Ich Liebe Ihn

Última atualização: 22/09/2018

Prólogo

prolog (prologue)
«jonah und ich» ( and me)
Há coisas que nós temos desde sempre.
Aquelas coisas que protagonizam as nossas primeiras memórias, que estão lá desde os nossos tempos de chucha e biberão. A minha coisa, o meu bem mais precioso, é Theodore .
Desde que vim da Alemanha, quando era nada mais, nada menos do que um bebé de colo, que eu e somos melhores amigos do mundo. Em quinze anos, já partilhámos de tudo. O banho, o jardim, a parede do quarto, os brinquedos, a cama e até saliva quando tínhamos sete anos e brincávamos aos papás e mamãs.
Tudo bem que, com o tempo, ele se tornou um idiota. Todos os rapazes, a seu tempo, se tornam. Acho que é um dos efeitos colaterais da adolescência. Mas mesmo assim continua a ser diferente. É o idiota que deixa tudo o que está a fazer para vir ter comigo e me deixar chorar no seu ombro quando um encontro corre mal. É o idiota que todos os dias me manda mensagem para que eu saiba que, mesmo que a nossa amizade tenha mudado muito desde o tempo das bonecas e dos carrinhos, ele continua lá. E o que me acorda à meia-noite com murros na parede no dia do meu aniversário. O mesmo idiota que todos os anos deixa as garotas com quem sai todo o ano para me levar ao baile de finalistas. A melhor noite do nosso ano.
Já não se fazem idiotas como ele hoje em dia.
Desligo o alarme que não para de tocar na minha mesa-de-cabeceira. Prometi a mim mesma que hoje acordaria cedo, mesmo que seja domingo. Preciso de estudar. Preciso mesmo de estudar, e, com a música e a natação, mal tenho parado em casa tempo suficiente para pegar no meu livro de química. O teste de quinta é importante. Eu sei que tenho que focar no que aí vem. Um erro pode custar o meu futuro inteiro. É assustador.
Subo um pouco a persiana do quarto para deixar entrar ar e luz natural. Quase de imediato me sinto mais acordada, mesmo que às vezes sinta que o meu cérebro só começa a regular bem a partir das dez. Meto os fones nos ouvidos e aproveito bem o som da música clássica. Ajuda-me a concentrar, a desligar-me do mundo e a esquecer que há mais um milhão de coisas que queria fazer e que imploram a minha atenção.
Coisas como chocolate, séries e vídeos fofos de gatos. Tudo isso é esquecido durante mais de uma hora, e só paro de sublinhar e escrevinhar as partes mais importantes da matéria quando bocejo.
Preciso de uma paragem.
Às vezes acontece a meio do estudo. Em forma de me recompensar pelo tempo perdido com a cabeça nos livros, vou até à cozinha, trinco umas bolachas e aproveito para ver se os meus sims ainda não morreram. Quando chego perto do armário da comida há uma mensagem de .
[03/09/2018 08:12:49] Patusco♥: Maldita sejas, . O teu despertador acordou-me.
[03/09/2018 08:41:50] : Alguém tem que estudar neste bairro. Não queres passar por aqui para rever química?
[03/09/2018 08:42:33] Patusco♥: Ugh, química, que nojo. Só se cozinhares para mim.
[03/09/2018 08:42:49] : Combinado.
[03/09/2018 08:43:01] Patusco♥: Ótimo! Vou-me vestir e já vou.
detesta química, mas, ao contrário de mim, é um crânio a matemática. Tem vencido todas as olimpíadas desde que começou a participar e uma vez foi competir a nível nacional e ficou em segundo lugar.
Ele não estuda muito, mas tem resultados perfeitos. Sei que queria mesmo era ser astronauta, por mais que diga que desistiu disso aos oito anos, quando aceitou que a NASA não tinha tempo para responder à sua carta. Ficou destroçado. Até hoje fico triste ao lembrar-me do seu beicinho amuado e da forma como chorou.
Foi com a mesma idade em que começou com o futebol americano e as aulas de guitarra elétrica, coisas que o tornaram conhecido por todos na escola. Ele é um idiota bonito, simpático e interessante. As meninas gostam disso e correm atrás dele.
As meninas vão e vêm. Tal como o pai dele foi e veio muitas vezes, até deixar de vir. Eu sou a única constante na vida de desde que fiz um ano e me mudei para a casa ao lado da sua.
