Capítulo 38
O detalhe inesperado me fez dar um pequeno pulo em meu lugar e, consequentemente, desequilibrar a xícara de cima do pires, fazendo-a tombar para o lado e despejar uma grande quantidade de seu conteúdo quente em minhas coxas. Anestesiada pelo sentimento ruim que me tomou ao olhá-la no rosto e tê-la ainda nos observando, não consegui esboçar muita reação com a provável queimadura que acabei de levar.
Ela estava nos olhando juntos por quê? O que devia estar se passando na cabeça dela? Eu geralmente não me importava muito com o que se passava na cabeça de desconhecidos que me olhavam na rua; sempre pensei que talvez pudessem estar apenas me olhando mesmo, não necessariamente analisando e julgando. Porém, aquela situação era completamente diferente! Dafne sabia quem eu era, conhecia até mesmo minhas angústias e quase ficou sabendo do meu trauma com o meu pai. não tinha o direito de me expor a ela daquela maneira, visto que eu era a esposa dele e ele tinha me levado ao mesmo ambiente que sua amante!
Tudo bem, ele talvez não pensasse daquele modo em relação a nós três. Eu representava apenas uma mentira a ele. O relacionamento que deveria estar preocupado em expor era o que tinha com Dafne, mesmo que vivesse dizendo que não tinha nada com ela. Não entrava na minha cabeça que poderia não sentir nada em relação a ela. Dafne era linda, estava se formando na faculdade, tinha um emprego num lugar sofisticado e um bom cargo de liderança. Ela era tudo o que eu já tentei incessantemente ser na vida e sempre falhei em conseguir.
E os seios dela eram realmente bem maiores que os meus.
Quando vi, eu já marchava com rapidez para fora do café com minha bolsa em mãos. Como eu iria pra casa? Não sabia, talvez pudesse ir andando. No caminho, conseguiria xingar mentalmente e me desfazer daquele ódio interno. Pensei também em voltar para a lanchonete, completamente humilhada para pedir dinheiro emprestado para as minhas amigas. Nem sabia se era realmente uma boa ideia fazê-lo; elas com certeza estranhariam o meu estado emocional e iriam querer saber o motivo de eu estar tão furiosa em ter visto a amante de . Eu não saberia responder, visto que nem eu mesma estava entendendo o que sentia naquele momento.
— ! — senti meu braço ser puxado e me virei, encontrando-o tão confuso quanto eu.
Me arrependi tanto de ter ido atrás dele, me meti numa confusão que nem consegui participar por muito tempo, fui covarde e saí correndo como um filhote assustado. Era ridículo! Eu devia ter ficado, agido de acordo com nossa farsa e com maturidade. Bom, pelo visto eu não era tão madura quanto pensava, aquela birra sem sentido estava me fazendo parecer uma louca! Como daquela vez no carro, por que eu não podia simplesmente não me importar com o fato de que tinha uma “namorada”? Eu não deveria reagir daquele jeito.
Aliás, eu não deveria reagir de jeito nenhum!
— O que foi? Se queimou? Vamos lá ver se está tudo bem — ele puxou-me pela mão em direção ao meio-fio. O trânsito estava a todo vapor por estar se aproximando do horário de pico. O semáforo estava amarelo, indicando que logo poderíamos atravessar em segurança.
— Não, eu vou embora — murmurei, tentando me soltar. Porém, se aproximou e procurou meu olhar.
Eu sentia minhas coxas molhadas. Estava tão estressada que nem me importei com o fato de que parecia que eu tinha me urinado toda. Dafne devia achar que o peso todo do chifre estava afetando minha coordenação motora.
— Não, espera — tocou meu rosto, fazendo-me instintivamente olhar de canto de olho para a cafeteria. Pelo vidro, vi Chace nos olhar preocupado enquanto falava com o funcionário que limpava o banco. Levei a mão ao rosto. Que vergonha, meu pai! — Me diga o que foi, quer conversar, é isso? Veio atrás de mim pra isso?
Suspirei, sentindo-me sufocada, agoniada. Eu sabia que tinha prometido a ele que tentaria ser mais aberta e falar sobre o que sentia. Mas, naquela situação, eu não achava uma boa ideia falar nada, justamente porque envolvia . Fora que, assim que meu marido me lembrou do motivo que me fez procurá-lo, uma enorme vontade de chorar me atingiu.
— Eu vim porque… — respirei fundo, abaixando meu olhar, envergonhada do que falaria a seguir. — Estou sem dinheiro, preciso ir pra casa e não tenho dinheiro para o táxi. Você sabe, dependo de você pra ir embora, por isso não ando com dinheiro na bolsa e…
— Tudo bem, te dou o dinheiro.
Pisquei algumas vezes, a fim de dissipar as lágrimas acumuladas na minha linha d’água.
— Você não está bem — ele afirmou, mas neguei com a cabeça, sentindo seu polegar acariciar minha bochecha. Evitei seu olhar penoso. Ultimamente, eu andava sendo frágil demais diante de , e mesmo que ele não fosse mais um inimigo, eu ainda me sentia estranha ao me deparar com seu acolhimento. — Vamos, não vou te deixar ir sem que se acalme primeiro.
O sinal fechou e atravessamos na faixa de pedestres. foi praticamente me guiando enquanto eu apenas me concentrava em mover as pernas.
Não queria ir com ele, não queria conversar, não queria expor meus pensamentos. Eu tinha a suspeita de que tudo soaria ainda mais ridículo se eu falasse em voz alta. Estava tentando guardar para mim, afinal, as coisas em relação ao eram completamente secretas para todo mundo ao meu redor. Eu não sentia que poderia falar com ninguém sobre aquilo, nem mesmo com Fanny, muito menos com Anne. Eu temia que elas interpretassem erroneamente.
— Boa tarde — cumprimentou os homens que entraram conosco na grande lata de metal. Me enfiei num canto longe dele, sendo separada pelos corpos grandes dos três engravatados presos ali junto de nós.
Seus olhos verdes me observavam mesmo a distância. Remexi-me incomodada, peguei o celular na bolsa e resolvi fuçá-lo durante aqueles minutos que pareceram uma eternidade. No quinto andar, entraram mais duas pessoas; no sexto, saiu um dos caras. Ao entrar no aplicativo de mensagens, me deparei com a última conversa que tive com Tom.
“Desculpe pela visita inesperada, queria te ver.”
Me lembrei do dia em que considerei aceitar seu convite, e não apenas lhe dizer que iríamos e enrolá-lo para que ele desistisse de vez. Talvez o jeito como eu estava me sentindo era apenas causado pelo fato de estar conseguindo ter um “relacionamento” durante aquela farsa, enquanto eu apenas dormi com um cara uma única vez. Se eu tentasse sair, me distrair com outro, talvez não me sentiria tão em desvantagem assim.
Digitei uma mensagem rápida para Tom:
“Oi, Tom! Tudo bem? Está livre esse fim de semana? Pensei no convite para jantar daquele dia.”
Não percebi quando a porta se abriu e estávamos apenas nós dois lá dentro. Saí acompanhada, dando de cara com Jordyn sentada em sua mesa. A loira sorriu abertamente quando me viu, olhando estranho para minha calça molhada. Mais uma mulher com quem tinha dormido; se eu fosse encontrar todas num dia só, faltaria tempo.
Adentrei a sala espaçosa e muito bem decorada de , pensando que, estranhamente, ela devia ser maior que o kitnet que eu morava antes. Dei passos lentos, ainda olhando em volta, antes de ser guiada por ele para o sofá escuro que havia ali.
— Quero ver a queimadura… — ainda de pé, levou as mãos ao cós da minha calça jeans, fazendo-me dar um pulo para trás, afastando-o.
— Não, eu estou bem! — esbravejei. Eu tinha milhões de motivos para começar a chorar naquele exato momento, e aquele chá derramado era a coisa mais insignificante da história inteira.
— Então me diga o que há de errado — ele deu um passo à frente, fazendo-me recuar.
Eu não conseguia entender. Já era a segunda vez que eu sabia que tinha estado no mesmo ambiente que Dafne e eu não conseguia deixá-lo me tocar ou se conectar comigo de alguma forma. Ele virava um desconhecido para mim. Era como se se tornasse um outro homem quando me lembrava que mantinha um relacionamento com outra. Como se o que estava em casa comigo, o cara que dormia ao meu lado todas as noites, me beijava e tocava não tivesse outra com quem dividir suas atenções.
Era esquisito demais! Parecia que eu estava tão imersa naquela fantasia de casados que estava estranhando como as coisas mudavam na realidade.
— Você disse que iria se abrir, . Me disse para não te afastar quando estivesse com problemas, e agora está fazendo o mesmo comigo. Vamos conversar sobre o que está te afligindo!
Respirei fundo, encarando-o exasperada. Ele tinha razão, não adiantava eu cobrar algo dele se não fazia a minha parte. E também, não tinha culpa alguma naquela minha confusão mental.
Mas, ao mesmo tempo, ele era o principal culpado dela! Por que tinha que ser tão carinhoso, cuidadoso e tão sexy?! Eu ficava confusa quando nada na realidade se parecia com nossa fantasia dentro de casa. Estava começando a ficar preocupada com a dependência que aquilo estava me causando, pior! Se eu abdicasse de trabalhar para ficar com em casa, ficaria louca, completamente imersa naquele casamento de mentira e sem nenhuma fuga para a realidade.
— Quer saber o que está acontecendo? — ofeguei, rindo sem humor. — Então vamos lá, . Eu acabei de ser mandada embora, estou sem dinheiro para pegar um simples táxi e não sei o que vou fazer agora, se deixo em casa morrendo de saudades para voltar a trabalhar ou se fico com ela. Além disso, tem o fato da sua amante estar naquela merda de cafeteria morrendo de rir da corna aqui, que não percebeu a hora que o maridinho inventou de nos enfiar juntas no mesmo ambiente. O chá na minha perna não está ardendo, , minha cara está depois de passar tanta merda numa única manhã que pensei que seria tranquila quando pisei os pés pra fora de casa.
Ele piscou algumas vezes, provavelmente impressionado com o fluxo de palavras que saiu da minha boca em pouquíssimos segundos, de tão puta da vida que eu estava.
— Dafne não está rindo de você.
Levei a mão ao rosto, furiosa. Era sério que ele iria defendê-la? Não parecia ser possível.
— Ela ficou preocupada com você.
— Ah, claro, ela é tão madura, não é mesmo? — Dafne claramente era bem mais velha que eu, uma pirralha de vinte anos. — Imagino que ela não deve nem dormir à noite de preocupação depois de sentar em você a noite inteira. Conta outra, ! — bufei, já com o coração acelerando na base do ódio.
— Espera, está com ciúmes dela?
Eu era uma pessoa da paz, completamente contra a violência, mas estava pedindo por um soco muito bem dado na cara só para quebrar seus dentes e desmanchar seu sorrisinho idiota.
— Mas é claro que não, seu idiota — neguei, mas seu sorriso cresceu e minha raiva aumentou. Lá vinha ele de novo com aquela baboseira de ciúmes. — Só não gostei de ser exposta dessa forma pra sua amante gostosona. Já não bastava ter dito a ela que eu tinha problemas com o meu pai, ainda tinha que me levar no trabalho dela? — resmunguei, jogando na cara, vendo-o desmanchar o sorrisinho e assentir sem graça.
— Me desculpe, eu não tinha pensado por esse lado. Quando te vi chorando na rua, a única coisa que se passou pela minha cabeça foi te levar para dentro.
Vi sinceridade em seu semblante. Olhei-o ainda carrancuda, de braços cruzados. Me senti um pouco mal por tê-lo feito se sentir culpado por tentar fazer algo legal por mim. Quando se tratava de me acolher, ele não media esforços, e isso eu tinha que reconhecer. Deixei-o se aproximar e pegar meu rosto, trazendo-me para perto.
— Você também é gostosona — arqueou as sobrancelhas, envolvendo-me em seus braços. “Também”. — Aliás, acho que até prefiro você…
— Mentiroso — tentei me desvencilhar de seu toque. riu, negando com a cabeça.
“Me preferia”, como era ridículo! Se preferisse, não a procuraria! Ele mesmo dizia que não tinha nada com ela. Não seria difícil desfazer laços com Dafne, visto que sempre foi super desapegado quando o assunto era mulheres. Fazia tempo que ele se encontrava com a amante, aliás, se me preferisse, não precisaria de nenhuma outra mulher.
Pensar aquilo me deixou ainda mais inquieta do que eu já estava. Se ele não precisasse de outras além de mim, logo… ficaríamos juntos?
Não!
Que ideia estúpida! Aquilo não existia! O combinado era ter algo casual com ele, transar só porque era gostoso, e funcionávamos bem juntos na cama. Aliás, a ideia inicial era só que nos casássemos, mas acho que se perdeu um pouco após vermos que conseguíamos ser duas pessoas civilizadas um do lado do outro. Mas aquela era a única coisa que tinha mudado desde que nos casamos, somente nossa amizade; de resto, tudo deveria estar intacto na cabeça de ambos como no início.
— Não sei o que você entende como preferência, mas definitivamente não é o que o resto do mundo pensa — ri de escárnio, andando para longe dele, que vinha querendo me envolver em seus braços, achando que estaria tudo bem quando me desse carinho e me fizesse esquecer o que eu estava pensando.
Eu não esqueceria. Fazia dias que tinha aquele assunto na cabeça.
— Do que está falando, afinal? — ele franziu o cenho, deixando-me ainda mais brava.
Eu não sabia o quanto achava aquela situação toda tranquila, porque, naquele momento, me parecia que ele não estava se importando nem um pouco com o fato de ter duas mulheres para si. Nem ao menos demonstrava se preocupar em nos administrar, o que, tratando-se de um homem, era algo esperado, até.
Aliás, que péssima administração. Se administrasse a empresa como fazia ao se dividir para nós duas, os já teriam declarado falência há tempos! Eu sabia dela e ela de mim. Demorei um pouco para reconhecê-la; porém, Dafne soube quem eu era no momento em que pôs os olhos em mim.
Já que estava tão empenhado em normalizar aquela situação com Dafne, falando sobre ela e até mesmo nos deixando juntas no mesmo ambiente, pois bem, nós falaríamos sobre Dafne! Eu não aguentava mais aquele incômodo me entalado na garganta.
— Do seu cinismo, , é disso que estou falando — acusei, impaciente. — Diz que me prefere, mas é Dafne quem você exibe por aí, levando-a em restaurantes e cafés. É pra ela que você se arruma e se perfuma todo pra sair. , você desliga o celular e literalmente para o mundo aqui fora só pra poder passar a noite inteira com ela na cama. Poupe-me das suas mentiras, .
Eu sabia que estava sendo rancorosa em ter guardado todas aquelas situações anteriores até ali para juntá-las e jogá-las em sua cara tudo de uma vez. Tinha consciência de que estava parecendo uma criança birrenta, mas eu estava magoada! Não admitiria que brincasse comigo daquele jeito e viesse com sua boa lábia para tentar me convencer de que eu não deveria ligar para o fato de ele me usar como estepe.
Quando, na verdade, eu sabia que estava certa. E apesar de não ter direito algum de reivindicar posição nenhuma em sua vida, eu ainda me sentia traída daquela forma ridícula.
— Ah, então é por isso que está brava.
Olhei para ele de canto de olho, de braços cruzados. Do que diabos estava falando daquela vez?
— Você quer que eu te leve pra sair, é isso? — perguntou. Respirei fundo, controlando o ódio que me tomava.
Sim, eu queria ser levada para jantar, ser paparicada, elogiada, amada, mas queria que fosse real. Estava há tanto tempo solteira. Meu último relacionamento me deixou tão machucada quando acabou que a única coisa que eu queria era ter alguém fazendo o que nem meu ex nem cara nenhum jamais me fez na vida. Tá, me tratava muito bem, me satisfazia e muito na cama, até me elogiava e consolava, mas tudo fazia parte de um teatro.
Queria poder ter aquilo na realidade.
Como se me ouvisse chamá-lo em pensamento, Tom fez meu celular vibrar no bolso de trás da calça. Peguei o aparelho, já desbloqueando-o.
— Eu te levo pra jantar, .
Desviei meus olhos da tela para encará-lo sorrindo, como se tudo fosse se resolver num passe de mágica com aquela simples ideia que ele acha que teve sozinho.
— Onde quer ir, hum? — envolveu minha cintura, enquanto eu ainda o encarava, confusa demais para tentar esboçar alguma reação que não demonstrasse a mágoa que estava sentindo dentro do peito.
— Eu não deveria ter que te pedir pra me levar para sair — murmurei, engolindo aquela maré de sentimentos ruins num gole só. Voltei a encarar o celular e li a resposta de Tom, que, como eu previa, pararia uma cirurgia no meio se precisasse, só para me atender ou me levar para sair. — Aliás, nem precisa. Eu já tenho alguém pra me levar a um encontro num restaurante lindo e elegante.
levantou as sobrancelhas, encarando-me de forma desafiadora.
— Com certeza vou me empenhar em estar deslumbrante para ser a melhor companhia do mundo para Tom — esforcei-me para fazer cara de paisagem, apesar de, dentro de mim, um grande sorriso lutava para querer ficar à mostra em meus dentes.
— O Tom, ? Justo o Tom? — se afastou de imediato, como se o incômodo que sentiu fosse passar daquela forma. Não passava, eu sabia bem daquilo.
Respirando audivelmente, ele levou uma das mãos ao cabelo e puxou os fios castanhos em pura impaciência. Me deleitei com a cena de vê-lo sentir na pele o que eu vinha sentindo há muito tempo.
— Ah, mas não se preocupe, . É claro que eu também prefiro você a ele — abanei o ar, sorrindo cinicamente.
— Claro que me prefere a ele, só o beijou uma vez na vida! — seu rosto estava vermelho de raiva. Ver com aquela carinha de bravo fez até minha calcinha umedecer. Que delicia sua voz ficava quando ele a impunha daquela forma.
Principalmente quando ele estava puto por conta de Tom.
Ah, era música para os meus ouvidos, a mais sensual de todas.
— Nem sabe se aquele velhote é bom de cama — desdenhou, fazendo-me arfar com sua suposição. poderia odiar Tom o quanto fosse, mas era impossível aquele homem gostoso não saber satisfazer uma mulher na cama. Seria um desperdício muito grande à humanidade.
— É isso que eu vou descobrir — lhe lancei um sorriso fechado. me encarou, possesso, apenas fazendo meu prazer se multiplicar.
Se soubesse que poderia irritá-lo tanto quanto ele me irritava quando falava de Dafne, apenas citando Tom, o teria feito muito antes.
— , não pode fazer isso, não pode ir pra cama com ele.
— E por que não? Hã? Eu por acaso fico escolhendo com quem você transa ou deixa de transar? — o enfrentei, erguendo meu queixo a fim de compensar a nossa diferença de altura. não me respondeu, apenas bufou em frustração. — Me diga, . Me dê um motivo plausível que justifique esse show todo que está dando. Se for algo coerente, eu não saio com ele — desafiei, já sabendo que não existia nenhum.
não queria que eu saísse com Tom porque iria ferir seu orgulho, até porque ter transado comigo era sua vantagem na competição idiota que ambos mantinham desde o primeiro dia em que se viram. Eu poderia me vangloriar daquele fato, afinal, eram dois homens gostosos brigando por mim; porém, o fato de saber que fazia aquilo em prol do próprio ego só me deixava ainda mais magoada.
— Porque… porque é isso o que ele quer, afinal! Quer só te levar pra cama para depois ficar se vangloriando por aí.
Eu não poderia reclamar daquilo. Afinal, se eu desse para aquele deus grego também me vangloriaria para Fanny e Annelise.
— E daí? Contanto que ele não exponha nossa mentira, eu não me importo com o que ele vai fazer com essa informação, . Estou sozinha há meses, mereço ter um encontro com um cara legal, me sentir viva de alguma forma!
— Você não está sozinha, !
Franzi o cenho diante de sua resposta exasperada. Me calei diante dele, esperando-o terminar aquela frase, porque não era possível que não havia mais de onde saiu aquilo. Tinha que ter uma continuação para fazer sentido. Meu coração ansiou por aquilo, uma explicação.
— Você tem a mim — soltou vacilante, quase como um sussurro.
— Não, . Eu não te tenho, nem você a mim — neguei com a cabeça, já sentindo-a latejar com aquela bagunça de fluxos de pensamentos transitando dentro dela. O corpo também deu sinais de cansaço, afinal, eram muitas ações e sentidos coexistindo dentro dele naquele exato momento.
Sei que já lhe disse que era sua uma vez, e, talvez no momento em que falei, realmente senti aquilo. Porém, não era tão simples quanto parecia quando estávamos na cama, com os corpos nus colados e escondidos do resto do mundo. Lá fora era tudo tão complicado.
Minhas energias estavam acabando, e também devia estar se cansando de discutir algo que não mudaria em nada a nossa situação. As coisas eram como eram. E mesmo que um de nós – ou ambos – não estivessem satisfeitos, era daquele modo que tinha que acontecer desde o início. Aquele era o combinado.
— As coisas que dizemos… são da boca pra fora, não são? Fazem parte do teatro — falei e ele suspirou, olhando para os próprios pés antes de assentir com a cabeça. Aquele era um teatro sem espectadores, quase um ensaio dentro da coxia, longe dos olhos do público. Ainda era estranho ter que dividir tudo aquilo. — Você não pode me pedir isso, . Não é justo comigo. Se eu não sou o suficiente e você quer sair com Dafne, tudo bem, vá em frente… Não estava tudo bem, não, mas eu não poderia fazer nada em relação àquilo. Por mais que quisesse impedi-lo de ir vê-la, não o faria. era livre para fazer o que quisesse.
— Você é o suficiente, mais que o suficiente, — suas mãos grandes envolveram minhas bochechas, trazendo-me para perto. Fechei os olhos assim que senti seus lábios virem de encontro aos meus. Suspirei audivelmente.
Não, eu não era.
Eu sentia que era quando estávamos juntos, imersos em prazer. Quando ele me encarava com seus olhos verdes intensos e me beijava lentamente. Quando me despia, causando arrepios indescritíveis com seu toque firme, eu sentia que era a única mulher da sua vida.
Mas a discrepância com a realidade fazia tudo aquilo parecer apenas uma mera fantasia.
— Então por que continua a procurá-la? — franzi o cenho, enfezada. — O que estava fazendo no trabalho dela agora há pouco, ?
— Eu paro de vê-la — assegurou-me, ansioso. — Se me prometer desistir de sair com Tom, eu deixo Dafne.
— Não, ! É injusto! Você já saiu com ela, transou, abraçou, beijou, já esteve com ela por várias vezes!
Era muito fácil simplesmente abrir mão de algo que já se aproveitou livremente. E outra, quem iria me garantir que ele pararia mesmo de vê-la? Eu não iria viver numa paranoia de mulher traída o tempo todo, ainda mais sabendo que não era meu marido de verdade.
— Me deixe ter a minha vez.
— Tudo bem, então — ele não me pareceu nada bem. me deu as costas, pegando o celular em cima da mesa, o desbloqueou evitando meu olhar. — Vou pedir seu táxi.
Sorri sem humor, prevendo que ele não se viraria para me olhar de qualquer forma. praticamente me mandou embora.
Sua voz soou estranha, mais baixa que o normal. Ele ficou daquela forma, de costas para mim por algum tempo. Fui até o sofá pegar minha bolsa e me sentei num dos cantos do estofado escuro. Quando finalmente me deixou ver seu rosto, o semblante que havia ali era de total indiferença. Engoli em seco, disfarçando ao mexer no meu celular, a fim de tentar não ligar para aquele clima de merda que ficou entre nós.
Quanto mais próximos ficávamos, pior saíamos das brigas que antigamente não seriam nada para ambos por conta do costume e do ódio mútuo.
— Ele já está chegando, acho melhor ir descendo — murmurou, ainda encostado na própria mesa, evitando me olhar.
— Obrigada, depois eu te pago — respondi, incomodada em ter ido pedir dinheiro a ele e estar indo embora daquela forma. Deveria mesmo ter ido a pé ou dado um outro jeito. Levantei-me, coloquei a alça longa da bolsa em meu ombro e me preparei para deixar a sala.
— Não precisa disso, você sabe — ele disse e eu assenti, mordendo meu lábio a fim de disfarçar meu nervosismo. — Até mais, .
— Tchau, — forcei um sorriso e saí porta afora, lembrando-me de fazer cara de paisagem ao passar pela mesa de Jordyn.
Para a secretária, eu e meu marido não teríamos motivos para brigas; afinal, éramos casados há pouco tempo e tínhamos o relacionamento perfeito. Acenei para ela e fui apressada até o elevador por onde subi anteriormente.
Engoli em seco quando as portas se abriram, revelando aquela caixa de metal completamente vazia. Dei meia-volta, soltando um risinho nervoso para a loira que me acompanhou curiosa com os olhos. Dei algumas batidas na porta de , que atendeu e me encarou confuso.
— Esqueceu algo?
Troquei o peso do meu corpo de uma perna para a outra, desconfortável.
— Você poderia, sabe, descer comigo lá embaixo? — indiquei o elevador atrás de mim. — É que eu tenho medo de ir só… — encolhi os ombros, vendo-o me olhar de cima de seu um metro e oitenta e suspirar, derrotado.
Ele sempre cedia quando eu lhe pedia algo. Aquela era a coisa que mais me surpreendia no que estava conhecendo após aquele casamento: o modo como cuidava de mim. Lembrei-me de quando ele me disse, visivelmente exausto, do quanto estava cansado de me ouvir lhe dizendo não. Pensei na proposta que me foi feita há pouco, na sala dele.
Eu disse não de novo. Ele cederia caso eu lhe pedisse aquilo também? Ficaria longe de Dafne? Bom, eu não tinha uma resposta certa para aquelas perguntas, e diante de um sim incerto e que poderia me acarretar arrependimentos futuros, eu manteria o meu não sem saber como seria se realmente tudo desse certo.
— Jordyn, vou ali embaixo rápido. Se Chace chegar, mande-o entrar, sim?
— Tudo bem, Sr. — ela acenou novamente para mim, fazendo-me imitá-la enquanto o elevador voltava a subir para nos buscar.
Entrei acompanhada dele, respirando aliviada assim que a porta se fechou e o senti se movimentar. Apesar do frio na barriga que me dava, ter ali me passava uma certa segurança. Que funcionário iria querer se responsabilizar por um acidente envolvendo o filho do dono da empresa? Sabia que se qualquer coisa acontecesse àquele elevador, iriam fazer de tudo para consertá-lo em tempo recorde.
Encostei-me numa das paredes laterais e suspirei audivelmente, sentindo frio e incomodada pelo silêncio dele. Meses atrás eu imploraria para que ele calasse a boca e simplesmente evitasse olhar em meu rosto. Mas, naquele momento, eu só queria que ele olhasse para mim e falasse comigo, porque eu não estava me sentindo bem sabendo que estava bravo por uma coisa que eu nem ao menos queria fazer.
Não sentia vontade de aceitar aquele convite de Tom; o fiz porque estava com raiva de , com raiva de toda a situação que envolvia ele e Dafne. Eu queria causar nele o que ele tinha me causado, lhe dar uma lição. Por mais estranheza que sua indiferença pudesse me causar naquele momento, eu precisava fazer aquilo. Tinha que tentar manter meu orgulho a salvo.
Três andares abaixo, as portas se abriram, fazendo-me desencostar de onde estava e finalmente tendo os olhos verdes de sobre mim, mas não pelas razões que eu queria. Infelizmente, ele não era o único homem de olhos de esmeraldas ali dentro. As portas se fecharam, deixando um clima que pesava toneladas no ar. Joseph esticou o braço à frente do rosto, checando as horas no relógio ao fingir que não nos enxergava. se aproximou, tocando-me com a lateral de seu braço.
Espiei-o de canto de olho, tendo uma ideia ridícula e infantil demais para uma adulta que já era mãe.
Sorri e me virei pra ele, deslizando uma das mãos de seu peito até o ombro, fazendo-lhe um cafuné na nuca, prostrando-me diante de seu corpo tenso vestido naquele blazer escuro. O encarei intensivamente, tentando fazê-lo entender o que eu queria fazer. me olhou, tentou ficar sério ao entender o recado e entrou no embalo, provavelmente já sentindo a raiva se esvair de si.
fazia tudo o que eu pedia, não disse? Sabia que ele não resistiria à oportunidade de enfurecer o pai. Queria ver se Joseph conseguiria continuar fingindo que não nos via ali.
Envolvi seu pescoço com meus braços, aproximando o rosto do seu e chocando meu nariz com o dele. Desferi um selinho em seus lábios e afastei-me ligeiramente para olhá-lo nos olhos.
Sabia que talvez aquele beijo mixuruca poderia passar longe de ser uma provocação efetiva se se tratasse de uma outra pessoa. Seria muito mais ousado se nos beijássemos como quando transávamos, quando as línguas se enroscavam e disputavam território na boca um do outro. Seria escandaloso se ele deslizasse aquele par de mãos deliciosas em minha bunda ou tocasse meus seios como só ele fazia.
Porém, tratando-se de Joseph, nada, nem a cena mais depravada da face da Terra, o incomodaria mais do que nos ver agir como um casal comum, felizes por estarem juntos. Nada soaria mais assustador a ele do que ver que a família que ele mais queria destruir estava intacta.
— O que vai querer comer no jantar hoje? — perguntei, quando suas mãos grandes envolveram meus quadris. Um friozinho me atingiu a barriga, trazendo uma sensação gostosa.
Seus lábios curvaram-se num sorrisinho sacana e seus olhos verdes ficaram mais escuros, devido à luxúria que os tomou.
Nem olhei para o lado para checar se Joseph nos observava ou não. Não consegui desviar meus olhos dos dele. Era como uma espécie de hipnose maluca, que me fazia entrar num transe bizarro mesmo de olhos bem abertos.
— Você — ele sussurrou ao pé do meu ouvido e mordeu o lóbulo, me causando um arrepio instantâneo. Encolhi os ombros, soltando uma risadinha junto dele.
Ok, talvez quisesse adicionar um pouco de depravação ao teatro. Típico dele.
— Bobo — mordi seu lábio e beijei sua boca devagar, tendo sua língua enroscando-se com a minha como num abraço aconchegante.
O elevador sinalizou que tinha chegado ao térreo e nos obrigou a desgrudar nossos corpos. Suspirei, ainda envolvendo seu pescoço quente com meus braços.
— Vou indo, lindo — selei seus lábios. — Te amo.
riu fraco, apertando minha cintura.
Ah, o “eu te amo” era pra fechar com chave de ouro. Admito que naquele momento me vi tentada em saber a reação de Joseph. Será que as câmeras pegaram direitinho? Pagaria pra ver cada mínimo frame da cara dele.
— Também te amo, amor.
Me soltei de suas mãos grandes, deixei o elevador e apenas senti o vento frio do corpo de Joseph passando ao meu lado como um furacão.
Ri sarcástica ao assisti-lo marchar para fora do saguão do prédio, enquanto eu não me preocupava em andar com aquela pressa toda. Ser demitida me deu aquela sensação – apesar de estar triste e com a cabeça cheia de problemas e preocupações, eu agora tinha a liberdade de não precisar correr para nada. Aquele foi o primeiro resquício de alívio que senti em relação a tudo aquilo. E esperava que não fosse o único, porque eu ainda sentia que algo estava errado.
— .
Assim que me aproximei do meio-fio, fui em direção ao homem asiático que desembarcou do táxi estacionado ali. Joseph surgiu à minha frente com sua mala gigante, já empurrando a alça para baixo e tirando-a do chão para entregá-la ao taxista, para que ele pudesse colocá-la no porta-malas do carro amarelo.
Franzi o cenho. tinha me dito que o motorista que me levaria embora já estava chegando.
— — Joseph largou a mala no chão, fazendo o barulho do impacto me causar um risinho completamente espontâneo. Acenei com a cabeça, ainda sob o olhar mortífero do engravatado ao meu lado.
Deliciei-me ao vê-lo absolutamente puto da vida ao perceber que eu tinha me apossado de seu sobrenome de merda. Tinha certeza que ele estava vivenciando seu pior pesadelo ao ver a filha da sua ex-empregada doméstica de anos sendo priorizada em algo diante dos seus olhos.
— Boa tarde, senhorita — o homem simpático abriu a porta para mim. Adentrei o veículo e, enquanto ele dava a volta para retornar ao banco do motorista, ouvi batidinhas no vidro da janela.
Pressionei o botão e dei de cara com Joseph, que, vermelho de ódio, abaixou-se para me encarar mais de perto com seus olhos verdes raivosos. Fiz cara de paisagem, limitando-me a apenas levantar as sobrancelhas num questionamento mudo: o que será que ele queria comigo a ponto de me abordar às pressas daquela forma?
— Só pra te avisar — mordi minha bochecha por dentro, afetada com seu tom de voz e tentando canalizar o que senti. — Acho melhor você começar a se despedir do meu sobrenome, porque tenho certeza que meu filho não vai durar com você.
Oito meses, Joseph, oito meses.
Cerrei meus punhos em ira ao pensar na felicidade que ele sentiria quando eu me divorciasse de . Seria tudo o que ele mais queria na vida se realizando. Não suportava a ideia de lhe proporcionar felicidade de forma alguma.
— Eu sou o pai dele, o conheço desde que veio a este mundo, e é nítido que você não passa de diversão para .
Soltei um riso desacreditado. Joseph estava me dizendo o que eu já sabia. Mal imaginava ele que e eu não tínhamos intenção alguma de sermos reais.
— Ele vai se cansar logo de brincar de casinha, de te sustentar e de levar essa vida pacata de pai sendo tão jovem. Meu filho não é assim, e muito menos escolheria viver preso a uma mulher do seu nível — seu olhar queimou sobre a estampa da lanchonete em meu uniforme.
Engoli com muito custo o choro que me subiu à garganta, mas não era de mágoa, era puramente raiva. Um ódio tão profundo que eu podia jurar que nunca tinha sentido na minha vida. Nem mesmo , que já chegou a sair nos tapas comigo na infância, jamais me inspirou tantos sentimentos ruins como aquele homem estava fazendo naquele instante.
Joseph não sabia o que e eu fazíamos juntos quando estávamos entre quatro paredes, nem em público. Não fazia ideia do quanto nos ajudávamos, da família maravilhosa que conseguimos formar mesmo em meio a tantas coisas ruins acontecendo à nossa volta. Ele jamais entenderia o que sentia por , o quanto ele adorava ser o pai dela.
Ser sustentada? Mulher do seu nível? Quem aquele velho desgraçado achava que era para falar aquelas coisas de mim? Ele nem ao menos me conhecia! Me acompanhar de longe ao longo do meu crescimento não lhe dava o direito de me julgar como se soubesse algo da minha vida e do meu caráter!
— Quando se cansar, sabe que estarei aqui por ele — Joseph continuou. “Do mesmo jeito que esteve para Grace?”, pensei. — Estarei aqui com todos os privilégios que ele tinha antes de querer estragar a própria vida com esse casamento de merda.
Privilégios? realmente não mentiu quando disse que o pai só ligava para aparências – não que eu algum dia cheguei a duvidar daquilo! Não! Mas por um momento só consegui parar um pouco para enxergá-lo em sua mais pura mediocridade ali, perdendo seu precioso tempo só para tentar me atingir de alguma forma. Ele era muito pior do que achava.
— Deve ser mesmo muito triste viver todos esses anos sem saber qual a sensação de amar e ser amado — sorri, encarando-o inconformada. Como alguém poderia ser tão podre daquele jeito? Me embrulhava o estômago. — Vamos indo, por favor? — me direcionei ao motorista, já pressionando de volta o botão que subiu o vidro na cara de Joseph, que continuou plantado no meio-fio, encarando-me como se pudesse me matar com seu olhar.
Se no mundo dele as aparências eram o que contavam, decidi então respondê-lo com algo que seus olhos gananciosos desconheciam e, pelo visto, jamais teriam a oportunidade de presenciar: um sentimento, algo que não se podia apalpar ou colocar preços. Joseph ficaria horas pensando no que eu lhe disse, morto de curiosidade para saber do que eu falava. Ele viveria um martírio ao perceber que não era algo que seu dinheiro comprava e que ele jamais teria acesso sendo do jeito que era. Nada deixava alguém como ele mais puto do que ser excluído, impotente diante de algo que suas mãos não alcançariam.
Em contrapartida, eu infelizmente também levei suas palavras comigo no trajeto que fiz até em casa. Segurei-me dentro do táxi, recebendo olhares demorados pelo retrovisor do homem que dirigia à frente, provavelmente fazendo comentários consigo mesmo sobre tudo o que tinha acabado de ouvir. Que constrangedor, ser humilhada daquela forma na frente de um desconhecido.
Sabia que não deveria deixá-lo me afetar daquela forma, afinal, aquela era sua intenção explícita. Porém, foi inevitável. Era irônico como ele pareceu adivinhar o que me afligia anteriormente. Quando pedi o dinheiro do táxi para , me senti insuficiente. Meu orgulho me sufocou a ponto de eu quase não conseguir falar. Pensar que as coisas poderiam mudar e eu teria que ficar pedindo mais a ele me amedrontava.
Era algo que eu sentia, dentro de mim, porém não tinha parado para pensar no externo, até porque deixei claro para todos que conhecemos após o casamento que eu trabalhava em busca de ter meu próprio dinheiro. Mas depois do que Joseph disse, comecei a pensar no que os outros iriam falar. Eu não queria ser conhecida por ser a mulher que é sustentada pelo marido.
Desbloqueei meu celular, abri o aplicativo do banco e perguntei ao taxista quanto tinha ficado a corrida. Ele estranhou a pergunta, porque já tinha pago em seu cartão de crédito quando o chamou; porém, insisti em saber a resposta e transferi o valor informado para a conta de .
Não seria a mulher que Joseph insinuou que eu era.
Cheguei em casa e não encontrei ninguém por lá. Dei falta do carrinho de bebê e imaginei que Elisabeta tinha levado para o parque que ficava dentro do condomínio. O dia estava bonito, o céu bem azul com um sol gostoso para dar uma caminhada. Apesar do meu estado de espírito se igualar a um dia nublado ou a uma tempestade tenebrosa, não pude deixar de olhar para o céu por alguns instantes antes de fechar as cortinas do quarto e tirar minha calça, enfiando-me debaixo dos cobertores na cama.
O tempo que passei ali foi de muita, mas muita reflexão. Pensei sobre tudo, tomei decisões e voltei atrás logo depois. Caí num sono profundo quando não tive mais nada para chorar. Eu estava tão confusa! E odiava não saber o que fazer, não ter controle do que sentia e fazia. Apesar de saber que não temos controle de nada na vida, ainda me cobrava muito naquele aspecto.
Despertei um tempo depois, ouvindo um cantarolar ao fundo antes que pudesse abrir os olhos e encarar o quarto meio escuro, por conta da claridade que vinha da porta do banheiro aberta. Claro, era com sua voz rouca e afinada. Respirei fundo levando o braço até meus olhos e pensando no que faria naquele momento.
Eu tinha que preparar o jantar, claro, tomar um banho antes, depois ficar com e ir dormir, acordar de madrugada para dar sua mamadeira e checar sua fralda, já que era o meu dia e depois, quando amanhecesse… Bom, eu não sabia mais o que faria.
— Vou acender a luz — avisou, fazendo-me tirar o braço do rosto e piscar algumas vezes para me acostumar com a claridade. — Tudo bem?
Encarei parado diante da cama, com apenas uma toalha branca enrolada nos quadris e esfregando outra em seus cabelos castanhos úmidos. Me mantive calada, fazendo-me a pergunta que ele tinha acabado de fazer.
Meu marido sentou-se na beira da cama. Sua mão se aproximou do meu rosto e ele encostou o dorso na minha testa, passando para fazer o mesmo na curva do meu pescoço, como minha mãe faria caso eu parecesse doente.
— Está quente. Vamos medir sua temperatura — ele se levantou, foi até a cômoda em frente à cama e voltou com o termômetro digital.
— Eu estou bem — minha voz saiu fraca, minhas pálpebras estavam pesadas. Talvez tivesse algo a ver com o fato de eu ter chorado metade daquele dia inteiro.
— Vamos só conferir — ele puxou a coberta do meu tronco e colocou o aparelho debaixo do meu braço, por dentro do meu uniforme da lanchonete. — Está deitada há quanto tempo? Elisabeta nem te viu chegar.
Não respondi. Eu sabia que estive ali tempo demais, enfurnada naquele quarto debaixo das cobertas no calor que fazia e sem reproduzir um ruído sequer, como se eu tivesse sumido da face da Terra por algumas horas.
Seu olhar de preocupação me fez ficar calada.
— Por que me devolveu o dinheiro, ?
Desviei o olhar, não sabendo se valia a pena mesmo compartilhar as merdas que ouvi do pai dele. suspirou e me encarou, cansado. Provavelmente Joseph tinha razão em dizer que ele logo se cansaria, mas não era nem do casamento, era da minha teimosia. Felizmente, já tinha sido avisado por mim que eu era complicada de lidar, e também sabia que se livraria disso em apenas oito meses.
O aparelho apitou, salva pelo gongo. enfiou a mão dentro da minha camiseta e analisou o resultado de cenho franzido. Ee estava parecendo um pai de verdade, só faltou o óculos de armação genérica.
— Trinta e seis graus — deixou o aparelho no móvel ao lado da cama, voltando suas atenções para mim.
— Eu disse que estava bem — cruzei os braços, evitando seu olhar mais uma vez.
— Não respondeu minha pergunta — ele apoiou uma das mãos ao lado do meu corpo, se debruçando sobre mim. Inalei sem querer o cheiro gostoso do seu shampoo. — Te transferi de volta, o dinheiro é seu.
Assenti, ponderando. Joseph não poderia me chamar de escorada só por alguns trocados, não é?
— Por que mudou de ideia? — perguntou.
Apertei meu próprio corpo no cruzar de braços mais forte, decidindo contar logo a ele. Como mesmo disse ontem, não conseguíamos mais esconder nada um do outro de qualquer forma.
— Seu pai, . Seu pai falou um monte de merda pra mim quando saímos da empresa — murmurei, emburrada. Ele não ficou surpreso, apenas assentiu e me esperou continuar. — Disse que eu não passava de uma diversão pra você, que você não iria querer me sustentar por muito tempo — senti minha voz embargar por um momento, mas disfarcei. — Que logo se cansaria de mim e dessa vida de pai… Enfim, finalizou dizendo que te conhecia e que você não iria querer viver com uma mulher do meu nível.
— Não dê ouvidos a ele, . Meu pai não sabe de nada — inclinou-se, beijando minha bochecha. Ri sem humor, inconformada.
Sabia que eu deveria fazer aquilo mesmo. Também sabia que tinha que deixar para lá o que aconteceu naquela cafeteria, já que nós dois tivemos aquela conversa intensa e cheia de dedos apontados e incômodos. Mas eu não consegui evitar o pensamento que me atingiu à cabeça enquanto segurava-me para não desabar em choro no banco de trás daquele carro.
— Não, , sabe o que me irrita? É que ele olhou pro meu uniforme com tanto desprezo… Foi como se eu fosse inferior só por ser uma garçonete! — e nem aquilo eu era mais. Se Joseph soubesse que eu era uma desempregada, me detonaria de vez. — Fico pensando se fosse uma outra mulher a se casar com você. Se fosse Dafne, por exemplo, que é uma gerente quase formada em psicologia e provavelmente não é filha de uma empregada… ele se sentiria no poder de ofendê-la do jeito que fez comigo?
— , o que meu pai acha ou deixa de achar não importa. Foi com você com quem me casei e fim de história — ele pegou meu rosto, olhando-me no fundo dos olhos.
— Mesmo sendo uma mentira, dói ouvir certas coisas.
— Eu sei, te conheço — acariciou-me e sorriu fraco. — Sendo mentira, meia-mentira, verdade… não importa — aproximou-se, juntando nossas testas. — Você continua sendo minha esposa. Você. , não Dafne e nenhuma outra.
Sua boca grudou-se na minha. Senti sua respiração bater contra meus lábios molhados quando nos separamos minimamente.
“Não importa.”
— Prove — selei seus lábios. — Prove que realmente não importa — ofeguei ao senti-lo envolver meu quadril com suas mãos firmes. — Prove que sou sua preferida, que faço seu coração acelerar, que te deixo louco…
mordiscou meu lábio com força.
— O que quer que eu faça para te provar?
Suspirei sob seu desejo latente, incendiando-me aos poucos.
— Faça amor comigo.
Ela estava nos olhando juntos por quê? O que devia estar se passando na cabeça dela? Eu geralmente não me importava muito com o que se passava na cabeça de desconhecidos que me olhavam na rua; sempre pensei que talvez pudessem estar apenas me olhando mesmo, não necessariamente analisando e julgando. Porém, aquela situação era completamente diferente! Dafne sabia quem eu era, conhecia até mesmo minhas angústias e quase ficou sabendo do meu trauma com o meu pai. não tinha o direito de me expor a ela daquela maneira, visto que eu era a esposa dele e ele tinha me levado ao mesmo ambiente que sua amante!
Tudo bem, ele talvez não pensasse daquele modo em relação a nós três. Eu representava apenas uma mentira a ele. O relacionamento que deveria estar preocupado em expor era o que tinha com Dafne, mesmo que vivesse dizendo que não tinha nada com ela. Não entrava na minha cabeça que poderia não sentir nada em relação a ela. Dafne era linda, estava se formando na faculdade, tinha um emprego num lugar sofisticado e um bom cargo de liderança. Ela era tudo o que eu já tentei incessantemente ser na vida e sempre falhei em conseguir.
E os seios dela eram realmente bem maiores que os meus.
Quando vi, eu já marchava com rapidez para fora do café com minha bolsa em mãos. Como eu iria pra casa? Não sabia, talvez pudesse ir andando. No caminho, conseguiria xingar mentalmente e me desfazer daquele ódio interno. Pensei também em voltar para a lanchonete, completamente humilhada para pedir dinheiro emprestado para as minhas amigas. Nem sabia se era realmente uma boa ideia fazê-lo; elas com certeza estranhariam o meu estado emocional e iriam querer saber o motivo de eu estar tão furiosa em ter visto a amante de . Eu não saberia responder, visto que nem eu mesma estava entendendo o que sentia naquele momento.
— ! — senti meu braço ser puxado e me virei, encontrando-o tão confuso quanto eu.
Me arrependi tanto de ter ido atrás dele, me meti numa confusão que nem consegui participar por muito tempo, fui covarde e saí correndo como um filhote assustado. Era ridículo! Eu devia ter ficado, agido de acordo com nossa farsa e com maturidade. Bom, pelo visto eu não era tão madura quanto pensava, aquela birra sem sentido estava me fazendo parecer uma louca! Como daquela vez no carro, por que eu não podia simplesmente não me importar com o fato de que tinha uma “namorada”? Eu não deveria reagir daquele jeito.
Aliás, eu não deveria reagir de jeito nenhum!
— O que foi? Se queimou? Vamos lá ver se está tudo bem — ele puxou-me pela mão em direção ao meio-fio. O trânsito estava a todo vapor por estar se aproximando do horário de pico. O semáforo estava amarelo, indicando que logo poderíamos atravessar em segurança.
— Não, eu vou embora — murmurei, tentando me soltar. Porém, se aproximou e procurou meu olhar.
Eu sentia minhas coxas molhadas. Estava tão estressada que nem me importei com o fato de que parecia que eu tinha me urinado toda. Dafne devia achar que o peso todo do chifre estava afetando minha coordenação motora.
— Não, espera — tocou meu rosto, fazendo-me instintivamente olhar de canto de olho para a cafeteria. Pelo vidro, vi Chace nos olhar preocupado enquanto falava com o funcionário que limpava o banco. Levei a mão ao rosto. Que vergonha, meu pai! — Me diga o que foi, quer conversar, é isso? Veio atrás de mim pra isso?
Suspirei, sentindo-me sufocada, agoniada. Eu sabia que tinha prometido a ele que tentaria ser mais aberta e falar sobre o que sentia. Mas, naquela situação, eu não achava uma boa ideia falar nada, justamente porque envolvia . Fora que, assim que meu marido me lembrou do motivo que me fez procurá-lo, uma enorme vontade de chorar me atingiu.
— Eu vim porque… — respirei fundo, abaixando meu olhar, envergonhada do que falaria a seguir. — Estou sem dinheiro, preciso ir pra casa e não tenho dinheiro para o táxi. Você sabe, dependo de você pra ir embora, por isso não ando com dinheiro na bolsa e…
— Tudo bem, te dou o dinheiro.
Pisquei algumas vezes, a fim de dissipar as lágrimas acumuladas na minha linha d’água.
— Você não está bem — ele afirmou, mas neguei com a cabeça, sentindo seu polegar acariciar minha bochecha. Evitei seu olhar penoso. Ultimamente, eu andava sendo frágil demais diante de , e mesmo que ele não fosse mais um inimigo, eu ainda me sentia estranha ao me deparar com seu acolhimento. — Vamos, não vou te deixar ir sem que se acalme primeiro.
O sinal fechou e atravessamos na faixa de pedestres. foi praticamente me guiando enquanto eu apenas me concentrava em mover as pernas.
Não queria ir com ele, não queria conversar, não queria expor meus pensamentos. Eu tinha a suspeita de que tudo soaria ainda mais ridículo se eu falasse em voz alta. Estava tentando guardar para mim, afinal, as coisas em relação ao eram completamente secretas para todo mundo ao meu redor. Eu não sentia que poderia falar com ninguém sobre aquilo, nem mesmo com Fanny, muito menos com Anne. Eu temia que elas interpretassem erroneamente.
— Boa tarde — cumprimentou os homens que entraram conosco na grande lata de metal. Me enfiei num canto longe dele, sendo separada pelos corpos grandes dos três engravatados presos ali junto de nós.
Seus olhos verdes me observavam mesmo a distância. Remexi-me incomodada, peguei o celular na bolsa e resolvi fuçá-lo durante aqueles minutos que pareceram uma eternidade. No quinto andar, entraram mais duas pessoas; no sexto, saiu um dos caras. Ao entrar no aplicativo de mensagens, me deparei com a última conversa que tive com Tom.
“Desculpe pela visita inesperada, queria te ver.”
Me lembrei do dia em que considerei aceitar seu convite, e não apenas lhe dizer que iríamos e enrolá-lo para que ele desistisse de vez. Talvez o jeito como eu estava me sentindo era apenas causado pelo fato de estar conseguindo ter um “relacionamento” durante aquela farsa, enquanto eu apenas dormi com um cara uma única vez. Se eu tentasse sair, me distrair com outro, talvez não me sentiria tão em desvantagem assim.
Digitei uma mensagem rápida para Tom:
“Oi, Tom! Tudo bem? Está livre esse fim de semana? Pensei no convite para jantar daquele dia.”
Não percebi quando a porta se abriu e estávamos apenas nós dois lá dentro. Saí acompanhada, dando de cara com Jordyn sentada em sua mesa. A loira sorriu abertamente quando me viu, olhando estranho para minha calça molhada. Mais uma mulher com quem tinha dormido; se eu fosse encontrar todas num dia só, faltaria tempo.
Adentrei a sala espaçosa e muito bem decorada de , pensando que, estranhamente, ela devia ser maior que o kitnet que eu morava antes. Dei passos lentos, ainda olhando em volta, antes de ser guiada por ele para o sofá escuro que havia ali.
— Quero ver a queimadura… — ainda de pé, levou as mãos ao cós da minha calça jeans, fazendo-me dar um pulo para trás, afastando-o.
— Não, eu estou bem! — esbravejei. Eu tinha milhões de motivos para começar a chorar naquele exato momento, e aquele chá derramado era a coisa mais insignificante da história inteira.
— Então me diga o que há de errado — ele deu um passo à frente, fazendo-me recuar.
Eu não conseguia entender. Já era a segunda vez que eu sabia que tinha estado no mesmo ambiente que Dafne e eu não conseguia deixá-lo me tocar ou se conectar comigo de alguma forma. Ele virava um desconhecido para mim. Era como se se tornasse um outro homem quando me lembrava que mantinha um relacionamento com outra. Como se o que estava em casa comigo, o cara que dormia ao meu lado todas as noites, me beijava e tocava não tivesse outra com quem dividir suas atenções.
Era esquisito demais! Parecia que eu estava tão imersa naquela fantasia de casados que estava estranhando como as coisas mudavam na realidade.
— Você disse que iria se abrir, . Me disse para não te afastar quando estivesse com problemas, e agora está fazendo o mesmo comigo. Vamos conversar sobre o que está te afligindo!
Respirei fundo, encarando-o exasperada. Ele tinha razão, não adiantava eu cobrar algo dele se não fazia a minha parte. E também, não tinha culpa alguma naquela minha confusão mental.
Mas, ao mesmo tempo, ele era o principal culpado dela! Por que tinha que ser tão carinhoso, cuidadoso e tão sexy?! Eu ficava confusa quando nada na realidade se parecia com nossa fantasia dentro de casa. Estava começando a ficar preocupada com a dependência que aquilo estava me causando, pior! Se eu abdicasse de trabalhar para ficar com em casa, ficaria louca, completamente imersa naquele casamento de mentira e sem nenhuma fuga para a realidade.
— Quer saber o que está acontecendo? — ofeguei, rindo sem humor. — Então vamos lá, . Eu acabei de ser mandada embora, estou sem dinheiro para pegar um simples táxi e não sei o que vou fazer agora, se deixo em casa morrendo de saudades para voltar a trabalhar ou se fico com ela. Além disso, tem o fato da sua amante estar naquela merda de cafeteria morrendo de rir da corna aqui, que não percebeu a hora que o maridinho inventou de nos enfiar juntas no mesmo ambiente. O chá na minha perna não está ardendo, , minha cara está depois de passar tanta merda numa única manhã que pensei que seria tranquila quando pisei os pés pra fora de casa.
Ele piscou algumas vezes, provavelmente impressionado com o fluxo de palavras que saiu da minha boca em pouquíssimos segundos, de tão puta da vida que eu estava.
— Dafne não está rindo de você.
Levei a mão ao rosto, furiosa. Era sério que ele iria defendê-la? Não parecia ser possível.
— Ela ficou preocupada com você.
— Ah, claro, ela é tão madura, não é mesmo? — Dafne claramente era bem mais velha que eu, uma pirralha de vinte anos. — Imagino que ela não deve nem dormir à noite de preocupação depois de sentar em você a noite inteira. Conta outra, ! — bufei, já com o coração acelerando na base do ódio.
— Espera, está com ciúmes dela?
Eu era uma pessoa da paz, completamente contra a violência, mas estava pedindo por um soco muito bem dado na cara só para quebrar seus dentes e desmanchar seu sorrisinho idiota.
— Mas é claro que não, seu idiota — neguei, mas seu sorriso cresceu e minha raiva aumentou. Lá vinha ele de novo com aquela baboseira de ciúmes. — Só não gostei de ser exposta dessa forma pra sua amante gostosona. Já não bastava ter dito a ela que eu tinha problemas com o meu pai, ainda tinha que me levar no trabalho dela? — resmunguei, jogando na cara, vendo-o desmanchar o sorrisinho e assentir sem graça.
— Me desculpe, eu não tinha pensado por esse lado. Quando te vi chorando na rua, a única coisa que se passou pela minha cabeça foi te levar para dentro.
Vi sinceridade em seu semblante. Olhei-o ainda carrancuda, de braços cruzados. Me senti um pouco mal por tê-lo feito se sentir culpado por tentar fazer algo legal por mim. Quando se tratava de me acolher, ele não media esforços, e isso eu tinha que reconhecer. Deixei-o se aproximar e pegar meu rosto, trazendo-me para perto.
— Você também é gostosona — arqueou as sobrancelhas, envolvendo-me em seus braços. “Também”. — Aliás, acho que até prefiro você…
— Mentiroso — tentei me desvencilhar de seu toque. riu, negando com a cabeça.
“Me preferia”, como era ridículo! Se preferisse, não a procuraria! Ele mesmo dizia que não tinha nada com ela. Não seria difícil desfazer laços com Dafne, visto que sempre foi super desapegado quando o assunto era mulheres. Fazia tempo que ele se encontrava com a amante, aliás, se me preferisse, não precisaria de nenhuma outra mulher.
Pensar aquilo me deixou ainda mais inquieta do que eu já estava. Se ele não precisasse de outras além de mim, logo… ficaríamos juntos?
Não!
Que ideia estúpida! Aquilo não existia! O combinado era ter algo casual com ele, transar só porque era gostoso, e funcionávamos bem juntos na cama. Aliás, a ideia inicial era só que nos casássemos, mas acho que se perdeu um pouco após vermos que conseguíamos ser duas pessoas civilizadas um do lado do outro. Mas aquela era a única coisa que tinha mudado desde que nos casamos, somente nossa amizade; de resto, tudo deveria estar intacto na cabeça de ambos como no início.
— Não sei o que você entende como preferência, mas definitivamente não é o que o resto do mundo pensa — ri de escárnio, andando para longe dele, que vinha querendo me envolver em seus braços, achando que estaria tudo bem quando me desse carinho e me fizesse esquecer o que eu estava pensando.
Eu não esqueceria. Fazia dias que tinha aquele assunto na cabeça.
— Do que está falando, afinal? — ele franziu o cenho, deixando-me ainda mais brava.
Eu não sabia o quanto achava aquela situação toda tranquila, porque, naquele momento, me parecia que ele não estava se importando nem um pouco com o fato de ter duas mulheres para si. Nem ao menos demonstrava se preocupar em nos administrar, o que, tratando-se de um homem, era algo esperado, até.
Aliás, que péssima administração. Se administrasse a empresa como fazia ao se dividir para nós duas, os já teriam declarado falência há tempos! Eu sabia dela e ela de mim. Demorei um pouco para reconhecê-la; porém, Dafne soube quem eu era no momento em que pôs os olhos em mim.
Já que estava tão empenhado em normalizar aquela situação com Dafne, falando sobre ela e até mesmo nos deixando juntas no mesmo ambiente, pois bem, nós falaríamos sobre Dafne! Eu não aguentava mais aquele incômodo me entalado na garganta.
— Do seu cinismo, , é disso que estou falando — acusei, impaciente. — Diz que me prefere, mas é Dafne quem você exibe por aí, levando-a em restaurantes e cafés. É pra ela que você se arruma e se perfuma todo pra sair. , você desliga o celular e literalmente para o mundo aqui fora só pra poder passar a noite inteira com ela na cama. Poupe-me das suas mentiras, .
Eu sabia que estava sendo rancorosa em ter guardado todas aquelas situações anteriores até ali para juntá-las e jogá-las em sua cara tudo de uma vez. Tinha consciência de que estava parecendo uma criança birrenta, mas eu estava magoada! Não admitiria que brincasse comigo daquele jeito e viesse com sua boa lábia para tentar me convencer de que eu não deveria ligar para o fato de ele me usar como estepe.
Quando, na verdade, eu sabia que estava certa. E apesar de não ter direito algum de reivindicar posição nenhuma em sua vida, eu ainda me sentia traída daquela forma ridícula.
— Ah, então é por isso que está brava.
Olhei para ele de canto de olho, de braços cruzados. Do que diabos estava falando daquela vez?
— Você quer que eu te leve pra sair, é isso? — perguntou. Respirei fundo, controlando o ódio que me tomava.
Sim, eu queria ser levada para jantar, ser paparicada, elogiada, amada, mas queria que fosse real. Estava há tanto tempo solteira. Meu último relacionamento me deixou tão machucada quando acabou que a única coisa que eu queria era ter alguém fazendo o que nem meu ex nem cara nenhum jamais me fez na vida. Tá, me tratava muito bem, me satisfazia e muito na cama, até me elogiava e consolava, mas tudo fazia parte de um teatro.
Queria poder ter aquilo na realidade.
Como se me ouvisse chamá-lo em pensamento, Tom fez meu celular vibrar no bolso de trás da calça. Peguei o aparelho, já desbloqueando-o.
— Eu te levo pra jantar, .
Desviei meus olhos da tela para encará-lo sorrindo, como se tudo fosse se resolver num passe de mágica com aquela simples ideia que ele acha que teve sozinho.
— Onde quer ir, hum? — envolveu minha cintura, enquanto eu ainda o encarava, confusa demais para tentar esboçar alguma reação que não demonstrasse a mágoa que estava sentindo dentro do peito.
— Eu não deveria ter que te pedir pra me levar para sair — murmurei, engolindo aquela maré de sentimentos ruins num gole só. Voltei a encarar o celular e li a resposta de Tom, que, como eu previa, pararia uma cirurgia no meio se precisasse, só para me atender ou me levar para sair. — Aliás, nem precisa. Eu já tenho alguém pra me levar a um encontro num restaurante lindo e elegante.
levantou as sobrancelhas, encarando-me de forma desafiadora.
— Com certeza vou me empenhar em estar deslumbrante para ser a melhor companhia do mundo para Tom — esforcei-me para fazer cara de paisagem, apesar de, dentro de mim, um grande sorriso lutava para querer ficar à mostra em meus dentes.
— O Tom, ? Justo o Tom? — se afastou de imediato, como se o incômodo que sentiu fosse passar daquela forma. Não passava, eu sabia bem daquilo.
Respirando audivelmente, ele levou uma das mãos ao cabelo e puxou os fios castanhos em pura impaciência. Me deleitei com a cena de vê-lo sentir na pele o que eu vinha sentindo há muito tempo.
— Ah, mas não se preocupe, . É claro que eu também prefiro você a ele — abanei o ar, sorrindo cinicamente.
— Claro que me prefere a ele, só o beijou uma vez na vida! — seu rosto estava vermelho de raiva. Ver com aquela carinha de bravo fez até minha calcinha umedecer. Que delicia sua voz ficava quando ele a impunha daquela forma.
Principalmente quando ele estava puto por conta de Tom.
Ah, era música para os meus ouvidos, a mais sensual de todas.
— Nem sabe se aquele velhote é bom de cama — desdenhou, fazendo-me arfar com sua suposição. poderia odiar Tom o quanto fosse, mas era impossível aquele homem gostoso não saber satisfazer uma mulher na cama. Seria um desperdício muito grande à humanidade.
— É isso que eu vou descobrir — lhe lancei um sorriso fechado. me encarou, possesso, apenas fazendo meu prazer se multiplicar.
Se soubesse que poderia irritá-lo tanto quanto ele me irritava quando falava de Dafne, apenas citando Tom, o teria feito muito antes.
— , não pode fazer isso, não pode ir pra cama com ele.
— E por que não? Hã? Eu por acaso fico escolhendo com quem você transa ou deixa de transar? — o enfrentei, erguendo meu queixo a fim de compensar a nossa diferença de altura. não me respondeu, apenas bufou em frustração. — Me diga, . Me dê um motivo plausível que justifique esse show todo que está dando. Se for algo coerente, eu não saio com ele — desafiei, já sabendo que não existia nenhum.
não queria que eu saísse com Tom porque iria ferir seu orgulho, até porque ter transado comigo era sua vantagem na competição idiota que ambos mantinham desde o primeiro dia em que se viram. Eu poderia me vangloriar daquele fato, afinal, eram dois homens gostosos brigando por mim; porém, o fato de saber que fazia aquilo em prol do próprio ego só me deixava ainda mais magoada.
— Porque… porque é isso o que ele quer, afinal! Quer só te levar pra cama para depois ficar se vangloriando por aí.
Eu não poderia reclamar daquilo. Afinal, se eu desse para aquele deus grego também me vangloriaria para Fanny e Annelise.
— E daí? Contanto que ele não exponha nossa mentira, eu não me importo com o que ele vai fazer com essa informação, . Estou sozinha há meses, mereço ter um encontro com um cara legal, me sentir viva de alguma forma!
— Você não está sozinha, !
Franzi o cenho diante de sua resposta exasperada. Me calei diante dele, esperando-o terminar aquela frase, porque não era possível que não havia mais de onde saiu aquilo. Tinha que ter uma continuação para fazer sentido. Meu coração ansiou por aquilo, uma explicação.
— Você tem a mim — soltou vacilante, quase como um sussurro.
— Não, . Eu não te tenho, nem você a mim — neguei com a cabeça, já sentindo-a latejar com aquela bagunça de fluxos de pensamentos transitando dentro dela. O corpo também deu sinais de cansaço, afinal, eram muitas ações e sentidos coexistindo dentro dele naquele exato momento.
Sei que já lhe disse que era sua uma vez, e, talvez no momento em que falei, realmente senti aquilo. Porém, não era tão simples quanto parecia quando estávamos na cama, com os corpos nus colados e escondidos do resto do mundo. Lá fora era tudo tão complicado.
Minhas energias estavam acabando, e também devia estar se cansando de discutir algo que não mudaria em nada a nossa situação. As coisas eram como eram. E mesmo que um de nós – ou ambos – não estivessem satisfeitos, era daquele modo que tinha que acontecer desde o início. Aquele era o combinado.
— As coisas que dizemos… são da boca pra fora, não são? Fazem parte do teatro — falei e ele suspirou, olhando para os próprios pés antes de assentir com a cabeça. Aquele era um teatro sem espectadores, quase um ensaio dentro da coxia, longe dos olhos do público. Ainda era estranho ter que dividir tudo aquilo. — Você não pode me pedir isso, . Não é justo comigo. Se eu não sou o suficiente e você quer sair com Dafne, tudo bem, vá em frente… Não estava tudo bem, não, mas eu não poderia fazer nada em relação àquilo. Por mais que quisesse impedi-lo de ir vê-la, não o faria. era livre para fazer o que quisesse.
— Você é o suficiente, mais que o suficiente, — suas mãos grandes envolveram minhas bochechas, trazendo-me para perto. Fechei os olhos assim que senti seus lábios virem de encontro aos meus. Suspirei audivelmente.
Não, eu não era.
Eu sentia que era quando estávamos juntos, imersos em prazer. Quando ele me encarava com seus olhos verdes intensos e me beijava lentamente. Quando me despia, causando arrepios indescritíveis com seu toque firme, eu sentia que era a única mulher da sua vida.
Mas a discrepância com a realidade fazia tudo aquilo parecer apenas uma mera fantasia.
— Então por que continua a procurá-la? — franzi o cenho, enfezada. — O que estava fazendo no trabalho dela agora há pouco, ?
— Eu paro de vê-la — assegurou-me, ansioso. — Se me prometer desistir de sair com Tom, eu deixo Dafne.
— Não, ! É injusto! Você já saiu com ela, transou, abraçou, beijou, já esteve com ela por várias vezes!
Era muito fácil simplesmente abrir mão de algo que já se aproveitou livremente. E outra, quem iria me garantir que ele pararia mesmo de vê-la? Eu não iria viver numa paranoia de mulher traída o tempo todo, ainda mais sabendo que não era meu marido de verdade.
— Me deixe ter a minha vez.
— Tudo bem, então — ele não me pareceu nada bem. me deu as costas, pegando o celular em cima da mesa, o desbloqueou evitando meu olhar. — Vou pedir seu táxi.
Sorri sem humor, prevendo que ele não se viraria para me olhar de qualquer forma. praticamente me mandou embora.
Sua voz soou estranha, mais baixa que o normal. Ele ficou daquela forma, de costas para mim por algum tempo. Fui até o sofá pegar minha bolsa e me sentei num dos cantos do estofado escuro. Quando finalmente me deixou ver seu rosto, o semblante que havia ali era de total indiferença. Engoli em seco, disfarçando ao mexer no meu celular, a fim de tentar não ligar para aquele clima de merda que ficou entre nós.
Quanto mais próximos ficávamos, pior saíamos das brigas que antigamente não seriam nada para ambos por conta do costume e do ódio mútuo.
— Ele já está chegando, acho melhor ir descendo — murmurou, ainda encostado na própria mesa, evitando me olhar.
— Obrigada, depois eu te pago — respondi, incomodada em ter ido pedir dinheiro a ele e estar indo embora daquela forma. Deveria mesmo ter ido a pé ou dado um outro jeito. Levantei-me, coloquei a alça longa da bolsa em meu ombro e me preparei para deixar a sala.
— Não precisa disso, você sabe — ele disse e eu assenti, mordendo meu lábio a fim de disfarçar meu nervosismo. — Até mais, .
— Tchau, — forcei um sorriso e saí porta afora, lembrando-me de fazer cara de paisagem ao passar pela mesa de Jordyn.
Para a secretária, eu e meu marido não teríamos motivos para brigas; afinal, éramos casados há pouco tempo e tínhamos o relacionamento perfeito. Acenei para ela e fui apressada até o elevador por onde subi anteriormente.
Engoli em seco quando as portas se abriram, revelando aquela caixa de metal completamente vazia. Dei meia-volta, soltando um risinho nervoso para a loira que me acompanhou curiosa com os olhos. Dei algumas batidas na porta de , que atendeu e me encarou confuso.
— Esqueceu algo?
Troquei o peso do meu corpo de uma perna para a outra, desconfortável.
— Você poderia, sabe, descer comigo lá embaixo? — indiquei o elevador atrás de mim. — É que eu tenho medo de ir só… — encolhi os ombros, vendo-o me olhar de cima de seu um metro e oitenta e suspirar, derrotado.
Ele sempre cedia quando eu lhe pedia algo. Aquela era a coisa que mais me surpreendia no que estava conhecendo após aquele casamento: o modo como cuidava de mim. Lembrei-me de quando ele me disse, visivelmente exausto, do quanto estava cansado de me ouvir lhe dizendo não. Pensei na proposta que me foi feita há pouco, na sala dele.
Eu disse não de novo. Ele cederia caso eu lhe pedisse aquilo também? Ficaria longe de Dafne? Bom, eu não tinha uma resposta certa para aquelas perguntas, e diante de um sim incerto e que poderia me acarretar arrependimentos futuros, eu manteria o meu não sem saber como seria se realmente tudo desse certo.
— Jordyn, vou ali embaixo rápido. Se Chace chegar, mande-o entrar, sim?
— Tudo bem, Sr. — ela acenou novamente para mim, fazendo-me imitá-la enquanto o elevador voltava a subir para nos buscar.
Entrei acompanhada dele, respirando aliviada assim que a porta se fechou e o senti se movimentar. Apesar do frio na barriga que me dava, ter ali me passava uma certa segurança. Que funcionário iria querer se responsabilizar por um acidente envolvendo o filho do dono da empresa? Sabia que se qualquer coisa acontecesse àquele elevador, iriam fazer de tudo para consertá-lo em tempo recorde.
Encostei-me numa das paredes laterais e suspirei audivelmente, sentindo frio e incomodada pelo silêncio dele. Meses atrás eu imploraria para que ele calasse a boca e simplesmente evitasse olhar em meu rosto. Mas, naquele momento, eu só queria que ele olhasse para mim e falasse comigo, porque eu não estava me sentindo bem sabendo que estava bravo por uma coisa que eu nem ao menos queria fazer.
Não sentia vontade de aceitar aquele convite de Tom; o fiz porque estava com raiva de , com raiva de toda a situação que envolvia ele e Dafne. Eu queria causar nele o que ele tinha me causado, lhe dar uma lição. Por mais estranheza que sua indiferença pudesse me causar naquele momento, eu precisava fazer aquilo. Tinha que tentar manter meu orgulho a salvo.
Três andares abaixo, as portas se abriram, fazendo-me desencostar de onde estava e finalmente tendo os olhos verdes de sobre mim, mas não pelas razões que eu queria. Infelizmente, ele não era o único homem de olhos de esmeraldas ali dentro. As portas se fecharam, deixando um clima que pesava toneladas no ar. Joseph esticou o braço à frente do rosto, checando as horas no relógio ao fingir que não nos enxergava. se aproximou, tocando-me com a lateral de seu braço.
Espiei-o de canto de olho, tendo uma ideia ridícula e infantil demais para uma adulta que já era mãe.
Sorri e me virei pra ele, deslizando uma das mãos de seu peito até o ombro, fazendo-lhe um cafuné na nuca, prostrando-me diante de seu corpo tenso vestido naquele blazer escuro. O encarei intensivamente, tentando fazê-lo entender o que eu queria fazer. me olhou, tentou ficar sério ao entender o recado e entrou no embalo, provavelmente já sentindo a raiva se esvair de si.
fazia tudo o que eu pedia, não disse? Sabia que ele não resistiria à oportunidade de enfurecer o pai. Queria ver se Joseph conseguiria continuar fingindo que não nos via ali.
Envolvi seu pescoço com meus braços, aproximando o rosto do seu e chocando meu nariz com o dele. Desferi um selinho em seus lábios e afastei-me ligeiramente para olhá-lo nos olhos.
Sabia que talvez aquele beijo mixuruca poderia passar longe de ser uma provocação efetiva se se tratasse de uma outra pessoa. Seria muito mais ousado se nos beijássemos como quando transávamos, quando as línguas se enroscavam e disputavam território na boca um do outro. Seria escandaloso se ele deslizasse aquele par de mãos deliciosas em minha bunda ou tocasse meus seios como só ele fazia.
Porém, tratando-se de Joseph, nada, nem a cena mais depravada da face da Terra, o incomodaria mais do que nos ver agir como um casal comum, felizes por estarem juntos. Nada soaria mais assustador a ele do que ver que a família que ele mais queria destruir estava intacta.
— O que vai querer comer no jantar hoje? — perguntei, quando suas mãos grandes envolveram meus quadris. Um friozinho me atingiu a barriga, trazendo uma sensação gostosa.
Seus lábios curvaram-se num sorrisinho sacana e seus olhos verdes ficaram mais escuros, devido à luxúria que os tomou.
Nem olhei para o lado para checar se Joseph nos observava ou não. Não consegui desviar meus olhos dos dele. Era como uma espécie de hipnose maluca, que me fazia entrar num transe bizarro mesmo de olhos bem abertos.
— Você — ele sussurrou ao pé do meu ouvido e mordeu o lóbulo, me causando um arrepio instantâneo. Encolhi os ombros, soltando uma risadinha junto dele.
Ok, talvez quisesse adicionar um pouco de depravação ao teatro. Típico dele.
— Bobo — mordi seu lábio e beijei sua boca devagar, tendo sua língua enroscando-se com a minha como num abraço aconchegante.
O elevador sinalizou que tinha chegado ao térreo e nos obrigou a desgrudar nossos corpos. Suspirei, ainda envolvendo seu pescoço quente com meus braços.
— Vou indo, lindo — selei seus lábios. — Te amo.
riu fraco, apertando minha cintura.
Ah, o “eu te amo” era pra fechar com chave de ouro. Admito que naquele momento me vi tentada em saber a reação de Joseph. Será que as câmeras pegaram direitinho? Pagaria pra ver cada mínimo frame da cara dele.
— Também te amo, amor.
Me soltei de suas mãos grandes, deixei o elevador e apenas senti o vento frio do corpo de Joseph passando ao meu lado como um furacão.
Ri sarcástica ao assisti-lo marchar para fora do saguão do prédio, enquanto eu não me preocupava em andar com aquela pressa toda. Ser demitida me deu aquela sensação – apesar de estar triste e com a cabeça cheia de problemas e preocupações, eu agora tinha a liberdade de não precisar correr para nada. Aquele foi o primeiro resquício de alívio que senti em relação a tudo aquilo. E esperava que não fosse o único, porque eu ainda sentia que algo estava errado.
— .
Assim que me aproximei do meio-fio, fui em direção ao homem asiático que desembarcou do táxi estacionado ali. Joseph surgiu à minha frente com sua mala gigante, já empurrando a alça para baixo e tirando-a do chão para entregá-la ao taxista, para que ele pudesse colocá-la no porta-malas do carro amarelo.
Franzi o cenho. tinha me dito que o motorista que me levaria embora já estava chegando.
— — Joseph largou a mala no chão, fazendo o barulho do impacto me causar um risinho completamente espontâneo. Acenei com a cabeça, ainda sob o olhar mortífero do engravatado ao meu lado.
Deliciei-me ao vê-lo absolutamente puto da vida ao perceber que eu tinha me apossado de seu sobrenome de merda. Tinha certeza que ele estava vivenciando seu pior pesadelo ao ver a filha da sua ex-empregada doméstica de anos sendo priorizada em algo diante dos seus olhos.
— Boa tarde, senhorita — o homem simpático abriu a porta para mim. Adentrei o veículo e, enquanto ele dava a volta para retornar ao banco do motorista, ouvi batidinhas no vidro da janela.
Pressionei o botão e dei de cara com Joseph, que, vermelho de ódio, abaixou-se para me encarar mais de perto com seus olhos verdes raivosos. Fiz cara de paisagem, limitando-me a apenas levantar as sobrancelhas num questionamento mudo: o que será que ele queria comigo a ponto de me abordar às pressas daquela forma?
— Só pra te avisar — mordi minha bochecha por dentro, afetada com seu tom de voz e tentando canalizar o que senti. — Acho melhor você começar a se despedir do meu sobrenome, porque tenho certeza que meu filho não vai durar com você.
Oito meses, Joseph, oito meses.
Cerrei meus punhos em ira ao pensar na felicidade que ele sentiria quando eu me divorciasse de . Seria tudo o que ele mais queria na vida se realizando. Não suportava a ideia de lhe proporcionar felicidade de forma alguma.
— Eu sou o pai dele, o conheço desde que veio a este mundo, e é nítido que você não passa de diversão para .
Soltei um riso desacreditado. Joseph estava me dizendo o que eu já sabia. Mal imaginava ele que e eu não tínhamos intenção alguma de sermos reais.
— Ele vai se cansar logo de brincar de casinha, de te sustentar e de levar essa vida pacata de pai sendo tão jovem. Meu filho não é assim, e muito menos escolheria viver preso a uma mulher do seu nível — seu olhar queimou sobre a estampa da lanchonete em meu uniforme.
Engoli com muito custo o choro que me subiu à garganta, mas não era de mágoa, era puramente raiva. Um ódio tão profundo que eu podia jurar que nunca tinha sentido na minha vida. Nem mesmo , que já chegou a sair nos tapas comigo na infância, jamais me inspirou tantos sentimentos ruins como aquele homem estava fazendo naquele instante.
Joseph não sabia o que e eu fazíamos juntos quando estávamos entre quatro paredes, nem em público. Não fazia ideia do quanto nos ajudávamos, da família maravilhosa que conseguimos formar mesmo em meio a tantas coisas ruins acontecendo à nossa volta. Ele jamais entenderia o que sentia por , o quanto ele adorava ser o pai dela.
Ser sustentada? Mulher do seu nível? Quem aquele velho desgraçado achava que era para falar aquelas coisas de mim? Ele nem ao menos me conhecia! Me acompanhar de longe ao longo do meu crescimento não lhe dava o direito de me julgar como se soubesse algo da minha vida e do meu caráter!
— Quando se cansar, sabe que estarei aqui por ele — Joseph continuou. “Do mesmo jeito que esteve para Grace?”, pensei. — Estarei aqui com todos os privilégios que ele tinha antes de querer estragar a própria vida com esse casamento de merda.
Privilégios? realmente não mentiu quando disse que o pai só ligava para aparências – não que eu algum dia cheguei a duvidar daquilo! Não! Mas por um momento só consegui parar um pouco para enxergá-lo em sua mais pura mediocridade ali, perdendo seu precioso tempo só para tentar me atingir de alguma forma. Ele era muito pior do que achava.
— Deve ser mesmo muito triste viver todos esses anos sem saber qual a sensação de amar e ser amado — sorri, encarando-o inconformada. Como alguém poderia ser tão podre daquele jeito? Me embrulhava o estômago. — Vamos indo, por favor? — me direcionei ao motorista, já pressionando de volta o botão que subiu o vidro na cara de Joseph, que continuou plantado no meio-fio, encarando-me como se pudesse me matar com seu olhar.
Se no mundo dele as aparências eram o que contavam, decidi então respondê-lo com algo que seus olhos gananciosos desconheciam e, pelo visto, jamais teriam a oportunidade de presenciar: um sentimento, algo que não se podia apalpar ou colocar preços. Joseph ficaria horas pensando no que eu lhe disse, morto de curiosidade para saber do que eu falava. Ele viveria um martírio ao perceber que não era algo que seu dinheiro comprava e que ele jamais teria acesso sendo do jeito que era. Nada deixava alguém como ele mais puto do que ser excluído, impotente diante de algo que suas mãos não alcançariam.
Em contrapartida, eu infelizmente também levei suas palavras comigo no trajeto que fiz até em casa. Segurei-me dentro do táxi, recebendo olhares demorados pelo retrovisor do homem que dirigia à frente, provavelmente fazendo comentários consigo mesmo sobre tudo o que tinha acabado de ouvir. Que constrangedor, ser humilhada daquela forma na frente de um desconhecido.
Sabia que não deveria deixá-lo me afetar daquela forma, afinal, aquela era sua intenção explícita. Porém, foi inevitável. Era irônico como ele pareceu adivinhar o que me afligia anteriormente. Quando pedi o dinheiro do táxi para , me senti insuficiente. Meu orgulho me sufocou a ponto de eu quase não conseguir falar. Pensar que as coisas poderiam mudar e eu teria que ficar pedindo mais a ele me amedrontava.
Era algo que eu sentia, dentro de mim, porém não tinha parado para pensar no externo, até porque deixei claro para todos que conhecemos após o casamento que eu trabalhava em busca de ter meu próprio dinheiro. Mas depois do que Joseph disse, comecei a pensar no que os outros iriam falar. Eu não queria ser conhecida por ser a mulher que é sustentada pelo marido.
Desbloqueei meu celular, abri o aplicativo do banco e perguntei ao taxista quanto tinha ficado a corrida. Ele estranhou a pergunta, porque já tinha pago em seu cartão de crédito quando o chamou; porém, insisti em saber a resposta e transferi o valor informado para a conta de .
Não seria a mulher que Joseph insinuou que eu era.
Cheguei em casa e não encontrei ninguém por lá. Dei falta do carrinho de bebê e imaginei que Elisabeta tinha levado para o parque que ficava dentro do condomínio. O dia estava bonito, o céu bem azul com um sol gostoso para dar uma caminhada. Apesar do meu estado de espírito se igualar a um dia nublado ou a uma tempestade tenebrosa, não pude deixar de olhar para o céu por alguns instantes antes de fechar as cortinas do quarto e tirar minha calça, enfiando-me debaixo dos cobertores na cama.
O tempo que passei ali foi de muita, mas muita reflexão. Pensei sobre tudo, tomei decisões e voltei atrás logo depois. Caí num sono profundo quando não tive mais nada para chorar. Eu estava tão confusa! E odiava não saber o que fazer, não ter controle do que sentia e fazia. Apesar de saber que não temos controle de nada na vida, ainda me cobrava muito naquele aspecto.
Despertei um tempo depois, ouvindo um cantarolar ao fundo antes que pudesse abrir os olhos e encarar o quarto meio escuro, por conta da claridade que vinha da porta do banheiro aberta. Claro, era com sua voz rouca e afinada. Respirei fundo levando o braço até meus olhos e pensando no que faria naquele momento.
Eu tinha que preparar o jantar, claro, tomar um banho antes, depois ficar com e ir dormir, acordar de madrugada para dar sua mamadeira e checar sua fralda, já que era o meu dia e depois, quando amanhecesse… Bom, eu não sabia mais o que faria.
— Vou acender a luz — avisou, fazendo-me tirar o braço do rosto e piscar algumas vezes para me acostumar com a claridade. — Tudo bem?
Encarei parado diante da cama, com apenas uma toalha branca enrolada nos quadris e esfregando outra em seus cabelos castanhos úmidos. Me mantive calada, fazendo-me a pergunta que ele tinha acabado de fazer.
Meu marido sentou-se na beira da cama. Sua mão se aproximou do meu rosto e ele encostou o dorso na minha testa, passando para fazer o mesmo na curva do meu pescoço, como minha mãe faria caso eu parecesse doente.
— Está quente. Vamos medir sua temperatura — ele se levantou, foi até a cômoda em frente à cama e voltou com o termômetro digital.
— Eu estou bem — minha voz saiu fraca, minhas pálpebras estavam pesadas. Talvez tivesse algo a ver com o fato de eu ter chorado metade daquele dia inteiro.
— Vamos só conferir — ele puxou a coberta do meu tronco e colocou o aparelho debaixo do meu braço, por dentro do meu uniforme da lanchonete. — Está deitada há quanto tempo? Elisabeta nem te viu chegar.
Não respondi. Eu sabia que estive ali tempo demais, enfurnada naquele quarto debaixo das cobertas no calor que fazia e sem reproduzir um ruído sequer, como se eu tivesse sumido da face da Terra por algumas horas.
Seu olhar de preocupação me fez ficar calada.
— Por que me devolveu o dinheiro, ?
Desviei o olhar, não sabendo se valia a pena mesmo compartilhar as merdas que ouvi do pai dele. suspirou e me encarou, cansado. Provavelmente Joseph tinha razão em dizer que ele logo se cansaria, mas não era nem do casamento, era da minha teimosia. Felizmente, já tinha sido avisado por mim que eu era complicada de lidar, e também sabia que se livraria disso em apenas oito meses.
O aparelho apitou, salva pelo gongo. enfiou a mão dentro da minha camiseta e analisou o resultado de cenho franzido. Ee estava parecendo um pai de verdade, só faltou o óculos de armação genérica.
— Trinta e seis graus — deixou o aparelho no móvel ao lado da cama, voltando suas atenções para mim.
— Eu disse que estava bem — cruzei os braços, evitando seu olhar mais uma vez.
— Não respondeu minha pergunta — ele apoiou uma das mãos ao lado do meu corpo, se debruçando sobre mim. Inalei sem querer o cheiro gostoso do seu shampoo. — Te transferi de volta, o dinheiro é seu.
Assenti, ponderando. Joseph não poderia me chamar de escorada só por alguns trocados, não é?
— Por que mudou de ideia? — perguntou.
Apertei meu próprio corpo no cruzar de braços mais forte, decidindo contar logo a ele. Como mesmo disse ontem, não conseguíamos mais esconder nada um do outro de qualquer forma.
— Seu pai, . Seu pai falou um monte de merda pra mim quando saímos da empresa — murmurei, emburrada. Ele não ficou surpreso, apenas assentiu e me esperou continuar. — Disse que eu não passava de uma diversão pra você, que você não iria querer me sustentar por muito tempo — senti minha voz embargar por um momento, mas disfarcei. — Que logo se cansaria de mim e dessa vida de pai… Enfim, finalizou dizendo que te conhecia e que você não iria querer viver com uma mulher do meu nível.
— Não dê ouvidos a ele, . Meu pai não sabe de nada — inclinou-se, beijando minha bochecha. Ri sem humor, inconformada.
Sabia que eu deveria fazer aquilo mesmo. Também sabia que tinha que deixar para lá o que aconteceu naquela cafeteria, já que nós dois tivemos aquela conversa intensa e cheia de dedos apontados e incômodos. Mas eu não consegui evitar o pensamento que me atingiu à cabeça enquanto segurava-me para não desabar em choro no banco de trás daquele carro.
— Não, , sabe o que me irrita? É que ele olhou pro meu uniforme com tanto desprezo… Foi como se eu fosse inferior só por ser uma garçonete! — e nem aquilo eu era mais. Se Joseph soubesse que eu era uma desempregada, me detonaria de vez. — Fico pensando se fosse uma outra mulher a se casar com você. Se fosse Dafne, por exemplo, que é uma gerente quase formada em psicologia e provavelmente não é filha de uma empregada… ele se sentiria no poder de ofendê-la do jeito que fez comigo?
— , o que meu pai acha ou deixa de achar não importa. Foi com você com quem me casei e fim de história — ele pegou meu rosto, olhando-me no fundo dos olhos.
— Mesmo sendo uma mentira, dói ouvir certas coisas.
— Eu sei, te conheço — acariciou-me e sorriu fraco. — Sendo mentira, meia-mentira, verdade… não importa — aproximou-se, juntando nossas testas. — Você continua sendo minha esposa. Você. , não Dafne e nenhuma outra.
Sua boca grudou-se na minha. Senti sua respiração bater contra meus lábios molhados quando nos separamos minimamente.
“Não importa.”
— Prove — selei seus lábios. — Prove que realmente não importa — ofeguei ao senti-lo envolver meu quadril com suas mãos firmes. — Prove que sou sua preferida, que faço seu coração acelerar, que te deixo louco…
mordiscou meu lábio com força.
— O que quer que eu faça para te provar?
Suspirei sob seu desejo latente, incendiando-me aos poucos.
— Faça amor comigo.
Capítulo 39
Alternei ambos os olhos nos dele, um de cada vez, e me vi refletida no verde de sua íris que disputava espaço com suas pupilas dilatadas.
Sempre ouvi dizer que as nossas pupilas costumam se dilatar quando estamos olhando diretamente para algo que nos agrada. Há sempre algo poético e romântico para explicar como nosso corpo reage a algo bom – desde toda a ansiedade que faz nosso estômago revirar, como se houvesse meras borboletas voando dentro de nós quando estamos apaixonados, até o arrepio ao receber beijos em determinadas partes do corpo. Nunca soube muito bem quando confiar nesses contos de fadas; para mim, tudo era enfeite para justificar que nosso corpo apenas tinha um jeito particular para cada cantinho dele, para sinalizar que estava gostando ou não de algum estímulo.
E ali estava , com seu corpo reagindo ao meu. Senti seus braços com os pelos eriçados quando me alinhei ainda mais a ele. Senti sua respiração quente e descompassada bater contra meu rosto, até mesmo seu toque trêmulo demonstrava reagir a mim. Eu não poderia dizer que era imune a ele, porque também já respirava com dificuldade e sentia minha calcinha mais úmida cada vez que sua língua tocava a minha durante o beijo lento e molhado que ele me deu após o pedido que lhe fiz.
Eu o queria tanto, sentia-me tão atraída por ele que meu corpo não mais apenas falava, mas gritava por seu nome enquanto se alinhava e se atraía ao dele como dois ímãs.
— Faço — trilhou seus beijos pelo meu queixo devagar, fazendo-me jogar a cabeça para trás inconscientemente. — É o que eu quero fazer o tempo todo — tirou meus cabelos do caminho enquanto me atacou o pescoço, chupando minha pele e arrepiando-me dos pés à cabeça.
Comigo?
Mordi minha língua para não ter a possibilidade de abrir a boca e fazer aquela pergunta em voz alta. Eu não iria querer saber a resposta e, sinceramente? Imaginá-lo beijando Dafne ou pensar nas mãos dela deslizando por seu peito como eu estava fazendo naquele exato momento me deixava de coração acelerado, com as emoções à flor da pele. Me deixava puta da vida.
Vê-la me despertou sentimentos que nem eu mesma sabia que tinha, principalmente em relação a ! Comecei a enxergar tudo por uma perspectiva diferente e completamente errada. Ver Dafne em carne e osso diante de mim trouxe-me dúvidas que jamais tinham se passado pela minha cabeça! Será que nos comparava na cama?
Ou até mesmo fora dela? Eu mesma, quando dei por mim, já tinha feito vários paralelos entre mim e ela. Dafne era mais velha, quase uma psicóloga de formação, e não devia ser uma pessoa difícil de lidar. Com a amante, as coisas deviam ser mais práticas. Ela devia fazê-lo rir, fazê-lo se esquecer dos problemas do trabalho e das responsabilidades, já que comigo mesmo já disse que não conseguia mais separar as coisas. Dafne não devia sequer deixá-lo irritado com suas manias ou fazê-lo se esforçar para ter o que queria dela.
Eu queria esquecer que a vi. Queria me esquecer de sua existência, mas parece que eu não conseguiria tão cedo, já que, mesmo tendo me beijando o corpo, sentia-me estranha ao imaginá-lo com os lábios sobre a pele dela!
Afastei-o por um segundo, somente o tempo em que puxei a barra da camiseta do uniforme que eu nunca mais usaria, despindo-me e me sentindo estranha ao ter aquele pensamento justo naquele momento. Algo não estava certo, alguma coisa ali não estava fluindo naturalmente. Quando estava com daquele jeito, tirando a roupa e dando beijos sedentos, eu geralmente não conseguia pensar muito – apenas fazia com que nossos corpos estivessem juntos e aproveitava as sensações inebriantes que aquilo me causava.
Mas, naquele instante, a única coisa que eu fazia além de corresponder seus beijos era pensar.
Tirei meu sutiã sob seu olhar penetrante, que não se desviava de meu corpo. Suspirei ao ter suas mãos agarrando meus seios libertos; alcancei-as, apertando seus dedos contra minha pele, sentindo sua boca chocar-se com a minha durante aquela massagem deliciosa que seu toque me proporcionou. Eu tentava me conectar ao momento, somente ao que acontecia ali, nos beijos que dávamos e na atmosfera que criávamos quando estávamos juntos daquele jeito.
Eu estava desesperada para voltar a sair de órbita e ignorar tudo o que nos rodeava, exatamente como fizemos naquela noite na casa de Megan, quando me despiu pela primeira vez e eu não consegui nem ao menos me lembrar que o odiava.
Deitei a cabeça contra a sua, gemendo baixinho ao tê-lo brincando com meus mamilos rijos, vidrado no que fazia.
Tirei sua concentração ao levar ambas as mãos aos seus cabelos castanhos, penteando-os com os dedos para trás, revelando seu rosto bem desenhado. era tão bonito que já me deu muita raiva. Eu ficava puta quando ouvia as garotas da escola suspirarem por ele. Tinha o mesmo asco que Grace quando as ouvia descrever o quão gostoso ele era. Cômico como naquele momento eu me via em cada uma delas, suspirando diante de seu olhar, completamente louca para estar em seus braços de novo.
