16- Bad angel, get off of my shoulder now
“I'm standing at the cross roads of Temptation and Salvation Street…”
[…]
Acordei com os latidos escandalosos de Stevie na manhã de segunda-feira, mas nem me importei. Me espreguicei na cama feito uma gata, deixando que os raios de sol entrassem pela cortina parcialmente aberta e aquecessem meu rosto. Depois de alguns instantes, virei a cabeça para o lado. Stevie estava deitado no chão, o rabo balançando animadamente e aqueles olhos cor de amêndoa me encarando.
- Bom dia, bebezão. – Sorri. O dálmata latiu em resposta, ficando de pé e pulando; depois saiu correndo para fora do quarto. Pelo visto ele só queria me acordar mesmo.
Desci da cama calmamente, sem me preocupar em calçar as pantufas no chão, e abri a janela.
- Bom dia, Jacksonville Beach. – Eu disse para mim mesma, seguindo para o banheiro em seguida.
Depois do sucesso dos meus planos na sexta-feira (tirando, é claro, a briga com Jasmine), eu estava muito feliz. A festa da fogueira tinha sido a mais divertida a que eu ia em muito tempo, e no dia seguinte eu tinha contado à e tudo sobre como eu havia ido parar no topo da pirâmide das líderes de torcida. não contou nada à sobre minha briga, e eu agradeci por isso.
- , ... Qual é o plano para hoje? – Perguntei a mim mesma escovando os dentes. Teria que descobrir, mas acreditava que não seria muito difícil com o rumo que as coisas estavam tomando. Exceto, é claro, que ainda exercia uma perigosa onda de sentimentos em mim. Mas eu acreditava, na verdade, que já estava ficando boa em controlar isso.
Desci as escadas ainda abotoando minha camiseta azul de botões – a mesma que eu tinha usado em meu primeiro dia de aula. Parecia ter sido uma eternidade atrás.
- Que cheiro é esse, pai? – Indaguei descendo as escadas. – Desde quando sabe fazer... – Mas parei no susto quando cheguei a cozinha. – Panquecas. Miguel?
- Acho que eu moro aqui agora, não é? – Ele moveu sutilmente a boca num sorriso que só alguém que o conhecesse há tanto tempo conseguiria perceber.
- Eu acho que pedi que morasse. – Concordei, entrando de vez na cozinha e me sentando à mesa. – Onde se meteu durante todo o final de semana?
- Você já estava dormindo quando cheguei do Roger’s na sexta, e tive que sair bem cedo no sábado para resolver uns assuntos em Fruit Cove. Voltei ontem à noite. – Ele colocou um prato com duas panquecas à minha frente. – Jack está dormindo.
- Era de se esperar. – Derramei um pouco de mel sobre as panquecas.
- Como foi no jogo? – Miguel se sentou ao meu lado com um prato também, enfiando um pedaço de panqueca na boca.
- Ah, Miguel, foi a coisa mais louca que já passei! – Fiz uma careta. – Elas me torturaram a manhã inteira, e depois inventaram que eu teria que ficar no alto da pirâmide... – Suspirei, cansada só de lembrar. – Mas depois disso, foi bem legal.
- Que bom. Sua amiga pareceu uma boa pessoa. Um pouco estranha, mas... – Deu de ombros. – Acredito que tenha encontrado seu namorado lá. Ele veio te procurar pra irem para a aula naquele dia, mas você já tinha saído.
- ? Nos desencontramos algumas vezes durante o dia, mas nos vimos na Fogueira.
- Sei. – Ele assentiu fixando aqueles olhos verdes intensos em mim. – Isso me lembra, ... Não havia algo sobre o qual você queria falar comigo da última vez que conversamos?
Olhei de volta para Miguel por alguns segundos, e então desviei meu olhar para as panquecas. Na noite de quinta-feira, eu realmente tinha cogitado a possibilidade de contar tudo a ele, mas agora não estava mais tão certa. Só de imaginar Jasmine indo até o Roger’s e revelando a verdade – e olhe que ela não sabia nem metade da verdade – eu tinha ficado maluca, e isso tinha me dado um choque de realidade. Talvez eu não quisesse que meu irmão de consideração soubesse a loucura que eu estava fazendo. Além disso, embora soubesse que Miguel não contaria nada ao meu pai, não queria fazê-lo mentir assim como estava fazendo com e . Isso só ia tornar aquela bola de neve maior.
- Na quinta-feira? – Me fiz de esquecida. – Não, não me lembro de nada. Devia ser uma bobagem qualquer. – Dei de ombros.
- Se é o que diz. – Miguel aceitou, mas continuou me encarando até que eu me sentisse uma pessoa péssima. E é por isso que ele não pode saber o que estou fazendo, pensei.
- Acho que alguém está me ligando! – Tirei o celular do bolso sem deixar que ele visse o visor, porque, é claro, eu estava mentindo. – Com licença.
Saí da mesa e corri para a sala de estar, ligando para na velocidade da luz.
- Você precisa vir me buscar agora.
- Mas, ...
- AGORA! – Falei alto demais, e depois baixei o volume da voz para um sussurro. – Eu preciso sair daqui antes que tudo vá por água a baixo. Ande logo.
Voltei para a mesa com um sorriso mais falso que os votos de felicidade no amor que papai fazia à mamãe nas datas comemorativas. Me sentei e terminei de comer as panquecas em silêncio, esperando que meu namorado mais falso ainda chegasse.🌴💚🌴
- Eu sempre soube que isso ia dar merda! – reclamava dentro do carro, enquanto procurávamos uma vaga no estacionamento da Jacksonville High. – Por que tinha que chamar o assassino para morar com vocês?
- Vocês precisam parar de chamar Miguel assim! – Repreendi. – E a culpa foi toda minha, eu sei. Mas eu só queria tê-lo por perto, não pensei realmente antes de falar!
- Tá. E agora, o que vamos fazer? – fez careta. – Como vamos falar sobre toda essa loucura na sua casa com Miguel lá vinte e quatro horas por dia?
- Ele não fica lá tanto tempo assim. Ele tem um emprego. – Lembrei. – Vamos dar um jeito. Eu vou pensar em algo.
- Ótimo. – bufou.
Estacionamos o carro bem ao lado de uma vaga vazia, mas quando abriu a porta, outro carro parou ao nosso lado a toda velocidade. Nosso amigo quase morreu de susto, e eu reconheci de imediato a BMW vermelha de Jasmine.
- É melhor ficar de olhos abertos, . – A morena disse ao sair do veículo. – Nunca se sabe quando um acidente pode acontecer.
ficou ali, recuperando o fôlego, enquanto ela passava e me lançava um olhar mortal – embora tenha dado um sorriso despreocupado. Reparei que, como ele mesmo havia previsto, ela estava usando uma blusa de mangas compridas.
- Eu perdi alguma coisa? – quis saber.
- Ela me odeia, não tem novidade alguma. – Respondi logo.
- É, mas parece que agora ela me odeia. – fez uma careta. Eu lhe lancei um olhar pra lá de significativo e ele assentiu discretamente. – Esquece isso, . Não importa. Só quero curtir minha popularidade muito provavelmente temporária em paz.
- Pensei que já tivesse feito isso ontem. – Dei risada, ajeitando a mochila e começando a andar. Eles me acompanharam. – Como foi o encontro com a Amber?
- Ah, o meu encontro com a Amber... – sorriu e suspirou. – Nunca pensei que eu diria isso a não ser que estivesse falando sobre um sonho ou uma situação muito hipotética.
- Se divertiram? – quis saber.
- Mas é claro que sim. – Ele respondeu como se fosse óbvio.
- Honestamente, , eu não sei bem como consegue se entender com a Amber. – Balancei a cabeça. – Quero dizer, sem ofensas, mas ela é meio...
- Devagar, eu sei. – assentiu. – Mas ela pode ser bem rápida para outras coisas que não sejam pensar. – Olhou para .
- Argh! – Eu o empurrei. – Me poupe dos detalhes, por favor.
E foi só falar no diabo para que ele aparecesse. Assim que colocamos os pés no corredor da Jacksonville High, Amber veio em nossa direção. Estava usando um short curto demais para os meus padrões, com uma blusa estampada e uma presilha de borboleta enfeitando o cabelo.
- Gatinho, você chegou! – Ela exclamou, puxando e dando um selinho nele. - ! – Ela sorriu. – Você está um arraso hoje. Seu cabelo está simplesmente incrível!
- Ah é? – Passei a mão pelo cabelo. – Obrigada, Amber.
- Ei, . – Ela acenou.
- E aí, Hayley.
- Você vai vir comigo agora, não vai? – Ela se voltou para de novo. – Os jogadores estavam falando sobre alguma coisa tática, acho que você deveria ouvir, agora que é um titular. – Ela riu, esfregando o nariz no dele.
ainda não parecia saber bem como interagir com a garota, mas assentiu.
- Acho que eu devia, não é? – Olhou para nós. – Tá, vamos lá.
Amber sorriu de orelha a orelha e saiu puxando o garoto.
- Eu senti tantas saudades! – Ainda a ouvíamos dizer.
Olhei para só para encontrar a mesma expressão que estava no meu rosto – a de quem estava prestes a vomitar.
- Nem me fale. – Ele disse antes que eu falasse qualquer coisa.
- Se era isso que eu fazia nosso namoro parecer antes, fico feliz que tenha me pedido para parar.
- Que bom que você entendeu. – sorriu, entrelaçando os dedos nos meus. Voltamos a andar.
- Quanto tempo acha que isso vai durar?
- Com o , nunca dá pra ter certeza. Mas é a primeira namorada dele, se é que eles estão mesmo namorando, então...
- Eu sou sua primeira namorada? – Ergui uma sobrancelha, curiosa.
- Não. Deve ser, sei lá, a décima.
Parei e o encarei, soltando sua mão.
- O que foi? – Ele riu. – Ficou com ciúmes?
- Você não me parece o tipo que sai com um monte de garotas, . – Desafiei.
- Você não passou muito tempo comigo antes da nossa mentirinha, passou?
Fiquei olhando para ele – que sorria, divertido – desconfiada. Eu realmente não achava que fazia o tipo pegador, mas então me lembrei de meus primeiros dias na cidade, antes da mentira, e como eu o achava irritantemente charmoso quando ele ficava implicando comigo, e o jeito como Jodi e Emma ficavam nervosas sempre que ele se aproximava de nós. Seria verdade então? Meu namorado de mentira era um galinha antes da minha chegada?
Antes que eu tivesse tempo de perguntar, meu celular vibrou, e o tirei do bolso para ler a mensagem.
“Venha para o ginásio AGORA”
Era Emma, e quase pude ouvir seu tom de voz mandão.
- Eu tenho que ir. – Falei para . – Emma está me procurando.
- Nos vemos depois, namorada. – Ele deu um sorriso torto e eu me afastei, ainda com aquela dúvida na cabeça sobre quem era realmente o garoto com quem eu passava os dias.🌴💚🌴
Quando abri as portas do ginásio da escola, avistei Emma, Jodi Lyn e Summer sentadas na arquibancada. Segui até elas desconfiada, pois as três me olhavam de um jeito muito animado para o meu gosto.
- Me procurando a essa hora da manhã? – Fui logo perguntando. – Não pode ser boa coisa.
- Acertou, querida. – Summer deu um sorriso enigmático, batendo no chão ao lado dela para que eu me sentasse.
- Nada pode ser pior que o que fizeram comigo na sexta. – Eu disse.
- Você sempre pode se surpreender. – Emma ergueu as sobrancelhas grossas.
Jodi puxou minha mão e começou:
- Certo, ... Acontece que... Você foi muito melhor na sexta-feira do que nós esperávamos. É sério. – Disse com seriedade. – Você foi desenvolta, foi ousada e conseguiu fazer perfeitamente o que ensinamos.
- Obrigada? – Olhei de soslaio para Summer, que assentia.
- Eu falei com a mãe da Maya ontem. – A baixinha continuou. – Parece que ela vai ter que ficar com o gesso na perna por algumas semanas ainda. Estávamos pensando se você não poderia... Substituí-la oficialmente até lá. – Jodi ergueu os ombros, dando seu sorrisinho de louca da torcida.
- Vocês ficaram doidas? – Não consegui conter meu espanto.
Tudo bem, eu tinha feito tudo certinho na tarde do jogo – eu até tinha me empolgado mais do que devia com aquelas estrelinhas (coisa da qual, por sinal, começava a me arrepender). Mas uma coisa era fazer aquele show por um dia, e outra bem diferente era assumir oficialmente aquele posto. Eu tinha ensaiado com as meninas; eu entendia agora. Líderes de torcida se esforçavam. Elas eram como atletas semiprofissionais com unhas perfeitamente bem cuidadas e brilho labial infinito.
- Você não pode nos deixar na mão! – Emma me ameaçou.
- Não, não, não, mocinha! Essa ameaça não vai funcionar de novo! – Avisei, e ela fez a cara de uma criança repreendida. – Antes vocês não tinham ninguém, mas agora tem tempo para encontrar outra garota.
- Mas nós queremos você! – Jodi choramingou. – Seremos, tipo, as quatro espiãs demais! As quatro panteras!
- Jodi Lyn está certa, . Nós queremos que você faça parte da equipe. – Summer se meteu. – Não só porque você aprende super rápido e tem o porte de uma líder de torcida, mas porque é nossa amiga. Além disso, seria ótimo para o plano. – Sorriu, tentando me animar. – As líderes de torcida e os jogadores passam um tempo considerável juntos, você sabe. Você estaria o tempo todo vendo o que acontece para me aconselhar e me ajudar com o Junior.
Abri levemente a boca, me dando conta daquilo por alguns segundos. Líderes de torcida e jogadores se viam o tempo todo, Summer estava certa. Até então, aquela era uma das poucas áreas em que eu não tinha acesso as interações dela e de – não sem que ela me contasse. O quão útil seria estar sempre de olho nos dois? O quão divertido seria deixar maluco com minha presença constante?
De repente, a ideia me parecia perfeita. Um pouquinho de treino e esmalte nas unhas e voilà! Eu estaria um passo mais próxima do meu objetivo.
- Pensando por esse lado, Summer... – Eu disse olhando para o nada. – Talvez não seja tão ruim assim. – Sorri.
As meninas me abraçaram, satisfeitas, e Sum agarrou minha mão.
- É, não é tão terrível. – Continuei. – Foi divertido na sexta-feira, então por que não? Pois bem. Eu aceito ser líder de torcida com vocês!
E elas comemoraram, sem fazer ideia dos mil planos que minha cabeça já maquinava.
🌴💚🌴
Na hora do intervalo, entrei feliz no refeitório e acenei para , que já estava sentado. Peguei minha comida me lembrando de que era uma atleta agora e precisava manter o peso. Nada gorduroso, como batata frita, poderia estar no meu prato. Agora eu entendia qual era a de Jodi e Emma com brócolis e filé de peixe.
Me sentei de frente para com um sorriso enorme, mas me lembrei depois que ele não podia nem desconfiar do que eu tinha em mente, e me contive um pouco.
- Que cara é essa? – Ele perguntou desconfiado.
- Essa cara? Pft, não é nada. Eu só... – Dei de ombros. – Sou oficialmente uma líder de torcida agora.
- Você o quê? – franziu o cenho.
- Era o que Emma queria comigo. – Tentei, mas não consegui conter o sorriso. – Meu desempenho foi tão bom na sexta-feira que elas querem que eu substitua Maya Burnes até a perna dela ficar boa.
- E você ficou feliz com isso?
- Feliz não... – Ponderei. – Mas as garotas precisavam de mim, e eu não sou de deixar meus amigos na mão.
- Seu pai vai ficar bem... Surpreso com essa notícia. Você? Fazendo exercícios e comendo... – Ele remexeu meu prato com seu garfo de plástico. – Brócolis, em vez de deitar no sofá com um balde de pipoca e assistir comédias românticas? – me lançou um olhar de quem não levava muita fé em mim.
- Para sua informação, eu adoro brócolis. – Enfiei um pedaço da coisa verde na boca. – Não duvide da minha força de vontade, .
Ele riu e balançou a cabeça, me encarando enquanto dava um gole em seu refrigerante. Era estranhamente divertido o modo como me conhecia tão bem em tão pouco tempo de convivência. Talvez estivéssemos mesmo passando tempo demais juntos.
- Onde está o ? – Perguntei, tentando partir meu filé de frango que mais parecia borracha.
- Amber o arrastou para algum canto logo que chegamos aqui. Algo sobre a comida do refeitório não ser saudável para um titular.
- Amber lá sabe o que é saudável? – Fiz uma careta, porque inteligência não era mesmo o forte dela.
- Ela pensa que sabe, pelo menos. – Ele deu de ombros. – Qual sua próxima aula?
- Na verdade, eu tenho uma reunião com o clube de teatro. Vamos falar sobre a Peça de Outono.
- É sempre O Mágico de Oz, e é sempre uma droga. – Me avisou.
- Muitas coisas estão mudando esse ano, . Talvez devesse se preparar para uma surpresa.🌴💚🌴
- Uma peça nova! – Foi a primeira coisa que ouvi quando entrei no auditório do colégio.
Veja só você, , pensei.
Os membros do grupo – felizmente eu já sabia os nomes da maioria – estavam apinhados em volta de Ed Miller, curiosos sobre a novidade. Me juntei a eles para ouvir.
- Nova? – Courtney perguntou surpresa. – Mas O Mágico de Oz vem sendo feito desde que eu tinha, sei lá, idade para lembrar!
- Eu sei! – Ed exclamou. – Não é fantástico? Ouvi dizer que é um texto original da senhorita Elizabeth.
- Isso é tão empolgante! – Ashley, que agora eu tinha notado que andava com a oferecida da Rosana Wayans, comemorou.
A porta do auditório rangeu e vimos a professora Elizabeth entrar acompanhada por Jasmine. A garota fez uma cara de poucos amigos ao passar por mim, e a professor sorriu para todos.
- Bom dia, meus monstrinhos! – Exclamou em sua voz musical.
- É verdade que vamos fazer uma peça nova? – Alguém no meio do grupo não conseguiu se conter e foi logo perguntando.
Elizabeth nos olhou divertida. Depois, com uma expressão misteriosa, fez sinal para que a acompanhássemos até o palco. Sentando-se no chão de pernas cruzadas, ela uniu as duas mãos e abriu um sorriso.
- Sim, Franklin, esse ano vocês farão uma peça nova no Halloween.
Todos começaram a falar ao mesmo tempo, se acotovelando entre comemorações e dúvidas.
- O roteiro é de minha própria autoria. – Elizabeth informou. – Achei que todos estavam cansados de assistir O Mágico de Oz, e, como sou nova aqui, decidi fazer algumas mudanças.
- É um alívio ouvir isso, professora. – Jasmine sorriu cinicamente. – Eu não aguentava mais fazer o papel de Dorothy.
Por algum motivo – um motivo bem óbvio talvez – eu tinha imaginado que Jasmine fazia o papel da Bruxa Malvada do Oeste, e não da garotinha boa e perdida. Mesmo me esforçando muito, eu não conseguia imagina-la dentro daquele meigo vestido azul.
- Soube de seu talento para o canto, Jas. – A professora sorriu para ela. – Garanto que ele será bem utilizado na nossa nova produção.
- Sobre o que é a peça, professora? – Courtney perguntou.
- Bom, eu vou trazer os roteiros para vocês ainda esta semana, mas em suma, a peça conta a estória de Ebony Purplewood, uma bruxa em um mundo fantástico, que quer usar sua magia para conquistar o amor verdadeiro...
Enquanto a professora explicava a estória, Jasmine me cutucou discretamente.
- Uma bruxa hen, Pie? – Sussurrou. – É bem a sua cara.
- ... Claro que testes serão feitos, então não precisam se preocupar com favoritismo dessa vez. – A professora terminou sua explicação.
Eu não tinha respondido a provocação de Jasmine, mas de repente, senti vontade de fazê-lo. Irrita-la só um pouquinho, para não perder o hábito.
- Achei a estória maravilhosa, professora. – Sorri para Elizabeth. – Espero realmente poder participar dessa peça, embora isso com certeza vá me dar certo trabalho, visto que sou oficialmente uma líder de torcida agora. – Disse inocentemente.
Vi os olhos de Jasmine se voltarem para mim de forma feroz no mesmo instante e me dei por satisfeita. Agora ela sabia da novidade, e eu tinha me divertido por um dia inteiro.
POV
Líder de torcida, era só o que faltava!
Eu balançava a cabeça, ainda tendo dificuldade para acreditar realmente naquilo – apesar de que, vindo de quem vinha a novidade, nada mais deveria me surpreender.
Vicentini Pie era definitivamente a garota mais inacreditável do mundo, e quando eu finalmente pensava que ela não poderia vir com nada para me assustar, lá vinha uma nova.
Eu não conseguia deixar de rir ao pensar em fazendo coreografias ensaiadas com Jodi e Emma quando ela, até quatro dias atrás, tinha horror à torcida organizada. Ela era mesmo muito maluca. E tinha ficado ridiculamente linda com aquele uniforme.
Suspirei, tentando tirar a imagem da cabeça, e entrei na sala da aula de Biologia. estava sentado no lugar de costume, o rosto pálido e uma expressão estranha nele.
- Por favor, diga que você tem algo de comer aí. – Ele falou de um jeito assustador assim que me sentei à sua frente. – Pode ser qualquer coisa, . Qualquer coisa.
- Não, não tenho... – O olhei preocupado. – Pensei que você tinha ido comer com a Amber.
- Aquilo não era comida, . – Ele disse sério, depois cobriu o rosto com as mãos. – Meu Deus, como sinto falta daquele chucrute do refeitório.
Enquanto sofria com sua fome, Rosana Wayans entrou na sala. Engoli em seco quando ela se sentou na cadeira ao meu lado e sorriu.
- Oi, . – Disse.
- Oi. – Dei um sorriso nervoso.
O senhor Ackles entrou na sala e outros alunos começaram a chegar.
- Ei, Ashley! – chamou. – Tem alguma coisa de comer aí?
- Ah, bom, eu tenho esta barrinha de cereal... – A garota ergueu o pacote. Em menos de um segundo, o tinha tomado das mãos dela.
- Serve. – Ele disse rasgando o plástico e enfiando a comida na boca. – Hm... – Fechou os olhos, saboreando. – É um manjar dos deuses!
Balancei a cabeça e me virei para frente, prestando atenção no que o professor começava a falar.
- Antes de tudo, quero avisá-los de que a reforma do laboratório acabou. – Ele informou, e ouve alguns murmúrios e reclamações, porque todos achavam muito mais fácil fofocar e enrolar com o dever na sala onde estávamos, que era mais ampla e dava menos destaque individual a cada um. – Ótimo, fico feliz que tenham gostado da notícia. – O professor fez uma careta. – Antes de mudarmos nossas aulas definitivamente para lá, no entanto, tem uma coisa que quero fazer com vocês aqui. Aconteceu um problema na copiadora e só metade das folhas foi impressa, então... Sentem-se com a pessoa ao seu lado.
Rosana abriu um enorme sorriso para mim, e eu prendi a respiração. A garota empurrou sua mesa para perto da minha, e eu vi fazendo o mesmo com Ashley. Quando ela colocou o imensa mecha de cabelo escuro atrás da orelha, percebi que de forma alguma eu conseguiria me concentrar no que quer que tivéssemos de fazer.
O senhor Ackles tinha nos entregado folhas onde havia paródias de músicas conhecidas, mas com a letra sendo trocada para informações sobre Biologia. Ele realmente andava parecendo cansado daquela turma – que era provavelmente uma das mais falantes da escola –, mas parecia disposto a fazer uma última tentativa de fazer algo divertido.
Enquanto ele escrevia algumas orientações no quadro, tomei coragem e me virei para Rosana – encostando nela o mínimo possível com a nossa proximidade. Ainda ficava nervoso quando ela estava por perto, mas sabia que queria fazer aquilo desde a semana anterior.
- Olha, Rosana... – Falei em voz baixa para que o senhor Ackles não me expulsasse da sala pela segunda vez no semestre.
- O que foi? – Ela olhou para mim.
- Eu queria... Eu tive a impressão de que você ficou um pouco sem graça quando a apareceu quando estávamos conversando, lá na Fogueira. E eu queria te pedir desculpas. Não queria que você ficasse constrangida sem motivo.
- Ah, é, eu fiquei um pouco. – Rosana assentiu tranquilamente. – Mas não precisa se preocupar com isso, . De verdade.
Sorri um pouco e movi a cabeça em concordância, feliz por finalizar o assunto. Mas Rosana ainda não tinha acabado.
- Além disso... – Disse, rabiscando em seu caderno. – está certa em ter ciúmes. Eu também teria se percebesse que uma garota bonita tem uma queda pelo meu namorado. – Sorriu, mas não me olhou.
Engoli em seco, mas não tive tempo – ou condições – de reagir, pois logo o senhor Ackles estava falando de novo. Mas eu não consegui ouvir bem.
Ela tinha mesmo dito o que eu havia entendido? Olhei para o lado, mas , morrendo de fome como estava, não parecia ter ouvido nada. O professor continuou falando:
- Como viram nas folhas que lhes dei, a Biologia pode ser muito mais divertida e... Artística – ele sorriu – do que parece. – Nós rimos. – Antes de mudarmos nossas aulas definitivamente para o laboratório, queria fazer algo diferente com vocês. Eis seu trabalho: vocês terão, junto com suas duplas, produzir paródias de músicas populares, falando sobre Biologia. Isso vai valer alguns pontos, então se esforcem e façam algo legal. As apresentações serão na próxima semana.
Não. Não. Não.
Eu não podia fazer nada em dupla com a Rosana justo agora. Por Deus, eu não podia nem ficar perto dela. Eu tinha dor de cabeça só de pensar no quão difícil isso seria.
- Na minha casa então. – Ela já estava dizendo antes que eu protestasse. E como eu protestaria afinal? Ela não tinha dito nada com clareza, o quão pretencioso e ridículo seria me recusar em público a fazer algo com ela?
A menina sorriu e me passou seu endereço, e eu estava definitivamente, absolutamente, perdido.🌴💚🌴
- Ah, cara, você está tão, tão, tão fodido... – dizia com a boca cheia de seu sanduíche de frango. Tínhamos parado na praia para comprar um depois da aula, já que não havia voltado conosco.
- Eu sei. – Bufei. – Eu não faço ideia de como vou conseguir fazer isso, . Eu não posso ficar sozinho com a Rosana, não posso.
Ele fez sinal para que eu esperasse e deu um gole em sua lata de refrigerante de uva.
- Ok, sabemos que ela é... Você sabe. Mas não é para tanto. – Disse. – É só um trabalho, você pode fazer isso, , sei que pode. Olhe para mim por exemplo: estive cercados de garotas bonitas que nunca peguei durante toda a vastidão do ensino médio. Não é difícil.
Eu assenti, embora tivesse achado aquele um péssimo exemplo.
- Se bem que... – deu de ombros, voltando a morder seu sanduíche. Eu o olhei de soslaio enquanto dirigia.
- Se bem que o quê? – Indaguei preocupado.
- Nenhuma daquelas garotas estava assumidamente afim de mim, não é, ? O que não é o seu caso. A Rosana deve ter planos.
- Planos? – Franzi o cenho e inspirei. – Do que você está falando? Que planos você acha que ela tem?
- Não se faça de inocente. Você sabe, ela está a fim de você e já deixou isso bem claro, e aí te chamou para ir à casa dela...
- Acha que ela quer alguma coisa comigo?
- Ah, , pelo amor de Deus! – Ele exclamou irritado. – É por isso que a consegue te meter em todas as mentiras que inventa. Para quem já saiu com muito mais garotas que eu, você é muito burro.
- É só que... – Inflei as bochechas, frustrado. – Rosana Wayans estudou com a gente nos últimos dois anos. Por que justo agora ela decidiu se interessar por mim?
- Porque as pessoas são assim, meu amigo. – deu de ombros, mais calmo. – Elas gostam do que não podem ter. Olhe só para você, suspirando pela .
Eu sabia que, por incrível que parecesse, estava certo. Rosana Wayans só estava interessada em mim agora porque eu tinha namorada, e por isso, parecia mais difícil de ser alcançado. A falha em sua filosofia estava na exemplificação. Porque a verdade, era que eu tinha caído de quatro por Pie bem antes de saber que ela estava fora do meu alcance.
Ou talvez, no fundo, eu sempre tivesse sabido. Será? Será que algo me dizia desde o início que ela não podia ser minha? Talvez eu tivesse ignorado o jeito como ela sempre parecia estar com a cabeça à milhas de distância quando nos conhecemos. O jeito como seus olhos sempre pareciam estar procurando por algo que não estava ali.
Talvez eu tivesse mesmo ignorado isso. Talvez eu ainda estivesse ignorando.
POV PIE
- Eu não estou absolutamente a coisa mais lindamente ridícula que você já viu? – Eu ria, girando em frente da câmera do computador para que Sofia me visse com meu mais novo uniforme de líder de torcida.
- Você está ficando completamente louca. – Ela balançava a cabeça.
- Ah, qual é, admita. – Insisti.
- Esse uniforme é ridículo, como qualquer outro uniforme de torcida. – Sofi bufou, apoiando o queixo teatralmente nas mão com as unhas pintadas de roxo escuro. – Lembra daquele tempo em que nós odiávamos essas coisas? Aquele tempo distante em que você era super inteligente, bem-humorada e normal?
- Eu ainda sou eu, Sofi. – Me sentei na cadeira em frente ao computador. – E ainda sou sua prima predileta e sua melhor amiga. Mas eu precisava fazer isso. Não tinha como dizer não.
- Bastava colocar numa frase as letras N, A, O e então um acento sobre a do meio.
- Muito engraçada.
Eu ainda não tinha contado a Sofia que tinha prometido ajudar Summer Olsen a reconquistar o , porque meus ouvidos doíam só de pensar no tamanho do sermão que ela me daria. Especialmente quando ela soubesse que eu não estava de fato ajudando ninguém além de mim mesma.
Antes que ela reclamasse mais, meu telefone tocou. Era Summer. Tirei o som do meu microfone, para que minha prima não conseguisse ouvir o que eu estava dizendo, e fiquei de pé para atender.
- Sum? – Sorri.
- Se arrume, nós vamos sair. – Ela disse.
- Nós? Nós quem?
- Você sabe, você é uma de nós agora. Eu chamei algumas garotas da torcida e uns rapazes do time para comemorar. – Imaginei a reunião, e só conseguia ficar feliz por Sofia não poder ouvir aquele negócio de você é uma de nós, como se fosse uma seita das líderes de torcida ou algo assim.
- Summer, não precisava fazer disso um evento. – Suspirei.
Honestamente, toda vez que Olsen fazia algo daquele tipo eu só ficava pensando no que seria da miserável vida de todos nós quando eu começasse a namorar de verdade com .
- Não é um evento, vamos comer tacos. – Sum disse. Havia um sorriso em sua voz. – Junior foi quem sugeriu. Ele ficou incrivelmente feliz e surpreso por saber que você era uma líder agora. Então aquilo tinha sido ideia de . Ele devia mesmo estar louco para olhar nos meus olhos enquanto eu explicava como tinha entrado para aquele seleto e bizarro grupo. Até imaginava sua expressão divertida, sua voz zombando de mim. “Quem diria, Vicentini!”.
- Tudo bem. – Concordei por fim. – Vou me trocar.
- Passo na sua casa daqui a pouco.
Encerrei a ligação e voltei ao computador, ligando o microfone de novo.
- O que deu em você? – Sofia fez uma careta. – Quem era no telefone?
- Minhas novas colegas de torcida. – Sorri maliciosamente. – Vamos sair para comemorar.🌴💚🌴
Depois de ter trocado meu uniforme azul e amarelo por uma bermuda jeans e uma regata cinza estampada, desci as escadas e encontrei com Summer, já preparada para buzinar. Fomos conversando pelo caminho rumo àquele lugar que eu ainda não conhecia.
- Vamos bastante lá, pelo menos quando eu estou na cidade. – Ela explicou. – Quero dizer, eu e Junior íamos bastante antes de... Você sabe.
- E você concordou em irmos justo lá? – Perguntei meio desconfortável. Eu não queria realmente ir ao point do casal mais famoso da Jacksonville High. Era estranho demais.
- É que comida de lá é ótima, e achei que também seria interessante para os nossos planos que Junior se lembrasse de como nos divertíamos quando estávamos juntos. Acha que foi burrice minha? – A loira me olhou parecendo insegura.
Na verdade, tinha sido uma jogada de mestre, o que era péssimo para mim. Se eu soubesse daquilo antes, teria sugerido que fôssemos à outro lugar.
- Não, eu achei uma boa ideia, pensando por esse lado. – Me forcei a sorrir. – Mas da próxima vez que ficar na dúvida, não deixe de me ligar. Sabe que estou aqui para ajudar.
Summer sorriu de volta, inocente como sempre, e não pude deixar de pensar que não era de se espantar que ela tivesse sido a melhor amiga de . Com aquele jeito dela, fazia perfeito sentido. Era fácil imaginar os dois sentados lado a lado rindo juntos ou ajudando cachorros necessitados pela rua.
Paramos perto da Las Chicas, a tal lanchonete de tacos, e descemos do carro. Assim que entramos no lugar – super colorido e alegre – avistamos Brad, Jodi, Emma, , Sienna Clark – a prima de Maya Burnes –, Teddy Moore – que era um dos garotos bonitos e gays da torcida –, Jasmine e sentados. Bufei de desânimo e irritação discretamente ao perceber que a infeliz garota de longos cabelos escuros estava lá, mas fiquei feliz por ver acenando com um enorme sorriso. Nos aproximamos da mesa e meu coração saltou no peito quando nossos olhos se encontraram.
- Bem, aqui estamos! – Summer sorriu, empurrando Teddy para o lado e se sentando. Me sentei ao lado dela, de frente para Jasmine e . – Pessoal, a mais nova integrante da torcida do Swordfish, Vicentini Pie!
Eles bateram palmas e senti o rosto esquentar um pouco.
- Parabéns, ! – Teddy esticou o braço por cima de Summer para segurar minha mão. – Eu não poderia estar mais feliz por você se unir a nós, por isso fiz questão de vir hoje. Honestamente, eu já sabia que não ia demorar para nos livrarmos de Maya e seus terríveis pés tortos. – Ele estremeceu, como se se lembrasse de algo traumático.
- Ei, não fale assim! – Sienna deu uma cotovelada no garoto.
- Seja honesta, Sienna, ela tropeçava até mesmo andando no chão liso. – Emma fez uma careta. riu.
- Vamos parar de falar da minha prima, tudo bem? – A garota disse exasperada. Depois sorriu, esticando bastante o braço para alcançar minha mão também. – Parabéns, . Apesar de tudo – olhou feio para Teddy – fico feliz que esteja conosco agora.
- Você foi muito bem na sexta, . – sorriu.
- Obrigada. – Eu disse a elas.
- Nunca pensei que poderia ir tão bem. – concordou, me lançando um olhar divertido. – Fale a verdade, já quis ser líder de torcida quando era criança, não é mesmo?
Eu o encarei por um segundo, sabendo que estava me provocando. sabia da minha repulsa pela torcida.
- Não, , nunca quis. – Respondi.
- Chamou ele de . – Jasmine me observou em voz alta, sorrindo tranquilamente. – Ninguém nunca o chama assim. Era como o chamava em Venice?
- Foi como me apresentei em Venice. – O garoto respondeu por mim, o que me deu um alívio indescritível. Dificilmente ele se metia quando eu Jasmine trocávamos farpas, era sempre Summer que me defendia primeiro. – . É o meu nome, Jas, caso não saiba.
- Só achei engraçado. – Ela disse apenas.
Deixando para lá o comentário, abrimos os cardápios e começamos a escolher, enquanto conversávamos sobre coisas variadas, como a Fogueira de sexta-feira e o próximo jogo, e as aulas da escola.
- Por falar nisso, onde está Amber? – Quis saber.
- Ela ia ao dentista. – Jodi explicou.
- E depois ia sair com a nova vítima, o garoto do gol milagroso. – Teddy ergueu as sobrancelhas.
- . – Summer sorriu. – Ele se chama .
Fiquei com pena do meu amigo. Amber parecia muito mais grudenta do que qualquer um de nós teria imaginado.
- Onde está seu namorado, ? – Sienna questionou.
- Ah, teve que ir fazer um trabalho de Biologia com alguém. – Respondi.
- Ele é músico, não é? – Teddy parecia curioso. – Bem, isso é tão interessante. Ninguém aqui namorou um músico. Como é? Ele fica, sei lá, cantando para você?
- Ele canta às vezes. – Não pude segurar o sorriso. Com o canto do olho, vi a expressão de irritação surgir no rosto de .
- Vou querer a enchilada de carne. – informou ao garçom que acabara de chegar.
Todos nós fizemos nossos pedidos e, quando o rapaz se afastou, percebi que Junior continuava parecendo nada feliz.
A comida era mesmo deliciosa. Eu havia pedido um taco de camarão coberto com guacamole, e era quase como estar de volta ao Novo México, quando eu era pequena e andava agarrada aos calcanhares de Miguel pela cidade. Precisava mostrar este lugar a ele depois. Ele ia adorar.
Depois de termos nos fartado com a parte salgada do cardápio, pedimos as sobremesas. Enquanto as mesmas ficavam prontas, me levantei para ir ao banheiro. Percebi que estava tentando se aproximar de Emma, apesar de ela zombar dele o tempo todo e tentar cortá-lo. Mas ele parecia mesmo empenhado em fazê-la não o achar um idiota, o que era meigo, para ser sincera.
Bem perto da porta do banheiro, havia uma janela um pouco maior que o normal. Talvez fosse estratégico dos donos do local coloca-la perto da porta do banheiro, porque, você sabe, não havia como qualquer cheiro ficar preso desse jeito. Mas, estranhamente, reparei que a vista dali era muito bonita – direto para o mar de Jacksonville Beach, que parecia quase mágico batendo nas pedras, iluminado pela lua. Parei ali por um instante, apoiando os braços no beiral, assistindo silenciosamente aquele espetáculo.
- Pensei que tivesse batido a cabeça na pia e desmaiado. – Ouvi a voz de atrás de mim.
- Sim, mas aí me levantei e vim aqui para tomar um ar. – Devolvi a brincadeira, dando um passo para o lado e permitindo que ele se apoiasse no beiral também.
riu e balançou a cabeça, olhando para fora. Ficamos calados por um tempo ali, só assistindo o vai-e-vem das ondas.
- Isso me lembra nossa última noite em Venice. – Ele disse de repente.
E era verdade. Aquela noite linda e incrivelmente triste em que tínhamos comido brigadeiro de panela queimado e nos beijado. Aquela noite que parecia ter sido há anos atrás, com duas pessoas completamente diferentes.
- Estava tudo assim mesmo, não é? – Perguntei baixinho. – O mar estava bonito.
- E você estava indo embora.
Me obriguei a engolir o nó que surgira em minha garganta ao lembrar daquilo. Não, não era isso que eu tinha que fazer. Não era a lembrança que eu queria que ele tivesse, de como tínhamos nos separado. Ele precisava se lembrar de como éramos bons juntos, de como tudo tinha sido maravilhoso.
- Você se lembra do bar da Alice? – Perguntei de repente. olhou para mim, um brilho novo e malicioso nos olhos.
- E o fingindo que tinha idade para beber? – Arqueou uma sobrancelha. – Como esquecer?
- “É sério, eu estou de férias da faculdade!”. – Eu ri.
- Ridículo! – estava gargalhando agora.
Parecia que cada vez que nos olhávamos sentíamos vontade de rir mais e mais, nos lembrando daquela que era só uma das nossas histórias juntos. E eu sabia que ele estava pensando o mesmo que eu. Nós tínhamos uma história juntos. Não havia como deixar tudo aquilo para trás – todas as nossas aventuras e encrencas, e fugas no meio da noite.
Mas toda a magia daquele momento foi cortada de repente por uma voz.
- Ei, Junior! – Era Summer. – Junior, venha ver isso!
Nos olhamos por um instante, tentando nos desvencilhar daquele sentimento nostálgico, e eu o segui de volta para onde os outros estavam. Não estavam mais sentados à mesa, e a sobremesa ainda não havia chegado. Em vez disso, todos se reuniam em volta de uma parede onde havia várias fotos pregadas.
- Olhe só, somos nós no aniversário do Patrick! – apontava encantado.
empurrou as meninas para se aproximar.
- Patrick. – Ele sorriu. Então se virou para mim: – É o meu irmão mais velho. – Explicou.
E eu percebi que não sabia que ele tinha um irmão. Havia outras fotos de fregueses espalhadas pela parede, e logo o dedo de Summer estava sobre uma.
- Aqui, somos nós! – Ela o puxou para olhar uma foto lá embaixo. – No nosso aniversário de um ano de namoro.
olhou a foto como se mil lembranças se passassem por sua cabeça, e depois sorriu ternamente para Summer, que sorriu de volta.
Era difícil admitir e difícil ignorar, que, na verdade, eles também tinham uma história juntos. E ela provavelmente sabia que ele tinha um irmão mais velho, não é? E conhecia os pais dele. Ele devia saber qual era a comida preferida dela, e ela devia sair com ele e o tempo todo. De repente, meu estômago se contraiu. Eu era só uma estranha naquele paraíso em que eles viviam. Uma intrusa. Meu breve e feliz verão não era nada se comparado aos anos de namoro de Summer e Junior, a todo aquele tempo em que eles haviam vivido sem mim.
- Ei, . – Jasmine apareceu atrás de mim com um sorriso, como se tivesse percebido minha expressão de dor e quisesse reforçar isso. – Alguém me disse que viu seu namorado entrando na casa de Rosana Wayans há algumas horas. Eu não sabia que ela era a dupla dele, mas ultimamente eles tem parecido bem próximos, não acha?
Então estava fazendo um trabalho de Biologia na casa de Rosana Wayans?
Por que ele não tinha me dito? Respirei fundo, fechando os olhos. Estava com raiva agora, e nem sabia o porquê, já que era só um maldito trabalho, mas estava.
Meu estômago terminou de revirar. Pedi licença e voltei para o banheiro, bem na hora que o garçom apareceu com nossas sobremesas.
POV
- ! – Rosana sorriu ao abrir a porta. – Pode entrar. – Ela deu um passo para o lado, e eu caminhei para dentro da grande casa.
Parecia mais uma casa cenário de um seriado qualquer. Era espaçosa, bem decorada e havia fotos nas paredes. Uma delas era de Rosana ainda pequena ao lado de outras três crianças negras – dois meninos e uma garotinha ainda menor que ela.
- Meus irmãos. – Ela respondeu minha pergunta silenciosa. – Benny, Mike e Kendra. Os dois já estão na faculdade, ela está no fundamental.
Sorri, ainda sem me sentir tão confortável assim, mas feliz pela conversa estar até então num rumo normal.
- Vocês se parecem. – Apontei para uma foto dela com a mãe.
- Todo mundo diz isso. Mas herdei o gênio do meu pai.
Engoli em seco. O senhor Wayans era juiz. Um dos mais assustadores, pelo que diziam na escola.
- Legal. – Assenti.
- Ah, você trouxe o violão! – Ela percebeu finalmente a bolsa do objeto pendurada em minhas costas. – Vamos lá para cima, é mais confortável.
Respirei fundo, tentando não pensar em todos os absurdos que tinha falado desde que tínhamos recebido à notícia do trabalho. Ele realmente, realmente tinha tentado tornar aquele o momento mais desastroso da minha vida.
O quarto de Rosana era lilás e branco, grande, com um pôster dos Lakers na parede e alguns outros espalhados. Ela se sentou num salto na cama alta encostada à parede. Olhei para ela, e então me sentei no chão. A garota riu, balançando a cabeça.
- Está com medo de mim, ? – Ergueu uma sobrancelha.
- Medo? Eu? – Franzi o cenho, encarando a capa do violão que abria em vez de olhar para ela. – Claro que não, Rosana.
- Ótimo. – Ela desceu da cama e sentou ao meu lado no chão. Bem perto de mim. – Porque temos muito trabalho para fazermos juntos.
E de repente, as teorias malucas de não pareciam mais tão malucas.🌴💚🌴
- Ok, então monossacarídeo vai rimar com nucleotídeo e... Voilà! – Ela comemorou. – Temos Yellow Submarine versão Biológicas.
- Ou, como prefiro chamar, Eles não fazem digestão. – Sorri. Rosana riu, tocando meu braço.
- Viu só? Somos bons juntos. E você é um músico incrível. Você compõe?
- Obrigado. E sim, eu componho às vezes.
- Quem sabe você não está afim de me mostrar uma das suas composições hoje? – Ela me encarou. Depois de um segundo, desviei o olhar.
- Claro, por que não? – Dei de ombros, nervoso.
- Ótimo. – A garota não pareceu decepcionada por minha quebra de contato visual. Infelizmente. – Eu vou lá embaixo arrumar alguma coisa para comermos, e então você canta algo para mim.
Rosana saiu do quarto e eu fiquei ali, sem saber bem o que fazer em seguida. Tínhamos terminado a música, e agora a situação ficava simplesmente muito estranha. Depois de tudo que vinha acontecendo, estávamos ali, sozinhos naquela casa gigante, no cair da noite. Onde diabos estava o juiz Wayans quando eu precisava que ele chegasse irritado e com ciúmes da filha?
Tentei ligar para , mas só caía na caixa postal.
- Maldição, ! – Exclamei, bem na hora que Rosana apareceu à porta.
- Falou comigo? – Ela pareceu confusa.
- Não, eu só estava... – Dei uma risada nervosa. – Pensando alto.
- Então tá. – Ela entrou de uma vez. Havia uma bandeja em suas mãos, onde estavam dois sanduíches embrulhados em plástico e dois copos do que parecia ser suco de laranja. – Minha mãe deixou isso pronto antes de sair. Não tem gosto de nada porque, você sabe, ela é médica e é super saudável. Mas dá pra comer.
Ávido por não entrar em nenhum assunto perigoso, comecei a desembrulhar meu sanduíche, mas Rosana segurou minha mão.
- Calma. – Disse. – Por que não toca uma música para mim antes?
- ... Tá. – Assenti.
Peguei o violão e toquei uma das minhas composições mais antigas, de quando eu tinha uns catorze anos. Era sobre uma garota bonita numa festa barulhenta. Era péssima.
- Mas eu gostei muito! – Rosana ria, mas parecia estar sendo sincera.
- Eu era muito fedelho quando fiz isso. – Falei, já mais calmo. A música sempre me tranquilizava. – Graças a Deus consigo fazer coisa muito melhor hoje em dia.
- Eu adoraria ouvir qualquer dia desses. Você podia me convidar para ir aquele lugar onde toca. – Sugeriu casualmente.
- O Roger’s. – Sorri um pouco. – É legal lá.
Rosana sorriu de volta, parecendo quase só a garota com quem eu tinha estudado aquele tempo todo – a que não tinha queda nenhuma por mim e só falava comigo uma vez por semana.
Mas quando eu menos esperava, seu nariz já estava colado ao meu e ela estava quase conseguindo me beijar.
No impulso, me arrastei para trás, e Rosana quase tombou. Ela me olhou de cara feia.
- Eu... – Gaguejei, pegando o violão e a bolsa no chão. – Preciso ir agora. Foi legal... Hoje.
Saí andando, e ela se colocou de pé, parecendo frustrada.
- Mas você nem tocou no seu sanduíche... – Tentou me convencer.
- Sei lá, acho que estou sem fome. – E eu já estava descendo as escadas então, seguido por ela.
- ...
- A gente se vê na escola! – Exclamei, andando o mais rápido possível e entrando no meu carro.
Eu era o cara mais burro de todos os tempos. Uma gata como Rosana Wayans estava ali, fazendo de tudo para ficar comigo, e aí eu fugia dela quando ela tentava me dar um mísero beijo?
Está certo. Por causa da , uma vozinha no fundo da minha cabeça dizia.
Porque eu era parte do teatro maluco dela, porque eu não podia deixa-la na mão e deixar que todo mundo pensasse que eu a tinha enganado.
Mas era mais do que isso.
A verdade era que eu não conseguia ficar com Rosana porque eu não conseguia parar de pensar em . Não só em todas as farsas insanas dela, mas nela. Em suas caretas e comentários irônicos e sua risada e em como cantava mal, e em nosso beijo na sexta-feira. Ficar com outra garota parecia simplesmente... Errado.
- Burro! – Xinguei a mim mesmo, dirigindo para casa e me lembrando de que, enquanto eu estava ali bancando o trouxa, estava com seus novos amigos e, para melhorar a situação, com , seu eterno amor de verão, em algum lugar da cidade. – Você é um burro, ! – Exclamei de novo. – Ela não é sua namorada de verdade, por que tem que ser tão patético?
Eu era mesmo um grande idiota.
POV PIE
Depois de ter passado mal no banheiro do Las Chicas, eu havia remexido minha sobremesa no prato sem conseguir realmente comê-la. Jodi perguntou se eu estava bem, e confessei que não, então ela e Brad me levaram para casa mais cedo. Os dois pareciam estar começando a ter alguma coisa, e eles eram muito fofos, e Brad era um amor com ela. Isso só piorou minha situação.
Psicológico ou não, a questão era que eu tinha vomitado meu delicioso taco no banheiro de casa durante a madrugada, e papai ficou realmente preocupado, cogitando me levar ao hospital.
- Acho que não tem necessidade disso. – Miguel balançou a cabeça, abaixando-se ao meu lado e segurando meu cabelo. – Você bebeu ou algo assim, ?
- Eu n... – E então vomitei de novo. – Não... Bebi.
- A comida mexicana deve ter te feito mal, querida. – Papai disse. – Vou preparar um chá para o estômago.
Eu teria protestado, porque os chás de papai eram horríveis, mas não consegui. Estava muito ocupada botando tudo para fora.
Depois de escovar os dentes, tomar um banho e tomar aquela mistura verde horrorosa, Miguel e papai me colocaram na cama. Eu dormi feito uma pedra, me sentindo horrível, e acordei na manhã seguinte mais desanimada do que nunca.
- Você não precisa ir à escola, meu bem. – Papai disse, conferindo se eu estava com febre. Não estava. – Não hoje, se não quiser.
- Vou ficar por aqui mesmo. – Me virei para o lado e dormi de novo. Talvez não fosse psicológico. Talvez eu estivesse mesmo com uma intoxicação alimentar ou algo assim.
Por todo o dia, Miguel ficou cuidando de mim. Ele podia não fazer o tipo carinhoso em excesso, mas me oferecia comida e a servia para mim, e perguntava como eu me sentia e carrega as coisas por mim. Eu estava feliz por ele estar ali conosco. Papai também deu um jeito de se livrar do Roger para ficar em casa, e me paparicou o dia todo.
Eu não queria ver , porque estava brava com ele, então pedi a Miguel que o espantasse, caso ele aparecesse ali. Ele quis saber o motivo, e eu disse vagamente que tinha mentido para mim sobre a pessoa com quem faria um trabalho, porque sabia que eu não gostava de Rosana. Não era de todo mentira, embora não fosse de todo verdade. De todo modo, Miguel manteve longe de mim, o impedindo ameaçadoramente de entrar no meu quarto quando ele foi à nossa casa.
Na quinta-feira, quando acordei, já estava me sentindo bem melhor. O que era ótimo, porque eu precisava voltar à escola. Tinha um plano para fazer funcionar.
Afinal de contas, é claro que eu não tinha desistido. Uma foto em um mural não seria suficiente para me deter.
Eu só precisava colocar a cabeça no lugar e continuar de onde havia parado.
- , telefone para você. – Miguel disse quando desci as escadas.
Eu tomei o telefone das suas mãos e atendi.
- Ei, mocinha. – Era Summer. – Estou ligando para saber se está se sentindo melhor.
Eu havia respondido uma mensagem de Jodi no dia anterior falando que estava me sentindo mal, e ela, claramente, havia contado à Olsen.
- Oi, Summer. – Respondi. – Estou sim, obrigada por perguntar. Já ia tomar o café-da-manhã para ir à escola.
- Não se dê ao trabalho. Hoje é a feira de ciências do primeiro ano, esqueceu? – Disse. – Ninguém vai realmente estudar, você não precisa se cansar à toa.
- Ah é? – na minha antiga escola, as pessoas estudavam sempre, mas foi bom saber daquilo. – Certo, então não vou.
- Pensei que eu poderia te visitar hoje à tarde. Levar o dever de casa de História para você e bater papo.
- Claro, você pode vir.
- Combinado então, eu passo aí à tarde.
Nos despedimos e eu contei a Miguel que não ia à escola. Mesmo vendo que eu estava melhor, ele passou a manhã em casa, garantindo que eu tomasse o soro caseiro para ficar hidratada e não fizesse esforço demais. Papai também ficou mais tranquilo por ver que eu estava bem, mas insistiu que me levaria dali a alguns dias para fazer exames de rotina. Não pude discutir, pois era evidente que ele estava muito satisfeito por desempenhar o papel de responsável por mim outra vez.
À tarde, tirei as coisas do armário e comecei a preparar a massa do bolo que faria para receber Summer. Mamãe e eu gostávamos bastante de inventar moda na cozinha, então qualquer coisa era uma desculpa para isso. Suspirei, sentindo falta dela, e então ouvi à porta bater. Miguel tinha saído havia pouco para resolver alguma coisa, e por um instante pensei que ele tinha esquecido alguma coisa, quando ouvi os latidos escandalosos e alegres de Stevie.
parou à porta, uma expressão que ficava entre a dúvida e a preocupação no rosto.
- Como você está? – Indagou.
- Estou melhor. – Dei de ombros.
Ele soltou o ar, entrando de vez na cozinha.
- Miguel não me deixou te ver ontem. – Recostou na bancada. – Tipo, ele realmente me proibiu.
- Eu não queria que você pegasse minha virose.
- Você parece bem agora.
- Acho que vomitei o vírus.
- Que nojo. – Ele riu um pouco, mas me pareceu um riso desconfiado, inseguro talvez.
, . O que ele havia aprontado?
- Como foi o trabalho de Biologia? – Perguntei casualmente.
me encarou por um instante, abriu a boca, e então inflou as bochechas.
- Foi bem... – Respondeu. – Nós praticamente já terminamos.
- Legal. – Dei um sorriso falso. – Você não me disse quem era sua dupla.
- Minha dupla é a... Rosana. A Wayans.
- Claro, que outra poderia ser? – Tentei não parecer tão irritada quanto realmente estava, mas sem dúvida não deu tão certo, porque me olhou de um jeito um pouco assustado.
Era estranho, mas eu estava estranhamente decepcionada com . Ele era basicamente o garoto que me fazia acreditar que ainda havia caras honestos no mundo, e de repente ele não me contava que estava indo à casa da Safada Wayans, e isso era tão... Eu estava brava, e não conseguia evitar, e isso só me deixava mais brava.
- Eu só soube que você tinha passado mal ontem, sabe? – Ele falou. – Eu cheguei cedo da casa da Rosana na terça. Vim assim que acabamos o trabalho. Você não tinha voltado ainda.
Olhei para ele por um instante, estudando sua expressão. Ele parecia preocupado com minha cara de louca possessiva, mas sincero. De repente, me senti muito boba. não mentiria para mim; ele realmente só não tinha contado sobre Rosana porque sabia que eu não gostava dela. Para ser sincera, não era bem que eu não gostasse dela, era só que... Eu não gostava dos dois juntos. Era difícil explicar de um jeito racional.
Percebi que era nos dois que eu estava pensando quando vomitei na terça-feira.
- Você não precisa... – Suspirei, minha raiva se esvaindo um pouco. – Não precisa se explicar. Está tudo bem.
assentiu e ficamos calados, um do lado do outro, mas sem nos olharmos.
- Rainbow... – Ele disse depois de algum tempo. Havia um sorriso em sua voz, embora ele não estivesse me olhando ainda. – Você é a segunda.
- Hum? – Ergui as sobrancelhas, me virando para ele.
- Você é minha segunda. – Ele me olhou e sorriu tímido. – Minha segunda namorada.
O sorriso se espalhou pelo meu rosto de um jeito tão natural que quase não percebi. Um sorriso de conforto. E de curiosidade.
- Quem foi a primeira então?
- Leslie Takagui. No segundo ano. Ela era da banda do time. Durou alguns meses.
- Takagui? Ela era japonesa? – Fiquei realmente surpresa. – Não me lembro de ter ouvido esse nome antes. – Observei franzindo o cenho.
- Os pais eram. – Ele contou. – Ela se mudou para Boston, por isso terminamos. Mas acho que terminaríamos de qualquer jeito. – Deu de ombros.
- Sinto muito.
- Está tudo bem. Se quer saber, eu gosto bastante da minha nova namorada. – Sorriu. – Quase mais que da Les.
- Quase? – Provoquei.
Nós nos encaramos e sorrimos, e me lembrei de meu primeiro dia na Flórida, quando tive medo de ficar sem ter o que falar com ele, mas descobri que o silêncio entre nós dois não era constrangedor, mas estranhamente tranquilo e gostoso, como se já nos conhecêssemos.
Agora, no entanto, era diferente.
Agora já nos conhecíamos de verdade. Mas, às vezes, quando olhava para , parecia que era o contrário. Que havia mil coisas que eu não sabia sobre ele – como aquela, que ele tinha acabado de revelar. E seu cabelo... Talvez ele parecesse mais escuro agora do que quando nos conhecemos. Por quê? Talvez eu tivesse fantasiado que era mais claro, porque afinal, pessoas que moravam perto da praia deveriam ter o cabelo mais claro, não é? Mas o dele era diferente. Eu nunca tinha sentido tanta vontade de tocar seu cabelo antes.
- Meu Deus! – Exclamei quando algo passou correndo pelo meio de nossas pernas.
Stevie. Stevie correndo feito um pouco.
E se tínhamos cambaleado com sua passagem, isso quer dizer que estávamos próximos demais. Quando tínhamos nos aproximado tanto?
engoliu em seco, olhando para tudo menos para mim. Então seus olhos encontraram Stevie, e ele magicamente voltou a sorrir.
- Já estava esperando, não é, garoto? – Ele se abaixou para brincar com o cachorro, que veio correndo ao seu encontro.
Stevie latiu em resposta, tentando sem sucesso lamber o rosto de . Ele riu.
- Na verdade, eu vim buscá-lo para passear. – O garoto disse.
- Ah, claro, tudo bem. – Assenti rapidamente.
Alguém bateu à porta de entrada e ele se colocou de pé.
- Acho que é a Summer. – Informei. – Ela vinha me ver hoje.
- Eu atendo. – Ele disse.
saiu da cozinha, e percebi que tinha deixado o celular sobre a bancada. Ia deixa-lo ali, mas então o aparelho fez um barulho. Toquei a tela rapidamente.
1 mensagem. R. Wayans.
Arqueei uma sobrancelha.
Devia ser algo sobre o trabalho, não é? Não haveria mal em dar uma olhada.
Stevie, que tinha ficado ali me observando, resmungou.
- Não tem nada demais em ler um recadinho. – Eu disse a ele. – Deve ser sobre o...
, sei que não nos encontramos ontem, mas queria conversar com você sobre o que aconteceu na terça-feira.
Estou no quiosque de sucos da Praia da Âncora.
Não me deixe esperando.
MAS O QUÊ?
O que diabos havia acontecido na terça-feira?! De repente, eu estava brava de novo. De repente, eu não gostava mesmo de Rosana. Fazer um trabalho em dupla era uma coisa, mas ali estava ela, insistindo em perseguir o garoto que teoricamente era meu namorado!
- Ops. – Eu disse, apagando a mensagem. Stevie latiu para mim. Mostrei a língua para ele, que saiu correndo para fora da cozinha.
Rosana ia ter o encontro que ela queria, mas com certeza não seria com .
Coloquei o celular de volta na bancada e calcei meus chinelos, indo para a sala. Lá estava conversando alegremente com Summer. Ótimo. Ele ficaria ali mesmo.
- Summer! – Sorri e dei um abraço nela.
- . – Ela sorriu também. – Já está se sentindo melhor?
- Sim, bem melhor. – Garanti. – Por sinal, estava fazendo um bolo para nós, mas o fermento acabou. Eu vou comprar mais e volto num instante. Por que não faz companhia a Sum, ?
- Mas eu ia levar o Stevie para dar uma volta. – Ele lembrou.
- Eu levo o Stevie. – Abaixei e prendi a corrente à coleira dele. – Não vou demorar, não se preocupem.
E antes que eles tivessem tempo de falar, eu já estava na rua.🌴💚🌴
Como estava mesmo com pressa, deixei que Stevie corresse. Ele aceitou, feliz, a liberdade, e eu tive que me dobrar para segui-lo, mas não me importei.
Só queria chegar à Praia da Âncora, encontrar aquela garota e acabar com aquilo. Meu coração batia forte. Eu nunca tinha começado uma discussão por um motivo tão idiota quanto um garoto em Denver, mas parecia que isso estava se tornando um hábito em Jacksonville Beach. Em uma semana Jasmine, na outra Rosana. Não que eu tivesse começado a briga com Jasmine, mas provavelmente não poderia evitar isso com Rosana.
Não que eu fosse sair no tapa com ela, obviamente. Não, não era assim que eu trabalhava.
Assim que me aproximei do quiosque, avistei a garota. O cabelo preto voava com o vento marítimo, e ela estava sentada à uma das mesas. Estava usando uma regata branca, com as alças do sutiã azul aparecendo. Várias garotas da cidade se vestiam desse jeito, então quando aquele estilo tinha se tornado tão vulgar para mim? Argh.
Segurei com mais força a coleira de Stevie, obrigando-o a se comportar, e dei a volta ao lugar, passando casualmente na frente dela. Então a encarei, como se tivesse acabado de vê-la.
- Rosana! – Exclamei alegremente.
- . – Ela arregalou os olhos, parecendo confusa, preocupada. Ela olhou para os lados, como que procurando outra pessoa. – Tudo bem? – Tentou soar educada.
- Ah, sim, estou ótima. – Sorri. – E quanto à você? Que coincidência te encontrar aqui. Se importa se eu me sentar? – Puxei a cadeira à sua frente.
- Na verdade, eu estou... – Ela ia dizer, mas eu já estava me sentando.
Sorri feito um louca e dei de ombros. Rosana estava me encarando estupefata, sem entender direito. Ela olhou para Stevie, sentado no chão, e sua expressão passou para o pânico. Então a falsiane tem medo de cachorros?
- Desculpe, ia dizer que estava esperando alguém? – Me fiz de desentendida.
- É, eu meio que...
- Não precisa nem terminar. – Eu cortei. – Sei quem está esperando. Está esperando . O meu namorado.
Primeiro a expressão de Rosana foi de espanto. Depois, sua boca se fechou. Ela sorriu.
- Certo. – Disse segura. – Eu estou esperando o . O seu namorado .
- Sua segurança ao dizer isso é adorável. Como se eu não pudesse te afogar nesse mar agora mesmo. – Observei.
Rosana abriu a boca para falar, uma cara indignada, mas eu continuei:
- Escute aqui, Wayans, eu sei o que está tentando fazer. Sei o que está se passando pela sua cabeça, mas vou logo te adiantando que não vai funcionar.
- É o que pensa? Que eu não tenho chance nenhuma com o ? Porque eu acho que está enganada, Pie. Sei que ele me acha atraente, ele...
- HAHA, ENTÃO ELE TE ACHA BONITA? – Gargalhei. – E o que acontece agora? Vocês fogem e se casam em Vegas? Você não pode ser tão sem noção assim, Rose.
- Já é alguma coisa. – Ela ergueu uma sobrancelha, confiante.
- Já seria alguma coisa, Rosana, se não fosse pelo fato de que ele é meu namorado. E não importa o que você diga ou faça ou pense. Você não importa para ele como eu, não o conhece tão bem quanto eu, e definitivamente não gosta dele tanto quanto eu! – E tudo saiu de forma tão natural que eu nem precisei pensar, o que me pegou de surpresa.
De onde tinha vindo aquilo tudo?
- Isso é ridículo. – Ela bufou. – Você nem gosta dele de verdade.
Certo. De onde tinha vindo essa agora?
- De onde você tirou isso? – Perguntei com cautela.
- Jasmine Torres me disse. – A garota cruzou os braços em frente ao corpo. – Ela me garantiu.
Fechei os olhos por um instante, amaldiçoando Jasmine com todas as minhas forças.
DESGRAÇADA. Não bastava desconfiar de que eu gostava de , ela também estava tentando boicotar meu namoro com !
Ou estava tentando estragar a mentira que achava que tínhamos inventado.
- Ok... – Murmurei, respirando fundo, e então a encarei com toda a intensidade possível. – Eu quero que isso fique bem claro pra você agora: Jasmine estava errada. Ela não sabe nada sobre e eu, obviamente, porque eu adoro meu namorado. E eu quero você longe dele.
- Ah é? E o que você...
- Pra começar, vou te bater até você desejar que sua mãe fosse uma cirurgiã plástica e não uma cardiologista. – Ameacei. Ela me olhou surpresa, horrorizada.
- Você não pode...
- Depois, quando eu tiver acabado e nenhum garoto nesse mundo aguentar mais olhar para sua cara arrebentada, especialmente o meu garoto, eu vou espalhar para essa cidade inteira que você é uma maldita ataca-namorados. Na verdade, vou espalhar para o estado, o país inteiro. Vou subir no palco em todos os shows do meu pai e dizer.
Rosana ficou me olhando, tentando parecer segura, mas evidentemente nervosa. Ela nunca devia ter sido ameaçada na vida.
- E se as ameaças futuras não te assustarem o suficiente, ou se você achar que não terei coragem para tanto... Está vendo meu lindo cachorrinho? – Passei a mão pela cabeça de Stevie, que latiu bem alto. Rosana estremeceu. – Nunca se sabe quando ele vai se soltar acidentalmente. Fui clara?
Depois de um instante emburrada, a garota assentiu.
