Mon Petit Diable

Última atualização: 22/08/2018

Capítulo 1

Acordei ouvindo um chorinho fino e manhoso vindo da babá eletrônica. Situação esta rotineira nos últimos dias.
Loan, uma criança, no geral, muito tranquila, mostrava uma inquietação inesperada, aterrorizando eu e meu marido com as muitas possibilidades.
Virose, os médicos disseram.
O tempo frio que emplacava em Madrid era um dos contribuintes para a enfermidade de meu caçula. Contudo, tal diagnóstico não serviu para acalmar meus ânimos.
Mesmo já estando no terceiro filho, um mero arranhão em algum de meus filhotes era motivo o suficiente para entrar desespero.
Eu me sentia como uma leoa pronta para defender minha cria. Por isso, mesmo tendo meu filho medicado e apresentando significativa melhora, ainda não havia conseguido relaxar, refletindo no meu estado atual.
Estava exausta.
As noites mal dormidas eram refletidas pelas olheiras em meu rosto e pelo aspecto mortificado.
- Deixa que eu vou, amor. - Grizi disse, dando um beijo singelo em minhas costas.
Antoine havia entrado de férias pelo time há alguns dias para aproveitar os feriados de final de ano com a família.
Após um início de temporada bastante convincente, o Atlético de Madrid disputava, com o Barcelona, a primeira colocação do campeonato espanhol.
A atuação na UEFA Champions League também trazia otimismo para a torcida colchonera.
Em primeiro lugar de seu grupo, o Atlético apresentava a melhor defesa da competição até ali, fazendo muitos especularem que ganhar a orelhuda, de forma inédita, era possível.
Estava tudo incrível.
A vitória francesa da Copa do Mundo da Rússia; a segunda colocação de Antoine no prêmio Bola de Ouro da FIFA, perdendo apenas para Lionel Messi, conseguindo ultrapassar Cristiano Ronaldo; e, sobretudo, o nascimento de Loan, tornavam o ano de 2018 memorável.
Mesmo com todas as vitórias profissionais, Griezmann sempre deixava claro que a melhor parte de seu ano havia sido o nascimento de nosso terceiro filho, que veio para iluminar nossas vidas ainda mais.

