Capítulo Único
, eu consegui a bolsa de intercâmbio!
Ainda me lembro perfeitamente daquele dia, o começo de tudo. Era para ser mais um dia qualquer, com aulas chatas e cansativas, que te fazem querer sair correndo pelo enorme portão de entrada e nunca mais voltar.
Talvez, bem lá no fundo, eu já imaginasse que isso viria a acontecer - Qual é? é o melhor aluno da classe-, apenas me recusava a aceitar. Não queria que ele se mudasse, não queria perder minha única companhia nas noites de sexta e sábado para festas regadas a álcool e mulheres seminuas. Ele era meu, e de mais ninguém. Sei que esse pensamento é egoísta demais, mas não posso evitá-lo.
Pensei na única explicação plausível para aquele meu drama todo e consegui apenas uma... ciúme. Eu estava com ciúme do meu melhor amigo, garoto que eu amo a um bom tempo, e, ainda por cima, por uma razão tão idiota como aquela (Que fique claro: idiota não era o fato de que ele iria embora e ficaria anos fora - isso era triste, é diferente - e sim o fato de que eu estava com ciúme de e da possibilidade dele me trocar por uma francesa sem banho e feia). Ele e eu éramos amigos desde a pré-escola, era óbvio que ele não me trocaria, ele não era tão louco assim.
Aquele dia tinha tudo para dar errado e nem, ao menos, havia começado. Deveriam ser por volta das vinte e três horas, horário de criança estar na cama, de acordo com a minha mãe, e tudo que eu conseguia fazer era me revirar na cama, me proibindo de dormir e permitir que o dia seguinte chegasse. Aquilo era loucura, eu sabia, não há meios de não permitir o dia seguinte de nascer; não meios que eu pudesse pagar naquele momento, com o pouco mais de dois reais que havia dentro da minha bolsa da faculdade. Eu não era mais nada, além de uma pobre estudante de Ciência da Computação, fadada a sofrer por amor.
Sim, amor. A não ser que houvesse outra palavra para definir o estágio seguinte da paixão, muito além da simples atração e do coração acelerado e borboletas no estômago, era isso que eu sentia por . Claro que tentei negar a mim mesma tal sentimento, assim como tento negar o fato de que metade de mim irá embora no vôo das 18:04 para Paris, mas foi mais forte que eu, e logo eu já havia perdido o controle sobre mim mesma em relação a isso.
Me levanto da cama, com a ideia de ir até o banheiro, ligar a banheira e me afogar nela, para que eu não precise estar viva amanhã, mas paro diante de minha escrivaninha e encaro, por alguns segundos, o papel e a caneta ali depositados. Eu precisava fazê-lo saber, precisava lhe dar uma razão para, ao menos, cogitar a hipótese de ficar, e a chance era aquela, bem diante de meus olhos.
Decidida a deixar minha prematura morte para mais tarde, caminhei até a mesa cinza, de gavetas pretas, e me sentei. Destapei a caneta e, como se minhas mãos tivessem vida própria, logo me vi escrevendo a primeira linha, com minha letra incrivelmente redonda e cheia de pernas que tanto fala bem:
“Querido ,
Antes que pudesse desejar-lhe boa viagem mais cedo, me vi obrigada a contar-lhe coisas que talvez você nunca saberia, se a vontade de lhe manter junto a mim para sempre não falasse mais alto agora.
Você pensará em mim aí na França, ? Espero que sim, pois, mesmo que eu possa vir a não querer, pensarei em você todo tempo, já que para cada lugar que olho, vejo seu sorriso, seu rosto.
Você já ouviu falar em amor, ? Aposto que já, afinal não era isso que você dizia sentir a cada 3 meses por uma garota diferente, me fazendo querer chorar por dias e dias até a dor em meu peito passar, ou você perceber que aquilo era somente atração física? Mas, sabe, , ao contrário das suas paixões 'duradouras', eu te amei, amo e vou te amar por muito tempo ainda. Talvez você nunca escute isso saindo da minha boca, afinal, sabe que sou tímida demais para isso, mas queria que soubesse disso agora que já não se pode mais voltar atrás.
