Capítulo Único
sorriu ao ver a garota sentada no banco de madeira velho. Por algum motivo que ele desconhecia, aquele era o seu favorito, apesar de haver outros em melhores condições espalhados pelo parque. Caminhou lentamente até , tentando surpreendê-la.
— Oi, . — Ela sorriu de canto, como sempre fazia com a sua chegada.
— Como você faz isso?! — perguntou indignado, ocupando o lugar ao lado dela.
— Eu conheço os seus passos — a moça explicou com simplicidade, rindo um pouco.
— Ainda te pegarei de surpresa.
— Boa sorte com isso. — Riu.
— Como foi o seu dia? — o rapaz questionou.
abriu um sorriso. era uma das poucas pessoas que tinha um tom realmente interessado ao conversar com ela. Não por dó, nem para matar o tempo, ele simplesmente queria saber. Com o passar dos anos sem poder ler as expressões faciais, havia ficado mais fácil identificar essas sutilezas ao conversar com as pessoas.
— Foi legal. E o seu?
— Estou quase enlouquecendo naquele lugar. — Suspirou. — Servir as pessoas é mais estressante do que parece. Todas querem algum detalhe diferente que acham que eu deveria ter a obrigação de saber.
— Como o quê? — perguntou curiosa. Adorava ouvir as histórias sobre os clientes malucos que ele atendia, e contá-las era a melhor parte do dia do garoto. Todos os dias torcia para que algo minimamente interessante acontecesse para que pudesse contar a ela no parque.
trabalhava num restaurante não muito longe dali. Era garçom. Todo dia, ao fim do seu turno, passava pelo parque; costumava dizer que o contato com a natureza o mantinha são, e era verdade. Até o dia que conheceu , sentada naquele mesmo banco, no mesmo horário de sempre. Desde aquele momento, não conseguiu parar de pensar na garota e voltava todos os dias para conversar. Era incrível como sempre havia assunto entre os dois.
— Hoje duas senhoras apareceram lá. Não deveriam ter mais que cinquenta anos, mas usavam uma quantidade tão absurda de maquiagem que até levei um susto, , sério. — Pausou ao vê-la rir. — A combinação de roupas também não era muito melhor, não achei que fosse possível usar tantas estampas de uma vez só!
— E o que aconteceu?
— A parte mais estranha está chegando, tenha paciência.
— O visual dela não é a pior parte?
— Não! — Ele riu. — Olha só, eu fui indicar a mesa que deveriam se sentar, como eu sou pago para fazer, afinal. E elas disseram que não queriam sentar, preferiam comer em pé. O que é muito estranho, certo?
A outra concordou, rindo.
— Então, uma delas me disse que a amiga da aula de ginástica delas aprendeu num spa sueco que comer em pé não engorda.
— O quê? Que tipo de maluquice é essa?
— Exato! Supostamente, o Gustaf, que descobri ser o melhor massagista do spa, disse que desse jeito a comida passa direto pelo sistema digestivo. Assim, mata a fome, mas não engorda.
— E o que você fez?
— Eu arranjei um lugar para elas comerem. Pensei em pedir permissão para o senhor Kim, mas você sabe o que ele responde nessas situações…
— O cliente tem sempre razão! — disseram em uníssono, rindo em seguida.
— E aí elas comerem em pé mesmo?
— Sim. — Deu de ombros. — Quer dizer, o que eu poderia fazer?
— Você estava certo, — assentiu, sorrindo.
— Pela quantidade absurda de comida que elas pediram, não há dica nenhuma do Gustaf que possa ajudá-las.
— Aconteceu mais alguma coisa hoje? — perguntou, ansiosa.
— Você quer algo melhor do que isso? — fingiu indignação. — Eu não posso contar todas as histórias de uma vez, — comentou, tocando a ponta do nariz dela, a fazendo sorrir ainda mais. — Sou um cara completamente entediante sem elas.
— Discordo.
— Você já ficou sem histórias alguma vez? — perguntou, empurrando o ombro dela levemente com o seu.
— Não, realmente. — Pausou. — Mas você é muito mais que um bando de histórias idiotas.
— Devo me ofender ou me sentir lisonjeado? — questionou, genuinamente confuso.
