Capítulo Um – Entre Leões e Águias
· ·
Minha doce Nova York nunca parecera tão fria e distante como agora.
Vendo o avião azul patriota e amarelo canário viajar sem minha tripulação fez com que um gosto amargo subisse pela garganta. Sentado a nossa frente, Konner cruzava os dedos de tantas formas possíveis e com tanta força que parecia querer quebra-los de uma só vez.
- Meus caros, não sei muito bem como dizer isso à vocês... – ele não tirava os olhos das juntas em suas mãos, nem mesmo para falar conosco. – Mas tenho certeza que já ouviram os rumores...
Sentindo o peso dos olhares dos outros três naquela sala, me adiantei e olhei para o velho.
- Senhor, por favor, rumores não tem forças suficientes para atingir minha equipe. Principalmente se forem feitos pelos Leões.
O velho não conseguia nem mesmo olhar dentro de meus olhos. Parando de quebrar os ossos de suas mãos trêmulas, Konner finalmente levantou o rosto, mas para meu desgosto, não direcionado a mim. Seguindo o rosto surpreso de Parker e o tenso de , que claramente gritava “Eles estavam certos”, virei para a porta escancarada, encarando uma figura pomposa e vermelha que suava feito um porco enquanto segurava uma caixa velha lacrada.
- Greg! – Konner soltou aliviado. deu um olhar tão sentido para o velho, como se sua dignidade tivesse compelido a vergonha da de Konner, que ele nem conseguiu mais olhar para nosso chefe. – Será que você poderia dar uma ajudinha aqui?
Minha vontade de cuspir em Konner e nesse tal de Greg e sair andando daquela sala era tão grande que eu quase o fiz, mas a mão gelada de segurando a minha fez com que eu retomasse a realidade - eu não podia deixar a minha equipe na mão, não desse jeito.
Arrumando minha postura, segurei a barra de meu uniforme azul com força e encarei o indivíduo vestido com a cor oposta a minha. A caixa em seus braços claramente etiquetada com “Uniforme: Lion Airways” fez meu coração apertar em protesto. Deixando a caixa intrusa na mesa de Konner como se os dois fossem velhos amigos, Greg pegou um lenço do bolso e secou o suor de sua testa.
- Perdoem o meu estado, mas esta primavera não está a favor de ninguém. – guardou o lenço úmido de volta e continuou. - Bom, onde paramos? – perguntou, se encostando na beira da mesa, olhando diretamente para nós como se fossemos crianças.
- Do zero. - Parker, sarcástico, sorriu de volta para o gordinho e adicionou um “por favor”, para parecer menos mal educado.
Secando mais uma vez o rosto com a mão, Greg suspirou tão rápida e suavemente que quase não reparei. Se ele não fosse mais um dos ingleses da Lion, eu até diria que Greg era uma pessoa amigável, mas – reformulando o que ele mesmo disse – a verdade não estava a favor de ninguém e ser amiga de um dos funcionários da nossa maior concorrente não estava na lista de coisas a se fazer.
- Primeiramente quero me apresentar à vocês. Sou Greg Bayard. Lion Airways.
O homem nem precisou especificar o motivo de sua visita, nós todos já sabíamos o que estava acontecendo: nosso pior pesadelo – meu pior pesadelo – se tornando realidade. Com os dedos de se fechando em minhas costas, senti o mundo desabar. fez o mesmo com minha mão, mais para se livrar da decepção do que para me confortar, e olhou diretamente nos olhos de Parker. Medo e preocupação pintados sob os rostos perfeitos de cada um deles.
- Sim, os rumores se revelaram como verdades. Konner e eu discutimos muito com os outros empreendedores de ambas companhias e chegamos a conclusão de que nos unir seria melhor do que competir.
Se meu orgulho estava se despedaçando? Nem preciso dizer! A American Jets, a maior de toda a América, se não a maior de todas no mundo, estava escapando de nossas mãos e caindo diretamente nas garras de nosso maior inimigo. Os ingleses podiam mesmo comprar tudo o que queriam nesse ramo.
- A American Jets, como vocês bem sabem, opera por toda América. É o maior império aéreo americano desde Pan Am. – por algum motivo, ouvir isso saindo da boca de um Leão com seu sotaque pesado, fez com que o título fosse baixo e tivesse pouca importância ao invés de nos dar conforto. – Enquanto isso, nós da Lion Airways operamos em toda Europa e Ásia. Somos os dois grandes pilares aéreos do mundo, por isso todos sabem da nossa grande rixa. Mas se juntássemos nosso poderio, imaginem a grandiosidade da coisa. Frotas aéreas indo e voltando sem parar, funcionários cada vez mais bem pagos, clientes satisfeitos, passagens por um preço mais baixo. Conseguem ver como isso pode ser bom?
Não, não e não. Isso era tudo que minha mente conseguia pensar no momento. Jets e Leões não poderiam trabalhar juntos. Em qualquer aeroporto que você vá, todos sabem que só existem duas companhias ícones no mundo todo, inimigas de sangue para melhorar. Se juntássemos as duas, uma guerra sem fim definitivamente aconteceria.
- Senhor, com todo respeito. – me virei para olhar , enrubescido e com a voz claramente chateada. – não vejo como podemos aceitar as coisas desse jeito, principalmente agora que a briga entre as duas companhias está em seu ápice. Greg, se posso lhe chamar assim, suas equipes praticamente roubaram nossos voos para que o senhor tivesse essa conversa conosco. Os outros funcionários da Jets estão lá fora, esperando para ver o que sua companhia vai fazer para nos recompensar. Precisamos voar tanto quanto os Leões, mas se o senhor for dar nossas rotas aos seus funcionários, não vejo como podemos criar um laço com a sua companhia.
Mordendo a boca de leve, sorri para e me virei para o velho. Konner também sorria discretamente, como se pensasse do mesmo jeito que nós. Não voltei a respeitá-lo por isso, mas a decepção em relação a sua pessoa diminuiu alguns milímetros.
- Capitão , sei que o que os “Leões”, como nos chamam, pegaram suas tarefas de hoje, mas isso foi por uma causa maior. A meu pedido e não por vontade própria. Queiram me perdoar se isso os chateou, realmente não queria começar com o pé esquerdo...
- Senhor, - levantou o rosto – pode me esclarecer quem é que comprou quem? Sei que todos os fatores inclinam para o seu lado, mas eu só preciso de uma...confirmação.
Com um sorriso complacente, Greg olhou diretamente nos olhos azuis de e falou:
- Nós da Lion investimos muito na companhia de vocês, então digamos que quem está em comando da situação somos nós. É por isso que vim aqui com isso. – apontou para a caixa na mesa. – Precisamos que vocês troquem os uniformes e leiam o manual de regras da Lion Airways. O voo que vamos colocá-los será divulgado em alguns instantes, por isso, enquanto esperam, quero que vocês comuniquem aos outros funcionários das novas mudanças. Mais alguma pergunta?
- Por que não nos demitiram? Vocês possuem tantos funcionários que já são leais a empresa. Por que continuar conosco? – de braços cruzados, Parker encarou Greg.
Agora era Konner quem se levantava, se propondo a falar.
- Porque um dos acordos que fizemos com a Lion antes da compra era que todos os funcionários seriam poupados. E como a Lion cumpre promessas, esperamos que vocês façam o mesmo. Queremos que vocês aceitem as mudanças e comecem a trabalhar com seus novos companheiros.
- E que nome vamos receber? – soltei sem pensar. Isso definitivamente era o de menos para se preocupar, mas minha boca soltou o que meu coração não queria sequer imaginar.
- Leões, senhorita . Vocês serão a mais nova parte da nossa família.
--- ✈ ---
Puxei o terno vermelho mais uma vez, tentando arrancar cada pedaço daquela roupa fora do meu corpo. As mulheres passando por trás do meu reflexo não paravam de me olhar como se eu fosse um parasita usando uma roupa cor de sangue curta e apertada.
Pelo menos era assim que eu me sentia.
- , tem como você me passar outra saia? Parece que a antiga dona dessa aqui gostava de uma atenção na bunda...
Ainda encarando o reflexo que não me pertencia, me abaixei para a caixa de uniformes jogada a minha frente e passei uma saia para , que esticava o braço por cima da porta da cabine.
- Eu ainda não acredito que nós vamos ter que trabalhar com eles. Só porque somos a equipe número um da Jets não significa que precisamos trabalhar com a equipe número um deles. Ainda mais tendo como chefe.
Eu ainda nem tinha pensado nisso. Cansada de toda aquela reviravolta maldita, deixei resmungando sozinha e sai do banheiro com a respiração pesada. Se isso era um karma por todos os anos que provoquei os funcionários da Lion, então realmente o preço a se pagar era muito grande. E infelizmente eu sentia que isso era apenas o começo.
Andando pelos corredores do aeroporto, olhei para os passageiros sentados nas cadeiras, esperando seu embarque. As telas dos voos mostravam claramente a águia dourada, símbolo da American Jets, mas bem ao lado, em uma letra mínima, aparecia também o nome da Lion Airways e o leão vermelho cuspindo fogo. Apertei o passo, tentando esquecer o que tinha acabado de ver e fui até a sala dos funcionários da Jets.
Assim que coloquei os pés na sala, todos se viraram para mim, surpresos, até mesmo chateados por me verem fora do uniforme azul e presa no vermelho. Por ser a chefe da melhor tripulação da companhia, era-se esperado que eu retaliasse, que eu fizesse alguma coisa - qualquer coisa - menos aceitar aquilo com a cabeça baixa.
Engolindo em seco, entrei na sala e fui direto até minha mala.
- , - um dos comissários de bordo da equipe Ômega segurou meu ombro enquanto eu me abaixava para pegar o lenço amarelo canário que precisava. – como você está?
Pela primeira vez naquele dia eu admiti para mim mesma que estava péssima. Mas, para não os desapontar, apenas sorri e dei de ombros.
- Estou bem. Tentando pensar em algo genial para conseguir nossa companhia de volta.
Dito isso todos abriram um sorriso orgulhoso. Minha consciência começou a pesar e meu corpo a acelerar o processo. Eu precisava dar o fora dali antes que fizesse uma promessa que não pudesse cumprir.
- Tipo o que? Podemos ajudar no que precisar... – outra menina, alguns anos mais nova, se colocou na minha frente como uma fã elétrica.
- Ainda não tenho um plano, - peguei na alça da mala e a estiquei, pronta para voltar ao banheiro junto de . – mas não posso envolver todos vocês. Por favor me prometam que não vão fazer nada. Konner disse que todos os Jets estão poupados, mas se vocês não seguirem as regras da Lion serão demitidos. – essa última parte eu não tinha certeza, mas falei do mesmo jeito para me assegurar de que eles não fariam nada de estúpido nesses próximos dias.
- Mas e a sua equipe? Se você fizer algo não vão demiti-los? – um senhor mais velho, que provavelmente trabalhava nos balcões de check-in, perguntou.
- Não seja ridículo Earl, eles nunca perderiam a melhor equipe da Jets. – outro senhor respondeu bravo.
- E eles não chamam a equipe de de Alfa por nada! – a “fã” saltitou orgulhosa. – Tenho certeza que qualquer plano que vier dela vai ser genial!
Respirando fundo, sorri nervosa. Muita pressão para pouco espaço e tempo. Pedindo licença, corri até a porta e olhei para trás, assistindo cada um dos rostos sorrirem de volta para mim.
- Não se preocupem, esses uniformes feios não vão ficar com vocês por muito tempo. – apontei para as outras caixas que Konner e Greg deixaram para os funcionários.
Assim que terminei, passei o lenço ao redor do meu pescoço e dei um nó, deixando-o seguro em meu corpo. Aquele era o toque Jet que eu nunca perderia. Pisquei para a “fã”, que procurava por um lenço para fazer o mesmo e saí dali, sentindo o orgulho voltar a reinar em meu corpo. A guerra estava prestes a começar, e eu só precisava convencer a minha tripulação.
· ·
Apertei o cinto da última criança naquele voo e me sentei no banco apertado do avião, destinado a tripulação. Matthew, sentado a minha frente, rabiscava o jornal, provavelmente entretido com uma palavra cruzada e instruía os passageiros no autofalante enquanto esperávamos a turbulência passar. Estávamos trinta minutos adiantados para o pouso em Nova Delhi.
- Ei Matt. – cutuquei-o com a perna. – Como você acha que a tripulação de está reagindo a isso tudo? Quero dizer, nós acabamos de pegar o voo e a companhia inteira deles. Ela deve estar surtando!
Abaixando a caneta, ele olhou para mim com um sorriso sincero.
- Sei que você queria estar lá para provocar mais ainda, mas fala sério, quando essa briga de casal vai acabar?
Fechei os olhos por um segundo, imaginando os gritos histéricos que ela poderia estar fazendo, mas os abri de novo, lembrando que não era dessas.
- Acaba quando eu tiver vencido meu caro amigo. E para ser mais claro do que já sou, nós não somos um casal.
- Sei... – rindo da minha cara, Matthew levantou a caneta e voltou a rabiscar o jornal.
· ·
Segurando pelo braço, corri em direção a e Parker pronta para jogar o plano perfeito em cima deles. Sentados na área VIP do aeroporto, quase não os reconheci com os uniformes vermelhos da Lion. Quando eles olharam em nossa direção, vi que o mesmo podia ser dito sobre nós duas.
- Nem precisa começar Parker. – , emburrada por ter de usar a primeira saia que tinha provado, balançou as mãos no ar.
- Eu não ia dizer nada, só que esse modelito não combina com o formato de seu corpo.
- Menos Parker. – o reprendi antes de começar a falar. – Meninos, eu acho que sei como acabar com essa brincadeira toda. Mas nós vamos precisar quebrar algumas regras.
Recebendo um olhar duvidoso de , parei por um segundo pensando mesmo se deveria envolvê-los nisso, mas continuei assim que vi dois atendentes da Lion desfilando pela sala como se fossem os donos do mundo.
- Greg nos deu o voo 190 e 279, Michigan e Vancouver. Precisamos fazer com que os Leões percebam que essa coisa de “regras da Lion para Jets” não está funcionando. Precisamos que eles enlouqueçam e relatem para seus superiores que, se a equipe Alfa da Jets não consegue manter o padrão inglês, então nenhuma das outras irá. Só assim a Lion será obrigada a quebrar o acordo de compra da Jets e nós vamos voltar a ter tudo o que tínhamos.
Lambendo os lábios, percebi que estava receosa quanto o plano. Parker pelo contrário parecia animado e ... Bom, estava na dele, claramente indo contra as minhas ideias como sempre fazia.
- Prometo que nada vai acontecer conosco. Só precisamos de boas pegadinhas e persistência. Sei que vocês odeiam aquela equipe tanto quanto eu e querem tirá-los de nossas vidas, mas eu não vejo outro jeito de fazer isso sem vocês. Por favor.
- , você sabe que não somos mais crianças, que esse emprego não está seguro para sempre... – começou. –Se nós formos seguir em diante com isso, precisamos de um plano B.
- Pode deixar, - eu já tinha uma ideia do que faria caso tudo desse errado. Tinha traçado milhares de planos caso esse único desse errado e nenhum deles envolvia minha equipe sendo demitida por minha culpa. – não se preocupem. Eu nunca vou deixar vocês na mão.
E dito isso, me abraçou. Não um abraço calmo e reconfortante, mas um abraço de despedida, como se desse adeus para nossa antiga vida perfeita.