- Ótimo. – Sorri. – E claro, se eu suspeitar de que você contou ao sobre essa conversa, não vou esperar você dar em cima dele para cumprir minhas ameaças.
- Você é uma falsa cínica!
- Pode até ser verdade, mas em quem você acha que ele acreditaria? Na doce , ou na garota que vem atacando ele dia após dia? Não seja bobinha, Rose.
Rosana não respondeu, mas pela sua cara estava bem claro que ela não contaria.
Me levantei e puxei Stevie, mas então me lembrei de algo que me perturbaria se eu não soubesse.
- Mais uma coisa. – Me virei para Rosana de novo. – O que foi que aconteceu entre você e na sua casa?
A garota abriu a boca, e então sorriu.
- Fica para sua imaginação. – Disse.
Dei uma risada debochada, mas muito segura.
- Fica mesmo? – Soltei um pouco a corrente de Stevie, que voou para o lado dela. Claro que ele só queria brincar, mas ela não precisava saber. Rosana recuou enquanto eu deixava que ele chegasse bem perto.
- NADA! NÃO ACONTECEU NADA! – Ela gritou. – EU JURO. QUASE ACONTECEU, MAS ELE FOI EMBORA!
Meu coração se encheu de felicidade ao ouvir aquilo, e eu puxei a corrente de Stevie de volta, sorrindo.
- Era tudo que eu queria ouvir. – Sorri. – Vejo você na escola, Rose.
POV
- Não acredito que você conheceu a Mokona! – Eu exclamava estupefato, enquanto Summer me contava sobre sua viagem para o Japão, nas últimas férias.
- Eu fiquei meio congelada, sabe? – Summer ria. – Eu não falei com ela, é claro, porque ela já estava indo embora, mas... – Suspirou. – Foi tão incrível. De repente, eu só conseguia pensar em como você ficaria maluco se estivesse lá.
Sorri, achando graça. Mokona era uma das escritoras de um desenho que nós assistíamos quando pequenos, Sakura Card Captors. Um dia, tínhamos decidido descobrir quem eram os criadores dele, e lembro que ficamos estupefatos ao descobrir que havia sido um grupo de escritoras, e não apenas uma pessoa. Na época, até tentamos desenhar nossa própria estória juntos, mas desistimos logo porque éramos péssimos com desenhos.
- Juro. – Ela reforçou. – Isso não saia da minha cabeça.
- Talvez devêssemos ir atrás dela no Japão. – Brinquei. – Dessa vez eu a seguraria e a obrigaria a tirar uma foto com você.
- E a polícia nos pegaria. – Sum sorriu. – Será que a polícia japonesa tem superpoderes?
- Será que eles soltam faísca quando se machucam?
- E será que as viaturas deles se transformam em robôs gigantes?
Nos encaramos por um instante, e então começamos a rir. Era incrível como a sensação era a mesma de estar com a Summer de doze anos de novo, a antes de nos separarmos. Ela não tinha mudado em nada. E ela fazia parecer que eu também não tinha.
- Ah, eu senti tanta falta de conversar com você, por tanto tempo. – Ela recostou preguiçosamente no sofá, encarando o teto.
- Bem, você pode conversar agora. – Respondi do mesmo modo.
Summer sorriu para mim. Depois, seus olhos pousaram no violão sobre a poltrona.
- Você aprendeu a tocar violão. – Observou. – Você sempre quis tocar.
- Você também. – Lembrei.
- É verdade. – Ficou pensativa. – Eu adorava quando o senhor Wilson tocava violão no fim da tarde.
- E por que você não aprende agora?
Ela piscou, depois balançou a cabeça.
- Porque não tenho muito tempo livre fixo, eu acho. – Respondeu. – É complicado entrar num curso assim.
- E se você tivesse um professor particular? – Sugeri.
Summer me olhou e sorriu, suspeitando do que eu diria a seguir. Mas antes que eu o fizesse, a porta bateu. Pensei que fosse de volta, mas era Miguel.
- ? – Ele parou quando nos viu.
- Miguel. – Eu disse, tentando não parecer assustado. – foi comprar fermento para um bolo e me pediu para ficar aqui. Esta é Summer. Ela veio visita-la.
- Oi! – Summer sorriu, sem parecer temer nem um pouco a cara séria de Miguel. – Você deve ser o irmão postiço da . É um prazer conhecê-lo.
- O prazer é meu, Summer. – Para minha surpresa, ele sorriu um pouco. Depois foi para seu quarto.
Summer olhou para mim e deu de ombros, sorrindo. Era mesmo como ter aquela garotinha loura de volta. Quando éramos crianças, Summer não tinha medo de nada. De ninguém. Estava sempre alegre e curiosa, mesmo nas situações mais inesperadas.
- E então, o que você acha? – Eu trouxe o assunto de volta.
- De quê? – Ela inclinou a cabeça para o lado.
- De aprender a tocar violão. De eu ser o seu professor de violão.
A garota ponderou por um instante, e então assentiu devagar.
- Eu ia adorar.
Fiquei muito empolgado em ouvir aquilo. A verdade era que tinha bloqueado a saudade que sentia de Summer por tanto tempo, que tudo parecia vir de uma vez agora. Ia começar a conversar sobre o assunto, mas a porta bateu de novo.
- Você voltou! – Summer exclamou quando apareceu.
Ela olhou para nós dóis. Seu rosto estava um pouco vermelho, parecia um pouco agitada. Stevie devia tê-la cansado.
- Sim. – assentiu. – Eu trouxe o fermento. – Sorriu. – Querem me ajudar com o bolo?
- Claro. – A outra desceu do sofá.
E eu as segui, trocando um olhar rápido com Summer que oficializava nossos planos futuros.
[…]
Acordei com os latidos escandalosos de Stevie na manhã de segunda-feira, mas nem me importei. Me espreguicei na cama feito uma gata, deixando que os raios de sol entrassem pela cortina parcialmente aberta e aquecessem meu rosto. Depois de alguns instantes, virei a cabeça para o lado. Stevie estava deitado no chão, o rabo balançando animadamente e aqueles olhos cor de amêndoa me encarando.
- Bom dia, bebezão. – Sorri. O dálmata latiu em resposta, ficando de pé e pulando; depois saiu correndo para fora do quarto. Pelo visto ele só queria me acordar mesmo.
Desci da cama calmamente, sem me preocupar em calçar as pantufas no chão, e abri a janela.
- Bom dia, Jacksonville Beach. – Eu disse para mim mesma, seguindo para o banheiro em seguida.
Depois do sucesso dos meus planos na sexta-feira (tirando, é claro, a briga com Jasmine), eu estava muito feliz. A festa da fogueira tinha sido a mais divertida a que eu ia em muito tempo, e no dia seguinte eu tinha contado à e tudo sobre como eu havia ido parar no topo da pirâmide das líderes de torcida. não contou nada à sobre minha briga, e eu agradeci por isso.
- , ... Qual é o plano para hoje? – Perguntei a mim mesma escovando os dentes. Teria que descobrir, mas acreditava que não seria muito difícil com o rumo que as coisas estavam tomando. Exceto, é claro, que ainda exercia uma perigosa onda de sentimentos em mim. Mas eu acreditava, na verdade, que já estava ficando boa em controlar isso.
Desci as escadas ainda abotoando minha camiseta azul de botões – a mesma que eu tinha usado em meu primeiro dia de aula. Parecia ter sido uma eternidade atrás.
- Que cheiro é esse, pai? – Indaguei descendo as escadas. – Desde quando sabe fazer... – Mas parei no susto quando cheguei a cozinha. – Panquecas. Miguel?
- Acho que eu moro aqui agora, não é? – Ele moveu sutilmente a boca num sorriso que só alguém que o conhecesse há tanto tempo conseguiria perceber.
- Eu acho que pedi que morasse. – Concordei, entrando de vez na cozinha e me sentando à mesa. – Onde se meteu durante todo o final de semana?
- Você já estava dormindo quando cheguei do Roger’s na sexta, e tive que sair bem cedo no sábado para resolver uns assuntos em Fruit Cove. Voltei ontem à noite. – Ele colocou um prato com duas panquecas à minha frente. – Jack está dormindo.
- Era de se esperar. – Derramei um pouco de mel sobre as panquecas.
- Como foi no jogo? – Miguel se sentou ao meu lado com um prato também, enfiando um pedaço de panqueca na boca.
- Ah, Miguel, foi a coisa mais louca que já passei! – Fiz uma careta. – Elas me torturaram a manhã inteira, e depois inventaram que eu teria que ficar no alto da pirâmide... – Suspirei, cansada só de lembrar. – Mas depois disso, foi bem legal.
- Que bom. Sua amiga pareceu uma boa pessoa. Um pouco estranha, mas... – Deu de ombros. – Acredito que tenha encontrado seu namorado lá. Ele veio te procurar pra irem para a aula naquele dia, mas você já tinha saído.
- ? Nos desencontramos algumas vezes durante o dia, mas nos vimos na Fogueira.
- Sei. – Ele assentiu fixando aqueles olhos verdes intensos em mim. – Isso me lembra, ... Não havia algo sobre o qual você queria falar comigo da última vez que conversamos?
Olhei de volta para Miguel por alguns segundos, e então desviei meu olhar para as panquecas. Na noite de quinta-feira, eu realmente tinha cogitado a possibilidade de contar tudo a ele, mas agora não estava mais tão certa. Só de imaginar Jasmine indo até o Roger’s e revelando a verdade – e olhe que ela não sabia nem metade da verdade – eu tinha ficado maluca, e isso tinha me dado um choque de realidade. Talvez eu não quisesse que meu irmão de consideração soubesse a loucura que eu estava fazendo. Além disso, embora soubesse que Miguel não contaria nada ao meu pai, não queria fazê-lo mentir assim como estava fazendo com e . Isso só ia tornar aquela bola de neve maior.
- Na quinta-feira? – Me fiz de esquecida. – Não, não me lembro de nada. Devia ser uma bobagem qualquer. – Dei de ombros.
- Se é o que diz. – Miguel aceitou, mas continuou me encarando até que eu me sentisse uma pessoa péssima. E é por isso que ele não pode saber o que estou fazendo, pensei.
- Acho que alguém está me ligando! – Tirei o celular do bolso sem deixar que ele visse o visor, porque, é claro, eu estava mentindo. – Com licença.
Saí da mesa e corri para a sala de estar, ligando para na velocidade da luz.
- Você precisa vir me buscar agora.
- Mas, ...
- AGORA! – Falei alto demais, e depois baixei o volume da voz para um sussurro. – Eu preciso sair daqui antes que tudo vá por água a baixo. Ande logo.
Voltei para a mesa com um sorriso mais falso que os votos de felicidade no amor que papai fazia à mamãe nas datas comemorativas. Me sentei e terminei de comer as panquecas em silêncio, esperando que meu namorado mais falso ainda chegasse.
- Eu sempre soube que isso ia dar merda! – reclamava dentro do carro, enquanto procurávamos uma vaga no estacionamento da Jacksonville High. – Por que tinha que chamar o assassino para morar com vocês?
- Vocês precisam parar de chamar Miguel assim! – Repreendi. – E a culpa foi toda minha, eu sei. Mas eu só queria tê-lo por perto, não pensei realmente antes de falar!
- Tá. E agora, o que vamos fazer? – fez careta. – Como vamos falar sobre toda essa loucura na sua casa com Miguel lá vinte e quatro horas por dia?
- Ele não fica lá tanto tempo assim. Ele tem um emprego. – Lembrei. – Vamos dar um jeito. Eu vou pensar em algo.
- Ótimo. – bufou.
Estacionamos o carro bem ao lado de uma vaga vazia, mas quando abriu a porta, outro carro parou ao nosso lado a toda velocidade. Nosso amigo quase morreu de susto, e eu reconheci de imediato a BMW vermelha de Jasmine.
- É melhor ficar de olhos abertos, . – A morena disse ao sair do veículo. – Nunca se sabe quando um acidente pode acontecer.
ficou ali, recuperando o fôlego, enquanto ela passava e me lançava um olhar mortal – embora tenha dado um sorriso despreocupado. Reparei que, como ele mesmo havia previsto, ela estava usando uma blusa de mangas compridas.
- Eu perdi alguma coisa? – quis saber.
- Ela me odeia, não tem novidade alguma. – Respondi logo.
- É, mas parece que agora ela me odeia. – fez uma careta. Eu lhe lancei um olhar pra lá de significativo e ele assentiu discretamente. – Esquece isso, . Não importa. Só quero curtir minha popularidade muito provavelmente temporária em paz.
- Pensei que já tivesse feito isso ontem. – Dei risada, ajeitando a mochila e começando a andar. Eles me acompanharam. – Como foi o encontro com a Amber?
- Ah, o meu encontro com a Amber... – sorriu e suspirou. – Nunca pensei que eu diria isso a não ser que estivesse falando sobre um sonho ou uma situação muito hipotética.
- Se divertiram? – quis saber.
- Mas é claro que sim. – Ele respondeu como se fosse óbvio.
- Honestamente, , eu não sei bem como consegue se entender com a Amber. – Balancei a cabeça. – Quero dizer, sem ofensas, mas ela é meio...
- Devagar, eu sei. – assentiu. – Mas ela pode ser bem rápida para outras coisas que não sejam pensar. – Olhou para .
- Argh! – Eu o empurrei. – Me poupe dos detalhes, por favor.
E foi só falar no diabo para que ele aparecesse. Assim que colocamos os pés no corredor da Jacksonville High, Amber veio em nossa direção. Estava usando um short curto demais para os meus padrões, com uma blusa estampada e uma presilha de borboleta enfeitando o cabelo.
- Gatinho, você chegou! – Ela exclamou, puxando e dando um selinho nele. - ! – Ela sorriu. – Você está um arraso hoje. Seu cabelo está simplesmente incrível!
- Ah é? – Passei a mão pelo cabelo. – Obrigada, Amber.
- Ei, . – Ela acenou.
- E aí, Hayley.
- Você vai vir comigo agora, não vai? – Ela se voltou para de novo. – Os jogadores estavam falando sobre alguma coisa tática, acho que você deveria ouvir, agora que é um titular. – Ela riu, esfregando o nariz no dele.
ainda não parecia saber bem como interagir com a garota, mas assentiu.
- Acho que eu devia, não é? – Olhou para nós. – Tá, vamos lá.
Amber sorriu de orelha a orelha e saiu puxando o garoto.
- Eu senti tantas saudades! – Ainda a ouvíamos dizer.
Olhei para só para encontrar a mesma expressão que estava no meu rosto – a de quem estava prestes a vomitar.
- Nem me fale. – Ele disse antes que eu falasse qualquer coisa.
- Se era isso que eu fazia nosso namoro parecer antes, fico feliz que tenha me pedido para parar.
- Que bom que você entendeu. – sorriu, entrelaçando os dedos nos meus. Voltamos a andar.
- Quanto tempo acha que isso vai durar?
- Com o , nunca dá pra ter certeza. Mas é a primeira namorada dele, se é que eles estão mesmo namorando, então...
- Eu sou sua primeira namorada? – Ergui uma sobrancelha, curiosa.
- Não. Deve ser, sei lá, a décima.
Parei e o encarei, soltando sua mão.
- O que foi? – Ele riu. – Ficou com ciúmes?
- Você não me parece o tipo que sai com um monte de garotas, . – Desafiei.
- Você não passou muito tempo comigo antes da nossa mentirinha, passou?
Fiquei olhando para ele – que sorria, divertido – desconfiada. Eu realmente não achava que fazia o tipo pegador, mas então me lembrei de meus primeiros dias na cidade, antes da mentira, e como eu o achava irritantemente charmoso quando ele ficava implicando comigo, e o jeito como Jodi e Emma ficavam nervosas sempre que ele se aproximava de nós. Seria verdade então? Meu namorado de mentira era um galinha antes da minha chegada?
Antes que eu tivesse tempo de perguntar, meu celular vibrou, e o tirei do bolso para ler a mensagem.
“Venha para o ginásio AGORA”
Era Emma, e quase pude ouvir seu tom de voz mandão.
- Eu tenho que ir. – Falei para . – Emma está me procurando.
- Nos vemos depois, namorada. – Ele deu um sorriso torto e eu me afastei, ainda com aquela dúvida na cabeça sobre quem era realmente o garoto com quem eu passava os dias.
Quando abri as portas do ginásio da escola, avistei Emma, Jodi Lyn e Summer sentadas na arquibancada. Segui até elas desconfiada, pois as três me olhavam de um jeito muito animado para o meu gosto.
- Me procurando a essa hora da manhã? – Fui logo perguntando. – Não pode ser boa coisa.
- Acertou, querida. – Summer deu um sorriso enigmático, batendo no chão ao lado dela para que eu me sentasse.
- Nada pode ser pior que o que fizeram comigo na sexta. – Eu disse.
- Você sempre pode se surpreender. – Emma ergueu as sobrancelhas grossas.
Jodi puxou minha mão e começou:
- Certo, ... Acontece que... Você foi muito melhor na sexta-feira do que nós esperávamos. É sério. – Disse com seriedade. – Você foi desenvolta, foi ousada e conseguiu fazer perfeitamente o que ensinamos.
- Obrigada? – Olhei de soslaio para Summer, que assentia.
- Eu falei com a mãe da Maya ontem. – A baixinha continuou. – Parece que ela vai ter que ficar com o gesso na perna por algumas semanas ainda. Estávamos pensando se você não poderia... Substituí-la oficialmente até lá. – Jodi ergueu os ombros, dando seu sorrisinho de louca da torcida.
- Vocês ficaram doidas? – Não consegui conter meu espanto.
Tudo bem, eu tinha feito tudo certinho na tarde do jogo – eu até tinha me empolgado mais do que devia com aquelas estrelinhas (coisa da qual, por sinal, começava a me arrepender). Mas uma coisa era fazer aquele show por um dia, e outra bem diferente era assumir oficialmente aquele posto. Eu tinha ensaiado com as meninas; eu entendia agora. Líderes de torcida se esforçavam. Elas eram como atletas semiprofissionais com unhas perfeitamente bem cuidadas e brilho labial infinito.
- Você não pode nos deixar na mão! – Emma me ameaçou.
- Não, não, não, mocinha! Essa ameaça não vai funcionar de novo! – Avisei, e ela fez a cara de uma criança repreendida. – Antes vocês não tinham ninguém, mas agora tem tempo para encontrar outra garota.
- Mas nós queremos você! – Jodi choramingou. – Seremos, tipo, as quatro espiãs demais! As quatro panteras!
- Jodi Lyn está certa, . Nós queremos que você faça parte da equipe. – Summer se meteu. – Não só porque você aprende super rápido e tem o porte de uma líder de torcida, mas porque é nossa amiga. Além disso, seria ótimo para o plano. – Sorriu, tentando me animar. – As líderes de torcida e os jogadores passam um tempo considerável juntos, você sabe. Você estaria o tempo todo vendo o que acontece para me aconselhar e me ajudar com o Junior.
Abri levemente a boca, me dando conta daquilo por alguns segundos. Líderes de torcida e jogadores se viam o tempo todo, Summer estava certa. Até então, aquela era uma das poucas áreas em que eu não tinha acesso as interações dela e de – não sem que ela me contasse. O quão útil seria estar sempre de olho nos dois? O quão divertido seria deixar maluco com minha presença constante?
De repente, a ideia me parecia perfeita. Um pouquinho de treino e esmalte nas unhas e voilà! Eu estaria um passo mais próxima do meu objetivo.
- Pensando por esse lado, Summer... – Eu disse olhando para o nada. – Talvez não seja tão ruim assim. – Sorri.
As meninas me abraçaram, satisfeitas, e Sum agarrou minha mão.
- É, não é tão terrível. – Continuei. – Foi divertido na sexta-feira, então por que não? Pois bem. Eu aceito ser líder de torcida com vocês!
E elas comemoraram, sem fazer ideia dos mil planos que minha cabeça já maquinava.
Na hora do intervalo, entrei feliz no refeitório e acenei para , que já estava sentado. Peguei minha comida me lembrando de que era uma atleta agora e precisava manter o peso. Nada gorduroso, como batata frita, poderia estar no meu prato. Agora eu entendia qual era a de Jodi e Emma com brócolis e filé de peixe.
Me sentei de frente para com um sorriso enorme, mas me lembrei depois que ele não podia nem desconfiar do que eu tinha em mente, e me contive um pouco.
- Que cara é essa? – Ele perguntou desconfiado.
- Essa cara? Pft, não é nada. Eu só... – Dei de ombros. – Sou oficialmente uma líder de torcida agora.
- Você o quê? – franziu o cenho.
- Era o que Emma queria comigo. – Tentei, mas não consegui conter o sorriso. – Meu desempenho foi tão bom na sexta-feira que elas querem que eu substitua Maya Burnes até a perna dela ficar boa.
- E você ficou feliz com isso?
- Feliz não... – Ponderei. – Mas as garotas precisavam de mim, e eu não sou de deixar meus amigos na mão.
- Seu pai vai ficar bem... Surpreso com essa notícia. Você? Fazendo exercícios e comendo... – Ele remexeu meu prato com seu garfo de plástico. – Brócolis, em vez de deitar no sofá com um balde de pipoca e assistir comédias românticas? – me lançou um olhar de quem não levava muita fé em mim.
- Para sua informação, eu adoro brócolis. – Enfiei um pedaço da coisa verde na boca. – Não duvide da minha força de vontade, .
Ele riu e balançou a cabeça, me encarando enquanto dava um gole em seu refrigerante. Era estranhamente divertido o modo como me conhecia tão bem em tão pouco tempo de convivência. Talvez estivéssemos mesmo passando tempo demais juntos.
- Onde está o ? – Perguntei, tentando partir meu filé de frango que mais parecia borracha.
- Amber o arrastou para algum canto logo que chegamos aqui. Algo sobre a comida do refeitório não ser saudável para um titular.
- Amber lá sabe o que é saudável? – Fiz uma careta, porque inteligência não era mesmo o forte dela.
- Ela pensa que sabe, pelo menos. – Ele deu de ombros. – Qual sua próxima aula?
- Na verdade, eu tenho uma reunião com o clube de teatro. Vamos falar sobre a Peça de Outono.
- É sempre O Mágico de Oz, e é sempre uma droga. – Me avisou.
- Muitas coisas estão mudando esse ano, . Talvez devesse se preparar para uma surpresa.
- Uma peça nova! – Foi a primeira coisa que ouvi quando entrei no auditório do colégio.
Veja só você, , pensei.
Os membros do grupo – felizmente eu já sabia os nomes da maioria – estavam apinhados em volta de Ed Miller, curiosos sobre a novidade. Me juntei a eles para ouvir.
- Nova? – Courtney perguntou surpresa. – Mas O Mágico de Oz vem sendo feito desde que eu tinha, sei lá, idade para lembrar!
- Eu sei! – Ed exclamou. – Não é fantástico? Ouvi dizer que é um texto original da senhorita Elizabeth.
- Isso é tão empolgante! – Ashley, que agora eu tinha notado que andava com a oferecida da Rosana Wayans, comemorou.
A porta do auditório rangeu e vimos a professora Elizabeth entrar acompanhada por Jasmine. A garota fez uma cara de poucos amigos ao passar por mim, e a professor sorriu para todos.
- Bom dia, meus monstrinhos! – Exclamou em sua voz musical.
- É verdade que vamos fazer uma peça nova? – Alguém no meio do grupo não conseguiu se conter e foi logo perguntando.
Elizabeth nos olhou divertida. Depois, com uma expressão misteriosa, fez sinal para que a acompanhássemos até o palco. Sentando-se no chão de pernas cruzadas, ela uniu as duas mãos e abriu um sorriso.
- Sim, Franklin, esse ano vocês farão uma peça nova no Halloween.
Todos começaram a falar ao mesmo tempo, se acotovelando entre comemorações e dúvidas.
- O roteiro é de minha própria autoria. – Elizabeth informou. – Achei que todos estavam cansados de assistir O Mágico de Oz, e, como sou nova aqui, decidi fazer algumas mudanças.
- É um alívio ouvir isso, professora. – Jasmine sorriu cinicamente. – Eu não aguentava mais fazer o papel de Dorothy.
Por algum motivo – um motivo bem óbvio talvez – eu tinha imaginado que Jasmine fazia o papel da Bruxa Malvada do Oeste, e não da garotinha boa e perdida. Mesmo me esforçando muito, eu não conseguia imagina-la dentro daquele meigo vestido azul.
- Soube de seu talento para o canto, Jas. – A professora sorriu para ela. – Garanto que ele será bem utilizado na nossa nova produção.
- Sobre o que é a peça, professora? – Courtney perguntou.
- Bom, eu vou trazer os roteiros para vocês ainda esta semana, mas em suma, a peça conta a estória de Ebony Purplewood, uma bruxa em um mundo fantástico, que quer usar sua magia para conquistar o amor verdadeiro...
Enquanto a professora explicava a estória, Jasmine me cutucou discretamente.
- Uma bruxa hen, Pie? – Sussurrou. – É bem a sua cara.
- ... Claro que testes serão feitos, então não precisam se preocupar com favoritismo dessa vez. – A professora terminou sua explicação.
Eu não tinha respondido a provocação de Jasmine, mas de repente, senti vontade de fazê-lo. Irrita-la só um pouquinho, para não perder o hábito.
- Achei a estória maravilhosa, professora. – Sorri para Elizabeth. – Espero realmente poder participar dessa peça, embora isso com certeza vá me dar certo trabalho, visto que sou oficialmente uma líder de torcida agora. – Disse inocentemente.
Vi os olhos de Jasmine se voltarem para mim de forma feroz no mesmo instante e me dei por satisfeita. Agora ela sabia da novidade, e eu tinha me divertido por um dia inteiro.
POV
Líder de torcida, era só o que faltava!
Eu balançava a cabeça, ainda tendo dificuldade para acreditar realmente naquilo – apesar de que, vindo de quem vinha a novidade, nada mais deveria me surpreender.
Vicentini Pie era definitivamente a garota mais inacreditável do mundo, e quando eu finalmente pensava que ela não poderia vir com nada para me assustar, lá vinha uma nova.
Eu não conseguia deixar de rir ao pensar em fazendo coreografias ensaiadas com Jodi e Emma quando ela, até quatro dias atrás, tinha horror à torcida organizada. Ela era mesmo muito maluca. E tinha ficado ridiculamente linda com aquele uniforme.
Suspirei, tentando tirar a imagem da cabeça, e entrei na sala da aula de Biologia. estava sentado no lugar de costume, o rosto pálido e uma expressão estranha nele.
- Por favor, diga que você tem algo de comer aí. – Ele falou de um jeito assustador assim que me sentei à sua frente. – Pode ser qualquer coisa, . Qualquer coisa.
- Não, não tenho... – O olhei preocupado. – Pensei que você tinha ido comer com a Amber.
- Aquilo não era comida, . – Ele disse sério, depois cobriu o rosto com as mãos. – Meu Deus, como sinto falta daquele chucrute do refeitório.
Enquanto sofria com sua fome, Rosana Wayans entrou na sala. Engoli em seco quando ela se sentou na cadeira ao meu lado e sorriu.
- Oi, . – Disse.
- Oi. – Dei um sorriso nervoso.
O senhor Ackles entrou na sala e outros alunos começaram a chegar.
- Ei, Ashley! – chamou. – Tem alguma coisa de comer aí?
- Ah, bom, eu tenho esta barrinha de cereal... – A garota ergueu o pacote. Em menos de um segundo, o tinha tomado das mãos dela.
- Serve. – Ele disse rasgando o plástico e enfiando a comida na boca. – Hm... – Fechou os olhos, saboreando. – É um manjar dos deuses!
Balancei a cabeça e me virei para frente, prestando atenção no que o professor começava a falar.
- Antes de tudo, quero avisá-los de que a reforma do laboratório acabou. – Ele informou, e ouve alguns murmúrios e reclamações, porque todos achavam muito mais fácil fofocar e enrolar com o dever na sala onde estávamos, que era mais ampla e dava menos destaque individual a cada um. – Ótimo, fico feliz que tenham gostado da notícia. – O professor fez uma careta. – Antes de mudarmos nossas aulas definitivamente para lá, no entanto, tem uma coisa que quero fazer com vocês aqui. Aconteceu um problema na copiadora e só metade das folhas foi impressa, então... Sentem-se com a pessoa ao seu lado.
Rosana abriu um enorme sorriso para mim, e eu prendi a respiração. A garota empurrou sua mesa para perto da minha, e eu vi fazendo o mesmo com Ashley. Quando ela colocou o imensa mecha de cabelo escuro atrás da orelha, percebi que de forma alguma eu conseguiria me concentrar no que quer que tivéssemos de fazer.
O senhor Ackles tinha nos entregado folhas onde havia paródias de músicas conhecidas, mas com a letra sendo trocada para informações sobre Biologia. Ele realmente andava parecendo cansado daquela turma – que era provavelmente uma das mais falantes da escola –, mas parecia disposto a fazer uma última tentativa de fazer algo divertido.
Enquanto ele escrevia algumas orientações no quadro, tomei coragem e me virei para Rosana – encostando nela o mínimo possível com a nossa proximidade. Ainda ficava nervoso quando ela estava por perto, mas sabia que queria fazer aquilo desde a semana anterior.
- Olha, Rosana... – Falei em voz baixa para que o senhor Ackles não me expulsasse da sala pela segunda vez no semestre.
- O que foi? – Ela olhou para mim.
- Eu queria... Eu tive a impressão de que você ficou um pouco sem graça quando a apareceu quando estávamos conversando, lá na Fogueira. E eu queria te pedir desculpas. Não queria que você ficasse constrangida sem motivo.
- Ah, é, eu fiquei um pouco. – Rosana assentiu tranquilamente. – Mas não precisa se preocupar com isso, . De verdade.
Sorri um pouco e movi a cabeça em concordância, feliz por finalizar o assunto. Mas Rosana ainda não tinha acabado.
- Além disso... – Disse, rabiscando em seu caderno. – está certa em ter ciúmes. Eu também teria se percebesse que uma garota bonita tem uma queda pelo meu namorado. – Sorriu, mas não me olhou.
Engoli em seco, mas não tive tempo – ou condições – de reagir, pois logo o senhor Ackles estava falando de novo. Mas eu não consegui ouvir bem.
Ela tinha mesmo dito o que eu havia entendido? Olhei para o lado, mas , morrendo de fome como estava, não parecia ter ouvido nada. O professor continuou falando:
- Como viram nas folhas que lhes dei, a Biologia pode ser muito mais divertida e... Artística – ele sorriu – do que parece. – Nós rimos. – Antes de mudarmos nossas aulas definitivamente para o laboratório, queria fazer algo diferente com vocês. Eis seu trabalho: vocês terão, junto com suas duplas, produzir paródias de músicas populares, falando sobre Biologia. Isso vai valer alguns pontos, então se esforcem e façam algo legal. As apresentações serão na próxima semana.
Não. Não. Não.
Eu não podia fazer nada em dupla com a Rosana justo agora. Por Deus, eu não podia nem ficar perto dela. Eu tinha dor de cabeça só de pensar no quão difícil isso seria.
- Na minha casa então. – Ela já estava dizendo antes que eu protestasse. E como eu protestaria afinal? Ela não tinha dito nada com clareza, o quão pretencioso e ridículo seria me recusar em público a fazer algo com ela?
A menina sorriu e me passou seu endereço, e eu estava definitivamente, absolutamente, perdido.
- Ah, cara, você está tão, tão, tão fodido... – dizia com a boca cheia de seu sanduíche de frango. Tínhamos parado na praia para comprar um depois da aula, já que não havia voltado conosco.
- Eu sei. – Bufei. – Eu não faço ideia de como vou conseguir fazer isso, . Eu não posso ficar sozinho com a Rosana, não posso.
Ele fez sinal para que eu esperasse e deu um gole em sua lata de refrigerante de uva.
- Ok, sabemos que ela é... Você sabe. Mas não é para tanto. – Disse. – É só um trabalho, você pode fazer isso, , sei que pode. Olhe para mim por exemplo: estive cercados de garotas bonitas que nunca peguei durante toda a vastidão do ensino médio. Não é difícil.
Eu assenti, embora tivesse achado aquele um péssimo exemplo.
- Se bem que... – deu de ombros, voltando a morder seu sanduíche. Eu o olhei de soslaio enquanto dirigia.
- Se bem que o quê? – Indaguei preocupado.
- Nenhuma daquelas garotas estava assumidamente afim de mim, não é, ? O que não é o seu caso. A Rosana deve ter planos.
- Planos? – Franzi o cenho e inspirei. – Do que você está falando? Que planos você acha que ela tem?
- Não se faça de inocente. Você sabe, ela está a fim de você e já deixou isso bem claro, e aí te chamou para ir à casa dela...
- Acha que ela quer alguma coisa comigo?
- Ah, , pelo amor de Deus! – Ele exclamou irritado. – É por isso que a consegue te meter em todas as mentiras que inventa. Para quem já saiu com muito mais garotas que eu, você é muito burro.
- É só que... – Inflei as bochechas, frustrado. – Rosana Wayans estudou com a gente nos últimos dois anos. Por que justo agora ela decidiu se interessar por mim?
- Porque as pessoas são assim, meu amigo. – deu de ombros, mais calmo. – Elas gostam do que não podem ter. Olhe só para você, suspirando pela .
Eu sabia que, por incrível que parecesse, estava certo. Rosana Wayans só estava interessada em mim agora porque eu tinha namorada, e por isso, parecia mais difícil de ser alcançado. A falha em sua filosofia estava na exemplificação. Porque a verdade, era que eu tinha caído de quatro por Pie bem antes de saber que ela estava fora do meu alcance.
Ou talvez, no fundo, eu sempre tivesse sabido. Será? Será que algo me dizia desde o início que ela não podia ser minha? Talvez eu tivesse ignorado o jeito como ela sempre parecia estar com a cabeça à milhas de distância quando nos conhecemos. O jeito como seus olhos sempre pareciam estar procurando por algo que não estava ali.
Talvez eu tivesse mesmo ignorado isso. Talvez eu ainda estivesse ignorando.
POV PIE
- Eu não estou absolutamente a coisa mais lindamente ridícula que você já viu? – Eu ria, girando em frente da câmera do computador para que Sofia me visse com meu mais novo uniforme de líder de torcida.
- Você está ficando completamente louca. – Ela balançava a cabeça.
- Ah, qual é, admita. – Insisti.
- Esse uniforme é ridículo, como qualquer outro uniforme de torcida. – Sofi bufou, apoiando o queixo teatralmente nas mão com as unhas pintadas de roxo escuro. – Lembra daquele tempo em que nós odiávamos essas coisas? Aquele tempo distante em que você era super inteligente, bem-humorada e normal?
- Eu ainda sou eu, Sofi. – Me sentei na cadeira em frente ao computador. – E ainda sou sua prima predileta e sua melhor amiga. Mas eu precisava fazer isso. Não tinha como dizer não.
- Bastava colocar numa frase as letras N, A, O e então um acento sobre a do meio.
- Muito engraçada.
Eu ainda não tinha contado a Sofia que tinha prometido ajudar Summer Olsen a reconquistar o , porque meus ouvidos doíam só de pensar no tamanho do sermão que ela me daria. Especialmente quando ela soubesse que eu não estava de fato ajudando ninguém além de mim mesma.
Antes que ela reclamasse mais, meu telefone tocou. Era Summer. Tirei o som do meu microfone, para que minha prima não conseguisse ouvir o que eu estava dizendo, e fiquei de pé para atender.
- Sum? – Sorri.
- Se arrume, nós vamos sair. – Ela disse.
- Nós? Nós quem?
- Você sabe, você é uma de nós agora. Eu chamei algumas garotas da torcida e uns rapazes do time para comemorar. – Imaginei a reunião, e só conseguia ficar feliz por Sofia não poder ouvir aquele negócio de você é uma de nós, como se fosse uma seita das líderes de torcida ou algo assim.
- Summer, não precisava fazer disso um evento. – Suspirei.
Honestamente, toda vez que Olsen fazia algo daquele tipo eu só ficava pensando no que seria da miserável vida de todos nós quando eu começasse a namorar de verdade com .
- Não é um evento, vamos comer tacos. – Sum disse. Havia um sorriso em sua voz. – Junior foi quem sugeriu. Ele ficou incrivelmente feliz e surpreso por saber que você era uma líder agora. Então aquilo tinha sido ideia de . Ele devia mesmo estar louco para olhar nos meus olhos enquanto eu explicava como tinha entrado para aquele seleto e bizarro grupo. Até imaginava sua expressão divertida, sua voz zombando de mim. “Quem diria, Vicentini!”.
- Tudo bem. – Concordei por fim. – Vou me trocar.
- Passo na sua casa daqui a pouco.
Encerrei a ligação e voltei ao computador, ligando o microfone de novo.
- O que deu em você? – Sofia fez uma careta. – Quem era no telefone?
- Minhas novas colegas de torcida. – Sorri maliciosamente. – Vamos sair para comemorar.
Depois de ter trocado meu uniforme azul e amarelo por uma bermuda jeans e uma regata cinza estampada, desci as escadas e encontrei com Summer, já preparada para buzinar. Fomos conversando pelo caminho rumo àquele lugar que eu ainda não conhecia.
- Vamos bastante lá, pelo menos quando eu estou na cidade. – Ela explicou. – Quero dizer, eu e Junior íamos bastante antes de... Você sabe.
- E você concordou em irmos justo lá? – Perguntei meio desconfortável. Eu não queria realmente ir ao point do casal mais famoso da Jacksonville High. Era estranho demais.
- É que comida de lá é ótima, e achei que também seria interessante para os nossos planos que Junior se lembrasse de como nos divertíamos quando estávamos juntos. Acha que foi burrice minha? – A loira me olhou parecendo insegura.
Na verdade, tinha sido uma jogada de mestre, o que era péssimo para mim. Se eu soubesse daquilo antes, teria sugerido que fôssemos à outro lugar.
- Não, eu achei uma boa ideia, pensando por esse lado. – Me forcei a sorrir. – Mas da próxima vez que ficar na dúvida, não deixe de me ligar. Sabe que estou aqui para ajudar.
Summer sorriu de volta, inocente como sempre, e não pude deixar de pensar que não era de se espantar que ela tivesse sido a melhor amiga de . Com aquele jeito dela, fazia perfeito sentido. Era fácil imaginar os dois sentados lado a lado rindo juntos ou ajudando cachorros necessitados pela rua.
Paramos perto da Las Chicas, a tal lanchonete de tacos, e descemos do carro. Assim que entramos no lugar – super colorido e alegre – avistamos Brad, Jodi, Emma, , Sienna Clark – a prima de Maya Burnes –, Teddy Moore – que era um dos garotos bonitos e gays da torcida –, Jasmine e sentados. Bufei de desânimo e irritação discretamente ao perceber que a infeliz garota de longos cabelos escuros estava lá, mas fiquei feliz por ver acenando com um enorme sorriso. Nos aproximamos da mesa e meu coração saltou no peito quando nossos olhos se encontraram.
- Bem, aqui estamos! – Summer sorriu, empurrando Teddy para o lado e se sentando. Me sentei ao lado dela, de frente para Jasmine e . – Pessoal, a mais nova integrante da torcida do Swordfish, Vicentini Pie!
Eles bateram palmas e senti o rosto esquentar um pouco.
- Parabéns, ! – Teddy esticou o braço por cima de Summer para segurar minha mão. – Eu não poderia estar mais feliz por você se unir a nós, por isso fiz questão de vir hoje. Honestamente, eu já sabia que não ia demorar para nos livrarmos de Maya e seus terríveis pés tortos. – Ele estremeceu, como se se lembrasse de algo traumático.
- Ei, não fale assim! – Sienna deu uma cotovelada no garoto.
- Seja honesta, Sienna, ela tropeçava até mesmo andando no chão liso. – Emma fez uma careta. riu.
- Vamos parar de falar da minha prima, tudo bem? – A garota disse exasperada. Depois sorriu, esticando bastante o braço para alcançar minha mão também. – Parabéns, . Apesar de tudo – olhou feio para Teddy – fico feliz que esteja conosco agora.
- Você foi muito bem na sexta, . – sorriu.
- Obrigada. – Eu disse a elas.
- Nunca pensei que poderia ir tão bem. – concordou, me lançando um olhar divertido. – Fale a verdade, já quis ser líder de torcida quando era criança, não é mesmo?
Eu o encarei por um segundo, sabendo que estava me provocando. sabia da minha repulsa pela torcida.
- Não, , nunca quis. – Respondi.
- Chamou ele de . – Jasmine me observou em voz alta, sorrindo tranquilamente. – Ninguém nunca o chama assim. Era como o chamava em Venice?
- Foi como me apresentei em Venice. – O garoto respondeu por mim, o que me deu um alívio indescritível. Dificilmente ele se metia quando eu Jasmine trocávamos farpas, era sempre Summer que me defendia primeiro. – . É o meu nome, Jas, caso não saiba.
- Só achei engraçado. – Ela disse apenas.
Deixando para lá o comentário, abrimos os cardápios e começamos a escolher, enquanto conversávamos sobre coisas variadas, como a Fogueira de sexta-feira e o próximo jogo, e as aulas da escola.
- Por falar nisso, onde está Amber? – Quis saber.
- Ela ia ao dentista. – Jodi explicou.
- E depois ia sair com a nova vítima, o garoto do gol milagroso. – Teddy ergueu as sobrancelhas.
- . – Summer sorriu. – Ele se chama .
Fiquei com pena do meu amigo. Amber parecia muito mais grudenta do que qualquer um de nós teria imaginado.
- Onde está seu namorado, ? – Sienna questionou.
- Ah, teve que ir fazer um trabalho de Biologia com alguém. – Respondi.
- Ele é músico, não é? – Teddy parecia curioso. – Bem, isso é tão interessante. Ninguém aqui namorou um músico. Como é? Ele fica, sei lá, cantando para você?
- Ele canta às vezes. – Não pude segurar o sorriso. Com o canto do olho, vi a expressão de irritação surgir no rosto de .
- Vou querer a enchilada de carne. – informou ao garçom que acabara de chegar.
Todos nós fizemos nossos pedidos e, quando o rapaz se afastou, percebi que Junior continuava parecendo nada feliz.
A comida era mesmo deliciosa. Eu havia pedido um taco de camarão coberto com guacamole, e era quase como estar de volta ao Novo México, quando eu era pequena e andava agarrada aos calcanhares de Miguel pela cidade. Precisava mostrar este lugar a ele depois. Ele ia adorar.
Depois de termos nos fartado com a parte salgada do cardápio, pedimos as sobremesas. Enquanto as mesmas ficavam prontas, me levantei para ir ao banheiro. Percebi que estava tentando se aproximar de Emma, apesar de ela zombar dele o tempo todo e tentar cortá-lo. Mas ele parecia mesmo empenhado em fazê-la não o achar um idiota, o que era meigo, para ser sincera.
Bem perto da porta do banheiro, havia uma janela um pouco maior que o normal. Talvez fosse estratégico dos donos do local coloca-la perto da porta do banheiro, porque, você sabe, não havia como qualquer cheiro ficar preso desse jeito. Mas, estranhamente, reparei que a vista dali era muito bonita – direto para o mar de Jacksonville Beach, que parecia quase mágico batendo nas pedras, iluminado pela lua. Parei ali por um instante, apoiando os braços no beiral, assistindo silenciosamente aquele espetáculo.
- Pensei que tivesse batido a cabeça na pia e desmaiado. – Ouvi a voz de atrás de mim.
- Sim, mas aí me levantei e vim aqui para tomar um ar. – Devolvi a brincadeira, dando um passo para o lado e permitindo que ele se apoiasse no beiral também.
riu e balançou a cabeça, olhando para fora. Ficamos calados por um tempo ali, só assistindo o vai-e-vem das ondas.
- Isso me lembra nossa última noite em Venice. – Ele disse de repente.
E era verdade. Aquela noite linda e incrivelmente triste em que tínhamos comido brigadeiro de panela queimado e nos beijado. Aquela noite que parecia ter sido há anos atrás, com duas pessoas completamente diferentes.
- Estava tudo assim mesmo, não é? – Perguntei baixinho. – O mar estava bonito.
- E você estava indo embora.
Me obriguei a engolir o nó que surgira em minha garganta ao lembrar daquilo. Não, não era isso que eu tinha que fazer. Não era a lembrança que eu queria que ele tivesse, de como tínhamos nos separado. Ele precisava se lembrar de como éramos bons juntos, de como tudo tinha sido maravilhoso.
- Você se lembra do bar da Alice? – Perguntei de repente. olhou para mim, um brilho novo e malicioso nos olhos.
- E o fingindo que tinha idade para beber? – Arqueou uma sobrancelha. – Como esquecer?
- “É sério, eu estou de férias da faculdade!”. – Eu ri.
- Ridículo! – estava gargalhando agora.
Parecia que cada vez que nos olhávamos sentíamos vontade de rir mais e mais, nos lembrando daquela que era só uma das nossas histórias juntos. E eu sabia que ele estava pensando o mesmo que eu. Nós tínhamos uma história juntos. Não havia como deixar tudo aquilo para trás – todas as nossas aventuras e encrencas, e fugas no meio da noite.
Mas toda a magia daquele momento foi cortada de repente por uma voz.
- Ei, Junior! – Era Summer. – Junior, venha ver isso!
Nos olhamos por um instante, tentando nos desvencilhar daquele sentimento nostálgico, e eu o segui de volta para onde os outros estavam. Não estavam mais sentados à mesa, e a sobremesa ainda não havia chegado. Em vez disso, todos se reuniam em volta de uma parede onde havia várias fotos pregadas.
- Olhe só, somos nós no aniversário do Patrick! – apontava encantado.
empurrou as meninas para se aproximar.
- Patrick. – Ele sorriu. Então se virou para mim: – É o meu irmão mais velho. – Explicou.
E eu percebi que não sabia que ele tinha um irmão. Havia outras fotos de fregueses espalhadas pela parede, e logo o dedo de Summer estava sobre uma.
- Aqui, somos nós! – Ela o puxou para olhar uma foto lá embaixo. – No nosso aniversário de um ano de namoro.
olhou a foto como se mil lembranças se passassem por sua cabeça, e depois sorriu ternamente para Summer, que sorriu de volta.
Era difícil admitir e difícil ignorar, que, na verdade, eles também tinham uma história juntos. E ela provavelmente sabia que ele tinha um irmão mais velho, não é? E conhecia os pais dele. Ele devia saber qual era a comida preferida dela, e ela devia sair com ele e o tempo todo. De repente, meu estômago se contraiu. Eu era só uma estranha naquele paraíso em que eles viviam. Uma intrusa. Meu breve e feliz verão não era nada se comparado aos anos de namoro de Summer e Junior, a todo aquele tempo em que eles haviam vivido sem mim.
- Ei, . – Jasmine apareceu atrás de mim com um sorriso, como se tivesse percebido minha expressão de dor e quisesse reforçar isso. – Alguém me disse que viu seu namorado entrando na casa de Rosana Wayans há algumas horas. Eu não sabia que ela era a dupla dele, mas ultimamente eles tem parecido bem próximos, não acha?
Então estava fazendo um trabalho de Biologia na casa de Rosana Wayans?
Por que ele não tinha me dito? Respirei fundo, fechando os olhos. Estava com raiva agora, e nem sabia o porquê, já que era só um maldito trabalho, mas estava.
Meu estômago terminou de revirar. Pedi licença e voltei para o banheiro, bem na hora que o garçom apareceu com nossas sobremesas.
POV
- ! – Rosana sorriu ao abrir a porta. – Pode entrar. – Ela deu um passo para o lado, e eu caminhei para dentro da grande casa.
Parecia mais uma casa cenário de um seriado qualquer. Era espaçosa, bem decorada e havia fotos nas paredes. Uma delas era de Rosana ainda pequena ao lado de outras três crianças negras – dois meninos e uma garotinha ainda menor que ela.
- Meus irmãos. – Ela respondeu minha pergunta silenciosa. – Benny, Mike e Kendra. Os dois já estão na faculdade, ela está no fundamental.
Sorri, ainda sem me sentir tão confortável assim, mas feliz pela conversa estar até então num rumo normal.
- Vocês se parecem. – Apontei para uma foto dela com a mãe.
- Todo mundo diz isso. Mas herdei o gênio do meu pai.
Engoli em seco. O senhor Wayans era juiz. Um dos mais assustadores, pelo que diziam na escola.
- Legal. – Assenti.
- Ah, você trouxe o violão! – Ela percebeu finalmente a bolsa do objeto pendurada em minhas costas. – Vamos lá para cima, é mais confortável.
Respirei fundo, tentando não pensar em todos os absurdos que tinha falado desde que tínhamos recebido à notícia do trabalho. Ele realmente, realmente tinha tentado tornar aquele o momento mais desastroso da minha vida.
O quarto de Rosana era lilás e branco, grande, com um pôster dos Lakers na parede e alguns outros espalhados. Ela se sentou num salto na cama alta encostada à parede. Olhei para ela, e então me sentei no chão. A garota riu, balançando a cabeça.
- Está com medo de mim, ? – Ergueu uma sobrancelha.
- Medo? Eu? – Franzi o cenho, encarando a capa do violão que abria em vez de olhar para ela. – Claro que não, Rosana.
- Ótimo. – Ela desceu da cama e sentou ao meu lado no chão. Bem perto de mim. – Porque temos muito trabalho para fazermos juntos.
E de repente, as teorias malucas de não pareciam mais tão malucas.
- Ok, então monossacarídeo vai rimar com nucleotídeo e... Voilà! – Ela comemorou. – Temos Yellow Submarine versão Biológicas.
- Ou, como prefiro chamar, Eles não fazem digestão. – Sorri. Rosana riu, tocando meu braço.
- Viu só? Somos bons juntos. E você é um músico incrível. Você compõe?
- Obrigado. E sim, eu componho às vezes.
- Quem sabe você não está afim de me mostrar uma das suas composições hoje? – Ela me encarou. Depois de um segundo, desviei o olhar.
- Claro, por que não? – Dei de ombros, nervoso.
- Ótimo. – A garota não pareceu decepcionada por minha quebra de contato visual. Infelizmente. – Eu vou lá embaixo arrumar alguma coisa para comermos, e então você canta algo para mim.
Rosana saiu do quarto e eu fiquei ali, sem saber bem o que fazer em seguida. Tínhamos terminado a música, e agora a situação ficava simplesmente muito estranha. Depois de tudo que vinha acontecendo, estávamos ali, sozinhos naquela casa gigante, no cair da noite. Onde diabos estava o juiz Wayans quando eu precisava que ele chegasse irritado e com ciúmes da filha?
Tentei ligar para , mas só caía na caixa postal.
- Maldição, ! – Exclamei, bem na hora que Rosana apareceu à porta.
- Falou comigo? – Ela pareceu confusa.
- Não, eu só estava... – Dei uma risada nervosa. – Pensando alto.
- Então tá. – Ela entrou de uma vez. Havia uma bandeja em suas mãos, onde estavam dois sanduíches embrulhados em plástico e dois copos do que parecia ser suco de laranja. – Minha mãe deixou isso pronto antes de sair. Não tem gosto de nada porque, você sabe, ela é médica e é super saudável. Mas dá pra comer.
Ávido por não entrar em nenhum assunto perigoso, comecei a desembrulhar meu sanduíche, mas Rosana segurou minha mão.
- Calma. – Disse. – Por que não toca uma música para mim antes?
- ... Tá. – Assenti.
Peguei o violão e toquei uma das minhas composições mais antigas, de quando eu tinha uns catorze anos. Era sobre uma garota bonita numa festa barulhenta. Era péssima.
- Mas eu gostei muito! – Rosana ria, mas parecia estar sendo sincera.
- Eu era muito fedelho quando fiz isso. – Falei, já mais calmo. A música sempre me tranquilizava. – Graças a Deus consigo fazer coisa muito melhor hoje em dia.
- Eu adoraria ouvir qualquer dia desses. Você podia me convidar para ir aquele lugar onde toca. – Sugeriu casualmente.
- O Roger’s. – Sorri um pouco. – É legal lá.
Rosana sorriu de volta, parecendo quase só a garota com quem eu tinha estudado aquele tempo todo – a que não tinha queda nenhuma por mim e só falava comigo uma vez por semana.
Mas quando eu menos esperava, seu nariz já estava colado ao meu e ela estava quase conseguindo me beijar.
No impulso, me arrastei para trás, e Rosana quase tombou. Ela me olhou de cara feia.
- Eu... – Gaguejei, pegando o violão e a bolsa no chão. – Preciso ir agora. Foi legal... Hoje.
Saí andando, e ela se colocou de pé, parecendo frustrada.
- Mas você nem tocou no seu sanduíche... – Tentou me convencer.
- Sei lá, acho que estou sem fome. – E eu já estava descendo as escadas então, seguido por ela.
- ...
- A gente se vê na escola! – Exclamei, andando o mais rápido possível e entrando no meu carro.
Eu era o cara mais burro de todos os tempos. Uma gata como Rosana Wayans estava ali, fazendo de tudo para ficar comigo, e aí eu fugia dela quando ela tentava me dar um mísero beijo?
Está certo. Por causa da , uma vozinha no fundo da minha cabeça dizia.
Porque eu era parte do teatro maluco dela, porque eu não podia deixa-la na mão e deixar que todo mundo pensasse que eu a tinha enganado.
Mas era mais do que isso.
A verdade era que eu não conseguia ficar com Rosana porque eu não conseguia parar de pensar em . Não só em todas as farsas insanas dela, mas nela. Em suas caretas e comentários irônicos e sua risada e em como cantava mal, e em nosso beijo na sexta-feira. Ficar com outra garota parecia simplesmente... Errado.
- Burro! – Xinguei a mim mesmo, dirigindo para casa e me lembrando de que, enquanto eu estava ali bancando o trouxa, estava com seus novos amigos e, para melhorar a situação, com , seu eterno amor de verão, em algum lugar da cidade. – Você é um burro, ! – Exclamei de novo. – Ela não é sua namorada de verdade, por que tem que ser tão patético?
Eu era mesmo um grande idiota.
POV PIE
Depois de ter passado mal no banheiro do Las Chicas, eu havia remexido minha sobremesa no prato sem conseguir realmente comê-la. Jodi perguntou se eu estava bem, e confessei que não, então ela e Brad me levaram para casa mais cedo. Os dois pareciam estar começando a ter alguma coisa, e eles eram muito fofos, e Brad era um amor com ela. Isso só piorou minha situação.
Psicológico ou não, a questão era que eu tinha vomitado meu delicioso taco no banheiro de casa durante a madrugada, e papai ficou realmente preocupado, cogitando me levar ao hospital.
- Acho que não tem necessidade disso. – Miguel balançou a cabeça, abaixando-se ao meu lado e segurando meu cabelo. – Você bebeu ou algo assim, ?
- Eu n... – E então vomitei de novo. – Não... Bebi.
- A comida mexicana deve ter te feito mal, querida. – Papai disse. – Vou preparar um chá para o estômago.
Eu teria protestado, porque os chás de papai eram horríveis, mas não consegui. Estava muito ocupada botando tudo para fora.
Depois de escovar os dentes, tomar um banho e tomar aquela mistura verde horrorosa, Miguel e papai me colocaram na cama. Eu dormi feito uma pedra, me sentindo horrível, e acordei na manhã seguinte mais desanimada do que nunca.
- Você não precisa ir à escola, meu bem. – Papai disse, conferindo se eu estava com febre. Não estava. – Não hoje, se não quiser.
- Vou ficar por aqui mesmo. – Me virei para o lado e dormi de novo. Talvez não fosse psicológico. Talvez eu estivesse mesmo com uma intoxicação alimentar ou algo assim.
Por todo o dia, Miguel ficou cuidando de mim. Ele podia não fazer o tipo carinhoso em excesso, mas me oferecia comida e a servia para mim, e perguntava como eu me sentia e carrega as coisas por mim. Eu estava feliz por ele estar ali conosco. Papai também deu um jeito de se livrar do Roger para ficar em casa, e me paparicou o dia todo.
Eu não queria ver , porque estava brava com ele, então pedi a Miguel que o espantasse, caso ele aparecesse ali. Ele quis saber o motivo, e eu disse vagamente que tinha mentido para mim sobre a pessoa com quem faria um trabalho, porque sabia que eu não gostava de Rosana. Não era de todo mentira, embora não fosse de todo verdade. De todo modo, Miguel manteve longe de mim, o impedindo ameaçadoramente de entrar no meu quarto quando ele foi à nossa casa.
Na quinta-feira, quando acordei, já estava me sentindo bem melhor. O que era ótimo, porque eu precisava voltar à escola. Tinha um plano para fazer funcionar.
Afinal de contas, é claro que eu não tinha desistido. Uma foto em um mural não seria suficiente para me deter.
Eu só precisava colocar a cabeça no lugar e continuar de onde havia parado.
- , telefone para você. – Miguel disse quando desci as escadas.
Eu tomei o telefone das suas mãos e atendi.
- Ei, mocinha. – Era Summer. – Estou ligando para saber se está se sentindo melhor.
Eu havia respondido uma mensagem de Jodi no dia anterior falando que estava me sentindo mal, e ela, claramente, havia contado à Olsen.
- Oi, Summer. – Respondi. – Estou sim, obrigada por perguntar. Já ia tomar o café-da-manhã para ir à escola.
- Não se dê ao trabalho. Hoje é a feira de ciências do primeiro ano, esqueceu? – Disse. – Ninguém vai realmente estudar, você não precisa se cansar à toa.
- Ah é? – na minha antiga escola, as pessoas estudavam sempre, mas foi bom saber daquilo. – Certo, então não vou.
- Pensei que eu poderia te visitar hoje à tarde. Levar o dever de casa de História para você e bater papo.
- Claro, você pode vir.
- Combinado então, eu passo aí à tarde.
Nos despedimos e eu contei a Miguel que não ia à escola. Mesmo vendo que eu estava melhor, ele passou a manhã em casa, garantindo que eu tomasse o soro caseiro para ficar hidratada e não fizesse esforço demais. Papai também ficou mais tranquilo por ver que eu estava bem, mas insistiu que me levaria dali a alguns dias para fazer exames de rotina. Não pude discutir, pois era evidente que ele estava muito satisfeito por desempenhar o papel de responsável por mim outra vez.
À tarde, tirei as coisas do armário e comecei a preparar a massa do bolo que faria para receber Summer. Mamãe e eu gostávamos bastante de inventar moda na cozinha, então qualquer coisa era uma desculpa para isso. Suspirei, sentindo falta dela, e então ouvi à porta bater. Miguel tinha saído havia pouco para resolver alguma coisa, e por um instante pensei que ele tinha esquecido alguma coisa, quando ouvi os latidos escandalosos e alegres de Stevie.
parou à porta, uma expressão que ficava entre a dúvida e a preocupação no rosto.
- Como você está? – Indagou.
- Estou melhor. – Dei de ombros.
Ele soltou o ar, entrando de vez na cozinha.
- Miguel não me deixou te ver ontem. – Recostou na bancada. – Tipo, ele realmente me proibiu.
- Eu não queria que você pegasse minha virose.
- Você parece bem agora.
- Acho que vomitei o vírus.
- Que nojo. – Ele riu um pouco, mas me pareceu um riso desconfiado, inseguro talvez.
, . O que ele havia aprontado?
- Como foi o trabalho de Biologia? – Perguntei casualmente.
me encarou por um instante, abriu a boca, e então inflou as bochechas.
- Foi bem... – Respondeu. – Nós praticamente já terminamos.
- Legal. – Dei um sorriso falso. – Você não me disse quem era sua dupla.
- Minha dupla é a... Rosana. A Wayans.
- Claro, que outra poderia ser? – Tentei não parecer tão irritada quanto realmente estava, mas sem dúvida não deu tão certo, porque me olhou de um jeito um pouco assustado.
Era estranho, mas eu estava estranhamente decepcionada com . Ele era basicamente o garoto que me fazia acreditar que ainda havia caras honestos no mundo, e de repente ele não me contava que estava indo à casa da Safada Wayans, e isso era tão... Eu estava brava, e não conseguia evitar, e isso só me deixava mais brava.
- Eu só soube que você tinha passado mal ontem, sabe? – Ele falou. – Eu cheguei cedo da casa da Rosana na terça. Vim assim que acabamos o trabalho. Você não tinha voltado ainda.
Olhei para ele por um instante, estudando sua expressão. Ele parecia preocupado com minha cara de louca possessiva, mas sincero. De repente, me senti muito boba. não mentiria para mim; ele realmente só não tinha contado sobre Rosana porque sabia que eu não gostava dela. Para ser sincera, não era bem que eu não gostasse dela, era só que... Eu não gostava dos dois juntos. Era difícil explicar de um jeito racional.
Percebi que era nos dois que eu estava pensando quando vomitei na terça-feira.
- Você não precisa... – Suspirei, minha raiva se esvaindo um pouco. – Não precisa se explicar. Está tudo bem.
assentiu e ficamos calados, um do lado do outro, mas sem nos olharmos.
- Rainbow... – Ele disse depois de algum tempo. Havia um sorriso em sua voz, embora ele não estivesse me olhando ainda. – Você é a segunda.
- Hum? – Ergui as sobrancelhas, me virando para ele.
- Você é minha segunda. – Ele me olhou e sorriu tímido. – Minha segunda namorada.
O sorriso se espalhou pelo meu rosto de um jeito tão natural que quase não percebi. Um sorriso de conforto. E de curiosidade.
- Quem foi a primeira então?
- Leslie Takagui. No segundo ano. Ela era da banda do time. Durou alguns meses.
- Takagui? Ela era japonesa? – Fiquei realmente surpresa. – Não me lembro de ter ouvido esse nome antes. – Observei franzindo o cenho.
- Os pais eram. – Ele contou. – Ela se mudou para Boston, por isso terminamos. Mas acho que terminaríamos de qualquer jeito. – Deu de ombros.
- Sinto muito.
- Está tudo bem. Se quer saber, eu gosto bastante da minha nova namorada. – Sorriu. – Quase mais que da Les.
- Quase? – Provoquei.
Nós nos encaramos e sorrimos, e me lembrei de meu primeiro dia na Flórida, quando tive medo de ficar sem ter o que falar com ele, mas descobri que o silêncio entre nós dois não era constrangedor, mas estranhamente tranquilo e gostoso, como se já nos conhecêssemos.
Agora, no entanto, era diferente.
Agora já nos conhecíamos de verdade. Mas, às vezes, quando olhava para , parecia que era o contrário. Que havia mil coisas que eu não sabia sobre ele – como aquela, que ele tinha acabado de revelar. E seu cabelo... Talvez ele parecesse mais escuro agora do que quando nos conhecemos. Por quê? Talvez eu tivesse fantasiado que era mais claro, porque afinal, pessoas que moravam perto da praia deveriam ter o cabelo mais claro, não é? Mas o dele era diferente. Eu nunca tinha sentido tanta vontade de tocar seu cabelo antes.
- Meu Deus! – Exclamei quando algo passou correndo pelo meio de nossas pernas.
Stevie. Stevie correndo feito um pouco.
E se tínhamos cambaleado com sua passagem, isso quer dizer que estávamos próximos demais. Quando tínhamos nos aproximado tanto?
engoliu em seco, olhando para tudo menos para mim. Então seus olhos encontraram Stevie, e ele magicamente voltou a sorrir.
- Já estava esperando, não é, garoto? – Ele se abaixou para brincar com o cachorro, que veio correndo ao seu encontro.
Stevie latiu em resposta, tentando sem sucesso lamber o rosto de . Ele riu.
- Na verdade, eu vim buscá-lo para passear. – O garoto disse.
- Ah, claro, tudo bem. – Assenti rapidamente.
Alguém bateu à porta de entrada e ele se colocou de pé.
- Acho que é a Summer. – Informei. – Ela vinha me ver hoje.
- Eu atendo. – Ele disse.
saiu da cozinha, e percebi que tinha deixado o celular sobre a bancada. Ia deixa-lo ali, mas então o aparelho fez um barulho. Toquei a tela rapidamente.
1 mensagem. R. Wayans.
Arqueei uma sobrancelha.
Devia ser algo sobre o trabalho, não é? Não haveria mal em dar uma olhada.
Stevie, que tinha ficado ali me observando, resmungou.
- Não tem nada demais em ler um recadinho. – Eu disse a ele. – Deve ser sobre o...
, sei que não nos encontramos ontem, mas queria conversar com você sobre o que aconteceu na terça-feira.
Estou no quiosque de sucos da Praia da Âncora.
Não me deixe esperando.
MAS O QUÊ?
O que diabos havia acontecido na terça-feira?! De repente, eu estava brava de novo. De repente, eu não gostava mesmo de Rosana. Fazer um trabalho em dupla era uma coisa, mas ali estava ela, insistindo em perseguir o garoto que teoricamente era meu namorado!
- Ops. – Eu disse, apagando a mensagem. Stevie latiu para mim. Mostrei a língua para ele, que saiu correndo para fora da cozinha.
Rosana ia ter o encontro que ela queria, mas com certeza não seria com .
Coloquei o celular de volta na bancada e calcei meus chinelos, indo para a sala. Lá estava conversando alegremente com Summer. Ótimo. Ele ficaria ali mesmo.
- Summer! – Sorri e dei um abraço nela.
- . – Ela sorriu também. – Já está se sentindo melhor?
- Sim, bem melhor. – Garanti. – Por sinal, estava fazendo um bolo para nós, mas o fermento acabou. Eu vou comprar mais e volto num instante. Por que não faz companhia a Sum, ?
- Mas eu ia levar o Stevie para dar uma volta. – Ele lembrou.
- Eu levo o Stevie. – Abaixei e prendi a corrente à coleira dele. – Não vou demorar, não se preocupem.
E antes que eles tivessem tempo de falar, eu já estava na rua.
Como estava mesmo com pressa, deixei que Stevie corresse. Ele aceitou, feliz, a liberdade, e eu tive que me dobrar para segui-lo, mas não me importei.