Ataquei seus lábios rosados, já tendo-o prestes a se levantar para ir atrás do preservativo. Segui-o com o olhar ao assisti-lo se esticar até a gaveta da cômoda ao lado da nossa cama e abrir o pacote com rapidez.
Mordi o lábio inferior, desejosa, quando vi a toalha branca que antes estava em volta de seu quadril ir ao chão, revelando seu membro ereto e majestoso, repleto de veias. manteve-se sério enquanto retornava à cama. Daquela vez, suas mãos alcançaram minha calcinha, despindo-me da última peça que eu usava.
De repente, o frio que eu sentia quando ele me tirou debaixo das cobertas se esvaiu. Assim que o tive de joelhos sobre o colchão, vindo até mim e se posicionando entre minhas pernas. Me abri para ele, ainda sendo encarada daquele jeito, que eu não sabia explicar como era, mas que me fazia sentir envergonhada. Parecia que estava lendo meus pensamentos, enxergando-me por dentro.
E eu não queria que ele visse nada, não conseguia conceber a ideia de tê-lo sabendo dos meus pensamentos naquele momento. Tinha medo do que iria pensar. Eu mesma tinha medo das conclusões que estava tendo sozinha, mesmo sem nunca ter chegado em lugar algum durante meus devaneios.
Assim que começou a beijar minha barriga e subiu devagar até meus seios, meu coração bateu ainda mais forte. Senti-me acolhida sendo coberta de beijos, meu corpo se aquecia mais e mais a cada instante.
Parecia que sabia do que eu precisava. Adivinhou que eu queria ser amada, naquela tarde principalmente. Sua boca deslizou por cada centímetro de pele que ele encontrou pelo caminho até meu rosto; quando chegou, beijou minha testa e colou a sua na minha em seguida.
Suspirei baixinho assim que ele pincelou o pau contra minha entrada. Contraí-me em ansiedade, maneando o quadril e avançando contra sua cabeça inchada. Suas covinhas se fizeram presentes por um momento – não perdia a oportunidade de me sacanear. Não evitei o sorriso que escapou de meus lábios, que se entreabriram logo em seguida, pois tinha decidido parar de me torturar e finalmente deslizava para dentro de mim devagarinho, mantendo seus olhos verdes nos meus.
Gemi ao jogar a cabeça para trás, apoiada nos cotovelos, tendo-o me assistindo enquanto me desfazia em tesão por, depois de tempo demais, tê-lo dentro de mim, preenchendo-me por completo. Após a primeira estocada, continuou a me penetrar lentamente, quase saindo e retornando até o fundo, fazendo-me sentir completa.
Deitei minha cabeça contra o travesseiro quando já não suportava mais apoiar meu tronco trêmulo. O tive se inclinando contra mim, cobrindo-me com seu peito largo e ombros deliciosos, que fiz questão de agarrar ao mesmo tempo em que o prendi entre minhas pernas, agarrando-o com minhas coxas.
Pude ouvi-lo gemer ao pé do ouvido, com o rosto colado na lateral do meu, deixando-me ainda mais excitada com aquela voz deliciosa me deixando saber o quão gostoso estava. Me perguntei se ela o fazia se sentir daquele jeito quando estavam transando, se a abraçava daquela forma, se ele gostava de ter as pernas dela em volta de si, prendendo-o daquele jeito.
Sentia-me estúpida com todos aqueles pensamentos que só faziam me machucar. Queria que me fizesse sentir como se fosse sua única de novo. Como se minha pele fosse a única coisa que seu tato ansiava tocar, como se meu cheiro fosse a única coisa que lhe cheirava familiar e meu gosto fosse a única coisa que seu paladar conhecia. Queria sentir de novo a sensação de ser a bomba que mantinha seu coração em pulsação.
Beijei-o com avidez, suspirando ao ter sua língua enroscando-se com a minha, concentrando-me no gosto do seu beijo e no cheiro que seu pescoço emanava. Ele estava ali comigo, não com ela. Eu não deveria ligar para o que ele fazia com Dafne.
Naquele exato momento, era meu.
— Meu marido… — sussurrei ao pé do ouvido, de olhos fechados e completamente inconsciente por já sentir o calor do ápice me subir o corpo, deixando tudo mais intenso e mais gostoso.
— Todo seu — ele juntou a testa na minha, chocando o nariz contra o meu. Abri meus olhos apenas para confrontá-lo, mesmo que em silêncio.
Eu sim era só dele. Digo, na cama. não era só meu, e mais uma vez comecei a pensar que, se teria que dividi-lo com Dafne, ele também teria que me dividir com outro.
Seu olhar voltou a se conectar com o meu, aos poucos, cada vez que seu corpo chocava-se contra o meu, reproduzindo aquele barulho característico que ia se misturando ao som das nossas respirações alteradas. A cama rangia baixinho com os movimentos, ainda que suaves, que fazia com o quadril sobre mim. Eu apenas o agarrava com minhas pernas e abraçava seu tronco, como se nunca fosse deixá-lo sair dali.
Se pudesse, não deixaria.
Não consegui sustentar a troca de olhares por muito tempo. Eu sentia meus olhos marejarem por conta do sentimento que me tomou quando o ouvi me dizer aquilo.
A impotência de não poder mais contestá-lo. De repente, me arrependi até mesmo de ter dito tudo o que lhe disse em seu escritório. Quem eu achava que era para confrontá-lo daquela maneira? Eu era a intrusa ali, alguém que chegou depois que já tinha estado com Dafne na cama.
Cravei minhas unhas curtas em suas costas com a força que usava para me agarrar ao orgulho que sentia por saber que aquela era uma luta sem causa. Eu perderia caso esperneasse mais, machucaria minhas mãos se continuasse a puxar a corda que o traria até mim naquele cabo de guerra que tinha Dafne puxando na outra ponta. Eu concordei em ter algo casual com ele; se fosse para brigar, era melhor pararmos de vez com aquilo.
Eu não queria parar, sentia-me sem forças para empurrá-lo para longe. Eu o queria perto.
meteu mais fundo, agarrando uma de minhas coxas com sua mão macia após acariciar minha pele. Era engraçado como ele conseguia ser duro ao mesmo tempo que era delicado. definitivamente era o tipo de homem que te fodia com força, sem dó nem piedade, para depois te encher de beijos e te acolher em seus braços para te proporcionar algum descanso.
Não daria para julgar Dafne por gostar de dar pra ele, eu mesma já não conseguia parar. Era um vício maldito, algo que jamais pensei em fazer em todos os nossos anos de ódio mútuo. Saber que anos atrás eu negaria até a morte caso me perguntassem se era eu ali, abaixo do corpo dele, gemendo e me desfalecendo em prazer, depois de experimentar a sensação de tê-lo dentro de mim, sentia que nunca desejaria voltar atrás.
poderia ser um filho da puta que não se preocupava com o fato de ter duas mulheres consigo, mas ele sabia bem o poder que tinha sobre mim. sabia que eu não poderia mais ficar sem tê-lo entre minhas pernas, sem ter sua língua deslizando sobre minha pele ou suas coxas grossas amortecendo minhas sentadas. Era por aquele motivo que eu não poderia mais reclamar sobre Dafne, porque eu sabia que iria enfurecê-lo e teríamos que ficar sem um ao outro.
Era horrível ter a sensação de que algo deu muito errado, porém ter que ficar quieta e fingir que estava tudo bem, na mais calma normalidade, para não terminar de estragar tudo. Ainda não entendia o que tinha dado errado entre nós. Não conseguia compreender nem o que eu sentia! Era tudo muito novo e ainda confuso.
O que me restava era tentar dar uma chance a Tom. Quem sabe ele não poderia organizar as coisas dentro de mim de alguma forma, ou, pelo menos, me fazer esquecer daquela confusão mental. Sabia o quão perigoso era colocar uma responsabilidade daquelas nas mãos de outra pessoa, mas Dormian era minha única alternativa no momento.
Lembrei-me de quando o conheci, de toda a minha empolgação quase adolescente em volta de seu ser. Eu ainda o achava incrivelmente bonito, inteligente mas… o tesão, o fogo que me tomava quando o olhava no início… não existia mais. Não sabia como faria para ir àquele jantar, apenas tinha em mente que eu deveria tentar.
No fundo, eu não queria ter que tentar. Quem eu queria me levando para jantar, me tratando como única prioridade e agindo como se só tivesse olhos para mim era outra pessoa. E ele estava ocupado demais passeando com ela em seu carro e gastando seu dinheiro em restaurantes caros.
— Amor? — ao ouvi-lo, enterrei meu rosto na curva de seu pescoço, molhando-o com minhas lágrimas. — Está chorando outra vez? — saiu de dentro de mim, apoiando-se nos antebraços para me olhar direito. — O que foi?
Levei minhas mãos ao rosto e suspirei em frustração quando senti seu corpo deslizar pela lateral do meu e pousar-se na cama ao meu lado. Agarrei o lençol que ele puxou sobre mim, encarando o teto ainda com os olhos molhados. O quão patético era chorar na frente da causa das suas lágrimas e não poder falar nada?
— Nada — funguei, ainda com os olhos vidrados no teto branco. — Eu só estou confusa, pensando demais — tentei sorrir, porém não devo ter convencido muito.
Meu olhar o capturou num mísero segundo, e logo eu voltava a encarar qualquer outro ponto que não fosse seu rosto. Senti o colchão se mexer quando seu corpo nu deixou a cama. Suspirei, pensando em como eu estava estragando tudo com aquela minha choradeira e sentimento de posse. Era pra ser sexo e diversão. Se eu não lhe desse sexo, o que restaria mesmo era vê-lo procurar Dafne cada vez mais.
— Me desculpa, eu... — murmurei ao me sentar, vendo-o apanhar a toalha branca do chão já vestido com sua samba-canção.
— Não se desculpe por isso — tirei a mão do rosto ao assisti-lo sentar-se na ponta da cama. — Pelo menos você não fingiu — deu de ombros.
— Bobo — me permiti rir da nossa própria desgraça, mas meu sorriso não durou muito tempo. Foi desaparecendo do rosto na mesma velocidade que veio.
— Já te disse que não gosto de te ver assim. Eu estou aqui, fale comigo. Você decide se quer que eu opine, escute calado ou faça gracinhas pra amenizar a situação.
Ri pelo nariz, desaprovando seu dom de me fazer rir quando eu mais queria chorar.
— Posso tomar um banho antes?
assentiu, beijando minha bochecha.
— Vou ver e preparar a mamadeira dela, logo ela acorda.
Arrastei-me pela cama, levando comigo o lençol claro. já ia em direção à porta, deixando-me aliviada.
— Te vejo na cozinha — falou, e eu assenti antes de adentrar o banheiro e fechar a porta atrás de mim.
O banho foi até rápido. Enquanto senti a água quente descendo pelo meu corpo e me mantendo aquecida, tentei organizar meus pensamentos. Na verdade, estava mais para camuflá-los. Eu iria mentir sobre a causa do choro, falar que era por conta do que ouvi do seu pai e sobre a minha demissão repentina. O que não deixava de ser uma mentira tão grande. Tinha acabado de superar a mudança enorme que ocorreu após a perda de Grace, ter que enfrentar outra tão cedo me deixou baqueada. Principalmente quando envolvia me despedir da única coisa que eu tinha da minha vida antiga: meu emprego.
Desci as escadas e deparei-me com o silêncio da casa. , sentado à mesa, tinha a bebê nos braços enquanto segurava sua mamadeira já pela metade.
— Olhe quem está vindo, a mamãe! — seguiu onde ele apontava com o dedo e seus olhinhos me encararam por um tempo. Suas mãozinhas e pés se agitaram e eu não pude deixar de sorrir ao ir até ela para beijar sua testa. Meus cabelos úmidos caíram sobre eles quando me abaixei. — Hum, que cabelo cheiroso e que camiseta bonita. Engraçado que se parece muito com a minha.
— Fica muito melhor em mim do que em você — sorri faceira, abrindo um dos armários de cima para pegar algumas panelas.
Meu marido manteve os olhos na barra da camiseta preta, que subiu quando levantei os braços, revelando minha calcinha. Enrubesci ao vê-lo manear a cabeça, como se não pudesse discordar.
— Pronta para falar agora?
Respirei fundo, assentindo. Após deixar os ingredientes do jantar sobre a pia, virei-me para encará-lo ainda sentado com a bebê.
— Já disse que não é nada de mais — comecei, mas ele me olhou desconfiado. — É só que… estão acontecendo tantas mudanças que estou um pouco perdida agora. Eu amo mais que tudo nesse mundo, morro de saudades dela quando estou longe. Mas ficar em casa sem trabalhar vai dar razão ao seu pai, .
Meu marido levantou as sobrancelhas, provavelmente não acreditando que eu tinha deixado o pai dele me atingir daquela forma.
— Eu não quero depender de você, não tem obrigação nenhuma de me carregar como se fosse um fardo.
— Você nunca vai ser um fardo, — deixou a mamadeira sobre a mesa, levantando a bebê para deixá-la arrotar encostada em seu peito. Encarei meus próprios pés, cabisbaixa. — O que te faz pensar isso? Meu pai não sabe de nada, não vê os nossos esforços para fazer o melhor pra . Se você chegou a cogitar concordar com ele, é porque também não está vendo.
Levantei meu olhar para ele, vendo-o sair de onde estava e caminhar até mim.
— Não me entendeu, , não estou me referindo a isso…
— Eu te entendi sim, está falando de dinheiro. Quem se importa com o dinheiro, ?
Eu costumava me importar. Inclusive, estava fazendo isso naquele exato momento.
— Olhe para trás, no início de tudo, como não sabíamos nem nos cuidar sozinhos, quem dirá cuidar de uma recém-nascida. Lembra do modo como discordamos no momento em que nos foi oferecida? Quando decidimos não pensarmos em dinheiro, pensamos em tê-la conosco. Esse sempre foi nosso objetivo, , e nós o alcançamos. Formamos uma família maravilhosa, você se tornou uma mãe maravilhosa! Olhe para nós agora, olhe pra si com um pouco de gentileza e não se cobre por algo que não foi sua culpa!
Suspirei diante de seu olhar ameno. Sua mão macia se instalou em meu rosto, acariciando minha bochecha devagar. Fechei os olhos, relaxando meus ombros diante de seu toque macio e tranquilo, sentindo o calor que emanava de seu corpo cada vez mais perto.
— Eu sei que essa não é a ideia de família que todo mundo tem, mas você e eu sabemos que é muito melhor do que a que tivemos enquanto crescíamos.
Assenti de imediato, sorrindo fraco ao pensar em como nós dois tínhamos Grace como exemplo de família. Alguém que amávamos e nos apoiava incondicionalmente.
E, de certa forma, ela continuava nos unindo mesmo não estando mais entre nós.
— Te conheço o bastante para saber que não gosta de depender assim de alguém, mas quero que saiba que não é assim que as coisas funcionam entre nós, . e eu somos a sua família. Você não está mais sozinha, estamos aqui com você e por você.
Olhei para a bebê com os olhos marejados e peguei sua mãozinha, deixando alguns beijos. Funguei o nariz e olhei para o rosto sério de , balançando a cabeça como se tivesse entendido o que ele tinha acabado de me falar. Mas, na verdade, eu ainda não compreendia muito bem tudo o que tinha acontecido conosco em tão pouco tempo. Nunca tinha me sentido tão segura num ambiente ou com as pessoas que me rodeavam.
Como mesmo tinha dito, aquela não era a concepção de família que eu era acostumada a ter.
Mas ao me deparar com eles dois ali, comigo, me acalmando e acolhendo naquela e em tantas outras vezes, eu sentia que poderia me acostumar com aquilo tranquilamente. Eu nunca tinha sido cuidada daquela forma.
— Se quiser voltar a trabalhar, ótimo, mas se não quiser, tudo bem também.
— E quanto a Elisabeta? — sequei meus olhos, sem graça.
— Falamos com ela. Posso pagar os próximos meses para que ela possa procurar outro emprego. Faremos uma carta de recomendação falando o quanto ela é incrível. Tenho certeza que não vai se importar de deixar matando as saudades da mãe dela — ele afastou meus cabelos, tomando meus lábios de leve. — Se me permite opinar… — revirei os olhos comicamente, como se já não estivesse fazendo aquilo há um tempão. — Acho que você precisa de um descanso.
— Nossa, eu estou tão péssima assim? — ri, passando as mãos nos meus cabelos úmidos, vendo se estavam fora do lugar.
— Você é linda — ele me deu um selinho seguido de um beijo tranquilo, com direito à sua língua deslizando sobre a minha devagarinho. — E alguém acabou de arrotar…
soltou um murmúrio baixinho, remexendo-se no colo do pai.
’s point of view.
Depois daquela conversa, preparamos o jantar e colocamos no berço. Eu admitia que sentia inveja de por agora ter um pretexto para ficar com a bebê o dia todo com o nariz enterrado no pescocinho dela, sentindo seu cheirinho de pertinho. Desfrutamos a comida em silêncio, cada um de seu lado da mesa. Enquanto mastigávamos e movíamos os talheres, nos espiávamos vez ou outra. A loira na minha frente sempre desviava o olhar quando me pegava olhando para ela.
realmente não se enxergava nem um pouco, desde o momento em que se comparou com Dafne, como se fosse inferior por ser garçonete, ou quando realmente levou em consideração o que meu pai lhe falou em puro despeito. Eu sabia que tinha uma parcela de culpa por já tê-la diminuído no passado, usando sua profissão. Não sentia orgulho das merdas que já falei para ela. Talvez eu não achasse que a afetava na época, por isso sempre insistia naquilo.
estava aprendendo a se abrir, o que era bom. Porém, eu ainda sentia que tinha algo que ela não queria dividir comigo, e, por mais que minha curiosidade me corroesse, eu respeitaria sua vontade. As meninas iriam pra casa no aniversário de Fanny; talvez, quando estivesse sozinha com as amigas, conseguiria desabafar o restante das coisas que a afligiam.
Subimos juntos e, após escovar os dentes e vestir nossos pijamas, deitamos na cama pela segunda vez naquele dia. Só naquela hora me dei conta do que houve mais cedo. Era a primeira vez que uma mulher caía no choro enquanto transava comigo.
Apesar da situação toda se parecer com um grande soco no meu ego, não consegui me atentar àquele detalhe, não quando era quem estava ali. Ficava quase impossível levar em consideração o que senti no momento. Não sabia explicar ao certo o que suas lágrimas me causavam, mas sabia que meu coração se apertava quando a via naquele estado.
Respirei fundo, sentindo sua cabeça pesar em meu peito. Levei uma de minhas mãos aos seus cabelos loiros e deixei um beijo de leve, temendo acordá-la. Sentia que talvez fosse por conta do que passamos juntos. Tudo o que eu lhe disse na cozinha fazia muito sentido quando eu começava a me questionar sobre os efeitos que causava em mim.
E para não piorar o seu dia, eu não tocaria no assunto que infelizmente tive com meu pai quando cheguei à empresa naquela manhã. não merecia ouvir todas aquelas merdas além do que já tinha ouvido. Lembrava-me de cada palavra dita por ele, que me cobrou o motivo de eu ter deixado o evento da empresa daquele jeito, sem avisar ninguém. Perguntei por que meu sumiço o tinha incomodado mais que a prisão em flagrante de Chris e acabei me denunciando ao falar de algo que ocorreu depois que deixei a festa.
Meu pai apenas ligou os pontos. Não foi difícil para ele saber que eu tinha ligado para a polícia. Acabei confessando, ocultando a parte em que teve quase um surto ao presenciar a agressão. Porém, ele me surpreendeu ao citar Theresa e as agressões do pai de . Cheguei a arfar, impressionado ao ver que ele tinha guardado aquele segredo com ela durante todos esses anos. Meu pai chegou a dizer que até contribuiu com as despesas do braço quebrado de na época do ocorrido.
Era estranho pensar em como ele viveu alheio a tudo aquilo, mesmo tendo Theresa sofrendo nas mãos do marido cada vez que ia para casa. Quando o indaguei sobre isso, levei uma resposta fria, indiferente. Irônico era saber que tínhamos virado da mesma família que meu pai tanto menosprezava.
Fiquei feliz em perceber que tivemos atitudes diferentes diante da mesma situação. Aquilo provava que eu não era igual a ele, algo que me atormentou nos últimos tempos.
(...)
Desci do carro cantarolando uma música qualquer enquanto caminhava pelo quintal de casa. Algumas coisas tinham mudado por ali desde que deixei a casa mais cedo, a começar pelo adeus a Elisabeta. , como sempre, chorou ao abraçá-la enquanto ela apenas ria, relevando tudo o que aconteceu no dia anterior. A babá demonstrou estar feliz por finalmente poder cuidar da filha e deu milhões de conselhos e dicas, além de prometer nos visitar sempre que pudesse. Elisabeta sabia que fazia parte da família, mas também demonstrou entender que seu papel ali tinha acabado.
Outra mudança foi notada assim que abri a porta e me deparei com aquele cheiro de limpeza – mas não era qualquer tipo de limpeza, era uma faxina profunda. O azulejo do hall de entrada chegava a brilhar. Ri baixinho e tirei meu terno. Aquilo era a cara de , descontar o tédio do desemprego na arrumação da casa. devia ter lavado até o teto, do jeito que era exagerada.
— Querida, cheguei — brinquei ao adentrar a sala e encontrá-la sentada no sofá, vidrada na tela à sua frente. — ? — me aproximei, só assim tendo sua atenção.
— Xiu, estou vendo as filmagens do casamento — abanou o ar, sem desgrudar os olhos da TV.
Onde diabos tinha encontrado aquele pen drive?
Prendi minha respiração, sentando-me ao seu lado. Pela sua expressão facial, ainda estava tudo bem. Quando vi que as imagens ainda mostravam sua entrada ao altar, percebi que estava calma daquele jeito porque o pior estava por vir – ou o melhor, dependia do ponto de vista. Mas tratando-se de , não era difícil prever que ela ficaria morta de vergonha quando assistisse a parte da festa.
Seus olhos azuis estavam atentos a tudo o que acontecia na filmagem. Com o rosto apoiado na mão, assistia à cerimônia como se estivesse vendo um filme super interessante.
Lembrava-me da primeira vez que vi aquelas filmagens. Foi quase como ver um filme de terror em que a gente implora para os personagens principais não irem em direção ao barulho sinistro vindo do porão, sabe? Quase gritei pra mim mesmo não ir ao altar. Mas aquilo foi há três meses atrás, hoje em dia eu já não via aquilo tudo com o mesmo pavor de antes.
Assisti junto dela nós dois trocando alianças. Eu já tinha visto aquilo quando o pen drive chegou um tempo atrás, mas, por algum motivo, ver ao lado dela me deixou nervoso.
— Estávamos tão sérios, né? — espiou-me rapidamente, voltando a encarar a tela. Murmurei algo, concordando. — Mas também, eu estava apavorada! — riu quando a câmera focou em seu rosto, quando estive prestes a me aproximar para beijá-la.
estava linda demais! Lembrava-me bem daquele dia. Acho que seria impossível se esquecer do seu primeiro casamento, mesmo que fosse tudo encenado. Mas, independente de tudo – até mesmo do ódio que sentia dela ou do pavor que ambos estávamos sentindo –, quando a vi entrar embalada pela marcha nupcial, não poderia dizer que fiquei alheio à sua presença.
Não só eu, todos naquele dia ficaram hipnotizados com vestida de noiva. Aquele vestido – apesar da confusão que foi comprá-lo – parecia ter sido feito para ela. Seus cabelos, maquiagem, até mesmo o cheiro que ela emanava ainda continuava vivo em minha memória, de tão marcante que aquela cena foi para mim. Nervoso, esperei-a durante seu atraso como se realmente fosse me casar, apenas para levá-la ao altar e firmar o trato que fizemos.
— Eu também estava nervoso — troquei olhares outra vez com ela, que vestia um moletom e um shorts jeans simples; os cabelos estavam presos num rabo de cavalo frouxo. — Jurei que iria me matar ali — ri junto dela, assistindo a parte do beijo, quando a puxei daquele jeito e lhe assustei.
— Tinham muitas testemunhas oculares.
Neguei com a cabeça, vendo a imagem dos convidados vibrando e achando graça da cena. Claramente pessoas que não nos conheciam de verdade.
— Por um lado é até bom termos essas filmagens guardadas — ela continuou. — Assim vamos poder mostrar a quando ela quiser saber de toda a história por trás da adoção dela.
Comprimi os lábios antes de discordar totalmente.
— Acho que não vai querer mostrar isso a ela tão cedo — falei, e virou o pescoço, confusa.
— E por que não? — franziu o cenho. Lhe estendi a mão, pedindo o controle que estava no braço do sofá ao seu lado.
— Há um motivo para eu ter escondido esse pen drive tão bem.
Passei as imagens para frente, tudo: as fotos que tiramos em frente ao pôr do sol, a nossa dança dos noivos e ainda um pouquinho do início de festa, quando ainda estava sóbria e agindo como uma pessoa normal.
Passei um pouco demais, então voltei, fazendo tudo ficar ainda mais engraçado. A piada de que se assistíssemos tudo aquilo de trás para frente como se nunca tivéssemos casado me veio à mente, porém decidi me calar, já sabendo que ficaria passada quando assistisse o que eu lhe mostraria. Achei melhor não provocar muito.
— Meu Deus do céu.
Não perdi meu tempo olhando para a TV. Só pela música eu já sabia o que a tinha feito reagir incrédula daquele jeito. Era dançando My Humps do Black Eyed Peas.
Seu rosto ficou tão vermelho que parecia que ela iria explodir naquele sofá. Levei a mão ao rosto, tentando esconder meu sorriso que crescia e ficava completamente incontrolável, impossível de não ser notado. Eu não consegui evitar e rir da cara que ela estava fazendo.
— Meu Deus, eu não acredito que fiz isso, que vergonha — tampou os olhos com ambas as mãos enquanto se encolhia cada vez mais.
Tão alterada quanto, Fanny ao seu lado a incentivando era hilário. Eu tinha certeza que iria matar a amiga na próxima vez que a encontrasse na sua frente. Os convidados assistiam empolgados se divertindo com a cena, o que só a deixava mais envergonhada. Recordei-me do desespero de Anne quando foi me chamar para avisar que estava descendo até o chão na pista de dança.
Eu não estava aguentando, já gargalhava sendo estapeado por .
— Ah, graças a Deus alguém parou isso.
Eu surgi na tela e a peguei pelo braço, tirando-a do meio do povo. Se eu soubesse que iria me divertir tanto com as imagens depois, teria deixado ela passar mais um pouco de vergonha.
— E você ainda ficou brava comigo!
O constrangimento que foi quando sacou que eu já tinha dormido com Jordyn e minha secretária se fazendo de inocente indo no nosso casamento foi a cereja do bolo. Hoje, depois de termos passado por tudo aquilo, a maioria dos acontecimentos eram engraçados.
Bom, pelo menos para mim.
— A culpa é toda sua, ! Me deu aquela bebida forte antes da festa começar e depois me largou sozinha.
E eu lá tinha cara de babá?
Ofeguei diante de seu dedo hasteado. Que calúnia!
Antes eu tivesse mesmo deixado-a sozinha a festa inteira. logo se arrependeria de ter me acusado de abandoná-la.
— A ideia de ficarmos bêbados foi sua! — protestei. cruzou os braços, contrariada, como uma criança faria.
— Mas você não ficou também!
Revirei os olhos com sua birra. Eu tinha ficado sim um pouco alterado, mas não no nível dela. Até porque era com certeza muito fraca para bebida.
— E eu tentei te parar, mas sua teimosia não deixou que você me obedecesse — tentei segurar o riso quando me encarou puta da vida. Ela odiava aquela palavra, “obedecer”.
Mudei de ideia sobre não mostrar aquelas filmagens para . Seriam úteis na adolescência, quando começassem a lhe oferecer bebidas alcoólicas antes da maioridade. As vergonhas que passou no casamento serviram de aviso sobre os perigos do álcool.
— Nem sei mais se quero terminar de ver isso — checou o tempo de vídeo e concluiu sozinha que poderia ter mais momentos vergonhosos de si. — Pior que eu praticamente não me lembro de quase nada depois que comecei a beber.
— Fica pior — avisei, vendo-a arregalar os olhos, provavelmente se perguntando se tinha como ficar pior. — Se quiser continuar, é por sua conta e risco — lhe estendi o controle sob seu olhar desconfiado.
não estava acreditando.
— Tudo bem — cantarolei, encostando-me no sofá de modo que ficasse mais confortável enquanto tirava o vídeo do pause.
As imagens a seguir foram de convidados aleatórios dançando na pista. Naquele momento, estava comigo, sentada e controlada. Chace a viu pela primeira vez e já tinha notado seus olhos brilhando pro lado dela; já ficou toda assanhada com ele. Porém, a calmaria não durou muito tempo – logo nós dois aparecíamos de volta na pista de dança, mas separadamente.
Quando Hot N’ Cold estava para terminar, inventou de fazer gracinhas e nós acabamos tendo que encenar o casal feliz novamente. Tá, eu a beijei, mas foi apenas por pressão popular, já que os convidados que agitaram. e eu nem parecíamos recém-casados até então. Eu mal a tinha visto durante a festa, e acredito que ela se aproveitou muito disso na hora de encher a cara descontroladamente.
me encarou com as sobrancelhas arqueadas enquanto na tela grande passavam imagens nossas praticamente nos engolindo. Dei de ombros, voltando a ver a filmagem. Eu avisei que ficava pior, e não era nem por conta de um simples beijo. Até porque já sabia que tínhamos nos beijado muito durante a festa, as fotos do casamento deixaram aquilo bem claro.
— Será que era sobre isso que Anne tinha falado quando discutiu comigo naquele dia?
— Não, era sobre isso aqui — passei o vídeo mais pra frente novamente, já podendo ver voltar a se encolher em pura preocupação.
Eu disse que ficaria pior.
Após vermos imagens nossas dançando juntinhos enquanto tocava alguma música lenta, nos movimentando em alta velocidade em ritmos mais agitados, finalmente parei na parte em que teria que ver com os próprios olhos por não acreditar em mim. A voz da Rihanna embalava a música de batida sensual, enquanto na tela e eu aparecíamos envoltos numa espécie de mundo particular.
Era até engraçado pensar que a cantora fazia parte de todos os nossos momentos mais quentes. Algo em sua voz nos despertava desejo. Rihanna era afrodisíaca aos nossos ouvidos. Minha esposa, naquela noite noiva, dançava envolvendo meu pescoço com seus braços enquanto me olhava no fundo dos olhos e movia o corpo de um jeito que estava me deixando louco só de assistir – daquela vez, fora de cena. me olhou de canto, engolindo em seco.
Respirei fundo, tentando disfarçar o calor que me subiu quando a assisti tomar minha boca com aquela lentidão fudida que me deixou completamente duro na hora. Minha ansiedade era visível no modo como eu avançava o rosto contra o seu, aprofundando o beijo e puxando-a para mais perto.
Entreabri meus lábios, evitando mordê-los quando a loira se virou, ainda dançando devagarinho. Aquela era a minha parte favorita. Admitia que tinha me acariciado ao assistir pela primeira vez quando o pen drive chegou, claro, sozinho em casa. Relembrar o modo como suas costas colaram-se em meu peito e a sensação de sua bunda encostando-se em mim conforme ela desceu até o chão na minha frente e subiu logo em seguida. Porra, o modo como rebolou aquela bunda gostosa em meu pau, inclinando-se para frente e virando o rosto para espiar minha reação, que foi imediata, fez minhas mãos a pegar pelos quadris, aumentando o contato ao projetar o quadril em direção a ela, como se a estivesse penetrando.
— Oh, céus, as pessoas em volta nos olhando… — se lamuriou ao meu lado. — Eu nunca mais vou sair de casa.
Ignorei-a, ainda assistindo seu sorrisinho safado na tela, satisfeita ao me ver morto de tesão. Pela primeira vez na vida correspondendo-a como se fosse um cachorrinho abanando o rabo com um simples estalar bobo de dedos de sua dona.
sabia que tinha vencido ali, sabia que me teve nas mãos naquele mesmíssimo instante. Só não tinha plena certeza daquilo porque estava bêbada demais para raciocinar direito e usar aquilo como arma contra mim. Porém, naquele momento, sóbria e capaz de distinguir bem as coisas, minha esposa me encarou de cenho franzido, mas não disse nada – que, para mim, já quis dizer alguma coisa.
— Doida pra dar pra mim — murmurei durante um risinho, numa tentativa de não sair muito por baixo. me encarou boquiaberta.
— Ah, como se você não estivesse querendo me levar pra cama também.
Levantei uma das sobrancelhas. Pelo menos ela não negou sua parte, o que não diminuía minha participação. Porém, já me deixava com o orgulho menos ferido.
— É óbvio que eu queria! — neguei com a cabeça diante de seu olhar curioso. Mesmo depois de já ter admitido que a queria tantas vezes e de até já tê-la tido daquela forma, falar sobre o passado que tínhamos envolto ao ódio mútuo ainda era difícil. — Tinha uma mulher gostosa rebolando no meu pau, óbvio que eu iria ceder!
— Me achava gostosa? — um sorrisinho nasceu em seus lábios, porém tentou disfarçá-lo, comprimindo-os.
— Eu sempre achei — remexi-me desconfortável no sofá, vendo-a me olhar e querendo saber mais sobre o assunto.
Eu sabia o quanto me ouvir admitir aquilo estava acariciando seu ego, e eu me forçava a ficar calado para não alimentar aquele monstrinho. Porém, ao mesmo tempo, o calor que me subia o corpo queria me fazer falar tudo o que guardei comigo por anos.
— A primeira vez que reparei em você foi na festa de despedida, quando eu ia me mudar pra cá para estudar. Eu sempre te odiei, mas não deu pra ignorar aquele biquíni minúsculo que você estava usando.
— Eu odiei ele! — riu, com o rosto rubro. Lembrava-me dela o ajeitando o tempo todo no corpo, principalmente na parte de trás, o que apenas fez chamar a atenção para si. — Sua irmã me obrigou a colocar. Disse que iríamos estar entre os veteranos e que tínhamos que chamar a atenção de alguma forma.
— Conseguiu — me aproximei, lhe sussurrando ao pé do ouvido antes de mordiscar o lóbulo de sua orelha e vê-la se arrepiar e encolher os ombros.
negou com a cabeça, discordando. Eu sabia bem que não era sua intenção chamar minha atenção naquela festa. E não era a minha também babar por ela.
Beijei a linha de sua mandíbula, deslizando as pontas dos meus dedos por sua coxa exposta e por sua perna flexionada. Acariciei a parte interna até onde seu short me permitiu ir. estremeceu e levou a mão até meu pescoço, subindo seu toque suave pelos meus cabelos.
— Eu amo quando você me pega desse jeito.
Na tela, estávamos ainda grudados. Eu ainda lhe agarrava por trás enquanto aproveitava seus cabelos jogados para o lado para beijar seu ombro e pescoço; me puxava os cabelos, visivelmente excitada ao continuar mexendo os quadris no ritmo da música.
Parecia que tudo estava em câmera lenta – ou era o calor do momento que me deixava daquele modo –, mas ao reparar em nós dois naquelas imagens, senti um tesão incontrolável. Era como se estivéssemos vendo um pornô. Nunca imaginei que fôssemos tão quentes, tão incríveis juntos. Parecia um desejo de anos sendo concretizado em frente às câmeras, uma conexão antiga. Era bizarro, dado o contexto da época em que nos casamos, quando ainda afirmávamos com todas as letras que não nos suportávamos.
— Você rebola tão gostoso, amor — minha voz saiu sôfrega. gemeu arrastado, alcançando minha boca e beijando-me com urgência.
Puxei-a para meu colo, tendo-a se encaixando em mim ao colocar suas pernas uma em cada lado da minha coxa. Desci meu toque pelas costas dela, lhe desferindo um tapa na bunda antes de apertá-la com vontade, enchendo minha mão e arrancando suspiros de minha esposa, que passou a rebolar ali, sobre meu membro pulsante.
Levantei seu moletom, revelando seus seios empinados. Abocanhei um por um ao massageá-los e encará-los, vidrado como sempre, sabendo que mesmo se os visse quinhentas vezes, ainda assim me deixariam louco como se fosse a primeira vez. Aliás, qualquer mínimo pedaço de pele de fazia-me sentir daquela forma, era algo que eu não sabia bem como explicar. Tudo relacionado a ela e seu corpo trazia-me a sensação de algo inédito, algo que parecia que eu não encontraria em nenhuma outra. Nem que eu passasse a vida procurando.
riu quando o moletom escapou de minha mão e me cobriu a cabeça, deixando-me preso dentro dele. Saí debaixo e recebi seu rosto, que colou-se ao meu à medida em que uma gargalhada sonora ecoava pela sala. Encarei seu rosto risonho por poucos segundos, mas que por um momento se pareceram minutos.
Os olhos brilhantes de logo focaram-se em algum ponto da minha coxa. Ali, senti algo vibrando e me dispersei, a fim de desligar meu celular que tocava. Apertei o botão lateral com dificuldade, devido à minha urgência em apagá-lo de vez. Porém, o máximo que fiz foi encerrar a chamada. Joguei-o para o lado e voltei a beijar minha esposa, que emaranhou seus dedos em meus cabelos devagarinho enquanto voltava a mover o quadril sobre mim.
Relaxei-me no sofá, lembrando-me de que deveríamos pular as preliminares, já que tínhamos uma bebê – aparentemente – à prova de sexo em casa, que parecia advinhar quando as coisas estavam começando a esquentar entre os pais. Para falar a verdade, as coisas sempre estiveram quentes entre nós, só não tínhamos nos dado conta ainda.
O sofá voltou a tremer. Daquela vez, não tive tempo de alcançar o aparelho para enfim desligar e silenciar quem quer que estivesse atrapalhando nós dois. estava dormindo, segura em seu berço, e estava ali comigo. Não tinha motivo plausível para pararmos as coisas ali para lidar com problemas insignificantes! Quem realmente me preocupava já estava ali, naquela casa comigo.
— Atenda seu telefone — sua voz soou fria, completamente incompatível com o clima em que estávamos.
Não compreendi até que lançou-se de volta ao sofá, jogando meu celular pra cima de mim com raiva. Vi na tela o nome de Dafne piscar e encarei minha esposa. Ela me encarava ainda ofegante, com um olhar que não soube distinguir bem, porém não era o mesmo de segundos atrás.
— Anda, , Dafne quer falar com você.
— … — não consegui impedi-la de ir marchando até a cozinha. Suspirei, irritado, atendendo a droga do celular. — Alô.
— ? Desculpa estar atrapalhando, é que você é o único amigo que parece estar disponível agora — sua risadinha sem graça me fez sentir culpado por ter sido grosso. Suspirei em frustração, encarando a entrada da cozinha. Eu tinha que ir atrás de . — Bom, você não falou nada… mas eu preciso de um favor. Meu carro quebrou. Estou aqui na rua perto da faculdade, passando vergonha e com um pouco de medo de esperar o guincho sozinha no meio da rodovia e…
— Sem problemas, Dafne — eu não queria estar em outro lugar além daquele sofá, com em cima de mim, mas realmente parecia ser uma emergência, e eu não iria me perdoar caso algo acontecesse com ela. — Me mande sua localização, sim? Estou indo — espiei novamente, vendo encostada no batente de braços cruzados. — Tchau, beijo.
— E você ainda diz que vai parar de vê-la — fungou o nariz vermelho. Ofeguei, levantando-me do sofá. A decepção estava explícita em seu semblante.
— É uma emergência, …
— Eu sei bem que tipo de emergência é essa — riu sem humor, sua voz soou trêmula.
— Não é isso que está pensando — que fala clichê. — Eu volto logo...
— Não precisa me explicar nada, eu não quero saber e isso nem me interessa — ela saiu em disparada escada acima, deixando-me puto da vida ali plantado.
Saí de casa, tirei meu carro da garagem e segui de encontro a Dafne. Não pude deixar de temer o que faria quando fosse naquele jantar patético com Dormian. Ela com certeza descontaria toda a raiva com ele, e eu não gostava nem de imaginar como.
Ajudei Dafne.
Curto e grosso. Tão rápido quanto durou aquela ligação, foi o tempo em que nos encontramos naquela noite. Encontrei-a já junto dos caras do guincho, então a única coisa que fiz foi lhe dar uma carona para casa. Dafne me perguntou se eu queria entrar; neguei, fazendo-a perceber que ela atrapalhou algo entre mim e . A morena me deu um beijo na bochecha e desceu, agradecendo-me pela quinta vez consecutiva.
Cheguei em casa já encontrando tudo escuro, aparelhos desligados e um silêncio que me agoniou levemente por já saber que ele permaneceria caso eu não me esforçasse para me redimir. Levei um susto ao passar pela cozinha e me deparar com encostada no balcão, comendo uma colher enorme lotada de sorvete.
— Não está cedo demais pra dormir? — encostei-me ao lado dela, que já vestia uma camisola curta de alcinhas, que deixava seu colo à mostra. balançou a cabeça, ainda com a boca cheia.
— Achei que não iria dormir em casa hoje.
não olhou em meu rosto desde que cheguei, parecia determinada a não fazê-lo. Orgulhosa do jeito que era, eu acreditei que não teria seu olhar no meu aquela noite, não depois de tê-la visto chorar por minha culpa.
— E te deixar dormir sozinha? — ri sem humor, não sendo acompanhado por ela. — Não saí de casa com intenção de dormir fora. Eu te disse que voltava.
— Não precisa se preocupar com isso, devia ter ficado com ela — enfiou a colher de volta no pote, cruzando os braços. — Eu vou me acostumar a dormir só de novo.
— Ainda falta o quê, sete, oito meses para o divórcio? — murmurei, confuso.
— Sim, mas agora que Elisabeta foi dispensada, você pode voltar para o seu quarto.
Encarei-a sem reação. Ela estava me colocando pra fora do quarto? Sua indiferença me causou um incômodo no peito.
— O quê? , eu não quero mudar de quarto, não quero dormir sem você.
Seus olhos focaram-se em mim por um instante. colocou os cabelos para trás da orelha, hesitante. Fui até ela, pegando seu rosto e aproximando do meu.
— Você pode se acostumar, mas eu não vou — falei, e ela riu sem humor, tentando tirar minha mão de si. — Me dê um beijo, sim?
— Não — se esquivou, afastando-me —, você beijou ela — acusou, enojada.
— Não a beijei — mesmo contra sua vontade, me lançou seu olhar desconfiado. — Eu juro por que não a beijei. Não queria nem ter ido até lá pra começo de conversa. Queria ter ficado com você aqui.
— Mentiroso.
Engoli em seco. não acreditava em nada que eu falava! Era frustrante demais!
— Estou falando sério.
respirou fundo, mantendo-se calada diante de mim.
— Eu iria desligar o celular, não queria que ninguém nos atrapalhasse — peguei seu queixo novamente, fazendo-a me olhar nos olhos. — Eu quero você, estou morto de saudades. Me dê um beijo, me desculpa se te magoei.
— Não estou magoada — desviou o olhar, me dando um selinho rápido.
Estava sim.
— Um beijo de verdade — decretei, tomando seus lábios e pedindo passagem com a língua.
Nem mesmo quando estávamos começando a fingir nos beijávamos daquela forma fria. e eu, na verdade, nunca fizemos muita questão de esconder que sentíamos uma atração mútua além do ódio. Nós aproveitamos da situação desde o início.
Minha esposa foi cedendo aos poucos. Deixou-me aproximar nossos corpos, me permitiu emaranhar meus dedos nos fios loiros e puxá-los. Encarei seu rosto enquanto ainda o tinha em mãos, desferi um selinho casto em sua boca e desci para o pescoço à mostra e totalmente vulnerável.
— Vamos terminar o que começamos no sofá? — sussurrei ao pé de seu ouvido, sugando sua pele e sabendo que aquilo provavelmente deixaria marcas.
tombou a cabeça para o lado, fazendo-me temer uma represália. Porém, sua consideração não durou muito tempo. Logo ela envolvia os braços em meu pescoço e subia sobre a bancada quando dei impulso para colocá-la ali em cima.
A loira me ajudou, levantando os braços para que eu tirasse sua camisola. Deixei-a apenas de calcinha, enquanto tentava desabotoar minha camisa clara sem muito sucesso no quesito velocidade. Puxei o tecido que ainda estava preso, estourando alguns botões, que saíram voando pela cozinha. me desferiu um tapa no peito, porque tinha sido ela quem tinha limpado tudo antes de eu chegar e bagunçar a casa.
Nossa dinâmica era daquele jeito mesmo: estabelecia as regras e organizava tudo, e eu era o responsável por burlá-las e bagunçar. Algo me dizia que com as coisas seriam exatamente iguais.
Porém, ela não teve como protestar por muito tempo, já que explorou meu peito e abdômen com suas unhas curtas assim que tirou a camisa do caminho. Logo minhas calças e cuecas também já iam para o chão.
Alcancei o pote de sorvete, enfiando os dedos dentro dele e lambuzando seus mamilos de chocolate. ofegou pela temperatura; já eu me deliciei ao chupá-los sem a menor pressa aparente, arrancando-lhe gemidos maravilhosos de sua boca.
— Ainda mais gostosa — lambi sua barriga, limpando um pouco do que escorreu antes de ir atrás da minha calça e apanhar minha carteira.
Tirei sua calcinha já puxando-a pelos quadris até a ponta do balcão. desfaleceu quando a penetrei de primeira, com tudo, fazendo com que seus seios se balançassem com os movimentos feitos a seguir. Inclinei-me para beijar sua boca e tentar abafar os murmúrios que soltava.
Me perguntei se quem passava na rua lateral não iria ouvir, já que estava um pouco alto. Ao mesmo tempo não queria que ela parasse, fazê-la gritar ao ponto de todo mundo ouvir era incrível demais. Era inevitável não compará-la com as outras mulheres com quem já estive na cama. Era impossível classificá-la abaixo de todas as outras, ela merecia o topo. Eu ainda não entendia muito o que era, mas nós dois tínhamos algo muito particular, uma química que jamais imaginei encontrar justo na minha ex-arqui-inimiga.
Acabamos no chão, exaustos depois de prolongar os orgasmos, diminuindo um pouco o ritmo quando estávamos chegando ao ápice. Aquela técnica chamada edging quase nunca funcionou comigo. Eu não tinha muita paciência em me segurar, principalmente quando estava prestes a gozar. Mas com eu fazia um esforço, e tinha valido a pena. O modo como ela se agarrou a mim enquanto tremia e tinha espasmos pelo corpo inteiro apenas potencializou o meu prazer.
Encaramos o teto por um tempo, aproveitando o piso gélido para espantar o calor que fazia ali. Eu não saberia dizer se estava quente demais ou se éramos nós, suados e esgotados. Apoiei minha cabeça em meu braço, virando-me de lado para olhá-la. só estava deitada ali, completamente nua, porque ela mesma tinha limpado aquele chão; caso contrário, se recusaria a estar ali.
Ri pelo nariz, vendo-a me olhar estranho. Era engraçado como era um pouco esquisita com suas manias desde criança. Mais engraçado ainda era o modo como eu aprendi a lidar com elas e até achar graça, eu costumava odiar até sua respiração.
Como era louco voltar no tempo, olhar em volta e ver onde nós tínhamos ido parar.
— Era para ter sido você — falei, e a loira apoiou-se nos antebraços sem entender nada. Mordi o lábio, sorrindo fraco. Que merda, eu tinha prometido pra mim mesmo que nunca falaria sobre aquilo com ninguém. E olhe justo para quem eu estava falando. — Nossa lua de mel. Eu pensei… bom, planejei durante a festa como faria contigo quando chegássemos em casa. Estava louco pra te arrancar aquele vestido mas…
— Anne veio junto — concluiu ao negar com a cabeça, olhando-me pensativa.
Era inevitável pensar no que teria acontecido. Começaríamos a transar desde então? Ou nunca mais iríamos nos aproximaríamos de novo, com medo de que tudo se repetisse?
— Quer saber? Provavelmente foi melhor assim — suspirei. — Você não iria se lembrar de nada. Iria amanhecer me estapeando e me acusando de ser um tarado.
gargalhou alto.
— Iria mesmo — confirmou, risonha.
Sempre ouvi dizer que as nossas pupilas costumam se dilatar quando estamos olhando diretamente para algo que nos agrada. Há sempre algo poético e romântico para explicar como nosso corpo reage a algo bom – desde toda a ansiedade que faz nosso estômago revirar, como se houvesse meras borboletas voando dentro de nós quando estamos apaixonados, até o arrepio ao receber beijos em determinadas partes do corpo. Nunca soube muito bem quando confiar nesses contos de fadas; para mim, tudo era enfeite para justificar que nosso corpo apenas tinha um jeito particular para cada cantinho dele, para sinalizar que estava gostando ou não de algum estímulo.
E ali estava , com seu corpo reagindo ao meu. Senti seus braços com os pelos eriçados quando me alinhei ainda mais a ele. Senti sua respiração quente e descompassada bater contra meu rosto, até mesmo seu toque trêmulo demonstrava reagir a mim. Eu não poderia dizer que era imune a ele, porque também já respirava com dificuldade e sentia minha calcinha mais úmida cada vez que sua língua tocava a minha durante o beijo lento e molhado que ele me deu após o pedido que lhe fiz.
Eu o queria tanto, sentia-me tão atraída por ele que meu corpo não mais apenas falava, mas gritava por seu nome enquanto se alinhava e se atraía ao dele como dois ímãs.
— Faço — trilhou seus beijos pelo meu queixo devagar, fazendo-me jogar a cabeça para trás inconscientemente. — É o que eu quero fazer o tempo todo — tirou meus cabelos do caminho enquanto me atacou o pescoço, chupando minha pele e arrepiando-me dos pés à cabeça.
Comigo?
Mordi minha língua para não ter a possibilidade de abrir a boca e fazer aquela pergunta em voz alta. Eu não iria querer saber a resposta e, sinceramente? Imaginá-lo beijando Dafne ou pensar nas mãos dela deslizando por seu peito como eu estava fazendo naquele exato momento me deixava de coração acelerado, com as emoções à flor da pele. Me deixava puta da vida.
Vê-la me despertou sentimentos que nem eu mesma sabia que tinha, principalmente em relação a ! Comecei a enxergar tudo por uma perspectiva diferente e completamente errada. Ver Dafne em carne e osso diante de mim trouxe-me dúvidas que jamais tinham se passado pela minha cabeça! Será que nos comparava na cama?
Ou até mesmo fora dela? Eu mesma, quando dei por mim, já tinha feito vários paralelos entre mim e ela. Dafne era mais velha, quase uma psicóloga de formação, e não devia ser uma pessoa difícil de lidar. Com a amante, as coisas deviam ser mais práticas. Ela devia fazê-lo rir, fazê-lo se esquecer dos problemas do trabalho e das responsabilidades, já que comigo mesmo já disse que não conseguia mais separar as coisas. Dafne não devia sequer deixá-lo irritado com suas manias ou fazê-lo se esforçar para ter o que queria dela.
Eu queria esquecer que a vi. Queria me esquecer de sua existência, mas parece que eu não conseguiria tão cedo, já que, mesmo tendo me beijando o corpo, sentia-me estranha ao imaginá-lo com os lábios sobre a pele dela!
Afastei-o por um segundo, somente o tempo em que puxei a barra da camiseta do uniforme que eu nunca mais usaria, despindo-me e me sentindo estranha ao ter aquele pensamento justo naquele momento. Algo não estava certo, alguma coisa ali não estava fluindo naturalmente. Quando estava com daquele jeito, tirando a roupa e dando beijos sedentos, eu geralmente não conseguia pensar muito – apenas fazia com que nossos corpos estivessem juntos e aproveitava as sensações inebriantes que aquilo me causava.
Mas, naquele instante, a única coisa que eu fazia além de corresponder seus beijos era pensar.
Tirei meu sutiã sob seu olhar penetrante, que não se desviava de meu corpo. Suspirei ao ter suas mãos agarrando meus seios libertos; alcancei-as, apertando seus dedos contra minha pele, sentindo sua boca chocar-se com a minha durante aquela massagem deliciosa que seu toque me proporcionou. Eu tentava me conectar ao momento, somente ao que acontecia ali, nos beijos que dávamos e na atmosfera que criávamos quando estávamos juntos daquele jeito.
Eu estava desesperada para voltar a sair de órbita e ignorar tudo o que nos rodeava, exatamente como fizemos naquela noite na casa de Megan, quando me despiu pela primeira vez e eu não consegui nem ao menos me lembrar que o odiava.
Deitei a cabeça contra a sua, gemendo baixinho ao tê-lo brincando com meus mamilos rijos, vidrado no que fazia.
Tirei sua concentração ao levar ambas as mãos aos seus cabelos castanhos, penteando-os com os dedos para trás, revelando seu rosto bem desenhado. era tão bonito que já me deu muita raiva. Eu ficava puta quando ouvia as garotas da escola suspirarem por ele. Tinha o mesmo asco que Grace quando as ouvia descrever o quão gostoso ele era. Cômico como naquele momento eu me via em cada uma delas, suspirando diante de seu olhar, completamente louca para estar em seus braços de novo.
Ataquei seus lábios rosados, já tendo-o prestes a se levantar para ir atrás do preservativo. Segui-o com o olhar ao assisti-lo se esticar até a gaveta da cômoda ao lado da nossa cama e abrir o pacote com rapidez.
Mordi o lábio inferior, desejosa, quando vi a toalha branca que antes estava em volta de seu quadril ir ao chão, revelando seu membro ereto e majestoso, repleto de veias. manteve-se sério enquanto retornava à cama. Daquela vez, suas mãos alcançaram minha calcinha, despindo-me da última peça que eu usava.
De repente, o frio que eu sentia quando ele me tirou debaixo das cobertas se esvaiu. Assim que o tive de joelhos sobre o colchão, vindo até mim e se posicionando entre minhas pernas. Me abri para ele, ainda sendo encarada daquele jeito, que eu não sabia explicar como era, mas que me fazia sentir envergonhada. Parecia que estava lendo meus pensamentos, enxergando-me por dentro.
E eu não queria que ele visse nada, não conseguia conceber a ideia de tê-lo sabendo dos meus pensamentos naquele momento. Tinha medo do que iria pensar. Eu mesma tinha medo das conclusões que estava tendo sozinha, mesmo sem nunca ter chegado em lugar algum durante meus devaneios.
Assim que começou a beijar minha barriga e subiu devagar até meus seios, meu coração bateu ainda mais forte. Senti-me acolhida sendo coberta de beijos, meu corpo se aquecia mais e mais a cada instante.
Parecia que sabia do que eu precisava. Adivinhou que eu queria ser amada, naquela tarde principalmente. Sua boca deslizou por cada centímetro de pele que ele encontrou pelo caminho até meu rosto; quando chegou, beijou minha testa e colou a sua na minha em seguida.
Suspirei baixinho assim que ele pincelou o pau contra minha entrada. Contraí-me em ansiedade, maneando o quadril e avançando contra sua cabeça inchada. Suas covinhas se fizeram presentes por um momento – não perdia a oportunidade de me sacanear. Não evitei o sorriso que escapou de meus lábios, que se entreabriram logo em seguida, pois tinha decidido parar de me torturar e finalmente deslizava para dentro de mim devagarinho, mantendo seus olhos verdes nos meus.
Gemi ao jogar a cabeça para trás, apoiada nos cotovelos, tendo-o me assistindo enquanto me desfazia em tesão por, depois de tempo demais, tê-lo dentro de mim, preenchendo-me por completo. Após a primeira estocada, continuou a me penetrar lentamente, quase saindo e retornando até o fundo, fazendo-me sentir completa.
Deitei minha cabeça contra o travesseiro quando já não suportava mais apoiar meu tronco trêmulo. O tive se inclinando contra mim, cobrindo-me com seu peito largo e ombros deliciosos, que fiz questão de agarrar ao mesmo tempo em que o prendi entre minhas pernas, agarrando-o com minhas coxas.
Pude ouvi-lo gemer ao pé do ouvido, com o rosto colado na lateral do meu, deixando-me ainda mais excitada com aquela voz deliciosa me deixando saber o quão gostoso estava. Me perguntei se ela o fazia se sentir daquele jeito quando estavam transando, se a abraçava daquela forma, se ele gostava de ter as pernas dela em volta de si, prendendo-o daquele jeito.
Sentia-me estúpida com todos aqueles pensamentos que só faziam me machucar. Queria que me fizesse sentir como se fosse sua única de novo. Como se minha pele fosse a única coisa que seu tato ansiava tocar, como se meu cheiro fosse a única coisa que lhe cheirava familiar e meu gosto fosse a única coisa que seu paladar conhecia. Queria sentir de novo a sensação de ser a bomba que mantinha seu coração em pulsação.
Beijei-o com avidez, suspirando ao ter sua língua enroscando-se com a minha, concentrando-me no gosto do seu beijo e no cheiro que seu pescoço emanava. Ele estava ali comigo, não com ela. Eu não deveria ligar para o que ele fazia com Dafne.
Naquele exato momento, era meu.
— Meu marido… — sussurrei ao pé do ouvido, de olhos fechados e completamente inconsciente por já sentir o calor do ápice me subir o corpo, deixando tudo mais intenso e mais gostoso.
— Todo seu — ele juntou a testa na minha, chocando o nariz contra o meu. Abri meus olhos apenas para confrontá-lo, mesmo que em silêncio.
Eu sim era só dele. Digo, na cama. não era só meu, e mais uma vez comecei a pensar que, se teria que dividi-lo com Dafne, ele também teria que me dividir com outro.
Seu olhar voltou a se conectar com o meu, aos poucos, cada vez que seu corpo chocava-se contra o meu, reproduzindo aquele barulho característico que ia se misturando ao som das nossas respirações alteradas. A cama rangia baixinho com os movimentos, ainda que suaves, que fazia com o quadril sobre mim. Eu apenas o agarrava com minhas pernas e abraçava seu tronco, como se nunca fosse deixá-lo sair dali.
Se pudesse, não deixaria.
Não consegui sustentar a troca de olhares por muito tempo. Eu sentia meus olhos marejarem por conta do sentimento que me tomou quando o ouvi me dizer aquilo.
A impotência de não poder mais contestá-lo. De repente, me arrependi até mesmo de ter dito tudo o que lhe disse em seu escritório. Quem eu achava que era para confrontá-lo daquela maneira? Eu era a intrusa ali, alguém que chegou depois que já tinha estado com Dafne na cama.
Cravei minhas unhas curtas em suas costas com a força que usava para me agarrar ao orgulho que sentia por saber que aquela era uma luta sem causa. Eu perderia caso esperneasse mais, machucaria minhas mãos se continuasse a puxar a corda que o traria até mim naquele cabo de guerra que tinha Dafne puxando na outra ponta. Eu concordei em ter algo casual com ele; se fosse para brigar, era melhor pararmos de vez com aquilo.
Eu não queria parar, sentia-me sem forças para empurrá-lo para longe. Eu o queria perto.
meteu mais fundo, agarrando uma de minhas coxas com sua mão macia após acariciar minha pele. Era engraçado como ele conseguia ser duro ao mesmo tempo que era delicado. definitivamente era o tipo de homem que te fodia com força, sem dó nem piedade, para depois te encher de beijos e te acolher em seus braços para te proporcionar algum descanso.
Não daria para julgar Dafne por gostar de dar pra ele, eu mesma já não conseguia parar. Era um vício maldito, algo que jamais pensei em fazer em todos os nossos anos de ódio mútuo. Saber que anos atrás eu negaria até a morte caso me perguntassem se era eu ali, abaixo do corpo dele, gemendo e me desfalecendo em prazer, depois de experimentar a sensação de tê-lo dentro de mim, sentia que nunca desejaria voltar atrás.
poderia ser um filho da puta que não se preocupava com o fato de ter duas mulheres consigo, mas ele sabia bem o poder que tinha sobre mim. sabia que eu não poderia mais ficar sem tê-lo entre minhas pernas, sem ter sua língua deslizando sobre minha pele ou suas coxas grossas amortecendo minhas sentadas. Era por aquele motivo que eu não poderia mais reclamar sobre Dafne, porque eu sabia que iria enfurecê-lo e teríamos que ficar sem um ao outro.
Era horrível ter a sensação de que algo deu muito errado, porém ter que ficar quieta e fingir que estava tudo bem, na mais calma normalidade, para não terminar de estragar tudo. Ainda não entendia o que tinha dado errado entre nós. Não conseguia compreender nem o que eu sentia! Era tudo muito novo e ainda confuso.
O que me restava era tentar dar uma chance a Tom. Quem sabe ele não poderia organizar as coisas dentro de mim de alguma forma, ou, pelo menos, me fazer esquecer daquela confusão mental. Sabia o quão perigoso era colocar uma responsabilidade daquelas nas mãos de outra pessoa, mas Dormian era minha única alternativa no momento.
Lembrei-me de quando o conheci, de toda a minha empolgação quase adolescente em volta de seu ser. Eu ainda o achava incrivelmente bonito, inteligente mas… o tesão, o fogo que me tomava quando o olhava no início… não existia mais. Não sabia como faria para ir àquele jantar, apenas tinha em mente que eu deveria tentar.
No fundo, eu não queria ter que tentar. Quem eu queria me levando para jantar, me tratando como única prioridade e agindo como se só tivesse olhos para mim era outra pessoa. E ele estava ocupado demais passeando com ela em seu carro e gastando seu dinheiro em restaurantes caros.
— Amor? — ao ouvi-lo, enterrei meu rosto na curva de seu pescoço, molhando-o com minhas lágrimas. — Está chorando outra vez? — saiu de dentro de mim, apoiando-se nos antebraços para me olhar direito. — O que foi?
Levei minhas mãos ao rosto e suspirei em frustração quando senti seu corpo deslizar pela lateral do meu e pousar-se na cama ao meu lado. Agarrei o lençol que ele puxou sobre mim, encarando o teto ainda com os olhos molhados. O quão patético era chorar na frente da causa das suas lágrimas e não poder falar nada?
— Nada — funguei, ainda com os olhos vidrados no teto branco. — Eu só estou confusa, pensando demais — tentei sorrir, porém não devo ter convencido muito.
Meu olhar o capturou num mísero segundo, e logo eu voltava a encarar qualquer outro ponto que não fosse seu rosto. Senti o colchão se mexer quando seu corpo nu deixou a cama. Suspirei, pensando em como eu estava estragando tudo com aquela minha choradeira e sentimento de posse. Era pra ser sexo e diversão. Se eu não lhe desse sexo, o que restaria mesmo era vê-lo procurar Dafne cada vez mais.
— Me desculpa, eu... — murmurei ao me sentar, vendo-o apanhar a toalha branca do chão já vestido com sua samba-canção.
— Não se desculpe por isso — tirei a mão do rosto ao assisti-lo sentar-se na ponta da cama. — Pelo menos você não fingiu — deu de ombros.
— Bobo — me permiti rir da nossa própria desgraça, mas meu sorriso não durou muito tempo. Foi desaparecendo do rosto na mesma velocidade que veio.
— Já te disse que não gosto de te ver assim. Eu estou aqui, fale comigo. Você decide se quer que eu opine, escute calado ou faça gracinhas pra amenizar a situação.
Ri pelo nariz, desaprovando seu dom de me fazer rir quando eu mais queria chorar.
— Posso tomar um banho antes?
assentiu, beijando minha bochecha.
— Vou ver e preparar a mamadeira dela, logo ela acorda.
Arrastei-me pela cama, levando comigo o lençol claro. já ia em direção à porta, deixando-me aliviada.
— Te vejo na cozinha — falou, e eu assenti antes de adentrar o banheiro e fechar a porta atrás de mim.
O banho foi até rápido. Enquanto senti a água quente descendo pelo meu corpo e me mantendo aquecida, tentei organizar meus pensamentos. Na verdade, estava mais para camuflá-los. Eu iria mentir sobre a causa do choro, falar que era por conta do que ouvi do seu pai e sobre a minha demissão repentina. O que não deixava de ser uma mentira tão grande. Tinha acabado de superar a mudança enorme que ocorreu após a perda de Grace, ter que enfrentar outra tão cedo me deixou baqueada. Principalmente quando envolvia me despedir da única coisa que eu tinha da minha vida antiga: meu emprego.
Desci as escadas e deparei-me com o silêncio da casa. , sentado à mesa, tinha a bebê nos braços enquanto segurava sua mamadeira já pela metade.
— Olhe quem está vindo, a mamãe! — seguiu onde ele apontava com o dedo e seus olhinhos me encararam por um tempo. Suas mãozinhas e pés se agitaram e eu não pude deixar de sorrir ao ir até ela para beijar sua testa. Meus cabelos úmidos caíram sobre eles quando me abaixei. — Hum, que cabelo cheiroso e que camiseta bonita. Engraçado que se parece muito com a minha.
— Fica muito melhor em mim do que em você — sorri faceira, abrindo um dos armários de cima para pegar algumas panelas.
Meu marido manteve os olhos na barra da camiseta preta, que subiu quando levantei os braços, revelando minha calcinha. Enrubesci ao vê-lo manear a cabeça, como se não pudesse discordar.
— Pronta para falar agora?
Respirei fundo, assentindo. Após deixar os ingredientes do jantar sobre a pia, virei-me para encará-lo ainda sentado com a bebê.
— Já disse que não é nada de mais — comecei, mas ele me olhou desconfiado. — É só que… estão acontecendo tantas mudanças que estou um pouco perdida agora. Eu amo mais que tudo nesse mundo, morro de saudades dela quando estou longe. Mas ficar em casa sem trabalhar vai dar razão ao seu pai, .
Meu marido levantou as sobrancelhas, provavelmente não acreditando que eu tinha deixado o pai dele me atingir daquela forma.
— Eu não quero depender de você, não tem obrigação nenhuma de me carregar como se fosse um fardo.
— Você nunca vai ser um fardo, — deixou a mamadeira sobre a mesa, levantando a bebê para deixá-la arrotar encostada em seu peito. Encarei meus próprios pés, cabisbaixa. — O que te faz pensar isso? Meu pai não sabe de nada, não vê os nossos esforços para fazer o melhor pra . Se você chegou a cogitar concordar com ele, é porque também não está vendo.
Levantei meu olhar para ele, vendo-o sair de onde estava e caminhar até mim.
— Não me entendeu, , não estou me referindo a isso…
— Eu te entendi sim, está falando de dinheiro. Quem se importa com o dinheiro, ?
Eu costumava me importar. Inclusive, estava fazendo isso naquele exato momento.
— Olhe para trás, no início de tudo, como não sabíamos nem nos cuidar sozinhos, quem dirá cuidar de uma recém-nascida. Lembra do modo como discordamos no momento em que nos foi oferecida? Quando decidimos não pensarmos em dinheiro, pensamos em tê-la conosco. Esse sempre foi nosso objetivo, , e nós o alcançamos. Formamos uma família maravilhosa, você se tornou uma mãe maravilhosa! Olhe para nós agora, olhe pra si com um pouco de gentileza e não se cobre por algo que não foi sua culpa!
Suspirei diante de seu olhar ameno. Sua mão macia se instalou em meu rosto, acariciando minha bochecha devagar. Fechei os olhos, relaxando meus ombros diante de seu toque macio e tranquilo, sentindo o calor que emanava de seu corpo cada vez mais perto.
— Eu sei que essa não é a ideia de família que todo mundo tem, mas você e eu sabemos que é muito melhor do que a que tivemos enquanto crescíamos.
Assenti de imediato, sorrindo fraco ao pensar em como nós dois tínhamos Grace como exemplo de família. Alguém que amávamos e nos apoiava incondicionalmente.
E, de certa forma, ela continuava nos unindo mesmo não estando mais entre nós.
— Te conheço o bastante para saber que não gosta de depender assim de alguém, mas quero que saiba que não é assim que as coisas funcionam entre nós, . e eu somos a sua família. Você não está mais sozinha, estamos aqui com você e por você.
Olhei para a bebê com os olhos marejados e peguei sua mãozinha, deixando alguns beijos. Funguei o nariz e olhei para o rosto sério de , balançando a cabeça como se tivesse entendido o que ele tinha acabado de me falar. Mas, na verdade, eu ainda não compreendia muito bem tudo o que tinha acontecido conosco em tão pouco tempo. Nunca tinha me sentido tão segura num ambiente ou com as pessoas que me rodeavam.
Como mesmo tinha dito, aquela não era a concepção de família que eu era acostumada a ter.
Mas ao me deparar com eles dois ali, comigo, me acalmando e acolhendo naquela e em tantas outras vezes, eu sentia que poderia me acostumar com aquilo tranquilamente. Eu nunca tinha sido cuidada daquela forma.
— Se quiser voltar a trabalhar, ótimo, mas se não quiser, tudo bem também.
— E quanto a Elisabeta? — sequei meus olhos, sem graça.
— Falamos com ela. Posso pagar os próximos meses para que ela possa procurar outro emprego. Faremos uma carta de recomendação falando o quanto ela é incrível. Tenho certeza que não vai se importar de deixar matando as saudades da mãe dela — ele afastou meus cabelos, tomando meus lábios de leve. — Se me permite opinar… — revirei os olhos comicamente, como se já não estivesse fazendo aquilo há um tempão. — Acho que você precisa de um descanso.
— Nossa, eu estou tão péssima assim? — ri, passando as mãos nos meus cabelos úmidos, vendo se estavam fora do lugar.
— Você é linda — ele me deu um selinho seguido de um beijo tranquilo, com direito à sua língua deslizando sobre a minha devagarinho. — E alguém acabou de arrotar…
soltou um murmúrio baixinho, remexendo-se no colo do pai.
’s point of view.
Depois daquela conversa, preparamos o jantar e colocamos no berço. Eu admitia que sentia inveja de por agora ter um pretexto para ficar com a bebê o dia todo com o nariz enterrado no pescocinho dela, sentindo seu cheirinho de pertinho. Desfrutamos a comida em silêncio, cada um de seu lado da mesa. Enquanto mastigávamos e movíamos os talheres, nos espiávamos vez ou outra. A loira na minha frente sempre desviava o olhar quando me pegava olhando para ela.
realmente não se enxergava nem um pouco, desde o momento em que se comparou com Dafne, como se fosse inferior por ser garçonete, ou quando realmente levou em consideração o que meu pai lhe falou em puro despeito. Eu sabia que tinha uma parcela de culpa por já tê-la diminuído no passado, usando sua profissão. Não sentia orgulho das merdas que já falei para ela. Talvez eu não achasse que a afetava na época, por isso sempre insistia naquilo.
estava aprendendo a se abrir, o que era bom. Porém, eu ainda sentia que tinha algo que ela não queria dividir comigo, e, por mais que minha curiosidade me corroesse, eu respeitaria sua vontade. As meninas iriam pra casa no aniversário de Fanny; talvez, quando estivesse sozinha com as amigas, conseguiria desabafar o restante das coisas que a afligiam.
Subimos juntos e, após escovar os dentes e vestir nossos pijamas, deitamos na cama pela segunda vez naquele dia. Só naquela hora me dei conta do que houve mais cedo. Era a primeira vez que uma mulher caía no choro enquanto transava comigo.
Apesar da situação toda se parecer com um grande soco no meu ego, não consegui me atentar àquele detalhe, não quando era quem estava ali. Ficava quase impossível levar em consideração o que senti no momento. Não sabia explicar ao certo o que suas lágrimas me causavam, mas sabia que meu coração se apertava quando a via naquele estado.
Respirei fundo, sentindo sua cabeça pesar em meu peito. Levei uma de minhas mãos aos seus cabelos loiros e deixei um beijo de leve, temendo acordá-la. Sentia que talvez fosse por conta do que passamos juntos. Tudo o que eu lhe disse na cozinha fazia muito sentido quando eu começava a me questionar sobre os efeitos que causava em mim.
E para não piorar o seu dia, eu não tocaria no assunto que infelizmente tive com meu pai quando cheguei à empresa naquela manhã. não merecia ouvir todas aquelas merdas além do que já tinha ouvido. Lembrava-me de cada palavra dita por ele, que me cobrou o motivo de eu ter deixado o evento da empresa daquele jeito, sem avisar ninguém. Perguntei por que meu sumiço o tinha incomodado mais que a prisão em flagrante de Chris e acabei me denunciando ao falar de algo que ocorreu depois que deixei a festa.
Meu pai apenas ligou os pontos. Não foi difícil para ele saber que eu tinha ligado para a polícia. Acabei confessando, ocultando a parte em que teve quase um surto ao presenciar a agressão. Porém, ele me surpreendeu ao citar Theresa e as agressões do pai de . Cheguei a arfar, impressionado ao ver que ele tinha guardado aquele segredo com ela durante todos esses anos. Meu pai chegou a dizer que até contribuiu com as despesas do braço quebrado de na época do ocorrido.
Era estranho pensar em como ele viveu alheio a tudo aquilo, mesmo tendo Theresa sofrendo nas mãos do marido cada vez que ia para casa. Quando o indaguei sobre isso, levei uma resposta fria, indiferente. Irônico era saber que tínhamos virado da mesma família que meu pai tanto menosprezava.
Fiquei feliz em perceber que tivemos atitudes diferentes diante da mesma situação. Aquilo provava que eu não era igual a ele, algo que me atormentou nos últimos tempos.
Desci do carro cantarolando uma música qualquer enquanto caminhava pelo quintal de casa. Algumas coisas tinham mudado por ali desde que deixei a casa mais cedo, a começar pelo adeus a Elisabeta. , como sempre, chorou ao abraçá-la enquanto ela apenas ria, relevando tudo o que aconteceu no dia anterior. A babá demonstrou estar feliz por finalmente poder cuidar da filha e deu milhões de conselhos e dicas, além de prometer nos visitar sempre que pudesse. Elisabeta sabia que fazia parte da família, mas também demonstrou entender que seu papel ali tinha acabado.
Outra mudança foi notada assim que abri a porta e me deparei com aquele cheiro de limpeza – mas não era qualquer tipo de limpeza, era uma faxina profunda. O azulejo do hall de entrada chegava a brilhar. Ri baixinho e tirei meu terno. Aquilo era a cara de , descontar o tédio do desemprego na arrumação da casa. devia ter lavado até o teto, do jeito que era exagerada.
— Querida, cheguei — brinquei ao adentrar a sala e encontrá-la sentada no sofá, vidrada na tela à sua frente. — ? — me aproximei, só assim tendo sua atenção.
— Xiu, estou vendo as filmagens do casamento — abanou o ar, sem desgrudar os olhos da TV.
Onde diabos tinha encontrado aquele pen drive?
Prendi minha respiração, sentando-me ao seu lado. Pela sua expressão facial, ainda estava tudo bem. Quando vi que as imagens ainda mostravam sua entrada ao altar, percebi que estava calma daquele jeito porque o pior estava por vir – ou o melhor, dependia do ponto de vista. Mas tratando-se de , não era difícil prever que ela ficaria morta de vergonha quando assistisse a parte da festa.
Seus olhos azuis estavam atentos a tudo o que acontecia na filmagem. Com o rosto apoiado na mão, assistia à cerimônia como se estivesse vendo um filme super interessante.
Lembrava-me da primeira vez que vi aquelas filmagens. Foi quase como ver um filme de terror em que a gente implora para os personagens principais não irem em direção ao barulho sinistro vindo do porão, sabe? Quase gritei pra mim mesmo não ir ao altar. Mas aquilo foi há três meses atrás, hoje em dia eu já não via aquilo tudo com o mesmo pavor de antes.
Assisti junto dela nós dois trocando alianças. Eu já tinha visto aquilo quando o pen drive chegou um tempo atrás, mas, por algum motivo, ver ao lado dela me deixou nervoso.
— Estávamos tão sérios, né? — espiou-me rapidamente, voltando a encarar a tela. Murmurei algo, concordando. — Mas também, eu estava apavorada! — riu quando a câmera focou em seu rosto, quando estive prestes a me aproximar para beijá-la.
estava linda demais! Lembrava-me bem daquele dia. Acho que seria impossível se esquecer do seu primeiro casamento, mesmo que fosse tudo encenado. Mas, independente de tudo – até mesmo do ódio que sentia dela ou do pavor que ambos estávamos sentindo –, quando a vi entrar embalada pela marcha nupcial, não poderia dizer que fiquei alheio à sua presença.
Não só eu, todos naquele dia ficaram hipnotizados com vestida de noiva. Aquele vestido – apesar da confusão que foi comprá-lo – parecia ter sido feito para ela. Seus cabelos, maquiagem, até mesmo o cheiro que ela emanava ainda continuava vivo em minha memória, de tão marcante que aquela cena foi para mim. Nervoso, esperei-a durante seu atraso como se realmente fosse me casar, apenas para levá-la ao altar e firmar o trato que fizemos.
— Eu também estava nervoso — troquei olhares outra vez com ela, que vestia um moletom e um shorts jeans simples; os cabelos estavam presos num rabo de cavalo frouxo. — Jurei que iria me matar ali — ri junto dela, assistindo a parte do beijo, quando a puxei daquele jeito e lhe assustei.
— Tinham muitas testemunhas oculares.
Neguei com a cabeça, vendo a imagem dos convidados vibrando e achando graça da cena. Claramente pessoas que não nos conheciam de verdade.
— Por um lado é até bom termos essas filmagens guardadas — ela continuou. — Assim vamos poder mostrar a quando ela quiser saber de toda a história por trás da adoção dela.
Comprimi os lábios antes de discordar totalmente.
— Acho que não vai querer mostrar isso a ela tão cedo — falei, e virou o pescoço, confusa.
— E por que não? — franziu o cenho. Lhe estendi a mão, pedindo o controle que estava no braço do sofá ao seu lado.
— Há um motivo para eu ter escondido esse pen drive tão bem.
Passei as imagens para frente, tudo: as fotos que tiramos em frente ao pôr do sol, a nossa dança dos noivos e ainda um pouquinho do início de festa, quando ainda estava sóbria e agindo como uma pessoa normal.
Passei um pouco demais, então voltei, fazendo tudo ficar ainda mais engraçado. A piada de que se assistíssemos tudo aquilo de trás para frente como se nunca tivéssemos casado me veio à mente, porém decidi me calar, já sabendo que ficaria passada quando assistisse o que eu lhe mostraria. Achei melhor não provocar muito.
— Meu Deus do céu.
Não perdi meu tempo olhando para a TV. Só pela música eu já sabia o que a tinha feito reagir incrédula daquele jeito. Era dançando My Humps do Black Eyed Peas.
Seu rosto ficou tão vermelho que parecia que ela iria explodir naquele sofá. Levei a mão ao rosto, tentando esconder meu sorriso que crescia e ficava completamente incontrolável, impossível de não ser notado. Eu não consegui evitar e rir da cara que ela estava fazendo.
— Meu Deus, eu não acredito que fiz isso, que vergonha — tampou os olhos com ambas as mãos enquanto se encolhia cada vez mais.
Tão alterada quanto, Fanny ao seu lado a incentivando era hilário. Eu tinha certeza que iria matar a amiga na próxima vez que a encontrasse na sua frente. Os convidados assistiam empolgados se divertindo com a cena, o que só a deixava mais envergonhada. Recordei-me do desespero de Anne quando foi me chamar para avisar que estava descendo até o chão na pista de dança.
Eu não estava aguentando, já gargalhava sendo estapeado por .
— Ah, graças a Deus alguém parou isso.
Eu surgi na tela e a peguei pelo braço, tirando-a do meio do povo. Se eu soubesse que iria me divertir tanto com as imagens depois, teria deixado ela passar mais um pouco de vergonha.
— E você ainda ficou brava comigo!
O constrangimento que foi quando sacou que eu já tinha dormido com Jordyn e minha secretária se fazendo de inocente indo no nosso casamento foi a cereja do bolo. Hoje, depois de termos passado por tudo aquilo, a maioria dos acontecimentos eram engraçados.
Bom, pelo menos para mim.
— A culpa é toda sua, ! Me deu aquela bebida forte antes da festa começar e depois me largou sozinha.
E eu lá tinha cara de babá?
Ofeguei diante de seu dedo hasteado. Que calúnia!
Antes eu tivesse mesmo deixado-a sozinha a festa inteira. logo se arrependeria de ter me acusado de abandoná-la.
— A ideia de ficarmos bêbados foi sua! — protestei. cruzou os braços, contrariada, como uma criança faria.
— Mas você não ficou também!
Revirei os olhos com sua birra. Eu tinha ficado sim um pouco alterado, mas não no nível dela. Até porque era com certeza muito fraca para bebida.
— E eu tentei te parar, mas sua teimosia não deixou que você me obedecesse — tentei segurar o riso quando me encarou puta da vida. Ela odiava aquela palavra, “obedecer”.
Mudei de ideia sobre não mostrar aquelas filmagens para . Seriam úteis na adolescência, quando começassem a lhe oferecer bebidas alcoólicas antes da maioridade. As vergonhas que passou no casamento serviram de aviso sobre os perigos do álcool.
— Nem sei mais se quero terminar de ver isso — checou o tempo de vídeo e concluiu sozinha que poderia ter mais momentos vergonhosos de si. — Pior que eu praticamente não me lembro de quase nada depois que comecei a beber.
— Fica pior — avisei, vendo-a arregalar os olhos, provavelmente se perguntando se tinha como ficar pior. — Se quiser continuar, é por sua conta e risco — lhe estendi o controle sob seu olhar desconfiado.
não estava acreditando.
— Tudo bem — cantarolei, encostando-me no sofá de modo que ficasse mais confortável enquanto tirava o vídeo do pause.
As imagens a seguir foram de convidados aleatórios dançando na pista. Naquele momento, estava comigo, sentada e controlada. Chace a viu pela primeira vez e já tinha notado seus olhos brilhando pro lado dela; já ficou toda assanhada com ele. Porém, a calmaria não durou muito tempo – logo nós dois aparecíamos de volta na pista de dança, mas separadamente.
Quando Hot N’ Cold estava para terminar, inventou de fazer gracinhas e nós acabamos tendo que encenar o casal feliz novamente. Tá, eu a beijei, mas foi apenas por pressão popular, já que os convidados que agitaram. e eu nem parecíamos recém-casados até então. Eu mal a tinha visto durante a festa, e acredito que ela se aproveitou muito disso na hora de encher a cara descontroladamente.
me encarou com as sobrancelhas arqueadas enquanto na tela grande passavam imagens nossas praticamente nos engolindo. Dei de ombros, voltando a ver a filmagem. Eu avisei que ficava pior, e não era nem por conta de um simples beijo. Até porque já sabia que tínhamos nos beijado muito durante a festa, as fotos do casamento deixaram aquilo bem claro.
— Será que era sobre isso que Anne tinha falado quando discutiu comigo naquele dia?
— Não, era sobre isso aqui — passei o vídeo mais pra frente novamente, já podendo ver voltar a se encolher em pura preocupação.
Eu disse que ficaria pior.
Após vermos imagens nossas dançando juntinhos enquanto tocava alguma música lenta, nos movimentando em alta velocidade em ritmos mais agitados, finalmente parei na parte em que teria que ver com os próprios olhos por não acreditar em mim. A voz da Rihanna embalava a música de batida sensual, enquanto na tela e eu aparecíamos envoltos numa espécie de mundo particular.
Era até engraçado pensar que a cantora fazia parte de todos os nossos momentos mais quentes. Algo em sua voz nos despertava desejo. Rihanna era afrodisíaca aos nossos ouvidos. Minha esposa, naquela noite noiva, dançava envolvendo meu pescoço com seus braços enquanto me olhava no fundo dos olhos e movia o corpo de um jeito que estava me deixando louco só de assistir – daquela vez, fora de cena. me olhou de canto, engolindo em seco.
Respirei fundo, tentando disfarçar o calor que me subiu quando a assisti tomar minha boca com aquela lentidão fudida que me deixou completamente duro na hora. Minha ansiedade era visível no modo como eu avançava o rosto contra o seu, aprofundando o beijo e puxando-a para mais perto.
Entreabri meus lábios, evitando mordê-los quando a loira se virou, ainda dançando devagarinho. Aquela era a minha parte favorita. Admitia que tinha me acariciado ao assistir pela primeira vez quando o pen drive chegou, claro, sozinho em casa. Relembrar o modo como suas costas colaram-se em meu peito e a sensação de sua bunda encostando-se em mim conforme ela desceu até o chão na minha frente e subiu logo em seguida. Porra, o modo como rebolou aquela bunda gostosa em meu pau, inclinando-se para frente e virando o rosto para espiar minha reação, que foi imediata, fez minhas mãos a pegar pelos quadris, aumentando o contato ao projetar o quadril em direção a ela, como se a estivesse penetrando.
— Oh, céus, as pessoas em volta nos olhando… — se lamuriou ao meu lado. — Eu nunca mais vou sair de casa.
Ignorei-a, ainda assistindo seu sorrisinho safado na tela, satisfeita ao me ver morto de tesão. Pela primeira vez na vida correspondendo-a como se fosse um cachorrinho abanando o rabo com um simples estalar bobo de dedos de sua dona.
sabia que tinha vencido ali, sabia que me teve nas mãos naquele mesmíssimo instante. Só não tinha plena certeza daquilo porque estava bêbada demais para raciocinar direito e usar aquilo como arma contra mim. Porém, naquele momento, sóbria e capaz de distinguir bem as coisas, minha esposa me encarou de cenho franzido, mas não disse nada – que, para mim, já quis dizer alguma coisa.
— Doida pra dar pra mim — murmurei durante um risinho, numa tentativa de não sair muito por baixo. me encarou boquiaberta.
— Ah, como se você não estivesse querendo me levar pra cama também.
Levantei uma das sobrancelhas. Pelo menos ela não negou sua parte, o que não diminuía minha participação. Porém, já me deixava com o orgulho menos ferido.
— É óbvio que eu queria! — neguei com a cabeça diante de seu olhar curioso. Mesmo depois de já ter admitido que a queria tantas vezes e de até já tê-la tido daquela forma, falar sobre o passado que tínhamos envolto ao ódio mútuo ainda era difícil. — Tinha uma mulher gostosa rebolando no meu pau, óbvio que eu iria ceder!
— Me achava gostosa? — um sorrisinho nasceu em seus lábios, porém tentou disfarçá-lo, comprimindo-os.
— Eu sempre achei — remexi-me desconfortável no sofá, vendo-a me olhar e querendo saber mais sobre o assunto.
Eu sabia o quanto me ouvir admitir aquilo estava acariciando seu ego, e eu me forçava a ficar calado para não alimentar aquele monstrinho. Porém, ao mesmo tempo, o calor que me subia o corpo queria me fazer falar tudo o que guardei comigo por anos.
— A primeira vez que reparei em você foi na festa de despedida, quando eu ia me mudar pra cá para estudar. Eu sempre te odiei, mas não deu pra ignorar aquele biquíni minúsculo que você estava usando.
— Eu odiei ele! — riu, com o rosto rubro. Lembrava-me dela o ajeitando o tempo todo no corpo, principalmente na parte de trás, o que apenas fez chamar a atenção para si. — Sua irmã me obrigou a colocar. Disse que iríamos estar entre os veteranos e que tínhamos que chamar a atenção de alguma forma.
— Conseguiu — me aproximei, lhe sussurrando ao pé do ouvido antes de mordiscar o lóbulo de sua orelha e vê-la se arrepiar e encolher os ombros.
negou com a cabeça, discordando. Eu sabia bem que não era sua intenção chamar minha atenção naquela festa. E não era a minha também babar por ela.
Beijei a linha de sua mandíbula, deslizando as pontas dos meus dedos por sua coxa exposta e por sua perna flexionada. Acariciei a parte interna até onde seu short me permitiu ir. estremeceu e levou a mão até meu pescoço, subindo seu toque suave pelos meus cabelos.
— Eu amo quando você me pega desse jeito.
Na tela, estávamos ainda grudados. Eu ainda lhe agarrava por trás enquanto aproveitava seus cabelos jogados para o lado para beijar seu ombro e pescoço; me puxava os cabelos, visivelmente excitada ao continuar mexendo os quadris no ritmo da música.
Parecia que tudo estava em câmera lenta – ou era o calor do momento que me deixava daquele modo –, mas ao reparar em nós dois naquelas imagens, senti um tesão incontrolável. Era como se estivéssemos vendo um pornô. Nunca imaginei que fôssemos tão quentes, tão incríveis juntos. Parecia um desejo de anos sendo concretizado em frente às câmeras, uma conexão antiga. Era bizarro, dado o contexto da época em que nos casamos, quando ainda afirmávamos com todas as letras que não nos suportávamos.
— Você rebola tão gostoso, amor — minha voz saiu sôfrega. gemeu arrastado, alcançando minha boca e beijando-me com urgência.
Puxei-a para meu colo, tendo-a se encaixando em mim ao colocar suas pernas uma em cada lado da minha coxa. Desci meu toque pelas costas dela, lhe desferindo um tapa na bunda antes de apertá-la com vontade, enchendo minha mão e arrancando suspiros de minha esposa, que passou a rebolar ali, sobre meu membro pulsante.
Levantei seu moletom, revelando seus seios empinados. Abocanhei um por um ao massageá-los e encará-los, vidrado como sempre, sabendo que mesmo se os visse quinhentas vezes, ainda assim me deixariam louco como se fosse a primeira vez. Aliás, qualquer mínimo pedaço de pele de fazia-me sentir daquela forma, era algo que eu não sabia bem como explicar. Tudo relacionado a ela e seu corpo trazia-me a sensação de algo inédito, algo que parecia que eu não encontraria em nenhuma outra. Nem que eu passasse a vida procurando.
riu quando o moletom escapou de minha mão e me cobriu a cabeça, deixando-me preso dentro dele. Saí debaixo e recebi seu rosto, que colou-se ao meu à medida em que uma gargalhada sonora ecoava pela sala. Encarei seu rosto risonho por poucos segundos, mas que por um momento se pareceram minutos.
Os olhos brilhantes de logo focaram-se em algum ponto da minha coxa. Ali, senti algo vibrando e me dispersei, a fim de desligar meu celular que tocava. Apertei o botão lateral com dificuldade, devido à minha urgência em apagá-lo de vez. Porém, o máximo que fiz foi encerrar a chamada. Joguei-o para o lado e voltei a beijar minha esposa, que emaranhou seus dedos em meus cabelos devagarinho enquanto voltava a mover o quadril sobre mim.
Relaxei-me no sofá, lembrando-me de que deveríamos pular as preliminares, já que tínhamos uma bebê – aparentemente – à prova de sexo em casa, que parecia advinhar quando as coisas estavam começando a esquentar entre os pais. Para falar a verdade, as coisas sempre estiveram quentes entre nós, só não tínhamos nos dado conta ainda.
O sofá voltou a tremer. Daquela vez, não tive tempo de alcançar o aparelho para enfim desligar e silenciar quem quer que estivesse atrapalhando nós dois. estava dormindo, segura em seu berço, e estava ali comigo. Não tinha motivo plausível para pararmos as coisas ali para lidar com problemas insignificantes! Quem realmente me preocupava já estava ali, naquela casa comigo.
— Atenda seu telefone — sua voz soou fria, completamente incompatível com o clima em que estávamos.
Não compreendi até que lançou-se de volta ao sofá, jogando meu celular pra cima de mim com raiva. Vi na tela o nome de Dafne piscar e encarei minha esposa. Ela me encarava ainda ofegante, com um olhar que não soube distinguir bem, porém não era o mesmo de segundos atrás.
— Anda, , Dafne quer falar com você.
— … — não consegui impedi-la de ir marchando até a cozinha. Suspirei, irritado, atendendo a droga do celular. — Alô.
— ? Desculpa estar atrapalhando, é que você é o único amigo que parece estar disponível agora — sua risadinha sem graça me fez sentir culpado por ter sido grosso. Suspirei em frustração, encarando a entrada da cozinha. Eu tinha que ir atrás de . — Bom, você não falou nada… mas eu preciso de um favor. Meu carro quebrou. Estou aqui na rua perto da faculdade, passando vergonha e com um pouco de medo de esperar o guincho sozinha no meio da rodovia e…
— Sem problemas, Dafne — eu não queria estar em outro lugar além daquele sofá, com em cima de mim, mas realmente parecia ser uma emergência, e eu não iria me perdoar caso algo acontecesse com ela. — Me mande sua localização, sim? Estou indo — espiei novamente, vendo encostada no batente de braços cruzados. — Tchau, beijo.
— E você ainda diz que vai parar de vê-la — fungou o nariz vermelho. Ofeguei, levantando-me do sofá. A decepção estava explícita em seu semblante.
— É uma emergência, …
— Eu sei bem que tipo de emergência é essa — riu sem humor, sua voz soou trêmula.
— Não é isso que está pensando — que fala clichê. — Eu volto logo...
— Não precisa me explicar nada, eu não quero saber e isso nem me interessa — ela saiu em disparada escada acima, deixando-me puto da vida ali plantado.
Saí de casa, tirei meu carro da garagem e segui de encontro a Dafne. Não pude deixar de temer o que faria quando fosse naquele jantar patético com Dormian. Ela com certeza descontaria toda a raiva com ele, e eu não gostava nem de imaginar como.
Ajudei Dafne.
