Finalizada em: 28/02/2020

Capítulo 26 – Dust in the Wind.

Música do Capítulo


Romero.

- Mas ... – O olhar de Jacob era idêntico ao de um cachorro a procura de o que comer. – Por favor...
- Não, Jacob. – Permaneci firme. – Não vou te ensinar a atirar e muito menos te jogar em uma jaula com mortos-vivos.
- Mas eu sonhei.... – Pediu novamente, arrastando a voz, tentando parecer mais fofo e adorável do que já era. Eu apenas rolei os olhos.
- Esquece, Jacob.
- Mas a ... – E fez bico. Golpe baixo.
Antes do apocalipse, a titia sempre foi mais querida que a titia . Todas as crianças adoravam e tudo que ela dava. Enquanto eu ficava com a fama de chata, que não deixava as crianças comerem giz de cera.
Maldita.
- Se desistir dessa ideia de armas e jaula com mortos-vivos, eu te faço um bolo de chocolate, que tal? – mas Jacob não pareceu convencido. – Tá... a Barbie faz o bolo. – E aí sim os olhos do garotinho brilharam imaginando o bolo delicioso que Barbie faria.
Viu? Eu sabia ser legal quando não precisava botar a mão na massa.
havia esquecido de buscar seus amigos da Colônia e de certa forma, eu nem me importava. Ter a companhia deles acabava sendo bem confortante e me deixava mais leve, já que o meu antigo grupo ainda me encarava com medo e Max evitava cruzar meu caminho.
E secretamente, eu estava tentando juntar Teddy e Barbie, já que meu estômago sentia falta de comida boa e quando os dois se juntavam, era quase os céus de um bom banquete.
Não me assustava não ter tido mais nenhuma novidade de minha irmã desde que fomos embora da fábrica. Não esperei por uma carta ou qualquer coisa, o silêncio significava que ela estava viva. Se estivesse com problemas, eu seria a primeira a saber.
Ou a última.
Como fui a última a descobrir que havia sido sequestrada pelo Hospital e quase morrido lá dentro, mas óbvio que minha caçula não esqueceu de me contar a parte censurada da história.
Precisei de uma representação atuada – por Baby e Jacob – sobre o que aconteceu de verdade. E Jacob cismava em colocar uma explosão toda vez que repetia a história, dizendo que era fodona demais – não nessas palavras, Deus me livre. me mataria se eu ensinasse essas palavras para o garotinho dela.
As coisas finalmente estavam andando para frente agora que estávamos todos nos ocupando mais em nos fortalecer contra a ameaça lá fora. Todos agora sabiam seus objetivos e estavam cumprindo-os. Até mesmo Toby havia começado a calar a boca.
Mas eu estava sentindo falta de algo...
Fui em caminho à Grande Casa e Baby estava sentada na cadeira de balanço, lendo um livro que julguei ser um manual sobre armas ou coisas do tipo. Ela apenas levantou a cabeça e sorriu para mim, retribuí o gesto e entrei na casa.
Era impressionante como mesmo com o tempo chuvoso ou o mundo caindo lá fora em uma tremenda tempestade – que não era a hora –, toda vez que eu entrava na Grande Casa algo me aquecia. E cada vez mais perto que chegava no escritório de , mais quente ficava.
Mas ele não estava em seu escritório e eu estranhei. quase nunca estava fora do escritório, era como se vivesse nele. Bom, só quando eu aparecia e o obrigava sair do escritório para irmos para o quarto dele, ou para o meu, ou para qualquer outro lugar.
Dei uma volta na casa procurando-o, mas ele estava em um dos lugares mais óbvios possíveis para estar: no quarto de Jolie.
Não cheguei entrando, fiquei afastada e em silêncio, observando a cena. sentado no chão e Jolie junto a ele. Os dois brincavam de alguma coisa que eu não conseguia entender. Às vezes a bebê sentava no chão e segurava os lápis de cor rabiscando as folhas de papel espalhadas entre eles.
a levantava de vez em quando, deixando seus pés tocarem o chão e simulava que ela caminhava, então Jolie gargalhava mesmo sem entender, apenas balançando as pernas para frente e para trás. Então ele a abraçou e ela continuou dando suas risadinhas, apertando o rosto do pai, passando as mãozinhas por sua barba rala ou puxando os cabelos do pai e gargalhando, muito alto. ria junto, conversando com sua filhinha e ela o respondia, no mais confuso idioma possível.
Quando o Xerife notou minha presença, apenas me encarou com um dos seus sorrisos mais genuínos e continuou brincando com a filha.
- Vem cá. – Me chamou e eu hesitei. Não queria atrapalhar aquele momento tão familiar. Mas Jolie e o pai dela tinham um imã que me puxavam para perto, querendo profundamente fazer parte daquilo.
Me sentei junto a eles e me puxou para mais perto, levando um de seus braços para trás de mim, até que tocasse minha cintura e me abraçasse de lado.
Já Jolie, ao me ver, abriu um sorrisão de criança e seus olhinhos brilharam. Ela começou a conversar comigo em seu idioma, balançando os lápis e me mostrando os rabiscos, que para ela eram como se fossem obras de arte.
Era difícil para mim me expressar em como me sentia. Era algo maior que eu, que me envolvia muito. Sempre fugi dessa sensação de família, de união, mas com eles não me incomodava pensar assim. Não me fazia achar errado querer uma família.
me encarava e eu fingia que não via. Ele tentava ler meus pensamentos e entender o que eu sentia. Para ele deveria ser tão importante me fazer sentir como uma família para que não me perdesse. Eu já sabia quando ele evitava me sufocar, me fazer sentir acuada ou assustada. Sempre me dando a liberdade para ir e voltar. Ou ir e não voltar mais, mesmo que aquilo o machucasse.
Estúpido, mal sabia que Romero não iria mais a lugar nenhum.
Não tirava de mim o que me completava, só fazia transbordar.

***

- Armas? – parecia chocado. – E jaula com andarilhos? – Assenti e ele balançou a cabeça, se livrando da sensação arrepiante que o preencheu.
- Crianças, sabe como são... – Ri e passou a mão em minha coxa, me encarando de uma forma que seria esquisita se eu já não gostasse dele. Estávamos de chamego e eu não entendia o motivo. Mas eu sentia uma sensação... estranha.
Algo em mim estava apertando meu coração e me fazendo sentir um nó na garganta. A sensação de que algo muito ruim estava para acontecer havia tirado meu sono, minha fome e até um pouco do meu humor. Só me sentia bem quanto estava perto de e isso me assustava mais ainda.
Aos dez anos, minha gatinha Madonna – sim, eu era muito fã – sumiu e um dia antes até a hora que sumiu, eu estava com uma sensação estranha, tão estranha quanto essa, mas sempre que eu estava com ela – até seu desaparecimento – eu me sentia bem. Sempre que a sentia, algo acontecia e geralmente com quem me trazia a calma.
- Tá tudo bem? – me perguntou e eu apenas assenti, sem forças o suficiente para falar que estava surtando. Ele não pareceu convencido, mas não me importei.
O Xerife continuava acariciando minha coxa e eu apertando a manga de sua camiseta preta de manga comprida. Ele havia dado um tempo nas camisas de botão e eu mal notava a diferença. Me focava em pensar em coisas boas, pensar nele, enquanto a angustia dentro de mim não passava.
Me levantei de seu colo e resmungou, de início me senti bem fazendo isso e me afastando, mas logo senti falta de seus toques.
- , você não tá bem.
Não diga, gênio.
- Claro que estou.
- O que tá acontecendo?
Você vai morrer, ou desaparecer, ou provavelmente desaparecer como meu bichinho de pelúcia. , eu sei o que você fez.
- Nada. Só estou agitada. – Dei os ombros.
- Quer dar uma volta? Podemos ir patrulhar um pouco.
Não, péssima ideia. Tínhamos que ficar presos dentro do escritório. Não podíamos sair dos portões da Colônia.
E em um gesto repentino, corri para a porta do escritório de e a fechei, impedindo que saíssemos dela.
Ele riu e se levantou, vindo até mim.
- Vamos, , vai ser bom sair um pouco. Espairecer.
Não. De jeito nenhum. Nem fodendo.
- Tenho uma melhor ideia, vamos ficar aqui. – Aproveitei que ele já estava perto de mim e o agarrei, apertando seus braços e forçando o corpo dele junto ao meu. – Estou com saudades de você...
Mas gargalhou, me segurando contra ele, acariciando minha cintura e beijando delicadamente meus ombros.
- Vamos, eu dirijo. – Ele me soltou e eu acabei saindo do caminho, provavelmente porque minha cabeça estava confusa demais para lutar contra ele.
saiu de seu escritório e eu fui atrás, tentando argumentar contra isso. Que era melhor ficarmos, já que o tempo estava ruim e podíamos ficar deitadinhos na cama fazendo qualquer coisa que não envolvesse sair da Colônia.
Mas ele nem me deu ouvidos.
Ele estava tão sorridente e convicto dessa ideia que partia meu coração ter que cortar o barato dele, então passei a me convencer de que era apenas uma sensação estúpida que logo passaria. Que nada aconteceria com .
Ele não era um bichinho de pelúcia ou uma gata. Ele era um líder, um pai e muito inteligente, forte e habilidoso, jamais deixaria que algo acontecesse contra si mesmo, seria mais precavido. Então eu estava me preocupando à toa, que tudo daria certo porque o era o .
Saí da Grande Casa, colocando meu casaco e já estava se despedindo, passando o comando para os colegas e dizendo que voltava logo. Se despedindo do filho e da filha. Então quando ele virou para mim sorridente, animado para ter um tempo comigo do lado de fora, a sensação horrível tomou conta de mim de novo e eu respirei fundo.
Se fosse para sairmos, seria em minhas condições.
Fui até ele e tirei as chaves de sua mão. me encarou confuso, esperando que eu fosse argumentar contra, brigar ou até mesmo sair correndo com suas chaves impedindo que ele saísse. Eu apenas tirei do meu bolso as chaves da camionete. Pelo menos lá eu me sentiria segura.
- Eu dirijo. – Sorri e passei por , ele veio atrás de mim.
Então passamos pelo portão e respirei fundo, rezando para todos os santos que fosse apenas uma sensação passageira.
Maldita sensação.

***

Estávamos na estrada para sabe-se lá onde. Eu dirigia sem rumo e apenas ficava me encarando, sem falar nada. Dizia algumas piadinhas ou qualquer coisa, mas não conversamos.
abriu o porta-luvas e agiu da forma mais curiosa possível, procurando para saber o que as irmãs Romero escondem dentro de seu carro que já foi por muito tempo a sua casa. Tirou de lá o CD com as músicas de meus pais, colocando no rádio e apertando para tocar. Encarei ele, aproveitando as lembranças que me traziam ouvir essas músicas.
- Meus pais adoravam todas essas músicas. Eles me contataram tantas vezes que me conceberam na faixa 16 e na faixa 25. – Contei e parecia muito interessado em minhas histórias de vida.
- Qual é a 16?
- Acho que é Wicked Games, não lembro. – Dei os ombros e continuei dirigindo.
continuou fuçando no porta-luvas e tirou de lá uma garrafinha pequena de alguma bebida alcóolica que eu e sempre carregávamos por aí. Era bom encher a cara quando as coisas não estavam tão boas assim.
- Não beba isso, deve estar estragado. – Dei bronca e ele bufou.
- E álcool estraga?
- Se vomitar no meu banco eu te jogo pra fora. Esteja avisado. – gargalhou e continuou fuçando no carro.
Meus olhos permaneciam focados na estrada, ouvindo a música no fundo da minha cabeça, sem realmente me importar com a letra, só a melodia me embalava e me acalmava. E a companhia era tão boa quanto a música que tocava.
Queria parar o carro e pular no colo de , agarrá-lo e tirar de mim toda essa angústia, medo, preocupação de uma vez, queria ir até o fim desses sentimentos e só ficar com as coisas boas que deveriam estar acontecendo.
Era fato que eu estava uma pilha por causa do Hospital. Desde que eles pegaram minha irmã, a única coisa que queria era matá-los, um por um. Eu queria a cabeça de Zeus em uma bandeja como meu prêmio depois de exterminar aquele lugar.
Eu nunca havia odiado e temido algo com tanta força como sentia pelo Hospital e por Zeus.
- O que é aquilo lá? – apontou para a estrada e eu percebi algo bem mais para frente, como se fosse um carro. Mas pela velocidade que íamos, não demoraria muito para que chegássemos lá.
E não havia como voltar.
- Vou tentar dar a volta. Melhor voltarmos. – Tentei alertar, sentindo a sensação ruim me preencher e minha garganta se fechar.
- Não. Vamos ver o que é. – A oposição de acabou me deixando em um estado de pânico. Mas meu pé não apertava o freio e ficávamos mais e mais próximos daquilo.
- ...
- Calma, , vai dar tudo certo. Deve ser algum grupo que ficou sem gasolina e largou o carro.
Eu queria muito que fosse.
Continuei dirigindo até que chegamos no carro e realmente, era apenas um carro vazio, estacionado barrando a passagem. Mas não acreditava que isso era acidental, esse carro havia sido deixado lá propositalmente.
- Vamos lá. – abriu a porta e eu segurei seu braço, impedindo-o de sair. Negando com a cabeça.
- Vamos voltar. Por favor. – Já havia pânico em minha voz e eu não sabia mais como convencê-lo. – Eu estou com uma sensação muito ruim, . Por favor, vamos voltar.
O Xerife me encarou, no fundo dos meus olhos e apertou a minha mão. Por mais suave e gentil que aquele toque havia sido, não conseguia anular tudo que eu estava sentindo e me aterrorizando.
- Vai ficar tudo bem, ok? Você confia em mim? – Assenti em resposta. – Não vou deixar nada acontecer com você, prometo. – beijou minha testa e saiu do carro.
Mas não é comigo que vai acontecer... é com você.
Rendida, saí do carro sentindo minhas pernas fracas e meu pulmão ardendo. O nó da minha garganta me impedia de falar, então eu apenas tirei o facão da proteção e o segurei com toda a minha força. Eu mataria qualquer coisa que aparecesse em minha frente.
Fomos até o carro e ele estava realmente vazio. Sem ninguém por perto e deixado como se alguém estivesse fugindo de algo. Ou de alguém. entrou para conferir se havia gasolina ou algo no porta-luvas, mas saiu com uma expressão frustrada.
- Nada? – Ele assentiu. – Então vamos.
- Vamos.
Saímos de perto do carro e um barulho chamou atenção, como se estivesse algo escondido na floresta. Os arbustos se mexeram e meu peito se apertou, como jamais havia se apertado antes.
Então um grupo de homens saiu dos arbustos. Mas não qualquer grupo. Era a única coisa que eu rezei para não trombarmos: homens do Zeus.
Todos saíram apontando suas armas para nós e eu levantei minhas mãos, me rendendo. fez o mesmo, mas eu sabia que ele não se renderia. Não assim, não tão fácil.
- Ora, ora, olha só o que temos por aqui... – Um deles disse, sorrindo da forma mais podre possível.
- Será que é o nosso dia de sorte?
- Talvez seja. – Um deles foi até mim e outro até . O que chegou até mim, me agarrou, prendendo meus braços para trás e fazendo com que meu facão caísse. – Eu gosto de loiras.... – Ele cheirou meu cabelo e eu senti tudo que não comi subir.
- Larga ela. – mandou, no seu tom mais autoritário possível e os caras nem tremeram.
- Qual é? Não vai dividir? Achei que no fim do mundo devíamos ficar mais gentis. – Um terceiro falou, o que eu julguei ser o líder deles. Sorrindo também da forma mais podre possível.
Eram três contra dois. Já era injusto e assustador o bastante. Mas um de nós era o e ele tinha uma reputação, então não nos deixaria morrer. Certo?
Estávamos fodidos.
– que até então só estava com seu facão em mãos – tirou sua arma do coldre e apontou para o que estava me segurando. Eu quis xingá-lo, porque isso acabaria nos matando de vez. Não que eu não confiasse nele, mas eu não confiava em toda a situação.
Eu estava com medo.
- Eu disse pra largar ela. – Ele repetiu, ainda autoritário. Ele parecia menos assustado que os de Zeus. – Agora.
O líder riu e negou com a cabeça.
- O que vai fazer? Atirar em nós? – Ele foi mais perto de e o que me segurava, me apertou mais forte ainda. E eu pude sentir ele se roçar em mim. – Ela morre antes que o primeiro caia no chão.
Dessa vez riu, mais debochado ainda.
- Será? – Encarou bem fundo o líder e meu coração parou. – Vamos testar. – atirou então em um, o mais afastado que caiu no chão rapidamente no mesmo instante que o disparo. O que me segurava acabou afrouxando mais atrás de mim. Então eu entendi o que quis fazer.
Assustar. Mostrar que ele não era de blefe, já eles...
O líder ficou irritado, completamente puto, mas tinha um sorriso podre nos lábios. E aquilo me deixou mais assustada ainda. O pior do que um psicopata, era um psicopata que não se importava com seu próprio grupo.
Isso quebraria o nosso plano.
- Pois é, você não estava de brincadeira! – Riu o líder. – Mas eu também não estava. – Então fechou a cara.
Eu comecei a respirar fortemente, completamente desesperada. Sentindo meu peito queimar e doer, cada vez mais apertado. Mas eu não estava em pânico por mim, eu estava em pânico por .
O líder foi até o carro e abriu o porta-malas, tirando algo que não vi e fechando em seguida. Ele permanecia com o objeto escondidos atrás do corpo e caminhou rápido até .
- Agora vamos começar a festa. – Sorriu, chutando forte a perna de que reclamou de dor e acabou caindo. – Você quer que a vadia sobreviva? – O líder perguntou e assentiu. – Então fica quietinho.
O líder deixou deitado e pisou forte em seu peito, impossibilitando que ele se movesse. Um tinha a expressão de dor, mas permanecia forte e o outro estava puto, pronto para matar. Então o líder tirou de trás das costas o machado.
Eu já não conseguia permanecer em pé. Sentindo as lágrimas escorrendo e molhando meu rosto.
- Eu odeio, odeio muito quando matam um dos meus, odeio de verdade. Mesmo quando é um bosta igual o Jeremiah, mas é como dizem... parceiros são parceiros. E eu poderia te matar agora, sabe? Mas qual seria a graça? Eu poderia matar a vadia, mas ela vai ser mais útil conosco. Muitos homens... poucas mulheres... sabe como é, né? Espero que não leve para o pessoal.
agora estava puto, mais puto do que eu já havia visto. Talvez só uma vez, na farmácia quando fui atacada. Ele bufava de fúria, completamente vermelho e mesmo imobilizado, suando de raiva.
- Eu te mato se você chegar perto dela! – Gritou, ameaçando o líder que apenas riu.
- Tô contanto com isso – debochou. – Agora, espero que não leve para o pessoal, eu só quero que você esteja vivo para ver nós levarmos sua garota. – Sorriu. – Bem... meio vivo. – Então ele tirou o pé de cima de , mas não havia dado tempo para ele reagir.
No mesmo momento que o pé do líder saiu do peito de , ele segurou forte o seu machado e o cravou no punho de , cortando sua mão direita em apenas uma machadada. A lâmina saiu ensanguentada e o braço de jorrava sangue.
Eu gritei, gritei com todo o meu pulmão o vendo sangrar daquela forma e o ouvi gritar, urrar de dor e sofrimento. Mas aquilo me encheu de fúria, de um tremendo ódio que me dominou.
O homem que me segurava, ele havia ficado tão chocado quanto eu ao ver a cena, abaixando a guarda. Abaixou o suficiente para que eu pisasse com força em seu pé, o fazendo gritar e me soltar. Girei meu corpo para ficar de frente a ele e enfiei meu dedo em seu olho esquerdo, enfiando minha unha até o fundo ferindo-o sem pensar duas vezes.
O mesmo gritou, cambaleando para trás. Foi o suficiente para que eu conseguisse alcançar meu facão e cortar seu pescoço rapidamente.
Mas enquanto o atacava, acabei chamando a atenção do líder que veio furiosamente em minha direção segurando seu machado, pronto para dar um fim em mim. Ele levantou o machado, eu me virei e um disparo atingiu sua perna, fazendo-o gritar e soltar o machado.
Ele se virou para que apontava a arma para o homem. Sua mão tremia, ele não conseguia mirar direito, já que não havia nenhum controle com aquela mão, mas mesmo assim ele tentava me proteger.
- Eu te avisei. – disse firmemente e descarregou o pente da arma toda no líder. Vários tiros que o acertou em vários lugares diferentes do corpo. soltou a arma e continuou gemendo de dor, com a mão ainda jorrando sangue.
Corri até ele, em completo desespero e sem saber o que fazer.
- Calma, calma. – Pedi, sabendo que aquilo era impossível.
Agarrei a manga de sua blusa e rasguei com toda a minha força, fiz isso com a do outro braço também e tentei enfaixar a mão, enquanto eu pensava o que fazer. Eu só queria parar o sangramento antes que morresse. Mas logo o pano estava completamente ensanguentado e continuava gemendo de dor.
Eu me levantei desesperada, procurando por algum lugar qualquer kit de primeiros socorros, qualquer coisa que o ajudasse para irmos embora antes que atraísse atenção de zumbis. Por sorte, o grupo havia limpado o local enquanto armava a armadilha.
Tive uma ideia, mas só em pensá-la ficava mais assustada ainda, sabendo na dor que aquilo traria para ele. Mas seria o suficiente para mantê-lo vivo.
Corri para a camionete e tirei de lá a garrafinha da bebida, voltei para e ao ver o líquido em minha mão, ele balançou a cabeça se negando.
- , eu preciso fazer isso. – Choraminguei e ele implorava para que não, mas eu fiz. Derramei o líquido todo no ferimento e ele urrou de dor. Tentei tampar sua boca com a minha mão, mas não adiantou muito. Ele continuava gritando e eu continuava despejando o líquido nele.
Ele parou de gritar, mas continuava reclamando em agonia e eu não achava que aquilo era o bastante. Até voltarmos para a Colônia ele perderia muito sangue e morreria. Então tentei pensar.
Lembrei quando havia ido na Colônia na primeira vez que estive lá. Lembrei de quando ele arrancou o braço de Liam e depois usou fogo no ferimento. Era muito arriscado e basicamente impossível, mas era possível e se salvasse , eu faria.
- Fica aqui – pedi. Corri para a mata, tremendo e ensanguentada, completamente em choque. Peguei de lá alguns galhos, algumas pedras. Peguei tudo que consegui e grudei em meu corpo, para que eu conseguisse trazer para o carro.
Ao chegar no carro, joguei os galhos e as pedras embaixo da bomba de gasolina e abri, despejando um pouco da gasolina, molhando-os. Corri a procura de um isqueiro. Eu e não tínhamos nenhum, mas algum dos caras de Zeus deveria ter.
Procurei em todos os bolsos deles, até achar um no bolso do que me agarrou. Voltei para que ainda estava acordado, mas muito fraco.
- , o que eu vou fazer agora vai ser horrível, doloroso e você vai me odiar por isso. – Comecei, puxando-o mais para perto dos galhos e ele se tocou.
- , não... Por favor. – Choramingou e meu coração doía. Partia demais meu coração vê-lo dessa forma.
- Vai ficar tudo bem, ok? Você confia em mim? – O imitei, como havia feito quando eu estava com medo. Ele assentiu fraco em resposta. – Não vou deixar nada acontecer com você, prometo.
Tirei meu casaco, dando para ele usar de mordaça para não gritar mais alto do que poderia. Respirei fundo, segurando o seu machucado com uma mão e com a outra tentando ascender a minha fogueira improvisada, mas tremendo demais.
E quando ascendi, levei o machucado para o fogo. O vi gritar, gritar com todas as suas forças, mas abafando com o pano do meu casaco em sua boca. Deixei as chamas queimarem a pele estragada e destruída, esperando que adiantasse de algo.
Eu sabia que não era nada, mas seria o bastante até levá-lo para Frid.
Ao ver que já estava bom, tirei a mão dele de lá e apaguei o fogo, cobrindo seu machucado com meu próprio casaco.
suava frio, estava pálido e fraco. Foi difícil conseguir levantá-lo e arrastá-lo para o carro. Mas consegui. O sentei no banco de passageiro, enquanto o ouvia resmungar e chorar de dor.
Fui para o banco de motorista e mais uma vez me desesperei, já que não conseguia encontrar as chaves de forma alguma e não tinha tempo para procurar. Apenas puxei os fios e a ligação direta mais rápida da minha vida.
- Onde você aprendeu isso? – perguntou fraco, me encarando com os olhos quase fechando.
- No reformatório. – Ele riu de minha resposta, mas logo choramingou novamente de dor e eu dei partida, sem pensar duas vezes dirigindo na maior velocidade possível.
Nunca dirigi tão rápido em minha vida e a sorte era que não haviam mais carros para os atrasar, por isso dirigi sem nem pensar. Só queria chegar logo na Colônia.
Eu estava tentando me segurar, mas eu estava morrendo por dentro vendo daquela forma. E eu senti, senti tudo. Tentei, tentei demais evitar que isso acontecesse e aconteceu, agora não havia como resolver isso.
Eu me odiaria para o resto da vida por não ter tentado mais.
Eu devia ter tentado mais.

***

Chegamos na Colônia e no momento que abriram o portão, eu entrei rapidamente com a camionete e não dei nem tempo de desligar o carro, apenas corri para fora. E todos ao redor se assustaram ao me ver ensanguentada.
- CHAMEM O FRIEDRICH! RÁPIDO! – Berrei com todos meus pulmões e correram chamá-lo. Eu abri a porta do lado de e o ajudei sair da camionete. Ele mal conseguia ficar em pé e quando o viram em meus braços, Judas e Teddy correram para me ajudar a levá-lo para a enfermaria.
- O que? Que foi que aconteceu? – Frid gritou e eu mal conseguia respirar. Nós apenas deitamos em uma das camas e Bailey foi atrás de soro e medicamentos para tratar de .
- Fomos parados por um grupo de Zeus. Cortaram a mão dele, Frid. Foi horrível. Eu tentei tudo que eu pude na hora pra parar o sangramento e deixá-lo vivo. – Eu tremia e Frid apenas me segurou, tentando me acalmar.
- Vai ficar tudo bem , calma. Ele vai ficar bem.
- Salva ele, Frid. Por favor. – Implorei.
- é forte, ele vai sair dessa. Eu farei o possível e o impossível para salvar ele. – Abracei o senhor com todas as minhas forças e ele retribuiu o gesto, tentando me consolar. – Agora saia daqui, preciso trabalhar.
Saí da enfermaria ainda muito mal, sentindo tudo girar e minha cabeça doer. Meu peito ainda ardia e eu mal respirava. Ninguém entendia nada que estava acontecendo e eu mal conseguia ficar em pé.
- O que aconteceu? – Max gritou, vindo em minha direção desesperado. – Meu pai tá bem? – Ele gritava. – O QUE VOCÊ FEZ COM MEU PAI? – Eu não tinha forças para responder, mas ele continuava gritando e gritando.
- Calma, Max. – Judas apareceu, segurando o garoto pelo braço e o afastando de mim. – Dá um tempo, vai ficar tudo bem.
Senti o peso de tudo que aconteceu voltar, a ficha cair e corri para a minha casa, mais precisamente para o banheiro. Me joguei na frente do vaso e vomitei tudo que não havia comigo e tudo que havia comigo há mais de uma semana.
Liberei tudo aquilo dentro de mim e quando parei de vomitar, comecei a chorar. Chorar de desespero, de medo, de raiva, de tristeza. Eu só conseguia chorar, porque tudo doía.
A cena de perdendo a mão estava grudada em minha cabeça e ficava se repetindo e repetindo, sem parar. Todo aquele sangue em mim. O ouvia chorar de dor no fundo de minha cabeça. Doía demais.
Fiquei fora de mim por um momento, encarando todo aquele sangue em mim e aquilo me fazia chorar muda. Esfregava minhas mãos nos braços tentando me limpar daquele sangue que não era meu. Era de . E aquilo me fazia gemer de dor, chorando sem voz e gritando em silêncio.
Minhas pernas não se mexiam, eu não conseguia me mover, então me deitei no chão do banheiro. Chorando cada vez mais, completamente desolada. E enquanto chorava, eu rezava. Rezava para que tudo aquilo fosse um pesadelo e eu acordasse.
Mas não era. Tudo aquilo era real.
Ouvi mais gente entrar no banheiro e não saí da minha posição. Continuei chorando.
- ? – ouvi a voz de Willa e meu coração se apertou mais ainda.
- Tá tudo bem? – a voz doce de Jacob me destruiu mais ainda. Consegui levar meu tronco, mostrando meu rosto destruído e todo cheio de lágrimas para os dois que estavam lá. Jacob, sem entender nada, correu até mim e me abraçou.
O abraço mais doce, mais gentil, mais carinhoso e mais consolador. Mesmo sem entender nada, ele estava me enchendo de amor. Ele não conhecia , mal sabia das coisas que passamos, mas não o importava. Ele só queria me consolar como podia.
E chorei mais ainda por causa daquele abraço.
Eu me sentia o pior tipo de pessoa por poucas coisas me fazerem chorar. Por ter que ser tão forte, mostrar a face mais dura que eu tinha para evitar mostrar minhas fraquezas. Poucas vezes chorei assim. Contaria no dedo.
A mais recente foi quando desapareceu quando estava salvando as crianças da Colônia. Naquela vez sofri tanto quanto sofria agora. Mas daquela vez não tinha uma criança tão doce tentando me consolar mesmo sem entender nada.
E isso me mostrava que estava tudo bem. Eu podia chorar. Eu podia sofrer. Não havia mais motivos para fingir que não sentia. Porque não era qualquer pessoa lá, era .
O mesmo que fez de tudo – até mentir para mim – pra me livrar das lágrimas quando perdi uma vez. Agora era vez dele.
E eu não sabia o que fazer pra fazer isso passar.
- Vai ficar tudo bem, . – A vozinha de Jacob me fazia chorar mais, mas me dava a maior força do mundo.
Eu o soltei e ele me encarou, passando os dedinhos pelo meu rosto e limpando as lágrimas que caíam. Mesmo com meu coração doendo e tudo se roendo ao meu redor, me atrevi sorrir para aquele gesto e ele retribuiu, abrindo um sorrisão.
Willa me ajudou a me levantar e ficar em pé, me abraçando e tentando me dar forças. Respirei fundo, absorvendo tudo que estavam me dando.
Respirei fundo, limpei as lágrimas e me fortaleci.
Isso não ficaria assim. O que fizeram com não ficaria impune e eu jamais esqueceria. Estava na hora de chamar a cavalaria.
Eu iria destruir Zeus.

***

Entrei no QG sem muita cerimônia. Não precisei que me ensinassem o caminho que eu seguiria. Não queria que me anunciassem e muito menos que me parassem. Eu só queria encontrar duas pessoas nesse lugar e eu esperava que ambos estivessem lá.
Entrei no escritório de sem nem mesmo me anunciar, abrindo a porta bruscamente e assustando os dois que se encontravam lá, e , que aparentemente estavam em uma reunião que eu pouco me importava.
- Mas que putaria é essa aqui? – xingou. – Onde ficou sua educação, garota? – mas ao prestar atenção em mim, sua expressão mudou. – Mas que porra... Tá tudo bem?
- ? O que aconteceu? – se levantou do sofá, também apática e chocada em me ver daquela forma.
Eu não havia mudado de roupa, eu ainda estava ensanguentada, descabelada e com o rosto inchado de tanto chorar. Só fiz questão de trazer uma coisa e essa seria a coisa.
Naquele momento, eu já havia passado da fase de sofrimento, de luto, estava na fase de ódio. Estava a pura fúria. Fúria pelo o que essa merda de Hospital anda fazendo e o que ele está destruindo.
Mas não sabia como falar. Ainda estava em choque demais.
- ? – se aproximou de mim, tocando meus ombros levemente. Eu estava apenas respirando forte e tremendo, sem forças para falar. Eu encarei os olhos de minha irmã e a transmiti toda a dor que eu estava sentindo, mas me segurei para não cair no chororô. Não na frente de .
Apenas tirei a mão de do pano e a coloquei na mesa de . O homem encarou a mão e me encarou, um pouco confuso. atrás de mim não entendia nada.
- O que? Não me diga que você curte essas coisas agora. Guardar como recordação das pessoas que mata? – fez piadinha. Parece que alguém estava de bom humor e não era eu. – Que foi? Isso é pra significar alguma coisa? Ou vai tacar na minha cara como tacou o braço aquela vez?
- Essa mão é de quem, ? De algum soldado do Zeus? O que aconteceu? Por que tanto sangue? – minha irmã segurou meu rosto, tentando obter respostas. – FALA ALGUMA COISA, ROMERO! – gritou.
Balancei a cabeça, negando suas respostas.
- Essa... mão... – disse pausadamente, tentando dizer e um “Olha, ela fala!” saiu da boca de enquanto eu tentava terminar. – Essa mão é... – minha garganta se fechou, respirei fundo. – É do . – disse de uma vez, sentindo minha voz falhar e as lágrimas voltarem ao lembrar daquilo tudo de novo.
O queixo de caiu e os olhos de Slade perderam a cor, ele havia ficado chocado e sem reação. Eu engoli seco, tentando me recompor.
- Como é que é? – disse seriamente. – Que merda aconteceu?
- Fomos atacados....
- .... – Minha irmã me abraçou e eu continuei pedra, evitando chorar.
- Soldados do Zeus? – Assenti a pergunta de e ele socou sua mesa com ódio.
- E o Xerife? Como ele tá?
- Tá com Frid. Ele tá tentando tudo que pode, mas ele perdeu muito sangue... – choraminguei, tentando, ainda tentando ser fria na frente deles.
- Calma, tá? Ele é forte. Se o Slade cortou o braço do garoto lá e ele tá vivo, pro Xerife vai ser fichinha. Relaxa. – me abraçou mais uma vez, tentando me consolar. Mas acho que nem ela sabia exatamente o que me dizer.
- Isso não vai ficar assim. – rangeu e eu me virei para ele.
- Não vai mesmo. – respondi firme. – Eu vou destruir aquele Hospital, custe o que custar.
Pela primeira na vez na vida eu e Slade concordamos em algo. Só não sabíamos como faríamos, mas faríamos.
- Vem, segurou minha mão. – Vamos tirar essa roupa suja. – Ela me puxou para fora do escritório aos poucos.
- Romero! – Slade chamou e se virou pra ele. – Não você, a outra – ela rolou os olhos.
- Oi?
- Nós vamos derrubar eles. Ninguém mexe com o , só eu. – Acenei com a cabeça e Slade fez o mesmo. Então me puxou para fora do escritório.
Depois daquilo, me levou para tomar um banho e me deu roupas limpas, mas sabia que mesmo com um trilhão de banhos, eu ainda me sentiria suja. Só me sentiria limpa quando tudo isso acabasse de vez.
Ela me ofereceu algo para comer, mas qualquer coisa que descesse a minha garganta voltaria na mesma hora.
Estávamos do lado de fora, ambas deitadas na grama. Eu com a minha cabeça em sua barriga e ela acariciando meus cabelos molhados delicadamente. Não falamos nada, porque não havia o que dizer. Só de minha caçula cuidar de mim com tanto carinho já me ajudava.
- Eu senti... – disse, quebrando o gelo. – Eu pedi pra ele pra voltarmos, eu pedi. – Engoli o choro.
- Não é sua culpa, .
- Eles iam me matar. Ou iam me levar pro Hospital e provavelmente me fazerem de escrava sexual ou tudo do pior. Ele perdeu a mão por contrariar o líder deles.
- Não é sua culpa.
- E mesmo sem a merda da mão ele me salvou.
- Não, não é sua culpa.
- É de quem então?
- Bom, primeiro de por ser um filho da mãe teimoso que deveria te ouvir mais vezes. Depois do Zeus por existir e ser tudo de ruim que acontece conosco.
Encarei e ela estava sorrindo pra mim. Um sorriso de quem dizia “eu sei o que você tá sentindo”.
- Quê?
- Você gosta dele.
- Hã?
- , eu te conheço há... sei lá... 26 anos. É a primeira vez que você fica assim tão preocupada com um cara. Você gosta do Xerife. E muito.
- Bom, é a primeira vez que alguém perde a mão na minha frente.
- Quer dizer...
- Ele não perdeu a mão... – Rolei os olhos. – Ele perdeu dois dedos.
apertou minha mão com força. Me transmitindo suas boas energias. Eu sabia que ela e não tinham uma boa relação, talvez fosse ciúmes de irmã mais nova, mas o apoio que ela me dava era tudo que eu precisava nesse momento.
- Ele vai ficar bem. E se não ficar, eu vou até lá e faço ele acordar com as minhas próprias mãos.
- Igual com o Ed da natação? – Arqueei as sobrancelhas e ela bufou, rolando os olhos.
- Ele tinha se afogado. Era meu dever como pessoa.
- A Salva-Vidas Gostosa foi a fantasia dele durante dois anos – dei os ombros.
- Viu? Gostosa. É pra poucas.
Não ri, porque não conseguia, mas apertei sua mão com mais força, como eu faria se estivesse rindo e ela entendeu o gesto.
Minha ida no QG me resultou em uma parceria com para destruir o Hospital de uma vez por todas e um momento reconfortante, familiar e especial com que vai me ajudar a passar por isso.
Não me sentia mais tão sozinha e saber que tinha tantas pessoas tentando me dar forças pra conseguir dar essas forças para o valia a pena.
Não desistiria.
Me manteria forte.
E destruiria o Hospital. Isso é o nº1 na minha lista.

***

Voltei para a Colônia no fim de tarde e ao passar pelo portão já senti todo aquele peso em mim de novo. Porque sabia que ainda estava trancado na enfermaria passando pelos procedimentos de Frid para salvá-lo.
Max estava sentado na escadaria na frente da enfermaria esperando por notícias do pai e fui até lá, imitando-o e me sentando ao seu lado.
A Colônia estava morta. Todos estavam preocupados com seu líder. Uns estavam rezando dentro de suas casas, outros estavam em choque demais, outros assustados demais a pensar do que seria da Colônia e deles caso o pior acontecesse com .
Naquele momento, éramos apenas eu e Max do lado de fora. Esperando por qualquer notícia e qualquer sinal de vida. E meu coração batia mais forte a cada barulho que ouvia saindo da enfermaria.
- Me desculpa. – Max chamou minha atenção e eu me virei para ele. – Me desculpa por ter gritado com você. Me desculpa também por ter feito o que fiz na patrulha, matando aqueles caras... fui idiota.
- Não foi não. Você estava certo em matá-los. Eu fui idiota em achar que existem pessoas boas dentro daquele Hospital. Fui idiota em querer salvá-los. – Enquanto Zeus estiver vivo, não há pessoas boas. Eu só saberia quem valeria salvar após que Zeus caísse de vez e então os verdadeiros bons se mostrassem.
- Eu tô com medo, , do meu pai... – Engoliu seco e eu apertei a sua mão.
- Ele vai ficar bem – encarei o garoto. – Bom, é exatamente o que todos me dizem. Que ele é forte e vai ficar bem. Vamos dar um voto de confiança pro seu pai.
Max apertou a minha mão de volta e ficamos lá, por horas esperando qualquer novidade de .
As horas passaram, o sol de pôs e nada. E ficava mais difícil passar por aquilo sem noticia nenhuma. Minha vontade era de entrar naquela enfermaria e descobrir de vez o que aconteceu. Mas uma parte de mim não queria nem pensar nisso, porque estava com muito medo da resposta.
E mais tempo se passou. Já havia anoitecido e Barbie saiu de sua casa, ao ver nós dois do lado de fora. A senhora tinha a preocupação no olhar e estava tão cabisbaixa quanto nós.
- Ei, vocês querem algo para comer? – perguntou genuinamente. – Eu e Teddy cozinhamos um pouco para os moradores e se quiserem podemos fazer um prato pra vocês.
Neguei com a cabeça e Barbie respirou fundo, tentando me compreender.
- Eu não tô com fome – Max disse e não concordei. Tudo bem eu descer nessa ladeira da autodestruição, mas não levaria Max comigo. Ele era jovem, precisava ser forte e permanecer forte agora.
- Vai comer Max, você precisa recuperar as forças. Seu pai vai precisar que você tome conta de tudo aqui enquanto ele melhora. – Pedi e ele se levantou, assentindo. – Qualquer novidade eu te aviso.
Barbie o levou pra o refeitório e eu permaneci sentada lá. Sabendo que a chuva cairia logo, o tempo se fechava, mas eu não me importava. Eu permaneceria ali, chovendo ou não. Até amanhecer se fosse preciso. Só sairia quando Frid saísse e me dissesse como estava.
E fiquei por mais algumas horas lá fora, esperando e nada.
Até que depois de horas esperando, agoniando e rezando para quem quisesse ouvir lá em cima, Frid abriu a porta da enfermaria. E eu levantei em um pulo.
Quase caí, depois de tanto tempo sentada minhas pernas falharam. Corri ao Frid e o mesmo tinha uma expressão calma no rosto. Não sabia se isso era bom ou ruim e isso me deixava mais agitada ainda.
- Ele perdeu muito sangue... – Já suspirei derrotada. – Mas está bem. – E um alivio percorreu o meu corpo. – Infelizmente ele terá que aprender a viver sem uma mão, mas está vivo. Fraco, cansado, com dores, mas vivo. E isso é o bastante para nós, certo? – Abracei Frid novamente, com toda a minha força e ele me abraçou também.
Para ele, era como um filho e eu nem havia parado pra pensar no susto que ele levou. Nas horas que ele dedicou pra cuidar de para que ele ficasse bem. Se para mim saber que ele ficaria bem era um alívio, imagina para Frid?
A Colônia toda sofreu o medo da perda. Todos nós sentimos o gostinho de quase perder o . E até os que conspiravam para que ele saísse da liderança se desesperou com a possibilidade de tê-lo morto. Mas felizmente, agora todos nós poderíamos descansar.
Já podia ouvi-lo rindo e dizendo que todos teriam que o engolir, dizendo que não iria a lugar algum. E era tudo que eu queria ouvir.
Frid havia me deixado entrar para vê-lo e lá estava, deitado desacordado, com a agulha do soro no braço e completamente fora da realidade. Com o machucado que um dia fora a sua mão enfaixado agora profissionalmente. Vê-lo naquela posição era de se partir o coração.
Um homem tão forte...
Me sentei na cadeira ao lado de sua cama e segurei em sua mão, a única que tinha. Me doendo só de pensar em explicar para ele e no que teríamos que passar até ele se acostumar com sua nova realidade. Mas para mim nada disso importava agora. Ele estava vivo e para mim isso era o bastante.
Acariciava sua mão e seus dedos, observando-o descansar e recuperar todas as forças que perdeu. E rezei.
Rezei que tudo isso acabasse logo e que ele ficasse bem.
Que o que viria a seguir não fosse tão difícil e doloroso para todos nós.
Para que ele pudesse ser o novamente.

***

A madrugada caía e junto com ela uma tempestade. Uma forte e terrível tempestade. Muito barulhenta. Tão barulhenta que havia acordado Jolie.
Jolie chorava como se não fosse só a chuva que a assustava, mas também o que aconteceu com seu pai.
Cantarolei para ela a madrugada toda, tentando fazer ela dormir novamente. E depois de várias tentativas e um repertório inteiro, ela dormiu. A botei delicadamente em seu berço e saí de seu quarto.
Depois de um dia cheio de desespero e nervoso, as coisas finalmente estavam se acalmando. Todos estavam descansando e estava se estabilizando aos poucos. Mas eu ainda não estava bem. Precisaria de um tempo para finalmente me botar no lugar.
Saí da Grande Casa e a chuva ainda não havia dado uma trégua. A chuva forte caia e uma leve ventania acompanhava. Era um daqueles temporais em que o melhor era ficar na cama esperando passar.
Mas nem todos estavam na cama.
Meu coração bateu mais forte e mais uma vez me desesperei naquele dia. Não havia folga, de jeito nenhum.
estava no portão em uma tentativa frustrada – graças a Deus – de abrir o portão para sair da Colônia, completamente ensopado, fraco e dopado demais pra fazer qualquer coisa.
Corri para onde ele estava, ignorando a chuva e que em pouco tempo, eu estava ensopada.
- Que merda é essa? O que você tá fazendo, ? – Segurei ele, que quase cedeu ao chão enquanto tentava puxar o portão.
- O que parece? Eu vou sair. – Disse meio grogue.
- Surtou? Você tem que descansar, se recuperar. Que porra. Para de ser teimoso – explodi, segurando-o e tentando arrastá-lo de volta para a enfermaria, mas ele se negava a sair do lugar.
- Me larga, , eu vou sair e vou atrás de Zeus. Vou acabar com isso de uma vez.
- Claro que vai. Mas não agora e muito menos assim. , por favor, só por uma vez, me ouve e faz o que eu te peço, porra.
- Não! – Gritou e se virou para mim. Ele não estava só dopado, ensopado e fraco, ele estava fodido. E eu entendia o porquê. – Olha o que ele fez comigo, , olha! – Levantou o braço machucado e sua voz já tomava outro tom. Cheio de raiva, mágoa.
- Por isso mesmo, você não tá em condições de ir atrás de ninguém, você precisa descansar.
- Descansar não vai fazer minha mão crescer de volta, porra! – Explodiu e junto com ele um trovão, mas eu nem tremi.
- ...
- Ele me fodeu de vez, . Olha pra mim, agora eu tô incompleto. Agora eu sou inútil. Como eu vou conseguir lutar? Como vou conseguir cuidar da minha família? De você? Dessa Colônia? Eu preferia ter morrido de uma vez... – Ele nem terminou de falar, porque no momento que ele soltou aquela frase, eu o estapeei com toda a minha força.
Foda-se se ele estava fraco. Foda-se. Ninguém fala algo assim para outra que estava desmoronando – e ensopada – em sua frente.
cambaleou, um pouco assustado com minha reação.
- Você nunca mais repita algo assim, tá me ouvindo? – gritei. – Podem sim ter te fodido de vez. Você pode sim estar numa merda e que não sabemos como você vai sair, mas você vai. E você vai continuar cuidando dessa porra toda, porque você é mais que isso. Você conseguiu me salvar e me proteger mesmo sem uma mão, coberto de sangue e morrendo de dor. Não duvide de si mesmo, porque se fizer, eu vou te encher de porrada até você se tocar.
- Mas... – e nem o deixei falar.
- E jamais na sua vida diga que preferia estar morto, porque você não faz noção do quanto eu vou te odiar se repetir isso. Porque você não tem noção do quanto doeu, do quanto me desesperou imaginar você morrendo. Você não tem noção de como todos ficamos, de como o Max ficou e até de como o ficou, porque ninguém prefere você morto. Ninguém! Você pode ser meio irritante, chato, muito cabeça dura e teimoso a um ponto que me dá vontade de te socar? Sim, muito. Mas você é uma das poucas coisas que eu tenho e eu não estou nem um pouco a fim de te perder. Foda-se se você tá quebrado ou não, nós vamos te consertar. Eu e você, juntos.
Não sei se era a chuva ou tantas coisas acontecendo ao mesmo tempo, mas eu nunca havia sido tão sincera. Só imaginar de perder foi uma das piores sensações que eu jamais vou querer sentir de novo. Eu não o abandonei nem mesmo quando ele mentiu para mim em relação à , não seria agora que eu o abandonaria.
veio para perto de mim, em uma tentativa de abraço. Ele apenas deitou sua cabeça em seu ombro e desabou, como deveria fazer. Porque para ele era uma vida mudando aos 45 do segundo tempo. Ele teria que aprender a fazer tudo de novo e se fortalecer para não deixar ninguém na mão. Não por nós, mas por ele mesmo.
Acariciei sua cabeça, deixando que chorasse em meu ombro. O abracei carinhosamente e ele fez o mesmo, me abraçando da forma mais desengonçada possível.
Jamais pensaria que Romero se encontraria nessa posição. Quem diria, eu jamais pensei que fosse possível me sentir dessa forma em relação a alguém. Era uma sensação tão...
Jamais acreditei que isso poderia acontecer.
Jamais imaginei que um dia eu amaria como agora.
Ele levantou a cabeça e deu um daqueles sorrisos genuínos e completamente meigos, tirando do bolso do meu casaco que ele ainda usava, a chave da camionete que eu estava procurando na hora do desespero.
- Estava aqui o tempo todo. – Ele a deu em minha mão e eu apenas dei os ombros.
- Que se dane, eu fiquei mais fodona do outro jeito – riu e eu o segurei, levando-o de volta para a enfermaria.
Ao entrarmos na mesma, completamente ensopados. Frid saiu de sua sala completamente assustado e puto com a nossa situação.
- Que bagunça é essa? – Brigou.
- Foi mal – deu os ombros e o senhor bufou. Ajudei a se sentar na cama.
- Ele tá uma fera – ri e me acompanhou.
O senhor voltou com toalhas e jogou para nós, ainda revoltado com a nossa atitude de ir “brincar” na chuva.
- Vocês dois... – Cruzou os braços. – São piores que as crianças.
Ajudei a se secar e o mesmo não tirava o sorriso do rosto, mesmo com os esporros de Frid. Sempre desconfiei que ele tivesse a cabeça de um adolescente que se apaixonou pela líder de torcida, agora tenho certeza.
- Não ligo – deu os ombros e o Frid não gostou da reação do Xerife. – Ela gosta de mim de qualquer jeito. – me encarou com aquele sorrisinho e eu corei, completamente perplexa com a falta de vergonha na cara.
Provavelmente eram os medicamentos. Tinha que ser os medicamentos.
O ajudei a deitar na cama e Frid praticamente me expulsou da enfermaria pra examinar novamente o para ver se essa brincadeira dele custaria alguma coisa mais pra frente, porque era só o que faltava ele ficar mais doente ainda.
Do lado de fora, mesmo com a chuva caindo e os trovões no céu. Não me importava com mais nada.
Segurei as chaves que ele havia me dado e respirei fundo, sem conseguir evitar meu sorriso de orelha a orelha. Eu me sentia patética e boba.
Me sentia uma adolescente apaixonadinha.
Eu tinha vergonha de mim mesma.
Mas que se foda, eu não ligava. Ele gostava de mim de qualquer jeito.

***

Eu estava sentada na cadeira, bebendo um chocolate quente que Frid havia me feito e feito para , que estava dopado, porém acordado. Agindo como uma criança, mas completamente adorável.
- Se você pegar uma pneumonia por causa dessa chuva, eu vou te matar, Grimes. – disse sem rodeios, porque isso estava me deixando levemente puta.
- Então você se importa comigo...
- É sério.
tinha aquele olhar meigo, porém provocador. A cabeça baixa e as sobrancelhas arqueadas, com um sorrisinho de canto que me dava um monte de sensações.
- Então... Nós temos um relacionamento agora? – Perguntou, repetindo os mesmos passos que fez na fábrica.
- Se você continuar perguntando isso, não. – Abri um sorriso amarelo e ele riu. E só Deus sabe como era bom ouvir a risada dele. Não era bom, era maravilhoso. Revigorante. Tudo de bom.
pegou a minha mão e levou até a sua boca, dando um beijo na mesma. Um toque delicado.
- Obrigado.
- Pelo o quê?
- Por ter cuidado de mim e ter feito tudo que fez pra me salvar.
Dei os ombros.
- Você estava morrendo na minha frente, não tinha muito o que fazer.
E novamente gargalhou. A sua gargalhada gostosa preencheu todo o ambiente e aqueceu meu coração, me fazendo sorrir genuinamente.
- Eu também te amo, Romero. – Ele apenas disse, sem rodeios, sem nada, só disse. Com a voz grogue e arrastada, completamente rouca, porém audível. Não era algo da minha cabeça. Ele disse.
E depois disso só se virou para o lado, fechou os olhos e dormiu. Ele dormiu, me deixando com de queixo caído, respiração descontrolada e coração quase explodindo.
Ele havia dito as duas palavrinhas e eu não sabia como reagir.
E eu o queria matar por isso.
Mas não o fiz. Apenas tomei meu chocolate quente tentando pensar como responder um eu também te amo para um cara completamente dopado que provavelmente nem se lembraria disso no dia seguinte.
Provavelmente eram os medicamentos. TINHA que ser os medicamentos.

