas ela continuou séria.
- A minha mãe morreu quando eu tinha quatorze anos.
Congelei no mesmo instante me arrependendo amargamente por ter feito tal comentário.
- Brooklyn me desculpa, eu... Eu sinto muito mesmo. – eu tive uma vontade imensa de abraça-la, mas eu sentia que iria violar algum tipo de regra.
- Tudo bem, eu já me acostumei com a dor.
- Eu sou muito idiota mesmo. – me levantei sentindo a culpa tomar conta de mim. – Fiquei tentando te forçar a me dizer o que te incomodava tanto e...
- , para. – ela também se levantou e veio em minha direção. – Você tem toda razão, ninguém pode guardar um segredo desses por tanto tempo sem explodir. Eu cansei de sofrer sozinha internamente, preciso falar sobre isso com alguém. – seus olhos estavam marejados.
- Você tem certeza? – perguntei com o coração na mão.
Ela me deu um meio sorriso triste e se escorou na parede ao nosso lado antes de começar a falar.
- Dizem que as pessoas não costumam se lembrar da infância ou caso se lembrem, talvez sege dos amiguinhos da escola, ou a primeira vez em que o dente caiu, ou um natal em família. Essas lembranças felizes. – começou dizendo. – O que eu acho irônico é que eu lembro justamente da pior fase que minha família passou. Eu me lembro de ter um pai que me fazia sentir a garotinha mais amada de todas e tinha a mãe mais protetora do mundo. Eu tinha aquelas esperanças falsa de que minha família era perfeita e inquebrável, entende? Que ninguém podia tirar isso da gente. Mas eu estava tão enganada. – um vento forte passou balançando o vestido dela e bagunçando alguns fios do seu cabelo, ela se abraçou e abaixou o rosto, encarando o chão. Não, pensei comigo, eu queria olhar em seus olhos. – Se você me perguntar o motivo eu não saberia te dizer, mas se tem uma coisa que eu nunca esqueço é das brigas que eu presenciava. Quase todas sem querer. Também não saberia dizer quem gritava mais alto ou quem estava certo ou errado, mas a briga estava ali. Quase todos os dias. – ela levantou o rosto e deu meio sorriso, um meio sorrio de tristeza. – Quando eu tinha nove anos o meu pai nos deixou, me deixou. – os olhos dela se entristeceram. – Por um lado sofri muito, por outro eu ainda tinha esperança de que ele fosse voltar e eles iriam fazer ás pazes, mas eu perdi a esperança quando se passou meses e a minha mãe se casou novamente. – ela estalou alguns dedos e passou a língua nos lábios. – Ninguém tira da minha cabeça que foi por minha causa, ela não estava aguentando cuidar de mim sozinha, precisava de um parceiro. – me olhou por alguns segundos e depois desviou novamente. - No começo ele era muito bom, cuidava da gente, trabalhava, ajudava em casa e com os meus deveres escolares. Ele quase tampou o buraco que ficou quando meu pai foi embora, até a minha mãe ficar doente as coisas pareceram desandar. Ele aparecia bêbado quase todos os dias, agredia a minha mãe alegando que ela o traía, gastava todo o nosso dinheiro com coisas que eu nunca irei saber. E em um dia que eu cheguei tarde por que estava estudando com um amigo, ele ficou possesso, disse que não me queria com esse garoto e começou a me agredir, também disse que eu era dele e que ninguém podia encostar em mim. Eu vi os olhos deles se escurecerem, na cabeça doente dele eu era alguma espécie de posse. Eu senti a mão dele tocar em mim como um homem toca a uma mulher e até hoje nenhum banho é o suficiente para me fazer esquecer aquela sensação horrível. Ele dizia que tudo isso era culpa da minha mãe, e então ele a matou. E até hoje eu não sei por que. – Ela arrastou seu corpo pela parede até se sentar ao chão e tampou seu rosto com suas mãos. Estava chorando! Corri até ela me sentando ao seu lado a abraçando pelo ombro, ela não se moveu, apenas ficou ali chorando baixinho enquanto eu via seus ombros se movendo para cima e para baixo.
- Canalha. – sussurrei não sabendo explicar por que senti tanta raiva só de pensar nesse homem tocando em Brooklyn. Talvez fosse uma reação comum diante tudo que ela acabou de me contar. - Não era culpa da sua mãe. – tentei dizer alguma coisa que pudesse reconforta-la.
- Não era culpa dela. – levantou seu rosto que estava todo molhado. – A culpa é toda minha.
- Claro que não, você não tem culpa de nada. Olha para mim. – tomei coragem para segurar seu rosto e o virar para mim. Nunca tinha visto Brooklyn tão frágil e tão linda. Seus olhos estavam avermelhados e assustados, suas bochechas levemente coradas combinavam com a ponta de seu nariz arrebitado e seus lábios pareciam tão macios e convidativos. Nunca tive tanta vontade de beijá-la, nem mesmo quando a conheci sozinha e tão independente naquele hotel. Me contive para não fazer qualquer coisa que pudesse me arrepender depois, ou pior, fazer Brooklyn pensar que eu estava me aproveitando da sua fragilidade.
- Você queria saber por que eu tenho dificuldades para deixar as pessoas se aproximarem e essa é a resposta: - o jeito que ela me olhou me fez querer protegê-la para sempre. – Todo mundo que eu amei me abandonou de algum jeito, eu sofri tudo que eu poderia sofrer, e acho que se alguma coisa parecida acontecesse de novo eu não aguentaria. Eu mal aguento agora. Mesmo depois de anos, eu sinto como se tivesse sido ontem. – ela desviou seus olhos e se levantou de repente. Levantei-me logo em seguida a cuidando com os olhos. – Eu nego a existência de um Deus, por que se eu aceitar que ele existe então significa que ele me deu as costas e se esqueceu de mim.
- Brooke...
- Não precisa dizer que sente muito ou qualquer coisa que você ache que irá me confortar, eu já ouvi todas essas palavras e eu posso te dizer com toda a certeza do mundo que elas não são nem um pouco reconfortantes.
Ela limpou a ponta do seu nariz com as costas da mão e me deu as costas, andou até a porta colocando sua mão na maçaneta ameaçando abri-la. Não sei o que a impediu de entrar, mas após alguns segundos parada ali, ela deu meia volta e andou em minha direção, eu fiquei sem reação até sentir os braços dela em volta da minha cintura e seu rosto húmido em meu peitoral. Meu reflexo foi rodeá-la com meus braços e apertá-la em meu corpo. De todos os nossos momentos e nossos raros “toques” eu senti que esse abraço foi à coisa mais íntima que tivemos desde que nos conhecemos, na verdade eu nunca havia abraçado alguém na minha vida com tanto carinho como eu estava abraçando Brooke. E então ficamos ali dividindo nossas dores que nos machucavam de formas tão diferentes. Apesar de toda essa escuridão que a cercava eu senti uma vontade maior ainda em estar presente na vida dela. Naquele momento eu soube que Brooklyn foi a melhor coisa que me aconteceu desde que cheguei à Nova York.


Capítulo 6 - Nova York

Olhei para a minha mãe que discutia com meu pai ao telefone. É só uma briga tola, sem motivo aparente. Eles são iguais, por isso vivem se batendo de frente. Era manhã de Ação de Graças nos Estados Unidos, mas nós preferimos não comemorar nessa data. O motivo por toda essa tensão, é que meu aniversário é domingo e meu pai queria que eu fosse para o Canadá para a nossa tradição de todos os anos. Família e amigos mais próximos reunidos, os jogos tradicionais, as histórias vergonhosas da minha infância e é claro muita comida típica. Minha mãe não queria que eu perdesse dia de aula, mas eu confesso que estava muito ansioso para voltar para o meu país.
- Mãe, eu posso ir sexta depois da aula e voltar no domingo à tarde. – tentei abrandar a situação.
- E se acontecer alguma coisa com o seu voo de volta para casa?
- Pare de arranjar desculpas esfarrapadas, ele é meu filho tanto quanto seu. – meu pai foi um pouco grosseiro. Mesmo pelo telefone.
- Você pode ir comigo, se quiser. – ela me olhou de esguelha e eu soube que fui infeliz fazendo aquele comentário. – Eu realmente quero ver a minha família e os meus amigos.
Ela suspirou soando convencida.
- Tudo bem, você pode ir. – andou em minha direção. – Mas eu não quero desculpas que está cansado de mais para ir à escola no outro dia.
- Eu prometo.
- Eu vou deixar vocês dois falando a sós. – ela tirou o telefone do viva voz e jogou em meu colo. Antes de sair do meu quarto me deu um olhar brusco e fechou a porta.
- Ela já se foi. – coloquei o telefone no ouvido e eu soube que ele estava mais pacífico.
- Sua mãe não é fácil de lidar. – rezingou.
- Não foi por isso que se casaram? – me levantei e fiquei de frente a janela
- E também foi por isso que nos separamos.
- Pensei que o seu caso com a melhor amiga dela tivesse algo a ver.
- Bom, eu tive um motivo, não é? – o tom lascivo dele estava ali. – Mal posso esperar para que veja a surpresa que eu estou preparando.
- Pai, por favor. Me diz que esse mulher não vai estar lá.
- É claro que não filho, esse final de semana é seu. Tudo que você quiser é uma ordem. – rolei meus olhos me sentindo nauseado com tanta meiguice.
- Se eu soubesse que me mudar te faria um pai mais presente, eu teria feito isso antes.
Ouvi a risada dele.
- É como dizem, você tem que perder pra dar valor.
- Isso foi uma piada, não foi? – me apoiei na estante de livros.
- Relaxa, você me conhece. – disse descontraído. – Mudando de assunto, sua mãe me contou que você anda saindo com uma menina. – franzi o cenho no mesmo momento.
- E você pode me contar como ela sabe disso?
- Ela viu seu carro algumas vezes na Upper East Side, e disse que ás vezes chega tarde da noite. Quando fui há Nova York a trabalho eu fiquei nesse bairro e ele é um bairro muito nobre.
- Pai...
- Não precisa me dizer nada, já está aprovada. Vejo que sabe escolher certo. – me cortou. – Por que não a trás com você, eu adoraria conhecer ela.
- Eu acho melhor não.
- Vamos lá , vou me comportar, prometo. – rolei meus olhos.
- Vou pensar. – senti meu celular vibrando em meu bolso. – Nos falamos mais tarde.
- Vou me gabar para todo mundo que você está namorando uma socialite.
O ouvi dizer antes de desligar. É claro que vai se gabar, foi o que sempre fez.
April estava me ligando, que situação mais importuna.
- April. – disse em um tom seco.
- Amor. – soou exasperada. – Onde você está? Combinamos de você passar o dia com a minha família, lembra? Dia de Ações de Graça.
Massageei minha têmpora não me sentindo nem um pouco disposto em conhecer a família da April.
- Claro, te vejo daqui a pouco.
Desliguei me sentindo encurralado. Por um lado o meu pai querendo conhecer a minha não namorada, por outro, a minha não namorada querendo que eu conheça a família dela. E só que eu conseguia pensar era em tudo que aconteceu entre mim e Brooklyn e no quanto ela está me ignorando desde a noite de Halloween. É claro que ter pais super protetores não se comparava com a infância que ela teve, mas ter ganhado a confiança dela me deu outro tipo de satisfação que eu pensei que fosse ter. As palavras de Brooklyn não saia da minha cabeça. Ela tinha que estar errada, deve ter alguma coisa que eu faça que possa ser reconfortante, que mostre alguma luz no fim do túnel e que a deixe mais confortável com as pessoas. Isso meio que ficou pessoal para mim, eu queria tanto isso, de um jeito que eu não sabia explicar.



***


Ouvi alguém bater na porta e segundos depois John entrou em meu quarto e parecia radiante. Coloquei meu livro no criado mudo e me sentei sob a cama, cruzando as minhas pernas.
- Eu percebi que desde que as aulas voltaram, nós dois nos afastamos um pouco. – ele se sentou na minha frente, aos pés da cama. – Então eu decidi que não vamos viajar para a casa da minha irmã nesse feriado, vamos ficar aqui e fazer o que você quiser.
- Isso é serio? – fiquei surpresa. – Seus irmãos estarão lá, sua família...
- Você é minha família. – me interrompeu. – Podemos convidar James e Nana e ficar o dia inteiros trancados, usando o feriado como desculpa para nos entupir de comida. O que acha?
Sorri para ele.
- Por que não ficamos aqui pela parte da manhã nos aquecendo, e depois vamos ver o seu jogo favorito?
Vi os olhos dele cintilarem.
- Você... Que ir? – se levantou extasiado.
- Quero. – me ajoelhei na cama. – Vamos levar James e Nana, depois podíamos patinar em algum lago congelado, não sei... Vamos fazer um piquenique no Central Park.
- Vai ser o melhor dia de Ações de Graça que já tivemos. – me garantiu ao andar até a porta.
- John. – o chamei. Ele parou e me olhou. – Está fazendo isso pelo o que te contei sobre a minha conversa com ?
Ele pôs a mão na cintura e suspirou.
- Você não sai mais desse quarto. De casa para a escola, da escola para casa. Nem os seus amigos eu vejo peregrinando por aqui mais. – se aproximou um pouco. – Você regrediu depois daquela noite, alguma coisa... Alguma lembrança voltou a te angustiar. Todos esses livros... – apontou a sua volta vendo meus livros jogados ao chão. – Está se isolando outra vez.
- Estou bem. – essas palavras não saíram de um mero sussurro fazendo com que sua veracidade seja questionável.
Ele me olhou cautelosamente e eu mal consegui sustentar seu olhar.
- Não volte a se fechar no seu circulo imaginário e afastar todas as pessoas que conseguiram conquistar um espaço na sua vida. – me pediu. – Principalmente com .
Descruzei minhas pernas e me joguei na cama encarando o teto e evitando o olhar apreensivo de John.
- Se você o contou é que por algum motivo confia nele, e se você confia nele, não acha que ele merece saber quem é a verdadeira Brooklyn quando não está recuada ou ressentida?
- A verdadeira Brooklyn é insegura, medrosa, sem graça, hermética... – fiquei encarando o teto ao dizer tais palavras.
- Pois não é assim que eu vejo. – me contestou. – Vejo uma garota linda, inteligente, capaz, independente. – ouvi seus passos se aproximarem da cama. – Você consegue fazer tudo o que quer quando está determinada, por que não pode começar tendo autoconfiança em si mesma?
Continuei a encarar o teto sem dizer uma palavra. Era tão fácil para ele falar... Difícil mesmo era fazer.



***



James não estava no saguão como de costume, talvez estivesse passando o dia com a sua família. Fui até o elevador calculando os minutos para minha liberdade ser presa por um namoro que eu não fazia ideia se queria. April e eu estamos juntos há quase três meses, a única garota com quem me relacionei desde que cheguei à Nova York. E ainda assim, querer estar só com ela não é uma motivação forte para assumir um relacionamento, não até eu ter certeza de que ela é a pessoa certa. Por mais que eu tentasse, eu não conseguia sentir isso e por mais que eu tentasse, eu não conseguia ser como os meus amigos e ter todas para saber qual é a certa. As portas do elevador se abriram me trazendo de volta a realidade e me fazendo notar que eu estava no andar do apartamento da April. Não sei o que aconteceu, mas eu sabia que se entrasse sem antes ter certeza do que queria, eu iria me arrepender. E eu não sei o que deu em mim, mas apertei o botão da cobertura sem fazer ideia de que Brooke me receberia, ou se estivesse em casa.
O elevador parou e suas portas se abriram novamente, fiquei parado no Hall olhando para os quadros e as rosas e me perguntando o que eu tenho na cabeça. Ninguém veio me receber, então eu poderia fingir que não estive ali, quando iria apertar o botão de volta para o térreo eu ouvi a risada dela, a mesma daquela noite, a que me fez querer rir junto com ela. Era bom saber que ela estava bem, que estava feliz. Quando dei por mim, andei passos silenciosos até a sala e me deparei com Brooklyn sentada ao chão e também tinha a empregada, John e James. Eles estavam de roupa de dormir. Todos eles. E riam de alguma coisa que eu não fazia ideia do que. James sussurrou algo para Brooklyn, que concordou e depois voltou a rir, apontava o dedo para John que parecia envergonhado com algo. De repente, ela olhou em minha direção e ficou séria no mesmo instante, sua expressão abstrusa era clara e eu estava me sentindo um intrometido, na verdade eu era um.
- . – John me chamou ao notar minha presença. – Que surpresa boa, não te ouvi chegar.
Todos eles se levantaram para me cumprimentar, exceto Brooklyn que ainda estava enlevada.
- Desculpe, eu deveria ter avisado. Mas...
- Sem problema, vem. – me convidou para entrar. – Estamos planejando o nosso Turkey Day. – eu entrei e me sentei ao lado dela, que não me olhou, apenas abaixou o rosto e ficou estalando os dedos.
- Eu ouvi dizer que no Canadá se comemora o dia de Ação de Graças em outubro, verdade? – James perguntou ao me entregar um suco.
- É verdade, minha família e eu já comemoramos, então hoje está sendo um dia comum pra mim. – olhei para ela novamente que persistia em me ignorar. Por que ela não queria falar comigo?
- Você pode comemorar com a gente, o que acha? – John sorriu para mim. E só então a Brooklyn mostrou alguma reação, por que ela o encarou como se quisesse o matar no mesmo instante. Entendi, ela não me queria por perto.
- Não, obrigado. Eu não quero incomodar. – me levantei e pus o copo de suco na mesinha de centro.
- Não seria incomodo nenhum. – ele deixou claro.
- Você não vai recusar o meu famoso peru assado, não é? – A empregada, que se eu me lembro bem se chama Nana, tentou me persuadir com a comida. – Temos pão, purê de batata, torta de abóbora, batata doce, nozes e maça. – ela estava quase me convencendo a ficar. – E para a sobremesa vamos ter mirtilo, uva e cranberry.
- Nossa, minha barriga roncou só de ouvir tudo isso. – James comentou e eu segurei um riso.
- Nós vamos a New Jersey ver o jogo dos Giants contra o Dallas Cowboys. – John também tentou me convencer. – Ideia da Brooke.
- Vamos botar aquelas maricas pra correr. – James e John trocaram um High Five.
- Parece ótimo, mas eu não sei...
- Olha só. – Brooklyn se levantou e me encarou pela primeira vez desde que entrei. – Desiste, eles sempre conseguem o que querem. Fica e... – parecia indecisa sobre o que dizer. – Vai ser legal.
- Você tem certeza? – perguntei me sentindo inseguro.
- Tenho. – deu um breve sorriso. – Tenho sim.
Abri um sorriso introvertido e ficamos parados, no meio da sala, nos encarando e sorrindo um para o outro como se não tivesse mais ninguém ali a não ser nós.
- Muito bem, quem quer me ajudar com o peru? – Nana chamou a nossa atenção, e quando iria me prontificar eu fui interrompido.
- Peterson e eu vamos. – John logo o empurrou até a cozinha, seguindo a Nana. – Podem ficar á vontade.
- Esperem. – Brooklyn os chamou fazendo com que eles nos olhassem. – Canadá me disse que ainda não visitou todos os pontos turísticos de Nova York, que tal fazermos uma tour? – tirou os olhos de mim e olhou para eles.
- Eu amei a ideia. – Nana deu dois pulinhos. – Tem muito tempo que eu não vou à estátua da liberdade.
- Está combinado. – John aprovou. – Acho que a neve não vai ser um problema.
- Ok, então... – ela me olhou mais uma vez e depois voltou a encarar eles. – Deixe que eu ajudo a Nana se não esse almoço não fica pronto. – deu a volta por mim indo até Nana. Ela não olhou para trás, apenas continuou a andar até sumir pelo corredor.
- Podemos trocar uma palavrinha? – John me pediu e eu acatei no mesmo instante.
Eu o segui pelo apartamento até seu escritório que ficava em direção oposta a sala e a cozinha, eram tantos corredores que eu poderia me perder. O escritório dele mais parecia uma biblioteca do que outra coisa, tudo que fosse possível aguentar um livro estava ocupado por um livro. Menos a mesa no canto da sala com um notebook, algumas pilhas de papéis e algumas fotos de Brooklyn quando mais nova.
- Ela tinha acabado de chegar em Manhattan. – ele disse quando percebeu que eu encarava a foto dela. – O melhor presente que eu já recebi.
- Me desculpe, eu não queria...
- Ela me contou. – me interrompeu. – Me disse que você sabe de tudo e eu fiquei muito surpreso. Ela não confia em ninguém, mas confia em você. – ele colocou uísque em seu copo e me ofereceu, neguei no mesmo instante e permaneci inerte no meu lugar. – Está acontecendo alguma coisa entre você e a Brooklyn?
Eu não estava esperando aquela pergunta. O que eu iria responder? Que temos uma relação de flertes, mas sem nenhum interesse amoroso de ambas as partes?
- Somos apenas amigos. – respondi rapidamente. Não era mentira, era? Não depois daquela noite.
- Tem certeza? – perguntou em um tom desconfiado. – Ela tem amigos há um tempo e mesmo assim nenhum deles sabem sobre a vida da Brooke no Brooklyn.
- Nenhum deles conseguiu entender que tudo que sai da boca dela é um pedido de socorro. – disse sem pensar.
Ele pisou uma vez e se sentou sem tirar os olhos de mim.
- O que quer dizer?
Suspirei.
- Quero dizer que todo os sacarmos da Brooklyn, o medo de deixar as pessoas se aproximarem, a dificuldade de confiar em alguém... – olhei para o chão. – Você não precisa ser um perito para saber que ela escondia algo, eu só não sabia o quão grave era, até ela me contar.
- E agora você sabe. – o olhei. – E você vai ser o melhor amigo que ela poderia ter. Brooke se machuca facilmente, você tem que me prometer que vai ajuda-la a superar.
Ele estava desesperado.
- Não se preocupe. – comprimi meus lábios. – Vou fazer tudo ao meu alcance para que ela se lembre cada vez menos do que aconteceu.



