Prólogo
Ser um herói é algo muito maior do que apenas combater vilões. É uma missão de altruísmo e sacrifício que exige mais do que qualquer um pode imaginar. Para ser um herói não basta apenas força física, inteligência ou poderes sobrenaturais; é preciso compaixão, sabedoria, dedicação total e persistência imensurável. É preciso saber lutar com o poder que vem do coração. Ter coragem para fazer a coisa certa mesmo nos momentos mais difíceis. Deixar de lado a individualidade e doar-se inteiramente para ajudar os outros, com a sua vida se for preciso. É um sacrifício de tempo, do corpo, da alma, do ser inteiro, por um completo desconhecido.
Ninguém imagina quantas concessões um herói tem que fazer para poder exercer seu papel. O perigo a que ele se expõe diariamente – e expõe aqueles que ama também. Os dias e noites de intenso treinamento, pois uma mínima falha pode custar a vida de alguém. Os sentimentos e histórias que precisa deixar de lado para que possa desempenhar seu trabalho com foco. Todas as decisões difíceis que precisam ser tomadas, algumas que podem atormentá-lo para sempre. O investimento total de si mesmo na humanidade, acreditando sempre que, ao salvá-la, tornará o mundo melhor.
Oh, sim, a fé na humanidade. Como é fácil perdê-la. Quando se está na posição de herói, todas as histórias e atrocidades vistas ao longo da jornada levantam a questão de persistir no ser humano, e se essa é mesmo a escolha certa a fazer. Humanos são capazes de coisas incríveis, e quando unidos tem um enorme potencial para o bem; porém, eles também são autodestrutivos, perigosos e volúveis. Na maioria das vezes, precisam ser salvos deles mesmos. Será que toda a dedicação de um herói vale mesmo a pena, para salvar um ser tão imprevisível?
Eles acreditam que sim. Porém, os homens não sabem se devem retribuir a convicção na mesma intensidade. Pode a humanidade confiar suas vidas a extraordinários desconhecidos, sem nenhuma garantia de sucesso em sua proteção? Podem as pessoas levantar a bandeira de heróis sem saber se não acabarão fazendo parte da estatística de fatalidades inevitáveis durante um combate? Sem saber se seus filhos e filhas estarão devidamente protegidos com a presença deles, ou expostos a mais perigo ainda?
Há anos a população mundial se pergunta. Desde o surgimento dos Vingadores, muita coisa mudou ao redor do globo; para alguns, ele ficou mais seguro e protegido. Homem de Ferro, Thor e outros super-humanos treinados fazem parte de uma equipe destinada a proteger as pessoas quando desastres acontecem, muito melhor do que um exército humano o faria. Para outros, se tornou ainda mais perigoso e incontrolável: seres como o Hulk andam por aí sem nenhum tipo de controle sobre seus poderes e podem muito bem causar um estrago muito grande, maior do que aquele que vieram remediar.
Fato é que os heróis existem, e estão – ao menos tentando – manter todos a salvo. Porém, até mesmo eles entram em colapso, principalmente quando os acontecimentos trazem à tona o seu lado mais humano.
A equipe dos heróis mais poderosos da Terra está dividida ao meio. De um lado, estão aqueles que acreditam que os heróis devem ter o controle sobre si para que possam proteger os humanos da melhor forma. Do outro, ficam os que defendem a liberdade dos homens de escolherem como e quando querem ser salvos. A notícia se espalhou, e a opinião geral se fragmentou em igual escala. Porém, há decisões definitivas: Steve Rogers, conhecido como Capitão América, é um fugitivo procurado pelo mundo todo, assim como todos aqueles que ficaram ao seu lado durante a batalha que dividiu os Vingadores. Ninguém sabe o que aconteceu depois que os companheiros de Rogers fugiram de sua prisão secreta, e seu paradeiro ainda é desconhecido – mas nunca deixou de ser procurado.
Já a parte da equipe que decidiu manter-se dentro da lei e das rédeas do governo, sendo liderada por Tony Stark, assinou o Tratado de Sokovia e agora atua em parceria com o poder político, tendo suas missões subordinadas ao Conselho de Segurança da ONU. Como um exército reserva, os Vingadores só atuam quando acionados pelo CSNU, em situações em que a defesa exclusivamente humana não foi capaz de conter os estragos. A equipe foi instalada em uma nova base ao norte dos Estados Unidos, em Massachussets, onde dispõe das mais modernas tecnologias e da mais alta segurança para realizar seus treinamentos e aprimorar seus poderes – tudo para que, quando chamados, possam proteger a humanidade da forma mais efetiva possível.
Uma nova equipe de inteligência foi designada para auxiliar nesse trabalho. Algumas das mentes mais brilhantes do mercado agora ajudam os heróis, enriquecendo seu poder e precisão de defesa. Físicos e engenheiros das mais renomadas universidades desenvolvem projetos de tecnologia e são responsáveis pela segurança e desenvolvimento da base. Tudo isso é investido para que a eficácia dos Vingadores cresça o máximo possível, na intenção de que a opinião pública, tão dividida a respeito deles, seja amenizada, e para que a humanidade se sinta realmente segura nas mãos dos heróis.
Todas essas mudanças também acarretaram questões internas na equipe. Thor e Hulk, que estavam ausentes durante o processo de cisão dos Vingadores, retornaram após a destruição de Asgard para integrar o grupo novamente. Vivendo na base onde tudo acontece, eles juntaram-se a Natasha Romanoff, Visão e Tony Stark. Porém, apesar de unida pelo mesmo ideal, a equipe parece estar com a sua coesão estremecida – não só por ter sido recentemente dividida, mas por conta de seu líder parecer cada vez mais distante do resto do grupo.
Talvez abalado pelos recentes acontecimentos, Tony Stark tem demonstrado um comportamento (que já é suficientemente excêntrico por natureza) alarmante aos seus colegas de equipe. Há alguns meses, todos desconfiam de seu isolamento e seus muitos segredos, alimentando suspeitas de que Stark esconde algo, mas tenta manter as aparências para não ser questionado. Porém, apesar da preocupação, todos evitam interferência no assunto, pois só os heróis sabem o fardo que carregam por serem eles mesmos.
Ninguém imagina quantas concessões um herói tem que fazer para poder exercer seu papel. O perigo a que ele se expõe diariamente – e expõe aqueles que ama também. Os dias e noites de intenso treinamento, pois uma mínima falha pode custar a vida de alguém. Os sentimentos e histórias que precisa deixar de lado para que possa desempenhar seu trabalho com foco. Todas as decisões difíceis que precisam ser tomadas, algumas que podem atormentá-lo para sempre. O investimento total de si mesmo na humanidade, acreditando sempre que, ao salvá-la, tornará o mundo melhor.
Oh, sim, a fé na humanidade. Como é fácil perdê-la. Quando se está na posição de herói, todas as histórias e atrocidades vistas ao longo da jornada levantam a questão de persistir no ser humano, e se essa é mesmo a escolha certa a fazer. Humanos são capazes de coisas incríveis, e quando unidos tem um enorme potencial para o bem; porém, eles também são autodestrutivos, perigosos e volúveis. Na maioria das vezes, precisam ser salvos deles mesmos. Será que toda a dedicação de um herói vale mesmo a pena, para salvar um ser tão imprevisível?
Eles acreditam que sim. Porém, os homens não sabem se devem retribuir a convicção na mesma intensidade. Pode a humanidade confiar suas vidas a extraordinários desconhecidos, sem nenhuma garantia de sucesso em sua proteção? Podem as pessoas levantar a bandeira de heróis sem saber se não acabarão fazendo parte da estatística de fatalidades inevitáveis durante um combate? Sem saber se seus filhos e filhas estarão devidamente protegidos com a presença deles, ou expostos a mais perigo ainda?
Há anos a população mundial se pergunta. Desde o surgimento dos Vingadores, muita coisa mudou ao redor do globo; para alguns, ele ficou mais seguro e protegido. Homem de Ferro, Thor e outros super-humanos treinados fazem parte de uma equipe destinada a proteger as pessoas quando desastres acontecem, muito melhor do que um exército humano o faria. Para outros, se tornou ainda mais perigoso e incontrolável: seres como o Hulk andam por aí sem nenhum tipo de controle sobre seus poderes e podem muito bem causar um estrago muito grande, maior do que aquele que vieram remediar.
Fato é que os heróis existem, e estão – ao menos tentando – manter todos a salvo. Porém, até mesmo eles entram em colapso, principalmente quando os acontecimentos trazem à tona o seu lado mais humano.
A equipe dos heróis mais poderosos da Terra está dividida ao meio. De um lado, estão aqueles que acreditam que os heróis devem ter o controle sobre si para que possam proteger os humanos da melhor forma. Do outro, ficam os que defendem a liberdade dos homens de escolherem como e quando querem ser salvos. A notícia se espalhou, e a opinião geral se fragmentou em igual escala. Porém, há decisões definitivas: Steve Rogers, conhecido como Capitão América, é um fugitivo procurado pelo mundo todo, assim como todos aqueles que ficaram ao seu lado durante a batalha que dividiu os Vingadores. Ninguém sabe o que aconteceu depois que os companheiros de Rogers fugiram de sua prisão secreta, e seu paradeiro ainda é desconhecido – mas nunca deixou de ser procurado.
Já a parte da equipe que decidiu manter-se dentro da lei e das rédeas do governo, sendo liderada por Tony Stark, assinou o Tratado de Sokovia e agora atua em parceria com o poder político, tendo suas missões subordinadas ao Conselho de Segurança da ONU. Como um exército reserva, os Vingadores só atuam quando acionados pelo CSNU, em situações em que a defesa exclusivamente humana não foi capaz de conter os estragos. A equipe foi instalada em uma nova base ao norte dos Estados Unidos, em Massachussets, onde dispõe das mais modernas tecnologias e da mais alta segurança para realizar seus treinamentos e aprimorar seus poderes – tudo para que, quando chamados, possam proteger a humanidade da forma mais efetiva possível.
Uma nova equipe de inteligência foi designada para auxiliar nesse trabalho. Algumas das mentes mais brilhantes do mercado agora ajudam os heróis, enriquecendo seu poder e precisão de defesa. Físicos e engenheiros das mais renomadas universidades desenvolvem projetos de tecnologia e são responsáveis pela segurança e desenvolvimento da base. Tudo isso é investido para que a eficácia dos Vingadores cresça o máximo possível, na intenção de que a opinião pública, tão dividida a respeito deles, seja amenizada, e para que a humanidade se sinta realmente segura nas mãos dos heróis.
Todas essas mudanças também acarretaram questões internas na equipe. Thor e Hulk, que estavam ausentes durante o processo de cisão dos Vingadores, retornaram após a destruição de Asgard para integrar o grupo novamente. Vivendo na base onde tudo acontece, eles juntaram-se a Natasha Romanoff, Visão e Tony Stark. Porém, apesar de unida pelo mesmo ideal, a equipe parece estar com a sua coesão estremecida – não só por ter sido recentemente dividida, mas por conta de seu líder parecer cada vez mais distante do resto do grupo.
Talvez abalado pelos recentes acontecimentos, Tony Stark tem demonstrado um comportamento (que já é suficientemente excêntrico por natureza) alarmante aos seus colegas de equipe. Há alguns meses, todos desconfiam de seu isolamento e seus muitos segredos, alimentando suspeitas de que Stark esconde algo, mas tenta manter as aparências para não ser questionado. Porém, apesar da preocupação, todos evitam interferência no assunto, pois só os heróis sabem o fardo que carregam por serem eles mesmos.
Capítulo 1
As experiências de ser um herói, com seus bônus, alguns sacrifícios e muitos aprendizados, são novidades das quais Peter Parker recentemente começou a desfrutar. Este universo passou a fazer parte de sua vida desde que o Homem-Aranha se tornou o mais novo membro oficial dos Vingadores – desta vez de forma definitiva. Após sua primeira missão sozinho, o jovem aracnídeo havia escolhido afastar-se dos grandes combates por um tempo, e passou alguns meses sendo apenas o amigo da vizinhança, ganhando experiência e vivendo sua pacata vida de nerd do ensino médio, até que decidiu que estava pronto para dar um passo à frente. O garoto aceitou o convite feito por Tony Stark alguns anos antes, e mudou-se da casa de sua tia May para viver com os Vingadores em sua nova sede em Massachusetts.
Aquela era a vida dos seus sonhos. Parker estava no último ano do ensino médio, e com uma leve ajudinha de Stark e seus antigos colegas de faculdade, entrou em um programa de senior year para jovens talentos no MIT. Agora, o garoto conciliava os estudos em uma das melhores universidades do mundo com os afazeres de herói, praticando e aprimorando seus poderes no centro de treinamento. Por ser muito inteligente, Peter recebeu de Stark um convite para fazer parte da equipe de Inovações Tecnológicas dos Vingadores, especialmente por seus conhecimentos de computação. Tratava-se de um estágio de horas complementares na central de controle – desta vez, um estágio de verdade – que contaria como créditos para seu curso na faculdade no ano seguinte.
Peter deixou o campus arborizado do Instituto de Tecnologia de Massachusetts dirigindo sua bicicleta, entusiasmado com a ótima demonstração de equações derivadas que acabara de ter na aula de Cálculo III. Depois da faculdade, era hora de ir ao setor de Inovações da base para completar o projeto do novo gerador de energia do centro de treinamento, que precisava ser resistente aos raios de Thor.
O ambiente amplo e ensolarado do setor de pesquisas parecia despertar de alguma forma a inspiração de Parker para cálculos matemáticos. Ele sentou-se em sua cadeira giratória, deu um peteleco na cabeça balançante de seu bonequinho do Darth Vader, e deixou a mente começar a funcionar. Finalizou o relatório do gerador antes do final do dia, e foi até a mesa da responsável pelo departamento, pelos corredores estreitos que dividiam as dezenas de gênios trabalhando.
-Srta. McCall, o levantamento de dados sobre o novo gerador. – Disse ele indicando a papelada, dirigindo-se à moça sentada do outro lado.
-Colocou o isolante pra raios? – Perguntou, e ele assentiu. – Ótimo, pode colocar na mesa. Obrigada. – Disse a moça com doçura, mas sem desviar-se do computador, concentrada no que quer que estivesse fazendo.
A garota responsável pelo setor de Inovações era notavelmente jovem, algo em que Peter reparara mais uma vez ao falar com ela – afinal, é bem estranho chamar alguém que tem quase a sua idade de "senhorita". Ela também estudava no MIT e era mesmo muito nova, e devia ser também incrivelmente inteligente para chefiar engenheiros ali com o dobro de sua idade. Constatar aquilo fez com que Parker tivesse um pequeno lapso de incentivo, afinal, quem sabe em breve ele pudesse chefiar um departamento inteiro também.
O garoto saiu dali e dirigiu-se até a sua mesa, onde encontrou um de seus supervisores esperando-o.
-Sr. Parker, reunião na sala de estratégias. – Disse o homem engravatado, e Peter reagiu de prontidão. Largou suas calculadoras e foi rapidamente até o outro lado do prédio, onde o dever o chamava.
A sala de estratégias possuía uma mesa grande e comprida no centro, onde se sentavam Thor, Banner, Romanoff, Visão e Stark, à espera do garoto. Só faltava ele para que o grupo estivesse completo, e a reunião pudesse começar.
Peter sentou-se na cadeira vaga mais próxima e observou enquanto dois executivos de terno entravam na sala, fechando a porta. Normalmente, quando caras como aqueles apareciam para assistir às reuniões, era porque o assunto era muito importante. Curioso, o garoto desejou internamente que fosse uma convocação para uma nova missão – algo que não aparecia há tempos. A tela de vidro na parede frontal à mesa foi acionada, para iniciar uma videoconferência.
-Boa tarde, Vingadores. – Disse formalmente o homem do vídeo, e todos responderam. O sujeito de meia idade usando um terno caro sentado em uma cadeira de couro já era conhecido. Aquele era o embaixador Thomas Callahan, presidente do Conselho de Segurança, que era responsável por fazer o contato entre a ONU e os Vingadores. – Agradeço a disponibilidade de todos para que pudéssemos fazer esta reunião.
-Nós é que agradecemos, Embaixador. – Disse Banner, ajeitando-se na cadeira.
-Pois bem. Como sabem, nosso trabalho nos últimos anos tem sido realizado de modo a tentar deixar a equipe dos Vingadores o mais próxima possível da sociedade. – O embaixador disse em tom introdutório. – Temos conseguido ótimos resultados desde então, porém, ainda há muito a ser feito. Desde o último combate em Sokovia, a população tem dividido opiniões em relação aos Vingadores protegendo a humanidade. Grande parte do medo que os rodeia parte daquilo que não conhecem. A equipe é blindada, trabalha em segredo, e estes segredos tem deixado as pessoas inseguras. Ninguém sabe como as coisas são feitas, como os membros da equipe são controlados e se a presença deles pode acarretar perigo ao invés de segurança, ou não. A reunião de hoje visa tratar desse assunto. Com o intuito de quebrar estas barreiras e aumentar a confiança da população na equipe, o governo dos Estados Unidos está organizando um evento em homenagem aos heróis, com um desfile a ser realizado em Washington na Avenida Pensilvânia durante o Veterans Day deste ano. Como o feriado homenageia pessoas que lutaram pela segurança e estabilidade do país durante a guerra, acreditamos que um destaque especial aos Vingadores poderia contribuir para um maior reconhecimento popular da equipe.
Os cinco heróis sentados à mesa entreolharam-se, sem manifestar. O embaixador Callahan continuou a falar, enquanto um dos seguranças engravatados abriu a porta da sala.
-Para organizar o desfile, estivemos em contato com a responsável técnica do departamento de equipamentos e Inovações dos Vingadores, Olivia McCall. – Apresentou Callahan, enquanto a moça adentrou a sala e caminhou até próximo da tela de projeção. – Pensamos que se vocês apresentarem algumas de suas novas tecnologias de batalha durante o evento, as pessoas ficariam impressionadas e isso inspiraria mais confiança. Obrigada pela presença, Srta. McCall. – O embaixador dirigiu-se a ela. – Mostre-nos o que sua equipe desenvolveu.
-Obrigada, embaixador Callahan. – Disse ela cordialmente. Aquela era a garota para quem Peter entregara os relatórios há pouco. – Boa tarde, Vingadores. Como todos sabem, o departamento de Inovações tem trabalhando incansavelmente para desenvolver as mais avançadas tecnologias de batalha para a equipe. Acreditamos que exibir algumas de nossas criações pode ser vantajoso para vocês, no entanto, mostrar demais poderia comprometer a estratégia de combate e possíveis elementos surpresa. Dito isso, nossa equipe idealizou algumas possibilidades. – Explicou a jovem com propriedade, segurando uma espécie de tablet de vidro na mão. Com um toque, ela ativou um projetor de realidade aumentada no centro da mesa que exibiu algumas imagens. – Pensamos que o desfile poderia ser liderado por alguns soldados de ferro organizados em filas. Inspirados no traje do Homem de Ferro, esses soldados foram aprimorados e possuem todos os acessórios para que deem assistência à população durante um combate. A maior novidade é que agora os robôs redefinem suas armaduras e permitem que cidadãos entrem nelas ou usem suas partes importantes para se protegerem, até serem levados para uma região segura. - Enquanto ela explicava isso, imagens detalhadas do projeto dos robôs eram exibidas no projetor 3D.
-Com licença, Srta. McCall – Thor interrompeu a explicação, erguendo a mão com um pouco de receio. – Sei que a questão aqui é o desfile e não o armamento, mas isso me ocorreu agora... e se as pessoas que usarem a armadura pra proteção durante o combate não devolverem o pedaço que pegaram?
-Como assim? Elas levariam embora tipo um souvenir de "meu primeiro ataque alienígena"? –Questionou Banner. – Pra quê?
-Bom, existem várias possibilidades. Roubar nossa tecnologia, ameaçar os vizinhos... – Thor explicou seu ponto de vista.
-Os soldados de ferro se reconstituem depois de levarem as pessoas até um lugar seguro. Caso alguém decida roubar uma parte, o robô pode localizá-la por GPS e tirar satisfações pessoalmente com quem tiver roubado seu acessório. – Explicou a garota, com um sorriso discreto no rosto.
-Quem seria estúpido a ponto de roubar um robô de guerra indestrutível? – Questionou Visão.
-Vamos voltar à reunião? – Sugeriu Romanoff com as sobrancelhas erguidas, após observar certa impaciência pela parte do embaixador. Todos se ativeram novamente à fala da Srta. McCall.
-A outra ideia diz respeito à chegada dos heróis. Recentemente, a equipe de Inovações desenvolveu um novo motor para os jatos oficiais, centenas de vezes mais potente. Na utilização em missões, o novo jato vai permitir que voem de um lado ao outro do globo em poucas horas. Isso vai agilizar as missões e fazer com que cheguem mais rápido a qualquer lugar que esteja sendo atacado, podendo conter a ameaça com mais eficácia. – A garota dizia enquanto caminhava ao redor da mesa. Uma imagem enorme do jato e seu novo motor se exibia. – A sugestão é que a equipe chegue em um desses jatos, pois além de ser muito rápido, ele ainda possui um design interessante que vai surpreender o público. – Finalizou a Srta. McCall, desligando o projetor de mesa.
-Senhor Callahan, não quero ser estraga-prazeres aqui, mas o governo acha mesmo uma boa ideia colocar uma equipe de super-heróis para desfilar em uma avenida pela imagem? –Questionou Romanoff com o semblante fechado.
-Não era nossa primeira opção também, agente Romanoff, mas precisamos colocar os Vingadores em contato mais direto com as pessoas. A sociedade precisa parar de vê-los apenas em situações de risco ou tragédia. A imagem da equipe precisa ser associada à segurança e coisas boas, e não a catástrofes. – Explicou o embaixador. – O que mais tem para nos apresentar, Srta. McCall?
-Essas são as principais ideias, Sr. Callahan. Os outros projetos dizem respeito aos trajes de cada herói, então serão discutidos com eles posteriormente.
-Muito bem. Obrigado pelo seu trabalho, mande elogios ao departamento. – Agradeceu o homem. – Acredito que este evento pode ser o início de uma fase mais favorável aos Vingadores. Sei que não é exatamente o que queriam, mas alguma coisa precisa ser feita. Não temos como prever quando um novo ataque alienígena pode ocorrer, mas quando isso acontecer, precisamos de toda a população ao nosso lado. – Callahan fez uma pausa. – Mais detalhes serão discutidos ao longo da semana para fecharmos o projeto em definitivo. Tenham uma coisa em mente, guerreiros: não adianta querer salvar a humanidade, se a humanidade não quer ser salva por vocês. Tenham uma boa tarde. – Concluiu o embaixador, desligando a conexão logo em seguida.
Alguns segundos de silêncio seguiram, até que um dos heróis decidiu se pronunciar.
-Não vamos fazer isso, não é? – Questionou Visão, confuso com tudo aquilo.
-Acho que não temos escolha. Nossa presença já foi anunciada. – Disse Peter, mostrando a notícia em um jornal virtual que acabara de abrir no celular.
-Gente famosa cancela eventos o tempo todo. – Constatou Banner. – É até bom pro status.
-Stark, foi você quem concordou com isso? – Perguntou Romanoff olhando feio para ele.
-Ah, parem de reclamar, não é como se fossemos fazer isso pra sempre. Andem, a reunião está encerrada. – Protestou Stark, fazendo todos se levantarem. – Não é tão ruim. Não sei quanto a vocês, mas eu mal posso esperar pra ver o Banner desfilando numa avenida e acenando para as pessoas como se fosse sociável.
-Se por acaso você ficar grudado na sua armadura e não conseguir mais sair depois do desfile, a culpa não será minha. - Respondeu Banner saindo da sala, fazendo Thor rir.
Os Vingadores caminharam em direção à porta, a maioria com caras bem insatisfeitas. Porém, não adiantaria discutir: ultimamente, sempre que Stark mandava todos saírem, era porque a decisão já tinha sido tomada e nem longas argumentações mudariam sua palavra final. Pouco a pouco, todos foram se retirando da sala de estratégias, e Peter foi o último a ficar. Quando o garoto estava quase saindo, Stark parou-o.
-Ei, Pirralho – Ele chamou, fazendo Parker dar meia volta. – Queria falar com você sobre uma coisa.
O rapaz entrou na sala novamente, parando em frente à mesa.
-Pois não, Sr. Stark? – Ele olhou para o homem ainda sentado.
-Queria te atualizar sobre o andamento dos testes do seu amigo.
Peter aprumou-se instantaneamente.
-Como ele está indo? – Perguntou, curioso.
-Muito bem. A equipe de pesquisa está impressionada com ele, continua surpreendendo e passando nos exames. – Contou Stark. – Ele tem potencial.
-Que bom saber. – Peter alegrou-se, e fez uma pausa logo em seguida. – E o que o senhor acha disso? – Questionou, apreensivo.
-Acho ótimo. O garoto é promissor. – Disse, fazendo Peter vibrar internamente. – Estou curioso para ver o que ele poderá fazer em combate.
-Eu também. Eu achei mesmo que ele poderia ajudar, ainda mais agora que a equipe está... meio defasada. – Peter mordeu o lábio, inseguro.
-Com toda certeza. – Concordou Stark. Os dois ficaram em silêncio por alguns segundos depois disso. – O que foi? Não espere que eu te agradeça por isso, ajudar a equipe é sua obrigação. Agora pode ir.
-Ok, Sr. Stark, até mais. – Peter sorriu, saindo da sala novamente.
-E vê se não traz mais nenhum amigo seu para cá. Já chega de adolescentes nesta equipe. – Stark gritou de dentro da sala.
O garoto saiu rindo e dirigiu-se até o departamento de Inovações para voltar ao trabalho, deixando Stark sozinho na sala de reuniões. O homem estava prestes a sair para cuidar de qualquer um dos seus afazeres empresariais, quando F.R.I.D.A.Y., o seu sistema operacional, enviou uma mensagem de áudio para alertá-lo de um compromisso.
-Sr. Stark, o senhor tem marcado em sua agenda uma visita ao laboratório do Dr. Banner para realizar os seus exames de rotina. – Disse a voz simpática saindo de seu relógio de pulso.
-Muito bem lembrado. – Respondeu. – O que eu faria sem você, F.R.Y.?
Tony foi sem demora até o outro lado do complexo, onde Banner já o esperava com um jaleco branco enquanto fazia algum tipo de pesquisa em seu computador.
Desde que Stark abandonara o reator ARC que ficava seu peito, e fizera a cirurgia para retirar os estilhaços de bomba próximos ao coração, Dr. Banner vinha fazendo um acompanhamento médico do caso de dentro da sede. Já que o eletroímã não era mais necessário para manter os fragmentos nocivos afastados, o coração de Stark funcionava normalmente, mas precisava ser constantemente monitorado por meio de exames e testes, assim como todo o funcionamento do seu corpo, já que ainda havia alguns danos.
Era tudo muito rápido, apenas um check-up de rotina. Algumas agulhas, exames de sangue, eletrocardiogramas e os resultados saiam logo em seguida. O laboratório de Banner fora propositalmente equipado com alguns dos melhores aparelhos de medicina, tudo para que Stark tivesse o melhor atendimento. Os exames eram precisos e rápidos, adequados para seu quadro tão peculiar.
-Está tudo ótimo como sempre, Stark. – Disse Banner após alguns minutos analisando os resultados na tela de seu computador. – Claro que você não é um sujeito comum, mas está dentro do que é normal pra você.
-Já me disseram que sou acima do normal. – Disse Tony, com uma brincadeira que era verídica do seu ponto de vista.
-A única coisa que me preocupa é, como sempre, o nível de radioatividade apontado nos exames. – Continuou Banner, voltando a uma velha história, o que fez Stark bufar. – Estes números são altos, você deveria me deixar investigar um pouco mais sobre eles.
-Eu já disse, Banner, essa radioatividade nunca me afetou, é besteira se preocupar com isso. – Falou Stark, dando a mesma resposta de sempre. - Já sobrevivi a coisas piores.
Desde que os exames de rotina começaram, Banner alertava Stark sobre a radioatividade que o uso contínuo do reator deixara em seu corpo. Depois de tantos anos com o ARC no peito, parte da radiação ainda permanecera no sistema, deixando um índice um tanto elevado e nocivo. Mesmo com isso apontado nos testes, Tony nunca quis que Bruce investigasse quais seriam as consequências destes níveis a longo prazo – o que não o impedia de insistir nisso em todos os seus encontros semanais.
-Tudo bem, então. – Banner deu-se por vencido, afinal já tinha cansado de fazer tal comentário. – Está liberado.
-Não fique verde de raiva só porque não deixo você me fazer de cobaia. – Respondeu Stark, fazendo Bruce rir. – Obrigado, amigo. – Finalizou, dando um tapinha nas costas do doutor e saindo do laboratório.
Banner voltou-se para a mesa de utensílios, negando com a cabeça. Stark era muito teimoso. Não havia uma boa razão para não fazer mais exames, exceto a chatice dele.
Bruce preparou-se para descartar amostras dos exames, como de costume. Porém, parou no meio do caminho, pensativo. Seu instinto de pesquisador estava falando alto, embora tivesse acabado de receber a sua enésima negativa. Banner se preocupava com o companheiro, e tinha medo que algo pudesse acontecer a ele por conta da maldita radioatividade – ele próprio sabia o efeito que ela podia causar. Além disso, estava muito curioso para ver quais seriam as consequências de um reator tão potente quanto o ARC no corpo humano. Isso o fez ponderar por alguns segundos.
Contrariando as vontades de Tony, Banner decidiu usar as amostras que tinha para fazer alguns testes. Queria sequenciar o DNA de Stark e fazer o mapa genético dele, para ver se a radiação havia causado alguma alteração significativa na sua composição. Talvez, depois de tanto tempo de exposição, a radioatividade tivesse deslocado algum gene, ou então iniciado algum outro processo mutagênico. Ele precisava investigar, ou não ficaria em paz consigo mesmo.
Aproveitando o restante das amostras que havia colhido, Banner colocou lâminas em sua centrífuga para iniciar a análise. Realizou a eletroforese, aplicou corante e jogou os dados em seu sistema para obter os resultados. Com diversas teorias em mente, ele programou o sequenciador para que analisasse os dados e finalizasse o processo.
Aquilo deveria demorar uns bons minutos, então ele sentou-se à mesa para tomar uma boa xícara de café enquanto esperava. Algum tempo depois, Romanoff bateu à porta de vidro do laboratório e apareceu para lhe fazer companhia.
-O que o cientista maluco está fazendo? – Ela questionou, entrando na sala.
-Estou processando os exames do Stark. – Respondeu Banner tomando mais um gole. – Quer me ajudar a contar hemácias?
-Parece divertido. – Romanoff sentou-se. – Está tudo bem com ele? – Perguntou, pegando uma xícara de café para si.
-Está sim, são os testes de rotina para o coração.
Ela fez um som em sinal de concordância, enquanto bebericava.
-Que bom que a saúde dele vai bem, porque eu tenho sinceras dúvidas sobre o resto. – Alegou Romanoff com ironia, afastando a xícara da boca. – Stark anda muito estranho.
-Mais estranho que o normal.
-Sim, e isso é preocupante. Anda todo autoritário, irredutível, fechado, e no meio disso faz algumas piadinhas típicas só pra tentar quebrar o gelo.
-Stark sempre foi um péssimo chefe, mas está se superando nos últimos meses. – Banner concordou.
-Ele tenta fazer tudo parecer bem, mas no fundo dá pra ver que ele está escondendo alguma coisa. – Afirmou Natasha, afogando a desconfiança com mais café.
-Tem alguma pista do que é, agente Romanoff? – Banner arqueou a sobrancelha.
-Bem que eu gostaria. – Lamentou, cerrando os olhos. – Aquele é um dos homens mais confusos que eu já vi. Sinceramente, eu tenho medo do que poderia descobrir se tentasse.
-Acha que tem algo a ver com os Vingadores? Algum erro ou quem sabe uma missão da qual não estamos sabendo?
-Não sei, mas espero que não. Já basta termos que nos submeter a desfilar pro Callahan, que de repente virou melhor amigo do Stark.
-Essa eu quero ver. – Riu o homem. – Como eles acham que um feriado, balões e uma avenida lotada irão fazer com que as pessoas gostem de nós?
O assunto foi interrompido por um alerta do computador, que fez Banner levantar-se imediatamente. Ele caminhou até a máquina, que avisava a conclusão de sequenciamento do DNA. Curioso, o cientista sentou-se e colocou os óculos, ignorando totalmente a presença de Romanoff – que pouco se importou, pois sabia o quanto parafernálias científicas interessavam ao amigo.
Alguns minutos encarando a tela e Bruce começou a se questionar se aquilo havia sido mesmo uma boa ideia. Ao constatar que o que pensara era verdade, ele soltou um grunhido de surpresa.
-O que foi? – Perguntou a mulher.
-Os resultados... – Ele respondeu, intrigado.
-O que é que tem? – Ela deixou o café em cima da mesa e aproximou-se para ver o que era. – Stark está doente?
-Não, não tem nada de errado.
-Então o que houve?
-Eu deixei o computador fazendo o mapeamento genético do Stark, porque queria saber quais poderiam ser os efeitos da radioatividade a que o corpo dele foi exposto por conta do reator ARC. A radiação não apresenta nenhum perigo pra ele por enquanto, mas o meu algoritmo encontrou uma coisa. – Explicou Banner, com os olhos ainda vidrados na tela. – Há outro DNA registrado no sistema que é muito parecido com o do Stark.
-Espera, que sistema? – Ela esforçava-se para entender, já que Banner não costumava ser muito específico quando ficava atônito com alguma coisa.
-Todas as pessoas que trabalham e circulam dentro da base dos Vingadores possuem seus dados jurídicos e biológicos salvos no sistema por segurança. Nós temos desde fichas de trânsito e biometrias até amostras de sangue e DNA, no caso de alguém ser alvo de algo ou suspeito de algo. – Ele esclareceu. – Existe alguém aqui dentro da base com mais de 40% de compatibilidade com ele.
-Pra você estar com essa cara, acho que isso deve significar alguma coisa séria. – Humorizou Natasha. – E quem é?
Os dados estavam terminando de ser baixados, e então uma janela se acendeu no visor. Banner abriu o arquivo da pessoa registrada com a compatibilidade, e deparou-se com dezenas de arquivos, uma foto e um nome: Olivia McCall.
-É a garota que chefia o departamento de inovações – Disse Natasha, intrigada. – Que estava na reunião hoje apresentando os equipamentos.
-Olha, eu não sei ao certo o que isso implica, mas... com esse nível de similaridade no DNA, não há muitas possibilidades. Só tem uma explicação para uma compatibilidade tão grande. – Disse Banner, tirando os óculos e virando-se para Romanoff. – O Stark é pai da menina.
Aquela era a vida dos seus sonhos. Parker estava no último ano do ensino médio, e com uma leve ajudinha de Stark e seus antigos colegas de faculdade, entrou em um programa de senior year para jovens talentos no MIT. Agora, o garoto conciliava os estudos em uma das melhores universidades do mundo com os afazeres de herói, praticando e aprimorando seus poderes no centro de treinamento. Por ser muito inteligente, Peter recebeu de Stark um convite para fazer parte da equipe de Inovações Tecnológicas dos Vingadores, especialmente por seus conhecimentos de computação. Tratava-se de um estágio de horas complementares na central de controle – desta vez, um estágio de verdade – que contaria como créditos para seu curso na faculdade no ano seguinte.
Peter deixou o campus arborizado do Instituto de Tecnologia de Massachusetts dirigindo sua bicicleta, entusiasmado com a ótima demonstração de equações derivadas que acabara de ter na aula de Cálculo III. Depois da faculdade, era hora de ir ao setor de Inovações da base para completar o projeto do novo gerador de energia do centro de treinamento, que precisava ser resistente aos raios de Thor.
O ambiente amplo e ensolarado do setor de pesquisas parecia despertar de alguma forma a inspiração de Parker para cálculos matemáticos. Ele sentou-se em sua cadeira giratória, deu um peteleco na cabeça balançante de seu bonequinho do Darth Vader, e deixou a mente começar a funcionar. Finalizou o relatório do gerador antes do final do dia, e foi até a mesa da responsável pelo departamento, pelos corredores estreitos que dividiam as dezenas de gênios trabalhando.
-Srta. McCall, o levantamento de dados sobre o novo gerador. – Disse ele indicando a papelada, dirigindo-se à moça sentada do outro lado.
-Colocou o isolante pra raios? – Perguntou, e ele assentiu. – Ótimo, pode colocar na mesa. Obrigada. – Disse a moça com doçura, mas sem desviar-se do computador, concentrada no que quer que estivesse fazendo.
A garota responsável pelo setor de Inovações era notavelmente jovem, algo em que Peter reparara mais uma vez ao falar com ela – afinal, é bem estranho chamar alguém que tem quase a sua idade de "senhorita". Ela também estudava no MIT e era mesmo muito nova, e devia ser também incrivelmente inteligente para chefiar engenheiros ali com o dobro de sua idade. Constatar aquilo fez com que Parker tivesse um pequeno lapso de incentivo, afinal, quem sabe em breve ele pudesse chefiar um departamento inteiro também.
O garoto saiu dali e dirigiu-se até a sua mesa, onde encontrou um de seus supervisores esperando-o.
-Sr. Parker, reunião na sala de estratégias. – Disse o homem engravatado, e Peter reagiu de prontidão. Largou suas calculadoras e foi rapidamente até o outro lado do prédio, onde o dever o chamava.
A sala de estratégias possuía uma mesa grande e comprida no centro, onde se sentavam Thor, Banner, Romanoff, Visão e Stark, à espera do garoto. Só faltava ele para que o grupo estivesse completo, e a reunião pudesse começar.
Peter sentou-se na cadeira vaga mais próxima e observou enquanto dois executivos de terno entravam na sala, fechando a porta. Normalmente, quando caras como aqueles apareciam para assistir às reuniões, era porque o assunto era muito importante. Curioso, o garoto desejou internamente que fosse uma convocação para uma nova missão – algo que não aparecia há tempos. A tela de vidro na parede frontal à mesa foi acionada, para iniciar uma videoconferência.
-Boa tarde, Vingadores. – Disse formalmente o homem do vídeo, e todos responderam. O sujeito de meia idade usando um terno caro sentado em uma cadeira de couro já era conhecido. Aquele era o embaixador Thomas Callahan, presidente do Conselho de Segurança, que era responsável por fazer o contato entre a ONU e os Vingadores. – Agradeço a disponibilidade de todos para que pudéssemos fazer esta reunião.
-Nós é que agradecemos, Embaixador. – Disse Banner, ajeitando-se na cadeira.
-Pois bem. Como sabem, nosso trabalho nos últimos anos tem sido realizado de modo a tentar deixar a equipe dos Vingadores o mais próxima possível da sociedade. – O embaixador disse em tom introdutório. – Temos conseguido ótimos resultados desde então, porém, ainda há muito a ser feito. Desde o último combate em Sokovia, a população tem dividido opiniões em relação aos Vingadores protegendo a humanidade. Grande parte do medo que os rodeia parte daquilo que não conhecem. A equipe é blindada, trabalha em segredo, e estes segredos tem deixado as pessoas inseguras. Ninguém sabe como as coisas são feitas, como os membros da equipe são controlados e se a presença deles pode acarretar perigo ao invés de segurança, ou não. A reunião de hoje visa tratar desse assunto. Com o intuito de quebrar estas barreiras e aumentar a confiança da população na equipe, o governo dos Estados Unidos está organizando um evento em homenagem aos heróis, com um desfile a ser realizado em Washington na Avenida Pensilvânia durante o Veterans Day deste ano. Como o feriado homenageia pessoas que lutaram pela segurança e estabilidade do país durante a guerra, acreditamos que um destaque especial aos Vingadores poderia contribuir para um maior reconhecimento popular da equipe.
Os cinco heróis sentados à mesa entreolharam-se, sem manifestar. O embaixador Callahan continuou a falar, enquanto um dos seguranças engravatados abriu a porta da sala.
-Para organizar o desfile, estivemos em contato com a responsável técnica do departamento de equipamentos e Inovações dos Vingadores, Olivia McCall. – Apresentou Callahan, enquanto a moça adentrou a sala e caminhou até próximo da tela de projeção. – Pensamos que se vocês apresentarem algumas de suas novas tecnologias de batalha durante o evento, as pessoas ficariam impressionadas e isso inspiraria mais confiança. Obrigada pela presença, Srta. McCall. – O embaixador dirigiu-se a ela. – Mostre-nos o que sua equipe desenvolveu.
-Obrigada, embaixador Callahan. – Disse ela cordialmente. Aquela era a garota para quem Peter entregara os relatórios há pouco. – Boa tarde, Vingadores. Como todos sabem, o departamento de Inovações tem trabalhando incansavelmente para desenvolver as mais avançadas tecnologias de batalha para a equipe. Acreditamos que exibir algumas de nossas criações pode ser vantajoso para vocês, no entanto, mostrar demais poderia comprometer a estratégia de combate e possíveis elementos surpresa. Dito isso, nossa equipe idealizou algumas possibilidades. – Explicou a jovem com propriedade, segurando uma espécie de tablet de vidro na mão. Com um toque, ela ativou um projetor de realidade aumentada no centro da mesa que exibiu algumas imagens. – Pensamos que o desfile poderia ser liderado por alguns soldados de ferro organizados em filas. Inspirados no traje do Homem de Ferro, esses soldados foram aprimorados e possuem todos os acessórios para que deem assistência à população durante um combate. A maior novidade é que agora os robôs redefinem suas armaduras e permitem que cidadãos entrem nelas ou usem suas partes importantes para se protegerem, até serem levados para uma região segura. - Enquanto ela explicava isso, imagens detalhadas do projeto dos robôs eram exibidas no projetor 3D.
-Com licença, Srta. McCall – Thor interrompeu a explicação, erguendo a mão com um pouco de receio. – Sei que a questão aqui é o desfile e não o armamento, mas isso me ocorreu agora... e se as pessoas que usarem a armadura pra proteção durante o combate não devolverem o pedaço que pegaram?
-Como assim? Elas levariam embora tipo um souvenir de "meu primeiro ataque alienígena"? –Questionou Banner. – Pra quê?
-Bom, existem várias possibilidades. Roubar nossa tecnologia, ameaçar os vizinhos... – Thor explicou seu ponto de vista.
-Os soldados de ferro se reconstituem depois de levarem as pessoas até um lugar seguro. Caso alguém decida roubar uma parte, o robô pode localizá-la por GPS e tirar satisfações pessoalmente com quem tiver roubado seu acessório. – Explicou a garota, com um sorriso discreto no rosto.
-Quem seria estúpido a ponto de roubar um robô de guerra indestrutível? – Questionou Visão.
-Vamos voltar à reunião? – Sugeriu Romanoff com as sobrancelhas erguidas, após observar certa impaciência pela parte do embaixador. Todos se ativeram novamente à fala da Srta. McCall.
-A outra ideia diz respeito à chegada dos heróis. Recentemente, a equipe de Inovações desenvolveu um novo motor para os jatos oficiais, centenas de vezes mais potente. Na utilização em missões, o novo jato vai permitir que voem de um lado ao outro do globo em poucas horas. Isso vai agilizar as missões e fazer com que cheguem mais rápido a qualquer lugar que esteja sendo atacado, podendo conter a ameaça com mais eficácia. – A garota dizia enquanto caminhava ao redor da mesa. Uma imagem enorme do jato e seu novo motor se exibia. – A sugestão é que a equipe chegue em um desses jatos, pois além de ser muito rápido, ele ainda possui um design interessante que vai surpreender o público. – Finalizou a Srta. McCall, desligando o projetor de mesa.
-Senhor Callahan, não quero ser estraga-prazeres aqui, mas o governo acha mesmo uma boa ideia colocar uma equipe de super-heróis para desfilar em uma avenida pela imagem? –Questionou Romanoff com o semblante fechado.
-Não era nossa primeira opção também, agente Romanoff, mas precisamos colocar os Vingadores em contato mais direto com as pessoas. A sociedade precisa parar de vê-los apenas em situações de risco ou tragédia. A imagem da equipe precisa ser associada à segurança e coisas boas, e não a catástrofes. – Explicou o embaixador. – O que mais tem para nos apresentar, Srta. McCall?
-Essas são as principais ideias, Sr. Callahan. Os outros projetos dizem respeito aos trajes de cada herói, então serão discutidos com eles posteriormente.
-Muito bem. Obrigado pelo seu trabalho, mande elogios ao departamento. – Agradeceu o homem. – Acredito que este evento pode ser o início de uma fase mais favorável aos Vingadores. Sei que não é exatamente o que queriam, mas alguma coisa precisa ser feita. Não temos como prever quando um novo ataque alienígena pode ocorrer, mas quando isso acontecer, precisamos de toda a população ao nosso lado. – Callahan fez uma pausa. – Mais detalhes serão discutidos ao longo da semana para fecharmos o projeto em definitivo. Tenham uma coisa em mente, guerreiros: não adianta querer salvar a humanidade, se a humanidade não quer ser salva por vocês. Tenham uma boa tarde. – Concluiu o embaixador, desligando a conexão logo em seguida.
Alguns segundos de silêncio seguiram, até que um dos heróis decidiu se pronunciar.
-Não vamos fazer isso, não é? – Questionou Visão, confuso com tudo aquilo.
-Acho que não temos escolha. Nossa presença já foi anunciada. – Disse Peter, mostrando a notícia em um jornal virtual que acabara de abrir no celular.
-Gente famosa cancela eventos o tempo todo. – Constatou Banner. – É até bom pro status.
-Stark, foi você quem concordou com isso? – Perguntou Romanoff olhando feio para ele.
-Ah, parem de reclamar, não é como se fossemos fazer isso pra sempre. Andem, a reunião está encerrada. – Protestou Stark, fazendo todos se levantarem. – Não é tão ruim. Não sei quanto a vocês, mas eu mal posso esperar pra ver o Banner desfilando numa avenida e acenando para as pessoas como se fosse sociável.
-Se por acaso você ficar grudado na sua armadura e não conseguir mais sair depois do desfile, a culpa não será minha. - Respondeu Banner saindo da sala, fazendo Thor rir.
Os Vingadores caminharam em direção à porta, a maioria com caras bem insatisfeitas. Porém, não adiantaria discutir: ultimamente, sempre que Stark mandava todos saírem, era porque a decisão já tinha sido tomada e nem longas argumentações mudariam sua palavra final. Pouco a pouco, todos foram se retirando da sala de estratégias, e Peter foi o último a ficar. Quando o garoto estava quase saindo, Stark parou-o.
-Ei, Pirralho – Ele chamou, fazendo Parker dar meia volta. – Queria falar com você sobre uma coisa.
O rapaz entrou na sala novamente, parando em frente à mesa.
-Pois não, Sr. Stark? – Ele olhou para o homem ainda sentado.
-Queria te atualizar sobre o andamento dos testes do seu amigo.
Peter aprumou-se instantaneamente.
-Como ele está indo? – Perguntou, curioso.
-Muito bem. A equipe de pesquisa está impressionada com ele, continua surpreendendo e passando nos exames. – Contou Stark. – Ele tem potencial.
-Que bom saber. – Peter alegrou-se, e fez uma pausa logo em seguida. – E o que o senhor acha disso? – Questionou, apreensivo.
-Acho ótimo. O garoto é promissor. – Disse, fazendo Peter vibrar internamente. – Estou curioso para ver o que ele poderá fazer em combate.
-Eu também. Eu achei mesmo que ele poderia ajudar, ainda mais agora que a equipe está... meio defasada. – Peter mordeu o lábio, inseguro.
-Com toda certeza. – Concordou Stark. Os dois ficaram em silêncio por alguns segundos depois disso. – O que foi? Não espere que eu te agradeça por isso, ajudar a equipe é sua obrigação. Agora pode ir.
-Ok, Sr. Stark, até mais. – Peter sorriu, saindo da sala novamente.
-E vê se não traz mais nenhum amigo seu para cá. Já chega de adolescentes nesta equipe. – Stark gritou de dentro da sala.
O garoto saiu rindo e dirigiu-se até o departamento de Inovações para voltar ao trabalho, deixando Stark sozinho na sala de reuniões. O homem estava prestes a sair para cuidar de qualquer um dos seus afazeres empresariais, quando F.R.I.D.A.Y., o seu sistema operacional, enviou uma mensagem de áudio para alertá-lo de um compromisso.
-Sr. Stark, o senhor tem marcado em sua agenda uma visita ao laboratório do Dr. Banner para realizar os seus exames de rotina. – Disse a voz simpática saindo de seu relógio de pulso.
-Muito bem lembrado. – Respondeu. – O que eu faria sem você, F.R.Y.?
Tony foi sem demora até o outro lado do complexo, onde Banner já o esperava com um jaleco branco enquanto fazia algum tipo de pesquisa em seu computador.
Desde que Stark abandonara o reator ARC que ficava seu peito, e fizera a cirurgia para retirar os estilhaços de bomba próximos ao coração, Dr. Banner vinha fazendo um acompanhamento médico do caso de dentro da sede. Já que o eletroímã não era mais necessário para manter os fragmentos nocivos afastados, o coração de Stark funcionava normalmente, mas precisava ser constantemente monitorado por meio de exames e testes, assim como todo o funcionamento do seu corpo, já que ainda havia alguns danos.
Era tudo muito rápido, apenas um check-up de rotina. Algumas agulhas, exames de sangue, eletrocardiogramas e os resultados saiam logo em seguida. O laboratório de Banner fora propositalmente equipado com alguns dos melhores aparelhos de medicina, tudo para que Stark tivesse o melhor atendimento. Os exames eram precisos e rápidos, adequados para seu quadro tão peculiar.
-Está tudo ótimo como sempre, Stark. – Disse Banner após alguns minutos analisando os resultados na tela de seu computador. – Claro que você não é um sujeito comum, mas está dentro do que é normal pra você.
-Já me disseram que sou acima do normal. – Disse Tony, com uma brincadeira que era verídica do seu ponto de vista.
-A única coisa que me preocupa é, como sempre, o nível de radioatividade apontado nos exames. – Continuou Banner, voltando a uma velha história, o que fez Stark bufar. – Estes números são altos, você deveria me deixar investigar um pouco mais sobre eles.
-Eu já disse, Banner, essa radioatividade nunca me afetou, é besteira se preocupar com isso. – Falou Stark, dando a mesma resposta de sempre. - Já sobrevivi a coisas piores.
Desde que os exames de rotina começaram, Banner alertava Stark sobre a radioatividade que o uso contínuo do reator deixara em seu corpo. Depois de tantos anos com o ARC no peito, parte da radiação ainda permanecera no sistema, deixando um índice um tanto elevado e nocivo. Mesmo com isso apontado nos testes, Tony nunca quis que Bruce investigasse quais seriam as consequências destes níveis a longo prazo – o que não o impedia de insistir nisso em todos os seus encontros semanais.
-Tudo bem, então. – Banner deu-se por vencido, afinal já tinha cansado de fazer tal comentário. – Está liberado.
-Não fique verde de raiva só porque não deixo você me fazer de cobaia. – Respondeu Stark, fazendo Bruce rir. – Obrigado, amigo. – Finalizou, dando um tapinha nas costas do doutor e saindo do laboratório.
Banner voltou-se para a mesa de utensílios, negando com a cabeça. Stark era muito teimoso. Não havia uma boa razão para não fazer mais exames, exceto a chatice dele.
Bruce preparou-se para descartar amostras dos exames, como de costume. Porém, parou no meio do caminho, pensativo. Seu instinto de pesquisador estava falando alto, embora tivesse acabado de receber a sua enésima negativa. Banner se preocupava com o companheiro, e tinha medo que algo pudesse acontecer a ele por conta da maldita radioatividade – ele próprio sabia o efeito que ela podia causar. Além disso, estava muito curioso para ver quais seriam as consequências de um reator tão potente quanto o ARC no corpo humano. Isso o fez ponderar por alguns segundos.
Contrariando as vontades de Tony, Banner decidiu usar as amostras que tinha para fazer alguns testes. Queria sequenciar o DNA de Stark e fazer o mapa genético dele, para ver se a radiação havia causado alguma alteração significativa na sua composição. Talvez, depois de tanto tempo de exposição, a radioatividade tivesse deslocado algum gene, ou então iniciado algum outro processo mutagênico. Ele precisava investigar, ou não ficaria em paz consigo mesmo.
Aproveitando o restante das amostras que havia colhido, Banner colocou lâminas em sua centrífuga para iniciar a análise. Realizou a eletroforese, aplicou corante e jogou os dados em seu sistema para obter os resultados. Com diversas teorias em mente, ele programou o sequenciador para que analisasse os dados e finalizasse o processo.
Aquilo deveria demorar uns bons minutos, então ele sentou-se à mesa para tomar uma boa xícara de café enquanto esperava. Algum tempo depois, Romanoff bateu à porta de vidro do laboratório e apareceu para lhe fazer companhia.
-O que o cientista maluco está fazendo? – Ela questionou, entrando na sala.
-Estou processando os exames do Stark. – Respondeu Banner tomando mais um gole. – Quer me ajudar a contar hemácias?
-Parece divertido. – Romanoff sentou-se. – Está tudo bem com ele? – Perguntou, pegando uma xícara de café para si.
-Está sim, são os testes de rotina para o coração.
Ela fez um som em sinal de concordância, enquanto bebericava.
-Que bom que a saúde dele vai bem, porque eu tenho sinceras dúvidas sobre o resto. – Alegou Romanoff com ironia, afastando a xícara da boca. – Stark anda muito estranho.
-Mais estranho que o normal.
-Sim, e isso é preocupante. Anda todo autoritário, irredutível, fechado, e no meio disso faz algumas piadinhas típicas só pra tentar quebrar o gelo.
-Stark sempre foi um péssimo chefe, mas está se superando nos últimos meses. – Banner concordou.
-Ele tenta fazer tudo parecer bem, mas no fundo dá pra ver que ele está escondendo alguma coisa. – Afirmou Natasha, afogando a desconfiança com mais café.
-Tem alguma pista do que é, agente Romanoff? – Banner arqueou a sobrancelha.
-Bem que eu gostaria. – Lamentou, cerrando os olhos. – Aquele é um dos homens mais confusos que eu já vi. Sinceramente, eu tenho medo do que poderia descobrir se tentasse.
-Acha que tem algo a ver com os Vingadores? Algum erro ou quem sabe uma missão da qual não estamos sabendo?
-Não sei, mas espero que não. Já basta termos que nos submeter a desfilar pro Callahan, que de repente virou melhor amigo do Stark.
-Essa eu quero ver. – Riu o homem. – Como eles acham que um feriado, balões e uma avenida lotada irão fazer com que as pessoas gostem de nós?
O assunto foi interrompido por um alerta do computador, que fez Banner levantar-se imediatamente. Ele caminhou até a máquina, que avisava a conclusão de sequenciamento do DNA. Curioso, o cientista sentou-se e colocou os óculos, ignorando totalmente a presença de Romanoff – que pouco se importou, pois sabia o quanto parafernálias científicas interessavam ao amigo.
Alguns minutos encarando a tela e Bruce começou a se questionar se aquilo havia sido mesmo uma boa ideia. Ao constatar que o que pensara era verdade, ele soltou um grunhido de surpresa.
-O que foi? – Perguntou a mulher.
-Os resultados... – Ele respondeu, intrigado.
-O que é que tem? – Ela deixou o café em cima da mesa e aproximou-se para ver o que era. – Stark está doente?
-Não, não tem nada de errado.
-Então o que houve?
-Eu deixei o computador fazendo o mapeamento genético do Stark, porque queria saber quais poderiam ser os efeitos da radioatividade a que o corpo dele foi exposto por conta do reator ARC. A radiação não apresenta nenhum perigo pra ele por enquanto, mas o meu algoritmo encontrou uma coisa. – Explicou Banner, com os olhos ainda vidrados na tela. – Há outro DNA registrado no sistema que é muito parecido com o do Stark.
-Espera, que sistema? – Ela esforçava-se para entender, já que Banner não costumava ser muito específico quando ficava atônito com alguma coisa.
-Todas as pessoas que trabalham e circulam dentro da base dos Vingadores possuem seus dados jurídicos e biológicos salvos no sistema por segurança. Nós temos desde fichas de trânsito e biometrias até amostras de sangue e DNA, no caso de alguém ser alvo de algo ou suspeito de algo. – Ele esclareceu. – Existe alguém aqui dentro da base com mais de 40% de compatibilidade com ele.
-Pra você estar com essa cara, acho que isso deve significar alguma coisa séria. – Humorizou Natasha. – E quem é?
Os dados estavam terminando de ser baixados, e então uma janela se acendeu no visor. Banner abriu o arquivo da pessoa registrada com a compatibilidade, e deparou-se com dezenas de arquivos, uma foto e um nome: Olivia McCall.
-É a garota que chefia o departamento de inovações – Disse Natasha, intrigada. – Que estava na reunião hoje apresentando os equipamentos.
-Olha, eu não sei ao certo o que isso implica, mas... com esse nível de similaridade no DNA, não há muitas possibilidades. Só tem uma explicação para uma compatibilidade tão grande. – Disse Banner, tirando os óculos e virando-se para Romanoff. – O Stark é pai da menina.
Capítulo 2
O telefone estava tocando o dia todo. Eram lembretes de reuniões, ligações internacionais, e-mails intermináveis... um típico dia de trabalho para um grande empresário multimilionário. Stark estava sentado diante de sua mesa em seu enorme escritório na base dos Vingadores, admirando a bela vista do último andar através das vidraças. Ele descansava os pés em cima do teclado do computador enquanto esforçava-se para entender o que um investidor coreano dizia num inglês enrolado do outro lado da linha, quando F.R.I.D.A.Y. interrompeu seu raciocínio.
-Thor está aqui. Devo deixá-lo entrar? – Perguntou o sistema operacional.
-Qualquer um é bem-vindo desde que fale minha língua. – Stark soltou, tirando os pés da mesa e ajeitando-se na poltrona giratória para receber a visita. Despediu-se do investidor em uma mistura confusa de inglês e coreano, para dar atenção ao deus que adentrava na sala.
-Dia difícil? – Perguntou o loiro com um sorriso, sentando-se na cadeira do outro lado da mesa.
Stark respondeu com aquilo que ele pensava significar "você nem imagina" em coreano.
-Vou entender isso como um sim.
-Ache como quiser, nem eu mesmo entendi. – Tony ergueu as sobrancelhas com indiferença. –Como estão as coisas?
-Tranquilas. Aliás, estava praticando meus poderes no novo centro de treinamento antes de vir até aqui, e ficou excelente. – Thor elogiou. – Bem melhor do que o que tínhamos na outra base. É amplo, tem bastante recursos, e a fonte de energia não pifou quando lancei meus raios.
-Que bom, isso quer dizer que a invenção do Parker funcionou. – Stark comemorou. – Ainda bem, porque se não estaríamos todos literalmente fritos agora, graças ao Pirralho. – Ele fez Thor rir. – Mas a que eu devo sua visita, meu caro amigo asgardiano?
-Estava esperando que pudesse me atualizar um pouco mais sobre o andamento da equipe durante tempo em que estive fora com o Banner. – Explicou Thor. – Ainda não tivemos muito tempo pra falar sobre isso.
-Bem, o governo ameaçou nos fechar, entramos em uma divisão violenta, ganhamos novos membros, mudamos de cidade... nada demais. – Disse Tony com as sobrancelhas arqueadas. – Por que a pergunta?
-Eu já sei de tudo isso, mas parece que mais coisas mudaram. Além de uma nova base e uma nova equipe, estamos respondendo para as grandes organizações de poder dos humanos. – Continuou o deus. – É muita coisa para dois ou três anos.
-Digamos que as circunstâncias nos obrigaram a fazer algumas alterações, mas estamos bem. – Stark fez uma pausa. – Por que a preocupação assim tão de repente?
-Eu não sei. Metade da equipe foi embora, isso gera várias perguntas. – Falou Thor, o que fez Tony se afastar na cadeira.
-Bom, alguns de nós não concordaram com as alterações que fomos obrigados a fazer. Às vezes divergências fazem equipes se dividirem e seguirem seus próprios caminhos. Como no One Direction. – Stark explicou, um pouco desconfortável com o assunto.
-Não é tão simples assim, Tony. Você não me contou a história toda. – Pressionou Thor. – As pessoas têm falado sobre isso, os outros membros da equipe também. A discussão foi bem além de apenas divergência de ideias. Os Vingadores entraram em guerra.
-Guerra é uma palavra tão pesada, não acha? – Tony franziu a testa. – Eu prefiro discussão incisiva.
-Isso é sério, Stark. – Thor fez uma pausa. Sabia que arrancar aquilo dele seria difícil. – O que houve entre você e o Rogers, afinal?
-Você mesmo disse: divergência de ideias. – Falou Tony, sério.
-Ele quebrou sua armadura e você tomou o escudo dele. Isso é bem mais grave do que discordar sobre a cor do uniforme ou algo do tipo.
-O Rogers não queria aceitar os fatos. – Stark disparou, cedendo ao assunto ao notar que não conseguiria evitá-lo. – Ele esqueceu que no século em que vivemos agora, ao contrário da época dele, todas as grandes organizações que possuem alta tecnologia e interferem diretamente no mundo como nós, precisam passar pelos olhos do governo por segurança. Ele queria bancar o herói injustiçado, e esqueceu que nós também causamos mortes.
-Ele se recusou a assinar o acordo com as Nações Unidas?
-Ele, Clint, a gêmea Maximoff e Falcão. – Contou Stark. – Cada um pensava uma coisa e não conseguimos chegar a um acordo sobre o que fazer com a equipe. E foi aí que as coisas começaram a, digamos... sair do controle.
-Com os dois maiores cabeças-duras da equipe discordando, não poderia ser diferente. – Thor ironizou. – Sempre soube que a relação entre você e o Rogers era difícil, mas não imaginei que isso pudesse fazer os dois quase se matarem. O que mais aconteceu pra que ficassem com tanta raiva um do outro?
-O Rogers escolheu o lado errado. – Tony resumiu. – E foi um traidor.
-Como assim um traidor? Eu pensei que você também não gostasse da ideia de deixar o governo controlar os Vingadores.
A fala do deus foi interrompida pelo som da porta abrindo. Banner e Romanoff adentraram o escritório e fecharam a porta logo em seguida, com semblantes estranhamente fechados.
-Será mesmo que alguém tem controle sobre essa equipe? – Comentou Stark.
-Me desculpe por não anunciar a entrada do Dr. Banner e da agente Romanoff, Sr. Stark. - A voz de F.R.I.D.A.Y. ecoou pelo escritório. - Mas eles não pediram permissão para entrar.
-Que novidade. – Tony disse com tédio. – Posso saber o motivo da reunião de última hora?
-Temos algumas dúvidas importantes pra esclarecer com você, Stark. – Falou Natasha, séria.
-Por que todo mundo resolveu me fazer perguntas hoje? – Ele retrucou.
-Eu estava processando seus exames no laboratório agora a pouco, e alguns resultados apontaram coisas bem curiosas. – Disse Banner, jogando alguns papéis em cima da mesa.
Eram os resultados dos testes feitos com o DNA de Stark, que apontaram a semelhança com a garota que chefiava o departamento de Inovações. Stark analisou aquilo por alguns segundos, antes de responder com a cara fechada:
-Você testou os níveis de radiação nos meus genes, não foi?
-Queria que fosse esse o problema. – Respondeu Banner, com aspereza na voz. – Sabe, seu DNA está ótimo. Inclusive, encontrou um parente no sistema.
-Parente? – Perguntou Thor, que observava a tudo confuso.
-Sim, alguém da família Stark, registrado aqui mesmo, na sede dos Vingadores. – Banner continuou. – Curioso, não? Nós também achamos.
-Quem é? – Perguntou o deus, enquanto Tony observava a cena toda com os olhos cerrados e o maxilar tensionado.
-Olivia McCall. A responsável das Inovações. – Revelou Natasha sem pudor, cruzando os braços. – O sistema está acusando que ela e o Stark tem um DNA muito parecido, que combina tanto que até poderiam ser...
-Tá bom, espera aí. – Tony a interrompeu, levantando de sua poltrona. – Vamos ignorar o fato de que o Banner acabou de violar o código de sigilo entre médico e paciente, e de que os dois estavam bisbilhotando a minha privacidade, e vamos esclarecer as coisas. O sistema achou uma semelhança porque ela é verdadeira.
-Não diga, pensamos que a máquina tivesse errado na contagem de cromossomos. – Provocou Romanoff, vendo que ele estava enrolando. – Quem é a garota, Stark?
-Não acredito que vou ter que dar satisfações sobre isso. – Tony bufou, rolando os olhos. – Olivia é minha sobrinha. Ela está fazendo faculdade aqui na cidade, então dei um estágio a ela na área do curso.
-Bom, se é assim tão simples, por que não nos contou? – Natasha questionou, sem comprar a ideia. – Ficaríamos felizes em saber que sua sobrinha trabalha com a gente.
-Eu não achei que fosse necessário, afinal a menina poderia ficar constrangida se todos soubessem que seu tio era...
-Corta essa, Stark. Você é filho único. – Interrompeu Banner, encurralando-o. – Não tem como ter sobrinhos.
Os olhos de Stark cerraram-se por um instante. Quando ele tomou fôlego para retrucar, Natasha disparou:
-A menina é sua filha.
-Negue o quanto quiser, eu fiz os testes. – Finalizou Banner, dando início a um silêncio constrangedor.
Tony soltou uma respiração pesada, recostando-se na mesa. Ele massageou as têmporas, enquanto os três companheiros o observavam esperando uma reação.
-O que querem que eu faça? Que saia gritando? Que brigue com vocês? – Stark esbravejou de repente. – A resposta está aí. É o que queriam ouvir?
-Você escondeu isso de nós por todos esses anos... – Natasha o encarava com desdém, negando com a cabeça.
-Por quê? – Banner questionou.
-Vocês não entendem, está bem? Não sabem de nada! – Tony vociferou. – E não merecem saber, depois do que fizeram. Esse assunto não interessa a vocês, não interessa a ninguém. Agora, pensem o que quiserem sobre isso, mas vocês não podem contar a ninguém que Olivia é minha filha.
Neste momento, uma garota loira adentrou inocentemente no escritório segurando uma pilha de papéis nos braços, e parou imediatamente ao ouvir a gritaria dos quatro.
Após vários segundos desconfortáveis de trocas de olhares entre os presentes, F.R.I.D.A.Y. apareceu com sua voz simpática para anunciar:
-Sr. Stark, Olivia McCall está aqui.
-Na hora certa, F.R.I.D.A.Y. – Disse Stark, ironicamente.
Os olhares de reprovação e repúdio dos três Vingadores passaram por Tony e pela garota, que estava visivelmente sem graça. Natasha, Bruce e Thor se entreolharam, contrariados, e saíram do escritório sem dizer mais nada.
O silêncio pesado permaneceu por mais algum tempo, enquanto a porta se fechava atrás dos três heróis e Stark dirigia-se novamente à sua mesa, negando com a cabeça.
-Como eles descobriram? – Perguntou a garota, com frustração na voz.
-Xeretando, é claro. – Stark rosnou.
-E agora? – Ela se aproximou da mesa.
-Eu ainda não sei. – O homem suspirou. – Mas não se preocupe com isso. Só continue fazendo seu trabalho.
-É claro que eu me preocupo. – Olivia retrucou. – Não quero causar problemas pra você.
-A culpa não é sua, Olivia, não me causou problema algum. Eu vou dar um jeito nisso.
-Que jeito? Eles vão dizer pro resto da equipe.
-Não vão, não. Eu falei a eles para não dizerem.
-Que é a mesma coisa que nada. – Olivia revirou os olhos. – Isso não é um segredinho qualquer, eles ficaram muito irritados com você.
-Tá bom, e o que quer que eu faça, então?
-Eu sei lá – A garota suspirou, colocando a mão sobre a testa. – Acho que está na hora de acabarmos com isso.
-Acabar com o que?
-Com essa palhaçada toda. Eu estou cansada disso, nem sequer deveria estar aqui. – Olivia bufou. – Acho que eu deveria ir embora.
-Deixe de ser boba, já discutimos sobre isso.
-É, mas foi antes de todos descobrirem. Isso muda as coisas.
-Não o suficiente. Você fica aqui e ponto.
-Mas...
-Olivia, você não pode ir embora e sabe muito bem por que. – Stark falou autoritário, fazendo a menina desviar o olhar. – Nós dois sabemos o que está em jogo e o que pode acontecer se você for.
-Que seja. – Ela cedeu, contrariada.
-Não se preocupe, eu vou resolver isso.
-Tanto faz. – Olivia falou tediosa, colocando a pilha de papéis que tinha em mãos em cima da mesa, e saindo logo em seguida. Ela se retirou e fechou a porta novamente, deixando Stark sozinho a pensar.
Teria sido mais fácil continuar a negociar com aquele investidor coreano.
_
-Eles acham mesmo que vamos sair assim na frente de milhares de pessoas?
-Nem pensar.
-Alguém precisa dar um jeito nisso.
O clima não era exatamente de harmonia e concordância na sala de equipamentos da base dos heróis. Aquela discussão era o que deveria ser o teste do desfile dos Vingadores para o Veterans Day, que acontecia em uma semana – porém, estava mais para uma sessão de stress, risos de deboche e olhares atravessados. Os guerreiros experimentavam seus uniformes e eram apresentados aos equipamentos que usariam durante o evento, mas estavam rejeitando quase todos eles.
-Eu me recuso a usar isso. – Falou Banner, analisando sua roupa que fazia alusão ao verde da pele do Hulk. – É ridículo.
-Isso aqui é de ferro. – Constatou Thor examinando o martelo que tinha em mãos, uma imitação do seu próprio, que havia sido quebrado por Hela.
-Eu não vou nem comentar. – Retrucou Natasha, olhando para o seu novo cinto de utilidades que possuía o desenho de uma aranha viúva-negra no centro.
-Sr. Stark, o senhor tem certeza disso? – Disse Peter com dificuldade, tentando entrar em seu novo uniforme apertadíssimo - mais que o normal.
Tony observava àquilo tudo com o rosto sério, analisando a situação e pensando que provavelmente não tinha sido uma boa ideia mexer com o bom humor do Dr. Banner.
-Tá bom, esperem aí. – Disse ele, descruzando os braços e andando entre os colegas. – Sei que não é desse jeito que costumamos sair às ruas todo dia, mas não está tão ruim assim.
Aquele comentário resultou em uma chuva de contradições e respostas atravessadas por parte dos outros companheiros.
O famigerado desfile que traria os Vingadores para o gosto do público novamente parecia estar cada vez mais distante. A equipe de Publicidade que era responsável por coordenar o evento havia ficado à mercê dos desejos do governador do distrito de Columbia, que era quem idealizava o Veterans Day, durante todo o processo de desenvolvimento do desfile. Aparentemente, aquele cara não tinha noção alguma do que eram super-heróis, e não sabia diferenciá-los de um grupo de palhaços.
-Tony, sei que está tentando amenizar, mas esses acessórios não estão passando credibilidade alguma. – Colocou Visão, tentando não bater de frente. Ele usava uma espécie de capacete que ressaltava a joia brilhante em sua testa de um jeito bizarro.
-Stark, você deveria ligar pra ele e dizer que não podemos fazer isso. Assim não dá. – Thor argumentou, balançando seu martelo de mentira pra lá e pra cá.
Stark suspirou, observando o desastre, a correria e as caras feias ao seu redor. Ele já sabia que aquilo ia acontecer.
-Ok, sei que está todo mundo chateado, mas nós não temos escolha agora. Nós precisamos dessa propaganda. – Stark enunciou. – O Callahan não vai voltar atrás.
-Mas foi ele que meteu a gente nessa – Peter discutiu por trás da máscara que o sufocava. – Ele deveria resolver.
-Nós somos super-heróis, Stark, não personagens de carnaval. – Disse Bruce.
-Ok, espera aí. Não vai ser como vocês estão pensando. Isso não é 4 de Julho, não vão ter balões e orquestras com trompetes. Nós vamos desfilar seriamente pela avenida ao lado de veteranos de guerra, eles vão dar uns tiros pra cima, e vamos receber medalhas de condecoração pelos feitos que tivemos. – Stark fez uma pausa, soltando um suspiro. – Olhem, eu também não gosto da ideia de sair por aí caminhando e acenando como se fosse a rainha da Inglaterra, mas nós estamos há muito tempo inativos e a ONU quer a nossa aparição em algum lugar.
-Então a ONU que arrume alguma aparição decente para os Vingadores, como uma missão de verdade, já que insistiu tanto em controlar o que a gente faz. – Romanoff replicou, sem paciência.
-A Natasha tem razão. – Disse Peter. – O Sr. Callahan não entende nada sobre os Vingadores.
-Até agora, todas as ordens do Conselho têm sido catastróficas. – Foi a vez de Visão tecer a crítica. – Eles não nos enviam para lugar nenhum, e nos deixam aqui com um monte de cientistas e funcionários que contrataram só para dirigir investimentos e fazer pesquisas. Sem ofensas. – Ele disse a última parte dirigindo-se à equipe de Publicidade, mas a maioria deles já havia se retirado para deixá-los discutir em particular.
-Acho difícil que o Stark bata de frente com as equipes de cientistas. – Banner alfinetou o empresário. – São particularmente importantes pra ele.
-Tudo bem, mas ainda precisamos fazer alguma coisa.
-O Stark não vai fazer nada, ele concorda com o Callahan. – Falou Natasha.
-É claro que eu concordo, mas ainda faço parte dessa equipe. – Stark retrucou, aborrecido com a conversa.
-Então diga a eles o que achamos disso.
-Ou deixe a gente dizer. Você é o único que negocia com o Conselho de Segurança, mas nós poderíamos fazer isso também.
-É verdade. – Concordou Thor. – Talvez nós devêssemos começar a participar dessas reuniões.
-Seria mais justo se a equipe inteira falasse, e ouvisse aquilo que eles falam também.
-É, Stark, não é certo guardar segredos da sua equipe. – Romanoff provocou, arqueando as sobrancelhas. Tony encarou-a com raiva.
-Isso é verdade, Tony. Você tem andado muito fechado a respeito da diplomacia ultimamente. – Disse Visão.
-Fica apenas no seu escritório, negocia sozinho, não fala com ninguém e finge que nada aconteceu.
-Ótimo, agora vamos para o lado pessoal. Quem disse isso? – Stark questionou, na defensiva.
-Todos nós temos dito isso. – Completou Parker, receoso. – Eu sei que você não vai gostar de ouvir isso, Sr. Stark, mas você tem andado muito estranho ultimamente. Parece até que está...
-Escondendo alguma coisa. – Acusou Thor, entrando na onda dos outros dois colegas ali que sabiam mais que o resto.
-Vocês acham mesmo que eu não jogo às claras com vocês? – Perguntou Stark, começando a perder a paciência. – Querem participar das reuniões? Ótimo, participem. Eu só faço isso sozinho porque pensava que seria chato pra vocês lidar com o Conselho. Vocês acham mesmo que eu estou escondendo algo?
-Nós não sabemos, não é mesmo? Você tem tantos segredos... – Continuou Natasha.
-Segredos? – Visão intrigou-se. – Sabe de algo que nós não sabemos, Romanoff?
-Parem de besteira, não existem segredos. – Stark discutiu.
-Não queremos te acusar de nada, só estamos comentando.
-Bom, eu sei de algumas coisas. – Thor jogou no ar.
-Que coisas? – O resto da equipe parecia perdido.
-Querem parar com isso? – Stark vociferou.
-Sabemos de uma coisa. – Banner entrou na chantagem, ignorando Tony totalmente. – Stark tem um segredinho de cabelos loiros e olhos claros dentro da equipe de Inovações.
-O Sr. Stark tem uma amante? – Agora era Peter quem estava confuso. – Mas e a Pepper? – Perguntou indignado.
-É claro que não, Parker, pare de besteira. – Stark falou, visivelmente irritado. – É que o Banner me adora tanto que não consegue deixar de interferir na minha vida, mesmo quando não é chamado.
-Vamos lá, Tony. – Bruce deixou escapar um sorriso, fazendo o sangue de Stark ferver. – Não acha que eles deveriam saber?
-Saber o que, pelo amor de Deus? Alguém pode explicar? – Parker bufou.
-Saber que eu tenho uma filha. – Exclamou Stark, em alto e bom som, o que fez com que todos se calassem imediatamente. – E vocês todos a conhecem. Ela trabalha aqui, na equipe de Inovações. Felizes agora? – Ele se dirigiu a Romanoff e Banner, com um semblante fechado assim como os deles. – Espero que estejam satisfeitos por arrancar isso de mim, porque este é um segredo pessoal, que não interfere nem um pouco na minha honestidade com a equipe. Me desculpem por não poder ser um livro aberto o tempo todo, mas vocês todos têm muito para apontar, não é mesmo? – Ele deu um sorriso irônico. – Bom, agora já sabem. Podem espalhar por aí que o segredo por trás da antipatia de Tony Stark nos últimos meses foi revelado. Sugiro que usem isso antes que saia no TMZ. – Ele encerrou com o rosto inteiro tenso, e saiu andando pelo saguão a passos largos e pesados.
Ninguém sabia direito o que falar após aquela informação ser atirada sem mais nem menos. Stark deu as costas, e após longos segundos mergulhados no silêncio, os heróis começaram a questionar.
-Isso é sério? – Visão dirigiu a pergunta aos três que provocavam há pouco.
-É, sim. – Romanoff disse, suspirando em seguida. – Foi o Banner quem descobriu.
-Como?
-Fazendo os exames do Stark como sempre faço. O sistema me mostrou o parentesco pela compatibilidade do DNA – Banner explicou. – Com a Srta. McCall.
Todos ficaram surpresos ao ouvirem o nome dela.
-E vocês usaram isso pra arrancar dele? – Peter questionou.
-Sim. E logo depois ele pirou dizendo que a gente não entendia nada. – Natasha falou em tom debochado. – Mas a verdade é que ele só estava escondendo as coisas de nós. Como vem fazendo faz tempo.
-Não quero discordar de vocês, mas isso realmente é pessoal, e não quer dizer que Stark é necessariamente um mentiroso. – Visão disse, ponderando.
-Ninguém disse que ele é um mentiroso, só dissemos que ele não nos conta as coisas.
-E o que é tão sério que não entendemos, afinal?
Os heróis passaram alguns minutos pensativos em silêncio, sem mais nada para falar mesmo que muito se passasse em suas cabeças. Ficaram assim, até que começaram a se retirar da sala também. Romanoff e Bruce foram os primeiros, seguidos por Thor e os outros. Ninguém sabia de que lado ficar, e as coisas terminaram assim.
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A confusão toda durante o teste não foi capaz de prejudicar o defeituoso desfile de Veterans Day dos Vingadores. Após uma semana regada de rancor, olhares atravessados e momentos constrangedores, os heróis viam-se a poucas horas de embarcar em viagem para o que acreditavam ser o maior mico que pagariam em sua trajetória como salvadores da pátria.
Stark passou a semana trancado em seu escritório, rodeado de afazeres e sem dar mais satisfações, sobre o ocorrido no teste ou qualquer outra coisa. Ficou sem conversar com todos os colegas de equipe, principalmente com Natasha e Bruce. Como ambos não faziam questão do contato, o clima frio e estranho pairou sobre todos os encontros dos Vingadores – o que não era diferente agora.
Os heróis estavam no hangar da base fazendo os toques finais em seus trajes esquisitos enquanto as equipes de Inovações e de Publicidade carregavam o avião com os equipamentos necessários para o desfile. A viagem aconteceria em breve, portanto a movimentação era intensa; mas o silêncio era constante.
-Gostei do seu maiô novo, Parker, é ainda mais apertado que o de sempre. Vai conquistar muitas garotas assim. – Thor brincou, na tentativa de quebrar aquele gelo sufocante.
-Muito engraçado, Martelo de Ferro. Quero ver você lançar uma faísca sequer com esse brinquedinho aí pra impressionar a multidão. – Peter entrou na brincadeira, sem se mover muito para não correr o risco de rasgar o collant que era realmente grudado.
-Tenho certeza que a multidão já vai estar bem impressionada ao ver a palhaçada que estamos fazendo. – Banner comentou, àquele ponto com uma crítica que já soava como piada.
A interação mínima foi interrompida por Olivia McCall aproximando-se com sua prancheta em mãos, anotando coisas rapidamente. Todos os heróis retesaram-se, diante da presença da garota cujo nome causou toda aquela situação desconfortável. Ela parou em frente a eles e pediu sua atenção.
-Boa tarde, Vingadores. Meu nome é Olivia McCall, caso vocês não se lembrem de mim; o que eu acho difícil, afinal sei que fui um assunto quente durante a semana. – Ela disse em tom de voz baixo, normalizando-o logo em seguida. – Eu e minha equipe fizemos tudo que pudemos para fazer do desfile o melhor... que ele poderia ser. – Ela torceu o nariz. Claramente ninguém ali se agradava com a ideia. – Todos os equipamentos já estão no avião e os novos acessórios já estão devidamente colocados nos uniformes de vocês. O exército americano será responsável por realizar a segurança do evento, garantindo a estabilidade da multidão e dos senhores, então estão liberados da função de heróis no dia de hoje; são apenas as estrelas do show. – Banner e Parker soltaram um riso abafado devido à menção daquilo como um “show”. Um show de horrores, talvez. – Eu estarei acompanhando a equipe pra supervisionar as tecnologias e garantir que as coisas fiquem certas. Partimos em quinze minutos.
A garota se retirou novamente após um breve sorriso simpático, e saiu anotando mais coisas em sua prancheta. Banner e Romanoff trocaram rápidos olhares por conta da fala dela no início, a respeito de sua identidade. Todos os membros da equipe dirigiram a atenção para Stark, que manteve o semblante sério, fingindo que não notara os olhares sobre si – da mesma forma que fez a semana toda.
Os engenheiros e estilistas que passaram os últimos vinte minutos fazendo ajustes nos trajes retiraram-se de perto dos heróis, e as enormes equipes disso e daquilo que transitavam incansavelmente começaram a sair do hangar para abrir espaço para a decolagem. Aquela seria uma viagem rápida até Washington, onde a reputação incerta dos Vingadores seria ainda mais ameaçada. A rampa do avião foi aberta, e os heróis prepararam-se para embarcar, quando tiveram o trajeto interrompido por um estrondo vindo do jardim.
O barulho foi similar a uma explosão, e veio seguido por alguns gritos distantes. Todos se voltaram imediatamente para o portão aberto da pista de pouso, que lhes dava a vista exata de um aglomerado de pessoas correndo, e do setor de Inteligência destruído com cacos de vidro e papeladas voando para todo lado.
-Sr. Stark, foram detectadas falhas no sistema de segurança da base. - Alertou F.R.I.D.A.Y. através do relógio de pulso de Tony.
-Quero toda a equipe de segurança aqui agora para investigar o que foi isso. – Stark disse ao comunicador, enquanto já se dirigia para o lado de fora acompanhado dos outros heróis, todos em alerta.
Não houve nem tempo para receber uma resposta de F.R.I.D.A.Y. ou de qualquer sistema. Ao chegarem ao jardim, os Vingadores avistaram uma figura erguida no céu a cerca de vinte metros acima de suas cabeças; era um homem que trajava um uniforme verde com vermelho, e já se preparava para causar outro estrago.
Imediatamente, o time dos Vingadores entrou em ação para deter quem quer que fosse aquele sujeito intrometido e raivoso. Peter e Romanoff correram até o que restara do setor de Inteligência para socorrer os funcionários desesperados, enquanto Thor, Stark e Banner iam tirar satisfações com o invasor.
-Sr. Stark, nossos firewalls de proteção estão inativos, e os sistemas da base encontram-se vulneráveis. - Foi mais um alerta de F.R.I.D.A.Y.
-Ainda temos tempo pra conter a ameaça. Eu instalei um firewall reserva recentemente, duas vezes mais incriptado, que se ativa automaticamente quando o primeiro cai. Deve detê-lo, ou ao menos atrasá-lo. – Constatou Stark.
-Lamento, mas o sistema de segurança II também caiu. – Aquilo alarmou Tony.
-O sistema III...?
-Já era.
Stark, que até ali se considerara muito astuto, achou que a brincadeira estava começando a perder a graça.
-Ative o protocolo de segurança Watchman, então. – Ele pediu preocupado.
-Eu já tinha acionado – A voz fez uma pausa e então retornou a falar. – Mas ele acabou de ser derrubado também.
-Ok, meus elementos-surpresa acabaram. – Tony disse, atônito e um tanto frustrado. – F.R.I.D.A.Y., anote na minha agenda: criar mais protocolos de segurança complementares e inesperados para deter intrometidos que gostam de estragar a minha festa.
Antes que os três heróis pudessem chegar ao agressor misterioso, mais uma explosão foi causada por ele, que parecia ser capaz de lançar um poder de detonação com suas próprias mãos. Desta vez, o setor vizinho era o alvo. Um dos pilares que sustentava o prédio ameaçou desmoronar, e Stark usou seus propulsores de voo – que estranhamente falharam – para chegar até lá e segurar a pilastra de concreto.
-Quem é esse sujeito tão nervosinho? – Disse Tony em seu comunicador, com um pouco de dificuldade devido ao esforço que estava fazendo. – Por acaso algum de vocês tem um velho inimigo procurando um remember?
A pilastra de concreto começou a rachar, obrigando Tony a agilizar o processo para reequilibrá-la.
-Quem seria? Asgardiano adotado com mania de grandeza? – Palpitou Stark.
-Não que eu saiba. – Respondeu Thor ofegante por conta do combate, referindo-se a Loki.
-Pai de família revoltado com tecnologia alienígena roubada? – Tony arriscou.
-Na cadeia, até onde eu sei. – Peter negou a presença de Abutre enquanto corria pelo saguão do departamento.
-Bom, pelos meus conhecimentos, ele não é nenhum funcionário louco tentando tomar o meu lugar. F.R.I.D.A.Y., conseguiu alguma pista da identidade do nosso amigo? – Questionou Stark, finalmente conseguindo colocar o pilar de concreto no lugar. Estranhamente, ele não recebeu resposta. – F.R.I.D.A.Y., está me ouvindo?
Ele dirigiu o olhar até o visor em seu capacete, onde um aviso luminoso atestava "conexão perdida" com seu sistema operacional.
-Bom, seja lá quem ele for, cortou a comunicação do complexo. – Stark anunciou, com frustração na voz. – Como estamos indo, equipe?
-Ele explodiu o setor de Contabilidade também, estou tentando ajudar as pessoas a saírem. – Disse Romanoff. – Mas digamos que esse novo cinto de utilidades não está sendo lá muito útil. – Bufou, apertando o botão da viúva negra no centro sem receber qualquer reação do equipamento.
-Eu mandei acionar o alarme pra evacuar a base antes da comunicação ser cortada, acredito que os outros prédios já estão sendo esvaziados. – Stark contou. – E o setor de Inteligência, Parker?
-Eu estou tentando ajudá-los, Sr. Stark, mas esse uniforme é muito ruim. – Disse Peter com dificuldade. A malha de seu novo traje limitava e muito seus movimentos, o que dificultava sua agilidade. Ele se balançava de um lado para o outro em suas teias por entre as marquises rachadas, pegando o máximo de pessoas que conseguia e lançando-as para suas teias salva-vidas do lado de fora.
-Continue tentando, garoto. Thor, e você? – Stark disse no meio do trajeto de voo para chegar até o deus, que estava mais próximo do invasor. – Estou indo até aí. Ou ao menos tentando. – Finalizou, após notar que seus propulsores estavam falhando novamente.
-As coisas estão meio difíceis com esse martelo decorativo. – Bufou o loiro, tentando arremessar o objeto no inimigo, mas sem atingir a distância necessária.
Os acessórios esdrúxulos do desfile estavam prejudicando – além da dignidade – o desempenho dos heróis em combate. Com medo de expor a tecnologia dos Vingadores para um possível roubo, a equipe de Inovações decidiu retirar boa parte dos adereços reais dos uniformes que usariam durante o desfile, deixando-os meramente decorativos e transformando-os nos alegóricos trajes idealizados pelo distrito de Columbia. Apenas os robôs e a nave seriam tecnologias verdadeiras, usadas para impressionar a multidão, e o restante não seria necessário, uma vez que os heróis estariam lá para desfilar e não lutar. Uma ideia que, agora, mostrava-se ter sido a pior possível.
Durante esse tempo de frustrações e desastres, a equipe de atiradores e seguranças da base chegou em peso para combater a invasão. Eles dispararam uma chuva de tiros em direção ao inimigo voador, da qual ele desviou facilmente, com uma agilidade sobre-humana. Também não foi difícil para o homem pegar destroços das explosões e arremessar contra os homens, que pouco tinham para se defender. Com isso, o combate parecia vencido; para terminar de derrubá-los, uma chuva de cacos de vidro opôs-se aos ínfimos tiros que disparavam.
-Sr. Stark, não estamos equipados o suficiente para lutar com esse cara – Atestou o chefe de segurança em seu walkie-talkie. – A sala de armas foi trancada no momento em que o alarme de alerta soou, com a maioria dos equipamentos dentro.
-Retire seus soldados daí imediatamente, comandante. Nós cuidamos disso. – Respondeu Tony, ficando cada vez mais irritado com aquele sujeito que parecia ter tudo a seu favor.
Após a vitória contra os seguranças, o invasor diminuiu sua altitude consideravelmente, visando, por trás da máscara que cobria metade do seu rosto, seu próximo alvo. Ele preparou seus poderes e atirou na direção do avião da viagem a Washington, explodindo-o. O estrago só não foi maior porque Banner, já transformado em Hulk, segurou a aeronave antes que pudesse atingir o hangar enquanto deslizava por ele. Com um grito de fúria, Hulk arremessou o avião de volta ao inimigo, que foi atingido em cheio, mas não foi abatido com o enorme impacto. Após alguns segundos de recuperação, ele retornou à sua posição inicial e atacou o monstro verde diretamente, jogando-o metros longe com uma explosão.
Não sem tempo, Thor e Stark chegaram rapidamente à pista de pouso, com o deus fazendo uma entrada triunfal ao ser arremessado por Tony contra o invasor, acertando seu martelo fajuto, porém pesado bem no meio da enorme letra W estampada no uniforme dele.
Em uma rápida reação, o inimigo atirou o martelo de volta com o que parecia ser o dobro da força inicial, e atingiu Stark bem no meio de sua armadura. Thor já preparava o contra-ataque com seus poderes de raio, porém, o adversário lançou um de seus poderes e derrubou-o bem em cima de Stark.
-Cadê o resto da equipe?! - Bradou Tony no comunicador, irritado com o fato de sua armadura falsa ter ficado tão danificada com uma simples martelada. De que era feito aquele traje? Papel?!
-Estamos a cam... - Foi a resposta obtida, antes de o que parecia ser uma interferência tomar conta da comunicação integrada.
-O que essa ervilha voadora quer, afinal? - Stark bufou, dando um tiro de propulsor do qual o inimigo conseguiu desviar.
Uma troca de tiros começou entre os dois, com Thor auxiliando Stark por meio de seus raios. Ambos desviavam dos ataques com agilidade e destreza, e após alguns segundos, Romanoff e Homem-Aranha entraram pelo portão escancarado do hangar. Peter lançou uma bomba de teia na direção do inimigo, mas uma mira surpreendentemente ruim fez com que ele atingisse o capacete de Stark.
-Está de brincadeira, Pirralho? - Tony irritou-se, tentando remover o fluído incrivelmente grudento de seu visor.
-Desculpe, Sr. Stark, é que esse lança teias não está calibrado e eu... - O garoto tentou se explicar. Ele lançou mais algumas bombas de teia, todas facilmente evitadas pelo inimigo devido à mira defeituosa do traje. Uma delas acabou saindo pelo lado errado e atingiu o próprio Peter, fazendo com que ele grudasse na parede mais próxima, ficando incapaz de se mexer.
-Já chega - Natasha irritou-se, sacando o revólver que possuía em seu cinto. Com rapidez, ela disparou três tiros certeiros na direção da cabeça e do peito do inimigo. As balas o atingiram, mas para a surpresa da agente, não pareceram machucá-lo. - É claro que ele é à prova de balas. - Ela falou com tédio.
Na verdade, os tiros o irritaram. O homem mascarado virou-se para Natasha e estava pronto para voar na direção dela, mas Stark colocou-se no meio para impedi-lo. Ele teria sido o escudo perfeito, se não fosse pela falha no comunicador da equipe que impediu Thor de alertar Tony sobre seu martelo, que vinha voando rápido demais para ser visto. Este, carregado com os poderes de raio do deus, atingiu a armadura de Tony em cheio – outra vez.
-Quer parar de ficar jogando essa sucata por aí? - Peter protestou, ainda tentando se desvencilhar de sua própria teia que o prendera na parede.
Após ser atingido e eletrocutado, Stark caiu com sua armadura reforçada em cima das pernas de Romanoff. O impacto machucou-a, e deixou-a incapaz de se levantar devido a uma provável fratura. Ao prever que Thor planejava uma reação, o inimigo mascarado agarrou uma das asas da nave destruída e arremessou em sua direção, derrubando-o metros longe. Com um sorriso cínico após constatar a falha da equipe, o homem proferiu:
-Vocês deuses, agentes especiais, supersoldados e aberrações: preparem-se para ver seu império cair.
O homem alçou voo após lançar tal frase, desaparecendo rapidamente. Stark ainda tentou ir atrás dele, mas seus propulsores de voo defeituosos não permitiram, ainda mais depois das duas marteladas que danificaram a armadura. Tony arrancou o capacete, ajudou Peter a terminar de se desgrudar das teias e eles se juntaram a Thor para que os três pudessem correr atrás do inimigo desconhecido. Banner, que já não estava mais verde e se recuperava da explosão que o atingira, ficara para ajudar Romanoff. Eles saíram correndo pelo enorme jardim, que parecia ficar mais longo a cada passo que davam para tentar impedir aquele ataque surpreendentemente catastrófico.
O homem mascarado voou sem mais dificuldades até o maior de seus objetivos: a central de comando da base. Após explodir o setor de Inteligência e de Contabilidade, o caminho ficou livre para que ele pudesse acessar todos os dados e controles que a base dos Vingadores possuía através daquele sistema. O invasor desativou seus propulsores de voo e foi caminhando entre os destroços e vidros quebrados pelo estrago que ele mesmo causou, e chegou até o conjunto de computadores e telas que continham as informações desejadas. Ele estava preparando-se para invadi-los, quando as luzes da sala começaram a falhar.
O homem mascarado virou-se e viu uma garota de cabelos loiros cobertos de fuligem aparecer em sua frente. Olivia McCall, com uma expressão seriamente fechada no rosto, ergueu os braços e esticou as duas mãos na direção do inimigo, concentrada.
O vilão observou a cena, confuso. De repente, os computadores começaram a pifar, e todo o sistema elétrico começou a entrar em curto-circuito, jogando faíscas para todo lado. A raiva na expressão da garota parecia se intensificar à medida que os choques aumentavam, e ela movimentava os dedos tensionados das mãos com muito esforço. Seus olhos focaram o invasor, e semicerraram-se.
Como se fosse por comando da mente dela, um turbilhão luminoso de força enorme foi lançado na direção do homem mascarado, no instante em que Olivia projetou seus braços para frente. A força da energia elétrica à alta voltagem atingiu o invasor em cheio, dando choques intensos e arremessando-o metros e metros para longe da sala de controle, na direção do jardim.
Olivia caiu no chão, atordoada. A equipe dos Vingadores chegou ao local a tempo de ver aquela cena impremeditada, enquanto corria pelo gramado tentando chegar até a sala. A garota levantou os olhos com dificuldade, tentando enxergar por trás da poeira que havia se erguido devido ao que ela acabara de fazer.
Apesar do ataque que sofreu, o inimigo misterioso conseguiu se levantar e alçar voo. Ele se projetou no céu, com uma expressão de raiva, mas ainda assim parecendo satisfeito. Antes de desaparecer, o homem lançou um raio de cor arroxeada com as mãos, que fez a energia elétrica da base cair – como se desse um aviso de que aquele não era o fim. Em seguida, saiu em voo para longe dali, rápido demais para que os olhos o acompanhassem. Sem sistemas de segurança ou ataque, ficou impossível segui-lo, rastreá-lo ou enfrentá-lo. Nada restara depois da energia ter sido cortada.
Após a partida do inimigo, a poeira que tomara conta da sala cedeu e revelou o ambiente destruído. Os Vingadores voltaram sua atenção para o lado de dentro da sala, onde os equipamentos caríssimos da equipe de controle ainda estavam curto-circuito. Curiosos e intrigados, eles observaram a garota caída no chão se erguer dificultosamente, com uma porção de perguntas em suas mentes.
-Thor está aqui. Devo deixá-lo entrar? – Perguntou o sistema operacional.
-Qualquer um é bem-vindo desde que fale minha língua. – Stark soltou, tirando os pés da mesa e ajeitando-se na poltrona giratória para receber a visita. Despediu-se do investidor em uma mistura confusa de inglês e coreano, para dar atenção ao deus que adentrava na sala.
-Dia difícil? – Perguntou o loiro com um sorriso, sentando-se na cadeira do outro lado da mesa.
Stark respondeu com aquilo que ele pensava significar "você nem imagina" em coreano.
-Vou entender isso como um sim.
-Ache como quiser, nem eu mesmo entendi. – Tony ergueu as sobrancelhas com indiferença. –Como estão as coisas?
-Tranquilas. Aliás, estava praticando meus poderes no novo centro de treinamento antes de vir até aqui, e ficou excelente. – Thor elogiou. – Bem melhor do que o que tínhamos na outra base. É amplo, tem bastante recursos, e a fonte de energia não pifou quando lancei meus raios.
-Que bom, isso quer dizer que a invenção do Parker funcionou. – Stark comemorou. – Ainda bem, porque se não estaríamos todos literalmente fritos agora, graças ao Pirralho. – Ele fez Thor rir. – Mas a que eu devo sua visita, meu caro amigo asgardiano?
-Estava esperando que pudesse me atualizar um pouco mais sobre o andamento da equipe durante tempo em que estive fora com o Banner. – Explicou Thor. – Ainda não tivemos muito tempo pra falar sobre isso.
-Bem, o governo ameaçou nos fechar, entramos em uma divisão violenta, ganhamos novos membros, mudamos de cidade... nada demais. – Disse Tony com as sobrancelhas arqueadas. – Por que a pergunta?
-Eu já sei de tudo isso, mas parece que mais coisas mudaram. Além de uma nova base e uma nova equipe, estamos respondendo para as grandes organizações de poder dos humanos. – Continuou o deus. – É muita coisa para dois ou três anos.
-Digamos que as circunstâncias nos obrigaram a fazer algumas alterações, mas estamos bem. – Stark fez uma pausa. – Por que a preocupação assim tão de repente?
-Eu não sei. Metade da equipe foi embora, isso gera várias perguntas. – Falou Thor, o que fez Tony se afastar na cadeira.
-Bom, alguns de nós não concordaram com as alterações que fomos obrigados a fazer. Às vezes divergências fazem equipes se dividirem e seguirem seus próprios caminhos. Como no One Direction. – Stark explicou, um pouco desconfortável com o assunto.
-Não é tão simples assim, Tony. Você não me contou a história toda. – Pressionou Thor. – As pessoas têm falado sobre isso, os outros membros da equipe também. A discussão foi bem além de apenas divergência de ideias. Os Vingadores entraram em guerra.
-Guerra é uma palavra tão pesada, não acha? – Tony franziu a testa. – Eu prefiro discussão incisiva.
-Isso é sério, Stark. – Thor fez uma pausa. Sabia que arrancar aquilo dele seria difícil. – O que houve entre você e o Rogers, afinal?
-Você mesmo disse: divergência de ideias. – Falou Tony, sério.
-Ele quebrou sua armadura e você tomou o escudo dele. Isso é bem mais grave do que discordar sobre a cor do uniforme ou algo do tipo.
-O Rogers não queria aceitar os fatos. – Stark disparou, cedendo ao assunto ao notar que não conseguiria evitá-lo. – Ele esqueceu que no século em que vivemos agora, ao contrário da época dele, todas as grandes organizações que possuem alta tecnologia e interferem diretamente no mundo como nós, precisam passar pelos olhos do governo por segurança. Ele queria bancar o herói injustiçado, e esqueceu que nós também causamos mortes.
-Ele se recusou a assinar o acordo com as Nações Unidas?
-Ele, Clint, a gêmea Maximoff e Falcão. – Contou Stark. – Cada um pensava uma coisa e não conseguimos chegar a um acordo sobre o que fazer com a equipe. E foi aí que as coisas começaram a, digamos... sair do controle.
-Com os dois maiores cabeças-duras da equipe discordando, não poderia ser diferente. – Thor ironizou. – Sempre soube que a relação entre você e o Rogers era difícil, mas não imaginei que isso pudesse fazer os dois quase se matarem. O que mais aconteceu pra que ficassem com tanta raiva um do outro?
-O Rogers escolheu o lado errado. – Tony resumiu. – E foi um traidor.
-Como assim um traidor? Eu pensei que você também não gostasse da ideia de deixar o governo controlar os Vingadores.
A fala do deus foi interrompida pelo som da porta abrindo. Banner e Romanoff adentraram o escritório e fecharam a porta logo em seguida, com semblantes estranhamente fechados.
-Será mesmo que alguém tem controle sobre essa equipe? – Comentou Stark.
-Me desculpe por não anunciar a entrada do Dr. Banner e da agente Romanoff, Sr. Stark. - A voz de F.R.I.D.A.Y. ecoou pelo escritório. - Mas eles não pediram permissão para entrar.
-Que novidade. – Tony disse com tédio. – Posso saber o motivo da reunião de última hora?
-Temos algumas dúvidas importantes pra esclarecer com você, Stark. – Falou Natasha, séria.
-Por que todo mundo resolveu me fazer perguntas hoje? – Ele retrucou.
-Eu estava processando seus exames no laboratório agora a pouco, e alguns resultados apontaram coisas bem curiosas. – Disse Banner, jogando alguns papéis em cima da mesa.
Eram os resultados dos testes feitos com o DNA de Stark, que apontaram a semelhança com a garota que chefiava o departamento de Inovações. Stark analisou aquilo por alguns segundos, antes de responder com a cara fechada:
-Você testou os níveis de radiação nos meus genes, não foi?
-Queria que fosse esse o problema. – Respondeu Banner, com aspereza na voz. – Sabe, seu DNA está ótimo. Inclusive, encontrou um parente no sistema.
-Parente? – Perguntou Thor, que observava a tudo confuso.
-Sim, alguém da família Stark, registrado aqui mesmo, na sede dos Vingadores. – Banner continuou. – Curioso, não? Nós também achamos.
-Quem é? – Perguntou o deus, enquanto Tony observava a cena toda com os olhos cerrados e o maxilar tensionado.
-Olivia McCall. A responsável das Inovações. – Revelou Natasha sem pudor, cruzando os braços. – O sistema está acusando que ela e o Stark tem um DNA muito parecido, que combina tanto que até poderiam ser...
-Tá bom, espera aí. – Tony a interrompeu, levantando de sua poltrona. – Vamos ignorar o fato de que o Banner acabou de violar o código de sigilo entre médico e paciente, e de que os dois estavam bisbilhotando a minha privacidade, e vamos esclarecer as coisas. O sistema achou uma semelhança porque ela é verdadeira.
-Não diga, pensamos que a máquina tivesse errado na contagem de cromossomos. – Provocou Romanoff, vendo que ele estava enrolando. – Quem é a garota, Stark?
-Não acredito que vou ter que dar satisfações sobre isso. – Tony bufou, rolando os olhos. – Olivia é minha sobrinha. Ela está fazendo faculdade aqui na cidade, então dei um estágio a ela na área do curso.
-Bom, se é assim tão simples, por que não nos contou? – Natasha questionou, sem comprar a ideia. – Ficaríamos felizes em saber que sua sobrinha trabalha com a gente.
-Eu não achei que fosse necessário, afinal a menina poderia ficar constrangida se todos soubessem que seu tio era...
-Corta essa, Stark. Você é filho único. – Interrompeu Banner, encurralando-o. – Não tem como ter sobrinhos.
Os olhos de Stark cerraram-se por um instante. Quando ele tomou fôlego para retrucar, Natasha disparou:
-A menina é sua filha.
-Negue o quanto quiser, eu fiz os testes. – Finalizou Banner, dando início a um silêncio constrangedor.
Tony soltou uma respiração pesada, recostando-se na mesa. Ele massageou as têmporas, enquanto os três companheiros o observavam esperando uma reação.
-O que querem que eu faça? Que saia gritando? Que brigue com vocês? – Stark esbravejou de repente. – A resposta está aí. É o que queriam ouvir?
-Você escondeu isso de nós por todos esses anos... – Natasha o encarava com desdém, negando com a cabeça.
-Por quê? – Banner questionou.
-Vocês não entendem, está bem? Não sabem de nada! – Tony vociferou. – E não merecem saber, depois do que fizeram. Esse assunto não interessa a vocês, não interessa a ninguém. Agora, pensem o que quiserem sobre isso, mas vocês não podem contar a ninguém que Olivia é minha filha.
Neste momento, uma garota loira adentrou inocentemente no escritório segurando uma pilha de papéis nos braços, e parou imediatamente ao ouvir a gritaria dos quatro.
Após vários segundos desconfortáveis de trocas de olhares entre os presentes, F.R.I.D.A.Y. apareceu com sua voz simpática para anunciar:
-Sr. Stark, Olivia McCall está aqui.
-Na hora certa, F.R.I.D.A.Y. – Disse Stark, ironicamente.
Os olhares de reprovação e repúdio dos três Vingadores passaram por Tony e pela garota, que estava visivelmente sem graça. Natasha, Bruce e Thor se entreolharam, contrariados, e saíram do escritório sem dizer mais nada.
O silêncio pesado permaneceu por mais algum tempo, enquanto a porta se fechava atrás dos três heróis e Stark dirigia-se novamente à sua mesa, negando com a cabeça.
-Como eles descobriram? – Perguntou a garota, com frustração na voz.
-Xeretando, é claro. – Stark rosnou.
-E agora? – Ela se aproximou da mesa.
-Eu ainda não sei. – O homem suspirou. – Mas não se preocupe com isso. Só continue fazendo seu trabalho.
-É claro que eu me preocupo. – Olivia retrucou. – Não quero causar problemas pra você.
-A culpa não é sua, Olivia, não me causou problema algum. Eu vou dar um jeito nisso.
-Que jeito? Eles vão dizer pro resto da equipe.
-Não vão, não. Eu falei a eles para não dizerem.
-Que é a mesma coisa que nada. – Olivia revirou os olhos. – Isso não é um segredinho qualquer, eles ficaram muito irritados com você.
-Tá bom, e o que quer que eu faça, então?
-Eu sei lá – A garota suspirou, colocando a mão sobre a testa. – Acho que está na hora de acabarmos com isso.
-Acabar com o que?
-Com essa palhaçada toda. Eu estou cansada disso, nem sequer deveria estar aqui. – Olivia bufou. – Acho que eu deveria ir embora.
-Deixe de ser boba, já discutimos sobre isso.
-É, mas foi antes de todos descobrirem. Isso muda as coisas.
-Não o suficiente. Você fica aqui e ponto.
-Mas...
-Olivia, você não pode ir embora e sabe muito bem por que. – Stark falou autoritário, fazendo a menina desviar o olhar. – Nós dois sabemos o que está em jogo e o que pode acontecer se você for.
-Que seja. – Ela cedeu, contrariada.
-Não se preocupe, eu vou resolver isso.
-Tanto faz. – Olivia falou tediosa, colocando a pilha de papéis que tinha em mãos em cima da mesa, e saindo logo em seguida. Ela se retirou e fechou a porta novamente, deixando Stark sozinho a pensar.
Teria sido mais fácil continuar a negociar com aquele investidor coreano.
-Eles acham mesmo que vamos sair assim na frente de milhares de pessoas?
-Nem pensar.
-Alguém precisa dar um jeito nisso.
O clima não era exatamente de harmonia e concordância na sala de equipamentos da base dos heróis. Aquela discussão era o que deveria ser o teste do desfile dos Vingadores para o Veterans Day, que acontecia em uma semana – porém, estava mais para uma sessão de stress, risos de deboche e olhares atravessados. Os guerreiros experimentavam seus uniformes e eram apresentados aos equipamentos que usariam durante o evento, mas estavam rejeitando quase todos eles.
-Eu me recuso a usar isso. – Falou Banner, analisando sua roupa que fazia alusão ao verde da pele do Hulk. – É ridículo.
-Isso aqui é de ferro. – Constatou Thor examinando o martelo que tinha em mãos, uma imitação do seu próprio, que havia sido quebrado por Hela.
-Eu não vou nem comentar. – Retrucou Natasha, olhando para o seu novo cinto de utilidades que possuía o desenho de uma aranha viúva-negra no centro.
-Sr. Stark, o senhor tem certeza disso? – Disse Peter com dificuldade, tentando entrar em seu novo uniforme apertadíssimo - mais que o normal.
Tony observava àquilo tudo com o rosto sério, analisando a situação e pensando que provavelmente não tinha sido uma boa ideia mexer com o bom humor do Dr. Banner.
-Tá bom, esperem aí. – Disse ele, descruzando os braços e andando entre os colegas. – Sei que não é desse jeito que costumamos sair às ruas todo dia, mas não está tão ruim assim.
Aquele comentário resultou em uma chuva de contradições e respostas atravessadas por parte dos outros companheiros.
O famigerado desfile que traria os Vingadores para o gosto do público novamente parecia estar cada vez mais distante. A equipe de Publicidade que era responsável por coordenar o evento havia ficado à mercê dos desejos do governador do distrito de Columbia, que era quem idealizava o Veterans Day, durante todo o processo de desenvolvimento do desfile. Aparentemente, aquele cara não tinha noção alguma do que eram super-heróis, e não sabia diferenciá-los de um grupo de palhaços.
-Tony, sei que está tentando amenizar, mas esses acessórios não estão passando credibilidade alguma. – Colocou Visão, tentando não bater de frente. Ele usava uma espécie de capacete que ressaltava a joia brilhante em sua testa de um jeito bizarro.
-Stark, você deveria ligar pra ele e dizer que não podemos fazer isso. Assim não dá. – Thor argumentou, balançando seu martelo de mentira pra lá e pra cá.
Stark suspirou, observando o desastre, a correria e as caras feias ao seu redor. Ele já sabia que aquilo ia acontecer.
-Ok, sei que está todo mundo chateado, mas nós não temos escolha agora. Nós precisamos dessa propaganda. – Stark enunciou. – O Callahan não vai voltar atrás.
-Mas foi ele que meteu a gente nessa – Peter discutiu por trás da máscara que o sufocava. – Ele deveria resolver.
-Nós somos super-heróis, Stark, não personagens de carnaval. – Disse Bruce.
-Ok, espera aí. Não vai ser como vocês estão pensando. Isso não é 4 de Julho, não vão ter balões e orquestras com trompetes. Nós vamos desfilar seriamente pela avenida ao lado de veteranos de guerra, eles vão dar uns tiros pra cima, e vamos receber medalhas de condecoração pelos feitos que tivemos. – Stark fez uma pausa, soltando um suspiro. – Olhem, eu também não gosto da ideia de sair por aí caminhando e acenando como se fosse a rainha da Inglaterra, mas nós estamos há muito tempo inativos e a ONU quer a nossa aparição em algum lugar.