Ela riu.
— Lisonjeado. Eu não me importo se você chegar aqui sem histórias.
— Tem certeza? Porque eu inventei a maioria delas.
— ! — choramingou, como se sua vida fosse uma mentira.
— Estou brincando! — Riu, abraçando-a. — Infelizmente, todas as pessoas da história realmente existem e fazem todas as coisas bizarras que eu tenho que aturar.
A menina sorriu.
— Obrigada… por se preocupar com isso. Eu sei que você se esforça para ter boas histórias.
— Não precisa agradecer. — Retribuiu o sorriso, só então percebendo que a ainda a abraçava, se afastando delicadamente.
Após alguns minutos de silêncio, notou as mãos da amiga inquietas e arqueou a sobrancelha, preocupado, já que aquele não era um comportamento normal.
— Está tudo bem, ?
Ela ficou em silêncio por alguns segundos, hesitante.
— ?
— Eu quero perguntar algo, mas não sei se você tem paciência ou disposição para responder minhas perguntas bobas.
O rapaz riu, fazendo o coração dela pular uma batida, congelando por um milésimo de segundo.
— Nada vindo de você pode ser bobo, . Nós somos amigos. Me pergunte o que quiser e responderei do melhor jeito que eu puder, tudo bem?
A moça mordeu o lábio, ainda considerando se deveria mesmo fazer a pergunta que estava em sua cabeça há dias. Na verdade, há anos, mas nunca havia se sentido confortável o suficiente para perguntar isso a alguém.
— Você consegue me explicar como são as cores? — Ele arqueou a sobrancelha, confuso.
— Eu acho que não, . Nunca tentei, pelo menos.
— Já sei a explicação técnica, sobre a percepção visual ou qualquer coisa assim. — Sorriu. — Pense um pouco e me diga o que acha.
Ele mordeu a bochecha internamente, olhando em volta. Algumas crianças e seus pais estavam à alguns metros, nos grandes brinquedos coloridos. A pequena missão que a garota havia lhe dado parecia quase impossível. Ele nunca havia pensado sobre como fazer algo assim. Ponderou uma ideia que surgiu e deu de ombros.
— Normalmente explicamos cores com objetos que são daquela cor, o que não faz muito sentido — apontou.
Ela riu, concordando.
— Nenhum sentido.
— Então talvez possamos usar algum sentimento? — sugeriu.
— Continue.
olhou em volta novamente, tentando decidir por onde começar.
— Amarelo é a cor do sol — explicou. — Então é alegre e otimista, eu acho.
— Você disse que não ia fazer comparações — observou, rindo da contradição.
— Eu estou contando, não comparando, ! — justificou, empurrando-a pelos ombros levemente. — Continuando… azul é a cor da tranquilidade. Da liberdade também, acredito. Não sei exatamente por que dizem isso, mas é verdade. Talvez por causa do céu? Ou do mar?
— Você gosta do céu?
— Sim. — Sorriu. — Quer dizer, o que tem para não gostar? Ele é grande e azul. De certa forma, me faz perceber que não somos tão grandes ou importantes como achamos.
— Eu entendo. — Abriu um sorriso de canto.
O garoto mordeu o lábio, antes de segurar a mão dela entre as suas com cuidado. sentiu suas bochechas queimarem com o contato inesperado.
— Laranja é quase como amarelo — continuou, fingindo não notar o constrangimento da garota. — É bem alegre. Me lembra amizade também; não sei, coisas boas?
— Parece uma cor legal. — murmurou.
— Ela é bem simpática. — deu de ombros, mas riu ao ouvi-la bufar ao seu lado.
— Idiota.
— Eu estou brincando. Gosto de laranja também, mas a minha favorita provavelmente é verde.
— O que mais? — questionou, ansiosa.
— Deixe-me ver… — Pensou, usando os dedos para listar as cores lentamente. — Azul, amarelo, laranja… ah, sim, o básico. Branco é a cor da paz, pureza e esse tipo de coisa. — explicou. — Preto é bastante ligado morte e luto. É um pouco medonho, na minha opinião. Quase todos os sentimentos ruins seriam relacionados com o preto, eu acho.
