How Rare and Beautiful

Última atualização: 16/03/2020

Capítulo único

É difícil contar uma história de amor.
Especialmente as que se acabam.
Tenho me perguntado há algum tempo: para onde vai o amor quando já não o sentimos mais? Será que, assim como as soluções que compõem o corpo humano, ele simplesmente evapora pelos poros? Ou que, assim como as plantas que enfeitam as casas, ele morre por falta de nutrição?
Mas antes de saber como o amor acaba e para onde ele vai, me pergunto de onde ele vem e como se acomoda em nós.
No auge dos meus 15 anos eu não sabia de muitas coisas. Eu não sabia, por exemplo, a distância entre o Sol e a Terra. Eu também não era muito boa com cálculos, o que tornava os meus pais dois progenitores aflitos que se questionavam o tempo todo qual seria o futuro da sua filha incrivelmente mediana. No entanto, para a sorte deles – e minha também – eu fui agraciada com o dom da curiosidade.
Sim, dom!
Dom porque era graças a ela que eu aprendia sozinha a maioria das coisas que eu sabia fazer o que, vale pontuar, não eram muitas coisas.
Meu pai, Bernard Bailey, trabalhava em uma multinacional e por isso nós moramos em diversos países. O último e mais especial de todos foi a Coréia do Sul. Minha mãe trabalhava como contadora e devido ao seu currículo tinha uma facilidade gigantesca em encontrar um trabalho.
Eu me lembro exatamente do momento em que coloquei meus pés na Coréia pela primeira vez. Meu corpo formigava e haviam tantas borboletas no meu estômago que eu estava com medo de flutuar. Esse sentimento era o que eu tinha de mais precioso na minha vida e eu não sei conceitua-lo muito bem, mas eu o chamava carinhosamente de “sonho”, porque sempre que ele surgia eu parecia estar em um sonho.
Cada país me trouxe uma expectativa, um aprendizado e um amor diferente. Na França eu aprendi a patinar no gelo e achei que esse seria o meu destino, lá eu conheci Gabrielle, minha instrutora. Na Dinamarca, eu conheci Alex, meu primeiro-e-grande-amor que acabou em menos de um mês. A Coréia me apresentou Kim Geong e , dois irmãos que mudariam minha vida para sempre.
Como eu já mencionei, eu não sabia de muitas coisas. Mas eu sabia que a primeira impressão que alguém tem sobre nós geralmente é a que comanda todos os pensamentos dela sobre quem nós somos, e a minha primeira impressão quando coloquei meus olhos em foi como se uma das borboletas do meu estômago entrasse em combustão levando todas as outras consigo e me queimando por inteira. Eu tinha 16 anos e era a pessoa mais rara e bonita que eu já havia conhecido em toda a minha vida.
Embora eu me achasse um ser humano sem absolutamente nada de especial e por isso ele jamais teria olhos para mim, ele achava que eu era o máximo nas aulas de arte e por isso sempre queria ser minha dupla. Não demorou muito para que o garoto se tornasse uma parte importante da minha vida, para quem eu confessava todos os pensamentos que me arrebatavam e me mantinham acordada pela madrugada.
– Você já se perguntou de onde vem o amor? – questionei , enquanto dividíamos um Kimchi no centro da cidade.
– Na verdade, não – me respondeu com a boca cheia, fazendo com que um pouco de molho picante caísse em sua roupa. Não havia uma vez sequer que as roupas dele saiam intactas do almoço. – Você já?
– Mais vezes do que eu gostaria de admitir. – Ri para ele.
– Sabe... você é complexa. Acho que você pode ser um gênio – disse, enquanto me encarava. – Eu acho mesmo isso.
– Eu nunca pensei que diria isto, mas você é a pessoa mais burra que eu conheço. – Ele fez uma careta ao me ouvir falar. – Eu não tenho nada de especial.
– Mas você tem muito a dizer! Sua mente trabalha muito mais rápido que a minha em relação a esses questionamentos. – Revirei meus olhos enquanto o assistia atacar a comida. Logo, limpei seus lábios. – Obrigado! Você já encontrou uma resposta para a sua pergunta?
– Acho que ninguém é verdadeiramente capaz.
Eu sabia que nem sempre ouvia minhas reflexões com atenção, pois ele mesmo tinha as suas próprias. Porém, lento como um barco e avassalador como uma tempestade meus sentimentos por ele começaram a ficar tão intensos que eu sequer conseguia esconder. E talvez, em compasso aos meus, os sentimentos dele também surgiram de forma que meus olhos simplórios não puderam notar.
No dia 13 de abril em um parque florido pela primavera, os olhos de me beijaram antes mesmo de seus lábios. O segundo antes do nosso primeiro beijo foi o momento mais silencioso e intenso que eu já havia vivido. Se antes eu parecia estar em um sonho, naquele momento eu tinha plena certeza de que eu havia voado até maior altitude possível e caia em voo livre, sem qualquer paraquedas.
– Vou te chamar de Rose – falou com seus lábios colados aos meus em um carinho macio.
– Por quê? – perguntei com meus olhos bem fechados enquanto aproveitava nosso momento.
– Porque neste exato momento você está tão vermelha quanto uma rosa.
E assim ele se tornou o meu grande amor-estrela-cadente e, como qualquer outra garota de 16 anos, eu imaginava nosso futuro brilhante e o destruía todas as vezes que discutíamos, apenas para refazê-lo de forma muito melhor quando nos reconciliávamos. Geong sempre fazia o papel de mediadora, pois, dizia ela, que era nossa maior fã. Ela também havia se tornado minha melhor amiga tão rápido quanto um piscar de olhos.
– A primeira coisa que nós devemos fazer aqui é comprar uma máscara divertida para você – ela me disse em um dia qualquer, assim que saímos da escola. Geong era uma entusiasta em me mostrar todos os lugares possíveis de Busan. Nós andamos por poucos minutos pelo centro até encontrarmos uma loja com vários dos itens. – Não dá para ter só uma no armário, porque, especialmente no inverno, elas se tornam um acessório. E eu tenho que admitir que eu adorava o entusiasmo dela em tentar me tornar uma legítima coreana. Além disso, Geong gostava de saber sobre meu passado e sobre os países que eu já havia vivido.
– Por que vocês usam máscaras aqui? – indaguei enquanto passeava meus olhos pelas prateleiras.
– São muitos os fatores, mas o que determina é a poluição do ar e facilidade de se espalhar uma doença por aqui. Sem contar que elas são muito estilosas, você já viu como andam os astros coreanos?
– Eu não conheço muitos astros coreanos, para ser sincera – respondi um pouco envergonhada.
– Então você precisa conhecer!
Dessa forma, meu primeiro ano na Coréia foi dividido entre uma amiga entusiasta com uma estrangeira, um namorado que realmente acreditava que poderia haver um grande gênio dentro de mim e uma dificuldade enorme de comunicação com qualquer outro coreano que não fosse os dois.
Acontece que todo aquele futuro brilhante, que só existia dentro da minha cabeça, foi rudemente desfeito quando me contou que seria trainee de uma empresa que o transformaria em um ídolo. Talvez a minha falta de empatia e a falta de esperança em uma carreira promissora para mim mesma ao se juntar com a frustração em ver o futuro (que apenas alguns anos depois eu consegui enxergar sua mediocridade) que eu havia planejado se esvaziando tenha afetado minha compreensão, pois todas as ideias dele pararam de fazer sentido para mim e pouco a pouco nossas mentes criaram caminhos diferentes. era um poeta maravilhoso e saber disso me deixava cada vez mais frustrada em relação à minha – quase nada – habilidade para as coisas, já que enquanto ele lutava para ser reconhecido pelo seu talento eu sequer sabia qual era o meu.
Deitados em sua cama eu observava o peito do meu namorado subir e descer calmamente enquanto seus olhos brilhavam.
– Você está triste – afirmou, e embora eu não quisesse demonstrar sabia que mal conseguia disfarçar minha expressão rude.
– Eu estou feliz por você.
– E triste por nós. – me olhou com carinho e passou seus dois braços ao redor do meu corpo, com seu rosto apertado na curva do meu pescoço, inspirando fundo cada centímetro da minha pele. – Não precisa ser assim, nós podemos fazer isso funcionar.
Infelizmente para , ele havia se comprometido com uma garota que possuía mais descrenças que crenças, e minha falta fé provavelmente seria minha ruína, eu sabia. No entanto, não pude deixar de perder a fé em nós no momento em que ele me disse que moraria em Seul, mesmo com toda a sua calma e positivismo.
– Sim, nós podemos – respondi, ainda que não acreditasse no que eu mesma falava.
No dia em que ele se mudou eu fui fortemente atingida por um vendaval de inseguranças e incertezas e em pensamentos da tolice que cercava minha vida. O quão maléfico é para uma garota de apenas 17 anos apegar-se tanto à um amor fadado ao fracasso? Mais importante ainda: apegar-se a qualquer amor que não fosse o próprio?
Mas a de 17 anos tinha todo o direito de estar triste, isto porque a evolução do nosso pensamento em relação às nossas crenças, como a que eu tinha no amor-apego, acontece com o tempo e com a experiência. Mas no aeroporto de Gimhae eu só conseguia pensar no meu namorado dentro de um avião rumo ao seu futuro encantador.
Eu o visitaria no inverno.
Mas o inverno não chegou para nós.