Curto e grosso. Tão rápido quanto durou aquela ligação, foi o tempo em que nos encontramos naquela noite. Encontrei-a já junto dos caras do guincho, então a única coisa que fiz foi lhe dar uma carona para casa. Dafne me perguntou se eu queria entrar; neguei, fazendo-a perceber que ela atrapalhou algo entre mim e . A morena me deu um beijo na bochecha e desceu, agradecendo-me pela quinta vez consecutiva.
Cheguei em casa já encontrando tudo escuro, aparelhos desligados e um silêncio que me agoniou levemente por já saber que ele permaneceria caso eu não me esforçasse para me redimir. Levei um susto ao passar pela cozinha e me deparar com encostada no balcão, comendo uma colher enorme lotada de sorvete.
— Não está cedo demais pra dormir? — encostei-me ao lado dela, que já vestia uma camisola curta de alcinhas, que deixava seu colo à mostra. balançou a cabeça, ainda com a boca cheia.
— Achei que não iria dormir em casa hoje.
não olhou em meu rosto desde que cheguei, parecia determinada a não fazê-lo. Orgulhosa do jeito que era, eu acreditei que não teria seu olhar no meu aquela noite, não depois de tê-la visto chorar por minha culpa.
— E te deixar dormir sozinha? — ri sem humor, não sendo acompanhado por ela. — Não saí de casa com intenção de dormir fora. Eu te disse que voltava.
— Não precisa se preocupar com isso, devia ter ficado com ela — enfiou a colher de volta no pote, cruzando os braços. — Eu vou me acostumar a dormir só de novo.
— Ainda falta o quê, sete, oito meses para o divórcio? — murmurei, confuso.
— Sim, mas agora que Elisabeta foi dispensada, você pode voltar para o seu quarto.
Encarei-a sem reação. Ela estava me colocando pra fora do quarto? Sua indiferença me causou um incômodo no peito.
— O quê? , eu não quero mudar de quarto, não quero dormir sem você.
Seus olhos focaram-se em mim por um instante. colocou os cabelos para trás da orelha, hesitante. Fui até ela, pegando seu rosto e aproximando do meu.
— Você pode se acostumar, mas eu não vou — falei, e ela riu sem humor, tentando tirar minha mão de si. — Me dê um beijo, sim?
— Não — se esquivou, afastando-me —, você beijou ela — acusou, enojada.
— Não a beijei — mesmo contra sua vontade, me lançou seu olhar desconfiado. — Eu juro por que não a beijei. Não queria nem ter ido até lá pra começo de conversa. Queria ter ficado com você aqui.
— Mentiroso.
Engoli em seco. não acreditava em nada que eu falava! Era frustrante demais!
— Estou falando sério.
respirou fundo, mantendo-se calada diante de mim.
— Eu iria desligar o celular, não queria que ninguém nos atrapalhasse — peguei seu queixo novamente, fazendo-a me olhar nos olhos. — Eu quero você, estou morto de saudades. Me dê um beijo, me desculpa se te magoei.
— Não estou magoada — desviou o olhar, me dando um selinho rápido.
Estava sim.
— Um beijo de verdade — decretei, tomando seus lábios e pedindo passagem com a língua.
Nem mesmo quando estávamos começando a fingir nos beijávamos daquela forma fria. e eu, na verdade, nunca fizemos muita questão de esconder que sentíamos uma atração mútua além do ódio. Nós aproveitamos da situação desde o início.
Minha esposa foi cedendo aos poucos. Deixou-me aproximar nossos corpos, me permitiu emaranhar meus dedos nos fios loiros e puxá-los. Encarei seu rosto enquanto ainda o tinha em mãos, desferi um selinho casto em sua boca e desci para o pescoço à mostra e totalmente vulnerável.
— Vamos terminar o que começamos no sofá? — sussurrei ao pé de seu ouvido, sugando sua pele e sabendo que aquilo provavelmente deixaria marcas.
tombou a cabeça para o lado, fazendo-me temer uma represália. Porém, sua consideração não durou muito tempo. Logo ela envolvia os braços em meu pescoço e subia sobre a bancada quando dei impulso para colocá-la ali em cima.
A loira me ajudou, levantando os braços para que eu tirasse sua camisola. Deixei-a apenas de calcinha, enquanto tentava desabotoar minha camisa clara sem muito sucesso no quesito velocidade. Puxei o tecido que ainda estava preso, estourando alguns botões, que saíram voando pela cozinha. me desferiu um tapa no peito, porque tinha sido ela quem tinha limpado tudo antes de eu chegar e bagunçar a casa.
Nossa dinâmica era daquele jeito mesmo: estabelecia as regras e organizava tudo, e eu era o responsável por burlá-las e bagunçar. Algo me dizia que com as coisas seriam exatamente iguais.
Porém, ela não teve como protestar por muito tempo, já que explorou meu peito e abdômen com suas unhas curtas assim que tirou a camisa do caminho. Logo minhas calças e cuecas também já iam para o chão.
Alcancei o pote de sorvete, enfiando os dedos dentro dele e lambuzando seus mamilos de chocolate. ofegou pela temperatura; já eu me deliciei ao chupá-los sem a menor pressa aparente, arrancando-lhe gemidos maravilhosos de sua boca.
— Ainda mais gostosa — lambi sua barriga, limpando um pouco do que escorreu antes de ir atrás da minha calça e apanhar minha carteira.
Tirei sua calcinha já puxando-a pelos quadris até a ponta do balcão. desfaleceu quando a penetrei de primeira, com tudo, fazendo com que seus seios se balançassem com os movimentos feitos a seguir. Inclinei-me para beijar sua boca e tentar abafar os murmúrios que soltava.
Me perguntei se quem passava na rua lateral não iria ouvir, já que estava um pouco alto. Ao mesmo tempo não queria que ela parasse, fazê-la gritar ao ponto de todo mundo ouvir era incrível demais. Era inevitável não compará-la com as outras mulheres com quem já estive na cama. Era impossível classificá-la abaixo de todas as outras, ela merecia o topo. Eu ainda não entendia muito o que era, mas nós dois tínhamos algo muito particular, uma química que jamais imaginei encontrar justo na minha ex-arqui-inimiga.
Acabamos no chão, exaustos depois de prolongar os orgasmos, diminuindo um pouco o ritmo quando estávamos chegando ao ápice. Aquela técnica chamada edging quase nunca funcionou comigo. Eu não tinha muita paciência em me segurar, principalmente quando estava prestes a gozar. Mas com eu fazia um esforço, e tinha valido a pena. O modo como ela se agarrou a mim enquanto tremia e tinha espasmos pelo corpo inteiro apenas potencializou o meu prazer.
Encaramos o teto por um tempo, aproveitando o piso gélido para espantar o calor que fazia ali. Eu não saberia dizer se estava quente demais ou se éramos nós, suados e esgotados. Apoiei minha cabeça em meu braço, virando-me de lado para olhá-la. só estava deitada ali, completamente nua, porque ela mesma tinha limpado aquele chão; caso contrário, se recusaria a estar ali.
Ri pelo nariz, vendo-a me olhar estranho. Era engraçado como era um pouco esquisita com suas manias desde criança. Mais engraçado ainda era o modo como eu aprendi a lidar com elas e até achar graça, eu costumava odiar até sua respiração.
Como era louco voltar no tempo, olhar em volta e ver onde nós tínhamos ido parar.
— Era para ter sido você — falei, e a loira apoiou-se nos antebraços sem entender nada. Mordi o lábio, sorrindo fraco. Que merda, eu tinha prometido pra mim mesmo que nunca falaria sobre aquilo com ninguém. E olhe justo para quem eu estava falando. — Nossa lua de mel. Eu pensei… bom, planejei durante a festa como faria contigo quando chegássemos em casa. Estava louco pra te arrancar aquele vestido mas…
— Anne veio junto — concluiu ao negar com a cabeça, olhando-me pensativa.
Era inevitável pensar no que teria acontecido. Começaríamos a transar desde então? Ou nunca mais iríamos nos aproximaríamos de novo, com medo de que tudo se repetisse?
— Quer saber? Provavelmente foi melhor assim — suspirei. — Você não iria se lembrar de nada. Iria amanhecer me estapeando e me acusando de ser um tarado.
gargalhou alto.
— Iria mesmo — confirmou, risonha.
Capítulo 40
A loira gargalhou, jogando a cabeça para trás. De repente lembrei-me de uma cena parecida com a situação que provavelmente aconteceria caso e eu tivéssemos transado: a personagem de Drew Barrymore em “Como Se Fosse a Primeira Vez” acordando com sua amnésia de todos os dias ao lado do Adam Sandler, sem lembrar que dormiram juntos na noite anterior.
— Me lembro da nossa primeira vez.
Foi inevitável não embutir aquela lembrança quando o assunto me veio à cabeça.
Aquela noite em Tulum tinha sido inesquecível, mesmo com a confusão da camisinha atrapalhando e conseguindo nos impedir de consumar o ato. Aliás, arrisco dizer que toda aquela viagem, mesmo com os problemas incluídos nela, foi inesquecível. Era engraçado como eu estava equivocado sobre não querer levar comigo. Já tinha feito diversas viagens de fim de ano com meus amigos, mas aquela tinha um quê especial.
Talvez fosse o fato de ser a primeira viagem com a bebê, ou o modo como minha caçada de gato e rato com tinha ganhado uma reviravolta e tanto. Quem diria que aquele casamento forçado iria evoluir àquele ponto?
— Estamos nostálgicos hoje — cantarolou, risonha. Mexi a cabeça; talvez fosse por causa dos vídeos do casamento.
Curiosamente, só nos demos conta das mudanças que sofremos durante aqueles três meses quando nos deparamos com registros nossos do passado. Tinha acontecido tudo tão naturalmente que eu acreditava que não falava só por mim quando dizia que não tinha notado as coisas mudarem, ou se transformarem, no nosso caso.
O ódio que sentíamos tinha se multado em cuidado quando se machucou, para logo depois se transformar em desejo quando… Bem, não me lembrava ao certo que evento me fez reparar nela antes. Eu mesmo já tinha admitido que a achava gostosa no passado, mas então de onde tinha vindo meu instinto de proteção e cuidado?
Mesmo que fossem sentimentos e sensações concretas, o que despertava em mim ainda era um mistério sem solução.
Minha atração por talvez tenha se iniciado mesmo no episódio da camisola transparente, ou como lembrado anteriormente, quando a vi de biquíni na adolescência.
Lembrava-me com clareza de quando a vi pela primeira vez, do dia em que Thereza chegou com a menininha loira de mãos dadas no aniversário de oito anos de Grace. praticamente sumia atrás da mãe, que a levou porque minha mãe tinha sugerido que ela levasse a filha para conhecer nossa família.
Não fui com a cara dela de imediato. Minha irmã foi o contrário de mim; puxou-a pela mão, louca para enturmá-la com as amiguinhas, e se esqueceu que tínhamos combinado de brincar na cama elástica que tinham alugado. Apesar dos esforços de Grace, estava bem cabisbaixa naquele dia. Naquele tempo eu não sabia o que possivelmente já acontecia na casa dela. Não gostei do modo como era fechada e apenas interagiu direito com minha irmã naquele dia.
Ela foi crescendo e, à medida que as duas iam se aproximando, minha interação com foi ficando pior. De repente ela não era apenas uma criança tímida e escolhia não falar comigo mesmo, e aquilo me tirava do sério! Ela entrou na minha casa, praticamente usurpou o meu cargo de irmão e ainda por cima me ignorava?
Hoje eu conseguia ver que o modo como escolhi provocá-la, por muitas vezes, era causado por pequenas doses de atração. Como quando cortou os cabelos claros curtos e eu lhe apelidei de Beiçola Loiro, quando na verdade eu tinha curtido o resultado. Ou quando ela cortou uma franja e eu a achei bonitinha, mas caçoei tanto da cara dela que a coitada passou a usar os cabelos presos até que crescessem novamente. Zombava de suas roupas, de sua risada e até de suas falas. Não me orgulhava daquilo; depois de mais velho, passei a perceber que a fazia sentir mal e parei de zombar de sua aparência.
Até porque, na adolescência, eu não tive muito o que fazer a não ser ignorar o fato que ela ficava cada vez mais bonita e, enquanto isso, na mesma medida, cada vez mais atrevida em suas respostas. Era divertido entrar em discussões com ela, vê-la vermelha diante de mim enquanto seus olhos queimavam em ódio, completamente vidrados em mim. Às vezes eu olhava para sua boca movendo-se com rapidez quando despejava rios de insultos contra mim.
Hoje sei que o que eu sentia não era apenas ódio, mas sempre mascarei para mim mesmo que era, sim, desprezo, e eu a repelia sempre que possível. Se vasculhasse bem minhas lembranças do ensino médio, não seria difícil achar momentos em que eu admitia internamente que alguns atributos físicos de eram… interessantes antes mesmo do dia do biquíni. dormiu muitas vezes em casa, e eu já entrei no quarto de Grace com uma desculpa qualquer só para vê-la vestindo pijamas de verão.
Tudo tinha começado de uma olhada e outra. Enquanto não era nada concreto e um segredo que eu guardava a sete chaves, estava tudo ok. Eu simplesmente fingia que não sentia nada.
Porém, depois do casamento, ter que beijá-la e fingir que não gostava… Eu não consegui resistir por muito tempo. Quanto a , bom, ela era uma incógnita. A única coisa que ela me deixava saber sobre seus sentimentos em relação a mim no passado era que não me suportava. Mas não era como se eu já não estivesse acostumado com seus segredos, principalmente quando se tratava sobre sentir ou não algo em relação a mim.
— Até hoje não acredito que topei fazer aquilo na casa de Megan — sua fala me fez arquear as sobrancelhas, voltando à realidade após ter mergulhado em devaneios sobre o passado. — Eles jantando normalmente, e nós dois… — não conseguiu completar, ficou vermelha feito um pimentão e cobriu o rosto.
Oh, nossa primeira vez juntos tinha mesmo sido na casa de Megan. Eram muitas lembranças embaralhadas, mas recordar aquela noite me fez sorrir. Foi a primeira de muitas vezes que tive o prazer de deslizar a língua em sua pele deliciosa.
— E, pelo visto, você sempre foi escandalosa desse jeito — ri da sua cara, lembrando-me da cena que protagonizamos minutos atrás naquele móvel na cozinha.
Eu adorava, mas que homem não gostava?
sempre me deixava saber o quanto estava gostando quando eu a tocava e a beijava. Era engraçado fazer aquele paralelo com o modo como era contida quando se tratava do que sentia e o modo como ela se entregava por completo quando estava em meus braços.
— Para! — empurrou-me pelo ombro e sentou-se, escondendo o rosto entre os joelhos. Me levantei junto, abraçando seu tronco e beijando sua nuca enquanto ria contra sua pele quente.
Queria que se abrisse para mim do mesmo jeito que fazia na cama, sem pudor, sem vergonha. Adoraria ouvi-la declarar o que sentia com a mesma naturalidade com que gemia em meu ouvido. Mesmo reclamando tanto de tê-la sempre guardando o que sentia, eu não poderia negar que era delicioso quando ela me olhava nos olhos e finalmente me deixava saber de algo que se passava dentro de si. Nunca conseguiria explicar o que era o frio na barriga que eu sentia quando me dava o privilégio de ouvir algo sobre si.
— Eu não consigo controlar — murmurou, ainda risonha. O som de sua voz saía abafado por causa das mãos ainda cobrindo seu sorriso.
— E nem deve — acariciei a região da sua costela, dedilhando os ossos aparentes com a ponta dos dedos, como se tocasse as cordas do meu velho violão. se encolheu em meu abraço, reproduzindo sua risada sem graça que soava como uma melodia aos meus ouvidos. — Sabia que é controlada demais?
levantou o rosto, tirando os fios loiros do caminho dos olhos, que cintilavam enquanto seus lábios se curvavam num sorriso contido. Ao contrário do que eu poderia prever, não assumiu a postura defensiva que um tempo atrás lhe caberia como uma luva. Ao invés de se defender como se o que eu disse soasse como uma ofensa ou um ataque, apenas assentiu com a cabeça. Reconheceu, deixando tudo mais leve.
Nossa cumplicidade recém-adquirida deixava toda e qualquer situação tranquila. Era muito novo para mim me relacionar com uma mulher daquela forma, sem pisar em ovos. Com , então… aquela estranheza boa apenas se triplicava.
— Amo te assistir perder o controle — beijei sua boca devagar, tendo seu antebraço encaixando-se em minha nuca, juntando-nos cada vez mais. — Amo saber que sou o responsável por te fazer perder a pose de mandona, se derreter em meus braços e abrir essas pernas… — desci meus lábios pelo seu pescoço e tronco, parando em um de seus seios e sugando seu mamilo.
soluçou em êxtase, pegando meus cabelos entre os dedos e fazendo um carinho gostoso neles.
Nossas pernas flexionadas se embolaram como fazíamos na cama logo pela manhã, quando eu sentia os pés gelados de se encostando em minhas panturrilhas. Já tinha desistido de lhe vestir meias e me acostumei com aquele defeito proveitoso quando estava calor, e torturante quando fazia frio.
— Eu me sinto tão bem com você, tão bem… — larguei sua pele e massageei seu mamilo já rijo, molhado por minha saliva. Havia outra coisa molhada em seu corpo, que descobri assim que levei minha outra mão até o calor entre suas pernas abertas. Introduzi um dedo em sua entrada, vendo-a revirar os olhos e gemer contra meu rosto.
— Já quero fazer de novo — sussurrou em meu ouvido, arrepiando-me e me deixando louco. Sua mão acariciou o dorso da que eu usava para penetrá-la com meus dedos devagar, torturando-a com a lentidão.
— Seu desejo é uma ordem — sorri faceiro, vendo-a rir com a rapidez que formulei a frase e a pronunciei.
— Não aqui, o chão está frio — ela se desvencilhou de meu movimento quando me inclinei para voltar a deitar-lá, já indo em cima dela.
— Ok, Vossa Majestade — me levantei e puxei-a pela mão, a ajudando a se levantar. Assim que ficamos de pé, fiz questão de colar nossos corpos antes de beijar sua boca com avidez, avançando com o quadril sobre sua virilha e vendo-a se arrepiar em desejo. — Vamos pro sofá.
Deixei-a ir na frente quando, contra a minha vontade, nos separamos e eu fiquei na cozinha para ir atrás da minha carteira. Assim que consegui o preservativo, rumei para a sala, encontrando-a sentada já me esperando, Mordi o lábio ao contemplar seu corpo nu e comecei a reparar que tinha uma espécie de feitiço sobre mim. Sempre achei que transar sempre com a mesma mulher por muito tempo chegaria num estágio em que eu me cansaria de ter a mesma visão.
Foi assim com todas as minhas ex-namoradas – não que desse para comparar o que eu tinha com com um dos meus namoros. Apesar de conter sentimentos, aquele casamento falso era o mais próximo de relacionamento sério que eu já tive na vida.
A adoção de era o fator predominante ali. Tudo era impassível de erros graves, mais sério até do que um namoro ou um casamento de verdade.
Beijei sua boca e peguei-a forte pela nuca, forçando-a a manter a cabeça elevada ao puxar bem a raiz de seus cabelos lisos. gemeu contra meus lábios, adorando aquela dominância animalesca. Sentei-me, puxando-a para se sentar em minhas coxas. Observei hipnotizado quando a loira gostosa se ajeitou em cima de meu pau já completamente ereto.
Ele não podia sequer vê-la que já se acendia como um isqueiro, que num simples clique há uma chama surgindo como um passe de mágica. Meu corpo reagia ao dela com uma simples menção de sua presença e existência. Meu olfato reconhecia seu cheiro durante a noite quando eu acordava na cama e não sentia a fragrância de seu shampoo, porque a tinha longe nas vezes em que ia checar em seu quarto. Parecia um cachorro que sente o cheiro do dono a quadras de distância, e quando o encontra, abana o rabo e quase morre de felicidade.
— Isso, linda, faz assim… — grunhi ao passar os olhos por sua barriga e seios suados, vendo-os em movimento cada vez que ela sentava em meu pau já envolto pela camisinha. Deslizei meus dedos por seu osso proeminente do quadril, ainda assistindo-a em ação, gemendo baixinho por conta da minha zoação anterior. Sorriu safada quando reparou em meus olhos vidrados nela. — Meu Deus, , você me deixa louco…
Sua gargalhada convencida me fez sorrir.
Puta que pariu, que mulher deliciosa. Minha esposa era uma puta de uma gostosa.
Abocanhei um de seus seios, ouvindo-a me ordenar que a chupasse inteira como prometi e fiz naquela vez que estivemos na cozinha. Sua mão passou a forçar meu rosto contra seu mamilo enquanto ela se deleitava com as sensações que minha boca lhe proporcionava.
Eu o faria de novo, quantas vezes fossem necessárias. Parecia que eu nunca me cansaria daquilo, da miragem que era ver seus quadris subindo e descendo sobre meu corpo, mesmo tendo-a tantas vezes antes. Mesmo depois de ter mapeado todas as suas pintas e cicatrizes, eu continuava com o mesmo tesão da primeira vez.
Ela jogou a cabeça para trás, deixando os cabelos caírem pelas costas ao se apoiar em meus ombros e aumentar a velocidade. ofegava e se esforçava para continuar a me dar prazer, passando a apenas rebolar quando se cansou de me cavalgar.
Joguei-a no sofá e escalei seu corpo, me encaixando de volta em sua entrada úmida, tendo suas coxas já envolvendo meu quadril e me fazendo sentir o cara mais sortudo do mundo ao reparar em como tínhamos um encaixe perfeito. Todos aqueles anos brigando… foi um tempo perdido. Poderíamos ter gastado nossas energias fodendo, gemendo contra o ouvido um do outro ao invés de gritar. Só os xingamentos e os puxões de cabelo que eu não mudaria – estávamos dando um jeito de manter as tradições entre nós bem vívidas.
— Ai, amor… — a ouvi dizer, e sorri contra seu pescoço quando senti suas unhas curtas arranhando-me as costas. Levantei o rosto e a vi praticamente desfalecer embaixo de mim, completamente arrepiado e imerso naquela sensação que experienciei ao ouvi-la me chamar daquele jeito, quase inconsciente de prazer. — Não pare… — soluçou, revirando os olhos azuis. Mordi seu lábio inferior, puxando-o com força. — Por favor… — ofegou.
— Não vou — beijei suas bochechas. Estoquei-a mais rápido ao sentir que estava chegando no ápice após o dela, que já tinha gozado e apenas me esperava fazer o mesmo para que pudéssemos finalmente voltar a respirar. Não que já não estivéssemos fazendo aquilo, mas estava tudo tão quente entre nós que o suor já podia ser visto em sua testa.
Estava difícil arranjar fôlego. Os corações batiam um contra o outro, frenéticos. Quando saí de cima dela, a tive sobre mim para economizar espaço no sofá; sua barriga subia e descia com rapidez contra a minha. Me livrei da camisinha, fazendo um nó e jogando-a num canto no chão.
Estávamos tontos, cansados. Eu não conseguia precisar em que ponto da noite pisquei os olhos pela última vez, só sabia que, quando os abri novamente, tive o vislumbre de tê-la passando já vestida para a cozinha com a bebê chorando nos braços. Voltei a fechá-los, sem forças para mantê-los abertos. Aquela era a noite de ver , eu acho… O sono não me deixou me lembrar se eu o tinha feito noite passada.
Voltei a me entregar à escuridão das minhas pálpebras quando identifiquei o cheiro de seu shampoo e senti sua cabeça se aconchegar em meu peito. Aproveitei o cobertor que foi jogado sobre mim e a envolvi em meu abraço antes de voltar a perder a consciência totalmente.
’s point of view.
Abri os olhos, irritando-os com a claridade repentina. Me perguntei por que diabos tínhamos dormido com as cortinas abertas. Ouvi meu celular vibrar em algum canto próximo de nós, então remexi-me sobre o peito desnudo de e acabei percebendo que tinha babado um pouco nele sem querer. Eu tinha me cansado tanto com tudo o que fizemos que tinha dormido feito um bebê. Pretendia continuar daquele jeito, porém um som vindo de longe estava me incomodando. Eram vozes, que depois se juntaram ao barulho de palmas…
— … …
Era meu aniversário ou eu estava sonhando?
Senti se remexer; entreabri os olhos e senti minhas pálpebras pesarem toneladas. Ok, não estávamos no quarto. Levei minha mão a um deles e o cocei a fim de desembaçar minha visão turva. Era a sala de casa. Pisquei mais uma vez e percebi que o barulho persistia. Espera um pouco, eu conhecia aquelas vozes.
— Puta merda — virei-me para sair da cama, mas ao invés disso fui impedida de ir ao chão pela mão de , que me segurou sobre si em cima do sofá. Seus olhos verdes e sonolentos encararam-me confusos. — São as meninas, me esqueci completamente delas.
— E eu com isso? Faça elas pararem de berrar — fez menção de se virar para continuar a dormir. Cutuquei-o, alarmada.
— Elas vão entrar. Aliás, não entraram ainda porque o portão está trancado. Tenho certeza que a porta ficou aberta.
Imagine se elas nos flagrassem ali! Eu não teria uma desculpa plausível para convencê-las de que não tínhamos dormido juntos. Aliás, o fato de ainda estar como veio ao mundo deixava explícito que não tínhamos apenas dormido naquele sofá.
— Anda, , não dificulte minha vida!
Mais do que já estava, aliás. Levantei-me para pegar o DVD do casamento e sua capa brega que continha uma foto nossa caracterizados de noivos, em seguida o joguei na gaveta do móvel que sustentava a TV. se sentou ainda aéreo, fazendo-me apressá-lo em meio a sussurros para que não nos ouvissem. Peguei o celular, digitando que já estava descendo para recebê-las enquanto se levantava numa lentidão filha da puta.
— Leve isso — joguei o cobertor em cima de sua cabeça. Eu tinha certeza que, se ele estivesse acordado o suficiente para perceber, me mataria por aquilo. — Anda, ! — segurei o riso ao encarar sua bunda branca de fora enquanto ele subia as escadas.
Corri até a lavanderia e resgatei um short do cesto para vesti-lo e não deixar nenhuma das duas pensando que eu transitava pela casa só de blusa e calcinha com lá. Fui até o portão, destranquei-o e as convidei para entrar. Só até a sala, no caso.
— O que houve com o seu cabelo? — Fanny indagou, fazendo-me levar as mãos à cabeça a fim de colocá-los no lugar, ou ao menos tentar.
— Dormi com ele solto — murmurei, engolindo em seco, esperando que aquela desculpa colasse. Era meio difícil; os travesseiros não os deixariam desgrenhados naquele ponto, a não ser que tivessem dedos largos e uma mão tatuada.
Ainda nervosa, assisti as meninas entrarem em casa com as mãos cheias de sacolas. Olhei em volta e vi o sofá bagunçado, com as almofadas tortas e uma delas no chão, próxima à mesa de centro.
— quase não me deixou dormir essa noite, passei horas no sofá com ela no colo — disparei antes mesmo que elas olhassem para o móvel. Senti-me culpada por colocar a culpa na bebê, mas era aquilo ou falar a verdade.
— O bom é que agora você vai poder voltar a dormir — Anne ponderou, parando ao lado de Fanny, que colocou algumas sacolas sobre a mesinha.
— E nós temos que ir trabalhar — a morena revirou os olhos, fazendo-me rir. — Vamos levar logo isso pra cozinha, não podemos nos atrasar.
Fiquei alarmada, lembrando da camisa de estourando e dos botões que deveriam estar espalhados ali. Se bem que eles eram o de menos. Ninguém repararia neles depois de ver minha calcinha, as calças de e suas cuecas e afins espalhados pelo chão. Será que elas acreditariam se eu dissesse que a máquina de lavar explodiu e as roupas sujas voaram até ali?
— ! — as duas deram um pulo de susto com o berro que eu dei, parando onde estavam, perigosamente próximas da entrada da cozinha. — Deixem aí, o leva, devem estar pesadas — desdenhei, rindo em puro nervoso. — !
Caramba.
O choro de foi ouvido assim que dei o último grito já em desespero, indo para a ponta da escada. Fechei um dos olhos com força. Aquilo não fazia parte do plano. Nada ali estava fazendo parte do plano, e a culpa era toda minha!
Eu sabia que as meninas passariam lá em casa para deixar as coisas delas e os ingredientes que iríamos usar no jantar que faríamos para comemorar o aniversário de Tiffany. Devia ter me lembrado daquilo antes de resolver dar para o meu marido no balcão da cozinha, mas não. Quem disse que eu conseguia sequer lembrar meu nome quando o tinha em cima de mim?
Eu simplesmente odiava o fato de ficar burra quando o assunto era e suas mãos e corpo e voz e… Tá, mentira, eu já não poderia afirmar aquilo. A fase do ódio já tinha passado há tempos, e minha cabeça sempre me lembrava daquilo quando eu ousava pensar em justificar algo relacionado a ele usando a mesma desculpa do ódio que sentia no passado.
— Não precisava acordá-lo, nós iríamos levar… — Anne murmurou baixinho quando ouvimos os passos na escada junto do choro mais contido da neném. desceu com a expressão séria. Só se deu ao trabalho de vestir uma bermuda, porém estava igualmente descabelado. — Bom dia, .
Quase peguei o paninho de para secar a baba dela quando Anne percebeu que ele estava sem camisa… com o peitoral e as tatuagens à mostra… Eu nem me sentia no direito de julgá-la por cobiça.
— Vai com a sua mãe — ele me deu a bebê chorosa, que chupava a chupeta enquanto ainda tinha os olhos molhados e sonolentos. Até ela estava descabelada.
Era de família.
Dei um olhar para quando me aproximei para pegá-la. Ele não podia simplesmente ignorá-la, seria falta de educação da sua parte.
— Ah, bom dia, Anne — passou por ela, abraçando Fanny de repente. — Feliz aniversário, chatonilda.
Bati na minha própria testa. Que universo paralelo era aquele em que sabia mais sobre minhas amigas do que eu?
Os olhos de Anne foram diretamente para ambos. Eu tinha certeza que ela não via a hora de fazer aniversário de novo só para ir lá em casa ganhar um abraço dele daquele jeito. Sem camisa, então, ela morreria!
— Nossa — se virou para mim, fazendo-me disfarçar que estava espiando-a se remoer de inveja de Fanny. — E esses arranhões aí, hein, ? — sua voz trêmula denunciou o quão afetada ela ficou, mesmo que seu sorrisinho falso tentasse encobrir.
Torci silenciosamente para que não lhe respondesse mal, porque eu tinha certeza que algo de baixíssimo calão se passou por aquela cabecinha… Não queria que ficasse um climão quando elas estivessem ali. Iríamos comemorar o aniversário de Fanny, era para ser divertido!
— Mas olhe só… — Tiffany se esticou para olhar também. Meu coração bateu tão forte que, se eu abrisse um pouco mais minha boca, ele pularia para fora. — Você deixa acontecer esse tipo de baixaria dentro da sua casa, ?
Ô se deixo. Não só deixo como também participo.
A covinha de ficou visível quando ele me encarou por cima do ombro, segurando o riso. O repreendi com o olhar, ficando nervosa quando, de repente, tive os três encarando-me e esperando uma resposta.
— Contanto que ele esteja bem longe de mim, eu é que não vou me opor — dei de ombros, fingindo desdenho.
— Falem baixo, Dafne está lá em cima. Já não basta terem acordado — seus olhos verdes me encararam fixamente antes que ele fizesse o que lhe foi pedido.
Segurei meus músculos faciais para não deixar vazar nenhuma expressão naquele momento, no qual minha boca quase se abriu num “O” perfeito. Eu não acredito que ele teve a audácia de falar aquilo. Minha vontade era de segui-lo até a cozinha e confrontá-lo. precisava mesmo usar o nome dela?
— Ela não estranha vocês morarem juntos, não? — Fanny indagou confusa. Do jeito que era desconfiada, ela jamais ficaria com um cara que morasse com outra mulher sem ter parentesco envolvido.
— Dafne sabe que não temos nada e nem vamos ter — lhe respondi, agradecendo mentalmente por não estar mais presente na sala.
— Engraçado. Quando dormi aqui, a situação era a mesma e pensei ter te ouvido dizer que eu levantaria suspeitas com os vizinhos — Anne riu sem humor, fazendo-me apressar em tentar contornar as coisas.
— Anne, eu não…
— Pelo amor de Deus, me dê de presente de aniversário um dia só sem essa sua paixão platônica pelo ? — a loira se afastou, emburrada, indo para a porta esperar Fanny. Neguei com a cabeça, porque era tudo o que eu menos queria: briga. — Já fazem três meses, … — murmurou quando percebeu minha reprovação.
— Chega desse assunto. Venha cá, me deixe te dar um abraço — a envolvi com o braço livre, afaguei suas costas e a tive brincando com , que era feita de sanduiche por nós duas. — Feliz aniversário, eu te amo. Amo as duas. Quero as duas aqui à noite e sem brigas, ouviram?
Elas se encararam em tédio. Fanny deu um tchau de longe para e deixou a casa junto de Anne. As acompanhei até o portão, vendo-as entrar no Uber a caminho da lanchonete. Voltei para dentro pisando firme, já encontrando parado na sala.
— Dafne na minha casa? — ri, incrédula. Nem por cima do meu cadáver! Se ficasse viúvo hoje, eu voltaria como fantasma só para impedir que ela sequer pisasse os pés ali.
— Ninguém mandou você começar de gracinha, desdenhando de mim.
Revirei os olhos. Mas como era sentimental.
— Não estou de gracinha. Não se esqueça que Tom mora logo ali — observei o brilho sumindo dele quando seu sorrisinho se desmanchou e seu rosto se contorceu em nojo. sabia bem que Dormian viria tranquilamente para que eu pudesse fazer um estrago daqueles nas costas dele também.
— Era brincadeira, amorzinho — agarrou-me, puxando-me para perto.
— Você se liga, hein — hasteei o dedo em sua direção. Ele tentou mordê-lo, não me levando a sério.
— Gostosa — sussurrou próximo ao meu ouvido. Mais uma distração para mudar de assunto, e daquela vez funcionou. Deixei-o beijar minha boca e deslizar sua mão grande até minha bunda. — Dois rounds essa noite… Hum, parece que temos um recorde a ser quebrado.
— Isso foi um desafio, Sr. ? — arqueei a sobrancelha, sorrindo maliciosamente.
— Com certeza, Sra. .
Gargalhei contra sua boca, selando nossos lábios antes de ir para a cozinha e arrumar a zona que fizemos.
— Ei, falando sobre ontem à noite… — se abaixou e pegou o preservativo na ponta dos dedos.
Ofeguei, agradecendo aos céus pelas meninas não terem percebido aquilo no chão. Deixar trazer outra mulher pra casa já não seria uma ideia muito agradável para mim, imagine se ainda por cima ele deixasse aquilo na sala no dia seguinte? Olha, só de imaginar eu já ficava possessa.
— Você vai limpar isso — avisei. E me certificaria de apagar qualquer rastro de sexo naquela casa, principalmente envolvendo eu e . Quando as meninas chegassem, tudo estaria do mesmo jeito que em nosso primeiro dia ali: cada um no seu quarto e com o ódio ainda intacto no coração.
ficou com para que eu pudesse tomar um banho e escovar os dentes. Ele conseguiu com que ela dormisse de volta, mas algo me dizia que não duraria muito tempo. Aproveitei para arrumar a bagunça da cozinha e preparar o café da manhã. desceu já arrumado para o trabalho e, após comer alguma coisa, saiu em disparada porque estava atrasado.
Suspirei quando me vi sozinha naquela casa silenciosa; olhei em volta e tive vontade de chorar. Eu já tinha passado o dia anterior limpando tudo que vi pela frente para tentar me distrair. Só me restava esperar acordar para me fazer companhia e tentar me acostumar com aquela nova rotina, já que não tinha decidido o que fazer ainda.
Quando ela acordou, lhe dei de mamar e fiquei mais tranquila. Assistimos um pouco de TV e me senti estúpida por falar que não a deixaria em frente à tela nenhuma. O que eu faria para distraí-la se não apelasse para todos aqueles desenhos coloridos e animais falantes? murmurava sons incompreensíveis junto dos personagens quando eles começavam a cantar. Aliás, eles faziam muito isso.
Passei parte da tarde levando coisas de um quarto para o outro, para caso as meninas subissem para o quarto de hóspedes e descobrissem que, na verdade, ninguém dormia ali. Deixei tudo com a minha cara, um pouco bagunçado, até. Tirei minha escova de dentes do nosso banheiro e coloquei no outro, junto de meus cremes para cabelo. Logo desci para o quarto de baixo, onde eu dormiria com as meninas. Em seguida, troquei os lençóis e voltei para a estaca zero, que era ficar em frente à TV com a bebê.
Elisabeta já dizia: era uma criança muito tranquila, tinha seus horários de soneca e de mamar. Deixei para lhe dar banho quando começou a entardecer, graças a um número dois que sujou não só a fralda, como também suas costas inteiras no berço.
Ouvi o barulho do carro de adentrar a garagem e respirei aliviada. Eu já não sabia mais o que fazer para preencher o silêncio que estava me incomodando.
— Oi, amor da minha vida — ele beijou a bochecha grande da bebê, que agitou os bracinhos ainda segurando seu brinquedinho azul. — Oi — senti um frio na barriga quando sua mão grande envolveu meu quadril, puxando-me para trás.
— Oi — sorri contida, tombando a cabeça para o lado para lhe dar espaço e receber mais alguns beijos no pescoço enquanto tinha meu corpo sendo colado ao dele.
— Me deixe te dar um beijo. Tenho que aproveitar que ainda tenho minha esposa aqui comigo — falou, e eu revirei os olhos, rindo do drama desnecessário. — Não ria. Na frente das suas amigas você se torna uma mulher fria e sem coração.
Gargalhei virando-me em sua direção. riu contra meu rosto, pegou minha nuca e se aproximou ainda mais, finalmente beijando minha boca.
— Depois vai querer dormir no meu peito na maior cara de pau.
Eu ria tanto que mal conseguia segurar a faca que estava na minha mão quando estava cortando os legumes antes da chegada de , que parecia que tinha engolido Pierrot, o palhaço triste, de tão engraçado e ao mesmo tempo dramático que estava.
— Quanto drama, meu Deus — envolvi seus ombros com meus braços. — Pois fique sabendo que eu não faço questão nenhuma de dormir no seu peito, você que me puxa — caçoei, vendo-o me encarar falsamente e boquiaberto.
— Ah, é?
Confirmei, comprimindo meus lábios, tentando segurar meu riso.
— Escreva o que eu estou te dizendo, . Quando o divórcio sair, você ainda vai me ligar pedindo pra dormir com você e eu vou fazer questão de negar e jogar isso na sua cara.
Ok, eu realmente tinha que anotar, porque tinha que me lembrar de nunca fazer aquilo. Eu conhecia bem e sabia que aquela era uma promessa séria.
— Me chamou de ? — fiz biquinho.
Fazia tempo que ele não me chamava pelo sobrenome antigo. Depois do acontecido na sala, me perguntei se não estava ficando realmente bravo ou se ainda era uma brincadeira.
Bom, de qualquer forma, ele quem tinha começado.
— Não se preocupe tanto comigo, . Até chegar na letra da minha agenda, eu já vou ter arranjado outras companhias pra dormir.
Sim, outras, no plural.
— Pode juntar todos, mas nenhum vai chegar aos pés do que eu te faço sentir.
Ofeguei diante de seu olhar penetrante. Eu não poderia negar aquilo, nem mesmo de brincadeira! Já tinha saído com vários, principalmente quando cheguei em Londres e passei a ter uma vida mais agitada, mas arrisco dizer que nunca tinha encontrado alguém como . Era irônico como eu o tinha ali, diante de mim, desde os meus oito anos, o odiando e privando-me de provar – nem que fosse um pouquinho – do que era capaz de fazer.
Chegava a desanimar saber que dali a alguns meses eu ficaria sozinha de novo. E talvez eu realmente tenha que ligar para ele, porque, além de ter preguiça de toda a burocracia que era ter que conhecer alguém novo – um cara que ao menos prestasse –, eu ainda dificilmente encontraria um encaixe tão perfeito.
O modo como seus quadris cabiam perfeitamente entre minhas pernas quando elas se abriam para recebê-lo; minha boca, que parecia feita no molde da dele; os narizes, que mal se chocavam durante o beijo; sua mão em minha cintura, seu tamanho e o modo como sempre vai fundo dentro de mim e não me causa nenhum desconforto. Até mesmo seus dedos pareciam magicamente ter o tamanho e o formato perfeito para não se embaraçarem em meus cabelos quando ele emaranhava suas mãos neles.
— O que tem de gostoso, tem de presunçoso — falei, e me deu um selinho ainda sorrindo.
— Estou mentindo? Quem seria o primeiro contato da sua agenda? O tal Alex, o cara que gozou e não te deixou satisfeita? — apertou ainda mais minha cintura, fazendo meus seios colarem em seu peito. Fiquei surpresa ao perceber que lembrava o nome dele, visto que eu mesma já tinha me esquecido. — Collin, aquele otário, ou o filho da puta do seu último ex que não via a mulher gostosa que você é… — ele passou na minha cara meu dedo podre para homens. Quase me vi sem palavras.
— Então não vou ligar pra ninguém. Porque você disse que não virá quando eu chamar — encolhi os ombros, jogando um verde.
— E desde quando eu mantenho minha palavra quando o assunto é você?
Ri fraco e aliviada. Ainda bem que eu não era a única a ter aquela percepção.
— Você é minha grande contradição, . Antes eu podia jurar que te odiava, e agora não consigo nem dormir sem você!
Arqueei as sobrancelhas.
— … — suspirou diante do meu olhar estreito. — Se você fizer alguma gracinha hoje à noite…
— Eu não vou, pode ficar tranquila com suas amigas. Nem vou ficar por aqui.
Franzi o cenho, estranhando a falta de seu calor quando se afastou.
— Também não precisa ficar recluso. Pode ficar com a gente, se quiser.
— Não, obrigado — sorriu amarelo. — Além dos seus coices, ainda tenho que ser legal com Anne, e eu não a suporto — continuou, e eu revirei os olhos diante da implicância. — Você não vê, mas ela te olha com um ar diferente. Parece até inveja, não sei…Eu não gosto disso.
— Você está parecendo aquelas vizinhas fofoqueiras, .
Ele arfou, ofendido. Talvez porque fosse pura hipocrisia minha chamá-lo daquela forma, sendo que eu sempre chegava do trabalho com uma fofoca nova dos clientes. tinha umas boas do pessoal do escritório; porém, nós pobres conseguíamos superar os ricos quando o assunto era fofoca de qualidade.
— Inveja do quê, afinal? — cruzei os braços, rindo incrédula.
— Do seu marido gostoso? — simulou um strip tease, tirando o blazer escuro.
— Vá tomar seu banho, — ordenei, rindo.
— Vem comigo?
Mordi o lábio em desejo. Era uma proposta bem tentadora. Eu mesma já tinha lhe dito o quanto queria ajudá-lo a se desfazer da gravata, tirar aquela camisa, puxar aquele cinto e depois me livrar da calça escura que ele usava. ficava tão sexy vestido como o homem de negócios que era, mas vê-lo nu ainda era minha visão favorita dele.
— Não posso. Logo as meninas chegam e eu tenho que adiantar as coisas por aqui — meus ombros caíram quando o assisti se afastar, não antes de distribuir beijos nas mãozinhas de no carrinho.
Aparentemente, realmente falou sério quando disse que não ficaria conosco. Se fechou em seu escritório e levou consigo. Anne e Fanny chegaram um tempo depois e, enquanto Fanny tomava um banho, Annelise me ajudava nos últimos preparativos para o jantar. Eu sabia que só tinha se passado um dia desde que fui demitida, mas estava com tantas saudades daquelas duas que parecia que tinham se passado meses.
— Quem é a tal Dafne? — Anne parou diante do balcão, deixando-me tensa próxima ao fogão.
— Eu não faço ideia.
E realmente não fazia ideia. Ultimamente, as poucas coisas que sabia já me faziam detestá-la, por isso sempre me poupei de descobrir mais coisas sobre ela. Não queria mais falar sobre Dafne, estava tentando esquecer da existência dela depois da noite passada. Eu me corroía de curiosidade para saber se realmente houve uma emergência ou não. disse que não a beijou, e eu decidi dar um voto de confiança para o pai da minha filha.
— Como não? Ela não dorme aqui com ele?
Mordi o lábio para descontar a raiva. Eu não gostava nem de saber que eles dormiam juntos, quem dirá imagina-lá na minha casa, na nossa cama. Olhei para Anne por cima do ombro e me fingi de desentendida.
— Tá, vocês não se falam — ela concluiu. Mexi a cabeça apenas, esperando que Anne entendesse meu sinal e mudasse de assunto. — Mas e aí, ela é bonita?
Mexi o arroz com mais força. Infelizmente, Dafne era mais bonita que nós duas juntas. vinha com aquele papinho de que me preferia, mas eu duvidava que, com uma gostosona daquelas, ele pensaria em me classificar acima dela. Tudo bem, eu era engraçada para compensar, mas mesmo assim era homem, e da pior espécie. Ele não me preferiria pelo meu senso de humor ao invés de Dafne e seus seios perfeitos.
— Cabelos pretos, olhos castanhos, corpo torneado… Ela é bem bonita, sim — comentei, e lembrar-me de seu rosto na cafeteria apenas fez meu coração disparar em ódio. — Mas sabe que ele é casado, mesmo estando na situação em que estamos, então… Digamos que tem um caráter duvidoso.
Quando vi, minha língua já estava igual a um chicote, então decidi me calar por hora. fazia muito mal para o meu feminismo.
— Óbvio. Onde já se viu ficar com o marido dos outros e, ainda por cima, na casa dele?
A força que fiz para ficar calada foi tão grande que cheguei a largar a colher de pau que segurava e desliguei o fogo para me recuperar.
Pois é, Anne. Onde já se viu.
— Do que estão fofocando? — Fanny chegou já vestindo seu pijama, fazendo-me respirar aliviada em ter alguém para me distrair daquele assunto.
Eu estava a um fio de jogar algumas coisas na cara de Anne. Principalmente depois de saber que ela me usou como desculpa para se enfiar em minha lua de mel e transar com . Não era para ela estar ali naquela noite. O que me consolava era saber que não a suportava, e, por mais que me desse medo de possíveis conflitos, ela acabou tendo o que mereceu: o desprezo dele.
— Da amante do — Anne simulou um vômito, fazendo Fanny revirar os olhos.
— Amiga, se a que é a “corna” não está se importando, por que então você está tomando as dores?
O triste foi o uso das aspas sem precisar. Porque era verdade. Mesmo que não tivéssemos nada sério, eu ainda estava levando chifres.
E talvez me importando mais do que deveria.
— Vamos mudar de assunto, sim? Daqui a pouco começamos a brigar, e não quero isso — saí pela tangente, levando as coisas para a mesa. — Gente, tem um vinho maravilhoso que ganhamos da vizinha oferecida. Vamos beber pra comemorar!
Eu não entendia nada de vinhos, mas aquele parecia ser bem caro. Tiffany pegou a garrafa de minhas mãos, tentou ler o rótulo em francês e falhou miseravelmente. Sempre que eu não conseguia ler o rótulo, sabia que era uma coisa chique, e aquele vinho estava ali justamente para provar meu ponto.
— Mas você está virando uma burguesa safada, hein, dona .
Gargalhamos juntas na mesa.
— Que calúnia! Se tem uma coisa que eu não sou é burguesa!
Mesmo morando naquele lugar, eu ainda continuava uma desempregada sem perspectiva de futuro. Seria engraçado se não fosse trágico. Minha única certeza era que eu cuidaria de ; do resto eu não sabia e tinha um pouco de medo de descobrir.
— Só safada, né, amiga? — Anne completou, não me dando chances de negar. Afinal, era verdade. E ultimamente estava me superando, diga-se de passagem.
— Hum — Fanny levantou o indicador enquanto dava uma golada no vinho. — Falando nisso, chegamos no meu assunto preferido.
— Me deixe advinhar, sexo? — arqueei a sobrancelha.
— Também — ela riu, jogando seus cachos para trás. — Junto com o meu mais novo assunto, o Doutor Gostosão.
— Ah, Tom — precisei beber um pouco. Eu estava me segurando naquela questão. Não poderia ficar alta o bastante a ponto de dar com a língua nos dentes na frente delas.
— E aí? Já rolou? — ambas me olharam em expectativa. Levei uma garfada à boca, mastigando devagar para ter tempo de pensar.
— Ainda não — respondi. Tiffany largou os talheres teatralmente inconformada; Anne apenas me julgava em silêncio. — Aliás, queria falar sobre isso com você, amiga. Me passe o contato daquela ginecologista que você passa? Preciso voltar a tomar meu anticoncepcional.
— Ah, sim, está explicado! Vai se proteger primeiro pra depois sentar a vontade no Tom!
Não aguentei e ri do jeito que ela falou, então concordei com a cabeça. Bom, não era lá uma grande mentira, só era preciso trocar Tom pelo que ficaria tudo certinho.
— Mas como estão indo as coisas com ele?
— Ótimas. Amanhã ele vai me levar pra jantar — forcei um sorriso aberto.
Aquele assunto de sexo e Tom estava me deixando inquieta. Não tinha parado para pensar naquilo. Ele com certeza iria querer fazer algo depois, e, apesar de sentir muita atração por ele ainda, apenas a menção de transar com outro me deixava nervosa.
Mas eu tinha que tentar. Não era justo que ficasse com outras pessoas enquanto eu me mantinha exclusiva dele sozinha. Aliás, aquela questão toda de exclusividade não deveria nem estar sendo colocada em questão; porém, estava tudo uma bagunça dentro do meu peito.
Eu me sentia dentro de um quarto abarrotado de coisas, tentando arrumar uma por uma e ficando confusa sobre onde guardar tudo.
— Vai rolar! — as duas comemoravam como duas adolescentes virgens. — Você merece, né, amiga? Está há o quê, um, dois meses na seca do deserto do Saara?
Quase discordei. Só ontem tinha transado duas vezes. Estava chovendo no meu deserto, eu não poderia estar mais molhada.
— Aproveite e goze por nós três — Anne exclamou, arrancando-me risadas gostosas junto de Fanny. — Já sabe que lingerie vai usar?
— Isso é muito importante… — Fanny mal abriu a boca e surgiu na cozinha como um foguete, carregando nos braços. Observamos caladas quando ele abriu a geladeira e pegou duas garrafas de cerveja com uma mão só, preparando-se para sair na mesma velocidade que entrou.
— Ué, não vai jantar com a gente, não? — indaguei. Tudo bem que era sexta-feira à noite, mas ele não costumava beber em dias da semana.
— Estou enjoado — quase não olhou na minha cara.
Eu continuava intrigada com seu comportamento, porém minha confusão se esvaiu quando seus olhos verdes me encararam friamente.
— A propósito, com amanhã já serão duas noites minhas com . Vou me lembrar disso da próxima vez que eu sair.
Engoli em seco. Ele tinha ouvido. Desde quando eu não sabia, mas a parte de Tom… aquela eu tinha certeza que sim. E se ele já levava a sério quando eu fingia desdenhar dele, imaginei o que devia estar pensando ao me ouvir comemorar o fato de que possivelmente iria transar com Tom.
— Você está desempregada, . Vai ficar com a bebê o dia todo e ele está reclamando disso? — Tiffany brandiu, indignada.
Soltei um riso fraco. Não era sobre , estava longe de ser. Nenhum de nós reclamava de ter que cuidar dela. Era sobre mim, mas teria que engolir tudo aquilo, porque ele estava sendo injusto pra caralho ao achar ruim toda aquela história de Tom e eu.
— Nada novo sob o sol — virei minha taça de uma vez, bebendo todo o vinho num gole só.
(...)
Me deitei para dormir no colchão no chão ao lado da cama de casal, deixei as meninas na cama porque quis poupá-las das minhas peripécias durante o sono, reclamava muito no início de tudo. Falando nele, não o vimos desde o episódio na cozinha. Admitia que estava com o coração um pouco dolorido, apesar de achar que ele merecia aquilo.
Revirei-me algumas vezes, não conseguia pregar o olho de jeito algum. Era para eu estar no décimo quinto sono, as duas já estavam até roncando e eu estava lá, encarando o teto escuro. Quando finalmente tirei um cochilo rápido, despertei num susto ouvindo o choro de .
Fiquei prestando atenção nos barulhos vindos do andar de cima, estava insistente, parecia com dificuldades de acalmá-la. Eu não estava fazendo nada mesmo, já tinha acordado, resolvi me levantar para ver o que era.
Fiz o mínimo de barulho possível, me levantei e fechei a porta devagarinho ao sair. Subi as escadas nas pontas dos pés e fui até o fim do corredor, encontrando-o no quarto de , balançando-a com a chupeta na boca. O som estava mais abafado. Encontrei distraído, de costas para a porta, conversando com ela baixinho.
— O que houve? — cochichei, temendo assustá-lo.
— Nada, ela só estava com a fralda suja — murmurou com a voz amena.
Me aproximei, acariciei seus cabelos lisos e beijei sua testa. Seus olhinhos estavam se fechando devagar, então continuei ali para observá-la cair no sono aos poucos. Quando levantei meus olhos, peguei observando-me sério. Sem graça, voltei a olhar , que já estava dormindo tranquila.
Fiz menção de sair; porém , antes de colocá-la no berço, me pediu para esperar. Saí e o esperei na porta, que foi fechada por ele devagar para não correr o risco de acordar a bebê.
— Ainda não preguei os olhos — murmurei ao seu lado no corredor. Iria acompanhá-lo até seu quarto e descer de volta para o meu colchão.
— Está sentindo a minha falta na cama, é? — senti sua mão grande me pegar e encostar-me na parede. Sorri contra seu rosto.
— Você é muito engraçado — ri baixinho. Espalmei as mãos em seu peito, tentando afastá-lo sem sucesso.
— Eu estou — beijou minha boca, e eu o encarei séria em meio ao breu. Sua sinceridade me deixava desconcertada às vezes. — Tô desde a hora que deitei encarando o teto do quarto, sentindo falta de ter o peso do seu corpo sobre o meu.
— Estou com saudades do meu travesseiro — desci minhas mãos de seus ombros para o peito, rindo ao lembrar que tinha babado nele mais cedo. — E talvez um pouquinho do dono dele.
— Só um pouquinho? — arqueou as sobrancelhas, duvidando. Colou nossas testas e me deixou sem ar pela milésima vez.
— Muito — sussurrei contra sua boca, negando com a cabeça.
— Oh, … — o modo como sua voz rouca pronunciou meu nome me acendeu como um copo se gasolina fosse jogado numa pequena chama. — Minha cabeça está me perturbando com as palavras que ouvi você dizer lá embaixo. Por favor, me diga que é apenas o script que criou para nosso teatro. Me diga que é mentira, que você não planeja ser de Tom e de nenhum outro homem além de minha…
Ofeguei contra sua boca, que já vinha em direção à minha, chocando-se com furor, amassando meus lábios e tendo minha língua sendo atacada pela dele. Puxei seus cabelos com a força que o queria para mim, e a mesma que eu queria ser somente dele.
Mas, infelizmente, a realidade não era aquela.
— Era mentira, eu não falei sério — confirmei. E, infelizmente, eu também não me importava com a realidade quando o tinha tão perto. — Eu falava sobre nós. Depois do acidente em Tulum, eu só quero… continuar fazendo o que fazemos sem nos preocuparmos tanto com um novo bebê a caminho.
riu baixinho contra minha bochecha, visivelmente aliviado. Seus ombros perderam a tensão que eu nem tinha percebido instalada neles.
— Eu sei um jeito bem eficaz de prevenir futuros bebês — ele sorriu sacana, voltando a me beijar. Daquela vez, suas mãos invadiram minha camisola e passaram por minhas coxas até acariciarem minha intimidade. Gemi sem me controlar. — Vamos ali dentro que eu te mostro — sussurrou ao pé do meu ouvido.
alcançou a fechadura, abriu o quarto e me puxou pelo quadril. Gargalhei tentando fazer silêncio. Aquilo não iria prestar. Tentei frear meus passos que se embolavam nos dele, mas estava sem forças, envolta pelo desejo e pela diversão que tudo aquilo estava me proporcionando.
De novo o perigo de sermos pegos no flagra me excitou.
— — o censurei, sem conseguir segurar o sorriso. Ele me ignorou e fechou a porta devagar para não fazer barulho.
O problema não seria a porta ou a cama balançando, seriam os gemidos. Apesar da ideia de fazer escondido me deixar louca, eu estava com medo real de alguém escutar. Naquele avião, sermos pegos não afetaria tanto nossas vidas; agora, em casa, significaria perder uma amiga. Mais uma. Eu sabia que Anne nunca iria me perdoar por mentir daquele jeito para ela.
— Só um pouquinho, amor — agarrou minha nuca enquanto eu ainda tentava resistir e unir forças para me desvencilhar dele. Quando consegui e me virei para a porta, fui agarrada por trás. — Estou com saudades…
Não era a primeira vez que ele falava em saudades, mesmo me tendo todos os dias ao seu lado, na sua cama. parecia nunca estar saciado. Era como um vício, que se inicia com poucas quantidades e, de repente, só aquilo já não basta. E eu me sentia da mesma forma em relação a ele.
chupou meu pescoço enquanto me encoxava com força, agarrando meu quadril e esfregando seu membro já ereto em minha bunda.
— Porra — praguejei já ofegando. Fechei os olhos com força, desistindo de tentar fugir e ir até a porta.
— Nós vamos fazer devagarinho, em silêncio — ele tornou a levantar a barra da camisola. Daquela vez, seus dedos se enroscaram nas alças da minha calcinha molhada. — E se nos ouvirem… vão entender o motivo de não conseguirmos aguentar até ficarmos a sós pra fazer o que estamos fazendo.
Mordi o lábio, sentindo meu coração disparado à medida em que minha calcinha deslizava por minhas pernas, indo ao chão em questão de segundos.
— E-Eu não consigo — gemi, sentindo seus dedos brincarem com meu clítoris. De olhos fechados, eu estava completamente entregue em suas mãos, debruçando meu corpo contra seu peito.
— Eu te ajudo — não entendia que o motivo de eu não conseguir fazer silêncio era justamente ele e o modo como ele me fazia sentir? — Venha — me guiou até a cama, onde eu cheguei completamente às cegas, com o corpo mole e de pernas bambas. tinha um efeito quase anestésico sobre mim. Ajoelhei-me sobre o colchão macio que eu conhecia muito bem. — Achei algo na gaveta que esvaziou hoje.
Murmurei algo, acho que perguntando o que era. Não que eu me importasse muito àquela altura do campeonato. Eu só queria que tirasse logo as roupas.
— Acho que pode me ajudar a prevenir uma fuga sua — sua boca em meu ouvido, mordiscando, suspirando… Eu estava louca por ele.
Tão louca que nem me toquei sobre o que ele falava.
Senti o metal gélido em meu pulso e levei um susto; abri os olhos e a atmosfera me deixou quase sob efeito de hipnose. Comecei a rir ao ver a algema que tinha ganhado de alguma das vizinhas fechada ali. puxou-me até a cabeceira da cama e fechou o outro lado lá, cessando meu riso.
— — o censurei novamente. — Você sabe onde está a chave disso? — havia um resquício de riso em minha voz, mas naquele momento era um pouco de desespero. não me respondeu, apenas saiu da cama e foi até a cômoda. — !
Eu tinha quase certeza que ele estava se aproveitando que eu não podia gritar e continuou ali, retornando com algo em mãos. Estava escuro, não soube identificar.
— O que você… — virei-me para tentar ver o que era.
— Xiu… — ele se posicionou atrás de mim, beijando minha bochecha. — Não reclame, sei que vai adorar isso. Apenas relaxe.
Senti seus dedos sujos do gel que trouxe consigo me massagearem após ter minha camisola erguida. Mordi o lábio ao tê-lo distribuindo beijos molhados por minhas costas e ombros. Segurei os gemidos de pura excitação, ainda sendo majestosamente estimulada.
Ansiosa, observei vestir o preservativo e se aproximar também ajoelhado no colchão. Sua mão grande e macia me agarrou uma das nádegas, apertando com vontade antes de afastá-la para o lado a fim de encaixar a cabecinha inchada na minha entrada.
Tentei relaxar ao senti-lo entrar devagar, bombeando de leve e me fazendo sentir uma pequena ardência que eu particularmente adorava. Gemi baixinho, agarrando o lençol branco na minha frente para descontar meu tesão. Arfei quando avançou ainda mais para dentro, envolvendo o osso do meu quadril com destreza, moldando meu corpo do jeito que queria para facilitar que ele metesse tudo de uma vez. Quando viu que não conseguiria, passou a estocar com rapidez com o que conseguiu, avançando mais com o passar das investidas.
Empinei a bunda ao olhar para trás e pegá-lo vidrado nela, imerso num prazer que parecia tomar todo seu ser e deixá-lo fora de órbita. Eu adorava observá-lo quando ele estava em êxtase. Me sentia incrível em saber que era eu quem estava lhe proporcionando tudo aquilo.
metia forte, mordia o lábio inferior para segurar seus gemidos, que aumentaram significativamente quando passei a avançar com o quadril de encontro ao dele, conseguindo fazer com que ele entrasse inteiramente dentro de mim. Sorri safada para ele, aguentando suas investidas cada vez mais intensas e rápidas, olhando para seu rosto sério como nunca.
— O que houve? — tentei sussurrar em meio aos barulhos de nossas respirações ofegantes. apenas negou com a cabeça sem dizer nada. — Amor?
— Promete pra mim que não vai deixar Tom te tocar desse jeito.
Não lhe respondi, fiquei sem fala.
O que eu realmente queria era prometer aquilo, mas ceder a ele seria me privar de coisas que ele não se privava.
Toquei sua mão que guiava meu quadril, porém fui afastada. Tentei novamente, recebendo o mesmo tratamento. Gemi arrastado quando tive seus dedos largos sendo emaranhados em meus cabelos e fui puxada em direção ao seu tronco quente, que abrigava seu coração frenético.
— Não me toque — disse ao pé do meu ouvido, fazendo-me franzir o cenho. — Está proibida de me tocar, só eu posso — ri, deixando-o irritado. — Continue rindo, é você quem está presa na cama.
— Você não faria isso… — solucei, sentindo-o dedilhar minha intimidade e potencializando meu prazer. — N-Não me deixaria aqui presa — ri, levando investidas mais fortes e profundas.
— Não posso te prender a mim, você é livre.
Revirei os olhos, sentindo o ápice vir. Eu já não sabia mais se era tão livre como antes. Já estava presa antes mesmo daquela algema ser presa em volta do meu pulso. Presa naqueles olhos verdes e em seus braços todas as noites.
Presa a ponto de ouvir que era livre e discordar, porque, mesmo com um cara incrível querendo me levar para sair, eu ainda queria ficar por ali.
— Eu queria ser — agarrei o lençol com a minha mão livre. Não poderia tocar nele e, por mais boba que fosse aquela regra, decidi acatar.
Aquela era eu, uma idiota que seguia regras que me faziam mal. Me privava do que eu queria para agradar terceiros e me forçava a fazer o que não queria para provar pontos estúpidos. Mesmo que não tivesse o direito de ficar bravo por eu sair com Tom, eu sabia que não poderia falar nada, porque me sentia do mesmo jeito em relação a Dafne.
— Então seja — ele beijou meu ombro, tirando uma das alças da minha camisola. Quase por um reflexo, levei minha mão até seu cabelo. — Geme pra suas amigas saberem o quanto nos odiamos, pra Anne saber o quanto você está adorando dar pro seu marido na sua cama.
Sorri, quase sem conseguir segurar meus gemidos.
— Grite bem alto pro condomínio inteiro ouvir. Pro seu doutorzinho saber que só eu te faço sentir assim, que eu sou o único que você quer ter na sua cama todas as noites.
Seria incrível poder fazer aquilo. Eu deixaria Grace onde quer que estivesse muito orgulhosa de mim por todas as vezes em que me incentivou a fazer o mesmo. Ser livre.
Mas ainda tinha minhas travas que nem mesmo eu entendia.
Vendo que eu, como a covarde que era, não faria nada daquilo. Me tapou a boca quando atingi meu orgasmo, me ajudando a abafar meus gemidos e sons incompreensíveis. Quando tudo se acalmou, deixei meu tronco cansado cair para frente; meu braço preso à cama ficou pendurado.
se esticou e destrancou a algema, pegando-me pela cintura e apoiando minhas costas em seu peito. Ainda ofegante, massageei meu punho enquanto digeria a loucura que tinha acabado de acontecer ali. Não só a ideia mirabolante de e o modo como ele me privou de tocá-lo, mas também os meus pensamentos duramente aquele frenesi.
Eu queria ser livre. Mas não poderia ser egoísta e magoar as pessoas que amava. Mesmo que aquilo significasse chatear ou frustrar . Apesar da nossa aproximação nos últimos meses, Anne era uma de minhas melhores amigas e eu tinha que tentar aproveitar minha noite com Tom.
me abraçou como se pudesse saber o que eu estava pensando, me deixando pior ainda por não tê-lo respondido naquele momento. Eu não estava o trocando por Tom, estava me dando uma chance de fazer algo novo.
— Posso te tocar agora? — virei meu rosto em sua direção.
— Desculpe — ele riu baixinho, acariciando meu punho. Observei quando beijou o local, fazendo-me tocar seu rosto e fazer um carinho ali.
— Não se desculpe. Isso foi muito sexy, se quer saber — pontuei, confidenciando algo que eu já tinha percebido há um tempo.
Eu adorava quando se deixava ser dominado, mas amava ainda mais quando ele me dominava. Não sabia identificar se era algum tipo de fetiche meu, mas fato era que eu tinha achado incrível a experiência de ser presa, até mesmo seu tom autoritário quando se dirigiu a mim.
Fora o fato de ele ter citado Tom e demonstrado mais uma vez sua infelicidade diante da ideia de imaginar nós dois juntos. Eu estava sendo vingada, e apesar de realmente ser um prato servido frio, ainda assim conseguia saciar minha fome.
Me alinhei ainda mais a ele, sendo beijada no pescoço enquanto tinha minha barriga sendo acariciada. Eu simplesmente amava o cheiro que emanava dele. Amava o modo como me sentia em casa ali, em nosso quarto aconchegante. Por um momento, quis deitar ao seu lado e dormir.
— Tenho que ir — abri meus olhos, ouvindo-o suspirar derrotado atrás de mim.
Saí de seus braços um pouco dolorida, cambaleei pelo quarto em busca da minha calcinha e a vesti rapidamente sendo observada por ele. sorriu triste para mim, sentado na cama. Meu coração se apertou um pouco dentro do peito. Por que ele tinha que fazer justo a carinha de cachorro caído do caminhão de mudança?
— Boa noite — sussurrei, sendo respondida no mesmo tom.
Desci as escadas nas pontas dos pés e parei no banheiro do corredor de baixo para me ajeitar e colocar tudo em seu devido lugar. Ri sozinha para o espelho, sabendo que aquilo tinha sido loucura. Imagine se alguma das duas estranhasse minha ausência e fosse atrás?
Deitei-me em meu colchão logo quando fechei a porta sem fazer barulho. Anne e Fanny roncavam juntas, deixando-me tranquila, pois era improvável que alguma delas tenha acordado estando num sono tão pesado.
's point of view.
Despertei com uma dor de cabeça que normalmente não sentiria nem se bebesse todas as bebidas existentes naquela casa. Acho que o fato de ter me tornado pai me fez envelhecer alguns anos, pelo menos mentalmente. A causa da minha dor de cabeça também poderia estar associada ao nervoso que passei noite passada.
Ouvir a conversa de não tinha sido algo feito propositalmente. Eu estava apenas passando no corredor vindo do escritório, onde me tranquei para fugir da presença desagradável de Anne e seus olhares e opiniões obsessivas sobre mim. achava um exagero, e poderia até estar certa sobre isso, mas eu não conseguia evitar desgostar de Anne.
Além de ser irritante, ela ainda namorou Miguel! Como ela poderia ter aquela queda enorme por mim e ficar com aquele filho da puta? O gosto dela para homens oscilava entre muito bom – eu, no caso – e péssimo.
Abri os olhos e encarei o teto preguiçosamente; estiquei-me na cama bagunçada pelo que fizemos ontem e ainda tive aquela sensação de estranhamento. Sabia que tinha reclamado muitas vezes sobre o fato de ser espaçosa na cama, dos chutes e braçadas que levava do nada durante a noite. Mas minhas suspeitas estavam certas – eu realmente já não conseguia dormir direito sem ela ao meu lado.
O que era, no mínimo, preocupante.
Até fizemos piada sobre aquilo, mas éramos daquele jeito mesmo. Ríamos do que não queríamos admitir para ver se soava tão ridículo em voz alta quanto na nossa cabeça.
Soltei um riso quando vi a algema pendurada na cabeceira. Estiquei meu braço e a empurrei, observando o objeto de metal balançando. Caralho, aquela foi uma das coisas mais impulsivas que já fiz em tempos. Ser pai também me deixou meio careta. Sempre fui irresponsável quando mais novo – mentira, um tempinho atrás, até Grace estar praticamente parindo, eu ainda era. Havia feito coisas muito mais perigosas do que apenas foder alguém algemado na cama, mas, no contexto que estávamos inseridos noite passada, tinha sim sido algo arriscado.
Principalmente para . Acho que ela preferiria ser pega no flagra no banheiro do avião do que sermos pegos por Anne ali, no nosso quarto.
E eu não reclamaria caso aquilo acontecesse. Teria me poupado de ter que ouvir planejar dar para Tom e as piadinhas e risadinhas maliciosas. e eu não tínhamos por que ficar nos escondendo daquele jeito para elas, como se estivéssemos cometendo um crime.
Se fosse crime transar demais, então pegaríamos prisão perpétua com muito prazer.
Ouvi uma movimentação lá embaixo e decidi me levantar. Estava morto de fome, e achei que não conseguiria segurar até que Anne fosse embora. Era a minha casa também, era ridículo ter que ficar me escondendo dela.
Tomei um banho, escovei os dentes e respirei fundo, tentando manter minha paciência nos eixos. Desci as escadas e encontrei apenas na cozinha. me viu com seus olhões verdes e soltou um murmúrio acompanhado de um sorrisão apenas de gengivas. Sorri instantemente, me aproximando rápido para beijar sua bochecha babada.
riu fraco ao sentir a bebê se encolher em seus braços quando distribuí beijinhos no rostinho miúdo da neném. Minhas mãos foram involuntariamente para os quadris da mãe dela. Percebi seu corpo enrijecer, porém continuei ali e virei o pescoço para poder beijá-la.
virou o rosto, fazendo-me franzir a testa em confusão.
— O que foi? — sussurrei ao pé de seu ouvido, num tom provocativo. Seus pelos do braço se eriçaram, eu sabia que ela não resistia. Beijei sua têmpora, migrando pela lateral de seu rosto até o canto de sua boca. Intensifiquei o aperto em seu quadril e relembrei o modo como peguei nele noite passada. Depois de ontem, o que eu mais queria era beijá-la. — Hein? — tentei mais uma vez beijar sua boca.
— ! — exclamou, se esquivando novamente.
Arfei em indignação. As meninas nem estavam ali, provavelmente estavam se arrumando para o trabalho. Não tinha a necessidade de temer que nos vissem, estávamos a sós com . Como deveria ser sempre.
— As meninas ainda estão aqui, o que eu te falei ontem? — questionou, e abri minha boca para retrucá-la. Porém, foi mais rápida: — Você pode cumprir o que combinamos ao menos uma vez?
A porta do quarto de hóspedes se abriu e ouvimos vozes pela sala. Eu continuei ali, parado, me perguntando o motivo de tanta afobação. Não, não era fingimento pelas meninas estarem vindo até nós; elas nem ao menos tinham saído do quarto.
Eu sabia o quanto era medrosa e o quanto ela prezava por fazer as coisas sempre certas. Ontem mesmo disse que não era livre, que não conseguia. Eu entendia, apesar de não concordar em vê-la se anular por alguém tão invejosa quanto Anne.
Mas aquele medo todo às vezes me parecia ser outra coisa. Eu tinha minhas desconfianças desde o início de que, caso a situação fosse diferente, ainda assim não assumiria que estávamos ficando para as amigas. sempre jogou na minha cara o quanto eu era um galinha sem coração, ria da quantidade de namoradas que já tive, as chamavam de inocentes por “caírem na minha lábia”. Sempre se achou inteligente demais para cair em meus encantos. Como se eu nunca fosse digno de ter uma mulher como ela.
— Eu nunca vou me acostumar em ver vocês assim, tão perto um do outro sem nenhuma faca ou um prato pra jogar e se machucarem — Tiffany deu a volta no balcão, fazendo-me afastar meu corpo do de imediatamente. Fingi que estava perto para pegar , e assim fiz, tomando a bebê babona em meus braços.
— E aquele casamento, então? — Anne riu forçadamente. Tudo nela era forçado para mim. — Foi um surto coletivo, isso sim.
Colei meus lábios na bochecha grande da minha filha, beijando-a até que chegasse na mesa, onde o café da manhã já estava servido.
— E você nem ficou aqui com a gente ontem, né, seu chato? — Fanny sentou na cadeira ao meu lado, servindo-se com o café.
— Estava ocupado resolvendo coisas do trabalho — murmurei, dando um gole na xícara que tinha em mãos. Não era mentira, eu realmente revisei uns documentos antes de começar a ver um filme no escritório.
— Pra mim foi ótimo. Quanto menos , melhor — sorriu faceira, se aproximando com a mamadeira de em mãos.
Ergui meus olhos para encará-la, pegando da mão dela antes de lhe dar um olhar raivoso. Fingi ignorar sua implicância ao prestar atenção na mamadeira que destampei.
— Parem vocês dois, tem visita em casa — Fanny riu baixinho de onde estava, já Anne se remexeu na cadeira onde estava.
— Falando nisso, como foi a estadia de vocês aqui? Dormiram bem? Geralmente os vizinhos fazem muito barulho durante a madrugada.
engoliu o pedaço de pão que tinha na boca a seco, já sentada entre mim e Anne, sua protegida. Quando não se sentia no controle da situação, apenas me olhava daquele jeito repreensivo que prometia uma discussão quando estivéssemos a sós.
— Sério? Pois eu achei uma delícia, nunca dormi em um lugar tão silencioso e tranquilo.
— Sim! Fora que esse condomínio é lindíssimo. Um dia vamos morar aqui, amiga — Anne riu junto de Fanny e .
— Nem que trabalhássemos a vida inteira conseguiríamos uma casa aqui — a morena rebateu, dando uma pequena olhada no relógio de pulso. — Falando em trabalhar, vamos logo com isso. Não podemos chegar atrasadas, o Sr. Williams corta nosso pescoço fora.
— Que droga, nem vai dar tempo da gente ajudar a escolher que roupa vestir hoje à noite — a loira lamentou.
— não precisa de ajuda, ela sabe que só precisa de um vestido justo e colocar as pernas de fora.
Tentei cantarolar algo em minha cabeça, tudo para me abster de ter que ouvir aquelas coisas. Como elas ousavam ir na minha casa e aconselhar minha esposa a me chifrar?
— Se bem que estamos falando de Tom. Se você vestisse um saco de papel na cabeça, ele não ligaria.
Ele não ligava nem para o fato de que poderia estragar tudo com a adoção de caso alguém os pegasse juntos por aí. Por qual motivo Tom se importaria com a roupa que iria ou não usar?
— Isso mesmo, algo fácil de tirar — Anne sorriu maliciosa, fazendo-me odiá-la mais do que poderia ser considerado possível.
me espiou pelo canto do olho, apreensiva, com um sorrisinho amarelo. Eu sabia que ela estava fingindo, ou pelo menos foi o que me disse noite passada. Mas depois de pensar na possibilidade de estar com vergonha de dizer para as amigas que era comigo que ela estava, já não sabia mais distinguir o que era medo de magoar Anne e o que era negação por estar ficando comigo.
— Parem de falar sobre isso, eu estou comendo — murmurei com meu rosto se contorcendo em nojo. Era genuíno até demais. Eu simplesmente não conseguia imaginá-la com Tom ou sequer ter que presenciar momentos como aquele beijo no Natal e ter que ficar na minha. Eu não a queria com ele, Dormian não a merecia. Vê-los juntos me causaria dor física, eu tinha certeza daquilo.
— Nós já estamos de saída, estressadinho — minha esposa me olhou, censurando-me pela milésima vez desde que as meninas chegaram. Os olhos azuis de falaram mais que sua boca; eu os entendia numa facilidade assustadora.
Torcia para que algum dia deixasse de se comunicar apenas com eles ou esboçar sorrisos sem graça – eu queria vê-la falar em voz alta o que realmente sentia e queria. Era inevitável, porém, eu não conseguia deixar de pensar que estaríamos melhores se estivéssemos sozinhos. Não colocaria proibições na casa que nem minha era, e eu gostava muito de Fanny para pensar na possibilidade de não querer tê-la por perto. Mas e eu sabíamos que o problema estava em Anne, e eu tinha certeza que Fanny não ligaria se soubesse de nós.
— Vamos logo, já pedi nosso Uber — Anne deu a última golada na sua xícara e se levantou, indo até para dar um beijo e um abraço nela.
Praticamente fechei os olhos num reflexo quando a assisti vir até mim. Por sorte, ela só deu um beijo no topo da cabeça de , que se mexeu incomodada enquanto ainda mamava tranquilamente. O perfume doce e irritante ficou no ar, fazendo-me coçar o nariz em agonia.
As duas saíram porta afora acompanhadas por , que demorou um pouco lá com elas, provavelmente esperando o carro chegar para buscá-las. Eu não entendia que tanto assunto elas tinham, porque não fazia tanto tempo que saiu do emprego. Não era possível que tivessem tantas novidades para contar a ela.
Balancei minha cabeça, sentindo-me estupido. A única razão para aquela minha implicância com as meninas e seus papinhos com era porque eu já sabia que estava tendo o apoio das amigas. E todas as vezes que fui fazer merda na vida, tive o mesmo apoio dos meus amigos.
— Agora sim, bom dia — arqueei as sobrancelhas quando a senti envolver meu pescoço com os braços; sua boca beijou meu pescoço e rumou para minha bochecha. Fechei os olhos, controlando as sensações boas que aquele gesto me trouxe. — O que foi aquilo ontem, hein? — encostou-se na mesa diante de mim, sorrindo safada.
Eu sabia que era ridículo pensar aquilo, mas eu estava me sentindo um tremendo idiota por estar sendo feito de brinquedo por . Ela desdenhou de mim desde que as amigas pisaram os pés naquela casa, e agora estava indo me buscar no canto onde me jogou.
— Nada. Eu estava com tesão, você apareceu e aconteceu — resolvi entrar no jogo dela.
— Por que está sendo tão grosseiro?
Levantei-me, indo levar a mamadeira para a pia. Tentei ignorá-la e lhe dei as costas. Não era fácil para mim sentir tudo aquilo e não poder externar. Ao contrário de , eu tinha que me segurar para não falar o que sentia sempre.
— ? Estou falando com você.
— Você não reclamou da minha grosseria quando estava te fodendo ontem à noite.
Não precisei me virar para saber sua expressão; ofegou, ofendida de onde estava. Ué, ela poderia me tratar daquela forma como se eu servisse apenas para sexo e eu não poderia fazer o mesmo?
— Seu idiota!
— Sim, , eu sou um idiota, o maior de todos os idiotas — controlei meu tom de voz, segurando as costas de com minha mão desocupada. Não queria assustá-la. — Tem que ser muito burro mesmo pra cair nas suas mentiras. Ontem você me disse que tinha inventado tudo aquilo pras meninas, mas hoje elas começaram de novo a te empurrar pra Dormian e você mais uma vez concordou.
— Eu não estou mentindo! Só não posso contar a verdade a elas, nós já falamos sobre isso, !
— Sim, já falamos milhares de vezes sobre isso e sobre como está cômodo pra você manter essa história de ainda me odiar só pra não assumir que me quer. É muito mais fácil fazê-las pensar que está com Tom.
— Não é verdade, e você sabe bem disso — a loira se aproximou com suas feições duras. — Elas são minhas únicas amigas, . Você achando Anne invejosa ou não, não vou abrir mão delas pra te agradar.
Sempre Anne no topo de tudo. não via que Annelise não faria falta na vida dela? conheceu Su, Carolina, Vitória, nossas vizinhas, e até mesmo Amélia era amiga dela. não entendia que o fato de Annelise fazê-la esconder algo que a fazia bem não era nada saudável?
— Eu já entendi, não tenho espaço na sua lista de prioridades — engoli em seco. Eu ser o pai da filha dela aparentemente não contava.
comprimiu os lábios sem resposta. O que pra mim já era uma.
— Tudo bem, já estava mesmo na hora da gente parar de tentar fazer isso dar certo. Você estava certa quando me disse que eu já poderia voltar pro meu quarto — passei por ela levando a bebê comigo lá para cima, onde fiquei até que caísse no sono.
Me sentia um bosta porque saí falando sem controle e sem pensar antes. Era realmente o que eu queria? Afastá-la ainda mais e praticamente entregá-la de bandeja nos braços de Tom?
Me deitei ao lado da neném e tirei um longo cochilo após ter passado a noite praticamente inteira me revirando na cama. O cheirinho dela me acalmou por um tempo, não foi difícil acompanhá-la na soneca.
Despertei um tempo depois, sozinho no quarto, não gostando daquela sensação ruim que me deu. Tinha acordado daquela mesma forma mais cedo, e não pude deixar de pensar que aquilo seria frequente quando saísse o divórcio. Não teria comigo todos os dias como estava me acostumando, muito menos .
Decidi distrair minha cabeça para ver se conseguia pensar em outra coisa a não ser aquela droga de encontro de com Tom. Eu já tinha dito tudo o que eu tinha pra falar – ao menos tudo o que minha consciência me permitia, porque tinha mais, muito mais coisas que eu queria dizer. Só não sabia como traduzir em palavras aquele incômodo no peito.
Vesti minhas roupas de corrida e deixei a casa silenciosa. Soube que estava ali quando a avistei na cozinha com a bebê já acordada. Saí sem falar nada, nem ao menos sabia o que dizer a ela depois daquela palhaçada que protagonizamos ali.
Depois de algumas voltas no quarteirão, percebi que não devia ter falado nada. Eu não deveria querer me intrometer nas relações de , por mais erradas que elas pudessem parecer. Eu tinha Chace, e ele também não conseguia esconder o quão a fim de ele era. A única diferença era que meu melhor amigo não sabia da nossa farsa.
Anne saber sobre nossa mentira só lhe dava mais liberdade ainda para desdenhar de nós dois juntos. Por isso nenhuma das duas conseguia ver que não era humanamente possível um homem como eu e uma mulher como viverem juntos sob o mesmo teto sem pensar em transar ao menos uma vez.
Tom também usava o fato do nosso casamento ser de mentira para ficar no pé de . Ele não a chamaria para jantar caso ainda pensasse que éramos casados de verdade. Me odiei profundamente pelo dia em que nos descuidamos e Tom ouviu nossa conversa, mesmo sabendo que nenhum de nós tinha culpa. Eu queria poder voltar no tempo para impedir aquilo.
Corri pra fora do condomínio. Estava ficando estressado de novo e teria que correr por dias para conseguir descontar minha raiva ali, e não brigando com . Até porque eu estava sendo egoísta, eu sabia. Mas, mesmo sabendo que eu não tinha moral de falar nada por sair com Dafne, as coisas ainda eram diferentes. Tom sabia de tudo e poderia estragar tudo se quisesse. E o que ele mais queria era .
Corri por bastante tempo, até anoitecer e minhas pernas ficarem doloridas. Na volta, tive a infelicidade de cruzar com um cara ateando fogo num monte de entulho. Tossi algumas vezes ao inalar sem querer aquela fumaça toda. Voltei para casa sentindo meu peito doer um pouco, então fui direto para o banho para tentar relaxar meu corpo tenso e repleto de suor.
Lavei os cabelos, esfregando-os como se aquele monte de pensamentos fossem sair com a espuma e descer com a água ralo abaixo. Queria conseguir desligar minha mente, porque saber que iria sair com outro homem estava me consumindo por dentro.
Saí do chuveiro ainda tossindo um pouco. Não entendia por que ainda estava com a respiração irregular daquele jeito, visto que estava em repouso. Vesti uma cueca qualquer e uma calça de moletom. Do closet, ouvi uma movimentação no quarto e saí, avistando-a diante da cômoda no espelho.
me olhou por baixo daqueles cílios falsos. Suas mãos, que seguravam o frasco de perfume, hesitaram por um instante. As bochechas estavam levemente coradas e iluminadas pela maquiagem; os lábios que eu tanto saboreei estavam pintados e bem delineados. Ela estava séria como nunca. Piscou algumas vezes, finalmente borrifando o perfume no cangote e nos pulsos.
Fechei os olhos, sentindo o aroma passear pelo ar até minhas narinas. Imaginei e senti meu coração se apertar; Tom com certeza deslizaria o nariz por seu pescoço e a arrepiaria como sempre ficava ao ser tocada daquela forma.
— Só vim pegar algumas coisas que esqueci de levar pra lá… — ela se apressou em se justificar. Como se estivesse fazendo algo errado ao entrar no nosso quarto.
A culpa era toda minha. Sentia vontade de me socar por ter dito aquilo mais cedo.
— Sabe, você não precisa mudar de quarto se não quiser… — me aproximei, receoso, ainda com a toalha úmida que usei para secar meus cabelos. , que procurava algo na primeira gaveta, parou o que estava fazendo para me olhar.
— V-Vai ser trabalhoso demais pegar tudo daqui e levar pra lá… — mexeu a cabeça, concordando, embora aquela desculpa fosse péssima. Afinal, agora teria todo o tempo do mundo para fazer aquilo se quisesse.
E eu esperava com todas as minhas forças que não quisesse.
— Eu não quero mais dormir longe de você. Uma noite já foi o suficiente.
— Se é isso o que você quer… — sorriu, fazendo-me sorrir de volta instantaneamente. Eu estava nervoso, tanto que prendi a respiração sem perceber. — Eu fico.
“Você deveria ficar comigo hoje”, pensei em silêncio.
— Fico feliz que queira ficar — murmurei atrás do seu corpo. A loira à minha frente achou o que procurava entre as roupas: uma caixinha que continha uma corrente delicada de prata.
— Fico feliz que esteja feliz — disse risonha, arrancando-me um riso sem graça. Observei quando tentou colocar o colar em si mesma, tendo alguma dificuldade.
— Quer ajuda? — perguntei. arqueou a sobrancelha, provavelmente surpresa por eu estar ajudando a se arrumar para sair com Tom. Eu estava tentando ser educado. Não queria e nem iria mais brigar com ela naquela noite, não depois de fazer as pazes e reverter a merda que tinha feito mais cedo.
assentiu, deixando-me pegar as pontas da corrente e tentar encaixar as peças para fechá-la. Quando o fiz, deslizei meus dedos de leve sobre sua pele macia, ajeitando o pingente pequeno em seu colo. Seus olhos azuis me assistiram do espelho. Foi difícil não ser atraído pelo seu olhar, que era como um ímã que me puxava. Eu não via escapatória, mas se houvesse alguma, recusaria qualquer uma, me permitindo ficar perdido no oceano de suas íris.
— Está linda — sibilei, sabendo que leria meus lábios e entenderia o que disse sem sequer emitir um som.
— Obrigada — virou-se, mantendo seu sorriso aberto.
— É sério, você é a mulher mais linda que conheço.
gargalhou, desdenhando. Puxei-a para perto pela cintura, sentindo seu nariz encostar-se ao meu num beijo de esquimó inocente.
— Pare com isso — ela envolveu meus bíceps com suas mãos firmes. Avancei contra seus lábios, dando-lhe um selinho. Mas meu coração bateu forte, ansiando por mais quando senti seu perfume de mais perto.
Peguei-a em meus braços, sentindo sua pele macia descoberta pelo vestido. Pedi passagem com a língua e fui correspondido, enroscando a minha na dela com furor. Pensei desesperadamente que poderia fazê-la ficar se conseguisse beijá-la a ponto de estarmos sem roupas na nossa cama. Como se pudesse prendê-la a mim novamente, como se não conseguisse sair do meu abraço e correr para Tom.
Suspirei derrotado ao notar suas mãos frias e trêmulas empurrando-me para longe, espalmadas em meu peito descoberto.
— Assim você vai arruinar minha maquiagem — ela me deu as costas, resmungando sem conseguir conter o sorrisinho crescente nos lábios.
Encarei-a pelo reflexo do espelho, pensando no quanto eu queria que as coisas fossem diferentes naquela noite. tinha razão quando me disse que não deveria me pedir para levá-la para jantar. E eu só estava me dando conta da minha burrice quando a vi pronta para sair com outro homem.
Seu celular, que estava sobre a cômoda, começou a vibrar insistentemente, atraindo nossos olhos, que antes estavam ocupados conectados entre si diante do espelho. O sorriso em seus lábios desapareceu, dando lugar a uma expressão de pura preocupação.
“Tom”.
pegou o aparelho e, antes de atendê-lo, deixou o quarto em passos largos, sem ao menos olhar para trás. Fiquei ali, parado, me sentindo impotente.
É, , você está arruinando a minha vida.
— Oi, já estou pronta — ouvi sua voz soar do corredor e fui atrás. Não sabia o motivo, já que estava voltando a sentir aquele aperto e dor no peito só de ouvi-la falar com ele. — Não exagera — riu baixinho. — Um minuto.
Ela afastou o celular ao se aproximar da cama; se remexeu em cima do colchão, reconhecendo a voz da mãe. Seus olhinhos verdes cintilavam ao contemplá-la se inclinar sobre si.
— A mamãe te ama, sim? — beijou o topo de sua cabeça. — Se comporte — beijou sua barriguinha, levantando-se e voltando ao celular. — Onde nos encontramos? — me flagrou parado diante dela, prestando atenção na conversa. — Sei, a dois quarteirões do condomínio. Tudo bem.
— O quê? Ele está louco em te fazer ir andando uma hora dessas, de salto num lugar perigoso desses? — protestei. Eu estava tentando, juro que estava. Bom, pelo menos durou mais que cinco minutos, que era minha aposta inicial.
— , eu não posso sair daqui com ele. Pode ser perigoso, e se alguém nos vê?
Sabe o que não seria perigoso? Você não sair com ele, olhe só!
— Perigoso é você ser assaltada ou sabe-se lá Deus mais o quê! Não se esqueça que Miguel está à solta. Tom não devia te colocar em risco dessa forma!
Ouvi Dormian falar merdas pelo telefone. Não compreendi o que era, mas deixaram bem irritada.
— A estrada é movimentada, ele já vai estar me esperando lá. Não faça esse drama todo por nada, !
— Não é drama, . Olha, eu posso te levar, se você quiser.
A loira suspirou quando ouvimos Tom protestar do outro lado da linha. Eu entendia que devia se sentir como um pedaço de carne sendo disputada por dois cães, mas ela não podia negar que eu estava certo!
— , por favor… — ela apertou o meio das sobrancelhas.
— Por favor, nada! Você é a mãe dos meus filhos, eu tenho que te proteger!
“E talvez eu não queira que você vá com ele também, mas isso é apenas um detalhe”, pensei.
— E tem mais, Dormian. Se demorar a voltar, eu vou atrás pra saber onde você a levou, já que está querendo colocá-la em risco assim.
Blá, blá, blá, o velho insuportável continuava latindo ao telefone.
— Vamos fazer assim, então. Eu pego um táxi e te encontro lá no restaurante, pode ser? — respondeu a Tom, exasperada. Aparentemente deu certo, porque ele não voltou a dar chiliques. — Ótimo, até daqui a pouco. Tchau — minha esposa finalizou a chamada respirando fundo antes de me lançar um olhar irritadiço. — O que diabos foi isso, ?
— Não está óbvio? Sou eu preocupado com você.
Ela negou com a cabeça em reprovação, apanhando sua bolsa e carteira e deixando o quarto.
— Eu não retiro o que disse — continuei. — Se você demorar muito, eu vou atrás. Tom não tem o mínimo de cuidado com você.
Tom não cuidaria dela como eu, que lhe dei banho, carreguei nos braços e passei pelo inferno ao lado dela. Nós éramos uma família, e eu duvidava que Tom soubesse o peso daquilo.
— Vou deixar uma coisa bem clara — cessou o barulho dos saltos finos no piso do corredor, virando-se para me olhar no fundo dos olhos. — Você não tem o direito de decidir que horas eu volto, . Quando foi a sua vez, você ficou até o amanhecer na casa de Dafne fazendo sabe se lá o quê, e eu não me lembro de ter te cobrado nada — sua expressão de nojo denunciou que ela sabia, sim. — Portanto, se eu quiser, farei o mesmo.
Engoli em seco.
— Vai mesmo dormir com ele? — minha voz saiu baixa, quase inaudível.
Os olhos de vacilaram, fugindo dos meus tempestuosos. A loira mordeu o lábio com força, voltando a me olhar no rosto – daquela vez, com os olhos marejados.
— Isso não é da sua conta.
A assisti me dar as costas e descer escada abaixo, deixando-me sozinho na casa.
— Me lembro da nossa primeira vez.
Foi inevitável não embutir aquela lembrança quando o assunto me veio à cabeça.
