Finalizada em: 11/02/2019

Capítulo Único

— Seu noivo mandou buscá-la.
Nunca poucas palavras me deram tanto medo. Era uma situação tão incomum que só poderia significar que eu estava com problemas. Quase ri com esse pensamento. Uma mulher normal não teria medo se seu noivo requisitasse sua presença; ao contrário, ficaria feliz em ver o Hummer na sua porta com o motorista e um segurança que a levaria direto até ele. Mas não eu.
Jullian Morales e eu tínhamos crescido juntos em Porto Rico, e foram os melhores momentos que passamos. Nossas famílias eram amigas, morávamos na mesma rua. Todos os vizinhos sabiam que nossos pais chefiavam um negócio lucrativo; poucos tinham a consciência do tipo de negócio que nos rendia tanto dinheiro. Juan Morales, pai de Jullian, era chefe de um cartel de drogas que dominava boa parte do país, e tinha uma sociedade com um dos homens mais temidos e ricos daquele mundo perigoso. Meu pai era seu homem de confiança, e juntos os dois conseguiram comandar aquele tráfico por décadas. Jullian e eu não nos importávamos com isso, embora. Éramos crianças relativamente normais, que brincavam e tinham amigos, se divertiam sem pensar em problemas. Mas nós sabíamos que havia um acordo entre nossas famílias. Eu pertencia a Jullian desde o momento em que nasci. No entanto, eu não me importava. Gostava dele, da sua companhia, dos seus brilhantes olhos verdes que se destacavam na pele bronzeada, e às vezes ficavam escondidos sob os cachos que caíam sobre a testa. Costumava ter uma sensação de euforia quando sabia que o veria naquele dia, e o sorriso raramente deixava meu rosto quando Jullian estava comigo. Isso durou até os meus quinze anos, quando ele e sua família resolveram mudar de país.
Foi um baque perceber que eu não o tinha por perto. Me apeguei ao fato de que um dia nós nos casaríamos, então ele ainda era meu, para todos os sentidos. Meu doce coração infantil e romântico sonhava com o nosso reencontro, onde ele diria que estava apaixonado, que sentira a minha falta, e juntos mataríamos a saudade. Mas não foi bem o que aconteceu, e eu deveria ter percebido o meu engano quando o tempo passou e Jullian não me ligou ou tentou entrar em contato. Dois anos depois de sua ida, foi a minha vez de o acompanhar com a minha família. O que encontrei passou bem longe dos meus sonhos apaixonados. Aquele não era meu Jullian, nada naquele homem frio e distante me lembrava do garoto da minha infância.
Nosso reencontro foi marcante, mas não da forma como eu esperava. Mamãe, papai e eu fomos convidados para um jantar de boas vindas na casa dos Morales. O lugar era aberto, amplo, estilo vila italiana. As paredes eram de uma cor clara, com janelas brancas, uma varanda pequena no andar superior com grades escuras e telhados avermelhados. Todo o chão que cercava a propriedade era de paralelepípedos limpos, e uma fonte ficava bem na frente da casa. Pensei imediatamente que adoraria viver ali com Jullian, ter filhos que correriam naquele gramado, brincariam com o papá enquanto eu apreciaria a vista com um sorriso no rosto. Estava tão ansiosa para vê-lo que ao passar pelas colunas na entrada, meus olhos vasculharam o saguão de visitas a procura do seu corpo alto e cabelos cacheados, foi quase uma decepção ser recepcionada pelos pais dele. Mamãe segurava meu braço suavemente, talvez para me impedir de correr para Jullian no momento em que ele aparecesse. Não precisou disso, embora. Ele apareceu no topo da escada, e foi lá mesmo que ficou, com seus olhos fixos em nós como sequer nos reconhecesse. Sorri de maneira tímida, estimulando-o a vir até mim, mas o máximo de reação que tive foi um breve franzir de cenho. Ele não falou uma palavra durante todo o jantar, mesmo enquanto tío Juan professava os feitos do filho, e a cada novidade eu reconhecia menos o meu amigo de infância. “Jullian foi iniciado três meses após nossa chegada!” Tío Juan dizia, com orgulho óbvio. “Matou um inimigo com nada mais do que um abridor de cartas e os punhos! É o nosso melhor manuseador de facas e punhais, ótimo em tortura física e psicológica!” Completava, em êxtase. Na minha cabeça, tudo que eu pensava era: o que tinham feito com meu Jullian? Não era aquele homem que olhava insistentemente para a mesa como se no prato houvesse a explicação da sua existência. Papai estava maravilhado, no entanto. O que poderia ser melhor do que um marido capaz de cuidar da sua menina?
O jantar acabou, e Jullian desapareceu para o andar superior. Eu estava chocada com sua falta de entusiasmo, e tía Lucy - percebendo isso - me incentivou a subir e procurá-lo. “Talvez ele só esteja tímido, niña”, dizia ela, com seu sorriso doce que me fez lembrar de tortas e lanches servidos no parque, nos fins de semana do nosso país natal. Mamãe também me instigou a ir em frente, então foi o que fiz. Subi as escadas e andei pelo corredor a procura do segundo quarto no lado esquerdo, como tía Lucy havia falado. Foi fácil achar, mas não precisei sequer chamá-lo. Jullian estava no telefone com alguém, e antes que eu pudesse dar as costas, ouvi meu nome sendo pronunciado através da fresta da porta aberta. A curiosidade ganhou da minha tão prezada educação. “Maya é só uma criança. Não preciso me preocupar com ela até esse maldito casamento. Por enquanto, tudo que preciso, posso encontrar com as prostitutas do chefe.” Foi como uma facada mortal no meu coração apaixonado. O que era apropriado, dada a habilidade dele com facas. Meus olhos queimavam, a vontade de chorar era absurda, mas tudo que fiz foi tropeçar no aparador e delatar minha posição. Logo Jullian estava na minha frente, com um sorriso displicente nos lábios e os olhos verdes estranhamente gentis. Ele se escorou na porta, cruzando os braços sobre o peito. Se eu não tivesse escutado a conversa anterior, jamais imaginaria como ele poderia ser rude. “Posso ajudá-la, cariño?” Perguntou ele, com a mesma voz melódica e suave que eu me lembrava. Não consegui responder sem cair em prantos, então só dei as costas e corri até estar segura com a minha mãe.
Desde aquele dia, eu nunca mais fiquei a sós com Jullian. Mesmo quando seus pais morreram, alguns meses depois, em uma explosão suspeita. Eu estava lá no velório, é claro, vendo-o de longe. A firmeza dele não era comum. Claro que homens como Jullian e papai não podiam expressar suas emoções como uma pessoa comum; mas Jullian emanava uma total falta de sentimentos, uma completa ausência de emoções, e isso era inquietante. Seus pais estavam mortos, e tudo que ele fazia era sorrir educadamente, apertar as mãos das pessoas e parecer entediado. Então passaram meses sem que eu o visse novamente. Lógico que eu sempre ouvia falar no jovem prodígio Jullian Morales, herdeiro de uma verdadeira fortuna e de uma multinacional de telecomunicações - sua ocupação pública -, que vivia em bares e boates com suas “amigas” modelos. Comecei a odiá-lo. Eu não queria, afinal, ainda nos casaríamos; mas o que eu deveria sentir quando ele me humilhava de forma tão pública? Não importava o quanto ele era perigoso, frio, manipulador, assassino ou o que fosse, ele deveria pensar em como eu me sentiria vendo-o com aquelas mulheres.