-Então a ONU que arrume alguma aparição decente para os Vingadores, como uma missão de verdade, já que insistiu tanto em controlar o que a gente faz. – Romanoff replicou, sem paciência.
-A Natasha tem razão. – Disse Peter. – O Sr. Callahan não entende nada sobre os Vingadores.
-Até agora, todas as ordens do Conselho têm sido catastróficas. – Foi a vez de Visão tecer a crítica. – Eles não nos enviam para lugar nenhum, e nos deixam aqui com um monte de cientistas e funcionários que contrataram só para dirigir investimentos e fazer pesquisas. Sem ofensas. – Ele disse a última parte dirigindo-se à equipe de Publicidade, mas a maioria deles já havia se retirado para deixá-los discutir em particular.
-Acho difícil que o Stark bata de frente com as equipes de cientistas. – Banner alfinetou o empresário. – São particularmente importantes pra ele.
-Tudo bem, mas ainda precisamos fazer alguma coisa.
-O Stark não vai fazer nada, ele concorda com o Callahan. – Falou Natasha.
-É claro que eu concordo, mas ainda faço parte dessa equipe. – Stark retrucou, aborrecido com a conversa.
-Então diga a eles o que achamos disso.
-Ou deixe a gente dizer. Você é o único que negocia com o Conselho de Segurança, mas nós poderíamos fazer isso também.
-É verdade. – Concordou Thor. – Talvez nós devêssemos começar a participar dessas reuniões.
-Seria mais justo se a equipe inteira falasse, e ouvisse aquilo que eles falam também.
-É, Stark, não é certo guardar segredos da sua equipe. – Romanoff provocou, arqueando as sobrancelhas. Tony encarou-a com raiva.
-Isso é verdade, Tony. Você tem andado muito fechado a respeito da diplomacia ultimamente. – Disse Visão.
-Fica apenas no seu escritório, negocia sozinho, não fala com ninguém e finge que nada aconteceu.
-Ótimo, agora vamos para o lado pessoal. Quem disse isso? – Stark questionou, na defensiva.
-Todos nós temos dito isso. – Completou Parker, receoso. – Eu sei que você não vai gostar de ouvir isso, Sr. Stark, mas você tem andado muito estranho ultimamente. Parece até que está...
-Escondendo alguma coisa. – Acusou Thor, entrando na onda dos outros dois colegas ali que sabiam mais que o resto.
-Vocês acham mesmo que eu não jogo às claras com vocês? – Perguntou Stark, começando a perder a paciência. – Querem participar das reuniões? Ótimo, participem. Eu só faço isso sozinho porque pensava que seria chato pra vocês lidar com o Conselho. Vocês acham mesmo que eu estou escondendo algo?
-Nós não sabemos, não é mesmo? Você tem tantos segredos... – Continuou Natasha.
-Segredos? – Visão intrigou-se. – Sabe de algo que nós não sabemos, Romanoff?
-Parem de besteira, não existem segredos. – Stark discutiu.
-Não queremos te acusar de nada, só estamos comentando.
-Bom, eu sei de algumas coisas. – Thor jogou no ar.
-Que coisas? – O resto da equipe parecia perdido.
-Querem parar com isso? – Stark vociferou.
-Sabemos de uma coisa. – Banner entrou na chantagem, ignorando Tony totalmente. – Stark tem um segredinho de cabelos loiros e olhos claros dentro da equipe de Inovações.
-O Sr. Stark tem uma amante? – Agora era Peter quem estava confuso. – Mas e a Pepper? – Perguntou indignado.
-É claro que não, Parker, pare de besteira. – Stark falou, visivelmente irritado. – É que o Banner me adora tanto que não consegue deixar de interferir na minha vida, mesmo quando não é chamado.
-Vamos lá, Tony. – Bruce deixou escapar um sorriso, fazendo o sangue de Stark ferver. – Não acha que eles deveriam saber?
-Saber o que, pelo amor de Deus? Alguém pode explicar? – Parker bufou.
-Saber que eu tenho uma filha. – Exclamou Stark, em alto e bom som, o que fez com que todos se calassem imediatamente. – E vocês todos a conhecem. Ela trabalha aqui, na equipe de Inovações. Felizes agora? – Ele se dirigiu a Romanoff e Banner, com um semblante fechado assim como os deles. – Espero que estejam satisfeitos por arrancar isso de mim, porque este é um segredo pessoal, que não interfere nem um pouco na minha honestidade com a equipe. Me desculpem por não poder ser um livro aberto o tempo todo, mas vocês todos têm muito para apontar, não é mesmo? – Ele deu um sorriso irônico. – Bom, agora já sabem. Podem espalhar por aí que o segredo por trás da antipatia de Tony Stark nos últimos meses foi revelado. Sugiro que usem isso antes que saia no TMZ. – Ele encerrou com o rosto inteiro tenso, e saiu andando pelo saguão a passos largos e pesados.
Ninguém sabia direito o que falar após aquela informação ser atirada sem mais nem menos. Stark deu as costas, e após longos segundos mergulhados no silêncio, os heróis começaram a questionar.
-Isso é sério? – Visão dirigiu a pergunta aos três que provocavam há pouco.
-É, sim. – Romanoff disse, suspirando em seguida. – Foi o Banner quem descobriu.
-Como?
-Fazendo os exames do Stark como sempre faço. O sistema me mostrou o parentesco pela compatibilidade do DNA – Banner explicou. – Com a Srta. McCall.
Todos ficaram surpresos ao ouvirem o nome dela.
-E vocês usaram isso pra arrancar dele? – Peter questionou.
-Sim. E logo depois ele pirou dizendo que a gente não entendia nada. – Natasha falou em tom debochado. – Mas a verdade é que ele só estava escondendo as coisas de nós. Como vem fazendo faz tempo.
-Não quero discordar de vocês, mas isso realmente é pessoal, e não quer dizer que Stark é necessariamente um mentiroso. – Visão disse, ponderando.
-Ninguém disse que ele é um mentiroso, só dissemos que ele não nos conta as coisas.
-E o que é tão sério que não entendemos, afinal?
Os heróis passaram alguns minutos pensativos em silêncio, sem mais nada para falar mesmo que muito se passasse em suas cabeças. Ficaram assim, até que começaram a se retirar da sala também. Romanoff e Bruce foram os primeiros, seguidos por Thor e os outros. Ninguém sabia de que lado ficar, e as coisas terminaram assim.
A confusão toda durante o teste não foi capaz de prejudicar o defeituoso desfile de Veterans Day dos Vingadores. Após uma semana regada de rancor, olhares atravessados e momentos constrangedores, os heróis viam-se a poucas horas de embarcar em viagem para o que acreditavam ser o maior mico que pagariam em sua trajetória como salvadores da pátria.
Stark passou a semana trancado em seu escritório, rodeado de afazeres e sem dar mais satisfações, sobre o ocorrido no teste ou qualquer outra coisa. Ficou sem conversar com todos os colegas de equipe, principalmente com Natasha e Bruce. Como ambos não faziam questão do contato, o clima frio e estranho pairou sobre todos os encontros dos Vingadores – o que não era diferente agora.
Os heróis estavam no hangar da base fazendo os toques finais em seus trajes esquisitos enquanto as equipes de Inovações e de Publicidade carregavam o avião com os equipamentos necessários para o desfile. A viagem aconteceria em breve, portanto a movimentação era intensa; mas o silêncio era constante.
-Gostei do seu maiô novo, Parker, é ainda mais apertado que o de sempre. Vai conquistar muitas garotas assim. – Thor brincou, na tentativa de quebrar aquele gelo sufocante.
-Muito engraçado, Martelo de Ferro. Quero ver você lançar uma faísca sequer com esse brinquedinho aí pra impressionar a multidão. – Peter entrou na brincadeira, sem se mover muito para não correr o risco de rasgar o collant que era realmente grudado.
-Tenho certeza que a multidão já vai estar bem impressionada ao ver a palhaçada que estamos fazendo. – Banner comentou, àquele ponto com uma crítica que já soava como piada.
A interação mínima foi interrompida por Olivia McCall aproximando-se com sua prancheta em mãos, anotando coisas rapidamente. Todos os heróis retesaram-se, diante da presença da garota cujo nome causou toda aquela situação desconfortável. Ela parou em frente a eles e pediu sua atenção.
-Boa tarde, Vingadores. Meu nome é Olivia McCall, caso vocês não se lembrem de mim; o que eu acho difícil, afinal sei que fui um assunto quente durante a semana. – Ela disse em tom de voz baixo, normalizando-o logo em seguida. – Eu e minha equipe fizemos tudo que pudemos para fazer do desfile o melhor... que ele poderia ser. – Ela torceu o nariz. Claramente ninguém ali se agradava com a ideia. – Todos os equipamentos já estão no avião e os novos acessórios já estão devidamente colocados nos uniformes de vocês. O exército americano será responsável por realizar a segurança do evento, garantindo a estabilidade da multidão e dos senhores, então estão liberados da função de heróis no dia de hoje; são apenas as estrelas do show. – Banner e Parker soltaram um riso abafado devido à menção daquilo como um “show”. Um show de horrores, talvez. – Eu estarei acompanhando a equipe pra supervisionar as tecnologias e garantir que as coisas fiquem certas. Partimos em quinze minutos.
A garota se retirou novamente após um breve sorriso simpático, e saiu anotando mais coisas em sua prancheta. Banner e Romanoff trocaram rápidos olhares por conta da fala dela no início, a respeito de sua identidade. Todos os membros da equipe dirigiram a atenção para Stark, que manteve o semblante sério, fingindo que não notara os olhares sobre si – da mesma forma que fez a semana toda.
Os engenheiros e estilistas que passaram os últimos vinte minutos fazendo ajustes nos trajes retiraram-se de perto dos heróis, e as enormes equipes disso e daquilo que transitavam incansavelmente começaram a sair do hangar para abrir espaço para a decolagem. Aquela seria uma viagem rápida até Washington, onde a reputação incerta dos Vingadores seria ainda mais ameaçada. A rampa do avião foi aberta, e os heróis prepararam-se para embarcar, quando tiveram o trajeto interrompido por um estrondo vindo do jardim.
O barulho foi similar a uma explosão, e veio seguido por alguns gritos distantes. Todos se voltaram imediatamente para o portão aberto da pista de pouso, que lhes dava a vista exata de um aglomerado de pessoas correndo, e do setor de Inteligência destruído com cacos de vidro e papeladas voando para todo lado.
-Sr. Stark, foram detectadas falhas no sistema de segurança da base. - Alertou F.R.I.D.A.Y. através do relógio de pulso de Tony.
-Quero toda a equipe de segurança aqui agora para investigar o que foi isso. – Stark disse ao comunicador, enquanto já se dirigia para o lado de fora acompanhado dos outros heróis, todos em alerta.
Não houve nem tempo para receber uma resposta de F.R.I.D.A.Y. ou de qualquer sistema. Ao chegarem ao jardim, os Vingadores avistaram uma figura erguida no céu a cerca de vinte metros acima de suas cabeças; era um homem que trajava um uniforme verde com vermelho, e já se preparava para causar outro estrago.
Imediatamente, o time dos Vingadores entrou em ação para deter quem quer que fosse aquele sujeito intrometido e raivoso. Peter e Romanoff correram até o que restara do setor de Inteligência para socorrer os funcionários desesperados, enquanto Thor, Stark e Banner iam tirar satisfações com o invasor.
-Sr. Stark, nossos firewalls de proteção estão inativos, e os sistemas da base encontram-se vulneráveis. - Foi mais um alerta de F.R.I.D.A.Y.
-Ainda temos tempo pra conter a ameaça. Eu instalei um firewall reserva recentemente, duas vezes mais incriptado, que se ativa automaticamente quando o primeiro cai. Deve detê-lo, ou ao menos atrasá-lo. – Constatou Stark.
-Lamento, mas o sistema de segurança II também caiu. – Aquilo alarmou Tony.
-O sistema III...?
-Já era.
Stark, que até ali se considerara muito astuto, achou que a brincadeira estava começando a perder a graça.
-Ative o protocolo de segurança Watchman, então. – Ele pediu preocupado.
-Eu já tinha acionado – A voz fez uma pausa e então retornou a falar. – Mas ele acabou de ser derrubado também.
-Ok, meus elementos-surpresa acabaram. – Tony disse, atônito e um tanto frustrado. – F.R.I.D.A.Y., anote na minha agenda: criar mais protocolos de segurança complementares e inesperados para deter intrometidos que gostam de estragar a minha festa.
Antes que os três heróis pudessem chegar ao agressor misterioso, mais uma explosão foi causada por ele, que parecia ser capaz de lançar um poder de detonação com suas próprias mãos. Desta vez, o setor vizinho era o alvo. Um dos pilares que sustentava o prédio ameaçou desmoronar, e Stark usou seus propulsores de voo – que estranhamente falharam – para chegar até lá e segurar a pilastra de concreto.
-Quem é esse sujeito tão nervosinho? – Disse Tony em seu comunicador, com um pouco de dificuldade devido ao esforço que estava fazendo. – Por acaso algum de vocês tem um velho inimigo procurando um remember?
A pilastra de concreto começou a rachar, obrigando Tony a agilizar o processo para reequilibrá-la.
-Quem seria? Asgardiano adotado com mania de grandeza? – Palpitou Stark.
-Não que eu saiba. – Respondeu Thor ofegante por conta do combate, referindo-se a Loki.
-Pai de família revoltado com tecnologia alienígena roubada? – Tony arriscou.
-Na cadeia, até onde eu sei. – Peter negou a presença de Abutre enquanto corria pelo saguão do departamento.
-Bom, pelos meus conhecimentos, ele não é nenhum funcionário louco tentando tomar o meu lugar. F.R.I.D.A.Y., conseguiu alguma pista da identidade do nosso amigo? – Questionou Stark, finalmente conseguindo colocar o pilar de concreto no lugar. Estranhamente, ele não recebeu resposta. – F.R.I.D.A.Y., está me ouvindo?
Ele dirigiu o olhar até o visor em seu capacete, onde um aviso luminoso atestava "conexão perdida" com seu sistema operacional.
-Bom, seja lá quem ele for, cortou a comunicação do complexo. – Stark anunciou, com frustração na voz. – Como estamos indo, equipe?
-Ele explodiu o setor de Contabilidade também, estou tentando ajudar as pessoas a saírem. – Disse Romanoff. – Mas digamos que esse novo cinto de utilidades não está sendo lá muito útil. – Bufou, apertando o botão da viúva negra no centro sem receber qualquer reação do equipamento.
-Eu mandei acionar o alarme pra evacuar a base antes da comunicação ser cortada, acredito que os outros prédios já estão sendo esvaziados. – Stark contou. – E o setor de Inteligência, Parker?
-Eu estou tentando ajudá-los, Sr. Stark, mas esse uniforme é muito ruim. – Disse Peter com dificuldade. A malha de seu novo traje limitava e muito seus movimentos, o que dificultava sua agilidade. Ele se balançava de um lado para o outro em suas teias por entre as marquises rachadas, pegando o máximo de pessoas que conseguia e lançando-as para suas teias salva-vidas do lado de fora.
-Continue tentando, garoto. Thor, e você? – Stark disse no meio do trajeto de voo para chegar até o deus, que estava mais próximo do invasor. – Estou indo até aí. Ou ao menos tentando. – Finalizou, após notar que seus propulsores estavam falhando novamente.
-As coisas estão meio difíceis com esse martelo decorativo. – Bufou o loiro, tentando arremessar o objeto no inimigo, mas sem atingir a distância necessária.
Os acessórios esdrúxulos do desfile estavam prejudicando – além da dignidade – o desempenho dos heróis em combate. Com medo de expor a tecnologia dos Vingadores para um possível roubo, a equipe de Inovações decidiu retirar boa parte dos adereços reais dos uniformes que usariam durante o desfile, deixando-os meramente decorativos e transformando-os nos alegóricos trajes idealizados pelo distrito de Columbia. Apenas os robôs e a nave seriam tecnologias verdadeiras, usadas para impressionar a multidão, e o restante não seria necessário, uma vez que os heróis estariam lá para desfilar e não lutar. Uma ideia que, agora, mostrava-se ter sido a pior possível.
Durante esse tempo de frustrações e desastres, a equipe de atiradores e seguranças da base chegou em peso para combater a invasão. Eles dispararam uma chuva de tiros em direção ao inimigo voador, da qual ele desviou facilmente, com uma agilidade sobre-humana. Também não foi difícil para o homem pegar destroços das explosões e arremessar contra os homens, que pouco tinham para se defender. Com isso, o combate parecia vencido; para terminar de derrubá-los, uma chuva de cacos de vidro opôs-se aos ínfimos tiros que disparavam.
-Sr. Stark, não estamos equipados o suficiente para lutar com esse cara – Atestou o chefe de segurança em seu walkie-talkie. – A sala de armas foi trancada no momento em que o alarme de alerta soou, com a maioria dos equipamentos dentro.
-Retire seus soldados daí imediatamente, comandante. Nós cuidamos disso. – Respondeu Tony, ficando cada vez mais irritado com aquele sujeito que parecia ter tudo a seu favor.
Após a vitória contra os seguranças, o invasor diminuiu sua altitude consideravelmente, visando, por trás da máscara que cobria metade do seu rosto, seu próximo alvo. Ele preparou seus poderes e atirou na direção do avião da viagem a Washington, explodindo-o. O estrago só não foi maior porque Banner, já transformado em Hulk, segurou a aeronave antes que pudesse atingir o hangar enquanto deslizava por ele. Com um grito de fúria, Hulk arremessou o avião de volta ao inimigo, que foi atingido em cheio, mas não foi abatido com o enorme impacto. Após alguns segundos de recuperação, ele retornou à sua posição inicial e atacou o monstro verde diretamente, jogando-o metros longe com uma explosão.
Não sem tempo, Thor e Stark chegaram rapidamente à pista de pouso, com o deus fazendo uma entrada triunfal ao ser arremessado por Tony contra o invasor, acertando seu martelo fajuto, porém pesado bem no meio da enorme letra W estampada no uniforme dele.
Em uma rápida reação, o inimigo atirou o martelo de volta com o que parecia ser o dobro da força inicial, e atingiu Stark bem no meio de sua armadura. Thor já preparava o contra-ataque com seus poderes de raio, porém, o adversário lançou um de seus poderes e derrubou-o bem em cima de Stark.
-Cadê o resto da equipe?! - Bradou Tony no comunicador, irritado com o fato de sua armadura falsa ter ficado tão danificada com uma simples martelada. De que era feito aquele traje? Papel?!
-Estamos a cam... - Foi a resposta obtida, antes de o que parecia ser uma interferência tomar conta da comunicação integrada.
-O que essa ervilha voadora quer, afinal? - Stark bufou, dando um tiro de propulsor do qual o inimigo conseguiu desviar.
Uma troca de tiros começou entre os dois, com Thor auxiliando Stark por meio de seus raios. Ambos desviavam dos ataques com agilidade e destreza, e após alguns segundos, Romanoff e Homem-Aranha entraram pelo portão escancarado do hangar. Peter lançou uma bomba de teia na direção do inimigo, mas uma mira surpreendentemente ruim fez com que ele atingisse o capacete de Stark.
-Está de brincadeira, Pirralho? - Tony irritou-se, tentando remover o fluído incrivelmente grudento de seu visor.
-Desculpe, Sr. Stark, é que esse lança teias não está calibrado e eu... - O garoto tentou se explicar. Ele lançou mais algumas bombas de teia, todas facilmente evitadas pelo inimigo devido à mira defeituosa do traje. Uma delas acabou saindo pelo lado errado e atingiu o próprio Peter, fazendo com que ele grudasse na parede mais próxima, ficando incapaz de se mexer.
-Já chega - Natasha irritou-se, sacando o revólver que possuía em seu cinto. Com rapidez, ela disparou três tiros certeiros na direção da cabeça e do peito do inimigo. As balas o atingiram, mas para a surpresa da agente, não pareceram machucá-lo. - É claro que ele é à prova de balas. - Ela falou com tédio.
Na verdade, os tiros o irritaram. O homem mascarado virou-se para Natasha e estava pronto para voar na direção dela, mas Stark colocou-se no meio para impedi-lo. Ele teria sido o escudo perfeito, se não fosse pela falha no comunicador da equipe que impediu Thor de alertar Tony sobre seu martelo, que vinha voando rápido demais para ser visto. Este, carregado com os poderes de raio do deus, atingiu a armadura de Tony em cheio – outra vez.
-Quer parar de ficar jogando essa sucata por aí? - Peter protestou, ainda tentando se desvencilhar de sua própria teia que o prendera na parede.
Após ser atingido e eletrocutado, Stark caiu com sua armadura reforçada em cima das pernas de Romanoff. O impacto machucou-a, e deixou-a incapaz de se levantar devido a uma provável fratura. Ao prever que Thor planejava uma reação, o inimigo mascarado agarrou uma das asas da nave destruída e arremessou em sua direção, derrubando-o metros longe. Com um sorriso cínico após constatar a falha da equipe, o homem proferiu:
-Vocês deuses, agentes especiais, supersoldados e aberrações: preparem-se para ver seu império cair.
O homem alçou voo após lançar tal frase, desaparecendo rapidamente. Stark ainda tentou ir atrás dele, mas seus propulsores de voo defeituosos não permitiram, ainda mais depois das duas marteladas que danificaram a armadura. Tony arrancou o capacete, ajudou Peter a terminar de se desgrudar das teias e eles se juntaram a Thor para que os três pudessem correr atrás do inimigo desconhecido. Banner, que já não estava mais verde e se recuperava da explosão que o atingira, ficara para ajudar Romanoff. Eles saíram correndo pelo enorme jardim, que parecia ficar mais longo a cada passo que davam para tentar impedir aquele ataque surpreendentemente catastrófico.
O homem mascarado voou sem mais dificuldades até o maior de seus objetivos: a central de comando da base. Após explodir o setor de Inteligência e de Contabilidade, o caminho ficou livre para que ele pudesse acessar todos os dados e controles que a base dos Vingadores possuía através daquele sistema. O invasor desativou seus propulsores de voo e foi caminhando entre os destroços e vidros quebrados pelo estrago que ele mesmo causou, e chegou até o conjunto de computadores e telas que continham as informações desejadas. Ele estava preparando-se para invadi-los, quando as luzes da sala começaram a falhar.
O homem mascarado virou-se e viu uma garota de cabelos loiros cobertos de fuligem aparecer em sua frente. Olivia McCall, com uma expressão seriamente fechada no rosto, ergueu os braços e esticou as duas mãos na direção do inimigo, concentrada.
O vilão observou a cena, confuso. De repente, os computadores começaram a pifar, e todo o sistema elétrico começou a entrar em curto-circuito, jogando faíscas para todo lado. A raiva na expressão da garota parecia se intensificar à medida que os choques aumentavam, e ela movimentava os dedos tensionados das mãos com muito esforço. Seus olhos focaram o invasor, e semicerraram-se.
Como se fosse por comando da mente dela, um turbilhão luminoso de força enorme foi lançado na direção do homem mascarado, no instante em que Olivia projetou seus braços para frente. A força da energia elétrica à alta voltagem atingiu o invasor em cheio, dando choques intensos e arremessando-o metros e metros para longe da sala de controle, na direção do jardim.
Olivia caiu no chão, atordoada. A equipe dos Vingadores chegou ao local a tempo de ver aquela cena impremeditada, enquanto corria pelo gramado tentando chegar até a sala. A garota levantou os olhos com dificuldade, tentando enxergar por trás da poeira que havia se erguido devido ao que ela acabara de fazer.
Apesar do ataque que sofreu, o inimigo misterioso conseguiu se levantar e alçar voo. Ele se projetou no céu, com uma expressão de raiva, mas ainda assim parecendo satisfeito. Antes de desaparecer, o homem lançou um raio de cor arroxeada com as mãos, que fez a energia elétrica da base cair – como se desse um aviso de que aquele não era o fim. Em seguida, saiu em voo para longe dali, rápido demais para que os olhos o acompanhassem. Sem sistemas de segurança ou ataque, ficou impossível segui-lo, rastreá-lo ou enfrentá-lo. Nada restara depois da energia ter sido cortada.
Após a partida do inimigo, a poeira que tomara conta da sala cedeu e revelou o ambiente destruído. Os Vingadores voltaram sua atenção para o lado de dentro da sala, onde os equipamentos caríssimos da equipe de controle ainda estavam curto-circuito. Curiosos e intrigados, eles observaram a garota caída no chão se erguer dificultosamente, com uma porção de perguntas em suas mentes.
Capítulo 3
O barulho de obras e a movimentação frenética de pessoas dominavam a sede dos Vingadores. A energia elétrica dos prédios havia sido reestabelecida, os softwares de segurança estavam sendo reativados e especialistas já investigavam o que os derrubara. Havia técnicos de informática restaurando sistemas, caminhões de obra carregando o entulho, e centenas de trabalhadores se empenhando para reparar o estrago causado, durante a noite que já caía. Os melhores e mais eficazes serviços de inteligência e engenharia foram contratados para reerguer imediatamente a parte da sede que havia sido destruída, para que a rotina de trabalho dos heróis voltasse ao normal o mais rápido possível.
Após o incidente sofrido na base, a participação dos Vingadores no desfile de Veterans Day em Washington teve de ser cancelada. Milhares de pessoas que se uniram em multidão para ver os heróis pessoalmente voltaram para casa desapontadas por conta da falta – embora fosse bem provável que também se decepcionassem caso se eles tivessem aparecido.
Os noticiários já comentavam. O vexame do grupo de heróis que não pôde comparecer ao desfile feito em sua homenagem porque não foram capazes de deter um inimigo dentro de sua própria casa. Era irônico. Exatamente às vésperas de um evento que deveria aproximar os Vingadores da sociedade, um desastre como aquele apareceu para diminuir ainda mais a confiança da humanidade na capacidade da equipe de proteger a Terra.
Os heróis estavam reunidos longe de todo o barulho e correria, dentro da sala de estratégias, que ficara intacta após o combate. Stark encarava o lado de fora do prédio através da janela de vidro, e assistia às retroescavadeiras removerem os destroços do setor vizinho, que tinha vindo a baixo com uma das explosões. Ele soltou um suspiro, sentindo aborrecimento e quase vergonha pelo resultado negativo daquela luta. Já os outros, estavam todos falando; queriam saber como tinha sido possível perderem de forma tão inédita e ficarem vulneráveis a um inimigo com tanta facilidade.
-Não podemos admitir uma derrota dessas. - Falou Thor no meio da discussão. - Não agora.
-Nunca perdemos tão feio antes. O que foi que esse cara fez pra conseguir isso? - Questionou Natasha, indignada.
-Não foi só graças a ele, nossos trajes também não estavam ajudando. - Peter constatou.
-Quem foi que teve a ideia magnífica de simplificar nossos uniformes e nos deixar ir até Washington sem armamento nenhum? - Banner protestou. - Aquilo não serve nem pra fantasia, como iríamos proteger as pessoas se aquele cara tivesse resolvido nos atacar no meio do desfile?
-Os armamentos foram retirados pra manter a nossa tecnologia em segredo, eu acho. Alguém poderia ter tentado roubá-la durante o evento. E se houvesse algum problema, o exército ia cuidar da segurança. - Visão esclareceu. - Deve ter parecido uma boa ideia no início.
-Aquela ervilha voadora nem era assim tão difícil de combater, só perdemos pra ele porque estávamos desprevenidos. - Thor defendeu a equipe. - O que ele tem demais, afinal?
-Ainda não conseguimos definir totalmente os padrões de combate dele. - Atestou Visão, acompanhando uma geração de relatórios através de um tablet. - Mas ele não era um ser humano comum.
-O que foi que ele usou pra explodir o complexo? Algum poder de detonação?
-Não, não era nenhuma habilidade. Os prédios foram derrubados com explosivos segundo a perícia. - Bruce esclareceu. - Seu voo também não era natural, ele tinha propulsores nos pés. - O homem exibiu uma gravação das câmeras de segurança, pausando em um momento em que os equipamentos se tornavam visíveis.
-Bom, esse cara tem recursos, inclusive tecnológicos. Ele conseguiu burlar todo o nosso sistema de segurança pra entrar. - Falou Parker, ao notar que até aquele momento alguns dos softwares da base continuavam fora do ar devido ao bug.
-Mas ele não é só feito de recursos. O corpo dele resistiu ao impacto do Hulk e também era à prova de balas. - Romanoff contou. - E ele derrubou toda a energia elétrica do complexo sozinho.
-Como?
-Não sei, parecia algum tipo de raio que saia das mãos dele. Não tem como saber o que era. - Ela respondeu. - Mas esse não é um sujeito comum.
A confabulação dos heróis foi interrompida com a abertura da porta, que trouxe de fora o barulho ensurdecedor de britadeiras e soldas do escritório ao lado. Quem irrompeu pela sala foi Srta. McCall a passos acelerados, carregando um tablet de tela transparente nas mãos.
-Bom, quase todos os nossos sistemas operacionais já estão de pé novamente. - Ela comunicou aos heróis, com a fala acelerada. - Apenas os sistemas de segurança estão dando um pouco mais de trabalho, mas os técnicos dizem que devem consertá-los em algumas horas.
-Ainda? - Stark grunhiu, agoniado com a demora.
-É, aquele bug pegou pra valer. - Ela respondeu. - Mas tirando isso, tudo anda relativamente bem. A equipe de engenheiros já está trabalhando em um projeto para reconstruir os setores de Inteligência e Contabilidade, e eles devem estar prontos em menos de quatro dias.
-O que mais tem pra nós? - Tony perguntou.
-São minhas informações mais atualizadas. - Olivia disse checando seu tablet. - Quanto ao nosso misterioso amigo verde, as pistas são poucas. Não fazemos ideia de quem ele é ou o que queria. Mas chegaremos lá.
Ela terminou a fala e dirigiu o olhar para os heróis. A sala caiu no silêncio, e todos eles a encaravam, impassíveis, como se ela fosse uma assombração. Todos mantinham os olhos curiosos sobre ela, por conta da cena inusitada e impressionante que acontecera há poucas horas. Diante da quietude dos companheiros, Stark interviu.
-Obrigado, Olivia. Vamos fazer uso das informações. Já pode ir. - Ele disse um tanto desconfortável, na intenção de que ela fosse embora.
-Espera aí. - Banner se manifestou. - Toda essa baboseira operacional é ótima, loirinha, mas não vamos nos esquecer do detalhe principal aqui. O que foi aquilo que você fez lá na central de controle?
Banner falou aquilo que todos aparentemente desejavam dizer, pois os demais heróis cruzaram os braços e se aproximaram do centro da sala ao ouvir aquelas palavras, interessados na resposta. A garota soltou um longo e pesado suspiro, e olhou para o chão.
-Claro que vocês viram, não é? - A garota disse, desconfortável.
-É, nós vimos. E adoraríamos uma explicação, se não estiver muito ocupada correndo atrás dos seus sistemas de ploftware. - Thor disse cruzando os braços.
-Software. - Peter corrigiu, camuflando a fala em uma tosse fingida.
-Você - Olivia disse, dirigindo um olhar curioso ao rapaz. - Você trabalha no setor de Inovações, não é? Não deveria estar reparando o sistema de dados? Eu disse aos outros funcionários que...
Peter logo se ligou. A garota o reconhecera como um de seus subordinados por conta do trabalho no departamento de Inovações. Provavelmente, ela nunca o tinha visto sem máscara antes, e não sabia quem ele realmente era.
-Não, é um mal-entendido. - O garoto se explicou. - Eu sou Peter Parker. - Ele se apresentou, com um sorriso simpático.
Olivia ficou encarando-o, tentando entender a relevância daquele comentário.
-E...? - Ela questionou com as sobrancelhas arqueadas.
-Oh, eu - Peter embaralhou-se. - Eu sou o Homem-Aranha.
-Você é o Homem-Aranha? - A menina perguntou, encarando o garoto de dezessete anos e um metro e setenta à sua frente.
-Sou. - Peter sorriu sem jeito.
-Isso sim é uma bela identidade secreta. - Olivia sorriu de volta, achando graça.
-Bom, agora que a Srta. McCall já conhece toda a equipe, talvez ela possa nos esclarecer um pouco mais sobre si mesma. - Natasha dirigiu a conversa novamente para o assunto que interessava a todos.
A garota respirou fundo, e olhou para todos eles.
-Vocês não são os únicos aqui que tem truques esquisitos. – Falou Olivia. – Aquele foi o meu.
-E o que exatamente é esse seu "truque esquisito", como você chama? - Questionou Thor.
-É uma coisa que eu faço. Eu manipulo energia. - A garota contou. - Posso controlá-la e transformá-la, dependendo dos meus pensamentos.
-Energia elétrica? - Visão perguntou, curioso assim como todos. - Tem um poder com energia elétrica?
-Não, não é só eletricidade. Faço qualquer tipo de energia me obedecer, basicamente. - Ela explicou, um tanto retraída.
-E como exatamente isso funciona? - Bruce disse com seus sentidos de pesquisador se aguçando.
-Bom - Olivia disse, dirigindo o olhar para Stark. - É uma história um pouco complicada.
-Vai em frente. - Tony disse a ela, recostado em uma das mesas da sala, concedendo uma espécie de permissão.
A garota tomou fôlego antes de falar, diante da deixa do homem.
-Ok, é mais ou menos assim. Meu pai usou, durante muito tempo, um reator ARC no corpo dele. Esse reator funcionava a base de raios gama, que são um tipo de radioatividade, para criar energia e alimentar o eletroímã que mantinha o coração dele a salvo. De alguma maneira, por conta do longo tempo de uso, a radioatividade de dentro do reator causou uma alteração nos genes dele, como toda radiação acaba fazendo eventualmente, e essa alteração atingia especificamente os seus cromossomos hereditários. Portanto, a mutação se transmitiu pra mim, a sua descendente, e me deu esses... poderes.
-E como a alteração se manifestou em você? - Dr. Banner perguntou, fascinado. Ele não estava errado, afinal: a radiação emitida pelo reator realmente teve efeitos colaterais sobre Stark.
-A mutação genética gerou uma anomalia no meu sistema nervoso. Graças a ela, meu cérebro processa as coisas de um jeito um pouco diferente de uma pessoa comum. Sou mais sensível do que os outros humanos. - Olivia continuou. - Isso se reflete no resto do corpo também, e faz com que os meus nervos possam detectar energia e se conectar com ela. É através dessa conexão que eu consigo controlá-la. Posso pegar a eletricidade de um cabo de força, por exemplo, e fazer com que ela atinja algo ou alguém como fiz com o nosso invasor, gerando uma descarga. Também posso fazer com que a energia cinética de um carro se altere, fazendo com que ele se mova mais rápido, ou então pare. Dá pra pegar a energia de um cata-vento agitando-se no jardim, e usá-la pra ligar um liquidificador ou a televisão. Ou então, transformar a energia do calor que o fogo libera em impulso pra mover uma cadeira. Eu consigo converter qualquer tipo de energia para outro. Minhas terminações nervosas fazem a conexão, e meu cérebro a comanda.
-Irado. - Disse Parker, impressionado.
-Ok, além de o Stark ter escondido uma filha, ele escondeu uma filha que tem superpoderes mentais excepcionais. - Disse Natasha, admirada.
-Eu não estava escondendo nada, eu estava simplesmente cuidando da minha própria vida. - Tony alfinetou-a, farto daquela discussão.
-Cuidar da própria vida longe de todas as outras pessoas me parece sinônimo de esconder as coisas. - Romanoff replicou.
-Ok, já chega de falarem sobre isso como se eu fosse um mentiroso. - Ele irritou-se. - Eu não estava mentindo pra vocês, eu estava tentando protegê-la.
-Protegê-la de quê? - Visão perguntou, tentando entender assim como todo o resto.
-Eu disse que vocês não entendiam. - Tony negou com a cabeça, e então fez uma pausa. - Eu não mantive a Olivia em segredo esse tempo todo porque queria escondê-la de vocês. Os Vingadores não são o problema. Vocês sabem muito bem o que meu sobrenome pode acarretar pra uma pessoa, e não é só atenção da mídia. Qualquer um que é ligado a mim fica sobre constante ameaça por conta de quem eu sou.
-Tudo bem, mas por que você decidiu trazê-la pra cá de repente, então? - Thor questionou, confuso.
-Porque mesmo com todos os cuidados que eu tomei durante todos esses anos, alguém a colocou em perigo. - Stark explicou, com peso na voz.
-Como assim, perigo?
-Descobriram a minha identidade de alguma forma. - Olivia contou. - Há alguns meses eu comecei a receber mensagens com ameaças e intimidações, dizendo que alguém teria me descoberto e iria me expor pra me fazer pagar pelo segredo. As coisas começaram a ficar um pouco assustadoras, e meu pai me trouxe pra cá. Ele me deu um trabalho administrativo dentro da sede e um dormitório isolado, pra que eu pudesse ser vigiada como uma princesa indefesa no topo da torre. - A garota ironizou. Aquilo parecia não a agradar.
-Isso explica muita coisa. - Concluiu Peter.
-É como eu disse: não estava mentindo pra vocês. Não precisavam ter armado todo aquele circo. - Stark bufou, por fim.
-Chegou a passar pela sua cabeça que, se a sua filha secreta e superpoderosa estava correndo perigo, poderíamos ter ajudado? - Bruce retrucou, um pouco ferido pela aparente falta de confiança do companheiro.
-Pois é. Bastava ter falado sobre isso com a gente e entenderíamos. Se confiasse na sua equipe, não teríamos armado todo aquele circo. - Romanoff completou sua fala.
-Ficaríamos felizes em te ajudar a protegê-la, Stark. Podia ter confiado em nós. - Disse Thor.
-E vocês poderiam ter confiado em mim também. - Tony protestou.
-Fica difícil confiar em você quando tudo que faz parece ser inteiramente problema seu. - Natasha respondeu sinceramente. - Há meses que você simplesmente não fala com a gente, pensamos que tinha alguma coisa errada.
-Me desculpem, tudo bem? - Stark ergueu a voz. - É que com todas essas coisas acontecendo, eu não estava muito preocupado em ser um líder simpático e transparente. Não sou a droga de um Power Ranger.
-Não tínhamos como adivinhar, Sr. Stark. E não foi nossa intenção interferir na sua vida ou passar dos limites com a sua privacidade. - Disse Peter. - Só estávamos preocupados com você.
-Está claro que a nossa equipe precisa rever suas políticas de confiança. - Visão constatou. - Agora, podemos perdoar os erros uns dos outros e seguir em frente, sem mais segredos e suspeitas? - Ele encarou os outros. - Romanoff? Banner?
-Sim. - Ambos falaram juntos, um pouco contrariados.
-Tony? - Disse o humanoide.
-Podemos. - Stark proferiu, olhando para Natasha e Banner do outro lado da sala.
-Ótimo. - Concluiu, dando uma pausa de alguns segundos na conversa.
-Mas que tipo de ameaças a Olivia estava recebendo, afinal de contas? - Thor fez a pergunta.
-Eram todas anônimas, do tipo mais covarde possível. - Ela se manifestou, com desprezo na voz. - Tudo começou com mensagens de texto, dizendo que "máscaras iriam cair". Depois, alguém invadiu minhas redes sociais e começou a mandar intimidações, dizendo que iriam me pegar e fazendo ameaças mais pesadas. Pensei que tudo não passava de um trote, até o dia em que cheguei em casa e vi uma mensagem colada na janela do meu quarto que dizia "eu sei quem você é". Foi aí que percebi que era algo sério.
-Assim que Olivia me contou, vi que o anonimato que construímos pra ela não era mais seguro. - Stark entrou no assunto. - Então que decidi trazê-la pra cá. Ninguém conseguiria atingi-la aqui dentro, pois estaria cercada de guardas e eu ficaria de olho nela. Ela já estava fazendo faculdade aqui na cidade, então dei a ela um trabalho na sede e um disfarce, pra que ficasse segura até que descobríssemos quem estava fazendo aquilo. Apagamos todas as suas redes sociais e outros dados, trocamos o número de celular e tudo mais, pra que ela sumisse do mapa.
-Ele exagerou um pouquinho. - Olivia falou em um tom mais baixo.
-E quem era o stalker? - Peter perguntou.
-Não sabemos. - Tony continuou, com frustração. - Parte da razão do meu sumiço nos os últimos tempos foi a investigação destas mensagens. Mas todas as pistas que conseguimos nos levaram a um beco sem saída.
-O que descobriram?
-As mensagens vieram de um número encriptado e sem registros, que não tem dono nenhum. - Tony explicou. - Rastreamos a localização da qual elas foram enviadas, e todas elas têm origem em um terreno abandonado que pertence ao governo. Eu tentei acessar as câmeras de segurança que cercam o lugar, mas elas não mostram ninguém entrando ou saindo de lá no último ano.
-Acha que essas ameaças podem ter alguma ligação com o invasor, Tony? - Visão levantou a hipótese.
-Acho que um cara que é capaz de invadir a nossa sede e passar todos nós pra trás tem mais a fazer do que enviar mensagens de ódio pra uma adolescente. - Banner discordou, e todos ficaram em silêncio após a sua fala.
-Bem-vinda ao misterioso drama dos Vingadores, Srta. McCall. - Thor dirigiu-se à menina com um sorriso simpático.
-É, sei. - A garota disse, rolando os olhos. - Bom, acho que eu não tenho muita escolha. Mas já que estou metida nessa de qualquer jeito, é hora de cortar a diplomacia, ok? - Ela falou, tediosa. - Sem mais "senhorita McCall", "boa tarde, senhores Vingadores" e toda essa palhaçada. Estou cansada disso.
Eles ficaram um pouco surpresos diante daquela declaração. Ela não era uma chefe de departamento formal, fofa e inteligente?
-Não tenho muita certeza, mas acho que isso quer dizer "protejam-se". - Disse Stark, o que fez Olivia lançar um olhar irritado para ele.
-Está bem, se ele não é um perseguidor de adolescentes, então o que o nosso querido Ervilha Voadora é? - Bruce procurou respostas.
Olivia, olhando para a imagem do inimigo em seu uniforme verde-musgo exibida na tela principal da sala, constatou:
-Alguém com péssimo estilo.
-Alguém como o senhor, Dr. Banner. - Stark concluiu, e o homem o encarou com desdém.
-Não podemos fazer reconhecimento facial nas imagens que temos dele? - Natasha sugeriu.
-Era uma possibilidade, mas não dá certo por conta da máscara que ele estava usando. - McCall explicou. - Já tentei fazer isso com todos os softwares possíveis.
-E nenhum desses seus smoftwarves consegue nos dizer como ele fez pra entrar aqui com tanta facilidade?
-Softwares. - Peter corrigiu Thor novamente usando uma tosse disfarçada.
-Isso é mais complicado de atestar. Mas, pelo que parece, foi realmente muito fácil pra ele paralisar os nossos sistemas. Ele meteu o pau em quatro firewalls como se fossem redes de caçar água-viva do Bob Esponja.
Thor ficou alguns segundos tentando absorver o fato de que a garota meiga de cinco minutos atrás acabara de usar a expressão "meteu o pau".
-Ei, calma aí - Stark se sentiu pessoalmente ofendido pelo insulto aos seus firewalls. - Primeiro de tudo: olha a linguagem. Segundo: eu mesmo instalei esses sistemas e posso garantir que não foi por culpa deles que nos invadir foi tão fácil.
-Eu sei disso, pai. Fui eu que te ajudei a projetá-los. - Olivia disse com obviedade. - É por isso mesmo que eu estou falando. Um prédio com tantas tecnologias caras e perigosas como esse precisa de um sistema de segurança à altura. Não tenho ideia de como o Ervilha fez pra deixá-los tão fracos. Mas, do jeito que eles estão agora, eu mesma posso hackeá-los pelo meu próprio computador.
O ego de Tony ficou ferido.
-Não exagere. - Ele discutiu. - Mesmo que estejam enfraquecidos, nossos programas ainda são alguns dos mais fortes do mundo. Não tem como.
Sem responder mais nada, a garota abaixou a cabeça e começou a teclar alguma coisa no tablet que havia trazido, com ligeiros toques. Após alguns segundos, alarmes de alerta começaram a soar pela sala, e também por todo o andar em que eles se encontravam. Uma mensagem vermelha apareceu no telão principal da sala, atestando que uma invasão no sistema havia sido detectada.
-Eu adoro estar certa. - A garota disse e riu, diante da cara emburrada de Tony.
-É, Stark, ela realmente é sua filha. - Banner brincou, notando que o orgulho era genético.
-A única diferença é que eu não sou cínica e desequilibrada emocionalmente. - Ela completou, e o queixo de Banner caiu. Estava começando a ficar fã daquela menina.
-Mas se esse cara é mesmo tão incrível a ponto de derrubar todas as barreiras virtuais brincando, por que vir até aqui pessoalmente pra roubar os dados que ele queria pegar? - Natasha questionou.
-Esse é o ponto em que acabamos vencendo. Por questões de segurança, mesmo que virem os nossos sistemas de cabeça pra baixo, nenhum dado pode ser retirado do nosso servidor. A única forma de pegar qualquer informação daqui é manualmente, de dentro da sala de comando, justamente pra impedir que invasores e hackers como o Ervilha consigam tudo simplesmente implantando algum bug que não conseguimos identificar. É um sistema...
-Manual-presencial. - Olivia falou, e esta última frase foi dita ao mesmo tempo por Peter, que também entendia daquela linguagem tecnológica.
-Isso aí. - Disse ela em resposta.
-Só pra constar, isso foi ideia minha. - Peter disse erguendo a mão, cheio de orgulho. - Fui eu que desenvolvi esse sistema.
-A garota é a Oprah da segurança de computação, e o Stark está preocupado com um stalker no celular dela. - Banner disse para Romanoff, brincando.
-É que ele está muito empenhado em tentar ser um pai preocupado. - Olivia falou num tom baixo. - Dá um tempo pra ele.
-Tá, isso não é muito otimista. Quem garante que o Ervilha não vai tentar roubar os dados de novo, já que não conseguiu da primeira vez? - Visão perguntou.
-Bom, nossos sistemas serão reforçados ao máximo. Se ele tentar, não vai conseguir. - Stark falou.
-Acho que ele não seria ingênuo de tentar a mesma coisa duas vezes. Quero dizer, na primeira tentativa, ele pegou nossos firewalls e fu... - Olivia ia dizer, mas encontrou com o olhar de reprovação de Tony. - Fuzilou. Ele sabe que vamos fazer de tudo pra que isso não aconteça de novo.
-Precisamos ficar atentos a qualquer outra alternativa que ele venha a tentar. Com sorte, ele será descuidado o suficiente para deixar alguma pista que nos leve a descobrir quem ele é e por que está fazendo isso. - Banner opinou.
-E se ele vier, vamos ter certeza de deixar que a dona do sistema nervoso superdesenvolvido seja a primeira a lhe dar boas-vindas. - Nat falou. - Viva os raios gama.
-É, viva. Eles me tornaram uma esquisitona, mas pelo menos não me transformaram em um monstro verde e raivoso. – Olivia olhou para Bruce, que não esperava por essa.
-Eu não me irritaria se fosse você, loirinha. - Bruce respondeu, entrando na brincadeira por um momento.
-Não, senhores. - A conversa foi interrompida por Stark. - Esse sistema nervoso superdesenvolvido ficará bem longe disso, focado apenas em seus computadores e em outras coisas de adolescente, tipo fazer as unhas ou ouvir Justin Bieber. - Ele disse com certa convicção. - Ela não vai se envolver nisso.
Thor olhou para Visão, e os dois trocaram um semblante confuso.
-Ela poderia ser uma grande ajuda pra nós. - O humanoide continuou.
-Stark, sei que não é tão simples assim, mas a garota foi a única que conseguiu chutar aquele maluco daqui. Não acha que deveríamos pelo menos pensar no assunto? - Thor questionou, alarmado.
-Nada disso. Ela não tem treinamento nenhum e não sabe usar as habilidades direito. - Tony manteve a sua negativa. - Aquele lance na sala de controle foi ótimo, e somos gratos por ela estar lá naquele momento, mas foi só.
Olivia permaneceu calada diante da discussão que lhe dizia respeito. Visão e o deus trocaram mais uma série de olhares, mas ninguém se manifestou.
-Acho que podemos declarar essa reunião encerrada. Já chega de conversas reveladoras, papos tecnológicos e insultos à minha pessoa. - Tony disse se dirigindo à porta da sala. - Não sei vocês, mas eu estou morrendo de fome. Adoraria comer um shawarma agora, pra comemorar nossa derrota maravilhosa. Quem me acompanha?
-Mas, Sr. Stark, o que vamos fazer se o Ervilha Voadora voltar? - Parker questionou procurando uma conclusão para tudo aquilo, enquanto todos seguiam o homem para fora da sala de estratégias.
-Ele vai voltar, Pirralho. E nós vamos estar preparados pra ele dessa vez.
Após o incidente sofrido na base, a participação dos Vingadores no desfile de Veterans Day em Washington teve de ser cancelada. Milhares de pessoas que se uniram em multidão para ver os heróis pessoalmente voltaram para casa desapontadas por conta da falta – embora fosse bem provável que também se decepcionassem caso se eles tivessem aparecido.
Os noticiários já comentavam. O vexame do grupo de heróis que não pôde comparecer ao desfile feito em sua homenagem porque não foram capazes de deter um inimigo dentro de sua própria casa. Era irônico. Exatamente às vésperas de um evento que deveria aproximar os Vingadores da sociedade, um desastre como aquele apareceu para diminuir ainda mais a confiança da humanidade na capacidade da equipe de proteger a Terra.
Os heróis estavam reunidos longe de todo o barulho e correria, dentro da sala de estratégias, que ficara intacta após o combate. Stark encarava o lado de fora do prédio através da janela de vidro, e assistia às retroescavadeiras removerem os destroços do setor vizinho, que tinha vindo a baixo com uma das explosões. Ele soltou um suspiro, sentindo aborrecimento e quase vergonha pelo resultado negativo daquela luta. Já os outros, estavam todos falando; queriam saber como tinha sido possível perderem de forma tão inédita e ficarem vulneráveis a um inimigo com tanta facilidade.
-Não podemos admitir uma derrota dessas. - Falou Thor no meio da discussão. - Não agora.
-Nunca perdemos tão feio antes. O que foi que esse cara fez pra conseguir isso? - Questionou Natasha, indignada.
-Não foi só graças a ele, nossos trajes também não estavam ajudando. - Peter constatou.
-Quem foi que teve a ideia magnífica de simplificar nossos uniformes e nos deixar ir até Washington sem armamento nenhum? - Banner protestou. - Aquilo não serve nem pra fantasia, como iríamos proteger as pessoas se aquele cara tivesse resolvido nos atacar no meio do desfile?
-Os armamentos foram retirados pra manter a nossa tecnologia em segredo, eu acho. Alguém poderia ter tentado roubá-la durante o evento. E se houvesse algum problema, o exército ia cuidar da segurança. - Visão esclareceu. - Deve ter parecido uma boa ideia no início.
-Aquela ervilha voadora nem era assim tão difícil de combater, só perdemos pra ele porque estávamos desprevenidos. - Thor defendeu a equipe. - O que ele tem demais, afinal?
-Ainda não conseguimos definir totalmente os padrões de combate dele. - Atestou Visão, acompanhando uma geração de relatórios através de um tablet. - Mas ele não era um ser humano comum.
-O que foi que ele usou pra explodir o complexo? Algum poder de detonação?
-Não, não era nenhuma habilidade. Os prédios foram derrubados com explosivos segundo a perícia. - Bruce esclareceu. - Seu voo também não era natural, ele tinha propulsores nos pés. - O homem exibiu uma gravação das câmeras de segurança, pausando em um momento em que os equipamentos se tornavam visíveis.
-Bom, esse cara tem recursos, inclusive tecnológicos. Ele conseguiu burlar todo o nosso sistema de segurança pra entrar. - Falou Parker, ao notar que até aquele momento alguns dos softwares da base continuavam fora do ar devido ao bug.
-Mas ele não é só feito de recursos. O corpo dele resistiu ao impacto do Hulk e também era à prova de balas. - Romanoff contou. - E ele derrubou toda a energia elétrica do complexo sozinho.
-Como?
-Não sei, parecia algum tipo de raio que saia das mãos dele. Não tem como saber o que era. - Ela respondeu. - Mas esse não é um sujeito comum.
A confabulação dos heróis foi interrompida com a abertura da porta, que trouxe de fora o barulho ensurdecedor de britadeiras e soldas do escritório ao lado. Quem irrompeu pela sala foi Srta. McCall a passos acelerados, carregando um tablet de tela transparente nas mãos.
-Bom, quase todos os nossos sistemas operacionais já estão de pé novamente. - Ela comunicou aos heróis, com a fala acelerada. - Apenas os sistemas de segurança estão dando um pouco mais de trabalho, mas os técnicos dizem que devem consertá-los em algumas horas.
-Ainda? - Stark grunhiu, agoniado com a demora.
-É, aquele bug pegou pra valer. - Ela respondeu. - Mas tirando isso, tudo anda relativamente bem. A equipe de engenheiros já está trabalhando em um projeto para reconstruir os setores de Inteligência e Contabilidade, e eles devem estar prontos em menos de quatro dias.
-O que mais tem pra nós? - Tony perguntou.
-São minhas informações mais atualizadas. - Olivia disse checando seu tablet. - Quanto ao nosso misterioso amigo verde, as pistas são poucas. Não fazemos ideia de quem ele é ou o que queria. Mas chegaremos lá.
Ela terminou a fala e dirigiu o olhar para os heróis. A sala caiu no silêncio, e todos eles a encaravam, impassíveis, como se ela fosse uma assombração. Todos mantinham os olhos curiosos sobre ela, por conta da cena inusitada e impressionante que acontecera há poucas horas. Diante da quietude dos companheiros, Stark interviu.
-Obrigado, Olivia. Vamos fazer uso das informações. Já pode ir. - Ele disse um tanto desconfortável, na intenção de que ela fosse embora.
-Espera aí. - Banner se manifestou. - Toda essa baboseira operacional é ótima, loirinha, mas não vamos nos esquecer do detalhe principal aqui. O que foi aquilo que você fez lá na central de controle?
Banner falou aquilo que todos aparentemente desejavam dizer, pois os demais heróis cruzaram os braços e se aproximaram do centro da sala ao ouvir aquelas palavras, interessados na resposta. A garota soltou um longo e pesado suspiro, e olhou para o chão.
-Claro que vocês viram, não é? - A garota disse, desconfortável.
-É, nós vimos. E adoraríamos uma explicação, se não estiver muito ocupada correndo atrás dos seus sistemas de ploftware. - Thor disse cruzando os braços.
-Software. - Peter corrigiu, camuflando a fala em uma tosse fingida.
-Você - Olivia disse, dirigindo um olhar curioso ao rapaz. - Você trabalha no setor de Inovações, não é? Não deveria estar reparando o sistema de dados? Eu disse aos outros funcionários que...
Peter logo se ligou. A garota o reconhecera como um de seus subordinados por conta do trabalho no departamento de Inovações. Provavelmente, ela nunca o tinha visto sem máscara antes, e não sabia quem ele realmente era.
-Não, é um mal-entendido. - O garoto se explicou. - Eu sou Peter Parker. - Ele se apresentou, com um sorriso simpático.
Olivia ficou encarando-o, tentando entender a relevância daquele comentário.
-E...? - Ela questionou com as sobrancelhas arqueadas.
-Oh, eu - Peter embaralhou-se. - Eu sou o Homem-Aranha.
-Você é o Homem-Aranha? - A menina perguntou, encarando o garoto de dezessete anos e um metro e setenta à sua frente.
-Sou. - Peter sorriu sem jeito.
-Isso sim é uma bela identidade secreta. - Olivia sorriu de volta, achando graça.
-Bom, agora que a Srta. McCall já conhece toda a equipe, talvez ela possa nos esclarecer um pouco mais sobre si mesma. - Natasha dirigiu a conversa novamente para o assunto que interessava a todos.
A garota respirou fundo, e olhou para todos eles.
-Vocês não são os únicos aqui que tem truques esquisitos. – Falou Olivia. – Aquele foi o meu.
-E o que exatamente é esse seu "truque esquisito", como você chama? - Questionou Thor.
-É uma coisa que eu faço. Eu manipulo energia. - A garota contou. - Posso controlá-la e transformá-la, dependendo dos meus pensamentos.
-Energia elétrica? - Visão perguntou, curioso assim como todos. - Tem um poder com energia elétrica?
-Não, não é só eletricidade. Faço qualquer tipo de energia me obedecer, basicamente. - Ela explicou, um tanto retraída.
-E como exatamente isso funciona? - Bruce disse com seus sentidos de pesquisador se aguçando.
-Bom - Olivia disse, dirigindo o olhar para Stark. - É uma história um pouco complicada.
-Vai em frente. - Tony disse a ela, recostado em uma das mesas da sala, concedendo uma espécie de permissão.
A garota tomou fôlego antes de falar, diante da deixa do homem.
-Ok, é mais ou menos assim. Meu pai usou, durante muito tempo, um reator ARC no corpo dele. Esse reator funcionava a base de raios gama, que são um tipo de radioatividade, para criar energia e alimentar o eletroímã que mantinha o coração dele a salvo. De alguma maneira, por conta do longo tempo de uso, a radioatividade de dentro do reator causou uma alteração nos genes dele, como toda radiação acaba fazendo eventualmente, e essa alteração atingia especificamente os seus cromossomos hereditários. Portanto, a mutação se transmitiu pra mim, a sua descendente, e me deu esses... poderes.
-E como a alteração se manifestou em você? - Dr. Banner perguntou, fascinado. Ele não estava errado, afinal: a radiação emitida pelo reator realmente teve efeitos colaterais sobre Stark.
-A mutação genética gerou uma anomalia no meu sistema nervoso. Graças a ela, meu cérebro processa as coisas de um jeito um pouco diferente de uma pessoa comum. Sou mais sensível do que os outros humanos. - Olivia continuou. - Isso se reflete no resto do corpo também, e faz com que os meus nervos possam detectar energia e se conectar com ela. É através dessa conexão que eu consigo controlá-la. Posso pegar a eletricidade de um cabo de força, por exemplo, e fazer com que ela atinja algo ou alguém como fiz com o nosso invasor, gerando uma descarga. Também posso fazer com que a energia cinética de um carro se altere, fazendo com que ele se mova mais rápido, ou então pare. Dá pra pegar a energia de um cata-vento agitando-se no jardim, e usá-la pra ligar um liquidificador ou a televisão. Ou então, transformar a energia do calor que o fogo libera em impulso pra mover uma cadeira. Eu consigo converter qualquer tipo de energia para outro. Minhas terminações nervosas fazem a conexão, e meu cérebro a comanda.
-Irado. - Disse Parker, impressionado.
-Ok, além de o Stark ter escondido uma filha, ele escondeu uma filha que tem superpoderes mentais excepcionais. - Disse Natasha, admirada.
-Eu não estava escondendo nada, eu estava simplesmente cuidando da minha própria vida. - Tony alfinetou-a, farto daquela discussão.
-Cuidar da própria vida longe de todas as outras pessoas me parece sinônimo de esconder as coisas. - Romanoff replicou.
-Ok, já chega de falarem sobre isso como se eu fosse um mentiroso. - Ele irritou-se. - Eu não estava mentindo pra vocês, eu estava tentando protegê-la.
-Protegê-la de quê? - Visão perguntou, tentando entender assim como todo o resto.
-Eu disse que vocês não entendiam. - Tony negou com a cabeça, e então fez uma pausa. - Eu não mantive a Olivia em segredo esse tempo todo porque queria escondê-la de vocês. Os Vingadores não são o problema. Vocês sabem muito bem o que meu sobrenome pode acarretar pra uma pessoa, e não é só atenção da mídia. Qualquer um que é ligado a mim fica sobre constante ameaça por conta de quem eu sou.
-Tudo bem, mas por que você decidiu trazê-la pra cá de repente, então? - Thor questionou, confuso.
-Porque mesmo com todos os cuidados que eu tomei durante todos esses anos, alguém a colocou em perigo. - Stark explicou, com peso na voz.
-Como assim, perigo?
-Descobriram a minha identidade de alguma forma. - Olivia contou. - Há alguns meses eu comecei a receber mensagens com ameaças e intimidações, dizendo que alguém teria me descoberto e iria me expor pra me fazer pagar pelo segredo. As coisas começaram a ficar um pouco assustadoras, e meu pai me trouxe pra cá. Ele me deu um trabalho administrativo dentro da sede e um dormitório isolado, pra que eu pudesse ser vigiada como uma princesa indefesa no topo da torre. - A garota ironizou. Aquilo parecia não a agradar.
-Isso explica muita coisa. - Concluiu Peter.
-É como eu disse: não estava mentindo pra vocês. Não precisavam ter armado todo aquele circo. - Stark bufou, por fim.
-Chegou a passar pela sua cabeça que, se a sua filha secreta e superpoderosa estava correndo perigo, poderíamos ter ajudado? - Bruce retrucou, um pouco ferido pela aparente falta de confiança do companheiro.
-Pois é. Bastava ter falado sobre isso com a gente e entenderíamos. Se confiasse na sua equipe, não teríamos armado todo aquele circo. - Romanoff completou sua fala.
-Ficaríamos felizes em te ajudar a protegê-la, Stark. Podia ter confiado em nós. - Disse Thor.
-E vocês poderiam ter confiado em mim também. - Tony protestou.
-Fica difícil confiar em você quando tudo que faz parece ser inteiramente problema seu. - Natasha respondeu sinceramente. - Há meses que você simplesmente não fala com a gente, pensamos que tinha alguma coisa errada.
-Me desculpem, tudo bem? - Stark ergueu a voz. - É que com todas essas coisas acontecendo, eu não estava muito preocupado em ser um líder simpático e transparente. Não sou a droga de um Power Ranger.
-Não tínhamos como adivinhar, Sr. Stark. E não foi nossa intenção interferir na sua vida ou passar dos limites com a sua privacidade. - Disse Peter. - Só estávamos preocupados com você.
-Está claro que a nossa equipe precisa rever suas políticas de confiança. - Visão constatou. - Agora, podemos perdoar os erros uns dos outros e seguir em frente, sem mais segredos e suspeitas? - Ele encarou os outros. - Romanoff? Banner?
-Sim. - Ambos falaram juntos, um pouco contrariados.
-Tony? - Disse o humanoide.
-Podemos. - Stark proferiu, olhando para Natasha e Banner do outro lado da sala.
-Ótimo. - Concluiu, dando uma pausa de alguns segundos na conversa.
-Mas que tipo de ameaças a Olivia estava recebendo, afinal de contas? - Thor fez a pergunta.
-Eram todas anônimas, do tipo mais covarde possível. - Ela se manifestou, com desprezo na voz. - Tudo começou com mensagens de texto, dizendo que "máscaras iriam cair". Depois, alguém invadiu minhas redes sociais e começou a mandar intimidações, dizendo que iriam me pegar e fazendo ameaças mais pesadas. Pensei que tudo não passava de um trote, até o dia em que cheguei em casa e vi uma mensagem colada na janela do meu quarto que dizia "eu sei quem você é". Foi aí que percebi que era algo sério.
-Assim que Olivia me contou, vi que o anonimato que construímos pra ela não era mais seguro. - Stark entrou no assunto. - Então que decidi trazê-la pra cá. Ninguém conseguiria atingi-la aqui dentro, pois estaria cercada de guardas e eu ficaria de olho nela. Ela já estava fazendo faculdade aqui na cidade, então dei a ela um trabalho na sede e um disfarce, pra que ficasse segura até que descobríssemos quem estava fazendo aquilo. Apagamos todas as suas redes sociais e outros dados, trocamos o número de celular e tudo mais, pra que ela sumisse do mapa.
-Ele exagerou um pouquinho. - Olivia falou em um tom mais baixo.
-E quem era o stalker? - Peter perguntou.
-Não sabemos. - Tony continuou, com frustração. - Parte da razão do meu sumiço nos os últimos tempos foi a investigação destas mensagens. Mas todas as pistas que conseguimos nos levaram a um beco sem saída.
-O que descobriram?
-As mensagens vieram de um número encriptado e sem registros, que não tem dono nenhum. - Tony explicou. - Rastreamos a localização da qual elas foram enviadas, e todas elas têm origem em um terreno abandonado que pertence ao governo. Eu tentei acessar as câmeras de segurança que cercam o lugar, mas elas não mostram ninguém entrando ou saindo de lá no último ano.
-Acha que essas ameaças podem ter alguma ligação com o invasor, Tony? - Visão levantou a hipótese.
-Acho que um cara que é capaz de invadir a nossa sede e passar todos nós pra trás tem mais a fazer do que enviar mensagens de ódio pra uma adolescente. - Banner discordou, e todos ficaram em silêncio após a sua fala.
-Bem-vinda ao misterioso drama dos Vingadores, Srta. McCall. - Thor dirigiu-se à menina com um sorriso simpático.
-É, sei. - A garota disse, rolando os olhos. - Bom, acho que eu não tenho muita escolha. Mas já que estou metida nessa de qualquer jeito, é hora de cortar a diplomacia, ok? - Ela falou, tediosa. - Sem mais "senhorita McCall", "boa tarde, senhores Vingadores" e toda essa palhaçada. Estou cansada disso.
Eles ficaram um pouco surpresos diante daquela declaração. Ela não era uma chefe de departamento formal, fofa e inteligente?
-Não tenho muita certeza, mas acho que isso quer dizer "protejam-se". - Disse Stark, o que fez Olivia lançar um olhar irritado para ele.
-Está bem, se ele não é um perseguidor de adolescentes, então o que o nosso querido Ervilha Voadora é? - Bruce procurou respostas.
Olivia, olhando para a imagem do inimigo em seu uniforme verde-musgo exibida na tela principal da sala, constatou:
-Alguém com péssimo estilo.
-Alguém como o senhor, Dr. Banner. - Stark concluiu, e o homem o encarou com desdém.
-Não podemos fazer reconhecimento facial nas imagens que temos dele? - Natasha sugeriu.
-Era uma possibilidade, mas não dá certo por conta da máscara que ele estava usando. - McCall explicou. - Já tentei fazer isso com todos os softwares possíveis.
-E nenhum desses seus smoftwarves consegue nos dizer como ele fez pra entrar aqui com tanta facilidade?
-Softwares. - Peter corrigiu Thor novamente usando uma tosse disfarçada.
-Isso é mais complicado de atestar. Mas, pelo que parece, foi realmente muito fácil pra ele paralisar os nossos sistemas. Ele meteu o pau em quatro firewalls como se fossem redes de caçar água-viva do Bob Esponja.
Thor ficou alguns segundos tentando absorver o fato de que a garota meiga de cinco minutos atrás acabara de usar a expressão "meteu o pau".
-Ei, calma aí - Stark se sentiu pessoalmente ofendido pelo insulto aos seus firewalls. - Primeiro de tudo: olha a linguagem. Segundo: eu mesmo instalei esses sistemas e posso garantir que não foi por culpa deles que nos invadir foi tão fácil.
-Eu sei disso, pai. Fui eu que te ajudei a projetá-los. - Olivia disse com obviedade. - É por isso mesmo que eu estou falando. Um prédio com tantas tecnologias caras e perigosas como esse precisa de um sistema de segurança à altura. Não tenho ideia de como o Ervilha fez pra deixá-los tão fracos. Mas, do jeito que eles estão agora, eu mesma posso hackeá-los pelo meu próprio computador.
O ego de Tony ficou ferido.
-Não exagere. - Ele discutiu. - Mesmo que estejam enfraquecidos, nossos programas ainda são alguns dos mais fortes do mundo. Não tem como.
Sem responder mais nada, a garota abaixou a cabeça e começou a teclar alguma coisa no tablet que havia trazido, com ligeiros toques. Após alguns segundos, alarmes de alerta começaram a soar pela sala, e também por todo o andar em que eles se encontravam. Uma mensagem vermelha apareceu no telão principal da sala, atestando que uma invasão no sistema havia sido detectada.
-Eu adoro estar certa. - A garota disse e riu, diante da cara emburrada de Tony.
-É, Stark, ela realmente é sua filha. - Banner brincou, notando que o orgulho era genético.
-A única diferença é que eu não sou cínica e desequilibrada emocionalmente. - Ela completou, e o queixo de Banner caiu. Estava começando a ficar fã daquela menina.
-Mas se esse cara é mesmo tão incrível a ponto de derrubar todas as barreiras virtuais brincando, por que vir até aqui pessoalmente pra roubar os dados que ele queria pegar? - Natasha questionou.
-Esse é o ponto em que acabamos vencendo. Por questões de segurança, mesmo que virem os nossos sistemas de cabeça pra baixo, nenhum dado pode ser retirado do nosso servidor. A única forma de pegar qualquer informação daqui é manualmente, de dentro da sala de comando, justamente pra impedir que invasores e hackers como o Ervilha consigam tudo simplesmente implantando algum bug que não conseguimos identificar. É um sistema...
-Manual-presencial. - Olivia falou, e esta última frase foi dita ao mesmo tempo por Peter, que também entendia daquela linguagem tecnológica.
-Isso aí. - Disse ela em resposta.
-Só pra constar, isso foi ideia minha. - Peter disse erguendo a mão, cheio de orgulho. - Fui eu que desenvolvi esse sistema.
-A garota é a Oprah da segurança de computação, e o Stark está preocupado com um stalker no celular dela. - Banner disse para Romanoff, brincando.
-É que ele está muito empenhado em tentar ser um pai preocupado. - Olivia falou num tom baixo. - Dá um tempo pra ele.
-Tá, isso não é muito otimista. Quem garante que o Ervilha não vai tentar roubar os dados de novo, já que não conseguiu da primeira vez? - Visão perguntou.
-Bom, nossos sistemas serão reforçados ao máximo. Se ele tentar, não vai conseguir. - Stark falou.
-Acho que ele não seria ingênuo de tentar a mesma coisa duas vezes. Quero dizer, na primeira tentativa, ele pegou nossos firewalls e fu... - Olivia ia dizer, mas encontrou com o olhar de reprovação de Tony. - Fuzilou. Ele sabe que vamos fazer de tudo pra que isso não aconteça de novo.
-Precisamos ficar atentos a qualquer outra alternativa que ele venha a tentar. Com sorte, ele será descuidado o suficiente para deixar alguma pista que nos leve a descobrir quem ele é e por que está fazendo isso. - Banner opinou.
-E se ele vier, vamos ter certeza de deixar que a dona do sistema nervoso superdesenvolvido seja a primeira a lhe dar boas-vindas. - Nat falou. - Viva os raios gama.
-É, viva. Eles me tornaram uma esquisitona, mas pelo menos não me transformaram em um monstro verde e raivoso. – Olivia olhou para Bruce, que não esperava por essa.
-Eu não me irritaria se fosse você, loirinha. - Bruce respondeu, entrando na brincadeira por um momento.
-Não, senhores. - A conversa foi interrompida por Stark. - Esse sistema nervoso superdesenvolvido ficará bem longe disso, focado apenas em seus computadores e em outras coisas de adolescente, tipo fazer as unhas ou ouvir Justin Bieber. - Ele disse com certa convicção. - Ela não vai se envolver nisso.
Thor olhou para Visão, e os dois trocaram um semblante confuso.
-Ela poderia ser uma grande ajuda pra nós. - O humanoide continuou.
-Stark, sei que não é tão simples assim, mas a garota foi a única que conseguiu chutar aquele maluco daqui. Não acha que deveríamos pelo menos pensar no assunto? - Thor questionou, alarmado.
-Nada disso. Ela não tem treinamento nenhum e não sabe usar as habilidades direito. - Tony manteve a sua negativa. - Aquele lance na sala de controle foi ótimo, e somos gratos por ela estar lá naquele momento, mas foi só.
Olivia permaneceu calada diante da discussão que lhe dizia respeito. Visão e o deus trocaram mais uma série de olhares, mas ninguém se manifestou.
-Acho que podemos declarar essa reunião encerrada. Já chega de conversas reveladoras, papos tecnológicos e insultos à minha pessoa. - Tony disse se dirigindo à porta da sala. - Não sei vocês, mas eu estou morrendo de fome. Adoraria comer um shawarma agora, pra comemorar nossa derrota maravilhosa. Quem me acompanha?
-Mas, Sr. Stark, o que vamos fazer se o Ervilha Voadora voltar? - Parker questionou procurando uma conclusão para tudo aquilo, enquanto todos seguiam o homem para fora da sala de estratégias.
-Ele vai voltar, Pirralho. E nós vamos estar preparados pra ele dessa vez.
Capítulo 4
-Cara, isso é um biorreator de escalonamento de última geração. Por favor, tome cuidado.
Dr. Banner estava apreensivo diante da reforma do seu laboratório. Com a explosão do setor vizinho no dia anterior, graças às bombas do Ervilha-Voadora, muitos aparelhos de pesquisa ficaram danificados e precisavam ser trocados. Havia homens carregando caixas para lá e para cá, trazendo novos exemplares dos seus equipamentos caríssimos de pesquisa, e reparando danos físicos nas vidraças e paredes. Bruce estava inquieto, imaginando que os funcionários não faziam ideia da preciosidade, tanto científica quanto monetária, que carregavam nas mãos. Já Stark, que supervisionava as trocas e observava a cena de longe, divertia-se ao ver Banner tão preocupado com seus novos brinquedinhos.
-Devagar com isso aí. Esse vidro tem que ficar perfeitamente encaixado, ou eu não vou conseguir o isolamento da... - Ele advertia mais um dos ajudantes.
-Calma aí, cientista maluco. Eles sabem o que estão fazendo. - Tony disse colocando a mão em seu ombro e interrompendo a cena, por mais que aquilo o divertisse.
-Está bem. - Banner respirou fundo, e teve que se segurar para não chamar a atenção de um tal de Dave pela quinta vez, ao ver que ele estava quase derrubando sua nova autoclave.
-Escuta, deixa eu te falar. O Callahan me ligou pela manhã. Ele quer fazer uma reunião hoje à noite, pra falar conosco a respeito do ataque de ontem. - Stark disse ao amigo. - Acho que seria interessante se toda a equipe estivesse lá.
-Claro. - Banner respondeu. - O que acha que ele vai dizer? Nos dar uma bronca?
-Não sei, mas "parabéns" é que não vai ser. Provavelmente ele fará algum discurso formal e politicamente correto sobre como ele e o Conselho acham que devemos agir. Mas nós conseguimos evitar que o invasor roubasse qualquer coisa, então, não pode ser de todo ruim.
-E ele sabe da participação especial da garota nessa parte? - Perguntou Bruce referindo-se a Olivia, com as sobrancelhas arqueadas.
-Não, e nem vai saber. Quanto menos gente metida nisso, melhor. Não quero ele dando palpite no que devo ou não decidir. - Stark respondeu.
-E você já sabe o que vai fazer?
-Eu sei o que eu não quero fazer. - Disse após um suspiro pesado. - Mas já deu pra perceber que com a Olivia a situação é um pouco mais complicada que isso.
-A garota é durona. - Banner constatou. - Como alguém que eu conheço.
O cientista pareceu ponderar por alguns segundos.
-Sabe, existe um lugar que poderia ser a solução. É uma escola, onde pessoas como a Olivia, com esses dons, podem aprender a controlá-los e usá-los do jeito certo. Os alunos formam uma espécie de equipe, e quem os comanda é aquele professor famoso, Charles Xavier.
-Sei, os X-Men. - Tony concluiu.
-Isso. Já pensou em levar a Olivia até lá? Xavier é um visionário, com certeza ele acharia um lugar para ela e pras suas habilidades.
-Já pensei, sim. - Stark contou. - Quando Olivia era pequena e começamos a perceber os poderes dela, eu pensei nisso. Mas ela não é exatamente o tipo de aluna que eles procuram, "mutante" como eles chamam. Além do mais, a mãe dela jamais deixaria.
Banner ficou um tempo em silêncio antes de perguntar, com uma expressão curiosa:
-E quem é a mãe dela?
-Já me fizeram muitas perguntas pessoais nessa semana, não acha? - Tony disse em resposta. Logo em seguida ele colocou os óculos escuros no rosto e caminhou para a saída da sala, deixando Banner rindo sozinho em seu laboratório cheio de ajudantes.
-Dave, qual é, cara! Esses destiladores são frágeis! - Ele exclamou, com o sorriso sumindo e dando lugar à preocupação.
Stark saiu do laboratório e foi caminhando pelos corredores da sede na direção de seu escritório. Ao adentrar no bloco administrativo, encontrou Olivia esperando-o na recepção.
-Bom dia, Sr. Stark. - Ela disse, tratando-o como seu chefe que, aos olhos dos outros, ele era. - Aqui estão os relatórios que o senhor pediu, para serem apresentados na reunião com o Sr. Callahan esta noite.
A garota esticou um pen-drive para ele, enquanto ambos caminhavam na direção da sua sala.
-Obrigado, Srta. McCall. - Disse Tony, abrindo a porta do escritório e entrando. - Pode deixar em cima da minha mesa.
-Está bem. - Ela respondeu, e o fez. - Se quiser, durante a reunião, eu posso mostrar a ele o levantamento que fiz sobre os firewalls da segurança que...
-Espera aí. - Stark franziu a testa. – Quem disse que a senhorita irá participar desta reunião, Srta.McCall?
-Bom, eu assumi que, devido à minha participação... - Ela explicou, mas foi interrompida novamente.
-Que participação? Não houve participação alguma, o invasor foi impedido de roubar os dados por uma falha no sistema. Fim de papo. - Ele tentou cortar o assunto.
-Você vai mesmo tirar todo o meu crédito assim? Estou magoada. - Olivia ironizou, saindo do papel de funcionária por um instante.
-Leia os relatórios, é isso que eles dizem. Agora pode ir, Srta. McCall. Eu tenho uma reunião em quinze minutos.
-Não tem, não. Eu chequei a sua agenda, seu próximo compromisso é só depois do almoço. - A menina cruzou os braços, e Stark fechou a cara. - Os relatórios não sabem que... - Ela continuou, e o homem colocou o dedo indicador à frente da boca pedindo silêncio.
-Não é lugar pra discutir. - Ele disse com a voz baixa e os dentes cerrados, pois não queria arriscar que alguém ouvisse aquilo.
Olivia balançou sua mão direita para trás, fazendo com que a porta da sala se fechasse sozinha; para movê-la ela transmutara a energia das lâmpadas, que rapidamente piscaram.
-E pare de fazer isso aqui. - Tony continuou, enquanto sentava-se em sua poltrona do outro lado da mesa. - Sabe que as pessoas podem ver.
-Por que não quer me deixar participar? - Olivia disse contrariada.
-Porque você não é uma vingadora. - Ele foi curto e grosso. - E aquilo que você fez na sala de controle não te deu nenhum passe livre.
-E por que não? Eu ajudei vocês. Parei aquele cara quando nenhum de vocês conseguiu. - Ela argumentou, orgulhosa.
-Olivia, nós já tivemos essa discussão. - O homem suspirou, aborrecido. - Eu já te dei um milhão de motivos pra ficar fora disso.
-É, mas você ainda tinha a sua equipe inteira, e não só metade dela. - Olivia provocou, mas Stark não respondeu e começou a ler alguns papéis que estavam sob a mesa, ignorando-a. Ela decidiu continuar. - Os outros vingadores queriam me colocar na equipe.
-É, mas você é minha filha, não deles. - Ele ainda encarava as folhas. - Nós nem sabemos ainda com quem estamos lidando, e eu não quero você envolvida nessa loucura.
-Bom, então você deveria ter me mandado pra um isolamento de férias nas Bahamas, e não me arranjado um trabalho aqui na sede, onde toda essa loucura acontece. - Olivia comentou.
- Não me tente. – Stark ameaçou. - Eu poderia fazer isso agora, aí não precisaria mais te ouvir reclamar.
-Agora já é um pouco tarde pra isso. Eu já estou metida nessa, quer você queira ou não. – A garota continuou, arrancando uma bufada do homem.
-Você não facilita, não é?
-Eu estou facilitando! - Ela exclamou. - Estou te oferecendo ajuda pra derrotar esse cara.
-Não quero a sua ajuda, muito obrigado. - Tony disse e virou-se para o computador.
-Qual é, pai! Você realmente acha que, com tudo que eu posso fazer, só devo usar meus poderes pra passar roupa sem ferro e pegar refrigerante na geladeira sem precisar levantar? - Olivia disse aborrecida.
-Prefiro que faça isso do que ficar por aí perseguindo maníacos com complexo de legume que não tem nada a ver com você. - Tony concluiu. Ele voltou os olhos para a garota, e viu sua expressão emburrada enquanto o encarava. O homem suspirou novamente, se levantou e começou a caminhar na direção dela. - Liv, eu não sou idiota. Sei o quanto os seus poderes poderiam ser úteis durante a luta contra esse novo adversário. Suas habilidades são incríveis, e iriam contribuir muito com a equipe. - Ele falou, carregando um pouco de culpa por sequer pensar em colocar a garota na missão. - Só que eu não posso.
-Mas por quê...
-Me escuta. - Ele recostou-se na mesa, ficando de frente para ela. - Você nunca treinou seus poderes antes. Eles são bons, mas quando se está sob a pressão de uma luta, tudo fica mais difícil. Você seria uma vingadora incrível, mas não posso expor você a esse risco. - A declaração dele a fez bufar. - Sei que você gostaria de ajudar, mas você ainda pode fazer isso. Já faz, aliás. Todas as inovações tecnológicas que vamos usar na caçada contra o Ervilha existem graças a você. Eu te coloquei nas Inovações porque, além de você ser uma líder incrível como eu, poderia comandar um departamento inteiro e ficar satisfeita ao fazer parte de alguma coisa.
-E você, pai? Iria se satisfazer só com burocracia administrativa e cálculos matemáticos, mesmo sabendo que pode fazer muito mais que isso?
Ele soltou uma risada abafada.
-Se sua mãe te ouvisse falando assim...
-Ela diria "você fala igualzinho ao seu pai". - Olivia respondeu irritada, imitando a voz da mãe. - Só que ela não está aqui pra dizer isso, e nem pra opinar. Além do mais, eu posso tomar minhas próprias decisões.
-Claro, é uma adulta completa. Devia dizer isso pra ela. - Stark disse com ironia. - Você sabe que, no momento em que sua mãe ficasse sabendo que deixei você se envolver com alguma das minhas missões, ela voaria de Nova York até aqui pra me dar uma surra.
-Eu diria que a culpa é minha, e aí você ficaria livre dessa.
-Olivia, eu prometi pra sua mãe que iria cuidar de você enquanto estivesse aqui, e que não te deixaria se meter em encrencas, principalmente em encrencas dos Vingadores. – Ele argumentou. - Ela morre de medo dessas coisas. Você sabe, e eu mais ainda.
-Se você pôde escolher usar suas habilidades pro bem, por que eu não posso?
-Porque ela é sua mãe e você deve obedecê-la, assim como deve obedecer seu pai quando ele diz não. - Tony continuou firme. - Há outras formas de usar suas habilidades pro bem.
-Quais, por exemplo?
-Colocando seu cérebro aguçado pra pensar em ideias geniais que os Vingadores podem usar.
-Que tal isso: eles podem usar minhas habilidades em controlar a energia, e também ter a companhia desse cérebro aguçado além desta carinha linda que você me deu, sempre que precisarem.
Stark ficou alguns segundos em silêncio, encarando o sorriso cínico no rosto de Olivia. De repente, arregalou os olhos e olhou para seu relógio de pulso.
-BEEP! BEEP! BEEP! - Ele começou a imitar o som de um alerta, fingindo que vinha do dispositivo.
-O que é isso? - Olivia fez uma cara confusa.
-É meu radar paternal apitando, e ele está me dizendo que eu serei um péssimo pai se me aproveitar dos seus poderes pra conseguir vantagem contra o inimigo. - Ele disse, tentado a ouvir a garota.
-"Radar paternal"? Meu Deus, você está tão empenhado nesse lance de ser um pai de verdade que já está até fazendo piadas ruins de pai. - A menina revirou os olhos.
-Tem razão, Liv, eu quero ser um pai de verdade pra você. - Ele concordou. - E estarei sendo um bem ruim se deixar você se colocar em perigo assim.
-Escuta, você não vai ser péssimo. Se me deixar ajudar vocês, vai estar ensinando a sua filha a lutar pelas coisas que ela acredita, e sobre o valor que há em lutar pelos mais fracos, e toda essa coisa. - Olivia argumentou.
-E morrer por isso também? Ou perder um braço, uma perna, um olho? - Ele levantou a voz, fazendo a menina suspirar frustrada.
-Olha, eu entendo você estar se preocupando comigo. Mas nesse momento eu não preciso do Tony Stark, pai preocupado tentando me proteger, e sim do Tony Stark, herói estrategista que lidera os Vingadores e que vai me autorizar a entrar pra equipe, porque sabe que deve usar toda a ajuda que conseguir.
-Você já parou pra pensar no que isso te acarretaria? - Stark continuou argumentando. - Não é só perigo de vida, Olivia. Se as pessoas descobrirem quem você é, de onde você veio, você nunca mais vai ter sossego. A imprensa cairia em cima de você como um bando de abutres, e sua vida nunca mais seria normal.
-Então você planeja me manter escondida pra sempre? - Ela perguntou, direta. - Pois não sei se você se lembra, pai, mas tem alguém por aí que já sabe quem eu sou. Se esse alguém conseguiu descobrir isso, um dia as outras pessoas também irão. Eu terei que lidar com a situação, mais cedo ou mais tarde.
-Quer saber? Estou feliz que você tenha mencionado isso. - Tony disse, apontando para ela. - Além de todo o perigo e loucura que um cargo nos Vingadores te traria, tem esse maluco desconhecido que está perseguindo você. Se todos souberem quem você é e onde está, será um prato cheio pra ele te encontrar e te fazer mal.
-É, estando em um dos prédios mais vigiados do mundo, ao lado dos heróis mais poderosos do planeta. - Olivia retrucou, irônica. - O objetivo dele é me desmascarar, não é? Se todos já souberem quem eu sou, ele não terá mais nada na manga.
-Prefiro que você fique nesse prédio vigiado ao lado desses heróis sem ter que arriscar sua pele em guerras. - Stark falou olhando no fundo dos olhos dela. Olivia abaixou a cabeça, soltando um suspiro.
-Escuta. - A garota disse francamente, num tom de voz mais baixo. - Eu sei que é perigoso. Sei que, se as pessoas descobrissem que você tem uma filha, minha vida nunca mais seria a mesma, e nem a sua. Sei que minha mãe ficaria uma fera, sei que eu estaria exposta, eu sei de tudo isso. - Ela admitiu. - Mas isso não é sobre mim, é sobre todas as pessoas que estão ameaçadas com a presença de um cara perigoso como aquele que estava aqui. Ele tentou roubar nossos arquivos, e sabe Deus o que ele vai tentar fazer a seguir. E o risco de tentar detê-lo não muda o fato de eu querer fazer alguma coisa pra ajudar. Não é só ser uma vingadora, pai, é lutar por uma coisa que eu acredito, e usar os meus dons pra algo que realmente valha a pena. Porque quando você consegue fazer as coisas que eu faço, mas não faz, e então coisas ruins acontecem, elas acontecem por sua causa. - Aquela frase pegou o homem de surpresa.
Tony ficou ponderando por alguns segundos. Era uma loucura total e descabida. Mas nem todos os nãos do mundo conseguiriam segurar a teimosia e o excesso de coragem da garota. Ele já tinha visto isso em algum lugar.
-Se alguma coisa acontecesse com você... - Ele disse, cheio de culpa.
-Não vai acontecer nada. Você vai estar lá pra me proteger. - A menina respondeu, quase rendendo-se a um pequeno sorriso.
-Escuta, não é fácil como você pensa. Esses outros caras que você vê fazendo parte da equipe, eles treinaram muito pra se tornarem os heróis que são hoje. - Tony retomou o tom sério.
-Me coloque pra treinar, então. Sei que eu posso aprender.
-Ser um herói exige muito mais do que força física e bons golpes. Tem que ter muita responsabilidade, aprender a fazer escolhas difíceis e lidar com pressão vinda de todos os lados.
-Responsabilidade você tem de sobra, mesmo. - Ela ironizou.
-Leva tempo, não dá pra se tornar um guerreiro da noite pro dia. - Tony aumentou o tom, ignorando o comentário.
-Tá bom, pai, eu entendi. - Olivia disse beirando o riso. - Eu consigo.
Stark bufou e ficou em silêncio, encarando os olhos cor de mar da garota.
-Você pode treinar. - Ele falou erguendo o dedo indicador como condição, e ela sorriu instantaneamente. - Depois que tiver bastante prática, eu tiver certeza de que está pronta e perceber que aquele maluco do seu celular já era, só então, nós podemos voltar a conversar.
-Obrigada, pai - Olivia exclamou animada, e deu um abraço apertado no homem recostado na bancada. - Eu não vou te decepcionar, eu prometo.
-Tá bom. Agora volta logo pro trabalho, ou eu vou te demitir por desvio das funções. - Ele disse mal-humorado, dando um tapinha nas costas dela.
Olivia soltou um riso animado e virou-se, caminhando em direção à porta enquanto Stark voltava para sua poltrona do outro lado da mesa. Antes de sair, a garota olhou para ele novamente.
-Ah, pai, mais uma coisa.
-O Dr. Banner não vai concordar em ser seu pet. Confie em mim, eu já tentei. - Tony disse já rolando os olhos, pensando em que pedido abusado ela faria daquela vez.
-Que assustador. - Ela fez uma careta. - Eu queria saber... já que os Vingadores descobriram sobre mim e eu sou praticamente uma de vocês agora, será que posso ter meu próprio quarto na torre? - A garota referiu-se à mansão em que os heróis moravam no topo do prédio central do campus. - Estou cansada de ficar naquele dormitório isolado que você me fez.
Tony ficou encarando-a com as sobrancelhas arqueadas e uma expressão de deboche.
-Ah, qual é! É muito empenho andar até lá todo dia depois do trabalho. E não tem mais sentido, agora que já sabem quem eu sou.
-Vou pensar no seu caso. - Stark respondeu, indicando a ela que fechasse a porta quando saísse.
-Valeu. - Ela cochichou enquanto ia embora, e mandou um beijo no ar para ele.
Tony respondeu com um simples arranhar de garganta. Ele sabia que ela não teria mandado aquele beijo meigo se ele não tivesse atendido a todas as suas requisições.
_
-Pare de se gabar, Parker.
-Ah, qual é! Eu acertei todos os alvos com o lança teias em dez segundos. Você viu aquilo?!
A voz dos garotos ecoava pelo enorme ginásio onde ficava o centro de treinamento dos Vingadores, reverberando pelas paredes reforçadas e pelo teto alto. Era hora do treino. Por determinação do Sr. Stark, Peter precisava treinar pelo menos quatro horas todos os dias, pra que conquistasse mais espaço dentro da equipe como o membro mais novo. Ele fazia isso agora, praticando seus tiros de teia em alvos com desenhos de bandidos.
-Não é assim tão incrível. Os alvos estavam parados.
-Vamos colocá-los em movimento, então. Aposto que consigo do mesmo jeito. - Parker disse cheio de confiança.
A conversa foi interrompida pelo som da porta pesada do ginásio sendo aberta. Olivia McCall apareceu, e os dois estranharam a presença da garota ali.
-Seus novos lança teias conseguem atirar até sessenta vezes por minuto, se você quiser. - Ela disse, caminhando em direção aos alvos.
-Como você sabe? - Perguntou Peter, encarando o equipamento no próprio pulso.
-Fui eu que os projetei. - Olivia sorriu, parando em frente a eles. - Oi, Peter Parker das Inovações.
-Oi... - O rapaz respondeu, confuso. - O que faz por aqui?
-F.R.I.D.A.Y. me mandou um aviso dizendo que precisava vir até o centro pra treinar. Eu vim, e parece que tenho companhia.
-Treinar, mas por quê? E o departamento? - Ele perguntou.
-Podemos dizer que eu fui... promovida. - A garota respondeu, cheia de orgulho. - O Sr. Stark aceitou me colocar na condição de potencial vingadora em observação, e pediu pra que eu começasse a treinar até que esteja pronta.
-Wow, legal. - O menino se impressionou. - Meus parabéns.
-Valeu. E você, por que está aqui?
-O Sr. Stark tem um cargo parecido pra mim. - Disse Peter. - Quero dizer, eu já sou um vingador, só que... - Ele chacoalhou a cabeça e tentou explicar de uma forma que parecesse mais importante. - Eu sou uma espécie de vingador júnior. Treino um pouco mais pra conseguir mais créditos com o Sr. Stark e com a equipe.
-Saquei. - Ela respondeu.
Olivia notou que havia outro garoto ali junto com Peter, que ela nunca tinha visto antes. Enquanto eles conversavam, o rapaz ficou a alguns metros de distância praticando arremessos, e ela ficou observando de revesgueio. Ele parecia muito bom, pois acertou todos os alvos com muita rapidez.
- E ele, o que ele é? - Ela notou que soara rude demais, então reformulou. - Quer dizer, quem é ele?
-Esse é meu amigo, Eric. - Peter indicou o outro rapaz, que olhou para eles e acenou com um pequeno sorriso. - Ele é novo por aqui.
-Olá, Srta. McCall, é um prazer conhecê-la. - O outro menino se aproximou e disse, simpático.
-Pode me chamar de Olivia. - Ela disse, um tanto farta daquela formalidade toda que tinham com ela.
-Ele é tipo um potencial vingador em observação, também. - Peter explicou. - O Sr. Stark decidiu dar uma chance a ele há algumas semanas.
-Que demais. - Disse Olivia, cumprimentando o rapaz. - Não sabia que tínhamos novas aquisições pra equipe.
-É, pois é. Eu estava há alguns meses no processo. – O rapaz novato explicou. - Fazendo alguns testes, respondendo várias perguntas e sendo analisado pelos superiores.
-Bom, acho que nós três somos a creche dos Vingadores. - A menina comentou, e os garotos riram.
A porta do ginásio se abriu novamente, e quem entrou foi Thor, vestido em um uniforme de treino.
-E aí, crianças? - Ele disse, e as palavras reverberaram enquanto ele caminhava na direção dos três. - Stark me pediu pra tomar conta do treino de vocês hoje. Vamos começar?
-Temos até uma babá. - Peter cochichou, e os outros riram baixinho.
-Eu ouvi isso, novato. Só por conta disso, você é quem começa. - Disse o deus referindo-se a Eric.
-Mas não fui eu que... - O garoto novo disse atônito, enquanto Peter só sabia rir dele.
-Viu só, Eric? Se quer fazer parte da equipe, deveria saber: jamais mexa com um asgardiano. - Falou o rapaz, erguendo as mãos como quem não podia fazer nada, enquanto o amigo o encarava com raiva.
Thor alcançou uma espécie de controle remoto na prateleira de armamentos, e apertou um dos botões. Uma porta se abriu no canto direito do ginásio, revelando robôs de treinamento, e cinco deles se inicializaram e marcharam. Aparentemente sem escolha, o garoto novo colocou-se ao centro da arena de batalha, pronto para enfrentar os sacos de pancada.
-Vamos ver o que você faz. - Disse Thor, que parecia estar estranhamente divertido com aquilo. Ele deu um comando pelo controle, e os robôs se colocaram à frente.
Os protótipos de treinamento tinham um visual muito parecido com os alienígenas Chitauri, aos quais os Vingadores já haviam combatido em anos anteriores. Logo de cara, Eric derrubou um deles com um soco incrivelmente forte, desferido no capacete.
Um segundo chegou pelas suas costas, e com reflexos muito rápidos, o garoto virou-se para ele e levou-o ao chão, ajoelhando-se no piso almofadado da arena. O protótipo desligou-se instantaneamente, ficando inerte junto com o primeiro.
Outro robô pegara o rapaz de surpresa, atingindo suas costas com um golpe que causou um corte. Eric fez uma cara de dor, e em seguida levantou-se indo na direção do inimigo, defendendo seus próximos golpes com extrema agilidade. Desviou dos socos usando a parte externa dos dois antebraços, e em seguida empurrou-o com enorme força na direção de outro robô, derrubando ambos.
O último combatente restante foi enfrentado corpo a corpo. Com golpes tão ágeis quanto suas defesas, Eric desferiu três socos no robô de treinamento, acertando seu capacete e seu abdômen. Nesse momento, após um movimento brusco, o braço direito do garoto se transformou em uma espécie de lâmina, que partia de seu cotovelo e ocupava todo o antebraço. Eric usou-a para perfurar a cabeça do inimigo, e assim desligou o último robô.
-Bons golpes, garoto. - Disse Thor, um pouco impressionado. - Só não precisava ter estragado esse último, essas coisas são bem caras. Mas tudo bem, o dinheiro não é meu, e foi uma ótima luta. - Ele falou a última parte erguendo os ombros com indiferença. Logo em seguida, Thor pressionou um botão do controle remoto que fez com que os robôs ligassem novamente e marchassem de volta para dentro do compartimento de onde vieram. Menos o último, que seguiu um caminho diferente, e pareceu se dirigir a uma espécie de oficina.
-Mandou bem, novato. - Peter disse para Eric, quando o rapaz se aproximou dos dois que ficaram assistindo.
-Eu ainda não engoli essa, Cabeça-de-Teia. - Eric respondeu, fingido estar irritado por ter levado a culpa pelo comentário de antes.
-Então esse é o seu "truque"? - Perguntou Olivia, apontando para a arena onde a luta acabara de acontecer. - Você é rápido e forte?
-É, acho que sim. - O garoto sorriu.
A menina inclinou-se e olhou na direção das costas dele, onde havia um corte ocasionado pelo golpe daquele robô.
-Você está bem? - Ela perguntou.
-O que, isso? É de boa. - Eric respondeu, e enquanto ele dizia isso, Olivia observou a ferida cicatrizar com uma velocidade incrível.
-E você se cura sozinho. - Falou a menina, completando sua fala anterior.
-Ele é bem maneiro. - Peter complementou fazendo a devida propaganda do amigo, que deu um sorriso tímido.
-E desde quando você faz isso? Tipo, você nasceu assim? - Liv perguntou, curiosa a respeito.
-Não. Na verdade, é uma história meio trágica. - Eric soltou uma risada para descontrair. - Meu pai era um cientista, e ele costumava trazer muito trabalho pra casa. Um dia, quando eu era pequeno, eu estava brincando escondido no laboratório dele, e acabei derrubando uma prateleira cheia de produtos químicos que virou toda em cima de mim. Tinham algumas coisas bem esquisitas naquelas prateleiras, e foram elas todas que, misturadas, causaram essas alterações no meu corpo. Eu fiquei vários meses internado depois do acidente, com feridas horríveis, mas enquanto eu me curava, mudanças aconteceram. Então, depois que me recuperei, eu tinha esses poderes. - Contou o rapaz.
-Caramba. - A garota reagiu. - E por que você tem essa coisa no seu braço?
-Quando alguns produtos se misturaram, acabaram fazendo uma reação que causou incêndio no laboratório. O fogo atingiu e queimou meu braço, derretendo até o osso. Depois que eu estava bem, meu pai desenvolveu uma prótese, tão real que ninguém conseguiria adivinhar que era falsa. Anos mais tarde, depois que percebi e aprendi a controlar essas habilidades, decidi usá-las para lutar. Então ele aprimorou a prótese, colocando essa foice nela. Agora eu a utilizo durante as batalhas.
-Acessório básico. - Falou Olivia, arqueando as sobrancelhas. - Deve ser um ótimo barbeador. - O rapaz riu diante do comentário. - E como você chegou até aqui?
-O Parker me apresentou pro Sr. Stark. - Disse ele, abraçando Peter pelo pescoço. - Eu trabalhava sozinho, resolvendo apenas alguns problemas na vizinhança, tipo roubos e sequestros. Nós dois estudávamos juntos, Peter acabou me reconhecendo e eu também descobri quem ele era. Ele me perguntou se eu não gostaria de ajudar a equipe, e eu disse que sim, é claro, então ele falou de mim para o Sr. Stark e, bom... aqui estou eu. Graças a ele.
-Eu sou demais. - Peter concluiu.
-Ei, Aranha e Mini Stark - Thor berrou do outro lado da arena. - É a vez de vocês.
Peter olhou para Olivia e disse:
-Primeiro as damas.
-Que corajoso. - Ela respondeu, e saiu caminhando para o centro. Enquanto andava, a garota pegou um par de luvas sem dedos e começou a calçá-las.
-Vai lutar boxe com os robôs? - Thor perguntou, olhando estranho para as mãos dela.
-É claro que não. - Ela rolou os olhos, achando graça. - São luvas especiais.
-Que seja, então. - Disse o deus, sem uma resposta satisfatória. - Vou pegar leve com você.
Thor exerceu um comando com o controle remoto, abrindo a porta novamente, e dessa vez, apenas um robô saiu do compartimento. Olivia ficou de frente para ele, colocando um pé atrás do outro e esperando a distância diminuir. O protótipo veio em sua direção, e quando estava a apenas alguns metros, a garota esticou sua mão direita para frente e liberou uma grande quantidade de energia em sua direção. As luzes que iluminavam o ginásio piscaram por um momento, enquanto Olivia as absorvia e canalizava, e se acenderam de volta pra revelar o robô caindo lentamente no chão, com um rombo enorme e redondo em sua armadura.
-Eu disse pra não destruírem as drogas dos robôs... - Thor rolou os olhos ao ver o protótipo derrubado entrando em curto.
-Como você fez isso? - Peter perguntou, enquanto os dois rapazes olhavam intrigados para a menina.
-É um upgrade que eu desenvolvi. - Ela disse cheia de si. - Venho trabalhando nelas desde que entrei no MIT. Ajudam a canalizar e potencializar meus poderes.
Parker aproximou-se da garota, curioso. Ela esticou as duas mãos e apontou-as para ele, dando uma melhor visão. O material que compunha a luva era revestido com pedrinhas minúsculas espalhadas por toda a palma.
-São cristais. Eu os chamo de Omni. Significa "todo" ou "inteiro" em alguma língua descolada que não me lembro. - Olivia explicou. - Eu os desenvolvi no laboratório da faculdade. São derivados de prata.
-Como eles funcionam? - Parker perguntou, olhando as mãos dela de perto. Qualquer tipo de tecnologia nova o fascinava.
-É um material com zero por cento de resistividade. Isso significa que não se opõe nem um pouco a conduzir corrente elétrica, ou qualquer tipo de energia que eu venha a absorver e transformar, deixando meus poderes mais fluídos. E são hipercondutores, então fazem o trabalho de conduzir essa energia muito melhor do que a minha pele o faria. - Ela contou. - Os cristais também conseguem armazenar muita energia, fazendo com que eu consiga mais potência, funcionando como...
-Supercapacitores. - Ela finalizou, e Peter disse a última palavra junto com ela.
-Irado. - Parker falou, deslizando o polegar pela superfície cravejada das luvas.
-Tá legal, garota inteligente. Eu não faço ideia do que é isso que você acabou de dizer, mas acho que te deixa páreo pra mais robôs dessa vez. - Thor interrompeu. - Só, por favor, pare de quebrá-los.
-Está bem, vou tentar. - Olivia respondeu, retornando à posição de batalha, virada para a porta ainda fechada do compartimento.
Thor abriu o portão novamente, liberando três robôs dessa vez. Eles marcharam em fila na direção da garota, que se preparou e novamente apontou as mãos para frente. O mais adiantado dos inimigos chegou perto, e com um movimento simples, Olivia retirou a energia difundida dentro de seus circuitos e desligou-o, fazendo-o desmoronar instantaneamente. Porém, ao invés de cair no chão, ele sentou-se no tablado fazendo o sinal da paz e amor com as mãos.
A energia acumulada nas luvas após derrubar o primeiro foi usada pela menina para atingir o segundo, que vinha logo atrás, e ele foi ao chão com superaquecimento do sistema, cruzando as pernas e apoiando-se em um dos cotovelos como uma modelo. O terceiro robô apertou o passo, vindo na direção de Olivia. Ela esticou o braço direito para frente, estendendo a palma da mão como uma barreira, e o robô ficou paralisado. McCall roubara toda a sua energia cinética, e após empurrar a palma da mão para frente, usou-a para colocá-lo de costas no chão, caindo com toda a suavidade e delicadeza em uma posição de twerk perfeita.
-Sem quebrá-los, não é? – Olivia disse, em tom de brincadeira.
Thor observava a cena, impressionado. Enquanto a garota derrubava os três primeiros com facilidade, ele liberou outros quatro de dentro do compartimento, para dificultar.
Os robôs logo avançaram. Olivia colocou os dois braços para baixo e ergueu-os lentamente até a altura do queixo, usando energia da gravidade para levantar um dos protótipos a metros do chão. Quando encontrou altura suficiente, ela soltou os braços, derrubando-o em cima de outros dois robôs, fazendo com que os três caíssem; o primeiro em uma posição magnífica de break, o segundo de joelhos fazendo o símbolo do rock n’ roll com as mãos, e o terceiro saudava um tributo abatido como em Jogos Vorazes.
Faltava apenas um, que veio correndo na direção de Olivia a todo vapor. Ela parou para pensar, e usando sua criatividade, encarou um dos enormes ventiladores que arejava o ginásio pelo teto. A garota ergueu uma das mãos para cima, e as pás pesadas de metal logo pararam de girar. Então, ela olhou para o robô que vinha para pegá-la, e cerrou os olhos. Com um movimento rápido no pescoço, a garota tombou a cabeça para o lado esquerdo, fazendo com que o homem de metal caísse no chão em curto circuito imediatamente, com os dois dedos do meio levantados para o ar.
-Você devia ter ido primeiro. - Eric cochichou para Peter, que assistia à cena admirado. - Boa sorte em fazer melhor que isso.
_
O treinamento continuou normalmente após a batalha de Olivia. Peter enfrentou os robôs, e depois os três pupilos fizeram mais alguns combates em equipe. Para a garota, a sensação era ótima: parecia que, pela primeira vez, ela fazia parte de algo efetivamente. Olivia saiu do banho em seu novo quarto após o treino, sentindo-se renovada. Após insistir para Stark, ela acabou de fato ganhando um dormitório no alojamento, ficando com o cômodo que pertencia a algum dos Vingadores que se foi com Capitão América – na verdade, havia muitos quartos vazios naquela casa por conta disso.
Liv caminhou até o lado de fora, secando o cabelo com energia térmica que saía de suas mãos. Terminou de vestir-se e foi rapidamente até o andar de baixo, onde viu Peter sentado no sofá jogando alguma nova versão de Pac-Man em seu celular, enquanto parecia aguardar alguém.
-Oi. - Ela disse, e acabou assustando o garoto, que estava tão concentrado que não a viu chegar. A distração acabou fazendo com que ele perdesse o jogo. - Desculpe. - Ela riu.
-Não tem problema. - Peter respondeu, abaixando o celular, talvez um pouco envergonhado por ela tê-lo visto jogando aquilo.
Olivia sentou ao lado dele no sofá, e esticou-se para encarar a tela do telefone que ele tentou esconder.
-Nossa, você é péssimo nesse jogo. - Ela fez uma careta, ao olhar a pontuação dele.
-Consegue passar dessa fase? - Ele perguntou, esticando o aparelho pra ela.
-Por favor – Ela debochou. Talvez fosse madura demais para aquilo. - Tetris é mil vezes melhor. - Ou talvez não.
-Parece justo. - Peter disse, após ponderar um pouco. - Escuta, você foi ótima no treino hoje. - Ele falou e coçou a nuca, sem jeito de começar um assunto. - Como usa seus poderes assim se nunca treinou antes?
-Oh, eu treinei. - Olivia respondeu. - Só não conta isso pro meu pai.
-Como assim?
-Ah, você sabe. Eu não tive esses poderes pra não fazer nada com eles esse tempo todo. - A garota riu, muito mais confortável com a conversa do que ele. - Eu sempre quis ter a oportunidade de usá-los em combate um dia, então eu sempre pratiquei, principalmente depois que desenvolvi os cristais Omni e as luvas. Só que meu pai nunca gostou da ideia, então, até que ele se acostumasse com a possibilidade, eu treinava sozinha.
-Entendi. Estava só esperando a oportunidade. - Peter constatou.
-Exatamente. - Ela respondeu. - Mas e você? Eu costumava ver seus vídeos no YouTube. Desde quando você faz isso?
-Desde os quinze anos. - Peter respondeu. - Foi quando fui picado pela aranha.
-E quantos anos você tem agora?
-Dezessete.
-Hm... - Olivia murmurou, e ficou em silêncio alguns segundos, pensando. - Não acha que seu nome está um pouco errado? Tipo, Homem-Aranha... não deveria ser Menino-Aranha? Moleque-Aranha? De repente, Jovem-Aranha? - Ela olhou para Peter, que parecia ter seu orgulho ferido. - Ah, qual é! Tenho que dizer, quando eu via o Homem-Aranha por aí, eu esperava algo muito diferente... disso. - Ela disse, apontando para Peter.
-Valeu. - Ele disse, irônico.
-Ok, não é como se eu tivesse muita moral pra te julgar. - A garota admitiu. - As pessoas costumam achar que eu sou mais velha por estar na faculdade, mas eu tenho dezessete também.
-Me sinto um pouco menos ofendido. - O garoto brincou. - Mas e você? Do que as pessoas vão te chamar?
-Como assim?
-Quando for uma vingadora de verdade. Qual vai ser o seu nome?
-Boa pergunta... - A menina desviou o olhar, pensativa. - Nunca parei pra bolar um. Tem alguma ideia? - Peter tomou fôlego pra falar, com um sorriso já formado nos lábios. - E não me venha com piadas relacionadas ao meu pai, tipo "Garota de Ferro" ou algo assim.
O sorriso do menino murchou instantaneamente. Eles ficaram mais um tempo em silêncio, pensando, e Peter preparou-se pra falar novamente, mas foi interrompido.
-Eu tenho certeza que Shocker e Electra já existem. - Disse Olivia, e ele perdeu a palavra novamente. - E meus poderes nem são de eletricidade, então não funciona.
-Sabe, eu tenho uma ideia... - Peter disse após pensar mais. - Uma vez eu li alguma coisa na aula de história sobre a entidade sagrada da energia, em alguma mitologia que não me lembro agora. Acho que é dos gregos.
-Tipo um deus?
-Sim, ele era imortal e filho de um deus. Acho que era de Poseidon. - Ele contou. - Mas o nome dele é usado como substantivo feminino.
-E qual era o nome?
-Começava com A... - Ele esforçou-se para lembrar. - Arion.
-Arion... gostei disso. - Olivia sorriu, após repetir o nome para si mesma. - Parece poderoso. Boa ideia, Menino-Aranha. - Ela riu, mas Peter não achou graça.
Um som de passos veio da escada, e agente Romanoff apareceu no andar de cima, caminhando até a sala.
-Oi, garotos. - Ela cumprimentou os dois, e então chegou até o fim dos degraus. - O que é isso? - Ela disse olhando para o canto da sala, referindo-se a uma árvore de natal que estava próxima da janela.
-Um dos funcionários da limpeza colocou ali. Na verdade, só está escondendo uma vidraça quebrada que eles esqueceram de trocar depois da invasão. - Ouviu-se a voz de Stark, que apareceu pela porta de entrada. - Mas eu decidi deixar. Quem sabe todo esse espírito natalino nos ajuda na investigação.
-O que? Os Vingadores terão uma noite de Natal? - Exclamou Bruce, que apareceu no topo da escada logo atrás de Natasha. - Visão e Olivia podem ficar encarregados de acender as luzinhas. - Ele fez referência ao sintozoide que acabara de entrar.
-Mas é claro. - Visão respondeu. - E quem vai ser o Papai Noel?
