Peter Parker é seu amigo de infância, e vocês sempre estudaram juntos. Você estranhou bastante a forma como ele se afastou de todos depois da morte do tio, mas será que era só isso mesmo?
Bem, eu nunca fui muito de ficar contando histórias, mas vocês estão me obrigando, então não tenho escolha. Tudo começou... O que? Por que preciso dizer meu nome? Vocês sabem quem eu sou. Tá, tanto faz. Meu nome é , estudo na Midtown High School, e estou aqui porque tive a infelicidade de crescer com Peter Parker. Melhor?
Voltando do começo então. Meus pais sempre foram muito amigos da May, não é à toa que vira e mexe acabo chamando ela de Tia May também. Então Peter e eu começamos a conviver mais depois que os pais dele faleceram e ele passou a morar com os tios. Depois disso, estávamos sempre juntos. Sempre na mesma escola, e isso não mudou até hoje. Sempre fomos bastante próximos, gostávamos das mesmas coisas. Peter começou a se a se afastar um pouco depois que o tio Ben morreu. Foi um choque para todo mundo, e dava para ver como ele e a May estavam abalados. Foram tempos difíceis, às vezes ainda é. Mais ou menos na mesma época o Homem-Aranha fez suas primeiras aparições. Não me orgulho de não ter ligado os pontos mais cedo. Quero dizer, não dava para ver o olho roxo do Peter e sair gritando “meu Deus, você é o Homem-Aranha!”, mas tinham outros indícios que eu acabei deixando de lado, sabe? Como eu disse, ele se afastou bastante. Dificilmente marcava algo com a gente, e, quando marcava, às vezes do nada falava que a May precisava de ajuda com algo, isso se aparecesse. Ned me fez acreditar que ele estava apenas tentando se acostumar com a ausência do tio, mas não era só isso. Eu sabia que tinha algo errado. Do nada aquele moleque magrelo tinha músculos, quando eu que tinha que ajudar ele a carregar os livros da escola. Ele nunca estava disponível, nunca atendia o celular, aparecia com alguns machucados estranhos...Estava tudo lá, esperando para que eu finalmente montasse o quebra cabeça.
“Como você descobriu?”
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pediu desculpas pela terceira vez em menos de um minuto para o transeunte em que esbarrara, sua mente inquieta demais para prestar atenção nas pessoas de quem ela deveria desviar. A noite já começava a cair e ela fora encarregada de buscar o jantar, já que ninguém em casa estava muito afim de aparecer na cozinha. Normalmente a garota estaria animada por poder pedir seu prato favorito do restaurante que ficava três quarteirões de seu prédio, e até seus pais estranharam seu sorriso forçado quando ela concordou em ir buscar a comida. Na manhã seguinte ela tinha uma prova complicada de química, e deveria ter passado a tarde com seus amigos estudando. Bom, passou a tarde estudando, mas com um amigo, no singular. Peter dessa vez sequer aparecera depois que a última aula terminou, apenas mandando uma mensagem avisando de que teria que furar com eles, mas que podiam comunicá-lo de qualquer dúvida, já que era o mais confortável com o conteúdo da prova, na medida do possível. Aquele cenário tinha se tornado tão corriqueiro que nem sabia o motivo de estar chateada, mesmo estando. A única razão de ainda não ter confrontado Peter era Ned, que dizia que era melhor dar espaço ao amigo, que mais cedo ou mais tarde ele voltaria aos trilhos.
Aquele plano não lhe agradava em nada, por isso tomaria medidas drásticas se aquilo não mudasse em uma semana a partir daquele dia.
A garota ajeitou melhor as sacolas nas mãos, fazendo o caminho de volta com a mesma atenção que tivera na ida, por isso sua surpresa quando ouviu o barulho alto de um carro freando, um braço envolvendo sua cintura e seu corpo saindo do chão. só entendeu o que acontecia quando seus pés voltaram a tocar o solo, ainda na mesma calçada, mas a uns bons metros longe do acidente, onde o carro batera em cheio na entrada de um prédio.
- Se não tiver nada muito líquido nessas sacolas, acho que salvei seu jantar também – comentou uma voz familiar demais, se virando rápido para o seu salvador, que ainda mantinha seu corpo próximo ao dele. Com aquela proximidade, ela não podia ver muita coisa, mas aquela máscara vermelha ela sabia muito bem a quem pertencia – Você está bem?
- E-eu... – por mais estranho que parecesse, a súbita confusão da garota não era apenas pela sua quase participação em um acidente, embora estivesse colaborando. Em sensação de familiaridade a envolvia, e não tinha nada a ver com o cenário, mas com os personagens. Era como se ela estivesse vendo alguém do outro lado da rua e não conseguisse se lembrar de onde se conheciam. Ou ouvir uma voz na multidão e não conseguir ligar a voz a seu dono – V-você...
- Certo, você precisa ir para casa antes que isso tudo esfrie, tudo bem? – uma viatura que fazia ronda já se aproximava do local, e o Homem-Aranha sabia que tinha que sair dali logo, mesmo com sua vontade de garantir que a garota estava bem. permaneceu imóvel mesmo quando ele se afastou, esticando um braço para atirar sua teia – E olhe para os dois lados antes de atravessar a rua, só por precaução!
apenas pode acompanhar o herói sumir de sua vista, balançando entre os prédios até sumir por um telhado. Sua mente ainda não conseguira processar tudo o que acontecera, um pouco de realidade apenas a atingindo quando sentiu uma mão em seu ombro, um policial perguntando se ela estava bem. A garota não respondera de imediato, ocupada demais em conseguir encontrar a peça que faltava no quebra-cabeça, sua voz saindo baixa e hesitante quando algo finalmente começou a fazer sentido.
- P-peter?
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Peter até tentou fazer mais uma ronda pelo bairro, mas não conseguiu nem achar mais algum local onde era necessário, nem se acalmar. Até que às vezes acabava ficando muito tempo nas rotas que costumava fazer – não que fosse algo consciente ou que estivesse seguindo a amiga, claro que não –, mas eram raras às vezes que realmente via a garota, e definitivamente não esperava ter que salvá-la um dia. O garoto resolveu voltar para casa antes que ficasse mais paranoico, imaginando que todos com quem se importava pudessem estar em perigo, e que talvez ele não fosse ser capaz de salvar todos. Peter sabia muito bem que era melhor fazer algo mesmo que falhasse do que ficar de braços cruzados, mas não podia negar que aquela possibilidade agora o assustava.
