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Última atualização: 23/04/2022

Prólogo

O programa de talentos privado da Island Records, The Chosen One, era um sonho de que saíra do papel e fora abraçado por Andrew Gertler como se fosse um próprio. A gravadora escolheria o próximo nome ou nomes, no caso de duetos ou bandas, a serem lançados através de um processo de avaliação de gravações em vídeo, entrevista remota e, na última fase, os participantes se apresentariam ao vivo em uma audição na cidade de Nova York, onde seriam avaliados pelos jurados responsáveis pela escolha: Andrew Gertler, Sabrina Carpenter e . O participante escolhido assinaria um ano de contrato com a gravadora e teria de se mudar para NY, inicialmente pelo período de 12 meses, para lançamento e consolidação da carreira. Todo o processo de avaliações, entrevistas, audições e escolha seria privado do público geral, que apenas conheceria os nomes escolhidos, definitivamente, através de um lançamento oficial.

, , como estava convencida a se apresentar para o mundo da música, amava música por toda a sua vida e sentia que, ao cantar, podia tudo apenas com o som da sua voz e, mais do que sentir, sabia que podia transmitir o que sentia a quem a ouvia. Quando a Island Records lançou o programa de jovens talentos, ela sabia que precisava, ao menos, tentar. O programa The Chosen One era o que a brasileira enxergava como sua maior chance de ter um contrato com uma grande gravadora, visto que, no Brasil, nunca havia passado de apresentar alguns shows isoladamente e abrir para bandas independentes da cidade de São Paulo. Nos últimos anos, essa paixão foi dividida com Diego, seu então namorado e dupla musical, com quem havia passado por todas as fases da seletiva e, finalmente, chegado à audição presencial.

Ao pisar na sala de preparação do dia da audição, poucos momentos antes dela, sentiu todo o seu corpo ser tomado por uma energia que a dizia que aquele momento poderia mudar toda a sua vida. Ela estava certa. Mas a verdade é que, não importa o quão preparada para mudanças ela estivesse, absolutamente nada poderia prepará-la para o quanto tudo mudaria: ela. Sua vida. Seus sentimentos. E tudo o que ela acreditava ser importante.

Capítulo 1

— Isso não pode estar acontecendo — repetiu pelo que parecia ser a 34ª vez no mesmo minuto enquanto andava de uma parede à outra daquela sala pequena e completamente branca, onde estava se preparando para a última fase das seletivas do mais novo jovem talento da Island Records — a apresentação para dois grandes nomes da gravadora, Sabrina Carpenter e , e Andrew Gertler, principal agente da companhia e responsável pela gestão do programa —, fase que finalmente escolheria o vencedor ou vencedora de um contrato inicial de um ano dentro da Island Records. , ou , como escolheu ser conhecida em sua carreira artística, havia sido selecionada com seu parceiro e namorado nas 2 fases preliminares à apresentação ao vivo, que agora enxergava indo por água abaixo depois que Diego a deixou sozinha na sala de preparação, alegando que aquele era o sonho da garota, não dele, e saindo sem olhar para trás.

A menina finalmente parou de andar, sentindo a falta de ar arrebatadora tomar conta de si e seu corpo inteiro formigar e tremer, anunciando a chegada de uma crise de ansiedade. Apertou as unhas nas palmas de suas mãos com força suficiente para machucar, se obrigando a sentir algo que a trouxesse o controle de seu próprio corpo. Sem muito sucesso, tentou afastar as lágrimas que rolavam indiscretamente, deixando um rastro na maquiagem impecável que tinha preparado para o momento que poderia mudar toda a sua vida.

Em uma sala não muito distante daquela, fazia o que tinha descoberto ser sua coisa preferida do dia e observava através das câmeras a sala de preparação e o ritual de cada participante nos minutos que antecediam à participação. Segundo a programação que tinha em mãos, a última apresentação seria de e Diego Ferrero, que apresentariam um dueto de Don’t Stop Believing, do Journey, mas havia alguns minutos que o garoto havia deixado a parceira sozinha na sala, bastante agitada, após uma conversa que, mesmo sem som, pareceu desagradável. continuou observando a garota até o momento em que a viu se sentar em um dos cantos da sala e abraçar as próprias pernas; aquele movimento, infelizmente tão conhecido pelo cantor, foi o que o fez deixar o lugar que estava e se direcionar à sala de preparação.

Quando abriu a porta, ele encontrou a mesma cena apenas de um outro ângulo e o som que preenchia a sala eram os soluços de um choro estrangulado de uma garota que tentava respirar ruidosamente. Ele se aproximou da menina e se abaixou à sua altura sem sequer ser notado e, cuidadosamente, levou uma das mãos ao ombro dela.

— Você precisa de alguma coisa? — ele perguntou, cuidadosamente, e recebeu, em resposta, o sobressalto de , vendo-a perder toda a cor de seu rosto manchado de maquiagem pelas lágrimas e responder algo que, com certeza, fora em outra língua.
— Porra — foi só o que a brasileira falou.

*

Depois de ter seu mental breakdown interrompido por ninguém menos do que o cantor canadense da atualidade, teve os próximos 20 minutos mais improváveis da sua vida. Toda a crise de ansiedade se transformou em choque quando ela levantou a cabeça e encontrou perguntando se ela precisava de ajuda. Após soltar um palavrão em Português e observar a confusão no olhar do canadense, ainda fez questão de traduzir sua reação repetindo um “Fuck”, o que fez com que o cantor soltasse uma risada curta, anasalada.

Os minutos que se seguiram foram compostos por uma tentando explicar, de forma controlada, entre mais lágrimas e fúria, que não conseguiria se apresentar, pois seu namorado — que ela sequer sabia se ainda seria seu namorado — havia deixado-a a ver navios e ela jamais teria tempo suficiente para adaptar uma outra canção e nem mesmo sabia se poderia se apresentar sozinha, uma vez que sua inscrição na competição fora em dupla.

— Quanto a isso, pode deixar comigo. Não me parece justo você perder a oportunidade depois de chegar até a final. Eu vou pessoalmente resolver isso com o Andrew. Quanto a música... e se você a cantar toda, inclusive as partes que seu parceiro cantaria? — ele sugeriu, um pouco incerto, e viu que os olhos da menina se encheram de lágrimas novamente enquanto ela assentia em silêncio. — Mas, para isso, você vai precisar parar de chorar.

— É só que... – respirou fundo antes de continuar – ele não é só meu parceiro musical... namoramos, ou namorávamos, não sei mais, há 3 anos. – Ela tornou a chorar, perdendo um pouco do controle novamente, e a olhou com compaixão. – Ótimo, além de tudo, está com pena de mim — disse ela, revirando os olhos e tentando secar as lágrimas com as costas de uma das mãos.

— Eu não estou com pena de você — ele riu, balançando a cabeça negativamente. — Eu só não sei o que fazer quando alguém chora em minha frente e, pela minha experiência, quando eu abraço garotas que estão chorando, elas só choram mais. — Dessa vez, foi quem riu.

— Então, sem ofensas, , mas eu não sou sua fã. Quer dizer, eu gosto do seu trabalho. Mas eu não vou chorar de emoção por ser abraçada por você — notando o que disse, corrigiu rapidamente: — Não que eu queira que você me abrace, também! — o que foi um pouco tarde demais, pois a puxou para um abraço desajeitado, que não viu outra opção a não ser corresponder.

— Agora você precisa se recompor — disse, segurando a garota pelos ombros e a afastando do abraço para que eles pudessem se olhar. — Eu assisti aos vídeos das seletivas, vocês eram ótimos juntos. Mas confie quando digo, você vai ser ótima sozinha, só precisa manter a mesma emoção que você cantou no vídeo da primeira fase, quando vocês cantaram “Those Were the Days” do McFly.

— Uau, assistiu aos meus vídeos cantando e falou que eu vou ser ótima. — O garoto gargalhou ao observá-la falar seu nome, acompanhado do seu sobrenome, mais uma vez. — Foda-se Diego — ela soltou em Português.

— Por que você só me chama de “ ”? Não pode ser só ‘’”? — ele observou enquanto arqueou uma sobrancelha como quem diz “a resposta para essa pergunta é tão óbvia” e continuou ao notar que ela não daria uma resposta objetiva a ele: — Vou te deixar se recompor, você tem... — checou o horário em seu relógio de pulso — 8 minutos até que alguém da produção venha te chamar. O Andrew já estará a par da situação quando você entrar no palco. Eu estarei lá, serei um dos caras que julga — ele piscou, divertido, e sorriu.

deixou a sala e ela entrou no banheiro, revirando os olhos ao encontrar seu rosto completamente vermelho e manchado pelo choro. Como não tinha sequer tempo para fazer uma nova maquiagem, decidiu apenas lavar o rosto e contar que sua voz fosse o suficiente para impressionar quem deveria, de forma que sua aparência seria apenas secundária.

A música sempre fora algo muito grande e presente na vida de , desde muito pequena gostava de cantar, não somente músicas que existiam, mas, também, inventar músicas que falassem sobre o que quer que ela estivesse fazendo naquele momento: desde uma simples atividade da escola, até lavar a louça e arrumar o seu quarto, todas as coisas pareciam uma boa razão para se tornarem música. Pelos últimos três anos, compartilhou essa paixão com Diego, com quem começou a gravar covers um pouco mais profissionais para seu canal no YouTube. Eles conversaram muito acerca do que fariam caso fossem escolhidos, uma vez que uma das exigências do programa era residir — enquanto durasse o contrato — na cidade de Nova York. Por meses, tiveram essa conversa e, em todas as vezes, o homem estava a bordo, decidindo pular fora do barco no momento em que ela mais precisou dele para realizar seu maior sonho. Ela poderia perdoá-lo por não falar a verdade sobre o que sentia, mas não sabia se poderia perdoá-lo por, de alguma forma, colocar seu sonho em risco. Eram esses os pensamentos que assombravam quando ela entrou no auditório que estava vazio, se não fossem pelas três pessoas que ela já sabia que a esperavam lá dentro.

— Bom, , é um prazer finalmente conhecê-la pessoalmente — Andrew iniciou enquanto ela se posicionava no “x” vermelho marcando o meio do palco, onde havia, também, um microfone. — Estamos ansiosos para ver o que você nos trouxe. — Ao final dessa frase, sentiu um arrepio percorrer toda a sua espinha, procurou pelos olhos amigáveis de , que a encaravam atentamente, e encontrou conforto no sorriso que ele lhe entregou, balançando a cabeça de forma afirmativa, quase que imperceptivelmente.

— É um prazer estar aqui, conforme vocês já sabem, as coisas estão sendo um pouco diferentes do que planejei para o dia de hoje. Mas estou ansiosa para mostrar quem sou. — Com isso, Andrew fez um sinal para a produção e o instrumental de Don’t Stop Believing, apenas no piano, encheu o ambiente.

Just a small town girl
(Apenas uma garota de uma cidade pequena)

Livin' in a lonely world
(Vivendo em um mundo solitário)

She took the midnight train going anywhere
(Ela pegou o trem da meia noite indo para qualquer lugar)

Quando a voz de soou, tranquila, como se ela fizesse isso todos os dias quando não havia ninguém olhando, segura, como se ela não estivesse chorando com toda a força apenas alguns minutos atrás, foi possível ver algo se acender no olhar de que, imediatamente, buscou pelos olhos de sua amiga Sabrina e pôde ver o mesmo em seu olhar, como se eles acabassem de descobrir algo muito bom.

Just a city boy
(Apenas um garoto urbano)

Born and raised in South Detroit
(Nascido e criado no Sul de Detroit)

He took the midnight train going anywhere
(Ele pegou o trem da meia noite indo para qualquer lugar)

No verso em que Diego deveria cantar, todos os três jurados puderam notar a voz de vacilante e, por meio milésimo, foi tomada pelo pânico ao pensar que não poderia fazer isso sem ele.