Aquela noite em Tulum tinha sido inesquecível, mesmo com a confusão da camisinha atrapalhando e conseguindo nos impedir de consumar o ato. Aliás, arrisco dizer que toda aquela viagem, mesmo com os problemas incluídos nela, foi inesquecível. Era engraçado como eu estava equivocado sobre não querer levar comigo. Já tinha feito diversas viagens de fim de ano com meus amigos, mas aquela tinha um quê especial.
Talvez fosse o fato de ser a primeira viagem com a bebê, ou o modo como minha caçada de gato e rato com tinha ganhado uma reviravolta e tanto. Quem diria que aquele casamento forçado iria evoluir àquele ponto?
— Estamos nostálgicos hoje — cantarolou, risonha. Mexi a cabeça; talvez fosse por causa dos vídeos do casamento.
Curiosamente, só nos demos conta das mudanças que sofremos durante aqueles três meses quando nos deparamos com registros nossos do passado. Tinha acontecido tudo tão naturalmente que eu acreditava que não falava só por mim quando dizia que não tinha notado as coisas mudarem, ou se transformarem, no nosso caso.
O ódio que sentíamos tinha se multado em cuidado quando se machucou, para logo depois se transformar em desejo quando… Bem, não me lembrava ao certo que evento me fez reparar nela antes. Eu mesmo já tinha admitido que a achava gostosa no passado, mas então de onde tinha vindo meu instinto de proteção e cuidado?
Mesmo que fossem sentimentos e sensações concretas, o que despertava em mim ainda era um mistério sem solução.
Minha atração por talvez tenha se iniciado mesmo no episódio da camisola transparente, ou como lembrado anteriormente, quando a vi de biquíni na adolescência.
Lembrava-me com clareza de quando a vi pela primeira vez, do dia em que Thereza chegou com a menininha loira de mãos dadas no aniversário de oito anos de Grace. praticamente sumia atrás da mãe, que a levou porque minha mãe tinha sugerido que ela levasse a filha para conhecer nossa família.
Não fui com a cara dela de imediato. Minha irmã foi o contrário de mim; puxou-a pela mão, louca para enturmá-la com as amiguinhas, e se esqueceu que tínhamos combinado de brincar na cama elástica que tinham alugado. Apesar dos esforços de Grace, estava bem cabisbaixa naquele dia. Naquele tempo eu não sabia o que possivelmente já acontecia na casa dela. Não gostei do modo como era fechada e apenas interagiu direito com minha irmã naquele dia.
Ela foi crescendo e, à medida que as duas iam se aproximando, minha interação com foi ficando pior. De repente ela não era apenas uma criança tímida e escolhia não falar comigo mesmo, e aquilo me tirava do sério! Ela entrou na minha casa, praticamente usurpou o meu cargo de irmão e ainda por cima me ignorava?
Hoje eu conseguia ver que o modo como escolhi provocá-la, por muitas vezes, era causado por pequenas doses de atração. Como quando cortou os cabelos claros curtos e eu lhe apelidei de Beiçola Loiro, quando na verdade eu tinha curtido o resultado. Ou quando ela cortou uma franja e eu a achei bonitinha, mas caçoei tanto da cara dela que a coitada passou a usar os cabelos presos até que crescessem novamente. Zombava de suas roupas, de sua risada e até de suas falas. Não me orgulhava daquilo; depois de mais velho, passei a perceber que a fazia sentir mal e parei de zombar de sua aparência.
Até porque, na adolescência, eu não tive muito o que fazer a não ser ignorar o fato que ela ficava cada vez mais bonita e, enquanto isso, na mesma medida, cada vez mais atrevida em suas respostas. Era divertido entrar em discussões com ela, vê-la vermelha diante de mim enquanto seus olhos queimavam em ódio, completamente vidrados em mim. Às vezes eu olhava para sua boca movendo-se com rapidez quando despejava rios de insultos contra mim.
Hoje sei que o que eu sentia não era apenas ódio, mas sempre mascarei para mim mesmo que era, sim, desprezo, e eu a repelia sempre que possível. Se vasculhasse bem minhas lembranças do ensino médio, não seria difícil achar momentos em que eu admitia internamente que alguns atributos físicos de eram… interessantes antes mesmo do dia do biquíni. dormiu muitas vezes em casa, e eu já entrei no quarto de Grace com uma desculpa qualquer só para vê-la vestindo pijamas de verão.
Tudo tinha começado de uma olhada e outra. Enquanto não era nada concreto e um segredo que eu guardava a sete chaves, estava tudo ok. Eu simplesmente fingia que não sentia nada.
Porém, depois do casamento, ter que beijá-la e fingir que não gostava… Eu não consegui resistir por muito tempo. Quanto a , bom, ela era uma incógnita. A única coisa que ela me deixava saber sobre seus sentimentos em relação a mim no passado era que não me suportava. Mas não era como se eu já não estivesse acostumado com seus segredos, principalmente quando se tratava sobre sentir ou não algo em relação a mim.
— Até hoje não acredito que topei fazer aquilo na casa de Megan — sua fala me fez arquear as sobrancelhas, voltando à realidade após ter mergulhado em devaneios sobre o passado. — Eles jantando normalmente, e nós dois… — não conseguiu completar, ficou vermelha feito um pimentão e cobriu o rosto.
Oh, nossa primeira vez juntos tinha mesmo sido na casa de Megan. Eram muitas lembranças embaralhadas, mas recordar aquela noite me fez sorrir. Foi a primeira de muitas vezes que tive o prazer de deslizar a língua em sua pele deliciosa.
— E, pelo visto, você sempre foi escandalosa desse jeito — ri da sua cara, lembrando-me da cena que protagonizamos minutos atrás naquele móvel na cozinha.
Eu adorava, mas que homem não gostava?
sempre me deixava saber o quanto estava gostando quando eu a tocava e a beijava. Era engraçado fazer aquele paralelo com o modo como era contida quando se tratava do que sentia e o modo como ela se entregava por completo quando estava em meus braços.
— Para! — empurrou-me pelo ombro e sentou-se, escondendo o rosto entre os joelhos. Me levantei junto, abraçando seu tronco e beijando sua nuca enquanto ria contra sua pele quente.
Queria que se abrisse para mim do mesmo jeito que fazia na cama, sem pudor, sem vergonha. Adoraria ouvi-la declarar o que sentia com a mesma naturalidade com que gemia em meu ouvido. Mesmo reclamando tanto de tê-la sempre guardando o que sentia, eu não poderia negar que era delicioso quando ela me olhava nos olhos e finalmente me deixava saber de algo que se passava dentro de si. Nunca conseguiria explicar o que era o frio na barriga que eu sentia quando me dava o privilégio de ouvir algo sobre si.
— Eu não consigo controlar — murmurou, ainda risonha. O som de sua voz saía abafado por causa das mãos ainda cobrindo seu sorriso.
— E nem deve — acariciei a região da sua costela, dedilhando os ossos aparentes com a ponta dos dedos, como se tocasse as cordas do meu velho violão. se encolheu em meu abraço, reproduzindo sua risada sem graça que soava como uma melodia aos meus ouvidos. — Sabia que é controlada demais?
levantou o rosto, tirando os fios loiros do caminho dos olhos, que cintilavam enquanto seus lábios se curvavam num sorriso contido. Ao contrário do que eu poderia prever, não assumiu a postura defensiva que um tempo atrás lhe caberia como uma luva. Ao invés de se defender como se o que eu disse soasse como uma ofensa ou um ataque, apenas assentiu com a cabeça. Reconheceu, deixando tudo mais leve.
Nossa cumplicidade recém-adquirida deixava toda e qualquer situação tranquila. Era muito novo para mim me relacionar com uma mulher daquela forma, sem pisar em ovos. Com , então… aquela estranheza boa apenas se triplicava.
— Amo te assistir perder o controle — beijei sua boca devagar, tendo seu antebraço encaixando-se em minha nuca, juntando-nos cada vez mais. — Amo saber que sou o responsável por te fazer perder a pose de mandona, se derreter em meus braços e abrir essas pernas… — desci meus lábios pelo seu pescoço e tronco, parando em um de seus seios e sugando seu mamilo.
soluçou em êxtase, pegando meus cabelos entre os dedos e fazendo um carinho gostoso neles.
Nossas pernas flexionadas se embolaram como fazíamos na cama logo pela manhã, quando eu sentia os pés gelados de se encostando em minhas panturrilhas. Já tinha desistido de lhe vestir meias e me acostumei com aquele defeito proveitoso quando estava calor, e torturante quando fazia frio.
— Eu me sinto tão bem com você, tão bem… — larguei sua pele e massageei seu mamilo já rijo, molhado por minha saliva. Havia outra coisa molhada em seu corpo, que descobri assim que levei minha outra mão até o calor entre suas pernas abertas. Introduzi um dedo em sua entrada, vendo-a revirar os olhos e gemer contra meu rosto.
— Já quero fazer de novo — sussurrou em meu ouvido, arrepiando-me e me deixando louco. Sua mão acariciou o dorso da que eu usava para penetrá-la com meus dedos devagar, torturando-a com a lentidão.
— Seu desejo é uma ordem — sorri faceiro, vendo-a rir com a rapidez que formulei a frase e a pronunciei.
— Não aqui, o chão está frio — ela se desvencilhou de meu movimento quando me inclinei para voltar a deitar-lá, já indo em cima dela.
— Ok, Vossa Majestade — me levantei e puxei-a pela mão, a ajudando a se levantar. Assim que ficamos de pé, fiz questão de colar nossos corpos antes de beijar sua boca com avidez, avançando com o quadril sobre sua virilha e vendo-a se arrepiar em desejo. — Vamos pro sofá.
Deixei-a ir na frente quando, contra a minha vontade, nos separamos e eu fiquei na cozinha para ir atrás da minha carteira. Assim que consegui o preservativo, rumei para a sala, encontrando-a sentada já me esperando, Mordi o lábio ao contemplar seu corpo nu e comecei a reparar que tinha uma espécie de feitiço sobre mim. Sempre achei que transar sempre com a mesma mulher por muito tempo chegaria num estágio em que eu me cansaria de ter a mesma visão.
Foi assim com todas as minhas ex-namoradas – não que desse para comparar o que eu tinha com com um dos meus namoros. Apesar de conter sentimentos, aquele casamento falso era o mais próximo de relacionamento sério que eu já tive na vida.
A adoção de era o fator predominante ali. Tudo era impassível de erros graves, mais sério até do que um namoro ou um casamento de verdade.
Beijei sua boca e peguei-a forte pela nuca, forçando-a a manter a cabeça elevada ao puxar bem a raiz de seus cabelos lisos. gemeu contra meus lábios, adorando aquela dominância animalesca. Sentei-me, puxando-a para se sentar em minhas coxas. Observei hipnotizado quando a loira gostosa se ajeitou em cima de meu pau já completamente ereto.
Ele não podia sequer vê-la que já se acendia como um isqueiro, que num simples clique há uma chama surgindo como um passe de mágica. Meu corpo reagia ao dela com uma simples menção de sua presença e existência. Meu olfato reconhecia seu cheiro durante a noite quando eu acordava na cama e não sentia a fragrância de seu shampoo, porque a tinha longe nas vezes em que ia checar em seu quarto. Parecia um cachorro que sente o cheiro do dono a quadras de distância, e quando o encontra, abana o rabo e quase morre de felicidade.
— Isso, linda, faz assim… — grunhi ao passar os olhos por sua barriga e seios suados, vendo-os em movimento cada vez que ela sentava em meu pau já envolto pela camisinha. Deslizei meus dedos por seu osso proeminente do quadril, ainda assistindo-a em ação, gemendo baixinho por conta da minha zoação anterior. Sorriu safada quando reparou em meus olhos vidrados nela. — Meu Deus, , você me deixa louco…
Sua gargalhada convencida me fez sorrir.
Puta que pariu, que mulher deliciosa. Minha esposa era uma puta de uma gostosa.
Abocanhei um de seus seios, ouvindo-a me ordenar que a chupasse inteira como prometi e fiz naquela vez que estivemos na cozinha. Sua mão passou a forçar meu rosto contra seu mamilo enquanto ela se deleitava com as sensações que minha boca lhe proporcionava.
Eu o faria de novo, quantas vezes fossem necessárias. Parecia que eu nunca me cansaria daquilo, da miragem que era ver seus quadris subindo e descendo sobre meu corpo, mesmo tendo-a tantas vezes antes. Mesmo depois de ter mapeado todas as suas pintas e cicatrizes, eu continuava com o mesmo tesão da primeira vez.
Ela jogou a cabeça para trás, deixando os cabelos caírem pelas costas ao se apoiar em meus ombros e aumentar a velocidade. ofegava e se esforçava para continuar a me dar prazer, passando a apenas rebolar quando se cansou de me cavalgar.
Joguei-a no sofá e escalei seu corpo, me encaixando de volta em sua entrada úmida, tendo suas coxas já envolvendo meu quadril e me fazendo sentir o cara mais sortudo do mundo ao reparar em como tínhamos um encaixe perfeito. Todos aqueles anos brigando… foi um tempo perdido. Poderíamos ter gastado nossas energias fodendo, gemendo contra o ouvido um do outro ao invés de gritar. Só os xingamentos e os puxões de cabelo que eu não mudaria – estávamos dando um jeito de manter as tradições entre nós bem vívidas.
— Ai, amor… — a ouvi dizer, e sorri contra seu pescoço quando senti suas unhas curtas arranhando-me as costas. Levantei o rosto e a vi praticamente desfalecer embaixo de mim, completamente arrepiado e imerso naquela sensação que experienciei ao ouvi-la me chamar daquele jeito, quase inconsciente de prazer. — Não pare… — soluçou, revirando os olhos azuis. Mordi seu lábio inferior, puxando-o com força. — Por favor… — ofegou.
— Não vou — beijei suas bochechas. Estoquei-a mais rápido ao sentir que estava chegando no ápice após o dela, que já tinha gozado e apenas me esperava fazer o mesmo para que pudéssemos finalmente voltar a respirar. Não que já não estivéssemos fazendo aquilo, mas estava tudo tão quente entre nós que o suor já podia ser visto em sua testa.
Estava difícil arranjar fôlego. Os corações batiam um contra o outro, frenéticos. Quando saí de cima dela, a tive sobre mim para economizar espaço no sofá; sua barriga subia e descia com rapidez contra a minha. Me livrei da camisinha, fazendo um nó e jogando-a num canto no chão.
Estávamos tontos, cansados. Eu não conseguia precisar em que ponto da noite pisquei os olhos pela última vez, só sabia que, quando os abri novamente, tive o vislumbre de tê-la passando já vestida para a cozinha com a bebê chorando nos braços. Voltei a fechá-los, sem forças para mantê-los abertos. Aquela era a noite de ver , eu acho… O sono não me deixou me lembrar se eu o tinha feito noite passada.
Voltei a me entregar à escuridão das minhas pálpebras quando identifiquei o cheiro de seu shampoo e senti sua cabeça se aconchegar em meu peito. Aproveitei o cobertor que foi jogado sobre mim e a envolvi em meu abraço antes de voltar a perder a consciência totalmente.
’s point of view.
Abri os olhos, irritando-os com a claridade repentina. Me perguntei por que diabos tínhamos dormido com as cortinas abertas. Ouvi meu celular vibrar em algum canto próximo de nós, então remexi-me sobre o peito desnudo de e acabei percebendo que tinha babado um pouco nele sem querer. Eu tinha me cansado tanto com tudo o que fizemos que tinha dormido feito um bebê. Pretendia continuar daquele jeito, porém um som vindo de longe estava me incomodando. Eram vozes, que depois se juntaram ao barulho de palmas…
— … …
Era meu aniversário ou eu estava sonhando?
Senti se remexer; entreabri os olhos e senti minhas pálpebras pesarem toneladas. Ok, não estávamos no quarto. Levei minha mão a um deles e o cocei a fim de desembaçar minha visão turva. Era a sala de casa. Pisquei mais uma vez e percebi que o barulho persistia. Espera um pouco, eu conhecia aquelas vozes.
— Puta merda — virei-me para sair da cama, mas ao invés disso fui impedida de ir ao chão pela mão de , que me segurou sobre si em cima do sofá. Seus olhos verdes e sonolentos encararam-me confusos. — São as meninas, me esqueci completamente delas.
— E eu com isso? Faça elas pararem de berrar — fez menção de se virar para continuar a dormir. Cutuquei-o, alarmada.
— Elas vão entrar. Aliás, não entraram ainda porque o portão está trancado. Tenho certeza que a porta ficou aberta.
Imagine se elas nos flagrassem ali! Eu não teria uma desculpa plausível para convencê-las de que não tínhamos dormido juntos. Aliás, o fato de ainda estar como veio ao mundo deixava explícito que não tínhamos apenas dormido naquele sofá.
— Anda, , não dificulte minha vida!
Mais do que já estava, aliás. Levantei-me para pegar o DVD do casamento e sua capa brega que continha uma foto nossa caracterizados de noivos, em seguida o joguei na gaveta do móvel que sustentava a TV. se sentou ainda aéreo, fazendo-me apressá-lo em meio a sussurros para que não nos ouvissem. Peguei o celular, digitando que já estava descendo para recebê-las enquanto se levantava numa lentidão filha da puta.
— Leve isso — joguei o cobertor em cima de sua cabeça. Eu tinha certeza que, se ele estivesse acordado o suficiente para perceber, me mataria por aquilo. — Anda, ! — segurei o riso ao encarar sua bunda branca de fora enquanto ele subia as escadas.
Corri até a lavanderia e resgatei um short do cesto para vesti-lo e não deixar nenhuma das duas pensando que eu transitava pela casa só de blusa e calcinha com lá. Fui até o portão, destranquei-o e as convidei para entrar. Só até a sala, no caso.
— O que houve com o seu cabelo? — Fanny indagou, fazendo-me levar as mãos à cabeça a fim de colocá-los no lugar, ou ao menos tentar.
— Dormi com ele solto — murmurei, engolindo em seco, esperando que aquela desculpa colasse. Era meio difícil; os travesseiros não os deixariam desgrenhados naquele ponto, a não ser que tivessem dedos largos e uma mão tatuada.
Ainda nervosa, assisti as meninas entrarem em casa com as mãos cheias de sacolas. Olhei em volta e vi o sofá bagunçado, com as almofadas tortas e uma delas no chão, próxima à mesa de centro.
— quase não me deixou dormir essa noite, passei horas no sofá com ela no colo — disparei antes mesmo que elas olhassem para o móvel. Senti-me culpada por colocar a culpa na bebê, mas era aquilo ou falar a verdade.
— O bom é que agora você vai poder voltar a dormir — Anne ponderou, parando ao lado de Fanny, que colocou algumas sacolas sobre a mesinha.
— E nós temos que ir trabalhar — a morena revirou os olhos, fazendo-me rir. — Vamos levar logo isso pra cozinha, não podemos nos atrasar.
Fiquei alarmada, lembrando da camisa de estourando e dos botões que deveriam estar espalhados ali. Se bem que eles eram o de menos. Ninguém repararia neles depois de ver minha calcinha, as calças de e suas cuecas e afins espalhados pelo chão. Será que elas acreditariam se eu dissesse que a máquina de lavar explodiu e as roupas sujas voaram até ali?
— ! — as duas deram um pulo de susto com o berro que eu dei, parando onde estavam, perigosamente próximas da entrada da cozinha. — Deixem aí, o leva, devem estar pesadas — desdenhei, rindo em puro nervoso. — !
Caramba.
O choro de foi ouvido assim que dei o último grito já em desespero, indo para a ponta da escada. Fechei um dos olhos com força. Aquilo não fazia parte do plano. Nada ali estava fazendo parte do plano, e a culpa era toda minha!
Eu sabia que as meninas passariam lá em casa para deixar as coisas delas e os ingredientes que iríamos usar no jantar que faríamos para comemorar o aniversário de Tiffany. Devia ter me lembrado daquilo antes de resolver dar para o meu marido no balcão da cozinha, mas não. Quem disse que eu conseguia sequer lembrar meu nome quando o tinha em cima de mim?
Eu simplesmente odiava o fato de ficar burra quando o assunto era e suas mãos e corpo e voz e… Tá, mentira, eu já não poderia afirmar aquilo. A fase do ódio já tinha passado há tempos, e minha cabeça sempre me lembrava daquilo quando eu ousava pensar em justificar algo relacionado a ele usando a mesma desculpa do ódio que sentia no passado.
— Não precisava acordá-lo, nós iríamos levar… — Anne murmurou baixinho quando ouvimos os passos na escada junto do choro mais contido da neném. desceu com a expressão séria. Só se deu ao trabalho de vestir uma bermuda, porém estava igualmente descabelado. — Bom dia, .
Quase peguei o paninho de para secar a baba dela quando Anne percebeu que ele estava sem camisa… com o peitoral e as tatuagens à mostra… Eu nem me sentia no direito de julgá-la por cobiça.
— Vai com a sua mãe — ele me deu a bebê chorosa, que chupava a chupeta enquanto ainda tinha os olhos molhados e sonolentos. Até ela estava descabelada.
Era de família.
Dei um olhar para quando me aproximei para pegá-la. Ele não podia simplesmente ignorá-la, seria falta de educação da sua parte.
— Ah, bom dia, Anne — passou por ela, abraçando Fanny de repente. — Feliz aniversário, chatonilda.
Bati na minha própria testa. Que universo paralelo era aquele em que sabia mais sobre minhas amigas do que eu?
Os olhos de Anne foram diretamente para ambos. Eu tinha certeza que ela não via a hora de fazer aniversário de novo só para ir lá em casa ganhar um abraço dele daquele jeito. Sem camisa, então, ela morreria!
— Nossa — se virou para mim, fazendo-me disfarçar que estava espiando-a se remoer de inveja de Fanny. — E esses arranhões aí, hein, ? — sua voz trêmula denunciou o quão afetada ela ficou, mesmo que seu sorrisinho falso tentasse encobrir.
Torci silenciosamente para que não lhe respondesse mal, porque eu tinha certeza que algo de baixíssimo calão se passou por aquela cabecinha… Não queria que ficasse um climão quando elas estivessem ali. Iríamos comemorar o aniversário de Fanny, era para ser divertido!
— Mas olhe só… — Tiffany se esticou para olhar também. Meu coração bateu tão forte que, se eu abrisse um pouco mais minha boca, ele pularia para fora. — Você deixa acontecer esse tipo de baixaria dentro da sua casa, ?
Ô se deixo. Não só deixo como também participo.
A covinha de ficou visível quando ele me encarou por cima do ombro, segurando o riso. O repreendi com o olhar, ficando nervosa quando, de repente, tive os três encarando-me e esperando uma resposta.
— Contanto que ele esteja bem longe de mim, eu é que não vou me opor — dei de ombros, fingindo desdenho.
— Falem baixo, Dafne está lá em cima. Já não basta terem acordado — seus olhos verdes me encararam fixamente antes que ele fizesse o que lhe foi pedido.
Segurei meus músculos faciais para não deixar vazar nenhuma expressão naquele momento, no qual minha boca quase se abriu num “O” perfeito. Eu não acredito que ele teve a audácia de falar aquilo. Minha vontade era de segui-lo até a cozinha e confrontá-lo. precisava mesmo usar o nome dela?
— Ela não estranha vocês morarem juntos, não? — Fanny indagou confusa. Do jeito que era desconfiada, ela jamais ficaria com um cara que morasse com outra mulher sem ter parentesco envolvido.
— Dafne sabe que não temos nada e nem vamos ter — lhe respondi, agradecendo mentalmente por não estar mais presente na sala.
— Engraçado. Quando dormi aqui, a situação era a mesma e pensei ter te ouvido dizer que eu levantaria suspeitas com os vizinhos — Anne riu sem humor, fazendo-me apressar em tentar contornar as coisas.
— Anne, eu não…
— Pelo amor de Deus, me dê de presente de aniversário um dia só sem essa sua paixão platônica pelo ? — a loira se afastou, emburrada, indo para a porta esperar Fanny. Neguei com a cabeça, porque era tudo o que eu menos queria: briga. — Já fazem três meses, … — murmurou quando percebeu minha reprovação.
— Chega desse assunto. Venha cá, me deixe te dar um abraço — a envolvi com o braço livre, afaguei suas costas e a tive brincando com , que era feita de sanduiche por nós duas. — Feliz aniversário, eu te amo. Amo as duas. Quero as duas aqui à noite e sem brigas, ouviram?
Elas se encararam em tédio. Fanny deu um tchau de longe para e deixou a casa junto de Anne. As acompanhei até o portão, vendo-as entrar no Uber a caminho da lanchonete. Voltei para dentro pisando firme, já encontrando parado na sala.
— Dafne na minha casa? — ri, incrédula. Nem por cima do meu cadáver! Se ficasse viúvo hoje, eu voltaria como fantasma só para impedir que ela sequer pisasse os pés ali.
— Ninguém mandou você começar de gracinha, desdenhando de mim.
Revirei os olhos. Mas como era sentimental.
— Não estou de gracinha. Não se esqueça que Tom mora logo ali — observei o brilho sumindo dele quando seu sorrisinho se desmanchou e seu rosto se contorceu em nojo. sabia bem que Dormian viria tranquilamente para que eu pudesse fazer um estrago daqueles nas costas dele também.
— Era brincadeira, amorzinho — agarrou-me, puxando-me para perto.
— Você se liga, hein — hasteei o dedo em sua direção. Ele tentou mordê-lo, não me levando a sério.
— Gostosa — sussurrou próximo ao meu ouvido. Mais uma distração para mudar de assunto, e daquela vez funcionou. Deixei-o beijar minha boca e deslizar sua mão grande até minha bunda. — Dois rounds essa noite… Hum, parece que temos um recorde a ser quebrado.
— Isso foi um desafio, Sr. ? — arqueei a sobrancelha, sorrindo maliciosamente.
— Com certeza, Sra. .
Gargalhei contra sua boca, selando nossos lábios antes de ir para a cozinha e arrumar a zona que fizemos.
— Ei, falando sobre ontem à noite… — se abaixou e pegou o preservativo na ponta dos dedos.
Ofeguei, agradecendo aos céus pelas meninas não terem percebido aquilo no chão. Deixar trazer outra mulher pra casa já não seria uma ideia muito agradável para mim, imagine se ainda por cima ele deixasse aquilo na sala no dia seguinte? Olha, só de imaginar eu já ficava possessa.
— Você vai limpar isso — avisei. E me certificaria de apagar qualquer rastro de sexo naquela casa, principalmente envolvendo eu e . Quando as meninas chegassem, tudo estaria do mesmo jeito que em nosso primeiro dia ali: cada um no seu quarto e com o ódio ainda intacto no coração.
ficou com para que eu pudesse tomar um banho e escovar os dentes. Ele conseguiu com que ela dormisse de volta, mas algo me dizia que não duraria muito tempo. Aproveitei para arrumar a bagunça da cozinha e preparar o café da manhã. desceu já arrumado para o trabalho e, após comer alguma coisa, saiu em disparada porque estava atrasado.
Suspirei quando me vi sozinha naquela casa silenciosa; olhei em volta e tive vontade de chorar. Eu já tinha passado o dia anterior limpando tudo que vi pela frente para tentar me distrair. Só me restava esperar acordar para me fazer companhia e tentar me acostumar com aquela nova rotina, já que não tinha decidido o que fazer ainda.
Quando ela acordou, lhe dei de mamar e fiquei mais tranquila. Assistimos um pouco de TV e me senti estúpida por falar que não a deixaria em frente à tela nenhuma. O que eu faria para distraí-la se não apelasse para todos aqueles desenhos coloridos e animais falantes? murmurava sons incompreensíveis junto dos personagens quando eles começavam a cantar. Aliás, eles faziam muito isso.
Passei parte da tarde levando coisas de um quarto para o outro, para caso as meninas subissem para o quarto de hóspedes e descobrissem que, na verdade, ninguém dormia ali. Deixei tudo com a minha cara, um pouco bagunçado, até. Tirei minha escova de dentes do nosso banheiro e coloquei no outro, junto de meus cremes para cabelo. Logo desci para o quarto de baixo, onde eu dormiria com as meninas. Em seguida, troquei os lençóis e voltei para a estaca zero, que era ficar em frente à TV com a bebê.
Elisabeta já dizia: era uma criança muito tranquila, tinha seus horários de soneca e de mamar. Deixei para lhe dar banho quando começou a entardecer, graças a um número dois que sujou não só a fralda, como também suas costas inteiras no berço.
Ouvi o barulho do carro de adentrar a garagem e respirei aliviada. Eu já não sabia mais o que fazer para preencher o silêncio que estava me incomodando.
— Oi, amor da minha vida — ele beijou a bochecha grande da bebê, que agitou os bracinhos ainda segurando seu brinquedinho azul. — Oi — senti um frio na barriga quando sua mão grande envolveu meu quadril, puxando-me para trás.
— Oi — sorri contida, tombando a cabeça para o lado para lhe dar espaço e receber mais alguns beijos no pescoço enquanto tinha meu corpo sendo colado ao dele.
— Me deixe te dar um beijo. Tenho que aproveitar que ainda tenho minha esposa aqui comigo — falou, e eu revirei os olhos, rindo do drama desnecessário. — Não ria. Na frente das suas amigas você se torna uma mulher fria e sem coração.
Gargalhei virando-me em sua direção. riu contra meu rosto, pegou minha nuca e se aproximou ainda mais, finalmente beijando minha boca.
— Depois vai querer dormir no meu peito na maior cara de pau.
Eu ria tanto que mal conseguia segurar a faca que estava na minha mão quando estava cortando os legumes antes da chegada de , que parecia que tinha engolido Pierrot, o palhaço triste, de tão engraçado e ao mesmo tempo dramático que estava.
— Quanto drama, meu Deus — envolvi seus ombros com meus braços. — Pois fique sabendo que eu não faço questão nenhuma de dormir no seu peito, você que me puxa — caçoei, vendo-o me encarar falsamente e boquiaberto.
— Ah, é?
Confirmei, comprimindo meus lábios, tentando segurar meu riso.
— Escreva o que eu estou te dizendo, . Quando o divórcio sair, você ainda vai me ligar pedindo pra dormir com você e eu vou fazer questão de negar e jogar isso na sua cara.
Ok, eu realmente tinha que anotar, porque tinha que me lembrar de nunca fazer aquilo. Eu conhecia bem e sabia que aquela era uma promessa séria.
— Me chamou de ? — fiz biquinho.
Fazia tempo que ele não me chamava pelo sobrenome antigo. Depois do acontecido na sala, me perguntei se não estava ficando realmente bravo ou se ainda era uma brincadeira.
Bom, de qualquer forma, ele quem tinha começado.
— Não se preocupe tanto comigo, . Até chegar na letra da minha agenda, eu já vou ter arranjado outras companhias pra dormir.
Sim, outras, no plural.
— Pode juntar todos, mas nenhum vai chegar aos pés do que eu te faço sentir.
Ofeguei diante de seu olhar penetrante. Eu não poderia negar aquilo, nem mesmo de brincadeira! Já tinha saído com vários, principalmente quando cheguei em Londres e passei a ter uma vida mais agitada, mas arrisco dizer que nunca tinha encontrado alguém como . Era irônico como eu o tinha ali, diante de mim, desde os meus oito anos, o odiando e privando-me de provar – nem que fosse um pouquinho – do que era capaz de fazer.
Chegava a desanimar saber que dali a alguns meses eu ficaria sozinha de novo. E talvez eu realmente tenha que ligar para ele, porque, além de ter preguiça de toda a burocracia que era ter que conhecer alguém novo – um cara que ao menos prestasse –, eu ainda dificilmente encontraria um encaixe tão perfeito.
O modo como seus quadris cabiam perfeitamente entre minhas pernas quando elas se abriam para recebê-lo; minha boca, que parecia feita no molde da dele; os narizes, que mal se chocavam durante o beijo; sua mão em minha cintura, seu tamanho e o modo como sempre vai fundo dentro de mim e não me causa nenhum desconforto. Até mesmo seus dedos pareciam magicamente ter o tamanho e o formato perfeito para não se embaraçarem em meus cabelos quando ele emaranhava suas mãos neles.
— O que tem de gostoso, tem de presunçoso — falei, e me deu um selinho ainda sorrindo.
— Estou mentindo? Quem seria o primeiro contato da sua agenda? O tal Alex, o cara que gozou e não te deixou satisfeita? — apertou ainda mais minha cintura, fazendo meus seios colarem em seu peito. Fiquei surpresa ao perceber que lembrava o nome dele, visto que eu mesma já tinha me esquecido. — Collin, aquele otário, ou o filho da puta do seu último ex que não via a mulher gostosa que você é… — ele passou na minha cara meu dedo podre para homens. Quase me vi sem palavras.
— Então não vou ligar pra ninguém. Porque você disse que não virá quando eu chamar — encolhi os ombros, jogando um verde.
— E desde quando eu mantenho minha palavra quando o assunto é você?
Ri fraco e aliviada. Ainda bem que eu não era a única a ter aquela percepção.
— Você é minha grande contradição, . Antes eu podia jurar que te odiava, e agora não consigo nem dormir sem você!
Arqueei as sobrancelhas.
— … — suspirou diante do meu olhar estreito. — Se você fizer alguma gracinha hoje à noite…
— Eu não vou, pode ficar tranquila com suas amigas. Nem vou ficar por aqui.
Franzi o cenho, estranhando a falta de seu calor quando se afastou.
— Também não precisa ficar recluso. Pode ficar com a gente, se quiser.
— Não, obrigado — sorriu amarelo. — Além dos seus coices, ainda tenho que ser legal com Anne, e eu não a suporto — continuou, e eu revirei os olhos diante da implicância. — Você não vê, mas ela te olha com um ar diferente. Parece até inveja, não sei…Eu não gosto disso.
— Você está parecendo aquelas vizinhas fofoqueiras, .
Ele arfou, ofendido. Talvez porque fosse pura hipocrisia minha chamá-lo daquela forma, sendo que eu sempre chegava do trabalho com uma fofoca nova dos clientes. tinha umas boas do pessoal do escritório; porém, nós pobres conseguíamos superar os ricos quando o assunto era fofoca de qualidade.
— Inveja do quê, afinal? — cruzei os braços, rindo incrédula.
— Do seu marido gostoso? — simulou um strip tease, tirando o blazer escuro.
— Vá tomar seu banho, — ordenei, rindo.
— Vem comigo?
Mordi o lábio em desejo. Era uma proposta bem tentadora. Eu mesma já tinha lhe dito o quanto queria ajudá-lo a se desfazer da gravata, tirar aquela camisa, puxar aquele cinto e depois me livrar da calça escura que ele usava. ficava tão sexy vestido como o homem de negócios que era, mas vê-lo nu ainda era minha visão favorita dele.
— Não posso. Logo as meninas chegam e eu tenho que adiantar as coisas por aqui — meus ombros caíram quando o assisti se afastar, não antes de distribuir beijos nas mãozinhas de no carrinho.
Aparentemente, realmente falou sério quando disse que não ficaria conosco. Se fechou em seu escritório e levou consigo. Anne e Fanny chegaram um tempo depois e, enquanto Fanny tomava um banho, Annelise me ajudava nos últimos preparativos para o jantar. Eu sabia que só tinha se passado um dia desde que fui demitida, mas estava com tantas saudades daquelas duas que parecia que tinham se passado meses.
— Quem é a tal Dafne? — Anne parou diante do balcão, deixando-me tensa próxima ao fogão.
— Eu não faço ideia.
E realmente não fazia ideia. Ultimamente, as poucas coisas que sabia já me faziam detestá-la, por isso sempre me poupei de descobrir mais coisas sobre ela. Não queria mais falar sobre Dafne, estava tentando esquecer da existência dela depois da noite passada. Eu me corroía de curiosidade para saber se realmente houve uma emergência ou não. disse que não a beijou, e eu decidi dar um voto de confiança para o pai da minha filha.
— Como não? Ela não dorme aqui com ele?
Mordi o lábio para descontar a raiva. Eu não gostava nem de saber que eles dormiam juntos, quem dirá imagina-lá na minha casa, na nossa cama. Olhei para Anne por cima do ombro e me fingi de desentendida.
— Tá, vocês não se falam — ela concluiu. Mexi a cabeça apenas, esperando que Anne entendesse meu sinal e mudasse de assunto. — Mas e aí, ela é bonita?
Mexi o arroz com mais força. Infelizmente, Dafne era mais bonita que nós duas juntas. vinha com aquele papinho de que me preferia, mas eu duvidava que, com uma gostosona daquelas, ele pensaria em me classificar acima dela. Tudo bem, eu era engraçada para compensar, mas mesmo assim era homem, e da pior espécie. Ele não me preferiria pelo meu senso de humor ao invés de Dafne e seus seios perfeitos.
— Cabelos pretos, olhos castanhos, corpo torneado… Ela é bem bonita, sim — comentei, e lembrar-me de seu rosto na cafeteria apenas fez meu coração disparar em ódio. — Mas sabe que ele é casado, mesmo estando na situação em que estamos, então… Digamos que tem um caráter duvidoso.
Quando vi, minha língua já estava igual a um chicote, então decidi me calar por hora. fazia muito mal para o meu feminismo.
— Óbvio. Onde já se viu ficar com o marido dos outros e, ainda por cima, na casa dele?
A força que fiz para ficar calada foi tão grande que cheguei a largar a colher de pau que segurava e desliguei o fogo para me recuperar.
Pois é, Anne. Onde já se viu.
— Do que estão fofocando? — Fanny chegou já vestindo seu pijama, fazendo-me respirar aliviada em ter alguém para me distrair daquele assunto.
Eu estava a um fio de jogar algumas coisas na cara de Anne. Principalmente depois de saber que ela me usou como desculpa para se enfiar em minha lua de mel e transar com . Não era para ela estar ali naquela noite. O que me consolava era saber que não a suportava, e, por mais que me desse medo de possíveis conflitos, ela acabou tendo o que mereceu: o desprezo dele.
— Da amante do — Anne simulou um vômito, fazendo Fanny revirar os olhos.
— Amiga, se a que é a “corna” não está se importando, por que então você está tomando as dores?
O triste foi o uso das aspas sem precisar. Porque era verdade. Mesmo que não tivéssemos nada sério, eu ainda estava levando chifres.
E talvez me importando mais do que deveria.
— Vamos mudar de assunto, sim? Daqui a pouco começamos a brigar, e não quero isso — saí pela tangente, levando as coisas para a mesa. — Gente, tem um vinho maravilhoso que ganhamos da vizinha oferecida. Vamos beber pra comemorar!
Eu não entendia nada de vinhos, mas aquele parecia ser bem caro. Tiffany pegou a garrafa de minhas mãos, tentou ler o rótulo em francês e falhou miseravelmente. Sempre que eu não conseguia ler o rótulo, sabia que era uma coisa chique, e aquele vinho estava ali justamente para provar meu ponto.
— Mas você está virando uma burguesa safada, hein, dona .
Gargalhamos juntas na mesa.
— Que calúnia! Se tem uma coisa que eu não sou é burguesa!
Mesmo morando naquele lugar, eu ainda continuava uma desempregada sem perspectiva de futuro. Seria engraçado se não fosse trágico. Minha única certeza era que eu cuidaria de ; do resto eu não sabia e tinha um pouco de medo de descobrir.
— Só safada, né, amiga? — Anne completou, não me dando chances de negar. Afinal, era verdade. E ultimamente estava me superando, diga-se de passagem.
— Hum — Fanny levantou o indicador enquanto dava uma golada no vinho. — Falando nisso, chegamos no meu assunto preferido.
— Me deixe advinhar, sexo? — arqueei a sobrancelha.
— Também — ela riu, jogando seus cachos para trás. — Junto com o meu mais novo assunto, o Doutor Gostosão.
— Ah, Tom — precisei beber um pouco. Eu estava me segurando naquela questão. Não poderia ficar alta o bastante a ponto de dar com a língua nos dentes na frente delas.
— E aí? Já rolou? — ambas me olharam em expectativa. Levei uma garfada à boca, mastigando devagar para ter tempo de pensar.
— Ainda não — respondi. Tiffany largou os talheres teatralmente inconformada; Anne apenas me julgava em silêncio. — Aliás, queria falar sobre isso com você, amiga. Me passe o contato daquela ginecologista que você passa? Preciso voltar a tomar meu anticoncepcional.
— Ah, sim, está explicado! Vai se proteger primeiro pra depois sentar a vontade no Tom!
Não aguentei e ri do jeito que ela falou, então concordei com a cabeça. Bom, não era lá uma grande mentira, só era preciso trocar Tom pelo que ficaria tudo certinho.
— Mas como estão indo as coisas com ele?
— Ótimas. Amanhã ele vai me levar pra jantar — forcei um sorriso aberto.
Aquele assunto de sexo e Tom estava me deixando inquieta. Não tinha parado para pensar naquilo. Ele com certeza iria querer fazer algo depois, e, apesar de sentir muita atração por ele ainda, apenas a menção de transar com outro me deixava nervosa.
Mas eu tinha que tentar. Não era justo que ficasse com outras pessoas enquanto eu me mantinha exclusiva dele sozinha. Aliás, aquela questão toda de exclusividade não deveria nem estar sendo colocada em questão; porém, estava tudo uma bagunça dentro do meu peito.
Eu me sentia dentro de um quarto abarrotado de coisas, tentando arrumar uma por uma e ficando confusa sobre onde guardar tudo.
— Vai rolar! — as duas comemoravam como duas adolescentes virgens. — Você merece, né, amiga? Está há o quê, um, dois meses na seca do deserto do Saara?
Quase discordei. Só ontem tinha transado duas vezes. Estava chovendo no meu deserto, eu não poderia estar mais molhada.
— Aproveite e goze por nós três — Anne exclamou, arrancando-me risadas gostosas junto de Fanny. — Já sabe que lingerie vai usar?
— Isso é muito importante… — Fanny mal abriu a boca e surgiu na cozinha como um foguete, carregando nos braços. Observamos caladas quando ele abriu a geladeira e pegou duas garrafas de cerveja com uma mão só, preparando-se para sair na mesma velocidade que entrou.
— Ué, não vai jantar com a gente, não? — indaguei. Tudo bem que era sexta-feira à noite, mas ele não costumava beber em dias da semana.
— Estou enjoado — quase não olhou na minha cara.
Eu continuava intrigada com seu comportamento, porém minha confusão se esvaiu quando seus olhos verdes me encararam friamente.
— A propósito, com amanhã já serão duas noites minhas com . Vou me lembrar disso da próxima vez que eu sair.
Engoli em seco. Ele tinha ouvido. Desde quando eu não sabia, mas a parte de Tom… aquela eu tinha certeza que sim. E se ele já levava a sério quando eu fingia desdenhar dele, imaginei o que devia estar pensando ao me ouvir comemorar o fato de que possivelmente iria transar com Tom.
— Você está desempregada, . Vai ficar com a bebê o dia todo e ele está reclamando disso? — Tiffany brandiu, indignada.
Soltei um riso fraco. Não era sobre , estava longe de ser. Nenhum de nós reclamava de ter que cuidar dela. Era sobre mim, mas teria que engolir tudo aquilo, porque ele estava sendo injusto pra caralho ao achar ruim toda aquela história de Tom e eu.
— Nada novo sob o sol — virei minha taça de uma vez, bebendo todo o vinho num gole só.
Me deitei para dormir no colchão no chão ao lado da cama de casal, deixei as meninas na cama porque quis poupá-las das minhas peripécias durante o sono, reclamava muito no início de tudo. Falando nele, não o vimos desde o episódio na cozinha. Admitia que estava com o coração um pouco dolorido, apesar de achar que ele merecia aquilo.
Revirei-me algumas vezes, não conseguia pregar o olho de jeito algum. Era para eu estar no décimo quinto sono, as duas já estavam até roncando e eu estava lá, encarando o teto escuro. Quando finalmente tirei um cochilo rápido, despertei num susto ouvindo o choro de .
Fiquei prestando atenção nos barulhos vindos do andar de cima, estava insistente, parecia com dificuldades de acalmá-la. Eu não estava fazendo nada mesmo, já tinha acordado, resolvi me levantar para ver o que era.
Fiz o mínimo de barulho possível, me levantei e fechei a porta devagarinho ao sair. Subi as escadas nas pontas dos pés e fui até o fim do corredor, encontrando-o no quarto de , balançando-a com a chupeta na boca. O som estava mais abafado. Encontrei distraído, de costas para a porta, conversando com ela baixinho.
— O que houve? — cochichei, temendo assustá-lo.
— Nada, ela só estava com a fralda suja — murmurou com a voz amena.
Me aproximei, acariciei seus cabelos lisos e beijei sua testa. Seus olhinhos estavam se fechando devagar, então continuei ali para observá-la cair no sono aos poucos. Quando levantei meus olhos, peguei observando-me sério. Sem graça, voltei a olhar , que já estava dormindo tranquila.
Fiz menção de sair; porém , antes de colocá-la no berço, me pediu para esperar. Saí e o esperei na porta, que foi fechada por ele devagar para não correr o risco de acordar a bebê.
— Ainda não preguei os olhos — murmurei ao seu lado no corredor. Iria acompanhá-lo até seu quarto e descer de volta para o meu colchão.
— Está sentindo a minha falta na cama, é? — senti sua mão grande me pegar e encostar-me na parede. Sorri contra seu rosto.
— Você é muito engraçado — ri baixinho. Espalmei as mãos em seu peito, tentando afastá-lo sem sucesso.
— Eu estou — beijou minha boca, e eu o encarei séria em meio ao breu. Sua sinceridade me deixava desconcertada às vezes. — Tô desde a hora que deitei encarando o teto do quarto, sentindo falta de ter o peso do seu corpo sobre o meu.
— Estou com saudades do meu travesseiro — desci minhas mãos de seus ombros para o peito, rindo ao lembrar que tinha babado nele mais cedo. — E talvez um pouquinho do dono dele.
— Só um pouquinho? — arqueou as sobrancelhas, duvidando. Colou nossas testas e me deixou sem ar pela milésima vez.
— Muito — sussurrei contra sua boca, negando com a cabeça.
— Oh, … — o modo como sua voz rouca pronunciou meu nome me acendeu como um copo se gasolina fosse jogado numa pequena chama. — Minha cabeça está me perturbando com as palavras que ouvi você dizer lá embaixo. Por favor, me diga que é apenas o script que criou para nosso teatro. Me diga que é mentira, que você não planeja ser de Tom e de nenhum outro homem além de minha…
Ofeguei contra sua boca, que já vinha em direção à minha, chocando-se com furor, amassando meus lábios e tendo minha língua sendo atacada pela dele. Puxei seus cabelos com a força que o queria para mim, e a mesma que eu queria ser somente dele.
Mas, infelizmente, a realidade não era aquela.
— Era mentira, eu não falei sério — confirmei. E, infelizmente, eu também não me importava com a realidade quando o tinha tão perto. — Eu falava sobre nós. Depois do acidente em Tulum, eu só quero… continuar fazendo o que fazemos sem nos preocuparmos tanto com um novo bebê a caminho.
riu baixinho contra minha bochecha, visivelmente aliviado. Seus ombros perderam a tensão que eu nem tinha percebido instalada neles.
— Eu sei um jeito bem eficaz de prevenir futuros bebês — ele sorriu sacana, voltando a me beijar. Daquela vez, suas mãos invadiram minha camisola e passaram por minhas coxas até acariciarem minha intimidade. Gemi sem me controlar. — Vamos ali dentro que eu te mostro — sussurrou ao pé do meu ouvido.
alcançou a fechadura, abriu o quarto e me puxou pelo quadril. Gargalhei tentando fazer silêncio. Aquilo não iria prestar. Tentei frear meus passos que se embolavam nos dele, mas estava sem forças, envolta pelo desejo e pela diversão que tudo aquilo estava me proporcionando.
De novo o perigo de sermos pegos no flagra me excitou.
— — o censurei, sem conseguir segurar o sorriso. Ele me ignorou e fechou a porta devagar para não fazer barulho.
O problema não seria a porta ou a cama balançando, seriam os gemidos. Apesar da ideia de fazer escondido me deixar louca, eu estava com medo real de alguém escutar. Naquele avião, sermos pegos não afetaria tanto nossas vidas; agora, em casa, significaria perder uma amiga. Mais uma. Eu sabia que Anne nunca iria me perdoar por mentir daquele jeito para ela.
— Só um pouquinho, amor — agarrou minha nuca enquanto eu ainda tentava resistir e unir forças para me desvencilhar dele. Quando consegui e me virei para a porta, fui agarrada por trás. — Estou com saudades…
Não era a primeira vez que ele falava em saudades, mesmo me tendo todos os dias ao seu lado, na sua cama. parecia nunca estar saciado. Era como um vício, que se inicia com poucas quantidades e, de repente, só aquilo já não basta. E eu me sentia da mesma forma em relação a ele.
chupou meu pescoço enquanto me encoxava com força, agarrando meu quadril e esfregando seu membro já ereto em minha bunda.
— Porra — praguejei já ofegando. Fechei os olhos com força, desistindo de tentar fugir e ir até a porta.
— Nós vamos fazer devagarinho, em silêncio — ele tornou a levantar a barra da camisola. Daquela vez, seus dedos se enroscaram nas alças da minha calcinha molhada. — E se nos ouvirem… vão entender o motivo de não conseguirmos aguentar até ficarmos a sós pra fazer o que estamos fazendo.
Mordi o lábio, sentindo meu coração disparado à medida em que minha calcinha deslizava por minhas pernas, indo ao chão em questão de segundos.
— E-Eu não consigo — gemi, sentindo seus dedos brincarem com meu clítoris. De olhos fechados, eu estava completamente entregue em suas mãos, debruçando meu corpo contra seu peito.
— Eu te ajudo — não entendia que o motivo de eu não conseguir fazer silêncio era justamente ele e o modo como ele me fazia sentir? — Venha — me guiou até a cama, onde eu cheguei completamente às cegas, com o corpo mole e de pernas bambas. tinha um efeito quase anestésico sobre mim. Ajoelhei-me sobre o colchão macio que eu conhecia muito bem. — Achei algo na gaveta que esvaziou hoje.
Murmurei algo, acho que perguntando o que era. Não que eu me importasse muito àquela altura do campeonato. Eu só queria que tirasse logo as roupas.
— Acho que pode me ajudar a prevenir uma fuga sua — sua boca em meu ouvido, mordiscando, suspirando… Eu estava louca por ele.
Tão louca que nem me toquei sobre o que ele falava.
Senti o metal gélido em meu pulso e levei um susto; abri os olhos e a atmosfera me deixou quase sob efeito de hipnose. Comecei a rir ao ver a algema que tinha ganhado de alguma das vizinhas fechada ali. puxou-me até a cabeceira da cama e fechou o outro lado lá, cessando meu riso.
— — o censurei novamente. — Você sabe onde está a chave disso? — havia um resquício de riso em minha voz, mas naquele momento era um pouco de desespero. não me respondeu, apenas saiu da cama e foi até a cômoda. — !
Eu tinha quase certeza que ele estava se aproveitando que eu não podia gritar e continuou ali, retornando com algo em mãos. Estava escuro, não soube identificar.
— O que você… — virei-me para tentar ver o que era.
— Xiu… — ele se posicionou atrás de mim, beijando minha bochecha. — Não reclame, sei que vai adorar isso. Apenas relaxe.
Senti seus dedos sujos do gel que trouxe consigo me massagearem após ter minha camisola erguida. Mordi o lábio ao tê-lo distribuindo beijos molhados por minhas costas e ombros. Segurei os gemidos de pura excitação, ainda sendo majestosamente estimulada.
Ansiosa, observei vestir o preservativo e se aproximar também ajoelhado no colchão. Sua mão grande e macia me agarrou uma das nádegas, apertando com vontade antes de afastá-la para o lado a fim de encaixar a cabecinha inchada na minha entrada.
Tentei relaxar ao senti-lo entrar devagar, bombeando de leve e me fazendo sentir uma pequena ardência que eu particularmente adorava. Gemi baixinho, agarrando o lençol branco na minha frente para descontar meu tesão. Arfei quando avançou ainda mais para dentro, envolvendo o osso do meu quadril com destreza, moldando meu corpo do jeito que queria para facilitar que ele metesse tudo de uma vez. Quando viu que não conseguiria, passou a estocar com rapidez com o que conseguiu, avançando mais com o passar das investidas.
Empinei a bunda ao olhar para trás e pegá-lo vidrado nela, imerso num prazer que parecia tomar todo seu ser e deixá-lo fora de órbita. Eu adorava observá-lo quando ele estava em êxtase. Me sentia incrível em saber que era eu quem estava lhe proporcionando tudo aquilo.
metia forte, mordia o lábio inferior para segurar seus gemidos, que aumentaram significativamente quando passei a avançar com o quadril de encontro ao dele, conseguindo fazer com que ele entrasse inteiramente dentro de mim. Sorri safada para ele, aguentando suas investidas cada vez mais intensas e rápidas, olhando para seu rosto sério como nunca.
— O que houve? — tentei sussurrar em meio aos barulhos de nossas respirações ofegantes. apenas negou com a cabeça sem dizer nada. — Amor?
— Promete pra mim que não vai deixar Tom te tocar desse jeito.
Não lhe respondi, fiquei sem fala.
O que eu realmente queria era prometer aquilo, mas ceder a ele seria me privar de coisas que ele não se privava.
Toquei sua mão que guiava meu quadril, porém fui afastada. Tentei novamente, recebendo o mesmo tratamento. Gemi arrastado quando tive seus dedos largos sendo emaranhados em meus cabelos e fui puxada em direção ao seu tronco quente, que abrigava seu coração frenético.
— Não me toque — disse ao pé do meu ouvido, fazendo-me franzir o cenho. — Está proibida de me tocar, só eu posso — ri, deixando-o irritado. — Continue rindo, é você quem está presa na cama.
— Você não faria isso… — solucei, sentindo-o dedilhar minha intimidade e potencializando meu prazer. — N-Não me deixaria aqui presa — ri, levando investidas mais fortes e profundas.
— Não posso te prender a mim, você é livre.
Revirei os olhos, sentindo o ápice vir. Eu já não sabia mais se era tão livre como antes. Já estava presa antes mesmo daquela algema ser presa em volta do meu pulso. Presa naqueles olhos verdes e em seus braços todas as noites.
Presa a ponto de ouvir que era livre e discordar, porque, mesmo com um cara incrível querendo me levar para sair, eu ainda queria ficar por ali.
— Eu queria ser — agarrei o lençol com a minha mão livre. Não poderia tocar nele e, por mais boba que fosse aquela regra, decidi acatar.
Aquela era eu, uma idiota que seguia regras que me faziam mal. Me privava do que eu queria para agradar terceiros e me forçava a fazer o que não queria para provar pontos estúpidos. Mesmo que não tivesse o direito de ficar bravo por eu sair com Tom, eu sabia que não poderia falar nada, porque me sentia do mesmo jeito em relação a Dafne.
— Então seja — ele beijou meu ombro, tirando uma das alças da minha camisola. Quase por um reflexo, levei minha mão até seu cabelo. — Geme pra suas amigas saberem o quanto nos odiamos, pra Anne saber o quanto você está adorando dar pro seu marido na sua cama.
Sorri, quase sem conseguir segurar meus gemidos.
— Grite bem alto pro condomínio inteiro ouvir. Pro seu doutorzinho saber que só eu te faço sentir assim, que eu sou o único que você quer ter na sua cama todas as noites.
Seria incrível poder fazer aquilo. Eu deixaria Grace onde quer que estivesse muito orgulhosa de mim por todas as vezes em que me incentivou a fazer o mesmo. Ser livre.
Mas ainda tinha minhas travas que nem mesmo eu entendia.
Vendo que eu, como a covarde que era, não faria nada daquilo. Me tapou a boca quando atingi meu orgasmo, me ajudando a abafar meus gemidos e sons incompreensíveis. Quando tudo se acalmou, deixei meu tronco cansado cair para frente; meu braço preso à cama ficou pendurado.
se esticou e destrancou a algema, pegando-me pela cintura e apoiando minhas costas em seu peito. Ainda ofegante, massageei meu punho enquanto digeria a loucura que tinha acabado de acontecer ali. Não só a ideia mirabolante de e o modo como ele me privou de tocá-lo, mas também os meus pensamentos duramente aquele frenesi.
Eu queria ser livre. Mas não poderia ser egoísta e magoar as pessoas que amava. Mesmo que aquilo significasse chatear ou frustrar . Apesar da nossa aproximação nos últimos meses, Anne era uma de minhas melhores amigas e eu tinha que tentar aproveitar minha noite com Tom.
me abraçou como se pudesse saber o que eu estava pensando, me deixando pior ainda por não tê-lo respondido naquele momento. Eu não estava o trocando por Tom, estava me dando uma chance de fazer algo novo.
— Posso te tocar agora? — virei meu rosto em sua direção.
— Desculpe — ele riu baixinho, acariciando meu punho. Observei quando beijou o local, fazendo-me tocar seu rosto e fazer um carinho ali.
— Não se desculpe. Isso foi muito sexy, se quer saber — pontuei, confidenciando algo que eu já tinha percebido há um tempo.
Eu adorava quando se deixava ser dominado, mas amava ainda mais quando ele me dominava. Não sabia identificar se era algum tipo de fetiche meu, mas fato era que eu tinha achado incrível a experiência de ser presa, até mesmo seu tom autoritário quando se dirigiu a mim.
Fora o fato de ele ter citado Tom e demonstrado mais uma vez sua infelicidade diante da ideia de imaginar nós dois juntos. Eu estava sendo vingada, e apesar de realmente ser um prato servido frio, ainda assim conseguia saciar minha fome.
Me alinhei ainda mais a ele, sendo beijada no pescoço enquanto tinha minha barriga sendo acariciada. Eu simplesmente amava o cheiro que emanava dele. Amava o modo como me sentia em casa ali, em nosso quarto aconchegante. Por um momento, quis deitar ao seu lado e dormir.
— Tenho que ir — abri meus olhos, ouvindo-o suspirar derrotado atrás de mim.
Saí de seus braços um pouco dolorida, cambaleei pelo quarto em busca da minha calcinha e a vesti rapidamente sendo observada por ele. sorriu triste para mim, sentado na cama. Meu coração se apertou um pouco dentro do peito. Por que ele tinha que fazer justo a carinha de cachorro caído do caminhão de mudança?
— Boa noite — sussurrei, sendo respondida no mesmo tom.
Desci as escadas nas pontas dos pés e parei no banheiro do corredor de baixo para me ajeitar e colocar tudo em seu devido lugar. Ri sozinha para o espelho, sabendo que aquilo tinha sido loucura. Imagine se alguma das duas estranhasse minha ausência e fosse atrás?
Deitei-me em meu colchão logo quando fechei a porta sem fazer barulho. Anne e Fanny roncavam juntas, deixando-me tranquila, pois era improvável que alguma delas tenha acordado estando num sono tão pesado.
's point of view.
Despertei com uma dor de cabeça que normalmente não sentiria nem se bebesse todas as bebidas existentes naquela casa. Acho que o fato de ter me tornado pai me fez envelhecer alguns anos, pelo menos mentalmente. A causa da minha dor de cabeça também poderia estar associada ao nervoso que passei noite passada.
Ouvir a conversa de não tinha sido algo feito propositalmente. Eu estava apenas passando no corredor vindo do escritório, onde me tranquei para fugir da presença desagradável de Anne e seus olhares e opiniões obsessivas sobre mim. achava um exagero, e poderia até estar certa sobre isso, mas eu não conseguia evitar desgostar de Anne.
Além de ser irritante, ela ainda namorou Miguel! Como ela poderia ter aquela queda enorme por mim e ficar com aquele filho da puta? O gosto dela para homens oscilava entre muito bom – eu, no caso – e péssimo.
Abri os olhos e encarei o teto preguiçosamente; estiquei-me na cama bagunçada pelo que fizemos ontem e ainda tive aquela sensação de estranhamento. Sabia que tinha reclamado muitas vezes sobre o fato de ser espaçosa na cama, dos chutes e braçadas que levava do nada durante a noite. Mas minhas suspeitas estavam certas – eu realmente já não conseguia dormir direito sem ela ao meu lado.
O que era, no mínimo, preocupante.
Até fizemos piada sobre aquilo, mas éramos daquele jeito mesmo. Ríamos do que não queríamos admitir para ver se soava tão ridículo em voz alta quanto na nossa cabeça.
Soltei um riso quando vi a algema pendurada na cabeceira. Estiquei meu braço e a empurrei, observando o objeto de metal balançando. Caralho, aquela foi uma das coisas mais impulsivas que já fiz em tempos. Ser pai também me deixou meio careta. Sempre fui irresponsável quando mais novo – mentira, um tempinho atrás, até Grace estar praticamente parindo, eu ainda era. Havia feito coisas muito mais perigosas do que apenas foder alguém algemado na cama, mas, no contexto que estávamos inseridos noite passada, tinha sim sido algo arriscado.
Principalmente para . Acho que ela preferiria ser pega no flagra no banheiro do avião do que sermos pegos por Anne ali, no nosso quarto.
E eu não reclamaria caso aquilo acontecesse. Teria me poupado de ter que ouvir planejar dar para Tom e as piadinhas e risadinhas maliciosas. e eu não tínhamos por que ficar nos escondendo daquele jeito para elas, como se estivéssemos cometendo um crime.
Se fosse crime transar demais, então pegaríamos prisão perpétua com muito prazer.
Ouvi uma movimentação lá embaixo e decidi me levantar. Estava morto de fome, e achei que não conseguiria segurar até que Anne fosse embora. Era a minha casa também, era ridículo ter que ficar me escondendo dela.
Tomei um banho, escovei os dentes e respirei fundo, tentando manter minha paciência nos eixos. Desci as escadas e encontrei apenas na cozinha. me viu com seus olhões verdes e soltou um murmúrio acompanhado de um sorrisão apenas de gengivas. Sorri instantemente, me aproximando rápido para beijar sua bochecha babada.
riu fraco ao sentir a bebê se encolher em seus braços quando distribuí beijinhos no rostinho miúdo da neném. Minhas mãos foram involuntariamente para os quadris da mãe dela. Percebi seu corpo enrijecer, porém continuei ali e virei o pescoço para poder beijá-la.
virou o rosto, fazendo-me franzir a testa em confusão.
— O que foi? — sussurrei ao pé de seu ouvido, num tom provocativo. Seus pelos do braço se eriçaram, eu sabia que ela não resistia. Beijei sua têmpora, migrando pela lateral de seu rosto até o canto de sua boca. Intensifiquei o aperto em seu quadril e relembrei o modo como peguei nele noite passada. Depois de ontem, o que eu mais queria era beijá-la. — Hein? — tentei mais uma vez beijar sua boca.
— ! — exclamou, se esquivando novamente.
Arfei em indignação. As meninas nem estavam ali, provavelmente estavam se arrumando para o trabalho. Não tinha a necessidade de temer que nos vissem, estávamos a sós com . Como deveria ser sempre.
— As meninas ainda estão aqui, o que eu te falei ontem? — questionou, e abri minha boca para retrucá-la. Porém, foi mais rápida: — Você pode cumprir o que combinamos ao menos uma vez?
A porta do quarto de hóspedes se abriu e ouvimos vozes pela sala. Eu continuei ali, parado, me perguntando o motivo de tanta afobação. Não, não era fingimento pelas meninas estarem vindo até nós; elas nem ao menos tinham saído do quarto.
Eu sabia o quanto era medrosa e o quanto ela prezava por fazer as coisas sempre certas. Ontem mesmo disse que não era livre, que não conseguia. Eu entendia, apesar de não concordar em vê-la se anular por alguém tão invejosa quanto Anne.
Mas aquele medo todo às vezes me parecia ser outra coisa. Eu tinha minhas desconfianças desde o início de que, caso a situação fosse diferente, ainda assim não assumiria que estávamos ficando para as amigas. sempre jogou na minha cara o quanto eu era um galinha sem coração, ria da quantidade de namoradas que já tive, as chamavam de inocentes por “caírem na minha lábia”. Sempre se achou inteligente demais para cair em meus encantos. Como se eu nunca fosse digno de ter uma mulher como ela.
— Eu nunca vou me acostumar em ver vocês assim, tão perto um do outro sem nenhuma faca ou um prato pra jogar e se machucarem — Tiffany deu a volta no balcão, fazendo-me afastar meu corpo do de imediatamente. Fingi que estava perto para pegar , e assim fiz, tomando a bebê babona em meus braços.
— E aquele casamento, então? — Anne riu forçadamente. Tudo nela era forçado para mim. — Foi um surto coletivo, isso sim.
Colei meus lábios na bochecha grande da minha filha, beijando-a até que chegasse na mesa, onde o café da manhã já estava servido.
— E você nem ficou aqui com a gente ontem, né, seu chato? — Fanny sentou na cadeira ao meu lado, servindo-se com o café.
— Estava ocupado resolvendo coisas do trabalho — murmurei, dando um gole na xícara que tinha em mãos. Não era mentira, eu realmente revisei uns documentos antes de começar a ver um filme no escritório.
— Pra mim foi ótimo. Quanto menos , melhor — sorriu faceira, se aproximando com a mamadeira de em mãos.
Ergui meus olhos para encará-la, pegando da mão dela antes de lhe dar um olhar raivoso. Fingi ignorar sua implicância ao prestar atenção na mamadeira que destampei.
— Parem vocês dois, tem visita em casa — Fanny riu baixinho de onde estava, já Anne se remexeu na cadeira onde estava.
— Falando nisso, como foi a estadia de vocês aqui? Dormiram bem? Geralmente os vizinhos fazem muito barulho durante a madrugada.
engoliu o pedaço de pão que tinha na boca a seco, já sentada entre mim e Anne, sua protegida. Quando não se sentia no controle da situação, apenas me olhava daquele jeito repreensivo que prometia uma discussão quando estivéssemos a sós.
— Sério? Pois eu achei uma delícia, nunca dormi em um lugar tão silencioso e tranquilo.
— Sim! Fora que esse condomínio é lindíssimo. Um dia vamos morar aqui, amiga — Anne riu junto de Fanny e .
— Nem que trabalhássemos a vida inteira conseguiríamos uma casa aqui — a morena rebateu, dando uma pequena olhada no relógio de pulso. — Falando em trabalhar, vamos logo com isso. Não podemos chegar atrasadas, o Sr. Williams corta nosso pescoço fora.
— Que droga, nem vai dar tempo da gente ajudar a escolher que roupa vestir hoje à noite — a loira lamentou.
— não precisa de ajuda, ela sabe que só precisa de um vestido justo e colocar as pernas de fora.
Tentei cantarolar algo em minha cabeça, tudo para me abster de ter que ouvir aquelas coisas. Como elas ousavam ir na minha casa e aconselhar minha esposa a me chifrar?
— Se bem que estamos falando de Tom. Se você vestisse um saco de papel na cabeça, ele não ligaria.
Ele não ligava nem para o fato de que poderia estragar tudo com a adoção de caso alguém os pegasse juntos por aí. Por qual motivo Tom se importaria com a roupa que iria ou não usar?
— Isso mesmo, algo fácil de tirar — Anne sorriu maliciosa, fazendo-me odiá-la mais do que poderia ser considerado possível.
me espiou pelo canto do olho, apreensiva, com um sorrisinho amarelo. Eu sabia que ela estava fingindo, ou pelo menos foi o que me disse noite passada. Mas depois de pensar na possibilidade de estar com vergonha de dizer para as amigas que era comigo que ela estava, já não sabia mais distinguir o que era medo de magoar Anne e o que era negação por estar ficando comigo.
— Parem de falar sobre isso, eu estou comendo — murmurei com meu rosto se contorcendo em nojo. Era genuíno até demais. Eu simplesmente não conseguia imaginá-la com Tom ou sequer ter que presenciar momentos como aquele beijo no Natal e ter que ficar na minha. Eu não a queria com ele, Dormian não a merecia. Vê-los juntos me causaria dor física, eu tinha certeza daquilo.
— Nós já estamos de saída, estressadinho — minha esposa me olhou, censurando-me pela milésima vez desde que as meninas chegaram. Os olhos azuis de falaram mais que sua boca; eu os entendia numa facilidade assustadora.
Torcia para que algum dia deixasse de se comunicar apenas com eles ou esboçar sorrisos sem graça – eu queria vê-la falar em voz alta o que realmente sentia e queria. Era inevitável, porém, eu não conseguia deixar de pensar que estaríamos melhores se estivéssemos sozinhos. Não colocaria proibições na casa que nem minha era, e eu gostava muito de Fanny para pensar na possibilidade de não querer tê-la por perto. Mas e eu sabíamos que o problema estava em Anne, e eu tinha certeza que Fanny não ligaria se soubesse de nós.
— Vamos logo, já pedi nosso Uber — Anne deu a última golada na sua xícara e se levantou, indo até para dar um beijo e um abraço nela.
Praticamente fechei os olhos num reflexo quando a assisti vir até mim. Por sorte, ela só deu um beijo no topo da cabeça de , que se mexeu incomodada enquanto ainda mamava tranquilamente. O perfume doce e irritante ficou no ar, fazendo-me coçar o nariz em agonia.
As duas saíram porta afora acompanhadas por , que demorou um pouco lá com elas, provavelmente esperando o carro chegar para buscá-las. Eu não entendia que tanto assunto elas tinham, porque não fazia tanto tempo que saiu do emprego. Não era possível que tivessem tantas novidades para contar a ela.
Balancei minha cabeça, sentindo-me estupido. A única razão para aquela minha implicância com as meninas e seus papinhos com era porque eu já sabia que estava tendo o apoio das amigas. E todas as vezes que fui fazer merda na vida, tive o mesmo apoio dos meus amigos.
— Agora sim, bom dia — arqueei as sobrancelhas quando a senti envolver meu pescoço com os braços; sua boca beijou meu pescoço e rumou para minha bochecha. Fechei os olhos, controlando as sensações boas que aquele gesto me trouxe. — O que foi aquilo ontem, hein? — encostou-se na mesa diante de mim, sorrindo safada.
Eu sabia que era ridículo pensar aquilo, mas eu estava me sentindo um tremendo idiota por estar sendo feito de brinquedo por . Ela desdenhou de mim desde que as amigas pisaram os pés naquela casa, e agora estava indo me buscar no canto onde me jogou.
— Nada. Eu estava com tesão, você apareceu e aconteceu — resolvi entrar no jogo dela.
— Por que está sendo tão grosseiro?
Levantei-me, indo levar a mamadeira para a pia. Tentei ignorá-la e lhe dei as costas. Não era fácil para mim sentir tudo aquilo e não poder externar. Ao contrário de , eu tinha que me segurar para não falar o que sentia sempre.
— ? Estou falando com você.
— Você não reclamou da minha grosseria quando estava te fodendo ontem à noite.
Não precisei me virar para saber sua expressão; ofegou, ofendida de onde estava. Ué, ela poderia me tratar daquela forma como se eu servisse apenas para sexo e eu não poderia fazer o mesmo?
— Seu idiota!
— Sim, , eu sou um idiota, o maior de todos os idiotas — controlei meu tom de voz, segurando as costas de com minha mão desocupada. Não queria assustá-la. — Tem que ser muito burro mesmo pra cair nas suas mentiras. Ontem você me disse que tinha inventado tudo aquilo pras meninas, mas hoje elas começaram de novo a te empurrar pra Dormian e você mais uma vez concordou.
— Eu não estou mentindo! Só não posso contar a verdade a elas, nós já falamos sobre isso, !
— Sim, já falamos milhares de vezes sobre isso e sobre como está cômodo pra você manter essa história de ainda me odiar só pra não assumir que me quer. É muito mais fácil fazê-las pensar que está com Tom.
— Não é verdade, e você sabe bem disso — a loira se aproximou com suas feições duras. — Elas são minhas únicas amigas, . Você achando Anne invejosa ou não, não vou abrir mão delas pra te agradar.
Sempre Anne no topo de tudo. não via que Annelise não faria falta na vida dela? conheceu Su, Carolina, Vitória, nossas vizinhas, e até mesmo Amélia era amiga dela. não entendia que o fato de Annelise fazê-la esconder algo que a fazia bem não era nada saudável?
— Eu já entendi, não tenho espaço na sua lista de prioridades — engoli em seco. Eu ser o pai da filha dela aparentemente não contava.
comprimiu os lábios sem resposta. O que pra mim já era uma.
— Tudo bem, já estava mesmo na hora da gente parar de tentar fazer isso dar certo. Você estava certa quando me disse que eu já poderia voltar pro meu quarto — passei por ela levando a bebê comigo lá para cima, onde fiquei até que caísse no sono.
Me sentia um bosta porque saí falando sem controle e sem pensar antes. Era realmente o que eu queria? Afastá-la ainda mais e praticamente entregá-la de bandeja nos braços de Tom?
Me deitei ao lado da neném e tirei um longo cochilo após ter passado a noite praticamente inteira me revirando na cama. O cheirinho dela me acalmou por um tempo, não foi difícil acompanhá-la na soneca.
Despertei um tempo depois, sozinho no quarto, não gostando daquela sensação ruim que me deu. Tinha acordado daquela mesma forma mais cedo, e não pude deixar de pensar que aquilo seria frequente quando saísse o divórcio. Não teria comigo todos os dias como estava me acostumando, muito menos .
Decidi distrair minha cabeça para ver se conseguia pensar em outra coisa a não ser aquela droga de encontro de com Tom. Eu já tinha dito tudo o que eu tinha pra falar – ao menos tudo o que minha consciência me permitia, porque tinha mais, muito mais coisas que eu queria dizer. Só não sabia como traduzir em palavras aquele incômodo no peito.
Vesti minhas roupas de corrida e deixei a casa silenciosa. Soube que estava ali quando a avistei na cozinha com a bebê já acordada. Saí sem falar nada, nem ao menos sabia o que dizer a ela depois daquela palhaçada que protagonizamos ali.
Depois de algumas voltas no quarteirão, percebi que não devia ter falado nada. Eu não deveria querer me intrometer nas relações de , por mais erradas que elas pudessem parecer. Eu tinha Chace, e ele também não conseguia esconder o quão a fim de ele era. A única diferença era que meu melhor amigo não sabia da nossa farsa.
Anne saber sobre nossa mentira só lhe dava mais liberdade ainda para desdenhar de nós dois juntos. Por isso nenhuma das duas conseguia ver que não era humanamente possível um homem como eu e uma mulher como viverem juntos sob o mesmo teto sem pensar em transar ao menos uma vez.
Tom também usava o fato do nosso casamento ser de mentira para ficar no pé de . Ele não a chamaria para jantar caso ainda pensasse que éramos casados de verdade. Me odiei profundamente pelo dia em que nos descuidamos e Tom ouviu nossa conversa, mesmo sabendo que nenhum de nós tinha culpa. Eu queria poder voltar no tempo para impedir aquilo.
Corri pra fora do condomínio. Estava ficando estressado de novo e teria que correr por dias para conseguir descontar minha raiva ali, e não brigando com . Até porque eu estava sendo egoísta, eu sabia. Mas, mesmo sabendo que eu não tinha moral de falar nada por sair com Dafne, as coisas ainda eram diferentes. Tom sabia de tudo e poderia estragar tudo se quisesse. E o que ele mais queria era .
Corri por bastante tempo, até anoitecer e minhas pernas ficarem doloridas. Na volta, tive a infelicidade de cruzar com um cara ateando fogo num monte de entulho. Tossi algumas vezes ao inalar sem querer aquela fumaça toda. Voltei para casa sentindo meu peito doer um pouco, então fui direto para o banho para tentar relaxar meu corpo tenso e repleto de suor.
Lavei os cabelos, esfregando-os como se aquele monte de pensamentos fossem sair com a espuma e descer com a água ralo abaixo. Queria conseguir desligar minha mente, porque saber que iria sair com outro homem estava me consumindo por dentro.
Saí do chuveiro ainda tossindo um pouco. Não entendia por que ainda estava com a respiração irregular daquele jeito, visto que estava em repouso. Vesti uma cueca qualquer e uma calça de moletom. Do closet, ouvi uma movimentação no quarto e saí, avistando-a diante da cômoda no espelho.
me olhou por baixo daqueles cílios falsos. Suas mãos, que seguravam o frasco de perfume, hesitaram por um instante. As bochechas estavam levemente coradas e iluminadas pela maquiagem; os lábios que eu tanto saboreei estavam pintados e bem delineados. Ela estava séria como nunca. Piscou algumas vezes, finalmente borrifando o perfume no cangote e nos pulsos.
Fechei os olhos, sentindo o aroma passear pelo ar até minhas narinas. Imaginei e senti meu coração se apertar; Tom com certeza deslizaria o nariz por seu pescoço e a arrepiaria como sempre ficava ao ser tocada daquela forma.
— Só vim pegar algumas coisas que esqueci de levar pra lá… — ela se apressou em se justificar. Como se estivesse fazendo algo errado ao entrar no nosso quarto.
A culpa era toda minha. Sentia vontade de me socar por ter dito aquilo mais cedo.
— Sabe, você não precisa mudar de quarto se não quiser… — me aproximei, receoso, ainda com a toalha úmida que usei para secar meus cabelos. , que procurava algo na primeira gaveta, parou o que estava fazendo para me olhar.
— V-Vai ser trabalhoso demais pegar tudo daqui e levar pra lá… — mexeu a cabeça, concordando, embora aquela desculpa fosse péssima. Afinal, agora teria todo o tempo do mundo para fazer aquilo se quisesse.
E eu esperava com todas as minhas forças que não quisesse.
— Eu não quero mais dormir longe de você. Uma noite já foi o suficiente.
— Se é isso o que você quer… — sorriu, fazendo-me sorrir de volta instantaneamente. Eu estava nervoso, tanto que prendi a respiração sem perceber. — Eu fico.
“Você deveria ficar comigo hoje”, pensei em silêncio.
— Fico feliz que queira ficar — murmurei atrás do seu corpo. A loira à minha frente achou o que procurava entre as roupas: uma caixinha que continha uma corrente delicada de prata.
— Fico feliz que esteja feliz — disse risonha, arrancando-me um riso sem graça. Observei quando tentou colocar o colar em si mesma, tendo alguma dificuldade.
— Quer ajuda? — perguntei. arqueou a sobrancelha, provavelmente surpresa por eu estar ajudando a se arrumar para sair com Tom. Eu estava tentando ser educado. Não queria e nem iria mais brigar com ela naquela noite, não depois de fazer as pazes e reverter a merda que tinha feito mais cedo.
assentiu, deixando-me pegar as pontas da corrente e tentar encaixar as peças para fechá-la. Quando o fiz, deslizei meus dedos de leve sobre sua pele macia, ajeitando o pingente pequeno em seu colo. Seus olhos azuis me assistiram do espelho. Foi difícil não ser atraído pelo seu olhar, que era como um ímã que me puxava. Eu não via escapatória, mas se houvesse alguma, recusaria qualquer uma, me permitindo ficar perdido no oceano de suas íris.
— Está linda — sibilei, sabendo que leria meus lábios e entenderia o que disse sem sequer emitir um som.
— Obrigada — virou-se, mantendo seu sorriso aberto.
— É sério, você é a mulher mais linda que conheço.
gargalhou, desdenhando. Puxei-a para perto pela cintura, sentindo seu nariz encostar-se ao meu num beijo de esquimó inocente.
— Pare com isso — ela envolveu meus bíceps com suas mãos firmes. Avancei contra seus lábios, dando-lhe um selinho. Mas meu coração bateu forte, ansiando por mais quando senti seu perfume de mais perto.
Peguei-a em meus braços, sentindo sua pele macia descoberta pelo vestido. Pedi passagem com a língua e fui correspondido, enroscando a minha na dela com furor. Pensei desesperadamente que poderia fazê-la ficar se conseguisse beijá-la a ponto de estarmos sem roupas na nossa cama. Como se pudesse prendê-la a mim novamente, como se não conseguisse sair do meu abraço e correr para Tom.
Suspirei derrotado ao notar suas mãos frias e trêmulas empurrando-me para longe, espalmadas em meu peito descoberto.
— Assim você vai arruinar minha maquiagem — ela me deu as costas, resmungando sem conseguir conter o sorrisinho crescente nos lábios.
Encarei-a pelo reflexo do espelho, pensando no quanto eu queria que as coisas fossem diferentes naquela noite. tinha razão quando me disse que não deveria me pedir para levá-la para jantar. E eu só estava me dando conta da minha burrice quando a vi pronta para sair com outro homem.
Seu celular, que estava sobre a cômoda, começou a vibrar insistentemente, atraindo nossos olhos, que antes estavam ocupados conectados entre si diante do espelho. O sorriso em seus lábios desapareceu, dando lugar a uma expressão de pura preocupação.
“Tom”.
pegou o aparelho e, antes de atendê-lo, deixou o quarto em passos largos, sem ao menos olhar para trás. Fiquei ali, parado, me sentindo impotente.
É, , você está arruinando a minha vida.
— Oi, já estou pronta — ouvi sua voz soar do corredor e fui atrás. Não sabia o motivo, já que estava voltando a sentir aquele aperto e dor no peito só de ouvi-la falar com ele. — Não exagera — riu baixinho. — Um minuto.
Ela afastou o celular ao se aproximar da cama; se remexeu em cima do colchão, reconhecendo a voz da mãe. Seus olhinhos verdes cintilavam ao contemplá-la se inclinar sobre si.
— A mamãe te ama, sim? — beijou o topo de sua cabeça. — Se comporte — beijou sua barriguinha, levantando-se e voltando ao celular. — Onde nos encontramos? — me flagrou parado diante dela, prestando atenção na conversa. — Sei, a dois quarteirões do condomínio. Tudo bem.
— O quê? Ele está louco em te fazer ir andando uma hora dessas, de salto num lugar perigoso desses? — protestei. Eu estava tentando, juro que estava. Bom, pelo menos durou mais que cinco minutos, que era minha aposta inicial.
— , eu não posso sair daqui com ele. Pode ser perigoso, e se alguém nos vê?
Sabe o que não seria perigoso? Você não sair com ele, olhe só!
— Perigoso é você ser assaltada ou sabe-se lá Deus mais o quê! Não se esqueça que Miguel está à solta. Tom não devia te colocar em risco dessa forma!
Ouvi Dormian falar merdas pelo telefone. Não compreendi o que era, mas deixaram bem irritada.
— A estrada é movimentada, ele já vai estar me esperando lá. Não faça esse drama todo por nada, !
— Não é drama, . Olha, eu posso te levar, se você quiser.
A loira suspirou quando ouvimos Tom protestar do outro lado da linha. Eu entendia que devia se sentir como um pedaço de carne sendo disputada por dois cães, mas ela não podia negar que eu estava certo!
— , por favor… — ela apertou o meio das sobrancelhas.
— Por favor, nada! Você é a mãe dos meus filhos, eu tenho que te proteger!
“E talvez eu não queira que você vá com ele também, mas isso é apenas um detalhe”, pensei.
— E tem mais, Dormian. Se demorar a voltar, eu vou atrás pra saber onde você a levou, já que está querendo colocá-la em risco assim.
Blá, blá, blá, o velho insuportável continuava latindo ao telefone.
— Vamos fazer assim, então. Eu pego um táxi e te encontro lá no restaurante, pode ser? — respondeu a Tom, exasperada. Aparentemente deu certo, porque ele não voltou a dar chiliques. — Ótimo, até daqui a pouco. Tchau — minha esposa finalizou a chamada respirando fundo antes de me lançar um olhar irritadiço. — O que diabos foi isso, ?
— Não está óbvio? Sou eu preocupado com você.
Ela negou com a cabeça em reprovação, apanhando sua bolsa e carteira e deixando o quarto.
— Eu não retiro o que disse — continuei. — Se você demorar muito, eu vou atrás. Tom não tem o mínimo de cuidado com você.
Tom não cuidaria dela como eu, que lhe dei banho, carreguei nos braços e passei pelo inferno ao lado dela. Nós éramos uma família, e eu duvidava que Tom soubesse o peso daquilo.
— Vou deixar uma coisa bem clara — cessou o barulho dos saltos finos no piso do corredor, virando-se para me olhar no fundo dos olhos. — Você não tem o direito de decidir que horas eu volto, . Quando foi a sua vez, você ficou até o amanhecer na casa de Dafne fazendo sabe se lá o quê, e eu não me lembro de ter te cobrado nada — sua expressão de nojo denunciou que ela sabia, sim. — Portanto, se eu quiser, farei o mesmo.
Engoli em seco.
— Vai mesmo dormir com ele? — minha voz saiu baixa, quase inaudível.
Os olhos de vacilaram, fugindo dos meus tempestuosos. A loira mordeu o lábio com força, voltando a me olhar no rosto – daquela vez, com os olhos marejados.
— Isso não é da sua conta.
A assisti me dar as costas e descer escada abaixo, deixando-me sozinho na casa.
Capítulo 41
— Boa noite — funguei, mantendo a cabeça baixa a fim de esconder meu rosto vermelho e os olhos molhados.
Segurei o choro que veio anunciado por aquelas lágrimas solitárias até metade do trajeto, conseguindo controlar a situação do meu coração. Eu podia senti-lo rachando. Eu tentava segurá-lo com uma das mãos enquanto a outra falhava em tentar remendá-lo. Era pura bobagem. Eu não devia estar tão magoada com o que saiu da minha própria boca, ainda mais para !
Os olhos dele… Os meus marejavam só de lembrar do modo como o deixei. Eu não era boa em demonstrar, mas era alguém transparente, principalmente em seus gestos. Vi em seu rosto o efeito de minhas palavras e me arrependi de tê-las dito. Independente de qualquer coisa, da sua posição em minha vida, eu nunca magoaria alguém intencionalmente.
Não conscientemente, claro. Talvez eu quisesse, no fundo, atingi-lo de alguma forma, fazê-lo sentir o que eu sentia.
Não sabia como ele se sentia quando saía para se encontrar com Dafne, se sentia-se errado ou estranho como eu estava me sentindo naquele momento. Era uma sensação tão ruim, como se eu o estivesse traindo, como se tudo aquilo que vivemos desde nossa subida ao altar fosse real.
Desembarquei e fui direto para o banheiro do restaurante que marquei de me encontrar com Tom. Era caro como esperado, e percebi aquilo no instante em que pisei os pés na calçada e vi a fachada imponente.
Tentei retocar a maquiagem de meus olhos e o corretivo debaixo deles. Consegui disfarçar meu choro superficialmente; porém, por dentro, ainda sentia a garganta trancada e meu estômago se revirando. Meus olhos ainda estavam um pouco vermelhos e se encheram de lágrimas quando me encarei no espelho e apoiei-me na pia de mármore, respirando fundo e decidindo deixar da porta para fora.
Era o meu momento de me divertir. Eu não poderia ficar com a cabeça avoada, pensando no que ele devia estar fazendo em casa sem mim, ou me imaginando lá com ele e em meu colo, brincando na cozinha enquanto jantávamos.
— Você faz parecer tão fácil — sussurrei sozinha, pensando em qual seria o truque de para sair com Dafne e voltar pra casa como se nada tivesse acontecido.
Ele tomava um banho, apagava as digitais e todos os rastros de beijos que recebia pelo corpo, jogava as roupas usadas e cheias de perfume de outra mulher no cesto e trocava por limpas. Voltava para mim como se nunca tivesse ido. Me beijava como sempre, me fazia sentir sua mulher e entrava no nosso teatro sendo o marido exemplar que foi escalado para ser.
Deixei o banheiro ainda com a sensação de que todos estavam me olhando e julgando. Até cheguei a checar se minha aliança estava em meu dedo por pura paranoia, já que eu sabia que a tinha tirado e colocado na bolsa ainda dentro do Uber.
Me acalmei quando avistei Tom já sentado, concentrado no celular e olhando em volta, distraído. Até que seus olhos azuis me encontraram em meio às mesas ocupadas e seu sorriso se abriu completamente. Lhe sorri de volta, percebendo o modo como seu olhar brilhava ao me assistir andar até ele. Eu sentia minhas bochechas esquentarem, e tinha certeza que estava vermelha e sem graça. Tom me deixava daquele jeito desde o primeiro momento em que conversamos, quando ele nem me conhecia ainda. Demonstrou interesse antes mesmo de de repente querer ficar comigo, provavelmente por conta da facilidade de já me ter ali, dividindo o mesmo teto.
Sentei-me e me esforcei para lembrar do sentimento que tive por Dormian quando o vi pela primeira vez na casa de Megan. Eu queria desesperadamente poder voltar a sentir o frio na barriga de antes, porque apesar de estar tão lindo quanto à primeira vista, muita coisa mudou desde então. Ele se mostrou um pouco possessivo e implicava com depois que descobriu da nossa farsa, como se aquilo lhe desse algum aval para tal. Além do mais, supriu grande parte da minha carência. Eu não podia negar que era muito bem servida em casa. Não daria para negar que, para mim, também era mais fácil transar, dormir abraçada ao homem com quem me casei, mesmo que de mentira.
— Está linda.
Comprimi os lábios, esperando pelo arrepio ou algo que sinalizasse que meu corpo o correspondia de alguma forma, porém não houve nada. Não como foi com , que me tomou em seus braços e me olhou no fundo dos olhos ao me dizer a mesma coisa naquela mesma noite. Eu realmente me senti linda, meu coração se acelerou de imediato.
Se acelerava só de lembrar do som da sua voz rouca.
— Obrigada, Tom, você também está lindo.
Não menti, não havia como. Ainda não conseguia compreender o que tinha acontecido com o tesão e a atração que algum dia já senti por ele. Era como se tivessem me lançado um feitiço: Tom era um homem extremamente atraente, era exatamente o meu tipo, o homem dos meus sonhos, mas ele parecia tão comum aos meus olhos.
Se estivessem ali, Fanny e Anne iriam me socar a cara.
— Estava te esperando para pedir, não sei o que você gosta.
Concordei, apanhando o cardápio que me foi estendido. E ele não sabia mesmo. Se soubesse, não me levaria a um restaurante tão caro. Espiei as mesas ao meu redor e notei que os pratos ali não deviam matar a fome de ninguém, apesar dos preços absurdos. não me levaria a um lugar daqueles. Quis rir em desgosto ao pensar numa piada que envolvia o fato de que meu marido nunca tinha me levado para jantar, porque sabia que eu não curtia restaurantes granfinos como aquele.
A graça toda se dissipou quando me lembrei de que ele não era meu marido de verdade, e que aquela não era a razão por eu não ser levada para sair.
— Tudo bem. Não teria como você saber, de qualquer forma — ponderei, e era verdade. Eu não deveria e nem poderia esperar nada daquilo de Tom. Apesar dos nossos flertes passados, ainda poderíamos nos considerar desconhecidos.
— Mas eu quero saber mais sobre você, te conhecer mais, saber do que gosta, do que não gosta… — sua mão alcançou a minha sobre a mesa, fazendo-me respirar fundo, ligeiramente nervosa.
Fazia tempo que eu não sentia a sensação de ser cortejada. Nossa, eu parecia as mulheres do século passado pensando naquela palavra. Não sabia se lembrava ao certo como reagir a interações como aquela. Conhecer alguém do zero depois de alguns meses vivendo uma vida de casados com parecia ser algo extremamente entediante para mim.
Ter que dosar o que falaria para não assustá-lo ou entretê-lo para que ele não me achasse sem graça… Ter que parecer bonita até quando fôssemos acordar juntos, vestir uma lingerie combinando sempre que saíssemos ou me privar de demonstrar muitas emoções para esconder o jogo no início… Eu não fazia aquilo desde que me casei. Não era preciso. Eu não tinha o objetivo de fazer se apaixonar por mim e nem conseguiria caso tentasse. me conhecia há anos, sabia o que eu gostava e o que não, e tudo o que ele não conhecia de mim até então foi decifrado de maneiras tão naturais que eu nem sabia se era capaz de pontuar quando aconteceram tais descobertas.
Era tudo tão fácil quando não estávamos tentando tanto fazer dar certo. Tudo se encaixava tão bem e fluía como se simplesmente fosse para ser daquele jeito.
— Obrigada por aceitar meu convite, sei que sua agenda deve ser muito lotada — agradeci e Tom soltou uma risadinha, fazendo-me sorrir junto. — Eu realmente precisava sair um pouco para me distrair.
— O que houve? — ele franziu a testa. Tentei me desprender daquele estigma de primeiro encontro e ser eu mesma, ver se Dormian iria mesmo gostar de mim e não da ideia da que ele achava conhecer. Afinal de contas, fomos apresentados em meio a uma bagunça e muita, muita mentira. — anda te enchendo muito a paciência ultimamente?
A paciência, por incrível que pudesse parecer, ele não estava afetando. Eram outras áreas da minha cabeça que eu ainda estava tentando compreender seu poder sobre elas e o que todos os sentimentos que ele me causava significavam.
— Não, com eu já aprendi a lidar, faço isso há muitos anos — menti. Eu não sabia, achei algum dia que iria saber, mas já era tudo novo para nós dois. Então, tudo o que aconteceu no passado não importava muito entre nós. — Meu problema mesmo é o trabalho, ou a falta dele, pelo menos.
Tom esboçou surpresa. Acho que pior que ser uma garçonete era ser desempregada. Já imaginei que ele desistiria ali.
— Oh, eu não sabia, ! Que pena.
O garçom finalmente trouxe os pratos, porém não senti meu apetite aguçar ao reparar na comida exageradamente arrumada ali.
— Bom, pelo menos agora você poderá cuidar de , não é?