***


Graças aos céus, John tinha um amigo que operava em uma das balsas que iam para a Liberty Island, então não precisamos esperar horas na fila do Castle Clinton para comprar ingressos. John estava sentado a cinco acentos à frente entre Peterson e Nana alegando que: Já que era para ser vela, que fizesse esse trabalho direito. e eu parecíamos mais íntimos do que nunca sentados lado a lado dividindo uma manta bem quente. Não podia dizer que não estava gostando. O celular dele tocou pela décima vez e após eu ter certeza de que era April, ele decidiu desligar o celular e eu tentei disfarçar enquanto admirava a vista.
- Não vou mentir, estava me sentindo culpado por termos passado na frente de todas aquelas pessoas para podermos estar aqui. Mas quando vejo esse sorriso no seu rosto, nada disso importa.
Fechei meu sorriso no mesmo instante sem ter notado que sorria. Olhei para ele estreitando meus olhos.
- Me responde uma coisa, você por um acaso sabe nadar?
Ele sorriu para mim e abaixou a minha toca fazendo com que minha visão ficasse negra. Senti o braço dele repousando em meus ombros antes de levantar a toca e o encarei com o cenho franzido.
- Você não me intimida mais. Sinto que nos conhecemos há anos.
Rolei os olhos.
- Será que você finalmente vai cair no meu charme?
- Não se cansa nunca de ser tão convencido?
- Deveria ficar lisonjeada por ser cortejada por mim.
- Você não é tão lisonjeiro quanto é inconveniente. – tirei seu braço dos meus ombros.
- As garotas da Trinity discordam.
Convencido.
- Ah, ta. – disse debochada. Ele inclinou seu rosto para poder me olhar melhor e arqueou as sobrancelhas.
- Eu não sei se entendi esse seu tom de ironia.
O olhei.
- Você faz parecer que é o rei da mulherada, o garanhão. O garoto que pode ter quem quiser. Mas desde que chegou a Nova York eu só te vi atrás de uma garota e ela se chama April.
Ele negou rapidamente.
- Isso não é verdade, eu também corro atrás de você. – se fingiu de ofendido.
- Você sabe o que eu quis dizer.
Ele voltou a encostar-se ao assento enquanto continuava a me encarar.
- Estou esperando você perceber que está apaixonada por mim. – agora era ele quem estava sendo debochado.
- Você fala como se fosse um copo de água e eu estivesse morrendo de sede.
- E está? – eu o encarei sem o responder. – Vou tomar esse silêncio como um sim.
- Cada um se ilude da forma que acha que vai ser mais feliz.
Ele soltou uma gargalhada gostosa.
- Sabia que eu nunca me diverti tanto assim com uma garota? – ele me encarou suavemente. – Você é sincera e engraçada, nunca temos uma conversa entediante e eu sempre quero estar perto de você.
Eu nunca tinha visto esse lado do . O jeito como ele me olhava era cativante e intenso. Fazia com que suas palavras fizessem um efeito que não deveria fazer. Eu sabia que ele adorava me deixar sem graça, mas vendo a forma como ele me olhava naquele momento, por um segundo, eu realmente achei que ele estivesse interessado em mim. Um calafrio passou por minha espinha corporal e meu estomago pareceu dar reviravoltas, do nada eu não estava mais confortável na presença dele. Desviei meus olhos até a estátua ao longe, coberta por neve.

A Estátua da Liberdade foi um presente da França para os Estados Unidos em comemoração ao centenário da independência norte-americana, comemorado no ano de 1876. A elaboração e a construção da estátua contou com grandes nomes da arquitetura francesa, como o famoso arquiteto Alexandre Gustave Eiffel, que alguns anos mais tarde seria o responsável pelo projeto da Torre Eiffel. O escultor do monumento, por sua vez, foi Frederic-Auguste Bartholdi, o qual teria se inspirado na própria mãe ao criar o rosto da estátua. Quando terminou de ser construída, em 1884, a estátua foi desmontada em centenas de peças e enviada aos Estados Unidos em um navio. Contudo, a sua inauguração oficial só ocorreu em 28 de outubro de 1886, pois foram necessários vários meses para que o monumento fosse devidamente montado e fixado em solo americano. Atualmente, além de um importante ponto turístico de Nova York, a estátua também é considerada como um Patrimônio Mundial da UNESCO, pela sua grande importância histórica e cultural.





Como eu havia previsto, os três Best friends forever saíram andando na frente e me deixaram sozinha com o Canadá para um passeio turístico pela Ellis Island. John me procurou com os olhos rapidamente e sorriu, eu sabia que para ele era muito importante que eu estivesse dando um passo em frente em vez de um para trás como sempre fiz. Depois do Halloween eu me fechei, me escondi no meu mundo solitário e não deixei ninguém entrar. Afastei meus amigos por dias e ignorei até hoje. Então, estar aqui com todos eles e principalmente com era um progresso e tanto.
- Me conta a sua história.
me pediu enquanto passeávamos pelo Museu da Imigração. O encarei confusa.
- Sua história com o John. – se corrigiu.
Guardei minhas mãos no bolso do meu casaco e encarei John apontando o dedo para um quadro preto e branco com duas mulheres, sendo que uma delas carregava um bebê de colo e dava a mão para outra criança. Normalmente eu nunca falo da minha vida ou do meu passado, mas fazia parecer que confiar em alguém era a coisa mais fácil do mundo.
- Quando a minha mãe morreu eu estava na Inglaterra, morando com a minha avó. Ela estava muito doente e não era uma opção viável para ter a minha guarda. Algumas pessoas me buscaram e me levaram de volta para Nova York e eu fiquei em um lar adotivo esperando que alguém da minha família reclamasse a minha guarda. Por algum tempo achei que meu pai voltaria seja lá de onde ele estivesse e fosse me levar com ele, mas depois de semanas eu havia perdido a esperança. – assoprei o ar frio o vendo se dissipar na minha frente. – John era o melhor amigo do meu pai na faculdade, ele sempre foi uma figura presente na minha vida, e como mais ninguém parecia interessado em me ter por perto, não foi difícil ele conseguir a minha guarda. Claro que a vida que ele tem ajudou os assistentes sociais a se decidirem sobre isso. Algumas visitas semanais foi o suficiente para eles terem certeza de que eu estava em boas mãos. – parei de andar sentindo o peso dos olhos de em mim. – Ele é meu anjo da guarda. – ainda encarava John. – Não faço ideia do que seria de mim sem ele.
segurou a minha mão e no mesmo instante eu as olhei. Não houve toque por que ambos estavam de luvas, mas ainda assim eu estava sentindo meu coração acelerar e eu não fazia ideia do por que. Retirei minha mão da dele e pisquei varias vezes tentando me recompor.
- Posso te fazer mais uma pergunta? – ele me olhou cauteloso.
Concordei com um aceno.
- Por que você estava me ignorando?
Coloquei uma mecha atrás da orelha e mordi meu lábio inferior.
- Eu pensei que quando nos encontrássemos você me olharia com pena e não saberia o que dizer. Eu queria evitar essas cenas constrangedoras por que é o que sempre acontece quando alguém ouve a minha história. – comprimi meus lábios o sentido gelados.
- Por que eu sentiria pena de você? – perguntou atônito. – Acho que você é pessoa mais forte que eu conheço. Tantas pessoas não aguentaria passar pela metade do que você passou sem algum dano físico ou psicológico. No entanto, aqui está você. – apontou para mim brevemente. – É inteligente e determinada. Não posso te comparar ao que era antes por não saber, mas eu sei quem você é agora e pra mim, você é um exemplo de pessoa.
- O que eu teria de exemplo? – perguntei sem entender aonde ele queria chegar.
- Muitas pessoas têm um começo de vida difícil e isso às destroem. Muitas até deixam isso alterar o caráter as fazendo se tornar pessoas que elas realmente não são. Só que você foi forte o suficiente para dar a volta por cima e vencer todos esses obstáculos. – segurou a minha mão novamente. – Você é um exemplo para mim.
Nunca ninguém havia me falado essas coisas, excetos por John e Mariah. As pessoas tem tendência em passar por mim sem saber o caos que carrego por dentro, sem se quer imaginar que uma garotinha da Upper East Side possa ser mais do que aparenta. Eu já não era eu mesma por fora, mas por dentro nada havia mudado. E eu não sei como e nem quando, mas conseguia me enxergar. Digo, ele me via de verdade. E pela forma como meu coração acelerava diante seus olhos claros, eu sabia que era extremamente importante. Eu estava começando a ver de uma forma completamente diferente do que eu via há um mês. O que está acontecendo comigo? Não saberia dizer o que estava sentindo naquele momento, só sabia que tinha a ver com o .
- Ei casal. – Peterson nos flagrou de mãos dadas. – Odeio estragar esse momento, mas estamos indo para a Liberty Island.
- Mas a balsa acabou de chegar. – soltei a mão de em um movimento involuntário.
- Que bom que vamos nos infiltrar na próxima balsa, que está partindo daqui a cinco minutos.
- John? – pousei minhas mãos na cintura.
- Quem mais seria? – arqueou a sobrancelha para mim e depois começou a andar. e eu o seguimos. – Precisamos ser rápidos se quisermos ir para New Jersey.
- Posso saber como ele conseguiu isso? – me questionou.
- John é um homem com muita credibilidade nos Estados Unidos. O trabalho dele faz com que tenha certa facilidade em conseguir o que quer.
- E com o que ele trabalha?
- Ele tem uma agência de publicidade, a maior da América. Conhece pessoas muito importantes que conhece pessoas não muito importantes e por assim vai. – o olhei rapidamente. – Fazer um favor a John Henson é ter como garantia que ele te deve um favor.


Assim que embarcamos na Liberty Island eu arrastei para o salão principal para que ele visse a verdadeira tocha que na minha opinião era a melhor vista de todas.
- É muito impressionante. – ele disse encarando o monumento.
Concordei.
- Vai encarar a escadaria?
- E a onde ela nos leva? – perguntou um pouco receoso pelo tamanho dela.
- Nos leva á coroa da Estátua da Liberdade. – ele me olhou surpreso. – Se eu me lembro bem, são 162 graus da base do pedestal até a coroa. Em minha opinião vale mais a pena pela jornada de chegar ao topo do que pela vista. – o olhei. – O único problema é que a escada é estreita e escura.
me deu um sorriso sacana.
- Então eu posso usar isso como uma desculpa para esbarrar em você e fazer parecer que foi de propósito?
- Não sei desde quando você precisa de desculpa para me importunar. – tentei ser fria para não demonstrar que eu havia gostado da ideia.
- Você tem razão, por que não vamos comer alguma coisa? – começou a se direcionar para fora do salão principal. – Estou morrendo de fome.
O segui me sentindo um pouco decepcionada por ele não insistir na ideia de ficarmos a sós. Repreendi-me mentalmente.


De volta a Manhattan, decidimos fazer um passeio pela Times Square e a primeira coisa que impressionou foram os letreiros gigantes e luminosos e a quantidade de pessoas que passavam por ali.
- É impressão minha ou tem mais gente do que o normal aqui? – me perguntou.
- Muitos turistas vêm para Nova York por causa da Black Friday que acontece um dia depois do dia de Ações de Graça e também por causa da neve.
- Ai meu Deus, é a loja da Disney Store? – Ele se jogou contra a vitrine e ficou olhando para dentro. Não segurei um riso.
- Você quer entrar?
Ele parecia fascinado com a loja, depois se recompôs e adotou uma postura rígida.
- Não, essa loja é para crianças. – saiu andando. – Onde está John, Peterson e Nana? – claramente estava mudando de assunto.
- Nos vigiando de algum lugar dos Times Square. – olhei a minha volta para ver se encontrava algum vestígio dos três.
- Por que eles ficaram afastados de nós a viagem toda?
- É uma ótima pergunta.



***


Compramos cinco cachorros quentes e nos sentamos na escadaria TKTS enquanto descansávamos para podermos ir para New Jersey. John, James e Nana já estavam conosco.
- Você gosta de futebol americano? – John me perguntou e eu dei de ombros
- Não tenho nada contra, mas prefiro Hóquei, vocês já viram?
- É bem popular aqui nos Estados Unidos, mas nenhum de nós nunca foi há um jogo.
- É muito legal, vocês iriam gostar.
Olhei para Brooklyn que conversava com Nana e tive uma ideia bem louca, mas que com certeza era uma opção muito melhor do que April.
- Brooke, você já esteve no Canadá? – ela me olhou confusa.
- Na verdade, só estive na Inglaterra. – Me levantei e me aproximei delas.
- Domingo é meu aniversário e é tradição que minha família tire o final de semana inteiro para comemorar, vocês poderiam ir e ficar na minha casa. O que acham? – olhei para todos eles.
- Infelizmente nós não podemos por causa dos nossos trabalhos, maaas... Brooklyn adoraria ir. – John disse em nome dela que franziu o cenho para ele.
- Adoraria? – replicou.
- Vamos, vai ser legal. – a garanti. – vamos amanhã depois da aula e voltamos no domingo, não vamos perder dia letivo, se estiver preocupada com isso.
- ...
Pelo seu tom, ela iria rejeitar. Não!
- É uma ótima oportunidade para conhecer novos costumes e lugares diferentes. – John me ajudou. – Você sempre me disse que queria viajar, está ai a sua chance. – Ele pegou seu celular e começou a pesquisar algo.
Ela olhou para ele e depois para mim. Eu conhecia aquele olhar, ela estava cedendo à pressão.
- Eu não quero ser um incomodo. – se encolheu e eu rolei os olhos para ela.
- Seria a melhor coisa do mundo se você fosse comigo. – A encarei suplicante. – Por favor.
Ela continuo séria e pensativa, até que soltou um suspiro derrotado.
- Tudo bem. Vamos para o Canadá.
- Que bom, por que eu já estou comprando a passagem de ida e de volta para vocês. – John sorriu ao mostrar o celular para ela.
Eu não aguentei e tive que ir abraça-la. Claro que ela se desvencilhou e puxou Nana a fazendo andar.
- Não estamos atrasados para o jogo?
John e James rapidamente se levantaram e as seguiram. Fui logo atrás sentindo uma coisa muito estranha, porém boa. Usar Brooklyn como desculpa para não levar April para o meu país foi uma boa ideia, mas ao mesmo tempo eu não queria que fosse outra pessoa a ir comigo, a não ser Brooke. Era estranho pensar dessa forma? Eu troquei duas noites de sexo com a April, para passar duas noites sendo rejeitado pela Brooklyn e essa ideia me agradava mais ainda.



***


- Tem um ultimo lugar que eu gostaria de ir antes de voltarmos para casa. – comentei enquanto voltávamos para Manhattan.
- É mesmo? – John me olhou pelo retrovisor. – E onde seria?
- Brooklyn Bridge.
John e James trocaram, ao que me pareceu, um olhar cúmplice e os dois sorriram.
- Estamos um pouco cansados, por que não vai você e ? Tenho certeza que ele irá adorar. – Tentei não revirar os olhos para eles.
- Eu acho uma ótima ideia. – me olhou, parecia estar empolgado.
Dei um sorriso breve para ele e depois olhei pela janela vendo a neve cair do lado de fora e tentando não pensar nas lembranças que aquele lugar me traria.
- Que bom que viemos de Tênis.
ficou mais empolgado do que deveria andando de metrô, pegamos a linha verde e logo estávamos começando nosso trajeto pela ponte que ligava Manhattan com o Brooklyn, até agora estava tudo bem, só não sabia como ia lidar com o final daquele passeio.
- Tudo bem para você, estarmos aqui? – Canadá me questionou. Respirei fundo e concordei com alguns acenos nada convincentes.
- Eu prometi a você uma tour, e uma tour sem vir a Brooklyn Bridge não está completa.
- Você não precisa fazer isso só por minha causa.
- É por mim também. – o olhei rapidamente. – Eu quero isso. – voltei a olhar á minha volta já avistando a Estátua da Liberdade. – Então, precisamos conversar sobre o fato de que não seria uma boa ideia, April e eu viajarmos juntas para a sua casa no Canadá?
deu uma risadinha.
- É por isso que ela não vai. – O que?
- Como assim ela não vai?
Parei no mesmo instante fazendo com que as pessoas que vinham logo atrás de mim parassem também. me puxou para que voltássemos a andar e eu fiquei o encarando, esperando por uma resposta.
- Precisamos falar sobre isso agora? – me olhou.
- Bom, são dois quilômetros de caminhada, precisamos conversar sobre alguma coisa.
- Então vamos falar sobre...
- Você não vai mudar de assunto.
Ele exasperou convencido, me deu um olhar gélido e passou a mão pelo cabelo retirando alguns flocos de neve. Eu não deveria ter o achado lindo por isso.
- Meu pai descobriu que eu tenho uma namorada...
- Então já aceitou o fato de que são namorados?
- É que ele pensa. – disse contraditório. – E ela.
- Por que é tão difícil de aceitar isso?
- Por que eu não sei o que sinto por ela. – disse sincero. – Eu gosto dela, de ficar com ela, o sexo é incrível e eu não tenho vontade de ficar com outra pessoa a não ser ela. – Ok, eu não deveria ter sentindo meu estomago afundar ao ouvir tais palavras. Mordi meu lábio e fiquei encarando o chão tentando fazer aquela sensação estranha passasse. – Mas ao mesmo tempo eu quero mais do que só ficar deitados nus em uma cama. É pedir muito? – me olhou, o que me obrigou a olhar para ele também.
- E o que tem em mente? – tentei disfarçar minhas reações estranhas.
- Eu não sei. – soltou um suspiro longo. – Parece que somos mais amantes do que outra coisa. Eu quero... – parecia que estava pensando no que ia dizer quando ele me olhou. – Quero que ela seja como você. – eu podia sentir claramente o meu coração acelerar ao ouvi essas palavras. – Quero esse conforto que sinto quando estamos conversando, quero que ela não se sinta forçada a rir de tudo que eu falo e seja sincera comigo, assim como você é. Quero me divertir com ela, assim você me divirto com você. – estávamos parados no meio da ponte, de frente um ao outro enquanto algumas pessoas passavam por nós. – Seria muito mais fácil se você existisse no corpo dela.
E foi ai que as coisas começaram a ficar estranhas.
- Outh. – disse claramente ofendida. – Então quer dizer que eu não sou bonita o suficiente para que se sinta atraído por mim? – voltei a andar me sentindo meio tosca.
- Se me lembro bem, você foi a primeira pessoa por quem me interessei. – me alcançou.
- Você estava bêbado. – o acusei.
- E você estava linda naquele vestido branco. – me fez parar para poder olhá-lo novamente. – Eu pensei que fosse cair no meu papo e no final da noite você estaria nos meus braços. – meus olhos vacilaram ao ficar encarando ele, eu estava rodeada de prédios e artefatos, mas ele ainda era a melhor vista de todas. – E agora somos amigos. Eu não sei o que seria de nós se você tivesse me dado uma chance naquele dia, mas eu não trocaria isso que nós temos, só para te ter na minha cama por uma noite.
E então ele fez de novo. Me fez pensar que eu era algo a mais para ele, mas no fundo o que importa é que eu seja sua amiga e que April seja a sua garota. O que havia de errado comigo? Eu não me importo com coisas relacionadas a sentimentos, aliás, eu não fazia ideia de como era gostar de alguém de verdade. E me fazia querer imaginar como era estar apaixonada... Eu preciso me controlar.
Assim que encerramos o nosso trajetório, fomos para a Brooklyn Bridge Park e ficamos olhando a ponte enquanto descansávamos. Eu não estava incomodada em estar no Brooklyn depois de tanto tempo, parecia que nada havia mudado desde que parti, e ainda assim eu sentia que não pertencia mais a esse lugar.
- Tudo bem até agora? – verificou pela quinta vez desde que chegamos.
- Por incrível que pareça. – respirei profundamente. – Está. – me levantei. – Vamos, quero ver se ainda me lembro de como se chega à Old Fulton Street. – ele se levantou.
- E o que vamos fazer lá? – começou a me seguir.
- Tem um carrossel liberado para todas as idades. Se você se comportar eu deixo você me pagar um sorvete.
Ele sorriu para mim e agora parecia mais determinado em fazer mais essa caminhada.
Como eu imaginava, o carrossel não estava do mesmo jeito desde a última vez em que estive aqui com o meu pai, eu conseguia me lembrar de certos detalhes. Sentei-me no banquinho de madeira quanto via escolhendo seu cavalo.
- Brooklyn? – ouvi alguém me chamar, eu não o conhecia. – É você mesmo?
- Desculpe... Nos conhecemos? – franzi o cenho.
- Thomas Carter. – se aproximou mais um pouco. – Estudamos juntos no Medgar Evers.
Ai meu Deus!
Eu me lembrava dele.
- Tom! – O chamei pelo apelido que eu costumava usar. – Você me passava cola durante as provas. – não evitei um sorriso ao me lembrar.
- E você está linda. – me olhou de baixo para cima. – Pintou o cabelo de preto, combina com você. Ficou muito parecida com a sua mãe...
Comprimi meus lábios em uma linha reta e ele percebeu que esse era um assunto delicado.
- Você foi embora sem se despedir e eu não conseguir dizer que sentia muito pelo o que aconteceu.
- Eu não consegui me despedir de muitas pessoas. – molhei meus lábios e olhei para o chão rapidamente.
- Eu senti a sua falta. - Foi direto e eu não sabia o que dizer. – Mas... Onde você está morando? Voltou para o Brooklyn? Eu te procurei depois que foi embora, mas você apagou todas as suas redes sociais.
- Não, não voltei para o Brooklyn, só estou passeando por aqui. – coloquei minhas mãos no bolso da calça e me limitei apenas a dizer isso. Não queria que ele soubesse que eu estava morando há uma ponte de distância. Ele notou que eu não estava tão aberta para uma conversa e se ajeitou sua postura.
- Em fim, foi muito bom te ver de novo. Você parece ótima.
- Obrigada Thomas, foi bom ver você também.
Quando entendi que a intenção dele era me dá um abraço, eu rapidamente lhe ofereci a minha mão para um aperto formal. Eu sei que ele ficou sem graça, mas apertou assim mesmo. Mais um aceno breve acompanhado de um sorriso constrangedor e ele saiu me deixando sozinha por pouco tempo, por que logo me acercou.
- Quem era? – perguntou visivelmente curioso.
- Você acha que ainda consegue ir a mais algum lugar comigo?