E se ele não conseguisse salvar May? Ou Ned e ?
Respirando fundo, ele foi descendo pela parede do lado de fora do prédio, até alcançar a janela de seu quarto, abrindo-a com todo o cuidado do mundo para produzir o mínimo de ruído para não dar motivos de May aparecer em seu quarto e flagrá-lo com o uniforme. Eram raras as vezes que a tia realmente aparecia em seu quarto, e ele agradecia a isso, já que facilitava demais sua vida para esconder sua identidade de herói. Peter não fazia ideia do que aconteceria caso um dia May descobrisse o que ele andava fazendo no tempo vago, e definitivamente não estava a fim de descobrir, por isso todo seu cuidado.
Só que não adiantava em nada toda aquela precaução quando alguém já tinha fortes suspeitas.
O coração do garoto quase saiu pela boca ao notar uma figura sentada em sua cama, a máscara de seu traje antigo cobrindo seu rosto, e mesmo com tecido parecia que ele podia ver sua expressão furiosa contorcendo seus traços normalmente calmos. Se apenas estivesse em seu quarto, esperando sua chegada, Peter poderia até se convencer de que se tratava de uma coincidência, mas seu guarda-roupa revirado e seu esconderijo dos trajes descobertos eram provas difíceis de se ignorar. Ela havia o reconhecido mais cedo, e agora estava ali para tirar satisfações.
No segundo que percebeu que pretendia abrir a boca – e ele podia apostar um braço que sua voz alcançaria volumes absurdos –, Peter acionou o lançador de teia, atingindo a cintura da garota e a puxando com um único movimento ágil, sua mão livre se colocando sobre onde deveria estar a boca dela.
- Não grita que a May aparece aqui! – pediu ele com urgência, suspirando alto enquanto sentia a garota se contorcer para se livrar de seu aperto – Você vai ficar quieta?
Para seu desespero, sinalizou com a cabeça que não, e a única medida que o garoto conseguiu pensar foi ir para o telhado, onde as chances de serem ouvidos pelo menos eram menores. Claro que não foi tarefa fácil fazer passar pela janela, muito menos subir as escadas de incêndio, tarefa que levou pelo menos uns bons cinco minutos. Só quando alcançaram o telhado que Peter tirou a mão de sua boca, aproveitando para tirar sua máscara antiga da cabeça de , que não gastou um segundo sequer para tirar os vários fios de cabelo que entraram em seu campo de visão e estavam perto demais de sua boca.
- Peter Parker, eu não acredito em você! – a frase que queria lhe escapar desde cedo saiu sem impedimento nenhum, ainda se adiantou em sua direção, estapeando seus ombros e peito sem dó nenhuma. Peter não teve outra escolha senão agarrá-la novamente, embora não tivesse achado que seria uma boa ideia tampar a boca da garota, presando demais pelo bem-estar de seus dedos, que estavam bem melhor longe dos dentes de .
- Não é só porque a gente tá aqui fora que você pode berrar!
- O que você tem na cabeça? Teia?! – continuou ela, seu tom se tornando mais pacífico apenas por encontrar uma dúvida antiga em seu caminho, se deixando agora ser segurada pelo amigo – Aproveitando, esse troço sai de você?
- É um dispositivo… – contou ele, se afastando o suficiente para girar seu braço e expor seu pulso para que pudesse ter uma visão melhor – Te explico melhor depois.
- É por isso que você vira e mexe aparece machucado? É nessas brigas que você se mete? – mesmo com a máscara ainda cobrindo seu rosto, sabia muito bem a expressão que se formava por debaixo dela, ainda mais pela forma desconfortável que Peter abaixou a cabeça. Aquele era o motivo do desfile de hematomas que Peter fazia dia sim dia não, e sentiu o estômago embrulhar. Todas as conversas que ouvira sobre as aparições do Homem-Aranha, as teorias de como logo ele estaria ainda mais em perigo, já que heróis exponencialmente ganhavam inimigos. Ela já estava preocupada antes, afinal, se tratava de uma pessoa, ainda mais uma que parecia ter boas intenções. Só que agora aquela pessoa era seu melhor amigo, aquele que havia sido seu primeiro pensamento de manhã e o último antes de dormir há meses. Era completamente diferente – Você precisa parar com isso. Agora!
A repentina agressividade na voz da garota fez com que Peter franzisse o cenho, erguendo uma mão para retirar a máscara agora de seu próprio rosto, seu olhar determinado se igualando ao de .
- Eu não posso parar – disse ele, o tom de fim de conversa que apenas irritou ainda mais a garoa – A cidade precisa de mim.
- Você vai acabar sendo morto, Peter! – retrucou ela, arrancando a máscara de suas mãos e usando o tecido para bater nos braços do jovem herói. sempre fora fácil de se ler, transparente demais na maior parte do tempo e um pouco mais expressiva do que considerado normal, e mesmo assim Peter estava surpreso. Nunca tinha a visto daquela forma, a agitação agoniada de todos seus movimentos, a forma mal controlada que sua voz soava – Consegue entender isso? É perigoso! Como você pode esconder isso?
- Não queria te deixar preocupada – não passou despercebido por como o amigo soara verdadeiro, a forma estranha como desviara o olhar depois daquela confissão. Eles cresceram juntos, conheciam melhor do que ninguém seus costumes e o que os deixava desconfortáveis, por isso se viu ainda mais irritada. Talvez eles não se conhecessem assim tão bem, então.
- Excelente trabalho você fez, já que é só isso que eu sei fazer nos últimos meses – o fator vento e barulhos dos carros andares abaixo tentaram impedir Peter de entender as palavras amarguradas da amiga, mas sua audição aprimorada mais uma vez lhe foi útil, embora suas pernas não tivessem lhe obedecido quando quis ir atrás da garota, que rumava para as escadas com os ombros caídos em derrota.
- O quê?
- Você se afastou, idiota. De todo mundo. De mim – Peter se arrependeu instantaneamente de ter feito aquela pergunta, a mágoa expressa nos olhos da garota sendo algo intenso demais para manter o contato visual – Não fazia ideia do que estava acontecendo com você e ainda não faço, porque você me afastou!
- E-eu não fiz isso – ele tentou desconversar – Eu só estava cuidado da cidade, ocupa muito tempo... Juro que é só isso.