***

Mais um dia e o clima estava melhorando. Tanto o clima fora, quanto dentro da Colônia. Estava finalmente começando a sair o sol e isso havia se tornado raro nos últimos dias.
estava se recuperando e até então não havia dado sinal nenhum que a chuva que tomou geraria consequências. Mas ainda estava trancado naquela enfermaria, já que Frid não confiava nele e preferia o ter de baixo de suas asas para cuidar.
Não havíamos debatido sobre as três palavrinhas – e nem iriamos.
Eu havia acabado de dar café da manhã pra ele e sua evolução me deixava mais confiante. Estava mais corado, saudável, falava mais, brincava – e me provocava – mais. Não havia se deixado se abater e isso nos ajudaria mais para frente.
Jacob entrou na enfermaria correndo e tinha algo escondido atrás das costas.
- O que você tá escondendo aí, Jacob? – perguntou, fazendo o menino sorrir de orelha a orelha.
- Bom, já que a não vai me deixar participar da jaula de monstrengos – Isso de novo?! – eu resolvi passar meu tempo fazendo algo pra você se sentir melhor!
Os olhos de brilharam.
- Ah é? O que você fez? – Arqueou as sobrancelhas e Jacob foi até ele, tirando o desenho e a cartinha de trás das costas e entrando ao .
- É um Super-Xerife. Porque você não é um Xerife qualquer, sabe? Eu também sou Super...
- Muito obrigado Jacob, de verdade – os dois deram um soquinho com as mãos e meu coração se encheu com o ato de fofura. Queria ter uma câmera para mostrar pra mais tarde.
- – Barbie apareceu na porta da enfermaria e eu fui até ela. – Dá pra vir ao refeitório um minutinho? – Assenti.
- Ei, Jacob? Você teve mais algum daqueles seus sonhos muito legais? – Perguntei e ele assentiu. – Então conta eles pro Super-, ele vai adorar saber. – O peguei no colo, sentando-o na cama junto com .
- Sério? – Os olhinhos de Jacob brilharam com a oportunidade de ir para o mundo da imaginação com alguém.
- Claro campeão, me conta aí.
E os dois se juntaram para uma sessão de sonhos e com certeza debateriam bem sobre isso.


3 semanas depois

Era mais um daqueles raros dias ensolarados, depois de tantas tempestades em nossas vidas. Eu finalmente havia tipo um descanso de tantas dores de cabeça. estava evoluindo como nunca. As coisas estavam finalmente voltando para os seus devidos lugares.
Barbie me acordou, o que já não era bom por natureza. Já que ser acordada me deixa de mau humor. A não ser que fosse , Jacob ou Jolie me acordando, eram três crianças que me acordavam rindo. Mas nesse caso, o mau humor era inevitável.
Principalmente após chegar ao portão e ver a pequena visita indesejada que só serviu para estragar completamente o meu dia.
Lá estava Lionel e uma criatura gigante que eu nunca havia visto na vida. Bizarro.
- O que você quer, Lionel?
- Eu quero falar com seu líder, por favor.
- Pode falar comigo. – Cruzei os braços e ele engoliu seco, dando uma risadinha idiota.
- Desculpa princesa, mas eu preciso falar com o seu líder. – Não me movi, permaneci de braços cruzados esperando que ele falasse logo e fosse embora.
- Pode. Falar. Comigo.
- Tá bom, tá bom. Eu hein. – O homem respirou e então despejou de uma vez: - O Zeus quer conversar.
Ahhhhh.
Iria ser uma boa conversa.
Ah se iria.
Tínhamos muito papo pra botar em dia.


Capítulo 27 – The Chain.

Música do Capítulo


Romero.

As pessoas estavam preparadas. Os tanques de todos os carros estavam cheios. Tínhamos um local para ficar se tudo desse errado. O QG havia preenchido cada quarto vazio como novos convidados que estavam aqui para ajudar. Tudo se reposicionava a cada instante. O sol brilhava no céu, mas nossos corações estavam nublados no peito. O ar era puro, e também sombrio.
Cada dia que passava era apenas mais um risco no caderno de Slade. Um dia mais próximo de sermos atacados e lutarmos para que soubéssemos qual enfim seria nosso destino. O que Deus teria preparado para nós?
Ao menos era o que tínhamos pensado.


30 minutos antes

- CALE A PORRA DA SUA BOCA! – Slade gritou após socar Lionel, que estava sentado ao seu lado no banco de carona da SUV.
Cerrei os dentes tomando meu olhar para a estrada que voltou a se movimentar. O dia estava lindo até aquele babaca aparecer no portão do QG ontem de manhã nos informando que Zeus estava disposto a conversar conosco.
Então não somente ele sabia onde estávamos como iria fazer as coisas do seu jeito. De alguma forma, ele já estava nos dando ordens antes mesmo de vencer a luta.
Obviamente todos do QG estranhavam a falta de ação de nosso inimigo por tanto tempo, ainda mais com alguns tendo que praticamente mudar toda a vida para passar uma temporada de treinamento em nosso campo para ajudar-nos no dia conjugal. Dia este que nunca veio.
Não reclamávamos pelo adiamento, o que não significava que não estávamos pensando qual era o plano de Zeus e como ele estava se recuperando e aumentando a força do seu grupo para nos combater.
Então aqui estávamos, Slade e eu, sendo guiados por Lionel até o local onde Zeus queria “bater um papo cabeça” conosco. Seria mais difícil aceitar se ele ainda possuísse os dois braços, mas sinceramente, o homem estava tão quebrado que eu me sentia confiante o suficiente de estar ao lado dele e não sentir nada mais do que desgosto por tudo que eu acabei sentindo por alguém que não merecia. Alguém tão baixo em suas atitudes que nem mesmo seu novo líder o parecia tratar mais que um cachorro ou garoto de recados.
E Slade batia nele, porque Lionel sabia que não precisava calar a boca, tendo certeza de que não importava o quanto ele provocasse o comandante do QG não poderia matá-lo. Acabaria por ser um efeito borboleta repleto de devastações para qualquer um que vivesse conosco. Mesmo que nosso grupo estivesse se preparando, evitar o pior era o mínimo que poderíamos fazer por eles.
- Estou apenas dizendo – o raquítico disse, retirando o sangue de seu maxilar com a única mão – que se eu pudesse reverter essa situação, eu nunca teria a tocado.
- Claro – zombei. – Como o bom homem que você é, deve estar dizendo a verdade.
- Eu não cometeria o mesmo erro duas vezes. Eu nunca faria isso se soubesse que de alguma forma vocês acabariam se envolvendo...
Então o filho da puta não conseguia fingir que se importava. Tudo que ele queria era a confiança de Slade, e provavelmente conseguia ver o erro sobre aquilo no único fato de que agora eu estava envolvida com o seu ex-chefe. Não havia respeito dele para comigo, não havia respeito dele para com qualquer pessoa, nem consigo mesmo.
- Lionel, eu quero que você entenda uma coisa – Slade falou calmo estacionando no que parecia ser uma casa pequena de madeira sozinha no deserto e nosso ponto de encontro segundo as instruções de Lionel. – Não toleramos estupradores. Você pode chorar, pode esganiçar, pode tentar encontrar qualquer desculpa, pode tentar culpá-la ou me chantagear emocionalmente. – ele se virou para o loiro de face queimada e cada palavra ficava vazia de sentimentos, mais rouca, amedrontadora. – Mas nunca, nunca, nesta vida, na Terra ou no Inferno, haverá perdão para a merda que você fez. E cada tentativa sua de tentar não morrer com a culpa dentro da sua cabeça me deixa mais irritado, porque você precisa pagar por isso Lionel. Você vai pagar por isso. Eu tentei fazer você pagar, mas não foi de longe a metade do que você merece por todas as merdas que já cometeu com todos ao seu redor, e entenda que, trair nosso vinculo, foi a menor delas.
Lionel estava com os olhos arregalados e suas narinas se dilatavam rapidamente, sua boca tremeu antes de ele olhar para a fora e dizer em um sussurro.
- Estou pagando todo dia, – saiu do carro.
Isso era pra supostamente nos fazer ter pena dele? Porque não havia funcionado.

***

- Então você é o famoso Slade. Não diria que é bom te conhecer, mas devo manter a educação que minha mãe me deu – ele riu com vontade. Pense em um garoto de dezessete anos tentando agir como um homem com lábia e acabava resultando em algo irritante demais para descrever fervorosamente. Este era Zeus agora e como eu me lembrava.
- Não posso dizer o mesmo... Ares?
- Zeus.
- Tem certeza? Disseram por aí que você era o cara da raiva ou algo assim.
- Sim, eu tenho certeza – um minuto e Slade já havia o irritado, belo caminho pra se tomar.
- Tanto faz, são todos deuses gregos, não é? – Slade o olhou de cima a baixo. – Pelo menos no nome.
Aquilo com certeza foi uma pontada no ego de Zeus, com seu corpo magricela e cabelo ralo. Ele conseguia ser até mais baixo que . Não que houvesse problema com caras baixinhos, mas com certeza havia um com ele e sua necessidade de mostrar grandiosidade a cada frase. Não poderia ser com sua aparência, então era com o que tinha materialmente falando.
Slade passou diretamente por ele e se sentou largamente na cadeira de madeira que o esperava. Minha irmã estava lá. estava lá. Ambos acompanhando tudo pacientemente.
Arregalei os olhos para o homem que estava de pé, ao lado do gigante Gut. Sim, Gut era assustador, mas depois de um você apenas se acostumava. O que o acompanhava por outro lado me assombrava completamente.
- Boa tarde, senhorita – ele falou. – Espero que minha aparência não te assuste.
Era o cientista maluco do Hospital. O mesmo que eu havia inserido alguns mililitros de produto tóxico em uma das veias safenas do pescoço. Em pé, na nossa frente.
Entretanto se ele não tivesse me chamado pelo nome eu provavelmente não o reconheceria dessa vez. Sua pele estava completamente pálida, suas olheiras visíveis demais, o cabelo que já era ralo não existia mais, assim como suas sobrancelhas.
- Estes esteroides estão cada vez mais na moda – murmurei me referindo a Gut, e agora também a ele.
- Podemos começar? – falou e o agradeci mentalmente.
- Sim, antes que me arrependa de estar gastando meu precioso tempo aqui.
- Tinha outro lugar para ir? Escola, talvez? – sorriu.
Ótimo , como se Slade não estivesse irritando ele o suficiente.
- Quem é você mesmo? – perguntou para minha irmã.
- Romero. Não é um prazer.
Ele franziu o cenho pensando.
- Onde já ouvi esse nome antes? – virou-se para o professor.
- disse que se chamava quando a conhecemos, senhor. – O careca falou.
Por que ele estava aqui mesmo?
- Oh! Então existe mesmo uma . Interessante. – Zeus se virou para mim. – E você... Se recuperando?
Sorriu antes de se sentar. Permaneci quieta.
- Quer revelar a graça do convite? – Slade perguntou.
Zeus respirou como se tivesse um problema muito grande pra resolver. Seus dois amigos estavam em pé atrás dele, não estavam armados, mas preparados se algum de nós tentasse algo.
- Slade, eu tenho o maior grupo do estado. O maior local de armazenamento que você poderá encontrar seja para comida ou hospedagem. Eu tenho mil soldados, entende?
Não. Você tem a metade disso, Zeus.
- E? – o moreno ao meu lado disse cansado.
- Mil é um número muito grande, não foi fácil chegar onde estamos hoje, você deve saber.
- Na verdade não. Não obrigamos as pessoas a estarem lá.
Zeus riu.
- Eu sou o líder deles, eu mando naquela merda com a palma da minha mão e não foi por ordens, foi por comida - gargalhou – eu sempre pensei que o poder poderia ser comprado com armas e bombas, e no fim era só aparecer com um prato de arroz em frente de pessoas esfomeadas.
Eu queria vomitar.
- Se isso te faz dormir melhor de noite... – falou deixando subentendido.
Ele a ignorou.
- O problema é que não posso continuar a dar esses pratos de arroz se tem mais gente roubando ele de mim. Mais dois grupos pra ser preciso.
- Nosso grupo tem plantação própria, fornecemos para o QG e para a Colônia somente, eu não vejo como isso pode afetar tanto a sua vivência nem tão perto de nós – argumentou brandamente.
E minha irmã bufou outra vez, se alterando.
- Você está no meio da porra de um Apocalipse, não tem do que reclamar.
E ela estava completamente certa. Estar vivo e tendo um teto em cima da cabeça era bom o bastante, se ele realmente estivesse em escassez de comida, ele viria atrás de nossos alimentos e não nossas cabeças. O que faria esta conversa estar direcionada para termos um acordo em dividir comida, e não salvar nossa pele no fim do dia.
- Quem deixou você abrir a boca? – os olhos de Zeus semicerraram para ela. Observei a mandíbula de apertar, ela estava furiosa. – Gut.
Ele chamou e em um segundo o morto-vivo que recebia ordens de 2 metros de altura vinha em sua direção.
- Não tem necessidade de fazer qualquer alarde – falou como um aviso para Zeus, do tipo “não mexa com a minha mulher” e se virou para ela. Zeus levantou a mão para que seu pet parasse. – , é melhor você esperar lá fora.
Ela não deixou o olhar sair de Zeus, nem mesmo quando se levantou com rapidez, empurrando a mesa que se mexeu um pouco e ouvimos o baque da cadeira caindo no chão. A porta bateu. Por dentro ela queria brigar, gritar para que ele estava errado e que isso era ridículo, mas ela não era burra, sabíamos que de nada adiantaria.
- Eu poderia matá-los sabia? – falou retoricamente. – Uma ordem e caixão para vocês.
Ele estava esperando receber uma pergunta, mas os caras ao meu lado não iriam dá-la.
- E ainda não fez isso. Por que? – falei finalmente. Não estava a fim de rebatê-lo a qualquer momento, ele merecia sim, mas eu tinha pavor pelo desencadeamento de reações.
Talvez, só talvez, eu tinha uma queda pelos homens consideravelmente malvados da parada. Zeus não era do tipo deles. Eu nem o considerava um homem. Era apenas um babaca.
- Eu não sou tão ruim assim – curvou os lábios, por um segundo pensei que ele estava lendo meus pensamentos. – Acredito que juntos somos melhores que separados. Porém meu povo não está apto assim, para aceitar outras pessoas.
Eu apostava que aquilo tinha a ver com a superlotação que Slade havia mencionado.
- Sim, convivência é realmente difícil, esse é o motivo para não nos juntarmos – eu podia sentir o sarcasmo pingar na voz de Slade, que continha um traço de bom humor.
Às vezes eu ficava chocada com o quão facilmente ele mudava de personalidade quando estávamos acompanhados de outras pessoas. Com inimigos ele tendia a fazer de conta que eu não importava para ele, com minha irmã ele me respeitava para que não houvesse mal-entendidos, e com o Quartel ele me deixava em posições altas para decisões difíceis deixando sua confiança em mim e desejando que o povo visse o mesmo que ele via em minhas atitudes.
- E o que vocês me propõem? – Zeus perguntou.
Do nada. Na lata. Alguém tinha algo em mente para respondê-lo? Nós viemos para saber sobre sua proposta, não o contrário, até porque Zeus não iria aceitar qualquer coisa que lhe déssemos. Se Zeus fosse Slade, ele riria da nossa cara, mas como ele é ele, ficaria irritado.
E eu deveria parar com comparações entre os dois.
- Convivemos juntos, cada um em nosso terreno, por pelo menos dois anos. Podemos estender esse prazo, Zeus. Você não quer ser apenas mais um garotinho egoísta – Slade falou conscientemente.
Mesmo que não intencional, ele estava surgindo como um bom professor para sobrevivência para mim. Aos poucos eu entendia suas atitudes e tentava replicá-las em mim onde eu jurava ser fraca. Aquele era meu lema de vida, sempre em evolução.
- Ora, cale a boca, isso não é sobre egoísmo, é sobre o seu povo roubando o que é meu por direito. Minoria aceita a maioria e suas regras para conviver, se não querem jogar o jogo da forma correta, não comecem a jogá-lo – Zeus o respondeu previsivelmente irritado.
- Isso não é um jogo, isso são nossas vidas – refutou.
- Tanto faz – revirou os olhos – vocês são fracos demais de qualquer jeito.
- Qual a sua oferta? – Slade quis saber.
Então Zeus olhou para mim, para a minha boca, abaixou para o meu pescoço, busto e pulso. Algo embrulhou dentro do meu estômago já sensível. Ao voltar para meus olhos, ele tentou prender lá, tentou ser intenso e raivoso, tentou causar impacto. Mas desviou o olhar. Ele não conseguia manter. Ele era fraco.
- Sempre digo que mulheres não deveriam participar de decisões importantes, a outra como uma selvagem, já me atacou – queixou-se para os homens, como o verdadeiro porco que era.
- Você também disse que o Hospital tinha segurança máxima e eu nunca sairia de lá – rebati. E não deveria ter feito isso.
Em um segundo uma faca apareceu em sua mão e no outro fincou a um milímetro de meu braço na mesa. Arfei com o susto.
- Cale a porra da sua boca. – olhou para mim. E depois para Slade, esperando alguma reação, como eu também acabaria por esperar, mas nada, se Zeus estivesse lidando com Lionel sua reação faria mais sentido.
Engoli seco e me forcei a olhar para baixo. Às vezes deveríamos nos fingir de tolas para que os verdadeiros tolos dessem corda o suficiente para se enforcarem sozinhos.
- Cinco dias – levantou. – Cinco dias para ambos os grupos estarem vazios. Sem pessoas, sem crianças, levem até mesmo a última escova de dente do seu grupo sujo junto com vocês. Me entenderam?
- Como quiser – Slade finalizou.

***

- Agora eles sabem onde está a Colônia – falou suspirando antes de largar o seu copo de uísque no balcão.
Minha irmã e estavam no “bar” do QG, bebendo, e diferente da noite em que eu e Slade nos beijamos, jazia vazio.
- Tente levar o máximo de pessoas para o grupo do Norte. Boa parte do nosso pessoal está lá, esvaziamos camas para encher com novos estranhos – tentei soar amigável. Mesmo com qualquer tipo de inimizade que eu possuía com apenas porque nossos gênios não batiam, eu precisava ser adulta. E eu estava com um pouco de pena também porque bom... Não que algum dia eu falaria isso em voz alta.
colocou o queixo no meu ombro e suspirou. Desanimo nos definia.
- Sumir em cinco dias – reclamou. – Onde Jacob vai ficar?
No momento que ela o mencionou, o garotinho de cabelos escuros apareceu com as bochechas vermelhas de tanto correr.
- Oi Super-Xerife. Oi tia – sorriu abertamente.
- Oi campeão – sorriu verdadeiramente.
- Como vai minha pessoa preferida? – perguntou depois de correr para abraçá-lo.
Esse moleque estava sendo muito mimado.
- Ah, eu tô ótimo – riu envergonhado.
Eu estava atrás da mesa do bar como uma garçonete, sentada em um banquinho de madeira observando ele falar nervoso.
- , será que eu posso ir naquele terreno lá atrás brincar com as meninas? – perguntou com uma voz baixa e contida.
- Naquele terreno que fica à beira de um precipício através do muro de proteção do QG onde você pode correr sem prestar a atenção e cair de uma altura infinita que você mesmo já me disse que morria de medo somente de chegar perto? – falei sem pausar.
- Sim... – sua voz era um fiapo.
- Não.
- Mas...
- Mas nada.
- As meninas todas estão indo... – meninas todas, que em outra língua significava Lily, uma garotinha de cabelos curtos. Extremamente fofa, mas também muito espertinha.
Lembrei que no início da minha estadia no QG Lacey, Teddy e eu dávamos aulas para ela Jacob e outras crianças sobre como dominar uma arma. Naquele tempo eles tinham muitas dúvidas, mas eram leigos demais por não terem perdido alguém muito próximo.
Hoje em dia eles poderiam passar a perna em mim sem muito esforço.
- Só porque elas estão indo, você acha que pode também? Você não é todo mundo. E quem deixou essas garotas irem, afinal de contas? Jacob, manda essas meninas virem pra dentro agora antes que eu chame a mãe de cada uma e vamos ver quem vai se divertir no terreno lá atrás.
Ele reclamou gemendo palavras desconexas, chutando o ar.
- Será que... – ele ia argumentar de novo e bufei e engrossando a voz.
- Jacob, se você fizer eu me levantar daqui... – antes que eu completasse a minha frase ele saiu correndo arregalando seus olhos.
Huh. Era só o que me faltava.
- Uau... – riu – você acabou de soar como... – levantei um dedo.
- Não termine essa frase.

***

- E então, como foi?
Maria era uma senhora de idade com os cabelos castanhos cacheados e pele muito branca. Ela tinha uma netinha que vivia no QG e dizia ela que sobreviveu da sua casa até a resistência usando apenas um guarda chuva.
- Ruim. Poderia ter sido pior.
- Como Slade se comportou? – perguntou como uma avó diria. Ela cuidava das roupas do QG então não tinha muito contato com ele, mas era uma das poucas pessoas duronas o suficiente para não se deixar levar pelo jeito bruto dele.
- Bem, eu acho. Provocou no início, mas conseguiu ficar firme em situações difíceis – falei enquanto arrancava alguns matinhos que impediria uma flor de nascer.
- E qual era o motivo dessa reunião afinal de contas? – olhei para ela com a luz solar ferindo meus olhos. Ela pendurava roupas enquanto eu estava sentada ao seu lado, tomando um pouco de ar puro.
- Eu tenho uma aposta. Ele queria inspecionar o terreno. Conhecer os oponentes. Tentar descobrir nossas fraquezas, nossas personalidades, com algumas palavras ele poderia entender o que seria capaz de nos derrubar, e não há nada pior do que ser destruído emocionalmente. Facas? Tiros? Puff. Descobrir que o Xerife tem um carinho maior pela minha irmã e poder começar com ela? Destruição total.
- É por isso então que você tem andado mais tempo na Colônia do que aqui.
- Bom... Sim. Ela acha que é loucura da minha cabeça, mas a loucura nos deixa de olhos abertos pra qualquer coisa que venha a ser uma ameaça real.
- Depois que isso tudo se acalmar sossegue um pouco aqui, ouviu? – reclamou e eu gargalhei.
- Com saudades da minha companhia Dona Maria? Nem responda, não precisa.
- Que nada menina – bateu com uma toalha em mim antes de pendurá-la no varal – é que as coisas ficam uma bagunça quando você está fora.
- Sério? – estranhei levemente orgulhosa de mim por estar fazendo um bom trabalho.
- É óbvio. Você dá as ordens que ele não tem prática em dar, as plantações que iniciamos mês passado estão crescendo como o vento com o sol que abriu nessa semana. A organização da limpeza, dos horários para alimentação de acordo com o sol e toda essa baboseira, a disponibilidade das pessoas para irem até lá fora jogar seu tempo livre e raiva na cabeça de alguns andarilhos estão fazendo com que cresçamos aos poucos. E claro, eles te obedecem, querida Primeira Dama.
Revirei os olhos.
- Me obedecem pelo medo do que Slade poderia fazer se eles não me ouvissem?
- Talvez – ela disse – mas toda pessoa que precisa dizer que é líder, não é um de verdade. Nasceu apenas com poder. E você mostra todo dia que não é disso que se trata. Você apenas tenta crescer espiritualmente.
- É, ok... Vamos tentar isso se Slade passar umas férias no Havaí – falei sarcástica.
- Ele já esteve fora e você cuidou de tudo perfeitamente, menina. Não precisa ser nomeada como nossa rainha para ganhar respeito desse grupo, você já tem esse respeito e ganha cada dia mais por suas atitudes.

***

- E se nós fugíssemos? – perguntei para antes de dar uma dentada no chocolate que ela trouxe da Grande Casa para mim.
- O que? – riu colocando o binóculo no chão.
Suspirei vendo a falta de movimentação no portão da Colônia do alto do observatório.
- É, sei lá, minha cota de ajudar os outros está lotada.
- Não sei, quem sabe. Mas também não sei se eles dariam conta sem a gente. Mana, esse pessoal é fraco demais, mesmo com um pulso firme eles não teriam coragem o suficiente pra encararem toda essa confusão.
- Eles não são fracos... Eles melhoraram muito esses últimos dias e com a ajuda do Norte nós podemos – ela sorriu pra mim com cara de malandra. Bufei. Nem hipoteticamente eu conseguiria largar aquele pessoal.
- Fica quieta – enfiei o chocolate na sua boca.

***

Slade.

Suspirei vendo o tanto de tempo que eu tomaria para deixar tudo aquilo pronto. Larguei a grande sacola com estacas grandes e pontudas e demais objetos que ajudariam para tornar aquele ambiente habitável e seguro para uma criança.
Criança esta que observava tudo com interesse e dúvida, com um cachorro ao seu lado que possuía o mesmo semblante e não parava de abanar seu rabo.
Sem mais saídas, estava na hora de começar.
Observei a casa de pescador desenhando mentalmente o que poderia ajudar a manter aqueles seres descerebrados longe. Resquício de uma fogueira e uma garrafa vazia jazia no chão. Eram os mesmos que estava usando e bebendo quando a conheci aqui, meses atrás.
Poderia me lembrar como se fosse ontem quando avistei a criatura em uma de minhas patrulhas com meus soldados, estava lá, aproveitando o luar para beber e ter um longo monólogo consigo mesma sobre sabe se lá o que, já que sua voz estava tão arrastada que entendi apenas metade, com o tempo que observei.
Ao primeiro olhar julguei como apenas uma garota que deu sorte de sobreviver por tanto tempo. No fim apenas entendi que o que diziam era verdade, as piores coisas aconteciam com as melhores pessoas.
Era até mesmo irritante pensar nas merdas que já sofreu somente neste meio tempo que eu a conhecia, e que mesmo assim continuava de pé e cabeça erguida, sem deixar se abalar, e principalmente, sem deixar sua humanidade ser corrompida.
De alguma forma, aquilo valia de inspiração para mim mesmo. Uma garota de vinte e seis anos pôde passar por inúmeras experiências traumatizantes sem deixar levar para o seu lado pessoal e começar a agir como uma total babaca, algo que eu não havia conseguido completar. Eu me sentia envergonhado por isso. Claro que ninguém, nunca, jamais, ouviria de mim tais palavras.
Tudo que falei para ela era verdade, não tinha uma história chocante por trás de minhas atitudes. Talvez eu fosse só um babaca mesmo que não merecia metade de sua atenção.
Demorei bastante para acordar, mas aos poucos eu estava tentando mudar isso. Não exatamente por mim ou para repentinamente criar uma passagem para o Céu assim que eu morresse, não, eu poderia ser idiota, mas não o suficiente para esperar um perdão de Deus por toda merda que já fiz. Era mais sobre parar de machucar pessoas alheias que não mereciam tudo aquilo e ela, que tomava as dores dos meus atos para si mesma.
- O que estamos fazendo aqui? – Jacob perguntou abrindo a porta da casa. Casa com... Quatro metros de perímetro? Era o tamanho do meu quarto.
- Eu estou aqui pra encher esse pombal de armadilhas o suficiente pra ninguém chegar perto de você – o empurrei com uma mão para trás e peguei a faca entrando primeiro para ver se estava tudo limpo.
- Pra mim? – questionou.
Desde o dia em que o levei para dar uma volta e me contar sobre o que ele tinha visto no Hospital na época em que era um prisioneiro lá dentro, ele já tinha crescido essa total confiança em cima de mim, o que era estranho para alguém que achou ótima a ideia de me esconder que havia sido capturada pelo grupo.
Ele me contou que vivia escondido lá dentro como no QG e assumi que era como um parasita. Mesmo não se lembrando de muito, ele acabou ajudando, mas claro que não abriu a boca até eu lhe dar uma oferta boa. Acabei lhe prometendo o pote de balas que havia na mesa do escritório. estava roubando balas junto com o garoto desde que colocaram os pés lá dentro e achavam mesmo que eu não suspeitaria que o local que antes estava cheio e agora tinha somente cinco balas – dava pra contar -, estava sendo roubado por eles dois.
Foi fácil demais comprar aquele moleque, mas me arrependi um pouco, já que antes ele não falava ou eu mal o via dentro do QG, hoje em dia ele faz questão de me seguir pra qualquer lugar e não parar de falar por. Um. Maldito. Segundo.
- Sim, pra você. Sua querida amiga me pediu pra que arranjasse um lugar seguro o suficiente pra você não se meter no meio do que tiver que acontecer no Quinto Dia.
A comunidade toda estava se referindo ao conflito como Quinto Dia, já que guerra ou luta era algo clichê e repetitivo demais.
- Pediu ou mandou? – gargalhou.
- Eu posso te largar no meio das ruas de Oklahoma se preferir, assim você fica sem Zeus no caminho e também sem ou qualquer outra pessoa, porque nunca mais vão conseguir te achar – sorri.
Ele arregalou os olhos e engoliu seco.
- Sabe... Você não é muito bom com crianças – comentou.
Alcancei a panela que estava ali jogada e enchi de água, jogando ao redor da casa para que amolecesse a superfície dura.
- Não estou vendo criança alguma aqui – ele sorriu. Não sei se esse era o efeito que eu queria para minha fala.
- É mesmo, eu já tenho quinze anos.
Arqueei uma sobrancelha.
- Tudo bem, eu tenho catorze.
Eu ri pegando uma das estacas enfiando contra o chão agora mole. Virando da forma certa, qualquer andarilho que se aproximasse se prenderia na ponta afiada.
- Ok, eu tenho dez anos – suspirou – mas já ouvi algumas pessoas deduzindo que eu tinha doze e também dezesseis.
Continuei em silêncio, afundando mais estacas.
- Tá bom, com dezesseis na verdade eles estavam se referindo a idade de uma das minhas amigas lá da Colônia. Mas eu não sou nenhuma criança!
- Se você diz.
Ele aumentou a voz.
- Você disse que não estava vendo nenhuma criança aqui!
- Isso porque você ainda é um bebê.
1x0.
- Não sou! – gritou.
- Sim, você é.
- Não eu não sou! Sou praticamente um adulto! – grunhiu, e parecia um filhote de gato.
Segurei minha risada.
- Então cadê sua barba? Pra ser um adulto precisa ter barba.
- Ela tá crescendo... No momento.
Finquei a última estaca e me virei para ele suspirando para as coisas que me metia.
- Você sabe lutar? Caçar? Correr ou atirar?
- É claro que eu sei – se defendeu.
- Qual destas opções exatamente...
- Teddy já me ensinou a abrir uma arma e eu sei correr, tenho duas pernas tá bom Slade? E sou rápido porque não sou tão velho quanto você – debochou.
1x1.
Cerrei os olhos.
- Muito bem. Então é o seguinte, quer provar pra mim que você já é um adulto?
- Eu não sei... – sua voz murchou. – disse pra eu não fazer nada estúpido que você pedisse, mesmo que parecesse legal. Porque no fim, não seria.
Eu bufei.
- Isso é apenas intriga da oposição, vamos lá, vai ser legal.
- O que é? – perguntou analisando a situação enquanto coçava o queixo como um nobre pensando.
Me aproximei da sacola grande e alcancei alguns panos e uma vassoura.
- Aqui – entreguei pra ele, sorrindo – pode começar a limpar tudo lá dentro.
- O que? – perguntou fazendo cara de cachorro abandonado. – O que tem de legal nisso?
- Sua querida amiga queria que você ficasse extremamente confortável e seguro aqui dentro então acho que como o adulto que você é poderia ajudar a deixar esse lugar assim, não é? Ou você não pode lidar com tanta responsabilidade assim? Pra mim tá tudo bem, sabe, como criança você deve...
- Não! – me cortou. – Tá bem, eu consigo.
Revirei os olhos.
- Não vai cair o braço, moleque. E depois volte aqui e carregue algumas dessas pedras grandes até o outro lado do rio.
Só queria ver sua reação. E foi engraçado. Jacob apenas reclamou e se remexeu no mesmo lugar antes de entrar na casinha e começar a missão deixar o local morável.
Me sentei em uma pedra ao lado do rio e alcancei algumas latas de metal, as enchendo com pequenas pedras que havia na margem. Porém cada vez que tentava pegar mais, o cachorro que mais parecia com um rato achava que eu estava brincando com ele e mordia de leve minha mão.
- Acabei de me livrar de um e você já vem pra cima – suspirei.
Iria gritar pra Jacob tirar aquela peça do meu caminho, mas percebi que o menino havia até gostado do seu trabalho, levando em conta que estava cantarolando alguma canção sem letra real usando o cabo da vassoura de microfone.
Continuei encarando aquela cena até que o menino percebeu e ficou vermelho, automaticamente fazendo uma carranca de “adulto”, voltando para seu trabalho.
Ok...
- Pega – falei para o cachorro jogando uma pedra longe.
Completei uma dúzia de latas com pedrinhas e estavam prontas para alguns furos e emendas.
- Jake? – gritei. Em um segundo ele estava ao meu lado. – Dentro daquela sacola tem alguns barbantes, traga pra mim.
- Beleza – correu sorrindo até o saco e ficou procurando por algum tempo. E mais minutos até que abriu a boca outra vez. – Huh Slade... O que é um barbante?
Revirei os olhos.
- Fios transparentes, Jacob. Fios transparentes.
- Ah tá, achei que fosse isso, mas parecia com linha de pesca então ignorei – riu. Meu Deus.
Alcancei um objeto pontudo de ferro no meu bolso e um isqueiro vermelho, esquentando a ponta para poder furar duas vezes a lateral de todas as latas. Jacob se sentou ao meu lado observando cada ponto com intensidade e seu cachorro já estava ao nosso lado, dessa vez também visualizando tudo com atenção. Fio por fio passando por cada abertura com rapidez e aptidão, alguns nós, minha respiração estava lenta, meu olhar se prendendo naquele processo até que uma voz aguda apitou.
- Slade – o garoto me chamou, e pulei por dentro com o susto. Apertei os olhos respirando profundamente, calma , só... Calma, tudo isso vai ser recompensado mais tarde. Levantei uma sobrancelha. – Por que você é tão estressado? Sabia que antes eu até tinha um pouco de medo de você devo confessar, mas no fim você acabou sendo só um grandão que tem uma voz grossa demais que às vezes ainda dá medo, porém a gente aprende a conviver você até porque não podemos nos deixar levar pela aparência e...
E ele continuou. Engatou a primeira naquele papo e nunca mais parou.
- Eu não sei, Jacob, é assim que as coisas são – disse alto parando o seu sermão. – Como, por que você é tão irritante? – levantei as sobrancelhas fazendo um gesto de como a vida era, porque ela era assim. E fim.
- Teddy disse que eu fiquei assim depois de descobrir o que era o açúcar, e como eu não era acostumado com esses negócios eles acabaram fazendo um estrago dentro de mim e agora eu costumo falar bastante quando permitem que eu faça isso principalmente quando estou ao redor de alguma pessoa bem caladona, como você Slade.
- Ah. – falei me levantando com as latas que fariam um barulho avisando que os andarilhos estivessem por perto.
Fomos para dentro das árvores e o cachorro tentava morder o fio do meu sapato que estava desamarrado.
- Segure este lado – dei uma lata para Jacob e iniciei o processo de amarrar os barbantes nas árvores camuflando o objeto prata para um visitante que percebesse a cor. – E eu não sou caladão, por incrível que pareça, mas de alguma forma você consegue ter palavras que cobre uma conversa inteira de dez pessoas.
- É eu sei, disse isso – falou alheio.
- O que? Que você não consegue manter sua boca fechada nem que lhe paguem? – perguntei sem interesse.
- Não, que você consegue ser mais legal quando conhece melhor a pessoa. Assim como eu, na verdade. E antes disso você usa essa imagem de sei lá, vilão.
- Ela não falou isso – desdenhei.
- É claro que disse, eu não minto – ralhou comigo.
- Muito bem garoto – baguncei seu cabelo. – Honestidade é a chave do negócio, e agora me diga... O que mais ela falou sobre mim?
Perguntei tentando soar desinteressado.
- Que você é cabeça dura – deu de ombros. – E que não importa o quanto eu te irritasse você não faria nada comigo porque eu sou especial demais pra ela – mostrou a língua irritantemente certo.
- Você puxa o saco dela demais, sabia disso? – apontei.
- Ela é legal comigo, me dá doces e me ensinou a me proteger usando armas.
Que bonito o pequeno sociopatinha. Tentei irritá-lo um pouquinho.
- Não sei, pra mim parece que alguém tem uma quedinha bem forte por ela.
Ele se assustou e ficou vermelho.
- O quê? Eu? Não! Slade, eu nunca, ela é muito mais velha que eu e...
Contive meu riso tentando acalmá-lo.
- Que bom, sou um pouco ciumento e vocês estão amiguinhos demais pro meu gosto.
- Vocês estão namorando?
Eu ri.
- Pessoas não namoram no fim do mundo.
- A tia e o tio estão namorando.
- Bom pra eles.
- Você já pensou em ter filhos, Slade? – trouxe a pergunta do além, até me assustei com o tópico.
- Isso é um interrogatório?
- São perguntas – deu de ombros.
- Sim. Não. Não sei. Por quê? – levantei uma sobrancelha me virando para ele.
Ele suspirou dando de ombros.
- Jacob? – tentei arrancar algo dali.
- Sim? – se fez de desentendido, olhando para baixo.
- Tem alguma coisa que você saiba e eu não?
Ficou nervoso olhando para qualquer outro lugar que não fosse meus olhos.
- Bom, eu acho que sei como desenhar quadrinhos e também sei recolher as melhores frutinhas da floresta e...
- Jacob! – gritei.
Então algo pulou em cima das minhas costas e em um segundo eu estava no chão. Este algo começou a gargalhar com força e meu coração estava disparado enquanto eu me recusava a tirar a cara do chão antes de me acalmar com o susto. Parecia que eu estava ficando velho, afinal de contas.
- Sobre o que vocês dois estão conversando? – perguntou sorrindo abertamente e me levantei indo até a casa.
- Seu querido filho de outra mãe limpou tudo aqui dentro e acabamos de colocar algumas campainhas modernas na floresta – informei.
- Limpei mesmo – Jacob começou. – Eu não sabia se isso estava na lista de coisas estúpidas que Slade pediria e eu não deveria fazer, mas fiz de qualquer forma, então isso faz de mim um adulto.
Ela não entendeu, mas perguntou:
- Tudo bem... Querem ajuda?
- Eu estava prestes a começar a levar algumas pedras grandonas para o outro lado do rio – eu tentei segurar minha risada quando ela cerrou os olhos. – Você pode me ajudar, .
Ela se virou pra mim e desviei de seu olhar rindo baixo.
- Isso tem algum propósito, Slade? – perguntou autoritária. Gargalhei.
- Ah, qual é... – continuei rindo. – Ele iria mesmo fazer isso...
- Pede desculpas pra ele.
Jacob não estava entendendo até compreender que eu estava meio que rindo de toda a situação e acima de tudo... Dele.
- Slade – ela me estapeou no braço algumas vezes e respirei profundamente.
- Tudo bem, caramba , que mão pesada – reclamei. – Jacob, me perdoa por tudo. Sinto muito por ser essa pessoa horrível que te dá balas todos os dias e está construindo uma cabana cinco estrelas pra você viver enquanto eu luto por sua honra.
- Assim está melhor – ela disse, fazendo aquela pose de professora gostosa que com certeza uma centena de alunos já pensou sobre na tarde da noite.
Ela tinha esse jeito de mandona que deixava meu corpo todo vibrando quando estávamos conversando assim em uma superfície de madeira com algo macio por cima.
O moleque sorriu cúmplice pra ela e revirei os olhos para a dupla invencível e voltei para o meu trabalho.
Eles trocaram algumas palavras enquanto eu pregava um forro na janela e observei o garoto ir para longe.
- Você é terrível com crianças – falou suavemente. Eu amava sua voz.
- Não é a primeira vez que escuto isso hoje.
Ela riu.
- Nada que não possa ser concertado – disse sorrindo antes de sumir para ir atrás dele. Quando finalmente me dei conta da sua frase, algo ficou espetando minha mente até o fim do dia.
E não, aquela possibilidade não era ruim. Estava bem longe de ser isso.
Tentei esconder meu sorriso antes de voltar ao trabalho.

***

Romero.

Teddy se levantou assim que me aproximei dele e de Baby, os dois estavam na pedreira ao lado da maravilhosa paisagem de infinita água azul que tinha atrás do QG.
Fiquei o encarando por alguns segundos e ele se moveu, para a minha frente, e me abraçou. Soltei o ar que não sabia que estava segurando e fechei os olhos com força sentindo toda a confiança existente naquele abraço de urso.
Nos sentamos nas pedras e ele voltou para sua vara de pescar que estava presa. Não demorou a que eu abrisse a boca para aquele assunto infernal e triste.
- Eu realmente sinto muito Teddy, por não ter salvado a vida dela. Mas eu posso te jurar que eu dei o máximo de mim, se tentasse mais um pouco, eu não teria voltado, e eu ainda me preocupo com aqueles que eu deixaria pra trás.
- , não faça isso – suspirou. – Eu fui um bobão por te cobrar tal coisa, e deveria apenas agradecer por você ter saído viva dessa. E creio que fui ainda mais estúpido por ter deixado a minha chance passar.
- Vocês não tinham se envolvido verdadeiramente, Ted? – Baby perguntou ao meu lado.
- Não como eu queria. Vocês sabem, ela me salvou, e acho que ela ter partido antes de mim me deu essa raiva por não ter conseguido ter pagado minha dívida com ela. E ter desperdiçado minhas chances de tentar me abrir ou falar com ela sobre o que eu sentia de verdade... Não querendo soar clichê, mas já soando, é a verdadeira prova de como a vida passa rapidamente diante de nossos olhos. Temos que aproveitar cada segundo. Cada segundo. Afinal, tudo que a vida espera da gente é coragem. Se esse sentimento não se impõe, tudo que sobra é arrependimento.
Sua vara começou a tremer e ele girou o objeto para diminuir a linha, finalmente encontrando seu premio.
- ? – olhei para ele. – Estou lhe dando uma trégua. Sobre qualquer opinião contraria que eu possua sobre esse tipo de relacionamento que você tem com o . Não cabe a minha pessoa julgar o que torna o próximo feliz, pelo contrário, eu só devo... Te apoiar, de alguma forma.
Ergui uma sobrancelha estranhando aquelas palavras repentinas. Lembrar-se de Lacey deveria ter levado ele para outro lugar. Mesmo assim, era bom que pelo menos alguns amigos meus já sabiam o que estava acontecendo e resolveu me dar à benção.
- Isso é ridículo – Baby resmungou. Nós dois olhamos pra ela em dúvida. – Essa decisão dele de passar pano na cabeça de todas as coisas ruins que já fez só porque ele consegue te deixar feliz.
- Você escuta o que você mesmo diz? – perguntei a ela. Ali estava a razão porque ele passava o pano. E eu também, de alguma forma.
- É sério, caramba. ele matou meu pai – ela gritou – ele matou meu pai e você transa com ele todos os dias sabendo disso.
Aquilo foi como um chute no meu estomago.
- Seu pai impossibilitava a entrada de qualquer outra pessoa aqui dentro. Se ele não desse um fim nisso eu ainda estaria na rua, estaria na rua e principalmente Jacob. E você ainda teria medo de sair do seu quarto.
- Repita isso mais vezes até se convencer de que ele não é o cara malvado. Eu não me importo com nada do que ele ajudou. Uma atitude boa não apaga um histórico obscuridades.
Eu não precisava de nada daquilo. Nada. Não é como se minha mente já não pensasse sobre isso cada segundo que eu estava com ele caramba, por que ela acha que eu ainda não tinha contado pra minha irmã ou colocado um outdoor pra expor nossa relação para o mundo?
Tudo que eles sabiam sobre nós era porque Jacob contava porque vivia espionando por aí ou era o próprio Slade que deixava escapar algo em alguma reunião. Não ficávamos visíveis para o povo, nem um pouco.
- Baby me perdoa, mas eu não devo qualquer satisfação pra você. Cada chance que eu tenho de poder te ajudar a enfrentar seus medos como atirar em um andarilho ou se esquivar de tempestades, eu usufruo dessa chance. E isso não de tá o direito de falar o que você não sabe sobre pessoas com quem eu me importo.
- Eu só me importo co...
- Sim, você se importa comigo, mas eu sou grande o suficiente pra tomar minhas próprias decisões. Se algum dia eu fizer ou falar algo que você não goste, por favor, fale pra mim na hora, porque eu não quero que você sinta o mesmo desgosto que eu estou sentindo agora.

***

- Fiz as pazes com um amigo pra acabar brigando com o outro – disse com raiva, atirando um dos dardos no alvo da parede. Atirei pelo menos vinte vezes e acertei tudo menos o alvo.
- Você tem amigos? Você conversa com outras pessoas além de mim? – Slade falou chocado do sofá, tentando relaxar e tomando um drinque, uísque puro provavelmente.
- Não, desculpe, abdiquei de todas as relações na minha vida só por você – ri.
- Se tivesse feito isso não estaríamos tendo essa conversa – deu de ombros.
- Não, Slade, você precisa parar de falar com todo mundo pra dar atenção só a mim, ok? Porque eu sou a coisa mais importante da sua vida, pensei que já tínhamos discutido sobre isso.
Ele sorriu fechando os olhos.
- Perdão.
Ajuntei todos os dardos do chão perto da parede e os joguei dentro do lixo em baixo da mesa do escritório. Ele olhou pra mim com curiosidade.
- Esse treco tá quebrado – me defendi. Ele assentiu concordando comigo, mas segurava sua risada. – É sério.
- Não estou te contrariando, amor.
Tranquei a porta do escritório e me voltei pra ele sorrindo que já mantinha uma cara de safado. Me aproximei sentando em seu colo e ele continuou deitado apenas segurando minha cintura.
- Slade? – chamei.
- Se eu ganhasse um dólar pra cada vez que me chamassem...
- Conseguiria comprar uma casa nova, né?
- Tenho certeza que temos alguns revendedores aqui no QG.
Sorri pensando sobre isso.
- Eu costumava a achar que eu, e todo mundo ao meu redor, nunca iríamos nos acostumar com isso. Que nunca aceitaríamos essa nova realidade onde não existem mais cantores gravando novas músicas, sem séries novas, sem filmes. Eu amo filmes Slade.
- Ninguém se acostumou com isso, apenas aprendemos a conviver.
- Eu me acostumei – hesitei. – Do contrário eu não estaria pensando no futuro. Assim como antes, eu já tenho em mente outros objetivos para o meu futuro, apenas levemente alterados.
- Posso saber alguns deles?
- O primeiro é não morrer.
- Isso é ótimo – riu fazendo carinho na minha perna descoberta.
- Não, é sério. Eu nunca havia perdido uma pessoa. Todos os meus avós eram vivos. E quando simplesmente nos perdemos ou passei a ver cada pessoa ao meu redor morrer, ficamos com esse remorso pra sempre.
- Nada dura para sempre – alegou sério.
- A dor sim. Ela nunca vai embora, você apenas cria espaço pra ela. E como eu disse, aprendemos a conviver com o que se torna real.
- Neste caso, somos todos paranoicos também, já que o medo anda ao nosso lado como um bichinho de estimação.
Concordei. Ele fechou os olhos e coloquei meus braços apoiados ao lado de sua cabeça, no sofá, beijei sua bochecha, maxilar e mandíbula, antes de sussurrar no seu ouvido:
- Slade? – senti seu sorriso abrir outra vez. Para alguém tão estressado até que estava feliz com alguém o irritando no seu cangote.
- Sim?
- Você pensa no futuro?
- Tento não criar expectativas.
- Já parou pra pensar que se isso nunca tivesse acontecido, nós nunca teríamos nos conhecido?
- Também tento não pensar nisso.
- Por quê?
Esganicei em um segundo quando o Slade sonolento abriu seus olhos e me virou rapidamente, se deitando em cima de mim.
- Apenas porque me faz compreender algo sobre eu mesmo, que é o quão vazio eu seria. Mesmo estando no meio de uma situação de merda, este é o máximo da minha vida . É o máximo de pessoas que eu já tive ao redor que não são tóxicas umas para as outras. É sobre eu acordar e ver pela janela do meu quarto um povo grande, forte e saudável, não se deixando abalar por todas as circunstâncias que o mundo os colocou.
- E parte disso vem de você – acenei compreendendo.
- Eu queria negar e me fazer de desentendido, como se não soubesse que estou os ajudando de qualquer forma, mas de fato eu estou, e isso faz bem pra mim mesmo. É aqui que eu sinto como se tivesse um propósito, é aqui que eu me sinto útil.
- E antes você...
- Quer saber o que eu era antes disso tudo? Não era nada, , eu era ninguém. Somente um bastardo inútil sem planos para o que viria a seguir. – Ele me beijou rápido demais. – Agora eu posso ver todo o meu futuro, em carne e osso, na minha frente.
Ele se sentou e me trouxe para o seu colo outra vez. Sua mão áspera acariciou toda minha perna até chegar a meu pescoço, e passear pelo meu decote. Agora ele prestava total atenção em mim.
- Você costumava ter um cordão aqui – beijou meu pescoço, beijou da forma que eu queria que ele beijasse minha boca, dando leves mordidas e passando aquela língua quente de forma moderada.
- Eu tive que arranjar alguma coisa pra abrir a gaiola que eu estava presa – suspirei fechando os olhos.
Ele me largou e notei uma movimentação súbita. Ele retirou a própria dog tag do pescoço e colocou no meu. Arrumando meu cabelo por cima em seguida.
- Isso vale como uma aliança, eu acho.
Sorri lendo a plaqueta.

SLADE

798-22-1233
AB+
CATÓLICO

- Valeu. Meu pescoço já estava se sentindo nu.

***

Listen to the wind blow, watch the sun rise
Running in the shadows, damn your love, damn your lies

- Você já chorou em um filme? – perguntei sentindo minha pele suada contra o colchão de bruços. Estávamos em cima da sua cama, com a porta bem trancada.
- Já – senti sua voz do outro lado. Estávamos nus e nossos corpos estavam em lados contrários dada à última posição que tentamos.
- Qual?
- Dumbo.
- Dumbo? - gargalhei.
- Aquela droga de elefante tem os olhos mais expressivos do cinema, amor, é difícil manter a pose. – se defendeu. – E você já chorou em algum filme?
- Slade – afinei a voz – me pergunte se existe algum filme que eu não chorei.
Ele riu.
– Você é fraca, te falta ódio. – disse antes de dar um tapa leve na minha bunda.
Mordi meu lábio fechando os olhos.