O taxi parou em frente ao cemitério Green-Wood e eu travei. As lápides estavam cobertas pelo manto branco da neve o que faziam parecer que todas fossem iguais. Mas eu sabia exatamente onde ficava a lápide da minha mãe.
- É aqui que... – não conseguiu terminar a frase.
- Eu preciso fazer isso. – sai do taxi e ouvi sair também. Virei-me para ele. – Sozinha.
Ele concordou no mesmo instante.
- Tudo bem, vou te esperar aqui no taxi.
Dei-lhe um olhar em forma de agradecimento e caminhei em direção ao cemitério que estava tão impressionante quanto dá ultima vez em que estive aqui. O pórtico de entrada ainda era de tirar o fôlego e as sepulturas ainda pareciam obras de artes. Não sei por que John escolheu esse lugar para sepultar a minha mãe, mas se ela pudesse escolher, sei que também seria esse. Não demorei a encontrar a lápide dela e no mesmo instante em que encontrei, eu cai de joelhos sobre o gramado molhado. Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, as lágrimas se apressaram em descer e eu não conseguia contê-las, e nem queria.
- Oi. – consegui dizer sem vacilar. - Eu sei que faz um tempo que não venho te ver. – comecei dizendo. – Eu também sei que prometi sempre te visitar, mas quando fui para Manhattan eu tive medo de voltar, medo de sempre ficar presa ao meu passado, à dor... – encarei sua foto. - Eu sentia que estava caindo de um precipício, mas eu nunca tocava o chão. Era tão estranho. Essa sensação de estar caindo, mas nunca chegar a lugar nenhum. É como entrar num beco sem saída, em que você é obrigada a voltar atrás. Eu não conseguia seguir em frente. Mas agora... – Olhei brevemente para o céu que estava limpo e sem sinal de neve. – Agora eu percebi que finalmente eu estou seguindo em frente. – Voltei a encarar a sua foto preta e branca. - Eu vi o Tom, você se lembra dele? – soltei uma risada involuntária. – Quando eu o vi não senti nada, era como se não tivesse mais importância, parece que não estou mais com medo, me sinto mais forte do que eu era e essa pessoa que eu me tornei foi por você. Sacrificou-se tanto por mim, achei que estava na hora de fazer o mesmo. – enxuguei o meu rosto e suspirei profundamente. – Eu sinto a sua falta, e isso é tão verdade agora quanto foi há dois anos. – dei um breve sorriso. – Eu te amo mamãe!


Capítulo 7 - Ottawa.

- COMO ASSIM VOCÊ IRÁ PARA O CANADÁ COM O GRINGO?
Acho que toda a Trinity ouviu os gritos de Edward, se não Manhattan inteira. Rolei meus olhos e andei até meu armário me arrependendo de não ter contado apenas quando já estivesse no avião. Ou em Ottawa.
- É aniversário dele. – expliquei.
- E você vai ser o presente? – Me virei para Ed no mesmo instante não gostando daquele comentário. – Ou o recheio do bolo?
- Você consegue passar um minuto sem tentar fazer piadinhas?
- Não mesmo. Você está prestes a ir para o Canadá com o gatinho e só nos contou agora. A minha reação é totalmente culpa sua.
Olhei Emma em um pedido de socorro, mas ela jogou seus braços para o alto como ato de que já havia desisto de Ed.
- E a April? – Ela questionou. – Queria ver vocês tentarem dividir a atenção do .
- Ou a cama dele. – Ed piscou para mim.
- Não que fosse ser uma competição justa, o canadense parece só ter olhos para você. – Emma o ignorou.
- E o pinto para a April. – Novamente Edward e seus comentários desnecessários.
- Adoro o som que você faz quando cala a boca. – ele me deu um sorriso sínico e eu semicerrei os olhos para ele. Depois me virei para meu armário tentando achar meu caderno de artes. – Ela não vai.
- QUE BABADO.
- Para de gritar.
- Você não entende o que está acontecendo aqui? – me cercou, fazendo com que eu ficasse entre ele e Emma. – te convidou para passar o final de semana com ele no Canadá, e não vai levar a “namorada” dele. – Disse o ‘namorada’ entre aspas fazendo o sinal com os dedos e enfatizou o “dele”. – No aniversário dele. – me olhou em expectativa ao enfatizar novamente.
- O que quer dizer? – me escorei no armário.
- Quero dizer que deveria se depilar por que você vai perder a sua virgindade esse final de semana.
Ed tinha que dizer aquilo em um corredor cheio de alunos. Eu não sabia onde enfiar a minha cara.
- Ele quer pegar você.
- Cala boca Edward.
- Espera ai. – Emma levantou o dedo indicador ao participar da conversa. – Estou com o Ed nessa. O gringo poderia levar quem ele quisesse para o Canadá, mas escolheu a única garota que claramente não demonstrou interesse nele.
- Deve ser por que somos amigos
- O que eu tenho que fazer para você entender que não existe amizade entre homem e mulher?
Fiquei encarando Ed sem o responder.
- Olha amiga, pode estar em um relacionamento com a April, mas é você quem está indo conhecer a família dele no Canadá. Pensa sobre o que é mais importante para um homem.
Emma parecia tão convicta sobre o que dizia que eu quase acreditei que poderia gostar de mim. Um barulho forte de armário se batendo ecoou pelo corredor e eu me virei para ver o que poderia ser. Arrependi-me quando vi o olhar petrificado de April em mim, pela sua expressão ela havia escutado a nossa conversa e isso não era nada bom. Ela passou por nós pisando firme e decidida a fazer seja lá o que ela iria fazer. Eu não queria ser nesse momento.
- Essa ai é mais estranha do que o estranho permite ser. – Ed comentou ao se agarrar ao meu braço e de Emma. – Vamos lá ver os sarados da aula de natação.


Decidi fazer uma caminhada do colégio até em casa e tentar colocar meus pensamentos em ordem, pensar sobre aquelas sensações estranhas que rondavam meu corpo quando vinha em meus pensamentos. Eu sorria do nada e parecia ter milhares de borboletas impregnadas em meu estômago. Abaixei meu rosto sentindo o vento gelado e vendo aquele manto branco da neve por toda parte de Manhattan.
Não sei como aconteceu, mas foi como se ele soubesse dos meus pensamentos e apareceu do meu lado, com aquele sorriso arrogante e galanteador.
- Está me seguindo Canadá?
- Foi o jeito, você me ignorou completamente na escola. – o olhei. – Como foi o seu dia? Já que ficou praticamente pensando em mim o tempo todo?
Pisei nos meus próprios pés e quase cai de cara no chão. Mas foi mais rápido ao me segurar.
- Cuidado Bennette. – me ajudou a levantar. – Com essa reação vou ser obrigado a pensar que minhas palavras tem algum fundo de verdade.
Rolei os olhos.
- Acho que vamos ter que adicionar “convencido” no seu caderno de reclamações. – ele sorriu.
- Saber o efeito que você causa nas pessoas não é nenhum tipo de crime.
- Depende. – paramos na faixa para poder atravessar. – Se for incomodo e irritação.
- Eu não te irrito. – disse convencido bem ao meu lado.
- É você quem está dizendo. – sorri para ele.
- Talvez quando nos conhecemos eu tenha sido um pouco forçado de mais...
- Não se esqueça de evasivo.
- É, isso também. – sorriu sem mostrar os dentes. – Mas agora você tem que admitir que eu sou uma pessoa legal.
Parou de andar me forçando a parar e ficar de frente para ele.
- Talvez você sege um pouco legal, mas... Só um pouquinho. Quase nada.
Ele passou os dedos longos por seus cabelos escuros e brilhosos enquanto me olhava como um predador e aquilo me desconcertou de várias maneiras que eu não conseguia dizer.
- Agora admite que está apaixonada por mim. – usou a sua língua para molhar os lábios e eu podia jurar que ele estava brincando de me seduzir. Eu só não fazia ideia de que todo o meu corpo fosse gritar um “SIM” confuso e incoerente.
- É muito bom ter um sonho. Mesmo ele sendo patético e nem um pouco realista. – tentei não deixar a minha voz vacilar e ele sorriu.
- Gosto de fazer meus sonhos virarem realidade.
Soltei uma risada nervosa antes de respondê-lo.
- Não sabia que gostava tanto de perder tempo.
- Conversar com você nunca é uma perda de tempo. – abriu aquele sorriso prepotente. – Em fim, eu precisava te entregar isso. – tirou um envelope da bolsa e estendeu em minha direção. – Você pode entregar ao John para mim? É o dinheiro das nossas passagens. Eu não me sentiria confortável se não pagasse sendo eu quem te convidei para ir comigo. – sorriu com os olhos. - Infelizmente eu preciso ir para casa agora. Te vejo no aeroporto? – me deu um beijo estalado na bochecha e eu quis me matar por ter gostado da sensação dos lábios dele em meu rosto e por não ter conseguido falar que John jamais aceitaria aquele dinheiro. Era tarde de mais.




- O que significa tudo isso? – parei na entrada da sala vendo muitas sacolas de compras jogadas pelo chão e o sofá.
- Só algumas coisinhas para você levar para o Canadá. – Nana me olhou e eu poderia jurar que estava empolgada, como se fosse ela a viajar.
- Eu vou passar um final de semana e não me mudar. – tentei andar sem pisar nas sacolas.
- Melhor prevenir do que remediar. – John apareceu do seu escritório, imagino eu.
- Eu deveria saber que isso foi ideia sua. – joguei minha mochila em cima da mesa vendo Nana desempacotar as sacolas e guardando todas as roupas dentro da mala exagerada da Louis Vuitton que eu nem me lembrava de ter uma.
- Eu fiz umas pesquisas... – começou dizendo e depois tirou algumas sacolas de compras do sofá para poder se sentar. – Você sabia que o pai do é um dos herdeiros da Ubisoft?
Posei minhas mãos na cintura.
- E dai?
- E dai que eu já vi o seu guarda roupa. Acredite em mim, não é bom o suficiente.
- Bom o suficiente para o que? – comecei a me sentir ofendida.
- Para as festas que a família concedem. Você não vai querer se sentir um peixe fora d’água, vai? – Pegou uma sacola da Lanvin e estendeu em minha direção. – Pega.
- Isso é dinheiro jogado fora. – deixei claro.
- De onde veio esse tem muito mais. Não se preocupe. – rolei os olhos.
- Me lembrei. – peguei o envelope e o entreguei. – quer devolver o dinheiro que gastou com as nossas passagens. – ele arqueou a sobrancelha para mim.
- Eu vou preparar alguma coisa para vocês comerem. E depois termino isso aqui. – Nana tinha um sorriso escondido no rosto.
- Eu vou para o meu quarto tomar um banho bem quente. – sai feliz por não ter ouvido John reclamar do dinheiro.




Já fazia algum tempo desde que o avião havia decolado, mas eu ainda não estava acreditando que estava indo de verdade para o Canadá. Tentei compensar a minha insegurança e ansiedade escrevendo uma história que estava em minha cabeça há muito tempo e só agora tive coragem para colocar em prática. , ao contrário de mim, parecia tenso e nervoso, se remexia desconfortável vez ou outra em seu acento super macio de primeira classe e mesmo ele achando que não, eu percebi alguns olhares tortos para mim.
Fechei meu notebook o depositando em meu colo e endireitei meu corpo para poder olhar melhor para .
- Então... – chamei sua atenção para mim. – Tem alguma coisa sobre a sua família que eu deveria saber?
- Minha família? – tinha um tom de nervosismo. – Ta bom, é... – suspirou. – Como já deve saber meu pai não é a melhor pessoa do mundo. – lhe dei um olhar de censura, mas não o interrompi. – Com ele são negócios e mais negócios. Tudo que importa é seu sucesso profissional e a satisfação de ser o melhor advogado do Canadá Ou... Melhor que o irmão dele. – ele me olhou rapidamente e depois encarou a janela ao seu lado, o céu cinzento jorrando neve por toda parte. – Mas não vou o culpar, meu avô foi muito rigoroso com ele e com o meu tio, acho que ele está tentando me ensinar à única coisa que aprendeu a vida toda.
Consenti silenciosamente me sentindo um pouco arrependida por ter tocado nesse assunto.
- Mas eu tenho uma prima incrível. – continuou e seu tom mudou para admiração e empolgação. – A Helena é o meu sol é um dia nublado, minha nuvem em um dia ensolarado.
- É a mesma Helena do The Quin? – perguntei me lembrando remotamente desse nome.
- Isso. Ela mesma. – dava para notar que ele realmente gostava dela pelo brilho em seus olhos. – Eu e ela somos filhos únicos, então éramos inseparáveis até eu vir para os Estados Unidos. – suspirou - Sabe de uma coisa? – perguntou e então me encarou como se realmente estivesse me enxergando desde que iniciamos aquela conversa. – Ela é a razão por eu não conseguir ser um babaca com as mulheres. Quero dizer, ver o quanto minha mãe sofreu com a separação me fez querer ser um tipo de cara diferente, daqueles que não troca sua garota por um rabo de saia curto com peitos falsos. Diferente do meu pai. – ficou alguns segundos em silencio parecendo recobrar alguma lembrança. - Mas a Helena sempre me ensinou que quando gostamos de verdade de alguém, devemos cultivar e preservar. Acho que o fato dela ser mulher me ajudou a entender como vocês se sentem quando tem um coração partido.
- Ela parece bem legal mesmo. – sorri para ele, sentindo uma vontade enorme de conhecer Helena melhor.
- Vocês irão ser dar muito bem, eu tenho certeza. – exasperou. – E tem a minha avó. Caramba, a melhor pessoa do mundo. Como pude esquecer ela? – abriu um sorriso largo. – Ela foi à pessoa que sempre cuidou de mim e da Helena, ensinou sobre que realmente devemos dar valor, nos encorajava a seguirmos nossos sonhos, desconversava tudo que nosso avô dizia sobre poder e dinheiro. Para ela tudo que importava era o bem da nossa família e que permanecêssemos unidos. Sempre.
Dei-lhe um sorriso franco que refletia ao seu.
- Depois que meu avô morreu, ela não perdeu sua essência e continuou a cuidar da família com o mesmo valor moral que sempre tivera. Mas infelizmente meu pai e meu tio já eram grandinhos de mais para reaprenderem sobre o que é ter uma família de verdade. – seus olhos ficaram tristes e meu coração se apertou.
- Ela deve ser uma grande mulher. – hesitei em colocar minha mão sobre a dele, mas a coloquei assim mesmo sentindo correntes elétricas passarem por todo o meu corpo. Ele me deu um sorriso cordial.
- E sobre o que tanto escrevia no seu notebook, posso saber?
Me virei para frente pensando se contaria ou não para . Bem... Essa não seria a primeira coisa que eu contaria para ele.
- Bom, eu amo literatura, livros, palavras, essas coisas... – comecei dizendo e eu sabia que seus olhos estavam grudados em mim. – Eu resolvi escrever uma história e no começo era para ser meu trabalho anual, mas depois eu acabei fazendo virar um conto.
- Puxa... – pareceu interessado. – E eu posso saber sobre o que é?
Remexi-me desconfortável.
- Mortes.
franziu o cenho para mim, mas eu continuei antes que ele pudesse contestar.
- Não só sobre mortes, mas sobre pessoas que podem se arrepender dos seus atos mesmo depois da morte, se... Existir vida depois da morte.
- E no que você acredita? – apertou sua mão na minha me fazendo notar que nossas mãos ainda estavam juntas.
- Acredito em uma segunda vida. – fiquei olhando para as nossas mãos. – Não, não é sobre o que eu acredito, mas sobre o que deveria ser o certo.
- Encarnação é uma opção?
- Acho que sim. – subi meus olhos até o seu. – Preciso me agarrar a essa esperança de que todos tem uma segunda, terceira, quarta chance de consertarem seus erros e serem pessoas melhores.
Ele consentiu, digerindo as minhas palavras.
- Acho que todo mundo merece uma segunda chance, só que não para os mesmos erros. Quero dizer... – ele soltou minha mão e eu acho que foi sem querer. – Se encarnação for uma opção, não acho que você nasce se lembrando de quem já foi no passado, tão pouco dos erros cometidos. Você pode ser uma pessoa boa, mas com o mesmo grau de chance de ser uma pessoa má. – seus olhos me capturaram com avidez. – Não pode ficar esperando que depois da morte você vá ter uma vida melhor do que já tem. Você precisa viver seus dias como se fossem o ultimo e aproveitar cada momento. Se existe alguma coisa que você queira fazer, faça. Mas faça agora, sem hesitar ou pensar. Você claramente vai se arrepender mais das coisas que não fez do que as que fez.
Eu pensei em como eu queria beijá-lo naquele mesmo instante. Saber qual era o gosto da sua boca, como era ser tocada por ele da mesma forma em que ele tocava April. Sentir o cheiro do seu perfumo enquanto enterrava meu rosto em sua clavícula. Mas só ficou em pensamento. Infelizmente eu não era corajosa o suficiente para viver o momento e deixar as coisas acontecerem. Ou tentar desvendar essas misturas de sentimentos que resolveram me cercar quando está por perto. Eu estava muito confusa.