- Coloque a máscara de volta – retrucou , as mãos já apoiadas para começar sua descida – Talvez o Homem-Aranha minta melhor que Peter Parker.
- Com o que eu posso fazer agora... – em segundos o garoto estava à sua frente, as mãos protegidas pelas luvas do traje sobre as suas nuas, impedindo que as tirasse do lugar. Seus olhos castanhos travados nos dela, a testa levemente enrugada enquanto Peter tentava medir as palavras que pretendia usar. Não dava para simplesmente a deixar ir, não era assim que as coisas funcionavam, e nem seria assim dali para frente. era sua amiga, esteve tanto tempo ao seu lado que sequer sabia como era passar por algo sem o seu apoio. Existiam algumas pessoas que ele temia decepcionar, não ser bom o bastante para suprir suas expectativas, e uma delas era – Se eu não fizer nada, parte da culpa pelo o que acontecer também vai ser minha. Não posso viver com isso. Pensei que você de todo mundo fosse me entender, se eu contasse. Você sempre quis ajudar as pessoas, e agora eu tenho o meu jeito.
Aquilo surtiu um pouco mais de efeito, mas não quis dar o braço a torcer. Mesmo aceitando a ajuda de Peter para voltar com os dois pés para o telhado, ela permaneceu de braços cruzados e expressão emburrada, o máximo de reprovação que conseguia exteriorizar no momento. Claro que em algum nível ela estava orgulhosa. Peter estava ajudando as pessoas de uma forma que não era possível a qualquer um, e ela sempre soube como seu coração era bondoso. Só que não dava para ignorar os pontos negativos daquela história, certo?
- Qual é, não fica assim... – choramingou Peter, arriscando uma iniciativa mais ousada na esperança que o humor da amiga tivesse melhorado. o olhou feio quando ele socou de leve seu ombro tenso – Você é a primeira a tomar a dianteira quando o assunto é o Homem de Ferro e o Capitão América.
- Eles são adultos. Com recursos – respondeu ela sem pensar duas vezes – E parecem muito mais durões do que você.
- Estou corando?
Não foi nada fácil fazer com que se acalmasse, mas eventualmente Peter obteve sucesso, voltando com a garota para seu quarto logo em seguida. O clima voltou um pouco mais à normalidade quando Peter pediu que ela esperasse, para que ambos deixassem o quarto junto, só que para isso ele precisava se livrar do uniforme. O problema era que ele não comunicara seus planos à garota, apertando o botão no peito de seu traje para que o tecido se afrouxasse, quase o puxando de volta para cima de seus ombros quando ela comentou alto demais que a May podia entrar a qualquer momento. E foi dito e feito: segundos depois May abria a porta com o olhar desconfiado, e tudo que Peter por fazer foi chutar o uniforme para debaixo da cama, puxando parte de seu coberto que não dobrara pela manhã para tentar se cobrir o máximo possível.
- Meninos… – começou a mulher, o tom claro de bronca presente, o que apenas fez com que os dois adolescentes começassem a falar rápido, tomados pelo constrangimento.
- Nós não…
- Não estávamos…
- Definitivamente a gente não...
- Tá bem tarde para a andar sozinha e eu estava me trocando para levar ela para casa – a desculpa de Peter não saíra tão convincente como planejava, mas May acabou por concordar com ela, pedindo que o sobrinho tomasse cuidado no caminho de volta, e que eles não demorassem para sair, já que Peter teria que retornar sozinho.
Ambos assentiram com uma velocidade ainda suspeita, mas a mulher optou por deixar tal detalhe de lado. foi a primeira a começar a rir quando May voltou a fechar a porta do quarto, quase não conseguindo abafar o som com as mãos quando Peter lançou um travesseiro em sua direção enquanto dizia que não tinha graça, mesmo com o sorriso travesso nos lábios.
Talvez fosse bom saber de seu segredo. Sentia falta da garota sempre ao lado.
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Depois que descobriu sua identidade de herói, Peter mudou consideravelmente. Claro que vez ou outra ele ainda furava em algum compromisso marcado com os amigos, aparecia com um hematoma ou escoriação no rosto, mas estava sem dúvidas se esforçando para se manter mais presente, e agradecia por aquilo. Era o mais perto possível de ter seu amigo de volta, mesmo que aquela preocupação por seu bem-estar não deixasse sua mente por completo por um minuto sequer, mas ela até que conseguia se distrair.
- Ah, droga – Peter praguejou alto de repente, fazendo com que e Ned erguessem os olhos de seus cadernos para tentar entender o que acontecia. O grupo havia resolvido se reunir para estudarem junto para a prova de inglês da semana seguinte, cada um procurando informações úteis em suas anotações, aproveitando o espaço vazio de uma das salas de leitura da biblioteca. O garoto coçou a nuca com uma expressão desanimada, guardando em seguida o celular que apitara minutos antes no bolso – Gente, eu preciso ir… Podemos continuar amanhã, por favor? Foi mal mesmo.
Como de costume, e Ned apenas assentiram, sem se darem ao trabalho de se mostrarem chateados com o abandono do amigo. O jovem herói reuniu da melhor forma que podia seu material de novo na mochila, se curvando para beijar o rosto da garota enquanto ajeitava as alças e dando um tapinha de leve no ombro do amigo. voltou para seus estudos logo em seguida, mas Ned continuava a encarar o caminho que Peter acabara de tomar.
- O que você fez? – perguntou o garoto depois de um tempo, se virando com o olhar acusador para a amiga, que girou sua caneta entre os dedos como se não soubesse de nada.
- Eu faço muitas coisas, Ned…
- Com o Peter. Ele virou todo atencioso do nada! – continuou ele, um pensamento lhe ocorrendo e seu cenho se franzindo ainda mais – Vocês estão se pegando?
espalmou ambas as mãos sobre a mesa, a caneta que antes estava entre seus dedos voando longe.
- Ned!
- Que é?! – devolveu ele, se desculpando junto com a amiga pelo barulho que estavam fazendo quando uma das bibliotecárias apareceu para repreendê-los. Enquanto a garota ia atrás de sua caneta voadora, Ned continuou, seu tom de voz se tornando muito mais convencido – Faz sentido.
- Se tem algo que isso não faz é sentido – retrucou ela, voltando a tomar seu lugar ao lado do garoto – E tanto ele quanto você só tem olhos para a Liz Allen.