Você está aí, na França, a 5841 milhas de distância, e eu aqui, em São Paulo, desejando voltar no tempo e te proibir de se inscrever nesse programa do governo, pois quem sabe assim poderíamos estar juntos agora.
A dor que sinto em meu peito nesse instante é, de longe, a dor mais forte que já senti em minha vida. Meus olhos estão vermelhos e sem mais lágrimas, minhas pupilas dilatas, meu rosto totalmente vermelho e meu coração dolorido, mas não apenas psicologicamente, como fisicamente. Ainda estou tentando entender o porquê de Deus fazer algo assim comigo. Sei que seria injusto demais para com você pedir para você ficar, mas saiba que, em meu interior, meu único desejo era de que você ficasse, pois só você seria capaz de arrancar as espadas contra mim transpassadas, que me corroem e dilaceram internamente, enquanto você não está por perto para ver, ou simplesmente não enxerga.
Não é óbvio, ? A garota que dizia que nunca iria se apegar a ninguém, para não sofrer, agora sofre pela única pessoa por quem se permitiu criar um laço dessa proporção. Sei que a culpa não é sua -talvez parte seja, mas não vem ao caso-, mas eu precisava passar para o papel o que estou sentindo e tudo que eu sinto nessa hora é dor. Dor por saber que, em meio aos sete bilhões de habitantes no mundo, o único que realmente importa está sendo arrancado de mim, sem qualquer tipo de anestesia. E, garanto a você, a dor é insuportável.
Terminei de escrever deveria ser uma da manhã. O papel já quase não existia, tamanha a quantidade de lágrimas que derramei durante o processo; e a caneta já quase não parava em pé, devido às minhas mãos trêmulas.
Destaquei a folha do caderno, dobrei-a e a deixei no mesmo lugar, voltando para a cama e lá ficando até que o sono batesse e me fizesse sair do mar de lágrimas e mergulhar na escuridão.
(...)
Acordei por volta da uma da tarde, era sexta-feira e meus pais já haviam saído para trabalhar, com a promessa de voltarem mais cedo para me 'dar apoio nesse momento triste e difícil'. Meus olhos ainda estavam com reflexos da noite mal dormida e das horas de choro, meu rosto pálido e meus passos lentos; eu parecia uma morta viva, interna e externamente. Me arrastei para o chuveiro, com o clima de velório me rodeando por todos os lados e direções. Talvez, se meus pais se separassem, a dor não seria tão grande quanto essa - não que eu quisesse descobrir, é claro.
Saí do banho e tive a certeza de que, se nem a água conseguiria melhorar meu estado emocional, nada, nem ninguém, que não fosse vindo por parte dele ou ele, conseguiria.
Almocei, em silêncio, um copo de suco de laranja e depois voltei para o quarto. Ainda me restavam quatro horas.
Três.
Dois.
Nunca desejei tanto que as horas passassem devagar, mas não, elas tinham que voar. Era sempre assim, quando mais se quer que elas voem, elas se arrastam e vice versa. Nem o tempo estava ao meu lado nesse momento difícil mais...
Quando o relógio marcou quatro horas, tive certeza de que meu funeral estava próximo. Fazendo jus a isso, coloquei uma roupa com que desejaria que fosse enterrada e saí de casa, indo em direção à casa de , para dar adeus.
Adeus. Uma palavra, cinco letras e uma sensação de buraco negro se formando em meu peito. Nunca gostei dessa palavra, ainda mais agora. Dizer adeus, para mim, era como dizer que uma das pessoas estava para morrer e isso me causava arrepios. Mesmo que viesse a ser verdade, eu estava prestes a morrer mesmo, ainda sim a palavra não deixaria de ser assustadora aos meus ouvidos.