— É, isso era para ser uma coisa ótima, e é, não me entenda mal — peguei os talheres, tentando organizar meus pensamentos. Tive medo de ser julgada por falar aquilo em voz alta.
Eu amava , não havia espaço para dúvidas ali, mas minha vida agora girava em torno dela e eu tinha medo daquilo me diminuir como mulher. Quero dizer, além de mãe, eu era uma mulher também. Queria sair com minhas amigas de vez em quando, ter uma profissão. Não queria ficar o dia trancafiada em casa, mesmo que aquele fosse o lugar mais aconchegante do universo e que fosse a minha pessoa predileta no mundo todinho. No fim do dia, eu ainda precisava me sentir um pouco mais… eu. Ficar sozinha por um tempo, ou me ocupar com alguma coisa diferente.
— Mas toda essa coisa de virar dona de casa e ser sustentada pelo marido… — continuei. “Sustentada”, desde que ouvi aquelas palavras de Joseph, sentia aquela em especial pesar em minhas costas.
— Ele joga alguma coisa na sua cara? — seu tom de voz afetado denunciou sua raiva crescente.
Neguei de imediato, tinha me esquecido de me policiar quando fosse falar sobre para Tom. Ele sempre o via de uma maneira exageradamente errada. Não dava para julgá-lo naquele aspecto, eu mesma já fui a pessoa que interpretava cada respirar de como algo negativo e também já insinuei que tinha me destratado na confusão do ano novo em Tulum.
— Isso não é sobre , é sobre mim. Eu não gosto de depender de ninguém.
Tom me ofereceu um pouco de vinho branco. Eu não gostava, mas achava que talvez fosse uma boa ideia ter um pouco de álcool na corrente sanguínea para me ajudar a me soltar mais. Afinal, eu não estava ali obrigada. Eu tinha o chamado para sair, não devia e nem iria estragar tudo sendo indiferente. Como disse a mim mesma antes de ir até aquela mesa, tentaria me divertir.
— Bom, se quiser, posso ver se tem algo no hospital onde trabalho. Talvez remanejar minha secretária para de repente abrir uma vaga… — ele sugeriu, mas neguei com a cabeça, rindo do jeito nada sugestivo que Tom falava. — Imagine, uma secretária linda dessas, eu iria trabalhar muito mais feliz.
— Bobo — murmurei, risonha.
— Tudo bem, sem ser minha secretária — ele revirou os olhos teatralmente. — Mas então em outra área, falo sério. Caso queira ajuda com isso, acho que posso fazer algo por você.
Fiz o que Tom me disse e imaginei, por um instante, caso eu conseguisse trabalhar assim tão perto dele. Pensei também na possibilidade de conviver com Tom, sair mais vezes com ele e levar aquilo para um outro nível se continuássemos daquela forma, juntos até o fim dos oito meses que faltavam.
E se ele gostasse de e quisesse algo mais sério comigo? Como seria a vida ao lado de Dormian? Acordar ao lado dele, sair para jantar vez ou outra… ficar em casa sozinha enquanto ele viajava para congressos médicos, esperando-o voltar tarde da noite porque, como um verdadeiro super-herói de quadrinhos, Tom precisou vestir seu uniforme e operar algum coração a beira de parar as batidas?
Acho que descobri o motivo de ele estar solteiro até agora. Aquela pergunta martelou em minha cabeça na noite em que nos conhecemos naquele jantar.
Não era algo que eu queria para mim. Eu queria um homem que pudesse estar presente, e precisaria daquilo também. Talvez insistir em Dormian fosse uma perda de tempo, mas ao menos poderia funcionar enquanto eu estivesse naquele acordo com .
— Muito obrigada. Sei que posso contar com você sempre que precisar — suspirei e o vi sorrir, solícito. — Mas você já fez muito por mim, Tom, eu já nem sei mais como agradecer.
— Já está fazendo, . Me dar a oportunidade de sair com você, sozinhos, sem o atrapalhando e tentando ficar entre nós…
— Podemos não falar sobre ele? — o interrompi. Já não bastava todas as milhares de vezes que passou pela minha cabeça somente naquele pouco espaço tempo em que deixei minha casa.
— Tudo bem, como quiser — ele concordou, fazendo-me forçar um sorriso. — Mas antes de focarmos em nós dois, primeiro me responda uma coisa?
Concordei, já me sentindo nervosa de novo.
— O que há entre você e ?
Respirei fundo e desviei o olhar. Minhas mãos, que seguravam os talheres, os soltaram no prato, começando a suar.
— — respondi simplesmente. — Sei que naquele dia você teve a impressão errada sobre nós, com toda aquela história de dormimos juntos, mas não é o que estava pensando. e eu não temos nada além de sexo casual, e nem pretendemos ter. Ele tem alguém, uma… amante. Tenho quase certeza que vai assumi-la quando esse casamento falso acabar — engoli em seco, dando um grande gole no vinho.
Apesar daquela ideia passar pela minha cabeça e ser realmente uma possibilidade, ainda era algo que me embrulhava o estômago e que eu evitava pensar. Não queria sofrer por antecedência. Sabia que quem ficasse ou deixasse de ficar jamais seria da minha conta, mas ainda assim tinha ciência de que teria que conviver com a mulher escolhida por causa da família que constituímos junto de .
— Amante — Tom arqueou as sobrancelhas, rindo fraco. Franzi o cenho, não entendendo onde estava a graça. — Me desculpe, , mas não sei se acredito em você — disse, e abri a boca para tentar responder, mas ele foi mais rápido. — Ok, vocês claramente se casaram por uma farsa, mas por que então chama a mulher que está dormindo com de amante se vocês não têm nada? A sua voz, o modo como fica nervosa ao falar sobre ela… Já vi isso antes, . E foi em , quando tentei por várias vezes me aproximar de você.
— Não me venha com esse papo de ciúmes agora, Tom, por favor — apoiei o cotovelo sobre a mesa, massageando minha têmpora. Estava cansada daquele assunto, daquele fruto da imaginação fértil alheia.
— Não vai doer se admitir, . Aliás, vocês dois precisam disso, parar de fingir que não há nada aí, sendo que está claro como o dia que tem algo acontecendo!
Ri sem humor, sentindo-me trêmula em puro descontrole. Meu coração se acelerou de repente. Senti o rosto queimando, tendo certeza que estava vermelha.
— Se não quiser ter nada sério comigo agora por isso, tudo bem, sou paciente. Consigo me contentar com pouco. Ainda é melhor que nada, não é?
— Tom, eu…
— Está tudo bem, , sei que deve estar confusa. Eu só quero te pedir, por favor, me deixe ao menos tentar conquistá-la?
— É o que estou fazendo agora — encolhi os ombros, sorrindo sem graça. Tom assentiu, levando mais uma garfada à boca. Aproveitei que estava ocupado para tentar lhe dar uma réplica à acusação de mentir sobre o que acontecia entre e eu. — É como eu já disse anteriormente, e eu só estamos aproveitando a praticidade de transar sem precisar sair de casa — dei de ombros, desdenhando. Senti-me culpada no mesmo instante, porque desdenhar do que fazíamos na cama era quase que um crime, de tão bom que era.
— Pelo que estou vendo, seu histórico com deve te atrapalhar de assumir até mesmo para si mesma.
Suspirei diante de sua insistência no assunto. Céus, eu odiava quando queriam colocar palavras em minha boca ou rótulos em meus sentimentos. Quem sentia era eu, portanto, era a única que poderia interpretá-los! Ok, talvez eu tivesse um pouco de dificuldades naquele trabalho, mas não me recordava de ter pedido ajuda de Tom para aquilo.
— O que sente em relação a ele, ? — sua voz me despertou de meus devaneios.
— Nada do que está pensando, Tom — arqueei a sobrancelha, irritadiça. Ele continuava ali, rindo de mim como se eu fosse uma comediante apresentando um show de stand up. — e eu nos odiávamos a vida inteira praticamente. Passamos a morar juntos há apenas quatro meses, temos muita química na cama, passamos a ser amigos por , e sobre eu não gostar de Dafne…
— Vamos mudar a pergunta, então. Por que não gosta de Dafne?
Mordi o lábio e segurei um xingamento, o que apenas o divertiu mais.
— Perdão, da amante do seu marido de mentira.
— Isso não tem graça — agarrei o guardanapo branco e fiz menção de sair da mesa quando o loiro à minha frente debochou, rindo de sua última frase dita.
— Me desculpe, , não é minha intenção rir de você — ele se apressou a me impedir de me levantar. Suspirei, ajeitando minha cadeira de volta no lugar. — É que é uma situação muito boba. Vocês são adultos, jovens, mas já tem uma filha para criar e continuam repetindo comportamentos adolescentes.
Arfei, ofendida. Adolescente era a put… Freei meus pensamentos sobre a mãe dele. Ela já deveria ser uma senhora de bastante idade, ou até poderia não estar mais entre nós àquela altura. Não merecia ser xingada pela inconveniência do filho. — Responda minha pergunta? — ele sorriu e deitou a cabeça para o lado, o que lhe deu uma aparência fofa.
Suspirei, derrotada. Se Tom queria falar sobre aquilo mesmo, então falaríamos. Na verdade, ele era a única pessoa das que sabiam da nossa farsa que também sabia que estávamos transando. No fim das contas, Tom era o único que poderia ouvir tudo o que eu tinha sentido nos últimos dias e, apesar da minha resistência, talvez pudesse me ajudar a resolver aquele quebra-cabeça muito confuso.
— Não tenho motivos para não gostar dela — admiti, cruzando meus braços como uma criança birrenta. — Talvez seja um pouco de inveja, por ela ser uma mulher bem sucedida, linda, ter um corpão e ser a mulher que caras como levam para jantar em restaurantes como esse — apontei, olhando em volta. — Não é ciúmes, Tom, eu só… quero ter o que ela tem, e não falo isso em voz alta porque… é feio ter inveja.
— Continuo discordando de você.
Revirei os olhos. Eu estava sendo sincera e ele ali, usando meu desabafo para provar seus pontos errados, diga-se de passagem.
— E agora percebi o motivo de ter me chamado para jantar esta noite.
— Tom… — levei as mãos ao rosto, vermelha de vergonha. — Está tão na cara assim?
Ele assentiu, apoiando a mão no queixo e deixando seus ombros caírem.
Caralho, eu estava estragando tudo.
— Você me usou para fazer ciúmes nele?
— Não — respondi de imediato, com veemência. Não era o que parecia, e esperava que ele acreditasse em mim. — Eu te chamei porque… Tá, talvez eu sinta um pouco de ciúme dele. Esses dias eu chorei enquanto transávamos, porque fiquei pensando se preferia ela na cama do que estar comigo…
Fui interrompida pela gargalhada dele. Pelo menos alguém estava se divertindo com aquela história toda.
— Me desculpe. Novamente, não estou rindo de você… — explicou ainda aos risos. — Estou imaginado a cara dele… Isso nunca me aconteceu na vida. O quão ruim o sexo devia estar para você ter caído no choro no ato?
Não falei nada. Não defendi o desempenho do , ele merecia ser motivo de riso por tudo o que estava me fazendo passar com Dafne. Soltei um riso ao ter tal pensamento.
— Posso continuar? — pedi e Tom fez um gesto com a mão, sinalizando para que eu seguisse com a história. — Enfim, eu te chamei porque, assim como pode ter uma amante, eu também poderia ter um.
— Que sou eu, no caso — ele apontou para si, sorrindo maliciosamente. Revirei os olhos.
— Eu queria tentar com você para esquecer essa coisa… — expliquei, e seus olhos claros me encararam sugestivamente. — Tá bom, para esquecer esse ciúme que eu estou sentindo do com a Dafne. Satisfeito?
— Sim, por estarmos tentando.
Baixei minha cabeça com o olhar que recebi. Quando o espiei, vi seu sorrisinho crescente nos lábios.
— Vamos esquecer esse idiota — ele disse. — Me diga, o que gosta de fazer no tempo livre?
Arrumei minha postura e me remexi na cadeira, visivelmente aliviada. Por favor! Vamos parar de falar em !
— Eu desenho — comecei envergonhada, atraindo sua atenção. — Na verdade, são croquis. Desenho roupas e costuro desde quando era criança… Comecei a cursar moda quando cheguei em Londres com Grace.
— Não conseguiu se formar?
Neguei, sentindo meus ombros caírem.
— O curso está trancado por motivos financeiros — mordi o lábio em frustração. — Mas pretendo voltar algum dia. É o que eu amo fazer e eu sou muito boa nisso — murmurei, segurando o sorriso que me rasgava o rosto.
— Nossa, que raro te ouvir falar bem de si mesma desse jeito.
Maneei a cabeça, me dando conta de que quase não conversávamos e que eu tinha mesmo uma mania de me autossabotar às vezes. Só não imaginava que era algo tão nítido.
— Está vendo? Não tem motivos para você sentir inveja da tal Dafne. é um imbecil por trocar uma mulher linda como você por quem quer que ela seja — Tom limpou a boca com o guardanapo repousado em seu colo. — Bom, isso é bom para mim, então nem vou reclamar.
— Mesmo que eu te diga que tenho ciúme dele, o que não significa absolutamente nada, não sente de você. Ele não vai com a sua cara apenas por achar que você pode contar a alguém sobre nossa mentira. nem ao menos ligava para seus flertes antes da noite de Natal.
Na verdade, eu estava mentindo um pouquinho. já implicava no início, sim. Porém, naquela época, ele e eu ainda brigávamos até pelo ar que respiramos lado a lado, então não queria dizer muita coisa.
— Vocês já estavam juntos nessa época? — Tom franziu o cenho, fazendo-me desistir de tentar dialogar sobre aquele assunto. Ele nunca acreditaria em nada do que eu dissesse, pelo visto.
— Não, mas isso…
— Pronto, está explicado.
Não disse? Ele nem ao menos me deixava argumentar.
— Confie em mim, , eu sou homem. Vejo o quanto minha presença o afeta. A prova disso é o jeito como ele ficou há pouco, quando te liguei para nos encontrarmos.
— Por que quer tanto provar que está certo?
— Porque quero te alertar para tomar cuidado. Se estão envolvidos a ponto de sentirem ciúmes um do outro, o próximo passo é se apaixonarem. Se é que já não estão — falou, mas neguei veementemente. — Não quero que ele te faça sofrer, e já disse antes, eu sei que vai. Conheço o tipo dele. Eu era igual quando tinha a mesma idade, já quebrei corações e não fiz nada para reparar meus erros, . Não confie nele.
— Não vai acontecer — coloquei firmeza na voz.
— Não mesmo, porque vai se apaixonar por mim primeiro — piscou em minha direção, fazendo-me rir.
Olhei em volta e, de repente, o restaurante não estava mais tão… antiquado para mim como antes. Eu estava relaxada, rindo com Tom, e até me sentia mais leve após aquele peso todo ter sido tirado de minhas costas, mesmo que contra a minha vontade. Tom fez quase um interrogatório daqueles filmes comigo. Eu suspeitava que, se ele pudesse, me levaria numa daquelas salas escuras com apenas uma lâmpada pendurada para me fazer perguntas até chegar naquela confissão.
Tom sairia dali satisfeito por ter o que queria; já eu estava um pouco assustada. Antes, nomear o que eu sentia parecia bastante assustador, mas depois de saber que era ciúme, senti-me como se tivesse recebido um diagnóstico de uma doença sem cura e tratamento. Não sabia o que fazer com aquela informação e tive vontade de chorar em desespero.
O que aquilo deveria significar? Como eu deixei que as coisas saíssem do controle naquele nível?
Ficamos por mais algum tempo ali, conversando sobre nós, daquela vez sem incluir terceiros. Mentira, falamos sobre . Era inevitável não citá-la ao menos uma vezinha, ela fazia parte do meu ser. E assim como Tom assustadoramente gostava de tudo o que ouvia sobre mim, Domian adorou escutar meu monólogo sobre a bebê. Ele disse gostar de crianças e revelou o desejo de ter um filho; aparentemente era a última coisa que tinha desejo de ter na vida depois da carreira bem sucedida como cirurgião.
Ele deixou aquilo para a última hora. Tenho certeza que nunca deve ter sido cobrado por ninguém com o passar dos anos, no máximo pela mãe dele querendo netos.
Não pude deixar de fazer aquele paralelo com o fato da maternidade ter vindo muito cedo em minha vida e se tornado minha prioridade, entrando na frente até mesmo da minha tão sonhada formação. Apesar dos sacrifícios que tudo aquilo implicava, eu não poderia dizer que me arrependia.
— Se molhou muito? — Tom fechou a porta, abafando o barulho da chuva que começava a ganhar velocidade e ir de uma simples garoa para o que parecia ser uma tempestade com o vento chacoalhando as árvores da rua.
Aquele encontro tinha tudo para ser ao menos parecido com o dos meus sonhos, com direito a até um sugar daddy que eu jamais pensei em ter na vida. Brincadeiras à parte, o jantar, o modo como Tom fez de tudo para que eu me sentisse à vontade junto dele e até mesmo a corrida na chuva pelo estacionamento quase vazio por ser muito tarde, tudo parecia-se com uma cena de um filme de comédia romântica.
Exceto pelo fato de que minha cabeça estava confusa demais àquela altura.
— Sim, meu sorvete já era — fiz bico, ainda segurando a casquinha destroçada, sentindo as gotas de chocolate que escorreram melecarem meu dedo indicador.
— Aqui — o loiro puxou do porta-luvas um saquinho preto, deixando-me colocar o que restou do sorvete dentro para jogarmos no lixo depois.
Levei a mão à boca, lambendo o pouco do sorvete que sujou e atraindo seu olhar enquanto seus movimentos para amarrar a pequena sacola cessaram. Os olhos azuis de Tom, ainda vidrados em meus lábios recém-umedecidos, migraram em direção aos meus. Ofeguei quando o vi se aproximar, sentindo sua respiração pesada contra meu rosto assim que o tive ainda mais perto.
Dormian não tinha tentado nada até aquele momento, apenas esperou o momento certo, e parecia que ele havia chegado. Sua mão grande se encaixou em minha mandíbula e tive seus dedos envolvendo minha nuca com destreza antes que ele me puxasse para perto.
Cada vez mais próxima de seus lábios, cada vez mais curiosa.
Sim, eu já havia o beijado antes, me recordava da noite de Natal. Mas aquilo foi antes de me tomar para si e apagar toda e qualquer impressão ou toque de outros lábios da minha boca e corpo. Me vi ansiando para sentir algo novo, algo que pudesse apagá-lo de mim. Fechei os olhos com força e correspondi com avidez o beijo ansioso de Dormian, praticamente implorando para que ele tirasse da minha cabeça. Nem que fosse só por aquela noite.
Quando abri os olhos novamente, encarei seu nariz fino ainda muito próximo do meu. Retribuí seu sorriso ao ofegar, feliz por estar sentindo algo, ao menos. Ainda não era algo estratosférico, mas era promissor. Meus pelos do corpo se eriçaram quando Dormian agarrou-me pela nuca e deslizou os dedos largos em direção à raiz de meus cabelos, onde ele puxou os fios devagar e forçou-me a expor minha jugular para que pudesse fazer o que bem entendesse dela.
Gemi de olhos fechados quando Tom chupou meu pescoço, parando em minha orelha e mordiscando o lóbulo dela. Agarrei seu bíceps, esfregando uma coxa na outra ao sentir minha intimidade pulsando debaixo daquele vestido justo. Percebendo o estado em que estava me deixando, Tom levou uma das mãos até a saia, adentrando o tecido e arranhando o local com suas unhas curtas. Parei o caminho que ele fazia em direção à minha calcinha e o tive afastando o rosto do meu pescoço para me olhar.
— O que foi? — sussurrou, beijando minha boca.
Demorei para focar-me em seu rosto por completo. Pisquei algumas vezes, tentando me situar.
— E-Eu não sei… — ofeguei, ainda trêmula.
Realmente não sabia. Eu queria, o queria como na noite em que o conheci. Minha calcinha estava molhada. Eu sentia minha pele quente e reconhecia o estado febril que só o tesão me deixava. Mas… não conseguia me concentrar nele. Apesar de nossa longa conversa naquele jantar, Tom ainda parecia um completo desconhecido para mim. Como se… como se não fosse compatível comigo.
Minha pele se arrepiou, mas por conta do estímulo, meu corpo logo começou a oscilar entre corresponder aos toques firmes e sedentos de Tom e depois esfriar, para logo em seguida voltar a se incendiar. Era como se Dormian tentasse me acessar, mas não tivesse a senha. Minha pele, minha boca, meus olhos não o reconheciam como alguém autorizado a invadir minha cabeça e deixá-lo entrar.
O que estava me deixando confusa em relação à minha rejeição era o fato de que aquela não era minha primeira vez indo transar no primeiro encontro. Eu já tinha dormido com desconhecidos antes – antes de me casar, claro. Me perguntei se o costume de ter um homem só não tinha me tirado a capacidade de me entregar a outros com mais facilidade.
De repente, a pegada de Tom não me pareceu boa o suficiente, apesar de claramente ser e eu ter ansiado por senti-la desde que coloquei meus olhos nele pela primeira vez. Quando o vi sentado à mesa do restaurante, lembrava-me de ter desejado sentir o que Dormian um dia já me despertou, e eu voltei a sentir. Aqueles amassos no carro dele me atiçaram a ponto de querer despi-lo e transar com ele.
Mas… nada era tão forte como era com .
Não era a mesma coisa, e eu estava tão habituada a sentir tudo tão intensamente com meu marido que com qualquer um outro parecia sem graça pra mim. Depois de me sentir completa de alguma forma, o meio-termo já não me enchia os olhos.
Ridícula! Era aquilo que eu era! Tinha certeza que não tinha o mesmo problema quando saía com Dafne.
— ?
— Me desculpa, Tom — voltei a encará-lo em frustração. Ele fez menção de tirar a mão de meus cabelos, mas fiz questão de segurar seu antebraço. — Eu quero… — sussurrei de imediato, e ele avançou com o rosto em direção ao meu. — Eu quero você, mas…
— Vamos devagar, ok? — ponderou, engolindo em seco. Sua respiração e o volume entre suas pernas na calça escura que ele usava discordaram veementemente. Ele não queria ir devagar. — Eu tinha reservado um quarto num hotel aqui perto, mas não tinha certeza se você ia querer ir ou não. Tudo bem, vamos deixar para uma próxima vez.
— Não, Tom — discordei, já sem suas mãos em mim e me afastando minimamente para conseguir respirar. — Vamos, eu já disse que quero. Estamos tentando, lembra?
— Ainda bem, porque eu não dormiria por noites depois do que aconteceu aqui…
Ri de seu alívio e o beijei demoradamente, tendo-o daquela vez mais contido, apenas acariciando a lateral do meu rosto.
Ele realmente me levou a um dos hotéis daqueles prédios brancos e cheio de luzes do centro da cidade. Passamos rapidamente pela recepção e logo íamos para o elevador. Assim que as portas se fecharam, Tom fez questão de me prensar contra a parede gélida e tomar meus lábios, deixando-me aliviada por ter medo de altura e ele ter reservado um quarto nos últimos andares.
Não tive tempo de pensar que estava presa numa caixa de metal subindo metros e metros longe do chão, sendo puxada por cabos de aço. Talvez aquela fosse a solução, ir rápido, como amarrar um dente mole na fechadura da porta e fechá-la de uma vez. Quando criança, eu nunca senti dor, apesar de morrer de medo. Talvez nós devêssemos correr com aquilo e, quando abríssemos os olhos, já teria acontecido.
Seguimos em direção à porta no fim do corredor silencioso. Dormian trancou-a enquanto meus dedos ágeis desabotoavam sua camisa, expondo seu peito malhado e sua pele bronzeada. Suas mãos já desciam o zíper do meu vestido ao andarmos aos tropeços em direção à cama enorme e macia onde fui deitada. Tom levantou o troco e passou a camisa pelos braços; ao mesmo tempo, eu subia o vestido e deixava à mostra minha calcinha preta.
Não era uma surpresa para ele. Tom já havia me visto nua naquele episódio vergonhoso do hospital, mas seu olhar sobre meu corpo quando me ajudou a passar o vestido cabeça afora fez parecer como se fosse a primeira vez. Lhe recebi entre as pernas sentindo seu membro ereto contra a renda da calcinha. Puxei seus cabelos loiros quando o tive descendo os beijos molhados por meu pescoço e colo.
Tentei relaxar sobre o colchão, ainda respirando irregularmente quando sua boca me alcançou os seios ainda cobertos pelo sutiã, e continuou seu caminho até minha barriga, que subia e descia com velocidade. A sensação de estranheza permanecia. Eu gostava do que via: sua barriga cheia de gominhos e aquele corpo gostoso nos seus quase dois metros de altura em cima de mim, dedicando-se a me dar prazer… Mas ainda não era familiar pra mim. O cheiro era diferente, o gosto dos beijos também.
Eu estava tonta devido à minha respiração irregular. Ainda assim, sentia-me aérea. Não me parecia interessante fazer aquilo sem pensar muito, como se estivesse me distanciando da situação tal qual atores performavam cenas de sexo em filmes. Tom não merecia aquilo, e eu também não.
Gemi quando abri as pernas e senti sua língua me acariciar a intimidade. Emaranhei meus dedos em seu cabelo e me esforcei para continuar ali, naquela atmosfera junto dele. Talvez a culpa fosse minha. Eu não estava realmente tentando, e sim comparando tudo o que sentia com minhas noites ao lado de .
O desânimo me tomava. Eu estava sem esperanças de encontrar alguém que pudesse suprir ou ao menos se igualar a .
Foi então que meu corpo, apenas reagindo aos estímulos, se entregou ao êxtase.
Eu mordia os lábios, tentando não fazer muito barulho, e passei a rebolar contra o rosto dele, sentindo o ápice vir e tomar meu corpo. Dormian usou os dedos para me estimular e introduziu dois deles em minha entrada enquanto continuava a me chupar majestosamente bem. Revirei os olhos, agarrando-me aos lençóis brancos, ainda arfando quando o assisti escalar até meu rosto e me arrancar um beijo de tirar o fôlego, convidando-me a sentir meu próprio gosto.
Rolei sobre Tom e sentei-me em seu quadril. Ainda com os lábios grudados nos dele, escutei um barulho insistente vindo de algum lugar do chão.
— Ouviu isso? — perguntei e ele negou, voltando a me beijar e tentando me sentar mais próxima de seu membro. Porém, o barulho persistiu, não me deixando concentrar. O que já estava difícil antes ficou pior ainda quando me toquei que era meu celular na bolsa. — Onde está?
— Deixa tocar, , não deve ser nada de mais.
Ignorei Tom e me desvencilhei de suas mãos, que tentaram me segurar sentada sobre meu quadril.
— Pode ser algo com — falei. Não tive a intenção de ser ríspida, mas acabei sendo por senti-lo desdenhar em sua fala. Peguei o celular, sentando-me na cama em seguida. O nome do piscava na tela. — Oi — tentei dar um jeito em meus cabelos desgrenhados.
— ...
Franzi o cenho quando ouvi sua voz falha. Chamei seu nome e ouvi uma respiração pesada do outro lado da linha.
— Onde está…m-minh-a…
— O quê?
Ouvi tossir. Parecia uma tosse seca. Eu não estava entendendo nada, sua voz mal saía e estava mais rouca que o normal.
— , está aí?
— Ele provavelmente está ligando para nos atrapalhar — Tom murmurou, deitado sobre o chão, e virei o pescoço para encará-lo ainda com o celular no ouvido. Não me senti muito segura daquilo. — Desligue, venha cá, sim? — ele se sentou, beijando meu ombro ao envolver minha cintura com os braços.
O barulho de seus lábios em contato com minha pele ecoou pelo quarto silencioso, bem ao lado do ouvido onde eu ainda mantinha o celular. Por um segundo, estremeci com a possibilidade de ouvir. Eu sabia que ele não se importava em esconder sua relação com Dafne de mim, mas causar nele o desconforto que saber de ambos me causava me fez sentir culpada.
— A-A bombinha…
— Sua bombinha de asma? — indaguei alarmada, saindo dos braços de Tom de imediato.
Puta que pariu, eu lembrava de tê-la visto quando fiz a última faxina na casa. Não lhe dei muita importância, não me recordava de quanto tempo fazia que não tinha uma crise. A última que tinha em minha memória ainda éramos adolescentes. Eu não imaginava que ele poderia voltar a ter crises assim, do nada!
— ! Está tudo bem? — levantei-me num pulo ao ouvir algo caindo em casa. — ?!
O desespero me tomou quando ele parou de me responder e apenas continuou a tossir, daquela vez sem parar.
— Estou indo — avisei, então busquei pela cama e encontrei minha calcinha. Era só vestir o vestido, pegar a bolsa e… Reparei em Tom sentado, encarando-me de braços cruzados. — N-Não se mexa, eu estou indo, tá? — desliguei o telefone e, de repente, tive uma espécie de déjà vu estranho.
Era a mesma situação que passei quando saí de casa para ir àquele jantar, só que, daquela vez, os papéis se inverteram e minha decisão final não seria Tom. Não daquela vez. Não quando estava passando mal em casa precisando de mim.
Eu não sabia o que faria em relação a Dormian, nem ao menos me situei quando entendi que estava tendo um ataque asmático. Nem me dei conta de que estava acompanhada por Tom. Foi quase como se eu tivesse sido tirada de órbita ao receber aquela informação. Depois de Grace, passei a ter pavor de pensar em perder mais alguém.
— Não vai me dizer que caiu nessa — e ele fez questão de se mostrar presente, fazendo-me encará-lo perplexa já dentro do vestido. — Qual é, , mesmo disse que iria fazer de tudo para te trazer pra casa cedo se você demorasse muito comigo.
— Sim, eu acredito nele, eu ouvi ! — apanhei a bolsa e meus sapatos ainda trêmula. — Estou indo embora, vou pedir um táxi — andei apressada em direção à porta.
— , espera — Tom pediu, me fazendo parar antes de abri-la. — Tenho um colega que mora no condomínio, vou ligar e pedir para dar uma olhada nele — sua voz não transparecia que ele tinha comprado a ideia, mas ao menos não insistiu na argumentação como achei que faria.
Tive a impressão de que Tom iria chamar o amigo para ir pegar na mentira. Se não fosse real, eu o faria ter uma crise de verdade só pelo susto que estava me dando.
Assenti e tentei me acalmar, mas ainda assim sentia meu coração apertado dentro do peito. Engoli o nó que se formava em minha garganta e pisquei a fim de dissipar as lágrimas em meus olhos.
Continuei parada ali. O loiro fez a ligação e explicou que era um amigo e que estava sozinho em casa, precisando de ajuda. Quando desligou, pensei que se levantaria rápido e me acompanharia, mas ele não o fez. Apenas encarou a tela em sua mão por um tempo enquanto pensava. Se Tom achava que eu iria voltar para a cama com ele sabendo que estava naquela situação em casa, estava muito enganado.
— Eu te levo — ele se levantou, suspirando derrotado ao recolher suas roupas.
Descemos no elevador em silêncio; o único barulho existente ali era meu sapato que batia contra o chão insistentemente, tamanha era minha ansiedade. Diferente de quando estávamos subindo, naquele momento eu tinha uma enxurrada de pensamentos vagando pela minha cabeça que, por incrível que pudesse parecer, a altura em que estávamos descendo era o mais leve deles.
Queria questionar Tom, perguntar se ele entendia de ataques asmáticos, se era realmente perigoso como minha cabeça estava me fazendo pensar. Mas preferi ficar calada, com medo do que iria ouvir. Eu precisava manter a calma ao menos até chegar em casa. Precisava vê-lo para comprovar que estava bem e que ficaria tudo bem.
O trajeto que o carro branco de Tom fez pareceu uma eternidade para mim, mas quando chequei o celular, não tinha demorado tanto. Dormian percebeu meu estado e dirigiu mais rápido em direção ao nosso condomínio. Decidi descer logo depois da portaria, numa parte arborizada próximo ao parque das crianças. Ali não havia muitas casas, portanto ninguém iria interpretar maldosamente o fato de Tom me levar para casa.
— Obrigada — murmurei, encarando-o ressabiada. Tom sorriu fraco, com o braço descansando sobre o volante do carro ainda de painel aceso.
Me senti um monstro. Aquele com certeza deve ter sido o pior encontro que ele já deve ter tido em anos. O meu não era, por incrível que pudesse parecer. Por ser mulher e heterosexual, já passei por poucas e boas apenas por querer beijar umas bocas de vez em quando.
— Me desculpa por hoje, por te usar para tentar esquecer meu ciúmes… por tudo.
Falar aquilo em voz alta e finalmente dar nome à sensação horrível que me acompanhou nos últimos dias era estranhamente libertador. Mas, ainda assim, iria guardar aquela descoberta para mim. Bom, ficaria entre Tom e eu, claro. Mais um segredo que nos unia.
— Tudo bem, . Estará perdoada se me deixar te levar para sair uma outra vez.
Sorri assentindo enquanto o tinha envolvendo meu rosto com sua mão grande. Apesar do fim desastroso, até que tinha sido divertido sair e não ser mãe por pelo menos algumas horas.
Tom se aproximou perigosamente, e virei o rosto quando sua boca estava próxima o bastante para me beijar. Ele entendeu e apenas deixou um beijo casto em minha bochecha. Entendeu errado, não era apenas por estarmos dentro do condomínio. Aquilo não era nada comparado à bagunça que existia dentro de mim.
— Ah, se acontecer alguma coisa, me ligue.
Concordei, já indo depressa para o meio-fio. O carro sumiu na próxima curva que encontrou. Soltei um risinho ao perceber que Tom disse aquilo num tom indiferente, mas, ao mesmo tempo, pareceu realmente se preocupar – imagine só – com o ! Não poderia julgar, eu estava fazendo o mesmo na frente dele e tornava a fazer quando estava com Anne e Fanny. Tudo para disfarçar o que realmente acontecia em casa quando estávamos a sós.
Dei passos largos pelo meio-fio, mas logo desisti e tratei de arrancar meus sapatos para que pudesse chegar logo em casa. O portão estava entreaberto e as luzes da sala e do nosso quarto estavam acesas. Me apressei, encontrando a sala vazia. Meu coração já quase saía pela boca quando larguei minha bolsa sobre o sofá, e tentei me recompor ao calçar um dos sapatos quando ouvi passos na escada.
— Boa noite. Você deve ser , a esposa.
Tom não tinha citado meu nome na ligação; poderia ter falado a ele, o que significava que estava bem.
— Sim, estava num jantar com amigas. Ele me ligou e vim correndo pra cá — forcei uma mentira goela afora, percebendo em seu semblante o convencimento. — Tá tudo bem? Onde ele está? E ?
— Está tudo sob controle, . Foi uma crise desencadeada por algo externo. A asma de seu marido estava controlada, mas é provável que algo provocou essa reação. De qualquer forma, já está medicado e está na nebulização. Certifique-se que ele faça até o fim, sim?
Assenti prontamente, respirando aliviada.
— Sua bebê está dormindo, acabei de checar a pedido de seu marido. No mais é isso, acredito que ele ficará bem, foi apenas um susto.
— Muito obrigada…
— Charles, mas pode me chamar de Charlie — ele sorriu, retribuindo meu aperto de mão ainda trêmulo.
— Quanto te devo?
Fui apressada até o sofá, onde joguei a bolsa minutos antes. Quase não a encontrei, e nem precisei; o homem de cabelos castanhos já negava com a cabeça.
— Não precisa me dar nada, foi um favor a um amigo. Bom, se é amigo de Tom, então é um amigo meu a partir de agora.
Soltei um riso nervoso. Estava mais para “inimigo”.
— Vou indo, vocês precisam descansar. Até mais, , foi um prazer te conhecer.
— O prazer foi meu, muito obrigada novamente — o segui envergonhada quintal afora, pisando na grama descalça para poder trancar o portão.
Quando retornei, uma onda de alívio me tomou. Respirei fundo, segurando-me na porta para fechar os olhos e poder enfim trancá-la e subir para ver . Uma ansiedade atípica me tomou enquanto eu subia as escadas, deixando tudo para trás: celular, sapatos, os beijos de Tom em minha pele e as lembranças daquela noite. Tirando o jantar com Tom, tudo se desenrolou da pior maneira possível.
O que de alguma forma me fez pensar: será que se eu não tivesse saído, as coisas iriam acontecer daquele modo? Eu ajudaria a encontrar sua bombinha e lhe pouparia de passar pelo aperto que tinha passado sozinho em casa com . Abri a porta devagar, encontrando-o sentado na cama, com as costas apoiadas na cabeceira.
— Oi — tentei sorrir.
Seu olhar opaco me encarou ainda de longe; ganhava um pouco de brilho a cada passo que eu avançava em sua direção, ou ao menos era o que meus olhos viam quando miravam nos dele. Senti os meus marejarem e sentei-me na beirada da cama.
— Vim o mais rápido que pude, desculpe se demorei.
Ele usava um pijama xadrez, diferente da roupa que vestia quando deixei a casa. Será que começou a passar mal há pouco tempo? Ou a crise veio um pouco antes de tudo se descontrolar e ele me ligar como última alternativa?
soltou um riso sem humor, encarando meu vestido amarrotado, ou talvez ele pudesse ver as marcas em meu pescoço. Eu trouxe meus cabelos para frente, sentindo meu rosto queimar em vergonha.
— Está tudo bem — sua voz saiu baixa, entrecortada e abafada pela fumaça do inalador afastado por ele.
Achei que jogaria algo em minha cara, brigaria dizendo que se eu não tivesse ido, ele não teria chegado àquele ponto crítico. Diria que eu não estava ali para ele quando precisou. Mas não, ele não disse nada. Talvez aquela fosse eu mesma me torturando sozinha.
— Não fala nada, continua assim — cobri sua mão e encaixei novamente a máscara de silicone em seu rosto. — O médico disse que você tem que fazer até o fim — não resisti e afaguei seus cabelos castanhos, afastando um cacho que estava caído em sua testa. — Vou tomar um banho rápido, já venho — aproximei-me, torcendo para que não estivesse com o cheiro de Tom impregnado em mim e lhe beijei a testa, vendo-o fechar os olhos ao sentir meus lábios sobre sua pele.
Dei-lhe as costas e fui ao banheiro, segurando um choro que nem ao menos vi chegar. não estava fingindo. Se estivesse, jogaria na minha cara, seria o antigo que eu odiava desde sempre. Ele parecia saber que me magoaria caso fizesse algo do tipo. Passou pelo mesmo inferno que foi perder Grace junto de mim. Ele sabia que eu ficaria preocupada demais e não mentiria sobre algo tão sério.
No fim da noite, me senti melhor por ter seguido meus instintos e confiado em . Não que vê-lo fraco daquela forma era uma coisa boa, jamais! Mas a situação reforçou algo que eu já tinha percebido entre nós: éramos apenas nós dois nesse mundo e que faríamos de tudo para cuidar um do outro. Eu já tinha sido cuidada por ele duas vezes; não imaginava a carga de adrenalina que era estar do outro lado.
Era engraçado pensar naquilo e sentir segurança tratando-se de , mas, de alguma forma, eu sabia que entre nós as coisas não eram mais como antes.
Esfreguei minha pele no chuveiro, tirando quaisquer resquícios de Tom de meu corpo. Estava agindo como se realmente tivesse feito algo errado naquela noite, e não era necessário, mas algo em mim me fazia pensar que era. Fui para o closet sob o olhar de ainda tomando inalação. Vesti uma blusa de alças e uma calcinha qualquer. Voltei para o quarto ao ouvir o choro de suando pela babá eletrônica ao lado da cama.
Já era por volta das três da manhã; aquele bebê era extremamente pontual quando se tratava de sentir fome nas madrugadas. Fui buscá-la, desci com ela em busca de sua mamadeira e subi as escadas já com ela mamando em meus braços. Quando retornei para o quarto, permanecia do mesmo jeito que tinha sido deixado há pouco.
Sentei-me ao seu lado na cama. Ainda com seus olhos verdes em mim, sorri sem graça ao reparar seu olhar em minhas pernas dobradas sobre o colchão.
— O que foi? — ri nervosa, desviando minha atenção para , que devorava sua mamadeira.
Vi quando seus dedos largos alcançaram a mãozinha de pendurada para fora. Seu polegar acariciou o dorso. Levantei meu olhar para seu rosto e o vi concentrado no que fazia, só parei de encará-lo sorrindo quando fui pega no flagra. Sua mão logo veio de encontro aos meus cabelos, tirando-os do caminho e colocando atrás da minha orelha.
— Obrigado por não desligar o telefone.
Não consegui lhe dar um sermão ao vê-lo tirar a máscara de inalação. Engoli em seco, não querendo falar sobre aquilo. Não importava naquele momento. Eu não precisei de naquela noite, apesar do sufoco que passei com e suas cólicas. A única coisa importante era que estávamos ali, bem e juntos.
— Eu estava pensando… — ele largou a máscara na cômoda. — Fui um idiota naquele dia. Mereci que você saísse com Tom e também mereceria se você me ignorasse para ficar com ele…
— Xi… Não vamos falar sobre isso — neguei com a cabeça, pegando sua mão que acariciava meu rosto e beijando a palma dela antes de acariciar seu dorso. — Só… não me dê um susto desses de novo, sim?
Senti meus olhos se encherem de lágrimas só de pensar na possibilidade de ter cogitado a ideia de não me ligar por achar que eu lhe daria o troco.
— Combinado — ele sorriu, deixando suas covinhas à mostra em ambas as bochechas, secando a lágrima que escapou do canto de meu olho. Foi em vão; logo outras caíram e fizeram o mesmo trajeto. — Não chora — se aproximou, beijando minha testa. — Eu ainda vou viver muitos anos pra te dar muito trabalho.
Aquela não seria a função de no futuro?
Ri fraco, fechando os olhos e tendo meu rosto seco por seu toque delicado. Esperava que ele cumprisse o que falou, porque precisava de nós dois inteiros ao seu lado pro resto da vida.
Abri meus olhos e mantive meu olhar no dele, pensando e comparando nossa situação atual com a do passado. Me comparando. A do passado não estaria cabendo em si ao saber que tinha chegado a quase dar para Tom Dormian, e também sentiria o estômago se revirar só de pensar em passar anos tendo que conviver com pacificamente.
Soltei mais um riso discreto, inclinando-me quando o vi se aproximar para colar a boca à minha. Eram apenas estalinhos. Seu nariz se chocava contra o meu, e eu conseguia sentir seus cílios acariciarem superficialmente minha pálpebra fechada, pesada pelo cansaço e pela calmaria que estar ali com ele e me proporcionava.
— Vou colocá-la para arrotar — levantei-me, ajoelhando no colchão. se esticou, deixando um beijinho no topo da cabeça de , então segui para fora do quarto.
De pé, balancei-me com a bebê em meus braços. Ela de fato tinha arrotado uma vez, mas não quis colocá-la para dormir logo. Por mais bizarro que pudesse parecer, eu tinha sentido falta dela e queria matar as saudades das horas que passei longe.
Depois de tanto tempo ao lado dela desde que fui demitida, era estranho não tê-la ao meu alcance, nem que fosse para olhá-la pela babá eletrônica. Não compreendia o que era aquele aperto no peito que ainda me assolava. Eu estava em casa e todos estavam bem, mas a ideia de que poderia ter sido pior ainda me assombrava.
Sempre tinha que ter alguém ou algo para nos preocupar ou tirar a paz que tínhamos levado tanto tempo para conseguir. Quando não era Miguel, era a família de , Tom, Dafne, e até mesmo Anne era motivo de brigas entre nós ou ameaças à nossa segurança. Pensei no que me disse; sobre tudo, na verdade. Me arrependi de não ter dito nada quando ele me confrontou sobre sua importância na minha vida, sobre seu lugar na minha lista de prioridades.
Ele estava acima dela, e eu só pude ver quando estive prestes a perdê-lo de alguma forma. Me perguntei quantas vezes fui cabeça-dura, teimosa sobre o que sentia. Me culpei por ser tão complicada. E se tivesse realmente hesitado em me ligar por não se achar tão importante para mim?
Deixei a bebê adormecida no berço após beijar e cheirar o topo de sua cabeça algumas vezes. Voltei para o quarto que, num intervalo de horas, tinha deixado de ser meu e logo depois voltado a ser. Tive que dar o braço a torcer, Tom estava certo. Às vezes parecíamos dois adolescentes.
Suspirei ao passar pela porta e me deparar com do mesmo jeito que tinha deixado quando saí, o que era engraçado, porque ele não estava se aguentando sentado de tanto sono.
— Ainda está aí? — sorri, encarando-o. Ele assentiu aliviado quando apaguei a luz, deixando só o abajur ao lado da cama aceso.
Deitei ao seu lado, ajeitei-me debaixo dos cobertores e foi como se o colchão da nossa cama já tivesse o desenho dos nossos corpos moldados nela. Seu braço me envolveu e fechei os olhos, ainda sentindo-o se remexer atrás de mim.
— Estava te esperando — sua voz saiu abafada. — Queria dormir com você essa noite…
Franzi o cenho. Nós já tínhamos dormido juntos tantas noites, o que aquela teria de especial? Virei-me e fiquei cara a cara com ele, que sorriu satisfeito e passou o braço pela minha cintura, invadindo minha blusa com sua mão grande.
— Todas as noites… — sussurrou, acariciando minha pele.
Deixei-o fazer o que quisesse, mas não esperei que fosse safado a ponto de subir em cima de mim caindo de sono, logo após praticamente quase morrer. Empurrei seu ombro de leve, fazendo-o desgrudar os lábios dos meus. alternou seus olhos nos meus ainda com o corpo apoiado sobre mim. Nossas coxas se enroscaram, fazendo-me sentir sua pele quente na minha.
— Eu só quero olhar pra você — sussurrei diante de seu olhar duvidoso.
Ele me sorriu fraco, assentindo ao fechar os olhos quando meus dedos tiraram as pequenas ondas de seu cabelo castanho de sua testa. suspirou, encostando a testa na minha. Senti o ar quente sair de sua boca e mordi o lábio em puro alívio. Como era bom senti-lo respirar depois de tudo.
— Eu te amo…
Soltei um riso surpreso. Seu rosto se relaxou diante de mim e eu encarei seus olhos verdes, buscando algum tipo de resposta para… aquilo.
— Meu Deus, o que tinha nesse remédio que você tomou? — estiquei-me para apanhar o frasco de comprimidos deixado pelo doutor na cômoda ao lado da nossa cama.
sorriu, deixando-se desfalecer sobre o travesseiro. Parecia meio grogue. Provavelmente, o remédio para asma tinha efeitos parecidos com antialérgicos, daqueles que te derrubam para que a alergia não te derrube primeiro. Aquilo explicava todo aquele romantismo que eu nunca tinha reparado nele antes. Comprimi um sorriso ao contemplá-lo piscar devagar até cair no sono profundo.
— Espero que não se lembre disso amanhã.
(...)
Acordei no dia seguinte ainda bem próxima a na cama. Sua mão ainda pesava em minha cintura, como se ele tivesse passado a noite me segurando ali. Tirei-a devagar, com medo de acordá-lo. Estava tão bonitinho com os cabelos bagunçados contra o travesseiro. Não resisti e me aproximei sorrateiramente, a fim de cheirar seus pequenos cachos. Adorava o cheiro de seu shampoo.
Tomei um banho, aproveitando que ainda estava dormindo tranquila. Desci com a babá eletrônica para ir pegá-la caso ela acordasse chorando e deixaria dormir e descansar depois da noite passada. Preparei omeletes, coloquei a cafeteira para trabalhar e, ao abrir a geladeira, notei no calendário pregado ali que era o dia do aniversário dos gêmeos de Victoria. Tinha acontecido tanta coisa desde o convite que nem me lembrei.
— Bom dia.
Virei-me e vi puxar uma cadeira e sentar-se à mesa. Ainda coçava o olho de cara amassada. Sorri em sua direção ao desligar o fogo e pegar a frigideira.
— Bom dia — murmurei, servindo seu prato e voltando à pia para deixar os utensílios por lá. Ia me sentar na cadeira mais próxima, mas fui até ele quando o vi me chamar pela mão. — Dormiu bem?
— Como um bebê.
Me deixei cair sentada em suas coxas quando me puxou pra cima de si. Levei uma das mãos à sua nuca quando senti sua boca colar-se com a minha num beijo calmo.
— Sob os cuidados da melhor mãe do mundo — ele disse, e sorri abertamente contra seu rosto. — Ficou toda preocupadinha…
— Eu não acredito que encontrou uma brecha para se achar com isso, — ri, sendo acompanhada pelo safado de ego inflado. Apesar de estar achando graça naquele momento, só Tom sabia o estado que aquela ligação tinha me deixado. — Fiquei mesmo — meu sorriso se desfez só de lembrar. — Fico feliz que consegui ajudar mesmo de longe. Não consigo nem imaginar a ideia de te perder… — falei, tendo seus olhos me analisando por um milésimo de segundo. — Digo, de te perder. Ela já perdeu a mãe e eu não sei o que faria sozinha…
Não era exagero dizer aquilo, eu realmente não sabia. Depois de tantos atentados de Miguel, acho que conhecia bem aquela sensação, aquele receio todo de perder um parceiro. Éramos um time. nunca teve com quem contar além de nós, e naquele aspecto ela teve sorte. Eu sentia que e eu tínhamos muito em comum quando o assunto era amar e tudo o que construímos naqueles poucos meses.
— Até entendi o que fez por Dafne naquela noite.
Quando gostamos muito de alguém e essa pessoa está precisando de nós, tendemos a largar tudo para ajudar. Mas me doeu o coração perceber que não tinha pensado duas vezes antes de sair de casa depois da ligação dela. Fazer aquele paralelo com o que passamos ontem e o fato de ser eu quem tinha largado tudo para ir atrás dele me magoava.
— O que fiz por Dafne não tem nada a ver com o que aconteceu ontem, — sua mão percorreu meu tronco antes de se alojar em minha nuca, fazendo-me olhá-lo diretamente nos olhos. E eu o fiz, sentindo-me tonta ao me deparar com a certeza latente estampada neles. — Não se compare com Dafne. Já disse e repito quantas vezes forem necessárias, , eu não tenho nada com ela e nem pretendo ter. O que nós temos é…
Senti meu coração disparar. Comprimi os lábios em ansiedade.
— … Diferente, maior do que tudo o que eu possa ter tido com ela ou com outra mulher.
Por um segundo, pareci esquecer de como respirar. Puxei o ar que nem percebi que prendia, ainda zonza com aquela sensação indescritível de estar em seus braços, ali tão perto e ouvi-lo falar aquelas coisas… Beijei-o sem conseguir me conter, sem ao menos saber se era o momento apropriado para aquilo.
Uma onda de alívio percorreu todo o meu corpo, que, após aquele pico de adrenalina e quase entrar em combustão com aquelas palavras, estava passando pela fase de resfriamento. Quando eu tomava minha dose dele, acalmava meus nervos e hormônios que praticamente imploravam por .
Após ter a certeza de que Dafne talvez não fosse uma ameaça tão grande – ou odiando profundamente classificá-la assim, uma concorrente tão forte –, senti necessidade de deixá-lo saber de sua posição em minha vida. Ele merecia aquilo, já tinha quebrado a cabeça tempo demais comigo.
— Queria me desculpar pela briga de ontem…
respirou fundo, ponderando. Quase se negou a ouvir meu pedido de desculpas. Antes, brigávamos por meio de ofensas; hoje disputávamos pedidos de perdão.
— Desculpa por não ter falado nada e dado a entender que Anne está acima de você. Não está, desde muito tempo.
Lembrei-me daquela briga ridícula no aniversário dela e do modo como Anne jogou na minha cara que sabia que eu trocaria minhas amigas por e . Hoje vejo que ela não estava errada; eu já tinha feito aquela escolha inconscientemente. A vida passa e, com as mudanças, nós reavaliamos nossas prioridades.
E do dia em que nos casamos em diante, e eram as minhas principais.
— Você é importante pra mim, . Você é minha família agora — me esforcei para me expressar da melhor maneira que consegui. De bochechas queimando, vi minha fala surtir efeito quando um sorrisinho bobo tomou os lábios dele.
— E você a minha — tombou a testa sobre a minha. A família que sempre sonhei em ter e que merecia. — E eu faria qualquer coisa por essa família.
Fechei os olhos ao ouvir sua voz sussurrar aquela promessa.
— Qualquer coisa? — abri um dos olhos, sorrindo faceira. franziu o cenho sem entender. — Até ir ao shopping comigo comprar os presentes dos gêmeos da Victoria?
— Oh, eu esqueci completamente desse aniversário — ele levou a mão à testa. Não pude julgá-lo, eu estava na mesma. — Não podemos só procurar comédias na Netflix e passar o dia debaixo das cobertas? — escondeu o rosto na curva do meu pescoço, fazendo-me pensar naquela possibilidade por um segundo.
Seria tão bom, principalmente depois dos últimos acontecimentos. Porém, fazia muito tempo desde a última vez que estivemos reunidos com os vizinhos, e precisávamos nos socializar com eles para manter nossa farsa, embora fizéssemos aquilo muito bem sem a ajuda deles.
— Não, Victoria sempre foi incrível conosco. Não podemos fazer essa desfeita.
suspirou, derrotado. Sabia que eu tinha razão.
— Vamos, né? Não tem muito o que fazer, de qualquer forma — murmurou emburrado, provocando um riso meu.
Engraçado como era obediente, acatava tudo o que eu decidia. Quem diria que aquele homem truculento do passado estivesse só esperando alguém para domá-lo? Apesar daquele pensamento engraçado, sentia que e eu éramos muito bons em tomar decisões conjuntas. Desde que decidimos ficar com , fomos abrindo mão de nosso próprio querer para o bem dela.
O choro de ecoou pela casa, abafado pela distância e a porta de seu quarto. Me ofereci para ir pegá-la, descendo com a neném assim que troquei sua fralda suja. já terminava de comer e foi logo preparar a mamadeira da neném, que estava enjoada e sonolenta ainda, querendo ficar de pé a todo custo.
— Parece que hoje alguém está de mau humor — ele esticou o braço, fingindo pegar a chupeta cor-de-rosa da boca da bebê. Ri e neguei com a cabeça, sentindo seu corpinho se alinhar ao meu enquanto tinha a cabeça tombada em meu ombro.
— Essa semana vou levá-la para tomar vacina — choraminguei, relembrando da primeira vez desastrosa. Doía em mim ter que ver alguém furá-la daquele jeito.
— Quer que eu vá junto? — ele indagou, já fechando a mamadeira munida de leite. — Eu posso sair do trabalho…
— Não precisa, acho que consigo lidar com isso sozinha dessa vez — beijei o topo da cabeça dela, que agora sorria com a aproximação do pai bobão que tinha. cheirou seu pescoço e a fez soltar um gritinho enquanto se encolhia.
Ele era o remédio perfeito para o mau humor dela. Era impressionante a conexão que aqueles dois tinham. era a pessoa que arrancava sorrisos dela com uma facilidade incrível; o cheiro dele cessava qualquer choro de dor. No início, eu achava que sentiria ciúmes caso ela demonstrasse alguma preferência por ele, mas não conseguia ter outra reação a não ser admiração. Meu coração se enchia e se aquecia ao vê-los juntos. Eu me sentia privilegiada por poder participar daquela relação.
também me amava muito e eu sabia, sentia aquilo. Ela procurava meus braços quando estava cansada também, e era mais séria comigo por talvez perceber que eu era a figura que lhe diria não quando necessário. Era engraçado ter aquela percepção de um bebê tão pequeno, mas era apenas o que eu achava que era. Não me sentia diminuída por ser a segunda pessoa preferida dela. Era tão bom quanto ser a primeira, e, bom, não dava pra competir com e seus braços fortes e quentes.
Eu mesma caí nos encantos deles e sabia que não tinha escapatória.
Enquanto tomava banho, fiquei pensativa sobre o que tinha dito na cozinha no café da manhã. “Lidar com isso”. Acabei percebendo que eu fugia de algumas coisas que me assustavam pelo fato de não saber bem como agir diante delas. Coisas que poderiam fugir do meu controle. Eu simplesmente as evitava, fazia curvas, pegava atalhos ou mesmo escolhia caminhos mais longos só para não ter que, de fato, lidar com elas.
No caso das vacinas de , calhou que, devido ao nosso trabalho, Elisabeta levava a menina para as consultas e vacinas, mas por me conhecer tão bem, eu sabia que ainda haviam muitas outras coisas que eu evitava. Pensei em uma em específico que já estava adiando demais para resolver e cansada demais para continuar fugindo dela.
Deixei que tirasse o carro da garagem e, quando ele apertou o botão do portão automático, respirei o fundo e tirei o cinto de segurança.
— Vamos trocar — falei de uma vez, sentindo minhas mãos já trêmulas. me olhou surpreso, me perguntando se eu tinha certeza. Não, eu não tinha, mas tinha que ao menos tentar.
Desembarquei do carro, dei a volta pelo parachoque e cruzei com ele, que tinha tirado os óculos escuros do rosto.
— Você consegue — selou meus lábios, colocando os óculos com cuidado em mim. Assenti, acreditando naquelas palavras. É, eu conseguia. Não era um bicho de sete cabeças, afinal.
Durante o trajeto, o tal bicho se transformou em um animalzinho inofensivo, mas algumas vezes se multou em um verdadeiro monstro com muito mais do que só sete cabeças. O trânsito com suas buzinas me pressionando deixaram-me ansiosa e tremendo. Continuei deixando o carro morrer algumas vezes, mas me ajudou, pegando em minha coxa e tentando me acalmar enquanto me auxiliava sobre o que fazer. Mesmo que algumas vezes fosse apenas respirar.
Chegamos ao shopping inteiros no fim das contas, e o carro estava incluso naquilo. Eu não sabia do que tinha mais medo: sofrer um acidente com ali ou dar um arranhadinho sequer na lataria do veículo que tratava como um filho. Estava impressionada com a confiança que ele demonstrou ter em mim ao me dar o carro com tanta boa vontade.
Compramos os presentes dos gêmeos e não resistimos ao ver algumas roupinhas para , mesmo sabendo que ela já tinha muita coisa, a ponto de termos que doar as que já não serviam mais para ter espaço. Ficava tão feliz em vê-la tendo tudo o que precisava conosco. Às vezes me frustrava saber que ela ainda não era nossa por inteiro e que a justiça precisava de mais provas para entender que éramos nós os pais dela, que a nossa casa era o lugar em que ela deveria crescer.
Paramos num quiosque para tomar um sorvete e aproveitar o sol que fazia na praça de alimentação do shopping a céu aberto. Eu nunca entenderia qual era a lógica de fazer um shopping daqueles. Quando estava ensolarado era lindo, porém, quando chovia, chovia dentro dele também e aí era um caos.
— Cadê sua aliança? — perguntou e franzi o cenho, largando a colher do sorvete ao notar a falta do metal em meu dedo anelar.
Peguei minha bolsa no suporte do carrinho de , que tinha usado na noite passada e me lembrava de ter guardado ali dentro, num dos bolsos internos. Enfiei a mão em todos, sentindo o desespero me tomar ao não encontrá-la em lugar nenhum.
— Acho que perdi — levei a mão à cabeça. Ela tinha sido bem cara, assim como tudo naquela cerimônia. iria me matar. — Tirei ela dentro do Uber.
Ele negou com a cabeça e eu entendi que já era. O motorista não iria devolver. Se fosse esperto, provavelmente mentiria caso fosse procurado.
— Não acredito que isso aconteceu… Me desculpa — arquejei, vermelha em constrangimento.
— Está tudo bem, . Eu só perguntei porque… porque você sempre está com ela, achei estranho.
Suspirei ao vê-lo agir na defensiva. Não era um comportamento frequente nele.
— Quer ir na joalheria? — ele propôs, e eu me remexi incomodada na cadeira, apoiando meu queixo em minha mão.
Tinha acabado de ser demitida e pretendia guardar o dinheiro que receberia para gastá-lo aos poucos, e não ficar dependendo de . Mas era bem capaz de aquela aliança valer duas vezes mais que a quantia que eu tinha recebido de rescisão. Sabia que não me deixaria pagar de qualquer forma, justamente por não querer depender dele.
Fiquei calada, pensando numa saída para aquele problema. Eu poderia sair por aí sem aliança, não? Continuava casada, aquele era apenas um detalhe bobo. Encarei minha mão sem nada, movi meu polegar pela lateral do dedo anelar e senti falta dela. Tinha me acostumado a tê-la ali sempre, até me surpreendeu o fato de eu não ter percebido sua ausência.
— Vamos lá, hum? — ele beijou meu pescoço exposto pelo meu cabelo preso. — Quer que eu me ajoelhe também para te pedir em casamento de novo? — sussurrou ao pé do meu ouvido. — Eu fico de joelhos pra você a hora que me pedir.
Ri, encolhendo os ombros. sempre apelava quando via que estava prestes a levar um “não” meu.
— Está romântico demais, ainda está sob o efeito do remédio?
Ele se afastou um pouco, revirando os olhos com um sorrisinho lutando para aparecer.
— Se lembra do que me disse ontem?
— Me lembro pouco de ontem depois que comecei a passar mal — comentou com o olhar longe. Imaginei como deveria ser ruim para ele pensar no assunto, o quão assustador foi se ver sozinho numa situação daquelas. — Lembro de você chegando, com seu vestido amassado… — riu fraco, sem humor. Então, desviei meus olhos dos dele. Se pudesse escolher, o faria não se lembrar daquela parte. — Do cheiro da sua pele quando saiu do banho… De ter falado que queria dormir com você… e de fato dormir.
— Você disse que me ama.
Seus olhos verdes se arregalaram. Fiquei em silêncio, tentando não criar expectativa. Afinal, aquele “eu te amo” não tinha saído de , e sim das substâncias contidas no remédio para fazê-lo dormir.
Neguei com a cabeça, rindo de sua cara de assustado. Realmente, era algo bem sério, do tipo que não falava para nenhuma outra além de . E mesmo que ele realmente tivesse me falado aquilo sóbrio, eu não sabia o que pensar sobre… Aquela era a única coisa que me assustava e me fazia não querer parar de fugir.
— Eu devia ter gravado — gargalhei daquela vez com sua cara de ofendido.
— E ficar rindo da minha cara num momento de fragilidade meu? — ele se levantou, apenas atiçando mais minha risada.
Não sabia se estava realmente bravo, mas foi divertido relembrar nossos velhos tempos de picuinhas. Saí da mesa ainda risonha, alcancei seu corpo quente e enlacei seus ombros com meus braços.
— Muito engraçado — ele ralhou, ainda sem me tocar. — , se você gravou…
— Me desculpa, é que você estava tão bonitinho ontem, dormindo feito um bebê.
“Falando todas aquelas coisas”, acrescentei na minha cabeça. Com certeza não estava em plenas faculdades mentais.
— Eu não gravei nadinha, juro — dei-lhe um selinho casto, tendo suas mãos pegando-me pelos quadris quando cedeu e parou de birra.
Encarei-o após terminarmos o beijo. Por que tinha ficado tão incomodado com uma possível gravação? Eu sabia que tinha sido da boca pra fora, mas éramos amigos, certo? Uma família, como dito mais cedo. E nós amamos nossa família e amigos, não?
Me perguntei se gostava mesmo de mim ou se ele gostava do que eu representava naquela história: a mãe da filha dele. E quando o divórcio saísse? Ele se afastaria e passaríamos a ser estranhos? Eu seria a mulher que lhe entregaria nos fins de semana quando ele ficaria responsável por cuidar dela com outra mulher ao seu lado?
Baixei a cabeça, sentindo meus braços deslizarem por seus ombros e deixarem seu corpo aos poucos.
— O que foi? — ele ergueu meu rosto e buscou meus olhos, pegando em meu queixo. Neguei com a cabeça, desdenhando. insistiu e beijou minha boca, como se assim pudesse me fazer falar o que tinha em minha cabeça.
— ? ?
Nos afastamos num pulo ao ouvir aquela voz familiar. Engoli em seco ao me deparar com Amélia nos encarando sorridente.
Sorridente demais.
— Quanto tempo! — ri nervosa, sentindo a mão de me apertar a cintura duas vezes. Ele também sentia a sensação de ser pego no flagra? — Como vai?
Seus olhos azuis ainda alternavam entre e eu com desconfiança. Demorei para notar o homem ao seu lado e de uma criança com um dinossauro, digo, cachorro na coleira.
— Vou bem, e pelo visto os dois também — a loira riu e arqueou as sobrancelhas, sugestiva. — Amor, esses são os . São meus clientes e estão disputando a guarda dessa bonequinha aqui — inclinou-se sobre o carrinho e afagou a barriguinha de .
— Prazer, Roger — o homem cumprimentou, e retribuí seu aperto de mãos. — Já ouvi falar vagamente de vocês algumas vezes.
— Esses são Benjamim e Derik — Amélia os apresentou, fazendo-me encará-los sem entender quem era quem.
— Eu sou o Ben — o garoto que devia ter seus dez anos explicou, sorrindo amarelo, provavelmente acostumado a ter que esclarecer para não ser confundido com o cachorro com nome de gente.
O cachorro de pelagem escura vagou curioso pelos pés dos donos e se aproximou do carrinho de bebê, passando o focinho nos pezinhos de . Me assustei quando ele se animou e, de rabo balançando, ficou de pé nas patas traseiras.
— Derik! — Roger repreendeu, puxando-o para perto pela guia. — Desculpe por isso. Eu disse que ele estava ficando agitado — alfinetou a esposa, rindo.
— Nós já vamos, querido — Amélia decretou, vendo o filho tentar distrair o cachorro. — Foi bom ver vocês. Temos que marcar algo para que eu possa ser atualizada dos últimos acontecimentos.
Primeiro eu tinha que ser atualizada também, porque não tinha nada para contar de novo. e eu assentimos ainda sem fala; fomos pegos completamente desprevenidos.
— Tchau, , — ela nos deu beijos na bochecha. — Tchau, — voltou a acariciar seu corpinho, que se agitou com o carinho.
Ainda paralisados, vimos a família ir embora. ainda me segurava pela cintura, descontando o nervosismo do momento. Nos encaramos ainda calados, e eu acabei soltando uma risada desacreditada. Éramos realmente péssimos em guardar segredos.
Primeiro Tom, agora Amélia. O receio de mais alguém ficar sabendo me tomou, não somente pelas minhas amigas descobrirem, mas também por saber que estávamos muito bem com aquele segredo. Se ninguém soubesse de nós, teríamos um pouco de paz pelo menos enquanto estivéssemos juntos e a sós.
— A culpa é sua — lhe bati de leve com minha bolsa pequena. ofegou, ultrajado. — Fica me beijando em público — prendi o riso, destravando as rodinhas do carrinho.
— Eu sou seu marido, é pra isso que eu sirvo — abraçou-me por trás, fazendo-me rir.
Nos restava rir daquela situação. Não tínhamos ideia do que falaríamos para ela.
(...)
Borrifei o perfume em meu pescoço com me apressando, como sempre. Revirei os olhos em implicância ao vê-lo sentado na cama com a bebê já arrumadinha no colo. Pior que eu nem tinha desculpas daquela vez, ele mesmo tinha dado banho e vestido . Me enrolei com meu cabelo e, com toda a hidratação que tentei fazer nele, acabei perdendo a hora.
Quando chegamos na festa, ela já tinha começado. Era de se esperar que a decoração fosse exagerada, mas Victoria tinha passado dos limites um pouco. O jardim de sua casa parecia um parque de diversões, repleto de tantas crianças que eu nem sabia que existiam naquele condomínio. Os heróis da Liga da Justiça estavam presentes em todo canto, inclusive nas roupas dos pequenos que corriam fantasiados pra lá e pra cá.
Fiz o que sempre fazia com em nossas aparições em público e me juntei às mulheres de sempre. Megan não tinha perdido o costume de elogiá-lo demais, mesmo que estivesse na minha frente, falando o quanto ele estava mais bonito com os braços mais definidos. Ri dela sem conseguir ser discreta; não estava mais sequer praticando suas corridas matinais, quem dirá indo à academia. O único exercício físico que ele andava fazendo era sexo em excesso, o que, tratando-se dele – que tinha duas mulheres para praticar –, talvez realmente desse aquele resultado de academia.
Fora aquelas inconveniências corriqueiras, eu estava me sentindo bem ali. No início, me preocupei muito sobre como iria me habituar a viver no meio de pessoas tão diferentes de mim. Apesar do tempo que não nos reunimos, aprendi a lidar com cada uma das vizinhas e suas particularidades, que tipo de assuntos evitar e até como manter as aparências do meu casamento intactas.
Antes eu me esforçava para elogiar , chegava a até ser algo físico. Era difícil segurar o riso quando eu falava sobre ser um marido muito bom e um pai incrível, porque nunca tive aquela imagem dele. Mas agora estava fácil, eu fazia isso e nem percebia. Até porque ele era realmente tudo o que menti no passado, surpreendendo até eu mesma sobre como a vida poderia ser engraçada.
’s point of view.
Troquei em um dos quartos de hóspedes que o marido de Victoria me cedeu e voltei para meu canto de sempre. O assunto agora era Fórmula 1 e eu não era habituado a ver corridas, então apenas fiquei calado, ouvindo os caras animados falarem sobre a última competição e suas expectativas para as próximas.
Não era muito difícil me encaixar no meio deles. Não eram muito diferentes dos amigos do meu pai, que cresci no meio, ou até mesmo do meu círculo de amizades. talvez tenha encontrado mais dificuldades em se camuflar no meio das mulheres de classe alta, mas ao que parecia, tinha dado seu jeito para se enturmar. Não sabia o que elas tanto falavam, mas toda vez que colocava meus olhos nela, a via acompanhada de alguém rindo. Minha esposa era esperta, tinha encontrado um jeito de lidar com as diferenças que deveriam atrapalhá-la. Fora que era engraçada e inteligente, não tinha como não prestar atenção nela.
Dei um gole em minha cerveja e a encarei de longe. Reparei desde seus cabelos loiros e brilhantes com o reflexo da luz do sol até seu corpo delineado pelo vestido que ela usava. Seus olhos azuis repararam em mim, como se soubessem que tinha alguém a observando. Sua testa franziu, estranhando minha atenção sobre ela, e, movendo os lábios, perguntou se eu queria lhe dar a bebê, mas neguei, ajeitando em meu braço. Ela se dispersou e voltou a prestar atenção em Victoria, que falava animadamente sobre algo a ver com a decoração da festa.
dormiu em meus braços e a deixei no mesmo quarto de antes, com a porta fechada e longe da barulheira da festa. Quando voltei, os caras já tinham se dispersado. Alguns deles estavam sentados com as respectivas esposas, então fui fazer o mesmo, aproveitando que a neném tinha dormido e que poderia namorar um pouco sem interrupções.
Nossa filha fazia sucesso entre os vizinhos. Sempre queriam pegá-la para ficar um pouquinho em eventos; nós que tínhamos medo de incomodar e ficávamos com ela. Porém, já que estava segura e dormindo seu soninho da tarde, não precisávamos nos preocupar com aquele detalhe.
Quase derrubei minha garrafa quando avistei de longe, acompanhada por Tom próximo da mesa de doces. Ele estava perto de seu corpo, muito perto. Tão perto que arriscou uma vez ou outra lhe falar algo ao pé do ouvido – isso enquanto eu estava olhando. Imaginei o que não fez antes que eu os percebesse ali. , como sempre, tentava se esquivar de maneira educada, coisa que eu já tinha lhe dito que Tom se aproveitava.
Meu sangue ferveu quando vi sua mão cobrindo a dela quando apanhou um cupcake para si. Respirei fundo e olhei em volta para ver se alguém mais os observava. Ou pior, se algum convidado da festa notava minha face vermelha de raiva, porque eu sentia minhas bochechas queimarem enquanto assistia a cena. Se na noite anterior vê-la sair e imaginar tudo o que eles poderiam fazer juntos já me doeu, imagine ali, vendo-os em ação. Eu sentia palpitações dentro do peito, ficava difícil até de respirar.
Controlei meus instintos e me mantive à distância. Eles, na verdade, me mandavam ir até lá e tirá-la de perto de Tom, mas eu não faria aquilo. Primeiro pelas aparências, porque eu não poderia bancar o marido ciumento, sendo que, para todos os efeitos, nosso casamento era perfeito. E também porque… porque eu não deveria estar sentindo aquilo… aquela dor no peito, a vontade de afastá-los, de tê-la para mim e mais ninguém.
Respirei fundo, fechando os olhos ao decifrar todos aqueles sintomas e chegar à conclusão que tanto me amedrontava: eu estava com ciúmes. Morto de ciúmes. Nunca tinha me sentido daquela forma antes. Era tão passional que eu preferia guardar para mim. Tão vexatório diante da nossa situação que aquilo deveria ser mantido em segredo junto de tudo o que me causava desde que nos casamos.
Me sentia tão idiota. Sentia aquilo me sufocar desde a noite passada, sabendo que provavelmente não sentia o mesmo por mim quando era a minha vez de ter algo com outra pessoa fora daquele casamento. Tudo bem, não ia com a cara de Dafne, mas não era ciúme, ela apenas se comparava com ela. Eu não, não me comparava a Tom. Eu era o completo oposto dele, e estava puto da vida justamente por aquilo. Dormian era tudo o que sempre sonhou para si, e agora que ela o tinha nas mãos, iria se deleitar à vontade enquanto eu não queria dividi-la com mais ninguém.
Pior, eu não tinha que querer. Não tinha direito sequer de contestar suas decisões. era livre, mesmo que se recusasse a acreditar. Ela não me respondeu quando a pedi para prometer que não deixaria Tom tocá-la do jeito que eu tocava. E eu sabia que estava sendo egoísta, um tremendo filho da puta. Não deveria pedir nada a .
E vê-la deixá-lo se aproximar daquele jeito respondeu aquilo para mim: e Tom deviam ter feito muito mais na noite passada. A familiaridade com que ela encarava o fato de Dormian estar pegando em seu rosto para limpar o canto de sua boca sujo de glacê azul fez meu estômago revirar.
Ao longe, vi Megan sair da mesa que estava e ir em direção ao gramado. Sabia que poderia estar indo atrás dos filhos que ainda corriam pra lá e pra cá, mas fiquei com medo de que ela colocasse seus olhos maldosos em cima do Casal 20 e percebesse o que estava rolando ali. Não era muito difícil de adivinhar, dado ao grau de intimidade que pareciam ter.
— As praias em Malibu são lindas, você vai adorar conhecer, …
Não pude evitar de franzir o cenho ao me aproximar para arrancá-la das garras daquele velho e ouvi-lo fazer planos de viajar com ela.
— Agora que não está trabalhando mais, poderíamos…
Só de pensar nos dois juntos como estivemos em Tulum, na praia, de roupas de banho, no verão, exatamente igual onde transamos pela primeira vez… Respirei fundo antes de interromper aquela palhaçada:
— Sabe que não pode simplesmente sumir por dias, não sabe?
Além de estar quase agarrando minha esposa na frente de todo mundo, ainda queria atrapalhar mais ainda nossa farsa e levantar suspeitas de um divórcio? Ele era fã ou hater?
Às vezes eu tinha a impressão de que Dormian iria adorar caso fôssemos pegos na mentira, assim o caminho ficaria livre para ele. Felizmente só aconteceria em sua cabeça, porque o odiaria pro resto da vida caso Tom fizesse algo para prejudicar nosso processo de adoção de .
— Me deixe adivinhar. Ela tem que ficar em casa cuidando da criança, esperando você voltar do trabalho e preparando seu jantar.
Arregalei meus olhos, segurando meu punho cerrado. Eu jurava que lhe daria um soco muito bem dado. Nunca enxerguei daquela forma, como se me servisse de alguma maneira. Nós dois dividíamos e muito bem as tarefas em casa. Tom mais uma vez estava querendo arranjar algo para me fazer ficar mal diante de .
— Parem já vocês dois, daqui a pouco vão olhar e perceber — a loira se colocou entre nós. — Assim como na viagem de fim de ano, vou recusar o convite. e eu temos um compromisso com a guarda de .
Sim, nós três tínhamos um compromisso, coisa que ele não teria com ela tão cedo.
— Tudo bem, . Quando o seu divórcio sair, te levo para onde você quiser quando for a vez de ficar com .
Ri com sarcasmo, sentindo no fundo uma pontada no peito ao saber que não conseguiria impedir aquilo também.
— Mas você viaja quando?
— Opa! Vai viajar, Dormian? Que notícia maravilhosa! — dei-lhe um tapinha no ombro, sem conseguir esconder o sorriso aberto que ocupava meu rosto. Finalmente iria me livrar daquele encosto centenário.
— Depois de amanhã. Inicialmente, é apenas um congresso.
Continuei a sorrir, torcendo para que fosse algo permanente e que Tom tivesse comprado a passagem só de ida.
— Não demoro a voltar, e claro que pode me ligar sempre que precisar de mim — ele pegou a mão dela pra si, fazendo-a concordar veementemente com a cabeça.
— Ela não vai — agarrei sua cintura, puxando-a para mim.
— Não tenha tanta certeza, . Nunca se sabe quando você vai estar ocupado com a tal Dafne…
Encarei , possesso. Por acaso ela estava dando munição para que Dormian pudesse me atacar?
Segurei o choro que veio anunciado por aquelas lágrimas solitárias até metade do trajeto, conseguindo controlar a situação do meu coração. Eu podia senti-lo rachando. Eu tentava segurá-lo com uma das mãos enquanto a outra falhava em tentar remendá-lo. Era pura bobagem. Eu não devia estar tão magoada com o que saiu da minha própria boca, ainda mais para !
Os olhos dele… Os meus marejavam só de lembrar do modo como o deixei. Eu não era boa em demonstrar, mas era alguém transparente, principalmente em seus gestos. Vi em seu rosto o efeito de minhas palavras e me arrependi de tê-las dito. Independente de qualquer coisa, da sua posição em minha vida, eu nunca magoaria alguém intencionalmente.
Não conscientemente, claro. Talvez eu quisesse, no fundo, atingi-lo de alguma forma, fazê-lo sentir o que eu sentia.
Não sabia como ele se sentia quando saía para se encontrar com Dafne, se sentia-se errado ou estranho como eu estava me sentindo naquele momento. Era uma sensação tão ruim, como se eu o estivesse traindo, como se tudo aquilo que vivemos desde nossa subida ao altar fosse real.
Desembarquei e fui direto para o banheiro do restaurante que marquei de me encontrar com Tom. Era caro como esperado, e percebi aquilo no instante em que pisei os pés na calçada e vi a fachada imponente.
Tentei retocar a maquiagem de meus olhos e o corretivo debaixo deles. Consegui disfarçar meu choro superficialmente; porém, por dentro, ainda sentia a garganta trancada e meu estômago se revirando. Meus olhos ainda estavam um pouco vermelhos e se encheram de lágrimas quando me encarei no espelho e apoiei-me na pia de mármore, respirando fundo e decidindo deixar da porta para fora.
Era o meu momento de me divertir. Eu não poderia ficar com a cabeça avoada, pensando no que ele devia estar fazendo em casa sem mim, ou me imaginando lá com ele e em meu colo, brincando na cozinha enquanto jantávamos.
— Você faz parecer tão fácil — sussurrei sozinha, pensando em qual seria o truque de para sair com Dafne e voltar pra casa como se nada tivesse acontecido.
Ele tomava um banho, apagava as digitais e todos os rastros de beijos que recebia pelo corpo, jogava as roupas usadas e cheias de perfume de outra mulher no cesto e trocava por limpas. Voltava para mim como se nunca tivesse ido. Me beijava como sempre, me fazia sentir sua mulher e entrava no nosso teatro sendo o marido exemplar que foi escalado para ser.
Deixei o banheiro ainda com a sensação de que todos estavam me olhando e julgando. Até cheguei a checar se minha aliança estava em meu dedo por pura paranoia, já que eu sabia que a tinha tirado e colocado na bolsa ainda dentro do Uber.
Me acalmei quando avistei Tom já sentado, concentrado no celular e olhando em volta, distraído. Até que seus olhos azuis me encontraram em meio às mesas ocupadas e seu sorriso se abriu completamente. Lhe sorri de volta, percebendo o modo como seu olhar brilhava ao me assistir andar até ele. Eu sentia minhas bochechas esquentarem, e tinha certeza que estava vermelha e sem graça. Tom me deixava daquele jeito desde o primeiro momento em que conversamos, quando ele nem me conhecia ainda. Demonstrou interesse antes mesmo de de repente querer ficar comigo, provavelmente por conta da facilidade de já me ter ali, dividindo o mesmo teto.
Sentei-me e me esforcei para lembrar do sentimento que tive por Dormian quando o vi pela primeira vez na casa de Megan. Eu queria desesperadamente poder voltar a sentir o frio na barriga de antes, porque apesar de estar tão lindo quanto à primeira vista, muita coisa mudou desde então. Ele se mostrou um pouco possessivo e implicava com depois que descobriu da nossa farsa, como se aquilo lhe desse algum aval para tal. Além do mais, supriu grande parte da minha carência. Eu não podia negar que era muito bem servida em casa. Não daria para negar que, para mim, também era mais fácil transar, dormir abraçada ao homem com quem me casei, mesmo que de mentira.
— Está linda.
Comprimi os lábios, esperando pelo arrepio ou algo que sinalizasse que meu corpo o correspondia de alguma forma, porém não houve nada. Não como foi com , que me tomou em seus braços e me olhou no fundo dos olhos ao me dizer a mesma coisa naquela mesma noite. Eu realmente me senti linda, meu coração se acelerou de imediato.
Se acelerava só de lembrar do som da sua voz rouca.
— Obrigada, Tom, você também está lindo.
Não menti, não havia como. Ainda não conseguia compreender o que tinha acontecido com o tesão e a atração que algum dia já senti por ele. Era como se tivessem me lançado um feitiço: Tom era um homem extremamente atraente, era exatamente o meu tipo, o homem dos meus sonhos, mas ele parecia tão comum aos meus olhos.
Se estivessem ali, Fanny e Anne iriam me socar a cara.
— Estava te esperando para pedir, não sei o que você gosta.
Concordei, apanhando o cardápio que me foi estendido. E ele não sabia mesmo. Se soubesse, não me levaria a um restaurante tão caro. Espiei as mesas ao meu redor e notei que os pratos ali não deviam matar a fome de ninguém, apesar dos preços absurdos. não me levaria a um lugar daqueles. Quis rir em desgosto ao pensar numa piada que envolvia o fato de que meu marido nunca tinha me levado para jantar, porque sabia que eu não curtia restaurantes granfinos como aquele.
A graça toda se dissipou quando me lembrei de que ele não era meu marido de verdade, e que aquela não era a razão por eu não ser levada para sair.
— Tudo bem. Não teria como você saber, de qualquer forma — ponderei, e era verdade. Eu não deveria e nem poderia esperar nada daquilo de Tom. Apesar dos nossos flertes passados, ainda poderíamos nos considerar desconhecidos.
— Mas eu quero saber mais sobre você, te conhecer mais, saber do que gosta, do que não gosta… — sua mão alcançou a minha sobre a mesa, fazendo-me respirar fundo, ligeiramente nervosa.
Fazia tempo que eu não sentia a sensação de ser cortejada. Nossa, eu parecia as mulheres do século passado pensando naquela palavra. Não sabia se lembrava ao certo como reagir a interações como aquela. Conhecer alguém do zero depois de alguns meses vivendo uma vida de casados com parecia ser algo extremamente entediante para mim.
Ter que dosar o que falaria para não assustá-lo ou entretê-lo para que ele não me achasse sem graça… Ter que parecer bonita até quando fôssemos acordar juntos, vestir uma lingerie combinando sempre que saíssemos ou me privar de demonstrar muitas emoções para esconder o jogo no início… Eu não fazia aquilo desde que me casei. Não era preciso. Eu não tinha o objetivo de fazer se apaixonar por mim e nem conseguiria caso tentasse. me conhecia há anos, sabia o que eu gostava e o que não, e tudo o que ele não conhecia de mim até então foi decifrado de maneiras tão naturais que eu nem sabia se era capaz de pontuar quando aconteceram tais descobertas.
Era tudo tão fácil quando não estávamos tentando tanto fazer dar certo. Tudo se encaixava tão bem e fluía como se simplesmente fosse para ser daquele jeito.
— Obrigada por aceitar meu convite, sei que sua agenda deve ser muito lotada — agradeci e Tom soltou uma risadinha, fazendo-me sorrir junto. — Eu realmente precisava sair um pouco para me distrair.
— O que houve? — ele franziu a testa. Tentei me desprender daquele estigma de primeiro encontro e ser eu mesma, ver se Dormian iria mesmo gostar de mim e não da ideia da que ele achava conhecer. Afinal de contas, fomos apresentados em meio a uma bagunça e muita, muita mentira. — anda te enchendo muito a paciência ultimamente?
A paciência, por incrível que pudesse parecer, ele não estava afetando. Eram outras áreas da minha cabeça que eu ainda estava tentando compreender seu poder sobre elas e o que todos os sentimentos que ele me causava significavam.
— Não, com eu já aprendi a lidar, faço isso há muitos anos — menti. Eu não sabia, achei algum dia que iria saber, mas já era tudo novo para nós dois. Então, tudo o que aconteceu no passado não importava muito entre nós. — Meu problema mesmo é o trabalho, ou a falta dele, pelo menos.
Tom esboçou surpresa. Acho que pior que ser uma garçonete era ser desempregada. Já imaginei que ele desistiria ali.
— Oh, eu não sabia, ! Que pena.
O garçom finalmente trouxe os pratos, porém não senti meu apetite aguçar ao reparar na comida exageradamente arrumada ali.
— Bom, pelo menos agora você poderá cuidar de , não é?
— É, isso era para ser uma coisa ótima, e é, não me entenda mal — peguei os talheres, tentando organizar meus pensamentos. Tive medo de ser julgada por falar aquilo em voz alta.
Eu amava , não havia espaço para dúvidas ali, mas minha vida agora girava em torno dela e eu tinha medo daquilo me diminuir como mulher. Quero dizer, além de mãe, eu era uma mulher também. Queria sair com minhas amigas de vez em quando, ter uma profissão. Não queria ficar o dia trancafiada em casa, mesmo que aquele fosse o lugar mais aconchegante do universo e que fosse a minha pessoa predileta no mundo todinho. No fim do dia, eu ainda precisava me sentir um pouco mais… eu. Ficar sozinha por um tempo, ou me ocupar com alguma coisa diferente.
— Mas toda essa coisa de virar dona de casa e ser sustentada pelo marido… — continuei. “Sustentada”, desde que ouvi aquelas palavras de Joseph, sentia aquela em especial pesar em minhas costas.
— Ele joga alguma coisa na sua cara? — seu tom de voz afetado denunciou sua raiva crescente.
Neguei de imediato, tinha me esquecido de me policiar quando fosse falar sobre para Tom. Ele sempre o via de uma maneira exageradamente errada. Não dava para julgá-lo naquele aspecto, eu mesma já fui a pessoa que interpretava cada respirar de como algo negativo e também já insinuei que tinha me destratado na confusão do ano novo em Tulum.
— Isso não é sobre , é sobre mim. Eu não gosto de depender de ninguém.
Tom me ofereceu um pouco de vinho branco. Eu não gostava, mas achava que talvez fosse uma boa ideia ter um pouco de álcool na corrente sanguínea para me ajudar a me soltar mais. Afinal, eu não estava ali obrigada. Eu tinha o chamado para sair, não devia e nem iria estragar tudo sendo indiferente. Como disse a mim mesma antes de ir até aquela mesa, tentaria me divertir.
— Bom, se quiser, posso ver se tem algo no hospital onde trabalho. Talvez remanejar minha secretária para de repente abrir uma vaga… — ele sugeriu, mas neguei com a cabeça, rindo do jeito nada sugestivo que Tom falava. — Imagine, uma secretária linda dessas, eu iria trabalhar muito mais feliz.
— Bobo — murmurei, risonha.
— Tudo bem, sem ser minha secretária — ele revirou os olhos teatralmente. — Mas então em outra área, falo sério. Caso queira ajuda com isso, acho que posso fazer algo por você.
Fiz o que Tom me disse e imaginei, por um instante, caso eu conseguisse trabalhar assim tão perto dele. Pensei também na possibilidade de conviver com Tom, sair mais vezes com ele e levar aquilo para um outro nível se continuássemos daquela forma, juntos até o fim dos oito meses que faltavam.
E se ele gostasse de e quisesse algo mais sério comigo? Como seria a vida ao lado de Dormian? Acordar ao lado dele, sair para jantar vez ou outra… ficar em casa sozinha enquanto ele viajava para congressos médicos, esperando-o voltar tarde da noite porque, como um verdadeiro super-herói de quadrinhos, Tom precisou vestir seu uniforme e operar algum coração a beira de parar as batidas?
Acho que descobri o motivo de ele estar solteiro até agora. Aquela pergunta martelou em minha cabeça na noite em que nos conhecemos naquele jantar.
Não era algo que eu queria para mim. Eu queria um homem que pudesse estar presente, e precisaria daquilo também. Talvez insistir em Dormian fosse uma perda de tempo, mas ao menos poderia funcionar enquanto eu estivesse naquele acordo com .
— Muito obrigada. Sei que posso contar com você sempre que precisar — suspirei e o vi sorrir, solícito. — Mas você já fez muito por mim, Tom, eu já nem sei mais como agradecer.
— Já está fazendo, . Me dar a oportunidade de sair com você, sozinhos, sem o atrapalhando e tentando ficar entre nós…
— Podemos não falar sobre ele? — o interrompi. Já não bastava todas as milhares de vezes que passou pela minha cabeça somente naquele pouco espaço tempo em que deixei minha casa.
— Tudo bem, como quiser — ele concordou, fazendo-me forçar um sorriso. — Mas antes de focarmos em nós dois, primeiro me responda uma coisa?
Concordei, já me sentindo nervosa de novo.
— O que há entre você e ?
Respirei fundo e desviei o olhar. Minhas mãos, que seguravam os talheres, os soltaram no prato, começando a suar.
— — respondi simplesmente. — Sei que naquele dia você teve a impressão errada sobre nós, com toda aquela história de dormimos juntos, mas não é o que estava pensando. e eu não temos nada além de sexo casual, e nem pretendemos ter. Ele tem alguém, uma… amante. Tenho quase certeza que vai assumi-la quando esse casamento falso acabar — engoli em seco, dando um grande gole no vinho.
Apesar daquela ideia passar pela minha cabeça e ser realmente uma possibilidade, ainda era algo que me embrulhava o estômago e que eu evitava pensar. Não queria sofrer por antecedência. Sabia que quem ficasse ou deixasse de ficar jamais seria da minha conta, mas ainda assim tinha ciência de que teria que conviver com a mulher escolhida por causa da família que constituímos junto de .
— Amante — Tom arqueou as sobrancelhas, rindo fraco. Franzi o cenho, não entendendo onde estava a graça. — Me desculpe, , mas não sei se acredito em você — disse, e abri a boca para tentar responder, mas ele foi mais rápido. — Ok, vocês claramente se casaram por uma farsa, mas por que então chama a mulher que está dormindo com de amante se vocês não têm nada? A sua voz, o modo como fica nervosa ao falar sobre ela… Já vi isso antes, . E foi em , quando tentei por várias vezes me aproximar de você.
— Não me venha com esse papo de ciúmes agora, Tom, por favor — apoiei o cotovelo sobre a mesa, massageando minha têmpora. Estava cansada daquele assunto, daquele fruto da imaginação fértil alheia.
— Não vai doer se admitir, . Aliás, vocês dois precisam disso, parar de fingir que não há nada aí, sendo que está claro como o dia que tem algo acontecendo!
Ri sem humor, sentindo-me trêmula em puro descontrole. Meu coração se acelerou de repente. Senti o rosto queimando, tendo certeza que estava vermelha.
— Se não quiser ter nada sério comigo agora por isso, tudo bem, sou paciente. Consigo me contentar com pouco. Ainda é melhor que nada, não é?
— Tom, eu…
— Está tudo bem, , sei que deve estar confusa. Eu só quero te pedir, por favor, me deixe ao menos tentar conquistá-la?
— É o que estou fazendo agora — encolhi os ombros, sorrindo sem graça. Tom assentiu, levando mais uma garfada à boca. Aproveitei que estava ocupado para tentar lhe dar uma réplica à acusação de mentir sobre o que acontecia entre e eu. — É como eu já disse anteriormente, e eu só estamos aproveitando a praticidade de transar sem precisar sair de casa — dei de ombros, desdenhando. Senti-me culpada no mesmo instante, porque desdenhar do que fazíamos na cama era quase que um crime, de tão bom que era.
— Pelo que estou vendo, seu histórico com deve te atrapalhar de assumir até mesmo para si mesma.
Suspirei diante de sua insistência no assunto. Céus, eu odiava quando queriam colocar palavras em minha boca ou rótulos em meus sentimentos. Quem sentia era eu, portanto, era a única que poderia interpretá-los! Ok, talvez eu tivesse um pouco de dificuldades naquele trabalho, mas não me recordava de ter pedido ajuda de Tom para aquilo.
— O que sente em relação a ele, ? — sua voz me despertou de meus devaneios.