***




Ah sim. A brisa familiar e congelante de dezembro no Canadá. Eu estava em casa. Brooklyn vinha ao meu lado entretida com as pessoas, como se os canadenses fossem uma raça diferente dos seres humanos. Logo avistei Helena segurando uma placa enorme com letras gigantes na cor fluorescente.

e Namorada Da Upper East Side”


Rolei os olhos, mas eu sabia que não podia esperar outra coisa dela.
- Vocês chegaram! – ela se jogou contra os meus braços e me apertou. Eu estava com tantas saudades dela e por estar quase sem conseguir respirar, eu sabia que era recíproco. Brooklyn se plantou ao meu lado e observava tudo silenciosamente enquanto nosso motorista se encarregava das bagagens.
Helena, depois de cinco minutos abraçados, pôs suas mãos em meu rosto, como se só assim pudesse acreditar que eu estava de fato ali.
- É bom ver você também. – eu disse em fim.
- Você não tem ideia do quanto está parecendo um americano com esse sotaque. – sorri para ela.
- Não vou mentir, estou me deixando levar pelas forças do mal. – ela sorriu.
- Espero que tenha trago presentes. – segurou a minha mão.
- Hm... Não. Mas eu trouxe uma pessoa... – me virei para Brooke que deu um aceno constrangido.
- Brooklyn, certo? – Helena andou até ela.
- Se lembra de mim? – notavelmente, Brooke perguntou confusa.
- É claro. – sorriu – Não tem como esquecer o primeiro fora do . - me deu um olhar cheio de humor. – Mas as fotos que ele me mandou me ajudaram a não esquecer... – a olhei impaciente.
- Que fotos? – Brooklyn quis saber.
- Não começa Helena. – rolei meus olhos e ela se virou para mim.
- Não sabia que ela era a namorada que o titio tanto falou. – abriu um sorriso mostrando seus dentes perfeitos. – Eu aprovo.
- Não, a gente não...
- Somo só amigos. – eu disse por fim. – Papai exagerou.
- Não, ele tem uma namorada. – Brooke disse. – Mas eu não sou ela.
Ótimo, agora elas são duas.
Helena me encarou pendurando suas mãos na cintura.
- Precisamos voltar as nossas aulas sobre como uma garota deve ser tratada?
Não evitei uma risada.
- Brooke é só uma amiga. E se quer saber a minha opinião: Não é ela quem precisa de proteção contra mim, sou eu quem precisa de proteção contra o coração frio dela.
Helena arqueou a sobrancelha ao olhar Brooke.
- É verdade. – constatei. – Eu já chamei ela para sair uma ou duas vezes, mas ela me rejeitou friamente. – Brooke rolou os olhos.
- Sua prima não iria gostar de saber que alguma dessas vezes você já estava comprometido com a April, não é?
- April? – perguntou confusa.
- Ele nunca te falou dela?
- Não, na verdade. – Helena se virou para mim e eu quis sair correndo para me esconder, como fazíamos quando éramos crianças. – Todos esses meses e de todas as nossas conversas, ele nunca mencionou nenhuma April. Apenas você.
- Ahhh – Brooklyn disse como se recordasse de algo. – Ele fica com ela, mas não é um namoro para ele.
- Por que não é um namoro? – Helena me perguntou.
- Por que eu não sei se realmente gosto dela. – cruzei os braços.
- E por que você não resolve isso com ela?
- Sou a favor de ignorar o problema até que ele desapareça.
- Nossa. – o tom de deboche conhecido de Brooke soou em meus ouvidos. – A April estaria orgulhosa se pudesse te ouvir agora.
- Nesse momento eu estou arrependido de não ter trago ela.
Brooke franziu o cenho parecendo estar ofendida com a minha brincadeira. Piscou duas vezes seguida e abriu um sorriso nada convincente para mim.
- Bom... – pôs a mão em meu ombro. – É um pouco tarde de mais para se arrepender. – me deu mais um sorriso breve e saiu andando em direção à saída do aeroporto. Helena a acompanhou com os olhos e depois me encarou. Tinha um sorriso de satisfação em seus lábios.
- Eu gosto dela.
Não evitei sorrir ao concordar com Helena.
- É meio difícil não gostar. – Helena me olhou engraçado e nós fomos andando atrás da Brooke que parecia se virar bem por onde deveria ir.
- E o papai? – perguntei colocando minhas mãos no bolso do meu casaco.
- Com certeza está tentando encontrar um jeito de convencer a vovó a deixar ele e o meu pai a cuidarem do testamento. Mas ela contratou outro advogado e está deixando todos no escuro.
- Nem nesses momentos eles conseguem deixar o dinheiro de lado. – fiquei olhando para Brooke andando distraidamente por entre as pessoas.
- Você gosta dela? – Helena me perguntou de repente. – Da Brooklyn?
- Ela é uma pessoa incrível, uma ótima amiga...
- Não, não estou falando apenas como amigos. – me interrompeu. – Não sente algo mais intenso por ela?
- Que? Não. – olhei para Helena não entendendo o porquê daquela pergunta. – Somos apenas amigos. Aliás... Ela foi a melhor coisa que me aconteceu em Nova York, mas apenas como amiga.
- Sei... E essa tal de April? O que ela significa para você? Não parece que significa muito já que é a Brooklyn quem está aqui.
Suspirei profundamente. Eu já sabia que passaria por esse interrogatório só que eu pensei que ela fosse ao menos esperar chegar em casa.
- Eu não iria trazer nenhuma delas, mas o papai ficou sabendo que eu estava saindo com alguém e ele queria que eu a trouxesse. É verdade que eu estou saindo com a April desde que cheguei à Nova York, mas é só isso. Não estou apaixonado ou algo parecido. Só temos uma química incrível, ela é linda e nos damos muito bem, mas...
- Mas ela não é a Brooklyn. – me interrompeu.
- Como assim? – fiquei confuso.
- A Brooklyn é interessante, engraçada, inteligente, sarcástica...
- Descobriu tudo isso em cinco minutos? – lhe dei um olhar interrogativo.
- Você fala isso pelo menos duas vezes nos seus e-mails. – me recordou.
Dei uma gargalhada.
- Eu tive muito sorte de tê-la como amiga.
- Está querendo dizer que desde o começo, lá no hotel. Era só uma brincadeira?
- Não. – dei de ombros. – Aquele dia eu realmente quis ficar com ela. Mas aos poucos que fomos nos conhecendo eu notei que eu queria que ela fosse mais do que uma garota de uma noite. – encarei Helena. – Ela é especial.
Helena me olhou com compreensão e me deu um sorriso carinhoso. Passei meu braço por seu ombro e apertei o passo a tempo de impedir que Brooklyn fosse em direção ao banheiro masculino.




Eu não saberia dizer o quanto eu senti falta desse lugar e do quanto eu gostaria de voltar a morar aqui. Mas ao mesmo tempo, eu gostava de Nova York e se alguém me perguntar eu negarei até a morte, mas eu comecei a gostar daquele caos. A cidade que nunca dorme tem lá suas vantagens e pessoas muito interessantes.
- Limusine? É sério?
- Ideia do seu pai. – Helena andou até o carro em questão. – Ele queria impressionar a sua namorada do Upper East Side.
- Que pena que ela não pode vir. – Brooklyn andou até minha prima. – Se não ela estaria muito impressionada.
Rolei os olhos para Brooklyn e depois entramos na limusine.
- Então Brooklyn... – Helena chamou a atenção dela.
- Me chama de Brooke, todo mundo me chama assim. – pediu gentilmente.
- Brooke. – pareceu testar o apelido da nova amiguinha. – Você conhece alguma coisa sobre o Canadá?
- Hm... Shawn Mendes conta como “coisa sobre o Canadá”? – nos perguntou e eu tive que rir.
- Conta sim. – Helena sorriu para ela. – Você gosta dele?
- Sim, eu gosto. Mas não tenho cantor ou banda favorita. Eu só curto as musicas.
- E o Justin Bieber? – eu perguntei.
Ela fez uma expressão engraçada.
- Talvez antes das drogas.
Levantei minha mão para que ela pudesse bater por que concordávamos nisso.
- Esse lugar é incrível. – voltou a olhar pela janela do carro em movimento. – Agora eu sei por que não queria ter saído daqui. – ela me olhou rapidamente e depois voltou a encarar a janela. Aproveitei que ela estava distraída para poder conversar a sós com Helena.
- Você acha que existe alguma chance da vovó melhorar? – eu estava esperançoso.
- Papai acha que esse pode ser a ultima vez em que a família estará toda reunida. – acho que aquilo foi um “não”.
- Não seria melhor cancelar essa festa e levarmos a vovó para um hospital?
Helena me olhou como se eu tivesse duas cabeças.
- É claro que não. A vovó faz questão. Além do mais, hospital inteiro está com ela.
Dei um suspiro profundo e olhei novamente para Brooklyn. Ela sorria distraidamente mal sabendo o problema em que eu estava ao nosso redor. Ela iria conhecer a minha família em fim e depois disso eu não sei se iria me olhar da mesma forma. Senti a mão de Helena sobre a minha e a olhei.
- Não se preocupe. Vai ficar tudo bem!




- Você tem uma casa incrível. – Brooklyn disse enquanto subíamos para o meu quarto.
- Não é minha, é do meu pai.
- E qual a diferença? – perguntou.
- A diferença é que eu moro em Nova York agora. Nada mais aqui é meu.
Eu pude ouvi-la bufar. Mas não pude dar atenção a ela por que eu tive que me jogar na minha cama. Eu estava cansado e com muitas saudades de daqui. Olhei a minha volta notando que tudo ainda estava do mesmo jeito. A parede cinza, a televisão, meu cantinho de estudos. Minha cama continuava deliciosamente grande e macia. Meu...
- Você tem um violão? – Brooke interrompeu minha linha de raciocínio. Sentei-me na cama.
- É. Eu tenho. – tentei me recordar de qual foi à última vez que o usei.
- Você sabe tocar? – me olhou.
- Mais ou menos.
- Não seja modesto. – Helena disse ao entrar no quarto. – Ele faz aula desde os cinco anos.
Brooke me olhou surpresa e eu me joguei na cama novamente.
- E você sabia que é a primeira garota a não ser eu a entrar nesse quarto? – franzi meu cenho no mesmo instante e depois apoiei meu cotovelo na cama para poder olhá-la. – O sempre gostou de privacidade.
- Me sinto honrada. – disse ao se sentar na minha poltrona favorita.
Abusada.
- Duraram anos até que ele me deixou entrar, mas eu quis sair no mesmo instante em que eu vi todos aqueles pôsteres depressivos e homossexuais.
- Era da minha banda favorita. E eles são héteros.
- Eles usavam maquiagem.
- Estava na moda.
- Por isso você também usava?
- Como é que é? – Brooklyn se intrometeu. – Você usava maquiagem?
- Eu não usava maquiagem, era só um lápis de olho. Eu tinha doze anos e odiava todo mundo.
- Olha só, eu uso lápis de olho e nem por isso tenho ódio no meu coração. – Helena se sentou na beirada da cama me encarando. – Para mim, isso era só a puberdade te fazendo ter duvida entre garotas e garotos. – não segurei um riso.
- Temos métodos diferentes de demonstrar nossos sentimentos.
- Ah primo. Eu trabalhei muito no seu desenvolvimento pessoal. Não me desaponte agora.
Fez biquinho.
- Eu ainda não convidei a Brooklyn para passar a noite comigo, pode ficar orgulhosa. – pisquei para Helena e olhei para Brooke. – Mas se você estiver interessada...
- Eu passo. – ajeitou seu cabelo. – Deve ser broxante ir para cama com alguém que tem duvida sobre a sua sexualidade.
Encarei Brooklyn não esperando que tais palavras viessem dela. Logo eu ouvi a risada abusada de Helena
- Vem Brooke. – a chamou. – Vou te mostrar a fotos do quando criança. Ele adorava brincar de boneca e vestir as minhas roupas.
Helena saiu do quarto ainda aos risos enquanto Brooke parou na porta e sorriu ao se virou para me olhar.
- Você tinha razão. Helena e eu vamos nos dar super bem.





- Vocês não se cansam uma da outra, não?
parou na porta do quarto de hóspedes, onde eu ficaria. Já havia tomado banho e trocado de roupa. Não sei por que, mas o achei mais canadense do que nunca. Mesmo tendo perdido seu sotaque.
- Acabamos de nos conhecer. – Helena o olhou. – Isso está longe de acontecer.
- Relaxa . – eu disse a pós voltar a folear suas fotos quando neném. – Você ainda vai ter muito tempo com a sua prima.
- Na verdade... – ele avançou um pouco olhando a sua volta e depois voltando a me encarar. – Eu queria te levar em um lugar.
Não vou mentir, eu fiquei surpresa e ao mesmo tempo, empolgada para sair com . E acho que a sós.
- E aonde o casal vai? – Helena quis saber, e eu também.
- É segredo. – piscou para sua prima e depois me deu um sorriso de lado. – Se arruma e põe algo bem quente. Vou te esperar lá em baixo.
Depois de um banho libertador, corri até minha mala me arrependendo de não tê-la desfeito quando cheguei. Nana havia arrumado, então eu não fazia a menor ideia de onde estavam minhas roupas intimas, casaco, blusa... Meu raciocínio se perdeu quando encontrei um envelope no meio das minhas lingeries.
- Por favor, não seja o que eu estou pensando. – pedi baixinho ao me sentar na cama com os olhos fixos naquele envelope. Abri com cuidado para logo em seguida sentir uma vontade enorme de xingar o John. Todo aquele dinheiro... Eu deveria saber que ele não aceitaria assim tão fácil. Bufei profundamente olhando para aquele cheque antes de ouvir meu celular tocar. Era uma mensagem de . Voltei a procurar por roupas quentes e tentando não ficar brava. Depois de ter certeza que eu estava quente e confortável o suficiente eu fui à procura de que conversava com um homem mais velho na sala de espera. me deu um olhar estranho enquanto o homem ao seu lado me deu um olhar interrogativo. Parei no penúltimo degrau da escada e fiquei quieta me sentindo intimidada.
- Você deve ser a Brooklyn, estou certo? – o homem perguntou e abriu um sorriso.
- Isso... Mesmo. – disse me sentindo sem graça.
- Nós estamos atrasados pai.
Pai? Como assim, pai? Olhei para o homem em questão tentando encontrar qualquer semelhança com o e encontrei um olhar convencido e um sorriso arrogante.
- E eu posso sabe aonde vocês irão?
- É surpresa. – me buscou na escada e me puxou pela mão. – Vamos?
- Foi um prazer. – eu disse rapidamente para o senhor .
- O prazer foi todo meu. – o ouvi responder antes de sairmos.
- O que foi isso? – perguntei para enquanto seguíamos até o carro.
- Isso foi o meu pai sendo intimidador e autoritário.
- Para mim, ele só estava curioso. – dei de ombros.
- Enxerido, é a palavra certa a ser usada.
- Você tinha que puxar a alguém, não é? - Ele me deu seu olhar serio, mas seus lábios apontou um sorriso breve.
Soltei a minha mão da dele voltando a dar passos normais. Ele parou para me olhar.
- O que foi?
- Ele acha que eu sou sua namorada? – perguntei.
suspirou ao olhar para os lados, depositou suas mãos em sua cintura e depois me olhou.
- Não, mas ele sabe quem é o John.
- Como assim ele sabe quem é o John? – franzi o cenho e dei uns dois passos para ficar mais perto de . O encarei.
- Enquanto eu te esperava, ele chegou de viajem e veio me receber. Disse que soube que eu havia trago uma garota e que estava doido para conhecer. Eu não quis o fazer pensar que você era minha namorada, para evitar um constrangimento para você. Então disse que você era minha amiga, apenas amiga. Ele não ficou satisfeito e quis mais. Ficou perguntando quem era os seus pais e acabei citando o John, ele quis saber o sobrenome. E eu disse. – parou para respirar, depois de ter dito tudo rapidamente. – Ele se lembrou remotamente de ter defendido um caso para um Henson em Nova York e acha que seria muita coincidência não serem da mesma família, se não a mesma pessoa.
- Um caso...? - fiquei mais confusa ainda.
- Ele não me disse sobre o que, mas não deve ser nada de mais. – deu de ombros. – Nós precisamos mesmo ir. – estendeu suas mãos para mim.
- E aonde vamos? – tentei saber mais uma vez.
- Você me levou para uma tour em Nova York uma vez, agora está na hora de retribuir. – abriu aquele meu sorriso favorito e eu não evitei um sorriso também. Joguei-me nos braços de me sentindo empolgada pelo passeio, mas também como uma desculpa para abraça-lo. Notei que ele ficou surpreso.
- Quer me dar um beijo também? – perguntou e eu me afastei no mesmo instante.
- Precisava estragar o clima? – cruzei meus braços.
- Posso criar outro, se quiser. – se inclinou em minha direção. Coloquei minha mão sobre o seu rosto o empurrando.
- Não quero que pense que pode fazer isso. – arquei a sobrancelha.
- Mas é claro que eu posso. Olha para mim. – apontou para o seu rosto. – Eu sou muito bonito.
- E tem muita autoconfiança, parabéns. – abri um sorriso sarcástico.
- Você consegue acabar com ela em questão de segundos. – se dirigiu até o carro e abriu a porta do carona para mim.
- Desculpa não ser tão fácil quanto você gostaria. – o encarei.
- Na verdade... Você é do jeito que eu acho que uma mulher deveria ser. – me deu um beijo no rosto e depois sorriu.