Avistar a casa de da esquina geralmente era motivo de alegria para mim, ainda mais quando ele estava na porta, como hoje, mas hoje, especificamente, não. Tudo parecia conspirar para o dia sombrio que eu estava vivendo, as ruas estavam desertas, as casas todas fechadas e o clima fechado, pesado.
- ... - ouvir a voz baixa dele me fez imaginar como se estivesse em uma dimensão alternativa, tentando voltar para casa, mas seu abraço me fez lembrar que era real e que, conforme disse John Green, a dor precisa ser sentida.
- É, acho que é hora de dar tchau - falei baixo, encarando meus próprios pés, assim que o vi guardar a última mala no porta malas, com o auxílio do pai, e este último entrar na casa e sair com a esposa, alguns minutos depois. vestia jeans, all star e xadrez, mas deveria ser preto, de acordo com sua expressão de velório, também.
- Sim - ele disse, também cabisbaixo, e colocou as mãos no bolso.
Era oficial, nenhum dos dois era bom com despedidas, talvez porque não quiséssemos nos despedir.
- , querido, vamos nos atrasar - a mãe dele disse, do banco do passageiro, de dentro do carro, fazendo-o olhar por cima dos ombros em sua direção e depois lançar o olhar mais triste que já vi em minha direção. Ele tinha lágrimas nos olhos, que poderiam rolar por seu rosto a qualquer momento, e eu uma parte de meu coração faltando.
Permitindo-se chorar, me abraçou. Minha vontade era de nunca mais soltá-lo, de prendê-lo ali, a mim, a aquele momento, pelo resto de nossas vidas, mas não pude.
- Que marica eu sou - ele disse me soltando e passando a mão pelo rosto, para secar as lágrimas.
- Chorar não faz de você um marica - tentei dar meu melhor sorriso, assim como ele tentou rir; ambos sem sucesso - Não quero dizer adeus - disse baixo, mais para mim do que para ele.
- Então não diga - ele tentou soar brincalhão, mas o clima mórbido não deixou - Dois anos passam rápido.
Dois anos, dois longos anos...
- ... - dessa vez uma voz mais grossa quem o chamou, era o pai dele.
Estava claro que nenhum de nós dois estava preparado para aquele momento, e ficou 'transparente' quando vi ele se virar e começar a caminhar em direção ao veículo. Então era assim? Ele iria embora sem dizer ao menos um tchau, tudo bem que ele não era bom com despedidas, nenhum de nós dois era, mas, ainda sim, eu queria ao menos um tchau descente. Foi então que ele pareceu acordar de um transe, se virou e correu de volta em minha direção.
- Te peguei - ele sorriu e me ergueu no ar, dando um beijo estalado em minha bochecha.
- Ai de você se tivesse entrado naquele carro... eu teria te perseguido até lá só para te dar uns tapas bem dados na cara - disse séria, assim que voltei ao chão.
- Ah é? Então deixa voltar para lá - ele se virou, como se fosse mesmo entrar no veículo, mas depois se voltou para mim - Não faria isso com você nunca, Sweet Heart, te amo demais para fazer algo do tipo - Amor... Ai, , se você soubesse o quanto eu te amo...
Então eu tenho uma lembrança, a carta, a bendita carta. Corro minha mão direita até o bolso e percebo que ela ainda está lá. Era a hora, se eu não a entregasse agora não entregaria nunca. Retiro ela do bolso do jeans, com o maior cuidado do mundo, e estendo para ele, com uma expressão indecifrável no rosto, era um misto de nervosismo, tristeza, incerteza e até... Arrependimento? Era a coisa certa a se fazer, ele precisava saber, não deveria me arrepender.
- O que é isso? - ele perguntou ao ver o pedaço de papel dobrado em minha mão, como era de se esperar.
- Uma coisa que você deve ler apenas quando chegar na França - ele arqueou uma das sobrancelhas, visivelmente confuso - Para você lembrar de mim.
- Eu nunca ia me esquecer de você mesmo, - ele me deu mais um abraço, seguindo de outro beijo estalado, assim que pegou o papel em minha mão e o guardou no bolso da calça.