Contar para que meu pai havia sido transferido para a Inglaterra e que consequentemente eu me mudaria também foi um dos maiores desafios da minha curta vida, porque, apesar de todas as circunstâncias, eu ainda me apegava ao sonho de poder me casar e viver meu amor de forma livre com ele. Mas quando ele atendeu minha ligação, minha voz tremeu com meu coração apertado e eu me agarrei a única coisa que eu poderia.
— Nós vamos ficar bem, juntos para sempre – disse com sua voz costumeiramente calma, enquanto eu apenas queria implodir. – O que é uma distância para duas pessoas que sentem tanto quanto nós dois?
Eu confiei naquelas palavras assim como eu confiaria em qualquer coisa que ele dissesse.
O tempo pareceu passar rápido como um raio. estava decolando em todas as áreas de sua vida, ele me ligava sempre que podia, conversávamos sobre a vida, sobre minha faculdade, sobre o seu debut que não demoraria muito para acontecer e sobre meus pais.
— Design? – Ele riu pelo telefone. – Isso é incrível! Eu sempre soube do seu talento, desde as nossas aulas de artes.
— Pena que você nunca me deixou exercer minha criatividade na escola.
— Amor, eu não acho que quebrar a parede da escola seria visto como uma escultura contemporânea. – Riu mais ainda, aquecendo meu coração ligeiramente gelado. – Eu acho que nós seríamos expulsos.
— Você provavelmente tinha razão.
— Ei, eu fiz uma música nova, você quer ouvir?
E como sempre com sua voz suave ele cantava para mim até que eu pegasse no sono e o deixasse falando sozinho, ou até que ficássemos cansados demais.
Apesar de amar com todo o meu coração e acreditar fielmente que ele era o único homem neste mundo que faria meu coração palpitar da forma que ele fazia, a vida adulta me atingiu em cheio: a faculdade, o primeiro emprego, relações interpessoais que eu deveria manter, sendo assim, a presença de no meu cotidiano foi lentamente sendo deixada para trás, os assuntos foram diminuindo com o passar das semanas e, junto a eles, as ligações. Eu dizia para mim mesma que nós dois estávamos ocupados demais para as ligações uma vez por semana, mas que eu ainda morava em seus pensamentos e em seu coração, pois era a única maneira que eu havia encontrado de me sentir um pouco menos estúpida por pensar nele todos os dias.
No que pareceu questão de poucos dias o nome de e de seu grupo estava em todos os jornais e meu namorado, que mal conversava comigo, era um ídolo mundial. Eu tinha 19 anos e trabalhava como garçonete em uma pizzaria de Londres.
Naturalmente como a vida e a morte eu já não sabia mais quem era e o mundo não sabia da minha existência. Suas ligações aconteciam uma vez por mês. Minhas mensagens eram ignoradas, mas eu ainda insistia em dizer para mim mesma que ele ainda estava lá: o amor. Guardado em um lugar tão profundo que apenas eu e poderíamos encontrar.
Acontece que nós o guardamos tão bem que em algum momento da minha curta existência eu o perdi de vez. Percebi isso quando me formei na faculdade e meu namorado não estava lá. Não houve mensagem de parabéns. Não houve ligação. Quando peguei meu celular para ligar para ele, havia mudado seu número me apagando de vez da sua vida.
Minha história com ele me faz pensar todos os dias para onde o amor vai. Para onde o nosso amor foi? Se eu percebesse que ele estava se perdendo talvez o teria segurado com toda a minha força e esperado por , que não voltaria mais, e aí me lembro que eu estava exausta de segurar um sentimento sozinha, embora eu não o culpe por seguir a vida que ele sempre quis ter para si, da mesma forma que eu fiz com a minha.
Não houve despedida na última vez que eu o vi porque ninguém está preparado para despedir-se de um grande amor.
O que me leva a outro período da minha vida.
Ainda morava na Inglaterra, se quer saber! Me formei em Design e trabalhava em uma agência que desenvolve personagens para uma linha de produtos de maquiagem e cuidados com a pele para uma empresa renomada e, apesar de nunca ter me conformado com a ideia de que a vida que eu construí é a única que eu poderia ter, eu gostava de tudo que cercava minha realidade.
Na mesma agência em que eu trabalho conheci Louis, um homem de trinta e poucos anos que tinha esperança de expandir o trabalho da sua pequena agência de publicidade e propaganda para outros países e, enfim, ter a vida que eu sempre tive. Foi cômico quando nos conhecemos e ele disse que o sonho dele sempre foi morar em vários países, pois eu nunca sequer havia refletido sobre a possibilidade de viver o sonho de alguém.
Louis era um homem fenomenal, devo ressaltar! Desde o nosso primeiro encontro ele acreditou nos meus sonhos e enxergou potencial em todos as características que eu levava como defeitos. Ele imaginou tanto o seu futuro comigo que eu passei a imaginar também e, por isso, em pouco tempo eu iria me casar com ele.
Observei ele se apressar naquela manhã em especial já que ele iria de bicicleta para o trabalho, porque meu noivo acreditava fielmente na salvação do planeta Terra com a diminuição da emissão de alguns gases na atmosfera. Ele beijou desajeitadamente a minha testa enquanto arrumou seu terno
— Amo você! – sussurrou contra os meus lábios. Eu não precisei responder, Louis sabia que eu o amava.
Caso esteja se perguntado, Geong e eu mantivemos nossa amizade apesar de todas as circunstâncias em nossas vidas e sempre que nos falávamos, o assunto “ ” era evitado, mas devo confessar que sempre me perguntei se eles ainda conversavam sobre mim ou se pensavam em mim com algum carinho. Não doía mais, se quer saber, era uma memória agradável e vazia ao mesmo tempo: agradável porque ele me mostrou a minha capacidade de amar e me fez repensar em toda a minha crença no amor, e vazia porque raramente aparecia e não causava mais a combustão de borboletas no meu estômago. Pelo menos não até uma quinta-feira, quando Geong me ligou.
– Olha só o que eu acabei de receber – disse assim que eu atendi sua chamada de vídeo. Ergueu o envelope que continha meu convite de casamento dentro. – Ficou incrível, , você desenhou toda a história de vocês aqui.
– Achei que ficaria incrível. – Sorri confiante. – Você vem?
– Aí, amiga, eu não posso dar certeza, porque você sabe que é difícil, né? – lamentou.
– Claro, eu vou entender se não vier, mas eu amaria ter você comigo nesse momento tão especial. – Ficamos em um silêncio desconfortável por alguns minutos. Geong agia como se procurasse as palavras certas. – Eu fiquei em dúvida se o convidava ou não. – Iniciei o assunto.
– Eu também recebi o convite dele. – Ela ergueu o papel para a câmera.
– Você acha que eu fiz certo? – perguntei insegura. – Eu me senti culpada por tantas coisas e por tanto tempo – desabafei. – Eu estou cansada de pensar que se eu tivesse sido mais forte ou esperado mais talvez esse convite fosse meu e dele. – Senti o peso das minhas próprias palavras. – Todos os dias eu acordava e a primeira coisa que vinha até a minha mente era o rosto dele. E sabe o que mais me deixa intrigada? – Não esperei ela responder para continuar. – Eu nunca derramei uma lágrima sequer por ele. – Sorri sem humor algum. – Acho que nós nunca tivemos a menor chance! Mas de qualquer forma vocês foram uma parte linda da minha vida e eu gostaria de compartilhar isso com vocês. – Me referi ao casamento.
Não me pergunte de onde as palavras vieram, acredito que eu as tenha guardado por tanto tempo que elas simplesmente não aguentaram mais a prisão dentro de mim.
– Você não tem culpa de nada – disse simplesmente. – Se alguém errou foi ele. – Geong pareceu ponderar algo. – Ele ainda fala sobre você as vezes. – Meu coração disparou no mesmo momento em que as palavras escorreram pelos seus lábios. – Ele sente muito por terem se afastado, mas eu sinceramente não acho que você seja algo além de um fantasma na vida dele. Sei que pode parecer duro, mas acontece, todos nós seguimos nossas vidas em algum momento – concordei com ela. – Ele terá uma pequena folga e virá para casa, eu vou entregar para ele.
— Tudo bem, eu tenho que trabalhar agora. Nos falamos mais tarde!
E assim como todos os outros dias em minha vida, eu dividia meu curto tempo em trabalhar e cuidar da casa onde eu e Louis vivíamos. Seguia minha vida sem pensar muito no que aconteceria depois, acredito que minha adolescência e juventude foi tão cercada de medos e ansiedades que eu perdi todo o meu tempo planejando coisas que, nos dias atuais, não se realizaram. Sete dias depois da ligação com a minha amiga que morava no outro lado do mundo, eu não havia recebido qualquer reposta em relação à presença dela ou do irmão no meu casamento. No entanto, naquela quinta em especial Geong não me ligou. Esperei curiosamente a ligação por horas, mas ela só aconteceu na sexta-feira assim que meu noivo deixou nossa casa. Atendi a ligação em vídeo apenas para fazer meu coração adormecido saltar pela boca. Namjoom me encarava perplexo pela tela do celular. Ficamos um tempo em silêncio, absorvendo cada segundo daquele momento particular. estava mais velho, mas tão bonito quanto eu me lembrava.
— Cabelo cinza? – disse a primeira coisa que me veio à mente. – Uau.