— Parece triste.
— Quando é combinado com outras cores, principalmente em roupas, não é tão ruim quanto parece. É a preferida muitas pessoas, sabia?
— Você ainda não me falou sobre vermelho — pediu, apertando a mão dele. — Muitas pessoas já me disseram que gostam de vermelho.
— Ah, sim, claro! — Riu. — É uma cor muito intensa, então representa sentimentos muito intensos também. Tem os bons e o ruins, o que quer ouvir primeiro?
— Os ruins — respondeu prontamente. Ela tinha uma teoria de que sempre deveria lidar com as coisas ruins primeiro.
— Raiva, principalmente — murmurou. — Perigo também.
— Eu achei que teria mais.
— É a cor do amor — contou, se inclinando para ficar mais próximo, como se estivesse compartilhando um segredo. — É a cor das suas bochechas também, nesse momento.
Ela riu, envergonhada, o que fez o tom intensificar.
— Alguma outra cor que eu devesse saber? — perguntou, tentando mudar de assunto.
— Por último, mas não menos importante, temos verde! — disse empolgado. — É a cor da vida. Por causa da natureza e coisas assim. E da sorte. — Pausou. — E esperança, se eu não me engano. — Sorriu abertamente. — Acho que é isso. Um intensivo sobre cores para a senhorita.
Ele tocou na ponta do nariz dela, fazendo-a rir.
— Obrigada — agradeceu, surpreendendo-o. — Ninguém nunca se importou o bastante para me explicar esse tipo de coisa.
— Não por isso. — Apertou a mão dela novamente. — Quando precisar de mais explicações geniais é só pedir, .
— Eu gosto da sua voz — confessou, timidamente. — É o único motivo para eu deixá-lo sentar aqui comigo todo dia, na verdade.
— Minha personalidade maravilhosa não tem nada a ver com isso? — perguntou, fingindo estar ofendido.
Ela riu.
— Estou falando sério, . Sua voz é diferente, não sei explicar. Acho… — interrompeu o pensamento.
— O quê?
— Posso fazer outra pergunta?
— Envolve explicações muito longas? Não sei, como a origem do universo?
A moça riu novamente, discordando.
— Por que faz isso? — indagou baixo, como se estivesse assustada demais com a resposta.
— Seja mais específica, ainda não sei ler pensamentos… — cantarolou, tocando a testa dela com seu dedo indicador.
— Por que senta aqui e conversa comigo todo dia?
— Porque eu gosto de você, talvez? — Arqueou uma sobrancelha, confuso.
— Quero dizer, você não tem nada melhor para fazer além de conversar com uma menina cega?
— Sabe, às vezes acho que não percebe a pessoa maravilhosa que é — falou, se ajeitando de modo que ficasse de frente para ela. Teve vontade de colocar as mãos nos ombros dela, mas não o fez. — , você é muito mais que uma “deficiência”.
O tom da voz do garoto indicava que ele não acreditava naquela palavra. Não do jeito como as outras pessoas encaravam, um problema maior do que realmente era, pelo menos.
— Você só precisava se adaptar mais do que os outros a algumas situações. E daí? Isso te faz muito mais inteligente e especial. Mais forte.
Ela podia sentir a felicidade invadir seu peito ao ouvir aquelas palavras. Finalmente tinha a certeza que ele a percebia como era, e isso era o melhor presente que alguém podia lhe dar.
— Eu sempre quis saber como você é — confessou, envergonhada.
— Você sabe como eu sou. — Pelo seu tom, sabia que se divertia com a frase inesperada.
A garota riu baixo, concordando. Às vezes eu não conseguia entender o que estava bem em sua frente, não importava o quão específica ela fosse.
— Estou me referindo a sua aparência, — murmurou, com um sutil sorriso nos lábios.
— Bem, dizem que tenho olhos de filhote. Pequenos e fofos, é o que sempre escuto. E já elogiaram meu sorriso duas ou três vezes. — Deu de ombros.
— Posso… — ela interrompeu o questionamento, com a mão direita levantada, hesitante.
— Você quer me tocar? — Sorriu torto, segurando-a pelo pulso delicadamente.