-Eu voto no bom e velho Stark. - Thor disse, aparecendo da cozinha com um sorriso brincalhão.
-Se eu serei o Papai Noel, já sei quem serão minhas renas. - Tony respondeu imitando chifres com os dedos na própria cabeça, e em seguida apontando para os dois outros. - Aliás, Thor, como vai a Jane?
Bruce soltou uma risada alta e olhou para Thor, que fez uma expressão estranha.
-Está bem, crianças. Lembrem-se que só irão ganhar presentes se forem bons meninos. - Natasha disse, sentando em uma das poltronas.
-Deem um martelo decente pro Thor, ele está precisando. - Olivia tirou sarro dele, que a olhou feio.
-E um calmante pro Banner. - O deus rebateu.
-Tony não vai ganhar presentes, ele foi mal esse ano. - Bruce complementou.
-Experimenta só. Eu corto a verba das suas pesquisas na hora. - Stark respondeu com um falso olhar de seriedade após a ameaça.
-Por que está todo mundo reunido aqui de repente? – Olivia perguntou.
-Vamos ter uma reunião com o Sr.Callahan, da qual você não irá participar. – Tony disse para a garota, com um sorriso caricato.
-Por que não? – Ela franziu a testa.
-Você não é uma vingadora ainda, portanto não faz parte das reuniões. – Ele concluiu. - Por isso, e também porque eu sei que você vai querer dar palpites e passar por cima de mim com esse seu senso de “vamos salvar o mundo e tocar fogo em tudo” se estiver presente.
Olivia pareceu ponderar e decidiu não discutir. Já tinha ganhado muita coisa naquele dia: uma vaga na equipe, treinamento e um quarto; perder esta reunião parecia ser o menor dos problemas para ela.
-Aliás, nem sei se você vai fazer parte dos Vingadores mesmo. Eu não consultei meus colegas de equipe. – Stark disse em tom majoritário. – O que vocês acham, pessoal? Alguém se opõe à entrada da Olivia? – Todos ficaram em silêncio enquanto Tony os encarava, parecendo concordar com ele. – Alguém acha que não deveríamos dar a ela uma chance?
Ninguém se manifestou, mostrando-se favoráveis à entrada da garota, afinal todos já tinham dito isso antes.
-Sério? Ninguém vai evitar que eu seja um péssimo pai e arrisque a pele da minha filha em missões perigosíssimas? – Stark continuou questionando. – Vocês são péssimos heróis.
A votação foi interrompida por um alerta no telão que ficava sala, que atestava uma ligação vinda do Conselho de Segurança. Todos pararam, fizeram caras sérias e se concentraram na tela. Stark indicou o andar de cima para Olivia, que aceitou seu comando e subiu as escadas rapidinho, dirigindo-se ao seu quarto.
-Atender. - Disse Tony, dando o comando de voz para o sistema. Em instantes, o embaixador Callahan apareceu na chamada.
-Boa noite, Vingadores. - Disse o homem, com o tom diplomático de sempre. - Peço desculpas por não ter entrado em contato com a equipe antes. Depois do incidente na base de vocês, minha agenda ficou muito apertada. Preferi lidar com a situação e ter dados sólidos para apresentar a vocês quando nos encontrássemos. - Ele explicou. - Sinto muito, mas terei que ser breve. Primeiro, gostaria de dizer que sinto pelo cancelamento do desfile de Veterans Day. Foi uma pena perdermos a oportunidade.
-Nossa, foi mesmo. - Falou Thor, soando totalmente fingido, e Peter teve que conter uma risada.
-Porém, agora mais do que nunca, a confiança na equipe precisa ser restaurada. - Callahan continuou. - O primeiro passo é encontrar o invasor o mais rápido possível, e entender o que houve para uma derrota tão... catastrófica. - Ele disse com um pouco de pesar, e todos sentiram a alfinetada. - É preciso identificá-lo e prendê-lo para demonstrar eficácia e inspirar a confiança de que a equipe precisa. Para que tal etapa seja concluída com a maior rapidez e qualidade possível, o Conselho de Segurança determinou que o caso fosse encaminhado para as equipes de investigação do FBI. Os diretores já estão colocando seus melhores homens no trabalho, dando prioridade máxima. As respostas logo aparecerão.
-Todos os relatórios que geramos e os dados que coletamos sobre o dia da invasão foram enviados ao Conselho. - Disse Tony, tomando as rédeas. - Nossos sistemas de segurança foram reforçados e reestabelecidos, depois da falha que tiveram. Todas as informações estarão disponíveis para consulta do FBI a qualquer momento, para agilizar a investigação.
-Ótimo. A equipe de Inteligência conseguiu alguma pista adicional sobre a identidade ou o objetivo do dito invasor? - Perguntou o conselheiro.
-Não, senhor. O bug implantado é irrastreável e não aponta para nenhum dado específico que fosse de interesse para o roubo. - Visão explicou. - O reconhecimento do suspeito também se torna impossível, devido à falta de imagens caracterizáveis.
-Bom, neste caso, o FBI terá que usar sua criatividade. - Constatou Callahan. - O Conselho confia em vocês, Vingadores, e encara este acontecido como um fato isolado capaz de ser contornado. Esperamos, contudo, que incidentes como este não se tornem recorrentes. Faremos tudo que está ao nosso alcance para ajudá-los, enquanto vocês defendem a humanidade. Assim que tiver mais informações, convocarei outra reunião para atualizá-los, e tomaremos as medidas necessárias para capturar e julgar o nosso invasor, encerrando esse caso. - Concluiu o embaixador. - Tenham uma boa noite. - Ele desligou, e a transmissão da TV foi desligada.
-Espera aí, nós não vamos fazer nada? - Natasha disse, virando para os colegas.
-Acho que é exatamente isso que eles querem. - Perguntou Banner. – O que você sugere?
-Descobrir quem o Ervilha-Voadora é e o que ele queria. Por conta própria. - Ela respondeu.
-É, também não gosto dessa ideia. Mas acho que a investigação seria mais rápida se estivesse nas mãos do governo, não? – Thor questionou.
-Como assim? Vocês querem ficar parados esperando o FBI fazer o trabalho? - Peter contestou.
-Não estaremos parados, Pirralho. Se o governo cuida das investigações, podemos nos concentrar nas batalhas e em tudo aquilo que vem depois delas. - Stark explicou. - Ficaremos prontos pro Ervilha, quando soubermos como pegá-lo.
-E que dia será "quando"? - Natasha questionou. - Isso que você disse é a definição de ficar parado esperando.
-Eu entendo seu ponto, Nat, mas nós somos heróis, não detetives. - Banner se manifestou. – Esses caras são o maior serviço de inteligência do planeta. Eu também não gosto de deixar minhas responsabilidades pros outros, mas neste caso, não vejo motivo suficiente pra discutir. Que diferença faz se eles pegarem o Ervilha ou nós?
-Os Vingadores estão subordinados ao Conselho. Discutir isso entre a gente não adianta, pois não afetará a decisão deles de qualquer jeito. - Visão falou. - É melhor deixar que eles lidem da forma como acharem mais pertinente. Se tomarmos isso pra nós e cometermos algum erro, será um peso enorme nas nossas costas. Mais um peso, além do desastre desta semana e de todo o resto.
-Visão está certo, não precisamos de mais um deslize para nos culparem. Mas talvez pudéssemos achar um meio termo. – Disse Thor. – Podíamos fazer um acordo com eles, e concordar em investigar em conjunto. Não precisamos interferir, apenas acompanhar para termos certeza de que eles estão seguindo no caminho certo.
-O que acham? – Stark perguntou para Peter e Natasha, que estavam insatisfeitos. – Isso dá pra fazer.
-Não vamos convencer o Callahan a nos deixar agir por conta própria, então... – Romanoff falou, ponderando. – Não que sejamos mestres em seguir ordens, é claro. Mas não vejo motivo para perseguirmos o mesmo cara com duas investigações diferentes. É como andar em círculos.
-Ok, vou falar com o Conselho amanhã de manhã e pedir pra que deixem a equipe a par do que estão investigando. – Tony disse, ficando em silêncio logo em seguida. Diante da conclusão subentendida, já que ninguém contrariou, ele continuou a falar. - Muito bem, é hora de começar a pensar em estratégias. Amanhã falaremos disso. Por enquanto, todos para a cama.
Os heróis se levantaram um a um, e devagar foram se designando para seus respectivos quartos no andar de cima. Peter estava prestes a entrar no próprio dormitório, quando a porta em frente à sua se abriu e Olivia apareceu.
-Eu não comprei essa. E você? - Ela cochichou para o garoto.
-Você estava escutando tudo? – O menino perguntou com a testa franzida.
-Mas é óbvio. – Olivia rolou os olhos. – As paredes são finas e eu sou incapaz de não me meter. Enfim, o que você acha?
-Não acho que temos escolha com o Conselho. - O rapaz respondeu. – O Callahan não vai ceder e o Sr. Stark não quer confrontá-lo. Supervisioná-los é bom, mas... não posso dizer que o Ervilha não me deixa curioso.
-Queria poder saber mais sobre ele. - McCall comentou. - Por conta própria.
Dr. Banner estava apreensivo diante da reforma do seu laboratório. Com a explosão do setor vizinho no dia anterior, graças às bombas do Ervilha-Voadora, muitos aparelhos de pesquisa ficaram danificados e precisavam ser trocados. Havia homens carregando caixas para lá e para cá, trazendo novos exemplares dos seus equipamentos caríssimos de pesquisa, e reparando danos físicos nas vidraças e paredes. Bruce estava inquieto, imaginando que os funcionários não faziam ideia da preciosidade, tanto científica quanto monetária, que carregavam nas mãos. Já Stark, que supervisionava as trocas e observava a cena de longe, divertia-se ao ver Banner tão preocupado com seus novos brinquedinhos.
-Devagar com isso aí. Esse vidro tem que ficar perfeitamente encaixado, ou eu não vou conseguir o isolamento da... - Ele advertia mais um dos ajudantes.
-Calma aí, cientista maluco. Eles sabem o que estão fazendo. - Tony disse colocando a mão em seu ombro e interrompendo a cena, por mais que aquilo o divertisse.
-Está bem. - Banner respirou fundo, e teve que se segurar para não chamar a atenção de um tal de Dave pela quinta vez, ao ver que ele estava quase derrubando sua nova autoclave.
-Escuta, deixa eu te falar. O Callahan me ligou pela manhã. Ele quer fazer uma reunião hoje à noite, pra falar conosco a respeito do ataque de ontem. - Stark disse ao amigo. - Acho que seria interessante se toda a equipe estivesse lá.
-Claro. - Banner respondeu. - O que acha que ele vai dizer? Nos dar uma bronca?
-Não sei, mas "parabéns" é que não vai ser. Provavelmente ele fará algum discurso formal e politicamente correto sobre como ele e o Conselho acham que devemos agir. Mas nós conseguimos evitar que o invasor roubasse qualquer coisa, então, não pode ser de todo ruim.
-E ele sabe da participação especial da garota nessa parte? - Perguntou Bruce referindo-se a Olivia, com as sobrancelhas arqueadas.
-Não, e nem vai saber. Quanto menos gente metida nisso, melhor. Não quero ele dando palpite no que devo ou não decidir. - Stark respondeu.
-E você já sabe o que vai fazer?
-Eu sei o que eu não quero fazer. - Disse após um suspiro pesado. - Mas já deu pra perceber que com a Olivia a situação é um pouco mais complicada que isso.
-A garota é durona. - Banner constatou. - Como alguém que eu conheço.
O cientista pareceu ponderar por alguns segundos.
-Sabe, existe um lugar que poderia ser a solução. É uma escola, onde pessoas como a Olivia, com esses dons, podem aprender a controlá-los e usá-los do jeito certo. Os alunos formam uma espécie de equipe, e quem os comanda é aquele professor famoso, Charles Xavier.
-Sei, os X-Men. - Tony concluiu.
-Isso. Já pensou em levar a Olivia até lá? Xavier é um visionário, com certeza ele acharia um lugar para ela e pras suas habilidades.
-Já pensei, sim. - Stark contou. - Quando Olivia era pequena e começamos a perceber os poderes dela, eu pensei nisso. Mas ela não é exatamente o tipo de aluna que eles procuram, "mutante" como eles chamam. Além do mais, a mãe dela jamais deixaria.
Banner ficou um tempo em silêncio antes de perguntar, com uma expressão curiosa:
-E quem é a mãe dela?
-Já me fizeram muitas perguntas pessoais nessa semana, não acha? - Tony disse em resposta. Logo em seguida ele colocou os óculos escuros no rosto e caminhou para a saída da sala, deixando Banner rindo sozinho em seu laboratório cheio de ajudantes.
-Dave, qual é, cara! Esses destiladores são frágeis! - Ele exclamou, com o sorriso sumindo e dando lugar à preocupação.
Stark saiu do laboratório e foi caminhando pelos corredores da sede na direção de seu escritório. Ao adentrar no bloco administrativo, encontrou Olivia esperando-o na recepção.
-Bom dia, Sr. Stark. - Ela disse, tratando-o como seu chefe que, aos olhos dos outros, ele era. - Aqui estão os relatórios que o senhor pediu, para serem apresentados na reunião com o Sr. Callahan esta noite.
A garota esticou um pen-drive para ele, enquanto ambos caminhavam na direção da sua sala.
-Obrigado, Srta. McCall. - Disse Tony, abrindo a porta do escritório e entrando. - Pode deixar em cima da minha mesa.
-Está bem. - Ela respondeu, e o fez. - Se quiser, durante a reunião, eu posso mostrar a ele o levantamento que fiz sobre os firewalls da segurança que...
-Espera aí. - Stark franziu a testa. – Quem disse que a senhorita irá participar desta reunião, Srta.McCall?
-Bom, eu assumi que, devido à minha participação... - Ela explicou, mas foi interrompida novamente.
-Que participação? Não houve participação alguma, o invasor foi impedido de roubar os dados por uma falha no sistema. Fim de papo. - Ele tentou cortar o assunto.
-Você vai mesmo tirar todo o meu crédito assim? Estou magoada. - Olivia ironizou, saindo do papel de funcionária por um instante.
-Leia os relatórios, é isso que eles dizem. Agora pode ir, Srta. McCall. Eu tenho uma reunião em quinze minutos.
-Não tem, não. Eu chequei a sua agenda, seu próximo compromisso é só depois do almoço. - A menina cruzou os braços, e Stark fechou a cara. - Os relatórios não sabem que... - Ela continuou, e o homem colocou o dedo indicador à frente da boca pedindo silêncio.
-Não é lugar pra discutir. - Ele disse com a voz baixa e os dentes cerrados, pois não queria arriscar que alguém ouvisse aquilo.
Olivia balançou sua mão direita para trás, fazendo com que a porta da sala se fechasse sozinha; para movê-la ela transmutara a energia das lâmpadas, que rapidamente piscaram.
-E pare de fazer isso aqui. - Tony continuou, enquanto sentava-se em sua poltrona do outro lado da mesa. - Sabe que as pessoas podem ver.
-Por que não quer me deixar participar? - Olivia disse contrariada.
-Porque você não é uma vingadora. - Ele foi curto e grosso. - E aquilo que você fez na sala de controle não te deu nenhum passe livre.
-E por que não? Eu ajudei vocês. Parei aquele cara quando nenhum de vocês conseguiu. - Ela argumentou, orgulhosa.
-Olivia, nós já tivemos essa discussão. - O homem suspirou, aborrecido. - Eu já te dei um milhão de motivos pra ficar fora disso.
-É, mas você ainda tinha a sua equipe inteira, e não só metade dela. - Olivia provocou, mas Stark não respondeu e começou a ler alguns papéis que estavam sob a mesa, ignorando-a. Ela decidiu continuar. - Os outros vingadores queriam me colocar na equipe.
-É, mas você é minha filha, não deles. - Ele ainda encarava as folhas. - Nós nem sabemos ainda com quem estamos lidando, e eu não quero você envolvida nessa loucura.
-Bom, então você deveria ter me mandado pra um isolamento de férias nas Bahamas, e não me arranjado um trabalho aqui na sede, onde toda essa loucura acontece. - Olivia comentou.
- Não me tente. – Stark ameaçou. - Eu poderia fazer isso agora, aí não precisaria mais te ouvir reclamar.
-Agora já é um pouco tarde pra isso. Eu já estou metida nessa, quer você queira ou não. – A garota continuou, arrancando uma bufada do homem.
-Você não facilita, não é?
-Eu estou facilitando! - Ela exclamou. - Estou te oferecendo ajuda pra derrotar esse cara.
-Não quero a sua ajuda, muito obrigado. - Tony disse e virou-se para o computador.
-Qual é, pai! Você realmente acha que, com tudo que eu posso fazer, só devo usar meus poderes pra passar roupa sem ferro e pegar refrigerante na geladeira sem precisar levantar? - Olivia disse aborrecida.
-Prefiro que faça isso do que ficar por aí perseguindo maníacos com complexo de legume que não tem nada a ver com você. - Tony concluiu. Ele voltou os olhos para a garota, e viu sua expressão emburrada enquanto o encarava. O homem suspirou novamente, se levantou e começou a caminhar na direção dela. - Liv, eu não sou idiota. Sei o quanto os seus poderes poderiam ser úteis durante a luta contra esse novo adversário. Suas habilidades são incríveis, e iriam contribuir muito com a equipe. - Ele falou, carregando um pouco de culpa por sequer pensar em colocar a garota na missão. - Só que eu não posso.
-Mas por quê...
-Me escuta. - Ele recostou-se na mesa, ficando de frente para ela. - Você nunca treinou seus poderes antes. Eles são bons, mas quando se está sob a pressão de uma luta, tudo fica mais difícil. Você seria uma vingadora incrível, mas não posso expor você a esse risco. - A declaração dele a fez bufar. - Sei que você gostaria de ajudar, mas você ainda pode fazer isso. Já faz, aliás. Todas as inovações tecnológicas que vamos usar na caçada contra o Ervilha existem graças a você. Eu te coloquei nas Inovações porque, além de você ser uma líder incrível como eu, poderia comandar um departamento inteiro e ficar satisfeita ao fazer parte de alguma coisa.
-E você, pai? Iria se satisfazer só com burocracia administrativa e cálculos matemáticos, mesmo sabendo que pode fazer muito mais que isso?
Ele soltou uma risada abafada.
-Se sua mãe te ouvisse falando assim...
-Ela diria "você fala igualzinho ao seu pai". - Olivia respondeu irritada, imitando a voz da mãe. - Só que ela não está aqui pra dizer isso, e nem pra opinar. Além do mais, eu posso tomar minhas próprias decisões.
-Claro, é uma adulta completa. Devia dizer isso pra ela. - Stark disse com ironia. - Você sabe que, no momento em que sua mãe ficasse sabendo que deixei você se envolver com alguma das minhas missões, ela voaria de Nova York até aqui pra me dar uma surra.
-Eu diria que a culpa é minha, e aí você ficaria livre dessa.
-Olivia, eu prometi pra sua mãe que iria cuidar de você enquanto estivesse aqui, e que não te deixaria se meter em encrencas, principalmente em encrencas dos Vingadores. – Ele argumentou. - Ela morre de medo dessas coisas. Você sabe, e eu mais ainda.
-Se você pôde escolher usar suas habilidades pro bem, por que eu não posso?
-Porque ela é sua mãe e você deve obedecê-la, assim como deve obedecer seu pai quando ele diz não. - Tony continuou firme. - Há outras formas de usar suas habilidades pro bem.
-Quais, por exemplo?
-Colocando seu cérebro aguçado pra pensar em ideias geniais que os Vingadores podem usar.
-Que tal isso: eles podem usar minhas habilidades em controlar a energia, e também ter a companhia desse cérebro aguçado além desta carinha linda que você me deu, sempre que precisarem.
Stark ficou alguns segundos em silêncio, encarando o sorriso cínico no rosto de Olivia. De repente, arregalou os olhos e olhou para seu relógio de pulso.
-BEEP! BEEP! BEEP! - Ele começou a imitar o som de um alerta, fingindo que vinha do dispositivo.
-O que é isso? - Olivia fez uma cara confusa.
-É meu radar paternal apitando, e ele está me dizendo que eu serei um péssimo pai se me aproveitar dos seus poderes pra conseguir vantagem contra o inimigo. - Ele disse, tentado a ouvir a garota.
-"Radar paternal"? Meu Deus, você está tão empenhado nesse lance de ser um pai de verdade que já está até fazendo piadas ruins de pai. - A menina revirou os olhos.
-Tem razão, Liv, eu quero ser um pai de verdade pra você. - Ele concordou. - E estarei sendo um bem ruim se deixar você se colocar em perigo assim.
-Escuta, você não vai ser péssimo. Se me deixar ajudar vocês, vai estar ensinando a sua filha a lutar pelas coisas que ela acredita, e sobre o valor que há em lutar pelos mais fracos, e toda essa coisa. - Olivia argumentou.
-E morrer por isso também? Ou perder um braço, uma perna, um olho? - Ele levantou a voz, fazendo a menina suspirar frustrada.
-Olha, eu entendo você estar se preocupando comigo. Mas nesse momento eu não preciso do Tony Stark, pai preocupado tentando me proteger, e sim do Tony Stark, herói estrategista que lidera os Vingadores e que vai me autorizar a entrar pra equipe, porque sabe que deve usar toda a ajuda que conseguir.
-Você já parou pra pensar no que isso te acarretaria? - Stark continuou argumentando. - Não é só perigo de vida, Olivia. Se as pessoas descobrirem quem você é, de onde você veio, você nunca mais vai ter sossego. A imprensa cairia em cima de você como um bando de abutres, e sua vida nunca mais seria normal.
-Então você planeja me manter escondida pra sempre? - Ela perguntou, direta. - Pois não sei se você se lembra, pai, mas tem alguém por aí que já sabe quem eu sou. Se esse alguém conseguiu descobrir isso, um dia as outras pessoas também irão. Eu terei que lidar com a situação, mais cedo ou mais tarde.
-Quer saber? Estou feliz que você tenha mencionado isso. - Tony disse, apontando para ela. - Além de todo o perigo e loucura que um cargo nos Vingadores te traria, tem esse maluco desconhecido que está perseguindo você. Se todos souberem quem você é e onde está, será um prato cheio pra ele te encontrar e te fazer mal.
-É, estando em um dos prédios mais vigiados do mundo, ao lado dos heróis mais poderosos do planeta. - Olivia retrucou, irônica. - O objetivo dele é me desmascarar, não é? Se todos já souberem quem eu sou, ele não terá mais nada na manga.
-Prefiro que você fique nesse prédio vigiado ao lado desses heróis sem ter que arriscar sua pele em guerras. - Stark falou olhando no fundo dos olhos dela. Olivia abaixou a cabeça, soltando um suspiro.
-Escuta. - A garota disse francamente, num tom de voz mais baixo. - Eu sei que é perigoso. Sei que, se as pessoas descobrissem que você tem uma filha, minha vida nunca mais seria a mesma, e nem a sua. Sei que minha mãe ficaria uma fera, sei que eu estaria exposta, eu sei de tudo isso. - Ela admitiu. - Mas isso não é sobre mim, é sobre todas as pessoas que estão ameaçadas com a presença de um cara perigoso como aquele que estava aqui. Ele tentou roubar nossos arquivos, e sabe Deus o que ele vai tentar fazer a seguir. E o risco de tentar detê-lo não muda o fato de eu querer fazer alguma coisa pra ajudar. Não é só ser uma vingadora, pai, é lutar por uma coisa que eu acredito, e usar os meus dons pra algo que realmente valha a pena. Porque quando você consegue fazer as coisas que eu faço, mas não faz, e então coisas ruins acontecem, elas acontecem por sua causa. - Aquela frase pegou o homem de surpresa.
Tony ficou ponderando por alguns segundos. Era uma loucura total e descabida. Mas nem todos os nãos do mundo conseguiriam segurar a teimosia e o excesso de coragem da garota. Ele já tinha visto isso em algum lugar.
-Se alguma coisa acontecesse com você... - Ele disse, cheio de culpa.
-Não vai acontecer nada. Você vai estar lá pra me proteger. - A menina respondeu, quase rendendo-se a um pequeno sorriso.
-Escuta, não é fácil como você pensa. Esses outros caras que você vê fazendo parte da equipe, eles treinaram muito pra se tornarem os heróis que são hoje. - Tony retomou o tom sério.
-Me coloque pra treinar, então. Sei que eu posso aprender.
-Ser um herói exige muito mais do que força física e bons golpes. Tem que ter muita responsabilidade, aprender a fazer escolhas difíceis e lidar com pressão vinda de todos os lados.
-Responsabilidade você tem de sobra, mesmo. - Ela ironizou.
-Leva tempo, não dá pra se tornar um guerreiro da noite pro dia. - Tony aumentou o tom, ignorando o comentário.
-Tá bom, pai, eu entendi. - Olivia disse beirando o riso. - Eu consigo.
Stark bufou e ficou em silêncio, encarando os olhos cor de mar da garota.
-Você pode treinar. - Ele falou erguendo o dedo indicador como condição, e ela sorriu instantaneamente. - Depois que tiver bastante prática, eu tiver certeza de que está pronta e perceber que aquele maluco do seu celular já era, só então, nós podemos voltar a conversar.
-Obrigada, pai - Olivia exclamou animada, e deu um abraço apertado no homem recostado na bancada. - Eu não vou te decepcionar, eu prometo.
-Tá bom. Agora volta logo pro trabalho, ou eu vou te demitir por desvio das funções. - Ele disse mal-humorado, dando um tapinha nas costas dela.
Olivia soltou um riso animado e virou-se, caminhando em direção à porta enquanto Stark voltava para sua poltrona do outro lado da mesa. Antes de sair, a garota olhou para ele novamente.
-Ah, pai, mais uma coisa.
-O Dr. Banner não vai concordar em ser seu pet. Confie em mim, eu já tentei. - Tony disse já rolando os olhos, pensando em que pedido abusado ela faria daquela vez.
-Que assustador. - Ela fez uma careta. - Eu queria saber... já que os Vingadores descobriram sobre mim e eu sou praticamente uma de vocês agora, será que posso ter meu próprio quarto na torre? - A garota referiu-se à mansão em que os heróis moravam no topo do prédio central do campus. - Estou cansada de ficar naquele dormitório isolado que você me fez.
Tony ficou encarando-a com as sobrancelhas arqueadas e uma expressão de deboche.
-Ah, qual é! É muito empenho andar até lá todo dia depois do trabalho. E não tem mais sentido, agora que já sabem quem eu sou.
-Vou pensar no seu caso. - Stark respondeu, indicando a ela que fechasse a porta quando saísse.
-Valeu. - Ela cochichou enquanto ia embora, e mandou um beijo no ar para ele.
Tony respondeu com um simples arranhar de garganta. Ele sabia que ela não teria mandado aquele beijo meigo se ele não tivesse atendido a todas as suas requisições.
-Pare de se gabar, Parker.
-Ah, qual é! Eu acertei todos os alvos com o lança teias em dez segundos. Você viu aquilo?!
A voz dos garotos ecoava pelo enorme ginásio onde ficava o centro de treinamento dos Vingadores, reverberando pelas paredes reforçadas e pelo teto alto. Era hora do treino. Por determinação do Sr. Stark, Peter precisava treinar pelo menos quatro horas todos os dias, pra que conquistasse mais espaço dentro da equipe como o membro mais novo. Ele fazia isso agora, praticando seus tiros de teia em alvos com desenhos de bandidos.
-Não é assim tão incrível. Os alvos estavam parados.
-Vamos colocá-los em movimento, então. Aposto que consigo do mesmo jeito. - Parker disse cheio de confiança.
A conversa foi interrompida pelo som da porta pesada do ginásio sendo aberta. Olivia McCall apareceu, e os dois estranharam a presença da garota ali.
-Seus novos lança teias conseguem atirar até sessenta vezes por minuto, se você quiser. - Ela disse, caminhando em direção aos alvos.
-Como você sabe? - Perguntou Peter, encarando o equipamento no próprio pulso.
-Fui eu que os projetei. - Olivia sorriu, parando em frente a eles. - Oi, Peter Parker das Inovações.
-Oi... - O rapaz respondeu, confuso. - O que faz por aqui?
-F.R.I.D.A.Y. me mandou um aviso dizendo que precisava vir até o centro pra treinar. Eu vim, e parece que tenho companhia.
-Treinar, mas por quê? E o departamento? - Ele perguntou.
-Podemos dizer que eu fui... promovida. - A garota respondeu, cheia de orgulho. - O Sr. Stark aceitou me colocar na condição de potencial vingadora em observação, e pediu pra que eu começasse a treinar até que esteja pronta.
-Wow, legal. - O menino se impressionou. - Meus parabéns.
-Valeu. E você, por que está aqui?
-O Sr. Stark tem um cargo parecido pra mim. - Disse Peter. - Quero dizer, eu já sou um vingador, só que... - Ele chacoalhou a cabeça e tentou explicar de uma forma que parecesse mais importante. - Eu sou uma espécie de vingador júnior. Treino um pouco mais pra conseguir mais créditos com o Sr. Stark e com a equipe.
-Saquei. - Ela respondeu.
Olivia notou que havia outro garoto ali junto com Peter, que ela nunca tinha visto antes. Enquanto eles conversavam, o rapaz ficou a alguns metros de distância praticando arremessos, e ela ficou observando de revesgueio. Ele parecia muito bom, pois acertou todos os alvos com muita rapidez.
- E ele, o que ele é? - Ela notou que soara rude demais, então reformulou. - Quer dizer, quem é ele?
-Esse é meu amigo, Eric. - Peter indicou o outro rapaz, que olhou para eles e acenou com um pequeno sorriso. - Ele é novo por aqui.
-Olá, Srta. McCall, é um prazer conhecê-la. - O outro menino se aproximou e disse, simpático.
-Pode me chamar de Olivia. - Ela disse, um tanto farta daquela formalidade toda que tinham com ela.
-Ele é tipo um potencial vingador em observação, também. - Peter explicou. - O Sr. Stark decidiu dar uma chance a ele há algumas semanas.
-Que demais. - Disse Olivia, cumprimentando o rapaz. - Não sabia que tínhamos novas aquisições pra equipe.
-É, pois é. Eu estava há alguns meses no processo. – O rapaz novato explicou. - Fazendo alguns testes, respondendo várias perguntas e sendo analisado pelos superiores.
-Bom, acho que nós três somos a creche dos Vingadores. - A menina comentou, e os garotos riram.
A porta do ginásio se abriu novamente, e quem entrou foi Thor, vestido em um uniforme de treino.
-E aí, crianças? - Ele disse, e as palavras reverberaram enquanto ele caminhava na direção dos três. - Stark me pediu pra tomar conta do treino de vocês hoje. Vamos começar?
-Temos até uma babá. - Peter cochichou, e os outros riram baixinho.
-Eu ouvi isso, novato. Só por conta disso, você é quem começa. - Disse o deus referindo-se a Eric.
-Mas não fui eu que... - O garoto novo disse atônito, enquanto Peter só sabia rir dele.
-Viu só, Eric? Se quer fazer parte da equipe, deveria saber: jamais mexa com um asgardiano. - Falou o rapaz, erguendo as mãos como quem não podia fazer nada, enquanto o amigo o encarava com raiva.
Thor alcançou uma espécie de controle remoto na prateleira de armamentos, e apertou um dos botões. Uma porta se abriu no canto direito do ginásio, revelando robôs de treinamento, e cinco deles se inicializaram e marcharam. Aparentemente sem escolha, o garoto novo colocou-se ao centro da arena de batalha, pronto para enfrentar os sacos de pancada.
-Vamos ver o que você faz. - Disse Thor, que parecia estar estranhamente divertido com aquilo. Ele deu um comando pelo controle, e os robôs se colocaram à frente.
Os protótipos de treinamento tinham um visual muito parecido com os alienígenas Chitauri, aos quais os Vingadores já haviam combatido em anos anteriores. Logo de cara, Eric derrubou um deles com um soco incrivelmente forte, desferido no capacete.
Um segundo chegou pelas suas costas, e com reflexos muito rápidos, o garoto virou-se para ele e levou-o ao chão, ajoelhando-se no piso almofadado da arena. O protótipo desligou-se instantaneamente, ficando inerte junto com o primeiro.
Outro robô pegara o rapaz de surpresa, atingindo suas costas com um golpe que causou um corte. Eric fez uma cara de dor, e em seguida levantou-se indo na direção do inimigo, defendendo seus próximos golpes com extrema agilidade. Desviou dos socos usando a parte externa dos dois antebraços, e em seguida empurrou-o com enorme força na direção de outro robô, derrubando ambos.
O último combatente restante foi enfrentado corpo a corpo. Com golpes tão ágeis quanto suas defesas, Eric desferiu três socos no robô de treinamento, acertando seu capacete e seu abdômen. Nesse momento, após um movimento brusco, o braço direito do garoto se transformou em uma espécie de lâmina, que partia de seu cotovelo e ocupava todo o antebraço. Eric usou-a para perfurar a cabeça do inimigo, e assim desligou o último robô.
-Bons golpes, garoto. - Disse Thor, um pouco impressionado. - Só não precisava ter estragado esse último, essas coisas são bem caras. Mas tudo bem, o dinheiro não é meu, e foi uma ótima luta. - Ele falou a última parte erguendo os ombros com indiferença. Logo em seguida, Thor pressionou um botão do controle remoto que fez com que os robôs ligassem novamente e marchassem de volta para dentro do compartimento de onde vieram. Menos o último, que seguiu um caminho diferente, e pareceu se dirigir a uma espécie de oficina.
-Mandou bem, novato. - Peter disse para Eric, quando o rapaz se aproximou dos dois que ficaram assistindo.
-Eu ainda não engoli essa, Cabeça-de-Teia. - Eric respondeu, fingido estar irritado por ter levado a culpa pelo comentário de antes.
-Então esse é o seu "truque"? - Perguntou Olivia, apontando para a arena onde a luta acabara de acontecer. - Você é rápido e forte?
-É, acho que sim. - O garoto sorriu.
A menina inclinou-se e olhou na direção das costas dele, onde havia um corte ocasionado pelo golpe daquele robô.
-Você está bem? - Ela perguntou.
-O que, isso? É de boa. - Eric respondeu, e enquanto ele dizia isso, Olivia observou a ferida cicatrizar com uma velocidade incrível.
-E você se cura sozinho. - Falou a menina, completando sua fala anterior.
-Ele é bem maneiro. - Peter complementou fazendo a devida propaganda do amigo, que deu um sorriso tímido.
-E desde quando você faz isso? Tipo, você nasceu assim? - Liv perguntou, curiosa a respeito.
-Não. Na verdade, é uma história meio trágica. - Eric soltou uma risada para descontrair. - Meu pai era um cientista, e ele costumava trazer muito trabalho pra casa. Um dia, quando eu era pequeno, eu estava brincando escondido no laboratório dele, e acabei derrubando uma prateleira cheia de produtos químicos que virou toda em cima de mim. Tinham algumas coisas bem esquisitas naquelas prateleiras, e foram elas todas que, misturadas, causaram essas alterações no meu corpo. Eu fiquei vários meses internado depois do acidente, com feridas horríveis, mas enquanto eu me curava, mudanças aconteceram. Então, depois que me recuperei, eu tinha esses poderes. - Contou o rapaz.
-Caramba. - A garota reagiu. - E por que você tem essa coisa no seu braço?
-Quando alguns produtos se misturaram, acabaram fazendo uma reação que causou incêndio no laboratório. O fogo atingiu e queimou meu braço, derretendo até o osso. Depois que eu estava bem, meu pai desenvolveu uma prótese, tão real que ninguém conseguiria adivinhar que era falsa. Anos mais tarde, depois que percebi e aprendi a controlar essas habilidades, decidi usá-las para lutar. Então ele aprimorou a prótese, colocando essa foice nela. Agora eu a utilizo durante as batalhas.
-Acessório básico. - Falou Olivia, arqueando as sobrancelhas. - Deve ser um ótimo barbeador. - O rapaz riu diante do comentário. - E como você chegou até aqui?
-O Parker me apresentou pro Sr. Stark. - Disse ele, abraçando Peter pelo pescoço. - Eu trabalhava sozinho, resolvendo apenas alguns problemas na vizinhança, tipo roubos e sequestros. Nós dois estudávamos juntos, Peter acabou me reconhecendo e eu também descobri quem ele era. Ele me perguntou se eu não gostaria de ajudar a equipe, e eu disse que sim, é claro, então ele falou de mim para o Sr. Stark e, bom... aqui estou eu. Graças a ele.
-Eu sou demais. - Peter concluiu.
-Ei, Aranha e Mini Stark - Thor berrou do outro lado da arena. - É a vez de vocês.
Peter olhou para Olivia e disse:
-Primeiro as damas.
-Que corajoso. - Ela respondeu, e saiu caminhando para o centro. Enquanto andava, a garota pegou um par de luvas sem dedos e começou a calçá-las.
-Vai lutar boxe com os robôs? - Thor perguntou, olhando estranho para as mãos dela.
-É claro que não. - Ela rolou os olhos, achando graça. - São luvas especiais.
-Que seja, então. - Disse o deus, sem uma resposta satisfatória. - Vou pegar leve com você.
Thor exerceu um comando com o controle remoto, abrindo a porta novamente, e dessa vez, apenas um robô saiu do compartimento. Olivia ficou de frente para ele, colocando um pé atrás do outro e esperando a distância diminuir. O protótipo veio em sua direção, e quando estava a apenas alguns metros, a garota esticou sua mão direita para frente e liberou uma grande quantidade de energia em sua direção. As luzes que iluminavam o ginásio piscaram por um momento, enquanto Olivia as absorvia e canalizava, e se acenderam de volta pra revelar o robô caindo lentamente no chão, com um rombo enorme e redondo em sua armadura.
-Eu disse pra não destruírem as drogas dos robôs... - Thor rolou os olhos ao ver o protótipo derrubado entrando em curto.
-Como você fez isso? - Peter perguntou, enquanto os dois rapazes olhavam intrigados para a menina.
-É um upgrade que eu desenvolvi. - Ela disse cheia de si. - Venho trabalhando nelas desde que entrei no MIT. Ajudam a canalizar e potencializar meus poderes.
Parker aproximou-se da garota, curioso. Ela esticou as duas mãos e apontou-as para ele, dando uma melhor visão. O material que compunha a luva era revestido com pedrinhas minúsculas espalhadas por toda a palma.
-São cristais. Eu os chamo de Omni. Significa "todo" ou "inteiro" em alguma língua descolada que não me lembro. - Olivia explicou. - Eu os desenvolvi no laboratório da faculdade. São derivados de prata.
-Como eles funcionam? - Parker perguntou, olhando as mãos dela de perto. Qualquer tipo de tecnologia nova o fascinava.
-É um material com zero por cento de resistividade. Isso significa que não se opõe nem um pouco a conduzir corrente elétrica, ou qualquer tipo de energia que eu venha a absorver e transformar, deixando meus poderes mais fluídos. E são hipercondutores, então fazem o trabalho de conduzir essa energia muito melhor do que a minha pele o faria. - Ela contou. - Os cristais também conseguem armazenar muita energia, fazendo com que eu consiga mais potência, funcionando como...
-Supercapacitores. - Ela finalizou, e Peter disse a última palavra junto com ela.
-Irado. - Parker falou, deslizando o polegar pela superfície cravejada das luvas.
-Tá legal, garota inteligente. Eu não faço ideia do que é isso que você acabou de dizer, mas acho que te deixa páreo pra mais robôs dessa vez. - Thor interrompeu. - Só, por favor, pare de quebrá-los.
-Está bem, vou tentar. - Olivia respondeu, retornando à posição de batalha, virada para a porta ainda fechada do compartimento.
Thor abriu o portão novamente, liberando três robôs dessa vez. Eles marcharam em fila na direção da garota, que se preparou e novamente apontou as mãos para frente. O mais adiantado dos inimigos chegou perto, e com um movimento simples, Olivia retirou a energia difundida dentro de seus circuitos e desligou-o, fazendo-o desmoronar instantaneamente. Porém, ao invés de cair no chão, ele sentou-se no tablado fazendo o sinal da paz e amor com as mãos.
A energia acumulada nas luvas após derrubar o primeiro foi usada pela menina para atingir o segundo, que vinha logo atrás, e ele foi ao chão com superaquecimento do sistema, cruzando as pernas e apoiando-se em um dos cotovelos como uma modelo. O terceiro robô apertou o passo, vindo na direção de Olivia. Ela esticou o braço direito para frente, estendendo a palma da mão como uma barreira, e o robô ficou paralisado. McCall roubara toda a sua energia cinética, e após empurrar a palma da mão para frente, usou-a para colocá-lo de costas no chão, caindo com toda a suavidade e delicadeza em uma posição de twerk perfeita.
-Sem quebrá-los, não é? – Olivia disse, em tom de brincadeira.
Thor observava a cena, impressionado. Enquanto a garota derrubava os três primeiros com facilidade, ele liberou outros quatro de dentro do compartimento, para dificultar.
Os robôs logo avançaram. Olivia colocou os dois braços para baixo e ergueu-os lentamente até a altura do queixo, usando energia da gravidade para levantar um dos protótipos a metros do chão. Quando encontrou altura suficiente, ela soltou os braços, derrubando-o em cima de outros dois robôs, fazendo com que os três caíssem; o primeiro em uma posição magnífica de break, o segundo de joelhos fazendo o símbolo do rock n’ roll com as mãos, e o terceiro saudava um tributo abatido como em Jogos Vorazes.
Faltava apenas um, que veio correndo na direção de Olivia a todo vapor. Ela parou para pensar, e usando sua criatividade, encarou um dos enormes ventiladores que arejava o ginásio pelo teto. A garota ergueu uma das mãos para cima, e as pás pesadas de metal logo pararam de girar. Então, ela olhou para o robô que vinha para pegá-la, e cerrou os olhos. Com um movimento rápido no pescoço, a garota tombou a cabeça para o lado esquerdo, fazendo com que o homem de metal caísse no chão em curto circuito imediatamente, com os dois dedos do meio levantados para o ar.
-Você devia ter ido primeiro. - Eric cochichou para Peter, que assistia à cena admirado. - Boa sorte em fazer melhor que isso.
O treinamento continuou normalmente após a batalha de Olivia. Peter enfrentou os robôs, e depois os três pupilos fizeram mais alguns combates em equipe. Para a garota, a sensação era ótima: parecia que, pela primeira vez, ela fazia parte de algo efetivamente. Olivia saiu do banho em seu novo quarto após o treino, sentindo-se renovada. Após insistir para Stark, ela acabou de fato ganhando um dormitório no alojamento, ficando com o cômodo que pertencia a algum dos Vingadores que se foi com Capitão América – na verdade, havia muitos quartos vazios naquela casa por conta disso.
Liv caminhou até o lado de fora, secando o cabelo com energia térmica que saía de suas mãos. Terminou de vestir-se e foi rapidamente até o andar de baixo, onde viu Peter sentado no sofá jogando alguma nova versão de Pac-Man em seu celular, enquanto parecia aguardar alguém.
-Oi. - Ela disse, e acabou assustando o garoto, que estava tão concentrado que não a viu chegar. A distração acabou fazendo com que ele perdesse o jogo. - Desculpe. - Ela riu.
-Não tem problema. - Peter respondeu, abaixando o celular, talvez um pouco envergonhado por ela tê-lo visto jogando aquilo.
Olivia sentou ao lado dele no sofá, e esticou-se para encarar a tela do telefone que ele tentou esconder.
-Nossa, você é péssimo nesse jogo. - Ela fez uma careta, ao olhar a pontuação dele.
-Consegue passar dessa fase? - Ele perguntou, esticando o aparelho pra ela.
-Por favor – Ela debochou. Talvez fosse madura demais para aquilo. - Tetris é mil vezes melhor. - Ou talvez não.
-Parece justo. - Peter disse, após ponderar um pouco. - Escuta, você foi ótima no treino hoje. - Ele falou e coçou a nuca, sem jeito de começar um assunto. - Como usa seus poderes assim se nunca treinou antes?
-Oh, eu treinei. - Olivia respondeu. - Só não conta isso pro meu pai.
-Como assim?
-Ah, você sabe. Eu não tive esses poderes pra não fazer nada com eles esse tempo todo. - A garota riu, muito mais confortável com a conversa do que ele. - Eu sempre quis ter a oportunidade de usá-los em combate um dia, então eu sempre pratiquei, principalmente depois que desenvolvi os cristais Omni e as luvas. Só que meu pai nunca gostou da ideia, então, até que ele se acostumasse com a possibilidade, eu treinava sozinha.
-Entendi. Estava só esperando a oportunidade. - Peter constatou.
-Exatamente. - Ela respondeu. - Mas e você? Eu costumava ver seus vídeos no YouTube. Desde quando você faz isso?
-Desde os quinze anos. - Peter respondeu. - Foi quando fui picado pela aranha.
-E quantos anos você tem agora?
-Dezessete.
-Hm... - Olivia murmurou, e ficou em silêncio alguns segundos, pensando. - Não acha que seu nome está um pouco errado? Tipo, Homem-Aranha... não deveria ser Menino-Aranha? Moleque-Aranha? De repente, Jovem-Aranha? - Ela olhou para Peter, que parecia ter seu orgulho ferido. - Ah, qual é! Tenho que dizer, quando eu via o Homem-Aranha por aí, eu esperava algo muito diferente... disso. - Ela disse, apontando para Peter.
-Valeu. - Ele disse, irônico.
-Ok, não é como se eu tivesse muita moral pra te julgar. - A garota admitiu. - As pessoas costumam achar que eu sou mais velha por estar na faculdade, mas eu tenho dezessete também.
-Me sinto um pouco menos ofendido. - O garoto brincou. - Mas e você? Do que as pessoas vão te chamar?
-Como assim?
-Quando for uma vingadora de verdade. Qual vai ser o seu nome?
-Boa pergunta... - A menina desviou o olhar, pensativa. - Nunca parei pra bolar um. Tem alguma ideia? - Peter tomou fôlego pra falar, com um sorriso já formado nos lábios. - E não me venha com piadas relacionadas ao meu pai, tipo "Garota de Ferro" ou algo assim.
O sorriso do menino murchou instantaneamente. Eles ficaram mais um tempo em silêncio, pensando, e Peter preparou-se pra falar novamente, mas foi interrompido.
-Eu tenho certeza que Shocker e Electra já existem. - Disse Olivia, e ele perdeu a palavra novamente. - E meus poderes nem são de eletricidade, então não funciona.
-Sabe, eu tenho uma ideia... - Peter disse após pensar mais. - Uma vez eu li alguma coisa na aula de história sobre a entidade sagrada da energia, em alguma mitologia que não me lembro agora. Acho que é dos gregos.
-Tipo um deus?
-Sim, ele era imortal e filho de um deus. Acho que era de Poseidon. - Ele contou. - Mas o nome dele é usado como substantivo feminino.
-E qual era o nome?
-Começava com A... - Ele esforçou-se para lembrar. - Arion.
-Arion... gostei disso. - Olivia sorriu, após repetir o nome para si mesma. - Parece poderoso. Boa ideia, Menino-Aranha. - Ela riu, mas Peter não achou graça.
Um som de passos veio da escada, e agente Romanoff apareceu no andar de cima, caminhando até a sala.
-Oi, garotos. - Ela cumprimentou os dois, e então chegou até o fim dos degraus. - O que é isso? - Ela disse olhando para o canto da sala, referindo-se a uma árvore de natal que estava próxima da janela.
-Um dos funcionários da limpeza colocou ali. Na verdade, só está escondendo uma vidraça quebrada que eles esqueceram de trocar depois da invasão. - Ouviu-se a voz de Stark, que apareceu pela porta de entrada. - Mas eu decidi deixar. Quem sabe todo esse espírito natalino nos ajuda na investigação.
-O que? Os Vingadores terão uma noite de Natal? - Exclamou Bruce, que apareceu no topo da escada logo atrás de Natasha. - Visão e Olivia podem ficar encarregados de acender as luzinhas. - Ele fez referência ao sintozoide que acabara de entrar.
-Mas é claro. - Visão respondeu. - E quem vai ser o Papai Noel?
-Eu voto no bom e velho Stark. - Thor disse, aparecendo da cozinha com um sorriso brincalhão.
-Se eu serei o Papai Noel, já sei quem serão minhas renas. - Tony respondeu imitando chifres com os dedos na própria cabeça, e em seguida apontando para os dois outros. - Aliás, Thor, como vai a Jane?
Bruce soltou uma risada alta e olhou para Thor, que fez uma expressão estranha.
-Está bem, crianças. Lembrem-se que só irão ganhar presentes se forem bons meninos. - Natasha disse, sentando em uma das poltronas.
-Deem um martelo decente pro Thor, ele está precisando. - Olivia tirou sarro dele, que a olhou feio.
-E um calmante pro Banner. - O deus rebateu.
-Tony não vai ganhar presentes, ele foi mal esse ano. - Bruce complementou.
-Experimenta só. Eu corto a verba das suas pesquisas na hora. - Stark respondeu com um falso olhar de seriedade após a ameaça.
-Por que está todo mundo reunido aqui de repente? – Olivia perguntou.
-Vamos ter uma reunião com o Sr.Callahan, da qual você não irá participar. – Tony disse para a garota, com um sorriso caricato.
-Por que não? – Ela franziu a testa.
-Você não é uma vingadora ainda, portanto não faz parte das reuniões. – Ele concluiu. - Por isso, e também porque eu sei que você vai querer dar palpites e passar por cima de mim com esse seu senso de “vamos salvar o mundo e tocar fogo em tudo” se estiver presente.
Olivia pareceu ponderar e decidiu não discutir. Já tinha ganhado muita coisa naquele dia: uma vaga na equipe, treinamento e um quarto; perder esta reunião parecia ser o menor dos problemas para ela.
-Aliás, nem sei se você vai fazer parte dos Vingadores mesmo. Eu não consultei meus colegas de equipe. – Stark disse em tom majoritário. – O que vocês acham, pessoal? Alguém se opõe à entrada da Olivia? – Todos ficaram em silêncio enquanto Tony os encarava, parecendo concordar com ele. – Alguém acha que não deveríamos dar a ela uma chance?
Ninguém se manifestou, mostrando-se favoráveis à entrada da garota, afinal todos já tinham dito isso antes.
-Sério? Ninguém vai evitar que eu seja um péssimo pai e arrisque a pele da minha filha em missões perigosíssimas? – Stark continuou questionando. – Vocês são péssimos heróis.
A votação foi interrompida por um alerta no telão que ficava sala, que atestava uma ligação vinda do Conselho de Segurança. Todos pararam, fizeram caras sérias e se concentraram na tela. Stark indicou o andar de cima para Olivia, que aceitou seu comando e subiu as escadas rapidinho, dirigindo-se ao seu quarto.
-Atender. - Disse Tony, dando o comando de voz para o sistema. Em instantes, o embaixador Callahan apareceu na chamada.
-Boa noite, Vingadores. - Disse o homem, com o tom diplomático de sempre. - Peço desculpas por não ter entrado em contato com a equipe antes. Depois do incidente na base de vocês, minha agenda ficou muito apertada. Preferi lidar com a situação e ter dados sólidos para apresentar a vocês quando nos encontrássemos. - Ele explicou. - Sinto muito, mas terei que ser breve. Primeiro, gostaria de dizer que sinto pelo cancelamento do desfile de Veterans Day. Foi uma pena perdermos a oportunidade.
-Nossa, foi mesmo. - Falou Thor, soando totalmente fingido, e Peter teve que conter uma risada.
-Porém, agora mais do que nunca, a confiança na equipe precisa ser restaurada. - Callahan continuou. - O primeiro passo é encontrar o invasor o mais rápido possível, e entender o que houve para uma derrota tão... catastrófica. - Ele disse com um pouco de pesar, e todos sentiram a alfinetada. - É preciso identificá-lo e prendê-lo para demonstrar eficácia e inspirar a confiança de que a equipe precisa. Para que tal etapa seja concluída com a maior rapidez e qualidade possível, o Conselho de Segurança determinou que o caso fosse encaminhado para as equipes de investigação do FBI. Os diretores já estão colocando seus melhores homens no trabalho, dando prioridade máxima. As respostas logo aparecerão.
-Todos os relatórios que geramos e os dados que coletamos sobre o dia da invasão foram enviados ao Conselho. - Disse Tony, tomando as rédeas. - Nossos sistemas de segurança foram reforçados e reestabelecidos, depois da falha que tiveram. Todas as informações estarão disponíveis para consulta do FBI a qualquer momento, para agilizar a investigação.
-Ótimo. A equipe de Inteligência conseguiu alguma pista adicional sobre a identidade ou o objetivo do dito invasor? - Perguntou o conselheiro.
-Não, senhor. O bug implantado é irrastreável e não aponta para nenhum dado específico que fosse de interesse para o roubo. - Visão explicou. - O reconhecimento do suspeito também se torna impossível, devido à falta de imagens caracterizáveis.
-Bom, neste caso, o FBI terá que usar sua criatividade. - Constatou Callahan. - O Conselho confia em vocês, Vingadores, e encara este acontecido como um fato isolado capaz de ser contornado. Esperamos, contudo, que incidentes como este não se tornem recorrentes. Faremos tudo que está ao nosso alcance para ajudá-los, enquanto vocês defendem a humanidade. Assim que tiver mais informações, convocarei outra reunião para atualizá-los, e tomaremos as medidas necessárias para capturar e julgar o nosso invasor, encerrando esse caso. - Concluiu o embaixador. - Tenham uma boa noite. - Ele desligou, e a transmissão da TV foi desligada.
-Espera aí, nós não vamos fazer nada? - Natasha disse, virando para os colegas.
-Acho que é exatamente isso que eles querem. - Perguntou Banner. – O que você sugere?
-Descobrir quem o Ervilha-Voadora é e o que ele queria. Por conta própria. - Ela respondeu.
-É, também não gosto dessa ideia. Mas acho que a investigação seria mais rápida se estivesse nas mãos do governo, não? – Thor questionou.
-Como assim? Vocês querem ficar parados esperando o FBI fazer o trabalho? - Peter contestou.
-Não estaremos parados, Pirralho. Se o governo cuida das investigações, podemos nos concentrar nas batalhas e em tudo aquilo que vem depois delas. - Stark explicou. - Ficaremos prontos pro Ervilha, quando soubermos como pegá-lo.
-E que dia será "quando"? - Natasha questionou. - Isso que você disse é a definição de ficar parado esperando.
-Eu entendo seu ponto, Nat, mas nós somos heróis, não detetives. - Banner se manifestou. – Esses caras são o maior serviço de inteligência do planeta. Eu também não gosto de deixar minhas responsabilidades pros outros, mas neste caso, não vejo motivo suficiente pra discutir. Que diferença faz se eles pegarem o Ervilha ou nós?
-Os Vingadores estão subordinados ao Conselho. Discutir isso entre a gente não adianta, pois não afetará a decisão deles de qualquer jeito. - Visão falou. - É melhor deixar que eles lidem da forma como acharem mais pertinente. Se tomarmos isso pra nós e cometermos algum erro, será um peso enorme nas nossas costas. Mais um peso, além do desastre desta semana e de todo o resto.
-Visão está certo, não precisamos de mais um deslize para nos culparem. Mas talvez pudéssemos achar um meio termo. – Disse Thor. – Podíamos fazer um acordo com eles, e concordar em investigar em conjunto. Não precisamos interferir, apenas acompanhar para termos certeza de que eles estão seguindo no caminho certo.
-O que acham? – Stark perguntou para Peter e Natasha, que estavam insatisfeitos. – Isso dá pra fazer.
-Não vamos convencer o Callahan a nos deixar agir por conta própria, então... – Romanoff falou, ponderando. – Não que sejamos mestres em seguir ordens, é claro. Mas não vejo motivo para perseguirmos o mesmo cara com duas investigações diferentes. É como andar em círculos.
-Ok, vou falar com o Conselho amanhã de manhã e pedir pra que deixem a equipe a par do que estão investigando. – Tony disse, ficando em silêncio logo em seguida. Diante da conclusão subentendida, já que ninguém contrariou, ele continuou a falar. - Muito bem, é hora de começar a pensar em estratégias. Amanhã falaremos disso. Por enquanto, todos para a cama.
Os heróis se levantaram um a um, e devagar foram se designando para seus respectivos quartos no andar de cima. Peter estava prestes a entrar no próprio dormitório, quando a porta em frente à sua se abriu e Olivia apareceu.
-Eu não comprei essa. E você? - Ela cochichou para o garoto.
-Você estava escutando tudo? – O menino perguntou com a testa franzida.
-Mas é óbvio. – Olivia rolou os olhos. – As paredes são finas e eu sou incapaz de não me meter. Enfim, o que você acha?
-Não acho que temos escolha com o Conselho. - O rapaz respondeu. – O Callahan não vai ceder e o Sr. Stark não quer confrontá-lo. Supervisioná-los é bom, mas... não posso dizer que o Ervilha não me deixa curioso.
-Queria poder saber mais sobre ele. - McCall comentou. - Por conta própria.
Capítulo 5
O barulho de socos, combates e equipamentos em uso reverberava pelas paredes altas do ginásio. Era a terceira semana de treinamento dos novatos. Peter, Olivia e Eric aproveitavam um tempo extra depois do treino para praticar e testar seus poderes de modo mais livre.
Olivia encontrava-se no centro de um circuito, com os olhos vendados e os sentidos bem atentos. Ao redor dela estavam espalhados vários robôs de treinamento, os quais ela teria que perceber usando eletrolocalização e derrotar antes que conseguissem chegar a ela. Usando seus poderes de modo mais minucioso, ela conseguia detectar a energia que alimentava os robôs correndo por dentro deles e se aproximando, para situá-los em sua mente.
Foi assim que ela derrubou o primeiro dos adversários, desligando-o e colocando-o no chão; o segundo veio por trás, com passos quase imperceptíveis mesmo no silêncio que agora se instalava, e Olivia o desativou, usando a energia que retirou dele logo em seguida para paralisar o outro que vinha pela sua direita. O quarto quase a pegou, chegando enquanto Liv combatia os outros, mas a garota o impediu segundos antes de tocá-la tomando sua energia cinética e em seguida desligando-o.
-Terminei? - Perguntou ela aos rapazes que a assistiam.
-Uhum. - Concordou Eric, descendo do observatório onde estava, dirigindo seu olhar para o teto.
Cuidadosamente, Peter pendurava-se em uma de suas teias pendendo do telhado do ginásio, e aproximava-se lentamente do circuito onde Olivia estava. Era uma espécie de desafio extra, surpresa, pra ver se ela conseguia detectá-lo. Sem fazer nenhum barulho, ele descia de ponta-cabeça sorrateiramente, preparando-se para pegá-la pelas costas.
-Então tira esse negócio da minha cara. - Olivia disse impaciente, com o rosto vermelho por conta da venda quente.
De repente, a garota atentou-se; virou o rosto bruscamente e ergueu a mão direita ao lado da bochecha, fazendo com que Peter caísse da teia e fosse ao chão com quase dois metros de queda.
Eric correu até o centro do circuito, rindo alto. Ele foi até a garota e desamarrou o pano do rosto dela, revelando um sorriso de satisfação ali estampado. Peter conseguiu cair sob o apoio das mãos, um pouco desajeitado, do jeito que seus reflexos aguçados permitiram, e agora caminhava na direção deles com a cara emburrada.
-Como você fez pra derrubá-lo? - Eric perguntou, curioso e muito divertido.
-Energia potencial elástica. - Olivia disse enquanto arrumava o cabelo bagunçado. - Toda corda ou mola possui esse tipo de energia pra permitir que tenha flexibilidade.
-Muito esperto. - Falou Parker, derrotado. - Você retirou a energia elástica pra arrebentar a teia.
-E a sua cara. - McCall completou, fazendo com que Eric risse mais alto ainda.
-Eu adoro essa garota. - Ele disse e esticou a mão para fazer um "toca aqui" com ela, que foi atendido com uma risada.
-Tá, foi muito engraçado, agora já chega. - Peter interrompeu, com o orgulho ferido, e decidiu mudar de assunto. - Me responde uma coisa, Olivia. Você já tentou usar seus poderes com todos os tipos de energia, incluindo gravitacional, certo?
-Sim. Dá pra erguer as coisas usando meus poderes contra a gravidade que age sobre elas. - A garota contou.
-E você já tentou fazer isso com você mesma?
-Como assim?
-É que eu estive pensando – O rapaz esclarecia. - Se dá pra levitar as coisas, será que você consegue controlar a energia gravitacional sobre si mesma e, de repente, voar?
-É uma ótima ideia... - Olivia respondeu, franzindo a testa em sinal de reflexão. - Eu costumo converter a gravidade em impulso pra que os corpos se movam pra cima. Tudo fica bem mais difícil quando é com o meu próprio corpo, porque confunde um pouco as minhas percepções, mas dá pra tentar.
-Eu não entendo uma palavra do que vocês dois dizem quando começam com esses papos científicos, sabiam? - Eric se manifestou, encarando os outros como se falassem uma língua alienígena.
-Digamos que ciência não é o seu forte. - Peter disse a ele, dando-lhe um tapinha nas costas.
-Ah, fala sério, isso nem é tão avançado. Você aprende essas coisas no ensino médio. - Olivia estranhou.
-É que o ensino médio do Eric não foi muito... acadêmico. - Parker tentou achar um termo apropriado, e o amigo deu risada. - Ele reprovou o primeiro ano. Algumas vezes.
-Peter era o nerd na escola. Minha parte era com o futebol. Mas de campo, afinal - Ele indicou o braço direito, substituído pela prótese. - Essa belezinha engana bem, mas não é tão boa assim pra fazer touchdowns no futebol convencional. - Ele riu. - A única matéria que eu passava direto era educação física, por conta do time. Eu era uma negação em todo o resto.
-A coisa era feia. - Parker cochichou.
-Entendi. - Olivia riu, mas logo se lembrou da ideia inicial que a deixara bastante curiosa, e decidiu voltar ao assunto. - Tá bom, vamos tentar o que você disse. Vou fazer com impulso primeiro.
A garota tomou distância e os outros dois rapazes saíram de perto, para que ela pudesse desafiar seus poderes um pouco mais. Olivia se concentrou e saiu correndo, e após cinco ou seis passadas deu um pulo, tentando impulsioná-lo com energia. Com o estímulo da sua mente, ela conseguiu atingir cerca de dois metros de altura, e caiu no chão um pouco desajeitadamente logo depois.
-Deu certo! - Peter comemorou, entusiasmado.
Após se recuperar da primeira tentativa, Olivia fez novamente e saltou. Conseguiu chegar até próximo do teto daquela vez, arrancando os resquícios da teia de Peter que se penduravam por ali. Ela chegou ao chão de novo, sentindo a adrenalina da altura.
-Ok, vou tentar me manter no ar agora. - Disse ela, ofegante pela mistura de entusiasmo e esforço.
Ela tomou alcance e pulou novamente, desta vez com menos força. Chegou a meio metro de altura, e então começou a converter a energia que a puxava para baixo para erguer-se no ar. Olivia foi a metros do chão, com os olhos semicerrados por conta da exigência de seus poderes. De repente, ela se desequilibrou, e com um último impulso conseguiu dirigir-se até a parte acolchoada do piso, onde caiu.
Os dois rapazes correram até ela, que saiu do meio dos colchonetes um tanto atordoada. Olivia se levantou com a ajuda deles, vendo tudo girar à sua volta.
-Você está bem? - Peter perguntou ao ver que ela falseou ao tentar andar.
-Seu nariz. - Eric apontou, e a garota alcançou-o com a mão, constatando que estava sangrando.
-Ah, isso é normal. - Liv disse limpando a gota com a manga do uniforme. - Não foi por causa da queda, acontece toda vez que exijo muito dos poderes. Gastei algumas calorias a mais do que devia, só preciso repô-las com carboidrato.
-Vem, vamos levar você pra enfermaria. - Eric falou, passando um dos braços dela pelo seu pescoço pra lhe dar apoio.
-Vou demorar pra conseguir fazer isso direito. Tenho que forçar os poderes aos poucos, ou então, isso acontece. - Olivia explicou enquanto tentava estancar o sangramento. Ela encarou as mangas manchadas de vermelho. - O meu sistema nervoso sobrecarrega e acaba rompendo vasos sanguíneos. Eu sou tipo a Eleven, só que não sou careca.
Os três saíram do ginásio caminhando lentamente em direção à enfermaria que ficava no prédio vizinho. Quando chegaram lá, encontraram certa agitação por parte dos funcionários, que corriam para lá e para cá, e viram os Vingadores aglomerados em volta de uma mesa.
-Novatos, venham até aqui. - Chamou Natasha, e os três se aproximaram curiosos da sala de conferências. - Temos uma nova missão.
Interessados e entusiasmados, os três jovens arranjaram um espaço entre as ombreiras da armadura de Thor para ouvir o que Visão e Banner estavam dizendo.
-Ele está na ponte, atacando todos que estão de carro e a pé - Visão mencionou na conversa que pegaram andando. - O trânsito trancou muita gente lá.
-E o que é essa coisa enorme, afinal? - Thor perguntou, e os três olharam para a projeção de realidade aumentada no centro. Lá se exibiam imagens de um ser metálico enorme atacando veículos e uma multidão de pessoas correndo.
-Não sabemos, mas é grande e perigoso. Parece uma armadura de guerra. - Banner explicou.
-É a ponte Harvard – Eric constatou ao olhar as imagens, e identificou que estavam acontecendo ali mesmo em Cambridge.
-Não podemos perder tempo. Todos para o hangar, agora. - Stark ordenou, e eles saíram dali imediatamente.
Os heróis se dirigiram apressados ao setor vizinho, onde a nave de missões já os esperava. Olivia estava logo atrás deles, ofegante, e andava com um pouco de dificuldade.
-Aonde você vai? - Tony perguntou com a testa franzida.
-Vou ajudar vocês. - Ela respondeu sem fôlego.
-Nem pensar. Você fica, Narizinho. - Disse o homem apontando para o rosto ensanguentado da garota, e em seguida foi andando atrás dos outros.
-Mas eu estou bem, só treinei um pouco demais... - Olivia justificou-se, limpando a narina novamente enquanto esforçava-se para ir atrás dele.
-Combinamos que você só fará parte da equipe quando eu achar que está pronta, lembra? Depois de muito treinamento. - Stark argumentou. - Agora vá até a enfermaria e se entupa de glicose. Eu volto já. - E saiu a passos largos enquanto falava alguma coisa em seu comunicador, deixando a garota frustrada sozinha na sala, sem energia até mesmo para discutir.
Os Vingadores embarcaram na nave de combate rapidamente, já com seus uniformes e armas preparados, e chegaram ao local da missão em minutos. De longe era possível ver a fumaça que se originava na ponte, na divisa entre Boston e Cambridge, que estava lotada de carros parados desordenadamente e pessoas correndo para todos os lados. Perto do centro, um ônibus estava em chamas por conta de uma explosão que acontecera a pouco, que foi ouvida de dentro da aeronave. E, aterrorizando os civis, uma criatura robótica de cinco metros de altura fazia o chão tremer com seus passos.
O pequeno avião aproximou-se do local com um rasante e abriu a rampa traseira, liberando Stark vestido em seu traje, Parker caindo em piruetas e Visão voando, para recepcionarem o novo inimigo de batalha. Assim que os três pousaram no asfalto, Tony esticou sua mão direita e carregou a arma na palma de sua luva, disparando um tiro contra o ser metálico há alguns metros, para anunciar a chegada de forma incisiva. Porém, poucos danos foram causados à sua estrutura, resumindo-se apenas a marcas de fumaça. Era um equipamento de qualidade, Stark constatou.
-F.R.I.D.A.Y., envie soldados de ferro para a ponte Harvard, imediatamente. - Ele ordenou pelo comunicador, prevendo que precisariam de reforços para proteger a multidão.
Em seguida, o Homem de Ferro colocou-se no ar novamente, disparando diversos tiros enquanto se aproximava voando do brutamonte. Três ou quatro disparos depois, e o robô gigante virou-se para trás de punho fechado, pronto para encontrar a armadura de Stark e lançá-la alguns metros de distância, desordenando seus propulsores de voo.
-Nada educado. - Disse Tony, estabilizando a armadura.
O imenso ser metálico caminhava a passos largos e pesados, pisoteando os carros presos no engarrafamento gerado pelo tumulto, e agitava os braços enormes no ar para atingir os cidadãos que corriam tentando escapar dali. A cena era horrível e desesperadora, e os civis gritavam e corriam aterrorizados. Peter começou a dar pulos ágeis por entre os automóveis, fazendo o possível para alcançar as pessoas com suas teias e impedir que caíssem dentro do rio Charles após os golpes do robô, ou mesmo numa tentativa desesperada de escapar. Stark chegou para ajudá-lo, deixando os civis pendurados nas teias do rapaz que pendiam das bordas da ponte conturbada.
A aeronave dos Vingadores pousara a alguns metros da cena, no primeiro espaço livre de asfalto que encontrou. De lá, os outros quatro heróis saíram em disparada, lutando contra o fluxo da multidão em fuga, para encontrar os companheiros.
Hulk foi o primeiro a chegar para a festa, a passos largos e raivosos. Com um grito de guerra, Banner atingiu o robô com o punho esquerdo, arremessando o saco de metal na fila de carros parados. Apesar do impacto, apenas um amassado surgiu em sua armadura, dando espaço para que o inimigo se levantasse, um pouco irritado. O robô ergueu um dos braços que era equipado com um potente canhão, e disparou em um caminhão de alimentos que estava atravessado na pista, atirando-o bem na direção dos heróis.
Hulk e Visão se prontificaram a ir de encontro com o veículo, parando-o antes que atingisse mais civis. Logo em seguida, do outro lado da pista, Romanoff irrompeu dirigindo um carro forte a toda velocidade. Ela anunciou sua chegada com o som da buzina, e atingiu o robô em cheio no meio do percurso, desestabilizando-o e desequilibrando seus passos.
Eric encontrava-se em cima do veículo, e assim que houve o impacto, ele saltou do teto do carro indo em direção à cabeça do robô com uma cambalhota. O rapaz pousou no capacete, com o braço direito transformado em foice, e começou a usar a arma para atingir o visor da armadura. Apesar dos golpes extremamente fortes, a tela iluminada não sofreu mais que arranhões; alguns segundos depois, o gigante de aço tomou a atitude de tirar Eric dali, arremessando-o com toda a força em cima de um Volkswagen, fazendo uma cratera na lataria. O rapaz ergueu-se momentos depois, mexendo os ombros para trás e para frente, fazendo seus ossos estralarem enquanto algumas costelas quebradas voltavam automaticamente ao lugar.
-Quem está dentro da armadura? - Questionou Thor pelo comunicador. - Ela é pilotada?
-Pilotada pelo capeta, talvez. - Foi o que Eric respondeu ainda um pouco atordoado com a pancada.
Foi a vez de o deus nórdico desferir seu ataque ao enorme robô, chamando trovões que atingiram a pequena antena localizada no topo da cabeça do gigante. Para a surpresa de Thor, a estrutura metálica não entrou em curto circuito, mesmo com toda a descarga de energia que acabara de receber.
-Ok, homem de lata, hora de dormir. - Disse Peter, aproximando-se da zona de conflito com pulos ágeis.
O Homem-Aranha começou a dar voltas ao redor do robô, enrolando nele uma porção de suas teias mais resistentes. Com pulos e cambalhotas, ele realizou a emboscada com agilidade, pronto para derrubar o inimigo gigante. No entanto, assim que suas teias tocavam a superfície metálica da armadura, elas deslizavam e iam direto para o chão, sem aderência alguma.
-Não estão grudando! - Foi só o que ele conseguiu dizer, perplexo, antes de ser atingido.
Em mais um golpe colossal, o robô disparou um de seus canhões na direção de Thor e Aranha, fazendo com que os dois fossem arremessados pelos ares. Peter, um tanto atordoado, conseguiu amenizar o impacto ao abrir as asas acopladas ao seu uniforme, e usou-as para planar de volta até o asfalto; Visão encarregou-se de ajudar o amigo nórdico, que não possuía nenhum acessório alado, e voou até Thor para trazê-lo de volta ao chão em seguida.
-Vou ter que apelar para a ignorância com esse cosplay barato de mim. - Disse Stark com os dentes cerrados, selecionando comandos em seu sistema operacional.
Aquela batalha já tinha durado tempo demais, e era preciso agir de forma mais agressiva pra que acabasse antes de ferir mais pessoas. A porção de soldados de ferro que estavam no local para auxiliar os civis na fuga do campo de batalha se aprumou; pela ordem de Tony no sistema, eles voaram até o gigante de metal e cercaram-no por diferentes direções, acionando seus propulsores à máxima velocidade.
Os soldados tentaram ao máximo não serem atingidos pelos tiros e socos que o robô usava para se defender; quatro foram derrubados pelos golpes de resistência dele, mas os ferrosos eram maioria. Os soldados se uniram e atingiram-no em cheio a toda velocidade, empurrando-o e fazendo-o cair no rio Charles. O impacto movimentou uma grande quantidade de água, o que causou uma onda enorme, atingindo a ponte e chegando a arrastar alguns carros para dentro do rio.
-Se for tripulado, o piloto irá se afogar. - Natasha constatou, enquanto todos os heróis focavam sua atenção na superfície do rio, aguardando o resultado.
Alguns segundos de suspense depois, o robô submerso ergueu-se de dentro d’água. Com propulsores de voo ultrapotentes, ele lançou-se ao céu, causando mais uma série de ondas fortes, e foi rápido demais para que qualquer um dos Vingadores em terra pudesse pará-lo.
-F.R.I.D.A.Y., envie um míssil monitorado na direção daquele homem de lata gigante, agora! - Stark ordenou, e seu sistema atendeu prontamente. Em instantes, uma linha de fogo apareceu cortando o céu, seguindo a direção que fora tomada pelo gigante de aço alguns instantes antes.
Minutos depois, quando nem o míssil ou o robô eram mais visíveis no céu ensolarado, F.R.I.D.A.Y. deu um relatório.
-Sinto muito, Sr. Stark, mas o alvo designado não se encontra mais nos radares e está fora do alcance do GPS. - A voz feminina respondeu, arrancando um suspiro frustrado de seu chefe.
-Envie o míssil para o mar. - Disse Tony por fim, com pesar na voz.
-Entendido.
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O laboratório de multimídia no complexo dos Vingadores trabalhava incansavelmente, em cima dos vídeos do combate ocorrido horas antes. E havia muitos deles: imagens de satélites, celulares amadores e redes de televisão, que transmitiam o atentado na ponte para o mundo todo. Depois de acabar, ou ao menos impedir que o ataque do robô gigante continuasse, era hora de deixar os pesquisadores trabalharem: quem era o inimigo, como ele funcionava e por que ele lutou como lutou?
Todas as dezenas de telas dentro daquela sala exibiam imagens de diferentes ângulos, fontes, qualidades e tamanhos, e analisavam meticulosamente a armadura de guerra humanoide que os heróis haviam enfrentado. Físicos, engenheiros e matemáticos faziam cálculos e tiravam conclusões a partir do que viam, e junto a eles, as mentes científicas da equipe também trabalhavam na investigação. Tudo para fornecer aos Vingadores o maior número de informações possível sobre seu mais recente inimigo.
-Como estamos indo na análise do homem de lata indestrutível? - Perguntou Stark, caminhando por entre os computadores pilotados pelos cientistas do laboratório.
-Bom, seus equipamentos são ultramodernos. - Disse uma das pesquisadoras próximas a ele. - Analisamos suas armas, mas não conseguimos encontrar o exato modelo. São semelhantes aos canhões mais atuais do mercado. Tem um poder de fogo devastador, destruiriam a ponte se os Vingadores não tivessem chegado a tempo. Ele possui mais alguns atributos bélicos, como metralhadoras e bombas, que conseguimos localizar espalhadas pelo traje, mas ele não as utilizou no combate. Aquele robô era uma máquina de guerra.
-O grupo C tem alguns resultados. - Parker respondeu, se aproximando com alguns relatórios em um tablet. - Pelos cálculos, a armadura dele deve pesar cerca de cinco toneladas. É bem pesada, mas compensa pela quantidade de armas que tem. O soco do robô corresponde a mais ou menos quatro vezes o peso dele, ao menos na intensidade em que ele usou os braços durante a luta.
-O desgraçado é bem forte. O que mais sabemos? - Tony questionou.
-Não conseguimos encontrar nenhum indício de que a armadura era controlada por alguém que estava dentro dela. - Dr. Banner aproximou-se para complementar o relatório atualizado. - Nenhuma das imagens mostra o que tinha por trás daquele visor de LED. Tudo leva a crer que era inteligência artificial, ou então controlada remotamente.
-Mais algum resultado? - Pronunciou Stark, vasculhando a equipe com o olhar.
-As imagens dos radares espalhados pela pista da ponte nos deram uma estimativa da velocidade com que o robô gigante se movia. - Disse Olivia, retirando da boca um pirulito. - Quando ele saiu de dentro d'água e acelerou para a fuga, chegou a atingir trezentos e trinta quilômetros por hora.
-O desgraçado é forte e rápido, ótimo. Mas o que você faz aqui? - Stark perguntou à garota, que usava um doce para repor seus níveis de energia após a queda no treinamento mais cedo. - Por que não está descansando?
-Me poupe, pai. Só mais alguns desse e estarei novinha em folha. - Ela respondeu tediosamente, atirando o palitinho do pirulito na lixeira.
-Te mandei ficar aqui pra que não fizesse nenhum esforço.
-É, você me deixou aqui, obrigada por me lembrar. - Olivia foi irônica. - Eu fiquei assistindo tudo pela TV, e já que não fui com vocês, decidi ajudar vindo até o laboratório fazer alguns cálculos.
-Meus instintos paternais me dizem que deveria ficar bravo com isso, mas você foi prestativa. Um ponto pra você no quesito "nova vingadora". - Disse o pai, fazendo a garota sorrir orgulhosamente. - Bom, eu não consegui muitos resultados. Estou tentando entender por que as teias do Homem-Aranha não grudaram no robô.
-Andei dando uma olhada nisso também. Acho que o metal que reveste a armadura é antiaderente. - Peter enunciou, olhando para a tela de seu tablet. - Só não sei como ele faz isso. Teoricamente, minhas teias deveriam grudar em qualquer superfície. Nunca encontrei nada que as fizesse escorregar daquele jeito. - Disse intrigado.
-Será que a superfície estava lubrificada? Vejam, o metal tinha um brilho esquisito quando o sol batia nele. - Olivia sugeriu, aproximando uma imagem do gigante em uma das telas de realidade aumentada.
-Não, isso não é lubrificação. É uma característica física, mas não sei que metal tem esse tipo de brilho. - Stark respondeu analisando as imagens com cuidado.
-A armadura mal cedeu aos socos do Hulk também. Não era um metal comum que revestia aquele traje. - Bruce falou recostando-se na bancada. - Era particularmente resistente, de um jeito que eu nunca tinha visto antes.
-O que acham que era? - Peter questionou.
-Pela análise das imagens que fiz com o pessoal de química, deviam haver traços de Adamantium na armadura. - Stark disse pegando os próprios laudos. - É um metal raro e bem resistente. Porém, não era Adamantium puro, pois a cor estava um pouco alterada. Os cientistas apostaram em uma liga metálica, mas não sabem dizer bem o que mais estava misturado naquela superfície.
-Adamantium não é tão indestrutível. Já consegui bater em coisas desse material com os socos do Hulk antes. - Atestou Banner, desconfiado. - Teríamos conseguido danificar mais a armadura se fosse assim.
-Vi que o Thor tentou dar um curto nos sistemas do robô usando raios, mas não conseguiu pifá-lo. - Olivia observou, e então ficou alguns segundos a pensar. - O outro metal deve ter alguma propriedade isolante, que impediu que a descarga elétrica atingisse os sistemas... Já pensaram em Vibranium? É um dos metais que menos conduz energia, e ele também absorve grandes impactos.
-Será? Misturar Vibranium e Adamantium é muito difícil. Na maioria das vezes, um anula o outro e faz com que a liga fique muito fraca. Só deu certo uma vez, com o escudo do Capitão América. - Peter observou com a testa franzida. Ele usou um aplicativo para simular a mistura dos dois elementos em uma das telas, e o resultado fracassado se concretizou.
-Quem sabe não seja só isso. Pode ter mais alguma coisa que ajude a unir os dois metais. - Banner sugeriu. - Um terceiro tipo de metal, que impediria que o Vibranium enfraquecesse o Adamantium e vice-versa. E que fosse igualmente forte, pra deixar a armadura tão impenetrável quanto vimos que ela é.
Os quatro cérebros avançados se aquietaram em seus próprios cálculos e teorias, enquanto mexiam em seus simuladores, coletores de dados e imagens nos tablets individuais. Em todos os casos, aquela teoria poderia ser válida. No entanto, nenhum dos servidores apontava qualquer sugestão do metal que pudesse compor o trio da liga para formar a armadura.
-Não conheço nenhum material que pudesse fazer esse trabalho. - Concluiu Banner, que tinha conhecimento mais vasto nessa área. - Deve ser algo novo, criado em laboratório ou sei lá. Não tem como saber.
-Mas foi uma ótima invenção, independente do que for. Deixou a gente sem reação. - Disse Parker, com uma pontada de tristeza ao se lembrar das próprias teias deslizando pela superfície. - A mistura fez com que nenhum de nós pudesse parar o robô.
-Todas as propriedades resultantes da mistura dos metais nos prejudicaram de alguma forma. Só pode ser proposital. Esse robô foi pensado especialmente pra nós. - Stark ousou constatar, com os olhos semicerrados. - Thor não consegue atingi-lo com raios, o Aranha não consegue amarrá-lo com teias, eu não consigo explodi-lo e o Hulk não o derruba na briga. Tudo meticulosamente calculado.
-Concordo com você, Tony. - Banner se pronunciou, retirando os óculos. - Quem quer que o tenha projetado não pensou o robô para enfrentar só a polícia ou o exército humano. Queria que chegássemos até ele.
-Não acham estranho que a primeira aparição dessa máquina tenha sido justo aqui, em Cambridge? - Olivia questionou com desconfiança. - Na mesma cidade em que fica a sede dos Vingadores.
-Quem fez o homem de lata queria que o enfrentássemos. - Peter concordou.
-E queria que falhássemos. - Stark complementou suas palavras com pesar na voz, enquanto olhava para a tela principal da sala, que estava ligada na BBC News. Lá, uma imagem de helicóptero da ponte destruída e dos carros em chamas se exibia.
A mídia estava toda em cima da equipe. O mundo inteiro falava sobre a ponte Harvard e o robô gigante que parecia ter tirado o melhor dos Vingadores, fazendo seus poderes parecerem inúteis. O número de mortos durante o atentado já passava das centenas, e crescia a cada momento; civis morreram afogados, pisoteados e queimados, enquanto os heróis pareciam ter falhado em salvá-los eficaz e rapidamente. E não adiantava negar, pois estava tudo documentado: a cada segundo, novas imagens do combate feitas por cinegrafistas amadores ou redes de televisão apareciam, mostrando Homem-Aranha e Thor sendo arremessados pelo tiro de canhão ou Stark sendo atingido pelo soco do robô.
Os Vingadores estavam por baixo, de novo. Será que eram capazes de proteger a humanidade mesmo? Como, se não foram páreo para aquele gigante de aço? Será que apenas metade da equipe original dava mesmo conta do recado, sem América e os outros? Pois aquela não era a primeira vez que falhavam; não fazia nem dois meses do dia em que a própria base dos heróis fora invadida por um vilão desconhecido, que inclusive nem havia sido identificado ainda. Aqueles resultados preocupavam a população, e faziam com que as pessoas questionassem até que ponto estavam seguras tendo os Vingadores como seus protetores.
-É tudo um jogo. Esse robô foi feito pra causar mortes, assustar as pessoas e nos desestabilizar. - Tony continuou, ainda observando as imagens da fumaça na ponte pelo telão. - É proposital, pra nos fazer parecer inúteis e fracos. E machucar gente.
-O que mais vão aprontar pra cima de nós? - Bruce questionou, irritado. - Por que com certeza não parou por aqui.
-Não, não parou. Eles vão tentar nos destruir com um passo de cada vez.
-Sr. Stark, você não acha que o que aconteceu na ponte pode ter alguma coisa a ver com o Ervilha-Voadora? - Parker questionou ao homem. - Quero dizer, as duas coisas aconteceram muito próximas uma da outra. Não acha que podem estar interligadas?
-Eu não duvido disso. - Falou McCall, trocando olhares com o rapaz. - Tudo pode estar relacionado. Ele deve estar brincando com a gente, tentando nos ridicularizar pro mundo todo.
-Não sei dizer. - Respondeu Tony. - Parece estranho, mas não sei onde tudo se encaixaria.
-Se aquele cara que nos invadiu é o mesmo que fez esse robô, por que no dia do ataque ele veio sozinho e não mandou seu soldadinho de chumbo pra causar um estrago maior? - Bruce discordou.
-É, tem razão. - Stark ponderou.
-Sei lá, mas isso é suspeito, não acham? - McCall insistiu. - Eu acho que devíamos investigar.
-O governo está investigando o Ervilha, Olivia, lembra-se? - Tony advertiu-a. - Não temos permissão pra interferir nesse caso.
-E desde quando você pede permissão? - A garota questionou com a sobrancelha arqueada.
-Não é essa a questão. Se houver ligação, o FBI vai descobrir. - Ele esclareceu. - Em todo caso, eu vou falar com o Callahan pra que deem uma atenção pra isso. Temos uma equipe aqui dentro que está colaborando com o ritmo das pesquisas.
-Mas, Sr. Stark... - Peter queria intervir, mas foi interrompido.
-Vocês dois, parem de brincar de detetives. Não tem Dona Branca na biblioteca com o castiçal, entenderam? As coisas são bem mais complicadas do que uma simples semelhança. - Tony deu uma dura. - Agora, todos os esforços das nossas equipes vão ficar voltados pra investigar esse robô e as propriedades dele, pra que possamos entendê-lo e criar um plano. Essa não foi a última vez que ele apareceu, com certeza. Nossa inteligência precisa ser usada pra ciência, pois é disso que entendemos. Temos cientistas aqui, não investigadores. O FBI vai cuidar do resto, e eu vou me certificar de que prestem atenção nos detalhes. Deixem as estratégias pros adultos, ok?
-Relaxem, todos sabem o que estão fazendo, inclusive nós. - Banner tentou apaziguar, enquanto Stark atendia um funcionário que se aproximou para falar com ele. - Nós estamos acompanhando o FBI, e agora temos mais coisas pra cuidar. Não vamos deixar que o Ervilha ou que o robô gigante escapem.
-Voltem ao trabalho, crianças. - Tony ordenou, interrompendo brevemente a sua conversa, e retornando a atenção ao subordinado logo em seguida.
Os outros três obedeceram, pegando seus equipamentos e retornando aos devidos grupos de pesquisa; porém, os dois mais jovens permaneceram visivelmente contrariados.
Olivia encontrava-se no centro de um circuito, com os olhos vendados e os sentidos bem atentos. Ao redor dela estavam espalhados vários robôs de treinamento, os quais ela teria que perceber usando eletrolocalização e derrotar antes que conseguissem chegar a ela. Usando seus poderes de modo mais minucioso, ela conseguia detectar a energia que alimentava os robôs correndo por dentro deles e se aproximando, para situá-los em sua mente.
Foi assim que ela derrubou o primeiro dos adversários, desligando-o e colocando-o no chão; o segundo veio por trás, com passos quase imperceptíveis mesmo no silêncio que agora se instalava, e Olivia o desativou, usando a energia que retirou dele logo em seguida para paralisar o outro que vinha pela sua direita. O quarto quase a pegou, chegando enquanto Liv combatia os outros, mas a garota o impediu segundos antes de tocá-la tomando sua energia cinética e em seguida desligando-o.
-Terminei? - Perguntou ela aos rapazes que a assistiam.
-Uhum. - Concordou Eric, descendo do observatório onde estava, dirigindo seu olhar para o teto.
Cuidadosamente, Peter pendurava-se em uma de suas teias pendendo do telhado do ginásio, e aproximava-se lentamente do circuito onde Olivia estava. Era uma espécie de desafio extra, surpresa, pra ver se ela conseguia detectá-lo. Sem fazer nenhum barulho, ele descia de ponta-cabeça sorrateiramente, preparando-se para pegá-la pelas costas.
-Então tira esse negócio da minha cara. - Olivia disse impaciente, com o rosto vermelho por conta da venda quente.
De repente, a garota atentou-se; virou o rosto bruscamente e ergueu a mão direita ao lado da bochecha, fazendo com que Peter caísse da teia e fosse ao chão com quase dois metros de queda.
Eric correu até o centro do circuito, rindo alto. Ele foi até a garota e desamarrou o pano do rosto dela, revelando um sorriso de satisfação ali estampado. Peter conseguiu cair sob o apoio das mãos, um pouco desajeitado, do jeito que seus reflexos aguçados permitiram, e agora caminhava na direção deles com a cara emburrada.
-Como você fez pra derrubá-lo? - Eric perguntou, curioso e muito divertido.
-Energia potencial elástica. - Olivia disse enquanto arrumava o cabelo bagunçado. - Toda corda ou mola possui esse tipo de energia pra permitir que tenha flexibilidade.
-Muito esperto. - Falou Parker, derrotado. - Você retirou a energia elástica pra arrebentar a teia.
-E a sua cara. - McCall completou, fazendo com que Eric risse mais alto ainda.
-Eu adoro essa garota. - Ele disse e esticou a mão para fazer um "toca aqui" com ela, que foi atendido com uma risada.
-Tá, foi muito engraçado, agora já chega. - Peter interrompeu, com o orgulho ferido, e decidiu mudar de assunto. - Me responde uma coisa, Olivia. Você já tentou usar seus poderes com todos os tipos de energia, incluindo gravitacional, certo?
-Sim. Dá pra erguer as coisas usando meus poderes contra a gravidade que age sobre elas. - A garota contou.
-E você já tentou fazer isso com você mesma?
-Como assim?
-É que eu estive pensando – O rapaz esclarecia. - Se dá pra levitar as coisas, será que você consegue controlar a energia gravitacional sobre si mesma e, de repente, voar?
-É uma ótima ideia... - Olivia respondeu, franzindo a testa em sinal de reflexão. - Eu costumo converter a gravidade em impulso pra que os corpos se movam pra cima. Tudo fica bem mais difícil quando é com o meu próprio corpo, porque confunde um pouco as minhas percepções, mas dá pra tentar.
-Eu não entendo uma palavra do que vocês dois dizem quando começam com esses papos científicos, sabiam? - Eric se manifestou, encarando os outros como se falassem uma língua alienígena.
-Digamos que ciência não é o seu forte. - Peter disse a ele, dando-lhe um tapinha nas costas.
-Ah, fala sério, isso nem é tão avançado. Você aprende essas coisas no ensino médio. - Olivia estranhou.
-É que o ensino médio do Eric não foi muito... acadêmico. - Parker tentou achar um termo apropriado, e o amigo deu risada. - Ele reprovou o primeiro ano. Algumas vezes.
-Peter era o nerd na escola. Minha parte era com o futebol. Mas de campo, afinal - Ele indicou o braço direito, substituído pela prótese. - Essa belezinha engana bem, mas não é tão boa assim pra fazer touchdowns no futebol convencional. - Ele riu. - A única matéria que eu passava direto era educação física, por conta do time. Eu era uma negação em todo o resto.
-A coisa era feia. - Parker cochichou.
-Entendi. - Olivia riu, mas logo se lembrou da ideia inicial que a deixara bastante curiosa, e decidiu voltar ao assunto. - Tá bom, vamos tentar o que você disse. Vou fazer com impulso primeiro.
A garota tomou distância e os outros dois rapazes saíram de perto, para que ela pudesse desafiar seus poderes um pouco mais. Olivia se concentrou e saiu correndo, e após cinco ou seis passadas deu um pulo, tentando impulsioná-lo com energia. Com o estímulo da sua mente, ela conseguiu atingir cerca de dois metros de altura, e caiu no chão um pouco desajeitadamente logo depois.
-Deu certo! - Peter comemorou, entusiasmado.
Após se recuperar da primeira tentativa, Olivia fez novamente e saltou. Conseguiu chegar até próximo do teto daquela vez, arrancando os resquícios da teia de Peter que se penduravam por ali. Ela chegou ao chão de novo, sentindo a adrenalina da altura.
-Ok, vou tentar me manter no ar agora. - Disse ela, ofegante pela mistura de entusiasmo e esforço.
Ela tomou alcance e pulou novamente, desta vez com menos força. Chegou a meio metro de altura, e então começou a converter a energia que a puxava para baixo para erguer-se no ar. Olivia foi a metros do chão, com os olhos semicerrados por conta da exigência de seus poderes. De repente, ela se desequilibrou, e com um último impulso conseguiu dirigir-se até a parte acolchoada do piso, onde caiu.
Os dois rapazes correram até ela, que saiu do meio dos colchonetes um tanto atordoada. Olivia se levantou com a ajuda deles, vendo tudo girar à sua volta.
-Você está bem? - Peter perguntou ao ver que ela falseou ao tentar andar.
-Seu nariz. - Eric apontou, e a garota alcançou-o com a mão, constatando que estava sangrando.
-Ah, isso é normal. - Liv disse limpando a gota com a manga do uniforme. - Não foi por causa da queda, acontece toda vez que exijo muito dos poderes. Gastei algumas calorias a mais do que devia, só preciso repô-las com carboidrato.
-Vem, vamos levar você pra enfermaria. - Eric falou, passando um dos braços dela pelo seu pescoço pra lhe dar apoio.
-Vou demorar pra conseguir fazer isso direito. Tenho que forçar os poderes aos poucos, ou então, isso acontece. - Olivia explicou enquanto tentava estancar o sangramento. Ela encarou as mangas manchadas de vermelho. - O meu sistema nervoso sobrecarrega e acaba rompendo vasos sanguíneos. Eu sou tipo a Eleven, só que não sou careca.
Os três saíram do ginásio caminhando lentamente em direção à enfermaria que ficava no prédio vizinho. Quando chegaram lá, encontraram certa agitação por parte dos funcionários, que corriam para lá e para cá, e viram os Vingadores aglomerados em volta de uma mesa.
-Novatos, venham até aqui. - Chamou Natasha, e os três se aproximaram curiosos da sala de conferências. - Temos uma nova missão.
Interessados e entusiasmados, os três jovens arranjaram um espaço entre as ombreiras da armadura de Thor para ouvir o que Visão e Banner estavam dizendo.
-Ele está na ponte, atacando todos que estão de carro e a pé - Visão mencionou na conversa que pegaram andando. - O trânsito trancou muita gente lá.
-E o que é essa coisa enorme, afinal? - Thor perguntou, e os três olharam para a projeção de realidade aumentada no centro. Lá se exibiam imagens de um ser metálico enorme atacando veículos e uma multidão de pessoas correndo.
-Não sabemos, mas é grande e perigoso. Parece uma armadura de guerra. - Banner explicou.
-É a ponte Harvard – Eric constatou ao olhar as imagens, e identificou que estavam acontecendo ali mesmo em Cambridge.
-Não podemos perder tempo. Todos para o hangar, agora. - Stark ordenou, e eles saíram dali imediatamente.
Os heróis se dirigiram apressados ao setor vizinho, onde a nave de missões já os esperava. Olivia estava logo atrás deles, ofegante, e andava com um pouco de dificuldade.
-Aonde você vai? - Tony perguntou com a testa franzida.
-Vou ajudar vocês. - Ela respondeu sem fôlego.
-Nem pensar. Você fica, Narizinho. - Disse o homem apontando para o rosto ensanguentado da garota, e em seguida foi andando atrás dos outros.
-Mas eu estou bem, só treinei um pouco demais... - Olivia justificou-se, limpando a narina novamente enquanto esforçava-se para ir atrás dele.
-Combinamos que você só fará parte da equipe quando eu achar que está pronta, lembra? Depois de muito treinamento. - Stark argumentou. - Agora vá até a enfermaria e se entupa de glicose. Eu volto já. - E saiu a passos largos enquanto falava alguma coisa em seu comunicador, deixando a garota frustrada sozinha na sala, sem energia até mesmo para discutir.
Os Vingadores embarcaram na nave de combate rapidamente, já com seus uniformes e armas preparados, e chegaram ao local da missão em minutos. De longe era possível ver a fumaça que se originava na ponte, na divisa entre Boston e Cambridge, que estava lotada de carros parados desordenadamente e pessoas correndo para todos os lados. Perto do centro, um ônibus estava em chamas por conta de uma explosão que acontecera a pouco, que foi ouvida de dentro da aeronave. E, aterrorizando os civis, uma criatura robótica de cinco metros de altura fazia o chão tremer com seus passos.
O pequeno avião aproximou-se do local com um rasante e abriu a rampa traseira, liberando Stark vestido em seu traje, Parker caindo em piruetas e Visão voando, para recepcionarem o novo inimigo de batalha. Assim que os três pousaram no asfalto, Tony esticou sua mão direita e carregou a arma na palma de sua luva, disparando um tiro contra o ser metálico há alguns metros, para anunciar a chegada de forma incisiva. Porém, poucos danos foram causados à sua estrutura, resumindo-se apenas a marcas de fumaça. Era um equipamento de qualidade, Stark constatou.
-F.R.I.D.A.Y., envie soldados de ferro para a ponte Harvard, imediatamente. - Ele ordenou pelo comunicador, prevendo que precisariam de reforços para proteger a multidão.
Em seguida, o Homem de Ferro colocou-se no ar novamente, disparando diversos tiros enquanto se aproximava voando do brutamonte. Três ou quatro disparos depois, e o robô gigante virou-se para trás de punho fechado, pronto para encontrar a armadura de Stark e lançá-la alguns metros de distância, desordenando seus propulsores de voo.
-Nada educado. - Disse Tony, estabilizando a armadura.
O imenso ser metálico caminhava a passos largos e pesados, pisoteando os carros presos no engarrafamento gerado pelo tumulto, e agitava os braços enormes no ar para atingir os cidadãos que corriam tentando escapar dali. A cena era horrível e desesperadora, e os civis gritavam e corriam aterrorizados. Peter começou a dar pulos ágeis por entre os automóveis, fazendo o possível para alcançar as pessoas com suas teias e impedir que caíssem dentro do rio Charles após os golpes do robô, ou mesmo numa tentativa desesperada de escapar. Stark chegou para ajudá-lo, deixando os civis pendurados nas teias do rapaz que pendiam das bordas da ponte conturbada.
A aeronave dos Vingadores pousara a alguns metros da cena, no primeiro espaço livre de asfalto que encontrou. De lá, os outros quatro heróis saíram em disparada, lutando contra o fluxo da multidão em fuga, para encontrar os companheiros.
Hulk foi o primeiro a chegar para a festa, a passos largos e raivosos. Com um grito de guerra, Banner atingiu o robô com o punho esquerdo, arremessando o saco de metal na fila de carros parados. Apesar do impacto, apenas um amassado surgiu em sua armadura, dando espaço para que o inimigo se levantasse, um pouco irritado. O robô ergueu um dos braços que era equipado com um potente canhão, e disparou em um caminhão de alimentos que estava atravessado na pista, atirando-o bem na direção dos heróis.
Hulk e Visão se prontificaram a ir de encontro com o veículo, parando-o antes que atingisse mais civis. Logo em seguida, do outro lado da pista, Romanoff irrompeu dirigindo um carro forte a toda velocidade. Ela anunciou sua chegada com o som da buzina, e atingiu o robô em cheio no meio do percurso, desestabilizando-o e desequilibrando seus passos.
Eric encontrava-se em cima do veículo, e assim que houve o impacto, ele saltou do teto do carro indo em direção à cabeça do robô com uma cambalhota. O rapaz pousou no capacete, com o braço direito transformado em foice, e começou a usar a arma para atingir o visor da armadura. Apesar dos golpes extremamente fortes, a tela iluminada não sofreu mais que arranhões; alguns segundos depois, o gigante de aço tomou a atitude de tirar Eric dali, arremessando-o com toda a força em cima de um Volkswagen, fazendo uma cratera na lataria. O rapaz ergueu-se momentos depois, mexendo os ombros para trás e para frente, fazendo seus ossos estralarem enquanto algumas costelas quebradas voltavam automaticamente ao lugar.
-Quem está dentro da armadura? - Questionou Thor pelo comunicador. - Ela é pilotada?
-Pilotada pelo capeta, talvez. - Foi o que Eric respondeu ainda um pouco atordoado com a pancada.
Foi a vez de o deus nórdico desferir seu ataque ao enorme robô, chamando trovões que atingiram a pequena antena localizada no topo da cabeça do gigante. Para a surpresa de Thor, a estrutura metálica não entrou em curto circuito, mesmo com toda a descarga de energia que acabara de receber.
-Ok, homem de lata, hora de dormir. - Disse Peter, aproximando-se da zona de conflito com pulos ágeis.
O Homem-Aranha começou a dar voltas ao redor do robô, enrolando nele uma porção de suas teias mais resistentes. Com pulos e cambalhotas, ele realizou a emboscada com agilidade, pronto para derrubar o inimigo gigante. No entanto, assim que suas teias tocavam a superfície metálica da armadura, elas deslizavam e iam direto para o chão, sem aderência alguma.
-Não estão grudando! - Foi só o que ele conseguiu dizer, perplexo, antes de ser atingido.
Em mais um golpe colossal, o robô disparou um de seus canhões na direção de Thor e Aranha, fazendo com que os dois fossem arremessados pelos ares. Peter, um tanto atordoado, conseguiu amenizar o impacto ao abrir as asas acopladas ao seu uniforme, e usou-as para planar de volta até o asfalto; Visão encarregou-se de ajudar o amigo nórdico, que não possuía nenhum acessório alado, e voou até Thor para trazê-lo de volta ao chão em seguida.
-Vou ter que apelar para a ignorância com esse cosplay barato de mim. - Disse Stark com os dentes cerrados, selecionando comandos em seu sistema operacional.
Aquela batalha já tinha durado tempo demais, e era preciso agir de forma mais agressiva pra que acabasse antes de ferir mais pessoas. A porção de soldados de ferro que estavam no local para auxiliar os civis na fuga do campo de batalha se aprumou; pela ordem de Tony no sistema, eles voaram até o gigante de metal e cercaram-no por diferentes direções, acionando seus propulsores à máxima velocidade.
Os soldados tentaram ao máximo não serem atingidos pelos tiros e socos que o robô usava para se defender; quatro foram derrubados pelos golpes de resistência dele, mas os ferrosos eram maioria. Os soldados se uniram e atingiram-no em cheio a toda velocidade, empurrando-o e fazendo-o cair no rio Charles. O impacto movimentou uma grande quantidade de água, o que causou uma onda enorme, atingindo a ponte e chegando a arrastar alguns carros para dentro do rio.
-Se for tripulado, o piloto irá se afogar. - Natasha constatou, enquanto todos os heróis focavam sua atenção na superfície do rio, aguardando o resultado.
Alguns segundos de suspense depois, o robô submerso ergueu-se de dentro d’água. Com propulsores de voo ultrapotentes, ele lançou-se ao céu, causando mais uma série de ondas fortes, e foi rápido demais para que qualquer um dos Vingadores em terra pudesse pará-lo.
-F.R.I.D.A.Y., envie um míssil monitorado na direção daquele homem de lata gigante, agora! - Stark ordenou, e seu sistema atendeu prontamente. Em instantes, uma linha de fogo apareceu cortando o céu, seguindo a direção que fora tomada pelo gigante de aço alguns instantes antes.
Minutos depois, quando nem o míssil ou o robô eram mais visíveis no céu ensolarado, F.R.I.D.A.Y. deu um relatório.
-Sinto muito, Sr. Stark, mas o alvo designado não se encontra mais nos radares e está fora do alcance do GPS. - A voz feminina respondeu, arrancando um suspiro frustrado de seu chefe.
-Envie o míssil para o mar. - Disse Tony por fim, com pesar na voz.
-Entendido.
O laboratório de multimídia no complexo dos Vingadores trabalhava incansavelmente, em cima dos vídeos do combate ocorrido horas antes. E havia muitos deles: imagens de satélites, celulares amadores e redes de televisão, que transmitiam o atentado na ponte para o mundo todo. Depois de acabar, ou ao menos impedir que o ataque do robô gigante continuasse, era hora de deixar os pesquisadores trabalharem: quem era o inimigo, como ele funcionava e por que ele lutou como lutou?
Todas as dezenas de telas dentro daquela sala exibiam imagens de diferentes ângulos, fontes, qualidades e tamanhos, e analisavam meticulosamente a armadura de guerra humanoide que os heróis haviam enfrentado. Físicos, engenheiros e matemáticos faziam cálculos e tiravam conclusões a partir do que viam, e junto a eles, as mentes científicas da equipe também trabalhavam na investigação. Tudo para fornecer aos Vingadores o maior número de informações possível sobre seu mais recente inimigo.
-Como estamos indo na análise do homem de lata indestrutível? - Perguntou Stark, caminhando por entre os computadores pilotados pelos cientistas do laboratório.
-Bom, seus equipamentos são ultramodernos. - Disse uma das pesquisadoras próximas a ele. - Analisamos suas armas, mas não conseguimos encontrar o exato modelo. São semelhantes aos canhões mais atuais do mercado. Tem um poder de fogo devastador, destruiriam a ponte se os Vingadores não tivessem chegado a tempo. Ele possui mais alguns atributos bélicos, como metralhadoras e bombas, que conseguimos localizar espalhadas pelo traje, mas ele não as utilizou no combate. Aquele robô era uma máquina de guerra.
-O grupo C tem alguns resultados. - Parker respondeu, se aproximando com alguns relatórios em um tablet. - Pelos cálculos, a armadura dele deve pesar cerca de cinco toneladas. É bem pesada, mas compensa pela quantidade de armas que tem. O soco do robô corresponde a mais ou menos quatro vezes o peso dele, ao menos na intensidade em que ele usou os braços durante a luta.
-O desgraçado é bem forte. O que mais sabemos? - Tony questionou.
-Não conseguimos encontrar nenhum indício de que a armadura era controlada por alguém que estava dentro dela. - Dr. Banner aproximou-se para complementar o relatório atualizado. - Nenhuma das imagens mostra o que tinha por trás daquele visor de LED. Tudo leva a crer que era inteligência artificial, ou então controlada remotamente.
-Mais algum resultado? - Pronunciou Stark, vasculhando a equipe com o olhar.
-As imagens dos radares espalhados pela pista da ponte nos deram uma estimativa da velocidade com que o robô gigante se movia. - Disse Olivia, retirando da boca um pirulito. - Quando ele saiu de dentro d'água e acelerou para a fuga, chegou a atingir trezentos e trinta quilômetros por hora.
-O desgraçado é forte e rápido, ótimo. Mas o que você faz aqui? - Stark perguntou à garota, que usava um doce para repor seus níveis de energia após a queda no treinamento mais cedo. - Por que não está descansando?
-Me poupe, pai. Só mais alguns desse e estarei novinha em folha. - Ela respondeu tediosamente, atirando o palitinho do pirulito na lixeira.
-Te mandei ficar aqui pra que não fizesse nenhum esforço.
-É, você me deixou aqui, obrigada por me lembrar. - Olivia foi irônica. - Eu fiquei assistindo tudo pela TV, e já que não fui com vocês, decidi ajudar vindo até o laboratório fazer alguns cálculos.
-Meus instintos paternais me dizem que deveria ficar bravo com isso, mas você foi prestativa. Um ponto pra você no quesito "nova vingadora". - Disse o pai, fazendo a garota sorrir orgulhosamente. - Bom, eu não consegui muitos resultados. Estou tentando entender por que as teias do Homem-Aranha não grudaram no robô.
-Andei dando uma olhada nisso também. Acho que o metal que reveste a armadura é antiaderente. - Peter enunciou, olhando para a tela de seu tablet. - Só não sei como ele faz isso. Teoricamente, minhas teias deveriam grudar em qualquer superfície. Nunca encontrei nada que as fizesse escorregar daquele jeito. - Disse intrigado.
-Será que a superfície estava lubrificada? Vejam, o metal tinha um brilho esquisito quando o sol batia nele. - Olivia sugeriu, aproximando uma imagem do gigante em uma das telas de realidade aumentada.
-Não, isso não é lubrificação. É uma característica física, mas não sei que metal tem esse tipo de brilho. - Stark respondeu analisando as imagens com cuidado.
-A armadura mal cedeu aos socos do Hulk também. Não era um metal comum que revestia aquele traje. - Bruce falou recostando-se na bancada. - Era particularmente resistente, de um jeito que eu nunca tinha visto antes.
-O que acham que era? - Peter questionou.
-Pela análise das imagens que fiz com o pessoal de química, deviam haver traços de Adamantium na armadura. - Stark disse pegando os próprios laudos. - É um metal raro e bem resistente. Porém, não era Adamantium puro, pois a cor estava um pouco alterada. Os cientistas apostaram em uma liga metálica, mas não sabem dizer bem o que mais estava misturado naquela superfície.
-Adamantium não é tão indestrutível. Já consegui bater em coisas desse material com os socos do Hulk antes. - Atestou Banner, desconfiado. - Teríamos conseguido danificar mais a armadura se fosse assim.
-Vi que o Thor tentou dar um curto nos sistemas do robô usando raios, mas não conseguiu pifá-lo. - Olivia observou, e então ficou alguns segundos a pensar. - O outro metal deve ter alguma propriedade isolante, que impediu que a descarga elétrica atingisse os sistemas... Já pensaram em Vibranium? É um dos metais que menos conduz energia, e ele também absorve grandes impactos.
-Será? Misturar Vibranium e Adamantium é muito difícil. Na maioria das vezes, um anula o outro e faz com que a liga fique muito fraca. Só deu certo uma vez, com o escudo do Capitão América. - Peter observou com a testa franzida. Ele usou um aplicativo para simular a mistura dos dois elementos em uma das telas, e o resultado fracassado se concretizou.
-Quem sabe não seja só isso. Pode ter mais alguma coisa que ajude a unir os dois metais. - Banner sugeriu. - Um terceiro tipo de metal, que impediria que o Vibranium enfraquecesse o Adamantium e vice-versa. E que fosse igualmente forte, pra deixar a armadura tão impenetrável quanto vimos que ela é.
Os quatro cérebros avançados se aquietaram em seus próprios cálculos e teorias, enquanto mexiam em seus simuladores, coletores de dados e imagens nos tablets individuais. Em todos os casos, aquela teoria poderia ser válida. No entanto, nenhum dos servidores apontava qualquer sugestão do metal que pudesse compor o trio da liga para formar a armadura.
-Não conheço nenhum material que pudesse fazer esse trabalho. - Concluiu Banner, que tinha conhecimento mais vasto nessa área. - Deve ser algo novo, criado em laboratório ou sei lá. Não tem como saber.
-Mas foi uma ótima invenção, independente do que for. Deixou a gente sem reação. - Disse Parker, com uma pontada de tristeza ao se lembrar das próprias teias deslizando pela superfície. - A mistura fez com que nenhum de nós pudesse parar o robô.
-Todas as propriedades resultantes da mistura dos metais nos prejudicaram de alguma forma. Só pode ser proposital. Esse robô foi pensado especialmente pra nós. - Stark ousou constatar, com os olhos semicerrados. - Thor não consegue atingi-lo com raios, o Aranha não consegue amarrá-lo com teias, eu não consigo explodi-lo e o Hulk não o derruba na briga. Tudo meticulosamente calculado.