· ·
O jeito que ela nos protegia, mesmo sendo a mais nova da equipe, fazia cada vez mais meu coração despertar de seu sono profundo. não percebia o quanto se destacava por sua personalidade forte, mas eu sempre soube – desde o dia em que ela chegou – que seria uma líder.
Completando o abraço das duas, Parker saltitou e fechou os olhos, sonhador. Era engraçado como nosso grupo tão distinto conseguiu ser unido desse jeito. Escondida entre os braços de e Parker, olhava para mim, intrigada, tentando ler meus pensamentos. Sorri para ela e arrumei o cap em minha cabeça.
Ela tinha algo de especial que fazia algo em mim também se tornar especial. Eu não fazia ideia, mas foi naquele momento que eu senti que estava me apaixonando.
· ·
Saltando para fora do avião, esperei e Matthew saírem para que pudéssemos almoçar juntos. Estava um dia lindo lá fora e eu mal podia esperar para comer um carneiro ao molho curry. Era como se tudo estivesse dando certo. Minha equipe finalmente seria a número um entre todas companhias aéreas, eu finalmente seria superior à e poderia viajar em paz por vários anos, sempre com o gostinho de vitória na boca.
Saindo com uma mochila nas costas e chinelos nos pés, Matthew sorria de canto a canto enquanto era seguido por , que balançava a cabeça em negação, ainda usando seu uniforme de copiloto.
- Eu falei para ele não tirar o uniforme, mas o bastardo vem e me coloca os chinelos.
Balançando os dedos dos pés, Matt riu inocente.
- Estamos na Índia, . Relaxa e agradeça por eu não estar usando túnica e bindi.
- Bindis são só para mulheres Matt. – corrigi, enquanto caminhávamos até a saída.
- Que seja. Hoje eu só quero me divertir, conhecer a cultura desse país e esquecer do drama lá em casa. – Matt deu uma corridinha com seus chinelos e seguiu um pouco mais a frente, como se não quisesse ficar para o interrogatório.
- Problemas com a namorada? – perguntou ao meu lado, dando uma cutucada em meu ombro pedindo que eu prestasse atenção na conversa e não na vista.
- E com quem mais seria? – ainda de costas para nós, ele respondeu com desdém, contando nos dedos. – Ela quer que nós sejamos um casal velho, com uma casa hipotecada, quatrocentos gatos, cinco filhos e quatorze netos. Ela quer me prender em Sheffield! Quer que eu pare de viajar para que possamos montar uma família perfeita. Céus, nós nem somos casados ainda!
Rindo em silêncio, olhou para mim dizendo um “Viu” bem baixinho e eu apenas dei de ombros com um sorriso cúmplice.
- Por que você não a larga logo? – perguntei inocente.
Parando de andar, Matthew fez com que nós quase o derrubássemos para que ele pudesse se virar e olhar bem dentro de meus olhos para explicar o por quê.
- Eu a amo de qualquer jeito... Só preciso aprender a colocar as prioridades dela ao lado das minhas. Mas nunca, de maneira alguma, vou largá-la só porque não concordo com algumas coisas.
- Ok, ok, nós entendemos Romeu. – balançando a cabeça, seguiu reto, ficando na frente. – Não precisa esfregar na nossa cara que você encontrou o amor de uma década.
- Eu diria mais que Matt encontrou o amor de um milênio, mas acho que eles não viveriam até lá. – brinquei, bagunçando o cabelo de Matt – Mas brincadeiras a parte, você tem razão, Matt, hoje nós precisamos relaxar e comemorar a nossa vitória e nada mais!
- Tá certo chefe. – ele respondeu mais leve, com um sorriso no rosto.
Minha doce Nova York nunca parecera tão fria e distante como agora.
Vendo o avião azul patriota e amarelo canário viajar sem minha tripulação fez com que um gosto amargo subisse pela garganta. Sentado a nossa frente, Konner cruzava os dedos de tantas formas possíveis e com tanta força que parecia querer quebra-los de uma só vez.
- Meus caros, não sei muito bem como dizer isso à vocês... – ele não tirava os olhos das juntas em suas mãos, nem mesmo para falar conosco. – Mas tenho certeza que já ouviram os rumores...
Sentindo o peso dos olhares dos outros três naquela sala, me adiantei e olhei para o velho.
- Senhor, por favor, rumores não tem forças suficientes para atingir minha equipe. Principalmente se forem feitos pelos Leões.
O velho não conseguia nem mesmo olhar dentro de meus olhos. Parando de quebrar os ossos de suas mãos trêmulas, Konner finalmente levantou o rosto, mas para meu desgosto, não direcionado a mim. Seguindo o rosto surpreso de Parker e o tenso de , que claramente gritava “Eles estavam certos”, virei para a porta escancarada, encarando uma figura pomposa e vermelha que suava feito um porco enquanto segurava uma caixa velha lacrada.
- Greg! – Konner soltou aliviado. deu um olhar tão sentido para o velho, como se sua dignidade tivesse compelido a vergonha da de Konner, que ele nem conseguiu mais olhar para nosso chefe. – Será que você poderia dar uma ajudinha aqui?
Minha vontade de cuspir em Konner e nesse tal de Greg e sair andando daquela sala era tão grande que eu quase o fiz, mas a mão gelada de segurando a minha fez com que eu retomasse a realidade - eu não podia deixar a minha equipe na mão, não desse jeito.
Arrumando minha postura, segurei a barra de meu uniforme azul com força e encarei o indivíduo vestido com a cor oposta a minha. A caixa em seus braços claramente etiquetada com “Uniforme: Lion Airways” fez meu coração apertar em protesto. Deixando a caixa intrusa na mesa de Konner como se os dois fossem velhos amigos, Greg pegou um lenço do bolso e secou o suor de sua testa.
- Perdoem o meu estado, mas esta primavera não está a favor de ninguém. – guardou o lenço úmido de volta e continuou. - Bom, onde paramos? – perguntou, se encostando na beira da mesa, olhando diretamente para nós como se fossemos crianças.
- Do zero. - Parker, sarcástico, sorriu de volta para o gordinho e adicionou um “por favor”, para parecer menos mal educado.
Secando mais uma vez o rosto com a mão, Greg suspirou tão rápida e suavemente que quase não reparei. Se ele não fosse mais um dos ingleses da Lion, eu até diria que Greg era uma pessoa amigável, mas – reformulando o que ele mesmo disse – a verdade não estava a favor de ninguém e ser amiga de um dos funcionários da nossa maior concorrente não estava na lista de coisas a se fazer.
- Primeiramente quero me apresentar à vocês. Sou Greg Bayard. Lion Airways.
O homem nem precisou especificar o motivo de sua visita, nós todos já sabíamos o que estava acontecendo: nosso pior pesadelo – meu pior pesadelo – se tornando realidade. Com os dedos de se fechando em minhas costas, senti o mundo desabar. fez o mesmo com minha mão, mais para se livrar da decepção do que para me confortar, e olhou diretamente nos olhos de Parker. Medo e preocupação pintados sob os rostos perfeitos de cada um deles.
- Sim, os rumores se revelaram como verdades. Konner e eu discutimos muito com os outros empreendedores de ambas companhias e chegamos a conclusão de que nos unir seria melhor do que competir.
Se meu orgulho estava se despedaçando? Nem preciso dizer! A American Jets, a maior de toda a América, se não a maior de todas no mundo, estava escapando de nossas mãos e caindo diretamente nas garras de nosso maior inimigo. Os ingleses podiam mesmo comprar tudo o que queriam nesse ramo.
- A American Jets, como vocês bem sabem, opera por toda América. É o maior império aéreo americano desde Pan Am. – por algum motivo, ouvir isso saindo da boca de um Leão com seu sotaque pesado, fez com que o título fosse baixo e tivesse pouca importância ao invés de nos dar conforto. – Enquanto isso, nós da Lion Airways operamos em toda Europa e Ásia. Somos os dois grandes pilares aéreos do mundo, por isso todos sabem da nossa grande rixa. Mas se juntássemos nosso poderio, imaginem a grandiosidade da coisa. Frotas aéreas indo e voltando sem parar, funcionários cada vez mais bem pagos, clientes satisfeitos, passagens por um preço mais baixo. Conseguem ver como isso pode ser bom?
Não, não e não. Isso era tudo que minha mente conseguia pensar no momento. Jets e Leões não poderiam trabalhar juntos. Em qualquer aeroporto que você vá, todos sabem que só existem duas companhias ícones no mundo todo, inimigas de sangue para melhorar. Se juntássemos as duas, uma guerra sem fim definitivamente aconteceria.
- Senhor, com todo respeito. – me virei para olhar , enrubescido e com a voz claramente chateada. – não vejo como podemos aceitar as coisas desse jeito, principalmente agora que a briga entre as duas companhias está em seu ápice. Greg, se posso lhe chamar assim, suas equipes praticamente roubaram nossos voos para que o senhor tivesse essa conversa conosco. Os outros funcionários da Jets estão lá fora, esperando para ver o que sua companhia vai fazer para nos recompensar. Precisamos voar tanto quanto os Leões, mas se o senhor for dar nossas rotas aos seus funcionários, não vejo como podemos criar um laço com a sua companhia.
Mordendo a boca de leve, sorri para e me virei para o velho. Konner também sorria discretamente, como se pensasse do mesmo jeito que nós. Não voltei a respeitá-lo por isso, mas a decepção em relação a sua pessoa diminuiu alguns milímetros.
- Capitão , sei que o que os “Leões”, como nos chamam, pegaram suas tarefas de hoje, mas isso foi por uma causa maior. A meu pedido e não por vontade própria. Queiram me perdoar se isso os chateou, realmente não queria começar com o pé esquerdo...
- Senhor, - levantou o rosto – pode me esclarecer quem é que comprou quem? Sei que todos os fatores inclinam para o seu lado, mas eu só preciso de uma...confirmação.
Com um sorriso complacente, Greg olhou diretamente nos olhos azuis de e falou:
- Nós da Lion investimos muito na companhia de vocês, então digamos que quem está em comando da situação somos nós. É por isso que vim aqui com isso. – apontou para a caixa na mesa. – Precisamos que vocês troquem os uniformes e leiam o manual de regras da Lion Airways. O voo que vamos colocá-los será divulgado em alguns instantes, por isso, enquanto esperam, quero que vocês comuniquem aos outros funcionários das novas mudanças. Mais alguma pergunta?
- Por que não nos demitiram? Vocês possuem tantos funcionários que já são leais a empresa. Por que continuar conosco? – de braços cruzados, Parker encarou Greg.
Agora era Konner quem se levantava, se propondo a falar.
- Porque um dos acordos que fizemos com a Lion antes da compra era que todos os funcionários seriam poupados. E como a Lion cumpre promessas, esperamos que vocês façam o mesmo. Queremos que vocês aceitem as mudanças e comecem a trabalhar com seus novos companheiros.
- E que nome vamos receber? – soltei sem pensar. Isso definitivamente era o de menos para se preocupar, mas minha boca soltou o que meu coração não queria sequer imaginar.
- Leões, senhorita . Vocês serão a mais nova parte da nossa família.
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Puxei o terno vermelho mais uma vez, tentando arrancar cada pedaço daquela roupa fora do meu corpo. As mulheres passando por trás do meu reflexo não paravam de me olhar como se eu fosse um parasita usando uma roupa cor de sangue curta e apertada.
Pelo menos era assim que eu me sentia.
- , tem como você me passar outra saia? Parece que a antiga dona dessa aqui gostava de uma atenção na bunda...
Ainda encarando o reflexo que não me pertencia, me abaixei para a caixa de uniformes jogada a minha frente e passei uma saia para , que esticava o braço por cima da porta da cabine.
- Eu ainda não acredito que nós vamos ter que trabalhar com eles. Só porque somos a equipe número um da Jets não significa que precisamos trabalhar com a equipe número um deles. Ainda mais tendo como chefe.
Eu ainda nem tinha pensado nisso. Cansada de toda aquela reviravolta maldita, deixei resmungando sozinha e sai do banheiro com a respiração pesada. Se isso era um karma por todos os anos que provoquei os funcionários da Lion, então realmente o preço a se pagar era muito grande. E infelizmente eu sentia que isso era apenas o começo.
Andando pelos corredores do aeroporto, olhei para os passageiros sentados nas cadeiras, esperando seu embarque. As telas dos voos mostravam claramente a águia dourada, símbolo da American Jets, mas bem ao lado, em uma letra mínima, aparecia também o nome da Lion Airways e o leão vermelho cuspindo fogo. Apertei o passo, tentando esquecer o que tinha acabado de ver e fui até a sala dos funcionários da Jets.
Assim que coloquei os pés na sala, todos se viraram para mim, surpresos, até mesmo chateados por me verem fora do uniforme azul e presa no vermelho. Por ser a chefe da melhor tripulação da companhia, era-se esperado que eu retaliasse, que eu fizesse alguma coisa - qualquer coisa - menos aceitar aquilo com a cabeça baixa.
Engolindo em seco, entrei na sala e fui direto até minha mala.
- , - um dos comissários de bordo da equipe Ômega segurou meu ombro enquanto eu me abaixava para pegar o lenço amarelo canário que precisava. – como você está?
Pela primeira vez naquele dia eu admiti para mim mesma que estava péssima. Mas, para não os desapontar, apenas sorri e dei de ombros.
- Estou bem. Tentando pensar em algo genial para conseguir nossa companhia de volta.
Dito isso todos abriram um sorriso orgulhoso. Minha consciência começou a pesar e meu corpo a acelerar o processo. Eu precisava dar o fora dali antes que fizesse uma promessa que não pudesse cumprir.
- Tipo o que? Podemos ajudar no que precisar... – outra menina, alguns anos mais nova, se colocou na minha frente como uma fã elétrica.
- Ainda não tenho um plano, - peguei na alça da mala e a estiquei, pronta para voltar ao banheiro junto de . – mas não posso envolver todos vocês. Por favor me prometam que não vão fazer nada. Konner disse que todos os Jets estão poupados, mas se vocês não seguirem as regras da Lion serão demitidos. – essa última parte eu não tinha certeza, mas falei do mesmo jeito para me assegurar de que eles não fariam nada de estúpido nesses próximos dias.
- Mas e a sua equipe? Se você fizer algo não vão demiti-los? – um senhor mais velho, que provavelmente trabalhava nos balcões de check-in, perguntou.
- Não seja ridículo Earl, eles nunca perderiam a melhor equipe da Jets. – outro senhor respondeu bravo.
- E eles não chamam a equipe de de Alfa por nada! – a “fã” saltitou orgulhosa. – Tenho certeza que qualquer plano que vier dela vai ser genial!
Respirando fundo, sorri nervosa. Muita pressão para pouco espaço e tempo. Pedindo licença, corri até a porta e olhei para trás, assistindo cada um dos rostos sorrirem de volta para mim.
- Não se preocupem, esses uniformes feios não vão ficar com vocês por muito tempo. – apontei para as outras caixas que Konner e Greg deixaram para os funcionários.
Assim que terminei, passei o lenço ao redor do meu pescoço e dei um nó, deixando-o seguro em meu corpo. Aquele era o toque Jet que eu nunca perderia. Pisquei para a “fã”, que procurava por um lenço para fazer o mesmo e saí dali, sentindo o orgulho voltar a reinar em meu corpo. A guerra estava prestes a começar, e eu só precisava convencer a minha tripulação.