- , Peter tem uma queda por você desde sempre! Que ele não sabe que tem, claro. Você é quase tão incrível quando a Liz. Ou mais! Eu não sei dizer, já que o amor verdadeiro cega as pessoas – não levou em consideração nada que o amigo dissera, mas se flagrou rindo no final – Pergunte para o Peter qualquer dia, é mais confiável.
- Como você é engraç… Espera aí – pediu a garota, buscando seu celular que esquecera de desligar o som no estojo ao lado da pilha de livros – Droga.
- O que foi?
- Meu pai vai ficar preso no escritório hoje, terminando alguma vistoria – contou ela, respirando fundo enquanto fechava os olhos e jogava a cabeça para trás – E como minha mãe tá de plantão hoje ele pediu para eu dormir na May… Não comenta.
- Não disse uma palavra – Ned riu, fingindo até que bem sua atenção ao texto a sua frente, embora o sorriso de lado o entregasse.
A dupla continuou ali por mais umas horas, até que cada um seguiu para sua casa. Algumas de suas coisas acabavam ficando na casa de May por suas constantes visitas, mas ainda parou em seu apartamento para pelo menos pegar o material que usaria nas aulas do dia seguinte. Como de costume, May ainda não tinha voltado do trabalho quando ela chegou, a garota aproveitando sua ciência da localização da chave extra para entrar no apartamento antes que seus moradores retornassem. Claro que ela podia ligar para o Peter e pedir que ele passasse ali para abrir a porta, mas não fazia ideia de que parte da cidade ele estava, muito menos se estava ocupado, e esperar que May chegasse estava fora de cogitação, já que entregaria de imediato que Peter não tinha voltado para casa na hora combinada de sempre.
já estava quase dormindo sentada quando percebeu uma movimentação no teto do quarto com sua visão periférica, abaixando de uma vez o grosso livro que lia, o som alto da capa colidindo com suas pernas fazendo Peter saltar sobressaltado para o chão.
- P-pelo escudo do Capitão América! – ofegou ele no tom mais alto que a situação permitia, se enrolando um pouco mais de costume para conseguir tirar a máscara do rosto e permitir que visse sua expressão assustada – Vai virar costume eu chegar e você estar no meu quarto?!
- “Pelo escudo do Capitão América”?
- Ainda não sai do modo Homem-Aranha… O que tá fazendo aqui? – Peter desconversou, jogando a máscara dentro do armário e passando a trabalhar no resto do traje.
- Pais não vão voltar para casa hoje…
- Aí você dorme aqui – completou ele, aceitando a camiseta que a garota lhe oferecera depois que ele encontrara uma calça de pijama fácil e a vestira – Desculpa não ter te feito companhia até aqui.
- Tá tudo bem. Estava lendo um pouco – sorriu, erguendo o livro que fora sua companhia até o momento antes de colocar o marcador entre as páginas e deixá-lo ao seu lado – Até te encobri para a May não descobrir que você não estava aqui.
Peter uniu as sobrancelhas, sem conseguir imaginar como ela fizera aquilo.
- Corpo de travesseiro – contou ela satisfeita depois que o garoto entregou os pontos e perguntou, apontando para o relevo debaixo das cobertas que podia muito bem ser uma pessoa adormecida – Disse que você estava quebrado por causa da aula de educação física de hoje, apagou assim que chegou. Eu podia ser espiã da SHIELD, sou muito boa.
- O que eu faria sem você? – Peter suspirou, a expressão falsamente convencida fazendo a garota rir.
- , Peter acordou? – perguntou May enquanto abria a porta, o garoto tendo menos que segundos para se jogar em sua cama e ficar na posição menos suspeita possível. A mulher se apoiou contra o batente ao encontrar os dois adolescentes acordados, os braços cruzados em frente ao peito – E aí, dorminhoco?
- Estou todo dolorido, não zoa – resmungou ele, a voz saindo abafada por ter forçado o rosto contra o travesseiro, dando mais autenticidade ao teatro de ambos.
- disse que você não jantou, e suspeito que ela também não. Salgadinho não é jantar, – emendou May, assim que notou que a garota pretendia retrucar. Depois disso, revirou os olhos e ficou quieta, sabendo que aquela era uma batalha que ela não estava destinada a ganhar – Querem comer alguma coisa?
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por dois segundos pensou que era seu despertador avisando que precisava levantar o mais rápido possível para não perder o trem que ecoava pelo seu quarto, sendo necessário apenas um bom bocejo para ela acordar o suficiente para reconhecer o toque de chamada. A falta de luz solar invadindo seu quarto indicava também que não era hora para ir para escola, a garota atendendo o aparelho mesmo sem conseguir distinguir as letras embaçadas que apareciam na tela.
- , tá acordada?
Mas aquela voz ela conseguia reconhecer mesmo semiconsciente.
- Ainda não aprendi a atender o telefone dormindo, Parker – grunhiu ela, voltando a afundar em seu travesseiro, as tentativas de tossir e pigarrear para sua voz soar mais acordada falhando miseravelmente – O que foi?
- Abre a janela do seu quarto.
até chegou a soltar uma exclamação confusa, mas a ligação sendo encerrada não lhe deu muitas opções. Chutando as cobertas para longe – além de ter reclamado muito pelo frio repentino –, a garota foi se arrastando até a janela, sem saber por que se surpreendera ao ver uma figura jogada nas escadas do lado de fora.
- O que aconteceu? – mesmo baixa, a pergunta estava carregava de urgência, ajudando o garoto com cuidado a passar pelo espaço da janela. Mesmo sem tirar a máscara, ela já sabia dizer que ele estava muito machucado só pelos sons que produzia, além da mancha escura no azul da lateral de seu traje.
- Uma queda muito feia e… – contou Peter entre gemidos, suspirando aliviado quando finalmente pode se sentar na cama da garota – … e alguma coisa bem afiada nas minhas costelas.
Com toda a delicadeza do mundo, ajudou o jovem herói a se livrar da máscara e o resto do traje, estudando primeiro o ferimento nos tórax, que só podia ser o mais sério. Não era um corte tão fundo que ela precisasse entrar em desespero, mas não chegava a ser superficial. Os músculos de Peter tensionavam instantaneamente toda vez que os dedos de tocavam sua pele, tanto pela dor como pela diferença de temperatura. Seu toque era sutil, mas ele ainda conseguia sentir um certo tremor, assim como a confusão em seus olhos que se forçavam a focar em uma coisa por cada vez. Ela estava assustada, e ele não podia julgá-la, já que também estava.