And if you don't love me now
You will never love me again
I can still hear you saying you would never break the chain

- Slade, só porque eu te disse que gosto de algo mais duro, não quer dizer que você pode ficar fazendo isso o tempo todo – mesmo que eu goste disso pra caramba.
Ele se levantou, beijando o local vermelho.
- Perdão amor, esqueci que estava lidando com uma bonequinha de vidro – ironizou.
- Sai daqui – ri sentindo ele se deitar em cima do meu corpo enquanto espalhava milhares de beijos por ele. – Desculpe se não sou perfeita.
- Ah viu, isso me irrita – se deitou meu lado, me olhando nos olhos, levemente irritado de verdade.
- O quê? - perguntei sem realmente dar bola. Lá vinha mais piada.
- Não existir nada ruim sobre você. – fez barulho de nojo com a boca. – Toda perfeitinha com a mente boa e intenções boas e educada, Deus me livre disso. Não consigo ver algo em você que eu não goste, horrível esse sentimento.
- Você constantemente me chama de pé no saco e fresca – levantei uma sobrancelha tentando argumentar sobre o que quer que seja aquele tipo de discussão.
- Isso são apenas adjetivos que completam o quão perfeita você é.
Segurei em seu braço repentinamente me levantando um pouco e fazendo cara de assustada.
- Meu Deus, chame o Frid – exasperei.
- O que foi? - ele se sentou franzindo a testa, preocupado.
- Meu nível de diabetes aumentou depois desse doce todo – gargalhei e ele bufou voltando a se deitar.
- Não gosta desse doce todo é, ? – fez cara de predador e arregalei os olhos.
- Não Slade, sai... – avisei.
Não adiantou. Ele partiu pra cima de mim nos colocando em baixo do lençol enquanto me matava. De cócegas. Sim, ele era ridículo a este ponto, nessa tortura tão infantil.
- Para – gargalhei tentando buscar ar.
- Você merece tal punição – tentou soar sério, mas ria junto comigo.
Segurei sua cintura com minhas pernas e o puxei contra mim, ele parou de respirar quando o beijei com força, massageando o seu cabelo enquanto minha língua trabalhava em satisfazer a sua. O calor em baixo do lençol servia de proteção para qualquer mal que houvesse lá fora.

And if you don't love me now
You will never love me again
I can still hear you saying you would never break the chain
(Never break the chain)

Retirei o lençol sorrindo brandamente por ter vencido a guerra que ele mesmo iniciou e me sentei em cima dele, sabendo que era o seu lugar preferido para me ter.
- – sussurrou em meu ouvido, tão baixo que por pouco eu não poderia ouvir. – Eu poderia morrer agora. Estou tão feliz. Não há outro lugar no mundo em que eu queria estar.
Senti meu olho lacrimejar e olhei para cima sorrindo para não deixar que nada pingasse ali, seria uma vergonha, é claro que eu estava uma merda de sentimentos desgovernados nos últimos dias, mas não precisava deixar isso à tona pra todos verem.
Voltamos a nos beijar e sua mão massageou meus seios. Gemi em sua boca quando o senti endurecer em baixo de mim. E logo éramos um só, a noite toda.
Como Teddy havia dito mais cedo, sem querer soar clichê, a vida passa muito rápido para não aproveitá-la.

Chains keep us together (run into the shadows)
Chains keep us together (run into the shadows)



Capítulo 28 – Seven Devils.

Música do Capítulo


Romero.

- Acho que esse combina mais, você não acha?
- Não sei, nunca pensei nisso como um acessório. – Ouvi uma conversa vindo do escritório de enquanto eu passeava por sua casa. E como a curiosidade sempre mata a gata, eu fui conferir.
Os dois – e Max – estavam sentados na mesa do líder, com algumas coisas em cima dela, conferindo as armas que poderiam ficar no lugar do que já foi uma vez a mão de .
E eu não estava apoiando essa ideia.
Também sei que meu apoio moral seria muito útil, mas como não estava apoiando isso, não seria falsa.
- O que estão fazendo? – Perguntei, adentrando no escritório. Como se eu já não soubesse.
- Eu e meu pai estamos escolhendo algo bem legal pra botar na ex-mão dele. - Max disse animado e apenas deu os ombros, concordando.
- Agora eu preciso ser mais legal. É questão de estilo.
- Estamos em dúvida entre o gancho – Max levantou um gancho, bem do tipo Capitão Gancho – ou a lâmina. – Depois levantou uma lâmina que era basicamente a mesma coisa do gancho, só que com uma lâmina. Só isso. – Qual você prefere, ?
- É. Qual você prefere, ? – também estava com um sorrisinho no rosto de quem estava adorando tirar sarro da situação. Maduro...
Suspirei alto.
- Bom, os dois são legais. Mas qual eu prefiro? Nenhum. – Dei os ombros. – O gancho vai deixar seu pai preso em algum lugar até lembrarmos de buscá-lo, o que pode demorar umas... – parei pra contar. – Umas três luas e quatro sois. – Fingi que sabia do que estava falando, mas na verdade nem sabia que o plural de sol era sois. – E a lâmina vai acabar o fazendo perder outros membros acidentalmente. Ou me fazendo perceber membros acidentalmente.
Os dois se entreolharam e deram os ombros.
- Acho que o gancho é melhor.
- Sim.
Rolei os olhos.
Andava convivendo com criança. Sentia falta do Jacob, ele pelo menos era sensato.
Os dois ficaram conversando por mais alguns minutos, até que eles escolheram esperar Jolie aprender a falar pra aí sim escolher o que botar no lugar da mão, já que eu era rabugenta demais pra ajudar.
Não era rabugenta, só não queria dormir com o Capitão Gancho, ou com o Freddy Krueger e muito menos com o Edward Mãos de Tesoura.
Max saiu da sala se despedindo de mim e de seu pai, ao sair, fechou a porta atrás de mim. Então ficamos só eu e sozinhos, o que era mais do que bom. Era ótimo.
O Xerife sorriu sem mostrar os dentes, deitando a cabeça para o lado e me chamando pra perto, gesticulando com a mão.
- Vem cá. – E eu fui. Mas não para o meu acento preferido que se resumia ao colo dele. Me sentei na cadeira que antes estava sendo ocupada pelo seu filho. ignorou meu ato.
Não estávamos mal e nem nada. Estávamos bem demais pra falar a verdade. Só que as tensões me impediam de querer atiçar as nossas libidos.
- Você tá bem? – Me perguntou cauteloso.
- Você anda me perguntando isso muito. E sim, estou.
- Então tudo bem.
- Eu só acho ridículo... – gargalhou. – Não tem graça. Não acredito que vamos abrir mão disso daqui porque o pirralho do Zeus mandou.
- Não é ridículo querer paz. Mesmo que tenhamos que abrir mão de certas coisas, . Fica calma, vai dar tudo certo. Não subestime a mim e ao .
Rolei os olhos.
- Vocês que não subestimem a mim. Se começar a palhaçada, eu pego minha irmã pelos cabelos e sumo com ela. – E gargalhou de novo.
- E abandonar a mim? – Mudou o tom de voz, tentando fingir uma falsa mágoa e dessa vez eu ri, só não tão visivelmente.
- Eu te levo no porta-malas. Melhorou?
Então abriu um sorriso.
- Muito.
Uma parte de mim desconfiava o porquê apoiou tanto a decisão de manter a “paz” entre os três grupos. Mesmo que ele e Slade estivessem planejando algo que eu não sabia – e nem queria saber –, o que eu sabia era que estava tentando fugir da guerra. O ataque contra ele havia abalado muito a sua confiança sobre triunfar no fim e sei que não queria se sentir culpado mais tarde por ter estragado tudo.
Mesmo que não estragasse nada.
Mas mesmo assim, sua evolução a cada dia era muito gritante. Graças a mim – e outras pessoas –, estava reaprendendo as coisas que sabia fazer muito bem, agora com a mão esquerda. Ainda não atirava como antes, mas atirava bem. Não lutava mais como antes, mas melhorou. Eram passos desses, que de pouquinhos em pouquinhos resultavam em sua melhora.
E isso me orgulhava.
Uma parte de mim queria que a guerra acontecesse. Eu queria Zeus morto a qualquer custo. Sonhava com sua morte, sonhava com sua cabeça em minhas mãos como troféu, mas mesmo assim... Eu tinha medo. Tinha medo de perder mais do que ganhar.
Era uma luta incerta e que ainda não estávamos prontos pra lutar.
Mas mesmo assim não queria abrir mão do meu lar, do grupo e ficar sem nada pra agradá-lo. Só que aprendi durante esse ano na Colônia que minha falsidade era minha melhor arma, junto com a minha manipulação. Se eu fingisse que estava tudo bem em relação ao acordo, eles acreditariam e então, quando Zeus abaixasse a guarda eu cortaria sua cabeça.
Simples assim.
permanecia me encarando e nessa altura do campeonato, eu não conseguia mais esconder que estávamos juntos e que estava tudo bem pra mim. Tinha medo de me sentir sufocada, mas não me assustava tanto quanto. era bom, mesmo com os momentos que me irrita e me deixa maluca, era a melhor coisa que me aconteceu esse ano.
Passei o ano todo odiando a Colônia com todas as minhas forças, odiando cada um deles por não serem iguais a mim e por quererem que eu fosse igual a eles, mas depois de tudo que passamos juntos, já tinha certa consideração por esse lugar.
- ... – me chamou, naquele tom que conseguiria me fazer bater nele e agarrá-lo. – Vem cá...
Me levantei e fui para trás da mesa dele, me sentando em seu colo e passou a mão em minha perna, subindo para acariciar meu braço e depois meu rosto.
Arrepios me percorriam e a teoria de toda vez que eu estava nesse escritório sentia a sensação térmica lá na casa dos 40 graus.
Abaixei meu rosto e toquei minha testa na sua. Ele continuava passeando com a sua mão pelo meu corpo em toques delicados, sem querer me dar mais do que iriamos fazer. E eu sorri.
- Alguém irá matar Zeus... – sussurrei perto de sua orelha. – E esse alguém será eu.
- Essa é minha garota. – Sorriu, apalpando minha coxa e eu suspirei contra sua orelha. subiu mais a mão, colocando-a por dentro da minha blusa e tocando minha pele que já estava quente.
- Quanto tempo temos mesmo?
- Que se foda o tempo. Hoje temos o dia livre. – E esse foi o gatilho.
me segurou em seu colo, se levantando de sua cadeira e me sentando em sua mesa, jogando as costas inúteis longe e deixando que meu corpo se deitasse na madeira.
Tirou a camiseta – e pasmem de forma impressionante e sensual para um cara sem uma mão – e se inclinou para frente, beijando minha boca e descendo para meu pescoço, ombros e por aí foi... Levei minhas mãos até sua calça, soltando o cinto e depois o botão, eufórica demais com aquilo.
- Só não grita. – Pediu, enquanto permanecia com o corpo inclinado em cima do meu, agora abrindo a minha calça.
- Vai ter que me calar. – E um sorriso de canto completamente malicioso surgiu na boca de ao me ouvir.
- Farei exatamente o contrário.
E fez.
De todas as coisas que estava reaprendendo, havia uma que ele fazia muito bem e não perdia a prática.

***

O sol brilhava do lado de fora, mais quente do que esperava. E tentei agir a todo o momento como se não tivesse visto um passarinho azul, mas o nosso líder não disfarçava, porque sempre que passava por ele, dava um sorriso que entregava todo o jogo.
Até me sentia suja por um momento, mas depois que se foda.
Fui para o depósito conferir as armas, que agora havia mais delas para conferir e ter certeza que estava tudo nos conformes. Desde que voltamos do centro com as armas, tudo parecia mais seguro. Para nós e para quem vivia aqui.
Enquanto conferia exatamente se todas as armas estavam ali, ouvi passos e me virei para ver quem era. E era Paige.
Eu já sabia que ela estava me procurando para conversar e sabia exatamente qual era o assunto. E sim, eu estava fugindo. Não era o fato dela agradecer por eu ter salvo a vida dela que me evitava querer encará-la, era o fato dela realmente ter pensado que teria alguma vida para salvar.
Foi só um corte na perna.
- Ei, . – disse delicadamente e eu sorri em retribuição.
- E aí, Paige.
- ... – respirou fundo. – Eu queria agradecê-la pelo o que fez comigo no centro. Você poderia ter me deixado para trás e que se foda, mas você preferiu me salvar mesmo quando eu já havia feito a minha cabeça para ficar. Você foi minha heroína e eu jamais esquecerei. Estou em débito com você! – A garota disse tudo de uma vez, estava vermelha por não respirar. E eu franzi as sobrancelhas um pouco confusa e com vergonha daquela situação.
- Paige... era só um corte na perna. – Dei os ombros.
- Eu sei, mas poderia ter me mata... – e nem a deixei continuar.
- Não, você não ia morrer por causa de um corte na perna, pelo amor de Deus. – Bufei. – Mas não fiz nada que qualquer outra pessoa sensata não faria, não precisa me agradecer. Só tome mais cuidado.
A garota sorriu e se despediu, se virando para sair.
“Ah , você está bem? Você quer ajuda pra organizar as armas?” isso ninguém me perguntava, agora vir agradecer por ter a salvado de uma perna cortada era SUPER importante.
- Ah, Paige? – a chamei e a garota se virou. – Da próxima vez que ficar gritando em meu ouvido pedindo pra ficar para trás e morrer, eu vou deixar. Depois não reclame, tá? – Sorri e a garota assentiu assustada, correndo do deposito.
Pessoas...
Voltei a conferir as armas e por um momento me desesperei.
O desespero me atingiu quando depois que a contagem mostrou que havia uma arma faltando e não havia nenhuma anotação que tinha sido pega por patrulha ou por quem. Contei de novo e de novo, perdi minutos, horas, conferindo se estava tudo certo. E mesmo assim ainda dava errado.
Me desesperei, agora preocupada de verdade. Estávamos sem uma arma, ou seja, uma pessoa ficaria desarmada e se essa pessoa ficasse desarmada em um ataque contra Zeus? Estaríamos muito fodidos!
Todos iriam morrer por causa de uma arma que faltava! E eu era quem estava no controle das armas.
Eu era uma incompetente mesmo.
Respirei fundo, tentando me acalmar e manter a cabeça no lugar, não surtar por pouca coisa. Era só uma arma. Isso não traria consequência nenhuma, certo?
E por causa de uma pessoa que entrou no depósito, minha calma e paciência se negativaram.
- ! – A voz de Toby fez meu sangue subir e uma vontade de fazer churrasco de cara chato. Minha raiva de Toby só ficou mais intensa depois de descobrir que ele e tiveram um confronto onde ele quis mais uma vez tentar algo contra e até fazer minha irmã surtar de preocupação por mim ele fez.
Desgraçado.
- O que você quer?
- Você tá bem? – Fingiu uma preocupação. – Você parece nervosa. Não me diga, alguma coisa errada com as armas? – Rolou os olhos fingindo estar inconformado com aquilo. – Ai ai, esse não tem jeito... – E eu explodi.
Tirei a minha arma do coldre e apontei para o rapaz que gelou, não fez nenhum movimento brusco e muito menos saiu do lugar.
Covarde...
- Sabe como é fácil atirar na sua cabeça à essa distância? – perguntei e ele nem se moveu. Nós não estávamos perto, ele estava na entrada do depósito e eu estava mais pelo fundo, onde ficam as armas. Ou seja, uma distância relativa que mesmo assim me faria acertar a cabeça dele. Igual uma daquelas latinhas que acertava facilmente em treinos de tiro. - Se você correr, eu atiro nas suas pernas e nunca mais andará. – O rapaz engoliu seco.
- ...
- Vamos, repita o que você estava dizendo do . Repete o que você vive falando do por todos os cantos? Sobre ele ser um péssimo líder e o caralho a quatro. Vamos! – Ordenei e ele tremeu.
- Por favor... – Choramingou.
- Sabe o seu problema, Toby? – Ele negou com a cabeça. – Você é um bosta e você não tem limites. Não gostar do , tudo bem, nem a minha própria irmã gosta dele, mas ela tem limite. Coisa que parece que não foi ensinado a você enquanto o mundo ainda era dos humanos. Só que você já tá virando um pé no saco, choramingando e reclamando do para a única pessoa que você deveria não encher a porra do saco: eu. Você não sabe com quem está mexendo e para que aprenda, eu te darei uma lição.
- O que.... O que vai fazer? – Ele quase soluçava.
- Vamos brincar de roleta-russa, meu amigo.
Destravei a arma e Toby começou a tremer, desesperado e com medo de morrer. Então atirei.
E como da vez que apontei a arma pro para botá-lo em seu lugar, não havia balas. Apenas o susto. Toby pulou e abriu os olhos, se vendo vivo em minha frente.
- Eu não morri? – Perguntou surpreso, se tocando para ver se havia alguma bala ou se era apenas um péssimo pesadelo tudo aquilo.
- Não, mas por pouco tempo se não aprender a calar a boca, se botar no seu lugar e aprender a ter limites. Tenha uma boa tarde. – Sorri e saí do depósito, sentindo minhas mãos tremerem.
Eu estava no meu limite. Era muita tensão, muita coisa para se preocupar e uma parte de mim estava com sede. Meu lado mais selvagem.
Passei os últimos dias me focando em cuidar de , manter a paz e organizar as coisas enquanto ele se recuperava que acabei indo raramente para o lado de fora. E com tantas coisas me acontecendo e essa vontade que me consumia de matar Zeus, de fazê-lo sangrar, eu precisava sair. Eu precisava matar uns bichos.
Saí andando do pátio até o escritório de . Sem saber exatamente o porquê. Não era como se eu estivesse indo atrás de permissão, mas eu queria avisá-lo de qualquer forma.
Talvez eu apenas precisasse de alguém pra conversar e a calmaria de me acalmava. O ouvir rir enquanto conto, sempre me tranquilizava. A forma de que ele não levava tão a sério meus surtos e só se mostrava companheiro, me acalmava.
Entrei em seu escritório e ele estava sentado quieto. Se surpreendeu com a minha entrada sem muita gentileza. Andei por seu escritório apenas até achar a garrafa de uísque que ele sempre bebia e um copo. Enchi um pouco com o líquido e bebi de uma vez, um gole único que queimou minha garganta. Então preparei outro.
- O que aconteceu? ? – Se levantou, vindo até mim um pouco preocupado.
- Eu atirei no Toby. – O queixo dele caiu. – Mas estava sem balas. – E então se tranquilizou.
- E por que fez isso?
- Porque ele é um saco! – Explodi e gargalhou. Viu, era disso que eu gostava. – Ele só sabe reclamar e reclamar de você, não levanta a bunda pra fazer nada. Enche o saco de todo mundo, é inconveniente e insuportável. Pelo menos meu “tiro” o calou. Só não sei por quanto tempo.
- Pelo menos isso... E chega disso. – Ele tirou a garrafa e o copo de minha mão. Nem havia bebido tanto, só talvez uns três ou quatro copinhos. Minha garganta estava seca, oras.
- Eu tô muito agitada , acho que tô de abstinência.
E ele riu de novo.
- E você lá tem vícios, ? Fica calma, respira fundo. Se sua irmã ver isso vai achar que é minha culpa de você estar surtando...
- Eu não estou surtando. – Fechei a cara e arqueou as sobrancelhas. – Ok, talvez um pouco.
- Não é sua culpa. Você tá muito preocupada com isso de guerra, Zeus e tal. Você só precisa descansar um pouco, relaxar e ficar um pouco longe do Toby e de armas.
- Você sabe do que eu preciso.
- Quer sair? – Assenti. – Não vou te impedir .
- Eu sei.
- Então por que veio até mim? Eu adoraria ir junto, mas você não veio pedir minha companhia.
Era verdade. Eu queria sair, sozinha, limpar a cabeça e matar uns bichos um pouco. Me reconectar com meu lado selvagem, isso me deixaria com a cabeça mais focada em outras coisas e não em Zeus, não em guerra.
Eu sentia falta de só me preocupar com os mortos e não com os vivos.
- Não sei porque vim. Só vim.
- Pode sair , tá tudo bem. Só volte.
Eu iria sem ou com a permissão dele, como sempre fiz. Mas agora que estávamos mais... juntos, eu não queria agir como se fosse apenas eu e eu mesma no mundo, porque isso o assustaria, como assustava quando agia dessa forma.
- O que eu faria sem você? – Sorri e o abracei.
- Muitas coisas. A pergunta certa seria: o que eu faria sem você?
- Nada, você é praticamente um inválido. – gargalhou de minha resposta e eu o soltei.
Nunca diria isso em voz alta e muito menos deixaria que soubesse, mas eu até que estava gostando desse lance de ser um casal. Era divertido.
Mas shhh, segredo.
Não quero que ache que eu amoleci. Eu ainda sou fodona pra caralho.

***

Anoitecia na Colônia e depois de conseguir me preparar fisicamente e psicologicamente pra sair, não pensei duas vezes e saí pelos portões, indo pra floresta.
A única coisa que eu queria era apenas matar mais mortos-vivos que pudesse, apenas pra limpar a minha cabeça e minha alma. Me focar em outras coisas me deixava mais relaxada, matar me tranquilizava.
Matar mortos-vivos, não humanos. Matar humanos me aterrorizava, a não ser que esse humano seja Zeus. Esse eu mataria e depois dormiria por três noites seguidas como um bebê.
Adentrava mais na floresta, passando pelos mortos-vivos que pulavam em minha frente, apenas enfiando a minha faca em suas têmporas e depois passando para a do bicho ao meu lado. Nenhum deles permanecia vivo, ou morto-vivo. Enfim.
A cada bicho que morria, mais dois apareciam. Era como um padrão.
Havia demorado um pouco pra que me acostumasse com essa realidade, quando apenas achava que só os que foram infectados se transformariam, sonhava acordada sobre a extinção dos mortos-vivos vindo pelas minhas mãos. Mas então descobri que os mortos-vivos e essa infecção era como um bicho de quadro cabeças que a cada cabeça que se cortava aparecia mais quatro e com o tempo havia mais cabeças que eu daria conta.
A cada morto-vivo que eu matava, mais e mais apareciam, porque era como um ciclo, a cada morto-vivo que morria, um vivo morria e se transformava em um deles.
Meu pai acreditava na lenda que haviam cidades que não haviam sido tomadas pelos bichos e que teria melhores condições de vida. Antes de minha mãe morrer os dois conversavam sobre arrumar formas de chegarmos lá. Mesmo que tivéssemos que passar por perrengues, ele tinha esperança. Mas depois que minha mãe morreu, a esperança morreu. Ele se arrastava pelos cantos, só se manteve vivo por nossa causa.
E de uma forma ou outra, a sua esperança era a minha e de . Por mais que até mesmo quando nossa mãe estava viva nós já sabíamos que cidades salvas eram apenas uma lorota, vê-los tão confiantes disso nós dava, me dava, confiança e coragem para irmos até os quintos.
Sentei em uma pedra, na frente do riacho que havia me separado de minha irmã uma vez e limpei minhas mãos, limpei meu facão e segui em frente, indo mais dentro da floresta.
Não sabia ao certo para onde estava indo, deixava com que minhas pernas me levassem para onde quisesse. Mesmo sabendo que minhas pernas estavam indo atrás de quem eu deveria ficar longe.
Minha sede de vingança era maior que minha racionalidade. E por mais que eu mesma tentasse me convencer que o melhor era permanecer nas sombras, meu instinto não me deixava parar. Ele me levava mais dentro da floresta, matando os bichos que cruzavam meu caminho, indo mais fundo e fundo naquela teia que me levaria para o lugar errado.
E não me importava.
Perdida na floresta, tropecei em algo que me fez rolar pela mata. Me levantei sentindo meus braços arderem pelos arranhões que os galhos deixaram em minha pele. Tirei as folhas que haviam ficado presas em minhas roupas e cabelos.
Me sentia fedida, mas isso me deixava mais escondida. Meu cheiro agora estava misturado com o da mata, ficaria mais difícil para que os bichos me farejassem.
Meus pés continuavam sendo puxados pelo imã dentro da floresta, já vendo umas luzes no fim da mata e ouvindo os gemidos dos mortos-vivos podres que se escondiam nessa área.
A cada vez que chegava perto do meu destino, a cada vez que matava um bicho mais perto do meu destino, meu coração batia mais forte e eu ficava mais aterrorizada. Havia sido corajosa o bastante para me deixar ser puxada pra cá, mas não era corajosa o suficiente pra chegar mais perto.
Então eu travei no meio da mata escura.
Olhei para os lados tentando arrumar um caminho de volta, mas não encontrava nada. Só árvores, mata e mais mata, mortos-vivos jogados no chão e nenhuma saída, também como nenhuma entrada.
Respirei fundo, retomando a consciência, me botando no controle da situação e não mais o meu sentido.
A ficha caiu.
- Que merda que eu fiz? – Disse em um sussurro, pra mim mesma.
Me aterrorizei, me tocando que estava perdida. Não sabia como havia chegado aqui e não sabia como voltar para a Colônia.
Continuei andando pelo meio da mata, procurando qualquer saída, mas parecia um beco sem saída cheio de árvores. E estava escuro demais para que eu conseguisse descobrir algo que não via.
Senti então uma mão em minha boca e gritei, mas ela abafou meu volume. Os braços em meu corpo me segurando me desesperou, me debati para me soltar, mas a força de quem me segurava me vencia. Meu medo de ser um morto-vivo que me devorar era inexistente já que eu estava sendo levada pra algum lugar e nenhum morto havia essa capacidade. Se fosse um deles, eu já estaria morta.
Então me desesperei porque se não era um dos mortos, seria um deles... Então de qualquer forma, eu era uma mulher morta.
Me fodi.
Quem me segurava me arrastou para fora da mata e percebi que eu estava ficando mais longe do Hospital e então fiquei confusa. Se estava indo para longe, então não era um deles.
Fui colocada no chão e me percebi na estrada, com um carro em minha frente e um soldado – o que provavelmente me trouxe. Em um impulso, segurei em seus pulsos para conferir se ele tinha um Z, e não tinha.
A porta do carro abriu e Nico me encarou. Gelei.
- Entra aí. O Chefe quer falar com você. – Sorriu e eu entrei, hesitante.
Era pior que mortos-vivos e Zeus. Era o Slade.
Eu era definitivamente uma mulher morta.

***

Grimes.

Não me preocupava com contra os mortos-vivos ou qualquer coisa que cruzasse seu caminho, me preocupava com contra ela mesma.
Às vezes ela travava uma batalha consigo mesma, principalmente quando era obrigada a se conter e estava bastante contida.
Perdeu dias cuidando de mim, me ajudando a reaprender algumas coisas e me dando forças para não desistir após o ataque. Cuidou da Colônia com pulso firme e eu não poderia escolher uma pessoa melhor pra ficar em meu lugar quando tudo isso acabar.
Não a escolheria por causa dos meus sentimentos por ela, longe disso, a escolheria porque era muito maior do que se mostrava ser. E ela sabia disso. Ela tinha um pulso firme, pouca paciência e era muito imparcial. Ela não deixava que tomassem as escolhas por ela, tomaria sozinha. Mal ouve alguém. Acho que as únicas pessoas que davam ouvidos era a irmã e Frid, senti um pouco de ciúmes disso. Mas gostava mesmo assim.
E não era que eu não confiava em , eu confiava. Repeti isso mentalmente várias vezes enquanto me preparava pra sair atrás dela. Só pra garantir, antes que ela acabe sendo pega pelo Zeus. Dei o voto de confiança, só que antes ela com raiva de mim e viva, do que morta e com uma outra Romero fazendo a minha cova.
Provei o gostinho da morte uma vez e odiei, consegui escapar. Não quero repetir a dose, nem fodendo.
Conferi a munição da minha Python e colocando mais algumas em meu bolso. Não havia aprendido ainda a atirar perfeitamente com a minha mão esquerda, mas até então o cara com uma mão só estava saindo melhor do que eu esperava. E seria o cara de uma mão só que salvaria a mocinha.
Que ficaria puta comigo porque não precisa de salvação. Mas fazer o que? Sou um romântico incorrigível.
Saí do depósito e dei de cara com Toby e como era a última pessoa que queria ver naquele momento, ignorei.
- , espera aí! – me chamou vindo atrás, mas eu apenas continuei andando. – Espera, por favor! – chamou novamente e eu parei.
- O quê?
- Eu quero ir com você.
Gargalhei.
- Não, muito obrigado.
- Eu vou de qualquer forma. – Deu os ombros e eu respirei fundo.
- Por que você quer ir Toby? O que tá planejando? – Desconfiei.
- Nada, oras. Eu só quero me redimir por tudo que eu andei fazendo, todas as merdas e as coisas que falei. Quero botar um fim nisso, ficar em paz. Só assim vamos ser capazes de unir forças e vencer o Hospital, né?
Não.
- Tá bom. Vamos. – Toby celebrou e eu dei as costas, indo ao portão e passando para o lado de fora da Colônia.
Não. Eu não confiava em Toby, nem um pouco. Sabia exatamente que se ele queria tanto ir era porque armaria algo, mas eu o deixaria ir sim, só por um motivo: duas mãos a mais. E caso ele me irritasse, eu o deixaria de vez para os andarilhos.
Se ele estava armando alguma coisa ou não, nem me importava. Nem um pouco.
Afinal, eu era mais esperto que ele. Muito mais.

***

Romero.

Estava sentada na cadeira de frente pra mesa de Slade. Ele estava quieto, não havia aberto a boca desde que me jogaram no escritório dele. Ele mantinha os braços cruzados e o olhar em mim.
Procurei pelos lados esperando a que ia piorar minha situação e me punir mais do que qualquer coisa que ele fizesse: . Mas nada dela. E nesse momento eu já estava com medo do que ele queria.
- Ela não vem. – Encarei surpresa. – não vem. Aliás, ela nem sabe que você tá aqui.
- Então por que eu estou aqui?
Slade respirou fundo e eu rolei os olhos, me preparando para o sermão que viria a seguir. Coitadinhos dos meus ouvidos.
- Sabe, sua irmã diz que você é a mais impulsiva das duas. Todo um lance de você ser sentimental demais, guardar muito e quando explode faz a primeira coisa que passa na cabeça, é muito de momentos. Por isso é sincera, fala o que vier na cabeça e faz a mesma coisa, sem se importar muito. E não é algo que me incomode ou incomode qualquer pessoa que conviva com você... – Nossa, ela disse isso mesmo? Obrigada maninha, não sabia que ela me via de forma tão legal. – Mas essa impulsividade se torna irresponsável em momentos como o de hoje. E eu não quero que essa sua impulsividade foda com meus planos e o nosso acordo com o Hospital, entendeu? Se quer se matar, vá em frente, mas se mate sem tentar trazer uma Guerra Civil.
- Não era o meu objetivo ir até o Hospital, foi meu... impulso. – Justifiquei, sendo até idiota ao ouvir sair da minha boca. – Mas não me arrependo de pensar assim, porque é a única coisa que eu penso. Em matar Zeus. Eu o quero morto e eu quero matá-lo, mesmo que isso arrisque a minha vida e... – me interrompeu, estralando a língua com um “tsc, tsc”.
- É aqui que você erra. Eu também quero Zeus morto e pra caralho. E nisso nós dois estamos em um consenso. Não concordamos em nada, mas nisso estamos juntos, ambos queremos que Zeus sangue de todas as formas possíveis pelo o que fez com e com , eu te entendo nessa. Mas é ridículo ouvir de uma pessoa como você a frase “mesmo que isso arrisque a minha vida”. – Balançou a cabeça em negação. – Você não é suicida, você só é vingativa. Você não quer morrer, só quer se vingar. Qual seria a graça de morrer depois de conseguir o objetivo? A melhor parte da vingança é aproveitar os frutos.
Eu havia entendido onde ele queria chegar e até estava surpresa. não era tão horrível assim, nós realmente compartilhávamos algumas ideias.
- Você parece ser a única pessoa sensata. Enquanto acha a paz a melhor solução, você pensa no mesmo que eu, na vingança.
- só pensa assim pelo o que aconteceu com ele, se sente impotente, mas logo que ele voltar a ser o bom e velho , ele entenderá que não há e jamais haverá uma relação de paz entre nós e o Hospital. Ou Zeus morre ou nós morremos.
- Então vamos matá-lo, oras. – disse em um impulso e Slade negou com a cabeça mais uma vez.
- Viu? Não é assim que funciona, . Você é mais esperta que isso. Sabe muito bem que pra acabarmos com o filho da puta precisaremos ser mais espertos e menos impulsivo. Mesmo que tenhamos que dar as mãos pra ele e posar como uma grande família de comercial de margarina. É tudo parte do plano.
Agora eu entendia tudo. Entendia que para vencermos não poderia agir mais por impulso, eu teria que comer pelas beiradas. Jogar com eles, enganar e passar a perna. Eu precisaria de acesso.
A única forma de destruir Zeus era destruindo o Hospital e todas cabeças dele, até sobrar a única. E essa nós esmagaríamos juntos.
- Me promete uma coisa? – pedi e Slade me encarou desconfiado.
- Se for pra me pedir pra cuidar da sua irmã caso algo acontecer com você, eu te mato aqui e agora. – Rolou os olhos e eu neguei com a cabeça. Não, eca. Ew.
Jamais deixaria minha irmãzinha na responsabilidade dele. Mesmo sabendo que ele cuidaria dela – e mesmo não querendo saber o que ela não me conta –, a responsabilidade de cuidar da era minha e não planejava morrer tão cedo.
- Quando conseguir ter Zeus em suas mãos, não esquece de me chamar. Eu quero estar aqui quando o matarmos. Eu tenho uma conta pra acertar com ele.
sorriu.
- Fechado. Temos um acordo.
Pela primeira vez – e talvez única – na vida, eu e Slade concordamos em algo. Nosso ódio por Zeus era maior do que nossa inexistente inimizade ou amizade. Eu não me importava com Slade e ele não se importava comigo.
Mas quem sabe quando tudo isso acabar, nós possamos entrar em paz de vez.
Me levantei da cadeira, indo até a porta, pronta para ir embora ou ir atrás de minha irmã. Pensei em avisá-la que estava aqui, mas provavelmente ela me socaria por ter ido à floresta.
- Romero? – me chamou e eu virei para o homem. – Você vai voltar pra floresta, né?
Assenti.
- Algumas coisas nunca mudam, Slade.
- Se eu te pegar na floresta de novo, perto do Hospital ou na região, eu te tratei aqui de volta e juro que não serei nem um pouco gentil como fui dessa vez. E vai piorar se você continuar voltando pra lá. Fique. Longe. Do. Hospital. Ou a farei entender da pior forma. – me ameaçou. Me perguntei onde estava nesses momentos? Ela não deveria me defender?
Não, espera. Ela concordaria com . Capaz de ajudá-lo a me torturar caso fosse pega na floresta de novo.
- Mal posso esperar. – Sorri e dei as costas, indo embora.
Foda-se a paz. Eu ainda odiava Slade.
E ficarei bem longe da floresta. Vai que o maluco não estivesse blefando e me sequestrasse?
Algumas coisas nunca mudavam e entre elas a distância que queria de Slade.

***

Grimes.

A floresta escura e nenhum sinal de .
Continuava entrando mais na mata, procurando por alguma pista de e com Toby ao meu lado, prestando atenção em cada coisa que eu fazia. Apostava que nesse exato momento já estivesse na Colônia e eu sendo idiota procurando.
Mas algo me fez parar ao sentir o cano de uma arma em minhas costas.
Era só o que me faltava.
Toby saiu de trás de mim, apontando a arma em minha direção e com as mãos tremendo. Nem para isso ele era homem o suficiente, vergonha.
- Essa é a arma que sumiu do depósito? – Perguntei, notando a semelhança da que me disse que estava faltando. E o garoto assentiu. – Cara, você tá tão morto...
Toby riu.
- Engraçado, quem tá apontando a arma aqui sou eu. – Deu mais uma risadinha. – , você não tem ideia o quanto eu estava esperando por esse momento. Eu finalmente darei um ponto final em você e em tudo que você traz de ruim pra Colônia. Finalmente vou fazer reconhecerem o péssimo líder que você é.
- E o que vai fazer? Me matar e depois falar que morri sendo atacado por um andarilho e então você me protegeu, matando-o por mim e sendo o herói de todos? – O garoto assentiu chocado om a minha resposta e eu arqueei as sobrancelhas. – Nem pra isso você serve pra ser criativo?
- Que se foda, você tá morto de qualquer jeito.
Dei os ombros.
- Então atira. – Toby gelou. – Ué? Não vai atirar? – Me aproximei dele, com os braços pra cima me mostrando rendido. Fiquei de frente então pra ele, com o cano tocando o meu peito. – Atire, vamos. – E a mão de Toby tremia. – Atira! – Gritei e ele choramingou.
E eu ri.
- Não é a primeira vez que apontam uma arma pra mim, sabia? Mas da primeira vez, ela teve coragem de atirar.
Tirei a arma da mão de Toby com facilidade, batendo com ela em sua cabeça.
- Agora é minha vez. Mas bom, eu sou mais de atos e não de palavras. Então resumo tudo em: eu vou te matar. – Sorri e soquei Toby.
O rapaz caiu no chão e eu fui para cima, socando-o sem piedade alguma. Ele tentava se defender, mas em momento algum teve coragem o suficiente pra me atacar de volta. E eu soquei, soquei e soquei, até sentir meus dedos se machucarem depois de fazê-lo sangrar.
Depois que parei de socar, comecei a chutá-lo. Surrando-o de verdade.
Toby havia sido um pé no meu saco desde que entrou no grupo, sempre tentando me apunhalar pelas costas e ninguém nunca fez nada. Nem as ameaças de ou de foram capazes de pará-lo. Nem todo mundo virando as costas para o plano dele mudou alguma coisa. Ele não aprendia.
Mas disso ele jamais esqueceria.
Parei de chutá-lo, ao ver que ele já estava bem machucado. O rosto quase todo ensanguentado depois dos socos e toda a região em volta dele com sangue que vomitou por causa dos socos. Não me sentia mal por ter o surrado, me sentia mal por não ter feito isso antes e por não querer matá-lo de uma vez.
- Sabe o que é irônico? – Disse ofegante e o rapaz apenas gemeu em resposta. – O cara sem mão te deu uma puta surra. – Sorri vitorioso e me inclinei pra frente. – E isso é o porquê você jamais me derrubará. Boa sorte pra achar o caminho de volta.
Dei as costas, voltando pra floresta. Mas mesmo de longe conseguia ouvi-lo gemer e agoniar de dor. Me chamar, implorando por clemência. E minha consciência pesou.
Eu não queria ser esse cara, mesmo com Toby sendo um pé no saco na maioria do tempo, ele era um de nós. E depois de tudo isso, ele teria que aprender. De alguma forma, alguns só aprendem dessa forma.
Respirei fundo, bufando de raiva e frustração, voltando para onde Toby estava.
O peguei no colo, jogando-o em meus ombros e peguei sua arma, guardando-a em meu outro coldre.
Voltei para a floresta e continuei andando até saímos da mata escura, passando por uns andarilhos que eu já havia matado e matei mais uns que me cruzaram quando farejaram o cheio de sangue de Toby.
Saímos da mata, já chegando nos portões da Colônia que se abriram na minha presença.
Como estava escuro já, não havia ninguém no pátio para ver a cena de Toby ensanguentado em meu ombro, só os guardas, mas eles não se importavam.
O levei até a enfermaria e Frid se assustou ao me ver. Eu apenas joguei o corpo de Toby em uma das camas e me afastei dele.
- O que você fez, ? – me perguntou preocupado.
- Eu surrei ele, Frid. – Sorri, sem vergonha nenhuma do que fiz.
- Vou cuidar dele.
- Faça o que quiser, não me importo. Já fiz mais do que eu devia.
Dei as costas, saindo da enfermaria.
Não me arrependia mesmo de ter acabado com Toby, era algo que cedo ou tarde aconteceria. Mas sabia que me arrependeria caso o deixasse pra trás, havia alguns tipos de culpas que eu não queria pra mim. Não mais.
Mas de uma coisa eu tinha certeza: se Toby apontar uma arma pra mim de novo, eu o matarei. E não haveria culpa pra isso.

***

Romero.

Voltei para a Colônia exausta. Não fisicamente, mas psicologicamente. Era um daqueles dias que eu só queria dormir muito.
Não sabia ao certo o que fazer, mas saberia para onde eu iria.
Pela hora, julguei que já estivesse em seu quarto e então me dirigi para ele. Passei antes no quarto de Jolie para conferir se ela estava lá e estava a dormir. Então fui direto para o quarto do Xerife.
Adentrei sem bater na porta que estava entreaberta. Lá estava ele, sentado em sua cama, se despindo para dormir. Já havia tirado a camiseta e os sapatos. Ao me ver entrar, apenas sorriu e bateu nas pernas como um convite.
Mas vi algo que não me agradou.
- O que aconteceu com você? – Apontei para a mão enfaixada e ele deu os ombros.
- Eu pergunto o mesmo. – Apontou para os meus arranhões.
Dei os ombros.
- Fui patrulhar e acabei me perdendo na floresta perto do Hospital, então Slade me sequestrou e me levou para o QG me dar um sermão insuportável. – disse tudo de uma vez. – E você?
- Fui atrás de você, Toby quis ir junto e tentou me matar no caminho. Então enchi ele de porrada.
- Sério? – Era inevitável o sorriso enorme em meu rosto e os pulinhos de alegria. Corri para , me jogando em seu colo. Nós tínhamos que comemorar por isso.
E ele gargalhou.
- Sim, mas acabei o trazendo de volta e está lá enfermaria. Não consegui deixá-lo pra morrer. – disse meio desanimado, como se fosse ruim ele ter poupado a vida do traste.
- E por que não?
- Porque eu não sou o .
Eu e nunca havíamos tido uma conversa sobre a história dele com Slade e eu também nunca havia perguntado. Nunca me senti íntima o bastante para isso, mesmo quando já estávamos bem íntimos. Mas algo em mim queria saber.
- O que aconteceu entre vocês? – Deixei escapar e me encarou, acariciando minha coxa e sorrindo.
Pelo os seus toques eu já sabia que ele me contaria tudo. Agora estaríamos passando de uma fase para outra muito mais íntima. E eu estava pronta.
- A gratidão... ela me deixou cego. Sempre fui grato por tudo que fez por mim e por minha família. Sua vontade de proteger Max e Mariah a todo custo, lutando e matando por eles como se fossem seus. Sempre fui muito grato porque sentia que devia isso a ele, que minha família era a dele. Éramos irmãos. E eu sabia o que estava acontecendo, eu só fui cego. Eu só não me importei. Tinha medo de tirar tudo que tinha e secar as últimas gotas de sua sanidade. – Respirou fundo, tirando alguns segundos pra se recompor. Sabia que era um assunto delicado pra ele. – Eu não sabia ao certo quão sérios estavam, achei que era só uma besteira. Mas foi real... foi profundo. Mais real para ele do que para mim e para ela, mas mesmo assim me fingi de cego. Deixei acontecer e quando chegou ao meu limite, quando vi que ele estava vendo fogo onde não havia nem uma faísca, eu tive que protegê-los. Eu tive que ser o homem pela primeira vez e parar de pensar só em mim e no grupo, tirar o controle da minha família dele. Mas já era tarde demais e o fatídico aconteceu... A tragédia. – Parou de me tocar e eu gelei. Era mais real e muito mais profundo do que eu achava. – Não culpo Slade, não culpo Mariah, eu me culpo. Me culpo por ter sido cego. E sei que haverá cicatrizes disso para sempre. Há coisas que nunca mudarão e nem mesmo um amor muito grande apagará os laços de sangue. Mas eu continuarei fingindo e sendo cego se for preciso, para manter o que restou da minha família. Para manter ela perto de mim...
Eu entendi o que ele quis dizer e senti isso pesar em meu coração. Havia mais coisas nessa história entre Mariah, e que eles dois escondiam de todos. E uma “consequência” que os dois levariam para o resto da vida.
Muitos demônios remanesceram dessa história e quanto mais cavássemos, mais apareceriam. Talvez fosse hora de botar um fim de uma vez nisso, deixar passar. Manter os segredos enterrados junto com Mariah. Não importava mais quem era e quem não era. Só existia uma coisa que era mais importante que tudo para os dois. E para protegê-la, era melhor se todos nós nos fizéssemos de cegos.
Se era um peso enorme para guardar isso pra si, imagina para ? Imagina como deve ter sido para abdicar de algo que sabia ser dele para proteger o que mais o importava? Era uma moeda de duas faces e no fim, era isso que os mantinha unidos.
Não era a mágoa, a raiva, ou qualquer coisa que envolvesse o caso entre Mariah e , mas sim o que restou disso.
- Quer saber? – quebrei o silêncio. – Não quero que você seja mesmo o . Você é ótimo do jeito que é. – sorriu. – E muito gostoso por sinal... – Passei meus dedos pelo seu peitoral, acariciando sua pele.
- Sou, é? – Assenti.
Estava na hora de deixar nossos demônios saírem pra brincar.
Em seu colo, tirei a minha blusa com a ajuda de e sua mão foi direto em meu sutiã, soltando-o sem demora. Senti seu toque em meu seio direito enquanto beijava meu pescoço, chupando com leveza e descendo seus lábios em minha pele, até meu outro seio, tomando-o em sua boca. Gemi.
me deitou em sua cama, ficando por cima de mim. E me beijou.
Foi algo passageiro, apenas para que ele pudesse sentir sua boca na minha, para que pudéssemos saciar a vontade de termos uns ao outro naquele momento. Depois voltou a descer a boca pelo meu corpo. Beijando minha pele, minha barriga, até que chegasse no cós da minha calça.
Ele a abriu sem esperar, descendo-a junto com a minha calcinha que já se encontrava úmida – sim, eu era muito fraca pelo . Continuou a beijar minha pele, beijando minhas coxas e depois minha virilha. Distribuiu beijos pela minha pele, até chegar em meu ponto mais sensível e a tomou para si. Me beijando, me lambendo e me chupando com certa fome que me fazia rolar os olhos e gemer.
Minhas mãos em seus cabelos, puxando-o e implorando por mais daquilo. Com meus olhos fechados e minhas costas se arqueando cada vez que sugava minha pele mais sensível.
conseguia me dominar com simplesmente um toque. Sem nem se esforçar. Ele fazia e eu já estava de quatro pra ele.
Após parar de beijar minha pele, subiu seus beijos até minha boca novamente. Se ajoelhou na cama e eu corri minhas mãos para sua calça que já estava sem cinto, a desabotoei e ajudei a descê-la. Ambos agora estávamos nus, pele com pele. Cada momento mais quente.
Empurrei meu Xerife na cama, ficando por cima dele. O penetrei em mim com calma, sem querer apressar as coisas. Lentamente, aos poucos me preenchia. E então me movimentei junto a ele, movimentos calmos e lentos que me satisfaziam.
Ele tinha sua mão em minha cintura e as minhas estavam espalmadas em seu peitoral, enquanto aos poucos intensificávamos mais os nossos movimentos. Ele levava o quadril para cima, estocando com um pouco mais de força para dentro de mim. E eu gemia de prazer.
não sabia o que fazer com sua mão, onde me tocar. Às vezes apertava a minha cintura, ou a subia para os meus seios, apertando-os e estimulando os meus mamilos já rígidos.
Ou quando queria ser mais perverso, estapeava minha bunda toda vez que sua cintura ia mais para cima e investia mais fundo em mim. Eram uma quantidade absurda de toques me deixavam a loucura, sem conseguir nem ao menos gemer, já que meu oxigênio faltava e minha respiração se ofegava rapidamente.
Em um movimento brusco, girou, me deitando na cama e ficando por cima de mim, sem que saísse de dentro de mim. Continuamos nos movimentando com intensidade e sem gentilezas.
Nos beijávamos com fome, enquanto nos tocávamos com necessidade. Era como se nem tudo fosse o bastante para saciar a vontade que tínhamos.
Aos poucos, quanto mais intensos ficávamos, mais me aproximava do meu ápice. E quando meu orgasmo me atingiu, não consegui me calar e o gemido alto que saíra de minha boca foi abafado com a mão de . E aquilo só me deixou mais excitada ainda.
- Shhh. – Pediu, em um sussurro sedutor e eu também o calei com um beijo.
Logo em seguida, sem demorar muito, chegou ao seu ápice também, escorregando segundos antes de gozar para fora de mim me melando inteira, mas naquele momento não me importava.
Talvez mais tarde sim, mas agora não.
Ele me encarou e encarou a bagunça que fez em mim. Sorriu um sorriso mais sedutor possível, porque eu sabia exatamente o que se passava em sua cabeça.
- Que tal um banho? – Encarou meus olhos, mas eu só conseguia encarar seu sorriso sedutor perto de mim.
- Por favor. – Gemi, implorando por aquilo. sorriu e me segurou no colo. E assim fomos para o banheiro para mais um pouco.
Sempre queríamos mais. E não era ruim querer mais, era ótimo saber que ele me desejava tanto quanto eu o desejava. Era só a forma que nos satisfazíamos.
Ambos tínhamos muitos demônios que nos cercavam, mas toda vez que ficávamos assim... juntos, conectados e pelados, nossos demônios saíram para brincar e esquecíamos de tudo o que nos afligia.
E quem se divertia mais era nós dois.
Era a mais pura paixão.

***

Ainda não havia me acostumado a acordar com ao meu lado, mas me esforçava o bastante para gostar tanto desses momentos quanto os que aconteciam antes de dormirmos.
Ele não havia acordado ainda, perdido em um dos seus sonhos que eram tão mais puros e não tinham nada a ver com essa realidade.
E vê-lo assim me fez pensar na conversa que tive com , sobre guardar meus impulsos para que finalmente pudesse me vingar. Sobre eu não querer morrer e isso fez sentido em minha cabeça. Antes não tinha medo da morte, pouco me importava, era a única coisa que tinha certeza, mas depois de tudo que aconteceu, depois de finalmente ter me entregado a alguém que gostava de mim de verdade, a morte se tornou um medo.
Sempre acreditei que por mais que sofresse a minha morte, sobreviveria a isso, se tornaria mais forte assim como fez depois que nossos país morreram. Mas agora... não quero a abandoná-la e também não quero abandonar a . Eu queria sobreviver, eu queria triunfar nessa guerra, para permanecer fazendo o que fazia de melhor:
Lutar pelos o que amava.
Lutar pelos que amava me deixaria viva por todo esse tempo.
A guerra estava chegando, podia senti-la. E eu a sobreviveria, mas não antes de fazer tudo que pudesse para lutar e proteger os que amo. Porque eu sou Romero.
E uma Romero era imparável.


Capítulo 29 – Feeling Good.


Música do Capítulo


- Tenho medo do chão.
- Queres dizer alturas.

(...)

- Eu sei o que quero dizer! O que nos mata é o chão!
- Terry Pratchett
Frid estava me ajudando, ele mal me conhecia e desde que coloquei os pés nessa Colônia percebi que isso era tudo o que ele fazia com todos, ajudar.
- Eu estou com tanto medo – solucei tentando me livrar das lágrimas. Ele tinha essa feição no seu rosto, algo entre pesar e compreensão. Me abraçou com força e senti cada nervo acender de conforto naquele carinho que eu precisava tanto no momento.
- Chute a bunda dele garota – gargalhei antes de fazer um som estranho com a boca por estar rindo da própria desgraça. – É isso que devemos fazer, rir do medo, abraçá-lo como um velho amigo antes de convidá-lo para tomar chá pra poder compreendê-lo e no final se sentir confortável na sua própria pele para poder derrotá-lo e chutar a sua bunda. Porque o medo é um estado de espirito continuo na vida, mas são fases continuas. Em algum momento ele não vai mais existir, porque você aprendeu a superá-lo.


***

Romero.