- Maman, vem brincar com a gente! - Theo chamava manhoso, enquanto montava alguns blocos com Méline no meio de nossa sala de estar.
Todavia, a barriga de nove meses era bastante incômoda e eu já não tinha disposição para rolar no chão com os meus filhos como antes.
- Mamãe não pode,Theo. - minha primogênita, sempre muito perspicaz, foi quem respondeu o irmão. - Petit Loan está muito pesado! - a menina gesticulou com exasperação para exemplificar.
- Eu nem acho! - o meu loirinho implicou, cruzando os braços. - Ele ainda tá na barriguinha, então, deve ser bem pequenininho! - falou como se fosse óbvio. - Papa disse que se eu colocar a mão suja na boca, eu vou criar um monte de bichinho na minha barriga e ela vai ficar grandona. - continuou Theodore, passando a mão na região citada. - Como o Loan deixou a mamãe!
Antoine associou nosso filho a um verme intestinal, ou é impressão minha?
- Theo, são situações diferentes, bebê. - comecei a explicação - O bichinho que o seu pai comentou vem de objetos ou lugares contaminados. Não foi assim que o Loan veio parar na barriga da mamãe.
- Mamãe, - agora foi Meli quem capturou minha atenção. - se é assim, de onde é que vêm os bebês?
Calma... O quê?
Em meio a minha tentativa de ser didática, não consegui perceber que caminhava para uma armadilha, esta facilmente auferida pela criança.
Afinal, não esperava ouvir essa pergunta nem tão cedo.
Nessa idade, o máximo de questionamento que eu aguentava era sobre o porquê do coelho da Páscoa ser um coelho e não um pônei, como sugeriu Méline.
- Como o Loan foi parar aí, maman? - insistiu, dessa vez, Theo. - A senhora já disse que não engoliu ele! - cruzou os bracinhos em sinal de indignação.
Eu ainda estava atônita com a situação.
Meus dois filhos me encaravam com curiosidade incontida e isso aumentava o meu nervosismo com o que estava acontecendo.
Pontadas agudas em minha região lombar mostravam bem minha ansiedade com o assunto.
- Querida, cheguei! - ouvi a voz de Griezmann vinda da direção da porta principal. - O que se passa por aqui? - falou, caminhando em direção ao sofá para me cumprimentar com um selinho, logo em seguida indo se sentar em cima do tapete de brincadeiras das crianças.
- Eles querem saber de onde os bebês vêm, Grizi. - apontei para meus dois filhos, ainda desconcertada com aquela situação.
- Claro, claro... - respondeu aéreo, já que tentava tirar um fiapo que estava na camisa de Theo. - Pera, o quê?! - meu marido, finalmente, pareceu se dar conta do que eu tinha lhe falado.
- Papa, como a mamãe engravidou do Loan? - minha filha mais velha questionou, mais uma vez, enquanto pegava algumas ligas de cabelo para amarrar no cabelo do pai. - ... - olhou com desespero para mim.
- Nem olhe assim para mim! Você e a sua história de bichinho que faz a barriga crescer começaram com isso!
- Eu só queria que ele parasse de colocar a mão cheia de terra na boca! - passou a mão no rosto, em claro sinal de nervosismo. - Não imaginava que ele iria questionar sobre isso. - completou, encarando Theodore que parecia bem interessado em nossa conversa, enquanto Méline já se distraia fazendo alguns penteados no pai.
- Maman, a senhora vai precisar usar fraldinha! - meu filho observou inesperadamente. - Tá fazendo xixi fora do peniquinho.
- Ahn... O quê? - perguntei, confusa com a mudança de assunto.
Há alguns poucos minutos estava em uma crise existencial por ter que explicar aos meus filhos de 3 e 4 anos o local de onde vêm os bebês, e agora estávamos discutindo uma possível infecção urinária minha?
- ... Acho que a sua bolsa estourou. - Antoine falou, olhando para a poça de líquido amniótico que escorria pelas minhas pernas e que fora notada apenas agora.
- É... Ccho que sim... - respondi, olhando ao redor ainda desnorteada com os momentos anteriores. - A BOLSA ESTOUROU! - exasperei, finalmente entendendo o que estava acontecendo.
- O Loan vai nascer! Meu Deus do céu, o que eu faço? - Griezmann perguntou mais para si do que para mim, levantando-se em um rompante. - A BOLSA, ! CADÊ A BOLSA DA MATERNIDADE? - começou a andar de um lado para o outro, começando a me deixar levemente tonta. - RESPIRA, AMOR! Não para! - exclamou, vindo em minha direção. - Um, dois, um, dois, um...
- ANTOINE! - segurei os seus braços, que tentavam levantar os meus para "facilitar" a respiração. Já havia caído a minha ficha e, por isso, já conseguia pensar com mais clareza. - Calma, homem! - agarrei seu rosto, fazendo-o olhar para mim. - É o seu terceiro filho. Você consegue passar por isso.
- Mas e as crianças, ? - falou, apontando para os dois menores da sala que olhavam o desespero de seu pai com semblantes confusos. - Nós demos folga para a babá e a sua mãe está em Nice! - falou, gesticulando efusivamente. - Nós vamos traumatizar nossos filhos fazendo-os assistir a um parto normal! - concluiu, personificando a imagem do drama. - Eles só queriam saber de onde vem os bebês, não por onde eles saem...