— Nada do que está pensando, Tom — arqueei a sobrancelha, irritadiça. Ele continuava ali, rindo de mim como se eu fosse uma comediante apresentando um show de stand up. — e eu nos odiávamos a vida inteira praticamente. Passamos a morar juntos há apenas quatro meses, temos muita química na cama, passamos a ser amigos por , e sobre eu não gostar de Dafne…
— Vamos mudar a pergunta, então. Por que não gosta de Dafne?
Mordi o lábio e segurei um xingamento, o que apenas o divertiu mais.
— Perdão, da amante do seu marido de mentira.
— Isso não tem graça — agarrei o guardanapo branco e fiz menção de sair da mesa quando o loiro à minha frente debochou, rindo de sua última frase dita.
— Me desculpe, , não é minha intenção rir de você — ele se apressou a me impedir de me levantar. Suspirei, ajeitando minha cadeira de volta no lugar. — É que é uma situação muito boba. Vocês são adultos, jovens, mas já tem uma filha para criar e continuam repetindo comportamentos adolescentes.
Arfei, ofendida. Adolescente era a put… Freei meus pensamentos sobre a mãe dele. Ela já deveria ser uma senhora de bastante idade, ou até poderia não estar mais entre nós àquela altura. Não merecia ser xingada pela inconveniência do filho. — Responda minha pergunta? — ele sorriu e deitou a cabeça para o lado, o que lhe deu uma aparência fofa.
Suspirei, derrotada. Se Tom queria falar sobre aquilo mesmo, então falaríamos. Na verdade, ele era a única pessoa das que sabiam da nossa farsa que também sabia que estávamos transando. No fim das contas, Tom era o único que poderia ouvir tudo o que eu tinha sentido nos últimos dias e, apesar da minha resistência, talvez pudesse me ajudar a resolver aquele quebra-cabeça muito confuso.
— Não tenho motivos para não gostar dela — admiti, cruzando meus braços como uma criança birrenta. — Talvez seja um pouco de inveja, por ela ser uma mulher bem sucedida, linda, ter um corpão e ser a mulher que caras como levam para jantar em restaurantes como esse — apontei, olhando em volta. — Não é ciúmes, Tom, eu só… quero ter o que ela tem, e não falo isso em voz alta porque… é feio ter inveja.
— Continuo discordando de você.
Revirei os olhos. Eu estava sendo sincera e ele ali, usando meu desabafo para provar seus pontos errados, diga-se de passagem.
— E agora percebi o motivo de ter me chamado para jantar esta noite.
— Tom… — levei as mãos ao rosto, vermelha de vergonha. — Está tão na cara assim?
Ele assentiu, apoiando a mão no queixo e deixando seus ombros caírem.
Caralho, eu estava estragando tudo.
— Você me usou para fazer ciúmes nele?
— Não — respondi de imediato, com veemência. Não era o que parecia, e esperava que ele acreditasse em mim. — Eu te chamei porque… Tá, talvez eu sinta um pouco de ciúme dele. Esses dias eu chorei enquanto transávamos, porque fiquei pensando se preferia ela na cama do que estar comigo…
Fui interrompida pela gargalhada dele. Pelo menos alguém estava se divertindo com aquela história toda.
— Me desculpe. Novamente, não estou rindo de você… — explicou ainda aos risos. — Estou imaginado a cara dele… Isso nunca me aconteceu na vida. O quão ruim o sexo devia estar para você ter caído no choro no ato?
Não falei nada. Não defendi o desempenho do , ele merecia ser motivo de riso por tudo o que estava me fazendo passar com Dafne. Soltei um riso ao ter tal pensamento.
— Posso continuar? — pedi e Tom fez um gesto com a mão, sinalizando para que eu seguisse com a história. — Enfim, eu te chamei porque, assim como pode ter uma amante, eu também poderia ter um.
— Que sou eu, no caso — ele apontou para si, sorrindo maliciosamente. Revirei os olhos.
— Eu queria tentar com você para esquecer essa coisa… — expliquei, e seus olhos claros me encararam sugestivamente. — Tá bom, para esquecer esse ciúme que eu estou sentindo do com a Dafne. Satisfeito?
— Sim, por estarmos tentando.
Baixei minha cabeça com o olhar que recebi. Quando o espiei, vi seu sorrisinho crescente nos lábios.
— Vamos esquecer esse idiota — ele disse. — Me diga, o que gosta de fazer no tempo livre?
Arrumei minha postura e me remexi na cadeira, visivelmente aliviada. Por favor! Vamos parar de falar em !
— Eu desenho — comecei envergonhada, atraindo sua atenção. — Na verdade, são croquis. Desenho roupas e costuro desde quando era criança… Comecei a cursar moda quando cheguei em Londres com Grace.
— Não conseguiu se formar?
Neguei, sentindo meus ombros caírem.
— O curso está trancado por motivos financeiros — mordi o lábio em frustração. — Mas pretendo voltar algum dia. É o que eu amo fazer e eu sou muito boa nisso — murmurei, segurando o sorriso que me rasgava o rosto.
— Nossa, que raro te ouvir falar bem de si mesma desse jeito.
Maneei a cabeça, me dando conta de que quase não conversávamos e que eu tinha mesmo uma mania de me autossabotar às vezes. Só não imaginava que era algo tão nítido.
— Está vendo? Não tem motivos para você sentir inveja da tal Dafne. é um imbecil por trocar uma mulher linda como você por quem quer que ela seja — Tom limpou a boca com o guardanapo repousado em seu colo. — Bom, isso é bom para mim, então nem vou reclamar.
— Mesmo que eu te diga que tenho ciúme dele, o que não significa absolutamente nada, não sente de você. Ele não vai com a sua cara apenas por achar que você pode contar a alguém sobre nossa mentira. nem ao menos ligava para seus flertes antes da noite de Natal.
Na verdade, eu estava mentindo um pouquinho. já implicava no início, sim. Porém, naquela época, ele e eu ainda brigávamos até pelo ar que respiramos lado a lado, então não queria dizer muita coisa.
— Vocês já estavam juntos nessa época? — Tom franziu o cenho, fazendo-me desistir de tentar dialogar sobre aquele assunto. Ele nunca acreditaria em nada do que eu dissesse, pelo visto.
— Não, mas isso…
— Pronto, está explicado.
Não disse? Ele nem ao menos me deixava argumentar.
— Confie em mim, , eu sou homem. Vejo o quanto minha presença o afeta. A prova disso é o jeito como ele ficou há pouco, quando te liguei para nos encontrarmos.
— Por que quer tanto provar que está certo?
— Porque quero te alertar para tomar cuidado. Se estão envolvidos a ponto de sentirem ciúmes um do outro, o próximo passo é se apaixonarem. Se é que já não estão — falou, mas neguei veementemente. — Não quero que ele te faça sofrer, e já disse antes, eu sei que vai. Conheço o tipo dele. Eu era igual quando tinha a mesma idade, já quebrei corações e não fiz nada para reparar meus erros, . Não confie nele.
— Não vai acontecer — coloquei firmeza na voz.
— Não mesmo, porque vai se apaixonar por mim primeiro — piscou em minha direção, fazendo-me rir.
Olhei em volta e, de repente, o restaurante não estava mais tão… antiquado para mim como antes. Eu estava relaxada, rindo com Tom, e até me sentia mais leve após aquele peso todo ter sido tirado de minhas costas, mesmo que contra a minha vontade. Tom fez quase um interrogatório daqueles filmes comigo. Eu suspeitava que, se ele pudesse, me levaria numa daquelas salas escuras com apenas uma lâmpada pendurada para me fazer perguntas até chegar naquela confissão.
Tom sairia dali satisfeito por ter o que queria; já eu estava um pouco assustada. Antes, nomear o que eu sentia parecia bastante assustador, mas depois de saber que era ciúme, senti-me como se tivesse recebido um diagnóstico de uma doença sem cura e tratamento. Não sabia o que fazer com aquela informação e tive vontade de chorar em desespero.
O que aquilo deveria significar? Como eu deixei que as coisas saíssem do controle naquele nível?
Ficamos por mais algum tempo ali, conversando sobre nós, daquela vez sem incluir terceiros. Mentira, falamos sobre . Era inevitável não citá-la ao menos uma vezinha, ela fazia parte do meu ser. E assim como Tom assustadoramente gostava de tudo o que ouvia sobre mim, Domian adorou escutar meu monólogo sobre a bebê. Ele disse gostar de crianças e revelou o desejo de ter um filho; aparentemente era a última coisa que tinha desejo de ter na vida depois da carreira bem sucedida como cirurgião.
Ele deixou aquilo para a última hora. Tenho certeza que nunca deve ter sido cobrado por ninguém com o passar dos anos, no máximo pela mãe dele querendo netos.
Não pude deixar de fazer aquele paralelo com o fato da maternidade ter vindo muito cedo em minha vida e se tornado minha prioridade, entrando na frente até mesmo da minha tão sonhada formação. Apesar dos sacrifícios que tudo aquilo implicava, eu não poderia dizer que me arrependia.
— Se molhou muito? — Tom fechou a porta, abafando o barulho da chuva que começava a ganhar velocidade e ir de uma simples garoa para o que parecia ser uma tempestade com o vento chacoalhando as árvores da rua.
Aquele encontro tinha tudo para ser ao menos parecido com o dos meus sonhos, com direito a até um sugar daddy que eu jamais pensei em ter na vida. Brincadeiras à parte, o jantar, o modo como Tom fez de tudo para que eu me sentisse à vontade junto dele e até mesmo a corrida na chuva pelo estacionamento quase vazio por ser muito tarde, tudo parecia-se com uma cena de um filme de comédia romântica.
Exceto pelo fato de que minha cabeça estava confusa demais àquela altura.
— Sim, meu sorvete já era — fiz bico, ainda segurando a casquinha destroçada, sentindo as gotas de chocolate que escorreram melecarem meu dedo indicador.
— Aqui — o loiro puxou do porta-luvas um saquinho preto, deixando-me colocar o que restou do sorvete dentro para jogarmos no lixo depois.
Levei a mão à boca, lambendo o pouco do sorvete que sujou e atraindo seu olhar enquanto seus movimentos para amarrar a pequena sacola cessaram. Os olhos azuis de Tom, ainda vidrados em meus lábios recém-umedecidos, migraram em direção aos meus. Ofeguei quando o vi se aproximar, sentindo sua respiração pesada contra meu rosto assim que o tive ainda mais perto.
Dormian não tinha tentado nada até aquele momento, apenas esperou o momento certo, e parecia que ele havia chegado. Sua mão grande se encaixou em minha mandíbula e tive seus dedos envolvendo minha nuca com destreza antes que ele me puxasse para perto.
Cada vez mais próxima de seus lábios, cada vez mais curiosa.
Sim, eu já havia o beijado antes, me recordava da noite de Natal. Mas aquilo foi antes de me tomar para si e apagar toda e qualquer impressão ou toque de outros lábios da minha boca e corpo. Me vi ansiando para sentir algo novo, algo que pudesse apagá-lo de mim. Fechei os olhos com força e correspondi com avidez o beijo ansioso de Dormian, praticamente implorando para que ele tirasse da minha cabeça. Nem que fosse só por aquela noite.
Quando abri os olhos novamente, encarei seu nariz fino ainda muito próximo do meu. Retribuí seu sorriso ao ofegar, feliz por estar sentindo algo, ao menos. Ainda não era algo estratosférico, mas era promissor. Meus pelos do corpo se eriçaram quando Dormian agarrou-me pela nuca e deslizou os dedos largos em direção à raiz de meus cabelos, onde ele puxou os fios devagar e forçou-me a expor minha jugular para que pudesse fazer o que bem entendesse dela.
Gemi de olhos fechados quando Tom chupou meu pescoço, parando em minha orelha e mordiscando o lóbulo dela. Agarrei seu bíceps, esfregando uma coxa na outra ao sentir minha intimidade pulsando debaixo daquele vestido justo. Percebendo o estado em que estava me deixando, Tom levou uma das mãos até a saia, adentrando o tecido e arranhando o local com suas unhas curtas. Parei o caminho que ele fazia em direção à minha calcinha e o tive afastando o rosto do meu pescoço para me olhar.
— O que foi? — sussurrou, beijando minha boca.
Demorei para focar-me em seu rosto por completo. Pisquei algumas vezes, tentando me situar.
— E-Eu não sei… — ofeguei, ainda trêmula.
Realmente não sabia. Eu queria, o queria como na noite em que o conheci. Minha calcinha estava molhada. Eu sentia minha pele quente e reconhecia o estado febril que só o tesão me deixava. Mas… não conseguia me concentrar nele. Apesar de nossa longa conversa naquele jantar, Tom ainda parecia um completo desconhecido para mim. Como se… como se não fosse compatível comigo.
Minha pele se arrepiou, mas por conta do estímulo, meu corpo logo começou a oscilar entre corresponder aos toques firmes e sedentos de Tom e depois esfriar, para logo em seguida voltar a se incendiar. Era como se Dormian tentasse me acessar, mas não tivesse a senha. Minha pele, minha boca, meus olhos não o reconheciam como alguém autorizado a invadir minha cabeça e deixá-lo entrar.
O que estava me deixando confusa em relação à minha rejeição era o fato de que aquela não era minha primeira vez indo transar no primeiro encontro. Eu já tinha dormido com desconhecidos antes – antes de me casar, claro. Me perguntei se o costume de ter um homem só não tinha me tirado a capacidade de me entregar a outros com mais facilidade.
De repente, a pegada de Tom não me pareceu boa o suficiente, apesar de claramente ser e eu ter ansiado por senti-la desde que coloquei meus olhos nele pela primeira vez. Quando o vi sentado à mesa do restaurante, lembrava-me de ter desejado sentir o que Dormian um dia já me despertou, e eu voltei a sentir. Aqueles amassos no carro dele me atiçaram a ponto de querer despi-lo e transar com ele.
Mas… nada era tão forte como era com .
Não era a mesma coisa, e eu estava tão habituada a sentir tudo tão intensamente com meu marido que com qualquer um outro parecia sem graça pra mim. Depois de me sentir completa de alguma forma, o meio-termo já não me enchia os olhos.
Ridícula! Era aquilo que eu era! Tinha certeza que não tinha o mesmo problema quando saía com Dafne.
— ?
— Me desculpa, Tom — voltei a encará-lo em frustração. Ele fez menção de tirar a mão de meus cabelos, mas fiz questão de segurar seu antebraço. — Eu quero… — sussurrei de imediato, e ele avançou com o rosto em direção ao meu. — Eu quero você, mas…
— Vamos devagar, ok? — ponderou, engolindo em seco. Sua respiração e o volume entre suas pernas na calça escura que ele usava discordaram veementemente. Ele não queria ir devagar. — Eu tinha reservado um quarto num hotel aqui perto, mas não tinha certeza se você ia querer ir ou não. Tudo bem, vamos deixar para uma próxima vez.
— Não, Tom — discordei, já sem suas mãos em mim e me afastando minimamente para conseguir respirar. — Vamos, eu já disse que quero. Estamos tentando, lembra?
— Ainda bem, porque eu não dormiria por noites depois do que aconteceu aqui…
Ri de seu alívio e o beijei demoradamente, tendo-o daquela vez mais contido, apenas acariciando a lateral do meu rosto.
Ele realmente me levou a um dos hotéis daqueles prédios brancos e cheio de luzes do centro da cidade. Passamos rapidamente pela recepção e logo íamos para o elevador. Assim que as portas se fecharam, Tom fez questão de me prensar contra a parede gélida e tomar meus lábios, deixando-me aliviada por ter medo de altura e ele ter reservado um quarto nos últimos andares.
Não tive tempo de pensar que estava presa numa caixa de metal subindo metros e metros longe do chão, sendo puxada por cabos de aço. Talvez aquela fosse a solução, ir rápido, como amarrar um dente mole na fechadura da porta e fechá-la de uma vez. Quando criança, eu nunca senti dor, apesar de morrer de medo. Talvez nós devêssemos correr com aquilo e, quando abríssemos os olhos, já teria acontecido.
Seguimos em direção à porta no fim do corredor silencioso. Dormian trancou-a enquanto meus dedos ágeis desabotoavam sua camisa, expondo seu peito malhado e sua pele bronzeada. Suas mãos já desciam o zíper do meu vestido ao andarmos aos tropeços em direção à cama enorme e macia onde fui deitada. Tom levantou o troco e passou a camisa pelos braços; ao mesmo tempo, eu subia o vestido e deixava à mostra minha calcinha preta.
Não era uma surpresa para ele. Tom já havia me visto nua naquele episódio vergonhoso do hospital, mas seu olhar sobre meu corpo quando me ajudou a passar o vestido cabeça afora fez parecer como se fosse a primeira vez. Lhe recebi entre as pernas sentindo seu membro ereto contra a renda da calcinha. Puxei seus cabelos loiros quando o tive descendo os beijos molhados por meu pescoço e colo.
Tentei relaxar sobre o colchão, ainda respirando irregularmente quando sua boca me alcançou os seios ainda cobertos pelo sutiã, e continuou seu caminho até minha barriga, que subia e descia com velocidade. A sensação de estranheza permanecia. Eu gostava do que via: sua barriga cheia de gominhos e aquele corpo gostoso nos seus quase dois metros de altura em cima de mim, dedicando-se a me dar prazer… Mas ainda não era familiar pra mim. O cheiro era diferente, o gosto dos beijos também.
Eu estava tonta devido à minha respiração irregular. Ainda assim, sentia-me aérea. Não me parecia interessante fazer aquilo sem pensar muito, como se estivesse me distanciando da situação tal qual atores performavam cenas de sexo em filmes. Tom não merecia aquilo, e eu também não.
Gemi quando abri as pernas e senti sua língua me acariciar a intimidade. Emaranhei meus dedos em seu cabelo e me esforcei para continuar ali, naquela atmosfera junto dele. Talvez a culpa fosse minha. Eu não estava realmente tentando, e sim comparando tudo o que sentia com minhas noites ao lado de .
O desânimo me tomava. Eu estava sem esperanças de encontrar alguém que pudesse suprir ou ao menos se igualar a .
Foi então que meu corpo, apenas reagindo aos estímulos, se entregou ao êxtase.
Eu mordia os lábios, tentando não fazer muito barulho, e passei a rebolar contra o rosto dele, sentindo o ápice vir e tomar meu corpo. Dormian usou os dedos para me estimular e introduziu dois deles em minha entrada enquanto continuava a me chupar majestosamente bem. Revirei os olhos, agarrando-me aos lençóis brancos, ainda arfando quando o assisti escalar até meu rosto e me arrancar um beijo de tirar o fôlego, convidando-me a sentir meu próprio gosto.
Rolei sobre Tom e sentei-me em seu quadril. Ainda com os lábios grudados nos dele, escutei um barulho insistente vindo de algum lugar do chão.
— Ouviu isso? — perguntei e ele negou, voltando a me beijar e tentando me sentar mais próxima de seu membro. Porém, o barulho persistiu, não me deixando concentrar. O que já estava difícil antes ficou pior ainda quando me toquei que era meu celular na bolsa. — Onde está?
— Deixa tocar, , não deve ser nada de mais.
Ignorei Tom e me desvencilhei de suas mãos, que tentaram me segurar sentada sobre meu quadril.
— Pode ser algo com — falei. Não tive a intenção de ser ríspida, mas acabei sendo por senti-lo desdenhar em sua fala. Peguei o celular, sentando-me na cama em seguida. O nome do piscava na tela. — Oi — tentei dar um jeito em meus cabelos desgrenhados.
— ...
Franzi o cenho quando ouvi sua voz falha. Chamei seu nome e ouvi uma respiração pesada do outro lado da linha.
— Onde está…m-minh-a…
— O quê?
Ouvi tossir. Parecia uma tosse seca. Eu não estava entendendo nada, sua voz mal saía e estava mais rouca que o normal.
— , está aí?
— Ele provavelmente está ligando para nos atrapalhar — Tom murmurou, deitado sobre o chão, e virei o pescoço para encará-lo ainda com o celular no ouvido. Não me senti muito segura daquilo. — Desligue, venha cá, sim? — ele se sentou, beijando meu ombro ao envolver minha cintura com os braços.
O barulho de seus lábios em contato com minha pele ecoou pelo quarto silencioso, bem ao lado do ouvido onde eu ainda mantinha o celular. Por um segundo, estremeci com a possibilidade de ouvir. Eu sabia que ele não se importava em esconder sua relação com Dafne de mim, mas causar nele o desconforto que saber de ambos me causava me fez sentir culpada.
— A-A bombinha…
— Sua bombinha de asma? — indaguei alarmada, saindo dos braços de Tom de imediato.
Puta que pariu, eu lembrava de tê-la visto quando fiz a última faxina na casa. Não lhe dei muita importância, não me recordava de quanto tempo fazia que não tinha uma crise. A última que tinha em minha memória ainda éramos adolescentes. Eu não imaginava que ele poderia voltar a ter crises assim, do nada!
— ! Está tudo bem? — levantei-me num pulo ao ouvir algo caindo em casa. — ?!
O desespero me tomou quando ele parou de me responder e apenas continuou a tossir, daquela vez sem parar.
— Estou indo — avisei, então busquei pela cama e encontrei minha calcinha. Era só vestir o vestido, pegar a bolsa e… Reparei em Tom sentado, encarando-me de braços cruzados. — N-Não se mexa, eu estou indo, tá? — desliguei o telefone e, de repente, tive uma espécie de déjà vu estranho.
Era a mesma situação que passei quando saí de casa para ir àquele jantar, só que, daquela vez, os papéis se inverteram e minha decisão final não seria Tom. Não daquela vez. Não quando estava passando mal em casa precisando de mim.
Eu não sabia o que faria em relação a Dormian, nem ao menos me situei quando entendi que estava tendo um ataque asmático. Nem me dei conta de que estava acompanhada por Tom. Foi quase como se eu tivesse sido tirada de órbita ao receber aquela informação. Depois de Grace, passei a ter pavor de pensar em perder mais alguém.
— Não vai me dizer que caiu nessa — e ele fez questão de se mostrar presente, fazendo-me encará-lo perplexa já dentro do vestido. — Qual é, , mesmo disse que iria fazer de tudo para te trazer pra casa cedo se você demorasse muito comigo.
— Sim, eu acredito nele, eu ouvi ! — apanhei a bolsa e meus sapatos ainda trêmula. — Estou indo embora, vou pedir um táxi — andei apressada em direção à porta.
— , espera — Tom pediu, me fazendo parar antes de abri-la. — Tenho um colega que mora no condomínio, vou ligar e pedir para dar uma olhada nele — sua voz não transparecia que ele tinha comprado a ideia, mas ao menos não insistiu na argumentação como achei que faria.
Tive a impressão de que Tom iria chamar o amigo para ir pegar na mentira. Se não fosse real, eu o faria ter uma crise de verdade só pelo susto que estava me dando.
Assenti e tentei me acalmar, mas ainda assim sentia meu coração apertado dentro do peito. Engoli o nó que se formava em minha garganta e pisquei a fim de dissipar as lágrimas em meus olhos.
Continuei parada ali. O loiro fez a ligação e explicou que era um amigo e que estava sozinho em casa, precisando de ajuda. Quando desligou, pensei que se levantaria rápido e me acompanharia, mas ele não o fez. Apenas encarou a tela em sua mão por um tempo enquanto pensava. Se Tom achava que eu iria voltar para a cama com ele sabendo que estava naquela situação em casa, estava muito enganado.
— Eu te levo — ele se levantou, suspirando derrotado ao recolher suas roupas.
Descemos no elevador em silêncio; o único barulho existente ali era meu sapato que batia contra o chão insistentemente, tamanha era minha ansiedade. Diferente de quando estávamos subindo, naquele momento eu tinha uma enxurrada de pensamentos vagando pela minha cabeça que, por incrível que pudesse parecer, a altura em que estávamos descendo era o mais leve deles.
Queria questionar Tom, perguntar se ele entendia de ataques asmáticos, se era realmente perigoso como minha cabeça estava me fazendo pensar. Mas preferi ficar calada, com medo do que iria ouvir. Eu precisava manter a calma ao menos até chegar em casa. Precisava vê-lo para comprovar que estava bem e que ficaria tudo bem.
O trajeto que o carro branco de Tom fez pareceu uma eternidade para mim, mas quando chequei o celular, não tinha demorado tanto. Dormian percebeu meu estado e dirigiu mais rápido em direção ao nosso condomínio. Decidi descer logo depois da portaria, numa parte arborizada próximo ao parque das crianças. Ali não havia muitas casas, portanto ninguém iria interpretar maldosamente o fato de Tom me levar para casa.
— Obrigada — murmurei, encarando-o ressabiada. Tom sorriu fraco, com o braço descansando sobre o volante do carro ainda de painel aceso.
Me senti um monstro. Aquele com certeza deve ter sido o pior encontro que ele já deve ter tido em anos. O meu não era, por incrível que pudesse parecer. Por ser mulher e heterosexual, já passei por poucas e boas apenas por querer beijar umas bocas de vez em quando.
— Me desculpa por hoje, por te usar para tentar esquecer meu ciúmes… por tudo.
Falar aquilo em voz alta e finalmente dar nome à sensação horrível que me acompanhou nos últimos dias era estranhamente libertador. Mas, ainda assim, iria guardar aquela descoberta para mim. Bom, ficaria entre Tom e eu, claro. Mais um segredo que nos unia.
— Tudo bem, . Estará perdoada se me deixar te levar para sair uma outra vez.
Sorri assentindo enquanto o tinha envolvendo meu rosto com sua mão grande. Apesar do fim desastroso, até que tinha sido divertido sair e não ser mãe por pelo menos algumas horas.
Tom se aproximou perigosamente, e virei o rosto quando sua boca estava próxima o bastante para me beijar. Ele entendeu e apenas deixou um beijo casto em minha bochecha. Entendeu errado, não era apenas por estarmos dentro do condomínio. Aquilo não era nada comparado à bagunça que existia dentro de mim.
— Ah, se acontecer alguma coisa, me ligue.
Concordei, já indo depressa para o meio-fio. O carro sumiu na próxima curva que encontrou. Soltei um risinho ao perceber que Tom disse aquilo num tom indiferente, mas, ao mesmo tempo, pareceu realmente se preocupar – imagine só – com o ! Não poderia julgar, eu estava fazendo o mesmo na frente dele e tornava a fazer quando estava com Anne e Fanny. Tudo para disfarçar o que realmente acontecia em casa quando estávamos a sós.
Dei passos largos pelo meio-fio, mas logo desisti e tratei de arrancar meus sapatos para que pudesse chegar logo em casa. O portão estava entreaberto e as luzes da sala e do nosso quarto estavam acesas. Me apressei, encontrando a sala vazia. Meu coração já quase saía pela boca quando larguei minha bolsa sobre o sofá, e tentei me recompor ao calçar um dos sapatos quando ouvi passos na escada.
— Boa noite. Você deve ser , a esposa.
Tom não tinha citado meu nome na ligação; poderia ter falado a ele, o que significava que estava bem.
— Sim, estava num jantar com amigas. Ele me ligou e vim correndo pra cá — forcei uma mentira goela afora, percebendo em seu semblante o convencimento. — Tá tudo bem? Onde ele está? E ?
— Está tudo sob controle, . Foi uma crise desencadeada por algo externo. A asma de seu marido estava controlada, mas é provável que algo provocou essa reação. De qualquer forma, já está medicado e está na nebulização. Certifique-se que ele faça até o fim, sim?
Assenti prontamente, respirando aliviada.
— Sua bebê está dormindo, acabei de checar a pedido de seu marido. No mais é isso, acredito que ele ficará bem, foi apenas um susto.
— Muito obrigada…
— Charles, mas pode me chamar de Charlie — ele sorriu, retribuindo meu aperto de mão ainda trêmulo.
— Quanto te devo?
Fui apressada até o sofá, onde joguei a bolsa minutos antes. Quase não a encontrei, e nem precisei; o homem de cabelos castanhos já negava com a cabeça.
— Não precisa me dar nada, foi um favor a um amigo. Bom, se é amigo de Tom, então é um amigo meu a partir de agora.
Soltei um riso nervoso. Estava mais para “inimigo”.
— Vou indo, vocês precisam descansar. Até mais, , foi um prazer te conhecer.
— O prazer foi meu, muito obrigada novamente — o segui envergonhada quintal afora, pisando na grama descalça para poder trancar o portão.
Quando retornei, uma onda de alívio me tomou. Respirei fundo, segurando-me na porta para fechar os olhos e poder enfim trancá-la e subir para ver . Uma ansiedade atípica me tomou enquanto eu subia as escadas, deixando tudo para trás: celular, sapatos, os beijos de Tom em minha pele e as lembranças daquela noite. Tirando o jantar com Tom, tudo se desenrolou da pior maneira possível.
O que de alguma forma me fez pensar: será que se eu não tivesse saído, as coisas iriam acontecer daquele modo? Eu ajudaria a encontrar sua bombinha e lhe pouparia de passar pelo aperto que tinha passado sozinho em casa com . Abri a porta devagar, encontrando-o sentado na cama, com as costas apoiadas na cabeceira.
— Oi — tentei sorrir.
Seu olhar opaco me encarou ainda de longe; ganhava um pouco de brilho a cada passo que eu avançava em sua direção, ou ao menos era o que meus olhos viam quando miravam nos dele. Senti os meus marejarem e sentei-me na beirada da cama.
— Vim o mais rápido que pude, desculpe se demorei.
Ele usava um pijama xadrez, diferente da roupa que vestia quando deixei a casa. Será que começou a passar mal há pouco tempo? Ou a crise veio um pouco antes de tudo se descontrolar e ele me ligar como última alternativa?
soltou um riso sem humor, encarando meu vestido amarrotado, ou talvez ele pudesse ver as marcas em meu pescoço. Eu trouxe meus cabelos para frente, sentindo meu rosto queimar em vergonha.
— Está tudo bem — sua voz saiu baixa, entrecortada e abafada pela fumaça do inalador afastado por ele.
Achei que jogaria algo em minha cara, brigaria dizendo que se eu não tivesse ido, ele não teria chegado àquele ponto crítico. Diria que eu não estava ali para ele quando precisou. Mas não, ele não disse nada. Talvez aquela fosse eu mesma me torturando sozinha.
— Não fala nada, continua assim — cobri sua mão e encaixei novamente a máscara de silicone em seu rosto. — O médico disse que você tem que fazer até o fim — não resisti e afaguei seus cabelos castanhos, afastando um cacho que estava caído em sua testa. — Vou tomar um banho rápido, já venho — aproximei-me, torcendo para que não estivesse com o cheiro de Tom impregnado em mim e lhe beijei a testa, vendo-o fechar os olhos ao sentir meus lábios sobre sua pele.
Dei-lhe as costas e fui ao banheiro, segurando um choro que nem ao menos vi chegar. não estava fingindo. Se estivesse, jogaria na minha cara, seria o antigo que eu odiava desde sempre. Ele parecia saber que me magoaria caso fizesse algo do tipo. Passou pelo mesmo inferno que foi perder Grace junto de mim. Ele sabia que eu ficaria preocupada demais e não mentiria sobre algo tão sério.
No fim da noite, me senti melhor por ter seguido meus instintos e confiado em . Não que vê-lo fraco daquela forma era uma coisa boa, jamais! Mas a situação reforçou algo que eu já tinha percebido entre nós: éramos apenas nós dois nesse mundo e que faríamos de tudo para cuidar um do outro. Eu já tinha sido cuidada por ele duas vezes; não imaginava a carga de adrenalina que era estar do outro lado.
Era engraçado pensar naquilo e sentir segurança tratando-se de , mas, de alguma forma, eu sabia que entre nós as coisas não eram mais como antes.
Esfreguei minha pele no chuveiro, tirando quaisquer resquícios de Tom de meu corpo. Estava agindo como se realmente tivesse feito algo errado naquela noite, e não era necessário, mas algo em mim me fazia pensar que era. Fui para o closet sob o olhar de ainda tomando inalação. Vesti uma blusa de alças e uma calcinha qualquer. Voltei para o quarto ao ouvir o choro de suando pela babá eletrônica ao lado da cama.
Já era por volta das três da manhã; aquele bebê era extremamente pontual quando se tratava de sentir fome nas madrugadas. Fui buscá-la, desci com ela em busca de sua mamadeira e subi as escadas já com ela mamando em meus braços. Quando retornei para o quarto, permanecia do mesmo jeito que tinha sido deixado há pouco.
Sentei-me ao seu lado na cama. Ainda com seus olhos verdes em mim, sorri sem graça ao reparar seu olhar em minhas pernas dobradas sobre o colchão.
— O que foi? — ri nervosa, desviando minha atenção para , que devorava sua mamadeira.
Vi quando seus dedos largos alcançaram a mãozinha de pendurada para fora. Seu polegar acariciou o dorso. Levantei meu olhar para seu rosto e o vi concentrado no que fazia, só parei de encará-lo sorrindo quando fui pega no flagra. Sua mão logo veio de encontro aos meus cabelos, tirando-os do caminho e colocando atrás da minha orelha.
— Obrigado por não desligar o telefone.
Não consegui lhe dar um sermão ao vê-lo tirar a máscara de inalação. Engoli em seco, não querendo falar sobre aquilo. Não importava naquele momento. Eu não precisei de naquela noite, apesar do sufoco que passei com e suas cólicas. A única coisa importante era que estávamos ali, bem e juntos.
— Eu estava pensando… — ele largou a máscara na cômoda. — Fui um idiota naquele dia. Mereci que você saísse com Tom e também mereceria se você me ignorasse para ficar com ele…
— Xi… Não vamos falar sobre isso — neguei com a cabeça, pegando sua mão que acariciava meu rosto e beijando a palma dela antes de acariciar seu dorso. — Só… não me dê um susto desses de novo, sim?
Senti meus olhos se encherem de lágrimas só de pensar na possibilidade de ter cogitado a ideia de não me ligar por achar que eu lhe daria o troco.
— Combinado — ele sorriu, deixando suas covinhas à mostra em ambas as bochechas, secando a lágrima que escapou do canto de meu olho. Foi em vão; logo outras caíram e fizeram o mesmo trajeto. — Não chora — se aproximou, beijando minha testa. — Eu ainda vou viver muitos anos pra te dar muito trabalho.
Aquela não seria a função de no futuro?
Ri fraco, fechando os olhos e tendo meu rosto seco por seu toque delicado. Esperava que ele cumprisse o que falou, porque precisava de nós dois inteiros ao seu lado pro resto da vida.
Abri meus olhos e mantive meu olhar no dele, pensando e comparando nossa situação atual com a do passado. Me comparando. A do passado não estaria cabendo em si ao saber que tinha chegado a quase dar para Tom Dormian, e também sentiria o estômago se revirar só de pensar em passar anos tendo que conviver com pacificamente.
Soltei mais um riso discreto, inclinando-me quando o vi se aproximar para colar a boca à minha. Eram apenas estalinhos. Seu nariz se chocava contra o meu, e eu conseguia sentir seus cílios acariciarem superficialmente minha pálpebra fechada, pesada pelo cansaço e pela calmaria que estar ali com ele e me proporcionava.
— Vou colocá-la para arrotar — levantei-me, ajoelhando no colchão. se esticou, deixando um beijinho no topo da cabeça de , então segui para fora do quarto.
De pé, balancei-me com a bebê em meus braços. Ela de fato tinha arrotado uma vez, mas não quis colocá-la para dormir logo. Por mais bizarro que pudesse parecer, eu tinha sentido falta dela e queria matar as saudades das horas que passei longe.
Depois de tanto tempo ao lado dela desde que fui demitida, era estranho não tê-la ao meu alcance, nem que fosse para olhá-la pela babá eletrônica. Não compreendia o que era aquele aperto no peito que ainda me assolava. Eu estava em casa e todos estavam bem, mas a ideia de que poderia ter sido pior ainda me assombrava.
Sempre tinha que ter alguém ou algo para nos preocupar ou tirar a paz que tínhamos levado tanto tempo para conseguir. Quando não era Miguel, era a família de , Tom, Dafne, e até mesmo Anne era motivo de brigas entre nós ou ameaças à nossa segurança. Pensei no que me disse; sobre tudo, na verdade. Me arrependi de não ter dito nada quando ele me confrontou sobre sua importância na minha vida, sobre seu lugar na minha lista de prioridades.
Ele estava acima dela, e eu só pude ver quando estive prestes a perdê-lo de alguma forma. Me perguntei quantas vezes fui cabeça-dura, teimosa sobre o que sentia. Me culpei por ser tão complicada. E se tivesse realmente hesitado em me ligar por não se achar tão importante para mim?
Deixei a bebê adormecida no berço após beijar e cheirar o topo de sua cabeça algumas vezes. Voltei para o quarto que, num intervalo de horas, tinha deixado de ser meu e logo depois voltado a ser. Tive que dar o braço a torcer, Tom estava certo. Às vezes parecíamos dois adolescentes.
Suspirei ao passar pela porta e me deparar com do mesmo jeito que tinha deixado quando saí, o que era engraçado, porque ele não estava se aguentando sentado de tanto sono.
— Ainda está aí? — sorri, encarando-o. Ele assentiu aliviado quando apaguei a luz, deixando só o abajur ao lado da cama aceso.
Deitei ao seu lado, ajeitei-me debaixo dos cobertores e foi como se o colchão da nossa cama já tivesse o desenho dos nossos corpos moldados nela. Seu braço me envolveu e fechei os olhos, ainda sentindo-o se remexer atrás de mim.
— Estava te esperando — sua voz saiu abafada. — Queria dormir com você essa noite…
Franzi o cenho. Nós já tínhamos dormido juntos tantas noites, o que aquela teria de especial? Virei-me e fiquei cara a cara com ele, que sorriu satisfeito e passou o braço pela minha cintura, invadindo minha blusa com sua mão grande.
— Todas as noites… — sussurrou, acariciando minha pele.
Deixei-o fazer o que quisesse, mas não esperei que fosse safado a ponto de subir em cima de mim caindo de sono, logo após praticamente quase morrer. Empurrei seu ombro de leve, fazendo-o desgrudar os lábios dos meus. alternou seus olhos nos meus ainda com o corpo apoiado sobre mim. Nossas coxas se enroscaram, fazendo-me sentir sua pele quente na minha.
— Eu só quero olhar pra você — sussurrei diante de seu olhar duvidoso.
Ele me sorriu fraco, assentindo ao fechar os olhos quando meus dedos tiraram as pequenas ondas de seu cabelo castanho de sua testa. suspirou, encostando a testa na minha. Senti o ar quente sair de sua boca e mordi o lábio em puro alívio. Como era bom senti-lo respirar depois de tudo.
— Eu te amo…
Soltei um riso surpreso. Seu rosto se relaxou diante de mim e eu encarei seus olhos verdes, buscando algum tipo de resposta para… aquilo.
— Meu Deus, o que tinha nesse remédio que você tomou? — estiquei-me para apanhar o frasco de comprimidos deixado pelo doutor na cômoda ao lado da nossa cama.
sorriu, deixando-se desfalecer sobre o travesseiro. Parecia meio grogue. Provavelmente, o remédio para asma tinha efeitos parecidos com antialérgicos, daqueles que te derrubam para que a alergia não te derrube primeiro. Aquilo explicava todo aquele romantismo que eu nunca tinha reparado nele antes. Comprimi um sorriso ao contemplá-lo piscar devagar até cair no sono profundo.
— Espero que não se lembre disso amanhã.
Acordei no dia seguinte ainda bem próxima a na cama. Sua mão ainda pesava em minha cintura, como se ele tivesse passado a noite me segurando ali. Tirei-a devagar, com medo de acordá-lo. Estava tão bonitinho com os cabelos bagunçados contra o travesseiro. Não resisti e me aproximei sorrateiramente, a fim de cheirar seus pequenos cachos. Adorava o cheiro de seu shampoo.
Tomei um banho, aproveitando que ainda estava dormindo tranquila. Desci com a babá eletrônica para ir pegá-la caso ela acordasse chorando e deixaria dormir e descansar depois da noite passada. Preparei omeletes, coloquei a cafeteira para trabalhar e, ao abrir a geladeira, notei no calendário pregado ali que era o dia do aniversário dos gêmeos de Victoria. Tinha acontecido tanta coisa desde o convite que nem me lembrei.
— Bom dia.
Virei-me e vi puxar uma cadeira e sentar-se à mesa. Ainda coçava o olho de cara amassada. Sorri em sua direção ao desligar o fogo e pegar a frigideira.
— Bom dia — murmurei, servindo seu prato e voltando à pia para deixar os utensílios por lá. Ia me sentar na cadeira mais próxima, mas fui até ele quando o vi me chamar pela mão. — Dormiu bem?
— Como um bebê.
Me deixei cair sentada em suas coxas quando me puxou pra cima de si. Levei uma das mãos à sua nuca quando senti sua boca colar-se com a minha num beijo calmo.
— Sob os cuidados da melhor mãe do mundo — ele disse, e sorri abertamente contra seu rosto. — Ficou toda preocupadinha…
— Eu não acredito que encontrou uma brecha para se achar com isso, — ri, sendo acompanhada pelo safado de ego inflado. Apesar de estar achando graça naquele momento, só Tom sabia o estado que aquela ligação tinha me deixado. — Fiquei mesmo — meu sorriso se desfez só de lembrar. — Fico feliz que consegui ajudar mesmo de longe. Não consigo nem imaginar a ideia de te perder… — falei, tendo seus olhos me analisando por um milésimo de segundo. — Digo, de te perder. Ela já perdeu a mãe e eu não sei o que faria sozinha…
Não era exagero dizer aquilo, eu realmente não sabia. Depois de tantos atentados de Miguel, acho que conhecia bem aquela sensação, aquele receio todo de perder um parceiro. Éramos um time. nunca teve com quem contar além de nós, e naquele aspecto ela teve sorte. Eu sentia que e eu tínhamos muito em comum quando o assunto era amar e tudo o que construímos naqueles poucos meses.
— Até entendi o que fez por Dafne naquela noite.
Quando gostamos muito de alguém e essa pessoa está precisando de nós, tendemos a largar tudo para ajudar. Mas me doeu o coração perceber que não tinha pensado duas vezes antes de sair de casa depois da ligação dela. Fazer aquele paralelo com o que passamos ontem e o fato de ser eu quem tinha largado tudo para ir atrás dele me magoava.
— O que fiz por Dafne não tem nada a ver com o que aconteceu ontem, — sua mão percorreu meu tronco antes de se alojar em minha nuca, fazendo-me olhá-lo diretamente nos olhos. E eu o fiz, sentindo-me tonta ao me deparar com a certeza latente estampada neles. — Não se compare com Dafne. Já disse e repito quantas vezes forem necessárias, , eu não tenho nada com ela e nem pretendo ter. O que nós temos é…
Senti meu coração disparar. Comprimi os lábios em ansiedade.
— … Diferente, maior do que tudo o que eu possa ter tido com ela ou com outra mulher.
Por um segundo, pareci esquecer de como respirar. Puxei o ar que nem percebi que prendia, ainda zonza com aquela sensação indescritível de estar em seus braços, ali tão perto e ouvi-lo falar aquelas coisas… Beijei-o sem conseguir me conter, sem ao menos saber se era o momento apropriado para aquilo.
Uma onda de alívio percorreu todo o meu corpo, que, após aquele pico de adrenalina e quase entrar em combustão com aquelas palavras, estava passando pela fase de resfriamento. Quando eu tomava minha dose dele, acalmava meus nervos e hormônios que praticamente imploravam por .
Após ter a certeza de que Dafne talvez não fosse uma ameaça tão grande – ou odiando profundamente classificá-la assim, uma concorrente tão forte –, senti necessidade de deixá-lo saber de sua posição em minha vida. Ele merecia aquilo, já tinha quebrado a cabeça tempo demais comigo.
— Queria me desculpar pela briga de ontem…
respirou fundo, ponderando. Quase se negou a ouvir meu pedido de desculpas. Antes, brigávamos por meio de ofensas; hoje disputávamos pedidos de perdão.
— Desculpa por não ter falado nada e dado a entender que Anne está acima de você. Não está, desde muito tempo.
Lembrei-me daquela briga ridícula no aniversário dela e do modo como Anne jogou na minha cara que sabia que eu trocaria minhas amigas por e . Hoje vejo que ela não estava errada; eu já tinha feito aquela escolha inconscientemente. A vida passa e, com as mudanças, nós reavaliamos nossas prioridades.
E do dia em que nos casamos em diante, e eram as minhas principais.
— Você é importante pra mim, . Você é minha família agora — me esforcei para me expressar da melhor maneira que consegui. De bochechas queimando, vi minha fala surtir efeito quando um sorrisinho bobo tomou os lábios dele.
— E você a minha — tombou a testa sobre a minha. A família que sempre sonhei em ter e que merecia. — E eu faria qualquer coisa por essa família.
Fechei os olhos ao ouvir sua voz sussurrar aquela promessa.
— Qualquer coisa? — abri um dos olhos, sorrindo faceira. franziu o cenho sem entender. — Até ir ao shopping comigo comprar os presentes dos gêmeos da Victoria?
— Oh, eu esqueci completamente desse aniversário — ele levou a mão à testa. Não pude julgá-lo, eu estava na mesma. — Não podemos só procurar comédias na Netflix e passar o dia debaixo das cobertas? — escondeu o rosto na curva do meu pescoço, fazendo-me pensar naquela possibilidade por um segundo.
Seria tão bom, principalmente depois dos últimos acontecimentos. Porém, fazia muito tempo desde a última vez que estivemos reunidos com os vizinhos, e precisávamos nos socializar com eles para manter nossa farsa, embora fizéssemos aquilo muito bem sem a ajuda deles.
— Não, Victoria sempre foi incrível conosco. Não podemos fazer essa desfeita.
suspirou, derrotado. Sabia que eu tinha razão.
— Vamos, né? Não tem muito o que fazer, de qualquer forma — murmurou emburrado, provocando um riso meu.
Engraçado como era obediente, acatava tudo o que eu decidia. Quem diria que aquele homem truculento do passado estivesse só esperando alguém para domá-lo? Apesar daquele pensamento engraçado, sentia que e eu éramos muito bons em tomar decisões conjuntas. Desde que decidimos ficar com , fomos abrindo mão de nosso próprio querer para o bem dela.
O choro de ecoou pela casa, abafado pela distância e a porta de seu quarto. Me ofereci para ir pegá-la, descendo com a neném assim que troquei sua fralda suja. já terminava de comer e foi logo preparar a mamadeira da neném, que estava enjoada e sonolenta ainda, querendo ficar de pé a todo custo.
— Parece que hoje alguém está de mau humor — ele esticou o braço, fingindo pegar a chupeta cor-de-rosa da boca da bebê. Ri e neguei com a cabeça, sentindo seu corpinho se alinhar ao meu enquanto tinha a cabeça tombada em meu ombro.
— Essa semana vou levá-la para tomar vacina — choraminguei, relembrando da primeira vez desastrosa. Doía em mim ter que ver alguém furá-la daquele jeito.
— Quer que eu vá junto? — ele indagou, já fechando a mamadeira munida de leite. — Eu posso sair do trabalho…
— Não precisa, acho que consigo lidar com isso sozinha dessa vez — beijei o topo da cabeça dela, que agora sorria com a aproximação do pai bobão que tinha. cheirou seu pescoço e a fez soltar um gritinho enquanto se encolhia.
Ele era o remédio perfeito para o mau humor dela. Era impressionante a conexão que aqueles dois tinham. era a pessoa que arrancava sorrisos dela com uma facilidade incrível; o cheiro dele cessava qualquer choro de dor. No início, eu achava que sentiria ciúmes caso ela demonstrasse alguma preferência por ele, mas não conseguia ter outra reação a não ser admiração. Meu coração se enchia e se aquecia ao vê-los juntos. Eu me sentia privilegiada por poder participar daquela relação.
também me amava muito e eu sabia, sentia aquilo. Ela procurava meus braços quando estava cansada também, e era mais séria comigo por talvez perceber que eu era a figura que lhe diria não quando necessário. Era engraçado ter aquela percepção de um bebê tão pequeno, mas era apenas o que eu achava que era. Não me sentia diminuída por ser a segunda pessoa preferida dela. Era tão bom quanto ser a primeira, e, bom, não dava pra competir com e seus braços fortes e quentes.
Eu mesma caí nos encantos deles e sabia que não tinha escapatória.
Enquanto tomava banho, fiquei pensativa sobre o que tinha dito na cozinha no café da manhã. “Lidar com isso”. Acabei percebendo que eu fugia de algumas coisas que me assustavam pelo fato de não saber bem como agir diante delas. Coisas que poderiam fugir do meu controle. Eu simplesmente as evitava, fazia curvas, pegava atalhos ou mesmo escolhia caminhos mais longos só para não ter que, de fato, lidar com elas.
No caso das vacinas de , calhou que, devido ao nosso trabalho, Elisabeta levava a menina para as consultas e vacinas, mas por me conhecer tão bem, eu sabia que ainda haviam muitas outras coisas que eu evitava. Pensei em uma em específico que já estava adiando demais para resolver e cansada demais para continuar fugindo dela.
Deixei que tirasse o carro da garagem e, quando ele apertou o botão do portão automático, respirei o fundo e tirei o cinto de segurança.
— Vamos trocar — falei de uma vez, sentindo minhas mãos já trêmulas. me olhou surpreso, me perguntando se eu tinha certeza. Não, eu não tinha, mas tinha que ao menos tentar.
Desembarquei do carro, dei a volta pelo parachoque e cruzei com ele, que tinha tirado os óculos escuros do rosto.
— Você consegue — selou meus lábios, colocando os óculos com cuidado em mim. Assenti, acreditando naquelas palavras. É, eu conseguia. Não era um bicho de sete cabeças, afinal.
Durante o trajeto, o tal bicho se transformou em um animalzinho inofensivo, mas algumas vezes se multou em um verdadeiro monstro com muito mais do que só sete cabeças. O trânsito com suas buzinas me pressionando deixaram-me ansiosa e tremendo. Continuei deixando o carro morrer algumas vezes, mas me ajudou, pegando em minha coxa e tentando me acalmar enquanto me auxiliava sobre o que fazer. Mesmo que algumas vezes fosse apenas respirar.
Chegamos ao shopping inteiros no fim das contas, e o carro estava incluso naquilo. Eu não sabia do que tinha mais medo: sofrer um acidente com ali ou dar um arranhadinho sequer na lataria do veículo que tratava como um filho. Estava impressionada com a confiança que ele demonstrou ter em mim ao me dar o carro com tanta boa vontade.
Compramos os presentes dos gêmeos e não resistimos ao ver algumas roupinhas para , mesmo sabendo que ela já tinha muita coisa, a ponto de termos que doar as que já não serviam mais para ter espaço. Ficava tão feliz em vê-la tendo tudo o que precisava conosco. Às vezes me frustrava saber que ela ainda não era nossa por inteiro e que a justiça precisava de mais provas para entender que éramos nós os pais dela, que a nossa casa era o lugar em que ela deveria crescer.
Paramos num quiosque para tomar um sorvete e aproveitar o sol que fazia na praça de alimentação do shopping a céu aberto. Eu nunca entenderia qual era a lógica de fazer um shopping daqueles. Quando estava ensolarado era lindo, porém, quando chovia, chovia dentro dele também e aí era um caos.
— Cadê sua aliança? — perguntou e franzi o cenho, largando a colher do sorvete ao notar a falta do metal em meu dedo anelar.
Peguei minha bolsa no suporte do carrinho de , que tinha usado na noite passada e me lembrava de ter guardado ali dentro, num dos bolsos internos. Enfiei a mão em todos, sentindo o desespero me tomar ao não encontrá-la em lugar nenhum.
— Acho que perdi — levei a mão à cabeça. Ela tinha sido bem cara, assim como tudo naquela cerimônia. iria me matar. — Tirei ela dentro do Uber.
Ele negou com a cabeça e eu entendi que já era. O motorista não iria devolver. Se fosse esperto, provavelmente mentiria caso fosse procurado.
— Não acredito que isso aconteceu… Me desculpa — arquejei, vermelha em constrangimento.
— Está tudo bem, . Eu só perguntei porque… porque você sempre está com ela, achei estranho.
Suspirei ao vê-lo agir na defensiva. Não era um comportamento frequente nele.
— Quer ir na joalheria? — ele propôs, e eu me remexi incomodada na cadeira, apoiando meu queixo em minha mão.
Tinha acabado de ser demitida e pretendia guardar o dinheiro que receberia para gastá-lo aos poucos, e não ficar dependendo de . Mas era bem capaz de aquela aliança valer duas vezes mais que a quantia que eu tinha recebido de rescisão. Sabia que não me deixaria pagar de qualquer forma, justamente por não querer depender dele.
Fiquei calada, pensando numa saída para aquele problema. Eu poderia sair por aí sem aliança, não? Continuava casada, aquele era apenas um detalhe bobo. Encarei minha mão sem nada, movi meu polegar pela lateral do dedo anelar e senti falta dela. Tinha me acostumado a tê-la ali sempre, até me surpreendeu o fato de eu não ter percebido sua ausência.
— Vamos lá, hum? — ele beijou meu pescoço exposto pelo meu cabelo preso. — Quer que eu me ajoelhe também para te pedir em casamento de novo? — sussurrou ao pé do meu ouvido. — Eu fico de joelhos pra você a hora que me pedir.
Ri, encolhendo os ombros. sempre apelava quando via que estava prestes a levar um “não” meu.
— Está romântico demais, ainda está sob o efeito do remédio?
Ele se afastou um pouco, revirando os olhos com um sorrisinho lutando para aparecer.
— Se lembra do que me disse ontem?
— Me lembro pouco de ontem depois que comecei a passar mal — comentou com o olhar longe. Imaginei como deveria ser ruim para ele pensar no assunto, o quão assustador foi se ver sozinho numa situação daquelas. — Lembro de você chegando, com seu vestido amassado… — riu fraco, sem humor. Então, desviei meus olhos dos dele. Se pudesse escolher, o faria não se lembrar daquela parte. — Do cheiro da sua pele quando saiu do banho… De ter falado que queria dormir com você… e de fato dormir.
— Você disse que me ama.
Seus olhos verdes se arregalaram. Fiquei em silêncio, tentando não criar expectativa. Afinal, aquele “eu te amo” não tinha saído de , e sim das substâncias contidas no remédio para fazê-lo dormir.
Neguei com a cabeça, rindo de sua cara de assustado. Realmente, era algo bem sério, do tipo que não falava para nenhuma outra além de . E mesmo que ele realmente tivesse me falado aquilo sóbrio, eu não sabia o que pensar sobre… Aquela era a única coisa que me assustava e me fazia não querer parar de fugir.
— Eu devia ter gravado — gargalhei daquela vez com sua cara de ofendido.
— E ficar rindo da minha cara num momento de fragilidade meu? — ele se levantou, apenas atiçando mais minha risada.
Não sabia se estava realmente bravo, mas foi divertido relembrar nossos velhos tempos de picuinhas. Saí da mesa ainda risonha, alcancei seu corpo quente e enlacei seus ombros com meus braços.
— Muito engraçado — ele ralhou, ainda sem me tocar. — , se você gravou…
— Me desculpa, é que você estava tão bonitinho ontem, dormindo feito um bebê.
“Falando todas aquelas coisas”, acrescentei na minha cabeça. Com certeza não estava em plenas faculdades mentais.
— Eu não gravei nadinha, juro — dei-lhe um selinho casto, tendo suas mãos pegando-me pelos quadris quando cedeu e parou de birra.
Encarei-o após terminarmos o beijo. Por que tinha ficado tão incomodado com uma possível gravação? Eu sabia que tinha sido da boca pra fora, mas éramos amigos, certo? Uma família, como dito mais cedo. E nós amamos nossa família e amigos, não?
Me perguntei se gostava mesmo de mim ou se ele gostava do que eu representava naquela história: a mãe da filha dele. E quando o divórcio saísse? Ele se afastaria e passaríamos a ser estranhos? Eu seria a mulher que lhe entregaria nos fins de semana quando ele ficaria responsável por cuidar dela com outra mulher ao seu lado?
Baixei a cabeça, sentindo meus braços deslizarem por seus ombros e deixarem seu corpo aos poucos.
— O que foi? — ele ergueu meu rosto e buscou meus olhos, pegando em meu queixo. Neguei com a cabeça, desdenhando. insistiu e beijou minha boca, como se assim pudesse me fazer falar o que tinha em minha cabeça.
— ? ?
Nos afastamos num pulo ao ouvir aquela voz familiar. Engoli em seco ao me deparar com Amélia nos encarando sorridente.
Sorridente demais.
— Quanto tempo! — ri nervosa, sentindo a mão de me apertar a cintura duas vezes. Ele também sentia a sensação de ser pego no flagra? — Como vai?
Seus olhos azuis ainda alternavam entre e eu com desconfiança. Demorei para notar o homem ao seu lado e de uma criança com um dinossauro, digo, cachorro na coleira.
— Vou bem, e pelo visto os dois também — a loira riu e arqueou as sobrancelhas, sugestiva. — Amor, esses são os . São meus clientes e estão disputando a guarda dessa bonequinha aqui — inclinou-se sobre o carrinho e afagou a barriguinha de .
— Prazer, Roger — o homem cumprimentou, e retribuí seu aperto de mãos. — Já ouvi falar vagamente de vocês algumas vezes.
— Esses são Benjamim e Derik — Amélia os apresentou, fazendo-me encará-los sem entender quem era quem.
— Eu sou o Ben — o garoto que devia ter seus dez anos explicou, sorrindo amarelo, provavelmente acostumado a ter que esclarecer para não ser confundido com o cachorro com nome de gente.
O cachorro de pelagem escura vagou curioso pelos pés dos donos e se aproximou do carrinho de bebê, passando o focinho nos pezinhos de . Me assustei quando ele se animou e, de rabo balançando, ficou de pé nas patas traseiras.
— Derik! — Roger repreendeu, puxando-o para perto pela guia. — Desculpe por isso. Eu disse que ele estava ficando agitado — alfinetou a esposa, rindo.
— Nós já vamos, querido — Amélia decretou, vendo o filho tentar distrair o cachorro. — Foi bom ver vocês. Temos que marcar algo para que eu possa ser atualizada dos últimos acontecimentos.
Primeiro eu tinha que ser atualizada também, porque não tinha nada para contar de novo. e eu assentimos ainda sem fala; fomos pegos completamente desprevenidos.
— Tchau, , — ela nos deu beijos na bochecha. — Tchau, — voltou a acariciar seu corpinho, que se agitou com o carinho.
Ainda paralisados, vimos a família ir embora. ainda me segurava pela cintura, descontando o nervosismo do momento. Nos encaramos ainda calados, e eu acabei soltando uma risada desacreditada. Éramos realmente péssimos em guardar segredos.
Primeiro Tom, agora Amélia. O receio de mais alguém ficar sabendo me tomou, não somente pelas minhas amigas descobrirem, mas também por saber que estávamos muito bem com aquele segredo. Se ninguém soubesse de nós, teríamos um pouco de paz pelo menos enquanto estivéssemos juntos e a sós.
— A culpa é sua — lhe bati de leve com minha bolsa pequena. ofegou, ultrajado. — Fica me beijando em público — prendi o riso, destravando as rodinhas do carrinho.
— Eu sou seu marido, é pra isso que eu sirvo — abraçou-me por trás, fazendo-me rir.
Nos restava rir daquela situação. Não tínhamos ideia do que falaríamos para ela.
Borrifei o perfume em meu pescoço com me apressando, como sempre. Revirei os olhos em implicância ao vê-lo sentado na cama com a bebê já arrumadinha no colo. Pior que eu nem tinha desculpas daquela vez, ele mesmo tinha dado banho e vestido . Me enrolei com meu cabelo e, com toda a hidratação que tentei fazer nele, acabei perdendo a hora.
Quando chegamos na festa, ela já tinha começado. Era de se esperar que a decoração fosse exagerada, mas Victoria tinha passado dos limites um pouco. O jardim de sua casa parecia um parque de diversões, repleto de tantas crianças que eu nem sabia que existiam naquele condomínio. Os heróis da Liga da Justiça estavam presentes em todo canto, inclusive nas roupas dos pequenos que corriam fantasiados pra lá e pra cá.
Fiz o que sempre fazia com em nossas aparições em público e me juntei às mulheres de sempre. Megan não tinha perdido o costume de elogiá-lo demais, mesmo que estivesse na minha frente, falando o quanto ele estava mais bonito com os braços mais definidos. Ri dela sem conseguir ser discreta; não estava mais sequer praticando suas corridas matinais, quem dirá indo à academia. O único exercício físico que ele andava fazendo era sexo em excesso, o que, tratando-se dele – que tinha duas mulheres para praticar –, talvez realmente desse aquele resultado de academia.
Fora aquelas inconveniências corriqueiras, eu estava me sentindo bem ali. No início, me preocupei muito sobre como iria me habituar a viver no meio de pessoas tão diferentes de mim. Apesar do tempo que não nos reunimos, aprendi a lidar com cada uma das vizinhas e suas particularidades, que tipo de assuntos evitar e até como manter as aparências do meu casamento intactas.
Antes eu me esforçava para elogiar , chegava a até ser algo físico. Era difícil segurar o riso quando eu falava sobre ser um marido muito bom e um pai incrível, porque nunca tive aquela imagem dele. Mas agora estava fácil, eu fazia isso e nem percebia. Até porque ele era realmente tudo o que menti no passado, surpreendendo até eu mesma sobre como a vida poderia ser engraçada.
’s point of view.
Troquei em um dos quartos de hóspedes que o marido de Victoria me cedeu e voltei para meu canto de sempre. O assunto agora era Fórmula 1 e eu não era habituado a ver corridas, então apenas fiquei calado, ouvindo os caras animados falarem sobre a última competição e suas expectativas para as próximas.
Não era muito difícil me encaixar no meio deles. Não eram muito diferentes dos amigos do meu pai, que cresci no meio, ou até mesmo do meu círculo de amizades. talvez tenha encontrado mais dificuldades em se camuflar no meio das mulheres de classe alta, mas ao que parecia, tinha dado seu jeito para se enturmar. Não sabia o que elas tanto falavam, mas toda vez que colocava meus olhos nela, a via acompanhada de alguém rindo. Minha esposa era esperta, tinha encontrado um jeito de lidar com as diferenças que deveriam atrapalhá-la. Fora que era engraçada e inteligente, não tinha como não prestar atenção nela.
Dei um gole em minha cerveja e a encarei de longe. Reparei desde seus cabelos loiros e brilhantes com o reflexo da luz do sol até seu corpo delineado pelo vestido que ela usava. Seus olhos azuis repararam em mim, como se soubessem que tinha alguém a observando. Sua testa franziu, estranhando minha atenção sobre ela, e, movendo os lábios, perguntou se eu queria lhe dar a bebê, mas neguei, ajeitando em meu braço. Ela se dispersou e voltou a prestar atenção em Victoria, que falava animadamente sobre algo a ver com a decoração da festa.
dormiu em meus braços e a deixei no mesmo quarto de antes, com a porta fechada e longe da barulheira da festa. Quando voltei, os caras já tinham se dispersado. Alguns deles estavam sentados com as respectivas esposas, então fui fazer o mesmo, aproveitando que a neném tinha dormido e que poderia namorar um pouco sem interrupções.
Nossa filha fazia sucesso entre os vizinhos. Sempre queriam pegá-la para ficar um pouquinho em eventos; nós que tínhamos medo de incomodar e ficávamos com ela. Porém, já que estava segura e dormindo seu soninho da tarde, não precisávamos nos preocupar com aquele detalhe.
Quase derrubei minha garrafa quando avistei de longe, acompanhada por Tom próximo da mesa de doces. Ele estava perto de seu corpo, muito perto. Tão perto que arriscou uma vez ou outra lhe falar algo ao pé do ouvido – isso enquanto eu estava olhando. Imaginei o que não fez antes que eu os percebesse ali. , como sempre, tentava se esquivar de maneira educada, coisa que eu já tinha lhe dito que Tom se aproveitava.
Meu sangue ferveu quando vi sua mão cobrindo a dela quando apanhou um cupcake para si. Respirei fundo e olhei em volta para ver se alguém mais os observava. Ou pior, se algum convidado da festa notava minha face vermelha de raiva, porque eu sentia minhas bochechas queimarem enquanto assistia a cena. Se na noite anterior vê-la sair e imaginar tudo o que eles poderiam fazer juntos já me doeu, imagine ali, vendo-os em ação. Eu sentia palpitações dentro do peito, ficava difícil até de respirar.
Controlei meus instintos e me mantive à distância. Eles, na verdade, me mandavam ir até lá e tirá-la de perto de Tom, mas eu não faria aquilo. Primeiro pelas aparências, porque eu não poderia bancar o marido ciumento, sendo que, para todos os efeitos, nosso casamento era perfeito. E também porque… porque eu não deveria estar sentindo aquilo… aquela dor no peito, a vontade de afastá-los, de tê-la para mim e mais ninguém.
Respirei fundo, fechando os olhos ao decifrar todos aqueles sintomas e chegar à conclusão que tanto me amedrontava: eu estava com ciúmes. Morto de ciúmes. Nunca tinha me sentido daquela forma antes. Era tão passional que eu preferia guardar para mim. Tão vexatório diante da nossa situação que aquilo deveria ser mantido em segredo junto de tudo o que me causava desde que nos casamos.
Me sentia tão idiota. Sentia aquilo me sufocar desde a noite passada, sabendo que provavelmente não sentia o mesmo por mim quando era a minha vez de ter algo com outra pessoa fora daquele casamento. Tudo bem, não ia com a cara de Dafne, mas não era ciúme, ela apenas se comparava com ela. Eu não, não me comparava a Tom. Eu era o completo oposto dele, e estava puto da vida justamente por aquilo. Dormian era tudo o que sempre sonhou para si, e agora que ela o tinha nas mãos, iria se deleitar à vontade enquanto eu não queria dividi-la com mais ninguém.
Pior, eu não tinha que querer. Não tinha direito sequer de contestar suas decisões. era livre, mesmo que se recusasse a acreditar. Ela não me respondeu quando a pedi para prometer que não deixaria Tom tocá-la do jeito que eu tocava. E eu sabia que estava sendo egoísta, um tremendo filho da puta. Não deveria pedir nada a .
E vê-la deixá-lo se aproximar daquele jeito respondeu aquilo para mim: e Tom deviam ter feito muito mais na noite passada. A familiaridade com que ela encarava o fato de Dormian estar pegando em seu rosto para limpar o canto de sua boca sujo de glacê azul fez meu estômago revirar.
Ao longe, vi Megan sair da mesa que estava e ir em direção ao gramado. Sabia que poderia estar indo atrás dos filhos que ainda corriam pra lá e pra cá, mas fiquei com medo de que ela colocasse seus olhos maldosos em cima do Casal 20 e percebesse o que estava rolando ali. Não era muito difícil de adivinhar, dado ao grau de intimidade que pareciam ter.
— As praias em Malibu são lindas, você vai adorar conhecer, …
Não pude evitar de franzir o cenho ao me aproximar para arrancá-la das garras daquele velho e ouvi-lo fazer planos de viajar com ela.
— Agora que não está trabalhando mais, poderíamos…
Só de pensar nos dois juntos como estivemos em Tulum, na praia, de roupas de banho, no verão, exatamente igual onde transamos pela primeira vez… Respirei fundo antes de interromper aquela palhaçada:
— Sabe que não pode simplesmente sumir por dias, não sabe?
Além de estar quase agarrando minha esposa na frente de todo mundo, ainda queria atrapalhar mais ainda nossa farsa e levantar suspeitas de um divórcio? Ele era fã ou hater?
Às vezes eu tinha a impressão de que Dormian iria adorar caso fôssemos pegos na mentira, assim o caminho ficaria livre para ele. Felizmente só aconteceria em sua cabeça, porque o odiaria pro resto da vida caso Tom fizesse algo para prejudicar nosso processo de adoção de .
— Me deixe adivinhar. Ela tem que ficar em casa cuidando da criança, esperando você voltar do trabalho e preparando seu jantar.
Arregalei meus olhos, segurando meu punho cerrado. Eu jurava que lhe daria um soco muito bem dado. Nunca enxerguei daquela forma, como se me servisse de alguma maneira. Nós dois dividíamos e muito bem as tarefas em casa. Tom mais uma vez estava querendo arranjar algo para me fazer ficar mal diante de .
— Parem já vocês dois, daqui a pouco vão olhar e perceber — a loira se colocou entre nós. — Assim como na viagem de fim de ano, vou recusar o convite. e eu temos um compromisso com a guarda de .
Sim, nós três tínhamos um compromisso, coisa que ele não teria com ela tão cedo.
— Tudo bem, . Quando o seu divórcio sair, te levo para onde você quiser quando for a vez de ficar com .
Ri com sarcasmo, sentindo no fundo uma pontada no peito ao saber que não conseguiria impedir aquilo também.
— Mas você viaja quando?
— Opa! Vai viajar, Dormian? Que notícia maravilhosa! — dei-lhe um tapinha no ombro, sem conseguir esconder o sorriso aberto que ocupava meu rosto. Finalmente iria me livrar daquele encosto centenário.
— Depois de amanhã. Inicialmente, é apenas um congresso.
Continuei a sorrir, torcendo para que fosse algo permanente e que Tom tivesse comprado a passagem só de ida.
— Não demoro a voltar, e claro que pode me ligar sempre que precisar de mim — ele pegou a mão dela pra si, fazendo-a concordar veementemente com a cabeça.
— Ela não vai — agarrei sua cintura, puxando-a para mim.
— Não tenha tanta certeza, . Nunca se sabe quando você vai estar ocupado com a tal Dafne…
Encarei , possesso. Por acaso ela estava dando munição para que Dormian pudesse me atacar?
Capítulo 42
Eu estava puto. Não somente por mais uma vez ter Tom se metendo onde claramente não foi chamado, mas também por saber que tinha quebrado a promessa que fizemos em Tulum. Promessa esta que foi criada justamente para afastar Dormian dos nossos assuntos, mas como o grande intrometido que era, ele sempre dava um jeito de se colocar em lugares onde não o pertenciam! Tratava como se fossem íntimos, pior! Como se tivessem algo como um relacionamento! Com certeza criado só na cabeça dele, é claro. Ele não conhecia minha esposa; a maioria das coisas que sabia sobre ela descobriu em meio à nossa farsa.
Tom não sabia como era ao acordar, com sua manha para não se levantar da cama. Muito menos como era ao dormir, quando se esparramava sobre o colchão e qualquer outra coisa que estivesse com ela ali. Ele não sabia dos seus segredos, traumas, angústias, não sabia de nada! Mas agia como se soubesse, e aquilo me irritava profundamente.
Mas também não era como se fosse inocente naquela história toda. Tudo bem, ela quis sair com ele. E apesar de eu não querer que isso acontecesse, estava no direito dela – eu não estava em posição de exigir muita coisa enquanto estava saindo com Dafne. Porém, mais uma vez, aquilo não lhe dava o direito de quebrar a promessa.
Ela não via que Tom só queria nos separar antes da hora só para tê-la inteiramente pra si? Com aquele papinho de viagem, querendo levá-la pra encher sua cabeça de merdas sobre mim. nunca precisou de ajuda para pensar que eu era um merda antes, não seria agora que mudaria de opinião.
Pensar naquilo me fazia experimentar uma amostra do ódio que nutri por durante os anos. Parecia que fazia de propósito. Era educada com Tom quando sabia muito bem se defender e dar um fora nele de vez. Talvez não o fizesse para me atingir, me fazer pagar pelo que fiz com ela quando ficava com Dafne.
Espera um pouco. Se estava se vingando, quer dizer que ela sentia o mesmo que eu quando sabia que estaria com outra pessoa? Ela sentia raiva ao saber que minhas mãos passeavam pelo corpo de Dafne, asco ao me imaginar beijando sua boca ao invés de estar em casa com ela?
Se sim, devia saber que eu nunca faria aquilo de propósito. Só eu sabia o que tinha passado noite passada ao vê-la sair porta afora, sabendo que ele iria tomá-la para si como eu fazia e que não poderia fazer nada para impedi-la de ir.
— , vamos ali no canto conversar uma coisinha, rapidinho — peguei-a pela mão. Eu iria tirar aquela história a limpo ou não me chamava .
Estava cansado daqueles joguinhos, de passar nervoso com Dormian rodeando a gente feito um abutre procurando alguma desgraça para se alimentar. Eu já lhe disse e tornaria a repetir: se deixasse Tom, eu juro que deixaria Dafne sem sequer pestanejar. Gostava muito de ficar com ela, mas com Dafne era apenas sexo. E como também já disse a uma vez, minha esposa era o suficiente, mais do que qualquer homem pudesse desejar ter em casa.
Não sabia o que se passava na cabeça dela. nunca me deixava saber com certeza o que estava pensando ou sentindo; logo, não poderia afirmar com a mesma certeza se eu era o suficiente para ela. Não conseguia esquecer do que ela me disse naquela discussão: que o que falávamos quando estávamos juntos, anestesiados pelo prazer ou na atmosfera que nos envolvia quando nos beijávamos, era da boca para fora. Da minha parte não era, mas ouvi-la falar aquilo me fez saber que, para ela, era apenas um mero teatro. Um jogo de palavras para excitar e incrementar nossa fantasia.
— Não é melhor irmos para a mesa do bolo? — sorriu amarelo enquanto Dormian continuava a segurar sua outra mão. A cena era ridícula. Parecíamos duas crianças disputando um cabo de guerra. — As crianças estão reunidas lá, acho que já vão cantar parabéns.
Encarei-a sério, repreendendo sua gracinha. Eu saquei o que estava tentando fazer: fugir da discussão que sabia que iria perder. tinha noção do que tinha feito. Eu soube no exato momento em que a olhei bravo ao ouvir Tom citar Dafne como se estivesse bem familiarizado com aquele nome.
— Não, nós precisamos conversar — puxei-a em direção aos brinquedos infláveis montados no canto do jardim. não se moveu, claro. Tinha um peso morto do outro lado segurando sua outra mão.
— não quer ir com você, deixe-a em paz — a mão fria dele pousou em meu antebraço. Eu segurava firme a mão de , então sua intromissão não foi eficaz. Mesmo assim, devia admitir que foi forte o bastante para me fazer esquecer completamente de onde estávamos e me provocar uma reação quase animalesca – avancei em sua direção sendo tudo menos racional naquele momento.
Quem Tom pensava que era para se meter entre nós? Já estava ali, tentando achar uma brecha há muito tempo, e eu não o permitiria mais pensar que tinha tal liberdade.
— Não me diga como tratar minha esposa — ralhei próximo ao seu rosto, sentindo meu punho ferrar-se com força, pronto para acertá-lo em cheio no rosto.
— Ela não é sua esposa — ele avançou também, estufando o peito como um galo de briga. — Eu, que acabei de chegar na vida dela, a trato melhor que você, . Salvei-a de um acidente que você deveria ter prevenido de deixá-la ir e vir naquela bicicleta frágil. Visitei-a no trabalho, levando chocolates e oferecendo apoio quando ela perdeu o gato que eu ajudei a cuidar…
— , que história é essa?
Aquele filho da puta soltou um riso sarcástico na minha cara.
, no meio de nós, chacoalhou ambas as mãos e se viu livre. Pude ouvi-la ofegar nervosa e tentei recobrar minha sanidade, pois não queria causar nada de ruim nela. Porém, já estava na hora de acabar com aquela palhaçada de vez.
— Eu não te disse, ? — Dormian desviou os olhos azuis para o rosto angustiado dela, que apenas me olhou de canto de olho ao engolir a seco.
Devia ter ficado estampado na minha cara o quão puto eu estava ao vê-los se comunicarem como se partilhassem segredos ou tivessem alguma piadinha interna. Tom fez parecer que sim, falou de um jeito que tinha certeza de que entenderia quando ouvisse, e minha esposa o fez. Eu não sabia o que era, mas não gostava nem um pouco da cara que ela estava fazendo.
— Esse idiota acha que tem algo real com você — ele arqueou as sobrancelhas como se tivesse acabado de falar um absurdo.
me olhou receosa, ficou muda, e eu desviei minhas atenções daquele babaca para encará-la de volta. Não bastava terem falado sobre nós, ela ainda se gabou de algo que eu nunca nem fiz menção de dizer a . Nunca falei que achava que tínhamos alguma coisa séria, mas ao mesmo tempo achava que era uma conclusão bem óbvia para ser dita em voz alta.
Não era algo que precisava ser traduzido em palavras, não quando as atitudes estavam bem ali, diante dos nossos olhos.
Nós dormíamos juntos, agarrados quase toda noite, menos quando dormia na nossa cama conosco. Mas, ainda assim, os olhos dela eram minha última visão ao fechar os meus quando eu caía no sono, e eram o meu primeiro vislumbre da cor do céu quando amanhecia. Sua pele deslizava sobre a minha; minha boca conhecia seu corpo por inteiro. Quando estávamos a sós, era para mim que ela sorria. Seus pelos se eriçavam quando eu a abraçava, e foi nos meus braços em que sempre se sentiu segura para desabar quando se sentia insegura.
Não era real o bastante para ? Éramos responsáveis por uma criança, dividíamos o mesmo teto; não era sério o bastante? Porque eu nunca tinha tido algo sequer parecido com nenhuma outra mulher na vida.
Balancei a cabeça a fim de me dispersar daqueles pensamentos. Era idiotice. podia pensar o que quisesse sobre o que tínhamos – eu não iria mais discutir aquilo com ela. Eu sempre saía perdendo; me abria e dizia coisas que, no fim das contas, eram descartadas por ela como se fossem meras bobagens ditas da boca pra fora.
— Vocês dois não passam de uma farsa, .
Rangi os dentes como um cachorro raivoso prestes a atacar.
— Pare de provocar, Tom! — finalmente tomou uma atitude e o repreendeu, se enfiando entre nós dois de forma desesperada como sempre. — Vem, vamos conversar — me puxou, tentando me afastar de Dormian. Ele estava brincando com a sorte, sorrindo prepotente, apenas esperando o impacto do meu punho fechado em sua cara. — Não era isso o que você queria? — o toque dela em meu rosto me distraiu por um instante. Encarei seus olhos ao ter meu queixo sendo puxado em sua direção. — Por favor, amor.
Estremeci ao ouvir sua voz amena. Me senti péssimo por ter caído na pilha de Dormian e por quase ter protagonizado uma briga física que não pegaria nada bem diante dos vizinhos.
Selei nossos lábios após me afastar de Dormian e aceitar ir com ela para onde quer que fosse me levar. Olhei para Tom enquanto tinha sua boca na minha e a agarrei com destreza, para mostrar a ele o meu lugar na vida de . Afinal de contas, era comigo que ela passou a andar apressadamente pelo jardim até uma área mais afastada. Era a mim quem ela tinha acabado de chamar de amor, e comigo com quem tinha se casado e iria continuar pelos próximos meses.
— Tem que aprender a se controlar, . Não é a primeira vez que tenho que me enfiar entre você e Tom para poder impedi-los de se socarem!
Encarei-a sarcasticamente ao chegarmos na área vazia onde os brinquedos infláveis estavam.
A solução para aquele problema era simples! Que nos deixasse sair no soco, ora! parecia se preocupar com Dormian e a integridade daquela cara de sonso dele mais que tudo no mundo. Da última vez que fiz menção de ir pra cima dele, lá estava ela, a postos para defendê-lo.
— E você tem que controlar sua língua — falei, e abriu a boca ultrajada. O pior de tudo era que ela nem ao menos se dava conta do sentido que eu falava. — Eu não acredito que contou a ele sobre… sobre tudo!
Não era somente àquilo que eu me referia.Queria que controlasse sua língua e a mantivesse longe da boca de Dormian! Só de imaginar a cena, meu estômago embrulhava.
— Oh, eu entendi agora — a loira à minha frente riu, sem o mínimo resquício de humor. — Esse show todo que deu é sobre Dafne.
— Meu pai amado — levei a mão à testa, respirando fundo. Lá íamos nós.
— Você pode sair contando a ela sobre mim, mas eu não posso sequer citá-la a Tom que você já fica defensivo, morto de preocupação pela sua protegida que tanto defende.
Quem arfou em indignação fui eu. Eu não a defendia! Quer dizer, a justificava quando fazia alguma acusação baseada nas vozes da própria cabeça. falava de Dafne como se ela fosse uma destruidora de lares, como se nós dois passássemos noites a fio planejando um relacionamento que jamais iria existir.
Coisa que eu tinha acabado de presenciar entre ela e Tom, e não era a primeira vez. Comecei a achar que talvez tivesse tais ideias baseadas no que ela mesma fazia com Dormian. Como se, me acusando daquele jeito, pudesse se isentar do que a própria praticava. Fora que nunca me deixava saber o que ela pensava sobre ter algo com Tom, o que me abriu os olhos para algo que eu já vinha pensando há algum tempo: planejava mesmo ficar com ele após o divórcio.
E eu, o idiota da história, já tinha lhe dito milhões de vezes que não tinha nada com Dafne! Mas por algum motivo desconhecido por mim, entendia o completo contrário.
E era teimosa! Como se fosse dona da razão, como se soubesse o que se passava em nossas mentes num tipo de bola de cristal. Não importava o que saísse de minha boca – se negava a ouvir e ver minhas atitudes, como eu tentava demonstrar o que sentia, mesmo não entendendo bem o que era aquela vontade de sempre trazê-la pra perto.
— Já conversamos sobre isso, — controlei minha voz para não parecer tão impaciente.
Também estava me cansando de me humilhar para ela. Não iria mais deixar claro o que eu tinha com Dafne – era desgastante, e no fim ela continuava pensando o que queria, de qualquer forma. Se quisesse mesmo ficar com Tom, que ficasse. Eu daria um jeito de me distrair do ódio cada vez que os visse juntos. Não seria nada fácil, mas depois de vê-lo debochar de mim daquela forma, certo de que eu era um idiota iludido que achava que a tinha – quando ela já deixou claro como a luz do sol que não –, decidi tomar vergonha na minha cara.
Eu não era o galinha, que ficava com várias e não era digno de tê-la como o incrível Tom Dormian, um cirurgião metido a George Clooney? iria me pagar por aquilo. A partir daquele dia, eu seria um novo homem, iria negar sexo e sair com outras. Ela não estava instatisfeita com Dafne? Pois ela que me aguardasse; eu iria sair com Dafne e com outras. Iria lhe dar mil motivos para reclamar.
Falando em sair com outras pessoas…
— Quando ia me contar que Tom levou chocolates pra te consolar? — cruzei os braços. Eu só achava engraçado que fez um dramalhão quando a deixei em casa para socorrer Dafne, mas quando era ela, se encontrava às escondidas com Tom. Eu nunca escondi nada dela.
— Do mesmo jeito que você ia me contar que foi na “cafeteria” com Dafne naquele dia? — ela devolveu, e franzi o cenho. fez aspas como se aquilo fosse um código para sexo extraconjulgal. — Não se faça de desentendido, . Eu só fiquei sabendo aonde você foi porque esqueceu a droga do blazer e teve que voltar pra buscar.
Inclinei a cabeça, observando-a com mais cuidado. Reparei na vermelhidão de suas bochechas e no ódio em seu olhar. tinha a mandíbula tensionada e raiva na voz ao citar aquele acontecimento que, se eu me lembrava bem, a tinha deixado estranha demais.
Lembrava-me de ter tentado beijá-la como sempre fazia ao ir buscá-la no trabalho e ter sido negado em todas as tentativas de aproximação, desde ter minha mão retirada de sua coxa no carro até minha oferta de banho juntos em casa. estava calada, evitava me olhar nos olhos e parecia ressentida. Parecia com… ciúmes?
Deixei um sorrisinho escapar. De repente, toda a raiva que eu sentia se esvaiu. Que droga de mulher doida era aquela? Antes, seria a última pessoa a me fazer rir durante uma briga, mas naquele momento ela me fez querer fazer muito mais que sorrir. Queria calar sua boca com um beijo, entrelaçar suas pernas em meu quadril e levá-la para nossa casa.
— Do que está rindo, ? — esbravejou, fazendo-me negar com a cabeça, reparando no quão linda ela ficava bravinha. Que inferno, eu continuava achando sexy a ruguinha que formava entre suas sobrancelhas enquanto ela me xingava e ameaçava me matar! — Por acaso acha engraçado sair por aí com outra colocando nosso plano em perigo só pra se satisfazer?
Arqueei as sobrancelhas.
— Você fala como se Tom não nos colocasse em risco também.
Apesar dos momentos de distração, vez ou outra a raiva me tomava novamente. Eu ainda era o mesmo de antigamente, e infelizmente – ou felizmente, não sabia dizer – continuava tão pirracenta quanto antes.
— Ele sabe de tudo e é doido pra nos delatar só pra ficar com você.
— Já disse que não pretendo ter nada com Tom, pelo menos não antes do divórcio acontecer.
Nossa, essa doeu.
Foi como se eu tivesse acabado de levar uma pancada no peito. Cheguei a respirar devagar, como se a região estivesse machucada e qualquer respiro mais forte agravasse a dor. Então era o que eu já tinha previsto. Os planos estavam de pé para que ela lhe desse uma chance quando saíssemos daquele casamento.
— Dafne não vai contar nada, pode ficar tranquila quanto a ela. Ao contrário de Dormian, ela não quer atingir nenhum de nós dois — minha voz contida se fez presente novamente. Daquela vez, ela não escondia impaciência; era mágoa, na sua mais pura e consistente forma.
Eu quis sair quase correndo dali. Não queria olhar mais na cara de . Queria me livrar da visão de seus olhos azuis amuados, olhando-me de volta com um receio que machucava. Era tão diferente do jeito que os assistia no nosso cotidiano… Eu gostava quando cintilavam enquanto ela ria de alguma coisa que eu fazia, ou quando reviravam ao receber prazer…
parecia não saber o que fazer: encarou o espaço à nossa volta por um segundo, levou uma das mãos à nuca e massageou a região que sofria com a tensão que lhe acometia os ombros. De repente, foi como olhar no espelho – vê-la perdida me fez reconhecer meu próprio reflexo ali, desenhado diante de mim.
Será que ela me enxergava frágil como eu a estava vendo? Sentia vontade de me tomar em seus braços, dizer coisas que… Merda, eu sentia minha boca secar ao me imaginar dizendo tudo o que passava pela minha cabeça. Me mantive calado, sufocando aquela voz dentro de mim, na esperança de conseguir manter meu plano anterior de preservar minha dignidade diante dela.
— Esse não é o assunto que eu queria tratar com você, de qualquer forma.
Suspirei, derrotado. Estava desgastado de tantas discussões envolvendo aqueles dois. Toda vez que estávamos bem, um deles aparecia para atrapalhar aquilo; seja Dafne completamente inocente ao tentar me ajudar às vezes com meu casamento, seja Tom com suas más intenções pra cima da minha esposa. Eu só queria que aceitasse minha proposta e deixasse Tom pra lá. Não era possível que isso fosse pedir muito a ela. Eu não queria acreditar que ele já tinha tomado ao menos um pedaço de seu coração, a ponto de fazê-la lutar para ainda tê-lo em sua vida.
— , tínhamos um trato, se lembra? De não falarmos sobre nós nem para Tom, nem para Dafne.
— Se é que esse trato é válido, né? Eu estava bêbada e não me lembro direito do que você decidiu sozinho naquela noite — cruzou os braços como uma criança emburrada. Era ridículo! Nós dois agíamos como duas crianças birrentas. — Você acha que eu não sei que vocês também falaram sobre nós da última vez que se encontraram?
Por que tinha que ser tão complicada, hein? Não largava o osso, não admitia erros quando seu orgulho estava envolvido! Às vezes queria que ela fosse apenas a que se desmanchava quando estava em meus braços, mas eu sabia que as coisas não funcionavam daquela maneira e que não adiantava querer somente a versão dela que me convinha. Era por aquele motivo, exclusivamente por ele, que eu ainda tinha paciência e cedia em momentos como aquele.
— Não falamos sobre você, — fui sincero. Eu tinha literalmente ido e voltado quase mudo no carro com Dafne. Cheguei até a tratá-la com um certo descaso depois de sair da casa sabendo que tinha deixado magoada. — Esse era o combinado, não? — falei mantendo o tom amigável.
Não iria inflamar outra briga. Ultimamente, era só aquilo que fazíamos quando havia uma interferência de terceiros entre nós. Brigar e transar. E apesar de ter começado aquela história daquele jeito e amar nosso sexo de reconciliação, eu não queria mais.
Algo ao longe entrou no meu campo de visão: uma das crianças que corriam e berravam pelo jardim um tempo atrás surgiu, andando perdida, procurando algo.
— Óbvio que não falaram sobre mim, ela estava com a boca ocupada no seu p…
Empurrei pelo ombro, interrompendo seu show que já recomeçava. O garoto procurava por nós, e ele com certeza iria sair espalhando pra todo mundo que nos viu brigando.
— Seu filho da…
— Olha a boca! — a repreendi; primeiro pelo palavrão, depois pelo tom de voz. Me lancei sobre ela, caindo de joelhos em meio às bolinhas coloridas da grande piscina de plástico amarela. — Esta é uma festa de criança, — continuei minha bronca, rindo ao vê-la me encarar indignada.
Era sempre ela quem ditava regras e fazia suas repreensões, mas já tinha falado demais por um dia só. Estava na hora de fechar a boca um pouco, pra variar.
— Saia de cima de mim, ! — esperneou, tentando se esquivar de meus braços posicionados um de cada lado de seus quadris na piscina.
— Fique quieta... — virei o rosto, tentando ouvir os passos do menino, que passou a nos chamar enquanto perambulava por aí.
Se denunciássemos nossa localização e ele nos pegasse naquela posição, e ainda por cima escondidos do resto dos convidados… Bom, eu não sabia o que se passava na cabeça de um garoto de doze anos, mas iria preveni-lo do trauma de pegar dois adultos um em cima do outro, seja lá o que estivessem fazendo.
Os passos dele foram se afastando quando percebemos que ele havia desistido de procurar. Virei-me de volta para e a ouvi suspirar audivelmente.
— Bom, se era só isso que queria falar… — ela evitou me olhar nos olhos ao colocar os cabelos loiros para trás das orelhas.
Não gostava daquele clima estranho entre nós. Não costumava pisar em ovos com ela. Nos conhecíamos há muito tempo – conhecia meu lado ruim e estava conhecendo o bom no momento. Já passamos por tantas coisas juntos que era como se fosse a pessoa que mais me conhecia no mundo atualmente. Era esquisito tentar mascarar coisas diante dela.
— Olhe pra mim — sussurrei, pegando seu queixo e levantando seu rosto.
— … — ela tentou tirar minha mão.
Eu não iria me calar diante de seu temor, era sempre daquele jeito. Eu tentava acessá-la e se fechava em seu casulo. Eu recuava para respeitar seu espaço, mas se não falasse, sentia que iria explodir.
— Acha que eu gostei de ouvir suas amigas falando sobre você e Tom? Te aconselhando a dormir com ele? — arfei de raiva, só de lembrar. Anne mandando-a vestir algo fácil de tirar, que ódio! Eu nunca quis tanto na vida mandá-la calar a boca, e olha que já desejei aquele momento muitas vezes quando era obrigado a conviver com ela. — Eu fiquei morto de ciúmes com você concordando, — continuei, e a vi prender a respiração. Sua expressão mudou de repente, ela iria dizer algo. Mas eu não iria parar, era tarde demais para parar. — E depois, ver ele te levando pra sair com você vestida daquele jeito, toda linda e perfumada… Doeu pensar que Tom pudesse beijar seu pescoço, sentir o seu cheiro de perto e até mesmo tirar a sua roupa e tocar sua pele, que eu já beijei inúmeras vezes…
Deslizei meu nariz por seu pescoço, sentindo o perfume e a maciez de sua pele. Parei quando cheguei em seu ombro descoberto pelo vestido de alças que usava, e ali depositei um beijo casto, vendo-a se arrepiar gradativamente. Minha esposa encolheu os ombros com a sensação que sentiu e se aproximou devagar de meu rosto ainda séria. Senti falta do seu sorriso, mas estive ocupado demais olhando-a no fundo dos olhos.
— Eu não transei com ele.
Fechei os olhos instantaneamente, apreciando o que saiu de seus lábios.
— Graças a Deus.
Sem brincadeira ou ironia alguma, suspirei aliviado. Deixei-me descansar com a testa apoiada em seu ombro. Em seguida, levantei minha cabeça ao ouvi-la suspirar frustrada.
— Sei que neguei quando você me disse antes, mas… e-eu também tenho ciúmes de Dafne.
Senti meu coração errar as batidas antes que se acelerasse de vez.
— Tenho mentido sobre coisas que sinto, , mas é porque… — ela olhou para longe, relutante, enquanto eu a esperava pacientemente terminar o árduo processo de desprender as palavras e soltá-las no ar.
Sabia o quanto era difícil para , mas me sentia agradecido por ver seu esforço. Finalmente pude ver que talvez valesse a pena continuar insistindo, saber que não me sentia sozinho e que ela poderia me ajudar a montar aquele quebra-cabeça dentro de mim.
Se ela sentisse o mesmo, com a mesma confusão que eu, talvez pudéssemos juntar todas as peças e tentar encaixá-las de algum modo.
— Porque é muito diferente do que estou acostumada a sentir por você, e isso me assusta, me deixa apavorada! — ela olhou-me nos olhos com os seus já cheios de lágrimas.