Agora ele quer ser enfermeiro. Isso é compatível comigo, já que há uns anos que estudo para tirar o curso de medicina. Insiste que, quando a faculdade chegar, vamos dividir apartamento, carro e festas. Diz que eu lhe vou dar banhos gelados quando apanhar bebedeiras.
Não que isso vá ser uma coisa nova para mim.
Aparentemente, ser popular no secundário vem com um pack exclusivo de vícios: álcool, tabaco e sexo. Em drogas ele nunca se meteu. Sexo ele faz muito. Não sei como é que ele nunca apanhou uma DST. Tabaco e álcool raramente, mas já o vi muito bêbado. Tentei evitar isso, mas nem sempre ele está comigo e nem sempre eu consigo evitar. É sempre comigo que ele vem ter quando precisa que alguém o abrace e afague as costas na hora de vomitar. Coexistimos bastante bem.
Ouço um batuque na janela que dá para a minha varanda. Aqui está ele. Os olhos verdes a olhar para mim do outro lado do vidro, o sorriso de lado a rasgar-lhe o rosto numa expressão querida. Abro-a e a minha coisa entra por ela adentro, tropeçando no carregador do meu computador e atirando-me ao chão junto com ele.
- Algum dia vais entrar em minha casa como uma pessoa normal? – Pergunto, sem conseguir conter o riso. – És uma merda.
Ele tapa-me a boca, obrigando-me a parar de gargalhar. Às vezes esqueço-me que tenho pais em casa. Eles também passam muito tempo fora, ainda mais do que eu. O meu pai é advogado. Ele não é lá muito bom nisso, então deixou o tribunal para trabalhar numa fábrica de carros. Eles pagam bem, melhor do que ele ganharia se tentasse sustentar o escritório de advocacia. Ele realmente não tinha jeito para isso. A minha mãe, pelo contrário, é tremendamente bem-sucedida. É diretora-geral de uma gravadora conhecida aqui em Los Angeles, que trabalha com vários artistas pop atuais e de renome. Ela basicamente colhe dinheiro das árvores. Mas enfim. Os meus pais são tão ocupados que não sei como é que tiveram tempo para me fabricar. Ainda pensaram em dar-me um irmão, mas isso nunca chegou a acontecer por falta de tempo, realmente.
Meninas a ler este livro, a seguir temos a primeira fala de Theodore .
Cuidado para não se apaixonarem. Eu já sou imune aos seus encantos e ao carisma rasca que as outras parecem gostar. Mas ser a sua melhor amiga e quase irmã não significa que seja cega. Ainda reparo nos olhos verdes e na barba malfeita. Nas covinhas no fundo do sorriso. Nos lábios que beijei a brincar tantas vezes e em todos os detalhes que eu vi crescer com ele.
- Eu gosto de entrar pela janela. Dá mais pica. – Responde, sacudindo as calças de pijama como se houvesse algum pó nelas. Reprimo a vontade de soltar um comentário irónico. Que grande adrenalina, escapar-se para a minha varanda às quase oito da manhã. Estende-me a mão, ajudando-me a levantar. – Estás com cara de cansada.
Claro que eu reparo. é o tipo de rapaz lindo. Lindo e com conteúdo dentro do cérebro. Isso é raro. Normalmente os rapazes são um ou outro. Se são os dois, estão ocupados por raparigas que jamais os largarão. É pena que, connosco, uma coisa como namoro jamais resultaria. Imagino-me a passar o resto da vida com ele, sim: uma de oitenta anos seria capaz de atravessar um quarteirão na sua mota para idosos para ir ver o jogo do Borussia Dortmund com um velhinho. Imagino-me a envelhecer com ele. Imagino a nossa amizade a durar mesmo para sempre, mesmo depois de a morte nos separar. Mas não nos consigo imaginar como namorados ou como marido e mulher. A minha nuvem do pensamento desvanece-se completamente quando penso nisso.
A única vez que eu senti algo a mais por ele correu desastrosamente e resultou nas piores semanas da minha vida. Além de perder o rapaz de quem gostava, perdi o meu melhor amigo. Eu não era capaz de lidar com a namorada dele na altura, uma Tiffany que entretanto mudou de cidade, e acabei por me afastar dele. Quando lhe contei que estava apaixonada por ele, não reagiu nem perto do que eu queria. E nenhum dos dois soube lidar com sentimentos só aos treze anos. Passaram três anos desde aí, mas parece que foi uma eternidade. Hoje percebo que talvez eu não tenha estado mesmo apaixonada por . Talvez apenas tenha sentido falta do meu melhor amigo quando ele começou a namorar.