-Concordo com você, Tony. - Banner se pronunciou, retirando os óculos. - Quem quer que o tenha projetado não pensou o robô para enfrentar só a polícia ou o exército humano. Queria que chegássemos até ele.
-Não acham estranho que a primeira aparição dessa máquina tenha sido justo aqui, em Cambridge? - Olivia questionou com desconfiança. - Na mesma cidade em que fica a sede dos Vingadores.
-Quem fez o homem de lata queria que o enfrentássemos. - Peter concordou.
-E queria que falhássemos. - Stark complementou suas palavras com pesar na voz, enquanto olhava para a tela principal da sala, que estava ligada na BBC News. Lá, uma imagem de helicóptero da ponte destruída e dos carros em chamas se exibia.
A mídia estava toda em cima da equipe. O mundo inteiro falava sobre a ponte Harvard e o robô gigante que parecia ter tirado o melhor dos Vingadores, fazendo seus poderes parecerem inúteis. O número de mortos durante o atentado já passava das centenas, e crescia a cada momento; civis morreram afogados, pisoteados e queimados, enquanto os heróis pareciam ter falhado em salvá-los eficaz e rapidamente. E não adiantava negar, pois estava tudo documentado: a cada segundo, novas imagens do combate feitas por cinegrafistas amadores ou redes de televisão apareciam, mostrando Homem-Aranha e Thor sendo arremessados pelo tiro de canhão ou Stark sendo atingido pelo soco do robô.
Os Vingadores estavam por baixo, de novo. Será que eram capazes de proteger a humanidade mesmo? Como, se não foram páreo para aquele gigante de aço? Será que apenas metade da equipe original dava mesmo conta do recado, sem América e os outros? Pois aquela não era a primeira vez que falhavam; não fazia nem dois meses do dia em que a própria base dos heróis fora invadida por um vilão desconhecido, que inclusive nem havia sido identificado ainda. Aqueles resultados preocupavam a população, e faziam com que as pessoas questionassem até que ponto estavam seguras tendo os Vingadores como seus protetores.
-É tudo um jogo. Esse robô foi feito pra causar mortes, assustar as pessoas e nos desestabilizar. - Tony continuou, ainda observando as imagens da fumaça na ponte pelo telão. - É proposital, pra nos fazer parecer inúteis e fracos. E machucar gente.
-O que mais vão aprontar pra cima de nós? - Bruce questionou, irritado. - Por que com certeza não parou por aqui.
-Não, não parou. Eles vão tentar nos destruir com um passo de cada vez.
-Sr. Stark, você não acha que o que aconteceu na ponte pode ter alguma coisa a ver com o Ervilha-Voadora? - Parker questionou ao homem. - Quero dizer, as duas coisas aconteceram muito próximas uma da outra. Não acha que podem estar interligadas?
-Eu não duvido disso. - Falou McCall, trocando olhares com o rapaz. - Tudo pode estar relacionado. Ele deve estar brincando com a gente, tentando nos ridicularizar pro mundo todo.
-Não sei dizer. - Respondeu Tony. - Parece estranho, mas não sei onde tudo se encaixaria.
-Se aquele cara que nos invadiu é o mesmo que fez esse robô, por que no dia do ataque ele veio sozinho e não mandou seu soldadinho de chumbo pra causar um estrago maior? - Bruce discordou.
-É, tem razão. - Stark ponderou.
-Sei lá, mas isso é suspeito, não acham? - McCall insistiu. - Eu acho que devíamos investigar.
-O governo está investigando o Ervilha, Olivia, lembra-se? - Tony advertiu-a. - Não temos permissão pra interferir nesse caso.
-E desde quando você pede permissão? - A garota questionou com a sobrancelha arqueada.
-Não é essa a questão. Se houver ligação, o FBI vai descobrir. - Ele esclareceu. - Em todo caso, eu vou falar com o Callahan pra que deem uma atenção pra isso. Temos uma equipe aqui dentro que está colaborando com o ritmo das pesquisas.
-Mas, Sr. Stark... - Peter queria intervir, mas foi interrompido.
-Vocês dois, parem de brincar de detetives. Não tem Dona Branca na biblioteca com o castiçal, entenderam? As coisas são bem mais complicadas do que uma simples semelhança. - Tony deu uma dura. - Agora, todos os esforços das nossas equipes vão ficar voltados pra investigar esse robô e as propriedades dele, pra que possamos entendê-lo e criar um plano. Essa não foi a última vez que ele apareceu, com certeza. Nossa inteligência precisa ser usada pra ciência, pois é disso que entendemos. Temos cientistas aqui, não investigadores. O FBI vai cuidar do resto, e eu vou me certificar de que prestem atenção nos detalhes. Deixem as estratégias pros adultos, ok?
-Relaxem, todos sabem o que estão fazendo, inclusive nós. - Banner tentou apaziguar, enquanto Stark atendia um funcionário que se aproximou para falar com ele. - Nós estamos acompanhando o FBI, e agora temos mais coisas pra cuidar. Não vamos deixar que o Ervilha ou que o robô gigante escapem.
-Voltem ao trabalho, crianças. - Tony ordenou, interrompendo brevemente a sua conversa, e retornando a atenção ao subordinado logo em seguida.
Os outros três obedeceram, pegando seus equipamentos e retornando aos devidos grupos de pesquisa; porém, os dois mais jovens permaneceram visivelmente contrariados.
Capítulo 6
Já era tarde da noite, e Parker ainda estava no laboratório de imagens da base, fazendo pesquisas e levantando hipóteses. Aquele robô gigante e sua liga metálica misteriosa realmente despertaram o interesse do garoto. Como todo bom curioso, Peter não estava satisfeito em deixar toda a diversão da investigação para os federais; ele vasculhava as imagens do atentado na ponte Harvard, à procura de alguma pista que pudesse levá-lo a respostas, já que Stark decidira abster os Vingadores dessa função.
-Eu tenho uma ideia – Disse ele, eufórico, ao abrir a porta do dormitório de Olivia McCall naquela noite, sem nem ao menos bater antes.
-O que está fazendo no meu quarto? - Falou a menina que estava deitada na cama com um notebook, franzindo a testa de um jeito nada receptivo.
-Precisava te mostrar. Pesquisei a noite toda. - Peter deu um passo para dentro do quarto, ofegante por ter corrido do laboratório até ali.
-Eu fiz alguma coisa pra você pensar que somos amigos? - Olivia encarou o rapaz por cima da tela com humor, mas ele pareceu não ligar para o comentário.
-Eu descobri uma coisa.
-Que você precisa de roupas mais descoladas? - Ela questionou, arqueando a sobrancelha.
-Não...
-Que você é baixinho demais pra um super-herói? - Olivia continuou a provocá-lo.
-Não. - Ele respondeu, confuso e impaciente.
-Ok, eu desisto. - A garota cedeu, bufando e fechando a tela do computador. - O que é?
-Primeiro, acabei de descobrir que, além de anomalias genéticas, seu pai também te passou a criatividade cínica dele por DNA. - O garoto comentou, e Olivia nem ficou ofendida, pois concordava com ele. - Segundo, descobri uma coisa sobre o gigante de aço. Acho que posso ter uma pista sobre quem é o dono. E, julgando pela sua indignação com as investigações mais cedo, acho que você está tão interessada em saber mais sobre ele quanto eu. Por isso vim até aqui.
O semblante entediado da garota mudou instantaneamente, dando lugar à curiosidade.
-Eu estava pesquisando algumas coisas aqui também, mas não encontrei nada. – Ela revelou, ansiosa por novas informações. - Qual é a sua pista?
-Bom, eu fiquei vasculhando as imagens no laboratório por mais um tempão depois que vocês foram embora – O rapaz disse sentando-se em uma cadeira giratória, e aproximando-a da cama da garota. - Fiquei horas sem achar nada interessante, até que vi algo muito esquisito no vídeo de uma câmera de segurança.
Olivia sentou-se na cama e agarrou uma almofada, atenta. Peter esticou o tablet que segurava para a garota, e ela se aproximou da tela para assistir ao vídeo.
-Encontrei esse cara nas gravações. - Parker explicou, dando zoom em um dos carros que estava parado na ponte durante a luta dos Vingadores contra o robô. Dentro do veículo, havia um homem sentado no banco da frente, parado. - É muito estranho que, no meio de um desastre como aquele, alguém decidisse continuar dentro do carro ignorando todo o perigo, certo? - Ele aproximou mais. - Esse cara ficou sentado aí um tempão, como se nada estivesse acontecendo. Ele só fica olhando fixamente através da janela, observando cada golpe e movimento do robô durante a luta. Por que ele estaria ali? E por que ele não teria medo de o carro dele ser pisoteado ou algo assim? Isso me fez pensar: ele deve saber de alguma coisa.
-Ele só fica sentado o vídeo inteiro? - Liv questionou, franzindo a testa.
-Quando a luta acaba, ele sai. - O garoto explicou, e avançou a gravação até perto do fim. A câmera filmou o exato momento em que o sujeito misterioso abriu a porta do veículo e saiu andando tranquilamente pela ponte destruída, e no canto do vídeo, era possível vê-lo entrar em um carro preto esperando na rua, que dava partida logo em seguida. - Então essa van aparece, e o leva embora dali rapidinho.
-Mas por que esse cara ficaria na ponte o tempo todo? Se ele está envolvido, por que não podia assistir ao desastre do sofá de casa? - Olivia se perguntou.
-Bom, ele precisava estar perto do homem de lata por algum motivo. Não consegui pensar por que, só achei tudo muito esquisito, e foi a única pista que encontrei.
-Acho que sei a razão... - Disse Olivia, colocando a mente pra funcionar. - Eu falei com o Banner antes de encerrarmos hoje, e ele me disse que os especialistas não conseguiram detectar nenhum sinal ou frequência que prove que o robô estava sendo controlado por satélite. - McCall contou. - E também não havia ninguém o controlando por dentro, pois não encontraram nenhum indício de vida ou de calor humano nas imagens. Isso nos fez pensar que talvez estivessem comandando o robô de cima da ponte.
-Esse cara poderia estar comandando os golpes dele de dentro do carro. - Peter supôs.
-Exatamente. - Olivia concordou, e ambos ficaram animados com a descoberta. - Acho que o pegamos.
-Precisamos descobrir quem ele é. - Parker voltou a encarar a imagem congelada, torcendo o lábio. - Eu usei o melhor zoom que encontrei pra conseguir mais nitidez no vídeo da câmera, na esperança de identificar o cara. Só que o rosto ficou muito borrado.
-Não tem problema. Passe a imagem pra mim. - Pediu Olivia, abrindo seu notebook no colo novamente. Peter deslizou o dedo na tela de seu tablet, e em instantes a imagem se transferiu para o computador da menina. - Esse programa é próprio pra fotos sem nitidez. Vamos usar reconhecimento facial nesta carinha criminosa e ver o que conseguimos.
Olivia iniciou um software rapidamente, e escaneou a foto congelada e escura do rosto do suspeito, jogando-o no servidor em busca de uma correspondência. O banco de dados não demorou a dar uma resposta, que indicava um perfil e algumas referências sobre o sujeito.
-Ta-dam. - Disse ela, comemorando a conclusão. Os dois adolescentes se aprumaram para verificar o resultado exibido na tela, curiosos. - Jack O'Brien. - Leu Olivia. - 33 anos, desempregado, estadunidense, já foi preso duas vezes por incitar violência nas redes sociais com um perfil anti-Vingadores. Um prato cheio para terrorismo midiático. - Brincou, observando a página do homem e a lista de dados escrita.
-Parece ser o mesmo cara. Anda quieto, pois não existem notícias dele desde julho do ano passado. - Parker constatou, lendo o relatório.
-Acha que ele é o dono do robô?
-Tem tudo pra ser. Ele estava lá na hora da batalha e, pelo que diz aqui, ele leva uma vida quieta até demais. Isso significa que ele tem alguma coisa pra esconder, como todo bandido tem. - Peter respondeu. - Devíamos mostrar isso pro Sr. Stark e dizer a ele pra investigar.
-Não vai adiantar. Ele vai dizer que é besteira e mandar a gente esquecer isso. - Olivia bufou. - Devíamos cuidar disso por conta própria. - Ela rolou a página do computador para baixo. - Olha só, o Jack tem um endereço no nome dele aqui em Cambridge: Rua Berkeley Odds, 75. Será que ele ainda vive lá? - Perguntou com a sobrancelha arqueada. – Deveríamos lhe fazer uma visita?
-Só tem um jeito de descobrir. Precisamos de qualquer informação que nosso querido Jack possa nos fornecer sobre o homem de lata. - Disse o rapaz. - Podíamos ir lá agora, já que não quer envolver o Sr. Stark. O endereço não é tão longe daqui. - Sugeriu, puxando o mapa do local.
-Uau, no meio da noite? E quebrar as regras assim? - Olivia surpreendeu-se. - Pensei que você fosse certinho.
-Podemos ir amanhã depois da aula, se você quiser. Eu não tenho o quinto período. Assim você não quebra o toque de recolher do seu pai. – Sugeriu Peter, pois sabia que a garota ainda estava sobre supervisão por conta do stalker.
-Não, vamos lá. Um pouco de rebeldia vai fazer bem pra você, Menino-Aranha. - Ela disse, dando uma piscadela. Imediatamente se levantou da cama e foi até a escrivaninha, pegando um casaco que estava jogado ali por cima.
-Não sou eu quem está fugindo dos guarda-costas do pai pra... - Falou o garoto, franzindo a testa e formulando um riso.
-Anda logo, Peter Parker! - Olivia o interrompeu, puxando-o pelo braço para fora do quarto e fechando a porta em seguida.
-
Peter e Olivia saíram do complexo dos heróis driblando alguns dos sistemas de segurança e guardas, que estavam mais preocupados em vigiar quem entrava do que quem saía. Pra evitar serem identificados, pegaram um Uber com destino duas quadras mais longe que o verdadeiro, e foram andando até a Rua Berkeley Odds, número 75. Os dois adolescentes se aproximaram do pequeno prédio de tijolos e ficaram observando o local por alguns minutos, verificando o perímetro.
-Ele mora no primeiro andar pelo que diz o registro. - Disse Olivia, olhando para o celular que tinha a cópia do dossiê do homem salva.
-As luzes estão apagadas. Parece que não tem ninguém em casa. - Peter constatou observando o apartamento, por de atrás da lata de lixo do beco.
-O que você está fazendo? - Questionou a garota, intrigada, ao observar o rapaz encapuzado e escondido, usando a máscara do Homem-Aranha no rosto.
-Estou me disfarçando. - Respondeu ele, como se fosse óbvio. - Somos detetives, não somos? Não podemos ser reconhecidos.
-Tem razão, ninguém aqui conhece o Homem-Aranha. - Olivia ironizou, rolando os olhos.
-É melhor do que verem o Peter Parker. Aqui, tem uma pra você. - Disse o rapaz, tirando da mochila uma touca preta com furos nos olhos parecida com aquelas que bandidos usam em filmes, e entregando para Olivia.
-Eu não vou usar isso! - Ela protestou. - Tira essa porcaria antes que alguém veja você, Sherlock Holmes. Vamos entrar logo.
Discretamente, os dois atravessaram a rua e abriram o pequeno portão de ferro que cercava o prédio, entrando em seguida. Não havia porteiro, e foi fácil destrancar a porta do apartamento 103 com um grampo de cabelo que Olivia tinha. Ela e Peter entraram, fazendo o máximo de esforço para serem silenciosos.
-Vamos procurar por qualquer pista ou prova do crime. Eu fico com aquele lado. - Cochichou Peter, dirigindo-se aos quartos enquanto Olivia ia até a cozinha. - Não se esqueça de não tocar em nada.
Tudo ali era muito desarrumado e esquisito. Havia uma pilha de louças na pia com cerca de um mês de idade, a julgar pelo aspecto da sujeira, e Olivia diria que o apartamento estava abandonado se não houvesse comida nova no pote do gato, que por sua vez descansava confortavelmente no sofá da sala. A garota vasculhava tudo meticulosamente, usando a lanterna do celular, à busca de qualquer indício de crime ali. De repente, ela ouviu a voz de Peter vindo baixinha do outro lado da casa.
-Olivia, encontrei uma coisa. - Disse ele. A moça foi até o quarto, tomando cuidado para não acordar o bichano pelo caminho.
-O que foi? - Perguntou ela, adentrando no cômodo que possuía um cheiro fortíssimo de meia velha. - Eu já falei pra você tirar isso! - Protestou, ao notar que Peter estava usando a máscara do Aranha de novo. Ela puxou-a da cabeça dele, dando uma bufada.
-Ei! Eu estou usando a visão noturna pra poder enxergar as coisas. - Peter protestou, segurando o tecido pelo outro lado pra impedir que escorregasse pelo seu cabelo. - Olha ali. - Ele indicou a escrivaninha.
A garota aproximou-se do móvel entulhado de coisas para observar. Ali, algo semelhante a um protetor auricular ou um comunicador de ouvido estava jogado, e emitia um brilho peculiar quando a luz que vinha da janela aberta batia sobre ele. Em baixo do aparelho, havia um bilhete digitado em papel reciclado.
"Faça o maior número de vítimas que puder. Ponte Harvard, 14h.
Magnum."
-Ele devia mesmo estar controlando o robô. - Disse Peter num sussurro, comemorando o palpite aparentemente correto. - E devia ser com essa coisa.
Aquela era uma pista e tanto, e trazia consigo muitas perguntas. Porém, não seria possível responder a todas elas ali naquela hora, pois a qualquer momento aquele gato gordo do sofá poderia acordar, e Jack logo voltaria para casa.
-Vamos levar isso pro laboratório. - Disse Olivia, esticando a mão até o objeto.
-Não podemos, ele vai dar falta. - Impediu Peter, segurando a mão dela.
-Acredite em mim, ele nem vai perceber que algo sumiu no meio dessa bagunça. - Respondeu ela, encarando a mão do garoto sobre a sua. - E precisamos de mais pistas. Só uma visita indesejada no meio da madrugada não prova muita coisa.
-Tá, vamos logo. - Parker cedeu. - Ele jamais vai saber quem foi que pegou mesmo, a não ser que o gato conte.
Olivia apressou-se em pegar um lenço de dentro do bolso do casaco e colocar o objeto dentro, enrolando-os e guardando de volta logo em seguida. Peter sacou o celular e tirou uma foto do bilhete sob a mesa, e logo os dois saíram do cômodo a passos leves. Atravessaram a sala e chegaram até o corredor do prédio em segurança, e já se viravam para dar o fora dali.
-A porta. - Falou Peter, alarmado, parando no meio do caminho. - Não podemos deixar destrancada.
Olivia encarou a fechadura de metal e esticou uma das mãos na direção dela, girando o dedo indicador para a esquerda. O trinco fez um estalo ao trancar, graças ao movimento.
-Eu devia ter feito isso quando entramos. Perdi um grampo à toa. - Ela rolou os olhos, então os dois correram até o lado de fora e saíram andando na calçada, como se nada tivesse acontecido.
_
-As coisas estão um pouco estagnadas. Provavelmente teremos mais informações em breve. - Disse Banner recostado na bancada do laboratório, respondendo à pergunta de Olivia sobre as investigações do robô.
-Tudo bem. Me avise se precisar de alguma coisa do setor de Inovações - A garota se prontificou, enquanto servia-se de café na máquina expressa. Ela estava checando se os rumos das pesquisas batiam, e procurava mais pistas que ajudassem a investigação paralela. - Não estou tão ocupada hoje.
-Ok, eu chamo você. Provavelmente vou querer usar aquele novo programa de...
A conversa dos dois foi interrompida por uma batida na porta de vidro. Eles viraram-se para encontrar Peter parado do lado de fora, vestindo uma camiseta do Gandalf.
-Com licença, Banner, posso roubar a Olivia um pouco? - Perguntou o rapaz cordialmente, colocando a cabeça para dentro do laboratório.
-É claro. - Concordou o cientista. - Nos falamos depois, garota.
Ele fez um joinha com a mão direita, e Olivia acenou positivamente antes de sair do local.
-Bom dia, Menino-Aranha. - Cumprimentou a moça, dando um gole no café enquanto caminhava pelo corredor. - Gostei da camiseta, não poderia estar mais nerd.
-Com o passar dos anos, comecei a ver isso como um elogio. - Disse ele, andando ao lado dela. - É hora de irmos ver aquela coisa.
-Seu projeto de robótica? - Olivia disse num volume um pouco mais alto que o normal, ao ver que a secretária do seu pai passava por eles com um sorriso simpático. Quando ela se afastou, a garota retornou ao tom baixo. - Ótimo, eu estava mesmo curiosa pra continuar a investigar. Aquele treco de ouvido que achamos ficou na minha cabeça a noite toda.
-Acho que tenho algumas respostas. - Disse Peter, indicando a segunda saída da direita para ela. - Consegui um laboratório pra nós.
Peter e Liv instalaram-se numa sala vazia e equipada, prontos para teorizar sobre as descobertas da noite passada e tentar ligar os pontos. No telão principal, havia imagens do bilhete misterioso e do aparelho roubado para ajudá-los na análise. Os computadores e outros aparelhos do laboratório estavam todos funcionando a favor deles, na tentativa de levantar dados sobre o robô e seu mestre.
-Temos um correio elegante anônimo, um aparelho de surdez e um gato com sobrepeso. - Constatou Olivia, olhando para as pistas. - Como tudo isso nos leva até um robô gigante e a ponte Harvard?
-Bom, quem quer que esteja armando tudo isso quer machucar pessoas e causar pânico. O que está escrito no bilhete prova isso. - Peter respondeu, lendo a frase "faça o maior número de vítimas que puder" na imagem do papel. - Não sabemos o motivo disso, mas sabemos que o nosso amigo Jack está envolvido.
-Não tem explicação melhor pra ele estar lá além de ser o operador do robô. Ele estava comandando os golpes, só não sabemos muito bem como.
-Esse comunicador de ouvido que encontramos é algo importante e está diretamente ligado com o ataque, julgando pelo bilhete. É uma espécie de controle remoto pra comandar o robô, só precisamos entender como funciona. - Peter deu alguns passos em direção a uma máquina. - Eu já dei alguns passos pra isso. Fiz um raio X no comunicador e encontrei detectores de sinapses dentro dele. Significa que quando você coloca essa coisa no ouvido, ela meio que se conecta com o seu cérebro.
- É um ótimo começo. Isso explicaria por que o Jack só ficou sentado no carro o tempo todo. - Olivia teorizou. - Se for o que eu acho, ele não precisava se mover pra controlar o robô, bastava pensar que a armadura o obedecia. Afinal, não tinha nada nas mãos dele que servisse como controle, mas não vimos seu ouvido esquerdo no vídeo. O cara devia estar usando esse negócio e controlando o robô através dele.
-Você pensou o mesmo que eu, Stark: o homem de lata é controlado com a mente. - Disse Parker, e a garota fez uma careta ao ser chamada por aquele sobrenome, o que o fez rir. - Ok, isso é ótimo. Também encontrei outra coisa na análise que deve esclarecer mais coisas. Existe uma espécie de código gravado nesses receptores, como se fosse uma sequência de números e letras.
-Algum palpite do que pode significar? - McCall questionou, olhando para o tal código que Peter colocara no telão. Era uma fileira interminável de algarismos.
-Bom, eu não sei... - Falou Peter, pensativo. - Pode ser um código operacional, uma trava... Mas, com o que temos até agora, parece ser muito fácil controlar o robô. A pessoa que tem inteligência pra projetar uma arma dessas não a deixaria tão simples assim de comandar, porque seria só roubar o comunicador de ouvido e o homem de lata obedeceria a todas as suas ordens. Pra mim é uma senha, só não sei como funciona.
-Olha, eu tenho uma suspeita, mas não dá pra provar – Disse Olivia, entortando o lábio. - Se o controle é cerebral, isso aí pode ser a trava. Assim não daria pra qualquer um comandá-lo como bem entendesse, só colocando o comunicador. Se esse "controle-remoto" funciona com sinapses, talvez só se combine com as ondas cerebrais de uma pessoa específica. Cada ser humano tem seu padrão. Esse código deve servir pra identificar o padrão cerebral do Jack, e receber ordens apenas dele. Seria inteligente, não seria?
-É, bem esperto. - Peter ponderou. - Mas não temos como saber, porque se tentarmos usar, o robô não está aqui pra obedecer e mostrar que estamos certos.
-Exatamente. - Concordou a garota, que já tinha previsto isso.
-Bom, de qualquer forma, a tecnologia que tem nessa belezinha aqui é única. - Falou o garoto, encarando o comunicador que estava dentro de um dos scanners. - Eu nunca vi nada parecido com isso, é tudo muito esquisito. Não parece com nada do que usamos por aqui.
-É uma maluquice tecnológica, isso sim. - Falou Liv. - E, se quer saber, eu acho que deveríamos destruí-lo. Teoricamente, se o controle se foi, não dá mais pra ligar o robô, não é?
-Ah, eles devem ter um de reserva. - Parker não comprou a ideia. - Mas concordo com você. Não duvido que essa coisa tenha um botão de autodestruição ou algum rastreador escondido dentro. Melhor nos livrarmos dele.
Dito isso, o garoto tirou o comunicador de dentro da máquina e colocou em cima da bancada, e em seguida pegou um equipamento do laboratório que se parecia com um martelo. Peter tomou distância para quebrá-lo e, em seguida, acertou o objeto.
-Eu estava com medo disso. - Disse Olivia, mordendo o lábio inferior, assim que viu que o impacto não causou nem mesmo um arranhão no controle-remoto esquisito.
-Pensei nessa possibilidade assim que peguei o martelo – Peter riu, negando com a cabeça. - É claro que eles pensaram nisso.
Olivia devolveu o equipamento para dentro do scanner e teclou algumas coisas pedindo uma análise química do objeto. Em segundos, o aparelho mostrou a composição detalhada.
-Adamantium, Vibranium... é a mesma liga metálica que reveste o robô. - Constatou ela. - Exatamente a mesma liga indestrutível.
-Pensando bem, o comunicador tinha um brilho esquisito quando a luz da rua batia nele lá no apartamento, igual ao brilho do robô. - Peter ligou os fatos. - Que ótimo. O que vamos fazer com essa coisa?
-Bom, não dá pra jogar no lixo ou largar na rua, então... - Disse a garota, erguendo as mãos em sinal de rendição. - Vamos deixar aí e rezar pra que não exploda ou vire um robô espião tipo um Transformer.
-A armadura e o controle são feitos do mesmo material. - Peter falou com os olhos semicerrados, encarando os resultados da análise. - E os dois tem aquele terceiro componente desconhecido.
-Não conseguimos descobrir o que era pelas fotos, mas agora temos uma prova física... Será que não dá pra mandar os scanners analisarem e tentarem descobrir ao menos uma pista do que é esse terceiro componente?
-Até dá, mas isso vai demorar semanas. - Falou o garoto, pensando nas possibilidades. - O scanner trabalha com um banco de dados dos elementos que já existem. Esse não tem registro, então vamos ter que criar um registro novo, basicamente. Vão ser necessários vários testes.
-Enquanto o robô não aparecer pra pisotear pessoas outra vez, temos tempo.
-É, mas nós sumimos com o comunicador. O cara já deve ter percebido a essa hora. - Alertou o rapaz. - Agora o nosso inimigo já sabe que chegamos perto dele.
-Parker, eu não sei quanto a você, mas... - Liv arqueou as sobrancelhas. - Não acho que o Jack é o cara que precisamos. Quero dizer, você viu a casa dele? Alguém com tanta inteligência e grana pra construir o homem de lata não vive daquele jeito, todo desorganizado. Tem mais alguém por trás disso.
-Esse lance do robô é maior do que a gente pensava. - Peter falou, coçando o queixo. - Não acho que seja coisa de alguém que trabalha sozinho. Jack O'Brien era só um capanga, sim. O verdadeiro vilão - Disse, usando uma caneta virtual para circular a assinatura do bilhete no telão. - É esse cara aqui. O tal Magnum.
-É, e ele tem um apelidinho. O que significa que não quer ser reconhecido pelo nome real dele. - Falou Olivia, desconfiada. - Conheço muito esses disfarces. Será que os subordinados sabem quem ele é, ou só conhecem o pseudônimo?
-Tem certeza de que isso é uma identidade secreta? Eu achei um nome legal pra um filho: "Magnum". - Falou Peter com as sobrancelhas erguidas, fazendo um comentário de descontração, e levou um tapa no ombro vindo da parceira.
-Não faço ideia, mas minha cabeça já está cansada. Anda logo, Menino-Aranha, vamos almoçar. - Ela chamou, pegando seu crachá de cima da mesa e virando-se na direção da porta.
Parker estava prestes a segui-la, mas quando foi desligar os aparelhos, notou uma coisa curiosa no telão, que o fez encarar a imagem exibida por alguns instantes.
-O que você tá fazendo, garoto? - Olivia perguntou confusa, estranhando a posição do rapaz, que estava parado com a cabeça torta para a esquerda.
-Olha isso. - Disse ele, sério. - Na assinatura do chefão, a letra M. - Indicou, e ela prestou atenção. - É bem maior que todas as outras da mensagem. E não vamos esquecer que esse bilhete foi digitado, então não tem caligrafia de ninguém.
-Tem razão, está em destaque. Será que ele se acha "Magnífico"? - Perguntou ela, observando que a letra era pelo menos três vezes maior que as outras do bilhete. - Ou "Muito especial"?
Peter não respondeu, apenas correu até um dos computadores com o semblante pensativo. Com alguns cliques rápidos, ele exibiu na tela uma foto do dia do ataque à base dos heróis, e aproximou a imagem no invasor, carinhosamente apelidado de Ervilha-Voadora. Focou a exibição em seu uniforme, e então colocou lado a lado com a imagem do bilhete.
-Eu posso estar louco, mas... - Falou Peter, incerto. - Esse W do uniforme do Ervilha pode ser...
-Um M invertido. - Os dois falaram juntos.
-Você está um pouco louco sim, mas é possível. - Disse Olivia, ficando na mesma posição que Peter estava, com a cabeça torta para enxergar a letra ao contrário.
Os dois jovens ficaram alguns segundos em silêncio, sem compartilhar mais ideias.
-Vamos mesmo fazer isso? - Perguntou Parker. - Tipo, investigar sozinhos?
-Acho que não dá pra convidar o Hercule Poirot pra se juntar ao time, então... - Liv deu de ombros.
-Não é isso - Peter rendeu-se ao riso. - Será que não deveríamos contar pra alguém sobre o que descobrimos? Tipo seu pai, por exemplo? Porque temos provas, e quem sabe ele...
-Não, você está louco? - Olivia o interrompeu, indignada. - Ele vai matar a gente se descobrir que estamos vasculhando pistas sem ele saber. Mesmo que estejamos no caminho certo, nossa investigação é meio ilegal, e meu pai está estranhamente correto com as regras ultimamente. Ele vai mandar a gente não se preocupar, vai entregar tudo pro FBI e ainda vamos perder pontos com a equipe por não seguirmos as ordens.
-Mas não podemos guardar isso só pra nós, Olivia – Discordou o Aranha. – Tem vidas em perigo.
-Eu sei disso, mas temos que fazer do jeito certo. Vamos ser muito mais rápidos se agirmos sozinhos, e só podemos contar quando tivermos certeza, do contrário ninguém vai nos ouvir. - McCall insistiu. - Eu quero descobrir quem é esse cara. Seja lá quem for esse maluco do Magnum, ele está machucando pessoas inocentes por alguma razão, e não importa qual for, é a errada. E nós temos que pará-lo, pois esse é o nosso trabalho. Somos os Vingadores, e vamos vingar e proteger as pessoas que sofreram ou ainda podem sofrer com isso.
A conversa dos dois adolescentes foi interrompida pela porta do laboratório abrindo. Peter apressou-se para desligar todos os equipamentos de projeção, ocultando qualquer prova do delito dos dois, bem a tempo de Stark entrar pela fresta entreaberta.
-Oi, crianças. Estão brincando de Alquimia? - Disse ele, com um bom humor estranho. Os dois permaneceram quietos. - Vocês são os membros juniores da equipe, mas pensei que iriam querer participar da reunião que teremos agora com o Conselho da ONU. Parece que eles têm novidades pra nós. Espero vocês na sala de conferências em cinco minutos para o relatório completo. - Falou Tony, e saiu dali tão rápido quanto apareceu.
Os dois jovens obedeceram, e foram até a sala indicada imediatamente. Lá, todos os outros membros da equipe já estavam reunidos esperando pela videoconferência que seria realizada com o embaixador Callahan, para trazer a tal novidade.
-Boa tarde, Vingadores! - Disse o homem engravatado que apareceu no vídeo, com satisfação na voz. - Venho trazer a vocês as ótimas notícias que acabei de receber: o FBI identificou e prendeu nesta manhã o sujeito que realizou a invasão ao complexo dos heróis no mês passado. E, como vocês previram nas investigações conjuntas, ele estava mesmo conectado ao atentado com o robô gigante na ponte Harvard. Segundo nossas pistas, os dois criminosos eram, na verdade, a mesma pessoa.
Todos comemoraram a notícia. Era um alívio e uma vitória finalmente ter o culpado por toda aquela insegurança e desconfiança atrás das grades. Em meio às celebrações, Olivia e Peter se entreolharam, pensando no que acabaram de ouvir. Estavam confusos e muito, muito curiosos.
-Eu tenho uma ideia – Disse ele, eufórico, ao abrir a porta do dormitório de Olivia McCall naquela noite, sem nem ao menos bater antes.
-O que está fazendo no meu quarto? - Falou a menina que estava deitada na cama com um notebook, franzindo a testa de um jeito nada receptivo.
-Precisava te mostrar. Pesquisei a noite toda. - Peter deu um passo para dentro do quarto, ofegante por ter corrido do laboratório até ali.
-Eu fiz alguma coisa pra você pensar que somos amigos? - Olivia encarou o rapaz por cima da tela com humor, mas ele pareceu não ligar para o comentário.
-Eu descobri uma coisa.
-Que você precisa de roupas mais descoladas? - Ela questionou, arqueando a sobrancelha.
-Não...
-Que você é baixinho demais pra um super-herói? - Olivia continuou a provocá-lo.
-Não. - Ele respondeu, confuso e impaciente.
-Ok, eu desisto. - A garota cedeu, bufando e fechando a tela do computador. - O que é?
-Primeiro, acabei de descobrir que, além de anomalias genéticas, seu pai também te passou a criatividade cínica dele por DNA. - O garoto comentou, e Olivia nem ficou ofendida, pois concordava com ele. - Segundo, descobri uma coisa sobre o gigante de aço. Acho que posso ter uma pista sobre quem é o dono. E, julgando pela sua indignação com as investigações mais cedo, acho que você está tão interessada em saber mais sobre ele quanto eu. Por isso vim até aqui.
O semblante entediado da garota mudou instantaneamente, dando lugar à curiosidade.
-Eu estava pesquisando algumas coisas aqui também, mas não encontrei nada. – Ela revelou, ansiosa por novas informações. - Qual é a sua pista?
-Bom, eu fiquei vasculhando as imagens no laboratório por mais um tempão depois que vocês foram embora – O rapaz disse sentando-se em uma cadeira giratória, e aproximando-a da cama da garota. - Fiquei horas sem achar nada interessante, até que vi algo muito esquisito no vídeo de uma câmera de segurança.
Olivia sentou-se na cama e agarrou uma almofada, atenta. Peter esticou o tablet que segurava para a garota, e ela se aproximou da tela para assistir ao vídeo.
-Encontrei esse cara nas gravações. - Parker explicou, dando zoom em um dos carros que estava parado na ponte durante a luta dos Vingadores contra o robô. Dentro do veículo, havia um homem sentado no banco da frente, parado. - É muito estranho que, no meio de um desastre como aquele, alguém decidisse continuar dentro do carro ignorando todo o perigo, certo? - Ele aproximou mais. - Esse cara ficou sentado aí um tempão, como se nada estivesse acontecendo. Ele só fica olhando fixamente através da janela, observando cada golpe e movimento do robô durante a luta. Por que ele estaria ali? E por que ele não teria medo de o carro dele ser pisoteado ou algo assim? Isso me fez pensar: ele deve saber de alguma coisa.
-Ele só fica sentado o vídeo inteiro? - Liv questionou, franzindo a testa.
-Quando a luta acaba, ele sai. - O garoto explicou, e avançou a gravação até perto do fim. A câmera filmou o exato momento em que o sujeito misterioso abriu a porta do veículo e saiu andando tranquilamente pela ponte destruída, e no canto do vídeo, era possível vê-lo entrar em um carro preto esperando na rua, que dava partida logo em seguida. - Então essa van aparece, e o leva embora dali rapidinho.
-Mas por que esse cara ficaria na ponte o tempo todo? Se ele está envolvido, por que não podia assistir ao desastre do sofá de casa? - Olivia se perguntou.
-Bom, ele precisava estar perto do homem de lata por algum motivo. Não consegui pensar por que, só achei tudo muito esquisito, e foi a única pista que encontrei.
-Acho que sei a razão... - Disse Olivia, colocando a mente pra funcionar. - Eu falei com o Banner antes de encerrarmos hoje, e ele me disse que os especialistas não conseguiram detectar nenhum sinal ou frequência que prove que o robô estava sendo controlado por satélite. - McCall contou. - E também não havia ninguém o controlando por dentro, pois não encontraram nenhum indício de vida ou de calor humano nas imagens. Isso nos fez pensar que talvez estivessem comandando o robô de cima da ponte.
-Esse cara poderia estar comandando os golpes dele de dentro do carro. - Peter supôs.
-Exatamente. - Olivia concordou, e ambos ficaram animados com a descoberta. - Acho que o pegamos.
-Precisamos descobrir quem ele é. - Parker voltou a encarar a imagem congelada, torcendo o lábio. - Eu usei o melhor zoom que encontrei pra conseguir mais nitidez no vídeo da câmera, na esperança de identificar o cara. Só que o rosto ficou muito borrado.
-Não tem problema. Passe a imagem pra mim. - Pediu Olivia, abrindo seu notebook no colo novamente. Peter deslizou o dedo na tela de seu tablet, e em instantes a imagem se transferiu para o computador da menina. - Esse programa é próprio pra fotos sem nitidez. Vamos usar reconhecimento facial nesta carinha criminosa e ver o que conseguimos.
Olivia iniciou um software rapidamente, e escaneou a foto congelada e escura do rosto do suspeito, jogando-o no servidor em busca de uma correspondência. O banco de dados não demorou a dar uma resposta, que indicava um perfil e algumas referências sobre o sujeito.
-Ta-dam. - Disse ela, comemorando a conclusão. Os dois adolescentes se aprumaram para verificar o resultado exibido na tela, curiosos. - Jack O'Brien. - Leu Olivia. - 33 anos, desempregado, estadunidense, já foi preso duas vezes por incitar violência nas redes sociais com um perfil anti-Vingadores. Um prato cheio para terrorismo midiático. - Brincou, observando a página do homem e a lista de dados escrita.
-Parece ser o mesmo cara. Anda quieto, pois não existem notícias dele desde julho do ano passado. - Parker constatou, lendo o relatório.
-Acha que ele é o dono do robô?
-Tem tudo pra ser. Ele estava lá na hora da batalha e, pelo que diz aqui, ele leva uma vida quieta até demais. Isso significa que ele tem alguma coisa pra esconder, como todo bandido tem. - Peter respondeu. - Devíamos mostrar isso pro Sr. Stark e dizer a ele pra investigar.
-Não vai adiantar. Ele vai dizer que é besteira e mandar a gente esquecer isso. - Olivia bufou. - Devíamos cuidar disso por conta própria. - Ela rolou a página do computador para baixo. - Olha só, o Jack tem um endereço no nome dele aqui em Cambridge: Rua Berkeley Odds, 75. Será que ele ainda vive lá? - Perguntou com a sobrancelha arqueada. – Deveríamos lhe fazer uma visita?
-Só tem um jeito de descobrir. Precisamos de qualquer informação que nosso querido Jack possa nos fornecer sobre o homem de lata. - Disse o rapaz. - Podíamos ir lá agora, já que não quer envolver o Sr. Stark. O endereço não é tão longe daqui. - Sugeriu, puxando o mapa do local.
-Uau, no meio da noite? E quebrar as regras assim? - Olivia surpreendeu-se. - Pensei que você fosse certinho.
-Podemos ir amanhã depois da aula, se você quiser. Eu não tenho o quinto período. Assim você não quebra o toque de recolher do seu pai. – Sugeriu Peter, pois sabia que a garota ainda estava sobre supervisão por conta do stalker.
-Não, vamos lá. Um pouco de rebeldia vai fazer bem pra você, Menino-Aranha. - Ela disse, dando uma piscadela. Imediatamente se levantou da cama e foi até a escrivaninha, pegando um casaco que estava jogado ali por cima.
-Não sou eu quem está fugindo dos guarda-costas do pai pra... - Falou o garoto, franzindo a testa e formulando um riso.
-Anda logo, Peter Parker! - Olivia o interrompeu, puxando-o pelo braço para fora do quarto e fechando a porta em seguida.
Peter e Olivia saíram do complexo dos heróis driblando alguns dos sistemas de segurança e guardas, que estavam mais preocupados em vigiar quem entrava do que quem saía. Pra evitar serem identificados, pegaram um Uber com destino duas quadras mais longe que o verdadeiro, e foram andando até a Rua Berkeley Odds, número 75. Os dois adolescentes se aproximaram do pequeno prédio de tijolos e ficaram observando o local por alguns minutos, verificando o perímetro.
-Ele mora no primeiro andar pelo que diz o registro. - Disse Olivia, olhando para o celular que tinha a cópia do dossiê do homem salva.
-As luzes estão apagadas. Parece que não tem ninguém em casa. - Peter constatou observando o apartamento, por de atrás da lata de lixo do beco.
-O que você está fazendo? - Questionou a garota, intrigada, ao observar o rapaz encapuzado e escondido, usando a máscara do Homem-Aranha no rosto.
-Estou me disfarçando. - Respondeu ele, como se fosse óbvio. - Somos detetives, não somos? Não podemos ser reconhecidos.
-Tem razão, ninguém aqui conhece o Homem-Aranha. - Olivia ironizou, rolando os olhos.
-É melhor do que verem o Peter Parker. Aqui, tem uma pra você. - Disse o rapaz, tirando da mochila uma touca preta com furos nos olhos parecida com aquelas que bandidos usam em filmes, e entregando para Olivia.
-Eu não vou usar isso! - Ela protestou. - Tira essa porcaria antes que alguém veja você, Sherlock Holmes. Vamos entrar logo.
Discretamente, os dois atravessaram a rua e abriram o pequeno portão de ferro que cercava o prédio, entrando em seguida. Não havia porteiro, e foi fácil destrancar a porta do apartamento 103 com um grampo de cabelo que Olivia tinha. Ela e Peter entraram, fazendo o máximo de esforço para serem silenciosos.
-Vamos procurar por qualquer pista ou prova do crime. Eu fico com aquele lado. - Cochichou Peter, dirigindo-se aos quartos enquanto Olivia ia até a cozinha. - Não se esqueça de não tocar em nada.
Tudo ali era muito desarrumado e esquisito. Havia uma pilha de louças na pia com cerca de um mês de idade, a julgar pelo aspecto da sujeira, e Olivia diria que o apartamento estava abandonado se não houvesse comida nova no pote do gato, que por sua vez descansava confortavelmente no sofá da sala. A garota vasculhava tudo meticulosamente, usando a lanterna do celular, à busca de qualquer indício de crime ali. De repente, ela ouviu a voz de Peter vindo baixinha do outro lado da casa.
-Olivia, encontrei uma coisa. - Disse ele. A moça foi até o quarto, tomando cuidado para não acordar o bichano pelo caminho.
-O que foi? - Perguntou ela, adentrando no cômodo que possuía um cheiro fortíssimo de meia velha. - Eu já falei pra você tirar isso! - Protestou, ao notar que Peter estava usando a máscara do Aranha de novo. Ela puxou-a da cabeça dele, dando uma bufada.
-Ei! Eu estou usando a visão noturna pra poder enxergar as coisas. - Peter protestou, segurando o tecido pelo outro lado pra impedir que escorregasse pelo seu cabelo. - Olha ali. - Ele indicou a escrivaninha.
A garota aproximou-se do móvel entulhado de coisas para observar. Ali, algo semelhante a um protetor auricular ou um comunicador de ouvido estava jogado, e emitia um brilho peculiar quando a luz que vinha da janela aberta batia sobre ele. Em baixo do aparelho, havia um bilhete digitado em papel reciclado.
Magnum."
-Ele devia mesmo estar controlando o robô. - Disse Peter num sussurro, comemorando o palpite aparentemente correto. - E devia ser com essa coisa.
Aquela era uma pista e tanto, e trazia consigo muitas perguntas. Porém, não seria possível responder a todas elas ali naquela hora, pois a qualquer momento aquele gato gordo do sofá poderia acordar, e Jack logo voltaria para casa.
-Vamos levar isso pro laboratório. - Disse Olivia, esticando a mão até o objeto.
-Não podemos, ele vai dar falta. - Impediu Peter, segurando a mão dela.
-Acredite em mim, ele nem vai perceber que algo sumiu no meio dessa bagunça. - Respondeu ela, encarando a mão do garoto sobre a sua. - E precisamos de mais pistas. Só uma visita indesejada no meio da madrugada não prova muita coisa.
-Tá, vamos logo. - Parker cedeu. - Ele jamais vai saber quem foi que pegou mesmo, a não ser que o gato conte.
Olivia apressou-se em pegar um lenço de dentro do bolso do casaco e colocar o objeto dentro, enrolando-os e guardando de volta logo em seguida. Peter sacou o celular e tirou uma foto do bilhete sob a mesa, e logo os dois saíram do cômodo a passos leves. Atravessaram a sala e chegaram até o corredor do prédio em segurança, e já se viravam para dar o fora dali.
-A porta. - Falou Peter, alarmado, parando no meio do caminho. - Não podemos deixar destrancada.
Olivia encarou a fechadura de metal e esticou uma das mãos na direção dela, girando o dedo indicador para a esquerda. O trinco fez um estalo ao trancar, graças ao movimento.
-Eu devia ter feito isso quando entramos. Perdi um grampo à toa. - Ela rolou os olhos, então os dois correram até o lado de fora e saíram andando na calçada, como se nada tivesse acontecido.
-As coisas estão um pouco estagnadas. Provavelmente teremos mais informações em breve. - Disse Banner recostado na bancada do laboratório, respondendo à pergunta de Olivia sobre as investigações do robô.
-Tudo bem. Me avise se precisar de alguma coisa do setor de Inovações - A garota se prontificou, enquanto servia-se de café na máquina expressa. Ela estava checando se os rumos das pesquisas batiam, e procurava mais pistas que ajudassem a investigação paralela. - Não estou tão ocupada hoje.
-Ok, eu chamo você. Provavelmente vou querer usar aquele novo programa de...
A conversa dos dois foi interrompida por uma batida na porta de vidro. Eles viraram-se para encontrar Peter parado do lado de fora, vestindo uma camiseta do Gandalf.
-Com licença, Banner, posso roubar a Olivia um pouco? - Perguntou o rapaz cordialmente, colocando a cabeça para dentro do laboratório.
-É claro. - Concordou o cientista. - Nos falamos depois, garota.
Ele fez um joinha com a mão direita, e Olivia acenou positivamente antes de sair do local.
-Bom dia, Menino-Aranha. - Cumprimentou a moça, dando um gole no café enquanto caminhava pelo corredor. - Gostei da camiseta, não poderia estar mais nerd.
-Com o passar dos anos, comecei a ver isso como um elogio. - Disse ele, andando ao lado dela. - É hora de irmos ver aquela coisa.
-Seu projeto de robótica? - Olivia disse num volume um pouco mais alto que o normal, ao ver que a secretária do seu pai passava por eles com um sorriso simpático. Quando ela se afastou, a garota retornou ao tom baixo. - Ótimo, eu estava mesmo curiosa pra continuar a investigar. Aquele treco de ouvido que achamos ficou na minha cabeça a noite toda.
-Acho que tenho algumas respostas. - Disse Peter, indicando a segunda saída da direita para ela. - Consegui um laboratório pra nós.
Peter e Liv instalaram-se numa sala vazia e equipada, prontos para teorizar sobre as descobertas da noite passada e tentar ligar os pontos. No telão principal, havia imagens do bilhete misterioso e do aparelho roubado para ajudá-los na análise. Os computadores e outros aparelhos do laboratório estavam todos funcionando a favor deles, na tentativa de levantar dados sobre o robô e seu mestre.
-Temos um correio elegante anônimo, um aparelho de surdez e um gato com sobrepeso. - Constatou Olivia, olhando para as pistas. - Como tudo isso nos leva até um robô gigante e a ponte Harvard?
-Bom, quem quer que esteja armando tudo isso quer machucar pessoas e causar pânico. O que está escrito no bilhete prova isso. - Peter respondeu, lendo a frase "faça o maior número de vítimas que puder" na imagem do papel. - Não sabemos o motivo disso, mas sabemos que o nosso amigo Jack está envolvido.
-Não tem explicação melhor pra ele estar lá além de ser o operador do robô. Ele estava comandando os golpes, só não sabemos muito bem como.
-Esse comunicador de ouvido que encontramos é algo importante e está diretamente ligado com o ataque, julgando pelo bilhete. É uma espécie de controle remoto pra comandar o robô, só precisamos entender como funciona. - Peter deu alguns passos em direção a uma máquina. - Eu já dei alguns passos pra isso. Fiz um raio X no comunicador e encontrei detectores de sinapses dentro dele. Significa que quando você coloca essa coisa no ouvido, ela meio que se conecta com o seu cérebro.
- É um ótimo começo. Isso explicaria por que o Jack só ficou sentado no carro o tempo todo. - Olivia teorizou. - Se for o que eu acho, ele não precisava se mover pra controlar o robô, bastava pensar que a armadura o obedecia. Afinal, não tinha nada nas mãos dele que servisse como controle, mas não vimos seu ouvido esquerdo no vídeo. O cara devia estar usando esse negócio e controlando o robô através dele.
-Você pensou o mesmo que eu, Stark: o homem de lata é controlado com a mente. - Disse Parker, e a garota fez uma careta ao ser chamada por aquele sobrenome, o que o fez rir. - Ok, isso é ótimo. Também encontrei outra coisa na análise que deve esclarecer mais coisas. Existe uma espécie de código gravado nesses receptores, como se fosse uma sequência de números e letras.
-Algum palpite do que pode significar? - McCall questionou, olhando para o tal código que Peter colocara no telão. Era uma fileira interminável de algarismos.
-Bom, eu não sei... - Falou Peter, pensativo. - Pode ser um código operacional, uma trava... Mas, com o que temos até agora, parece ser muito fácil controlar o robô. A pessoa que tem inteligência pra projetar uma arma dessas não a deixaria tão simples assim de comandar, porque seria só roubar o comunicador de ouvido e o homem de lata obedeceria a todas as suas ordens. Pra mim é uma senha, só não sei como funciona.
-Olha, eu tenho uma suspeita, mas não dá pra provar – Disse Olivia, entortando o lábio. - Se o controle é cerebral, isso aí pode ser a trava. Assim não daria pra qualquer um comandá-lo como bem entendesse, só colocando o comunicador. Se esse "controle-remoto" funciona com sinapses, talvez só se combine com as ondas cerebrais de uma pessoa específica. Cada ser humano tem seu padrão. Esse código deve servir pra identificar o padrão cerebral do Jack, e receber ordens apenas dele. Seria inteligente, não seria?
-É, bem esperto. - Peter ponderou. - Mas não temos como saber, porque se tentarmos usar, o robô não está aqui pra obedecer e mostrar que estamos certos.
-Exatamente. - Concordou a garota, que já tinha previsto isso.
-Bom, de qualquer forma, a tecnologia que tem nessa belezinha aqui é única. - Falou o garoto, encarando o comunicador que estava dentro de um dos scanners. - Eu nunca vi nada parecido com isso, é tudo muito esquisito. Não parece com nada do que usamos por aqui.
-É uma maluquice tecnológica, isso sim. - Falou Liv. - E, se quer saber, eu acho que deveríamos destruí-lo. Teoricamente, se o controle se foi, não dá mais pra ligar o robô, não é?
-Ah, eles devem ter um de reserva. - Parker não comprou a ideia. - Mas concordo com você. Não duvido que essa coisa tenha um botão de autodestruição ou algum rastreador escondido dentro. Melhor nos livrarmos dele.
Dito isso, o garoto tirou o comunicador de dentro da máquina e colocou em cima da bancada, e em seguida pegou um equipamento do laboratório que se parecia com um martelo. Peter tomou distância para quebrá-lo e, em seguida, acertou o objeto.
-Eu estava com medo disso. - Disse Olivia, mordendo o lábio inferior, assim que viu que o impacto não causou nem mesmo um arranhão no controle-remoto esquisito.
-Pensei nessa possibilidade assim que peguei o martelo – Peter riu, negando com a cabeça. - É claro que eles pensaram nisso.
Olivia devolveu o equipamento para dentro do scanner e teclou algumas coisas pedindo uma análise química do objeto. Em segundos, o aparelho mostrou a composição detalhada.
-Adamantium, Vibranium... é a mesma liga metálica que reveste o robô. - Constatou ela. - Exatamente a mesma liga indestrutível.
-Pensando bem, o comunicador tinha um brilho esquisito quando a luz da rua batia nele lá no apartamento, igual ao brilho do robô. - Peter ligou os fatos. - Que ótimo. O que vamos fazer com essa coisa?
-Bom, não dá pra jogar no lixo ou largar na rua, então... - Disse a garota, erguendo as mãos em sinal de rendição. - Vamos deixar aí e rezar pra que não exploda ou vire um robô espião tipo um Transformer.
-A armadura e o controle são feitos do mesmo material. - Peter falou com os olhos semicerrados, encarando os resultados da análise. - E os dois tem aquele terceiro componente desconhecido.
-Não conseguimos descobrir o que era pelas fotos, mas agora temos uma prova física... Será que não dá pra mandar os scanners analisarem e tentarem descobrir ao menos uma pista do que é esse terceiro componente?
-Até dá, mas isso vai demorar semanas. - Falou o garoto, pensando nas possibilidades. - O scanner trabalha com um banco de dados dos elementos que já existem. Esse não tem registro, então vamos ter que criar um registro novo, basicamente. Vão ser necessários vários testes.
-Enquanto o robô não aparecer pra pisotear pessoas outra vez, temos tempo.
-É, mas nós sumimos com o comunicador. O cara já deve ter percebido a essa hora. - Alertou o rapaz. - Agora o nosso inimigo já sabe que chegamos perto dele.
-Parker, eu não sei quanto a você, mas... - Liv arqueou as sobrancelhas. - Não acho que o Jack é o cara que precisamos. Quero dizer, você viu a casa dele? Alguém com tanta inteligência e grana pra construir o homem de lata não vive daquele jeito, todo desorganizado. Tem mais alguém por trás disso.
-Esse lance do robô é maior do que a gente pensava. - Peter falou, coçando o queixo. - Não acho que seja coisa de alguém que trabalha sozinho. Jack O'Brien era só um capanga, sim. O verdadeiro vilão - Disse, usando uma caneta virtual para circular a assinatura do bilhete no telão. - É esse cara aqui. O tal Magnum.
-É, e ele tem um apelidinho. O que significa que não quer ser reconhecido pelo nome real dele. - Falou Olivia, desconfiada. - Conheço muito esses disfarces. Será que os subordinados sabem quem ele é, ou só conhecem o pseudônimo?
-Tem certeza de que isso é uma identidade secreta? Eu achei um nome legal pra um filho: "Magnum". - Falou Peter com as sobrancelhas erguidas, fazendo um comentário de descontração, e levou um tapa no ombro vindo da parceira.
-Não faço ideia, mas minha cabeça já está cansada. Anda logo, Menino-Aranha, vamos almoçar. - Ela chamou, pegando seu crachá de cima da mesa e virando-se na direção da porta.
Parker estava prestes a segui-la, mas quando foi desligar os aparelhos, notou uma coisa curiosa no telão, que o fez encarar a imagem exibida por alguns instantes.
-O que você tá fazendo, garoto? - Olivia perguntou confusa, estranhando a posição do rapaz, que estava parado com a cabeça torta para a esquerda.
-Olha isso. - Disse ele, sério. - Na assinatura do chefão, a letra M. - Indicou, e ela prestou atenção. - É bem maior que todas as outras da mensagem. E não vamos esquecer que esse bilhete foi digitado, então não tem caligrafia de ninguém.
-Tem razão, está em destaque. Será que ele se acha "Magnífico"? - Perguntou ela, observando que a letra era pelo menos três vezes maior que as outras do bilhete. - Ou "Muito especial"?
Peter não respondeu, apenas correu até um dos computadores com o semblante pensativo. Com alguns cliques rápidos, ele exibiu na tela uma foto do dia do ataque à base dos heróis, e aproximou a imagem no invasor, carinhosamente apelidado de Ervilha-Voadora. Focou a exibição em seu uniforme, e então colocou lado a lado com a imagem do bilhete.
-Eu posso estar louco, mas... - Falou Peter, incerto. - Esse W do uniforme do Ervilha pode ser...
-Um M invertido. - Os dois falaram juntos.
-Você está um pouco louco sim, mas é possível. - Disse Olivia, ficando na mesma posição que Peter estava, com a cabeça torta para enxergar a letra ao contrário.
Os dois jovens ficaram alguns segundos em silêncio, sem compartilhar mais ideias.
-Vamos mesmo fazer isso? - Perguntou Parker. - Tipo, investigar sozinhos?
-Acho que não dá pra convidar o Hercule Poirot pra se juntar ao time, então... - Liv deu de ombros.
-Não é isso - Peter rendeu-se ao riso. - Será que não deveríamos contar pra alguém sobre o que descobrimos? Tipo seu pai, por exemplo? Porque temos provas, e quem sabe ele...
-Não, você está louco? - Olivia o interrompeu, indignada. - Ele vai matar a gente se descobrir que estamos vasculhando pistas sem ele saber. Mesmo que estejamos no caminho certo, nossa investigação é meio ilegal, e meu pai está estranhamente correto com as regras ultimamente. Ele vai mandar a gente não se preocupar, vai entregar tudo pro FBI e ainda vamos perder pontos com a equipe por não seguirmos as ordens.
-Mas não podemos guardar isso só pra nós, Olivia – Discordou o Aranha. – Tem vidas em perigo.
-Eu sei disso, mas temos que fazer do jeito certo. Vamos ser muito mais rápidos se agirmos sozinhos, e só podemos contar quando tivermos certeza, do contrário ninguém vai nos ouvir. - McCall insistiu. - Eu quero descobrir quem é esse cara. Seja lá quem for esse maluco do Magnum, ele está machucando pessoas inocentes por alguma razão, e não importa qual for, é a errada. E nós temos que pará-lo, pois esse é o nosso trabalho. Somos os Vingadores, e vamos vingar e proteger as pessoas que sofreram ou ainda podem sofrer com isso.
A conversa dos dois adolescentes foi interrompida pela porta do laboratório abrindo. Peter apressou-se para desligar todos os equipamentos de projeção, ocultando qualquer prova do delito dos dois, bem a tempo de Stark entrar pela fresta entreaberta.
-Oi, crianças. Estão brincando de Alquimia? - Disse ele, com um bom humor estranho. Os dois permaneceram quietos. - Vocês são os membros juniores da equipe, mas pensei que iriam querer participar da reunião que teremos agora com o Conselho da ONU. Parece que eles têm novidades pra nós. Espero vocês na sala de conferências em cinco minutos para o relatório completo. - Falou Tony, e saiu dali tão rápido quanto apareceu.
Os dois jovens obedeceram, e foram até a sala indicada imediatamente. Lá, todos os outros membros da equipe já estavam reunidos esperando pela videoconferência que seria realizada com o embaixador Callahan, para trazer a tal novidade.
-Boa tarde, Vingadores! - Disse o homem engravatado que apareceu no vídeo, com satisfação na voz. - Venho trazer a vocês as ótimas notícias que acabei de receber: o FBI identificou e prendeu nesta manhã o sujeito que realizou a invasão ao complexo dos heróis no mês passado. E, como vocês previram nas investigações conjuntas, ele estava mesmo conectado ao atentado com o robô gigante na ponte Harvard. Segundo nossas pistas, os dois criminosos eram, na verdade, a mesma pessoa.
Todos comemoraram a notícia. Era um alívio e uma vitória finalmente ter o culpado por toda aquela insegurança e desconfiança atrás das grades. Em meio às celebrações, Olivia e Peter se entreolharam, pensando no que acabaram de ouvir. Estavam confusos e muito, muito curiosos.
Capítulo 7
Foi divulgado na manhã desta sexta que as investigações da polícia federal americana levaram à prisão de um homem sueco como autor do crime que chocou o país. As pistas levantadas indicaram um antigo foragido da justiça que agiu sozinho.
"Autor de ataque com robô em Cambridge é pego pela inteligência americana; tragédia deixou 107 mortos"
O responsável pela morte de mais de cem civis durante o desastre foi preso pelo FBI na noite de ontem. Os federais alegaram que o ataque se trata de um ato terrorista isolado, utilizando uma arma de alta tecnologia.
"Responsável pela invasão ao complexo dos Vingadores é pego nos USA; suspeito tem ligação com ataque em Massachusetts"
Dois crimes surpreendentes chocaram o mundo no último mês, e ambos foram orquestrados pelo mesmo sujeito, segundo a polícia. Em investigações, o FBI concluiu que tanto o ataque na ponte quanto a invasão da estação dos heróis foram realizados por um homem com diagnósticos de psicopatia e desvios mentais. O criminoso é Christer Bergström, 47 anos.
"Terrorista que desafiou a América e os Vingadores no último mês é silenciado"
Segundo os federais, o dinheiro que bancara as tecnologias avançadas e o imenso poder bélico do terrorista era ilegal e provinha de contas no exterior. O presidente do Conselho de Segurança da ONU, Thomas Callahan, parabenizou durante coletiva de imprensa a eficácia da polícia federal dos EUA em encontrar e prender o autor dos crimes com rapidez.
"Os Estados Unidos podem dormir em paz: FBI se encarregou do serviço que os Vingadores não fizeram"
Após a catastrófica batalha contra o criminoso dentro de sua própria base, os 'heróis' falharam em detê-lo durante seu ataque em Cambridge, que resultou na morte de mais de cem pessoas. Claramente incapazes de lidar com a segurança mundial, os Vingadores recorreram ao brilhante serviço de inteligência dos Estados Unidos, que deteve o terrorista e o levou a julgamento.
O treinamento daquela sexta-feira havia sido intenso e puxado. Olivia praticara seus tiros de energia, Eric erguera pesos de praticamente uma tonelada, e Peter aguçava sua mira com os novos lança teias. O treino havia sido ministrado por Visão, que observava e corrigia tudo com atenção, mostrando ser um ótimo professor.
Cansados de tanto esforço com os poderes, Peter e Olivia estavam sentados na arquibancada do centro de treinamento logo após o fim da aula. Utilizando o tablet de tela transparente do garoto, eles consultavam os principais sites de notícia para ver a repercussão do comunicado que receberam no dia anterior. A novidade estava em todos os lugares: o grande vilão, autor de dois dos maiores atos de terrorismo que o mundo já viu, estava finalmente atrás das grades. Algo muito duvidoso na opinião deles.
-Absolutamente nenhum dado da investigação deles bateu com os nossos. - Disse Peter, intrigado. - Eles foram numa direção completamente diferente.
-A única coisa em que concordamos é que uma pessoa sozinha foi responsável pelos dois ataques. - Olivia constatou, encarando as manchetes no tablet. - Mas, tirando isso, parece que estamos falando de dois crimes totalmente distintos.
-Nem a nacionalidade dele a gente conseguiu combinar. O FBI acha que ele agiu sozinho, e diz ter milhares de provas pra incriminar esse tal Christer.
-É, mas você sabe que é tudo história, certo? - Disse a garota com a sobrancelha arqueada. - Eles sempre dizem ter certeza absoluta das coisas pra deixar as pessoas tranquilas e acalmar os nervos da imprensa. Mas eu também tenho cem por cento de certeza daquilo que descobrimos ontem.
-Então por que chegamos a um resultado tão diferente? Colocando numa balança, nós perdemos feio pra eles. O FBI tem nomes e provas, e tudo que nós temos é um bilhete assinado e um monte de suposições. - Falou Peter, frustrado. - Quem sabe eles estejam certos. O que são dois adolescentes metidos a detetives perto da polícia federal americana, não é?
-Sei lá, Parker. Muita coisa está envolvida nesse jogo da mídia e no governo querendo silenciar a opinião pública. E seja lá quem for o nosso inimigo, ele não é idiota também. Eu não sei quem foi que armou toda essa zona, mas tenho certeza que não foi aquele cara com nome de trava-língua.
-Como sabe disso?
-Eu sei o que eu vi. Em nenhum momento as investigações apontaram pra qualquer uma das nossas pistas, não é? Bom, então talvez tenhamos um lado da história do qual eles não sabem. - McCall insistiu, soltando um suspiro logo depois. - Sei que podemos estar errados, mas vale a pena continuar escavando pra ter certeza, não acha?
-É, claro. - Peter cedeu. - Vou pensar no que podemos fazer e te aviso caso descobrir alguma coisa. Acho que isso ainda não acabou.
Peter deixou o ginásio de treinamento logo após a conversa, indo até seu dormitório para tomar uma ducha. Ficou pensando em várias possibilidades para a investigação debaixo do chuveiro, internamente desejando ter aquele ovo mágico dourado de Harry Potter, que contou uma pista valiosa para Harry quando ele o colocou debaixo d'água durante o banho em O Cálice de Fogo. O rapaz saiu do banheiro com uma toalha sob os ombros, e encontrou Eric sentado em sua cama lendo uma de suas revistas em quadrinhos.
-E aí, Parker? - Disse ele, sem desviar o olhar do gibi. - Isso aqui é bem maneiro.
-Fala, Carter. - Respondeu ele, secando o cabelo com a toalha. Já estava acostumado a ter o amigo invadindo seu quarto e mexendo em suas coisas. - Irado, né?
-Sim, esse cara é louco. - Falou Eric Carter impressionado, apontando para o desenho de Han Solo na capa da revistinha. - E tem uma namorada bem gatinha. Não sabia que essas coisas de nerds podiam ser tão legais.
-Sou um cara de bom gosto. - Indagou Peter, apontando para si mesmo com um sorriso convencido.
-O que acha de sairmos pra dar uma volta? O treino de hoje me deixou cansado, estava afim de relaxar. - Disse Eric, deixando o gibi de lado e deitando na cama com as duas mãos atrás da cabeça. Eles sempre costumavam sair juntos depois das aulas.
-Não dá, cara. Eu tenho umas coisas pra fazer.
-O que, por exemplo? - Carter estranhou.
-...Paradas. - Respondeu Parker, mexendo em sua escrivaninha.
-Ah, fala sério. - Riu o amigo, e então fez uma pausa. - Essas "paradas" por acaso têm alguma coisa a ver com a Olivia McCall?
-Por quê? - Peter franziu a testa.
-Sei lá, vocês andam tão próximos ultimamente... - Eric ergueu a sobrancelha. - Tá rolando alguma coisa entre vocês dois?
-Quê? - Peter virou para ele na mesma hora, achando graça.
-Você tá afim dela! - Eric exclamou, e em seguida deu risada. - Não tá?
-Cara, é claro que não - Parker riu nervosamente, tentando inventar uma desculpa boa o suficiente para a amizade repentina dos dois. - É só trabalho. Coisa da faculdade.
-Sei. Vocês vivem de conversinha, e ela é toda...
-Cara! - Peter riu da imaginação fértil do amigo. - Não tem nada, é sério.
-Tá bom. - Eric ergueu as mãos em sinal de rendição. - Só tô dizendo que...
-Eu entendi. - Parker interrompeu com um riso.
-Ok, ok. - O rapaz desistiu. - E o que você tem pra fazer, então?
-É do trabalho nas Inovações. Coisa entediante de nerd, você não entenderia.
-Saquei. - Eric respondeu, ficando em silêncio por alguns instantes. - É tudo tão maneiro aqui, não é? Tipo, todo mundo é superinteligente, qualquer coisa que você toca é supercara e todas as missões em que a gente se mete são tipo "o mundo vai acabar" e tal. Isso é legal.
-Sim, é maneiro. As coisas ficam doidas demais às vezes, mas em geral é legal. - Peter sorriu diante da análise do amigo, feita na própria linguagem dele.
-Sabe, Peter, acho que nunca te agradeci direito pelo que você fez por mim. - Falou o loiro, sentando na beirada da cama. - Essa oportunidade de estar na equipe e tudo mais. Pouca gente tem a chance de fazer parte de algo tão grande quanto os Vingadores, e eu devo isso a você.
-Relaxa, parceiro. – Peter desconversou.
-Não, é sério! Se não fosse a gente ter se esbarrado naquele dia, eu jamais saberia do Aranha e você jamais saberia de mim. Foi muito legal da sua parte me apresentar pro Sr. Stark, me colocar pra treinar aqui e...
-Relaxa, Eric. Você vai ser muito útil pros Vingadores, e mereceu isso. - Disse Parker, sinceramente. - Agora para de falar sobre isso, está ficando grudento. - Brincou.
-Qual é, eu abri meu coração! - Exclamou Eric, rindo e arremessando um travesseiro no amigo, que riu. - Amigos carinhosos como eu são raros, sabia? Não dá pra encontrar em qualquer lugar.
Peter parou de rir imediatamente, sentindo uma ideia surgir em sua cabeça.
-Não se encontra em qualquer lugar... - Sussurrou ele, com o rosto atônito.
-O que? - Eric questionou, confuso.
-Tenho que ir. - Parker disse, e saiu do quarto apressado de repente enquanto teclava algo no celular, fechando a porta e deixando o amigo sozinho.
-Eu sei o que podemos fazer pra encontrar o Magnum. - Peter disparou assim que viu sua parceira de investigação entrar pela porta.
-E o que é? - Perguntou Olivia curiosa, enquanto caminhava pela sala vazia onde, durante o dia, funcionava o departamento de Inovações.
-Vamos rastrear umas coisinhas e chegar até a linha de produção daquele robô gigante. - Falou, animado.
-Desenvolva. - Olivia parou ao lado dele, interessada.
-A armadura do robô tem Adamantium. Esse é um dos metais mais raros e caros do mundo, e por ter um potencial bélico bem grande, ele é muito difícil de conseguir. - Peter começou. - Ele é artificial, e todos os laboratórios do mundo que o produzem passam por uma burocracia enorme pra poderem fabricar. Isso inclui emitir notas especiais das vendas, que mantém toda e qualquer empresa que compra o metal sobre constante vigilância. A boa notícia é que o são apenas algumas pouquíssimas indústrias do mundo que trabalham com Adamantium, e é esse pessoal que precisamos conhecer.
-Pera aí, Parker. Você acha mesmo que o terrorista do mal fez um registro dos produtos que ele usou pra construir a máquina da morte dele? - Liv debochou.
-Claro que não, mas quem comprou o Adamantium fez. – Ele rebateu. - O tal Magnum não conseguiu o metal com uma licença própria, mas ele roubou ou desviou de alguma das empresas licenciadas. Nós só precisamos descobrir de qual delas.
-E como você pretende fazer isso?
-Escavando, como você disse. - Falou o rapaz, sentando na própria mesa de trabalho. - A fiscalização exige que seja documentado em que foi usada cada grama do metal. Tem que ter alguma falha nos dados de uma das fábricas pra flagrarmos.
-Isso vai demorar. - Constatou a garota, pegando seu notebook na própria mesa e em seguida sentando ao lado do garoto para começar a investigar. - Mas é uma boa.
Os dois adolescentes usaram o banco de dados dos Vingadores cedido pelo governo para começarem sua "escavação". Acessaram a lista de cadastros e prepararam seus cálculos. Analisaram cada planilha de dados minuciosamente, de mais de vinte e duas empresas registradas. Item por item, em cada data, olhando cada detalhe. Já eram quase três e meia da manhã, mas ainda não tinham encontrado nada que fosse digno de duvidar. Eles decidiram parar e continuar no dia seguinte.
Durante a semana que correu, Liv e Peter se encontraram na sala fechada das Inovações todas as noites depois das dez e meia, e passaram as madrugadas acordados analisando dados e planilhas das compradoras de Adamantium. Porém, por mais que tentassem, nada do que viam parecia fora do normal ou das contas matemáticas. Tudo ali obedecia às regras estabelecidas, e nenhum material tinha sido desviado – pelo menos, não de uma forma que os relatórios fossem capazes de apontar.
Já era quinta-feira, e Peter cruzava o campus da universidade rumo à biblioteca durante o intervalo entre as aulas, tomando um enorme copo de café. Olivia apareceu carregando uma pilha de livros e cadernos, e começou a andar ao seu lado.
-Bom dia, Parker - Disse ela, e então constatou que o rapaz tinha olheiras debaixo dos olhos por conta da noite praticamente em claro. - Por sua culpa eu dormi durante a aula de Álgebra Avançada hoje. Valeu.
-Duas horas de sono por noite durante uma semana inteira e você ainda acha energias pra ser sarcástica às nove da manhã? Estou impressionado. - Respondeu o garoto, andando pela passarela calçada que trilhava o caminho.
-Meu bom humor só é possível porque, depois de quase ficar vesga de tanto olhar praquelas planilhas idiotas, eu finalmente descobri uma coisa.
-Encontrou alguma divergência de dados? - Peter animou-se, espantando o bocejo que lhe distorceu um pouco a voz.
-Não, mas tenho uma convergência de nomes. - Falou satisfeita, abaixando um pouco o tom de voz. - Depois de dormir na aula e ser tirada de sala, eu fiquei sem nada pra fazer até o próximo período e decidi continuar nossa pesquisa. Estava investigando quais das empresas da lista possuíam filiais perto de Cambridge, por onde seria mais fácil desviar o Adamantium, já que o nosso vilão deve estar instalado por aqui. - A garota sacou o celular para mostrar a ele, e ambos pararam em um canto mais reservado do jardim para olhar. - Encontrei apenas uma delas, a Williams, com uma propriedade registrada na cidade. E acontece que essa propriedade é o galpão de onde vinham as mensagens de ameaça que eu recebia. Ele pertencia à Williams até que passaram o terreno para o governo há um tempo.
-Wow, isso é inesperado. - Falou Parker olhando as pesquisas no celular da moça. - Alguém já foi até esse galpão pra checar o que tem lá?
-Meu pai mandou alguns homens lá depois que descobriu o endereço, só pra tirar o peso da consciência. Eles não encontraram nada além de móveis apodrecendo e poeira. - Contou ela. - Chegamos à conclusão de que era só um lugar aleatório que o stalker escolheu por estar vazio e abandonado, e então não poderia ser ligado a ele. Mas já não tenho certeza.
-Bom, isso pode ser só uma coincidência, mas é a única coisa que temos. - Falou Peter. - Se o Magnum desvia Adamantium de alguma dessas empresas, ele é esperto o suficiente pra manter os dados bem certos pra ninguém desconfiar. Essa é a única ponta solta.
-Seria perda de tempo irmos checar o galpão? - Liv franziu a testa com incerteza.
-Eu não tenho planos para hoje, você tem? - Parker disse erguendo as sobrancelhas. - Ninguém descobriu quem era o remetente das mensagens, não é? Pode ser que isso não nos leve ao Magnum, mas talvez nos leve ao seu stalker, ou então mostre que os dois estão conectados. Deve ter algum detalhe que os seguranças deixaram passar.
-Você iria comigo?
-Claro, eu adoro drama investigativo. - Peter sorriu. - Hoje depois do almoço?
-Fechado. - Olivia sorriu de volta, e então virou à direita para entrar no bloco de ciências.
Como combinado, Olivia e Peter se encontraram no portão principal do MIT ao meio dia e dez em ponto, prontos para darem início a mais uma fase de sua busca pela verdade. O galpão ficava no bairro ao lado, então os dois não se incomodaram de ir andando até lá enquanto conversavam sobre assuntos aleatórios pelo caminho.
A propriedade ficava instalada entre uma casa e um prédio baixo, de frente para o pequeno shopping center do outro lado da rua. Possuía cercas de metal para demarcar o terreno, que era grande e extenso, e o galpão de madeira ficava bem no meio do gramado morto pelo tempo. Os dois jovens foram até o corredor estreito formado entre o local e a lateral do prédio, e escalaram a cerca até pularem para dentro da propriedade. Caminharam rápida e furtivamente até a casa de madeira no centro, e entraram pela porta lateral que estava com a tranca enferrujada.
O cheiro de mofo logo invadiu suas narinas. O galpão era apenas uma construção alta e quadrada onde a luz do sol quase não chegava. A umidade havia consumido boa parte do que restara daquele lugar, que parecia não ser usado há um bom tempo. Móveis de madeira esverdeados e escuros estavam espalhados: uma mesa no centro com uma cadeira de cada lado e duas prateleiras empoeiradas e vazias na parede.
-Não tem mais energia elétrica. - Constatou Parker, ao pressionar o interruptor ao lado da porta e ver que o lustre oval que pendia do teto não se acendeu.
-O governo está com essa propriedade faz mais de um ano. - Olivia justificou, acendendo a lanterna do celular e apontando-a para o local. - Só não sei por que a Williams tinha um barraco como esse em primeiro lugar.
-Não devíamos ter vindo aqui enquanto está de dia – Falou Peter, fazendo o mesmo que a garota e analisando a escrivaninha. - Fica mais fácil pra alguém nos ver entrando.
-Não tem problema, vão pensar que a gente veio aqui pra se pegar ou se drogar. - Liv deu de ombros. - Embora, na minha opinião, tenha sido perda de tempo. Meu pai já mandou gente aqui, e só tem um monte de entulho.
-Não foi perda de tempo. - Parker discordou, olhando embaixo da mesa. - Quando os homens do seu pai checaram, já vieram com a ideia formada de que era só fachada pro perseguidor se safar. Mas nós sabemos que tem algo a mais.
Olivia virou-se assustada quando ouviu o barulho de alguma coisa caindo atrás dela. Encontrou Peter com o rosto pávido e um monte de poeira se espalhando pelo ar, por conta da prateleira que ele acabara de derrubar.
-Eu só queria empurrar – Ele se defendeu imediatamente. – Mas a madeira estava mais podre do que pensei.
-Acho que não tem problema... – Disse Olivia, que nem conseguiu zombar dele, pois seus olhos encontraram algo naquele monte de estacas quebradas. Ela abaixou-se para retirar uma pasta marrom do monte de poeira que estava por baixo da prateleira, e em seguida colocou-a na mesa.
Aquela parecia ser uma pasta de arquivos, provavelmente esquecida ali por acidente quando o local fora abandonado. Era feita de papel reciclado e possuía um símbolo em sua capa, impresso em tinta preta.
-Algum estagiário foi demitido por isso. – Peter caçoou, apontando a lanterna para a descoberta enquanto Olivia folheava os documentos que estavam dentro.
-É uma planilha de negócios. Parece um controle de vendas. – Falou ela, lendo por cima. Liv pegou o celular e registrou o símbolo misterioso com uma foto, e então voltou a ler. Na terceira página dos arquivos, encontrou algo. – Olha, é a assinatura do Magnum! – Mostrou, indicando para Peter a digitação com a letra M em evidência, do mesmo modo que estava no bilhete. - Isso é...
A fala da garota foi interrompida pela mão de Peter tampando a boca dela. Irritada, Olivia empurrou o braço dele, enquanto o rapaz olhava atento para a fresta da porta entreaberta.
-O que você... - Ela ralhou.
-Estamos em perigo. - Peter disse baixo, e a garota percebeu que o braço dele estava arrepiado. Era o Sentido Aranha.
Por instinto, Olivia largou os papéis no chão debaixo da mesa, para escondê-los do que quer que Parker estivesse detectando. Não demorou para que os dois ouvissem passos discretos do lado de fora, até que alguém irrompeu para dentro dando um chute na porta.
Com uma touca preta e a barba mais longa do que as fotos mostravam, Jack O’Brien encarava os dois com uma arma apontada na direção deles. Era o homem cuja casa eles haviam invadido algumas noites atrás, e ele não parecia nada contente em encontrá-los ali.
-Vocês não fazem ideia de onde estão se metendo, crianças. – Jack ameaçou, segurando firme o revólver. Os dois jovens ergueram as mãos na altura da cabeça, em sinal de rendição.
-Corre. – Peter ordenou, uma fração de segundo antes de disparar uma teia de seu pulso na direção do vilão, atingindo sua arma e colando-a junto com a mão de Jack na parede logo atrás dele.
Os dois adolescentes saíram correndo imediatamente, passando pela porta antes que o inimigo furioso retirasse a luva e conseguisse libertar a mão presa. Antes de passar pela porta, Peter disparou uma teia para o chão, grudando-a na pasta ali escondida e puxando-a para si, pronto para voltar a correr. Porém, antes que os papéis atravessassem o gramado para chegar a ele, Jack agarrou-os e os puxou de dentro da pasta envolta no fluído, correndo para o lado oposto com as planilhas.
-Ele pegou os arquivos! – Peter anunciou, e Olivia parou de correr logo à frente dele.
Parker e McCall começaram a avançar na direção oposta para alcançar Jack. Peter ia lançar teias para pará-lo, mas o homem sacou outra pistola e começou a disparar para trás freneticamente na intenção de atrasá-los, obrigando o rapaz a se abaixar. Para proteger os dois, Olivia fez com que as balas parassem no ar, retirando a energia que as impulsionava.
O’Brien saiu por um buraco que ele mesmo fizera anteriormente na cerca de metal, e correu para o meio da avenida. Peter e Olivia foram atrás dele, desviando dos carros, e o viram entrar no shopping que ficava do outro lado da rua. Eles atravessaram a porta automática, procurando o homem de jaqueta e touca por todos os lados.
Ele estava tentando despistá-los dentro de uma loja de esportes. Os dois foram na direção do estabelecimento, até que Jack disparou duas vezes contra a vitrine, espalhando cacos de vidro por toda a entrada e assustando as pessoas que estavam em volta. Peter e Olivia estavam em desvantagem: não poderiam usar seus poderes em um local público sem os uniformes, ou suas identidades secretas já eram.
Os jovens passaram por cima do tapete de estilhaços e entraram na loja. Jack os viu se aproximar e derrubou uma prateleira de bolas de basquete para atrasá-los, e correu na direção da escada que levava ao segundo piso da loja.
-Encontre-o lá em cima – Olivia disse a Peter, que saiu da loja imediatamente e foi para o segundo andar.
Ouvindo a dica da garota para o parceiro, Jack mudou o curso de sua fuga e pulou dos cinco primeiros degraus da escada, voltando ao primeiro andar. Tentou pegar a porta de saída mais próxima, que o levaria de volta para o shopping, mas o sensor estranhamente não funcionou e ela se fechou. Jack olhou para trás, encontrando Olivia com um sorriso de deboche no rosto e o dedo indicador discretamente levantado, impedindo que a porta abrisse. Após uma bufada, o fugitivo foi de encontro com a porta, quebrando o vidro e correndo para o saguão novamente, pegando a primeira escada rolante de subida.
-Tá de brincadeira. – Peter bufou, observando-o subir enquanto ele próprio estava na escada que vinha descendo. Rapidamente, o rapaz ficou de pé no corrimão deslizante e pulou três metros para a escada rolante vizinha, onde estava Jack.
Parker pousou dez degraus abaixo dele, e começou a subir por entre as pessoas assustadas para alcançá-lo. O inimigo chegou ao andar de cima, onde Olivia já o esperava. A garota tentou puxar as planilhas que ele carregava debaixo do braço, mas Jack reagiu com uma cotovelada. Liv desviou com um dos golpes que aprendera recentemente, mas o homem era bem mais forte que ela e a empurrou para o chão, derrubando um vaso decorativo em cima dela logo em seguida. McCall tentou voltar a correr, mas caiu no chão por conta da fratura que o vaso causara em seu tornozelo; Jack estava agora quase escapando pela escada rolante para o terceiro andar. Porém, assim que ele pisou no primeiro degrau, ela desligou a mando de Olivia e não foi a lugar nenhum.
Irritado, Jack pegou a escada convencional, por onde civis fugiam assustados, e chegou ao primeiro andar antes que qualquer um dos dois pudesse pará-lo. Incapaz de arremessar teias, Peter observou o bandido derrubar dois seguranças que tentaram segurá-lo e fugir pela porta principal, cambaleando e levando consigo os papéis que eram valiosas pistas.
-Se alguém levantar suspeitas, nós estamos ferrados. – Peter disse preocupado, sentando ao lado da parceira no balcão da cozinha.
-Não, você está ferrado. Eu estou fod... – Olivia respondeu, tomando um gole do copo de água que o rapaz trouxera para ela no meio da frase.
Após o combate dentro do shopping, Peter e Liv se retiraram do local o mais rápido possível para que não lhes fizessem perguntas. Eles não retornaram para a aula, e foram direto para o complexo dos Vingadores. Já era noite, e os dois estavam reunidos na cozinha da mansão, preocupados com a repercussão do episódio e em como isso afetaria a investigação, ou pior, suas carreiras na equipe.
-Como está seu pé? – Parker questionou.
-Melhorando. Quando o ferimento não é muito grande, consigo direcionar minha energia corporal para os linfócitos e outras células reparadoras, fazendo com que trabalhem mais rápido e o machucado sare depressa. – Explicou a garota, encarando o tornozelo roxo apoiado em um banquinho, que já estava bem menos inchado.
-Irado. – Disse Parker legitimamente impressionado, mas sem expressar da devida maneira por conta da preocupação, que era maior que qualquer outra coisa. – Aquele imbecil atirou nas vitrines, e nós fizemos a maior bagunça. Com certeza as pessoas vão saber sobre o que aconteceu.
-Não tem problema as pessoas saberem, não usamos nossos poderes visivelmente. – Liv falou tentando ponderar. – Até onde todo mundo viu, somos dois adolescentes perseguindo um homem adulto em público. O problema verdadeiro é se qualquer um aqui dentro, principalmente meu pai, descobrir isso.
-Eu não vi ninguém lá com celulares, acho que as pessoas só estavam preocupadas em sair a salvo. Mas shoppings possuem câmeras de segurança, com certeza tem imagens. – Peter coçou a nuca. – Acha que foi um estrago tão grande a ponto de sair no jornal?
-Com certeza foi. – Uma voz feminina disse atrás deles. Natasha estava encostada no batente da porta com os braços cruzados.
Nenhum dos dois sabia o que dizer. O sangue gelou em suas veias, não deixando a McCall e Parker alternativas para defesa.
-Aquele cara devia mesmo ser importante pra o perseguirem daquele jeito. – Disse a moça, entrando na cozinha despreocupadamente e comendo um biscoito do prato em cima do balcão. – Sorte a de vocês não estarem uniformizados, isso facilitou as coisas.
-Facilitou o que? – Olivia ousou perguntar, engolindo seco por medo da resposta.
-Encobrir. – Natasha falou, e os dois adolescentes estranharam a resposta. – Como não estavam vestidos de Homem-Aranha e Arion, e ninguém liga pra quem são Peter Parker e Olivia McCall, a imprensa estava pronta para noticiar dois adolescentes e um homem em perseguição criminosa dentro de shopping. – Ela deu mais uma mordida no biscoito, e depois o largou na bancada. – Porém, pra sorte de vocês, certas fontes anônimas ligaram para alguns jornais e disseram que foi uma tentativa de assalto que deu errado. Nada ligado aos Vingadores.
-Do que está falando? – Peter questionou, confuso.
-Que eu limpei a sujeira de vocês dois amadores. – Natasha soou tediosa. – E que vocês tem muita sorte, porque nem sempre é possível.
-Por que fez isso?
-Porque nós não precisamos de mais um escândalo envolvendo a equipe, e vocês deviam ter se importado o suficiente para evitarem um, assim como eu fiz. – A mulher deu uma bronca leve. – Foi bem difícil sumir com as imagens das câmeras quando começaram a sair, mas eu consegui. Disse aos jornais que era rotineiro e foi assim que a matéria saiu. De nada. – Continuou, prestes a deixar o cômodo. - Tomem mais cuidado da próxima vez que decidirem bancar os heróis sozinhos.
-Espera, você não está brava? – Olivia perguntou.
-É claro que eu estou, vocês me deram trabalho e atrapalharam meu dia de folga. – Natasha franziu a testa.
-Mas você vai contar pra equipe?
-E atrapalhar a investigação privada de vocês sobre o Ervilha e os robôs? É claro que não. – Disse Natasha, quase deixando escapar um sorriso ao ver os queixos dos dois mais novos caírem na altura da bancada.
-Como você sabe? – Peter disse, indignado.
-Vocês não apagam seus históricos de pesquisa do sistema. E não se preocupem, porque já fiz isso por vocês também. – Falou a mulher, vangloriando-se.
-Por quê? – Questionou Liv, impedindo mais uma vez que Natasha saísse.
-Porque eu concordo com o que estão fazendo. – Ela esclareceu. – Um homem suíço psicopata que agiu sozinho? Por favor – Romanoff debochou, referindo-se ao resultado das investigações governamentais. – O público pode ser idiota, mas nós não. Tem mais alguém por trás disso, e eu sei que vocês estão afim de descobrir tanto quanto eu. Então vou deixar que façam isso, desde que façam em silêncio. – Ela alfinetou. – Se precisarem de alguma coisa, saibam que podem me chamar.
-Obrigada, Nat. – Olivia sorriu para ela, aliviada. A ruiva retribuiu o gesto, e saiu da cozinha em seguida como se nada tivesse acontecido.
-Essa foi por pouco. – Peter disse assim que ela se foi.
-É, nem me fale. – Liv rolou os olhos. – Essa palhaçada só faz com que tenhamos que ser ainda mais rápidos pra encontrar o Magnum. Porque agora eles têm certeza de que estão sendo investigados.
-Depois que roubamos o comunicador, eles devem ter ficado espertos. Viram que alguém estava vasculhando seus dados e ficaram de olho pra ver quando iríamos aparecer. – Parker sugeriu.
-Exatamente, o que significa que não podemos parar. – McCall enunciou, levantando de onde estava sentada. – Te encontro nas Inovações às dez e meia, certo?
-Certo. – Peter confirmou o habitual horário e o lugar do encontro noturno. – Vou levar bastante café pra ficarmos acordados.
Os dois adolescentes inteligentes e teimosamente curiosos dariam continuidade ao processo de investigação com os novos dados que descobriram. Embora roubados, os relatórios que encontraram no galpão continham algumas informações que eles haviam conseguido absorver, e estas deveriam ser suficientes para avançar pelo menos um pouco.
-Aqui está, Srta. McCall. – Disse Peter ao entregar para a garota um copo do Starbucks, chamando-a com a formalidade que ela detestava, de propósito.
-É café preto puro? – Ela arqueou a sobrancelha, testando-o.
-E com um envelope de açúcar. – Completou o rapaz, cheio de si, pois sabia ter acertado.
-Own, você decorou meu pedido do Starbucks. – Liv disse de modo fofo. – Precisamos parar de conviver urgentemente. – Completou com a voz séria, fazendo Peter rir.
-O que você tem aí? – Perguntou o rapaz, tomando um gole do próprio café e olhando para o notebook que ela operava.
-Tirei essa foto do símbolo que estava estampado na pasta antes que o Jack aparecesse. – Liv mostrou a imagem na tela. – Temos isso, e sabemos que se tratava de uma planilha de negócios assinada pelo Magnum.
-Engraçado, eu acho que já vi esse símbolo em algum lugar. – Parker franziu a testa enquanto vasculhava algo parecido com aquele desenho circular em sua mente. – Do que se trata?
-Vamos descobrir. – Falou a garota, e em seguida apertou enter para baixar a imagem em um software de pesquisa.
Aquilo era bem inesperado, e a primeira vista sem sentido. Conectar as duas coisas era inusitado, e aqueles resultados exibidos na tela fizeram Peter ter um calafrio ao pensar em certas lembranças que aquilo trazia.
-Abutre? - Olivia questionou confusa. - Produtor e vendedor armas construídas com tecnologia alienígena. – Ela leu nos relatórios.
-É, eu sei quem ele é. - Peter engoliu seco, ao ver o rosto de Adrian Toomes no tribunal sendo julgado por seus crimes em uma das fotos que compunha o relatório.
-...Pego pelo Homem-Aranha no ano de 2017. - A garota continuou lendo, e então encarou Peter. - Você prendeu esse cara?
-É, ele foi o primeiro vilão que combati sozinho. - Parker contou, intrigado com a menção do antigo rival naquele caso. - Ele usou o que restou de lixo alienígena da primeira batalha dos Vingadores em Nova York pra construir superarmas com a tecnologia dos invasores. Ele as vendeu por anos até eu pegá-lo.
-Caramba. - Disse Olivia, absorvendo a informação. - E o que isso quer dizer, então?
-No começo, pensei que os relatórios que achamos fossem registros do Adamantium que a Williams contrabandeava pro Magnum ilegalmente. Talvez eles tivessem substituído os documentos originais por falsos, sei lá. - Parker coçou a nuca. - Mas se o símbolo na pasta era utilizado pelos negociadores das armas alienígenas, então...
-O Magnum estava negociando com o Abutre antes de ele ser pego por você. - McCall concluiu.
-Ok, eu não esperava por essa.
-Se o Magnum estava comprando desse cara, ele deve ter usado alguma das tecnologias alienígenas dele pra fazer o robô.
-Com certeza, alguma arma ou coisa do tipo. - Peter concordou. - Mas os negócios do Abutre já acabaram há dois anos. Onde isso nos leva?
-Bom, a Williams tem Adamantium pra armadura, e o galpão onde achamos a planilha de negociações pertencia a ela quando o Abutre ainda atuava, há dois anos. - Olivia iniciou, batendo os dados e vendo que, na época em que as armas eram vendidas, o galpão ainda não tinha sido entregue ao governo, o que explicaria as planilhas de negociações estarem lá. - Essa empresa tem que estar envolvida, certo?
-Seria muita coincidência não estar.
-Você pegou o Abutre em Nova York, e era lá que ele vendia os armamentos dele. - Olivia constatou e Parker assentiu. - Vamos procurar por filiais da Williams lá, então.
Ao mesmo tempo em que dizia isso, Olivia já providenciava a pesquisa em seu computador. Buscou por terrenos registrados pela empresa em qualquer local de Nova York ou Manhattan, que pudessem lhes render alguma informação.
-Tem uma fábrica - Disse ela, e Peter largou o café na mesa para olhar. - Mas pelas fotos que o Google Maps tem da propriedade, ela parece estar abandonada faz um tempo. - Constatou com desânimo, vendo os tapumes cobrindo o local e a grama alta na fachada. Parecia que ninguém o visitava há muito tempo.
-Isso não quer dizer muita coisa, você sabe. - Parker não se deixou abater, arqueando a sobrancelha para ela. - Eles podem fazer parecer abandonado pra que ninguém preste atenção. Mas não estamos procurando informações atuais, não é? Veja como estava a fábrica há dois anos, quando os negócios do Abutre ainda rolavam.
A garota deu o comando no computador para acessar as fotos mais antigas da mesma propriedade. No ano desejado, o local estava bem diferente, em perfeitas condições e com uma pista valiosíssima estampada em sua fachada.
Pintado com tinta spray em um dos pilares laterais da fábrica, num local discreto mas visível, estava o mesmo símbolo que os dois haviam visto na capa da pasta. O círculo com um losango e um X, feito à tinta branca como se demarcasse o local.
-Bingo. - Disse Peter com um sorriso. Ele colocou a foto antiga e a atual lado a lado para que pudessem comparar. - Hoje em dia o símbolo está tampado. Antes de descobrirem os negócios do Abutre, esse desenho não tinha significado pra polícia, então não tinha problema usá-lo pra fazer a identificação do local. Porém, quando prenderam o fornecedor – Parker aproximou a foto atual. - Eles pintaram o muro e cobriram a prova do envolvimento.
-Mas o que é esse X, afinal?
-Não é um X, são várias letras V.* - O rapaz explicou, e Olivia fez uma expressão de surpresa. - Aposto que eles usaram essa fábrica pra construir o robô. Além de ser grande e escondida, tinha a comodidade de não precisar transportar a matéria-prima até Cambridge.
-Ok, Parker, mas ainda não temos muito pra avançar aqui. - Liv torceu o lábio, encarando as fotos.
-É claro que temos. Encontramos a provável fábrica do robô, precisamos checar o que tem lá. - Falou o garoto, entusiasmado. - Mesmo se estiver vazia como parece, ainda podemos encontrar pistas soltas. O galpão estava abandonado e mesmo assim tinha uma, não é?
-Temos que ir à Nova York. - Falou Olivia, decidida.
-Bom, alguém tem que ir, mas acho que você deveria ficar. – Ponderou Parker, e ela o olhou com estranheza. – Você está em cárcere preventivo, como você chama, lembra? E tem uma razão pra isso. Você está em perigo, não devia sair daqui. Fique onde é seguro, eu posso ir e te deixar informada sobre o que descobrir.
-Que fofo, você acha que vai ser herói sozinho. – Olivia debochou do comentário com tanta naturalidade que o rapaz não soube como reagir.
-Não é isso, só acho que você não precisa se arriscar. O stalker pode te encontrar, você vai correr perigo.
-Eu sou o perigo, Parker. – Ela cerrou os olhos de modo cômico. Peter tomou fôlego para retrucar, mas ela o impediu. – Se você for sozinho, eu sairei cinco minutos depois pra ir atrás de você. Vou pra Nova York também, e se duvidar descobrirei as coisas até antes de você. Confia em mim, você não quer tentar me impedir de fazer algo.
Parker a encarou com um olhar de derrota e suspirou.
-Ótimo, iremos juntos. – Liv falou vitoriosa. - O único problema vai ser convencer meu pai disso. Vou ter que me superar pra arranjar uma desculpa.
-Vamos dar um jeito. - Parker apaziguou, cedendo já que não conseguiria protegê-la de si mesma. - Hora de fazer nossa terceira visita de campo, parceira.
-Visita de campo? Temos sete anos? - Ela se levantou e sorriu. - Sabe, Parker, seu senso de humor é péssimo. Pensei que já teria melhorado depois de passar tantos dias andando comigo.
-Por quê? Você é uma excelente piadista? - O garoto entrou na onda, fechando o sistema e desligando o computador para que saíssem.
-Querido – Ela parou de frente para ele. - Eu sou filha do Tony Stark. Acho que isso é meio natural pra mim.
-Sarcasmo é meio natural pra você.
-"Stark" quer dizer "sarcasmo" em hebraico.
-Ah é? - Ele ergueu as sobrancelhas.
-Não, eu estava sendo sarcástica. Viu só? É por isso que você precisa andar mais comigo. - Ela sorriu, e então saiu andando com o garoto logo atrás, ambos rumo a uma tão esperada e merecida noite de sono decente depois das descobertas.
*A letra V no símbolo faz alusão ao nome do Abutre em inglês, Vulture.
Capítulo 8
-Como assim vocês dois querem ir pra Nova York? - Stark fez uma careta diante do pedido dos dois jovens pupilos parados em frente à sua mesa.
-Bom, nós já estamos no recesso de fim de ano na faculdade, então pensamos que seria bom tirar umas férias. - Peter falou com um sorriso amarelo. Ele era péssimo com mentiras.
-Vocês querem tirar férias? - O homem estranhou. - E eu, por que ninguém diz que eu deveria sair de férias? - Tony apontou para si mesmo, sentado na poltrona onde esteve trabalhando o dia todo.
-Não são férias, pai, são só alguns dias. - Olivia esclareceu. - Peter quer ver a tia dele, e eu vou visitar minha mãe.
-Sua tia, é? Faz um tempo que você não vai vê-la... - Stark observou.
-É, eu sei... - O garoto coçou a nuca, desconfortável. - É por isso que queria ir.
-Podemos conversar sobre isso depois que eu sair do trabalho?
-Não é uma decisão tão difícil. Só queremos ver nossos familiares durante as festas, e passar o natal aonde vá ao menos haver uma ceia de Natal. - Liv disse simplesmente.
-Mas nós vamos ter uma ceia de Natal aqui - Tony retrucou. - Eu disse pra vocês que estou planejando um jantarzinho lá no alojamento...
-Pai, pedir pizza da Domino's não é uma ceia. E eu duvido que eles abram nesse dia. - Olivia rolou os olhos.
-Você ficaria surpresa com o horário de funcionamento desses lugares. - O homem apontou para ela com as sobrancelhas erguidas.
-Tá, tanto faz... - Ela negou com a cabeça. - Podemos ir depois do Natal então, se você quiser. É só uma semana, não tem nada demais.
-Pro Peter tudo bem. Você é a questão. - Tony respondeu enquanto digitava algo em seu computador. - Sabe por que está aqui. Não pegamos aquele stalker ainda, você não está a salvo pra ir aonde bem quiser.
-Você tá exagerando. Já faz meses que nada acontece, não posso ficar sobre vigilância pra sempre. – Ela insistiu. - Além do mais, é minha mãe. Não pode negar a mãe pra uma garotinha.
-Se você viajar bem escoltada... - Tony ponderou.
-Ah não, sem chance. - A garota o interrompeu, afinal era uma péssima ideia pra quem queria fazer uma investigação às escondidas. - Você conhece a senhora McCall, ela vai surtar se tiver que ficar com dois caras desconhecidos de dois metros de altura na casa dela todo esse tempo. - Liv advertiu.
-É, ela não iria aceitar. - Stark ponderou novamente. - É muito arriscado, Liv. Esse tipo de gente fica apenas esperando um descuido pra agir. Combinamos que você ficaria aqui até estar realmente segura, e eu não estou muito confortável em deixar você sair sem segurança nenhuma ainda.
-Mas eu não vou estar sem segurança. É por isso que eu vou com o Peter. - Olivia apontou para o rapaz, que engoliu seco. Eles não tinham combinado um roteiro para a conversa, apenas chegaram à sala de Stark e antes de entrarem Liv disse "deixa que eu falo". Aquilo o pegou desprevenido. - Se acontecer qualquer coisa, ele vai estar comigo pra me proteger.
-Eu... eu vou cuidar bem dela, Sr. Stark. - O rapaz arriscou dizer, e tremeu ao ver o olhar do homem pousando sobre ele com desconfiança.
Tony ficou encarando os dois jovens por alguns segundos. Olivia estava sorrindo naturalmente, e Peter permaneceu calado como sempre. Ele não sabia dizer se era uma boa ideia, mas era para verem a família...
-Quatro dias, nem um minuto a mais. - Deu o veredicto, e viu a filha vibrar. - E se acontecer qualquer coisa, mesmo que seja só uma suspeita, eu quero que me liguem e voltem pra cá imediatamente.
-Pode deixar. - Os dois disseram em uníssono, e em seguida saíram do escritório para deixar Stark voltar aos afazeres. Falar com ele enquanto estava ocupado foi uma tática de Olivia para fazer Tony concordar mais facilmente, só pra tirar os dois dali e poder voltar ao trabalho mais rápido.
-Então... - Peter disse segurando o riso assim que deixaram a sala. - Você quer que eu proteja você?
-Claro que não, eu só disse aquilo pra ele sossegar. - A garota negou veementemente com a cabeça. - Eu sei me virar.
-Ok, ok. - Ele cedeu. - Entendo que possa ser difícil pra você admitir. Quer que eu banque o segurança disfarçado então, seja mais discreto?
-Escuta, Cabeça-de-Teia – Ela chegou perto dele. - Se tentar me fazer parecer uma donzela em perigo, eu quebro a sua cara.
Peter riu, arregalando os olhos e erguendo os braços em rendição diante da ameaça.
-Anda logo, temos mais o que fazer. - Ela puxou-o pelo braço, rolando os olhos enquanto fingia uma cara séria.
Os dois adolescentes não demoraram a providenciar passagens para dali a três dias, com destino à Nova York. Quando chegaram, a neve da última tempestade já derretia em meio aos remanescentes enfeites natalinos ainda espalhados pela cidade. Ao contrário do que disseram, Olivia e Peter não visitariam ninguém: ficariam hospedados em uma pousada no centro, usando duas identidades falsas que conseguiram com a ajuda de Romanoff – a mais recente compactuada – para continuarem a investigação. Os dois chegaram depois do almoço, e foram do aeroporto direto para a instalação.
-Luke e Lauren Smith. - Enunciou cordialmente o recepcionista, checando as reservas e a documentação. - O quarto de vocês é o 406, fica no 4º andar. Tenham uma boa estadia.
Após o check-in, um funcionário escoltou os dois falsos irmãos de Toronto até os aposentos alugados para as "férias". Era um quarto duplo, com dois dormitórios separados por uma porta de correr e uma sacada externa que os conectava. Peter e Olivia largaram as malas pelo chão e começaram a checar o local.
O rapaz jogou-se em sua cama, exausto por conta do voo. Não era acostumado com aviões, e por estar com Olivia esforçou-se o tempo todo para parecer mais corajoso e relaxado do que realmente estava. Ele fechou os olhos, e de repente, ouviu um grito abafado vindo do outro lado da divisória.
-O que foi? - Ele irrompeu assustado, e encontrou Olivia sentada na cama abraçando as duas pernas.
-Tem uma aranha no tapete! – Ela exclamou. - Mata ela, Parker!
O garoto olhou para o chão e viu um aracnídeo amarronzado de tamanho médio parado sob o tecido listrado, então ficou encarando-o.
-Mas eu vou matá-la? - Ele torceu o nariz. Aquilo parecia um pouco errado na cabeça dele, afinal...
-Qual o problema, ela é sua prima ou algo do tipo? Mata logo! - Ordenou a menina, impaciente.
Peter não podia matá-la; aquilo ia contra seu código moral, de alguma forma. Contrariado, ele pegou um dos panfletos do hotel que estava na bancada e envolveu a pequena aranha, levando-a até o lado de fora da sacada, e colocando-a sobre a grade logo em seguida. O rapaz olhou para Olivia, que relaxou instantaneamente após constatar o fim do perigo. Para alguém que se dizia tão corajosa, uma cena como aquela era quase cômica.
-Então você tem medo de aranhas? - Ele disse arqueando as sobrancelhas, e a garota rolou os olhos.
-Eu não tenho medo, só me incomodo com elas por perto. - Olivia desceu da cama, tentando fazer pouco caso do escândalo de segundos atrás.
-E quanto a mim? Pensei que fossemos amigos.
-Você é um garoto, Parker, não seja ridículo. - Ela respondeu. – E eu nunca disse que somos amigos, aliás.
-Isso por acaso te incomoda? - O rapaz perguntou, e quando ela se virou pra olhá-lo ele estava pendurado no teto.
-Não. - Ela fechou a cara.
-Isso te incomoda? - Ele continuou a brincadeira, disparando uma teia na parede ao lado dela.
-Não tem graça. - Olivia se afastou, e foi mexer na escrivaninha ao pé da cama.
Peter desceu do teto de mansinho e se aproximou dela, que estava de costas. Ele colocou os dedos indicador e médio em cima do ombro da garota, e começou a andar com eles por ali para imitar as patas de uma aranha.
-Isso te incomoda? - Perguntou, e logo em seguida levou uma almofadada.
-Para de ser criança! - McCall disse irritada, e o garoto caiu na cama rindo. Ela arremessou o travesseiro na cara dele, e acabou se rendendo ao riso também. - Você é um idiota.
-Mas você gosta de mim. - Ele fez uma cara convencida, envolvendo o travesseiro com os braços.
Olivia encarou o garoto por alguns segundos, enquanto ele piscava os olhos acastanhados para ela.
-Nem um pouco. - Ela respondeu friamente, e virou-se para mexer em sua mala.
Peter riu e sentou-se na cama, questionando se aquela resposta era mesmo só uma brincadeira, e ficou observando a garota retirar da bolsa o notebook.
-Sabe, eu pensei em umas coisas durante o voo, sobre o Magnum e tudo mais. - Olivia mudou o assunto, e sentou ao lado do rapaz enquanto abria a tela. - Sabemos que essa empresa Williams está envolvida, tanto pelo Adamantium quanto pelo Abutre. Mas ninguém consegue esconder tanta sujeita assim dentro de uma companhia se não for do alto escalão.
-É preciso ter influência pra impedir que a irregularidade vaze. - Peter concordou, observando o que a garota vasculhava online.
-Foi por isso que pensei que talvez devêssemos começar a investigar os sócios da empresa. - Sugeriu ela, conectando-se ao site da Williams e indo até a parte que mostrava os chefes. - Um deles tem que estar envolvido. Encontrar registros vai ser bem difícil, porque nosso amigo já mostrou que sabe ocultar os dados; então acho que poderíamos tentar descobrir o que cada um estava fazendo no dia em que a nossa base foi atacada. Pode render uma boa pista.
-Manda ver.
A garota inteligente teclou rapidamente até acessar o software da polícia. Pesquisou pelos nomes de cada um dos três donos da Williams Inovações, vendo se havia registros de qualquer um deles estando próximo de Cambridge no dia fatídico. Ela checou passagens, passaportes e registros de transporte no nome dos empresários.
-Bom, acontece que todos eles estavam no mesmo lugar no dia da invasão à base – Ela concluiu sem demora, e Peter se aproximou para checar. - Em Tóquio.
-Tóquio? - O rapaz franziu o cenho.
-Sim, aparentemente em uma conferência de tecnologia que durou oito dias. - Liv enunciou com tédio, mostrando a ele as fotos que achou dos homens engravatados posando com líderes japoneses. - Todos os três estavam lá, segundo os registros nos passaportes. Lá se vai minha ideia. - Bufou.
-Tá, tudo bem... - Peter colocou a cabeça pra funcionar. - Não precisa ser necessariamente um dos donos. Eles não têm nenhum investidor ou CEO que se encaixe no que precisamos? - Sugeriu.
-Vamos ver.
Olivia pôs-se a teclar, e acessou a relação de lideranças e cargos de alto nível da empresa. Passou a hora seguinte checando cada um dos poderosos, mas todos tinham álibis confiáveis que impediam que assumissem a autoria dos atentados.
-Hm, isso é interessante. - Murmurou um bom tempo de silêncio depois. - Um histórico que achei diz que, há dois anos, a Williams Inovações pertencia à outra pessoa.
Os dois se aprumaram para perto da tela para ver melhor.
-Nessa época o galpão ainda era da empresa. Provavelmente as negociações ainda aconteciam. - Parker atiçou a memória. - Quem estava no comando?
-Simon Williams, o herdeiro da companhia. - McCall leu para ele, interessada. – Ele chefiava a grande empresa até ser afastado do cargo por negociações ilícitas.
-Abutre. - Aranha constatou.
Olivia tratou de pesquisar o acontecido, pois quando grandes líderes eram depostos com escândalos de corrupção, não faltavam matérias sobre isso na mídia. Ela não demorou a encontrar um artigo completo sobre o caso.
-Aqui diz que esse Simon quase faliu a empresa, e foi pego negociando com um famoso fabricante de armas de alta tecnologia. - A trilha de dados parecia esquentar. - Tem documentos que provam o crime.
Liv abriu a compilação de três fotos do que pareciam ser notas da negociação, que destinavam contrabando do Abutre direto para a Williams Inovações. Era inegável, e as imagens comprometiam a empresa de tal modo que os dois tiveram que supor que haviam sido determinantes para a investigação do caso na época.
-Ei, olha isso. - Peter apontou para as fotos na tela. - Não estão assinadas pelo Magnum.
Um detalhe bem observado: os três comprovantes não continham a já conhecida assinatura do vilão, com a letra M em evidência. Ao invés disso, uma enorme letra C com os mesmos padrões de digitação pendia no rodapé das notas.