E agora lá estava seu guarda-costas mais fiel, na porta da minha casa, quase um ano depois do nosso último “encontro”, me dizendo que eu era esperada por Jullian. Apesar do medo, eu me sentia revoltada. O que ele queria comigo agora? O que poderia ser tão urgente que eu teria que sair tarde da noite para vê-lo? Porque suas “amigas” não poderiam resolver seu problema? Mas eu tinha sido exaustivamente ensinada a nunca questionar um pedido do meu futuro marido. Mamãe costumava dizer que eu poderia sim ser uma menina rebelde, se eu quisesse; mas não esperasse carinho em troca. Se eu fosse uma boa garota, uma esposa doce e obediente, talvez meu casamento não fosse um fracasso completo. E foi por esse motivo que não bati a porta na cara do guarda-costas.
— Jullian quer me ver agora? — Perguntei, ainda confusa. Não fazia sentido, mas até então, nada sobre aquele noivado fazia qualquer sentido para mim.
— Sim, senhorita Hensel. — Confirmou, austero. — Ele me mandou buscá-la. Posso ligar para ele, se não acredita.
— Não é necessário. — Sussurrei rapidamente. Tudo que eu não precisava era que meu noivo soubesse da minha incredulidade em seu desejo de me ver. O quão patética eu pareceria? — Me dê um momento, tudo bem? Eu já volto.
O homem acenou, concordando, e eu subi as escadas até o meu quarto. Troquei meu pijama por um vestido azul escuro acinturado e com um decote quadrado revelador. Eu não deveria mostrar tanto, minha mãe odiaria, mas era a minha forma de protesto. Eu poderia ser obrigada a ir, mas me vestiria da forma que eu quisesse. Depois de me calçar e deixar um aviso com Sueli - nossa governanta - corri de volta para a entrada, onde o homem ainda me esperava. Ele me levou até o Hummer preto, olhando para os lados como se esperasse tiros a qualquer instante. Devia ser cansativo trabalhar para Jullian, sempre em perigo constante. Logo seria eu, também. Faltava alguns meses para o casamento, e eu não me sentia nem um pouco preparada para isso.
Nos acomodamos nos bancos traseiros do carro, e logo estávamos a caminho da casa dos Morales.
— Qual seu nome? — Perguntei ao rapaz, observando seus olhos tão castanhos quanto os meus estreitarem enquanto olhava pela janela. Ele me olhou, parecendo surpreso. — Se vou deixá-lo me tirar de casa de madrugada, prefiro saber seu nome.
— Miguel Ramirez, senhorita. — Respondeu ele. — Sou o chefe da guarda do senhor Morales.
— Claro. É um prazer conhecê-lo, Miguel. — Murmurei, voltando minha atenção para as minhas mãos trêmulas que se apertavam sobre minha coxa.
— Preciso alertá-la sobre algumas questões importantes, já que encontrará o Sr. Morales. — Miguel continuou. Virei para ele, erguendo uma sobrancelha em incredulidade.
— Tenho regras para encontrá-lo?
— Não são regras, senhorita. São formas de não deixar o Sr. Morales perturbado.
— Oh, é claro. — O sarcasmo não estava tão mascarado quanto imaginei. — Diga as regras disfarçadas de conselhos, então.
— Tente não fazer muitas perguntas. — Miguel começou a recitar, como se fizesse isso com frequência. — O chefe não gosta de ser questionado. Ele pode estar um pouco bêbado, mas não vai machucá-la, não se preocupe. Se ele não quiser conversar, apenas fique lá, em silêncio. Tente não parecer com medo, o chefe não gosta disso.
— O problema é que eu estou com medo. — Era para ser um sussurro incompreensível, mas o olhar de pena de Miguel me atravessou como uma espada.
— Ele não vai ferí-la. — Falou ele, me olhando de esguelha. — O Sr. Morales não aprova violência contra mulheres.
Tive vontade de bufar e revirar os olhos, mas isso não era nada educado. Claro que ele era contra violência, contanto que pudesse usar suas aptidões sanguinárias vez ou outra.
— Ele fala de mim? — Eu duvidava muito que Jullian falasse de mim, mas ainda assim precisava perguntar. Queria apenas ter certeza de que meu antigo amigo estava perdido para sempre. Olhei para Miguel, que parecia mortificado em falar do chefe dessa forma íntima. Não desviei os olhos, embora, precisava saber a resposta. Ele pigarreou, e só então respondeu:
— Todos sabem quem é a senhorita Maya Hensel. Sabem que é a noiva do Sr. Morales, e que ele tem grande respeito pela senhorita.
— Mas ele me esconde, não é? — Sorri, erguendo uma sobrancelha. — Conhecem meu nome, mas não meu rosto.
— Escondemos nossos tesouros mais valiosos, senhorita Hensel. — O sussurro de Miguel fez meu coração vacilar. Tesouro… Será que eu era o tesouro valioso de Jullian? Eu também duvidava disso.
Chegamos a casa dos Morales alguns minutos depois. Fazia um pouco mais de um ano que eu não a via, e mais uma vez fui surpreendida com a beleza do lugar. As flores nos canteiros davam um ar familiar, e a grama verde bem cuidada me remetia a piqueniques. Era uma casa perfeita para formar uma família. Miguel me ajudou a descer do Hummer, e me acompanhou até a porta ladeada por duas colunas de cor clara. Ele a abriu, e acenou para que eu entrasse. O saguão continuava o mesmo, amplo e bem decorado. O lustre de cristais enorme pendia sobre as nossas cabeças, as paredes exibiam os quadros caros de artistas famosos. A escada subia única até a parede, e então se dividia em duas, uma para cada corredor que era o andar superior. Miguel acenou para que eu subisse, e foi o que eu fiz. Depois das escadas, pegamos o lado direito da casa, onde o corredor se estendia por três portas, após elas vinha uma sala de estar com uma mesa de café da manhã de frente para a porta francesa que dava para a varanda. Continuamos adiante, até o próximo corredor, onde só havia duas portas, uma de frente para a outra. Miguel parou na frente de uma delas, bateu duas vezes e esperou. Meu coração estava acelerado, e minhas mãos suavam frio. Depois de tanto tempo, eu seria obrigada a presenciar o homem que achei que seria meu único amor. Agora ele era apenas um desconhecido com quem eu teria de casar.
— Entre. — A ordem veio de dentro da sala, arrepiando minha nuca com o reconhecimento do tom suave. Miguel abriu a porta e acenou para que eu me adiantasse.
Assim que entrei, eu o vi. Era um escritório parecido com o do meu pai, com estantes de livros nas paredes, uma mesa de madeira no centro, cadeiras na frente dela e uma área separada com um sofá, duas poltronas e uma mesa de centro. Jullian estava sentado na cadeira atrás da mesa, com os pés sobre a superfície de madeira cheia de papéis. Acendia um cigarro entre os lábios, e a camisa de botões estava aberta, mostrando uma camiseta sem mangas por dentro. Os cabelos cacheados eram uma bagunça despojada, e quando seus olhos verdes vieram até mim, estavam turvos. Um sorriso esticou um lado dos lábios de Jullian, e ele levantou, contornando a mesa e vindo até nós. Parou a uma distância confortável, abaixando o cigarro, me observando com curiosidade quase clínica.
— Minha doce Maya. — Murmurou, inclinando-se em uma breve cortesia. Meu corpo estava tenso, eu não sabia se tinha sido sarcasmo ou não, mas retribui o gesto com um aceno. Ele olhou para Miguel. — Trouxeram-na em segurança?
— Nenhum problema no percurso, chefe. — O guarda-costas respondeu imediatamente. — Também repassamos suas preferências.
— Preferências? — Jullian não esboçou qualquer emoção, só perguntou, como se não quisesse realmente saber. Era isso que me inquietava nele, o fato de eu nunca saber o que ele planejava ou pensava.
— O senhor sabe. Os… aconselhamentos de sempre. — Miguel me lançou um olhar rápido de desconforto.