Fiquei ali, encarando aquelas íris azuis e molhadas como a imensidão do mar, sem ter direito ao que dizer. Devia dizer que estava ainda mais aliviado ao ouvi-la falar tudo o que me travava a garganta, saber que ela sentia o mesmo, por mais angustiante que fosse viver aquilo daquela forma.
A sensação era de estar correndo preso por uma corda. Não importava o quão rápido queríamos ir, algo nos prendia sempre no mesmo lugar.
— Você sente também? — fungou, secando o canto dos olhos. Sorri fraco, assentindo, beijando com carinho sua pálpebra, que se fechou com minha aproximação. Migrei meus lábios por sua bochecha recém-úmida e finalizei com minha boca na sua. — Isso é ridículo — ela riu nervosa, levando ambas as mãos ao rosto.
Eu preferia chamar de estupido. Mas “ridículo” também servia. O fato de nos privarmos tanto por meras idiotices, digo, não deveríamos discutir sobre outras pessoas e nem deixá-las nos afetar a ponto de nos atrapalhar. Éramos casados, somente nós dois e neste mundo. Ninguém deveria ter a facilidade que tinham de ficar entre nós.
Fora que já tínhamos passado da fase de fingir que não nos desejávamos. Às vezes parecia infantil o fato de ainda fingirmos indiferença um pelo outro, quando, na verdade, acho que nunca desejei uma mulher quanto desejava na vida.
Não pude ver se ela estava sorrindo ou se tinha continuado a derramar lágrimas. Comprimi os lábios. Eu estava da mesma forma: não sabia se ria ou se chorava.
— Nós dois agindo desse modo, não era pra ser assim, é apenas algo casual…
Foi o que combinamos no início. Lembrar daquela noite em Tulum me fez rir ironicamente ao me sentar ao seu lado. Senti minha bunda doer – aquelas bolinhas coloridas não eram nada confortáveis. E também não tinham sido feitas para aguentar o peso de um adulto. Me estiquei tirando uma amassada de minhas costas, causando um riso instantâneo em .
— É, não era para nos apegarmos a esse ponto — murmurei, trocando um olhar cúmplice com ela.
Era para ter sido apenas um dia, um dia antes do ano acabar. Já tinha se passado um mês e eu a queria cada dia mais. Era preocupante, até.
— Mas, também, nós dormimos juntos todas as noites, vivemos como um casal normal, temos uma filha juntos… É normal dar uma enlouquecida assim, não? Tipo, nosso cérebro deve se confundir às vezes.
Às vezes?
Mexi a cabeça. Eu não sabia direito a resposta. Acho que nem sabia explicar aquilo que dizia sobre o cérebro fazer algo involuntariamente dessa forma. Ela só estava usando uma desculpa para preencher aquele rombo que era o fato de termos começado a transar por diversão, e agora estamos brigando por ciúmes. Se fosse algo como um hábito, como dizia em sua teoria mirabolante, nós teríamos percebido antes, não? Digo, não dá pra se apegar tanto a alguém sem perceber, ou dá?
— O que foi? — ela me olhou preocupada. Sorri ao vê-la enrugar o meio da sobrancelha de novo, brava por não estar a par dos meus devaneios sobre nós.
Tossi como se estivesse engasgado. E estava – tentava expulsar garganta afora a conclusão que acabei de chegar ao perceber que não me lembrava quando foi que passei a sorrir que nem um idiota reagindo a alguma coisa que fez, e pior, sem perceber!
— A-Acho que tem a ver com o fato de eu não suportar Tom desde o primeiro momento em que o vi. — Assim que tomei um ar, desatei a falar a primeira coisa que me vinha à cabeça a não ser o fato de… Nossa! Fora de cogitação! — E você… Bom, você nunca demonstrou nada contra Dafne, talvez seja apenas um jeito que encontrou de me dar o troco pela minha implicância com Dormian.
A loira me olhou em dúvida e voltou a ficar pensativa, fazendo-me virar um pouco para o lado oposto, tentando ter alguma privacidade para surtar sozinho. Tinha uma chance esmagadora de estar certa. Mas, então, como quebrar aquele hábito sem sofrimento?
— Será que quando ficarmos com outras pessoas isso vai passar? — ela murmurou baixinho, encarando o horizonte ao apoiar o queixo no joelho flexionado.
Com “isso” ela falava da vontade de ficar trancados em casa só para não correr o risco de esbarrar com “pessoas indesejadas” e estragar nosso clima?
Lembrei-me de Tulum novamente. Não da parte em que transamos, mas daquele dia na praia. Virei-me animado em sua direção, talvez ainda tivéssemos esperanças!
— Já passou, minha cara — afastei seus cabelos do pescoço para depositar beijos molhados ali. Tentei deixar aquela ideia anterior de lado também.
Eu ainda tinha que trabalhar, e não seria nada saudável ter tais tipos de pensamentos. Era possessivo demais não querer que qualquer ser do sexo masculino colocasse os olhos nela? Meu lado racional dizia com veemência que sim, mas enquanto sentia seu cheiro tão de perto com a cara enterrada na curva de seu pescoço, meu outro lado assumia o controle.
E, bem, eu ainda não o conhecia muito bem, pra falar a verdade. Mas só eu sabia o quão louco ele era por aquela loira estressadinha.
— Não liguei nem um pouco de ter te visto ser engolida por aquele surfista. — Isso, assuma o controle, sensato. — Se bem que eu não teria com o que me preocupar nesse caso. Afinal, eu fui o seu “melhor sexo da vida”, não fui?
— Achei que estava nos ignorando naquele dia no carro por ter brigado com seu pai.
Não negou.
Interessante.
— Nada nesse mundo iria me fazer ignorar isso.
— Então essa é a nossa solução — riu, revirando os olhos. Pisquei confuso em sua direção. — Vamos ficar com outras pessoas, isso que estamos sentindo vai passar logo!
Sabia que era a resposta para a pergunta que pairou em minha cabeça durante aquela conversa. Eu poderia estar surpreso com aquela conexão bizarra que reforçava a piada sobre dividirmos o mesmo neurônio, mas não, eu só estava confuso.
Eu queria uma solução sem sofrimentos. Tinha ciência de que sugeri aquilo indiretamente ao citar o idiota do surfista, mas ela entendeu tudo errado! Eu não queria vê-la com outros homens, aquilo só pioraria tudo!
Ah, não, não foi isso o que eu pedi.
— Vamos, devem estar nos procurando para comer bolo — se levantou, ajeitando o vestido, e tentou me puxar para fora.
Segui meio que às cegas, porque em minha cabeça havia várias frases e assuntos relacionados a poligamia, porém fiquei calado. Iria me contradizer sobre o que falei do surfista e confirmar o que Tom colocou na cabeça dela, aquela história de eu achar que tínhamos algo sério.
De repente, eu já não sabia mais se era tão alheio assim à ideia de ficar com outros. Eu esperava que não tivesse que tirar aquilo à prova tão cedo.
— Aí estão os dois! — Javier berrou, chamando a atenção dos convidados. deu uma hesitada antes de baixar a cabeça e ir até Megan pegar no colo.
— Pelo menos já sabemos o que fazem por aí escondidos quando dão uma sumidinha — Megan piscou cúmplice em minha direção. Quase se convidou para entrar no meio.
fingiu não ouvir enquanto eu dava uma risadinha sem graça ainda sob seu olhar predador. Meu Deus, não importava o tempo que passasse, ela parecia que nunca desistiria.
Cantamos parabéns para os gêmeos levados durante o tempo em que ficamos piorando nossa situação, digo, conversando sobre nossa relação. Foram os minutos que usaram para tirarem fotos com os convidados na mesa do bolo. Logo após ter os dois assoprando as velinhas e brigando entre si pelo mesmo motivo, Vitória lembrou de que tinha feito quatro meses e fez todo mundo cantar parabéns de novo, para minha bebê daquela vez.
ficou sem graça como o previsto. Fomos puxados para o centro da mesa e todas as atenções estavam voltadas para nós e , que chorou um pouco assustada. a deitou no ombro, fazendo-me inclinar meu corpo para beijar o topo de sua cabeça e ajudar a acalmá-la.
— Parabéns aos dois, são ótimos pais. E tem sorte em ter vocês — Vitória se aproximou,enquanto separava os pratinhos para dar bolo a multidão de crianças doidas por açúcar.
— Quatro meses, já. Dá pra acreditar? Parece que foi ontem que ela chegou em casa tão pequenininha! — falava como se já fosse uma criança de um ano, o que me fez rir escondido de seu exagero.
— Sim, ela já está uma mocinha — a mulher pegou sua mãozinha delicada. — E cada dia mais parecida com o pai. Vai entender, né?
Sorri, orgulhoso. Era engraçado porque, em alguns casos de adoção, a criança realmente se parecia com os pais não-biológicos. Não era bem o nosso caso; tinha meu sangue, mesmo assim realmente se parecia comigo até demais. Acho que de tanto ouvir falar mal de mim durante a gestação, Grace deu à luz a uma cópia minha.
— Tudo bem, ela vai ser inteligente como eu — fingiu dar de ombros, como se não estivesse com ciúmes.
— já baba nessa menina normalmente, ela parecendo o pai, então…
Apertei a cintura da minha esposa, ouvindo-a rir e ficar vermelha com a fala de Vitória.
— Completamente rendida — a abracei por trás, beijando seu pescoço no lado vago.
— Ele já é convencido, você ainda dá corda… — ela riu, pedindo licença para atender ao chamado de um dos filhos.
Peguei um pedaço de bolo envolto pelo glacê azul, que remetia ao Homem-Aranha, e nos afastamos da mesa para evitar grande parte da aglomeração da festa, indo para a calmaria do jardim.
— Quatro meses, huh — sorriu contida, ajeitando nos braços. Roubei-lhe um selinho. — Parabéns pra nós. Sobrevivemos.
Ou melhor, ela sobreviveu, pobrezinha.
— Hum, isso merece um presentinho — puxei sua chupeta, sujando o dedo no glacê e aproximando da boca da neném.
— …
Eu conhecia aquele tom de censura. Nada de açúcar para bebês.
— É aniversário dela, ! Não se faz quatro meses todos os dias — esperei para ver a reação de ao provar do paraíso, porém, ela virou a cara e não pareceu curtir muito. — Ih, sua mãe conseguiu te estragar tão cedo.
me olhou de cara feia, negando com a cabeça quando aproximei o indicador ainda melado de sua boca. Arqueei a sobrancelha, desafiando-a, e riu desacreditada, abrindo logo depois um sorrisinho safado que me deixava duro só de olhar para ela.
— Essa é uma festa de criança, .
Ofeguei diante de sua voz mansa e sexy. Mordi meu lábio ao vê-la chupar meu dedo na mesma lentidão, sem tirar os olhos de mim, para não perder nem um segundo sequer do meu desejo explícito.
— Gostosa — tomei sua cintura, puxando-a para mim com minha mão livre. Beijei sua boca superficialmente, tendo-a me atiçando ao invadir a minha com sua língua quente.
gostava de me provocar. Devia ser por aquele motivo que me deixou mais do que ciente de que iria ficar com outros caras. Deixei até o bolo de lado; minha boca estava com um gosto amargo, intragável. Me afastei levemente, tentando me abster daquela tortura psicológica que me fez sem nem ao menos se dar conta.
Ao longe estava Tom, parado num canto, nos olhando como um psicopata à espreita. Acenei para ele enquanto , distraída, conversava com a neném sobre ela ter ido muito bem ao negar o doce que lhe ofertei. Dormian estava visivelmente puto. Devia estar ali há um tempo assistindo a cena entre nós dois. Como devia ser triste saber que jamais teria o que tínhamos… Pelo menos não com .
Se bem que, ao que parecia, quem ganhou aquela disputa fui eu. Mas também perdi um pouco, no fim das contas. Todo mundo perdeu.
Sorri e acenei em sua direção. Ele não precisava saber daquilo.
(...)
— Lar, doce lar — sussurrei, pegando minha neném sonolenta do carrinho e aprumando-a sobre o peito.
riu baixinho, também visivelmente aliviada de estar longe de nossos vizinhos novamente. Eles eram tão cansativos. Relembravam o início de tudo, quando e eu nos matávamos para parecer um casal que fosse minimamente real.
Subi para o quartinho de , fazendo movimentos mínimos para não acordá-la. Apesar de também estar cansada de toda a agitação daquele dia longo, ela não costumava dormir naquele horário, e tinha passado acordada a hora de sua soneca mais cedo.
Ela tinha aproveitado muito a festinha, mesmo não fazendo nada além de gargalhar quando alguma criança brincava com ela. Era a coisa mais adorável da face da Terra. gostou muito de Charlie, filho do vizinho da rua de trás, de sete anos, que infernizou a mãe a festa inteira querendo uma irmãzinha. e eu nos olhamos preocupados quando assistimos a cena. Esperávamos que se contentasse em ser filha única, pelo menos por um tempo.
Não seria nada fácil reestruturar tudo após o divórcio, e ter outro bebê com certeza não estava nos nossos planos separadamente. Ainda parecia algo muito distante da nossa realidade, aquela coisa toda de se acostumar novamente com um outro alguém. Pensar nas possibilidades que outra pessoa poderia trazer para a minha vida deixava-me receoso. Eu gostava da vida que estava levando naquele momento, tudo parecia estar em seu devido lugar.
Por mais estranho que pudesse parecer.
Desci as escadas procurando por , para aproveitar o sono desprogramado de . Queria namorar um pouco, já era domingo à noite e a semana que viria estava cada vez mais próxima. Odiava domingos à noite. Ultimamente, estava adorando fins de semana mais que o normal, mesmo que não passasse mais a noite fora como fazia antes de me casar.
A porta estava entreaberta. Fui até lá para ver se tinha saído, mas parei com a mão já na maçaneta – ouvi vozes e me forcei a regredir meus passos pelo hall de entrada. Fui até a janela lateral e disfarçadamente espiei pelo vão da cortina. Lá estavam eles, perto demais um do outro. O corpo dela dentro do abraço de Dormian, que a apertava contra si e fazia seus quadris se chocarem. Ele manteve o quadril no dela mesmo quando tirou os braços de volta de seu pescoço, então se inclinou em direção ao rosto dela.
Fiquei ali assistindo-os, paralisado. Daquela vez não havia ninguém para testemunhar meu punho se chocando contra o rosto de Tom; porém, sem ninguém por perto, eu também não tinha motivo para querer socá-lo. Digo, sei que já tinha admitido a que estava com ciúmes, mas mesmo assim não tinha o direito de proibi-la de vê-lo.
virou o rosto quando percebeu sua intenção, mas não afastou o tronco do dele – se deixou ser beijada na bochecha e encolheu os ombros quando Tom desceu os beijos pelo seu pescoço. Suspirei em frustração, tentando me fazer entender que não me pertencia, pelo menos não de verdade. E que, para meu próprio bem, eu deveria me afastar daquela droga de janela.
Voltei para o sofá, onde tinha planejado me deitar com minha mulher e ficar até a hora do jantar. Porém, como ela estava ocupada demais com outro lá fora, liguei o videogame, que quase não foi tocado desde que nos mudamos para aquela casa. E pensar que eu tinha levado ele justamente para me distrair da presença de . O quão irônico era recorrer a ele quando tudo o que eu queria era tê-la ali, deitada em cima de mim?
Escolhi um jogo de luta e me contentei em escolher um personagem no Mortal Kombat que fosse minimamente parecido com Dormian. Iria descontar minha raiva nele de alguma forma, pelo menos.
entrou depois de mais alguns minutos lá fora, fazendo sabe-se lá o quê com o velhote. Nem queria imaginar. Só com a menção em fazê-lo, já apertei os botões com mais força.
— Esse sapato tá me matando — ela gemeu ao tirá-los dos pés, andando descalça até a entrada da sala.
Mantive meus olhos na televisão como se minha vida dependesse daquilo. Tentei ignorar ao máximo sua presença ali. Se a olhasse, iria falar. Se abrisse a minha boca… Não, eu ainda tinha que salvar um pouco da minha dignidade. Não adiantava mais falar. sabia o que eu pensava sobre Tom, e eu já tinha dito tudo e mais um pouco, mesmo assim ela tinha acabado aquele maldito dia nos braços dele.
— ? Estou falando com você — passou a mão diante de meu rosto, despertando-me do meu transe. Tinha ganhado aquele round na força do ódio. Literalmente. — O que foi dessa vez?
“O que foi dessa vez”. Quase soltei um riso irônico. Ela não podia estar falando sério.
— ? — entrou na minha frente, fazendo-me inclinar o corpo para o lado, tentando me desvencilhar de seus quadris.
— Está me atrapalhando, — ralhei, tentando empurrá-la de leve para o lado.
— Ah, não, eu não me casei com um adolescente. Não vou disputar atenção com um videogame — tirou minha mão de si, sentando-se emburrada ao meu lado.
Continuei ignorando-a. Agora éramos casados? Engraçado, eu só servia como marido quando ela queria minha atenção. Isto é, quando ela não estava sendo endeusada por Dormian.
— Amor — tentou deitar a cabeça em meu ombro, mas me afastei rapidamente. — Que saco — cruzou os braços, encarando-me. — Eu só estava me despedindo de Tom, não precisa fingir que eu não existo por isso.
Que despedida longa, não?
Suspirei, ganhando outro round. Eu tinha o direito de estar bravo, ao menos. Tínhamos acabado de ter uma conversa sobre, então achei que tinha ficado subentendido que eu me afastaria de Dafne, e ela, de Tom. Mas parecia que era eu quem não tinha entendido.
— Pare com isso, , está parecendo uma criança. Eu não ajo assim quando se trata da Dafne.
Não consegui ignorar aquilo. Era muita cara de pau, mesmo.
— Não, . Só não me deixe te beijar, fique fria e distante. Imagine se não fizesse.
Vi seu sorrisinho crescer ao me ouvir falando com ela de novo. Sabia que eu não resistia a uma provocação.
Droga. Voltei a fazer meu voto de silêncio.
— Você tinha beijado ela, ! Pelo amor de Deus, queria que eu pegasse a baba dela em sua boca?
Aquilo seria nojento. E ela tinha razão. Odiava quando ela tinha razão.
— Então, estamos quites. Não te quero me tocando depois de ter se agarrado por aí com Dormian.
arqueou as sobrancelhas e se levantou de repente. Voltei minhas atenções para a televisão, olhando-a ainda parada pela minha visão periférica. De repente, minha esposa se contorceu e puxou o zíper do vestido com certa dificuldade. Foi doloroso me manter alheio àquele barulho.
Ele significava a possibilidade de vê-la só de lingerie. E mesmo depois de já tê-la visto nua tantas vezes, seu corpo ainda era uma perdição pra mim. Nunca me cansaria de suas curvas, mesmo já tendo decorado cada pedacinho de pele. Eu não deixava de ficar louco para ver de novo e de novo.
— Pronto.
Assustei-me com a peça sendo jogada contra meu rosto. Quando olhei para ela, me arrependi profundamente.
Não tive como ignorar aquele conjunto de calcinha e sutiã preto, não quando o contraste com o tom de sua pele gritava meu nome com um megafone insuportavelmente alto. Minha mão quase ganhava vida própria. Eu queria tocá-la a todo custo, puxá-la para meu colo e não soltá-la até que estivesse se desfalecendo em prazer em cima de mim.
O coração bateu forte. Fiquei duro ao ver seu rosto contorcido de raiva. Queria poder descontar a minha nela, invadindo-a com força, sem a mínima piedade. Também desejei receber minha punição por deixá-la vermelha daquela forma, tendo minhas costas castigadas por suas unhas ou a pele marcada por suas mordidas.
Eu era um idiota, mesmo. Era muito fácil para ela ficar seminua e me deixar confuso sobre ainda estar bravo ou não. Me perguntei o que aconteceria se fosse o contrário. Tirar minha roupa funcionária? Bom, talvez fosse a hora de começar a apelar daquele jeito mesmo.
— Tirei o vestido que ele tocou, satisfeito? Agora será que dá pra olhar pra mim?
Me desvencilhei do tecido, encarando-a ainda de pé diante de mim. Olhei diretamente para seu rosto, evitando a distração de todo o resto. Estava exausto, e não iria adiar aquela conversa mesmo que estivesse passando por aquele teste de sanidade. Suspirei exasperado, deixando o controle sobre a mesa de centro.
— Achei que depois de hoje…
— Foi a última vez — ela se aproximou, tocando meu rosto com sua mão gélida. Segurei seu pulso, olhando no fundo de seus olhos. Eu queria acreditar. Mas sabia que não conseguia ser rude com Dormian, e ele parecia precisar ouvir alguns insultos dela para sair das nossas vidas. — Eu prometo — sentou-se em meu colo, sussurrando próximo à minha boca. — Agora você pode, por favor, parar de fingir que não existo?
Cedi e beijei sua bochecha, fechando-a em meu abraço e tendo seu corpo se aconchegando ao meu. Minhas mãos finalmente puderam tocar sua pele macia. Acariciei sua barriga e coxas, escondendo o rosto na curva de seu pescoço.
— Não faz isso comigo — ela pegou minhas mãos de si, passando os dedos devagar pelos meus antebraços. Sua voz era suplicante. Senti o ar se esvair de meus pulmões ao perceber aquilo. — Eu preciso… preciso que fale comigo, preciso que me toque, que me sinta em suas mãos… — seus dedos apertaram os meus contra seus seios cobertos pelo sutiã. — Preciso dos seus olhos nos meus… Não posso ficar sem você.
virou o pescoço, sustentando o contato visual. Meu queixo tremeu em desejo, assim como meus dedos, que deslizaram por suas costas até encontrarem o fecho do sutiã que ela usava. Tomei sua boca e peguei seu rosto com firmeza, fazendo-a se virar e sentar-se de frente para mim. A peça deslizou pelos braços da minha esposa, que se livrou dela rapidamente antes de avançar contra meu rosto. Afoguei-me em sua pele. Peguei seus seios, juntando-os diante de meus olhos e chupando ambos os mamilos, um de cada vez, massageando o que ficou sem o toque dos meus lábios.
Levantei meu queixo, encontrando o dela. Mordisquei a região e a senti sorrir enquanto eu segurava seu rosto com ambas as mãos. Sorri junto, mesmo que não conseguisse ver, imersa na cabeleira loira que lhe tapava a visão.
— Prometo que também vou deixá-la — afastei seus cabelos para olhá-la melhor. permaneceu séria, apoiando-se em meus ombros e respirando ofegante por conta da ação que acabamos de protagonizar. — Chega de joguinhos, . Não aguento mais. Não quero mais sentir o que senti hoje, não quero te causar isso.
A loira sorriu, desferindo um selinho em minha boca, e se afastou de repente para me lançar o olhar que eu conhecia muito bem. Mordi o lábio e apertei sua bunda com força, pressionando-a contra o meu volume entre as pernas.
— Sabia que eu tenho tesão em homens sensatos?
Ri gostosamente, beijando mais uma vez sua boca. envolveu os braços em meus ombros e tornou tudo naquele momento ainda mais aconchegante. Seu cheiro tão de perto, a textura de sua pele, o peso dela sobre o meu… Tudo me era extremamente familiar e me aquecia o peito. Ali eu baixava minha guarda totalmente. Não precisava ser o chefe exigente como na empresa ou até mesmo me preparar antes de falar como quando conversava com meu pai. Era leve, tão leve que acredito ser aquele o motivo de eu simplesmente sair falando o que sinto para toda vez que estávamos juntos daquela forma.
— Eu te odeio tanto — murmurei, assistindo-a gargalhar e discordar veementemente.
Eu odiava o fato de não conseguir mais ficar bravo com . Não durava nem mais cinco minutos; logo qualquer coisa que ela fazia substituía o sentimento por algo bom. Odiava o fato de já não conseguir mais controlar meus instintos diante dela. Eu não tinha forças para tirar meus olhos de seu corpo, nem minhas mãos, que sempre ansiavam em tocá-la. Odiava o fato de estar viciado nela, a ponto de sofrer em abstinência só com a ideia de não tê-la mais. Era como se eu estivesse sob efeito de uma droga – totalmente chapado, língua solta e a cabeça girando em torno de tudo o que se resumia a ela.
— Não, não, você me ama — hasteou o dedo e se aproximou de meu rosto, sorrindo faceira do jeito que sabia que eu costumava odiar quando éramos mais novos. Neguei com a cabeça apenas pelo prazer de vê-la irritadiça. — Você mesmo me disse ontem.
— Não é justo ficar jogando isso na minha cara, sabia? — deixei meu tronco cair para trás e se encostar no sofá, fraco pela risada que me causou com a provocação. — Eu não estava sóbrio.
Me perguntava o quão metida ficaria se aquilo fosse verdade. Estava se achando tanto, mesmo sabendo que era mentira.
— Ah, então você é desses que fica embriagado e sai falando “eu te amo” pra primeira que te aparece?
Revirei os olhos. Que mulher insuportável foi aquela que fui arrumar?
— É assim que você flerta, hein, ?
Segurei suas mãos, que tentavam me causar cócegas na barriga.
— Não! — eu ainda gargalhava, sem ar.
— Me mostre.
— O quê?
— Me mostre como o garanhão fazia para pegar todas aquelas meninas na época da escola. Como aquele casting da Victoria’s Secrets entrava e saía do seu apartamento aos montes…
Cruzei os braços, assistindo-a dar um show de caras e bocas com muito deboche na voz. Era cômico pensar que viu tudo aquilo acontecer como uma mera expectadora e hater. E hoje estava ali, seminua em meu colo, em livre e muita espontânea vontade.
— Vamos, quero ver a mágica acontecendo.
— Tem certeza? Vai se apaixonar por mim — arqueei as sobrancelhas, fazendo-a gargalhar audivelmente. Segurei-a pelo quadril com medo que caísse para trás. — Vai rindo, foi assim que chegamos até aqui — brinquei com a alça de sua calcinha.
— Ah, por favor — ela riu. — Você é ridículo.
Sem argumentos para negar, apelou para a ofensa. Inclinei-me para beijá-la, tive que fazê-lo. ficou tão beijável naquela pose, fingindo-se de desentendida.
Voltei a me recostar no descanso do sofá, ainda com os dedos movendo-se devagarinho, acariciando seu quadril. Sustentei a troca de olhares que estávamos tendo enquanto me sentia bobo como um adolescente. Mal piscava ao olhá-la ali, serena, com os cabelos bagunçados tapando-lhe os seios pequenos que, sendo completamente suspeito, eu adorava.
— Eu fazia o de sempre, você sabe. Chamava pra sair, levava em algum restaurante…
— E depois, quando gosta muito do encontro e quer mais? — não pareceu muito impressionada com a resposta anterior.
Não era difícil agradar as mulheres com quem eu saía. Íamos comer para jogar conversa fora e disfarçar o fato de que estávamos loucos para ir para algum quarto, e eu tinha a decência de pagar a conta. A verdade era que eu não tinha algo em especial que usava para ter mulheres, só fazia bem feito para que quisessem voltar a me procurar. foi debochada quando disse que eu era um garanhão. Eu só saía bastante com mulheres porque não conseguia manter contatos; mas nem que eu jurasse que não era por mal acreditaria.
— Mais uma vez, nada de especial. Mando mensagem no dia seguinte, envio flores, essas coisas — dei de ombros, vendo começar a rir do nada. — O que foi? Eu sou bem romântico quando quero, ok?
Não pude deixar de ficar ofendido. Eu era romântico até com ela, com quem não tinha um relacionamento, imagine com quem tinha! Era atencioso, lhe dava prazer a ponto de deixá-la mole na cama e, ainda por cima, a deixava dormir em cima do meu peito. era uma mal agradecida. Nem com todas as vantagens que eu lhe oferecia ela deixava de tentar caçoar de mim.
— Desculpa! — tapou a boca, tentando controlar o riso. — É que, ao meu ver, homem que envia flores geralmente faz merda e está tentando se redimir. Não sei se é o seu caso — deixou no ar, encolhendo os ombros.
Estreitei os olhos para ela. O que estava querendo dizer?
— Você não me conhece desse jeito — suspirei, sem vontade de prolongar aquele assunto. já tinha uma opinião mais do que formada sobre mim quando o assunto era relacionamentos.
— Como namorado?
— Isso. Até porque eu sou seu marido.
Não conseguiria provar que ela estava errada. Não tínhamos tido a chance de ter algo antes de juntar as escovas de dentes. Nos conhecíamos desde sempre, mas não era como se tivéssemos tido um tempo para conhecer um ao outro de verdade, não como agora. Tudo o que eu sabia sobre foi através de Grace, ou eu via acontecer de fora da vida dela e vice-versa.
O lado bom era que não tinha como mentir e nem esconder defeitos como nos primeiros encontros. O ruim era não ter como se afastar um pouco para sentir saudades, o que era importante para ter liberdade individual num namoro. Ter ali, todos os dias disponível para mim e vivendo na mesma casa, me causou uma dependência fodida, da qual eu não sabia como iria sair depois que tudo entre nós acabasse.
Ter uma esposa ao invés de uma namorada antes fez tudo entre nós ter um peso maior, e olhe que eu nem estava incluindo o fato de sermos pais de um bebê! Me perguntava se aquele era o motivo de tantas emoções fortes que causávamos um ao outro, se todo aquele ciúmes que eu sentia tinha a ver com esse peso de ter me casado com alguém que de repente passei a desenvolver sentimentos. Talvez ser preparado num namoro antes fosse mesmo necessário para processar toda aquela intensidade.
— Marido de mentira — ela acrescentou, como se fizesse alguma diferença. O que eu sentia era real demais para simplesmente fingir que não estava sentindo.
— Detalhes — maneei a cabeça como se não importasse.
— Isso não é um simples detalhe. Eu não saber como você flerta, e estar casada com você já resume isso — franziu a testa.
— Não importa como começou, olhe pra nós agora — peguei seu rosto, me aproximando. Sua expressão suavizou, apenas provando meu ponto.
levou as mãos aos meus ombros e respirou devagarinho contra mim. Rocei meus lábios nos dela superficialmente, vendo-a fechar os olhos, esperando até que eu a tomasse completamente.
Não o fiz; apenas selei nossas bocas, pensando no que tinha acabado de lhe dizer. Olhar para nós agora assustava. Tínhamos criado mais intimidade em meses do que alguns casais com muito tempo de casados. Nosso companheirismo era maior que o dos nossos pais, que estavam juntos há anos. A família que formamos, tudo parecia estar em seu devido lugar predestinado.
— O quão longe acha que podemos ir? — de olhos ainda cerrados, sussurrou contra meus lábios. Como se estivesse compartilhando um segredo.
— Não sei — respondi no mesmo tom, nem um pouco a fim de me importar com aquilo. Minha mente trabalhava em outras coisas, mais especificamente no que eu queria fazer com nas próximas horas. — Podemos apenas viver o agora? — choquei nossos narizes, vendo-a respirar fundo. — Agora eu só quero fazer amor com você. Podemos fazer isso?
assentiu, sorrindo. Beijei sua boca e acariciei sua cintura, deslizando as mãos por seu tronco quente. Guiei seu corpo até o sofá e fiquei por cima, onde ela ficou apoiada nos antebraços.
— ?
Murmurei algo distraidamente, sendo abafado pelos cabelos loiros enquanto lhe beijava o pescoço. Não queria conversar, queria estar dentro dela o mais rápido possível.
— Eu quero na nossa cama.
Mordi o lábio ao me afastar o bastante para ter a visão de sua cara de safada. Levantei-me rápido, pegando-a pela mão e subindo as escadas junto dela.
“Nossa cama”.
Eu sorria feito idiota ao me dar conta de que não importava o tanto de intimidade que qualquer outro cara achasse ter com ; no fim do dia, aquela ainda era a nossa casa, a nossa cama e a nossa filha. Saber que ela não tinha aquilo com ninguém além de mim me deixava aliviado.
Chegar no quarto nunca foi tão rápido. Após um pequeno acidente de percurso na porta, finalmente tivemos nossa cama à vista e poderíamos enfim terminar o que começamos lá embaixo.
Eu pegava em sua bunda deliciosa enquanto tinha sua boca colada na minha. Me recusei a ficar longe do seu calor humano, largando-a apenas para jogá-la na cama e arrancar a camiseta que ainda usava. tirou a calcinha, abriu as pernas para mim e ficou totalmente exposta enquanto dedilhava a própria intimidade.
Quase caí de joelhos diante dela. Jurava ter sentido minhas pernas bambearem diante da cena imoral que estava presenciando. gemia baixinho, se certificando que era observada. Baixei o zíper de meus jeans, querendo desesperadamente que eles desaparecessem, tamanha minha ansiedade de substituir aquela mão entre suas pernas. Peguei a camisinha e a abri já trêmulo, envolvendo meu membro no látex antes de finalmente pôr um fim naquela distância torturante entre nós.
— Pare de se divertir sem mim — afastei sua mão. Sua barriga subia e descia com velocidade, denunciando seu estado quase em combustão.
— O que estava esperando? Um convite?
Puxei-a pelas coxas, apertando com força sua pele como uma punição pela malcriação. Apoiei-me sobre o colchão e beijei sua bochecha quente. ofegou quando, com a outra mão restante, direcionei o pau até sua entrada já molhada. Fiz menção de dar o que ela tanto queria e coloquei apenas a cabecinha, vendo-a se contorcer em êxtase e logo reclamar da interrupção.
— Eu não preciso de convite para meter nessa buceta — disse firme em seu ouvido, sentindo o efeito de minhas palavras em seu corpo quando se arrepiou.
O som que saiu de sua boca… Fechei os olhos enquanto eu avançava devagar, torturando-a com a lentidão em que lhe dava o que queria. Amava o fato de se fazer de durona na frente dos outros, mas quando estava a sós comigo, faltava implorar para receber prazer. Estava ali, quase desfalecendo, e eu não tinha nem começado. Só não jogava aquilo em sua cara porque sabia que era orgulhosa e que poderia colocar aquilo que tínhamos em risco.
E, também, aparentemente eu gostava de apanhar daquela forma. Era péssimo vê-la desdenhar de nós dois, mas o poder que eu tinha sobre ela na cama… Ah, aquilo não tinha preço e me deixava completamente louco.
— Tem razão, você é dono.
Não segurei a risada, negando com a cabeça. Sexo era um negócio muito doido, mesmo. estava completamente bêbada de tesão. Beijei-a já completamente dentro dela, movimentando o quadril devagar, fazendo-a me sentir centímetro a centímetro, deixando-a completamente chapada pelas sensações que estava tendo.
— Vai se arrepender disso depois — adverti. apenas sorriu, confiante. Era óbvio que eu nunca me esqueceria daquilo, nem que tivesse uma amnésia!
— Não me arrependo de nada do que fiz com você.
Meu sorriso se desmanchou aos poucos. Olhei para seu rosto e a vi séria. Então, fechei os olhos e tornei a beijá-la e a mover meu quadril de encontro ao dela. Não estava com cabeça para interpretar aquilo. Mas com certeza também iria me lembrar depois.
Aquela coisa de memória era complicada entre nós. Eu me recordava claramente do tempo em que desdenhava dela, da nossa primeira vez, do primeiro beijo e até mesmo da primeira vez que senti desejo por . Mas não conseguia, de jeito nenhum, me lembrar da vez que lhe disse “eu te amo” naquele fim de semana.
Será que não estava zombando da minha cara com aquela história? Se não estava, qual foi a reação dela?
Suas unhas me arranharam as costas, trazendo-me para o momento de volta. Os olhos de me analisaram por um instante antes que ela me beijasse e me fizesse deixar pra lá. Concentrei-me no que fazia de melhor e lhe dei prazer, apenas ficando realmente satisfeito quando vi seus olhos azuis se revirarem diante dos meus. Deixei seu corpo quente desfalecido na cama e me lancei para seu lado, respirando audivelmente enquanto esperava o coração desacelerar aos poucos – o que quase nunca acontecia quando a tinha nua tão próxima de mim. Sua pele me convidava a tocá-la. Eu já tinha notado antes o modo como não conseguia tirar minhas mãos dela. Seja lá o que pudesse ser aquela atração como dois ímãs que se grudam, eu não me importava. Enquanto me deixasse deslizar meus dedos sobre sua barriga, seios e pescoço, medindo cada centímetro dela, eu que não iria reclamar.
Aproveitei minha mão em seu pescoço e a puxei para um beijo. também estava ofegante, como se tivesse corrido uma maratona. Encaixei seu corpo sobre o meu, tendo sua mão quente espalmada em meu peito, onde beijou antes de se aconchegar em mim como se eu de fato fosse um travesseiro. Sorri, levando uma das mãos até seus cabelos bagunçados.
De repente, sentou-se na cama e levou a mão ao rosto como se algo a tivesse machucado. Me sentei junto dela, aproximando-me, preocupado.
— Não é nada de mais, só o rímel que está escorrendo e irritando meu olho — ela arrastou-se para a beirada da cama. — Vou tirar essa maquiagem pra dormir.
Continuei ali, sentado, observando-a vestir minha camiseta e sua calcinha escura. caminhou descalça até o banheiro e deixou a porta entreaberta enquanto mexia no balcão em busca de algo para limpar o rosto. Suspirei entediado e fui atrás da minha cueca, indo atrás dela com a desculpa de que queria usar o banheiro. O fiz, tendo-a em frente ao lavabo no espelho, passando o algodão na área dos olhos.
Aproximei-me para lavar as mãos, vendo-a comprimir o riso. Intimidade era uma merda, mesmo. Eu tinha acabado de fazer xixi na frente dela e a tinha vestindo algo meu enquanto tinha a bunda de fora diante de mim. Bom, aquela última parte fazia nossa intimidade ser incrível. Eu nunca me cansaria de olhar para seu corpo.
— Que droga — ela reclamou. Terminei de secar minhas mãos e a encarei ainda em frente ao espelho. — Arranquei um cílio enquanto esfregava o algodão — choramingou, com o fiozinho grudado em seu indicador.
Ri baixinho. Talvez aquele draminha fosse necessário, afinal, aqueles cílios de mentira que e as outras mulheres usavam eram caros. Perder os naturais devia ser mesmo um desperdício.
— Veja pelo lado bom, agora você pode fazer um pedido — debochei, encostado na parede atrás dela, vendo-a revirar os olhos pelo reflexo.
Aquela manhã em que me mandou fazer um pedido quando o meu caiu foi… O pensamento que tive poderia ser comparado aos delírios que todo ser humano tinha ao passar por uma ponte com o celular na mão: um impulso repentino de jogá-lo na água. Tive algo parecido envolvendo e toda a situação em que estávamos naquele momento: desejei inconscientemente mais manhãs ao lado dela na cama. O que era ridículo. Daqui a alguns meses teria outras ocupando o seu lugar.
— Não preciso, meu desejo já se realizou — sorriu falsamente enquanto prendia os cabelos num coque no topo da cabeça.
Reparei em seu corpo alongado com o movimento dos braços elevados; a nuca à mostra e seu rosto limpo, quase sem nenhum resquício de maquiagem. Como diabos conseguia ficar tão linda ao natural? Pior, fazendo coisas extremamente cotidianas!
— Tenho um homem rico me bancando — inclinou-se para molhar o rosto antes de alcançar, às cegas, o sabonete para o rosto.
Gargalhei e cruzei os braços, não deixando de dar uma olhada rápida em seu traseiro empinado devido à sua posição. Quando terminou de se enxaguar, lhe estendi a toalha de rosto e a vi sorrir em meio às gotas que pingavam de sua face.
— Engraçadinha — aproximei-me, pegando-a de surpresa ao agarrá-la por trás, o que apenas potencializou sua risada esquisita. — Seria ainda mais engraçado se não fosse de você que estamos falando — beijei sua nuca, vendo seus pêlos do braço se eriçarem. — A mulher mais orgulhosa do mundo — beijei pescoço e bochecha enquanto se encolhia, tentando fugir das cócegas que eu fazia em sua barriga.
— É claro que é brincadeira — ela jogou a toalha sobre o ombro e pegou um creme daquela vez. Abriu a tampa dourada e pegou um pouco da pasta branca e cheirosa nos dedos, espalhando pelo rosto devagar. Não sabia o que ainda fazia ali, mas olhar para ela era tão satisfatório que apenas fiquei parado, olhando. — , em casa, com a gente.
— O quê? — balancei a cabeça, despertando-me da espécie de hipnose em que me encontrava.
— Esse é meu pedido — sorriu fraco, pensativa. Voltei a abraçá-la instintivamente. — Mas acho que esse não vai valer. Eu tinha que ter pedido e assoprado o cílio do meu dedo e…
— Claro que vai valer — a interrompi. Eu nem acreditava naquelas baboseiras. sabia daquilo, por isso levou as mãos até meus braços em volta de si e acariciou minha pele enquanto ria baixinho. — Nós vamos manter isso, você vai ver — beijei o topo de sua cabeça.
Ser responsável por uma empresa do tamanho da minha era um fardo bem pesado para se ter nas costas. Algumas vezes, eu me pegava de cabeça cheia ao finalizar reuniões que pareciam encurtar nosso caminho para o fundo do poço ao invés de nos ajudar a sair. Tinha que me responsabilizar por tantos funcionários que eu geralmente fingia tranquilidade e confiança para não assustar ninguém. Não importava o cenário em que estávamos.
Mas ali com , pela primeira vez em muito tempo, finalizei uma discussão sobre algo que não dependia da minha vontade de dizer algo positivo, não somente para tranquilizar quem me ouvia. Disse aquilo porque eu realmente acreditava que iria acontecer, mais cedo ou mais tarde.
— Vamos dormir. Você me deu um chá de canseira hoje — ela seguiu para fora do banheiro e pegou minha mão enquanto me guiava de volta para a cama.
Não lhe disse nada, até porque quem tinha dado um chá tinha sido ela.
Nos deitamos e percebi que estávamos realmente cansados; nem ao menos percebi quando foi minha última piscada. Caímos num sono profundo. Fiquei tão relaxado que consegui sonhar durante aquele período. Me esqueci o que vivia em meu subconsciente quando abri uma fenda nos olhos e ouvi o conhecido choro soar ao fundo.
despertou, levantando-se sonolenta e calçando os chinelos para se arrastar até o quarto de . Virei-me na cama para conseguir assistir o que acontecia pela babá eletrônica e vi o momento em que minha esposa pegou a bebê chorosa do berço. Perdi o sono ao reparar quando ambas desceram até a cozinha e depois subiram em direção ao quarto novamente.
Vi lhe dar de mamar sentada na poltrona grande ao lado do berço. Quando terminou e estava de barriguinha cheia, assisti tentar por várias vezes fazê-la voltar a dormir após esperar que ela arrotasse.
Sorri sozinho ao ver os olhinhos da neném bem abertos enquanto seus bracinhos se agitavam. Nem se aguentava e inclinava-se para beijar seu rostinho. Tive vontade de me levantar e ir até elas para participar da sessão de beijinhos e risinhos que estava acontecendo no quarto ao lado. Porém, as deixei aproveitar o momento a sós. tinha um complexo sem sentido com aquela coisa de me preferir, e eu evitava qualquer comportamento que a fizesse realmente crer naquela ideia doida. era completamente apaixonada pela mãe, e eu suspeitava que as duas ficariam ainda mais próximas agora que passavam o dia juntas.
— Achei que ela não dormiria mais — a loira murmurou ao se enfiar entre os cobertores após fechar a porta do quarto.
Me aproximei dela na cama, ignorando seus picolés gélidos encostando em meus pés. suspirou, deixando-se ser enlaçada pelo meu abraço, e encolheu os ombros quando sentiu meu beijo molhado na nuca.
— Acho que também preciso de alguns beijos pra conseguir dormir — beijei o caminho até sua orelha pequena, mordiscando o lóbulo após sussurrar em seu ouvido.
— … — ela murmurou. Sorri contra sua pele, acariciando um de seus seios. — Você tem que dormir, amanhã trabalha.
Revirei os olhos.
— Não importa — arrastei seu corpo ainda mais em direção ao meu, tendo seu quadril colado na minha virilha. — Eu quero você — pressionei meu membro contra sua bunda descoberta pela calcinha, sentindo sua barriga denunciar a falta de ar repentina.
finalmente cedeu, virou o rosto e encontrou minha boca. Ali ela me deu o que disse que precisaria para voltar a dormir, mas era óbvio que não pararíamos nos beijos. Não seríamos nós se apenas aquilo bastasse.
esticou a mão para trás e invadiu minha cueca. Respirei fundo, sentindo seu toque gentil passar por toda a extensão de meu pau já ereto e tirá-lo para fora. Mordisquei seu lábio inferior e a segurei pelo pescoço, tendo sua mão movimentando-se devagar ao me masturbar. O êxtase que eu sentia me fez sorrir contra sua boca.
— Você quer assim? — alisei sua bunda macia, chupando de leve seu pescoço exposto.
não disse nada, apenas assentiu, olhando-me com o canto de olho enquanto sorria safada.
Contornei seu quadril e puxei a alça da calcinha preta para baixo. Direcionei-me à sua entrada e penetrei devagarinho, deixando-a se acostumar com meu tamanho. Eu beijava toda a extensão de pele que tinha diante de mim, arrepiando-a quando mordia ou chupava alguma parte em especial. Eu a segurava pelo quadril, mantendo o ritmo moderado que embalamos após as primeiras estocadas.
Os gemidos sôfregos eram abafados contra as bocas urgentes e o pudor da madrugada. Eram três e quarenta da manhã. Além de não querermos virar o casal transudo do condomínio (se é que já não éramos), tínhamos medo de despertar a bebê.
Estiquei o braço, levantei minha camiseta a fim de expor seus seios e tive uma grata surpresa ao vê-la brincando consigo mesma, imersa no êxtase do momento. Substituí uma de suas mãos, enchendo a minha com um deles enquanto lhe sussurrava o quão gostoso era fodê-la por trás e o quão gostosa ela era e sempre foi. Desci meu toque pelo seu abdômen suado, fazendo-a se contorcer em ansiedade ao já saber o que viria a seguir.
Meti forte, arfando contra seu ouvido, e gemeu audivelmente quando meus dedos tocaram sua buceta molhada. A loira se debateu no mínimo contato meu, mas a segurei mais firme, começando a masturbá-la superficialmente, sem penetrá-la nem nada. E somente aquilo, combinado às minhas investidas, foram o bastante para deixá-la louca.
Eu ainda a penetrava quando cheguei ao ápice, explodindo em prazer dentro dela. gozava em meus dedos quando interrompi a penetração para me dedicar à minha missão de levá-la a outro nível. Ouvi-la tentar sem o mínimo sucesso disfarçar o prazer que sentia me deixava extremamente excitado. Saber que era eu o responsável por fazê-la sair dos eixos deixava-me orgulhoso. Seu corpo ainda produzia alguns espasmos quando voltei a movimentar meus dedos contra sua intimidade pulsante.
Àquela altura, já estava praticamente de barriga para baixo no colchão; as pernas trêmulas e abertas enquanto movia os quadris, rebolando gostoso contra minha mão, completamente descontrolada. Lhe penetrei com os dedos e tive meu triunfo final. Logo revirava os olhos azuis, tendo mais um orgasmo delicioso diante de mim. Sorri, lhe beijando a têmpora, puxando-a para meu abraço enquanto sua respiração ofegante ia se normalizando aos poucos.
— Eu amo isso — beijei seu ombro, envolvendo seu corpo quente e suado em meus braços. sorria sonolenta, cansada demais para sequer abrir a boca. — Nenhuma outra faz como você.
Senti sua mão acariciar meu pulso. Era sempre incrível com ela. Me perguntava como, depois de tantas vezes, não tínhamos enjoado um do outro.
— Boa noite — ela bocejou, deixando-se ser beijada no pescoço e bochecha já de olhos fechados.
Enrosquei meus pés nos dela, deslizando pele com pele, sem nada nos atrapalhando de tocar cada superfície um no outro. Era deliciosa aquela sensação, ter o corpo que me deu tanto prazer repousar colado ao meu.
(...)
O despertador tocou, me despertando de meu sonho confuso. Na verdade, eu não poderia descrever muito bem o que acontecera no meu subconsciente durante a madrugada após a volta de do quarto de . Dificilmente lembrava dos meus sonhos após acordar, mas aquele em especial tinha sido tão bom que desejei virar-me para o lado e voltar até lá, onde me senti tão confortável que sequer desconfiei do fato de não haver problemas nele.
Ao mesmo tempo em que queria voltar, assim que abri meus olhos tive a mesma vontade anterior: a de não ir a lugar algum. Não queria deixar aquela cama, o aconchego dos acolchoados e a temperatura gostosa que aquele quarto tinha. O barulho da chuva misturado com a respiração pesada dela me traziam uma calmaria que tornava a tarefa de voltar aos meus sonhos a coisa mais fácil do universo.
Me estiquei para desligar o alarme e deixei o aparelho sobre a cômoda, decidindo ainda se ficaria mais cinco minutos ali ou se me jogaria para a realidade antes que a preguiça me tomasse de vez pra si.
, como sempre esparramada pela cama, se remexeu devagarinho, ainda imersa na inconsciência que seu sono pesado lhe acometeu. A noite tinha sido boa para ela também. A loira tinha o rosto sereno e relaxado, parecia ter tido bons sonhos. Sua mão veio de encontro à minha nuca, e sorri ao sentir seus dedos finos se emaranharem em meus cabelos, me proporcionando um cafuné irresistível. Me derreti diante da cena de seu rosto sonolento enquanto ainda me acariciava quase que inconscientemente. Fiquei imóvel, com medo de acordá-la e perder aquela cena.
O telefone maldito voltou a despertar, fazendo-me pegá-lo em mãos para, daquela vez, enfim desligar o barulho irritante. Praguejei quando senti seus dedos pararem os movimentos lentos.
— Amor? — ainda de olhos cerrados, sua voz saiu como um sussurro, rouca pelo longo tempo sem uso. Me aproximei de seu corpo ainda quase encaixado no meu, sentindo de perto o cheiro de seus cabelos.
— Hum?
— Já vai?
Observei quando seus olhos azuis se abriram devagar com duas fendas, protegendo-se da luz do dia que invadia as cortinas claras.
— Infelizmente — lamentei, quase que em manha, sentindo seu toque quente deslizar por meu braço antes de me agarrar meu pulso e puxá-lo para si. Ri baixinho quando se colocou em meu abraço, alinhando-se contra meu peito ainda meio dormindo, meio acordada. — Oh, por favor, não torne isso mais difícil do que já está sendo — beijei seu ombro exposto pelas alcinhas finas de sua blusa.
— Você bem que poderia ficar mais um pouquinho.
Mantive o rosto enterrado na curva de seu pescoço e fechei os olhos ao suspirar, concordando. Queria muito ficar com ela ali. Fiz o que geralmente evitava nos fins de semana e pensei no trabalho que teria para aquela semana. Entre reuniões com os clientes e a equipe, fechamento de contratos e orçamentos, sabia que iria voltar mentalmente àquele lugar, no nosso quarto e cama, e querer voltar fisicamente. Mas como acabei de listar, tinha muito trabalho acumulado; não parecia viável ignorar tudo.
— Queria muito, mas…
— Sem “mas”! — fui interrompido, tendo suas mãos mais firmes segurando-me ali. — Você é presidente da empresa, pode chegar a hora que quiser!
— Eu vivi pra te ver me incentivando a aproveitar meus privilégios de filho do dono.
não aguentou e riu, virando-se para me olhar com os olhos de cachorro que caiu da mudança.
— Não me olhe assim.
— Está funcionando? — ela aproximou o rosto do meu e beijou minha boca. Neguei, apenas tendo-a cada vez mais perto de mim, dificultando ainda mais minha partida. — Está frio e preciso de você aqui pra me esquentar — dramatizou contra meus lábios.
Arqueei as sobrancelhas, ouvindo a desculpa esfarrapada. Tirei seus cabelos do caminho e a peguei pela nuca, aprofundando o beijo e tocando sua língua com a minha. Ficamos daquele jeito por uns minutos. Eu estava usando o tempo como uma soneca do despertador, que seria prolongada em horas caso resolvesse subir em cima de mim como parecia estar planejando.
Olhei de relance para a babá eletrônica em cima da cômoda e vi a bebê remexer-se no berço, já com os olhos abertos e curiosos.
— Olhe quem está super acordada — indiquei a tela pequena com o queixo.
— é super pontual — virou o pescoço para espiá-la. — E não chora mais quando acorda e se vê sozinha no quarto de manhã. Acho que está ficando crescidinha.
Mais um drama. Ri da melancolia em sua voz, beijando sua bochecha.
— Bom, vou pegá-la — se desvencilhou de mim, arrastando-se pelo colchão. Senti frio ao ter meu corpo sozinho na cama, principalmente quando ela levantou as cobertas em busca da calcinha perdida. Vestiu quando encontrou e saiu porta afora.
Suspirei, jogando-me para trás, sendo amparado pelo travesseiro macio. Minha cadeira do trabalho era confortável, mas nada seria tão gostoso e quentinho quanto aquele colchão e cobertas. As pessoas com quem eu trabalhava eram agradáveis, mas não tanto quanto , seu sorriso babado e banguela e , que nunca tinha me parecido tão legal quanto naquela manhã. Era impressão minha ou era eu que estava muito a fim dela após a madrugada passada?
Peguei meu celular do móvel ao lado da cama e, nos contatos, selecionei o nome de Chace. Nunca que eu iria dar satisfações a insuportável da Beatrice sobre a minha empresa.
— Fala, cara! Vou chegar um pouco atrasado hoje. Tá chovendo e o trânsito parou de vez.
Franzi o cenho e olhei para a janela tampada pela cortina. Nem tinha notado.
— Relaxa, só liguei pra dizer que não vou hoje — olhei para a babá eletrônica, vendo o quarto vazio.
— Aconteceu alguma coisa com as meninas?
Estranhei seu tom urgente. adentrou o quarto com no colo e a outra mão cheia de coisas para banho da neném.
— Não — respondi, e a loira me espiou, curiosa. Sentei-me na cama e arrumei a postura.
Chace achava que eu estaria tranquilo daquele jeito caso algo tivesse acontecido com alguma delas? Pensei em perguntar aquilo a ele, de tão indignado que fiquei; porém, vendo ali tão perto, fiquei constrangido de expor aquilo. E também não queria deixá-la saber que Chace estava perguntando sobre ela.
— Mas decidi ficar por hoje — disse, sucinto. Ele devia estar estranhando minhas respostas monossilábicas. pelo menos estava distraída falando com ; devia achar que era coisa do trabalho, por isso não parou para prestar atenção.
— Você está estranho. Me conta, aconteceu alguma coisa?
Respirei fundo, levantando-me para ir até o banheiro. Esqueci que estava nu e ouvi rindo baixinho da minha gafe. Saí andando mesmo assim, chegando ao cômodo ao lado e já fechando a porta.
— Você nunca falta no trabalho e…
— Não, cara, já disse, tá tudo certo — respondi. Eu era tão previsível assim? — Só estava ocupado com e , por isso estou falando rápido — menti. — Só liguei pra avisar e para te pedir que me ligue caso algo fuja da normalidade por aí.
— Ah, sim. Foi mal, então — ele riu, nervoso. — Pode deixar, . Vai lá, dê um beijo nas meninas por mi…
Finalizei a ligação e encarei a tela do celular, duvidoso. O que ele quis dizer com “dê um beijo por mim?”
A porta se abriu, revelando sozinha daquela vez. Encarei-a, tentando parecer ofendido por ter minha privacidade invadida, quando na verdade estava realizando uma fantasia minha: tê-la invadindo o banheiro durante meu banho e transar com ela debaixo do chuveiro. Estranhamente, depois de meses morando juntos, nós nunca conseguimos fazer no chuveiro. Sempre algo nos atrapalhava ou um de nós tinha que olhar .
— Tome banho rápido. está faminta e eu vou tomar banho com ela antes de dar mamadeira.
Olhei frustrado para ela. Até a bebê tinha um banho com ela e eu nada?
— Ei — chamei, tendo-a me espiando pelo vão da porta que tinha acabado de passar. Lhe dei um selinho rápido, fazendo-a rir baixinho. — Bom dia.
me olhou de cima a baixo, mordendo o lábio ao espiar o que tinha entre minhas pernas e voltar seus olhos azuis para os meus. Engoli em seco. Agora sabia qual o significado de ser comido com os olhos.
— Ótimo dia — ela fechou a porta e correu quando fiz menção de ir até ela e agarrá-la, como meu subconsciente ordenava.
Sorte a dela eu não poder fazer o que tanto queria naquele momento. Sorte a dela.
(...)
Enquanto as princesas Dianas tomavam banho, desci e comecei a preparar o café da manhã. Fiz o omelete que tinha me ensinado da primeira vez que cozinhei na vida, quando desceu junto da bebê mais cheirosa desse mundo. soltou uma piadinha sobre não precisar mais me ensinar a cozinhar, e não pude deixar de notar seu sorriso amarelo ao se nomear “dona de casa”. Quase perguntei se estava tudo bem. Depois do dia em que minha esposa ficou tão frágil e confusa após a demissão repentina, acabei não me aprofundando em conversas sobre o assunto. parecia evitar todas elas a todo custo, ou eu não estava sendo insistente o bastante.
De qualquer forma, senti um aperto no peito ao vê-la sem graça daquele jeito na hora de sinalizar que nosso leite estava acabando na dispensa; não conseguiu deixar claro que estava me pedindo dinheiro para reabastecer. Ainda não tinha recebido o dinheiro da rescisão do trabalho, e eu não sabia se queria discutir comigo o destino daquele valor. Temia que ela quisesse usar para coisas desnecessárias, como comprar leite pra casa só para não ter que pedir.
Queria que ela gastasse com algo para si, mas sabia o quanto poderia ser orgulhosa. Pensei na possibilidade de deixar um de meus cartões com ela, para que não precisasse vir até mim pedir. Deixei claro que eu ainda queria aprender a cozinhar e que iríamos continuar praticando a direção juntos.
Após o café, coloquei para tirar sua soneca da manhã em seu quarto. Desci para ajudar com a louça e transamos na lavanderia quando eu fingi que iria ajudá-la também nas roupinhas da bebê. No fim de tudo, a coloquei sobre a máquina de lavar e, quando vi, já estávamos nus. Só de poder foder minha esposa em plena segunda-feira às dez da manhã, fez aquele dia inteiro de folga ter valido a pena.
Voltamos para dentro e ficamos esparramados no sofá, fazendo o que tínhamos planejado para o domingo: revirar a Netflix em busca de algo interessante. Acabamos colocando um filme ruim, mas não importou muito. Todo mundo sabe o que significa quando te chamam pra ver algo na Netflix. Acabamos do mesmo jeito que na lavanderia, e aquele dia não poderia ficar mais perfeito. Parecia um sonho erótico sem fim.
Perto do horário do almoço, acordou. tinha tido a ideia de levarmos ela para tomar vacina e, já que estávamos os dois em casa, estávamos combinados de ir após o almoço. Enquanto terminava de preparar a refeição que fizemos juntos, eu distraía a neném de cara amassada após ter dormido um soninho tentador. Talvez, quando voltássemos da vacinação, pudéssemos acompanhá-la na próxima soneca, afinal, não dormimos muito bem noite passada.
Estávamos sentados à mesa quando meu telefone começou a tocar insistentemente na mesa. Olhei para o visor, ainda mastigando, e vi que era Chace. Encarei , que deu de ombros como se não importasse caso eu atendesse. Aceitei a chamada contra minha vontade, afinal, poderia ser algo importante.
— Me disse pra ligar caso algo saísse da normalidade.
Murmurei nervoso para que ele continuasse.
— Beatrice está na sua sala te esperando para uma reunião extraordinária que surgiu com uns clientes importantes.
— Está brincando, né? — ri sem nenhum resquício de humor, já me levantando da mesa, agitado. — Quem ela pensa que é para exigir minha presença assim, do nada? E mais! Quem deixou aquele… — ia falar dragão, mas flagrei encarando-me de sobrancelhas arqueadas. — … Aquele ser entrar na minha sala sem autorização?
— , ela meio que é dona da empresa também…
Ignorei sua fala para não perder a amizade. Já era a segunda mancada no mesmo dia.
— O que eu falo pra ela?
— Pergunte como ela marca uma reunião com alguém que não está presente para concordar ou não.
— … — o ouvi suspirar, cansado.
— Estão te chamando? — veio até mim, fazendo-me interromper minha massagem na têmpora para encará-la. — Parece importante. Tudo bem se precisar ir, levo pra vacinar amanhã.
Concordei com a cabeça, ainda hesitante.
— Eu vou. Mas só depois do almoço.
Não iria na hora que ela queria, já não bastasse a insolência de querer exigir algo! E se eu estivesse realmente ocupado?
Me despedi de Chace com me chamando de volta à mesa. Sentei-me ainda carrancudo, pensando em milhares de xingamentos que poderiam ser direcionados aos Thorpe, que eu nem queria ter sociedade para início de conversa.
Assim que terminei, subi para me aprontar e tomei um banho rápido. ainda estava na cozinha quando desci já pronto e ainda de cara amarrada. Quando me viu, enxugou as mãos molhadas e veio me dar um beijo, envolvendo meu pescoço com os braços.
— Queria ficar aqui com vocês — lamentei entre um selinho e outro.
— Não foi o que me disse hoje de manhã — riu baixinho, relaxada com o toque de minhas mãos subindo e descendo por sua coluna. — Você adora trabalhar e ama aquela empresa — outro beijo. Não discordei, ela tinha razão. — Mas se quiser trocar de lugar, eu topo.
Me afastei para olhar em seu rosto; seu sorriso amarelo voltou a dar as caras. Puxei-a para um abraço sem saber o que responder. Não era uma piada qualquer. tinha mania de falar verdades em forma de brincadeiras ao invés de ser sincera e dividir o problema.
Fiquei abraçado nela por um tempinho, com nos observando atenta e deitada no carrinho.
— Adorei a manhã de hoje — murmurei com a boca colada em seu ouvido. Quando a soltei, já exibia o sorriso que eu já conhecia, um genuíno.
— Podemos repetir num fim de semana.
Mordi o lábio, imaginando. gargalhou do estado em que fiquei só de pensar e me beijou demoradamente, deixando minha boca vermelha de tanta pressão que fez em meus lábios. Enrosquei minha língua na dela, desejando não ter que ir embora.
Deixei a casa dirigindo o mais devagar possível. Apesar do horário não me presentear com um engarrafamento pelo caminho, onde estavam as filas quilométricas de carros quando precisávamos delas? Cheguei na empresa e fui direto para meu andar, tendo Jordyn me recepcionando com uma metralhadora com recados. Beatrice deve ter espalhado pelos quatro cantos daquele prédio que eu tinha faltado ao trabalho. Deviam pensar que eu estava desaparecido ou coisa assim.
Fui para a merda da reunião, sentando-me na outra ponta da grande mesa. Entrei mudo e saí calado dela. Beatrice era quem tinha feito o negócio; não entendi o motivo da minha presença ser necessária ali. Eu não me meteria em suas coisas, não iria exigir participar de algo que não me envolvia, e não a queria achando que teria liberdade de fazer o mesmo comigo.
Tive certeza que ela me chamou de propósito, só porque percebeu que eu não tinha ido para a empresa. Ela falou tudo, sabia todos os detalhes do contrato que fechou naquela tarde e o assinou, tendo-me apenas como testemunha. Coisa que qualquer um naquele prédio inteiro poderia fazer.
Passei o resto do dia trancafiado em minha sala. Já tinha almoçado e até mesmo Chace imaginou meu estado de espírito – não se atreveu a ir até minha sala até o fim da tarde.
Cheguei em casa, tomei um banho e jantei com . Naquela noite, todos os três capotaram cedo demais. não tinha tirado sua soneca no horário da tarde e, bom, e eu estávamos cansados da noite anterior.
acordou no mesmo horário de sempre, na madrugada, e minha esposa me cutucou para me lembrar de quem era a vez de ir pegá-la. Fui até o quartinho dela e não pude reclamar de ter que me levantar e passar longos minutos acordado em plena madrugada. tinha um olhar tão doce que compensava todo e qualquer sacrifício que fazíamos para seu bem.
Acordamos no dia seguinte e tudo voltou à normalidade. Pensei em como tinha parado de sair para correr de manhã e que tinha planos de ir à academia. Eu precisava voltar a praticar exercícios para acompanhar o pique de na cama. Não sabia de onde ela tirava tanta energia. Mesmo sendo poucos anos mais velho que ela, acredito que o fato de eu estar mais longe dos vinte e próximo dos trinta andava me preocupando.
Logo seria meu aniversário. Tudo estava tão mudado que, ao mesmo tempo em que tinha muito a comemorar, não sabia se conseguiria sem ela ali comigo. Saber que eu não receberia nenhuma ligação de Grace e nem seria marcado na mesmíssima foto de nós dois pequenos nas redes sociais me deixava deprimido.
Deixei em casa após uma sucessão de beijos enquanto ela me acompanhava até a porta. Murmurei um adeus ainda contra seus lábios, guardando o gosto de seu beijo em minha memória para poder revisitar mais tarde quando sentisse falta.
Passei com o carro em frente à floricultura de esquina num cruzamento próximo ao trabalho. Me apressei em deixar o carro no estacionamento da empresa e fui até lá a pé. Tive uma ideia repentina, e me apressei a colocá-la em prática antes que pensasse demais e desse para trás. Adentrei a lojinha repleta das flores mais lindas e apanhei uma das rosas para sentir o cheiro. Não havia nada de mal naquilo, certo? Eu estava apenas presenteando alguém!
E, além do mais, eram apenas flores, não um pedido de casamento!
— Ocasião especial?
Dei um pulo de susto com o velhinho surgindo do além ao meu lado. Deixei a rosa no lugar e disfarcei minha reação enquanto era observado por ele.
— Ah, não — falar aquilo em voz alta apenas me fez ficar ainda mais nervoso.
Não, não era uma data especial. Não tinha nada de especial naquelas flores, que logo murchariam e morreriam! Definitivamente não era algo especial.
— Um pedido de desculpas?
Franzi o cenho, indagando com o fato de estar certa sobre homens que mandam flores fora de datas comemorativas.
— Recomendo que leve alguns chocolates junto, se for o caso.
— Não, não é um pedido de desculpas, são só… rosas vermelhas — respondi, vendo quando seu olhar pairou sobre minha aliança.
— Nunca serão só rosas vermelhas, meu filho. Elas representam paixão, o ápice da paixão.
Engoli em seco, rindo nervoso e sem jeito de contrariar o velho, que tinha os olhos castanhos brilhando.
— Sua esposa é uma mulher de muita sorte. Nem todos os casamentos conseguem manter a paixão. Não se cultiva mais o hábito de dar flores à mulher amada fora de datas comemorativas.
Pobrezinho, devia estar sem clientes.
— Nós temos meses de casados — expliquei. Aquele papo talvez serviria para casais antigos. E verdadeiros, apesar de ser apenas um detalhe. — Bom, vou levar um buquê de rosas vermelhas. Vocês entregam, né?
Ele assentiu, pegando as rosas e as ajeitando para começar a montar.
Fiquei ali parado feito estátua, pensando no que ele disse e torcendo para que continuasse calado enquanto me atendia. Eu não era um cético daqueles que não acreditavam em nada sobre o amor, afinal, eu mesmo fui vítima dele quando vi pela primeira vez. Mas não gostava de ouvir ninguém falando sobre como se fosse algo fantasioso. Ficava irritado. Era como ouvir sintomas de uma doença e começar a senti-los de repente. Ler sobre coceiras e começar a se coçar também.
Parecia tudo muito enfeitado demais: falas, músicas, filmes de romance. Tudo era montado para causar aquele efeito em quem estava vendo. Ninguém falava como nos filmes com a pessoa que está namorando, por exemplo. Não era natural. Tudo era forçado para ser filmado e colocado na internet para as outras pessoas verem e acreditassem que era real. Ninguém postava brigas e discordâncias, somente o que convinha mostrar.
Se eu estivesse apaixonado como o velhinho insinuou há pouco, não iria ficar postando meu relacionamento em redes sociais. Iria demonstrar a ela, falar para que ela realmente soubesse o que sentia. Não iria espalhar por aí para todo mundo ficar sabendo.
— Quer dizer algo a ela?
— O-O quê? — outro pulo. Encarei seu rosto sorridente até demais.
— Um cartão. Quer escrever algo para sua esposa ou vai enviar um cartão já impresso?
Arqueei as sobrancelhas, vendo a prateleira que ele me indicou para dar uma olhada. Senti-me estúpido. Lógico que ele não sabia o que eu estava pensando! E mesmo que soubesse, não era sobre . Eu não precisava ficar tão nervoso como fiquei.
Eu, hein.
Passei os olhos pelas juras de amor mais cafonas que já li na vida. Peguei o mais simples e lhe entreguei, meio incerto. Ainda dava tempo de desistir?
— Hum… Um homem de poucas palavras — ele murmurou para si mesmo e foi até o caixa, já com o buquê adornado do cartão em mãos. Eu o segui, vendo-o pegar uma caderneta. — O nome dela?
— — disse, desconfortável com o modo com que ele me analisou por tempo demais para uma simples resposta daquelas.
— Qual o endereço? — perguntou, e passei o nome do condomínio. — Ela pode ir até a portaria pegar?
— Não, ela está em casa com nossa filha — falei, e um sorrisinho nasceu em seus lábios. Não gostava de vê-lo sorrir como se eu estivesse agindo feito um bobo apaixonado. Não era o que ele estava pensando, e aquilo estava me irritando. — Nossa casa fica um pouco longe da portaria. Mas posso ligar para autorizar a entrada.
— Melhor assim — o velho falou consigo novamente. Devia estar caducando já. — Entregaremos em até um hora.
Concordei após pegar meu cartão de crédito de volta.
— Tudo bem, muito obrigado — acenei com a cabeça, dei-lhe as costas e voltei pelo corredor cheiroso.
— Esse casamento… vai durar anos… eu sei!
Virei o rosto e o encontrei sentado no caixa enquanto anotava algo. Franzi o cenho, deixando o estabelecimento o mais rápido possível. Não deviam deixar alguém tão idoso sozinho numa loja atendendo clientes.
Saí do elevador e fui direto para minha sala. Jordyn, dessa vez, não tinha milhões de coisas anotadas para me repassar e me deixou aliviado quando apenas me desejou um bom dia. Trabalhei um pouco ansioso, acelerado, olhando para o relógio pelos próximos minutos até que passasse uma hora desde que fui à floricultura. Era bizarro o quanto fiquei produtivo enquanto esperava algo acontecer. O que eu não sabia ao certo: quem iria receber algo era , não eu. Deveria esperar uma mensagem ao menos? Ela iria me agradecer, afinal, foi um presente, certo?
Ouvi batidas na porta e logo Beatrice passava por ela, vestida num vestido vermelho, sóbrio e elegante, com seus sapatos de salto barulhentos que me dava nos nervos.
— Bom dia, .
Aprumei-me na cadeira, respondendo-a ainda na defensiva. Ela já tinha comprado metade da minha empresa, o que mais aquela mulher queria?
— Bom, estava indo a uma reunião, mas antes queria te pedir desculpas por ontem.
Franzi o cenho, sem saber muito bem o que dizer. Quem ela pensava que era para me irritar como fez ontem e depois simplesmente vir com a cara deslavada para se desculpar? Ela queria me deixar culpado? Pois foi perder seu tempo. Eu não iria me sentir assim. Thorpe foi autoritária e egoísta ao exigir minha presença na empresa sem que houvesse grande necessidade. poderia falar o que quisesse, mas ao menos daquela vez eu tinha razão em ficar bravo.
— Sei que não devia ter te trazido aqui do jeito que fiz. Acredito que tenha exagerado um pouco.
Continuei calado, esperando-a continuar. Beatrice juntou as mãos, esfregou uma na outra em sinal de ansiedade e levantou os olhos escuros em minha direção antes de sorrir, incerta.
— É que eu nunca tinha presidido uma reunião com clientes tão importantes. Ao menos, não sozinha. Meu pai sempre esteve ao meu lado, e talvez eu tenha ficado um pouco insegura. E busquei em você, que tem mais experiência, alguém para ter confiança no que eu estava fazendo.
Nossa, por essa eu não esperava. Engoli em seco e ajeitei a gravata. Ver Beatrice sem sua armadura me despertou empatia por me ver nela quando meu pai me introduziu ao mundo dos negócios. Eu tinha o mesmo receio, de falar besteira em frente aos verdadeiros predadores, que eram os demais empresários com anos de bagagem. Não gostei da sensação de que eu poderia parecer um deles diante dela. Apesar de não ir com a cara de Beatrice, não queria parecer quem eu não era. E eu definitivamente não era nem um pouco ameaçador. Ao menos que fosse provocado.
Mesmo após a compra da empresa contra a minha vontade, a culpa meio que não era muito de Beatrice. Afinal, se meu pai não tivesse decidido me punir por adotar , a empresa não seria colocada à venda e, consequentemente, sido comprada pelo pai dela.
— Está tudo bem — suspirei após fazer força para soltar tais palavras direcionadas a ela. Tá, eu estava sendo empático, mas demonstrar empatia? Aí já era demais! — Não se preocupe, você se saiu bem ontem. Até fechou o contrato com eles.
— Muito obrigada por ter vindo ontem — ela agradeceu, e eu assenti ainda sério, sem saber mais o que dizer. — Bom, vou te deixar trabalhar em paz.
Pelo menos ela sabia que me tirava a paz. Beatrice se direcionou à porta, porém, parou ao tocar a maçaneta.
— Como vão sua esposa e filha?
Estranhei sua pergunta. Não costumava trabalhar tão junto de mulheres. Até mesmo Jordyn, por nossa posição hierárquica, não fazia perguntas de cunho pessoal e não tocava no assunto, ao menos que eu começasse a falar sobre minha família. Devia ser normal entre as mulheres. O único que perguntava sobre e era Chace, mas além de ser meu melhor amigo, ele era evasivo daquele jeito quando se tratava de . O restante dos caras até se preocupavam, mas não chegavam a perguntar, apenas deduziam que estava tudo bem pelo fato de eu não falar sobre algum problema.
— Estão bem, obrigado por perguntar — soei robótico.
— Que bom — ela assentiu, finalmente abriu a porta e sorriu minimamente. Estava na cara que ela não se importava. — Até mais, .
Beatrice saiu, fazendo-me voltar a encarar meu computador e refletir, por um mísero segundo, se talvez não pudéssemos manter aquela convivência mesquinha e completamente feita de aparências. Se ela colaborasse, é claro.
As horas passaram. Nada. Será que entregaram no endereço correto? Eu liguei para a portaria, estava tudo certo!
Me aliviei ao perceber que logo daria meu horário de almoço e eu sairia com Chace e os outros caras, então iria me distrair um pouco daquela bobagem. Não devia ter colocado expectativa em algo tão bobo. Eram apenas flores, e era apenas a .
O celular começou a vibrar em cima da mesa. O nome dela piscava na tela. Peguei o aparelho rapidamente; porém, percebi a idiotice que eu estava fazendo, reagindo a uma interação como um adolescente emocionado. Então, me recompus antes de atender.
— Alô — disse calmamente, como se não estivesse esperando aquela ligação.
— Oi — ouvi murmurar algo, e sorri sem nem perceber. — Está ocupado?
— Não estou, pode falar. Aconteceu alguma coisa?
— Na verdade, não, é que… chegaram flores aqui em casa.
— Hum… Quem foi que mandou? — segurei o riso ao ouvi-la rir do outro lado da linha.
— É sério, .
Encarei a vista do céu nublado enquanto ria junto dela.
— Você gostou? — senti meu coração acelerar ao ansiar por sua resposta.
— Sim, elas são lindas.
Mordi o lábio, calado, imaginando-a sorrir com os olhos quase cerrados.
— …
— Hum? — murmurei, atento ao que ela diria a seguir.
— O que está fazendo?
Segurei o celular mais forte entre meus dedos; provavelmente o esmagaria caso tivesse força o suficiente para fazê-lo. Imaginei em casa, na cozinha, parada diante da pia após encher um vaso para colocar as rosas vermelhas.
Encarei a tela do meu computador logo depois. Todas aquelas letras e números que me deixavam louco durante os meus dias ali de repente pareceram a coisa mais simples do universo. Difícil mesmo era compreender a complexidade que era sentir algo tão forte e tão presente, e mesmo assim não conseguir interpretar e traduzir em palavras.
Às vezes eu me sentia doente, mas era como se nenhum médico possível conseguisse diagnosticar o que eu tinha. Mesmo comparando a algo ruim como uma doença, eu não me sentia enfermo. Longe disso, me sentia mais vivo. O coração trabalhava depressa e meu sorriso se abria involuntariamente.
Abri a boca uma, duas vezes. Minha voz não saía. De repente, me vi como um adolescente inseguro, temendo levar um fora. O que, tratando-se de , não seria muito difícil. Aquela indagação era a prova de que minha intuição estava certa, me dizia que não seria uma conversa lá muito simples de se ter. Principalmente porque eu não sabia o que falar.
Eu apenas o tinha feito. Era esquisito estar naquela atmosfera dentro de casa – acordar ao lado dela, trocar beijos e carícias na cozinha, nos deitarmos grudados no sofá e, quando estávamos separados, sentir receio em fazer o que já fazíamos longe dos olhos alheios. Eu não devia ficar ansioso daquele jeito ao ser questionado sobre o motivo de ter lhe enviado flores.
Não quando a tinha deixado em casa com um beijo daqueles mais cedo.
— ? Está aí?
Eu podia ouvi-la mexendo nas flores, tirando o plástico que as envolvia do caminho. Pensei que talvez teria sido melhor comprar girassóis; não pela música escrita anos atrás sem sequer imaginar aonde iríamos parar, mas para desvincular o pensamento que tinha quanto a receber flores fora de datas comemorativas. Não queria que ela pensasse naquele presente e logo lhe viessem memórias das vezes em que seus ex-namorados “fizeram merda” com ela.
Eu não queria dividir espaço em seus pensamentos com nenhum outro.
Estávamos há muito tempo sem brigar, e eu diria até que batemos um recorde nunca visto antes quando o assunto era nós dois. E apesar de me sentir a pessoa mais estranha do universo ao dizer isso, eu não gostava mais de brigar com . Irritá-la de vez em quando era engraçado, mas eu estava adorando o tempo que ficávamos juntos sem confusões. Não queria mais vê-la chorar como das últimas vezes e saber que eu, de alguma forma, provoquei tal reação. Eu me esforçaria para manter nosso recorde recém-alcançado.
Chace surgiu dentro da sala após dar batidas quase imperceptíveis, apesar de acreditar que, mesmo que ele tivesse derrubado a porta, eu não perceberia. Estive muito concentrado em na voz de e em meus pensamento durante a conversa.
— Vamos almoçar? — ele percebeu o telefone em meu ouvido e hesitou, fechando a porta atrás de si. — Foi mal, cara — sussurrou, exasperado. Fiz um gesto, o desdenhando. Mal sabia ele que eu iria agradecê-lo por nos interromper naquele instante.
— Tenho que desligar.
— O quê, tem alguém aí?
— Sim — fiz sinal para que Chace esperasse um pouco.
— Quem? Chace? — ela perguntou, e eu concordei com um murmúrio. — Vá em frente, capriche no script final.
Não pude deixar de sorrir ao ouvir aquilo. Eu adorava encenar com quando tínhamos plateia.
— Pode deixar, amor.
riu:
— Muito simples. Eu esperava mais de você, .
Arqueei as sobrancelhas, atraindo a atenção de Chace, que percebeu com quem eu falava.
— Não estava escrito no cartão, mas estou com saudades — baixei um pouco o tom de voz, mas meu amigo continuou atento ao que eu dizia, tanto que riu da minha cara ao me ouvir tão meloso. — Não vejo a hora de chegar em casa pra gente repetir a dose do que fizemos em cima da máquina de lavar e…
— Já está bom! — ela me interrompeu, com certeza vermelha de vergonha. — Ok, eu mereci essa, te provoquei.
— Você sempre provoca — sorri triunfante, encarando um Chace constrangido. — Te amo, dê um beijo em por mim.
Somente eu podia pedir a que desse um beijo em nossa filha e, obviamente, beijar . Esperava que Chace entendesse daquela forma.
— Tchau, .
Encerrei a ligação, fingindo que ela tinha me dito algo extremamente excitante. Peguei minha carteira e rumamos para fora da sala.
Durante o almoço, o assunto não foi outro além do jogo do Liverpool que aconteceria mais tarde. Os caras estavam combinando de assistirmos todos juntos, como nos velhos tempos, antes de eu me casar e virar pai e Jack começar a namorar. Ele nos defendia, dizendo que os outros tinham inveja de nós por termos arranjado alguém e que eles também deveriam arrumar uma namorada. Eu apenas concordava, recordando-me de que se fosse antigamente, eu faria parte do grupo que caçoaria de quem tinha uma mulher mandando em si.
No fim, combinamos que iríamos sim ver o jogo juntos e, como sempre, era em meu apartamento. O local não mudou. Eu os receberia em casa, só tinha que avisar . Como disse anteriormente, agora eu tinha uma esposa a quem dar satisfação, e aquilo não passou despercebido por eles, que riram quando eu a citei. Passei-lhes as regras no caminho de volta para a empresa que eu mesmo as tinha criado: maneirar na bagunça, comprar pizza e cervejas moderadas e sem gritos para não assustar . Se ela chorasse, revezaríamos os colos para acalmá-la, e, especialmente para que Chace não a importunasse, nada de encher o saco de .
Todos concordaram. Quando chegamos na empresa e cada um foi para sua sala, nem tive tempo de pegar em meu celular para comunicar minha esposa. Beatrice me alugou pelo restante da tarde num projeto que planejou junto dos clientes da reunião do dia anterior.
Tom não sabia como era ao acordar, com sua manha para não se levantar da cama. Muito menos como era ao dormir, quando se esparramava sobre o colchão e qualquer outra coisa que estivesse com ela ali. Ele não sabia dos seus segredos, traumas, angústias, não sabia de nada! Mas agia como se soubesse, e aquilo me irritava profundamente.
Mas também não era como se fosse inocente naquela história toda. Tudo bem, ela quis sair com ele. E apesar de eu não querer que isso acontecesse, estava no direito dela – eu não estava em posição de exigir muita coisa enquanto estava saindo com Dafne. Porém, mais uma vez, aquilo não lhe dava o direito de quebrar a promessa.
Ela não via que Tom só queria nos separar antes da hora só para tê-la inteiramente pra si? Com aquele papinho de viagem, querendo levá-la pra encher sua cabeça de merdas sobre mim. nunca precisou de ajuda para pensar que eu era um merda antes, não seria agora que mudaria de opinião.
Pensar naquilo me fazia experimentar uma amostra do ódio que nutri por durante os anos. Parecia que fazia de propósito. Era educada com Tom quando sabia muito bem se defender e dar um fora nele de vez. Talvez não o fizesse para me atingir, me fazer pagar pelo que fiz com ela quando ficava com Dafne.
Espera um pouco. Se estava se vingando, quer dizer que ela sentia o mesmo que eu quando sabia que estaria com outra pessoa? Ela sentia raiva ao saber que minhas mãos passeavam pelo corpo de Dafne, asco ao me imaginar beijando sua boca ao invés de estar em casa com ela?
Se sim, devia saber que eu nunca faria aquilo de propósito. Só eu sabia o que tinha passado noite passada ao vê-la sair porta afora, sabendo que ele iria tomá-la para si como eu fazia e que não poderia fazer nada para impedi-la de ir.
— , vamos ali no canto conversar uma coisinha, rapidinho — peguei-a pela mão. Eu iria tirar aquela história a limpo ou não me chamava .
Estava cansado daqueles joguinhos, de passar nervoso com Dormian rodeando a gente feito um abutre procurando alguma desgraça para se alimentar. Eu já lhe disse e tornaria a repetir: se deixasse Tom, eu juro que deixaria Dafne sem sequer pestanejar. Gostava muito de ficar com ela, mas com Dafne era apenas sexo. E como também já disse a uma vez, minha esposa era o suficiente, mais do que qualquer homem pudesse desejar ter em casa.
Não sabia o que se passava na cabeça dela. nunca me deixava saber com certeza o que estava pensando ou sentindo; logo, não poderia afirmar com a mesma certeza se eu era o suficiente para ela. Não conseguia esquecer do que ela me disse naquela discussão: que o que falávamos quando estávamos juntos, anestesiados pelo prazer ou na atmosfera que nos envolvia quando nos beijávamos, era da boca para fora. Da minha parte não era, mas ouvi-la falar aquilo me fez saber que, para ela, era apenas um mero teatro. Um jogo de palavras para excitar e incrementar nossa fantasia.
— Não é melhor irmos para a mesa do bolo? — sorriu amarelo enquanto Dormian continuava a segurar sua outra mão. A cena era ridícula. Parecíamos duas crianças disputando um cabo de guerra. — As crianças estão reunidas lá, acho que já vão cantar parabéns.
Encarei-a sério, repreendendo sua gracinha. Eu saquei o que estava tentando fazer: fugir da discussão que sabia que iria perder. tinha noção do que tinha feito. Eu soube no exato momento em que a olhei bravo ao ouvir Tom citar Dafne como se estivesse bem familiarizado com aquele nome.
— Não, nós precisamos conversar — puxei-a em direção aos brinquedos infláveis montados no canto do jardim. não se moveu, claro. Tinha um peso morto do outro lado segurando sua outra mão.
— não quer ir com você, deixe-a em paz — a mão fria dele pousou em meu antebraço. Eu segurava firme a mão de , então sua intromissão não foi eficaz. Mesmo assim, devia admitir que foi forte o bastante para me fazer esquecer completamente de onde estávamos e me provocar uma reação quase animalesca – avancei em sua direção sendo tudo menos racional naquele momento.
Quem Tom pensava que era para se meter entre nós? Já estava ali, tentando achar uma brecha há muito tempo, e eu não o permitiria mais pensar que tinha tal liberdade.
— Não me diga como tratar minha esposa — ralhei próximo ao seu rosto, sentindo meu punho ferrar-se com força, pronto para acertá-lo em cheio no rosto.
— Ela não é sua esposa — ele avançou também, estufando o peito como um galo de briga. — Eu, que acabei de chegar na vida dela, a trato melhor que você, . Salvei-a de um acidente que você deveria ter prevenido de deixá-la ir e vir naquela bicicleta frágil. Visitei-a no trabalho, levando chocolates e oferecendo apoio quando ela perdeu o gato que eu ajudei a cuidar…
— , que história é essa?
Aquele filho da puta soltou um riso sarcástico na minha cara.
, no meio de nós, chacoalhou ambas as mãos e se viu livre. Pude ouvi-la ofegar nervosa e tentei recobrar minha sanidade, pois não queria causar nada de ruim nela. Porém, já estava na hora de acabar com aquela palhaçada de vez.
— Eu não te disse, ? — Dormian desviou os olhos azuis para o rosto angustiado dela, que apenas me olhou de canto de olho ao engolir a seco.
Devia ter ficado estampado na minha cara o quão puto eu estava ao vê-los se comunicarem como se partilhassem segredos ou tivessem alguma piadinha interna. Tom fez parecer que sim, falou de um jeito que tinha certeza de que entenderia quando ouvisse, e minha esposa o fez. Eu não sabia o que era, mas não gostava nem um pouco da cara que ela estava fazendo.
— Esse idiota acha que tem algo real com você — ele arqueou as sobrancelhas como se tivesse acabado de falar um absurdo.
me olhou receosa, ficou muda, e eu desviei minhas atenções daquele babaca para encará-la de volta. Não bastava terem falado sobre nós, ela ainda se gabou de algo que eu nunca nem fiz menção de dizer a . Nunca falei que achava que tínhamos alguma coisa séria, mas ao mesmo tempo achava que era uma conclusão bem óbvia para ser dita em voz alta.
Não era algo que precisava ser traduzido em palavras, não quando as atitudes estavam bem ali, diante dos nossos olhos.
Nós dormíamos juntos, agarrados quase toda noite, menos quando dormia na nossa cama conosco. Mas, ainda assim, os olhos dela eram minha última visão ao fechar os meus quando eu caía no sono, e eram o meu primeiro vislumbre da cor do céu quando amanhecia. Sua pele deslizava sobre a minha; minha boca conhecia seu corpo por inteiro. Quando estávamos a sós, era para mim que ela sorria. Seus pelos se eriçavam quando eu a abraçava, e foi nos meus braços em que sempre se sentiu segura para desabar quando se sentia insegura.
Não era real o bastante para ? Éramos responsáveis por uma criança, dividíamos o mesmo teto; não era sério o bastante? Porque eu nunca tinha tido algo sequer parecido com nenhuma outra mulher na vida.
Balancei a cabeça a fim de me dispersar daqueles pensamentos. Era idiotice. podia pensar o que quisesse sobre o que tínhamos – eu não iria mais discutir aquilo com ela. Eu sempre saía perdendo; me abria e dizia coisas que, no fim das contas, eram descartadas por ela como se fossem meras bobagens ditas da boca pra fora.
— Vocês dois não passam de uma farsa, .
Rangi os dentes como um cachorro raivoso prestes a atacar.
— Pare de provocar, Tom! — finalmente tomou uma atitude e o repreendeu, se enfiando entre nós dois de forma desesperada como sempre. — Vem, vamos conversar — me puxou, tentando me afastar de Dormian. Ele estava brincando com a sorte, sorrindo prepotente, apenas esperando o impacto do meu punho fechado em sua cara. — Não era isso o que você queria? — o toque dela em meu rosto me distraiu por um instante. Encarei seus olhos ao ter meu queixo sendo puxado em sua direção. — Por favor, amor.
Estremeci ao ouvir sua voz amena. Me senti péssimo por ter caído na pilha de Dormian e por quase ter protagonizado uma briga física que não pegaria nada bem diante dos vizinhos.
Selei nossos lábios após me afastar de Dormian e aceitar ir com ela para onde quer que fosse me levar. Olhei para Tom enquanto tinha sua boca na minha e a agarrei com destreza, para mostrar a ele o meu lugar na vida de . Afinal de contas, era comigo que ela passou a andar apressadamente pelo jardim até uma área mais afastada. Era a mim quem ela tinha acabado de chamar de amor, e comigo com quem tinha se casado e iria continuar pelos próximos meses.
— Tem que aprender a se controlar, . Não é a primeira vez que tenho que me enfiar entre você e Tom para poder impedi-los de se socarem!
Encarei-a sarcasticamente ao chegarmos na área vazia onde os brinquedos infláveis estavam.
A solução para aquele problema era simples! Que nos deixasse sair no soco, ora! parecia se preocupar com Dormian e a integridade daquela cara de sonso dele mais que tudo no mundo. Da última vez que fiz menção de ir pra cima dele, lá estava ela, a postos para defendê-lo.
— E você tem que controlar sua língua — falei, e abriu a boca ultrajada. O pior de tudo era que ela nem ao menos se dava conta do sentido que eu falava. — Eu não acredito que contou a ele sobre… sobre tudo!
Não era somente àquilo que eu me referia.Queria que controlasse sua língua e a mantivesse longe da boca de Dormian! Só de imaginar a cena, meu estômago embrulhava.
— Oh, eu entendi agora — a loira à minha frente riu, sem o mínimo resquício de humor. — Esse show todo que deu é sobre Dafne.
— Meu pai amado — levei a mão à testa, respirando fundo. Lá íamos nós.
— Você pode sair contando a ela sobre mim, mas eu não posso sequer citá-la a Tom que você já fica defensivo, morto de preocupação pela sua protegida que tanto defende.
Quem arfou em indignação fui eu. Eu não a defendia! Quer dizer, a justificava quando fazia alguma acusação baseada nas vozes da própria cabeça. falava de Dafne como se ela fosse uma destruidora de lares, como se nós dois passássemos noites a fio planejando um relacionamento que jamais iria existir.
Coisa que eu tinha acabado de presenciar entre ela e Tom, e não era a primeira vez. Comecei a achar que talvez tivesse tais ideias baseadas no que ela mesma fazia com Dormian. Como se, me acusando daquele jeito, pudesse se isentar do que a própria praticava. Fora que nunca me deixava saber o que ela pensava sobre ter algo com Tom, o que me abriu os olhos para algo que eu já vinha pensando há algum tempo: planejava mesmo ficar com ele após o divórcio.
E eu, o idiota da história, já tinha lhe dito milhões de vezes que não tinha nada com Dafne! Mas por algum motivo desconhecido por mim, entendia o completo contrário.
E era teimosa! Como se fosse dona da razão, como se soubesse o que se passava em nossas mentes num tipo de bola de cristal. Não importava o que saísse de minha boca – se negava a ouvir e ver minhas atitudes, como eu tentava demonstrar o que sentia, mesmo não entendendo bem o que era aquela vontade de sempre trazê-la pra perto.
— Já conversamos sobre isso, — controlei minha voz para não parecer tão impaciente.
Também estava me cansando de me humilhar para ela. Não iria mais deixar claro o que eu tinha com Dafne – era desgastante, e no fim ela continuava pensando o que queria, de qualquer forma. Se quisesse mesmo ficar com Tom, que ficasse. Eu daria um jeito de me distrair do ódio cada vez que os visse juntos. Não seria nada fácil, mas depois de vê-lo debochar de mim daquela forma, certo de que eu era um idiota iludido que achava que a tinha – quando ela já deixou claro como a luz do sol que não –, decidi tomar vergonha na minha cara.