— Desculpa, Andrew, preciso fazer isso — falou baixo, inclinando-se para o agente e subindo ao palco mais rápido do que qualquer pessoa naquela sala conseguiria entender o que ele estava fazendo. retornou a si quando escutou a voz do cantor cantar a estrofe seguinte:

A singer in a smoky room
(Um cantor em uma sala esfumaçada)

The smell of wine and cheap perfume
(O cheiro de vinho e perfume barato)

For a smile, they can share the night
(Por um sorriso, eles podem compartilhar a noite)

It goes on and on and on and on
(Isso continua e continua e continua e continua)

Sabrina se ajeitou em seu lugar, observando a cena completamente admirada, alternando entre olhar para o palco, onde seu amigo acabara de subir com uma completa desconhecida muito talentosa, e o seu agente, mas, quando a loira pensou que Gertler teria um ataque nervoso pela imprevisibilidade do ato de , o mais velho apenas olhou para ela com o maior sorriso habitando seus lábios e sussurrou: — Comece a gravar isto AGORA. E assim ela o fez, pegando seu celular de forma ágil e iniciando uma gravação.

apenas seguiu seus instintos e coração quando ambos cantaram juntos o verso posterior:

Strangers waiting
(Estranhos esperando)

Up and down the boulevard
(Subindo e descendo a avenida)

Their shadows searching in the night
(Suas sombras procurando na noite)

Streetlights, people
(Luzes da rua, pessoas)

Living just to find emotion
(Vivendo apenas para encontrar emoções)

Hiding somewhere in the night
(Escondidos em algum lugar pela noite)

Para os dois que estavam assistindo, aquela era uma cena única e rara de uma grande artista sendo descoberta, havia se soltado completamente na presença de , como se uma luz se acendesse dentro dela e fosse apenas aumentando. Andrew, agora, se balançava em sua cadeira, acompanhando o ritmo da música, enquanto Sabrina fazia questão de permanecer estática, filmando, para capturar da melhor forma possível a essência daquele momento. A dupla resolveu, como se houvessem ensaiado aquela apresentação por noites e noites a fio, revezar cada verso da estrofe que se seguiu, com iniciando:

— Working hard to get my feel… Everybody wants a thrill — ela cantava, olhando diretamente nos olhos de e se afastando do microfone para dar vez ao cantor, com um sorriso brincalhão em seu rosto.

Paying anything to roll the dice, just one more time cantou em seguida, tirando o microfone da base e andando em direção à garota, conforme o ritmo da música. , por sua vez, se aproximou do microfone que ainda estava sendo segurado por para voltar a cantar:

— Some will win — ela cantou sozinha, com a voz de misturando-se à dela logo em seguida: — Some will lose. Some were born to sign the blues.

— Oh, the movie never ends, it goes on and on and on and on pegou o microfone das mãos de e ele sabia que o trabalho dele naquele palco havia acabado. Sorriu, satisfeito, se direcionando para a lateral do palco, quando olhou para seu agente, encontrando um Andrew totalmente espantado, mas com um semblante de quem estava vendo algo de que gostou muito.

finalizou a música sozinha, ainda contagiada pela eletricidade de ter no mesmo palco, e, para finalizar sua apresentação com chave de ouro, resolveu mostrar sua potência, fechando a música de forma não planejada em “Hold on to the feelin” com um grande e longo agudo, colocando toda a sua alma naquele único verso. Fechou os olhos e apenas deixou-se levar pelo momento, que poderia ser a única vez que teria a oportunidade de apresentar-se daquela forma para duas estrelas da música e um agente com o poder de mudar carreiras e vidas, mas saberia que fez o seu melhor e se entregara completamente.

Quando abriu os olhos novamente, encontrou Sabrina dando pulinhos e palminhas em pé, completamente empolgada, e Andrew Gertler ainda sentado em sua cadeira, mas batendo palmas lentas e assentindo com a cabeça, muito satisfeito. Olhou para a direção por onde tinha saído e o encontrou andando em sua direção, batendo palmas com um sorriso que faria qualquer pessoa sorrir junto com ele. Ele sussurrou quando passou ao lado dela em seu caminho para unir-se aos outros dois jurados: — Eu falei que você seria ótima.

Independentemente do resultado que aquela apresentação trouxesse, sua vida já havia mudado, ela só não imaginava que estava por mudar ainda mais.

*

— É ela — Andrew falou quando finalmente estava sozinho com Sabrina e , após assistirem o vídeo da apresentação pela 5ª vez. — Eu não sei o que deu na sua cabeça, , mas, seja lá o que tenha motivado essa sua atitude impensada, você fez essa garota nos mostrar algo que, talvez, nós não teríamos a chance de ver. Então, obrigado.

— Eu só vi potencial nela — o garoto afirmou, dando com os ombros despreocupadamente. — E parece que eu estava certo, afinal. Pelo que vimos ali, aquele tipo de potencial, Andrew... — ele se limitou a dizer.

— Eu sei... a forma como vocês iluminaram o palco... a última vez que eu vi isso foi com a Sabrina e o Joshua. Você tem ideia do poder que um single em parceria de vocês faria? — riu, sabendo que Gertler costumava ir muito longe em seus devaneios quando ficava empolgado sobre um novo trabalho. — Você quer ser o responsável por dar as boas notícias a ela? — Andrew perguntou e, tanto quanto Sabrina, arquearam as sobrancelhas; sabiam muito bem que Andrew Gertler gostava de cuidar ele mesmo desse tipo de negócio. Mas, com a oportunidade em suas mãos, queria, inclusive, parabenizá-la pela apresentação incrível.

— Pode ser, você marca a reunião? — O mais velho apenas assentiu e disse a que enviaria mais detalhes por mensagem quando estivesse tudo certo.

*

Depois de sua apresentação, foi diretamente para o hotel, estava em êxtase, sentia tantas coisas ao mesmo tempo, que mal podia nomeá-las, mas sabia, com certeza, que nenhuma delas era ruim. Ao pensar em Diego, não sabia o que falar para ele quando o encontrasse no quarto do hotel, mas, com certeza, precisaria falar alguma coisa. Ao menos, era o que pensava, pois, ao entrar no quarto, encontrou-o muito mais arrumado do que tinha deixado. Vasculhou todo o quarto em busca de qualquer rastro do namorado, mas, quando estava finalmente aceitando que ele fora embora sem sequer dá-la o direito e a consideração de esclarecer como estariam as coisas entre eles, ouviu seu celular vibrar com uma mensagem do mesmo no WhatsApp:

Di ❤
visto por último hoje às 19:35

Espero que um dia você possa me perdoar, mas, a cada dia que eu acordava em Nova York, eu percebia que essa não é a vida que eu quero para mim, tive medo de encarar o significado disso no nosso relacionamento, mas sabia que não poderia ficar entre você e seu sonho. Estou voltando para o Brasil em um voo ainda hoje, nos vemos quando você voltar. Se você voltar. Você merece conquistar tudo o que quiser, . Mas eu também mereço sonhar meus próprios sonhos.


Com aquela mensagem, a tristeza que ela havia sentido, quando Diego a deixou sozinha na sala mais branca na qual ela já havia estado, retornou; como ele poderia ter sido tão frio ao simplesmente ir embora sem sequer ser corajoso o suficiente para dizer tudo o que, aparentemente, já vinha formulando há tanto tempo, na sua cara? Seus três anos juntos não haviam significado nada?

Ela se permitiu deitar na cama e chorar e sentir toda a tensão que envolveu aquele dia se acumulando bem na sua cabeça, presságio da enxaqueca que seria sua única companhia pelo resto daquele dia. Pelo menos, era o que pensava.

Eram por volta das 18h quando acordou com seu telefone tocando, apertou os olhos quando a luz da tela do aparelho lhe atingiu em cheio e encontrou um número de telefone de NY. Na mesma hora, sentou-se na cama e arrumou o cabelo, como se alguém pudesse vê-la através de uma chamada telefônica.

— Alô — ela atendeu de forma contida e ouviu o outro lado da ligação. — Claro. Ainda hoje? — levantou-se, apressada, acendendo todas as luzes do quarto e encontrando uma caneta em sua bolsa. — Certo, Hotel Conrad New York, às 20h00. Perfeito. — Ela continuou ouvindo. — Não, eu me viro! Consigo chegar lá de metrô sem problemas. — O homem do outro lado da ligação era Andrew, que se despediu dizendo “aproveite a normalidade”.

apenas ficou paralisada com seu telefone ainda em seu ouvido, se perguntando o que Andrew quis dizer com ‘’aproveite a normalidade’’. Sua reação foi correr para ligar para sua mãe e atualizá-la sobre esse dia com mais acontecimentos do que em uma semana inteira da sua vida normal, enquanto aproveitava a próxima hora para pedir algo para jantar no próprio restaurante do hotel e se arrumar para a reunião em que ela saberia, finalmente, seu destino. Sua mãe não poupou palavras ao elogiar a filha que, segundo ela, havia feito subir ao palco em meio à uma audição apenas para que ela continuasse a cantar.

— Eu sempre soube que sua voz te levaria longe, filha. Mas, ao que parece, agora também sabe. — A mãe da garota parecia mais empolgada com o dueto da filha com um cantor famoso do que preocupada com seu mais recente término de namoro.

— Mãe, calma. Eu preciso ir, te mando uma mensagem assim que souber do que se trata a reunião. Mas, das duas uma: ou eles vão falar ‘’parabéns, adeus’’ ou eu vou ter um contrato com a Island Records, mãe. Você tem noção do que é isso? — se exaltou ao falar sobre a possibilidade e sua mãe acompanhou a excitação da filha pelo outro lado do telefone.

— Filha, desde que acordei, eu tive o pressentimento de que você só voltaria ao Brasil de passagem. Meu coração se encolheu em saudade, não só por esse último mês inteiro longe, mas por saber que, provavelmente, é só o começo. Mas logo ele se encheu de orgulho por você não ter desistido, nem por um segundo, do seu sonho. E, independentemente do que te disserem nessa reunião, sei que você vai continuar fazendo o seu melhor e, para mamãe, você já é uma estrela. — Os olhos de marejaram com a fala da mãe, também estava morrendo de saudades e sabia que era uma possibilidade real que ela só voltasse ao Brasil a passeio, pelo menos no próximo ano inteiro, mas ficava feliz de ouvir sua mãe falando de si com tanto orgulho, mesmo antes de saber o resultado.

Capítulo 2

And if only you were nearer, I'd say
(E se você estivesse mais perto eu diria)

Don't wake me up
(Não me acorde)

Baby I'm in love
(Baby, eu estou apaixonada)

And I'm dreaming so much
(E eu estou sonhando tanto)

But I don't ever wanna stop
(Mas eu não quero parar)

Don't wake me up
(Não me acorde)


chegou ao hotel um pouco mais cedo do que o combinado e, seguindo as instruções de Andrew, se direcionou até a recepção, onde, dando o seu nome, recebeu um cartão para acessar o quarto onde a reunião aconteceria. Chegando ao vigésimo andar, aproximou o cartão do leitor magnético que havia no quarto de número 2058 e, ao entrar, se deparou com um quarto que, por si só, era maior que o apartamento inteiro que morava com sua mãe no centro de São Paulo, com uma janela que cobria uma das paredes da anla que possuía vista para o Rio Hudson. Ela foi a primeira a chegar ao local e se aproximou da janela contemplando a vista. As luzes dos arranha-céus, do lado oposto ao que ela se encontrava, refletiam na água do rio, a fazendo acreditar que qualquer movimento brusco que fizesse a acordaria, porque só poderia estar sonhando.

usou seu cartão para destrancar a porta do quarto e, quando entrou, se deparou com uma que, no mesmo momento, se virou para olhá-lo, recebendo-o com um sorriso que não escondia sua surpresa ao vê-lo chegar.

— Oi! Muito melhor encontrá-la sorrindo ao invés de chorando — ele comentou de forma cordial.

— Nossa, por que eu tenho a impressão de que isso aconteceu há dias, quando, na realidade, foi um dos primeiros acontecimentos de hoje? — a garota respondeu, descontraída, andando até e o cumprimentando com um beijo rápido no rosto, que causou um sobressalto da parte dele, que, definitivamente, não estava acostumado com pessoas desconhecidas estabelecendo contato físico de forma tão natural, sem tratá-lo como um ser sobre-humano. – Eu não sabia que você estaria aqui, eu vou criar uma lista de coisas que eu já fiz com , minha irmã vai ficar enlouquecida.

— Ela é uma fã, então? — o cantor riu, ao perguntar, e fez um sinal para que ela o acompanhasse até um cômodo separado do quarto, com uma mesa de escritório. — Quantas coisas a gente vai precisar nessa lista até que você me chame só de ?

— Ela é a sua MAIOR fã, quase entrou na minha mala quando eu contei que finalmente tinha descoberto que você estaria na audição ao vivo — falou, panfletando a caçula. – E eu gosto de colocar o , demonstra o impacto da sua presença; meia dúzia de pessoas por metro quadrado podem ser no continente norte-americano, mas nem todo mundo pode ser . – disse, sem nenhum filtro, naquela declaração, se arrependendo no mesmo minuto e arregalando os olhos, o que fez rir gostosamente. – Eu juro que não sou nenhuma fã ou algo do tipo. É só que, uau, você é o maior cantor pop da atualidade, então, se você não se importar, eu vou continuar te chamando de — terminou de falar, dando com os ombros.

— Tudo bem, isso vai ser divertido. E como você prefere ser chamada? — se sentou em uma das poltronas disponíveis e apontou para a que sobrou ao seu lado para que a menina fizesse o mesmo, e assim ela fez.