- Você ainda não me disse aonde iremos. – me remexi no banco super confortável daquele carro. Já estávamos na estrada a mais ou menos uma hora e minha bunda estava começando a doer.
- Você é muito curiosa.
- E você não combina nada com essa pose de misterioso.
- O que quer dizer? – franziu o cenho.
- Quero dizer que, geralmente você é direto sobre as coisas que você quer.
- Acho que esse método não é tão eficaz quando se trata de você.
- O que não o impede de continuar tentando. – comentei enquanto olhava pelo retrovisor, não queria perder nada daquela cidade.
- Você precisa saber a cada segundo que tem uma chance comigo. – me deu um olhar breve.
- É por isso que tem um duplo sentido em tudo que você fala?
Ele abriu um sorriso escancarado.
- É óbvio. A velha tática do “estou brincando, mas se você quiser, eu também quero”.
- E o que houve com toda aquela ladainha de fazer o que você quer pra não se arrepender depois? – arqueei a sobrancelha para ele e lhe dei um olhar interrogativo.
Ele sorriu de lado.
- Você sempre tem uma resposta na ponta da língua, não é?
- E a resposta pra essa pergunta é: Sim
não segurou uma risadinha.
- Chegamos.
Tirei meus olhos dele e olhei para frente ficando completamente confusa. saiu do carro imediatamente fazendo com que o ar congelado entrasse. Eu não me mexi apenas o vi dar meia volta, abrindo a minha porta.
- Você não vem? – perguntou ao estender a mão para mim.
Olhei para a mão dele e depois para o lugar em que havia me trago. Ele só podia estar brincando.
- O que você pensa que está fazendo? – sai do carro sem se quer encostar nele. Fechei a porta com força.
- Opa, calma. Esse carro era do meu avô.
- ...
- Confia em mim. – pediu.
- Por que você me trouxe em uma igreja?
- Por que tem umas pessoas que eu quero que você conheça. – segurou a minha mão sem a minha permissão. – Se você não se sentir confortável, nós vamos embora no mesmo instante. Mas antes disso, me deixa te mostrar que uma história pode ter dois lados. Tudo bem?
Demorei para aceitar fazer aquilo, mas algo me dizia que não iria desistir daquela ideia e parte de mim estava curiosa para saber onde tudo isso iria dar. Passamos por um portão enorme transado por flores amarelas e rosas, andamos por um caminho empedrado enquanto aos lados tinha uma grama verde. A neve havia cessado, então as que haviam caído estavam descongelando. Tinha duas pessoas em pé, do lado da porta principal, perto de um sino gigante. Eles nos olhavam com expectativa e eu pude notar que estava tendo alguma espécie de culto e que tinha muito pessoas por lá.
- , é sempre bom te ver por aqui. - O Homem veio andando em nossa direção com um sorriso largo e os braços abertos. Eles se abraçaram.
- Senhor McCall. É muito bom ver o senhor também.
- Que isso, não vamos voltar com essas formalidades. – deu dois tapinhas no ombro de . – Essa é a garota que você me falou?
me deu uma olhada rápida e depois assentiu. Franzi o cenho muito confuso com tudo aquilo que estava acontecendo.
- É a minha amiga. Brooklyn Bennette de Nova York.
- É uma cidade muito bonita. – ele andou até mim e me cumprimentou. A mulher que até então só tinha falado com , pareceu ter notado a minha presença.
- nos disse que você é cética. – ela disse e eu me segurei para não bater no , ou revirar os olhos. – E ele acha que nós podemos te ajudar a acreditar em Deus.
- É mesmo? – usei meu tom de deboche ao olhar para que engoliu em seco. – E como vocês podem fazer isso? Vão transformar a agua em vinho?
- Pelo contrario. Só vamos te contar uma história e depois você decide se acredita ou não. – a mulher me deu um olhar duro. Talvez seja por que eu fui um pouco rude.
- Há uns anos atrás, eu não acreditava em Deus assim como você. Achava que era besteira rezar por alguém que nunca ninguém viu na vida, a espera de um milagre. – ele começou. – Só que a minha mulher sempre foi muito religiosa e nunca desistiu de mim. Sempre pegando no meu pé para ir à igreja e rezar, coisa que eu achava uma perca de tempo. Até que um dia ela me convenceu. Eu pensei em fazer uma média com, quem sabe ela me deixasse em paz por um tempo.
- Eu fiquei muito feliz por ele ter aceitado. – ela continuou. – Fui correndo para o nosso padre pedir por uma missa especial. Eu tinha muita fé de que Patrick sairia outro homem da igreja naquela noite. Chegamos cedo e ocupamos nossos lugares perto do altar e eu percebi que ele já estava impaciente, querendo ir para casa. Até que a missa começou e ele ficou cada vez mais impaciente. Durante a explicação do evangelho eu me lembro perfeitamente do Padre pregar sobre amar o próximo e estava sendo a coisa mais linda do mundo, até eu ver o meu marido jogado ao chão, desmaiado. Corremos para o hospital para descobrir o que tinha acontecido, e para nossa surpresa, Patrick havia ficado cego. Do nada. Ninguém sabia explicar o motivo da cegueira repentina e aquilo me deixava aflita.
- Eu peguei na mão dela e pedi para ela ficar calma, eu tinha algo muito importante para dizer. Ela segurou minha mão muito forte e tremia bastante. Enquanto eu estava calmo e de certa forma muito feliz. Eu precisava contar para ela o que havia acontecido.
Fiquei encarando o casal em expectativa.
- Durante a pregação, todos estavam de pé, escutando a ladainha do Padre e eu fiquei sentado, impaciente para ir embora. Lembro que o Padre nos pediu para ajoelhar e com muita má vontade e o fiz. – ele segurou a mão da sua esposa. – Do nada, uma luz branca começou a surgir, por de baixo dos bancos e parecia vir em minha direção. Ela ficava cada vez mais brilhante e quanto mais próxima, mais meus olhos insistiam em olhar. Eu vi dois pés, com um furo de prego em cada um deles por de baixo daquele manto branco e estava andando em minha direção, eu não consegui tirar os olhos, a luz só foi se intensificando e quando eu percebi, acordei em um hospital cego. Ninguém sabia explicar por que eu estava cego e eu não conseguia entender por que somente eu tinha visto aquela luz branca, eu fiquei muito confuso. Mas eu soube na mesma hora que eu tinha visto Jesus, na verdade eu senti a presença dele naquela igreja desde o momento em que eu entrei, eu só ignorei. Como fiz a minha vida inteira. O que me fez pensar que talvez fosse por isso que eu achasse que Deus não existisse, por que eu mesmo não me deixava acreditar. Eu sei pelo o que está passando nesse momento, e nós não esperamos que você acredite em Deus por nossa causa, ele tem um proposito para você. Só irá acreditar quando você mesma o ver.
- E como eu posso ver Deus? – perguntei muito aflita.
- Uma flor. – a mulher me respondeu. – O nascimento de uma criança, o por do sol... Tudo que você ache que não tem uma explicação é Deus.
Olhei para pensando em todos aqueles sentimentos que eu não conseguia explicar, eu só sabia que era bom e intenso. Muito diferente do que eu sentia em relação a Willy, era raiva e medo. Não podia negar que aquela história havia me deixado confusa.
- Nós preparamos um encontro para os Jovens católicos da cidade vizinha, Se chama AMI-HUAMA. Eles passam um final de semana inteiro em uma escola, ouvindo pregações, assistindo teatros, tudo sobre Deus. E nós temos uma equipe muito competente para poder ajudar aos que mais precisam sentir a presença D’ele. Daqui a pouco nossos jovens vão chegar para a primeira pregação nessa igreja, mas antes disso, nossa equipe se reuniu para uma oração. Você quer se juntar a nós?
Olhei nervosa para que segurou a minha mão.
- Tudo bem, você vai gostar. – me incentivou. – Vamos.
Subi dois degraus até entrarmos na igreja encontrando um grupo de pessoas de mãos dadas, formando uma roda. , eu e o casal entramos na roda e eu tive que segurar a mão de outro garoto que eu não conhecia, obviamente.
- Eu tive um sentimento muito intenso. – uma mulher disse para todos nós. – Enquanto Cristian fazia sua oração eu vi uma enxurrada d’agua, muito forte. Agua por todo o lugar. – ela olhou para um homem em especifico. – Durante a sua pregação você precisa focar sobre o Amor de Deus, eles precisam ouvi sobre o amor de Deus. Vamos rezar O Pai Nosso.
Eles começaram a rezar em voz alta, como se a vida deles dependessem disso eu só fiquei os encarando tentando sentir o que eles estavam sentindo.
- Nós vamos ao pátio preparar a primeira dinâmica dos jovens, vocês podem ajudar se quiserem. – Patrick se virou para nós após o fim da oração e algumas pessoas se dispersaram.
- E o que podemos fazer? – me pronunciei me sentindo incentivada.
- Vem que eu mostro para vocês.
O seguimos até o pátio da igreja onde eles estavam fazendo um muro com mesas de madeiras. Patrick explicou que era uma dinâmica de libertação. Os jovens irão subir nas mesas e vão se jogar em um movimento de confiança nas pessoas que estarão lá em baixo para segura-las. Acho que a moral da história é você fechar os olhos, parar de tentar enxergar Deus e se deixar sentir ele. Enquanto eu via ajudar com as mesas, tive a impressão de ter visto alguns pingos de agua caírem. Quando olhei a minha volta, os pingos de chuva foram ficando mais intensos e fortes, e eu senti todo o meu corpo se arrepiar, como aquilo seria possível? Os jovens que até então estavam ouvindo a pregação saíram da igreja e foram direcionados para o pátio, eu não estava perto o suficiente para saber sobre o que estavam falando, mas eu soube que eles estavam tomando banho de chuva pela forma como abriram seus braços e olhavam para o céu, parecia que estavam agradecendo. Senti a presença de ao meu lado.
- Isso não estava combinado. – comentou. Eu olhei. – Não é muita coincidência?
Não consegui responder.
- Vem, você precisa sentir isso. – disse antes de seguir até os jovens e começar a tomar banho de chuva junto com eles.
- Sentir o que? – gritei para ele que sorriu para mim antes de olhar para o céu e fechar os olhos.
- Sentir Deus.
Eu senti, eu senti Deus. Eu não sabia como, eu apenas senti. E acho que esse foi o proposito desde o começo.
Eu também senti, bem ali, o que estava tão óbvio, mas eu não conseguia ver.
Eu estava completamente apaixonada por .


Essa é uma história verídica que aconteceu com Pamella Luiz.


Capítulo 8 - Happy B-Day!

O que seria estar apaixonada por alguém? Fiz-me essa pergunta tantas vezes sabendo que a resposta era sempre a mesma. Se me perguntarem o que faz o meu coração acelerar, eu direi “”, se me perguntaram o que faz as minhas mãos suarem frio e meu corpo trepidar, eu também direi “”, se me perguntarem o que me faz sorrir, apenas por pensar, eu ainda direi “”. Disseram-me que todos esses são sintomas de pessoas apaixonadas, não que eu tenha experiência no assunto, mas eu estava começando a acreditar que em tudo que eu achava saber já não eram tão compreensíveis assim. Por que afinal, estar apaixonado não era saber ou entender. Apenas sentir! Acordei remotamente feliz naquela manhã de inverno, mas logo me lembrei de que amanhã era aniversário do e eu não tinha comprado um presente ainda. Se quer lembrei. Pensei que ontem quando ele disse que iria me levar em uma “tour” eu poderia comprar um presente disfarçadamente, mas os planos foram completamente outros. O que eu daria para um garoto que aparentemente tinha tudo? Seja já lá o que fosse eu tinha que pedir a ajuda da Helena. Depois de um banho quentinho e vestir minhas roupas super quentes eu decidir ir procurá-la para pedir uma opinião. Ao descer as escadas eu avistei e Helena em pé, ao lado da porta de entrada, cochichando. Fiquei alguns segundos parada no ultimo degrau até eles me notarem ali. abriu o meu sorriso favorito e andou em minha direção.
- Dormiu bem? – perguntou.
- Muito bem, obrigada. – sorri gentilmente.
- Olha, está sendo gentil... – cruzou os braços ao arquear a sobrancelha.
- A arrogância tem que ser merecida. – terminei de descer o ultimo degrau e andei até Helena.
- Será que isso é um progresso? – me virei para ele.
- Me diz você. – sorri sem mostrar os dentes e depois virei-me para Helena novamente. – O que acha de me ajudar a escolher um presente para o seu primo? – disse um pouco baixo para não escutar.
- É claro, eu vou adorar te apresentar para os meus amigos gatos de Ottawa. – disse um pouco mais alto, e acho que foi para disfarçar.
- Boa sorte. – ouvi dizer. – Vai precisar.
Sorri para ela e a vi me dar uma piscadela.
- Eu iria com vocês, mas preciso ir ver a vovó.
- Ótimo. – Helena segurou a minha mão. – Nos poupou do trabalho de dizermos que você não estava convidado. – sorriu para ele – Vamos!



- Então... – Helena chamou a minha atenção enquanto passeávamos pelo ByWard. – O que rola entre você e o meu primo?
A olhei insegura.
- Pensei que tivesse te dito que somos apenas amigos. – sorri nervosa.
- E ele disse, mas eu vejo como você olha para ele.
- E como eu olho para ele? – a encarei arqueando a sobrancelha.
- Como se estivesse apaixonada. – foi direta e eu não soube o que dizer pelos segundos que se arrastaram a seguir. – Eu entendo, de verdade. – ela me indicou um dos banquinhos e nos sentamos. – sempre foi diferente de todos os garotos que eu conheci. – me olhou. – Nós somos muito unidos então ele sempre sabia quando eu estava apaixonada ou com o coração partido. Acho que ele dotou aquela coisa de não fazer com os outros, o que não quer que faça com você. Por onde ele passa, as garotas fazem filas para tentar fazer ele se apaixonar, mas ele sempre me jurou que só teria algo sério quando ele tivesse certeza que fosse a garota certa. – Meu coração deveria ficar feliz ou triste com essas informações? – Eu sei o que deve estar pensando: Ele está com essa tal de April, então ela é a garota certa. Mas não é. Eu sei, vai por mim. – garantiu. – Eu o conheço, eu sei quando está apaixonado e isso só aconteceu uma vez na vida. Ele não está apaixonado por ela.
- Mas também não está apaixonado por mim. – deixei claro sentindo uma pitada de decepção.
- Mas está no caminho. – sorriu para mim. – Te trazer até aqui, no Canadá, para o aniversário dele? Nenhuma garota já teve algum privilégio assim ou algo parecido.
- Talvez ele só não quisesse vir sozinho.
- Pode ser que sim, pode ser que não. Mas ele sente algo por você, só não percebeu ainda.
Não sei, mas algo dentro de mim acreditou naquelas palavras. Parando para pensar em tudo que aconteceu entre nós, parecia ter algo mais “real” agora do que nunca.
- E como eu faço para ele perceber? – perguntei depois de minutos quieta, enquanto seguíamos olhando as lojas. Ela me olhou.
- Só continue sendo você. – piscou para mim e parou em frente a uma barraca de frutas. – Está com fome?
Depois de ter certeza que não tinha nada que fosse ser um bom presente para naquele lugar, decidimos ir ao shopping que ficava bem pertinho dali.
- Do que ele gosta? – estávamos subindo pela escada rolante. – O .
- Sobre bens materiais... – ela parecia pensar em algo. – gosta do carro dele, na verdade ele tem uma mini coleção de carros guardados em algum cofre escondido. Ele me jurou que se livrou disso, mas eu sei que não. É difícil, acho que ele tem de tudo.
- Não tem nada que ele queira que ainda não tenha? – perguntei.
- Acho que isso se trataria mais de um presente emocional, entende?
- Como assim? – franzi o cenho.
- Poder ver seus pais juntos de novo, ou... – ela encarou o outro lado, sua expressão ficou triste. – Que a nossa vó melhorasse. – ela abaixou seu rosto e piscou uma vez. – Essas coisas, sabe? – me olhou. – Que não depende de você para acontecer.
- Helena eu sinto muito. – me aproximei dela ao deixarmos a escada. – não me disse nada.
- Ele sempre foi o mais forte de todos nós. Mas no fundo eu sei que ele está sofrendo. Só não gosta de deixar as pessoas saberem disso.
Eu a abracei sentindo um aperto no coração. Sabia exatamente como era o medo constante de perder alguém que amamos.




Havíamos chegado há quase meia hora e eu ainda não tinha visto . Me sentei ao lado da janela vendo a correria que estava lá fora, pessoas passando para lá e para cá o tempo todo, com flores, comida, enfeites, móveis... Estavam tão preocupados em deixar tudo perfeito que nem notaram Helena e eu passarmos por eles. Duas batidas na porta interromperam o meu raciocínio. Levantei-me rapidamente deparando com . Ele estava escorado no batente da porta, com uma das mãos enfiadas dentro do bolso do terno que lhe caia perfeitamente e a outra segurando uma caixa de presente. Ele estava tão lindo...
- E então? – abriu um sorriso galanteador.
- Uau . – sorri. – Estou impressionada.
- Parece que eu estou tentando muito? – perguntou ao se dar uma olhada.
- Depende do que está tentando.
Ele me olhou silenciosamente por alguns segundos, parecia mergulhado em seus pensamentos e de repente pareceu acordar dos devaneios.
- Charlotte O’Brien virá para a minha festa. – comentou ao passar por mim e colocar a caixa sobre a penteadeira.
Fechei a porta e me virei para ele.
- Eu deveria saber quem ela é? – arqueei a sobrancelha. suspirou profundamente ao me encarar.
- Ela é conhecida por ser a minha única e ex-namorada. – o encarei inexpressiva.
- E você está vestido assim para ela? – apontei para ele e seu terno preto e charmoso.
- Não. – disse rapidamente. – Quero dizer... – piscou várias vezes. – Eu sei que é bobagem, mas nós não terminamos bem e vai ser a primeira vez que eu a vejo desde então...
- E você quer impressioná-la. – conclui. E por não ter recebido uma resposta, acho que de fato eu estava certa.
Cruzei os meus braços e escorei as minhas costas na porta.
- Você... Você ainda gosta dela? – eu não tinha certeza se queria ouvir aquela resposta.
-Não, mas... – aquele maldito “mas” - Acho que ela ainda significa alguma coisa por que eu não consigo parar de pensar que ela vai estar aqui.
Eu sabia que iria me arrepender disso, só que algo em mim não conseguia ignorar , afinal somos amigos e amigos contam um com o outro. Andei até a cama e me sentei, depois o olhei notando toda aquela tensão.
- Eu sei que eu não sou a sentimental aqui, mas... Você quer conversar sobre isso? – bati na cama para que ele se sentasse ao meu lado. Ele ponderou se deveria ou não, mas acabou por vencido e se sentou ao meu lado. Eu fiquei ali esperando que ele dissesse algo, não queria pressioná-lo a dizer alguma coisa e no fundo eu torcia para que não dissesse.
- Não é algo que eu deva dar mais importância do que realmente tem. Ela só foi alguém muito especial e eu a perdi. Não sei exatamente o que deu errado, mas eu sei que foi minha culpa. E está tudo bem. – suspirou. – Está mesmo. – garantiu ao me olhar, como se quisesse me fazer acreditar que realmente estava. O que me fez perceber que ele não queria ter uma conversa deprimente sobre amor.
- Coração partido é realmente uma droga. – comentei. – Você deveria escrever sobre isso na aula de redação.
Ele sorriu.
- Você não consegue conversar comigo sem o seu nível habitual de sarcasmo, não é? – perguntou e eu me fingi de ofendida.
- Eu estou falando serio. A literatura é uma coisa louca. – suspirei ao sorrir também. – Nós falamos sobre dor e as pessoas acham lindo.
Percebi que ele estava se esforçando para não rir.
- Ah, qual é! – o empurrei de leve. – Cadê aquele sorriso prepotente e ensolarado que não contribui em nada com o aquecimento global? – ficou me encarando até não conseguir mais se segurar. Ele sorriu e o meu dia havia melhorado muito depois disso.
- Posso te pedir uma opinião? – perguntou segundos depois.
- É Claro. – assenti para ele.
- O que você faria no meu lugar? Em relação a isso...
- É uma pergunta difícil, eu não tenho experiências amorosas e a única que tive, eu não tenho certeza se posso comparar, mas... Eu acho que tudo que aconteceu é passado, você mora em Nova York agora e tem uma namorada te esperando lá. De qualquer forma você precisa seguir em frente.
- Falando sobre isso, eu não tenho tanta certeza assim... De que April ainda quer ser a minha namorada.
- A pergunta é: Você quer que ela seja? – ele me olhou cauteloso, parecia confuso sobre o que queria. Algo poderia ter mudado por causa dessa Charlotte? Eu queria saber? Não tenho tanta certeza assim.
- E o que tem na caixa? – apontei para o objeto. Eu estava louca para mudar de assunto e não disfarcei a minha curiosidade. Ele pareceu se lembrar que aquilo estava ali e sorriu ao se levantar e pegar a caixa.
- É um presente para você. – me entregou.
- Um presente? – fiquei confusa. – Achei que o aniversário fosse seu.
- Boa observação. – sorriu. – Vamos! Abre. – me incentivou.
O olhei desconfiada antes de puxar o laço vermelho e abrir a caixa. Meu rosto esquentou no mesmo instante em que vi o que tinha ali dentro.
- O que significa isso? – me levantei eufórica.
- É uma fantasia de enfermeira sexy. – picou para mim e eu tenho certeza de que fiquei da cor daquele laço.
- Eu sei o que é, mas por que diabos você me deu isso? – joguei a lingerie na cara dele.
- Vamos lá, você precisa ter um pouco mais de imaginação Bennette – segurou a lingerie pelas alças a suspendendo no ar e colocando a minha frente, ele a analisou e depois focou em mim, senti minhas bochechas inflarem e corar, percebeu isso e começou a gargalhar. - Meu Deus! Sobre o que você e a April conversam depois de transar? – perguntei indignada.
- Você não vai querer saber. – tinha um sorriso sacana.
- Quer saber? É melhor você ir, eu preciso... Eu preciso tomar um banho. – Abri a porta para ele.
- Espera, eu estava brincando. – puxou a caixa da cama e como se tivesse um fundo falso ele tirou uma caixinha de veludo preta e andou em minha direção. – É tradição da minha família presentear quando temos um novo integrante. – ele abriu à caixa deixando a mostra uma linda pulseira platinada.
- ... – não sabia o que dizer. – Mas eu... É linda, só que eu não sou da família. – o olhei.
- É claro que você é. – retirou a pulseira para coloca-la em meu braço. – Sabe... Desde que cheguei à Nova York eu só tenho vontade de voltar para o Canadá, mas quando eu estou com você é diferente, por que você faz me sentir em casa, me sentir bem-vindo. – sorriu para mim. – Eu tenho muita sorte de ter você comigo.
E o abracei forte, por que cada parte do meu corpo se contorcia de felicidade por ouvir aquelas palavras. Tive uma vontade enorme de dizer o que eu sentia por ele, mas ainda não sabia se ele estava pronto para saber ou se sentia o mesmo.
- obrigado, isso é... Primeiro a igreja e agora... – o encarei com carinho. – Eu não sei nem o que dizer.
- Use hoje à noite, está bem? – eu consenti. – Eu preciso ir agora. – se aproximou da porta e parou para me encarar. – Você tem certeza de que não quer usar isso aqui? – Segurou a lingerie pela alça e sorriu. Rolei os olhos ao bater a porta na cara dele.