Eu não era o galinha, que ficava com várias e não era digno de tê-la como o incrível Tom Dormian, um cirurgião metido a George Clooney? iria me pagar por aquilo. A partir daquele dia, eu seria um novo homem, iria negar sexo e sair com outras. Ela não estava instatisfeita com Dafne? Pois ela que me aguardasse; eu iria sair com Dafne e com outras. Iria lhe dar mil motivos para reclamar.
Falando em sair com outras pessoas…
— Quando ia me contar que Tom levou chocolates pra te consolar? — cruzei os braços. Eu só achava engraçado que fez um dramalhão quando a deixei em casa para socorrer Dafne, mas quando era ela, se encontrava às escondidas com Tom. Eu nunca escondi nada dela.
— Do mesmo jeito que você ia me contar que foi na “cafeteria” com Dafne naquele dia? — ela devolveu, e franzi o cenho. fez aspas como se aquilo fosse um código para sexo extraconjulgal. — Não se faça de desentendido, . Eu só fiquei sabendo aonde você foi porque esqueceu a droga do blazer e teve que voltar pra buscar.
Inclinei a cabeça, observando-a com mais cuidado. Reparei na vermelhidão de suas bochechas e no ódio em seu olhar. tinha a mandíbula tensionada e raiva na voz ao citar aquele acontecimento que, se eu me lembrava bem, a tinha deixado estranha demais.
Lembrava-me de ter tentado beijá-la como sempre fazia ao ir buscá-la no trabalho e ter sido negado em todas as tentativas de aproximação, desde ter minha mão retirada de sua coxa no carro até minha oferta de banho juntos em casa. estava calada, evitava me olhar nos olhos e parecia ressentida. Parecia com… ciúmes?
Deixei um sorrisinho escapar. De repente, toda a raiva que eu sentia se esvaiu. Que droga de mulher doida era aquela? Antes, seria a última pessoa a me fazer rir durante uma briga, mas naquele momento ela me fez querer fazer muito mais que sorrir. Queria calar sua boca com um beijo, entrelaçar suas pernas em meu quadril e levá-la para nossa casa.
— Do que está rindo, ? — esbravejou, fazendo-me negar com a cabeça, reparando no quão linda ela ficava bravinha. Que inferno, eu continuava achando sexy a ruguinha que formava entre suas sobrancelhas enquanto ela me xingava e ameaçava me matar! — Por acaso acha engraçado sair por aí com outra colocando nosso plano em perigo só pra se satisfazer?
Arqueei as sobrancelhas.
— Você fala como se Tom não nos colocasse em risco também.
Apesar dos momentos de distração, vez ou outra a raiva me tomava novamente. Eu ainda era o mesmo de antigamente, e infelizmente – ou felizmente, não sabia dizer – continuava tão pirracenta quanto antes.
— Ele sabe de tudo e é doido pra nos delatar só pra ficar com você.
— Já disse que não pretendo ter nada com Tom, pelo menos não antes do divórcio acontecer.
Nossa, essa doeu.
Foi como se eu tivesse acabado de levar uma pancada no peito. Cheguei a respirar devagar, como se a região estivesse machucada e qualquer respiro mais forte agravasse a dor. Então era o que eu já tinha previsto. Os planos estavam de pé para que ela lhe desse uma chance quando saíssemos daquele casamento.
— Dafne não vai contar nada, pode ficar tranquila quanto a ela. Ao contrário de Dormian, ela não quer atingir nenhum de nós dois — minha voz contida se fez presente novamente. Daquela vez, ela não escondia impaciência; era mágoa, na sua mais pura e consistente forma.
Eu quis sair quase correndo dali. Não queria olhar mais na cara de . Queria me livrar da visão de seus olhos azuis amuados, olhando-me de volta com um receio que machucava. Era tão diferente do jeito que os assistia no nosso cotidiano… Eu gostava quando cintilavam enquanto ela ria de alguma coisa que eu fazia, ou quando reviravam ao receber prazer…
parecia não saber o que fazer: encarou o espaço à nossa volta por um segundo, levou uma das mãos à nuca e massageou a região que sofria com a tensão que lhe acometia os ombros. De repente, foi como olhar no espelho – vê-la perdida me fez reconhecer meu próprio reflexo ali, desenhado diante de mim.
Será que ela me enxergava frágil como eu a estava vendo? Sentia vontade de me tomar em seus braços, dizer coisas que… Merda, eu sentia minha boca secar ao me imaginar dizendo tudo o que passava pela minha cabeça. Me mantive calado, sufocando aquela voz dentro de mim, na esperança de conseguir manter meu plano anterior de preservar minha dignidade diante dela.
— Esse não é o assunto que eu queria tratar com você, de qualquer forma.
Suspirei, derrotado. Estava desgastado de tantas discussões envolvendo aqueles dois. Toda vez que estávamos bem, um deles aparecia para atrapalhar aquilo; seja Dafne completamente inocente ao tentar me ajudar às vezes com meu casamento, seja Tom com suas más intenções pra cima da minha esposa. Eu só queria que aceitasse minha proposta e deixasse Tom pra lá. Não era possível que isso fosse pedir muito a ela. Eu não queria acreditar que ele já tinha tomado ao menos um pedaço de seu coração, a ponto de fazê-la lutar para ainda tê-lo em sua vida.
— , tínhamos um trato, se lembra? De não falarmos sobre nós nem para Tom, nem para Dafne.
— Se é que esse trato é válido, né? Eu estava bêbada e não me lembro direito do que você decidiu sozinho naquela noite — cruzou os braços como uma criança emburrada. Era ridículo! Nós dois agíamos como duas crianças birrentas. — Você acha que eu não sei que vocês também falaram sobre nós da última vez que se encontraram?
Por que tinha que ser tão complicada, hein? Não largava o osso, não admitia erros quando seu orgulho estava envolvido! Às vezes queria que ela fosse apenas a que se desmanchava quando estava em meus braços, mas eu sabia que as coisas não funcionavam daquela maneira e que não adiantava querer somente a versão dela que me convinha. Era por aquele motivo, exclusivamente por ele, que eu ainda tinha paciência e cedia em momentos como aquele.
— Não falamos sobre você, — fui sincero. Eu tinha literalmente ido e voltado quase mudo no carro com Dafne. Cheguei até a tratá-la com um certo descaso depois de sair da casa sabendo que tinha deixado magoada. — Esse era o combinado, não? — falei mantendo o tom amigável.
Não iria inflamar outra briga. Ultimamente, era só aquilo que fazíamos quando havia uma interferência de terceiros entre nós. Brigar e transar. E apesar de ter começado aquela história daquele jeito e amar nosso sexo de reconciliação, eu não queria mais.
Algo ao longe entrou no meu campo de visão: uma das crianças que corriam e berravam pelo jardim um tempo atrás surgiu, andando perdida, procurando algo.
— Óbvio que não falaram sobre mim, ela estava com a boca ocupada no seu p…
Empurrei pelo ombro, interrompendo seu show que já recomeçava. O garoto procurava por nós, e ele com certeza iria sair espalhando pra todo mundo que nos viu brigando.
— Seu filho da…
— Olha a boca! — a repreendi; primeiro pelo palavrão, depois pelo tom de voz. Me lancei sobre ela, caindo de joelhos em meio às bolinhas coloridas da grande piscina de plástico amarela. — Esta é uma festa de criança, — continuei minha bronca, rindo ao vê-la me encarar indignada.
Era sempre ela quem ditava regras e fazia suas repreensões, mas já tinha falado demais por um dia só. Estava na hora de fechar a boca um pouco, pra variar.
— Saia de cima de mim, ! — esperneou, tentando se esquivar de meus braços posicionados um de cada lado de seus quadris na piscina.
— Fique quieta... — virei o rosto, tentando ouvir os passos do menino, que passou a nos chamar enquanto perambulava por aí.
Se denunciássemos nossa localização e ele nos pegasse naquela posição, e ainda por cima escondidos do resto dos convidados… Bom, eu não sabia o que se passava na cabeça de um garoto de doze anos, mas iria preveni-lo do trauma de pegar dois adultos um em cima do outro, seja lá o que estivessem fazendo.
Os passos dele foram se afastando quando percebemos que ele havia desistido de procurar. Virei-me de volta para e a ouvi suspirar audivelmente.
— Bom, se era só isso que queria falar… — ela evitou me olhar nos olhos ao colocar os cabelos loiros para trás das orelhas.
Não gostava daquele clima estranho entre nós. Não costumava pisar em ovos com ela. Nos conhecíamos há muito tempo – conhecia meu lado ruim e estava conhecendo o bom no momento. Já passamos por tantas coisas juntos que era como se fosse a pessoa que mais me conhecia no mundo atualmente. Era esquisito tentar mascarar coisas diante dela.
— Olhe pra mim — sussurrei, pegando seu queixo e levantando seu rosto.
— … — ela tentou tirar minha mão.
Eu não iria me calar diante de seu temor, era sempre daquele jeito. Eu tentava acessá-la e se fechava em seu casulo. Eu recuava para respeitar seu espaço, mas se não falasse, sentia que iria explodir.
— Acha que eu gostei de ouvir suas amigas falando sobre você e Tom? Te aconselhando a dormir com ele? — arfei de raiva, só de lembrar. Anne mandando-a vestir algo fácil de tirar, que ódio! Eu nunca quis tanto na vida mandá-la calar a boca, e olha que já desejei aquele momento muitas vezes quando era obrigado a conviver com ela. — Eu fiquei morto de ciúmes com você concordando, — continuei, e a vi prender a respiração. Sua expressão mudou de repente, ela iria dizer algo. Mas eu não iria parar, era tarde demais para parar. — E depois, ver ele te levando pra sair com você vestida daquele jeito, toda linda e perfumada… Doeu pensar que Tom pudesse beijar seu pescoço, sentir o seu cheiro de perto e até mesmo tirar a sua roupa e tocar sua pele, que eu já beijei inúmeras vezes…
Deslizei meu nariz por seu pescoço, sentindo o perfume e a maciez de sua pele. Parei quando cheguei em seu ombro descoberto pelo vestido de alças que usava, e ali depositei um beijo casto, vendo-a se arrepiar gradativamente. Minha esposa encolheu os ombros com a sensação que sentiu e se aproximou devagar de meu rosto ainda séria. Senti falta do seu sorriso, mas estive ocupado demais olhando-a no fundo dos olhos.
— Eu não transei com ele.
Fechei os olhos instantaneamente, apreciando o que saiu de seus lábios.
— Graças a Deus.
Sem brincadeira ou ironia alguma, suspirei aliviado. Deixei-me descansar com a testa apoiada em seu ombro. Em seguida, levantei minha cabeça ao ouvi-la suspirar frustrada.
— Sei que neguei quando você me disse antes, mas… e-eu também tenho ciúmes de Dafne.
Senti meu coração errar as batidas antes que se acelerasse de vez.
— Tenho mentido sobre coisas que sinto, , mas é porque… — ela olhou para longe, relutante, enquanto eu a esperava pacientemente terminar o árduo processo de desprender as palavras e soltá-las no ar.
Sabia o quanto era difícil para , mas me sentia agradecido por ver seu esforço. Finalmente pude ver que talvez valesse a pena continuar insistindo, saber que não me sentia sozinho e que ela poderia me ajudar a montar aquele quebra-cabeça dentro de mim.
Se ela sentisse o mesmo, com a mesma confusão que eu, talvez pudéssemos juntar todas as peças e tentar encaixá-las de algum modo.
— Porque é muito diferente do que estou acostumada a sentir por você, e isso me assusta, me deixa apavorada! — ela olhou-me nos olhos com os seus já cheios de lágrimas.
Fiquei ali, encarando aquelas íris azuis e molhadas como a imensidão do mar, sem ter direito ao que dizer. Devia dizer que estava ainda mais aliviado ao ouvi-la falar tudo o que me travava a garganta, saber que ela sentia o mesmo, por mais angustiante que fosse viver aquilo daquela forma.
A sensação era de estar correndo preso por uma corda. Não importava o quão rápido queríamos ir, algo nos prendia sempre no mesmo lugar.
— Você sente também? — fungou, secando o canto dos olhos. Sorri fraco, assentindo, beijando com carinho sua pálpebra, que se fechou com minha aproximação. Migrei meus lábios por sua bochecha recém-úmida e finalizei com minha boca na sua. — Isso é ridículo — ela riu nervosa, levando ambas as mãos ao rosto.
Eu preferia chamar de estupido. Mas “ridículo” também servia. O fato de nos privarmos tanto por meras idiotices, digo, não deveríamos discutir sobre outras pessoas e nem deixá-las nos afetar a ponto de nos atrapalhar. Éramos casados, somente nós dois e neste mundo. Ninguém deveria ter a facilidade que tinham de ficar entre nós.
Fora que já tínhamos passado da fase de fingir que não nos desejávamos. Às vezes parecia infantil o fato de ainda fingirmos indiferença um pelo outro, quando, na verdade, acho que nunca desejei uma mulher quanto desejava na vida.
Não pude ver se ela estava sorrindo ou se tinha continuado a derramar lágrimas. Comprimi os lábios. Eu estava da mesma forma: não sabia se ria ou se chorava.
— Nós dois agindo desse modo, não era pra ser assim, é apenas algo casual…
Foi o que combinamos no início. Lembrar daquela noite em Tulum me fez rir ironicamente ao me sentar ao seu lado. Senti minha bunda doer – aquelas bolinhas coloridas não eram nada confortáveis. E também não tinham sido feitas para aguentar o peso de um adulto. Me estiquei tirando uma amassada de minhas costas, causando um riso instantâneo em .
— É, não era para nos apegarmos a esse ponto — murmurei, trocando um olhar cúmplice com ela.
Era para ter sido apenas um dia, um dia antes do ano acabar. Já tinha se passado um mês e eu a queria cada dia mais. Era preocupante, até.
— Mas, também, nós dormimos juntos todas as noites, vivemos como um casal normal, temos uma filha juntos… É normal dar uma enlouquecida assim, não? Tipo, nosso cérebro deve se confundir às vezes.
Às vezes?
Mexi a cabeça. Eu não sabia direito a resposta. Acho que nem sabia explicar aquilo que dizia sobre o cérebro fazer algo involuntariamente dessa forma. Ela só estava usando uma desculpa para preencher aquele rombo que era o fato de termos começado a transar por diversão, e agora estamos brigando por ciúmes. Se fosse algo como um hábito, como dizia em sua teoria mirabolante, nós teríamos percebido antes, não? Digo, não dá pra se apegar tanto a alguém sem perceber, ou dá?
— O que foi? — ela me olhou preocupada. Sorri ao vê-la enrugar o meio da sobrancelha de novo, brava por não estar a par dos meus devaneios sobre nós.
Tossi como se estivesse engasgado. E estava – tentava expulsar garganta afora a conclusão que acabei de chegar ao perceber que não me lembrava quando foi que passei a sorrir que nem um idiota reagindo a alguma coisa que fez, e pior, sem perceber!
— A-Acho que tem a ver com o fato de eu não suportar Tom desde o primeiro momento em que o vi. — Assim que tomei um ar, desatei a falar a primeira coisa que me vinha à cabeça a não ser o fato de… Nossa! Fora de cogitação! — E você… Bom, você nunca demonstrou nada contra Dafne, talvez seja apenas um jeito que encontrou de me dar o troco pela minha implicância com Dormian.
A loira me olhou em dúvida e voltou a ficar pensativa, fazendo-me virar um pouco para o lado oposto, tentando ter alguma privacidade para surtar sozinho. Tinha uma chance esmagadora de estar certa. Mas, então, como quebrar aquele hábito sem sofrimento?
— Será que quando ficarmos com outras pessoas isso vai passar? — ela murmurou baixinho, encarando o horizonte ao apoiar o queixo no joelho flexionado.
Com “isso” ela falava da vontade de ficar trancados em casa só para não correr o risco de esbarrar com “pessoas indesejadas” e estragar nosso clima?
Lembrei-me de Tulum novamente. Não da parte em que transamos, mas daquele dia na praia. Virei-me animado em sua direção, talvez ainda tivéssemos esperanças!
— Já passou, minha cara — afastei seus cabelos do pescoço para depositar beijos molhados ali. Tentei deixar aquela ideia anterior de lado também.
Eu ainda tinha que trabalhar, e não seria nada saudável ter tais tipos de pensamentos. Era possessivo demais não querer que qualquer ser do sexo masculino colocasse os olhos nela? Meu lado racional dizia com veemência que sim, mas enquanto sentia seu cheiro tão de perto com a cara enterrada na curva de seu pescoço, meu outro lado assumia o controle.
E, bem, eu ainda não o conhecia muito bem, pra falar a verdade. Mas só eu sabia o quão louco ele era por aquela loira estressadinha.
— Não liguei nem um pouco de ter te visto ser engolida por aquele surfista. — Isso, assuma o controle, sensato. — Se bem que eu não teria com o que me preocupar nesse caso. Afinal, eu fui o seu “melhor sexo da vida”, não fui?
— Achei que estava nos ignorando naquele dia no carro por ter brigado com seu pai.
Não negou.
Interessante.
— Nada nesse mundo iria me fazer ignorar isso.
— Então essa é a nossa solução — riu, revirando os olhos. Pisquei confuso em sua direção. — Vamos ficar com outras pessoas, isso que estamos sentindo vai passar logo!
Sabia que era a resposta para a pergunta que pairou em minha cabeça durante aquela conversa. Eu poderia estar surpreso com aquela conexão bizarra que reforçava a piada sobre dividirmos o mesmo neurônio, mas não, eu só estava confuso.
Eu queria uma solução sem sofrimentos. Tinha ciência de que sugeri aquilo indiretamente ao citar o idiota do surfista, mas ela entendeu tudo errado! Eu não queria vê-la com outros homens, aquilo só pioraria tudo!
Ah, não, não foi isso o que eu pedi.
— Vamos, devem estar nos procurando para comer bolo — se levantou, ajeitando o vestido, e tentou me puxar para fora.
Segui meio que às cegas, porque em minha cabeça havia várias frases e assuntos relacionados a poligamia, porém fiquei calado. Iria me contradizer sobre o que falei do surfista e confirmar o que Tom colocou na cabeça dela, aquela história de eu achar que tínhamos algo sério.
De repente, eu já não sabia mais se era tão alheio assim à ideia de ficar com outros. Eu esperava que não tivesse que tirar aquilo à prova tão cedo.
— Aí estão os dois! — Javier berrou, chamando a atenção dos convidados. deu uma hesitada antes de baixar a cabeça e ir até Megan pegar no colo.
— Pelo menos já sabemos o que fazem por aí escondidos quando dão uma sumidinha — Megan piscou cúmplice em minha direção. Quase se convidou para entrar no meio.
fingiu não ouvir enquanto eu dava uma risadinha sem graça ainda sob seu olhar predador. Meu Deus, não importava o tempo que passasse, ela parecia que nunca desistiria.
Cantamos parabéns para os gêmeos levados durante o tempo em que ficamos piorando nossa situação, digo, conversando sobre nossa relação. Foram os minutos que usaram para tirarem fotos com os convidados na mesa do bolo. Logo após ter os dois assoprando as velinhas e brigando entre si pelo mesmo motivo, Vitória lembrou de que tinha feito quatro meses e fez todo mundo cantar parabéns de novo, para minha bebê daquela vez.
ficou sem graça como o previsto. Fomos puxados para o centro da mesa e todas as atenções estavam voltadas para nós e , que chorou um pouco assustada. a deitou no ombro, fazendo-me inclinar meu corpo para beijar o topo de sua cabeça e ajudar a acalmá-la.
— Parabéns aos dois, são ótimos pais. E tem sorte em ter vocês — Vitória se aproximou,enquanto separava os pratinhos para dar bolo a multidão de crianças doidas por açúcar.
— Quatro meses, já. Dá pra acreditar? Parece que foi ontem que ela chegou em casa tão pequenininha! — falava como se já fosse uma criança de um ano, o que me fez rir escondido de seu exagero.
— Sim, ela já está uma mocinha — a mulher pegou sua mãozinha delicada. — E cada dia mais parecida com o pai. Vai entender, né?
Sorri, orgulhoso. Era engraçado porque, em alguns casos de adoção, a criança realmente se parecia com os pais não-biológicos. Não era bem o nosso caso; tinha meu sangue, mesmo assim realmente se parecia comigo até demais. Acho que de tanto ouvir falar mal de mim durante a gestação, Grace deu à luz a uma cópia minha.
— Tudo bem, ela vai ser inteligente como eu — fingiu dar de ombros, como se não estivesse com ciúmes.
— já baba nessa menina normalmente, ela parecendo o pai, então…
Apertei a cintura da minha esposa, ouvindo-a rir e ficar vermelha com a fala de Vitória.
— Completamente rendida — a abracei por trás, beijando seu pescoço no lado vago.
— Ele já é convencido, você ainda dá corda… — ela riu, pedindo licença para atender ao chamado de um dos filhos.
Peguei um pedaço de bolo envolto pelo glacê azul, que remetia ao Homem-Aranha, e nos afastamos da mesa para evitar grande parte da aglomeração da festa, indo para a calmaria do jardim.
— Quatro meses, huh — sorriu contida, ajeitando nos braços. Roubei-lhe um selinho. — Parabéns pra nós. Sobrevivemos.
Ou melhor, ela sobreviveu, pobrezinha.
— Hum, isso merece um presentinho — puxei sua chupeta, sujando o dedo no glacê e aproximando da boca da neném.
— …
Eu conhecia aquele tom de censura. Nada de açúcar para bebês.
— É aniversário dela, ! Não se faz quatro meses todos os dias — esperei para ver a reação de ao provar do paraíso, porém, ela virou a cara e não pareceu curtir muito. — Ih, sua mãe conseguiu te estragar tão cedo.
me olhou de cara feia, negando com a cabeça quando aproximei o indicador ainda melado de sua boca. Arqueei a sobrancelha, desafiando-a, e riu desacreditada, abrindo logo depois um sorrisinho safado que me deixava duro só de olhar para ela.
— Essa é uma festa de criança, .
Ofeguei diante de sua voz mansa e sexy. Mordi meu lábio ao vê-la chupar meu dedo na mesma lentidão, sem tirar os olhos de mim, para não perder nem um segundo sequer do meu desejo explícito.
— Gostosa — tomei sua cintura, puxando-a para mim com minha mão livre. Beijei sua boca superficialmente, tendo-a me atiçando ao invadir a minha com sua língua quente.
gostava de me provocar. Devia ser por aquele motivo que me deixou mais do que ciente de que iria ficar com outros caras. Deixei até o bolo de lado; minha boca estava com um gosto amargo, intragável. Me afastei levemente, tentando me abster daquela tortura psicológica que me fez sem nem ao menos se dar conta.
Ao longe estava Tom, parado num canto, nos olhando como um psicopata à espreita. Acenei para ele enquanto , distraída, conversava com a neném sobre ela ter ido muito bem ao negar o doce que lhe ofertei. Dormian estava visivelmente puto. Devia estar ali há um tempo assistindo a cena entre nós dois. Como devia ser triste saber que jamais teria o que tínhamos… Pelo menos não com .
Se bem que, ao que parecia, quem ganhou aquela disputa fui eu. Mas também perdi um pouco, no fim das contas. Todo mundo perdeu.
Sorri e acenei em sua direção. Ele não precisava saber daquilo.
— Lar, doce lar — sussurrei, pegando minha neném sonolenta do carrinho e aprumando-a sobre o peito.
riu baixinho, também visivelmente aliviada de estar longe de nossos vizinhos novamente. Eles eram tão cansativos. Relembravam o início de tudo, quando e eu nos matávamos para parecer um casal que fosse minimamente real.
Subi para o quartinho de , fazendo movimentos mínimos para não acordá-la. Apesar de também estar cansada de toda a agitação daquele dia longo, ela não costumava dormir naquele horário, e tinha passado acordada a hora de sua soneca mais cedo.
Ela tinha aproveitado muito a festinha, mesmo não fazendo nada além de gargalhar quando alguma criança brincava com ela. Era a coisa mais adorável da face da Terra. gostou muito de Charlie, filho do vizinho da rua de trás, de sete anos, que infernizou a mãe a festa inteira querendo uma irmãzinha. e eu nos olhamos preocupados quando assistimos a cena. Esperávamos que se contentasse em ser filha única, pelo menos por um tempo.
Não seria nada fácil reestruturar tudo após o divórcio, e ter outro bebê com certeza não estava nos nossos planos separadamente. Ainda parecia algo muito distante da nossa realidade, aquela coisa toda de se acostumar novamente com um outro alguém. Pensar nas possibilidades que outra pessoa poderia trazer para a minha vida deixava-me receoso. Eu gostava da vida que estava levando naquele momento, tudo parecia estar em seu devido lugar.
Por mais estranho que pudesse parecer.
Desci as escadas procurando por , para aproveitar o sono desprogramado de . Queria namorar um pouco, já era domingo à noite e a semana que viria estava cada vez mais próxima. Odiava domingos à noite. Ultimamente, estava adorando fins de semana mais que o normal, mesmo que não passasse mais a noite fora como fazia antes de me casar.
A porta estava entreaberta. Fui até lá para ver se tinha saído, mas parei com a mão já na maçaneta – ouvi vozes e me forcei a regredir meus passos pelo hall de entrada. Fui até a janela lateral e disfarçadamente espiei pelo vão da cortina. Lá estavam eles, perto demais um do outro. O corpo dela dentro do abraço de Dormian, que a apertava contra si e fazia seus quadris se chocarem. Ele manteve o quadril no dela mesmo quando tirou os braços de volta de seu pescoço, então se inclinou em direção ao rosto dela.
Fiquei ali assistindo-os, paralisado. Daquela vez não havia ninguém para testemunhar meu punho se chocando contra o rosto de Tom; porém, sem ninguém por perto, eu também não tinha motivo para querer socá-lo. Digo, sei que já tinha admitido a que estava com ciúmes, mas mesmo assim não tinha o direito de proibi-la de vê-lo.
virou o rosto quando percebeu sua intenção, mas não afastou o tronco do dele – se deixou ser beijada na bochecha e encolheu os ombros quando Tom desceu os beijos pelo seu pescoço. Suspirei em frustração, tentando me fazer entender que não me pertencia, pelo menos não de verdade. E que, para meu próprio bem, eu deveria me afastar daquela droga de janela.
Voltei para o sofá, onde tinha planejado me deitar com minha mulher e ficar até a hora do jantar. Porém, como ela estava ocupada demais com outro lá fora, liguei o videogame, que quase não foi tocado desde que nos mudamos para aquela casa. E pensar que eu tinha levado ele justamente para me distrair da presença de . O quão irônico era recorrer a ele quando tudo o que eu queria era tê-la ali, deitada em cima de mim?
Escolhi um jogo de luta e me contentei em escolher um personagem no Mortal Kombat que fosse minimamente parecido com Dormian. Iria descontar minha raiva nele de alguma forma, pelo menos.
entrou depois de mais alguns minutos lá fora, fazendo sabe-se lá o quê com o velhote. Nem queria imaginar. Só com a menção em fazê-lo, já apertei os botões com mais força.
— Esse sapato tá me matando — ela gemeu ao tirá-los dos pés, andando descalça até a entrada da sala.
Mantive meus olhos na televisão como se minha vida dependesse daquilo. Tentei ignorar ao máximo sua presença ali. Se a olhasse, iria falar. Se abrisse a minha boca… Não, eu ainda tinha que salvar um pouco da minha dignidade. Não adiantava mais falar. sabia o que eu pensava sobre Tom, e eu já tinha dito tudo e mais um pouco, mesmo assim ela tinha acabado aquele maldito dia nos braços dele.
— ? Estou falando com você — passou a mão diante de meu rosto, despertando-me do meu transe. Tinha ganhado aquele round na força do ódio. Literalmente. — O que foi dessa vez?
“O que foi dessa vez”. Quase soltei um riso irônico. Ela não podia estar falando sério.
— ? — entrou na minha frente, fazendo-me inclinar o corpo para o lado, tentando me desvencilhar de seus quadris.
— Está me atrapalhando, — ralhei, tentando empurrá-la de leve para o lado.
— Ah, não, eu não me casei com um adolescente. Não vou disputar atenção com um videogame — tirou minha mão de si, sentando-se emburrada ao meu lado.
Continuei ignorando-a. Agora éramos casados? Engraçado, eu só servia como marido quando ela queria minha atenção. Isto é, quando ela não estava sendo endeusada por Dormian.
— Amor — tentou deitar a cabeça em meu ombro, mas me afastei rapidamente. — Que saco — cruzou os braços, encarando-me. — Eu só estava me despedindo de Tom, não precisa fingir que eu não existo por isso.
Que despedida longa, não?
Suspirei, ganhando outro round. Eu tinha o direito de estar bravo, ao menos. Tínhamos acabado de ter uma conversa sobre, então achei que tinha ficado subentendido que eu me afastaria de Dafne, e ela, de Tom. Mas parecia que era eu quem não tinha entendido.
— Pare com isso, , está parecendo uma criança. Eu não ajo assim quando se trata da Dafne.
Não consegui ignorar aquilo. Era muita cara de pau, mesmo.
— Não, . Só não me deixe te beijar, fique fria e distante. Imagine se não fizesse.
Vi seu sorrisinho crescer ao me ouvir falando com ela de novo. Sabia que eu não resistia a uma provocação.
Droga. Voltei a fazer meu voto de silêncio.
— Você tinha beijado ela, ! Pelo amor de Deus, queria que eu pegasse a baba dela em sua boca?
Aquilo seria nojento. E ela tinha razão. Odiava quando ela tinha razão.
— Então, estamos quites. Não te quero me tocando depois de ter se agarrado por aí com Dormian.
arqueou as sobrancelhas e se levantou de repente. Voltei minhas atenções para a televisão, olhando-a ainda parada pela minha visão periférica. De repente, minha esposa se contorceu e puxou o zíper do vestido com certa dificuldade. Foi doloroso me manter alheio àquele barulho.
Ele significava a possibilidade de vê-la só de lingerie. E mesmo depois de já tê-la visto nua tantas vezes, seu corpo ainda era uma perdição pra mim. Nunca me cansaria de suas curvas, mesmo já tendo decorado cada pedacinho de pele. Eu não deixava de ficar louco para ver de novo e de novo.
— Pronto.
Assustei-me com a peça sendo jogada contra meu rosto. Quando olhei para ela, me arrependi profundamente.
Não tive como ignorar aquele conjunto de calcinha e sutiã preto, não quando o contraste com o tom de sua pele gritava meu nome com um megafone insuportavelmente alto. Minha mão quase ganhava vida própria. Eu queria tocá-la a todo custo, puxá-la para meu colo e não soltá-la até que estivesse se desfalecendo em prazer em cima de mim.
O coração bateu forte. Fiquei duro ao ver seu rosto contorcido de raiva. Queria poder descontar a minha nela, invadindo-a com força, sem a mínima piedade. Também desejei receber minha punição por deixá-la vermelha daquela forma, tendo minhas costas castigadas por suas unhas ou a pele marcada por suas mordidas.
Eu era um idiota, mesmo. Era muito fácil para ela ficar seminua e me deixar confuso sobre ainda estar bravo ou não. Me perguntei o que aconteceria se fosse o contrário. Tirar minha roupa funcionária? Bom, talvez fosse a hora de começar a apelar daquele jeito mesmo.
— Tirei o vestido que ele tocou, satisfeito? Agora será que dá pra olhar pra mim?
Me desvencilhei do tecido, encarando-a ainda de pé diante de mim. Olhei diretamente para seu rosto, evitando a distração de todo o resto. Estava exausto, e não iria adiar aquela conversa mesmo que estivesse passando por aquele teste de sanidade. Suspirei exasperado, deixando o controle sobre a mesa de centro.
— Achei que depois de hoje…
— Foi a última vez — ela se aproximou, tocando meu rosto com sua mão gélida. Segurei seu pulso, olhando no fundo de seus olhos. Eu queria acreditar. Mas sabia que não conseguia ser rude com Dormian, e ele parecia precisar ouvir alguns insultos dela para sair das nossas vidas. — Eu prometo — sentou-se em meu colo, sussurrando próximo à minha boca. — Agora você pode, por favor, parar de fingir que não existo?
Cedi e beijei sua bochecha, fechando-a em meu abraço e tendo seu corpo se aconchegando ao meu. Minhas mãos finalmente puderam tocar sua pele macia. Acariciei sua barriga e coxas, escondendo o rosto na curva de seu pescoço.
— Não faz isso comigo — ela pegou minhas mãos de si, passando os dedos devagar pelos meus antebraços. Sua voz era suplicante. Senti o ar se esvair de meus pulmões ao perceber aquilo. — Eu preciso… preciso que fale comigo, preciso que me toque, que me sinta em suas mãos… — seus dedos apertaram os meus contra seus seios cobertos pelo sutiã. — Preciso dos seus olhos nos meus… Não posso ficar sem você.
virou o pescoço, sustentando o contato visual. Meu queixo tremeu em desejo, assim como meus dedos, que deslizaram por suas costas até encontrarem o fecho do sutiã que ela usava. Tomei sua boca e peguei seu rosto com firmeza, fazendo-a se virar e sentar-se de frente para mim. A peça deslizou pelos braços da minha esposa, que se livrou dela rapidamente antes de avançar contra meu rosto. Afoguei-me em sua pele. Peguei seus seios, juntando-os diante de meus olhos e chupando ambos os mamilos, um de cada vez, massageando o que ficou sem o toque dos meus lábios.
Levantei meu queixo, encontrando o dela. Mordisquei a região e a senti sorrir enquanto eu segurava seu rosto com ambas as mãos. Sorri junto, mesmo que não conseguisse ver, imersa na cabeleira loira que lhe tapava a visão.
— Prometo que também vou deixá-la — afastei seus cabelos para olhá-la melhor. permaneceu séria, apoiando-se em meus ombros e respirando ofegante por conta da ação que acabamos de protagonizar. — Chega de joguinhos, . Não aguento mais. Não quero mais sentir o que senti hoje, não quero te causar isso.
A loira sorriu, desferindo um selinho em minha boca, e se afastou de repente para me lançar o olhar que eu conhecia muito bem. Mordi o lábio e apertei sua bunda com força, pressionando-a contra o meu volume entre as pernas.
— Sabia que eu tenho tesão em homens sensatos?
Ri gostosamente, beijando mais uma vez sua boca. envolveu os braços em meus ombros e tornou tudo naquele momento ainda mais aconchegante. Seu cheiro tão de perto, a textura de sua pele, o peso dela sobre o meu… Tudo me era extremamente familiar e me aquecia o peito. Ali eu baixava minha guarda totalmente. Não precisava ser o chefe exigente como na empresa ou até mesmo me preparar antes de falar como quando conversava com meu pai. Era leve, tão leve que acredito ser aquele o motivo de eu simplesmente sair falando o que sinto para toda vez que estávamos juntos daquela forma.
— Eu te odeio tanto — murmurei, assistindo-a gargalhar e discordar veementemente.
Eu odiava o fato de não conseguir mais ficar bravo com . Não durava nem mais cinco minutos; logo qualquer coisa que ela fazia substituía o sentimento por algo bom. Odiava o fato de já não conseguir mais controlar meus instintos diante dela. Eu não tinha forças para tirar meus olhos de seu corpo, nem minhas mãos, que sempre ansiavam em tocá-la. Odiava o fato de estar viciado nela, a ponto de sofrer em abstinência só com a ideia de não tê-la mais. Era como se eu estivesse sob efeito de uma droga – totalmente chapado, língua solta e a cabeça girando em torno de tudo o que se resumia a ela.
— Não, não, você me ama — hasteou o dedo e se aproximou de meu rosto, sorrindo faceira do jeito que sabia que eu costumava odiar quando éramos mais novos. Neguei com a cabeça apenas pelo prazer de vê-la irritadiça. — Você mesmo me disse ontem.
— Não é justo ficar jogando isso na minha cara, sabia? — deixei meu tronco cair para trás e se encostar no sofá, fraco pela risada que me causou com a provocação. — Eu não estava sóbrio.
Me perguntava o quão metida ficaria se aquilo fosse verdade. Estava se achando tanto, mesmo sabendo que era mentira.
— Ah, então você é desses que fica embriagado e sai falando “eu te amo” pra primeira que te aparece?
Revirei os olhos. Que mulher insuportável foi aquela que fui arrumar?
— É assim que você flerta, hein, ?
Segurei suas mãos, que tentavam me causar cócegas na barriga.
— Não! — eu ainda gargalhava, sem ar.
— Me mostre.
— O quê?
— Me mostre como o garanhão fazia para pegar todas aquelas meninas na época da escola. Como aquele casting da Victoria’s Secrets entrava e saía do seu apartamento aos montes…
Cruzei os braços, assistindo-a dar um show de caras e bocas com muito deboche na voz. Era cômico pensar que viu tudo aquilo acontecer como uma mera expectadora e hater. E hoje estava ali, seminua em meu colo, em livre e muita espontânea vontade.
— Vamos, quero ver a mágica acontecendo.
— Tem certeza? Vai se apaixonar por mim — arqueei as sobrancelhas, fazendo-a gargalhar audivelmente. Segurei-a pelo quadril com medo que caísse para trás. — Vai rindo, foi assim que chegamos até aqui — brinquei com a alça de sua calcinha.
— Ah, por favor — ela riu. — Você é ridículo.
Sem argumentos para negar, apelou para a ofensa. Inclinei-me para beijá-la, tive que fazê-lo. ficou tão beijável naquela pose, fingindo-se de desentendida.
Voltei a me recostar no descanso do sofá, ainda com os dedos movendo-se devagarinho, acariciando seu quadril. Sustentei a troca de olhares que estávamos tendo enquanto me sentia bobo como um adolescente. Mal piscava ao olhá-la ali, serena, com os cabelos bagunçados tapando-lhe os seios pequenos que, sendo completamente suspeito, eu adorava.
— Eu fazia o de sempre, você sabe. Chamava pra sair, levava em algum restaurante…
— E depois, quando gosta muito do encontro e quer mais? — não pareceu muito impressionada com a resposta anterior.
Não era difícil agradar as mulheres com quem eu saía. Íamos comer para jogar conversa fora e disfarçar o fato de que estávamos loucos para ir para algum quarto, e eu tinha a decência de pagar a conta. A verdade era que eu não tinha algo em especial que usava para ter mulheres, só fazia bem feito para que quisessem voltar a me procurar. foi debochada quando disse que eu era um garanhão. Eu só saía bastante com mulheres porque não conseguia manter contatos; mas nem que eu jurasse que não era por mal acreditaria.
— Mais uma vez, nada de especial. Mando mensagem no dia seguinte, envio flores, essas coisas — dei de ombros, vendo começar a rir do nada. — O que foi? Eu sou bem romântico quando quero, ok?
Não pude deixar de ficar ofendido. Eu era romântico até com ela, com quem não tinha um relacionamento, imagine com quem tinha! Era atencioso, lhe dava prazer a ponto de deixá-la mole na cama e, ainda por cima, a deixava dormir em cima do meu peito. era uma mal agradecida. Nem com todas as vantagens que eu lhe oferecia ela deixava de tentar caçoar de mim.
— Desculpa! — tapou a boca, tentando controlar o riso. — É que, ao meu ver, homem que envia flores geralmente faz merda e está tentando se redimir. Não sei se é o seu caso — deixou no ar, encolhendo os ombros.
Estreitei os olhos para ela. O que estava querendo dizer?
— Você não me conhece desse jeito — suspirei, sem vontade de prolongar aquele assunto. já tinha uma opinião mais do que formada sobre mim quando o assunto era relacionamentos.
— Como namorado?
— Isso. Até porque eu sou seu marido.
Não conseguiria provar que ela estava errada. Não tínhamos tido a chance de ter algo antes de juntar as escovas de dentes. Nos conhecíamos desde sempre, mas não era como se tivéssemos tido um tempo para conhecer um ao outro de verdade, não como agora. Tudo o que eu sabia sobre foi através de Grace, ou eu via acontecer de fora da vida dela e vice-versa.
O lado bom era que não tinha como mentir e nem esconder defeitos como nos primeiros encontros. O ruim era não ter como se afastar um pouco para sentir saudades, o que era importante para ter liberdade individual num namoro. Ter ali, todos os dias disponível para mim e vivendo na mesma casa, me causou uma dependência fodida, da qual eu não sabia como iria sair depois que tudo entre nós acabasse.
Ter uma esposa ao invés de uma namorada antes fez tudo entre nós ter um peso maior, e olhe que eu nem estava incluindo o fato de sermos pais de um bebê! Me perguntava se aquele era o motivo de tantas emoções fortes que causávamos um ao outro, se todo aquele ciúmes que eu sentia tinha a ver com esse peso de ter me casado com alguém que de repente passei a desenvolver sentimentos. Talvez ser preparado num namoro antes fosse mesmo necessário para processar toda aquela intensidade.
— Marido de mentira — ela acrescentou, como se fizesse alguma diferença. O que eu sentia era real demais para simplesmente fingir que não estava sentindo.
— Detalhes — maneei a cabeça como se não importasse.
— Isso não é um simples detalhe. Eu não saber como você flerta, e estar casada com você já resume isso — franziu a testa.
— Não importa como começou, olhe pra nós agora — peguei seu rosto, me aproximando. Sua expressão suavizou, apenas provando meu ponto.
levou as mãos aos meus ombros e respirou devagarinho contra mim. Rocei meus lábios nos dela superficialmente, vendo-a fechar os olhos, esperando até que eu a tomasse completamente.
Não o fiz; apenas selei nossas bocas, pensando no que tinha acabado de lhe dizer. Olhar para nós agora assustava. Tínhamos criado mais intimidade em meses do que alguns casais com muito tempo de casados. Nosso companheirismo era maior que o dos nossos pais, que estavam juntos há anos. A família que formamos, tudo parecia estar em seu devido lugar predestinado.
— O quão longe acha que podemos ir? — de olhos ainda cerrados, sussurrou contra meus lábios. Como se estivesse compartilhando um segredo.
— Não sei — respondi no mesmo tom, nem um pouco a fim de me importar com aquilo. Minha mente trabalhava em outras coisas, mais especificamente no que eu queria fazer com nas próximas horas. — Podemos apenas viver o agora? — choquei nossos narizes, vendo-a respirar fundo. — Agora eu só quero fazer amor com você. Podemos fazer isso?
assentiu, sorrindo. Beijei sua boca e acariciei sua cintura, deslizando as mãos por seu tronco quente. Guiei seu corpo até o sofá e fiquei por cima, onde ela ficou apoiada nos antebraços.
— ?
Murmurei algo distraidamente, sendo abafado pelos cabelos loiros enquanto lhe beijava o pescoço. Não queria conversar, queria estar dentro dela o mais rápido possível.
— Eu quero na nossa cama.
Mordi o lábio ao me afastar o bastante para ter a visão de sua cara de safada. Levantei-me rápido, pegando-a pela mão e subindo as escadas junto dela.
“Nossa cama”.
Eu sorria feito idiota ao me dar conta de que não importava o tanto de intimidade que qualquer outro cara achasse ter com ; no fim do dia, aquela ainda era a nossa casa, a nossa cama e a nossa filha. Saber que ela não tinha aquilo com ninguém além de mim me deixava aliviado.
Chegar no quarto nunca foi tão rápido. Após um pequeno acidente de percurso na porta, finalmente tivemos nossa cama à vista e poderíamos enfim terminar o que começamos lá embaixo.
Eu pegava em sua bunda deliciosa enquanto tinha sua boca colada na minha. Me recusei a ficar longe do seu calor humano, largando-a apenas para jogá-la na cama e arrancar a camiseta que ainda usava. tirou a calcinha, abriu as pernas para mim e ficou totalmente exposta enquanto dedilhava a própria intimidade.
Quase caí de joelhos diante dela. Jurava ter sentido minhas pernas bambearem diante da cena imoral que estava presenciando. gemia baixinho, se certificando que era observada. Baixei o zíper de meus jeans, querendo desesperadamente que eles desaparecessem, tamanha minha ansiedade de substituir aquela mão entre suas pernas. Peguei a camisinha e a abri já trêmulo, envolvendo meu membro no látex antes de finalmente pôr um fim naquela distância torturante entre nós.
— Pare de se divertir sem mim — afastei sua mão. Sua barriga subia e descia com velocidade, denunciando seu estado quase em combustão.
— O que estava esperando? Um convite?
Puxei-a pelas coxas, apertando com força sua pele como uma punição pela malcriação. Apoiei-me sobre o colchão e beijei sua bochecha quente. ofegou quando, com a outra mão restante, direcionei o pau até sua entrada já molhada. Fiz menção de dar o que ela tanto queria e coloquei apenas a cabecinha, vendo-a se contorcer em êxtase e logo reclamar da interrupção.
— Eu não preciso de convite para meter nessa buceta — disse firme em seu ouvido, sentindo o efeito de minhas palavras em seu corpo quando se arrepiou.
O som que saiu de sua boca… Fechei os olhos enquanto eu avançava devagar, torturando-a com a lentidão em que lhe dava o que queria. Amava o fato de se fazer de durona na frente dos outros, mas quando estava a sós comigo, faltava implorar para receber prazer. Estava ali, quase desfalecendo, e eu não tinha nem começado. Só não jogava aquilo em sua cara porque sabia que era orgulhosa e que poderia colocar aquilo que tínhamos em risco.
E, também, aparentemente eu gostava de apanhar daquela forma. Era péssimo vê-la desdenhar de nós dois, mas o poder que eu tinha sobre ela na cama… Ah, aquilo não tinha preço e me deixava completamente louco.
— Tem razão, você é dono.
Não segurei a risada, negando com a cabeça. Sexo era um negócio muito doido, mesmo. estava completamente bêbada de tesão. Beijei-a já completamente dentro dela, movimentando o quadril devagar, fazendo-a me sentir centímetro a centímetro, deixando-a completamente chapada pelas sensações que estava tendo.
— Vai se arrepender disso depois — adverti. apenas sorriu, confiante. Era óbvio que eu nunca me esqueceria daquilo, nem que tivesse uma amnésia!
— Não me arrependo de nada do que fiz com você.
Meu sorriso se desmanchou aos poucos. Olhei para seu rosto e a vi séria. Então, fechei os olhos e tornei a beijá-la e a mover meu quadril de encontro ao dela. Não estava com cabeça para interpretar aquilo. Mas com certeza também iria me lembrar depois.
Aquela coisa de memória era complicada entre nós. Eu me recordava claramente do tempo em que desdenhava dela, da nossa primeira vez, do primeiro beijo e até mesmo da primeira vez que senti desejo por . Mas não conseguia, de jeito nenhum, me lembrar da vez que lhe disse “eu te amo” naquele fim de semana.
Será que não estava zombando da minha cara com aquela história? Se não estava, qual foi a reação dela?
Suas unhas me arranharam as costas, trazendo-me para o momento de volta. Os olhos de me analisaram por um instante antes que ela me beijasse e me fizesse deixar pra lá. Concentrei-me no que fazia de melhor e lhe dei prazer, apenas ficando realmente satisfeito quando vi seus olhos azuis se revirarem diante dos meus. Deixei seu corpo quente desfalecido na cama e me lancei para seu lado, respirando audivelmente enquanto esperava o coração desacelerar aos poucos – o que quase nunca acontecia quando a tinha nua tão próxima de mim. Sua pele me convidava a tocá-la. Eu já tinha notado antes o modo como não conseguia tirar minhas mãos dela. Seja lá o que pudesse ser aquela atração como dois ímãs que se grudam, eu não me importava. Enquanto me deixasse deslizar meus dedos sobre sua barriga, seios e pescoço, medindo cada centímetro dela, eu que não iria reclamar.
Aproveitei minha mão em seu pescoço e a puxei para um beijo. também estava ofegante, como se tivesse corrido uma maratona. Encaixei seu corpo sobre o meu, tendo sua mão quente espalmada em meu peito, onde beijou antes de se aconchegar em mim como se eu de fato fosse um travesseiro. Sorri, levando uma das mãos até seus cabelos bagunçados.
De repente, sentou-se na cama e levou a mão ao rosto como se algo a tivesse machucado. Me sentei junto dela, aproximando-me, preocupado.
— Não é nada de mais, só o rímel que está escorrendo e irritando meu olho — ela arrastou-se para a beirada da cama. — Vou tirar essa maquiagem pra dormir.
Continuei ali, sentado, observando-a vestir minha camiseta e sua calcinha escura. caminhou descalça até o banheiro e deixou a porta entreaberta enquanto mexia no balcão em busca de algo para limpar o rosto. Suspirei entediado e fui atrás da minha cueca, indo atrás dela com a desculpa de que queria usar o banheiro. O fiz, tendo-a em frente ao lavabo no espelho, passando o algodão na área dos olhos.
Aproximei-me para lavar as mãos, vendo-a comprimir o riso. Intimidade era uma merda, mesmo. Eu tinha acabado de fazer xixi na frente dela e a tinha vestindo algo meu enquanto tinha a bunda de fora diante de mim. Bom, aquela última parte fazia nossa intimidade ser incrível. Eu nunca me cansaria de olhar para seu corpo.
— Que droga — ela reclamou. Terminei de secar minhas mãos e a encarei ainda em frente ao espelho. — Arranquei um cílio enquanto esfregava o algodão — choramingou, com o fiozinho grudado em seu indicador.
Ri baixinho. Talvez aquele draminha fosse necessário, afinal, aqueles cílios de mentira que e as outras mulheres usavam eram caros. Perder os naturais devia ser mesmo um desperdício.
— Veja pelo lado bom, agora você pode fazer um pedido — debochei, encostado na parede atrás dela, vendo-a revirar os olhos pelo reflexo.
Aquela manhã em que me mandou fazer um pedido quando o meu caiu foi… O pensamento que tive poderia ser comparado aos delírios que todo ser humano tinha ao passar por uma ponte com o celular na mão: um impulso repentino de jogá-lo na água. Tive algo parecido envolvendo e toda a situação em que estávamos naquele momento: desejei inconscientemente mais manhãs ao lado dela na cama. O que era ridículo. Daqui a alguns meses teria outras ocupando o seu lugar.
— Não preciso, meu desejo já se realizou — sorriu falsamente enquanto prendia os cabelos num coque no topo da cabeça.
Reparei em seu corpo alongado com o movimento dos braços elevados; a nuca à mostra e seu rosto limpo, quase sem nenhum resquício de maquiagem. Como diabos conseguia ficar tão linda ao natural? Pior, fazendo coisas extremamente cotidianas!
— Tenho um homem rico me bancando — inclinou-se para molhar o rosto antes de alcançar, às cegas, o sabonete para o rosto.
Gargalhei e cruzei os braços, não deixando de dar uma olhada rápida em seu traseiro empinado devido à sua posição. Quando terminou de se enxaguar, lhe estendi a toalha de rosto e a vi sorrir em meio às gotas que pingavam de sua face.
— Engraçadinha — aproximei-me, pegando-a de surpresa ao agarrá-la por trás, o que apenas potencializou sua risada esquisita. — Seria ainda mais engraçado se não fosse de você que estamos falando — beijei sua nuca, vendo seus pêlos do braço se eriçarem. — A mulher mais orgulhosa do mundo — beijei pescoço e bochecha enquanto se encolhia, tentando fugir das cócegas que eu fazia em sua barriga.
— É claro que é brincadeira — ela jogou a toalha sobre o ombro e pegou um creme daquela vez. Abriu a tampa dourada e pegou um pouco da pasta branca e cheirosa nos dedos, espalhando pelo rosto devagar. Não sabia o que ainda fazia ali, mas olhar para ela era tão satisfatório que apenas fiquei parado, olhando. — , em casa, com a gente.
— O quê? — balancei a cabeça, despertando-me da espécie de hipnose em que me encontrava.
— Esse é meu pedido — sorriu fraco, pensativa. Voltei a abraçá-la instintivamente. — Mas acho que esse não vai valer. Eu tinha que ter pedido e assoprado o cílio do meu dedo e…
— Claro que vai valer — a interrompi. Eu nem acreditava naquelas baboseiras. sabia daquilo, por isso levou as mãos até meus braços em volta de si e acariciou minha pele enquanto ria baixinho. — Nós vamos manter isso, você vai ver — beijei o topo de sua cabeça.
Ser responsável por uma empresa do tamanho da minha era um fardo bem pesado para se ter nas costas. Algumas vezes, eu me pegava de cabeça cheia ao finalizar reuniões que pareciam encurtar nosso caminho para o fundo do poço ao invés de nos ajudar a sair. Tinha que me responsabilizar por tantos funcionários que eu geralmente fingia tranquilidade e confiança para não assustar ninguém. Não importava o cenário em que estávamos.
Mas ali com , pela primeira vez em muito tempo, finalizei uma discussão sobre algo que não dependia da minha vontade de dizer algo positivo, não somente para tranquilizar quem me ouvia. Disse aquilo porque eu realmente acreditava que iria acontecer, mais cedo ou mais tarde.
— Vamos dormir. Você me deu um chá de canseira hoje — ela seguiu para fora do banheiro e pegou minha mão enquanto me guiava de volta para a cama.
Não lhe disse nada, até porque quem tinha dado um chá tinha sido ela.
Nos deitamos e percebi que estávamos realmente cansados; nem ao menos percebi quando foi minha última piscada. Caímos num sono profundo. Fiquei tão relaxado que consegui sonhar durante aquele período. Me esqueci o que vivia em meu subconsciente quando abri uma fenda nos olhos e ouvi o conhecido choro soar ao fundo.
despertou, levantando-se sonolenta e calçando os chinelos para se arrastar até o quarto de . Virei-me na cama para conseguir assistir o que acontecia pela babá eletrônica e vi o momento em que minha esposa pegou a bebê chorosa do berço. Perdi o sono ao reparar quando ambas desceram até a cozinha e depois subiram em direção ao quarto novamente.
Vi lhe dar de mamar sentada na poltrona grande ao lado do berço. Quando terminou e estava de barriguinha cheia, assisti tentar por várias vezes fazê-la voltar a dormir após esperar que ela arrotasse.
Sorri sozinho ao ver os olhinhos da neném bem abertos enquanto seus bracinhos se agitavam. Nem se aguentava e inclinava-se para beijar seu rostinho. Tive vontade de me levantar e ir até elas para participar da sessão de beijinhos e risinhos que estava acontecendo no quarto ao lado. Porém, as deixei aproveitar o momento a sós. tinha um complexo sem sentido com aquela coisa de me preferir, e eu evitava qualquer comportamento que a fizesse realmente crer naquela ideia doida. era completamente apaixonada pela mãe, e eu suspeitava que as duas ficariam ainda mais próximas agora que passavam o dia juntas.
— Achei que ela não dormiria mais — a loira murmurou ao se enfiar entre os cobertores após fechar a porta do quarto.
Me aproximei dela na cama, ignorando seus picolés gélidos encostando em meus pés. suspirou, deixando-se ser enlaçada pelo meu abraço, e encolheu os ombros quando sentiu meu beijo molhado na nuca.
— Acho que também preciso de alguns beijos pra conseguir dormir — beijei o caminho até sua orelha pequena, mordiscando o lóbulo após sussurrar em seu ouvido.
— … — ela murmurou. Sorri contra sua pele, acariciando um de seus seios. — Você tem que dormir, amanhã trabalha.
Revirei os olhos.
— Não importa — arrastei seu corpo ainda mais em direção ao meu, tendo seu quadril colado na minha virilha. — Eu quero você — pressionei meu membro contra sua bunda descoberta pela calcinha, sentindo sua barriga denunciar a falta de ar repentina.
finalmente cedeu, virou o rosto e encontrou minha boca. Ali ela me deu o que disse que precisaria para voltar a dormir, mas era óbvio que não pararíamos nos beijos. Não seríamos nós se apenas aquilo bastasse.
esticou a mão para trás e invadiu minha cueca. Respirei fundo, sentindo seu toque gentil passar por toda a extensão de meu pau já ereto e tirá-lo para fora. Mordisquei seu lábio inferior e a segurei pelo pescoço, tendo sua mão movimentando-se devagar ao me masturbar. O êxtase que eu sentia me fez sorrir contra sua boca.
— Você quer assim? — alisei sua bunda macia, chupando de leve seu pescoço exposto.
não disse nada, apenas assentiu, olhando-me com o canto de olho enquanto sorria safada.
Contornei seu quadril e puxei a alça da calcinha preta para baixo. Direcionei-me à sua entrada e penetrei devagarinho, deixando-a se acostumar com meu tamanho. Eu beijava toda a extensão de pele que tinha diante de mim, arrepiando-a quando mordia ou chupava alguma parte em especial. Eu a segurava pelo quadril, mantendo o ritmo moderado que embalamos após as primeiras estocadas.
Os gemidos sôfregos eram abafados contra as bocas urgentes e o pudor da madrugada. Eram três e quarenta da manhã. Além de não querermos virar o casal transudo do condomínio (se é que já não éramos), tínhamos medo de despertar a bebê.
Estiquei o braço, levantei minha camiseta a fim de expor seus seios e tive uma grata surpresa ao vê-la brincando consigo mesma, imersa no êxtase do momento. Substituí uma de suas mãos, enchendo a minha com um deles enquanto lhe sussurrava o quão gostoso era fodê-la por trás e o quão gostosa ela era e sempre foi. Desci meu toque pelo seu abdômen suado, fazendo-a se contorcer em ansiedade ao já saber o que viria a seguir.
Meti forte, arfando contra seu ouvido, e gemeu audivelmente quando meus dedos tocaram sua buceta molhada. A loira se debateu no mínimo contato meu, mas a segurei mais firme, começando a masturbá-la superficialmente, sem penetrá-la nem nada. E somente aquilo, combinado às minhas investidas, foram o bastante para deixá-la louca.
Eu ainda a penetrava quando cheguei ao ápice, explodindo em prazer dentro dela. gozava em meus dedos quando interrompi a penetração para me dedicar à minha missão de levá-la a outro nível. Ouvi-la tentar sem o mínimo sucesso disfarçar o prazer que sentia me deixava extremamente excitado. Saber que era eu o responsável por fazê-la sair dos eixos deixava-me orgulhoso. Seu corpo ainda produzia alguns espasmos quando voltei a movimentar meus dedos contra sua intimidade pulsante.
Àquela altura, já estava praticamente de barriga para baixo no colchão; as pernas trêmulas e abertas enquanto movia os quadris, rebolando gostoso contra minha mão, completamente descontrolada. Lhe penetrei com os dedos e tive meu triunfo final. Logo revirava os olhos azuis, tendo mais um orgasmo delicioso diante de mim. Sorri, lhe beijando a têmpora, puxando-a para meu abraço enquanto sua respiração ofegante ia se normalizando aos poucos.
— Eu amo isso — beijei seu ombro, envolvendo seu corpo quente e suado em meus braços. sorria sonolenta, cansada demais para sequer abrir a boca. — Nenhuma outra faz como você.
Senti sua mão acariciar meu pulso. Era sempre incrível com ela. Me perguntava como, depois de tantas vezes, não tínhamos enjoado um do outro.
— Boa noite — ela bocejou, deixando-se ser beijada no pescoço e bochecha já de olhos fechados.
Enrosquei meus pés nos dela, deslizando pele com pele, sem nada nos atrapalhando de tocar cada superfície um no outro. Era deliciosa aquela sensação, ter o corpo que me deu tanto prazer repousar colado ao meu.
O despertador tocou, me despertando de meu sonho confuso. Na verdade, eu não poderia descrever muito bem o que acontecera no meu subconsciente durante a madrugada após a volta de do quarto de . Dificilmente lembrava dos meus sonhos após acordar, mas aquele em especial tinha sido tão bom que desejei virar-me para o lado e voltar até lá, onde me senti tão confortável que sequer desconfiei do fato de não haver problemas nele.
Ao mesmo tempo em que queria voltar, assim que abri meus olhos tive a mesma vontade anterior: a de não ir a lugar algum. Não queria deixar aquela cama, o aconchego dos acolchoados e a temperatura gostosa que aquele quarto tinha. O barulho da chuva misturado com a respiração pesada dela me traziam uma calmaria que tornava a tarefa de voltar aos meus sonhos a coisa mais fácil do universo.
Me estiquei para desligar o alarme e deixei o aparelho sobre a cômoda, decidindo ainda se ficaria mais cinco minutos ali ou se me jogaria para a realidade antes que a preguiça me tomasse de vez pra si.
, como sempre esparramada pela cama, se remexeu devagarinho, ainda imersa na inconsciência que seu sono pesado lhe acometeu. A noite tinha sido boa para ela também. A loira tinha o rosto sereno e relaxado, parecia ter tido bons sonhos. Sua mão veio de encontro à minha nuca, e sorri ao sentir seus dedos finos se emaranharem em meus cabelos, me proporcionando um cafuné irresistível. Me derreti diante da cena de seu rosto sonolento enquanto ainda me acariciava quase que inconscientemente. Fiquei imóvel, com medo de acordá-la e perder aquela cena.
O telefone maldito voltou a despertar, fazendo-me pegá-lo em mãos para, daquela vez, enfim desligar o barulho irritante. Praguejei quando senti seus dedos pararem os movimentos lentos.
— Amor? — ainda de olhos cerrados, sua voz saiu como um sussurro, rouca pelo longo tempo sem uso. Me aproximei de seu corpo ainda quase encaixado no meu, sentindo de perto o cheiro de seus cabelos.
— Hum?
— Já vai?
Observei quando seus olhos azuis se abriram devagar com duas fendas, protegendo-se da luz do dia que invadia as cortinas claras.
— Infelizmente — lamentei, quase que em manha, sentindo seu toque quente deslizar por meu braço antes de me agarrar meu pulso e puxá-lo para si. Ri baixinho quando se colocou em meu abraço, alinhando-se contra meu peito ainda meio dormindo, meio acordada. — Oh, por favor, não torne isso mais difícil do que já está sendo — beijei seu ombro exposto pelas alcinhas finas de sua blusa.
— Você bem que poderia ficar mais um pouquinho.
Mantive o rosto enterrado na curva de seu pescoço e fechei os olhos ao suspirar, concordando. Queria muito ficar com ela ali. Fiz o que geralmente evitava nos fins de semana e pensei no trabalho que teria para aquela semana. Entre reuniões com os clientes e a equipe, fechamento de contratos e orçamentos, sabia que iria voltar mentalmente àquele lugar, no nosso quarto e cama, e querer voltar fisicamente. Mas como acabei de listar, tinha muito trabalho acumulado; não parecia viável ignorar tudo.
— Queria muito, mas…
— Sem “mas”! — fui interrompido, tendo suas mãos mais firmes segurando-me ali. — Você é presidente da empresa, pode chegar a hora que quiser!
— Eu vivi pra te ver me incentivando a aproveitar meus privilégios de filho do dono.
não aguentou e riu, virando-se para me olhar com os olhos de cachorro que caiu da mudança.
— Não me olhe assim.
— Está funcionando? — ela aproximou o rosto do meu e beijou minha boca. Neguei, apenas tendo-a cada vez mais perto de mim, dificultando ainda mais minha partida. — Está frio e preciso de você aqui pra me esquentar — dramatizou contra meus lábios.
Arqueei as sobrancelhas, ouvindo a desculpa esfarrapada. Tirei seus cabelos do caminho e a peguei pela nuca, aprofundando o beijo e tocando sua língua com a minha. Ficamos daquele jeito por uns minutos. Eu estava usando o tempo como uma soneca do despertador, que seria prolongada em horas caso resolvesse subir em cima de mim como parecia estar planejando.
Olhei de relance para a babá eletrônica em cima da cômoda e vi a bebê remexer-se no berço, já com os olhos abertos e curiosos.
— Olhe quem está super acordada — indiquei a tela pequena com o queixo.
— é super pontual — virou o pescoço para espiá-la. — E não chora mais quando acorda e se vê sozinha no quarto de manhã. Acho que está ficando crescidinha.
Mais um drama. Ri da melancolia em sua voz, beijando sua bochecha.
— Bom, vou pegá-la — se desvencilhou de mim, arrastando-se pelo colchão. Senti frio ao ter meu corpo sozinho na cama, principalmente quando ela levantou as cobertas em busca da calcinha perdida. Vestiu quando encontrou e saiu porta afora.
Suspirei, jogando-me para trás, sendo amparado pelo travesseiro macio. Minha cadeira do trabalho era confortável, mas nada seria tão gostoso e quentinho quanto aquele colchão e cobertas. As pessoas com quem eu trabalhava eram agradáveis, mas não tanto quanto , seu sorriso babado e banguela e , que nunca tinha me parecido tão legal quanto naquela manhã. Era impressão minha ou era eu que estava muito a fim dela após a madrugada passada?
Peguei meu celular do móvel ao lado da cama e, nos contatos, selecionei o nome de Chace. Nunca que eu iria dar satisfações a insuportável da Beatrice sobre a minha empresa.
— Fala, cara! Vou chegar um pouco atrasado hoje. Tá chovendo e o trânsito parou de vez.
Franzi o cenho e olhei para a janela tampada pela cortina. Nem tinha notado.
— Relaxa, só liguei pra dizer que não vou hoje — olhei para a babá eletrônica, vendo o quarto vazio.
— Aconteceu alguma coisa com as meninas?
Estranhei seu tom urgente. adentrou o quarto com no colo e a outra mão cheia de coisas para banho da neném.
— Não — respondi, e a loira me espiou, curiosa. Sentei-me na cama e arrumei a postura.
Chace achava que eu estaria tranquilo daquele jeito caso algo tivesse acontecido com alguma delas? Pensei em perguntar aquilo a ele, de tão indignado que fiquei; porém, vendo ali tão perto, fiquei constrangido de expor aquilo. E também não queria deixá-la saber que Chace estava perguntando sobre ela.
— Mas decidi ficar por hoje — disse, sucinto. Ele devia estar estranhando minhas respostas monossilábicas. pelo menos estava distraída falando com ; devia achar que era coisa do trabalho, por isso não parou para prestar atenção.
— Você está estranho. Me conta, aconteceu alguma coisa?
Respirei fundo, levantando-me para ir até o banheiro. Esqueci que estava nu e ouvi rindo baixinho da minha gafe. Saí andando mesmo assim, chegando ao cômodo ao lado e já fechando a porta.
— Você nunca falta no trabalho e…
— Não, cara, já disse, tá tudo certo — respondi. Eu era tão previsível assim? — Só estava ocupado com e , por isso estou falando rápido — menti. — Só liguei pra avisar e para te pedir que me ligue caso algo fuja da normalidade por aí.
— Ah, sim. Foi mal, então — ele riu, nervoso. — Pode deixar, . Vai lá, dê um beijo nas meninas por mi…
Finalizei a ligação e encarei a tela do celular, duvidoso. O que ele quis dizer com “dê um beijo por mim?”
A porta se abriu, revelando sozinha daquela vez. Encarei-a, tentando parecer ofendido por ter minha privacidade invadida, quando na verdade estava realizando uma fantasia minha: tê-la invadindo o banheiro durante meu banho e transar com ela debaixo do chuveiro. Estranhamente, depois de meses morando juntos, nós nunca conseguimos fazer no chuveiro. Sempre algo nos atrapalhava ou um de nós tinha que olhar .
— Tome banho rápido. está faminta e eu vou tomar banho com ela antes de dar mamadeira.
Olhei frustrado para ela. Até a bebê tinha um banho com ela e eu nada?
— Ei — chamei, tendo-a me espiando pelo vão da porta que tinha acabado de passar. Lhe dei um selinho rápido, fazendo-a rir baixinho. — Bom dia.
me olhou de cima a baixo, mordendo o lábio ao espiar o que tinha entre minhas pernas e voltar seus olhos azuis para os meus. Engoli em seco. Agora sabia qual o significado de ser comido com os olhos.
— Ótimo dia — ela fechou a porta e correu quando fiz menção de ir até ela e agarrá-la, como meu subconsciente ordenava.
Sorte a dela eu não poder fazer o que tanto queria naquele momento. Sorte a dela.
Enquanto as princesas Dianas tomavam banho, desci e comecei a preparar o café da manhã. Fiz o omelete que tinha me ensinado da primeira vez que cozinhei na vida, quando desceu junto da bebê mais cheirosa desse mundo. soltou uma piadinha sobre não precisar mais me ensinar a cozinhar, e não pude deixar de notar seu sorriso amarelo ao se nomear “dona de casa”. Quase perguntei se estava tudo bem. Depois do dia em que minha esposa ficou tão frágil e confusa após a demissão repentina, acabei não me aprofundando em conversas sobre o assunto. parecia evitar todas elas a todo custo, ou eu não estava sendo insistente o bastante.
De qualquer forma, senti um aperto no peito ao vê-la sem graça daquele jeito na hora de sinalizar que nosso leite estava acabando na dispensa; não conseguiu deixar claro que estava me pedindo dinheiro para reabastecer. Ainda não tinha recebido o dinheiro da rescisão do trabalho, e eu não sabia se queria discutir comigo o destino daquele valor. Temia que ela quisesse usar para coisas desnecessárias, como comprar leite pra casa só para não ter que pedir.
Queria que ela gastasse com algo para si, mas sabia o quanto poderia ser orgulhosa. Pensei na possibilidade de deixar um de meus cartões com ela, para que não precisasse vir até mim pedir. Deixei claro que eu ainda queria aprender a cozinhar e que iríamos continuar praticando a direção juntos.
Após o café, coloquei para tirar sua soneca da manhã em seu quarto. Desci para ajudar com a louça e transamos na lavanderia quando eu fingi que iria ajudá-la também nas roupinhas da bebê. No fim de tudo, a coloquei sobre a máquina de lavar e, quando vi, já estávamos nus. Só de poder foder minha esposa em plena segunda-feira às dez da manhã, fez aquele dia inteiro de folga ter valido a pena.
Voltamos para dentro e ficamos esparramados no sofá, fazendo o que tínhamos planejado para o domingo: revirar a Netflix em busca de algo interessante. Acabamos colocando um filme ruim, mas não importou muito. Todo mundo sabe o que significa quando te chamam pra ver algo na Netflix. Acabamos do mesmo jeito que na lavanderia, e aquele dia não poderia ficar mais perfeito. Parecia um sonho erótico sem fim.
Perto do horário do almoço, acordou. tinha tido a ideia de levarmos ela para tomar vacina e, já que estávamos os dois em casa, estávamos combinados de ir após o almoço. Enquanto terminava de preparar a refeição que fizemos juntos, eu distraía a neném de cara amassada após ter dormido um soninho tentador. Talvez, quando voltássemos da vacinação, pudéssemos acompanhá-la na próxima soneca, afinal, não dormimos muito bem noite passada.
Estávamos sentados à mesa quando meu telefone começou a tocar insistentemente na mesa. Olhei para o visor, ainda mastigando, e vi que era Chace. Encarei , que deu de ombros como se não importasse caso eu atendesse. Aceitei a chamada contra minha vontade, afinal, poderia ser algo importante.
— Me disse pra ligar caso algo saísse da normalidade.
Murmurei nervoso para que ele continuasse.
— Beatrice está na sua sala te esperando para uma reunião extraordinária que surgiu com uns clientes importantes.
— Está brincando, né? — ri sem nenhum resquício de humor, já me levantando da mesa, agitado. — Quem ela pensa que é para exigir minha presença assim, do nada? E mais! Quem deixou aquele… — ia falar dragão, mas flagrei encarando-me de sobrancelhas arqueadas. — … Aquele ser entrar na minha sala sem autorização?
— , ela meio que é dona da empresa também…
Ignorei sua fala para não perder a amizade. Já era a segunda mancada no mesmo dia.
— O que eu falo pra ela?
— Pergunte como ela marca uma reunião com alguém que não está presente para concordar ou não.
— … — o ouvi suspirar, cansado.
— Estão te chamando? — veio até mim, fazendo-me interromper minha massagem na têmpora para encará-la. — Parece importante. Tudo bem se precisar ir, levo pra vacinar amanhã.
Concordei com a cabeça, ainda hesitante.
— Eu vou. Mas só depois do almoço.
Não iria na hora que ela queria, já não bastasse a insolência de querer exigir algo! E se eu estivesse realmente ocupado?
Me despedi de Chace com me chamando de volta à mesa. Sentei-me ainda carrancudo, pensando em milhares de xingamentos que poderiam ser direcionados aos Thorpe, que eu nem queria ter sociedade para início de conversa.
Assim que terminei, subi para me aprontar e tomei um banho rápido. ainda estava na cozinha quando desci já pronto e ainda de cara amarrada. Quando me viu, enxugou as mãos molhadas e veio me dar um beijo, envolvendo meu pescoço com os braços.
— Queria ficar aqui com vocês — lamentei entre um selinho e outro.
— Não foi o que me disse hoje de manhã — riu baixinho, relaxada com o toque de minhas mãos subindo e descendo por sua coluna. — Você adora trabalhar e ama aquela empresa — outro beijo. Não discordei, ela tinha razão. — Mas se quiser trocar de lugar, eu topo.
Me afastei para olhar em seu rosto; seu sorriso amarelo voltou a dar as caras. Puxei-a para um abraço sem saber o que responder. Não era uma piada qualquer. tinha mania de falar verdades em forma de brincadeiras ao invés de ser sincera e dividir o problema.
Fiquei abraçado nela por um tempinho, com nos observando atenta e deitada no carrinho.
— Adorei a manhã de hoje — murmurei com a boca colada em seu ouvido. Quando a soltei, já exibia o sorriso que eu já conhecia, um genuíno.
— Podemos repetir num fim de semana.
Mordi o lábio, imaginando. gargalhou do estado em que fiquei só de pensar e me beijou demoradamente, deixando minha boca vermelha de tanta pressão que fez em meus lábios. Enrosquei minha língua na dela, desejando não ter que ir embora.
Deixei a casa dirigindo o mais devagar possível. Apesar do horário não me presentear com um engarrafamento pelo caminho, onde estavam as filas quilométricas de carros quando precisávamos delas? Cheguei na empresa e fui direto para meu andar, tendo Jordyn me recepcionando com uma metralhadora com recados. Beatrice deve ter espalhado pelos quatro cantos daquele prédio que eu tinha faltado ao trabalho. Deviam pensar que eu estava desaparecido ou coisa assim.
Fui para a merda da reunião, sentando-me na outra ponta da grande mesa. Entrei mudo e saí calado dela. Beatrice era quem tinha feito o negócio; não entendi o motivo da minha presença ser necessária ali. Eu não me meteria em suas coisas, não iria exigir participar de algo que não me envolvia, e não a queria achando que teria liberdade de fazer o mesmo comigo.
Tive certeza que ela me chamou de propósito, só porque percebeu que eu não tinha ido para a empresa. Ela falou tudo, sabia todos os detalhes do contrato que fechou naquela tarde e o assinou, tendo-me apenas como testemunha. Coisa que qualquer um naquele prédio inteiro poderia fazer.
Passei o resto do dia trancafiado em minha sala. Já tinha almoçado e até mesmo Chace imaginou meu estado de espírito – não se atreveu a ir até minha sala até o fim da tarde.
Cheguei em casa, tomei um banho e jantei com . Naquela noite, todos os três capotaram cedo demais. não tinha tirado sua soneca no horário da tarde e, bom, e eu estávamos cansados da noite anterior.
acordou no mesmo horário de sempre, na madrugada, e minha esposa me cutucou para me lembrar de quem era a vez de ir pegá-la. Fui até o quartinho dela e não pude reclamar de ter que me levantar e passar longos minutos acordado em plena madrugada. tinha um olhar tão doce que compensava todo e qualquer sacrifício que fazíamos para seu bem.
Acordamos no dia seguinte e tudo voltou à normalidade. Pensei em como tinha parado de sair para correr de manhã e que tinha planos de ir à academia. Eu precisava voltar a praticar exercícios para acompanhar o pique de na cama. Não sabia de onde ela tirava tanta energia. Mesmo sendo poucos anos mais velho que ela, acredito que o fato de eu estar mais longe dos vinte e próximo dos trinta andava me preocupando.
Logo seria meu aniversário. Tudo estava tão mudado que, ao mesmo tempo em que tinha muito a comemorar, não sabia se conseguiria sem ela ali comigo. Saber que eu não receberia nenhuma ligação de Grace e nem seria marcado na mesmíssima foto de nós dois pequenos nas redes sociais me deixava deprimido.
Deixei em casa após uma sucessão de beijos enquanto ela me acompanhava até a porta. Murmurei um adeus ainda contra seus lábios, guardando o gosto de seu beijo em minha memória para poder revisitar mais tarde quando sentisse falta.
Passei com o carro em frente à floricultura de esquina num cruzamento próximo ao trabalho. Me apressei em deixar o carro no estacionamento da empresa e fui até lá a pé. Tive uma ideia repentina, e me apressei a colocá-la em prática antes que pensasse demais e desse para trás. Adentrei a lojinha repleta das flores mais lindas e apanhei uma das rosas para sentir o cheiro. Não havia nada de mal naquilo, certo? Eu estava apenas presenteando alguém!
E, além do mais, eram apenas flores, não um pedido de casamento!
— Ocasião especial?
Dei um pulo de susto com o velhinho surgindo do além ao meu lado. Deixei a rosa no lugar e disfarcei minha reação enquanto era observado por ele.
— Ah, não — falar aquilo em voz alta apenas me fez ficar ainda mais nervoso.
Não, não era uma data especial. Não tinha nada de especial naquelas flores, que logo murchariam e morreriam! Definitivamente não era algo especial.
— Um pedido de desculpas?
Franzi o cenho, indagando com o fato de estar certa sobre homens que mandam flores fora de datas comemorativas.
— Recomendo que leve alguns chocolates junto, se for o caso.
— Não, não é um pedido de desculpas, são só… rosas vermelhas — respondi, vendo quando seu olhar pairou sobre minha aliança.
— Nunca serão só rosas vermelhas, meu filho. Elas representam paixão, o ápice da paixão.
Engoli em seco, rindo nervoso e sem jeito de contrariar o velho, que tinha os olhos castanhos brilhando.
— Sua esposa é uma mulher de muita sorte. Nem todos os casamentos conseguem manter a paixão. Não se cultiva mais o hábito de dar flores à mulher amada fora de datas comemorativas.
Pobrezinho, devia estar sem clientes.
— Nós temos meses de casados — expliquei. Aquele papo talvez serviria para casais antigos. E verdadeiros, apesar de ser apenas um detalhe. — Bom, vou levar um buquê de rosas vermelhas. Vocês entregam, né?
Ele assentiu, pegando as rosas e as ajeitando para começar a montar.
Fiquei ali parado feito estátua, pensando no que ele disse e torcendo para que continuasse calado enquanto me atendia. Eu não era um cético daqueles que não acreditavam em nada sobre o amor, afinal, eu mesmo fui vítima dele quando vi pela primeira vez. Mas não gostava de ouvir ninguém falando sobre como se fosse algo fantasioso. Ficava irritado. Era como ouvir sintomas de uma doença e começar a senti-los de repente. Ler sobre coceiras e começar a se coçar também.
Parecia tudo muito enfeitado demais: falas, músicas, filmes de romance. Tudo era montado para causar aquele efeito em quem estava vendo. Ninguém falava como nos filmes com a pessoa que está namorando, por exemplo. Não era natural. Tudo era forçado para ser filmado e colocado na internet para as outras pessoas verem e acreditassem que era real. Ninguém postava brigas e discordâncias, somente o que convinha mostrar.
Se eu estivesse apaixonado como o velhinho insinuou há pouco, não iria ficar postando meu relacionamento em redes sociais. Iria demonstrar a ela, falar para que ela realmente soubesse o que sentia. Não iria espalhar por aí para todo mundo ficar sabendo.
— Quer dizer algo a ela?
— O-O quê? — outro pulo. Encarei seu rosto sorridente até demais.
— Um cartão. Quer escrever algo para sua esposa ou vai enviar um cartão já impresso?
Arqueei as sobrancelhas, vendo a prateleira que ele me indicou para dar uma olhada. Senti-me estúpido. Lógico que ele não sabia o que eu estava pensando! E mesmo que soubesse, não era sobre . Eu não precisava ficar tão nervoso como fiquei.
Eu, hein.
Passei os olhos pelas juras de amor mais cafonas que já li na vida. Peguei o mais simples e lhe entreguei, meio incerto. Ainda dava tempo de desistir?
— Hum… Um homem de poucas palavras — ele murmurou para si mesmo e foi até o caixa, já com o buquê adornado do cartão em mãos. Eu o segui, vendo-o pegar uma caderneta. — O nome dela?
— — disse, desconfortável com o modo com que ele me analisou por tempo demais para uma simples resposta daquelas.
— Qual o endereço? — perguntou, e passei o nome do condomínio. — Ela pode ir até a portaria pegar?
— Não, ela está em casa com nossa filha — falei, e um sorrisinho nasceu em seus lábios. Não gostava de vê-lo sorrir como se eu estivesse agindo feito um bobo apaixonado. Não era o que ele estava pensando, e aquilo estava me irritando. — Nossa casa fica um pouco longe da portaria. Mas posso ligar para autorizar a entrada.
— Melhor assim — o velho falou consigo novamente. Devia estar caducando já. — Entregaremos em até um hora.
Concordei após pegar meu cartão de crédito de volta.
— Tudo bem, muito obrigado — acenei com a cabeça, dei-lhe as costas e voltei pelo corredor cheiroso.
— Esse casamento… vai durar anos… eu sei!
Virei o rosto e o encontrei sentado no caixa enquanto anotava algo. Franzi o cenho, deixando o estabelecimento o mais rápido possível. Não deviam deixar alguém tão idoso sozinho numa loja atendendo clientes.
Saí do elevador e fui direto para minha sala. Jordyn, dessa vez, não tinha milhões de coisas anotadas para me repassar e me deixou aliviado quando apenas me desejou um bom dia. Trabalhei um pouco ansioso, acelerado, olhando para o relógio pelos próximos minutos até que passasse uma hora desde que fui à floricultura. Era bizarro o quanto fiquei produtivo enquanto esperava algo acontecer. O que eu não sabia ao certo: quem iria receber algo era , não eu. Deveria esperar uma mensagem ao menos? Ela iria me agradecer, afinal, foi um presente, certo?
Ouvi batidas na porta e logo Beatrice passava por ela, vestida num vestido vermelho, sóbrio e elegante, com seus sapatos de salto barulhentos que me dava nos nervos.
— Bom dia, .
Aprumei-me na cadeira, respondendo-a ainda na defensiva. Ela já tinha comprado metade da minha empresa, o que mais aquela mulher queria?
— Bom, estava indo a uma reunião, mas antes queria te pedir desculpas por ontem.
Franzi o cenho, sem saber muito bem o que dizer. Quem ela pensava que era para me irritar como fez ontem e depois simplesmente vir com a cara deslavada para se desculpar? Ela queria me deixar culpado? Pois foi perder seu tempo. Eu não iria me sentir assim. Thorpe foi autoritária e egoísta ao exigir minha presença na empresa sem que houvesse grande necessidade. poderia falar o que quisesse, mas ao menos daquela vez eu tinha razão em ficar bravo.
— Sei que não devia ter te trazido aqui do jeito que fiz. Acredito que tenha exagerado um pouco.
Continuei calado, esperando-a continuar. Beatrice juntou as mãos, esfregou uma na outra em sinal de ansiedade e levantou os olhos escuros em minha direção antes de sorrir, incerta.
— É que eu nunca tinha presidido uma reunião com clientes tão importantes. Ao menos, não sozinha. Meu pai sempre esteve ao meu lado, e talvez eu tenha ficado um pouco insegura. E busquei em você, que tem mais experiência, alguém para ter confiança no que eu estava fazendo.
Nossa, por essa eu não esperava. Engoli em seco e ajeitei a gravata. Ver Beatrice sem sua armadura me despertou empatia por me ver nela quando meu pai me introduziu ao mundo dos negócios. Eu tinha o mesmo receio, de falar besteira em frente aos verdadeiros predadores, que eram os demais empresários com anos de bagagem. Não gostei da sensação de que eu poderia parecer um deles diante dela. Apesar de não ir com a cara de Beatrice, não queria parecer quem eu não era. E eu definitivamente não era nem um pouco ameaçador. Ao menos que fosse provocado.
Mesmo após a compra da empresa contra a minha vontade, a culpa meio que não era muito de Beatrice. Afinal, se meu pai não tivesse decidido me punir por adotar , a empresa não seria colocada à venda e, consequentemente, sido comprada pelo pai dela.
— Está tudo bem — suspirei após fazer força para soltar tais palavras direcionadas a ela. Tá, eu estava sendo empático, mas demonstrar empatia? Aí já era demais! — Não se preocupe, você se saiu bem ontem. Até fechou o contrato com eles.
— Muito obrigada por ter vindo ontem — ela agradeceu, e eu assenti ainda sério, sem saber mais o que dizer. — Bom, vou te deixar trabalhar em paz.
Pelo menos ela sabia que me tirava a paz. Beatrice se direcionou à porta, porém, parou ao tocar a maçaneta.
— Como vão sua esposa e filha?
Estranhei sua pergunta. Não costumava trabalhar tão junto de mulheres. Até mesmo Jordyn, por nossa posição hierárquica, não fazia perguntas de cunho pessoal e não tocava no assunto, ao menos que eu começasse a falar sobre minha família. Devia ser normal entre as mulheres. O único que perguntava sobre e era Chace, mas além de ser meu melhor amigo, ele era evasivo daquele jeito quando se tratava de . O restante dos caras até se preocupavam, mas não chegavam a perguntar, apenas deduziam que estava tudo bem pelo fato de eu não falar sobre algum problema.
— Estão bem, obrigado por perguntar — soei robótico.
— Que bom — ela assentiu, finalmente abriu a porta e sorriu minimamente. Estava na cara que ela não se importava. — Até mais, .
Beatrice saiu, fazendo-me voltar a encarar meu computador e refletir, por um mísero segundo, se talvez não pudéssemos manter aquela convivência mesquinha e completamente feita de aparências. Se ela colaborasse, é claro.
As horas passaram. Nada. Será que entregaram no endereço correto? Eu liguei para a portaria, estava tudo certo!
Me aliviei ao perceber que logo daria meu horário de almoço e eu sairia com Chace e os outros caras, então iria me distrair um pouco daquela bobagem. Não devia ter colocado expectativa em algo tão bobo. Eram apenas flores, e era apenas a .
O celular começou a vibrar em cima da mesa. O nome dela piscava na tela. Peguei o aparelho rapidamente; porém, percebi a idiotice que eu estava fazendo, reagindo a uma interação como um adolescente emocionado. Então, me recompus antes de atender.
— Alô — disse calmamente, como se não estivesse esperando aquela ligação.
— Oi — ouvi murmurar algo, e sorri sem nem perceber. — Está ocupado?
— Não estou, pode falar. Aconteceu alguma coisa?
— Na verdade, não, é que… chegaram flores aqui em casa.
— Hum… Quem foi que mandou? — segurei o riso ao ouvi-la rir do outro lado da linha.
— É sério, .
Encarei a vista do céu nublado enquanto ria junto dela.
— Você gostou? — senti meu coração acelerar ao ansiar por sua resposta.
— Sim, elas são lindas.
Mordi o lábio, calado, imaginando-a sorrir com os olhos quase cerrados.
— …
— Hum? — murmurei, atento ao que ela diria a seguir.
— O que está fazendo?
Segurei o celular mais forte entre meus dedos; provavelmente o esmagaria caso tivesse força o suficiente para fazê-lo. Imaginei em casa, na cozinha, parada diante da pia após encher um vaso para colocar as rosas vermelhas.
Encarei a tela do meu computador logo depois. Todas aquelas letras e números que me deixavam louco durante os meus dias ali de repente pareceram a coisa mais simples do universo. Difícil mesmo era compreender a complexidade que era sentir algo tão forte e tão presente, e mesmo assim não conseguir interpretar e traduzir em palavras.
Às vezes eu me sentia doente, mas era como se nenhum médico possível conseguisse diagnosticar o que eu tinha. Mesmo comparando a algo ruim como uma doença, eu não me sentia enfermo. Longe disso, me sentia mais vivo. O coração trabalhava depressa e meu sorriso se abria involuntariamente.
Abri a boca uma, duas vezes. Minha voz não saía. De repente, me vi como um adolescente inseguro, temendo levar um fora. O que, tratando-se de , não seria muito difícil. Aquela indagação era a prova de que minha intuição estava certa, me dizia que não seria uma conversa lá muito simples de se ter. Principalmente porque eu não sabia o que falar.
Eu apenas o tinha feito. Era esquisito estar naquela atmosfera dentro de casa – acordar ao lado dela, trocar beijos e carícias na cozinha, nos deitarmos grudados no sofá e, quando estávamos separados, sentir receio em fazer o que já fazíamos longe dos olhos alheios. Eu não devia ficar ansioso daquele jeito ao ser questionado sobre o motivo de ter lhe enviado flores.
Não quando a tinha deixado em casa com um beijo daqueles mais cedo.
— ? Está aí?
Eu podia ouvi-la mexendo nas flores, tirando o plástico que as envolvia do caminho. Pensei que talvez teria sido melhor comprar girassóis; não pela música escrita anos atrás sem sequer imaginar aonde iríamos parar, mas para desvincular o pensamento que tinha quanto a receber flores fora de datas comemorativas. Não queria que ela pensasse naquele presente e logo lhe viessem memórias das vezes em que seus ex-namorados “fizeram merda” com ela.
Eu não queria dividir espaço em seus pensamentos com nenhum outro.
Estávamos há muito tempo sem brigar, e eu diria até que batemos um recorde nunca visto antes quando o assunto era nós dois. E apesar de me sentir a pessoa mais estranha do universo ao dizer isso, eu não gostava mais de brigar com . Irritá-la de vez em quando era engraçado, mas eu estava adorando o tempo que ficávamos juntos sem confusões. Não queria mais vê-la chorar como das últimas vezes e saber que eu, de alguma forma, provoquei tal reação. Eu me esforçaria para manter nosso recorde recém-alcançado.
Chace surgiu dentro da sala após dar batidas quase imperceptíveis, apesar de acreditar que, mesmo que ele tivesse derrubado a porta, eu não perceberia. Estive muito concentrado em na voz de e em meus pensamento durante a conversa.
— Vamos almoçar? — ele percebeu o telefone em meu ouvido e hesitou, fechando a porta atrás de si. — Foi mal, cara — sussurrou, exasperado. Fiz um gesto, o desdenhando. Mal sabia ele que eu iria agradecê-lo por nos interromper naquele instante.
— Tenho que desligar.
— O quê, tem alguém aí?
— Sim — fiz sinal para que Chace esperasse um pouco.
— Quem? Chace? — ela perguntou, e eu concordei com um murmúrio. — Vá em frente, capriche no script final.
Não pude deixar de sorrir ao ouvir aquilo. Eu adorava encenar com quando tínhamos plateia.
— Pode deixar, amor.
riu:
— Muito simples. Eu esperava mais de você, .
Arqueei as sobrancelhas, atraindo a atenção de Chace, que percebeu com quem eu falava.
— Não estava escrito no cartão, mas estou com saudades — baixei um pouco o tom de voz, mas meu amigo continuou atento ao que eu dizia, tanto que riu da minha cara ao me ouvir tão meloso. — Não vejo a hora de chegar em casa pra gente repetir a dose do que fizemos em cima da máquina de lavar e…
— Já está bom! — ela me interrompeu, com certeza vermelha de vergonha. — Ok, eu mereci essa, te provoquei.
— Você sempre provoca — sorri triunfante, encarando um Chace constrangido. — Te amo, dê um beijo em por mim.
Somente eu podia pedir a que desse um beijo em nossa filha e, obviamente, beijar . Esperava que Chace entendesse daquela forma.
— Tchau, .
Encerrei a ligação, fingindo que ela tinha me dito algo extremamente excitante. Peguei minha carteira e rumamos para fora da sala.
Durante o almoço, o assunto não foi outro além do jogo do Liverpool que aconteceria mais tarde. Os caras estavam combinando de assistirmos todos juntos, como nos velhos tempos, antes de eu me casar e virar pai e Jack começar a namorar. Ele nos defendia, dizendo que os outros tinham inveja de nós por termos arranjado alguém e que eles também deveriam arrumar uma namorada. Eu apenas concordava, recordando-me de que se fosse antigamente, eu faria parte do grupo que caçoaria de quem tinha uma mulher mandando em si.
No fim, combinamos que iríamos sim ver o jogo juntos e, como sempre, era em meu apartamento. O local não mudou. Eu os receberia em casa, só tinha que avisar . Como disse anteriormente, agora eu tinha uma esposa a quem dar satisfação, e aquilo não passou despercebido por eles, que riram quando eu a citei. Passei-lhes as regras no caminho de volta para a empresa que eu mesmo as tinha criado: maneirar na bagunça, comprar pizza e cervejas moderadas e sem gritos para não assustar . Se ela chorasse, revezaríamos os colos para acalmá-la, e, especialmente para que Chace não a importunasse, nada de encher o saco de .
Todos concordaram. Quando chegamos na empresa e cada um foi para sua sala, nem tive tempo de pegar em meu celular para comunicar minha esposa. Beatrice me alugou pelo restante da tarde num projeto que planejou junto dos clientes da reunião do dia anterior.
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Nota da autora: Oi amigas! Queria pedir perdão pela extensa demora na att, mas peço para que entrem no grupo do Facebook/Wpp ou me sigam no instagram de autora para que vocês fiquem tranquilas e verem que eu não abandonei RML, mesmo com a demora deixo avisos por lá e posto spoilers também! Enfim, me digam o que estão achando!
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