- Barris de pólvora! – o moleque gritou antes de se aproximar. Seu rosto estava pingando de suor e a respiração descontrolada. Ele tinha provavelmente corrido o morro todo até aqui.
- Ei – alertei – respira um pouco. Senta aqui – me levantei do banco onde estava e ele se sentou, e então lhe alcancei um copo d’água. – Agora pode falar.
George era um dos adolescentes do QG, um rapaz que tinha saído com o grupo Beta naquela manhã e aparentemente tinha encontrado uma mina de ouro por sua animação ao tentar me contar algo.
- Steve e eu caminhamos muito essa manhã, muito mesmo, tipo por horas, até agora senhora, e encontramos uma fazenda abandonada. Estava vazia de verdade.
Acenei confirmando suas informações e Steve, seu amigo, chegou, parecia estar com ele mesmo já que sua aparência de cansado era praticamente a mesma, mas este demorou um pouco mais para subir o morro.
- Teddy tem mais água aí? – perguntei para o grandão que estava atrás da janela da cozinha e ele foi atrás de mais.
- A gente resolveu passar pelo pasto e tudo mais, poderíamos encontrar algo interessante, não é? Você vive dizendo pra gente olhar através dos olhos e tcharam! Barris de pólvora! – disse sorridente.
Seu amigo Steve ainda estava com a respiração falha e estranhei.
- Você foi mordido? – perguntei séria deixando a reação pra informação de George para depois.
- Não senhora – pegou a garrafinha de água que Teddy ofereceu a ele e jogou em cima da sua cabeça – sou apenas um adolescente sedentário.
Balancei a cabeça mudando o foco do assunto, mas fazendo um aviso em mente de que deveria mandar Nico revistar os dois antes de sair para procurar o que quer que George esteja falando sobre.
- Se o local estava vazio por que estão tão cansados assim?
- Bom... estava vazio – George olhou para o chão, envergonhado. – Chegamos até o local achando que seria bom, você sabe, tentar treinar nosso tiro, já que era longe o suficiente daqui e atrairia os andarilhos na direção contrária do QG. E nós fizemos isso, treinamos, e depois demos uma olhada no lugar, a casa estava vazia, e tinha bastante coisa útil lá dentro também – ele sorriu malicioso para o amigo e rolei os olhos. - Utensílios pra cozinha e toda essa baboseira... Mas parece que demoramos muito tempo, já que pelas últimas quatro horas tivemos que bolar um plano gigantesco para conseguirmos sair daquela casa sem que nenhum dos andarilhos comessem nossos cérebros.
- Ok... Então vocês entraram em um local vazio, fizeram barulho o suficiente para atrair a atenção deles e mesmo assim ficaram horas lá, com a guarda aberta e gastando munição quando deveriam fazer uma vistoria, e voltar direto pra cá, no maior silêncio possível. – Não era nem uma pergunta. Era apenas uma versão resumida do que os dois panacas poderiam muito bem ter feito se seguissem as regras com aptidão.
Por que adolescentes tinham que ser... tão adolescentes?
- Sim – ainda não olhava em meus olhos. Ele tinha falado a verdade, dava pra sentir na sua animação quando veio primeiro a mim para contar tudo e ser útil na nossa luta, mas agora só estava com vergonha por ter infestado o campo de andarilhos.
- São muitos barris? Qual o peso? – me agachei na sua frente pra que ele olhasse para mim.
- Menos que dez, acho. E não são pesados, poderíamos ter trazido pelo menos dois, mas estávamos longe demais.
- Então uma pessoa de carro dá conta? – perguntei e ele entortou a boca assentindo.
- Nico! – gritei para o cara de cabelo cacheado que estava no topo do portão de vigia com mais um soldado. Ele veio correndo em minha direção. Slade estava fora mais uma vez. – Esses dois estiveram lá fora e disseram que viram algumas coisas que poderiam nos ajudar para o quinto dia. Eu vou sozinha pra não deixar o local mais aberto que o necessário. Tome conta de tudo até eu voltar e peça para o Mike revistar os dois.
Ele assentiu uma vez e saiu. Me virei para Teddy.
- Peça pra George anotar o local da fazenda enquanto eu arrumo minhas coisas pra sair.
Ele sorriu de leve indo atrás do que eu apostaria ser um guardanapo. Eu poderia perguntar para George, o que tomaria mais tempo já que infelizmente eu sou leiga na parte rural de Oklahoma, e não era pouca. Teddy poderia converter aquilo pra que eu pudesse entender, já que ele trabalhou se locomovendo por toda nossa cidade.
Regata marrom, shorts jeans curto, meu digníssimo boné de couro falso preto e coldres escuros em minhas coxas. Apesar disso eu já sabia em minha mente que optaria pelas facas GKH. Não iria tomar o mesmo erro que os dois cometeram.
Com tudo preparado, os garotos abriram o portão para mim, assim que passei pelas frestas largas com o carro, Nico colocou a mão em cima da janela do carro e disse baixo:
- Boa sorte, Okie. – Sorriu e deu dois tapinhas no teto. Finalmente avancei para a fazenda.

***

Se ainda ligássemos para o tempo ou soubéssemos a hora, deveríamos estar em algum momento entre o início ou fim da madrugada quando avistei a fazenda. Lá estavam todos os andarilhos, em seus corpos cinzas e alguns com membros como pernas e braços faltando, em busca de qualquer sinal de luz ou movimento brusco, soltando um som já famoso por quem convivia com eles diariamente.
É, eu já estava acostumada.
Estacionei o carro atrás de algumas árvores para poder observar todo o perímetro e calcular o perigo antes de tentar alguma coisa pra valer. Era uma pequena fazenda, talvez todos aqueles acres nem ao mesmo pertencessem àquela grande casa branca de madeira, mas estava ao seu lado. Havia um celeiro completamente trancado e parecia estar vazio. Um pequeno lago, um poço de água com alguns sons de gargantas com fome vindo com eco dentro dele e um vagão de trem coberto por andarilhos.
Subi em cima da minha camionete e consegui avistar os barris dentro daquele vagão solitário virado em direção horizontal. Sério mesmo? A única coisa que eu queria era pegar aquela droga e sair rapidamente, e lá estava o produto principal lotado de seguranças mortos-vivos.
Voltei para o carro alcançando um isqueiro no porta-luvas e deixei algumas armas embaixo do banco, trazendo somente uma pistola e a faca que Slade tinha me dado. Adentrei a floresta silenciosamente sabendo que não haveria tantas surpresas no caminho já que os rapazes tinham chamado a atenção de dentro da casa e não fora dela. Aquelas coisas já estavam dispersas, mas eu mantinha um olho aberto.
Acertei a cabeça de um, o segurando para não fazer ruídos contra a folha seca até chegar ao chão. Visando essas folhas e o próprio corpo dele, rapidamente montei um pequeno monte com mais gravetos e ateei fogo naquilo.
Corri para a traseira da camionete observando os andarilhos prestarem atenção na chama do fogo em meio toda a escuridão daquela madrugada quente. E bingo. Eles já não estavam mais no meu caminho.
Me aproximei do vagão quebrado com algumas entradas e saídas que meu corpo poderia caber e comecei a carregar os barris, no carro agora já estacionado perto o bastante. Não tinha ligado o farol para não acabar com o plano estupidamente. Havia sete barris e o cheiro de pólvora era quase literal. Todos eles pesavam pelo menos vinte quilos e eu os peguei, um por um, atenta para qualquer ataque e reclamando mentalmente sobre o peso, mas tudo bem, mesmo que minha disposição tenha setenta anos eu ainda tinha vinte e seis.
Aproveitando a minha solidão naquele local demoraria para que os mortos-vivos notassem algum som vindo de mim, tudo que poderia escutar eram os estalos do fogo e eu já sentia o cheiro insuportável de suas carnes já podres queimando ao irem perto demais da luz do fim do túnel. Pelo menos aquilo era como um serviço solidário, eu estava gratuitamente limpando o local sem fazer muito esforço.
O celeiro estava trancado demais, um pouco atrás de algumas árvores que estavam ao redor da casa. Não ouvia movimentação alguma dentro dele então parecia ser uma resistência, significava que algumas pessoas conheciam esse lugar e até mesmo viveram aqui depois do vírus atacar a cidade.
Retirei o revolver do coldre na minha coxa direita e mirei objetivamente antes de subir as escadas da varanda para adentrar a casa.
Estava tudo escuro lá dentro, não tanto quando cheguei aqui, deveria estar amanhecendo e logo eu veria o céu em tons de rosa claro.
As paredes da casa eram cobertas por papéis de parede floridos e não tão antigos, parecia ser uma moradia bem cuidada. Quem morava ali antes amava de verdade a casa. Fotos e mais fotos cobriam os corredores, era aconchegante, todas aquelas imagens com um casal de velhinhos e dois garotos magricelas de cabelos escuros e pele clara.
Ri de leve ao ver uma vidraça com pratos de porcelana. Parecia que George estava falando sério sobre garfos e outras coisas que poderiam ajudar o Quartel, e ele estava certo. Munição e comida não era tudo o que precisávamos, principalmente quando nosso grupo atingia cem pessoas. Acessórios como pratos, talheres, potes, toalhas, roupas e principalmente papel higiênicos não deveriam ser esquecidos.
Peguei uma sacola forte em uma das gavetas na pia e coloquei o necessário que encontrava no meio do passeio por dentro da casa lá dentro. Larguei a mesma na mesa depois de encontrar uma porta ao lado da dispensa que parecia dar para o porão. Preparei minha faca e abri com cuidado, mantendo minha respiração o mais baixo possível para escutar a asa de um mosquito batendo.
Como parecia estar tudo vazio, desci as escadas lentamente ouvindo aquele típico barulho de ranger a madeira em um filme de terror. Então o fedor venceu o ambiente. Procurei rapidamente o núcleo daquilo e era um corpo jogado no chão, de bruços, sua cabeça completamente amassada pelo que parecia ser o taco de baseball ao seu lado.
Uma porta para garagem, um cara morto com inúmeras larvas e moscas passeando em sua carne aberta, cordas. Nada interessante.
Subi rapidamente fechando a porta atrás de mim para evitar inundar a casa com o odor da decomposição. E também um leve medo do que toda aquela carne estragada poderia gerar o meu sistema. Não foi assim que tudo isso começou? Com um vírus que se espalhou pelo ar inocentemente?
Voltei a caminhar pela casa encontrando um quarto no segundo andar. Era um típico quarto de adolescente que não parecia ser visitado há décadas, pois estava limpo demais. Pôsteres de banda de rock dos anos oitenta tampavam a cor original da parede e adesivos tribais cobriam o guarda roupa.
Abri a mesa de cabeceira encontrando apenas um CD empoeirado e o tampei com uma folha de papel, fazendo um protetor para colocá-lo no meu bolso para testar no rádio da camionete vermelha dos meus pais que ainda estava viva, bem e com a minha irmã. O que eu não achava justo, mas discutiríamos isso mais tarde.
Enchi a sacola com algumas camisetas de banda que encontrei em seu armário e meus olhos arderam quando uma luz forte entrou pela janela.
- Droga... – suspirei vendo um carro se aproximar dos meus barris acabando por chamar a atenção de alguns andarilhos. Estava estampado em suas caras “vamos roubar tudo isso aqui e dar o fora” e quase chutei a porta antes de descer, enfurecida por ter que lidar com mais essa.
Segurei minha arma apontando para um deles que estava na traseira da minha camionete.
- Isso não é seu – moderei minha voz, chamando sua atenção.
Ele me analisou rapidamente, certamente me julgando fraca, até que riu.
- Também não tem seu nome escrito, gracinha.
Acionei o gatilho com cara de poucos amigos. Ele mudou sua expressão para ódio e levantou os braços.
- Desce daí – mandei. Por um segundo seu olhar estava diferente, atuando.
Me virei rapidamente para trás e desarmei seu amigo como o planejado. Ninguém iria me levar para qualquer lugar que eu não estivesse a fim hoje. Rapidamente alcancei minha faca na cintura cortando o seu braço antes que a luta corporal entre nós se intensificasse. O seu amigo mais velho me chamou tipicamente de vadia antes de tentar resgatar a arma no ventre e levantei minha mira para a cabeça de ambos. Quem era a vadia agora?
- Pra onde diabos vocês acham que estão levando as minhas coisas?
- Achado não é roubado putinha – cuspiu no chão o cara em cima do caminhão. Ele desceu lentamente com os braços em sua cabeça e revistei os dois, retirando todas as armas em seu possível acesso.
- Olha ali Greg... Ela tem o Z no pulso – sorriu vendo minha marca. – Nenhuma vadia de lá tem essa marca sabia? Apenas os soldados de Zeus...
- Você deve ser a vagabunda que fugiu... – o cortei levando meu punho em sua boca. Ele caiu no chão cuspindo e levei o cano da arma diretamente na têmpora de seu amigo.
- Me chama de vadia outra vez ou qualquer outro sinônimo que você vai desejar ter nascido sem língua – ameacei o infeliz. Ele parecia ter um resquício de medo no início, mas sorriu.
Um sorriso. Um deboche. Atirei em sua perna.
- ARGGGGGGG, VAGABUNDA – caiu no chão pela dor. Eu tinha avisado, não tinha? Outro tiro, rápido, letal, no pé. Ele continuou a gritar asneiras e apenas mirei em seu amigo outra vez.
- Quer o mesmo fim que ele? – perguntei, se quisesse era só abrir a boca e poderíamos poupar trabalho. Ele negou. – Então é melhor sair logo daí.
Não fazia muito tempo que eu passava por esse sufoco, e não o queria de volta tão rápido assim, viu Deus?
Infelizmente não podemos ter tudo o que queremos.
O som do carro deles, o som de suas vozes, a luz do farol e pra complementar os tiros, era tudo o que precisava para os andarilhos viessem em nossa direção, procurando algo um pouco mais interessante que seus próprios corpos queimando, algo como nossa carne para se alimentar.
Corri em direção contrária a eles, observando o amigo Greg ser comido vivo em meio aos seus gritos e o amigo sem nome correr atrás de mim, já que ele estava desarmado e completamente inútil. Era praticamente um desaforo eu inconscientemente protegê-lo agora tentando proteger a mim mesma.
Dei a volta na camionete que agora estava completamente infestada bloqueando minha passagem de liberdade para ela e fui em direção ao topo do vagão de trem. O topo estava quebrado e eu poderia entrar pra sair em um dos lados se o mesmo estivesse sem andarilhos. Com isso mente acabei atirando o resto das minhas balas em um grupo esfomeado que estava começando a conseguir subir para o topo do vagão horizontal e me joguei neste buraco da lataria, saindo rapidamente pela frente onde peguei os barris da primeira vez. E o encosto estava atrás de mim.
Ele saiu do meu campo de visão em um segundo disparando para o chão tentando se recuperar enquanto eu trancava a porta com as milhares de fechaduras que tinham ali.
Bufei antes de me virar para ele e apontar uma arma em sua direção enquanto puxava sem delicadeza a cortina da cozinha para amarrar seus braços atrás de si em seguida.
- Não gosto de matar pessoas gratuitamente – falei puxando o nó fazendo ele arfar como um bebezinho.
- Então não sou eu quem vai te dar motivos pra isso... – disse como uma reclamação.
- Cala a boca – o empurrei para um canto da cozinha vendo através de uma fresta da porta a inundação de criaturas querendo entrar. Precisava de uma visão melhor do perímetro do quintal então subi para o quarto em que estava antes sentindo a presença do cara atrás de mim.
Não tinha facas naquela cozinha e muito menos armas, então a menos que ele tenteasse algum golpe que eu poderia facilmente parar, ele não tentaria algo mais trágico.
Como o esperado, o céu já estava rosado. Feixes de luz do sol davam as boas vindas e pensei no quanto Slade estaria irritado com a minha demora. Levou quinze minutos para eu chegar até a fazenda, o que fazia sentido para os meninos que não estavam de carro e sem trânsito algum como eu estava.
E falando no diabo...
- Mais visitas – o cara atrás de mim reclamou olhando janela afora o carro distante se aproximando da casa.
Olhei para ele com uma careta mortal e fui direto para o armário pegando uma das camisetas enfiando em sua boca sem dó ou piedade para que ele a calasse definitivamente. Ele já estava se sentindo parte do time? Porque ele foi primeira visita indesejada no local.
Já esta segunda pessoa... Poderia me ajudar e me matar depois com o sermão que eu poderia levar. E se ele tentasse me dar um sermão eu o mataria por achar que está falando com uma criança. Seria complicado. E a julgar pela velocidade do veículo cantando pneu no meio do pasto... Ele não estava de bom humor.
Abri a janela tentando não fazer barulho acenando pra ele com o braço. Slade se aproximou do quarto onde eu estava e desligou o carro de qualquer forma perto do celeiro. Subiu em cima do mesmo e passou a atirar nos andarilhos que agora estavam atrás dele.
- OUTRA JANELA – ele gritou alternando suas balas e facas rapidamente para tentar para-los antes que chegassem até o seu corpo.
Corri para o outro quarto que ele parecia ter apontado com a pistola e forcei a janela quase emperrada para cima. Imediatamente compreendi que sua ideia era que eu tentasse pular dali diretamente para os galhos de uma árvore que estava próxima o suficiente.
- ME AJUDA – foi o que consegui entender das palavras que saíram abafadas pela boca do cara com as mãos amarradas pela cortina da cozinha.
Dei um sorriso inocente.
- A vadia aqui não sabe como... – dei as costas para ele, com minha sacola em mãos, fiquei em pé na estrutura de madeira da janela e me estiquei até conseguir alcançar o galho. Larguei minhas pernas e consegui fazer impulso para que minhas coxas agarrassem com força a árvore. Caminhei nessa posição estranha até o tronco.
Um baque chamou minha atenção e notei que o cara atrás de mim tentou fazer o mesmo que eu fiz, o que não deu muito certo com suas mãos amarradas, e foi direto ao chão, ele tinha essa careta de quem ficou sem ar por alguns segundos, mas logo estava gemendo de dor outra vez.
Me levantei na árvore vendo Slade abrindo passagem por um dos lados do celeiro até a entrada do mesmo. Eu teria que ser rápida. Desci o tronco rapidamente me camuflando em locais como o poço e moitas para que não percebessem minha movimentação.
Ponto A até ponto B.
Agora precisava chegar até o vagão de trem outra vez, era o negócio mais próximo que eu poderia me esconder por mais alguns segundos antes de avançar.
Corri até o vagão sentindo meu coração acelerar e meus músculos queimarem, alguns andarilhos notaram meus gestos e já estavam próximos. Dois deles foram ao chão com a mira de Slade direto de uma janelinha no topo do celeiro. Um se aproximou em um piscar de olhos e forcei seu pescoço para um lado e o corpo para o outro, quebrando o osso, deixando-o impossibilitado de andar.
A sensação de encostar neles com certeza não era boa, era horrenda, mas agora com tanta adrenalina no meu sangue facilmente era tudo ignorado com sucesso.
Enfiei a faca de cabo branco no estomago de um deles e puxei para cima, até o seu pulmão. Não o matou, contudo, foi ao chão. Mais alguns passos.
Passei diretamente pelo portão do celeiro que agora estava infestado. A cada momento mais deles apareciam, mais e mais. Teriam pelo menos duzentos deles ali senão mais, toda nossa bagunça tinha chamado muita atenção e ralhei mentalmente por ter brigado com os garotos mais cedo por ter feito o mesmo, porém menos pior.
Eles estavam muito perto, perto demais, e eu estava a mínimos metros do pequeno buraco que eu me forçaria entrar para dentro do celeiro, mas tentava dar mais voltas para ter uma pequena vantagem ao tentar fazer a passagem.
Era tudo ou nada. Forcei minhas pernas o máximo que conseguia e meu ritmo era insano, então me agachei, deslizei pelas folhas e grama, me jogando contra o pequeno buraco, a pequena falha na madeira, alguns tentaram pegar minha sofrida canela, eu chutei, eu lutei, e fui puxada para dentro.
Engatinhei de costas para trás antes que voltassem a me pegar por fora com seus braços espedaçados e senti meu pulmão subir e descer com muita força, me virando pra cima para encontrar aqueles olhos azuis me encarando de forma raivosa. Deitei no feno bufando e coloquei a mão nos meus olhos.

Slade.

Como poderia levar a sério alguém que ficava irritada quando quem ela se importava saía em missão suicida e ela mesmo fazia a mesma coisa? Aquilo era tudo ridículo demais e bufei colocando uma porta de madeira solta na frente do buraco entre os braços que tentavam nos alcançar.
- Conseguiu, vadia – o velho gargalhou com a camiseta caindo de sua boca. Minha camiseta...
Que diabos?
Eu não fazia ideia de quem este inútil era, mas pensei que poderia ser algum amigo que ela se irritou o suficiente para prender suas mãos com as cortinas da cozinha. Mas ele estar na minha frente e ter a coragem de chamar ela dessa forma... Era realmente falta de noção do perigo. Ou apenas ignorância.
Que bom que eu teria algo para extravasar minha raiva.
Sorri antes de pegá-lo pela gola de sua camiseta.
- Repete.
Uma palavra. Ele se calou. Engoliu seco.
- Slade? – falou baixo. Presumiu certo.
Assenti. Ser conhecido não aumentava meu ego, apenas me deixava puto por saber que eu tinha deixado caras demais fugirem para ter alguma história pra contar. Mas agora eu era nobre não era?
- Não quero destruir o resto dessa cara feia que você tem...
- Fritz – olhou pra baixo.
- Fritz – apertei meus olhos – o problema é que você dificulta bastante pra mim falando asneiras pra uma pessoa que te deixou entrar no celeiro e inconsequentemente salvou sua bunda não merecedora.
- Eu já disse pra ela que não vou fazer nada. Eu vou ficar quieto e o que vocês quiserem eu vou aceitar, eu juro.
- Ah disse? – levantei uma sobrancelha.
- Bom... Sim... Ela não me deixou muita escolha também – sua voz estava sumindo e diminui a força na camiseta. – Ela matou meu parceiro, cara.
E ele fez essa careta de cachorro que caiu da mudança. Eu acho que foi isso ou ele era somente muito feio.
- O parceiro dele mereceu a morte, amor? – perguntei para a morena.
- Eu não o matei, eu dei apenas alguns tiros depois que me chamaram de vadia cinquenta vezes seguidas – explicou.
- Que pena – torci a boca. – Onde ele está agora?
Ela deu de ombros.
- Na boca de alguns andarilhos lá fora.
Esta era a minha garota.
Sorri para o cara novamente o botando no chão, alívio em sua feição quando fiz questão de arrumar seus ombros e vestimentas, postura correta, até que estava ali, o seu queixo tão convidativo.
Soco. Fritz caiu no chão limpando o sangue que jorrou para o ar.
- Mas que merda cara – outro soco, desta vez mais forte. O puxei para cima antes de mais um punho atingi-lo com força. E então um chute. Ele estava no chão se contorcendo e sabia que meu olhar pegava fogo com ódio daquela raça repugnante.
Apertei as juntas em meus dedos respirando fundo ao olhar para o seu corpo se debatendo. Pisei em cima de sua mão esquerda e ali estava a maldita marca daquele maldito pirralho que vinha infernizando minha vida há algum tempo. Cuspi em cima dele.
- A vadia aqui é você Fritz, a vadia de Zeus, a vadia que não tem opinião própria ou personalidade, que faz tudo o que ele te pedir. – Peguei minha arma apontando em sua cabeça no chão e escutei seu soluço. Ele estava chorando. Que bom. – Nem o diabo aceitaria sua alma de tão baixo que você é Fritz. Você é um lixo que não merece nem mesmo meus socos, o mínimo de esforço. Eu não gastaria uma bala com você. Então vá. Vá atrás da merda do seu chefe e diga pra ele que venha logo, que estamos esperando, preparados pra ele, que ele é fraco ao ponto de não ter uma razão para lutar. Nós temos, e adivinhe? Vamos vencer. E matar cada uma das vadias dele sem ter um pingo de remorso porque é isso que todos vocês merecem. Uma morte fria e rápida, pra ter tanta importância quanto suas miseras vidas.
Segurei seu pescoço forçando a levantar e abri a porta do celeiro o jogando para fora, se tivesse sorte, ele escaparia daquela horda, senão, quem se importa?
Limpei seu sangue das minhas mãos com a camiseta preta e guardei minha arma, sempre com o olhar apontado para o chão até estar calmo o suficiente para enfrenta-la.
Então me virei para . Seus cabelos longos e escuros estavam amarrados no topo de sua cabeça e resquícios de sua pequena franja escapavam para frente. Pequenas sardas se destacam em seu nariz arrebitado, o olhar azul me queimava com algo novo. A boca levemente aberta respirando com força, fazendo seu peito subir e descer, em uma maldita camiseta minúscula que combinava com os seus shorts, e eu lamentava pela saudade de estar entre aquelas pernas suculentas.
Era difícil ficar puto com aquela visão a sua frente, mas eu estava mesmo assim.
- Quer falar sobre isso? – ela se manteve quieta. – Você sabe, , sabe que eu não sou tão confiante assim como o é quando sua irmã sai, eu não tenho o autocontrole que ele tem pra deixar a garota dele sair sem ir atrás como um idiota pra ver se você não tem qualquer arranhão em seu corpo. E o que você faz? Aproveita para fugir o minuto em que eu saio da porra da sua frente – ela ia rebater, mas fechou a boca. – E aquela merda de história sobre se preocupar com as pessoas, hein? A dor não vai embora, você sabe disso e faz de tudo pra me ver impaciente, caralho. – Ela se aproximou tomando ar e percebi que sua mandíbula estava travada. Ótimo. Fique com raiva também. Desconte tudo em mim, amor. Me odeie ou me ame. – Você pode ter feito sua irmã de trouxa, seus pais de trouxa ou qualquer outro namorado ou grupo que pode ter feito algum mínimo de importância em sua vida , mas comigo não é assim. Você não tem desejo por morte, você tem desejo por adrenalina. Então se quiser bancar a heroína outra vez... Saiba que eu não vou tolerar ou permitir isso.
Ela apertou os olhos partindo pra cima de mim. Tentou me estapear no rosto e sorri pegando seu pulso com força no ar. Eu me daria um tapa se pudesse também.
- Não faz ideia do que está dizendo, seu idiota. – Segurei seu corpo contra o meu e ela tentava se livrar enquanto eu apertava ainda mais o nosso contato.
- Shhh – sussurrei em seu ouvido. Beijei seu pescoço e ela tentou se esquivar enquanto se arrepiava. Era incrível a sensação em saber que apenas um toque meu poderia faze-la se sentir assim, da mesma forma que ela conseguia fazer eu me sentir.
Em um segundo ela estava lá, com ódio de todas as minhas palavras querendo me esbofetear, no outro ela tinha se virado pra mim com rapidez, me beijando com força tentando arrancar minha camisa.
A segurei no colo apertando sua bunda e levei para a escada do celeiro que nos dava para um andar elevado, mas paramos no meio, ali ficávamos na mesma altura e ela estava sentada na minha frente, pronta pra ter todo seu corpo estimulado nos melhores lugares.
Tirei sua blusa a jogando longe e ela rapidamente se livrou do sutiã. Nossos lábios nunca se separavam, até que ela precisou tomar ar e tomei o meu caminho preferido até seus seios, lambendo e mordiscando toda sua carne. Eu já conhecia todo seu corpo de trás para frente.
Controlei minha ereção quando ela ficou completamente nua e tentei me segurar para que pudesse deixa-la em um ponto extremamente sensível e pronta para mim. Sua língua brincava com o contorno dos meus lábios enquanto seus calcanhares puxavam minha bunda contra ela, fazendo com que eu a fodesse ainda de roupas.
Segurei sua cintura outra vez e ela automaticamente se grudou em mim, e nos levei para cima.
- O que você tá fazendo? – ela indagou gemendo quando a deitei de barriga para o chão.
Retirei o rabicó de seu cabelo e ele caiu por suas costas nuas. Estávamos entre a madeira e o feno, ela deitada sobre aquelas cores pastéis, completamente pelada, a pele morena se contrastando com o amarelo da planta seca no chão e contemplei a cena espetacular. Beijei suas costas nuas e algumas marcas de mordidas e chupões em sua pele que eu reconhecia muito bem. Tinha várias dessas espalhadas pelo meu próprio corpo.
- Eu vou foder você – lambi seu lóbulo e coloquei minha mão sobre a sua carne molhada, a puxando para cima fazendo-a ficar empinada para mim.
- Eu vou gostar? – sorriu, quase sem voz.
- Você vai amar.
Estávamos lutando minutos atrás, brigando segundos atrás e querendo comer nossos próprios corpos agora. Nossa sintonia era completamente inquestionável. Eu a queria, ela me queria, não importava a situação.
Estimulei seu clitóris o encontrando por trás e ouvi sua voz gemer quando encontrei rapidamente um ponto sensível dentro dela. Eu conhecia seu corpo como se fosse o meu. Eu sabia seus pontos de prazer e como acende-los tão fácil quanto eu sabia escovar os dentes.
Meu pau engrossou com sua voz roca soando musicalmente maliciosa para os meus ouvidos e aquela bunda deliciosa se empinava cada vez mais, pronta pra me receber. Já não aguentando mais a dor da minha ereção contra o tecido da minha calça abri o meu zíper, pincelando minha ponta na entrada de sua abertura e vi sua cintura se contorcer de antecipação.
Estoquei a primeira vez com força e meus olhos se fecharam com o prazer imediato e minha boca se abriu soltando um som sôfrego, em um longo, longo gemido, e ela me acompanhava aí. Meu ritmo inicial era quase tímido, tentando me controlar por estar dentro dela em uma posição nova que podia alcançar lugares mais profundos, suas paredes me apertavam com força assim como sua mão apertava o feno no chão e eu grunhia apertando os dentes para me acostumar com tanto prazer.
E então eu estava de volta ao jogo. Me inclinei sobre ela apertando seus peitos deliciosos metendo com força, ela gritava a cada vez que meu pau a adentrava e mantínhamos um ritmo gostoso em que ela não conseguia se segurar e rebolar deliciosamente enquanto eu a comia de quatro.
- Você é realmente uma putinha, não é, ? – disse em pura maliciosa lhe dando um tapa que deixou a marca de minha mão em sua bunda.
Na vida a morena mandava, ela liderava e chamava a atenção por onde passava. Na cama ela era uma perfeita submissa. E só eu sabia disso. Só eu saberia disso daqui até o resto da vida.
- Slade... Isso lindo... – um som parecido com um rugido saiu de mim e percebi que foi somente uma resposta para aquela boquinha linda gemendo meu nome como se eu pertencesse a ela.
trabalhou mais a sua cintura em minhas mãos, gemendo alto, ignorando a plateia de mortos-vivos lá embaixo e qualquer outra coisa que pudesse estar em nosso caminho.
Meu membro inchou dentro dela e ela segurou minha mão com força sentindo o que estava vindo. Coloquei o dedo em seu carocinho e o circulei rapidamente para que pudéssemos vir ao mesmo tempo. Ela gozou tremendo deliciosamente embaixo de mim e manteve essa feição gostosa em seu rosto por alguns segundos, mais duas estocadas e eu gozei dentro dela, assistindo meu leite transbordar com encantamento, como todas as outras vezes...
E em todas essas vezes, nenhum de nós nos importávamos.

***

Romero.

O clima estava pesado. O olhar gritante de todos os moradores continha apenas uma palavra: medo. Era apenas inevitável. Era o que tínhamos para o agora. Não havia como fugir, havíamos nos preparado o máximo possível e tinha chegado a hora. Uma jornada tão extensa e osciladora que parecia ridículo contar que o inevitável era que milhares de histórias que se iniciaram neste local, poderiam terminar amanhã. Em um piscar de olhos.
Histórias que talvez mal tenham sua chance de serem apresentadas ao mundo...
Mas quem é que quer viver neste mundo, não é mesmo?
Slade e eu já estávamos novamente no QG. Era noite da fogueira. Diferente da noite em que tive um dos primeiros contatos com o chefão de tudo aquilo ali, dessa vez estavam presentes todos os moradores, até mesmo algumas crianças, para não dizer adolescente. De alguma forma todos nós éramos crianças, até os com mais de trinta anos, tendo que conviver nesse novo estilo de vida que fomos forçados a presenciar.
Pouco sabiam como caçar, cozinhar ou atirar, sobrevivendo a um estilo selvagem, quando tudo se iniciou. Tínhamos o mesmo conhecimento que um recém-nascido. Mas conseguimos conciliar e aprender, pois essa é a palavra chave do ser humano. Aprender e seguir em frente. Passar o dia chorando no quarto não resolveria o Apocalipse e não salvaria sua vida, a não ser que esse não era o seu objetivo de qualquer forma.
Armados. Fortes. Sem rostos felizes ou bêbados. Apenas concentrados. Olhares focados para uma só pessoa que os liderava desde o início dos tempos. O que conseguiu reerguer todo aquele local e mesmo sendo o objeto de terror número um de todo aquele povo, era o mesmo cara que eles estavam confiando suas vidas para o que poderia ser o seu último dia na terra.
Eles olhavam para Slade, seus rostos através da sombra das árvores e chamas de todo aquele fogo que aquecia minha alma. Mas se suas expressões continham medo... de Slade permanecia dura. Sem parecer que haveria palavras saindo de seus lábios a qualquer segundo, que era o que eles esperavam. Slade fitava com força o vermelho com uma ruga na testa que demonstrava até mesmo um pouco de raiva.
Nada daquilo resolveria.

***


Música da Parte


Romero.

- Vocês já sabem o que está acontecendo - Slade deu de ombros como uma criança birrenta. - Não olhem para mim esperando palavras inspiradoras.
Incrível que a primeira vez que alguém realmente espera que ele fale alguma coisa, ele não fala. E olha que ele fala, até demais.
Mas nada adiantaria nesse ritmo, principalmente com aquele temperamento ridículo. Ele era naturalmente bravo, porém dessa forma parecia para o pessoal que ele poderia até estar culpando-os por tudo que estava acontecendo. E ele não estava. Estava culpando a si mesmo.
E na verdade, não era culpa de ninguém. A vida era assim, lamentar não adianta nada e o mínimo esperado é apenas algumas palavras para ajudar os desafortunados da vontade de estar ali e se sacrificar.
Então vamos tentar...
Fiz uma careta pra ele.
- Beleza... - bufou. - A qualquer momento amanhã de manhã ou de madrugada sofreremos um ataque do grupo do fodido Zeus e provavelmente metade daqui vai morrer e ninguém precisa se importar porque desde que estamos nessa merda de lugar, a cada mês, metade do pessoal vai morrendo e...
- Jesus Cristo, Slade, cale a boca! - falei. Indignada.
Ele bufou, mas depois debochou.
- Fale você então, princesa.
30 anos de casados. Implicâncias ridículas.
- Falo - disse como um desafio.
Ok. É fácil. Só falar, blablabla. Levantar, no meio de um povo que eu já conhecia, conhecia até demais, e suas atitudes seriam ponderadas ou exageradas tudo de acordo com o que eu falaria agora. Se falasse de menos eles não ligariam, se eu enchesse linguiça e ligasse o Shakespeare dentro de mim eles dormiriam.
Era difícil falar.
- Não custa tentar... - respirei fundo e assobiei alto com dois dedos, chamando a atenção de todo o grupo para mim. Continuei sentada e serena, tentando transpassar calma porque a aflição deles já era demais, principalmente depois das palavras do bonitão sociopata. - Eu sei que Slade pode ser assustador a maioria das vezes, mas ele só demonstra isso por fora e na verdade sente cócegas na barriga.
Ele bufou, se levantou e saiu, enquanto algumas senhoras riram de leve. Eles prestavam a atenção em mim.
- E esse medo pode até ter se tornado respeito com o tempo, mas ele ainda lidera o sentimento de vocês, e qualquer coisa que ele falar, vocês vão se prender nisso, mesmo quando o mau humor e medo dele estão à tona e o faz soltar bobagens que instigam também o medo que vocês estão sentindo. Não tô dizendo que não é para senti-lo. Na verdade, é bom. Significa que vocês não querem acabar o relacionamento com a vida agora. Vocês temem o amanhã e são fortes o suficiente para enfrentá-lo e saber que dando o seu máximo, o medo não tomará conta de você. Apenas lutando, vocês terão a chance de ver o sol nascendo outra vez. A desistência nos torna fracos porque nos torna poucos. Sozinhos lá fora, não duramos. Aqui dentro, armados, um grupo forte e decidido a lutar e viver... É assim que duramos. Duramos sendo sensatos o suficiente pra saber que amanhã haverá momentos mais baixos do que altos. E duraremos ainda mais, porque sabemos como ultrapassar todos estes obstáculos... Afinal, ainda estamos aqui. Nós conhecemos nosso inimigo, sabemos o seu ponto fraco e sabemos nossa própria fraqueza, agimos para combatê-la. Amanhã é a decisão final. Saber se todos os dias em que lutamos na nossa vida, valerá a pena, porque amanhã... Vamos lutar. Eu vou lutar. Por mim, pela minha família que virá, pela minha família que se foi, por vocês e por todo o futuro que eu sei que ainda tenho pela frente. Eu sei que vou lutar. Quem está comigo?
Eu já estava em pé. Discursei olhando no fundo de seus olhos e o nervosismo não me cabia aqui, pois era como estar em uma sala de aula. Os educando. Educando para a vida e a sobrevivência com os ensinamentos que eu mesma tive repassando apenas com sinceridade. A sinceridade os conquistou.
Um por um se levantou, alguns ergueram seus copos, suas garrafas de cerveja, seguravam suas armas com força, com apenas um olhar demonstrado em suas faces: coragem. Suas cabeças acenavam para mim, concordando, incentivando. Aceitando.
Eles estavam comigo.
Quem é que quer viver nesse mundo?
Eu quero.
Eu preciso.

***


- É isso. Eu tenho um filho de dez anos e nem sei quem é o pai. - sussurrei e Slade riu.
A casinha do pescador na beira do rio que separava o caminho do QG para a Colônia. Era lá que estávamos. Eu tinha acabado de contar uma história para Jacob e o colocado para dormir, com direito a todas as janelas seladas com tábuas de madeira e porta também trancada. Ele não sairia dali e ninguém entraria ali dentro sem minha permissão. Mamãe urso já era realidade.
- Apenas mais um fruto positivo da sua estadia no QG - segurou minha mandíbula com suas duas mãos e me deu um beijo suave.
- Você é o negativo - ri e me sentei em uma das pedras, ouvindo o som da água corrente.
- Nem você acredita nisso, amor.
Fitei por um instante, tentando pensar como tocar nesse assunto dessa forma, mas acreditei que aquele momento era o certo. Então o fiz.
Desentalei algo que estava na minha garganta há algum tempo.
- A fazenda era de seu pai? - Ele franziu o cenho. - Frid.
- Velho fofoqueiro.
- Ele tem boa conversa. - Talvez fofoqueiro sim, mas era por isso que na maioria das vezes eu o procurava. Eu praticamente já possuía uma biografia da vida de Slade. Graças a ele? Não. Graças a Frid.
- Conversa até demais... – respirou fundo. – Sim. Era de meu pai. Na verdade ele era pai biológico somente do , mas você já deve saber. - deu de ombros. - Eu morava na capital do país que você deve imaginar qual, meu pai era um bêbado inútil sem familiares que acabou sendo preso e fui enviado para o meu padrinho. Fim da história.
- Só fale se quiser. – sorri. Mas Slade apenas deu os ombros, como se não fosse tão ruim falar de sua vida para mim.
- Como eu disse, não foi nada demais. Eu cresci em um lugar bom, o pai de era um cara honesto e bom, nos ensinou vários valores importantes. – então ele deu uma risada. – Que aparentemente serviram mais pro do que para mim...
- Você e , quem diria... – tentei manter esse clima e funcionou, pois Slade se manteve rindo.
- Pode não parecer, mas eu e tivemos muitas coisas em comum... Servimos juntos e ele não era tão molenga como agora.
- Qual é, – ri. – o no mesmo nível de Slade? Eu deveria ficar preocupada por minha irmã estar com uma versão menos musculosa de um sociopata? – brinquei.
- Claro que não no mesmo nível. – rolou os olhos. – Eu sou melhor que ele em muitos aspectos. – olhou safado pra mim e gargalhei. – O Xerife tem sua vantagem, a sanidade dele pode dar umas rachadas, mas jamais quebraria totalmente. É impressionante como depois de tantas coisas que passamos até mesmo antes disso tudo aqui, ele não perdeu os mesmos valores que tinha quando éramos mais jovens, ele apenas os modificou para essa nova realidade.
Ainda era um grande enigma descobrir o que aconteceu entre os dois e o porquê havia tanta mágoa e ressentimento. Minha irmã já havia deixado claro que em seu entendimento odiava , mesmo que tivessem que trabalhar juntos. Mas, segundo ela, se odiava mais por ter deixado as coisas chegarem ao ponto que chegaram. Mas que ponto?
Não era surpresa que houve uma terceira pessoa entre eles, a que fez Slade perder o resto de sanidade que o sobrara e feito com que perdesse a sua também, mas será que havia algo mais por trás disso? Algo que ligue os três para sempre e que impossibilite o fim disso?
Era algo que só os dois poderiam dizer, mas eu não queria – tanto assim – saber sobre. Slade já havia se provado uma pessoa diferente do que aparentava ser e também acredito que nada que aconteceu no passado possa mudar efetivamente como o via. E se essa história o machucava, não insistiria.
Mas claro que eu e adorávamos ser espectadoras desse enredo, ainda mais com cada nova revelação que saía. Fazer o que, era da nossa natureza.
Slade respirou fundo.
- Se eu pudesse eu trancaria você junto com o Jacob nessa casinha apenas para mantê-la em segurança. – disse, transbordando honestidade e eu sorri um pouco boba. – É sério.
- Aprecio sua preocupação, mas passo. – dei os ombros. – Acho que estou pronta para o que possa vir a acontecer.
- Mas eu não! – se exaltou. – Esse pirralho é maluco, completamente desequilibrado. – Isso vindo de Slade significa muito, pessoal. – Eu estaria disposto a levar uma facada por você, mas não aceitaria você levando uma por mim... nem fodendo.
- Relaxa. – segurei em sua mão. – Ninguém vai levar facada por ninguém, ok? Vai dar tudo certo. A Colônia tem um plano e nós também temos. – apertei sua mão. – Sejamos sinceros, só unidos conseguiremos passar por isso.
- Eu sei – se rendeu. – Ter você lutando ao meu lado é o mais provável de uma vitória. E também é o que eu quero.
- Não tem o que se preocupar, é impossível o Zeus sair vivo disso. – ri. – Desde que ele apareceu eu fui atacada algumas vezes, acabei marcada e o sem uma mão. A se ficar sozinha com ele é capaz de espancá-lo até a morte, literalmente. – E não era brincadeira. Minha irmã tinha mais de cem formas de matar o Zeus, todas as formas ele sofreria lentamente e dolorosamente. – Então acredite, isso vai acabar logo e tudo ficará bem.
Slade soltou a minha mão apenas para esfregar as duas em seu rosto, suspirando alto e murmurando algo.
- Só quero que essa merda acabe logo pra que tudo volte aos conformes e eu possa tirar o moleque dessa casa. Ninguém merece ficar trancafiado, muito menos uma criança.
Isso foi um soco em meu estômago. A forma que ele claramente se importava com Jacob me abriu a cabeça e me fez repensar algumas coisas. Coisas importantes.
- Já tá com saudades dele, é? – debochei.
riu.
- Ele nem é tão irritante assim, pra falar a verdade. Quem sabe depois que tudo isso acabar eu possa ensinar umas coisas pra ele. O garoto é esperto, pode se dar muito bem, até mais que eu. – sorriu. – Dá pra nós fazermos uma porção de coisas juntos, se ele falar menos, claro.
Fitei seus olhos e eles continham um brilho diferente. Pela primeira vez havia o visto e era como se Slade quisesse realmente ensinar suas coisas para Jacob. Ensinar as coisas que um dia seu pai ou até o pai de havia o ensinado. Os mesmos valores que embora não respeitasse todos, sabia quais eram e estava pronto para repassar para uma criancinha que ele pudesse considerar como um filho.
E mais uma vez isso fora um soco em meu estômago, mas um bem mais diferente. Eu sentia que isso abriria uma porta e afastaria um medo que eu sentia em relação às novas coisas que aconteciam conosco. Eram muitas delas ao mesmo tempo e eu queria tirá-las de minhas costas um pouco.
Não seria tão ruim se soubesse o que estava acontecendo afinal de contas.
- ... – segurei em suas mãos, fitando profundamente seus olhos que ainda mantinham o brilho, para que ele recebesse minhas próximas palavras com profunda sinceridade que eu as diria. – Eu... eu...
- Sim? – e os brilhos se destacaram mais ainda, como se ele tivesse uma lista de frases que eu diria naquele momento e ele estava completamente receptivo para ouvi-las.
Mas então pensei no que estava por vir e fraquejei, hesitando em contá-lo. Porque sabia que no momento que dissesse as palavras, sua postura mudaria e sua atitude também. E isso nos enfraqueceria e poderia custar nossas vidas.
- Nada... nada não. – sorri falsamente, tentando fazer com que aquilo não fosse tão importante. Suspirei me aproximando dele e coloquei minhas mãos em seu pescoço, o puxando para um beijo leve e gostoso. Suas mãos estavam na minha cintura e ao fim do beijo ficamos em silencio nos abraçando. – O Jacob vai rir de sua cara quando souber que você está completamente derretido por ele. – mudei o foco.
Slade rolou os olhos e eu ri.
Era essa imagem que eu queria guardar nesse momento. Um Slade descontraído, esperançoso para um futuro que estava para acontecer assim que vencêssemos a guerra que estava por vir. E assim que Zeus fosse derrubado, eu estarei pronta para dizer o que Slade precisava ouvir, mas não antes.
Por que? Porque eu não queria correr o risco de perder essa guerra, de perder o que conquistamos e principalmente, o perder. Mantê-lo no escuro seria o mais seguro para todos nós.
E mesmo assim ele tinha os pensamentos dele, as ideias e as teorias do que eu estava prestes a contar, mas recuei. Isso manteria o brilho em seu olhar e o coração cheio de esperanças, era assim que eu queria deixá-lo por mais um tempo. Assim ele teria algo para lutar por e para voltar.
Slade estava feliz com o que tinha e com o que poderia ter.
E eu estava pronta para dá-lo.
O pacote completo.


Capítulo 30 – Reptilia.

Música do Capítulo


Romero.

O confronto final estava mais próximo que nunca. Não só eu, como todos nós podíamos sentir chegando. Mas não estávamos prontos. Talvez de certa forma jamais estaríamos.
Acima de todos, havia uma mais preocupada. Uma que não estava pronta pra isso. Não depois de tantas coisas boas que aconteceram depois dessa bagunça que estava vivendo. Coisas boas que uma guerra dessas iria destruir.
E com essa guerra próxima todos haviam mudado, cada um resistia a tudo isso de uma forma diferente.
Frid vivia com sua bíblia, orando por proteção. Barbie estava apática, assustada e preocupada com cada ser vivo dentro da Colônia. Até Toby em um ato de proteção – e depois da surra que recebeu – se redimiu. Todos os moradores estavam com sangue nos olhos, se iludindo que sobreviveríamos isso se ficássemos todos unidos. estava pilhado, mas era o único que não estava com medo. Sua confiança estava reestabelecida e sabia que com Slade ao seu lado, nenhum dos dois cairia sem derrubar Zeus juntos.
E eu? Bom, eu estava louca.
Não dormia direito e qualquer barulho, por mais idiota que fosse me assustava. Não saia do ponto de observação. Eu ficava horas esperando para ver se tinha algum sinal dos soldados do Hospital, qualquer coisa fora do comum para assim alertar todos.
O vento me tocava e mesmo assim não me trazia claridade. Eu tinha aquela sensação de que poderia ser a última vez que estaríamos todos aqui, todos vivos. A última vez que veria minha irmã, o grupo do QG que havia se tornado uma parte de mim também e até mesmo Slade. Poderia ser a última vez de muitas coisas. E eu não queria.
Meu orgulho me impedia de aceitar cair por Zeus.
- ? – Frid me chamou, ficando ao meu lado no posto. Ele não se importava com a vigia, ele só se importava comigo.
- Eu sei o que você tá pensando, só não quero ouvir – ralhei e o senhor nem se abalou.
- Você não pode deixar isso te corroer, . É só um dos muitos que vamos enfrentar pela frente. Não deixa a vingança te mudar.
- E que mal há nisso? – me virei para o senhor. – É essa sensação que faz querer seguir em frente, me faz querer lutar e vencer. Qual é o problema de querer vingança?
- Muitos problemas – segurou a minha mão e encarou bem fundo em meus olhos. – Principalmente quando se está disposta a morrer por isso. E você não pode morrer, .
- E não vou – dei uma sombra de sorriso, que fez o senhor desconfiar.
- Você tá planejando algo? – dei os ombros.
- Todos têm planos, Frid. E o meu envolve a morte de Zeus e não a minha.
Depois de minha conversa com a sensação de estar disposta a morrer para destruir Zeus havia sido descartada, porque me fez pensar. Me fez pensar na tristeza que minha morte traria para todos que se importam comigo.
Seria egoísmo de minha parte trazer uma vitória para eles se envolvesse uma outra derrota. Se um de nós morrêssemos nessa guerra, ainda sim seria uma derrota. Por isso eu me coloquei a frente de tudo isso e me preservei. Mesmo que minha sanidade estivesse para dar pau, eu me manteria viva.
Eu tinha muito o que perder morta.
Desci do posto de observação, caminhando pelo pátio vazio, como sempre estava. Os moradores passavam a maioria de seus dias ou do lado de trás da Colônia treinando, ou passavam em suas casas com seus familiares e pessoas importantes. Era uma forma de manter a normalidade mesmo que todos estivessem pilhados demais.
Avistei Willa, a garota estava com Jolie, ambas sentadas na escadaria da Grande Casa, brincando de alguma coisa que fazia a bebê gargalhar. Ambas leves e aquilo aqueceu minha alma. Era bom apreciar pequenos momentos como esse. Era o que tirava minha cabeça do medo.
Ao me ver, Willa abriu um sorriso e eu me sentei ao seu lado.
O primeiro instinto de Jolie a me ver foi choramingar e querer vir para o meu colo. A mais velha passou a bebê para mim e a segurei delicadamente em meu colo. Não era algo que estava acostumada, ter uma criança realmente me vendo como uma figura materna. Teria até medo quando crescesse.
Mas eu amaria ser mãe de Jolie. Mesmo não sendo.
- Você tá preocupada com um ataque? – Willa me perguntou e eu não precisei responder, porque ela já havia captado a resposta. – Eu não estou.
- E por que não?
- Porque você vai estar lutando, oras.
Eu ri e Jolie me acompanhou, achando graça de nada. E eu apertei com carinho, porque sua fofura me acalmara.
- Eu não sou Deus, Willa.
- Ah, mas é quase isso – deu os ombros. – Aposto que você pode derrubar muitos dele sem nem mesmo receber um arranhão.
Admirava a forma que Willa me via. Um dia me viu assim, quando eu era apenas a irmã mais velha legal e destemida, a modelo que queria seguir. Até que então passou de mim e se tornou tudo que eu era e até mais. Cedo ou tarde Willa seguiria os passos de minha irmã e seria bem maior, mais corajosa e forte que eu. E Jolie seria mais forte que nós duas. E por aí vai...
Talvez fosse um tipo de legado, seguindo de geração em geração. As Romero – as de sangue ou de coração – sempre ficam mais fortes, destemidas e maiores que a da sua geração anterior.
Como fui mais forte que a minha mãe e foi mais forte que eu.
- Me promete uma coisa? – pedi.
- O quê?
- Se ouvir algo, qualquer sombra de Zeus ou qualquer soldado do Hospital, se esconda. Leve Barbie e Jolie com você. Se escondam em qualquer lugar e que impeça que te encontrem.
- Mas , eu quero... – choramingou, mas nem deixei continuar.
- Essa luta não é sua Willa. E não é da Jolie. Alguém precisa tomar conta dela e alguém precisa tomar conta de você. E não é uma discussão, prometendo ou não você fará.
- Você vai voltar, né? – Willa perguntou e eu respirei fundo, repetindo mentalmente todo o discurso que tive que ouvir de Slade.
Olhei para Jolie com seus olhinhos brilhantes e sorrisinho nos lábios, mesmo sem entender porra alguma do que estava acontecendo, permanecia feliz e tentando tirar toda a aflição de dentro de mim. Acariciando – ou tentando – meu rosto com suas mãozinhas, dando uma risada gostosa toda vez que eu a apertava.
Me virei para a mais velha, segurando em sua mão.
- Claro que vou. Eu sou Romero, né? Não sou Deus, mas sou quase isso. E consigo derrubar muitos deles sem receber um arranhão – sorri e Willa me abraçou de lado. Jolie resmungou de ciúmes e me abraçou mais forte. Nós três rimos.
Meu objetivo era manter as duas seguras enquanto agia. E depois quando eu voltasse, daria tudo que tivesse para manter as coisas dessa forma que eu já estava me acostumando. Da forma mais cuidada, amada e normal possível.
Elas mereciam isso.
Todas nós merecíamos. E teríamos, assim que isso tudo acabasse.
E eu sentia o fim se aproximando, mas não tinha mais tanto medo de perder. Perder era para os fracos e eu não era um deles.