***



- Estava falando com a Brooklyn? – Helena perguntou ao me ver na sala de jantar. Arqueei a sobrancelha.
- Como sabe?
- O seu sorriso de orelha a orelha não disfarça. – abaixei meu rosto tentando disfarçar. – Que bom que está de bom humor, você vai precisar dele.
- Como assim? – a encarei.
- Estão nos esperando no escritório do titio. E alguma coisa me diz que isso não vai ser nada bom.
Franzi o cenho bastante confuso com aquele comentário, mas decidir ir ver o que era mesmo assim.
Ao chegarmos ao escritório me deparei com o meu pai, o advogado da vovó e o pai da Helena. Fiquei confuso.
- Até que em fim chegaram, podemos começar essa reunião. – Papai disse ao sair da janela e se sentar em sua cadeira.
- Reunião? – perguntei. – O que está acontecendo aqui? – encarei Helena que apenas deu de ombros e depois foi junto do meu tio.
- , como você bem sabe, sua vó não tem muito tempo de vida. – não fiquei nem um pouco impressionado ao notar que seu tom era natural ao dizer aquelas palavras. – Depois de muita conversa, ela nos deixou ver o seu testamento e pediu para esclarecermos qualquer dúvida que possa surgir.
- Isso é sério? – eu estava chocado.
- Parece que Augusto não conseguiu aceitar alguns termos que estão aqui, mas como não depende dele para acontecer... – me ignorou.
- Eu só gostaria de saber o que você fez para nossa mãe aceitar mudar o testamento. – meu tio disse com um tom seco.
- Eu não fiz nada. – como meu pai estava tão à vontade com aquela situação? – Ela deve ter percebido o óbvio. – ele se levantou ao pegar alguns papeis que estavam em cima da mesa. – será maior de idade o ano que vem ao contrario da Helena, então ele poderá administrar a Ubisoft o quanto antes. É simples. – me entregou os tais papeis.
- O... Que? – não consegui raciocinar.
- Alguma duvida sobre o que eu acabei de dizer? – se dirigiu a mim.
- Como assim administrar a Ubisoft? – franzi o cenho confuso com toda aquela situação.
- Sua vó não quer deixar a nossa empresa nas mãos de alguém que não seja da família, e como seu tio e eu já administramos o escritório de advocacia que era do seu avô, você será o próximo CEO da Ubisoft.
- Mas e a Helena? Ela tem tantos direitos quanto eu. – exclamei.
- Sua prima vai herdar boa parte das nossas propriedades pela cidade, as joias da sua vó... E muitas outras coisas que você pode ler no testamento. – apontou uma caneta em minha direção. – Se esclarecemos tudo, você já pode assinar como testemunha.
- Não. – me afastei no mesmo instante. – Eu não vou tirar o que também é da Helena.
- ...
- Eu preciso conversar com a vovó.
Retirei-me do escritório desnorteado.




***




não veio falar comigo pelas horas que se arrastaram a seguir. Eu também não tive muito tempo para procurá-lo. Helena decidiu brincar de salão de beleza comigo e agora eu mal conseguia me reconhecer em frente ao espelho.
- Uau. – sussurrei para mim mesma.
- Pois é! – Helena disse empolgada. – Também não achei que fosse possível você ficar mais linda do que já é. – se colocou ao meu lado, me olhando pelo espelho.
- Não exagera. – pedi me sentindo tímida, de repente.
- Por favor, não me diz que é uma daquelas pessoas que não dão valor a própria beleza.
Pisquei algumas vezes ainda me encarando.
- Não, é que... – me virei para ela. – Esse não é tipo de beleza que eu dou valor.
Helena ficou me encarando enquanto sorria. Do nada me puxou para um abraço apertado.
- Mal posso esperar para o perceber o quanto está apaixonado por você.
- Falando em ... – disse de mansinho ao sair dos braços dela. – Ele me disse que a ex-namorada dele virá para a festa, e ficou todo inseguro. Você acha que ele ainda pode gostar dela? – não me preocupei em ser indiscreta. Helena sabia dos meus sentimentos pelo primo dela.
- É difícil saber Brooke. – ela se sentou na cama e eu me escorei na penteadeira. – Eles tiveram um relacionamento longo e intenso e só terminaram quando soube que estava prestes a se mudar para Nova York.
- Então ainda pode haver algum sentimento, já que eles só terminaram pelo fato do ir embora?
- Não foi tão simples assim. A Charlotte queria que escolhesse.
- Escolhesse o que? – perguntei confusa.
- Ficar com ela ou ir para Nova York. Ele poderia ter ficado aqui, morando com o titio, a namorando e tendo a mesma vida que sempre teve. Mas se ela se importasse um pouco com os problemas dele, saberia que a melhor coisa que poderia acontecer, seria essa mudança.
- Eu... Eu não entendo.
- O titio já foi um pai mais presente na vida do . Eles viviam para cima e pra baixo juntos, apesar de sempre ser muito exigente com ele. sempre precisou ser o número 1 em tudo que ele fizesse, e no começo parecia mais fácil entender só que com o tempo, quando se fica adolescente e rebelde, às vezes você só quer sair com os seus amigos e chegar tarde da noite, beber até não lembrar o nome, fazer uma tatuagem, sabe? Mas com o isso nunca foi possível. A convivência foi ficando mais difícil entre os dois, e depois que o vovô morreu as coisas só pioraram. Papai e titio tiveram que assumir o escritório de advocacia e em seguida veio à separação dos pais dele e o namoro com a Charlotte. Eles se afastaram cada vez mais. E então a mãe do se casou novamente e com isso veio à oportunidade de ir para Nova York.
Helena suspirou profundamente ao se levantar e começar a olhar algumas roupas que estavam na minha mala.
- Era uma escolha difícil, porém definitiva. – continuou. – Ficar com a Charlotte e continuar deixando que titio fizesse as escolhas por ele, ou ir para Nova York recomeçar a vida e começar a fazer coisas que ele realmente quisesse fazer. – me olhou. – Ser independente.
- Ele me disse que quer ser ator. – andei até ela.
- Ele quer mesmo. – sorriu para mim. – Acho que você é mais especial para ele do que eu imagino, nem a Charlotte sabe disso.
Meu corpo todo vibrou ao ouvir tais palavras.
- Você deveria ir com esse vestido. – puxou uma peça da fame and patners dourado, longo, de apenas um ombro e o colocou sobre o meu corpo.
- Você gostou?
- É lindo. – sorriu para mim novamente. – Você vai ficar maravilhosa.
Apertei o vestido em minha cintura ao sorrir para ela. Soube que Helena realmente torcia para que gostasse de mim e também, naquele instante eu soube o presente que daria a .





***



Parei em frente quarto onde Brooklyn estava a vendo pela brecha da porta. Ela estava deslumbrante enquanto ria despreocupada com a vida e parecia realmente bem. Fiquei alguns minutos ali, observando cada detalhe dela, o vestido longo, o cabelo solto escorrendo em seu rosto perfeitamente alinhado, a forma como ela olhava para Helena e sorria. Lembrei-me do dia em que fiquei no hall a olhando e pensei em como gostava da sensação de observá-la de longe. Helena me viu e correu até a porta a abrindo por completo. Brooklyn se virou para mim e parecia estar sem graça na minha presença, e acho que bem no fundo eu acabei ficando também.
- Eu não queria interromper. – falei sentindo minha voz oscilar.
- Não interrompeu. – Helena sorriu para mim e depois olhou para Brooklyn. – Eu estava ajudando a Brooke nos últimos detalhes. Ela não está linda? Quero dizer, mais do que já é.
Brooke rolou os olhos e sorriu também.
- É verdade. – concordei no mesmo instante. – Você está incrível.
- Vocês dois possuem certa prepotência em exageros. – Brooke disse.
- Bom, meu trabalho aqui está feito. Eu preciso me arrumar agora, vejo vocês depois. – Helena me deu um beijo no rosto e saiu me deixando sozinho com Brooklyn. Eu não sei quando comecei a ficar tímido na presença dela, mas essa certamente era uma daquelas raras situações em que eu não sabia o que dizer. Acho que ela percebeu o meu mau jeito e me deu um sorrio tímido, logo depois puxou um papel de cima do criado mudo e me entregou.
- Feliz aniversário. – disse.
Olhei para o papel notando que era um numero de celular. Franzi o cenho.
- Obrigado, mas eu já tenho o seu numero.
Ela deu uma risada engraçada e eu não entendi qual era a graça.
- Não é o meu numero. – explicou. – É o numero do David Yates.
- David Yates? – perguntei cada vez mais confuso.
- Você me disse que queria ser ator, então eu achei que esse poderia ser um presente perfeito para você. Eu liguei para o John e pedi esse favor. Você tem uma reunião com ele semana que vem.
- Você está falando serio? – minha voz estava aguda.
- Muito sério. – ela sorriu com os lábios fechados e eu não esperei mais nem um segundo para lhe dar um abraço apertado.
- Brooklyn, isso é... Minha nossa, como eu posso te agradecer? – a soltei para poder olhar em seus olhos. Eu estava desesperado de tanta felicidade.
- Conseguindo um papel no próximo filme de “Animais Fantásticos e Onde Habitam”.
- Brooke, eu... –aproximei meu rosto do dela sentindo a minha respiração falhar, por um momento eu tive a sensação de que deveria beijá-la. Eu acho que queria isso, não tinha certeza, só me empolguei mais do que deveria. Pigarreei ao me afastar. – Você é mesmo incrível.
Foi tudo que consegui dizer e pelo resto do tempo em que fiquei ali com ela, a sensação de que iria me arrepender de não tê-la beijado ficou me rondando constantemente.






Quase todos os convidados haviam chegado, a casa estava consideravelmente lotada por familiares e amigos mais próximos. A decoração estava impecável e mesmo assim eu não conseguia fazer outra coisa a não ser olhar para Brooklyn que naquele instante estava conversando com Theo Hennig, meu melhor amigo. Senti a presença de Helena ao meu lado e tentei disfarçar um pouco.
- Tive a ideia de apresenta-los, eles não são um par fofo? – me perguntou.
- Não acho que Theo faça o tipo dela. – dei de ombros. – Ela parece desconfortável.
- E você parece com ciúmes. – observou e eu rolei os olhos. – Tem certeza de que não rola nada entre vocês?
- Somos apenas amigos. Já disse.
- Então avisa a sua cara por que ela ainda não sabe disso. – olhei Helena que me deu um sorriso convencido e depois saiu. Assim que o garçom passou por mim eu peguei uma taça de champanhe, dei um gole considerável e olhei para Brooklyn uma ultima vez. Ela sorria e ao contrario do que eu havia dito, ela não parecia desconfortável, ainda assim eu achava que deveria ir até lá e... Quando me virei decidido a ir até Brooke, vi Charlotte parada ao meu lado me encarando. Meu coração disparou de uma forma que eu não saberia explicar, meu corpo travou bem ali, meus pensamentos sumiram repentinamente. Eu pensei que tivesse superado isso, pelo visto, eu estava muito enganado.
- Oi. – ela disse de repente, suave e parecia tão normal.
- Oi. – tentei me recompor.
- Eu não tinha certeza se deveria vir, mas... – ela deu um passo em minha direção. – Eu queria ver você.
- Queria? – repliquei com um tom amargo. – Não foi o que pareceu na ultima vez em que nos falamos.
Ela suspirou.
- Eu estava com raiva e você sabe. – disse como se aquilo justificasse algo.
- As coisas poderiam ter sido diferentes. E você sabe
- Você estava indo embora e eu estava machucada. Tudo que eu queria era que ficasse. – se aproximou mais. – Que ficasse comigo.
- Charlotte, eu até posso esquecer as coisas que me disse, mas eu nunca vou esquecer como você me fez sentir.
- , eu te amava. – declarou e meu coração se apertou, eu queria dizer que também a amava, mas eu não conseguia. Virei meu rosto para o outro lado não querendo encará-la. – Podemos conversar, em um lugar mais reservado?
Olhei rapidamente para Brooklyn que ainda conversava com Theo, e depois de ter certeza de que ela não precisava de mim, olhei para Charlotte.
- Tudo bem!






***




- É serio, você precisava ver a forma como ele olhava para vocês. – Helena declarou. – Parecia que ele iria bater no Theo.
- Como assim? – não consegui segurar um riso em saber que poderia estar com ciúmes de mim. – O Theo é legal, mas ele...
- Não faz o seu tipo? – me cortou e eu assenti.
- É. – sorri. – Isso mesmo, como sabia que eu diria isso?
- Por que disse o mesmo. – ela se levantou em um momento involuntário. – Vocês precisam se resolver de uma vez e eu preciso ir atrás do bolo, está quase na hora.
Ela assoprou um beijo no ar e saiu descontraída.
- Do que está rindo? – se apossou do lugar onde Helena estava alguns segundos atrás.
- Nada de mais – continuei com um sorriso nos lábios enquanto olhava pra pista de dança, vi dar de ombros.
- Quer dançar? – perguntou.
- Parece que o álcool esta brincando de se esconder com a sua inteligência – falei.
- Eu sei que isso foi sarcasmo, mais eu vou ignorá-la por que nós vamos dançar agora. – se levantou me puxando pela mão, não tive tempo de protestar quando dei por mim já estava na pista de dança. - Onde está o Theo? – perguntou o procurando enquanto sua mão esquerda enlaçava a minha mão direita. Ele encarou a pulseira que havia me dado de presente por alguns segundos.
- Por que eu saberia a resposta dessa pergunta? – arquei a sobrancelha ao olhar em seus olhos claros.
- Ele não desgrudou de você a noite inteira. – observou.
- Assim como você não desgrudou da Charlotte? – ele me deu um olhar contraditório. – Eu sou a rainha em prestar atenção nos detalhes.
- Tínhamos um assunto pendente para resolver, apenas isso.
- Você não tem que me dar satisfação de nada. – me rodou.
- Não é satisfação, é explicação. Eu sei que quase não te dei atenção essa noite e eu quero compensar você.
- Na verdade, não posso negar que fiquei feliz com isso. Pelo menos você teve outra pessoa para encher o saco ao invés de mim.
Ele sorriu antes de colar seu rosto no meu.
- Seu senso de humor sempre vai ser a sua melhor qualidade. Nunca se esqueça disso.
Aproveitei cada segundo ao lado dele por que eu não fazia ideia de quando estaríamos tão próximos novamente.
De repente começou a tocar uma versão acústica de Treat You Better do Shawn Mendes e eu dei um olhar desconfiado para .
- “I won’t lie to you, I know he’s just not right for you”. – começou a cantarolar em meu ouvido para que somente eu escutasse. – “And you can tell me if I’m off, but a see on your face when you say that he’s the one that you want”. – apertou sua mão em minha cintura enquanto seus olhos me encaravam os meus.
- Você é tão clichê – declarei sem conseguir segurar o sorriso.
- Pedi para tocarem especialmente para você.
- Não cansa de impressionar, não é? – me girou duas vezes e depois me puxou fortemente para seu corpo. Não conseguir sustentar o olhar dele.
- Pelo menos disfarça esse ar de deboche. – espreitou seus olhos para mim e eu deitei minha cabeça em seu peito jogando minhas mãos em seu pescoço, sentindo as mãos deles rodearem a minha cintura.
- Isso seria humanamente impossível. – deixei claro. – Mas eu tenho que admitir que você sabe o que fazer. Agora entendo o que as garotas veem em você. – senti o sorriso dele. – Além do seu rostinho bonito e do seu carro caro, é claro. – ele gargalhou. – Não sabia que sua mente tinha espaço para dois ’s diferentes.
- Dois ’s diferentes? – questionou.
- Sim. O brincalhão convencido, metido a besta flertador. E... O amigo romântico, dançarino que gosta de dar presentes.
Ele riu.
- Não tem duas pessoas em mim, só me esforço mais com quem merece. – me afastou um pouco para poder olhar em meus olhos, depois sorriu carinhosamente. Todo o meu coração se dilatou. – No fundo não somos tão diferentes.
- Como assim? – fiquei confusa.
- Você só me mostrou quem você era quando se sentiu a vontade para isso. Esse sentimento é reciproco. Você é especial de mais para não ter o melhor de mim.
Gostaria de saber o que ele quis dizer com isso.
- Nós não temos nada parecido , vai por mim. – o garanti.
- Está tentando convencer a mim ou a você?
- Não é nada disso, é só que você é a pessoa mais sociável que eu já conheci, depois do Ed. Na escola todo mundo quer ser seu amigo e isso não tem nada a ver comigo.
- Do que está falando? – franziu o cenho. – Eu sei que você e seus amigos são bem populares.
- Meus amigos podem até ser, mas eu apenas ando com eles. E só. Eu não tenho nada de especial.
- Para mim você tem. Isso não importa pra você? – Ele segurou a minha mão e a sensação de segurança nunca foi tão grande.
- Eu sei aonde você quer chegar. – encarei nossas mãos para não precisar olhar em seus olhos. – Eu não tenho nada de especial e muito menos de interessante. Acho que todo esse passado pesado que carrego em minha mala seja algo atraente para você. A garota inteligente e divertida, porém misteriosa. – engoli em seco. - A verdade é que eu não tenho graça nenhuma.
- Brooklyn... – segurou o meu queixo para que eu olhasse em seus olhos e eu tive a impressão de que ele fosse dizer alguma coisa, mas nós ficamos nos encarando silenciosamente pelos minutos que se arrastaram a seguir e quando a musica estava quase no final Helena anunciou que era a hora de cantar os parabéns e cortar o bolo. não pareceu ter ouvido já que ele não havia movido um músculo. Seus olhos não se desviaram de mim.
- Você precisa ir. – eu falei quando notei todos os olhares em nossa direção, mas continuou imóvel.
- Eu sei.
Pigarreou ao me soltar e andou em direção ao palco onde todos o aguardavam ansiosamente, pegou uma taça de champanhe que estava em cima da mesa e tomou tudo em apenas um gole. Aproximei-me logo em seguida e me juntei há todos.
- Antes de qualquer coisa eu queria dizer que... – Helena começou a dizer. – Nós temos muita sorte de termos você na família. Você sempre me protegeu e cuidou de mim. Podemos ser primos, mas eu te olho como um irmão. – ele a abraçou. – Todos os dias sem você aqui foram tediosos e estranhos, nada mais é a mesma coisa. Nós sentimos a sua falta e esperamos que volte pra gente logo.
Em seguida todos começaram a aplaudir e eu tive certeza de ver chorar com o discurso da Helena, sei que também não admitiria isso. Jamais.



***



Olhei a minha volta procurando por Helena quando avistei meu pai se aproximar, rolei meus olhos já me preparando mentalmente seja lá para o que fosse acontecer.
- Você precisa voltar atrás na sua decisão. – falou em um tom alto e irritante. Obvio que ele não deixaria esse assunto para amanhã.
- Podemos falar sobre isso outra hora? – o ignorei passando por ele.
- Não, não podemos. – ele me puxou pelo braço como se eu fosse uma criança de dez anos fazendo pirraça.
- Que merda é essa? – me soltei dele vendo as pessoas nos darem olhares curiosos. Ele pareceu perceber isso e se recompôs ajeitando seu blazer.
- , se você não aceitar a sua herança tudo será herdado pelo Augusto. Vai perder tudo o que tem direito por orgulho?
- Orgulho? – perguntei indignado. – Isso não tem nada a ver com o meu orgulho, e sim com o seu status financeiro. Você sabe que sendo menor de idade, você seria o responsável legal pelo o que me pertence.
- , olha a sua volta. – apontou para todo aquele lugar. – Tudo isso será seu quando eu morrer. Tudo que é meu é seu!
- Eu não sei como você conseguiu fazer com que a vovó mudasse de ideia, mas eu não vou tomar o que a Helena também tem por direito, assim como o meu tio.
- , você... – ele passou as mãos pelos cabelos mostrando sua frustação. – Eu vou deixar você pensar melhor no que está fazendo agora, mas eu espero que amanhã você tenha pensado claramente no que é melhor pra você. Se ainda quiser ser o meu filho.
Aquela ultima frase me acertou em cheio, como se eu tivesse levado um soco. Não, não... Foi algo bem pior.
- Não seria no que é melhor para você? – o afrontei. – Podemos ter o mesmo sangue, mas não temos o mesmo caráter.
O deixei falando sozinho.
Precisava esfriar minha mente e ficar muito bêbado para esquecer aquela noite ridícula.