-Mas o Magnum negociava através da Williams, já sabemos disso. - Liv ficou confusa. - Será que tem mais alguém envolvido?
-Talvez seja um sócio, alguém de confiança pra receber a mercadoria. - Parker supôs. - Porque, de qualquer modo, ninguém parece ter mencionado o nome “Magnum” nessa investigação. Então não sabiam do pseudônimo.
-Eu te disse que tínhamos encontrado algo que eles não viram. - Olivia transbordou satisfação. - Ok, vamos ver por onde anda nosso empresário sujo.
Dados sobre Simon Williams que procedessem as investigações sobre a corrupção eram nulos. Ele não estava preso, pois se safara no processo judicial, mas também não estava em lugar nenhum; não havia endereços fixos ou registros de qualquer paradeiro. A polícia havia emitido um alerta, segundo os dados que os adolescentes encontraram, mas não abrira nenhum inquérito para investigar onde Simon tinha se metido, já que ele não era mais réu.
-Ele simplesmente sumiu. - Olivia constatou. - Curioso, não é? Me parece com alguém que tem um plano terrorista.
-Ninguém some desse jeito hoje em dia. – Peter discordou, e com a permissão da menina pegou o notebook para si.
Parker recortou a imagem que a notícia exibia do homem de quarenta anos e cabelos escuros, Simon. Usando um programa novo e ainda em teste que o setor de Inovações dos Vingadores estava desenvolvendo, ele buscou as feições de Williams em qualquer registro de câmeras de trânsito e de segurança espalhadas por Nova York. Após longos minutos e muitos dados inúteis e antigos, como bancos e shoppings, o software mostrou apenas um resultado significativo.
O rapaz abriu as imagens, que eram as mais recentes e datavam dois anos atrás. Por coincidência, a dita câmera que registrara o rosto de Simon estava na rua de baixo da fábrica abandonada que Olivia e Peter pretendiam visitar. Lá, a face do investigado, acompanhada do corpo vestido em um terno chique, visitava a instalação clandestina da própria empresa – o que já acontecera antes outras sete vezes, segundo o registro. Nas primeiras fotos, a unidade ainda parecia funcionar; já nas duas últimas, o visual abandonado da fábrica espantava a atenção de quem via de fora, mas não impedia que Simon entrasse cautelosamente. E então, depois daqueles registros, ele sumiu misteriosamente.
-A última foto foi tirada duas semanas depois da prisão do Abutre. - Peter informou, conectando as datas. - Foi o que obrigou o Simon a apagar o símbolo das armas na fachada e montar o cenário abandonado pra que o esconderijo não fosse descoberto. E apesar de o pegarem com a corrupção da Williams, ninguém chegou até a fábrica. - Concluiu o rapaz. - Olivia, acho que encontramos o Magnum.
-Eu tenho certeza. - Disse a garota com satisfação na voz. Ela esticava para o próprio celular, que exibia uma foto.
No smartphone de Liv, estava uma das imagens da invasão ao complexo dos Vingadores, aproximada no homem que orquestrara o ataque, vestido em seu uniforme de Ervilha-Voadora.
-Isso no uniforme dele não é um M de Magnum virado ao contrário. - Olivia enunciou apontando para o traje, se referindo a suspeita inicial deles.
-É um W de Williams. - Os dois jovens falaram juntos, e concluíram a ideia com sorrisos de satisfação nos rostos.
-Somos fodas! - Olivia exclamou, oferecendo a mão para um high-five animado com o rapaz, que correspondeu.
-Com as provas da fábrica, nós já o pegamos. - Comemorou ele.
-Sabe... por mais que eu não vá muito com a sua cara, nós dois formamos uma ótima equipe. - Olivia constatou com as sobrancelhas erguidas.
-É, formamos sim. - Parker respondeu com um riso. Logo depois, a conversa caiu no silêncio. - Você não vai com a minha cara por que isso te incomoda? - Ele retomou, voltando a tamborilar os dedos ligeiramente nas costas da garota para imitar a aranha.
-Não me toca, Cabeça-de-Teia! - Ela esbravejou, se esquivando imediatamente com um instinto, enquanto Peter só sabia rir.
_
Olivia e Peter acreditavam estar cada vez mais perto de encontrar o terrorista misterioso que vinha ameaçando a humanidade e tirando a paz dos Vingadores. Impulsionados pela satisfação com a última descoberta, os dois deixaram a pousada onde estavam hospedados para darem mais um passo em sua missão: visitar a fábrica onde presumiam ter sido construído o robô gigante da ponte Harvard. Os dois andaram por alguns quarteirões no ar gélido da cidade, enquanto Peter procurava um jeito de elogiar a blusa do Ferris Bueller que Olivia usava sem parecer ainda mais nerd.
-Você é muito nerd. - Foi o que ela disse rindo, mesmo ele tendo usado a melhor frase que encontrou.
-Acho engraçado me acusar sendo que é você que está usando a blusa. Você também é nerd.
-Não, eu sou inteligente. São duas coisas bem diferentes. - A garota retrucou. - Gosto de algumas coisas consideradas nerds, mas é pura coincidência.
-Ok, já que é tão esperta, veja se consegue responder isso, porque tenho pensado nessa ideia desde o hotel. - Peter disse, aquecendo as mãos dentro dos bolsos da jaqueta. - Se estivermos mesmo certos sobre o Williams, o Magnum é de Massachusetts. Como será que ele ficou sabendo sobre os negócios locais do Abutre aqui em Nova York?
-Bom, eles devem ter um amigo em comum. - Supôs a menina. - As notícias voam no mundo do crime.
Liv e Peter pegaram um táxi na próxima esquina e foram até o outro lado da cidade, onde a fábrica se instalava, para continuar a busca por respostas. As redondezas eram pouco movimentadas, e o terreno bem escondido. Encapuzados, os dois jovens se esquivaram entre os tapumes e grades para chegarem até o local, e entraram pelas saídas de ar sendo içados por uma teia de Parker. Pousaram em segurança no centro da fábrica, iluminada pela luz do sol que entrava pelas ventoinhas do teto.
O local extenso e retangular que pertencia à Williams estava completamente vazio, exceto por teias de aranha e ninhos de rato e pássaros. Havia marcas pretas no chão indicando que equipamentos pesados já estiveram ali, mas foram arrastados.
-Acho que a grama alta e os tapumes não eram encenação pra parecer que a fábrica estava abandonada. - A voz desconfiada de Olivia reverberou pelas paredes altas.
-Vamos procurar, pode ser que encontremos alguma coisa. - Parker insistiu, e saiu andando pelo local com a lanterna do celular ligada.
Aquela fábrica poderia ser uma qualquer, se os dois adolescentes não tivessem tanta certeza de que abrigara respostas importantes um dia. No entanto, eles procuraram e procuraram, mas não conseguiram achar nada que tivesse permanecido ali para lhes dar mais pistas. Nenhuma pasta de arquivos esquecida debaixo de uma prateleira empoeirada dessa vez. Eles foram ao escritório, à sala de máquinas e até mesmo aos banheiros, vasculhando cada canto daquele lugar. Mas a pessoa que evacuou a fábrica tomara todos os devidos cuidados pra não deixar sequer uma pegada para trás.
-Já cansei de desviar meus passos dos ratos e de enfiar meu nariz nesses cômodos empoeirados, Parker. - Olivia bufou impaciente, após quase duas horas de investigação minuciosa. - Não tem nada aqui.
-Tem que ter alguma coisa. Não podemos ter vindo até aqui pra nada. - Peter discordou, sem tirar os olhos das bancadas. Ele assoprou uma delas, levantando uma nuvem de poeira que o fez tossir.
-É claro que tinha alguma coisa, mas não está mais aqui. Anda, antes que um de nós fique com a rinite atacada.
-Eu não tenho rinite – Peter protestou com a voz embargada. No instante seguinte, ele soltou um espirro alto que fez com que uma das pombas hospedadas no teto saísse voando.
-Sei. – Ela respondeu tediosa. – Ficar aqui analisando grãos de poeira e cocôs de pássaro é ridículo. Vamos embora. - Retrucou a garota, notando que o sol já estava se pondo e a iluminação natural do lugar ficava mais fraca a cada momento.
-Mas eles produziram o robô aqui. Temos que provar!
-O Magnum sabia que esse lugar era um alvo, Parker! Ele tirou todas as provas e as levou embora pra garantir que ninguém conseguisse pegá-lo aqui depois que o Abutre foi preso. Você não está vendo? Esse barraco está abandonado há anos! - Olivia discutia frustrada e impacientemente. - Vamos logo.
Peter cedeu, bufando e levantando do chão sujo. Os dois caminharam com passos pesados até a teia que os trouxera para dentro, e a escalaram até o lado de fora.
McCall e Parker pegaram outro táxi, e ficaram em silêncio durante todo o caminho de volta para o hotel. Ambos foram até a fábrica muito esperançosos, e agora sentiam que a viagem tinha sido perdida. As descobertas até agora eram ótimas, mas nenhuma levaria Simon Williams para a prisão. Os dois voltaram aos dormitórios, lavaram toda a poeira e serragem em um banho quente e pediram jantar pelo serviço de quarto.
-Você gosta de altura, não é? - Olivia perguntou, observando o rapaz que estava dependurado na sacada do lado de fora.
-Me acostumei com ela. Ajuda a pensar. - Ele explicou, virando para a garota que caminhou até perto dele.
-Não acredito que viemos até Nova York pra nada. - Liv bufou, passando uma das pernas para o lado de fora da grade assim como Parker fizera, e então ficou sentada de frente para ele.
-Não foi pra nada. Descobrimos a identidade do Magnum. - Peter ponderou, comendo um bolinho de carne restante da porção que eles haviam pedido.
-Podíamos ter feito isso lá de Cambridge. - Discordou ela, pegando um bolinho também. - Viemos pra cá só pra ver a fábrica idiota, e acabamos sem nada.
-Vamos encontrar outro jeito de incriminar o Williams. Já chegamos até aqui - Disse o rapaz em uma dose de otimismo. - Só vai levar mais tempo do que imaginávamos.
-Tomara que ninguém mais tenha que morrer por isso. - Olivia disse com peso na consciência, então ficou em silêncio alguns segundos. - O que vamos fazer agora? Voltar pra casa?
-Não podemos. Teoricamente estamos de férias, qual seria sua explicação pra aparecer mais cedo? - Peter alertou sabiamente.
-Tem razão. - Ela concordou, e em seguida soltou um riso abafado ao olhar o visor do celular. - Meu pai não para de me mandar mensagens. Ele está superpreocupado, fica perguntando a cada cinco minutos onde eu estou e se nós estamos bem.
-Por que isso é engraçado? - Parker sorriu, acompanhando-a.
-É que ele está realmente se empenhando em ser um pai cuidadoso, e eu acho bonitinho. - Ela contou, dando de ombros. - Desde que essa loucura do stalker começou e eu fui morar com ele, é assim que ele tem agido. Acho que ele se sente meio responsável por isso, então faz de tudo pra ajudar.
-Não tinha como ele prever, é óbvio. - O garoto aliviou. - Mas eu entendo.
-Eu também. - Ela sorriu de lado. - Sabe, meu pai e eu somos muito ligados. Sei que às vezes pode não parecer, porque eu vivo tirando com a cara dele, o insultando e dizendo que a barba dele é ridícula - Esse comentário fez Peter rir - E ele vive encrencando comigo e tentando mandar em mim, mas essa é nossa forma de sermos pai e filha. Digamos que nós dois não somos muito chegados em sentimentos, então encontramos nosso jeito.
-No começo tive a impressão que a relação de vocês era bem abalada, porque o Sr. Stark é... bem, o Sr. Stark. - Os dois riram. – Pensei que você guardava algum tipo de mágoa. Não foi difícil crescer lidando com quem ele é, com o Homem de Ferro e tudo mais?
-Olha, quando eu era mais nova era um pouco difícil, sim. - Olivia contou. - Eu era só uma criança e não entendia por que meu pai não podia estar perto quando eu ficava gripada ou pra me ensinar a andar de bicicleta. Mas de certa forma eu estava acostumada a não ter a presença dele, e à medida que eu fui crescendo eu passei a entender o porquê. - Ela explicou.
-O que foi que você compreendeu?
-Meu pai pode ser muitas coisas, mas ele é bem sensível por dentro, por mais que não admita. Eu sei que, assim como doía em mim, doía nele não estar sempre ali. Ele jamais teria sido ausente se pudesse decidir, mas ele tinha feito uma escolha anteriormente que o privava de muita coisa. Foram só... circunstâncias. Então, ao contrário do que muita gente pensa, eu não tenho mágoa nenhuma. Ele sempre entrava em contato quando podia, mandava cartões musicais e livros de colorir, sempre me colocou pra estudar nos melhores colégios... e não era tão ruim. Eu tinha um pai legal que aparecia na TV o tempo todo, e ganhava presentes muito legais de natal e aniversário. - Ela disse dando ênfase referindo-se ao dinheiro, e os dois deram risada.
-Mas como foi que você aprendeu a lidar com isso? - O rapaz perguntou. - Tipo, o que fez você mudar de ideia a respeito dele?
-Eu percebi a importância do que ele estava fazendo ao invés de ficar lá pra mim. - Falou a garota. - Meu pai salvava milhares vidas e arriscava a própria, só pra ajudar as pessoas que precisavam dele muito mais que eu naquele momento. Seria egoísmo da minha parte querer que ele parasse de lutar pelo mundo só pra estar em casa e assistir Zoboomafoo comigo. - Ela riu fraco. - Ao invés de detestar o trabalho dele, eu aprendi a admirá-lo. O Homem de Ferro e os Vingadores são a melhor coisa que ele poderia ter feito com o poder e a influência dele. E eu tenho muito orgulho do quanto ele se doa pra esses projetos, porque o mundo precisa muito disso. Eu costumava ficar de coração partido porque ele não era meu herói, entende? Ele era o herói de todo o resto da população. Mas então eu percebi que estava sendo injusta e imatura. E boa parte desse desprendimento veio graças à minha mãe, porque ela entendia o meu lado e sempre fez de tudo pra que eu me sentisse completa, mesmo sem um pai. Então eu me adaptei e parei de esquentar a cabeça, curtindo o momento quando ele estava presente, e ficando bem do mesmo jeito quando ele não estava.
-Entendi. - Peter respondeu, matutando uma pergunta que não sabia se deveria fazer. - Sua mãe parece muito legal. Ela, tipo...
-Quer saber o que rolou entre ela e o meu pai? - Liv falou assertiva, com as sobrancelhas arqueadas.
-Você liga de me contar? - Ele torceu o lábio.
-Eu não, mas o meu pai ligaria. - Olivia riu. - Ele não gosta muito de falar sobre isso. Bom, o nome da minha mãe é Meredith, e ela conheceu meu pai quando os dois estavam no MIT. - A garota iniciou. - Ela fazia psicologia e ele engenharia, e os dois se apaixonaram como qualquer casal. Só que meu avô, Creighton McCall, não era exatamente um fã da família Stark. - Ela disse com dramaticidade e riu. - Ele era muito pacifista e achava um absurdo que meu outro avô, Howard Stark, tivesse uma empresa que vendia armas. "Enriquecer através da guerra dos outros", como ele dizia, era algo que ele não tolerava, e o ódio entre Creighton e Howard já era antigo por conta disso. Nem preciso dizer que ele surtou quando minha mãe se interessou pelo meu pai, herdeiro da Stark Industries, então ele proibiu a relação dos dois e eles tiveram que parar de se falar. Mas meus pais nunca ligaram muito pra briga das famílias, por isso, quando meu avô Creighton morreu, os dois voltaram a ter contato e reataram o namoro. Eles ficaram juntos por dois anos, até que o jovem Tony pediu a jovem Meredith em casamento.
-Wow, isso tá emocionante. - Peter comentou, fazendo Olivia dar risada. – E aí?
-Tudo ia bem entre os dois, mas aí o meu pai foi sequestrado pelos terroristas no Vietnã, rolou a explosão, os estilhaços no coração e tudo mais. Ele ficou muito debilitado e estava tendo problemas pra se adaptar ao reator ARC, que liberava muita radioatividade, e os médicos não tinham certeza sobre as chances de vida dele. Aquilo foi bem complicado, e meus pais ficaram em um momento confuso depois disso, coisa de casal, não sei direito. - Olivia explicou. – Sei que, em algum momento no meio dessa loucura, meu pai teve a ideia do Homem de Ferro. Ele ficou muito entusiasmado e começou a desenvolver a armadura, mas minha mãe não aprovava. Ela não queria vê-lo se arriscar daquele jeito, dizia que era perigoso demais, e então eles brigaram feio. Foi tipo: lágrimas, gritos, portas batendo e ela disse "ou eu ou o Homem de Ferro". E então eles terminaram de vez.
-Ele sacrificou o noivado pelo Homem de Ferro... - Parker disse surpreso. - Eu não tinha ideia de tudo isso.
-Meu pai não fala disso com ninguém. A maioria das pessoas nem sabe que ele já foi noivo, e pra ele isso era bom porque mantinha a mim e a todo o resto no anonimato.
-Mas e então? O que aconteceu?
-Bom, eu surgi em algum momento no meio dessa bagunça. Minha mãe descobriu que estava grávida depois que eles tinham terminado, e não sabia o que fazer. Mas depois que o Homem de Ferro foi colocado em prática, ela viu que não tinha espaço pra uma criança na vida tão complicada do meu pai, pois ela tendia a ficar ainda mais maluca. E quando ele revelou que era Tony Stark quem estava por trás da armadura, mamãe achou que seria perigoso demais pra mim se as pessoas soubessem que ele tinha uma filha. Além disso, ela tinha certeza que poderia tomar cona de nós duas sozinha. Então ela manteve em segredo. - McCall continuou a explicar.
-Mas então como ele ficou sabendo sobre você?
-Meu pai só foi descobrir alguns anos depois, quando eu já era nascida. Um dos inimigos do Homem de Ferro estava no hospital psiquiátrico onde minha mãe trabalhava, tomando o controle com poderes mentais ou algo assim. Meu pai salvou o dia e reencontrou minha mãe. Ela decidiu contar a ele sobre mim, e obviamente Tony ficou em choque e também bravo por ela ter escondido aquilo dele. Mas no fim deu tudo certo, e meu pai quis me assumir. Ele se comprometeu em pagar todas as minhas despesas e vinha me visitar sempre que podia. Mas, pro meu bem, eles decidiram que seria melhor me manter em segredo pra não me expor a nenhum perigo por conta de quem era Tony Stark. Eu sabia, mas ninguém mais deveria saber; e as coisas ficaram assim. - Contou a garota. - Hoje ele está noivo da Pepper, que na época era namorada dele e aceitou isso surpreendentemente bem, e minha mãe está namorando um cara bem legal, que a levou pra passar as férias na Austrália. E eu estou aqui. – Ela deu de ombros no fim, com um sorrisinho.
-Que loucura. - Parker riu, surpreso. – Ok, mas onde começa a história de Olivia McCall? Tipo, você tem sua vida, seus poderes e tudo mais, deve ter sido interessante... – Ele interrompeu a si mesmo. - Mas se não quiser me contar tudo bem, eu não quero te interrogar nem nada.
-Não, relaxa. – A menina riu. – Nunca pude contar tudo isso pra ninguém antes, então é legal falar sobre mim. Sabe, eu era bem alheia a toda essa loucura de paternidade na época em que aconteceu, tinha dois ou três anos no máximo. Cresci de um jeito bem normal e sem ter noção de nada enquanto era criança. Mas logo cedo eu já tinha começado a manifestar as minhas... esquisitices. - Liv comentou. - Quando eu era pequena, não tinha nenhum controle disso, então meus poderes se demonstravam de acordo com as minhas emoções. Minha mãe conta que quando eu era bebê e chorava por fome ou sono, fazia as luzes do meu quarto piscarem. E quando brincávamos de ataque de cócegas, eu ria tanto que fazia alguns objetos flutuarem.
-Maneiro. - Peter disse. - Bizarro, mas maneiro.
-Ela viu claramente que eu não era normal, e como ela é psiquiatra, fez vários exames e constatou a alteração no meu sistema nervoso. Depois, quando meu pai já estava por perto, os dois fizeram testes mais apurados e confirmaram que a mutação que originou os meus poderes tinha sido gerada pela radioatividade do reator ARC, liberada durante os primeiros e mais agressivos meses em que meu pai o usou, causando uma alteração nos cromossomos hereditários dele e passando aquilo pra mim.
-E como era ser uma criança com poderes? - Questionou o rapaz. - Quando você queria alguma coisa e sua mãe negava você ameaçava queimar a geladeira ou acabar com a luz do prédio?
-Não, mas talvez eu devesse ter feito isso. - A garota riu, coçando o queixo. - Eu não tinha muito controle sobre as minhas habilidades. Isso era meio perigoso, na verdade. Por isso eu estudei em casa até ter idade suficiente pra aprender a me conter, e poder ir pra escola sem fritar a classe toda ao errar uma resposta ou mover coisas por aí sem querer enquanto estivesse brincando. - Os dois riram. - Foi então que eu descobri que não se aprende equações de segundo grau na pré-escola.
-Como assim? – O rapaz assustou-se.
-O superdesenvolvimento do cérebro não me deu apenas poderes legais, também me deixou mais inteligente. - Ela esclareceu. - Você pensou que minha habilidade com números fosse algo tipo "tal pai, tal filha" que eu herdei dos Stark, não é? - Peter concordou, o que a fez rir. - Bom, não é. Somos parecidos em muita coisa, eu sei, mas isso é só coincidência.
-Entendi. Aí você entrou na escola e viu que plantar feijão no algodão e brincar de massinha era muito entediante pra você, certo?
-Exatamente, então fui adiantada alguns anos. Mas não muitos pra que não ficasse alarmante, só o suficiente pra que eu pensasse que ir pra escola era uma brincadeira e que eu poderia continuar realmente evoluindo ao estudar coisas mais complexas sozinha.
-Mas por que você não foi pra uma escola especial de superdotados ou alguma coisa assim?
-Levantaria suspeitas. - Liv explicou, o que fazia sentido. – Quanto mais eu exercitasse o cérebro, mais aquela predisposição iria se desenvolver, e poderia ficar muito estressada ou por em risco a minha normalidade. Além disso, meus pais nunca gostaram da ideia de uma escola diferenciada. Eu já vivia uma vida bastante reservada da sociedade por conta da minha identidade, e estudar em um local especial só me faria ainda mais diferente e me privaria da vida de uma criança normal. Então eu segui a vida escolar assim, e entrei pro MIT aos quinze anos. – Contou. - Foi difícil pra minha mãe deixar eu me mudar, mas como os Vingadores já tinham instalado a base em Massachusetts, ela ficou mais tranquila. Eu estava próxima do meu pai, embora não o visse muito por conta do segredo. Mas pra minha mãe isso era até bom, porque um dos maiores medos dela sempre foi essa proximidade, na verdade. – A menina riu de leve.
-Por quê? - Peter estranhou. – Ela não queria que vocês criassem laços?
-Ela morria de medo que eu me tornasse como ele. - Liv contou com um sorriso, e então pulou para dentro da sacada, virando-se para a rua e apoiando os dois braços na grade para observar a vista. - Minha mãe sempre viu o quanto eu e meu pai éramos parecidos. Ela gostava disso, mas também tinha medo. Ela não queria que eu fosse porque não me queria envolvida com os Vingadores, e esse medo só era tão grande porque ela sabia que eu faria isso se tivesse chance. Internamente, minha mãe via que cedo ou tarde eu iria querer seguir os passos do meu pai e usar meus poderes pra ser uma heroína. A gente brigou muito por isso durante os anos, mas ela internalizou que, sendo tão parecida com o meu pai, eu tinha uma das características mais fortes dele: fazia o que queria sem aceitar não como resposta.
-É, seu pai faz muito isso. - Parker concordou.
-Mas me envolver com os Vingadores nem era uma possibilidade antes. É que quando o stalker começou a me mandar as mensagens de ameaça, meu pai fez questão de me trazer pra morar com ele no complexo pra me proteger. Ele fez um quarto isolado e bem seguro pra mim lá dentro, me desligou do mundo e me deu um trabalho nas Inovações, pra que eu tivesse algo pra fazer e pra que pudesse continuar sob a vigilância. A única coisa que ele não me convenceu a fazer foi desistir da faculdade, então ele espalhou escoltas disfarçadas pelas salas de aula e pelo campus pra ficarem de olho em mim.
-Isolamento total. – Peter fez uma careta.
-Não é muito diferente da vida que eu levava antes. Eu sempre fui meio isolada – Olivia riu. - Meus pais fizeram de tudo pra tentar me deixar uma garota normal, mas acho que isso é meio impossível. Fora os poderes, esconder quem eu era de todos que eu conhecia era bem difícil. Eu nunca quis fazer amigos próximos ou nada do tipo, porque não queria ter que mentir sobre quem eu era. Afinal, ninguém jamais poderia descobrir sobre o meu pai, porque se a informação vazasse não seria apenas notícia mundial, mas também um risco enorme pra mim.
-Que horrível. - Peter lamentou.
-É meio solitário, mas eu nunca liguei muito, pra ser honesta. Eu sempre tive minha mãe, meus estudos e às vezes o meu pai também, e eu me acostumei assim. - A garota explicou sem dor alguma na voz. - E eu não sou muito ligada em laços e sentimentos, de qualquer forma. - Riu.
-Criar laços é a coisa mais difícil de se fazer pra quem tem segredos. - O garoto concordou, saindo da beirada da grade e se juntando a Olivia encostado à sacada. - Você não quer ter que mentir pra quem você se importa, então prefere não se importar com ninguém.
-Exatamente.
-Que bom que é fácil pra você - Ele riu fraco. - Porque pra mim não é. Tipo, eu amo meu trabalho, mas essa parte é bem ruim. Quando comecei com o Aranha, dizia como desculpa que tinha um estágio nas Indústrias Stark que tomava boa parte do meu tempo. Aí, quando ia me mudar pra Massachusetts pra ficar com os Vingadores, falei pra todos os meus amigos que tinha sido efetivado e ia trabalhar na sede.
-É uma merda. - Olivia compadeceu, e os dois ficaram algum tempo em silêncio. - Mas como foi que você começou com o Homem-Aranha, afinal?
-Você quis dizer como foi que o Homem-Aranha começou comigo? - Peter corrigiu com humor. - Eu estava no primeiro ano, e durante um passeio da escola a um laboratório de biotecnologia, uma das aranhas radioativas usadas pra um dos experimentos fugiu e me picou. Eu quase morri de febre, infecção ou o que quer que fosse, e no dia seguinte acordei com esses poderes. - Ele explicou. - No início, confesso que ser um herói não foi minha primeira ideia. Pensei em usar minhas habilidades pra virar um atleta ou coisa do tipo. Mas aí meu tio Ben, que foi meu pai a vida toda, morreu baleado depois de um assalto que eu poderia ter evitado. Foi aí que eu percebi que as minhas habilidades podiam servir pra coisas bem maiores e mais especiais do que touchdowns, e criei o Homem-Aranha.
-É um propósito bem melhor, sem dúvida. - Liv sorriu de lado. - Sinto muito pelo seu tio, ele parecia ser muito especial pra você. - Ela tinha uma pergunta em mente que não sabia se deveria fazer. - Ele...
-Quer saber o que houve com o meu pai de verdade pro meu tio ter assumido o papel dele? - Peter disse assertivamente, e a garota se surpreendeu com a exatidão do rapaz, o que o fez rir ligeiramente. - Meus pais morreram quando eu era pequeno, em um acidente de avião. Eles saíram para viajar um dia e me deixaram na casa dos meus tios, então nunca mais voltaram. Os dois me criaram.
-Caramba, Parker... - A garota ficou surpresa e sem graça.
-Relaxa, faz muito tempo. - Ele sorriu de lado, confortando-a. - Recentemente eu descobri que a morte deles não foi um acidente em vão. Seu pai me contou que Richard e Mary Parker eram na verdade agentes da S.H.I.E.L.D., e eles estavam em uma missão quando o avião deles caiu. Os dois estavam salvando vidas, assim como eu faço hoje. Descobrir isso foi um dos meus principais motivos pra decidir me juntar aos Vingadores definitivamente, talvez como uma forma de seguir os passos deles ou continuar o que eles faziam, sabe?
-Sim, eu sei. - Olivia concordou, pois entendia daquilo. - Sua família deve ter ficado orgulhosa de você por essa escolha.
-Bom... - O rapaz deu um sorriso amarelo. - Na verdade foi meio que o oposto. É complicado.
-O que houve? - Liv franziu o cenho. Talvez ela não devesse questionar, mas aquela conversa já estava tão surpreendentemente íntima para os dois que ela não viu de que maneira uma pergunta como aquela faria diferença.
-Eles nunca souberam sobre o Homem-Aranha. - Parker contou. - Não até minha tia May descobrir por acidente, e então começarmos a brigar por isso. Depois do que aconteceu com os meus pais e o meu tio, era totalmente compreensível que ela ficasse superprotetora comigo, e ela estava horrorizada em saber sobre todo o perigo que eu enfrentava como o Homem-Aranha. Desde que ela soube, começou a ficar impossível conviver com a minha identidade secreta. Ela sabia que eu saía de casa todas as noites pra quebrar todas as regras que ela me estabelecera, e pra me colocar em situações de risco que ela tremia só de pensar. E eu tinha que sair de casa todas as noites pensando que estava a desapontando, porque fazia algo que ela não aceitava e a deixava triste. – Ele deu de ombros. – Ela foi minha mãe durante a vida toda, e eu não estava mais aguentando fazer aquilo com ela, sabe? Mas eu também não podia parar o meu trabalho, porque as pessoas precisavam de mim. Nós tentamos conversar várias vezes, mas nenhuma das duas opiniões iria mudar. Então, quando eu descobri sobre os meus pais e o Sr. Stark me fez o convite pra equipe de novo, eu aceitei e decidi me mudar. – Peter explicou. - Claro que eu não fiquei feliz em deixar a tia May, mas eu precisava fazer o que era certo. Ela jamais iria entender tudo que ser um herói envolve, e eu nem esperava que entendesse.
-Ser herói é uma escolha, mas não é fácil. Principalmente porque não envolve apenas a sua vida. - Olivia acrescentou. - Assim como eu sofri as consequências da escolha do meu pai, sua tia sofreu as suas. Mas, às vezes, mesmo fazendo a coisa certa, acabamos magoando quem a gente ama.
-É verdade, mas tem dias em que eu me questiono se vale mesmo a pena. - O rapaz admitiu sorrindo torto. - Quando eu olho pra pessoa que seu pai é e pra tudo que ele fez, eu não tenho dúvidas. Mas eu não sou Tony Stark, eu sou só... o Amigão da Vizinhança, sabe?
-Você acha que não vale? – Liv estranhou.
-Não é isso. É que às vezes parece que não faço tanta diferença quanto deveria. – Ele admitiu.
Olivia ficou encarando o rapaz ao seu lado por alguns segundos, e depois desviou o olhar para a paisagem de prédios que estava à frente.
-Eu acho que você faz mais do que pensa que faz. - Ela disse, francamente. - Deixa eu te contar. O Homem-Aranha já me salvou uma vez, sabia?
Peter virou-se para ela, surpreso.
-Sério? Ele salv... Quer dizer, eu salvei? - Falou espantado. - Como?
-Eu não sei se você vai se lembrar disso – A garota disse sorrindo devido à reação assustada dele. - Mas um dia um cara roubou uma bicicleta e saiu pedalando rápido com ela pela calçada. Você o parou e a pegou de volta, devolveu na frente de uma loja e deixou um bilhete nela, que dizia "essa bicicleta é sua? Se não é, não a roube! Homem-Aranha" - Ela testemunhou, e os dois riram em seguida.
-Eu lembro sim, foi o mesmo dia em que ajudei aquela senhora dominicana que me comprou um churr... - Peter interrompeu-se no meio, notando o quão irrelevante e estúpido era aquele comentário. Ele precisava parar de contar aquilo pras pessoas.
-Ela fez o que? - Olivia deu risada.
-Nada, esquece. - Ele chacoalhou a cabeça. - Eu me lembro. O que tem?
-Bom, aquela bicicleta era minha. - Contou a menina. - É uma longa e complicada história, mas você realmente me salvou devolvendo-a pra mim. Basicamente, eu não estaria aqui se não a tivesse de volta. E sempre fui grata ao Homem-Aranha por isso.
-Jura? - Peter disse confuso e surpreso.
-É sério. O que eu estou tentando dizer é... - Ela respirou fundo. - Você fez uma grande diferença mesmo sem saber, e com uma coisa bem pequena. E eu não fui a única que você ajudou durante todo esse tempo como o Aranha.
-Mas mesmo fazendo uma grande diferença, não é preciso ter superpoderes pra impedir o roubo de uma bicicleta. - Ele insistiu.
-Tem razão, não é preciso ser um super-herói - Liv concordou. - Mas é preciso ser um ótimo ser humano.
Peter abriu um sorriso sincero diante daquele comentário, o que fez Olivia rir. Aquela era a coisa mais legal que ela já havia dito, e não veio acompanhada de nenhum xingamento ou sarcasmo. Os dois ficaram em silêncio depois daquilo, o que os fez rir instantes depois.
-Ok, essa conversa já ficou bem mais longa e sentimental do que devia. - Olivia disse, pendurando-se na grade da sacada. - É hora de dormir.
-Tem razão, já é quase uma da manhã. - Peter surpreendeu-se ao olhar no relógio do celular.
Olivia fechou o casaco que usava e apertou-o contra o corpo abraçando a si mesma, e em seguida entrou para o dormitório, onde estava mais quente.
-Boa noite, Menino-Aranha. - Ela disse com um aceno de cabeça e um riso contido, e então entrou.
-Boa noite, Olivia.
-Bom, nós já estamos no recesso de fim de ano na faculdade, então pensamos que seria bom tirar umas férias. - Peter falou com um sorriso amarelo. Ele era péssimo com mentiras.
-Vocês querem tirar férias? - O homem estranhou. - E eu, por que ninguém diz que eu deveria sair de férias? - Tony apontou para si mesmo, sentado na poltrona onde esteve trabalhando o dia todo.
-Não são férias, pai, são só alguns dias. - Olivia esclareceu. - Peter quer ver a tia dele, e eu vou visitar minha mãe.
-Sua tia, é? Faz um tempo que você não vai vê-la... - Stark observou.
-É, eu sei... - O garoto coçou a nuca, desconfortável. - É por isso que queria ir.
-Podemos conversar sobre isso depois que eu sair do trabalho?
-Não é uma decisão tão difícil. Só queremos ver nossos familiares durante as festas, e passar o natal aonde vá ao menos haver uma ceia de Natal. - Liv disse simplesmente.
-Mas nós vamos ter uma ceia de Natal aqui - Tony retrucou. - Eu disse pra vocês que estou planejando um jantarzinho lá no alojamento...
-Pai, pedir pizza da Domino's não é uma ceia. E eu duvido que eles abram nesse dia. - Olivia rolou os olhos.
-Você ficaria surpresa com o horário de funcionamento desses lugares. - O homem apontou para ela com as sobrancelhas erguidas.
-Tá, tanto faz... - Ela negou com a cabeça. - Podemos ir depois do Natal então, se você quiser. É só uma semana, não tem nada demais.
-Pro Peter tudo bem. Você é a questão. - Tony respondeu enquanto digitava algo em seu computador. - Sabe por que está aqui. Não pegamos aquele stalker ainda, você não está a salvo pra ir aonde bem quiser.
-Você tá exagerando. Já faz meses que nada acontece, não posso ficar sobre vigilância pra sempre. – Ela insistiu. - Além do mais, é minha mãe. Não pode negar a mãe pra uma garotinha.
-Se você viajar bem escoltada... - Tony ponderou.
-Ah não, sem chance. - A garota o interrompeu, afinal era uma péssima ideia pra quem queria fazer uma investigação às escondidas. - Você conhece a senhora McCall, ela vai surtar se tiver que ficar com dois caras desconhecidos de dois metros de altura na casa dela todo esse tempo. - Liv advertiu.
-É, ela não iria aceitar. - Stark ponderou novamente. - É muito arriscado, Liv. Esse tipo de gente fica apenas esperando um descuido pra agir. Combinamos que você ficaria aqui até estar realmente segura, e eu não estou muito confortável em deixar você sair sem segurança nenhuma ainda.
-Mas eu não vou estar sem segurança. É por isso que eu vou com o Peter. - Olivia apontou para o rapaz, que engoliu seco. Eles não tinham combinado um roteiro para a conversa, apenas chegaram à sala de Stark e antes de entrarem Liv disse "deixa que eu falo". Aquilo o pegou desprevenido. - Se acontecer qualquer coisa, ele vai estar comigo pra me proteger.
-Eu... eu vou cuidar bem dela, Sr. Stark. - O rapaz arriscou dizer, e tremeu ao ver o olhar do homem pousando sobre ele com desconfiança.
Tony ficou encarando os dois jovens por alguns segundos. Olivia estava sorrindo naturalmente, e Peter permaneceu calado como sempre. Ele não sabia dizer se era uma boa ideia, mas era para verem a família...
-Quatro dias, nem um minuto a mais. - Deu o veredicto, e viu a filha vibrar. - E se acontecer qualquer coisa, mesmo que seja só uma suspeita, eu quero que me liguem e voltem pra cá imediatamente.
-Pode deixar. - Os dois disseram em uníssono, e em seguida saíram do escritório para deixar Stark voltar aos afazeres. Falar com ele enquanto estava ocupado foi uma tática de Olivia para fazer Tony concordar mais facilmente, só pra tirar os dois dali e poder voltar ao trabalho mais rápido.
-Então... - Peter disse segurando o riso assim que deixaram a sala. - Você quer que eu proteja você?
-Claro que não, eu só disse aquilo pra ele sossegar. - A garota negou veementemente com a cabeça. - Eu sei me virar.
-Ok, ok. - Ele cedeu. - Entendo que possa ser difícil pra você admitir. Quer que eu banque o segurança disfarçado então, seja mais discreto?
-Escuta, Cabeça-de-Teia – Ela chegou perto dele. - Se tentar me fazer parecer uma donzela em perigo, eu quebro a sua cara.
Peter riu, arregalando os olhos e erguendo os braços em rendição diante da ameaça.
-Anda logo, temos mais o que fazer. - Ela puxou-o pelo braço, rolando os olhos enquanto fingia uma cara séria.
Os dois adolescentes não demoraram a providenciar passagens para dali a três dias, com destino à Nova York. Quando chegaram, a neve da última tempestade já derretia em meio aos remanescentes enfeites natalinos ainda espalhados pela cidade. Ao contrário do que disseram, Olivia e Peter não visitariam ninguém: ficariam hospedados em uma pousada no centro, usando duas identidades falsas que conseguiram com a ajuda de Romanoff – a mais recente compactuada – para continuarem a investigação. Os dois chegaram depois do almoço, e foram do aeroporto direto para a instalação.
-Luke e Lauren Smith. - Enunciou cordialmente o recepcionista, checando as reservas e a documentação. - O quarto de vocês é o 406, fica no 4º andar. Tenham uma boa estadia.
Após o check-in, um funcionário escoltou os dois falsos irmãos de Toronto até os aposentos alugados para as "férias". Era um quarto duplo, com dois dormitórios separados por uma porta de correr e uma sacada externa que os conectava. Peter e Olivia largaram as malas pelo chão e começaram a checar o local.
O rapaz jogou-se em sua cama, exausto por conta do voo. Não era acostumado com aviões, e por estar com Olivia esforçou-se o tempo todo para parecer mais corajoso e relaxado do que realmente estava. Ele fechou os olhos, e de repente, ouviu um grito abafado vindo do outro lado da divisória.
-O que foi? - Ele irrompeu assustado, e encontrou Olivia sentada na cama abraçando as duas pernas.
-Tem uma aranha no tapete! – Ela exclamou. - Mata ela, Parker!
O garoto olhou para o chão e viu um aracnídeo amarronzado de tamanho médio parado sob o tecido listrado, então ficou encarando-o.
-Mas eu vou matá-la? - Ele torceu o nariz. Aquilo parecia um pouco errado na cabeça dele, afinal...
-Qual o problema, ela é sua prima ou algo do tipo? Mata logo! - Ordenou a menina, impaciente.
Peter não podia matá-la; aquilo ia contra seu código moral, de alguma forma. Contrariado, ele pegou um dos panfletos do hotel que estava na bancada e envolveu a pequena aranha, levando-a até o lado de fora da sacada, e colocando-a sobre a grade logo em seguida. O rapaz olhou para Olivia, que relaxou instantaneamente após constatar o fim do perigo. Para alguém que se dizia tão corajosa, uma cena como aquela era quase cômica.
-Então você tem medo de aranhas? - Ele disse arqueando as sobrancelhas, e a garota rolou os olhos.
-Eu não tenho medo, só me incomodo com elas por perto. - Olivia desceu da cama, tentando fazer pouco caso do escândalo de segundos atrás.
-E quanto a mim? Pensei que fossemos amigos.
-Você é um garoto, Parker, não seja ridículo. - Ela respondeu. – E eu nunca disse que somos amigos, aliás.
-Isso por acaso te incomoda? - O rapaz perguntou, e quando ela se virou pra olhá-lo ele estava pendurado no teto.
-Não. - Ela fechou a cara.
-Isso te incomoda? - Ele continuou a brincadeira, disparando uma teia na parede ao lado dela.
-Não tem graça. - Olivia se afastou, e foi mexer na escrivaninha ao pé da cama.
Peter desceu do teto de mansinho e se aproximou dela, que estava de costas. Ele colocou os dedos indicador e médio em cima do ombro da garota, e começou a andar com eles por ali para imitar as patas de uma aranha.
-Isso te incomoda? - Perguntou, e logo em seguida levou uma almofadada.
-Para de ser criança! - McCall disse irritada, e o garoto caiu na cama rindo. Ela arremessou o travesseiro na cara dele, e acabou se rendendo ao riso também. - Você é um idiota.
-Mas você gosta de mim. - Ele fez uma cara convencida, envolvendo o travesseiro com os braços.
Olivia encarou o garoto por alguns segundos, enquanto ele piscava os olhos acastanhados para ela.
-Nem um pouco. - Ela respondeu friamente, e virou-se para mexer em sua mala.
Peter riu e sentou-se na cama, questionando se aquela resposta era mesmo só uma brincadeira, e ficou observando a garota retirar da bolsa o notebook.
-Sabe, eu pensei em umas coisas durante o voo, sobre o Magnum e tudo mais. - Olivia mudou o assunto, e sentou ao lado do rapaz enquanto abria a tela. - Sabemos que essa empresa Williams está envolvida, tanto pelo Adamantium quanto pelo Abutre. Mas ninguém consegue esconder tanta sujeita assim dentro de uma companhia se não for do alto escalão.
-É preciso ter influência pra impedir que a irregularidade vaze. - Peter concordou, observando o que a garota vasculhava online.
-Foi por isso que pensei que talvez devêssemos começar a investigar os sócios da empresa. - Sugeriu ela, conectando-se ao site da Williams e indo até a parte que mostrava os chefes. - Um deles tem que estar envolvido. Encontrar registros vai ser bem difícil, porque nosso amigo já mostrou que sabe ocultar os dados; então acho que poderíamos tentar descobrir o que cada um estava fazendo no dia em que a nossa base foi atacada. Pode render uma boa pista.
-Manda ver.
A garota inteligente teclou rapidamente até acessar o software da polícia. Pesquisou pelos nomes de cada um dos três donos da Williams Inovações, vendo se havia registros de qualquer um deles estando próximo de Cambridge no dia fatídico. Ela checou passagens, passaportes e registros de transporte no nome dos empresários.
-Bom, acontece que todos eles estavam no mesmo lugar no dia da invasão à base – Ela concluiu sem demora, e Peter se aproximou para checar. - Em Tóquio.
-Tóquio? - O rapaz franziu o cenho.
-Sim, aparentemente em uma conferência de tecnologia que durou oito dias. - Liv enunciou com tédio, mostrando a ele as fotos que achou dos homens engravatados posando com líderes japoneses. - Todos os três estavam lá, segundo os registros nos passaportes. Lá se vai minha ideia. - Bufou.
-Tá, tudo bem... - Peter colocou a cabeça pra funcionar. - Não precisa ser necessariamente um dos donos. Eles não têm nenhum investidor ou CEO que se encaixe no que precisamos? - Sugeriu.
-Vamos ver.
Olivia pôs-se a teclar, e acessou a relação de lideranças e cargos de alto nível da empresa. Passou a hora seguinte checando cada um dos poderosos, mas todos tinham álibis confiáveis que impediam que assumissem a autoria dos atentados.
-Hm, isso é interessante. - Murmurou um bom tempo de silêncio depois. - Um histórico que achei diz que, há dois anos, a Williams Inovações pertencia à outra pessoa.
Os dois se aprumaram para perto da tela para ver melhor.
-Nessa época o galpão ainda era da empresa. Provavelmente as negociações ainda aconteciam. - Parker atiçou a memória. - Quem estava no comando?
-Simon Williams, o herdeiro da companhia. - McCall leu para ele, interessada. – Ele chefiava a grande empresa até ser afastado do cargo por negociações ilícitas.
-Abutre. - Aranha constatou.
Olivia tratou de pesquisar o acontecido, pois quando grandes líderes eram depostos com escândalos de corrupção, não faltavam matérias sobre isso na mídia. Ela não demorou a encontrar um artigo completo sobre o caso.
-Aqui diz que esse Simon quase faliu a empresa, e foi pego negociando com um famoso fabricante de armas de alta tecnologia. - A trilha de dados parecia esquentar. - Tem documentos que provam o crime.
Liv abriu a compilação de três fotos do que pareciam ser notas da negociação, que destinavam contrabando do Abutre direto para a Williams Inovações. Era inegável, e as imagens comprometiam a empresa de tal modo que os dois tiveram que supor que haviam sido determinantes para a investigação do caso na época.
-Ei, olha isso. - Peter apontou para as fotos na tela. - Não estão assinadas pelo Magnum.
Um detalhe bem observado: os três comprovantes não continham a já conhecida assinatura do vilão, com a letra M em evidência. Ao invés disso, uma enorme letra C com os mesmos padrões de digitação pendia no rodapé das notas.
-Mas o Magnum negociava através da Williams, já sabemos disso. - Liv ficou confusa. - Será que tem mais alguém envolvido?
-Talvez seja um sócio, alguém de confiança pra receber a mercadoria. - Parker supôs. - Porque, de qualquer modo, ninguém parece ter mencionado o nome “Magnum” nessa investigação. Então não sabiam do pseudônimo.
-Eu te disse que tínhamos encontrado algo que eles não viram. - Olivia transbordou satisfação. - Ok, vamos ver por onde anda nosso empresário sujo.
Dados sobre Simon Williams que procedessem as investigações sobre a corrupção eram nulos. Ele não estava preso, pois se safara no processo judicial, mas também não estava em lugar nenhum; não havia endereços fixos ou registros de qualquer paradeiro. A polícia havia emitido um alerta, segundo os dados que os adolescentes encontraram, mas não abrira nenhum inquérito para investigar onde Simon tinha se metido, já que ele não era mais réu.
-Ele simplesmente sumiu. - Olivia constatou. - Curioso, não é? Me parece com alguém que tem um plano terrorista.
-Ninguém some desse jeito hoje em dia. – Peter discordou, e com a permissão da menina pegou o notebook para si.
Parker recortou a imagem que a notícia exibia do homem de quarenta anos e cabelos escuros, Simon. Usando um programa novo e ainda em teste que o setor de Inovações dos Vingadores estava desenvolvendo, ele buscou as feições de Williams em qualquer registro de câmeras de trânsito e de segurança espalhadas por Nova York. Após longos minutos e muitos dados inúteis e antigos, como bancos e shoppings, o software mostrou apenas um resultado significativo.
O rapaz abriu as imagens, que eram as mais recentes e datavam dois anos atrás. Por coincidência, a dita câmera que registrara o rosto de Simon estava na rua de baixo da fábrica abandonada que Olivia e Peter pretendiam visitar. Lá, a face do investigado, acompanhada do corpo vestido em um terno chique, visitava a instalação clandestina da própria empresa – o que já acontecera antes outras sete vezes, segundo o registro. Nas primeiras fotos, a unidade ainda parecia funcionar; já nas duas últimas, o visual abandonado da fábrica espantava a atenção de quem via de fora, mas não impedia que Simon entrasse cautelosamente. E então, depois daqueles registros, ele sumiu misteriosamente.
-A última foto foi tirada duas semanas depois da prisão do Abutre. - Peter informou, conectando as datas. - Foi o que obrigou o Simon a apagar o símbolo das armas na fachada e montar o cenário abandonado pra que o esconderijo não fosse descoberto. E apesar de o pegarem com a corrupção da Williams, ninguém chegou até a fábrica. - Concluiu o rapaz. - Olivia, acho que encontramos o Magnum.
-Eu tenho certeza. - Disse a garota com satisfação na voz. Ela esticava para o próprio celular, que exibia uma foto.
No smartphone de Liv, estava uma das imagens da invasão ao complexo dos Vingadores, aproximada no homem que orquestrara o ataque, vestido em seu uniforme de Ervilha-Voadora.
-Isso no uniforme dele não é um M de Magnum virado ao contrário. - Olivia enunciou apontando para o traje, se referindo a suspeita inicial deles.
-É um W de Williams. - Os dois jovens falaram juntos, e concluíram a ideia com sorrisos de satisfação nos rostos.
-Somos fodas! - Olivia exclamou, oferecendo a mão para um high-five animado com o rapaz, que correspondeu.
-Com as provas da fábrica, nós já o pegamos. - Comemorou ele.
-Sabe... por mais que eu não vá muito com a sua cara, nós dois formamos uma ótima equipe. - Olivia constatou com as sobrancelhas erguidas.
-É, formamos sim. - Parker respondeu com um riso. Logo depois, a conversa caiu no silêncio. - Você não vai com a minha cara por que isso te incomoda? - Ele retomou, voltando a tamborilar os dedos ligeiramente nas costas da garota para imitar a aranha.
-Não me toca, Cabeça-de-Teia! - Ela esbravejou, se esquivando imediatamente com um instinto, enquanto Peter só sabia rir.
Olivia e Peter acreditavam estar cada vez mais perto de encontrar o terrorista misterioso que vinha ameaçando a humanidade e tirando a paz dos Vingadores. Impulsionados pela satisfação com a última descoberta, os dois deixaram a pousada onde estavam hospedados para darem mais um passo em sua missão: visitar a fábrica onde presumiam ter sido construído o robô gigante da ponte Harvard. Os dois andaram por alguns quarteirões no ar gélido da cidade, enquanto Peter procurava um jeito de elogiar a blusa do Ferris Bueller que Olivia usava sem parecer ainda mais nerd.
-Você é muito nerd. - Foi o que ela disse rindo, mesmo ele tendo usado a melhor frase que encontrou.
-Acho engraçado me acusar sendo que é você que está usando a blusa. Você também é nerd.
-Não, eu sou inteligente. São duas coisas bem diferentes. - A garota retrucou. - Gosto de algumas coisas consideradas nerds, mas é pura coincidência.
-Ok, já que é tão esperta, veja se consegue responder isso, porque tenho pensado nessa ideia desde o hotel. - Peter disse, aquecendo as mãos dentro dos bolsos da jaqueta. - Se estivermos mesmo certos sobre o Williams, o Magnum é de Massachusetts. Como será que ele ficou sabendo sobre os negócios locais do Abutre aqui em Nova York?
-Bom, eles devem ter um amigo em comum. - Supôs a menina. - As notícias voam no mundo do crime.
Liv e Peter pegaram um táxi na próxima esquina e foram até o outro lado da cidade, onde a fábrica se instalava, para continuar a busca por respostas. As redondezas eram pouco movimentadas, e o terreno bem escondido. Encapuzados, os dois jovens se esquivaram entre os tapumes e grades para chegarem até o local, e entraram pelas saídas de ar sendo içados por uma teia de Parker. Pousaram em segurança no centro da fábrica, iluminada pela luz do sol que entrava pelas ventoinhas do teto.
O local extenso e retangular que pertencia à Williams estava completamente vazio, exceto por teias de aranha e ninhos de rato e pássaros. Havia marcas pretas no chão indicando que equipamentos pesados já estiveram ali, mas foram arrastados.
-Acho que a grama alta e os tapumes não eram encenação pra parecer que a fábrica estava abandonada. - A voz desconfiada de Olivia reverberou pelas paredes altas.
-Vamos procurar, pode ser que encontremos alguma coisa. - Parker insistiu, e saiu andando pelo local com a lanterna do celular ligada.
Aquela fábrica poderia ser uma qualquer, se os dois adolescentes não tivessem tanta certeza de que abrigara respostas importantes um dia. No entanto, eles procuraram e procuraram, mas não conseguiram achar nada que tivesse permanecido ali para lhes dar mais pistas. Nenhuma pasta de arquivos esquecida debaixo de uma prateleira empoeirada dessa vez. Eles foram ao escritório, à sala de máquinas e até mesmo aos banheiros, vasculhando cada canto daquele lugar. Mas a pessoa que evacuou a fábrica tomara todos os devidos cuidados pra não deixar sequer uma pegada para trás.
-Já cansei de desviar meus passos dos ratos e de enfiar meu nariz nesses cômodos empoeirados, Parker. - Olivia bufou impaciente, após quase duas horas de investigação minuciosa. - Não tem nada aqui.
-Tem que ter alguma coisa. Não podemos ter vindo até aqui pra nada. - Peter discordou, sem tirar os olhos das bancadas. Ele assoprou uma delas, levantando uma nuvem de poeira que o fez tossir.
-É claro que tinha alguma coisa, mas não está mais aqui. Anda, antes que um de nós fique com a rinite atacada.
-Eu não tenho rinite – Peter protestou com a voz embargada. No instante seguinte, ele soltou um espirro alto que fez com que uma das pombas hospedadas no teto saísse voando.
-Sei. – Ela respondeu tediosa. – Ficar aqui analisando grãos de poeira e cocôs de pássaro é ridículo. Vamos embora. - Retrucou a garota, notando que o sol já estava se pondo e a iluminação natural do lugar ficava mais fraca a cada momento.
-Mas eles produziram o robô aqui. Temos que provar!
-O Magnum sabia que esse lugar era um alvo, Parker! Ele tirou todas as provas e as levou embora pra garantir que ninguém conseguisse pegá-lo aqui depois que o Abutre foi preso. Você não está vendo? Esse barraco está abandonado há anos! - Olivia discutia frustrada e impacientemente. - Vamos logo.
Peter cedeu, bufando e levantando do chão sujo. Os dois caminharam com passos pesados até a teia que os trouxera para dentro, e a escalaram até o lado de fora.
McCall e Parker pegaram outro táxi, e ficaram em silêncio durante todo o caminho de volta para o hotel. Ambos foram até a fábrica muito esperançosos, e agora sentiam que a viagem tinha sido perdida. As descobertas até agora eram ótimas, mas nenhuma levaria Simon Williams para a prisão. Os dois voltaram aos dormitórios, lavaram toda a poeira e serragem em um banho quente e pediram jantar pelo serviço de quarto.
-Você gosta de altura, não é? - Olivia perguntou, observando o rapaz que estava dependurado na sacada do lado de fora.
-Me acostumei com ela. Ajuda a pensar. - Ele explicou, virando para a garota que caminhou até perto dele.
-Não acredito que viemos até Nova York pra nada. - Liv bufou, passando uma das pernas para o lado de fora da grade assim como Parker fizera, e então ficou sentada de frente para ele.
-Não foi pra nada. Descobrimos a identidade do Magnum. - Peter ponderou, comendo um bolinho de carne restante da porção que eles haviam pedido.
-Podíamos ter feito isso lá de Cambridge. - Discordou ela, pegando um bolinho também. - Viemos pra cá só pra ver a fábrica idiota, e acabamos sem nada.
-Vamos encontrar outro jeito de incriminar o Williams. Já chegamos até aqui - Disse o rapaz em uma dose de otimismo. - Só vai levar mais tempo do que imaginávamos.
-Tomara que ninguém mais tenha que morrer por isso. - Olivia disse com peso na consciência, então ficou em silêncio alguns segundos. - O que vamos fazer agora? Voltar pra casa?
-Não podemos. Teoricamente estamos de férias, qual seria sua explicação pra aparecer mais cedo? - Peter alertou sabiamente.
-Tem razão. - Ela concordou, e em seguida soltou um riso abafado ao olhar o visor do celular. - Meu pai não para de me mandar mensagens. Ele está superpreocupado, fica perguntando a cada cinco minutos onde eu estou e se nós estamos bem.
-Por que isso é engraçado? - Parker sorriu, acompanhando-a.
-É que ele está realmente se empenhando em ser um pai cuidadoso, e eu acho bonitinho. - Ela contou, dando de ombros. - Desde que essa loucura do stalker começou e eu fui morar com ele, é assim que ele tem agido. Acho que ele se sente meio responsável por isso, então faz de tudo pra ajudar.
-Não tinha como ele prever, é óbvio. - O garoto aliviou. - Mas eu entendo.
-Eu também. - Ela sorriu de lado. - Sabe, meu pai e eu somos muito ligados. Sei que às vezes pode não parecer, porque eu vivo tirando com a cara dele, o insultando e dizendo que a barba dele é ridícula - Esse comentário fez Peter rir - E ele vive encrencando comigo e tentando mandar em mim, mas essa é nossa forma de sermos pai e filha. Digamos que nós dois não somos muito chegados em sentimentos, então encontramos nosso jeito.
-No começo tive a impressão que a relação de vocês era bem abalada, porque o Sr. Stark é... bem, o Sr. Stark. - Os dois riram. – Pensei que você guardava algum tipo de mágoa. Não foi difícil crescer lidando com quem ele é, com o Homem de Ferro e tudo mais?
-Olha, quando eu era mais nova era um pouco difícil, sim. - Olivia contou. - Eu era só uma criança e não entendia por que meu pai não podia estar perto quando eu ficava gripada ou pra me ensinar a andar de bicicleta. Mas de certa forma eu estava acostumada a não ter a presença dele, e à medida que eu fui crescendo eu passei a entender o porquê. - Ela explicou.
-O que foi que você compreendeu?
-Meu pai pode ser muitas coisas, mas ele é bem sensível por dentro, por mais que não admita. Eu sei que, assim como doía em mim, doía nele não estar sempre ali. Ele jamais teria sido ausente se pudesse decidir, mas ele tinha feito uma escolha anteriormente que o privava de muita coisa. Foram só... circunstâncias. Então, ao contrário do que muita gente pensa, eu não tenho mágoa nenhuma. Ele sempre entrava em contato quando podia, mandava cartões musicais e livros de colorir, sempre me colocou pra estudar nos melhores colégios... e não era tão ruim. Eu tinha um pai legal que aparecia na TV o tempo todo, e ganhava presentes muito legais de natal e aniversário. - Ela disse dando ênfase referindo-se ao dinheiro, e os dois deram risada.
-Mas como foi que você aprendeu a lidar com isso? - O rapaz perguntou. - Tipo, o que fez você mudar de ideia a respeito dele?
-Eu percebi a importância do que ele estava fazendo ao invés de ficar lá pra mim. - Falou a garota. - Meu pai salvava milhares vidas e arriscava a própria, só pra ajudar as pessoas que precisavam dele muito mais que eu naquele momento. Seria egoísmo da minha parte querer que ele parasse de lutar pelo mundo só pra estar em casa e assistir Zoboomafoo comigo. - Ela riu fraco. - Ao invés de detestar o trabalho dele, eu aprendi a admirá-lo. O Homem de Ferro e os Vingadores são a melhor coisa que ele poderia ter feito com o poder e a influência dele. E eu tenho muito orgulho do quanto ele se doa pra esses projetos, porque o mundo precisa muito disso. Eu costumava ficar de coração partido porque ele não era meu herói, entende? Ele era o herói de todo o resto da população. Mas então eu percebi que estava sendo injusta e imatura. E boa parte desse desprendimento veio graças à minha mãe, porque ela entendia o meu lado e sempre fez de tudo pra que eu me sentisse completa, mesmo sem um pai. Então eu me adaptei e parei de esquentar a cabeça, curtindo o momento quando ele estava presente, e ficando bem do mesmo jeito quando ele não estava.
-Entendi. - Peter respondeu, matutando uma pergunta que não sabia se deveria fazer. - Sua mãe parece muito legal. Ela, tipo...
-Quer saber o que rolou entre ela e o meu pai? - Liv falou assertiva, com as sobrancelhas arqueadas.
-Você liga de me contar? - Ele torceu o lábio.
-Eu não, mas o meu pai ligaria. - Olivia riu. - Ele não gosta muito de falar sobre isso. Bom, o nome da minha mãe é Meredith, e ela conheceu meu pai quando os dois estavam no MIT. - A garota iniciou. - Ela fazia psicologia e ele engenharia, e os dois se apaixonaram como qualquer casal. Só que meu avô, Creighton McCall, não era exatamente um fã da família Stark. - Ela disse com dramaticidade e riu. - Ele era muito pacifista e achava um absurdo que meu outro avô, Howard Stark, tivesse uma empresa que vendia armas. "Enriquecer através da guerra dos outros", como ele dizia, era algo que ele não tolerava, e o ódio entre Creighton e Howard já era antigo por conta disso. Nem preciso dizer que ele surtou quando minha mãe se interessou pelo meu pai, herdeiro da Stark Industries, então ele proibiu a relação dos dois e eles tiveram que parar de se falar. Mas meus pais nunca ligaram muito pra briga das famílias, por isso, quando meu avô Creighton morreu, os dois voltaram a ter contato e reataram o namoro. Eles ficaram juntos por dois anos, até que o jovem Tony pediu a jovem Meredith em casamento.
-Wow, isso tá emocionante. - Peter comentou, fazendo Olivia dar risada. – E aí?
-Tudo ia bem entre os dois, mas aí o meu pai foi sequestrado pelos terroristas no Vietnã, rolou a explosão, os estilhaços no coração e tudo mais. Ele ficou muito debilitado e estava tendo problemas pra se adaptar ao reator ARC, que liberava muita radioatividade, e os médicos não tinham certeza sobre as chances de vida dele. Aquilo foi bem complicado, e meus pais ficaram em um momento confuso depois disso, coisa de casal, não sei direito. - Olivia explicou. – Sei que, em algum momento no meio dessa loucura, meu pai teve a ideia do Homem de Ferro. Ele ficou muito entusiasmado e começou a desenvolver a armadura, mas minha mãe não aprovava. Ela não queria vê-lo se arriscar daquele jeito, dizia que era perigoso demais, e então eles brigaram feio. Foi tipo: lágrimas, gritos, portas batendo e ela disse "ou eu ou o Homem de Ferro". E então eles terminaram de vez.
-Ele sacrificou o noivado pelo Homem de Ferro... - Parker disse surpreso. - Eu não tinha ideia de tudo isso.
-Meu pai não fala disso com ninguém. A maioria das pessoas nem sabe que ele já foi noivo, e pra ele isso era bom porque mantinha a mim e a todo o resto no anonimato.
-Mas e então? O que aconteceu?
-Bom, eu surgi em algum momento no meio dessa bagunça. Minha mãe descobriu que estava grávida depois que eles tinham terminado, e não sabia o que fazer. Mas depois que o Homem de Ferro foi colocado em prática, ela viu que não tinha espaço pra uma criança na vida tão complicada do meu pai, pois ela tendia a ficar ainda mais maluca. E quando ele revelou que era Tony Stark quem estava por trás da armadura, mamãe achou que seria perigoso demais pra mim se as pessoas soubessem que ele tinha uma filha. Além disso, ela tinha certeza que poderia tomar cona de nós duas sozinha. Então ela manteve em segredo. - McCall continuou a explicar.
-Mas então como ele ficou sabendo sobre você?
-Meu pai só foi descobrir alguns anos depois, quando eu já era nascida. Um dos inimigos do Homem de Ferro estava no hospital psiquiátrico onde minha mãe trabalhava, tomando o controle com poderes mentais ou algo assim. Meu pai salvou o dia e reencontrou minha mãe. Ela decidiu contar a ele sobre mim, e obviamente Tony ficou em choque e também bravo por ela ter escondido aquilo dele. Mas no fim deu tudo certo, e meu pai quis me assumir. Ele se comprometeu em pagar todas as minhas despesas e vinha me visitar sempre que podia. Mas, pro meu bem, eles decidiram que seria melhor me manter em segredo pra não me expor a nenhum perigo por conta de quem era Tony Stark. Eu sabia, mas ninguém mais deveria saber; e as coisas ficaram assim. - Contou a garota. - Hoje ele está noivo da Pepper, que na época era namorada dele e aceitou isso surpreendentemente bem, e minha mãe está namorando um cara bem legal, que a levou pra passar as férias na Austrália. E eu estou aqui. – Ela deu de ombros no fim, com um sorrisinho.
-Que loucura. - Parker riu, surpreso. – Ok, mas onde começa a história de Olivia McCall? Tipo, você tem sua vida, seus poderes e tudo mais, deve ter sido interessante... – Ele interrompeu a si mesmo. - Mas se não quiser me contar tudo bem, eu não quero te interrogar nem nada.
-Não, relaxa. – A menina riu. – Nunca pude contar tudo isso pra ninguém antes, então é legal falar sobre mim. Sabe, eu era bem alheia a toda essa loucura de paternidade na época em que aconteceu, tinha dois ou três anos no máximo. Cresci de um jeito bem normal e sem ter noção de nada enquanto era criança. Mas logo cedo eu já tinha começado a manifestar as minhas... esquisitices. - Liv comentou. - Quando eu era pequena, não tinha nenhum controle disso, então meus poderes se demonstravam de acordo com as minhas emoções. Minha mãe conta que quando eu era bebê e chorava por fome ou sono, fazia as luzes do meu quarto piscarem. E quando brincávamos de ataque de cócegas, eu ria tanto que fazia alguns objetos flutuarem.
-Maneiro. - Peter disse. - Bizarro, mas maneiro.
-Ela viu claramente que eu não era normal, e como ela é psiquiatra, fez vários exames e constatou a alteração no meu sistema nervoso. Depois, quando meu pai já estava por perto, os dois fizeram testes mais apurados e confirmaram que a mutação que originou os meus poderes tinha sido gerada pela radioatividade do reator ARC, liberada durante os primeiros e mais agressivos meses em que meu pai o usou, causando uma alteração nos cromossomos hereditários dele e passando aquilo pra mim.
-E como era ser uma criança com poderes? - Questionou o rapaz. - Quando você queria alguma coisa e sua mãe negava você ameaçava queimar a geladeira ou acabar com a luz do prédio?
-Não, mas talvez eu devesse ter feito isso. - A garota riu, coçando o queixo. - Eu não tinha muito controle sobre as minhas habilidades. Isso era meio perigoso, na verdade. Por isso eu estudei em casa até ter idade suficiente pra aprender a me conter, e poder ir pra escola sem fritar a classe toda ao errar uma resposta ou mover coisas por aí sem querer enquanto estivesse brincando. - Os dois riram. - Foi então que eu descobri que não se aprende equações de segundo grau na pré-escola.
-Como assim? – O rapaz assustou-se.
-O superdesenvolvimento do cérebro não me deu apenas poderes legais, também me deixou mais inteligente. - Ela esclareceu. - Você pensou que minha habilidade com números fosse algo tipo "tal pai, tal filha" que eu herdei dos Stark, não é? - Peter concordou, o que a fez rir. - Bom, não é. Somos parecidos em muita coisa, eu sei, mas isso é só coincidência.
-Entendi. Aí você entrou na escola e viu que plantar feijão no algodão e brincar de massinha era muito entediante pra você, certo?
-Exatamente, então fui adiantada alguns anos. Mas não muitos pra que não ficasse alarmante, só o suficiente pra que eu pensasse que ir pra escola era uma brincadeira e que eu poderia continuar realmente evoluindo ao estudar coisas mais complexas sozinha.
-Mas por que você não foi pra uma escola especial de superdotados ou alguma coisa assim?
-Levantaria suspeitas. - Liv explicou, o que fazia sentido. – Quanto mais eu exercitasse o cérebro, mais aquela predisposição iria se desenvolver, e poderia ficar muito estressada ou por em risco a minha normalidade. Além disso, meus pais nunca gostaram da ideia de uma escola diferenciada. Eu já vivia uma vida bastante reservada da sociedade por conta da minha identidade, e estudar em um local especial só me faria ainda mais diferente e me privaria da vida de uma criança normal. Então eu segui a vida escolar assim, e entrei pro MIT aos quinze anos. – Contou. - Foi difícil pra minha mãe deixar eu me mudar, mas como os Vingadores já tinham instalado a base em Massachusetts, ela ficou mais tranquila. Eu estava próxima do meu pai, embora não o visse muito por conta do segredo. Mas pra minha mãe isso era até bom, porque um dos maiores medos dela sempre foi essa proximidade, na verdade. – A menina riu de leve.
-Por quê? - Peter estranhou. – Ela não queria que vocês criassem laços?
-Ela morria de medo que eu me tornasse como ele. - Liv contou com um sorriso, e então pulou para dentro da sacada, virando-se para a rua e apoiando os dois braços na grade para observar a vista. - Minha mãe sempre viu o quanto eu e meu pai éramos parecidos. Ela gostava disso, mas também tinha medo. Ela não queria que eu fosse porque não me queria envolvida com os Vingadores, e esse medo só era tão grande porque ela sabia que eu faria isso se tivesse chance. Internamente, minha mãe via que cedo ou tarde eu iria querer seguir os passos do meu pai e usar meus poderes pra ser uma heroína. A gente brigou muito por isso durante os anos, mas ela internalizou que, sendo tão parecida com o meu pai, eu tinha uma das características mais fortes dele: fazia o que queria sem aceitar não como resposta.
-É, seu pai faz muito isso. - Parker concordou.
-Mas me envolver com os Vingadores nem era uma possibilidade antes. É que quando o stalker começou a me mandar as mensagens de ameaça, meu pai fez questão de me trazer pra morar com ele no complexo pra me proteger. Ele fez um quarto isolado e bem seguro pra mim lá dentro, me desligou do mundo e me deu um trabalho nas Inovações, pra que eu tivesse algo pra fazer e pra que pudesse continuar sob a vigilância. A única coisa que ele não me convenceu a fazer foi desistir da faculdade, então ele espalhou escoltas disfarçadas pelas salas de aula e pelo campus pra ficarem de olho em mim.
-Isolamento total. – Peter fez uma careta.
-Não é muito diferente da vida que eu levava antes. Eu sempre fui meio isolada – Olivia riu. - Meus pais fizeram de tudo pra tentar me deixar uma garota normal, mas acho que isso é meio impossível. Fora os poderes, esconder quem eu era de todos que eu conhecia era bem difícil. Eu nunca quis fazer amigos próximos ou nada do tipo, porque não queria ter que mentir sobre quem eu era. Afinal, ninguém jamais poderia descobrir sobre o meu pai, porque se a informação vazasse não seria apenas notícia mundial, mas também um risco enorme pra mim.
-Que horrível. - Peter lamentou.
-É meio solitário, mas eu nunca liguei muito, pra ser honesta. Eu sempre tive minha mãe, meus estudos e às vezes o meu pai também, e eu me acostumei assim. - A garota explicou sem dor alguma na voz. - E eu não sou muito ligada em laços e sentimentos, de qualquer forma. - Riu.
-Criar laços é a coisa mais difícil de se fazer pra quem tem segredos. - O garoto concordou, saindo da beirada da grade e se juntando a Olivia encostado à sacada. - Você não quer ter que mentir pra quem você se importa, então prefere não se importar com ninguém.
-Exatamente.
-Que bom que é fácil pra você - Ele riu fraco. - Porque pra mim não é. Tipo, eu amo meu trabalho, mas essa parte é bem ruim. Quando comecei com o Aranha, dizia como desculpa que tinha um estágio nas Indústrias Stark que tomava boa parte do meu tempo. Aí, quando ia me mudar pra Massachusetts pra ficar com os Vingadores, falei pra todos os meus amigos que tinha sido efetivado e ia trabalhar na sede.
-É uma merda. - Olivia compadeceu, e os dois ficaram algum tempo em silêncio. - Mas como foi que você começou com o Homem-Aranha, afinal?
-Você quis dizer como foi que o Homem-Aranha começou comigo? - Peter corrigiu com humor. - Eu estava no primeiro ano, e durante um passeio da escola a um laboratório de biotecnologia, uma das aranhas radioativas usadas pra um dos experimentos fugiu e me picou. Eu quase morri de febre, infecção ou o que quer que fosse, e no dia seguinte acordei com esses poderes. - Ele explicou. - No início, confesso que ser um herói não foi minha primeira ideia. Pensei em usar minhas habilidades pra virar um atleta ou coisa do tipo. Mas aí meu tio Ben, que foi meu pai a vida toda, morreu baleado depois de um assalto que eu poderia ter evitado. Foi aí que eu percebi que as minhas habilidades podiam servir pra coisas bem maiores e mais especiais do que touchdowns, e criei o Homem-Aranha.
-É um propósito bem melhor, sem dúvida. - Liv sorriu de lado. - Sinto muito pelo seu tio, ele parecia ser muito especial pra você. - Ela tinha uma pergunta em mente que não sabia se deveria fazer. - Ele...
-Quer saber o que houve com o meu pai de verdade pro meu tio ter assumido o papel dele? - Peter disse assertivamente, e a garota se surpreendeu com a exatidão do rapaz, o que o fez rir ligeiramente. - Meus pais morreram quando eu era pequeno, em um acidente de avião. Eles saíram para viajar um dia e me deixaram na casa dos meus tios, então nunca mais voltaram. Os dois me criaram.
-Caramba, Parker... - A garota ficou surpresa e sem graça.
-Relaxa, faz muito tempo. - Ele sorriu de lado, confortando-a. - Recentemente eu descobri que a morte deles não foi um acidente em vão. Seu pai me contou que Richard e Mary Parker eram na verdade agentes da S.H.I.E.L.D., e eles estavam em uma missão quando o avião deles caiu. Os dois estavam salvando vidas, assim como eu faço hoje. Descobrir isso foi um dos meus principais motivos pra decidir me juntar aos Vingadores definitivamente, talvez como uma forma de seguir os passos deles ou continuar o que eles faziam, sabe?
-Sim, eu sei. - Olivia concordou, pois entendia daquilo. - Sua família deve ter ficado orgulhosa de você por essa escolha.
-Bom... - O rapaz deu um sorriso amarelo. - Na verdade foi meio que o oposto. É complicado.
-O que houve? - Liv franziu o cenho. Talvez ela não devesse questionar, mas aquela conversa já estava tão surpreendentemente íntima para os dois que ela não viu de que maneira uma pergunta como aquela faria diferença.
-Eles nunca souberam sobre o Homem-Aranha. - Parker contou. - Não até minha tia May descobrir por acidente, e então começarmos a brigar por isso. Depois do que aconteceu com os meus pais e o meu tio, era totalmente compreensível que ela ficasse superprotetora comigo, e ela estava horrorizada em saber sobre todo o perigo que eu enfrentava como o Homem-Aranha. Desde que ela soube, começou a ficar impossível conviver com a minha identidade secreta. Ela sabia que eu saía de casa todas as noites pra quebrar todas as regras que ela me estabelecera, e pra me colocar em situações de risco que ela tremia só de pensar. E eu tinha que sair de casa todas as noites pensando que estava a desapontando, porque fazia algo que ela não aceitava e a deixava triste. – Ele deu de ombros. – Ela foi minha mãe durante a vida toda, e eu não estava mais aguentando fazer aquilo com ela, sabe? Mas eu também não podia parar o meu trabalho, porque as pessoas precisavam de mim. Nós tentamos conversar várias vezes, mas nenhuma das duas opiniões iria mudar. Então, quando eu descobri sobre os meus pais e o Sr. Stark me fez o convite pra equipe de novo, eu aceitei e decidi me mudar. – Peter explicou. - Claro que eu não fiquei feliz em deixar a tia May, mas eu precisava fazer o que era certo. Ela jamais iria entender tudo que ser um herói envolve, e eu nem esperava que entendesse.
-Ser herói é uma escolha, mas não é fácil. Principalmente porque não envolve apenas a sua vida. - Olivia acrescentou. - Assim como eu sofri as consequências da escolha do meu pai, sua tia sofreu as suas. Mas, às vezes, mesmo fazendo a coisa certa, acabamos magoando quem a gente ama.
-É verdade, mas tem dias em que eu me questiono se vale mesmo a pena. - O rapaz admitiu sorrindo torto. - Quando eu olho pra pessoa que seu pai é e pra tudo que ele fez, eu não tenho dúvidas. Mas eu não sou Tony Stark, eu sou só... o Amigão da Vizinhança, sabe?
-Você acha que não vale? – Liv estranhou.
-Não é isso. É que às vezes parece que não faço tanta diferença quanto deveria. – Ele admitiu.
Olivia ficou encarando o rapaz ao seu lado por alguns segundos, e depois desviou o olhar para a paisagem de prédios que estava à frente.
-Eu acho que você faz mais do que pensa que faz. - Ela disse, francamente. - Deixa eu te contar. O Homem-Aranha já me salvou uma vez, sabia?
Peter virou-se para ela, surpreso.
-Sério? Ele salv... Quer dizer, eu salvei? - Falou espantado. - Como?
-Eu não sei se você vai se lembrar disso – A garota disse sorrindo devido à reação assustada dele. - Mas um dia um cara roubou uma bicicleta e saiu pedalando rápido com ela pela calçada. Você o parou e a pegou de volta, devolveu na frente de uma loja e deixou um bilhete nela, que dizia "essa bicicleta é sua? Se não é, não a roube! Homem-Aranha" - Ela testemunhou, e os dois riram em seguida.
-Eu lembro sim, foi o mesmo dia em que ajudei aquela senhora dominicana que me comprou um churr... - Peter interrompeu-se no meio, notando o quão irrelevante e estúpido era aquele comentário. Ele precisava parar de contar aquilo pras pessoas.
-Ela fez o que? - Olivia deu risada.
-Nada, esquece. - Ele chacoalhou a cabeça. - Eu me lembro. O que tem?
-Bom, aquela bicicleta era minha. - Contou a menina. - É uma longa e complicada história, mas você realmente me salvou devolvendo-a pra mim. Basicamente, eu não estaria aqui se não a tivesse de volta. E sempre fui grata ao Homem-Aranha por isso.
-Jura? - Peter disse confuso e surpreso.
-É sério. O que eu estou tentando dizer é... - Ela respirou fundo. - Você fez uma grande diferença mesmo sem saber, e com uma coisa bem pequena. E eu não fui a única que você ajudou durante todo esse tempo como o Aranha.
-Mas mesmo fazendo uma grande diferença, não é preciso ter superpoderes pra impedir o roubo de uma bicicleta. - Ele insistiu.
-Tem razão, não é preciso ser um super-herói - Liv concordou. - Mas é preciso ser um ótimo ser humano.
Peter abriu um sorriso sincero diante daquele comentário, o que fez Olivia rir. Aquela era a coisa mais legal que ela já havia dito, e não veio acompanhada de nenhum xingamento ou sarcasmo. Os dois ficaram em silêncio depois daquilo, o que os fez rir instantes depois.
-Ok, essa conversa já ficou bem mais longa e sentimental do que devia. - Olivia disse, pendurando-se na grade da sacada. - É hora de dormir.
-Tem razão, já é quase uma da manhã. - Peter surpreendeu-se ao olhar no relógio do celular.
Olivia fechou o casaco que usava e apertou-o contra o corpo abraçando a si mesma, e em seguida entrou para o dormitório, onde estava mais quente.
-Boa noite, Menino-Aranha. - Ela disse com um aceno de cabeça e um riso contido, e então entrou.
-Boa noite, Olivia.
Capítulo 9
O dia seguinte começou bem menos agitado que o anterior. Peter e Olivia acordaram sem propósito, afinal não tinham mais nenhuma pista em Nova York que os permitisse continuar a investigação. Como estavam num beco sem saída e ainda não podiam voltar para Massachusetts, decidiram dar uma volta pela cidade natal dos dois; matar as saudades do ar nova-iorquino e dos grandes prédios, além de espairecer um pouco a mente que andara tão ocupada com as pesquisas. Liv e Peter caminharam pelas avenidas perfeitamente retas e jogaram conversa fora, despreocupados e até se divertindo um pouco na companhia um do outro. Eles passearam, riram e implicaram, até perto do meio dia.
-Estou começando a ficar com fome. – Olivia constatou assim que atravessaram uma das ruas.
-Eu também. - Falou Peter. – Se fosse há alguns anos atrás, existiria um lugar perfeito para almoçarmos.
-Qual?
-Delmar. – Disse o garoto, sentindo o apetite abrir imediatamente.
-E o que é isso? – Ela franziu a testa.
Ao ouvir o comentário, Peter parou no meio da calçada, como se não acreditasse no que acabara de ouvir.
-Pobre garotinha chique de Manhattan – Disse, fazendo graça. – Nunca teve o prazer único e inigualável de provar um sanduíche do Delmar.
Olivia o encarou com os olhos cerrados.
-Tem razão, nunca provei isso aí. O que tem de tão especial?
-Era o melhor sanduíche do Queens. Eu costumava comer lá todo dia depois da aula. – Peter explicou enquanto os dois voltaram a caminhar. – Mas infelizmente, na época em que o Abutre ainda vendia as armas dele, alguns dos seus compradores tentaram roubar o banco da esquina vizinha à lanchonete e acabaram a explodindo quando eu lutei com eles.
-Boa, Parker, destruiu o melhor sanduíche do Queens. – Ela brincou.
-Não fui eu, foram os caras maus. – Peter fechou a cara. – E se quer saber, acabou sendo bom pro Delmar no fim das contas. Quando o negócio afundou em Nova York, ele voltou a morar com a família em Massachusetts e abriu outra lanchonete. Deu certo, e ele chegou até a expandir pra um restaurante. Sempre como lá quando sinto saudades de casa.
-Que fofo. – Falou Olivia, sem a menor sinceridade na voz.
-Qual é! – Peter protestou, rindo. – Um dia vou te levar lá, aí vai entender do que estou falando.
-É claro. – Ela disse irônica. – Eu...
A habitual discussão humorada dos dois foi interrompida pelo toque do celular de Peter. O visor atestava que Natasha Romanoff estava ligando.
-Fala, Nat. - Disse o rapaz aproximando o aparelho do ouvido.
-Recebi um alerta vindo do laboratório de investigação de vocês hoje - Disse a voz da mulher. - Do scanner químico, pra ser exata. Ele terminou a análise que vocês deixaram executando, estou enviando os resultados pros dois agora mesmo.
Naquele momento, o celular de Peter vibrou em seu rosto e o de Olivia fez um bipe alertando a transferência concluída. A garota sacou o aparelho e acessou os arquivos imediatamente.
Há semanas atrás, Peter e Olivia haviam deixado o scanner de seu laboratório improvisado analisando a composição do controle-remoto do robô, que encontraram na casa de Jack O'Brien. Eles buscavam entender a liga metálica indestrutível da armadura, e tal resposta vinha muito a calhar naquele momento pacato da investigação.
-Os testes apontaram que, além de Vibranium e Adamantium, a liga metálica que reveste o controle remoto também possui um tipo de metal bem raro, de origem alienígena. - Romanoff adiantou os resultados. - O catálogo diz que se chama Exoginium, mas não tem mais informações.
-Devia ser isso que o Abutre estava vendendo pro Magnum – Liv constatou, lendo os mesmos dados enquanto ouvia a ligação de longe. - É matéria-prima alienígena, assim como os produtos dele. Não tem como fazer mais sentido.
-Tem razão. - Peter cochichou em concordância.
-Bom, já que temos uma análise química precisa, agora podemos descobrir como destruir esse metal - Olivia entusiasmou-se.
-Não tão rápido, loirinha Stark. - Natasha cortou-a do outro lado da linha. - Fazer essa análise tão complexa e demorada acabou consumindo toda a amostra do metal que tínhamos. O controle era muito pequeno, já era. Vocês precisam de outro plano.
-Como assim? Não sobrou nada? - Peter disse surpreso. - Precisávamos daquele controle.
-Agora é tarde demais. - Disse a mulher no telefone. - Bom, isso é tudo que eu tenho. Me liguem se precisarem de mais alguma coisa.
-Ok, Nat, obrigado. - Agradeceu Peter, e logo depois ela finalizou a chamada. Ele bloqueou a tela e guardou o aparelho no bolso, dando um suspiro frustrado. - Beleza, quem está a fim de almoçar?
-É o que nos resta. - Respondeu Olivia dando de ombros, e os dois voltaram a caminhar pela calçada.
Peter e Liv encontraram um restaurante a algumas quadras de onde estavam e pararam para uma refeição rápida. Sentaram-se em uma mesa no canto do estabelecimento e começaram a teorizar estratégias, intercalando a fala com uma porção grande de nachos.
-Ok, não temos metal suficiente para estudar como destruir o homem de lata. - Disse Liv, limpando o canto da boca com um guardanapo. - Que opção temos?
-Eu estava pensando em hackear o código de sinapses que estava no controle pra que pudéssemos tentar usá-lo pra comandar o robô da próxima vez. - Peter contou. - Se conseguíssemos colocar o seu código ou o meu lá dentro, ele nos obedeceria e ficaria fácil pará-lo. Mas agora já era.
-Precisamos de um plano B. - Falou a garota pensativa, enquanto tomava seu suco no canudinho. - Você viu os produtos do Abutre na época em que ele os vendia, lembra desse tal Exoginium?
-Lembro de coisas revestidas com ele. Não sabia que tinha um nome, mas sei do que se trata. É um metal muito resistente, não dá pra destruí-lo usando tecnologia humana. - Peter explicou a ela. - Eu encontrei uma daquelas armas alienígenas uma vez, era feita de Exoginium. Eu tentei abri-la usando um martelo, mas só consegui quebrar a parcela de metal comum, porque o resto era impossível de destruir. Dentro dela havia um cristal explosivo, que meu amigo colocou na mochila e quase destruiu o Capitólio. E o resto do invólucro... - Ele interrompeu a si próprio. - É mesmo! - O rapaz bateu o copo na mesa com entusiasmo.
-Sem escândalo, gênio. - Olivia o reprovou com o olhar, temendo a reação de quem estava em volta - afinal era uma missão disfarçada. – O que tem o resto?
-O resto da arma ficou comigo. Eu guardei porque não sabia o que fazer com aquilo, obviamente não dava pra jogar no lixo e mandar pra reciclagem. - Peter falou aceleradamente. - Então eu deixei toda a armação de metal lá, no meu quarto em algum lugar. Podemos pegar essa outra amostra e usar pra tentar descobrir um jeito de destruir a liga metálica!
-Boa, Parker! - A garota compartilhou a animação dele. - Vamos buscar esse negócio, então.
-É, só tem um problema... - O rapaz complementou, coçando a nuca.
-O quê? - Liv o olhou com tédio.
-Esse negócio está guardado na casa da minha tia May. - Ele torceu o lábio, desconfortável.
Houve certa resistência interna da parte do garoto em buscar a amostra em sua antiga residência. Peter não pretendia voltar ao Queens naquela viagem, e muito menos fazer uma visita daquelas, já que a relação com a tia andava bem abalada. Então, ele preferiu nem tentar: os dois adolescentes esperaram escurecer para ir até o apartamento de May no início da noite, escondidos. Para evitar o encontro e um clima ruim, eles entrariam pela janela do quarto de Peter, da forma furtiva que ele já estava acostumado a chegar.
-Dá pra ir devagar? Nem todo mundo sabe escalar paredes, Menino-Aranha. - Olivia protestou irritada, observando o rapaz acima dela subir pelos tijolos com uma facilidade invejável.
Peter olhou para baixo um tanto confuso, pois fazer aquilo era tão habitual que se esquecera da companheira não-aracnídea.
-Calma, eu puxo você com uma teia. - Disse ele.
-Quer saber... - Bufou a garota, soltando-se dos tijolos e perdendo os quinze centímetros de altura avançados. Ela apontou as palmas das mãos para baixo, e fez as luzes da rua diminuírem brevemente para tomar sua energia luminosa. Liv utilizou seus poderes para erguer o próprio corpo no ar, e em poucos segundos alcançou a mesma distância do chão que Peter. Ela lançou um sorriso cínico para ele, e então pousou na escada de incêndio.
-Ou isso. - Peter ergueu as sobrancelhas e riu. Ele deu mais dois passos para cima até chegar à altura desejada, e com cuidado, arrastou a janela de vidro para a esquerda, abrindo a passagem para seu velho quarto. Ele entrou pelo teto cuidadosamente, e Liv veio logo atrás.
Peter pisou no chão silenciosamente, e então encarou seu antigo dormitório. Tudo estava exatamente como ele deixara, e os móveis e objetos espalhados se dispunham como se ele nunca tivesse saído dali. O local ainda cheirava a gibis e computadores antigos, e o rapaz sentiu uma mistura ligeira de saudade e culpa.
No entanto, não havia tempo para nostalgia; ele precisava encontrar aquele invólucro de metal e dar o fora dali para que os dois pudessem continuar a investigação. E fazendo o mínimo possível de barulho, para evitar que tia May percebesse algo errado, se é que ela estava em casa. Pela falta de movimentação no apartamento, Peter presumiu que ela estivesse dormindo, então acendeu as luzes e iniciou a busca.
O garoto tratou de vasculhar suas gavetas, enquanto Olivia procurava na escrivaninha do outro lado do quarto. Parker não se lembrava do local exato do esconderijo, afinal já fazia muito tempo desde que o cristal explodira o Capitólio, e ele não guardara aquilo na esperança de precisar achar de volta um dia. E sua típica bagunça nos armários, é claro, não ajudava também.
De repente, a busca dos dois foi interrompida pelo som da porta da frente se fechando. Peter e Olivia congelaram nas posições em que estavam, enquanto tia May entrava no apartamento e colocava as chaves na cômoda da sala despreocupadamente. A porta do quarto estava encostada, o que os dava algum tempo de vantagem; porém, eles ainda não tinham encontrado o que precisavam.
-Acha logo essa droga! - Olivia esbravejou no tom de voz mais baixo que conseguiu, e começou a jogar as cobertas e roupas do garoto pelo chão para acelerar a procura.
-Tem alguém aí? - A voz da mulher enunciou desconfiada, vinda do corredor. Tarde demais.
Os dois adolescentes arregalaram os olhos e se entreolharam imediatamente. Os passos de salto alto de May aproximaram-se do quarto, e agora já não dava mais tempo para fugir. Peter arremessou algumas roupas de volta para o armário e Olivia sentou na parte de baixo do beliche, momentos antes da italiana de meia idade abrir a porta rapidamente.
-Peter? - Disse ela confusa, encontrando o sobrinho atônito ao lado do guarda-roupa.
-O-Oi, tia May. - Falou ele, nervoso. - Pensei que estivesse dormindo.
-Mesmo dormindo sei bem qual é o som de você entrando escondido em casa. - Respondeu May, com as sobrancelhas franzidas. Ela vasculhou o cômodo até visualizar Olivia, que estava sentada na cama como uma estátua.
May encarou Peter e depois voltou a encarar a garota desconhecida, com um olhar confuso e desconfiado que dizia clara e atonitamente, tem uma garota no seu quarto. O silêncio que se instalou ajudou a tornar aquele um momento muito constrangedor para os três; Parker colocou-se à frente das duas, na tentativa de contornar a situação.
-May, essa é a Olivia. - Ele apresentou com a maior naturalidade que conseguiu encontrar naquele instante. - Ela... estuda comigo no MIT.
-Hm. - Murmurou a mulher, sem desviar os olhos da loira.
-Bom, nós já vamos indo. - Peter interrompeu a cena de forma acelerada e constrangida. - Foi bom te ver. - E então se virou para a janela.
-Espere – May impediu-o, e os dois adolescentes voltaram-se para ela. - Eu estava prestes a ir para a cozinha agora, vocês... não querem ficar para jantar? - Ela sugeriu repentinamente, um pouco sem graça.
Parker estava a um segundo de negar o convite e dar o fora dali o mais rápido possível.
-Nós...
-Eu adoraria jantar. - Olivia o interrompeu antes que a frase pudesse sair da sua boca, se levantando da cama e dando um passo para frente. Os dois a encararam.
-...Então tá. - May abriu um sorriso de surpresa, após alguns segundos de silêncio. - Podem vir, vou fazer Yakisoba.
Olivia caminhou até a porta, acompanhando May para o lado de fora enquanto Peter a encarava com o queixo caído de incredulidade.
-É uma visita surpresa, mas podemos dar um jeito. - Disse a tia, caminhando na direção da cozinha com a voz instantaneamente mais animada. - Sabe, é a primeira vez que o Peter traz uma garota aqui pra casa...
Ao ouvir aquilo, Liv virou-se de volta para o quarto, com um sorriso surpreso e divertido. Ela encarou o rapaz achando graça e viu Peter coçar a nuca de vergonha, o que a fez rir. Pouco antes de virar o corredor para seguir May, que ainda falava contente, ela cochichou para que ele aproveitasse a distração e continuasse procurando.
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-Então, como você e o Peter se conheceram? - Perguntou May enquanto colocava os pratos na mesa.
-Nós estudamos juntos – Olivia respondeu, questionando se a tia havia registrado bem quando eles disseram serem apenas colegas do MIT. Liv tinha sido encarregada de cortar os legumes para ajudar a fazer o jantar.
-Oh, sim. Ele não me conta muito sobre o que acontece lá em Massachusetts, então fiquei curiosa. – Disse a mulher. - Você é de lá?
-Na verdade sou de Nova York também. - Contou simplesmente, pra preservar sua identidade. - Estou lá pelos estudos.
-Você deve ser muito inteligente. Só pessoas muito especiais conseguem uma chance naquele lugar. - May sorriu. - Foi um orgulho saber que Peter foi escolhido para o programa de calouros. Ele sempre foi muito estudioso e sonhou com isso a vida toda. - Concluiu, com felicidade aparente. Olivia notou e decidiu continuar puxando assunto a partir desse ponto.
-A senhora é como se fosse a mãe dele, não é?
-Por favor, me chame de May. - Interrompeu a mulher gentilmente. - Não sou tão velha.
-Desculpe – Liv riu. - May, você é como uma mãe para o Peter, não é?
-Mãe e pai há alguns anos, desde que Ben faleceu. - Respondeu fechando a porta do armário de louças. - Eu e meu marido criamos o Peter como se fosse nosso desde que ele era muito pequeno.
-Ele tem muito carinho por vocês. - Olivia atestou, baseando-se na conversa da noite anterior. - E sente muita falta daqui.
-Bem que essa saudade poderia refletir em visitas mais frequentes. – Disse a italiana, com certa frustração na voz.
-Acho que ele anda muito ocupado com o estágio na base dos Vingadores. - A garota justificou, tentando aliviar a barra do amigo. - Lá não temos tempo pra muita coisa.
-Você trabalha lá também? - A mulher ergueu as sobrancelhas, surpresa. - Sabe, eu sempre achei que esse lugar exigia demais. E nunca fui com a cara daquele Tony Stark, também. Ele não me parece nada confiável com aquela simpatia forçada e aqueles óculos escuros esquisitos, que ele acha que são bonitos. - Ela fez uma cara de desgosto.
Olivia riu disfarçadamente ao ouvir aquela frase. Ela sabia que o pai dava em cima de May sempre que a via – e, pelo visto, não estava funcionando.
-Mas isso pode ser apenas superproteção da minha parte. Acho que mães nunca estão preparadas para ver seus filhos indo embora. - Continuou a mulher, adicionando temperos à panela. - Sabe, embora eu fosse muito nova quando Peter veio morar comigo, eu assumi o papel de mãe dele como você disse, e ainda ajo como tal. Dou broncas quando necessário, fico exageradamente orgulhosa e sinto sua falta quando está longe também. - May sorriu de lado. - Foi por isso que convidei vocês para ficarem.
-Ele também sente falta da senho... de você, May. - Olivia corrigiu-se e sorriu.
-É... - A mulher saiu andando até a sala. - Embora eu seja uma tia meio maluca e tenha cometido alguns erros, eu o amo.
Olivia conseguia sentir a mágoa e o arrependimento da tia por todos os recentes fatos, que Peter mencionara na noite anterior. E Liv sentia também que cabia a ela apaziguar isso, na medida do possível.
-Bom, o Peter é um cara incrível, então acho que você fez um bom trabalho. - Olivia sorriu, tentando aliviar um pouco. O comentário fez a mais velha sorrir.
-Está falando bem de mim, Olivia? - A voz convencida de Peter ecoou no corredor, fazendo as duas mulheres se virarem para ele.
-Não estou falando bem de você, estou elogiando a educação da sua tia. - Ela contornou, fazendo May rir.
-Olivia estava sendo gentil. - Disse a mulher, colocando os vegetais picados dentro da panela fervente. - Pode vir comer, já está quase pronto. O que você estava fazendo esse tempo todo, aliás? - Ela franziu a testa enquanto mexia com a colher.
-Vendo umas coisas antigas. - Peter respondeu, tirando do bolso o pedaço de metal para que só Olivia pudesse vê-lo, indicando o sucesso da busca com um sorriso. Logo em seguida, guardou-o de volta.
Os três sentaram-se em volta da mesa para comer o delicioso Yakisoba da tia May, do qual Peter sentira saudades. Os dois mais novos estavam de frente um para o outro enquanto a tia tomava a ponta.
-Do que vocês duas ficaram falando esse tempo todo? - Parker perguntou ajeitando-se na cadeira, externando a dúvida preocupante que o rodeou durante todo o tempo em que esteve no quarto.
-Estávamos falando mal de você. - Olivia respondeu e May deu risada.
-Eu não duvido. - Peter deu uma garfada.
-Sua tia disse que você mal aparece aqui. E eu disse que ia te obrigar a vir mais. - Liv falou e deu uma piscadela para a mulher sentada ao lado.
-Eu gostei dessa menina. - Disse a tia, e Olivia sorriu.
-Que ótimo, vocês são melhores amigas agora. - Peter falou, sem saber se deveria ficar feliz ou com medo daquilo.
-Inclusive, estou curiosa pra saber o que você faz em Nova York. - Questionou May. - Faz tempo que não vem pra cá, pelo que eu sei.
-Coisa nossa da faculdade. - O rapaz respondeu simplesmente, sem olhá-la nos olhos.
-Ah, sim... - A italiana encarou os dois com um olhar malandro, que os fez estranhar. - Você não me disse o que estuda, Olivia.
-Engenharia mecatrônica. - Respondeu a moça.
-É algum tipo de trabalho com os calouros? - Perguntou, pois sabia que Peter ainda estava no preparatório.
-É... – O rapaz apenas concordou, pois não conseguiu extrair mais nada da desculpa que criara.
-Bem, fico feliz que está aqui, e que está tudo bem com você. Fico tão preocupada sabendo dos riscos que você corre... - May interrompeu-se e olhou para Olivia, assustada. - Sabe, é que o Peter...
-Ela sabe. - Parker disse simplesmente, enquanto servia-se de mais macarrão. Ele referia-se ao segredo do Homem-Aranha.
-Certo. - May falou baixo, feliz por não ter que mentir sobre Peter praticar hóquei no gelo ou algum outro esporte radical.
-O Peter é um ótimo Vingador, May. - Olivia manifestou-se interrompendo o silêncio, tentando levantar a bola dele. - E é um ótimo tecnólogo também. No setor de Inovações, ele ajudou a inventar um isolante de raios pra que o Thor pudesse treinar na base.
-É mesmo? - A tia disse surpresa, encarando o garoto impassível do seu lado esquerdo. - Sabe, Peter sempre foi um garoto muito inteligente, desde pequeno. Quando ele era criança, costumava ajudar Ben com os consertos da casa, e às vezes sabia mais que o tio sobre as coisas.
-May... - Peter impediu-a, desconfortável por ser o centro da conversa.
-Ele odeia quando eu banco a mãezona. - A italiana dirigiu-se a Olivia, tomando um gole de suco. A garota riu.
-Ela nem começou a mostrar suas fotos de criança ainda, relaxa. - Liv entrou na brincadeira.
Peter ergueu as duas mãos para cima, agradecendo aos céus. Aquela cumplicidade das duas estava começando a lhe parecer perigosa.
-Quanto tempo vocês dois vão ficar na cidade? - May perguntou levantando-se e indo até a cozinha.
-Só alguns dias. - Peter respondeu, monossilábico.
-É um trabalho rápido. - Olivia complementou.
-Bom, espero que dê tudo certo.
-Vai dar, sim. As coisas estão indo muito bem até agora. - Peter sorriu brevemente para Liv, referindo-se à busca realizada com sucesso. - Parece que somos bons colegas de trabalho.
-É mesmo? - May sorriu, voltando a sentar. - Fico feliz em saber. Vocês dois são fofos juntos.
Nesse momento, Peter engasgou-se com o suco que tomava e Olivia derrubou seu garfo no chão, ambos com os olhos arregalados. May pareceu não entender a reação.
-May, nós... - Peter apressou-se em esclarecer.
-Não somos... - Olivia continuou, olhando assustada para o rapaz.
-Não são namorados? - Ela disse confusa. - Mas...
-Somos só amigos, tia May. - Parker explicou, num tom embaraçado. Suas bochechas estavam vermelhas.
-Me perdoem - A italiana riu divertida, mas parecia ser a única achando graça ali. - Quando olhei pra vocês dois juntos, podia jurar que eram... - Ela riu de novo. - Foi mal.
-Está tudo bem. - Olivia respondeu, permitindo-se rir depois do choque inicial.
-A comida estava ótima, tia May. - Peter tratou de mudar de assunto, levantando-se para levar o prato até a pia. Era provavelmente a primeira coisa legal que ele dirigia para a tia a noite toda.
-Eu imaginei que fosse gostar. Sempre foi seu prato preferido. - A mais velha sorriu.
-Massachusetts não tem Yakisobas bons assim.
-Bem, você nunca veio me visitar desde que se mudou – May disse ainda sorrindo. - Então pensei que iria gostar de matar as saudades. Quem sabe assim você volta mais vezes.
A conversa caiu em um silêncio indesejável depois da fala dela. Aquela situação toda entre tia e sobrinho era bem delicada, e Olivia sentia o estranho dever de aliviar a tensão entre os dois já que estava ali. E a melhor maneira de fazer isso seria aproveitar a deixa para sair de cena e permitir que os dois conversassem.
-Eu preciso ir ao banheiro. - Disse ela, interrompendo o silêncio barulhento. - Onde fica?
-Segunda porta à esquerda, meu bem. - May indicou, simpática.
-Eu te mostro. - Peter apressou-se em dizer levantando da cadeira, louco para dar o fora dali.
-Eu acho sozinha. - Olivia rebateu, já entrando no corredor. Ela lançou um olhar de reprovação para ele, enquanto disse apenas com o movimento dos lábios "fale com ela, droga". Logo em seguida ela sumiu para o lavabo.
Após a saída da garota, Peter voltou a sentar e ambos ficaram quietos por mais alguns instantes, um pouco desconfortáveis. Demorou um pouco até May ser a primeira a falar alguma coisa.
-Você em Nova York depois de quase um ano... - Disse a tia com um meio sorriso. - Seria burrice minha achar que tudo está voltando ao normal?
-May, você sabe que eu não posso voltar. - Peter disse com peso na voz.
-Eu sei. - May respondeu como se já tivesse ouvido aquilo várias vezes. - Eu não estou falando sobre voltar a morar comigo. Mas bem que você poderia aparecer de vez em quando, ou ao menos me ligar pra dar satisfações. Garanto que não iria comprometer a sua missão tão importante.
-Ligar pra te contar o que? Que eu estou em outro estado colocando minha vida em risco do jeito que você tem tanto medo? - Ele respondeu, desviando o olhar.
-Ao menos eu saberia que você está vivo. - May bufou. - Pois, mesmo que você não perceba, é só isso que me importa.
Aquela era uma velha discussão que já tinha se desenrolado várias vezes naquela mesma mesa de jantar. Ambos já estavam cansados dos mesmos argumentos e da briga que parecia sem fim, e que desgastava cada vez mais a relação familiar entre os dois.
-Escuta. - Disse a tia após suspirar pesado. - Eu entendo o que está fazendo. E acho nobre, de verdade. Principalmente porque sei que toda essa coragem e vontade de ajudar os outros está no seu sangue.
Peter ergueu a cabeça e olhou para ela em sinal de surpresa.
-Eu sei sobre os seus pais. - Atestou a mulher. - Stark me contou depois que você foi embora. Disse que eles foram sua principal motivação pra entrar pros Vingadores quando descobriu a verdade. E, sendo sincera, eu e seu tio nunca acreditamos muito na versão da polícia sobre o acidente de avião.
-May, eu... - Disse o garoto, estupefato.
-Eu entendi a sua escolha. Não consigo imaginar o quanto foi difícil pra você crescer sem eles. - Ela continuou. - Mas seus pais são o maior exemplo que posso te dar do porquê tenho tanta preocupação. Essa vida que você escolheu tem consequências, Peter. E eu não quero ficar sozinha no mundo.
-Eu jamais te deixaria sozinha...
-Eu sei – A tia o interrompeu novamente, com a voz embargada. - Não estou falando da nossa briga, estou falando de perder você. - Ela fez uma pausa para se recompor. - Mas, como eu disse, está no seu sangue querer fazer o bem sem medir esforços. Você é crescido o suficiente pra tomar suas próprias decisões, e eu não posso te impedir de fazer isso se é o que você quer. Por isso eu não vou tentar mais.
-Não vai? - Peter perguntou confuso.
-Não vou. - Ela confirmou. - Jamais serei a favor de você se colocar em perigo, mas eu prefiro que faça isso estando próximo de mim do que afastado sem que eu tenha a oportunidade de te dizer adeus se algo acontecer.
O rapaz abraçou-a por instinto imediatamente, fazendo com que May soltasse as lágrimas. Ele próprio precisou se segurar, pois aquela separação estava o sufocando como se fosse a falta de uma mãe. A mulher se afastou alguns instantes depois.
-Estar disposto a arriscar a sua própria vida para salvar os outros é muito nobre, Peter. E eu sempre vi essa qualidade em você. – Ela contou. - Sempre soube que o seu coração era capaz disso. Meu único problema é que o meu sobrinho, meu Peter, é quem está lá lutando contra aqueles extraterrestres esquisitos e robôs gigantes, entende? - May riu, e o rapaz a acompanhou. - Eu tenho muito orgulho de você, querido. Seu tio também tinha, e seus pais também teriam ao ver o homem que você se tornou.
Os dois se abraçaram novamente, e desta vez Peter não conseguiu conter-se. Sempre que ouvia falar do tio ou dos pais, principalmente pensando na possibilidade de estarem vivos, ele ficava emocionado. E ter a tia próxima daquele jeito depois de tanto tempo era um alívio tremendo.
-Obrigado, tia May. - Ele disse secando os olhos com as costas da mão. - Me desculpe por ter ido embora daquele jeito. Foi muito injusto com você.
-Esqueça. - Ela sorriu de lado. - Isso é passado. Nós dois fizemos e dissemos coisas erradas, e elas não importam mais. Precisamos nos lembrar de tudo que sentimos e fizemos de bom, pra recuperar esses laços. De agora em diante, eu quero estar próxima de você, ok? - Ela entornou a cabeça. - De você e da sua...
-May, ela não é minha namorada! - Peter adiantou-se, voltando ao tom constrangido de voz ao falar de Olivia.
-Tudo bem, tudo bem... - May ergueu as mãos na defensiva, e os dois deram risada. - Eu quero ficar próxima de você. Trate de me ligar sempre que puder, ouviu? Mande fotos, vídeos, FaceMime...
-Tá bom - Peter a interrompeu dando risada. - É FaceTime, tia May.
-Foi o que eu disse. Pensa que eu sou velha e não sei dessas coisas? - Ela fingiu estar brava, e depois se rendeu ao riso.
-Obrigado. - Disse o rapaz. - Obrigado por entender e... por todo o resto, durante toda a minha vida. Você é incrível.
-Eu sei. - Ela respondeu na brincadeira, sorrindo.
Olivia, que estava esperando no corredor já fazia um tempo, viu no breve silêncio seguinte a deixa para fechar a porta do banheiro e caminhar de volta para a sala, como se nada tivesse acontecido.
-Sei que está adorando matar as saudades da sua tia, Peter, mas acho que temos que ir. - Disse ela aparecendo instantes depois, parando atrás da cadeira dele. - Está ficando tarde e temos trabalho a fazer amanhã.
-Tem razão - Peter concordou, e levantou-se logo em seguida. - Muito obrigado pelo jantar, tia May, nós adoramos.
-Não tem de quê. - A italiana ficou de pé e sorriu. - Pode vir sempre que quiser – Ela andou até Olivia. - E pode trazer essa moça adorável com você também.
-Eu iria adorar – A garota sorriu sinceramente. – Estava tudo ótimo, May, obrigada.
-Boa noite - Falou Peter dirigindo-se até a porta do seu quarto. As duas ficaram olhando para ele, confusas.
-Peter – May chamou, fazendo-o olhar para trás. - Você pode usar a porta da frente, sabia? - Ela o encarava com a sobrancelha arqueada.
-Claro. - O rapaz bateu na própria cabeça. Era a força do hábito.
-Foi um prazer conhecê-la. - Olivia sorriu simpática. - Boa noite.
-Eu te amo, tia May! - Peter disse já do outro lado da sala.
-Boa noite, crianças - Ela respondeu sorridente, assistindo aos dois fecharem a porta do apartamento. - Eu também te amo, querido.
Olivia e Peter voltaram para o hotel, e chegaram perto da meia noite indo direto para seus dormitórios. Apesar do jantar emocionante e inusitado, eles teriam um dia cheio amanhã para continuar as investigações, e precisavam descansar para que pudessem pôr os cérebros para funcionar da melhor maneira. Eles tinham um metal alienígena e desconhecido para desvendar.
-Guardar essa tralha acabou salvando a gente – Disse Peter tirando a amostra de Exoginium do bolso, e em seguida jogando-se na própria cama. - Sem essa coisinha não daria pra descobrir como desestabilizar o robô.
-E isso ainda vai dar trabalho – Olivia complementou, sentando no colchão ao lado dele. - Mas nós vamos conseguir.
-Vamos, sim. - Os dois se juntaram para encarar o invólucro de metal brilhando de um jeito curioso à luz artificial. - E depois?
-Depois vamos encontrar provas da sujeita de Simon Williams, e o mandaremos pra cadeia.
-E todos viverão felizes para sempre. - Foi a vez de Peter completar a ideia.
-É, menos ele.
-Só precisamos de uma assinatura, ou de algo que prove que ele é o Magnum. - Falou Parker enquanto brincava com o metal.
-Ou então precisamos destruir o robô através do Exoginium. - Liv falou. - Deve ter alguma forma de fragilizar esse material.
-Nada é indestrutível, só temos que descobrir qual é o segredo.
Os dois adolescentes ficaram encarando a amostra brilhante na frente deles por alguns segundos, até Peter surgir com uma conversa diferente.
-Minha tia adorou você, aparentemente.
-Ela é uma fofa – A garota deu risada. - Eu adorei conhecê-la.
-Você estava tão sociável e simpática, achei até esquisito. - Peter fez uma careta, que resultou em um tapa instantâneo no ombro.
-Eu sou muito simpática quando eu quero, ok? - Protestou ela.
-Quando você quer. - O rapaz frisou entre risos. - Mas, sério... obrigado por insistir em ficar e fazer com que nós dois conversássemos sobre o que aconteceu.