Por alguma razão eu sabia que aquela finalmente era nossa despedida oficial, então tentei estender ao máximo o momento, antes que pudesse ver me soltar e entrar no carro, já em meio às lágrimas novamente. Ele deve ter pensado que sou uma insensível por não chorar, mas não sabe que só não chorei hoje porque ontem chorei por nós dois e o mundo todo; acho que poderia ter reabastecido o Cantareira com todas as minhas lágrimas.
- Eu vou viajar por uns dias, , mas saiba que vou te levar comigo para onde eu for. Se cuida! Chegando lá eu te ligo - disse pela janela do banco de trás, já dentro do carro, colocando a mão no ombro do pai em seguida, permitindo que ele finalmente desse partida no veículo.
Não me mexi. Me mantive no mesmo lugar enquanto via o veículo se deslocar, com ele no banco de trás entregue às lágrimas, por mais que minha vontade fosse correr atrás dele e dizer que o amava. Quando o carro finalmente dobrou a esquina foi que a minha ficha caiu. Meus joelhos fraquejaram, meus olhos ficaram embaçados, minhas mãos trêmulas, e logo me vi tentando correr até minha casa, enquanto as lágrimas já começavam a escorrer.
Entrei em casa e me permiti finalmente chorar. O buraco em meu peito era imensurável. Meus joelhos cederam totalmente e logo já estava ao chão chorando e me descabelando, enquanto procurava alguém a quem culpar.
Verdade é que poucas pessoas dão valor às coisas enquanto não as perdem, não se permitindo ser felizes enquanto podem. Não foi isso que aconteceu comigo e , eu sempre dei valor a sua companhia e presença em minha vida, mas sei que existem pessoas que possuem as pessoas que amam por perto e não aproveitam; e isso, para mim, não é amar alguém. Amar é querer estar perto, cuidar e ajudar a pessoa a quem se ama. Amar é necessitar da pessoa por perto, mesmo sem razão, é você gostar tanto de alguém e não saber o porquê. Amor... é isso que eu sinto pelo . Amor em todas as suas formas, jeitos e tamanhos.
Fecho meus olhos com força. A simples ideia de ter mais um dia com ele junto a mim vem a tona, me fazendo querer apelar a todos os santos, mas logo percebo que não será mais possível, a essa hora ele já deve estar embarcando.
A campainha toca. Não estou em condições estéticas e nem vontade de atender, então simplesmente a ignoro. Mas a pessoa deve estar realmente desesperada, pois ainda insiste, mesmo depois de me ouvir gritar "Vá embora!". Finalmente me levanto, depois de o maluco ter metido o dedo na campainha e ter feito-a tocar diversas vezes, e começo a caminhar em direção a porta, pronta para mandar aquele adorável ser humano para o quinto dos infernos.
Abro a porta. Para minha surpresa, não há nenhum 'filho da boa mãe' - para não dizer o contrário - e sim um visivelmente cansado, corado e desesperado.
- Aquilo tudo que eu li é verdade? - ele diz rápido, começando a respirar rápido logo em seguida. Sinto meu rosto empalidecer e minhas pernas bambearem, o desejo de nunca ter entregue aquela carta começa a me consumir, enquanto meu corpo parece ser sugado por um buraco no chão, logo abaixo dos meus pés. Preciso falar algo, mas estou em choque demais para esboçar qualquer outra reação.
- O que faz aqui? - me forço finalmente a dizer, esperando que ele não me lance a mesma pergunta novamente. Que entenda minha mudança desesperada de assunto como um sim, mas que não me cobre explicações, porque não quero dá-las - E a França?
- A França pode esperar - ele disse simplesmente, antes de dar um passo em minha direção e colar seus lábios nos meus. Fechei meus olhos instantaneamente. Se minhas preces foram atendidas, amém; se minha mente resolveu brincar comigo, a brincadeira estava boa demais para parar agora. A verdade era: eu estava beijando , por uma razão que transcendia a vontade e a necessidade, que parecia essencial à nossa existência.