— Você gostou? – respondeu timidamente.
— É, ficou bom. – Sorri. – Onde você está? – falei apressadamente, como eu fazia todas as vezes em que eu ficava nervosa, vendo-o abrir um sorriso curto.
— Olha. – Ele disse e apontou a câmera para um prato de Kimchi posicionado à sua frente.
— Faz anos que eu não como isso. – Lembrei nostálgica.
— Eu como sempre que posso. – Ele riu e eu que duvidava que meu coração poderia bater mais forte, fui desafiada por ele. – Eu te liguei porque vim para casa e... – Ele respirou fundo. – Eu recebi o seu convite. Ficou muito bonito, a propósito. Você que o fez?
— Sim. – Foi tudo o que eu disse.
– Eu sempre soube do seu talento – disse enquanto dava mais uma garfada no seu prato de Kimchi.
— Você sempre diz isso – retruquei com um sorriso curto enquanto assistia ele abrir a boca em um sorriso sujo de molho.
Confesso para você que imaginei esse momento durante muitos meses assim que eu percebi que e Bailey estavam acabados para sempre. Primeiro imaginei que poderia dizer a ele que tinha me formado com honra e feito doutorado no Japão, se eu realmente tivesse feito. Depois, pensei que talvez já teria um filho e mostraria para ele. Por último, e a pior das possibilidades, eu ainda estaria sofrendo por ele. Mas quando finalmente me ligou enquanto comia o Kimchi que sempre dividíamos, eu me senti a adolescente com coração alado que eu sempre havia sido. Eu queria sentir raiva, queria mostrar para ele que eu estava muito bem e que minha vida com certeza estava muito melhor que a dele, mas eu apenas senti que deveria contar tudo o que eu aprendi e todos os lugares incríveis que eu conheci e como minha vida havia tomado um rumo que eu jamais imaginei que tomaria, pois, por mais que eu não gostasse de admitir, ele foi e sempre será meu grande confidente. E mais: eu queria saber tudo sobre o homem de cabelo cinza e camiseta suja de molho picante que estava no vídeo para mim naquele exato momento. Mas meus pensamentos foram cortados quando uma voz diferente soou ao fundo da chamada.
— Essa é a garota do ? – alguém perguntou.
— Espera, o tem uma garota? – Outra voz.
— Quem seria a louca? – Ouvi risadas e de repente um par de olhos puxadinhos e cabelos platinados apareceram na tela: — Oi! Eu sou o , quem é você? – Olhei perdida para enquanto mais homens tentavam se apertar para caber na pequena tela do celular.
— Essa é a minha banda. – Ele riu. – E essa, pessoal, é uma grande amiga que vai se casar em breve. – Ouvi um coro com “ah”.
— A “amiga” que vai se casar, nós entendemos – um homem de cabelos um pouco ondulados e um sorriso que beirava a perfeição disse. – Eu sou o , mas pode me chamar só de mesmo.
— Vocês não têm mais o que fazer não? – perguntou olhando para sua banda. – Me desculpe, não existe no mundo alguém mais curioso que eles.
— Tudo bem! – Sorri amarelo enquanto observava o semblante relaxado dele mudar a forma.
— Eu estarei em Londres em dois dias – iniciou. – Eu gostaria muito de te rever, se não for te causar problemas.
De todas as vertentes do meu possível diálogo “futuro” com , eu nunca imaginei que ele, um homem extremamente famoso, cogitaria se encontrar comigo e sua ideia havia me pegado completamente de surpresa.
— Tudo bem, claro. – Sorri. – Vai ser legal.
— Ótimo! Eu vou pegar seu número com a minha irmã e te aviso quando eu estiver aí, pode ser?
— Certo – respondi ao me lembrar de como foi doloroso perceber que meu namorado havia mudado de número sem me adicionar à nova lista de contatos.
— Certo! Tchau, Rose.

No dia 22 de junho eu encarei meu reflexo no espelho, com um sorriso irônico. Aliás, o quão irônico era a minha própria vida? Há dois dias do meu casamento minhas mãos tremiam só de pensar na possibilidade de me reencontrar com o amor da minha na adolescência. A verdade é que eu não estava nervosa só porque era meu ex-namorado, mas porque eu sequer sabia sobre o que falar com ele, pois era um completo desconhecido para mim embora eu tenha ouvido falar muitas coisas positivas sobre sua banda, especialmente da Cady, a filha de 13 anos da minha vizinha. Certa vez, enquanto ela se derretia por um tal de , eu perguntei a ela se ela conhecia o e ela me disse algo como “Oh! Sim, eu conheço!”, e então eu disse para ela que já havia namorado com ele e a reação dela foi impagável. Certo, eu sei que eu poderia ter causado uma grande confusão, mas ninguém liga para o namoro adolescente de uma pessoa famosa.
Enquanto eu caminhava pelo parque à espera de , comprei um cachorro quente e comi lentamente, pois gostaria que ele provasse a versão inglesa do prato, já que ele só conhecia a coreana que era muito diferente. Não demorou muito para que ele chegasse com uma blusa branca presa às calças jeans, all star de cano alto e óculos escuros. Ok, talvez eu tenha engasgado quando pousei meus olhos nele, que abriu um lindo sorriso assim que me viu.
— Por que sempre que eu te vejo você está comendo? – perguntei a ele, que portava um saquinho de balas na mão.
— Poxa, eu adoro essas balas. E o que é isso que você está comendo? – indagou enquanto já pegava o cachorro quente das minhas mãos.
— É o cachorro quente daqui – disse.
— Ah, eu conheço! Em alguma das turnês eu comi muito. – Ele sorriu.
— Claro, você já deve ter vindo para cá algumas vezes.
— Algumas – concordou enquanto começamos a caminhar. Reparei em alguns fotógrafos que não demoraram para chegar.
— Olha só, sendo seguido por paparazzi – comentei rindo um pouco desconfortável.
— Você se acostuma! – disse casualmente e eu aproveitei para colocar os meus óculos escuros também. – Seu noivo sabe que está comigo?
Ri levemente e peguei o pacote de balas das suas mãos.
— Por que ele não saberia? Nós contamos tudo um para o outro.
— Não sei, eu sou seu ex-namorado. – Mastigou mais um pedaço do meu cachorro quente.
— Não é grande coisa – comentei despercebida e ele fez um “ouch” enquanto colocava a mão no peito. – Não foi isso que eu quis dizer, .
— Tudo bem, eu entendo.
— Você fica até quando? – perguntei enquanto entravamos por um caminho com um pouco mais de árvores e mais privado que o anterior.
— Tenho um show hoje à noite e amanhã eu vou embora.
— Poxa, mais um dia e poderia ficar para a cerimônia.
— É... Bom você sabe que é difícil.
— A agenda? – perguntei distraída.
— Na verdade, ver você se casando.
me acertou em cheio com a resposta e imediatamente eu procurei seus olhos com os meus, apesar de cobertos com os óculos. Meu ex-namorado abriu um sorriso melancólico enquanto tentava me passar confiança, mas eu não soube o que dizer.
— Por que você nunca mais me ligou? – iniciei de repente, tentando esconder a tristeza repentina que me acometeu.
– Eu queria ter a resposta para isso e para muitas outras coisas. – Ele suspirou. – Eu não sei, , acho que a vida foi acontecendo e eu fui priorizando outras coisas e em algum momento eu procurei por você e percebi que você não estava mais lá, como se tivesse desaparecido. – Ele colocou as mãos nos bolsos enquanto eu atacava mais balinhas. – Eu sabia que o erro tinha sido todo meu e que provavelmente você estaria muito chateada, mas eu não sabia mais como voltar. – Sorriu sem qualquer humor. – Eu sinto muito.
Eu queria poder xingar ele e dizer que ele me partiu em tantos pedaços e tão pequenos que eu demorei anos para me reconstruir, mas tudo o que saiu pela minha boca foi um suspiro cansado.
– Tudo bem, . Nós erámos crianças.
– Sim, nós erámos. – Virou-se para mim, sem parar de caminhar. – Mas absolutamente todos os meus sentimentos foram reais e eu me odiaria se deixasse você pensar que em algum momento das nossas vidas eu menti para você. Me desculpe por ser tão ruim em demonstrar meu amor.
No ápice da nossa conversa fomos interrompidos por um grupo de garotas tão jovens quanto nós dois quando nos apaixonamos. Elas queriam fotos com e mais que isso, queriam saber quem eu era. A interação do grupo me deu tempo para pensar exatamente no que estava acontecendo: ele estava me pedindo desculpas por tudo o que ocorreu e confesso que me perguntei o que eu faria com aquelas desculpas.
– Nós fizemos muitas promessas que não saberíamos se iríamos cumprir ou não – comecei assim que o grupo se afastou. – Acho que todo mundo faz isso, está tudo bem.
– De fato! – concordou. – Você encontrou a resposta para seu questionamento sobre o destino do amor? – Lembrou-se.
– Eu parei de procurar a resposta quando conheci Louis.
– Você está feliz? – perguntou repentinamente e pareceu arrependido logo em seguida. Sorri sincera embora esse questionamento me assombrasse todos os dias em todos os momentos da minha vida. Mas acho que não seria diferente se meu destino fosse com , pois Bailey sempre se questionava.
– Estou – afirmei. – Eu encontrei um jeito de me fazer feliz.