-Não tem de quê. - Ela sorriu. - Sei o quanto sua tia é importante pra você.
-Estar na boa com ela é um alívio. Eu provavelmente não teria feito isso sem a sua ajuda, então... valeu. - O garoto disse sem jeito.
-Assistência social é um dos meus muitos dons. - Olivia não podia deixar de brincar. - Mas não se sinta tão especial, não fiz isso por você. É que, por algum motivo que eu sinceramente não entendo, sua tia gosta muito de você. – Ela franziu a testa. – E como ela é legal, decidi intervir.
-Ok, ok. - Parker deu risada. - May merecia isso. E agora ela tem mais um motivo pra te adorar.
-Ela ainda acha que somos namorados, não acha? - McCall fez uma careta e riu.
-Ela tem certeza disso. - Peter a acompanhou. - Eu tentei explicar, mas...
-Tudo bem, não parta o coração dela. Todos sabem que eu seria uma ótima nora-sobrinha.
-Acho que ela ficou muito feliz com a ideia de eu finalmente apresentar uma garota pra ela.
-Por quê? - Olivia franziu a testa. - Você realmente nunca tinha feito isso?
-Não.
-Qual é, Parker! - A garota indignou-se. - Você não pode ser assim tão difícil.
-Não é isso. Digamos que as garotas da minha escola preferiam meninos que faziam parte do time de futebol, e não do decatlo acadêmico. - Peter torceu o nariz.
-Se elas soubessem quem você é...
-Aí não gostariam de mim de verdade, então não valeria a pena. - O rapaz concluiu, dando de ombros.
-Muito maduro. - Liv se impressionou, vendo que ele não se vangloriava pelo Homem-Aranha. - E você está certo. Aconteceria algo parecido se eu decidisse usar meu verdadeiro sobrenome.
-As pessoas iriam se aproximar pra ganhar uma visita à torre Stark ou um passeio de Maserati. - Peter constatou, e os dois deram risada. - Mas você não precisa disso.
-Eu sou a excluída, Parker, esqueceu? - A garota riu da convicção que ele usara na frase anterior. - Digamos que os caras da minha escola não gostavam de garotas que eram mais inteligentes que eles.
-Sério? - Peter franziu o cenho. - Que idiotas.
-Eu entendo. Uma sabe-tudo pode ser um pé no saco às vezes. - Liv deu risada. - Mas gente estúpida me entedia de qualquer forma, então...
--Se eles soubessem quem você é... - Ele utilizou a mesma frase que ela minutos antes.
-O que quer dizer? - Liv o encarou.
-Ah, você sabe. Mesmo sendo sarcástica e odiando boa parte das pessoas que te cercam, você é legal. - Peter disse e a fez rir. - E não é por ser superesperta ou por ser filha do Tony Stark.
-Eu não odeio todos que me cercam, só quem merece. - Olivia constatou, aproximando-se dele.
-Que bom que eu não mereço. - Ele rebateu, chegando perto também.
Os rostos dos dois estavam próximos demais quando eles se deram conta. Eles pararam de falar, e encontraram os olhares mais conectados do que jamais estiveram. Então, em um lapso que exigiu apenas poucos centímetros de impulso, Peter tocou os lábios dos dois.
Olivia afastou o próprio rosto depois de alguns segundos. Ela encarou o garoto com uma expressão indecifrável nos olhos, e esquivou-se. Ficou de pé e virou para frente, alisando a parte da frente da blusa.
-Boa noite, Peter. - Foi o que ela disse, num tom impassível.
-Liv, espera... - Pediu o rapaz, confuso com a situação. Porém, ela não deu ouvidos, e saiu pela porta de correr que separava os dois quartos, fechando-a logo em seguida sem dizer mais nada.
Peter ficou sentado na própria cama, parado e sem reação. Não sabia explicar ao certo o que tinha sido aquilo, e nem ia parar para raciocinar; tinha sido a escolha errada. Ele fechou os olhos e apertou-os, arrependendo-se instantaneamente do impulso que teve, e jogou-se para trás a encontro do colchão.
Olivia não fez mais nenhum barulho sequer depois de desaparecer pela porta, o que o deixava mais inseguro. Mas ele não bateria na divisória ou abriria uma fresta; não o faria, pois tinha medo do que ia ver ou ouvir. Então, após se martirizar por alguns minutos, ele enfiou-se nas cobertas que estavam abaixo de si e apagou a luz do abajur, pois só o restava dormir na esperança de que aquilo se apagasse no dia seguinte.
-Estou começando a ficar com fome. – Olivia constatou assim que atravessaram uma das ruas.
-Eu também. - Falou Peter. – Se fosse há alguns anos atrás, existiria um lugar perfeito para almoçarmos.
-Qual?
-Delmar. – Disse o garoto, sentindo o apetite abrir imediatamente.
-E o que é isso? – Ela franziu a testa.
Ao ouvir o comentário, Peter parou no meio da calçada, como se não acreditasse no que acabara de ouvir.
-Pobre garotinha chique de Manhattan – Disse, fazendo graça. – Nunca teve o prazer único e inigualável de provar um sanduíche do Delmar.
Olivia o encarou com os olhos cerrados.
-Tem razão, nunca provei isso aí. O que tem de tão especial?
-Era o melhor sanduíche do Queens. Eu costumava comer lá todo dia depois da aula. – Peter explicou enquanto os dois voltaram a caminhar. – Mas infelizmente, na época em que o Abutre ainda vendia as armas dele, alguns dos seus compradores tentaram roubar o banco da esquina vizinha à lanchonete e acabaram a explodindo quando eu lutei com eles.
-Boa, Parker, destruiu o melhor sanduíche do Queens. – Ela brincou.
-Não fui eu, foram os caras maus. – Peter fechou a cara. – E se quer saber, acabou sendo bom pro Delmar no fim das contas. Quando o negócio afundou em Nova York, ele voltou a morar com a família em Massachusetts e abriu outra lanchonete. Deu certo, e ele chegou até a expandir pra um restaurante. Sempre como lá quando sinto saudades de casa.
-Que fofo. – Falou Olivia, sem a menor sinceridade na voz.
-Qual é! – Peter protestou, rindo. – Um dia vou te levar lá, aí vai entender do que estou falando.
-É claro. – Ela disse irônica. – Eu...
A habitual discussão humorada dos dois foi interrompida pelo toque do celular de Peter. O visor atestava que Natasha Romanoff estava ligando.
-Fala, Nat. - Disse o rapaz aproximando o aparelho do ouvido.
-Recebi um alerta vindo do laboratório de investigação de vocês hoje - Disse a voz da mulher. - Do scanner químico, pra ser exata. Ele terminou a análise que vocês deixaram executando, estou enviando os resultados pros dois agora mesmo.
Naquele momento, o celular de Peter vibrou em seu rosto e o de Olivia fez um bipe alertando a transferência concluída. A garota sacou o aparelho e acessou os arquivos imediatamente.
Há semanas atrás, Peter e Olivia haviam deixado o scanner de seu laboratório improvisado analisando a composição do controle-remoto do robô, que encontraram na casa de Jack O'Brien. Eles buscavam entender a liga metálica indestrutível da armadura, e tal resposta vinha muito a calhar naquele momento pacato da investigação.
-Os testes apontaram que, além de Vibranium e Adamantium, a liga metálica que reveste o controle remoto também possui um tipo de metal bem raro, de origem alienígena. - Romanoff adiantou os resultados. - O catálogo diz que se chama Exoginium, mas não tem mais informações.
-Devia ser isso que o Abutre estava vendendo pro Magnum – Liv constatou, lendo os mesmos dados enquanto ouvia a ligação de longe. - É matéria-prima alienígena, assim como os produtos dele. Não tem como fazer mais sentido.
-Tem razão. - Peter cochichou em concordância.
-Bom, já que temos uma análise química precisa, agora podemos descobrir como destruir esse metal - Olivia entusiasmou-se.
-Não tão rápido, loirinha Stark. - Natasha cortou-a do outro lado da linha. - Fazer essa análise tão complexa e demorada acabou consumindo toda a amostra do metal que tínhamos. O controle era muito pequeno, já era. Vocês precisam de outro plano.
-Como assim? Não sobrou nada? - Peter disse surpreso. - Precisávamos daquele controle.
-Agora é tarde demais. - Disse a mulher no telefone. - Bom, isso é tudo que eu tenho. Me liguem se precisarem de mais alguma coisa.
-Ok, Nat, obrigado. - Agradeceu Peter, e logo depois ela finalizou a chamada. Ele bloqueou a tela e guardou o aparelho no bolso, dando um suspiro frustrado. - Beleza, quem está a fim de almoçar?
-É o que nos resta. - Respondeu Olivia dando de ombros, e os dois voltaram a caminhar pela calçada.
Peter e Liv encontraram um restaurante a algumas quadras de onde estavam e pararam para uma refeição rápida. Sentaram-se em uma mesa no canto do estabelecimento e começaram a teorizar estratégias, intercalando a fala com uma porção grande de nachos.
-Ok, não temos metal suficiente para estudar como destruir o homem de lata. - Disse Liv, limpando o canto da boca com um guardanapo. - Que opção temos?
-Eu estava pensando em hackear o código de sinapses que estava no controle pra que pudéssemos tentar usá-lo pra comandar o robô da próxima vez. - Peter contou. - Se conseguíssemos colocar o seu código ou o meu lá dentro, ele nos obedeceria e ficaria fácil pará-lo. Mas agora já era.
-Precisamos de um plano B. - Falou a garota pensativa, enquanto tomava seu suco no canudinho. - Você viu os produtos do Abutre na época em que ele os vendia, lembra desse tal Exoginium?
-Lembro de coisas revestidas com ele. Não sabia que tinha um nome, mas sei do que se trata. É um metal muito resistente, não dá pra destruí-lo usando tecnologia humana. - Peter explicou a ela. - Eu encontrei uma daquelas armas alienígenas uma vez, era feita de Exoginium. Eu tentei abri-la usando um martelo, mas só consegui quebrar a parcela de metal comum, porque o resto era impossível de destruir. Dentro dela havia um cristal explosivo, que meu amigo colocou na mochila e quase destruiu o Capitólio. E o resto do invólucro... - Ele interrompeu a si próprio. - É mesmo! - O rapaz bateu o copo na mesa com entusiasmo.
-Sem escândalo, gênio. - Olivia o reprovou com o olhar, temendo a reação de quem estava em volta - afinal era uma missão disfarçada. – O que tem o resto?
-O resto da arma ficou comigo. Eu guardei porque não sabia o que fazer com aquilo, obviamente não dava pra jogar no lixo e mandar pra reciclagem. - Peter falou aceleradamente. - Então eu deixei toda a armação de metal lá, no meu quarto em algum lugar. Podemos pegar essa outra amostra e usar pra tentar descobrir um jeito de destruir a liga metálica!
-Boa, Parker! - A garota compartilhou a animação dele. - Vamos buscar esse negócio, então.
-É, só tem um problema... - O rapaz complementou, coçando a nuca.
-O quê? - Liv o olhou com tédio.
-Esse negócio está guardado na casa da minha tia May. - Ele torceu o lábio, desconfortável.
Houve certa resistência interna da parte do garoto em buscar a amostra em sua antiga residência. Peter não pretendia voltar ao Queens naquela viagem, e muito menos fazer uma visita daquelas, já que a relação com a tia andava bem abalada. Então, ele preferiu nem tentar: os dois adolescentes esperaram escurecer para ir até o apartamento de May no início da noite, escondidos. Para evitar o encontro e um clima ruim, eles entrariam pela janela do quarto de Peter, da forma furtiva que ele já estava acostumado a chegar.
-Dá pra ir devagar? Nem todo mundo sabe escalar paredes, Menino-Aranha. - Olivia protestou irritada, observando o rapaz acima dela subir pelos tijolos com uma facilidade invejável.
Peter olhou para baixo um tanto confuso, pois fazer aquilo era tão habitual que se esquecera da companheira não-aracnídea.
-Calma, eu puxo você com uma teia. - Disse ele.
-Quer saber... - Bufou a garota, soltando-se dos tijolos e perdendo os quinze centímetros de altura avançados. Ela apontou as palmas das mãos para baixo, e fez as luzes da rua diminuírem brevemente para tomar sua energia luminosa. Liv utilizou seus poderes para erguer o próprio corpo no ar, e em poucos segundos alcançou a mesma distância do chão que Peter. Ela lançou um sorriso cínico para ele, e então pousou na escada de incêndio.
-Ou isso. - Peter ergueu as sobrancelhas e riu. Ele deu mais dois passos para cima até chegar à altura desejada, e com cuidado, arrastou a janela de vidro para a esquerda, abrindo a passagem para seu velho quarto. Ele entrou pelo teto cuidadosamente, e Liv veio logo atrás.
Peter pisou no chão silenciosamente, e então encarou seu antigo dormitório. Tudo estava exatamente como ele deixara, e os móveis e objetos espalhados se dispunham como se ele nunca tivesse saído dali. O local ainda cheirava a gibis e computadores antigos, e o rapaz sentiu uma mistura ligeira de saudade e culpa.
No entanto, não havia tempo para nostalgia; ele precisava encontrar aquele invólucro de metal e dar o fora dali para que os dois pudessem continuar a investigação. E fazendo o mínimo possível de barulho, para evitar que tia May percebesse algo errado, se é que ela estava em casa. Pela falta de movimentação no apartamento, Peter presumiu que ela estivesse dormindo, então acendeu as luzes e iniciou a busca.
O garoto tratou de vasculhar suas gavetas, enquanto Olivia procurava na escrivaninha do outro lado do quarto. Parker não se lembrava do local exato do esconderijo, afinal já fazia muito tempo desde que o cristal explodira o Capitólio, e ele não guardara aquilo na esperança de precisar achar de volta um dia. E sua típica bagunça nos armários, é claro, não ajudava também.
De repente, a busca dos dois foi interrompida pelo som da porta da frente se fechando. Peter e Olivia congelaram nas posições em que estavam, enquanto tia May entrava no apartamento e colocava as chaves na cômoda da sala despreocupadamente. A porta do quarto estava encostada, o que os dava algum tempo de vantagem; porém, eles ainda não tinham encontrado o que precisavam.
-Acha logo essa droga! - Olivia esbravejou no tom de voz mais baixo que conseguiu, e começou a jogar as cobertas e roupas do garoto pelo chão para acelerar a procura.
-Tem alguém aí? - A voz da mulher enunciou desconfiada, vinda do corredor. Tarde demais.
Os dois adolescentes arregalaram os olhos e se entreolharam imediatamente. Os passos de salto alto de May aproximaram-se do quarto, e agora já não dava mais tempo para fugir. Peter arremessou algumas roupas de volta para o armário e Olivia sentou na parte de baixo do beliche, momentos antes da italiana de meia idade abrir a porta rapidamente.
-Peter? - Disse ela confusa, encontrando o sobrinho atônito ao lado do guarda-roupa.
-O-Oi, tia May. - Falou ele, nervoso. - Pensei que estivesse dormindo.
-Mesmo dormindo sei bem qual é o som de você entrando escondido em casa. - Respondeu May, com as sobrancelhas franzidas. Ela vasculhou o cômodo até visualizar Olivia, que estava sentada na cama como uma estátua.
May encarou Peter e depois voltou a encarar a garota desconhecida, com um olhar confuso e desconfiado que dizia clara e atonitamente, tem uma garota no seu quarto. O silêncio que se instalou ajudou a tornar aquele um momento muito constrangedor para os três; Parker colocou-se à frente das duas, na tentativa de contornar a situação.
-May, essa é a Olivia. - Ele apresentou com a maior naturalidade que conseguiu encontrar naquele instante. - Ela... estuda comigo no MIT.
-Hm. - Murmurou a mulher, sem desviar os olhos da loira.
-Bom, nós já vamos indo. - Peter interrompeu a cena de forma acelerada e constrangida. - Foi bom te ver. - E então se virou para a janela.
-Espere – May impediu-o, e os dois adolescentes voltaram-se para ela. - Eu estava prestes a ir para a cozinha agora, vocês... não querem ficar para jantar? - Ela sugeriu repentinamente, um pouco sem graça.
Parker estava a um segundo de negar o convite e dar o fora dali o mais rápido possível.
-Nós...
-Eu adoraria jantar. - Olivia o interrompeu antes que a frase pudesse sair da sua boca, se levantando da cama e dando um passo para frente. Os dois a encararam.
-...Então tá. - May abriu um sorriso de surpresa, após alguns segundos de silêncio. - Podem vir, vou fazer Yakisoba.
Olivia caminhou até a porta, acompanhando May para o lado de fora enquanto Peter a encarava com o queixo caído de incredulidade.
-É uma visita surpresa, mas podemos dar um jeito. - Disse a tia, caminhando na direção da cozinha com a voz instantaneamente mais animada. - Sabe, é a primeira vez que o Peter traz uma garota aqui pra casa...
Ao ouvir aquilo, Liv virou-se de volta para o quarto, com um sorriso surpreso e divertido. Ela encarou o rapaz achando graça e viu Peter coçar a nuca de vergonha, o que a fez rir. Pouco antes de virar o corredor para seguir May, que ainda falava contente, ela cochichou para que ele aproveitasse a distração e continuasse procurando.
-Então, como você e o Peter se conheceram? - Perguntou May enquanto colocava os pratos na mesa.
-Nós estudamos juntos – Olivia respondeu, questionando se a tia havia registrado bem quando eles disseram serem apenas colegas do MIT. Liv tinha sido encarregada de cortar os legumes para ajudar a fazer o jantar.
-Oh, sim. Ele não me conta muito sobre o que acontece lá em Massachusetts, então fiquei curiosa. – Disse a mulher. - Você é de lá?
-Na verdade sou de Nova York também. - Contou simplesmente, pra preservar sua identidade. - Estou lá pelos estudos.
-Você deve ser muito inteligente. Só pessoas muito especiais conseguem uma chance naquele lugar. - May sorriu. - Foi um orgulho saber que Peter foi escolhido para o programa de calouros. Ele sempre foi muito estudioso e sonhou com isso a vida toda. - Concluiu, com felicidade aparente. Olivia notou e decidiu continuar puxando assunto a partir desse ponto.
-A senhora é como se fosse a mãe dele, não é?
-Por favor, me chame de May. - Interrompeu a mulher gentilmente. - Não sou tão velha.
-Desculpe – Liv riu. - May, você é como uma mãe para o Peter, não é?
-Mãe e pai há alguns anos, desde que Ben faleceu. - Respondeu fechando a porta do armário de louças. - Eu e meu marido criamos o Peter como se fosse nosso desde que ele era muito pequeno.
-Ele tem muito carinho por vocês. - Olivia atestou, baseando-se na conversa da noite anterior. - E sente muita falta daqui.
-Bem que essa saudade poderia refletir em visitas mais frequentes. – Disse a italiana, com certa frustração na voz.
-Acho que ele anda muito ocupado com o estágio na base dos Vingadores. - A garota justificou, tentando aliviar a barra do amigo. - Lá não temos tempo pra muita coisa.
-Você trabalha lá também? - A mulher ergueu as sobrancelhas, surpresa. - Sabe, eu sempre achei que esse lugar exigia demais. E nunca fui com a cara daquele Tony Stark, também. Ele não me parece nada confiável com aquela simpatia forçada e aqueles óculos escuros esquisitos, que ele acha que são bonitos. - Ela fez uma cara de desgosto.
Olivia riu disfarçadamente ao ouvir aquela frase. Ela sabia que o pai dava em cima de May sempre que a via – e, pelo visto, não estava funcionando.
-Mas isso pode ser apenas superproteção da minha parte. Acho que mães nunca estão preparadas para ver seus filhos indo embora. - Continuou a mulher, adicionando temperos à panela. - Sabe, embora eu fosse muito nova quando Peter veio morar comigo, eu assumi o papel de mãe dele como você disse, e ainda ajo como tal. Dou broncas quando necessário, fico exageradamente orgulhosa e sinto sua falta quando está longe também. - May sorriu de lado. - Foi por isso que convidei vocês para ficarem.
-Ele também sente falta da senho... de você, May. - Olivia corrigiu-se e sorriu.
-É... - A mulher saiu andando até a sala. - Embora eu seja uma tia meio maluca e tenha cometido alguns erros, eu o amo.
Olivia conseguia sentir a mágoa e o arrependimento da tia por todos os recentes fatos, que Peter mencionara na noite anterior. E Liv sentia também que cabia a ela apaziguar isso, na medida do possível.
-Bom, o Peter é um cara incrível, então acho que você fez um bom trabalho. - Olivia sorriu, tentando aliviar um pouco. O comentário fez a mais velha sorrir.
-Está falando bem de mim, Olivia? - A voz convencida de Peter ecoou no corredor, fazendo as duas mulheres se virarem para ele.
-Não estou falando bem de você, estou elogiando a educação da sua tia. - Ela contornou, fazendo May rir.
-Olivia estava sendo gentil. - Disse a mulher, colocando os vegetais picados dentro da panela fervente. - Pode vir comer, já está quase pronto. O que você estava fazendo esse tempo todo, aliás? - Ela franziu a testa enquanto mexia com a colher.
-Vendo umas coisas antigas. - Peter respondeu, tirando do bolso o pedaço de metal para que só Olivia pudesse vê-lo, indicando o sucesso da busca com um sorriso. Logo em seguida, guardou-o de volta.
Os três sentaram-se em volta da mesa para comer o delicioso Yakisoba da tia May, do qual Peter sentira saudades. Os dois mais novos estavam de frente um para o outro enquanto a tia tomava a ponta.
-Do que vocês duas ficaram falando esse tempo todo? - Parker perguntou ajeitando-se na cadeira, externando a dúvida preocupante que o rodeou durante todo o tempo em que esteve no quarto.
-Estávamos falando mal de você. - Olivia respondeu e May deu risada.
-Eu não duvido. - Peter deu uma garfada.
-Sua tia disse que você mal aparece aqui. E eu disse que ia te obrigar a vir mais. - Liv falou e deu uma piscadela para a mulher sentada ao lado.
-Eu gostei dessa menina. - Disse a tia, e Olivia sorriu.
-Que ótimo, vocês são melhores amigas agora. - Peter falou, sem saber se deveria ficar feliz ou com medo daquilo.
-Inclusive, estou curiosa pra saber o que você faz em Nova York. - Questionou May. - Faz tempo que não vem pra cá, pelo que eu sei.
-Coisa nossa da faculdade. - O rapaz respondeu simplesmente, sem olhá-la nos olhos.
-Ah, sim... - A italiana encarou os dois com um olhar malandro, que os fez estranhar. - Você não me disse o que estuda, Olivia.
-Engenharia mecatrônica. - Respondeu a moça.
-É algum tipo de trabalho com os calouros? - Perguntou, pois sabia que Peter ainda estava no preparatório.
-É... – O rapaz apenas concordou, pois não conseguiu extrair mais nada da desculpa que criara.
-Bem, fico feliz que está aqui, e que está tudo bem com você. Fico tão preocupada sabendo dos riscos que você corre... - May interrompeu-se e olhou para Olivia, assustada. - Sabe, é que o Peter...
-Ela sabe. - Parker disse simplesmente, enquanto servia-se de mais macarrão. Ele referia-se ao segredo do Homem-Aranha.
-Certo. - May falou baixo, feliz por não ter que mentir sobre Peter praticar hóquei no gelo ou algum outro esporte radical.
-O Peter é um ótimo Vingador, May. - Olivia manifestou-se interrompendo o silêncio, tentando levantar a bola dele. - E é um ótimo tecnólogo também. No setor de Inovações, ele ajudou a inventar um isolante de raios pra que o Thor pudesse treinar na base.
-É mesmo? - A tia disse surpresa, encarando o garoto impassível do seu lado esquerdo. - Sabe, Peter sempre foi um garoto muito inteligente, desde pequeno. Quando ele era criança, costumava ajudar Ben com os consertos da casa, e às vezes sabia mais que o tio sobre as coisas.
-May... - Peter impediu-a, desconfortável por ser o centro da conversa.
-Ele odeia quando eu banco a mãezona. - A italiana dirigiu-se a Olivia, tomando um gole de suco. A garota riu.
-Ela nem começou a mostrar suas fotos de criança ainda, relaxa. - Liv entrou na brincadeira.
Peter ergueu as duas mãos para cima, agradecendo aos céus. Aquela cumplicidade das duas estava começando a lhe parecer perigosa.
-Quanto tempo vocês dois vão ficar na cidade? - May perguntou levantando-se e indo até a cozinha.
-Só alguns dias. - Peter respondeu, monossilábico.
-É um trabalho rápido. - Olivia complementou.
-Bom, espero que dê tudo certo.
-Vai dar, sim. As coisas estão indo muito bem até agora. - Peter sorriu brevemente para Liv, referindo-se à busca realizada com sucesso. - Parece que somos bons colegas de trabalho.
-É mesmo? - May sorriu, voltando a sentar. - Fico feliz em saber. Vocês dois são fofos juntos.
Nesse momento, Peter engasgou-se com o suco que tomava e Olivia derrubou seu garfo no chão, ambos com os olhos arregalados. May pareceu não entender a reação.
-May, nós... - Peter apressou-se em esclarecer.
-Não somos... - Olivia continuou, olhando assustada para o rapaz.
-Não são namorados? - Ela disse confusa. - Mas...
-Somos só amigos, tia May. - Parker explicou, num tom embaraçado. Suas bochechas estavam vermelhas.
-Me perdoem - A italiana riu divertida, mas parecia ser a única achando graça ali. - Quando olhei pra vocês dois juntos, podia jurar que eram... - Ela riu de novo. - Foi mal.
-Está tudo bem. - Olivia respondeu, permitindo-se rir depois do choque inicial.
-A comida estava ótima, tia May. - Peter tratou de mudar de assunto, levantando-se para levar o prato até a pia. Era provavelmente a primeira coisa legal que ele dirigia para a tia a noite toda.
-Eu imaginei que fosse gostar. Sempre foi seu prato preferido. - A mais velha sorriu.
-Massachusetts não tem Yakisobas bons assim.
-Bem, você nunca veio me visitar desde que se mudou – May disse ainda sorrindo. - Então pensei que iria gostar de matar as saudades. Quem sabe assim você volta mais vezes.
A conversa caiu em um silêncio indesejável depois da fala dela. Aquela situação toda entre tia e sobrinho era bem delicada, e Olivia sentia o estranho dever de aliviar a tensão entre os dois já que estava ali. E a melhor maneira de fazer isso seria aproveitar a deixa para sair de cena e permitir que os dois conversassem.
-Eu preciso ir ao banheiro. - Disse ela, interrompendo o silêncio barulhento. - Onde fica?
-Segunda porta à esquerda, meu bem. - May indicou, simpática.
-Eu te mostro. - Peter apressou-se em dizer levantando da cadeira, louco para dar o fora dali.
-Eu acho sozinha. - Olivia rebateu, já entrando no corredor. Ela lançou um olhar de reprovação para ele, enquanto disse apenas com o movimento dos lábios "fale com ela, droga". Logo em seguida ela sumiu para o lavabo.
Após a saída da garota, Peter voltou a sentar e ambos ficaram quietos por mais alguns instantes, um pouco desconfortáveis. Demorou um pouco até May ser a primeira a falar alguma coisa.
-Você em Nova York depois de quase um ano... - Disse a tia com um meio sorriso. - Seria burrice minha achar que tudo está voltando ao normal?
-May, você sabe que eu não posso voltar. - Peter disse com peso na voz.
-Eu sei. - May respondeu como se já tivesse ouvido aquilo várias vezes. - Eu não estou falando sobre voltar a morar comigo. Mas bem que você poderia aparecer de vez em quando, ou ao menos me ligar pra dar satisfações. Garanto que não iria comprometer a sua missão tão importante.
-Ligar pra te contar o que? Que eu estou em outro estado colocando minha vida em risco do jeito que você tem tanto medo? - Ele respondeu, desviando o olhar.
-Ao menos eu saberia que você está vivo. - May bufou. - Pois, mesmo que você não perceba, é só isso que me importa.
Aquela era uma velha discussão que já tinha se desenrolado várias vezes naquela mesma mesa de jantar. Ambos já estavam cansados dos mesmos argumentos e da briga que parecia sem fim, e que desgastava cada vez mais a relação familiar entre os dois.
-Escuta. - Disse a tia após suspirar pesado. - Eu entendo o que está fazendo. E acho nobre, de verdade. Principalmente porque sei que toda essa coragem e vontade de ajudar os outros está no seu sangue.
Peter ergueu a cabeça e olhou para ela em sinal de surpresa.
-Eu sei sobre os seus pais. - Atestou a mulher. - Stark me contou depois que você foi embora. Disse que eles foram sua principal motivação pra entrar pros Vingadores quando descobriu a verdade. E, sendo sincera, eu e seu tio nunca acreditamos muito na versão da polícia sobre o acidente de avião.
-May, eu... - Disse o garoto, estupefato.
-Eu entendi a sua escolha. Não consigo imaginar o quanto foi difícil pra você crescer sem eles. - Ela continuou. - Mas seus pais são o maior exemplo que posso te dar do porquê tenho tanta preocupação. Essa vida que você escolheu tem consequências, Peter. E eu não quero ficar sozinha no mundo.
-Eu jamais te deixaria sozinha...
-Eu sei – A tia o interrompeu novamente, com a voz embargada. - Não estou falando da nossa briga, estou falando de perder você. - Ela fez uma pausa para se recompor. - Mas, como eu disse, está no seu sangue querer fazer o bem sem medir esforços. Você é crescido o suficiente pra tomar suas próprias decisões, e eu não posso te impedir de fazer isso se é o que você quer. Por isso eu não vou tentar mais.
-Não vai? - Peter perguntou confuso.
-Não vou. - Ela confirmou. - Jamais serei a favor de você se colocar em perigo, mas eu prefiro que faça isso estando próximo de mim do que afastado sem que eu tenha a oportunidade de te dizer adeus se algo acontecer.
O rapaz abraçou-a por instinto imediatamente, fazendo com que May soltasse as lágrimas. Ele próprio precisou se segurar, pois aquela separação estava o sufocando como se fosse a falta de uma mãe. A mulher se afastou alguns instantes depois.
-Estar disposto a arriscar a sua própria vida para salvar os outros é muito nobre, Peter. E eu sempre vi essa qualidade em você. – Ela contou. - Sempre soube que o seu coração era capaz disso. Meu único problema é que o meu sobrinho, meu Peter, é quem está lá lutando contra aqueles extraterrestres esquisitos e robôs gigantes, entende? - May riu, e o rapaz a acompanhou. - Eu tenho muito orgulho de você, querido. Seu tio também tinha, e seus pais também teriam ao ver o homem que você se tornou.
Os dois se abraçaram novamente, e desta vez Peter não conseguiu conter-se. Sempre que ouvia falar do tio ou dos pais, principalmente pensando na possibilidade de estarem vivos, ele ficava emocionado. E ter a tia próxima daquele jeito depois de tanto tempo era um alívio tremendo.
-Obrigado, tia May. - Ele disse secando os olhos com as costas da mão. - Me desculpe por ter ido embora daquele jeito. Foi muito injusto com você.
-Esqueça. - Ela sorriu de lado. - Isso é passado. Nós dois fizemos e dissemos coisas erradas, e elas não importam mais. Precisamos nos lembrar de tudo que sentimos e fizemos de bom, pra recuperar esses laços. De agora em diante, eu quero estar próxima de você, ok? - Ela entornou a cabeça. - De você e da sua...
-May, ela não é minha namorada! - Peter adiantou-se, voltando ao tom constrangido de voz ao falar de Olivia.
-Tudo bem, tudo bem... - May ergueu as mãos na defensiva, e os dois deram risada. - Eu quero ficar próxima de você. Trate de me ligar sempre que puder, ouviu? Mande fotos, vídeos, FaceMime...
-Tá bom - Peter a interrompeu dando risada. - É FaceTime, tia May.
-Foi o que eu disse. Pensa que eu sou velha e não sei dessas coisas? - Ela fingiu estar brava, e depois se rendeu ao riso.
-Obrigado. - Disse o rapaz. - Obrigado por entender e... por todo o resto, durante toda a minha vida. Você é incrível.
-Eu sei. - Ela respondeu na brincadeira, sorrindo.
Olivia, que estava esperando no corredor já fazia um tempo, viu no breve silêncio seguinte a deixa para fechar a porta do banheiro e caminhar de volta para a sala, como se nada tivesse acontecido.
-Sei que está adorando matar as saudades da sua tia, Peter, mas acho que temos que ir. - Disse ela aparecendo instantes depois, parando atrás da cadeira dele. - Está ficando tarde e temos trabalho a fazer amanhã.
-Tem razão - Peter concordou, e levantou-se logo em seguida. - Muito obrigado pelo jantar, tia May, nós adoramos.
-Não tem de quê. - A italiana ficou de pé e sorriu. - Pode vir sempre que quiser – Ela andou até Olivia. - E pode trazer essa moça adorável com você também.
-Eu iria adorar – A garota sorriu sinceramente. – Estava tudo ótimo, May, obrigada.
-Boa noite - Falou Peter dirigindo-se até a porta do seu quarto. As duas ficaram olhando para ele, confusas.
-Peter – May chamou, fazendo-o olhar para trás. - Você pode usar a porta da frente, sabia? - Ela o encarava com a sobrancelha arqueada.
-Claro. - O rapaz bateu na própria cabeça. Era a força do hábito.
-Foi um prazer conhecê-la. - Olivia sorriu simpática. - Boa noite.
-Eu te amo, tia May! - Peter disse já do outro lado da sala.
-Boa noite, crianças - Ela respondeu sorridente, assistindo aos dois fecharem a porta do apartamento. - Eu também te amo, querido.
Olivia e Peter voltaram para o hotel, e chegaram perto da meia noite indo direto para seus dormitórios. Apesar do jantar emocionante e inusitado, eles teriam um dia cheio amanhã para continuar as investigações, e precisavam descansar para que pudessem pôr os cérebros para funcionar da melhor maneira. Eles tinham um metal alienígena e desconhecido para desvendar.
-Guardar essa tralha acabou salvando a gente – Disse Peter tirando a amostra de Exoginium do bolso, e em seguida jogando-se na própria cama. - Sem essa coisinha não daria pra descobrir como desestabilizar o robô.
-E isso ainda vai dar trabalho – Olivia complementou, sentando no colchão ao lado dele. - Mas nós vamos conseguir.
-Vamos, sim. - Os dois se juntaram para encarar o invólucro de metal brilhando de um jeito curioso à luz artificial. - E depois?
-Depois vamos encontrar provas da sujeita de Simon Williams, e o mandaremos pra cadeia.
-E todos viverão felizes para sempre. - Foi a vez de Peter completar a ideia.
-É, menos ele.
-Só precisamos de uma assinatura, ou de algo que prove que ele é o Magnum. - Falou Parker enquanto brincava com o metal.
-Ou então precisamos destruir o robô através do Exoginium. - Liv falou. - Deve ter alguma forma de fragilizar esse material.
-Nada é indestrutível, só temos que descobrir qual é o segredo.
Os dois adolescentes ficaram encarando a amostra brilhante na frente deles por alguns segundos, até Peter surgir com uma conversa diferente.
-Minha tia adorou você, aparentemente.
-Ela é uma fofa – A garota deu risada. - Eu adorei conhecê-la.
-Você estava tão sociável e simpática, achei até esquisito. - Peter fez uma careta, que resultou em um tapa instantâneo no ombro.
-Eu sou muito simpática quando eu quero, ok? - Protestou ela.
-Quando você quer. - O rapaz frisou entre risos. - Mas, sério... obrigado por insistir em ficar e fazer com que nós dois conversássemos sobre o que aconteceu.
-Não tem de quê. - Ela sorriu. - Sei o quanto sua tia é importante pra você.
-Estar na boa com ela é um alívio. Eu provavelmente não teria feito isso sem a sua ajuda, então... valeu. - O garoto disse sem jeito.
-Assistência social é um dos meus muitos dons. - Olivia não podia deixar de brincar. - Mas não se sinta tão especial, não fiz isso por você. É que, por algum motivo que eu sinceramente não entendo, sua tia gosta muito de você. – Ela franziu a testa. – E como ela é legal, decidi intervir.
-Ok, ok. - Parker deu risada. - May merecia isso. E agora ela tem mais um motivo pra te adorar.
-Ela ainda acha que somos namorados, não acha? - McCall fez uma careta e riu.
-Ela tem certeza disso. - Peter a acompanhou. - Eu tentei explicar, mas...
-Tudo bem, não parta o coração dela. Todos sabem que eu seria uma ótima nora-sobrinha.
-Acho que ela ficou muito feliz com a ideia de eu finalmente apresentar uma garota pra ela.
-Por quê? - Olivia franziu a testa. - Você realmente nunca tinha feito isso?
-Não.
-Qual é, Parker! - A garota indignou-se. - Você não pode ser assim tão difícil.
-Não é isso. Digamos que as garotas da minha escola preferiam meninos que faziam parte do time de futebol, e não do decatlo acadêmico. - Peter torceu o nariz.
-Se elas soubessem quem você é...
-Aí não gostariam de mim de verdade, então não valeria a pena. - O rapaz concluiu, dando de ombros.
-Muito maduro. - Liv se impressionou, vendo que ele não se vangloriava pelo Homem-Aranha. - E você está certo. Aconteceria algo parecido se eu decidisse usar meu verdadeiro sobrenome.
-As pessoas iriam se aproximar pra ganhar uma visita à torre Stark ou um passeio de Maserati. - Peter constatou, e os dois deram risada. - Mas você não precisa disso.
-Eu sou a excluída, Parker, esqueceu? - A garota riu da convicção que ele usara na frase anterior. - Digamos que os caras da minha escola não gostavam de garotas que eram mais inteligentes que eles.
-Sério? - Peter franziu o cenho. - Que idiotas.
-Eu entendo. Uma sabe-tudo pode ser um pé no saco às vezes. - Liv deu risada. - Mas gente estúpida me entedia de qualquer forma, então...
--Se eles soubessem quem você é... - Ele utilizou a mesma frase que ela minutos antes.
-O que quer dizer? - Liv o encarou.
-Ah, você sabe. Mesmo sendo sarcástica e odiando boa parte das pessoas que te cercam, você é legal. - Peter disse e a fez rir. - E não é por ser superesperta ou por ser filha do Tony Stark.
-Eu não odeio todos que me cercam, só quem merece. - Olivia constatou, aproximando-se dele.
-Que bom que eu não mereço. - Ele rebateu, chegando perto também.
Os rostos dos dois estavam próximos demais quando eles se deram conta. Eles pararam de falar, e encontraram os olhares mais conectados do que jamais estiveram. Então, em um lapso que exigiu apenas poucos centímetros de impulso, Peter tocou os lábios dos dois.
Olivia afastou o próprio rosto depois de alguns segundos. Ela encarou o garoto com uma expressão indecifrável nos olhos, e esquivou-se. Ficou de pé e virou para frente, alisando a parte da frente da blusa.
-Boa noite, Peter. - Foi o que ela disse, num tom impassível.
-Liv, espera... - Pediu o rapaz, confuso com a situação. Porém, ela não deu ouvidos, e saiu pela porta de correr que separava os dois quartos, fechando-a logo em seguida sem dizer mais nada.
Peter ficou sentado na própria cama, parado e sem reação. Não sabia explicar ao certo o que tinha sido aquilo, e nem ia parar para raciocinar; tinha sido a escolha errada. Ele fechou os olhos e apertou-os, arrependendo-se instantaneamente do impulso que teve, e jogou-se para trás a encontro do colchão.
Olivia não fez mais nenhum barulho sequer depois de desaparecer pela porta, o que o deixava mais inseguro. Mas ele não bateria na divisória ou abriria uma fresta; não o faria, pois tinha medo do que ia ver ou ouvir. Então, após se martirizar por alguns minutos, ele enfiou-se nas cobertas que estavam abaixo de si e apagou a luz do abajur, pois só o restava dormir na esperança de que aquilo se apagasse no dia seguinte.
Capítulo 10
Parker acordou por volta das nove da manhã com a luz do dia invadindo o quarto pelas cortinas. A divisória entre os dois dormitórios ainda estava fechada, e constatar aquilo fez o garoto engolir seco por conta do acontecido na noite anterior. O sol refletia nos vidros da sacada, onde Olivia já tomava café da manhã sentada na mesinha externa enquanto mexia em seu notebook.
Peter não fazia ideia de como agir perto dela. E pior: não fazia ideia de como ela iria agir perto dele. Demonstrar seus sentimentos, ainda mais daquela maneira, não podia ter acontecido em pior momento. Ele não sabia lidar com garotas, era fato. No entanto, hoje seria preciso, pois havia muito mais em jogo e eles tinham um trabalho a fazer. Pensando nisso, Parker tomou coragem e abriu a vidraça de correr da sacada, e foi até o lado de fora.
-Bom dia. - Disse ele, simples e neutro.
-Bom dia, Menino-Aranha - Olivia respondeu num tom simpático e estranhamente normal, tomando um gole de sua xícara de café. - Tenho umas coisas que você precisa ver.
Confuso com aquela naturalidade toda, Peter sentou-se desconfiado na cadeira do lado oposto da mesa, servindo-se de suco de laranja e encarando o notebook que Liv esticara para ele.
-Estava falando com a Romanoff agora pouco. Parece que nossos amiguinhos realmente sabem sobre a nossa investigação. - Ela indicou a tela do computador, onde havia um aviso dizendo "acesso negado". - Aparentemente, eles arrumaram um jeito de bloquear o nosso servidor de acessar os arquivos relacionados à nossa pesquisa sobre o Magnum.
-Não podemos ver nada do caso? - O rapaz franziu a testa.
-Nem aqui e nem em Massachusetts. - Explicou a menina. - É o sistema todo. Mas não está totalmente inoperante, apenas quando tentamos abrir qualquer coisa relacionada ao Magnum na nossa nuvem privada, ou online nos registros governamentais. O problema é que não temos como acessar arquivos policiais ou da inteligência sem a chave de acesso que o sistema dos Vingadores tem. Nosso aliado mais poderoso no momento é o Google.
-Que maravilha.
-Pois é. Foi por isso que chamei um jatinho pra cá e enviei o invólucro de Exoginium para a base, e ele deve chegar em meia hora. Aquele motor superpotente que desenvolvemos nas Inovações veio a calhar. – Liv relatou. – A Nat vai receber e colocar a amostra pra análise no laboratório usando os equipamentos de lá, para nos ajudar a descobrir mais.
-Ok. - Peter respondeu e então a encarou, um tanto desconfortável. Ela nem sequer olhava para ele, concentrada no que quer que estivesse fazendo online.
Aparentemente, Olivia estava agindo como se nada tivesse acontecido. E já que ela decidira encarar daquela forma, Peter não tinha porque contrariar. Aquele não era o local e nem o momento para discutir relação adolescente, então o rapaz decidiu jogar o jogo dela e esquecer-se da noite passada, focando a atenção apenas na missão, que era o mais importante.
Como tinha se tornado impossível avançar na investigação sobre o suspeito até que Natasha conseguisse destravar o sistema na base, Peter e Olivia decidiram focar na outra parte das pesquisas. Eles precisavam entender o que era o metal alienígena Exoginium, e se possível descobrir uma forma de deixá-lo mais fraco. Uma pequena equipe de cientistas da base, convocada secretamente pela agente Romanoff, colaborou com a pesquisa enviando informações que conseguiram a partir dos experimentos realizados com o exemplar físico. Os dois jovens passaram o dia todo dentro do quarto de hotel, analisando à distância os resultados dos testes feitos com a nova amostra. Cálculo a cálculo, eles estavam tentando encontrar uma brecha a partir do amplo conhecimento científico dos dois.
Os dois ficaram a maior parte do tempo em silêncio total, sem fazer nenhum contato visual. O único assunto tratado era a química, da qual os dois entendiam muito bem. Analisando os índices, os prodígios perceberam que o Exoginium possuía propriedades tanto de metal quanto de não-metal e mineral também. Era uma espécie de elemento que combinava tudo, e unia as características mais fortes de todas as classes naturais: alto ponto de fusão, ebulição, resistência altamente incomum e praticamente impenetrável. Provavelmente, um dos materiais mais complexos que já visitaram a Terra. E muito, muito sub-estudado.
Parker e McCall passaram o dia afundados em pesquisas, cálculos, gráficos e leituras científicas. Foi difícil, mas no fim eles conseguiram chegar a algumas hipóteses.
-Ok, minha cabeça não consegue pensar mais. - Olivia disse quando já era noite do lado de fora, levantando-se da cama onde passara um bom tempo pesquisando. - E eu tenho um cérebro superdesenvolvido, ou seja: isso deve significar alguma coisa.
Peter deu uma risada fraca e fechou o próprio notebook, pousando seu olhar sob a garota.
-Não dá pra chegar mais longe, simplesmente não existem dados sobre esse material e não tem como consegui-los hoje. Entender o Exoginium exigiria um estudo de anos, é tecnologia muito além da nossa. - Concluiu a moça. - Mas temos como pesquisar mais ao longo do tempo, e por hoje acho que temos um bom avanço.
-Beleza. - Peter murmurou. Naquele dia ele tinha resumido as suas falas a simplesmente concordar com tudo que Olivia dizia.
-Nat está tendo um pouco de dificuldade em liberar as travas do sistema. Parece que ainda vai levar alguns dias. - Liv enunciou após ler uma mensagem em seu celular, com frustração na voz. - Nesse quesito estamos estagnados. Precisávamos conseguir acessar todos esses bancos de dados investigativos em algum outro computador que não use nosso sistema. Mas que outro sistema teria esses acessos?
-Eu acho que conheço alguém que pode nos ajudar... - Parker se manifestou após ter uma ideia, com um sorriso prestes a se formar.
Peter e Olivia pegaram um táxi até a parte mais suburbana e residencial de Nova York, em um bairro simpático tomado por casas de muros baixos. Pararam em frente a um sobrado de esquina, onde morava o tal amigo de Peter que poderia contribuir tecnologicamente para a investigação. Eles desceram e tocaram a campainha, e um garoto rechonchudo com traços havaianos atendeu a porta.
-Peter! - Exclamou o menino surpreso.
-Ned! - Comemorou o amigo aracnídeo, e então os dois fizeram seu típico toquinho de manos.
Peter Parker e Ned Leeds eram melhores amigos desde a escola primária, foram parceiros de colégio, decatlo e todo o resto, e não se viam desde que Parker havia se mudado para Massachusetts. Ned era o único que sabia sobre o Homem-Aranha, e ele próprio já havia ajudado Peter várias vezes em seu combate contra vilões locais. Enquanto os dois tinham seu reencontro feliz, Olivia precisou se afastar para atender uma ligação em seu celular.
-Que surpresa, cara! – Falou Ned, ainda extasiado pela presença do amigo. - Bom ver você. Ei, feliz ano novo!
-Ano novo? - Peter franziu a testa. Ele andava um tanto perdido no calendário.
-Claro, hoje é dia 31. - O amigo estranhou. - Mano, em que mundo você está?
-Desculpe, tem muita coisa acontecendo. Festividades não eram exatamente uma prioridade da minha agenda. - Atestou o rapaz. - Não tenho muito tempo pra conversar, preciso da sua ajuda.
-Oh, uma missão? - Ned aprumou-se, e os dois foram mais para dentro para conversar secretamente. - O que é?
-Sabe os ataques da TV, o da base dos Vingadores, o do robô gigante e tal? - Peter questionou, e o outro acenou positivamente com a cabeça. - O FBI diz que pegou o cara, certo? - Ele concordou novamente. - Bom, nós achamos que não. Temos um suspeito e estamos o investigando há quase um mês, mas alguém descobriu e bloqueou nosso sistema, e agora não podemos mais pesquisar sobre ele. Por isso preciso do meu cara na cadeira.
Ned teve um arrepio ao ouvir o amigo dizer aquilo.
-O que precisa que eu faça, parceiro? - Disse ele de prontidão.
-O servidor mega incrível e rápido que o Sr. Stark te deu pra que você pudesse me ajudar nas minhas missões locais; preciso que você o use para acessar os arquivos da polícia que estão bloqueados pra nós. - Explicou Parker.
-Saquei. - Ned concordou, cheio de adrenalina. - Ei, mas quem é essa garota que está com você? - Ele apontou para Olivia, que ainda falava ao celular no gramado.
-É uma longa história. - Peter coçou a nuca.
-Ela é bonita – O garoto arqueou a sobrancelha. - Por que ela está falando com o Sr. Stark? – Ele leu o nome no visor do celular da moça e estranhou.
-Em resumo, ela está envolvida com os Vingadores e também acredita que o FBI pegou o cara errado, então começamos a investigar juntos e viemos pra cá pra seguir umas pistas.
-Engraçado, ela faz uma cara cínica com a sobrancelha arqueada igualzinha a do Sr. Stark. – Ned observou, sem pretensão alguma.
Peter arregalou os olhos imediatamente.
-Espera, ela acabou de chamá-lo de pai? – O rapaz ouviu um pedaço do diálogo, então começou a achar estranho. – Ela chamou, sim! Ela é...
Parker pulou desesperado em cima do amigo, tampando sua boca com a mão.
-Ned – Ele piscou algumas vezes, encarando o garoto amordaçado e surpreso. – Isso é bem mais complicado do que você pensa...
-Mas ela... – O amigo libertou a boca e voltou a falar, e Peter o interrompeu com um shiu.
-Isso é segredo total, está entendendo? Se souberem que você descobriu... – Explicou Peter, em pânico.
-Cara, eu ocultei sua identidade durante o ensino médio inteiro – Ned o interrompeu, gesticulando com as mãos para que ele se acalmasse. – Eu consigo guardar segredos.
-Ok, só não fale sobre isso com ninguém, nem com ela. É sério. – O rapaz advertiu.
-Prometo que vou tentar. – Ned disse convicto, o que fez Parker arregalar os olhos outra vez. – Estou brincando! Caramba, Peter, você está tenso.
-Você não sabe nem da metade. – Parker disse com um suspiro, encarando Olivia no jardim.
-E ela trabalha na sede dos Vingadores? – Leeds perguntou, mas não esperou a resposta. - Espera, ela é aquela garota superinteligente e interessante do trabalho de quem você me fala sempre? - Ele ergueu as sobrancelhas.
-Essa mesma. – Peter confirmou, quase com pesar. – Quanta sorte eu tenho, não?
-Calma aí - Ned pareceu ter um clique e parou o amigo por um instante, indignado. - Você tá pegando a filha do chefe?!
Segundos depois, Olivia desligou o celular e veio caminhando no gramado, na direção dos dois. Os rapazes pararam de falar e ficaram em silêncio como se nada tivesse acontecido, até que ela estivesse lado a lado com Peter na entrada.
-Então, esse é meu amigo Ned. Ele concordou em nos ajudar. - Parker tentou agir naturalmente e apresentou-os.
-Olá, prazer – Ned disse com um excesso de simpatia nada convincente, esticando a mão para um aperto. - Você é...?
-A Filha Do Chefe. - Olivia respondeu com um sorriso irônico, apertando a mão do rapaz.
-Sei... - Ned olhou para Peter, estupefato, e eles ficaram em um silêncio esquisitíssimo por alguns segundos. - Podem entrar, meus pais estão viajando. - O garoto fingiu que os últimos segundos da conversa não tinham acontecido, virando-se para o interior da residência e entrando. - Eu estava quase saindo, ia pra casa da minha avó pra passar a virada.
Olivia e Peter se entreolharam por um instante, e ela apenas rolou os olhos antes de caminhar para dentro da residência. Parker entrou logo atrás, sem saber se ria ou chorava com a própria situação.
_
O anfitrião Ned levou os dois amigos até seu quarto, onde ficava o supercomputador que hospedava seu poderoso sistema operacional. Ele sentou-se na cadeira giratória à frente da máquina, enquanto os outros dois pararam logo atrás dele.
-Muito bem, meus jovens, é hora do Poderoso Ned entrar em ação - Ele disse em tom dramático, estalando os dedos das mãos na frente do rosto. Logo em seguida, ele começou a teclar ligeiramente.
-Precisamos que você acesse o servidor da polícia, e procure por processos judiciais contra Simon Williams. - Peter deu a direção ao amigo. - Acreditamos que ele é o autor dos crimes, e que usa o codinome de Magnum pra ocultar a identidade. Precisamos ver a ação judicial que quase o prendeu pra entender todas as provas que já existem sobre ele, e se possível usá-las pra comprovar a nossa tese.
-Saquei. Procurando. - Respondeu Ned com o rosto focado na tela enquanto seus dedos se moviam pelo teclado. Em segundos, ele já estava na página da polícia com acesso total aos arquivos como seu servidor permitia, e pesquisou o nome do suspeito. Ele obteve o resultado em instantes.
Fora várias ações trabalhistas de antigos funcionários, alguns clientes insatisfeitos e até uma multa de trânsito não paga, Ned finalmente encontrou uma pasta sobre o processo que removera Simon da presidência de sua empresa, Williams Inovações, por negociações ilícitas. Qualquer informação dali seria de grande ajuda pra que Peter e Olivia entendessem mais sobre ele, sua acusação e soltura, e talvez pudessem usar alguma pista que ajudasse na investigação deles.
-Aracnídeo Alfa, temos um problema aqui. - Enunciou Ned, utilizando o codinome que ele e Peter estabeleceram em missão.
-Cara, não me chama assim na frente dos outros. - Peter protestou, desconfortável, e então encarou a tela para ver o que era. Um aviso luminoso surgira barrando a entrada para a pasta. - "Estes arquivos encontram-se sobre proteção judicial. Acesso somente com autorização". - Leu o rapaz.
-Eles nos barraram de novo. - Olivia enunciou de braços cruzados, logo atrás deles. - Deviam saber que tentaríamos acessar os processos usando outro servidor, então trataram de colocar uma trava nos próprios arquivos também.
-É um firewall bem poderoso. - Ned atestou ao falhar na tentativa de passar pelo bloqueio. - Posso tentar usar um decodificador pra quebrar essa barreira, mas vai demorar uns bons minutos até que o programa ache o código.
-Manda ver. - Peter deu sinal verde, e assim Ned fez.
O programa estimara o tempo de vinte minutos para completar a decodificação. Enquanto isso, os três jovens começaram a jogar conversa fora.
-Liv, o que seu pai queria? - Peter perguntou à garota.
-Só checar como estamos. - Ela respondeu. - Mas achei estranho, geralmente ele faz isso por mensagem.
-Será que está tudo bem? - O rapaz arqueou a sobrancelha, referindo-se à missão secreta.
-Acho que se não estivesse já teria um helicóptero na rua de baixo pronto pra nos buscar nesse momento. - Olivia disse com humor. Ela começou a circular pelo quarto depois disso.
-E como anda o Midtown? - Peter questionou a Ned, procurando por notícias de seu antigo colégio.
-Ah, a mesma coisa de sempre. - Leeds deu de ombros. - Ganhamos o decatlo pela terceira vez consecutiva esse ano.
-Michelle realmente manda bem pra liderar o grupo. - Disse o garoto, lembrando da amiga.
-Ela manda. Mas tirando isso, não tem nada de interessante. - Ned continuou. - Apenas nerds, jogadores de futebol e líderes de torcida tendo as mesmas aulas chatas de sempre. Era mais legal com você lá.
-Tudo é mais legal quando eu estou por perto. - Peter brincou.
-E como vai o Eric? - Questionou o outro.
-Bem. Ele está dentro da equipe agora, está bem feliz. - Contou Parker. - Acontece que, apesar de tudo, ele é um cara bem legal.
-Vocês são bem amigos agora, não é? - Leeds disse todo enciumado.
-Você ainda é meu melhor amigo, Ned, relaxa. - Peter riu e deu um tapinha no ombro do colega. Ele sabia que Ned não gostava de Eric porque secretamente queria estar no lugar dele.
Olivia, que estava fazendo um tour pelo quarto em silêncio, entrosou na conversa dos dois.
-Isso aqui é uma Estrela da Morte de Lego? - Ela perguntou, impressionada, apontando para o artefato montado na prateleira do garoto.
-É sim. - Ned respondeu, estranhando o interesse dela.
-É tão legal! - Olivia disse entusiasmada, abaixando-se para encarar mais de perto. - Tem até os guardas vermelhos e um TIE Fighter! - Ela encantou-se.
Os dois rapazes a encararam, surpresos e estranhados. Ela sabia o que era um TIE Fighter.
-Você gosta de Star Wars? - Ned questionou, com as sobrancelhas arqueadas.
-É claro! - Liv disse como se fosse óbvio. - O melhor filme de toda a galáxia ele é. - Sorriu, e então voltou a encarar os detalhes do brinquedo.
-Case com ela. - Ned inclinou-se e cochichou para Peter, visto a imitação de Yoda da garota.
A surpresa dos dois foi interrompida por um bipe vindo do computador. O programa atestava ter concluído a decodificação, e os três adolescentes se juntaram em volta do aparelho para abrir o arquivo recém-liberado.
-Ok, hora de ter umas respostas. - Peter esfregou as mãos, enquanto Ned acessava os registros.
-Bom, vamos lá. Processo 1625-8: Simon Williams, removido da presidência da empresa Williams Inovações, acusado de realizar negociações ilícitas com o fabricante de armas ‘Abutre’. - Ned introduziu o caso, lendo o que os relatórios diziam. - Wow, aquele cara.
-Sim, aquele cara. - Peter concordou, referindo-se à sua primeira missão sozinho, da qual Ned bem se lembrava. - Ele vendia um metal alienígena pra esse Simon na época em que o prendi.
-Entendi. - Ned captou, e em seguida avançou um pouco na leitura. - Chegaram até esse cara através do Abutre, então o investigaram e processaram, mas ele foi absolvido e pagou apenas multas. - Contou. - Acredita-se que as negociações entre os dois criminosos eram realizadas na cidade onde residia o acusado, dentro de uma das instalações da empresa Williams. - Ele parafraseou, e em seguida abriu uma imagem atrelada ao parágrafo. - Esse lugar é familiar pra vocês?
-Nós fomos lá – Peter enunciou, vendo na foto o galpão que ele e Olivia haviam visitado ainda em Massachusetts, e onde encontraram a pasta de arquivos perdida em baixo da prateleira. - É aquele galpão abandonado. Devia ser lá que os dois se encontravam pra negociar, isso explicaria as planilhas de vendas que encontramos.
-Aqui diz que a instalação pertence ao governo atualmente, e foi oferecida pelo próprio Simon como forma de pagar parte das multas dele. - Ned informou.
-Um jeito muito inteligente de tirar o imóvel do seu nome, assim você pode usá-lo pra mandar mensagens de ameaça para uma adolescente e elas jamais serão rastreadas até você. - Olivia ironizou, já que aquele era o local de origem das ameaças de seu stalker.
-Ele deve ter aproveitado que o terreno pertencia ao governo no papel, e continuou a utilizá-lo escondido pra enviar as mensagens, sem que pudessem acusá-lo por ser o proprietário. Devia ser tipo o escritório secreto dele antes disso.
-A justiça tem uma teoria interessante aqui. - Ned falou, após passar os últimos segundos lendo em silêncio. – ‘Abutre’ era traficante atuante na área de Nova York, enquanto Simon Williams residia e trabalhava em Massachusetts; portanto, os investigadores suspeitam de um terceiro envolvido nas negociações. Williams e seu fornecedor de armas possuíam um contato em comum, que era o responsável pelo intercâmbio de informações entre ambos. Segundo evidências, o sujeito envolvido respondia pelo codinome ‘Ceifador’.
-A assinatura com a letra C nos documentos! - Peter e Olivia se olharam e exclamaram ao mesmo tempo.
-Vocês dois são assustadores. - Ned constatou, encarando os dois com estranheza.
-Encontramos essa assinatura com uma letra C ratificando vendas em alguns dos documentos das negociações. Suspeitávamos que o Magnum tivesse um parceiro, deve ser desse tal Ceifador. - Parker explicou.
-Precisávamos saber um pouco mais sobre o Williams. Se ele e o Abutre tinham um contato em comum, devia ser alguém da convivência dele. - Olivia externou.
-Olha, aqui tem um perfil do acusado. - Ned mostrou outro arquivo logo ao lado daquele. Ele o abriu e começou a resumir o que lia. - Aparentemente, esse Simon comandava a Williams Inovações desde a morte do pai dele, o fundador. Só que a empresa começou a perder dinheiro, o que a polícia acredita ser a motivação pra essas negociações ilícitas. - Ele explicou.
-Ou ele queria ser um terrorista. - Peter sugeriu.
-E matar pessoas só pelo caos. - Olivia completou.
-Aqui diz que Simon tinha um irmão mais novo que nunca se envolveu com a empresa. - Ned continuou a contar. - Suspeitaram que ele pudesse estar metido na maracutaia do Abutre.
-Será que ele é o Ceifador? - Peter indagou.
-A justiça acreditava que sim, mas nunca conseguiu provas suficientes pra incriminá-lo. - Ned contou, com o olhar focado no texto. - Só algumas ligações de números falsos.
-Tem elas aí? - Perguntou Parker.
Ned acenou positivamente com a cabeça, e colocou um dos áudios arquivados ali para reproduzir.
-Olá, parceiro. Novidades pra mim? - Enunciou a primeira voz na ligação, que deveria ser de Simon.
-Com certeza. - Respondeu a voz de Abutre. Os três estavam aprumados para ouvir atentamente.
-Como vai meu último pedido? - Perguntou o empresário.
-Deve ser entregue pra você na próxima terça. Já consegui um transporte seguro, deve chegar à fábrica sem problemas. - Respondeu o traficante.
-Ótimo, vou dizer ao Ceifador para buscá-lo. - Simon disse com satisfação.
-Diga a ele pra ser discreto. - Abutre alertara. - Tem muita gente na minha cola.
-Não se preocupe, ele sabe o que faz.
-Vou precisar dele no próximo mês. Tenho alguns serviços pra fazermos.
-Irei avisá-lo. - Simon respondeu, e em seguida a ligação foi finalizada.
-De quando é esse áudio? - Olivia questionou logo após o fim da reprodução.
-Pouco antes de o Peter pegar o Abutre. - Ned esclareceu após conferir a data. - Aqui no arquivo diz que atualmente esse irmão do Simon está desaparecido.
-Nada suspeito. - Peter constatou.
-Tem fotos de uma das últimas aparições dele. - Disse Leeds, abrindo os anexos para que eles pudessem ver.
Devia ser apenas mais uma prova no meio de tantas outras, mas aquela informação em específico revelava muito mais coisas do que Peter e Olivia jamais sonharam em descobrir. O rosto ali, logo ao lado de Simon Williams em um restaurante chique, não era desconhecido, e muito menos suspeito. Era o rosto de alguém que usara uma identidade secreta e ocultara sua origem durante todo aquele tempo. Era o rosto de alguém que mentira e enganara a todos. Era o rosto de Eric Carter.
Peter não fazia ideia de como agir perto dela. E pior: não fazia ideia de como ela iria agir perto dele. Demonstrar seus sentimentos, ainda mais daquela maneira, não podia ter acontecido em pior momento. Ele não sabia lidar com garotas, era fato. No entanto, hoje seria preciso, pois havia muito mais em jogo e eles tinham um trabalho a fazer. Pensando nisso, Parker tomou coragem e abriu a vidraça de correr da sacada, e foi até o lado de fora.
-Bom dia. - Disse ele, simples e neutro.
-Bom dia, Menino-Aranha - Olivia respondeu num tom simpático e estranhamente normal, tomando um gole de sua xícara de café. - Tenho umas coisas que você precisa ver.
Confuso com aquela naturalidade toda, Peter sentou-se desconfiado na cadeira do lado oposto da mesa, servindo-se de suco de laranja e encarando o notebook que Liv esticara para ele.
-Estava falando com a Romanoff agora pouco. Parece que nossos amiguinhos realmente sabem sobre a nossa investigação. - Ela indicou a tela do computador, onde havia um aviso dizendo "acesso negado". - Aparentemente, eles arrumaram um jeito de bloquear o nosso servidor de acessar os arquivos relacionados à nossa pesquisa sobre o Magnum.
-Não podemos ver nada do caso? - O rapaz franziu a testa.
-Nem aqui e nem em Massachusetts. - Explicou a menina. - É o sistema todo. Mas não está totalmente inoperante, apenas quando tentamos abrir qualquer coisa relacionada ao Magnum na nossa nuvem privada, ou online nos registros governamentais. O problema é que não temos como acessar arquivos policiais ou da inteligência sem a chave de acesso que o sistema dos Vingadores tem. Nosso aliado mais poderoso no momento é o Google.
-Que maravilha.
-Pois é. Foi por isso que chamei um jatinho pra cá e enviei o invólucro de Exoginium para a base, e ele deve chegar em meia hora. Aquele motor superpotente que desenvolvemos nas Inovações veio a calhar. – Liv relatou. – A Nat vai receber e colocar a amostra pra análise no laboratório usando os equipamentos de lá, para nos ajudar a descobrir mais.
-Ok. - Peter respondeu e então a encarou, um tanto desconfortável. Ela nem sequer olhava para ele, concentrada no que quer que estivesse fazendo online.
Aparentemente, Olivia estava agindo como se nada tivesse acontecido. E já que ela decidira encarar daquela forma, Peter não tinha porque contrariar. Aquele não era o local e nem o momento para discutir relação adolescente, então o rapaz decidiu jogar o jogo dela e esquecer-se da noite passada, focando a atenção apenas na missão, que era o mais importante.
Como tinha se tornado impossível avançar na investigação sobre o suspeito até que Natasha conseguisse destravar o sistema na base, Peter e Olivia decidiram focar na outra parte das pesquisas. Eles precisavam entender o que era o metal alienígena Exoginium, e se possível descobrir uma forma de deixá-lo mais fraco. Uma pequena equipe de cientistas da base, convocada secretamente pela agente Romanoff, colaborou com a pesquisa enviando informações que conseguiram a partir dos experimentos realizados com o exemplar físico. Os dois jovens passaram o dia todo dentro do quarto de hotel, analisando à distância os resultados dos testes feitos com a nova amostra. Cálculo a cálculo, eles estavam tentando encontrar uma brecha a partir do amplo conhecimento científico dos dois.
Os dois ficaram a maior parte do tempo em silêncio total, sem fazer nenhum contato visual. O único assunto tratado era a química, da qual os dois entendiam muito bem. Analisando os índices, os prodígios perceberam que o Exoginium possuía propriedades tanto de metal quanto de não-metal e mineral também. Era uma espécie de elemento que combinava tudo, e unia as características mais fortes de todas as classes naturais: alto ponto de fusão, ebulição, resistência altamente incomum e praticamente impenetrável. Provavelmente, um dos materiais mais complexos que já visitaram a Terra. E muito, muito sub-estudado.
Parker e McCall passaram o dia afundados em pesquisas, cálculos, gráficos e leituras científicas. Foi difícil, mas no fim eles conseguiram chegar a algumas hipóteses.
-Ok, minha cabeça não consegue pensar mais. - Olivia disse quando já era noite do lado de fora, levantando-se da cama onde passara um bom tempo pesquisando. - E eu tenho um cérebro superdesenvolvido, ou seja: isso deve significar alguma coisa.
Peter deu uma risada fraca e fechou o próprio notebook, pousando seu olhar sob a garota.
-Não dá pra chegar mais longe, simplesmente não existem dados sobre esse material e não tem como consegui-los hoje. Entender o Exoginium exigiria um estudo de anos, é tecnologia muito além da nossa. - Concluiu a moça. - Mas temos como pesquisar mais ao longo do tempo, e por hoje acho que temos um bom avanço.
-Beleza. - Peter murmurou. Naquele dia ele tinha resumido as suas falas a simplesmente concordar com tudo que Olivia dizia.
-Nat está tendo um pouco de dificuldade em liberar as travas do sistema. Parece que ainda vai levar alguns dias. - Liv enunciou após ler uma mensagem em seu celular, com frustração na voz. - Nesse quesito estamos estagnados. Precisávamos conseguir acessar todos esses bancos de dados investigativos em algum outro computador que não use nosso sistema. Mas que outro sistema teria esses acessos?
-Eu acho que conheço alguém que pode nos ajudar... - Parker se manifestou após ter uma ideia, com um sorriso prestes a se formar.
Peter e Olivia pegaram um táxi até a parte mais suburbana e residencial de Nova York, em um bairro simpático tomado por casas de muros baixos. Pararam em frente a um sobrado de esquina, onde morava o tal amigo de Peter que poderia contribuir tecnologicamente para a investigação. Eles desceram e tocaram a campainha, e um garoto rechonchudo com traços havaianos atendeu a porta.
-Peter! - Exclamou o menino surpreso.
-Ned! - Comemorou o amigo aracnídeo, e então os dois fizeram seu típico toquinho de manos.
Peter Parker e Ned Leeds eram melhores amigos desde a escola primária, foram parceiros de colégio, decatlo e todo o resto, e não se viam desde que Parker havia se mudado para Massachusetts. Ned era o único que sabia sobre o Homem-Aranha, e ele próprio já havia ajudado Peter várias vezes em seu combate contra vilões locais. Enquanto os dois tinham seu reencontro feliz, Olivia precisou se afastar para atender uma ligação em seu celular.
-Que surpresa, cara! – Falou Ned, ainda extasiado pela presença do amigo. - Bom ver você. Ei, feliz ano novo!
-Ano novo? - Peter franziu a testa. Ele andava um tanto perdido no calendário.
-Claro, hoje é dia 31. - O amigo estranhou. - Mano, em que mundo você está?
-Desculpe, tem muita coisa acontecendo. Festividades não eram exatamente uma prioridade da minha agenda. - Atestou o rapaz. - Não tenho muito tempo pra conversar, preciso da sua ajuda.
-Oh, uma missão? - Ned aprumou-se, e os dois foram mais para dentro para conversar secretamente. - O que é?
-Sabe os ataques da TV, o da base dos Vingadores, o do robô gigante e tal? - Peter questionou, e o outro acenou positivamente com a cabeça. - O FBI diz que pegou o cara, certo? - Ele concordou novamente. - Bom, nós achamos que não. Temos um suspeito e estamos o investigando há quase um mês, mas alguém descobriu e bloqueou nosso sistema, e agora não podemos mais pesquisar sobre ele. Por isso preciso do meu cara na cadeira.
Ned teve um arrepio ao ouvir o amigo dizer aquilo.
-O que precisa que eu faça, parceiro? - Disse ele de prontidão.
-O servidor mega incrível e rápido que o Sr. Stark te deu pra que você pudesse me ajudar nas minhas missões locais; preciso que você o use para acessar os arquivos da polícia que estão bloqueados pra nós. - Explicou Parker.
-Saquei. - Ned concordou, cheio de adrenalina. - Ei, mas quem é essa garota que está com você? - Ele apontou para Olivia, que ainda falava ao celular no gramado.
-É uma longa história. - Peter coçou a nuca.
-Ela é bonita – O garoto arqueou a sobrancelha. - Por que ela está falando com o Sr. Stark? – Ele leu o nome no visor do celular da moça e estranhou.
-Em resumo, ela está envolvida com os Vingadores e também acredita que o FBI pegou o cara errado, então começamos a investigar juntos e viemos pra cá pra seguir umas pistas.
-Engraçado, ela faz uma cara cínica com a sobrancelha arqueada igualzinha a do Sr. Stark. – Ned observou, sem pretensão alguma.
Peter arregalou os olhos imediatamente.
-Espera, ela acabou de chamá-lo de pai? – O rapaz ouviu um pedaço do diálogo, então começou a achar estranho. – Ela chamou, sim! Ela é...
Parker pulou desesperado em cima do amigo, tampando sua boca com a mão.
-Ned – Ele piscou algumas vezes, encarando o garoto amordaçado e surpreso. – Isso é bem mais complicado do que você pensa...
-Mas ela... – O amigo libertou a boca e voltou a falar, e Peter o interrompeu com um shiu.
-Isso é segredo total, está entendendo? Se souberem que você descobriu... – Explicou Peter, em pânico.
-Cara, eu ocultei sua identidade durante o ensino médio inteiro – Ned o interrompeu, gesticulando com as mãos para que ele se acalmasse. – Eu consigo guardar segredos.
-Ok, só não fale sobre isso com ninguém, nem com ela. É sério. – O rapaz advertiu.
-Prometo que vou tentar. – Ned disse convicto, o que fez Parker arregalar os olhos outra vez. – Estou brincando! Caramba, Peter, você está tenso.
-Você não sabe nem da metade. – Parker disse com um suspiro, encarando Olivia no jardim.
-E ela trabalha na sede dos Vingadores? – Leeds perguntou, mas não esperou a resposta. - Espera, ela é aquela garota superinteligente e interessante do trabalho de quem você me fala sempre? - Ele ergueu as sobrancelhas.
-Essa mesma. – Peter confirmou, quase com pesar. – Quanta sorte eu tenho, não?
-Calma aí - Ned pareceu ter um clique e parou o amigo por um instante, indignado. - Você tá pegando a filha do chefe?!
Segundos depois, Olivia desligou o celular e veio caminhando no gramado, na direção dos dois. Os rapazes pararam de falar e ficaram em silêncio como se nada tivesse acontecido, até que ela estivesse lado a lado com Peter na entrada.
-Então, esse é meu amigo Ned. Ele concordou em nos ajudar. - Parker tentou agir naturalmente e apresentou-os.
-Olá, prazer – Ned disse com um excesso de simpatia nada convincente, esticando a mão para um aperto. - Você é...?
-A Filha Do Chefe. - Olivia respondeu com um sorriso irônico, apertando a mão do rapaz.
-Sei... - Ned olhou para Peter, estupefato, e eles ficaram em um silêncio esquisitíssimo por alguns segundos. - Podem entrar, meus pais estão viajando. - O garoto fingiu que os últimos segundos da conversa não tinham acontecido, virando-se para o interior da residência e entrando. - Eu estava quase saindo, ia pra casa da minha avó pra passar a virada.
Olivia e Peter se entreolharam por um instante, e ela apenas rolou os olhos antes de caminhar para dentro da residência. Parker entrou logo atrás, sem saber se ria ou chorava com a própria situação.
O anfitrião Ned levou os dois amigos até seu quarto, onde ficava o supercomputador que hospedava seu poderoso sistema operacional. Ele sentou-se na cadeira giratória à frente da máquina, enquanto os outros dois pararam logo atrás dele.
-Muito bem, meus jovens, é hora do Poderoso Ned entrar em ação - Ele disse em tom dramático, estalando os dedos das mãos na frente do rosto. Logo em seguida, ele começou a teclar ligeiramente.
-Precisamos que você acesse o servidor da polícia, e procure por processos judiciais contra Simon Williams. - Peter deu a direção ao amigo. - Acreditamos que ele é o autor dos crimes, e que usa o codinome de Magnum pra ocultar a identidade. Precisamos ver a ação judicial que quase o prendeu pra entender todas as provas que já existem sobre ele, e se possível usá-las pra comprovar a nossa tese.
-Saquei. Procurando. - Respondeu Ned com o rosto focado na tela enquanto seus dedos se moviam pelo teclado. Em segundos, ele já estava na página da polícia com acesso total aos arquivos como seu servidor permitia, e pesquisou o nome do suspeito. Ele obteve o resultado em instantes.
Fora várias ações trabalhistas de antigos funcionários, alguns clientes insatisfeitos e até uma multa de trânsito não paga, Ned finalmente encontrou uma pasta sobre o processo que removera Simon da presidência de sua empresa, Williams Inovações, por negociações ilícitas. Qualquer informação dali seria de grande ajuda pra que Peter e Olivia entendessem mais sobre ele, sua acusação e soltura, e talvez pudessem usar alguma pista que ajudasse na investigação deles.
-Aracnídeo Alfa, temos um problema aqui. - Enunciou Ned, utilizando o codinome que ele e Peter estabeleceram em missão.
-Cara, não me chama assim na frente dos outros. - Peter protestou, desconfortável, e então encarou a tela para ver o que era. Um aviso luminoso surgira barrando a entrada para a pasta. - "Estes arquivos encontram-se sobre proteção judicial. Acesso somente com autorização". - Leu o rapaz.
-Eles nos barraram de novo. - Olivia enunciou de braços cruzados, logo atrás deles. - Deviam saber que tentaríamos acessar os processos usando outro servidor, então trataram de colocar uma trava nos próprios arquivos também.
-É um firewall bem poderoso. - Ned atestou ao falhar na tentativa de passar pelo bloqueio. - Posso tentar usar um decodificador pra quebrar essa barreira, mas vai demorar uns bons minutos até que o programa ache o código.
-Manda ver. - Peter deu sinal verde, e assim Ned fez.
O programa estimara o tempo de vinte minutos para completar a decodificação. Enquanto isso, os três jovens começaram a jogar conversa fora.
-Liv, o que seu pai queria? - Peter perguntou à garota.
-Só checar como estamos. - Ela respondeu. - Mas achei estranho, geralmente ele faz isso por mensagem.
-Será que está tudo bem? - O rapaz arqueou a sobrancelha, referindo-se à missão secreta.
-Acho que se não estivesse já teria um helicóptero na rua de baixo pronto pra nos buscar nesse momento. - Olivia disse com humor. Ela começou a circular pelo quarto depois disso.
-E como anda o Midtown? - Peter questionou a Ned, procurando por notícias de seu antigo colégio.
-Ah, a mesma coisa de sempre. - Leeds deu de ombros. - Ganhamos o decatlo pela terceira vez consecutiva esse ano.
-Michelle realmente manda bem pra liderar o grupo. - Disse o garoto, lembrando da amiga.
-Ela manda. Mas tirando isso, não tem nada de interessante. - Ned continuou. - Apenas nerds, jogadores de futebol e líderes de torcida tendo as mesmas aulas chatas de sempre. Era mais legal com você lá.
-Tudo é mais legal quando eu estou por perto. - Peter brincou.
-E como vai o Eric? - Questionou o outro.
-Bem. Ele está dentro da equipe agora, está bem feliz. - Contou Parker. - Acontece que, apesar de tudo, ele é um cara bem legal.
-Vocês são bem amigos agora, não é? - Leeds disse todo enciumado.
-Você ainda é meu melhor amigo, Ned, relaxa. - Peter riu e deu um tapinha no ombro do colega. Ele sabia que Ned não gostava de Eric porque secretamente queria estar no lugar dele.
Olivia, que estava fazendo um tour pelo quarto em silêncio, entrosou na conversa dos dois.
-Isso aqui é uma Estrela da Morte de Lego? - Ela perguntou, impressionada, apontando para o artefato montado na prateleira do garoto.
-É sim. - Ned respondeu, estranhando o interesse dela.
-É tão legal! - Olivia disse entusiasmada, abaixando-se para encarar mais de perto. - Tem até os guardas vermelhos e um TIE Fighter! - Ela encantou-se.
Os dois rapazes a encararam, surpresos e estranhados. Ela sabia o que era um TIE Fighter.
-Você gosta de Star Wars? - Ned questionou, com as sobrancelhas arqueadas.
-É claro! - Liv disse como se fosse óbvio. - O melhor filme de toda a galáxia ele é. - Sorriu, e então voltou a encarar os detalhes do brinquedo.
-Case com ela. - Ned inclinou-se e cochichou para Peter, visto a imitação de Yoda da garota.
A surpresa dos dois foi interrompida por um bipe vindo do computador. O programa atestava ter concluído a decodificação, e os três adolescentes se juntaram em volta do aparelho para abrir o arquivo recém-liberado.
-Ok, hora de ter umas respostas. - Peter esfregou as mãos, enquanto Ned acessava os registros.
-Bom, vamos lá. Processo 1625-8: Simon Williams, removido da presidência da empresa Williams Inovações, acusado de realizar negociações ilícitas com o fabricante de armas ‘Abutre’. - Ned introduziu o caso, lendo o que os relatórios diziam. - Wow, aquele cara.
-Sim, aquele cara. - Peter concordou, referindo-se à sua primeira missão sozinho, da qual Ned bem se lembrava. - Ele vendia um metal alienígena pra esse Simon na época em que o prendi.
-Entendi. - Ned captou, e em seguida avançou um pouco na leitura. - Chegaram até esse cara através do Abutre, então o investigaram e processaram, mas ele foi absolvido e pagou apenas multas. - Contou. - Acredita-se que as negociações entre os dois criminosos eram realizadas na cidade onde residia o acusado, dentro de uma das instalações da empresa Williams. - Ele parafraseou, e em seguida abriu uma imagem atrelada ao parágrafo. - Esse lugar é familiar pra vocês?
-Nós fomos lá – Peter enunciou, vendo na foto o galpão que ele e Olivia haviam visitado ainda em Massachusetts, e onde encontraram a pasta de arquivos perdida em baixo da prateleira. - É aquele galpão abandonado. Devia ser lá que os dois se encontravam pra negociar, isso explicaria as planilhas de vendas que encontramos.
-Aqui diz que a instalação pertence ao governo atualmente, e foi oferecida pelo próprio Simon como forma de pagar parte das multas dele. - Ned informou.
-Um jeito muito inteligente de tirar o imóvel do seu nome, assim você pode usá-lo pra mandar mensagens de ameaça para uma adolescente e elas jamais serão rastreadas até você. - Olivia ironizou, já que aquele era o local de origem das ameaças de seu stalker.
-Ele deve ter aproveitado que o terreno pertencia ao governo no papel, e continuou a utilizá-lo escondido pra enviar as mensagens, sem que pudessem acusá-lo por ser o proprietário. Devia ser tipo o escritório secreto dele antes disso.
-A justiça tem uma teoria interessante aqui. - Ned falou, após passar os últimos segundos lendo em silêncio. – ‘Abutre’ era traficante atuante na área de Nova York, enquanto Simon Williams residia e trabalhava em Massachusetts; portanto, os investigadores suspeitam de um terceiro envolvido nas negociações. Williams e seu fornecedor de armas possuíam um contato em comum, que era o responsável pelo intercâmbio de informações entre ambos. Segundo evidências, o sujeito envolvido respondia pelo codinome ‘Ceifador’.
-A assinatura com a letra C nos documentos! - Peter e Olivia se olharam e exclamaram ao mesmo tempo.
-Vocês dois são assustadores. - Ned constatou, encarando os dois com estranheza.
-Encontramos essa assinatura com uma letra C ratificando vendas em alguns dos documentos das negociações. Suspeitávamos que o Magnum tivesse um parceiro, deve ser desse tal Ceifador. - Parker explicou.
-Precisávamos saber um pouco mais sobre o Williams. Se ele e o Abutre tinham um contato em comum, devia ser alguém da convivência dele. - Olivia externou.
-Olha, aqui tem um perfil do acusado. - Ned mostrou outro arquivo logo ao lado daquele. Ele o abriu e começou a resumir o que lia. - Aparentemente, esse Simon comandava a Williams Inovações desde a morte do pai dele, o fundador. Só que a empresa começou a perder dinheiro, o que a polícia acredita ser a motivação pra essas negociações ilícitas. - Ele explicou.
-Ou ele queria ser um terrorista. - Peter sugeriu.
-E matar pessoas só pelo caos. - Olivia completou.
-Aqui diz que Simon tinha um irmão mais novo que nunca se envolveu com a empresa. - Ned continuou a contar. - Suspeitaram que ele pudesse estar metido na maracutaia do Abutre.
-Será que ele é o Ceifador? - Peter indagou.
-A justiça acreditava que sim, mas nunca conseguiu provas suficientes pra incriminá-lo. - Ned contou, com o olhar focado no texto. - Só algumas ligações de números falsos.
-Tem elas aí? - Perguntou Parker.
Ned acenou positivamente com a cabeça, e colocou um dos áudios arquivados ali para reproduzir.
-Olá, parceiro. Novidades pra mim? - Enunciou a primeira voz na ligação, que deveria ser de Simon.
-Com certeza. - Respondeu a voz de Abutre. Os três estavam aprumados para ouvir atentamente.
-Como vai meu último pedido? - Perguntou o empresário.
-Deve ser entregue pra você na próxima terça. Já consegui um transporte seguro, deve chegar à fábrica sem problemas. - Respondeu o traficante.
-Ótimo, vou dizer ao Ceifador para buscá-lo. - Simon disse com satisfação.
-Diga a ele pra ser discreto. - Abutre alertara. - Tem muita gente na minha cola.
-Não se preocupe, ele sabe o que faz.
-Vou precisar dele no próximo mês. Tenho alguns serviços pra fazermos.
-Irei avisá-lo. - Simon respondeu, e em seguida a ligação foi finalizada.
-De quando é esse áudio? - Olivia questionou logo após o fim da reprodução.
-Pouco antes de o Peter pegar o Abutre. - Ned esclareceu após conferir a data. - Aqui no arquivo diz que atualmente esse irmão do Simon está desaparecido.
-Nada suspeito. - Peter constatou.
-Tem fotos de uma das últimas aparições dele. - Disse Leeds, abrindo os anexos para que eles pudessem ver.
Devia ser apenas mais uma prova no meio de tantas outras, mas aquela informação em específico revelava muito mais coisas do que Peter e Olivia jamais sonharam em descobrir. O rosto ali, logo ao lado de Simon Williams em um restaurante chique, não era desconhecido, e muito menos suspeito. Era o rosto de alguém que usara uma identidade secreta e ocultara sua origem durante todo aquele tempo. Era o rosto de alguém que mentira e enganara a todos. Era o rosto de Eric Carter.
Capítulo 11
Já tinham sido quase três horas de exercício, entre corridas, aparelhos e combates com robôs no centro de treinamento da base. Eric estava exausto, e saiu do ginásio com uma toalha sob os ombros para conter o suor que escorria. As coisas estavam quietas naquele dia, sem ordens nem daqui nem de lá, dando a ele tempo para praticar sozinho e relaxar.
No caminho para o alojamento dos heróis, o rapaz passou pela sala de estratégias, constatando algo que chamou sua atenção. Stark estava andando de um lado para o outro, inquieto, enquanto falava ao celular. Eric parou pra observar alguns segundos, e percebeu que ele conversava com a filha, parecendo preocupado com alguma coisa. Tony gesticulava e andava a passos largos, balbuciando algo sobre a viagem de Olivia a Nova York.
Após rir para si mesmo e negar com a cabeça, Eric voltou a tomar seu caminho. Tony Stark andava muito empenhado em assumir o papel de pai zeloso; mas, no fundo, só era movido pela culpa de colocar a vida de Olivia em perigo por conta de quem era. Stark nunca se importara com ninguém além dele mesmo antes, não começaria agora; todo o seu cuidado só priorizava tranquilizar a própria consciência e manter a própria autoimagem intacta.
Empresários bem sucedidos como Tony Stark eram todos iguais. Ele conhecia bem o tipo.
Fama, dinheiro, renome, um prédio lotado de assessores e cientistas, e a estampa da capa da Forbes de setembro. Familiar? Tudo isso ajudava a construir a imagem notável do revolucionário inventor, Sanford Williams, muito antes de Stark. Um sujeito inteligente, bom homem, preocupado em melhorar o mundo à sua volta através das inovadoras invenções de sua bilionária empresa, Williams Inovações. Desde cedo um prodígio, inteligente, visionário e altruísta. Era o que todos pensavam.
Mas essa não era a realidade. A vida de Sanford Williams escondia muito mais segredos obscuros do que suas fotos sorridentes no jornal atestavam. Por trás da simpatia, havia alguém apático e fissurado pelo trabalho. Quando a máscara caía, Sanford não era nada mais que um péssimo pai e marido, agressivo com a esposa e os dois filhos, viciado na própria fama e poder.
Eric Williams e seu irmão Simon cresceram sob a sombra do pai autoritário. As únicas coisas que ouviam da boca dele eram ordens e proibições. Além, é claro, das constantes discussões com a mãe, que era reprimida demais para evitar o inferno em que a família vivia. E o que já era ruim apenas piorou com o tempo.
Eric chegou até seu dormitório, arrastado de cansaço. Sentou-se na beirada da própria cama massageando o ombro direito, muito dolorido por conta do treino. A prótese que ele usava para substituir o braço perdido era ótima e quase imperceptível, mas podia ser bem incômoda em alguns momentos, principalmente por conta da foice acoplada. Não que ele já não estivesse acostumado com a dor, afinal, aquela peça mecânica já o acompanhara por quase toda a vida.
Eric era o mais novo dos irmãos Williams, e sempre fora uma criança levada. Costumava entrar no laboratório que o pai possuía em casa para brincar escondido, apesar das inúmeras ordens contrárias. Ele gostava de misturar produtos e fazer experimentos, e adorava quando suas combinações causavam nuvens coloridas ou cheiros engraçados. Até que, um dia, uma mistura fatal de produtos químicos causou um incêndio. O fogo atingiu o laboratório e também o braço do garoto, numa queimadura tão séria que exigiu amputação. Foi desesperador, um transtorno imenso para a família e para a imagem do renomado pai, além de um trauma para o pequeno Eric.
Depois do episódio, a ditadura sob a qual ele e o irmão viviam ficou ainda pior. Porém, apesar da ira, Sanford precisava ajudar o próprio filho, por motivos até mesmo de reputação. Como era um inventor com amplo conhecimento tecnológico, o empresário criou para o garoto uma prótese que substituía o membro perdido, um protótipo praticamente perfeito para o braço direito de Eric. Tão bom que poderia ser vendido aos milhares para amputados ao redor do mundo, e render muito dinheiro.
Após ter a valiosa ideia sem intenção, a visão de negócios de Sanford aflorou. Ele deu início a um projeto, e começou a acompanhar o dia a dia do filho que se adaptava ao novo braço, melhor do que qualquer prótese no mercado. O pai coletava dados para a pesquisa do produto que dera tão certo, quase igual a um braço de verdade que realizava múltiplas atividades. Depois, o empresário apresentou sua mais nova invenção para os investidores da Williams Inovações, entusiasmado. Os sócios, é claro, ficaram impressionados. E o resultado foi tão positivo, que não poderia ter sido pior.
Aquilo causava arrepios em Eric até hoje, mesmo depois de tantos anos. Após tomar alguns analgésicos, o rapaz dirigiu-se ao chuveiro para um banho. Enquanto estava debaixo d’água, mesmo tentando relaxar, alguns flashes de suas memórias mais traumáticas começaram a aparecer sem permissão. Laboratórios, o pai num jaleco branco, raios avermelhados, o pânico do irmão mais velho e o próprio também. Traços de memória que nunca o deixariam em paz. Ele podia se acostumar com a dor física; mas a mental, que tomava conta de seu subconsciente, parecia uma ferida incapaz de sarar.
Devido ao sucesso com o estudo da prótese de Eric, Sanford teve uma brilhante e quase doentia ideia: começar a usar seus filhos como cobaias para suas novas invenções. Provando que funcionavam com seus próprios garotos, ele poderia aprová-las mais facilmente, sem precisar de autorização para ter cobaias legalizadas. Realizar os estudos seria fácil, e bastava apresentá-los após o sucesso da experiência para que mais uma invenção lucrativa fosse lançada. E Sanford decidiu começar os experimentos com sua maior e mais renegada ideia, o projeto de sua vida que jamais havia sido sequer tirado do papel, tamanho risco que apresentava.
Tratava-se de um raio iônico, que realizava melhoramento genético através de ampla irradiação no corpo humano. Uma ideia muito arriscada que ameaçava a vida, e era sempre rejeitada aos primeiros estudos por todo e qualquer cientista da empresa que se preocupasse com a ética. Mas que, se funcionasse nos garotos, poderia render a Sanford amplo prestígio, imensos lucros e até mesmo prêmios de ciências. E, movido por esses desejos, Williams construiu a máquina de raios, e aplicou-os nos pequenos Simon e Eric.
Nenhum dos dois morreu como previam os estudiosos que barraram o projeto; mas coisas estranhas começaram a acontecer. Os resultados entre os dois garotos foram variados. Simon, o mais velho, desenvolveu força e agilidade, além de reflexos rápidos, audição aguçada e ampla resistência corpórea. Apenas um efeito colateral: as pupilas de seus olhos adquiriram tom avermelhado, da cor dos raios que o atingiram. Já Eric ficou igualmente forte, além de poder se teletransportar e resistir à imensa dor, regenerando-se após contusões. E mais, suas células foram absurdamente fortalecidas, de modo que envelhecessem numa velocidade duas vezes mais lenta que o normal.
Sanford não poderia estar mais orgulhoso do macabro experimento que fizera. De fato, o raio iônico desenvolvido por ele dava a seres humanos capacidades sobrenaturais de resistência e força. Por anos, o inventor acompanhou o desenvolvimento dos garotos, com todas as mudanças e evoluções à medida que cresciam. A mãe, que morrera pouco antes, nunca pode intervir. E os dois Williams menores passaram anos nas mãos do pai maníaco, sendo testados em segredo, para que o pai pudesse coletar dados e mostrar aos colegas de trabalho que sua invenção era válida e não apresentava riscos, afinal seus próprios filhos eram prova.
Porém, o esforço e dedicação doentios de Sanford acabaram indo por água abaixo, quando o mesmo faleceu pouco antes de concluir sua pesquisa. Algo quase irônico. A interrupção do desumano projeto libertou os dois garotos, agora crescidos, mas não apagou o trauma de suas mentes. Aquilo jamais seria esquecido. Consternados, os irmãos Williams destruíram o raio iônico, e queimaram todos os projetos e dados computados por tantos anos, para garantir que uma barbárie como aquela jamais voltasse a acontecer com alguém.
O rapaz saiu do banho, com o vapor quente vazando pela porta na direção do quarto. Esfregou uma toalha nos cabelos loiros e respirou fundo, pensativo. Logo após, Eric passou o mesmo tecido pelo espelho embaçado, expondo ali o seu reflexo. Ele encarou a si mesmo, como se estivesse dentro do corpo de um estranho. Aquele rosto jovem e cheio de espinhas não refletia o que ele era por dentro, tampouco a quantidade de anos que ele realmente tinha vivido.
Eric havia se tornado um sujeito esquisito, e ele próprio tinha noção disso. Nunca quis ter absolutamente nada a ver com o império empresarial da Williams Inovações. Após a morte do pai, Eric passou a viver praticamente em isolamento, com aversão do mundo. E ele tinha um bom motivo: graças às alterações genéticas que o raio iônico causara em seu corpo, Eric envelhecia muito tardiamente. Já era um homem feito, mas ainda tinha o corpo de um adolescente. Precisava trocar de identidade constantemente, fazendo documentos falsos que se adequassem à idade que ele aparentava. E isso, juntamente com todas as experiências traumáticas do seu passado, mexeu com seu psicológico e sua mente. Ao longo do tempo, Eric se tornou solitário e um pouco problemático.
Ao contrário do irmão, que precisou assumir certas responsabilidades, Eric não teve nada que trouxesse sua cabeça para o mundo real. Portanto, as tendências levadas que tinha desde criança, o guiaram até um estilo de vida à altura. Eric nunca fora o irmão inteligente, esse era Simon; o que fez com que ele precisasse alternar. Eric pretendia usar os poderes que involuntariamente ganhara graças ao raio iônico para tornar-se um atleta de alta performance.
Mas até que esse desejo se realizasse, ele precisava se sustentar. Foi essa necessidade, e também alguns contatos antigos, que o uniram a Abutre: um fabricante de armas ilegais, que usava tecnologia alienígena roubada para criar adereços de guerra. Eric tornou-se um de seus vendedores, e aproveitou a inteligência tecnológica de seus engenheiros para modernizar sua prótese, adicionando uma foice altamente cortante ao seu falso braço direito. Aquele adereço rendeu a ele o apelido de Ceifador, usado como seu codinome durante as vendas e também em futuras atividades ilícitas.
O homem com corpo de rapaz saiu do banheiro e foi direto até a escrivaninha, para checar o celular que mantinha no fundo falso da gaveta. Era hora de fazer o boletim da noite, entrando em contato com o irmão Simon para ver como andava a operação secreta. Eric agarrou o aparelho e digitou rapidamente a mensagem para o único contato da lista.
“Como estamos?”
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Em algum lugar de Massachusetts, um homem de meia idade vestindo um terno gasto de alguma marca cara encarava a janela, perdido em pensamentos. Pela vidraça do prédio, ele podia ver toda a cidade com suas luzes acesas e carros passando. Seres humanos vivendo suas simples vidas, sem ideia do grande perigo oculto que os encarava naquele momento.
Simon foi tirado de seus devaneios de grandeza pelo alerta vibratório do celular. Já era hora de seu irmão Eric fazer contato sobre a estadia clandestina no complexo dos Vingadores.
“Como estamos?”
O caçula escrevera simplesmente. Uma pergunta vaga. Ser breve era uma regra na comunicação entre os irmãos Williams, que pretendiam não serem compreendidos caso tivessem seu canal rastreado. Simon respirou fundo, pensando sobre a resposta que enviaria.
Naquele momento, tudo estava bem. Bem demais para os dois irmãos, visto como já estiveram no passado obscuro que compartilhavam. Passar pelo que Eric e Simon passaram e ainda encontrar forças para lutar por um ideal era, de fato, admirável. Incrível o poder que o rancor e o ódio têm de mover uma pessoa.
É, não dava para fazer o passado desaparecer. O que podia gerar cicatrizes incuráveis, como no caso de Eric, que ainda era assombrado pelas lembranças do passado tão tortuoso. Ou então, o passado poderia continuar ali, mas oculto, com suas lembranças traumáticas sendo usadas para alimentar uma revanche. Simon Williams havia se dado melhor nesse quesito.
O mais velho dos irmãos havia herdado por testamento a chefia da bilionária Williams Inovações, o império da família, após o falecimento de seu pai. Formado no MIT, Simon, que sempre teve gosto por tecnologia, caiu de paraquedas no cargo presidencial de uma das maiores empresas dos Estados Unidos, assim que o antigo dono ausentou-se. O rapaz adotou óculos escuros para esconder suas pupilas vermelhas, e junto com elas, o seu passado. E então assumiu a sua liderança por direito, ocupando a liderança que havia nascido para tomar.
Teria sido um longo caminho de vitórias, se não fosse por intervenções externas. Na sala, a TV ligada exibia o noticiário, entre chuviscos na tela. O jornal falava sobre uma coletiva de imprensa que acontecera naquela mesma tarde, onde Tony Stark havia falado sobre a atual situação dos Vingadores, e também sobre os novos projetos das Indústrias Stark. Simon teve uma ligeira vontade de vomitar ao encarar o rosto do homem na televisão, mas logo essa sensação deu lugar apenas à raiva que ele sentia. Sentimento que o levara até ali, inclusive.
Por décadas, a Williams Inovações fora a líder do mercado em inovações científicas e tecnológicas. Nenhuma empresa se comparava ao patamar de qualidade e notabilidade – um renome que seu pai batalhara para construir. Até que, alguns anos depois da troca administrativa, uma forte e arrebatadora concorrente surgiu. A Stark Industries, famosa pela secular produção de armas, revolucionou sua política empresarial e passou a vender avanços tecnológicos para melhoria da sociedade. Tony Stark desistiu de fabricar armamentos e teve sua redenção ao tornar-se o Homem de Ferro, que por si só foi responsável por atrair a atenção do mundo todo - e também dos investidores.
Em poucos anos de concorrência, o mercado da Williams Inovações havia sido totalmente roubado pelas Indústrias Stark. Isso ocorreu pois a empresa tinha ao seu lado os melhores garotos-propaganda do mundo: os Vingadores. Quem não iria querer investir nas indústrias que criavam os equipamentos de ponta usados pelos guardiões da Terra? Apoiar os negócios de Stark era na verdade um ganho, pois trazia, atrelada ao lucro, a segurança da própria humanidade. E o jovem empresário Simon não soube competir com super-humanos vestidos em roupas coloridas que salvavam gatinhos de árvores.
A Williams Inovações entrou em decadência. Os investidores debandaram, os melhores funcionários e mentes migraram e eles ficaram à beira da falência. Simon precisava impedir. E como a vida bem lhe ensinara, impedir desgraças exigia atitudes drásticas. Para salvar seu monopólio, o homem viu-se obrigado a envolver-se com os negócios do irmão mais novo, que possuía um tipo diferente de empreendimento.
Desesperado para manter sua empresa de pé, Simon entrou em contato com Eric, que o apresentou ao traficante de armas Abutre. Através da parceria estabelecida com o criminoso, Simon passou a aplicar algumas tecnologias alienígenas em suas próprias invenções, na tentativa de torná-las atrativas ao mercado e reerguer a Williams Inovações. Além, é claro, de derrotar o concorrente e inimigo, Tony Stark.
Sim, Tony Stark e seu time de palhaços uniformizados. Após a debandada do dinheiro e do prestígio para as Indústrias Stark, Simon começou a observar os Vingadores mais de perto. Ficou fissurado. Eles eram o motivo de seu fracasso como empresário, em primeiro lugar. A opinião entusiasta do povo a respeito dos super-heróis não era assim tão certa na opinião dele. Simon começou a achar, à medida que o tempo passava, que os Vingadores não salvavam o mundo; eles o destruíam. Todas as suas lutas, que supostamente deveriam salvar a humanidade, só causavam mortes e prejuízos bilionários aos governos. E todo o seu império havia caído, para que idiotas como Stark ascendessem ao poder.
Os Vingadores precisavam acabar. Alguém tinha que intervir, impedir que eles trouxessem todo aquele caos para o mundo – e impedir também que eles afundassem sua estimada empresa. Portanto, Simon decidiu usar toda a sua raiva reprimida por anos para agir. Ele mesmo terminaria com a iniciativa Vingadores de uma vez por todas, e ele mesmo mandaria Stark para o fundo do poço.
Simon não era o único que via os Vingadores da forma como realmente eram. E ele encontrou motivação para seu ódio e inspiração para seu projeto em um caso muito particular: Helmut Zemo. Mais conhecido como o sujeito responsável por causar a Guerra Civil, que dividiu a equipe dos Vingadores em duas metades. Sua família inteira havia morrido no combate dos heróis em Sokovia, e a sede de vingança de Zemo permitiu que ele, sozinho, orquestrasse o caos dentro da equipe. Ele tinha conseguido separá-los, embora Tony Stark ainda mantivesse metade da equipe ativa e causando mais e mais estragos. Porém, Simon tomaria uma atitude em relação a essa infelicidade.
Williams orquestrou uma pequena operação silenciosa para libertar Helmut Zemo de sua prisão de segurança máxima, e o trouxe para seu esquema. Ainda mais vidrado de raiva e vingança, Zemo uniu-se à Simon para que juntos colocassem em prática o plano sangrento de derrubar o império dos Vingadores.
Cego de ódio, Simon Williams gastou os últimos recursos da Williams Inovações para investir na tecnologia de ponta que seu plano requisitava. Usando materiais extraterrestres vendidos pelo parceiro de negócios Abutre, Simon desenvolveu um super-robô, com a ajuda da inteligência militar que Zemo possuía de sua época na divisão Sokoviana. A ideia era criar um soldado que fosse à prova de todos os Vingadores. Dessa maneira, o gigante de aço poderia orquestrar diversos atentados terroristas em diferentes partes do país, causando desastres e milhares de mortes, de forma que os heróis não pudessem impedi-lo. Humilhando-os através do fracasso, a opinião pública, que tanto os adorava, passaria a não confiar mais a segurança mundial aos Vingadores, e eles cairiam.
O projeto demandou muitos estudos e investimentos. O robô de guerra era feito de Vibranium, Adamantium e Exoginium, os três materiais mais fortes do universo, para que resistisse a todos os heróis. Hulk não poderia socá-lo, Homem de Ferro não poderia explodi-lo, Thor não poderia eletrocutá-lo e Homem-Aranha não conseguiria amarrá-lo. Tudo meticulosamente calculado, pensado, estudado, produzido e testado, durante muito tempo.
Além, é claro, da própria personalidade de liderança, que também recebeu upgrades. Simon treinou suas habilidades e passou a intitular-se de Magnum, um nome que em breve seria conhecido por trazer justiça à humanidade, quando ele mesmo lutasse para acabar com os Vingadores. Porém, ele não o faria sozinho: para auxiliá-lo, Simon recrutou diversas pessoas que compartilhavam do seu ponto de vista revolucionário. Líderes de movimentos anti-heróis e pessoas que perderam tudo durante catástrofes geradas pelos Vingadores, para que canalizassem sua raiva através do plano dele, ajudando com o robô e disseminando o movimento online.
Porém, turbulências apareceram ao longo do processo. Durante o desenvolvimento do plano, o parceiro de negócios de Magnum, Abutre, foi descoberto pela polícia. Mais precisamente, pelo intrometido Homem-Aranha. Uma investigação minuciosa foi realizada, e esta acabou respingando nas negociações entre Simon e o fabricante de armas. E as provas do delito geraram o tipo de escândalo do qual a Williams Inovações não estava precisando naquele momento.
Simon encarou a logo da própria empresa num prédio a alguns quilômetros de distância. O ódio e a mágoa tomaram conta de sua expressão facial, fazendo com que ele socasse o vidro. O sobrenome luminoso ali escrito lhe pertencia, mas o resto já não era mais seu há muito tempo.
Após a comprovação das negociações ilícitas com Abutre, Simon foi deposto do cargo presidencial da empresa em crise. Os membros do comitê assumiram a liderança, tirando dele qualquer direito sob o próprio sobrenome agora manchado. Com sorte, o homem conseguiu escapar da prisão, o que demandou uma fortuna em advogados que convenceram a justiça de que ele não era um criminoso assim tão perverso. Ele só havia negociado com um, e, portanto, devia ser punido apenas de forma financeira e bem menos agressiva, como acontece com a maioria dos peixes grandes com dinheiro suficiente para se safarem.
Tal manobra jurídica só foi possível porque a polícia não chegara tão longe quanto poderia com suas investigações. Após prender Abutre, os únicos documentos que o FBI encontrou eram os que ficavam com os traficantes de armas – todos assinados por Eric, que recebia as cargas sob o pseudônimo de Ceifador. Aqueles documentos destinavam contrabando diretamente para a Williams Inovações, o que, no fim das contas, permitiu que Simon ocultasse a parte mais escabrosa de seu plano. Ao ser julgado, o empresário admitiu que suas compras ilegais destinavam o material alienígena para as invenções da empresa - o que, de início, não era mentira. Dessa forma, foi possível convencer os federais de que aquele era o único crime, sem que eles sequer sonhassem com a produção do robô de guerra.
A fonte de renda bilionária de Simon fora perdida, de fato, pois ele não tinha mais direito a sequer um centavo dos lucros da Williams. Porém, nem tudo tinha ido por água abaixo: o robô estava em processo de construção, e Simon já havia comprado matéria-prima suficiente para terminá-lo antes da prisão de Abutre. A produção continuou nos anos seguintes, investindo até o último centavo da fortuna restante da família.
Mais uma mensagem de Eric apareceu no visor do celular. Era a outra parte da atualização, que deveria dizer ao irmão as novidades descobertas em seu trabalho de espionagem. E, principalmente naquele estágio crítico do processo, tais informações eram muito importantes.
“Vi Stark falando com ela. Ainda estão lá.”
Simon ergueu as sobrancelhas demonstrando seu esclarecimento. Há dias os irmãos vinham acompanhando o trajeto dos dois adolescentes metidos a investigadores, que viajaram escondidos à procura de respostas que deveriam desejar nunca saber. Um deles, o Homem-Aranha; alguém que já causara estragos demais ao plano para alguém do tamanho dele. A segunda, uma garotinha metida, dona de cabelos loiros e de um sobrenome que, só da menção, já causava dores de cabeça a Simon.
Cedo ou tarde, aqueles robôs acabariam com os Vingadores e com todo o seu império mentiroso; mas toda aquela maldade parecia não ser suficiente para saciar o desejo de vingança que Simon Williams nutria. Tony Stark, o verdadeiro responsável por sua falência e pela ascensão dos Vingadores, deveria pagar de uma forma muito mais pessoal e dolorosa do que apenas seu fracasso. Em sua obsessão, Simon havia passado a perseguir e observar cada passo de Stark, tentando descobrir uma forma de destruí-lo por dentro.
Foi um processo difícil, pois Simon descobriu que Tony possuía uma vida muito mais privada e segura do que aparentava ter quando dava suas esnobes entrevistas. Foram meses de acompanhamento até que Williams conseguisse penetrar sua barreira e obter algo além da fama e da fortuna para poder tirar de Stark. Mas quando ele descobriu, teve certeza de que era, sem dúvidas, a melhor e mais inesperada forma possível de arrasá-lo por completo.
Tony Stark tinha uma filha. E ele costumava visitá-la sempre que tirava folga de sua vida de empresário bilionário. Williams invadiu seu itinerário e descobriu que Tony estava em Nova York, visitando um endereço residencial. A casa, para espanto e satisfação dele, era o lar de uma garota absolutamente secreta, que carregava o sangue nojento dos Stark nas veias. E era exatamente disso que Magnum precisava.
Porém, Simon não era assim tão ingênuo. Stark deveria ter uma proteção impenetrável para manter o anonimato e a segurança da garota, então ele decidiu agir devagar e discretamente. Ele encontrou a menina nas redes sociais, e começou a plantar medo através delas. Olivia McCall passou a ser alvo de hacks, xingamentos e ameaças, até mesmo presenciais - tudo isso para demonstrar o poder de Magnum perante o pífio Stark. E, como ele previa, suas ações foram suficientes para assustar o pai da garota, que em pouco tempo fez com que Olivia desaparecesse imediatamente de seus radares. Ela não estava em casa, nem na escola, nem com a mãe, ao menos de uma forma que se pudesse detectar. A reação era um ótimo indicativo de medo, que afinal era o objetivo de tudo aquilo.
A rua em que o prédio abandonado ficava era bem movimentada, mesmo àquela hora da noite. Enquanto filosofava, Simon observava a agitação lá de cima, pensativo. Na calçada, ele enxergou um pequeno garotinho caminhando de mãos dadas com a mãe, saltitando contente. Em sua camiseta, estava estampada uma foto do Homem-Aranha em posição de batalha. Era uma arte elaborada, em vermelho e azul como seu uniforme, e logo abaixo do desenho estava escrito “herói”.
Simon riu diante da denominação. Se aquele garotinho soubesse das mesmas coisas que ele próprio havia descoberto sobre o ridículo Cabeça-de-Teia, rasgaria aquela camiseta de tanta decepção com seu querido “herói”.
Paralelo ao terrorismo juvenil com a filha secreta, Magnum foi ainda mais longe com a observação do empresário inimigo. Acontece que, mesmo sem a presença da filha na cidade, Tony Stark ainda visitava Nova York frequentemente. Um fato curioso, que obrigou Williams a investigar. E sua descoberta foi um bônus, sem o qual ele jamais teria conseguido continuar seu plano de forma tão genial.
Em uma de suas viagens à metrópole, Stark fez uma visita ao colégio Midtown High para buscar um garoto. O fato atiçou a curiosidade de Simon, pois sabia que aquele era o colégio onde seu próprio irmão, que era um falso adolescente, estudava. Ao observar a movimentação por algumas semanas, Williams descobriu que o garoto de Stark era Peter Parker, um estudante comum, que por acaso era o Homem-Aranha. Ao ver o rapaz aracnídeo escalando as paredes do próprio prédio em um uniforme vermelho e azul, Simon viu a brecha que precisava, e decidiu agir.
Williams contatou seu irmão mais novo outra vez, e pediu sua ajuda em uma parte nova do plano, que envolvia outra vingança. Eric tinha um ódio mortal pelo Homem-Aranha, já que o herói havia desmascarado seu chefe Abutre, e consequentemente acabado com sua fonte de renda ilegal. Simon explorou este ponto para propor-lhe um trabalho: aproximar-se do colega de classe, Peter Parker, para enganá-lo e infiltrar-se nos Vingadores.