***

- Você tem certeza disso, ? – estava de braços cruzados com a cara fechada e nem um pouco contente. Sua voz ficava mais grossa e seu sotaque mais sobressaído quando ficava irritado.
Já era de praxe Grimes ficar dessa forma sempre que eu apresentava alguma ideia ou plano que não fosse muito como ele queria. Eu já estava acostumada com suas negações, havia até aprendido a gostar disso. Era bom ter alguém que se importava incondicionalmente comigo além de minha irmã.
Mas dessa vez sua irritação tinha um certo motivo. Eu só não me importava. E nem toda raiva possível me faria mudar de ideia. Já tinha feito minha cabeça.
- Certeza? Não. Mas farei mesmo assim – virei o copo de uísque goela a baixo e mesmo com a ardência, era gostoso.
- Não vou deixar você fazer isso.
- Você sabe que não tem opção. E nem será eu que provocará isso. Só assim vamos conseguir destruí-los.
bufou.
- Que merda, – resmungou. – Você fala de uma forma tão natural, como se tudo isso valesse o preço para destruí-los. Mas não vale! – bateu a mão na sua mesa. Poucas vezes havia visto dessa forma, ele estava desesperado com tudo isso e preocupado mais do que o normal – Pra mim nunca vai valer chegar a imaginar uma realidade em que não estamos juntos. Eu, você, Max, Jolie e todo o resto da nossa conturbada, problemática, fodida família – sorri boba. – Para com isso, eu tô falando sério.
Rolei os olhos.
- Me deixa me preocupar com você, temer o pior e evitar a todo custo que isso aconteça – veio até mim, com seus olhos transbordando tantos sentimentos que me deixavam com um frio no estômago. – Da mesma forma que você se preocupa comigo, tenta evitar o pior e me manter seguro ao seu lado – acariciou minha bochecha e fitou fundo meus olhos. – Eu não quero... eu não posso te perder .
Sorri boba mais uma vez.
- E você não vai, Xerife – retribuí o carinho, acariciando seu rosto. – Sabe o que irá acontecer? Nós vamos lutar, nós vamos perder pessoas de qualquer forma, mas não vamos nos perder. Vamos vencer e nos encontraremos todos no GQ, para brindar e comemorar nossa vitória. Todos nós – apertei sua mão. – E depois disso, voltaremos pra cá e traremos a comemoração conosco, então, tudo vai voltar ao normal. Minha irmã e o Slade ficarão no QG com o grupo deles, nós ficaremos aqui com o nosso grupo. Acabará essa merda de briga por poder entre você e o , nós nos uniremos e a paz reinará. E ficaremos assim todos juntos.
riu baixo.
- É meio impossível termos paz e ficarmos juntos com o , vai por mim – o acompanhei rindo. – Você me promete que não vai à lugar algum? Que no fim ficaremos juntos, de verdade?
Assenti.
- Eu prometo – sorri e deitou sua cabeça em meu ombro e me abraçou, respirei fundo, abraçando o seu corpo e sentindo todo seu calor, afeto e proteção. Dei um beijo carinhoso no topo de sua cabeça e permaneci aproveitando daquele carinho gostoso.
Eu entendia o porquê isso tudo era tão importante para o , até mais que para mim. Afinal, ele perdeu alguém que amava, alguém que era importante para ele de verdade e isso era irreparável.
Frid havia me contado que e sua esposa, Mariah, já não estavam bem desde que tudo isso começou, mas mesmo assim o homem se esforçava para mantê-la em segurança, ele basicamente se doava para que ela jamais sofresse um aranhão, mesmo antes da gravidez. E mesmo assim ele não recebia nada em troca, ele vivia um vazio por saber que Mariah já não o amava mais da mesma forma.
se tornou frio com tudo isso, vazio. Isso havia fodido ele de verdade. E quando Mariah se tocou que tudo que fazia era genuinamente para protegê-la, porque mesmo tendo se fechado completamente, ele ainda a amava, já era tarde demais.
E depois veio a perda, o luto, a culpa. O nunca mais fora o mesmo e eu não digo que tenha sido minha presença que mudou tudo, mas sim as circunstâncias. Muitas coisas aconteceram desde que cheguei à Colônia. Coisas que me mudaram também de fato.
No começo achava exagerada a forma que se preocupava comigo, a forma que ele queria me proteger e evitar que qualquer coisa ruim acontecesse comigo, porque era sua forma de amar. Ele tinha medo, mesmo que não demonstrasse, ele tinha pavor de mais uma perda importante. E por saber que dessa vez os sentimentos eram recíprocos, que ele não estava mais vazio, uma perda seria devastadora.
Da mesma forma que perder seria o meu fim também. Senti o gosto de quase perdê-lo e tudo havia mudado em minha cabeça desde então. Nós estávamos no mesmo barco e assim permaneceríamos.
murmurou algo enquanto bebia mais, me tirando o transe. O encarei e ele estava passando a mão pelo rosto, respirando fundo.
- Quando isso acabar... eu juro que não quero mais ser o líder – riu. – É tão difícil e cansativo. Quando éramos poucos, eu dava conta, eu era foda nisso. Agora... é muito pra mim. Sinto falta de ficar lá fora, da ação, do instinto de sobrevivente. Quero isso de volta.
Eu ri.
- Quem sabe depois que tudo isso acabar, nós possamos retomar as raízes. Sair um pouco daqui e lembrar como é atrás dos muros. Porque acredite, se sobrevivermos ao Zeus, sobreviveremos a qualquer coisa.
acompanhou minha risada.
- Então vamos sobreviver primeiro – levantou o copo. – Por boa sorte e a morte do filho da puta do Zeus – e brindamos.
E então o temido aconteceu.
Um barulho alto nos chamou a atenção e literalmente corremos para o lado de fora, em um pânico. Quando chegamos ao lado de fora, meu coração bateu mais forte e eu senti todo o ar faltar. Eram eles. Eles estavam arrombando o portão.
Os vários caminhões que entraram no pátio da Colônia assustaram todos os moradores, que correram para dentro de suas casas em tremendo pânico. Procurei desesperada por Willa, rezando mentalmente para que tenha feito o que pedi.
E que tenha feito direito.
- Filho da puta – esbravejou, descendo a escadaria e indo atrás de Zeus que no mesmo instante desceu do caminhão em que veio com um sorriso no rosto. Tão perto...
E tão cheio de guardas...
- Que merda é essa, pirralho? – continuou puto, indo em direção ao rapaz que só se virou sem muita importância.
- Alô, alô. Só vim dar o prazer de dizer nessa sua carinha bonita que o acordo está oficialmente cancelado – ele bateu palmas, como se comemorasse tal feito. – E agora posso foder com vocês.
- Você é doente.
- Seu grupo é o mais fraco Xerife, posso utilizar vocês para outros fins que beneficiam bem mais que esse acordo inútil.
- Que acordo? Espero que seja o que você cai fora da minha propriedade, porra. Antes que eu te encha de balas, moleque – sorriu e Zeus gargalhou. O pirralho era muito cara de pau.
- Nossa, Xerife. Você agora falou igual a um caipira de verdade – gargalhou. – Mas não. O acordo é o seguinte: eu quero todas as mulheres, mas só as bonitas, jovens e gostosas. Nada dessas barangas, velhas e abertas que vocês têm por aqui. Meus rapazes e eu só comemos carne de primeira linha, se é que você me entende – sorriu podre e mesmo de longe pude perceber atingir um novo nível de ódio. – Principalmente a loirinha ali – apontou pra mim. – Essa aí eu comeria até me lambuzar... – e então socou Zeus.
E tudo ficou silencioso. Sim, todos nós estávamos chocados.
- Se falar isso de novo, prometo que corto sua língua. Moleque – Os soldados de Zeus apontaram as armas para , mas o rapaz apenas gesticulou mandando-os abaixar.
- Você não tem o direito de falar assim comigo, caipira de merda! – Zeus disse com raiva e a boca ensanguentada. Sua voz havia ficado fina e ele estava mais vermelho que um pimentão. Eu via uma criança dando piti em minha frente – Tragam todas essas vadias imundas agora e vou pensar muito bem se elas vão servir de depósito de porra ou vou fazer uma carnificina só pelo meu bel prazer – se virou saindo, mas parou dando mais ordens para seus soldados. Era inútil fazer qualquer movimento porque eles estavam em um número escandalosamente maior que o nosso. A raiva por ele falar dessa maneira asquerosa e poder falar porque ninguém poderia fazer nada contra isso, era maior que tudo. – Continuando... e as armas. Ou todos vocês podem ir se foder antes de reproduzir qualquer merda de treinamento que tentaram nos últimos dias. Inútil, sabe?
- Nunca – se opôs e Zeus não mudou a expressão sorridente.
- Acho que você ainda não entendeu como as coisas acontecem aqui, . Você já está velho demais pra proteger qualquer um – sorriu e então o Xerife tirou a arma do coldre e apontou para a testa de Zeus, que nem tremeu.
- Soube que você perdeu a mão por causa daquela vagabunda – sorriu psicopata e foi ficando mais puto ainda. – Vou ter que provar por mim mesmo se vale tanto a pena assim, já que essa arminha não é capaz de me deter.
- O que você quer? – perguntou impaciente.
- Bom, as mulheres e as armas. A não ser que você queira um acordo nosso, eu e você – sorriu.
- Que tipo de acordo?
- Todos nós sabemos que se você ainda tá aqui é porque quem tá protegendo é o Slade, então vamos fazer um acordo. Você me ajuda a matar todos lá e eu aumento o prazo pra vocês caírem fora. Que tal?
- Nah.
Zeus deu os ombros.
- Então plano B – o rapaz fez um assobio e os seus soldados pegaram Frid. E pior ainda, pegando Max.
Os soldados botaram os dois ajoelhados e apontando suas armas na cabeça dos dois, como uma nojenta execução. E meu coração bateu forte aterrorizado, com medo do que viria a seguir, porque eu sabia o que viria a seguir. Minhas pernas estavam travadas e por mais que eu tentasse reagir, eu estava na minha forma mais vulnerável possível.
O pior de tudo, era que Zeus seria capaz de matar todos e me manter viva, apenas para virar sua bonequinha no Hospital. E era disso que queria fugir, mas não tinha forças o suficiente para correr.
- Então, Xerife. Escolhe quem morre – apontou para os dois. – O velhote ou o pirralho? – sorriu.
- Você – permaneceu com a arma apontada para a cabeça de Zeus.
- Resposta errada.
E então tudo aconteceu muito rápido.
Zeus arrancou sua própria arma de seu coldre e atirou em Frid sem nenhuma piedade. O tiro atingiu o abdômen do senhor que apenas caiu no chão já inconsciente.
O grito que saiu de minha garganta foi involuntário, mas transmitia o tamanho choque que aquilo me trouxe. Não era apenas eu que havia sentido uma parte do peito se rasgar com aquele tiro. Sua filha Bailey caiu de joelhos, chorando desolada.
E nem tremeu. Aquilo por mais que tivesse o deixado em estado de choque, completamente desolado e desesperado, o deu mais raiva ainda. Mais ódio para matar Zeus.
Só que se matasse Zeus agora, todos nós morreríamos. E eu havia prometido para um monte de pessoas que não morreria.
Um massacre não compensaria a vitória. Do que adiantaria vencer se todos nós morreríamos? A morte de Zeus obviamente ativaria um tiro de plano B que no final causaria a nossa morte a do pessoal do QG.
E apenas de imaginar tanto sangue. Imaginar Willa, Jolie, Max, , Frid e Barbie mortos aqui e , Jacob, Baby e Teddy mortos no QG me destruíam.
Não pagaria esse custo para matar Zeus. Ele morreria, mas apenas e unicamente ele.
- Você vai ter que ser melhor que isso, moleque – a arma permanecia firme apontada na testa de Zeus que sorria mais ainda quando o desafiava.
- Posso matar todos aqui e mesmo assim você não vai me matar, Xerife. Aceita logo. E se fizer isso, o velhote ainda vai ter uma chance de viver. Você é tão estúpido assim? Arriscar a vida de todos aqui por uma mulher?
- E arriscaria muito mais ainda – quando destravou a arma e Zeus fechou os olhos, não pude deixar. Meu cérebro gritou com minhas pernas e eu corri para , abraçando-o por trás, puxando-o para longe de Zeus.
- A selvagem é prendada afinal de contas – cuspiu. – Vão atrás das armas. E eu quero todas as mulheres em fila. E você loira pode se sentar no meu colo.
Ignorei tudo que falava. Minha cabeça não estava mais nele e sim em que estava prestes a surtar. Eu podia sentir em seu corpo que estava no limite, aterrorizado, em pânico, mas ele não daria o gostinho para Zeus, mesmo que custasse sua vida.
Consegui convencer a abaixar a arma e o virei para mim. Seus olhos estavam perdidos igual quando o impedi de fugir na tempestade. Nas duas vezes havia o impedido de fazer merda.
E igual naquela noite, estava disposto a morrer e eu sabia o porquê. Ver Zeus depois do que lhe aconteceu, mesmo com toda a confiança do mundo não havia nada que o impediria de se sentir pequeno nessas situações. E Zeus sabia como mexer com o psicológico de qualquer pessoa, principalmente uma que havia ferido tão covardemente.
- Vai ficar tudo bem, ok? – acariciei o seu rosto, enquanto ele fechava os olhos tentando se focar em mim e esquecer o ódio que o cegou nas duas vezes. – Vai ser exatamente igual o plano, amor. Você vai ver.
- Eu odeio tanto quando você faz isso – levou a mão ao rosto, resmungando enquanto se acalmava.
deitou a cabeça em meu ombro novamente e eu acariciei seus cabelos carinhosamente, tentando me focar e não desabar. O fato era que eu estava morrendo de medo, com medo de não ser forte o bastante para dar um fim nisso. Só que eu faria.
Eu daria um fim.
- Confia em mim. De hoje Zeus não passa.
levantou a cabeça e acariciou meu rosto, dando um breve beijo em minha testa. Então saiu de minha frente, indo ajudar a levar Frid para a enfermaria.
As mulheres já estavam em fila, mas Zeus não levaria todas. Ele só separou as “melhores” para os fins que eu não o deixaria realizar. Paige, Lola, Bailey, Brianna e várias outras moradoras, as mais jovens. E o mais nojento era que algumas nem tinham mais de dezoito anos.
Os soldados de Zeus saíam com todas as armas do depósito, levando-as junto com as mulheres para os caminhões. Muitas choravam, gritavam, imploravam e os soldados as puxavam, batiam se fosse necessário para calá-las.
Isso me deixava com mais ódio ainda. O tipo de raiva que se acumulava dentro de mim e ativava o pior que existia dentro de Romero. Cada cena, cada grito, cada lágrima, tudo estava guardado em minha memória e eu faria Zeus pagar.
Sangue por sangue.
- Vamos – Zeus disse autoritário me puxando pelo braço. – Obrigado pelo presente, Xerife. Farei questão de aproveitar cada pedacinho – me virei para que não esboçava nenhuma reação e seu olhar disse tudo.
Zeus me puxou para o lado de fora da Colônia, me colocando a força no banco ao seu lado no caminhão. Se sentando logo em seguida, ao meu lado.
Colocou a mão em minha coxa, em cima demais, apertando com força e tinha um pequeno sorriso na sua boca fina que me deu ânsia.
- Vamos nos divertir muito, loirinha. Só eu e você – chegou perto do meu rosto e roçando seu nariz em minha bochecha. Ele era magricelo demais e não sabia como tocar uma pessoa direito. – E se tentar fazer qualquer coisa contra mim, eu farei questão de te dividir com cada um dos meus soldados. E assim, você não vai conseguir nem andar. E quando estiver agoniando de dor, eu apenas sorrirei e te direi: você mereceu, por ser uma vadia. Porque é isso que todas mulheres são – acariciou meus cabelos e eu sentia minha garganta fechar. – Mas você é diferente loirinha, você é especial. Você tem um fogo e vai me ser muito útil. E assim que eu botar minhas mãos na sonsa da sua irmã, eu terei as duas ao mesmo tempo e prometo que darei o que vocês mais gostam... Porque só o papai consegue apagar seu fogo.
Zeus desgrudou de mim e se virou para frente, com uma mão segurando o volante e a outra em minha coxa. Então começou a dirigir.
Mantive meus olhos focados na estrada, minha cabeça completamente quente e repassando todo o plano. Todo o sangue que eu derramaria antes que ele pensasse em tocar em ou em qualquer uma das mulheres novamente.
Era o fim de Zeus. Ele só não sabia ainda.
Zeus havia mexido com a pior vadia de todas. E eu o faria se arrepender de cada palavra suja que me disse. Uma por uma.
Agora mais que nunca eu sabia que venceríamos.

***

Willa.

Ao ouvir o portão se arrombando, Barbie me puxou pelo braço para dentro da entrada de trás da Grande Casa, me levando escadaria a baixo para o porão secreto na casa. Pela história que me disse no caminho, haviam criado esse porão secreto para caso de ataques como esse. Assim as crianças ficariam protegidas.
No porão haviam algumas mães e crianças escondidas. Principalmente garotas.
Todas nós sabíamos da história de que o Hospital pegava as mulheres mais jovens e saudáveis para usá-las como escravas sexuais ou fins reprodutivos, depois as matavam.
Nenhuma de nós queria morrer assim.
Jolie estava junto de umas mães e chorou para vir em meu colo. A peguei, segurando-a forte contra mim e cumprindo o que prometi à : eu a protegeria com toda a minha vida.
A garotinha não parava de choramingar e eu sabia que estava com medo, eu também estava.
- Calma, Jolie, vai ficar tudo bem – pedi, aninhando-a. Tentando acalmá-la, mas não estava funcionando.
- Nós estamos mortas já – uma das moradoras chorou e a outra a abraçou.
- Não estamos! Estamos protegidas aqui, ninguém nos ferirá – Barbie se posicionou e permaneceu perto da saída, se certificando que ninguém desceria ou encontraria a entrada. – não deixará que nada nos aconteça e se acontecer algo, não será aqui. Só somos iscas.
- Vamos orar – uma das mães pediu e o resto se juntou. E eu também.
Rezei para que isso acabasse logo e eles fossem embora, que estivesse bem e Max também. E até , eu gostava dele. Queria que todos estivessem bem e pudéssemos ficar bem. Que o Hospital não nos queira, só queira nos assustar. E que ninguém se feriria.
Mas pedi tarde demais.
O som de tiro conseguiu ecoar até onde estávamos, assustando Jolie e as outras crianças que choraram. Tentamos calá-las de todas as formas, agora sim aterrorizadas que isso atraísse atenção.
- Ei, Jolie! – chamei – Não chore. Você é uma garotinha forte e vai ficar tudo bem, mas você não pode chorar. Sem. Chorar! – a garotinha permaneceu com os olhinhos cheios de lágrimas, mas não chorou mais, apertou a boquinha e ficou quietinha, me abraçando.
Jolie era inteligente e por mais que vivesse em uma realidade completamente diferente, ela entendia as coisas. Ela entendia quando falávamos com ela. E ela era forte, muito forte.
Com o tempo tudo se silenciou e ouvimos carros partindo. Aquilo foi a luz no fim do nosso túnel e a esperança de que tivesse acabado.
- Vamos? – uma das moradoras suplicou e Barbie assentiu, abrindo a saída e tirando uma de cada vez, mas conferindo antes para ver se a barra estava limpa.
E quando eu saí, percebi que estava limpa e muito quieta por sinal. Não dava pra ouvir nada e meus pés correram para fora da casa, querendo ver o que aconteceu lá fora.
O pátio estava vazio, apenas com um pequeno rastro de sangue que levava até a enfermaria. Meu coração bateu forte e corri, seguindo a trilha de sangue. Mas Toby não me deixou entrar.
- Gatinha, fique quieta aqui – ordenou e eu dei a língua. – Sério você não quer ir lá dentro, tá uma bagunça.
- É a ? – sentia a minha garganta fechar e o medo me preencher. Não queria perdê-la. Eu não podia perdê-la!
- Não – me aliviei. – Ela foi com Zeus.
Senti meu corpo tremer e ficar fraca, mas Toby me segurou, não me deixando desabar no chão com Jolie em meu colo. Nós duas sentimos o impacto de saber que agora estava nas mãos daquele psicopata. E choramos, mesmo devemos ficar em silêncio.
A bebê me abraçou e eu a abracei em meu colo.
- Vai ficar tudo bem Jolie... Ela é a , certo? É a .
Tentei trazer a maior força possível para que tudo desse certo, torcer era a melhor coisa que podíamos fazer agora. Se eu saísse lá fora morreria e se morresse não adiantaria nada.
Cuidaria de Jolie e acreditaria em .
Ela nunca me desapontou e não iria começar agora.

***

Grimes.

Estava coberto de sangue, tentando conter o sangramento de Frid, mas era impossível fazer isso sem Bailey, sem Barbie, sem o próprio Frid e sem uma mão.
Saí da enfermaria, vendo Barbie parada por perto e aquilo me aliviou. Ao ver minha situação, ela veio desesperada querer saber o que aconteceu e com medo de ser algo pior do que pudesse fazer.
- O que houve?
- Frid, um tiro na área do abdômen. É feio e eu não posso fazer nada. Eles levaram Bailey – respirei fundo, tentando me controlar e Barbie tocou meus ombros, me dando forças.
- Eu cuido dele. Não era uma veterinária boa como ele e nem tinha um pouco de curso de medicina que Bailey tinha, mas consigo cuidar desse ferimento. E você tem que ir atrás de , agora.
- Eu sei.
- O avise do que está acontecendo . Agora é guerra. E eles vão vir com tudo. Temos que estar preparados.
Assenti.
- Tome conta de tudo aqui, ok? E salve Frid. Eu chamarei reforços e irei atrás de , trarei de volta e tudo vai dar certo.
- O que ela estava planejando, ? – Barbie me perguntou receosa e era difícil pra mim dizer. Fiz tudo que pude para impedir que o plano dela desse certo, acabei arriscando a vida de Frid no processo e agora ela estava nas mãos de Zeus.
Exatamente como queria.
- Loucura, Barbie. Suicídio – passei a minha mão em meu rosto, limpando minhas gotas de suor. – Nem sei como vou contar pra isso.
- Você descobre no caminho – me empurrou mais pra frente. – Agora vai! Tenho um paciente pra cuidar. – Se virou e entrou na enfermaria. Essa era a minha deixa.
Desci para o pátio e fui direto ao portão quebrado, mas Max me alcançou no caminho.
- Pai, eu vou com você!
- Nem pensar. Não tenho tempo pra isso Max, você precisa ficar cuidando das coisas por aqui – toquei o ombro de meu filho, o encarando no fundo dos seus olhos tão iguais aos meus. – Você agora está no comando de tudo aqui. Cuide de sua irmã até que eu volte com . E se alguém vir atacar, mate-os, sem dó. É guerra agora, meu filho.
Max assentiu, se posicionando e deu as costas. Indo atrás de arrumar as coisas para caso acontecesse enquanto eu estivesse fora.
Me virei para Judas, o puxando para repassar sua parte do plano.
- Tô indo ao Quartel. Lidere um grupo até a floresta e tente ter pistas de onde o grupo de foi levado, fique de olho em tudo lá. E depois volte para o Quartel, precisaremos de vocês lá.
- E a ?
- Ela não precisou de ajuda pra entrar, com certeza não vai precisar de ajuda pra sair.
Saí da Colônia e fui direto para o meu carro.
Deixar a ser pega foi a parte mais difícil, porque eu precisei confiar nela cegamente e confiar em suas certezas. Confiar em seu plano maluco e que poderia trazer riscos absurdos. Mas a parte mais difícil agora seria contar para a outra Romero sem botar sua vida em risco.
A guerra estava vindo. E que Deus nos proteja.

***

Cheguei no Quartel e entrei direto, indo direto à Slade, que por um milagre não estava no seu escritório. Estava cuidando das armas e se armando. Era como se também sentisse o que estava por vir, então já estava se preparando.
- ... – o chamei e ao me ver, ele já entendeu o que vim fazer lá. – Aconteceu, cara. Tá acontecendo.
- Eles chegaram? – soltou as armas e se levantou, vindo até mim.
- Pegaram todas as mulheres que estavam na Colônia e também munição.
- Então ela conseguiu... – murmurou.
- O que aconteceu? – a voz de acabou me assustando por dentro, porque agora eu teria que contar pra ela. – Quem conseguiu o quê? – seu tom levantou um pouco querendo uma resposta.
- ...
- Para de balbuciar, fala logo o que aconteceu – ainda não estava brava, mas mantinha esse tom autoritário e deu um passo pra trás.
- Zeus foi na Colônia e atirou no Frid, levou as armas e mulheres... Bom. Foi uma merda.
- Atirou no Frid? Ele vai ficar bem? – sua ficha não havia caído ainda e sua preocupação momentânea com Frid me dava alguns instantes. – Tá, e a ? Cadê a minha irmã? Foi ela que realmente conseguiu? Conseguiu o quê?
- Entrar no Hospital – Slade disse ao seco e suspirou massageando as têmporas.
E eu esperei aquela explosão, o ataque, palavras de raiva contra mim e alguns tapas... Que nunca veio. Ela continuou parada e pensando em algo e fiquei um pouco nervoso tentando achar outras palavras pra acrescentar em tudo aquilo.
- Eu fui totalmente contra isso .
- E essa merda foi ideia de quem então? Do ? – disse finalmente arqueando uma sobrancelha. Slade apenas deu mais um passo pra trás.
- Nem vem... – covarde. - Foi da sua própria irmã maluca. E na verdade era até uma boa ideia – disse e os olhos da garota se encheram de chamas. Ela poderia o matar agorinha.
- Que diabos... eu estava esperando isso de você porque só precisa sacudir os cílios e os peitos pra cima de ti que você gargalha e aceita tudo que ela quiser, mas de você Slade...
- E vai fazer o que? Ir atrás dela quando precisamos de você agora aqui mais que tudo? – Slade a desafiou.
- Não porra! Eu to cansada disso, se ela quer ficar se metendo nessas merdas que arriscam a própria vida dela, que se foda. Eu tenho mais o que fazer, principalmente agora.
- , eu odiei essa ideia tanto quando você, eu fiz de tudo pra impedir e agora até Frid tá entre a vida e a morte por isso, porra! – explodi, liberando a raiva que eu estava de mim mesmo por ter deixado tudo chegar a esse ponto – Ele falou cada coisa... eu poderia ter o matado, eu devia ter o matado. Mas a e esse maldito plano suicida!
- Não você não fez de tudo pra impedir, se tivesse feito, teria impedido – arrebitou o nariz e bufei com sua atitude naturalmente narcisista.
- Se eu tivesse impedido sua irmã estaria morta agora – disse em um tom baixo, me controlando. – É o Frid que está entre a vida e a morte, mas poderia ser todos nós se eu tivesse atirado na cabeça daquele filho da puta quando tive a chance.
respirou fundo, mudando um pouco a sua expressão. Ela estava com raiva disso também. Do Zeus, de mim, da e de tudo que estava acontecendo, mas ela também sabia que tudo isso aconteceria de uma forma ou outra. Eles a levariam de qualquer jeito, Zeus estava empenhado nisso e nós também sabíamos o porquê.
Ele estava explorando as novas fraquezas... uma por uma.
- Tudo bem, você tá certo – bufou. – Mas agora que se foda, vou gastar minha raiva com gente que merece.
- Dá pra manter a esperança, é uma ideia aceitável – começou. – Uma das únicas formas de enfraquecer o Hospital é por dentro e com lá, consegue tirar o poder de fogo deles e trazer para nós. Zeus não virá completamente carregado, ele virá nos torturar primeiro como vez com a Colônia. E quando isso acontecer, estaremos um passo à frente com ela lá. E ela não está sozinha lá dentro como você esteve , e conseguiu escapar inteira.
Ela ficou quieta e seu olhar queimava para qualquer coisa que estivesse em seus pensamentos.
- Ela vai conseguir. Ela orquestrou o plano todo e até agora não houveram falhas – Era difícil admitir que tivesse a coragem o suficiente pra entrar e sair daquele Hospital com o que foi buscar. Ela é esperta e consegue convencer a todos em menos de cinco minutos, porque sabe exatamente o que fazer.
- Vocês não têm coisa melhor pra fazer do que tentar me convencer de que minha irmã é boa o bastante pra fazer alguma coisa? – falou como se nos mandasse dispersar. – Quando isso acabar vou conversar com cada um de vocês e tentar descobrir porque não tinha pessoa melhor pra ir nessa missão suicida, porque claro, é exatamente nisso que estou pensando – falou sarcasticamente.
- Antes ela do que você – Slade disse baixo pensando que não ouviríamos e bufei com o comentário vendo o chamar de babaca antes de sair dali.
- Slade, é hora de se preparar – avisei. – Eles estão vindo. E eles não vão vir só pra pegar as mulheres. Eles vão vir pra destruir o QG.
- Que venham. É hoje que o Zeus cai. E eu vou derrubá-lo.

***

Romero.

- Esse é o começo do seu fim – Zeus pronunciou, enquanto jogavam-nos no galpão escuro e sujo.
- Você não vai ganhar – ameacei.
- Já ganhei – disse com raiva. – Tudo tá indo da forma que eu quero que seja e logo seus amigos estarão mortos. E não se sintam mal, cuidaremos bem de vocês aqui. Aqui vocês aprenderão regras e entenderão de uma vez por todas que enquanto o homem fala, a mulher cala a porra da boca e obedece. Entendeu, ? – se aproximou mais de mim, sorrindo e me dando um tapa meio forte no rosto. Não dei a outra face, só escondi meu rosto entre os fios bagunçados. – Calou? – sorriu. – Prefiro assim.
As garotas que estavam junto choravam, tremiam e estavam aterrorizadas, com medo do que Zeus faria a elas. E eu entendia. Também sentia um pouco desse medo.
Ele não era um líder, era um psicopata que mataria todo mundo sem mesmo se importar com os outros. Pouco se fodia pro seu próprio grupo, ele deixaria todos morrerem se conseguisse ganhar a guerra. Por isso tínhamos medo dele, por ser imprevisível demais a ponto de guerrear a qualquer custo. Estando pronto ou não.
Zeus ordenou algo para dois de seus guardas que apenas assentiram em resposta, as meninas tremiam ao ver suas armas enormes e suas caras de poucos amigos. Mas eu não tinha medo.
Eles não nos matariam. Não agora.
- Lembrem-se, qualquer coisa que elas fizerem: atirem – ordenou e uma das prisioneiras ao meu lado chorou. – Mais tarde volto pra buscar a vadia mor – sorriu para mim e saiu do galpão batendo a porta.
E os dois guardas sentados em duas cadeiras, sorrindo da forma mais podre possível para nós. Com suas armas no colo, devidamente preparados para qualquer movimento em falso nosso.
- Se o chefe deixasse... – os dois começaram uma conversa indecente em nossa frente, que assustava mais as meninas. – Eu pegaria cada uma e daria um bom trato nelas...
- Eu também – o outro concordou. – E se reclamassem? Metia bala.
Tremi de nojo.
As garotas atrás de mim estavam mais assustadas ainda, principalmente Paige e Bailey que mal entendiam o motivo de tanta brutalidade. Todas permaneciam atrás de mim, pareciam se sentir mais seguras comigo em sua frente, protegendo-as.
Os dois ficaram nos encarando, uma a uma, dos pés à cabeça. Sem nem piscar.
Murmuraram algo baixo para si mesmos, como se entrassem em um acordo. Um sorriu e apontou para Lola, que nem se moveu do lugar.
- Mexicana, vem cá – chamou, mas não como um pedido, sim como uma ordem. – Senta aqui. Me mostra se vocês são tão fogosas quanto dizem – permanecia com um sorriso podre nos lábios e os olhos focados em Lola.
- Vai se foder – retribuiu na mais forte raiva, deixando seu sotaque se sobressair. O cara não gostou, fechando a cara em seguida.
Ele se levantou com rapidez, deixando a sua arma cair longe e veio até Lola furiosamente. Me botei em sua frente, mas me empurrou, puxando a garota pelos cabelos e a arrastando pelo galpão até que se sentasse novamente na cadeira, segurando-a a força em seu colo.
- Eu não pedi, vadia. Eu mandei – estralou um tapa forte no rosto da garota que assustou a todos nós. Mas Lola era forte, ela nem ao menos reagiu. E não reagiria.
E eu não a deixaria naquela posição por muito tempo.
O que me aterrorizava de verdade nem era toda essa situação, me deixava com nojo e não medo. O que realmente me aterrorizava era como Zeus era burro. Burro de verdade. Era completamente estúpido.
Mas de uma coisa valia a sua mentalidade machista, o rapaz não acreditava que nós mulheres poderíamos ser fortes e estar armadas, por isso não ouve nenhuma revista. Ele apenas nos pegou e nos tacou nesse galpão vazio. Óbvio que claro, de certa forma, nenhuma das garotas estavam armadas.
Só eu.
De forma alguma me deixaria ser levada para um lugar como esses sem ter um plano já estabelecido. E foi o que fiz. Desde que fui embora da sala de Slade noites atrás, preparei delicadamente um plano para acabar de uma vez por todas com o Hospital.
E se tivesse sorte, ainda daria tempo de pegar Zeus e matá-lo de uma vez por todas.
A partir desse momento, pude traçar meu plano detalhadamente em minha cabeça. Ao mesmo tempo tinha que pensar em Lola que estava a refém de um homem nojento, mas desarmado. A minha segunda preocupação seria o outro soldado, mas ele estava entretido demais em assistir seu amigo abusar deu uma mulher em sua forma mais nojenta.
Disfarçadamente levei uma de minhas mãos até a minha bota e sem um barulho, tirei de dentro uma pequena faca completamente metalizada e discreta. Ela estava escondida e pela falta de revista, ninguém a percebeu.
E mesmo com revista não a achariam, era fina demais para passar apercebida.
A escondi no bolso de trás da minha calça, deixando seu cabo fino para fora, de uma forma prática para eu retirá-la do meu bolso.
Me levantei devagar, com meu olhar fixado no soldado que assistia seu parceiro. O que estava com Lola estava focado apenas nela e em suas súplicas para parar. O outro era o único armado, mas também distraído.
Eu teria de ser rápida.
Graças ao espaço do galpão ser pequeno, caminhei rápido até o outro soldado, sem dar muito tempo para que ele percebesse que já estava chegando em sua direção. Apenas se tocou quando eu já estava em sua frente, parada em silêncio.
- O que você quer? – o homem perguntou impaciente e ao mesmo tempo um pouco assustado. Eu apenas sorri de forma debochada e o rapaz perdeu a paciência. – Volta pro seu lugar agora, vadia.
O soldado parou em minha frente. Ele era mais alto que eu, mas seu corpo também magricelo não era tão intimidador assim. A vantagem de tudo isso foi que ele esqueceu de sua arma, que estava posicionada na cadeira que antes estava sentado.
- Me obrigue – sorri novamente e ele veio para cima de mim, sem qualquer pena. Tive que ser o mais rápido que pude nesse momento.
Eu tirei a faca do meu bolso com agilidade e a cravei em seu pescoço. Os olhos do homem se arregalaram e ele parou, cedendo ao chão em seguida.
- Mas que merda... – assim que o outro soldado percebeu o que estava acontecendo, Lola o atacou, dando uma cabeçada nele. Os dois começaram uma luta corporal em busca da primeira arma que acharem.
Ao mesmo tempo, arranquei minha faca do pescoço do rapaz, deixando-o o sangrar e agonizar até sua morte.
Corri para o outro soldado, me jogando em cima dele e livrando Lola de suas agressões, toquei com a lâmina da minha faca no pescoço do homem, que parou assustado.
- Mais um movimento e eu corto seu pescoço, assim como fiz com o seu amiguinho lá.
Ele virou o rosto e viu o outro guarda jogado no chão, em uma poça do seu próprio sangue.
- Sua desgraçada! – me xingou, se movimentando e mudando de posição. Na tentativa de arrancar a faca de minhas mãos e me acertar.
Chutei seu estômago, enquanto tentava me desviar de seus ataques. Enfiei a faquinha em uma de suas mãos e o cara gritou de dor, ainda mais furioso.
Quando novamente tentou me atingir, o barulho da arma destravando e o cano apontado para ele o fez parar bruscamente.
- Se mexe e eu atiro, desgraçado – Lola bateu com a arma na cabeça do cara, fazendo-o cair para trás. – Obrigada – agradeceu, me ajudando a levantar e ver seu rosto machucado partia meu coração. Mas estava viva e seria o bastante para sairmos daqui.
Amarrei as mãos do guarda usando o cinto do outro – que descanse no Inferno. O arrastei para o lado do morto, deixando-o próximo o suficiente para quando voltasse a “vida” atacasse seu próprio parceiro.
- Ok, vamos lá. Você tem alguns minutos ou até horas que seu parceiro volte e te mate – me sentei na cadeira em sua frente, cruzando os braços. As armas estavam apontadas para ele e não havia fuga. Ele morreria de qualquer forma, só escolheria como.
- Vá para o inferno, puta.
- Já estou nele, queridinho – sorri, esfaqueando-o na perna. Ele gritou e Lola o acertou com a arma, calando-o. – Agora me diga, onde está o depósito de armas e a saída?
- Vai se foder.
- Deve ser tão patético ser você, né? – sorri fria. – Uma putinha que nem eu consegui matar o seu colega e tenho você na palma da minha mão – aproximei meu rosto do dele. – Você poderia me emprestar suas bolas? Eu as usaria melhor que você.
Sorri e o soldado cuspiu sangue em mim.
O acertaram novamente.
- O depósito e a saída, por favor – disse enquanto me limpava.
- Me chupa, gatinha.
Lola o acertou mais uma vez.
Seu rosto estava sangrando e se abrindo mais a cada vez que o acertava, mesmo assim não abria a boca. Estava na hora do plano B.
- Vou perguntar mais uma vez. O depósito e a saída.
Ele sorriu podre, com a boca completamente ensanguentada e o olhar de um psicopata preparando uma vítima.
- Quando eu me soltar, vou matar você e depois vou terminar de foder a mexicana – permanecia sorrindo e então eu que sorriu.
- Que pena, gatinho. Resposta errada – me aproximei novamente, ficando cara a cara e seu sorriso desapareceu, porque ele viu no fundo dos meus olhos. Não estava blefando. – Quero que guarde bem o meu rosto, porque é essa vadia é a última pessoa que vai ver. E quando chegar no Inferno, avise que estarei levando todo o resto de vocês. Guarde um bom assento para Zeus, porque eu estou chegando. E vou matar todos vocês – enfiei minha faca em sua têmpora de uma só vez, matando-o.
Repeti o movimento com o outro guarda, matando-o antes que virasse um morto-vivo.
- Se armem e se preparem – avisei o restante das meninas que não estava tremendo de medo. – Estamos indo embora daqui.
Tirei o meu casaco ensanguentado, ficando apenas com meu suéter branco que Barbie me mataria caso o sujasse com sangue. Ri ao lembrar dela.
Meu coração se encheu ao lembrar de todos que estava disposta a rever quando tudo isso acabar. Porque não, eu não morreria aqui. Sairia daqui e levaria todas elas comigo, para lutar e vencer Zeus. Mas antes destruiria cada pedaço do Hospital.
Para destruir o inimigo, você tem que começar por dentro.
Tirei de um dos guardas a chave para abrir o galpão e o destranquei. Me virei para as garotas, garantindo que todas estavam vivas e bem armadas. Então abri o portão do galpão.
E som de tiros me ensurdeceu.
Era a morte chegando para todos nós.


Capítulo 31 – Zombie.

Música do Capítulo


"Reality is much worse than any stories about ghosts, zombies our aliens."

Romero.

- A cabeça não dói de tanto pensar? – ouvi uma voz masculina atrás de mim, não virei para vê-lo.
- Pensar nunca é demais, Teddy - continuei séria.
Meu amigo se sentou ao meu lado no observatório enquanto eu continuava de pé. Não disse nada por um tempo e nem tinha muito o que falar. Respirei fundo observando pelas lentes grossas do binóculos através do muro. O céu estava preto, o dia estava de luto.
O meu pensar atingia um nível de meditação escondida, por fora eu poderia estar parecendo calma e serena, por dentro tremia como se estivesse na pior noite de frio vivendo ainda sem teto com minha irmã nas ruas de Oklahoma.
Quanto mais perto chegava, toda e qualquer teoria citada até aqui parecia ser bonita apenas no papel. A realidade era assustadora.
Mesmo assim estava tranquilo. Observei ele caminhando como um verdadeiro comandante entre o Quartel. Flutuava sobre os lugares, dando suas ordens de setor em setor, sem transparecer qualquer tipo de apreensão.
- Estamos prontos pra isso? – quebrei o silêncio.
- Sim, com o Slade no comando, duvido que tenham alguma chance.
- Eles tem mais homens... Mais armas... – retruquei.
- E nós temos mais guerreiros – me virei à Teddy ao ouvir sua observação. – todos nós sobrevivemos ao apocalipse e aos nossos próprios demônios dia após dia. Perdemos pessoas e permanecemos em pé. Somos guerreiros e não máquinas de matar, não soldados treinados apenas para atirar. E na guerra, não basta somente atirar. Temos tenção.
- Obrigada – assenti olhando para baixo.
Teddy estava certo, não dá pra vencer uma guerra sozinho. O Hospital tem robôs na mão de Zeus, um protótipo, um sinônimo de andarilhos que seguem e obedecem, não enxergam nada além do que o líder os manda ver. E dessa vez teremos que atingir nos pontos cegos que eles possuem e tampouco imaginam.

***


O QG estava como o esperado, não parecia como antes, não tinha crianças ali ou pessoas mais fracas fisicamente, pelo menos não a vista. Se algum dia possuiu alguma decoração, brinquedos ou roupas penduradas para secar no nosso pátio, estavam a muitos metros dali. Nossa base agora parecia uma cidade fantasma repleta de combatentes com feições injuriadas.
Tais figuras tomaram um formato piorar quando silenciosamente o alarme tocou.
Ele chegou.
Assim a comoção na limiar se iniciou.
saiu do arsenal munido e preparado, como o resto de todos os moradores ali. Os nossos soldados estavam espalhados pelo QG em pontos estratégicos e no pátio os grupos já estavam mirando suas armas apenas esperando por uma ordem de Slade.
Os portões se abriram e por incrível que pareça, cercado de homens e carros-fortes, Zeus assemelhava estar ainda menor.
Deu alguns passos para a entrada com seus homens o seguindo, todos com seus canos abaixados e se posicionando ao oposto dos nossos, prontos para o contra-ataque quando mandado. gesticulou com a mão mandando nosso grupo não iniciar até que uma ordem sua fosse proferida.
Zeus deu um passo à frente e outro.
- Veio cobrar o aluguel? – o sotaque britânico se destacava.
- Sei que hoje em dia, para pessoas como vocês, o tempo é algo inexistente. - Zeus começou. - Quer dizer, vocês não tem nenhuma tecnologia pra contar os dias? Não conseguem ver os sois e as luas? – riu de sua própria piada. Fechou a cara quando ninguém o acompanhou. – A questão é, acabou o prazo e vocês ainda estão aqui. Posso saber o motivo?
se aproximou do garoto.
- Porque nós não vamos sair. Simples assim.
Zeus ficou vermelho com o atrevimento. Era fácil irritar um garoto branco como ele. Antes e depois do apocalipse.
- Quer jogar duro, Slade? Tem certeza? – balançou a cabeça. – Faça que nem o seu amiguinho, me enfrente! Vamos!
- Ah, você não quer jogar este jogo garoto, você não quer acabar assim. Lembre-se, a vida é cheia de possibilidades e a morte é apenas o final dela. - falou como um monge sábio. E entre todos nós, eu sabia que esta era a versão mais longe do que ele verdadeiramente era.
- Esse povo caipira de merda conseguiu levar alguns dos nossos, agora posso levar alguns de vocês. E levar as mulheres como fiz na Colônia... – Zeus me encarou. – Inclusive... sua irmã já deve estar de quatro me esperando lá no Hospital, então vim te buscar. O papai gosta do prazer em dobro.
não conteve esforço para acertar seu punho ferino contra o queixo de Zeus. Seus homens se posicionaram de prontidão até que o garoto loiro riu, cuspindo o vermelho para o chão e pediu que se preservassem.

***

Grimes.

A Colônia resistente estava ali. Judas e eu continuávamos através do corredor, esperando o momento certo para atacar. Zeus não sabia da nossa presença e isso transformava seu grupo com uma potencial desvantagem.
se esgueirou entre as pessoas que cercavam seus líderes e se aproximou de nós dois.
Eu estava atento a sua presença quando notou que me pediria algo.
- Preciso que você mande a equipe de resgate atrás da no Hospital – começou. – Já que eles estão aqui, o Hospital deve estar em desvantagem e vai ser mais fácil para ela atacá-los lá dentro e sair conosco.
Enquanto repassava a mensagem, a cobertura de ambos surgiu. E Judas continuava incomodado como quando saímos da Colônia.
- Temos um galpão cheio lá atrás, não de armas ou bombas, mas sim de crianças e pessoas incapazes de lutar. Por que diabos Slade não os mandou para um local mais seguro? - rosnou para a morena.
- Não teria como, fizemos uma reunião, uma votação, e optamos bolar um plano de fuga assim que eles colocassem os pés aqui, afinal qualquer movimentação diferente lá fora do QG acabaria atraindo a atenção dos camisetas vermelhas que Zeus botou na floresta pra tomar conta da gente.
Judas ameaçou voltar a reclamar mais um pouco até que alguns gritos e exaspero chamaram nossa atenção para o portão. Zeus tinha uma arma apontada para a cabeça de Slade.
correu em direção a uma garota loira que já tinha passado algum tempo na Colônia. Zeus e Slade mantinham sua guerra particular de egos, e diferente dele, continha uma maturidade maior ao ignorar as ameaças que partiam dali. era idiota o suficiente para tentar enforcar o cara ao primeiro sinal de tocar no seu ponto fraco.
A Colônia ainda estava atrás de mim, escondidos para outros olhos e espalhados em menores bandos para melhor ataque.
- Mande a parte beta se separar entre os portões, não queremos uma invasão lateral. E preciso de cobertura. – murmurei para Judas. Após alguns sinais, seguimos um dos braços direitos de , Nico, até uma abertura para a parte traseira da base. Adiante o muro havia somente a entrada especial para o mar, em alguns longos metros até cair nele, assim a área seguia vazia de garotos do Zeus.
Parte do plano se seguia e tínhamos que fazer aquilo de uma forma parecida com o que construiu no Hospital. Acabar com eles. De dentro pra fora. Ou como chamamos no português mais velho, faremos uma emboscada.

***

Romero.

- Me perdoem a interrupção, mas acho que podemos resolver isso como seres vivos, enquanto ainda estamos. O suficiente já se foi e não queremos diminuir este número hoje.
Sim, eu estava enrolando. Adiando o inadiável.
- Agora isso é o que eu chamo de uma conversa em desvantagem. Sua querida irmãzinha fez questão de dizimar parte do que era meu, sabia princesa? Nada mais justo do que igualar a quantidade que possuímos agora - Zeus mostrou seus dentes antes de mirar a arma para Baby.
Dessa vez eu fraquejei de verdade. Comecei a caminhar até ele e em um piscar de olhos, um soco rápido e pesado chocou contra o seu rosto. Não, não fui eu. Era outra vez.
Zeus gritou de dor e se contorceu no chão, sua mandíbula possivelmente estaria quebrada agora e eu poderia sentir uma áurea escura de puro ódio exalando Slade. Não é assim que se toma tempo meu bem, afinal, agora seus garotos estão mais exaltados que antes, como hienas prontas para dar o bote.
O sádico louco começa a gargalhar, profundamente, como se tivesse ouvido a melhor piada do mundo.
- Abaixa essa merda - ele faz uma movimentação com a mão e no mesmo instante seus soldados miram para o chão. Ok, isso é bom. - Eu cuido disso.
Ele deveria estar se sentindo a pessoa mais impotente do mundo, leva um soco e as babás estão de prontidão para ajudá-lo? Pela segunda vez? Ah, agora bateu no ego.

***


Teddy.

Levantei a grande porta de ferro do galpão com a ajuda de Baby tentando não fazer tanto barulho e chamar a atenção com o eco que exalava dali. Assim que observamos, olhos grandes e assustados refletiam para nós esperando algum tipo de ajuda e levemente aliviados por sermos nós quem abrimos sua porta. Significava que pelo menos a primeira parte do plano estava funcionando.
- Tenho uma lista aqui que precisamos verificar uma vez aqui dentro e outra lá fora - a loira disse e começou a checagem. Enquanto ela fazia silenciosamente, tentei dar algumas informações.
- Lena, Mara e Godoy, preciso da ajuda de vocês. São as mães mais protetoras e que confio com todo meu coração aqui, preciso que cada uma lidere um pequeno grupo para ajudar a nossa locomoção e para que não percamos nenhum - elas assentiram e deram instruções cada uma para seu monte, a principal era não soltar a mão de ninguém.
Baby terminou e deixamos as mães continuarem com seu trabalho rapidamente.
- Estão todas aqui, agora você precisa guia-las até a floresta. Está com a arma?
- Em mãos. E na minha canela.
- Tudo bem. Em dez minutos estarei lá, se não estiver...
- Já sei, saberei que deu certo.
Seu olho lacrimejou por um segundo e engoliu seco. Baby me abraçou e desejou boa sorte antes de seguir o seu caminho.
- Vamos lá? - olhei para as pessoas a minha frente, que concordaram corajosamente. Agora era somente nós e nossa pequena e perigosa jornada até o grande portão.

***

Baby.

- 371, 371, 371... aqui! - esta era a placa do ônibus escolar abandonado entre alguns carros e caminhões no galpão do QG. Combinava com a numeração da chave que havia em minhas mãos e eu rezava para que pelo menos o motor ligasse.

***

Nico.