***



Vi ir cambaleando para os fundos do jardim, desta vez com uma garrafa de champanhe em mãos. Decidi o seguir e tentar impedir que ele fizesse algo estúpido ou vergonhoso. O avistei tentando subir uma escada grudada em uma enorme arvore. Foi uma cena engraça de se ver, até ele cair de costas no chão. Corri até ele.
- Você está bem? – me agachei até ele o analisando.
- Fisicamente? – tinha os olhos fechados. – Estou ótimo.
- O quanto você bebeu?
- O suficiente para não sentir o impacto dessa queda.
- Quantos dedos têm aqui? – perguntei quando ele abriu os olhos.
- Três. – resmungou a se levantar. – Eu estou bêbado e não burro.
- Acho que esse comentário sarcástico significa que você está ótimo.
Ele me de um olhar vazio e depois suspirou.
- Me desculpa. – estendeu a mão me ajudando a levantar.
- Tudo bem. – dei um sorriso fraco. – O que estava tentando fazer?
- Hm... Eu queria subir até o meu antigo esconderijo, eu não tive muito tempo desde que cheguei.
Olhei para cima vendo uma casa na árvore.
- Quer ajuda? – ele me deu um olhar engraçado.
- Acho que posso me virar sozinho. – colocou a garrafa de champanhe de baixo do braço esquerdo e com a mão direita voltou a se apoiar na escada. – Além do mais é proibido entrada de garotas.
- Achei que soubesse que eu não sou uma garota qualquer. – me aproximei tomando a garrafa da mão dele. – E acho que você não precisa disso aqui.
- Acredite, eu preciso sim. – se aproximou de mim para pegar a garrafa. Mas eu não dei. – E você continua sendo uma garota.
- Eu só vou devolver se você me contar o que está acontecendo.
Ele suspirou.
- Brooklyn eu não quero que você se envolva mais nos meus problemas familiares.
- Eu também não queria que você se envolvesse nos meus, mas eu te contei mesmo assim. Por que você me fez acreditar que tudo fica melhor quando dividimos com outras pessoas. Pessoas que confiamos – ele ficou me olhando em silencio. - Eu não vou sair daqui até você me contar. – afirmei.
Ele continuou me encarando friamente sem dizer uma palavra, até que virou para o lado a apontou para a escada.
- Damas primeiro.
Sorri satisfeita e empurrei a garrafa em direção ao peito dele. Depois me dirigi até a escada começando a fazer o trajeto até a casa. Graças aos céus aquele vestido não me atrapalhou em nada e muito menos deixava alguma visão indesejada nas pernas. veio logo em seguida me ajudando a entrar na casinha, o que tivemos que fazer andando de quatro.
- Eu tinha dez anos desde a última vez que vim aqui. – me contou ao nos acomodarmos em um canto. – Era muito maior quando eu era uma criança. – sorriu para mim e eu sorri de volta. – Meu pai me ajudou a construí, naquela época ele era o meu melhor amigo e eu... – olhou para baixo. – Eu queria ser como ele quando crescer. – parou de falar por alguns segundos. – Agora se quer reconheço aquele homem. E parece que todo a minha família quer que eu seja como ele.
- ... – me estreitei para poder conseguir sentar ao lado dele. – Você jamais será como ele. – o garanti. – Ninguém é como ninguém, todo mundo tem uma originalidade dentro de si, mas às vezes, algumas pessoas não conseguem se mostrar quem são de verdade por medo. Acredite, eu sou um exemplo em pessoa.
- Você é... – começou dizendo ao olhar em meus olhos. – Você é diferente de todas as garotas que eu já convivi. E confesso que eu até tentei te encaixar no meio delas, te tornar igual. Mas foi inútil. Você... Você é tão linda e se quer sabe disso.
Eu não soube o que dizer. sempre foi objetivo, mas nunca tão sincero dessa forma. Alguma parte da minha mente gritava que aquele comentário era efeito do álcool, mas a outra parte e a que eu resolvi escutar, me dizia que poderia existir uma pequena chance dele gostar de mim da mesma forma que eu gostava dele. De repente ele soltou uma risada sem graça e cortou nosso contato visual.
- Sei lá... – começou dizendo. – Quem sabe eu vire um grande advogado como o meu pai gostaria, aceite a herança da minha avó sendo egoísta o suficiente para saber que seria errado. Ou então serei uma causa perdida. – deu um gole da sua bebida. – Em um dia eu acordo e sou apenas um garoto comum e entediado e no outro eu não faço a menor ideia do que é o certo e o errado. – ficou encarando a garrafa. – É tudo uma grande confusão. – sussurrou ao me olhar triste e meu coração se partiu em mil pedaços. – Eu queria poder te salvar dos seus medos, mas como dar um de herói quando eu não consigo me salvar dos meus?
- Você já me salvou. – declarei e eu vi seus olhos ficarem confusos enquanto minha mente pedia repetidamente para que ele acreditasse em mim. Segurei a mão dele com carinho. – Você sempre vê o lado bom das coisas, não importa o quanto seja difícil. Você viu algo bom em mim, mesmo quando eu já havia desistido.
- Por que você se culpava por algo que nunca foi sua culpa. É mais fácil enxergar isso com o tempo. Mas eu... Eu tenho uma decisão para tomar e independente da escolha, a responsabilidade será totalmente minha. – deu alguns acenos negativos para si mesmo. – Eu estou dividido entre duas opções e ambas irão me machucar.
- Então faz o que o seu coração está mandado.
Ele me olhou e piscou atônito.
- O meu coração está me mandando fazer algo, mas não tem nada a ver com essa situação.
- O que quer dizer? – perguntei aflita.
- Quero dizer que... – ele pausou. Em seguida apertou a minha mão com força a levando até seu peito me fazendo sentir as batidas aceleradas do seu coração. Exatamente como o meu. Sua mão livre segurou o meu rosto com delicadeza o puxando para perto do seu. Eu não sabia o que dizer, não sabia o que fazer. Era o efeito que ele que ele causava, em que tudo que eu pensei saber sobre mim tivesse sido modificado. Eu finalmente havia me apaixonado por alguém e aquele sentimento novo, de alguma forma, fazia eu me sentir completa novamente. Nossos lábios se tocaram delicadamente em um selinho simples, porém cheio de sentimentos inexplicável. Aquilo significou algo que eu não saberia nomear. No fundo, acho que essa deve ser a melhor parte, o frio na barriga de saber que seu coração pertence à outra pessoa. Segundos depois estava jogado aos meus pés, desacordado. Ele havia desmaiado.
- Feliz aniversario, !



Capítulo 9 - Thomas Carter!

Eu li em algum lugar que a grande maioria das pessoas querem ser amadas, mas possuem um medo grande amar. Bom, vão ter aquelas pessoas que terão coragem para se arriscarem mesmo com grande chance de ouvirem um não, mas ainda assim, acho que seria melhor do que ficar sentado esperando o destino trazer o amor da sua vida. Quem sou eu para dizer essas coisas não é? Passei a minha vida inteira no espreito, esperando que as pessoas não me notassem, nunca quis mais do que tive e mesmo assim tenho mais do que quero, ou tenho exatamente o que eu mereço ter. Uma mãe assassinada e um pai desparecido. Acho que aprendi a lidar com essa falta de esperança ou com o comodismo. Quero dizer, corro atrás dos meus objetivos, mas só daqueles que eu sei que terá sucesso ou que está se encaminhando para um. E foi exatamente por isso que liguei para Emma naquela manhã. Eu não conseguia parar de pensar no “quase beijo” que rolou e na possibilidade de também ter passado a noite em claro pensando em várias maneiras de me dizer como havia gostado, talvez tanto quanto eu. O barulho das pessoas quebrando ou desmontando alguma coisa lá fora fazia com que eu não escutasse bem o face time no meu quarto, então procurei um lugar mais silencioso e acabei entrando no escritório do pai do . Espero que o senhor não apareça agora.
- VOCÊS SE BEIJARAM?
A tão esperada reação de Emma. Rolei os olhos para me conter, por que no fundo eu gostaria de gritar com ela.
- Shiiii. – pedi. – Não foi exatamente um beijo, mas... – encolhi os ombros e sorri de orelha a orelha.
- Você fica tão linda e radiante quando está apaixonada. – ela disse. – Devia ver como seus olhos estão brilhando agora.
- Foi muito difícil perceber, mas é isso. – dei de ombros. – Estou apaixonada por , o garoto mais convencido e prepotente que eu já conheci.
- E também o mais gatinho. – ela completou e sorriu. – Vocês terão filhos lindo. Posso ser madrinha?
- Vamos com calma, por favor, uma coisa de cada vez.
- Isso, primeiro você precisa perder a virgindade. – rolei os olhos.
- Primeiro eu preciso saber se ele também gosta de mim.
- É... Isso também. – ela estava tão empolgada quanto eu.
Ia dizer mais alguma coisa quando a porta do escritório se abriu e eu corri para me esconder atrás da estante de livros. Respirei aliviada quando vi que era e Helena.
- Ainda estou esperando você me dizer aonde se meteu ontem à noite. – Helena o seguiu até a escrivaninha onde ficava o computador. se sentou e começou a pesquisar algo e parecia bem concentrado.
- Estava com a Brooklyn. – respondeu sem o menor interesse.
- Hmmmmm. – ela se sentou na mesinha em questão. – E o que vocês tinham para resolver mais importante do que saber de quem era o primeiro pedaço do bolo?
- Que seria para a vovó se ela estivesse presente na festa.
- E apenas por isso eu não me sinto ofendida. – ela sorriu. – Vamos, me conte. O que aconteceu entre vocês? – ela parecia curiosa, e eu também acabei ficando. Diga , o que aconteceu entre a gente? O que significou para você?
- Por que está tão empolgada para saber o que aconteceu entre nós? – ele a olhou ao franzir o cenho.
- Tenho esperanças de que da próxima vez em que voltarem para Ottawa ela já seja a sua namorada.
sorriu ao manear a cabeça negativamente.
- Não aconteceu nada de mais. – disse em fim ao se levantar. – E nada vai acontecer por que a Brooklyn é como uma irmã mais nova para mim.
- Uma irmã? – a voz de Helena era de surpresa. – Como consegue olhar para a Brooklyn e vê-la como uma irmã?
- Ué, eu não sei... – ficou de frente para ela e soltou um suspiro. –Ok, ela é linda e tudo mais, só que... Olha, a Brooklyn é complicada de mais, você não entenderia.
- Me explica. – Ela insistiu.
- A Brooklyn não é só essa garota meiga e engraçada que você conheceu. Ela tem... – ele se calou por um segundo. – Ela é problemática e muito fechada. Você não tem ideia do caos que ela tem na vida dela e acredite em mim, as coisas entre nós estão melhores assim.
Foi um frio que eu senti bem no meu peito. Não daqueles de nervosismos quando você espera ansiosamente por algo, mas daqueles em que você percebe que tudo que você queria não passava de uma mera ilusão. Acho que esse é o pior tipo de rejeição, quando você conhece um cara e se apaixona pelo caráter dele. A forma como ele te trata, te faz rir, e te faz parecer importante pra ele, torna tão fácil o jogo da sedução, por que ele não está sendo um idiota, então basicamente ele não vem com a aquele rótulo dizendo que devemos manter distancia, e não sabemos se vamos ou não nos apaixonar da mesma forma! Eu não sabia se amava , mas eu sabia que amava a forma como ele fazia me sentir bem comigo mesma, mas aparentemente somos apenas amigos e a rejeição é inevitável! Eu sentia como se algo estivesse esmagando o meu coração, e eu não sei se era por que tudo que ele havia dito eram verdades ou por estar o odiando naquele momento. havia ultrapassado todos os limites e eu não sei se o perdoaria.
- Vamos. – a abraçou pelo ombro. – Papai trocou a senha do e-mail. Não vamos conseguir nada aqui.
Assim que eles saíram eu percebi que tinha prendido a minha respiração. Escorei-me na instante tentando controlar a vontade de chorar que me acercou.
- Amiga... – Emma me chamou pelo celular e ao ouvir sua voz de pena eu quis xingar , gritar e dizer tudo que estava entalado aqui. – Você está bem?
- Nos falamos depois. – desliguei o celular e deixei que as lágrimas descessem de uma vez.





***




- Como à senhora está? – sentei-me na cama ao lado da vovó a olhando com carinho.
- Estou ótima. – sorriu para mim. – Estou muito contente por saber que estive aqui para comemorar mais um aniversario seu, mesmo que eu não pude ir à festa.
- Eu guardei um pedaço de bolo para a senhora. Pode comer se tomar todos os seus remédios.
- Então eu virei à criança mimada agora? – ela deu um sorriso fraco.
- E teimosa. – completei.
- Pelo o que eu soube é você quem está tendo problemas para aceitar o seu lugar de direito nesta família. – eu sabia que em algum momento eu sabia que ela tocaria nesse assunto. – Era o que seu avô sempre sonhou. A família tomando conta dos negócios.
- Mas a senhora sabe que não é isso que eu quero para mim. – ela novamente deu um sorriso fraco e meu coração se apertou com a sua falta de força.
- Então vá atrás dos seus sonhos. – aconselhou. – Viva a sua vida, mas nunca se esqueça de onde você vem e nem quem você é.
Guardei aquele conselho para mim e fiquei junto com ela até que adormecesse. Eu estava com uma ressaca muito forte e precisava tomar alguma coisa. Assim que passei no corredor vi que Helena vinha ao meu encontro.
- Vamos, me conte! – Helena disse.
- Contar o que? – entramos na cozinha. – Oi, pode me fazer um café? – pedi a empregada. Ela assentiu e se afastou.
- Me conte o que rolou entre você e a Charlotte. – sentou na bancada de frente para mim e pegou um pãozinho de mel que estava sobre a mesa.
- Só terminamos o que não conseguimos terminar da ultima vez em que nos falamos.
- Então acabou de vez? – ela arqueou a sobrancelha. – Você era tão apaixonado por ela. – observou.
- Sabe que eu acho que não. – confessei. – Acho que eu gostava dos momentos, as viagens que me faziam ficar longe dessa casa. Ontem quando eu a vi eu senti algo sim, mas não foi toda aquela paixão que eu pensei sentir. Eu sei lá. Eu senti saudades dela, mas não senti a falta dela. Se é que consegue me entender.
- Senhorita . – a camareira entrou na cozinha com um pacote de presente. – Deixaram isso para você. – entregou para Helena que me olhou confusa.
- Obrigada. – a agradeceu e esperou que ficássemos a sós para que abrisse. Fiquei curioso. – Será que confundiram o seu aniversario com o meu? – disse rindo e rasgando o pacote. Mas seu sorriso desapareceu quando ela viu o que tinha dentro do pacote.
- Isso é...
- É o vestido que a Brooklyn estava usando ontem à noite. – eu completei a frase dela.
- Tem um cartão. – ela puxou o papel do embrulho e começou a ler:


“Querida Helena!

Fico me perguntando com que frequência duas pessoas que acabam de se conhecer, podem se gostar em tão pouco tempo como eu gosto você. Obrigada pelos conselhos e pelos momentos incríveis. Espero que nos encontremos novamente, e até lá, eu espero de coração que aceite esse vestido como uma forma de desculpa por ter partido sem me despedir. Estarei torcendo para que sua avó melhore. Beijos e fica bem!”




- Ela... Ela foi embora? – Helena perguntou em um tom confuso e eu não esperei nenhum minutos a mais para ir até o quarto dela.
Busquei meu celular no bolso discando os números de Brooklyn, mas estava caindo diretamente na caixa postal. Assim que cheguei ao quarto que ela estava hospedada percebi que realmente não tinha mais nada dela ali, a não ser o cheiro inebriante do seu perfume. O que poderia ter acontecido?
- Tem certeza que não aconteceu nada ontem à noite? – Helena me perguntou procurando por algum rastro da Brooklyn ali.
- Não... Quero dizer, eu acho que não.
Ela se virou para mim.
- Como assim você “acha”? – franziu o cenho.
- Eu estava chateado com o papai e muito bêbado, a gente foi para casa na arvore e conversamos, mas eu não me lembro de mais nada, eu apaguei. – encolhi os ombros. – Literalmente. – passei a mão na cabeça bagunçando meus cabelos. – Será que eu disse algo que ela...
- Você precisa falar com ela. – disse andando até a porta do quarto. – Precisa mesmo falar com ela. – e saiu me deixando sozinho e muito atordoado.
O que será que poderia ter acontecido para que a Brooklyn fosse embora sem falar com ninguém? Nem mesmo comigo. Sentei-me na cama tentando me lembrar que alguma coisa, qualquer coisa que pudesse fazer aquela história ter sentindo, mas eu não me recordava de nada.






***





- Cheguei. – anunciei assim que passei pela porta, mas logo notei que não tinha ninguém ali a não ser o meu eco. Era muito estranho não ter alguém em casa em uma hora dessas. Joguei-me no sofá tentando relaxar um pouco e manter meus pensamentos distantes aos acontecimentos daquela manhã. Preciso tentar ter uma lembrança boa do Canadá e não deixar estragar isso. Enviei uma mensagem para Emma a avisando que eu havia chegado e ignorei todas as mensagens e ligações de . Depois me dirigi até o banheiro, decidida a ficar na banheira pelo resto do dia, se tivesse sorte, pelo resto da semana. Quando estava quase adormecendo naquela agua maravilhosamente aquecida meu celular começou a tocar, percebi que era Edward. A essa altura ele já deve saber o que aconteceu, e conhecendo o meu amigo, se eu não atendesse o telefone, ele estaria aqui em cinco minutos.
- Festinha no terraço do Hotel Ganservoot, você tem meia hora para estar aqui.
- Hmm. – murmurei ao enrolar a toalha no meu corpo. – Não era bem o que eu tinha em mente hoje.
- E o que você planejou? Ficar deitada na cama se lamentando o resto do dia e chorando a noite toda?
- Parece mais deprimente quando você diz em voz alta. – constatei. – Eu só pensei em dormir um pouco, sem a parte do chorar e tal.
- Deixa para você dormir quando morrer.
Suspirei.
- Ou você vem à festa, ou eu levo a festa até você.
E desligou.
Mas eu sabia que aquela ameaça era bem seria. Era melhor eu começar a me arrumar.
Andei até meu closet separando umas peças bem quentinhas e estava calçando minhas botas quando ouvi um barulho de conversa. John devia ter chegado. Puxei minha bolsa do criado mudo e andei em direção ao murmurinho.
- Eu ainda não consigo acreditar no que está me contando. – parei ao ouvir o tom de surpresa de Nana. – Você tem certeza disso?
- Ele confessou Nana, confessou tudo. – essa era a voz de John e ela parecia devastadora. Parei na entrada da sala encarando os dois e eles estavam tão perdidos no mudinho deles que não me notaram ali.
- E você pretende voltar para Aurburn Prison? – Nana perguntou.
Aurburn Prison? O que John tem para fazer em uma prisão?
- Primeiro preciso encontrar um jeito de contar a Brooklyn.
- Contar o que? – me manifestei e vi os dois darem um pulo de susto, John arregalou os olhos ao me ver e eu não entendi a reação deles.
- Você já che-gou? – gaguejou.
- Não mudem de assunto. – cruzei os braços e andei até eles. – O que você tem que me contar?
- Não é que... – John encarou Nana que virou o rosto para o outro lado e eu percebi que ela estava disfarçando algo.
- Que...? – arqueei a sobrancelha enquanto revezava o olhar entre eles.
- Você está com fome? Eu vou preparar alguma coisa para vocês comerem. – Nana se retirou rapidamente da sala e quase correu em direção a cozinha deixando John a sós comigo e pela expressão dele, ele não havia gostado dessa ideia.
- Estou esperando. – sentei no sofá o encarando.
Ele suspirou profundamente e se sentou ao meu lado.
- É que um amigo meu acabou fazendo uma besteira e está... Está preso.
Fiquei o olhando sem entender aquela conversa.
- E por que você precisa me contar isso? É alguém que eu conheça?
- Não, você não conhece. – disse um pouco eufórico. – Eu preciso falar com você por que... Por que você é amiga do , e o pai dele é um ótimo advogado.
Virei meu rosto para frente pensando na palavra “amiga” e no quanto ela não se encaixava mais na mesma frase que contenha o nome “ ”.
- Você acha que consegue o número dele?
- John, eu adoraria ajudar, mas a família do está passando por uma situação difícil, não acho que o pai dele poderá sair do Canadá nesse momento. – o olhei novamente. – Não pode ligar para o seu advogado?
- Ele... Ele está em uma conferencia em Washington, mas obrigado assim mesmo. – John parecia um pouco mais aliviado agora.
- Escuta, o me disse que o pai dele defendeu um caso para você há alguns anos quando esteve aqui. – me recordei de perguntar. – Você se lembra disso?
- Um caso... – ficou confuso. – Como o pai do se chama?
Só naquele momento eu havia parado para pensar que eu não sabia o nome do pai do .
- Hmmm...
- Ah sim. – ele pareceu se lembrar de algo. – Harold . – deu um sorriso curto. – Foi ele quem me ajudou a conseguir a sua guarda.
Fiquei surpresa em saber que o pai do tinha algo a ver com isso.
- Como a vida da voltas, não é? Quem diria que você e o filho dele iriam se tornar amigos. – piscou para mim e parecia mais relaxado do que quando iniciamos aquela conversa.
- Incrível. – dei um sorriso sem graça e me levantei. – Ed me convidou para uma festa no Ganservoot, não vou chegar tarde. – coloquei minha bolsa no meu ombro. – Avisa a Nana que não vou jantar em casa.
Andei até a porta me sentindo aliviada por não ter sido obrigada a dizer por que eu havia voltado mais cedo.