— Eu me chamo . — riu verdadeiramente, notando que a garota resolveu se apresentar um pouco atrasada. — Eu sei que você já tem essa informação, mas parece educado da minha parte me apresentar. — A risada do garoto aumentou e ele notou que a espontaneidade de o fazia rir com mais facilidade do que o normal na presença de alguém que acabara de conhecer. Ele assentiu para que ela continuasse sua apresentação. — Eu tenho 24 anos recém completados e, na realidade, a convocação para a fase final foi meio que o meu presente de aniversário. Eu recebi o e-mail no dia anterior ao meu aniversário.

— Isso é demais, feliz aniversário atrasado! — comentou, sincero, enquanto se deixou mais confortável na poltrona, encostando a cabeça no encosto, sem deixar de olhar para a brasileira ao seu lado, o que a incentivou a continuar.

— Como você também já sabe, eu sou brasileira e todas as pessoas com quem eu tenho algum grau de intimidade me chamam de .

tentou replicar com um pouco de dificuldade, mas parecendo satisfeito com o resultado.

— Mas eu decidi que, se eu for ter uma carreira artística, quero que as pessoas me chamem de . Então, talvez, seja bom começar a me apresentar dessa forma? E, como você pode notar, eu falo bastante quando fico nervosa. — Ela deslizou as mãos que estavam pousadas em suas coxas, de forma inquieta.

— Acontece e confesso que é interessante ver alguém com uma reação ao nervosismo tão oposta à minha, — ele enfatizou o apelido escolhido pela menina, com o intuito de deixar, de alguma forma, subentendido que seria assim que ela seria chamada daqui para frente. O coração dela bateu descompassado ao ouvir aquele apelido soando de , como a concretização de algo que ela sempre quis. — Andrew não deve chegar até às 20h30, eu pensei em várias formas de te dar essa notícia.

Instantaneamente, seu coração foi parar em sua garganta e, ao mesmo tempo, parecia que batia dentro de seus ouvidos, tamanho o nervosismo, que agora também estampava seu rosto. desencostou da poltrona e se inclinou em direção à menina, levando uma das mãos ao joelho de , o que fez com que o balançar ansioso de suas pernas cessasse e ela o encarasse, esperançosa.

— Eu disse que você seria ótima, não disse? — ele sorriu e levou as duas mãos ao peito, sentindo-se como se pudesse, literalmente, explodir a qualquer momento. — Mas acho que nenhum de nós esperava que você fosse TÃO bem. Não houve hesitação, de ninguém; escolher você era a escolha óbvia terminou de dizer e observou se levantar em supetão e começar a andar de um lado para o outro, falando palavras desconexas em português.

— Puta que pariu! — ela praticamente gritou e se levantou e passou a segui-la. – Puta merda. — O corpo inteiro de parecia tremer como se ela estivesse prestes a começar a chorar, mas, dessa vez, de felicidade. Quando finalmente parou de andar de um lado para o outro, encarou e seu próximo movimento o pegou completamente desprevenido: jogou seus braços em torno do pescoço do cantor em um abraço apertado, sem parar de agradecê-lo, começando a chorar em seguida. Quando o soltou, depois do que pareceram ser 5 minutos inteiros de lágrimas, agradecimentos e soluços, finalmente disse: — Eu preciso abraçar as pessoas. É algo que eu faço. Me desculpe se isso foi inapropriado. Eu abraço quando estou triste porque sinto que preciso de conforto, abraço quando estou feliz porque sinto que preciso dividir aquele sentimento bom com alguém, você é a única pessoa aqui e, de qualquer forma, acho que antes você do que o Andrew, certo?

A forma como disparou a falar e a se explicar fez gargalhar, jogando a cabeça para trás, e puxá-la para outro abraço, dessa vez mais rápido: — Meus parabéns, realmente acredito que você era nossa melhor escolha. E, honestamente, eu sei o que você está sentindo. Senti o mesmo quando recebi a ligação de Gertler sobre ter visto meu cover de “Say Something”. Acredite, fiquei feliz que ele me deixou te dar essa notícia, foi como fazer por alguém o que ele fez por mim anos atrás.

— Você sabe que, provavelmente, eu teria travado se você não tivesse subido naquele palco, não sabe? — assentiu de forma contida. — Então, você fez muito mais do que simplesmente me dar a notícia. Talvez eu devesse ser sua fã, after all — ela brincou e empurrou o cantor com o ombro, recebendo outro empurrão de volta.

— Teria sido um desperdício se você tivesse travado, eu faria de novo — falou, sincero, e sorriu, tímida, pela primeira vez. — Mas acho que eu prefiro que você seja minha amiga do que minha fã. O que você acha?

— Parece justo. — Foi a resposta dela.

— Tudo o que você conhece sobre a vida está prestes a mudar, será incrível na maior parte do tempo, às vezes, um pouco demais para lidar sozinha, eu bem sei disso... eu e Sab estamos sempre tentando passar por isso de forma leve, juntos, sei que posso falar por ela também, então conte conosco. — segurou a mão de , apertando em concordância e agradecendo sinceramente pelas palavras. No fim, talvez sua irmã estivesse certa em admirar tanto o cantor e, talvez, ela mesma pudesse admirá-lo.

Os dois continuaram conversando, atualizou sobre o desfecho de ter sido largada por seu, agora, ex-namorado, que a essa altura deveria estar em um avião a caminho do seu país, e contou um pouco sobre como era sua vida no Brasil. , por sua vez, contou sobre como se adaptou à vida de fama e falou também sobre sua relação com seus fãs enquanto apenas o observava, admirada com o carinho com o qual falava sobre seus fãs e sobre tudo o que eles o ajudaram a conquistar.

Passado algum tempo, os dois ouviram o sinal eletrônico de que a porta estava se abrindo e sabiam que era Andrew.

— Aqui, no escritório! — gritou para o agente, que logo se juntou a eles com uma pasta cheia de papéis. cochichou para : — Boa sorte, você passará as próximas 3 horas falando sobre contratos. Não recomendo, é a pior parte do nosso trabalho.

— Vejo que as crianças já estão se tornando amigas, então? — Andrew comentou, ao apoiar a pasta na mesa e riu quando revirou os olhos. — ! Sei que já lhe deu as boas notícias, mas, meus parabéns! — ele estendeu a mão para , que não se demorou em cumprimentá-lo cordialmente.

— Eu já agradeci tanto ao , mas sinto que devo começar a te agradecer também ou não conseguirei parar ainda neste século! — ela respondeu, animada, arrancando risadas dos outros dois.

— Será um prazer agenciar uma garota tão talentosa! Espero que você me dê menos trabalho do que esse aqui — Gertler apontou para com o polegar, que, de onde estava, apenas apresentou o dedo do meio.

— Prometo que serei comportada e dedicada, meu foco é a música e é por isso que estou aqui.

— É o que todos vocês falam no início, minha querida — Andrew sorriu e balançou negativamente a cabeça. — Mas vamos começar falando de negócios.

se despediu dos dois para que eles pudessem cuidar de toda a burocracia envolvida na contratação de um novo artista. Andrew Gertler seguiu a próxima hora praticamente falando sozinho, com exceção de algumas respostas curtas que ele precisava de , por exemplo:

“Qual é o nome com o qual você gostaria de se lançar ao mercado?”
”.

Ela respondeu que facilitaria o reconhecimento, mas que não gostaria de deixar de lado suas raízes, então o seria muito importante para ela. Andrew assentiu, fazendo anotações em seu notebook.

— Eu não sei se você sabe, mas, quando subiu ao palco hoje, durante a sua audição, pedi para que Sabrina gravasse a apresentação — ele falou de forma cautelosa.

— Eu vi que ela estava gravando, mas não sabia que era você quem tinha pedido. O que tem?

— Em nosso contrato, temos, inicialmente, a gravação de um álbum e uma turnê de 15 cidades. O número de cidades pode mudar se, no momento da turnê, as condições estiverem favoráveis ou desfavoráveis, isso também está explicado aqui — Andrew sinalizou a parte do contrato com a informação que ele estava mencionando, maneou a cabeça em acordo. — Sabemos que a gravação de um álbum é um processo complexo e demorado, mas, com a sua apresentação de hoje, pensei em algo...

— Diga.

— O que você acha de começarmos a lançar o seu nome com um cover de “Don’t Stop Believing” em dueto com o ? — No momento em que Andrew finalizou a pergunta, não pôde evitar que seu queixo caísse. — Se você não estiver confortável com isso, seguimos com o contrato como está, mas eu realmente acho que a sinergia de vocês naquele palco precisa ser aproveitada de alguma forma.

— Uau... isso é... uau — foi tudo o que ela conseguiu falar.

— Eu sei, uau, essa foi exatamente a minha reação assistindo vocês cantarem juntos — ele falou com uma faísca em seus olhos.

— O que o acha disso? — Foi a sua pergunta.

— Eu ainda não falei com ele, na verdade, mas sei que ele vai topar, conheço meu garoto e, se ele subiu naquele palco, foi porque o pouco material que tínhamos sobre você fez com que ele acreditasse em você, não vejo por que ele não toparia. Além disso, é bom para ele também, relembrar um pouco das origens com a gravação de um cover, os fãs com certeza vão aprovar.

— Tudo bem, fale com , se ele topar, faremos isso — respondeu, sentindo seu estômago revirar. Eram muitas informações ao mesmo tempo e, apesar de saber que um contrato dessa dimensão a faria ultrapassar um limite e que ela jamais poderia voltar atrás e ser simplesmente a , , como seus amigos diriam, cantar com o artista que está em primeiro em todas as paradas com seu último lançamento e ser lançada ao mundo ao cantar com ele com certeza não fazia parte dos seus planos. Era muito maior do que ela imaginara.

— Perfeito! — Andrew comemorou e digitou no mesmo minuto uma mensagem para com sua ideia, confiante de que o canadense toparia sem pensar duas vezes.

O homem continuou passando o contrato ponto a ponto e acompanhava atentamente lendo sua própria cópia, fazendo perguntas quando dúvidas surgiam e concordando com cada cláusula. O contrato falava sobre comportamento, sobre atitudes encorajadas e desencorajadas, sobre os tipos de punição que ela poderia receber caso quebrasse as cláusulas comportamentais, foi apresentada às cláusulas de assessoria e monitoramento de mídias sociais, isto é, a partir do momento da assinatura daquele contrato, qualquer pronunciamento oficial sobre temas polêmicos obrigatoriamente deveria passar pelas mãos de sua assessora, , que ela conheceria ainda naquela semana.

, agora vamos conversar sobre relacionamentos, a próxima cláusula especifica explicitamente que você não pode assumir nenhum relacionamento em público sem a minha autorização e a de , esta cláusula se encaixa a você uma vez que, pelo que entendo, seu relacionamento com o se ex-parceiro não existe mais, correto?

— Correto — assentiu com um nó se formando em sua garganta.

— Veja bem, nesta cláusula não fala nada sobre você não poder ter relacionamentos amorosos, você pode. Mas, a partir do momento que você tiver maior visibilidade, se relacionar publicamente traz consequências para a sua imagem, para a imagem da pessoa envolvida, por isso, somos extremamente cautelosos com esse tema.

Ela continuava apenas concordando com a cabeça, um pouco assustada, imaginando que algo tão pessoal como um relacionamento amoroso pudesse ter proporções tão grandes a ponto de estar discriminado em uma cláusula contratual, mas, de qualquer forma, não é como se, após terminar um relacionamento de 3 anos e assinar um contrato com uma gravadora gigantesca, ela estivesse preocupada em começar um novo relacionamento.

— Ainda no tema relacionamentos, você será a primeira de nossos agenciados a ter esta cláusula, mas, diante de acontecimentos recentes, é uma forma de nos protegermos de problemas e drama entre nossos contratados: está vedado qualquer relacionamento romântico ou sexual entre agenciados da Island Records enquanto durarem, simultaneamente, os contratos dos envolvidos.

riu quando Andrew terminou de ler, diante de tantos “vedados”, “proibidos” e “desencorajados”, esse era o mais fácil, certo? Afinal, com tantas pessoas no mundo, por que ela iria escolher se relacionar com pessoas do trabalho?

O que poderia dar errado?