Ele não deveria se comportar desse jeito, apesar de cabeça dura e idiota, ele não é imortal. Essa não é uma luta simples. Zeus não é como os outros lutando e matando pra poder comer. Ele já tem a comida.
A cara do garoto já estava completamente desfigurada, os olhos inchados, a mandíbula parecia estar quebrada e o sangue jorrava por todos os locais possíveis de sua face agora medonha. O problema é que o imbecil era um sociopata de primeira, levava na cara e somente gargalhava disso.
Slade era imbatível nas lutas corporais contra seus inimigos, Zeus não é dessa forma. Mas dentro deste ringue, ele age como se fosse somente um robô sedento pelo caos.
Como destruir um vilão que não possui motivação?
Zeus não quer dinheiro. Não quer o abrigo.
Ele só está buscando a desordem, a desgraça. Propagando como se fosse a sua última sentença saciada na vida. Eram pessoas que se importavam lutando contra uma casca vazia com puro ódio que não pensaria duas vezes em jogar para os abutres a carne do seu único amor.
- Nós fazemos todo tipo de coisas só pra ficarmos vivos não é ? Você mais do que nós. Fiz meu dever de casa - se referiu ao passado dele. - Um grupo abandonado, problemas gerais dentro desse meio, traiu o melhor amigo... É, tenho algumas dúvidas se o cara lá de cima guardaria um espacinho pra você - aprazerou-se.
estava no chão. Seu ódio não poderia ser comparado à apatia de Zeus.
E então, um chute diretamente em seu queixo. arfou ao meu lado. Slade cuspiu sangue. Seus soldados mostravam os dentes claramente mostrando a felicidade irradiando a favor de seu Zeus.
- Você não é a justiça aqui, - outro chute. Slade se contorceu de dor e virou-se em uma posição fetal. - No mundo de hoje, não temos mais justiça. Não importa o quanto você lute, eu vou estar aqui pra mudar isso...
Em um grito se levantou espirrando seu sangue junto com o suor e areia, correndo diretamente para o garoto que não parava de falar. O jogou no chão e ambos entraram em uma rápida luta corporal. Braços próximos a se quebrarem, traqueias por um risco.
O dono do quartel relutou ficando por cima de seu inimigo e alcançando a pistola caída na terra ao seu lado. Três tiros. Ao lado da cabeça de Zeus. Enquanto a outra mão se apertava contra sua garganta;
- Acabe logo com isso... - sussurrou nervosa para si mesma.
- E você não é Deus - ele praticamente urrou com raiva. A arma ainda apontada para sua cabeça foi de encontro ao chão. Já era difícil saber o que estava acontecendo. Tudo se tornou um breu.
A chuva começou a cair com uma força inacreditável. Trovões ecoavam nos céus e os garotos de Zeus se amontoaram ao redor da briga. tentou passar entre todo o povo e logo já a tinha perdido também.
Minhas roupas estavam ensopadas e completas de lama. Subi em cima de um dos carros sem largar minha arma presa ao cordão em meu tronco. Eu conseguia ouvir os gritos barbáries de todos os homens observando a luta entre eles.
- Não teremos um acordo! - Slade vociferou – Vocês vão sumir daqui e eu vou fingir que não lembro da sua maldita e podre existência.
Ele poderia simplesmente matá-lo, como já fez tantas outras vezes, contudo aquilo ali era um ato de coragem e muita força mental. Um tiro proferido contra Zeus e a guerra se iniciaria. Inocentes iriam morrer sem podermos evitar e as chances de perdermos valia a metade de um total. Se fosse para iniciar algo, não seria de Slade essa culpa.
E então Zeus gritou, acho que foi um nome ou algo parecido, só sei que foi tudo rápido, como um daqueles flashes que você não nota exatamente o que está acontecendo só que a partir daquele momento tudo... muda.
A que eu havia perdido antes estava perto demais deles, tanto que um dos caras de Zeus a pegou, prendendo-a perto de seu corpo. Ela tinha uma arma apontada contra sua cabeça. Nesse pequeno momento de distração o garoto Zeus saiu de baixo de o empurrando ainda zonzo para o lado. não sabia o que fazer.
E não poderíamos tentar nada, eram ordens dele, até que ele dissesse o contrário. E confiávamos demais que sairia livre daquela prestes a mandar nossas bundas moles para a batalha enfim.
- Não larga sua arma Slade, ele vai... – a boca de foi tampada rapidamente pelo brutamontes que a segurava. firmou a arma em suas mãos para a cabeça de Zeus. Sua namorada começaria a chorar a qualquer momento... estava apavorada, mas eu não saberia responder se era por ela, ou por ele, que eu, Nico, nunca o vira mais perdido do que agora.
A arma jazia apontada para Zeus. Porém seu olhar não perdia o de por um sequer segundo.
- Abaixe um pouco a arma, Tadeo - ele seguiu sua instrução. Da cabeça foi para o pescoço de - mais um pouco. - mandou. E foram para seus seios. Zeus sorriu e movimentou a cabeça, mais um pouco, então. Assim que o cano se formou contra sua barriga, o sorriso dele se tornou uma forma elevada de psicopatia. Uma cara esfomeada, chegou seu prato principal.
Assim ela começou a chorar... oh Deus.
Todos encarando aquele teatro tinham mistos de feições quase indecifráveis por baixo da chuva, no entanto ainda era possível ver os rostos contorcidos.
estava...
A cara de para ela era algo que nunca vi antes em toda minha vida sendo seu braço direito. Ele estava triste. Era a carne humana pura, mais horrenda e cru tristeza presente possível dentro dos sentimentos de um homem que se viu incapaz de proteger seu povo, e pior ainda, sua mulher. Ele não sabia o que fazer. E com certeza não tinha mais o que pensar.
Havia um homem na sua frente apontando uma arma para o estômago da mulher que ele amava.
Três tiros foram o suficiente.
A cara de estava manchada em vermelho. Meu coração parou com medo do que poderia ter acontecido mas a arma já não estava mais contra ela. O homem, Tadeo, estava morto e todo seu sangue banhou o rosto e corpo dela.
Silêncio.
O completo silêncio em baixo de toda aquela chuva.
Slade caiu de joelho olhando diretamente para a mulher que amava.
Zeus saiu de sua frente.
A faca ensanguentada deslizou lentamente de dentro para fora do corpo dele.
Enquanto matava Tadeo, era esfaqueado.

***


Romero.

Não. Não. Não. Não.
Meus olhos se fixaram para a cena a minha frente.
Ele estava no chão. Uma abertura em sua barriga com o vermelho escarlate que combinava com os machucados do seu rosto, no entanto para aquele é possível que não houvesse cura. Eu não sabia o que fazer. Minha exata expressão era a que Slade tinha segundos antes em sua face.
Zeus não somente projetou a faca no corpo dele. Ele cravou com ódio na frente do seu povo, até que puxou a faca para cima rasgando sua pele próximo a seu coração. E parecia que instantes o meu pularia do meu próprio peito.
Segundos após paralisar, corri até ele. Tentei segurar seu corpo para que não se espalhasse por toda a chuva e lama. Não queria que ele se sujasse... eu...
Eu não estava chorando. Estava em choque, olhando para seu rosto que só sabia me enxergar por dentro, toda a , pura e verdadeira que ele conheceu. E seu olhar não pedia nada, só queria que eu ficasse ali.
Sua boca tentava formar palavras desconexas e perguntei o que ele queria dizer, até me dar conta que aquilo era ridículo, ele não deveria falar, devia poupar forças.
Sempre brinquei sobre meu senso de direção, mas desta vez era real, eu estava completamente perdida.
Alguém gritou e partir daquilo a guerra se instalou. Homens formavam cobertura ao redor de meu corpo e de Slade. Senti alguém me puxando para trás e urrei batendo minhas pernas para o ar tentando me soltar até perceber quem era. Ele me travou contra a parede do corredor e puxou meu rosto para prestar atenção em suas palavras.
- Vamos cuidar dele. Precisamos de você - Judas passou a mão em meu rosto tentando tirar os resquícios de sangue do homem que morreu a centímetros de mim. Tadeo. Virei para o corpo de Slade no meio da chuva e tentei pensar em algo. Antes que Judas falasse qualquer outra coisa, corri em direção a Teddy.

***

Teddy.

Assim que conseguimos encontrar o caminhão na floresta, corri para o QG outra vez, o som do caos se espalhava até mesmo entre as árvores e logo aquilo estaria movimentado por além de somente humanos vivos. Encontrei com o rosto e corpo coberto de sangue e em um check up geral rápido percebi que ela não estava machucada. Ao puxá-la, no meio da chuva, ela relutou.
- Ouvi tiros, vamos , vamos embora! - ordenei. Não costumava agir assim, contudo ali era caso de vida ou morte.
- Não - ela se soltou, voltada para certa direção e seu gesto corporal não precisou de mais nada. estava jogado no chão, seu sangue se misturava com a chuva e lama e talvez logo poderia acabar sendo pisoteado pelo exército se movimentando entrando em seus postos. Não havia mais respeito ali.
Compreendi o que ela queria, e eu ajudaria.

***

Nico.

Uma bateria de tiros de sniper vindas do terraço se iniciaram com a caída de . Não tinha no que ele mandar mais. Alguns corpos já foram derrubados no início dos tiros, mas dessa forma, com o forte, poderíamos afastar os soldados de Zeus para ganharmos algum tempo. E depois... só Deus sabe.

***

Romero.

Ele me entendeu, Teddy entendeu. Correu em direção ao corpo dele e o puxou contra seu ombro. Teddy era um cara enorme e mesmo assim encontrou certa dificuldade ao carregá-lo.
O direcionei até as escadas para um andar abaixo e logo estávamos nas celas. A sala de tortura que um dia também fora o quarto de Jacob.

***

Baby.

Notei a presença de Nico no forte e para afastá-los ainda mais precisariam de uma ajuda extra. Essa era a minha chance.
Engatei a marcha e me posicionei. Esperei as pessoas que eram de meu grupo saírem da frente, afinal, já tinham em mente o que era esperado fazer.
Até que pisei fundo no acelerador.
O veículo derrapou entre a chuva e relutou para conseguir uma maior velocidade, em instantes o ônibus escolar que eu dirigia estava entre os espaços do portão do quartel dificultando a passagem de quem entraria ali.

***

Romero.

- Deixe-o aqui Ted - falei sem fôlego pela corrida. A agonia me consumia enquanto não encontrava o maldito balde com água e algumas faixas dentro daquela cela, eu sabia que tinha e... lá estava.
Teria que tentar estancar o sangue o máximo possível, agora que estávamos também na falta de Frid, se tornaria um desafio a mais. Slade parecia estar desacordado, provavelmente fraco pelo tanto de líquido que perdeu e socos que tomou na cabeça, ou então estaria enchendo meu saco agora por tratá-lo como um inválido.
Suspirei. Não tinha fogo, teria que improvisar um curativo. Contudo, tinha álcool, bastante álcool ali em baixo.
- Vamos lá meu bem, você vai sair dessa - sussurrei para ele notando sua respiração pesada e notei Teddy saindo atrás de mim para a porta do térreo.
- Você tem cinco minutos! - disse rapidamente.
Eu confiava em Slade, ele era um daqueles vasos ruins da história. E o pessoal lá em cima também precisava de mim. Uma guerra estava acontecendo.

***

Teddy.

- Estamos alinhados para o escape. Segundo a lista de Baby não falta ninguém. Vamos redirecionar o caminho agora, Teddy, câmbio desligo.
Foi a rápida mensagem que recebi das mães. Sofremos uma pior dificuldade para a passagem anteriormente quando encontramos o portão ainda emperrado. Com a ajuda de alguns soldados da Colônia conseguimos quebrá-lo, não era muito grande, entretanto facilitava e muito a vida dos andarilhos que agora surgiam pela floresta.
O tiroteio ali dentro chamava a atenção do pequeno resquício de movimento do órgão deles e poderíamos parecer costelas assadas andantes em suas frentes agora.
Não tinha por que gastar mais balas. Resgatei o facão em um dos meus coldres e apliquei com força sobre o crânio de um deles. Ainda eram poucos, mas por longe entre as árvores era possível ver um pequeno novo exército participando desta guerra.

***


Baby.

Saí rapidamente do ônibus pela porta traseira e a fechei, com uma arma em mãos. Os snipers do forte estavam me dando cobertura e corri rapidamente entre as gordas gotas de chuva para encontrar o grupo de escape.
Por sorte encontrei Teddy próximo ao portão que estava quebrado e uma matilha de mortos-vivos próximos a entrarem.
- Cadê o grupo? Precisamos ir até lá - gritei atirando na cabeça de alguns que estavam longe.
- Tenho que pegar a primeiro!
- O quê? - Onde essa maldita tinha se metido? Era pra estar ou no forte, ou com as crianças. - Vai logo!
Ele tentou dar alguns passos pra trás, mas acho que os andarilhos não deixariam ele sair tão cedo.

***

Romero.

- Você precisa ir logo - Slade estava fraco, um pouco de sangue saiu de sua boca.
- E você precisa ser mandado para a Colônia. - me assustei quando minha voz saiu afobada. A qualquer instante soldados de Zeus ou até mesmo andarilhos poderiam entrar por aquela porta e eu estava tentando... Não sei o que estava tentando.
Só sei que Slade tinha que ir para a Colônia logo. Sempre foi assim, o Quartel tinha mais armas, a Colônia tinha a maior área para feridos. foi vital para que o hospital não atacasse com sua potência completa e agora tínhamos que resistir.
Tentei limpar a mancha escura em seu peito com delicadeza, não poderia perdê-lo outra vez fazendo sua mente desmaiar com a dor, pioraria a situação. Ao amarrar com mais força os panos para que o sangue parasse de vazar, a dor surgiu e seu grito foi um desespero contido. Chamei sua atenção para minha voz.
- Você não estava certo, Slade. - ele franziu o cenho, fraco. - Lembra, o dia que me acusou de querer experimentar o fogo, no maldito dia dentro daquele carro onde você me beijou pela primeira vez? Eu não queria o fogo, poderia experimentar um pouco mais de calmaria.
A dor era visível, não era física e sim sentimental. Ele arriscou um sorriso fraco.
- , para, olha pra mim - ele tentou se sentar e segurou meu rosto, me fazendo parar tudo e prestar atenção nele. Pensei que falaria algo logo, mas parece que ele se perdeu no meu olhar. Notava todos os meus traços, a ponta do nariz, sobrancelha, bochechas onde seus dedos ásperos estavam e eu não ligava que suas mãos estavam sujas de sangue. Eu não ligava pra isso. Só queria ele bem logo.
- Lembro o dia em que conheci você. Uma garota completamente doida e bêbada na beira do rio, ao lado de uma fogueira, fazendo um curativo em si mesma e contando histórias doidas pra tentar liberar um pouco de tudo que estava sentindo naquele instante. Como não poderia te levar pra casa, amor? - sorriu triste. - Você queria constituir família com Pete, o pescador zumbi que matou naquela casinha e não ter que voltar pra sua irmã e viver na vergonha eterna de ter pisado em uma armadilha para ursos onde nossa maior ameaça hoje em dia são andarilhos carnívoros. Cheguei na hora certa, quase te perdi para o Pete.
Ri de leve e olhei para o outro lado tentando conter as lágrimas que ameaçavam sair. Eu não aguentaria aquilo por muito tempo, minha sanidade mental precisava se ocupar com outra coisa.
- Eu não queria o fogo, você que apareceu desgovernadamente na minha vida. Certeza que agora teria menos cabelos brancos se tivesse tentando algo com Pete - sorri e apertei seu lábio contra o meu. Slade não parecia triste, longe disso, seu olhar parecia conter a resposta que ele procurou a vida toda. Não dava mais pra mim. - Slade, eu preciso do fogo agora. E preciso que você fique bem ok? Por nós. Tem que ser forte - segurei sua mão a encaixando contra meu estômago e prendi a respiração. Não iria chorar, tinha que me manter em sua frente. Ele não estava chorando por que eu iria?
Beijei seu lábio mais algumas vezes, toques leves, como foi nosso primeiro beijo. Ele parecia ter medo de tentar naquele dia e mesmo assim arriscou, porque ele queria. Não tinha certeza das palavras que saíram da minha boca no meio daquilo, minha mente vagava para outro lugar, mais feliz, mas acho que foram três delas. Importantes.
Me afastei. Poderia contar minha respiração. O brilho de seu olhar perdia o foco enquanto minhas palavras saíam. Involuntariamente, sua boca tossiu mais sangue.
Meu coração parou quando sua mão soltou a minha.
Em um tremor, Slade parecia focar o nada. Sua alma tão cinza quanto a cela onde estávamos.
- Eu vou... - falei sem saber ao certo se alguém estava me ouvindo.
Me levantei correndo para a porta de saída. Esbarrei com Teddy e prontamente o mandei levar Slade até o caminhão do pessoal do escape. Não importava como, ele teria que levá-lo até a Colônia.
Todo aquele momento parecia levar uma eternidade.

"After all to the well-organized mind, death is but the next great adventure."

- A. Dumbledore.




Capítulo 32 – Final - Parte 1.

Sacrifício ETIM lat. sacrificium,ii 'sacrifício'. Substantivo masculino.
1.oferenda ritual a uma divindade que se caracteriza pela imolação real ou simbólica de uma vítima ou pela entrega da coisa ofertada.
"s. de animais"

2. pessoa ou coisa sacrificada.
"Isaac foi o s. oferecido por Abraão"

3.privação financeira em proveito de alguém.
"é capaz de qualquer s. para dar conforto à família"

***


Romero.

Assim que abrimos o portão, dei dois tiros pra cima, pra garantir que quem pudesse estar do lado de fora estivesse ciente que estávamos armadas e que a guerra começaria lá dentro mesmo.
Corram por suas vidas, covardes.
Depois dos tiros, o silêncio. Eu conseguia sentir o cheiro da pólvora e o calor da arma em minha mão. Não tinha sangue, não tinha ferimentos, não tinha morte.
Só o senhor do outro lado, com uma aparência mórbida, pálido e careca, com traços esverdeados em seu rosto magro, como se pudesse quebrar a qualquer instante.
Não que eu tivesse pena.
Segurei a gola do seu jaleco branco e o puxei pra mim, devido sua falta de peso, consegui levantá-lo do chão. O senhor nem se debatia, possuindo uma expressão de pânico no rosto por não ter controle da situação.
- O-o quê? – a voz falha.
- Olá, desculpe a minha falta de educação, mas onde fica o depósito de armas? – perguntei, sem delongas, enquanto caminhava para fora do galpão segurando o homem pela gola. – Por favor, não demore pra responder... o negócio ficará feio por aqui.
O homem apenas olhava atordoado para nós.
- Desculpe senhorita, mas acredito que não posso te dar essa informação... logo Zeus estará de volta e.
O interrompi.
- Seu Doutor Maluco, você sabe o que vai acontecer aqui? – ele negou com a cabeça. – Ótimo, então vou te explicar. Você tem poucos momentos de vida, só resta saber como irá morrer... pra valer. Quer dizer, estamos em vantagem aqui e pra eu dar um tiro no seu cérebro pra garantir que você não volte tão cedo é inevitável. Agora... talvez eu te deixe vivo e garanta que Zeus te faça sofrer antes de morrer... porque ele faz isso, certo?
O homem engoliu seco.
- C-como? – tremia sua voz.
- Ora, tolinho, você acha realmente que Zeus, adorável como ele é, vai realmente acreditar que nós, um bando de mulheres indefesas e inúteis, seríamos capazes de matar dois guardas e fugir? – ri. – Mas quem será que os outros soldados irão encontrar conosco? O senhor. Acredito que seja mais fácil pra ele acreditar que fomos libertadas por alguém misericordioso e infiel ao seu líder.
Dessa vez, consegui atingir o velho direto no seu ponto fraco e pelo terror que vi em seu olhar sabia que estava certa. Se havia algo em que podia me apoiar cegamente e seria impossível falhar, era no narcisismo e machismo de Zeus.
Ele jamais acreditaria que teríamos força pra fugir do Hospital sozinhas por sermos mulheres, mesmo já tendo provado que éramos fortes. Então, ele acreditaria que alguém facilitou nossa saída, alguém com um pingo de humanidade na alma. E pela cara do velho depois que me ouviu, essa pessoa era ele.
Soltei aos poucos o homem no chão, sabia que ele não apresentaria nenhuma ameaça depois do pequeno choque de realidade. Mas pra garantir, as meninas apontavam as armas em sua direção.
- Então? Se eu fosse o senhor dava uma resposta logo... os soldados ouviram tiros, devem estar a caminho.
O doutor olhou para mim e depois para as meninas, desviou e secou sua testa suada. Em seguida, caminhou, nos chamando para segui-lo.
- Se eles estiverem vindo, provavelmente será pela porta principal. Então, se querem fugir sem serem notadas, teremos que ir pelo caminho... sujo – disse e seu tom escureceu. – Mas acredito que vocês não estejam prontas para conhecer o pior do Hospital.
Revirei os olhos.
- Tá, vamos logo.
O homem deu os ombros.
- O que vocês verão será algo que ninguém que viveu atrás dos muros seguros da Colônia ou do Quartel jamais sonharia em enxergar. É a prova de que os mortos, ao final de contas, são menos vis que o homem. Quando em tese, estes são os únicos ainda na terra com o cérebro que não está completamente fritado.
Os passos se aproximavam. As meninas já estavam ansiosas e esperavam por uma resposta. Eu sabia que Zeus era o pior dos homens vivos, que era o monstro que temíamos justamente porque não havia mais um pingo de humanidade dentro daquele ser.
Mas precisamos sobreviver, e para isso, precisávamos fugir do Hospital o mais rápido possível.
- Vamos.
Não importa o quê, eu serei forte, por elas.

***


Seguíamos pelo túnel do Hospital, que nos levava até o corredor mais “pesado” do prédio – segundo o doutor maluco. Ele dizia que lá era onde ficava o açougue e o laboratório, ambos os lugares menos protegidos, já que eram os lugares que só Zeus, o doutor, Gut e o soldados de maior confiança de Zeus, tinham acesso.
Nosso guia continuou, contando que ao passar pelo laboratório, chegaríamos no corredor de trás do arsenal, lá era onde encontraríamos as armas que precisaríamos pra fugir dali sem problema e levar pro QG, onde Zeus e seu exército estava.
A parte “difícil” era passar pelo açougue, onde por todo o caminho, o doutor falava que era o pior lugar de todo o Hospital. Ele não queria explicar o que era e o que acontecia lá, mas eu já tinha minhas suspeitas.
- Vocês estão prontas? – perguntou quando já estávamos de frente às portas.
Não aguentando todo esse suspense, fui a primeira a abrir as portas e entrar na sala. E o doutor estava certo, assim que o cheiro de carne podre atingiu meu olfato, senti que seria capaz de vomitar, isso claro, se houvesse algo no meu estômago.
A sala era escura e muito fria. Não dava pra enxergar direito devido à pouca luz. As paredes eram brancas, mas estavam cobertas de sangue e mofo. Parecia ser espaçosa, mas ao mesmo tempo era claustrofóbico lá dentro, devido à quantidade de corpos.
Sim, corpos, vários deles. Centenas talvez. Todos estavam jogados em montes, um em cima do outro. Como se fossem lixo. Eles estavam conservados, nenhum havia a aparência mórbida dos mortos-vivos, nenhum deles havia se transformado. Como que morreram, então?
Era notável em alguns, pela aparência, a condição de sua morte. Os pescoços cortados, têmporas furadas, e poucos sem ferimento aparente, nem de arma e nem de faca. Morreram por causas “naturais”. A maioria desses eram mulheres e crianças... me enojava só de pensar o que teriam feito com essas.
- Meu Deus – Bailey não aguentou, vomitando no chão tudo que havia e não havia dentro de si.
- Isso aqui é o inferno... – Paige dizia, enquanto passava pelos corpos. – O que aconteceu com essas pessoas?
- Zeus aconteceu... – Lola cuspiu no chão e seguiu andando. – Vamos.
- Responda a pergunta, doutor – ordenei, enquanto procurava pelos corpos. Queria saber se havia alguém conhecido aqui, ou algum vivo... Sei que não devia manter esperanças pra esse tipo de coisa, mas eu queria salvar as pessoas boas daqui.
- Não há nenhum vivo, senhorita , se é sua dúvida – respondeu, educadamente. – Os únicos vivos no Hospital somos nós, e os soldados que estão espalhados por todo o prédio – caminhou até ficar em frente a uma pilha de corpos. – Alguns eram moradores, outros soldados renegados, que Zeus não achou aptos pra manter. Alguns são apenas uns desafortunados que cruzaram o caminho de Zeus. Mulheres, esposas, velhos e crianças... – respirou e senti tristeza em seu tom. – Zeus odeia crianças.
- É, psicopatas tendem seguir esse perfil.
- Psicopatas não seguem um perfil. Se seguem, não deve ser o do ódio. Zeus não é um psicopata, ele possui muitos sentimentos, e é isso que me assusta.
Aquelas palavras grudaram em minha cabeça… não conseguiria imaginar Zeus com sentimentos, como isso seria possível? Como alguém tão ruim pode ter algum sentimento?
Pensar isso me assustava também.
Agachei na frente de um corpo específico. Era uma mulher de cabelos curtos, quase raspados, mas ruivos. Ela estava pálida e ela tinha marcas vermelhas espalhadas na pele. O que me chamou atenção fora uma pulseira de ouro em seu pulso... por que não tiraram isso dela? Indaguei para eu mesma, enquanto recolhia a peça.
Não estava roubando uma morta, se é o que estão pensando. Talvez isso me ajude a descobrir quem era e quem sabe alguém da Colônia ou QG a conhecia? Gostaria que se algo acontecesse comigo, tivesse alguma coisa que pudesse fazê-la se lembrar de mim.
- Vamos seguir... esse lugar fede – me levantei e segui em frente.
As meninas obedeceram e vieram atrás de mim. O doutor correu pra minha frente, ficando ao meu lado enquanto me encarava estranho, querendo falar algo, sem jeito.
- A senhorita é muito corajosa... igual sua irmã – disse, e me peguei pensando em minha irmã.
Como será que ela estava? Como será que estava o QG? O que me reconfortava, era saber que minha caçula não se juntaria a mim, que eu poderia fazer o que fosse preciso para destruir o Hospital por dentro, sabendo que estava lá fora, lutando ao lado de pessoas que protegeriam sua vida e cuidariam dela caso eu não estivesse mais aqui.
Um dos meus maiores medos era imaginar que fosse um desses corpos, que ela estivesse morta e empilhada com várias pessoas desconhecidas, sem nome, sem rosto, sem ninguém. Agora sabia que ela jamais estaria ali, porque ela jamais seria uma desconhecida. E jamais estaria sem ninguém.
Era ela quem me dava a coragem pra me fazer lutar, comandar esse grupo e nos tirar do Hospital. Mesmo que eu estivesse morrendo de medo por dentro, mesmo que eu estivesse desolada e aterrorizada.
- Eu não sou corajosa, doutor. Eu só finjo bem.

***


O corredor do laboratório era realmente sinistro, como uma cena de filme de terror. Escuro e totalmente bagunçado, tudo estava jogado no chão como se fosse justamente para dificultar a locomoção lá. As portas estavam trancadas, a maioria tinham toras de madeira impedindo que o que estivesse lá dentro fugisse. Mas o que estava lá dentro?
Me aproximei de uma das portas, mesmo com a relutância do doutor ao meu lado e olhei pelo pequeno quadrado de vidro na porta. Vi macas do outro lado, macas com pessoas deitadas lá. Franzi o cenho.
- O senhor disse que éramos os únicos vivos aqui... – disse baixo.
O corredor além da pouca luz, bagunça e cheiro de podridão, era também muito frio, assim como a sala do açougue.
Me afastei da porta e encarei o doutor que chorava... ele estava aos prantos e eu nem mesma entendia o porquê.
- O que houve?
- Meu Deus... por que você tá chorando, homem? – Lola perguntou, impaciente.
- P-porque eles não estão vivos – chorou. – Eu queria que estivessem... eu tentei, eu tentei... mas falhei e... – respirou fundo. – Eu passei toda a fase da infecção, da dominação dos mortos e a extinção da humanidade, tentando criar uma cura... tentando salvar a vida dos mortos e transformá-los de volta. Tinha que haver uma forma... sempre há!
- Eles estão mortos doutor, não tem como salvar. Está dentro de nós já... quando morrermos, nos transformaremos em um deles. Sem consciência, sem vida, só fome.
O homem balançou a cabeça, negando.
- Não... não... Eu consegui! Eu criei um vírus para combater o já existente em nosso organismo, o que nos transforma neles... Eu consegui restaurar o mínimo de consciência e obediência.
- Você diz que criou andarilhos obedientes? – Paige perguntou pasma.
- Sim! Eu consegui! – e chorou, um choro de dor que se transformou em alegria. – Meus filhos... eu os trouxe de volta a vida... eu os fiz humanos de novo!
O encarei. Nada disso fazia sentido, por Deus!
Depois que se morre, nos transformamos em um dos mortos-vivos. Não tem como eles serem obedientes e muito menos serem humanos novamente! O que o doutor dizia era pura baboseira, era pura ilusão de um homem que estava beirando à loucura.
- Não doutor, isso não existe – disse ríspida. O homem me encarou como se eu fosse louca, como se EU fosse a louca.
- Olhe para o Gut! – se exaltou. Ouvi murmúrios dos outros lados da porta. Cale-se doutor ou você acordará os seus filhos.
- O que tem Gut?
- Ele era o irmão mais velho de Zeus... um homem e tanto, tão ruim como o mais novo, mas mais sensato, acredito. Ele morreu diante aos olhos de Zeus, não se sabe como. Usei meu vírus nele... meu primeiro paciente que houve sucesso... e lá estava ele, vivo de novo... ou quase. Claro que não consegue se comunicar, mas ele ainda está vivo e consciente, entende o que falamos e obedece com louvor.
- Uau, você transformou um andarilho em um robô. Parabéns – Lola bateu palmas para dar mais ênfase à sua fala. Isso atraiu mais atenção dos bichos, fazendo-os ficarem mais agitados do outro lado das portas.
- Menos, Lola – pedi, abaixando o tom.
- Olhe para mim então, tolas! – o médico já berrava, estava desesperado e descontrolado. Tentei pedir para que ele se calasse, mas só falava mais alto. – Eu morri! Sua irmã me matou... mas meu vírus me salvou, me trouxe de volta a vida e olha pra mim, eu sou eu... Meu vírus falhou porque Gut já havia se transformado quando usei meu vírus nele e a maioria das minhas tentativas também... mas eu tentei... Zeus me ajudou, ele me deu os corpos e eu fiz os testes, mas algo estava errado... algo tem que estar errado... meus filhos, eles... eles estão vivos, mas... não. Eu só preciso acertar...
Nada disso fazia sentido, como o homem estava vivo se o matou? E como ele estava consciente e falando como se nada tivesse acontecido? Por isso a sua aparência parecia mórbida? Mas ainda nada disso fazia sentido... ele estava morto? Ele estava vivo?
Merda, o que está acontecendo?
- Você matava pessoas pra usar seu vírus? – Paige agora estava exaltada. – Seu filho da puta! Você matou pessoas pra usar em seu experimento falho? Você nem ao menos conseguiu trazê-las de volta? – empurrou o mais velho, sem dó dele. Tive que intervir, segurando-a.
- Calma Paige, porra, precisamos dele! – pedia. Só ele sabia onde ficava a merda do arsenal pra sairmos dali. Não podia morrer, não agora.
- Não , não! – berrava. – O que você fez com os corpos, hein? Os jogou fora no seu depósito de mortos? No seu açougue?
De repente a minha ficha caiu e soltei Paige, assim que encarei o doutor e sua real forma, a mais grotesca e morta se revelava aos meus olhos. Ele já era assim, mas só agora o notei como o morto-vivo que realmente era.
– Meu Deus...
Era pra isso que existia o açougue, pra servir de alimento aos mortos-vivos obedientes de Zeus. Provavelmente era isso que Gut se alimentava e o doutor também.
- Você se alimenta deles, não?
Seu silêncio foi a resposta que eu precisava.
De tantas coisas que presenciei desde o começo, nunca imaginei que ouviria tantas loucuras. Mortos-vivos que tem consciência, que são "humanos" novamente, mas se alimentam de carne humana.
Era um nível doentio e completamente alterado de um tipo de canibalismo que estava me enojando.
– Você é realmente um andarilho! - Bailey disse, espantada.
Algo mudou assim que o mais velho ouviu essas palavras.
O doutor berrou e começou a esmurrar as portas, em berros. Um surto que nos assustou. A forma que em poucos instantes ele se transformava.
- Eu não sou um deles! Eu sou humano! Eu estou vivo! – berrava. Os mortos-vivos esmurravam as portas, tentando quebrá-las. O que nem o doutor e talvez muito menos Zeus contava era que eles iam conseguir se livrar.
- Eles estão quebrando as portas ... – Paige alertou. – Nós temos que ir embora daqui!
- NÃO! NINGUÉM VAI EMBORA DAQUI! – O seu tom aumentava. – Não antes de vocês entenderem... vocês precisam acreditar em mim... eu não sou um monstro... eu não posso... eu sou igual à vocês... – chorava copiosamente.
- Você nunca será igual à nós, hijo de puta! – Lola foi até ele, com sua faca em mãos. – Você é igual à eles, um morto, um monstro que se alimenta de pessoas pra sobreviver... – cortou sua própria pele, fazendo com que seu sangue pingasse no chão. – É isso que você gosta, é? É isso que você quer, não é?
Vi os olhos do doutor arregalarem, como se aquilo tivesse ligado um interruptor nele. Merda. Corri e puxei Lola pra trás, assim que o doutor avançou pra frente tentando mordê-la.
- MERDA, LOLA! – a empurrei pra parede contrária. – QUAL É A MERDA DO SEU PROBLEMA?
- Não... por favor... não – o doutor se contorcia, com as mãos na cabeça e o choro incessante. Parecia que sentia dor, muita dor. – Não... eu não quero... por favor...
- Nós temos que ir embora daqui agora! – Ordenei.
Os mortos-vivos estavam quebrando as portas e aos poucos se libertando das salas em que estavam presos. O doutor parecia que aos poucos ia perdendo toda a sua sanidade e humanidade. Pude ver em seus olhos, ele estava certo afinal de contas.
Ele havia criado o vírus pra tentar manter a humanidade dos mortos-vivos, transformá-los em humanos novamente ou tentar fazê-los como soldados, como no caso de Gut. Mas no caso do próprio doutor, ele foi trazido de volta antes da infecção se manifestar em seu corpo e transformá-lo em um deles, por isso o seu vírus serviu como se fosse uma dose de adrenalina pesada que trouxe um morto de volta à vida.
Só que ele ainda estava morto, ele não era humano. Ele tinha fome de sangue, fome de carne humana, e Lola, em seu ato mais estúpido e suicida, fez com que acordasse esse lado do doutor. E parece que a infecção é mais forte que o seu contra vírus, tão forte que o transformava em morto-vivo diante os nossos olhos.
- Me desculpem – pediu, em seu último suspiro de vida.
- VAMOS EMBORA! – berrei.
No mesmo instante, as portas foram quebradas e o doutor já não era mais consciente. Corremos pelo corredor, fugindo dos mortos-vivos que vinham em nossa direção sedentos pela nossa carne.
Foi um total terror, sabendo que o corredor era estreito e algumas meninas caíram, ficando pra trás e nós não tendo o tempo pra salvar todas. Tentamos, atirando contra os mortos-vivos que corriam, impossível em alguns casos.
Era como uma horda em um pequeno corredor. Uns eram até mais sedentos por carne que outros, uns eram brutais quando arrancavam pedaços da carne das meninas que acabaram por ficar. Logo, o corredor estava banhado em sangue, gritos de horror e os múrmuros dos mortos.
Passamos pelas grandes portas e as fechamos, fazendo força para que a horda não conseguisse passar.
- Corram, peguem coisas pra prendermos a porta! – pedi, enquanto fazia força pra que eles não conseguissem abrir a porta.
- Que merda! – Paige xingava, vendo eles ocupados devorando mais uma das meninas que ficou para trás.
As restantes trouxeram madeiras, macas e qualquer coisa que pudesse servir pra que barrássemos a porta. Assim, os mortos que estavam do outro lado assim que se desocupassem, não passariam tão fácil.
Se permanecêssemos em silêncio, isso não atrairia atenção deles. Eles ficariam quietos do outro lado, até que percebessem que havia carne fresca.
Seguimos pelo corredor, todas em silêncio. Eu estava tentando manter a minha cabeça no lugar e não surtar, não ainda. Precisava manter a calma das meninas, ainda tínhamos uma missão pela frente.
Estávamos no corredor que segundo o doutor era o que nos levaria até o arsenal. Nesse corredor, havia luz, mas não havia soldados. Provavelmente estavam do lado de fora, evitando que o Hospital fosse atacado por fora, mal sabiam que já estava sendo atacado por dentro.
- , acho que é ali – Bailey chamou minha atenção, apontando à porta grande e trancada, com cadeado. É, com certeza era ali.
- Como vamos entrar? – Paige perguntou, ansiosa.
Levantei o meu dedo, pedindo silêncio.
Tirei do cabelo de Bailey um grampo. A mesma nem relutou. O abri e me agachei em frente ao cadeado. Enfiei o grampo lá e mexi, tentando destravar o cadeado com ele.
- Onde você aprendeu isso? – Bailey perguntou intrigada.
- Com a Daphne – sorri.
O cadeado se abriu e a parte mais difícil já havia sido feita. Tiramos as correntes que seguravam as portas e as usamos pra barricar ainda melhor a porta em que estavam os bichos, para conseguir prendê-los por mais um tempo.
Era engraçado como Zeus era um amador. Ele podia ter o poder de fogo, os soldados e todo o ar ameaçador, mas ele era amador. Não tinha estratégia. Ele contava tanto com seu egocentrismo e achava que era mais poderoso que Deus o suficiente pra não proteger seus pontos importantes, porque em sua cabeça limitada, ninguém seria esperto o suficiente pra o atacar.
E nem era questão de ser esperto o suficiente não, porque até alguém burro conseguiria adentrar no Hospital e o destruir por dentro, já que o líder acreditava que não tinha inimigos mais fortes que ele, por isso não se esforçava em proteger.
Acho que alguém disse que a ignorância e o narcisismo que derruba uma pessoa, né?
- Maldito estúpido! – Lola disse, enquanto entrávamos no arsenal.
As prateleiras estavam cheias de armas, desde pistolas à fuzis, armas militares e até armamento mais pesado. Claro que faltavam muitas armas, principalmente porque eles levaram a maioria pra guerra contra o QG. Mas mesmo assim, as que tinham no arsenal eram o suficiente pra que pudéssemos atacar de volta e causar um estrago.
O meu plano sempre foi muito simples, eu entraria no Hospital e desarmaria eles por dentro, mataria a maior quantidade de soldados possível pra que eles não conseguissem chegar ao QG e assim, o elemento surpresa de Zeus, sem todo o seu poder de fogo e soldados estaria perdido.
A parte complicada é que fizemos mais barulho que deveríamos. O meu plano era ser sorrateira. Silenciosa o suficiente pra que pudesse atacá-los de surpresa.
Agora com os tiros que tivemos que dar nos bichos, os soldados mortos, e o doutor também... era questão de tempo até que descobrissem que estávamos soltas e escondidas pelo Hospital.
E tudo isso poderia ter sido evitado...
- Que foda essa aqui – Lola pegava as armas e brincava com elas, se sentindo a mais foda segurando o pedaço de cano mais poderoso em suas mãos. Não consegui me conter.
Tirei a arma de sua mão e a empurrei, despejando toda a minha raiva nela. Não sabia se estava sendo justa, mas eu não conseguiria deixar em branco o que ela fez...
- Que merda é essa, ? – me empurrou de volta.
- Você tem noção do que fez, Lola? Não... você não tem! – me exaltei. – Que porra, eu planejei um plano inteiro pra que eu pudesse entrar e sair dessa merda sem perder ninguém, sem matar ninguém que não fosse do Hospital e você sozinha conseguiu descobrir tudo! Quer dizer... – me virei pra Paige. – Quase sozinha.
- Quê? O que eu fiz, ? Me explica. Eu só enfrentei um psicopata doente, um andarilho vivo! Por favor, não me diga que você estava com pena dele... – me encarava como se eu estivesse errada. Meu sangue ferveu.
Eu estava arriscando a porra da minha vida pra cuidar de todas e eu estava errada? Merda! Se eu estivesse sozinha, conseguiria sair desse lugar sem nem fazer um piu. Talvez devesse deixa-las pra morrer mesmo.
- Ele estava nos ajudando, porra! Você não consegue entender? – tentei controlar meu tom de voz, mas já estava difícil. – Não tem nada a ver com pena, remorso ou o caralho a quatro, pode ter certeza que no momento que fosse pra matá-lo, eu mataria, sem nem pensar duas vezes. Mas naquele momento precisávamos dele, estávamos cercadas de mortos-vivos que tinham sei lá o que no organismo deles. Vocês viram como pra alguns foi muito fácil arrancar membros, devorar um corpo inteiro e permanecer sedento... E o que você fez, Lola? Você nos botou nessa merda. Pode ter certeza que esse sangue não tá nas minhas mãos não!
Lola riu desdenhosa, aplaudindo à mim.
- Uau, , você é realmente fodona! Quer dizer, você nos mete nessa merda, nos bota pra trabalhar junto com um andarilho que poderia nos devorar quando quisesse e a culpa é minha por um acidentezinho?
Dessa vez eu ri.
- Eu botei vocês nessa merda? Sério, Lola? Fui eu quem atraiu o Zeus pra Colônia? Fui eu que botei vocês em filas e as coloquei em carros pra virem pra cá? Aceitem, se eu não estivesse aqui, o destino de vocês seria o mesmo daquele monte de corpos que vimos.
As meninas se calaram.
Podia parecer cruel falar, podia até ser errado. Num momento desse a calma é necessária, a tranquilidade e a razão é o certo, mas não dava. Sempre que eu estava no comando, minha liderança era questionada por motivos que não eram minha culpa.
Só que dessa vez, não estávamos presas numa lojinha de coisas pra bebê, trancadas esperando a chuva passar pra sobreviver à uma horda de mortos-vivos. Nós estávamos na base inimiga e aqui, nossa menor preocupação agora são os mortos.
- Por favor , não finja que está fazendo isso por nós! - veio até mim. - Você está fazendo isso por você, pelo seu ego… pra mostrar que pode ser uma líder, pra ficar na altura de sua irmã - riu.
- É melhor ficar quieta, Lola. Você não faz ideia do que está falando…
- Acho que tenho sim… e na verdade, tenho certeza - veio para mais perto. - O que vai ganhar sendo a fodona? Uma boa foda com o Slade? Cansou de brincar de casinha com o banana do e os malas dos filhos dele?
A estapeei com toda a minha força.
- Nunca mais fale de minha família. Ou eu te mato - me afastei.
Essa situação era ridícula, extremamente patética. Eu não as queria ali, eu queria fazer tudo sozinha e mesmo que talvez no fim fosse mais difícil, eu teria menos dor de cabeça.
Eu não estava entendendo Lola. Não fazia sentido o porquê estava agindo dessa forma, eu a ajudei e estávamos todas juntas nessa. Mas igual quando ficamos perdidas no Centro, eu estava sentindo como se elas não me aceitassem como líder… como se eu tivesse feito algo errado e não fosse digna.
Seria mais fácil deixá-las para morrer… mas infelizmente essa não era eu.
- Eu não peço a gratidão de vocês não. Não preciso que me devam a vida ou o que for, de verdade, podem ficar tranquilas. O que eu peço é um pouquinho de colaboração de cada uma, porque se vocês notaram, antes estávamos com um pouco mais de vinte, agora, estamos com dez, se chegar... E a maioria morreu sem chance de lutar, foram devoradas e nem com a gente estando em maior número conseguimos vencer. O que vocês acham que vai ser quando precisarmos enfrentar os soldados? Vocês acham que correr vai adiantar? Vamos precisar lutar e mesmo que sejamos dez contra vinte, trinta, cinquenta, não importa! Nós vamos lutar juntas pra vencer e vocês vão seguir as minhas ordens, querendo ou não. Ou eu as deixo pra trás.
As meninas permaneciam em silêncio, mas pelo seus olhares elas estavam concordando comigo. Era estúpido pensar que elas discordariam, sendo que eu era a única opção que elas tinham.
- Alguém tem algo contra? – perguntei, mas nenhuma se manifestou.
Quase.
- Eu tenho – Lola veio até mim, ficando cara a cara comigo. – Eu não sei quem morreu e te fez a líder aqui, Romero. Não vou te obedecer, não dessa vez. Você não sabe o que está fazendo, você tá com medo... vai acabar nos matando.
Dei os ombros.
- Bom, então pegue umas armas e dê no pé, vai enfrentar você os soldados e as que quiserem te acompanhar, podem ir. Eu vou atrás de suplementos, porque estou faminta e acredito que muitas aqui também estão. Não dá pra lutarmos fracas e de estômago vazio. Tire esse tempo pra refletir, se ainda estiver aqui quando eu voltar, espero que esteja ciente que só unidas poderemos vencer. E se não estiver... boa sorte, quem sabe o seu corpo morto distraia e facilite a nossa fuga.
Assim que disse, peguei um fuzil e balas, as coloquei em meu bolso. Peguei um coldre e uma pistola, levando pra garantir... nunca se sabe. Saí do arsenal. Agora teria que ir atrás de suplemento, o máximo que achar melhor.
E durante todo esse processo repetirei o meu mantra “seja uma líder, não abandone todas pra trás” repensando o porquê eu devia realmente ouvi-lo.

***


Lola.

Quem ela pensa que é pra me expulsar? Foda-se ela! Eu estava há muito mais tempo na Colônia, eu que deveria ser a líder dessa merda! Eu saberia como manter todas vivas, sem perder nenhuma no caminho...
Se tivéssemos matado aquele maldito doutor antes, todas estariam vivas e juntas. Mas não, quer ser a misericordiosa nesse momento tão precário. Por isso vai causar as nossas mortes, mas eu não vou morrer.
Não aqui.
Fui até às prateleiras e peguei armas, me armando por completo. Eu sairia dali e enfrentaria quantos soldados tivessem pela frente, não tenho medo, eu sei que posso sobreviver sozinha. Chegaria ao QG e lutaria ao lado de todos, como deveria ser.
- O que você tá fazendo, Lola? – perguntou Paige. – Você vai realmente cometer esse erro? Vai se matar pra quê? Pra provar que ponto?
Me virei pra ela sem paciência.
- Que provar o quê, eu quero é sobreviver e com a doida da isso não vai acontecer e você sabe muito bem disso!
- Eu não sei de nada, você tá viajando. A já nos salvou várias vezes, por que abandonaríamos ela? Eu assumo o meu erro, devia ter me controlado melhor e talvez evitado toda aquela situação.
Revirei os olhos. Cara, essa garota é boa... faz um discursinho e consegue fazer com que se sintam culpadas por algo que é culpa dela. Mas não comigo.
- Não é sua culpa! Ela que ficou ao lado daquele doutor maluco! Ela que está nos empurrando nessa situação sem salvação! Que merda, vocês não conseguem enxergar?
- Acho que é você quem não enxerga, Lola... – disse Bailey em seu tom de pena.
Foda-se, eu não preciso de sua pena. Eu não estou errada nessa.
- Lola, me escuta, por favor – Paige tocou em meu ombro. – Não arrisca sua vida sem motivo... espera a voltar com os suplementos, come e esfria a cabeça, ela vai bolar um plano e vamos embora, todas juntas. Por favor, se você for e algo acontecer... eu nunca irei me perdoar, Lola.
Respirei fundo. Ok, eu tentaria. Daria essa chance à . Mas pela Paige apenas, pois éramos amigas...
- Tudo bem. Mas se ela demorar demais, vou assumir o comando e vamos fazer as coisas do meu jeito!
- Tudo bem – as meninas concordaram.
Não tenha pressa , tome todo o seu tempo... enquanto isso eu crio uma estratégia que vai nos tirar daqui vivas.

***


Capítulo 33 – Mute

Romero.

Achar o depósito não fora tão difícil quanto eu esperava. Mas ele se localizava numa área “perigosa” no refeitório. Escondido depois da grande cozinha estilo americana de refeitório hospitalar.
Por sorte, não havia nenhum soldado perdido no caminho e me tranquei na sala onde estavam todos os alimentos assim que cheguei, eu permanecia de ouvidos bem atentos caso qualquer coisa acontecesse para evitar surpresas indesejadas e tiros que atraíssem atenções.
No depósito, havia de tudo: doces, salgados, enlatados e carnes. Eu sabia que o Hospital era bem abastecido, já que roubava todos os outros lugares e não levava só armas, mas também todos os tipos de alimentos. E levando em consideração que conseguiam entrar em lugares com muitos mortos-vivos graças ao seu poder de fogo, eles conseguiam se abastecer melhor que nós.
E como a divisão de comida deveria ser feita de forma “controlada”, sempre sobraria bastante, principalmente para Zeus, que com certeza adorava banquetes.
Também havia roupas e outras coisas dentro do depósito. Foi impossível conter o nojo ao ver a quantidade de revistas de pornografia que tinham. Deus, até na porra do Apocalipse os homens são repugnantes.
Peguei uma mala e enchi com todos os alimentos que vi pela frente, o suficiente para alimentar todas as meninas. Seria importante todas recuperarem suas forças para conseguirmos sair do Hospital.
A maioria não estava pronta pra lutar, mesmo que tenham sido devidamente treinadas. A pior parte é que agora elas teriam que lutar querendo ou não, ou não sairíamos vivas dali..
No momento em que fechei a bolsa, ouvi o barulho de passos e me escondi nas estantes ao lado da porta, a melhor posição para que assim que a pessoa entrasse no depósito, eu me jogaria em cima dela e na melhor das hipóteses, eu a imobilizaria ou a esfaquearia.
A porta abriu aos poucos e um soldado entrou no depósito. Assim que ele fechou a porta, avancei nele, pulando em suas costas. Ele se assustou, então não teve tempo de sacar a sua arma e foi o suficiente pra jogar a dele pra longe.
Ele conseguiu me derrubar, mas eu o segurei, puxando-o pra baixo junto comigo. Rolamos no chão, em uma luta corporal. Quando ele quase conseguiu ficar por cima de mim, esfaqueei sua perna e assim que ele gemeu de dor, aproveitei o momento de distração dele e fiquei por cima. Tirei a pistola do meu coldre e apontei pra ele. O soldado levantou as duas mãos em rendição.
- Por favor, não atire, por favor. Eu posso ajudar – disse desesperado, sem nem ao menos me deixar falar. Mantive minha arma apontada para ele, mas pelo seu tom de voz estranhei e acabei fraquejando um pouco.
- Quem é você?
Era um rapaz, na faixa dezessete ou dezoito anos, mesmo com a expressão cansada e as olheiras fundas, o rosto pálido agora mais avermelhado por causa da nossa pequena luta corporal e agora com gotas de suor escorrendo pelo seu rosto.
- Me chamo Trevor Carver. Eu sei que pode parecer suspeito e você não tem motivo nenhum pra confiar em mim, mas eu quero e posso ajudar você.
Franzi o cenho.
- Por que você me ajudaria? Por que trairia o seu líder?
Sua expressão escureceu, ficando mais sombria. Não tinha mais tanto desespero em olhar e sim raiva. Ele odiava Zeus, estava estampado em sua expressão.
- Ele não é meu líder, ele é meu inimigo. Eu preciso vingar o que ele me tirou... E só me vingarei quando seu sangue estiver derramado em minhas mãos.
Havia sido um enorme choque para mim estar vendo ali a personificação de um dos maiores pesadelos de Zeus, uma figura que ele jamais acreditaria que fosse possível de existir. E pela sua face, ele realmente deveria temê-lo. Mas mesmo assim, como eu deveria confiar nele? E se isso tudo fosse uma armação?
Mesmo jovem, ele era forte e parecia ser treinado o suficiente mesmo antes de Zeus e do Hospital, além de ter o ar intelectual e estratégico e para a infelicidade do seu líder, ele também o odiava e desejava sua cabeça em uma bandeja.
Um soldado perfeito, tudo que Zeus precisaria para prosperar agora estava contra ele... ajudando uma de suas piores inimigas. Isso soava vitorioso para mim.
- Por que deveria confiar em você? – perguntei. Não mudei minha posição, minha arma continuava em sua cabeça. Poderia confiar e deixá-lo viver? Era o que eu precisava saber, era o que essa pessoa deveria me convencer.
Assim que minha pergunta foi feita, as mãos do soldado foram direto pra minha cintura e um único movimento, agora ele estava por cima de mim. O susto me fez abaixar minha guarda e a arma que antes eu apontava pra ele, agora estava em sua mão e apontada pra minha cabeça.
Esperei que atirasse, que ele comprovasse que era um Z até a morte e que mais uma vez me enganei e confiei na pessoa errada, mas não atirou. Não foi sádico pra esperar que eu implorasse – porque eu não faria. E não aproveitou o momento para agir de forma suja comigo. Ele apenas desmontou a arma em minha frente, soltando o carregador junto com as palavras.
- Confiável o suficiente pra você?
Engoli seco. Se fosse lá fora, em outras circunstâncias e outras realidade, em um outro momento da minha vida, eu juro que estaria completamente impressionada por esse homem, imaginando que conheci a porra do Chris Redfield, mas não.
Confiança era algo que vindo de mim é mais difícil que ganhar na loteria e ele só conseguiu me impressionar e imaginá-lo como arma ao meu favor nessa guerra.
Trevor segurou minha mão e me puxou para cima, me levantando junto com ele.
Eu ainda não confiava nele, mas nesse momento estávamos desarmados – quase – e não atiramos no outro por enquanto.
- Agora, você poderia me contar como veio parar aqui no Hospital? – perguntei e o rapaz em minha frente deu os ombros.
- É uma longa história.
Me sentei na mesa e peguei um chocolate que estava dentro da bolsa que levaria pras meninas.
- Não tenho pressa.