- Você sabe como dar pontos, não é? Eu preciso que você faça isso, ok? – Peter adotou um tom mais claro e firme na segunda parte de sua fala quando notou se agitar mais, a negação já formada em seus olhos – Não dá para eu ir no hospital e contar como que ganhei esse corte, . Por favor.
- Não tem anestesia aqui, Peter – lembrou ela, a voz falha combinando bastante com suas mãos agora ainda mais trêmulas – Esse troço dói!
- Eu só tenho você.
engoliu em seco, sem saber como responder depois daquilo. Peter estava ali, todo seu corpo sequer se dando o trabalho de mascarar o cansaço que sentia, o leve desespero pela situação lhe ter saído do controle. Seu olhar mesmo assim parecia não conversar com o resto do corpo. Enquanto todo o restante parecia lhe implorar pela ajuda, os calmos olhos escuros do garoto pareciam estar cheios de compreensão. Peter sabia que estava pedindo demais, que a amiga não tinha tanto treinamento para aquilo e que não poderia a julgar caso negasse o auxílio. Ela não tinha nenhuma obrigação com aquilo, foram suas escolhas que o levaram até aquele ponto, e era injusto arrastar junto consigo. Durante todo o caminho até o apartamento da garota, Peter se questionara se estaria fazendo aquele percurso mesmo se ela não tivesse descoberto seu segredo semanas atrás, e um peso abandonara seu coração ao constatar que sim, aquilo nem precisava ser questionado. Claro que aparecer na janela dela como Homem-Aranha quebrado faria ela ter um ataque, que provavelmente acordaria o bairro inteiro com seus gritos, mas não havia mais ninguém a ser considerado, e ele não queria. Era algo tão natural que Peter nunca percebera isso até aquele dia.
Ele confiava em , não importasse o que.
- Vou pegar o kit da minha mãe, já volto – avisou ela, depois de muito respirar fundo na tentativa de retomar o controle sob suas ações. Se ia mesmo suturar aquela ferida, tinha que começar logo antes que mudasse de ideia.
- Ela não vai perceber? Acordar?
- Plantão – explicou a garota, buscando uma camiseta qualquer jogada sobre sua mesa para limpar o sangue que estava em suas mãos, já que não seria nada interessante deixar rastros pela casa. Já seria difícil se livrar de todo o material que usaria em Peter sem que seus pais notassem, quem diria explicar as marcas de sangue no quarto do casal – Pai capotado no sofá. Podemos treinar ginástica aqui que ele só acorda amanhã.
Peter soltou um riso fraco, tanto pela exaustão como pela dor nas costelas que atrapalhavam até para respirar. Não demorou muito para que voltasse, a maleta branca de primeiros socorros da mãe em uma mão e um par de luvas de látex na outra. Ele assistiu a garota trabalhar com uma calma e precisão que lhe davam inveja, seus dedos protegidos trocando tantos pedaços de algodão que Peter perdera a conta, passando o material embebido de um líquido escuro no ferimento antes de iniciar o procedimento de fato. Minutos depois, ela trocava o algodão e o líquido pela linha de sutura e a agulha curvada, respirando fundo várias vezes para se preparar assim como ele.
- Isso vai doer, m-mas avisa se estiver doendo demais – pediu ela em um sussurro, antes de ajeitar os pedaços de pele partidos com a mão livre e posicionar a agulha com a outra no local onde faria o primeiro ponto.
A respiração de travou na garganta na primeira vez que perfurou a carne de Peter, a forma como as mãos do garoto se agarraram com desespero em suas cobertas para tentar aliviar a tensão ficaria semanas em sua mente depois daquele dia. Ela apenas continuou depois que o jovem herói assentiu de leve, confirmando que estava tudo bem, na medida do possível. Porém seu rosto não voltou a relaxar, como se costume. Seu maxilar ficara travado durante toda a sutura, ele até tentara não prender os lábios entre os dentes porque sabia que acabaria machucando, mas vez ou outra era um movimento involuntário.
Acabou que Peter se concentrou tanto em ignorar o que acontecia que apenas notou que acabara quando viu se levantar de repente, uma sacola em mãos para juntar todo o material usado durante a sutura.
- Quando você colocou a faixa? – ofegou Peter, a mão do lado oposto do ferimento percorrendo o peito coberto pelo tecido. Quando riu sem graça, ele sorriu admirado – Você realmente é muito boa.
- Me deixa terminar de limpar o resto…
Os ferimentos menores, mais concentrados no rosto, foram bem mais fáceis e rápidos de cuidar, e logo ela voltava a tarefa de organizar o que utilizara e o que precisava devolver ao quarto de seus pais na organização original mais próxima o possível para não levantar suspeitas. Peter aproveitou aquela deixa para juntar suas coisas também, agora vestido com um conjunto de calça e camiseta de flanela que lhe emprestara
- O que você pensa que está fazendo? – perguntou a garota quando notou Peter se aproximar da janela do quarto, seu uniforme sujos embolado em uma das mãos.
- Indo para casa.
- Você dorme aqui – soara tão autoritária que surpreendeu o garoto, que arregalou os olhos de leve enquanto ela enfiava a sacola com o material para descarte em sua mochila, para dar um jeito naquilo pela manhã quando fosse para a escola – Manda alguma mensagem para May dizendo que esqueceu de avisar que ia dormir aqui. Você não sai desse apartamento nem se Tony Stark aparecer na porta.
- Tudo bem, durmo no sofá...
- Meu pai chegou primeiro, vai ter que dormir aqui comigo – esperava alguma concordância da parte do garoto, e chegou a rir de leve quando notou seu rosto corado, sem entender de imediato o motivo de seu constrangimento – Que é? Pelo menos não ronco tanto quanto você.