A menina concordou e ele guiou as duas mãos pequenas para seu rosto, tentando ficar o mais quieto possível. Com cuidado, ela começou a tocar o rosto do rapaz pelas bochechas, afagando levemente antes de seguir para os olhos, parando ao sentir algo gelado contra seus dedos.
— Nunca me contou que usa óculos — sussurrou.
— Ah… — Riu baixo, antes de tirar a armação. — Não preciso, na verdade. Só gosto.
Em silêncio, passou os dedos finos por sua testa e desceu cuidadosamente para o nariz, sentindo-o o máximo que podia. tentava se manter o mais imóvel possível, mordendo o lábio para segurar o riso. Por fim, ela tocou os lábios do rapaz, sorrindo ao sentir o leve sorriso dele contra as pontas de seus dedos, o que fez o dele aumentar consideravelmente.
— Eu gosto de sentir o seu sorriso — contou-o.
— Mas nada se compara ao seu, .
Com cuidado, ela segurou o rosto do rapaz entre suas mãos e parou por um momento, como se o estivesse analisando. O garoto arqueou uma sobrancelha e, antes que percebesse o que fazia, segurou a mão direita da moça, acariciando levemente e levando-a até seus lábios, beijando os dedos um a um, vagarosamente, antes de depositar um beijo mais demorado na palma da sua mão, sorrindo ao perceber as bochechas dela assumirem um tom corado forte.
— Você me deixa sem graça, — ela anunciou.
— Adoro ouvi-la pronunciar meu nome — cochichou ele. — Parece tão mais especial vindo de você.
Ela riu, incrédula.
— Não seja bobo.
— Estou falando sério. — Só então ele se deu conta de como estavam próximos e que a mão dela ainda estava em seu rosto.
Num impulso, acabou com a distância entre os dois, pressionando seus lábios contra os dela. Porém, se afastou ao tomar total consciência do que fazia. parecia surpresa quando levou uma das mãos aos lábios.
— Sinto muito! — se apressou, preocupado. — Eu não sei o que deu em mim, .
— O que… Eu… — Pausou, tentando formar um pensamento coerente.
— Eu estraguei tudo. Sinto muito. — Suspirou, derrotado.
— Você… me beijou? — perguntou com cuidado.
— Sim… Eu não quis… sinto muito — repetiu, envergonhado.
— Acho que você finalmente conseguiu me surpreender, . — Ela riu baixo.
Ele arregalou os olhos, estupefato com a reação dela.
— Você não está brava?
— Por que estaria?
Ele ficou em silêncio, sem saber o que responder. A reação de não fazia total sentido, mas ele não sabia como agir com aquela resposta. Ela não estava brava porque eram amigos e estava tudo bem? Ou gostava dele também? Como sempre, desejava poder saber o que ela pensava, tornaria tudo tão fácil. Talvez o significado do silêncio era que deveria ir embora.
A garota sabia que deveria dizer algo a mais. Queria dizer tantas coisas ao mesmo tempo que não sabia por onde começar. a havia beijado. Isso mudava tudo, certo? Esperava que sim. Era tudo que ela mais desejava todas as tardes que passavam juntos. Tentou organizar seus pensamentos por vários minutos, frustrada por não conseguir algo bom o suficiente.
— Eu te ouvi cantando uma vez — finalmente admitiu, quando ele estava prestes a levantar. De certa forma, sentia como se tivesse invadido a privacidade do rapaz.
— O quê? — questionou, confuso com a súbita mudança de assunto.
— Você estava passando por aqui, provavelmente ouvindo música e cantou. Eu adorei a sua voz, mas achei que nunca teria uma oportunidade para falar com você. — Encolheu os ombros. — Eu não pude acreditar quando sentou aqui e começou a conversar comigo.
— Sério? — Ela podia perceber o sorriso apenas por sua voz.
— Digamos que foi um fator de peso para eu me apaixonar por você — confessou.
— O quê?! Apaixonar? Eu… não acredito nisso.
Ela sorriu, envergonhada.
— Bem, se eu tivesse que usar uma cor definir como me sinto perto de você, provavelmente seria vermelho. — Pausou por alguns segundos e riu. — Quero dizer, os sentimentos bons.
riu e entrelaçou seus dedos aos da garota, levantando a mão dela e beijando as costas.