— Está me dizendo que passou as regras com a minha noiva? — Jullian murmurou, naquele tom doce e afiado. Seus olhos tinham um brilho assustador. — As mesmas regras que uso com as prostitutas? Está me falando que minha futura esposa foi confundida com uma das prostitutas que me visitam?
Uma pedra parecia decididamente fincada sobre meu estômago. O calor se espalhou nas minhas bochechas, eu só não sabia bem o motivo: se a voz perigosamente calma de Jullian, sua atenção focada em um Miguel aturdido, ou o fato de ele admitir ter prostitutas bem na minha frente. Mas ao vê-lo caminhar até estar na frente de Miguel e encará-lo, o medo de presenciar a morte de alguém fez meu estômago revirar. Jullian era mais alto do que Miguel, apesar de ser mais magro. Ainda assim, o medo no rosto do segurança era mais que óbvio.
— Me desculpe, chefe. — O rapaz apressou-se, piscando rapidamente. — Eu só achei que…
Um lamento engasgado ficou preso na minha garganta, quando vi Jullian pressionar a extremidade acesa do cigarro contra a camisa branca de Miguel, logo ao lado dos botões. O rapaz fechou os lábios em uma linha dura, as veias do pescoço saltando. Era óbvio que sentia dor, mas não emitiu qualquer som.
— Jules. — Chamei, sem pensar duas vezes. Não estava acostumada a violência, meu pai era cuidadoso em não me expor a isso. Jullian tirou a ponta do cigarro da camisa do rapaz, deixando um buraco exposto, e sob ele a pele queimada. Minhas mãos tremiam tanto que apertei em punhos, tentando esconder meu medo. Jullian colocou o que restou do cigarro dentro do bolso de Miguel e deu um passo para trás.
— Não trate minha futura esposa como uma prostituta, Miguel. — Disse suavemente. — Pode ir, agora.
O rapaz acenou, impassível, faz uma reverência para nós e saiu da sala rapidamente. Não percebi que tinha prendido a respiração até meu peito queimar, e o suspiro deixar meus lábios. Jullian virou para mim, inclinando a cabeça para o lado, como se me analisasse.
— Maya. — Disse, pronunciando meu nome devagar. — Peço que perdoe os péssimos modos de Miguel. Ele não está habituado a lidar com mulheres respeitáveis.
— Apenas com as suas prostitutas, já entendi. — Falei, me arrependendo logo em seguida quando os olhos verdes dele estreitaram na minha direção. — Fui solicitada para vê-lo, então estou curiosa sobre o motivo. Depois de tanto tempo, achei que só nos veríamos no casamento, como é a sua vontade.
— Então você preferia não me ver? — Perguntou ele, dando as costas e se afastando até a mesa. Minha voz ficou engasgada quando ele virou de volta para mim, encostando-se na superfície de madeira e cruzando os braços sobre o peito, os olhos verdes me observando impassíveis. Pigarreei, desviando minha atenção do seu rosto afilado.
— Não precisava fazer isso com Miguel. — Mudei drasticamente de assunto, torcendo para que ele não voltasse a perguntar sobre minhas vontades. Tinha medo de que ao responder, descobrisse que era ridícula ao ponto de ainda querer que Jullian me visse daquela mesma forma de antes.
— E o que eu fiz com Miguel?
Encarei-o, irritada. Ele estava tentando me incomodar ou realmente queria uma resposta para aquela pergunta? Mas como sempre, seu rosto era uma máscara sem emoções, apenas um inclinar leve da cabeça como se estivesse curioso. Deixei meus olhos passarem por ele com a liberdade que não tinham desde muitos anos. Seu corpo longo e esguio escorado displicentemente na mesa, sempre aparentando aquela tranquilidade que eu duvidava que ele sentia. Jullian tinha mudado tanto desde a adolescência, mas eu ainda pude ver o garoto que ele foi, que sorria para mim e perguntava insistentemente sobre meus planos para o nosso casamento. Ele costumava gostar da ideia, antes. Passei meu peso para a outra perna, me sentindo desconfortável naquele lugar. Nem tinha percebido que não respondi sua pergunta, até ele franzir o cenho.
— Está preocupada com ele? — Questionou, suavemente. — Foi só uma forma de ensiná-lo a se comportar, cariño. Miguel é o mais fiel entre meus assassinos, ele sabe o quanto prezo por sua lealdade.
— Me parece um péssimo modo de demonstrar agradecimento. — Critiquei, incapaz de me calar. — Mas o que eu sei a respeito dos modos de vocês? Faz mais de um ano que não nos falamos, afinal. Fiquei surpresa de Miguel saber meu nome, então ser tratada como uma das suas… amigas, não é grande coisa.
— Minhas amigas? — Jullian repetiu, sorrindo. — Elas não são minhas amigas, querida.
— Não me importa o que elas são. — Murmurei, meu estômago agitado com a mentira. O mais humilhante era que eu me importava, e não só pela sua exposição, me sentia traída de uma forma íntima. Jullian suspirou, colocando uma dose de tequila no copo e tomando de uma vez. Seu rosto sequer contraiu com o ardor do álcool, e logo a atenção dele estava de volta em mim.
— Bebe algo, Maya? — Jullian ofereceu, e neguei rapidamente com um aceno. Ele deu uma risada seca, não parecendo surpreso. — Como eu pensei, foi educada para ser a esposa perfeita.
— Não sou perfeita. — Reclamei, mas ele não pareceu dar ouvidos. Na verdade ele parecia ausente, e isso me irritou. Porque havia me chamado até ali se me trataria com frieza? O que ele queria comigo?
Um calor subiu no meu corpo, e nada tinha a ver com a temperatura do ambiente. A raiva ferveu meu sangue, fez meu coração acelerar até que eu pudesse ouvir as pulsações nos ouvidos. Eu não era a garota perfeita, apesar de ele ter razão quanto a minha criação. Não permitiria que ele me tratasse como um joguinho, ou me colocasse em um tipo doentio de pedestal da pureza e serenidade. Jamais seria levada a sério se não me impusesse. Eu tinha crescido com ele, esperado por ele, e não me contentaria com menos do que merecia.
— Me chamou para ter certeza da minha perfeição? Ou só quer saber se consegui manter minha pureza intacta?
Jullian ergueu a sobrancelha, levemente surpreso. Não era isso que eu queria. Precisava que ele reagisse, me mostrasse mais do que exibia para qualquer outra pessoa. Queria saber que eu tinha algo dele que ninguém jamais teria, que ele era autêntico quando estava comigo. Eu queria que ele… me olhasse com algo mais do que sua máscara de paciência e tédio. Queria ficar sem chão, que Jullian me tirasse o ar, que me enfrentasse, brigasse, qualquer coisa que me dissesse que sua atenção era só minha. Que eu valia algo para ele, era importante, não só uma esposa troféu.
Minha respiração estava rápida, mas me mantive firme.
— E você conseguiu? — Perguntou ele, entretido. Franzi o cenho, confusa, e ele continuou. — Sua pureza. Ela continua intacta?
— Você é completamente revoltante. — Dei uma risada, incrédula. — Acabou de falar que tem suas prostitutas e então quer saber se eu me guardei para você?
— Era o acordo dos nossos pais, não era?
— Então faz parte do acordo que você se enfie sob os vestidos alheios, mas não no meu?
Meu rosto esquentou quando ele sorriu, e desviei meus olhos, constrangida.
— Então é isso que a deixa chateada? Que eu foda com outras garotas, mas não com você?
— Eu já disse, não me importo. — Dei de ombros, mortificada. — O que quero dizer é que não tivemos contato por muito tempo, então não me parece justo que sua primeira pergunta seja sobre a minha virgindade.