Eric já possuía uma vantagem, que era a foice altamente cortante que compunha sua prótese no braço – o que, no início, servia apenas para amedrontar os compradores e possíveis dedos-duros. Mas aquela ferramenta poderia ser usada em combate, o que daria ao rapaz a chance de integrar a equipe dos heróis mais poderosos da Terra, assim que fizesse contato com o Aracnídeo.
Eric Carter – sua identidade secreta – era, para todas as outras pessoas, um adolescente comum e normal que estudava no ensino médio da Midtown High. Era um atleta muito talentoso do time de futebol, fazia sucesso com as garotas e era bem popular, o que também fazia dele um belo pé no saco. Junto com seus colegas de time, Eric tinha o passatempo de zombar da turma nerd do colégio. Que, é claro, incluía Peter Parker. Carter era, com orgulho, o autor do apelido sem graça do garoto, que contagiara todos os outros da turma, Pênis Parker. A convivência dos dois era nula, exceto pelas brincadeiras em que o time basicamente o humilhava enquanto ele fingia não ligar. Claramente, não era o cenário mais propício a uma amizade que levasse Eric até a verdadeira identidade de Peter.
Sabendo disso, Simon encarregou-se de criar o ambiente para que o contato dos dois acontecesse de forma adequada. Os dois orquestraram um crime falso nas redondezas da casa de Peter, um assalto à mão armada no meio da noite, para que o Homem-Aranha aparecesse para impedir. Eric estaria lá esperando, pronto para entrar em cena e cruzar "por acidente" com Peter, enquanto tentava impedir o mesmo crime usando seus poderes.
Assim que o herói teioso apareceu, os dois bandidos de mentira correram e deixaram a velhinha assaltada em paz. Naquele exato momento, Eric estava em combate com eles, utilizando sua foice e suas super-habilidades para chamar a atenção de Parker. O garoto reconheceu o colega de escola, e ficou surpreso por vê-lo naquela situação altruísta, lutando tão bem contra os criminosos.
Eric tratou de apresentar-se e revelar a verdadeira identidade logo depois que o combate acabou. Conversando com o Aranha, disse reconhecer Peter pela voz por trás da máscara, fingindo surpresa, o que gerou uma veemente negação e a fuga imediata do rapaz.
Levou semanas para que Eric conseguisse chegar perto do garoto outra vez. Na escola, Parker fazia de tudo para não cruzar com ele e evitar a pergunta sobre a noite fatídica. Até que, depois de muita insistência e perseguição nos corredores do colégio, Eric conseguiu a atenção dele. Fingiu ser um grande fã do Homem-Aranha, dizendo que durante toda a vida considerou-se uma aberração pelas habilidades que adquirira em um acidente; ao ver que o Aranha utilizava seus poderes para ajudar os outros, teria criado sua prótese para o braço amputado, e se inspirado para lutar pelas pessoas.
Peter ficou sem reação, diante do atleta aparentemente idiota do seu colégio sendo um grande admirador seu. Eric tratou de tranquilizá-lo, dizendo que seu segredo estava seguro e se desculpando por todas as maldades que já havia dito sobre Parker. Depois daquela conversa, Peter passou a reconsiderar seus princípios. Devagar, ele e Eric foram tornando-se amigos, e ele achou que Carter era, na verdade, um cara legal. Dessa amizade e parceria, surgiu o espírito bondoso de Parker, com o qual os irmãos Williams estavam contando. Vendo as incríveis habilidades do amigo, o adolescente sugeriu a Tony Stark que lhe desse uma oportunidade na equipe. E, pouco antes de Peter mudar-se para Massachusetts, a oportunidade foi concedida.
Tudo corria perfeitamente bem no andamento do plano. Após ter o irmão infiltrado na base, Simon orquestrou, depois de tantos anos, a primeira fase prática do seu projeto de caos: invadir a base dos Vingadores. O objetivo era desestabilizar a equipe, vencendo-os dentro da própria casa, aproveitando a oportunidade cômoda do desfile de Veterans Day, onde eles estariam totalmente desequipados. Com a ajuda de Eric, que enfraqueceu os sistemas de segurança por dentro da base, Magnum entrou com aparente facilidade no santuário dos heróis. A ideia era tentar roubar dados do servidor, simplesmente para fazer com que se sentissem ainda mais vulneráveis.
As coisas só não saíram perfeitas porque Magnum não esperava que a filhinha de Stark, até agora sumida do mapa, aparecesse com o bônus de superpoderes especiais para impedi-lo. Principalmente habilidades energéticas, que concorriam diretamente com os raios iônicos que Simon aprendera a disparar com seus poderes.
Mas, no fim das contas, aquele pequeno contratempo desagradável pouco influenciou no andamento dos planos. Magnum estava sempre um passo à frente dos heróis, pois tinha lá dentro um informante totalmente camuflado que lhe passava todas as informações antes que se convertessem em ações. Simon sabia no que eles pensavam, conhecia seus planos e também seus medos através de Eric. Quando notasse que a equipe já estava suficientemente desestabilizada, tanto por dentro quanto por fora, seria a hora de agir. Após realizar a série de atentados com o robô, matar um número considerável de civis e humilhar os Vingadores ao máximo aos olhos da população mundial e da mídia, Magnum daria seu golpe final. Com a ajuda do irmão, ele enganaria os fraquejados heróis e destruiria os odiosos e hipócritas Vingadores de uma vez por todas.
Um bipe de alerta começou a ser emitido pelo computador de Magnum, atraindo sua atenção. O homem caminhou aceleradamente até o aparelho para verificar do que se tratava: era um aviso de seu firewall, alegando que um dos arquivos que ele protegia acabara de ser violado e acessado pelo usuário MestreNed556. Mais precisamente, um arquivo da polícia. A gota d’água para aquelas duas crianças intrometidas.
Simon correu até seu telefone novamente, bufando. Teclou ligeiramente e iniciou uma ligação, que foi atendida logo em seguida.
-Eles entraram. – Disse o homem entre dentes.
-O que quer que eu faça? - A voz de Eric respondeu do outro lado da linha.
-É com você, irmãozinho. – Simon falou, com um sorriso malicioso se formando. – Dê um jeito nisso.
No caminho para o alojamento dos heróis, o rapaz passou pela sala de estratégias, constatando algo que chamou sua atenção. Stark estava andando de um lado para o outro, inquieto, enquanto falava ao celular. Eric parou pra observar alguns segundos, e percebeu que ele conversava com a filha, parecendo preocupado com alguma coisa. Tony gesticulava e andava a passos largos, balbuciando algo sobre a viagem de Olivia a Nova York.
Após rir para si mesmo e negar com a cabeça, Eric voltou a tomar seu caminho. Tony Stark andava muito empenhado em assumir o papel de pai zeloso; mas, no fundo, só era movido pela culpa de colocar a vida de Olivia em perigo por conta de quem era. Stark nunca se importara com ninguém além dele mesmo antes, não começaria agora; todo o seu cuidado só priorizava tranquilizar a própria consciência e manter a própria autoimagem intacta.
Empresários bem sucedidos como Tony Stark eram todos iguais. Ele conhecia bem o tipo.
Fama, dinheiro, renome, um prédio lotado de assessores e cientistas, e a estampa da capa da Forbes de setembro. Familiar? Tudo isso ajudava a construir a imagem notável do revolucionário inventor, Sanford Williams, muito antes de Stark. Um sujeito inteligente, bom homem, preocupado em melhorar o mundo à sua volta através das inovadoras invenções de sua bilionária empresa, Williams Inovações. Desde cedo um prodígio, inteligente, visionário e altruísta. Era o que todos pensavam.
Mas essa não era a realidade. A vida de Sanford Williams escondia muito mais segredos obscuros do que suas fotos sorridentes no jornal atestavam. Por trás da simpatia, havia alguém apático e fissurado pelo trabalho. Quando a máscara caía, Sanford não era nada mais que um péssimo pai e marido, agressivo com a esposa e os dois filhos, viciado na própria fama e poder.
Eric Williams e seu irmão Simon cresceram sob a sombra do pai autoritário. As únicas coisas que ouviam da boca dele eram ordens e proibições. Além, é claro, das constantes discussões com a mãe, que era reprimida demais para evitar o inferno em que a família vivia. E o que já era ruim apenas piorou com o tempo.
Eric chegou até seu dormitório, arrastado de cansaço. Sentou-se na beirada da própria cama massageando o ombro direito, muito dolorido por conta do treino. A prótese que ele usava para substituir o braço perdido era ótima e quase imperceptível, mas podia ser bem incômoda em alguns momentos, principalmente por conta da foice acoplada. Não que ele já não estivesse acostumado com a dor, afinal, aquela peça mecânica já o acompanhara por quase toda a vida.
Eric era o mais novo dos irmãos Williams, e sempre fora uma criança levada. Costumava entrar no laboratório que o pai possuía em casa para brincar escondido, apesar das inúmeras ordens contrárias. Ele gostava de misturar produtos e fazer experimentos, e adorava quando suas combinações causavam nuvens coloridas ou cheiros engraçados. Até que, um dia, uma mistura fatal de produtos químicos causou um incêndio. O fogo atingiu o laboratório e também o braço do garoto, numa queimadura tão séria que exigiu amputação. Foi desesperador, um transtorno imenso para a família e para a imagem do renomado pai, além de um trauma para o pequeno Eric.
Depois do episódio, a ditadura sob a qual ele e o irmão viviam ficou ainda pior. Porém, apesar da ira, Sanford precisava ajudar o próprio filho, por motivos até mesmo de reputação. Como era um inventor com amplo conhecimento tecnológico, o empresário criou para o garoto uma prótese que substituía o membro perdido, um protótipo praticamente perfeito para o braço direito de Eric. Tão bom que poderia ser vendido aos milhares para amputados ao redor do mundo, e render muito dinheiro.
Após ter a valiosa ideia sem intenção, a visão de negócios de Sanford aflorou. Ele deu início a um projeto, e começou a acompanhar o dia a dia do filho que se adaptava ao novo braço, melhor do que qualquer prótese no mercado. O pai coletava dados para a pesquisa do produto que dera tão certo, quase igual a um braço de verdade que realizava múltiplas atividades. Depois, o empresário apresentou sua mais nova invenção para os investidores da Williams Inovações, entusiasmado. Os sócios, é claro, ficaram impressionados. E o resultado foi tão positivo, que não poderia ter sido pior.
Aquilo causava arrepios em Eric até hoje, mesmo depois de tantos anos. Após tomar alguns analgésicos, o rapaz dirigiu-se ao chuveiro para um banho. Enquanto estava debaixo d’água, mesmo tentando relaxar, alguns flashes de suas memórias mais traumáticas começaram a aparecer sem permissão. Laboratórios, o pai num jaleco branco, raios avermelhados, o pânico do irmão mais velho e o próprio também. Traços de memória que nunca o deixariam em paz. Ele podia se acostumar com a dor física; mas a mental, que tomava conta de seu subconsciente, parecia uma ferida incapaz de sarar.
Devido ao sucesso com o estudo da prótese de Eric, Sanford teve uma brilhante e quase doentia ideia: começar a usar seus filhos como cobaias para suas novas invenções. Provando que funcionavam com seus próprios garotos, ele poderia aprová-las mais facilmente, sem precisar de autorização para ter cobaias legalizadas. Realizar os estudos seria fácil, e bastava apresentá-los após o sucesso da experiência para que mais uma invenção lucrativa fosse lançada. E Sanford decidiu começar os experimentos com sua maior e mais renegada ideia, o projeto de sua vida que jamais havia sido sequer tirado do papel, tamanho risco que apresentava.
Tratava-se de um raio iônico, que realizava melhoramento genético através de ampla irradiação no corpo humano. Uma ideia muito arriscada que ameaçava a vida, e era sempre rejeitada aos primeiros estudos por todo e qualquer cientista da empresa que se preocupasse com a ética. Mas que, se funcionasse nos garotos, poderia render a Sanford amplo prestígio, imensos lucros e até mesmo prêmios de ciências. E, movido por esses desejos, Williams construiu a máquina de raios, e aplicou-os nos pequenos Simon e Eric.
Nenhum dos dois morreu como previam os estudiosos que barraram o projeto; mas coisas estranhas começaram a acontecer. Os resultados entre os dois garotos foram variados. Simon, o mais velho, desenvolveu força e agilidade, além de reflexos rápidos, audição aguçada e ampla resistência corpórea. Apenas um efeito colateral: as pupilas de seus olhos adquiriram tom avermelhado, da cor dos raios que o atingiram. Já Eric ficou igualmente forte, além de poder se teletransportar e resistir à imensa dor, regenerando-se após contusões. E mais, suas células foram absurdamente fortalecidas, de modo que envelhecessem numa velocidade duas vezes mais lenta que o normal.
Sanford não poderia estar mais orgulhoso do macabro experimento que fizera. De fato, o raio iônico desenvolvido por ele dava a seres humanos capacidades sobrenaturais de resistência e força. Por anos, o inventor acompanhou o desenvolvimento dos garotos, com todas as mudanças e evoluções à medida que cresciam. A mãe, que morrera pouco antes, nunca pode intervir. E os dois Williams menores passaram anos nas mãos do pai maníaco, sendo testados em segredo, para que o pai pudesse coletar dados e mostrar aos colegas de trabalho que sua invenção era válida e não apresentava riscos, afinal seus próprios filhos eram prova.
Porém, o esforço e dedicação doentios de Sanford acabaram indo por água abaixo, quando o mesmo faleceu pouco antes de concluir sua pesquisa. Algo quase irônico. A interrupção do desumano projeto libertou os dois garotos, agora crescidos, mas não apagou o trauma de suas mentes. Aquilo jamais seria esquecido. Consternados, os irmãos Williams destruíram o raio iônico, e queimaram todos os projetos e dados computados por tantos anos, para garantir que uma barbárie como aquela jamais voltasse a acontecer com alguém.
O rapaz saiu do banho, com o vapor quente vazando pela porta na direção do quarto. Esfregou uma toalha nos cabelos loiros e respirou fundo, pensativo. Logo após, Eric passou o mesmo tecido pelo espelho embaçado, expondo ali o seu reflexo. Ele encarou a si mesmo, como se estivesse dentro do corpo de um estranho. Aquele rosto jovem e cheio de espinhas não refletia o que ele era por dentro, tampouco a quantidade de anos que ele realmente tinha vivido.
Eric havia se tornado um sujeito esquisito, e ele próprio tinha noção disso. Nunca quis ter absolutamente nada a ver com o império empresarial da Williams Inovações. Após a morte do pai, Eric passou a viver praticamente em isolamento, com aversão do mundo. E ele tinha um bom motivo: graças às alterações genéticas que o raio iônico causara em seu corpo, Eric envelhecia muito tardiamente. Já era um homem feito, mas ainda tinha o corpo de um adolescente. Precisava trocar de identidade constantemente, fazendo documentos falsos que se adequassem à idade que ele aparentava. E isso, juntamente com todas as experiências traumáticas do seu passado, mexeu com seu psicológico e sua mente. Ao longo do tempo, Eric se tornou solitário e um pouco problemático.
Ao contrário do irmão, que precisou assumir certas responsabilidades, Eric não teve nada que trouxesse sua cabeça para o mundo real. Portanto, as tendências levadas que tinha desde criança, o guiaram até um estilo de vida à altura. Eric nunca fora o irmão inteligente, esse era Simon; o que fez com que ele precisasse alternar. Eric pretendia usar os poderes que involuntariamente ganhara graças ao raio iônico para tornar-se um atleta de alta performance.
Mas até que esse desejo se realizasse, ele precisava se sustentar. Foi essa necessidade, e também alguns contatos antigos, que o uniram a Abutre: um fabricante de armas ilegais, que usava tecnologia alienígena roubada para criar adereços de guerra. Eric tornou-se um de seus vendedores, e aproveitou a inteligência tecnológica de seus engenheiros para modernizar sua prótese, adicionando uma foice altamente cortante ao seu falso braço direito. Aquele adereço rendeu a ele o apelido de Ceifador, usado como seu codinome durante as vendas e também em futuras atividades ilícitas.
O homem com corpo de rapaz saiu do banheiro e foi direto até a escrivaninha, para checar o celular que mantinha no fundo falso da gaveta. Era hora de fazer o boletim da noite, entrando em contato com o irmão Simon para ver como andava a operação secreta. Eric agarrou o aparelho e digitou rapidamente a mensagem para o único contato da lista.
Em algum lugar de Massachusetts, um homem de meia idade vestindo um terno gasto de alguma marca cara encarava a janela, perdido em pensamentos. Pela vidraça do prédio, ele podia ver toda a cidade com suas luzes acesas e carros passando. Seres humanos vivendo suas simples vidas, sem ideia do grande perigo oculto que os encarava naquele momento.
Simon foi tirado de seus devaneios de grandeza pelo alerta vibratório do celular. Já era hora de seu irmão Eric fazer contato sobre a estadia clandestina no complexo dos Vingadores.
O caçula escrevera simplesmente. Uma pergunta vaga. Ser breve era uma regra na comunicação entre os irmãos Williams, que pretendiam não serem compreendidos caso tivessem seu canal rastreado. Simon respirou fundo, pensando sobre a resposta que enviaria.
Naquele momento, tudo estava bem. Bem demais para os dois irmãos, visto como já estiveram no passado obscuro que compartilhavam. Passar pelo que Eric e Simon passaram e ainda encontrar forças para lutar por um ideal era, de fato, admirável. Incrível o poder que o rancor e o ódio têm de mover uma pessoa.
É, não dava para fazer o passado desaparecer. O que podia gerar cicatrizes incuráveis, como no caso de Eric, que ainda era assombrado pelas lembranças do passado tão tortuoso. Ou então, o passado poderia continuar ali, mas oculto, com suas lembranças traumáticas sendo usadas para alimentar uma revanche. Simon Williams havia se dado melhor nesse quesito.
O mais velho dos irmãos havia herdado por testamento a chefia da bilionária Williams Inovações, o império da família, após o falecimento de seu pai. Formado no MIT, Simon, que sempre teve gosto por tecnologia, caiu de paraquedas no cargo presidencial de uma das maiores empresas dos Estados Unidos, assim que o antigo dono ausentou-se. O rapaz adotou óculos escuros para esconder suas pupilas vermelhas, e junto com elas, o seu passado. E então assumiu a sua liderança por direito, ocupando a liderança que havia nascido para tomar.
Teria sido um longo caminho de vitórias, se não fosse por intervenções externas. Na sala, a TV ligada exibia o noticiário, entre chuviscos na tela. O jornal falava sobre uma coletiva de imprensa que acontecera naquela mesma tarde, onde Tony Stark havia falado sobre a atual situação dos Vingadores, e também sobre os novos projetos das Indústrias Stark. Simon teve uma ligeira vontade de vomitar ao encarar o rosto do homem na televisão, mas logo essa sensação deu lugar apenas à raiva que ele sentia. Sentimento que o levara até ali, inclusive.
Por décadas, a Williams Inovações fora a líder do mercado em inovações científicas e tecnológicas. Nenhuma empresa se comparava ao patamar de qualidade e notabilidade – um renome que seu pai batalhara para construir. Até que, alguns anos depois da troca administrativa, uma forte e arrebatadora concorrente surgiu. A Stark Industries, famosa pela secular produção de armas, revolucionou sua política empresarial e passou a vender avanços tecnológicos para melhoria da sociedade. Tony Stark desistiu de fabricar armamentos e teve sua redenção ao tornar-se o Homem de Ferro, que por si só foi responsável por atrair a atenção do mundo todo - e também dos investidores.
Em poucos anos de concorrência, o mercado da Williams Inovações havia sido totalmente roubado pelas Indústrias Stark. Isso ocorreu pois a empresa tinha ao seu lado os melhores garotos-propaganda do mundo: os Vingadores. Quem não iria querer investir nas indústrias que criavam os equipamentos de ponta usados pelos guardiões da Terra? Apoiar os negócios de Stark era na verdade um ganho, pois trazia, atrelada ao lucro, a segurança da própria humanidade. E o jovem empresário Simon não soube competir com super-humanos vestidos em roupas coloridas que salvavam gatinhos de árvores.
A Williams Inovações entrou em decadência. Os investidores debandaram, os melhores funcionários e mentes migraram e eles ficaram à beira da falência. Simon precisava impedir. E como a vida bem lhe ensinara, impedir desgraças exigia atitudes drásticas. Para salvar seu monopólio, o homem viu-se obrigado a envolver-se com os negócios do irmão mais novo, que possuía um tipo diferente de empreendimento.
Desesperado para manter sua empresa de pé, Simon entrou em contato com Eric, que o apresentou ao traficante de armas Abutre. Através da parceria estabelecida com o criminoso, Simon passou a aplicar algumas tecnologias alienígenas em suas próprias invenções, na tentativa de torná-las atrativas ao mercado e reerguer a Williams Inovações. Além, é claro, de derrotar o concorrente e inimigo, Tony Stark.
Sim, Tony Stark e seu time de palhaços uniformizados. Após a debandada do dinheiro e do prestígio para as Indústrias Stark, Simon começou a observar os Vingadores mais de perto. Ficou fissurado. Eles eram o motivo de seu fracasso como empresário, em primeiro lugar. A opinião entusiasta do povo a respeito dos super-heróis não era assim tão certa na opinião dele. Simon começou a achar, à medida que o tempo passava, que os Vingadores não salvavam o mundo; eles o destruíam. Todas as suas lutas, que supostamente deveriam salvar a humanidade, só causavam mortes e prejuízos bilionários aos governos. E todo o seu império havia caído, para que idiotas como Stark ascendessem ao poder.
Os Vingadores precisavam acabar. Alguém tinha que intervir, impedir que eles trouxessem todo aquele caos para o mundo – e impedir também que eles afundassem sua estimada empresa. Portanto, Simon decidiu usar toda a sua raiva reprimida por anos para agir. Ele mesmo terminaria com a iniciativa Vingadores de uma vez por todas, e ele mesmo mandaria Stark para o fundo do poço.
Simon não era o único que via os Vingadores da forma como realmente eram. E ele encontrou motivação para seu ódio e inspiração para seu projeto em um caso muito particular: Helmut Zemo. Mais conhecido como o sujeito responsável por causar a Guerra Civil, que dividiu a equipe dos Vingadores em duas metades. Sua família inteira havia morrido no combate dos heróis em Sokovia, e a sede de vingança de Zemo permitiu que ele, sozinho, orquestrasse o caos dentro da equipe. Ele tinha conseguido separá-los, embora Tony Stark ainda mantivesse metade da equipe ativa e causando mais e mais estragos. Porém, Simon tomaria uma atitude em relação a essa infelicidade.
Williams orquestrou uma pequena operação silenciosa para libertar Helmut Zemo de sua prisão de segurança máxima, e o trouxe para seu esquema. Ainda mais vidrado de raiva e vingança, Zemo uniu-se à Simon para que juntos colocassem em prática o plano sangrento de derrubar o império dos Vingadores.
Cego de ódio, Simon Williams gastou os últimos recursos da Williams Inovações para investir na tecnologia de ponta que seu plano requisitava. Usando materiais extraterrestres vendidos pelo parceiro de negócios Abutre, Simon desenvolveu um super-robô, com a ajuda da inteligência militar que Zemo possuía de sua época na divisão Sokoviana. A ideia era criar um soldado que fosse à prova de todos os Vingadores. Dessa maneira, o gigante de aço poderia orquestrar diversos atentados terroristas em diferentes partes do país, causando desastres e milhares de mortes, de forma que os heróis não pudessem impedi-lo. Humilhando-os através do fracasso, a opinião pública, que tanto os adorava, passaria a não confiar mais a segurança mundial aos Vingadores, e eles cairiam.
O projeto demandou muitos estudos e investimentos. O robô de guerra era feito de Vibranium, Adamantium e Exoginium, os três materiais mais fortes do universo, para que resistisse a todos os heróis. Hulk não poderia socá-lo, Homem de Ferro não poderia explodi-lo, Thor não poderia eletrocutá-lo e Homem-Aranha não conseguiria amarrá-lo. Tudo meticulosamente calculado, pensado, estudado, produzido e testado, durante muito tempo.
Além, é claro, da própria personalidade de liderança, que também recebeu upgrades. Simon treinou suas habilidades e passou a intitular-se de Magnum, um nome que em breve seria conhecido por trazer justiça à humanidade, quando ele mesmo lutasse para acabar com os Vingadores. Porém, ele não o faria sozinho: para auxiliá-lo, Simon recrutou diversas pessoas que compartilhavam do seu ponto de vista revolucionário. Líderes de movimentos anti-heróis e pessoas que perderam tudo durante catástrofes geradas pelos Vingadores, para que canalizassem sua raiva através do plano dele, ajudando com o robô e disseminando o movimento online.
Porém, turbulências apareceram ao longo do processo. Durante o desenvolvimento do plano, o parceiro de negócios de Magnum, Abutre, foi descoberto pela polícia. Mais precisamente, pelo intrometido Homem-Aranha. Uma investigação minuciosa foi realizada, e esta acabou respingando nas negociações entre Simon e o fabricante de armas. E as provas do delito geraram o tipo de escândalo do qual a Williams Inovações não estava precisando naquele momento.
Simon encarou a logo da própria empresa num prédio a alguns quilômetros de distância. O ódio e a mágoa tomaram conta de sua expressão facial, fazendo com que ele socasse o vidro. O sobrenome luminoso ali escrito lhe pertencia, mas o resto já não era mais seu há muito tempo.
Após a comprovação das negociações ilícitas com Abutre, Simon foi deposto do cargo presidencial da empresa em crise. Os membros do comitê assumiram a liderança, tirando dele qualquer direito sob o próprio sobrenome agora manchado. Com sorte, o homem conseguiu escapar da prisão, o que demandou uma fortuna em advogados que convenceram a justiça de que ele não era um criminoso assim tão perverso. Ele só havia negociado com um, e, portanto, devia ser punido apenas de forma financeira e bem menos agressiva, como acontece com a maioria dos peixes grandes com dinheiro suficiente para se safarem.
Tal manobra jurídica só foi possível porque a polícia não chegara tão longe quanto poderia com suas investigações. Após prender Abutre, os únicos documentos que o FBI encontrou eram os que ficavam com os traficantes de armas – todos assinados por Eric, que recebia as cargas sob o pseudônimo de Ceifador. Aqueles documentos destinavam contrabando diretamente para a Williams Inovações, o que, no fim das contas, permitiu que Simon ocultasse a parte mais escabrosa de seu plano. Ao ser julgado, o empresário admitiu que suas compras ilegais destinavam o material alienígena para as invenções da empresa - o que, de início, não era mentira. Dessa forma, foi possível convencer os federais de que aquele era o único crime, sem que eles sequer sonhassem com a produção do robô de guerra.
A fonte de renda bilionária de Simon fora perdida, de fato, pois ele não tinha mais direito a sequer um centavo dos lucros da Williams. Porém, nem tudo tinha ido por água abaixo: o robô estava em processo de construção, e Simon já havia comprado matéria-prima suficiente para terminá-lo antes da prisão de Abutre. A produção continuou nos anos seguintes, investindo até o último centavo da fortuna restante da família.
Mais uma mensagem de Eric apareceu no visor do celular. Era a outra parte da atualização, que deveria dizer ao irmão as novidades descobertas em seu trabalho de espionagem. E, principalmente naquele estágio crítico do processo, tais informações eram muito importantes.
Simon ergueu as sobrancelhas demonstrando seu esclarecimento. Há dias os irmãos vinham acompanhando o trajeto dos dois adolescentes metidos a investigadores, que viajaram escondidos à procura de respostas que deveriam desejar nunca saber. Um deles, o Homem-Aranha; alguém que já causara estragos demais ao plano para alguém do tamanho dele. A segunda, uma garotinha metida, dona de cabelos loiros e de um sobrenome que, só da menção, já causava dores de cabeça a Simon.
Cedo ou tarde, aqueles robôs acabariam com os Vingadores e com todo o seu império mentiroso; mas toda aquela maldade parecia não ser suficiente para saciar o desejo de vingança que Simon Williams nutria. Tony Stark, o verdadeiro responsável por sua falência e pela ascensão dos Vingadores, deveria pagar de uma forma muito mais pessoal e dolorosa do que apenas seu fracasso. Em sua obsessão, Simon havia passado a perseguir e observar cada passo de Stark, tentando descobrir uma forma de destruí-lo por dentro.
Foi um processo difícil, pois Simon descobriu que Tony possuía uma vida muito mais privada e segura do que aparentava ter quando dava suas esnobes entrevistas. Foram meses de acompanhamento até que Williams conseguisse penetrar sua barreira e obter algo além da fama e da fortuna para poder tirar de Stark. Mas quando ele descobriu, teve certeza de que era, sem dúvidas, a melhor e mais inesperada forma possível de arrasá-lo por completo.
Tony Stark tinha uma filha. E ele costumava visitá-la sempre que tirava folga de sua vida de empresário bilionário. Williams invadiu seu itinerário e descobriu que Tony estava em Nova York, visitando um endereço residencial. A casa, para espanto e satisfação dele, era o lar de uma garota absolutamente secreta, que carregava o sangue nojento dos Stark nas veias. E era exatamente disso que Magnum precisava.
Porém, Simon não era assim tão ingênuo. Stark deveria ter uma proteção impenetrável para manter o anonimato e a segurança da garota, então ele decidiu agir devagar e discretamente. Ele encontrou a menina nas redes sociais, e começou a plantar medo através delas. Olivia McCall passou a ser alvo de hacks, xingamentos e ameaças, até mesmo presenciais - tudo isso para demonstrar o poder de Magnum perante o pífio Stark. E, como ele previa, suas ações foram suficientes para assustar o pai da garota, que em pouco tempo fez com que Olivia desaparecesse imediatamente de seus radares. Ela não estava em casa, nem na escola, nem com a mãe, ao menos de uma forma que se pudesse detectar. A reação era um ótimo indicativo de medo, que afinal era o objetivo de tudo aquilo.
A rua em que o prédio abandonado ficava era bem movimentada, mesmo àquela hora da noite. Enquanto filosofava, Simon observava a agitação lá de cima, pensativo. Na calçada, ele enxergou um pequeno garotinho caminhando de mãos dadas com a mãe, saltitando contente. Em sua camiseta, estava estampada uma foto do Homem-Aranha em posição de batalha. Era uma arte elaborada, em vermelho e azul como seu uniforme, e logo abaixo do desenho estava escrito “herói”.
Simon riu diante da denominação. Se aquele garotinho soubesse das mesmas coisas que ele próprio havia descoberto sobre o ridículo Cabeça-de-Teia, rasgaria aquela camiseta de tanta decepção com seu querido “herói”.
Paralelo ao terrorismo juvenil com a filha secreta, Magnum foi ainda mais longe com a observação do empresário inimigo. Acontece que, mesmo sem a presença da filha na cidade, Tony Stark ainda visitava Nova York frequentemente. Um fato curioso, que obrigou Williams a investigar. E sua descoberta foi um bônus, sem o qual ele jamais teria conseguido continuar seu plano de forma tão genial.
Em uma de suas viagens à metrópole, Stark fez uma visita ao colégio Midtown High para buscar um garoto. O fato atiçou a curiosidade de Simon, pois sabia que aquele era o colégio onde seu próprio irmão, que era um falso adolescente, estudava. Ao observar a movimentação por algumas semanas, Williams descobriu que o garoto de Stark era Peter Parker, um estudante comum, que por acaso era o Homem-Aranha. Ao ver o rapaz aracnídeo escalando as paredes do próprio prédio em um uniforme vermelho e azul, Simon viu a brecha que precisava, e decidiu agir.
Williams contatou seu irmão mais novo outra vez, e pediu sua ajuda em uma parte nova do plano, que envolvia outra vingança. Eric tinha um ódio mortal pelo Homem-Aranha, já que o herói havia desmascarado seu chefe Abutre, e consequentemente acabado com sua fonte de renda ilegal. Simon explorou este ponto para propor-lhe um trabalho: aproximar-se do colega de classe, Peter Parker, para enganá-lo e infiltrar-se nos Vingadores.
Eric já possuía uma vantagem, que era a foice altamente cortante que compunha sua prótese no braço – o que, no início, servia apenas para amedrontar os compradores e possíveis dedos-duros. Mas aquela ferramenta poderia ser usada em combate, o que daria ao rapaz a chance de integrar a equipe dos heróis mais poderosos da Terra, assim que fizesse contato com o Aracnídeo.
Eric Carter – sua identidade secreta – era, para todas as outras pessoas, um adolescente comum e normal que estudava no ensino médio da Midtown High. Era um atleta muito talentoso do time de futebol, fazia sucesso com as garotas e era bem popular, o que também fazia dele um belo pé no saco. Junto com seus colegas de time, Eric tinha o passatempo de zombar da turma nerd do colégio. Que, é claro, incluía Peter Parker. Carter era, com orgulho, o autor do apelido sem graça do garoto, que contagiara todos os outros da turma, Pênis Parker. A convivência dos dois era nula, exceto pelas brincadeiras em que o time basicamente o humilhava enquanto ele fingia não ligar. Claramente, não era o cenário mais propício a uma amizade que levasse Eric até a verdadeira identidade de Peter.
Sabendo disso, Simon encarregou-se de criar o ambiente para que o contato dos dois acontecesse de forma adequada. Os dois orquestraram um crime falso nas redondezas da casa de Peter, um assalto à mão armada no meio da noite, para que o Homem-Aranha aparecesse para impedir. Eric estaria lá esperando, pronto para entrar em cena e cruzar "por acidente" com Peter, enquanto tentava impedir o mesmo crime usando seus poderes.
Assim que o herói teioso apareceu, os dois bandidos de mentira correram e deixaram a velhinha assaltada em paz. Naquele exato momento, Eric estava em combate com eles, utilizando sua foice e suas super-habilidades para chamar a atenção de Parker. O garoto reconheceu o colega de escola, e ficou surpreso por vê-lo naquela situação altruísta, lutando tão bem contra os criminosos.
Eric tratou de apresentar-se e revelar a verdadeira identidade logo depois que o combate acabou. Conversando com o Aranha, disse reconhecer Peter pela voz por trás da máscara, fingindo surpresa, o que gerou uma veemente negação e a fuga imediata do rapaz.
Levou semanas para que Eric conseguisse chegar perto do garoto outra vez. Na escola, Parker fazia de tudo para não cruzar com ele e evitar a pergunta sobre a noite fatídica. Até que, depois de muita insistência e perseguição nos corredores do colégio, Eric conseguiu a atenção dele. Fingiu ser um grande fã do Homem-Aranha, dizendo que durante toda a vida considerou-se uma aberração pelas habilidades que adquirira em um acidente; ao ver que o Aranha utilizava seus poderes para ajudar os outros, teria criado sua prótese para o braço amputado, e se inspirado para lutar pelas pessoas.
Peter ficou sem reação, diante do atleta aparentemente idiota do seu colégio sendo um grande admirador seu. Eric tratou de tranquilizá-lo, dizendo que seu segredo estava seguro e se desculpando por todas as maldades que já havia dito sobre Parker. Depois daquela conversa, Peter passou a reconsiderar seus princípios. Devagar, ele e Eric foram tornando-se amigos, e ele achou que Carter era, na verdade, um cara legal. Dessa amizade e parceria, surgiu o espírito bondoso de Parker, com o qual os irmãos Williams estavam contando. Vendo as incríveis habilidades do amigo, o adolescente sugeriu a Tony Stark que lhe desse uma oportunidade na equipe. E, pouco antes de Peter mudar-se para Massachusetts, a oportunidade foi concedida.
Tudo corria perfeitamente bem no andamento do plano. Após ter o irmão infiltrado na base, Simon orquestrou, depois de tantos anos, a primeira fase prática do seu projeto de caos: invadir a base dos Vingadores. O objetivo era desestabilizar a equipe, vencendo-os dentro da própria casa, aproveitando a oportunidade cômoda do desfile de Veterans Day, onde eles estariam totalmente desequipados. Com a ajuda de Eric, que enfraqueceu os sistemas de segurança por dentro da base, Magnum entrou com aparente facilidade no santuário dos heróis. A ideia era tentar roubar dados do servidor, simplesmente para fazer com que se sentissem ainda mais vulneráveis.
As coisas só não saíram perfeitas porque Magnum não esperava que a filhinha de Stark, até agora sumida do mapa, aparecesse com o bônus de superpoderes especiais para impedi-lo. Principalmente habilidades energéticas, que concorriam diretamente com os raios iônicos que Simon aprendera a disparar com seus poderes.
Mas, no fim das contas, aquele pequeno contratempo desagradável pouco influenciou no andamento dos planos. Magnum estava sempre um passo à frente dos heróis, pois tinha lá dentro um informante totalmente camuflado que lhe passava todas as informações antes que se convertessem em ações. Simon sabia no que eles pensavam, conhecia seus planos e também seus medos através de Eric. Quando notasse que a equipe já estava suficientemente desestabilizada, tanto por dentro quanto por fora, seria a hora de agir. Após realizar a série de atentados com o robô, matar um número considerável de civis e humilhar os Vingadores ao máximo aos olhos da população mundial e da mídia, Magnum daria seu golpe final. Com a ajuda do irmão, ele enganaria os fraquejados heróis e destruiria os odiosos e hipócritas Vingadores de uma vez por todas.
Um bipe de alerta começou a ser emitido pelo computador de Magnum, atraindo sua atenção. O homem caminhou aceleradamente até o aparelho para verificar do que se tratava: era um aviso de seu firewall, alegando que um dos arquivos que ele protegia acabara de ser violado e acessado pelo usuário MestreNed556. Mais precisamente, um arquivo da polícia. A gota d’água para aquelas duas crianças intrometidas.
Simon correu até seu telefone novamente, bufando. Teclou ligeiramente e iniciou uma ligação, que foi atendida logo em seguida.
-Eles entraram. – Disse o homem entre dentes.
-O que quer que eu faça? - A voz de Eric respondeu do outro lado da linha.
-É com você, irmãozinho. – Simon falou, com um sorriso malicioso se formando. – Dê um jeito nisso.
Capítulo 12
Os três adolescentes no quarto ficaram em silêncio absoluto por alguns instantes, perplexos. Tentavam entender como algo tão sério havia passado tão despercebido, bem debaixo dos narizes de todos. Alguém diretamente ligado ao maior inimigo da equipe, estava há meses dormindo no complexo e treinando no ginásio, ao lado deles.
-Eu sabia que esse Eric não prestava. – Ned foi o primeiro a quebrar o silêncio, com desprezo na voz.
-Que filho da... – Olivia revoltou-se com os olhos cerrados.
-Ele nos enganou esse tempo todo... – Peter a interrompeu, encarando a tela com um olhar sério. – Ned, o que mais diz aí?
-Segundo a polícia, o Eric está desaparecido. – O amigo continuou a ler. – Ele deve apagar os registros dele o tempo todo pra permanecer anônimo mesmo estando nos Vingadores. Provavelmente o irmão pagou muito dinheiro pra manter a polícia calada.
-É, porque até onde todo mundo sabe ele não é um agente duplo terrorista e mentiroso. – McCall disse com raiva. – Então não tem por que se preocupar com ele.
-Vamos raciocinar. A empresa da família pra onde ele levava o contrabando, o que vende exatamente? – Peter perguntou.
-A Williams Inovações é uma corporação destinada a desenvolver inovações tecnológicas e biotecnológicas para melhoria da qualidade de vida da raça humana. – Ned parafraseou. – Além de produtos de engenharia e robótica, seus serviços incluem tratamentos médicos avançados, vacinas experimentais, melhoramento genético e outras terapias inovadoras.
-Deve ser por isso que os dois irmãos são esquisitões. – Olivia supôs. – Alguma invenção mirabolante.
-O Eric diz que perdeu o braço brincando no laboratório do pai que era cientista. – Parker recordou. – Os poderes dele e do irmão devem ter a ver com essas coisas que o pai deles inventava.
-Ok, eu só quero entender uma coisa – Ned disse girando a cadeira e ficando de frente para os outros dois. – Em teoria, era pra esse irmão do Simon ter uns quarenta anos agora. Como ele pode ser o Eric, que estudava com a gente?
-Foi por isso que a polícia considerou aquela foto como uma prova inconsistente e classificou o Eric como desaparecido. – Olivia respondeu, lendo de longe a informação na tela do computador.
-Mas esse é o Eric – Peter destacou. – e sabemos disso. Como?
-Excelente pergunta. – Ned deu de ombros.
-Ok, seguindo em frente – Olivia começou a caminhar pelo quarto. – O que vamos fazer agora que sabemos que o Eric é um impostor desgraçado e bizarramente jovem?
-Não podemos contar pra ninguém sobre o que descobrimos. Pelo menos não ainda. – Parker se pronunciou sabiamente. – O Eric não sabe que sabemos, o que nos dá uma vantagem sobre ele. Se avisarmos alguém na base e ele descobrir, vai fugir. Não temos certeza se ele não grampeou nossa comunicação ou algo assim, então não seria seguro. A melhor coisa a fazer é descobrir tudo o que podemos enquanto estamos aqui, onde ele não nos vê, e então voltar quando pudermos pegá-lo no momento certo.
-Concordo. – Olivia manifestou a opinião. – Devíamos começar a monitorá-lo, só pra ter certeza de que não está fazendo nada suspeito. Podíamos acessar o rastreador do traje dele.
-Mas precisamos usar o sistema da base pra conseguir isso, e não estamos com ele, lembra? – Peter alertou.
-Não precisamos. Meu pai tem um sistema próprio pra acessar rastreadores, do qual só ele tem o código. – Olivia esclareceu, pedindo para que Ned cedesse o lugar na cadeira. – Pelo menos é o que ele acha. – Ela deu uma piscadela em seguida, então começou a teclar ligeiramente.
-Seu pai tem um sistema de rastreadores secretos? – Peter surpreendeu-se.
-É claro. Como você acha que ele está monitorando a gente aqui em Nova York? – Olivia franziu a testa.
-Ele está?! – Parker surpreendeu-se mais ainda.
-É claro que está, Parker, não seja ingênuo. E ele pensa que não sabemos. Mas, como eu conheço a senha, alterei o GPS antes de sairmos pra que ele não nos seguisse. – A garota continuou a explicar, com obviedade. – Até onde meu pai vê, eu estou dentro do apartamento da minha mãe em Manhattan o fim de semana todo, e você está na casa da sua tia. Mas, é claro, com algumas visitas programadas à padaria do outro lado da rua ou ao cinema, só pra não ficar suspeito demais.
Ned e Peter dirigiram seus olhares um para o outro, impressionados.
-Eu gostei dessa menina. – Ned disse, fazendo Olivia rir à tela.
-É, você não é o primeiro que me diz isso. – Peter ergueu as sobrancelhas, tedioso.
-Ei, garotos – Liv chamou a atenção dos dois. – Querem saber como o Eric fez tudo isso? Perguntem a ele pessoalmente – Ela indicou o mapa que se exibia na tela. – pois ele está vindo pra Nova York nesse momento.
-Como assim? – Peter perguntou imediatamente, aproximando-se do computador para ver.
-Um jato da base acabou de decolar do hangar com o piloto automático pra Nova York. O Eric é o único tripulante. – Olivia indicou o pontinho vermelho no do desenho. – Ele chegará em uma hora.
-Aquela trava no arquivo da polícia... – Parker começou a pensar. – Quando desativamos, ele deve ter recebido algum tipo de aviso. Provavelmente estar vindo pra cá perguntar pra gente quais são as novas.
-Eu tenho umas boas novas pra dizer pra ele. – Olivia fechou o punho.
-O que vocês vão fazer? – Ned questionou.
-Nada ainda. – Peter respondeu. – Liv, qual o destino do jato?
-Então, esse é o problema – A menina respondeu mordendo o lábio. – Ele vai para a Times Square.
-Times Square? O que ele vai fazer lá? – Ned questionou novamente.
-É véspera de ano novo. Vão ter milhares de pessoas reunidas lá pra ver a bola descer. – Parker disse franzindo o cenho.
-Ele vai aprontar. – Concluiu Olivia e trincou o maxilar em seguida.
-Provavelmente vai levar o homem de lata pra fazer outro atentado. – Peter preocupou-se. – Temos que fazer alguma coisa.
-Mas aquele robô não é, tipo, à prova de todos vocês? – Perguntou Ned, confuso. – Como vão fazer pra derrotá-lo, ainda mais só os dois, sozinhos?
-Temos uma arma secreta. – Peter disse, dirigindo o olhar para Olivia.
-A ciência. – Liv completou, olhando de volta para o garoto.
-Ok, não estou entendendo nada. – Ned interrompeu o momento. – Alguém me diz, como dois pirralhos vão enfrentar um Megazord de cinco metros?
-Como anda o laboratório de química da escola, Ned? – Peter perguntou, sem dar atenção ao questionamento do amigo.
-Está muito bom. – O rapaz respondeu, buscando a razão do assunto. – Depois que vencemos o decatlo naquele ano, ganhamos uns upgrades. Agora temos mais equipamentos e produtos. Por quê?
-Tem ácido fluorídrico?
-Tem...
-E ácido nítrico? – Perguntou Olivia.
-Aham... – Ned franziu a testa, ainda sem entender a conversa.
-Então podemos dar um jeito. – Parker referiu-se à parceira.
-Não custa tentar, não é? – Ela deu de ombros.
-Oi, eu estou aqui – Leeds exclamou aborrecido, agitando os braços no ar para chamar atenção dos outros dois. – Querem me dizer o que vão aprontar?
-Ned, nós vamos invadir a escola. – Peter virou-se para ele, convicto.
-Tá de brincadeira. – Ned disse, e ao constatar o silêncio dos outros dois, deu um suspiro derrotado. – Eu só me ferro por ser seu amigo, sabia?
Sem demora, os três adolescentes saíram da casa de Ned e se dirigiram à Midtown High, onde Peter costumava estudar no ensino médio. Devido à data comemorativa, era muito provável que houvesse pouca ou nenhuma segurança no local, facilitando a entrada. Eles pularam a grade do estacionamento de professores e Olivia arrebentou o cadeado de uma das portas usando energia, e logo já estavam dentro dos corredores.
-Eu odeio vocês. – Ned cochichou contrariado, enquanto se esgueirava entre os armários.
-Não precisa se esconder, Ned, não tem ninguém aqui dentro. – Peter respondeu sem alterar o tom de voz, caminhando normalmente ao lado de Olivia.
-Você só está tranquilão assim porque não vai mais levar uma suspensão se for pego aqui à noite. Mas eu vou. – Retrucou o amigo. – O que viemos fazer aqui, afinal?
-Olivia e eu fizemos algumas pesquisas sobre o material que torna o robô indestrutível. – Parker começou a explicar. – Um dos componentes da liga metálica é um metal alienígena muito resistente, chamado Exoginium. Fazendo alguns testes com ele, descobrimos uma forma pela qual talvez possamos enfraquecê-lo.
-Por mais que seja um material bem resistente, é até fácil desestabilizá-lo. – Olivia continuou. - O Exoginium tem grande resistência mecânica, energética e física em geral, mas química não. Tentar quebrá-lo, aquecê-lo ou resfriá-lo quase não o afeta, porque o planeta de onde ele veio tem grande variação de atmosfera, o que o tornou resistente a essas oscilações. Mas, por ser um planeta rochoso de solo pobre, lá existe muito pouca variedade de elementos químicos. Isso faz o metal vulnerável a substâncias que, na Terra, são relativamente comuns.
-Em resumo, nós achamos que uma combinação de ácidos normalmente utilizados pra corroer metais pode afetá-lo e transformá-lo em líquido. Isso seria suficiente pra desestabilizar a liga e nos dar uma vantagem. – Parker concluiu, bem no momento em que chegaram à porta do laboratório.
Bastou um chute bem forte de Peter para que a tranca arrebentasse, e então a sala toda era deles para que pudessem realizar o experimento. De jalecos e óculos, os três adolescentes fizeram a mistura com a dosagem prevista por Olivia e Parker naquela mesma tarde, na esperança de que aquilo funcionasse quando fosse a hora. Após finalizar o composto, eles o colocaram no lança-teias de Peter, onde a mistura ficaria segura e sem risco de ferir algum deles. Bastaria dar um comando à Karen e o Homem-Aranha conseguiria disparar o ácido certeiramente no homem de lata.
-Onde ele está? – Peter perguntou, retirando o jaleco e pendurando-o no cabide.
-Ele deve pousar em dez minutos. – Olivia respondeu, acompanhando o rastreador de Eric pelo celular.
-Temos que ir. – O rapaz apressou, e então os dois se prepararam para saírem correndo. – Ned, muito obrigado pela ajuda, cara.
-Esperem aí – Ned interrompeu, mas eles não pararam, então ele gritou. – Eu devo supostamente escalar aquelas grades e ir embora sozinho?
-Feliz ano novo, cara! – Peter gritou de volta em resposta, enquanto os dois corriam em disparada.
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Do topo de um dos enormes prédios que rodeavam a Times Square, Eric Williams observava a multidão reunida na praça logo abaixo. À direita, a brilhante bola do ano novo se segurava, com o relógio contando os minutos para sua descida. E a cada segundo a menos no timer, era como um segundo a menos na vida ínfima daqueles cidadãos, que mal sabiam estar fazendo a contagem regressiva para o próprio massacre.
O rapaz estava visivelmente irritado, o que se refletira em seu plano maligno. Ele precisava tomar uma atitude diante da afronta de seus inimigos, e faria isso mostrando quem realmente tinha o poder ali.
Seus devaneios foram interrompidos pelo som de pousos a poucos metros atrás. Homem-Aranha acabara de chegar em uma de suas teias, e sua parceira Arion viera flutuando com energia. Eric levantou-se do parapeito onde estava, e caminhou lentamente até eles com um sorriso no rosto.
-Invasão de propriedade privada, pesquisas não autorizadas, roubo de informações confidenciais, furto... isso não é nada exemplar para um Vingador. – Ele enunciou, com uma diversão cínica na voz.
-Falsidade ideológica também não é, Eric Williams. – Parker retrucou, com um pouco de raiva.
-O brilhante e idiota Peter Parker, sempre se metendo onde não foi chamado. – Falou Eric elevando o tom. – Parabéns, Sherlock e Watson, vocês chegaram até mim.
-Não pensou que esconderia sua identidade como um covarde pra sempre, não é? – Olivia desdenhou.
-No início não, mas vocês estavam sendo tão cegos e burros até agora que eu honestamente pensei por um momento que não me descobririam. – Eric respondeu, arrumando seu uniforme, que agora possuía uma capa púrpura que cobria seu rosto.
-Bem, surpresa. – Parker ironizou. – Acabou a sua palhaçada.
-Vou te dizer o que é uma palhaçada. – Williams rebateu, caminhando para a esquerda. – Vocês. Os tão respeitados e imbatíveis Vingadores. – Ele riu em seguida. – Eu enganei todos vocês. Manipulei os resultados das pesquisas de Tony Stark sobre mim, fazendo Eric Carter parecer apenas um adolescente normal, e entrei pra equipe. A equipe “blindada”, que estava tão desesperada pela ajuda de novos membros que me recebeu de braços abertos. Logo depois, enfraqueci os sistemas de segurança tão “invencíveis” de vocês e coloquei meu irmão pra dentro do seu santuário, só pra fazer os Vingadores passarem vergonha. Tudo isso com uma facilidade tão grande, que chegou a ser patética.
-Você tem quarenta anos e continua tendo espinhas. Quer mesmo discutir o que é mais patético? – Olivia arqueou as sobrancelhas.
-Que tal seu pai, Olivia Stark? – Eric respondeu com cinismo. – Afinal, ele é quem comanda todo esse circo. Tão patético que não consegue nem proteger a própria filha de um simples ataque de ódio no Facebook.
-Eu estou aqui, por que não me ataca agora? – A garota provocou. – Tem medo de fazer isso sem estar por detrás da tela?
-Se você fosse tão importante quanto pensa... – O outro se riu. – Acho que arrogância está no sangue.
-Insanidade também está no sangue, pelo visto. Cadê o lunático do seu irmão? – Parker questionou, puxando o foco.
-Ele não se daria ao trabalho de vir até aqui. Isso é entre mim e vocês, criancinhas. – Williams respondeu. – Sabe, Simon não liga de ser reconhecido como Magnum. Ele sabe que as pessoas irão apoiá-lo quando virem o quão brilhante a luta dele é. Enquanto vocês se intrometiam apenas na vida dele, estava tudo bem. Mas quando chegaram naquele arquivo da polícia, a única prova sobre mim que nunca consegui ocultar, eu soube que precisaria silenciar vocês.
-Não me sinto silenciado. Na verdade, queria entender por que assassinar pessoas inocentes é uma luta brilhante pra você. – Parker questionou, colocando a mão no queixo. – Vocês não souberam brincar de banco imobiliário com Tony Stark e agora estão bravos, é isso?
-Isso não é sobre Tony Stark – Eric retrucou, rindo. – Ele é um idiota convencido, isso é verdade. Mas não queremos nos vingar dele por ter destruído os negócios do nosso pai. Ele era só um sádico que nos transformou nas aberrações que somos, a Williams Inovações pode morrer com ele. Estamos aqui pra vingar o povo que vocês oprimem.
-Não somos nós que atiçamos robôs gigantes contra pessoas em pontes. – Olivia respondeu.
-Não, mas vocês causam muito mais mortes do que esse robô jamais causará. Vocês destroem casas, cidades, famílias e vidas. E nós vamos acabar com os Vingadores e com todo o mal que eles trazem ao mundo. – Eric enunciou com raiva iminente.
-Boa sorte com isso.
-Não preciso de sorte. – O rapaz cuspiu. – O mundo todo acha que o responsável pelos atentados foi preso pela brilhante inteligência policial americana. Isso porque eles foram burros o suficiente para acreditar nas provas que implantamos, incriminando um de nossos aliados que se sacrificou pela causa e foi para a prisão. Mas em poucos minutos, a ONU fará papel de idiota na frente do mundo todo, quando o gigante de aço voltar e ninguém conseguir detê-lo. Então, quando a humanidade vir que seus heróis e seu governo são fracos e não os representam de verdade, eles estarão prontos para apoiar o Magnum e defender seus ideais.
-Vocês vão matar as pessoas pra que elas confiem em vocês? Que tipo de livro de política vocês andam lendo? – Parker desdenhou.
-E você, Pênis Parker? Que tipo de livros anda lendo pra ser tão ingênuo? – Eric voltou a provocar, desta vez de modo mais pessoal. – Sabe que a culpa disso tudo é sua, não sabe? Porque eu só entrei pros Vingadores por sua causa. Você estava tão desesperado pra fazer amizade com os garotos do time de futebol que nem hesitou em me chamar pro seu clubinho.
Peter ficou em silêncio, apenas encarando Eric de forma séria.
-Do que ele está falando, Parker? – Olivia cochichou.
-Oh, ela não sabe da idiotice que você fez? – Williams começou a rir. – Vamos Peter, conte a ela.
-Eric e eu estudávamos juntos. – O rapaz respondeu com a voz retraída, mas sem dar o braço a torcer. – Eu descobri que ele tinha poderes e disse ao Sr. Stark para dar uma chance pra ele na equipe.
-Eu fui o cara mais horrível com ele durante o ensino médio inteiro, tirei sarro da cara dele e inventei apelidos, e ele foi trouxa o suficiente pra me convidar pro time! – Eric divertia-se.
-Cala a boca. – Peter disse simplesmente.
-E eu ainda tive que fingir ser seu amigo durante todos esses meses. Tive que te ouvir falar sobre ciências e física, tive que achar graça nas suas piadas e aturar você, fingir que éramos parceiros. E você fez de mim o seu melhor amigo sem nem pensar.
-Você não me afeta mais, Carter. – Peter o encarava.
-E eu nem preciso! Você já é uma piada por si mesmo. O cara mais nerd da escola, tão patético que foi capaz de abandonar a garota mais bonita da escola no baile sozinha. Um super-herói que não conseguiu nem salvar a vida do próprio tio durante um assalto. Tão covarde que não é capaz nem de revidar o que eu digo!
Vendo que a situação caminhava pra uma chantagem psicológica perigosa, Olivia tomou uma atitude. Usou a rede elétrica para dar um choque em Eric, fazendo-o cair sentado.
-Precisa que a sua namorada te defenda, Parker? – Ele não parou, e levantou-se lentamente sem muitos danos.
-Ok, já chega. – Peter tomou a frente, e disparou uma teia na direção do rosto de Eric, tapando sua boca. – Quer saber o que ando lendo? Vou te indicar, pode ser útil pra você. Já ouviu falar em Tumblr? Tem muitas frases inspiradoras lá, de autoajuda e positivismo, quem sabe acalme seus nervos e te faça repensar esse seu plano assassino e essa sua cabeça problemática.
Eric aproximou-se, irritado, e deu um soco em Parker. O garoto se defendeu com a parte de trás do braço.
-Você fala demais – Williams respondeu, tirando a teia da boca. – Todas aquelas pessoas morreram por sua causa, você sabe. – Ele fez um movimento com o ombro, liberando a foice em seu braço, então avançou com ela na direção do rapaz.
-Não fui eu que coloquei o robô naquela ponte. – Peter defendeu o golpe com o antebraço, e Eric começou a forçar o adereço contra o corpo dele. Quando a lâmina começou a partir o tecido do uniforme de Parker, Olivia interviu.
Com um movimento da mão, ela empurrou a foice de Eric para longe usando energia mecânica, dando a Peter tempo de reação. Ele deu um chute em Eric, que parou de pé após um pulo para trás.
-É tarde demais pra tentar concertar isso. – Disse Williams, e quase ao mesmo tempo, um estrondo surdo veio lá de baixo. Logo em seguida, vozes de uma multidão inquieta, que se transformaram em gritos, sendo abafados por rangidos de metal.
Gigante de aço. E desta vez, não estava sozinho: eram três homens de metal, caminhando imponentes com seus canhões, prontos para atacar a multidão aglomerada na Times Square, há menos de uma hora da descida da bola.
-Vamos brincar? – Eric disse para os dois, com um sorriso diabólico no rosto.
-Eu sabia que esse Eric não prestava. – Ned foi o primeiro a quebrar o silêncio, com desprezo na voz.
-Que filho da... – Olivia revoltou-se com os olhos cerrados.
-Ele nos enganou esse tempo todo... – Peter a interrompeu, encarando a tela com um olhar sério. – Ned, o que mais diz aí?
-Segundo a polícia, o Eric está desaparecido. – O amigo continuou a ler. – Ele deve apagar os registros dele o tempo todo pra permanecer anônimo mesmo estando nos Vingadores. Provavelmente o irmão pagou muito dinheiro pra manter a polícia calada.
-É, porque até onde todo mundo sabe ele não é um agente duplo terrorista e mentiroso. – McCall disse com raiva. – Então não tem por que se preocupar com ele.
-Vamos raciocinar. A empresa da família pra onde ele levava o contrabando, o que vende exatamente? – Peter perguntou.
-A Williams Inovações é uma corporação destinada a desenvolver inovações tecnológicas e biotecnológicas para melhoria da qualidade de vida da raça humana. – Ned parafraseou. – Além de produtos de engenharia e robótica, seus serviços incluem tratamentos médicos avançados, vacinas experimentais, melhoramento genético e outras terapias inovadoras.
-Deve ser por isso que os dois irmãos são esquisitões. – Olivia supôs. – Alguma invenção mirabolante.
-O Eric diz que perdeu o braço brincando no laboratório do pai que era cientista. – Parker recordou. – Os poderes dele e do irmão devem ter a ver com essas coisas que o pai deles inventava.
-Ok, eu só quero entender uma coisa – Ned disse girando a cadeira e ficando de frente para os outros dois. – Em teoria, era pra esse irmão do Simon ter uns quarenta anos agora. Como ele pode ser o Eric, que estudava com a gente?
-Foi por isso que a polícia considerou aquela foto como uma prova inconsistente e classificou o Eric como desaparecido. – Olivia respondeu, lendo de longe a informação na tela do computador.
-Mas esse é o Eric – Peter destacou. – e sabemos disso. Como?
-Excelente pergunta. – Ned deu de ombros.
-Ok, seguindo em frente – Olivia começou a caminhar pelo quarto. – O que vamos fazer agora que sabemos que o Eric é um impostor desgraçado e bizarramente jovem?
-Não podemos contar pra ninguém sobre o que descobrimos. Pelo menos não ainda. – Parker se pronunciou sabiamente. – O Eric não sabe que sabemos, o que nos dá uma vantagem sobre ele. Se avisarmos alguém na base e ele descobrir, vai fugir. Não temos certeza se ele não grampeou nossa comunicação ou algo assim, então não seria seguro. A melhor coisa a fazer é descobrir tudo o que podemos enquanto estamos aqui, onde ele não nos vê, e então voltar quando pudermos pegá-lo no momento certo.
-Concordo. – Olivia manifestou a opinião. – Devíamos começar a monitorá-lo, só pra ter certeza de que não está fazendo nada suspeito. Podíamos acessar o rastreador do traje dele.
-Mas precisamos usar o sistema da base pra conseguir isso, e não estamos com ele, lembra? – Peter alertou.
-Não precisamos. Meu pai tem um sistema próprio pra acessar rastreadores, do qual só ele tem o código. – Olivia esclareceu, pedindo para que Ned cedesse o lugar na cadeira. – Pelo menos é o que ele acha. – Ela deu uma piscadela em seguida, então começou a teclar ligeiramente.
-Seu pai tem um sistema de rastreadores secretos? – Peter surpreendeu-se.
-É claro. Como você acha que ele está monitorando a gente aqui em Nova York? – Olivia franziu a testa.
-Ele está?! – Parker surpreendeu-se mais ainda.
-É claro que está, Parker, não seja ingênuo. E ele pensa que não sabemos. Mas, como eu conheço a senha, alterei o GPS antes de sairmos pra que ele não nos seguisse. – A garota continuou a explicar, com obviedade. – Até onde meu pai vê, eu estou dentro do apartamento da minha mãe em Manhattan o fim de semana todo, e você está na casa da sua tia. Mas, é claro, com algumas visitas programadas à padaria do outro lado da rua ou ao cinema, só pra não ficar suspeito demais.
Ned e Peter dirigiram seus olhares um para o outro, impressionados.
-Eu gostei dessa menina. – Ned disse, fazendo Olivia rir à tela.
-É, você não é o primeiro que me diz isso. – Peter ergueu as sobrancelhas, tedioso.
-Ei, garotos – Liv chamou a atenção dos dois. – Querem saber como o Eric fez tudo isso? Perguntem a ele pessoalmente – Ela indicou o mapa que se exibia na tela. – pois ele está vindo pra Nova York nesse momento.
-Como assim? – Peter perguntou imediatamente, aproximando-se do computador para ver.
-Um jato da base acabou de decolar do hangar com o piloto automático pra Nova York. O Eric é o único tripulante. – Olivia indicou o pontinho vermelho no do desenho. – Ele chegará em uma hora.
-Aquela trava no arquivo da polícia... – Parker começou a pensar. – Quando desativamos, ele deve ter recebido algum tipo de aviso. Provavelmente estar vindo pra cá perguntar pra gente quais são as novas.
-Eu tenho umas boas novas pra dizer pra ele. – Olivia fechou o punho.
-O que vocês vão fazer? – Ned questionou.
-Nada ainda. – Peter respondeu. – Liv, qual o destino do jato?
-Então, esse é o problema – A menina respondeu mordendo o lábio. – Ele vai para a Times Square.
-Times Square? O que ele vai fazer lá? – Ned questionou novamente.
-É véspera de ano novo. Vão ter milhares de pessoas reunidas lá pra ver a bola descer. – Parker disse franzindo o cenho.
-Ele vai aprontar. – Concluiu Olivia e trincou o maxilar em seguida.
-Provavelmente vai levar o homem de lata pra fazer outro atentado. – Peter preocupou-se. – Temos que fazer alguma coisa.
-Mas aquele robô não é, tipo, à prova de todos vocês? – Perguntou Ned, confuso. – Como vão fazer pra derrotá-lo, ainda mais só os dois, sozinhos?
-Temos uma arma secreta. – Peter disse, dirigindo o olhar para Olivia.
-A ciência. – Liv completou, olhando de volta para o garoto.
-Ok, não estou entendendo nada. – Ned interrompeu o momento. – Alguém me diz, como dois pirralhos vão enfrentar um Megazord de cinco metros?
-Como anda o laboratório de química da escola, Ned? – Peter perguntou, sem dar atenção ao questionamento do amigo.
-Está muito bom. – O rapaz respondeu, buscando a razão do assunto. – Depois que vencemos o decatlo naquele ano, ganhamos uns upgrades. Agora temos mais equipamentos e produtos. Por quê?
-Tem ácido fluorídrico?
-Tem...
-E ácido nítrico? – Perguntou Olivia.
-Aham... – Ned franziu a testa, ainda sem entender a conversa.
-Então podemos dar um jeito. – Parker referiu-se à parceira.
-Não custa tentar, não é? – Ela deu de ombros.
-Oi, eu estou aqui – Leeds exclamou aborrecido, agitando os braços no ar para chamar atenção dos outros dois. – Querem me dizer o que vão aprontar?
-Ned, nós vamos invadir a escola. – Peter virou-se para ele, convicto.
-Tá de brincadeira. – Ned disse, e ao constatar o silêncio dos outros dois, deu um suspiro derrotado. – Eu só me ferro por ser seu amigo, sabia?
Sem demora, os três adolescentes saíram da casa de Ned e se dirigiram à Midtown High, onde Peter costumava estudar no ensino médio. Devido à data comemorativa, era muito provável que houvesse pouca ou nenhuma segurança no local, facilitando a entrada. Eles pularam a grade do estacionamento de professores e Olivia arrebentou o cadeado de uma das portas usando energia, e logo já estavam dentro dos corredores.
-Eu odeio vocês. – Ned cochichou contrariado, enquanto se esgueirava entre os armários.
-Não precisa se esconder, Ned, não tem ninguém aqui dentro. – Peter respondeu sem alterar o tom de voz, caminhando normalmente ao lado de Olivia.
-Você só está tranquilão assim porque não vai mais levar uma suspensão se for pego aqui à noite. Mas eu vou. – Retrucou o amigo. – O que viemos fazer aqui, afinal?
-Olivia e eu fizemos algumas pesquisas sobre o material que torna o robô indestrutível. – Parker começou a explicar. – Um dos componentes da liga metálica é um metal alienígena muito resistente, chamado Exoginium. Fazendo alguns testes com ele, descobrimos uma forma pela qual talvez possamos enfraquecê-lo.
-Por mais que seja um material bem resistente, é até fácil desestabilizá-lo. – Olivia continuou. - O Exoginium tem grande resistência mecânica, energética e física em geral, mas química não. Tentar quebrá-lo, aquecê-lo ou resfriá-lo quase não o afeta, porque o planeta de onde ele veio tem grande variação de atmosfera, o que o tornou resistente a essas oscilações. Mas, por ser um planeta rochoso de solo pobre, lá existe muito pouca variedade de elementos químicos. Isso faz o metal vulnerável a substâncias que, na Terra, são relativamente comuns.
-Em resumo, nós achamos que uma combinação de ácidos normalmente utilizados pra corroer metais pode afetá-lo e transformá-lo em líquido. Isso seria suficiente pra desestabilizar a liga e nos dar uma vantagem. – Parker concluiu, bem no momento em que chegaram à porta do laboratório.
Bastou um chute bem forte de Peter para que a tranca arrebentasse, e então a sala toda era deles para que pudessem realizar o experimento. De jalecos e óculos, os três adolescentes fizeram a mistura com a dosagem prevista por Olivia e Parker naquela mesma tarde, na esperança de que aquilo funcionasse quando fosse a hora. Após finalizar o composto, eles o colocaram no lança-teias de Peter, onde a mistura ficaria segura e sem risco de ferir algum deles. Bastaria dar um comando à Karen e o Homem-Aranha conseguiria disparar o ácido certeiramente no homem de lata.
-Onde ele está? – Peter perguntou, retirando o jaleco e pendurando-o no cabide.
-Ele deve pousar em dez minutos. – Olivia respondeu, acompanhando o rastreador de Eric pelo celular.
-Temos que ir. – O rapaz apressou, e então os dois se prepararam para saírem correndo. – Ned, muito obrigado pela ajuda, cara.
-Esperem aí – Ned interrompeu, mas eles não pararam, então ele gritou. – Eu devo supostamente escalar aquelas grades e ir embora sozinho?
-Feliz ano novo, cara! – Peter gritou de volta em resposta, enquanto os dois corriam em disparada.
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Do topo de um dos enormes prédios que rodeavam a Times Square, Eric Williams observava a multidão reunida na praça logo abaixo. À direita, a brilhante bola do ano novo se segurava, com o relógio contando os minutos para sua descida. E a cada segundo a menos no timer, era como um segundo a menos na vida ínfima daqueles cidadãos, que mal sabiam estar fazendo a contagem regressiva para o próprio massacre.
O rapaz estava visivelmente irritado, o que se refletira em seu plano maligno. Ele precisava tomar uma atitude diante da afronta de seus inimigos, e faria isso mostrando quem realmente tinha o poder ali.
Seus devaneios foram interrompidos pelo som de pousos a poucos metros atrás. Homem-Aranha acabara de chegar em uma de suas teias, e sua parceira Arion viera flutuando com energia. Eric levantou-se do parapeito onde estava, e caminhou lentamente até eles com um sorriso no rosto.
-Invasão de propriedade privada, pesquisas não autorizadas, roubo de informações confidenciais, furto... isso não é nada exemplar para um Vingador. – Ele enunciou, com uma diversão cínica na voz.
-Falsidade ideológica também não é, Eric Williams. – Parker retrucou, com um pouco de raiva.
-O brilhante e idiota Peter Parker, sempre se metendo onde não foi chamado. – Falou Eric elevando o tom. – Parabéns, Sherlock e Watson, vocês chegaram até mim.
-Não pensou que esconderia sua identidade como um covarde pra sempre, não é? – Olivia desdenhou.
-No início não, mas vocês estavam sendo tão cegos e burros até agora que eu honestamente pensei por um momento que não me descobririam. – Eric respondeu, arrumando seu uniforme, que agora possuía uma capa púrpura que cobria seu rosto.
-Bem, surpresa. – Parker ironizou. – Acabou a sua palhaçada.
-Vou te dizer o que é uma palhaçada. – Williams rebateu, caminhando para a esquerda. – Vocês. Os tão respeitados e imbatíveis Vingadores. – Ele riu em seguida. – Eu enganei todos vocês. Manipulei os resultados das pesquisas de Tony Stark sobre mim, fazendo Eric Carter parecer apenas um adolescente normal, e entrei pra equipe. A equipe “blindada”, que estava tão desesperada pela ajuda de novos membros que me recebeu de braços abertos. Logo depois, enfraqueci os sistemas de segurança tão “invencíveis” de vocês e coloquei meu irmão pra dentro do seu santuário, só pra fazer os Vingadores passarem vergonha. Tudo isso com uma facilidade tão grande, que chegou a ser patética.
-Você tem quarenta anos e continua tendo espinhas. Quer mesmo discutir o que é mais patético? – Olivia arqueou as sobrancelhas.
-Que tal seu pai, Olivia Stark? – Eric respondeu com cinismo. – Afinal, ele é quem comanda todo esse circo. Tão patético que não consegue nem proteger a própria filha de um simples ataque de ódio no Facebook.
-Eu estou aqui, por que não me ataca agora? – A garota provocou. – Tem medo de fazer isso sem estar por detrás da tela?
-Se você fosse tão importante quanto pensa... – O outro se riu. – Acho que arrogância está no sangue.
-Insanidade também está no sangue, pelo visto. Cadê o lunático do seu irmão? – Parker questionou, puxando o foco.
-Ele não se daria ao trabalho de vir até aqui. Isso é entre mim e vocês, criancinhas. – Williams respondeu. – Sabe, Simon não liga de ser reconhecido como Magnum. Ele sabe que as pessoas irão apoiá-lo quando virem o quão brilhante a luta dele é. Enquanto vocês se intrometiam apenas na vida dele, estava tudo bem. Mas quando chegaram naquele arquivo da polícia, a única prova sobre mim que nunca consegui ocultar, eu soube que precisaria silenciar vocês.
-Não me sinto silenciado. Na verdade, queria entender por que assassinar pessoas inocentes é uma luta brilhante pra você. – Parker questionou, colocando a mão no queixo. – Vocês não souberam brincar de banco imobiliário com Tony Stark e agora estão bravos, é isso?
-Isso não é sobre Tony Stark – Eric retrucou, rindo. – Ele é um idiota convencido, isso é verdade. Mas não queremos nos vingar dele por ter destruído os negócios do nosso pai. Ele era só um sádico que nos transformou nas aberrações que somos, a Williams Inovações pode morrer com ele. Estamos aqui pra vingar o povo que vocês oprimem.
-Não somos nós que atiçamos robôs gigantes contra pessoas em pontes. – Olivia respondeu.
-Não, mas vocês causam muito mais mortes do que esse robô jamais causará. Vocês destroem casas, cidades, famílias e vidas. E nós vamos acabar com os Vingadores e com todo o mal que eles trazem ao mundo. – Eric enunciou com raiva iminente.
-Boa sorte com isso.
-Não preciso de sorte. – O rapaz cuspiu. – O mundo todo acha que o responsável pelos atentados foi preso pela brilhante inteligência policial americana. Isso porque eles foram burros o suficiente para acreditar nas provas que implantamos, incriminando um de nossos aliados que se sacrificou pela causa e foi para a prisão. Mas em poucos minutos, a ONU fará papel de idiota na frente do mundo todo, quando o gigante de aço voltar e ninguém conseguir detê-lo. Então, quando a humanidade vir que seus heróis e seu governo são fracos e não os representam de verdade, eles estarão prontos para apoiar o Magnum e defender seus ideais.
-Vocês vão matar as pessoas pra que elas confiem em vocês? Que tipo de livro de política vocês andam lendo? – Parker desdenhou.
-E você, Pênis Parker? Que tipo de livros anda lendo pra ser tão ingênuo? – Eric voltou a provocar, desta vez de modo mais pessoal. – Sabe que a culpa disso tudo é sua, não sabe? Porque eu só entrei pros Vingadores por sua causa. Você estava tão desesperado pra fazer amizade com os garotos do time de futebol que nem hesitou em me chamar pro seu clubinho.
Peter ficou em silêncio, apenas encarando Eric de forma séria.
-Do que ele está falando, Parker? – Olivia cochichou.
-Oh, ela não sabe da idiotice que você fez? – Williams começou a rir. – Vamos Peter, conte a ela.
-Eric e eu estudávamos juntos. – O rapaz respondeu com a voz retraída, mas sem dar o braço a torcer. – Eu descobri que ele tinha poderes e disse ao Sr. Stark para dar uma chance pra ele na equipe.
-Eu fui o cara mais horrível com ele durante o ensino médio inteiro, tirei sarro da cara dele e inventei apelidos, e ele foi trouxa o suficiente pra me convidar pro time! – Eric divertia-se.
-Cala a boca. – Peter disse simplesmente.
-E eu ainda tive que fingir ser seu amigo durante todos esses meses. Tive que te ouvir falar sobre ciências e física, tive que achar graça nas suas piadas e aturar você, fingir que éramos parceiros. E você fez de mim o seu melhor amigo sem nem pensar.
-Você não me afeta mais, Carter. – Peter o encarava.
-E eu nem preciso! Você já é uma piada por si mesmo. O cara mais nerd da escola, tão patético que foi capaz de abandonar a garota mais bonita da escola no baile sozinha. Um super-herói que não conseguiu nem salvar a vida do próprio tio durante um assalto. Tão covarde que não é capaz nem de revidar o que eu digo!
Vendo que a situação caminhava pra uma chantagem psicológica perigosa, Olivia tomou uma atitude. Usou a rede elétrica para dar um choque em Eric, fazendo-o cair sentado.
-Precisa que a sua namorada te defenda, Parker? – Ele não parou, e levantou-se lentamente sem muitos danos.
-Ok, já chega. – Peter tomou a frente, e disparou uma teia na direção do rosto de Eric, tapando sua boca. – Quer saber o que ando lendo? Vou te indicar, pode ser útil pra você. Já ouviu falar em Tumblr? Tem muitas frases inspiradoras lá, de autoajuda e positivismo, quem sabe acalme seus nervos e te faça repensar esse seu plano assassino e essa sua cabeça problemática.
Eric aproximou-se, irritado, e deu um soco em Parker. O garoto se defendeu com a parte de trás do braço.
-Você fala demais – Williams respondeu, tirando a teia da boca. – Todas aquelas pessoas morreram por sua causa, você sabe. – Ele fez um movimento com o ombro, liberando a foice em seu braço, então avançou com ela na direção do rapaz.
-Não fui eu que coloquei o robô naquela ponte. – Peter defendeu o golpe com o antebraço, e Eric começou a forçar o adereço contra o corpo dele. Quando a lâmina começou a partir o tecido do uniforme de Parker, Olivia interviu.
Com um movimento da mão, ela empurrou a foice de Eric para longe usando energia mecânica, dando a Peter tempo de reação. Ele deu um chute em Eric, que parou de pé após um pulo para trás.
-É tarde demais pra tentar concertar isso. – Disse Williams, e quase ao mesmo tempo, um estrondo surdo veio lá de baixo. Logo em seguida, vozes de uma multidão inquieta, que se transformaram em gritos, sendo abafados por rangidos de metal.
Gigante de aço. E desta vez, não estava sozinho: eram três homens de metal, caminhando imponentes com seus canhões, prontos para atacar a multidão aglomerada na Times Square, há menos de uma hora da descida da bola.
-Vamos brincar? – Eric disse para os dois, com um sorriso diabólico no rosto.
Capítulo 13
-Manda ver, Benjamin Button. – Peter respondeu ao ex-amigo, com os olhos cerrados.
Os dois rapazes se encontraram no centro do terraço para iniciar uma troca de golpes. Peter fez sinal para Olivia, indicando que ela fosse até lá em baixo para tentar deter os robôs que já começavam a aterrorizar a multidão, enquanto ele cuidava do resto.
-Duas crianças como vocês nunca vão conseguir parar o exército. – Ceifador falou com desprezo, girando a lâmina em seu braço rapidamente.
-Observe. – Foi a resposta do garoto, que defendeu o movimento.
A trocação entre os dois era rápida, e variava entre golpes, lançamentos de teia e tilintar de lâminas. Em um determinado momento, a foice de Eric começou a emitir um brilho avermelhado esquisito, que resultou num raio de mesma cor segundos depois, passando de raspão pela cabeça de Parker.
-Que droga é essa? – Aranha exclamou, confuso. Em seguida, arremessou uma bomba de teia da qual o adversário conseguiu desviar.
-Tem muita coisa que você não sabe, garoto. – Eric respondeu, dando mais um golpe violento com a foice. Desta vez, ele conseguiu abrir uma fissura no uniforme de Peter.
-Eu adoraria ficar aqui no alto conversando com você – Começou o rapaz, disparando teias rapidamente. – Mas eu tenho uma festa de ano novo pra salvar. – Ele grudou uma das teias no pé de Eric e puxou, fazendo com que ele caísse, e em seguida lançou uma no prédio vizinho, dando um leve aceno com a mão antes de pular.
Homem-Aranha estava prestes a escapar e ir até o solo ajudar os civis, mas Ceifador foi rápido o suficiente para saltar logo atrás do rapaz, agarrando sua perna enquanto ele se pendurava.
-Sai do meu pé, literalmente! – Peter indagou, dando um chute no rosto de Eric enquanto planava. Devido à carona indesejada, o garoto foi obrigado a pousar no prédio vizinho, mais baixo que o anterior. Os dois caíram no chão, rolando um pouco até ficarem de pé novamente.
-Olhe pra baixo, Parker – Eric gritou, indicando a multidão de pessoas desesperadas na praça. – Você causou isso, todos vocês causaram! – Ele disparou o raio avermelhado de função desconhecida mais uma vez, mas Peter defendeu-se com um reflexo rápido, impedindo a passagem puxando um latão de lixo à frente do próprio corpo. – Quanto mais você lutar, mais humilhante essa derrota vai ser pra você. Nunca se cansa de ser humilhado?
-Humilhado? – Peter zombou, subindo a capa de Eric com uma teia e enrolando-a no rosto do mesmo. Logo em seguida, ele arremessou a lata de lixo na direção do rapaz. – Não considero humilhação lutar pelo bem das pessoas.
-Então você está do lado errado – Eric enunciou, e logo em seguida sumiu. Ele reapareceu instantes depois logo atrás de Peter, dando um golpe surpresa que o derrubou para frente. – Deixe de ser ingênuo, Parker.
-Você é ingênuo – Aranha revidou, grudando uma teia na foice que vinha em sua direção, e prendendo-a na parede logo atrás de Eric, para que ele não conseguisse mover o braço. – Eu não consegui ver o que estava atrás de mim esse tempo todo. Mas você, amigo, não enxerga o que está bem na sua frente. – Peter disse olhando nos olhos do inimigo imobilizado, e o jogou contra a parede com um chute, grudando-o em uma teia que ali estava. Logo em seguida, o rapaz pulou do prédio na direção da Times Square.
Enquanto os dois ex-colegas discutiam lá em cima, Olivia encarregava-se de tentar conter o caos mais abaixo, onde tudo acontecia. Milhares de pessoas corriam para todos os lados, tentando escapar da praça pelas ruas laterais, tumultuadas de gente e de carros. Enquanto isso, os três robôs gigantes caminhavam a passos largos, agitando os braços de metal e dando tiros de canhão para assustá-los.
Era impossível transitar ou sequer sair do lugar naquele momento. Para tentar liberar um pouco a passagem e tirar as pessoas desesperadas dali, Olivia começou a usar seus poderes para mover as grades de contenção da praça, que bloqueavam a multidão. Com o movimento das mãos à distância, ela erguia e empurrava as barras de metal, enquanto fazia o possível para permanecer de pé apesar dos empurrões que levava o tempo todo.
Liv conseguiu liberar uma área relativamente boa, por onde as pessoas podiam sair e se salvar. Ela correu ao contrário do fluxo e subiu em uma das estátuas da praça, na tentativa de enxergar melhor. Os robôs estavam há metros dela, mas era possível tentar detê-los. Ela ergueu as duas mãos na altura da cabeça e apontou-as para os telões luminosos da Times Square, concentrada. Alguns segundos depois, dois deles começaram a falhar, e seus LEDs apagaram. Olivia tomou a eletricidade que os alimentava, e preparou-se para descarregá-la nos robôs. Ela disparou a energia, mas para sua surpresa, a mesma não os atingiu.
Campos de força luminosos apareceram imediatamente em volta dos três homens de lata, protegendo-os contra a descarga elétrica que Olivia disparou. Confusa, ela ouviu uma voz se aproximando dela por trás.
-Gostou do novo acessório? – Disse Eric, superando os gritos das pessoas que passavam. Ele havia se teletransportado do prédio onde ficara preso e surgira ali, num piscar de olhos. – Depois que descobrimos que a nova Vingadora júnior tinha poderes escondidos, tivemos que fazer alguns aprimoramentos para que os robôs pudessem lutar contra a Arion também.
-Você também tem esses aprimoramentos? Vai precisar – Olivia disse irritada, e avançou na direção do rapaz. Ela atirou uma corrente elétrica na direção dele, que se defendeu usando a lâmina para rebatê-la.
Peter havia acabado de chegar até o solo. O caos era tão grande que ele nem sabia por onde começar: eram pessoas desesperadas de todos os lados para salvar, três robôs enormes pra deter e sua parceira para ajudar. Porém, antes que pudesse bolar qualquer estratégia, o rapaz avistou uma cena que merecia sua prioridade. Dois garotinhos há alguns metros dele, usando jaquetas reforçadas e arquinhos que diziam “feliz ano novo”. Eram gêmeos, de no máximo quatro anos, que não conseguiam sair de dentro de uma das grades de contenção. As pessoas correndo trombavam na armação o tempo todo, e ela estava prestes a cair em cima deles. Além de, é claro, os robôs estarem se aproximando, a poucos minutos de pisotearem aquela área.
Peter foi até lá, pendurando-se nos postes de luz. Ele chegou perto dos garotinhos, que estavam desesperados chorando e chamando pela mãe, de quem aparentemente tinham se perdido.
-Oi, carinhas. Vou tirar vocês daqui, tá bom? – Disse ele, tentando acalmá-los no meio daquela confusão toda. Com um pouco de dificuldade, ele forçou duas barras da grade em direções opostas, abrindo ali uma passagem para os dois. – Venham.
Os gêmeos obedeceram, passando pelo buraco com dificuldade por conta dos casacos de frio. Eles secavam as lágrimas dos rostinhos vermelhos, e vasculhavam a multidão à procura da mãe. Um dos robôs vinha se aproximando cada vez mais da região em que estavam, obrigando Peter a tomar uma atitude. Ele amarrou os dois garotinhos juntos usando uma teia, e abaixou-se para falar com eles.
-Fechem os olhos, está bem? Vai ser como brincar de balanço. – Disse ele, segurando as duas crianças num dos braços. Peter disparou uma teia para cima e prendeu em um dos telões, içando a si mesmo e aos dois meninos poucos segundos antes do imenso pé de metal do robô atingir a região, amassando todas as grades.
Parker segurava os gêmeos o mais firme que conseguia, enquanto tentava sair da zona de conflito com um dos três robôs, que começou a persegui-lo. Ele deu a volta na praça, saindo por trás e caminhando nas costas de um dos homens de lata para desviar de um soco. Logo em seguida, ele pulou em um poste de luz levemente tombado, empurrando-o e fazendo com que caísse em cima do inimigo para tentar atrasá-lo.
-Pensando bem, talvez esteja mais pra brincar de montanha-russa. – Peter corrigiu, e ficou surpreso ao ouvir os dois garotinhos rirem. Eles estavam, surpreendentemente, se divertindo com o vento no rosto, a altura e os voos.
Aranha pensou ter conseguido escapar, porém, o robô reagiu rapidamente e segurou a teia em que ele se pendurava, arrebentando-a. Para evitar que as crianças caíssem, Peter disparou uma bomba de teia entre os dois postes seguintes, fazendo uma espécie de rede de salvamento. Já ele parou no asfalto da forma que conseguiu, esfolando-se um pouco.
-Homem-Aranha, ali! – Gritou um dos garotinhos, apontando para trás de Peter. O robô ainda não tinha desistido.
Parker deu um pulo rápido para escapar do soco que o homem de lata deu no chão, e agarrou os garotinhos novamente logo em seguida. Ele voltou a se balançar, tentando encontrar um local seguro para deixar os gêmeos.
-Mamãe! – Disse o outro deles, apontando para baixo. Na calçada da quadra da frente, uma mulher desesperada estava parada no meio da correria, olhando fixamente para eles, preocupada.
-Vou levar vocês até a mamãe, ok? – Peter disse, com os sentidos sobrecarregados tentando conciliar a luta com o robô, a estratégia pra descer e o discurso para tranquilizar os garotinhos. – Mas vocês vão ter que me ajudar. Não consigo fazer tudo sozinho, então vocês dois tem que ser bem corajosos, entenderam?
Peter continuou a se balançar, tentando encontrar a oportunidade para pousar em segurança. Ele começou a empurrar as grades de contenção na direção dos gigantes, tentando atrasá-los. Ao mesmo tempo em que ele lutava, os dois garotinhos começaram a imitá-lo, fingindo que disparavam teias com as próprias mãos, enquanto faziam o barulho do lança-teias com a boca e franziam as testas com caras bravas.
Conseguindo uma vantagem, Peter preparou-se para descer na esquina onde a mãe dos gêmeos estava. Ele desacelerou, parando no meio do asfalto, e a mulher veio correndo na direção deles. O rapaz entregou os dois garotinhos no colo dela, desvencilhando-os da teia que ele tinha usado para grudá-los juntos, enquanto a mãe agradecia repetidas vezes.
-Vocês foram muito corajosos – Disse ele, acelerado. – Obrigado pela ajuda. Se cuidem! – Ele sorriu por trás da máscara, e logo em seguida saiu correndo para continuar o combate.
-Acaba com eles, Homem-Aranha! – Gritou um dos menininhos, agitando os dois braços pra cima. Em seguida, o irmão começou a imitá-lo. Peter riu, voltando a pendurar-se entre os prédios.
Simultaneamente ao ato heroico do rapaz, Olivia e Eric travavam um intenso combate do outro lado da praça. A garota estava tentando retirar o comunicador dele, que lhe dava controle sobre os robôs, mas o rapaz não estava facilitando.
Movê-lo ou pifa-lo era impossível. Ela já tinha tentado arrancar o comunicador com energia cinética ou desligá-lo usando uma descarga elétrica, mas não tinha funcionado – era o mesmo princípio do campo de força dos robôs. Só restava a Olivia tentar tirá-lo usando a força.
-Pode tentar me parar o quanto quiser, os robôs ainda estão à solta. – Desdenhou Eric durante a briga.
-Sem você eles são só uma pilha de sucata – Liv discutiu. – E você sem eles é só um idiota brincando de esconde-esconde.
Ceifador aparecia e desaparecia o tempo todo graças ao teletransporte, desviando dos choques e também dos objetos que Olivia arremessava nele. Em compensação, Eric continuava disparando raios vermelhos com sua foice – que serviam para induzir coma, como Olivia constatou quando um dos raios infelizmente atingiu um civil. No momento, a luta dos dois se resumia a uma trocação rápida de golpes, de foice contra choques e impulsos motores.
-Sabe - Disse Eric defendendo uma caixa de correios que foi jogada contra ele. – Enquanto treinávamos no complexo dos Vingadores, eu até te achei interessante. – Ele girou a foice no ar, debochando. - Você é bonitinha, pena que é tão xereta.
-Olha – Olivia respondeu, bloqueando a lâmina com a mente. – Nada contra o tipo badboy com uma foice mágica no lugar do braço – Ela esticou a mão para um cabo de força próximo. – Mas eu não curto coroas.
Logo em seguida, ela converteu uma quantidade enorme de energia em impulso contra o rapaz, atingindo-o em cheio e jogando-o metros para trás. Aquilo pareceu que alguma forma ter pifado o sistema de sua lâmina, o que deveria ganhar aos dois Vingadores algum tempo de vantagem.
-Você vai demorar muito pra me ajudar, parceira? – A voz de Peter perguntou pelo comunicador da garota, em ironia. Ele parecia bem sobrecarregado.
-Três Power Rangers do mal são demais pra você? – Olivia brincou, observando o rapaz lutar a poucos metros dela.
-Não, estou de boa. – Parker fez pouco caso, e logo em seguida levou um soco de um dos robôs, que o acertou bem no rosto.
-Você não é nada sem mim. – A garota revirou os olhos e correu até o rapaz.
Olivia ajudou Peter a se levantar, e logo os dois ficaram frente a frente com os três gigantes de metal, que os encaravam esperando uma reação de batalha. Agora Ceifador observava a luta de longe, controlando seus homens de lata a partir de um dos prédios periféricos, já que seus equipamentos estavam danificados. A praça já estava bem mais vazia, pois grande parte da multidão havia evadido; porém, os robôs não desistiriam, pois Eric pretendia, como ele mesmo anunciou, silenciar os dois adolescentes a todo custo.
Peter estava pronto para demonstrar reação, quando começou a ouvir uma música ecoando das caixas de som usadas no evento de ano novo. Eram os acordes iniciais de Shoot To Thrill, do ACDC. Ele virou-se para Olivia, que tinha as duas mãos apontadas na direção do sistema de som. Ela estava criando energia sonora, fazendo aquela música ser tocada.
-O que é isso? – O rapaz questionou, com a testa franzida.
-Essa música me deixa mais confiante. – Olivia deu de ombros, usando seus poderes para aumentar o volume da frequência.
Os dois jovens começaram a correr a encontro dos três robôs, que se preparavam para o contra-ataque. De fato, eram três contra dois; e três muito mais fortes do que Olivia e Peter conseguiriam vencer na briga sozinhos. Porém, isso não os intimidou.
Homem-Aranha e Arion passaram a explorar seus pontos fortes para se ajudarem durante a batalha. Olivia usava energia cinética, elétrica e gravitacional; Peter usava teias, socos e reflexos rápidos, e assim eles combinavam seus poderes contra os gigantes de metal. Eles desviavam dos golpes, davam reforço, atrasavam e confundiam os robôs. Olivia conseguia flutuar para confundir os ataques, e Peter a ajudava agarrando-a com suas teias. Enquanto o Aranha se pendurava entre os telões, Arion continha e atrasava os movimentos dos homens de lata para que ele pudesse passar. Durante a queda de braço, um dos robôs atingiu o sistema de som com um murro, pifando-o.
-Estraga-prazeres. – Olivia ralhou ao ver sua música ser interrompida.
-Ok, precisamos de um plano. – Disse Peter no comunicador, planando pela praça. – Como vamos pará-los?
-Temos que usar o ácido, é o único jeito - Olivia respondeu enquanto corria. – Mas não fizemos o suficiente pra destruir três deles.
-Nem seria seguro ficar jogando essa coisa por aí, é muito corrosiva – Parker complementou, golpeando um dos adversários. – No que você pensou?
-Pra ser certeiro, acho que você deveria mirar na cabeça deles. Seguindo a lógica, essa é a parte mais importante da estrutura.
-Entendi. – Aranha confirmou, e tratou de colocar em prática o combinado logo em seguida.
Peter aproximou-se do primeiro robô, que já estava atrás dele há algum tempo. Calibrou bem a mira, pois o material era escasso demais para se desperdiçar, e perigoso demais para atingir o lugar errado.
-Karen, coloque o ácido no lança-teias. – Ordenou o garoto, falando com o sistema operacional de seu traje.
-É pra já. – Respondeu a voz feminina, e logo após houve um bipe de confirmação.
Parker atirou. Ao contrário de uma teia comum, que era lançada de modo contínuo, o ácido fora disparado rapidamente cinco ou seis vezes, atingindo em cheio o crânio de metal do primeiro adversário. Depois de uma mira precisa, restava esperar o resultado.
Peter pousou em cima de um carro estacionado para observar se a reação química que os dois planejaram iria funcionar. Em instantes, o metal que revestia a cabeça do robô começou a mudar ligeiramente, perdendo o formato original; ele ficou pastoso, dando lugar a um líquido espelhado logo em seguida, que escorreu pela armadura, expondo os sistemas que ficavam guardados no capacete.
-Funcionou! – Olivia comemorou através do comunicador, e Peter fez o mesmo. – Manda ver, Menino-Aranha!
Era a deixa. Parker tratou de ir atrás dos outros dois robôs restantes, disparando a mistura ácida em cima de suas cabeças. Eric, que os controlava de cima do prédio, ardeu de raiva. Nem ele sabia do ponto fraco que seu exército possuía – talvez ele devesse ter prestado mais atenção nas aulas de química.
Em poucos minutos, os três gigantes de aço estavam decapitados. No entanto, mesmo que seus circuitos estivessem desprotegidos, os robôs ainda estavam operantes. Seria preciso ter mais uma ideia brilhante para vencer aquela batalha.
-E agora? – Questionou Aranha.
-Sei lá, não sou a única inteligente aqui – Liv protestou, enquanto tentava se livrar de um dos robôs sem cabeça. Eles pareciam estar mais irritados agora que tinham sido expostos - talvez refletissem o que se passava na mente de Eric, que era quem os controlava.
Olivia estava prestes a ser alcançada por um deles, pois suas pernas humanas não venciam as passadas do gigante. Parker estava longe demais para ajudá-la a tempo com suas teias, então ela estava sozinha. Por um instinto que poderia ser inútil, Liv juntou qualquer energia que encontrou disponível em seu campo de sentidos para tentar dar um choque no robô. Teoricamente, ele ergueria um campo de força imediatamente e impediria a passagem da corrente elétrica; no entanto, isso não aconteceu. Para surpresa da garota, seus poderes penetraram a barreira defeituosa, e o robô parou de correr, atordoado.
-Tá, agora eu tenho uma ideia – Disse a garota entusiasmando-se de repente, fugindo do local. Ela encarou o relógio no telão principal. – O ácido deve ter danificado os circuitos da cabeça, impedindo que os robôs formem um campo de força contra os meus poderes. Eu só preciso dar uma descarga de energia forte o suficiente, e você só precisa imobilizá-los com uma teia ao mesmo tempo.
-As minhas teias não grudam nesse metal, lembra? – Aranha advertiu. - Não vai adiantar.
-Claro que vai, cabeção. Elas não irão grudar no metal, irão grudar por indução, porque teias de aranha são – Ela começou a explicar.
-Atraídas por eletricidade. – Os dois finalizaram ao mesmo tempo, quando Parker entendeu o conceito.
-Você é um gênio. – Ele elogiou.
-Eu sei. Agora os enrole por mais dois minutos e trinta e sete segundos, e mantenha-os juntos.
-Por quê?
-Escute o gênio, Parker. – Olivia declarou apenas, e em seguida desativou o seu comunicador.
O rapaz decidiu acatar e continuou atrasando os três adversários por mais alguns instantes, enquanto Olivia caminhava até o centro da praça. Ela parou no ponto principal do local, destruído por conta do combate e da multidão desesperada que por ali passara. Observou as grades entortadas, as pilhas de copos abandonados e os enfeites e chapéus pisoteados. Ela conduziu o olhar para frente, e então, fechou os olhos.
A contagem no relógio oficial da Times Square marcava vinte segundos para meia noite. Olivia McCall concentrou-se, tentando se preparar para o que pretendia fazer. Nunca havia usado seus poderes em tão grande escala, mas seria preciso, e ela sentia que conseguiria. Ela esticou os dois braços e abriu-os ao lado do corpo. A energia começou a fluir, tomando conta de cada terminação nervosa; a bola do ano novo começara a descer, no momento de maior consumo de energia da noite. Todos os telões espalhados pela extensa avenida começaram a piscar e falhar. Ao mesmo tempo, raios e correntes de energia começaram a circundar as mãos da garota, onde estavam suas luvas receptoras.
Peter fazia o possível para conter os três robôs pelo tempo necessário. Os três caminhavam para frente, na direção em que Olivia estava. No lugar perfeito.
Dez segundos para meia noite. O relógio fazia a contagem regressiva para o ano que se iniciaria, em grandes números amarelos no telão de LED. A bola luminosa estava cada vez mais próxima, e os sentidos de Olivia estavam cada vez mais e mais carregados. Ela respirou fundo, tentando relaxar; a energia fluía mais rápido, tomando conta dela, como se saísse do asfalto sob seus pés e a invadisse.
A bola estava caindo. Suas lâmpadas começaram a se apagar, e os telões auxiliares pifaram. Tudo ficou escuro, exceto os cristais azuis nas luvas de Olivia, que brilhavam como nunca. Ela suspirou.
Cinco, quatro, três, dois, um.
De repente, tudo se acendeu. Os fogos começaram a estourar e subir para o céu. Os telões brilharam com a maior intensidade possível, arrebentando todas as lâmpadas que os compunham. Olivia estava no centro da praça, e com um movimento rápido, impulsionou os dois braços para frente. Um feixe luminoso cortou Times Square, esbanjando faíscas e correntes, no instante em que a bola atingiu o fim da descida.
A garota emitiu um grito, tamanha carga de energia que a percorria naquele instante, fazendo seus pés ficarem suspensos do chão. Mas o som da sua voz nem se fez audível, devido ao choque que seus poderes causaram, bem na direção dos três gigantes de aço que caminhavam para ela. Todos os telões começaram a estourar, sobrecarregados, e após uma chuva de cores e faíscas, se apagaram; a bola do ano novo ficou escura, e os fogos cessaram sem que sua luz sequer chegasse a atingir o céu, sendo consumidos.
Olivia caiu no chão, de joelhos. Os três robôs gigantes paralisaram, com cada peça de suas armaduras sendo sacudida pela descarga de energia. Os circuitos internos pifaram, os reatores explodiram, e os três ficaram completamente inertes, esbanjando uma fumaça preta.
Peter precisou desviar de toda a ação, escondendo-se da imensa descarga elétrica. Quando viu a deixa, o rapaz disparou sua melhor e mais potente teia na direção dos três homens de lata rodeados pela eletricidade. Como previsto, a energia atraiu-as, amarrando os robôs juntos, sem deixar que reagissem. Circundados pelas resistentes cordas, os três desligaram, com as luzes em seus olhos mecânicos se apagando lentamente.
Parker retirou a máscara e correu até sua parceira, que estava apoiada sob os ombros no asfalto da praça, atordoada. Ela ergueu a cabeça lentamente, extremamente fraca, e viu o resultado de sua façanha.
Os três robôs gigantes cederam para trás, caindo em um baque surdo na calçada, derrotados. A fumaça que vinha deles já havia ultrapassado a altura dos prédios, e tornava tudo turvo.
-Você está bem? – Peter disse, preocupado, ajudando a garota a se levantar.
-Nós vencemos? – Disse ela com a voz fraca, e suas pernas falharam. Ela apoiou-se nos ombros do rapaz.
-Você venceu. – Parker sorriu para ela. – Foi incrível.
Olivia deu um suspiro aliviado, e sorriu lentamente. De suas duas narinas escorria uma grande quantidade de sangue vermelho vivo.
-Aqui. – Disse Peter, oferecendo a máscara para que ela estancasse o sangue. – Você vai ficar bem.
-Cadê o Eric?
-Quando os telões começaram a apagar, ele fugiu. Tentei impedir, mas era tarde demais. – O rapaz explicou. – Mas não se preocupe com isso agora.
Os dois encararam o cenário de batalha à frente deles. A Times Square tinha sido completamente destruída. A praça estava tomada por destroços, fumaça e artefatos abandonados da festa da virada. Não havia mais nenhum civil ali, pois todos que haviam sobrevivido – infelizmente não a totalidade, mas a maioria – tinha conseguido fugir. Só o que restava era a destruição material, e um grande trabalho para os bombeiros e policiais que já se aproximavam, a julgar pelo som crescente de sirenes. Porém, apesar de tudo, os robôs tinham sido derrotados, e Arion e Homem-Aranha haviam vencido.
-Eu chutei a bunda de todos eles, não foi? – A garota riu por trás da fuligem em seu rosto.
-É, foi. – O amigo riu. – Como está se sentindo?
-Com fome. – Liv declarou, fazendo-o estranhar. – Preciso repor calorias. Muitas calorias.
-Vem, vamos comer alguma coisa. – Disse Peter, e então os dois saíram caminhando lentamente pela avenida destruída, enquanto ela se apoiava nele.
_
-Boa noite, seja bem-vindo ao McDonald’s. Qual o seu pedido, senhor?
-Vamos ver...
O atendente sonolento do drive-thru tomou um susto enorme ao ver quem estava do outro lado da janelinha. A última coisa que um estagiário escalado para a nada movimentada noite de ano novo esperava era ter ninguém menos que o Homem-Aranha como cliente, pronto para fazer seu pedido.
-Dois Big-Macs com refrigerantes grandes e batatas-fritas, por favor. – Disse a voz simpática do rapaz por trás da máscara, dirigindo-se ao ainda estático atendente.
-Com molho extra. – Palpitou Olivia, que esperava sentada no meio-fio do outro lado da pista, com um pano úmido sobre o nariz.
-C-Claro... – Gaguejou o funcionário. – Mark, vê dois combos grandes pro... Homem-Aranha. – Anunciou ele, incrédulo, para o pessoal da cozinha.
-Muito obrigado, cara. – Disse Aranha, fazendo um joinha com a mão direita. - Tenha uma boa noite, feliz ano novo.
Depois de tirar uma selfie com o funcionário da lanchonete, o que pareceu ter feito a noite de trabalho dele mais feliz, Peter pegou os pedidos e ele e Olivia sentaram-se em cima do telhado do restaurante para comer. Liv precisava de uma grande dose de carboidratos sempre que exigia demais dos poderes, e aquele lanche veio mais do que a calhar para repor suas energias. O que não era diferente para Peter, é claro: combater o crime sempre o deixava com muita fome.
-A hora que você ficou lá no meio e fechou seus olhos, eu pensei: não! – Peter exclamou, colocando duas batatas-fritas na boca enquanto agitava os pés suspensos no telhado. Ele e Olivia riam em alto e bom som para a rua deserta. – Ver aquela cena dos telões apagando e dos robôs praticamente tremendo de medo foi épico.
-E aquela hora que você salvou os dois garotinhos e saiu balançando com eles? Foi incrível! – Liv apontou entusiasmada, com a boca cheia. – Eles nunca vão esquecer isso.
-Foi engraçado, porque eles estavam se divertindo enquanto eu estava lá, quase matando nós três. – Peter deu risada entre goles no refrigerante.
-Imagina quando eles voltarem pra escolinha e a professora perguntar o que eles fizeram nas férias. – Olivia sugeriu, e os dois voltaram a rir. – “Nós salvamos o mundo com o Homem-Aranha”.
-Eles vão acabar com as histórias de férias dos amiguinhos. – Peter riu-se, e então soltou um suspiro alto. Ele jogou um guardanapo dentro da sacolinha de seu lanche e então deitou para trás, descansando as costas no telhado. – Foi incrível.
-Ainda não acredito que fizemos mesmo tudo isso. – Liv disse dando a última mordida em seu hambúrguer. – Descobrimos tudo, ligamos os pontos e derrotamos os robôs, sozinhos.
-Eu queria ter sido mais rápido, sabe. – Parker explanou, com peso na voz. – Ter percebido antes que o Eric era um impostor. Eu teria poupado muita gente de muita coisa.
-Não pense assim. – Olivia advertiu-o. – Ninguém percebeu, a culpa não foi sua. Ele enganou a todos nós.
-É, mas a ideia de trazê-lo pra equipe foi minha.
-Você só estava tentando ajudar – A garota insistiu, puxando Peter pelo braço para que ele se sentasse, tentando tirar dele aquele sentimento bobo de culpa. – Não enxergar o que os outros têm de ruim não é um defeito. Significa que você ainda tem fé nas pessoas.
Peter sorriu ternamente para ela, que retribuiu.
-Sabe, esse lanche foi a melhor parte da minha noite. – Olivia declarou, fazendo o rapaz rir. – É sério, me sinto dez anos mais jovem.
-Me sinto dez quilos mais gordo – Peter respondeu, e Liv caiu na risada. – É sério, está vendo essa saliência no meu uniforme? – Ele apontou para seu traje, todo sujo e rasgado, perto da barriga.
-Uma ceia de Réveillon à altura, você não acha? – Ela arqueou uma sobrancelha.
-Com certeza. – O rapaz concordou, erguendo seu copo plástico para cima na intenção de fazer um brinde. Olivia fez o mesmo, levando seu copo de encontro ao dele, e os dois tomaram um gole em seguida.
Por trás de todos os prédios que compunham a maravilhosa vista do telhado do McDonald’s, alguns feixes luminosos repentinos chamaram a atenção dos dois adolescentes. Eram fogos de artifício bem ao longe, vindos da ilha de Manhattan, estourando e iluminando o céu. Comemoravam o novo ano que havia se iniciado naquela noite, algo que os dois haviam esquecido por um instante; mais trezentos e sessenta e cinco dias de um ciclo vigente cheio de surpresas.
-Feliz ano novo, Liv. – Peter desejou, observando os pontinhos brilhosos no horizonte.
-Feliz ano novo, Menino-Aranha. – Olivia disse de volta, com um sorriso tímido se formando.
Os dois rapazes se encontraram no centro do terraço para iniciar uma troca de golpes. Peter fez sinal para Olivia, indicando que ela fosse até lá em baixo para tentar deter os robôs que já começavam a aterrorizar a multidão, enquanto ele cuidava do resto.
-Duas crianças como vocês nunca vão conseguir parar o exército. – Ceifador falou com desprezo, girando a lâmina em seu braço rapidamente.
-Observe. – Foi a resposta do garoto, que defendeu o movimento.
A trocação entre os dois era rápida, e variava entre golpes, lançamentos de teia e tilintar de lâminas. Em um determinado momento, a foice de Eric começou a emitir um brilho avermelhado esquisito, que resultou num raio de mesma cor segundos depois, passando de raspão pela cabeça de Parker.
-Que droga é essa? – Aranha exclamou, confuso. Em seguida, arremessou uma bomba de teia da qual o adversário conseguiu desviar.
-Tem muita coisa que você não sabe, garoto. – Eric respondeu, dando mais um golpe violento com a foice. Desta vez, ele conseguiu abrir uma fissura no uniforme de Peter.
-Eu adoraria ficar aqui no alto conversando com você – Começou o rapaz, disparando teias rapidamente. – Mas eu tenho uma festa de ano novo pra salvar. – Ele grudou uma das teias no pé de Eric e puxou, fazendo com que ele caísse, e em seguida lançou uma no prédio vizinho, dando um leve aceno com a mão antes de pular.
Homem-Aranha estava prestes a escapar e ir até o solo ajudar os civis, mas Ceifador foi rápido o suficiente para saltar logo atrás do rapaz, agarrando sua perna enquanto ele se pendurava.
-Sai do meu pé, literalmente! – Peter indagou, dando um chute no rosto de Eric enquanto planava. Devido à carona indesejada, o garoto foi obrigado a pousar no prédio vizinho, mais baixo que o anterior. Os dois caíram no chão, rolando um pouco até ficarem de pé novamente.
-Olhe pra baixo, Parker – Eric gritou, indicando a multidão de pessoas desesperadas na praça. – Você causou isso, todos vocês causaram! – Ele disparou o raio avermelhado de função desconhecida mais uma vez, mas Peter defendeu-se com um reflexo rápido, impedindo a passagem puxando um latão de lixo à frente do próprio corpo. – Quanto mais você lutar, mais humilhante essa derrota vai ser pra você. Nunca se cansa de ser humilhado?
-Humilhado? – Peter zombou, subindo a capa de Eric com uma teia e enrolando-a no rosto do mesmo. Logo em seguida, ele arremessou a lata de lixo na direção do rapaz. – Não considero humilhação lutar pelo bem das pessoas.
-Então você está do lado errado – Eric enunciou, e logo em seguida sumiu. Ele reapareceu instantes depois logo atrás de Peter, dando um golpe surpresa que o derrubou para frente. – Deixe de ser ingênuo, Parker.
-Você é ingênuo – Aranha revidou, grudando uma teia na foice que vinha em sua direção, e prendendo-a na parede logo atrás de Eric, para que ele não conseguisse mover o braço. – Eu não consegui ver o que estava atrás de mim esse tempo todo. Mas você, amigo, não enxerga o que está bem na sua frente. – Peter disse olhando nos olhos do inimigo imobilizado, e o jogou contra a parede com um chute, grudando-o em uma teia que ali estava. Logo em seguida, o rapaz pulou do prédio na direção da Times Square.
Enquanto os dois ex-colegas discutiam lá em cima, Olivia encarregava-se de tentar conter o caos mais abaixo, onde tudo acontecia. Milhares de pessoas corriam para todos os lados, tentando escapar da praça pelas ruas laterais, tumultuadas de gente e de carros. Enquanto isso, os três robôs gigantes caminhavam a passos largos, agitando os braços de metal e dando tiros de canhão para assustá-los.
Era impossível transitar ou sequer sair do lugar naquele momento. Para tentar liberar um pouco a passagem e tirar as pessoas desesperadas dali, Olivia começou a usar seus poderes para mover as grades de contenção da praça, que bloqueavam a multidão. Com o movimento das mãos à distância, ela erguia e empurrava as barras de metal, enquanto fazia o possível para permanecer de pé apesar dos empurrões que levava o tempo todo.