– Que bom, Rose. Eu gostaria de apresentar minha banda para você, mas o nosso tempo é tão curto.
– O nosso tempo é sempre curto. – Sorri. – Quem sabe um dia?
Ao fim do nosso passeio que não durou nem duas horas, eu me livrei de um peso que me acompanhava há anos e finalmente descobri o que significavam as desculpas de : meu álibi para ser livre. Ele não apenas se desculpou, ele me libertou e se libertou do amor que tínhamos e que nos fazia tão reféns de uma dor que nos acompanhou durante alguns anos. e eu estávamos enfim nos despedindo.

No dia do meu casamento com Louis eu não conseguia pensar em outra coisa senão manter a minha calma para não surtar. Eu queria que tudo estivesse sob absoluto controle. Não lembro de ter me sentido tão nervosa há anos. Em meu quarto de hotel, com os cabelos presos em bobs e muitos buquês de flores me cercando, que meu próprio noivo havia me enviado, eu só conseguia pensar no momento em que eu diria “sim” ao homem que me fazia feliz.
Eu estava sendo maquiada quando um par de olhos puxados entrou pela porta. Meu coração saltou de tamanha alegria.
– Você veio! – Me levantei no mesmo instante em direção à minha melhor amiga, que estava de braços abertos. Ela me acolheu em seus braços fraternos como há muito não fazíamos.
– Eu não deixaria este momento passar por nada – Geong me respondeu. – Você está ficando tão bonita, !
– Obrigada, amiga – agradeci com meu peito cheio de alegria. – Fica aqui comigo?
– Claro que eu fico! – afirmou, enquanto se sentava na cama da minha suíte.
– Como foi o seu voo? – perguntei.
– Amiga, eu quase surtei – confessou. – O voo atrasou e eu só pensava em chegar a tempo. Fora isso, um alemão super bonitinho sentou do meu lado, mas nossa história acabou quando fizemos conexão no país dele – contou, me fazendo rir enquanto voltava a ser maquiada.
Enquanto Geong não para de falar sobre todos os acontecimentos que eu perdi na Coréia esses anos todos, algumas batidas na porta se fizeram presente e eu apenas respondi para quem quer que fosse, que poderia entrar. E então um buquê enorme de flores de cerejeiras foi entregue para mim. Era o maior e mais diferente buquê de todo o meu quarto. Minha amiga se calou ao meu lado ao observar a beleza estampada no buquê em minhas mãos.
– Dessa vez seu noivo se superou – comentou com um sorriso.
Peguei em minhas mãos o pequeno cartão escondido por entre as pétalas. No papel, aparentemente decorado a mão, o nome de , escrito na grafia coreana, brilhava.
“Para a noiva mais linda que cruzou o meu caminho, com seu coração puro e seus olhos de Marte. Que rara você é. Que você seja feliz hoje e todos os dias em sua caminhada. Que o amor regue a flor do seu ser todos os dias em sua linda existência. Você estará para sempre em meus pensamentos.
Com amor, ”.

Meus olhos cheios de lágrimas terminaram de ler as escritas no cartão enquanto meu coração se apertava em um misto nostálgico de amor, carinho e saudade. No momento, pouco antes do meu casamento com outro homem, eu soube que seria eternamente um amor. E esse fato não me deixava completamente feliz embora me aliviasse saber que tudo o que tivemos havia sido tão puro e real que atravessaria a eternidade, mas me lembrava também que a eternidade seria conciliada à distância. E que talvez, na vida simplória e comum que eu escolhi levar, não havia mais espaço para .
Quanto amor cabia dentro de mim?
– O que Louis escreveu? – Geong me perguntou.
– Na verdade, é do seu irmão – respondi simplesmente, assistindo um sorriso terno estampar o rosto fino da mulher. – Ele se lembrou – afirmei.
– Ele não esqueceu nem por um dia.

Caminhei lentamente pelo altar montado no campo que abrigava meu casamento, com meu pai sorridente ao meu lado. Apesar de feliz, meu peito gritava ecos de uma intuição que me dizia que não era ali que ele queria estar. Passei meus olhos pelos meus convidados e os olhos brilhantes de Geong atraíram os meus. Que doce ela era. Sorrindo orgulhosa e melancólica ao me ver naquele momento. Por um segundo eu quis abraça-la tão forte que todo o tempo seria apenas um sonho e eu acordaria deitada no sofá da casa da minha amiga, com ela e meu namorado brigando para escolher um filme enquanto eu só conseguia pensar em como eu amava minha realidade e amava ainda mais os dois.
Por outro segundo, ao olhar para o meu futuro marido que tinha olhos lacrimejados de emoção ao me ver no vestido branco que ele sonhou desde a primeira vez que seus lábios tocaram os meus, eu senti que talvez fosse ali mesmo que eu deveria estar. E pela primeira vez, eu calei os gritos da minha intuição.
No dia 05 de janeiro eu disse sim à Louis. E assim me comprometi a passar o resto dos meus dias ao lado dele.
Mas para Bailey “resto dos meus dias” é muito tempo.
Não me levem a mal, Louis foi um ótimo marido, mas para mim isso era o pior. Aos poucos eu me vi abandonando meu emprego, minha carreira e meus grupos de amigos para cuidar dele, que sempre me agraciava com jantares formais com os sócios da sua empresa, flores ao fim do dia, vinhos caros e tudo mais o que uma legítima dona de casa pode contentar-se.
– Feche os olhos – pediu o meu marido. Eu, com um sorriso curto, obedeci. – Abra a boca.
– Você está pedindo demais – brinquei, fazendo-o rir.
– Confie em mim, amor.
Abri minha boca sentindo Louis colocar um pequeno bombom com um sabor maravilhoso dentro dela. Abri meus olhos lentamente, ainda em deleite com aquele pequeno prazer em uma plena sexta-feira.
– Ganhei de um cliente suíço. É maravilhoso, não é?
– Muito bom mesmo! – respondi enquanto assistia ele despir-se de sua gravata. – Amor, o que acha de sairmos hoje? – iniciei. – Podíamos sair para dançar ou simplesmente fazer uma caminhada no parque.
– Ah, meu amor, eu estou muito cansado, meu dia foi cheio. Eu estava pensando em jantar e ir direto para a cama – respondeu sem me dar muita atenção. – Aliás, você já fez o jantar?
Eu estava casada há seis meses quando subitamente percebi a tragédia que minha vida havia se tornado, em que todos os sonhos que eu persegui e batalhei para realizar estavam jogados na lixeira da casa, no subúrbio da cidade, em que eu morava.
– Não! Eu não fiz o jantar hoje.
Alguns dias eu era tomada por uma imensa vontade de voltar à agência, desenvolver os projetos que eu havia deixado de lado e exercer minha criatividade, mas meu marido me dizia que não precisávamos, pois já tínhamos renda o suficiente com apenas um trabalhando. Em outros dias da semana, eu visitava meus pais para me sentir um pouco menos entediada e, ainda que eles fizessem o máximo para disfarçar, eu podia ver a decepção transpassando os olhos deles pelo que eu havia me tornado.
Eu não sabia o que a mente do meu marido esperava do nosso casamento, então em pouco mais de sete meses, ele começou a insistir em uma gravidez, o que para mim era impensável no momento em que estávamos vivendo. Contei para Geong, em uma das nossas quintas-feiras.
– Então você não está feliz? – me perguntou com seu olhar que me analisava.
– Por que temos essa obsessão em sermos felizes? – respondi com meu rosto afundado no balcão da cozinha.
– Acho que é porque esse é o objetivo, não é? Não adianta termos tudo e não estarmos felizes com isso.
Olhei, através da tela do meu computador, os olhos que me transmitiam a segurança de um lar.
Geong? – chamei, vendo-a corresponder. – Eu preciso de ajuda, não estou feliz!
Eu gostaria de poder explicar o que admitir minha infelicidade havia significado para mim. Justo para mim, que deixei tantas oportunidades de lado para sempre agradar alguém que estivesse ao meu redor. Primeiro os meus pais. Depois . E por fim, Louis.
Minha avó costumava dizer, quando eu era mais nova, que diferentemente da minha mãe, meu coração era preenchido com o altruísmo e que eu pensava milhões de vezes em outras pessoas antes de pensar em mim, e assim eu colocava a felicidade dos outros sempre à frente da minha. Eu achava que ela estava me elogiando, mas eu percebi, muito tempo depois, que ela estava com pena de mim.
O ápice da minha infelicidade foi em uma segunda-feira quando meu marido, sem se esquecer da ideia de ter um filho, quis me obrigar a ir contra a minha vontade e contra o meu controle sobre meu próprio corpo.
– Você não me ama? Esse é o problema? – Ele esbravejou.
– Louis você está se escutando? – respondi com a mesma voracidade. – Você está duvidando do que eu sinto simplesmente porque eu não acho que seja o momento para ter um filho!
– Se você me ama e tem certeza de que sou eu quem você quer, qual o grande problema em termos um filho afinal? – perguntou, depois de algumas horas de discussão, o que havia se tornado rotina entre nós dois.
– Acontece que eu não tenho mais certeza se é você quem eu quero – gritei sem pensar antes, em meio as lagrimas que insistiram em cair pelo meu rosto. Respirei fundo enquanto uma expressão pura de choque surgiu no lindo rosto do meu marido. – Afinal... – Terminei da mesma forma que ele.