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Apertei o cinto da última criança naquele voo e me sentei no banco apertado do avião, destinado a tripulação. Matthew, sentado a minha frente, rabiscava o jornal, provavelmente entretido com uma palavra cruzada e instruía os passageiros no autofalante enquanto esperávamos a turbulência passar. Estávamos trinta minutos adiantados para o pouso em Nova Delhi.
- Ei Matt. – cutuquei-o com a perna. – Como você acha que a tripulação de está reagindo a isso tudo? Quero dizer, nós acabamos de pegar o voo e a companhia inteira deles. Ela deve estar surtando!
Abaixando a caneta, ele olhou para mim com um sorriso sincero.
- Sei que você queria estar lá para provocar mais ainda, mas fala sério, quando essa briga de casal vai acabar?
Fechei os olhos por um segundo, imaginando os gritos histéricos que ela poderia estar fazendo, mas os abri de novo, lembrando que não era dessas.
- Acaba quando eu tiver vencido meu caro amigo. E para ser mais claro do que já sou, nós não somos um casal.
- Sei... – rindo da minha cara, Matthew levantou a caneta e voltou a rabiscar o jornal.
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Segurando pelo braço, corri em direção a e Parker pronta para jogar o plano perfeito em cima deles. Sentados na área VIP do aeroporto, quase não os reconheci com os uniformes vermelhos da Lion. Quando eles olharam em nossa direção, vi que o mesmo podia ser dito sobre nós duas.
- Nem precisa começar Parker. – , emburrada por ter de usar a primeira saia que tinha provado, balançou as mãos no ar.
- Eu não ia dizer nada, só que esse modelito não combina com o formato de seu corpo.
- Menos Parker. – o reprendi antes de começar a falar. – Meninos, eu acho que sei como acabar com essa brincadeira toda. Mas nós vamos precisar quebrar algumas regras.
Recebendo um olhar duvidoso de , parei por um segundo pensando mesmo se deveria envolvê-los nisso, mas continuei assim que vi dois atendentes da Lion desfilando pela sala como se fossem os donos do mundo.
- Greg nos deu o voo 190 e 279, Michigan e Vancouver. Precisamos fazer com que os Leões percebam que essa coisa de “regras da Lion para Jets” não está funcionando. Precisamos que eles enlouqueçam e relatem para seus superiores que, se a equipe Alfa da Jets não consegue manter o padrão inglês, então nenhuma das outras irá. Só assim a Lion será obrigada a quebrar o acordo de compra da Jets e nós vamos voltar a ter tudo o que tínhamos.
Lambendo os lábios, percebi que estava receosa quanto o plano. Parker pelo contrário parecia animado e ... Bom, estava na dele, claramente indo contra as minhas ideias como sempre fazia.
- Prometo que nada vai acontecer conosco. Só precisamos de boas pegadinhas e persistência. Sei que vocês odeiam aquela equipe tanto quanto eu e querem tirá-los de nossas vidas, mas eu não vejo outro jeito de fazer isso sem vocês. Por favor.
- , você sabe que não somos mais crianças, que esse emprego não está seguro para sempre... – começou. –Se nós formos seguir em diante com isso, precisamos de um plano B.
- Pode deixar, - eu já tinha uma ideia do que faria caso tudo desse errado. Tinha traçado milhares de planos caso esse único desse errado e nenhum deles envolvia minha equipe sendo demitida por minha culpa. – não se preocupem. Eu nunca vou deixar vocês na mão.
E dito isso, me abraçou. Não um abraço calmo e reconfortante, mas um abraço de despedida, como se desse adeus para nossa antiga vida perfeita.
· ·
O jeito que ela nos protegia, mesmo sendo a mais nova da equipe, fazia cada vez mais meu coração despertar de seu sono profundo. não percebia o quanto se destacava por sua personalidade forte, mas eu sempre soube – desde o dia em que ela chegou – que seria uma líder.
Completando o abraço das duas, Parker saltitou e fechou os olhos, sonhador. Era engraçado como nosso grupo tão distinto conseguiu ser unido desse jeito. Escondida entre os braços de e Parker, olhava para mim, intrigada, tentando ler meus pensamentos. Sorri para ela e arrumei o cap em minha cabeça.
Ela tinha algo de especial que fazia algo em mim também se tornar especial. Eu não fazia ideia, mas foi naquele momento que eu senti que estava me apaixonando.
· ·
Saltando para fora do avião, esperei e Matthew saírem para que pudéssemos almoçar juntos. Estava um dia lindo lá fora e eu mal podia esperar para comer um carneiro ao molho curry. Era como se tudo estivesse dando certo. Minha equipe finalmente seria a número um entre todas companhias aéreas, eu finalmente seria superior à e poderia viajar em paz por vários anos, sempre com o gostinho de vitória na boca.
Saindo com uma mochila nas costas e chinelos nos pés, Matthew sorria de canto a canto enquanto era seguido por , que balançava a cabeça em negação, ainda usando seu uniforme de copiloto.
- Eu falei para ele não tirar o uniforme, mas o bastardo vem e me coloca os chinelos.
Balançando os dedos dos pés, Matt riu inocente.
- Estamos na Índia, . Relaxa e agradeça por eu não estar usando túnica e bindi.
- Bindis são só para mulheres Matt. – corrigi, enquanto caminhávamos até a saída.
- Que seja. Hoje eu só quero me divertir, conhecer a cultura desse país e esquecer do drama lá em casa. – Matt deu uma corridinha com seus chinelos e seguiu um pouco mais a frente, como se não quisesse ficar para o interrogatório.
- Problemas com a namorada? – perguntou ao meu lado, dando uma cutucada em meu ombro pedindo que eu prestasse atenção na conversa e não na vista.
- E com quem mais seria? – ainda de costas para nós, ele respondeu com desdém, contando nos dedos. – Ela quer que nós sejamos um casal velho, com uma casa hipotecada, quatrocentos gatos, cinco filhos e quatorze netos. Ela quer me prender em Sheffield! Quer que eu pare de viajar para que possamos montar uma família perfeita. Céus, nós nem somos casados ainda!
Rindo em silêncio, olhou para mim dizendo um “Viu” bem baixinho e eu apenas dei de ombros com um sorriso cúmplice.
- Por que você não a larga logo? – perguntei inocente.
Parando de andar, Matthew fez com que nós quase o derrubássemos para que ele pudesse se virar e olhar bem dentro de meus olhos para explicar o por quê.
- Eu a amo de qualquer jeito... Só preciso aprender a colocar as prioridades dela ao lado das minhas. Mas nunca, de maneira alguma, vou largá-la só porque não concordo com algumas coisas.
- Ok, ok, nós entendemos Romeu. – balançando a cabeça, seguiu reto, ficando na frente. – Não precisa esfregar na nossa cara que você encontrou o amor de uma década.
- Eu diria mais que Matt encontrou o amor de um milênio, mas acho que eles não viveriam até lá. – brinquei, bagunçando o cabelo de Matt – Mas brincadeiras a parte, você tem razão, Matt, hoje nós precisamos relaxar e comemorar a nossa vitória e nada mais!
- Tá certo chefe. – ele respondeu mais leve, com um sorriso no rosto.
Capítulo Dois – Ação e Reação
· ·
Quando o último passageiro desceu do voo 279, e Parker se sentaram na primeira fileira do avião e me olharam felizes e ao mesmo tempo cansados. Nós tínhamos quebrado todas as regras possíveis impostas pela Lion quando continuamos com o protocolo de voo da Jets e como era a sensação? Bom, digamos que ela não poderia ser melhor.
- Aí está a tripulação rebelde. – , saindo da cabine, guardou o cap de baixo do braço. – E então? Como fomos?
- Mais do que perfeito. – sorri e corri para abraçá-lo de lado. – Obrigada por ter concordado conosco.
- Não podia deixar a equipe fazer besteira sem mim. – sorriu simpático, sem tirar os braços de mim.
, mandando um olhar de aprovação, começou a falar.
- Gente, precisamos ir para a parte dois do plano, amanhã temos um voo para Itália e voar para a Europa é a especialidade deles. Tenho certeza que vão mandar alguém nos acompanhar...
Sentindo o calor dos dedos de em minha pele, me distrai por um momento, sentindo minha boca virar para cima em um sorriso singelo. Era antiético, eu sei, mas não tinha como evitar.
- Pessoal... – Parker esganiçou – Estamos ferrados. – apontou para a janela, aflito.
olhou para mim e logo me soltou para que eu pudesse correr para a janela atrás de Parker.
E lá estavam eles, prontos para estragar toda a nossa brincadeira.
· ·
Nos puxaram para fora do avião como se tivéssemos acabado com o mundo.
Levaram na frente e deixaram nós três sentados nas cadeiras da sala de espera.
Escolhemos fazer o errado e estávamos prestes a levar as consequências.
seria a principal culpada.
--- ✈ ---
Duas semanas depois
· ·
Fechei a porta do quarto e deslizei pelo corredor com a mala de rodinhas na mão e o cabelo molhado, o perfume do sabonete fazendo meu corpo se sentir mais relaxado ainda. Chamei o elevador e, esperando-o subir ao meu andar, encarei a paisagem lá fora.
As ruas de Londres pareciam calmas vistas de cima. As casas estavam todas apagadas e os postes de iluminação ainda estavam acesos dado ao horário.
Entrei no elevador e apertei o botão do segundo andar.
Os cadarços de meu sapato balançavam conforme o elevador descia. Meus olhos fixaram na ponta do pé esquerdo, onde havia uma marca afundada, fina e circular. tinha pisado naquela parte na primeira vez que nos vimos, há mais ou menos cinco anos. Não me lembro direito o que tinha acontecido, mas sei que quando nos encontramos no aeroporto do Brasil começamos logo com o pé esquerdo. Literalmente.
Quando as portas se abriram para o andar, entrou correndo no elevador e apertou freneticamente o botão do primeiro andar. Desarrumado como nunca, ele passou a mão na nuca e depois no cabelo bagunçado antes de começar a se explicar.
- Tive caso de uma noite com uma das funcionárias do hotel e bom, digamos que eu não deixaria gorjeta. E você? Como foi sua noite?
O elevador parou e abriu as portas para o corredor vazio. Sorri desajeitado e sai, indo em direção ao quarto de Matt, que sempre era o último a ficar pronto. , ao meu encalce, arrumava sua camisa e gravata.
- Definitivamente menos agitada que a sua. – Recebi um balanço de ombro do mais novo e continuei. – Justo hoje que nós vamos fazer um voo de doze horas você fez sexo, ? Descansou um pouco pelo menos?
Bati na porta e cruzei os braços, esperando. Ele passou a mão nos olhos e sorriu para mim confiante.
- Sabe que sim. – ele sorriu, empurrando a porta quando Matt a abriu. - Meu sonho é pilotar até o Japão, acha que eu vou dormir em algum momento?
- Depende. O sexo foi bom? – entrando na conversa, Matt perguntou enquanto voltava a guardar algumas amostras de sabonete do hotel na mala.
Me sentei na beira da cama e peguei o controle da TV. Matt gostava de assistir infomerciais no som alto. Estranho, eu sei. Mudei para um canal de notícias e vi que arrancou o controle para colocar em um canal de música.
- Não diria que foi bom, mas também não diria que foi ruim...
- Então essa vai ser sua performance de hoje. – o outro disse com a maior firmeza.
Nós dois nos viramos para ele, ajoelhado, agora guardando seu último par de sapato. e eu perguntamos ao mesmo tempo:
- Como você sabe?
Matt, fechando a mala e limpando as calças, sorriu inocente e deu de ombros, deligando a TV.
- Eu só sei. Agora, vamos porque temos um voo para pegar.
--- ✈ ---
Não era possível que um dia tão bonito tivesse se tornado mais bonito ainda!
Quando , Matt e eu chegamos na sala da Lion, encontramos as quatro figuras, emburradas e cansadas, que tanto “amávamos” sentadas no outro canto do recinto. Americanos e sua preguiça, ri mentalmente, analisando as olheiras deles.
- Hey ! – me cutucou, sem tirar os olhos da amiga de – O que você acha que eles aprontaram dessa vez?
Passei a língua por trás dos dentes e abri um sorriso satisfeito.
- Não sei exatamente o que eles fizeram, mas sei que as consequências vão ser muito interessantes...
me encarava com um olhar mortal. Eu tinha certeza que ela ouvia a nossa conversa e queria se intrometer, mas como Greg estava indo na direção deles, ela apenas ficou lá, me encarando.
Matt, chegando um pouco mais atrás de nós, sussurrou discretamente:
- Acabei de descobrir que eles foram suspensos por quebrarem as regras de conduta. Aposto cem pratas que Greg vai jogar esse peso para cima de nós.
- Não veja as coisas desse jeito, Matt. – abrindo um sorriso parecido com o meu, se virou para o outro. – Temos que ser positivos se queremos aproveitar essa situação.
- ?
Pisquei para enquanto a assistia entrar na sala de Greg e me virei para os dois.
- Aproveitar é pouco, . Vamos ensinar uma lição para esses americanos, isso sim.
· ·
Filho da mãe, canalha, inglesinho de quinta. Quem ele pensa que é pra ficar de brincadeira pra cima de mim?
- , vamos. – pausou a minha explosão mental e me puxou.
- Tô indo. – resmunguei revirando os olhos para .
Caminhei atrás dos três e entrei na sala de Greg calada. O velho tinha um semblante sereno, bem diferente dos nossos, o que me surpreendeu completamente, afinal, nós quebramos os ideais da empresa dele logo no primeiro dia. Não tinha como ele estar tão pleno assim, mas, pelo sorriso que ele carregava, nem parecia que isso sequer tinha acontecido!
- Bem vindos de volta, equipe Alfa! Espero que tenham passado as duas semanas bem! – sentando em sua cadeira, Greg cruzou os dedos e os repousou sobre seu colo. – Como vocês podem ver, nós trouxemos vocês para a sede da Lion justamente para tratarmos de um assunto de suma importância.
Agora, olhando diretamente para mim, ele completou.
- Sabemos que o ocorrido no voo 279 do dia dois de setembro foi uma maneira de retaliação da equipe em relação a união das empresas. Temos plena consciência que o acordo que fizemos com a American Jets firmava a contratação de todos seus funcionários e a sua continuidade por pelo menos um ano, mas como membro do conselho administrativo da Lion Airways, não podemos aceitar uma equipe imprudente e inconsequente que atua como tal.
Levando alguns segundos para voltar a falar, Greg mudou o olhar de mim para alguém atrás de nós, fora da sala.
- Então, como nós não queremos perder a fé em vocês, chegamos a conclusão que vamos recolocá-los em suas devidas posições. Vocês voltarão a trabalhar com as mesmas escalas de voos e mesmos horários...
- Mas? – Parker interrompeu, olhando para trás como se suspeitasse de algo. – Sei que vocês não nos trouxeram para Londres somente para dizer que vamos voltar com o cronograma comum... Qual vai ser o plot twist?
Greg sorriu culpado e encarou Parker.
- Você já deve ter uma suspeita, sr. Redwood... – disse enquanto acenava para as pessoas do outro lado do vidro, atrás de nós.
Minha mente me levou diretamente para o sorriso presunçoso de . Tinha certeza de que ele seria a tal surpresa. Levei o olhar para a porta de vidro que estava prestes a ser aberta por um ser saltitante que confirmava as minhas suspeitas.
- Greggy! Quanto tempo não nos vemos! – entrou explodindo de felicidade na sala. - Como vai a família? E a filha sortuda?
Respirei fundo para que não desse uma bofetada em seu rosto e olhei para com um sorriso sarcástico. Em resposta, ele apenas balançou os ombros e revirou os olhos para o trio inglês.
