Postada em: 02/07/2018

GALWAY GIRL

“You know, she played the fiddle in an Irish band
But she fell in Love with an English man
Kissed her on the neck and then I took her by the hand
Said, "Baby, I Just want to dance"
With my pretty little Galway Girl”
(Ed Sheeran)

— Babe, eu não vou colocar uma galesa no mundo, supere. – a loira soltou uma risadinha enquanto examinava a própria imagem no enorme espelho da suíte do hotel, que só não era tão gigante quanto sua barriga – Por mais que eu saiba que cada novo cidadão é bem-vindo, já que seu país é um ovo... – fez questão de enfatizar, incapaz de conter a brincadeira – Você terá uma linda irlandesinha em casa. – abriu um enorme sorriso, que iluminava os olhos verdes de forma a torná-los ainda mais claros.
— Isso eu já tenho. – o homem argumentou, ajeitando a gola da camisa social branca e piscando para a esposa através do espelho – Ela vai ser muito mais feliz se for galesa, ... – lançou o olhar mais convincente que encontrou em seu arsenal, antes de dizer – Sabe, nós temos o maior número de castelos por metro quadrado, em todo o mundo! Você tem ideia de como ela vai se sentir uma princesa?
— Querido... – claramente continha uma risada frente ao argumento pífio e desesperado do marido – Ela vai nascer na terra de Bono Vox, Gareth! – enfatizou, e seus olhos brilharam à menção da banda favorita que, segundo ela, era muito maior que os Beatles, aqueles ingleses sem sal nem açúcar – Além do mais, não quero minha filha nascida em uma terra onde tem quatro vezes mais ovelhas do que pessoas, quer que a primeira palavra da garota seja “béee”? – e aquela imitação de ovelha foi o suficiente para que Gareth gargalhasse, deixando todos os seus argumentos de lado. O que estava pensando quando decidiu se casar com alguém tão cabeça dura quanto ?
Era uma discussão infrutífera, afinal, e ele não fazia ideia do motivo pelo qual entravam naquele assunto mais uma vez. Quer dizer, era de se esperar que escolher a nacionalidade da filha fosse algo mais simples, mas não quando a esposa era uma patriota ferrenha e detentora dos discursos mais inflamados acerca da necessidade da pequena Valerie nascer em solo irlandês. Tudo seria mais fácil se ele próprio, Gareth Bale, não fosse tão alucinadamente apaixonado por sua origem galesa – sendo, inclusive, capitão da seleção nacional – o que vinha gerando um impasse entre o casal durante todas aquelas longas 35 semanas de gravidez – ou oito meses, como implorava que a esposa dissesse, a fim de facilitar suas contas.
— Eu vou acabar te sequestrando e te mantendo em cativeiro em Cardiff até que essa pequena resolva sair, sabia? – enlaçou a loira pela cintura, sentindo a presença da filha entre eles. Não via a hora de tê-la ali de fato, por Deus! Como podia sentir tanta falta de alguém que nem mesmo existia no mundo do lado de fora? O sorriso de cresceu, ocupando os lábios e então alcançando os olhos, quando sentiu o beijo que Gareth pousava em sua testa.
— Só se quiser que ela faça greve e não saia da barriga da mamãe nunca mais, não é, filhota? – pousou as mãos sobre própria barriga, rindo alto quando o bebê se mexeu – Boa garota! – a loira sorriu, tocando os lábios nos do marido uma vez, quase com pena da expressão desolada dele frente à ‘traição’ da filha – Ela é uma pequena rebelde!
— Por que isso não me surpreende? – Gareth riu, tocando o rosto da esposa com carinho, enquanto uma revoada de momentos passados invadia suas lembranças, causando uma sensação gostosa de nostalgia e felicidade.
Ela ainda era a sua . A mesma loira estonteante que conhecera em um pub londrino (quão irônico) e esfumaçado há quase cinco anos, e que conservava no olhar aquela rebeldia empolgante que o encantara desde o primeiro momento. A mesma garota em roupas de couro que pedira um isqueiro ao desconhecido que a observava verdadeiramente hipnotizado, antes de passar com ele uma noite em claro discutindo assuntos que iam de política internacional à programação astrológica – ela era de Sagitário, ele de Câncer – para que, num flerte desajeitado e absolutamente às cegas, o rapaz então se arriscasse a dizer que não havia combinação astral mais perfeita do que a de uma Irlandesa Sagitariana e um Galês Canceriano. Gareth nunca se esqueceria do sorriso indômito que lhe dera em reposta, e cujo motivo hoje ele entendia: era um péssimo encontro astrológico. Sorte a dele ela não acreditar em signos.