Só queria chegar à Praia da Âncora, encontrar aquela garota e acabar com aquilo. Meu coração batia forte. Eu nunca tinha começado uma discussão por um motivo tão idiota quanto um garoto em Denver, mas parecia que isso estava se tornando um hábito em Jacksonville Beach. Em uma semana Jasmine, na outra Rosana. Não que eu tivesse começado a briga com Jasmine, mas provavelmente não poderia evitar isso com Rosana.
Não que eu fosse sair no tapa com ela, obviamente. Não, não era assim que eu trabalhava.
Assim que me aproximei do quiosque, avistei a garota. O cabelo preto voava com o vento marítimo, e ela estava sentada à uma das mesas. Estava usando uma regata branca, com as alças do sutiã azul aparecendo. Várias garotas da cidade se vestiam desse jeito, então quando aquele estilo tinha se tornado tão vulgar para mim? Argh.
Segurei com mais força a coleira de Stevie, obrigando-o a se comportar, e dei a volta ao lugar, passando casualmente na frente dela. Então a encarei, como se tivesse acabado de vê-la.
- Rosana! – Exclamei alegremente.
- . – Ela arregalou os olhos, parecendo confusa, preocupada. Ela olhou para os lados, como que procurando outra pessoa. – Tudo bem? – Tentou soar educada.
- Ah, sim, estou ótima. – Sorri. – E quanto à você? Que coincidência te encontrar aqui. Se importa se eu me sentar? – Puxei a cadeira à sua frente.
- Na verdade, eu estou... – Ela ia dizer, mas eu já estava me sentando.
Sorri feito um louca e dei de ombros. Rosana estava me encarando estupefata, sem entender direito. Ela olhou para Stevie, sentado no chão, e sua expressão passou para o pânico. Então a falsiane tem medo de cachorros?
- Desculpe, ia dizer que estava esperando alguém? – Me fiz de desentendida.
- É, eu meio que...
- Não precisa nem terminar. – Eu cortei. – Sei quem está esperando. Está esperando . O meu namorado.
Primeiro a expressão de Rosana foi de espanto. Depois, sua boca se fechou. Ela sorriu.
- Certo. – Disse segura. – Eu estou esperando o . O seu namorado .
- Sua segurança ao dizer isso é adorável. Como se eu não pudesse te afogar nesse mar agora mesmo. – Observei.
Rosana abriu a boca para falar, uma cara indignada, mas eu continuei:
- Escute aqui, Wayans, eu sei o que está tentando fazer. Sei o que está se passando pela sua cabeça, mas vou logo te adiantando que não vai funcionar.
- É o que pensa? Que eu não tenho chance nenhuma com o ? Porque eu acho que está enganada, Pie. Sei que ele me acha atraente, ele...
- HAHA, ENTÃO ELE TE ACHA BONITA? – Gargalhei. – E o que acontece agora? Vocês fogem e se casam em Vegas? Você não pode ser tão sem noção assim, Rose.
- Já é alguma coisa. – Ela ergueu uma sobrancelha, confiante.
- Já seria alguma coisa, Rosana, se não fosse pelo fato de que ele é meu namorado. E não importa o que você diga ou faça ou pense. Você não importa para ele como eu, não o conhece tão bem quanto eu, e definitivamente não gosta dele tanto quanto eu! – E tudo saiu de forma tão natural que eu nem precisei pensar, o que me pegou de surpresa.
De onde tinha vindo aquilo tudo?
- Isso é ridículo. – Ela bufou. – Você nem gosta dele de verdade.
Certo. De onde tinha vindo essa agora?
- De onde você tirou isso? – Perguntei com cautela.
- Jasmine Torres me disse. – A garota cruzou os braços em frente ao corpo. – Ela me garantiu.
Fechei os olhos por um instante, amaldiçoando Jasmine com todas as minhas forças.
DESGRAÇADA. Não bastava desconfiar de que eu gostava de , ela também estava tentando boicotar meu namoro com !
Ou estava tentando estragar a mentira que achava que tínhamos inventado.
- Ok... – Murmurei, respirando fundo, e então a encarei com toda a intensidade possível. – Eu quero que isso fique bem claro pra você agora: Jasmine estava errada. Ela não sabe nada sobre e eu, obviamente, porque eu adoro meu namorado. E eu quero você longe dele.
- Ah é? E o que você...
- Pra começar, vou te bater até você desejar que sua mãe fosse uma cirurgiã plástica e não uma cardiologista. – Ameacei. Ela me olhou surpresa, horrorizada.
- Você não pode...
- Depois, quando eu tiver acabado e nenhum garoto nesse mundo aguentar mais olhar para sua cara arrebentada, especialmente o meu garoto, eu vou espalhar para essa cidade inteira que você é uma maldita ataca-namorados. Na verdade, vou espalhar para o estado, o país inteiro. Vou subir no palco em todos os shows do meu pai e dizer.
Rosana ficou me olhando, tentando parecer segura, mas evidentemente nervosa. Ela nunca devia ter sido ameaçada na vida.
- E se as ameaças futuras não te assustarem o suficiente, ou se você achar que não terei coragem para tanto... Está vendo meu lindo cachorrinho? – Passei a mão pela cabeça de Stevie, que latiu bem alto. Rosana estremeceu. – Nunca se sabe quando ele vai se soltar acidentalmente. Fui clara?
Depois de um instante emburrada, a garota assentiu.
- Ótimo. – Sorri. – E claro, se eu suspeitar de que você contou ao sobre essa conversa, não vou esperar você dar em cima dele para cumprir minhas ameaças.
- Você é uma falsa cínica!
- Pode até ser verdade, mas em quem você acha que ele acreditaria? Na doce , ou na garota que vem atacando ele dia após dia? Não seja bobinha, Rose.
Rosana não respondeu, mas pela sua cara estava bem claro que ela não contaria.
Me levantei e puxei Stevie, mas então me lembrei de algo que me perturbaria se eu não soubesse.
- Mais uma coisa. – Me virei para Rosana de novo. – O que foi que aconteceu entre você e na sua casa?
A garota abriu a boca, e então sorriu.
- Fica para sua imaginação. – Disse.
Dei uma risada debochada, mas muito segura.
- Fica mesmo? – Soltei um pouco a corrente de Stevie, que voou para o lado dela. Claro que ele só queria brincar, mas ela não precisava saber. Rosana recuou enquanto eu deixava que ele chegasse bem perto.
- NADA! NÃO ACONTECEU NADA! – Ela gritou. – EU JURO. QUASE ACONTECEU, MAS ELE FOI EMBORA!
Meu coração se encheu de felicidade ao ouvir aquilo, e eu puxei a corrente de Stevie de volta, sorrindo.
- Era tudo que eu queria ouvir. – Sorri. – Vejo você na escola, Rose.
POV
- Não acredito que você conheceu a Mokona! – Eu exclamava estupefato, enquanto Summer me contava sobre sua viagem para o Japão, nas últimas férias.
- Eu fiquei meio congelada, sabe? – Summer ria. – Eu não falei com ela, é claro, porque ela já estava indo embora, mas... – Suspirou. – Foi tão incrível. De repente, eu só conseguia pensar em como você ficaria maluco se estivesse lá.
Sorri, achando graça. Mokona era uma das escritoras de um desenho que nós assistíamos quando pequenos, Sakura Card Captors. Um dia, tínhamos decidido descobrir quem eram os criadores dele, e lembro que ficamos estupefatos ao descobrir que havia sido um grupo de escritoras, e não apenas uma pessoa. Na época, até tentamos desenhar nossa própria estória juntos, mas desistimos logo porque éramos péssimos com desenhos.
- Juro. – Ela reforçou. – Isso não saia da minha cabeça.
- Talvez devêssemos ir atrás dela no Japão. – Brinquei. – Dessa vez eu a seguraria e a obrigaria a tirar uma foto com você.
- E a polícia nos pegaria. – Sum sorriu. – Será que a polícia japonesa tem superpoderes?
- Será que eles soltam faísca quando se machucam?
- E será que as viaturas deles se transformam em robôs gigantes?
Nos encaramos por um instante, e então começamos a rir. Era incrível como a sensação era a mesma de estar com a Summer de doze anos de novo, a antes de nos separarmos. Ela não tinha mudado em nada. E ela fazia parecer que eu também não tinha.
- Ah, eu senti tanta falta de conversar com você, por tanto tempo. – Ela recostou preguiçosamente no sofá, encarando o teto.
- Bem, você pode conversar agora. – Respondi do mesmo modo.
Summer sorriu para mim. Depois, seus olhos pousaram no violão sobre a poltrona.
- Você aprendeu a tocar violão. – Observou. – Você sempre quis tocar.
- Você também. – Lembrei.
- É verdade. – Ficou pensativa. – Eu adorava quando o senhor Wilson tocava violão no fim da tarde.
- E por que você não aprende agora?
Ela piscou, depois balançou a cabeça.
- Porque não tenho muito tempo livre fixo, eu acho. – Respondeu. – É complicado entrar num curso assim.
- E se você tivesse um professor particular? – Sugeri.
Summer me olhou e sorriu, suspeitando do que eu diria a seguir. Mas antes que eu o fizesse, a porta bateu. Pensei que fosse de volta, mas era Miguel.
- ? – Ele parou quando nos viu.
- Miguel. – Eu disse, tentando não parecer assustado. – foi comprar fermento para um bolo e me pediu para ficar aqui. Esta é Summer. Ela veio visita-la.
- Oi! – Summer sorriu, sem parecer temer nem um pouco a cara séria de Miguel. – Você deve ser o irmão postiço da . É um prazer conhecê-lo.
- O prazer é meu, Summer. – Para minha surpresa, ele sorriu um pouco. Depois foi para seu quarto.
Summer olhou para mim e deu de ombros, sorrindo. Era mesmo como ter aquela garotinha loura de volta. Quando éramos crianças, Summer não tinha medo de nada. De ninguém. Estava sempre alegre e curiosa, mesmo nas situações mais inesperadas.
- E então, o que você acha? – Eu trouxe o assunto de volta.
- De quê? – Ela inclinou a cabeça para o lado.
- De aprender a tocar violão. De eu ser o seu professor de violão.
A garota ponderou por um instante, e então assentiu devagar.
- Eu ia adorar.
Fiquei muito empolgado em ouvir aquilo. A verdade era que tinha bloqueado a saudade que sentia de Summer por tanto tempo, que tudo parecia vir de uma vez agora. Ia começar a conversar sobre o assunto, mas a porta bateu de novo.
- Você voltou! – Summer exclamou quando apareceu.
Ela olhou para nós dóis. Seu rosto estava um pouco vermelho, parecia um pouco agitada. Stevie devia tê-la cansado.
- Sim. – assentiu. – Eu trouxe o fermento. – Sorriu. – Querem me ajudar com o bolo?
- Claro. – A outra desceu do sofá.
E eu as segui, trocando um olhar rápido com Summer que oficializava nossos planos futuros.
17- The man who never lied
“But I just couldn’t break your heart…”
[…]
- Por que afinal o papai tinha que cismar com essa história de exame? Eu estou bem! – Resmunguei sentada no banco do carona.
- Você parecia mal, , Jack ficou assustado. – Miguel disse apenas. – Pais são assim.
- Sei disso; sou filha de Jaqueline Vicentini, lembra? A neurótica.
Miguel riu e balançou a cabeça. Ele sabia que minha mãe sempre fora super preocupada com tudo, o que se intensificava bastante pelo fato de ela viver com meu pai, que não ligava para nada. Esse era mais um motivo para a separação deles.
- Vai perder algo muito importante na primeira aula? – O rapaz quis saber.
- Não realmente. – Suspirei.
A verdade era que eu estava chateada por perder a aula porque, por um compromisso aleatório, a senhora Turttle adiantaria a aula de economia doméstica de quarta-feira para a terça-feira naquela semana; o que significava que eu não teria nem sequer uma aula com nos próximos dias, já que estava perdendo nossa única juntos.
- Sabe, eu falei com sua mãe ontem. – Miguel disse então.
- É mesmo? – Me surpreendi. – Mas ninguém me contou que ela tinha ligado.
- Não era nada demais. Ela só queria saber como estavam as coisas por aqui, e acabamos conversando um pouco.
- Ah. – Forcei um sorriso. – Legal. – Me virei para a janela.
Mas Miguel ainda não tinha encerrado o assunto, para meu azar.
- Ela me contou que você passou as últimas férias em Venice Beach, na casa dos parentes do seu pai. – Ele continuou, e o rumo da conversa me deixou um pouco tensa.
- Sim, eu passei. – Me obriguei a encará-lo. – Foi... Divertido.
- Posso imaginar. – Miguel voltou a encarar a estrada à frente. – Ela disse que você conheceu um garoto lá, um garoto daqui de Jacksonville Beach.
Era justamente o que eu temia. Meu corpo inteiro pareceu congelar quando as palavras saíram da boca de Miguel, que me olhava de soslaio, indagativo. Engoli em seco sem intenção e acabei tendo um acesso de tosse nervosa, engasgada com toda aquela confusão.
- , está tudo bem?
- Eu... – Tosse mais um pouco. – Estou... Só... Preciso beber alguma coisa. Logo. Minha garganta está... – Tossi mais.
- Calma, fique calma.
Miguel parou o carro no acostamento, perto de um trailer-lanchonete, e desceu do veículo. Enquanto ele comprava uma bebida para mim, consegui me tranquilizar o suficiente para praguejar mentalmente e reclamar da minha mãe por pensamento.
Por que ela tinha que ser tão bocuda?! Eu pensava que ela tinha esquecido a maldita história do garoto de Venice Beach!
- Pronto, aqui está. – Miguel entrou no carro de novo, estendendo uma lata de refrigerante já aberta na minha direção.
- Obrigada. – Peguei-a das mãos dele e dei um longo gole, respirando fundo em seguida.
- E então, era o ?
Olhei para ele sem entender.
- O quê?
- O garoto que você conheceu nas férias. – Miguel repetiu. – Era o ?
Como eu poderia dizer que era e como eu poderia dizer que não? Se eu mentisse dizendo que era meu namoradinho do verão, Miguel poderia comentar o assunto com meu pai, que me desmentiria por não fazer ideia de nada. Mas se eu contasse que tinha saído com em Venice, ele poderia, por causa do nome, fazer a ligação do garoto com o tal namorado de quem Summer falava, e aí ia começar a desconfiar de tudo.
- Não era o , não. – Balancei a cabeça, ainda pensando no que dizer.
- Jaqueline disse que sua tia ouviu sua prima falando no telefone com você sobre vocês estarem na mesma escola agora. – Ele perguntou com curiosidade. – Então quem é?
- É, ele estuda na Jacksonville High... – Concordei. – Ele é o... .
O quão tarde será que era para colar minha boca com super bonder?
- . – Miguel meneou a cabeça. – E vocês ainda se falam?
- Até que sim. O joga no time de futebol, andamos juntos às vezes. – Meu Deus, , pare de dar informações!
- E o sabe que vocês já saíram juntos antes?
- ? Sabe, ele sabe, sim. Eu ainda estava bem abalada por causa do quando cheguei aqui e eu contava tudo a ele, então... Ele sabe.
- Pelo jeito como fala, esse não parece ser boa coisa. – Ele comentou. – Mas é melhor mesmo que tenha contado tudo ao . Mentiras só atrapalham.
Ah, meu caro Miguel, não faz ideia de como eu concordo com você.
🌴💚🌴
Cheguei à escola morrendo de raiva, incrédula com a minha própria capacidade de ser uma idiota.
Por Deus, o que eu ia fazer agora?!
, , ... Eu não parava de envolver os outros nas minhas mentiras absurdas!
O que eu faria agora? Contaria a alguém o que tinha inventado para Miguel? Eu tinha que contar, não é? Ou tudo daria errado.
Mas tinha prometido a não colocá-lo em mais mentiras sem avisar antes! O que eu ia fazer? O QUE EU IA FAZER?
- Ei, ! – Amber Hayley parou alegremente em frente a mim no corredor.
- Ei, Amber! – Forcei um sorriso, não querendo perder tempo com nenhuma coisa boba.
- Sem querer te pegar de surpresa, porque sei que sua agenda deve ser super ocupada, mas eu precisava fazer umas compras e Summer não vai poder ir, e Jas anda com um mau humor pavoroso, então andei pensando se você não gostaria de ir comigo ao shopping amanhã à tarde.
- Amanhã? – Quase não consegui esconder minha careta, me imaginando uma tarde inteira sozinha com Amber.
- É, amanhã! O vai estar lá, é claro, mas ele anda tão cansado com os treinos que acho que nem vai conseguir opinar, então...
Então a resposta se acendeu sobre minha cabeça como uma lâmpada.
! Era para ele que eu tinha que contar!
Ele impediria de se meter em problemas com Miguel, conseguiria administrar a situação. E se eu estivesse com ele e Amber no shopping, poderia falar com ele longe de .
- Não precisa falar mais nada, Amber. – Eu toquei o ombro da menina, dessa vez sorrindo de verdade. – Eu vou com você.
- Sabia que poderia contar com você! – Alegre, ela agarrou meu braço, e nem me incomodei quando ela saiu me puxando, falando sobre mil futilidades.
Depois de uma manhã relativamente tranquila acreditando que tudo correria segundo o plano, joguei minha mochila nas costas e segui sozinha para o refeitório no horário do almoço. Sabia que não poderia falar nada com sobre o que precisava ali, mas tinha que perguntar a ele como, por todos os santos, ele estava conseguindo suportar Amber vinte e quatro horas por dia. A garota tinha conseguido me deixar nervosa com toda aquela conversa sobre unhas de gel e a nova dieta dela!
Foi só quando entrei no refeitório que percebi uma movimentação estranha. Olhares que se voltavam para outro lugar que não a mesa VIP, pessoas mudando o fluxo de seus caminhos. De repente, percebi que Summer Olsen não estava sentada com as líderes de torcida e os jogadores.
Meus olhos varreram o lugar, e quando finalmente a encontrei, não entendi muito bem. Summer estava sentada à minha mesa – nos fundos do refeitório, com e .
Fiquei ligeiramente incomodada com a atenção que estava recebendo de todas as mesas enquanto andava, visto que agora todos pareciam olhar para mim em busca de uma explicação. Era como se a abelha rainha da colmeia tivesse mudado de lugar ou desaparecido, e todos estavam desorientados, e eu era a nova dama de companhia da abelha rainha, então devia entender melhor do que eles.
Engolindo em seco e tentando não encarar demais ninguém, segui para minha mesa. Quando passei em frente à mesa VIP, Jodi e Emma – que pareciam o próprio retrato da confusão – se levantaram com suas bandejas e me seguiram apressadamente.
- Ok, alguém me explique o que está acontecendo. – Eu disse parando em frente à minha mesa. acenou para mim. Summer virou o rosto em minha direção, um sorrisinho no canto da boca.
- Oi, meninas! – Ela disse. – Não fiquem aí paradas feito estátuas vivas. – Chegou para o lado para que nos sentássemos, ficando bem de frente para .
É claro que eu não ia ficar parada. Aquela era minha mesa, e por sinal ela estava no meu lugar agora.
Me sentei, aproximando-me dela, e Jodi ficou ao meu lado, enquanto Emma foi se sentar brutamente ao lado de , que teve que dar um pulo para mais perto de .
- E pensar que as líderes de torcida nem olhavam para minha cara. – comeu um pedaço de bolo de carne.
- Desculpe a confusão, . – Summer tocou minha mão sobre a mesa. – Eu só achei que seria legal ficar um pouco mais com vocês. Às vezes acho que me sinto melhor aqui, sem toda aquela multidão.
- Grande Summer. – Emma fez uma careta. – Passamos pelo inferno por dois anos para nos sentar na mesa VIP e quando conseguimos você simplesmente decide vir para cá! Eu poderia ter me sentado aqui antes se soubesse que teríamos que vir de qualquer jeito, sabia?
- Minha filha, essa mesa pode ser muito mais seletiva do que parece. – a encarou à distância.
- Ah, cale a droga da boca, . – Ela bufou. – Você não deveria estar comendo uma salsicha de tofu com Amber há essa hora por acaso?
- Não mais do que você deveria estar em um pântano com os outros ogros. – devolveu. Emma o fuzilou com o olhar.
- Já chega vocês dois. – Cortei. Então olhei para Summer e dei um sorriso compreensivo. De certa forma, eu podia entender o que ela queria dizer. Embora, é claro, fosse extremamente perigoso tê-la ali uma vez que não sabia que eu tinha inventado todo aquele negócio de ajuda-la com .
- Se se sente bem aqui, Summer. – Dei de ombros. – Bom dia. – Sorri um pouco para .
- Bom dia, Rainbow. – Ele respondeu.
Summer sorriu para nós dois e deu um gole em seu suco de laranja.
- – Ela chamou então. –, a que horas eu posso chegar à sua casa hoje à noite?
Meu garfo parou a meio caminho do filé de frango. Ergui os olhos para ela e então para . Nenhum dos dois pareceu perceber. me olhou de um jeito indagativo.
- Pode chegar às seis. – Ele respondeu depois de um segundo pensando. – Minha mãe vai adorar se jantar conosco. – Abriu um sorriso enorme.
- Diga a ela que vou levar algo para a sobremesa. – A loura sorriu de volta.
arregalou os olhos, apoiando o queixo na mão e encarando o nada de um jeito no mínimo bizarro.
- Você vai à casa do hoje, Sum? – Perguntei então, porque não podia aguentar mais a falta de noção dos dois, conversando sem explicar nada.
- Ah, eu não te contei. Pensei que ele fosse comentar. – Ela olhou para mim. – vai me ensinar a tocar violão.
- É sério? – Jodi sorriu. – Que legal!
- Sum sempre quis aprender, desde que éramos pequenos. – comentou.
- Eu nem imaginava. – Emma disse com sinceridade.
- Vocês sabem, as coisas acontecem diferentes do planejado às vezes. – Sum deu de ombros. – Mas fico feliz por poder retomar isso agora.
- É, as coisas... Elas saem do plano o tempo todo. – Assenti com vontade, tentando normalizar aquilo tudo, mas sem sucesso. – Que bom que é tão legal.
- Ah, o é, sim. – concordou. Tinha saído daquele transe, mas seu olhar ainda parecia levemente maluco. – é um cara ótimo! – Jogou o braço nos ombros do amigo. – O segundo nome dele é prestativo, se querem saber.
Summer riu e Jodi também. Emma rolou os olhos, voltando a comer. Mas eu, eu continuei encarando meu namorado de mentira.
Algo me dizia que aquela novidade seria uma coisa péssima para todos nós e, portanto, eu precisava dar um jeito no problema.
POV
ficou me olhando de um jeito esquisito durante o almoço, e eu tive certeza de que havia algo bem particular se passando por sua cabeça, mas preferi não saber. Estava feliz por Summer estar ali e porque ela parecia melhor conosco do que eu a havia visto em muito tempo.
- Então Summer vai jantar na sua casa hoje. – cruzou os braços quando eu, ela e saíamos do refeitório.
- É, vai. – Concordei. – Minha mãe não vê a Summer tem um bom tempo, acho que ela vai gostar da visita.
- Que gentil da sua parte pensar nisso. – fez uma cara engraçada.
- Legal. Bem legal. Elas devem ter muitos assuntos a colocar em dia não é? – Ela sorriu de um jeito esquisito. – Assim como vocês dois.
- É, devem... Ou não. – Franzi o cenho confuso.
- Pffft! Com certeza elas têm ! – Meu amigo me deu um empurrão. Olhei para ele sem entender.
- Bom, eu vou para a aula então. – juntou as mãos no ar com um barulho forte, me dando um susto. – Nos vemos mais tarde.
se afastou rapidamente e eu encarei .
- Qual é o problema com vocês, hen?!
- QUAL É O NOSSO PROBLEMA, ?! – me encarou ensandecido. – No momento, acho que é você!
- Mas o que...
Antes que eu terminasse, ele saiu me arrastando rumo a nossa aula de Educação Física.
- Que história mais doida é essa de ser professor de violão da Summer, ? – Ele balançava a cabeça, incrédulo. – O que você acha que vai conseguir com isso?
- Ser um cara legal e ajudar minha amiga de infância a realizar um sonho? – Puxei o braço, obrigando ele a me soltar.
parou e respirou fundo, me encarando.
- É sério, . – Disse. – Por mais que a seja doida de pedra, no fundo eu estava feliz por ver você gostando dela, por ver você... Você sabe, progredindo. E aí você me vem com essa agora, meu Deus do céu...
- Não fala besteira, . – Fechei a cara. – Tá entendendo tudo errado.
- Estou mesmo, ? – Ele colocou as mãos na cintura. – Porque o que eu vejo é você sendo legal com a Summer, dando conselhos que ela não vai ouvir e se esforçando pra nada.
- Não é como antes. – Protestei.
E então levei um esbarrão de alguém. Eu e olhamos para o lado ao mesmo tempo.
- Ah, foi mal, . – Junior disse rindo, seguido por sua corja. – Eu não tinha te visto aí.
Quando ele se afastou um pouco, olhou diretamente para mim.
- Agora sim é igualzinho a antes. – Disse com mau humor.
FLASHBACK ON
2 anos atrás; 1º dia de aula daquele ano na Jacksonville High
- Você pegou tudo que precisava? Tem certeza? O dinheiro para uma emergência? Seu celular? – Minha mãe repetiu todas as perguntas pela milésima vez.
- Está tudo aqui, mãe. – Respondi de mau humor. – É só o meu primeiro dia de aula no ensino médio, não uma fuga da polícia.
- Certo, tudo bem então. – Ela respirou fundo. – Vai dar tudo certo. Para nós dois.
- Você vai se sair bem no seu primeiro dia de trabalho, mãe. – Tirei o cinto. – E eu no meu. – Abri a porta e saí do carro.
- ! – Ela chamou quando eu já me afastava.
Me virei para trás. Minha mãe sorriu.
- Boa sorte.
- Pra você também. – Tentei sorrir um pouco, e então ela se foi.
Parei em frente à entrada da Jacksonville Beach High School e respirei fundo então. Ela era enorme. Assustadora.
Durante os últimos anos, eu tinha estudado em uma escola bem menor, mas sabia que muitos dos meus colegas também tinham se mudado para a Jacksonville High para o ensino médio. Infelizmente muitos deles não eram exatamente mais meus colegas. Depois da separação dos meus pais, eu tinha me afastado de todo mundo, e quando dei por mim, a maioria das pessoas tinha se afastado de mim também. Não que fizesse mesmo diferença; afinal, eu gostava de outras coisas e tinha outras ideias agora, estava muito diferente de antes.
Mas tinha que admitir que era um pouco assustador olhar para aquele lugar gigante e estar sozinho. Sempre imaginei que eu e minha melhor amiga chegaríamos juntos ao ensino médio. Que nosso primeiro ano seria cheio de aventuras malucas e fugas escondidos para festas. As coisas mudavam.
- EI, CALOURO, SAI DA FRENTE! – Alguém gritou.
Dei alguns passos para o lado bem a tempo de escapar de ser atingido por um grupo de veteranos, que puxava pelos braços e a gola da camisa um garoto que devia ter a minha idade, de olhos e cabelo . Por um segundo, pensei que ele precisava de ajuda. Cogitei fazer alguma coisa, mas então percebi que ele estava rindo.
- Abram caminho para o irmão pirralho de Patrick ! – Os veteranos gritavam em meio a risadas.
Tudo bem, o tal garoto não estava sozinho como eu. Eles conheciam o irmão mais velho dele, pelo que entendi, e não pareciam dispostos a deixa-lo se sentir um peixe fora d’água. Por sinal, exatamente o que eu era naquele momento.
Decidi que já tinha enrolado demais. Ajeitei a mochila e entrei na Jacksonville High.
🌴💚🌴
Minha primeira aula seria a de Biologia. O professor era um tal de senhor Ackles, e por algum motivo eu tinha achado esse nome engraçado pra caramba. Imaginei que ele fosse ser um cara divertido também.
Quando cheguei à sala de aula que meu horário pessoal informava, percebi que havia algo errado. A sala não era um laboratório, como era de se esperar numa aula de Biologia.
Droga, será que havia algo errado com o horário que eu tinha pegado? A última coisa que eu queria era ter que sair por aí procurando o laboratório – os veteranos iam achar essa a chance perfeita de curtir com a cara do novo calouro. Estava certo de que se tivesse que perguntar a alguém, iria acabar parando na dispensa ou no armário de vassouras.
- A sala é essa mesma, se quer saber. – A voz suave disse atrás de mim, me fazendo congelar. Eu reconheceria aquela voz em qualquer lugar.
Me virei para trás e dei de cara com Summer Olsen, me olhando sem esboçar nenhuma reação de fato.
Summer Olsen, aquela que tinha crescido comigo e com quem eu costumava caçar bichinhos na praia. Summer Olsen, que tinha ficado mais alta que eu do nada aos doze anos, me deixando morrendo de vergonha de andar com ela, mas que agora parecia estar uns dois centímetros menor que eu. Summer Olsen, de quem eu tinha fugido descaradamente no último ano, sendo um idiota e o pior amigo que alguém poderia ter. Summer Olsen. A garota mais linda que eu conhecia, Summer Olsen.
- Obrigado. – Murmurei. – Faz um tempão que a gente não se vê, não é verdade?
Summer desfez a expressão de nada do rosto, ponderando sobre meu comentário.
- É verdade. – Disse. – Eu fui para o acampamento de modelos nas férias. Meus pais me deixaram escolher dessa vez.
- Puxa, isso é legal. – Assenti. Summer sonhava em ser modelo desde os dez anos. Isso ou Bióloga, mas não havia um acampamento de Biologia nas redondezas, provavelmente.
- E você? Como estão as coisas?
- Bem. Eu estou legal. – Sorri um pouco, e então ela sorriu de volta, colocando o cabelo louro atrás da orelha.
Um homem de talvez uns trinta anos apareceu logo atrás dela, encarando a turma por cima de óculos quadrados.
- Certo, vão para os seus lugares, calouros. – Ele disse, e percebendo que se tratava do tal senhor Ackles, procuramos nos sentar. Fiquei na fileira do meio, bem no centro da sala, e Summer na primeira carteira.
- Como podem notar, nosso laboratório está com problemas. – O professor continuou. – Ele está sempre com problemas. – Acrescentou com um suspiro desanimado. – Mas vamos tentar fazer com que este seja um bom ano, apesar de tudo.
Ele começou a escrever alguma coisa no quadro, mas tudo que eu conseguia fazer era prestar atenção em Summer. Enquanto eu estava ali ainda perdido, dois outros alunos já estavam puxando assunto com ela, que respondia com um sorriso.
Vai começar tudo de novo, pensei. Eu já deveria saber.
Não tive a chance de fazer muitos amigos durante as primeiras aulas, embora não soubesse de fato como fazer isso. Todos pareciam ter criado uma conexão natural com alguém nos primeiros cinco minutos de aula, mas eu ainda estava meio deslocado, embora uma garota tivesse me ajudado a encontrar a sala de aula seguinte. Summer não faria aquela matéria comigo, então no fim não tentei puxar muito assunto com ninguém. Os professores em suma usaram aquele dia para explicar o funcionamento da Jacksonville High e dar dicas, falar sobre sua matéria e coisas do tipo. Não havia muito o que falar, nem tempo para conversar.
Segui sozinho para o refeitório na hora do almoço, já sofrendo por antecipação enquanto imaginava onde iria me sentar. Tinha certeza que todos teriam um lugar com seus novos melhores amigos para sempre e eu acabaria sentado no gramado do lado de fora. Não que isso fosse tão ruim, mas tinha chovido naquela manhã e a grama devia estar encharcada.
A fila da cantina estava enorme quando entrei nela. Os calouros se acotovelavam falando sem parar sobre as primeiras horas ali.
Vi aquele mesmo garoto que tinha visto ser puxado naquela manhã. Ele estava encostado tranquilamente a uma parede nos fundos e havia outro garoto ao seu lado, com o cabelo mais escuro. Enquanto eles conversavam, alguns outros meninos se aproximaram deles. Me perguntei se eu conseguiria me aproximar também. Quer dizer, não tínhamos nenhuma aula juntos até então, mas talvez eu pudesse passar aquele intervalo com eles.
Foi então que entraram no refeitório alguns dos veteranos que o estavam puxando mais cedo. Reparei que um deles usava um casaco com o desenho do mascote do time da escola, o espadarte. O rapaz subiu na mesa onde estavam sentadas várias garotas – pelo perfil, imaginei que fossem líderes de torcida. Elas riram e deram gritinhos, e então ele começou a falar:
- Bom dia, calouros! Espero que estejam tendo um primeiro dia bem traumático, do jeito que deve ser. – Disse em voz alta, e muitas pessoas ali riram. – Eu sou Alex Anderson, o capitão do Swordfish, o melhor time de futebol da costa. – Os outros alunos bateram palmas e assoviaram. – Estou aqui para anunciar que amanhã às duas da tarde faremos uma reunião para falar sobre o processo seletivo do time deste ano. Todos que tiverem interesse em jogar futebol na Jacksonville High devem comparecer. Eu e o resto do time prometemos ser... acolhedores. – Ele olhou para os amigos e riu. – Esperamos vê-los lá. – Então Alex saltou da mesa e se sentou junto com as garotas, acompanhado de seus amigos.
Passou pela minha cabeça que os jogadores deviam estar armando alguma para o dia seguinte, mas eu não jogava mais futebol há tempos, então não achava que estaria lá.
- Cara, não seria irado entrar para o time de futebol no nosso primeiro ano? – Alguém disse.
Olhei para trás e encontrei um garoto mais ou menos da minha altura, usando uma camisa xadrez sobre uma blusa com estampa de stormtrooper.
- Eu não pretendo ir. – Balancei a cabeça. – Sei lá, acho que eles estão armando alguma.
- Pft, é claro que estão! – O garoto riu. – Mas quem se importa? Não deve ser difícil descobrir o que é. O lance é que essa é a nossa chance de nos socializar. Somos calouros, precisamos de um grupo, e que grupo poderia ser melhor que o dos jogadores? Estaríamos protegidos dos valentões, teríamos desculpas para faltar aulas e, a melhor parte, as líderes de torcida iriam nos amar. – Ele suspirou encarando a mesa onde Anderson havia se sentado. Então olhou para mim e estendeu a mão. – Sou , a propósito.
- . – Apertei a mão dele. – .
- E então, qual é sua próxima aula?
- Matemática Financeira.
- Cara, que coincidência! – Ele abriu um sorriso de orelha a orelha. – A minha também!
🌴💚🌴
O tal não só estava na minha classe de Matemática Financeira, mas também na de História e na de Educação Física. Ele falava à beça, o que me deixava meio louco às vezes, mas era bom que alguém estivesse falando comigo, no fim das contas. E também, não era de todo ruim – os assuntos dele eram até interessantes. Ele era maluco por filmes de sci-fi e quadrinhos, e aparentemente entendia um bocado de coisas inúteis e já sabia de cor a ficha de vários dos nossos novos colegas de classe. Andar com ele fazia com que eu me sentisse menos perdido naquele lugar.
- Eu sabia que você vinha! – O garoto sorriu quando viu que eu me aproximava.
- Tá, mas eu só vou participar da reunião por ora. – Lembrei. – Não quer dizer que vou entrar no time.
- Eu não disse nada. – ergueu as mãos inocentemente.
- Claro que não. – Rolei os olhos. – Vamos logo.
Seguimos juntos para o campo de futebol da Jacksonville High, seguindo o mapa horroroso que tinha desenhado em sua primeira visita ao lugar. Os jogadores estavam papeando despreocupadamente no campo de futebol, enquanto a maioria dos calouros se encontrava sentada na arquibancada, o nervosismo evidente.
Aquele garoto que eu vira no dia anterior estava lá. Quando ele passou pelo grupo de veteranos, um deles agarrou o braço dele e disse alguma coisa. O garoto sorriu e deu de ombros, indo se juntar aos amigos calouros.
- Eles devem estar armando alguma coisa cruel. – , sentando-se no banco, observou os jogadores.
- E você ainda quer ficar pra ver. – Resmunguei me sentando ao seu lado.
- Eu posso aguentar qualquer coisa pelas vantagens de ser um jogador, .
- Não sei se eu estou disposto a tanto.
Antes que continuássemos aquela conversa, os jogadores se colocaram diante da arquibancada, batendo palmas para chamar nossa atenção.
- Sejam bem-vindos, calouros! – Alex Anderson cumprimentou. – Fico feliz que pelo visto a vontade de vocês de fazer parte do time tenha superado o medo de levar um trote.
- E vocês não pretendem mesmo aplicar nenhum trote esse ano? – Um dos calouros perguntou com descrença.
Anderson olhou para os amigos e sorriu.
- Talvez, calouro. – Admitiu. – Mas não é por isso que estamos aqui hoje.
- Hoje vamos explicar a vocês o que significa ser um jogador do Swordfish nesta escola. – Um garoto ruivo tomou a frente do discurso.
Os jogadores fizeram um longo discurso explicando as razões para que quiséssemos fazer parte do time. Jogadores tinham infinitas vantagens ali, como ser dispensados das provas em semanas de jogo, poder faltar para viajar para os campeonatos, entre outras coisas. Havia também a já sabida proximidade com as líderes de torcida, o que deixava qualquer um muito feliz. Em suma, ser um calouro jogando no time era como ter uma passagem garantida para um ensino médio feito só de diversão, e ainda com a grande possibilidade de ganhar uma bolsa de estudos como atleta no fim.
- O teste será na quinta-feira. – Outro veterano anunciou. – Treinem. Se exercitem. E assim, talvez vocês tenham a chance de se unir a nós este ano.
Os calouros bateram palmas e os veteranos se afastaram. Assim como muitos outros, eu e continuamos sentados.
- Estou com uma péssima intuição. – Murmurei. deu de ombros, fazendo uma careta. Apesar da animação, ele devia concordar que algo estava errado.
Percebi que aquele garoto que eu sempre via – que estava a alguns metros com seu amigo – olhou em nossa direção. Ele disse alguma coisa ao outro garoto e veio para onde estávamos, se sentando ao lado de .
- Isso foi um pouco suspeito, não? – Nos perguntou olhando para o campo. – Sei lá, tudo parece bom demais para ser verdade.
- Era o que eu estava dizendo. – Concordei.
O garoto olhou em minha direção e sorriu, estendendo a mão.
- Sou . . Mas podem me chamar de Junior. E este é o . – Indicou o amigo. Apertei a mão dele e acenei para o outro garoto.
- Sou . . Este é o...
- . – Meu colega estendeu a mão, terminando de se apresentar. – . – O encarou por um instante. – Você por acaso é o irmão mais novo do Patrick ?
Junior o encarou por um segundo e então sorriu de novo, assentindo.
- É, eu sou.
- Eu e meu pai fomos a alguns jogos do seu irmão. – se empolgou. – Ele era... Caramba, ele era muito bom.
- Pat é uma lenda. – disse com admiração. – É uma pena que tenha se formado justo agora que chegamos aqui.
- Mas você pretende continuar a tradição familiar, não é? – Perguntei a Junior. – Entrar para o time, ser famoso. – Brinquei.
- Essa segunda parte fica a seu critério. – Ele riu. – Estamos todos no mesmo barco aqui, . Quem sabe se não são vocês dois que vão entrar no meu lugar?
- Ah, eu não acho nada provável. – riu.
- Bom, nunca se sabe. – se colocou de pé e Junior também. – Nos vemos por aí?
assentiu com vontade.
- Claro! – Exclamou alegre. – Nos vemos por aí. Sem dúvida.
- Bom, até mais. – Junior disse, e eles se afastaram.
Quando os dois já estavam um pouco longe, agarrou na minha camisa, afoito.
- Dá pra acreditar nisso? O irmão mais novo de Pat estava conversando conosco. Sabe o que esse cara é? É nosso ingresso para a popularidade.
- Eu não quero ser popular, . – Balancei a cabeça e me levantei. me seguiu.
- Algumas coisas não são opcionais, . Elas simplesmente estão destinadas a acontecer.
- É, mas...
- ! – Outra voz chamou à distância.
Parei e me virei para trás. também. Summer acenava enquanto corria em nossa direção. Havia uma garota morena – talvez latina – de cabelo longo com ela, parecendo um pouco tímida. Olhei para meu colega, que definitivamente parecia ainda pior que quando Junior se sentara do nosso lado, e decidi me afastar alguns passos dele para falar com ela.
- Sum! – Eu disse quando a menina já estava perto. – O que está fazendo aqui? Pensei que já tinha ido embora.
- Eu fiquei para a reunião com as líderes de torcida...
- Vai fazer teste para a equipe?
- Vou, sim. – Sorriu. – Você veio à reunião do time? Não pensei que quisesse jogar futebol.
- Na verdade, eu vim só por vir. – Dei de ombros.
- Bom, nunca se sabe não é? Talvez você acabe sendo jogador.
- É, talvez. – Concordei.
A garota com Summer pigarreou.
- Summer? – Chamou. – Sem querer ser chata, mas temos que correr.
- Ah, desculpe, Jasmine. Você está certa. – A loura riu. – É uma brincadeira da equipe de torcida com nós calouras. – Me explicou. – Temos essa lista enorme de coisas pra fazer se quisermos nos juntar à equipe. – Mostrou uma folha cheia de itens. – Nos vemos por aí?
- Claro. – Sorri. – A gente se vê.
- Ótimo. – Ela sorriu. – Vamos lá, Jasmine!
As duas saíram correndo, rindo, em direção a algum outro lugar. Junior e , a alguns metros, tiveram que abrir caminho.
- Desculpe! – Summer gritou.
- Sempre que quiserem esbarrar em alguém, estaremos aqui! – gritou de volta, rindo.
Balancei a cabeça, me lembrando então de . O garoto estava ali parado me olhando como se eu tivesse um alvo na testa.
- Qual é o problema? – Perguntei.
- “Oi garota extremamente gata falando comigo do nada, este é meu amigo ”. – Ele repetiu incrédulo. – Era tão difícil assim dizer isso?
- A gente não se conhece nem a quarenta e oito horas. Não somos amigos. – Rolei os olhos, voltando a andar.
- Isso doeu, mas eu vou te desculpar porque sua amiguinha é a caloura mais notada da escola até agora, depois de Junior . – Ele me seguiu. – Sério, como você a conhece?
- Não conheço, ela só me achou bonito e parou pra falar comigo. – Ironizei.
- Ah, claro. Se ela tivesse que achar alguém bonito, é óbvio que seria eu. – bufou. – Onde mesmo é sua casa? – Perguntou sem sair da minha cola, tirando o celular do bolso.
- Na 16th Street N. – Respondi. Depois franzi o cenho. – Por quê?
- Nada demais. É que eu preciso avisar a minha mãe onde vou passar o resto da tarde. – Ele disse simplesmente. Abri a boca para protestar, mas ele fez sinal para que eu me calasse, já falando ao telefone. – E aí, mãe? É. Olha, eu só vou para casa mais tarde. Vou ficar na casa do . É...
continuou explicando a mãe dele como ia passar a tarde enfurnado na minha casa, deixando de lado, é claro, a parte de que eu nunca o convidara para ir até lá.
🌴💚🌴
- Falando sério, de onde conhece Summer Olsen? – perguntou de novo naquela tarde. Estávamos no meu quintal, treinando para o teste.
- Você sabe o quanto é assustador que saiba nome e sobrenome de todo mundo no segundo dia de aula, né? – Ergui uma sobrancelha e ele deu de ombros. – Ela era minha vizinha. Éramos amigos.
- Quão amigos vocês eram? – Ele chutou para mim. Fiz uma careta. – Só pra saber.
- Melhores amigos. – Respondi por fim. – Mas isso foi antes.
- E por que diabos você deixaria de ser amigo daquela divindade?!
- Porque... Um monte de coisa aconteceu, ! – Peguei a bola com as mãos e me sentei no chão, exasperado com aquele interrogatório. pareceu assustado com a minha reação, mas não me importei. – Nós andávamos juntos, aí ela se mudou, meus pais se separaram de um jeito nada amigável e minha vida virou uma merda. A Summer sempre viveu cercada de amigos, e eu estava entre eles, mas fui me afastando de todo mundo, e quando vi, não éramos mais como antes.
ficou calado, sem saber o que fazer em seguida. Imaginei que depois de todo aquele drama ele iria simplesmente ir embora, mas em vez disso ele se aproximou e se sentou ao meu lado na grama.
- Entendi agora. – Ele disse. – Foi mal por ser um intrometido. Eu não consigo controlar às vezes. Na maioria delas.
- Tudo bem. – Balancei a cabeça.
- Eu imagino que isso tudo tenha sido uma merda. Quer dizer, parece uma droga pra mim. – Assentiu. – Mas talvez, se entrarmos para o time e a Summer para a torcida, vocês acabem se aproximando de novo! – Me empurrou de leve, esperançoso. – Os jogadores e as animadoras fazem tudo juntos, vocês vão se ver o tempo todo. As coisas podem voltar a ser como antes. Talvez melhores. – Ergueu as sobrancelhas sugestivamente, e eu acabei rindo.
- É, talvez você esteja certo. – Concordei. Pelo visto não era tão chato quanto eu havia pensado.
- E então, vamos treinar para entrar nessa porcaria de time ou não? – Ele se colocou de pé, tomando a bola das minhas mãos.
- Vamos. – Fiquei de pé com a ajuda dele e sorri, ainda segurando sua mão. – Nós vamos entrar para os Swordfishes.
🌴💚🌴
Nós estávamos sentados no gramado do lado de fora – uma vez que o dia amanhecera ensolarado naquele dia – repassando nossa estratégia para o teste. estava empenhado em fazer tudo dar certo, mas eu me distraía um pouco com Summer ensaiando alguns passos para o teste da torcida com a ajuda de Natasha Meyer, a capitã das líderes. Teoricamente Sum nem tinha entrado para a equipe ainda, mas era fácil ver que elas a queriam nela.
- , você ouviu alguma coisa do que eu acabei de dizer? – me deu um cutucão. Olhei para ele meio perdido, mas assenti.
- Mas é claro que ouvi.
- O que foi que eu falei então?
- Você falou sobre... Futebol. – Dei de ombros.
- Pro inferno, . – Ele me empurrou, seus olhos encontrando Summer a distância. – Falando sério, você gosta dessa garota, né? E não estou falando desse papo de amiguinhos. Você é afim dela.
- Óbvio que não. – Neguei.
- Ah, tá bom. E eu não queria pegar a Natasha.
Eu ri do comentário, especialmente pensando no quão impossível aquilo seria ainda que ele fosse do time. Mas antes que pudesse fazer minha piada, alguém se jogou no chão perto de nós. Era Junior , junto de seu amigo .
- E aí, pessoal? – Ele sorriu amigavelmente, mas parecia ansioso.
- Junior. – Cumprimentei. – E aí?
- É o seguinte: Junior e eu descobrimos uma coisa. – informou em de conchavo.
- Coisa? – se inclinou para mais perto. – Que coisa?
- É o seguinte. – Junior falou, olhando para os lados como que para ter certeza de que estávamos sozinhos. – Ontem à noite, e eu estávamos na praia, praticando para o teste, quando ouvimos a voz do Anderson. Nós nos escondemos e o vimos falando ao telefone num quiosque.
- Ele estava falando sobre o trote. – esclareceu.
- Ah, Deus. – arregalou os olhos. – E o que ele disse?
- Ele disse que eles se reuniriam para combinar o que farão conosco aqui, no campo de futebol. – Junior explicou. – A reunião deles vai ser hoje à noite, às sete. Eu e tivemos uma ideia, e achamos que vocês mereciam saber também.
- Qual é a ideia? – Perguntei. Junior olhou para e sorriu, voltando-se para nós de novo.
- Nós vamos vir aqui hoje à noite e nos esconder debaixo das arquibancadas. – Revelou. – Vamos descobrir o que eles estão armando pra podermos escapar.
- Uow, isso é um pouco arriscado, não é? – ergueu as sobrancelhas. – E se eles nos pegarem?
- Não se preocupe, eles não vão. – dispensou a possibilidade. – Eu e Junior nos escondemos lá várias vezes para ouvir conversas do Pat.
- É verdade. – Junior confirmou. – Nós viemos falar com vocês porque pensamos que talvez quisessem vir também.
- Tem certeza de que eles não vão conseguir nos ver? – Questionei, meio em dúvida.
- Absoluta, . – Junior riu. – Além disso, o que pode acontecer se eles nos virem?
Olhei para , que deu de ombros, e então para Summer, à distância.
- Certo. – Decidi. – Nós vamos vir.
- Ótimo! – Junior comemorou. – Nos vemos debaixo da arquibancada esquerda à noite então.
- Às sete, não é? – Sorri, já mais animado.
- Às sete. – confirmou, colocando-se de pé junto com Junior. – Fizeram a escolha de suas vidas, rapazes. Nos vemos mais tarde.
Os dois acenaram e se afastaram.
- Uau, não é incrível? – sorria, abobalhado. – Parece que vamos mesmo entrar para o time.
- É, parece que vamos. – Concordei feliz, me deitando de vez na grama. Talvez estivesse um pouquinho certo sobre eu ter uma queda por Summer Olsen.
🌴💚🌴
Por sorte, naquela noite minha mãe aceitou um convite para jantar de seu novo colega de trabalho, Henry. Ao que parecia, ela tinha uma queda pelo sotaque britânico dele, mas fazia de tudo para esconder isso, pois achava que eu ia me chatear. Ela estava enganada.
- Certo, eu deixei a comida pronta. – Ela explicava aflita, andando pela casa. – Se precisar de qualquer coisa, é só me ligar. E o telefone do restaurante é...
- Eu já sei, mãe. – Tranquilizei-a. – Vai ficar tudo bem.
Alguém buzinou do lado de fora.
- É ele. – Ela respirou fundo. – É sério, . Qualquer coisa, só precisa me ligar.
- Divirta-se, mãe. – Dei um beijo em sua bochecha. – A senhora está linda.
Minha mãe sorriu, respirou fundo de novo e saiu de casa. Fui para a janela e acenei para o tal Henry, que ajeitou os óculos e acenou de volta alegremente. Esperei para ver se ele abriria a porta do carro para ela, e ele o fez. Um ponto para ele.
Dei um tempo até que eles se afastassem e então subi as escadas correndo para trocar de roupa.
- Ei, ! – Ouvi a voz de lá embaixo bem quando fechava o botão da calça.
- Já vou descer! – Avisei pela janela.
Quando cheguei ao quintal, usava uma blusa camuflada e uma blusa de capuz preta.
- Você deve pensar que é um agente secreto, né? – Rolei os olhos.
- E não sou? – Ele sorriu. – Descobrindo os planos secretos de um grupo de pessoas poderosas e inescrupulosas. Parece coisa de agente pra mim.
Balancei a cabeça e ri, tomando o rumo do fim da rua.
- Ei, para onde está indo? – perguntou confuso.
- Para o ponto de ônibus. – Falei como se fosse óbvio. – O que você esperava?
- Que você fosse pegar emprestado o carro da sua mãe que acabou de sair? Qual é, .
- Nem pensar, ! – Franzi o cenho. – Você ficou maluco? Não quero acabar na cadeia. Ainda estou tirando a carteira.
- Ah, , não pode me fazer pegar um ônibus há essa hora! Eu nem trouxe dinheiro. E não vamos ser presos, meu pai trabalha na polícia. – Ele correu atrás de mim e eu grunhi. – O que pode acontecer de mau? Vamos ficar lá por no máximo uma maldita hora e voltar na velocidade permitida. Estamos a um quilometro e meio da escola, não há cem anos luz.
Parei e o encarei com uma expressão de poucos amigos. me mostrou o celular, que mostrava que já eram 6:40 p.m. Eu tinha precisado esperar até que mamãe saísse, então já estava quase na hora marcada pelos veteranos.
- Tá, eu dirijo. – Aceitei por fim. – Mas se formos pegos...
- Combinado. – Sorriu, enquanto eu voltava para onde estava o velho fiat uno rules da minha mãe. – Se acontecer qualquer coisa, meu pai limpa sua barra. Ele vai ficar muito feliz em saber que tenho um amigo. Não que eu nunca tenha tido um...
- Tudo bem, ! – Cortei. Por Deus, ele falava demais. – Vamos de uma vez.
Alegre, correu para dentro do carro, jogando-se preguiçosamente no banco do carona. Para o bem dele, era bom mesmo que não fôssemos pegos.
🌴💚🌴
Estacionamos a alguns metros da escola, porque achamos que um carro no estacionamento no meio da noite daria muito na vista. Depois caminhamos – atentos a todo e qualquer barulho – para dentro da Jacksonville High e rumo ao campo de futebol.
- Devíamos ter pegado os telefones daqueles dois. – Eu olhava para os lados.
- Relaxa. – dizia. – Estamos atrasados, os dois já devem estar lá.
Quando chegamos à área aberta, corremos o mais rapidamente possível para baixo da arquibancada, entrando por uma brecha na parte de trás da mesma.
- Eles não estão aqui! – exclamou.
- Percebeu isso naturalmente ou precisou do seu treinamento de agente secreto? – Fiz uma careta. Então ouvi um barulho acima de nós e fiz sinal para que ele se calasse.
Nos aproximamos das frestas do banco e vimos os veteranos se reunirem no gramado. Alex Anderson usava uma touca preta e seu casaco do time, e falava alguma coisa com o veterano de cabelo ruivo que discursara no dia anterior, Max Adams.
- Meus caros colegas de time – Anderson começou a falar mais alto. – Sabemos que temos que fazer uma recepção memorável para os nossos calouros. Este é o último ano da maior parte de nós, então vamos fazer com que o trote seja especial dessa vez.
olhou para mim e levantou os polegares, animado.
- Já temos em mente os candidatos a jogadores mais promissores deste ano, mas ainda faltam algumas etapas para essa escolha...
De repente, deu um pulo ao meu lado.
- Ai! – Exclamou baixinho.
- O que foi? – Me virei para ele.
- Um bicho me mordeu!
- , para de fazer barulho! Eles vão nos ouvir.
- Foi reflexo! – Ele se defendeu.
- Já chega! Vamos prestar aten... – Mas quando olhei de volta para o campo.
- Ué, pra onde eles foram? – ficou confuso.
Foi então que ouvimos o ranger de madeira, e abertura do lugar onde havíamos passado se abrir mais. Max Adams entrou pelo buraco, um sorriso maldoso no rosto.
- Ora, ora, o que temos aqui. – Disse. Demos um passo para trás. – Não adianta correr. Até porque, para onde iriam, não é?
- Encontrou algo de interessante aí embaixo, Max? – A voz de Anderson soou lá em cima.
- Justamente o que estávamos procurando, Alex.
Eles nos arrastaram até o meio do campo, enquanto tentávamos incansavelmente explicar o que tinha acontecido.
- Por favor, por favor! – dizia sendo arrastado por dois caras maiores. – Não fizemos por mal!
- Anda logo, calouro. – O garoto o puxou com mais força.
- Dois espertinhos, vejam só vocês! – Anderson exclamava, fazendo os outros rirem.
- Anderson, sentimos muito. – Tentei nos safar. – Juro que não queríamos estragar a surpresa de vocês...
- Ah, mas vocês não estragaram nada, calouro! – Anderson parou de andar bem no meio do campo. – Estávamos esperando por vocês dois. – Então se virou para os outros. – Meus caros colegas, e ! Nossos convidados de honra da noite!
E eu soube exatamente de duas coisas. A primeira delas era que estávamos fodidos. A segunda era que Junior e tinham armado para nós.
🌴💚🌴
- Ah, droga! Merda, merda! – exclamava abraçando o próprio corpo. – Vocês precisavam mesmo fazer isso? Está congelando aqui!
Lá estávamos nós dois, apenas de cueca, no meio do campo de futebol da Jacksonville Beach High School. Eu nunca tinha sentido tanta vergonha na vida, e só conseguia pensar em assassinar aqueles dois desgraçados.
- Senhores, nosso trote está oficialmente aplicado! – Anderson comemorou junto com os veteranos. – Quanto a vocês, calouros otários, nos vemos amanhã. – Nos encarou. – Espero que tenham aprendido que é muito feio xeretar a vida de seus veteranos.
Rindo, os jogadores começaram a se afastar de nós, deixando-nos ali, sem roupas, no frio do início de outono.
- Ei, o que vão fazer com as nossas roupas?! – Gritei.
[N/A: Ok, podem colocar pra tocar essa agora, ladies]
- Vamos deixar amanhã no mesmo lugar onde as perderam. – Max falou. – No meio do campo de futebol!
Eles foram embora gargalhando, e vimos, depois de alguns instantes, seus carros passando a toda do lado de fora da escola.
- Merda. – murmurou. – Merda! Merda! Merda! – Chutou o gramado. – Desgraçados!
- Nós devíamos ter desconfiado! – Exclamei irado.
Meu amigo parou e respirou fundo, balançando a cabeça.
- Tá legal, vamos embora de uma vez. – Começou a andar. – Só quero comer porcarias, dormir e fingir que isso nunca aconteceu.
Eu comecei a segui-lo, mas então parei, em choque.
- Porra. – Murmurei. parou e se virou para trás.
- O que foi? – Perguntou devagar.
- A chave do carro. – Respondi no mesmo ritmo. – Estava no bolso da minha calça.
voltou a chutar o chão, totalmente fora de si.
- Ah, não, ! Mas que merda! Por quê?!
- O que você queria? – Falei desesperado. – Que eu adivinhasse o futuro e guardasse ela na roupa de baixo?
- Mas que inferno! O que vamos fazer agora?
- Podemos pegar um ônibus ou correr por um quilômetro e meio. Mas temos que sair logo daqui.
- Tenho a sensação de que a qualquer momento vão aparecer pessoas com câmeras! – choramingou enquanto começávamos a correr.
Fomos a toda velocidade até um pouco depois do ginásio, onde ouvimos vozes – vozes femininas, para melhorar – rindo e gritando.
- Era só o que faltava! – exclamou. – Mas que porcaria de noite!
Procuramos um lugar para nos esconder, mas não havia nada por perto. Nossa única solução era correr mais, mas não tivemos tempo. Duas garotas vieram correndo na mesma direção que nós, usando biquínis e parecendo desesperadas. Reconheci uma delas, que morava numa rua perto da minha. Jodi alguma coisa. Ela usava aparelho, era baixinha e tinha um cabelo meio rebelde. A outra garota com ela eu não conhecia. Tinha as sobrancelhas grossas assustadoras e usava um aparelho freio de burro, o cabelo escuro estava preso num rabo de cavalo.
- Malditas líderes de torcida! – A garota com Jodi exclamava. – Malditas, quero matar todas!
Provavelmente elas tinham acabado de passar pela mesma situação que nós. olhou para mim meio sem saber o que fazer, quando elas finalmente notaram nossa presença.
- Oh meu Deus! – Jodi tentou se cobrir com as mãos.
- Mas que... – A outra garota nos fuzilou com os olhos.
Depois de um instante constrangedor, em que todos processamos que tínhamos sido alvo dos trotes daquele ano, encarou a garota de cabelo escuro.
- Não contamos se vocês não contarem. – Sugeriu.
- Fechado. – Ela concordou rapidamente. – Anda logo, Jodi Lyn!
As duas voltaram a correr e um segundo depois nós fizemos o mesmo.
Alcançamos a rua tentando nos esconder atrás de árvores, lixeiras e de qualquer coisa que conseguíssemos, mas a certa altura isso já estava ficando cansativo.
[N/A: Podem parar por aqui, docinhos]
- O quão longe ainda estamos? – perguntou exausto.
- Deve faltar só um quilômetro agora. – Ofeguei.
Um carro se aproximou de nós então. Por um segundo, pensamos que seríamos presos ou sequestrados, mas em vez disso um cara loiro nos encarou da janela.
- Foram as vítimas desse ano, não é? – Ele perguntou. – Do trote.
Até pensei em negar, mas não havia como.
- É. Fomos.
O cara balançou a cabeça e riu.
- Olha, eu também já fui uma vítima, então podem ficar tranquilos. – Disse. – Eu sou barman no Roger’s, não sei se vocês conhecem, e estou indo pra lá. Se quiserem uma carona para aquelas bandas, deixo vocês no caminho.
- Tem certeza de que não quer nos matar? – questionou. – Porque meu pai é da polícia.
O cara riu de novo.
– Bom, é melhor entrarem logo então, antes que ele os prenda por atentado ao pudor.
olhou para mim, que também não estava certo de que aquela era uma boa ideia, mas naquelas circunstâncias, acabamos aceitando a carona. O cara, que se chamava Filip, tinha acabado de voltar para a cidade depois de uma temporada viajando pela Europa. Ele era bem legal, na verdade.
- Bom, acho que posso deixar vocês por aqui. – Filip disse quando já estávamos na 8th Ave N, a uns trezentos metros da minha casa.
- Não dava pra pedir mais que isso. – Eu disse agradecido.
- Valeu, Filip. – desceu do carro, seguido por mim.
- Até mais ver, rapazes! Boa sorte na escola. – Ele acenou se afastando.
Logo eu e voltamos a andar rapidamente em direção a minha rua.
- Mais rápido, ! – Eu dizia.
- Que diabos pode acontecer? Já estamos quase na sua casa!
E foi justamente quando ouvimos uma sirene. Congelei no mesmo instante encarando , que estava reclamando.
- Não, não, não! Estávamos tão perto!
Quando o carro parou, viramos de costas, envergonhados.
- Boa noite. – O policial falou atrás de nós. – Estávamos parados na esquina e vimos vocês dois passando nessas... Condições. Será que podem me explicar o que está acontecendo ou terei que ser mais insistente?
balançou a cabeça, praguejando, e se virou.
- ?! – Ouvi o policial exclamar, e me virei também, quase sendo cegado pela luz da lanterna do homem.
Meu amigo deu um sorriso amarelo.
- E aí, pai?
🌴💚🌴
- Eu não sei se conseguirei tirar esses óculos escuros algum dia. – disse quando me sentei ao seu lado num banco, depois de recolhermos nossas roupas do meio do campo de futebol. – É como se todo mundo estivesse olhando para mim. Será que estou ficando maluco?
Depois de se sentir extremamente chocado ao encontrar seu filho usando roupas íntimas em um bairro que não era nem sequer dele, o pai de se acalmou e – para meu total espanto – ficou feliz por conhecer o novo amigo do filho. Ele achou nossa história divertida, coisa de adolescente, e até se ofereceu para ir à casa de Anderson buscar nossas roupas e a chave do carro, mas nós nos recusamos terminantemente a isso, pois seria a cartada final da vergonha. Assim, ele contatou o reboque, que levou o carro de volta para minha casa e nós o empurramos para cima da calçada de novo. Garanti ao senhor que os veteranos devolveriam as roupas e as chaves estariam lá no dia seguinte; do contrário, eu contaria a ele, que as buscaria pessoalmente. Na manhã seguinte, fiz minha mãe acreditar que ela tinha esquecido as chaves em algum lugar, e assim ela acabou indo trabalhar de carona com uma amiga. Esperava já ter as chaves de novo quando a tarde chegasse, para que ela nunca descobrisse aquela catástrofe.
- Pelo menos eu tenho as chaves de novo. – Eu disse. – Agora eu tenho outra missão.
- Qual?
- Arrancar a cabeça de Junior . – Me coloquei de pé e comecei a andar a passos largos.
- , será que essa é mesmo uma boa ideia?
- Não me importo se é uma péssima ideia, só quero acabar com a raça dele.
ainda estava me seguindo de perto quando alguém chamou meu nome.
- , espera aí!
Summer tinha um sorriso enorme no rosto quando se aproximou.
- Oi, Summer. – Eu disse, tentando esconder meu mau humor naquele momento.
- Eu só queria te contar... Fiz um teste para um desfile ontem.
- Jura? – Me surpreendi de verdade. – E aí, como foi?
- Acho que fui bem, mas o resultado só sai daqui a alguns dias.
- Tenho certeza de que vão te escolher. – Sorri com sinceridade.
- Bom, eu espero que sim.
O sinal tocou, encerrando nossa conversa.
- Temos Biologia agora, não? – Ela se pôs a andar.
acenou para mim e seguiu para a aula dele, enquanto eu fui atrás dela.
- Sim, temos. Eu até gostei do senhor Ackles. – Comentei.
- Sim, ele é legal.
Entramos na sala de aula e eu fui para o meu lugar. Ainda estava tirando as coisas da bolsa quando, para minha surpresa, Junior passou pela porta. Me preparei para confrontá-lo ali mesmo, mas então ele puxou uma cadeira para perto de Summer.
- Ei, lembra de mim? – Perguntou a ela.
- Dylan, não é? – A garota fez cara de quem estava chutando e Junior pareceu sem graça. Summer sorriu então. – Brincadeira, eu me lembro sim. Junior-irmão-do-namorado-da-Natasha, foi assim que decorei Mas não sabia que você estava nessa turma.
- E não estava mesmo. – Ele sorriu de volta. – Mas tive que mudar. É bom ver um rosto conhecido aqui.
Sum pareceu se sentir lisonjeada com o comentário e eles começaram a conversar casualmente.
Tá. Que merda era aquela?
Era fácil entender que um garoto quisesse se aproximar de Summer, mas por algum motivo algo ali estava me parecendo muito estranho. Eu cogitei que talvez estivesse sendo paranoico por ela ser minha amiga e eu detestar aquele cara, mas mesmo quando o senhor Ackles entrou na sala, não consegui deixar de ficar vigiando aqueles dois.
Quando a aula acabou, eles estavam falando sobre alguma coisa, e eu me mantive afastado, fingindo arrumar minha mochila.
- Então... A gente se vê por aí. – Summer colocou o cabelo atrás da orelha.
- Se eu tiver sorte. – Ele respondeu. A garota riu e assentiu, saindo da sala com o rosto levemente corado.
Fiquei ainda mais irritado, observando aquele sorriso cínico de enquanto saia da sala. Terminei de enfiar as coisas na mochila e fui atrás dele a passos largos.
A alguns metros da sala, eu o alcancei. Puxei sua mochila para trás com força, pegando-o desprevenido. bateu as costas com força no armário quando eu o empurrei e segurei seu colarinho.