- Tudo vai bem, , obrigado por perguntar. – o gordinho riu, massageando as têmporas. – Enfim, o motivo dessa pequena reunião é o seguinte...
Por um segundo pensei que seria uma boa novidade. Pensei que iríamos ser “devolvidos” à antiga American Jets. Realmente pensei isso, mas me enganei completamente.
- Nós vamos ser os seus novos chefes! – e seus dois capangas gritaram ao mesmo tempo, jogando olhares maldosos e divertidos para cima de nós.
Engoli em seco quando piscou para mim. Greg estava indeciso entre colocar um sorriso no rosto ou nos dar um olhar complacente quando me virei de volta para ele.
- Isso é sério? – perguntei levemente irritada.
- Seríssimo. Conheçam seus supervisores.
- Ah, eles já nos conhecem. – riu , recebendo uma ombrada amigável de Matt.
- Posso saber o motivo? – , timidamente perguntou. – Sei que foi pelo que fizemos no outro dia, mas precisamos deles para ensinar um trabalho que conhecemos há tanto tempo? Mesmo?
Me recusando olhar aqueles ingleses, me virei para frente, diretamente para Greg. Infelizmente, atrás de sua cadeira, o vidro refletia aqueles três no canto da sala. sorria estupefato enquanto ouvia e me olhava também pelo reflexo. Quando nossos olhares se cruzaram, mantivemos o contato como se fosse uma competição - ele achando divertido e eu irritante.
- Creio que sim, senhorita . Mas, por mais que esse seja um dos fatores para a nossa decisão de uni-los, queremos mais é que haja uma harmonia entre os grupos. Queremos que os sete se entendam de uma vez por todas e que vocês quatro compreendam que daqui para frente não há mais volta.
Em um movimento sincronizado, , Parker, e eu assentimos. Sem mais delongas, Greg se levantou estupefato, abrindo a porta de sua sala.
- Então agora que estamos esclarecidos, vocês podem ir para a sala comum. Vamos anunciar o voo daqui a alguns minutos. Estejam prontos para decolar e, por favor, comportem-se.
- Sim, chefe! – os três soltaram ao mesmo tempo e foram para fora, sussurrando satisfeitos.
se levantou para fazer o mesmo, porém Greg o parou rapidamente. Sussurrando, tive um pouco de dificuldade de entender o que ele estava falando, mas não precisou de muito para eu compreender o que estava acontecendo ali. Me levantei e parti com os passos pesados. Eu podia não estar inteiramente ciente do que aquela conversa se tratava, mas eu liguei os pontos. Não sou tola.
· ·
- Capitão , confio em você para manter a equipe em ordem. Já que não o fez direito, quero passar o bastão para você.
Engoli em seco quando vi sair irritada de seu lugar e passar bruscamente por nós dois. Não queria que ela tivesse ouvido isso. Olhei para Greg, levemente chateado, mas apenas assenti.
- Tudo bem.
me olhava confusa e Parker encarava os pés. Parecia que nossa equipe estava prestes a desmoronar a qualquer momento. Peguei os dois integrantes que restaram pelo ombro e seguimos o mesmo caminho que havia feito há alguns segundos.
Eu precisava pensar.
Quando o último passageiro desceu do voo 279, e Parker se sentaram na primeira fileira do avião e me olharam felizes e ao mesmo tempo cansados. Nós tínhamos quebrado todas as regras possíveis impostas pela Lion quando continuamos com o protocolo de voo da Jets e como era a sensação? Bom, digamos que ela não poderia ser melhor.
- Aí está a tripulação rebelde. – , saindo da cabine, guardou o cap de baixo do braço. – E então? Como fomos?
- Mais do que perfeito. – sorri e corri para abraçá-lo de lado. – Obrigada por ter concordado conosco.
- Não podia deixar a equipe fazer besteira sem mim. – sorriu simpático, sem tirar os braços de mim.
, mandando um olhar de aprovação, começou a falar.
- Gente, precisamos ir para a parte dois do plano, amanhã temos um voo para Itália e voar para a Europa é a especialidade deles. Tenho certeza que vão mandar alguém nos acompanhar...
Sentindo o calor dos dedos de em minha pele, me distrai por um momento, sentindo minha boca virar para cima em um sorriso singelo. Era antiético, eu sei, mas não tinha como evitar.
- Pessoal... – Parker esganiçou – Estamos ferrados. – apontou para a janela, aflito.
olhou para mim e logo me soltou para que eu pudesse correr para a janela atrás de Parker.
E lá estavam eles, prontos para estragar toda a nossa brincadeira.
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Nos puxaram para fora do avião como se tivéssemos acabado com o mundo.
Levaram na frente e deixaram nós três sentados nas cadeiras da sala de espera.
Escolhemos fazer o errado e estávamos prestes a levar as consequências.
seria a principal culpada.
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Duas semanas depois
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Fechei a porta do quarto e deslizei pelo corredor com a mala de rodinhas na mão e o cabelo molhado, o perfume do sabonete fazendo meu corpo se sentir mais relaxado ainda. Chamei o elevador e, esperando-o subir ao meu andar, encarei a paisagem lá fora.
As ruas de Londres pareciam calmas vistas de cima. As casas estavam todas apagadas e os postes de iluminação ainda estavam acesos dado ao horário.
Entrei no elevador e apertei o botão do segundo andar.
Os cadarços de meu sapato balançavam conforme o elevador descia. Meus olhos fixaram na ponta do pé esquerdo, onde havia uma marca afundada, fina e circular. tinha pisado naquela parte na primeira vez que nos vimos, há mais ou menos cinco anos. Não me lembro direito o que tinha acontecido, mas sei que quando nos encontramos no aeroporto do Brasil começamos logo com o pé esquerdo. Literalmente.
Quando as portas se abriram para o andar, entrou correndo no elevador e apertou freneticamente o botão do primeiro andar. Desarrumado como nunca, ele passou a mão na nuca e depois no cabelo bagunçado antes de começar a se explicar.
- Tive caso de uma noite com uma das funcionárias do hotel e bom, digamos que eu não deixaria gorjeta. E você? Como foi sua noite?
O elevador parou e abriu as portas para o corredor vazio. Sorri desajeitado e sai, indo em direção ao quarto de Matt, que sempre era o último a ficar pronto. , ao meu encalce, arrumava sua camisa e gravata.
- Definitivamente menos agitada que a sua. – Recebi um balanço de ombro do mais novo e continuei. – Justo hoje que nós vamos fazer um voo de doze horas você fez sexo, ? Descansou um pouco pelo menos?
Bati na porta e cruzei os braços, esperando. Ele passou a mão nos olhos e sorriu para mim confiante.
- Sabe que sim. – ele sorriu, empurrando a porta quando Matt a abriu. - Meu sonho é pilotar até o Japão, acha que eu vou dormir em algum momento?
- Depende. O sexo foi bom? – entrando na conversa, Matt perguntou enquanto voltava a guardar algumas amostras de sabonete do hotel na mala.
Me sentei na beira da cama e peguei o controle da TV. Matt gostava de assistir infomerciais no som alto. Estranho, eu sei. Mudei para um canal de notícias e vi que arrancou o controle para colocar em um canal de música.
- Não diria que foi bom, mas também não diria que foi ruim...
- Então essa vai ser sua performance de hoje. – o outro disse com a maior firmeza.
Nós dois nos viramos para ele, ajoelhado, agora guardando seu último par de sapato. e eu perguntamos ao mesmo tempo:
- Como você sabe?
Matt, fechando a mala e limpando as calças, sorriu inocente e deu de ombros, deligando a TV.
- Eu só sei. Agora, vamos porque temos um voo para pegar.
--- ✈ ---
Não era possível que um dia tão bonito tivesse se tornado mais bonito ainda!
Quando , Matt e eu chegamos na sala da Lion, encontramos as quatro figuras, emburradas e cansadas, que tanto “amávamos” sentadas no outro canto do recinto. Americanos e sua preguiça, ri mentalmente, analisando as olheiras deles.
- Hey ! – me cutucou, sem tirar os olhos da amiga de – O que você acha que eles aprontaram dessa vez?
Passei a língua por trás dos dentes e abri um sorriso satisfeito.
- Não sei exatamente o que eles fizeram, mas sei que as consequências vão ser muito interessantes...
me encarava com um olhar mortal. Eu tinha certeza que ela ouvia a nossa conversa e queria se intrometer, mas como Greg estava indo na direção deles, ela apenas ficou lá, me encarando.
Matt, chegando um pouco mais atrás de nós, sussurrou discretamente:
- Acabei de descobrir que eles foram suspensos por quebrarem as regras de conduta. Aposto cem pratas que Greg vai jogar esse peso para cima de nós.
- Não veja as coisas desse jeito, Matt. – abrindo um sorriso parecido com o meu, se virou para o outro. – Temos que ser positivos se queremos aproveitar essa situação.
- ?
Pisquei para enquanto a assistia entrar na sala de Greg e me virei para os dois.
- Aproveitar é pouco, . Vamos ensinar uma lição para esses americanos, isso sim.
· ·
Filho da mãe, canalha, inglesinho de quinta. Quem ele pensa que é pra ficar de brincadeira pra cima de mim?
- , vamos. – pausou a minha explosão mental e me puxou.
- Tô indo. – resmunguei revirando os olhos para .
Caminhei atrás dos três e entrei na sala de Greg calada. O velho tinha um semblante sereno, bem diferente dos nossos, o que me surpreendeu completamente, afinal, nós quebramos os ideais da empresa dele logo no primeiro dia. Não tinha como ele estar tão pleno assim, mas, pelo sorriso que ele carregava, nem parecia que isso sequer tinha acontecido!
- Bem vindos de volta, equipe Alfa! Espero que tenham passado as duas semanas bem! – sentando em sua cadeira, Greg cruzou os dedos e os repousou sobre seu colo. – Como vocês podem ver, nós trouxemos vocês para a sede da Lion justamente para tratarmos de um assunto de suma importância.
Agora, olhando diretamente para mim, ele completou.
- Sabemos que o ocorrido no voo 279 do dia dois de setembro foi uma maneira de retaliação da equipe em relação a união das empresas. Temos plena consciência que o acordo que fizemos com a American Jets firmava a contratação de todos seus funcionários e a sua continuidade por pelo menos um ano, mas como membro do conselho administrativo da Lion Airways, não podemos aceitar uma equipe imprudente e inconsequente que atua como tal.
Levando alguns segundos para voltar a falar, Greg mudou o olhar de mim para alguém atrás de nós, fora da sala.
- Então, como nós não queremos perder a fé em vocês, chegamos a conclusão que vamos recolocá-los em suas devidas posições. Vocês voltarão a trabalhar com as mesmas escalas de voos e mesmos horários...
- Mas? – Parker interrompeu, olhando para trás como se suspeitasse de algo. – Sei que vocês não nos trouxeram para Londres somente para dizer que vamos voltar com o cronograma comum... Qual vai ser o plot twist?
Greg sorriu culpado e encarou Parker.
- Você já deve ter uma suspeita, sr. Redwood... – disse enquanto acenava para as pessoas do outro lado do vidro, atrás de nós.
Minha mente me levou diretamente para o sorriso presunçoso de . Tinha certeza de que ele seria a tal surpresa. Levei o olhar para a porta de vidro que estava prestes a ser aberta por um ser saltitante que confirmava as minhas suspeitas.
- Greggy! Quanto tempo não nos vemos! – entrou explodindo de felicidade na sala. - Como vai a família? E a filha sortuda?
Respirei fundo para que não desse uma bofetada em seu rosto e olhei para com um sorriso sarcástico. Em resposta, ele apenas balançou os ombros e revirou os olhos para o trio inglês.
- Tudo vai bem, , obrigado por perguntar. – o gordinho riu, massageando as têmporas. – Enfim, o motivo dessa pequena reunião é o seguinte...
Por um segundo pensei que seria uma boa novidade. Pensei que iríamos ser “devolvidos” à antiga American Jets. Realmente pensei isso, mas me enganei completamente.
- Nós vamos ser os seus novos chefes! – e seus dois capangas gritaram ao mesmo tempo, jogando olhares maldosos e divertidos para cima de nós.
Engoli em seco quando piscou para mim. Greg estava indeciso entre colocar um sorriso no rosto ou nos dar um olhar complacente quando me virei de volta para ele.
- Isso é sério? – perguntei levemente irritada.
- Seríssimo. Conheçam seus supervisores.
- Ah, eles já nos conhecem. – riu , recebendo uma ombrada amigável de Matt.
- Posso saber o motivo? – , timidamente perguntou. – Sei que foi pelo que fizemos no outro dia, mas precisamos deles para ensinar um trabalho que conhecemos há tanto tempo? Mesmo?
Me recusando olhar aqueles ingleses, me virei para frente, diretamente para Greg. Infelizmente, atrás de sua cadeira, o vidro refletia aqueles três no canto da sala. sorria estupefato enquanto ouvia e me olhava também pelo reflexo. Quando nossos olhares se cruzaram, mantivemos o contato como se fosse uma competição - ele achando divertido e eu irritante.
- Creio que sim, senhorita . Mas, por mais que esse seja um dos fatores para a nossa decisão de uni-los, queremos mais é que haja uma harmonia entre os grupos. Queremos que os sete se entendam de uma vez por todas e que vocês quatro compreendam que daqui para frente não há mais volta.
Em um movimento sincronizado, , Parker, e eu assentimos. Sem mais delongas, Greg se levantou estupefato, abrindo a porta de sua sala.
- Então agora que estamos esclarecidos, vocês podem ir para a sala comum. Vamos anunciar o voo daqui a alguns minutos. Estejam prontos para decolar e, por favor, comportem-se.
- Sim, chefe! – os três soltaram ao mesmo tempo e foram para fora, sussurrando satisfeitos.
se levantou para fazer o mesmo, porém Greg o parou rapidamente. Sussurrando, tive um pouco de dificuldade de entender o que ele estava falando, mas não precisou de muito para eu compreender o que estava acontecendo ali. Me levantei e parti com os passos pesados. Eu podia não estar inteiramente ciente do que aquela conversa se tratava, mas eu liguei os pontos. Não sou tola.
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- Capitão , confio em você para manter a equipe em ordem. Já que não o fez direito, quero passar o bastão para você.
Engoli em seco quando vi sair irritada de seu lugar e passar bruscamente por nós dois. Não queria que ela tivesse ouvido isso. Olhei para Greg, levemente chateado, mas apenas assenti.
- Tudo bem.
me olhava confusa e Parker encarava os pés. Parecia que nossa equipe estava prestes a desmoronar a qualquer momento. Peguei os dois integrantes que restaram pelo ombro e seguimos o mesmo caminho que havia feito há alguns segundos.
Eu precisava pensar.
Capítulo Três – Ponte Aérea
· ·
“Senhores passageiros, dentro de alguns instantes iremos iniciar o procedimento de decolagem. Por favor, afivelem os cintos e tenham uma boa viagem!”
desligou o autofalante e e Matt retornaram para seus assentos.
Dei uma última olhada nos passageiros do corredor esquerdo e Parker auxiliou os do direito, tudo isso enquanto nos supervisionava, passo a passo. À mim principalmente. Quando tudo estava do jeito que a Lion pedia, caminhei para o meu acento no início do avião. Afivelei meu cinto e virei o rosto para fora, diretamente para a janela, sem vontade alguma de olhar para o gigante parado ao meu lado.