Ela deixara de ser a aspirante a revolucionária em prol da paz mundial, para de fato alcançar um alto cargo na Embaixada Irlandesa na Espanha. Ele, então jogador do Tottenham, ascendera ao posto de estrela do Real Madrid e capitão da Seleção Nacional. Contudo, se precisasse listar a mudança mais drástica e gratificante que viveram em todos aqueles anos, Gareth não levaria nem meio segundo antes de responder: seriam pais.
— Posso fazer mais um xixi antes de irmos? – a jovem sorriu de forma infantil ao esposo, que não conteve uma risada enquanto observava a corrida dela até o banheiro. Aquela era a novidade do terceiro trimestre: eles simplesmente não podiam mais sair de casa para qualquer lugar que não tivesse um banheiro por perto... – Será que vai ter um banheiro lá? – gritou, preocupada, e Gareth revirou os olhos, ainda rindo por ter se antecipado a ela no pensamento.
— Amor, é Paris. – suspirou – Eles provavelmente inventaram os banheiros. – comentou, checando as horas: tinham vinte minutos para chegar ao restaurante onde fizera uma reserva, mas se dependesse de , provavelmente fariam uma parada ou duas até ela finalmente esvaziar aquela bendita bexiga hiperativa...
— Pronto, pronto... – a loira adentrou o quarto erguendo os braços, prevendo a pressa do marido. Sempre tão certinho, seu Gareth... Ajeitou o vestido preto em torno dos quadris dois números maiores do que costumavam ser, e mirou-se no espelho uma última vez. Era uma grávida bem gostosa, em sua opinião. E, ousava dizer com um grau enorme de alívio, na de Bale também.
— Você tá linda, meu amor, mas precisamos ir. A não ser que queira matar a sua filha de fome. – o moreno brincou, beijando os lábios da esposa uma vez.
— Matar o marido de fome, você quer dizer... – os olhos verdes se estreitaram divertidamente – Para de usar a criança, Bale! – riu, batendo de leve no ombro musculoso do jogador.
— Ei, pelo menos eu não uso a nossa filha pra justificar que ando fazendo xixi na calça... – Gareth riu, sentindo que o vestido da esposa estava molhado. Não era a primeira vez que acontecia, e o constrangimento inicial de hoje já não existia mais, tendo sido substituído por gargalhadas e piadas entre o casal.
— Do que você tá...? – franziu o cenho, olhando para baixo e sentindo o sorriso morrer quando percebeu o líquido que escorria de suas pernas sem que percebesse – Gareth, não é xixi... – murmurou.
— Como não é...? – ele começou, e só quando notou a expressão assustada tomando os olhos verdes de , percebeu o que se passava. Mas não podia ser, podia? Matemática nunca fora seu forte, mas 35 semanas estavam razoavelmente longe de 40, certo? – A bolsa?! – tomou coragem de perguntar, mas a resposta estava óbvia no desespero da esposa.
— Gareth, ela não pode nascer agora... – a loira sentia as lágrimas correndo pelo rosto, enquanto pensava naquela coisinha pequena que ainda estava longe de estar pronta pra enfrentar o lado de fora - Não tá na hora! – exclamou, sentindo um soluço desolado escapar de seus lábios no momento em que braços do esposo a envolveram, tentando transmitir uma segurança que faltava nele próprio.
— Vai ficar tudo bem, ok? – ele murmurou, sentindo o coração acelerado frente à adrenalina e ao sentimento de não ter ideia do que fazer – Ela vai ficar bem... – afirmou, incerto de para quem a frase se destinava, mas aliviado ao sentir o rosto de acenando afirmativamente contra seu peito, entregando-se à confiança dele.
Os minutos seguintes passaram dolorosamente devagar. sabia tudo o que devia fazer: manter-se calma, afinal, uma bolsa rota não significava parto imediato. Ligar para seu obstetra e pedir instruções. Avisar aos pais que estava indo para o hospital. Ela sabia de tudo aquilo, e estava mais do que preparada para agir... Na hora certa. Não em um país estranho, com língua estranha e pessoas estranhas cercando o que seria o momento mais importante de sua vida. Focou, então, na única coisa que lhe parecia certa em meio a todo aquele caos: a mão de Gareth tocando a sua, num gesto que dizia desesperadamente que ele estava ali. Com ela. Por elas.