- Antoine Griezmann, recomponha-se, criatura! - falei com toda seriedade possível; porém, pausadamente, uma vez que já sentia as contrações começando a aparecer. - Podemos ligar para o Paul. Ele está em Madrid essa semana, não é? - sugeri, me lembrando dos insta stories que visualizei de Pogba na cidade madrilhenha, além de seu auto-convite para vir nos visitar.
- , qual a parte do "não quero traumatizar" meus filhos você não entendeu? - perguntou, sentando-se no braço do sofá. - Da última vez que deixamos os dois com o Paul, eles voltaram dizendo que o Barcelona é o melhor time da La Liga! - apontou, indignado com a situação.
- Isso faz meses, Grizi! Supera! - falei, começando a sentir pontadas mais fortes irradiando em direção à minha virilha. - Ligue para ele ou vamos ter nosso filho no tapete de casa!
- Tá, ta! - resmungou, já voltando ao seu nível de estresse anterior. - Como estão as contrações?
- Doloridas. - respondi, com uma cara sofrida. - Vá agilizando a história com o Pogba que eu vou pegar as coisas da maternidade. - falei, levantando com dificuldade.
- NÃO! - gritou, assustando a mim e as crianças, que já começavam a ficar impacientes com tudo àquilo que estava acontecendo. - , fique aí paradinha! Eu irei pegar tudo.
- Antoine, nós preci... - falei, interrompendo minha própria fala para respirar fundo. - Precisamos ser rápidos. Eu não tenho um histórico de demorar para dar à luz!
- Eu sei, amor! - respondeu meu marido, correndo pela casa, enquanto colocava o celular embaixo de uma de suas orelhas. - CADÊ A BOLSA? - gritou do quarto que será de Loan.
- NO ARMÁRIO DE ROUPAS. - gritei de volta, logo passando minha atenção para Meli e Theo que vinham em minha direção.
- O Loan vai nascer, mamãe? - perguntou a menina, enquanto passava as mãos pela minha barriga que já se encontrava endurecida.
- Vai sim, filha. - disse, em tom carinhoso. - Daqui a pouco ele vai estar aqui com vocês.
- E se ele não gostar da gente? - a criança mais nova perguntou preocupada.
- Como não gostar de vocês, Theo? - falei, acariciando o rosto de meu filho. - Vocês são pessoinhas incríveis, meu amor!
- Ele vai chorar muito, maman? - Meli começou um novo questionamento. - O Theo era muito chorão!
- Ei! - Theodore protestou emburrado.
- Isso eu não posso te responder ainda, querida. - expliquei, risonha. - E como você descobriu que o Theo era um pouquinho... - fiz um sinal com os dedos, frisando a informação para não chatear meu menino. - manhoso? Você era bem pequenina quando ele nasceu.
- Papai que disse. - respondeu. - Ele falou que não conseguia colocar nós dois... - apontou para o irmão - Em um mesmo lugar porque ficava muito barulhento, mamãe!
- É verdade, Meli. - assenti. - Você era mais calminha, mas quando seu irmão chegava, todo agitado do jeito que é, você acabava abrindo o berreiro também. - fiz uma careta, lembrando-me daqueles momentos complicados. - Vocês dois monstrinhos eram um terror. - finalizei, apertando as bochechas de minhas crianças.
- AMOR! - ouvi a voz de meu marido se aproximando, virando a tempo de vê-lo totalmente descabelado, com a bolsa que havíamos preparado para o hospital colocada transversalmente em seu corpo. - Liguei para o Paul e ele já está vindo com o Mathias. - falou, enquanto colocava a bolsa em cima de uma das cadeiras dispostas pela nossa sala de jantar. - Você consegue esperar alguns minutos?
- Acho que sim. - ponderei. As contrações viam com certa força, mas a frequência ainda era espaçada.
- Também falei com nossos pais. - disse, aproximando-se de mim e colocando a mão em minha barriga. - Disseram que até amanhã de manhã estão aqui. Sua mãe talvez se atrase um pouco mais por causa do tempo, mas ela disse que amanhã está aqui, sem falta.
- Tudo certo. - suspirei. - Agora é só você sair da barriga da mamãe, bebê. - falei, acariciando minha protuberância de nome meses. Sentido, logo em seguida, uma forte contração que assustou os outros três que estavam na sala, visto o gritinho agudo que soltei.
- Espere um pouquinho só, Loan! - Antoine falou, olhando preocupado para mim. - Nascer no tapete da sala só seria legal caso fosse o Aladdin.
- Eu gosto do Aladdin! - falou Theo.
- Eu prefiro a Pequena Sereia. - intrometeu-se Méline.
- Aquele peixe sem graça, Méline? - implicou Theodore.
Enquanto sentia as dores das primeiras contrações, e observava meu marido tentando apartar o pequeno desentendimento de nossos filhos, refletia mentalmente como seria lidar com mais um serzinho de luz. Concluindo, enfim, que era possível.
Afinal, não estava sozinha.
E, dificilmente, estaria.