Ainda me lembro perfeitamente daquele dia, o começo de tudo. Era para ser mais um dia qualquer, com aulas chatas e cansativas, que te fazem querer sair correndo pelo enorme portão de entrada e nunca mais voltar.
Talvez, bem lá no fundo, eu já imaginasse que isso viria a acontecer - Qual é? é o melhor aluno da classe-, apenas me recusava a aceitar. Não queria que ele se mudasse, não queria perder minha única companhia nas noites de sexta e sábado para festas regadas a álcool e mulheres seminuas. Ele era meu, e de mais ninguém. Sei que esse pensamento é egoísta demais, mas não posso evitá-lo.
Pensei na única explicação plausível para aquele meu drama todo e consegui apenas uma... ciúme. Eu estava com ciúme do meu melhor amigo, garoto que eu amo a um bom tempo, e, ainda por cima, por uma razão tão idiota como aquela (Que fique claro: idiota não era o fato de que ele iria embora e ficaria anos fora - isso era triste, é diferente - e sim o fato de que eu estava com ciúme de e da possibilidade dele me trocar por uma francesa sem banho e feia). Ele e eu éramos amigos desde a pré-escola, era óbvio que ele não me trocaria, ele não era tão louco assim.
Aquele dia tinha tudo para dar errado e nem, ao menos, havia começado. Deveriam ser por volta das vinte e três horas, horário de criança estar na cama, de acordo com a minha mãe, e tudo que eu conseguia fazer era me revirar na cama, me proibindo de dormir e permitir que o dia seguinte chegasse. Aquilo era loucura, eu sabia, não há meios de não permitir o dia seguinte de nascer; não meios que eu pudesse pagar naquele momento, com o pouco mais de dois reais que havia dentro da minha bolsa da faculdade. Eu não era mais nada, além de uma pobre estudante de Ciência da Computação, fadada a sofrer por amor.
Sim, amor. A não ser que houvesse outra palavra para definir o estágio seguinte da paixão, muito além da simples atração e do coração acelerado e borboletas no estômago, era isso que eu sentia por . Claro que tentei negar a mim mesma tal sentimento, assim como tento negar o fato de que metade de mim irá embora no vôo das 18:04 para Paris, mas foi mais forte que eu, e logo eu já havia perdido o controle sobre mim mesma em relação a isso.
Me levanto da cama, com a ideia de ir até o banheiro, ligar a banheira e me afogar nela, para que eu não precise estar viva amanhã, mas paro diante de minha escrivaninha e encaro, por alguns segundos, o papel e a caneta ali depositados. Eu precisava fazê-lo saber, precisava lhe dar uma razão para, ao menos, cogitar a hipótese de ficar, e a chance era aquela, bem diante de meus olhos.
Decidida a deixar minha prematura morte para mais tarde, caminhei até a mesa cinza, de gavetas pretas, e me sentei. Destapei a caneta e, como se minhas mãos tivessem vida própria, logo me vi escrevendo a primeira linha, com minha letra incrivelmente redonda e cheia de pernas que tanto fala bem:
“Querido ,
Antes que pudesse desejar-lhe boa viagem mais cedo, me vi obrigada a contar-lhe coisas que talvez você nunca saberia, se a vontade de lhe manter junto a mim para sempre não falasse mais alto agora.
Você pensará em mim aí na França, ? Espero que sim, pois, mesmo que eu possa vir a não querer, pensarei em você todo tempo, já que para cada lugar que olho, vejo seu sorriso, seu rosto.
Você já ouviu falar em amor, ? Aposto que já, afinal não era isso que você dizia sentir a cada 3 meses por uma garota diferente, me fazendo querer chorar por dias e dias até a dor em meu peito passar, ou você perceber que aquilo era somente atração física? Mas, sabe, , ao contrário das suas paixões 'duradouras', eu te amei, amo e vou te amar por muito tempo ainda. Talvez você nunca escute isso saindo da minha boca, afinal, sabe que sou tímida demais para isso, mas queria que soubesse disso agora que já não se pode mais voltar atrás.