— Eu também, . Definitivamente vermelho.
— Oi, . — Ela sorriu de canto, como sempre fazia com a sua chegada.
— Como você faz isso?! — perguntou indignado, ocupando o lugar ao lado dela.
— Eu conheço os seus passos — a moça explicou com simplicidade, rindo um pouco.
— Ainda te pegarei de surpresa.
— Boa sorte com isso. — Riu.
— Como foi o seu dia? — o rapaz questionou.
abriu um sorriso. era uma das poucas pessoas que tinha um tom realmente interessado ao conversar com ela. Não por dó, nem para matar o tempo, ele simplesmente queria saber. Com o passar dos anos sem poder ler as expressões faciais, havia ficado mais fácil identificar essas sutilezas ao conversar com as pessoas.
— Foi legal. E o seu?
— Estou quase enlouquecendo naquele lugar. — Suspirou. — Servir as pessoas é mais estressante do que parece. Todas querem algum detalhe diferente que acham que eu deveria ter a obrigação de saber.
— Como o quê? — perguntou curiosa. Adorava ouvir as histórias sobre os clientes malucos que ele atendia, e contá-las era a melhor parte do dia do garoto. Todos os dias torcia para que algo minimamente interessante acontecesse para que pudesse contar a ela no parque.
trabalhava num restaurante não muito longe dali. Era garçom. Todo dia, ao fim do seu turno, passava pelo parque; costumava dizer que o contato com a natureza o mantinha são, e era verdade. Até o dia que conheceu , sentada naquele mesmo banco, no mesmo horário de sempre. Desde aquele momento, não conseguiu parar de pensar na garota e voltava todos os dias para conversar. Era incrível como sempre havia assunto entre os dois.
— Hoje duas senhoras apareceram lá. Não deveriam ter mais que cinquenta anos, mas usavam uma quantidade tão absurda de maquiagem que até levei um susto, , sério. — Pausou ao vê-la rir. — A combinação de roupas também não era muito melhor, não achei que fosse possível usar tantas estampas de uma vez só!
— E o que aconteceu?
— A parte mais estranha está chegando, tenha paciência.
— O visual dela não é a pior parte?
— Não! — Ele riu. — Olha só, eu fui indicar a mesa que deveriam se sentar, como eu sou pago para fazer, afinal. E elas disseram que não queriam sentar, preferiam comer em pé. O que é muito estranho, certo?
A outra concordou, rindo.
— Então, uma delas me disse que a amiga da aula de ginástica delas aprendeu num spa sueco que comer em pé não engorda.
— O quê? Que tipo de maluquice é essa?
— Exato! Supostamente, o Gustaf, que descobri ser o melhor massagista do spa, disse que desse jeito a comida passa direto pelo sistema digestivo. Assim, mata a fome, mas não engorda.
— E o que você fez?
— Eu arranjei um lugar para elas comerem. Pensei em pedir permissão para o senhor Kim, mas você sabe o que ele responde nessas situações…
— O cliente tem sempre razão! — disseram em uníssono, rindo em seguida.
— E aí elas comerem em pé mesmo?
— Sim. — Deu de ombros. — Quer dizer, o que eu poderia fazer?
— Você estava certo, — assentiu, sorrindo.
— Pela quantidade absurda de comida que elas pediram, não há dica nenhuma do Gustaf que possa ajudá-las.
— Aconteceu mais alguma coisa hoje? — perguntou, ansiosa.
— Você quer algo melhor do que isso? — fingiu indignação. — Eu não posso contar todas as histórias de uma vez, — comentou, tocando a ponta do nariz dela, a fazendo sorrir ainda mais. — Sou um cara completamente entediante sem elas.
— Discordo.
— Você já ficou sem histórias alguma vez? — perguntou, empurrando o ombro dela levemente com o seu.
— Não, realmente. — Pausou. — Mas você é muito mais que um bando de histórias idiotas.
— Devo me ofender ou me sentir lisonjeado? — questionou, genuinamente confuso.
Ela riu.
— Lisonjeado. Eu não me importo se você chegar aqui sem histórias.