- Você é um filho da mãe covarde e otário. – Vociferei.
- Calma, , eu posso explicar... – Junior gaguejou assustado.
- Por que é que fez aquilo? Eu e não te fizemos nada! Por que nos mandou para aquela droga de campo ontem? – Bati as costas dele com mais força.
- Porque... – Ele olhou para trás.
- Deixa ele em paz, ! – Outra voz se meteu na conversa.
apareceu do meu lado e me lembrei do quanto eu também queria arrebentar a cara dele; mas uma briga a três ia causar uma confusão desnecessária, então o larguei.
- Eu fiz aquilo porque precisava! – Junior disse irritado então, parecendo muito mais corajoso do que dois minutos atrás. – Era parte da nossa tarefa de calouros do time arrumar duas vítimas para o trote, e vocês caíram na nossa conversa fiada.
- Vocês são dois desgraçados! – Exclamei fechando a mão em punho.
- Que se dane, vocês teriam feito a mesma coisa. – se defendeu. – Eu ouvi os papos daquele tal de . Ele teria nos entregado sem pensar duas vezes.
- Mas eu não! – Argumentei.
- Quer saber, ? Agora já foi. – Junior ajeitou a camisa. – Não adianta ficar chorando que nem um bebezinho. Vocês sobreviveram ao trote, não é? Parem de reclamar e nos deixem em paz agora.
- Fique bem avisado, . – ameaçou enquanto os dois se afastavam.
E eu não tinha imaginado que poderia sentir mais raiva deles do que na noite anterior, mas eu estava terrivelmente enganado.
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- Esquece isso. – jogou uma batata chips na boca. – Se os veteranos souberem que estamos espalhando essa história por aí, são bem capazes de querer nos dar outro trote.
Balancei a cabeça sem olhar para ele, concentrado no jogo de vídeo game que jogávamos.
- Não dá pra esquecer. – Murmurei.
- Bem, então supere! – Ele largou o controle e se levantou.
Eu o segui até a cozinha, onde ele abriu a geladeira e arremessou uma lata de refrigerante para mim, abrindo outra e dando um longo gole.
- Não adianta de nada ficarmos remoendo essa humilhação agora. – Disse. – O fato é que eles tinham uma tarefa, e está certo: eu teria entregado os dois sem pensar duas vezes.
Ergui uma sobrancelha para ele. podia ser péssimo, mas eu duvidava um pouco daquilo.
- Ok, talvez eu pensasse duas vezes antes! – Ele admitiu. – Mas muito provavelmente os entregaria, sim.
Balancei a cabeça e abri minha lata de refrigerante.
- Talvez você esteja certo. – Dei um gole. – Mas é tão difícil tirar isso da cabeça. Ainda mais agora que...
- Ei, você ouviu isso?
Parei antes de terminar o raciocínio. Uma voz conhecida estava rindo na rua.
- É a Summer. – Concluí rapidamente. – O que ela está fazendo desse lado da cidade?
Corri para o lado de fora seguido por . Para o meu total desgosto, Summer estava passando em frente à casa de acompanhada de Junior . Os dois tinham sorvetes nas mãos e riam despreocupadamente. Ela olhou para o lado e me viu, parando de andar e sorrindo.
- ! – Exclamou. – O que está fazendo aqui?
Junior pareceu surpreso – tanto pela minha presença ali como por ela estar falando comigo. Caminhei até o portão, mas não saí, falando com eles sobre a cerca.
- Ei, Summer. Meu amigo mora aqui. – Expliquei, indicando com a cabeça. – E vocês?
- Estávamos tomando um sorvete ali na praia. Já conhece o Junior?
Eu encarei o garoto, que pareceu meio preocupado, apesar de claramente tentar disfarçar.
- Já sim. – Concordei. – Ele também fez teste para o time.
- Vocês são amigos? – Junior perguntou a ela.
- Desde pequenos. – A garota confirmou com a cabeça.
- Legal. – Ele forçou um sorriso. – Bem, vamos andando?
- Ah, claro. – Ela sorriu. – Nos vemos na escola, .
- Até mais. – Meneei a cabeça.
Quando os dois já estavam longe, me aproximei de de novo, impaciente.
- Está vendo só? É por esse tipo de coisa que eu não consigo esquecer.
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Por duas semanas, assisti Summer e Junior saindo juntos. Eles andavam juntos nos intervalos, sentavam próximos na aula e eu já até tinha ouvido uma caloura comentando que eles iriam juntos ao Baile de Boas-vindas. A situação era um pouco revoltante para mim, que agora sabia bem que era Junior . Olsen não fazia ideia da furada em que estava se metendo.
- Se acha tão ruim assim, por que não fala com ela? – perguntou um dia, entre uma mordida e outra de seu sanduíche. – Vocês são amiguinhos, não são? Devia tentar.
- Acha mesmo? – Perguntei observando Summer, que falava alguma coisa com Natasha e depois se afastou da mesa rumo ao corredor.
- Pelo menos não vai se sentir culpado por ela casar com o . – Ele deu de ombros.
A simples possibilidade era tão terrível, que me levantei do meu lugar e corri atrás de Summer. A alcancei já no corredor, por onde alguns alunos transitavam.
- Summer! – Chamei. Ela se virou para trás e sorriu.
- Oi, . – Disse.
- Isso vai parecer muito, muito aleatório. – Fechei os olhos, só então percebendo que eu não tinha planejado o que falar. – Mas será que podemos conversar por um minuto?
Eu e Summer nos sentamos num dos bancos do pátio. Havia menos gente ali.
- E então, o que quer me dizer? – Ela perguntou ansiosa.
- Não quero me intrometer na sua vida. – Comecei olhando para o alto. – Mas você está saindo com Junior , não está? – Indaguei. A menina levou um segundo para responder.
- Sim, estou saindo com o Junior. Qual é o problema?
- O problema é que... – Olhei para ela, tentando encontrar as palavras. – Não acho que ele seja o cara certo pra você, Summer.
Ela me encarou por um instante, sem demonstrar reação. Depois, inclinou a cabeça para o lado.
- Por quê?
Fiquei pensando se deveria contar o que tinha feito comigo e , mas me lembrei de que meu novo amigo acreditava que os veteranos se vingariam de nós se por acaso soubessem que estávamos falando mal deles por aí. Eu não podia condenar a um ensino médio aturando valentões.
- Eu não posso dizer, Summer. Só sinto que ele não é um cara legal. Você merece coisa muito melhor que...
- , pode parar. – Ela me cortou. Não estava sorrindo como de costume, mas também não parecia brava.
- Summer...
- Olha, eu sei o que está tentando fazer. – A loira balançou a cabeça. – Está tentando me proteger porque não confia nas pessoas. – Pensei em contestar, mas ela fechou os olhos e respirou fundo. Então voltou a me encarar. – Durante o último ano, eu percebi que você queria ficar sozinho, que não gostava dos meus amigos, às vezes achava que não gostava nem de mim.
- Mas eu...
- Quando cheguei aqui esse ano e vi que estávamos na mesma turma, fiquei muito feliz pensando que poderíamos ser grandes amigos de novo, mas já percebi que você tem se afastado de mim outra vez desde que comecei a andar com o Junior. – Suspirou. – Por favor, , não faça isso.
- Summer, eu realmente acho que o Junior não é a pessoa que você merece. – Insisti.
- Por que não me deixa descobrir sozinha? – Ela sorriu então. – Sabe o que eu queria? Que em vez de se preocupar com as pessoas com quem ando e se você gosta ou não delas, você se importasse mais com as minhas realizações. Quer dizer, eu finalmente fiz uma audição para um desfile e você está sem falar comigo direito por causa de um garoto com quem saio para tomar sorvete às vezes!
Sem saber como continuar o que eu queria, acabei me desculpando. Summer continuou sorrindo.
- Quero que se preocupe com o que realmente faz diferença, tudo bem? Faça isso por mim. – Ela apertou minha mão. – Tenho que ir agora.
Ela foi embora e eu continuei ali, me questionando: o que acontecera fazia diferença ou não?
🌴💚🌴
- Quer saber? Eu acho que você devia deixar essa garota se lascar. – disse no dia seguinte, quando contei o resultado de minha conversa com Summer. – Se ela quer descobrir a verdade sozinha, o problema é dela.
- Não é assim também, . – Defendi. – Eu excluí tanto meus amigos no ano passado; não me espanta que Summer ache que eu estou sendo paranoico. – Suspirei. – Mas não vou me meter mais.
- Eu acho melhor mesmo, . – Meu amigo apertou meu ombro ao passo que entravamos no vestiário depois da aula de Educação Física. – Deixe as coisas acontecerem como tem que ser.
Chegando aos nossos armários, se sentou para tirar os tênis de corrida, e eu comecei a tirar a camisa. Foi então que ouvimos uma conversa do outro lado.
- Junior está me saindo melhor que a encomenda. – Era a voz de Max Adams. – Honestamente, não pensei que ele fosse conseguir enganar os dois calouros, mas ele foi brilhante.
- É irmão do Pat, afinal. – Alguém riu. – Qual é a segunda tarefa dele?
- Ah, essa é ainda melhor. – Adams riu. – Ele tem que conseguir sair com a rainha do Baile de Boas-vindas. Claro que a Natasha não vale, ela faria isso por ele num piscar de olhos. Mas, esperto do jeito que é, ele já tratou de começar a sair com a segunda candidata mais promissora.
- Olsen, não é esse o nome dela? Uh, mas ela é mesmo uma delícia.
- Junior chegou nela como quem não quer nada porque percebeu logo que aquela garota com certeza vai substituir a Natasha quando ela for embora. E bonita como é, não me espantaria se ela ganhasse a coroa no baile também. Junior foi muito esperto. Acho que ele vai conseguir cumprir essa última tarefa com louvor.
- Ouvi dizer que ela é modelo, não é? Então...
De olhos arregalados, me encarou. Eu o olhava do mesmo modo, em estado de choque.
Então Junior estava saindo com Summer por causa da uma tarefa?
Meu sangue ferveu nas veias. Nem que eu quisesse teria como deixar aquilo pra lá agora.
FLASHBACK OFF
Dias atuais; casa da
Ignorei a argumentação de sobre ser uma péssima ideia ser professor de Summer. Nada que ele dissesse me faria me afastar dela de novo depois do tempo que levara para voltarmos a nos aproximar.
Coloquei água na tigela de Stevie depois de tê-la lavado e ele veio correndo. O carteiro tinha passado a pouco e ele estava cansado de latir.
- Isso é pra aprender a ser menos encrenqueiro. – Brinquei ao ver o tamanho de sua sede.
Depois de ter bebido sua água, o dálmata saiu da cozinha. Fiquei ali por algum tempo, arrumando a bagunça sobre a mesa. Uma vez que eu tinha frequentado a casa de Jack por um tempo antes da chegada de , tinha pegado o hábito de ajuda-lo a manter as coisas em ordem quando possível. Ainda não tinha me livrado do costume.
- Está arrumando pra mim, namorado?
Me virei para trás e encontrei , usando um short e uma camiseta. O cabelo ainda estava molhado do banho.
- Para o seu pai. – Provoquei. Ela ergueu uma sobrancelha e sorriu, entrando na cozinha.
- Como está sua agenda no Roger’s essa semana? – Ela apoiou as costas na mesa.
- Apertada. Ando tirando muitas folgas por causa do nosso relacionamento. Vou ficar lá de quinta a domingo.
- Eu posso ir até lá ficar te fazendo companhia.
- Talvez isso não fosse tão ruim assim. – Ergui uma sobrancelha e ri sem vergonha. me bateu, mas estava achando graça.
- ... – Disse então. – Eu quero conversar com você sobre uma coisa.
- O quê? – Perguntei sem parar de arrumar a cozinha.
- É sobre esse negócio de você ensinar violão a Summer. – Mordeu o lábio. – Eu não acho que seja uma boa ideia.
- Você também não... – Rolei os olhos, deixando a cozinha.
saltou da mesa e me seguiu.
- É sério, , é muito sério! – Ela insistiu. – Você sabe o quanto eu gosto da Summer, mas ter qualquer um de nós tão perto dela é como ficar brincando com uma granada. Eu me obrigo a fazer isso porque não tem jeito, mas quanto mais pudermos evitar, melhor.
- , a Summer é minha amiga. – A encarei sério.
- Não estou dizendo que não possa ser. Só estou dizendo que não precisa criar situações em que ela esteja ainda mais enfiada dentro das nossas casas! Você mesmo reclamou por eu ter chamado Miguel pra morar aqui. É o mesmo tipo de problema.
Eu podia entender o argumento de e aceitar sua preocupação, mas, francamente, não achava que Summer seria um problema.
- Não adianta, . Não vou cancelar com ela.
A impaciência de estava evidente no rosto dela. A menina xingou alguma coisa em português e eu não entendi.
- Por que ser tão cabeça-dura, ?! Por que insistir nisso?
- Porque... – Suspirei. – Porque eu devo isso a ela.
FLASHBACK ON
2 anos atrás; corredor da Jacksonville High
- ! – chamou. – Para onde está indo?
- Não sei. – Respondi sem parar de andar. – Tenho que resolver isso. Preciso contar pra Summer o que está acontecendo!
- Sem nenhuma prova?! – Ele puxou a manga da minha camisa, me forçando a parar. – E se ela não acreditar? Acabou de dizer que ela acha que você está sendo paranoico.
Passei a mão pelo cabelo e inflei as bochechas, considerando o que ele dizia. estava certo. Ela ia achar que eu tinha enlouquecido de vez.
- O que eu faço então? – Perguntei confuso.
- Não sei! Só sei que não pode ir atrás da Summer e jogar nela essa bomba sem ter como provar nada.
Soltei o ar numa baforada, passando a mão pelo cabelo. estava certo, aquilo não daria certo. Desanimado, encostei as costas na parede e me deixei escorregar até sentar no chão.
- Droga. – Murmurei.
- Vamos dar um jeito nisso, . Pode ter certeza.
Eu estava duvidando, quando ouvi um barulho no fim do corredor e olhei para lá. Junior estava passando tranquilamente, provavelmente preparado para ir embora.
- Junior! – Chamei com raiva, sem conseguir me conter.
Os olhos de se arregalaram, mas logo ele fechou a cara.
- Me erra, ! – Respondeu mal-humorado.
Me levantei e comecei a correr atrás dele, que apressou o passo até estar fora da escola. Antes que eu pudesse fazer alguma coisa, ele entrou em no carro que o estava esperando. Junior me encarou uma última vez antes que o carro arrancasse.
- Filho da puta! – Xinguei, mas provavelmente ele nem ouviu.
🌴💚🌴
Eu estava em casa no sábado, ainda sem ter uma solução aparente para o problema, quando alguém bateu à porta com força.
- ? – Franzi o cenho quando o encontrei com o cabelo despenteado e aparentemente todo suado ali.
- Encontrei a solução do caso! – Ele exclamou. – Você tem que vir comigo.
Segui a pé rumo à praia que fica a alguns bons metros de distância, enquanto ele explicava.
- Fiquei pensando lá em casa, que qualquer prova que encontrássemos poderia ser facilmente desacreditada, já que a Summer parece caidinha pelo . – Disse. – Então concluí que a única possibilidade de ela acreditar em você, seria uma confissão.
- O nunca vai admitir nada, . – Bufei.
- Ele não, mas o vai. – deu um sorriso diabólico.
- Duvido muito. Ele não entregaria o Junior assim.
- Ele nem vai saber que o está entregando.
- Como assim?
- Eu estava no supermercado quando vi ele no celular, marcando de se encontrar com alguém na praia da Âncora, para onde estamos indo agora. – Explicou. – O que vamos fazer é ir até lá, e aí eu vou confrontá-lo até que ele admita o que Junior está fazendo, cheio daquele arzinho de superioridade dele de vocês-não-podem-fazer-nada-porque-são-dois-fracassados. Só que... – Tirou algo do bolso. – Eu vou estar gravando tudo. E depois, , você vai levar isso pra Summer e contar a verdade.
- Vai mesmo fazer isso por mim? – Ergui uma sobrancelha. parou, surpreso com a pergunta.
- É claro. Somos amigos. – Depois me encarou. – Somos, não somos?
Fui obrigado a rir. Cada vez mais tinha certeza daquilo.
- Sim, . Somos amigos.
- Ótimo, então vamos andar logo. – Ele voltou a apressar o passo. – Não podemos perder essa chance.
Chegamos à Praia da Âncora pouco menos de dez minutos depois. Demos uma volta pela orla, fazendo o possível para sermos discretos, procurando sinais de .
Logo, o avistamos numa lanchonete, não muito longe dali.
- Vamos até lá. – disse firme.
- Eu só queria saber uma coisa . – Comentei enquanto andávamos. – Se você tinha certeza do que fazer e sabia que você é que falaria com , por que me trouxe?
- Pro caso de ele querer me bater, é óbvio. – Ele deu de ombros.
Nos aproximamos um pouco e vimos sentado sozinho, comendo um sanduíche. Devia estar esperando sua companhia.
- Tem que ser agora. – ligou o gravador no bolso. – Se ele ameaçar me bater, você vai lá e arrebenta a cara dele.
- Tá. – Assenti.
Meu amigo subiu as escadas de madeira enquanto eu fiquei observando da areia, me revelando o mínimo possível.
- Ei, ! – exclamou. virou para ele confuso. Depois, deu uma risadinha de deboche.
- O que quer aqui, ? Um autógrafo? – Zombou.
- Sei que já teve uma conversinha com vocês sobre a palhaçada que fizeram conosco, mas acho que eu ainda não tive a oportunidade.
- Seu amiguinho não esclareceu nada pra você? Já foi. Vocês levaram o trote porque são o tipo de pessoas que levam um trote. Ele, o antissocial metido a misterioso, e você... Você é ainda pior que ele. Detectei sua aura de nerd no momento em que pisou naquele campo. – Voltou a comer seu sanduíche. – Como diria o Junior, não temos nada contra vocês, é só como as coisas são.
Vi titubear diante do discurso. Provavelmente, ele se sentiria mais seguro naquele momento se não estivesse usando uma camisa onde se lia “Meu nome é Barry Allen”. Mesmo assim, ele respirou fundo e voltou a falar:
- Você e seu amigo Junior não valem o sanduíche de frango que comem. – Ofendeu. – E tem mais. Sei da segunda parte da tarefa do .
Ao som daquelas palavras, parou de comer. Ele limpou a boca com a mão e se levantou. deu um passo para trás.
- Ah, então você sabe? – riu.
- Sim. Sei que era o desafio dele sair com a Summer.
- As pessoas hoje em dia estão cada vez mais fofoqueiras. – Ele balançou a cabeça. – Mas está certo, . A segunda tarefa do Junior era sair com a rainha do Baile de Boas-vindas, e, honestamente, eu acho que ele vai conseguir, porque Olsen com certeza vai ganhar a votação.
- Não acredito que teve coragem de admitir isso. – disse enojado.
- E o que você vai fazer com essa informação preciosa, ? Han? – ergueu as sobrancelhas, aproximando-se mais de , que foi andando para trás. Eu me encolhi, certo de que ele cairia da plataforma de madeira a qualquer instante e seríamos descobertos. continuou falando com :
- Você vai correr e contar para o , pra que ele possa contar pra Summer, e então vocês três serão felizes para sempre e meu amigo perderá? – Sugeriu. – Isso NÃO vai acontecer, . Eu nem preciso te impedir, e quer saber por que? Não importa o quanto pensa que foi amigo da Olsen quando eles tinham três anos de idade. Eles agora são de espécies diferentes. Ela é uma modelo, é líder de torcida e está saindo com o futuro capitão dos Swordfishes, enquanto é só o ex-amigo antissocial dela, alguém que está amargurado com curso que a vida dela tomou e em como ele não faz mais parte disso. Ela nunca vai acreditar nele.
Vi cerrar os punhos, se esforçando – mesmo sabendo que provavelmente levaria uma surra – para não avançar em .
- Agora, quer saber? Você já tomou demais o meu tempo. – disse exasperado. – Some daqui, . Logo.
Calado, começou a se afastar. Chegando na beira da escada, porém, ele virou de costas, e foi andando assim, encarando .
- Na verdade, , Summer é que ficaria amargurada se soubesse onde foi que se meteu. – Disse. – E só pra você saber: ontem, quando você estava atrás de mim na fila da cantina, eu cuspi no suco que você ia pegar.
A última coisa que vi, foi correndo a toda rumo a minha rua, perseguido ferozmente por .
🌴💚🌴
- Você é muito burro, . – Eu lhe estendi uma bolsa com gelo. – Pra que foi dizer aquilo?
- Não podia sair sem dizer! – Ele resmungou, gemendo de dor em seguida. – Pelo menos ele não deixou a vingança pra depois. Já acabou. – Colocou o gelo na bochecha.
Dei de ombros, achando que ele estava meio certo mesmo.
- Cuspiu mesmo no copo dele?
deu um enorme sorriso, mas logo se arrependeu, sentindo o rosto doer. Percebi que sua cara já começava a inchar. Sua mãe surtaria quando ele chegasse em casa.
Me ajeitei na cama, colocando os braços atrás da cabeça.
- Agora só tenho que esperar até semana que vem e...
- O quê? Semana que vem? – virou para mim num pulo. – Não, ! Não pode esperar até semana que vem! fica bancando o valentão, mas aposto que vai correr pra contar o que aconteceu para o Junior! Tem que falar com Summer antes que eles façam a cabeça dela! Tem que ir agora.
- Mas e você?
- Eu fico aqui até você voltar e invento uma mentira se sua mãe aparecer. Digo que eu caí enquanto jogávamos bola e você foi comprar um remédio pra dor, sei lá. – Insistiu. – Só vá. Não demore.
Fiquei de pé e assenti. Depois, desci as escadas. Passando pela mesa de chaves, imaginei que não haveria problema se eu pegasse o carro da minha mãe de novo.
🌴💚🌴
Dirigi todo o caminho até o outro lado da cidade pensando no que diria a Summer. Como explicaria que o garoto com quem ela estava saindo só estava fazendo isso por uma aposta? Era uma das piores coisas que poderia ser dita a uma garota, provavelmente.
No fundo, eu preferia que ela lidasse bem com a descoberta. Queria que ela mal se importasse em saber daquilo, porque esperava que ela não gostasse de Junior tanto assim.
Respirei fundo quando parei o carro em frente à casa dela. Eu só tinha ido ali uma vez depois de sua mudança. Depois, tinham vindo os problemas, e então eu inventara desculpa após desculpa para não ir mais. Me arrependia amargamente disso agora. Se eu não tivesse me afastado dela, talvez Summer não estivesse agora metida com o idiota do Junior. Talvez eu pudesse tê-la alertado bem antes. Talvez...
Desci do carro e, tomando coragem, me aproximei e toquei a campainha ao lado da grande porta branca. Meu coração estava acelerado quando a maçaneta girou.
Mas não foi Summer quem abriu a porta. Foi Junior .
Ele pareceu um pouco surpreso a me ver, mas não me atacou imediatamente. Junior parecia preocupado, talvez até um pouco cansado.
- Oi, . – Ele disse.
- Onde está a Summer? – Perguntei desconfiado.
- O que está fazendo aqui?
- Seu amigo não já te disse? – Enfrentei.
Junior franziu o cenho, confuso, depois balançou a cabeça.
- Ele me ligou pra dizer alguma coisa, mas eu não deixei. Estava ocupado.
- Vou esclarecer então. Vim aqui pra contar a verdade a Summer sobre a sua tarefa nojenta e como só está com ela pra entrar no time.
Os olhos de se arregalaram e ele engoliu em seco.
- Não pode fazer isso agora. – Ele disse sério.
- Por que não, ? – O encarei.
Junior olhou para dentro por um instante e fechou a porta atrás de si. Ele caminhou até se sentar na calçada da casa dos Olsen. Sem entender nada, eu o segui, mas fiquei de pé.
- Summer não foi escolhida para o desfile. – Ele contou. – Eles ligaram têm mais ou menos uma hora para avisar.
- Oh, droga! – Surpreso por ouvir aquilo, me sentei ao seu lado.
- É, uma merda. – Ele concordou, levemente irritado. – Disseram que ela não é alta o bastante. É ridículo.
- E como ela está?
- Muito mal, é claro. Íamos sair hoje, mas ela me ligou para cancelar quando recebeu a notícia. Achei que seria certo eu vir pra cá ajudar.
Fiquei calado, Junior também. Eu poderia ver com bons olhos aquela atitude, se por acaso ele não estivesse fazendo de tudo para ficar com Summer até que ela fosse eleita rainha do baile.
- Não pode contar a verdade a ela hoje, . – Ele disse então.
- Eu vou contar a verdade a ela, Junior. O que vocês fizeram foi uma canalhice.
- Eu sei que foi! – Ele exclamou com a voz não tão alta. – Quando os rapazes me deram a tarefa, eu só estava pensando em ser parte do time, como meu irmão tinha sido. Eu conheci a Summer e achei que seria fácil cumprir a tarefa ficando com ela, e depois do baile eu estaria livre pra sair com todas as garotas da Costa. – Suspirou. – Mas eu estava errado. A Summer... Ela é diferente. Ela é uma garota especial. Eu estou gostando dela, . De verdade. Por isso estou aqui hoje.
Eu sabia que não deveria acreditar em uma palavra que saía da boca daquele cara, mas Junior mal olhava para mim enquanto falava. Seus olhos encaravam a rua à frente, pensativo.
- Eu sei que se importa com ela. – Ele voltou a falar. – Eu queria pedir para que você guardasse esse segredo, para que me deixasse ficar com a Summer sob a promessa perpétua de nunca magoá-la sendo um idiota de novo. Mas eu te sacaneei e você me odeia agora. Então tudo que vou pedir é que não conte a verdade a ela hoje. Não quando ela já está tão mal.
Respirei fundo e me deitei ali no gramado. O que eu iria fazer?
O discurso de mais cedo tinha sido realista. Apesar de termos sido grandes amigos, eu e Summer pertencíamos a mundos diferentes agora. Junior, pelo contrário, era parte dessa nova vida dela, assim como sua carreira de modelo e a torcida.
Se eu contasse a verdade para Summer – agora ou depois – ela não aceitaria continuar convivendo com os amigos que tinha feito ou mesmo com as líderes, pois Junior estaria sempre ali, e ela sempre se lembraria daquela humilhação, ainda que terminasse com ele antes do baile.
O que aconteceria com ela então? Acabaria como eu, antissocial e revoltada? Sempre com um pé atrás com todo mundo?
Não era isso que eu queria para Summer. Eu não tinha pensado nisso quando saíra de casa, mas não era.
Além disso... E se Junior estivesse dizendo a verdade? E se ele estivesse mesmo gostando de Olsen, assim como ela dele, e eu me metesse – do jeito que ela tinha me pedido para não fazer – e estragasse tudo?
E se depois de eu já ter me metido, ela continuasse com ele e acabasse me odiando?
Eu nunca tinha mentido para Summer, mas todas as possibilidades com a verdade em minha cabeça levavam a um desastre eminente. A chance de ela aceitar a brincadeira de mau gosto que fora feita e seguir em frente sem se abalar me parecia cada vais mais improvável.
Desanimado, me sentei na grama.
- Tem certeza de que gosta dela mesmo, ? – Perguntei. Junior me olhou com esperança.
- Tenho. Eu gosto muito. De verdade.
- Então eu não vou contar. – Decidi. – Mas se chutar ela depois do baile, ou se algum dia aprontar mais uma dessas, eu juro que arrebento sua cara.
Junior engoliu em seco, mas assentiu.
- Obrigado, . – Murmurou. – De verdade.
Então ouvimos o ranger de madeira e a porta se abriu. Summer apareceu com os olhos vermelhos e inchados.
- ? – Ela me encarou. – Junior te chamou aqui?
Olhei para ele, que ficou calado, então assenti para a garota.
- É. Ele me contou o que aconteceu. – Menti. – Sinto muito, Sum.
Ela limpou o rosto e se aproximou, me puxando para um abraço.
- Obrigada. – Fungou. – Por que não entra também?
Junior deu de ombros, e fui obrigado a ficar ali por mais algum tempo.
🌴💚🌴
- Eu sinto muito mesmo, cara. Não pensei que isso fosse terminar assim. – suspirou, a cabeça encostada na janela do carro.
Depois de ficar preso pelo menos meia hora na casa dos Olsen, eu havia voltado para casa e descoberto que minha mãe, graças a Deus, ainda não havia voltado de sua tarde na casa de uma amiga. Os pais de , pelo contrário, o estavam procurando porque queriam jantar na casa dos avós dele. Eu já estava com pena o suficiente em imaginar a reação do senhor e da senhora quando o vissem – sem contar os avós do garoto –, então me ofereci para leva-lo de carro até sua rua para que ele não tivesse que fazer o percurso de ônibus com aquele rosto inchado.
- Eu é que deveria ter imaginado. – Dei de ombros. – estava certo, no fim das contas.
- Não, , ele não estava não! – O garoto exclamou. Sua cara estava muito engraçada daquele jeito. – Eles não são melhores do que nós, nem estão em outra categoria de pessoas. Isso é ridículo. Summer teria escutado você. A escolha foi sua, e, para a sorte deles, você é um cara decente.
Dei um sorriso de “tanto faz” e segui dirigindo.
- De qualquer modo, é melhor que você não esteja metido nesse drama. – Ele continuou. – Temos muito o que aproveitar no ensino médio, meu amigo. Você vai ver. Daqui a uns dois anos, nem vamos lembrar que Junior ou mesmo Summer existem.
- Acho que você está certo. – Concordei. – E também, tem outras coisas com que eu quero me ocupar agora.
- Tipo o quê? – se animou.
- Sei lá. – Ri um pouco. – Tem várias coisas que eu queria fazer antes e não dava. Tipo...
Meus olhos então passaram por um letreiro iluminado do lado de fora.
Rocklin Guitar – Let the bass choose YOU!
Parei o carro quase sem perceber, observando o lugar.
- Ei, esse não é aquele lugar em que fazem contrabaixos? – perguntou curioso.
- É, é aqui sim. – Tirei o cinto e saí do carro. Ele também.
- Meu pai prendeu uns ladrões de instrumentos aqui uma vez. – Contou.
- Meu pai sempre prometeu que me daria um contrabaixo daqui... – Comentei distraído. – Antes de se separar da minha mãe e ir para Atlanta.
- Bom, acho que é uma excelente hora para cobrar. – bateu no meu ombro. – Vamos entrar pra dar uma olhada.
- É, vamos sim. – Andei em direção à entrada do lugar.
- Sabe, se você tivesse uma banda, íamos sair com várias garotas...
Rolei os olhos e ri. Eu ainda não tinha aprendido a tocar de fato, mas tudo que eu queria agora era escolher meu contrabaixo. Ou, como dizia o slogan do lugar, deixar que ele me escolhesse.
FLASHBACK OFF
Dias atuais; casa da
Fiquei dando banho em Stevie, enquanto observava ensaiando de muito mau humor os passos da torcida com Jodi. Honestamente, eu estava com pena da baixinha.
Eu não queria que ficasse brava comigo, mas aquilo era um assunto pessoal meu. Em parte, eu sentia que os problemas de Summer com Junior também eram um pouco minha culpa, por ter escondido a verdade naquela noite, e por isso não achava justo me afastar dela sem explicação agora.
Talvez se eu tivesse falado tudo dois anos atrás, as coisas fossem diferentes agora. Mas era tarde. Eu nunca tinha dito.
Embora meu melhor amigo , depois de ver Summer tentar desesperadamente voltar com Junior depois da forma como ele agira, acreditasse que, honestamente, a verdade não teria feito diferença alguma.
[…]
- Por que afinal o papai tinha que cismar com essa história de exame? Eu estou bem! – Resmunguei sentada no banco do carona.
- Você parecia mal, , Jack ficou assustado. – Miguel disse apenas. – Pais são assim.
- Sei disso; sou filha de Jaqueline Vicentini, lembra? A neurótica.
Miguel riu e balançou a cabeça. Ele sabia que minha mãe sempre fora super preocupada com tudo, o que se intensificava bastante pelo fato de ela viver com meu pai, que não ligava para nada. Esse era mais um motivo para a separação deles.
- Vai perder algo muito importante na primeira aula? – O rapaz quis saber.
- Não realmente. – Suspirei.
A verdade era que eu estava chateada por perder a aula porque, por um compromisso aleatório, a senhora Turttle adiantaria a aula de economia doméstica de quarta-feira para a terça-feira naquela semana; o que significava que eu não teria nem sequer uma aula com nos próximos dias, já que estava perdendo nossa única juntos.
- Sabe, eu falei com sua mãe ontem. – Miguel disse então.
- É mesmo? – Me surpreendi. – Mas ninguém me contou que ela tinha ligado.
- Não era nada demais. Ela só queria saber como estavam as coisas por aqui, e acabamos conversando um pouco.
- Ah. – Forcei um sorriso. – Legal. – Me virei para a janela.
Mas Miguel ainda não tinha encerrado o assunto, para meu azar.
- Ela me contou que você passou as últimas férias em Venice Beach, na casa dos parentes do seu pai. – Ele continuou, e o rumo da conversa me deixou um pouco tensa.
- Sim, eu passei. – Me obriguei a encará-lo. – Foi... Divertido.
- Posso imaginar. – Miguel voltou a encarar a estrada à frente. – Ela disse que você conheceu um garoto lá, um garoto daqui de Jacksonville Beach.
Era justamente o que eu temia. Meu corpo inteiro pareceu congelar quando as palavras saíram da boca de Miguel, que me olhava de soslaio, indagativo. Engoli em seco sem intenção e acabei tendo um acesso de tosse nervosa, engasgada com toda aquela confusão.
- , está tudo bem?
- Eu... – Tosse mais um pouco. – Estou... Só... Preciso beber alguma coisa. Logo. Minha garganta está... – Tossi mais.
- Calma, fique calma.
Miguel parou o carro no acostamento, perto de um trailer-lanchonete, e desceu do veículo. Enquanto ele comprava uma bebida para mim, consegui me tranquilizar o suficiente para praguejar mentalmente e reclamar da minha mãe por pensamento.
Por que ela tinha que ser tão bocuda?! Eu pensava que ela tinha esquecido a maldita história do garoto de Venice Beach!
- Pronto, aqui está. – Miguel entrou no carro de novo, estendendo uma lata de refrigerante já aberta na minha direção.
- Obrigada. – Peguei-a das mãos dele e dei um longo gole, respirando fundo em seguida.
- E então, era o ?
Olhei para ele sem entender.
- O quê?
- O garoto que você conheceu nas férias. – Miguel repetiu. – Era o ?
Como eu poderia dizer que era e como eu poderia dizer que não? Se eu mentisse dizendo que era meu namoradinho do verão, Miguel poderia comentar o assunto com meu pai, que me desmentiria por não fazer ideia de nada. Mas se eu contasse que tinha saído com em Venice, ele poderia, por causa do nome, fazer a ligação do garoto com o tal namorado de quem Summer falava, e aí ia começar a desconfiar de tudo.
- Não era o , não. – Balancei a cabeça, ainda pensando no que dizer.
- Jaqueline disse que sua tia ouviu sua prima falando no telefone com você sobre vocês estarem na mesma escola agora. – Ele perguntou com curiosidade. – Então quem é?
- É, ele estuda na Jacksonville High... – Concordei. – Ele é o... .
O quão tarde será que era para colar minha boca com super bonder?
- . – Miguel meneou a cabeça. – E vocês ainda se falam?
- Até que sim. O joga no time de futebol, andamos juntos às vezes. – Meu Deus, , pare de dar informações!
- E o sabe que vocês já saíram juntos antes?
- ? Sabe, ele sabe, sim. Eu ainda estava bem abalada por causa do quando cheguei aqui e eu contava tudo a ele, então... Ele sabe.
- Pelo jeito como fala, esse não parece ser boa coisa. – Ele comentou. – Mas é melhor mesmo que tenha contado tudo ao . Mentiras só atrapalham.
Ah, meu caro Miguel, não faz ideia de como eu concordo com você.
Cheguei à escola morrendo de raiva, incrédula com a minha própria capacidade de ser uma idiota.
Por Deus, o que eu ia fazer agora?!
, , ... Eu não parava de envolver os outros nas minhas mentiras absurdas!
O que eu faria agora? Contaria a alguém o que tinha inventado para Miguel? Eu tinha que contar, não é? Ou tudo daria errado.
Mas tinha prometido a não colocá-lo em mais mentiras sem avisar antes! O que eu ia fazer? O QUE EU IA FAZER?
- Ei, ! – Amber Hayley parou alegremente em frente a mim no corredor.
- Ei, Amber! – Forcei um sorriso, não querendo perder tempo com nenhuma coisa boba.
- Sem querer te pegar de surpresa, porque sei que sua agenda deve ser super ocupada, mas eu precisava fazer umas compras e Summer não vai poder ir, e Jas anda com um mau humor pavoroso, então andei pensando se você não gostaria de ir comigo ao shopping amanhã à tarde.
- Amanhã? – Quase não consegui esconder minha careta, me imaginando uma tarde inteira sozinha com Amber.
- É, amanhã! O vai estar lá, é claro, mas ele anda tão cansado com os treinos que acho que nem vai conseguir opinar, então...
Então a resposta se acendeu sobre minha cabeça como uma lâmpada.
! Era para ele que eu tinha que contar!
Ele impediria de se meter em problemas com Miguel, conseguiria administrar a situação. E se eu estivesse com ele e Amber no shopping, poderia falar com ele longe de .
- Não precisa falar mais nada, Amber. – Eu toquei o ombro da menina, dessa vez sorrindo de verdade. – Eu vou com você.
- Sabia que poderia contar com você! – Alegre, ela agarrou meu braço, e nem me incomodei quando ela saiu me puxando, falando sobre mil futilidades.
Depois de uma manhã relativamente tranquila acreditando que tudo correria segundo o plano, joguei minha mochila nas costas e segui sozinha para o refeitório no horário do almoço. Sabia que não poderia falar nada com sobre o que precisava ali, mas tinha que perguntar a ele como, por todos os santos, ele estava conseguindo suportar Amber vinte e quatro horas por dia. A garota tinha conseguido me deixar nervosa com toda aquela conversa sobre unhas de gel e a nova dieta dela!
Foi só quando entrei no refeitório que percebi uma movimentação estranha. Olhares que se voltavam para outro lugar que não a mesa VIP, pessoas mudando o fluxo de seus caminhos. De repente, percebi que Summer Olsen não estava sentada com as líderes de torcida e os jogadores.
Meus olhos varreram o lugar, e quando finalmente a encontrei, não entendi muito bem. Summer estava sentada à minha mesa – nos fundos do refeitório, com e .
Fiquei ligeiramente incomodada com a atenção que estava recebendo de todas as mesas enquanto andava, visto que agora todos pareciam olhar para mim em busca de uma explicação. Era como se a abelha rainha da colmeia tivesse mudado de lugar ou desaparecido, e todos estavam desorientados, e eu era a nova dama de companhia da abelha rainha, então devia entender melhor do que eles.
Engolindo em seco e tentando não encarar demais ninguém, segui para minha mesa. Quando passei em frente à mesa VIP, Jodi e Emma – que pareciam o próprio retrato da confusão – se levantaram com suas bandejas e me seguiram apressadamente.
- Ok, alguém me explique o que está acontecendo. – Eu disse parando em frente à minha mesa. acenou para mim. Summer virou o rosto em minha direção, um sorrisinho no canto da boca.
- Oi, meninas! – Ela disse. – Não fiquem aí paradas feito estátuas vivas. – Chegou para o lado para que nos sentássemos, ficando bem de frente para .
É claro que eu não ia ficar parada. Aquela era minha mesa, e por sinal ela estava no meu lugar agora.
Me sentei, aproximando-me dela, e Jodi ficou ao meu lado, enquanto Emma foi se sentar brutamente ao lado de , que teve que dar um pulo para mais perto de .
- E pensar que as líderes de torcida nem olhavam para minha cara. – comeu um pedaço de bolo de carne.
- Desculpe a confusão, . – Summer tocou minha mão sobre a mesa. – Eu só achei que seria legal ficar um pouco mais com vocês. Às vezes acho que me sinto melhor aqui, sem toda aquela multidão.
- Grande Summer. – Emma fez uma careta. – Passamos pelo inferno por dois anos para nos sentar na mesa VIP e quando conseguimos você simplesmente decide vir para cá! Eu poderia ter me sentado aqui antes se soubesse que teríamos que vir de qualquer jeito, sabia?
- Minha filha, essa mesa pode ser muito mais seletiva do que parece. – a encarou à distância.
- Ah, cale a droga da boca, . – Ela bufou. – Você não deveria estar comendo uma salsicha de tofu com Amber há essa hora por acaso?
- Não mais do que você deveria estar em um pântano com os outros ogros. – devolveu. Emma o fuzilou com o olhar.
- Já chega vocês dois. – Cortei. Então olhei para Summer e dei um sorriso compreensivo. De certa forma, eu podia entender o que ela queria dizer. Embora, é claro, fosse extremamente perigoso tê-la ali uma vez que não sabia que eu tinha inventado todo aquele negócio de ajuda-la com .
- Se se sente bem aqui, Summer. – Dei de ombros. – Bom dia. – Sorri um pouco para .
- Bom dia, Rainbow. – Ele respondeu.
Summer sorriu para nós dois e deu um gole em seu suco de laranja.
- – Ela chamou então. –, a que horas eu posso chegar à sua casa hoje à noite?
Meu garfo parou a meio caminho do filé de frango. Ergui os olhos para ela e então para . Nenhum dos dois pareceu perceber. me olhou de um jeito indagativo.
- Pode chegar às seis. – Ele respondeu depois de um segundo pensando. – Minha mãe vai adorar se jantar conosco. – Abriu um sorriso enorme.
- Diga a ela que vou levar algo para a sobremesa. – A loura sorriu de volta.
arregalou os olhos, apoiando o queixo na mão e encarando o nada de um jeito no mínimo bizarro.
- Você vai à casa do hoje, Sum? – Perguntei então, porque não podia aguentar mais a falta de noção dos dois, conversando sem explicar nada.
- Ah, eu não te contei. Pensei que ele fosse comentar. – Ela olhou para mim. – vai me ensinar a tocar violão.
- É sério? – Jodi sorriu. – Que legal!
- Sum sempre quis aprender, desde que éramos pequenos. – comentou.
- Eu nem imaginava. – Emma disse com sinceridade.
- Vocês sabem, as coisas acontecem diferentes do planejado às vezes. – Sum deu de ombros. – Mas fico feliz por poder retomar isso agora.
- É, as coisas... Elas saem do plano o tempo todo. – Assenti com vontade, tentando normalizar aquilo tudo, mas sem sucesso. – Que bom que é tão legal.
- Ah, o é, sim. – concordou. Tinha saído daquele transe, mas seu olhar ainda parecia levemente maluco. – é um cara ótimo! – Jogou o braço nos ombros do amigo. – O segundo nome dele é prestativo, se querem saber.
Summer riu e Jodi também. Emma rolou os olhos, voltando a comer. Mas eu, eu continuei encarando meu namorado de mentira.
Algo me dizia que aquela novidade seria uma coisa péssima para todos nós e, portanto, eu precisava dar um jeito no problema.
POV
ficou me olhando de um jeito esquisito durante o almoço, e eu tive certeza de que havia algo bem particular se passando por sua cabeça, mas preferi não saber. Estava feliz por Summer estar ali e porque ela parecia melhor conosco do que eu a havia visto em muito tempo.
- Então Summer vai jantar na sua casa hoje. – cruzou os braços quando eu, ela e saíamos do refeitório.
- É, vai. – Concordei. – Minha mãe não vê a Summer tem um bom tempo, acho que ela vai gostar da visita.
- Que gentil da sua parte pensar nisso. – fez uma cara engraçada.
- Legal. Bem legal. Elas devem ter muitos assuntos a colocar em dia não é? – Ela sorriu de um jeito esquisito. – Assim como vocês dois.
- É, devem... Ou não. – Franzi o cenho confuso.
- Pffft! Com certeza elas têm ! – Meu amigo me deu um empurrão. Olhei para ele sem entender.
- Bom, eu vou para a aula então. – juntou as mãos no ar com um barulho forte, me dando um susto. – Nos vemos mais tarde.
se afastou rapidamente e eu encarei .
- Qual é o problema com vocês, hen?!
- QUAL É O NOSSO PROBLEMA, ?! – me encarou ensandecido. – No momento, acho que é você!
- Mas o que...
Antes que eu terminasse, ele saiu me arrastando rumo a nossa aula de Educação Física.
- Que história mais doida é essa de ser professor de violão da Summer, ? – Ele balançava a cabeça, incrédulo. – O que você acha que vai conseguir com isso?
- Ser um cara legal e ajudar minha amiga de infância a realizar um sonho? – Puxei o braço, obrigando ele a me soltar.
parou e respirou fundo, me encarando.
- É sério, . – Disse. – Por mais que a seja doida de pedra, no fundo eu estava feliz por ver você gostando dela, por ver você... Você sabe, progredindo. E aí você me vem com essa agora, meu Deus do céu...
- Não fala besteira, . – Fechei a cara. – Tá entendendo tudo errado.
- Estou mesmo, ? – Ele colocou as mãos na cintura. – Porque o que eu vejo é você sendo legal com a Summer, dando conselhos que ela não vai ouvir e se esforçando pra nada.
- Não é como antes. – Protestei.
E então levei um esbarrão de alguém. Eu e olhamos para o lado ao mesmo tempo.
- Ah, foi mal, . – Junior disse rindo, seguido por sua corja. – Eu não tinha te visto aí.
Quando ele se afastou um pouco, olhou diretamente para mim.
- Agora sim é igualzinho a antes. – Disse com mau humor.
FLASHBACK ON
2 anos atrás; 1º dia de aula daquele ano na Jacksonville High
- Você pegou tudo que precisava? Tem certeza? O dinheiro para uma emergência? Seu celular? – Minha mãe repetiu todas as perguntas pela milésima vez.
- Está tudo aqui, mãe. – Respondi de mau humor. – É só o meu primeiro dia de aula no ensino médio, não uma fuga da polícia.
- Certo, tudo bem então. – Ela respirou fundo. – Vai dar tudo certo. Para nós dois.
- Você vai se sair bem no seu primeiro dia de trabalho, mãe. – Tirei o cinto. – E eu no meu. – Abri a porta e saí do carro.
- ! – Ela chamou quando eu já me afastava.
Me virei para trás. Minha mãe sorriu.
- Boa sorte.
- Pra você também. – Tentei sorrir um pouco, e então ela se foi.
Parei em frente à entrada da Jacksonville Beach High School e respirei fundo então. Ela era enorme. Assustadora.
Durante os últimos anos, eu tinha estudado em uma escola bem menor, mas sabia que muitos dos meus colegas também tinham se mudado para a Jacksonville High para o ensino médio. Infelizmente muitos deles não eram exatamente mais meus colegas. Depois da separação dos meus pais, eu tinha me afastado de todo mundo, e quando dei por mim, a maioria das pessoas tinha se afastado de mim também. Não que fizesse mesmo diferença; afinal, eu gostava de outras coisas e tinha outras ideias agora, estava muito diferente de antes.
Mas tinha que admitir que era um pouco assustador olhar para aquele lugar gigante e estar sozinho. Sempre imaginei que eu e minha melhor amiga chegaríamos juntos ao ensino médio. Que nosso primeiro ano seria cheio de aventuras malucas e fugas escondidos para festas. As coisas mudavam.
- EI, CALOURO, SAI DA FRENTE! – Alguém gritou.
Dei alguns passos para o lado bem a tempo de escapar de ser atingido por um grupo de veteranos, que puxava pelos braços e a gola da camisa um garoto que devia ter a minha idade, de olhos e cabelo . Por um segundo, pensei que ele precisava de ajuda. Cogitei fazer alguma coisa, mas então percebi que ele estava rindo.
- Abram caminho para o irmão pirralho de Patrick ! – Os veteranos gritavam em meio a risadas.
Tudo bem, o tal garoto não estava sozinho como eu. Eles conheciam o irmão mais velho dele, pelo que entendi, e não pareciam dispostos a deixa-lo se sentir um peixe fora d’água. Por sinal, exatamente o que eu era naquele momento.
Decidi que já tinha enrolado demais. Ajeitei a mochila e entrei na Jacksonville High.
Minha primeira aula seria a de Biologia. O professor era um tal de senhor Ackles, e por algum motivo eu tinha achado esse nome engraçado pra caramba. Imaginei que ele fosse ser um cara divertido também.
Quando cheguei à sala de aula que meu horário pessoal informava, percebi que havia algo errado. A sala não era um laboratório, como era de se esperar numa aula de Biologia.
Droga, será que havia algo errado com o horário que eu tinha pegado? A última coisa que eu queria era ter que sair por aí procurando o laboratório – os veteranos iam achar essa a chance perfeita de curtir com a cara do novo calouro. Estava certo de que se tivesse que perguntar a alguém, iria acabar parando na dispensa ou no armário de vassouras.
- A sala é essa mesma, se quer saber. – A voz suave disse atrás de mim, me fazendo congelar. Eu reconheceria aquela voz em qualquer lugar.
Me virei para trás e dei de cara com Summer Olsen, me olhando sem esboçar nenhuma reação de fato.
Summer Olsen, aquela que tinha crescido comigo e com quem eu costumava caçar bichinhos na praia. Summer Olsen, que tinha ficado mais alta que eu do nada aos doze anos, me deixando morrendo de vergonha de andar com ela, mas que agora parecia estar uns dois centímetros menor que eu. Summer Olsen, de quem eu tinha fugido descaradamente no último ano, sendo um idiota e o pior amigo que alguém poderia ter. Summer Olsen. A garota mais linda que eu conhecia, Summer Olsen.
- Obrigado. – Murmurei. – Faz um tempão que a gente não se vê, não é verdade?
Summer desfez a expressão de nada do rosto, ponderando sobre meu comentário.
- É verdade. – Disse. – Eu fui para o acampamento de modelos nas férias. Meus pais me deixaram escolher dessa vez.
- Puxa, isso é legal. – Assenti. Summer sonhava em ser modelo desde os dez anos. Isso ou Bióloga, mas não havia um acampamento de Biologia nas redondezas, provavelmente.
- E você? Como estão as coisas?
- Bem. Eu estou legal. – Sorri um pouco, e então ela sorriu de volta, colocando o cabelo louro atrás da orelha.
Um homem de talvez uns trinta anos apareceu logo atrás dela, encarando a turma por cima de óculos quadrados.
- Certo, vão para os seus lugares, calouros. – Ele disse, e percebendo que se tratava do tal senhor Ackles, procuramos nos sentar. Fiquei na fileira do meio, bem no centro da sala, e Summer na primeira carteira.
- Como podem notar, nosso laboratório está com problemas. – O professor continuou. – Ele está sempre com problemas. – Acrescentou com um suspiro desanimado. – Mas vamos tentar fazer com que este seja um bom ano, apesar de tudo.
Ele começou a escrever alguma coisa no quadro, mas tudo que eu conseguia fazer era prestar atenção em Summer. Enquanto eu estava ali ainda perdido, dois outros alunos já estavam puxando assunto com ela, que respondia com um sorriso.
Vai começar tudo de novo, pensei. Eu já deveria saber.
Não tive a chance de fazer muitos amigos durante as primeiras aulas, embora não soubesse de fato como fazer isso. Todos pareciam ter criado uma conexão natural com alguém nos primeiros cinco minutos de aula, mas eu ainda estava meio deslocado, embora uma garota tivesse me ajudado a encontrar a sala de aula seguinte. Summer não faria aquela matéria comigo, então no fim não tentei puxar muito assunto com ninguém. Os professores em suma usaram aquele dia para explicar o funcionamento da Jacksonville High e dar dicas, falar sobre sua matéria e coisas do tipo. Não havia muito o que falar, nem tempo para conversar.
Segui sozinho para o refeitório na hora do almoço, já sofrendo por antecipação enquanto imaginava onde iria me sentar. Tinha certeza que todos teriam um lugar com seus novos melhores amigos para sempre e eu acabaria sentado no gramado do lado de fora. Não que isso fosse tão ruim, mas tinha chovido naquela manhã e a grama devia estar encharcada.
A fila da cantina estava enorme quando entrei nela. Os calouros se acotovelavam falando sem parar sobre as primeiras horas ali.
Vi aquele mesmo garoto que tinha visto ser puxado naquela manhã. Ele estava encostado tranquilamente a uma parede nos fundos e havia outro garoto ao seu lado, com o cabelo mais escuro. Enquanto eles conversavam, alguns outros meninos se aproximaram deles. Me perguntei se eu conseguiria me aproximar também. Quer dizer, não tínhamos nenhuma aula juntos até então, mas talvez eu pudesse passar aquele intervalo com eles.
Foi então que entraram no refeitório alguns dos veteranos que o estavam puxando mais cedo. Reparei que um deles usava um casaco com o desenho do mascote do time da escola, o espadarte. O rapaz subiu na mesa onde estavam sentadas várias garotas – pelo perfil, imaginei que fossem líderes de torcida. Elas riram e deram gritinhos, e então ele começou a falar:
- Bom dia, calouros! Espero que estejam tendo um primeiro dia bem traumático, do jeito que deve ser. – Disse em voz alta, e muitas pessoas ali riram. – Eu sou Alex Anderson, o capitão do Swordfish, o melhor time de futebol da costa. – Os outros alunos bateram palmas e assoviaram. – Estou aqui para anunciar que amanhã às duas da tarde faremos uma reunião para falar sobre o processo seletivo do time deste ano. Todos que tiverem interesse em jogar futebol na Jacksonville High devem comparecer. Eu e o resto do time prometemos ser... acolhedores. – Ele olhou para os amigos e riu. – Esperamos vê-los lá. – Então Alex saltou da mesa e se sentou junto com as garotas, acompanhado de seus amigos.
Passou pela minha cabeça que os jogadores deviam estar armando alguma para o dia seguinte, mas eu não jogava mais futebol há tempos, então não achava que estaria lá.
- Cara, não seria irado entrar para o time de futebol no nosso primeiro ano? – Alguém disse.
Olhei para trás e encontrei um garoto mais ou menos da minha altura, usando uma camisa xadrez sobre uma blusa com estampa de stormtrooper.
- Eu não pretendo ir. – Balancei a cabeça. – Sei lá, acho que eles estão armando alguma.
- Pft, é claro que estão! – O garoto riu. – Mas quem se importa? Não deve ser difícil descobrir o que é. O lance é que essa é a nossa chance de nos socializar. Somos calouros, precisamos de um grupo, e que grupo poderia ser melhor que o dos jogadores? Estaríamos protegidos dos valentões, teríamos desculpas para faltar aulas e, a melhor parte, as líderes de torcida iriam nos amar. – Ele suspirou encarando a mesa onde Anderson havia se sentado. Então olhou para mim e estendeu a mão. – Sou , a propósito.
- . – Apertei a mão dele. – .
- E então, qual é sua próxima aula?
- Matemática Financeira.
- Cara, que coincidência! – Ele abriu um sorriso de orelha a orelha. – A minha também!
O tal não só estava na minha classe de Matemática Financeira, mas também na de História e na de Educação Física. Ele falava à beça, o que me deixava meio louco às vezes, mas era bom que alguém estivesse falando comigo, no fim das contas. E também, não era de todo ruim – os assuntos dele eram até interessantes. Ele era maluco por filmes de sci-fi e quadrinhos, e aparentemente entendia um bocado de coisas inúteis e já sabia de cor a ficha de vários dos nossos novos colegas de classe. Andar com ele fazia com que eu me sentisse menos perdido naquele lugar.
- Eu sabia que você vinha! – O garoto sorriu quando viu que eu me aproximava.
- Tá, mas eu só vou participar da reunião por ora. – Lembrei. – Não quer dizer que vou entrar no time.
- Eu não disse nada. – ergueu as mãos inocentemente.
- Claro que não. – Rolei os olhos. – Vamos logo.
Seguimos juntos para o campo de futebol da Jacksonville High, seguindo o mapa horroroso que tinha desenhado em sua primeira visita ao lugar. Os jogadores estavam papeando despreocupadamente no campo de futebol, enquanto a maioria dos calouros se encontrava sentada na arquibancada, o nervosismo evidente.
Aquele garoto que eu vira no dia anterior estava lá. Quando ele passou pelo grupo de veteranos, um deles agarrou o braço dele e disse alguma coisa. O garoto sorriu e deu de ombros, indo se juntar aos amigos calouros.
- Eles devem estar armando alguma coisa cruel. – , sentando-se no banco, observou os jogadores.
- E você ainda quer ficar pra ver. – Resmunguei me sentando ao seu lado.
- Eu posso aguentar qualquer coisa pelas vantagens de ser um jogador, .
- Não sei se eu estou disposto a tanto.
Antes que continuássemos aquela conversa, os jogadores se colocaram diante da arquibancada, batendo palmas para chamar nossa atenção.
- Sejam bem-vindos, calouros! – Alex Anderson cumprimentou. – Fico feliz que pelo visto a vontade de vocês de fazer parte do time tenha superado o medo de levar um trote.
- E vocês não pretendem mesmo aplicar nenhum trote esse ano? – Um dos calouros perguntou com descrença.
Anderson olhou para os amigos e sorriu.
- Talvez, calouro. – Admitiu. – Mas não é por isso que estamos aqui hoje.
- Hoje vamos explicar a vocês o que significa ser um jogador do Swordfish nesta escola. – Um garoto ruivo tomou a frente do discurso.
Os jogadores fizeram um longo discurso explicando as razões para que quiséssemos fazer parte do time. Jogadores tinham infinitas vantagens ali, como ser dispensados das provas em semanas de jogo, poder faltar para viajar para os campeonatos, entre outras coisas. Havia também a já sabida proximidade com as líderes de torcida, o que deixava qualquer um muito feliz. Em suma, ser um calouro jogando no time era como ter uma passagem garantida para um ensino médio feito só de diversão, e ainda com a grande possibilidade de ganhar uma bolsa de estudos como atleta no fim.
- O teste será na quinta-feira. – Outro veterano anunciou. – Treinem. Se exercitem. E assim, talvez vocês tenham a chance de se unir a nós este ano.
Os calouros bateram palmas e os veteranos se afastaram. Assim como muitos outros, eu e continuamos sentados.
- Estou com uma péssima intuição. – Murmurei. deu de ombros, fazendo uma careta. Apesar da animação, ele devia concordar que algo estava errado.
Percebi que aquele garoto que eu sempre via – que estava a alguns metros com seu amigo – olhou em nossa direção. Ele disse alguma coisa ao outro garoto e veio para onde estávamos, se sentando ao lado de .
- Isso foi um pouco suspeito, não? – Nos perguntou olhando para o campo. – Sei lá, tudo parece bom demais para ser verdade.
- Era o que eu estava dizendo. – Concordei.
O garoto olhou em minha direção e sorriu, estendendo a mão.
- Sou . . Mas podem me chamar de Junior. E este é o . – Indicou o amigo. Apertei a mão dele e acenei para o outro garoto.
- Sou . . Este é o...
- . – Meu colega estendeu a mão, terminando de se apresentar. – . – O encarou por um instante. – Você por acaso é o irmão mais novo do Patrick ?
Junior o encarou por um segundo e então sorriu de novo, assentindo.
- É, eu sou.
- Eu e meu pai fomos a alguns jogos do seu irmão. – se empolgou. – Ele era... Caramba, ele era muito bom.
- Pat é uma lenda. – disse com admiração. – É uma pena que tenha se formado justo agora que chegamos aqui.
- Mas você pretende continuar a tradição familiar, não é? – Perguntei a Junior. – Entrar para o time, ser famoso. – Brinquei.
- Essa segunda parte fica a seu critério. – Ele riu. – Estamos todos no mesmo barco aqui, . Quem sabe se não são vocês dois que vão entrar no meu lugar?
- Ah, eu não acho nada provável. – riu.
- Bom, nunca se sabe. – se colocou de pé e Junior também. – Nos vemos por aí?
assentiu com vontade.
- Claro! – Exclamou alegre. – Nos vemos por aí. Sem dúvida.
- Bom, até mais. – Junior disse, e eles se afastaram.
Quando os dois já estavam um pouco longe, agarrou na minha camisa, afoito.
- Dá pra acreditar nisso? O irmão mais novo de Pat estava conversando conosco. Sabe o que esse cara é? É nosso ingresso para a popularidade.
- Eu não quero ser popular, . – Balancei a cabeça e me levantei. me seguiu.
- Algumas coisas não são opcionais, . Elas simplesmente estão destinadas a acontecer.
- É, mas...
- ! – Outra voz chamou à distância.
Parei e me virei para trás. também. Summer acenava enquanto corria em nossa direção. Havia uma garota morena – talvez latina – de cabelo longo com ela, parecendo um pouco tímida. Olhei para meu colega, que definitivamente parecia ainda pior que quando Junior se sentara do nosso lado, e decidi me afastar alguns passos dele para falar com ela.
- Sum! – Eu disse quando a menina já estava perto. – O que está fazendo aqui? Pensei que já tinha ido embora.
- Eu fiquei para a reunião com as líderes de torcida...
- Vai fazer teste para a equipe?
- Vou, sim. – Sorriu. – Você veio à reunião do time? Não pensei que quisesse jogar futebol.
- Na verdade, eu vim só por vir. – Dei de ombros.
- Bom, nunca se sabe não é? Talvez você acabe sendo jogador.
- É, talvez. – Concordei.
A garota com Summer pigarreou.
- Summer? – Chamou. – Sem querer ser chata, mas temos que correr.
- Ah, desculpe, Jasmine. Você está certa. – A loura riu. – É uma brincadeira da equipe de torcida com nós calouras. – Me explicou. – Temos essa lista enorme de coisas pra fazer se quisermos nos juntar à equipe. – Mostrou uma folha cheia de itens. – Nos vemos por aí?
- Claro. – Sorri. – A gente se vê.
- Ótimo. – Ela sorriu. – Vamos lá, Jasmine!
As duas saíram correndo, rindo, em direção a algum outro lugar. Junior e , a alguns metros, tiveram que abrir caminho.
- Desculpe! – Summer gritou.
- Sempre que quiserem esbarrar em alguém, estaremos aqui! – gritou de volta, rindo.
Balancei a cabeça, me lembrando então de . O garoto estava ali parado me olhando como se eu tivesse um alvo na testa.
- Qual é o problema? – Perguntei.
- “Oi garota extremamente gata falando comigo do nada, este é meu amigo ”. – Ele repetiu incrédulo. – Era tão difícil assim dizer isso?
- A gente não se conhece nem a quarenta e oito horas. Não somos amigos. – Rolei os olhos, voltando a andar.
- Isso doeu, mas eu vou te desculpar porque sua amiguinha é a caloura mais notada da escola até agora, depois de Junior . – Ele me seguiu. – Sério, como você a conhece?
- Não conheço, ela só me achou bonito e parou pra falar comigo. – Ironizei.
- Ah, claro. Se ela tivesse que achar alguém bonito, é óbvio que seria eu. – bufou. – Onde mesmo é sua casa? – Perguntou sem sair da minha cola, tirando o celular do bolso.
- Na 16th Street N. – Respondi. Depois franzi o cenho. – Por quê?
- Nada demais. É que eu preciso avisar a minha mãe onde vou passar o resto da tarde. – Ele disse simplesmente. Abri a boca para protestar, mas ele fez sinal para que eu me calasse, já falando ao telefone. – E aí, mãe? É. Olha, eu só vou para casa mais tarde. Vou ficar na casa do . É...
continuou explicando a mãe dele como ia passar a tarde enfurnado na minha casa, deixando de lado, é claro, a parte de que eu nunca o convidara para ir até lá.
- Falando sério, de onde conhece Summer Olsen? – perguntou de novo naquela tarde. Estávamos no meu quintal, treinando para o teste.
- Você sabe o quanto é assustador que saiba nome e sobrenome de todo mundo no segundo dia de aula, né? – Ergui uma sobrancelha e ele deu de ombros. – Ela era minha vizinha. Éramos amigos.
- Quão amigos vocês eram? – Ele chutou para mim. Fiz uma careta. – Só pra saber.
- Melhores amigos. – Respondi por fim. – Mas isso foi antes.
- E por que diabos você deixaria de ser amigo daquela divindade?!
- Porque... Um monte de coisa aconteceu, ! – Peguei a bola com as mãos e me sentei no chão, exasperado com aquele interrogatório. pareceu assustado com a minha reação, mas não me importei. – Nós andávamos juntos, aí ela se mudou, meus pais se separaram de um jeito nada amigável e minha vida virou uma merda. A Summer sempre viveu cercada de amigos, e eu estava entre eles, mas fui me afastando de todo mundo, e quando vi, não éramos mais como antes.
ficou calado, sem saber o que fazer em seguida. Imaginei que depois de todo aquele drama ele iria simplesmente ir embora, mas em vez disso ele se aproximou e se sentou ao meu lado na grama.
- Entendi agora. – Ele disse. – Foi mal por ser um intrometido. Eu não consigo controlar às vezes. Na maioria delas.
- Tudo bem. – Balancei a cabeça.
- Eu imagino que isso tudo tenha sido uma merda. Quer dizer, parece uma droga pra mim. – Assentiu. – Mas talvez, se entrarmos para o time e a Summer para a torcida, vocês acabem se aproximando de novo! – Me empurrou de leve, esperançoso. – Os jogadores e as animadoras fazem tudo juntos, vocês vão se ver o tempo todo. As coisas podem voltar a ser como antes. Talvez melhores. – Ergueu as sobrancelhas sugestivamente, e eu acabei rindo.
- É, talvez você esteja certo. – Concordei. Pelo visto não era tão chato quanto eu havia pensado.
- E então, vamos treinar para entrar nessa porcaria de time ou não? – Ele se colocou de pé, tomando a bola das minhas mãos.
- Vamos. – Fiquei de pé com a ajuda dele e sorri, ainda segurando sua mão. – Nós vamos entrar para os Swordfishes.