Você está aí, na França, a 5841 milhas de distância, e eu aqui, em São Paulo, desejando voltar no tempo e te proibir de se inscrever nesse programa do governo, pois quem sabe assim poderíamos estar juntos agora.
A dor que sinto em meu peito nesse instante é, de longe, a dor mais forte que já senti em minha vida. Meus olhos estão vermelhos e sem mais lágrimas, minhas pupilas dilatas, meu rosto totalmente vermelho e meu coração dolorido, mas não apenas psicologicamente, como fisicamente. Ainda estou tentando entender o porquê de Deus fazer algo assim comigo. Sei que seria injusto demais para com você pedir para você ficar, mas saiba que, em meu interior, meu único desejo era de que você ficasse, pois só você seria capaz de arrancar as espadas contra mim transpassadas, que me corroem e dilaceram internamente, enquanto você não está por perto para ver, ou simplesmente não enxerga.
Não é óbvio, ? A garota que dizia que nunca iria se apegar a ninguém, para não sofrer, agora sofre pela única pessoa por quem se permitiu criar um laço dessa proporção. Sei que a culpa não é sua -talvez parte seja, mas não vem ao caso-, mas eu precisava passar para o papel o que estou sentindo e tudo que eu sinto nessa hora é dor. Dor por saber que, em meio aos sete bilhões de habitantes no mundo, o único que realmente importa está sendo arrancado de mim, sem qualquer tipo de anestesia. E, garanto a você, a dor é insuportável.
Para sempre sua,
"
"
Terminei de escrever deveria ser uma da manhã. O papel já quase não existia, tamanha a quantidade de lágrimas que derramei durante o processo; e a caneta já quase não parava em pé, devido às minhas mãos trêmulas.
Destaquei a folha do caderno, dobrei-a e a deixei no mesmo lugar, voltando para a cama e lá ficando até que o sono batesse e me fizesse sair do mar de lágrimas e mergulhar na escuridão.
Acordei por volta da uma da tarde, era sexta-feira e meus pais já haviam saído para trabalhar, com a promessa de voltarem mais cedo para me 'dar apoio nesse momento triste e difícil'. Meus olhos ainda estavam com reflexos da noite mal dormida e das horas de choro, meu rosto pálido e meus passos lentos; eu parecia uma morta viva, interna e externamente. Me arrastei para o chuveiro, com o clima de velório me rodeando por todos os lados e direções. Talvez, se meus pais se separassem, a dor não seria tão grande quanto essa - não que eu quisesse descobrir, é claro.
Saí do banho e tive a certeza de que, se nem a água conseguiria melhorar meu estado emocional, nada, nem ninguém, que não fosse vindo por parte dele ou ele, conseguiria.
Almocei, em silêncio, um copo de suco de laranja e depois voltei para o quarto. Ainda me restavam quatro horas.
Três.
Dois.
Nunca desejei tanto que as horas passassem devagar, mas não, elas tinham que voar. Era sempre assim, quando mais se quer que elas voem, elas se arrastam e vice versa. Nem o tempo estava ao meu lado nesse momento difícil mais...
Quando o relógio marcou quatro horas, tive certeza de que meu funeral estava próximo. Fazendo jus a isso, coloquei uma roupa com que desejaria que fosse enterrada e saí de casa, indo em direção à casa de , para dar adeus.
Adeus. Uma palavra, cinco letras e uma sensação de buraco negro se formando em meu peito. Nunca gostei dessa palavra, ainda mais agora. Dizer adeus, para mim, era como dizer que uma das pessoas estava para morrer e isso me causava arrepios. Mesmo que viesse a ser verdade, eu estava prestes a morrer mesmo, ainda sim a palavra não deixaria de ser assustadora aos meus ouvidos.
Avistar a casa de da esquina geralmente era motivo de alegria para mim, ainda mais quando ele estava na porta, como hoje, mas hoje, especificamente, não. Tudo parecia conspirar para o dia sombrio que eu estava vivendo, as ruas estavam desertas, as casas todas fechadas e o clima fechado, pesado.