- N-não somos mais crianças, …
Certo, aquilo era verdade. Já fazia um certo tempo que, quando dormiam na casa um do outro, o adulto presente exigia que dormissem em camas separadas, e eles demoraram mais do que se orgulhavam para entender o motivo. Se a cena que May presenciara semanas atrás e interpretara de maneira errônea já causara dor de cabeça o suficiente aos dois, não queria nem imaginar o que aconteceria quando sua mãe chegasse pela manhã e notasse a figura de Peter deitada com sua filha em sua cama. Só que não tinha muitas opções, já que dormir no chão seria uma péssima ideia para ela, e principalmente para Peter, que precisava do mínimo de conforto para se recuperar melhor de seus ferimentos. teve que controlar a vontade de bufar ao pensar no pai dormindo no sofá com a televisão ligada. Logo hoje ele tinha que ocupar a cama improvisada de Peter quando passava a noite ali, com tantas outras oportunidades pela semana.
Exatamente como esperava, não houve muita discussão sobre como organizariam aquelas poucas horas de sono. Quando disse que era melhor ele deitar mais próximo à parede por dificultar a tarefa de ela poder esbarrar no ferimento mais sério durante a noite, Peter sequer conseguiu concordar com a ideia, já que a imagem da garota se alinhando contra seu corpo durante a noite ocupou com egoísmo seus pensamentos, a possibilidade de aquilo acontecer fazendo seu rosto esquentar mais uma vez. Claro que eles tinham um acordo silencioso de deitaram o mais distante possível um do outro, mas ainda se tratava de uma cama de solteiro, a maior distância possível não era tão grande assim. Seus sentidos haviam melhorado consideravelmente desde que ganhara seus poderes, o que significava que o batimento acelerado de ficaria mais evidente com ela ao seu lado, talvez tão alto como seu próprio.
“Com desconforto” parecia ser uma escolha modesta de palavras, mas essa era a melhor maneira que Peter tinha para descrever como foi se ajeitar na cama da amiga, mesmo o colchão dela sendo muito melhor que o seu. Ele precisava forçar o ar a entrar em seus pulmões, ainda mais quando se ajeitou ao seu lado, puxando sua coberta de maneira que pudesse abrigar ambos. Ela pelo menos conseguia fingir bem melhor do que ele que estava levando a situação numa boa, mesmo não estando. Seus músculos pareciam não acreditar muito em seus comandos, quase como se recusando a relaxarem, mesmo já estando devidamente posicionada em seu colchão, a cabeça quase caindo do travesseiro de tão na ponta que deitara, já que dividia a peça com Peter. Ele também estava bastante tenso, isso a garota podia dizer sem nenhuma dificuldade, mas o cansaço parecia estar ganhando aquela briga, aos poucos a respiração do jovem herói se tornando mais profunda e mais ritmada, seu corpo aos poucos desistindo de se importar com a situação inusitada e se mostrando mais determinado em encontrar uma posição confortável para passar a noite.
Apenas uma eternidade mais tarde – ou teriam sido dez minutos? –, que Peter fez uma movimentação mais ousada, mesmo sem perceber o que fazia. Na tentativa de criar mais espaço para ambos, além de tentar deixar a situação menos constrangedora e passarem a madrugada se encarando, ficara levemente de costas para ele, que continuava deitado de barriga para cima. O problema era que não era aquela posição que o garoto costumava dormir, e, como não era inteligente se curvar para o lado do ferimento, sua única opção era ir mais para o lado da amiga, sua mão pousando timidamente sobre sua cintura por cima do cobertor por não ter muito local para seu braço repousar, aquele gesto tão simples e corriqueiro fazendo algo curioso acontecer em seu estômago. Depois de tantos anos, suas mãos conheciam muito bem a cintura da garota: era ali que elas ficavam quando se abraçavam, quando queria a guiar em alguma direção e ela cismava em querer a oposta, uma forma muito mais sutil e delicada do que puxá-la pelo braço, embora muitas vezes fosse sua vontade. Aquela não era a primeira vez que ficavam tão próximos, e, por mais estranho que soasse, Peter não queria que fosse a última. Principalmente se aquela nova sensação curiosa fosse sempre se manter presente.
- T-te incomoda? – perguntou ele depois de um tempo, ao perceber que pouco se movera. O garoto se viu ainda mais confuso quando apenas negou com a cabeça, voltando a seu silêncio absoluto. Uma confusão de sentimentos se instalou em seu peito, e ele não sabia dizer se era por entender que ela não se incomodava por não sentir nada diferente como ele, ou por talvez ela também sentir e a ideia não lhe assustar. Bem, ele pelo menos estava assustado. Amedrontado, para ser mais sincero. As coisas não deviam funcionar daquela forma, se sentir daquela maneira diante de sua amiga de infância. Não que ele fosse cego, claro. Peter tinha ciência da atenção que ela recebia dos outros garotos da escola, e não era porque era a pessoa mais incrível e irada que ele conhecia, eles não a viam daquela forma, não era por isso que se admiravam. Ele, em contrapartida, se apaixonava mais e mais a cada dia por cada mero detalhe dela. Okay, talvez ele estivesse tirando conclusões precipitadas. Tipo muito precipitadas. Aquilo não podia estar certo, certo? Aquilo tinha que ser errado, por isso ele estava assustado. Ou ele estava tão assustado por não estar assustado de fato?
Peter estava tão imerso em pensamentos que não notou o momento que adormeceu, só se deu conta quando sentiu uma movimentação excessiva da pessoa ao seu lado, notando logo de cara que sua mão antes apenas sobre a cintura de escorregara e agora seu braço agora envolvia a garota, que se esticava para checar seu celular na mesa de cabeceira.
- Tá tudo bem? – perguntou ele, depois que devolveu o aparelho ao seu lugar, voltando a se ajeitar em seus braços sem perceber que ele também despertara. A voz sonolenta e mais grave de Peter fez com que ela se sobressaltasse de princípio, a garota sorrindo tímida e se virando minimamente para ele em seguida.
- Sim, só… Dificuldade para dormir, acho.
Peter soltou uma risada baixa e concordou, mesmo não se encontrando na mesma situação que a garota. Mesmo com seu sono um tanto mais inquieto do que de costume, ele sentia que podia dormir por uma semana direto sem descanso, mas também sentia que podia continuar para sempre ali, admirando aquele rosto amassado contra o travesseiro, os olhos sonolentos que lutavam para permanecerem abertos. Foi nesse momento que Peter se tornou mais consciente de sua mão descansando sobre a barriga da garota, acompanhando o movimento calmo de sua respiração, o polegar que praticamente criara vida própria fazendo um movimento circular em um carinho sutil.
- Peter? Obrigada – disse ela em um sussurro, emendando quando notou a confusão nos olhos escuros do amigo – Por confiar em mim.