— Não se preocupe, cariño, eu não me importo de verdade com a sua virgindade. — Apesar da voz suave, a frase me perfurou dolorosamente. Eu me importava em entregá-la para ele, porque Jullian não poderia ao menos parecer prezar isso também? — Não sei porque está tão chateada. Te mandei presentes, como noivos fazem.
Mais uma risada irônica escapou dos meus lábios. Encarei Jullian, cruzando os braços como ele. De repente sua atenção foi direcionada ao meu decote, e na borda de renda preta do sutiã que aparecia. Puxei o vestido para cima, estreitando os olhos para ele, até seus olhos focarem no meu rosto. Mesmo com o flagra, sua expressão era a mais inocente possível.
— Presentes nas datas comemorativas não me faz conhecê-lo, Jules. — Provoquei. — Eles só dizem o quanto você é frio e distante. Pulseiras de diamantes e colares de rubi são apenas dinheiro, não afeto.
— A barganha não incluía afeto, Maya. — Respondeu ele, um pequeno vinco aparecendo entre as sobrancelhas. — Não conhece nosso mundo? Afeto não nos faz mais fortes. Tudo que meus pais queriam para mim era uma esposa respeitável que me desse filhos, e aconteceu de ser você.
— Está satisfeito com um casamento de fachada, então? — Meu peito doía, e eu não sabia bem o motivo. Eu já sabia disso tudo, não era? Então porque ainda me sentia magoada?
— Satisfeito? — Jullian riu, distraído. — Não sei o significado real dessa palavra, querida.
— O que você quer de mim, Jules? — Questionei, cansada de fugir do ponto principal. Ele me olhou, e pela primeira vez na noite eu percebi que ele me viu, não apenas a menina que foi escolhida para ser sua esposa, mas a mim, Maya, a garota que cresceu junto com ele. Um nó se formou na minha garganta, mas não era vontade de chorar. Era como se eu quisesse falar algo, mas não conseguisse.
— Jules. — Repetiu ele, em um sussurro. — Faz tempo que não escuto esse nome.
— Era como eu…
— Como me chamava, antes. Eu sei. — Jullian interrompeu, desviando os olhos dos meus, quebrando aquela intensidade que havia se formado. — Eu te chamei para conversarmos sobre nosso futuro, Maya. — Finalmente ele começou, e mais uma vez a falta de emoções era a única coisa que eu via nele. — Tem razão, não tivemos muito contato ultimamente, mas se vamos nos casar, precisaremos ao menos saber mais um sobre o outro. Para começar, você precisa saber sobre o que esse casamento envolve. Todas as normas dos meus negócios, os perigos, as regras.
— Mais regras. — Sorri com ironia, e seu olhar gelado me atravessou. Jullian conseguia ser apavorante quando queria, bastava um olhar daquele e minha vontade era fechar a boca e escutar em silêncio. Ao invés disso, no entanto, ergui uma sobrancelha e o encarei de volta. — Estou esperando, Jullian.
— Pelo que sei, faltam dois meses até o casamento. — Ele retomou, mas parecia mais duro do que antes. — Seu nome passará a ser Maya Hensel Morales, será esposa de um Morales, isso virá com responsabilidades. Me acompanhará em reuniões, com pessoas que nos observarão como pitbulls esperando um pedaço de carne. Sei que sua mãe te ensinou sobre etiqueta, mas essas reuniões vão exigir muito mais do que isso. Frieza, Maya, e muito cuidado, é isso que te mantém viva.
— Eu também cresci entre assassinos, Jullian Morales. — Murmurei. — Não tem razão para me tratar como uma tola.
— Ótimo. — Disse, sorrindo. — Então tem que saber que Miguel designará um guarda-costas para você. Não sairá sem ele, nunca ficará sozinha com nenhum homem que não seja ele ou seu marido. Terá um carro sempre a disposição, mas eu prefiro que não dirija sozinha.
— Isso é ridículo. — Dei uma risada, surpreendendo a ele e a mim.
— Sua segurança não me parece ridícula.
— Quem o ouve falando dessa forma pode pensar que se importa comigo, não é?
— E eu não o faço?
— Eu não… — O riso nervoso escapou, e então um suspiro. — O que eu estou fazendo? — Perguntei, sussurrando. — Não posso me doar a alguém que me verá apenas como um corpo para a reprodução dos seus filhos. — Ergui os olhos para Jullian, resolvendo ser honesta comigo e com ele. Talvez fosse minha última chance de ser verdadeira, antes da minha vida se resumir a facilitar a do meu estimado marido. — Não sei se vou conseguir aceitar isso. Não sou boba, sei que papai tem amantes, e mamãe aceita isso porque “nenhuma amante chegará aos pés da esposa”. Mas algo em saber que você dormirá com suas prostitutas, para depois vir até mim com a intenção de me engravidar… Não me parece justo ou certo.
— Talvez eu tenha me enganado com você. — Falou ele, ríspido. O gelo se espalhou pelas minhas veias. Se ele terminasse nosso acordo, papai me mataria. E Jullian poderia alegar que eu me recusei a aceitá-lo, assim papai não teria qualquer direito de se sentir ofendido com a quebra da barganha. Engoli em seco, sentindo meu rosto empaliceder aos poucos. — Você não é a garota que eu pensei, afinal.
— Tem razão. Talvez isso seja um engano. — Murmurei, me recusando a deixar meu orgulho de lado.
— Então me deixe perguntar claramente. — Jullian levantou, andando na minha direção até ficar a dois passos de mim. Meu coração estava descompassado, enlouquecido com a proximidade. Seus olhos me fitaram, insistentes, exigentes. — Você quer se casar comigo, Maya?
A resposta estava presa na minha garganta. A pergunta se repetiu na minha cabeça até que me senti atordoada. Eu queria? Conseguiria conviver com ele? Com aquele Jullian distante e cruel? Talvez fosse uma tortura para mim. Sempre esperando que meu antigo Jules retornasse, nunca recebendo o afeto que eu queria. Ele me amaria um dia? Ele era capaz de amar? Eu precisava de amor, disso eu sabia. Não era uma mulher objetiva como a minha mãe, eu continuava sonhando com coisas que jamais seriam para mim, caso eu me casasse com um Morales. Amor, carinho, atenção… eu precisava disso para ser feliz. Jullian me daria o que eu precisava?
— Eu não… — Balbuciei, aturdida. — Não sei.
Jullian deu dois passos para frente, tão repentinamente que pulei de susto, cambaleando para trás, até que minhas costas se chocaram com a porta de madeira. De repente seu corpo estava quase colado no meu, me cercando, e tive que levantar a cabeça para olhá-lo nos olhos. Jules me encarava com mais do que a indiferença de sempre, e isso me causou um choque de autoconsciência. Ele estava reagindo, finalmente se mostrando, mesmo que fosse apenas irritação. Meu peito subia e descia rapidamente com a respiração veloz, minha boca entreaberta de susto. Jules se inclinou, nossos rostos se aproximando.
— Maya. — Ele me chamou, meu nome saindo rouco e melódico, fazendo minhas pernas bambearem. Sua boca estava tão perto que eu sentia o hálito de tequila no meu rosto, me esquentando por dentro, causando um tipo de reação tão visceral que eu não entendia.
— Não me machuque. Por favor. — Pedi, em um sussurro hesitante. Não sabia se estava com medo do que ele faria comigo naquela hora ou depois do casamento. Na verdade desconfiava que eu sairia daquela relação quebrada, mas era inevitável. Soube naquele momento que eu queria me casar com Jullian, me ligar a ele de todas as formas que eu pudesse, lutar incansavelmente para tê-lo de um modo que ninguém nunca o possuiu. Um senso de posse me atravessou. Ele era meu, era assim desde que éramos crianças, seria assim até a nossa morte. Entraríamos nesse casamento juntos, e sairíamos dele juntos, não importava o que isso significasse.