- Nada mal até agora.
Ainda olhando para a pista cinza, ignorei o comentário sarcástico de e comecei a contar os segundos para que o avião começasse a se mexer.
- Vamos ver nas próximas horas... Greg nos deu o 339 só para que eu pudesse ver se vocês aguentam o trampo.
- Claro que nós aguentamos. – resmunguei ainda sem olhar para ele – Somos a melhor equipe, temos mais experiência que vocês. Não é como se nós nunca tivéssemos viajado longas distâncias.
- Esse é um voo de doze horas, . – ele falou de um jeito tão preocupado que me fez virar, só para ver a sua cara passar de surpresa para convencida. – Vocês não aguentam olhar para nós nem por dois minutos, imagine por doze horas!
E dito isso, sorriu presunçosamente e se sentou na minha frente. Dentre os cinco lugares destinados à tripulação, ele escolheu justo aquele. Esse idiota só podia estar de brincadeira! Colocando os fones de ouvido para impedir que eu pudesse revidar o seu ataque, sorriu bobamente e começou a balançar a cabeça com o ritmo da música. Ele realmente era um idiota. Bufando, me virei novamente para a janela e fechei os olhos.
Tudo o que eu queria naquele momento era que decolasse logo.
--- ✈ ---
Tempo para aterrisagem: 10 horas
Fechei o livro marcando a última página que li e olhei para frente, onde descansava de olhos fechados.
- . – chutei sua perna. – Acorda.
passou as mão pelo rosto como se fosse uma criancinha acordando e olhou para o relógio em seu pulso.
- Estou vendo que sua pontualidade está em dia. – falou com a voz ainda grogue - Parece até uma inglesa.
Forçando uma risada, tirei o cinto e caminhei em direção aos carrinhos de comida.
- Nem daqui mil anos.
Fingindo estar afetado, se levantou e ficou ao meu lado.
- Eu sei que no fundo você gosta. – em um movimento rápido, ele apoiou o braço direito na bancada e aproveitou para colocar o outro na barra do carrinho, me prendendo entre seu corpo e o móvel.
- Sai . – cutuquei sua barriga com o cotovelo. – Não me toca.
Soprando levemente em meu pescoço, ele se afastou com os braços para cima em rendição e começou a pegar as bandejas.
- Não tá mais aqui quem falou.
Balançando a cabeça, peguei os talheres e comecei a separá-los em cada bandeja. era uma grande babaca.
Chegando logo depois, Matt, levemente atordoado, pegou o carrinho de comida e começou a servir sem a ajuda de Parker, que sorria de maneira maliciosa quando se aproximou de mim. Segurando seu braço rapidamente, sussurrei um “não começa” para ele e soltei-o com um olhar repreensivo.
- Calma, ele é interessante, mas não pra tudo isso. – gesticulou freneticamente para seu próprio corpo e seguiu seu rumo, dando olhares furtivos para Matt enquanto ele começava a servir as bandejas.
- Parker...
Quando percebi, já estava no outro corredor, levando o carrinho sozinho. Respirei fundo e caminhei até ele. Esse cara insistia em ser difícil de se trabalhar junto.
· ·
- Valeu por me esperar. – ouvi sussurrar irritada, enquanto começava a tirar o lacre das bebidas.
- O prazer foi meu. – respondi, sem conseguir segurar o sorriso.
Eu amo provocar as pessoas, mas com é mais do que isso. Primeiro porque ela me odeia, segundo porque ela reage de uma maneira tão engraçada que é difícil evitar e terceiro porque eu simplesmente amo provocar as pessoas.
- Boa tarde! O que você gostaria de beber? – perguntou para o passageiro, tentando manter o seu controle.
Eu sei que deveria ser um chefe complacente, educado e compreensivo, mas eu tinha essa necessidade louca de provocar cada um deles, começando com e terminando com .
Digamos que ela era o meu alvo favorito.
- Um suco de laranja. – um homem que não tirava os olhos do celular estendeu a mão para .
Pegando o copo e a bebida, ela mordeu a boca tentando não derramar uma gota. Uma ideia imediatamente surgiu em minha cabeça. Era um tanto maldosa, mas as consequências seriam extremamente interessantes. Passando as mãos na barra do carrinho, o empurrei levemente para frente fazendo com que ele tocasse no corpo de com força. Sentindo seu equilíbrio ser abalado, ela se segurou numa das poltronas e acabou derramando o líquido no chão e nos pés do passageiro, que se levantou rapidamente.
Olhando para mim completamente enfurecida, ela colocou o copo de volta no carrinho e respirou fundo.
- Peço mil desculpas senhor. – soltou educadamente. – Por favor deixe que eu limpe tudo...
- Deixe. – Irritado, ele apenas ficou de pé e esperou que saísse para que ele pudesse ir ao banheiro. – Se eu soubesse que a “grande” Lion Airways seria assim, nunca pagaria a fortuna dessa maldita passagem para receber um atendimento de quinta categoria!
Engolindo em seco, vi que ela abaixou os olhos e esperou que o homem sumisse para que pudesse voltar a atender os outros passageiros. nunca abaixava o olhar... Não. Agora que já ferrei com ela não podia me arrepender.
Puxando o carrinho, olhei para uma das adolescentes sentadas na poltrona da janela e perguntei o que queria. ainda estava parada quando comecei a servir o refrigerante.
--- ✈ ---
Tempo para a aterrisagem: 9 horas e 40 minutos
Dei duas batidas na porta da cabine antes de entrar e vi que lia um de seus livros de auto-ajuda. Equilibrando a bandeja em uma mão e usando a outra para dar um tapa na cabeça do meu amigo, encarei-o enquanto ele fechava o livro e guardava no bolso da poltrona.
- Às vezes eu acho que o que falta em você é gentileza, .
- Aqui a minha gentileza, capitão . – estendi o almoço para e fechei a porta. – Falando em capitão, onde está ?
- Ajudando ... Achei que saberia já que foi você quem fez a coitada se descabelar toda.
Sentando na cadeira de , encarei o painel colorido piscando para que pudesse evitar o olhar acusatório de .
- Não foi tão dramático assim, viu. E o passageiro nem lembra mais do nome dela para reclamar com a empresa.
- Não lembra mais porque quem foi falar com ele foi o capitão. – se curvando para perto do painel, ele checou a altitude por alguns segundos e voltou a se recostar na cadeira. – Pelo menos alguém foi se desculpar nesse avião.
- Ei, que inquisição é essa? Achei que você ficaria contente com a minha pegadinha, . Você é o meu parceiro de crime, não o policial bonzinho!
Parando para pensar, ele olhou para mim e estendeu a mão. Seu sorriso maroto de volta em cena.
- Deixa pra lá cara. Só não esquece de me chamar para o próximo crime, ficar preso aqui é um saco às vezes.
Fechando a mão na dele, fiz nosso cumprimento secreto e sorri, grato pela compreensão.
- Pode deixar que para o grand finale vou precisar do mestre das pegadinhas!
- É o que?
Olhando para trás rapidamente, senti a surpresa contornar o meu rosto. Era uma droga ser pego no flagra.
· ·
Encarei os dois esperando por uma explicação e fechei a porta atrás de mim. Largando a bandeja de na pequena bancada ao lado, cruzei os braços e ergui a sobrancelha tentando ao máximo forçar a minha cara de brava. Eu sei, não sou muito convincente, mas ficar brava não é uma coisa comum para mim.
- Então, vão me contar o que está acontecendo ou vou ter que adivinhar?
não parava de me encarar com os olhinhos brilhantes. Seu rosto rosado indicava que seria mais fácil tirar a informação dele do que de , o mestre da maldade, como o chamava.
- , desembucha.
- Eu e o estávamos... Conversando sobre assuntos delicados.
- É... Bem delicados. – completou, olhando de soslaio para .
- Que seria?
- Errr... Você...? – passando a mão pela nuca, o mais novo olhou para mim e sorriu como se estivesse se desculpando.
- Isso foi uma pergunta? – segurei a risada. É, ser brava não era comigo.
- Não, claro que não. – falou e encarou o amigo do mesmo jeito que eu fazia. – Eu vim aqui para pedir a ajuda de para...
- Chamar a para sair! – falou enquanto tampava a boca do outro. – Isso!
Fuzilando o amigo com o olhar, tirou a mão de sua boca e sorriu vingativo.
- Não precisa mentir, . , a verdade é que o meu amigo aqui queria chamar você para tomar uma bebida assim que nós chegarmos no Japão.
Passando a língua pelos lábios, deixei o sorriso se abrir no rosto e apenas dei de ombros.
- Tudo bem.
Arregalando os olhos, olhou para , sorrindo orgulhoso de si mesmo e deu dois tapinhas nas costas do outro.
- Bem, meu trabalho por aqui acabou. – se levantando, ele piscou para que me olhava com um sorriso de canto, e saiu.
Devolvendo o sorriso, peguei a bandeja de e deixei em cima de sua cadeira.
- Avisa o que a sopa está bem quente.
assentiu ainda sem falar uma palavra e eu deixei a sala, sentindo o coração disparar. que me perdoasse depois, mas aquele Leão era uma gracinha.
· ·
estava demorando muito e eu já estava começando a ficar sem unha para roer. Joguei os braços para baixo tentando me distrair com outra coisa e quando o sinal de afivelar os cintos foi acionado eu olhei para o corredor onde o passageiro estava.
A sombra do corpo de se aproximava conforme o avião tremia de leve e eu balancei a mão para que ele viesse logo.
- Ele vai me processar? Acabar com a minha vida profissional?
- Calma, está tudo certo. Eu conversei com ele e você está perdoada. Sem processo nem demissão.
Soltando a respiração, abracei com força e escondi meu rosto em seu peito.
- Obrigada, obrigada, obrigada.
- Você fica me devendo essa, baixinha. – ele sorriu e completou. – Isso e uma garrafa de vinho. Você acredita que o bastardo pediu a minha garrafa especial em troca da sua remissão?
- Acredito. Esses ingleses são todos uns babacas.
- Vou ignorar isso e isto. – surgindo por trás, Matt apontou para nós dois e pegou um travesseiro extra do armário.
- Desculpa Matthew, mas é verdade. – soltou o meu corpo e colocou a mão no ombro do outro. – Vocês conseguem ser um pé no saco de vez em quando.
- Ah, mas vocês também não são anjos. – Ele revidou – Vocês americanos são muito inconsequentes, agem como se fossem as pessoas mais importantes do mundo.
- Sabe o que deveríamos fazer então? Acabar com nossos defeitos. Se vamos trabalhar juntos por Deus sabe quanto tempo, por que não facilitar essa experiência, não é? O que você acha ?
Olhei para os dois parados a minha frente e depois para a sombra distante de na frente do avião. Se eu fosse entrar nessa proposta ele também teria.
- Concordo, mas você vai ter que falar pro seu chefe ali fazer o mesmo, se não, nada feito.
Matt apenas soltou um “Tudo bem” e saiu, voltando para o corredor para entregar o travesseiro à um dos passageiros.
- Não sei se isso vai dar certo, ... – sussurrei, olhando Matt, , Parker e trabalhando em pontos diferentes do avião.
- E quem disse que era para dar certo? – levantando as sobrancelhas como se aprontasse alguma coisa, ele piscou para mim e se afastou, seguindo o mesmo caminho de Matt. – Aproveite essa chance de vulnerabilidade do inimigo !
Dando as costas para mim, caminhou de volta para a cabine de comando e me deixou ali, com pensamentos a mil.
--- ✈ ---
Tempo para aterrisagem: 6 horas
· ·
- Então vai ser isso. Todos entenderam? – sussurrei para os dois esticando o pescoço para ver se estava tudo correndo sob os conformes.
- Sim senhora! – Parker sorriu malicioso, provavelmente ansioso para sua parte. – Só para confirmar, se ele der uma brecha é só atacar?
- Isso, só não faça ele ficar permanentemente perturbado. Vai pode ir. , alguma dúvida?
Amarrando o seu cabelo no topo da cabeça, ela olhou para mim meio culpada e balançou a cabeça.
- Nenhuma.
- Ótimo... Tá tudo bem com você? – arrumei um fio que estava mais alto em seu rabo de cavalo e esperei pela sua resposta.
Ela ponderou por alguns segundos e abriu a boca, respondendo na velocidade da luz.
- me chamou para sair.
Arregalei os olhos surpresa e sorri para ela.
- Isso é bom... Você quer seguir com o plano mesmo assim?
- Se for fazer você feliz, acho que não tem problema.
- Tudo bem, - peguei o remédio tranquilizante e o cortei na metade. – coloca isso na bebida dele e depois peça a ajuda de Parker para colocá-lo na cadeira 14B. Leve os crayons e as canetinhas para as crianças que depois elas fazem o resto do trabalho.
assentiu e pegou uma das garrafas de água.
- Que o universo me ajude. – ela respirou fundo e entrou na cabine de comando.
Sentindo uma euforia no corpo, sorri ao ver que meu plano estava dando certo. Parker, do outro lado do avião, encurralava Matt para uma conversa a sós, e atendia uma das últimas passageiras acordadas, como o esperado.
Pegando o pote de balas, caminhei até a fileira onde só haviam crianças ainda energizadas e me abaixei ao lado delas.
- Oi! Como vocês estão?
Uma das menininhas sentada na ponta, sorriu e fez um positivo com a mão. O menino sentado na janela fez uma careta e o outro mais novo sentado ao meio apenas olhou surpreso.
- Espero que isso seja um “muito bem obrigado” – falei comigo mesma – olha, eu trouxe uns doces para vocês, mas antes será que eu podia pedir um favor?
As três assentiram ao mesmo tempo sem tirar os olhos das balas coloridas em minhas mãos. Procurando por , sorri ao ver que ele já estava na parte de trás do avião, e então comecei a contar os meus planos para as crianças.
· ·
Quando vi que começava a cair no sono, me levantei da cadeira, deixando o avião no piloto automático, e abri a porta para que Parker e viessem buscá-lo.
- Linda, você não faz ideia de como Matt ficou assustado! Foi divino, a reação mais glamorosa que eu já vi na minha vida! Me chama de 007 que eu realizo qualquer missão impossível depois de hoje!
- Ah Parker, você misturou todos os filmes! – revirando os olhos, entrou rindo – , tudo certo?
Cutuquei com o cotovelo e assenti, me sentindo um tanto culpado.
- Já peguei o celular, só falta saber a senha...
- 0408. – Parker falou como se fosse a coisa mais normal do mundo - É o aniversário dele. – ele completou como se fosse ajudar.
Olhei para , que ria de Parker, e digitei a senha procurando por alguma coisa que servisse para ajudar em seu plano.
- Pega ele logo, Parker. – sem paciência, saiu na frente e foi pegar as canetinhas.
- Essas mulheres não sabem me tratar direito. É por isso que eu sou gay.
Agora sim eu ri como se não houvesse amanhã. Se sentindo levemente ofendido, Parker pegou o corpo mole de e o levou para fora, quase batendo a cabeça do garoto na parede da cabine.
Fechando a porta, me sentei na cadeira mais uma vez e comecei a revirar o celular. A pasta de fotos seria o primeiro lugar em que eu iria procurar.
· ·
Encostada no armário da parte de trás do avião, observei a zona de guerra com um sorriso no rosto. e Parker logo chegavam para ver o procedimento do plano comigo. De acordo com o relógio, a bagunça estava prestes a começar.
Chegando ao meu lado, os dois se encostaram exaustos, mas sorriram ansiosos.