- Obrigado por confiar em mim também – devolveu ele no mesmo tom, apoiando o peso de seu corpo no braço do lado bom para se curvar sobre ela, beijando a bochecha que não estava contra o travesseiro. A respiração de Peter travou brevemente em sua garganta ao sentir uma mão de na base de seu pescoço, sua palma deslizando pelo tecido da camiseta até parar no meio de seu peito, um toque carinhoso que não tinha experimentado até aquele momento.
Foi de forma tímida e hesitante que ele se afastou da garota, o tempo que seus lábios estavam contra a pele dele já tendo passado do considerável socialmente adequado. A primeira coisa que notou era que já buscava seus olhos antes de seu olhar encontrar o dela, eles se movendo inquietos, estudando o rosto do garoto mesmo com a pouca iluminação do quarto. Daí foi uma série de constatações da parte de Peter: a primeira era que sim, ela tinha sentido algo diferente, fosse um mês atrás, semana passada, ou há dez minutos. Aquele olhar que recebia era diferente do que costumava a receber, ou talvez ele apenas não tinha um pedaço de informação importante para interpretá-lo da forma correta. Ou sua expectativa por reciprocidade que estava o iludindo. E isso levava ao último ponto: ele definitivamente iria se arrepender se não tomasse alguma forma de iniciativa.
Pareceu uma eternidade o tempo que demorou para que seu rosto voltasse a ficar próximo ao dela, seu olhar buscando alguma oposição da parte da garota antes de focar de novo em seus lábios entreabertos. Quando ergueu o rosto minimamente em sua direção, fazendo seu nariz deslizar contra o dele, um discreto sorriso mais confiante se desenhou nos lábios do garoto, algo que sumiu quando os lábios fartos dela encostaram contra os seus mais finos. Toda a confiança de segundos antes se esvaiu, e Peter não fazia ideia do que fazer, muito menos como se respirar. Tipo, puta merda, ele estava beijando a ! Ele se recuou com a cabeça minimamente apenas para retornar em seguida, capturando os lábios dela de um ângulo melhor e com mais firmeza. Ele estava beijando a e ela estava beijando de volta! A partir de que momento era apropriado ele levantar e sair correndo, xingando alto apenas pelo alvoroço de sentimentos em seu peito? As mãos delas passaram por seus braços, ombros. No momento que os dedos dela alcançaram sua nuca, Peter soube no exato momento que aquele arrepio percorreu seu corpo que ele estava ferrado, que aquela garota o tinha na palma da mão. Já era bem limitada a lista de coisas que poderia pedir com jeitinho que ele não fizesse sorrindo, mesmo que contra a vontade, agora sentia que ela podia pedir que ele pulasse da ponte que ele simplesmente atenderia o pedido, mesmo sem seu lançador de teias.
Bem perto de quando ambos já estavam sem fôlego, com Peter parcialmente deitado sobre ela, passeou suas mãos pelo peitoral bem trabalhado do jovem herói que até aquele momento ela só teve a felicidade de admirar de longe, sentindo seus músculos contrariem contra seu toque, até parar no meio de suas costas, abraçando o garoto enquanto ele começava a beijar de leve o canto de sua boca, bochecha e queixo.
- Isso foi… – começou , a dificuldade em encontrar uma boa palavra para descrever não lhe parecendo algo tão problemático assim. A frase suspensa também lhe soava bem.
- ...muito inapropriado para o momento – completou Peter, surpreendendo a garota, que arregalou os olhos surpresa. Ao perceber que ela não entendera seu ponto, o jovem herói continuou – Seu pai tá dormindo no sofá e nem sabe que eu estou aqui e é madrugada.
- É, isso também – concordou ela, depois de alguns breves segundos ponderando aquele fato. Em seguida, ela deu de ombros, sorrindo brincalhona – Relaxa, você vai ter bastante tempo para ficar desconfortável com isso pela manhã.
- Ah, constrangimentos… – choramingou o garoto, se adiantando mais uma vez contra os lábios de , que teve que se esforçar para manter sua risada baixa – Vou ter que aproveitar agora então…
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Peter tentava se fingir de calmo, mas a verdade era que seu coração estava quase para sair pela boca. Até agora não entendera muito bem o que tinha presenciado: tinha saído com para comprarem material para um projeto da escola, e do nada tudo começou a desandar, um tipo de confronto confuso que só mais tarde ele saberia dizer que era entre alguma equipe da HYDRA e dos Vingadores. Em um primeiro momento, a dupla ficou atordoada olhando seus arredores, Peter logo percebendo que não era um adolescente do colegial que era necessário naquele momento, correndo logo para trocar de vestes para ser útil à situação, mas não antes de fazer um pedido claro para que procurasse um local seguro para se abrigar.
E claro que não foi isso que ela fez.
Haviam algumas pessoas machucadas correndo pelas ruas, além das assustadas e confusas que não sabiam o que fazer. Desde criança, sempre soube o que fazer nessas situações: dar instruções, auxiliar os feridos. Sua mãe não estava nos arredores, mas ela sabia que estaria orgulhosa. Claro que ela terminara com um arranhão ou outro, um hematoma aqui ou ali, mas o sentimento que tinha era que fizera a coisa certa. A garota conseguia distinguir até com facilidade alguns ferimentos, e por sorte não encontrara nenhuma pessoa com algum grave. No mais ela estava mais era convencendo pessoas a buscar abrigo, a sair da linha de fogo. Algumas vezes ela vira Peter balançando por entre os prédios, ajudando também da forma que podia, auxiliando os Vingadores quando não conseguia derrubar um grupo de inimigos sozinho.
Peter não fazia ideia que que horas eram, ou de quanto tempo atrás que se iniciara aquele ataque. As únicas informações úteis em sua mente era que ele estava agora na Torre dos Vingadores passando por cuidados médicos, e que ele não fazia ideia de onde estava . Seu celular se perdera em algum momento da batalha, e nem mesmo J.A.R.V.I.S. conseguia contatar a garota, dizendo que hora o aparelho dela se dava fora de área ou ocupado. Clint, Steve e Tony assistiam com um pingo de curiosidade a forma inquieta que o jovem herói se portava. Como tinha tendências a falar demais em alguns momentos, eles sabiam muito bem quem era a amiga que o acompanhava naquele dia, então viam algo a mais no desespero dele em saber se estava bem. E Peter negar com veemência e o rosto corado toda vez que perguntavam se ela era apenas amiga mesmo não ajudava em nada a equipe mudar suas suposições.