Capítulo 3

You've been fighting the memory, all on your own
(Você esteve lutando contra a memória, por conta própria)

Nothing worsens, nothing grows
(Nada piora, nada melhora)

I know how it feels being by yourself in the rain
(Eu sei como é ficar sozinho na chuva)

We all need someone to stay
(Todos nós precisamos de alguém que fique)


Os dias que se seguiram à assinatura do contrato foram o que chamou de “os dias mais intensos dos meus 24 anos de vida”. Ela entrava em reunião após reunião para definir os próximos passos, aulas sobre consultoria de imagem, de canto, de teoria musical, de como se comportar perante à mídia e nos palcos e até mesmo de gerenciamento de crise. No meio de tudo isso, ainda precisava encaixar a mudança para um dos apartamentos que a gravadora disponibilizava para seus agenciados. Com sorte, estava contando com , ou , sua assessora, que ela preferia chamar de “amiga contratada”, pois dizia que parecia surreal demais ter alguém sendo paga para acompanhá-la e ajudá-la com absolutamente todos os aspectos sobre a sua vida.

estava grata em poder contar com , não só como seu braço direito, mas, porque, apenas 4 anos mais velha que ela, era uma companhia extremamente agradável com quem estava passando os poucos minutos livres em seus dias, de forma que, na maior parte do tempo, até conseguia esquecer que a relação entre elas era majoritariamente profissional.

Logo na manhã seguinte à sua contratação, Sabrina a colocou em um grupo de WhatsApp chamado “Prison Island” (nome que ela e gostavam de utilizar para dramatizar sobre as regras da gravadora), onde os três trocavam mensagens diariamente e utilizava para atualizá-los sobre as pessoas que ela havia conhecido e as coisas bizarras que ela estava vivenciando pela primeira vez, arrancado risadas sinceras dos outros dois com suas reações espontâneas.

Vocês acreditam que durante a aula de gerenciamento de crises de hoje me perguntaram se alguém do meu passado possuía fotos íntimas minhas?
Tipo, WTF?


SM: LOL, eles querem estar preparados pra possíveis vazamentos quando seu nome estiver na mídia. E qual foi sua resposta?

SC: Ainda bem que você perguntou, eu fiquei curiosa pra saber.

Guys, eu sou mais esperta do que isso, me respeitem. LOL.
Tenho que ir, me disse que minhas coisas do Brasil chegaram hoje pela manhã no apartamento.


SC: Mande vídeos da sua nova casa!

SM: E nos convide para conhecermos.

vez ou outra, ao longo do dia, ainda se perguntava se o que estava vivendo era mesmo real. Além de ser oficialmente uma cantora que recebia pelo seu trabalho, as primeiras pessoas com quem fez algo parecido à uma amizade foram Sabrina Carpenter e e eles eram pessoas normais como ela, dois jovens adultos que entendiam, melhor que ninguém, o que era viver o seu próprio sonho. havia assinado o contrato há duas semanas, em um domingo à noite, e, agora, depois de todos os compromissos de mais uma semana finalizados, ela estava exausta. A única coisa que conseguia pensar era em falar com sua mãe e Olivia, sua irmã mais nova, que estava em surtos por saber que a mais velha mantinha contato com seu ídolo e estava agora inserida no mundo da música.

Quando atendeu a chamada de vídeo, se deparou com a voz de sua irmã com cara de poucos amigos:

Se você não me apresentar o dentro das próximas 48h, esqueça que você tem uma irmã. — Foi o que a adolescente de 14 anos falou antes de entregar o celular para sua mãe e se retirar do alcance da chamada. ouviu sua mãe repreender a irmã, mas só conseguiu rir.

— Mãe, ela sabe que eu vou apresentar, não sabe? Ele, inclusive, já está ciente de que ela é a maior fã que ele tem! — ela avisou à mãe, que sorriu cativante. — Eu só não tive tempo ainda, na realidade, apesar de falar com ele e Sabrina o tempo inteiro, nos vimos rapidamente só uma vez depois daquele dia.

Eu sei, mas ela está tão ansiosa! Desde a postagem da gravadora no Instagram divulgando que haviam finalmente escolhido o novo nome do momento e o comentário que fez, ela não consegue falar em outra coisa a não ser ‘’minha irmã é amiga de e será uma cantora famosa’’ pela casa inteira, já que ainda não pode se gabar para as amigas — a mãe completou, entre risos.

Na quarta-feira daquela mesma semana, o Instagram da Island Records publicou uma nota oficial, declarando finalizado o projeto The Chosen One, que deveria escolher entre anônimos, a portas fechadas, o mais novo agenciado da gravadora, e oficializando que já havia a data para que o mundo inteiro a conhecesse: 8 de julho. Agora, faltava pouco mais de um mês para o lançamento do vídeo cover que e começariam a gravar juntos na próxima segunda-feira. Nessa mesma publicação, havia escrito: vocês deveriam estar ansiosos para conhecê-la, eu prometo que será incrível.

Depois disso, todo o fandom do cantor não parou de especular sobre quem seria o próximo nome lançado pela IR, desde buscas nos últimos perfis seguidos pelo cantor, por Andrew e pela gravadora — mas eles estavam sendo realmente sigilosos sobre isso e nenhum deles havia seguido nas redes sociais ainda. Estava matando Olivia não poder falar sobre a única coisa que rondava seus pensamentos: sua irmã era oficialmente cantora e amiga de ! E a menor sequer conseguia esconder que estava muito mais animada pela segunda parte.

E como você está se sentindo com tudo isso, ? — A menina sorriu ao ouvir sua mãe a chamar pelo apelido que ela amava e que estava cada vez mais raro ouvi-lo, considerando o seu novo círculo social.

— Estou feliz, exausta, às vezes sinto medo antes de dormir nesse apartamento gigante, mas, na maior parte do tempo, não tenho um minuto para sentir medo. Em alguns momentos, sinto muita saudade do Diego, mas continuo puta da vida com ele, então esses momentos são curtos. Estou um pouco decepcionada com nossos amigos, até mesmo Laura me acusou de estar sendo irredutível por me recusar a respondê-lo — ela bufou e sua mãe a viu revirar os olhos na tela do celular. — Como se ele não fosse o responsável por eu não querer falar com ele!

Seus amigos só querem seu bem, meu amor. E o bem de Diego. Eles estão em uma posição difícil — a mulher mais velha, com a pele no mesmo tom de pele amendoado que e os mesmos cabelos negros com ondas que se misturavam entre cachos, mas muito mais curtos do que o da jovem, disse de forma comedida e cuidadosa.

e Diego sempre dividiram os mesmos amigos. Namoraram por 3 anos, mas foram amigos nos 4 anteriores ao início do relacionamento. De alguma forma, se sentia injustiçada ao vê-los convivendo com Di e até mesmo pedindo que ela compreendesse sua atitude, que aceitasse ouvir o que o homem tinha a dizer. Nenhum deles, nem mesmo Laura, sua amiga mais próxima, parecia estar levando em consideração a forma desleal com que Diego havia a deixado em Nova York. Era como se eles não quisessem escolher lados, o que, para , fazia sentido, mas o que não notavam é que, ao invalidar a forma como ela se sentia, já estavam o fazendo.

— Bom... Eu garanto que a minha posição foi muito mais difícil — ela respondeu com a voz carregada de ressentimento, mas rapidamente mudou o assunto e a expressão, assumindo um tom muito mais animado: — Mas, para resumir, felicidade, incredulidade e exaustão são meus principais sentimentos, se você quer saber. — A sua mãe ouviu tudo atentamente e decidiu se deixar levar pela mudança de assunto da filha, por conhecê-la o suficiente para saber que aquilo que ela dizia significava, nas entrelinhas, que não estava disposta a mudar de opinião.

Isso é muito bom, filha. Estou ansiosa para receber vídeos da gravação quando vocês começarem. E, pelo amor de Deus, quando encontrar uma brecha, apresente para Olivia, ela realmente vai ficar muito feliz.

— Sobre isso... amanhã ele e Sabrina virão aqui — falou despretensiosamente enquanto separava um pijama limpo com a mão que não segurava o celular. — Estava falando que ainda achava esse apartamento muito estranho e não me sentia em casa, eles sugeriram que fizéssemos algo aqui para que eu me sinta mais em casa.

Isso é ótimo, ! Eles parecem estar te acolhendo tão bem, fico tão feliz. Diga a eles que mamãe agradece a forma como eles estão te tratando, meu coração fica em paz sabendo que você está fazendo amigos.

— Pode deixar, mãe, diga à Oli que, se não se importar, amanhã faço uma chamada de vídeo para apresentá-lo, mas diga que, se ela gritar ou começar a chorar, eu vou desligar. — As duas riram, divertidas, já imaginando a reação de Olivia ao ter a oportunidade de falar com . Se despediram e resolveu tomar um banho e assistir Modern Family, sua comfort serie, aproveitando que no dia seguinte não teria compromissos de trabalho e poderia finalmente acordar tarde.

*

SM:
Segundo o GPS, estamos chegando dentro de 5 minutos. Considere 3 com a Sabrina no volante, alguém precisa avisá-la de que sou muito novo pra morrer.

Estou esperando por vocês com Monopoly, Mojitos e pizzas veganas!


estava realmente feliz com a amizade que estava construindo com Sabrina e , eles passavam a maior parte do dia trocando mensagens em seus tempos livres, enviando fotos do seu dia e criando figurinhas no WhatsApp com fotos de Andrew tiradas em momentos em que ele não estava esperando, durante reuniões.

havia deixado avisado na portaria que o casal de amigos estava chegando, então, quando ouviu a campainha do apartamento, sabia que se tratava deles.

— Garota, finalmente você encontrou um tempo na sua agenda de artista para socializar com outros artistas — Sabrina comentou enquanto cumprimentava com um abraço na entrada do apartamento. A morena dos cabelos ondulados deu espaço para que a amiga entrasse e cumprimentou , também com um abraço.

— Gente, eu sabia que vocês, famosos, eram ocupados, mas, ufa! Pensei que nunca mais poderia agir como uma pessoa normal, conheci tantas pessoas nas últimas semanas, que não consigo sequer lembrar o nome de todas elas! — ela comentou, fechando a porta atrás de si, e, em seguida, foram juntos para a sala.

O apartamento escolhido pela brasileira já tinha, de certa forma, algo que a representava em cada lugar, o que não passou despercebido pelos dois amigos. Ela fez um tour pelo apartamento, e e Sabrina prestavam muita atenção aos detalhes que ela havia colocado ali para se sentir um pouco mais em casa; por exemplo, nos compartimentos do painel onde uma TV estava fixada, era possível encontrar fotos de com sua mãe e irmã, conforme ela apresentou, e uma outra foto em que a menina estava com os amigos em volta de uma mesa com um bolo de aniversário e uma grande vela, mostrando que aquela foto fora tirada no aniversário de 24 anos da garota, recentemente. Aquela foi a última vez em que esteve reunida com todos os amigos no Brasil.

Além disso, o apartamento tinha uma ampla varanda envidraçada, que acompanhava todo o comprimento da sala e cujo horizonte possibilitava enxergar a Brooklyn Bridge iluminada todas as noites, o que fazia com que ela se sentisse realmente dentro de um sonho vívido, pois aquela imagem parecia saída diretamente dos milhares de filmes e séries situados na cidade de Nova York que ela assistiu ao longo da sua vida.

— Uau, bela vista comentou, se aproximando da janela da sala. — Se importa? — ele perguntou, tirando o celular do bolso e abrindo a câmera.

— À vontade! Aliás, como você já tinha comentado que queria conhecê-la, eu meio que prometi à Olivia que ligaria para ela hoje para te apresentar. Você acha uma péssima ideia? — ela mordeu a bochecha ao perguntar, incerta. — Pensei em ligarmos antes dos mojitos! — a brasileira completou, brincalhona.

— Acho uma ótima ideia! Você já impediu demais esse encontro, . Ligue agora, aposto que ela é muito mais divertida que você. — A garota riu, adorando ouvir seu nome com o sotaque do canadense e, quando ele terminou de tirar a foto, os três se juntaram no sofá de , que posicionou seu celular de forma que os três aparecessem na chamada e selecionou a opção de chamada de vídeo no contato de sua irmã.

A mais nova atendeu no segundo toque, o que indicou que ela deveria estar esperando aquela ligação o dia inteiro.

Meu Deus! Meu Deus! É você mesmo e Sabrina Carpenter! — Olivia começou a falar em português, arrancando risos dos três amigos.

— Oli, em inglês, por favor! Mostre para mamãe que seus 4 anos de Cultura Inglesa valeram à pena — a irmã mais velha respondeu em inglês, zombando da menor, que sentiu seu rosto queimar, visivelmente nervosa e envergonhada.

— Não tem problemas, Olivia! É um prazer finalmente conhecê-la — começou a falar e notou como ele falava de forma galanteadora com uma fã. — Oi! — ele disse em português, fazendo com que Olivia suspirasse do outro lado do vídeo. Ver interagindo com uma fã e se esforçando para agradá-la, sendo essa fã a sua irmã, fez sorrir sinceramente.

Eu não posso acreditar! Oi, ! Eu amo você! Suas músicas sempre foram uma inspiração para mim, obrigada por isso — Oli falou, emocionada, e se derreteu por dentro pela emoção de vê-la tão feliz. — Oi, Sabrina! Eu amei seu novo single, espero que saiba que te defendi de todos os ataques no Twitter! — Ao ouvir isso, gargalhou e confirmou.