O sorriso que esticou seus lábios foi o mais selvagem que eu já havia presenciado. O transformou em uma fera, me fez sentir como a presa. E foi dessa forma que ele chocou os lábios nos meus, me arrancando um lamento desesperado do fundo do peito. Meus dedos se agarraram a camisa de Jules, puxando-o para mais perto, impedindo que ele me deixasse. Sua língua deslizou entre meus lábios, tocando a minha, como um convite para dar a ele algo que eu queria entregar. Jullian tinha o gosto mais maravilhoso que eu já conheci, o leve amargor da tequila e algo que identifiquei como gosto de Jules. Era como se meu corpo estivesse aceso, queimando, implorando por mais, e eu não tinha ideia do que “mais” significava. Meus pés se esticaram para que eu passasse um braço pelo seu pescoço, mordendo seu lábio e sentindo meu peito apertar quando ouvi o som delicioso do gemido dele. Jules me pressionava contra a porta sem delicadeza, e eu não queria que ele fosse delicado. Suas mãos foram até as minhas coxas, escorregando para cima, erguendo o vestido e acariciando minha pele exposta. Onde quer que ele tocasse eu sentia arrepiar.
Havia tanto que eu queria dele, e estava tudo ali, eu poderia ter, e esse pensamento foi o bastante para me fazer queimar. Jullian passou os polegares pela tira da calcinha de renda preta que eu usava, e a sensação era que meu coração havia parado de expectativa. E então ele envolveu minhas coxas, me impulsionando para cima e enrolando minhas pernas na sua cintura. Eu não conseguia parar de beijá-lo; mesmo que eu tivesse pouca experiência com beijos, eu sabia que eu jamais encontraria algo melhor que aquilo.
Algo rígido apertava contra meu estômago, e meu corpo reagiu pressionando meu quadril no corpo dele, buscando atrito em um ponto entre minhas coxas que doía de uma forma doce. Jules rosnou baixinho, as mãos escorregando até minha bunda e me apertando mais contra ele. Eu já estava sem ar, fora da minha mente, sem chão, e nada me pareceu melhor do que isso. Era o fogo que eu procurava, a paixão desesperada pela qual eu havia esperado. Quando nossos lábios se separaram, Jullian beijou meu queixo, deixando rastros molhados no meu pescoço, descendo pelo decote do vestido até seus dentes morderem a borda do sutiã e Jules puxar, dando mais espaço para seus lábios procurarem entre meus seios. Meus dedos se perderam nos cachos grossos dele, da forma que eu queria fazer a tempos, e nunca pude. Senti enquanto ele caminhava pela sala, até me sentar sobre a superfície da mesa. E então Jules se inclinou sobre mim, segurando o decote quadrado do vestido e puxando-o para baixo, junto com a taça do sutiã. Arfei, vendo meus seios expostos por um segundo, antes dos lábios dele envolverem um e após o outro, provocando, mordendo, beijando até que meus olhos fecharam com força, minhas costas arquearam contra sua boca quente.
— Jules. — Chamei, sem saber ao certo o que dizer. Ele respondeu enrolando meu cabelo no seu punho e puxando, sua boca voltando até encostar na minha. Abri meus olhos, vendo-o me observar com um brilho de malícia. Ele prendeu meu cabelo firmemente, me impedindo de mover a cabeça.
, querida, seu Jules. — Murmurou, antes de voltar a me beijar. Meu coração estava tentando com muito esforço sair pela boca, de tanto que martelava no meu peito. Meu Jules, ele tinha dito. O meu Jullian.
Se ainda havia qualquer rastro de receio ou racionalidade, ela se perdeu após ouvir aquelas palavras. Gemi alto, sentindo seus dentes rasparem no meu queixo e pescoço, cada beijo deixando uma marca avermelhada no meu colo. Não que eu me importasse, só queria que ele continuasse até… O quê? Eu não fazia ideia do que ele faria comigo, mas importava? Eu era dele, de qualquer forma.
Jules espalmou uma mão no meu peito, me fazendo deitar sobre a mesa. Arquejei ao sentir algo sólido sob minha coluna, e tirei um cinzeiro de prata de baixo de mim. Jules sorriu, pegando o objeto e o jogando para trás, fazendo um barulho alto ao cair. A expressão entretida dele me fez sorrir, até que voltei a deitar e notei uma arma ao lado da minha cabeça. Meu corpo se tencionou no mesmo instante, o sinal de alerta ecoando na minha mente. Eu odiava armas, talvez por crescer ao redor delas. Jullian sabia disso, não era algo novo. Ele hesitou, olhando para a pistola e de volta para mim. Percebi que ele lembrou da minha aversão, e meu peito queria cantar em comemoração a sua preocupação. Jules engoliu em seco, franzido o cenho e voltando a me levantar, até me colocar de volta sobre meus pés pouco firmes.
— Quer… — Ele começou, parando em erguida e franzindo o rosto. Olhei para ele, pedindo em silêncio para que não me mandasse embora. Não queria acabar tão rápido, ainda precisava de mais. Jules sorriu de lado e segurou a minha mão. — Eu ia perguntar se você quer ir para casa, mas não me sinto disposto a deixá-la ir. — Declarou. — Vai dormir comigo, essa noite.
Pisquei, atordoada. Uma mistura de medo e excitação corria nas minhas veias com toda força, acelerando meu coração até fazê-lo doer. Ele me queria com ele. Jules não queria que eu fosse embora. Sem falar mais nada, Jullian me carregou através da sala e abriu a porta, me levando junto para o corredor. Eu sabia que meus cabelos pretos deviam estar um caos, que havia marcas no meu pescoço, e que meu rosto corado deixava claro o que estávamos fazendo; isso me fez enrubescer ainda mais. Dois homens ladeavam a porta do escritório, e ao nos ver sair e perceber nosso estado, abaixaram as cabeças, desconfortáveis. Jules nem sequer parou, abriu a porta à frente do escritório enquanto falava sobre o ombro:
— Dispensados. Maya só voltará para casa amanhã.
Os dois responderam com um aceno. Me senti estúpida por nem conseguir olhar na cara dos dois sem querer me enfiar atrás dos quadros da parede, então balbuciei:
— Boa noite. — Os seguranças me olharam, e Jullian fechou a porta na cara deles.
Virei para o quarto, apreensiva. A king size ficava no meio, com dois criado-mudos aos lados. Na frente dela estava uma estante preta cheia de livros, uma TV, videogames e outras máquinas que não tinha ideia do que era. À esquerda um corredor levava ao que pensei ser o banheiro. Mesmo que estivesse tudo claro, eu não tinha ideia de onde vinha a luz. Não havia lâmpadas visíveis, só uma tênue luz azulada que preenchia o lugar de um clima sombrio. A decoração preta, branca e cinza também não colaborava para um clima mais alegre. Mas parecia com um quarto onde Jullian dormiria, afinal.
Olhei ao redor, me sentindo estranha em estar em seu lugar particular. O que eu fazia ali? Mamãe odiaria que eu me entregasse a Jullian antes do casamento. Mas eu me importava? Quase ri com o pensamento de que minhas preocupações ruiam quando Jules me tocava. Nunca tinha percebido o quanto eu o queria, o tanto que eu o desejava, até senti-lo tão perto. Mas então o medo também estava lá, coexistindo junto com a vontade de ceder.
Me surpreendi com as mãos dele nos meus ombros, segurando atrás de mim. Meu corpo ficou tenso, talvez pela expectativa ou apenas receio. Apesar de tudo, eu ainda era a menina virgem sem experiências com homens. Fui criada para ser esposa de alguém, não me foram permitido conhecimentos íntimos como aqueles. Jules percebeu minha hesitação, e num instante estava na minha frente, me olhando com seriedade, um vinco se formando entre as sobrancelhas. Os cachos caíram sobre os olhos, e minhas mãos coçaram para tirá-los de lá.