- ... - ouvir a voz baixa dele me fez imaginar como se estivesse em uma dimensão alternativa, tentando voltar para casa, mas seu abraço me fez lembrar que era real e que, conforme disse John Green, a dor precisa ser sentida.
- É, acho que é hora de dar tchau - falei baixo, encarando meus próprios pés, assim que o vi guardar a última mala no porta malas, com o auxílio do pai, e este último entrar na casa e sair com a esposa, alguns minutos depois. vestia jeans, all star e xadrez, mas deveria ser preto, de acordo com sua expressão de velório, também.
- Sim - ele disse, também cabisbaixo, e colocou as mãos no bolso.
Era oficial, nenhum dos dois era bom com despedidas, talvez porque não quiséssemos nos despedir.
- , querido, vamos nos atrasar - a mãe dele disse, do banco do passageiro, de dentro do carro, fazendo-o olhar por cima dos ombros em sua direção e depois lançar o olhar mais triste que já vi em minha direção. Ele tinha lágrimas nos olhos, que poderiam rolar por seu rosto a qualquer momento, e eu uma parte de meu coração faltando.
Permitindo-se chorar, me abraçou. Minha vontade era de nunca mais soltá-lo, de prendê-lo ali, a mim, a aquele momento, pelo resto de nossas vidas, mas não pude.
- Que marica eu sou - ele disse me soltando e passando a mão pelo rosto, para secar as lágrimas.
- Chorar não faz de você um marica - tentei dar meu melhor sorriso, assim como ele tentou rir; ambos sem sucesso - Não quero dizer adeus - disse baixo, mais para mim do que para ele.
- Então não diga - ele tentou soar brincalhão, mas o clima mórbido não deixou - Dois anos passam rápido.
Dois anos, dois longos anos...
- ... - dessa vez uma voz mais grossa quem o chamou, era o pai dele.
Estava claro que nenhum de nós dois estava preparado para aquele momento, e ficou 'transparente' quando vi ele se virar e começar a caminhar em direção ao veículo. Então era assim? Ele iria embora sem dizer ao menos um tchau, tudo bem que ele não era bom com despedidas, nenhum de nós dois era, mas, ainda sim, eu queria ao menos um tchau descente. Foi então que ele pareceu acordar de um transe, se virou e correu de volta em minha direção.
- Te peguei - ele sorriu e me ergueu no ar, dando um beijo estalado em minha bochecha.
- Ai de você se tivesse entrado naquele carro... eu teria te perseguido até lá só para te dar uns tapas bem dados na cara - disse séria, assim que voltei ao chão.
- Ah é? Então deixa voltar para lá - ele se virou, como se fosse mesmo entrar no veículo, mas depois se voltou para mim - Não faria isso com você nunca, Sweet Heart, te amo demais para fazer algo do tipo - Amor... Ai, , se você soubesse o quanto eu te amo...
Então eu tenho uma lembrança, a carta, a bendita carta. Corro minha mão direita até o bolso e percebo que ela ainda está lá. Era a hora, se eu não a entregasse agora não entregaria nunca. Retiro ela do bolso do jeans, com o maior cuidado do mundo, e estendo para ele, com uma expressão indecifrável no rosto, era um misto de nervosismo, tristeza, incerteza e até... Arrependimento? Era a coisa certa a se fazer, ele precisava saber, não deveria me arrepender.
- O que é isso? - ele perguntou ao ver o pedaço de papel dobrado em minha mão, como era de se esperar.
- Uma coisa que você deve ler apenas quando chegar na França - ele arqueou uma das sobrancelhas, visivelmente confuso - Para você lembrar de mim.
- Eu nunca ia me esquecer de você mesmo, - ele me deu mais um abraço, seguindo de outro beijo estalado, assim que pegou o papel em minha mão e o guardou no bolso da calça.