— É mesmo, ela brigou com todo mundo que ela via te atacando!

— Obrigada, Oli! É importante para mim saber que tenho apoio. Fico feliz de verdade. Prazer em conhecê-la! — respondeu a loira, com gratidão transbordando em sua voz.

— Olivia, espero que você venha visitar sua irmã em breve! Faço questão de levá-la ao estúdio, posso te mostrar exclusivamente no que estou trabalhando, se você prometer guardar bem um segredo — o cantor falou e lançou uma piscadinha, o que foi suficiente para que a adolescente perdesse o controle que estava se esforçando muito para manter. Ela começou a chorar de forma contida, cobrindo o rosto com a sua mão livre.

— Oli, não precisa chorar! Ele não é tão incrível assim pessoalmente, eu prometo — provocou, recebendo em resposta um forçando uma expressão exageradamente surpresa, com a boca em formato de “O” e mostrando a língua para a amiga em seguida.

! Não fale dessa forma com ele — sua irmã a repreendeu, falando em português, causando uma certa confusão em e Sabrina, que não compreenderam nada além do apelido da menina.

— Tudo bem se você precisar chorar, mas prefiro você sorrindo — comentou e Olivia sorriu, sincera.

, desse jeito ela vai se apaixonar ainda mais por você! — o repreendeu divertidamente, fazendo com que sua irmã ruborizasse do outro lado da tela.

Eu não sou apaixonada por ele, eu sou FÃ dele, são coisas diferentes — a menor explicou, como se fosse óbvio.

— Eu preciso concordar com ela, — a loira brincou.

— Eu não saberia dizer a diferença, ele é o wallpaper do celular dela há uns 3 anos!

! — a irmã berrou do outro lado do telefone e Sabrina explodiu em risadas junto com enquanto observavam um tom claro de rosa se acomodar nas bochechas de . — Estar apaixonada por ele significaria que eu gostaria de namorar com ele. O que não é verdade — Oli frisou. — Eu só tenho 14 anos! Seria esquisito — finalizou com uma careta e todos riram.

— Eu disse que sabia que ela seria muito mais legal que você — empurrou a amiga com o ombro e estalou a língua no céu da boca.
— Bom, chega de e Sabrina Carpenter para você por hoje. O complô dos dois contra mim já é o suficiente, não preciso que minha própria irmã faça parte — a brasileira falou, simplesmente, forjando um bico ao final.

— Até a próxima, Oli, obrigado pelo carinho, vou combinar com para enviar meu novo disco autografado e alguns itens promocionais para a minha maior fã — disse, simplesmente, e Olivia agradeceu repetidamente por isso.

A ligação foi finalizada com muitos beijos dos 3 jovens cantores para Olivia, que desligou a chamada completamente radiante, com lágrimas de felicidade ainda em seu rosto.

— Ela é muito fofa, ! — Brina disse, quando apoiou o celular na mesinha de centro em frente a eles.

— Ela é, não é? Eu a amo com todo meu coração — a brasileira comentou, orgulhosa, sentindo o canto de seus olhos molhados. Realmente sentia muita falta de sua irmã, mas sabia que o maior presente que poderia dar a ela e sua mãe seria a realização de seu sonho. — Coitada da minha mãe, ela não vai parar de falar disso dentro de casa enquanto não puder falar para nenhuma amiga. — Os três riram.

— Foi nesse endereço que nos prometeram mojitos, ? — Sab perguntou, arqueando uma das sobrancelhas e o menino apenas gargalhou, jogando a cabeça para trás em resposta.

— Promessa feita é promessa cumprida, minha cara amiga — respondeu, se direcionando para a cozinha, sendo seguida pelos outros dois.

Enquanto preparavam as bebidas, compartilhou alguns detalhes aleatórios sobre como era sua vida no Brasil e como ela decidiu que queria tentar participar do The Chosen One: de como aquela havia sido uma decisão conjunta com Diego, seu ex-namorado, e de como ela — apesar de saber que ele só passou a considerar uma carreira na música depois que a conheceu — jamais imaginou que ele havia embarcado na ideia sem ter a mesma vontade.

— E a mensagem que ele te mandou? Você respondeu? — havia traduzido a mensagem e enviado no grupo dos três. Se ela iria de fato viver em Nova York, ela precisava ter uma rede de apoio e sabia que a tinha encontrado em e Sabrina.

— Não e nem vou — deu de ombros.

— Mas você não sente curiosidade de saber o que ele tem a dizer? — Foi a vez de perguntar.

— Na verdade, não, ele deixou bem claro o que ele tinha a dizer quando preferiu acabar tudo da forma mais covarde que ele conseguiu. Eu não vou dizer para vocês que isso não me afeta, seria mentira. Vez ou outra abro a conversa dele e quase digito algo muito legal que aconteceu no meu dia e eu sei que ele iria gostar, mas aí me lembro que, se ele quisesse fazer parte disso, existiam formas mais maduras de dizer que não queria viver o meu sonho do que me deixar sozinha no último minuto e entrar em um avião antes mesmo de nos dar uma chance de falar a respeito, certo?

— Certo — os outros dois responderam em uníssono, se vendo obrigados a concordar.

— Mas você sabe que pode sempre falar com a gente, sim? — a loira disse, colocando uma mão no ombro de enquanto ela finalizava a bebida em uma jarra, e replicou o movimento, acariciando seu ombro com o polegar.

— Sei, obrigada por isso, não sei como estaria sobrevivendo à essa loucura sem saber que vocês sabem exatamente como é. Eu realmente aprecio isso e por terem me abraçado como se me conhecessem desde sempre. Acreditem, nem mesmo meus amigos mais antigos fizeram isso. Para eles, eu estou exagerando, como se eu tivesse exigido que Diego deixasse tudo para trás para me seguir, mas eu só queria que ele tivesse sido honesto comigo. — os entregou um sorriso contido, mas a voz dela não correspondia àquele sorriso e, em seguida, levantou a jarra de cristal preenchida com a bebida transparente, gelos, folhas de hortelã e algumas rodelas de limão, mudando de assunto. — Servidos, e Sabrina Carpenter?

— Whoo-hoo! Seja oficialmente bem-vinda ao time, falou e a garota sentiu seu coração aquecer ao ouvir seu apelido de infância com o sotaque carregado do amigo. — Que seja uma jornada incrível.

— E a verdade é que parece que a gente te conhece há mais tempo — Sab completou.

serviu as três taças e, pela primeira vez desde que se mudou para o apartamento, percebeu que naquele lugar poderia se sentir em casa, com aquelas pessoas, e se sentiu agradecida por tê-los ali ao seu lado. Os três ergueram, cada um, a sua taça, em direção ao centro e brindaram animadamente:

— Quem não bebe depois de brindar, sete anos sem sexo! — falou travessa e bebericou, e e Sabrina olharam para ela de forma confusa, ela revirou os olhos divertida e explicou: — Lá no Brasil, dizemos isso quando brindamos. É obrigatório, bebeu, dá um gole.

E, quando ela terminou de falar, tanto quanto Sabrina beberam um gole apressadamente, de forma desajeitada.

— Isso é algum tipo de maldição? — perguntou.
— Bom, espero que não, porque vocês dois demoraram demais a beber — ela disse, simplesmente, e virou as costas aos dois, balançando os ombros, guiando-os até a sala, sob protestos deles.

*


Eles compartilharam sobre as suas vidas, Sabrina e falaram sobre a melhor e a pior parte da fama, em que, em geral, a melhor costumava superar; brincaram que era questão de tempo até que tivesse fãs e milhares de seguidores em suas redes sociais, algo que, apesar de saber ser parte do sonho que havia escolhido, a deixava completamente apavorada apenas por imaginar.

Brina confidenciou aos amigos como realmente se sentia a respeito de seu relacionamento com Joshua ter tido um destaque tão negativo na mídia alguns meses antes, falou das crises de ansiedade que antes só havia compartilhado com o namorado e encontrou nada além de apoio e acolhimento nos outros dois.

, por sua vez, falou da pressão que sempre colocou em si mesmo sobre ser um exemplo aos seus fãs e o quanto, muitas vezes, isso tirava sua liberdade em fazer coisas que realmente tinha vontade por medo de decepcioná-los. Mas comentou, ao final, que hoje possuía uma relação de confiança muito saudável com seus fãs e que a pressão foi diminuindo.

contou sobre a sua família: eram só as três. O pai de Olivia e havia saído de casa antes mesmo de Oli nascer e, no início, ainda aparecia vez ou outra em datas comemorativas, mas que, com o passar dos anos, os contatos se tornaram cada vez mais escassos e as visitas presenciais reduziram tanto, ao ponto em que já fazia anos desde a última vez em que estivera com seu pai.

Para Olivia, a situação foi um pouco mais fácil, ela nunca havia tido um pai presente do qual sentir falta e Márcia, mãe das duas, sempre fez o impossível para que elas soubessem que não precisavam dele. Mas, como disse aos amigos, conheceu a vida com um pai presente e precisou se adaptar abruptamente ao perdê-lo.

Por muito tempo, sentia-se como se, de alguma forma, não fosse o suficiente para que o homem quisesse estar por perto, como se houvesse algo que ela, quando tinha apenas 10 anos, devesse ter feito diferente para mantê-lo ao lado dela. Eventualmente, entendeu que nenhuma atitude do pai era responsabilidade dela, ele quem escolhera ir embora e não as ver crescer e, apesar de ter demorado muito tempo para que isso não fosse mais um assunto sensível, era grata por saber que Olivia não precisou sentir o abandono que ela sentiu. Poderia, definitivamente, ter sido pior.

— Acho que algo sobre isso é parte da razão pela qual eu não quero falar com Diego — admitiu, preenchendo sua taça novamente enquanto os outros dois a observavam atentamente. — As pessoas não podem sair e entrar nas nossas vidas como bem entendem, quando bem entendem, e esperar que as portas estejam abertas para que elas continuem mudando de ideia.

— Você está certa... Seu ex namorado foi um covarde e só pelo que vejo de você, você é corajosa demais para se contentar com um homem covarde ao seu lado.

— E muito menos alguém que faça você sentir culpa por seguir os seus sonhos. — Foi a vez de dizer.

Os três encontraram naquela amizade que ainda surgia um espaço seguro para ser quem eram e se abrir sobre o que sentiam e pensavam naquele espaço era fácil demais para os três. Em dado momento da noite, quando já havia álcool o suficiente em seus organismos para estabelecer promessas, prometeram que fariam daquela amizade uma âncora que os manteria firmes, com os pés no chão, nesse mundo cheio de deslumbres que, inevitavelmente, faria parte daqui para frente. Para , significava o mundo tê-los ali ao seu lado.

Para e Sabrina, quando olhavam para , pareciam enxergar a si mesmos no começo de suas carreiras e se sentiam impelidos a serem para ela o que queriam ter encontrado antes de conhecerem um ao outro, já mais tarde na jornada de cada um. Não houve uma conversa sobre isso, foi simplesmente natural incluí-la entre eles, como se ela sempre devesse estar ali. E eles sabiam, melhor do que ninguém: todos nós precisamos de alguém que fique. E eles ficariam.

Quando abriu os olhos na manhã de domingo, notou que sua cabeça latejava — sem dúvidas devido à quantidade de álcool que ingeriu na noite anterior. Respirou fundo, tateando a mesa ao lado de sua cama para encontrar seu celular e conferir as horas, ainda resgatando as últimas lembranças da noite anterior.

1. Sabia que e Sabrina decidiram dormir lá para evitar a logística de que Jake — segurança pessoal de — tivesse que buscá-los e ainda lidar com o carro da loira que teria de ficar no local.
2. Depois de muita briga sobre se estaria ou não roubando no Monopoly Deal, os três se levantaram pela primeira vez depois de algumas horas sentados no tapete da sala e notaram, ao sentir o ambiente girar, que haviam bebido demais e decidido finalmente ir dormir, às 3h da manhã.
3. , após acomodar os amigos em seus dois quartos de hóspedes — perfeitamente pensados para receber sua mãe e Olivia — foi para o seu quarto e...

Puta que pariu! — ela xingou em português, se sentando rapidamente, apesar da reclamação de sua cabeça e finalmente encontrando o celular no móvel ao lado. Quando o encontrou, gemeu, não só pela dor de cabeça, mas também por reprovação a si mesma. — Merda.

, Brina! — Saiu porta do quarto afora gritando os amigos pelo corredor. — ACORDEM, ANDA! — ela continuou gritando quando finalmente saiu de um dos quartos com cabelos desgrenhados, vestindo somente a calça da noite anterior e confusão espalhada em seu rosto. Momentaneamente, os olhos de desceram pelo peito e barriga de , mas, ao notar, ela mesma balançou a cabeça e murmurou:

— Pelo amor de Deus, dá para colocar uma camiseta?