— Está com medo. — Não era uma pergunta, ele só constatava um fato óbvio. Não ousei negar.
— Achei que gostasse disso.
— De você com medo? — Perguntou, confuso. Ergui meus olhos até os dele, buscando algo para lê-lo.
— De ser temido.
— Eu gosto. — Jullian deu de ombros, inclinando a cabeça levemente. Ele levantou a mão até a alça larga do meu vestido, acompanhando toda a margem do decote, sorrindo quando meu peito subia e descia com a respiração rápida. — Mas não de você. — Disse ele, distraído. — Não quero que tenha medo.
Eu podia sentir meu rosto quente, e minhas mãos apertavam o tecido do vestido aos meus lados. Sim, estava com medo, mas também curiosa. Ele deu um passo para trás, tirou a camisa branca de botões e deixou-a cair no chão. Rapidamente se desfez dos sapatos e abriu o botão da calça social. A respiração de repente ficou presa na garganta. Nunca tinha visto um homem despido na minha frente, e era apropriado que o primeiro fosse Jules. Sem parecer notar minha ansiedade, ele deixou a calça cair no chão, empurrando-a para junto da camisa descartada. Em seguida tirou a camiseta branca sem mangas, exibindo as belas tatuagens que enfeitavam seus braços. Por um momento esqueci de como respirar, e meu pulmão protestou, até eu puxar o ar com rapidez. Meus olhos se recusavam a piscar, não queriam perder nem um segundo daquele momento. Jules estava ali, apenas de boxer cinza, as mãos bagunçando os cabelos encaracolados. Quem poderia imaginar que por baixo daqueles ternos caros se escondiam músculos? Não grandes, mas definidos, esguios, perfeitos para acariciar e admirar.
— Vire-se. — Pediu ele, sem rodeios. Antes mesmo que eu pensasse sobre isso, meu corpo o obedeceu. Seus dedos frios seguraram meu cabelo espesso e colocaram sobre um ombro, pegaram o zíper do vestido e desceram por toda a extensão das minhas costas. Meu coração martelava a cada toque suave na minha pele, mesmo um leve resvalar me atingia. Jullian tirou o vestido dos meus ombros, e deixou-o cair no chão aos meus pés. Tudo que eu usava era a lingerie preta de renda e os sapatos altos, nunca havia ficado tão exposta na frente de alguém. — Sente-se na cama. — Voltou a ordenar, e fiz o que foi mandado. Não queria pensar, ou poderia desistir e sair correndo daquela casa. Se ele tinha mais experiência nisso do que eu, só me bastava fazer o que ele pedia. Sentei sobre os lençóis, olhando, incrédula, enquanto ele se ajoelhava na minha frente e segurava uma das minhas pernas, tirando o sapato e fazendo o mesmo com o outro. Foi um gesto tão gentil que eu paralisei, sem saber o que pensar. Ele passou um braço pela minha cintura, me erguendo alguns centímetros e tirando os cobertores de baixo de mim. — Deite-se, agora.
Mais uma vez fiz o que ele pediu, me esticando em um lado da cama, descansando a cabeça sobre o travesseiro macio. Jullian me cobriu, contornou a cama e deitou-se ao meu lado, pegou algum tipo de controle remoto e apertou alguns botões. O ar de repente ficou mais frio, a luz azulada se dissipou até se tornar um escuro agradável. Eu ainda podia ver os contornos de Jules, os cabelos, as tatuagens dos braços. Ele virou-se para mim, e mais uma vez me atordoou ao me abraçar pela cintura e deitar a cabeça sobre meu peito. Seus braços ao meu redor eram firmes, claramente requisitando algo que era dele. O nariz passeou pela minha pele, e Jules inspirou, como se sentisse meu cheiro. O corpo dele relaxou contra o meu, como se gostasse da situação inusitada.
— Jules… — Comecei, mas ele me interrompeu com um pedido inesperado:
— Cante para mim.
Pisquei, confusa. Quando éramos crianças eu costumava cantar para ele e nossas famílias, mas era apenas uma brincadeira, não me orgulhava muito da minha voz.
— Cantar? — Perguntei, na esperança de que fosse uma piada. Mas Jules ergueu o rosto para me olhar, decidido.
— Sim, cante para mim. Lembro que a sua voz costumava me agradar.
Intimamente meu coração deu uma cambalhota de alegria. Ele gostava da minha voz, lembrava dos meus cantos idiotas, e talvez até sentisse falta deles. Um sorriso bobo esticou meus lábios, e vasculhei minha cabeça até lembrar da música que mamãe havia me ensinado desde pequena. Ela a cantava para mim, todas as noites, até eu conseguir dormir sozinha.
Apesar de trêmula, comecei a cantar suavemente, hesitante. Jullian suspirou, se acomodando novamente no meu peito, os braços me apertando confortavelmente. Minhas mãos estavam sobre a cama, eu não sabia bem o que fazer com elas, até Jullian procurá-la e a colocar sobre seus cabelos, como uma criança pedindo carinho. Meu coração parecia amolecido, meu corpo inteiro entregue ao simples gesto de carência de Jules. Acariciei seus cabelos, cantando baixinho, até sentir sua respiração uniforme no meu peito. Inclinei o rosto, beijando sua cabeça, um sorriso ainda estampado nos meus lábios.
— Boa noite, Jules. — Sussurrei, fechando os olhos.


Não tinha certeza se estava acordada ou se era um sonho, mas se eu pudesse escolher, preferiria que fosse real. Mesmo de olhos fechados eu sabia quem me tocava, de quem eram os dedos que se emaranhavam nos meus cabelos, de quem era a boca que cobria a minha. O gosto dele ainda não tinha saído da minha cabeça, e agora estava outra vez na minha língua. O lamento escapou da minha boca no instante que seus dentes rasparam nos meus lábios, e então deslizaram até meu pescoço. Ergui as mãos, sentindo os cachos grossos de Jullian, e foi assim que eu soube que era de verdade. Eu nunca conseguira imaginar perfeitamente como seria essa sensação, como seus cabelos me pareceriam ao toque dos meus dedos, e era melhor do que qualquer sonho que eu pudesse produzir.
Entreabri os olhos, maravilhada com a realidade. Estava na cama de Jules, sob seu corpo alto, na penumbra do quarto. Ainda que estivéssemos no escuro eu podia ver seu rosto, os olhos fechados, a expressão relaxada, mas não com a apatia de sempre, era apenas meu Jules sendo ele mesmo. O sorriso estava de volta nos meus lábios, mesmo quando minhas costas arquearam, colando meu peito no dele. A pele quente de Jullian me aquecia inacreditavelmente melhor do que qualquer cobertor, seu cheiro embaralhava minha cabeça, inebriava meus pensamentos.
Minha mente clareou instantaneamente quando a mão de Jules escorregou entre nós, alcançando a margem da calcinha que eu usava. Eu queria ser dele da única forma que ainda não era, mas minha apreensão estava de volta, retesando meu corpo, me fazendo gelar. Tinha medo de decepcioná-lo, de não conseguir ser o que ele precisava.
— Jules… — Murmurei, colocando as mãos nos ombros dele, tensa. Jullian ainda tinha os olhos fechados, os lábios voltaram até estarem a centímetros dos meus, cheios e avermelhados, hipnóticos.
— É apenas um sonho, cariño. — Sussurrou ele. — Não posso machucá-la nos sonhos.
Franzi o rosto, confusa. Ele achava que era um sonho? E isso me fazia questionar se ele sonhava comigo com frequência. Deus, será que ele sentia por mim o mesmo sentimento que eu nutria por ele? Será que Jullian podia realmente ter sentimentos bons?