- Olha só quem chego-ou. – Ed cantarolou quando me viu entrar no terraço do Hotel Ganservoot.
- Recebi ameaças caso eu não viesse. – brinquei.
- Eu já estava pronto pra te buscar.
- Você sabe que eu acabei de chegar de viagem, não é?
- Sei! Canadá, gringo idiota, coração partido. Você precisa disso aqui. – abriu os braços a sua volta.
Tentei lhe dar um sorriso quando Emma chegou.
- Só achei que ia gostar de sair um pouco da sua zona de conforto e se divertir com os melhores amigos do mundo. – ele a abraçou pelo ombro
- Vem, tem um gatinho aqui que eu quero te apresentar. – Emma disse animada.
- Ah não.
- Ah simmmm. – Ela puxou a minha mão e me levou até o Open Bar– Brooklyn, esse é Thomas Carter, Thomas essa é...
- Brooklyn. – completou a frase de Emma e seu tom não disfarçou a sua surpresa.
O choque foi um pouco intenso por que eu jamais achei que veria Tom ali, justamente ali e com os meus amigos.
- Tom! – pisquei várias vezes ainda tentando assimilar aquela coincidência.
- Vocês já se conhecem? – Emma e Ed perguntaram juntos e pareciam confusos.
- Estudávamos juntos no Brooklyn. – respondi ainda muito confusa com o que estava acontecendo.
- Mais que isso. – ele abriu um sorriso simples. – Ela foi minha primeira namorada.
- Ownnnnt. – Ed suspirou ao meu lado. – São tão bonitinhas essas histórias de amor na infância.
- E de onde vocês se conhecem? – me virei para Emma tentando mudar o rumo daquela conversa.
- Bom, eu... – ela começou a dizer, mas Thomas a interrompeu.
- Eu fui selecionado para um curso de duas semanas na Trinity e o Christensen achou queria legal que eu viesse nessa festa para me enturmar com alguns alunos, e então ele me apresentou a Emma.
- Christensen... – fui ficando cada vez mais confusa.
- Eu faço estagio na empresa do pai dele.
- Só que...
- Esse jogo de pergunta e respostas está cansando a minha beleza, vem vamos dançar. – Ed puxou Emma pela mão. – Sinto que esses dois tem muito papo para botar em dia. – Ele me deu uma piscadela e depois arrastou Emmalyn a levando até o centro da pista. Thomas ficou encarando os dois por alguns segundos e depois voltou a me encarar.
- Eu não estou te seguindo, se é isso que está pensando. – disse em um tom brincalhão.
- Tudo bem. – sorri. – Eu não te culparia. A minha beleza é realmente algo inexplicável. – ele alargou o sorriso. – Não está vendo a fila de garotos disputando a minha atenção?
- Vejo que continua a mesma brincalhona e sarcástica de sempre. – nos sentamos na cadeira do bar.
- São as minhas únicas qualidades. – pedi uma Coca-Cola e ele me acompanhou.
– Isso não é verdade. Eu me lembro de nunca entender o que você falava, mas mesmo assim adorava cada som que saia da sua boca. – confessou. – Você me fazia parecer o garoto mais burro do mundo.
- E agora você vai fazer um curso na Trinity School, não é para qualquer pessoa.
- Eu tive uma ajuda em particular, mas confesso que achei que não fosse conseguir. Essa escola é muito exigente.
- Você não faz ideia. – sorri para ele começando a me sentir a vontade em sua presença.
- E então, eu posso saber como você entrou para esse mundo ou eu vou passar algum tipo de linha imaginária?
- Ganhei na loteria. – brinquei. Só que não era totalmente uma mentira.
- Entendi. – deu alguns acenos ainda sorrindo. – Você também sempre foi muito reservada.
- Desculpa... – fiquei sem jeito.
- Não, nada a ver. É bom saber que algumas coisas não mudaram. – deu um gole em sua bebida sem tirar os olhos de mim. Meu celular tocou e era .
- Namorado? – ele perguntou visivelmente curioso.
Apenas fiquei encarando meu celular vibrar enquanto a foto do com aquele sorriso aprecia na tela. Recusei a chamada e suspirei ao olhar para Thomas e dar um sorriso sem graça.
- Nem de longe.
Mudamos de assunto e dessa vez falamos sobre as coisas que aconteceram com ele desde que fui embora, e diferente de mim, ele estava bem confortável para me contar. Descobri que ele é muito bom com números e depois de passar em vários concursos acabou chamando atenção do Sean Jensen, um empresário do ramo econômico. Trabalha para ele desde então e foi ideia do próprio Sean que Thomas fizesse o curso que a Trinity estaria disponibilizando para alunos de outras escolas. Ele irá ficar por duas semanas e estudará na parte da manhã e depois ir para o estágio na parte da tarde. Ele foi muito aberto sobre a questão “família”, me disse que sua irmã estava com doze anos e que sua mãe fazia muito hora extra para poder sustentar a casa. A vida deles estava muito difícil desde que seu pai morrera e que ele precisava desse emprego para poder ajudar em casa. Uma parte de mim entendia totalmente pelo o que ele estava passando e a outra estava feliz em saber que ele estava lutando para ajudar sua irmã e sua mãe, mais feliz ainda em saber que ele não optou por fugir quando as coisas ficaram difíceis. Assim como meu pai fez.










Apertei meu cachecol em meu pescoço assim que passei pelos portões da Trinity tomando cuidado para não esbarrar em alguma pessoa indesejada, logo avistei Ed e Emma perto da fonte e apressei meu passo até eles.
- Eu adoro esses enfeites natalinos. – ouvi Ed tagarelar. – É tão alto astral, good vibe. – mexia em um bonequinho de neve que enfeitava uma mini arvore de natal.
- Falando em natal, vocês irão viajar? – Emma nos olhou.
- Vou para a casa da vovó, como sempre. – Ed a respondeu.
- Provavelmente vou para casa da tia Ivana.
- Deve ser horrível ir para Miami nessa época do ano, sem poder ir as praias ver os gatos surfando...
- Sabe que essa viajem não veio em uma hora melhor? – observei. – Estou mesmo precisando ficar um pouco longe. Esfriar a cabeça.
- Mas até lá, você precisa encontrar outro jeito de ignorar o gringo. – Emma me lembrou.
- Eu não preciso ignorá-lo. Querem saber, isso é coisa de criança. Quando eu o vir, eu vou dizer tudo que está entalado desde ontem.
- É mesmo? – Ed cruzou os braços parecendo duvidar das minhas palavras.
- É. – disse convicta.
- E o que você irá dizer para ele?
- Eu vou olhar bem nos olhos dele e dizer que ele é a pessoa mais babaca que eu já conheci na minha vida.
Ed deu uma risadinha de provocação.
- Então ai está a sua chance.
Apontou para o corredor no exatamente momento em que passava.
Nossos olhares se cruzaram no mesmo instante e eu senti aquelas malditas borboletas no meu estômago. E só quando eu notei que ele vinha em minha direção é que eu demonstrei alguma reação.
- Eu preciso ir ao banheiro.
Sai andando rapidamente sabendo que Ed e Emma me seguiam sem conseguir esconder um riso.
- Eu quase acreditei nessa nova versão corajosa e determinada. – Emma disse.
- Você precisava ver a sua cara quando olhou para ele – Ed riu. – Acho melhor checar as suas calças.
- Que bom que me acham engraçada. – depositei minha mão na cintura ao me virar para eles. – Não quero ninguém triste com os meus problemas.
- Nós sabemos que o que ele fez foi errado, mas ele foi muito legal com você desde que chegou, eu acho que vocês precisam conversar. – Emma me aconselhou.
- Quem morreu?– Elijah perguntou ao se aproximar junto com o Josh.
- Pelo visto foram os bons modos. – Emma disse seca e ajeitou sua bolsa.
- Aproveitando o seu bom humor, eu gostaria de saber se você quer sair comigo qualquer dia desses – Ele se escorou no batente da porta e sorriu para ela.
- E o que te faz pensar que eu sairia com você? – ela rebateu.
- Se você não aceitar eu vou ter que começar a sair com as garotas que gostam de mim.
- Se puder encontrar uma. – ela piscou para ele e ao som de deboche de Ed e Josh, nós caminhamos em direção à sala.
- Desde quando esses dois se falam? – sussurrei para Josh.
- Depois de explico. É uma longa e engraçada história.






Por mais que eu tentasse, eu não conseguia prestar atenção na aula de literatura. Era uma fadiga não conseguir tirar as palavras de da minha cabeça. Ele me achava problemática? Minha vida era um caos? Algo ali não fazia sentido, se alguém tivesse me dito eu não teria acreditado, por que ele me fez acreditar que ele realmente fosse um tipo de garoto diferente, mas ontem eu percebi o quanto fui tola em achar que podem existir príncipes encantados, todos eles vem com defeito de fábrica e uma hora ou outra irão aparecer. De repente a secretária da escola entrou na sala, andou até a senhora Hill e a entregou um papel e saiu. A professora franziu o cenho ao lê-lo e depois olhou em minha direção.
- Senhorita Bennette, o diretor Steel está a chamando na sala dele.
A atenção de todos era minha naquele momento e eu não conseguia imaginar um motivo se quer para ter sido chamada na sala do diretor depois de dois anos sem sequer ser chamada a atenção. Levantei me sentindo constrangida, sabendo que eu estava sendo seguida pelos olhares curiosos, decidi não olhar para a senhora Hill e sai de uma vez daquela sala. Durante o trajeto no caminho eu vi andando em minha direção, e eu não soube o que fazer. Corria? Dava meia volta? Eu já estava quase em frente à sala do diretor, então essa não era uma opção. Pelo o jeito que ele me olhava dava para notar a determinação dele em falar comigo. Prendi a respiração quando nos aproximamos.
- Brooklyn...
Ele disse meu nome, mas foi interrompido pela coordenadora Murphy que estava toda sorridente naquele dia.
- Vocês estão ai, vamos, entrem! O diretor está esperando por vocês dois.
Franzi o cenho no mesmo instante. O que o diretor teria para falar que envolvesse e eu?
- Aconteceu alguma coisa? – a perguntou enquanto entravamos na secretaria.
- Vocês já irão descobrir. – ela piscou para nós depois e depois nos anunciou para o diretor Steel, ela nos deu espaço e entramos na sala dele. Ele nos indicou as cadeiras em frente a sua mesa e nós nos sentamos.
- Bem, devem estar se perguntando por que foram chamados aqui e não se preocupem, eu tenho ótimas noticias. – ele se levantou. – Primeiro, eu gostaria de entregar o premio que vocês ganharam ao trabalharem em dupla na oficina de fotografia. Realmente foi um ótimo trabalho, e já está no site da escola. – ele pegou duas caixas que continham as câmeras Nikon que o técnico disse que ganharíamos, e nos entregou. – Fiquei impressionado com o trabalho de vocês e em como foram elogiados pelo técnico. Senhor o senhor fez uma ótima escolha em fazer amizade com a senhorita Bennette, nossa melhor aluna.
Encolhi-me na cadeira sentindo os olhos de em mim e eu sabia que ele sorria.
- Agora, eu gostaria de falar com a senhorita Bennette a sós.
me deu uma última olhada antes de sair e eu agradeci mentalmente ao diretor por ter feito sair antes de mim.
- Está tudo bem senhor Steel?
- É claro que está, por que não estaria? – ele se sentou novamente e sorriu. – Eu gostaria de saber se a senhorita já está pensando no que irá fazer quando os estudos na Trinity acabarem.
- É... Já. – respondi. – Inclusive eu entrei em contato com alguns professores que dão aula na Morgan State, e...
- Morgan State? – ele perguntou e parecia um pouco chocado.
- Sim senhor. – consenti.
- Bem, eu estou surpreso por que... A senhorita Hill me disse que Harvard quer muito você.
O olhei confusa.
- Nós recebemos um e-mail pessoal da reitora Drew Gilpin Faust, ela ficou impressionada com as suas notas, seu comportamento desde que estuda em nossa escola, nas suas atividades extracurriculares. Não me leve a mal, Morgan State é uma ótima universidade, mas nesta escola nós preparamos os alunos para as melhores faculdades e Harvard está estre elas.
- Senhor Steel, a Morgan State é uma escolha pessoal. Eu admiro Harvard e eu sei que existem muito outros alunos nesta escola tão bons quantos eu que poderão preencher a vaga que eles querem.
Ele ficou me encarando em silencio, como se não estivesse acreditando que eu estava trocando Harvard por Morgan State.
- A senhoria parece decidida, mas... – ele puxou um panfleto da gaveta e me entregou. Era um guia de Harvard. – De uma boa olhada e pense no que será melhor para você e o seu futuro. Pesquise sobre a universidade, fique por dentro do que acontece por lá. E depois você poderá ter uma opinião decidida sobre isso.
Peguei o panfleto e fiquei o encarando até ouvir a voz dele novamente.
- Está dispensada.
Levantei-me no mesmo instante puxando a câmera para os meus braços e saindo completamente confusa com aquela história. Dei mais uma olhada no panfleto quando senti uma mão me puxar para dentro do laboratório. Era .
Ele trancou a porta e depois ficou de frente para mim, me olhando sem piscar.
- Você não vai me dizer o que está acontecendo?
- Não está acontecendo nada. – dei de ombros ao comprimir os lábios.
- Por que você foi embora sem me falar? Eu... Eu fiz algo que você não gostou?
Rolei os olhos.
- Por favor, não finja que se importa. – virei para poder sair, mas estendeu seu braço me impedindo de passar.
- Eu não estou te entendendo. – me analisou.
- Você não está me entendendo por que eu não sou só uma garota meiga e engraçada, mas também sou fechada, problemática de mais e a minha vida é um caos. – falei de uma vez e eu vi os olhos deles ficarem confusos, até que ele pareceu se dar conta do que eu estava falando. Ele fechou os olhos por alguns segundos e depois voltou abri-los.
- Você ouviu. – concluiu.
- É eu ouvi. E a parti de agora você não precisa fingir que somos amigos, eu não preciso da sua pena.
- Brooklyn, não...
- Eu não quero escutar . – tirei o braço dele e abri a porta. – Tudo que eu tinha para escutar você já disse.
Caminhei rapidamente até a biblioteca e fiquei por lá tentando me acalmar e pensando em todas as coisas que eu queria ter dito para , mas não consegui.







- Harvard? – ouvi a voz da Emma e eu fechei o panfleto rapidamente. – Que foi? Até parece que foi pega com uma revista da playboy.
- Conhecendo o amor da Brooklyn por Morgan State, é quase a mesma coisa. – Ed apareceu de algum lugar e eu rolei os olhos.
- Não, é que... Massachusetts é bem legal. – endireite-me na cadeira.
- Pode ser, mas eu ainda não sairia de Nova York. – Ed se sentou ao meu lado e tomou o panfleto das minhas mãos. – É só uma universidade Brooklyn. – ele me encarou. – Você não deveria se sentir pressionada por isso.
- Não é só uma universidade, é uma das melhores do mundo e eles me querem. – revezei o olhar entre os dois.
- O que eu quero dizer, é que... Independente da universidade que escolher, você vai ser a melhor, por que é isso que você faz. Você é tipo aquelas crianças dotadas que pulam de série e terminam o ano escolar com quatorze anos de idade. E com dezoito já está com dois diplomas.
Não segurei um riso.
- Ele tem razão. – Emma me puxou pela mão me fazendo levantar. – Mas eu sei que não é por isso que você está com essa carinha. – observou enquanto saíamos da biblioteca.
- É o , eu falei com ele.
- E ai? – Ed perguntou em expectativa. – Fez ele chorar?
- Não, mas... Mas depois de hoje a nossa amizade acabou.
- Você tem certeza?
- Tenho. – concordei. – Vai ser melhor.
- Sabe que eu concordo. – Ouvimos uma voz diferente e olhamos para trás vendo April vindo em nossa direção. - Eu deveria imaginar que essa cara de sonsa que você tem era só uma fachada. – ela me olhou de cima a baixo. – sempre me disse que vocês eram apenas amigos e eu, boba, acreditei.
- Aonde você quer chegar com essa conversa? – perguntei sem o menor interesse em saber.
- Desde quando você e estão saindo? - Soltei uma risada incrédula não resistindo em rolar os olhos. - Qual é o seu problema? Algum tipo de fantasia com caras compromissados?
- Minha linda, se você não percebeu é o seu namorado quem fica atrás da Brooklyn por ai o tempo todo. – Ed disse com deboche. – É só prestar um pouco mais de atenção nas coisas que acontecem a sua volta.
- Não sabia que precisava de amiguinhos pra te defender.
- Defender de que? Do seu desespero? Não me admira que o queira algum tempo para ficar longe de você.
- Isso é ridículo, eu nem sei por que ainda perco meu tempo tirando alguma satisfação. É óbvio que o não tem interesse em você. Você é a pessoa mais insignificante que eu já conheci. – Ela cruzou os braços ao se aproximar de mim. Emma deu um passo na direção dela, mas eu a impedi.
- Tudo bem Emma. – olhei para April em seguida. – Deve ser muito difícil aceitar que uma pessoa insignificante como eu tenha mais a atenção do seu namorado do que você, não é? – arquei a sobrancelha – É impressionante como você transpira insegurança. - lhe dei as costas ouvindo os passos de Ed e Emma vindo atrás de mim.
- Girls, é serio. Se um dia essa garota for atropelada tomara que seja eu dirigindo o carro. – Ed comentou e eu ouvi Emma sorrir.
- Você está bem? – Emmalyn perguntou quando chegamos ao meu armário.
- Estou ótima. – dei um suspiro rápido e levantei os ombros.
- Eu tenho aula de álgebra agora, e vocês?
- Jornalismo. – Ed respondeu. – Vamos? – se virou para mim.
- Podem indo, eu preciso guardar alguns livros.
- Está bem.
Eles saíram e quando eu notei que estava sozinha no corredor me deixei desabar um pouco. Era muito difícil fazer parecer que eu era forte o tempo todo quando por dentro estava tudo um caos. Eu estava machucada e não fazia ideia se iria curar.





***






Estava indo em direção ao banheiro quando vi Brooklyn parada em frente ao seu armário. Ela estava cabisbaixa e parecia triste. É claro que ela estava triste, e por minha culpa. Olhei a minha volta vendo que só estavam nós dois ali e ela não poderia fugir de mim dessa vez. Caminhei em seu encontro.
- Precisamos conversar. – ela não demonstrou emoção alguma ao notar minha presença. Apenas continuou a guardar seus livros como se eu não estivesse ali. Depois fechou seu armário e andou em direção oposta a minha. Passei a mão pelo cabelo tentando conter minha raiva e a segui puxando seu braço.
- Você precisa me escutar.
Ela olhou para a minha mão e depois subiu seus olhos escuros como a noite em minha direção.
- Eu já ouvi tudo que tinha para ouvir. – seu tom era de mágoa, eu saberia mesmo se ela tentasse disfarçar.
- Você me entendeu mal, eu não quis dizer...
- ... – ela soltou a mão da minha e eu senti a sua rejeição ao meu toque. – Eu me apaixonei por você.
Meus olhos se arregalaram ao ouvir aquelas palavras. Eu não estava esperando que ela dissesse isso, se quer imaginei que Brooklyn tivesse sentimentos desse tipo por alguém.
- É, Eu estou apaixonada por você. E não é só pelo teu sorriso prepotente ou pela sua teimosia em me fazer enxergar as coisas que eu me recusava ver. Eu pensei que... – ela pausou quando percebeu que eu estava sem reação, mas continuou quando eu não disse nada. – Quero dizer, você fez as coisas ficarem tão simples. Sempre esteve do meu lado, me mostrando o lado bom da vida, como se fosse fácil existir, como se fosse fácil confiar em alguém. – seus olhos estavam molhados e eu ainda não conseguia dizer nada. – Eu estava bem aqui, tão perdida e tão fora de mim, intocável e impenetrável. Você chegou e derrubou todas as paredes que eu construí a minha volta, você mostrou um lado meu que eu não via há muito tempo e por um período você quase me fez acreditar que poderia sentir o mesmo por mim. – ela fungou ao limpar o rosto e depois voltou a me encarar. Meu coração parecia querer sair do peito. – Quando disse todas aquelas coisas sobre mim, você fez com que me sentisse tão pequena e inferior e isso foi tão opressor da sua parte.
- Brooklyn... – sussurrei em um suplico ao andar em sua direção, mas ao notar meu movimento ela deu um passo para trás mostrando que queria distancia. Parei no mesmo instante a encarando e sentindo o peso das suas palavras.
- Você não conseguiu perceber a infinidades de coisas que estavam estampadas na sua frente. E o que eu sinto por você era uma delas. Você deveria ter notado. – ela abraçou seu corpo e olhou para os seus pés ajeitando um fio de cabelo. - Mas agora é tarde, assim como é para todas as coisas que você deveria ter feito e não fez. – suspirou ao me olhar. – Eu queria que isso tivesse se tornado algo, mas eu mereço coisa melhor.
Ela me deu um olhar frio e sem emoção, logo depois me deu as costas e por uma fração de segundos eu permaneci ali, paralisado, com a garganta entalada de palavras a serem ditas para alguém que não queria escutá-las.






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I’m Junkie

Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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