— Tem certeza? Porque eu inventei a maioria delas.
— ! — choramingou, como se sua vida fosse uma mentira.
— Estou brincando! — Riu, abraçando-a. — Infelizmente, todas as pessoas da história realmente existem e fazem todas as coisas bizarras que eu tenho que aturar.
A menina sorriu.
— Obrigada… por se preocupar com isso. Eu sei que você se esforça para ter boas histórias.
— Não precisa agradecer. — Retribuiu o sorriso, só então percebendo que a ainda a abraçava, se afastando delicadamente.
Após alguns minutos de silêncio, notou as mãos da amiga inquietas e arqueou a sobrancelha, preocupado, já que aquele não era um comportamento normal.
— Está tudo bem, ?
Ela ficou em silêncio por alguns segundos, hesitante.
— ?
— Eu quero perguntar algo, mas não sei se você tem paciência ou disposição para responder minhas perguntas bobas.
O rapaz riu, fazendo o coração dela pular uma batida, congelando por um milésimo de segundo.
— Nada vindo de você pode ser bobo, . Nós somos amigos. Me pergunte o que quiser e responderei do melhor jeito que eu puder, tudo bem?
A moça mordeu o lábio, ainda considerando se deveria mesmo fazer a pergunta que estava em sua cabeça há dias. Na verdade, há anos, mas nunca havia se sentido confortável o suficiente para perguntar isso a alguém.
— Você consegue me explicar como são as cores? — Ele arqueou a sobrancelha, confuso.
— Eu acho que não, . Nunca tentei, pelo menos.
— Já sei a explicação técnica, sobre a percepção visual ou qualquer coisa assim. — Sorriu. — Pense um pouco e me diga o que acha.
Ele mordeu a bochecha internamente, olhando em volta. Algumas crianças e seus pais estavam à alguns metros, nos grandes brinquedos coloridos. A pequena missão que a garota havia lhe dado parecia quase impossível. Ele nunca havia pensado sobre como fazer algo assim. Ponderou uma ideia que surgiu e deu de ombros.
— Normalmente explicamos cores com objetos que são daquela cor, o que não faz muito sentido — apontou.
Ela riu, concordando.
— Nenhum sentido.
— Então talvez possamos usar algum sentimento? — sugeriu.
— Continue.
olhou em volta novamente, tentando decidir por onde começar.
— Amarelo é a cor do sol — explicou. — Então é alegre e otimista, eu acho.
— Você disse que não ia fazer comparações — observou, rindo da contradição.
— Eu estou contando, não comparando, ! — justificou, empurrando-a pelos ombros levemente. — Continuando… azul é a cor da tranquilidade. Da liberdade também, acredito. Não sei exatamente por que dizem isso, mas é verdade. Talvez por causa do céu? Ou do mar?
— Você gosta do céu?
— Sim. — Sorriu. — Quer dizer, o que tem para não gostar? Ele é grande e azul. De certa forma, me faz perceber que não somos tão grandes ou importantes como achamos.
— Eu entendo. — Abriu um sorriso de canto.
O garoto mordeu o lábio, antes de segurar a mão dela entre as suas com cuidado. sentiu suas bochechas queimarem com o contato inesperado.
— Laranja é quase como amarelo — continuou, fingindo não notar o constrangimento da garota. — É bem alegre. Me lembra amizade também; não sei, coisas boas?
— Parece uma cor legal. — murmurou.
— Ela é bem simpática. — deu de ombros, mas riu ao ouvi-la bufar ao seu lado.
— Idiota.
— Eu estou brincando. Gosto de laranja também, mas a minha favorita provavelmente é verde.
— O que mais? — questionou, ansiosa.
— Deixe-me ver… — Pensou, usando os dedos para listar as cores lentamente. — Azul, amarelo, laranja… ah, sim, o básico. Branco é a cor da paz, pureza e esse tipo de coisa. — explicou. — Preto é bastante ligado morte e luto. É um pouco medonho, na minha opinião. Quase todos os sentimentos ruins seriam relacionados com o preto, eu acho.
— Parece triste.
— Quando é combinado com outras cores, principalmente em roupas, não é tão ruim quanto parece. É a preferida muitas pessoas, sabia?