Sentei-me ao sofá com o rosto em minhas mãos. Naquele momento, se eu pudesse desejar algo a todos os homens com quem eu me relacionei de alguma forma nos meus 24 anos, eu desejaria a sensibilidade e a maturidade necessária para entender os sentimentos de uma mulher que decide romper com as barreiras que lhes são impostas e mais ainda, desejaria amor o suficiente a todos eles para entender uma mulher que decide colocar seu amor próprio em primeiro lugar. Mas Louis não era um homem sensível, maduro e amoroso. Naquela noite ele saiu de casa. Não me preocupei onde ele dormiria.
Acordei com o toque do meu celular em plena madrugada. O nome de destacava-se na tela, e apesar da curiosidade que meu peito havia tomado, achei que não era o momento para atendê-lo. Joguei o celular para debaixo do travesseiro onde meu marido deveria estar repousando e tentei esquecer o toque irritante, que não demorou muito para cessar. No entanto, para minha infelicidade, logo o toque retornou e apesar do rosto vermelho que denunciava claramente meu choro, eu atendi ao chamado.
– Não consegui dormir – iniciou sem me deixar falar qualquer coisa. A tela dele estava toda escura e eu podia ver apenas o contorno do seu rosto, enquanto a minha tinha um clarão que permitia que ele enxergasse todos os meus traços. – Espere, você está chorando?
Depois do lindo cartão que ele havia me enviado no dia do meu casamento, e eu retomamos timidamente o nosso contato. Ele me ligava pelo menos uma vez a cada dois meses e permitia que eu contasse a ele todos os meus anseios.
– Eu estava assistindo um filme triste – menti.
– Não vai me dizer que você assistiu ao Titanic de novo? Você se emociona só em ouvir aquela música – brincou, mas eu não ri. Pelo contrário, meus olhos carregaram ainda mais lágrimas. – Ei, o que foi?
– Você me conhece muito bem, não é? – Suspirei sentindo falta daqueles olhos puxadinhos que sorriam todas as vezes que eu atendia o celular.
– Bem o suficiente para saber que você sempre insiste em algo que te machuca – disse em relação ao filme que eu supostamente havia assistido, sem sequer imaginar o impacto que aquela frase tinha no momento em que eu estava passando.
– Eu deveria parar de assistir Titanic. – Sorri fraco, tentando tirar algum proveito da minha analogia.
– Sim, você deveria. – Ele sorriu cobrindo seu corpo até o pescoço com um cobertor grosso. – Tem muitos outros filmes que podem te emocionar de um jeito bom.
Eu ri.
– Eu estou vendo agora o filme que me emociona de um jeito bom – respondi com meus olhos presos no seu rosto delicado.
– Qual é? – perguntou curioso. Meu coração, o mesmo que me avisou para sair correndo do altar no casamento, gritou para todos os impulsos no meu corpo, que eu deveria dizer para que seus olhos sorridentes, sua pele de veludo e sua boca tão doce quanto as balas que dividimos no parque em que nos (re)conhecemos, eram o único filme que eu gostaria de assistir naquele momento. Mas contra todos os meus nervos, eu apenas disse o nome de um filme qualquer.
– Por que você não consegue dormir? – Tentei mudar de assunto. Ele suspirou parecendo um pouco confuso e coçou os olhos enquanto virou-se lentamente para olhar algo atrás dele.
– Tenho que falar baixo pois o dorme no mesmo quarto que eu – comentou. – Eu não sei o que houve, eu apenas sonhei com você e acordei sem sono, então eu soube que você também estava acordada.
– O que você sonhou?
– Bom... Eu não me lembro direito – gaguejou. – Foi tudo confuso, mas eu sei que era você, eram os seus olhos me olhando tão de perto que eu acordei e achei que você realmente estivesse aqui. – Riu bem-humorado. – Mas era só o mesmo.
Eu o acompanhei no riso, e senti finalmente o alívio que meu coração implorava há meses. Quão grande era o que eu sentia por e eu sequer sabia explicar. Deitei meu rosto no travesseiro e assim como ele cobri meu corpo com o cobertor.
– Você está com frio? – sussurrou com sua voz que soava segurança. Apenas assenti com o rosto, sem tirar meus olhos do rosto dele. – Está com sono? – Assenti novamente. – Quer que eu cante para você?
– Quero – respondi.
Ele iniciou uma música com o seu inglês britânico perfeitamente decorado. Seus sussurros ritmados, enquanto seus olhos estavam fixos nos meus, lentamente me levaram para outro lugar, em outro tempo, quando e eu dormíamos abraçados e ele sempre me esperava dormir primeiro para que eu não me sentisse sozinha. Ou quando nós percebíamos que estávamos tão apaixonados que, assim que eu caia no sono, seu rosto era a primeira coisa que aparecia em meus sonhos, e eu acordava plenamente feliz sentindo a respiração calma do meu namorado se compassar à minha. O peito que subia e descia contra as minhas costas, na nossa posição preferida, que me convencia de que tudo o que eu queria estava bem ali, dormindo com os braços em volta da minha cintura. Quando e eu nos amávamos tão puramente que nunca dormíamos com assuntos mal resolvidos.
Quando e eu nos amávamos, simplesmente.
Adormeci lentamente como se ainda estivesse em seus braços, e a última coisa que eu ouvi foi o sussurro de .
Deita no colo do meu amor e descansa.
No dia seguinte, como de costume após as discussões, Louis chegou tarde em casa com flores e vinho. Não tenho certeza sobre o que ele esperava encontrar lá. Sentada no sofá, eu observei o meu marido sentar-se ao meu lado, sem jeito, sem saber o que dizer. Naquele momento, me sentia dura como uma rocha, ainda que meu rosto estivesse inchado da madrugada de choros.
– Eu sinto muito. – Ele procurou as palavras. – Pela nossa discussão... E por não ter te compreendido.
Prestei atenção em cada palavra que escorria por seus lábios em uma tentativa frágil de estancar o sangue de uma ferida com um curativo pequeno.
– Eu sei que você está com medo da maternidade. porque você tem apenas 24 anos. – Deixei ele falar sem esboçar qualquer reação. – Mas, meu amor, eu estou aqui e nós enfrentaremos isso juntos. Eu não vou deixar você sozinha nessa. Eu prometo que não deixarei você sofrer por um dia sequer.
– Você não deveria prometer coisas que não pode cumprir, Louis – respondi friamente. – Não é sobre a maternidade. Não é sobre ter apenas 24 anos. – Me levantei do sofá. – Quando você desrespeita a minha decisão de não querer ser mãe agora, você não está apenas reivindicando o seu direito de querer ser pai. Você está retirando o meu direito de decidir sobre o meu corpo e sobre o meu destino. – Me aproximei dele. – Quando você sai de casa sem mais nem menos, porque não consegue lidar com algo que eu disse, você faz eu me questionar qual seria a sua reação em outras ocasiões. E quando você tenta me convencer de que eu não quero ser “só” por medo, você desvaloriza todo o meu discurso. Eu não quero ser mãe, Louis. E eu não importo se você estará comigo ou não. Eu não serei mãe de um filho seu.
Meu marido permaneceu sentado no sofá, parecendo surpreso demais para esboçar qualquer reação.
– Você está exagerando – respondeu.
– Exagerando? – Perguntei desacreditada. – Há três meses você me atormenta todos os dias com essa história, mesmo que eu já tenha deixado muito claro que não é o meu desejo. Todos os dias você faz eu me sentir culpada por isso. Você me afastou do meu trabalho, porque você acha que eu o fazia exclusivamente por dinheiro, sequer passou pela sua cabeça que ele era o que me mantinha viva e feliz. Você acha que está tudo bem sair de casa todas as vezes que nós discutimos e ir chorar no colo da sua mãe, que acha que não existe nada que não possa ser consertado com um buquê idiota. – Apontei para as flores que ele havia levado para mim. – Você não se importa comigo, Louis. Você não olha para mim e me enxerga como um ser humano de desejos e sonhos. Você só me vê como o suporte que infla o seu ego – desabafei. – Você me vê como alguém que depende emocionalmente e financeiramente de você e é isso o que te faz feliz aqui. É saber que alguém precisa de você.
Deixei meu corpo exausto cair novamente no sofá e meu rosto em minhas mãos. Respirei fundo temendo a reação do meu marido ao meu próximo passo, mas não havia caminho de volta. Eu não queria voltar. Eu, pela primeira vez em toda a minha vida, preenchi meu coração com as minhas vontades.
– Eu me demito oficialmente da sua agência. Eu vou voltar para a Coréia – falei por fim, sem qualquer rodeio.
– O quê? – Ele despertou do seu transe, que me fez acreditar que ele sequer prestou atenção em tudo o que eu havia dito antes.

E foi assim que, aos meus 24 anos, o casamento de dez meses com o homem que eu pensei que arrancaria todos os meus suspiros e me faria viver em um conto de fadas, acabou. De fato, Louis me faria viver um conto, mas eu percebi odiava os contos de fadas.