— Jules. — Chamei novamente, segurando seu rosto entre as mãos. Ele ergueu um lado dos lábios, como se apreciasse seu apelido na minha voz. — Jullian! — Voltei a chamar, e finalmente ele abriu os olhos, confuso. Jules piscou duas vezes, olhando para mim como se não entendesse o que estava acontecendo.
— O que…
— Não é um sonho. — Murmurei. — Eu estou aqui.
Ele abaixou a cabeça para o meu pescoço e inspirou profundamente, as mãos apertando minhas coxas e as colocando na sua cintura. Jules pressionou a ereção entre minhas pernas, suspirando na minha pele, me arrancando um arfar de surpresa. Era como se ele soubesse o local exato onde eu precisava de atrito, como se sentisse que eu o queria tanto que doía. Passei uma mão pelos cabelos de Jullian, perdida naquela onda de apreciação muda. Até que suas palavras anteriores entraram no meu cérebro atordoado, e eu as discerni com clareza.
— Jules? — Chamei em um sussurro, deixando meus dedos acompanharem a linha de sua coluna enquanto a outra mão se perdia nos cachos dele. Jullian murmurou algo, a vibração de sua voz suave me estremecendo. — Você quer me machucar?
Sua cabeça ergueu da curva do meu pescoço, os olhos encontrando os meus. Parecia receoso, incerto da resposta que me daria.
— Por que está me perguntando isso? — Perguntou ele, e dessa vez seu tom suave não me enganou.
— Você disse que nos sonhos não pode me machucar. Isso quer dizer que você quer me ferir de alguma forma?
Jullian suspirou, deitando a cabeça sobre minha barriga, e o silêncio durou até que achei que ele não responderia. Já tinha perdido as esperanças quando finalmente ele falou, da mesma forma indiferente de sempre, mas agora eu podia sentir seu coração acelerado contra o meu corpo.
— Eu tentei não te colocar nesse acordo, entende? — Perguntou. Meu coração apertou doentia e dolorosamente, e engoli o bolo que se formava na minha garganta. Talvez eu tivesse me enganado, afinal. Fechei os olhos por um momento, forçando as lágrimas a não virem.
— Entendo. — Respondi, ríspida. Para a minha surpresa, Jullian riu baixinho, um som rápido e rude.
— Não, não entende. — Disse. — Seu tom de voz deixa claro que não sabe. — Não olhar no rosto dele me incomodava. Mas Jules continuava deitado sobre minha barriga, seus dedos passeando pelas minhas pernas. — Você ainda é pura, Maya. — Recomeçou ele. — Não estou falando apenas do seu corpo, e sim de você inteira. Quando entrar na minha vida vai perder boa parte disso. Não me parece justo cobrar de você algo que eu nunca quis te tirar.
— Eu não estou te entendendo.
— Eu matei pela primeira vez quando eu tinha quinze anos. — Ele continuou. Meu estômago revirou ao imaginar a cena de forma diferentes,cada uma mais assustadora do que a anterior. Não consegui falar, só continuei em silêncio, escutando. — Ele era um cara bem maior do que eu. Mesmo assim foi fácil enfiar aquele abridor de cartas no seu pescoço, ver o sangue sujar minhas mãos. É quente, sabe… O sangue, eu quero dizer. A sensação não é tão ruim, pelo menos para mim. Me senti como um deus, com o poder de tirar a vida de quem eu quisesse. A partir daí foi simples continuar. Tortura física sempre foi minha melhor habilidade, depois das facas. Os gritos… É como se eu pudesse sentir a vontade de viver deles se esvaindo. A cada trabalho concluído, parte da minha sensibilidade se perdia, até que chegou no que eu sou, agora tudo que sinto é a adrenalina, euforia em estar no controle. Sou bom nisso, Maya, em matar, apreciar o momento de tirar a vida de alguém.
— Jullian. — Eu não queria ouvir aquilo, me causava pânico saber que Jules estava tão danificado. Não saber se ele poderia melhorar me deixava ansiosa, inquieta. Mais uma vez ele levantou os olhos até os meus, um sorriso brincando nos lábios.
— Viu só? — Jullian ergueu uma sobrancelha. — Eu nunca quis a mesma coisa para você. Depois da minha iniciação, meus pais me disseram mais claramente sobre o acordo. Você era minha, e nosso casamento já era dado como certo. Prometi que não te contaminaria até que não fosse mais possível adiar o inevitável. Deixei que aproveitasse sua vida sem mim, sem nada que te tirasse a inocência. Agora não dá mais, Maya. Você será oficialmente minha em todos os aspectos, e isso vai te macular. Não demorará para que se contamine com a minha depravação. Mas não posso mais evitar, entende? Eu esperei por tempo demais, não vou abrir mão de estar com você por nem mais um minuto.
Meu rosto parecia congelado naquela expressão de surpresa. As frases foram se encaixando na minha cabeça até que eu pude pensar de forma mais clara. Jullian se considerava um monstro, e talvez ele o fosse, mas tentou - da sua forma estranha - me salvar pelo maior tempo que conseguiu. Era isso que ele tinha tentado todo esse tempo? Me deixar segura dele? Me afastar do seu mundo?
Dios, Jules.. — Sussurrei, vendo-o aproximar o rosto do meu, atento, procurando sinais de que eu fugiria. — É você que não entende. Eu senti sua falta, tanto que daria qualquer coisa para só estar com você. — Jules franziu o cenho, confuso. Passei a ponta do indicador sobre o vinco entre suas sobrancelhas, sorrindo de incredulidade. — Pensei que não me quisesse, por isso lutei para não querê-lo.
— Mas eu quero. — Jullian se apressou, como se apenas o fato de eu duvidar o ofendesse.
— Bom, eu não sabia. — Dei de ombros. — Você com todas aquelas mulheres, em fotos na internet, eventos, bares…
— Elas nunca foram importantes.
— Achei que me odiasse por te tirar a liberdade de casar-se com quem quiser.
— Não, Maya. — Dei uma risada sussurrada com seu tom insultado. — Eu quero me casar com você. É a única mulher com quem eu me casaria.
— Eu também quero. — Sorri outra vez, suspirando lentamente. — Só preciso saber de algo.
— O quê?
— Você ainda é meu Jules? — Fitei seus olhos, esperando a resposta. Então ele sorriu, as pontas dos cachos fazendo cócegas no meu rosto.
— Ele sempre esteve aqui, só precisava de você para trazê-lo de volta. — Respondeu, me arrancando um sorriso vitorioso. — Seu Jules, Maya. — Disse em um sussurro, os lábios tocando os meus, minha respiração se misturando a dele. — Sempre seu.
Não houve mais dúvidas na minha cabeça. Era simples, eu o queria, e ele sentia o mesmo por mim; não havia motivos para adiar o inevitável. Minhas pernas o rodearam, trazendo seu corpo de volta para o meu. Jules grunhiu, seus lábios persuadindo os meus a abrirem, e então sua língua estava tocando a minha, fazendo com que um interruptor ligasse, produzindo um calor que me envolveu por inteira. Estava entregue a alguém que todos chamavam de ‘sanguinário imprevisível’ pelas costas, e tinha por ele uma fé que não possuía nem por mim. Era aquilo que eu tinha buscado desde o início, aquele fogo incontrolável, me incendiando por todos os lugares.
Jullian mordeu delicadamente meu lábio, e então passou a beijar meu pescoço, descendo pelo meu colo, deixando rastros que queimavam onde sua boca tocava. Fechei os olhos, arqueando meu corpo para ele, entregando-o tudo que eu tinha. Sua mão deslizou sob mim, abrindo o fecho do sutiã rapidamente, em seguida escorregou as alças pelos meus ombros, me olhando. Ele não me pediu permissão, sua expressão deixava claro que ele sabia o que o pertencia. Só estava reivindicando o que era dele, sempre foi. Quando o sutiã foi jogado para o lado, não houve o medo que eu esperava, a vergonha da nudez. Agora que eu sabia que era desejada, não sobrara espaço para mais nada. Tudo que existia era um desejo que me consumia, a vontade de marcar a pele de Jules, para que todos soubessem que ele era meu.