***


Paige.

Merda , cadê você?
As meninas estavam ansiosas por causa da demora de e eu estava tentando acalmá-las porque se estava demorando era porque tinha um motivo. Afinal, estávamos em um Hospital cheio de soldados de Zeus, seria difícil ela ir e voltar tão rápido assim.
Por sorte consegui acalmar as meninas... quase todas. Uma estava mais ansiosa que todas, sorridente por causa da demora de e pronta pra ir embora, nos levando junto.
Era o que ela pensava.
- Bom, não tem mais por que esperar. Ela morreu – Lola sorriu. Mas nós não estávamos com boas caras. – O que, meninas? Sejamos realistas. Ela deve ter morrido... uma pena.
- Uau, você é fria...
Lola deu os ombros.
- Eu sou prática e eu quero sobreviver. Adoro a , mas quando estamos na Colônia e minha vida não tá nas mãos dela. Agora que sobreviver é a única coisa que temos, não posso perder tempo presa nessa sala esperando ela voltar.
- Caralho Lola, você não se tocou que até nisso a fez o melhor pra gente? – me exaltei. Andei até ela, ficando frente a frente. – Estamos na porra do arsenal de armas, trancadas aqui por causa da e enquanto estivermos aqui estaremos seguras! Se alguém entrar, nós metralhamos e pronto! Agora o que você quer? Nos levar lá pra fora pra realmente correr perigo porque não consegue aceitar a liderança da ?
Sua expressão ficou raivosa, furiosa. Ela me empurrou e caminhou pras prateleiras. Pegou uma bolsa e armas, encheu com quantas pode.
- Quer saber? Fodam-se vocês. Se querem morrer aqui o problema é de vocês, mas eu não vou morrer aqui!
- E o que você vai fazer? Vai sair daqui e matar todos os soldados que vir pela frente? Boa sorte. Uma contra vários vai dar muito certo!
Deu os ombros.
- Pelo menos eu vou tentar algo... não vou me esconder atrás da e esperar que ela mande pra que finalmente tomem um atitude.
- Então boa sorte, Lola. Vai fundo. Eu espero te ver viva no QG quando chegarmos lá, todas vivas e com todas as armas.
Lola riu.
- É... vamos ver – e saiu do arsenal.
Esperei que fosse apenas um momento de raiva, em que ela finalmente botaria a cabeça no lugar e voltaria. Mas não, não voltou. Ela realmente foi e decidiu encarar aquilo sem nem ao menos pensar em sua vida.
Tem pessoas que não tem medo da morte e essas são as mais perigosas, porque quando não se tem nada a perder não se tem limite.
Agora eu só conseguia pensar onde estava e rezava para que estivesse viva e voltasse logo, porque eu não fazia ideia como contar o que aconteceu.

***


Romero.

- Não é uma história linda e não tem um final feliz – Trevor começou. – Lá fora as coisas não eram bonitas, eu fazia de tudo para sobreviver, mas se eu soubesse do que sei hoje... Eu jamais teria reclamado por um instante – riu triste. – Mas então ele e seus soldados me encontraram e me trouxeram pra cá... e foi aí que vi o que era o inferno. Ele queria um soldado, ele precisava que eu fosse um soldado dele. Eu não tive outra opção, era isso ou minha vida. E até então, a morte não era algo que eu almejava.
Eu não falava nada, não queria interrompê-lo. Eu saberia que não teria a versão completa de sua história, já que ele se atentava nos detalhes que me dava, mas só de saber uma parte, já era importante para confiar.
- Zeus parece ser esperto, mas ele é estúpido. Ele e seus soldados... por isso agem na brutalidade, porque não sabem agir com a inteligência. E foi assim que eu consegui me infiltrar. Foi simples até – deu os ombros. – Só precisei agir como um soldado, ouvir e rir de suas piadas nojentas e fingir que estava tudo bem, que eu gostava disso. Era detestável fingir que era um deles, porque eu não sou e nunca serei.
Sim, conseguia sentir empatia. Conseguia sentir o remorso em sua voz e a força em que sabia o que faria quando isso acabasse, não havia um “e se...”, era uma certeza.
- E descobriu algo que pudesse te ajudar?
- Conheci lugares estratégicos, pontos menos movimentados e observados. Lugares para me esconder quando não vestia meu uniforme e tentar ignorar o nojo que sinto desse lugar. E foi assim entre os canos do Hospital que pude ver com meus próprios olhos o que acontece com as mulheres aqui. E foi assim que conheci... ela – suspirou triste.
- Ela? Ela quem? – perguntei. Estava receosa em tocar nesse assunto de forma bruta, mas já que o assunto fora trazido à tona não deixaria passar.
- Não quero falar sobre isso – mas me cortou. Haviam duas opções, insistir ou desistir do assunto. Queria insistir, mas isso poderia impedir que saíssemos do Hospital com vida.
- Pode me dizer ao menos o que aconteceu?
- Não é bonito, ... As mulheres aqui são maltratadas, tem seus cabelos raspados e se tornam escravas... “esposas” de Zeus, para quando ele quisesse e para o que ele quisesse – senti a repulsa em seu tom. – Todas. Nem uma mulher fora poupada. E eu não pude fazer nada... eu não pude protegê-la.
Senti o clima pesar e achei que seria melhor cortar o assunto, mas quando notei seu pomo-de-adão subir e descer, percebi que chegamos à parte difícil de sua história.
- Quando os primeiros indícios de guerra apareceram, Zeus não queria que seus soldados sofressem distrações e nem houvesse falta de comida, por isso... – não disse mais nada.
Ele as matou. Ou melhor, mandou as matar.
E pela expressão de dor misturada com fúria em seu olhar, não precisa dizer qual fora sua função nessa missão.
Não sabia quem era essa mulher que Trevor falava, mas pela forma que falava e pela dor que emanava, com certeza os dois tiveram uma ligação especial. Seria possível se apaixonar vivendo nesse inferno? Impossível era imaginar matar a pessoa que ama a mando de um monstro.
Zeus não é uma pessoa que constrói lealdade, ele obriga uma lealdade e bota seus soldados em situações deploráveis, desumanas e muitos se transformam nos monstros que ele cria, uns já são esses monstros e outros... outros são que nem Trevor, que vivem movidos pela vingança e assim que a tiverem, pagarão pelos seus pecados.
E mesmo que os pecados de Zeus sejam os piores porque ele é o mandante, são os seus soldados que executam, que tem o sangue cobrindo suas mãos e carregam a culpa, os pecados e a dor.
- Eu sinto muito.
Era só o que eu podia dizer, de verdade.
- Você tem alguém que você ame tanto, mas tanto, que chega a um ponto que viver nessa realidade se encurta apenas em viver por essa pessoa? – assenti. Sim, eu tinha, claro que tinha. – Esse sou eu agora, eu perdi a pessoa que eu mais amo em minha vida e por isso estou disposto ao que for preciso pra que Zeus pague. Pra acabar com esse local aqui que trouxe tanto sofrimento para mim e para todos, não só as mulheres e crianças que foram brutalmente tratadas aqui. Até pelos soldados que vivem essa realidade por obrigação, por ser sua única forma de sobreviver. Nem todos são maus, eles só têm mais medo de Zeus do que dos mortos lá fora. E só assim eu terei a minha paz, entende? Só assim eu pagarei pelo o que fiz. – me encarou. – E é por isso que quero ajudá-la, eu sei que posso ajudar e eu farei o que precisar, tudo que você pedir.
Eu conseguia entendê-lo, porque por tempos meu único combustível era meu amor e minha sede por vingança. Por mais que enchesse meu coração com seu amor, eu ainda vivia assombrada pelo ódio que sentia por Zeus e pela necessidade de vê-lo morto.
Só derramando seu sangue teria minha paz.
Não tinha ainda a confiança cega, mas era o suficiente pelo momento para que pudéssemos sair daqui juntos e então derrubar Zeus. A partir dali, o darei a chance de decidir como quer seguir sua vida.
Me levantei e caminhei até o rapaz que me encarava esperando a minha primeira ordem.
- Vou te apresentar a umas pessoas.
É, isso vai ser divertido.

***


Paige.

Eu estava começando a enlouquecer, merda, onde estava ?
Já não bastava Lola ter surtado e sumido, agora não dá nenhum sinal de vida também... parecia que já faziam horas e nada dela, nada! O que estava acontecendo?
Nos assustamos quando ouvimos a porta se abrindo. Mas mantivemos nossas armas baixas porque acreditávamos que poderia ser ou Lola, que voltaria a si e desistiria da ideia suicida de fugir sozinha.
Mas não era isso... estávamos enganadas.
Assim que percebemos as roupas similares à de soldados do Z, apontamos nossas armas pra ele. Só que travamos, nenhuma de nós teve coragem de atirar. O que falaria disso? Que éramos lerdas e estúpidas. Merda, morreríamos por nossa covardia.
Mas assim que tomei coragem pra atirar, lembrando de tudo que havia nos ensinado durante todo esse tempo. O soldado fez um gesto com a mão... espera, é a...
?!
- Vocês foram lentas – disse, tirando o boné que escondia seu rosto. – Se eu fosse realmente um soldado, vocês estariam mortas – sorriu e veio até nós.
Quando vimos a figura masculina ao seu lado, miramos automaticamente para o homem. Ele era alto, com um porte físico malhado e provavelmente mais forte e ágil que todas aqui. Tinha cabelos pretos cacheados e bagunçados e vestia moletom, provavelmente era o dono das roupas que usava agora.
Só precisávamos de um sinal de e atiraríamos ou pelo menos nos manteríamos em guarda até ela nos explicar quem ele era.
- Relaxem, ele vai ajudar – disse, ainda rindo do nosso desespero. O homem jogou uma bolsa na mesa em que estavam as armas. – É comida, se alimentem...
Deus abençoe Romero! Caralho, ela realmente conseguiu! E conseguiu ainda um soldado pra ajudar com que ela se infiltre nos que estão espalhados pelo Hospital... genial, muito genial!
- Ei, pera aí, tá faltando uma... – notou e se virou pra mim. Arqueou a sobrancelha. – Cadê a Lola, Paige?
Respirei fundo. Agora vai... por Deus, que esse grandão aí consiga segurar toda a fúria de e não a deixe me matar, amém.
- Então, eu tenho meio que uma má notícia pra te dar...

***


Romero.

Impressionante... impressionante pra um caralho! Mas que merda, o que essas meninas têm na cabeça?
Ok, eu entendo que a Lola seja meio problemática e revoltada, que igual a mim se vira melhor sozinha do lado de fora que com um monte de gente em um grupo de dentro, eu entendo isso, mas suicida... isso é realmente demais pra mim.
O que ela pensava? Que ia sair e atirar pra todos os lados, matar todos os soldados e fugir sem nada atrapalhando? Que merda, pra conseguir fugir ela quase morreu e ainda perdeu a menina lá no caminho... Nós pra fugirmos perdemos mais metade! Droga, por que ninguém consegue me obedecer?
É por isso que eu não sou líder, senhoras e senhores. Porque eu não tenho paciência e eu não consigo ter empatia por quem não consegue aceitar as ordens e não arriscar tudo porque não concorda comigo!
Ainda mais agora que eu finalmente consegui arrumar uma maneira mais limpa de fugirmos. Eu estava vestida de soldado, poderia usar isso pra matar o máximo que conseguir sem fazer muito alarde. O Trevor seria meu plano B, ele diz ser um ótimo atirador, então ajudaria da melhor forma possível. Mas agora...
- O que faremos agora, ? – Brianna perguntou assustada.
- Vamos manter o plano original. Nós vamos embora e eu vou tentar cobrir vocês, usando o uniforme. Temos armas com silenciadores, usaremos isso pra atirar da forma mais discreta possível e matar o máximo que conseguirmos, pra fugir. – respirei fundo. – Eles não sabem que estamos aqui, então ainda estamos em vantagem.
Falei cedo demais...
- Atenção, Falcão 007! – o talkie de Trevor chamou atenção. Ele pegou. Sinalizei para que respondesse normalmente.
- Na escuta, Águia 69! – disse um pouco desconfortável em ter que repetir a referência numérica que o soldado havia escolhido como seu codinome. É, homens ainda mesmo no fim do mundo são desprezíveis. – Pode falar, câmbio.
- Código vermelho, 007! As vadiazinhas fugiram, mataram dois dos nossos... elas devem estar escondidas em algum lugar do prédio. Vamos varrer tudo... Conseguimos pegar uma delas – o cara do outro lado riu. – Direto pro inferno. Câmbio.
Lola...
O clima pesou e todos nós ficamos em silêncio por um instante. Não queria pensar o que fizeram com ela, queria imaginar que Lola se foi lutando, como a guerreira que era.
- Eles vão pagar por isso... - sussurrei para minha equipe, garantindo que só elas ouviriam e pudessem sentir o conforto em minhas palavras.
Me virei à Trevor. Agora era a hora dele provar sua lealdade e nos ajudar. Eles estavam atrás de nós, não teriam dó dele se ele fosse pego conosco... resta saber agora de que lado ele estaria.
O rapaz tocou meu ombro, em um gesto de cumplicidade.
- Ficarei de olho, 69. Qualquer coisa, eu aviso. Nós vamos pegá-las... Câmbio e desligo. – desligou o talkie e jogou no chão, pisando nele com força até que se quebrasse em vários pedaços. – Se foder, filho da puta!
Acenei a cabeça e ele acenou de volta. Trevor provou que posso confiar nele, então estava na hora de seguirmos com o plano B. Mas o meu plano B, o lógico e o único que faria com as armas saíssem do Hospital e fossem pro QG. O plano correto.
Chamei Trevor para o canto mais afastado das meninas, precisava conversar com alguém que já esteve dentro do Hospital e conhecesse as coisas. Ele havia me contado que conhecia cada canto do prédio e seus pontos estratégicos, então seria de grande ajuda agora.
Só precisava que ele não empatasse o que eu estava querendo fazer...
- Se eu quisesse explodir o Hospital, para onde eu iria? – perguntei de uma vez e os olhos de Trevor se arregalaram. Ele entendeu o que eu quis dizer, mas já negou com a cabeça. Não dei tempo. – Você disse que faria o que fosse pra me ajudar, então me diga, como eu explodo o Hospital?
Trevor passou as mãos pelo rosto e respirou fundo. Seu pomo-de-adão subiu e desceu novamente e ele suspirou fundo. Ele me daria a resposta que queria.
- Existe uma escada que leva ao subtérreo do Hospital e lá tem o gerador, umas máquinas e essas coisas... Lá tem uns barris que vários tipos de gases e a maioria é inflamável. Se conseguir liberar esses gases, uma chaminha que seja, já explode tudo.
Assenti.
- Mas , é impossível sobreviver a isso. Quer dizer, se eu, você ou qualquer pessoa conseguir liberar o gás, terá questões de segundos pra sair de lá antes que exploda... – disse, mas então seu olhar mudou... Ele teve uma ideia. – A não ser que não seja nenhum de nós que bote o fogo.
- O que quer dizer? - Franzi o cenho.
- Ainda existe um gerador lá em baixo e um climatizador. Por isso que certas áreas são muito mais frias que outras. Se conseguirmos fazer com que o climatizador esquente muito mais que deve, trabalhe muito mais que possa trabalhar...
- Ele pega fogo – sorri. – E se ele pegar fogo com os gases livres...
- Bum! - se animou junto a mim.
- Vai ser perfeito. Nós ativamos as máquinas e fugimos. É o tempo pra que tudo esquente e exploda, o Hospital vá pelos ares e todos aqui dentro também. Nenhum de nós se sacrifica e todos teremos a oportunidade de lutar pelo lado certo no QG e ter a chance de dar um tiro no maldito do Zeus.
- Então bora!
Me virei para as meninas e pela primeira vez em muito tempo agora eu me sentia completamente no controle, sem dúvidas e sem precauções. Eu sabia o que deveria ser feito pra acabar com o Hospital e não mediria nenhum esforço pra isso.
Eu explodirei essa merda e vingarei a morte de Lola, queimando quem a matou. Acabarei com o império de Zeus por dentro e levarei as armas pro QG, pra vencermos essa guerra de uma vez por todas!
- Meninas, se preparem – sorri. – Está na hora de acabar com esses filhos da puta.

***


Talvez eu tivesse falado cedo demais...
- Que merda vocês fizeram aqui? – Trevor tentou se conter, pra não chamar muita atenção. – O corredor tá cheio de bichos, como vamos passar?
Eis que a tal escada que nos leva até o subtérreo do Hospital está no corredor do laboratório, porque seria muita sorte se fosse em qualquer outro lugar dessa merda de prédio enorme.
- Tem sempre um jeito... vamos meter balas neles! – Paige disse – Ou podemos usar o sangue deles e mudar o nosso cheiro... fizemos isso uma vez, deu certo. Quase certo...
Boas memórias de situações de quase morte.
- Não dá... esses bichos são mais... espertos. Algo que o doutor Snyder injetava neles pra tentar transformá-los em um Gut só que mais inteligente. Eles conseguem farejar o cheiro humano com mais facilidade.
- Ei, pera aí... – apontei pra vidraçaria da porta e franzi o cenho. – Eles estão se devorando? – abri a boca em choque. – Caralho, eles estão se devorando!
- O quê? – Trevor se esticou pra ver melhor. – Eita porra, eles então se devorando mesmo!
- Isso é bom? – Bailey nos encarou esperançosa. Dei os ombros.
- Bom, bom, bom não é, mas não é ruim.
- Se eles estão se devorando, são menos pra matarmos. Só que os que estão devorando devem ser os mais fortes, então não podemos errar os tiros. Todos tem que ser na cabeça pra matar de uma vez.
- Quem morreu e te fez o líder daqui? – revirei os olhos. – Ok gente, tiros na cabeça, não se esqueçam.
Trevor riu.
- Eu vou na frente, só pra garantir... – disse e se posicionou, soltando o cadeado aos poucos.
- Você não vai me ouvir protestar.
Assim que Trevor abriu as portas do corredor, apontou sua arma pra cabeça dos mortos-vivos e atirou com precisão. Eu e Paige dávamos cobertura, atirando nos que ele não conseguisse ver ou que estavam jogados no chão, parecendo “mortos”, mas não estando.
Os tiros eram silenciosos – graças aos silenciadores – e aos poucos os corredores ficavam apertados, graças à quantidade de corpos estendidos no chão. O cheiro de podre subia e o corredor parecia mais quente que o normal. Era uma caminhada difícil.
A parte mais difícil foi ter que matar mais uma vez nossas antigas companheiras que foram atacadas, poucas delas realmente ainda estavam “vivas”, muitas foram devoradas por outros mortos-vivos, os mais fortes.
Quando chegamos ao último, o mais forte, que estava sentado no chão devorando a cabeça de outro morto-vivo como se sua vida dependesse disso, a nossa surpresa foi ver o jaleco todo coberto de sangue e gosma, sujeira e pedaços de corpo, do doutor.
Paramos para olhá-lo e ele nos olhou de volta. Ele diferente dos outros, ainda mantinha sua aparência mórbida e humana, mesmo que agora deteriorada. Seus olhos estavam esbugalhados e totalmente brancos, sua boca imunda.
Ele berrou para nós, um berro que se transformou em choro. Um choro dolorido, como se a parte consciente que um dia esteve ali, estivesse reassumindo o pouco controle que tinha e encarando tudo que fez. Só ele havia devorado a maioria dos mortos-vivos, por isso sua barriga era enorme e parecia que estouraria a qualquer momento.
- Eu nunca gostei dele... – Trevor disse. – Mas de todos, ele foi o mais humano. Ele se importava conosco, perguntava se estávamos bem e era o que mais temia Zeus. É uma pena... ele só fez tudo que fez pra ter a chance de trazer seus filhos de volta como fez com Gut e agora...
O doutor tinha a cabeça de dois mortos-vivos esverdeados, com o rosto totalmente deformado e imundo em seu colo. Ele não os devorava, ele fazia carinho em suas cabeças enquanto chorava, um choro que não dava medo e sim... dó. Ele estava sofrendo, chorando por seus filhos.
Era por isso então que ele fez tudo isso? Pra trazer seus filhos de volta? Por isso o choro, por isso o surto... por isso se importava tanto com eles. Ele não queria ser um monstro, ele não queria fazer tudo que fez, mas fez, por um motivo honesto.
Nessa realidade, não podemos julgar alguns porque só nós sabemos como é difícil manter a humanidade nesse mundo, como é difícil ver nossos familiares se tornarem no que devemos lutar contra e não poder fazer nada! O doutor tentou fazer algo e pra isso teve que se aliar com o pior humano vivo.
Nem todos são que nem Zeus. E eu sinto pena dessas pessoas, pena por não terem cruzado o caminho certo que eu tive a chance de cruzar, de conhecer as pessoas que eu conheci e ter tido segurança, família e arrumado um lar, como eu consegui.
Atirei na cabeça do doutor.
- Que ele fique com seus filhos agora – disse e segui reto o caminho, com o grupo me seguindo atrás.
- Por aqui – Trevor apontou pra portinha que ficava entre a do laboratório e a do açougue. Abriu e nós seguimos, descendo pela escadaria até o andar de baixo. O subtérreo.
Arrombei a porta da sala de máquinas e nós entramos. Lá com certeza era o único lugar que não parecia ter parado no Apocalipse.
As máquinas estavam em boas condições e faziam barulho de que estavam funcionando. Haviam vários barris em que ficavam os gases, havia o gerador que piscava e ao seu lado o climatizador.
- Como isso ainda funciona depois de tanto tempo? – Bailey perguntou curiosa, enquanto fuçava pelas máquinas, tentando entender os seus usos.
- Antes de Zeus invadir, isso aqui era uma base segura. Os antigos moradores poupavam energia e arrumavam fontes alternativas, como a solar. Mas assim que Zeus assumiu, usou a fonte alternativa de seu gosto... a humana. Vários morreram pra gerar energia o suficiente pra manter os geradores. Depois ele usou os bichos, já que se balançar um pedaço de carne pra eles, eles podem ficar por horas sem se cansarem – olhou para o gerador ligado e se virou pra nós. – Inclusive devem estar trabalhando agora.
- Como você sabe de tudo isso? – franzi o cenho.
Trevor deu os ombros.
- Eu disse que não gostava do doutor Snyder, mas ele era o único humano aqui. E um tremendo fofoqueiro.
Trevor foi até o climatizador e ajustou o regulador, deixando-o no máximo. O ar já estava ficando mais quente e denso, conforte o aparelho ofegava. Ele quebrou o regulador, impedindo que pudesse resfriá-lo.
- Agora é uma questão de tempo até que ele pife de vez e incendeie...
Enquanto terminavam com o climatizador, eu me locomovi até o um dos gases. O barril de cor vermelha e com um sinal que informava que eram inflamáveis. Segurei com força o machado em minha mão e acertei no metal. Acertei várias vezes seguidas, despejando toda a minha força até que abrisse uma pequena fenda.
- Está saindo o gás? – Bailey perguntou.
- Sim, eu acho.
O resto do grupo se aproximou. Assim que conferimos que realmente havia gás saindo daquela fenda que abri, era o suficiente para subirmos.
- Vamos. Agora nós temos um tempo antes que isso aqui exploda. O suficiente pra fugirmos com todas as armas.
Saímos da salinha e subimos a escadaria até novamente ao arsenal. Trancados lá novamente, enchemos bolsas com as armas e munições, deixando uma bolsa para cada uma de nós.
- Agora é a hora da verdade... – comecei. – Eu vou na frente, já que estou vestida e vocês me dão cobertura. Assim que sairmos, corram sem parar até o QG e quando chegarem, entreguem as armas para a e . E lutem. Nós vamos vencer!
Armadas e perigosas, saímos do arsenal e passamos pelo corredor principal do Hospital. O corredor que nos levaria até a entrada principal e que era o único lugar sem mortos-vivos que poderíamos passar. havia contado do muro de arame quando saiu da primeira vez, ir por lá seria mais difícil agora carregando bolsas com as armas.
A entraria principal era mais arriscada, mas era a melhor opção. Só precisaríamos abater os soldados que cruzarem os nossos caminhos.
Os soldados estavam à nossa procura, por isso quando chegamos ao corredor principal, nos esconder e atirar foi necessário. Aos poucos um a um foram caindo e a saída estava cada vez mais próxima. Esse era o momento que fugiríamos de uma vez.
Mas quem diria...
- Espera, espera! – Trevor segurou e apontou pra entrada, - Gut tá lá, é impossível passar com ele por ali... vai atrair atenção indesejada.
Ele estava certo. Os soldados que não sabiam que estávamos na entrada, estariam nos procurando pelos outros corredores e isso fazia com que eles ficassem perdidos, então na hora que explodisse, eles seriam pegos mais facilmente. E os da entrada, seria tarde demais pra eles também.
Mas agora, com Gut na entrada... isso impossibilitaria que pudéssemos sair pela porta da frente e só dar conta dos soldados de lá.
- Ok, mudança de planos... – comecei e as meninas me encararam. Tirei minha bolsa e entreguei para Bailey. – Vocês vão, eu vou dar cobertura. Saiam e sigam o plano original.
Gut era lento, então se eu atraísse sua atenção ele viria até mim e não até as meninas que passariam pelos portões atirando.
- Mas , não podemos a deixar pra trás! Lembra? Ninguém deixa a outra pra trás – Paige disse aflita. Eu sabia que ela estava assustada e nesse momento, eu precisava que ela fosse forte.
- Minha filha, faça o que eu digo agora e o que eu disse em outros momentos... – disse e as meninas me encararam confusas.
- Quê?
- Eu quero dizer que nesse momento, você vai liderar as meninas pra fora e eu vou dar cobertura. Você lidera as meninas até o QG, entrega as armas e avisa que eu tô chegando. Assim que eu atrair o Gut pra cá, eu fujo, ele explode junto com o resto do Hospital e pronto, final feliz!
Paige obedeceu e puxou as meninas em direção pra entrada. Assim que respirei fundo e virei para o lado, me assustei com a figura de Trevor ainda em posição e deixando claro que não iria a lugar nenhum.
Revirei os olhos. Como sempre tinha que ser um homem que não consegue me obedecer. Ai, Papai do Céu.
Tenho imã.
- O que você ainda tá fazendo aqui, meu anjo? Vai com elas – apontei. Mas Trevor não saiu do lugar.
- Nah, eu vou ficar. Eu atiro bem, lembra? Vou conseguir atirar nos soldados que se expuserem enquanto elas correm e você atrai o Gut.
Revirei os olhos.
Sinalizei pras meninas e assim que dei o sinal, elas passaram pela porta do Hospital. Eu expus minha posição e apontei minha arma pra Gut, dei tiros segundos em seus pés enquanto ele sambava de um lado pro outro, sem saber pra onde correr. As meninas se separaram assim que passaram pelos portões, atirando pra cima. Trevor atirava nos soldados escondidos, fazendo-os choverem do céu.
Assim que as meninas sumiram da minha vista, respirei aliviada e me escondi enquanto Gut vinha em minha direção.
O ar estava mais abafado no Hospital e era sinal que faltava pouco para que a explosão suceda. Gut vinha até nós com fúria e agora eu só precisava o atrair pra um bom lugar, assim quando o Hospital explodisse ele fosse atingido.
- Tá pronta? - Trevor disse para mim, enquanto me dava cobertura.
- Mais do que nunca.

***


Romero.

Teddy o levaria, fecharia seus machucados e ele ficaria bem. Apenas isso.
Meu coração ainda estava paralisado e engoli seco, correndo até a área dos quartos.
Ainda era possível ouvir os sons de tiros ocorrendo do lado exterior do QG, a base era forte e feita propriamente para guerras deste tipo, mas não conseguiríamos manter todos salvos por muito tempo, por isso o plano B já estava em ascensão.
Amarrei meu cabelo e respirei profundamente ao averiguar o local, algumas pessoas estavam gravemente machucadas e uma equipe própria de cuidadores do nosso time tentava estancar suas feridas.
- Terminem logo, por favor – gritei entre a euforia de mães chorando por seus filhos e uma luta determinando nosso futuro lá fora. – Temos que encaminhar todos os sobreviventes para os veículos o mais rápido possível.
- – um dos cuidadores chamou minha atenção, ele havia finalizado uma costura na perna de um senhor de idade. Sua face parecia assustada. – Não vamos conseguir levar todo mundo... São muitos, precisamos de ajuda.
- A ala leste deveria estar aqui ajudando... A posição deles ainda não foi encontrada – comuniquei.
- Eles deveriam, mas... Não aceitam meus pedidos.
- Me empreste seu walkie-talkie Bruce, por favor – ele devolveu com “sim senhora”, alcançando o objeto.
Apertei rapidamente o botão e me ajoelhei na frente de uma garotinha de cabelos cacheados, que não parava de gritar desde que cheguei ali. Ela era pequena, então parecia estar camuflada no meio de tantos adultos com suas próprias dores.
- Mamãe! Mamãe! – As palavras saíam desconexas, mas ainda era compreensível.
- – uma garota da minha idade apontou para próximo das minhas pernas. – Gaze, por favor!
Joguei o utensílio para ela e voltei à atenção para a criança à minha frente, identificando seu problema. Ela apertava a própria perna, pequena, tentando se levantar, e não conseguindo.
- Shhh, pequena, não faça força – segurei a em meu colo, impedindo que se machucasse ainda mais, e apertei rapidamente o botão no walkie-talkie.
- Liam?
- Em posição.
- Status da ala este, por favor – pedi, tentando massagear a perna da pequena com minha outra mão. Levei um susto ao olhar através de um espelho do quarto minha face ainda suja de sangue do Slade. Limpei rapidamente para não assustar a criança.
- Nada ainda, chefe – falou ele, parecendo impaciente.
- Venham diretamente para os quartos, precisamos de reforço para transportar os sobreviventes.
- Estamos indo – desligou.
A menina no meu colo ainda não havia parado de chorar e fiquei nervosa. Situações de risco comigo mesma eram fáceis de lidar, mas eu certamente não estava cogitando fazer queimaduras na pele da criança para fechar qualquer ferimento.
- Bruce, ela está com a canela fraturada – gritei em meio ao caos, pedindo ajuda ao garoto.
Ainda ajudando o idoso, ele tentou me atender.
- Quebra ou torsão?
- Eu não sei – fiz careta.
- Tudo bem... Apenas... Tente imobilizar a Alice.
Certo.
Pensei por um tempo, observando e andando pelo quarto, ajudando os que precisavam de algo no caminho, sem largar Alice de meu colo. Ela não era mais um bebê, mas estava próxima de ser.
Aparentemente não tínhamos talas, então alcancei um pedaço de madeira da carcaça da cama e quebrei em um tamanho ideal para a perna de Alice. Tomei o cuidado de enrolar a madeira com uma fita branca, em caso de fiapos ou algo do tipo.
Com a ajuda de Bruce, parei a menina em seu colo e tornei a fita em sua perna junto com a tala improvisada. Foi difícil, ela se debatia e chorava de dor, mas funcionou.
Em seguida, Bruce trouxe o que parecia ser uma aspirina e quebramos no meio, fazendo Alice tomar.
Um dos membros da equipe da ala leste que havia aparecido segundos atrás resgatou a menina em seu colo, que agora lutava para manter seus olhos abertos de tanto sono e luta.
Suspirei e virei para o quarto outra vez, notando o vazio de pessoas, mas marcado com seu rastro de sangue.

***


No corredor, passei por Dylan e o chamei, o garoto veio rapidamente. Ele era um pouco jovem, mas era valente. Sabia que era a pessoa certa para fazer esse pedido.
- Vá até meu quarto, dentro de uma mochila verde você encontrará algumas pílulas, pegue tudo que encontrar e leve até Bruce.
O garoto assente e corre.
Em um dos quartos, havia um menino deitado na cama com o braço ensanguentado. Ele tinha sido mordido.
Depois que Zeus chegou, os mortos pareciam tão estúpidos que em situações como esta, eu lembrava o quão importante era que não baixássemos a segurança contra os nossos inimigos de longa data.
- Estamos sendo invadidos por eles – a mãe do garoto chorou para mim. – E os que morreram estão se transformando neles... – não terminou, nem precisou. Seu filho estava gemendo de dor e o sangue jorrava pelo seu braço.
- Você precisa sair daqui.
A mulher riu.
- Por quê? – eu me sentia estúpida.
- Ou você vai morrer também – era óbvio, ela sabia disso, e ela não se importava.
Seus olhos brilharam, enquanto fazia carinho no seu filho. O garoto tinha os olhos profundos e arroxeados, o corpo encharcado de suor e sangue, mas para ela, ele parecia ser perfeito, o menino de sempre.
- A razão pelo que eu luto já está indo embora – sussurrou triste, beijando a testa dele.
Engoli seco.
- Tranque as portas e mantenha silêncio – arrastei pelo chão a única arma que tinha para a direção da senhora que se assustou um pouco, e fui embora.
Cada um lida com o luto da sua forma, não estou aqui para julgar isso. Eu só esperava que ela... tentasse.
A mulher assentiu e eu voltei pra porta, trilhando meu caminho para sair.

***


Grimes.


Escondidos na laje, atiramos nos soldados do lado de fora para evitar que eles não chegassem mais perto. Mas aos poucos os tiros foram cessando e estranhei. Eles estavam recuando?
Por que eles recuariam?
Ouvimos os caminhões dando a ré e me levantei pra ter uma visão melhor do portão. Eles realmente estavam indo embora... mas que merda, por que ele estava indo embora?
Judas e eu fomos até o lado de dentro do forte, para reagrupar e tentar entender a ida precoce dos soldados do Hospital.
- O que houve? – chegou e veio até nós. Dei os ombros.
- Eles foram embora... Eu só não entendo o por que.
caminhou até a laje e apontou para o muro com os andarilhos tentando escalar e uns conseguindo. Atrás dos muros havia uma horda de mortos encurralando todo o QG. Era impossível entrar e sair sem que eles atacassem... por isso que o Hospital fugiu.
- Duzentos... talvez mais – ela disse em um suspiro apático e se virou para nós. – E temos algo a mais para nos preocupar.
- O quê? – franzi o cenho.
- Zeus está sumido.
Quais eram as chances dele ter morrido de verdade e tenhamos vencido a guerra? A mais provável era que ele havia fugido com seus capangas, como o grande e maldito covarde que era.
Nesse momento só consegui pensar em ainda dentro do Hospital quando eles chegassem... O mal que aquele moleque poderia fazer a ela se voltasse com raiva e ainda mais com as meninas que para ele não eram nada.
Tudo que eu precisava agora era uma boa notícia.
- ! ! – A voz de Baby veio calorosa, enquanto subia a laje correndo e vindo até nós no forte. Atrás dela tinha Paige. – As meninas chegaram!
Uma pequena frase e tanto eu quanto pudemos dividir a mesma sensação de alívio. Com aqui, mesmo que as coisas fossem difíceis pela frente, só de saber que ela estaria lutando ao nosso lado seria uma preocupação a menos. Zeus jamais a teria.
Mas quando notamos a expressão de Paige, era notável que as más notícias viriam. Nem um momento de felicidade podíamos ter.
- O que aconteceu, Paige? – perguntei.
também não demorou muito para perceber que algo estava estranho com a garota.
A garota recuou uns passos e permaneceu de cabeça baixa, se preparando para responder. Merda, eu sentia o ar faltando e uma sensação péssima dentro de mim.
tinha que estar viva... qual outro motivo para ela não estar aqui com o resto do grupo?
- Muitas coisas aconteceram lá, gente... – começou. – Eu nem sei como explicar... eles têm andarilhos conscientes que o doutor louco tenta criar e o doutor era um deles... conseguimos as armas e a Lola surtou, quis ir embora sozinha e acabou sendo pega pelos soldados e-
a interrompeu.
- Estão todos bem? – preocupada.
- Lola está morta e ficou pra trás – e o silêncio se instaurou. – O Gut apareceu... aquele andarilho gigante deles e ela quis ficar, pra segurar ele lá dentro enquanto nós fugimos com as armas.
respirou profundamente:
- Precisamos... – se engasgou. Olhou pra mim um pouco perdida e então fitou Judas, determinada. - Separe um grupo pequeno e os mande para a floresta. Espionem o perímetro do Hospital e se for preciso, tem permissão para entrar e acabar com qualquer um que cruzar o caminho da nossa equipe. Homens, soldados de Zeus. Libertem qualquer sobrevivente, crianças ou mulheres, levem até um ponto seguro.
- Devo ir também? – Judas perguntou a nós dois.
- Precisamos de você aqui – respondi. - Mande alguém de confiança ir, alguém que seja a altura dessa missão.
- Não tem ninguém vivo lá… – Paige disse baixo.
- Como assim? – perguntei.
- Zeus tem um depósito de corpos mortos de todos os homens, mulheres e crianças que viviam lá.
O horror em nossas faces foi em conjunto. Era inacreditável saber que Zeus era tão doente e cruel a esse ponto, o suficiente para que matar todo mundo lá e só deixar vivo seus soldados. Era mais assustador saber o que faria assim que perdesse essa guerra.
- Vão – pediu e os dois desceram juntos.
Agora eu faria outra coisa importante, para evitar outra tragédia.
- ZEUS ESTÁ MORTO! – berrei aos soldados do lado de fora. Os que lutavam pelo Hospital pararam, confusos e incrédulos. olhou confusa para mim. – Eu estou dando uma chance para que se redimam e não tenham o mesmo destino que o líder de vocês! Desistam, se rendam!
Era uma ideia arriscada, eles poderiam não acreditar nisso, ainda mais se Zeus estivesse com eles. Mas pelo silêncio, eles estavam cogitando a ideia já que de todos, o seu líder foi o único que sumiu.
Eles só precisavam aceitar. Meu medo era que agora sem o líder, eles entrassem em modo kamikaze e ainda mais se eles tivessem um plano reserva pra caso Zeus morresse.
Esperei por uma resposta, mas o que recebi foi o portão sendo quebrado por um dos caminhões do Hospital.
- Merda!
Desci correndo pro portão, entre o tiroteio que ainda acontecia. Corri até o grande portão de metal que estava para cair e juntei forças com os outros soldados e moradores para tentar segurá-lo. Teríamos pouco tempo, mas precisávamos tentar mantê-lo em pé pra evitar que os andarilhos invadissem de uma vez o QG.
Ou seria muito pior do que estava sendo.


***


Romero.

Sou contra a ideia de que passar por uma experiência traumática serve como lição para a vida. Uma lição de como passar por aquela experiência de novo, mas de uma nova forma, porque agora você “aprendeu” a lidar com aquilo. Você está mais forte.
Só que a morte dos meus pais fizeram isso comigo. Principalmente a do meu pai.
Quando minha mãe morreu, eu travei completamente, quando meu pai morreu o mesmo aconteceu, mas aprendi que a vida era assim mesmo. Quem você ama vai embora e você precisa aceitar isso.
O que não dá aberturas de eu começar a perder todos que eu amo ao redor de mim.
Eu sequer cogitei a possibilidade da morte da minha irmã e de Slade. Eles estariam bem, pra frente, no futuro contaríamos isso apenas como uma história de superação. Algo para virar exemplo quando surgirem outros obstáculos na vida.
E eu não podia desistir, não com todo o QG precisando de mim. Eles precisavam de alguém para ficar no lugar de Slade até ele se recuperar.


***



Eu estava na cela outra vez. Uma sensação ruim tomou conta do meu corpo e tive ânsia de vômito com o estado a minha frente. Tentei ignorar tudo, sem ver, caminhando diretamente para o armário de bebidas que estava ali há mais tempo que eu.
Resgatei todo o álcool escondido repassando o plano mentalmente, esperando ter sucesso.
Fui até à cama e percebi que meus braços tremiam, meu coração estava acelerado, e usei toda minha força para não entrar em um lapso de escuridão mental que visitei meses atrás.
Teddy o levaria, fecharia seus machucados e ele ficaria bem.
A patrulha encontraria , ela estava bem.
Com a garganta apertada, peguei o lençol ensanguentado e fiz uma espécie de saco para facilitar o carregamento do álcool.
Era uma boa ideia. Precisa apenas executá-la da maneira correta.
Ouvi passos na escada e congelei.
Minha cabeça só conseguia imaginar em vê-lo ali, com toda sua força e determinação, que no momento em que me virasse ele faria uma piadinha estúpida com seu sotaque e lutaríamos juntos para acabar com essa guerra. Piegas.
Mas não era ele, não poderia ser. Slade não tinha esse cheiro. E só por estar no mesmo lugar que ele novamente, eu conseguia sentir toda aquela energia ruim, capaz de cometer um nível de mau-caratismo indescritível, no qual eu já havia presenciado e sentido na pele. Queria ter fugido, mas fiquei parada.
O inimigo não estava morto, ele havia me encontrado.
Mas eu também o encontrei. E hoje não era o meu dia.


***



Grimes.

O portão caiu e o inevitável aconteceu, seria questão de minutos até que os andarilhos invadissem todo o QG e fosse nosso fim. Não podia deixar isso acontecer.
Subi no caminhão junto com Judas e tiramos as nossas armas. Atiramos na maioria que pudéssemos, vendo-os cair de um de um. Mas quanto mais atirávamos, mais apareciam. Estávamos ficando encurralados.
- LEVANTEM O PORTÃO! – Berrei aos homens que seguravam o metal, puxando-o para cima. A melhor opção era mantê-lo em pé, o suficiente para segurar os andarilhos.
Mas parecia ainda mais impossível.


***


Romero.

- Fechei a porta, espero que não se importe. Quero ter uma conversa mais... reservada.
Engoli seco.
- Estávamos te procurando, até mesmo declarou sua morte... Já eu, pensei que tivesse fugido.
Ele grunhiu e cuspiu no chão perto de mim.
- Eu não fujo, sua vadia. Por que eu fugiria? Já quebrei a patinha do beta daqui... agora posso foder com a cadelinha dele.
Tentei ignorar suas palavras. Slade fazia isso, eu poderia fazer também, era fácil. Zeus era como uma criança birrenta, necessitada de atenção.
- Cadê minha irmã?
Ele gargalhou.
- Seu namoradinho sumiu, sua irmã também... honestamente, , não pode me culpar a cada minúsculo problema que aparece em sua vida.
Interessante. Ele também não sabia onde ela estava. Significa que há um ruído entre a comunicação do Hospital com seu próprio líder, o que pode facilitar o trabalho da equipe de busca que enviamos para lá.
- Pensei que ela estivesse em sua casa, mas não me choca você não saber disso, afinal, nós dois sabemos o quanto é fácil entrar e sair de lá.
Pisei em sua ferida. Zeus se achava O fodão com o seu forte gigantesco. “Quem entra, não sai para contar história” ele dizia. Eu saí. As meninas saíram. Em breve também sairia.
O que me preocupava, era ele estar atrás de um novo lar, devido à enfraquecida do seu próprio. E ainda não tínhamos colocado uma placa de venda no portão do Quartel.
- Você pensa que fez algo, não pensa? – seu ódio virou deboche. – Acha realmente que presta pra alguma coisa, devo admitir que chega a ser fofo e idiota. Você é só mais uma mulher na história. Uma vadia inútil, que vai ser esquecida, que está sozinha, sem família e sem amigos, que eu vou comer, por horas e horas, até saciar toda essa sua sede de dar para um cara malvado e que te causa medo, até enfiar uma faca na sua virilha e puxar até sua garganta. Mas antes disso você vai pedir perdão, , perdão por toda a vergonha que você me fez passar. Tudo por sorte, porque você não é boa , você não é inteligente, não consegue salvar os que estão ao seu redor e não importa quantas crianças você acolha, sempre vai ser somente uma vagabunda usada como um pedaço de carne por um cara que no final do dia vai apenas bocejar, dizendo para si mesmo o quanto isso foi fácil. Você é fraca.
Atônita, falei sem pensar.
- Eu estava errada sobre você.
- Não me importo com o que você acha de mim, sabia? – riu. – E dizem que eu sou egocêntrico. Haha.
Ele se aproximava cada vez mais, logo estaríamos compartilhando o mesmo ar.
- Eu costumava achar que você lutava sem uma causa, um cara que só queria propagar o caos... Claro, você não tem amigos ou família... - pausei e olhei para os lados, procurando algo para me proteger. – Você tem uma causa. Ter. Consumir. Sem razão. Só não é uma boa causa.
Segurei uma garrafa em minhas costas quando ele pulou na minha frente, apertando meu pescoço com força, quase me tirando do chão.
- Adquiri a morte da vagabunda da sua irmã e do filho da puta do seu amante. E eu vou tirar tudo o que resta de você, sua piranha. Sua vida será minha, o Quartel vai ser meu e você vai se arrepender de ter nascido.
Bingo.
Ele queria o Quartel.
Tudo foi rápido.
Levantei a garrafa de vinho diretamente para sua cabeça, batendo com força. Ele me largou em um segundo, segurando seu crânio, e caiu no chão com a tontura.
Ao começar a correr para fora, atrás de uma arma, ele agarrou minha panturrilha, me fazendo cair do seu lado.
Zeus puxou meu cabelo com força pra trás e me virei, mordendo seu braço. Levantei outra vez e chutei o seu saco, fazendo-o se contorcer de dor.
- SUA VAGABUNDA! – gritou desesperado.
Corri escada acima com as garrafas em mão e amarrei tudo com força, para não escapar nenhuma. Talvez não fosse o suficiente.
Forcei a porta e quase chorei ao notar que estava emperrada.
“Tranquei para uma conversa particular”, ele havia dito.
Antes de tentar chutar, um empurrão me tirou da órbita, e minhas costas batiam com força em todos os degraus da escada, enquanto eu caía até o chão do primeiro andar.
Arfei sem ar, e instintivamente pousei a mão sobre minha barriga. Uma singela e única lágrima caiu de meu olho e tentei recuperar minha respiração, aflita, enquanto via Zeus se aproximar devagar, como em um filme de terror. Em um segundo ele poderia acabar com a minha vida.
Seu olhar focou no meu braço estendido e fiquei com medo. Eu me sentia uma criança pequena, eu queria chorar, gritar, implorar pelos meus pais, e nada disso adiantaria, porque eu não conseguia levantar, e sem compaixão, ele pisou em meu braço.
O grito foi inevitável.
Dor. Dor. Dor.
Voz já não saía.
Seu sorriso era tenebroso. Seu pé continuava a torcer meu braço contra o chão, e logo ele poderia ser esmagado.
- Fica caladinha, puta – desceu, com seu rosto grudado ao meu, fechando a palma em minha boca. – Ninguém vai te ajudar, você vai morrer de qualquer forma. Não suporto o choro de uma puta.
Então mordi sua mão, com raiva, o assustando. Ele estava errado. Eu não era fraca.
Usei toda minha força e senti o gosto metálico de seu sangue, notando que consegui arrancar um pedaço da sua pele.
Zeus berrou se afastando, segurou em sua mão ensanguentada e resmungou de dor. Eu aproveitei sua vulnerabilidade para alcançar a mesa que Slade costumava usar e encontrei um martelo feito de completo ferro.
Aproveitando sua distração, atingi algumas vezes suas costas com sucesso. Foi brutal, foi seco. Eu poderia ouvir alguns dos seus ossos quebrando e o sangue ultrapassava a camisa.
Zeus caiu no chão. A respiração descompassada enquanto olhava para mim com ódio. Ele vomitou no seu próprio colo. Sangue e comida.
As lágrimas pela dor do meu braço esmagado ainda escorriam e se juntavam com o meu suor. Eu estava tão cansada.
Uma movimentação na porta chamou minha atenção, quando me virei, Zeus tinha uma arma em mãos. Era de Slade.
- Você achou mesmo que ia me derrotar tão fácil? – sua voz era como um sussurro, inaudível. – Com um martelinho?
- Eu já te derrotei. Você é só mais um garoto na história. Inútil, e que vai ser esquecido. Está sozinho, sem amigos, sem família. E eu não preciso do seu perdão para seguir em frente, Zeus. Eu tenho eu mesma, eu tenho meus amigos, tenho meu amor, tenho minha irmã, e tenho meu filho – chorei, as mãos em meu colo. Por minha queda na escada, eu chorava de medo dele não estar mais ali. – Você não tem nada. É fraco. E sozinho.
O rosto de Zeus ficou vermelho e vomitou sangue outra vez. Tentou sorrir através de tudo e ativou a trava do gatilho. Levantou-se fraco, mas não perdia sua mira. Era possível ver uma hemorragia acontecendo em seu corpo. Os olhos estavam amarelados e sua pele branca.
Larguei o martelo.
Apesar de tudo, irritá-lo não seria bom. Zeus tinha apenas segundos de vida... e bastava um deles para apertar o gatilho.
- Diga adeus, – decidiu.
- BACKUP, PEGA! – Me assustei ao ouvir a voz de Jacob e em seguida o cachorro que ele encontrou semanas atrás pulando nas costas de meu inimigo.
O homem se contorceu de dor com a mordida poderosa do cão e derrubou sua arma, me fazendo correr até ela rapidamente e mirar nele.
- O que você tá fazendo aqui? – perguntei irritada para o garoto, o escondendo atrás de mim para que Zeus não ousasse fazer qualquer coisa com ele.
- Eu não ia te deixar sozinha! – fez cara de choro.
Suspirei beijando sua cabeça rapidamente, tentando o abraçar com apenas um braço.
Com um forte chute, Backup foi arremessado para o outro lado da sala, uivando dolorido.
- Não encosta nele! – Jacob estava indo para cima de Zeus e o puxei para trás de mim novamente.
- Um cachorro – riu, delirando a este momento. Um ser humano não teria aguentado tanto tempo como ele.
Pelo histórico do que vi na sua casa, ele poderia não ser tão humano assim.
Continuei mirando até que as luzes da cela começaram a piscar. Um forte estrondo de trovão ecoou no céu e Jacob me abraçou com medo.
A porta que dava para a saída de trás do QG começou a bater com força. Braços esfomeados queriam entrar ali. Atraídos pelo cheiro de sangue e morte do local.
Observei a cena por um instante e Zeus também. Ele estava com medo. Engoliu seco.
Abaixei a arma e guiei Jacob e Backup para as escadas.
- O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO? – Zeus gritou em pavor, atraindo mais vozes de andarilhos querendo entrar. Em um segundo aquela porta abriria. O QG havia sido invadido por eles, não tinha mais nada aqui, estava na hora de acabar com o resto.
Com um martelo, Zeus procurou se defender.
- Para com isso ... vamos resolver isso... só eu e você... Por favor – pela primeira vez desde que o conheci, vi Zeus vulnerável e com medo. – , POR FAVOR, NÃO FAZ ISSO COMIGO. EU TE IMPLORO.
Jacob me ajudou com as garrafas e Backup nos seguiu. A porta abriu quando estávamos no topo da imagem. Eu nunca esqueceria aquela cena... Zeus sendo devorado por mortos-vivos enquanto implorava minha ajuda.
Ao final do dia, eles faziam parte de um império, no qual nunca conseguiríamos derrotar.
A luz da cela se apagou.