Antes mesmo de definitivamente decidir romper com Louis, eu e Geong entregamos o meu currículo em algumas agências de Seul, onde minha amiga estava morando, e depois de quase quatro meses eu finalmente fui chamada por uma empresa. A partir disso, com incentivo de um bom emprego e o coração cheio de esperança de voltar a sentir que a minha vida valia mais que apenas cuidar dos desejos de um homem, eu embarquei para a Coreia em 10 de setembro, em pleno outono. Tão animada quanto a primeira vez em que estive lá, no entanto, tratava-se de um ânimo muito diferente dessa vez. Voltar para o país que tomou meu coração e o fez seu, mais velha e cheia de experiências na bagagem me fez refletir mais ainda sobre a posição que eu estava tomando em minha própria vida. Gostaria de poder dizer que eu não me arrependia de nada. Mas eu me arrependia de todo o tempo em que passei ao lado do meu ex-marido acreditando que tudo o que eu precisava estava bem ali nos braços dele. Eu levei dez meses para descobrir que tudo o que eu precisava estava, na verdade, dentro de mim mesma. O tempo todo.
– O seu currículo é muito completo – comentou o senhor de óculos. – Estou feliz em poder contratá-la. Você fala minha língua fluentemente?
– Sim, senhor! Eu morei aqui durante um tempo.
– Perfeito. – Ele sorriu gentil. – Além disso, eu liguei para o seu antigo emprego – comentou fazendo meu coração gelar. – Conversei com seu ex-chefe. – Engoli em seco, esperando pelo que viria a seguir. – Ele me disse que você foi a designer mais competente que trabalhou para ele.
Senti um soco no meu peito. Eu esperava muitas reações da parte de Louis ao saber do meu novo emprego. Mas, de forma alguma, eu esperei por uma reação positiva. Por um segundo, me arrependi de todas as coisas que pensei sobre ele, mas passou no segundo seguinte. Eu o agradeceria se eu não tivesse feito questão de apagar toda sua existência em minha vida.
– Bem-vinda à Line Friends, .
Lentamente conquistei minha independência financeira na Coréia do Sul e mais importante que isso: minha independência emocional. Reconstruir-se depois de ter o seu coração e os seus planos quebrados em muitos pedaços sempre foi uma tarefa difícil. Me arrisco a dizer que seja a tarefa mais difícil que nós somos forçados a aprender durante nossa vida, e também, a mais importante. Com 25 anos eu descobri que absolutamente todo mundo está fadado a partir alguém ao meio, e não me saio intacta dessa: quebrei alguns corações e fiquei em paz comigo mesma ao saber disso. Dessa forma, perdoei Louis e desejei que ele tivesse paz consigo.
, me acompanhe, por favor – chamou o senhor Myung com seu olhar doce.
Me levantei da minha mesa de trabalho onde há alguns dias eu desenvolvia um projeto novo para uma linha de cuidados com a pele cujo público alvo eram os adolescentes. Meu chefe pediu para que eu me encarregasse da projeção da reunião que teríamos com os nossos possíveis apoiadores. Confesso que era um desafio para mim pois, apesar da minha vasta experiência no assunto, eu nunca havia trabalhado com possíveis sócios coreanos e não sabia exatamente o que eles gostariam de assistir na reunião.
– Amanhã é a nossa grande reunião, está tudo pronto? – perguntou esperançoso.
– Sim, está tudo feito. Enviei a apresentação no e-mail do senhor – respondi prontamente, me sentando na cadeira disposta à sua frente.
– Ótimo! Esses novos apoiadores são muito importantes, . Preciso que dê certo – afirmou. – Se eles fecharem conosco, nosso lucro será muito maior. Se você vencer a reunião de amanhã, estará à frente do projeto.
A afirmação e a confiança que o senhor Myung depositou no meu trabalho me levou a outro patamar na minha relação com a minha autoconfiança, embora eu soubesse que não seria a única a conduzir a reunião, pois Lisa, uma desenvolvedora de projetos, estaria comigo. Mas Lisa e eu trabalhávamos muito bem.
No dia seguinte toda a confiança transpassada pela minha voz na minha conversa com meu chefe havia se esvaído. Enquanto me arrumava mais formalmente para o trabalho, mal conseguia respirar, afinal, era a grande chance de conquistar meu espaço na empresa em que eu trabalhava e eu mal podia imaginar onde aquele espaço me levaria. Me olhei no espelho lembrando-me do momento em que pensei que nunca mais usaria uma roupa social, mas fiz questão de apagar as memórias. Convenci-me de que não fazia bem voltar para o lugar me adoeceu.
Cheguei uma hora antes no meu trabalho, deixei a sala de reuniões arrumada conforme facilitaria meu diálogo com os envolvidos e esperei pacientemente na minha mesa até que todos estivessem presentes. A empresa estava calma, para minha surpresa, pois dentro de mim parecia que tudo entraria em colapso e eu, sinceramente, amava aquela sensação. Eu estava me sentindo em um sonho depois de tanto tempo. Não demorou para que o meu chefe me chamasse na minha sala e me conduzisse até a sala de reuniões.
– Muito bem – ele disse tentando esconder seu próprio nervosismo. – Você está pronta, certo? Lembre-se: nós precisamos deles. – Tentou me dar um incentivo que na verdade só me deixou mais nervosa.
Quando ele abriu a porta da sala de reuniões, minhas mãos tremeram no mesmo momento em que meus olhos foram subitamente atraídos pelo par de olhos que frequentava meus sonhos mais vezes do que eu me permitia admitir. e todos os outros Bangtan Boys se sentavam ao redor da sala, bem como seus gerentes e advogados.
Reencontrar alguém que você amou pode ser difícil e pode te causar muitas sensações impossíveis de explicar. Eu, com toda a minha experiência, achei que seria impossível que alguém me deixasse sem palavras novamente. Mas conseguia.
Ele sempre conseguia qualquer coisa de mim.
Ao me reconhecer, seus olhos, como de costume, sorriram. Ele levantou-se rapidamente e me cumprimentou de forma discreta embora seu sorriso denunciasse para quem quer que o conhecesse muito bem, a felicidade que ele estava em me ver.
– Bom dia a todos. – Senhor Myung iniciou. – Essa é , nossa designer, e Lisa, nossa desenvolvedora, elas são as mentes brilhantes por trás desse projeto e por isso deixarei que elas conduzam a reunião da forma que acharem mais proveitosa.
Todos responderam um sonoro “bom dia” e eu me sentei na cadeira da ponta direita enquanto Lisa apresentava a Line Friends para a banda. Tentei me concentrar no tablet em minhas mãos, que continha todos os tópicos dos quais eu deveria me lembrar quando fosse o meu momento. Contra todas as minhas vontades e impulsos, eu mantive meus olhos pregados em Lisa e desviava apenas para anotar alguma observação importante no meu tablet, que eu poderia usar depois. No entanto, percebi que minhas mãos tremiam e respirei fundo discretamente em uma tentativa falha de me acalmar.
Enquanto um dos gerentes da banda interrompia Lisa com algum questionamento, senti um papel pequeno tocar a ponta dos meus dedos ao mesmo tempo em que um pé tocou levemente minha perna. Olhei para o dono do pé, e acenava, quase nada discretamente, para o papel. Abri o pequeno bilhete que continha um dizeres “por mim, já estaríamos fechados”. Sorri para o homem animado bem à minha frente. Peguei minha caneta, enquanto aproveitava a distração de todos, e respondi ao bilhete: “me ajuda nessa” e joguei de volta para . Ouvi a voz de Lisa anunciar meu nome e soube que era o momento de expor a ideia prática de como seria desenvolvido o projeto. E mais que uma parceria com a Line Friends, o BTS teria uma marca dentro da empresa, por isso, eu tinha plena consciência do papel importante que o meu trabalho teria naquele momento. Levantei-me com meu tablet em mãos, assistindo me dar um sorriso reconfortante.
Para a minha própria surpresa, eu conduzi a reunião de forma clara e honesta a respeito dos aspectos que cabiam a mim. Meus olhos passavam corriqueiramente por todos os presentes na sala, e em dado momento percebi um garoto de olhos únicos sussurrar algo no ouvido de , e o mesmo apenas sorrir enquanto não tirava os olhos de mim. Enquanto tentava me dar algum apoio, meu ex-namorado fez um sinal positivo com as mãos, o que me distraiu ligeiramente, mas não demorou para que eu retomasse o rumo na reunião, que durou quase três horas, mas ao final, todos os contratos foram assinados. Todos na sala da reunião comemoravam a mais nova parceria, e eu assistia com pleno orgulho do meu próprio desempenho.
– Meus parabéns. – Reconheci a voz que me fazia dormir diversas vezes ao telefone. – Você foi ótima!
– Obrigado, . – Sorri para ele. – Acho que este é o momento perfeito para você me apresentar seus amigos. – Lembrei e ele riu sincero.
– Quem diria que nossos destinos nos trariam até aqui? Finalmente poderei apresentá-los. – Pensei um pouco, mas não tive resposta alguma. – Vem! – Me conduziu até a roda de seus amigos que conversavam animados.
– Esse é o , mas você já o conhece. Esse é o , você o conheceu por telefone! – Iniciou um por um. – Aquele é o , ele é sempre quieto assim mesmo. – apenas acenou para mim, e eu o correspondi reconhecendo-o como o garoto que sussurrou para . – que é o mais bonito, na minha opinião – afirmou rindo. – , que é o mais bonito na opinião do resto do mundo. E, por fim, , que tem o sorriso mais charmoso que eu conheço. – Cumprimentei todos, mal conseguindo esconder meu sorriso.
– Você não é a garota do ? – questionou.
– A que se casou? – complementou .
– É ela mesma – respondeu .