— O quê? O que houve? — A expressão de ficou ainda mais confusa.

— BRINAAAAAAAAAAA! — ela gritou mais uma vez.

— Minha cabeça, . Dói. Fuck — o amigo reclamou, recostando-se ao batente da porta e, segundos depois, Sabrina abriu a porta do quarto de uma só vez:

— O QUE, INFERNO? — gritou ainda mais alto, de forma mal humorada, fazendo com que os outros dois se encolhessem ao sentir como se suas cabeças fossem explodir em resposta ao grito.

— Olhem isso — ela apenas virou o celular para cima e os dois se aproximaram para encontrar a tela de bloqueio notificando 4 mensagens não lidas de Diego no WhatsApp.

, o que você fez? — Sabrina se pronunciou, olhando para uma de olhos fechados como se não quisesse encarar os amigos.

— Eu respondi aquela mensagem dele, digamos que de forma sincera e sentimental DEMAIS, eu não lembro muito bem, e ainda não tive coragem de ler.

— Eu me ofereceria para ler no seu lugar, mas, você sabe, barreiras linguísticas — comentou, tentando aliviar a tensão que a amiga sentia. — Mas você pode ler para a gente, se quiser... Ou a gente pode ir embora e te dar privacidade para lidar com isso — finalizou, dando de ombros.

— Não, vocês ficam, eu poderia tirar proveito da companhia. Vou fazer um café antes, acho que disso nós três podemos tirar proveito. E, você — ela apontou para —, camiseta, agora! — concluiu, de forma que Sabrina gargalhou, entendendo muito bem de onde aquilo vinha, e , por sua vez, apenas revirou os olhos e voltou para dentro do quarto para fazer o que a garota pedira.

Quando finalmente estavam os três sentados em volta da bancada que separava a cozinha da sala de estar, munidos de todo o café da cidade de Nova York, waffles e pasta de amendoim, finalmente começou a ler a mensagem que havia enviado antes de dormir:

Diego, a verdade é que tenho uma única pergunta, por quê? — ela traduzia ao inglês tão rápido quanto seu cérebro era capaz, para compartilhar com os amigos, que bebericavam café e ouviam atentamente. — Se essa era uma decisão que, te conhecendo como conheço, você pensou muito antes de tomar, por que naquele momento? E por que não tive sequer chance de uma última conversa? Uma mensagem no WhatsApp, sério? Três anos de namoro e sabe-se lá quantos de amizade te valeram o esforço de apenas uma mensagem? — Sua voz ficou trêmula e foi sua vez de tomar um gole de café antes de continuar. — Queria que fosse fácil para mim te deixar para trás como, aparentemente, foi para você entrar naquele avião, infelizmente, no fim do dia, ainda quero te ligar e contar tudo o que aconteceu, sabendo que foi você quem me ouviu sonhar com isso nos últimos anos. — A esse ponto, já precisou apertar os olhos para impedir que algumas lágrimas transbordassem, Sabrina segurou uma mão da amiga por cima da bancada, acariciando-a e encorajando-a a continuar. — Você poderia ter me falado a verdade, nós poderíamos ter pensado nos impactos para o nosso relacionamento juntos, mas, ao invés disso, você preferiu tomar todas as decisões sobre nós, esquecendo de me envolver. Você foi covarde, injusto e poderia ter estragado muito mais do que o nosso relacionamento e, mesmo sabendo disso, foi o que fez, por isso, não sei se algum dia vou poder te perdoar. Te desejo sorte ao sonhar seus próprios sonhos, saiba que farei os meus serem incríveis, com ou sem você ao meu lado. — ela respirou fundo e soltou uma risada anasalada antes de ler a última frase, que, com certeza, foi o que entregou que ela estava longe da sobriedade. — Ps.: Apague todos os meus nudes, tudo que eu não preciso é de um escândalo de slut shaming antes mesmo de começar a minha carreira oficialmente. — Nesse momento, nem e nem Sabrina conseguiram manter a seriedade e começaram a rir com vontade, fazendo com que a amiga os acompanhasse, mais uma vez sentindo gratidão por ter resolvido abrir sua vida a eles, era como se tornassem tudo à sua volta mais fácil.
— Eles bem que dizem que quando a bebida entra, a verdade sai, huh? — foi o primeiro a tecer um comentário, que fez com que revirasse os olhos divertidamente, sem discordar.

— O que você está pensando em fazer depois dessa mensagem? — Foi a vez de Brina se pronunciar, ainda segurando a mão da amiga, que tomou um grande gole de café e suspirou antes de responder:

— Primeiro, preciso ler as mensagens dele. E acho que é isso, certo? Um encerramento, eu falei o que estava guardado e agora eu vou fazer o que disse, viver meu sonho e fazer ser incrível sem ele — finalizou, balançando os ombros e finalmente rolando a tela para as três mensagens mais recentes, de Diego.

Di ❤: , você está bêbada?

Dizia a primeira mensagem, cujo horário acusava ter sido enviada exatos 7 minutos após a sua. Sem resposta de , mais 15 minutos depois:

Di ❤: Acho que sim e, provavelmente, você dormiu. Fiz merda, . Eu sei disso, deveria ter conversado com você, mas, se você estiver disposta, gostaria de fazer isso, mesmo que atrasado. Em respeito a todos esses anos que estivemos na vida um do outro, por favor, me deixa conversar com você.

Nesse momento, a reação de transpareceu todo o ultraje ao ler as últimas palavras que ela compartilhou com os amigos.

— Eu simplesmente não acredito que ele conseguiu jogar a carta dos anos que nos conhecemos, como se não tivesse sido ele a me deixar sem sequer me dar a chance de entender de onde aquilo saiu! — ela esbravejou, recebendo um olhar de compreensão dos dois companheiros, e empurrou um dos pratos com Waffles em sua direção, como se quisesse oferecer algum conforto através daquele gesto. , por sua vez, cortou um pedaço do alimento e colocou na boca antes de ler a última mensagem.

Di ❤: Eu sei que não tem volta, não depois de como as coisas aconteceram, mas você não acha que podemos tentar pelo menos ser amigos? Eu realmente quero fazer parte da sua vida...

Esta última mensagem fora enviada mais de 2 horas de intervalo em relação à última.

— O que eu faço? — falou, com um murmuro, como se fosse uma criança perguntando algo a um adulto, soltando o celular e encarando os dois amigos.

— O que você QUER fazer? — Sabrina perguntou, deixando claro que, independentemente da sua opinião, a vontade da amiga era o mais importante.

— Sinceramente? Mandá-lo ao inferno — respondeu honestamente, antes de continuar. — Racionalmente? Nós namoramos os últimos 3 anos, mas, além disso, nós fomos amigos pelos últimos quase 8 anos da minha vida, eu sequer sei como é a que não teve o Diego nos momentos importantes, fossem eles bons ou ruins — ela admitiu, se sentindo vencida. — Ao mesmo tempo, se ele pensasse dessa forma, as coisas poderiam ter sido diferentes.

— E se você tentar dar uma chance, pelo menos, à versão Diego e amigos? Se não der certo, ao menos vocês tentaram, é melhor do que ter que descobrir como seria sem tentar? — disse em tom de pergunta. — Por outro lado, talvez você queira conhecer a sem Diego. De qualquer forma, estaremos aqui.

— Eu concordo com o , . E, se ele for um grande idiota mais uma vez, eu posso te ajudar a escrever uma música contando para o mundo todo — Sab brincou com o fato de já ter sido envolvida nesse tipo de dinâmica anteriormente, mesmo que contra sua vontade, causando uma explosão de gargalhada dos outros dois.

e Sabrina tinham um ponto, ela poderia tentar dar uma chance à amizade com Diego, uma vez que ele foi uma das pessoas mais importantes da sua vida nos anos anteriores, mas tinha um ponto ainda mais forte quando disse que ela poderia conhecer quem era sem o ex-namorado ao seu lado.

Foi ponderando as circunstâncias que decidiu: não iria cortar Diego de sua vida completamente, teria maturidade o suficiente para dar a ele a chance de ser, pelo menos, seu amigo. Ao mesmo tempo, ele nunca ocuparia o mesmo espaço e ela teria, assim, a oportunidade de ser a sem o Di, a sem o Diego e a — esta, já construída com ele a uma distância segura.

*

Após se despedir de e Sabrina, se viu enviando uma mensagem a Diego, na qual dizia que tudo bem que eles tentassem manter contato como amigos, em respeito aos anos que foram amigos e que namoraram, mas optou por não conversar novamente sobre o término, uma vez que, para ela, nada do que eles conversassem poderia mudar o que aconteceu.

agora vivia em Nova York e sabia que viveria uma rotina intensa na vida artística, intensa demais para caber resgatar um relacionamento terminado. Diego voltou ao Brasil e, pelo que disse, estava decidido a voltar à faculdade de Medicina que havia trancado para embarcar na música e continuar cantando somente como hobby em casas de shows de forma independente com alguns amigos da cena underground. Não fazia parte dos planos da jovem equilibrar sua nova vida e um relacionamento que, olhando a forma como as coisas se desenvolveram, estava claramente fadado ao fracasso.

Parecia a escolha certa e madura a se fazer e agora ela sentia que poderia simplesmente tentar abandonar aquele assunto e dar mais este capítulo por encerrado. A melhor parte disso é que, quando Diego voltou ao Brasil e ela foi escolhida pelo TCO, como carinhosamente ela e Andrew se referiam ao programa, imaginou que teria de construir toda a sua trajetória na cidade que nunca dorme completamente sozinha. Ela estava aliviada por pensar em e Sabrina e ver que estava completamente errada sobre isso. odiava mais do que tudo estar errada, mas, por hoje, ela iria agradecer.

Capítulo 4

I don’t wanna look at anything now that I saw you
(Eu não quero olhar para mais nada agora que eu te vi)

I don’t wanna think of anything else now that I thought of you
(Eu não quero pensar em mais nada agora que eu pensei em você)

I’ve been sleeping so long in a 20-year dark night
(Eu estive adormecido há tanto tempo em uma noite escura de 20 anos)

And now I see daylight, I only see daylight
(E agora eu vejo a luz do dia, vejo apenas luz do dia)


A segunda-feira, dia em que as gravações do vídeo-cover começariam, iniciou com recebendo uma mensagem de Sabrina no grupo, perguntando se ela e estavam preparados para serem shippados pela internet inteira. A possibilidade fez rir sozinha de nervoso enquanto se trocava para esperar Anthony, o segurança que lhe fora designado por Andrew para levá-la aos compromissos. Apesar de saber que era uma possibilidade real, ela não se deixava demorar demais nesse pensamento, acompanhava o suficiente da cultura pop para saber como as coisas saíam de controle nas mãos de fãs de casais que, muitas vezes, sequer existiam.
Tudo ainda era tão surreal que, vez ou outra, ao receber uma mensagem dos dois amigos, piscava rapidamente, tantas vezes, para ter certeza de que estava mesmo acordada. gostava demais de como as coisas estavam fluindo entre os três, de forma que se sentia livre para entrar nas brincadeiras de Sabrina:

Seria o seu sonho, huh, @SM?