***


Teddy.

Precisei voltar com pressa para o QG. As crianças já estavam em segurança na Colônia, mas eu sabia que o Quartel ainda precisava de mim... principalmente a .
Nesse momento toda a ajuda seria necessária e eu precisava cumprir a promessa que fiz a mim mesmo e cuidar dela. Nada aconteceria.
A minha surpresa foi ver o QG rodeado de bichos e o caminhão segurando o portão, antes que ele caísse de vez. Não adiantava mantê-lo, precisávamos só barricar a entrada até irmos embora, isso seguraria os bichos por um tempo já que era impossível eles entrarem no ônibus.
Peguei o meu talkie e liguei, esperando que pegasse na frequência de que estava em cima do caminhão atirando nos andarilhos.
- , câmbio! Tirem o caminhão do portão, vamos derrubá-lo de uma vez e usar o caminhão e o ônibus pra travar a entrada enquanto decidimos como seguir.
- Faremos isso. Câmbio.
Assim que respondeu, desceu e entrou no caminhão. Os raios pareciam estar cada vez mais próximos do QG.
Judas me contatou por walkie e atravessei o mapa rapidamente com o ônibus. Nós dois juntos fizemos a pressão e o portão soltou de vez, em cima de uns bichos que foram atropelados e esmagados. A entrada estava travada por enquanto e os mortos não conseguiriam entrar. A parte da entrada e saída do ônibus estava protegida, até então.
Desci do ônibus e matei os bichos que estavam por perto, a maior quantidade que conseguia.
- Vocês viram a ? Onde ela está? – perguntei, mas não obtive resposta. Ela era minha prioridade agora, não a deixaria sozinha.
- Acho que ela tá lá dentro – Judas respondeu.
Fui até ele.
- Vamos atrás dela então – ele assentiu e nós fomos.

***


Romero.

Avistei Teddy e Judas vindo até mim e foi tão bom ver o rosto de Teddy nesse momento, eu só queria perguntar como Slade estava, mas compreendi que não era o momento certo.
Estava com pressa, meu corpo não suportava mais a dor em meu braço e logo uma chuva monstruosa cairia, cegando nossa vista.
A expressão do grandão ficou séria assim que viu meu braço enfaixado. Pedi ajuda de Baby para que meu braço quebrado ficasse assim até que fosse para a Colônia cuidar desse ferimento da forma necessária.
Eu entendia agora o que Alice passou quando cuidei dela mais cedo.
- O que houve? – perguntou, vindo até mim e tocando com cuidado meu braço.
- Zeus está morto – saiu em uma arfada. Os dois me olharam e a expressão de alívio era igual.
- , seu braço é mais importante que isso agora – Teddy disse e eu ri. Eu sabia que ele estava tentando cuidar de mim, principalmente com tudo que aconteceu.
- Não é não. Meu braço vai se curar, mas agora precisamos ir embora daqui antes que os mortos consigam invadir de vez o QG e comam os nossos restos – disse firme e os dois assentiram prontos pras ordens.
- Eu estou com o ônibus.
- Ótimo! Então encha ele com todo mundo, as que estão nos quartos escondidas e quem restou. Não esqueça de levar o Backup!
Teddy assentiu e saiu. Virei-me para Judas assim que vi a arma diferenciada que segurava, era mais pesada que as normais.
- E você vem comigo.
- Você não vai para o caminhão? – me encarou como se eu fosse louca.
- Agora não.

***


Subimos até a laje onde eu costumava dar aulas de tiros para as crianças do Quartel e pelo que parecia, os andarilhos já haviam consumido o local.
O QG ficava cada vez mais cercado deles, e precisávamos agir rápido.
Fomos até os bichos e atirei na testa de quatro, prestando atenção no ônibus, tendo certeza de que tudo funcionaria com Teddy levando os moradores até a Colônia.
- Judas, obtenha o status da equipe de busca que foi até o Hospital, por favor, e também veja se está tudo em ordem na Colônia, como Barbie prometeu.
- Sim senhora – alcançou o walkie, sem deixar de facilitar o caminho para mim. Comecei a abrir as garrafas de álcool, sentindo Judas me seguir em pouco tempo. – Tudo certo.
Assenti.
Os mortos, em centenas, tentavam subir pelos cantos do QG, até chegar à laje, não haviam muitos sobreviventes ali, então qualquer resquício de cheiro de carne atrairia eles, mesmo com a chuva rala que havia acabado de se iniciar.
Juntamos os corpos de alguns que matamos e jogamos o líquido da garrafa em cima deles. O cheiro de podre, com o qual já estava acostumada, tinha um teor diferente agora.
Fiquei tonta por um segundo e Judas me ajudou.
- Tá tudo bem?
Engoli seco e afirmei que sim.
- Abaixo de nós está o nosso arsenal. Pelo menos o que sobrou dele.
- Sei disso... – comentou, tentando saber onde eu estava querendo chegar.
- Um dos elementos que nunca foi usado desta base de guerra foi a pólvora. O que é compreensível, nesses anos todos, não queríamos chamar a atenção.
Ele compreendeu e sorriu, quase vingativo.
- Se um desses bichinhos se aproximarem o suficiente da janela do arsenal...
- Será o fim do QG. E precisamos ser rápidos, você me entende?
Engoliu seco, balançando a cabeça.
As trovoadas começaram e eu já podia sentir o aroma de chuva por vir, misturado com o álcool e dos mortos, sangue e podridão. Respirei fundo, estava chegando ao fim, finalmente.
Jogamos os corpos dos banhados em álcool em cima daqueles que tentavam escalar a parede, próximos do arsenal.
- Tá pronto pra isso?
Judas assentiu.
- Você é louca.
Judas se posicionou em minha frente e me empurrou um pouco pra trás sem força, só pra que eu pudesse me proteger do que viria a seguir.
Ele apontou sua arma para os bichos e atirou. No mesmo momento as chamas começaram a consumir todos os andarilhos, queimando um por um. Eles resmungavam algo, enquanto o cheiro de carne queimada ficava mais forte.
Assim que o fogo consumiu grande parte da laje nos afastamos e descemos correndo. Judas se segurou em mim e me abraçou, nos escondemos e assim, de repente, uma explosão.
Era o fim do Quartel General.

***


Romero.

Esse é o momento da minha história de vida em que eu repenso tudo que fiz até chegar onde cheguei e tento me convencer que haveria outra forma de lidar com isso.
Só que eu não queria lidar com isso de outra forma.
Gut estava dentro do Hospital nos procurando e eu ouvia os caminhões chegando. Ainda havia soldados vivos espalhados pelo prédio e a nossa procura também. Em poucos minutos o prédio todo explodiria e nós precisávamos ser rápidos e fugir.
Só que seria impossível os dois saírem do prédio.
Um precisava ficar segurando Gut por um tempo, porque ele podia ser lento, mas atraía atenção e ele viria atrás da gente floresta a dentro se preciso, isso atraia a atenção dos soldados do Hospital e no fim eu e Trevor terminaríamos mortos. Não sei Trevor, mas eu não queria morrer. Não assim.
Alguém tinha que segurar Gut e essa pessoa tinha que ser eu. Por quê? Porque é o certo, é o que uma líder faz. Uma líder não deixa os seus soldados morrerem sabendo que pode fazer isso sozinha. E eu estava cansada de correr... cansada de apostar no seguro, seguir alguém e deixar outra pessoa tomar as decisões. Era a minha vez de ser corajosa, de mostrar pra mim mesma que por mais estúpida que eu fosse ao tomar essa decisão, eu não falharia.
O Hospital ia cair e eu mesma me garantiria disso.
- Trevor, você precisa ir – disse e o rapaz me encarou desacreditado. – Você vai ir embora e correrá até a Colônia. É só seguir o caminho do rio, quanto você chegar em uma casinha de madeira, você pula o riacho e segue, você vai conseguir ver os muros pela floresta e é só entrar. Eles vão te receber.
- Não. Eu fico, você vai – disse convicto. Coitado, ele não sabia que eu era a teimosia em pessoa e não iria a lugar algum.
- Isso não é um pedido, Trevor. É uma ordem e você disse que me obedeceria.
O rapaz me encarou, ainda desacreditado no que estava ouvindo.
- Você tem noção do que tá dizendo, ? Você tá me mandando ir embora e te deixar aqui sozinha com o Gut, os soldados e uma provável explosão. Você acha que eu sou o quê? Maluco?
- Não, você não é maluco. Você é um soldado e soldados obedecem seus líderes. Vá logo, mais tempo que enrolarmos será menos tempo pra que eu consiga ir embora.
Mas Trevor não se mexeu, permaneceu estático ao meu lado e se recusando a me obedecer.
- , eu entendo que você quer ser uma líder e tudo mais, mas por favor, isso é estúpido. Você não precisa correr esse risco pra me poupar... se eu morrer aqui agora, é uma tragédia, mas não é como se eu estivesse fugindo da minha punição. Eu morrer é destino, você morrer é... errado.
Revirei os olhos.
- Quer parar com isso? Olha pra você caralho, você é um puta soldado e fica até feio você vir com esse papo de auto-piedade. Pode ter certeza que nós dois aqui merecemos viver e nosso destino não é morrer, não assim. E é até estúpido você imaginar que eu vou me sacrificar aqui. Você aqui agora me atrapalha, agora você lá na Colônia lutando ao lado do time certo, porra, é a vitória na certa. Então por favor, corta esse papo e me obedece, porque ninguém aqui vai morrer hoje.
Trevor me encarou surpreso e pude ver admiração em seu olhar. Eu sentia o mesmo por ele e era por isso que estaria o priorizando agora.
Enfiei a minha mão no bolso da calça que eu usava, a calça militar que era de Trevor antes de trocarmos. Tirei de lá o bracelete que peguei mais cedo e o entreguei. Havia o tirado da minha calça assim que troquei de roupa, pra garantir, porque naquele momento eu soube de quem pertencia. O rapaz pegou com as mãos trêmulas, sem entender como eu tinha aquilo.
- Isso era dela, né? – perguntei e ele assentiu, emocionado ao ver aquele pedacinho dela em sua frente. – Eu não sei quem é ela e nem a sua ligação com ela, mas ela foi importante pra você e isso a faz ser importante pra mim. E vai ser por meio desse pequeno objeto que ela vai permanecer viva e vai ser através de você que vai continuar vivendo e lutando que a memória dela jamais será esquecida. Você entendeu?
Trevor assentiu.
- Eu entendo porque agora Zeus precisava de você como seu soldado, porque você não é apenas bem treinado... você é leal e eu preciso da sua lealdade agora. E te prometo que eu vou te recompensar e você nunca vai sentir mais medo, nunca mais vai se sentir sozinho... você vai ter uma família e uma vida – segurei em sua mão, apertando-a. – Eu prometo isso. Você agora é parte da minha família e eu cuidarei de você.
Era uma sensação estranha, nova para mim. Antes de tudo, eu só tinha , ela era a minha família, ela era a minha vida. Mas depois da Colônia, depois de , eu vi uma nova perspectiva, uma nova família. Eu nunca seria mãe e isso me assombrava antigamente. Mas eu era mãe. Eu fui mãe de , fui mãe de Willa e fui mãe dos filhos de . Agora, serei a mãe de Trevor.
- ... por favor, eu não quero te deixar...
- Vai ficar tudo bem... Você vai pra Colônia, eles vão te acolher lá e você vai lutar, até o fim. E então, quando você menos esperar, eu vou chegar da forma mais triunfal possível, trazendo a cabeça de Gut em meus braços – sorri.
Em um gesto súbito, Trevor me abraçou e eu senti o conforto em seu gesto. Se ele tivesse batido no portão certo, se ele tivesse sido recebido por mim ou por , tudo seria diferente. Ele seria diferente.
Mas ele merecia uma segunda chance e eu daria essa segunda chance pra ele.
Senti o bafo quente do climatizador e não tinha mais tempo a perder. O soltei de meu abraço e acariciei seu rosto.
- Agora vá! Mate todos os soldados de Zeus que ver pela frente, mas não olhe pra trás. Sob nenhuma hipótese olhe para trás. Quando chegar a Colônia, diga que eu estou chegando – mandei.
Trevor assentiu, ainda meio atordoado e segurou minha mão em despedida. Acenou para mim e eu para ele. Então partiu.
Nesse momento eu entendi , porque ele botava um monte de pessoas dentro da Colônia pra viverem normalmente como se nada estivesse errado. Por muito tempo eu achei que sua atitude era errada, mas não, era a certa. Se você vive alheio, a dor é menor e a perda também, afinal, quem está do lado seguro do muro jamais precisaria passar pelo que quem viveu no Hospital passou.
Quem está do lado seguro dos muros, não vira um corpo jogado no depósito pra não precisar ser alimentado, protegido e cuidado. Vira um aliado, vira um soldado que não precisa de ameaças e violência pra lutar. O melhor tipo de lealdade é aquele que não se conquista com medo, se conquista com cuidado.
Assim que vi Trevor ir embora, floresta a dentro, peguei o meu machado e saí de onde estava escondida, ficando em frente ao Gut.
Ouvi a tempestade do lado de fora gritando e assisti Gut entrando no Hospital com os trovões atrás.
- Agora somos apenas nós dois, grandão – sorri. – Vamos nos divertir bastante!

***


Romero.

Tossia a fumaça da explosão e Judas permanecia me segurando, garantindo que nada havia nos ferido.
- Você tá bem?
Assenti.
- Vamos.
Era difícil enxergar entre tanta fumaça, Judas segurava em mim e tentava liderar o caminho até a saída mais próxima. Encontrou uma janela e a quebrou com os ombros.
- Você primeiro.
Passamos pelo vidro quebrado, correndo até o muro. O fogo estava consumindo todo o terreno, os andarilhos estavam caindo um por um, mesmo que não morrendo queimados estavam se tornando inúteis com suas pernas queimadas. Além do fogo e dos bichos, fugimos dos trovões da tempestade que estava para cair.
- Pro ônibus! – gesticulei e Judas assentiu. Ele ia à minha frente, matando os bichos que vinham ao nosso encontro. Eu matava o resto que estava por perto, para garantir que chegaríamos com segurança. Era um pouco difícil utilizando somente um braço.
A porta do ônibus ainda estava aberta e assim que entramos, forçamos a porta, fechando no pulso de alguns andarilhos que queriam entrar.
Era inútil agora. Estávamos salvos.
Teddy deu partida e dirigiu, saindo do QG que se parecia com o próprio inferno da Bíblia agora.
Aquela imagem... Era assustadora.
Eu pensava em Slade também. Como ele se sentiria ao saber que tudo que construiu estava se desmanchando nas chamas? Ficaria irritado, ou encararia como um novo começo, algo bom?
Cambaleei entre as pessoas, cansada, e vi em pé, conferindo se estavam todos os moradores no ônibus.
- Deveríamos ter feito uma listagem – reclamei com minha estupidez.
- Tenho certeza que você já sabe o nome de todos os moradores aqui de cor – sorriu me acalmando. Notei a presença de Rita, a senhora de mais cedo, na qual alcancei minha única arma para ela tomar sua própria decisão: ficar viva, ou seguir o destino do filho.
Seus olhos não tinham vida, mas eu sei que ela conseguiria seguir em frente, de alguma forma.
- ? – tomou minha atenção. – Onde está ? – perguntou e sua voz falhou.
- Depois que Zeus o feriu, ajudei-o na cela, estanquei seus ferimentos. Teddy o levou até a Colônia. Neste instante, ele deve estar se recuperando – sorri fraca, impaciente para vê-lo.
Queria correr em seus braços e abraçá-lo, sem me importar com os machucados que ele tiver e gemer de dor, porque tê-lo ao redor de mim seria o suficiente.
Vislumbrei cortando o olhar para Teddy, seguindo como um fantasma, e cortei seus pensamentos.
- Ele está bem, você vai ver. E também. Ela estará nos esperando no portão.
Ele sentou-se um pouco zonzo.
- Ela precisa estar... Eu não sei o que seria capaz de fazer, . Eu não conseguiria, de novo não.
Acalentei-o com um abraço apertado e senti seu coração nervoso. Precisávamos ser forte.
O pior já passou.

***


Romero.

Eu não vou morrer, eu não vou morrer, eu não vou morrer, eu não vou morrer.
Repeti isso milhões de vezes enquanto corria Hospital a dentro, ouvindo a tempestade lá fora, os trovões gritando alto. Enquanto Gut vinha atrás pra tentar me pegar. Levava ele mais dentro do prédio, precisava garantir que ele estaria em um ponto que a explosão o pegaria sem dó.
Gut em pedacinhos, é por isso que eu estou aqui.
Parei e assim que ele chegou perto de mim, cortei seu braço com o machado, ele gritou. O seu sangue espirrava e ele vinha com mais raiva pra cima de mim. Ele era grande, mas era lento e isso era bom para que eu pudesse desviar dele.
Mas ele conseguiu me pegar e me empurrou pra parede. Senti a dor do impacto e me forcei a respirar, sentindo a falta de ar. Me levantei devagar, com dificuldade e peguei novamente o meu machado, cortando mais uma parte do corpo de Gut que berrava.
Ele tentava jogar em mim as coisas que pegava durante o caminho e eu desviava, correndo de um lado pro outro. Em um zigue-zague que o deixava puto, ele berrava algo e tentava correr até mim. Seus passos eram longos, o que podia ser perigoso caso eu demorasse pra correr de volta.
Mais uma vez o ataquei com o meu machado e o corte fora mais profundo, sangrando mais. Gut berrou mais alto e conseguiu me segurar, ele tirou o machado de minha mão e me segurou pelo pescoço, me levantando do chão.
Dessa vez eu estava imóvel e me sentindo sufocada, sentindo o ar indo embora. Ele me devorava com o olhar, mesmo sem meu sangue estar exposto a ele. Ele sentia o meu sangue pulsar em suas mãos enquanto tinha meu pescoço em suas mãos.
Meus olhos cansaram e eu me forcava para mantê-los abertos, segurando o mínimo de ar que ainda tinha. Mas Gut não me matou ali, ele me jogou para longe.
Bati em várias macas e caí no chão. Dessa vez havia me machucado, sentia a dor por todo meu corpo e os pequenos cortes devidos à vidraça que acabou quebrando. Tossi, tentando recuperar o ar e não desmaiar. Se eu desmaiasse ele me mataria.
Me levantei desarmada, mas ainda com força para tomar alguma atitude. Poderia tentar correr, mas estava fraca e dolorida. Talvez ele me alcançasse. Mas não ficaria parada, quanto mais parada mais chance dele me devorar.
Se ele quiser minha carne, vai ter que lutar por ela!
Notei um corpo de soldado morto no chão. As macas estavam em cima dele e seu fuzil estava jogado perto. Usei toda a minha força e a peguei, levantando-a e apontando pra cabeça de Gut.
Ele parou na hora.
O grandão me olhava e olhava pra arma. Sorri, dessa vez ele não teria como escapar. No fim, Gut era um morto-vivo e eu só precisava atirar em sua cabeça, um tiro certeiro e ele morreria. Não tinha nada mais que isso.
- Últimas palavras, grandão?
Franzi o cenho assim que notei a boca de Gut se movendo, ele estava tentando dizer algo, estava tentando se comunicar. Não era que ele realmente usaria sua voz pela primeira e última vez quando fosse morrer? Que irônico e clichê.
- P-por... f-favor.
Gut não se movia, não fugia e nem nada. Ele estava parado esperando pelo tiro limpo e certeiro em sua cabeça. Ele queria morrer. Deus, isso era perturbador.
Um morto-vivo querendo morrer... isso não fazia sentido algum.
Ou talvez fizesse... talvez Gut tenha sido por muitos anos mantido vivo contra sua vontade, contra o seu descanso merecido. Foi preso e obrigado a obedecer Zeus porque essa era sua natureza, ele não tinha consciência ou fala.
Ele estava conformado com sua morte, sabia que não havia outra forma disso acabar que não fosse assim. Pelo menos, ele pediu com jeitinho...
Então atirei. A bala atravessou a sua cabeça e Gut cambaleou para trás. Assim que caiu, senti a terra tremer. Simples assim, ele estava morto... agora pra valer, pra sempre. Estava acabado, eu venci. O Hospital perdeu. Zeus perdeu.
Sorri. E finalmente, senti o bafo quente. Fechei meus olhos.
Bum.

***


Romero.

- ABRAM OS PORTÕES! – berrou e assim que o ônibus estacionou do lado de dentro da Colônia, ajudamos a posicionar os sobreviventes.
A primeira coisa que fiz assim que saí do ônibus foi correr para Frid e o abracei, mas só assim que ele resmungou de dor, eu notei que ele estava ferido. havia contado que Zeus quase o matou quando chegou na Colônia.
- Barbie é milagrosa quando quer... – fez piada. Ele estava fraco, mas estava se esforçando pra não deixar a Colônia desamparada. Eu o respeitava por isso.
O senhor deu uma olhada no meu braço e o vi ficar preocupado.
- Ele nunca mais vai te machucar – disse séria.
Ele olhou compreensivo e esperançoso. Mandou que eu visitasse a enfermaria mais tarde.
- Eles têm uma enfermaria? – ouvi uma criança do QG sussurrando assustada e feliz.
Mas tudo estava quieto, tudo estava... morto. Parecia que todos estavam escondidos com medo e todo o pátio estava vazio.
- ? – ouvi a voz de Barbie. Ela saiu da enfermaria e veio até mim, me abraçando. – Me desculpe – disse, assim que notou meu braço machucado.
- A tá aqui? – perguntei, esperando que a sua resposta fosse a que eu estava esperando, mas pela sua expressão não seria.
- A não tá com vocês? – Willa apareceu e sua expressão estava entre um misto de desespero e dor. – Como assim ela não tá com vocês? O que aconteceu com a ? – sua voz falhava devido ao desespero.
- Calma Willa – Barbie tentou acalmá-la. – Não há de ser nada. É a , lembra? Ela gosta de fazer uma chegada triunfal – deu uma risada falsa, tentando ser convincente.
Os portões abriram novamente e nesse momento eu queria que a Barbie estivesse certa, mas mais uma vez me enganei. Era o grupo que foi mandado pra ir atrás dela. Corri até lá, pois qualquer notícia seria importante.
- Encontraram alguma coisa? – perguntei, passando por cima de . Não conseguia me segurar, eu precisava saber que ela estava bem e que estava chegando.
- Estão todos mortos – o rapaz respondeu seco e minha garganta travou.
- C-como? – eu não aceitaria aquela resposta.
- Houve uma explosão no Hospital. Ele explodiu todo de uma vez. Todos estão mortos. Não é possível ter uma pessoa viva lá dentro... Sinto muito.
- E se ela tiver saído, hein? E se ela estiver na floresta? – me irritei. – E se isso tudo foi um plano do Zeus para que assim que eles perdessem, os sobreviventes explodirem o Hospital só pra ninguém conseguisse se apossar dele, hum? Vocês não pensam?! – fui até o portão. – Deixa comigo que eu consigo encontrar a minha irmã sozinha. Vocês são inúteis.
- Eu vou junto – se pronunciou pela primeira vez. Nem ele acreditava nessa baboseira de “todos mortos” e muito menos na possibilidade de ter morrido. Isso era ridículo.
- NÃO FOI ZEUS! – Paige berrou, do nada.
- Oi? – se virou pra ela.
- Não foi Zeus que planejou a explosão... foi a – disse e de repente tudo começou a girar. – Era o plano dela.
- Espera – A expressão de escureceu, se tornando sombria. Caminhou até a garota que tremeu de medo. – Quando perguntamos da mais cedo você não falou sobre qualquer explosão... você já sabia disso e escondeu de nós, Paige? – a garota não disse nada, só deu mais um passo pra frente. – RESPONDE!
- Eu sabia, ok! – disse, caindo aos prantos em seguida. – O plano era fazer com que o Hospital explodisse. Mas ela precisava atrair o Gut pra dentro pra que ele explodisse junto, então ela mandou a gente ir embora e ficou com Trevor...
- Quem diabos é Trevor? – perguntou, a interrompendo.
- O soldado que ela encontrou e nos ajudou! Ele que nos mostrou onde era a sala das máquinas, nos ajudou a descobrir que Lola estava morta e a fugir com as armas... eles dois ficaram lá pra atrair o Gut pra dentro do Hospital e depois fugirem antes da explosão.
- Então você tá dizendo que ela pode ter fugido?! – soltei. - É isso, eu vou.
- Um segundo aí! - Frid apareceu furioso, trancando a minha passagem. - Seu braço está destruído, você acabou de lutar por horas e mais horas e acha mesmo que vamos deixar você arriscar sua vida tão facilmente assim de novo? Isso é mais do que burrice .
- É minha irmã! - gritei.
- Que sabe as consequências de seus atos e também sabe que ninguém deve pagar por isso com a vida.
Quando tentei revidar, o pano que envolvia meu ferimento se abriu e senti uma pontada, como um estouro.
estava aflito e eu estava desistindo da minha decisão de sair. Ele passou a mão pelo rosto e caminhou até os caras de busca. Ele estava furioso e eu entendia o por que. tinha essa mania de executar as coisas sem avisar ninguém e isso o deixava preocupado, assim como a mim.
- Vocês vão sair daqui agora e vão buscar a . Nem que tenham que entrar na bosta do Hospital queimado e conferir se ela não está de baixo de nenhum escombro. Me entenderam? Ou vocês voltem com a ou não voltem.
Os homens concordaram e saíram, sem reclamar.
- Eu preciso beber – murmurou.

***


A espera era interminável e a cada momento que passava, parecia que ela não voltaria. Parecia que eu tinha ficado horas somente aos cuidados de Frid. Ele tentava reconstruir meu braço, havia marcas de sapato, meu osso realmente estava menor e tinha recebido, no mínimo, 30 pontos.
Não tive tempo sequer de falar com Slade. Frid não me deixava sair da enfermaria. O pessoal estava muito estranho.
De repente os portões se abriram novamente e corri até lá, por um instante, mais uma vez a esperança me preencheu e eu estava ansiosa para vê-la ali. Mas não era ela, nem de longe. Aquilo já estava ficando chato.
Era um garoto desconhecido, vestindo moletons e estava molhado. Era um sobrevivente. Ele era provavelmente mais novo que eu.
- Ei, ele é o Trevor! – Brianna disse, confusa ao vê-lo ali e não onde ele deveria estar... com a .
assim que ouviu seu nome, correu até o rapaz e o segurou com sua mão na gola do seu moletom. Ele estava pura fúria, nunca havia o visto com tanta raiva desde que o conheci.
- Onde está a ? O que você fez com ela, seu filho da puta?! – berrava na cara do rapaz. - ONDE ESTÁ A ?!
- EU NÃO FIZ NADA! EU JURO! – disse, se defendendo. – E-eu juro cara, eu não fiz nada com ela... ela que salvou a minha vida – o soltou e Trevor olhou para mim, sua expressão se transformou em dor e eu pude captar o que ele estava tentando dizer.
Caminhei até ele sem muita noção. Só percebi quando estava em frente a ele. Eu parecia reconhecer aquele cara de algum lugar.
- Cadê ela? – minha voz soou infantil.
- E-eu não sei – sussurrou. – Ela me pediu pra ir embora, ela disse que tinha que atrair o Gut sozinha, que eu precisava ir embora e vir até aqui, que eu merecia uma segunda chance – ele também não conseguia falar e se segurar ao mesmo tempo. – Era pra eu estar lá. Não ela...
Perdi o chão.
- Não, não, não! – murmurava e chutava tudo que via pela frente. – MERDA! – tentou se segurar, mas também já chorava. – Isso é minha culpa, é tudo a minha culpa! Eu devia ter evitado, merda, eu devia ter impedido – levou a mão ao rosto e soluçou, tentando secar os olhos em vão.
Todos encaravam a cena. Eu olhava para o chão.
Silêncio e olhares assustados.
- Não vou desistir tão facilmente – declarei um sussurro para eu mesma.

***


Romero.

Achava que a morte era algo mais glamoroso... que assim que eu morresse as dores passariam e a paz eterna me abraçaria. Mas não, eu ainda sentia o cheiro do queimado e o gosto do meu sangue.
Merda, eu teria que agonizar até a minha morte?
Enquanto eu esperava por sei lá, uma luz branca e vozes de anjo no fundo, eu só conseguia ouvir o som da tempestade lá fora indicando que minha paz eterna teria que esperar.
Eu tive meu ato corajoso e suicida, qual é a minha recompensa? Vale a pena mesmo ficar deitada nos destroços até morrer?
Antes de explodir junto com o Hospital, eu só conseguia pensar nos que eu amo. Pensei em junto de Slade, pensei em com seus filhos, pensei em Willa conhecendo Trevor. Frid bem, sendo o pai de todos na Colônia. Pensei em Jacob correndo e brincando com seu cachorrinho.
Isso me deixou triste, porque eu não queria perder esses momentos. Eu queria estar lá, queria continuar vivendo. Me senti frustrada de imaginar tudo isso e não estar lá. Achei que seria reconfortante saber que eles estariam bem.
Eu não queria morrer. Eu tinha motivos pra mandar a luz branca, os anjos e a paz eterna se foderem, né?
Quer dizer, eu ainda tinha e sentia sua falta, se eu morresse nunca mais a veria de novo. Tem o , o amor da minha vida que eu amo demais. Eu com certeza sentiria falta dele... do corpinho dele... ai. Então, era meio que um motivo pra continuar vivendo, certo? Tinha a Willa também, o Max e a Jolie, e claro, o Jacob. E tinha a Barbie e o Frid, nossa... o Frid... será que ele tá bem?
Tinha o Slade também, eu não gosto muito dele, mas... devido os últimos acontecimentos eu acredito que se eu e ele ficássemos presos em uma sala por mais de cinco minutos, eu não tentaria matar ele... Slade pode ser um motivo pra eu considerar viver?
Eu não estava morta, né? Se eu realmente estivesse morta eu não estaria tendo uma epifania sobre continuar vivendo ou não.
- Merda – resmunguei e ouvir minha voz fraca foi um indicativo que estava viva. Ok, agora eu faço o quê?
Meu corpo todo doía e eu com certeza não queria considerar a possibilidade de ter queimaduras em meu corpinho lindo, merda, só me faltava essa. Mas bom, pelo menos não tinha nenhum machucado tão grave que me deixaria jogada aqui me debatendo comigo mesma até morrer de hemorragia ou algo do tipo.
Yayyyy, viva.
Só um corte mais profundo em minha barriga. Uau, adeus biquínis.
Me arrastei pelo chão, saindo dos destroços que de uma certa forma haviam me protegido do pior. Estava completamente dolorida, suja e ensanguentada de sangue meu e não. Minhas pernas estavam falhando e para levantar foi muito mais difícil.
Me apoiei em um pau de madeira que estava jogado no chão e tentei usá-lo como bengala.
Respirar era quase impossível, não só pelo tanto de fumaça que inalei e ainda estava no ar, mas pelos machucados minha respiração estava falha e era questão de tempo, eu ia desmaiar. Seja pelos ferimentos menores, ou pelo maior em minha barriga, ou pela fumaça.
De qualquer forma, eu precisava chegar até a entrada do Hospital. Era o suficiente para que caso mandassem alguém para cá – o que era certeza – eu fosse resgatada.
Estava tudo destruído, caindo aos pedaços e em chamas. O corredor que eu estava com Gut parecia ter sido o menos afetado, mas dava indícios que estava prestes a desabar e isso me aterrorizou. Não queria morrer soterrada pelo Hospital.
Sentia que se morresse aqui, minha alma ficaria vagando por esses terrenos para sempre. Afinal, como ter paz eterna logo no inferno?
Avistei a porta do Hospital a poucos metros de mim e usei toda a minha força, pra chegar mais rápido. Não queria ficar mais nenhum instante lá dentro.
Quando cheguei do lado de fora e senti a brisa fria da noite chuvosa me abraçar e as gotas banharem, desabei ao chão. Fechei os olhos, me permitindo descansar. Não lutaria, não mais, porque sabia que não ia morrer. Não agora.
Eu estava viva, afinal de contas.
Por muito tempo eu desejei a morte, por mais sombrio que pareça, eu realmente queria. Viver nesse mundo é se sacrificar diariamente, abrir mão de coisas que eu não queria e eu fiquei cansada. Exausta. Tudo que eu queria era descansar, parar de fugir e de lutar para sobreviver.
O meu engano foi achar que as coisas continuavam as mesmas, que eu era a mesma antes da Colônia, antes do . Meu erro foi acreditar que morrer em uma explosão no Hospital valeria a pena, não valeria. Eu não queria morrer e só precisei passar por uma experiência de morte pra me tocar disso.
Você não é suicida, você só é vingativa. Você não quer morrer, só quer se vingar. Qual seria a graça de morrer depois de conseguir o objetivo? A melhor parte da vingança é aproveitar os frutos.
Slade estava certo no fim. Eu substituí meu desejo de morte, pela minha vingança, por fazer Zeus pagar. Achei que se eu juntasse as duas coisas, vencendo o Hospital eu poderia descansar em paz. Mas eu não consigo descansar, eu estou mais ligada que nunca.
E quero aproveitar os frutos da minha vitória.
- ? – ouvi uma voz familiar. Aquela voz que fez com que meu coração se esquentasse e de repente toda a dor e experiência de quase morte tenha se tornado tão irrelevante.
- Ei mana. Eu acho que destruí o Hospital.

***


Romero.

Seus olhos abriram aos poucos, eu beijava a palma de sua mão e meu coração estava calmo outra vez.
Teddy, Baby, Barbie, , Judas, alguns amigos dela que eu não fazia a ideia do nome... Praticamente todos estavam na sala esperando ela acordar.
Após resgatarmos , rapidamente a trouxemos para a Colônia e Frid cuidou de seus ferimentos e pulmão, que estava terrivelmente contaminado com a fumaça do Hospital.
- Muita... gente… – gesticulou com a mão, pedindo para que nos afastássemos dela. Ri, é, essa é a ... ela estava bem.
- Ei mana – sorri quando ela abriu os olhos. – Explodi o Quartel.
Ela sorriu também.
- Acho que temos essa coisa de gêmeas, sabe? Que pensamos as mesmas coisas – sua voz era rouca e fraca. Alcancei rapidamente uma garrafa de água até sua boca.
Concordei. Tirando o fato de que não éramos gêmeas.
- Ei, meu bem. – se aproximou, ajoelhando ao lado dela, deitada no sofá. – Não gaste a voz, tente repousar um pouco. Ela assentiu.
estava sorridente e era ótimo vê-la assim. Eu tive tanto medo de perdê-la e agora ela estava ali, como sempre, iluminando a todos com sua personalidade.
Puxei para perto o garoto que havia chegado mais cedo, agora seco e vestindo roupas mais confortáveis. Assim que os olhos de repousaram nele, um sorriso materno apareceu em seus lábios e ele, sem se importar com o resto, correu para seus braços.
- Você está bem! Graças a Deus. E cuidaram bem de você? Se não cuidaram pode me falar que eu quebro na porrada – tossiu por forçar a voz, mas não se importava com isso. Abraçou forte o garoto.
Não era estranho ver assim, por mais que pareça que não, ela tem um instinto materno forte e era esse carinho que ela tinha pelo garoto, como se fosse seu filho. Por isso ela o resgatou do Hospital e não o deixou ter o mesmo fim que os outros soldados.
- A voz deu bronca, brincando. Ela fez cara feia pra ele.
- Tá tudo bem, eles são ótimos aqui – Trevor sorriu e beijou a mão de . – Obrigado por tudo, de verdade – eles sorriam um para o outro e acariciava o rosto de seu novo filho.
- Ganhamos?
- Sim – Teddy riu.
- E Zeus? – voltou a perguntar, ignorando completamente o pedido de para que ela não gastasse a própria voz.
- Neste momento já deve ter virado comida de morto-vivo.
riu do comentário de Judas e fitou meu braço.
- O que houve?
Balancei a cabeça.
- Não se preocupe com isso, por favor. Eu tô bem, tá todo mundo bem, ok? Você tá viva, , ... Estamos sãos, salvos e juntos, é o que importa agora.
O silêncio se instaurou na sala, perdendo o clima leve.
- Huh, – Baby quebrou a linha, sem forças no discurso.
- Sim? – sorri, encorajando-a.
Ela negou com a cabeça e parecia nervosa, olhou para o teto e para o chão.
- Eu não consigo – declarou a loira, indo embora.
Estranhei a situação e pensei em levantar para segui-la, mas Jacob foi atrás dela. Parecia saber exatamente do que ela estava falando.
- O que aconteceu gente? São os sobreviventes? Estamos precisando de alguma coisa? Podemos pegar um caminhão e ir até a cidade, tá tudo bem já! Estamos livres agora!
Agarrei-me àquele sentimento. Me sentia estranha. Sorriso aberto, sem intenção.
- Não é isso – Barbie concluiu.
Franzi o cenho.
- O que houve? – todos estavam paralisados e somente eu e não entendíamos nada. Eu não queria entender.
- Falem logo, chega desse drama! – minha irmã ralhou.
Teddy tossiu.
- Slade... Ele... Não sobreviveu.
Minha garganta secou e fiquei brava por alguns segundos. Em seguida gargalhei, do nada, forte, alto.
- Essa foi péssima, Ted.
Barbie olhou para mim com pena e tentou me abraçar. Rapidamente me levantei e me afastei de todos eles. Negando com a cabeça.
- Pare de mentir Ted, por favor, você estava lá, ele falou comigo. Eu estanquei as feridas dele, você estava lá! – falava desesperadamente. A voz rouca.
- Eu queria estar mentindo, pequena.
- Não... – meus lábios tremiam. – , por favor, você acredita em mim não acredita? Eu ajudei ele, não foi igual a vez do papai, eu juro que não parei dessa vez, eu não travei, eu ajudei ele, me ajuda por favor, ele estava lá!
Minha irmã me encarava confusa com toda a situação e seus olhos brilharam, acompanhando minha dor.
- Ele perdeu muito sangue , não foi possível. Eu não queria te falar isso até chegarmos aqui, para que não fizesse muita bobagem - Teddy continuou.
- NÃO! ELE NÃO MORREU, EU AJUDEI ELE, EU NÃO TRAVEI, EU ESTAVA LÁ, EU BEIJEI ELE, ELE ME BEIJOU, EU FALEI QUE ESTAVA ESPERANDO O FILHO DELE.... DE QUE ADIANTA?
- Oh, minha querida... - suspirou, compreendendo tudo.
Todos estavam chocados com o meu surto e revelações no meio das frases. E eu... estava perdendo a cabeça.
- DE QUE ADIANTA, ?
- ... por favor fica calma, você vai conseguir superar isso, eu sei que vai.
- DE QUE ADIANTA? EU NÃO CONSEGUI AJUDAR O PAPAI E ELE MORREU. EU AJUDEI SLADE E ELE TAMBÉM MORREU. ZEUS ESTAVA CERTO, EU SOU UMA INÚTIL, EU SOU FRACA, EU...
Caí de joelhos, abraçando meu colo, gritando em um choro dolorido, esperando que alguém aparecesse ali e parasse com a dor que eu estava sentindo.
A última coisa que eu me lembrava daquele dia, era o abraço apertado de .


Epílogo

Slade me abraçou e estranhei que foi diretamente na minha cintura, agora que a barriga não estava mais gigante como costumava nos últimos nove meses. Ele beijou minha bochecha com a ternura que sempre guardou apenas para mim e avisou que o jantar estava pronto. Reclamei e ele riu, sabendo da minha preguiça com eventos sociais.
Foi diferente aquela vez. Sem preocupações. Caminhei até a nossa grande mesa no meio do jardim, farta.
e ele finalmente se acertaram. estava mais coruja do que o usual ensinando caretas para Max e Jolie enquanto eles gargalhavam dela. Frid estava bebendo uísque, algo novo para ele, acho que ele estava confortável outra vez, sem medo do amanhã. Vi Judas sorrir e isso foi outro choque naquela tarde, eu nunca o tinha visto sorrir.
Todos conversavam e socializavam porque agora éramos um só. Bailey e Paige se entrosavam com Baby e acho que eu não poderia ter escolhido uma amizade melhor para as duas. Elas sempre estavam lá para ajudar, e isso poderia contribuir uma à outra.
Willa me surpreendeu, com o tempo, saiu de sua toca, correndo com Jacob e Backup, junto com Trevor, o novato nessa família.
E Jacob tentava me enganar dizendo que as fatias de carne eram pra ele, e não para seu cachorro.
Teddy e Barbie também criaram uma amizade bonita e sincera, talvez amizade colorida... afinal, estavam bem íntimos. Quando me aproximei deles, Barbie mostrou aquele sorriso sincero, que ela mostrava desde a primeira vez que ajudou a e a mim. Em um segundo, Ben levantou seus bracinhos, querendo vir para o meu colo. Quando o segurei, notei que estava ficando cada vez mais pesado e ri.
- Barbie, você continua dando biscoitos escondidos pra ele?
- Ele sempre pede mais! E suspeito que ele caminha escondido até minha cozinha para roubá-los, não é bebê? – faz algumas caretinhas pra ele e aperta sua bochecha.
- Ele não sabe falar... ou andar... mas vou fingir que acredito na sua desculpa – sorri.
- Ele sabe apontar e engatinhar, ! É uma criança prodígio, esse pequeno Ben. Sem falar na sua linguagem própria que só Slade entende.
Gargalhei. Realmente, nem eu entendia o que Ben falava.
Era Benjamin, em homenagem a meu pai.
- Obrigada por cuidar dele pra mim hoje, Barbie.
Ela me abraçou de lado.
- Está tudo bem criança, eu roubaria ele pra mim, se precisasse.
Ben estava com dez meses. Tinha os cabelos escuros como os meus e os olhos não identificáveis ainda. Talvez ficasse igual do pai.
Backup passou correndo por nós e Ben gargalhou, querendo ir atrás do cachorro.
Sentamos todos na mesa. e estavam ridículos, se abraçando toda hora, de beijinhos, enquanto Max olhava pra eles com cara de vômito.
Frid contava algumas piadas enquanto eu passava a salada para , afinal os dois estavam entretidos no meio daquela conversa.
Deixei dois lugares ao meu lado vazios, para os principais daquela tarde: mamãe e papai. Não demorou para que eles chegassem, mamãe segurou Ben no colo e Slade revirou os olhos, sabendo o quanto seu filho era puxa saco da avó. Papai o cumprimentou e também disse um olá para , colocando seus assuntos em dia. Ele ria e brincava com os garotos, falando para que cuidasse muito bem das irmãs Romero. Mamãe disse que ele não precisava se preocupar com isso, porque enquanto nós duas estávamos juntas, tudo iria dar certo.

bateu a porta do passageiro e pediu desculpas por ter me acordado.
Estávamos na frente de uma farmácia vazia, tentando pegar o suficiente para os feridos, ajudando de qualquer forma possível. Se eu estava certa, teríamos o dobro de pessoal que normalmente tínhamos para cuidar agora, e seria difícil lidar com isso daqui pra frente.
- Tá tudo bem, foi só um cochilo – respondi. Nós duas ainda estávamos desamparadas pelo o que ocorreu ontem. Era muito novo ainda.
Dirigi de volta para a Colônia e ligou o som baixo. Thriller começou a tocar e sorri de leve ouvindo o CD de nossos pais. Pelo menos aquilo e o carro ainda estavam com a gente. O chaveirinho de Kill Bill havia sumido, até isso as pessoas roubavam no meio de um apocalipse. Sacanagem.
- Você tá melhor? – estava com medo de pisar em ovos comigo.
- Vou ficar.
- Então... você e o Slade, hein... quem diria. Eu diria – quase ri dessa vez, eu não sei porque tentava esconder algo da minha irmã ainda. Agora não tinha o que esconder.
, eu estava namorando esse cara de caráter duvidoso, mas ele morreu, e você vai ser tia. Surpresa.
- Aquilo ontem foi ridículo, me perdoa. Eu reagi intensa demais – com vergonha do meu show.
- Não foi uma vergonha, , todo mundo lida com o luto de uma forma. E foi um baque pra você. Não só pra você, né... – olhou pra minha barriga. Dessa vez eu ri de verdade, ainda estava em choque com aquela informação e arregalava os olhos toda vez que encarava meu ventre. E acho que ainda não tinha caído minha própria ficha. Eu vou ter um filho. Eu vou ter um filho. Slade é o pai.
É, ainda não é real.
- Eu acho que estava em negação, todo mundo tá propenso a morrer aqui, não está? Papai e mamãe se foram, e a gente continua aqui.
- Continuamos, e não estamos sozinhas dessa vez – sorriu.
- Apesar de que se estivermos juntas, tudo vai dar certo – repeti a frase velha da minha mãe e olhei pra minha irmã.
Tudo ia dar certo. Eu confiava naquilo.
Quando estacionamos, apareceu.
- Preciso da sua ajuda – disse alarmado e parecia ter visto um fantasma.
- O que houve?
– “Vem” ele puxou nós duas e corremos para a Colônia.
Eu tinha pensado no dobro, não no quádruplo de pessoas.
Agora que Slade estava morto, o pessoal dele estava perdido. Mas o que tinha no quintal da Colônia agora, eram pessoas do hospital. Mulheres e crianças que conseguiram de alguma forma fugir no meio da batalha e pareciam desamparados com tudo o que aconteceu, em busca de alguma ajuda.
Olhei pra um pouco assustada e não sabíamos direito o que fazer. Judas apareceu e praticamente me empurrou em cima de uma camionete. Todos eles esperavam alguma palavra, e eu seria a produtora da mesma.
Segurei com força a faca de cabo branco na minha cintura. A que ganhei dele. E comecei a falar, em alto e bom som, para que todos os sobreviventes da Colônia, do Quartel General e do Hospital, pudessem me ouvir.
- Slade está morto, - observei seu pessoal, e os sobreviventes do Hospital pareciam assustados. - Mas Zeus também está e junto com ele se foi também aquela forma de governar o mundo dos humanos. Ele trouxe o pior de nós à tona, dentro de uma sociedade extinta, onde tínhamos mais medo da nossa própria espécie do que de inimigos que não podiam morrer. Nós queremos construir um novo mundo, com paz e justiça, que abrace todo mundo, não só o que julgamos ser certo – fitei todos significativamente. Era pra todos eles, os nossos e quem era nosso inimigo um dia. Éramos todos iguais agora. Perdedores. - Eu sei que todos estão se sentindo desamparados neste momento, mas eu juro pra vocês, que podem ficar. Vamos atrás de comida, vamos atrás de água, um local quente pra dormir, seus filhos e filhas não estarão sem rumo no mundo porque vamos abraçar todos vocês. Nós precisamos ficar unidos, não importa o seu passado agora e da onde você veio. Eu só preciso de uma promessa de que vocês acreditam que existe mais no mundo do que luta e morte, porque eu acredito que há... Eu quero que meu filho viva nesse mundo. A guerra acabou.




Fim.



Nota da autora: 1/2 A idéia pra criar Império dos Mortos começou com nossa obsessão bizarra com Resident Evil e The Walking Dead, que levou dias pra montar um roteiro com duas protagonistas irmãs que se amavam demais até criar um capítulo por vez. Enrolamos pra caramba, começamos a odiar nossos próprios personagens, tivemos ressalvas, bloqueio de criação, mas chegamos ao fim com o sentimento de trabalho cumprido. Então só queria agradecer a todas as leitoras que comentavam em todas as atualizações, e deixando claro que liamos todos os comentários com a mão no coração com tanto elogio que nem sei se merecemos. E também, amávamos quando vocês comentavam coisas como “Caramba, o Toby é um idiota, não vai morrer nunca????” ou “eu nunca odiei alguém mais que odiei o Zeus” ou até mesmo “foda-se as irmãs, eu quero mais cenas do Slade!!!” HAHAHA nós vivemos por esse carinho que vocês tinham com a nossa história e novamente só sei dizer obrigada por tudo e por aguentarem os quase 3 anos aqui com a gente. IDM finalmente chegou ao fim, mas vai ficar pra sempre aqui guardadinha pra quem quiser reler ceninhas doidas como podre de bêbada tendo seu primeiro encontro com Slade no meio da floresta, ou quando ela enfrentou alguns apuros pra poder fugir do hospital e de Zeus. Tchau andarilhas, até a próxima!

2/2 Bom, chegamos ao fim da nossa maior obra que foi IDM. É muito chocante chegar nesse momento e inesperado, mas uma parte nossa tá muito tranquila e feliz por ter tido a oportunidade de escrever essa história durante esses anos e tocar cada uma de vocês que leu e acompanhou aqui conosco. Foram 3/4 anos difíceis de criação e em vários momentos queríamos jogar tudo fora e desistir, mas aqui estamos com esse fim. Eu quero agradecer a TODAS que leram, comentaram, falaram conosco e dividiram o amor por IDM com a gente, vocês fizeram essa fic acontecer e somos gratas pelo amor de vocês, sério, vocês foram foda. Também quero agradecer as nossas betas durante esses 3 anos, a Dafne e Gabi que cuidaram dessa fic com tanto amor e carinho durante todo esse tempo, se não fossem por vocês, pelo feedback e pelo carinho que tiveram betando essa fic não teria sido a mesma experiência pra nós, muito obrigada. Muito muito muito obrigada por tudo, obrigada por essa caminhada conosco e espero vê-las por ai. Que as irmãs Romero permaneçam na memória de vocês como vai permanecer na nossa. Até a próxima, amamos vocês!

Romero’s Playlist: https://open.spotify.com/user/3xlh1j5rfa9gloj4g69btheoo/playlist/6eXwxsj86szQvx7ExsjLPg





Outras Fanfics:
13TALES: Outros, Restritas, Em Andamento.(/fobs/number/13tales.html)
Caça ao Tesouro: Outros, Short, Finalizada.(/fobs/c/cacaaotesouro.html)


Nota de beta: Ah, gente, eu que agradeço por ter feito parte da postagem dessa reta final de IDM. E agradeço mais ainda por ter tido a oportunidade de ler essa preciosidade que vocês criaram. Adorei muito todas as emoções que IDM me proporcionou, vocês são escritoras incríveis. Espero que continuem sempre e sempre a postar hisórias perfeitas como essa.

Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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