– Ah... – Eu ri. – Sou eu mesma, a “que se casou”. – Tentei disfarçar meu nervosismo por sempre me chamarem de “garota do ”. – Meu nome é , mas vocês já sabem porque o senhor Myung já me apresentou – respondi apressadamente me sentindo estúpida logo em seguida.
– Ela é assim mesmo. Fala rápido quando fica nervosa. – me empurrou com seus ombros.
– O que vocês acham de sairmos todos juntos para comemorar o seu sucesso? – gentilmente perguntou. Todos concordaram prontamente e me olhou com seu sorriso tímido.
– Claro. – Sorri para ele. – Você me avisa para onde vão e eu apareço lá. Mas agora eu tenho que voltar ao trabalho, garotos.
– O quê? Mas essa vitória é sua, você tem que comemorar aqui com a gente. – comentou, pela primeira vez, parecendo inconformado.
– Eu agradeço o apoio, mas agora eu tenho um projeto muito maior em mãos. – Sorri contente. – Vejo vocês mais tarde! – Toquei o braço de levemente enquanto mantive meu sorriso no rosto, para minha surpresa, ele me envolveu em seus braços, o que me deixou completamente sem reação. Suspirei mais alto do que eu gostaria e devolvi o abraço com a mesma gentiliza. Nos soltamos em poucos segundos, assim que percebeu que ainda estávamos em um ambiente de trabalho. Olhei para os garotos e todos mantinham sorrisos carinhosos.
– A gente já ama você. – , que estava facilmente se tornando um dos meus favoritos, disse.
– A gente ouviu tanto sobre você – completou . – Sério, não podíamos pisar em terras ocidentais sem que o lembrasse de você.
– Certo, já chega. – disse. – Bom trabalho, .
Durante toda aquela tarde eu me envolvi com o meu novo trabalho, que me daria um posto importante na empresa. Era um prazer imensurável sentir que eu estava exatamente onde eu deveria estar, e pouco a pouco meu coração fez as pazes comigo por não ter dado ouvido aos seus desejos e anseios. Cheguei em meu pequeno apartamento sentindo meu corpo exausto do trabalho e me joguei no sofá enquanto me permitia aproveitar do curto momento de descanso. Ouvi meu celular tocar dentro da bolsa.
“Estamos pensando em sair para jantar e depois ir em um karaokê, o que me diz?” Nanjoom perguntou.
“Claro, me passa o endereço”, respondi.
Fui de metrô até o restaurante que os garotos haviam me indicado e os encontrei em uma parte estritamente reservada do estabelecimento. Eles estavam tão animados que mal parecia que quem havia conseguido uma promoção no trabalho era eu.
– Você veio! – exclamou, fazendo com que todos me olhassem. Cumprimentei todos rapidamente me sentei ao lado de .
– O que você quer comer? – ele me perguntou. – Escolhe logo porque eu estou com fome – disse casualmente, me fazendo rir do seu modo de falar.
– Ele é assim mesmo, não se importe com isso – disse .
– Eu pedi um Kimchi – , que estava sentado bem a minha frente, me informou.
– Sabe que eu ainda não comi desde que voltei? – respondi.
– Claro que sei, você jamais comeria um Kimchi sem mim!
– Espera! Que cheiro é esse? – perguntou, atraindo a atenção de todos.
– É cheiro de tinta? – respondeu .
– É, porque está pintando um clima. – Os dois disseram juntos, me fazendo gargalhar e revirar os olhos.
Fizemos nossos pedidos para o garçom que nos atendeu e eu me surpreendi com a acessibilidade e gentileza que aqueles garotos mundialmente famosos possuíam.
– Então, , nos conte sobre você. – me olhou com o sorriso mais lindo que eu já havia presenciado. – Por que voltou para a Coréia?
– Porque eu adoro a Coréia – falei casualmente. – Eu nunca quis ir embora realmente. E depois de me divorciar e conseguir um emprego aqui, eu não pensei duas vezes. – Ele me ouviu com toda atenção possível, sem desviar seus olhos um segundo sequer.
– Por que o seu casamento não deu certo? – Perguntou e eu percebi que todos estavam interessados na história.
– Tudo bem se não quiser falar sobre isso. – passou seus dedos levemente pela minha mão, que estava espalmada em cima da mesa.
– Tudo bem. – Sorri para ele. – Ah, eu me casei muito nova, para falar a verdade. – iniciei, mantendo meus olhos em . – E eu percebi que ainda tinha muita coisa para viver, você sabe, eu tinha deixado tudo de lado para viver o casamento e eu fiquei muito infeliz com isso, então eu decidi colocar a minha felicidade em primeiro lugar.
– Coisa que ela nunca fez – comentou , despretensiosamente, atraindo meu olhar para ele. – Ela sempre apoiou todo mundo que estava em sua volta, inclusive eu. Eu nem imagino o quanto ela deve ter se machucado por isso. Mas eu sei que não teria conseguido sem o apoio dela – contou para os garotos e em algum momento eu senti que nem estava ali pois ele nunca havia me dito tais coisas.
– Não é estranho estar na presença do seu ex-namorado assim? – me perguntou.
– Na verdade, não é nada estranho – respondi, olhando para , que me abriu um sorriso curto. Nossos pratos chegaram e nós nos dividimos em comer e conversar sobre toda a história da banda. Eu fiquei verdadeiramente impressionada com a química que os garotos possuíam. e eu dividimos nosso Kimchi, por um segundo parecendo tudo fazer sentido. Era exatamente ali que eu deveria estar. Eu estava no caminho certo.
Depois de sairmos do restaurante, fomos até o karaokê divididos em dois carros. Meu ex-namorado estava sentado ao meu lado, parecendo extremamente preocupado ao perceber que iria dirigir o carro em que nós estávamos, e durante todo o caminho ele dizia o que o motorista deveria fazer.
– Ei, , eu não comprei a minha licença. Eu frequentei todas as aulas e passei no teste, fique tranquilo – tranquilizou. E eu percebi que eu simplesmente adorava ele.
Ao chegarmos ao karaokê, os garotos pediram várias bebidas. Escolherem “Boy With Luv” para cantar. , e começaram a cantar enquanto os outros dançavam e eu só conseguia rir. e eu viramos muitos shots de uma cerveja misturada com outra coisa, que meu novo amigo havia me prometido que eu gostaria. estava sentado em um sofá ao lado de e , que tomavam cerveja. Ao final da cantoria, os garotos receberam a pontuação mais baixa do karaokê por cantarem sua própria música.
– O quê? Essa música é minha! Como você pode dizer que eu canto mal? – indignou-se.
Não demorou muito para que e eu fossemos os primeiros a dar indícios de estarmos bêbados, por isso, decidimos cantar uma música em inglês que o garoto definitivamente não conseguia acompanhar. Ele passou de frustrado por não conseguir cantar à imerso em uma crise de risos em poucos minutos e eu literalmente ri tanto que me joguei no sofá ao lado dele. , e decidiram cantar uma música romântica que terminou com o em lágrimas.
– Ele está sofrendo por amor? – perguntei assim que se jogou ao meu lado no sofá, enquanto os outros seis garotos se abraçavam e cantavam a música coreana.
– O ? – Me olhou levemente alterado. – Você está brincando? Ele deve ter milhões de garotas atrás dele. – Ele riu.
– E você também tem milhões de garotas atrás de você? – indaguei sem pudor algum devido ao álcool, fazendo-o rir.
– Você sabe! – Deu de ombros. – Com certeza deve ter pelo menos uma que goste muito de mim. – Riu ainda mais alto.
– Com certeza tem. – Atraí seus olhos curiosos.
– Mas diferente do , as vezes eu ainda sofro por amor – falou, enquanto me encarava fixamente. Percebi o tom em sua voz e tentei pensar em algo rápido, mas o álcool atrapalhou meu raciocínio.
– Aposto que o não tem problemas com isso. – Mudei de assunto.
– Com certeza não, olha só para ele, é lindo demais. – Riu, mandando um beijo para o amigo que agora cantava emocionadamente e apontava para nós dois.
– Ele é mesmo. e também. – Apontei. – Na verdade, não consigo me decidir, porque olha bem para os olhinhos do e o sorriso do . – riu e concordou comigo.
– E o que eu tenho? – me perguntou, sem tirar seu lindo sorriso do rosto.
– Você tem tantas coisas que eu nem sei por onde eu começaria a listar.
– UAU! – Ele riu alto me fazendo o acompanhar. – Aposto que sou seu preferido.
– Na verdade, é o , mas com certeza você deve estar entre o e — brinquei, observando a careta que ele fez.
– Aí, casal, acho que está na hora de irmos, já são quase três da manhã. – jogou-se entre nós, caindo com o tronco no meu colo.
– Você sabe que não podemos deixar ele dirigir né? – falei para , enquanto ajeitava-se confortavelmente no meu colo, piscando lento devido ao sono.
– Eu vou ligar para alguém. – disse, e eu me surpreendi com a responsabilidade que ele mantinha mesmo que estivesse alcoolizado.
– Uau, por isso você é o líder. – Ri enquanto ele se levantava. saiu do cômodo em que nós estávamos para falar ao celular e , , e eu aproveitamos para acabar com as últimas doses que estavam nas garrafas. Quando o retornou, os garotos estavam apagados em um sofá, enquanto desabafava comigo sobre as dificuldades da fama e e dançavam ao som de um pop.