Nós estávamos sentados no gramado do lado de fora – uma vez que o dia amanhecera ensolarado naquele dia – repassando nossa estratégia para o teste. estava empenhado em fazer tudo dar certo, mas eu me distraía um pouco com Summer ensaiando alguns passos para o teste da torcida com a ajuda de Natasha Meyer, a capitã das líderes. Teoricamente Sum nem tinha entrado para a equipe ainda, mas era fácil ver que elas a queriam nela.
- , você ouviu alguma coisa do que eu acabei de dizer? – me deu um cutucão. Olhei para ele meio perdido, mas assenti.
- Mas é claro que ouvi.
- O que foi que eu falei então?
- Você falou sobre... Futebol. – Dei de ombros.
- Pro inferno, . – Ele me empurrou, seus olhos encontrando Summer a distância. – Falando sério, você gosta dessa garota, né? E não estou falando desse papo de amiguinhos. Você é afim dela.
- Óbvio que não. – Neguei.
- Ah, tá bom. E eu não queria pegar a Natasha.
Eu ri do comentário, especialmente pensando no quão impossível aquilo seria ainda que ele fosse do time. Mas antes que pudesse fazer minha piada, alguém se jogou no chão perto de nós. Era Junior , junto de seu amigo .
- E aí, pessoal? – Ele sorriu amigavelmente, mas parecia ansioso.
- Junior. – Cumprimentei. – E aí?
- É o seguinte: Junior e eu descobrimos uma coisa. – informou em de conchavo.
- Coisa? – se inclinou para mais perto. – Que coisa?
- É o seguinte. – Junior falou, olhando para os lados como que para ter certeza de que estávamos sozinhos. – Ontem à noite, e eu estávamos na praia, praticando para o teste, quando ouvimos a voz do Anderson. Nós nos escondemos e o vimos falando ao telefone num quiosque.
- Ele estava falando sobre o trote. – esclareceu.
- Ah, Deus. – arregalou os olhos. – E o que ele disse?
- Ele disse que eles se reuniriam para combinar o que farão conosco aqui, no campo de futebol. – Junior explicou. – A reunião deles vai ser hoje à noite, às sete. Eu e tivemos uma ideia, e achamos que vocês mereciam saber também.
- Qual é a ideia? – Perguntei. Junior olhou para e sorriu, voltando-se para nós de novo.
- Nós vamos vir aqui hoje à noite e nos esconder debaixo das arquibancadas. – Revelou. – Vamos descobrir o que eles estão armando pra podermos escapar.
- Uow, isso é um pouco arriscado, não é? – ergueu as sobrancelhas. – E se eles nos pegarem?
- Não se preocupe, eles não vão. – dispensou a possibilidade. – Eu e Junior nos escondemos lá várias vezes para ouvir conversas do Pat.
- É verdade. – Junior confirmou. – Nós viemos falar com vocês porque pensamos que talvez quisessem vir também.
- Tem certeza de que eles não vão conseguir nos ver? – Questionei, meio em dúvida.
- Absoluta, . – Junior riu. – Além disso, o que pode acontecer se eles nos virem?
Olhei para , que deu de ombros, e então para Summer, à distância.
- Certo. – Decidi. – Nós vamos vir.
- Ótimo! – Junior comemorou. – Nos vemos debaixo da arquibancada esquerda à noite então.
- Às sete, não é? – Sorri, já mais animado.
- Às sete. – confirmou, colocando-se de pé junto com Junior. – Fizeram a escolha de suas vidas, rapazes. Nos vemos mais tarde.
Os dois acenaram e se afastaram.
- Uau, não é incrível? – sorria, abobalhado. – Parece que vamos mesmo entrar para o time.
- É, parece que vamos. – Concordei feliz, me deitando de vez na grama. Talvez estivesse um pouquinho certo sobre eu ter uma queda por Summer Olsen.
Por sorte, naquela noite minha mãe aceitou um convite para jantar de seu novo colega de trabalho, Henry. Ao que parecia, ela tinha uma queda pelo sotaque britânico dele, mas fazia de tudo para esconder isso, pois achava que eu ia me chatear. Ela estava enganada.
- Certo, eu deixei a comida pronta. – Ela explicava aflita, andando pela casa. – Se precisar de qualquer coisa, é só me ligar. E o telefone do restaurante é...
- Eu já sei, mãe. – Tranquilizei-a. – Vai ficar tudo bem.
Alguém buzinou do lado de fora.
- É ele. – Ela respirou fundo. – É sério, . Qualquer coisa, só precisa me ligar.
- Divirta-se, mãe. – Dei um beijo em sua bochecha. – A senhora está linda.
Minha mãe sorriu, respirou fundo de novo e saiu de casa. Fui para a janela e acenei para o tal Henry, que ajeitou os óculos e acenou de volta alegremente. Esperei para ver se ele abriria a porta do carro para ela, e ele o fez. Um ponto para ele.
Dei um tempo até que eles se afastassem e então subi as escadas correndo para trocar de roupa.
- Ei, ! – Ouvi a voz de lá embaixo bem quando fechava o botão da calça.
- Já vou descer! – Avisei pela janela.
Quando cheguei ao quintal, usava uma blusa camuflada e uma blusa de capuz preta.
- Você deve pensar que é um agente secreto, né? – Rolei os olhos.
- E não sou? – Ele sorriu. – Descobrindo os planos secretos de um grupo de pessoas poderosas e inescrupulosas. Parece coisa de agente pra mim.
Balancei a cabeça e ri, tomando o rumo do fim da rua.
- Ei, para onde está indo? – perguntou confuso.
- Para o ponto de ônibus. – Falei como se fosse óbvio. – O que você esperava?
- Que você fosse pegar emprestado o carro da sua mãe que acabou de sair? Qual é, .
- Nem pensar, ! – Franzi o cenho. – Você ficou maluco? Não quero acabar na cadeia. Ainda estou tirando a carteira.
- Ah, , não pode me fazer pegar um ônibus há essa hora! Eu nem trouxe dinheiro. E não vamos ser presos, meu pai trabalha na polícia. – Ele correu atrás de mim e eu grunhi. – O que pode acontecer de mau? Vamos ficar lá por no máximo uma maldita hora e voltar na velocidade permitida. Estamos a um quilometro e meio da escola, não há cem anos luz.
Parei e o encarei com uma expressão de poucos amigos. me mostrou o celular, que mostrava que já eram 6:40 p.m. Eu tinha precisado esperar até que mamãe saísse, então já estava quase na hora marcada pelos veteranos.
- Tá, eu dirijo. – Aceitei por fim. – Mas se formos pegos...
- Combinado. – Sorriu, enquanto eu voltava para onde estava o velho fiat uno rules da minha mãe. – Se acontecer qualquer coisa, meu pai limpa sua barra. Ele vai ficar muito feliz em saber que tenho um amigo. Não que eu nunca tenha tido um...
- Tudo bem, ! – Cortei. Por Deus, ele falava demais. – Vamos de uma vez.
Alegre, correu para dentro do carro, jogando-se preguiçosamente no banco do carona. Para o bem dele, era bom mesmo que não fôssemos pegos.
Estacionamos a alguns metros da escola, porque achamos que um carro no estacionamento no meio da noite daria muito na vista. Depois caminhamos – atentos a todo e qualquer barulho – para dentro da Jacksonville High e rumo ao campo de futebol.
- Devíamos ter pegado os telefones daqueles dois. – Eu olhava para os lados.
- Relaxa. – dizia. – Estamos atrasados, os dois já devem estar lá.
Quando chegamos à área aberta, corremos o mais rapidamente possível para baixo da arquibancada, entrando por uma brecha na parte de trás da mesma.
- Eles não estão aqui! – exclamou.
- Percebeu isso naturalmente ou precisou do seu treinamento de agente secreto? – Fiz uma careta. Então ouvi um barulho acima de nós e fiz sinal para que ele se calasse.
Nos aproximamos das frestas do banco e vimos os veteranos se reunirem no gramado. Alex Anderson usava uma touca preta e seu casaco do time, e falava alguma coisa com o veterano de cabelo ruivo que discursara no dia anterior, Max Adams.
- Meus caros colegas de time – Anderson começou a falar mais alto. – Sabemos que temos que fazer uma recepção memorável para os nossos calouros. Este é o último ano da maior parte de nós, então vamos fazer com que o trote seja especial dessa vez.
olhou para mim e levantou os polegares, animado.
- Já temos em mente os candidatos a jogadores mais promissores deste ano, mas ainda faltam algumas etapas para essa escolha...
De repente, deu um pulo ao meu lado.
- Ai! – Exclamou baixinho.
- O que foi? – Me virei para ele.
- Um bicho me mordeu!
- , para de fazer barulho! Eles vão nos ouvir.
- Foi reflexo! – Ele se defendeu.
- Já chega! Vamos prestar aten... – Mas quando olhei de volta para o campo.
- Ué, pra onde eles foram? – ficou confuso.
Foi então que ouvimos o ranger de madeira, e abertura do lugar onde havíamos passado se abrir mais. Max Adams entrou pelo buraco, um sorriso maldoso no rosto.
- Ora, ora, o que temos aqui. – Disse. Demos um passo para trás. – Não adianta correr. Até porque, para onde iriam, não é?
- Encontrou algo de interessante aí embaixo, Max? – A voz de Anderson soou lá em cima.
- Justamente o que estávamos procurando, Alex.
Eles nos arrastaram até o meio do campo, enquanto tentávamos incansavelmente explicar o que tinha acontecido.
- Por favor, por favor! – dizia sendo arrastado por dois caras maiores. – Não fizemos por mal!
- Anda logo, calouro. – O garoto o puxou com mais força.
- Dois espertinhos, vejam só vocês! – Anderson exclamava, fazendo os outros rirem.
- Anderson, sentimos muito. – Tentei nos safar. – Juro que não queríamos estragar a surpresa de vocês...
- Ah, mas vocês não estragaram nada, calouro! – Anderson parou de andar bem no meio do campo. – Estávamos esperando por vocês dois. – Então se virou para os outros. – Meus caros colegas, e ! Nossos convidados de honra da noite!
E eu soube exatamente de duas coisas. A primeira delas era que estávamos fodidos. A segunda era que Junior e tinham armado para nós.
- Ah, droga! Merda, merda! – exclamava abraçando o próprio corpo. – Vocês precisavam mesmo fazer isso? Está congelando aqui!
Lá estávamos nós dois, apenas de cueca, no meio do campo de futebol da Jacksonville Beach High School. Eu nunca tinha sentido tanta vergonha na vida, e só conseguia pensar em assassinar aqueles dois desgraçados.
- Senhores, nosso trote está oficialmente aplicado! – Anderson comemorou junto com os veteranos. – Quanto a vocês, calouros otários, nos vemos amanhã. – Nos encarou. – Espero que tenham aprendido que é muito feio xeretar a vida de seus veteranos.
Rindo, os jogadores começaram a se afastar de nós, deixando-nos ali, sem roupas, no frio do início de outono.
- Ei, o que vão fazer com as nossas roupas?! – Gritei.
[N/A: Ok, podem colocar pra tocar essa agora, ladies]
- Vamos deixar amanhã no mesmo lugar onde as perderam. – Max falou. – No meio do campo de futebol!
Eles foram embora gargalhando, e vimos, depois de alguns instantes, seus carros passando a toda do lado de fora da escola.
- Merda. – murmurou. – Merda! Merda! Merda! – Chutou o gramado. – Desgraçados!
- Nós devíamos ter desconfiado! – Exclamei irado.
Meu amigo parou e respirou fundo, balançando a cabeça.
- Tá legal, vamos embora de uma vez. – Começou a andar. – Só quero comer porcarias, dormir e fingir que isso nunca aconteceu.
Eu comecei a segui-lo, mas então parei, em choque.
- Porra. – Murmurei. parou e se virou para trás.
- O que foi? – Perguntou devagar.
- A chave do carro. – Respondi no mesmo ritmo. – Estava no bolso da minha calça.
voltou a chutar o chão, totalmente fora de si.
- Ah, não, ! Mas que merda! Por quê?!
- O que você queria? – Falei desesperado. – Que eu adivinhasse o futuro e guardasse ela na roupa de baixo?
- Mas que inferno! O que vamos fazer agora?
- Podemos pegar um ônibus ou correr por um quilômetro e meio. Mas temos que sair logo daqui.
- Tenho a sensação de que a qualquer momento vão aparecer pessoas com câmeras! – choramingou enquanto começávamos a correr.
Fomos a toda velocidade até um pouco depois do ginásio, onde ouvimos vozes – vozes femininas, para melhorar – rindo e gritando.
- Era só o que faltava! – exclamou. – Mas que porcaria de noite!
Procuramos um lugar para nos esconder, mas não havia nada por perto. Nossa única solução era correr mais, mas não tivemos tempo. Duas garotas vieram correndo na mesma direção que nós, usando biquínis e parecendo desesperadas. Reconheci uma delas, que morava numa rua perto da minha. Jodi alguma coisa. Ela usava aparelho, era baixinha e tinha um cabelo meio rebelde. A outra garota com ela eu não conhecia. Tinha as sobrancelhas grossas assustadoras e usava um aparelho freio de burro, o cabelo escuro estava preso num rabo de cavalo.
- Malditas líderes de torcida! – A garota com Jodi exclamava. – Malditas, quero matar todas!
Provavelmente elas tinham acabado de passar pela mesma situação que nós. olhou para mim meio sem saber o que fazer, quando elas finalmente notaram nossa presença.
- Oh meu Deus! – Jodi tentou se cobrir com as mãos.
- Mas que... – A outra garota nos fuzilou com os olhos.
Depois de um instante constrangedor, em que todos processamos que tínhamos sido alvo dos trotes daquele ano, encarou a garota de cabelo escuro.
- Não contamos se vocês não contarem. – Sugeriu.
- Fechado. – Ela concordou rapidamente. – Anda logo, Jodi Lyn!
As duas voltaram a correr e um segundo depois nós fizemos o mesmo.
Alcançamos a rua tentando nos esconder atrás de árvores, lixeiras e de qualquer coisa que conseguíssemos, mas a certa altura isso já estava ficando cansativo.
[N/A: Podem parar por aqui, docinhos]
- O quão longe ainda estamos? – perguntou exausto.
- Deve faltar só um quilômetro agora. – Ofeguei.
Um carro se aproximou de nós então. Por um segundo, pensamos que seríamos presos ou sequestrados, mas em vez disso um cara loiro nos encarou da janela.
- Foram as vítimas desse ano, não é? – Ele perguntou. – Do trote.
Até pensei em negar, mas não havia como.
- É. Fomos.
O cara balançou a cabeça e riu.
- Olha, eu também já fui uma vítima, então podem ficar tranquilos. – Disse. – Eu sou barman no Roger’s, não sei se vocês conhecem, e estou indo pra lá. Se quiserem uma carona para aquelas bandas, deixo vocês no caminho.
- Tem certeza de que não quer nos matar? – questionou. – Porque meu pai é da polícia.
O cara riu de novo.
– Bom, é melhor entrarem logo então, antes que ele os prenda por atentado ao pudor.
olhou para mim, que também não estava certo de que aquela era uma boa ideia, mas naquelas circunstâncias, acabamos aceitando a carona. O cara, que se chamava Filip, tinha acabado de voltar para a cidade depois de uma temporada viajando pela Europa. Ele era bem legal, na verdade.
- Bom, acho que posso deixar vocês por aqui. – Filip disse quando já estávamos na 8th Ave N, a uns trezentos metros da minha casa.
- Não dava pra pedir mais que isso. – Eu disse agradecido.
- Valeu, Filip. – desceu do carro, seguido por mim.
- Até mais ver, rapazes! Boa sorte na escola. – Ele acenou se afastando.
Logo eu e voltamos a andar rapidamente em direção a minha rua.
- Mais rápido, ! – Eu dizia.
- Que diabos pode acontecer? Já estamos quase na sua casa!
E foi justamente quando ouvimos uma sirene. Congelei no mesmo instante encarando , que estava reclamando.
- Não, não, não! Estávamos tão perto!
Quando o carro parou, viramos de costas, envergonhados.
- Boa noite. – O policial falou atrás de nós. – Estávamos parados na esquina e vimos vocês dois passando nessas... Condições. Será que podem me explicar o que está acontecendo ou terei que ser mais insistente?
balançou a cabeça, praguejando, e se virou.
- ?! – Ouvi o policial exclamar, e me virei também, quase sendo cegado pela luz da lanterna do homem.
Meu amigo deu um sorriso amarelo.
- E aí, pai?
- Eu não sei se conseguirei tirar esses óculos escuros algum dia. – disse quando me sentei ao seu lado num banco, depois de recolhermos nossas roupas do meio do campo de futebol. – É como se todo mundo estivesse olhando para mim. Será que estou ficando maluco?
Depois de se sentir extremamente chocado ao encontrar seu filho usando roupas íntimas em um bairro que não era nem sequer dele, o pai de se acalmou e – para meu total espanto – ficou feliz por conhecer o novo amigo do filho. Ele achou nossa história divertida, coisa de adolescente, e até se ofereceu para ir à casa de Anderson buscar nossas roupas e a chave do carro, mas nós nos recusamos terminantemente a isso, pois seria a cartada final da vergonha. Assim, ele contatou o reboque, que levou o carro de volta para minha casa e nós o empurramos para cima da calçada de novo. Garanti ao senhor que os veteranos devolveriam as roupas e as chaves estariam lá no dia seguinte; do contrário, eu contaria a ele, que as buscaria pessoalmente. Na manhã seguinte, fiz minha mãe acreditar que ela tinha esquecido as chaves em algum lugar, e assim ela acabou indo trabalhar de carona com uma amiga. Esperava já ter as chaves de novo quando a tarde chegasse, para que ela nunca descobrisse aquela catástrofe.
- Pelo menos eu tenho as chaves de novo. – Eu disse. – Agora eu tenho outra missão.
- Qual?
- Arrancar a cabeça de Junior . – Me coloquei de pé e comecei a andar a passos largos.
- , será que essa é mesmo uma boa ideia?
- Não me importo se é uma péssima ideia, só quero acabar com a raça dele.
ainda estava me seguindo de perto quando alguém chamou meu nome.
- , espera aí!
Summer tinha um sorriso enorme no rosto quando se aproximou.
- Oi, Summer. – Eu disse, tentando esconder meu mau humor naquele momento.
- Eu só queria te contar... Fiz um teste para um desfile ontem.
- Jura? – Me surpreendi de verdade. – E aí, como foi?
- Acho que fui bem, mas o resultado só sai daqui a alguns dias.
- Tenho certeza de que vão te escolher. – Sorri com sinceridade.
- Bom, eu espero que sim.
O sinal tocou, encerrando nossa conversa.
- Temos Biologia agora, não? – Ela se pôs a andar.
acenou para mim e seguiu para a aula dele, enquanto eu fui atrás dela.
- Sim, temos. Eu até gostei do senhor Ackles. – Comentei.
- Sim, ele é legal.
Entramos na sala de aula e eu fui para o meu lugar. Ainda estava tirando as coisas da bolsa quando, para minha surpresa, Junior passou pela porta. Me preparei para confrontá-lo ali mesmo, mas então ele puxou uma cadeira para perto de Summer.
- Ei, lembra de mim? – Perguntou a ela.
- Dylan, não é? – A garota fez cara de quem estava chutando e Junior pareceu sem graça. Summer sorriu então. – Brincadeira, eu me lembro sim. Junior-irmão-do-namorado-da-Natasha, foi assim que decorei Mas não sabia que você estava nessa turma.
- E não estava mesmo. – Ele sorriu de volta. – Mas tive que mudar. É bom ver um rosto conhecido aqui.
Sum pareceu se sentir lisonjeada com o comentário e eles começaram a conversar casualmente.
Tá. Que merda era aquela?
Era fácil entender que um garoto quisesse se aproximar de Summer, mas por algum motivo algo ali estava me parecendo muito estranho. Eu cogitei que talvez estivesse sendo paranoico por ela ser minha amiga e eu detestar aquele cara, mas mesmo quando o senhor Ackles entrou na sala, não consegui deixar de ficar vigiando aqueles dois.
Quando a aula acabou, eles estavam falando sobre alguma coisa, e eu me mantive afastado, fingindo arrumar minha mochila.
- Então... A gente se vê por aí. – Summer colocou o cabelo atrás da orelha.
- Se eu tiver sorte. – Ele respondeu. A garota riu e assentiu, saindo da sala com o rosto levemente corado.
Fiquei ainda mais irritado, observando aquele sorriso cínico de enquanto saia da sala. Terminei de enfiar as coisas na mochila e fui atrás dele a passos largos.
A alguns metros da sala, eu o alcancei. Puxei sua mochila para trás com força, pegando-o desprevenido. bateu as costas com força no armário quando eu o empurrei e segurei seu colarinho.
- Você é um filho da mãe covarde e otário. – Vociferei.
- Calma, , eu posso explicar... – Junior gaguejou assustado.
- Por que é que fez aquilo? Eu e não te fizemos nada! Por que nos mandou para aquela droga de campo ontem? – Bati as costas dele com mais força.
- Porque... – Ele olhou para trás.
- Deixa ele em paz, ! – Outra voz se meteu na conversa.
apareceu do meu lado e me lembrei do quanto eu também queria arrebentar a cara dele; mas uma briga a três ia causar uma confusão desnecessária, então o larguei.
- Eu fiz aquilo porque precisava! – Junior disse irritado então, parecendo muito mais corajoso do que dois minutos atrás. – Era parte da nossa tarefa de calouros do time arrumar duas vítimas para o trote, e vocês caíram na nossa conversa fiada.
- Vocês são dois desgraçados! – Exclamei fechando a mão em punho.
- Que se dane, vocês teriam feito a mesma coisa. – se defendeu. – Eu ouvi os papos daquele tal de . Ele teria nos entregado sem pensar duas vezes.
- Mas eu não! – Argumentei.
- Quer saber, ? Agora já foi. – Junior ajeitou a camisa. – Não adianta ficar chorando que nem um bebezinho. Vocês sobreviveram ao trote, não é? Parem de reclamar e nos deixem em paz agora.
- Fique bem avisado, . – ameaçou enquanto os dois se afastavam.
E eu não tinha imaginado que poderia sentir mais raiva deles do que na noite anterior, mas eu estava terrivelmente enganado.
- Esquece isso. – jogou uma batata chips na boca. – Se os veteranos souberem que estamos espalhando essa história por aí, são bem capazes de querer nos dar outro trote.
Balancei a cabeça sem olhar para ele, concentrado no jogo de vídeo game que jogávamos.
- Não dá pra esquecer. – Murmurei.
- Bem, então supere! – Ele largou o controle e se levantou.
Eu o segui até a cozinha, onde ele abriu a geladeira e arremessou uma lata de refrigerante para mim, abrindo outra e dando um longo gole.
- Não adianta de nada ficarmos remoendo essa humilhação agora. – Disse. – O fato é que eles tinham uma tarefa, e está certo: eu teria entregado os dois sem pensar duas vezes.
Ergui uma sobrancelha para ele. podia ser péssimo, mas eu duvidava um pouco daquilo.
- Ok, talvez eu pensasse duas vezes antes! – Ele admitiu. – Mas muito provavelmente os entregaria, sim.
Balancei a cabeça e abri minha lata de refrigerante.
- Talvez você esteja certo. – Dei um gole. – Mas é tão difícil tirar isso da cabeça. Ainda mais agora que...
- Ei, você ouviu isso?
Parei antes de terminar o raciocínio. Uma voz conhecida estava rindo na rua.
- É a Summer. – Concluí rapidamente. – O que ela está fazendo desse lado da cidade?
Corri para o lado de fora seguido por . Para o meu total desgosto, Summer estava passando em frente à casa de acompanhada de Junior . Os dois tinham sorvetes nas mãos e riam despreocupadamente. Ela olhou para o lado e me viu, parando de andar e sorrindo.
- ! – Exclamou. – O que está fazendo aqui?
Junior pareceu surpreso – tanto pela minha presença ali como por ela estar falando comigo. Caminhei até o portão, mas não saí, falando com eles sobre a cerca.
- Ei, Summer. Meu amigo mora aqui. – Expliquei, indicando com a cabeça. – E vocês?
- Estávamos tomando um sorvete ali na praia. Já conhece o Junior?
Eu encarei o garoto, que pareceu meio preocupado, apesar de claramente tentar disfarçar.
- Já sim. – Concordei. – Ele também fez teste para o time.
- Vocês são amigos? – Junior perguntou a ela.
- Desde pequenos. – A garota confirmou com a cabeça.
- Legal. – Ele forçou um sorriso. – Bem, vamos andando?
- Ah, claro. – Ela sorriu. – Nos vemos na escola, .
- Até mais. – Meneei a cabeça.
Quando os dois já estavam longe, me aproximei de de novo, impaciente.
- Está vendo só? É por esse tipo de coisa que eu não consigo esquecer.
Por duas semanas, assisti Summer e Junior saindo juntos. Eles andavam juntos nos intervalos, sentavam próximos na aula e eu já até tinha ouvido uma caloura comentando que eles iriam juntos ao Baile de Boas-vindas. A situação era um pouco revoltante para mim, que agora sabia bem que era Junior . Olsen não fazia ideia da furada em que estava se metendo.
- Se acha tão ruim assim, por que não fala com ela? – perguntou um dia, entre uma mordida e outra de seu sanduíche. – Vocês são amiguinhos, não são? Devia tentar.
- Acha mesmo? – Perguntei observando Summer, que falava alguma coisa com Natasha e depois se afastou da mesa rumo ao corredor.
- Pelo menos não vai se sentir culpado por ela casar com o . – Ele deu de ombros.
A simples possibilidade era tão terrível, que me levantei do meu lugar e corri atrás de Summer. A alcancei já no corredor, por onde alguns alunos transitavam.
- Summer! – Chamei. Ela se virou para trás e sorriu.
- Oi, . – Disse.
- Isso vai parecer muito, muito aleatório. – Fechei os olhos, só então percebendo que eu não tinha planejado o que falar. – Mas será que podemos conversar por um minuto?
Eu e Summer nos sentamos num dos bancos do pátio. Havia menos gente ali.
- E então, o que quer me dizer? – Ela perguntou ansiosa.
- Não quero me intrometer na sua vida. – Comecei olhando para o alto. – Mas você está saindo com Junior , não está? – Indaguei. A menina levou um segundo para responder.
- Sim, estou saindo com o Junior. Qual é o problema?
- O problema é que... – Olhei para ela, tentando encontrar as palavras. – Não acho que ele seja o cara certo pra você, Summer.
Ela me encarou por um instante, sem demonstrar reação. Depois, inclinou a cabeça para o lado.
- Por quê?
Fiquei pensando se deveria contar o que tinha feito comigo e , mas me lembrei de que meu novo amigo acreditava que os veteranos se vingariam de nós se por acaso soubessem que estávamos falando mal deles por aí. Eu não podia condenar a um ensino médio aturando valentões.
- Eu não posso dizer, Summer. Só sinto que ele não é um cara legal. Você merece coisa muito melhor que...
- , pode parar. – Ela me cortou. Não estava sorrindo como de costume, mas também não parecia brava.
- Summer...
- Olha, eu sei o que está tentando fazer. – A loira balançou a cabeça. – Está tentando me proteger porque não confia nas pessoas. – Pensei em contestar, mas ela fechou os olhos e respirou fundo. Então voltou a me encarar. – Durante o último ano, eu percebi que você queria ficar sozinho, que não gostava dos meus amigos, às vezes achava que não gostava nem de mim.
- Mas eu...
- Quando cheguei aqui esse ano e vi que estávamos na mesma turma, fiquei muito feliz pensando que poderíamos ser grandes amigos de novo, mas já percebi que você tem se afastado de mim outra vez desde que comecei a andar com o Junior. – Suspirou. – Por favor, , não faça isso.
- Summer, eu realmente acho que o Junior não é a pessoa que você merece. – Insisti.
- Por que não me deixa descobrir sozinha? – Ela sorriu então. – Sabe o que eu queria? Que em vez de se preocupar com as pessoas com quem ando e se você gosta ou não delas, você se importasse mais com as minhas realizações. Quer dizer, eu finalmente fiz uma audição para um desfile e você está sem falar comigo direito por causa de um garoto com quem saio para tomar sorvete às vezes!
Sem saber como continuar o que eu queria, acabei me desculpando. Summer continuou sorrindo.
- Quero que se preocupe com o que realmente faz diferença, tudo bem? Faça isso por mim. – Ela apertou minha mão. – Tenho que ir agora.
Ela foi embora e eu continuei ali, me questionando: o que acontecera fazia diferença ou não?
- Quer saber? Eu acho que você devia deixar essa garota se lascar. – disse no dia seguinte, quando contei o resultado de minha conversa com Summer. – Se ela quer descobrir a verdade sozinha, o problema é dela.
- Não é assim também, . – Defendi. – Eu excluí tanto meus amigos no ano passado; não me espanta que Summer ache que eu estou sendo paranoico. – Suspirei. – Mas não vou me meter mais.
- Eu acho melhor mesmo, . – Meu amigo apertou meu ombro ao passo que entravamos no vestiário depois da aula de Educação Física. – Deixe as coisas acontecerem como tem que ser.
Chegando aos nossos armários, se sentou para tirar os tênis de corrida, e eu comecei a tirar a camisa. Foi então que ouvimos uma conversa do outro lado.
- Junior está me saindo melhor que a encomenda. – Era a voz de Max Adams. – Honestamente, não pensei que ele fosse conseguir enganar os dois calouros, mas ele foi brilhante.
- É irmão do Pat, afinal. – Alguém riu. – Qual é a segunda tarefa dele?
- Ah, essa é ainda melhor. – Adams riu. – Ele tem que conseguir sair com a rainha do Baile de Boas-vindas. Claro que a Natasha não vale, ela faria isso por ele num piscar de olhos. Mas, esperto do jeito que é, ele já tratou de começar a sair com a segunda candidata mais promissora.
- Olsen, não é esse o nome dela? Uh, mas ela é mesmo uma delícia.
- Junior chegou nela como quem não quer nada porque percebeu logo que aquela garota com certeza vai substituir a Natasha quando ela for embora. E bonita como é, não me espantaria se ela ganhasse a coroa no baile também. Junior foi muito esperto. Acho que ele vai conseguir cumprir essa última tarefa com louvor.
- Ouvi dizer que ela é modelo, não é? Então...
De olhos arregalados, me encarou. Eu o olhava do mesmo modo, em estado de choque.
Então Junior estava saindo com Summer por causa da uma tarefa?
Meu sangue ferveu nas veias. Nem que eu quisesse teria como deixar aquilo pra lá agora.
FLASHBACK OFF
Dias atuais; casa da
Ignorei a argumentação de sobre ser uma péssima ideia ser professor de Summer. Nada que ele dissesse me faria me afastar dela de novo depois do tempo que levara para voltarmos a nos aproximar.
Coloquei água na tigela de Stevie depois de tê-la lavado e ele veio correndo. O carteiro tinha passado a pouco e ele estava cansado de latir.
- Isso é pra aprender a ser menos encrenqueiro. – Brinquei ao ver o tamanho de sua sede.
Depois de ter bebido sua água, o dálmata saiu da cozinha. Fiquei ali por algum tempo, arrumando a bagunça sobre a mesa. Uma vez que eu tinha frequentado a casa de Jack por um tempo antes da chegada de , tinha pegado o hábito de ajuda-lo a manter as coisas em ordem quando possível. Ainda não tinha me livrado do costume.
- Está arrumando pra mim, namorado?
Me virei para trás e encontrei , usando um short e uma camiseta. O cabelo ainda estava molhado do banho.
- Para o seu pai. – Provoquei. Ela ergueu uma sobrancelha e sorriu, entrando na cozinha.
- Como está sua agenda no Roger’s essa semana? – Ela apoiou as costas na mesa.
- Apertada. Ando tirando muitas folgas por causa do nosso relacionamento. Vou ficar lá de quinta a domingo.
- Eu posso ir até lá ficar te fazendo companhia.
- Talvez isso não fosse tão ruim assim. – Ergui uma sobrancelha e ri sem vergonha. me bateu, mas estava achando graça.
- ... – Disse então. – Eu quero conversar com você sobre uma coisa.
- O quê? – Perguntei sem parar de arrumar a cozinha.
- É sobre esse negócio de você ensinar violão a Summer. – Mordeu o lábio. – Eu não acho que seja uma boa ideia.
- Você também não... – Rolei os olhos, deixando a cozinha.
saltou da mesa e me seguiu.
- É sério, , é muito sério! – Ela insistiu. – Você sabe o quanto eu gosto da Summer, mas ter qualquer um de nós tão perto dela é como ficar brincando com uma granada. Eu me obrigo a fazer isso porque não tem jeito, mas quanto mais pudermos evitar, melhor.
- , a Summer é minha amiga. – A encarei sério.
- Não estou dizendo que não possa ser. Só estou dizendo que não precisa criar situações em que ela esteja ainda mais enfiada dentro das nossas casas! Você mesmo reclamou por eu ter chamado Miguel pra morar aqui. É o mesmo tipo de problema.
Eu podia entender o argumento de e aceitar sua preocupação, mas, francamente, não achava que Summer seria um problema.
- Não adianta, . Não vou cancelar com ela.
A impaciência de estava evidente no rosto dela. A menina xingou alguma coisa em português e eu não entendi.
- Por que ser tão cabeça-dura, ?! Por que insistir nisso?
- Porque... – Suspirei. – Porque eu devo isso a ela.
FLASHBACK ON
2 anos atrás; corredor da Jacksonville High
- ! – chamou. – Para onde está indo?
- Não sei. – Respondi sem parar de andar. – Tenho que resolver isso. Preciso contar pra Summer o que está acontecendo!
- Sem nenhuma prova?! – Ele puxou a manga da minha camisa, me forçando a parar. – E se ela não acreditar? Acabou de dizer que ela acha que você está sendo paranoico.
Passei a mão pelo cabelo e inflei as bochechas, considerando o que ele dizia. estava certo. Ela ia achar que eu tinha enlouquecido de vez.
- O que eu faço então? – Perguntei confuso.
- Não sei! Só sei que não pode ir atrás da Summer e jogar nela essa bomba sem ter como provar nada.
Soltei o ar numa baforada, passando a mão pelo cabelo. estava certo, aquilo não daria certo. Desanimado, encostei as costas na parede e me deixei escorregar até sentar no chão.
- Droga. – Murmurei.
- Vamos dar um jeito nisso, . Pode ter certeza.
Eu estava duvidando, quando ouvi um barulho no fim do corredor e olhei para lá. Junior estava passando tranquilamente, provavelmente preparado para ir embora.
- Junior! – Chamei com raiva, sem conseguir me conter.
Os olhos de se arregalaram, mas logo ele fechou a cara.
- Me erra, ! – Respondeu mal-humorado.
Me levantei e comecei a correr atrás dele, que apressou o passo até estar fora da escola. Antes que eu pudesse fazer alguma coisa, ele entrou em no carro que o estava esperando. Junior me encarou uma última vez antes que o carro arrancasse.
- Filho da puta! – Xinguei, mas provavelmente ele nem ouviu.
Eu estava em casa no sábado, ainda sem ter uma solução aparente para o problema, quando alguém bateu à porta com força.
- ? – Franzi o cenho quando o encontrei com o cabelo despenteado e aparentemente todo suado ali.
- Encontrei a solução do caso! – Ele exclamou. – Você tem que vir comigo.
Segui a pé rumo à praia que fica a alguns bons metros de distância, enquanto ele explicava.
- Fiquei pensando lá em casa, que qualquer prova que encontrássemos poderia ser facilmente desacreditada, já que a Summer parece caidinha pelo . – Disse. – Então concluí que a única possibilidade de ela acreditar em você, seria uma confissão.
- O nunca vai admitir nada, . – Bufei.
- Ele não, mas o vai. – deu um sorriso diabólico.
- Duvido muito. Ele não entregaria o Junior assim.
- Ele nem vai saber que o está entregando.
- Como assim?
- Eu estava no supermercado quando vi ele no celular, marcando de se encontrar com alguém na praia da Âncora, para onde estamos indo agora. – Explicou. – O que vamos fazer é ir até lá, e aí eu vou confrontá-lo até que ele admita o que Junior está fazendo, cheio daquele arzinho de superioridade dele de vocês-não-podem-fazer-nada-porque-são-dois-fracassados. Só que... – Tirou algo do bolso. – Eu vou estar gravando tudo. E depois, , você vai levar isso pra Summer e contar a verdade.
- Vai mesmo fazer isso por mim? – Ergui uma sobrancelha. parou, surpreso com a pergunta.
- É claro. Somos amigos. – Depois me encarou. – Somos, não somos?
Fui obrigado a rir. Cada vez mais tinha certeza daquilo.
- Sim, . Somos amigos.
- Ótimo, então vamos andar logo. – Ele voltou a apressar o passo. – Não podemos perder essa chance.
Chegamos à Praia da Âncora pouco menos de dez minutos depois. Demos uma volta pela orla, fazendo o possível para sermos discretos, procurando sinais de .
Logo, o avistamos numa lanchonete, não muito longe dali.
- Vamos até lá. – disse firme.
- Eu só queria saber uma coisa . – Comentei enquanto andávamos. – Se você tinha certeza do que fazer e sabia que você é que falaria com , por que me trouxe?
- Pro caso de ele querer me bater, é óbvio. – Ele deu de ombros.
Nos aproximamos um pouco e vimos sentado sozinho, comendo um sanduíche. Devia estar esperando sua companhia.
- Tem que ser agora. – ligou o gravador no bolso. – Se ele ameaçar me bater, você vai lá e arrebenta a cara dele.
- Tá. – Assenti.
Meu amigo subiu as escadas de madeira enquanto eu fiquei observando da areia, me revelando o mínimo possível.
- Ei, ! – exclamou. virou para ele confuso. Depois, deu uma risadinha de deboche.
- O que quer aqui, ? Um autógrafo? – Zombou.
- Sei que já teve uma conversinha com vocês sobre a palhaçada que fizeram conosco, mas acho que eu ainda não tive a oportunidade.
- Seu amiguinho não esclareceu nada pra você? Já foi. Vocês levaram o trote porque são o tipo de pessoas que levam um trote. Ele, o antissocial metido a misterioso, e você... Você é ainda pior que ele. Detectei sua aura de nerd no momento em que pisou naquele campo. – Voltou a comer seu sanduíche. – Como diria o Junior, não temos nada contra vocês, é só como as coisas são.
Vi titubear diante do discurso. Provavelmente, ele se sentiria mais seguro naquele momento se não estivesse usando uma camisa onde se lia “Meu nome é Barry Allen”. Mesmo assim, ele respirou fundo e voltou a falar:
- Você e seu amigo Junior não valem o sanduíche de frango que comem. – Ofendeu. – E tem mais. Sei da segunda parte da tarefa do .
Ao som daquelas palavras, parou de comer. Ele limpou a boca com a mão e se levantou. deu um passo para trás.
- Ah, então você sabe? – riu.
- Sim. Sei que era o desafio dele sair com a Summer.
- As pessoas hoje em dia estão cada vez mais fofoqueiras. – Ele balançou a cabeça. – Mas está certo, . A segunda tarefa do Junior era sair com a rainha do Baile de Boas-vindas, e, honestamente, eu acho que ele vai conseguir, porque Olsen com certeza vai ganhar a votação.
- Não acredito que teve coragem de admitir isso. – disse enojado.
- E o que você vai fazer com essa informação preciosa, ? Han? – ergueu as sobrancelhas, aproximando-se mais de , que foi andando para trás. Eu me encolhi, certo de que ele cairia da plataforma de madeira a qualquer instante e seríamos descobertos. continuou falando com :
- Você vai correr e contar para o , pra que ele possa contar pra Summer, e então vocês três serão felizes para sempre e meu amigo perderá? – Sugeriu. – Isso NÃO vai acontecer, . Eu nem preciso te impedir, e quer saber por que? Não importa o quanto pensa que foi amigo da Olsen quando eles tinham três anos de idade. Eles agora são de espécies diferentes. Ela é uma modelo, é líder de torcida e está saindo com o futuro capitão dos Swordfishes, enquanto é só o ex-amigo antissocial dela, alguém que está amargurado com curso que a vida dela tomou e em como ele não faz mais parte disso. Ela nunca vai acreditar nele.
Vi cerrar os punhos, se esforçando – mesmo sabendo que provavelmente levaria uma surra – para não avançar em .
- Agora, quer saber? Você já tomou demais o meu tempo. – disse exasperado. – Some daqui, . Logo.
Calado, começou a se afastar. Chegando na beira da escada, porém, ele virou de costas, e foi andando assim, encarando .
- Na verdade, , Summer é que ficaria amargurada se soubesse onde foi que se meteu. – Disse. – E só pra você saber: ontem, quando você estava atrás de mim na fila da cantina, eu cuspi no suco que você ia pegar.
A última coisa que vi, foi correndo a toda rumo a minha rua, perseguido ferozmente por .
- Você é muito burro, . – Eu lhe estendi uma bolsa com gelo. – Pra que foi dizer aquilo?
- Não podia sair sem dizer! – Ele resmungou, gemendo de dor em seguida. – Pelo menos ele não deixou a vingança pra depois. Já acabou. – Colocou o gelo na bochecha.
Dei de ombros, achando que ele estava meio certo mesmo.
- Cuspiu mesmo no copo dele?
deu um enorme sorriso, mas logo se arrependeu, sentindo o rosto doer. Percebi que sua cara já começava a inchar. Sua mãe surtaria quando ele chegasse em casa.
Me ajeitei na cama, colocando os braços atrás da cabeça.
- Agora só tenho que esperar até semana que vem e...
- O quê? Semana que vem? – virou para mim num pulo. – Não, ! Não pode esperar até semana que vem! fica bancando o valentão, mas aposto que vai correr pra contar o que aconteceu para o Junior! Tem que falar com Summer antes que eles façam a cabeça dela! Tem que ir agora.
- Mas e você?
- Eu fico aqui até você voltar e invento uma mentira se sua mãe aparecer. Digo que eu caí enquanto jogávamos bola e você foi comprar um remédio pra dor, sei lá. – Insistiu. – Só vá. Não demore.
Fiquei de pé e assenti. Depois, desci as escadas. Passando pela mesa de chaves, imaginei que não haveria problema se eu pegasse o carro da minha mãe de novo.
Dirigi todo o caminho até o outro lado da cidade pensando no que diria a Summer. Como explicaria que o garoto com quem ela estava saindo só estava fazendo isso por uma aposta? Era uma das piores coisas que poderia ser dita a uma garota, provavelmente.
No fundo, eu preferia que ela lidasse bem com a descoberta. Queria que ela mal se importasse em saber daquilo, porque esperava que ela não gostasse de Junior tanto assim.
Respirei fundo quando parei o carro em frente à casa dela. Eu só tinha ido ali uma vez depois de sua mudança. Depois, tinham vindo os problemas, e então eu inventara desculpa após desculpa para não ir mais. Me arrependia amargamente disso agora. Se eu não tivesse me afastado dela, talvez Summer não estivesse agora metida com o idiota do Junior. Talvez eu pudesse tê-la alertado bem antes. Talvez...
Desci do carro e, tomando coragem, me aproximei e toquei a campainha ao lado da grande porta branca. Meu coração estava acelerado quando a maçaneta girou.
Mas não foi Summer quem abriu a porta. Foi Junior .
Ele pareceu um pouco surpreso a me ver, mas não me atacou imediatamente. Junior parecia preocupado, talvez até um pouco cansado.
- Oi, . – Ele disse.
- Onde está a Summer? – Perguntei desconfiado.
- O que está fazendo aqui?
- Seu amigo não já te disse? – Enfrentei.
Junior franziu o cenho, confuso, depois balançou a cabeça.
- Ele me ligou pra dizer alguma coisa, mas eu não deixei. Estava ocupado.
- Vou esclarecer então. Vim aqui pra contar a verdade a Summer sobre a sua tarefa nojenta e como só está com ela pra entrar no time.
Os olhos de se arregalaram e ele engoliu em seco.
- Não pode fazer isso agora. – Ele disse sério.
- Por que não, ? – O encarei.
Junior olhou para dentro por um instante e fechou a porta atrás de si. Ele caminhou até se sentar na calçada da casa dos Olsen. Sem entender nada, eu o segui, mas fiquei de pé.
- Summer não foi escolhida para o desfile. – Ele contou. – Eles ligaram têm mais ou menos uma hora para avisar.
- Oh, droga! – Surpreso por ouvir aquilo, me sentei ao seu lado.
- É, uma merda. – Ele concordou, levemente irritado. – Disseram que ela não é alta o bastante. É ridículo.
- E como ela está?
- Muito mal, é claro. Íamos sair hoje, mas ela me ligou para cancelar quando recebeu a notícia. Achei que seria certo eu vir pra cá ajudar.
Fiquei calado, Junior também. Eu poderia ver com bons olhos aquela atitude, se por acaso ele não estivesse fazendo de tudo para ficar com Summer até que ela fosse eleita rainha do baile.
- Não pode contar a verdade a ela hoje, . – Ele disse então.
- Eu vou contar a verdade a ela, Junior. O que vocês fizeram foi uma canalhice.
- Eu sei que foi! – Ele exclamou com a voz não tão alta. – Quando os rapazes me deram a tarefa, eu só estava pensando em ser parte do time, como meu irmão tinha sido. Eu conheci a Summer e achei que seria fácil cumprir a tarefa ficando com ela, e depois do baile eu estaria livre pra sair com todas as garotas da Costa. – Suspirou. – Mas eu estava errado. A Summer... Ela é diferente. Ela é uma garota especial. Eu estou gostando dela, . De verdade. Por isso estou aqui hoje.
Eu sabia que não deveria acreditar em uma palavra que saía da boca daquele cara, mas Junior mal olhava para mim enquanto falava. Seus olhos encaravam a rua à frente, pensativo.
- Eu sei que se importa com ela. – Ele voltou a falar. – Eu queria pedir para que você guardasse esse segredo, para que me deixasse ficar com a Summer sob a promessa perpétua de nunca magoá-la sendo um idiota de novo. Mas eu te sacaneei e você me odeia agora. Então tudo que vou pedir é que não conte a verdade a ela hoje. Não quando ela já está tão mal.
Respirei fundo e me deitei ali no gramado. O que eu iria fazer?
O discurso de mais cedo tinha sido realista. Apesar de termos sido grandes amigos, eu e Summer pertencíamos a mundos diferentes agora. Junior, pelo contrário, era parte dessa nova vida dela, assim como sua carreira de modelo e a torcida.
Se eu contasse a verdade para Summer – agora ou depois – ela não aceitaria continuar convivendo com os amigos que tinha feito ou mesmo com as líderes, pois Junior estaria sempre ali, e ela sempre se lembraria daquela humilhação, ainda que terminasse com ele antes do baile.
O que aconteceria com ela então? Acabaria como eu, antissocial e revoltada? Sempre com um pé atrás com todo mundo?
Não era isso que eu queria para Summer. Eu não tinha pensado nisso quando saíra de casa, mas não era.
Além disso... E se Junior estivesse dizendo a verdade? E se ele estivesse mesmo gostando de Olsen, assim como ela dele, e eu me metesse – do jeito que ela tinha me pedido para não fazer – e estragasse tudo?
E se depois de eu já ter me metido, ela continuasse com ele e acabasse me odiando?
Eu nunca tinha mentido para Summer, mas todas as possibilidades com a verdade em minha cabeça levavam a um desastre eminente. A chance de ela aceitar a brincadeira de mau gosto que fora feita e seguir em frente sem se abalar me parecia cada vais mais improvável.
Desanimado, me sentei na grama.
- Tem certeza de que gosta dela mesmo, ? – Perguntei. Junior me olhou com esperança.
- Tenho. Eu gosto muito. De verdade.
- Então eu não vou contar. – Decidi. – Mas se chutar ela depois do baile, ou se algum dia aprontar mais uma dessas, eu juro que arrebento sua cara.
Junior engoliu em seco, mas assentiu.
- Obrigado, . – Murmurou. – De verdade.
Então ouvimos o ranger de madeira e a porta se abriu. Summer apareceu com os olhos vermelhos e inchados.
- ? – Ela me encarou. – Junior te chamou aqui?
Olhei para ele, que ficou calado, então assenti para a garota.
- É. Ele me contou o que aconteceu. – Menti. – Sinto muito, Sum.
Ela limpou o rosto e se aproximou, me puxando para um abraço.
- Obrigada. – Fungou. – Por que não entra também?
Junior deu de ombros, e fui obrigado a ficar ali por mais algum tempo.
- Eu sinto muito mesmo, cara. Não pensei que isso fosse terminar assim. – suspirou, a cabeça encostada na janela do carro.
Depois de ficar preso pelo menos meia hora na casa dos Olsen, eu havia voltado para casa e descoberto que minha mãe, graças a Deus, ainda não havia voltado de sua tarde na casa de uma amiga. Os pais de , pelo contrário, o estavam procurando porque queriam jantar na casa dos avós dele. Eu já estava com pena o suficiente em imaginar a reação do senhor e da senhora quando o vissem – sem contar os avós do garoto –, então me ofereci para leva-lo de carro até sua rua para que ele não tivesse que fazer o percurso de ônibus com aquele rosto inchado.
- Eu é que deveria ter imaginado. – Dei de ombros. – estava certo, no fim das contas.
- Não, , ele não estava não! – O garoto exclamou. Sua cara estava muito engraçada daquele jeito. – Eles não são melhores do que nós, nem estão em outra categoria de pessoas. Isso é ridículo. Summer teria escutado você. A escolha foi sua, e, para a sorte deles, você é um cara decente.
Dei um sorriso de “tanto faz” e segui dirigindo.
- De qualquer modo, é melhor que você não esteja metido nesse drama. – Ele continuou. – Temos muito o que aproveitar no ensino médio, meu amigo. Você vai ver. Daqui a uns dois anos, nem vamos lembrar que Junior ou mesmo Summer existem.
- Acho que você está certo. – Concordei. – E também, tem outras coisas com que eu quero me ocupar agora.
- Tipo o quê? – se animou.
- Sei lá. – Ri um pouco. – Tem várias coisas que eu queria fazer antes e não dava. Tipo...
Meus olhos então passaram por um letreiro iluminado do lado de fora.
Rocklin Guitar – Let the bass choose YOU!
Parei o carro quase sem perceber, observando o lugar.
- Ei, esse não é aquele lugar em que fazem contrabaixos? – perguntou curioso.
- É, é aqui sim. – Tirei o cinto e saí do carro. Ele também.
- Meu pai prendeu uns ladrões de instrumentos aqui uma vez. – Contou.
- Meu pai sempre prometeu que me daria um contrabaixo daqui... – Comentei distraído. – Antes de se separar da minha mãe e ir para Atlanta.
- Bom, acho que é uma excelente hora para cobrar. – bateu no meu ombro. – Vamos entrar pra dar uma olhada.
- É, vamos sim. – Andei em direção à entrada do lugar.
- Sabe, se você tivesse uma banda, íamos sair com várias garotas...
Rolei os olhos e ri. Eu ainda não tinha aprendido a tocar de fato, mas tudo que eu queria agora era escolher meu contrabaixo. Ou, como dizia o slogan do lugar, deixar que ele me escolhesse.
FLASHBACK OFF
Dias atuais; casa da
Fiquei dando banho em Stevie, enquanto observava ensaiando de muito mau humor os passos da torcida com Jodi. Honestamente, eu estava com pena da baixinha.
Eu não queria que ficasse brava comigo, mas aquilo era um assunto pessoal meu. Em parte, eu sentia que os problemas de Summer com Junior também eram um pouco minha culpa, por ter escondido a verdade naquela noite, e por isso não achava justo me afastar dela sem explicação agora.
Talvez se eu tivesse falado tudo dois anos atrás, as coisas fossem diferentes agora. Mas era tarde. Eu nunca tinha dito.
Embora meu melhor amigo , depois de ver Summer tentar desesperadamente voltar com Junior depois da forma como ele agira, acreditasse que, honestamente, a verdade não teria feito diferença alguma.
18- We’ll eat cake by the ocean
“Let's lose our minds and go fucking crazy…”
[…]
- Onde, onde, onde? – Eu falava sozinha, procurando freneticamente pela minha calça jeans clara. Impaciente, fui até a porta em busca de ajuda. – PAI, ONDE ESTÁ MINHA CALÇA JEANS CLARA?
Mas não houve resposta. Me lembrei então de que meu pai tinha ido para o Roger’s mais cedo naquela noite. Também me dei conta de que tinha confundido papai com minha mãe, visto que ela sim era quem costumava saber onde estavam as coisas. Jack esquecia até de onde tinha guardado a caixa de cereal.
Me senti cansada de repente. Às vezes sentia saudade da minha mãe neurótica e organizada, com quem eu dividia as responsabilidades quase igualmente. Com o meu pai, eu tinha que ser responsável em dobro. De vez em quando eu me perguntava como ele sobrevivera tanto tempo sozinho ali antes de eu chegar. Mas a resposta era bem óbvia e tinha dois nomes. .
obviamente não apenas cuidava de Stevie antes. Era fácil perceber isso quando eu o pegava arrumando a cozinha quase sem se dar conta ou colocando as almofadas esquisitas de papai no sofá.
Em meus primeiros dias ali, eu até tinha ficado um pouco enciumada, porque conhecia a rotina da casa muito melhor que eu, a filha do Jack, e já tinha sua cópia da chave antes de mim, que tive que esperar uma semana. Depois fui aprendendo a gostar da companhia dele e a admirar a forma como tinha cuidado do meu pai maluco por todo aquele tempo. Esperava que o pai de soubesse do que tinha aberto mão.
E... Merda. Lá estava eu pensando em de novo.
Eu não queria pensar em naquele momento, nem em nenhum outro tão cedo. Eu não estava nada satisfeita com ele depois daquela ideia louca de ser professor da Olsen.
- Você só está com ciúmes. – Sofia disse como se fosse óbvio, sem nem se dar ao trabalho de parar de lixar as unhas enquanto falava.
- E você só está sendo ridícula. – Terminei de vestir a calça com esforço e fuzilei a tela do notebook com um olhar. Sofia deu de ombros e fui para o guarda roupa atrás de uma blusa.
- Qual é, , não é bem óbvio? – Ela continuou. – Você gosta do e aí descobre que ele sempre foi apaixonado pela Summer. Daí você começa a, aspas e mais aspas, fingir que está a fim do , e de repente ele volta a se aproximar justamente da Summer, que coincidentemente também foi a namoradinha de infância dele. É normal que isso te deixe com um pouco de dor de cotovelo.
- Sofia, eu não estou com dor de cotovelo, tá legal?! Nem acho o tão bonito ou interessante assim, se quer saber. – Vesti minha blusa branca com renda. – Eu simplesmente acho uma falta de noção do trazer a Summer pra mais perto de nós enquanto ainda estamos vivendo essa farsa maluca.
- Então, está me dizendo que se ele quisesse sair com a Summer depois que esse teatrinho acabasse, estaria tudo bem?
- Sim. Estou. – Disse com o máximo de segurança possível.
- E se eu quisesse sair com o , você também não ia ligar?
- Você mora em Venice, isso nunca vai acontecer. – Fiz uma careta, indo arrumar meu cabelo. – Mas a resposta é: é claro que eu não ligaria. Quem sabe até pagasse um cinema pra vocês.
Sofia ficou me encarando por um instante. Até mesmo parou de mexer nas unhas.
- Tudo bem. Se você está dizendo.
- Eu juro, prima. – Garanti. – Agora vou desligar. Prometi que estaria lá quando eles chegassem ao Roger’s.
- Nos vemos depois. – Sofia sorriu e então finalizou a chamada.
Fechei o notebook e fui procurar minhas sandálias embaixo da cama, onde elas estavam mesmo. Assim que saí dali, no entanto, levei um susto com o enorme focinho de Stevie quase na minha cara.
- Ei, seu babão, não agora! – Me levantei e fui para o banheiro, lavar o rosto da fungada que ele havia me dado.
Stevie me seguiu até lá e depois escada abaixo. Enquanto enfiava as sandálias baixas nos pés, conferi se ele tinha comida e água. Estava tudo certo. Seu osso de brinquedo também estava ali no chão.
- Está tudo bem por aqui. Você vai se comportar enquanto eu estiver com a Jodi. – Eu disse. Ele fez um grunhido, indo para perto da geladeira. Entendi qual era sua intenção.
- Ah, ótimo. – Reclamei, indo até lá e abrindo a porta, para a alegria do cachorro. – Agora além de ficar andando com a Summer, aquele idiota do também coloca hábitos horríveis no meu cachorro. - É isso que você quer, não é? – Levantei a caixa de leite. Stevie latiu e pulou alegremente. Entornei um pouco de leite na sua tigela. – Isso sempre te dá dor de barriga, Stevie. Se bem que... Quem limpa o seu coco é o . – Concluí. – Certo, pode beber leite quando quiser. – Sorri, guardando a caixa de novo enquanto o cão latia.
Fui para a porta da frente satisfeita.
- A volta depois, bebezão. – Joguei um beijo para o dálmata, e então o deixei ali.
🌴💚🌴
Quando cheguei ao Roger’s, o lugar estava começando a encher. Em geral, as coisas funcionavam assim ali: durante o dia, havia um público composto por pais solteiros e filhos, às vezes famílias e alguns turistas perdidos. No fim da tarde, o lugar começava a esvaziar conforme essas pessoas procuravam descanso, e depois de um tempo vazio, o segundo público começava a chegar – aqueles que gostavam de música e festa, os jovens e os aventureiros.
Como não vi Jodi quando cheguei, fui para o balcão do bar, onde Miguel estava arrumando as coisas.
- Olá, barman bonitão. Que tal me dar seu telefone? – Brinquei.
- Atualmente, é o da sua casa. – Ele deu um meio sorriso. – O que está fazendo aqui?
- Ei, eu passava muito tempo aqui antes de você chegar! – Protestei. – Só tenho andado meio ocupada.
- Tudo bem, eu acredito! – Ele deu de ombros.
- Minha amiga tem um encontro aqui hoje. – Expliquei. – Estou aqui para ajudar.
- Brincando de casamenteira de novo?
- Eu adoro essa brincadeira, Miguel. – Sorri maliciosamente. – Se lembra da Gabriela?
- De quando você fingiu que tinha machucado o joelho perto dela pra que ela te levasse de volta para mim e eu fosse obrigado a falar com ela, você quer dizer?
- Señorita, que me ayude! Ay, ay, me duele la rodilla! – Imitei a de seis anos, que entendia quase nada de espanhol, mas que havia ensaiado aquela frase diversas vezes para forçar a aproximação de Miguel com a menina bonita do bairro. Uma completa bobagem, por sinal, visto que Gabriela, como boa parte das pessoas no Novo México, entendia Inglês muito bem.
- Você era uma péssima mentirosa. – Miguel riu.
Travei por um instante com o comentário, mas logo relaxei e sorri.
- Mas era muito fofa, por isso ninguém duvidava de mim. – Me gabei. Talvez por isso minhas mentiras continuassem funcionando.
Ouvi o mover da porta de entrada do bar e me virei para trás. Jodi tinha acabado de entrar, acompanhada de Brad Winter, seu amor-não-mais-tão-platônico-assim. A meu ver, eles sempre tinham combinado. Assim como Jodi Lyn, Brad era gentil e quase ingênuo; mas é claro, havia coisas que os distanciavam, como por exemplo, o fato de Jodi ser tão maluca quanto Emma. Quem diria que a baixinha iria conseguir conquistar aquele garoto...
- Ei! – Eu acenei, descendo da cadeira.
- ! – Jodi abriu um sorriso, exibindo o aparelho amarelo. Ela me abraçou com força.
- Como você está bonita, Jodi! – Elogiei. – Oi, Brad!
- Oi, ! Como vai? – Ele me deu um beijo no rosto.
- Melhor agora que vocês chegaram.
- Uau, esse lugar está incrível! – O rapaz comentou. – Eu costumava vir comer hambúrgueres aqui com meu pai toda sexta-feira quando era criança, mas tive que parar quando entrei no time porque o treinador achava que eu era meio gordinho... – Contou tristemente. – Mas está tudo muito diferente agora!
- Aposto que as mudanças têm o dedo do seu pai. – Jodi deu seu sorrisinho de admiração de sempre quando se falava de papai.
- É, em parte foi coisa dele sim. – Confessei. – Mas vamos logo, conheço a mesa perfeita pra vocês.
Guiei o casal até uma mesa no canto esquerdo, que tinha vista para o palco, mas que não ficava no meio da agitação. Assim, eles poderiam conversar com tranquilidade.
- Vou pegar alguma coisa para vocês beberem. Por conta do Jack. – Avisei. Os dois sorriram alegres, e eu me afastei. Com certeza papai não ia se importar com aquilo. Ele gostava bastante da Jodi.
Me aproximei do balcão onde Miguel estava de novo.
- Preciso de duas bebidas para o casal.
- Dois refrigerantes, você quer dizer. – Corrigiu.
- Você deve saber fazer alguma coisa maneira sem álcool. – Ergui as sobrancelhas.
Miguel balançou a cabeça, mas estava sorrindo um pouco.
- Já vão sair.
Fiz sinal para que Jodi e Brad esperassem e me sentei ali para aguardar. Estava observando Miguel misturar várias coisas em seu copo de barman, quando alguém veio falando atrás de mim.
- Cansou de me odiar e veio fazer uma visita? Ou só veio me odiar mais?
Olhei para trás. carregava o contrabaixo nas costas e usava uma camisa com a imagem do Charlie Parker estampada.
- Nem uma coisa nem outra. – O Olhei com desdém. – Tenho mais o que fazer.
- Tipo? – Ele se sentou ao meu lado.
Antes que eu respondesse, Jodi apareceu junto a nós.
- , será que uma das bebidas pode ser sem gelo? Brad tem dentes sensíveis. – Pediu. Então olhou para o lado. – Oi, ! – Cumprimentou.
- Jodi. – Ele sorriu. – Está mesmo saindo com o Brad, não está? – Se surpreendeu.
- Sim, estou! – Ela ficou vermelha. – Quer dizer, hoje é nosso primeiro encontro oficial.
- Vou me certificar de tocar algo romântico pra vocês – O garoto prometeu.
- Puxa, obrigada! – Jodi corou ainda mais.
- A bebida vai ser sem gelo, Jodi. – Cortei o assunto, querendo que sumisse dali logo. – Não se preocupe.
- Certo, obrigada. Vou voltar pra perto do Brad.
Jodi se afastou, voltando a sua mesa, e eu encarei .
- Esse era seu compromisso? Segurar vela para a Slaterton e o Winter? – Ele riu.
- Por que não cala a boca? – Franzi o cenho.
- As bebidas. – Miguel empurrou dois copos coloridos na minha direção, me observando cuidadosamente.
- Rainbow... – começou.
- Obrigada. – Eu disse alto, cortando-o, desci do banco e peguei os dois copos. – É melhor não me provocar hoje, . – Sussurrei para .
Levei os copos até a mesa e os coloquei em frente à Jodi e Brad.
- Nossa, parece delicioso! – Brad comentou.
- Espero que gostem. Se precisarem de qualquer outra coisa, podem me chamar. Eles vão atender ao pedido mais rápido se eu os fizer. Eu estarei lá no...
Fui interrompida pelo som do chiado de microfonia. Desviei meus olhos para o palco – assim como os dois. estava lá em cima. O contrabaixo havia sido substituído por um ukulele, o que foi muito surpreendente para mim, visto que eu nem sabia que ele tinha um, muito menos que sabia tocar. Fiquei paralisada por um instante e ele sorriu para mim. Eu tinha aquela paixão de infância por música havaiana e sabia disso.
- Boa noite, Roger’s. – Ele disse no microfone, começando a tocar. – Eu sou , contrabaixista da banda do Jack Pie. – Anunciou. Não havia quase ninguém no local, mas as pessoas que estavam lá tornaram sua atenção para ele.
- O é muito legal, não é? – Jodi suspirou. – Ele tem mesmo jeito de artista!
- Talvez ele pudesse se inscrever no American Idol! – Brad disse como se tivesse tido uma grande ideia. Jodi abriu a boca, encantada com aquela perspectiva.
Eu, no entanto, já estava irritada com de novo. Ele nunca cantava no Roger’s, e justo na noite em que eu estava tentando esquecer sua existência ele subia no palco com um maldito ukulele?
- Desde que a competição vá acontecer bem longe daqui, podem inscrevê-lo. – Murmurei, mas Jodi e Brad não pareceram escutar.
continuou falando:
- Eu gostaria de dedicar essa canção a um casal de amigos meus que está aqui essa noite, Jodi Slaterton e Brad Winter... – Disse, deixando os dois extasiados. – E também a minha namorada, Pie. – Deu um sorriso torto, e eu fiz uma careta.
Algumas pessoas bateram palmas e o som do ukulele ficou mais alto. Talvez eu já tivesse ouvido aquela música em algum lugar, mas não me lembrava realmente. A voz bonita de se espalhou pelo ambiente num instante, me obrigando a olhar para ele.
[N/A.: Caso vocês queiram ouvir, a música – com certeza vão querer – é essa aqui. E ela é ma-ra-vi-lho-sa].
If I were you, I would fall for me
Keep every promise, answer my calls
And I… I would never let you down, oh
If I were you, I would turn that car around
Come speeding back tonight
And I, I would wonder how
I got so lucky that I'm right here with you
If I were you… I'd know exactly what to do
Ele riu, entrando no refrão:
I would take you by the hand
And I would keep holding tight
And if you wanna go to sleep, I got a lullaby
I know exactly what to say
And I would do what you need
If I were you… I would fall for me
Yeah, I would fall for me
Maldito . Sempre me pegando desprevenida com aquela voz. E a música era tão boa...
- Oh, não é romântico, ele dedicar essa música a você, ? – Jodi estava encantada.
Engoli em seco, prestando atenção a ela e Brad.
- Ele dedicou a vocês também. – Balancei a cabeça.