- Ele dormiu novamente. - falou Grizi, deitando-se novamente ao meu lado. - A irritação já está passando.
- Fico aliviada em ouvir isso. - suspirei, virando-se em sua direção. - Você sabe como eu fico abalada quando qualquer um dos três fica doente.
- Eu sei, meu amor. - respondeu, distribuindo beijos - Você é uma mãe extraordinária. - deu-me seu sorriso mais bonito.
- E você é um pai extraordinário. - beijei a ponta de seu nariz.
- Você imaginava, quando nos conhecemos, que hoje estaríamos assim? - questionou meu marido, puxando-me para deitar em seu peito.
- Assim como? - devolvi a pergunta.
- Casados, com três filhos e muito, muito, muito... - para cada pausa era um selinho que ele me dava. - Felizes.
- Sendo bem sincera, - comecei, olhando para os olhos mais lindos que eu já havia visto. - para mim nós não duraríamos nem um mês. - confessei.
- Como assim? - perguntou, confuso.
- Nós éramos bem diferentes, ainda somos, na verdade. - iniciei - Acreditava que em algum momento você iria cansar da minha chatice e me chutar para fora de sua vida. - concluí, lembrando-me da insegurança que minha versão adolescente possuía no início de nosso relacionamento.
- Eu nunca ouvi tanta besteira na minha vida, Ma Belle. - usou o apelido que me deu quando tínhamos 18 anos, puxando meu rosto para encará-lo. - Desde que você apareceu com aquele vestidinho preto, chamando toda a atenção do salão, eu nunca mais consegui tirar os olhos de você.
- Parafraseando One Direction? Sério? - zombei.
- Fazer o que se eles sabem das coisas? - estirou a língua para mim. - Uma pena estarem em hiatus.
- Eu nunca vou superar o fato de você ser um fã-boy de boyband adolescente! - disse, rindo.
- Ah, qual é! Você me fez te levar para vários shows do McFly e ainda tive que aguentar você cheia de amores para o lado daquele guitarrista sardento!
- Epa! - dei uma batidinha em seu peito desnudo. - Respeita minha história que McFly não é boyband e Danny Jones nem é gente, é anjo! - provoquei Antoine. Sabia que ele nunca havia superado o meu crush juvenil pelo britânico.
- Tá. - respondeu com um bico idêntico aos que Theodore fazia quando estava emburrado.
- Ei, vem cá. - falei, ajeitando minha posição na cama. - Você sabe que o único cara que me faz suspirar é você. - completei, cutucando suas costelas já que sabia que ele sentia cócegas ali.
- Para, ! - falou rindo, esquivando-se de meus dedos que ainda o provocavam. - Eu sei, mas gosto de te ver repetindo. - concluiu convencido.
- Bobão. - rebati, puxando-o para um beijo.
- Eu te amo demais, sabia? - falou, quebrando nosso contato.
- Eu sei, mas gosto de te ver repetindo. - fiz uso de suas palavras, fazendo-o rolar os olhos. - Também o amo, Mon Petit Diable.



FIM.



Nota da autora: Falaram que eu deveria escrever uma continuação para Mon Petit, eu acreditei e agora estamos aqui! Eu amo essa família, gente! Escrever mais alguma coisinha sobre eles me divertiu demais. No mais, escrevam o que acharam aí embaixo, por favor! Um beijo <3


Nota da beta: Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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