- É. Não tenho dormido muito.
- Miles? – Pergunta, com um tom cuidadoso. Assinto com um gesto de cabeça e deito a cabeça no ombro dele. Já não nos encontramos assim, de propósito para conversarmos, há quase um mês. Ele tem estado demasiado ocupado com os testes e as competições nacionais do futebol americano, então só nos vemos nas aulas ou nos corredores, de relance. – Queres falar sobre isso?
Depois de superar a coisa que sentia por , conheci Miles Eastman na escola de música.
É com ele que tenho estado nos últimos anos, numa relação de pára-arranca que é tudo menos estável. Na semana passada acabei com ele pela décima segunda vez e desde então tenho evitado ler as suas mensagens ou responder aos telefonemas. A única imagem na minha cabeça quando penso no rapaz é a da imagem que me mostrou. A minha amiga apanhou numa fotografia do seu crush de futebol, por acaso, o meu namorado e uma das chefes de claque juntos nas bancadas. Deve ter-lhe custado tanto ter de ser ela a dar a novidade de que ele me traía como me custou a mim saber disso. Sabia que ele bebia muito, sabia que ele era ciumento e que não suportava quando eu saía com , sabia que olhava para os decotes das outras e sabia que ele era um idiota. Mas não sabia que algum dia ele seria capaz de tocar noutra estando comigo.
Sou muito idiota por deixar que um rapaz me tire o sono. Um rapaz não é motivo para eu me autodestruir. Nem para perder a fome ou tentar emagrecer porque não tenho o corpo esculpido na perfeição como as outras. Nem queimar todo o meu guarda-roupa e comprar coisas mais atrevidas. Não é o meu género. Nem pensar que eu vou mudar porque o senhor Eastman achou que havia outra melhor que eu. Tenho que ser boa para mim mesma, repito isso para mim todos os dias. E afogo-me todos os dias nos milhares de atividades que tenho para fazer: natação, poesia, estudo, aulas de música para não ter tempo de pensar nisso.
- Não. Prefiro não pensar nisso.
Saio dos braços dele e salto até à secretária. Atiro-lhe à cabeça o nosso livro de química, abrindo um sorriso genuíno. Não sei por que é que estou tão feliz. É só ele. E para estudar. Não consigo não rir ao ver que ele está com o seu pijama idiota de zebras e com as all-star vermelhas, que são a sua imagem de marca. Desde os oito que não calça mais nada a não ser um par de ténis dessa cor. Tem até uns cinco pares iguais. É impressionante.
- Não acredito que tu me chamaste mesmo para estudar, . – Resmunga, tirando uma caneta do bolso. Puxa um banco do canto do quarto e senta-se ao meu lado, segurando a cabeça com as mãos. – Pensei que isso fosse nome de código para “netflix and chill”.
- E por que seria? – Pergunto, revirando os olhos. Como é que um rapaz tão inteligente pode ser tão preguiçoso? Ele passa os olhos pelo livro, fazendo beicinho. Estudar não é um sacrifício assim tão grande. O que seria de nós se não estudássemos, afinal? Eu devo ser a única aluna na minha escola que não se importa de dispensar uma tarde para fazer resumos e fichas. – O teste de quinta-feira é verdadeiro.
- Espero que o almoço que me prometeste também seja.
Mais uma vez, prova durante as horas que passamos a estudar e a comer batatas fritas de pacote que é esperto o suficiente para me deitar abaixo até a mim. Claro que ele não passa sem me roubar os marcadores neon para me riscar os braços e eu não resisto a atirar a borracha à sua testa, mas, quando finalmente a barafunda acaba, ele é homenzinho o suficiente para me explicar a teoria que eu não percebi de uma forma que os professores não conseguem. E eu fico a entender.
- Podemos fazer uma pausa? – Pergunta, suspirando. Atira-se para a minha cama mal feita, rebolando e desfazendo ainda mais os lençóis. Reviro os olhos, assentindo. Ele agarra-me pela cintura e puxa-me. Fico cara a cara com ele, rindo. No entanto, mantém-se inexpressivo, com os olhos vazios. – Preciso de falar contigo.