— Você ainda não me falou sobre vermelho — pediu, apertando a mão dele. — Muitas pessoas já me disseram que gostam de vermelho.
— Ah, sim, claro! — Riu. — É uma cor muito intensa, então representa sentimentos muito intensos também. Tem os bons e o ruins, o que quer ouvir primeiro?
— Os ruins — respondeu prontamente. Ela tinha uma teoria de que sempre deveria lidar com as coisas ruins primeiro.
— Raiva, principalmente — murmurou. — Perigo também.
— Eu achei que teria mais.
— É a cor do amor — contou, se inclinando para ficar mais próximo, como se estivesse compartilhando um segredo. — É a cor das suas bochechas também, nesse momento.
Ela riu, envergonhada, o que fez o tom intensificar.
— Alguma outra cor que eu devesse saber? — perguntou, tentando mudar de assunto.
— Por último, mas não menos importante, temos verde! — disse empolgado. — É a cor da vida. Por causa da natureza e coisas assim. E da sorte. — Pausou. — E esperança, se eu não me engano. — Sorriu abertamente. — Acho que é isso. Um intensivo sobre cores para a senhorita.
Ele tocou na ponta do nariz dela, fazendo-a rir.
— Obrigada — agradeceu, surpreendendo-o. — Ninguém nunca se importou o bastante para me explicar esse tipo de coisa.
— Não por isso. — Apertou a mão dela novamente. — Quando precisar de mais explicações geniais é só pedir, .
— Eu gosto da sua voz — confessou, timidamente. — É o único motivo para eu deixá-lo sentar aqui comigo todo dia, na verdade.
— Minha personalidade maravilhosa não tem nada a ver com isso? — perguntou, fingindo estar ofendido.
Ela riu.
— Estou falando sério, . Sua voz é diferente, não sei explicar. Acho… — interrompeu o pensamento.
— O quê?
— Posso fazer outra pergunta?
— Envolve explicações muito longas? Não sei, como a origem do universo?
A moça riu novamente, discordando.
— Por que faz isso? — indagou baixo, como se estivesse assustada demais com a resposta.
— Seja mais específica, ainda não sei ler pensamentos… — cantarolou, tocando a testa dela com seu dedo indicador.
— Por que senta aqui e conversa comigo todo dia?
— Porque eu gosto de você, talvez? — Arqueou uma sobrancelha, confuso.
— Quero dizer, você não tem nada melhor para fazer além de conversar com uma menina cega?
— Sabe, às vezes acho que não percebe a pessoa maravilhosa que é — falou, se ajeitando de modo que ficasse de frente para ela. Teve vontade de colocar as mãos nos ombros dela, mas não o fez. — , você é muito mais que uma “deficiência”.
O tom da voz do garoto indicava que ele não acreditava naquela palavra. Não do jeito como as outras pessoas encaravam, um problema maior do que realmente era, pelo menos.
— Você só precisava se adaptar mais do que os outros a algumas situações. E daí? Isso te faz muito mais inteligente e especial. Mais forte.
Ela podia sentir a felicidade invadir seu peito ao ouvir aquelas palavras. Finalmente tinha a certeza que ele a percebia como era, e isso era o melhor presente que alguém podia lhe dar.
— Eu sempre quis saber como você é — confessou, envergonhada.
— Você sabe como eu sou. — Pelo seu tom, sabia que se divertia com a frase inesperada.
A garota riu baixo, concordando. Às vezes eu não conseguia entender o que estava bem em sua frente, não importava o quão específica ela fosse.
— Estou me referindo a sua aparência, — murmurou, com um sutil sorriso nos lábios.
— Bem, dizem que tenho olhos de filhote. Pequenos e fofos, é o que sempre escuto. E já elogiaram meu sorriso duas ou três vezes. — Deu de ombros.
— Posso… — ela interrompeu o questionamento, com a mão direita levantada, hesitante.
— Você quer me tocar? — Sorriu torto, segurando-a pelo pulso delicadamente.
A menina concordou e ele guiou as duas mãos pequenas para seu rosto, tentando ficar o mais quieto possível. Com cuidado, ela começou a tocar o rosto do rapaz pelas bochechas, afagando levemente antes de seguir para os olhos, parando ao sentir algo gelado contra seus dedos.