- Isso vai ser muito bom... – Parker passou as mãos uma contra a outra e olhou para frente.
- Eles vão ficar tão perdidos... – completou, jogando o peso de um pé para o outro.
- Eles vão nos matar! – falei sem desmanchar o sorriso. – E quando eles explodirem vai ser a melhor parte.
Dito isso, as televisões se abaixaram e começaram a carregar o vídeo. Era isso, a brincadeira estava começando e tinha conseguido plantar a primeira bomba.
Ao mesmo tempo que o vídeo começava a tocar, as crianças recheadas de açúcar começaram a apertar o botão de comissário de bordo freneticamente, fazendo com que , que descansava na parte da frente do avião, se levantasse desesperado para ver o que estava acontecendo. Correndo para a fileira das crianças, ele parou para ver o que elas precisavam e se assustou quando viu como elas estavam elétricas.
Escutando a voz de sair do vídeo, observei se contorcer levemente para ver o que passava na TV, enquanto ao mesmo tempo tentava segurar as três crianças, que se debatiam de baixo de seus braços.
- Vem Matt! Rápido pega o meu celular!
- Não vai ser uma boa ideia , ele está em um momento delicado e...
- Cala a boca cara, você está falando que nem sua namorada.
- Tá já parei. Cadê ele? Acende a luz !
- Ai meu Deus. , você tá chorando? E dentro de uma banheira? Cara isso é deprimente até para mim...
- você não está ajudando. Ele está em choque. Ou não... , quer parar de se balançar que nem uma criancinha?
- , vamos lá, não foi tão ruim...
- ... ela acabou de me chamar de aeromoça. No feminino! Eu nunca mais vou conseguir sair daqui, muito menos olhar para uma garota como aquela...
- Fica tranquilo que coisas muito piores ainda estão por vir…
Quando o Matt do vídeo disse isso, as telas se recolheram e os passageiros olhavam para enquanto seguravam a risada. As crianças pararam de se debater e começaram a rir da cara dele. Mesmo longe eu podia ver que seu rosto estava quente que nem um pimentão e, para melhorar a situação, tinha acordado e se levantado para ver o que estava acontecendo.
Rabiscado da cabeça aos pés, ele balançou a cabeça confuso e chegou ao lado de . A risada agora rolava solta entre os passageiros, o que fez sair da cabine para olhar a nossa obra de arte. Mandei um positivo para ele, feliz por sua ajuda e olhei de volta para os dois palhaços no meio do corredor.
Os dois conversavam um com o outro. ficava cada vez mais nervoso e passava a mão no rosto para ver se a tinta saía. Tentando ignorar os olhares dos passageiros, eles encararam diretamente para nós com os rostos pintados de raiva e começaram a vir em nossa direção.
- Se preparem para o estouro final. – falei para e Parker, sem tirar os olhos de .
- Que porcaria vocês acham que estão fazendo? – pisando forte, chegou soltando fogo. – Para que fazer tudo isso? Tinha necessidade?
- E aquele papo de “vamos trabalhar nossos defeitos”, onde fica? – , acompanhando o amigo, falou sem tirar os olhos de . – Achei que nós estávamos indo bem...
- E o Matthew? O que vocês fizeram com ele? – eu podia ver a raiva saindo dos olhos de , por isso continuei calada, queria provocá-lo mais um pouquinho como ele fazia comigo. – Ei! Eu estou falando com você. Não vai me responder, não?
Molhei os lábios e dei de ombros. A resposta já estava na ponta da língua.
- Aqui se faz, aqui se paga.
estreitou os olhos e se segurou para não bater na parede. Os passageiros que se sentavam mais perto da parte final do avião assistiam a cena curiosos. Ergui a sobrancelha provocando-o mais ainda e o puxou para o corredor, levando-o para a parte oposta do avião.
- Jets, dez. Lions, zero. – Parker mandou um high five para mim e para . – Isso foi demais! Aliás, o Matthew se trancou no banheiro, acho que ele não quer me ver tão cedo assim. – falou mais alto para que os dois ouvissem.
Olhando para trás, mandou um “Vai se ferrar” e seguiu reto, parando na frente do banheiro trancado para falar com Matthew.
Parker realmente estava certo. Se isso fosse um jogo, os Jets definitivamente estariam ganhando.
--- ✈ ---
Tempo para aterrisagem: 4 horas
· ·
Se eu ainda estava puto? Sim.
Se eu iria fazer alguma coisa em relação a isso? Não sei.
Sentado com Matt e , tentei organizar os meus pensamentos e deixar os sentimentos de lado. Se eu deixasse ser levado pela irracionalidade, começaria a escrever o e-mail para Greg e os outros chefes da Lion, mas se eu fosse racional, pediria desculpas para por começar essa briga idiota e tudo voltaria à paz.
- O que vocês acham?
- Que seria idiotice da sua parte perdoar esses cretinos. – Matt, sentado com uma coberta em suas costas, me olhava indignado. – Aquele tal de Parker disse umas coisas que nunca tinha visto nem nos sites mais restritos da internet...
- ?
Encarando a janela, ele demorou a responder. Sabia que ele estava tão indeciso quanto eu, por isso queria saber sua opinião.
- Acho que você deveria pedir desculpas por ter sido babaca com mais cedo. Mas eu também acho que eles nós devem o mesmo.
Procurei pelos três na parte de trás do avião e vi que e conversavam calmamente enquanto Parker ajudava uma idosa a se sentar. Eles não eram completamente ruins, eram só um reflexo de nossas ações. De minhas ações.
Respirei fundo e peguei o microfone.
Era isso, ia me desculpar da maneira mais ridícula possível.
· ·
“Senhoras e senhores, desculpe-nos pelos inconvenientes que vieram ocorrendo durante o voo. Gostaria de esclarecer que qualquer desconforto causado ou reclamação sobre o atendimento desse dia deve ser diretamente ligado a mim, , chefe da tripulação deste voo.”
Franzindo o cenho, olhei para , tão confusa quanto eu, e procurei por na parte da frente do avião. Ficando no meio do corredor, encarei o garoto que falava no microfone. Ele estava exatamente na minha frente, por isso olhava em meus olhos, mesmo à distância.
- Gostaria também de fazer um pedido de desculpas, honesto e inteiramente verdadeiro à , minha futura co-chefe. , me desculpe por ser um babaca desde o dia em que nos conhecemos. Me desculpe por ter feito você derrubar suco no passageiro do 20D, me desculpe por isso senhor. - Mandou um joinha para o homem de braços cruzados - E me desculpe por ter detonado uma possível amizade entre nós. Sei que começamos com o pé esquerdo. Admito que sempre pensei que nós seríamos bons amigos, mas por culpa dessa rixa ridícula que nossas companhias tinham, ou tem, eu perdi a chance de uma nova amizade.
Respirando fundo, colocou a mão no bolso e sorriu tímido.
- Por favor, será que nós podemos começar de novo? E dessa vez é de verdade, sem brincadeiras nem discussões.
Sentindo os olhares se virarem para mim, apenas assenti. Não podia continuar com aquela briguinha infantil. Apesar dos meus motivos ainda serem válidos, acho que já estava na hora de fazermos as pazes.
Ouvindo uma salva de palmas, sorri sem graça e vi que ele caminhava em minha direção.
- O que ele vai fazer? – perguntei olhando para .
- Começar uma nova amizade...? – ela sorriu em dúvida. – Acho que eu deveria fazer o mesmo com .
Quando chegou perto o suficiente, estendeu a mão e sorriu para mim.
- Oi, eu sou o , mas pode me chamar de .
Ainda em dúvida, estendi a mão e selei o cumprimento.
- .
- Prazer em conhecê-la, .
- Você é ridículo, .
- .
- .
--- ✈ ---
Tempo para aterrisagem: 2 horas
· ·
Assistindo o nascer do sol sob as nuvens cor de rosa, soltei um suspiro contente e deitei a cabeça no encosto da poltrona. e dormiam, um encostado no outro, e Matt e Parker conversavam sobre algum gosto que tinham em comum. Mas, se eu fosse escolher a vista mais perfeita daquele avião, seria definitivamente a porta da cabine de comando aberta, colorida pelos raios do sol e com a sombra das costas de pilotando o avião.
Tudo estava correndo bem. Até estava calmo. Olhando para a janela com o rosto em plena alegria, ele voltou a falar comigo em um sussurro:
- Nunca estive nessa parte do mundo. – encarei seus olhos, surpresa, e vi que eles brilhavam que nem as estrelas. – Espero que a gente consiga ver o Monte Fuji daqui.
Trocando um olhar amigável com , sorri honestamente para ele, e percebi que aquela era a primeira vez que fazia isso. Ele provavelmente também percebeu isso, já que não parava de me olhar bobo. Começando a ficar constrangida, me curvei para a frente e toquei no cantinho da janela. Queria que ele voltasse a olhar a paisagem e não a mim.
- Daqui uns minutos, vai aparecer bem aqui.
não se moveu, nem disse nada, só ficou olhando para mim. Em seu rosto, havia um misto de surpresa e fascinação. Ergui as sobrancelhas como se estivesse esperando uma explicação e ele apenas falou:
- Você sabe que essa é a primeira vez que sorri desse jeito para mim, não sabe?
Sentindo meu coração bater mais forte, dei de ombros e voltei a me sentar direito.
- Não foi proposital, se é isso que você está pensando.
- É claro que foi! – ele se virou para mim, animado. – Pode admitir, o que foi que fez você sorrir para mim? Foi o meu rostinho lindo, não foi?
Respirando fundo, voltei a olhar a sombra de .
- Não. Sabe o que foi que me fez sorrir? – se ajeitou na cadeira e se aproximou de mim - Foi ver você se debruçar feito uma criancinha na janela. – ele estreitou os olhos e abriu a boca.
Antes que pudesse me interromper, falei apontando de volta para a janela.
- Olha lá o Monte Fuji!
- Onde? – ele se virou rapidamente, batendo o cotovelo. – Mentira! Eu perdi?
- Perdeu, assim como essa conversa! – ri, maldosa e me levantei para começar a arrumar as coisas.
- Ei, ei, ei! – se levantou só para me colocar de volta na poltrona. – Não vou deixar as coisas assim não. Vem cá que eu preciso te contar uma coisa.
Olhei-o desconfiada, mas me sentei do mesmo jeito. Fiz um sinal para que Parker e Matt começassem a arrumar as coisas para mim e ergui as sobrancelhas para .
- Fala.
Fingindo estar aquecendo a voz, ele se sentou mais perto ainda e olhou bem dentro dos meus olhos. Tive uma sensação estranha no corpo. Era como se ele estivesse perto o suficiente para ver tudo o que eu sentia. Queria desviar o olhar, assistir outra cena, mas algo nele me fazia suster a conexão.
- Eu percebi que toda vez que você fica nervosa, bom, que eu te faço ficar nervosa, você procura pela ajuda de . Não sei se você já sabe, mas eu gosto muito de você.
Arregalei os olhos surpresa com sua confissão, mas ele logo adiantou, tentando se explicar melhor.
- Não desse jeito! Mas sim eu gosto muito de você, como amiga ou inimiga, sei que você é uma boa pessoa.
- Qual é a questão aqui?
- A questão é o seguinte: você procura estar com a cada segundo e ele também tenta fazer o mesmo. Ele gosta de você, no sentido contrário do meu. E eu sei que você também sente isso, só que como você acha que é só amizade o sentimento aí dentro fica misturado e confunde todos os seus pensamentos.
- Uau . Você repara tanto assim em mim?
- Calma, não vai pensando a coisa errada. Eu só fazia isso porque queria saber melhor quem era você. Digamos que era mais uma pesquisa de campo...
- Pesquisa do que? – ri desentendida.
- Da concorrência, ué.
- Tá vendo, isso sim é característico seu. Não essa coisa toda de conselheiro amoroso.
- Você está dizendo que eu não tenho um lado romântico? Nossa, estou levemente ofendido.
- Não fui eu quem disse! – coloquei as mãos para o alto.
Ele me encarou provocativo e abaixou o olhar para a mão direita. Meu coração parou assim que vi sua aliança.
- Você está noivo? – peguei a sua mão rapidamente e analisei o anel dourado. – É de verdade?
Rindo de mim, sorriu e assentiu.
- Vamos casar em Janeiro.
- Você só pode estar brincando! Eu nunca percebi essa aliança! E aquela história do vídeo que você foi rejeitado por uma mulher e nunca mais falaria com outra? – comecei a falar rápido. – E, Deus, todo esse tempo eu achei que você só fazia essas provocações porque queria...
- Ficar com você? O mundo não gira somente em torno de você!
- Ai meu Deus... – soltei sua mão e respirei fundo. – Como eu fui tonta!
Se levantando, ele sorriu para mim e deu uma típica piscada de olho.
- Eu tiro a aliança porque não quero perdê-la durante o trabalho. E aquela história de nunca mais conversar com uma mulher ficou no passado. Foi a minha noiva quem me chamou de aeromoça. – sorriu bobo, provavelmente pensando nela. – E agora que você descobriu tudo isso, acho que vai ser mais fácil conversar com . Pode ir lá que eu cubro a sua parte.
Sentindo o frio no estômago voltar, mordi a boca e olhei preocupada para .
- Tem certeza?
- Tenho. – Estendendo a mão, me ajudou a levantar – Se você não se arriscar, nunca vai saber.
Olhei mais uma vez para a sombra de . Não sabia como tinha feito isso, mas aquela sensação de transição entre amizade e amor estava começando a fazer sentido para mim. Sentindo a confiança crescer dentro de mim, sorri para ele e respirei fundo.
- Obrigada... .
Devolvendo um sorriso orgulhoso, piscou para mim e se virou, indo ajudar Matt e Parker. Com o caminho livre, observei com outros olhos. Ele tão sereno, em sua cadeira, olhando o horizonte com mil sonhos. Com ele eu não precisava ter medo. Não precisava duvidar. Com um sorriso, fui em direção à cabine do capitão, ainda iluminada pelo céu colorido, e deslizei a mão pelo encosto da cadeira de . Ele olhou para mim como se tivesse visto o mundo em uma noite e eu sabia que com ele seria feliz, como sempre fui durante anos.
Naquele pequeno silêncio, a única coisa que eu conseguia pensar era que , justo o garoto que eu mais odiava, tinha me mostrado um novo mundo. Um mundo onde dizer um “me desculpe” é mais fácil do que bolar um plano de vingança, onde um inimigo pode ser na verdade um amigo e onde o amor pode ser mais fácil do que parece ser. Era incrível como, somente com uma única conversa com aquele garoto, eu tinha entendido que o sentido da minha vida estava a apenas uma cabine de distância. Pronto para voar ao redor do mundo comigo.
Mas o pior de tudo era que estava certo. Não, .
“Senhores passageiros, dentro de alguns instantes iremos iniciar o procedimento de decolagem. Por favor, afivelem os cintos e tenham uma boa viagem!”
desligou o autofalante e e Matt retornaram para seus assentos.
Dei uma última olhada nos passageiros do corredor esquerdo e Parker auxiliou os do direito, tudo isso enquanto nos supervisionava, passo a passo. À mim principalmente. Quando tudo estava do jeito que a Lion pedia, caminhei para o meu acento no início do avião. Afivelei meu cinto e virei o rosto para fora, diretamente para a janela, sem vontade alguma de olhar para o gigante parado ao meu lado.
- Nada mal até agora.
Ainda olhando para a pista cinza, ignorei o comentário sarcástico de e comecei a contar os segundos para que o avião começasse a se mexer.