Quando alguém diz que “precisa de falar connosco” nunca é nada de bom. E a sua cara diz tudo. O seu sorriso maroto desapareceu só por dizer que temos de conversar. Ele já não me aperta contra si. Só me encara com seriedade, os olhos varrendo cada um dos detalhes do meu rosto. Sinto um arrepio quando os seus lábios se entreabrem, aquecendo as minhas bochechas com a sua respiração.
- O que se passa, Patusco? – Pergunto, provocando-o com a sua alcunha de criança.
- Isto… É um bocado frustrante de dizer. – Resmunga, sentando-se. Esconde a cabeça entre as mãos. Este não é o a que estou habituada. Deito-me sobre as costas dele e mexo-lhe no cabelo, enrolando os dedos nos fios castanhos como ele gosta que lhe façam. – Um dos olheiros do futebol americano reparou em mim no último jogo e… Eu tenho hipótese de ganhar uma bolsa para Harvard.
- Meu deus. – Levanto-me da cama num salto como se tivesse molas no colchão. Ele continua à espera da minha reação como se eu o fosse matar por ter a possibilidade de conseguir entrar na faculdade dos nossos sonhos desde crianças. Eu apoio os sonhos dele. Sempre. A nossa amizade mudou assim tanto que ele até já se esqueceu disso? – Isso é ótimo! Por que é que não estás no bar a festejar?
Ele entrega-me um envelope. Tem a estampa de Harvard na frente e o nome dele como destinatário. Abro-o e começo a ler em voz alta, sem disfarçar o meu sorriso de orgulho ao proferir os elogios do olheiro da universidade às notas e à forma de jogar de . A certa altura, o meu coração para. Levanto os olhos da folha para ele, só para ter a certeza de que isto não é uma partida. Não pode. Ele nem sequer sorri. Olha-me com aquela cara de cachorrinho triste que ele já não fazia desde que perdeu o carro de controlo remoto do Faísca aos cinco anos.
Se estiver interessado nas vagas para o curso de Enfermagem para o próximo ano deve comparecer na nossa faculdade no início do próximo semestre.
Isso significa que, se quiser destaque em relação aos outros candidatos a enfermagem pelo futebol, deve ir morar para Boston. E fazer o último semestre do secundário lá. Pouso a carta sobre a minha secretária e sento-me ao lado dele na cama, afundando no edredom pesado.
- Agora entendes. – Diz ele, com a voz apagada. Apalpa a cama em busca da minha mão. Quando a encontra, amarra os seus dedos aos meus. Estou sem reação, deitada na cama contra o seu peito. Só tenho vontade de o esmurrar, mesmo sabendo que é uma oportunidade incrível e que eu própria estaria dividida. – Só temos quatro meses juntos.
Mesmo que no fim do semestre eu seja aceite em Harvard, vão ser seis meses sem . E muito pode mudar até lá. Nos últimos meses eu tenho tido apenas um pedacinho do meu melhor amigo por dia, às vezes nada. E sei que sinto a falta dele, porque, de tudo e todas as coisas, ele é aquela pessoa que sempre lá esteve quando nem os meus próprios pais estavam. Em quatro meses, pode deixar de pensar em mim nem que seja apenas uma vez ao dia. Em quatro meses, a nossa amizade pode simplesmente desaparecer. E se o FaceTime e as mensagens não forem suficiente?
E eu não posso ficar sem ele.
Quer dizer, posso. Eu viveria sem ele. Mas não quero.
- Então vamos fazer desses quatro meses os melhores de sempre.
Ele abraça-me com tanta força que o meu coração parece uma bomba prestes a explodir. está feliz, muito feliz por eu o apoiar nesta loucura de faculdade em que, em breve, vai embarcar. Posso sentir o sorriso dele aquecer as minhas costas.
E sinto-me culpada, perguntando-me se ele sente nas dele o frio das minhas lágrimas.




Continua...



Nota da autora: Aloha, princesas! Bem-vindas à minha primeira longfic. Espero que tenham gostado desse prólogo, que foi apenas um gostinho do que está para vir. Até à próxima att!



Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no Mariana Stark.


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