- Ah, mas você é a namorada dele! – Brad deu um gole em sua bebida. – Além disso, ele olha pra você o tempo todo.
Eles estavam errados, é óbvio. Era só uma música, nada mais. Não havia nada de romântico na atitude de .
Ou será que havia?
Voltei a olhar para ele, e estava tão absorta pela música que quase não ouvi meu celular tocar.
- , é o seu celular tocando? – Brad perguntou, e então ouvi o som baixinho.
- Ah, claro. Obrigada, Brad. – Sorri e me afastei para atender.
Quando já estava em um ponto isolado, perto do banheiro, olhei o visor. Era Summer. Eu atendi.
- Hey, Sum.
- Oi, . Tudo bem?
- Hanram. E você?
- Estou muito bem pra falar a verdade. – Riu um pouco. – Você por acaso está ocupada agora?
- Não realmente... Eu vim ao Roger's garantir que corresse tudo bem no encontro da Jodi e do Brad.
- Ah, é verdade! Deixa pra lá então, não quero estragar isso. Estou tão feliz por ela!
- Não, sério, pode falar. – Insisti, desconfiada daquela alegria toda. – O que você queria?
- Eu só ia perguntar se você não queria vir aqui em casa pra ver um filme. É que tem umas coisas que eu queria te contar, mas acho que posso esperar até...
- Não, nada de esperar! – Impedi autoritária. Summer se assustou.
- Tudo. Bem. – Disse pausadamente.
- É que... está aqui hoje, ele pode cuidar das coisas enquanto eu vou até aí.
- Se não tiver problema por ele, por mim está ótimo. Quer que eu te busque?
A simples ideia de assistir mais uma sessão de amigos-pra-sempre-de-novo de e Summer em pleno Roger's já me dava nos nervos o suficiente.
- Não, não precisa. – Dispensei. – Vou com o carro do meu pai. Chego em alguns minutos.
- Estou te esperando. – E então ela desligou.
🌴💚🌴
Minha última ida à casa dos Olsen havia sido na noite do término de Summer e Junior, dias atrás. Não era eu quem estava dirigindo naquele dia, porém, me lembrava do caminho perfeitamente.
tinha tentado reclamar de ter que ficar cuidando do encontro de Jodi e Brad, mas fugi antes que ele o fizesse. Expliquei rapidamente a Jodi a situação, mas sussurrei em seu ouvido que estaria ali, se precisassem. Como tudo parecia estar correndo bem de qualquer modo, eu não achava que seria necessário, mas sabia que ela se sentiria mais segura assim.
Parei o carro em frente à casa branca e me aproximei da porta. Ela se abriu antes mesmo que eu tocasse a campainha.
- Summer? – Me surpreendi.
- Estava contando os minutos pra fofocar com você, Pie. – Ela abriu um enorme sorriso, me arrastando para dentro.
A casa por dentro era quase mais bonita do que por fora. Fez com que eu me perguntasse que espécie de salto na carreira os pais de Summer tinham dado para se mudarem para aquele lugar. Com certeza a vida deles devia ser mais simples quando viviam na rua de , visto que não havia nada luxuoso lá.
- Aceita um brownie? – Ela perguntou, andando rapidamente enquanto eu a seguia pela casa. – Ainda não coloquei a pipoca no micro-ondas.
- Não, obrigada. – Sorri educadamente. – Mas gostaria de um copo d'água.
- É pra já.
Fomos para a cozinha e esperei, tamborilando os dedos no balcão amarelo, enquanto Summer enchia um copo com água gelada. Bem na hora em que ela o estendeu para mim, uma mulher loura, magra e com o cabelo preso por alguns rolinhos entrou no recinto. Ela pareceu não notar nossa presença, indo até um armário. Summer olhou para mim e sorriu.
- Mamãe? – Chamou.
A mulher quase deu um pulo, assustada, e virou-se para nós.
- Summer, quase me matou. – Disse numa voz leve e segura. – Não sabia que tínhamos visita.
- Mãe, esta é a . Te falei dela, lembra? – Olsen falou. – A namorada do .
- Ah, claro... A namoradinha do . – A mãe de Summer me olhou com cuidado. Senti algo apertar em meu peito, como se ela estivesse olhando o fundo da minha alma de mentirosa. Ela estendeu a mão para mim. – Sou Susan. É um prazer, .
- O prazer é meu, senhora Olsen. – Forcei um sorriso.
- É engraçado... Nunca pensei que fosse voltar para assombrar Summer a essa altura da vida, mas de repente ela ficou sua amiga e veja só.
- Mamãe! – Summer a encarou feio. De repente, comecei a achar que Susan não gostava muito da amizade da filha com .
- Desculpe, querida. – Susan se recompôs. – Só quis dizer que eles se afastaram por tanto tempo... É mesmo uma surpresa que tenham voltado a serem amigos agora. Graças a você, . – Sorriu cordialmente. – Bem, estarei no jardim, se precisarem. Foi um prazer, meu bem.
A mãe de Summer saiu da cozinha e a garota rolou os olhos, irritada.
- Desculpe por isso. – Sum saiu andando. Eu a segui.
- Não, tudo bem. – Garanti.
- Ela gosta do , só não sabe demonstrar bem. – Explicou. – É só que ela meio que associou o fato de eu e Junior termos terminado a volta da minha amizade com ele. Ela adora o Junior, ficou devastada quando contei que tínhamos terminado.
Então Susan estava irritada com só por desconfiar de que indiretamente ele tinha provocado o fim do relacionamento de sua filha e Junior ? Mal podia esperar pelo que ela faria quando descobrisse a verdade sobre mim.
- Esse é o meu quarto. – Summer abriu uma porta branca.
Entrei meio sem jeito, e meus olhos se arregalaram.
- Nossa, é maravilhoso! – Exclamei encantada.
Havia uma grande cama forrada de branco, com algumas almofadas com estampas de bandeiras de países e outras prateadas. Placas de metal personalizadas com os nomes de diferentes cidades estavam na parede onde a cabeceira da cama estava encostada, e na parede do outro lado havia várias fotos. Havia uma estante de livros e CDs, havia flores e havia velas de incenso coloridas.
- É o meu cantinho. – Summer sorriu, entrando e fechando a porta. Ela foi até a parede oposta à cama e abriu um armário fino, que deu origem a uma TV ainda mais fina, colada à parede. – Eu quase nunca ligo isso. Foi ideia da mamãe colocá-la aqui. – Contou. – Vamos ver o filme por aqui mesmo.
- Uau. – Eu continuava impressionada. Depois fiquei com medo de estar parecendo uma caipira esquisita. – Quer dizer... Tá, tudo bem.
- Mas antes... – Ela largou o controle remoto de lado. – Tenho que te contar o que aconteceu. – Se jogou na cama. Eu me sentei também. Era inconcebivelmente fofa.
- Eu estava muito ansiosa pra saber. – Sorri curiosa. – Você parecia tão feliz ao telefone!
- E eu estou mesmo! – Ela sorriu de volta. – Acontece que... Estive na casa do Junior ontem.
Tive que trincar meus dentes para não grunhir, o que mais deixou parecendo que eu estava dando um sorriso assustadoramente alegre.
- É mesmo? – Perguntei. – Estou sem palavras. E aí?
- Ah, na real, não houve nada demais. – Summer deu de ombros. – Era aniversário da Lily, a irmãzinha dele, e a mãe deles ligou para me convidar. Acontece que não foi só minha mãe que ficou devastada com nosso término, sabe? Desde que eu e Junior começamos a namorar, nossas famílias se aproximaram muito. A Lily e a Gwen, minha irmã mais nova, até estudam juntas.
- Oh. – Assenti. – Entendi.
- Não rolou nada entre eu e o Junior, mas foi tão bom me sentir parte da família de novo, entende? Foi como se nunca tivéssemos terminado.
- É mesmo uma pena que a realidade puxe a gente pra baixo, no fim das contas. – Tentei soar um pouco desanimadora.
- Na verdade, ela não me puxou tanto assim dessa vez. – A garota deu um sorriso maroto.
- Como assim? – Fiquei confusa e nervosa de repente. – Pensei que não tinha acontecido nada.
- Ontem não, mas... Junior se aproximou de mim durante a festa. – Revelou. – E ele me convidou para ir à Praia das Ostras. Ele, Brad e tinham marcado de ir, e aí ele me chamou para ir também. – Ela agarrou as minhas mãos, ansiosa. – , a Praia das Ostras é onde ele me convidou para irmos ao nosso primeiro baile juntos. É um lugar tão importante para nós... Costumávamos ir até lá o tempo todo. Quer dizer, deve significar alguma coisa pra ele também, não é?
Engoli em seco, me forçando a voltar a sorrir:
- Deve. – Concordei. – Com certeza deve significar, Summer.
- Então... Sei que nosso plano tem estado meio congelado desde que praticamente te forcei a entrar para a torcida, mas acredito que esteja na hora de voltarmos a trabalhar nele.
- O que você tem em mente?
- Primeiro, eu imaginei que pudesse saber se Junior tem algum plano para o sábado, na praia, mas já percebi que você não sabe de nada. Não tem problema, ele deve ter decidido me chamar em cima da hora. Antes tarde do que nunca, já diria meu avô. – Deu de ombros. – Minha segunda ideia, era te convidar para ir também. Nunca se sabe quando se vai precisar de um empurrãozinho. Isso vale tanto para mim quanto para o Junior.
- Eu ia adorar dar um empurrãozinho. – Meneei a cabeça. Um empurrãozinho na reconciliação de vocês, e jogá-la direto no fundo do oceano.
- Ah, que maravilha! – Summer comemorou. – É bem possível que o Brad chame a Jodi também, quando souber que estamos indo, e talvez o queira convidar a Emma. – Ela ponderou. – Já sei. Você devia chamar o .
- Tenho certeza de que ele vai gostar da ideia. – Menti.
A porta se abriu e uma garotinha de cabelo louro na altura do queixo e pijama cor-de-rosa apareceu. Ela parecia Kelly, a irmã mais nova da Barbie.
- Summer? – Ela chamou, me olhando meio desconfiada.
- Gwen. – A loira sorriu. – Esta é , minha amiga.
- Oi, . – A garotinha cumprimentou.
- Oi, Gwen. Como vai? – Sorri.
- Aconteceu alguma coisa? – Summer quis saber.
- Eu tenho que ir pra cama cedo hoje por causa do concurso de soletração de amanhã, mas não consigo dormir.
- Oh, meu amorzinho, você só deve estar nervosa. – A mais velha a consolou. – Mas não se preocupe, vou ler uma estória pra você e logo o Homem do Sono vai vir fazer com que caia no sono.
- Vou escolher o livro. – A pequena sorriu, saindo do quarto.
Summer sorriu e balançou a cabeça, virando-se para mim.
- Isso só vai levar uns quinze minutos, ela é bem fraquinha. – Explicou. – Se importa de esperar?
- Não, sem problemas. – Sorri, me lembrando de quando mamãe me contava estórias para dormir. – Pode ir tranquila. Vou aproveitar pra ligar para o e saber como está indo o encontro da Jodi.
- Não se esqueça de convidá-lo para o sábado! – A garota lembrou colocando-se de pé.
- Pode deixar.
Summer saiu do quarto e eu fiquei ali, praguejando em português. Agora também havia famílias que se amavam tentando estragar meus planos. Será que eles não percebiam que Summer e Junior já tinham estendido aquele namoro por muito mais tempo do que deveriam? Francamente, os dois pareciam se dar melhor depois de terem terminado do que antes.
- Rainbow. – disse quando atendeu. – Decidiu voltar a falar comigo?
- Não. – Conferi se tinha alguém do lado de fora da porta. – Como está o encontro da Jodi?
- Muito melhor do que se esperaria que um encontro com Jodi Slaterton pudesse ser. – Ouvi a voz de dizer ao fundo.
- Ótimo. – Sorri satisfeita. – A propósito, vamos à praia com Brad, Junior, e Summer no sábado. E é possível que Jodi e Emma também estejam lá.
- Você ficou doida? – protestou. – Eu não vou a lugar nenhum.
- Não é uma excursão ao Tártaro, . – Rolei os olhos. – É um dia na praia.
- Olha, , eu simplesmente não quero ir, ok?
- Ele não sabe nadar! – A voz de disse ao fundo.
- O quê? – Franzi o cenho.
- Cala a droga da boca, ! – reclamou.
- Isso é sério? Você não sabe nadar? – Perguntei chocada. – Você mora nessa cidade com o nome BEACH desde que nasceu e não saber nadar?
- É irônico, não é? – Ouvi dizer.
- Cale a boca vocês dois! – nos cortou.
- Quer saber? Isso não importa. – Insisti. – Você não precisa nadar, . É só ficar na areia.
- Isso mesmo! – disse alto. – Eu também vou, se não se importarem. Se importarem também, na verdade.
- Era só o que me faltava. – bufou.
Ouvi passos no corredor e me apressei:
- Tenho que ir. Conversamos mais amanhã.
Bem quando encerrei a ligação, Summer entrou no quarto.
- Não é que ela caiu no sono ainda mais rápido do que de costume? – Ela comentou sorrindo. – E então, falou com o ?
- Sim, eu falei. – Assenti. – Ele adorou a ideia.
🌴💚🌴
Coloquei meu chapéu boho e passei um pouco mais de protetor solar no nariz, já que ele adorava descascar depois de longas exposições ao sol.
- Prontinha. – Sorri para o espelho. Stevie latiu. – Desculpe, bebezão, você não pode ir dessa vez.
O cachorro grunhiu e saiu do quarto a toda. Peguei minha bolsa sobre a cama e segui o mesmo caminho, descendo alegremente as escadas. Quando cheguei lá embaixo, estava sentado no sofá, usando uma regata e assistindo os desenhos matinais do sábado. Sua cara não estava muito melhor que a de Stevie.
- Ah, vamos lá. Não fique com essa cara. – Tentei animá-lo. – Vai ser divertido.
- Claro que vai. – Ele deu um sorriso irônico. – Eu, Junior e as piscinas naturais da Praia das Ostras.
- Você não precisa ir para as piscinas fundas e nem precisa ficar de namorico com o , . Não precisa nem falar com ele. – Ressaltei. – Você vai ver, isso não vai ser nada assustad... AHHHH! – Me virei bem enquanto falava, e meu grito interrompeu o resto da frase. – ! Mas que porcaria é essa?!
estava com as maçãs do rosto brancas de tanto protetor solar, usando um chapéu de pescador azul.
- Minha pele é muito sensível ao sol. – Ele respondeu apenas, erguendo uma garrafinha de suco e dando um gole. – O que ainda estamos fazendo aqui? Vamos logo.
Seguimos para o lado de fora – ainda emburrado – a caminho do carro de .
- Por acaso a Amber também vai hoje, ? – Eu quis saber.
- Não, por isso estou aqui. – Ele sorriu, jogando-se dentro do carro.
- Levou a vida toda pra conseguir chamar a atenção de uma garota e agora está fugindo dela? – franziu o cenho, ligando o carro.
- Aprendi que temos que tomar muito cuidado com nossos desejos, . – disse em uma voz séria. – Uma garota como Amber pode deixar um homem maluco de várias formas. Nem todas são positivas.
- Eu bem que avisei. – Dei de ombros. – , sabe chegar lá?
- Sei, sim.
- Bom, porque os outros já estão nos esperando. – Dei um sorrisinho sem dúvida irritante, e o garoto rolou os olhos, arrancando com o carro.
🌴💚🌴
- Uau! – Eu disse pela quinta vez. Era tudo que eu conseguia dizer desde que chegamos ali.
- Como se você nunca tivesse visto o mar. – provocou.
- É que é tão bonito... – Suspirei. – Por que mesmo nunca viemos aqui? – Questionei. me lançou um olhar mortal. – Ah, claro. Desculpe.
A Praia das Ostras era grande, e àquela hora já tinha uma quantidade razoável de pessoas – o que nunca acontecia em Jacksonville Beach. O mar era de um azul esverdeado forte e as ondas quebravam suavemente. As piscinas naturais de que me falaram não estavam à vista. Elas ficavam do outro lado das pedras que ladeavam a praia – duas de um lado e a terceira, a maior, do outro.
- Pronto, podemos ir. – se aproximou de nós com um sorvete na mão.
- Não dá pra acreditar que acabou de botar os pés aqui e já está comendo. – ergueu as sobrancelhas.
- Praias me dão fome. Você sabe. – O outro disse com displicência.
- , onde eles estão?
- Vou ligar para a Jodi e descobrir. – Procurei o telefone na bolsa.
- Acho que não vai precisar. – Meu namorado de mentira apontou.
Levantei os olhos e sorri ao avistar Emma acenando. Ela correu em nossa direção. Estava usando um biquíni verde e um short jeans.
- Ei, pessoal! – Ela cumprimentou. – Que porcaria é essa na sua cabeça, ?
fez uma careta, mas não respondeu.
- Não tinha certeza se você vinha. – Eu disse.
- me convidou. – Ela explicou. Dei um sorriso sugestivo. – Não, Pie! Cala essa boca! Eu só estava a fim de sair.
- Com o ? – Dei risada.
- Sério, se me provocar, eu te afogo. – A garota ameaçou. – Agora vamos, os outros já estão lá.
Seguimos Emma pela praia. Minha piadinha me lembrou, de repente, da presença de ali naquele dia. Quase tinha me esquecido de minha ridícula fuga ao colocar seu nome na minha mentira. Preocupada, me aproximei de .
- . – Eu disse em voz baixa. – Como andam as coisas com Miguel? Ele disse alguma coisa perto do ?
O garoto balançou a cabeça, conferindo se o amigo olhava para nós. Não olhava.
- Não. Ele não falou muita coisa sobre nada na quinta, na verdade. Estava quase mais esquisito que de costume.
- Excelente. Melhor assim. – Assenti.
- Mas o ficou meio desconfiado quando me viu puxando assunto com ele. – Informou. – Ficou me olhando com aquele cenho franzido, você sabe.
- Sei bem! – Sorri presunçosa. – A cara-de-quem-não-está-enxergando-à-distância. Ele sempre faz isso quando não está entendendo alguma coisa. É quase tão perigosa quanto a cara-de-quem-está-prestes-a-explodir.
- Essa é quando ele infla as bochechas? – ficou na dúvida.
- Não. Quando ele infla as bochechas geralmente é a cara-de-socorro-o-que-eu-vou-fazer? Quando está prestes a explodir ele fecha a cara, olha pro nada. A tensão no ar fica tão grande que parece que ele vai te matar.
- Cara, isso é muito verdade!
- Nosso garoto é fácil de ler. – Ri um pouquinho, observando de costas.
- E quanto àquela cara ali? – indicou com a cabeça. – Já aprendeu a identificar?
tinha parado de andar. Adiantei um pouco o passo para ficar ao seu lado. O rapaz estava sorrindo tão inocentemente que parecia uma criança. Segui seus olhos e encontrei Summer, acenando de longe.
Engoli em seco, me forçando a não sentir aquele incomodo infundado. Agarrei a mão de , que me olhou surpreso, sorri para ele e acenei para ela também.
🌴💚🌴
- Nós acordamos mais cedo porque queríamos ter certeza de encontrar um lugar legal. – A loira contava enquanto nos levava para perto dos outros.
- E conseguiram? – perguntou.
- Vocês é que vão dizer. – Ela deu um sorriso instigador, apontando para Jodi, Brad e sentados preguiçosamente debaixo de um guarda-sol chique estampado. , que estava de fora do time pelos próximos dias, ainda tinha o tornozelo enfaixado.
Nos aproximamos dos três, que sorriram alegremente.
- Pessoal! – Jodi cumprimentou. – Finalmente chegaram!
- Olhe só, . – Summer me puxou pela mão alguns passos. – Ficamos aqui porque logo ali é a piscina média. – Ela apontou para uma pequena elevação rochosa a alguns metros. – E também a pequena, mas é mais para crianças mesmo.
- Talvez queira ficar nessa. – lambeu seu sorvete. o olhou feio.
Sorri e rolei os olhos, tentando desviar o assunto para algo que me interessava mais.
- E então, Sum, onde está o Junior?
- Ele tinha ido dar um mergulho. – Ela ponderou. – Ah, lá está ele!
vinha do mar, passando a mão pelo cabelo para se livrar do excesso de água. Tive que me controlar bastante para não dar um longo suspiro. A visão de sem camisa ainda era tão divina quanto eu me lembrava. Não encarar era basicamente impossível.
- Sua bff acabou de chegar. – Emma ergueu as sobrancelhas para Junior, dando um passo enojado para o lado quando percebeu sorrindo para ela.
- Vicentini. – Junior me deu um sorriso torto. – Faz tempo que não nos encontramos nessas condições.
- É, engraçado, né? – Improvisei um sorriso amistoso, me obrigando a olhar em seus olhos. – Jacksonville Beach está cheia de praias.
- De fato. – concordou. – Mas você nunca quis sair com a gente.
Era ridículo pensar que eu realmente poderia sair com eles sem que um plano maléfico estivesse envolvido. Ainda assim, decidi apenas concordar.
- Falta de tempo. – Menti. – Bom, vamos nos acomodar?
Todos começaram a falar ao mesmo tempo, enquanto eu estendia minha canga a poucos centímetros das outras. armou o guarda-sol de forma que só parte da sombra cobrisse meu espaço, e então se sentou.
- Ah, eu estou morrendo de sede. – Summer comentou. – Vou até ali comprar uma água. Alguém quer?
- Quero é alguma coisa pra comer. – disse. – Me ajuda aqui, .
ajudou o amigo a se colocar de pé e os três seguiram, junto de Brad, até o quiosque perto de onde estávamos. Emma e Jodi foram dar um mergulho na piscina, de modo que eu, e ficamos sozinhos.
- Cara, conseguem pensar em algo mais incrível do que Summer Olsen de biquíni? – admirava a garota se afastar. – É como se Afrodite tivesse encarnado em Jacksonville Beach.
- Obrigada pela parte que me toca. – Resmunguei, puxando o vestido pela cabeça e revelando meu biquíni colorido. – Além disso, eu consigo imaginar sim, porque não sou um cara. – Dei um sorriso malcriado.
- Ah, , não se preocupe, você também é muito gata. – levantou um polegar e balançou a cabeça em aprovação. – Não é verdade, ?
não respondeu e olhamos para ele, que me encarava com a boca levemente aberta, pensando em sei lá o quê.
- Dá pra ver que ele concorda, não é? – me lançou um olhar sugestivo, me deixando sem jeito, e então acordou do transe, balançando a cabeça.
- O quê? – Ele perguntou. Depois olhou para mim de novo e inflou as bochechas. – Eu... Preciso comprar um sorvete. – Se colocou de pé num segundo. – E dar um mergulho. No mar. Não nas piscinas.
- Sorvete? O pessoal está logo... – apontou, mas negou com a cabeça, ficando de pé.
- Mais longe. – Ele disse enfaticamente. O olhamos com ar de interrogação. – Eu quero o sorvete do começo da praia. – Insistiu. – , você vai querer que eu traga um?
- Eu? – Não estava entendendo nada do comportamento maluco e urgente de , mas eu é que não ia me meter. – Não, estou bem. Vou ficar com as men...
- Tudo bem então! – Concordou antes que eu terminasse.
Em menos de um segundo, estava andando a toda velocidade rumo ao começo da praia, de onde tínhamos acabado de sair. Eu estava mais confusa do que quando papai guardara o leite no armário e o achocolatado na geladeira.
- Melhor não me perguntar nada! – levantou as mãos quando olhei para ele.
- E não ia mesmo! – Garanti. – Estou indo pra piscina.
Às vezes, me deixava realmente, realmente intrigada. Mas aquele não era o momento para essa isso. Eu não estava ali por causa dele. Enquanto eu subia o solo rochoso rumo à piscina média, acenou para mim do bar onde estavam, erguendo uma sobrancelha. Dei de ombros, sorrindo inocentemente. Esperava que a visão de Vicentini em um biquíni trouxesse milhares de dolorosas lembranças a ele.
POV
Andei o mais rápido possível para longe dela. Quase corri. Precisava me afastar para voltar a pensar de forma coerente.
Quando finalmente eles tinham sumido de vista, parei.
- Mas qual é a droga do seu problema, ?! – Perguntei a mim mesmo em voz alta. Uma garotinha que passava por perto me olhou como se eu fosse um maluco, e então saiu correndo. – Agora também assusto criancinhas. – Balancei a cabeça, envergonhado.
- ! – A voz conhecida chamou. – , espera aí!
Olhei para trás e encontrei , vindo em minha direção com aquele chapéu ridículo.
- Não pode ter vindo atrás de outro sorvete. – Eu disse incrédulo.
- É óbvio que não! – O garoto se defendeu, ofendido. – Vim pra saber o que há com você. Que loucura foi aquela?
- É só que... – Suspirei, olhando as ondas quebrarem. – A cada dia que passa, fica mais difícil ficar perto da .
- Bem desconfiei que fosse algo do tipo. – Ele deu de ombros com uma cara de comiseração.
- Antes, quando a coisa era só platônica, era diferente. Mas desde que a gente começou a ficar se beijando por aí, tem esse turbilhão na minha cabeça. – Fechei os olhos. – Na maior parte do tempo, estamos fazendo alguma outra coisa, então eu fico legal. Geralmente, quase esqueço toda essa maluquice, e aí ficamos como amigos normais, fazendo coisa de gente normal. Mas às vezes, quando não estamos necessariamente ocupados com nada, eu começo a pensar demais, e quando dou por mim estou quase beijando ela. – Joguei a cabeça para trás e bufei.
- E talvez você devesse mesmo fazer isso, . – colocou as mãos na cintura. A ideia era soar incentivador, mas com aquele protetor solar e aquele chapéu azul, só parecia ridículo.
- Ela ia ficar maluca... – Soltei o ar numa baforada. – Se achasse que eu estou levando isso a sério.
- Ela já é maluca, . – Ele sorriu de um jeito um tanto quanto crítico, apertando de leve meu ombro. – E você também vai ficar, se ficar se matando pra esconder o que sente.
- É, mas...
- Cara, sem forçar a barra! – Tentou me acalmar. – Por que você não só... Vai chegando nela aos poucos e tal? Tenta descobrir se ela não está meio a fim de você também.
- Acha que ela pode estar? – Perguntei com uma ponta de expectativa.
- Ela ficou com ciúmes da Rosana Wayans, não foi? Foi o que pareceu pra mim.
- É, ela meio que ficou sim.
- Então aí está sua chance! – Exclamou. – Vamos descobrir de quem Pie realmente gosta. Do artilheiro ou do músico.
Apesar da perspectiva de que a resposta fosse a segunda opção, eu ainda tinha um pouco de receio de descobrir.
POV PIE
Mergulhei e atravessei a piscina, emergindo perto de Emma e Jodi.
- Ah, esse lugar é maravilhoso! – Dei risada, feliz.
- Quase tanto quanto o namoradinho da Jodi sem camisa. – Emma ergueu as sobrancelhas. – Por Deus, você viu aquilo?
- Emma! – Jodi repreendeu, sem jeito.
- Pra falar a verdade, eu sempre achei o Brad um gato. – Confessei. Jodi ponderou por um instante, mas sorriu.
- Ele é bonito mesmo, não é verdade? – Ergueu os ombros.
- Sério, Jodi, diga que vocês já deram uns amassos. – Emma disse séria. – Diga agora ou eu mesma agarro ele.
- Bom, na verdade, já sim. – A baixinha admitiu.
- Grande Jodi Lyn! – Eu ri, cutucando-a por baixo d'água.
- Foi com num sonho. – Ela suspirou. – Mas aí minha mãe saiu de dentro de casa com uma touca na cabeça e uma vassoura. – Balançou a cabeça e fechou os olhos. Tive que me segurar para não rir, imaginando quantas piadas e poderiam fazer sobre o ocorrido.
Ouvimos um splash vindo do outro canto da piscina, e logo Summer emergiu perto de nós.
- Ei, meninas. – Ela disse. – Do que estão falando?
- Da dona Slaterton aparecendo bem quando Jodi e o Winter estavam dando uns amassos. – Emma a atualizou.
Summer ergueu as sobrancelhas e abriu a boca, surpresa.
- Certo, eu definitivamente quero saber sobre isso. – Avisou. – Mas agora, , você tem uma missão.
- Fale mais. – Ergui uma sobrancelha, sorrindo.
- Junior está comendo uma porcaria qualquer com e Brad lá embaixo, mas logo vai vir pra cá. – Disse. – É uma excelente hora pra você descobrir se ele está planejando alguma coisa pra hoje. E sobre ele ter me convidado pra vir e tal. Enfim, o que está se passando pela cabeça dele.
- Vou ter uma conversinha com ele. – Prometi.
- Talvez seja melhor deixarmos os dois sozinhos pra ele falar. – Jodi opinou.
- Ótimo, Jodi. – Sum concordou. – Vamos lá embaixo tomar um banho de sol então. Depois você me conta tudo, .
- Sim, capitã, minha capitã! – Bati continência.
As três nadaram até a borda rochosa e saíram da piscina. Imaginando o que faria quando Junior chegasse, flutuei por alguns minutos de costas, com os olhos fechados.
- Vejam só o que encontrei. – A voz conhecida disse.
Abri os olhos e encontrei os olhos de me encarando. Seu rosto bloqueava o sol do meu, e havia um sorriso em seus lábios.
Tomei um leve impulso e fiquei de pé. A água batia logo abaixo do meu peito.
- Oi, . – Cumprimentei.
- Fico feliz de te encontrar aqui. – Ele disse. – Estava ansioso por te dizer que adorei esse biquíni.
- É mesmo?
Nadei para longe dele, para o muro de pedra onde as ondas batiam e acabavam por encher a piscina. me seguiu.
- Sinto falta de quando íamos à praia juntos. – Admitiu. – Eu, você, , Sofia.
- Pode ter certeza de que Sofia não sente sua falta nem um pouco. – Dei uma risada baixa.
- O que disse?
- Nada. – Balancei a cabeça, me virando então para ele. – Convidou Summer para vir hoje, não é? Boa jogada.
- Sabe muito bem que a Summer é parte da minha vida, e ainda não decidi qual parte. Além disso, o que você queria? – O rapaz estava calmo até então, mas pareceu ficar na dúvida. – Você só anda com o . Eu não ia te chamar pra passar o dia tendo que ver vocês dois juntos.
Me aproximei alguns centímetros. Os olhos de se desviaram para minha boca.
- Te incomoda tanto assim me ver com ele? – Sussurrei.
- É difícil explicar o quanto. – Ele respondeu no mesmo tom.
Abri um sorriso então, dando de ombros.
- Bom, é uma pena. – Dei um passo para o lado. – Porque enquanto ele for meu namorado, vai ter que aguentar.
Mergulhei e nadei rumo à borda da piscina. Quando cheguei à rocha, acenei para Junior, que me lançou um sorriso malicioso. Brad apareceu de pé na rocha, logo atrás de mim, ajudando a se equilibrar.
- Veio nadar, ? – Questionei.
- Não, só quero ficar sentadinho perto dos meus amiguinhos. – Ele disse quando Brad o ajudou a se abaixar no solo rochoso.
- Já está saindo, ? – O rapaz perguntou.
- Ah, já estou sim, Brad. – Sorri para ele, que me deu a mão para me ajudar a sair. – Preciso falar com meu namorado. Você o viu? – Perguntei em voz alta, e vi balançar a cabeça.
As meninas estavam tomando sol quando desci. Jodi e Summer, deitadas em cangas, e Emma sentada numa cadeira dobrável lilás. Não havia sinal de ou .
- Puxa, está calor mesmo, não é? – Parei de pé perto delas, deixando que o sol me ajudasse a secar. – Mas a água está ótima.
- Já está de volta? – Summer ficou surpresa. – E aí? Alguma informação?
- Ah, isso. – Ponderei. – Bem, ele disse que você ainda faz parte da vida dele.
- Jura? – O rosto da loura se iluminou. Ela apertou a mão de Emma, que sorriu.
- Sim. – Confirmei. – Mas também disse que não sabe que parte você é. – Contei. Não havia necessidade de ficar mentindo para Summer. Junior por si só já era bem desencorajador.
- Ah, tudo bem. – Ela fez uma careta, mas deu de ombros. – Já é alguma coisa.
- Com certeza é. – Forcei um sorriso. – Alguém viu o ? Ele estava aqui quando eu saí. E o tinha ido comprar sorvete.
- Não faço ideia de onde aquele esquisito do foi. – Emma estremeceu. – Viram aquilo na cabeça dele? Fala sério.
- Acho que é um garoto muito meigo, se quer saber. – Summer o defendeu.
- Ah, não são eles lá? – Jodi perguntou, levantando seus óculos de gatinho.
Me virei para o outro lado, de onde vinham os dois garotos. tinha outro sorvete nas mãos. tinha tirado a camisa, e a trazia pendurada no ombro. O cabelo estava molhado.
Ok. Eu tinha que admitir que aquela era uma bela visão.
Qual é? Eu nunca tinha visto sem camisa? Era difícil de acreditar. Ele dava banho em Stevie toda semana; às vezes eu até o ajudava. Mas pelo visto, ele sempre fazia isso vestido, e ao que parecia, ele deveria fazer sempre sem camisa.
Eu não fazia ideia de que ser babá de dálmatas e tocar contrabaixo e ukulele poderiam conceder a dádiva da definição corporal a alguém.
Estava tão impressionada com aquilo que nem percebi que eles já estavam perto demais.
- Foi mal pela demora. – disse tomando o picolé das mãos de e o entregando para mim.
Engoli em seco, tentando agir normalmente ao pensar na cara que Sofia faria se me visse naquele momento.
- Valeu. – Sorri.
Emma assobiou, dando um sorriso malicioso para .
- , . – Ela disse. – Ainda melhor do que da última vez que te vi sem camisa, tanto tempo atrás.
pareceu entender do que ela falava, por que ficou sem jeito na hora.
- Qual foi a última vez? – Eu quis saber. Jodi se sentou na canga.
- Ah, foi no primeiro ano, quando... – Começou.
- PACTO! – Emma e gritaram ao mesmo tempo.
Jodi parou de falar e rolou os olhos.
- Deixa pra lá. – Disse pra mim.
Summer riu, se sentando também.
- , Amber por acaso sabe que você veio hoje? – Perguntou.
- Achei que seria melhor se não soubesse. – Ele se sentou ao lado da loira. – Sabe como é, relacionamentos saudáveis precisam de espaço para as duas pessoas.
- Concordo plenamente. – Ela sorriu, tirando o chapéu azul da cabeça dele e colocando na própria. Virou-se para Emma então. – Não parece tão terrível agora, não é?
- Até uma melancia ficaria bem na sua cabeça, Olsen, não se faça de boba.
Os outros estavam conversando, e se virou para mim.
- Quer dar uma volta? – Chamou. Levei um segundo para processar.
- Claro. – Assenti.
🌴💚🌴
- Eu pensei que você ia tomar um sorvete. – Observei enquanto andávamos, mordendo o último pedaço do meu picolé.
arregalou os olhos, como se tivesse sido pego de surpresa. Depois sorriu. Não entendi a reação.
- Ah, eu tomei no caminho de volta. – Explicou. – Era de chocolate.
- Hum. – Meneei a cabeça. – Você parece mais calmo, sabe? Mesmo estando perto de toda essa água.
- Não estamos perto da parte da água que realmente me assusta. – Ele ergueu as sobrancelhas e eu ri, correndo para jogar o palito de picolé numa lixeira próxima e depois voltando.
, que estava em cima da pedra, estendeu a mão para me ajudar a subir.
- Desculpe por rir de você. – Pedi. – Não é por mal. Só achei irônico.
- Até eu acho. – O garoto suspirou.
Tínhamos chegado a outro lugar. Era a outra piscina, a menor. Havia várias crianças e pais brincando ali.
- Tá. Agora você está realmente desafiando meu autocontrole. – Olhei para ele prendendo o riso.
- Você não sabe cantar e eu não encho seu saco. – deu de ombros.
Eu o segui até entrarmos na piscina. A água ali batia pouco acima do meu joelho, mas parecia ser mais rasa do outro lado. se sentou.
- Eu costumava vir aqui quando era moleque. – Disse. Me sentei ao lado dele.
não vivia falando sobre sua infância, e como eu era muito propensa a falar besteiras, preferi não dizer nada. Só fiquei ali, quietinha junto dele, observando as crianças brincando. Por um instante, imaginei um de seis anos correndo por ali, com a mãe e o pai por perto. Será que ele tinha uma janelinha no lugar do dente da frente? Será que tinha medo de monstros marinhos? Porque eu tinha, quando era pequena. Talvez ele já tivesse brincado com a Summer de seis anos ali, também.
- Sinto muito por ter te chateado com essa história de ser professor da Summer. – O garoto disse então, como se estivesse lendo meus pensamentos. Eu apenas olhei para ele, surpresa. – Mas eu queria que você entendesse. O que eu sinto por ela é como o que você sente pela Sofia. Se vocês tivessem se afastado e de repente surgisse a chance de serem amigas de novo, você não tentaria?
- Acho que sim. – Ponderei, mesmo tendo certeza absoluta de que tentaria. A verdade é que eu entendia o lado de , entendia desde o começo. Mas ainda não gostava da ideia. Por causa do plano, é claro. De todo modo, era uma escolha dele, não minha.
- Não está mais brava comigo então? – Ele abriu um sorriso curioso.
- Não realmente. – Não havia necessidade de dizer que eu nunca conseguia ficar irritada com ele por muito tempo.
afundou mais na água, olhando para frente ao dizer:
- Ótimo, porque eu ainda tenho um trabalho para apresentar com a Rosana.
Certo, não era por isso que eu o tinha desculpado.
Tencionei o maxilar, mas fiz o possível para não demonstrar incomodo.
- Tudo bem. – Dei de ombros.
olhou para mim por um instante, estudando minha expressão de displicência.
- Você não gosta mesmo nem um pouco dela, não é? – Indagou.
- Eu só não entendo o que você vê nessa garota! – Deixei escapar, movendo as mãos enquanto falava, como a boa meia-brasileira que eu era. – Sério, ela tem aquela bunda, mas, fala sério...
- Meu Deus, Rainbow, o que a Rosana te fez? – estava rindo muito agora, o que só me deixou mais nervosa. – Ela só é legal comigo.
- Não, ela dá em cima de você, o que é diferente. – Corrigi.
- E qual é o problema com isso? – Ele apoiou o cotovelo no joelho e pôs a mão sob o queixo, me encarando com uma expressão divertida.
- O problema é que ela nem faz o seu tipo, ! Por Deus. – Eu queria controlar meus ânimos, mas não conseguia.
- Qual seria o meu tipo? – O rapaz me encarou, esperando.
- Uma garota que goste de música, e de animais. – Listei, me lembrando de como Wayans tinha medo de Stevie. – E que seja engraçada, pra te fazer rir quando estiver todo emburrado. – Sorri. Percebi que me encarava com uma sobrancelha erguida. – Por fim, alguém que não dê em cima de um cara que já tem namorada. – Finalizei rapidamente.
- Tirando, é claro, o fato de que eu não tenho namorada. – Ele provocou.
- Mas ela não sabe disso, não é? E também, nunca te procurou antes de eu chegar. – Ergui as sobrancelhas, e ele deu de ombros.
- É verdade, ela não sabe. – Olhou bem para mim. – Às vezes até eu me esqueço de que é mentira.
Não consegui deixar de encará-lo de volta. Por mais tempo do que deveria, talvez.
- Ei, casal! – Alguém gritou, nos dando um susto.
Olhei para trás e vi Summer, de pé no alto da rocha. Ela sorria.
- Estamos indo dar uma voltar na feira artesanal da orla. – Ela explicou. – Vocês querem vir?
- Claro! – Eu disse rapidamente, ficando de pé. Subi na pedra primeiro e ajudei a subir depois.
Preferi dizer para mim mesma que tinha ficado aliviada pela chegada da garota, mas a verdade era que parte de mim queria ter continuado ali para descobrir o que aconteceria a seguir.
🌴💚🌴
A feira se estendia ao longo da orla da praia, cheia de barraquinhas com coisas que iam de bijuterias à comida e vasos artesanais. Havia pessoas por todo lado. Summer estava olhando alguns artesanatos em argila, enquanto Jodi e Emma comentavam animadamente sobre o rapaz bonito que passara. e falavam com Brad sobre o próximo jogo, e e tinham ido ver se a piscina maior – o grande pesadelo de – estava muito cheia.
Eu caminhava tranquilamente sozinha quando algo chamou minha atenção. Era uma barraquinha com colares, pulseiras e brincos, que estava sendo cuidada por um homem talvez um pouco mais velho que papai, e que lembrava o próprio Jack.
- Bom dia, mocinha. – Ele sorriu por baixo de um chapéu muito mais descolado que o de .
- Olá. – Sorri, diminuindo o passo.
Meus olhos encontraram por acaso uma pulseira macramê amarela, que me lembrou justamente da pulseira que eu tinha roubado de , e que depois ele me dera de verdade, embora a dele fosse marrom.
- Quanto custa essa pulseira? – Perguntei.
- São três dólares. – O homem se aproximou.
- Eu vou levar. – Peguei o dinheiro na bolsa e o senhor colocou a bijuteria num saquinho, estendendo-o para mim.
- Seu namorado vai gostar muito. – Ele comentou.
- Como sabe que é para o meu namorado? – Me surpreendi.
- Pode não parecer, mas tenho muitos anos nas costas, querida. – Ele sorriu. – Conheço um jovem apaixonado quando vejo. Vi seu sorriso quando a escolheu. – Apontou para o pacotinho.
Sem saber bem o que dizer, apenas sorri.
- Obrigada. – Eu disse.
- Volte sempre.
O velho voltou a se sentar e eu balancei a cabeça, deixando para lá o comentário dele. Apressei o passo e alcancei os garotos.
- Ei. – Segurei o braço dele.
Os três se viraram para mim e sorriram, sem parar de andar. Eu os acompanhei.
- Pra você. – Estendi o pacotinho para .
- Pra mim? – Ele me olhou desconfiado, tirando a pulseira do embrulho. O rapaz sorriu, mas pareceu sem jeito. – Não precisava, Rain.
- Quando começamos nossa farsa, você disse que eu arcaria com os gastos se te obrigasse a ir a algum lugar que não fosse da sua vontade. – Falei a uma altura que Brad não ouvisse.
- Ótimo, então você também me deve um sorvete. – comentou despreocupadamente sem olhar para mim, fechando a pulseira no braço. Eu rolei os olhos e o empurrei, mas ri.
Brad parou de andar, apontando para a areia.
- e Junior estão voltando! – Disse.
Logo as meninas estavam ao nosso lado. Os dois garotos – mancando – se aproximaram de nós com uma cara de poucos amigos.
- O que houve? – Summer foi quem perguntou.
- Não nos deixaram ver a piscina. – contou. – Na verdade, nem chegar perto dela.
- Mas por quê? – Jodi quis saber.
- Pelo visto, a piscina maior foi reservada para a realização de uma gincana hoje. – explicou.
- Mas que porcaria de desculpa é essa? – Emma se enfezou. – Acordamos cedo pra vir pra cá, não podem nos impedir de entrar. – A garota saiu andando.
- Emma, aonde você vai? – Perguntei.
- Ensinar esses babacas a não estragarem meu final de semana. – Ela respondeu sem parar.
- Essa garota é mesmo de matar! – riu, encantado.
Seguimos Emma – que estava furiosa – com medo de que algo acontecesse. Quando nos aproximamos do local onde ficava a tal piscina, percebemos certa aglomeração. Várias pessoas com uma camisa laranja onde se lia "Hot Weather Radio" circulavam com objetos, e dava para ver que havia um local cercado, de modo que não podíamos enxergar lá dentro.
- Ei, você! – Emma foi logo dizendo.
Um homem careca de bigode se virou para ela, encarando-a com certo desdém.
- O que foi? – Ele perguntou.
- Por que diabos barraram a piscina? – Ela inquiriu. – Eu e meus amigos viemos de Jacksonville Beach para nadar nela!
- É uma pena. – O homem disse com displicência. – Hoje a piscina foi fechada para receber uma das provas da gincana que a HWR está realizando. – Ele apontou para a camisa.
- E que droga de gincana é essa?
Uma moça com um microfone auricular apareceu ao lado do homem.
- É uma gincana para comemorar o período de volta as aulas. Estamos algumas semanas atrasados, mas quem liga? Jovens adoram essas coisas. – Suspirou alegremente.
- Quem está participando desse troço? – quis saber.
- Qualquer um pode participar. Basta estar em uma equipe. Podem formar uma, se quiserem. Vocês são muitos. – Ela explicou.
- E qual é o prêmio dos vencedores? – Brad perguntou.
- Ah, é maravilhoso! Um almoço completo pago para a equipe inteira no Jay's Lobster. Devem conhecê-lo, é o restaurante mais famoso da cidade.
- Como nos inscrevemos nesse negócio? – perguntou, tomando a frente de todos.
- É só entrar na fila. – O careca deu um sorrisinho debochado para Emma.
Olhamos para o lado e vimos uma enorme fila de pessoas, que se inscrevia ao passar por algumas pequenas mesas onde estava o pessoal da HWR.
Emma fez uma careta, mas tratou de voltar a encarar o homem com um sorrisinho cínico.
- Te vejo quando for pagar meu almoço, careca. – Ela disse antes de sair, e ele só faltou cuspir fogo.
Depois do que Emma fez, não tivemos escolha se não entrar na bendita gincana. Não que estivéssemos reclamando. Parecia que seria divertido, e Jodi tinha me contado animadamente que todo mundo na região já tinha pelo menos ouvido falar do Jay's Lobster.
parecia obcecado pela ideia de ganhar. De repente, ele parecia um maluco com complexo de grandeza, o que piorava com o fato de Summer realmente estar levando a sério o papel de liderança autoproclamada dele.
- Eles simplesmente me mandaram voltar pra fila! – Ele exclamou indignado, depois de voltar do balcão. O que já era de se esperar, porque não estávamos nem na metade do caminho. – Equipezinha ridícula. – O garoto resmungou, falando alto para eles em seguida: – ONDE PENSAM QUE VÃO CHEGAR NA VIDA SEM NENHUM INFORMATIVO DECENTE?
- Eles não contaram nada? – Summer perguntou decepcionada.
- Nada, estamos a ver navios. – reclamou. – Como vamos escolher quem é adequado para cada prova se não sabemos quais são as malditas provas?
- Não importam as provas, vou ganhar e esfregar minha lagosta na cara daquele careca. – Emma afirmou em meio a uma série de alongamentos.
- Com essa boa forma, eu não duvidaria de você nem por um segundo, boneca.
Olhamos para o grupo à nossa frente, de onde um cara alto e bronzeado sorria para Emma. A garota arqueou uma sobrancelha, dando um sorriso malicioso.
- Bem, não sei quem você é, mas está certo em não duvidar. – Ela disse.
- Brendan Campbell, ao seu dispor. – Ele estendeu a mão, que Emma segurou, e beijou a dela.
- Emma Hughes, a garota que vai acabar com vocês.
- Quem sabe você não prefere se juntar ao nosso time agora, doçura? – Ele olhou de soslaio para nós. – Sem dúvida estará acompanhada dos verdadeiros campeões.
- Pode ser bonito, mas não é nada esperto se acha que pode nos vencer.
- Então me acha bonito? – Brendan arqueou uma sobrancelha.
bufou ao meu lado, e só então reparei que seu rosto já estava vermelho de raiva. Mal-humorado, ele mancou até .
- , no seu manual da vitória por acaso não tem nenhuma regra de não confraternizar com o inimigo?
, até então apenas levemente incomodado diante do discurso de Campbell, pareceu cair na real e voltar a assumir o papel de chefe de batalhão.
- Ei, o está certo! – Ele foi se aproximando e puxando Emma de perto de Brendan. – Nada de confraternizar com o inimigo, Hughes! – Ordenou. Emma o olhou de cara feia. – E você, fique longe da minha equipe! Pelo menos até o momento em que for nos entregar pessoalmente o troféu de campeões.
- Desafio aceito, Grilo Falante. – O garoto o olhou em tom de desafio e voltou para seu lugar.
ajeitou seu chapeuzinho azul – o motivo do apelido – na cabeça, e nos puxou para uma roda.
- Certo, equipe, estamos falando de um desafio! Agora definitivamente temos que ganhar esse negócio!
- Sabe, , eu posso ser um cara calmo – Brad falou. – mas a verdade é que sou super competitivo. Estou nessa!
- É assim que se fala, Winter! – estendeu a mão e eles fizeram um high five. Então os olhos de pararam em um ponto atrás de Brad. – AH NÃO! – Ele exclamou. – Não pode ser! Vocês tem que me esconder, rápido!
Sem entender nada, nos atrapalhamos enquanto tentava encontrar um lugar atrás de um de nós, que acabou sendo .
Olhamos para trás então, e descobrimos o motivo da preocupação de . A alguns metros dali, Amber Hayley ajeitava o cabelo e conversava com um grupo de pessoas, enfiada em um biquíni rosa choque.
- Aquela ali não é a Amber? – apontou.
Como se tivesse um radar especializado em detectar a pronúncia de seu nome a quilômetros, Amber se virou para nós naquele instante. Primeiro, ela sorriu, acenando alegremente. Depois franziu o cenho, confusa, e veio em nossa direção.
- Ei, pessoal! – Cumprimentou, e então se virou para . – , o que está fazendo aqui? Pensei que você e fossem passar o fim de semana em Atlanta, com seu pai.
abriu a boca, mas logo deu um sorriso até bem convincente, cruzando os braços em frente ao corpo.
- Mudança de planos, Amber. – Explicou. – Meu pai teve que resolver uns negócios.
- E onde está o ? – Ela quis saber.
Percebi meu amigo se esconder, desesperado, mas logo Emma o agarrou pelo colarinho, satisfeita por se vingar do que ele fizera instantes atrás.
- Ah, o está bem aqui! – Ela deu um sorriso sinistro. – Estava comentando agora a pouco como estava com saudade de você.
– que quase caíra quando a menina o empurrou para perto de Hayley – levantou os olhos e forçou um sorriso.
- Oi, Amber. – Disse.
- Gatinho! – Ela exclamou, as mãos na cintura. – Por que não me contou que vinham pra cá? Eu poderia ter vindo junto!
- Acho que esse foi exatamente o motivo. – Brad sussurrou com cara de pena.
engoliu em seco, respirando fundo.
- Desculpe, decidi vir junto em cima da hora. – Mentiu. – Mas não esquenta com isso, não quero atrapalhar seu dia com seus amigos, pode ficar com eles à vontade. Nos vemos na escola.
- Ah, não vim com meus amigos. – Ela dispensou. – São só meus primos. Mas não tem problema, prefiro ficar com vocês. Eles são tããão chatos! – Nos contou em tom de conchavo.
A garota saiu correndo rumo aos primos com a intenção de se livrar dos mesmos, e desabou no chão.
- Sinto muito, meu amigo. – Brad se abaixou ao lado dele e disse seriamente, apertando seu ombro. – Tenha força, você vai sobreviver.
🌴💚🌴
Agora, havia muito mais pessoas do que antes. O pessoal da rádio tinha armado uma estrutura de porte razoável para comportar a competição e aqueles que quisessem assisti-la. Aos poucos, banhistas e residentes das redondezas tomavam seus lugares nas duas arquibancadas.
- Vocês serão o time laranja. – Um rapaz da organização nos disse ao entregar um bolo de regatas de tecido leve.
- E quantos times são? – Jodi questionou, vestindo a camisa.
- Quatro. Laranja, amarelo, azul e verde. – Explicou. Depois nos olhou por um instante e deu uma risadinha. – Boa sorte. Vocês vão precisar.
se aproximou de mim com o cenho franzido.
- Só eu achei esse comentário muito estranho? – Observou. Também tinha achado, mas dei de ombros.
Minutos depois, nos reunimos às outras equipes no campo de areia. As pessoas bateram palmas. Comecei a acenar, feliz por ser o centro das atenções em um palco de novo. Não que fosse um palco, ou que fosse eu o centro das atenções, mas eu adorava as palmas da plateia.
- Somos famosos! – Jodi sussurrou emocionada para mim, que assenti com força.
Os dois radialistas responsáveis por narrarem a competição tomaram seus lugares, numa mesa num patamar mais alto da arena. Um deles tinha o cabelo louro quase verde, provavelmente uma triste consequência dos raios de sol da praia.
- Sejam bem-vindos frequentadores da Praia das Ostras! E sejam bem-vindos times! Eu sou Darren Mendes, e esse é meu parceiro Shawn Freterrick, falando com vocês ao vivo e transmitindo essa deliciosa competição para todo o estado pela Hot Weather Radio! Bom dia, Shawn.
- Bom dia, Darren! – O outro respondeu. – Parece que temos equipes animadas para vencer aqui. Lembrando que o prêmio para os vitoriosos será um almoço digno de realeza pago pela HWR no Jay's Lobster, o melhor restaurante da região.
Olhamos para o lado. Brendan Campbell, o admirador de Emma, tinha ficado na equipe azul. Ele acenou e jogou um beijo para ela.
- E vamos a primeira prova, Shawn! – Darren anunciou, chamando nossa atenção de volta. – A primeira parte da disputa hoje será a Corrida de Carrinho de Mão. Um casal de cada equipe tomara seu lugar na pista de areia. Garotos terão que segurar os (quase sempre) lindos pezinhos das moças, que correão com as mãos até a linha de chegada. O primeiro casal a fazer o percurso de ida e volta, vencerá a prova.
- Parece uma prova bem fácil pra mim, Darren! – Shawn sorriu. – As equipes têm dois minutos para decidir seus representantes.
Nos reunimos em uma roda de novo.
- Certo, quem vai? – quis saber.
- Bem, eu e Junior não estamos namorando, então não somos realmente um casal. – Summer lembrou. – Que tal e ?
- é uma molenga, vai nos fazer perder. – dispensou a ideia sem nem olhar para mim.
- Ei! – Protestei.
- Meu pé está ruim, não posso correr. – se dispensou.
- Summer, você é a mais rápida. – Jodi opinou.
- Não tem realmente problema se não estamos namorando, Sum. – deu sua opinião. – Ainda somos bons juntos.
Ela olhou para cada um de nós e então assentiu.
- Certo, eu vou com Junior.
Fiquei um pouco irritada – tanto pelo comentário de quanto pela decisão final –, mas não teve jeito. Logo Summer e Junior estavam se juntando aos outros casais escolhidos. Do time azul, foram uma garota de cabelo castanho e olhos verdes e um cara de cabelo dourado, como o de Brendan.
- Já temos os representantes, Shawn. – Darren anunciou. – A produção está explicando as regras e colocando os competidores em suas posições agora.
Poucos minutos depois, vimos Summer plantar bananeira, Junior pegou os pés dela e caminhou para trás, de forma que o corpo dela ficou na horizontal, apoiado pelas mãos. A sincronia com que eles se moviam era irritantemente natural.
- Os competidores estão prontos, Darren! Repetindo, o vencedor será aquele que conseguir ir até a marca e fazer o percurso de volta primeiro. – Shawn reforçou. – Vamos lá, equipes! Em suas marcas. Preparar... VALENDO!
A corrida começou e Junior e Summer dispararam, ultrapassando rapidamente o casal da equipe Amarela, que tinha saído na frente de todos. A garota da equipe verde logo caiu, ela e seu parceiro perdendo quase que por completo a chance de vencer. Nós gritamos, incentivando Sum e a irem mais rápido. Agora, a dupla da equipe Azul também tinha ultrapassado o casal Amarelo, e estava na cola do nosso time. Por uns dois segundos, eles até conseguiram ficar à nossa frente, mas rapidamente recuperamos a dianteira. Tínhamos chegado ao fim da pista, e com perfeita graciosidade, Olsen e fizeram a curva para fazer o percurso de volta. O público gritava tanto quanto nós, quando a equipe Azul também curvou. Era certo íamos ganhar; nosso time já estava na metade do percurso de volta. A equipe Azul acelerou, mas a garota parecia estar cansada.
De repente, ela gritou algo incompreensível para seu parceiro, que começou então a se aproximar de Junior e Summer. Quando eles já estavam perto o suficiente, andando quase grudados, algo aconteceu, e, quando nos demos conta, Summer estava caindo, levando Junior consigo.
- O QUÊ?! – estava em choque. – Não pode ser!
- O que houve com ela??? – Jodi se preocupou.
deu um passo à frente, assim como eu, mas não podíamos invadir a pista. O time Azul venceu, seguido pelo Amarelo. Antes que o verde tivesse tempo de chegar, no entanto, Summer levantou e esticou os pés. Junior a levou praticamente caindo até a linha de chagada. Acabamos em terceiro.
- E o primeiro ponto vai para a Equipe Azul, Shawn! – Darren Mendes anunciou. O público aplaudiu.
- E eu que pensei que essa já estava no papo da Equipe Laranja, Darren. – Shawn riu. – Bem, eles ainda têm mais seis provas pela frente para ter sua revanche.
Ainda estávamos frustrados e confusos quando Summer e voltaram para perto de nós. Summer parecia furiosa, assim como Junior.
- Que diabos houve com vocês lá dentro?! – exigiu saber.
- Achei que estava tudo indo bem. – fez uma careta.
- Aquela garota jogou areia no meu rosto! – Summer contou com raiva.
- Mas o quê?! – Emma ergueu as sobrancelhas.
- Eles foram se aproximando de nós, e a menina jogou um punhado de terra na cara da Olsen, por isso perdemos o equilíbrio. – Junior explicou.
- Temos que contar isso à produção! – Brad decretou.
- Está certo, Winter. – assentiu. – Vamos lá.
Enquanto a segunda prova ainda estava sendo preparada, nós todos fomos até a primeira pessoa da produção que vimos. Ironicamente, era o careca com quem Emma tinha discutido antes.
- Ah não! Bosta! – Ela xingou quando o viu a distância.
Assim que chegamos bem perto, o homem se virou para nós com cara de tédio. Deu um mínimo sorriso, no entanto, quando viu Emma, provavelmente se divertindo com o fato de já estarmos perdendo.
- O que querem? – Ele perguntou.
- Armaram pro nosso time! – revelou de uma vez. – Aquela fracote que não sabe perder da equipe Azul jogou areia na cara da nossa corredora!
- Hum, é mesmo? – O homem nos olhou como se aquilo não fizesse a mínima diferença para ele. – Têm provas disso? Não acho que posso ajudar vocês sem algo convincente.
- Provas? – Emma deu um passo à frente, irritada. – Olha aqui, careca, você viu que estávamos ganhando! Se seu problema é comigo...
O homem mudou a fisionomia do tédio para a raiva diante da ofensa. Decidi que era hora de intervir, e joguei Emma para trás antes que terminasse.
- Cala essa boca, Hughes! – Briguei. Depois me virei para o homem com um sorriso educado. – Desculpe por isso... – Li o nome em seu crachá. – Larry. Posso te chamar de Larry, não é? – Ele não respondeu. – Não queríamos mesmo ofender você. Meus amigos só estão irritados porque isso é algo muito sério.
Ao som do pedido de desculpas, a expressão de Larry se suavizou. Ele ainda não parecia gostar de nós, mas estava ouvindo de verdade agora.
- A questão é que, se aquela garota não tivesse jogado areia no rosto da nossa amiga, nós teríamos ganhado a prova. – Eu disse. – É uma tremenda injustiça que eles vençam.
O homem ponderou sobre o assunto, e senti a esperança crescer em meu peito. Ele fez sinal para que alguém se aproximasse. Era o cara que tinha nos dado as camisas antes do início da gincana.
- Ei, Pitt. – Larry disse. – Os garotos estão dizendo que a equipe Azul trapaceou. A garota jogou areia no rosto da competidora Laranja. O que se pode fazer quanto a isso?
- Eles têm provas? – Pitt olhou com curiosidade para nós, e então para Larry de novo.
- Não. – Eu disse frustrada. – Não temos. Mas...
- Foi mal, garotada. – Pitt balançou a cabeça, já se afastando. – Sem provas, sem revisão.
Desabamos de revolta e tristeza. Larry deu de ombros.
- Sinto muito. – Disse.
estava sentado ao lado de Summer no banco, os braços em volta de seus ombros.
- A culpa não foi sua, Summer. – Ele dizia.
- Com certeza não foi. – Junior se sentou do outro lado, puxando-a para perto dele. rolou os olhos, ficando de pé e se juntando a Brad e a mim.
- Estávamos tão pertinho... – Jodi choramingou.
estivera sentado por alguns instantes, Amber fazendo carinho em seu cabelo para acalmar sua fúria intensa. Ele ficou de pé então, tirou o chapéu – que Amber ficou segurando amorosamente – e assumiu seu posto de novo.
- Já chega dessa lamentação, time! – Ele bradou, assustando a todos nós. – Eles trapacearam. E aí, o que tem isso? Milhares de pessoas trapaceiam todos os dias. Mas o que temos aqui é garra de verdade! ESTÃO ME OUVINDO?
- SIM, SENHOR! – Brad respondeu automaticamente. Olhei para ele, mas preferi nem comentar.
- Muito bem, Winter. – cruzou as mãos nas costas e começou a andar de um lado para o outro. – Ouviram que a próxima prova é a competição de Nado, certo? Pois bem, temos que decidir quem vai. Eliminando desde já o , que não sabe nadar.
arregalou os olhos ao ter aquilo revelado, mas não pareceu nem notar.
- ! – Repreendi agarrando o braço de .
- E então, equipe, quem vai? – O garoto continuou. – QUEM VAI TRAZER ESSE PONTO PARA NÓS?
- EU VOU, SENHOR! – Brad respondeu.
- Está certo disso, Winter? – Emma segurou os ombros dele.
- Sim, senhora! – O garoto prometeu. – Tenho nadado em diversos ambientes a vida inteira. Sou quase um tritão.
- Que seja. – deu de ombros. – TRAGA A VITÓRIA PRA NÓS ENTÃO, WINTER!
Eles fizeram um high five de novo e Brad saiu correndo rumo a organização para ouvir as regras.
- Espero que ele consiga. – Jodi cruzou os dedos.
Pouco depois, todos seguiram para a piscina grande. Ela não era muito diferente da média em termos de comprimento, mas dava para ver que era bem mais funda. estremeceu só de olhar.
Dessa vez, Shawn e Darren estavam de pé na borda da piscina, usando microfones auriculares. O resto do público que tinha insistido em ver a prova se acomodava nas pedras mais distantes que cercavam a piscina.
Brad já estava usando sua cueca de natação. A produção lhe dera uma touca laranja, para simbolizar a equipe. Ele fazia aquecimentos ao lado dos outros competidores. Brendan Campbell, o escolhido da equipe Azul, acenou para Emma de novo.
- Já se arrependeu da equipe que escolheu, princesa? – Ele gritou.
- Não, nem vou, Campbell! – Ela respondeu. – Brad vai te fazer engolir sal!
Shawn ajeitou seu microfone e tomou mais distância da água, assim como Darren.
- A segunda prova da competição de hoje, Darren, é a Prova de Nado. Os competidores, dessa vez, não precisam fazer o percurso de volta. Aquele que chegar ao nosso lado já será coroado o vencedor.
- Me permite dar o sinal da largada, Shawn? – Darren pediu.
- Com todo o prazer, Darren. – O outro estendeu uma arma de brinquedo para ele.
- Competidores, se preparem para saltar! – Ele avisou. Todos se posicionaram. – Preparar... Apontar... – Então ele apertou o gatilho e a arma fez um estouro.
Os competidores pularam dentro da água, E Brad estava certo: ele era muito rápido.
Com os corações na boca como estávamos, a piscina parecia muito maior que a princípio, e a prova, ainda mais longa. Mas Brad estava na frente, o que nos alegrava.
- VAI, BRAD! – Jodi berrava. – VOCÊ CONSEGUE!
- VAI LÁ, WINTER! – incentivava.
De repente, o braço de Brendan – que estava logo atrás – se ergueu para uma braçada, e na decida, agarrou o pé de Brad, que perdeu o controle de seu corpo dentro da água e teve que buscar apoio no chão.
- FALTA! – Nós gritamos irados.
- Aquele cara puxou meu pé! – Brad gritou para o olheiro da competição.
- Todo mundo viu! – também gritou.
Acontece que o olheiro era justamente o tal do Pitt-vocês-não-têm-provas, e ele deu de ombros e balançou a cabeça, como se não tivesse visto.
- Estão perdendo tempo de prova. – Disse apenas.
A essa altura, no entanto, Brendan já estava tocando a borda da piscina, e sendo anunciado como vencedor.
- E O PONTO VAI MAIS UMA VEZ PARA A EQUIPE AZUL! – Shawn bradou.
Alguma coisa muito errada estava acontecendo naquela gincana.
Pouquíssimo tempo depois, nos encontrávamos sentados na estrutura de areia novamente. Enquanto a prova da piscina acontecia, eles tinham armado uma série de etapas para que fosse realizada a Prova de Obstáculos.
Nossa equipe agora exalava revolta. Estávamos certos de que a equipe Azul estava sendo beneficiada.
- Desculpe, time. – Brad disse deprimido. – Vocês estavam contando comigo.
- Relaxa, Brad. – balançou a cabeça.
- É, a culpa não foi sua. – Jodi o abraçou.
- Da primeira vez tudo bem, mas agora eles viram o que aconteceu! – Emma exclamou frustrada. – Pelo menos o Pitt-num-sei-quê.
- É óbvio que viu. – concordou. – O trabalho dele é vigiar as trapaças.
- Ele está fazendo vista grossa pra eles. – opinou. – É bem possível que tenha visto até da primeira vez.
- É, mas não temos como provar. – Summer deu de ombros, conformada.
- Só temos uma coisa a fazer, time. – disse solenemente. – Se não temos como provar, temos que tirar deles a chance de trapacearem. Até agora só fizemos provas em que eles tinham a chance de se aproximar de nós, mas a última vem agora. Se sobrevivermos à Prova de Obstáculos, eles não vão poder mais chegar perto de nós.