- Vamos ver nas próximas horas... Greg nos deu o 339 só para que eu pudesse ver se vocês aguentam o trampo.
- Claro que nós aguentamos. – resmunguei ainda sem olhar para ele – Somos a melhor equipe, temos mais experiência que vocês. Não é como se nós nunca tivéssemos viajado longas distâncias.
- Esse é um voo de doze horas, . – ele falou de um jeito tão preocupado que me fez virar, só para ver a sua cara passar de surpresa para convencida. – Vocês não aguentam olhar para nós nem por dois minutos, imagine por doze horas!
E dito isso, sorriu presunçosamente e se sentou na minha frente. Dentre os cinco lugares destinados à tripulação, ele escolheu justo aquele. Esse idiota só podia estar de brincadeira! Colocando os fones de ouvido para impedir que eu pudesse revidar o seu ataque, sorriu bobamente e começou a balançar a cabeça com o ritmo da música. Ele realmente era um idiota. Bufando, me virei novamente para a janela e fechei os olhos.
Tudo o que eu queria naquele momento era que decolasse logo.
--- ✈ ---
Tempo para aterrisagem: 10 horas
Fechei o livro marcando a última página que li e olhei para frente, onde descansava de olhos fechados.
- . – chutei sua perna. – Acorda.
passou as mão pelo rosto como se fosse uma criancinha acordando e olhou para o relógio em seu pulso.
- Estou vendo que sua pontualidade está em dia. – falou com a voz ainda grogue - Parece até uma inglesa.
Forçando uma risada, tirei o cinto e caminhei em direção aos carrinhos de comida.
- Nem daqui mil anos.
Fingindo estar afetado, se levantou e ficou ao meu lado.
- Eu sei que no fundo você gosta. – em um movimento rápido, ele apoiou o braço direito na bancada e aproveitou para colocar o outro na barra do carrinho, me prendendo entre seu corpo e o móvel.
- Sai . – cutuquei sua barriga com o cotovelo. – Não me toca.
Soprando levemente em meu pescoço, ele se afastou com os braços para cima em rendição e começou a pegar as bandejas.
- Não tá mais aqui quem falou.
Balançando a cabeça, peguei os talheres e comecei a separá-los em cada bandeja. era uma grande babaca.
Chegando logo depois, Matt, levemente atordoado, pegou o carrinho de comida e começou a servir sem a ajuda de Parker, que sorria de maneira maliciosa quando se aproximou de mim. Segurando seu braço rapidamente, sussurrei um “não começa” para ele e soltei-o com um olhar repreensivo.
- Calma, ele é interessante, mas não pra tudo isso. – gesticulou freneticamente para seu próprio corpo e seguiu seu rumo, dando olhares furtivos para Matt enquanto ele começava a servir as bandejas.
- Parker...
Quando percebi, já estava no outro corredor, levando o carrinho sozinho. Respirei fundo e caminhei até ele. Esse cara insistia em ser difícil de se trabalhar junto.
· ·
- Valeu por me esperar. – ouvi sussurrar irritada, enquanto começava a tirar o lacre das bebidas.
- O prazer foi meu. – respondi, sem conseguir segurar o sorriso.
Eu amo provocar as pessoas, mas com é mais do que isso. Primeiro porque ela me odeia, segundo porque ela reage de uma maneira tão engraçada que é difícil evitar e terceiro porque eu simplesmente amo provocar as pessoas.
- Boa tarde! O que você gostaria de beber? – perguntou para o passageiro, tentando manter o seu controle.
Eu sei que deveria ser um chefe complacente, educado e compreensivo, mas eu tinha essa necessidade louca de provocar cada um deles, começando com e terminando com .
Digamos que ela era o meu alvo favorito.
- Um suco de laranja. – um homem que não tirava os olhos do celular estendeu a mão para .
Pegando o copo e a bebida, ela mordeu a boca tentando não derramar uma gota. Uma ideia imediatamente surgiu em minha cabeça. Era um tanto maldosa, mas as consequências seriam extremamente interessantes. Passando as mãos na barra do carrinho, o empurrei levemente para frente fazendo com que ele tocasse no corpo de com força. Sentindo seu equilíbrio ser abalado, ela se segurou numa das poltronas e acabou derramando o líquido no chão e nos pés do passageiro, que se levantou rapidamente.
Olhando para mim completamente enfurecida, ela colocou o copo de volta no carrinho e respirou fundo.
- Peço mil desculpas senhor. – soltou educadamente. – Por favor deixe que eu limpe tudo...
- Deixe. – Irritado, ele apenas ficou de pé e esperou que saísse para que ele pudesse ir ao banheiro. – Se eu soubesse que a “grande” Lion Airways seria assim, nunca pagaria a fortuna dessa maldita passagem para receber um atendimento de quinta categoria!
Engolindo em seco, vi que ela abaixou os olhos e esperou que o homem sumisse para que pudesse voltar a atender os outros passageiros. nunca abaixava o olhar... Não. Agora que já ferrei com ela não podia me arrepender.
Puxando o carrinho, olhei para uma das adolescentes sentadas na poltrona da janela e perguntei o que queria. ainda estava parada quando comecei a servir o refrigerante.
--- ✈ ---
Tempo para a aterrisagem: 9 horas e 40 minutos
Dei duas batidas na porta da cabine antes de entrar e vi que lia um de seus livros de auto-ajuda. Equilibrando a bandeja em uma mão e usando a outra para dar um tapa na cabeça do meu amigo, encarei-o enquanto ele fechava o livro e guardava no bolso da poltrona.
- Às vezes eu acho que o que falta em você é gentileza, .
- Aqui a minha gentileza, capitão . – estendi o almoço para e fechei a porta. – Falando em capitão, onde está ?
- Ajudando ... Achei que saberia já que foi você quem fez a coitada se descabelar toda.
Sentando na cadeira de , encarei o painel colorido piscando para que pudesse evitar o olhar acusatório de .
- Não foi tão dramático assim, viu. E o passageiro nem lembra mais do nome dela para reclamar com a empresa.
- Não lembra mais porque quem foi falar com ele foi o capitão. – se curvando para perto do painel, ele checou a altitude por alguns segundos e voltou a se recostar na cadeira. – Pelo menos alguém foi se desculpar nesse avião.
- Ei, que inquisição é essa? Achei que você ficaria contente com a minha pegadinha, . Você é o meu parceiro de crime, não o policial bonzinho!
Parando para pensar, ele olhou para mim e estendeu a mão. Seu sorriso maroto de volta em cena.
- Deixa pra lá cara. Só não esquece de me chamar para o próximo crime, ficar preso aqui é um saco às vezes.
Fechando a mão na dele, fiz nosso cumprimento secreto e sorri, grato pela compreensão.
- Pode deixar que para o grand finale vou precisar do mestre das pegadinhas!
- É o que?
Olhando para trás rapidamente, senti a surpresa contornar o meu rosto. Era uma droga ser pego no flagra.
· ·
Encarei os dois esperando por uma explicação e fechei a porta atrás de mim. Largando a bandeja de na pequena bancada ao lado, cruzei os braços e ergui a sobrancelha tentando ao máximo forçar a minha cara de brava. Eu sei, não sou muito convincente, mas ficar brava não é uma coisa comum para mim.
- Então, vão me contar o que está acontecendo ou vou ter que adivinhar?
não parava de me encarar com os olhinhos brilhantes. Seu rosto rosado indicava que seria mais fácil tirar a informação dele do que de , o mestre da maldade, como o chamava.
- , desembucha.
- Eu e o estávamos... Conversando sobre assuntos delicados.
- É... Bem delicados. – completou, olhando de soslaio para .
- Que seria?
- Errr... Você...? – passando a mão pela nuca, o mais novo olhou para mim e sorriu como se estivesse se desculpando.
- Isso foi uma pergunta? – segurei a risada. É, ser brava não era comigo.
- Não, claro que não. – falou e encarou o amigo do mesmo jeito que eu fazia. – Eu vim aqui para pedir a ajuda de para...
- Chamar a para sair! – falou enquanto tampava a boca do outro. – Isso!
Fuzilando o amigo com o olhar, tirou a mão de sua boca e sorriu vingativo.
- Não precisa mentir, . , a verdade é que o meu amigo aqui queria chamar você para tomar uma bebida assim que nós chegarmos no Japão.
Passando a língua pelos lábios, deixei o sorriso se abrir no rosto e apenas dei de ombros.
- Tudo bem.
Arregalando os olhos, olhou para , sorrindo orgulhoso de si mesmo e deu dois tapinhas nas costas do outro.
- Bem, meu trabalho por aqui acabou. – se levantando, ele piscou para que me olhava com um sorriso de canto, e saiu.
Devolvendo o sorriso, peguei a bandeja de e deixei em cima de sua cadeira.
- Avisa o que a sopa está bem quente.
assentiu ainda sem falar uma palavra e eu deixei a sala, sentindo o coração disparar. que me perdoasse depois, mas aquele Leão era uma gracinha.
· ·
estava demorando muito e eu já estava começando a ficar sem unha para roer. Joguei os braços para baixo tentando me distrair com outra coisa e quando o sinal de afivelar os cintos foi acionado eu olhei para o corredor onde o passageiro estava.
A sombra do corpo de se aproximava conforme o avião tremia de leve e eu balancei a mão para que ele viesse logo.
- Ele vai me processar? Acabar com a minha vida profissional?
- Calma, está tudo certo. Eu conversei com ele e você está perdoada. Sem processo nem demissão.
Soltando a respiração, abracei com força e escondi meu rosto em seu peito.
- Obrigada, obrigada, obrigada.
- Você fica me devendo essa, baixinha. – ele sorriu e completou. – Isso e uma garrafa de vinho. Você acredita que o bastardo pediu a minha garrafa especial em troca da sua remissão?
- Acredito. Esses ingleses são todos uns babacas.
- Vou ignorar isso e isto. – surgindo por trás, Matt apontou para nós dois e pegou um travesseiro extra do armário.
- Desculpa Matthew, mas é verdade. – soltou o meu corpo e colocou a mão no ombro do outro. – Vocês conseguem ser um pé no saco de vez em quando.
- Ah, mas vocês também não são anjos. – Ele revidou – Vocês americanos são muito inconsequentes, agem como se fossem as pessoas mais importantes do mundo.
- Sabe o que deveríamos fazer então? Acabar com nossos defeitos. Se vamos trabalhar juntos por Deus sabe quanto tempo, por que não facilitar essa experiência, não é? O que você acha ?
Olhei para os dois parados a minha frente e depois para a sombra distante de na frente do avião. Se eu fosse entrar nessa proposta ele também teria.
- Concordo, mas você vai ter que falar pro seu chefe ali fazer o mesmo, se não, nada feito.
Matt apenas soltou um “Tudo bem” e saiu, voltando para o corredor para entregar o travesseiro à um dos passageiros.
- Não sei se isso vai dar certo, ... – sussurrei, olhando Matt, , Parker e trabalhando em pontos diferentes do avião.
- E quem disse que era para dar certo? – levantando as sobrancelhas como se aprontasse alguma coisa, ele piscou para mim e se afastou, seguindo o mesmo caminho de Matt. – Aproveite essa chance de vulnerabilidade do inimigo !
Dando as costas para mim, caminhou de volta para a cabine de comando e me deixou ali, com pensamentos a mil.
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Tempo para aterrisagem: 6 horas
· ·
- Então vai ser isso. Todos entenderam? – sussurrei para os dois esticando o pescoço para ver se estava tudo correndo sob os conformes.
- Sim senhora! – Parker sorriu malicioso, provavelmente ansioso para sua parte. – Só para confirmar, se ele der uma brecha é só atacar?
- Isso, só não faça ele ficar permanentemente perturbado. Vai pode ir. , alguma dúvida?
Amarrando o seu cabelo no topo da cabeça, ela olhou para mim meio culpada e balançou a cabeça.
- Nenhuma.
- Ótimo... Tá tudo bem com você? – arrumei um fio que estava mais alto em seu rabo de cavalo e esperei pela sua resposta.
Ela ponderou por alguns segundos e abriu a boca, respondendo na velocidade da luz.
- me chamou para sair.
Arregalei os olhos surpresa e sorri para ela.
- Isso é bom... Você quer seguir com o plano mesmo assim?
- Se for fazer você feliz, acho que não tem problema.
- Tudo bem, - peguei o remédio tranquilizante e o cortei na metade. – coloca isso na bebida dele e depois peça a ajuda de Parker para colocá-lo na cadeira 14B. Leve os crayons e as canetinhas para as crianças que depois elas fazem o resto do trabalho.
assentiu e pegou uma das garrafas de água.
- Que o universo me ajude. – ela respirou fundo e entrou na cabine de comando.
Sentindo uma euforia no corpo, sorri ao ver que meu plano estava dando certo. Parker, do outro lado do avião, encurralava Matt para uma conversa a sós, e atendia uma das últimas passageiras acordadas, como o esperado.
Pegando o pote de balas, caminhei até a fileira onde só haviam crianças ainda energizadas e me abaixei ao lado delas.
- Oi! Como vocês estão?
Uma das menininhas sentada na ponta, sorriu e fez um positivo com a mão. O menino sentado na janela fez uma careta e o outro mais novo sentado ao meio apenas olhou surpreso.
- Espero que isso seja um “muito bem obrigado” – falei comigo mesma – olha, eu trouxe uns doces para vocês, mas antes será que eu podia pedir um favor?
As três assentiram ao mesmo tempo sem tirar os olhos das balas coloridas em minhas mãos. Procurando por , sorri ao ver que ele já estava na parte de trás do avião, e então comecei a contar os meus planos para as crianças.
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Quando vi que começava a cair no sono, me levantei da cadeira, deixando o avião no piloto automático, e abri a porta para que Parker e viessem buscá-lo.
- Linda, você não faz ideia de como Matt ficou assustado! Foi divino, a reação mais glamorosa que eu já vi na minha vida! Me chama de 007 que eu realizo qualquer missão impossível depois de hoje!
- Ah Parker, você misturou todos os filmes! – revirando os olhos, entrou rindo – , tudo certo?
Cutuquei com o cotovelo e assenti, me sentindo um tanto culpado.
- Já peguei o celular, só falta saber a senha...
- 0408. – Parker falou como se fosse a coisa mais normal do mundo - É o aniversário dele. – ele completou como se fosse ajudar.
Olhei para , que ria de Parker, e digitei a senha procurando por alguma coisa que servisse para ajudar em seu plano.
- Pega ele logo, Parker. – sem paciência, saiu na frente e foi pegar as canetinhas.
- Essas mulheres não sabem me tratar direito. É por isso que eu sou gay.
Agora sim eu ri como se não houvesse amanhã. Se sentindo levemente ofendido, Parker pegou o corpo mole de e o levou para fora, quase batendo a cabeça do garoto na parede da cabine.
Fechando a porta, me sentei na cadeira mais uma vez e comecei a revirar o celular. A pasta de fotos seria o primeiro lugar em que eu iria procurar.
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Encostada no armário da parte de trás do avião, observei a zona de guerra com um sorriso no rosto. e Parker logo chegavam para ver o procedimento do plano comigo. De acordo com o relógio, a bagunça estava prestes a começar.
Chegando ao meu lado, os dois se encostaram exaustos, mas sorriram ansiosos.
- Isso vai ser muito bom... – Parker passou as mãos uma contra a outra e olhou para frente.
- Eles vão ficar tão perdidos... – completou, jogando o peso de um pé para o outro.