Por alguma razão eu sabia que aquela finalmente era nossa despedida oficial, então tentei estender ao máximo o momento, antes que pudesse ver me soltar e entrar no carro, já em meio às lágrimas novamente. Ele deve ter pensado que sou uma insensível por não chorar, mas não sabe que só não chorei hoje porque ontem chorei por nós dois e o mundo todo; acho que poderia ter reabastecido o Cantareira com todas as minhas lágrimas.
- Eu vou viajar por uns dias, , mas saiba que vou te levar comigo para onde eu for. Se cuida! Chegando lá eu te ligo - disse pela janela do banco de trás, já dentro do carro, colocando a mão no ombro do pai em seguida, permitindo que ele finalmente desse partida no veículo.
Não me mexi. Me mantive no mesmo lugar enquanto via o veículo se deslocar, com ele no banco de trás entregue às lágrimas, por mais que minha vontade fosse correr atrás dele e dizer que o amava. Quando o carro finalmente dobrou a esquina foi que a minha ficha caiu. Meus joelhos fraquejaram, meus olhos ficaram embaçados, minhas mãos trêmulas, e logo me vi tentando correr até minha casa, enquanto as lágrimas já começavam a escorrer.
Entrei em casa e me permiti finalmente chorar. O buraco em meu peito era imensurável. Meus joelhos cederam totalmente e logo já estava ao chão chorando e me descabelando, enquanto procurava alguém a quem culpar.
Verdade é que poucas pessoas dão valor às coisas enquanto não as perdem, não se permitindo ser felizes enquanto podem. Não foi isso que aconteceu comigo e , eu sempre dei valor a sua companhia e presença em minha vida, mas sei que existem pessoas que possuem as pessoas que amam por perto e não aproveitam; e isso, para mim, não é amar alguém. Amar é querer estar perto, cuidar e ajudar a pessoa a quem se ama. Amar é necessitar da pessoa por perto, mesmo sem razão, é você gostar tanto de alguém e não saber o porquê. Amor... é isso que eu sinto pelo . Amor em todas as suas formas, jeitos e tamanhos.
Fecho meus olhos com força. A simples ideia de ter mais um dia com ele junto a mim vem a tona, me fazendo querer apelar a todos os santos, mas logo percebo que não será mais possível, a essa hora ele já deve estar embarcando.
A campainha toca. Não estou em condições estéticas e nem vontade de atender, então simplesmente a ignoro. Mas a pessoa deve estar realmente desesperada, pois ainda insiste, mesmo depois de me ouvir gritar "Vá embora!". Finalmente me levanto, depois de o maluco ter metido o dedo na campainha e ter feito-a tocar diversas vezes, e começo a caminhar em direção a porta, pronta para mandar aquele adorável ser humano para o quinto dos infernos.
Abro a porta. Para minha surpresa, não há nenhum 'filho da boa mãe' - para não dizer o contrário - e sim um visivelmente cansado, corado e desesperado.
- Aquilo tudo que eu li é verdade? - ele diz rápido, começando a respirar rápido logo em seguida. Sinto meu rosto empalidecer e minhas pernas bambearem, o desejo de nunca ter entregue aquela carta começa a me consumir, enquanto meu corpo parece ser sugado por um buraco no chão, logo abaixo dos meus pés. Preciso falar algo, mas estou em choque demais para esboçar qualquer outra reação.
- O que faz aqui? - me forço finalmente a dizer, esperando que ele não me lance a mesma pergunta novamente. Que entenda minha mudança desesperada de assunto como um sim, mas que não me cobre explicações, porque não quero dá-las - E a França?
- A França pode esperar - ele disse simplesmente, antes de dar um passo em minha direção e colar seus lábios nos meus. Fechei meus olhos instantaneamente. Se minhas preces foram atendidas, amém; se minha mente resolveu brincar comigo, a brincadeira estava boa demais para parar agora. A verdade era: eu estava beijando , por uma razão que transcendia a vontade e a necessidade, que parecia essencial à nossa existência.
FIM
Nota da autora: Sem nota.
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