- Sr. Stark, tem uma garota no saguão que diz ser sua filha exigindo sua presença – a já normalmente voz alta de J.A.R.V.I.S. pareceu ainda mais imponente no silêncio absoluto da sala, algo que não voltou a reinar depois daquela informação.
- A minha o que?!
- Você tem uma filha?
- Não! Que eu saiba – Tony respondeu à pergunta dos dois colegas, completamente atordoado – J.A.R.V.I.S., o que a garota disse?
- Que May não estava mais aguentando e que agora você deveria cuidar dela, senhor.
- É a ! – exclamou Peter, ganhando um tapa no braço de Clint por estar se movimentando demais e dificultando sua tarefa de limpar os ferimentos do herói mascarado.
- Garota esperta… – riu Tony admirado – J., deixe ela subir.
Minutos depois, a porta da enfermaria foi aberta com violência, ignorando os três vingadores receosos e se focando apenas no jovem herói que ela vira desabar de um prédio quase uma hora atrás e não conseguira mais localizar no meio de toda a zona que virara aquela cidade.
- Peter Parker, eu vou matar você!
- Feliz em ver que você está bem também – devolveu ele, se esforçando para soar mal-humorado, mesmo estando na verdade aliviado.
- E você não está! – continuou ela, pouco se importando com os pedidos dos três homens para que ela se acalmasse. Ela manteve a calma sabe-se lá por quantas horas, ela tinha o direito de gritar um pouco e iria – Não faço ideia do que aconteceu com seu celular, e a May está ligando para mim! Eu disse que a gente estava bem e que você não podia falar porque estava no banheiro, mas ela continua ligando e eu estou ficando desculpas p… – como se acreditando ser uma boa deixa, o aparelho na mão de voltar a tocar, e ela não hesitou em estendê-lo para Peter – Aqui, se vira.
- Deixa isso comigo – Tony suspirou alto, pegando o aparelho no lugar do garoto, não conseguindo evitar analisá-lo antes de atender, o finco em sua testa adiantando que ele não estava feliz com a visão – Uma velharia dessas e ainda com a tela trincada?
- Eu estava no meio de um ataque, e a pessoa rica aqui é você. Respeita minha velharia.
- Me lembra de te dar um celular novo antes de ir embora… Oi, May! Tony Stark, lembra? Como está? – enquanto conversava, Tony começou a rumar para a porta, ciente de que todos os olhares acompanhavam seus movimentos – Sim, as crianças estão comigo. Tava uma zona lá embaixo e tivemos que descer, vi o Peter e a perto demais do perigo e pedi para eles virem para a Torre – quando estava para sumir no corredor, ele se virou e sorriu para a garota – Mas é claro que eu conheço a ! Quase como se fosse minha filha.
- Tony Stark estava flertando com a sua tia? – perguntou a garota baixo para o amigo, que assumiu uma expressão ofendida.
- Mas é claro que não!
- Cara, isso é tão legal!
- Você era a garota que estava ajudando os civis – comentou Steve logo em seguida, conseguindo o olhar constrangido da jovem, que riu sem graça.
- E você é o Capitão América.
- Venha comigo – pediu o soldado, sinalizando com o braço para que ela o acompanhasse. O olhar de inconscientemente seguiu para o jovem herói, um aviso silencioso de que ela não queria sair dali sem sua companhia – Eles vão cuidar do Parker, e você e eu precisamos conversar.
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- Resumindo, é isso – suspirou, suas costas escorregando pelo encosto da cadeira que ocupara pelos últimos minutos, de repente cansada depois da longa narrativa. Steve em algum momento abandonara sua postura mais correta e agora apoiava seu queixo no punho fechado, o cotovelo sobre a mesa, uma expressão tão cansada quando a da garota.
- Você não precisava ter contado o final – comentou o soldado – Eu estava presente.
- Você que pediu para que eu contasse tudo.
- Na verdade, tinha muito detalhe que eu não precisava saber.
- Você pediu para saber de tudo, eu contei, ué.
- Você é uma garota forte, – uma terceira voz se junto à conversa, Tony passando pela porta da sala e ocupando uma cadeira ao lado do Capitão – Talvez tenha um lugar na equipe.
- Equipe? – repetiu a garota, confusa. Tipo, que?
- Parte técnica, é claro – Tony logo prosseguiu, vendo a falta de compreensão expressa nos olhos da jovem – Você precisa se esforçar um pouco mais para eu te dar um traje.
- Mas o celular ainda está de pé, certo? Eu definitivamente preciso de um novo – brincou a garota, mesmo esperando ganhar um aparelho novo depois de tudo – Mas sério, do que vocês estão falando?
- Quero te oferecer um estágio na Stark. Um estágio de verdade, não como o do Peter – disse o engenheiro por fim, a expressão confusa de se tornando aos poucos surpresa – Você é inteligente, . Deve valer a pena o investimento. Claro que ficar de namoro com Peter pelo prédio não vai ser tolerado.
- Nós nã… Ele que nunca soube manter o foco.
- Eu sabia que estava rolando algo entre eles! Peter, aquele mentiroso…! – exclamou Tony, batendo o punho na mesa e rindo com gosto – A gente pode ficar com ela, certo? Você quis ficar com o Peter, eu quero a menina. Assim a gente fica empatado.
- Ei, você passa mais tempo com o Peter do que eu – retrucou Steve, girando sua cadeira para ficar de frente para o colega – No fundo você está ficando com os dois, os dois pendem para o lado de tecnologia. Você está adotando todas as crianças sozinho.
- Qual é, você pode ficar com elas nos feriados, o que acha? – sugeriu Tony, sorrindo satisfeito quando Steve pareceu concordar com a ideia – ?
- Vocês são estranhos.
Fim
Nota da autora: EXTRA EXTRA, BOATOS DE QUE JESS GONÇALVES PERDEU O CONTROLE DE VEZ!!!
Tenho 23948239 coisas pra finalizar, eu sei, mas como poderia deixar essa belezura aqui ser esquecida na minha mente com perda de memória recente (sim, eu sou a Dori)??? Dá pra entender, vai.
Página da Autora: (Clique aqui para mais informações e saber as demais fanfics da autora.)
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