- está certo. – Concordei. – Só precisamos passar dessa fase. Como no vídeo game.
- Perfeita comparação, recruta Pie! – O garoto estendeu a mão, na qual eu bati. – Agora vamos decidir quem...
- Eu. – Jodi se colou de pé, o rosto sério. – Vou pelo que fizeram com Brad e Summer.
- Slaterton, tem certeza que... – começou.
- Ah, ela pode vencer sim. – Emma garantiu com sua risada de porquinho. – A Slaterton tem esses surtos de adrenalina quando fica irritada. Vão ter que segurá-la para não arrancar a cabeça de quem competir com ela.
me olhou assustado, mas eu também estava assustada, então não me atrevi a dizer nada.
- Então essa é sua, recruta Slaterton! – decretou. – Acabe com esses babacas!
- SENHOR, SIM SENHOR! – Jodi Lyn bateu continência, depois saiu correndo.
- Tem certeza de que é mesmo seguro manda-la lá? – estava na dúvida.
- Para nós, sim. – Emma deu de ombros.
Darren Mendes tinha voltado à bancada com seu parceiro de narração agora. Ele ajeitou o cabelo esverdeado diante de um espelho, e depois conferiu se o microfone funcionava.
- Estamos de volta à etapa terrena da competição. Será que pode nos dizer o que teremos agora, Shawn?
- Posso sim, Darren. – O outro sorriu. – A próxima prova é a Prova de Obstáculos. Espalhados pela pista, temos diversas armadilhas para atrasar nossos competidores. A primeira delas é a rampa molhada, que eles terão que subir. Logo que conseguirem, eles se depararão com o trepa-trepa, onde terão que passar pendurados se não quiserem cair na poça de gosma melequenta.
- Eu nem sei o que é aquilo, Shawn! – Darren riu.
- Nem eu, Darren. – Shawn continuou. – Depois disso, os competidores irão se deparar com uma parede de escalada, seguida pela corrida sobre os pneus, e depois terão que rastejar sob o arame falso, se sujando todos na areia molhada.
- É isso aí, Shawn. Aquele que terminar primeiro, deverá tocar o sino pendurado bem ali. – Ele apontou para uma sineta dourada no campo de areia. – E então será nomeado vencedor da prova.
- Agora vamos ver quem está competindo dessa vez. Parece que tanto a equipe Azul quanto a Laranja escolheram mandar garotas, mas as equipes Verde e Amarela apostaram nos rapazes.
- Isso vai ser interessante de se ver! Sem mais delongas, vamos à competição.
[N/a: Podem ouvir aqui, bombons]
Jodi se posicionou sem nem ao menos olhar para os lados. Os outros competidores pareciam gigantes perto dela.
- Preparar... – Shawn anunciou em seu microfone. – Apontar... VAI!
Jodi Lyn saiu correndo, e nós gritamos seu nome em incentivo. Acontece que aparentemente nenhum de nós – apesar de amarmos Jodi – estava realmente preparado para o que vimos. Parecia que a pequena Jodi Slaterton tinha incorporado o espírito de um super soldado.
Enquanto o rapaz da equipe amarela levou séculos para conseguir subir ridiculamente a rampa alta e molhada, Jodi já estava no topo da mesma, e saltando para o outro lado.
- VIRAM ISSO?! – Exclamei eufórica.
- Vi, eu vi sim! – Brad riu. – VAI LÁ, PEQUENININHA!
Jodi se pendurou no trepa-trepa, surpreendendo a todos nós com a força de seus braços. O garoto da equipe Verde vinha logo atrás dela, mas quando ele se aproximou demais, Slaterton simplesmente se balançou para trás – não soubemos dizer se foi acidental ou não – e lhe acertou no estômago com os pés. O garoto caiu na gosma nojenta, e ela seguiu para a próxima etapa.
- Isso é mesmo permitido? – fez a mesma pergunta que eu em voz alta.
- Quem liga?! – estava mais alegre do que tudo. – Estamos vencendo! VAI SLATERTON! ACABA COM ELES!
O garoto da equipe Amarela tinha conseguido recuperar o ritmo depois da rampa, seguindo atrás de Jodi junto da garota do time Azul. Eles tinham chegado à parede de escalada. Jodi estava logo acima dele, tão focada que nem parecia escutar nossos gritos. Talvez por isso mesmo ela tenha decido o pé com toda força bem no nariz do pobre rapaz, derrubando-o lá de cima. Teoricamente, tinha sido porque o pé dela deslizara do apoio de escalada. Àquela altura, porém, eu não duvidava de mais nada.
- Eu falei que ela era feroz! – Emma comemorou.
- Vamos sair daqui direto pra cadeia. – estava abismado.
Slaterton foi para a corrida sobre os pneus ao mesmo em tempo que a outra garota. As duas competiram na mesma velocidade, e em determinado momento a garota tentou empurrar Jodi, que desviou sem pestanejar. A baixinha continuou a frente, se deitando na areia molhada para passar debaixo do arame. Quando saiu de lá e viu o sino, havia um brilho assustador em seus olhos.
A garota do Azul, porém, saiu logo atrás dela, e ao perceber que a vitória estava em risco, tentou correr atrás de Jodi e sutilmente puxar seu rabo de cavalo.
Jodi desviou dela, que foi parar ao seu lado na sequência, se esforçando para respirar. Quando ela tentou novamente atrapalhar Slaterton, a baixinha jogou seu corpo pra cima dela, empurrando-a de modo que a garota caiu e saiu rolando. Foi assustador, mas estávamos felizes ao mesmo tempo.
- VAI! VAI! VAI! – Gritávamos.
E então Jodi correu mais, pulou e puxou o sino. Havíamos ganhado.
- ESSA É PRA VOCÊ, BRAD! – Ela gritou. E Brad correu para abraça-la, orgulhoso.
[N/a: Certo, já podem parar, docinhos]
Quinze minutos depois, Jodi ainda estava jogada no chão de areia, se recuperando. Brad estava sentado ao lado dela, uma garrafa de água na mão preparada para oferecer a sua amada.
- Não sei o que deu em mim. – Jodi dizia, como se acordasse de um longo sono. – Eu só conseguia ver a sineta! Eu não machuquei muito ninguém, não é? – Se sentou alarmada.
- Não mais do que o necessário, Jodi. – sorriu, apertando o ombro dela. – O que importa é que conseguiu o ponto pra gente. Pode descansar pelas próximas provas.
- Já sabem qual é a próxima etapa? – questionou.
- Ainda não disseram nada. – Respondi.
Como mágica, o microfone chiou. Tampamos os ouvidos, mas logo percebemos que Darren Mendes tinha voltado ao seu posto. O problema de microfonia foi resolvido e ele voltou a falar.
- Estamos de volta com a gincana, pessoal! – Ele disse. – Depois das grandes emoções da última prova, três competidores acabaram com leves contusões, mas o problema já foi resolvido pela equipe médica.
Jodi olhou envergonhada para nós. Brad a tranquilizou com um sorriso. Concluí que nunca na minha vida eu arrumaria confusão com Jodi Lyn Slaterton.
- É isso mesmo, Darren. – Shawn entrou na conversa. – Mas estou certo de que a prova seguinte será mais segura.
- Vem aí – Darren anunciou. – A Prova da Dança!
Olhamos uns para os outros, surpresos.
- Nessa prova, Darren, dois competidores de cada equipe virão até aqui mostrar seus talentos artísticos no nosso super vídeo game. Esperamos que ninguém se machuque dessa vez.
- As equipes têm dois minutos para enviar seus representantes.
Olhamos uns para os outros então. Os meninos com olhares prevenidos.
- É Just Dance! – Ri, empolgada. – Não tem como eu perder nisso! Eu vou dessa vez.
- Me incluam fora dessa. – avisou.
- Eu também. – disse.
- Meu pé está quebrado. – lembrou.
- Vocês são uns chorões! – Summer fez cara feia.
- Gente, não se preocupem. – Amber abriu um enorme sorriso, se alongando. – Sou uma líder de torcida; se tem algo que sei fazer, é dançar.
- Só se for por cima do meu cadáver, Hayley. – Emma a empurrou para cima de . –Cinquenta por cento da minha preparação para ser líder de torcida veio desse jogo. Fique longe do meu holofote. – Estalou os dedos.
- Isso vai ser vergonhoso. – Ouvi murmurar.
já me vira jogar aquilo na casa de mais de uma vez. Estava certo – dependendo da música, poderia ser ridículo. Eu me importava? Não realmente.
- Quando eu ganhar vou dedicar a vitória a você igualzinho a Jodi. – Avisei.
- Nem pense nisso. – Ele disse, mas riu.
Sob o olhar nada feliz de Amber, eu e Emma fomos ao centro do campo, onde as equipes foram colocadas em ordem. A primeira equipe a competir seria a Azul, que estava na frente; depois nós; por último, Verde e Amarela. A música seria a mesma para todos nós, para que fosse um jogo justo.
A música foi escolhida aleatoriamente pelo jogo, e acabou por ser Jump, da Girls Aloud. Emma comemorou o fato.
- Eu adoro essa música! – Exclamou. O que era bom, porque eu também a conhecia.
A dupla Azul foi até o pequeno palco armado e pegou os controles. Eram uma garota e um garoto. A música começou e os assistimos dançar.
Ok... Os dois eram muito bons. O garoto de vez em quando olhava para nós com certo desdém, como se estivesse zombando previamente da nossa performance. Lembrei de como Teddy, o amigo das meninas da torcida, olhava quando falava dos pés tortos de Maya Burnes.
Para o azar dele, no entanto, a menina, num momento de distração, acabou virando para o lado contrário do que o jogo indicava. Isso gerou um erro posterior, eles deram um encontrão, e no fim das contas não conseguiram todas as cinco estrelas, mas sim quatro.
- Perfeito, eles erraram! – Emma comemorou. – Essa é nossa chance.
- Vamos levar essa. – Assenti.
Ainda não haviam nos chamado para assumir as posições. Então esperamos enquanto Pitt – que estava mais para um faz tudo agora – passava um rodo com alguma coisa na lona sobre o palco.
- Ei, o que é aquilo? – perguntou à distância.
- Não sei, ele só deve estar limpando a areia! – Respondi.
Assim que ele saiu do palco, Larry subiu, fazendo sinal para que eu e Emma subíssemos. Ele nos entregou os controles e programou o vídeo game.
- Obrigada, Larry. – Eu disse educadamente.
- Boa sorte, à você. – Ele deixou bem claro. Emma mostrou a língua para ele, que desceu do palco em seguida.
- Esse careca vai ver só. – Ela deu uma risadinha.
Respirei fundo e esperei que o jogo começasse. Nós íamos dançar descalças, uma regra da competição. A coreografia começava com nós duas abaixadas, e assim fizemos.
A música começou e tudo que eu via na tela era a palavra "Perfect" repetidas vezes. Olhei para trás um segundo e vi meus amigos sorrindo. Eu e Emma estávamos em uma ótima sincronia.
A letra seguia ritmadamente quando uma coisa começou a me incomodar. Parecia que algo tinha grudado em meus dedos. A sensação era irritante. Olhei para o lado. Emma estava absolutamente normal, dançando o pedaço que vinha antes do refrão:
I'll take you down, I'll take you down
Where no one's ever gone before…
Eu devia ter pisado em alguma coisa antes de entrar ali, com certeza. Me concentrei em fazer os passos com mais cuidado e ignorar aquela sensação.
Mas quando o refrão enfim chegou, não houve jeito. Eu tinha que pular.
Then, Jump!
For my love
Jump in!
Olhei para o lado de novo. Dessa vez a cara de Emma denunciava que ela tinha percebido algo estranho também. Nenhuma de nós queria parar de dançar, mesmo assim.
I know my heart can make you happy…
Jump in!
You know these arms can feel you up…
Eu quase escorreguei, mas Emma me empurrou com o quadril e voltei ao lugar. Continuamos dançando até quase o final do refrão, até que, por fim, no último pulo, a própria Emma escorregou, caindo de bunda no chão.
- Emma! – Me abaixei ao seu lado.
Larry apareceu perto de nós num instante acompanhado de mais duas pessoas da produção. Uma delas parou a música.
- Acho que vamos precisar de um médico. – A garota da produção disse.
- Não, eu estou bem. – Emma garantiu, se colocando de pé. – Nós perdemos?
A garota deu de ombros. Emma bufou, voltando para perto da nossa equipe. Eu a segui.
- Ei, o que aconteceu lá em cima? – Junior questionou.
- O chão estava escorregadio. – Contei triste.
Em alguns instantes, o tal Pitt estava com seu esfregão no palco novamente. Depois foi a vez da equipe verde, e as duas garotas caíram miseravelmente também. O mesmo aconteceu com a equipe Amarela.
- Vocês não acham isso estranho? – Summer perguntou cismada. – A primeira equipe não teve nem um deslize. Só não conseguiram todas as estrelas porque aquela menina virou para o lado errado.
- Eu diria que é muito suspeito, isso sim. – concordou.
- Dou minha cara à tapa como aquele tal de Pitt está envolvido nisso. – Junior bufou.
- Quando eu puder provar isso, vou enfiar a cara dele num buraco de areia. – Emma disse com ódio. Jodi a abraçou.
Depois de terem anunciado a equipe Azul como vencedora da prova, Darren e Shawn voltaram a falar.
- Vamos lá, frequentadores da Praia das Ostras. – Darren disse. – Eu diria que a próxima prova é uma graça. – Riu da própria piada.
- Vem aí o FAÇA-ME RIR OU MORRA! – Shawn anunciou. – Essa prova é um verdadeiro teste de resistência, Darren. Quatro competidores serão colocados em roda no meio do campo. Aquele que conseguir se manter sério ao final de três minutos, será o vencedor.
- É isso aí, Shawn, nem mesmo um sorrisinho vale. Vamos lá, equipes, escolham seus representantes.
, que estava de muito mau humor a essa altura, se colocou de pé.
- Essa vai ser bem fácil. – Disse sem emoção, tomando seu chapéu das mãos de Amber e se direcionando ao centro do campo de areia sem que tivéssemos tempo de dizer qualquer coisa.
- Boa sorte, amorzinho! – Amber gritou.
Os outros times mandaram seus representantes em seguida.
- Boa sorte, Grilo Falante! – Brendan zombou de onde estava com o resto de sua equipe ao ver .
Larry foi até o centro do palco e posicionou os competidores.
- A prova começa em um instante, Darren! – Shawn anunciou. – Preparados, competidores? Valendo!
olhou bem para cada um dos competidores – uma garota e dois rapazes. Ninguém parecia disposto a rir. Então, sem mais nem menos, ele pegou seu ridículo chapéu azul, que trazia nas mãos cruzadas atrás das costas, e colocou na cabeça.
Vi a boca da garota da equipe Amarela tremer diante daquela visão. Logo ela balançou as mãos em rendição, saindo do meio com as mãos na boca tentar conter o riso. Depois foi o garoto da equipe Verde. Por último, ficou ali, encarando o remanescente da equipe Azul. O garoto tinha o rosto vermelho, como se estivesse quase morrendo para não rir. De repente ele não aguentou mais. Explodiu em gargalhadas e caiu no chão rolando.
voltou para nós com as mãos erguidas em sinal de vitória, enquanto o garoto ficava lá.
- Bem, Shawn, isso foi... – Darren tentava entender. – Rápido.
- Boa escolha de palavras, Darren. – O outro respondeu.
Nem mesmo nós estávamos acreditando no quão fácil tinha sido.
- Você disse alguma coisa para o último cara? – perguntou ao melhor amigo.
- É verdade, pensei que ele fosse resistir. – Concordei. – O tempo já estava acabando.
- Disse sim. – assentiu. – Cri-cri.
Dessa vez, nem nós aguentamos, desabando em gargalhadas.
A manhã se estendia e já estávamos cansados e famintos. Podíamos sentir o cheiro das lagostas do Jay's Lobster se fechássemos os olhos.
- Calma, pessoal, já está quase acabando. – Summer disse, mas dava para ver que estava exausta também.
- Não vejo a hora de comer alguma coisa. – se jogou para trás.
- Se fossem como eu, estariam de barriga cheia a essa altura. – deu de ombros. – Estou comendo desde que cheguei a essa praia.
balançou a cabeça.
- E a próxima prova é uma prova de força, Darren! – Shawn anunciou, tomando nossa atenção de volta.
- Se preparem para o cabo de guerra, equipes! – Darren exclamou. – Três competidores de cada lado virão até o centro do campo para mostrar quem pode mais nessa tradicional brincadeira, Shawn.
- Equipes, já podem escolher seus representantes.
– cujo ombro estava servindo de apoio para minha cabeça até então – levantou a mão.
- Eu vou. Não fiz nada ainda.
- Também quero ir. – Brad disse. – Preciso me redimir com vocês pela prova de nado.
Emma se colocou de pé no mesmo instante.
- Sendo assim, a terceira pessoa sou...
- Sossega aí, Hughes. – a empurrou para o banco de novo. – Já se machucou hoje. Eu vou dessa vez.
- Grande Junior. – o cumprimentou. Emma o olhou feio.
Logo os três garotos estavam posicionados no centro. Era estranho ver e fazendo qualquer coisa juntos, mas eu sabia que eles tinham boas chances de ganhar.
- Vamos lá, meninos! – Summer gritou e bateu palmas, apreensiva.
Primeiro, a equipe Verde foi colocada para competir contra a Azul, para quem perdeu miseravelmente. Depois, nossa equipe foi contra a equipe Amarela, de quem ganhamos. A chave final era Azul x Laranja.
- É nessa hora que vem o roubo. – balançou a cabeça, prevendo o pior.
As equipes se colocaram em seus lugares. Pitt chegou trazendo uma nova corda, o que pareceu de fato muito esquisito. Os garotos agarraram a corda, cada time de um lado.
- VALENDO! – Gritou Darren Mendes.
Os garotos puxam a corda com a mesma força da equipe Azul. Ambos os times eram fortes e equilibrados. Era difícil dizer qual deles venceria.
De repente, percebi as mãos de Brad escorregando. Ele se apressou em agarrar a corda de novo, mas dava para ver a dificuldade.
- Que diabos está havendo? – disse entre dentes.
- Roubo. É isso que está havendo. – Repetiu .
As mãos de e também começaram a escorregar. Vimos os garotos do outro time rirem. Apesar dos evidentes esforços para não soltar a corda, logo nossa equipe foi parar no chão, uns em cima dos outros. A equipe Azul tinha vencido mais uma.
- Tinha alguma coisa na nossa corda. – Junior contou depois.
- CHEGA, TEMOS QUE DESCOBRIR O QUE ESTÁ HAVENDO. – decidiu.
- Mas não adianta. – Jodi disse desanimada. – Só tem mais uma prova, e mesmo se ganharmos, vamos perder. Eles ainda estarão um ponto à frente.
- Se conseguirmos provar que eles trapacearam podemos pegar nossos pontos de volta. – insistiu.
- Isso é verdade. – Brad meneou a cabeça.
- Talvez dê certo. – concordou.
Enquanto conversávamos sobre o que fazer para descobrir como eles tinham trapaceado, Darren Mendes e Shawn Freterrick voltaram aos seus lugares.
- Está na hora da nossa última prova, Shawn! As equipes Verde e Amarela se cansaram, mas mesmo sabendo da impossibilidade da vitória, a equipe Laranja, se recusa a desistir. É algo bonito de se ver.
- É sim, Darren. – Shawn concordou solene. – A última prova da nossa gincana será também a mais deliciosa, meu amigo. Vem aí a PROVA DO BOLO!
- Hummm, parece delicioso pra mim, Shawn! – Darren riu. – Nossa equipe preparou carinhosamente quatro deliciosos bolos enormes para os quatro representantes escolhidos de cada equipe. Infelizmente, vão sobrar dois.
- Os competidores tomarão seus lugares à mesa nessa prova. Vence aquele que conseguir devorar um bolo inteiro primeiro!
Apesar da nossa fome, olhamos uns para os outros, sentindo dor de estômago só de pensar.
- Brutal. – Emma moveu a cabeça em aprovação. – Uma pena que eu vá desvendar o mistério da trapaça. Talvez eu até conseguisse.
- Quem vai dessa vez? – Summer perguntou com um pouco de medo.
Nem sabia quem indicar. Era quase muito cruel pensar que um de nós ficaria de barriga cheia bem antes de irmos para o tal almoço de realeza.
- Essa é a única prova de que eu posso participar. – disse então com certo receio. – Eu vou.
Brad e o ajudaram a ficar de pé, mas alguém entrou em sua frente.
Amber, para o espanto de todos.
- Não, , e vou. – Ela disse.
se aproximou da garota com o cenho franzido, segurando em seus ombros.
- Amber, é uma competição de comer bolo. – Ele disse calmamente. – Não sei se é a prova certa para você participar...
- É exatamente por isso que é perfeita, gatinho. – Amber disse tocando a cabeça com a ponta do dedo, como se fosse uma ideia brilhante. – Um dos motivos é que ninguém vai me levar a sério com esse corpinho. Mas a parte principal é que... Eu estou fazendo dieta há três anos. Sabe quanta fome acumulada eu tenho aqui? – Tocou a barriga.
desviou os olhos para o abdômen de Amber, depois ponderou, dando de ombros.
- Faz bastante sentido. – Olhou para nós. – Essa prova é sua, Amber.
Alegre, Amber o puxou para um beijo e depois saiu correndo para o palco, onde estava colocada a mesa com quatro enormes bolos confeitados com glacê.
- Estamos indo descobrir qual é a daquele otário do Pitt. – Emma avisou agarrando o braço de Jodi e Brad.
- E agora? – Perguntei a , que observava Emma, apreensivo.
- Agora esperamos. – Ele deu de ombros. – É tudo que temos a fazer.
[N/a: Meninas, podem ouvir aqui, que com certeza vocês já conhecem]
Amber se preparou para competir com um garoto forte da equipe Azul, que até riu quando a viu se sentar à mesa. A bem da verdade, era mesmo difícil leva-la a sério.
Darren deu início a competição, e a garota começou a comer delicadamente garfadas de bolo, enquanto o garoto se matava para comer com as mãos o que podia. Em certo ponto, dava para ver que ele estava cansado.
Ele parou para beber um copo d'água. Acenou para sua equipe e o público. Olhou para a própria Amber.
E foi justamente quando ele parou para respirar, que a bela garota loira se transformou num monstro comedor de bolos, devorando todo aquele glacê e massa à sua frente.
Era assustador, mas estávamos dando pulos de alegria enquanto Amber Hayley se fartava com todas aquelas calorias.
- Isso só pode ser brincadeira. – estava embasbacado.
- Se eu soubesse que ela estava tão faminta, teria obrigado ela a comer há mais tempo. – Summer encarava a cena em choque.
A boca de Amber estava toda suja de glacê, mas ela parecia genuinamente feliz. O outro garoto tinha voltado a comer, e olhava para ela enquanto tentava acompanhar seu ritmo frenético.
- Estamos ganhando! – estava eufórico. – VAI, AMBER! VAI!
A garota ainda teve forças para acenar e sorrir com aquela boca toda suja.
Levaram uns bons dez minutos, mas por fim, Amber jogou o garfo sobre a mesa e ergueu os braços, engolindo o último pedaço de bolo em sua boca.
- Venci! – Ela gritou. – Parecia bêbada. – EU VENCI!
Diante do acontecimento, Darren Mendes e Shawn Freterrick desceram de sua bancada e correram para o palco.
- Ora, ora, mas não é que é verdade? – Shawn estava abismado.
- Bem, TEMOS UMA VENCEDORA! – Darren anunciou, erguendo o braço de Amber no ar.
O público aplaudiu de pé a inesperada vitória de Amber sobre o fortão da equipe Azul, e nós comemoramos loucamente.
- Infelizmente... – Shawn falou. – Mesmo ganhando essa prova, a equipe Laranja ainda está um ponto atrás. Sendo assim, sou obrigado a dar estas medalhas e o prêmio de um delicioso almoço no Jay's Lobster para a equipe Azul.
O público vaiou quando a equipe Azul – Brendan na frente, satisfeito – subiu ao palco para pegar as medalhas e receber a premiação.
- O que vocês tem a dizer, Azuis? – Darren perguntou. Brendan pegou o microfone das mãos dele.
- Bem, que eu sempre soube que isso acabaria assim, não é? – Ele deu um sorriso ofuscante, acenando para a plateia que o vaiava.
- SOLTEM ESSAS MEDALHAS, SEUS BABACAS!
Olhamos para o lado e vimos Emma, Jodi e Brad marchando rumo ao palco. Olhamos uns para os outros e corremos para lá também.
- Qual o problema, meu bem? – Darren quis saber.
- O problema é que esses trapaceiros roubaram em todas as provas! – Jodi revelou.
- E como sabem disso? – Shawn questionou.
- Já tínhamos percebido, mas o Pitt, da produção, se recusou a revisar os resultados! – Brad disse.
- E tudo porque... – Emma deu um sorrisinho, erguendo o celular. – Aquele miserável estava ficando com essa cara de bolacha do time deles! – Ela estendeu o celular para Darren e Shawn, onde era possível ver as fotos que ela tirara há pouco do infeliz casal.
Pitt e a garota da equipe Azul chegaram em seguida, mas era tarde demais.
- Eles passaram no chão da pista de dança a mesma gosma que foi usada na prova de obstáculos, e também usou essa mesma mistura na corda na prova dos garotos. – Jodi explicou.
- E Brendan puxou meu pé na prova de Natação, e aquela garota jogou areia no rosto da nossa corredora na primeira prova. – Brad reforçou.
Darren e Shawn estavam chocados.
- Bem... – Darren ponderou. – Diante dos fatos apresentados, tudo que podemos fazer é tirar esse prêmio dessa equipe medíocre. – Larry apareceu então e foi puxando as medalhas da equipe Azul, que parecia ultrajada. – E oferecê-las aos verdadeiros vencedores da competição, assim como o prêmio do almoço no Jay's Lobster.
O público vibrou com a notícia, assim como nós enquanto recebíamos as medalhas de Larry.
- Eu bem que disse, careca. – Emma sorriu para ele.
- Mandou bem, casca-grossa. – Larry piscou para ela.
- E você, meu jovem... – Shawn se direcionou a Pitt. – Está demitido.
Os integrantes da equipe Azul, ainda sem aceitar o que havia acontecido, deram um passo à frente.
- Isso é ridículo! – Exclamou Brendan. – Vocês todos são!
Então, sem mais nem menos, ele enfiou a mão em um dos bolos inutilizados sobre a mesa e bateu com o pedaço na cara de Darren Mendes.
- Eu não acredito que...
- Ah, isso não vai ficar assim não! – Emma jogou um pedaço de bolo no rosto de Brendan.
- GUERRA DE BOLOS! - Alguém gritou.
Logo, todos jogávamos bolo uns nos outros, dando àquela gincana uma última prova improvisada.
De todo modo, não importava realmente quem ganharia aquela. Aquela já tinha sido uma vitória das mais deliciosas, como já diria Amber Hayley.
[N/a: Podem parar, docinhos!]
🌴💚🌴
Ainda não havíamos conseguido nos livrar completamente do glacê quando os carros da produção do programa vieram nos buscar para nos levar ao Jay's.
- Tem certeza de que quer ir? – Ouvi perguntar a Amber, mal acreditando. – Quer dizer, você aguenta comer qualquer outra coisa?
- , o problema era sair da dieta. – A loira garantiu. – Uma vez fora dela, poderia comer até três bolos como aquele! – Ela comemorou puxando-o pela mão. Eu dei risada.
Os outros estavam em diferentes pontos, tentando se livrar daquela sujeira, quando vi acenar para mim de uma das barraquinhas da feira de artesanato.
- Vicentini! – Ele chamou.
Caminhei até ele e parei.
- Que foi?
- Pedra do sol ou ametista? – Ele perguntou, erguendo dois colares no ar.
- ... Nenhuma coisa nem outra. – Balancei a cabeça, apesar de sorrir.
- Pedra do sol ou ametista, ? Estou perguntando.
Rolei os olhos, mas dei de ombros.
- Pedra do sol. – Respondi.
- Ótimo. – Ele sorriu. – Aqui está o dinheiro, moço.
- , eu não quero nada se... – Tentei protestar, mas em um segundo ele tinha me virado e fechava o colar em meu pescoço.
- Eu queria te dar um presente tem tempo.
Suspirei, medindo a veracidade de suas palavras. O sol estava bem atrás dele, fazendo seu cabelo parecer mais brilhante, e seus olhos, mais .
- Pessoal, vamos?
Olhei para trás e vi Summer acenando animada.
- Já estou indo! – Gritei. – Obrigada. – Sorri para e me afastei.
Logo apareceu também, já praticamente todo limpo.
- Preparada para comer lagosta? – Ele perguntou quando me aproximei.
- Viu só? O dia na praia não foi tão ruim, não é? – Sorri enquanto andávamos rumo ao carro.
- Não. – Deu de ombros, sorrindo. – Mas talvez eu já devesse estar esperando. Quando estamos juntos as coisas geralmente acabam nunca sendo tão ruins, no fim das contas.
[…]
- Onde, onde, onde? – Eu falava sozinha, procurando freneticamente pela minha calça jeans clara. Impaciente, fui até a porta em busca de ajuda. – PAI, ONDE ESTÁ MINHA CALÇA JEANS CLARA?
Mas não houve resposta. Me lembrei então de que meu pai tinha ido para o Roger’s mais cedo naquela noite. Também me dei conta de que tinha confundido papai com minha mãe, visto que ela sim era quem costumava saber onde estavam as coisas. Jack esquecia até de onde tinha guardado a caixa de cereal.
Me senti cansada de repente. Às vezes sentia saudade da minha mãe neurótica e organizada, com quem eu dividia as responsabilidades quase igualmente. Com o meu pai, eu tinha que ser responsável em dobro. De vez em quando eu me perguntava como ele sobrevivera tanto tempo sozinho ali antes de eu chegar. Mas a resposta era bem óbvia e tinha dois nomes. .
obviamente não apenas cuidava de Stevie antes. Era fácil perceber isso quando eu o pegava arrumando a cozinha quase sem se dar conta ou colocando as almofadas esquisitas de papai no sofá.
Em meus primeiros dias ali, eu até tinha ficado um pouco enciumada, porque conhecia a rotina da casa muito melhor que eu, a filha do Jack, e já tinha sua cópia da chave antes de mim, que tive que esperar uma semana. Depois fui aprendendo a gostar da companhia dele e a admirar a forma como tinha cuidado do meu pai maluco por todo aquele tempo. Esperava que o pai de soubesse do que tinha aberto mão.
E... Merda. Lá estava eu pensando em de novo.
Eu não queria pensar em naquele momento, nem em nenhum outro tão cedo. Eu não estava nada satisfeita com ele depois daquela ideia louca de ser professor da Olsen.
- Você só está com ciúmes. – Sofia disse como se fosse óbvio, sem nem se dar ao trabalho de parar de lixar as unhas enquanto falava.
- E você só está sendo ridícula. – Terminei de vestir a calça com esforço e fuzilei a tela do notebook com um olhar. Sofia deu de ombros e fui para o guarda roupa atrás de uma blusa.
- Qual é, , não é bem óbvio? – Ela continuou. – Você gosta do e aí descobre que ele sempre foi apaixonado pela Summer. Daí você começa a, aspas e mais aspas, fingir que está a fim do , e de repente ele volta a se aproximar justamente da Summer, que coincidentemente também foi a namoradinha de infância dele. É normal que isso te deixe com um pouco de dor de cotovelo.
- Sofia, eu não estou com dor de cotovelo, tá legal?! Nem acho o tão bonito ou interessante assim, se quer saber. – Vesti minha blusa branca com renda. – Eu simplesmente acho uma falta de noção do trazer a Summer pra mais perto de nós enquanto ainda estamos vivendo essa farsa maluca.
- Então, está me dizendo que se ele quisesse sair com a Summer depois que esse teatrinho acabasse, estaria tudo bem?
- Sim. Estou. – Disse com o máximo de segurança possível.
- E se eu quisesse sair com o , você também não ia ligar?
- Você mora em Venice, isso nunca vai acontecer. – Fiz uma careta, indo arrumar meu cabelo. – Mas a resposta é: é claro que eu não ligaria. Quem sabe até pagasse um cinema pra vocês.
Sofia ficou me encarando por um instante. Até mesmo parou de mexer nas unhas.
- Tudo bem. Se você está dizendo.
- Eu juro, prima. – Garanti. – Agora vou desligar. Prometi que estaria lá quando eles chegassem ao Roger’s.
- Nos vemos depois. – Sofia sorriu e então finalizou a chamada.
Fechei o notebook e fui procurar minhas sandálias embaixo da cama, onde elas estavam mesmo. Assim que saí dali, no entanto, levei um susto com o enorme focinho de Stevie quase na minha cara.
- Ei, seu babão, não agora! – Me levantei e fui para o banheiro, lavar o rosto da fungada que ele havia me dado.
Stevie me seguiu até lá e depois escada abaixo. Enquanto enfiava as sandálias baixas nos pés, conferi se ele tinha comida e água. Estava tudo certo. Seu osso de brinquedo também estava ali no chão.
- Está tudo bem por aqui. Você vai se comportar enquanto eu estiver com a Jodi. – Eu disse. Ele fez um grunhido, indo para perto da geladeira. Entendi qual era sua intenção.
- Ah, ótimo. – Reclamei, indo até lá e abrindo a porta, para a alegria do cachorro. – Agora além de ficar andando com a Summer, aquele idiota do também coloca hábitos horríveis no meu cachorro. - É isso que você quer, não é? – Levantei a caixa de leite. Stevie latiu e pulou alegremente. Entornei um pouco de leite na sua tigela. – Isso sempre te dá dor de barriga, Stevie. Se bem que... Quem limpa o seu coco é o . – Concluí. – Certo, pode beber leite quando quiser. – Sorri, guardando a caixa de novo enquanto o cão latia.
Fui para a porta da frente satisfeita.
- A volta depois, bebezão. – Joguei um beijo para o dálmata, e então o deixei ali.
Quando cheguei ao Roger’s, o lugar estava começando a encher. Em geral, as coisas funcionavam assim ali: durante o dia, havia um público composto por pais solteiros e filhos, às vezes famílias e alguns turistas perdidos. No fim da tarde, o lugar começava a esvaziar conforme essas pessoas procuravam descanso, e depois de um tempo vazio, o segundo público começava a chegar – aqueles que gostavam de música e festa, os jovens e os aventureiros.
Como não vi Jodi quando cheguei, fui para o balcão do bar, onde Miguel estava arrumando as coisas.
- Olá, barman bonitão. Que tal me dar seu telefone? – Brinquei.
- Atualmente, é o da sua casa. – Ele deu um meio sorriso. – O que está fazendo aqui?
- Ei, eu passava muito tempo aqui antes de você chegar! – Protestei. – Só tenho andado meio ocupada.
- Tudo bem, eu acredito! – Ele deu de ombros.
- Minha amiga tem um encontro aqui hoje. – Expliquei. – Estou aqui para ajudar.
- Brincando de casamenteira de novo?
- Eu adoro essa brincadeira, Miguel. – Sorri maliciosamente. – Se lembra da Gabriela?
- De quando você fingiu que tinha machucado o joelho perto dela pra que ela te levasse de volta para mim e eu fosse obrigado a falar com ela, você quer dizer?
- Señorita, que me ayude! Ay, ay, me duele la rodilla! – Imitei a de seis anos, que entendia quase nada de espanhol, mas que havia ensaiado aquela frase diversas vezes para forçar a aproximação de Miguel com a menina bonita do bairro. Uma completa bobagem, por sinal, visto que Gabriela, como boa parte das pessoas no Novo México, entendia Inglês muito bem.
- Você era uma péssima mentirosa. – Miguel riu.
Travei por um instante com o comentário, mas logo relaxei e sorri.
- Mas era muito fofa, por isso ninguém duvidava de mim. – Me gabei. Talvez por isso minhas mentiras continuassem funcionando.
Ouvi o mover da porta de entrada do bar e me virei para trás. Jodi tinha acabado de entrar, acompanhada de Brad Winter, seu amor-não-mais-tão-platônico-assim. A meu ver, eles sempre tinham combinado. Assim como Jodi Lyn, Brad era gentil e quase ingênuo; mas é claro, havia coisas que os distanciavam, como por exemplo, o fato de Jodi ser tão maluca quanto Emma. Quem diria que a baixinha iria conseguir conquistar aquele garoto...
- Ei! – Eu acenei, descendo da cadeira.
- ! – Jodi abriu um sorriso, exibindo o aparelho amarelo. Ela me abraçou com força.
- Como você está bonita, Jodi! – Elogiei. – Oi, Brad!
- Oi, ! Como vai? – Ele me deu um beijo no rosto.
- Melhor agora que vocês chegaram.
- Uau, esse lugar está incrível! – O rapaz comentou. – Eu costumava vir comer hambúrgueres aqui com meu pai toda sexta-feira quando era criança, mas tive que parar quando entrei no time porque o treinador achava que eu era meio gordinho... – Contou tristemente. – Mas está tudo muito diferente agora!
- Aposto que as mudanças têm o dedo do seu pai. – Jodi deu seu sorrisinho de admiração de sempre quando se falava de papai.
- É, em parte foi coisa dele sim. – Confessei. – Mas vamos logo, conheço a mesa perfeita pra vocês.
Guiei o casal até uma mesa no canto esquerdo, que tinha vista para o palco, mas que não ficava no meio da agitação. Assim, eles poderiam conversar com tranquilidade.
- Vou pegar alguma coisa para vocês beberem. Por conta do Jack. – Avisei. Os dois sorriram alegres, e eu me afastei. Com certeza papai não ia se importar com aquilo. Ele gostava bastante da Jodi.
Me aproximei do balcão onde Miguel estava de novo.
- Preciso de duas bebidas para o casal.
- Dois refrigerantes, você quer dizer. – Corrigiu.
- Você deve saber fazer alguma coisa maneira sem álcool. – Ergui as sobrancelhas.
Miguel balançou a cabeça, mas estava sorrindo um pouco.
- Já vão sair.
Fiz sinal para que Jodi e Brad esperassem e me sentei ali para aguardar. Estava observando Miguel misturar várias coisas em seu copo de barman, quando alguém veio falando atrás de mim.
- Cansou de me odiar e veio fazer uma visita? Ou só veio me odiar mais?
Olhei para trás. carregava o contrabaixo nas costas e usava uma camisa com a imagem do Charlie Parker estampada.
- Nem uma coisa nem outra. – O Olhei com desdém. – Tenho mais o que fazer.
- Tipo? – Ele se sentou ao meu lado.
Antes que eu respondesse, Jodi apareceu junto a nós.
- , será que uma das bebidas pode ser sem gelo? Brad tem dentes sensíveis. – Pediu. Então olhou para o lado. – Oi, ! – Cumprimentou.
- Jodi. – Ele sorriu. – Está mesmo saindo com o Brad, não está? – Se surpreendeu.
- Sim, estou! – Ela ficou vermelha. – Quer dizer, hoje é nosso primeiro encontro oficial.
- Vou me certificar de tocar algo romântico pra vocês – O garoto prometeu.
- Puxa, obrigada! – Jodi corou ainda mais.
- A bebida vai ser sem gelo, Jodi. – Cortei o assunto, querendo que sumisse dali logo. – Não se preocupe.
- Certo, obrigada. Vou voltar pra perto do Brad.
Jodi se afastou, voltando a sua mesa, e eu encarei .
- Esse era seu compromisso? Segurar vela para a Slaterton e o Winter? – Ele riu.
- Por que não cala a boca? – Franzi o cenho.
- As bebidas. – Miguel empurrou dois copos coloridos na minha direção, me observando cuidadosamente.
- Rainbow... – começou.
- Obrigada. – Eu disse alto, cortando-o, desci do banco e peguei os dois copos. – É melhor não me provocar hoje, . – Sussurrei para .
Levei os copos até a mesa e os coloquei em frente à Jodi e Brad.
- Nossa, parece delicioso! – Brad comentou.
- Espero que gostem. Se precisarem de qualquer outra coisa, podem me chamar. Eles vão atender ao pedido mais rápido se eu os fizer. Eu estarei lá no...
Fui interrompida pelo som do chiado de microfonia. Desviei meus olhos para o palco – assim como os dois. estava lá em cima. O contrabaixo havia sido substituído por um ukulele, o que foi muito surpreendente para mim, visto que eu nem sabia que ele tinha um, muito menos que sabia tocar. Fiquei paralisada por um instante e ele sorriu para mim. Eu tinha aquela paixão de infância por música havaiana e sabia disso.
- Boa noite, Roger’s. – Ele disse no microfone, começando a tocar. – Eu sou , contrabaixista da banda do Jack Pie. – Anunciou. Não havia quase ninguém no local, mas as pessoas que estavam lá tornaram sua atenção para ele.
- O é muito legal, não é? – Jodi suspirou. – Ele tem mesmo jeito de artista!
- Talvez ele pudesse se inscrever no American Idol! – Brad disse como se tivesse tido uma grande ideia. Jodi abriu a boca, encantada com aquela perspectiva.
Eu, no entanto, já estava irritada com de novo. Ele nunca cantava no Roger’s, e justo na noite em que eu estava tentando esquecer sua existência ele subia no palco com um maldito ukulele?
- Desde que a competição vá acontecer bem longe daqui, podem inscrevê-lo. – Murmurei, mas Jodi e Brad não pareceram escutar.
continuou falando:
- Eu gostaria de dedicar essa canção a um casal de amigos meus que está aqui essa noite, Jodi Slaterton e Brad Winter... – Disse, deixando os dois extasiados. – E também a minha namorada, Pie. – Deu um sorriso torto, e eu fiz uma careta.
Algumas pessoas bateram palmas e o som do ukulele ficou mais alto. Talvez eu já tivesse ouvido aquela música em algum lugar, mas não me lembrava realmente. A voz bonita de se espalhou pelo ambiente num instante, me obrigando a olhar para ele.
[N/A.: Caso vocês queiram ouvir, a música – com certeza vão querer – é essa aqui. E ela é ma-ra-vi-lho-sa].
Keep every promise, answer my calls
And I… I would never let you down, oh
If I were you, I would turn that car around
Come speeding back tonight
And I, I would wonder how
I got so lucky that I'm right here with you
If I were you… I'd know exactly what to do
And I would keep holding tight
And if you wanna go to sleep, I got a lullaby
I know exactly what to say
And I would do what you need
If I were you… I would fall for me
Yeah, I would fall for me
- Oh, não é romântico, ele dedicar essa música a você, ? – Jodi estava encantada.
Engoli em seco, prestando atenção a ela e Brad.
- Ele dedicou a vocês também. – Balancei a cabeça.
- Ah, mas você é a namorada dele! – Brad deu um gole em sua bebida. – Além disso, ele olha pra você o tempo todo.
Eles estavam errados, é óbvio. Era só uma música, nada mais. Não havia nada de romântico na atitude de .
Ou será que havia?
Voltei a olhar para ele, e estava tão absorta pela música que quase não ouvi meu celular tocar.
- , é o seu celular tocando? – Brad perguntou, e então ouvi o som baixinho.
- Ah, claro. Obrigada, Brad. – Sorri e me afastei para atender.
Quando já estava em um ponto isolado, perto do banheiro, olhei o visor. Era Summer. Eu atendi.
- Hey, Sum.
- Oi, . Tudo bem?
- Hanram. E você?
- Estou muito bem pra falar a verdade. – Riu um pouco. – Você por acaso está ocupada agora?
- Não realmente... Eu vim ao Roger's garantir que corresse tudo bem no encontro da Jodi e do Brad.
- Ah, é verdade! Deixa pra lá então, não quero estragar isso. Estou tão feliz por ela!
- Não, sério, pode falar. – Insisti, desconfiada daquela alegria toda. – O que você queria?
- Eu só ia perguntar se você não queria vir aqui em casa pra ver um filme. É que tem umas coisas que eu queria te contar, mas acho que posso esperar até...
- Não, nada de esperar! – Impedi autoritária. Summer se assustou.
- Tudo. Bem. – Disse pausadamente.
- É que... está aqui hoje, ele pode cuidar das coisas enquanto eu vou até aí.
- Se não tiver problema por ele, por mim está ótimo. Quer que eu te busque?
A simples ideia de assistir mais uma sessão de amigos-pra-sempre-de-novo de e Summer em pleno Roger's já me dava nos nervos o suficiente.
- Não, não precisa. – Dispensei. – Vou com o carro do meu pai. Chego em alguns minutos.
- Estou te esperando. – E então ela desligou.
Minha última ida à casa dos Olsen havia sido na noite do término de Summer e Junior, dias atrás. Não era eu quem estava dirigindo naquele dia, porém, me lembrava do caminho perfeitamente.
tinha tentado reclamar de ter que ficar cuidando do encontro de Jodi e Brad, mas fugi antes que ele o fizesse. Expliquei rapidamente a Jodi a situação, mas sussurrei em seu ouvido que estaria ali, se precisassem. Como tudo parecia estar correndo bem de qualquer modo, eu não achava que seria necessário, mas sabia que ela se sentiria mais segura assim.
Parei o carro em frente à casa branca e me aproximei da porta. Ela se abriu antes mesmo que eu tocasse a campainha.
- Summer? – Me surpreendi.
- Estava contando os minutos pra fofocar com você, Pie. – Ela abriu um enorme sorriso, me arrastando para dentro.
A casa por dentro era quase mais bonita do que por fora. Fez com que eu me perguntasse que espécie de salto na carreira os pais de Summer tinham dado para se mudarem para aquele lugar. Com certeza a vida deles devia ser mais simples quando viviam na rua de , visto que não havia nada luxuoso lá.
- Aceita um brownie? – Ela perguntou, andando rapidamente enquanto eu a seguia pela casa. – Ainda não coloquei a pipoca no micro-ondas.
- Não, obrigada. – Sorri educadamente. – Mas gostaria de um copo d'água.
- É pra já.
Fomos para a cozinha e esperei, tamborilando os dedos no balcão amarelo, enquanto Summer enchia um copo com água gelada. Bem na hora em que ela o estendeu para mim, uma mulher loura, magra e com o cabelo preso por alguns rolinhos entrou no recinto. Ela pareceu não notar nossa presença, indo até um armário. Summer olhou para mim e sorriu.
- Mamãe? – Chamou.
A mulher quase deu um pulo, assustada, e virou-se para nós.
- Summer, quase me matou. – Disse numa voz leve e segura. – Não sabia que tínhamos visita.
- Mãe, esta é a . Te falei dela, lembra? – Olsen falou. – A namorada do .
- Ah, claro... A namoradinha do . – A mãe de Summer me olhou com cuidado. Senti algo apertar em meu peito, como se ela estivesse olhando o fundo da minha alma de mentirosa. Ela estendeu a mão para mim. – Sou Susan. É um prazer, .
- O prazer é meu, senhora Olsen. – Forcei um sorriso.
- É engraçado... Nunca pensei que fosse voltar para assombrar Summer a essa altura da vida, mas de repente ela ficou sua amiga e veja só.
- Mamãe! – Summer a encarou feio. De repente, comecei a achar que Susan não gostava muito da amizade da filha com .
- Desculpe, querida. – Susan se recompôs. – Só quis dizer que eles se afastaram por tanto tempo... É mesmo uma surpresa que tenham voltado a serem amigos agora. Graças a você, . – Sorriu cordialmente. – Bem, estarei no jardim, se precisarem. Foi um prazer, meu bem.
A mãe de Summer saiu da cozinha e a garota rolou os olhos, irritada.
- Desculpe por isso. – Sum saiu andando. Eu a segui.
- Não, tudo bem. – Garanti.
- Ela gosta do , só não sabe demonstrar bem. – Explicou. – É só que ela meio que associou o fato de eu e Junior termos terminado a volta da minha amizade com ele. Ela adora o Junior, ficou devastada quando contei que tínhamos terminado.
Então Susan estava irritada com só por desconfiar de que indiretamente ele tinha provocado o fim do relacionamento de sua filha e Junior ? Mal podia esperar pelo que ela faria quando descobrisse a verdade sobre mim.
- Esse é o meu quarto. – Summer abriu uma porta branca.
Entrei meio sem jeito, e meus olhos se arregalaram.
- Nossa, é maravilhoso! – Exclamei encantada.
Havia uma grande cama forrada de branco, com algumas almofadas com estampas de bandeiras de países e outras prateadas. Placas de metal personalizadas com os nomes de diferentes cidades estavam na parede onde a cabeceira da cama estava encostada, e na parede do outro lado havia várias fotos. Havia uma estante de livros e CDs, havia flores e havia velas de incenso coloridas.
- É o meu cantinho. – Summer sorriu, entrando e fechando a porta. Ela foi até a parede oposta à cama e abriu um armário fino, que deu origem a uma TV ainda mais fina, colada à parede. – Eu quase nunca ligo isso. Foi ideia da mamãe colocá-la aqui. – Contou. – Vamos ver o filme por aqui mesmo.
- Uau. – Eu continuava impressionada. Depois fiquei com medo de estar parecendo uma caipira esquisita. – Quer dizer... Tá, tudo bem.
- Mas antes... – Ela largou o controle remoto de lado. – Tenho que te contar o que aconteceu. – Se jogou na cama. Eu me sentei também. Era inconcebivelmente fofa.
- Eu estava muito ansiosa pra saber. – Sorri curiosa. – Você parecia tão feliz ao telefone!
- E eu estou mesmo! – Ela sorriu de volta. – Acontece que... Estive na casa do Junior ontem.
Tive que trincar meus dentes para não grunhir, o que mais deixou parecendo que eu estava dando um sorriso assustadoramente alegre.
- É mesmo? – Perguntei. – Estou sem palavras. E aí?
- Ah, na real, não houve nada demais. – Summer deu de ombros. – Era aniversário da Lily, a irmãzinha dele, e a mãe deles ligou para me convidar. Acontece que não foi só minha mãe que ficou devastada com nosso término, sabe? Desde que eu e Junior começamos a namorar, nossas famílias se aproximaram muito. A Lily e a Gwen, minha irmã mais nova, até estudam juntas.
- Oh. – Assenti. – Entendi.
- Não rolou nada entre eu e o Junior, mas foi tão bom me sentir parte da família de novo, entende? Foi como se nunca tivéssemos terminado.
- É mesmo uma pena que a realidade puxe a gente pra baixo, no fim das contas. – Tentei soar um pouco desanimadora.
- Na verdade, ela não me puxou tanto assim dessa vez. – A garota deu um sorriso maroto.
- Como assim? – Fiquei confusa e nervosa de repente. – Pensei que não tinha acontecido nada.
- Ontem não, mas... Junior se aproximou de mim durante a festa. – Revelou. – E ele me convidou para ir à Praia das Ostras. Ele, Brad e tinham marcado de ir, e aí ele me chamou para ir também. – Ela agarrou as minhas mãos, ansiosa. – , a Praia das Ostras é onde ele me convidou para irmos ao nosso primeiro baile juntos. É um lugar tão importante para nós... Costumávamos ir até lá o tempo todo. Quer dizer, deve significar alguma coisa pra ele também, não é?
Engoli em seco, me forçando a voltar a sorrir:
- Deve. – Concordei. – Com certeza deve significar, Summer.
- Então... Sei que nosso plano tem estado meio congelado desde que praticamente te forcei a entrar para a torcida, mas acredito que esteja na hora de voltarmos a trabalhar nele.
- O que você tem em mente?
- Primeiro, eu imaginei que pudesse saber se Junior tem algum plano para o sábado, na praia, mas já percebi que você não sabe de nada. Não tem problema, ele deve ter decidido me chamar em cima da hora. Antes tarde do que nunca, já diria meu avô. – Deu de ombros. – Minha segunda ideia, era te convidar para ir também. Nunca se sabe quando se vai precisar de um empurrãozinho. Isso vale tanto para mim quanto para o Junior.
- Eu ia adorar dar um empurrãozinho. – Meneei a cabeça. Um empurrãozinho na reconciliação de vocês, e jogá-la direto no fundo do oceano.
- Ah, que maravilha! – Summer comemorou. – É bem possível que o Brad chame a Jodi também, quando souber que estamos indo, e talvez o queira convidar a Emma. – Ela ponderou. – Já sei. Você devia chamar o .
- Tenho certeza de que ele vai gostar da ideia. – Menti.
A porta se abriu e uma garotinha de cabelo louro na altura do queixo e pijama cor-de-rosa apareceu. Ela parecia Kelly, a irmã mais nova da Barbie.
- Summer? – Ela chamou, me olhando meio desconfiada.
- Gwen. – A loira sorriu. – Esta é , minha amiga.
- Oi, . – A garotinha cumprimentou.
- Oi, Gwen. Como vai? – Sorri.
- Aconteceu alguma coisa? – Summer quis saber.
- Eu tenho que ir pra cama cedo hoje por causa do concurso de soletração de amanhã, mas não consigo dormir.
- Oh, meu amorzinho, você só deve estar nervosa. – A mais velha a consolou. – Mas não se preocupe, vou ler uma estória pra você e logo o Homem do Sono vai vir fazer com que caia no sono.
- Vou escolher o livro. – A pequena sorriu, saindo do quarto.
Summer sorriu e balançou a cabeça, virando-se para mim.
- Isso só vai levar uns quinze minutos, ela é bem fraquinha. – Explicou. – Se importa de esperar?
- Não, sem problemas. – Sorri, me lembrando de quando mamãe me contava estórias para dormir. – Pode ir tranquila. Vou aproveitar pra ligar para o e saber como está indo o encontro da Jodi.
- Não se esqueça de convidá-lo para o sábado! – A garota lembrou colocando-se de pé.
- Pode deixar.
Summer saiu do quarto e eu fiquei ali, praguejando em português. Agora também havia famílias que se amavam tentando estragar meus planos. Será que eles não percebiam que Summer e Junior já tinham estendido aquele namoro por muito mais tempo do que deveriam? Francamente, os dois pareciam se dar melhor depois de terem terminado do que antes.
- Rainbow. – disse quando atendeu. – Decidiu voltar a falar comigo?
- Não. – Conferi se tinha alguém do lado de fora da porta. – Como está o encontro da Jodi?
- Muito melhor do que se esperaria que um encontro com Jodi Slaterton pudesse ser. – Ouvi a voz de dizer ao fundo.
- Ótimo. – Sorri satisfeita. – A propósito, vamos à praia com Brad, Junior, e Summer no sábado. E é possível que Jodi e Emma também estejam lá.
- Você ficou doida? – protestou. – Eu não vou a lugar nenhum.
- Não é uma excursão ao Tártaro, . – Rolei os olhos. – É um dia na praia.
- Olha, , eu simplesmente não quero ir, ok?
- Ele não sabe nadar! – A voz de disse ao fundo.
- O quê? – Franzi o cenho.
- Cala a droga da boca, ! – reclamou.
- Isso é sério? Você não sabe nadar? – Perguntei chocada. – Você mora nessa cidade com o nome BEACH desde que nasceu e não saber nadar?
- É irônico, não é? – Ouvi dizer.
- Cale a boca vocês dois! – nos cortou.
- Quer saber? Isso não importa. – Insisti. – Você não precisa nadar, . É só ficar na areia.
- Isso mesmo! – disse alto. – Eu também vou, se não se importarem. Se importarem também, na verdade.
- Era só o que me faltava. – bufou.
Ouvi passos no corredor e me apressei:
- Tenho que ir. Conversamos mais amanhã.
Bem quando encerrei a ligação, Summer entrou no quarto.
- Não é que ela caiu no sono ainda mais rápido do que de costume? – Ela comentou sorrindo. – E então, falou com o ?
- Sim, eu falei. – Assenti. – Ele adorou a ideia.
Coloquei meu chapéu boho e passei um pouco mais de protetor solar no nariz, já que ele adorava descascar depois de longas exposições ao sol.
- Prontinha. – Sorri para o espelho. Stevie latiu. – Desculpe, bebezão, você não pode ir dessa vez.
O cachorro grunhiu e saiu do quarto a toda. Peguei minha bolsa sobre a cama e segui o mesmo caminho, descendo alegremente as escadas. Quando cheguei lá embaixo, estava sentado no sofá, usando uma regata e assistindo os desenhos matinais do sábado. Sua cara não estava muito melhor que a de Stevie.
- Ah, vamos lá. Não fique com essa cara. – Tentei animá-lo. – Vai ser divertido.
- Claro que vai. – Ele deu um sorriso irônico. – Eu, Junior e as piscinas naturais da Praia das Ostras.
- Você não precisa ir para as piscinas fundas e nem precisa ficar de namorico com o , . Não precisa nem falar com ele. – Ressaltei. – Você vai ver, isso não vai ser nada assustad... AHHHH! – Me virei bem enquanto falava, e meu grito interrompeu o resto da frase. – ! Mas que porcaria é essa?!
estava com as maçãs do rosto brancas de tanto protetor solar, usando um chapéu de pescador azul.
- Minha pele é muito sensível ao sol. – Ele respondeu apenas, erguendo uma garrafinha de suco e dando um gole. – O que ainda estamos fazendo aqui? Vamos logo.
Seguimos para o lado de fora – ainda emburrado – a caminho do carro de .
- Por acaso a Amber também vai hoje, ? – Eu quis saber.
- Não, por isso estou aqui. – Ele sorriu, jogando-se dentro do carro.
- Levou a vida toda pra conseguir chamar a atenção de uma garota e agora está fugindo dela? – franziu o cenho, ligando o carro.
- Aprendi que temos que tomar muito cuidado com nossos desejos, . – disse em uma voz séria. – Uma garota como Amber pode deixar um homem maluco de várias formas. Nem todas são positivas.
- Eu bem que avisei. – Dei de ombros. – , sabe chegar lá?
- Sei, sim.
- Bom, porque os outros já estão nos esperando. – Dei um sorrisinho sem dúvida irritante, e o garoto rolou os olhos, arrancando com o carro.
- Uau! – Eu disse pela quinta vez. Era tudo que eu conseguia dizer desde que chegamos ali.
- Como se você nunca tivesse visto o mar. – provocou.
- É que é tão bonito... – Suspirei. – Por que mesmo nunca viemos aqui? – Questionei. me lançou um olhar mortal. – Ah, claro. Desculpe.
A Praia das Ostras era grande, e àquela hora já tinha uma quantidade razoável de pessoas – o que nunca acontecia em Jacksonville Beach. O mar era de um azul esverdeado forte e as ondas quebravam suavemente. As piscinas naturais de que me falaram não estavam à vista. Elas ficavam do outro lado das pedras que ladeavam a praia – duas de um lado e a terceira, a maior, do outro.
- Pronto, podemos ir. – se aproximou de nós com um sorvete na mão.
- Não dá pra acreditar que acabou de botar os pés aqui e já está comendo. – ergueu as sobrancelhas.
- Praias me dão fome. Você sabe. – O outro disse com displicência.
- , onde eles estão?
- Vou ligar para a Jodi e descobrir. – Procurei o telefone na bolsa.
- Acho que não vai precisar. – Meu namorado de mentira apontou.
Levantei os olhos e sorri ao avistar Emma acenando. Ela correu em nossa direção. Estava usando um biquíni verde e um short jeans.
- Ei, pessoal! – Ela cumprimentou. – Que porcaria é essa na sua cabeça, ?
fez uma careta, mas não respondeu.
- Não tinha certeza se você vinha. – Eu disse.
- me convidou. – Ela explicou. Dei um sorriso sugestivo. – Não, Pie! Cala essa boca! Eu só estava a fim de sair.
- Com o ? – Dei risada.
- Sério, se me provocar, eu te afogo. – A garota ameaçou. – Agora vamos, os outros já estão lá.
Seguimos Emma pela praia. Minha piadinha me lembrou, de repente, da presença de ali naquele dia. Quase tinha me esquecido de minha ridícula fuga ao colocar seu nome na minha mentira. Preocupada, me aproximei de .
- . – Eu disse em voz baixa. – Como andam as coisas com Miguel? Ele disse alguma coisa perto do ?
O garoto balançou a cabeça, conferindo se o amigo olhava para nós. Não olhava.
- Não. Ele não falou muita coisa sobre nada na quinta, na verdade. Estava quase mais esquisito que de costume.
- Excelente. Melhor assim. – Assenti.
- Mas o ficou meio desconfiado quando me viu puxando assunto com ele. – Informou. – Ficou me olhando com aquele cenho franzido, você sabe.
- Sei bem! – Sorri presunçosa. – A cara-de-quem-não-está-enxergando-à-distância. Ele sempre faz isso quando não está entendendo alguma coisa. É quase tão perigosa quanto a cara-de-quem-está-prestes-a-explodir.
- Essa é quando ele infla as bochechas? – ficou na dúvida.
- Não. Quando ele infla as bochechas geralmente é a cara-de-socorro-o-que-eu-vou-fazer? Quando está prestes a explodir ele fecha a cara, olha pro nada. A tensão no ar fica tão grande que parece que ele vai te matar.
- Cara, isso é muito verdade!
- Nosso garoto é fácil de ler. – Ri um pouquinho, observando de costas.
- E quanto àquela cara ali? – indicou com a cabeça. – Já aprendeu a identificar?
tinha parado de andar. Adiantei um pouco o passo para ficar ao seu lado. O rapaz estava sorrindo tão inocentemente que parecia uma criança. Segui seus olhos e encontrei Summer, acenando de longe.
Engoli em seco, me forçando a não sentir aquele incomodo infundado. Agarrei a mão de , que me olhou surpreso, sorri para ele e acenei para ela também.
- Nós acordamos mais cedo porque queríamos ter certeza de encontrar um lugar legal. – A loira contava enquanto nos levava para perto dos outros.
- E conseguiram? – perguntou.
- Vocês é que vão dizer. – Ela deu um sorriso instigador, apontando para Jodi, Brad e sentados preguiçosamente debaixo de um guarda-sol chique estampado. , que estava de fora do time pelos próximos dias, ainda tinha o tornozelo enfaixado.
Nos aproximamos dos três, que sorriram alegremente.
- Pessoal! – Jodi cumprimentou. – Finalmente chegaram!
- Olhe só, . – Summer me puxou pela mão alguns passos. – Ficamos aqui porque logo ali é a piscina média. – Ela apontou para uma pequena elevação rochosa a alguns metros. – E também a pequena, mas é mais para crianças mesmo.
- Talvez queira ficar nessa. – lambeu seu sorvete. o olhou feio.
Sorri e rolei os olhos, tentando desviar o assunto para algo que me interessava mais.
- E então, Sum, onde está o Junior?
- Ele tinha ido dar um mergulho. – Ela ponderou. – Ah, lá está ele!
vinha do mar, passando a mão pelo cabelo para se livrar do excesso de água. Tive que me controlar bastante para não dar um longo suspiro. A visão de sem camisa ainda era tão divina quanto eu me lembrava. Não encarar era basicamente impossível.
- Sua bff acabou de chegar. – Emma ergueu as sobrancelhas para Junior, dando um passo enojado para o lado quando percebeu sorrindo para ela.
- Vicentini. – Junior me deu um sorriso torto. – Faz tempo que não nos encontramos nessas condições.
- É, engraçado, né? – Improvisei um sorriso amistoso, me obrigando a olhar em seus olhos. – Jacksonville Beach está cheia de praias.
- De fato. – concordou. – Mas você nunca quis sair com a gente.
Era ridículo pensar que eu realmente poderia sair com eles sem que um plano maléfico estivesse envolvido. Ainda assim, decidi apenas concordar.
- Falta de tempo. – Menti. – Bom, vamos nos acomodar?
Todos começaram a falar ao mesmo tempo, enquanto eu estendia minha canga a poucos centímetros das outras. armou o guarda-sol de forma que só parte da sombra cobrisse meu espaço, e então se sentou.
- Ah, eu estou morrendo de sede. – Summer comentou. – Vou até ali comprar uma água. Alguém quer?
- Quero é alguma coisa pra comer. – disse. – Me ajuda aqui, .
ajudou o amigo a se colocar de pé e os três seguiram, junto de Brad, até o quiosque perto de onde estávamos. Emma e Jodi foram dar um mergulho na piscina, de modo que eu, e ficamos sozinhos.
- Cara, conseguem pensar em algo mais incrível do que Summer Olsen de biquíni? – admirava a garota se afastar. – É como se Afrodite tivesse encarnado em Jacksonville Beach.
- Obrigada pela parte que me toca. – Resmunguei, puxando o vestido pela cabeça e revelando meu biquíni colorido. – Além disso, eu consigo imaginar sim, porque não sou um cara. – Dei um sorriso malcriado.
- Ah, , não se preocupe, você também é muito gata. – levantou um polegar e balançou a cabeça em aprovação. – Não é verdade, ?
não respondeu e olhamos para ele, que me encarava com a boca levemente aberta, pensando em sei lá o quê.
- Dá pra ver que ele concorda, não é? – me lançou um olhar sugestivo, me deixando sem jeito, e então acordou do transe, balançando a cabeça.
- O quê? – Ele perguntou. Depois olhou para mim de novo e inflou as bochechas. – Eu... Preciso comprar um sorvete. – Se colocou de pé num segundo. – E dar um mergulho. No mar. Não nas piscinas.
- Sorvete? O pessoal está logo... – apontou, mas negou com a cabeça, ficando de pé.
- Mais longe. – Ele disse enfaticamente. O olhamos com ar de interrogação. – Eu quero o sorvete do começo da praia. – Insistiu. – , você vai querer que eu traga um?
- Eu? – Não estava entendendo nada do comportamento maluco e urgente de , mas eu é que não ia me meter. – Não, estou bem. Vou ficar com as men...
- Tudo bem então! – Concordou antes que eu terminasse.
Em menos de um segundo, estava andando a toda velocidade rumo ao começo da praia, de onde tínhamos acabado de sair. Eu estava mais confusa do que quando papai guardara o leite no armário e o achocolatado na geladeira.
- Melhor não me perguntar nada! – levantou as mãos quando olhei para ele.
- E não ia mesmo! – Garanti. – Estou indo pra piscina.