SM: Ou o seu, afinal, quem não gostaria de ser a próxima rainha do pop?

riu gostosamente e revirou os olhos, sozinha, ao ler a mensagem com a piada interna entre eles, que fazia referência ao fato de ter sido recentemente chamado por um grande veículo midiático de “Rei do Pop”; assim, quem conseguisse fisgar seu coração seria a rainha.
As gravações aconteceriam no estúdio que Sabrina costumava gravar, para não facilitar que os dois fossem rastreados, e, ao chegar ao lugar pela entrada privativa, em um carro completamente preto que impossibilitava ver qualquer coisa em seu interior, ela sentiu como se estivesse vivendo dentro de um filme. Essa sensação apenas se intensificou ao abrir a porta onde Anthony a havia deixado e encontrar , Andrew e uma equipe inteira de produtores de audiovisual, operadores de câmeras e de som conversando. Por um momento, sua vontade era dar meia volta para seu apartamento e dizer que eles se enganaram ao escolhê-la e que, apesar de amar cantar, ela não era artista coisa nenhuma.
Mas não foi isso o que ela fez, mesmo com as pernas tremendo a ponto de quase vacilarem. Enquanto a atenção de todos ali se voltou a ela, respirou fundo, inspirando todo o ar que coube em seus pulmões e deu um passo à frente, entrando definitivamente no estúdio. parou no meio de uma frase para recebê-la com um abraço caloroso e demorado, enquanto ela inspirou profundamente o perfume suave que sempre emanava dele, como se ele tivesse acabado de sair do banho.
Nesse momento, ela se surpreendeu ao notar que aquele cheiro já lhe parecia familiar, o que fez com que aquele abraço fosse reconhecido pelo seu cérebro como seguro, a tranquilizando, pelo menos temporariamente. Eles se afastaram naturalmente e , com as mãos nos ombros da brasileira, a incentivou silenciosamente, com um sorriso ladino nos lábios, que ela prontamente correspondeu.
Ela só precisava cantar, certo? Havia feito isso a vida inteira, em todas as situações possíveis, em cima de palcos, nos metrôs de São Paulo, dentro de casa, em festas de amigos. Não tinha como ser tão difícil, tinha?
A verdade é que, sim, tinha. Ela precisava cantar e praticamente atuar com uma dezena de câmeras a rondando e a pressão em saber que o trabalho que ela estava desenvolvendo hoje seria visto pelo mundo inteiro estava a paralisando.
— Querida, você está esquecendo de respirar após “Livin’ just to find emotion”, é por isso que você não está conseguindo a extensão necessária para o verso seguinte — Garfield Mason, professor de canto de , que os estava acompanhando na gravação, interrompeu pela 5ª vez naquela manhã para apontar algum deslize na técnica da garota e, ainda que de forma afetuosa, estava começando a ficar impaciente por não estar conseguindo manter a consistência técnica que sempre teve com tanta facilidade — do contrário sequer estaria ali.
— Ugh, eu sei Field, eu sei! É realmente muito difícil me concentrar na técnica com essas lentes gigantescas nos rondando, eu simplesmente não CONSIGO parar de olhar para elas quando eu escuto o “Gravando” — a menina bufou, contrariada, e levantou da banqueta do piano que estavam dividindo, sinalizou para Andrew — dentro da cabine de controles — e falou ao microfone:
— Precisamos de uma pausa, Andrew. — Se voltando em seguida para e falando: — Vamos beber uma água e ensaiar algumas vezes, sem câmeras, para que você possa voltar à segurança de que não tem nada diferente do que você sempre fez, certo? — terminou, apertando um dos ombros da garota e indo em direção à cabine para pegar mais algumas garrafas d’água. Ele voltou e entregou uma garrafa d’água para a amiga enquanto abria uma para si mesmo.
— Como você consegue fazer isso com tanta calma em frente à essa estrutura? — ela perguntou para com uma gota de desespero em sua voz.
— Da mesma forma que você sempre fez para o seu canal do YouTube — ele deu com os ombros, como se não fosse nada. — É a mesma coisa, eu sei que parece uma pressão muito maior, acredite, eu estive lá. Você só precisa focar em você e em mim. Uma das coisas mais importantes que eu aprendi gravando duetos é que, se você confia no seu parceiro e vocês estão na mesma página, o resto não importa muito. — Ao ouvi-lo dizer aquilo, encostou a cabeça no abdômen de (que nesse momento estava exatamente atrás dela, que ainda continuava sentada na banqueta), pendeu um pouco a cabeça para trás o suficiente para encará-lo de baixo e sorriu sinceramente, respondendo:
— Você é um anjo, . Vamos ensaiar um pouco antes de retomar? — Ele assentiu, sentindo cada músculo do seu corpo se tensionando com o contato físico repentino, bebendo um último gole d’água enquanto varria os olhos por seu rosto que, mesmo do ângulo em que estava, ainda parecia ter sido desenhado cuidadosamente a dedo.
Por conta de sua irmã, sempre teve informações sobre , uma vez que Olivia estava para lá e para cá falando de acontecimentos que envolviam o cantor, além de comentar assiduamente nas redes sociais. Não era segredo para ninguém que o canadense é considerado pelo mundo inteiro um homem muito bonito, mas só conseguia pensar o quão irritante era o fato de que, pessoalmente, ele parecia ainda mais perfeito. Além da aparência física impecável, conhecê-lo como ela estava tendo a oportunidade de conhecer só o tornava mais surpreendente, porque ela estava a cada dia descobrindo que ele era muito mais do que sempre ouvira falar.
Eles sustentaram o olhar por alguns segundos, quando, por fim, aumentou o sorriso e retornou sua cabeça à posição normal, e se afastou dela cuidadosamente para assumir seu lugar no assento, ainda um pouco desnorteado pela intensidade do olhar da brasileira escrutinando seu rosto. Ele já havia notado que fazia parte da personalidade dela e demonstrava quão à vontade ela se sentia com ele, o que era recíproco, mas, algumas vezes, ainda era pego de surpresa por esses gestos afetuosos, algo que não costumava ter com tanta rapidez ou mesmo com qualquer pessoa. No entanto, com , apesar da surpresa, sua reação natural era sempre retribuir.
Na cabine, Andrew observava através do vidro a interação entre os dois jovens, mais uma vez admirado pela sinergia que rondava cada movimento deles. Desde a forma como se olhavam até sua linguagem corporal, era quase como se eles estivessem sincronizados. Pensando nisso, disse ao diretor de câmera:
— Começa a gravar esse ensaio, por favor. Sem anunciar, vamos ver como ela se sai sem a pressão de saber que estão sendo gravados. — Recebendo uma confirmação com a cabeça enquanto o responsável pelas filmagens, discretamente, acenou para que a equipe desse início a mais um take de gravação, Andrew continuou o comando, dessa vez para a direção de som: — Iniciem a captação também, por favor. — Outro aceno em confirmação.
introduziu as primeiras notas da melodia no piano com calma e o seguiu, iniciando a primeira estrofe — que deveria cantar sozinha.
Just a small town girl, livin' in a lonely world, she took the midnight train goin' anywhere. — Ela respirou profundamente antes de continuar, recebendo um sorriso quase imperceptível do companheiro em resposta para que ela continuasse, e sentiu um pouco mais da tensão deixar seus ombros. — Just a city boy, born and raised in South Detroit, he took the midnight train goin' anywhere.
Todos dentro da cabine conseguiram assistir à cena imóveis, receosos de que qualquer movimento brusco fosse tirar dos eixos novamente. assumiu na estrofe que se seguiu:
A singer in a smokey room, the smell of wine and cheap perfume, for a smile they can share the night, it goes on and on, and on, and on. — Vê-lo cantar aquela parte mais uma vez durante um ensaio, de forma quase que particular, fez com que fosse invadida pelas memórias de sua audição, se deixando levar pelas sensações como se novamente estivesse em cima do palco, apenas em frente à Sabrina e Andrew, com cantando ao seu lado pela primeira vez, juntando-se a ele para a primeira estrofe da música onde as duas vozes se misturavam:
Strangers, waitin', up and down the boulevard, their shadows searchin' in the night. — Conforme a melodia da música se agitava, começou a deixar seu corpo balançar conforme o som saía do piano enquanto eles cantavam, dando um leve empurrãozinho com seu ombro no de , o que fez com que ambos rissem durante a música. — Streetlights, people, livin' just to find emotion, hidin' somewhere in the night. — Nesse momento, dentro da cabine Garlfied comemorou apenas com um gesto das mãos vendo que, dessa vez, conseguiu alcançar perfeitamente a extensão que teve dificuldade apenas alguns minutos atrás.
Workin' hard to get my fill, everybody wants a thrill, payin' anything to roll the dice just one more time. — Neste momento da música, conforme se mostrava eletrizado pela batida da música acelerando abaixo de seus dedos, simplesmente levantou-se da banqueta e deu à volta no cantor, deixando uma mão se deslocar da extremidade de um ombro ao outro, rodeando o piano e parando bem em frente a , que a seguiu com os olhos, gargalhando pela animação da amiga ao cantar aquela parte específica da música.
Some will win fez sua voz se sobressair neste verso, ouvindo assumir o seguinte, ainda dançando em sua frente, com as mãos passeando pela parte superior do piano:
Some will lose.
Some were born to sing the blues. — Foi a vez dele novamente.
Oh, the movie never ends assumiu outra vez, fazendo um movimento dramático de levar as mãos ao peito para continuar girando ao redor de si mesma: — It goes on and on, and on, and on.
Nas três estrofes que se seguiram para finalizar a música, as vozes de e conduziram juntas, novamente como se eles tivessem cantado juntos a vida inteira. Em algum momento, voltou à banqueta onde ela e dançavam sentados no ritmo da música e, de forma sincronizada, alternando a direção em que dançavam. Quando eles finalmente terminaram, rindo de forma solta um para o outro, claramente satisfeitos sobre a própria performance, se levantaram juntos e pulou em , o abraçando, e ele a tirou do chão e girou, sussurrando em seu ouvido “viu como você consegue?”.
Quando chamou Andrew pelo microfone, para avisá-lo que estavam prontos para tentar gravar novamente, Gertler entrou no estúdio batendo palmas animadamente e disse:
— É isso o que eu quero de vocês nesse vídeo, naturalidade, sincronia, dois amigos fazendo música porque amam fazer música, se divertindo enquanto cantam! — ele falou com a animação típica que estava aprendendo a admirar nele, cada dia mais.
— Mas fazer isso em frente às câmeras é quase atuar, eu ainda não tive aulas de teatro o suficiente pra isso, Andrew — falou, sentindo o nervosismo bater em sua garganta, ela sequer havia feito nada, apenas cantou com um amigo e se divertiu enquanto o fazia, mas sem o compromisso de que o mundo inteiro os veria.
— Sorte a sua, então, que seu agente é um gênio e começou a gravar, prevendo que isso poderia acontecer, não é mesmo? — ele falou, muito orgulhoso de si mesmo, cruzando os braços no peito, cheio de si. — Vamos ver a gravação juntos, com sorte, algumas edições, alguns cortes, nada muito difícil de obter, nem precisaremos gravar novamente. Talvez, alguns retoques de voz gravadas em estúdio mesmo, mas, pelo que vi agora, penso que nem isso será necessário.
riu porque sabia que isso era exatamente o tipo de atitude que fazia do Andrew um ótimo agente, ele era apaixonado pelo que fazia e acreditava nos seus agenciados como se fossem seus filhos, sendo capaz de extrair o melhor deles, inclusive em situações de tensão, como estava sendo aquele dia para .

*


O vídeo havia, de fato, ficado perfeito e nem acreditou quando assistiu que aquela era ela em frente às câmeras. Cantar junto de tinha sido, desde a primeira e inesperada vez, uma experiência incrível, mas ver com seus próprios olhos o resultado era outra experiência, diferente, mas igualmente incrível, porque ali não parecia mais , brasileira de 24 anos que tinha o sonho de viver de música, ali era , de fato, vivendo de música. Estava orgulhosa de ver o que tinha feito e ainda mais orgulhosa por saber que ainda poderia fazer muito e melhor.
A gravação foi enviada para a edição e para seus próprios e-mails, ainda crua, e, embora eles ainda não pudessem compartilhá-la com seus contatos pessoais, enviou-a no Prison Island para que Sabrina pudesse ver, porque, além de tudo, a loirinha tinha insights muito bons sobre edição de vídeos, sendo responsável por colocar a mão na massa em muitos de seus clipes.

SC: OMFG, isso é uma das melhores coisas que eu vi nos últimos tempos! Guys, falando sério, vocês são incríveis, ótimo trabalho. Esse vai ser um debut incrível para você, , e , achei realmente nostálgico te ver em um cover, as Army vão surtar, você sabe disso certo?

SM: Eu realmente espero que elas gostem, mas, principalmente, que recebam muito bem nossa novata :D

Eu estou tão nervosa para ver esse cover no mundo! Mal posso esperar para vê-lo editado. O que vocês farão hoje?


SC: Josh está vindo de Cali passar um tempo, ele tem reuniões com Andrew essa semana. Hoje estou fora de qualquer plano ☹
Sorry, mas vamos marcar para você conhecê-lo, .

Que pena, mas aproveite. Diga a Josh que mandei um oi! E, sim, mande as coordenadas que estarei lá. 😉


SM: Sem planos para hoje, posso chegar aí em 1 hora, se você quiser beber algo, já que você continua prisioneira e escondida do mundo, LOL.

Perfeito, te espero! O que você quer beber?



SM: Você quem manda. Estou indo pela companhia 😊

SC: Awn, vocês seriam um ótimo casal se não fossem proibidos por contrato. LOL.

SM: Vai à merda, Brina.

Apesar de exausta pelo dia que teve, não parecia nada mal poder convidar para beber em sua casa em plena segunda-feira.