Seus lábios envolveram meu peito, o calor da sua língua me fazendo vibrar. Segurei sua cabeça, impedindo que ele fosse embora, incapaz de falar mais do que murmúrios incompreensíveis. Enquanto sua boca provocava meu peito, a mão de Jullian deslizou entre nós, chegando na dor pulsante entre minhas coxas. Ele espalmou a mão lá, e meus quadris se remexiam em busca de qualquer atrito que conseguisse. Apenas aquele toque, e eu já não conseguia mais pensar com clareza. E então ele se ergueu sobre os joelhos repentinamente, me assustando. Antes que eu perguntasse por algo, Jullian segurou as alças da minha calcinha e tirou pelas minhas pernas, jogando-a para que se juntasse a outra peça, e voltou a deitar sobre mim. Seus lábios estavam sobre meu estômago, os olhos verdes me observando, enquanto ele descia mais os beijos, até parar entre minhas pernas. Olhei, atônita, Jules colocando minha coxa sobre seu ombro, e senti seu hálito morno na umidade do meu sexo. Meu gemido desesperado ecoou no quarto, seguido por outro mais alto quando ele beijou exatamente onde eu precisava.
— Por favor, Jules. — Pedi, atordoada, meus olhos se fechando. Segurei seus cabelos, sentindo meu coração acelerar ruidosamente, talvez o bastante para que Jullian conseguisse ouvir. Eu queria que ele parasse de me torturar, ao mesmo tempo que queria que ele nunca parasse. Havia uma aflição doce que me tirava o ar, que tomava conta do meu corpo e fazia dele algo incontrolável. Minhas pernas estavam ao redor da cabeça dele, como se deixasse claro que ainda não era a hora de se afastar. Aquela dor se construiu a cada vez que a língua de Jullian encontrava um lugar sensível e faminto, fazendo meus membros contraírem, minha mente girar, até que tudo que existia era eu e ele. E quando o mundo desmoronou a minha volta, Jules foi a única coisa sólida que tornou tudo tão real. Foi nele que me segurei, chamando repetidamente seu nome, até que o prazer deu lugar a uma dor aguda, como fogo se espalhando por mim.
Abri os olhos, engolindo um engasgo de pavor, e só então notei que Jullian estava dentro de mim, e esse foi o motivo da dor. Ele beijou meu rosto com uma delicadeza impressionante, sussurrando palavras em espanhol que não compreendi em meio a dor.
— Já vai passar, cariño. — Disse ele, beijando a umidade no canto dos meus olhos. Respirei fundo, implorando em silêncio para que a dor cedesse, a queimação abrandasse. Queria ser forte para ele, não a menininha frágil que sequer podia aguentar a dor de se tornar uma mulher. Jules não se moveu, teve paciência, esperou minha hora. Encostei meu rosto na curva do seu pescoço, sentindo o cheiro tão bom que era o dele, me deixando inebriar. Um sorriso esticou meus lábios quando percebi a dor ceder, e entrelacei as pernas ao redor de Jullian. Seu corpo retesou, um rosnado suave saindo do seu peito, causando uma reação em mim que me assombrou. Eu notei que gostava de como ele perdia o controle. Apreciava o Jullian rude tanto quanto o Jules doce. Na verdade, eu o amava de qualquer forma.
— Continue. — Murmurei. — Me faça esquecer tudo. Me mostre coisas novas. Me faça sua, Jullian.
Seu peito vibrou com o lamento alto que saiu dos seus lábios, pouco antes de se chocarem com os meus. Permiti que eu me perdesse naquele beijo, esquecendo do incômodo inicial, esquecendo do mundo que nos aguardava lá fora, de mortes e sangue que nos acompanhariam para sempre, só deixei espaço para nós dois.
Éramos nós, novamente. Meu Jullian. Sua Maya.
— Minha. — Sussurrou ele, perdido, me olhando com seus olhos verdes nublados com desejo. — Você é minha, agora.
Suas palavras me dominaram. Os dedos de Jules se embrenharam nos meus cabelos, arqueando minha cabeça para que seus lábios alcançassem meu pescoço. A cada investida a dor diminuía, e o que sobrava era a posse e entrega. Eu entregava a ele meu corpo, e recebia em troca o dele. E tudo em mim parecia concordar com isso; meu quadril erguia para encontrar o dele, minhas mãos tateavam suas costas, minhas unhas deixavam marcas rosadas na sua pele. Jullian envolveu minha cintura um braço, chegando tão fundo que era como se seu corpo fosse um complemento do meu. Com hesitação, meus lábios deslizaram pela aspereza do seu queixo, pelo pescoço forte, minha língua tocando timidamente a curva do ombro, sentindo o gosto de Jullian, e quando meus dentes rasparam sua pele ele arfou, investindo uma última vez e parando, tenso sobre mim.
Nossas respirações unidas e ruidosas eram os únicos sons do quarto, e foi assim por um tempo. Jullian descansava a cabeça no meu peito, enquanto eu acariciava seu cabelo. Tinha sido perfeito. Mais significativo do que qualquer coisa que eu pudesse ter imaginado, e o sorriso se recusava a sair da minha boca, talvez por um bom tempo.
— Gosto de ouvir seu coração. — Ele murmurou, traçando a ponta do dedo sobre meu peito. — Ele é… seguro. Constante.
— Isso é bom. — Brinquei, sorrindo. — Gosto de sentir você sobre mim, também.
— Você me pertence, agora. — Jullian ergueu a cabeça, pairando sobre meu rosto. Tinha uma expressão genuinamente calma, tranquila. Ele tirou uma mecha da minha testa, pensativo.
— E você a mim.
— Sempre foi assim.
— Sim, sempre foi. — Observei a curva perfeita dos seus lábios cheios, que agora eu sabia como eram macios.
— Não vou deixá-la ir. — Disse ele, decidido. — Vai morar comigo, de agora em diante.
Dei uma risada, assustada.
— Não posso, Jules. Meus pais me matariam.
— Você ainda não conhece meu lado persuasivo. — Ele sorriu, apenas um leve arquear dos lábios. — Posso ser muito convincente, se quiser.
— De um jeito bom… — Estreitei meus olhos, envolvendo seu pescoço com os braços. — ou de um jeito mal?
— Da forma que for conveniente para a situação. — Respondeu, divertido. — Mas você não vai embora, isso está decidido.
— Eu gosto disso. — Suspirei. — Pode me fazer cativa, se quiser.
— Nesse quarto. — Jullian se inclinou, resvalando os lábios nos meus. — Nessa cama. Me parece uma ótima ideia.
— Me parece algo que Jullian Morales faria.
— Não, não Jullian. — Ele me olhava com uma intensidade que me aquecia, me deixava inacreditavelmente feliz, me fazia sentir completa e satisfeita. Então se inclinou, sussurrando na minha boca: — Jules. Seu Jules.
Meu coração expandiu de tamanho e todo ele estava completo de Jules. A fé me inundou com uma força arrebatadora, enquanto nossos corpos se entrelaçavam. Seríamos felizes, juntos. Eu acreditava nisso. Porque desde o começo fomos destinados um ao outro, e o destino nunca, nunca falhava.




Fim



Nota da autora: Agradecimento especial a Larissa e as Scripters!
Muito obrigada.




Qualquer erro no layout dessa fanfic, notifique-me somente por e-mail.


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