Liv conseguiu liberar uma área relativamente boa, por onde as pessoas podiam sair e se salvar. Ela correu ao contrário do fluxo e subiu em uma das estátuas da praça, na tentativa de enxergar melhor. Os robôs estavam há metros dela, mas era possível tentar detê-los. Ela ergueu as duas mãos na altura da cabeça e apontou-as para os telões luminosos da Times Square, concentrada. Alguns segundos depois, dois deles começaram a falhar, e seus LEDs apagaram. Olivia tomou a eletricidade que os alimentava, e preparou-se para descarregá-la nos robôs. Ela disparou a energia, mas para sua surpresa, a mesma não os atingiu.
Campos de força luminosos apareceram imediatamente em volta dos três homens de lata, protegendo-os contra a descarga elétrica que Olivia disparou. Confusa, ela ouviu uma voz se aproximando dela por trás.
-Gostou do novo acessório? – Disse Eric, superando os gritos das pessoas que passavam. Ele havia se teletransportado do prédio onde ficara preso e surgira ali, num piscar de olhos. – Depois que descobrimos que a nova Vingadora júnior tinha poderes escondidos, tivemos que fazer alguns aprimoramentos para que os robôs pudessem lutar contra a Arion também.
-Você também tem esses aprimoramentos? Vai precisar – Olivia disse irritada, e avançou na direção do rapaz. Ela atirou uma corrente elétrica na direção dele, que se defendeu usando a lâmina para rebatê-la.
Peter havia acabado de chegar até o solo. O caos era tão grande que ele nem sabia por onde começar: eram pessoas desesperadas de todos os lados para salvar, três robôs enormes pra deter e sua parceira para ajudar. Porém, antes que pudesse bolar qualquer estratégia, o rapaz avistou uma cena que merecia sua prioridade. Dois garotinhos há alguns metros dele, usando jaquetas reforçadas e arquinhos que diziam “feliz ano novo”. Eram gêmeos, de no máximo quatro anos, que não conseguiam sair de dentro de uma das grades de contenção. As pessoas correndo trombavam na armação o tempo todo, e ela estava prestes a cair em cima deles. Além de, é claro, os robôs estarem se aproximando, a poucos minutos de pisotearem aquela área.
Peter foi até lá, pendurando-se nos postes de luz. Ele chegou perto dos garotinhos, que estavam desesperados chorando e chamando pela mãe, de quem aparentemente tinham se perdido.
-Oi, carinhas. Vou tirar vocês daqui, tá bom? – Disse ele, tentando acalmá-los no meio daquela confusão toda. Com um pouco de dificuldade, ele forçou duas barras da grade em direções opostas, abrindo ali uma passagem para os dois. – Venham.
Os gêmeos obedeceram, passando pelo buraco com dificuldade por conta dos casacos de frio. Eles secavam as lágrimas dos rostinhos vermelhos, e vasculhavam a multidão à procura da mãe. Um dos robôs vinha se aproximando cada vez mais da região em que estavam, obrigando Peter a tomar uma atitude. Ele amarrou os dois garotinhos juntos usando uma teia, e abaixou-se para falar com eles.
-Fechem os olhos, está bem? Vai ser como brincar de balanço. – Disse ele, segurando as duas crianças num dos braços. Peter disparou uma teia para cima e prendeu em um dos telões, içando a si mesmo e aos dois meninos poucos segundos antes do imenso pé de metal do robô atingir a região, amassando todas as grades.
Parker segurava os gêmeos o mais firme que conseguia, enquanto tentava sair da zona de conflito com um dos três robôs, que começou a persegui-lo. Ele deu a volta na praça, saindo por trás e caminhando nas costas de um dos homens de lata para desviar de um soco. Logo em seguida, ele pulou em um poste de luz levemente tombado, empurrando-o e fazendo com que caísse em cima do inimigo para tentar atrasá-lo.
-Pensando bem, talvez esteja mais pra brincar de montanha-russa. – Peter corrigiu, e ficou surpreso ao ouvir os dois garotinhos rirem. Eles estavam, surpreendentemente, se divertindo com o vento no rosto, a altura e os voos.
Aranha pensou ter conseguido escapar, porém, o robô reagiu rapidamente e segurou a teia em que ele se pendurava, arrebentando-a. Para evitar que as crianças caíssem, Peter disparou uma bomba de teia entre os dois postes seguintes, fazendo uma espécie de rede de salvamento. Já ele parou no asfalto da forma que conseguiu, esfolando-se um pouco.
-Homem-Aranha, ali! – Gritou um dos garotinhos, apontando para trás de Peter. O robô ainda não tinha desistido.
Parker deu um pulo rápido para escapar do soco que o homem de lata deu no chão, e agarrou os garotinhos novamente logo em seguida. Ele voltou a se balançar, tentando encontrar um local seguro para deixar os gêmeos.
-Mamãe! – Disse o outro deles, apontando para baixo. Na calçada da quadra da frente, uma mulher desesperada estava parada no meio da correria, olhando fixamente para eles, preocupada.
-Vou levar vocês até a mamãe, ok? – Peter disse, com os sentidos sobrecarregados tentando conciliar a luta com o robô, a estratégia pra descer e o discurso para tranquilizar os garotinhos. – Mas vocês vão ter que me ajudar. Não consigo fazer tudo sozinho, então vocês dois tem que ser bem corajosos, entenderam?
Peter continuou a se balançar, tentando encontrar a oportunidade para pousar em segurança. Ele começou a empurrar as grades de contenção na direção dos gigantes, tentando atrasá-los. Ao mesmo tempo em que ele lutava, os dois garotinhos começaram a imitá-lo, fingindo que disparavam teias com as próprias mãos, enquanto faziam o barulho do lança-teias com a boca e franziam as testas com caras bravas.
Conseguindo uma vantagem, Peter preparou-se para descer na esquina onde a mãe dos gêmeos estava. Ele desacelerou, parando no meio do asfalto, e a mulher veio correndo na direção deles. O rapaz entregou os dois garotinhos no colo dela, desvencilhando-os da teia que ele tinha usado para grudá-los juntos, enquanto a mãe agradecia repetidas vezes.
-Vocês foram muito corajosos – Disse ele, acelerado. – Obrigado pela ajuda. Se cuidem! – Ele sorriu por trás da máscara, e logo em seguida saiu correndo para continuar o combate.
-Acaba com eles, Homem-Aranha! – Gritou um dos menininhos, agitando os dois braços pra cima. Em seguida, o irmão começou a imitá-lo. Peter riu, voltando a pendurar-se entre os prédios.
Simultaneamente ao ato heroico do rapaz, Olivia e Eric travavam um intenso combate do outro lado da praça. A garota estava tentando retirar o comunicador dele, que lhe dava controle sobre os robôs, mas o rapaz não estava facilitando.
Movê-lo ou pifa-lo era impossível. Ela já tinha tentado arrancar o comunicador com energia cinética ou desligá-lo usando uma descarga elétrica, mas não tinha funcionado – era o mesmo princípio do campo de força dos robôs. Só restava a Olivia tentar tirá-lo usando a força.
-Pode tentar me parar o quanto quiser, os robôs ainda estão à solta. – Desdenhou Eric durante a briga.
-Sem você eles são só uma pilha de sucata – Liv discutiu. – E você sem eles é só um idiota brincando de esconde-esconde.
Ceifador aparecia e desaparecia o tempo todo graças ao teletransporte, desviando dos choques e também dos objetos que Olivia arremessava nele. Em compensação, Eric continuava disparando raios vermelhos com sua foice – que serviam para induzir coma, como Olivia constatou quando um dos raios infelizmente atingiu um civil. No momento, a luta dos dois se resumia a uma trocação rápida de golpes, de foice contra choques e impulsos motores.
-Sabe - Disse Eric defendendo uma caixa de correios que foi jogada contra ele. – Enquanto treinávamos no complexo dos Vingadores, eu até te achei interessante. – Ele girou a foice no ar, debochando. - Você é bonitinha, pena que é tão xereta.
-Olha – Olivia respondeu, bloqueando a lâmina com a mente. – Nada contra o tipo badboy com uma foice mágica no lugar do braço – Ela esticou a mão para um cabo de força próximo. – Mas eu não curto coroas.
Logo em seguida, ela converteu uma quantidade enorme de energia em impulso contra o rapaz, atingindo-o em cheio e jogando-o metros para trás. Aquilo pareceu que alguma forma ter pifado o sistema de sua lâmina, o que deveria ganhar aos dois Vingadores algum tempo de vantagem.
-Você vai demorar muito pra me ajudar, parceira? – A voz de Peter perguntou pelo comunicador da garota, em ironia. Ele parecia bem sobrecarregado.
-Três Power Rangers do mal são demais pra você? – Olivia brincou, observando o rapaz lutar a poucos metros dela.
-Não, estou de boa. – Parker fez pouco caso, e logo em seguida levou um soco de um dos robôs, que o acertou bem no rosto.
-Você não é nada sem mim. – A garota revirou os olhos e correu até o rapaz.
Olivia ajudou Peter a se levantar, e logo os dois ficaram frente a frente com os três gigantes de metal, que os encaravam esperando uma reação de batalha. Agora Ceifador observava a luta de longe, controlando seus homens de lata a partir de um dos prédios periféricos, já que seus equipamentos estavam danificados. A praça já estava bem mais vazia, pois grande parte da multidão havia evadido; porém, os robôs não desistiriam, pois Eric pretendia, como ele mesmo anunciou, silenciar os dois adolescentes a todo custo.
Peter estava pronto para demonstrar reação, quando começou a ouvir uma música ecoando das caixas de som usadas no evento de ano novo. Eram os acordes iniciais de Shoot To Thrill, do ACDC. Ele virou-se para Olivia, que tinha as duas mãos apontadas na direção do sistema de som. Ela estava criando energia sonora, fazendo aquela música ser tocada.
-O que é isso? – O rapaz questionou, com a testa franzida.
-Essa música me deixa mais confiante. – Olivia deu de ombros, usando seus poderes para aumentar o volume da frequência.
Os dois jovens começaram a correr a encontro dos três robôs, que se preparavam para o contra-ataque. De fato, eram três contra dois; e três muito mais fortes do que Olivia e Peter conseguiriam vencer na briga sozinhos. Porém, isso não os intimidou.
Homem-Aranha e Arion passaram a explorar seus pontos fortes para se ajudarem durante a batalha. Olivia usava energia cinética, elétrica e gravitacional; Peter usava teias, socos e reflexos rápidos, e assim eles combinavam seus poderes contra os gigantes de metal. Eles desviavam dos golpes, davam reforço, atrasavam e confundiam os robôs. Olivia conseguia flutuar para confundir os ataques, e Peter a ajudava agarrando-a com suas teias. Enquanto o Aranha se pendurava entre os telões, Arion continha e atrasava os movimentos dos homens de lata para que ele pudesse passar. Durante a queda de braço, um dos robôs atingiu o sistema de som com um murro, pifando-o.
-Estraga-prazeres. – Olivia ralhou ao ver sua música ser interrompida.
-Ok, precisamos de um plano. – Disse Peter no comunicador, planando pela praça. – Como vamos pará-los?
-Temos que usar o ácido, é o único jeito - Olivia respondeu enquanto corria. – Mas não fizemos o suficiente pra destruir três deles.
-Nem seria seguro ficar jogando essa coisa por aí, é muito corrosiva – Parker complementou, golpeando um dos adversários. – No que você pensou?
-Pra ser certeiro, acho que você deveria mirar na cabeça deles. Seguindo a lógica, essa é a parte mais importante da estrutura.
-Entendi. – Aranha confirmou, e tratou de colocar em prática o combinado logo em seguida.
Peter aproximou-se do primeiro robô, que já estava atrás dele há algum tempo. Calibrou bem a mira, pois o material era escasso demais para se desperdiçar, e perigoso demais para atingir o lugar errado.
-Karen, coloque o ácido no lança-teias. – Ordenou o garoto, falando com o sistema operacional de seu traje.
-É pra já. – Respondeu a voz feminina, e logo após houve um bipe de confirmação.
Parker atirou. Ao contrário de uma teia comum, que era lançada de modo contínuo, o ácido fora disparado rapidamente cinco ou seis vezes, atingindo em cheio o crânio de metal do primeiro adversário. Depois de uma mira precisa, restava esperar o resultado.
Peter pousou em cima de um carro estacionado para observar se a reação química que os dois planejaram iria funcionar. Em instantes, o metal que revestia a cabeça do robô começou a mudar ligeiramente, perdendo o formato original; ele ficou pastoso, dando lugar a um líquido espelhado logo em seguida, que escorreu pela armadura, expondo os sistemas que ficavam guardados no capacete.
-Funcionou! – Olivia comemorou através do comunicador, e Peter fez o mesmo. – Manda ver, Menino-Aranha!
Era a deixa. Parker tratou de ir atrás dos outros dois robôs restantes, disparando a mistura ácida em cima de suas cabeças. Eric, que os controlava de cima do prédio, ardeu de raiva. Nem ele sabia do ponto fraco que seu exército possuía – talvez ele devesse ter prestado mais atenção nas aulas de química.
Em poucos minutos, os três gigantes de aço estavam decapitados. No entanto, mesmo que seus circuitos estivessem desprotegidos, os robôs ainda estavam operantes. Seria preciso ter mais uma ideia brilhante para vencer aquela batalha.
-E agora? – Questionou Aranha.
-Sei lá, não sou a única inteligente aqui – Liv protestou, enquanto tentava se livrar de um dos robôs sem cabeça. Eles pareciam estar mais irritados agora que tinham sido expostos - talvez refletissem o que se passava na mente de Eric, que era quem os controlava.
Olivia estava prestes a ser alcançada por um deles, pois suas pernas humanas não venciam as passadas do gigante. Parker estava longe demais para ajudá-la a tempo com suas teias, então ela estava sozinha. Por um instinto que poderia ser inútil, Liv juntou qualquer energia que encontrou disponível em seu campo de sentidos para tentar dar um choque no robô. Teoricamente, ele ergueria um campo de força imediatamente e impediria a passagem da corrente elétrica; no entanto, isso não aconteceu. Para surpresa da garota, seus poderes penetraram a barreira defeituosa, e o robô parou de correr, atordoado.
-Tá, agora eu tenho uma ideia – Disse a garota entusiasmando-se de repente, fugindo do local. Ela encarou o relógio no telão principal. – O ácido deve ter danificado os circuitos da cabeça, impedindo que os robôs formem um campo de força contra os meus poderes. Eu só preciso dar uma descarga de energia forte o suficiente, e você só precisa imobilizá-los com uma teia ao mesmo tempo.
-As minhas teias não grudam nesse metal, lembra? – Aranha advertiu. - Não vai adiantar.
-Claro que vai, cabeção. Elas não irão grudar no metal, irão grudar por indução, porque teias de aranha são – Ela começou a explicar.
-Atraídas por eletricidade. – Os dois finalizaram ao mesmo tempo, quando Parker entendeu o conceito.
-Você é um gênio. – Ele elogiou.
-Eu sei. Agora os enrole por mais dois minutos e trinta e sete segundos, e mantenha-os juntos.
-Por quê?
-Escute o gênio, Parker. – Olivia declarou apenas, e em seguida desativou o seu comunicador.
O rapaz decidiu acatar e continuou atrasando os três adversários por mais alguns instantes, enquanto Olivia caminhava até o centro da praça. Ela parou no ponto principal do local, destruído por conta do combate e da multidão desesperada que por ali passara. Observou as grades entortadas, as pilhas de copos abandonados e os enfeites e chapéus pisoteados. Ela conduziu o olhar para frente, e então, fechou os olhos.
A contagem no relógio oficial da Times Square marcava vinte segundos para meia noite. Olivia McCall concentrou-se, tentando se preparar para o que pretendia fazer. Nunca havia usado seus poderes em tão grande escala, mas seria preciso, e ela sentia que conseguiria. Ela esticou os dois braços e abriu-os ao lado do corpo. A energia começou a fluir, tomando conta de cada terminação nervosa; a bola do ano novo começara a descer, no momento de maior consumo de energia da noite. Todos os telões espalhados pela extensa avenida começaram a piscar e falhar. Ao mesmo tempo, raios e correntes de energia começaram a circundar as mãos da garota, onde estavam suas luvas receptoras.
Peter fazia o possível para conter os três robôs pelo tempo necessário. Os três caminhavam para frente, na direção em que Olivia estava. No lugar perfeito.
Dez segundos para meia noite. O relógio fazia a contagem regressiva para o ano que se iniciaria, em grandes números amarelos no telão de LED. A bola luminosa estava cada vez mais próxima, e os sentidos de Olivia estavam cada vez mais e mais carregados. Ela respirou fundo, tentando relaxar; a energia fluía mais rápido, tomando conta dela, como se saísse do asfalto sob seus pés e a invadisse.
A bola estava caindo. Suas lâmpadas começaram a se apagar, e os telões auxiliares pifaram. Tudo ficou escuro, exceto os cristais azuis nas luvas de Olivia, que brilhavam como nunca. Ela suspirou.
Cinco, quatro, três, dois, um.
De repente, tudo se acendeu. Os fogos começaram a estourar e subir para o céu. Os telões brilharam com a maior intensidade possível, arrebentando todas as lâmpadas que os compunham. Olivia estava no centro da praça, e com um movimento rápido, impulsionou os dois braços para frente. Um feixe luminoso cortou Times Square, esbanjando faíscas e correntes, no instante em que a bola atingiu o fim da descida.
A garota emitiu um grito, tamanha carga de energia que a percorria naquele instante, fazendo seus pés ficarem suspensos do chão. Mas o som da sua voz nem se fez audível, devido ao choque que seus poderes causaram, bem na direção dos três gigantes de aço que caminhavam para ela. Todos os telões começaram a estourar, sobrecarregados, e após uma chuva de cores e faíscas, se apagaram; a bola do ano novo ficou escura, e os fogos cessaram sem que sua luz sequer chegasse a atingir o céu, sendo consumidos.
Olivia caiu no chão, de joelhos. Os três robôs gigantes paralisaram, com cada peça de suas armaduras sendo sacudida pela descarga de energia. Os circuitos internos pifaram, os reatores explodiram, e os três ficaram completamente inertes, esbanjando uma fumaça preta.
Peter precisou desviar de toda a ação, escondendo-se da imensa descarga elétrica. Quando viu a deixa, o rapaz disparou sua melhor e mais potente teia na direção dos três homens de lata rodeados pela eletricidade. Como previsto, a energia atraiu-as, amarrando os robôs juntos, sem deixar que reagissem. Circundados pelas resistentes cordas, os três desligaram, com as luzes em seus olhos mecânicos se apagando lentamente.
Parker retirou a máscara e correu até sua parceira, que estava apoiada sob os ombros no asfalto da praça, atordoada. Ela ergueu a cabeça lentamente, extremamente fraca, e viu o resultado de sua façanha.
Os três robôs gigantes cederam para trás, caindo em um baque surdo na calçada, derrotados. A fumaça que vinha deles já havia ultrapassado a altura dos prédios, e tornava tudo turvo.
-Você está bem? – Peter disse, preocupado, ajudando a garota a se levantar.
-Nós vencemos? – Disse ela com a voz fraca, e suas pernas falharam. Ela apoiou-se nos ombros do rapaz.
-Você venceu. – Parker sorriu para ela. – Foi incrível.
Olivia deu um suspiro aliviado, e sorriu lentamente. De suas duas narinas escorria uma grande quantidade de sangue vermelho vivo.
-Aqui. – Disse Peter, oferecendo a máscara para que ela estancasse o sangue. – Você vai ficar bem.
-Cadê o Eric?
-Quando os telões começaram a apagar, ele fugiu. Tentei impedir, mas era tarde demais. – O rapaz explicou. – Mas não se preocupe com isso agora.
Os dois encararam o cenário de batalha à frente deles. A Times Square tinha sido completamente destruída. A praça estava tomada por destroços, fumaça e artefatos abandonados da festa da virada. Não havia mais nenhum civil ali, pois todos que haviam sobrevivido – infelizmente não a totalidade, mas a maioria – tinha conseguido fugir. Só o que restava era a destruição material, e um grande trabalho para os bombeiros e policiais que já se aproximavam, a julgar pelo som crescente de sirenes. Porém, apesar de tudo, os robôs tinham sido derrotados, e Arion e Homem-Aranha haviam vencido.
-Eu chutei a bunda de todos eles, não foi? – A garota riu por trás da fuligem em seu rosto.
-É, foi. – O amigo riu. – Como está se sentindo?
-Com fome. – Liv declarou, fazendo-o estranhar. – Preciso repor calorias. Muitas calorias.
-Vem, vamos comer alguma coisa. – Disse Peter, e então os dois saíram caminhando lentamente pela avenida destruída, enquanto ela se apoiava nele.
-Boa noite, seja bem-vindo ao McDonald’s. Qual o seu pedido, senhor?
-Vamos ver...
O atendente sonolento do drive-thru tomou um susto enorme ao ver quem estava do outro lado da janelinha. A última coisa que um estagiário escalado para a nada movimentada noite de ano novo esperava era ter ninguém menos que o Homem-Aranha como cliente, pronto para fazer seu pedido.
-Dois Big-Macs com refrigerantes grandes e batatas-fritas, por favor. – Disse a voz simpática do rapaz por trás da máscara, dirigindo-se ao ainda estático atendente.
-Com molho extra. – Palpitou Olivia, que esperava sentada no meio-fio do outro lado da pista, com um pano úmido sobre o nariz.
-C-Claro... – Gaguejou o funcionário. – Mark, vê dois combos grandes pro... Homem-Aranha. – Anunciou ele, incrédulo, para o pessoal da cozinha.
-Muito obrigado, cara. – Disse Aranha, fazendo um joinha com a mão direita. - Tenha uma boa noite, feliz ano novo.
Depois de tirar uma selfie com o funcionário da lanchonete, o que pareceu ter feito a noite de trabalho dele mais feliz, Peter pegou os pedidos e ele e Olivia sentaram-se em cima do telhado do restaurante para comer. Liv precisava de uma grande dose de carboidratos sempre que exigia demais dos poderes, e aquele lanche veio mais do que a calhar para repor suas energias. O que não era diferente para Peter, é claro: combater o crime sempre o deixava com muita fome.
-A hora que você ficou lá no meio e fechou seus olhos, eu pensei: não! – Peter exclamou, colocando duas batatas-fritas na boca enquanto agitava os pés suspensos no telhado. Ele e Olivia riam em alto e bom som para a rua deserta. – Ver aquela cena dos telões apagando e dos robôs praticamente tremendo de medo foi épico.
-E aquela hora que você salvou os dois garotinhos e saiu balançando com eles? Foi incrível! – Liv apontou entusiasmada, com a boca cheia. – Eles nunca vão esquecer isso.
-Foi engraçado, porque eles estavam se divertindo enquanto eu estava lá, quase matando nós três. – Peter deu risada entre goles no refrigerante.
-Imagina quando eles voltarem pra escolinha e a professora perguntar o que eles fizeram nas férias. – Olivia sugeriu, e os dois voltaram a rir. – “Nós salvamos o mundo com o Homem-Aranha”.
-Eles vão acabar com as histórias de férias dos amiguinhos. – Peter riu-se, e então soltou um suspiro alto. Ele jogou um guardanapo dentro da sacolinha de seu lanche e então deitou para trás, descansando as costas no telhado. – Foi incrível.
-Ainda não acredito que fizemos mesmo tudo isso. – Liv disse dando a última mordida em seu hambúrguer. – Descobrimos tudo, ligamos os pontos e derrotamos os robôs, sozinhos.
-Eu queria ter sido mais rápido, sabe. – Parker explanou, com peso na voz. – Ter percebido antes que o Eric era um impostor. Eu teria poupado muita gente de muita coisa.
-Não pense assim. – Olivia advertiu-o. – Ninguém percebeu, a culpa não foi sua. Ele enganou a todos nós.
-É, mas a ideia de trazê-lo pra equipe foi minha.
-Você só estava tentando ajudar – A garota insistiu, puxando Peter pelo braço para que ele se sentasse, tentando tirar dele aquele sentimento bobo de culpa. – Não enxergar o que os outros têm de ruim não é um defeito. Significa que você ainda tem fé nas pessoas.
Peter sorriu ternamente para ela, que retribuiu.
-Sabe, esse lanche foi a melhor parte da minha noite. – Olivia declarou, fazendo o rapaz rir. – É sério, me sinto dez anos mais jovem.
-Me sinto dez quilos mais gordo – Peter respondeu, e Liv caiu na risada. – É sério, está vendo essa saliência no meu uniforme? – Ele apontou para seu traje, todo sujo e rasgado, perto da barriga.
-Uma ceia de Réveillon à altura, você não acha? – Ela arqueou uma sobrancelha.
-Com certeza. – O rapaz concordou, erguendo seu copo plástico para cima na intenção de fazer um brinde. Olivia fez o mesmo, levando seu copo de encontro ao dele, e os dois tomaram um gole em seguida.
Por trás de todos os prédios que compunham a maravilhosa vista do telhado do McDonald’s, alguns feixes luminosos repentinos chamaram a atenção dos dois adolescentes. Eram fogos de artifício bem ao longe, vindos da ilha de Manhattan, estourando e iluminando o céu. Comemoravam o novo ano que havia se iniciado naquela noite, algo que os dois haviam esquecido por um instante; mais trezentos e sessenta e cinco dias de um ciclo vigente cheio de surpresas.
-Feliz ano novo, Liv. – Peter desejou, observando os pontinhos brilhosos no horizonte.
-Feliz ano novo, Menino-Aranha. – Olivia disse de volta, com um sorriso tímido se formando.
Capítulo 14
“A máquina da morte que aterrorizou o mundo em ataque a Cambridge no último mês voltou a causar destruição durante a tradicional festa de ano novo de Nova York.”
A comemoração de Réveillon dos nova-iorquinos foi brutalmente interrompida e transformada em tragédia na noite do último dia 31. Cerca de uma hora antes da virada do ano, três robôs de tecnologia militar avançaram sobre milhares de pessoas reunidas na Times Square para assistir à derrubada anual da bola. O desastre inesperado gerou 326 mortes e centenas de feridos, que encontraram dificuldade em abandonar o local por conta da multidão.
A tecnologia bélica utilizada no ataque foi a mesma apresentada no desastre da ponte Harvard, em Cambridge, onde um robô do mesmo tipo atacou carros e pedestres há um mês. Na época, a polícia federal americana conduziu as investigações, que resultaram na prisão de Christer Bergström, suposto autor do ato criminoso. O terrorista também foi responsabilizado pela invasão à base dos Vingadores, que ocorreu algumas semanas antes – o que gerou rumores de que toda a ação está ligada a um movimento anti-heróis.
Devido aos recentes fatos, que demonstraram a permanência do perigo, o FBI foi internacionalmente cobrado pela incompatibilidade de suas investigações, já que seu resultado ineficiente gerou falsa segurança mundial. A equipe de inteligência encontra-se com a reputação ameaçada, já que o autor dos atentados criminosos, supostamente, continua à solta. O Conselho de Segurança da ONU convocou uma reunião de emergência para determinar as medidas a serem tomadas diante da calamidade.
Após a falha da polícia, o responsável por deter os robôs gigantes e evitar maiores estragos foi o herói Homem-Aranha. O mascarado integra a equipe dos Vingadores, que vem dividindo a opinião pública quanto à sua eficácia na segurança mundial, especialmente nos últimos meses. O evento gerou discussões no âmbito social e político: alguns admiraram a reação tomada, enquanto outros afirmam que os atentados fazem parte de uma tentativa de acabar com a equipe dos heróis.
No meio de todo o heroísmo, Aranha parece ter contado com o auxílio de uma parceira misteriosa no combate contra as máquinas de guerra. Segundo testemunhas, uma garota com habilidades sobrenaturais participou da batalha ao lado do Vingador, lutando e salvando civis durante o desastre. Milhares de rumores se espalharam pelas redes sociais, no entanto sua identidade permanece anônima, e é uma das grandes incógnitas deixadas pelo trágico início de ano em Nova York.
Luke Evans: Ainda bem que o Homem-Aranha conseguiu proteger a população, coisa que o governo não fez!
Faith Moore: Não venha tentar colocar os Vingadores como os heróis da história agora. Os rumores estão dizendo que a culpa por trás disso tudo é deles.
Caroline Stevens: Concordo! Além do mais, os Vingadores já lutaram contra esse cara uma vez e falharam. O Aranha só deu sorte.
Josh Smith: Eu estava no ataque da Times Square e presenciei o ato heroico do Homem-Aranha e da sua parceira para salvar a multidão desesperada. Se vocês vissem o que eu vi, jamais criticariam os Vingadores assim. Eu devo minha vida a eles.
Anne O’Connor: Os Vingadores tem uma freelancer, aparentemente. Quando é que essa garota vai aparecer e explicar pra gente quem ela é?! Já quero abraçá-la, que heroína!
Thomas Walker: Parem de aplaudir essa garota misteriosa que ajudou o Homem-Aranha. Ela é mais uma pro time de pessoas com habilidades sobrenaturais que trazem perigo pra sociedade, e o governo não tem controle nenhum disso!
Rick Green: Se o objetivo desse cara com os atentados é acabar com os Vingadores, a solução é simples: acabem com os Vingadores! Assim a população não vai mais precisar sofrer pelas guerras deles.
Diana Black: E quem sabe o que esse cara poderá fazer com todo o poder bélico dele depois que estivermos sem os Vingadores? Se nem eles que são deuses e supersoldados conseguem derrotar as armas dele, você acha que nossas forças armadas conseguiriam?
O recepcionista do hotel rolava exaustivamente pelas notícias em seu computador, entediado. Imagens de helicóptero do ataque que acabara de acontecer em Nova York se exibiam na TV, durante o noticiário da madrugada. O som do aparelho era abafado pela máquina de café, que estava triturando grãos para preparar o café da manhã do hotel. Perturbando a calmaria, um casal de jovens hóspedes estranhamente sujos e machucados entrou pela recepção, tilintando o sino da porta e chamando a atenção do balconista. Os dois estavam encapuzados, escondendo seus ferimentos, e entraram no elevador como se nada tivesse acontecido, deixando pegadas de terra e pó pelo saguão.
Olivia e Peter estavam exaustos após toda a ação que haviam presenciado há algumas horas. Após escapar dos olhos curiosos do recepcionista, tudo o que queriam era uma bela noite de descanso – mesmo que a noite em si já estivesse quase acabando.
Quando o elevador já estava quase no andar certo, Liv sentiu seu celular vibrar no bolso. Ela agarrou o aparelho para olhar, e viu que a notificação atestava uma nova mensagem de ninguém menos que Tony Stark.
O texto dizia apenas isso. Engraçado, pois Liv estava mesmo pensando no tamanho da bronca que levaria do pai assim que ele ligasse a TV.
O elevador abriu as portas para o andar do quarto, e Peter estava prestes a sair. Porém, Olivia parou-o com o braço.
-Andar errado. Temos que ir até o terraço. – Disse a garota com a voz séria.
Parker olhou para ela, confuso. Liv apenas mostrou o celular a ele, bem na hora em que o som de um helicóptero pôde ser ouvido ao longe.
-Temos que ir. – Ela disse, com um meio sorriso amarelo.
No telhado do prédio do hotel, um helicóptero preto já esperava pelos dois adolescentes, pronto para levá-los de volta à sede dos Vingadores. Alguns homens uniformizados encarregaram-se de pegar suas malas, enquanto eles subiam a bordo, com destino a Massachusetts. Ou à morte deles.
O transporte chegou a Cambridge quando já era dia, por volta da sete da manhã, e os deixou no hangar da base. Lá, Peter e Liv foram recepcionados por Happy Hogan, que os encarava de um jeito nada receptivo. A coisa devia estar feia.
Happy escoltou Parker e McCall até o prédio administrativo, e os levou em frente à porta de vidro do escritório de Tony. A sala estava lotada de assessores e chefes disso e daquilo, falando todos ao mesmo tempo, num caos total. Todos tentavam se posicionar a respeito do ocorrido na noite anterior, pensando em como proceder diante do mundo. No centro da sala, Stark andava de um lado para o outro, tentando atender inúmeras ligações no meio de todo o barulho.
Happy entrou na sala trazendo os dois jovens consigo. Imediatamente, todos se calaram e olharam para eles. Tony desligou o celular e dirigiu o olhar direto para os dois, fulminando-os.
-Podem me dar licença, senhores? – Disse Stark, com os olhos fixos. Todos os outros homens, inclusive Happy, levantaram-se e saíram do local, levando consigo o barulho e os problemas.
Restaram apenas Olivia e Peter ali, parados. Tony ficou alguns segundos em silêncio encarando os jovens atônitos, antes de começar a falar.
-Bom dia, crianças. Como vai a manhã de vocês? – Disse ele, com um sorriso estranho. Nenhum dos dois se atreveu a responder. – Caso queiram saber, a minha está um desastre – Tony continuou, agora sem sorrir. – O mundo inteiro está caindo em cima de mim agora, e só falta o Papa me ligar perguntando o que foi toda essa bagunça. Que vocês dois aprontaram.
Stark praticamente jogou o celular na mesa de vidro, batendo-o forte.
-Sabem, eu devia ter desconfiado. – Continuou, num tom bravo. – Essa amizade repentina de vocês, essa viagem... Eu sabia que estavam aprontando alguma coisa, agora isso? – Ele esbravejou, apontando para a TV que exibia imagens dos robôs na Times Square. – Eu realmente não esperava que vocês fossem capazes de me desobedecer a esse nível.
Peter e Olivia encaravam o homem, acanhados no meio da sala, sem dizer nada.
-E eu fui burro o suficiente para dar um voto de confiança a vocês. “Eles só querem visitar a família”, eu pensei. Eu estava tranquilo com isso, e aí, ontem à noite eu decidi abrir o Facebook, só pra ver aquelas mensagens prontas e ridículas de ano novo. Até que eu vi que sua mãe tinha postado uma foto, desejando bom Réveillon um dia antes da data. – Ele dirigiu-se a Liv. - Eu achei estranho, mas depois entendi: é porque ela está em Sydney! – Stark exclamou, furioso. - Há vinte e quatro horas de diferença daqui. E minha filha mentiu pra mim.
-Pai...
-Não tente. – Tony a interrompeu antes que pudesse tentar explicar qualquer coisa. – Vocês acharam que eu jamais iria descobrir, não é? Que eu não veria suas pesquisas privadas no sistema, que eu não perceberia que vocês desativaram os rastreadores de vocês.
Os dois jovens olharam um para o outro, estupefatos.
-Que surpresa, não é? – Tony arqueou as sobrancelhas, irônico. – Pois é, eu também sei ser esperto. Queria ver até onde eram capazes de ir. Agora digam, qual de vocês dois foi o inteligente que roubou a senha dos meus rastreadores?
-Fui eu. – Olivia e Peter responderam ao mesmo tempo. Nenhum dos dois tentou desmentir.
Stark cerrou os olhos, encarando cada um deles.
-Isso tem cheiro de Stark. – Ele constatou, parando na frente de Liv. Ela não negou. – Francamente, eu não pensei que chegaria tão longe, Olivia. Mentiu sobre sua mãe, fugiu da sua escolta, roubou minha senha e hackeou o rastreador secreto que coloquei em vocês. – Tony estava furioso.
-Exatamente, você colocou um rastreador secreto na gente. – A garota resolveu responder, indignada. – Você não disse que confiava em nós dois? Isso não me parece atitude de alguém que confia.
-Não me responda, mocinha! – Tony levantou a voz imediatamente. – Eu fiz isso para proteger vocês, o que, caso não tenham notado, era minha única intenção esse tempo todo. – Ele respirou fundo. - Se você não fosse tão teimosa e aprendesse a ouvir, entenderia isso e pararia de tentar me atravessar o tempo inteiro.
-Eu não estava tentando te atravessar, eu estava tentando fazer a coisa certa. – Olivia retrucou com uma expressão brava. – Você não quis enxergar, nós tivemos que tomar uma atitude. – Ela olhou para Peter.
-Fazer a coisa certa arriscando suas vidas? Jogando um ácido corrosivo por aí? Colocando uma cidade inteira em perigo? – Stark esbravejou.
-Nós salvamos as pessoas. – Ela continuou.
-Vocês deram sorte, isso sim. – Ele rebateu. - Muita sorte. Podiam ter virado parte daquele asfalto sem nem perceber o que os atingiu. Vocês não fazem ideia do quanto isso poderia ter dado errado porque decidiram fazer as coisas escondido. – Tony pressionou a garota, que permaneceu em silêncio e encarou Peter. – E pare de olhar pra ele, porque eu sei que esse plano mirabolante e maligno de fugir e mentir pra mim veio dessa sua cabecinha superdesenvolvida e diabólica. – O homem advertiu, apontando para ela.
-Na verdade, Sr. Stark, a ideia foi minha. – Peter se pronunciou timidamente, fazendo Tony olhar para ele. – Fui eu que comecei a investigar o Ervilha e os robôs por baixo dos panos depois que você falou que deveríamos esquecer. Eu descobri umas coisas, e então fui atrás da Olivia pra pedir a ajuda dela. – Admitiu.
-Bom, Parker, dado o seu péssimo histórico em seguir as minhas ordens, eu não me surpreendo. – Stark constatou, sério. Peter permaneceu em silêncio. – Aliás, essa nem é a primeira razão pela qual estou bravo com você. Além de ter me desobedecido, sua falta de atenção quase custou o sigilo da nossa base. Trazer o Eric pra cá foi ideia sua em primeiro lugar, e você me disse que ele era confiável. Claro que nossas investigações sobre ele também falharam, mas era você quem o conhecia, e deveria ter percebido que ele era um maluco vingativo e eternamente jovem.
-Ninguém percebeu. – Olivia falou, tentando defender o amigo que ouvia a tudo de cabeça baixa.
-E não pense que eu me sinto menos culpado por isso. – Respondeu Tony, caminhando até sua mesa e recostando-se sobre ela. – Quando ficamos sabendo do Eric e do que estava acontecendo na Times Square, íamos enviar a equipe para Nova York no mesmo instante pra ajudar vocês. Aí veio o Conselho de Segurança, dando uma ordem específica pra que os Vingadores não interferissem. Eles insistiram que tinham o controle da situação – Ele riu brevemente. – Pura prepotência, pois o Conselho só planejava resolver tudo sozinho pra sair bem na foto dos jornais do dia seguinte, como se não precisasse de nós. Mas o exército não conseguiu sequer chegar perto da praça pra prestar socorro, e eles morderam a língua. – Tony explicava. – A ONU ainda enviou alguns representantes aqui pra uma reunião sem sentido na última hora, só uma desculpa pra me prender na sede e impedir que eu fosse ajudar. Eu enviei uma mensagem do meu relógio para Thor e Romanoff, e pedi para que eles viajassem até Nova York já que eu não podia. Mas, ao contrário do que pensei de primeira, resolvi não deixar que eles fossem vistos ou interferissem, a não ser que vocês dois estivessem perdendo feio. Pensei que faria bem pra vocês enfrentarem o robô e o Eric sozinhos, pra ver se aprendiam a não se meter com coisas muito maiores que vocês.
-O Conselho de Segurança não entende nada – Peter resolveu dizer. – E o desastre do FBI só comprova isso. Nós conseguimos fazer o que eles não fizeram.
-Isso não dava a vocês dois o direito de interferir. – Stark respondeu. - Vocês tem ideia do tamanho da irresponsabilidade de vocês? De quanto perigo passaram? Do quanto eu estou furioso? – Questionou. – Não, vocês devem se achar muito espertos. Enganaram o adulto chato que contrariou vocês, saíram burlando o sistema de segurança e metendo o bedelho por aí, bancando heróis. Quanta coragem. – Ele ironizou. - Deixe-me dizer uma coisa pra vocês: ser herói não é ter coragem desmedida em qualquer situação. Isso se chama burrice e presunção. Ser um verdadeiro herói é saber ouvir, e trabalhar em grupo, sem sair por aí fazendo o que acha que é certo. Só assim conseguimos ajudar a humanidade, sem cometer erros que podem custar as vidas das pessoas. Ou as nossas.
Peter e Olivia permaneceram em silêncio, sem dizer nada. Mesmo que não se arrependessem por um segundo, sabiam que o que fizeram tinha sido muito arriscado e totalmente antiético perante o resto da equipe. E sabiam também da tremenda sorte que tiveram.
-Agora, saindo do papel de adulto chato que dá bronca em adolescentes desobedientes, tem outra coisa que eu gostaria de dizer. – Stark continuou, com o tom de voz mais calmo. – Apesar de ser uma loucura total, o que fizeram foi nobre. Mesmo que tenham desobedecido ordens, vocês estavam motivados por buscar a verdade, e foram muito inteligentes descobrindo tanta coisa sozinhos. Com um pouco de ajuda da Romanoff. – Ele sorriu brevemente. Ok, ele sabia disso também. – Pra ser um Vingador, precisamos ter essa ousadia às vezes, algo que eu mesmo parecia ter me esquecido. Então, tirando toda a dor de cabeça que vocês me deram, eu queria dar os parabéns.
Peter e Olivia se entreolharam brevemente, e sorriram. Tony retribuiu o gesto, e logo em seguida caminhou até os dois e abraçou-os ao mesmo tempo.
-Nunca mais façam uma coisa dessas. – Ele advertiu, envolvendo um deles em cada braço. – O que eu iria fazer se tivesse que dizer à May e Meredith que nossos bebês viraram ceia de ano novo de robô?
Os dois adolescentes riram. Apesar da raiva, Tony não podia negar estar aliviado por ter seus dois pupilos de volta e a salvo.
-E quanto a você, mocinha – Ele dirigiu-se especificamente a Olivia desta vez. – Nós dois temos muito que conversar.
-Você ouviu o Peter, foi tudo ideia dele. – A garota defendeu-se imediatamente, apontando com humor para o amigo.
-Não é sobre isso. – Tony corrigiu. – Mesmo tendo me desobedecido, o que devemos concordar que não é nenhuma surpresa – Ele a fez rir. – Você trabalhou muito bem, e foi muito corajosa e inteligente. Eu havia prometido a você que, depois muito treino, eu deixaria que se tornasse uma Vingadora quando estivesse pronta. Bom, diante de tudo que aconteceu, eu tenho duas opções: ou acabo com sua chance pra sempre por conta da teimosia e da irresponsabilidade – Ele disse, fazendo a garota arregalar os olhos. - Ou resolvo cumprir a promessa e colocar você na equipe por conta do sucesso com a missão.
Stark ficou em silêncio por alguns instantes, deixando Olivia e até mesmo Peter apreensivos diante da sua decisão. Tony demorou alguns segundos para dar o veredicto.
-Eu decidi dar a você uma chance, porque reconheço seu potencial. – O homem contou, fazendo Liv dar um suspiro aliviado seguido de um sorriso. – Mas – Ele ergueu o dedo indicador - Você tem que me prometer que vai ser mais responsável com as suas ações, e que irá obedecer às ordens dadas a equipe, sem teimosia. Temos um trato? – Perguntou, sério.
A garota simplesmente sorriu, correndo para abraçá-lo em seguida. Tony correspondeu o ato, envolvendo a filha com os dois braços.
-Você vai ser uma grande heroína – Ele disse perto do ouvido dela. - Isso sempre esteve em você.
-Muito obrigada, pai. – Ela respondeu, com o rosto em seu peito. Arion era, oficialmente, a mais nova Vingadora da equipe.
Os dois demoraram alguns segundos para separar o abraço. Quando o fizeram, Tony caminhou até sua mesa para pegar o celular e alguns papéis.
-Bom, se me dão licença, eu tenho uma coletiva de imprensa agora pra esclarecer algumas coisas. Aliás – Ele parou no meio do caminho, olhando para Olivia. – Eu tenho uma ideia mirabolante sobre uma coisa, mas preciso que concorde comigo pra colocar em prática. Está afim de fazer bagunça?
-Eu vivo pra isso. – A garota respondeu a ele, com um sorriso brincalhão.
-Sr. Stark, como os Vingadores se posicionam diante de todos os recentes acontecimentos?
-Alguma coisa a dizer sobre o ato do Homem-Aranha?
-Tony, uma palavrinha, por favor!
A sala de imprensa estava lotada de repórteres e jornalistas de todos os meios de comunicação, vindos das mais diversas partes do mundo, apenas para ver o pronunciamento do líder dos Vingadores. Tony Stark iria falar publicamente pela primeira vez após o atentado da Times Square, na manhã seguinte ao evento, e a imprensa pretendia sanar as dúvidas sobre as quais o mundo todo se perguntava.
-Bom dia, pessoal. – Tony iniciou sua fala, com a visão dificultada pelos flashes das câmeras. Todos se aprumaram para ouvir, fazendo silêncio. – Eu estou aqui hoje em nome de toda a equipe dos Vingadores para responder as suas questões, e eu sei que devem haver muitas, então vamos começar.
Stark começou a vasculhar a plateia com o olhar, e apontou para um dos jornalistas aleatoriamente.
-Sr. Stark, por que os Vingadores não estavam junto com o Homem-Aranha durante o combate aos robôs? – Perguntou o repórter, lendo a questão em um bloquinho. Toda a atenção se voltou para o homem no palanque.
-Os Vingadores sempre estão juntos, mesmo que indiretamente. Nossas ações estão sempre interligadas, e embora o resto da equipe não estivesse na Times Square pessoalmente, estávamos em conjunto. – Respondeu Tony, simplesmente. Logo sinalizou à outra jornalista do lado esquerdo da sala, lhe dando a fala.
-Os Vingadores tiveram alguma participação na investigação do FBI que apontou erroneamente o culpado pelos atentados? – Questionou a moça, que era da TV.
-A investigação foi conduzida pelo FBI, os Vingadores eram apenas consultores. Infelizmente, todos nós estamos sujeitos a errar, e havia provas incontestáveis quanto ao falso culpado. – Disse Stark sinceramente. – Mas uma equipe interna dos Vingadores estava dirigindo uma investigação paralela, e eles foram responsáveis por prever o ataque a Times Square, o que permitiu que ajudássemos e impedíssemos que se tornasse um desastre ainda maior.
O terceiro jornalista que recebeu a palavra se colocou de pé para fazer sua pergunta.
-Stark, a internet está cheia de rumores a respeito desse assunto, mas creio que você possa nos esclarecer mais exatamente. Quem era a garota misteriosa que auxiliou o Homem-Aranha no combate? – Questionou ele, e todos se atentaram.
-Bom, amigo, essa é uma ótima pergunta. – Respondeu Tony, ajeitando-se na cadeira para prosseguir. Ele já sabia que teria que responder sobre esse assunto, e estava preparado. – De fato há muitos rumores, e havia sim uma segunda pessoa nessa luta. A garota é uma nova aquisição dentro dos Vingadores, da qual ainda não contamos à imprensa. - Diante desta frase, todos na sala aprumaram-se para ouvir a novidade. – Seu nome de batalha é Arion. Ela é o que nós internamente chamamos de energopata, o que significa que ela pode controlar todos os tipos de energia com a sua mente.
Todos os comunicadores ali sentados começaram a tomar nota de suas palavras, fosse escrevendo, gravando ou narrando. No entanto, a maior das novidades ainda estava por vir. Tony soltou um breve sorriso antes de prosseguir; ele adorava estardalhaço midiático.
-E quem é essa garota? – Adiantou o mesmo jornalista, fazendo justamente a pergunta que Stark planejava responder.
-Bom – Ele aprumou-se. – O nome dela é Olivia McCall. Ela é minha filha.
Nesse momento, um rebuliço enorme tomou conta da sala, inundando-a de conversas e reações de surpresa. Boa parte dos jornalistas se levantou, competindo pela próxima pergunta, pois aquela era de longe a maior e mais inesperada notícia que todos esperavam receber naquela manhã. A coletiva virou uma bagunça, e choveram questionamentos para cima de Stark, que permaneceu sentado. Os assessores de imprensa pediram calma, e foram precisos alguns bons minutos para que todos se sentassem e a ordem e o silêncio voltassem ao normal.
-Sr. Stark, há quanto tempo o senhor sabe que tem uma filha? – Questionou uma jovem sentada na primeira fileira.
-Onde esteve essa garota o tempo todo? – Disparou o outro logo atrás dela.
-Por que o senhor nunca a assumiu? – Questionou um terceiro.
-De onde vêm os poderes dela? – Gritou uma.
-Acalmem-se, pessoal. – Pediu Tony, vendo que a desordem estava voltando a imperar. – Tudo que importa é que ela é minha filha e tem superpoderes. O resto não é para mim que vocês tem que perguntar, e em breve vocês terão a oportunidade.
-Senhor Stark – Um rapaz bem jovem ergueu a mão pedindo a palavra. Tony concedeu. – Por que ela entrou para os Vingadores só agora? Ela ganhou esse direito por ser sua filha?
-Não, amigo. – Tony respondeu, com um sorriso se formando nos lábios. – Ela ganhou esse direito por ser uma das heroínas mais talentosas que vocês terão o prazer de ver em ação.
Não é preciso dizer o tamanho do alvoroço que Tony Stark causou ao dizer aquelas palavras. Mas tudo já era sabido: Olivia tinha concordado em revelar sua identidade, e ela própria daria uma entrevista mais adiante para esclarecer as dúvidas que teriam eventualmente sobre ela. Liv já era grandinha o suficiente para que o mundo soubesse de sua existência, e, com o passar do tempo, ela aprenderia a lidar com a sua imagem da mesma forma que seu pai um dia fez. Sua exposição era inevitável, e apesar do alvoroço que sua identidade causaria num primeiro momento, em breve tudo se estagnaria em certo nível de normalidade. Stark não podia negar que, por trás de tudo isso, ele sentia-se orgulhoso dela por tomar essa decisão – era hora de sua garotinha mostrar para o mundo a que veio.
Tony deixou a coletiva de imprensa perto do meio dia, e dirigiu-se para uma reunião na sede dos Vingadores logo em seguida. A equipe tinha uma conferência marcada com o embaixador Callahan do Conselho de Segurança, para falar a respeito da Times Square e de todas as consequências que o evento implicava, além dos próximos passos da equipe diante delas.
Todos os membros do grupo haviam sido convocados para tal reunião, e boa parte deles já estava dentro da sala quando ele chegou. Thor, Olivia, Visão, Peter e Romanoff sentavam-se em volta da mesa oval de frente para o telão, onde Thomas Callahan daria as caras a qualquer momento.
-Olhem só, a Olivia está nos trending topics do Twitter – Apontou Visão, que acessava a rede social através de seu tablet. – O nome dela está logo acima de #ForaRobôs e #StarkPaiDoAno. – Disse, e todos na sala riram.
-Bem-vinda à equipe, mini Stark. – Disse Natasha, dando um toque de leve na garota que estava ao seu lado.
-Vai ficar famosa nos quatro cantos do universo agora. – Atestou Thor com um sorriso.
-Eu sempre soube que tinha nascido para os holofotes. – Respondeu a menina, bem humorada.
Stark entrou na sala no meio do diálogo, e tomou a cadeira vazia logo ao lado de Olivia. Banner havia acabado de chegar para completar a equipe, e todos já se preparavam para iniciar a chamada de vídeo dentro dos próximos minutos.
-A primeira parte do Projeto Bagunça foi concluída com sucesso. – Tony cochichou para a filha, referindo-se à revelação, e Liv sorriu em resposta. – Agora é hora da parte dois.
Em poucos segundos, Callahan atendeu à chamada e apareceu no telão para dar início à reunião. Ele estava sentado em seu gabinete como de costume, e tinha cara de poucos amigos.
-Bom dia, Vingadores. – Disse ele, introdutório. – Após uma manhã de deliberações, eu decidi marcar esta reunião com a equipe para atualizá-los sobre as decisões do Conselho. – Disse ele, e então se ajeitou na cadeira. – Primeiramente, gostaria de informar que já há uma comissão especializada investigando o paradeiro dos dois suspeitos do crime, Simon e Eric Williams, de acordo com os dados que foram enviados a nós pela base de vocês.
-Isso é ótimo. Prendam esses dois malucos o quanto antes e façam um favor para a humanidade. – Banner comentou, com repulsa.
-Porém, antes de qualquer outro tópico, gostaria de ressaltar que esta reunião tem o objetivo de cruzar nossos dados e estabelecer acordos. – Callahan prosseguiu, em um tom esquisito. - O que significa que nem o Conselho e nem os Vingadores tomarão decisões ou farão pronunciamentos sem que o outro lado seja notificado e concorde com as palavras a serem ditas. Talvez isso não tenha sido explicitado da maneira correta anteriormente, mas estou reforçando o ponto devido ao seu discurso na coletiva de imprensa desta manhã, Sr. Stark.
Tony arqueou as sobrancelhas ao perceber que aquilo estava sendo direcionado a ele. Callahan prosseguiu com a fala.
-O Conselho não ficou nada satisfeito ao saber que o senhor havia ocultado a informação de ter uma filha, ainda mais envolvida com a missão e os Vingadores. Inclusive, revelar estes dados para a imprensa mundial sem ter nos consultado foi considerado uma grande falta.
-Me desculpe, Sr. Callahan – Tony interrompeu com a cara fechada. – Mas, que eu saiba, o nosso acordo com o Conselho diz respeito apenas às questões internas que envolvem os Vingadores. O senhor não tem autoridade alguma sobre mim ou a minha família. Meu pronunciamento tratava da minha vida pessoal, e o Conselho não pode controlar o que eu falo sobre isso.
-De fato, Sr. Stark, mas as circunstâncias pediam mais cuidado, e era preciso ter consultado o Conselho antes de fazer tal revelação já que ela envolveu o nome da sua equipe. – O embaixador não deu o braço a torcer.
Todos os presentes na sala ficaram em silêncio, diante do que poderia se tornar uma discussão. No entanto, Callahan decidiu prosseguir com a pauta da reunião.
-Quanto aos episódios da noite de ano novo em Nova York, ainda há muito a ser discutido. A ação de integrantes dos Vingadores, Homem-Aranha e Arion, durante o atentado foi considerada falha pelos membros do Conselho. – Disse o homem, lendo um papel. - A ONU havia dado ordens claras sobre a não participação da equipe durante o combate na Times Square, e esta ordem foi desrespeitada.
-Nós salvamos a população, senhor. – Peter ousou interromper a fala dele, erguendo o braço no fundo da sala.
-No entanto, devido ao auxílio que foi prestado à população, o Conselho considerou que a intervenção foi válida, apesar de irregular. – Prosseguiu o embaixador após a declaração do rapaz. – Gostaríamos de propor, diante deste acontecimento, que as próximas ações tomadas diante do caso dos robôs sejam exclusivamente decididas pelo Conselho de Segurança, e só então passadas a equipe, quando e se as medidas envolverem seus serviços.
Após a fala dele, todos na sala começaram a cochichar, sem esconder a indignação. O Conselho queria apertar o cerco ainda mais. Porém, já havia passado da hora de tomar uma atitude em relação a isso.
-Me desculpe interromper novamente, Sr. Callahan – Stark tomou a frente, e todos se calaram para ouvi-lo. – Mas eu não concordo com a posição do Conselho. Aliás, eu considero que o Conselho está sendo totalmente hipócrita ao sugerir um acordo desse tipo.
Os outros integrantes da equipe se entreolharam, sem acreditar naquela atitude.
-Vocês deveriam nos agradecer pelo que fizemos na Times Square naquela noite. Nós realizamos uma intervenção porque o exército americano não era capaz de dar conta do recado do jeito que nós fizemos, e nós salvamos milhares de pessoas de serem pisoteadas por um homem de lata do mal, do jeito que o governo não conseguiu.
Ninguém emitia um som sequer, esperando para ver qual seria o próximo passo daquela reviravolta interessante. Callahan ouvia a tudo com a cara fechada.
-Aliás, por falar em ineficácia – Tony levantou-se, e começou a desfilar pela sala de reuniões com soberania. – O Conselho havia exigido que os Vingadores deixassem a investigação do caso dos robôs para o FBI, e bateu o pé para que o governo tomasse a liderança. Nós deixamos, e a polícia cometeu um escândalo internacional ao prender o cara errado em uma das operações antiterrorismo mais importantes da história. Até dois adolescentes de dezessete anos foram mais eficazes que eles, e resolveram o caso antes que o FBI pudesse sequer sonhar que tinha sido enganado. Portanto, Sr. Callahan, eu acho que deveria haver uma inversão de valores por aqui. – Tony alegou, parando de frente para o telão aceso. – Está na hora de o Conselho começar a ouvir o que temos a dizer, ou então cada vez mais e mais pessoas vão morrer enquanto nós ficamos aqui sentados numa sala tentando decidir o que fazer.
Tony fez uma breve pausa, olhando Callahan nos olhos.
-Deixe que nós tomemos conta daquilo que sabemos fazer, enquanto vocês legislam com seus ternos e gravatas. A partir de agora, nós iremos dar satisfações a vocês até onde acharmos que é da sua conta, e em troca eu prometo que os Vingadores irão encontrar esses terroristas e acabar com os seus ataques de uma vez por todas.
Todos os presentes ficaram atônitos diante do que acabara de ser dito. Depois de muito tempo, aquele voltara a ser o Tony Stark que todos conheciam e amavam. Callahan, por sua vez, estava em silêncio, tentando achar as palavras certas para responder tamanha afronta diante dele.
-O senhor entende que o que está propondo é uma total quebra do protocolo, Sr. Stark? – Disse ele, com a raiva contida no olhar.
-Pro inferno com o protocolo. Nós só queremos fazer o nosso trabalho sem que o governo se meta. – Respondeu Stark, com classe.
-Pois bem. Eu levarei a sua proposta descabida até os outros membros do Conselho. – Disse o embaixador, tomando nota a contragosto.
-Vá em frente. – Tony concluiu, dando um breve sorriso cínico.
A transmissão foi cortada logo em seguida. A reunião foi dada como oficialmente encerrada, e todos encararam Stark esperando alguma reação diante de toda a confusão que ele havia acabado de causar.
-A parte dois do Projeto Bagunça acaba de ser concluída. – Disse ele, virando-se para o resto da equipe que se sentava à mesa. – Os Vingadores estão de volta.
Capítulo 15
Não bastasse toda a agitação das últimas semanas, os dias que se seguiram não trouxeram exatamente a paz à equipe dos Vingadores. A mídia ainda não havia dado trégua em relação ao atentado da Times Square, Eric e os robôs, e toda a história envolvendo a família Stark continuava uma novidade muito comentada por aí. Diante de toda aquela loucura, Olivia havia encontrado um pouco de tranquilidade após um dia longo e cheio de trabalho nas Inovações, e relaxava na cozinha do alojamento jantando panquecas.
-Olá, Olivia. – Cumprimentou Visão, entrando no cômodo com simpatia. – Como você está?
-Pra quem enfrentou três super-robôs de guerra e quase morreu pra salvar uma cidade inteira, posso me considerar praticamente de férias. – Brincou a garota, tomando um gole de suco.
-Dia cheio? – Riu o sintozoide, abrindo a geladeira.
-Você nem imagina. – Liv respondeu, dando uma garfada. – E esse aqui é só meu intervalo. Eu ainda tenho que investigar alguns dados que eu e o Peter conseguimos em Nova York.
-Durante excursão de férias de vocês? – Visão brincou, sentando-se de frente para ela no balcão.
-Quer dizer que essa história já ficou popular? – A garota fez uma careta.
-Tudo que é sigiloso corre como o vento dentro da equipe. Culpe ao Banner por isso. – Contou o homem, fazendo Liv rir. Em seguida, eles fizeram alguns segundos de silêncio. – Posso te fazer uma pergunta?
-Claro.
-Está acontecendo algo entre você e o Peter? – Visão disparou, assim de cara, o que fez a garota congelar. – Algo além de uma viagem de férias?
-Por que a pergunta? – Olivia questionou, desconfiada. Era um assunto bem delicado.
-Não sei – Ele deu de ombros. – É que eu tenho observado vocês dois. Notei que, quando ele está perto de você, a frequência cardíaca dele aumenta, suas pupilas dilatam e ele...
-Ok, eu entendi – Liv interrompeu, achando graça naquilo.
-É verdade, sabe que eu consigo ver tudo isso com meus poderes. Você iria se surpreender com o que o amor faz no corpo das pessoas apaixonadas. – Ele constatou.
-E por falar em pessoas apaixonadas... – Olivia prosseguiu, achando uma ótima e safa oportunidade para desconversar o assunto anterior. – Como andam as coisas entre você e a Feiticeira Escarlate?
-Bom, isso é complicado... – Visão respondeu desconfortável, afastando-se um pouco. – Wanda e eu não temos nos falado desde que a equipe se dividiu. Acho que ela está brava comigo. Ou então não pode me contatar pra manter sua localização em sigilo.
-Aquela briga não fez bem pra ninguém. – Liv torceu o lábio, compadecendo-se. – Sabe, eu tenho pensado muito nisso. Acho que, com tudo que vem acontecendo ultimamente, seria bom ter o outro lado da equipe de volta pra nos ajudar.
-Com certeza, Liv – Respondeu ele, concordando. – Mas acho que isso é impossível. Sabe como essa é uma questão difícil para o seu pai.
-Sim, eu nunca nem toquei no assunto. – Ela acrescentou.
-É, realmente, essa briga não fez bem pra ninguém. – Visão concluiu, dando um suspiro pesado.
-Bom, como nós mesmos acabamos de dizer, temos alguns membros faltando, e por conta disso as tarefas se acumulam – Falou Olivia, se levantando e quebrando o clima tenso. – Então, se você me der licença, eu preciso ir trabalhar.
-Tudo bem. – Visão disse, rindo brevemente. Então Liv deixou a cozinha logo em seguida.
A cabeça da garota estava a mil enquanto ela caminhava para o prédio das pesquisas, que já estava fechado e vazio devido ao fim do expediente. Liv pensava nas milhares de coisas que pretendia averiguar naquela noite, a respeito de Magnum e dos robôs, e entrou no laboratório de informática com os pensamentos fervilhando. Ela nem notou que a luz do local já estava acesa, e se assustou quando viu Peter ali mexendo em um dos computadores.
-Oi, Liv! – Ele cumprimentou simpático, fazendo a garota dar um pulo e quase derrubar seu copo de café. – Foi mal.
-Caramba, Parker – Olivia reclamou, rindo da situação logo em seguida. – O que está fazendo aqui?
-Pesquisando umas coisas. Queria verificar alguns dos dados que conseguimos lá em Nova York. E você?
-Pensei exatamente o mesmo. – Ela respondeu, sentando na cadeira giratória ao lado da que o garoto estava. – O que conseguiu aí? – Perguntou, aproximando-se da tela para ver.
-Ah, quase nada. Descobrimos praticamente tudo o que dá pra tirar daqui quando estávamos por lá. – O rapaz mostrou suas pesquisas para ela. – Fiquei aqui o dia todo, confesso que estou um pouco cansado de tanto olhar pra essa tela. – Peter riu fraco, afastando levemente a cadeira.
-Nem me fale. – Liv bufou, jogando-se para trás como ele fez. – Eu passei o dia preenchendo relatórios e respondendo e-mails que ficaram pendentes nas Inovações no tempo em que estivemos fora. Pra ser sincera, acho que prefiro enfrentar robôs gigantes a enfrentar burocracia. – Ela admitiu, fazendo o rapaz rir.
A conversa caiu num silêncio esquisito após as risadas. Os dois estavam um pouco desconfortáveis na presença um do outro, por conta de tudo que havia acontecido entre eles nos últimos dias.
-E como vai sua nova vida de celebridade instantânea? – O rapaz perguntou para fugir do clima, referindo-se a toda a loucura com a mídia por conta da identidade dela. – Já teve muitos convites pra propagandas e presenças VIP?
-Demais. – Ela respondeu, sendo irônica, e os dois riram. – Bom, eu revivi as minhas redes sociais que estavam inativas por conta de toda a história do stalker, e ganhei uma quantidade absurda de seguidores quase instantaneamente. Meu Twitter e meu Instagram estão uma loucura, eu tive que silenciar todas as notificações do meu celular. – Liv contou, arregalando os olhos. – As pessoas estão pirando um pouco com essa história de Arion, filha do Tony Stark e tal. Tem gente achando o máximo, louca pra ser minha amiga e pra saber mais sobre mim, e tem gente que por outro lado que está achando que eu sou uma farsa ou sei lá. É um pouco assustador.
-Bom, você é filha de um dos maiores empresários do mundo, e tem poderes sobrenaturais muito incríveis. Isso é uma novidade é tanto. – Apontou o rapaz.
-É, as pessoas ficaram muito curiosas com isso. É um pouco estranho ter toda essa atenção, ainda mais pra alguém como eu que sempre esteve longe do resto do mundo – Ela riu. – Mas é normal. Isso teria que acontecer uma hora ou outra, e eu sabia que seria assim. Todo mundo fica interessado e chocado, tendendo aos extremos, mas logo a história deixa de ser uma novidade, e tudo fica bem de novo.
-Você está lidando muito bem com essas coisas. – Peter constatou. – Eu não sei como eu iria reagir diante da atenção do mundo todo se descobrissem que eu sou o Homem-Aranha. – Ele girou com a cadeira. - Acho que eu piraria.
-Não piraria, não – Liv discordou, levantando-se para pegar o café que estava na bancada. – Mesmo que todos soubessem seu segredo, não mudaria nada em quem você é.
-Que profundo. – Peter brincou.
-Sou uma filósofa nata. – A garota deu uma piscadela.
-Mas é sério – Disse o garoto, caminhando até onde ela estava. – Acho muito legal a forma como você encara tudo isso. Eu sei que você costuma bancar a durona e irredutível – Ele riu, e a menina o acompanhou. – Mas, na verdade, você é muito compreensiva. O jeito que você lida com as consequências da sua identidade, e até mesmo com o seu pai, sem guardar nenhum tipo de mágoa dele por isso ou coisa do gênero, é muito legal. Nem todo mundo conseguiria levar as coisas como você levou durante todo esse tempo.
-Ah, foram as circunstâncias que me fizeram assim. – Liv deu de ombros. – Essa era minha vida, minha família, minha história. Eu precisava lidar com tudo isso, e lidei. Não é nenhum heroísmo.
-Mas você nunca foi refém disso. Mesmo com todo esse drama do Sr. Stark, você é você, entende? – O rapaz explicou. – Nunca se resumiu à sua história. Você é independente, não tem medo de ser original nem de dizer o que pensa, e pode ser inteligente e engraçada sem estar nem aí pro que os outros pensam a respeito. Se quer saber, eu fico feliz que o mundo irá conhecer Olivia McCall. – Disse ele. – Ela é uma das pessoas mais impressionantes que se tem pra conhecer.
-Se você está dizendo... – Liv arqueou as sobrancelhas, usando um tom convencido para esconder seu sorriso tímido. Ela demorou alguns segundos para voltar a falar. – Sabe, sempre achei muito fofa a forma como você vê o lado bom das pessoas. Quase me faz acreditar em você.
-Pode acreditar – Peter riu de leve. – Eu jamais mentiria para alguém que eu gosto. Porque, Liv, eu... – Ele titubeou por um segundo. – Eu posso ser honesto com você sobre uma coisa?
-Claro. – Olivia virou-se para ele.
-Eu... – O rapaz gaguejou, tímido. – Eu gosto de você. Tipo... – Ele fez outra pausa, como se as palavras não saíssem. – Não, eu estou apaixonado por você. Mesmo.
A garota ficou em silêncio total, sem saber o que dizer. Quando ela tomou fôlego para responder, Peter a impediu.
-Antes que você diga que isso é loucura e que você me odeia, me deixa explicar. – Disse o rapaz, falando acelerado. – Eu sempre pensei nisso, eu acho, mas nunca quis te dizer nada porque fiquei com medo do que você iria pensar.
-Peter... – Liv tentou interrompê-lo, mas ele não parou.
-Foi burrice total aquilo que eu fiz no quarto de hotel, te beijar daquele jeito, mas... Sei lá, aconteceu, então, se você quiser esquecer tudo isso depois para o clima não ficar ruim entre a gente, tudo bem. – Peter continuou a falar rápido por conta do nervosismo. – Eu só queria que você soubesse o quanto eu te acho incrível, e diferente de todas as garotas que eu já conheci. Eu gosto de você, mesmo você me chamando de Menino-Aranha, zoando meu uniforme e dizendo que eu só sei te irritar.
-Peter...
-E já que eu estou te contando toda a verdade, sim, eu já falei de você pro Ned várias vezes, e, sim, eu secretamente adorei quando minha tia May disse que a gente combinava. – Ele continuou, gesticulando. – Eu pensei muito antes de decidir te falar tudo isso, porque sabia que as coisas poderiam nunca mais ser as mesmas depois, mas eu...
-Peter! – Olivia praticamente gritou, desta vez conseguindo chamar a atenção do garoto, fazendo com que ele se calasse.
Assim que Peter ficou em silêncio, Liv respirou fundo para recuperar o fôlego, atordoada pela chuva de palavras. O garoto olhava para ela, atônito, esperando uma reação.
-Eu não vou dizer que te odeio. – Liv sorriu, achando graça. – Na verdade, eu acho que, pela primeira vez na vida, eu posso até dizer que eu... concordo com você.
Parker continuou olhando para ela, preocupado e confuso.
-Com essa história toda dos robôs e do Magnum, eu e você acabamos nos aproximando muito rápido. A gente trabalhava juntos, brincava, e se irritava um pouco no meio do caminho; e em algum ponto dessa história toda eu que percebi que você sentia alguma coisa por mim. Talvez por que... eu sentisse também. – Liv admitiu, fazendo o queixo do garoto cair. – Eu fiquei um pouco assustada com isso, eu acho. Por isso eu agi daquele jeito no dia em que você me beijou. Sei que eu não costumo demonstrar muito esse tipo de coisa... mas eu gosto de você também. – Ela sorriu. – Mesmo ainda achando que você é baixinho demais pra ser um super-herói.
Peter soltou um riso abafado em resposta, quase aliviado por ouvir as palavras dela. Ele desembuchara todas aquelas palavras já conformado de que ela iria dispensá-lo. Olivia riu sem graça, e tocou as mãos dele, que constatou estarem suadas; o garoto olhou para ela, engolindo seco, e aproximou o rosto para encarar seus olhos mais de perto.
Essa era a hora, não era? Peter já cometera um erro ao pensar assim antes - mas agora era diferente. Quem sabe, a primeira vez nem tivesse sido ruim, no fim das contas. Tudo que aconteceu, exatamente como foi, com tropeços e acertos, levara àquele momento; e nenhum dos dois ali queria sair dele.
Peter aproximou-se dela, e Olivia tocou os lábios dos dois. Os corações de ambos, que estavam acelerados, gradativamente começaram a se acalmar. Liv apoiou-se nos ombros do garoto, fazendo com que os corpos se encaixassem, e entregou-se ao momento fechando os olhos. Parker colocou as mãos em sua cintura, e após alguns segundos foi aprofundando o beijo. Tudo estava calmo agora, depois de tantas correrias, risadas e desavenças; eram só ele e ela, com seus sentidos cheios e pensamentos um pouco extasiados, mas levados pelo sentimento que os carregara por todo o caminho.
Porém, o momento dos dois acabou sendo interrompido pelo som de passos que se aproximaram no corredor. Olivia e Peter ouviram um pigarreio de garganta, e se afastaram rapidamente um do outro, para darem de cara com Tony Stark parado no início da sala, com os dois braços atrás das costas. Ele tinha a cara fechada em uma expressão impassível, e os encarava fixamente.
Os dois adolescentes ficaram estáticos. Por impulso, Olivia deu um passo para trás, afastando-se da figura atônita de um Peter Parker completamente pálido. Ela, com o rosto todo ruborizado, não sabia o que dizer diante do pai ali, que os olhava sem esboçar emoção.
-Boa noite, crianças. Treinando técnicas de coworking? – Disse ele, os observando com os olhos fixos.
O desespero dos dois era simultâneo. Por um fato do qual os dois adolescentes pareciam ter infelizmente se esquecido, o expediente de Stark era sempre o último a terminar, sendo ele o responsável por fechar o prédio no fim da noite – o que propiciara aquele momento nada agradável.
-Tem alguma coisa que queira me dizer, Cabeça de Teia? – Perguntou Stark, dirigindo-se a Peter com o mesmo tom apático.
O rapaz gelou ao sentir o olhar de Stark sobre si. Parecia que estava sendo fuzilado.
-Sr. Stark, é... Eu... Nós... – Peter gaguejou, totalmente desajeitado.
-Foi o que eu pensei. – Tony afirmou, antes que o garoto pudesse concluir. Ele correu os olhos pelos dois mais uma vez antes de continuar. – Agora podem ir.
Os dois jovens se entreolharam, acanhados. Eles decidiram obedecer, e começaram a andar a passos curtos e rápidos, saindo da sala sem emitir nenhum som. Escaparam um por cada lado, deixando Stark plantado no escritório.
Logo que deixaram a zona de conflito, Peter e Olivia suspiraram aliviados. Eles olharam um para o outro, e não tiveram outra reação que não fosse rir daquela situação tão péssima e inusitada. Assim que viraram a esquina do corredor, os dois caíram na gargalhada, fosse pelo nervoso, pela adrenalina, ou até mesmo pela felicidade compartilhada e secreta do momento anterior.
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Os Vingadores viviam um momento conturbado e crítico. Após todas as recentes batalhas, revelações e acontecimentos, era inegável a necessidade de uma reunião para que a equipe debatesse tantas questões pendentes. Seria preciso cruzar dados, ouvir opiniões e decidir o que fazer a seguir, para que os heróis pudessem prosseguir em sua infindável batalha contra o mal.
De fato, os integrantes da equipe encontravam-se reunidos na sala de estratégias, para definir tais caminhos a serem seguidos. Olivia e Peter já haviam se encarregado de apresentar aos demais membros todas as descobertas que fizeram durante a missão em Nova York, a respeito de Magnum, Ceifador e os robôs, para que todos ficassem a par da situação. Então, logo em seguida, eles iniciaram a deliberação.
-Que péssimas férias vocês tiraram. – Banner comentou com as sobrancelhas erguidas, assim que os dois mais jovens terminaram de explanar a história.
-Sabem, nunca fui com a cara do Eric – Falou Natasha, apoiada sobre a mesa. – Mas não pensei que ele era louco assim.
-Eu nunca confiei naquele cabelo loiro dele. – Afirmou Thor, concordando com a cabeça.
-Bom, diante do que a nossa equipe Fraldas conseguiu descobrir, precisamos decidir o que faremos a seguir com a Família da Pesada e seus homens de lata. – Stark introduziu, andando em volta da bancada.
-É tão bom poder finalmente decidir alguma coisa – Romanoff comemorou, jogando as mãos para o céu.
Após a fatídica videoconferência em que a equipe se impôs diante do embaixador Callahan, o Conselho de Segurança realizou uma reunião para deliberar sobre o polêmico parecer dos heróis. Diante da situação difícil e tensa entre o governo, a mídia e a população, os parlamentares decidiram acatar parte do pedido de Tony Stark, autorizando certo nível de autonomia à equipe, em missões de baixa e média relevância. A ONU jamais daria o braço a torcer a respeito de suas restrições, e muito menos do Tratado de Sokovia – mas, reconhecendo a situação crítica e a divisão da opinião popular a respeito das falhas investigações do FBI, não lhes restou muita opção. Bem ou mal, o governo precisa dos Vingadores em seu time; e Stark soube jogar muito bem com isso, convencendo-os de um acordo bilateral durante uma conferência realizada na mesma semana.
-Bom, nós conseguimos derrotar os robôs uma vez – Tony continuou, circulando por seus colegas. – Mas é óbvio que não terminamos ainda. Os dois irmãos Pinky e Cérebro claramente irão voltar, mais cedo ou mais tarde, e eles estarão mais fortes e com mais vontade ainda de dominar o mundo. Sendo quem somos, precisamos estar preparados pra isso.
-O objetivo do Magnum é claro e simples: acabar com a gente de uma vez por todas. – Peter complementou, olhando para os companheiros. Menos para Stark, ele não tinha coragem de encará-lo. – E ele vai fazer de tudo pra conseguir isso. O Ervilha voltará no seu pior pra cima dos Vingadores, e precisamos achar um jeito de combatê-lo de igual pra igual quando esse dia chegar.
-Podemos usar o ácido especial que Liv e Peter fizeram para combater os robôs – Atestou Thor, dando sua sugestão. – Já funcionou uma vez, funcionará nas próximas.
-Seria arriscado demais. Esse ácido é muito perigoso, um erro apenas e poderíamos condenar uma cidade inteira com ele. – Visão discordou, explicando o ponto. – Foi uma primeira tentativa boa, mas acho que utilizar uma substância perigosa em combate é tudo que não precisamos agora. Podemos machucar civis e gerar um caos total.
-Eu acho que podemos fazer mais que isso. Existem soluções bem mais seguras pra essa questão, e eu estava conversando com a Olivia sobre isso um pouco antes de começarmos. – Falou Banner, encarando a garota ao seu lado. – Tivemos umas ideias legais, acho que ela pode explicar para todos. – Ele passou a palavra.
-O setor de Inovações tem trabalhado incansavelmente nos últimos meses tentando achar soluções versáteis para as imperfeições e fraquezas em nossos trajes e equipamentos. – Iniciou Olivia didaticamente. – Nós temos muitos projetos que estão em fase de teste há tempos, como o traje do Aranha de Ferro, o Cinturão do Thor e outras coisas. Talvez essa seja a hora perfeita para tirar essas ideias do papel, e começar a aplicá-las no combate contra os homens de lata.
-Se fosse há um mês, fazer isso seria dar um tiro no escuro. Mas com todas as pesquisas e dados que foram levantados a respeito do robô, nós já conhecemos o seu estilo de batalha, seus pontos fortes e fracos. – Bruce argumentou, complementando a fala dela. - Se pegarmos as ideias originais e as aprimorarmos de acordo com todas essas descobertas, podemos criar upgrades pra toda a equipe, potencializando nossos poderes e tornando-os páreo para combater os gigantes de aço.
-Excelente – Disse Tony, animado, tomando nota das ideias em uma das telas holográficas que ficava na sala. – Podemos começar isso agora mesmo. Vou dobrar os recursos para o setor de Inovações, e todos aqui que se sentirem confortáveis pra participar do processo de criação, mandem ver. Se tem algo que vocês acreditam que pode potencializar os poderes de vocês, digam. Um equipamento, um uniforme, um acessório... até as ideias mais malucas, pois podem servir pra algo mais maluco e melhor ainda.
-Vale porta copos? – Thor perguntou, erguendo o braço.
-Vai embebedar o robô? – Questionou Natasha, fazendo Banner rir ao lado dela.
-Ok, eu quero ideias. O que mais podemos fazer pra possibilitar que chutemos as bundas daqueles Megazords da próxima vez que aparecerem? – Tony lançou, buscando sugestões.
-Sr. Stark, eu tenho uma ideia que gostaria de compartilhar. – Visão se prontificou, e todos se atentaram para ouvi-lo. – Acho que, se fizéssemos isso, aumentaríamos incrivelmente nossas chances. Sei que seria difícil de colocar em prática, mas eu acredito que ter a nossa equipe completa para esses combates seria ideal. Se ao menos nós pudéssemos...
-Essa ideia está fora de cogitação. – Stark o interrompeu imediatamente, fechando a cara. Todos na sala se entreolharam, ressabiados.
-Você não quer ao menos ouvir a ideia inteira? – Olivia se pronunciou, com cuidado. O homem voltou-se para ela.
-Eu já entendi qual é o ponto. Mas não vai acontecer, então não tem porque ouvir. – Tony respondeu, direto. – Próxima ideia.
-Eu pensei que todas as sugestões aqui fossem válidas. Afinal, se nós estamos em uma situação tão crítica, toda a ajuda é bem vinda, inclusive a deles, não acha? – A garota continuou insistindo, e Stark estava perdendo a paciência.
-Isso não é ajuda, é um problema com o qual não precisamos lidar. – Ele disse, áspero.
-Não precisa ser um problema, é só...
-Já chega, Olivia – Stark a interrompeu, irritado. - Não basta você e o Cabeça de Teia ontem a noite, agora você quer incluir o Rogers nessa também?
A sala caiu em silêncio total. Tony permaneceu com os olhos fixos na garota, percebendo o que tinha acabado de dizer. Olivia o encarava, incrédula, e tinha os olhos cerrados como se dissesse “você não fez isso”. Já Peter, por sua vez, observava tudo em silêncio, de olhos arregalados e rosto pálido, encolhendo-se na cadeira.
Após alguns segundos de silêncio estranho e mortal, Tony saiu pela porta da sala na direção do corredor, dizendo que precisava de uma pausa. Todo o resto da equipe permaneceu ali dentro, sem entender nada, olhando para uma Olivia enfurecida e um Peter completamente constrangido.
-Isso é sério? – Thor arriscou perguntar, buscando uma explicação para aquela cena toda. Banner precisou conter o riso para não deixar tudo ainda pior.
Ninguém se atreveu a responder. Após alguns minutos, Olivia também acabou deixando a sala, sem dizer uma palavra. E estava declarado o fim da reunião de equipe.
-Olá, Olivia. – Cumprimentou Visão, entrando no cômodo com simpatia. – Como você está?
-Pra quem enfrentou três super-robôs de guerra e quase morreu pra salvar uma cidade inteira, posso me considerar praticamente de férias. – Brincou a garota, tomando um gole de suco.
-Dia cheio? – Riu o sintozoide, abrindo a geladeira.
-Você nem imagina. – Liv respondeu, dando uma garfada. – E esse aqui é só meu intervalo. Eu ainda tenho que investigar alguns dados que eu e o Peter conseguimos em Nova York.
-Durante excursão de férias de vocês? – Visão brincou, sentando-se de frente para ela no balcão.
-Quer dizer que essa história já ficou popular? – A garota fez uma careta.
-Tudo que é sigiloso corre como o vento dentro da equipe. Culpe ao Banner por isso. – Contou o homem, fazendo Liv rir. Em seguida, eles fizeram alguns segundos de silêncio. – Posso te fazer uma pergunta?
-Claro.
-Está acontecendo algo entre você e o Peter? – Visão disparou, assim de cara, o que fez a garota congelar. – Algo além de uma viagem de férias?
-Por que a pergunta? – Olivia questionou, desconfiada. Era um assunto bem delicado.
-Não sei – Ele deu de ombros. – É que eu tenho observado vocês dois. Notei que, quando ele está perto de você, a frequência cardíaca dele aumenta, suas pupilas dilatam e ele...
-Ok, eu entendi – Liv interrompeu, achando graça naquilo.
-É verdade, sabe que eu consigo ver tudo isso com meus poderes. Você iria se surpreender com o que o amor faz no corpo das pessoas apaixonadas. – Ele constatou.
-E por falar em pessoas apaixonadas... – Olivia prosseguiu, achando uma ótima e safa oportunidade para desconversar o assunto anterior. – Como andam as coisas entre você e a Feiticeira Escarlate?
-Bom, isso é complicado... – Visão respondeu desconfortável, afastando-se um pouco. – Wanda e eu não temos nos falado desde que a equipe se dividiu. Acho que ela está brava comigo. Ou então não pode me contatar pra manter sua localização em sigilo.
-Aquela briga não fez bem pra ninguém. – Liv torceu o lábio, compadecendo-se. – Sabe, eu tenho pensado muito nisso. Acho que, com tudo que vem acontecendo ultimamente, seria bom ter o outro lado da equipe de volta pra nos ajudar.
-Com certeza, Liv – Respondeu ele, concordando. – Mas acho que isso é impossível. Sabe como essa é uma questão difícil para o seu pai.
-Sim, eu nunca nem toquei no assunto. – Ela acrescentou.
-É, realmente, essa briga não fez bem pra ninguém. – Visão concluiu, dando um suspiro pesado.
-Bom, como nós mesmos acabamos de dizer, temos alguns membros faltando, e por conta disso as tarefas se acumulam – Falou Olivia, se levantando e quebrando o clima tenso. – Então, se você me der licença, eu preciso ir trabalhar.
-Tudo bem. – Visão disse, rindo brevemente. Então Liv deixou a cozinha logo em seguida.
A cabeça da garota estava a mil enquanto ela caminhava para o prédio das pesquisas, que já estava fechado e vazio devido ao fim do expediente. Liv pensava nas milhares de coisas que pretendia averiguar naquela noite, a respeito de Magnum e dos robôs, e entrou no laboratório de informática com os pensamentos fervilhando. Ela nem notou que a luz do local já estava acesa, e se assustou quando viu Peter ali mexendo em um dos computadores.
-Oi, Liv! – Ele cumprimentou simpático, fazendo a garota dar um pulo e quase derrubar seu copo de café. – Foi mal.
-Caramba, Parker – Olivia reclamou, rindo da situação logo em seguida. – O que está fazendo aqui?
-Pesquisando umas coisas. Queria verificar alguns dos dados que conseguimos lá em Nova York. E você?
-Pensei exatamente o mesmo. – Ela respondeu, sentando na cadeira giratória ao lado da que o garoto estava. – O que conseguiu aí? – Perguntou, aproximando-se da tela para ver.
-Ah, quase nada. Descobrimos praticamente tudo o que dá pra tirar daqui quando estávamos por lá. – O rapaz mostrou suas pesquisas para ela. – Fiquei aqui o dia todo, confesso que estou um pouco cansado de tanto olhar pra essa tela. – Peter riu fraco, afastando levemente a cadeira.
-Nem me fale. – Liv bufou, jogando-se para trás como ele fez. – Eu passei o dia preenchendo relatórios e respondendo e-mails que ficaram pendentes nas Inovações no tempo em que estivemos fora. Pra ser sincera, acho que prefiro enfrentar robôs gigantes a enfrentar burocracia. – Ela admitiu, fazendo o rapaz rir.
A conversa caiu num silêncio esquisito após as risadas. Os dois estavam um pouco desconfortáveis na presença um do outro, por conta de tudo que havia acontecido entre eles nos últimos dias.
-E como vai sua nova vida de celebridade instantânea? – O rapaz perguntou para fugir do clima, referindo-se a toda a loucura com a mídia por conta da identidade dela. – Já teve muitos convites pra propagandas e presenças VIP?
-Demais. – Ela respondeu, sendo irônica, e os dois riram. – Bom, eu revivi as minhas redes sociais que estavam inativas por conta de toda a história do stalker, e ganhei uma quantidade absurda de seguidores quase instantaneamente. Meu Twitter e meu Instagram estão uma loucura, eu tive que silenciar todas as notificações do meu celular. – Liv contou, arregalando os olhos. – As pessoas estão pirando um pouco com essa história de Arion, filha do Tony Stark e tal. Tem gente achando o máximo, louca pra ser minha amiga e pra saber mais sobre mim, e tem gente que por outro lado que está achando que eu sou uma farsa ou sei lá. É um pouco assustador.
-Bom, você é filha de um dos maiores empresários do mundo, e tem poderes sobrenaturais muito incríveis. Isso é uma novidade é tanto. – Apontou o rapaz.
-É, as pessoas ficaram muito curiosas com isso. É um pouco estranho ter toda essa atenção, ainda mais pra alguém como eu que sempre esteve longe do resto do mundo – Ela riu. – Mas é normal. Isso teria que acontecer uma hora ou outra, e eu sabia que seria assim. Todo mundo fica interessado e chocado, tendendo aos extremos, mas logo a história deixa de ser uma novidade, e tudo fica bem de novo.
-Você está lidando muito bem com essas coisas. – Peter constatou. – Eu não sei como eu iria reagir diante da atenção do mundo todo se descobrissem que eu sou o Homem-Aranha. – Ele girou com a cadeira. - Acho que eu piraria.
-Não piraria, não – Liv discordou, levantando-se para pegar o café que estava na bancada. – Mesmo que todos soubessem seu segredo, não mudaria nada em quem você é.
-Que profundo. – Peter brincou.
-Sou uma filósofa nata. – A garota deu uma piscadela.
-Mas é sério – Disse o garoto, caminhando até onde ela estava. – Acho muito legal a forma como você encara tudo isso. Eu sei que você costuma bancar a durona e irredutível – Ele riu, e a menina o acompanhou. – Mas, na verdade, você é muito compreensiva. O jeito que você lida com as consequências da sua identidade, e até mesmo com o seu pai, sem guardar nenhum tipo de mágoa dele por isso ou coisa do gênero, é muito legal. Nem todo mundo conseguiria levar as coisas como você levou durante todo esse tempo.
-Ah, foram as circunstâncias que me fizeram assim. – Liv deu de ombros. – Essa era minha vida, minha família, minha história. Eu precisava lidar com tudo isso, e lidei. Não é nenhum heroísmo.
-Mas você nunca foi refém disso. Mesmo com todo esse drama do Sr. Stark, você é você, entende? – O rapaz explicou. – Nunca se resumiu à sua história. Você é independente, não tem medo de ser original nem de dizer o que pensa, e pode ser inteligente e engraçada sem estar nem aí pro que os outros pensam a respeito. Se quer saber, eu fico feliz que o mundo irá conhecer Olivia McCall. – Disse ele. – Ela é uma das pessoas mais impressionantes que se tem pra conhecer.
-Se você está dizendo... – Liv arqueou as sobrancelhas, usando um tom convencido para esconder seu sorriso tímido. Ela demorou alguns segundos para voltar a falar. – Sabe, sempre achei muito fofa a forma como você vê o lado bom das pessoas. Quase me faz acreditar em você.
-Pode acreditar – Peter riu de leve. – Eu jamais mentiria para alguém que eu gosto. Porque, Liv, eu... – Ele titubeou por um segundo. – Eu posso ser honesto com você sobre uma coisa?
-Claro. – Olivia virou-se para ele.
-Eu... – O rapaz gaguejou, tímido. – Eu gosto de você. Tipo... – Ele fez outra pausa, como se as palavras não saíssem. – Não, eu estou apaixonado por você. Mesmo.
A garota ficou em silêncio total, sem saber o que dizer. Quando ela tomou fôlego para responder, Peter a impediu.
-Antes que você diga que isso é loucura e que você me odeia, me deixa explicar. – Disse o rapaz, falando acelerado. – Eu sempre pensei nisso, eu acho, mas nunca quis te dizer nada porque fiquei com medo do que você iria pensar.
-Peter... – Liv tentou interrompê-lo, mas ele não parou.
-Foi burrice total aquilo que eu fiz no quarto de hotel, te beijar daquele jeito, mas... Sei lá, aconteceu, então, se você quiser esquecer tudo isso depois para o clima não ficar ruim entre a gente, tudo bem. – Peter continuou a falar rápido por conta do nervosismo. – Eu só queria que você soubesse o quanto eu te acho incrível, e diferente de todas as garotas que eu já conheci. Eu gosto de você, mesmo você me chamando de Menino-Aranha, zoando meu uniforme e dizendo que eu só sei te irritar.
-Peter...
-E já que eu estou te contando toda a verdade, sim, eu já falei de você pro Ned várias vezes, e, sim, eu secretamente adorei quando minha tia May disse que a gente combinava. – Ele continuou, gesticulando. – Eu pensei muito antes de decidir te falar tudo isso, porque sabia que as coisas poderiam nunca mais ser as mesmas depois, mas eu...
-Peter! – Olivia praticamente gritou, desta vez conseguindo chamar a atenção do garoto, fazendo com que ele se calasse.
Assim que Peter ficou em silêncio, Liv respirou fundo para recuperar o fôlego, atordoada pela chuva de palavras. O garoto olhava para ela, atônito, esperando uma reação.
-Eu não vou dizer que te odeio. – Liv sorriu, achando graça. – Na verdade, eu acho que, pela primeira vez na vida, eu posso até dizer que eu... concordo com você.
Parker continuou olhando para ela, preocupado e confuso.
-Com essa história toda dos robôs e do Magnum, eu e você acabamos nos aproximando muito rápido. A gente trabalhava juntos, brincava, e se irritava um pouco no meio do caminho; e em algum ponto dessa história toda eu que percebi que você sentia alguma coisa por mim. Talvez por que... eu sentisse também. – Liv admitiu, fazendo o queixo do garoto cair. – Eu fiquei um pouco assustada com isso, eu acho. Por isso eu agi daquele jeito no dia em que você me beijou. Sei que eu não costumo demonstrar muito esse tipo de coisa... mas eu gosto de você também. – Ela sorriu. – Mesmo ainda achando que você é baixinho demais pra ser um super-herói.
Peter soltou um riso abafado em resposta, quase aliviado por ouvir as palavras dela. Ele desembuchara todas aquelas palavras já conformado de que ela iria dispensá-lo. Olivia riu sem graça, e tocou as mãos dele, que constatou estarem suadas; o garoto olhou para ela, engolindo seco, e aproximou o rosto para encarar seus olhos mais de perto.
Essa era a hora, não era? Peter já cometera um erro ao pensar assim antes - mas agora era diferente. Quem sabe, a primeira vez nem tivesse sido ruim, no fim das contas. Tudo que aconteceu, exatamente como foi, com tropeços e acertos, levara àquele momento; e nenhum dos dois ali queria sair dele.
Peter aproximou-se dela, e Olivia tocou os lábios dos dois. Os corações de ambos, que estavam acelerados, gradativamente começaram a se acalmar. Liv apoiou-se nos ombros do garoto, fazendo com que os corpos se encaixassem, e entregou-se ao momento fechando os olhos. Parker colocou as mãos em sua cintura, e após alguns segundos foi aprofundando o beijo. Tudo estava calmo agora, depois de tantas correrias, risadas e desavenças; eram só ele e ela, com seus sentidos cheios e pensamentos um pouco extasiados, mas levados pelo sentimento que os carregara por todo o caminho.
Porém, o momento dos dois acabou sendo interrompido pelo som de passos que se aproximaram no corredor. Olivia e Peter ouviram um pigarreio de garganta, e se afastaram rapidamente um do outro, para darem de cara com Tony Stark parado no início da sala, com os dois braços atrás das costas. Ele tinha a cara fechada em uma expressão impassível, e os encarava fixamente.
Os dois adolescentes ficaram estáticos. Por impulso, Olivia deu um passo para trás, afastando-se da figura atônita de um Peter Parker completamente pálido. Ela, com o rosto todo ruborizado, não sabia o que dizer diante do pai ali, que os olhava sem esboçar emoção.
-Boa noite, crianças. Treinando técnicas de coworking? – Disse ele, os observando com os olhos fixos.
O desespero dos dois era simultâneo. Por um fato do qual os dois adolescentes pareciam ter infelizmente se esquecido, o expediente de Stark era sempre o último a terminar, sendo ele o responsável por fechar o prédio no fim da noite – o que propiciara aquele momento nada agradável.
-Tem alguma coisa que queira me dizer, Cabeça de Teia? – Perguntou Stark, dirigindo-se a Peter com o mesmo tom apático.
O rapaz gelou ao sentir o olhar de Stark sobre si. Parecia que estava sendo fuzilado.
-Sr. Stark, é... Eu... Nós... – Peter gaguejou, totalmente desajeitado.
-Foi o que eu pensei. – Tony afirmou, antes que o garoto pudesse concluir. Ele correu os olhos pelos dois mais uma vez antes de continuar. – Agora podem ir.
Os dois jovens se entreolharam, acanhados. Eles decidiram obedecer, e começaram a andar a passos curtos e rápidos, saindo da sala sem emitir nenhum som. Escaparam um por cada lado, deixando Stark plantado no escritório.
Logo que deixaram a zona de conflito, Peter e Olivia suspiraram aliviados. Eles olharam um para o outro, e não tiveram outra reação que não fosse rir daquela situação tão péssima e inusitada. Assim que viraram a esquina do corredor, os dois caíram na gargalhada, fosse pelo nervoso, pela adrenalina, ou até mesmo pela felicidade compartilhada e secreta do momento anterior.
Os Vingadores viviam um momento conturbado e crítico. Após todas as recentes batalhas, revelações e acontecimentos, era inegável a necessidade de uma reunião para que a equipe debatesse tantas questões pendentes. Seria preciso cruzar dados, ouvir opiniões e decidir o que fazer a seguir, para que os heróis pudessem prosseguir em sua infindável batalha contra o mal.
De fato, os integrantes da equipe encontravam-se reunidos na sala de estratégias, para definir tais caminhos a serem seguidos. Olivia e Peter já haviam se encarregado de apresentar aos demais membros todas as descobertas que fizeram durante a missão em Nova York, a respeito de Magnum, Ceifador e os robôs, para que todos ficassem a par da situação. Então, logo em seguida, eles iniciaram a deliberação.
-Que péssimas férias vocês tiraram. – Banner comentou com as sobrancelhas erguidas, assim que os dois mais jovens terminaram de explanar a história.
-Sabem, nunca fui com a cara do Eric – Falou Natasha, apoiada sobre a mesa. – Mas não pensei que ele era louco assim.
-Eu nunca confiei naquele cabelo loiro dele. – Afirmou Thor, concordando com a cabeça.
-Bom, diante do que a nossa equipe Fraldas conseguiu descobrir, precisamos decidir o que faremos a seguir com a Família da Pesada e seus homens de lata. – Stark introduziu, andando em volta da bancada.
-É tão bom poder finalmente decidir alguma coisa – Romanoff comemorou, jogando as mãos para o céu.
Após a fatídica videoconferência em que a equipe se impôs diante do embaixador Callahan, o Conselho de Segurança realizou uma reunião para deliberar sobre o polêmico parecer dos heróis. Diante da situação difícil e tensa entre o governo, a mídia e a população, os parlamentares decidiram acatar parte do pedido de Tony Stark, autorizando certo nível de autonomia à equipe, em missões de baixa e média relevância. A ONU jamais daria o braço a torcer a respeito de suas restrições, e muito menos do Tratado de Sokovia – mas, reconhecendo a situação crítica e a divisão da opinião popular a respeito das falhas investigações do FBI, não lhes restou muita opção. Bem ou mal, o governo precisa dos Vingadores em seu time; e Stark soube jogar muito bem com isso, convencendo-os de um acordo bilateral durante uma conferência realizada na mesma semana.
-Bom, nós conseguimos derrotar os robôs uma vez – Tony continuou, circulando por seus colegas. – Mas é óbvio que não terminamos ainda. Os dois irmãos Pinky e Cérebro claramente irão voltar, mais cedo ou mais tarde, e eles estarão mais fortes e com mais vontade ainda de dominar o mundo. Sendo quem somos, precisamos estar preparados pra isso.
-O objetivo do Magnum é claro e simples: acabar com a gente de uma vez por todas. – Peter complementou, olhando para os companheiros. Menos para Stark, ele não tinha coragem de encará-lo. – E ele vai fazer de tudo pra conseguir isso. O Ervilha voltará no seu pior pra cima dos Vingadores, e precisamos achar um jeito de combatê-lo de igual pra igual quando esse dia chegar.
-Podemos usar o ácido especial que Liv e Peter fizeram para combater os robôs – Atestou Thor, dando sua sugestão. – Já funcionou uma vez, funcionará nas próximas.
-Seria arriscado demais. Esse ácido é muito perigoso, um erro apenas e poderíamos condenar uma cidade inteira com ele. – Visão discordou, explicando o ponto. – Foi uma primeira tentativa boa, mas acho que utilizar uma substância perigosa em combate é tudo que não precisamos agora. Podemos machucar civis e gerar um caos total.
-Eu acho que podemos fazer mais que isso. Existem soluções bem mais seguras pra essa questão, e eu estava conversando com a Olivia sobre isso um pouco antes de começarmos. – Falou Banner, encarando a garota ao seu lado. – Tivemos umas ideias legais, acho que ela pode explicar para todos. – Ele passou a palavra.
-O setor de Inovações tem trabalhado incansavelmente nos últimos meses tentando achar soluções versáteis para as imperfeições e fraquezas em nossos trajes e equipamentos. – Iniciou Olivia didaticamente. – Nós temos muitos projetos que estão em fase de teste há tempos, como o traje do Aranha de Ferro, o Cinturão do Thor e outras coisas. Talvez essa seja a hora perfeita para tirar essas ideias do papel, e começar a aplicá-las no combate contra os homens de lata.
-Se fosse há um mês, fazer isso seria dar um tiro no escuro. Mas com todas as pesquisas e dados que foram levantados a respeito do robô, nós já conhecemos o seu estilo de batalha, seus pontos fortes e fracos. – Bruce argumentou, complementando a fala dela. - Se pegarmos as ideias originais e as aprimorarmos de acordo com todas essas descobertas, podemos criar upgrades pra toda a equipe, potencializando nossos poderes e tornando-os páreo para combater os gigantes de aço.
-Excelente – Disse Tony, animado, tomando nota das ideias em uma das telas holográficas que ficava na sala. – Podemos começar isso agora mesmo. Vou dobrar os recursos para o setor de Inovações, e todos aqui que se sentirem confortáveis pra participar do processo de criação, mandem ver. Se tem algo que vocês acreditam que pode potencializar os poderes de vocês, digam. Um equipamento, um uniforme, um acessório... até as ideias mais malucas, pois podem servir pra algo mais maluco e melhor ainda.
-Vale porta copos? – Thor perguntou, erguendo o braço.
-Vai embebedar o robô? – Questionou Natasha, fazendo Banner rir ao lado dela.
-Ok, eu quero ideias. O que mais podemos fazer pra possibilitar que chutemos as bundas daqueles Megazords da próxima vez que aparecerem? – Tony lançou, buscando sugestões.
-Sr. Stark, eu tenho uma ideia que gostaria de compartilhar. – Visão se prontificou, e todos se atentaram para ouvi-lo. – Acho que, se fizéssemos isso, aumentaríamos incrivelmente nossas chances. Sei que seria difícil de colocar em prática, mas eu acredito que ter a nossa equipe completa para esses combates seria ideal. Se ao menos nós pudéssemos...
-Essa ideia está fora de cogitação. – Stark o interrompeu imediatamente, fechando a cara. Todos na sala se entreolharam, ressabiados.
-Você não quer ao menos ouvir a ideia inteira? – Olivia se pronunciou, com cuidado. O homem voltou-se para ela.
-Eu já entendi qual é o ponto. Mas não vai acontecer, então não tem porque ouvir. – Tony respondeu, direto. – Próxima ideia.
-Eu pensei que todas as sugestões aqui fossem válidas. Afinal, se nós estamos em uma situação tão crítica, toda a ajuda é bem vinda, inclusive a deles, não acha? – A garota continuou insistindo, e Stark estava perdendo a paciência.
-Isso não é ajuda, é um problema com o qual não precisamos lidar. – Ele disse, áspero.
-Não precisa ser um problema, é só...
-Já chega, Olivia – Stark a interrompeu, irritado. - Não basta você e o Cabeça de Teia ontem a noite, agora você quer incluir o Rogers nessa também?
A sala caiu em silêncio total. Tony permaneceu com os olhos fixos na garota, percebendo o que tinha acabado de dizer. Olivia o encarava, incrédula, e tinha os olhos cerrados como se dissesse “você não fez isso”. Já Peter, por sua vez, observava tudo em silêncio, de olhos arregalados e rosto pálido, encolhendo-se na cadeira.
Após alguns segundos de silêncio estranho e mortal, Tony saiu pela porta da sala na direção do corredor, dizendo que precisava de uma pausa. Todo o resto da equipe permaneceu ali dentro, sem entender nada, olhando para uma Olivia enfurecida e um Peter completamente constrangido.
-Isso é sério? – Thor arriscou perguntar, buscando uma explicação para aquela cena toda. Banner precisou conter o riso para não deixar tudo ainda pior.
Ninguém se atreveu a responder. Após alguns minutos, Olivia também acabou deixando a sala, sem dizer uma palavra. E estava declarado o fim da reunião de equipe.
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Nota da autora: Avengers Assemble!
Primeiro de tudo, muito obrigada por chegarem até aqui com a sua leitura. Espero de coração que tenham gostado e se divertido!
Guerreiros de Aço buscou, durante seus vinte e seis capítulos, entreter e surpreender os leitores, fazendo-os rir, torcer, teorizar e se empolgar, como toda história de super-herói deve fazer para envolver e emocionar. Mas, mais fundamental ainda, buscou indagar uma reflexão sobre responsabilidades, sacrifícios, missão, mídia e internet, raça humana, opinião pública, política, e sobre o componente mais delicado e complexo que inevitavelmente permeia todo herói e cidadão comum: a humanidade.
Desde o início, GDA pautou sua narrativa na humanidade. Nas fraquezas, defeitos e limitações que tornam heróis imperfeitos, e que fazem sua jornada ser tão complexa e complicada. E, que ao mesmo tempo, os tornam corajosos e capazes de sacrificar suas vidas para salvar outros humanos – mesmo quando eles resistem.
Vimos Tony Stark, Olivia McCall, Peter Parker, Eric Williams, Steve Rogers e Simon Williams, entre todos os outros heróis e vilões, errando e acertando, se colocando acima e se sacrificando, mostrando a nós que até mesmo seres superpoderosos não são perfeitos. A própria humanidade em si falhou, por medo ou ignorância, e lutaram uns pelos outros para consertar os erros ao final. Espero que essa reflexão tenha, de alguma forma, feito vocês leitores pensarem sobre si mesmos e sobre todos que estão a sua volta também.
Ao longo da história, GDA fez muitas referências a eventos do MCU e dos quadrinhos, misturando um pouco dos dois universos para criar uma narrativa completa que pudesse envolver os fãs da Marvel das duas áreas. Os irmãos Williams, Meredith McCall, os Thunderbolts e outros componentes importantes, são eventos dos gibis sobre os quais você pode descobrir mais nas minhas redes sociais (disponibilizadas mais abaixo), caso vocês tenham curiosidade de entender as conexões utilizadas nessa fic.
Agora, queria dedicar um parágrafo especial dessa nota à nossa personagem principal, a protagonista que me inspirou a escrever essa história: Olivia McCall, a nossa queria Liv.
“Caramba, GirlSilver, você escreveu uma fanfic sobre a filha do Tony Stark. Mais uma, dentre as milhares que existem por aí. Cadê a criatividade?!”
Esse sempre foi um assunto sobre o qual eu queria falar com os meus leitores.
Pra mim, a criatividade não está só em escrever algo novo, mas também em reinventar algo que já foi feito. Olivia não é o clichê de filha do Tony Stark; ela não é incrivelmente bonita e encantadora, não confunde sarcasmo e humor com falta de educação, não odeia o pai sem razão e toda a vida dela não se resume ao fato de ela ser uma Stark. O sobrenome dela nem é esse, aliás: ela é Olivia McCall, com sua própria história e sua própria jornada. Tony Stark aqui é um pretexto para uma personagem que é completa por si só. E eu gostaria muito que vocês pudessem ver mais dela no futuro.
Olivia é uma Stark, não há como negar. E ver o Tony interagindo com uma versão feminina e mais nova de si mesmo é algo muito interessante de se pensar, a primeira vista. Mas eu busquei, durante todo o desenvolvimento dos meus personagens e do meu enredo, fugir do drama adolescente e da típica relação que se espera da filha do Stark com ele e com o mundo. Tentei não fazer do Tony o Daddy Stark clichê também, sendo ciumento e possessivo, rebaixando e subestimando a filha, resumindo a relação deles às brigas. Procurei ser o mais honesta com os personagens originais quanto possível, pensando realmente, “como eles agiriam se isso estivesse acontecendo nos quadrinhos/nas telas da Marvel?”. Espero que tenha conseguido trazer uma visão mais honesta e realista a vocês.
Por fim, queria agradecer mais uma vez a você que chegou ao fim dessa história (e também dessa nota de autora interminável). Não se esqueça de me contar nos comentários a sua opinião sincera sobre tudo que leu. Se quiser saber mais sobre GDA, encontrar minhas outras obras, e interagir comigo e com outros leitores, aparece lá no meu Twitter @GirlSilver_ pra gente bater um papo. Até mais! xx
Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.
Primeiro de tudo, muito obrigada por chegarem até aqui com a sua leitura. Espero de coração que tenham gostado e se divertido!
Guerreiros de Aço buscou, durante seus vinte e seis capítulos, entreter e surpreender os leitores, fazendo-os rir, torcer, teorizar e se empolgar, como toda história de super-herói deve fazer para envolver e emocionar. Mas, mais fundamental ainda, buscou indagar uma reflexão sobre responsabilidades, sacrifícios, missão, mídia e internet, raça humana, opinião pública, política, e sobre o componente mais delicado e complexo que inevitavelmente permeia todo herói e cidadão comum: a humanidade.
Desde o início, GDA pautou sua narrativa na humanidade. Nas fraquezas, defeitos e limitações que tornam heróis imperfeitos, e que fazem sua jornada ser tão complexa e complicada. E, que ao mesmo tempo, os tornam corajosos e capazes de sacrificar suas vidas para salvar outros humanos – mesmo quando eles resistem.
Vimos Tony Stark, Olivia McCall, Peter Parker, Eric Williams, Steve Rogers e Simon Williams, entre todos os outros heróis e vilões, errando e acertando, se colocando acima e se sacrificando, mostrando a nós que até mesmo seres superpoderosos não são perfeitos. A própria humanidade em si falhou, por medo ou ignorância, e lutaram uns pelos outros para consertar os erros ao final. Espero que essa reflexão tenha, de alguma forma, feito vocês leitores pensarem sobre si mesmos e sobre todos que estão a sua volta também.
Ao longo da história, GDA fez muitas referências a eventos do MCU e dos quadrinhos, misturando um pouco dos dois universos para criar uma narrativa completa que pudesse envolver os fãs da Marvel das duas áreas. Os irmãos Williams, Meredith McCall, os Thunderbolts e outros componentes importantes, são eventos dos gibis sobre os quais você pode descobrir mais nas minhas redes sociais (disponibilizadas mais abaixo), caso vocês tenham curiosidade de entender as conexões utilizadas nessa fic.
Agora, queria dedicar um parágrafo especial dessa nota à nossa personagem principal, a protagonista que me inspirou a escrever essa história: Olivia McCall, a nossa queria Liv.
“Caramba, GirlSilver, você escreveu uma fanfic sobre a filha do Tony Stark. Mais uma, dentre as milhares que existem por aí. Cadê a criatividade?!”
Esse sempre foi um assunto sobre o qual eu queria falar com os meus leitores.
Pra mim, a criatividade não está só em escrever algo novo, mas também em reinventar algo que já foi feito. Olivia não é o clichê de filha do Tony Stark; ela não é incrivelmente bonita e encantadora, não confunde sarcasmo e humor com falta de educação, não odeia o pai sem razão e toda a vida dela não se resume ao fato de ela ser uma Stark. O sobrenome dela nem é esse, aliás: ela é Olivia McCall, com sua própria história e sua própria jornada. Tony Stark aqui é um pretexto para uma personagem que é completa por si só. E eu gostaria muito que vocês pudessem ver mais dela no futuro.
Olivia é uma Stark, não há como negar. E ver o Tony interagindo com uma versão feminina e mais nova de si mesmo é algo muito interessante de se pensar, a primeira vista. Mas eu busquei, durante todo o desenvolvimento dos meus personagens e do meu enredo, fugir do drama adolescente e da típica relação que se espera da filha do Stark com ele e com o mundo. Tentei não fazer do Tony o Daddy Stark clichê também, sendo ciumento e possessivo, rebaixando e subestimando a filha, resumindo a relação deles às brigas. Procurei ser o mais honesta com os personagens originais quanto possível, pensando realmente, “como eles agiriam se isso estivesse acontecendo nos quadrinhos/nas telas da Marvel?”. Espero que tenha conseguido trazer uma visão mais honesta e realista a vocês.
Por fim, queria agradecer mais uma vez a você que chegou ao fim dessa história (e também dessa nota de autora interminável). Não se esqueça de me contar nos comentários a sua opinião sincera sobre tudo que leu. Se quiser saber mais sobre GDA, encontrar minhas outras obras, e interagir comigo e com outros leitores, aparece lá no meu Twitter @GirlSilver_ pra gente bater um papo. Até mais! xx