Entramos novamente no carro, todos cobertos com capuzes e máscaras que evitassem sermos reconhecidos. Dois seguranças dirigiam os carros. ajeitou-se confortavelmente no meu ombro e não demorou a dormir, enquanto eu, por minha vez, ajeitei-me no ombro de , que passou os braços ao redor do meu pescoço e alisava meu ombro com as pontas dos dedos. Embora desnorteada pelo sono e pelo álcool, eu mantinha meus olhos abertos e meu rosto escorrendo pela curva do pescoço de . Ao perceber que eu estava caindo, ele segurou-me mais fortemente e me ajeitou delicadamente no seu colo.
– É engraçado, não é? – Perguntou-me com sua voz suave.
– O quê?
– Tudo. A nossa vida. – Refletiu. – Eu nunca imaginei que estaríamos assim novamente.
– Pensando bem, eu não acho nada engraçado. – Ergui meu rosto para olhar em seus olhos. – Acho que nós estamos exatamente onde deveríamos e acho que a vida sempre soube disso.
– Disso o quê?
– Que não adiantaria nos separar, nós acabaríamos voltando um para o outro.
– O que você quer dizer? – perguntou confuso.
– Eu não sei. – Demonstrei meu sorriso alterado. – Eu só quero dormir. – riu e fez encostar na porta do carro, para que pudesse me abraçar com seus dois braços e me ajeitar mais confortavelmente em seu colo.
– Quer que eu cante para você dormir? – sussurrou enquanto seus dedos se emaranhavam delicadamente no meu cabelo em um carinho que fazia todo o meu corpo relaxar.
– Sempre. – sussurrei de volta.

Naquela madrugada acordei em uma cama extremamente confortável e estranha para mim. Com a luz tímida que entrava pela janela eu soube que ainda não havia amanhecido. A cama de solteiro comportava meu corpo e eu passei os dedos por ela, enquanto sentia o lençol por entre meus dedos. Procurei por algo que, naquele momento nem eu mesma sabia o que era. Levantei meu corpo lentamente e percebi que, em outra cama, estava afundado em um sono pesado e que não acordaria nem se eu chamasse por ele. Em outro canto, afastado de onde eu estava, dormia sentado em um sofá aparentemente desconfortável. Ele, assim como usava pijamas. Só então percebi que eu mesma estava com uma camiseta mais larga, shorts de tecido leve e meias. Ri baixo, sentindo meu coração tão aquecido que poderia esquentar todo o quarto em que nós três dormíamos. Tirei os cobertores de cima de mim e andei até o sofá onde estava, com dois cobertores em mãos. Ele acordou suavemente quando sentiu meu corpo grudar ao seu.
– Você parece uma pandinha grudada ao galho – brincou enquanto passava os braços ao meu redor.
– Você me vestiu assim? – perguntei.
– Pedi para Wendy, que trabalha aqui, trocar você – respondeu de olhos fechados.
– Onde nós estamos? – Ele abriu os olhos assim que percebeu que eu não ficaria quieta tão cedo.
– Na casa onde o BTS mora. – Sorriu, passando seus dedos pelo meu rosto, em um carinho suave. – Você não está cansada? – Assenti.
– Você poderia ter me deixado no sofá.
– Tudo bem, a cama é mais confortável e eu a deixei para você.
– Mas eu não quero ficar lá sozinha – confessei. – Prefiro ficar aqui com você.
não disse absolutamente nada, apenas abriu seu sorriso tímido que fazia suas bochechas saltarem levemente. Ele manteve o carinho em meu rosto, o que me fez fechar os olhos para apreciar o toque da sua mão macia na minha pele. De olhos fechados, eu percebi todos meus sentidos aflorados ao seu toque e o meu coração acelerado ao sentir sua respiração lenta bater em meu rosto. Novamente, assim como há anos atrás, mantinha sua costumeira calmaria enquanto as borboletas em meu estômago pareciam renascer depois de muito tempo. Quando abri meus olhos, ele me olhava concentrado em algo que eu não soube explicar, como se travasse uma batalha consigo mesmo.
Ao longo do tempo eu pensei sinceramente que jamais me apaixonaria perdidamente por alguém, inclusive por . Mas ele tirava tudo de mim. tomava toda a minha respiração apenas para poder me fazer voltar a respirar com mais intensidade. Da mesma forma que fazia meu coração parar de bater para poder ressuscitar ele ainda mais forte. No momento em que seus olhos encararam o meu, um milhão de sentimentos e preocupações foram demonstradas para mim. Eu sabia. Não éramos mais os dois adolescentes que se conheceram há tempos, nossas vidas haviam tomado rumos muito diferentes e qualquer decisão de não afetaria somente ele. Mas por aquele segundo eu queria que apenas fingíssemos que nada havia mudado.
Passei minha mão por seu braço descoberto pela camiseta que ele usava, até o seu pescoço. Trilhei o caminho duas vezes em um carinho tão suave que se não estivéssemos atentos àquilo, mal perceberíamos. fechou os olhos desfrutando da sensação inexplicável que nos acometia quando estávamos juntos. Senti a mão que estava em meu quadril subir levemente até minha cintura e ali apertar. Do pescoço, levei minha mão para a sua nuca e carinhosamente aproximei seu rosto do meu.
– Podemos parar tudo ao nosso redor só por um minuto? – perguntei enquanto percebia a guerra que ele ainda travava em seu interior. Rocei meu nariz no seu, esperando pela sua resposta, mas ele apenas assentiu. tomou a liberdade de grudar nossos lábios em um selinho calmo que carregava em si um milhão de tormentas entre saudade e outros sentimentos. Esperei pacientemente pelo seu próximo passo, tendo em vista que ele ainda estava confuso pelo que estava acontecendo. Não que eu não estivesse, mas ao contrário dele, eu apenas me deixei levar.
Parecendo silenciar todas as vozes que gritavam em seu interior, o garoto me beijou calmamente como há anos atrás. Suas mãos escorregavam pela extensão das minhas costas em um carinho delicado que me fazia arrepiar. Por segundos eu temi acordar em algum momento e perceber que tudo aquilo não passava de um sonho, mas quando sua mão apertou minha coxa eu soube que eu realmente estava ali. Repousou sua outra mão em cima da minha que estava em seu ombro e gentilmente levou-a até seu peito, me fazendo sentir seu coração acelerado. Sorri entre nosso beijo pois o meu estava tão descompassado quanto o dele. Nossas línguas se tocavam e eu esqueci completamente que estávamos em pleno inverno porque tudo em mim se aqueceu. Esqueci também que no mesmo quarto, o gentil repousava. Esqueci de tudo. Não havia mais nada além de mim, e nosso toque.
– O que vamos fazer? – indaguei assim que encerrei nosso beijo, no entanto mantive meus lábios colados aos seus e meus olhos fechados.
– Pensamos nisso amanhã. Vamos só aproveitar – sussurrou da mesma forma. – Você quer ficar?
– Não tem outro lugar que eu queira estar senão aqui com você – respondi sinceramente e finalmente descolei meus lábios dos seus para poder enxergar seus olhos.
– Pelo tempo que nos for permitido? – perguntou inseguro.
– Pelo tempo e nas condições que nos forem permitidos.
Naquele momento, enquanto o vento frio do inverno entrava pela nossa janela e balbuciava palavras incompreensíveis durante seu sono, eu percebi que havia algo muito mais valioso que angustiar-se e encher-se de perguntas sobre o amor. Mais ainda: percebi que de nada me valia questionar-me para onde havia partido meu amor por , pois ele não havia estado em outro lugar senão dentro de mim, alojado em meu mais profundo ser, esperando pacientemente para que pudesse ser demonstrado livremente. Mas quando e eu nos conhecemos pela primeira vez não era o momento. Nós precisávamos partir, viver outras vidas, exercer outros amores e só então estaríamos aptos para nos encontrarmos novamente. E longe de , e com todas as outras vivências, eu experimentei o mais poderoso de todos os amores: o meu próprio.
Eu descobri que o amor tem dessas. Tem esse jeito romântico e inusitado de nos mostrar que nada nem ninguém pode ser mais forte que o sentimento que nutrimos por nós mesmos. E que só estaremos aptos a amar outra pessoa assim que aprendemos a amar a nós mesmo. A caminhada deve ser mais fácil para algumas pessoas, mas no meu caso eu precisei encontrar o amor em diversos lugares e experimentar a dor de outros rompimentos para que eu finalmente aprendesse a lição mais importante de toda a minha vida. Além disso, o amor sabe exatamente quando deve chegar. E, da mesma forma, quando partir.
Ter amado Louis verdadeiramente pelo tempo que eu amei não tirou de mim o amor que eu nutri por , da mesma forma que amar jamais tornou meu sentimento por Louis menos verdade. O amor está em todos os lugares, o tempo todo, em formas diferentes.
Querem saber?
É muito fácil contar uma história de amor.
Especialmente as que não se acabam.




Fim...



Nota da autora: É muito fácil contar uma história de amor, principalmente as que vivem dentro da gente. Escrever “How Rare and Beautiful” é colocar meu coração e minhas lições em forma de história. Espero que tenham gostado desse meu xodó e, não se esqueçam de que o amor está em todos os lugares, em todas as formas. <3



Outras Fanfics:
Chicago’s Chaos [Harry Styles]

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