— Bale, eu quero te matar!! – a loira conseguiu dizer entre os dentes semicerrados, agarrando a mão do marido enquanto urrava de dor pela contração que se anunciava mais uma vez.
— Empurra só mais uma, amor... – o jogador parecia ainda mais pálido na cabeceira da cama, mas se recusava a sair da sala de parto. Queria acompanhar cada segundo daquele momento que, apesar de menos glamoroso do que imaginava, não deixava de ser poderoso e impactante – Você pode me matar depois...
— Você nunca mais vai me engravidar, tá entendendo? – ela arfava, tomando fôlego enquanto uma nova contração não vinha – Nunca mais! – gemeu, batendo um dedo fracamente no peito de Gareth, que precisava usar todo o seu autocontrole para não rir, despertando assim a fúria de uma mulher em trabalho de parto.
— Querida, só mais uma... – a obstetra parecia tranquila, e Bale dava graças a Deus por isso: alguém precisava manter o controle naquela sala, e claramente não estava sendo ele – Eu já tô vendo o cabelinho dela...
— Ela é loira? – a jovem mãe ergueu a cabeça por um segundo, sendo acometida por uma nova onda de contração em seguida, que a fez trancar a mandíbula, a fim de concentrar a força onde devia. . – Se essa menina for morena e tiver esses seus olhos azuis, depois de eu quase morrer parindo, Bale, eu juro que te dou uma surra... – completou, dramática, e dessa vez o jogador não foi capaz de segurar o riso: conseguia fazer graça nos momentos mais inusitados, como naquele em que tinha uma cabeça saindo por um orifício corporal de 2cm.
, a cabecinha já veio... – a médica sorriu, tranquilizando a jovem – Só uma e você já vai ver o rostinho dela.
Foi o último estímulo que faltava para que se concentrasse em projetar toda a força da contração para trazer sua menina ao mundo. E Valerie veio, com um chorinho agudo que nunca soou tão bem aos ouvidos dos pais quanto naquele dia. recebeu o bebê nos braços, sabendo que aquela emoção era única e jamais se repetiria. Era prematura, mas com um peso razoável, e a pele tão rosadinha que não deixava dúvidas de que nascera bem. Os cabelos eram tão escuros quanto os de Gareth, e quando abriu os olhos – encarando aquele novo mundo com a curiosidade dos inocentes – exibia orbes de um azul cristalino que eram inconfundíveis quando colocados ao lado dos olhos do pai. Bale sorriu, sentindo algumas lágrimas escaparem, junto a uma risada de sincero alívio e da mais pura admiração. Era indiscutivelmente o momento mais emocionante de sua vida, nem de longe comparável a tudo que já vivera no esporte.
— Muito prazer, meu amor... – derreteu-se, admirando a forma como a recém-nascida prendia um de seus dedos entre a mãozinha, ocupando-a por completo – Eu sou sua mamãe. E esse aqui é seu papai... – completou, sentindo uma lágrima emocionada escapar dos olhos — E nós te amamos tanto! – murmurou, hipnotizada pelos olhos da filha – Ela é uma mini-você, querido. – sorriu para o esposo, nem uma sombra da braveza prévia, agora que a dor cessara e o fruto daquele esforço estava ali, quentinho e seguro entre seus braços – E eu não poderia ser mais grata por isso. – completou e Gareth beijou a testa da jovem, transbordando amor por aquelas que guardavam em suas mãos a melhor parte de sua vida. Nascera uma criança. Mas também nasciam ali um pai e uma mãe com o íntimo desejo de serem os melhores do mundo no novo ofício.
— Eu já trago ela de volta pra vocês, sim? – uma enfermeira se aproximou, enrolando o bebê em uma manta para que fosse pesada, medida e avaliada devidamente – Mes compliments, est une belle enfant.
À menção do idioma francês, Gareth e se entreolharam com expressões idênticas de surpresa e divertimento, finalmente percebendo o que se sucedera sem que tivessem qualquer regência sobre os fatos. A vida era mesmo uma coisa engraçada, colocando em xeque a rivalidade mais antiga do mundo – e também a única que unia o casal: França x Reino Unido – para provar que as coisas mais importantes não podiam, e nem deviam, ser planejadas.
— Uma francesinha, hm?


Fim.



Nota da autora: É série nova, êeeeeeeeee!
Galácticos é um denguinho que eu guardo com muito amor. São contos curtinhos, quase momentos. Mas espero que vocês se apaixonem por esses casais mesmo com o pouco tempo, assim como eu amo cada um deles!
Bale não podia ser diferente, né? Um príncipe!
Muito obrigada por ter ficado até aqui!
Até a próxima!





Nota da beta: Ah como eu amo contos! Belle teve essa ideia maravilhosa e vocês vão adorar cada momento que está por vir, fora que pegar esses homões do Madrid por si só já é uma delícia né. Bale querido foi uma fofura, eu morro de amores nele como pai, mas fiquem ligadas nos próximos ;)
xx

Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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