*


, fala a verdade, você acha que o público vai me receber bem? — Em algum momento daquela noite, enquanto eles já haviam jantado e estavam jogados na cama da garota bebendo e conversando distraidamente, perguntou, preocupada.
— Sendo 100% sincero com você, a gente sabe que tudo pode acontecer. Mas estava conversando com Andrew recentemente e achamos que o fato de você ser uma representação brasileira sendo lançada para a música global é um ponto muito positivo ao seu favor. Os brasileiros são extremamente apaixonados, uma das minhas fanbases mais fiéis e engajadas, acredito que quando Andrew pensou em te lançar em um cover nosso, ele pensou justamente em garantir o apoio dessa parte específica da audiência. Conheço Andrew o suficiente para saber que ele não faria esse movimento se ele não estivesse quase completamente certo da receptividade — ele respondeu, confiante.
— Confesso que eu tenho medo de as pessoas dizerem que estou me aproveitando de você para ficar famosa. Seus fãs são como leões quando precisam te defender. É até engraçado de ver — a garota gargalhou e a acompanhou.
— Eles são, mas eles não têm nenhuma razão para quererem me defender de você, . E pode ter certeza de que, no momento que eles te ouvirem cantar, eles vão saber, assim como eu, que você não precisa de mim para nada — ele piscou.
— Disse a pessoa que literalmente me salvou da maior humilhação da minha vida algumas semanas atrás.
— Ah, é, isso sim — soltou uma risada anasalada, apoiando sua taça no móvel da cabeceira, e se deixou cair deitado na cama ao lado de , que estava sentada com as costas na parede. Em seguida, eles logo engataram em outro assunto. — Acho que dessa todos nós saímos ganhando, certo? — a encarou de lado e piscou para a garota que, sem filtro algum entre seu cérebro e sua boca, soltou:
— Você tem alguma noção de que você parece estar flertando em 90% do tempo?
— O quê? Eu, não... Não? — gaguejou em resposta, se levantando apenas até a metade do caminho, ficando apoiado nos dois cotovelos, a encarando com as sobrancelhas unidas.
— Você tem toda essa pose “Eu sou .” — engrossou a voz em uma tentativa de imitá-lo e fez aspas no ar. — E você pisca, sorri de lado, passa a mão nos cabelos e é como se você tivesse saído diretamente de um filme da Disney. É bem irritante, para falar a verdade.
Sem conseguir se conter, riu alto, jogando a cabeça para trás, de forma que seus cabelos acompanharam o movimento.
— Viu só? Cada maldito movimento que você faz é como se eu estivesse encarando um ser sobre-humano, deveria ser crime ser bonito dessa forma, . Como você está solteiro?
! — ele a repreendeu de forma propositalmente mais dramática do que o necessário, com o sotaque carregado em seu nome, mas sem conseguir esconder o quão sem jeito ficara com a frase da garota. — Eu sou bom em muitas coisas, confesso. Mas relacionamentos definitivamente não estão nessa lista.
— Ah, é? Me conte mais sobre isso, então. — Ela se inclinou, desencostando-se da cabeceira da cama, demonstrando interesses. a olhou, hesitante, por um segundo, e ela insistiu: — Qual é, não tem como ser pior do que ser abandonada em outro país 10 minutos antes de uma audiência ao vivo em dueto por ninguém mais ninguém menos que seu namorado, que era também a outra parte do dueto — ela finalizou, jogando um travesseiro na direção do outro, quando ele gargalhou tão alto que precisou levar a mão à boca para se conter, por conta do horário.
Se dando por vencido, contou de forma resumida suas últimas experiências amorosas, com Hailey e Camila, ambas tão rápidas quanto intensas, finalizadas de forma desastrosa com a intromissão da mídia e dos fãs. Parte daquelas informações não eram novidade para , mas ouvir a forma como, principalmente, o fim do relacionamento com Camila afetou era muito diferente da imagem pública que ela tinha acesso até o momento.
— É realmente complicado quando as pessoas assumem que sabem coisas sobre você que elas simplesmente não têm a menor ideia — ele disse, por fim. — Eu e Camila estávamos certos de que o fim do nosso relacionamento era o melhor para nós dois, mas isso não tornava a decisão menos dolorosa. De repente, eu vi as pessoas tentando determinar um vilão em uma história onde não existia nada além de respeito das duas partes, eu não podia falar sobre o que estava sentindo através da música, porque, de repente, eu só queria chamar atenção. O mesmo aconteceu com ela. O término por si só já foi triste o suficiente, mas as pessoas o tornaram cruel.
ouviu atentamente e alcançou a mão dele por cima da cama, segurando-a sem pensar duas vezes, em sinal de compreensão.
— Eu sinto muito, muito mesmo. — Se limitou a falar.
— Agora está tudo bem — ele assegurou. — Mas ainda me assusta pensar em arrastar qualquer pessoa para essa loucura, então, prefiro evitar.
— Mas não é injusto pensar que você pode estar deixando de viver algo bom por conta dos outros?
pendeu a cabeça para o lado e olhou discretamente para as suas mãos, que ainda estavam juntas, movendo seu olhar para o rosto da menina e um vinco entre suas sobrancelhas, que, no pouco tempo que se conheciam, já reconhecia como um movimento que a menina fazia quando estava contrariada com alguma coisa. Ela também mordia o canto do lábio inferior, outra coisa que notara que fazia com frequência, sempre que sua mente estava processando alguma coisa intrigante que alguém havia dito, já vira aquela expressão no rosto dela em diferentes momentos, com Andrew e com Sabrina.
Ele estava descobrindo que uma das características da brasileira que tornava tão fácil estar perto dela era o fato de que ela se preocupava verdadeiramente com as coisas que outras pessoas estavam compartilhando. Em todas as oportunidades em que ele contava algo de si, ela apenas ouvia e oferecia compreensão, se indignava diante de informações indignantes, gargalhava de forma espalhafatosa com as coisas engraçadas e fazia questão de demonstrar que estava ali, mesmo com pequenos gestos.
era transparente, espontânea, empática e, naquele momento, tinha a impressão que conhecer era, na realidade, como se estivesse reencontrando-a.
— Parece muito injusto, de fato, mas eu não estou exatamente deixando de viver nada, . Só não estou ativamente procurando por isso — ele respondeu, olhando-a intensamente e se endireitando em seguida para alcançar novamente sua taça e beber um longo gole, utilizando a sua mão livre, porque não conseguia pensar em soltar a dela.
gostava de como estava descobrindo o que era estar na presença de , quando o encontrou pela primeira vez, ele era o cantor canadense que reunia uma legião de fãs histéricos ao redor do mundo, dono de uma voz inconfundível e de um talento sem igual. Mas, ali, em seu novo quarto, ele era só , com quem parecia ser fácil demais dividir tudo o que estava descobrindo, e conhecer só era ainda mais incrível do que conhecer .
— Nunca se sabe o que você pode encontrar quando não está procurando, — ela brincou, utilizando seu nome composto, como adorava fazer, mas, por alguma razão, aquela frase atravessou o peito de com uma seriedade que ele não estava preparado para investigar o que significava.

*


No final daquela mesma semana, foi o primeiro a ser contatado por Andrew para uma reunião de validação do vídeo-cover que seria lançado.
— Vou dar play, e te digo, posso estar sonhando alto, sei que é apenas um cover, mas uma produção original de vocês dois tem grandes chances de ser o ponto alto de ambas as carreiras, mesmo da sua, que já tem tantos marcos — o mais velho comentou de forma contida, apesar da seriedade do conteúdo do seu comentário. — Me diga o que você vê.
era sonhador, mas muito disso aprendeu com Andrew ao longo dos últimos 7 anos de sua carreira, a sonhar alto. Ele não queria ser bom, ele queria ser o melhor e, ao mesmo tempo, continuar se divertindo, surpreendendo seus fãs e entregando o melhor de si. E Andrew Gertler incentivava isso.
Mas mesmo aquilo que o fazia tão feliz, às vezes, precisava de um freio, para que as cobranças sobre si mesmo não fossem tão grandes que o fizessem esquecer de aproveitar a caminhada. Apesar de empolgado em estar tão envolvido no lançamento da carreira de , considerando que a ideia original do The Chosen One partiu de si, se preocupava que, caso Andrew sonhasse alto demais para ela, as coisas acontecessem tão rápido que a sufocassem, como aconteceu com ele em seus primeiros anos, onde se viu afundando cada dia mais em ansiedade por não saber como acompanhar a reviravolta que sua vida havia tomado e não houve ninguém a quem recorrer que soubesse exatamente o que ele estava pensando.
Por isso, sentia como se fosse uma espécie de responsabilidade de sua parte protegê-la também das partes negativas que a fama repentina pode estar acompanhada.
— Vamos com calma, Gertler — ele riu, apesar de estar falando sério. – Nós sequer sabemos como isso será recebido pelos meus fãs, sabemos que a reação deles pode ser meio imprevisível vendo uma nova cantora ser lançada através de um trabalho comigo — ponderou, trazendo a preocupação que havia expressado no último encontro dos dois.
— Concordo, mas veja o que eu vi e, talvez, você pense como eu. Eu insisto, me diga o que você vê nesse vídeo.
assentiu e o outro finalmente apertou o botão de play, fazendo com que o vídeo começasse a ser transmitido no telão em frente à sala de reuniões. O cantor assistiu todo o vídeo atentamente, com seu queixo apoiado em suas duas mãos cruzadas abaixo dele, de forma relaxada. Assistindo ao vídeo, pôde perceber muitas coisas, mas a que mais lhe chamou a atenção foi o fato de que qualquer um que assistisse àquela gravação poderia prometer com os pés juntos e sem os dedos cruzados que aqueles dois se conheciam a vida inteira, não apenas há pouco menos de um mês. Durante toda a gravação eles estavam sincronizados sem sequer notar e a todo momento estava sorrindo ao acompanhar a garota com o olhar ou gargalhando nos momentos em que ela dançava de forma um pouco mais exagerada, como se estivesse encenando a música animadamente, como quando levou uma das mãos ao peito de forma dramática.
Como Andrew suspeitara, não havia sido necessário regravar vozes, o que deu um toque ainda mais especial ao vídeo.
Quem assistisse àquela gravação veria dois jovens cantores felizes e em sintonia. Mas, para , aquilo era uma surpresa ainda maior. Ele sempre foi sociável e teve muita facilidade em interagir com pessoas, mesmo as que ele acabara de conhecer, por ter facilidade para se adaptar aos mais diversos grupos de pessoas, uma característica necessária para o mundo em que estava inserido. Mas aquilo era diferente, aquele não era o adaptável, aquele era simplesmente o , pura e verdadeiramente, de uma forma que poucas pessoas conheciam. Ele estava relaxado e entregue, diferente do homem muitas vezes ansioso em situações de trabalho, por se cobrar demais. Naquele vídeo, ele estava apenas vivendo o momento.
Por toda a música, os olhos dos dois estavam conectados, seus movimentos, suas vozes, e, a menos que estivesse ficando louco, seus corações. De uma forma que nunca se sentiu conectado com alguém pela música antes. Em outras circunstâncias, essa conexão faria com que se sentisse completamente inundado e encantado, mas, considerando de quem e do que se tratava, ele sabia que esse tipo de ligação poderia complicar as coisas.
Pensar nisso fez seu coração bater de forma desorientada dentro do peito e ele engoliu em seco, tentando digerir aquele sentimento. Sentia-se como se enxergasse pela primeira vez de uma forma que, ainda que quisesse, simplesmente não conseguiria voltar atrás, como se estivesse fechando seus olhos para algo que somente agora enxergava com clareza.
Quando o vídeo terminou, Gertler perguntou, com um sorriso que não escondia sua excitação:
— O que você achou?
, por sua vez, guardou momentaneamente os receios causados pelos sentimentos que aquele vídeo lhe deu e respondeu, entendendo o que Gertler queria dizer anteriormente:
— Uhn, acho que nós temos química na música, certo? — Limpou a garganta antes de continuar — Acredito que vamos, sim, conquistar o público. — A resposta fez Andrew bater palmas animadamente, já compartilhando o vídeo editado com mais um número de pessoas da equipe, seguido de instruções logísticas e ideias para o lançamento.
O que guardou apenas para si mesmo naquele momento, enquanto recostava-se preocupado na cadeira giratória, é que, talvez, a química dos dois fosse muito além da música e tudo o que sabia era o quanto isso poderia colocá-los em apuros.
“Nunca se sabe o que você pode encontrar quando não está procurando, .”
A voz de rondava sua voz enquanto o vídeo ainda passava na tela.
De fato, nunca se sabe.


Continua...



Nota da autora: Sem nota.




Nota da beta: SHAWN MENDES PERCEBENDO QUE JÁ TÁ FERRADO EM RELAÇÃO À TESSA É A MINHA RELIGIÃO HAHAHAHAHAHAHA
E Sabrina falando que eles dariam um belo casal me representou toda! Mas depois de um vídeo como aqueles, né, gente, eu vi a cena todinha acontecendo de tão realista que eu eu senti que foi! Sem contar o momento que a Tessa fala que ele parece estar sempre flertando, que foi o meu diálogo favorito HAHAHAHAHA ai ai amo esses dois ❤️

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