- Eles vão nos matar! – falei sem desmanchar o sorriso. – E quando eles explodirem vai ser a melhor parte.
Dito isso, as televisões se abaixaram e começaram a carregar o vídeo. Era isso, a brincadeira estava começando e tinha conseguido plantar a primeira bomba.
Ao mesmo tempo que o vídeo começava a tocar, as crianças recheadas de açúcar começaram a apertar o botão de comissário de bordo freneticamente, fazendo com que , que descansava na parte da frente do avião, se levantasse desesperado para ver o que estava acontecendo. Correndo para a fileira das crianças, ele parou para ver o que elas precisavam e se assustou quando viu como elas estavam elétricas.
Escutando a voz de sair do vídeo, observei se contorcer levemente para ver o que passava na TV, enquanto ao mesmo tempo tentava segurar as três crianças, que se debatiam de baixo de seus braços.
- Vem Matt! Rápido pega o meu celular!
- Não vai ser uma boa ideia , ele está em um momento delicado e...
- Cala a boca cara, você está falando que nem sua namorada.
- Tá já parei. Cadê ele? Acende a luz !
- Ai meu Deus. , você tá chorando? E dentro de uma banheira? Cara isso é deprimente até para mim...
- você não está ajudando. Ele está em choque. Ou não... , quer parar de se balançar que nem uma criancinha?
- , vamos lá, não foi tão ruim...
- ... ela acabou de me chamar de aeromoça. No feminino! Eu nunca mais vou conseguir sair daqui, muito menos olhar para uma garota como aquela...
- Fica tranquilo que coisas muito piores ainda estão por vir…
Quando o Matt do vídeo disse isso, as telas se recolheram e os passageiros olhavam para enquanto seguravam a risada. As crianças pararam de se debater e começaram a rir da cara dele. Mesmo longe eu podia ver que seu rosto estava quente que nem um pimentão e, para melhorar a situação, tinha acordado e se levantado para ver o que estava acontecendo.
Rabiscado da cabeça aos pés, ele balançou a cabeça confuso e chegou ao lado de . A risada agora rolava solta entre os passageiros, o que fez sair da cabine para olhar a nossa obra de arte. Mandei um positivo para ele, feliz por sua ajuda e olhei de volta para os dois palhaços no meio do corredor.
Os dois conversavam um com o outro. ficava cada vez mais nervoso e passava a mão no rosto para ver se a tinta saía. Tentando ignorar os olhares dos passageiros, eles encararam diretamente para nós com os rostos pintados de raiva e começaram a vir em nossa direção.
- Se preparem para o estouro final. – falei para e Parker, sem tirar os olhos de .
- Que porcaria vocês acham que estão fazendo? – pisando forte, chegou soltando fogo. – Para que fazer tudo isso? Tinha necessidade?
- E aquele papo de “vamos trabalhar nossos defeitos”, onde fica? – , acompanhando o amigo, falou sem tirar os olhos de . – Achei que nós estávamos indo bem...
- E o Matthew? O que vocês fizeram com ele? – eu podia ver a raiva saindo dos olhos de , por isso continuei calada, queria provocá-lo mais um pouquinho como ele fazia comigo. – Ei! Eu estou falando com você. Não vai me responder, não?
Molhei os lábios e dei de ombros. A resposta já estava na ponta da língua.
- Aqui se faz, aqui se paga.
estreitou os olhos e se segurou para não bater na parede. Os passageiros que se sentavam mais perto da parte final do avião assistiam a cena curiosos. Ergui a sobrancelha provocando-o mais ainda e o puxou para o corredor, levando-o para a parte oposta do avião.
- Jets, dez. Lions, zero. – Parker mandou um high five para mim e para . – Isso foi demais! Aliás, o Matthew se trancou no banheiro, acho que ele não quer me ver tão cedo assim. – falou mais alto para que os dois ouvissem.
Olhando para trás, mandou um “Vai se ferrar” e seguiu reto, parando na frente do banheiro trancado para falar com Matthew.
Parker realmente estava certo. Se isso fosse um jogo, os Jets definitivamente estariam ganhando.
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Tempo para aterrisagem: 4 horas
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Se eu ainda estava puto? Sim.
Se eu iria fazer alguma coisa em relação a isso? Não sei.
Sentado com Matt e , tentei organizar os meus pensamentos e deixar os sentimentos de lado. Se eu deixasse ser levado pela irracionalidade, começaria a escrever o e-mail para Greg e os outros chefes da Lion, mas se eu fosse racional, pediria desculpas para por começar essa briga idiota e tudo voltaria à paz.
- O que vocês acham?
- Que seria idiotice da sua parte perdoar esses cretinos. – Matt, sentado com uma coberta em suas costas, me olhava indignado. – Aquele tal de Parker disse umas coisas que nunca tinha visto nem nos sites mais restritos da internet...
- ?
Encarando a janela, ele demorou a responder. Sabia que ele estava tão indeciso quanto eu, por isso queria saber sua opinião.
- Acho que você deveria pedir desculpas por ter sido babaca com mais cedo. Mas eu também acho que eles nós devem o mesmo.
Procurei pelos três na parte de trás do avião e vi que e conversavam calmamente enquanto Parker ajudava uma idosa a se sentar. Eles não eram completamente ruins, eram só um reflexo de nossas ações. De minhas ações.
Respirei fundo e peguei o microfone.
Era isso, ia me desculpar da maneira mais ridícula possível.
· ·
“Senhoras e senhores, desculpe-nos pelos inconvenientes que vieram ocorrendo durante o voo. Gostaria de esclarecer que qualquer desconforto causado ou reclamação sobre o atendimento desse dia deve ser diretamente ligado a mim, , chefe da tripulação deste voo.”
Franzindo o cenho, olhei para , tão confusa quanto eu, e procurei por na parte da frente do avião. Ficando no meio do corredor, encarei o garoto que falava no microfone. Ele estava exatamente na minha frente, por isso olhava em meus olhos, mesmo à distância.
- Gostaria também de fazer um pedido de desculpas, honesto e inteiramente verdadeiro à , minha futura co-chefe. , me desculpe por ser um babaca desde o dia em que nos conhecemos. Me desculpe por ter feito você derrubar suco no passageiro do 20D, me desculpe por isso senhor. - Mandou um joinha para o homem de braços cruzados - E me desculpe por ter detonado uma possível amizade entre nós. Sei que começamos com o pé esquerdo. Admito que sempre pensei que nós seríamos bons amigos, mas por culpa dessa rixa ridícula que nossas companhias tinham, ou tem, eu perdi a chance de uma nova amizade.
Respirando fundo, colocou a mão no bolso e sorriu tímido.
- Por favor, será que nós podemos começar de novo? E dessa vez é de verdade, sem brincadeiras nem discussões.
Sentindo os olhares se virarem para mim, apenas assenti. Não podia continuar com aquela briguinha infantil. Apesar dos meus motivos ainda serem válidos, acho que já estava na hora de fazermos as pazes.
Ouvindo uma salva de palmas, sorri sem graça e vi que ele caminhava em minha direção.
- O que ele vai fazer? – perguntei olhando para .
- Começar uma nova amizade...? – ela sorriu em dúvida. – Acho que eu deveria fazer o mesmo com .
Quando chegou perto o suficiente, estendeu a mão e sorriu para mim.
- Oi, eu sou o , mas pode me chamar de .
Ainda em dúvida, estendi a mão e selei o cumprimento.
- .
- Prazer em conhecê-la, .
- Você é ridículo, .
- .
- .
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Tempo para aterrisagem: 2 horas
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Assistindo o nascer do sol sob as nuvens cor de rosa, soltei um suspiro contente e deitei a cabeça no encosto da poltrona. e dormiam, um encostado no outro, e Matt e Parker conversavam sobre algum gosto que tinham em comum. Mas, se eu fosse escolher a vista mais perfeita daquele avião, seria definitivamente a porta da cabine de comando aberta, colorida pelos raios do sol e com a sombra das costas de pilotando o avião.
Tudo estava correndo bem. Até estava calmo. Olhando para a janela com o rosto em plena alegria, ele voltou a falar comigo em um sussurro:
- Nunca estive nessa parte do mundo. – encarei seus olhos, surpresa, e vi que eles brilhavam que nem as estrelas. – Espero que a gente consiga ver o Monte Fuji daqui.
Trocando um olhar amigável com , sorri honestamente para ele, e percebi que aquela era a primeira vez que fazia isso. Ele provavelmente também percebeu isso, já que não parava de me olhar bobo. Começando a ficar constrangida, me curvei para a frente e toquei no cantinho da janela. Queria que ele voltasse a olhar a paisagem e não a mim.
- Daqui uns minutos, vai aparecer bem aqui.
não se moveu, nem disse nada, só ficou olhando para mim. Em seu rosto, havia um misto de surpresa e fascinação. Ergui as sobrancelhas como se estivesse esperando uma explicação e ele apenas falou:
- Você sabe que essa é a primeira vez que sorri desse jeito para mim, não sabe?
Sentindo meu coração bater mais forte, dei de ombros e voltei a me sentar direito.
- Não foi proposital, se é isso que você está pensando.
- É claro que foi! – ele se virou para mim, animado. – Pode admitir, o que foi que fez você sorrir para mim? Foi o meu rostinho lindo, não foi?
Respirando fundo, voltei a olhar a sombra de .
- Não. Sabe o que foi que me fez sorrir? – se ajeitou na cadeira e se aproximou de mim - Foi ver você se debruçar feito uma criancinha na janela. – ele estreitou os olhos e abriu a boca.
Antes que pudesse me interromper, falei apontando de volta para a janela.
- Olha lá o Monte Fuji!
- Onde? – ele se virou rapidamente, batendo o cotovelo. – Mentira! Eu perdi?
- Perdeu, assim como essa conversa! – ri, maldosa e me levantei para começar a arrumar as coisas.
- Ei, ei, ei! – se levantou só para me colocar de volta na poltrona. – Não vou deixar as coisas assim não. Vem cá que eu preciso te contar uma coisa.
Olhei-o desconfiada, mas me sentei do mesmo jeito. Fiz um sinal para que Parker e Matt começassem a arrumar as coisas para mim e ergui as sobrancelhas para .
- Fala.
Fingindo estar aquecendo a voz, ele se sentou mais perto ainda e olhou bem dentro dos meus olhos. Tive uma sensação estranha no corpo. Era como se ele estivesse perto o suficiente para ver tudo o que eu sentia. Queria desviar o olhar, assistir outra cena, mas algo nele me fazia suster a conexão.
- Eu percebi que toda vez que você fica nervosa, bom, que eu te faço ficar nervosa, você procura pela ajuda de . Não sei se você já sabe, mas eu gosto muito de você.
Arregalei os olhos surpresa com sua confissão, mas ele logo adiantou, tentando se explicar melhor.
- Não desse jeito! Mas sim eu gosto muito de você, como amiga ou inimiga, sei que você é uma boa pessoa.
- Qual é a questão aqui?
- A questão é o seguinte: você procura estar com a cada segundo e ele também tenta fazer o mesmo. Ele gosta de você, no sentido contrário do meu. E eu sei que você também sente isso, só que como você acha que é só amizade o sentimento aí dentro fica misturado e confunde todos os seus pensamentos.
- Uau . Você repara tanto assim em mim?
- Calma, não vai pensando a coisa errada. Eu só fazia isso porque queria saber melhor quem era você. Digamos que era mais uma pesquisa de campo...
- Pesquisa do que? – ri desentendida.
- Da concorrência, ué.
- Tá vendo, isso sim é característico seu. Não essa coisa toda de conselheiro amoroso.
- Você está dizendo que eu não tenho um lado romântico? Nossa, estou levemente ofendido.
- Não fui eu quem disse! – coloquei as mãos para o alto.
Ele me encarou provocativo e abaixou o olhar para a mão direita. Meu coração parou assim que vi sua aliança.
- Você está noivo? – peguei a sua mão rapidamente e analisei o anel dourado. – É de verdade?
Rindo de mim, sorriu e assentiu.
- Vamos casar em Janeiro.
- Você só pode estar brincando! Eu nunca percebi essa aliança! E aquela história do vídeo que você foi rejeitado por uma mulher e nunca mais falaria com outra? – comecei a falar rápido. – E, Deus, todo esse tempo eu achei que você só fazia essas provocações porque queria...
- Ficar com você? O mundo não gira somente em torno de você!
- Ai meu Deus... – soltei sua mão e respirei fundo. – Como eu fui tonta!
Se levantando, ele sorriu para mim e deu uma típica piscada de olho.
- Eu tiro a aliança porque não quero perdê-la durante o trabalho. E aquela história de nunca mais conversar com uma mulher ficou no passado. Foi a minha noiva quem me chamou de aeromoça. – sorriu bobo, provavelmente pensando nela. – E agora que você descobriu tudo isso, acho que vai ser mais fácil conversar com . Pode ir lá que eu cubro a sua parte.
Sentindo o frio no estômago voltar, mordi a boca e olhei preocupada para .
- Tem certeza?
- Tenho. – Estendendo a mão, me ajudou a levantar – Se você não se arriscar, nunca vai saber.
Olhei mais uma vez para a sombra de . Não sabia como tinha feito isso, mas aquela sensação de transição entre amizade e amor estava começando a fazer sentido para mim. Sentindo a confiança crescer dentro de mim, sorri para ele e respirei fundo.
- Obrigada... .
Devolvendo um sorriso orgulhoso, piscou para mim e se virou, indo ajudar Matt e Parker. Com o caminho livre, observei com outros olhos. Ele tão sereno, em sua cadeira, olhando o horizonte com mil sonhos. Com ele eu não precisava ter medo. Não precisava duvidar. Com um sorriso, fui em direção à cabine do capitão, ainda iluminada pelo céu colorido, e deslizei a mão pelo encosto da cadeira de . Ele olhou para mim como se tivesse visto o mundo em uma noite e eu sabia que com ele seria feliz, como sempre fui durante anos.
Naquele pequeno silêncio, a única coisa que eu conseguia pensar era que , justo o garoto que eu mais odiava, tinha me mostrado um novo mundo. Um mundo onde dizer um “me desculpe” é mais fácil do que bolar um plano de vingança, onde um inimigo pode ser na verdade um amigo e onde o amor pode ser mais fácil do que parece ser. Era incrível como, somente com uma única conversa com aquele garoto, eu tinha entendido que o sentido da minha vida estava a apenas uma cabine de distância. Pronto para voar ao redor do mundo comigo.
Mas o pior de tudo era que estava certo. Não, .
Fim
Nota da autora: Satellite é um projeto que surgiu a partir de um Ficstape abandonado, pronto e escondido nos meus arquivos desde 2015, mas era uma história que fiz com tanto carinho que não poderia ser esquecida tão facilmente assim. Sempre tive uma paixão por viagens e, quando peguei a música Satellite do The Wanted, decidi escrever sobre o tema em uma perspectiva diferente: através dos olhos daqueles que trabalham com isso! Ninguém disse que diversão no trabalho é proibido, principalmente quando se passa tanto tempo longe da terra. Espero que você leitora tenha gostado dessa pequena viagem, se quiser conhecer mais das minhas invenções a lista das minhas fanfics está aqui embaixo. Ah! Todos os comentários são bem-vindos!
Outras Fanfics:
Black Magic
04. Why Try (Ficstape Ariana Grande)
02. Spaghetti (Ficstape Emblem3)
Qualquer erro no layout dessa fanfic, notifique-me somente por e-mail.
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