— Nunca me contou que usa óculos — sussurrou.
— Ah… — Riu baixo, antes de tirar a armação. — Não preciso, na verdade. Só gosto.
Em silêncio, passou os dedos finos por sua testa e desceu cuidadosamente para o nariz, sentindo-o o máximo que podia. tentava se manter o mais imóvel possível, mordendo o lábio para segurar o riso. Por fim, ela tocou os lábios do rapaz, sorrindo ao sentir o leve sorriso dele contra as pontas de seus dedos, o que fez o dele aumentar consideravelmente.
— Eu gosto de sentir o seu sorriso — contou-o.
— Mas nada se compara ao seu, .
Com cuidado, ela segurou o rosto do rapaz entre suas mãos e parou por um momento, como se o estivesse analisando. O garoto arqueou uma sobrancelha e, antes que percebesse o que fazia, segurou a mão direita da moça, acariciando levemente e levando-a até seus lábios, beijando os dedos um a um, vagarosamente, antes de depositar um beijo mais demorado na palma da sua mão, sorrindo ao perceber as bochechas dela assumirem um tom corado forte.
— Você me deixa sem graça, — ela anunciou.
— Adoro ouvi-la pronunciar meu nome — cochichou ele. — Parece tão mais especial vindo de você.
Ela riu, incrédula.
— Não seja bobo.
— Estou falando sério. — Só então ele se deu conta de como estavam próximos e que a mão dela ainda estava em seu rosto.
Num impulso, acabou com a distância entre os dois, pressionando seus lábios contra os dela. Porém, se afastou ao tomar total consciência do que fazia. parecia surpresa quando levou uma das mãos aos lábios.
— Sinto muito! — se apressou, preocupado. — Eu não sei o que deu em mim, .
— O que… Eu… — Pausou, tentando formar um pensamento coerente.
— Eu estraguei tudo. Sinto muito. — Suspirou, derrotado.
— Você… me beijou? — perguntou com cuidado.
— Sim… Eu não quis… sinto muito — repetiu, envergonhado.
— Acho que você finalmente conseguiu me surpreender, . — Ela riu baixo.
Ele arregalou os olhos, estupefato com a reação dela.
— Você não está brava?
— Por que estaria?
Ele ficou em silêncio, sem saber o que responder. A reação de não fazia total sentido, mas ele não sabia como agir com aquela resposta. Ela não estava brava porque eram amigos e estava tudo bem? Ou gostava dele também? Como sempre, desejava poder saber o que ela pensava, tornaria tudo tão fácil. Talvez o significado do silêncio era que deveria ir embora.
A garota sabia que deveria dizer algo a mais. Queria dizer tantas coisas ao mesmo tempo que não sabia por onde começar. a havia beijado. Isso mudava tudo, certo? Esperava que sim. Era tudo que ela mais desejava todas as tardes que passavam juntos. Tentou organizar seus pensamentos por vários minutos, frustrada por não conseguir algo bom o suficiente.
— Eu te ouvi cantando uma vez — finalmente admitiu, quando ele estava prestes a levantar. De certa forma, sentia como se tivesse invadido a privacidade do rapaz.
— O quê? — questionou, confuso com a súbita mudança de assunto.
— Você estava passando por aqui, provavelmente ouvindo música e cantou. Eu adorei a sua voz, mas achei que nunca teria uma oportunidade para falar com você. — Encolheu os ombros. — Eu não pude acreditar quando sentou aqui e começou a conversar comigo.
— Sério? — Ela podia perceber o sorriso apenas por sua voz.
— Digamos que foi um fator de peso para eu me apaixonar por você — confessou.
— O quê?! Apaixonar? Eu… não acredito nisso.
Ela sorriu, envergonhada.
— Bem, se eu tivesse que usar uma cor definir como me sinto perto de você, provavelmente seria vermelho. — Pausou por alguns segundos e riu. — Quero dizer, os sentimentos bons.
riu e entrelaçou seus dedos aos da garota, levantando a mão dela e beijando as costas.
— Eu também, . Definitivamente vermelho.