Às vezes, me deixava realmente, realmente intrigada. Mas aquele não era o momento para essa isso. Eu não estava ali por causa dele. Enquanto eu subia o solo rochoso rumo à piscina média, acenou para mim do bar onde estavam, erguendo uma sobrancelha. Dei de ombros, sorrindo inocentemente. Esperava que a visão de Vicentini em um biquíni trouxesse milhares de dolorosas lembranças a ele.
POV
Andei o mais rápido possível para longe dela. Quase corri. Precisava me afastar para voltar a pensar de forma coerente.
Quando finalmente eles tinham sumido de vista, parei.
- Mas qual é a droga do seu problema, ?! – Perguntei a mim mesmo em voz alta. Uma garotinha que passava por perto me olhou como se eu fosse um maluco, e então saiu correndo. – Agora também assusto criancinhas. – Balancei a cabeça, envergonhado.
- ! – A voz conhecida chamou. – , espera aí!
Olhei para trás e encontrei , vindo em minha direção com aquele chapéu ridículo.
- Não pode ter vindo atrás de outro sorvete. – Eu disse incrédulo.
- É óbvio que não! – O garoto se defendeu, ofendido. – Vim pra saber o que há com você. Que loucura foi aquela?
- É só que... – Suspirei, olhando as ondas quebrarem. – A cada dia que passa, fica mais difícil ficar perto da .
- Bem desconfiei que fosse algo do tipo. – Ele deu de ombros com uma cara de comiseração.
- Antes, quando a coisa era só platônica, era diferente. Mas desde que a gente começou a ficar se beijando por aí, tem esse turbilhão na minha cabeça. – Fechei os olhos. – Na maior parte do tempo, estamos fazendo alguma outra coisa, então eu fico legal. Geralmente, quase esqueço toda essa maluquice, e aí ficamos como amigos normais, fazendo coisa de gente normal. Mas às vezes, quando não estamos necessariamente ocupados com nada, eu começo a pensar demais, e quando dou por mim estou quase beijando ela. – Joguei a cabeça para trás e bufei.
- E talvez você devesse mesmo fazer isso, . – colocou as mãos na cintura. A ideia era soar incentivador, mas com aquele protetor solar e aquele chapéu azul, só parecia ridículo.
- Ela ia ficar maluca... – Soltei o ar numa baforada. – Se achasse que eu estou levando isso a sério.
- Ela já é maluca, . – Ele sorriu de um jeito um tanto quanto crítico, apertando de leve meu ombro. – E você também vai ficar, se ficar se matando pra esconder o que sente.
- É, mas...
- Cara, sem forçar a barra! – Tentou me acalmar. – Por que você não só... Vai chegando nela aos poucos e tal? Tenta descobrir se ela não está meio a fim de você também.
- Acha que ela pode estar? – Perguntei com uma ponta de expectativa.
- Ela ficou com ciúmes da Rosana Wayans, não foi? Foi o que pareceu pra mim.
- É, ela meio que ficou sim.
- Então aí está sua chance! – Exclamou. – Vamos descobrir de quem Pie realmente gosta. Do artilheiro ou do músico.
Apesar da perspectiva de que a resposta fosse a segunda opção, eu ainda tinha um pouco de receio de descobrir.
POV PIE
Mergulhei e atravessei a piscina, emergindo perto de Emma e Jodi.
- Ah, esse lugar é maravilhoso! – Dei risada, feliz.
- Quase tanto quanto o namoradinho da Jodi sem camisa. – Emma ergueu as sobrancelhas. – Por Deus, você viu aquilo?
- Emma! – Jodi repreendeu, sem jeito.
- Pra falar a verdade, eu sempre achei o Brad um gato. – Confessei. Jodi ponderou por um instante, mas sorriu.
- Ele é bonito mesmo, não é verdade? – Ergueu os ombros.
- Sério, Jodi, diga que vocês já deram uns amassos. – Emma disse séria. – Diga agora ou eu mesma agarro ele.
- Bom, na verdade, já sim. – A baixinha admitiu.
- Grande Jodi Lyn! – Eu ri, cutucando-a por baixo d'água.
- Foi com num sonho. – Ela suspirou. – Mas aí minha mãe saiu de dentro de casa com uma touca na cabeça e uma vassoura. – Balançou a cabeça e fechou os olhos. Tive que me segurar para não rir, imaginando quantas piadas e poderiam fazer sobre o ocorrido.
Ouvimos um splash vindo do outro canto da piscina, e logo Summer emergiu perto de nós.
- Ei, meninas. – Ela disse. – Do que estão falando?
- Da dona Slaterton aparecendo bem quando Jodi e o Winter estavam dando uns amassos. – Emma a atualizou.
Summer ergueu as sobrancelhas e abriu a boca, surpresa.
- Certo, eu definitivamente quero saber sobre isso. – Avisou. – Mas agora, , você tem uma missão.
- Fale mais. – Ergui uma sobrancelha, sorrindo.
- Junior está comendo uma porcaria qualquer com e Brad lá embaixo, mas logo vai vir pra cá. – Disse. – É uma excelente hora pra você descobrir se ele está planejando alguma coisa pra hoje. E sobre ele ter me convidado pra vir e tal. Enfim, o que está se passando pela cabeça dele.
- Vou ter uma conversinha com ele. – Prometi.
- Talvez seja melhor deixarmos os dois sozinhos pra ele falar. – Jodi opinou.
- Ótimo, Jodi. – Sum concordou. – Vamos lá embaixo tomar um banho de sol então. Depois você me conta tudo, .
- Sim, capitã, minha capitã! – Bati continência.
As três nadaram até a borda rochosa e saíram da piscina. Imaginando o que faria quando Junior chegasse, flutuei por alguns minutos de costas, com os olhos fechados.
- Vejam só o que encontrei. – A voz conhecida disse.
Abri os olhos e encontrei os olhos de me encarando. Seu rosto bloqueava o sol do meu, e havia um sorriso em seus lábios.
Tomei um leve impulso e fiquei de pé. A água batia logo abaixo do meu peito.
- Oi, . – Cumprimentei.
- Fico feliz de te encontrar aqui. – Ele disse. – Estava ansioso por te dizer que adorei esse biquíni.
- É mesmo?
Nadei para longe dele, para o muro de pedra onde as ondas batiam e acabavam por encher a piscina. me seguiu.
- Sinto falta de quando íamos à praia juntos. – Admitiu. – Eu, você, , Sofia.
- Pode ter certeza de que Sofia não sente sua falta nem um pouco. – Dei uma risada baixa.
- O que disse?
- Nada. – Balancei a cabeça, me virando então para ele. – Convidou Summer para vir hoje, não é? Boa jogada.
- Sabe muito bem que a Summer é parte da minha vida, e ainda não decidi qual parte. Além disso, o que você queria? – O rapaz estava calmo até então, mas pareceu ficar na dúvida. – Você só anda com o . Eu não ia te chamar pra passar o dia tendo que ver vocês dois juntos.
Me aproximei alguns centímetros. Os olhos de se desviaram para minha boca.
- Te incomoda tanto assim me ver com ele? – Sussurrei.
- É difícil explicar o quanto. – Ele respondeu no mesmo tom.
Abri um sorriso então, dando de ombros.
- Bom, é uma pena. – Dei um passo para o lado. – Porque enquanto ele for meu namorado, vai ter que aguentar.
Mergulhei e nadei rumo à borda da piscina. Quando cheguei à rocha, acenei para Junior, que me lançou um sorriso malicioso. Brad apareceu de pé na rocha, logo atrás de mim, ajudando a se equilibrar.
- Veio nadar, ? – Questionei.
- Não, só quero ficar sentadinho perto dos meus amiguinhos. – Ele disse quando Brad o ajudou a se abaixar no solo rochoso.
- Já está saindo, ? – O rapaz perguntou.
- Ah, já estou sim, Brad. – Sorri para ele, que me deu a mão para me ajudar a sair. – Preciso falar com meu namorado. Você o viu? – Perguntei em voz alta, e vi balançar a cabeça.
As meninas estavam tomando sol quando desci. Jodi e Summer, deitadas em cangas, e Emma sentada numa cadeira dobrável lilás. Não havia sinal de ou .
- Puxa, está calor mesmo, não é? – Parei de pé perto delas, deixando que o sol me ajudasse a secar. – Mas a água está ótima.
- Já está de volta? – Summer ficou surpresa. – E aí? Alguma informação?
- Ah, isso. – Ponderei. – Bem, ele disse que você ainda faz parte da vida dele.
- Jura? – O rosto da loura se iluminou. Ela apertou a mão de Emma, que sorriu.
- Sim. – Confirmei. – Mas também disse que não sabe que parte você é. – Contei. Não havia necessidade de ficar mentindo para Summer. Junior por si só já era bem desencorajador.
- Ah, tudo bem. – Ela fez uma careta, mas deu de ombros. – Já é alguma coisa.
- Com certeza é. – Forcei um sorriso. – Alguém viu o ? Ele estava aqui quando eu saí. E o tinha ido comprar sorvete.
- Não faço ideia de onde aquele esquisito do foi. – Emma estremeceu. – Viram aquilo na cabeça dele? Fala sério.
- Acho que é um garoto muito meigo, se quer saber. – Summer o defendeu.
- Ah, não são eles lá? – Jodi perguntou, levantando seus óculos de gatinho.
Me virei para o outro lado, de onde vinham os dois garotos. tinha outro sorvete nas mãos. tinha tirado a camisa, e a trazia pendurada no ombro. O cabelo estava molhado.
Ok. Eu tinha que admitir que aquela era uma bela visão.
Qual é? Eu nunca tinha visto sem camisa? Era difícil de acreditar. Ele dava banho em Stevie toda semana; às vezes eu até o ajudava. Mas pelo visto, ele sempre fazia isso vestido, e ao que parecia, ele deveria fazer sempre sem camisa.
Eu não fazia ideia de que ser babá de dálmatas e tocar contrabaixo e ukulele poderiam conceder a dádiva da definição corporal a alguém.
Estava tão impressionada com aquilo que nem percebi que eles já estavam perto demais.
- Foi mal pela demora. – disse tomando o picolé das mãos de e o entregando para mim.
Engoli em seco, tentando agir normalmente ao pensar na cara que Sofia faria se me visse naquele momento.
- Valeu. – Sorri.
Emma assobiou, dando um sorriso malicioso para .
- , . – Ela disse. – Ainda melhor do que da última vez que te vi sem camisa, tanto tempo atrás.
pareceu entender do que ela falava, por que ficou sem jeito na hora.
- Qual foi a última vez? – Eu quis saber. Jodi se sentou na canga.
- Ah, foi no primeiro ano, quando... – Começou.
- PACTO! – Emma e gritaram ao mesmo tempo.
Jodi parou de falar e rolou os olhos.
- Deixa pra lá. – Disse pra mim.
Summer riu, se sentando também.
- , Amber por acaso sabe que você veio hoje? – Perguntou.
- Achei que seria melhor se não soubesse. – Ele se sentou ao lado da loira. – Sabe como é, relacionamentos saudáveis precisam de espaço para as duas pessoas.
- Concordo plenamente. – Ela sorriu, tirando o chapéu azul da cabeça dele e colocando na própria. Virou-se para Emma então. – Não parece tão terrível agora, não é?
- Até uma melancia ficaria bem na sua cabeça, Olsen, não se faça de boba.
Os outros estavam conversando, e se virou para mim.
- Quer dar uma volta? – Chamou. Levei um segundo para processar.
- Claro. – Assenti.
- Eu pensei que você ia tomar um sorvete. – Observei enquanto andávamos, mordendo o último pedaço do meu picolé.
arregalou os olhos, como se tivesse sido pego de surpresa. Depois sorriu. Não entendi a reação.
- Ah, eu tomei no caminho de volta. – Explicou. – Era de chocolate.
- Hum. – Meneei a cabeça. – Você parece mais calmo, sabe? Mesmo estando perto de toda essa água.
- Não estamos perto da parte da água que realmente me assusta. – Ele ergueu as sobrancelhas e eu ri, correndo para jogar o palito de picolé numa lixeira próxima e depois voltando.
, que estava em cima da pedra, estendeu a mão para me ajudar a subir.
- Desculpe por rir de você. – Pedi. – Não é por mal. Só achei irônico.
- Até eu acho. – O garoto suspirou.
Tínhamos chegado a outro lugar. Era a outra piscina, a menor. Havia várias crianças e pais brincando ali.
- Tá. Agora você está realmente desafiando meu autocontrole. – Olhei para ele prendendo o riso.
- Você não sabe cantar e eu não encho seu saco. – deu de ombros.
Eu o segui até entrarmos na piscina. A água ali batia pouco acima do meu joelho, mas parecia ser mais rasa do outro lado. se sentou.
- Eu costumava vir aqui quando era moleque. – Disse. Me sentei ao lado dele.
não vivia falando sobre sua infância, e como eu era muito propensa a falar besteiras, preferi não dizer nada. Só fiquei ali, quietinha junto dele, observando as crianças brincando. Por um instante, imaginei um de seis anos correndo por ali, com a mãe e o pai por perto. Será que ele tinha uma janelinha no lugar do dente da frente? Será que tinha medo de monstros marinhos? Porque eu tinha, quando era pequena. Talvez ele já tivesse brincado com a Summer de seis anos ali, também.
- Sinto muito por ter te chateado com essa história de ser professor da Summer. – O garoto disse então, como se estivesse lendo meus pensamentos. Eu apenas olhei para ele, surpresa. – Mas eu queria que você entendesse. O que eu sinto por ela é como o que você sente pela Sofia. Se vocês tivessem se afastado e de repente surgisse a chance de serem amigas de novo, você não tentaria?
- Acho que sim. – Ponderei, mesmo tendo certeza absoluta de que tentaria. A verdade é que eu entendia o lado de , entendia desde o começo. Mas ainda não gostava da ideia. Por causa do plano, é claro. De todo modo, era uma escolha dele, não minha.
- Não está mais brava comigo então? – Ele abriu um sorriso curioso.
- Não realmente. – Não havia necessidade de dizer que eu nunca conseguia ficar irritada com ele por muito tempo.
afundou mais na água, olhando para frente ao dizer:
- Ótimo, porque eu ainda tenho um trabalho para apresentar com a Rosana.
Certo, não era por isso que eu o tinha desculpado.
Tencionei o maxilar, mas fiz o possível para não demonstrar incomodo.
- Tudo bem. – Dei de ombros.
olhou para mim por um instante, estudando minha expressão de displicência.
- Você não gosta mesmo nem um pouco dela, não é? – Indagou.
- Eu só não entendo o que você vê nessa garota! – Deixei escapar, movendo as mãos enquanto falava, como a boa meia-brasileira que eu era. – Sério, ela tem aquela bunda, mas, fala sério...
- Meu Deus, Rainbow, o que a Rosana te fez? – estava rindo muito agora, o que só me deixou mais nervosa. – Ela só é legal comigo.
- Não, ela dá em cima de você, o que é diferente. – Corrigi.
- E qual é o problema com isso? – Ele apoiou o cotovelo no joelho e pôs a mão sob o queixo, me encarando com uma expressão divertida.
- O problema é que ela nem faz o seu tipo, ! Por Deus. – Eu queria controlar meus ânimos, mas não conseguia.
- Qual seria o meu tipo? – O rapaz me encarou, esperando.
- Uma garota que goste de música, e de animais. – Listei, me lembrando de como Wayans tinha medo de Stevie. – E que seja engraçada, pra te fazer rir quando estiver todo emburrado. – Sorri. Percebi que me encarava com uma sobrancelha erguida. – Por fim, alguém que não dê em cima de um cara que já tem namorada. – Finalizei rapidamente.
- Tirando, é claro, o fato de que eu não tenho namorada. – Ele provocou.
- Mas ela não sabe disso, não é? E também, nunca te procurou antes de eu chegar. – Ergui as sobrancelhas, e ele deu de ombros.
- É verdade, ela não sabe. – Olhou bem para mim. – Às vezes até eu me esqueço de que é mentira.
Não consegui deixar de encará-lo de volta. Por mais tempo do que deveria, talvez.
- Ei, casal! – Alguém gritou, nos dando um susto.
Olhei para trás e vi Summer, de pé no alto da rocha. Ela sorria.
- Estamos indo dar uma voltar na feira artesanal da orla. – Ela explicou. – Vocês querem vir?
- Claro! – Eu disse rapidamente, ficando de pé. Subi na pedra primeiro e ajudei a subir depois.
Preferi dizer para mim mesma que tinha ficado aliviada pela chegada da garota, mas a verdade era que parte de mim queria ter continuado ali para descobrir o que aconteceria a seguir.
A feira se estendia ao longo da orla da praia, cheia de barraquinhas com coisas que iam de bijuterias à comida e vasos artesanais. Havia pessoas por todo lado. Summer estava olhando alguns artesanatos em argila, enquanto Jodi e Emma comentavam animadamente sobre o rapaz bonito que passara. e falavam com Brad sobre o próximo jogo, e e tinham ido ver se a piscina maior – o grande pesadelo de – estava muito cheia.
Eu caminhava tranquilamente sozinha quando algo chamou minha atenção. Era uma barraquinha com colares, pulseiras e brincos, que estava sendo cuidada por um homem talvez um pouco mais velho que papai, e que lembrava o próprio Jack.
- Bom dia, mocinha. – Ele sorriu por baixo de um chapéu muito mais descolado que o de .
- Olá. – Sorri, diminuindo o passo.
Meus olhos encontraram por acaso uma pulseira macramê amarela, que me lembrou justamente da pulseira que eu tinha roubado de , e que depois ele me dera de verdade, embora a dele fosse marrom.
- Quanto custa essa pulseira? – Perguntei.
- São três dólares. – O homem se aproximou.
- Eu vou levar. – Peguei o dinheiro na bolsa e o senhor colocou a bijuteria num saquinho, estendendo-o para mim.
- Seu namorado vai gostar muito. – Ele comentou.
- Como sabe que é para o meu namorado? – Me surpreendi.
- Pode não parecer, mas tenho muitos anos nas costas, querida. – Ele sorriu. – Conheço um jovem apaixonado quando vejo. Vi seu sorriso quando a escolheu. – Apontou para o pacotinho.
Sem saber bem o que dizer, apenas sorri.
- Obrigada. – Eu disse.
- Volte sempre.
O velho voltou a se sentar e eu balancei a cabeça, deixando para lá o comentário dele. Apressei o passo e alcancei os garotos.
- Ei. – Segurei o braço dele.
Os três se viraram para mim e sorriram, sem parar de andar. Eu os acompanhei.
- Pra você. – Estendi o pacotinho para .
- Pra mim? – Ele me olhou desconfiado, tirando a pulseira do embrulho. O rapaz sorriu, mas pareceu sem jeito. – Não precisava, Rain.
- Quando começamos nossa farsa, você disse que eu arcaria com os gastos se te obrigasse a ir a algum lugar que não fosse da sua vontade. – Falei a uma altura que Brad não ouvisse.
- Ótimo, então você também me deve um sorvete. – comentou despreocupadamente sem olhar para mim, fechando a pulseira no braço. Eu rolei os olhos e o empurrei, mas ri.
Brad parou de andar, apontando para a areia.
- e Junior estão voltando! – Disse.
Logo as meninas estavam ao nosso lado. Os dois garotos – mancando – se aproximaram de nós com uma cara de poucos amigos.
- O que houve? – Summer foi quem perguntou.
- Não nos deixaram ver a piscina. – contou. – Na verdade, nem chegar perto dela.
- Mas por quê? – Jodi quis saber.
- Pelo visto, a piscina maior foi reservada para a realização de uma gincana hoje. – explicou.
- Mas que porcaria de desculpa é essa? – Emma se enfezou. – Acordamos cedo pra vir pra cá, não podem nos impedir de entrar. – A garota saiu andando.
- Emma, aonde você vai? – Perguntei.
- Ensinar esses babacas a não estragarem meu final de semana. – Ela respondeu sem parar.
- Essa garota é mesmo de matar! – riu, encantado.
Seguimos Emma – que estava furiosa – com medo de que algo acontecesse. Quando nos aproximamos do local onde ficava a tal piscina, percebemos certa aglomeração. Várias pessoas com uma camisa laranja onde se lia "Hot Weather Radio" circulavam com objetos, e dava para ver que havia um local cercado, de modo que não podíamos enxergar lá dentro.
- Ei, você! – Emma foi logo dizendo.
Um homem careca de bigode se virou para ela, encarando-a com certo desdém.
- O que foi? – Ele perguntou.
- Por que diabos barraram a piscina? – Ela inquiriu. – Eu e meus amigos viemos de Jacksonville Beach para nadar nela!
- É uma pena. – O homem disse com displicência. – Hoje a piscina foi fechada para receber uma das provas da gincana que a HWR está realizando. – Ele apontou para a camisa.
- E que droga de gincana é essa?
Uma moça com um microfone auricular apareceu ao lado do homem.
- É uma gincana para comemorar o período de volta as aulas. Estamos algumas semanas atrasados, mas quem liga? Jovens adoram essas coisas. – Suspirou alegremente.
- Quem está participando desse troço? – quis saber.
- Qualquer um pode participar. Basta estar em uma equipe. Podem formar uma, se quiserem. Vocês são muitos. – Ela explicou.
- E qual é o prêmio dos vencedores? – Brad perguntou.
- Ah, é maravilhoso! Um almoço completo pago para a equipe inteira no Jay's Lobster. Devem conhecê-lo, é o restaurante mais famoso da cidade.
- Como nos inscrevemos nesse negócio? – perguntou, tomando a frente de todos.
- É só entrar na fila. – O careca deu um sorrisinho debochado para Emma.
Olhamos para o lado e vimos uma enorme fila de pessoas, que se inscrevia ao passar por algumas pequenas mesas onde estava o pessoal da HWR.
Emma fez uma careta, mas tratou de voltar a encarar o homem com um sorrisinho cínico.
- Te vejo quando for pagar meu almoço, careca. – Ela disse antes de sair, e ele só faltou cuspir fogo.
Depois do que Emma fez, não tivemos escolha se não entrar na bendita gincana. Não que estivéssemos reclamando. Parecia que seria divertido, e Jodi tinha me contado animadamente que todo mundo na região já tinha pelo menos ouvido falar do Jay's Lobster.
parecia obcecado pela ideia de ganhar. De repente, ele parecia um maluco com complexo de grandeza, o que piorava com o fato de Summer realmente estar levando a sério o papel de liderança autoproclamada dele.
- Eles simplesmente me mandaram voltar pra fila! – Ele exclamou indignado, depois de voltar do balcão. O que já era de se esperar, porque não estávamos nem na metade do caminho. – Equipezinha ridícula. – O garoto resmungou, falando alto para eles em seguida: – ONDE PENSAM QUE VÃO CHEGAR NA VIDA SEM NENHUM INFORMATIVO DECENTE?
- Eles não contaram nada? – Summer perguntou decepcionada.
- Nada, estamos a ver navios. – reclamou. – Como vamos escolher quem é adequado para cada prova se não sabemos quais são as malditas provas?
- Não importam as provas, vou ganhar e esfregar minha lagosta na cara daquele careca. – Emma afirmou em meio a uma série de alongamentos.
- Com essa boa forma, eu não duvidaria de você nem por um segundo, boneca.
Olhamos para o grupo à nossa frente, de onde um cara alto e bronzeado sorria para Emma. A garota arqueou uma sobrancelha, dando um sorriso malicioso.
- Bem, não sei quem você é, mas está certo em não duvidar. – Ela disse.
- Brendan Campbell, ao seu dispor. – Ele estendeu a mão, que Emma segurou, e beijou a dela.
- Emma Hughes, a garota que vai acabar com vocês.
- Quem sabe você não prefere se juntar ao nosso time agora, doçura? – Ele olhou de soslaio para nós. – Sem dúvida estará acompanhada dos verdadeiros campeões.
- Pode ser bonito, mas não é nada esperto se acha que pode nos vencer.
- Então me acha bonito? – Brendan arqueou uma sobrancelha.
bufou ao meu lado, e só então reparei que seu rosto já estava vermelho de raiva. Mal-humorado, ele mancou até .
- , no seu manual da vitória por acaso não tem nenhuma regra de não confraternizar com o inimigo?
, até então apenas levemente incomodado diante do discurso de Campbell, pareceu cair na real e voltar a assumir o papel de chefe de batalhão.
- Ei, o está certo! – Ele foi se aproximando e puxando Emma de perto de Brendan. – Nada de confraternizar com o inimigo, Hughes! – Ordenou. Emma o olhou de cara feia. – E você, fique longe da minha equipe! Pelo menos até o momento em que for nos entregar pessoalmente o troféu de campeões.
- Desafio aceito, Grilo Falante. – O garoto o olhou em tom de desafio e voltou para seu lugar.
ajeitou seu chapeuzinho azul – o motivo do apelido – na cabeça, e nos puxou para uma roda.
- Certo, equipe, estamos falando de um desafio! Agora definitivamente temos que ganhar esse negócio!
- Sabe, , eu posso ser um cara calmo – Brad falou. – mas a verdade é que sou super competitivo. Estou nessa!
- É assim que se fala, Winter! – estendeu a mão e eles fizeram um high five. Então os olhos de pararam em um ponto atrás de Brad. – AH NÃO! – Ele exclamou. – Não pode ser! Vocês tem que me esconder, rápido!
Sem entender nada, nos atrapalhamos enquanto tentava encontrar um lugar atrás de um de nós, que acabou sendo .
Olhamos para trás então, e descobrimos o motivo da preocupação de . A alguns metros dali, Amber Hayley ajeitava o cabelo e conversava com um grupo de pessoas, enfiada em um biquíni rosa choque.
- Aquela ali não é a Amber? – apontou.
Como se tivesse um radar especializado em detectar a pronúncia de seu nome a quilômetros, Amber se virou para nós naquele instante. Primeiro, ela sorriu, acenando alegremente. Depois franziu o cenho, confusa, e veio em nossa direção.
- Ei, pessoal! – Cumprimentou, e então se virou para . – , o que está fazendo aqui? Pensei que você e fossem passar o fim de semana em Atlanta, com seu pai.
abriu a boca, mas logo deu um sorriso até bem convincente, cruzando os braços em frente ao corpo.
- Mudança de planos, Amber. – Explicou. – Meu pai teve que resolver uns negócios.
- E onde está o ? – Ela quis saber.
Percebi meu amigo se esconder, desesperado, mas logo Emma o agarrou pelo colarinho, satisfeita por se vingar do que ele fizera instantes atrás.
- Ah, o está bem aqui! – Ela deu um sorriso sinistro. – Estava comentando agora a pouco como estava com saudade de você.
– que quase caíra quando a menina o empurrou para perto de Hayley – levantou os olhos e forçou um sorriso.
- Oi, Amber. – Disse.
- Gatinho! – Ela exclamou, as mãos na cintura. – Por que não me contou que vinham pra cá? Eu poderia ter vindo junto!
- Acho que esse foi exatamente o motivo. – Brad sussurrou com cara de pena.
engoliu em seco, respirando fundo.
- Desculpe, decidi vir junto em cima da hora. – Mentiu. – Mas não esquenta com isso, não quero atrapalhar seu dia com seus amigos, pode ficar com eles à vontade. Nos vemos na escola.
- Ah, não vim com meus amigos. – Ela dispensou. – São só meus primos. Mas não tem problema, prefiro ficar com vocês. Eles são tããão chatos! – Nos contou em tom de conchavo.
A garota saiu correndo rumo aos primos com a intenção de se livrar dos mesmos, e desabou no chão.
- Sinto muito, meu amigo. – Brad se abaixou ao lado dele e disse seriamente, apertando seu ombro. – Tenha força, você vai sobreviver.
Agora, havia muito mais pessoas do que antes. O pessoal da rádio tinha armado uma estrutura de porte razoável para comportar a competição e aqueles que quisessem assisti-la. Aos poucos, banhistas e residentes das redondezas tomavam seus lugares nas duas arquibancadas.
- Vocês serão o time laranja. – Um rapaz da organização nos disse ao entregar um bolo de regatas de tecido leve.
- E quantos times são? – Jodi questionou, vestindo a camisa.
- Quatro. Laranja, amarelo, azul e verde. – Explicou. Depois nos olhou por um instante e deu uma risadinha. – Boa sorte. Vocês vão precisar.
se aproximou de mim com o cenho franzido.
- Só eu achei esse comentário muito estranho? – Observou. Também tinha achado, mas dei de ombros.
Minutos depois, nos reunimos às outras equipes no campo de areia. As pessoas bateram palmas. Comecei a acenar, feliz por ser o centro das atenções em um palco de novo. Não que fosse um palco, ou que fosse eu o centro das atenções, mas eu adorava as palmas da plateia.
- Somos famosos! – Jodi sussurrou emocionada para mim, que assenti com força.
Os dois radialistas responsáveis por narrarem a competição tomaram seus lugares, numa mesa num patamar mais alto da arena. Um deles tinha o cabelo louro quase verde, provavelmente uma triste consequência dos raios de sol da praia.
- Sejam bem-vindos frequentadores da Praia das Ostras! E sejam bem-vindos times! Eu sou Darren Mendes, e esse é meu parceiro Shawn Freterrick, falando com vocês ao vivo e transmitindo essa deliciosa competição para todo o estado pela Hot Weather Radio! Bom dia, Shawn.
- Bom dia, Darren! – O outro respondeu. – Parece que temos equipes animadas para vencer aqui. Lembrando que o prêmio para os vitoriosos será um almoço digno de realeza pago pela HWR no Jay's Lobster, o melhor restaurante da região.
Olhamos para o lado. Brendan Campbell, o admirador de Emma, tinha ficado na equipe azul. Ele acenou e jogou um beijo para ela.
- E vamos a primeira prova, Shawn! – Darren anunciou, chamando nossa atenção de volta. – A primeira parte da disputa hoje será a Corrida de Carrinho de Mão. Um casal de cada equipe tomara seu lugar na pista de areia. Garotos terão que segurar os (quase sempre) lindos pezinhos das moças, que correão com as mãos até a linha de chegada. O primeiro casal a fazer o percurso de ida e volta, vencerá a prova.
- Parece uma prova bem fácil pra mim, Darren! – Shawn sorriu. – As equipes têm dois minutos para decidir seus representantes.
Nos reunimos em uma roda de novo.
- Certo, quem vai? – quis saber.
- Bem, eu e Junior não estamos namorando, então não somos realmente um casal. – Summer lembrou. – Que tal e ?
- é uma molenga, vai nos fazer perder. – dispensou a ideia sem nem olhar para mim.
- Ei! – Protestei.
- Meu pé está ruim, não posso correr. – se dispensou.
- Summer, você é a mais rápida. – Jodi opinou.
- Não tem realmente problema se não estamos namorando, Sum. – deu sua opinião. – Ainda somos bons juntos.
Ela olhou para cada um de nós e então assentiu.
- Certo, eu vou com Junior.
Fiquei um pouco irritada – tanto pelo comentário de quanto pela decisão final –, mas não teve jeito. Logo Summer e Junior estavam se juntando aos outros casais escolhidos. Do time azul, foram uma garota de cabelo castanho e olhos verdes e um cara de cabelo dourado, como o de Brendan.
- Já temos os representantes, Shawn. – Darren anunciou. – A produção está explicando as regras e colocando os competidores em suas posições agora.
Poucos minutos depois, vimos Summer plantar bananeira, Junior pegou os pés dela e caminhou para trás, de forma que o corpo dela ficou na horizontal, apoiado pelas mãos. A sincronia com que eles se moviam era irritantemente natural.
- Os competidores estão prontos, Darren! Repetindo, o vencedor será aquele que conseguir ir até a marca e fazer o percurso de volta primeiro. – Shawn reforçou. – Vamos lá, equipes! Em suas marcas. Preparar... VALENDO!
A corrida começou e Junior e Summer dispararam, ultrapassando rapidamente o casal da equipe Amarela, que tinha saído na frente de todos. A garota da equipe verde logo caiu, ela e seu parceiro perdendo quase que por completo a chance de vencer. Nós gritamos, incentivando Sum e a irem mais rápido. Agora, a dupla da equipe Azul também tinha ultrapassado o casal Amarelo, e estava na cola do nosso time. Por uns dois segundos, eles até conseguiram ficar à nossa frente, mas rapidamente recuperamos a dianteira. Tínhamos chegado ao fim da pista, e com perfeita graciosidade, Olsen e fizeram a curva para fazer o percurso de volta. O público gritava tanto quanto nós, quando a equipe Azul também curvou. Era certo íamos ganhar; nosso time já estava na metade do percurso de volta. A equipe Azul acelerou, mas a garota parecia estar cansada.
De repente, ela gritou algo incompreensível para seu parceiro, que começou então a se aproximar de Junior e Summer. Quando eles já estavam perto o suficiente, andando quase grudados, algo aconteceu, e, quando nos demos conta, Summer estava caindo, levando Junior consigo.
- O QUÊ?! – estava em choque. – Não pode ser!
- O que houve com ela??? – Jodi se preocupou.
deu um passo à frente, assim como eu, mas não podíamos invadir a pista. O time Azul venceu, seguido pelo Amarelo. Antes que o verde tivesse tempo de chegar, no entanto, Summer levantou e esticou os pés. Junior a levou praticamente caindo até a linha de chagada. Acabamos em terceiro.
- E o primeiro ponto vai para a Equipe Azul, Shawn! – Darren Mendes anunciou. O público aplaudiu.
- E eu que pensei que essa já estava no papo da Equipe Laranja, Darren. – Shawn riu. – Bem, eles ainda têm mais seis provas pela frente para ter sua revanche.
Ainda estávamos frustrados e confusos quando Summer e voltaram para perto de nós. Summer parecia furiosa, assim como Junior.
- Que diabos houve com vocês lá dentro?! – exigiu saber.
- Achei que estava tudo indo bem. – fez uma careta.
- Aquela garota jogou areia no meu rosto! – Summer contou com raiva.
- Mas o quê?! – Emma ergueu as sobrancelhas.
- Eles foram se aproximando de nós, e a menina jogou um punhado de terra na cara da Olsen, por isso perdemos o equilíbrio. – Junior explicou.
- Temos que contar isso à produção! – Brad decretou.
- Está certo, Winter. – assentiu. – Vamos lá.
Enquanto a segunda prova ainda estava sendo preparada, nós todos fomos até a primeira pessoa da produção que vimos. Ironicamente, era o careca com quem Emma tinha discutido antes.
- Ah não! Bosta! – Ela xingou quando o viu a distância.
Assim que chegamos bem perto, o homem se virou para nós com cara de tédio. Deu um mínimo sorriso, no entanto, quando viu Emma, provavelmente se divertindo com o fato de já estarmos perdendo.
- O que querem? – Ele perguntou.
- Armaram pro nosso time! – revelou de uma vez. – Aquela fracote que não sabe perder da equipe Azul jogou areia na cara da nossa corredora!
- Hum, é mesmo? – O homem nos olhou como se aquilo não fizesse a mínima diferença para ele. – Têm provas disso? Não acho que posso ajudar vocês sem algo convincente.
- Provas? – Emma deu um passo à frente, irritada. – Olha aqui, careca, você viu que estávamos ganhando! Se seu problema é comigo...
O homem mudou a fisionomia do tédio para a raiva diante da ofensa. Decidi que era hora de intervir, e joguei Emma para trás antes que terminasse.
- Cala essa boca, Hughes! – Briguei. Depois me virei para o homem com um sorriso educado. – Desculpe por isso... – Li o nome em seu crachá. – Larry. Posso te chamar de Larry, não é? – Ele não respondeu. – Não queríamos mesmo ofender você. Meus amigos só estão irritados porque isso é algo muito sério.
Ao som do pedido de desculpas, a expressão de Larry se suavizou. Ele ainda não parecia gostar de nós, mas estava ouvindo de verdade agora.
- A questão é que, se aquela garota não tivesse jogado areia no rosto da nossa amiga, nós teríamos ganhado a prova. – Eu disse. – É uma tremenda injustiça que eles vençam.
O homem ponderou sobre o assunto, e senti a esperança crescer em meu peito. Ele fez sinal para que alguém se aproximasse. Era o cara que tinha nos dado as camisas antes do início da gincana.
- Ei, Pitt. – Larry disse. – Os garotos estão dizendo que a equipe Azul trapaceou. A garota jogou areia no rosto da competidora Laranja. O que se pode fazer quanto a isso?
- Eles têm provas? – Pitt olhou com curiosidade para nós, e então para Larry de novo.
- Não. – Eu disse frustrada. – Não temos. Mas...
- Foi mal, garotada. – Pitt balançou a cabeça, já se afastando. – Sem provas, sem revisão.
Desabamos de revolta e tristeza. Larry deu de ombros.
- Sinto muito. – Disse.
estava sentado ao lado de Summer no banco, os braços em volta de seus ombros.
- A culpa não foi sua, Summer. – Ele dizia.
- Com certeza não foi. – Junior se sentou do outro lado, puxando-a para perto dele. rolou os olhos, ficando de pé e se juntando a Brad e a mim.
- Estávamos tão pertinho... – Jodi choramingou.
estivera sentado por alguns instantes, Amber fazendo carinho em seu cabelo para acalmar sua fúria intensa. Ele ficou de pé então, tirou o chapéu – que Amber ficou segurando amorosamente – e assumiu seu posto de novo.
- Já chega dessa lamentação, time! – Ele bradou, assustando a todos nós. – Eles trapacearam. E aí, o que tem isso? Milhares de pessoas trapaceiam todos os dias. Mas o que temos aqui é garra de verdade! ESTÃO ME OUVINDO?
- SIM, SENHOR! – Brad respondeu automaticamente. Olhei para ele, mas preferi nem comentar.
- Muito bem, Winter. – cruzou as mãos nas costas e começou a andar de um lado para o outro. – Ouviram que a próxima prova é a competição de Nado, certo? Pois bem, temos que decidir quem vai. Eliminando desde já o , que não sabe nadar.
arregalou os olhos ao ter aquilo revelado, mas não pareceu nem notar.
- ! – Repreendi agarrando o braço de .
- E então, equipe, quem vai? – O garoto continuou. – QUEM VAI TRAZER ESSE PONTO PARA NÓS?
- EU VOU, SENHOR! – Brad respondeu.
- Está certo disso, Winter? – Emma segurou os ombros dele.
- Sim, senhora! – O garoto prometeu. – Tenho nadado em diversos ambientes a vida inteira. Sou quase um tritão.
- Que seja. – deu de ombros. – TRAGA A VITÓRIA PRA NÓS ENTÃO, WINTER!
Eles fizeram um high five de novo e Brad saiu correndo rumo a organização para ouvir as regras.
- Espero que ele consiga. – Jodi cruzou os dedos.
Pouco depois, todos seguiram para a piscina grande. Ela não era muito diferente da média em termos de comprimento, mas dava para ver que era bem mais funda. estremeceu só de olhar.
Dessa vez, Shawn e Darren estavam de pé na borda da piscina, usando microfones auriculares. O resto do público que tinha insistido em ver a prova se acomodava nas pedras mais distantes que cercavam a piscina.
Brad já estava usando sua cueca de natação. A produção lhe dera uma touca laranja, para simbolizar a equipe. Ele fazia aquecimentos ao lado dos outros competidores. Brendan Campbell, o escolhido da equipe Azul, acenou para Emma de novo.
- Já se arrependeu da equipe que escolheu, princesa? – Ele gritou.
- Não, nem vou, Campbell! – Ela respondeu. – Brad vai te fazer engolir sal!
Shawn ajeitou seu microfone e tomou mais distância da água, assim como Darren.
- A segunda prova da competição de hoje, Darren, é a Prova de Nado. Os competidores, dessa vez, não precisam fazer o percurso de volta. Aquele que chegar ao nosso lado já será coroado o vencedor.
- Me permite dar o sinal da largada, Shawn? – Darren pediu.
- Com todo o prazer, Darren. – O outro estendeu uma arma de brinquedo para ele.
- Competidores, se preparem para saltar! – Ele avisou. Todos se posicionaram. – Preparar... Apontar... – Então ele apertou o gatilho e a arma fez um estouro.
Os competidores pularam dentro da água, E Brad estava certo: ele era muito rápido.
Com os corações na boca como estávamos, a piscina parecia muito maior que a princípio, e a prova, ainda mais longa. Mas Brad estava na frente, o que nos alegrava.
- VAI, BRAD! – Jodi berrava. – VOCÊ CONSEGUE!
- VAI LÁ, WINTER! – incentivava.
De repente, o braço de Brendan – que estava logo atrás – se ergueu para uma braçada, e na decida, agarrou o pé de Brad, que perdeu o controle de seu corpo dentro da água e teve que buscar apoio no chão.
- FALTA! – Nós gritamos irados.
- Aquele cara puxou meu pé! – Brad gritou para o olheiro da competição.
- Todo mundo viu! – também gritou.
Acontece que o olheiro era justamente o tal do Pitt-vocês-não-têm-provas, e ele deu de ombros e balançou a cabeça, como se não tivesse visto.
- Estão perdendo tempo de prova. – Disse apenas.
A essa altura, no entanto, Brendan já estava tocando a borda da piscina, e sendo anunciado como vencedor.
- E O PONTO VAI MAIS UMA VEZ PARA A EQUIPE AZUL! – Shawn bradou.
Alguma coisa muito errada estava acontecendo naquela gincana.
Pouquíssimo tempo depois, nos encontrávamos sentados na estrutura de areia novamente. Enquanto a prova da piscina acontecia, eles tinham armado uma série de etapas para que fosse realizada a Prova de Obstáculos.
Nossa equipe agora exalava revolta. Estávamos certos de que a equipe Azul estava sendo beneficiada.
- Desculpe, time. – Brad disse deprimido. – Vocês estavam contando comigo.
- Relaxa, Brad. – balançou a cabeça.
- É, a culpa não foi sua. – Jodi o abraçou.
- Da primeira vez tudo bem, mas agora eles viram o que aconteceu! – Emma exclamou frustrada. – Pelo menos o Pitt-num-sei-quê.
- É óbvio que viu. – concordou. – O trabalho dele é vigiar as trapaças.
- Ele está fazendo vista grossa pra eles. – opinou. – É bem possível que tenha visto até da primeira vez.
- É, mas não temos como provar. – Summer deu de ombros, conformada.
- Só temos uma coisa a fazer, time. – disse solenemente. – Se não temos como provar, temos que tirar deles a chance de trapacearem. Até agora só fizemos provas em que eles tinham a chance de se aproximar de nós, mas a última vem agora. Se sobrevivermos à Prova de Obstáculos, eles não vão poder mais chegar perto de nós.
- está certo. – Concordei. – Só precisamos passar dessa fase. Como no vídeo game.
- Perfeita comparação, recruta Pie! – O garoto estendeu a mão, na qual eu bati. – Agora vamos decidir quem...
- Eu. – Jodi se colou de pé, o rosto sério. – Vou pelo que fizeram com Brad e Summer.
- Slaterton, tem certeza que... – começou.
- Ah, ela pode vencer sim. – Emma garantiu com sua risada de porquinho. – A Slaterton tem esses surtos de adrenalina quando fica irritada. Vão ter que segurá-la para não arrancar a cabeça de quem competir com ela.
me olhou assustado, mas eu também estava assustada, então não me atrevi a dizer nada.
- Então essa é sua, recruta Slaterton! – decretou. – Acabe com esses babacas!
- SENHOR, SIM SENHOR! – Jodi Lyn bateu continência, depois saiu correndo.
- Tem certeza de que é mesmo seguro manda-la lá? – estava na dúvida.
- Para nós, sim. – Emma deu de ombros.
Darren Mendes tinha voltado à bancada com seu parceiro de narração agora. Ele ajeitou o cabelo esverdeado diante de um espelho, e depois conferiu se o microfone funcionava.
- Estamos de volta à etapa terrena da competição. Será que pode nos dizer o que teremos agora, Shawn?
- Posso sim, Darren. – O outro sorriu. – A próxima prova é a Prova de Obstáculos. Espalhados pela pista, temos diversas armadilhas para atrasar nossos competidores. A primeira delas é a rampa molhada, que eles terão que subir. Logo que conseguirem, eles se depararão com o trepa-trepa, onde terão que passar pendurados se não quiserem cair na poça de gosma melequenta.
- Eu nem sei o que é aquilo, Shawn! – Darren riu.
- Nem eu, Darren. – Shawn continuou. – Depois disso, os competidores irão se deparar com uma parede de escalada, seguida pela corrida sobre os pneus, e depois terão que rastejar sob o arame falso, se sujando todos na areia molhada.
- É isso aí, Shawn. Aquele que terminar primeiro, deverá tocar o sino pendurado bem ali. – Ele apontou para uma sineta dourada no campo de areia. – E então será nomeado vencedor da prova.
- Agora vamos ver quem está competindo dessa vez. Parece que tanto a equipe Azul quanto a Laranja escolheram mandar garotas, mas as equipes Verde e Amarela apostaram nos rapazes.
- Isso vai ser interessante de se ver! Sem mais delongas, vamos à competição.
[N/a: Podem ouvir aqui, bombons]
Jodi se posicionou sem nem ao menos olhar para os lados. Os outros competidores pareciam gigantes perto dela.
- Preparar... – Shawn anunciou em seu microfone. – Apontar... VAI!
Jodi Lyn saiu correndo, e nós gritamos seu nome em incentivo. Acontece que aparentemente nenhum de nós – apesar de amarmos Jodi – estava realmente preparado para o que vimos. Parecia que a pequena Jodi Slaterton tinha incorporado o espírito de um super soldado.
Enquanto o rapaz da equipe amarela levou séculos para conseguir subir ridiculamente a rampa alta e molhada, Jodi já estava no topo da mesma, e saltando para o outro lado.
- VIRAM ISSO?! – Exclamei eufórica.
- Vi, eu vi sim! – Brad riu. – VAI LÁ, PEQUENININHA!
Jodi se pendurou no trepa-trepa, surpreendendo a todos nós com a força de seus braços. O garoto da equipe Verde vinha logo atrás dela, mas quando ele se aproximou demais, Slaterton simplesmente se balançou para trás – não soubemos dizer se foi acidental ou não – e lhe acertou no estômago com os pés. O garoto caiu na gosma nojenta, e ela seguiu para a próxima etapa.
- Isso é mesmo permitido? – fez a mesma pergunta que eu em voz alta.
- Quem liga?! – estava mais alegre do que tudo. – Estamos vencendo! VAI SLATERTON! ACABA COM ELES!
O garoto da equipe Amarela tinha conseguido recuperar o ritmo depois da rampa, seguindo atrás de Jodi junto da garota do time Azul. Eles tinham chegado à parede de escalada. Jodi estava logo acima dele, tão focada que nem parecia escutar nossos gritos. Talvez por isso mesmo ela tenha decido o pé com toda força bem no nariz do pobre rapaz, derrubando-o lá de cima. Teoricamente, tinha sido porque o pé dela deslizara do apoio de escalada. Àquela altura, porém, eu não duvidava de mais nada.
- Eu falei que ela era feroz! – Emma comemorou.
- Vamos sair daqui direto pra cadeia. – estava abismado.
Slaterton foi para a corrida sobre os pneus ao mesmo em tempo que a outra garota. As duas competiram na mesma velocidade, e em determinado momento a garota tentou empurrar Jodi, que desviou sem pestanejar. A baixinha continuou a frente, se deitando na areia molhada para passar debaixo do arame. Quando saiu de lá e viu o sino, havia um brilho assustador em seus olhos.
A garota do Azul, porém, saiu logo atrás dela, e ao perceber que a vitória estava em risco, tentou correr atrás de Jodi e sutilmente puxar seu rabo de cavalo.
Jodi desviou dela, que foi parar ao seu lado na sequência, se esforçando para respirar. Quando ela tentou novamente atrapalhar Slaterton, a baixinha jogou seu corpo pra cima dela, empurrando-a de modo que a garota caiu e saiu rolando. Foi assustador, mas estávamos felizes ao mesmo tempo.
- VAI! VAI! VAI! – Gritávamos.
E então Jodi correu mais, pulou e puxou o sino. Havíamos ganhado.
- ESSA É PRA VOCÊ, BRAD! – Ela gritou. E Brad correu para abraça-la, orgulhoso.
[N/a: Certo, já podem parar, docinhos]
Quinze minutos depois, Jodi ainda estava jogada no chão de areia, se recuperando. Brad estava sentado ao lado dela, uma garrafa de água na mão preparada para oferecer a sua amada.
- Não sei o que deu em mim. – Jodi dizia, como se acordasse de um longo sono. – Eu só conseguia ver a sineta! Eu não machuquei muito ninguém, não é? – Se sentou alarmada.
- Não mais do que o necessário, Jodi. – sorriu, apertando o ombro dela. – O que importa é que conseguiu o ponto pra gente. Pode descansar pelas próximas provas.
- Já sabem qual é a próxima etapa? – questionou.
- Ainda não disseram nada. – Respondi.
Como mágica, o microfone chiou. Tampamos os ouvidos, mas logo percebemos que Darren Mendes tinha voltado ao seu posto. O problema de microfonia foi resolvido e ele voltou a falar.
- Estamos de volta com a gincana, pessoal! – Ele disse. – Depois das grandes emoções da última prova, três competidores acabaram com leves contusões, mas o problema já foi resolvido pela equipe médica.
Jodi olhou envergonhada para nós. Brad a tranquilizou com um sorriso. Concluí que nunca na minha vida eu arrumaria confusão com Jodi Lyn Slaterton.
- É isso mesmo, Darren. – Shawn entrou na conversa. – Mas estou certo de que a prova seguinte será mais segura.
- Vem aí – Darren anunciou. – A Prova da Dança!
Olhamos uns para os outros, surpresos.
- Nessa prova, Darren, dois competidores de cada equipe virão até aqui mostrar seus talentos artísticos no nosso super vídeo game. Esperamos que ninguém se machuque dessa vez.
- As equipes têm dois minutos para enviar seus representantes.
Olhamos uns para os outros então. Os meninos com olhares prevenidos.
- É Just Dance! – Ri, empolgada. – Não tem como eu perder nisso! Eu vou dessa vez.
- Me incluam fora dessa. – avisou.
- Eu também. – disse.
- Meu pé está quebrado. – lembrou.
- Vocês são uns chorões! – Summer fez cara feia.
- Gente, não se preocupem. – Amber abriu um enorme sorriso, se alongando. – Sou uma líder de torcida; se tem algo que sei fazer, é dançar.
- Só se for por cima do meu cadáver, Hayley. – Emma a empurrou para cima de . –Cinquenta por cento da minha preparação para ser líder de torcida veio desse jogo. Fique longe do meu holofote. – Estalou os dedos.
- Isso vai ser vergonhoso. – Ouvi murmurar.
já me vira jogar aquilo na casa de mais de uma vez. Estava certo – dependendo da música, poderia ser ridículo. Eu me importava? Não realmente.
- Quando eu ganhar vou dedicar a vitória a você igualzinho a Jodi. – Avisei.
- Nem pense nisso. – Ele disse, mas riu.
Sob o olhar nada feliz de Amber, eu e Emma fomos ao centro do campo, onde as equipes foram colocadas em ordem. A primeira equipe a competir seria a Azul, que estava na frente; depois nós; por último, Verde e Amarela. A música seria a mesma para todos nós, para que fosse um jogo justo.
A música foi escolhida aleatoriamente pelo jogo, e acabou por ser Jump, da Girls Aloud. Emma comemorou o fato.
- Eu adoro essa música! – Exclamou. O que era bom, porque eu também a conhecia.
A dupla Azul foi até o pequeno palco armado e pegou os controles. Eram uma garota e um garoto. A música começou e os assistimos dançar.
Ok... Os dois eram muito bons. O garoto de vez em quando olhava para nós com certo desdém, como se estivesse zombando previamente da nossa performance. Lembrei de como Teddy, o amigo das meninas da torcida, olhava quando falava dos pés tortos de Maya Burnes.
Para o azar dele, no entanto, a menina, num momento de distração, acabou virando para o lado contrário do que o jogo indicava. Isso gerou um erro posterior, eles deram um encontrão, e no fim das contas não conseguiram todas as cinco estrelas, mas sim quatro.
- Perfeito, eles erraram! – Emma comemorou. – Essa é nossa chance.
- Vamos levar essa. – Assenti.
Ainda não haviam nos chamado para assumir as posições. Então esperamos enquanto Pitt – que estava mais para um faz tudo agora – passava um rodo com alguma coisa na lona sobre o palco.
- Ei, o que é aquilo? – perguntou à distância.
- Não sei, ele só deve estar limpando a areia! – Respondi.
Assim que ele saiu do palco, Larry subiu, fazendo sinal para que eu e Emma subíssemos. Ele nos entregou os controles e programou o vídeo game.
- Obrigada, Larry. – Eu disse educadamente.
- Boa sorte, à você. – Ele deixou bem claro. Emma mostrou a língua para ele, que desceu do palco em seguida.
- Esse careca vai ver só. – Ela deu uma risadinha.
Respirei fundo e esperei que o jogo começasse. Nós íamos dançar descalças, uma regra da competição. A coreografia começava com nós duas abaixadas, e assim fizemos.
A música começou e tudo que eu via na tela era a palavra "Perfect" repetidas vezes. Olhei para trás um segundo e vi meus amigos sorrindo. Eu e Emma estávamos em uma ótima sincronia.
A letra seguia ritmadamente quando uma coisa começou a me incomodar. Parecia que algo tinha grudado em meus dedos. A sensação era irritante. Olhei para o lado. Emma estava absolutamente normal, dançando o pedaço que vinha antes do refrão:
I'll take you down, I'll take you down
Where no one's ever gone before…
Eu devia ter pisado em alguma coisa antes de entrar ali, com certeza. Me concentrei em fazer os passos com mais cuidado e ignorar aquela sensação.
Mas quando o refrão enfim chegou, não houve jeito. Eu tinha que pular.
Then, Jump!
For my love
Jump in!
Olhei para o lado de novo. Dessa vez a cara de Emma denunciava que ela tinha percebido algo estranho também. Nenhuma de nós queria parar de dançar, mesmo assim.
I know my heart can make you happy…
Jump in!
You know these arms can feel you up…
Eu quase escorreguei, mas Emma me empurrou com o quadril e voltei ao lugar. Continuamos dançando até quase o final do refrão, até que, por fim, no último pulo, a própria Emma escorregou, caindo de bunda no chão.
- Emma! – Me abaixei ao seu lado.
Larry apareceu perto de nós num instante acompanhado de mais duas pessoas da produção. Uma delas parou a música.
- Acho que vamos precisar de um médico. – A garota da produção disse.
- Não, eu estou bem. – Emma garantiu, se colocando de pé. – Nós perdemos?
A garota deu de ombros. Emma bufou, voltando para perto da nossa equipe. Eu a segui.
- Ei, o que aconteceu lá em cima? – Junior questionou.
- O chão estava escorregadio. – Contei triste.
Em alguns instantes, o tal Pitt estava com seu esfregão no palco novamente. Depois foi a vez da equipe verde, e as duas garotas caíram miseravelmente também. O mesmo aconteceu com a equipe Amarela.
- Vocês não acham isso estranho? – Summer perguntou cismada. – A primeira equipe não teve nem um deslize. Só não conseguiram todas as estrelas porque aquela menina virou para o lado errado.
- Eu diria que é muito suspeito, isso sim. – concordou.
- Dou minha cara à tapa como aquele tal de Pitt está envolvido nisso. – Junior bufou.
- Quando eu puder provar isso, vou enfiar a cara dele num buraco de areia. – Emma disse com ódio. Jodi a abraçou.
Depois de terem anunciado a equipe Azul como vencedora da prova, Darren e Shawn voltaram a falar.
- Vamos lá, frequentadores da Praia das Ostras. – Darren disse. – Eu diria que a próxima prova é uma graça. – Riu da própria piada.
- Vem aí o FAÇA-ME RIR OU MORRA! – Shawn anunciou. – Essa prova é um verdadeiro teste de resistência, Darren. Quatro competidores serão colocados em roda no meio do campo. Aquele que conseguir se manter sério ao final de três minutos, será o vencedor.
- É isso aí, Shawn, nem mesmo um sorrisinho vale. Vamos lá, equipes, escolham seus representantes.
, que estava de muito mau humor a essa altura, se colocou de pé.
- Essa vai ser bem fácil. – Disse sem emoção, tomando seu chapéu das mãos de Amber e se direcionando ao centro do campo de areia sem que tivéssemos tempo de dizer qualquer coisa.
- Boa sorte, amorzinho! – Amber gritou.
Os outros times mandaram seus representantes em seguida.
- Boa sorte, Grilo Falante! – Brendan zombou de onde estava com o resto de sua equipe ao ver .
Larry foi até o centro do palco e posicionou os competidores.
- A prova começa em um instante, Darren! – Shawn anunciou. – Preparados, competidores? Valendo!
olhou bem para cada um dos competidores – uma garota e dois rapazes. Ninguém parecia disposto a rir. Então, sem mais nem menos, ele pegou seu ridículo chapéu azul, que trazia nas mãos cruzadas atrás das costas, e colocou na cabeça.
Vi a boca da garota da equipe Amarela tremer diante daquela visão. Logo ela balançou as mãos em rendição, saindo do meio com as mãos na boca tentar conter o riso. Depois foi o garoto da equipe Verde. Por último, ficou ali, encarando o remanescente da equipe Azul. O garoto tinha o rosto vermelho, como se estivesse quase morrendo para não rir. De repente ele não aguentou mais. Explodiu em gargalhadas e caiu no chão rolando.
voltou para nós com as mãos erguidas em sinal de vitória, enquanto o garoto ficava lá.
- Bem, Shawn, isso foi... – Darren tentava entender. – Rápido.
- Boa escolha de palavras, Darren. – O outro respondeu.
Nem mesmo nós estávamos acreditando no quão fácil tinha sido.
- Você disse alguma coisa para o último cara? – perguntou ao melhor amigo.
- É verdade, pensei que ele fosse resistir. – Concordei. – O tempo já estava acabando.
- Disse sim. – assentiu. – Cri-cri.
Dessa vez, nem nós aguentamos, desabando em gargalhadas.
A manhã se estendia e já estávamos cansados e famintos. Podíamos sentir o cheiro das lagostas do Jay's Lobster se fechássemos os olhos.
- Calma, pessoal, já está quase acabando. – Summer disse, mas dava para ver que estava exausta também.
- Não vejo a hora de comer alguma coisa. – se jogou para trás.
- Se fossem como eu, estariam de barriga cheia a essa altura. – deu de ombros. – Estou comendo desde que cheguei a essa praia.
balançou a cabeça.
- E a próxima prova é uma prova de força, Darren! – Shawn anunciou, tomando nossa atenção de volta.
- Se preparem para o cabo de guerra, equipes! – Darren exclamou. – Três competidores de cada lado virão até o centro do campo para mostrar quem pode mais nessa tradicional brincadeira, Shawn.
- Equipes, já podem escolher seus representantes.
– cujo ombro estava servindo de apoio para minha cabeça até então – levantou a mão.
- Eu vou. Não fiz nada ainda.
- Também quero ir. – Brad disse. – Preciso me redimir com vocês pela prova de nado.
Emma se colocou de pé no mesmo instante.
- Sendo assim, a terceira pessoa sou...
- Sossega aí, Hughes. – a empurrou para o banco de novo. – Já se machucou hoje. Eu vou dessa vez.
- Grande Junior. – o cumprimentou. Emma o olhou feio.
Logo os três garotos estavam posicionados no centro. Era estranho ver e fazendo qualquer coisa juntos, mas eu sabia que eles tinham boas chances de ganhar.
- Vamos lá, meninos! – Summer gritou e bateu palmas, apreensiva.
Primeiro, a equipe Verde foi colocada para competir contra a Azul, para quem perdeu miseravelmente. Depois, nossa equipe foi contra a equipe Amarela, de quem ganhamos. A chave final era Azul x Laranja.
- É nessa hora que vem o roubo. – balançou a cabeça, prevendo o pior.
As equipes se colocaram em seus lugares. Pitt chegou trazendo uma nova corda, o que pareceu de fato muito esquisito. Os garotos agarraram a corda, cada time de um lado.
- VALENDO! – Gritou Darren Mendes.
Os garotos puxam a corda com a mesma força da equipe Azul. Ambos os times eram fortes e equilibrados. Era difícil dizer qual deles venceria.
De repente, percebi as mãos de Brad escorregando. Ele se apressou em agarrar a corda de novo, mas dava para ver a dificuldade.
- Que diabos está havendo? – disse entre dentes.
- Roubo. É isso que está havendo. – Repetiu .
As mãos de e também começaram a escorregar. Vimos os garotos do outro time rirem. Apesar dos evidentes esforços para não soltar a corda, logo nossa equipe foi parar no chão, uns em cima dos outros. A equipe Azul tinha vencido mais uma.
- Tinha alguma coisa na nossa corda. – Junior contou depois.
- CHEGA, TEMOS QUE DESCOBRIR O QUE ESTÁ HAVENDO. – decidiu.
- Mas não adianta. – Jodi disse desanimada. – Só tem mais uma prova, e mesmo se ganharmos, vamos perder. Eles ainda estarão um ponto à frente.
- Se conseguirmos provar que eles trapacearam podemos pegar nossos pontos de volta. – insistiu.
- Isso é verdade. – Brad meneou a cabeça.
- Talvez dê certo. – concordou.
Enquanto conversávamos sobre o que fazer para descobrir como eles tinham trapaceado, Darren Mendes e Shawn Freterrick voltaram aos seus lugares.
- Está na hora da nossa última prova, Shawn! As equipes Verde e Amarela se cansaram, mas mesmo sabendo da impossibilidade da vitória, a equipe Laranja, se recusa a desistir. É algo bonito de se ver.
- É sim, Darren. – Shawn concordou solene. – A última prova da nossa gincana será também a mais deliciosa, meu amigo. Vem aí a PROVA DO BOLO!
- Hummm, parece delicioso pra mim, Shawn! – Darren riu. – Nossa equipe preparou carinhosamente quatro deliciosos bolos enormes para os quatro representantes escolhidos de cada equipe. Infelizmente, vão sobrar dois.
- Os competidores tomarão seus lugares à mesa nessa prova. Vence aquele que conseguir devorar um bolo inteiro primeiro!
Apesar da nossa fome, olhamos uns para os outros, sentindo dor de estômago só de pensar.
- Brutal. – Emma moveu a cabeça em aprovação. – Uma pena que eu vá desvendar o mistério da trapaça. Talvez eu até conseguisse.
- Quem vai dessa vez? – Summer perguntou com um pouco de medo.
Nem sabia quem indicar. Era quase muito cruel pensar que um de nós ficaria de barriga cheia bem antes de irmos para o tal almoço de realeza.
- Essa é a única prova de que eu posso participar. – disse então com certo receio. – Eu vou.
Brad e o ajudaram a ficar de pé, mas alguém entrou em sua frente.
Amber, para o espanto de todos.
- Não, , e vou. – Ela disse.
se aproximou da garota com o cenho franzido, segurando em seus ombros.
- Amber, é uma competição de comer bolo. – Ele disse calmamente. – Não sei se é a prova certa para você participar...
- É exatamente por isso que é perfeita, gatinho. – Amber disse tocando a cabeça com a ponta do dedo, como se fosse uma ideia brilhante. – Um dos motivos é que ninguém vai me levar a sério com esse corpinho. Mas a parte principal é que... Eu estou fazendo dieta há três anos. Sabe quanta fome acumulada eu tenho aqui? – Tocou a barriga.
desviou os olhos para o abdômen de Amber, depois ponderou, dando de ombros.
- Faz bastante sentido. – Olhou para nós. – Essa prova é sua, Amber.
Alegre, Amber o puxou para um beijo e depois saiu correndo para o palco, onde estava colocada a mesa com quatro enormes bolos confeitados com glacê.
- Estamos indo descobrir qual é a daquele otário do Pitt. – Emma avisou agarrando o braço de Jodi e Brad.
- E agora? – Perguntei a , que observava Emma, apreensivo.
- Agora esperamos. – Ele deu de ombros. – É tudo que temos a fazer.
[N/a: Meninas, podem ouvir aqui, que com certeza vocês já conhecem]
Amber se preparou para competir com um garoto forte da equipe Azul, que até riu quando a viu se sentar à mesa. A bem da verdade, era mesmo difícil leva-la a sério.
Darren deu início a competição, e a garota começou a comer delicadamente garfadas de bolo, enquanto o garoto se matava para comer com as mãos o que podia. Em certo ponto, dava para ver que ele estava cansado.
Ele parou para beber um copo d'água. Acenou para sua equipe e o público. Olhou para a própria Amber.
E foi justamente quando ele parou para respirar, que a bela garota loira se transformou num monstro comedor de bolos, devorando todo aquele glacê e massa à sua frente.
Era assustador, mas estávamos dando pulos de alegria enquanto Amber Hayley se fartava com todas aquelas calorias.
- Isso só pode ser brincadeira. – estava embasbacado.
- Se eu soubesse que ela estava tão faminta, teria obrigado ela a comer há mais tempo. – Summer encarava a cena em choque.
A boca de Amber estava toda suja de glacê, mas ela parecia genuinamente feliz. O outro garoto tinha voltado a comer, e olhava para ela enquanto tentava acompanhar seu ritmo frenético.
- Estamos ganhando! – estava eufórico. – VAI, AMBER! VAI!
A garota ainda teve forças para acenar e sorrir com aquela boca toda suja.
Levaram uns bons dez minutos, mas por fim, Amber jogou o garfo sobre a mesa e ergueu os braços, engolindo o último pedaço de bolo em sua boca.
- Venci! – Ela gritou. – Parecia bêbada. – EU VENCI!
Diante do acontecimento, Darren Mendes e Shawn Freterrick desceram de sua bancada e correram para o palco.
- Ora, ora, mas não é que é verdade? – Shawn estava abismado.
- Bem, TEMOS UMA VENCEDORA! – Darren anunciou, erguendo o braço de Amber no ar.
O público aplaudiu de pé a inesperada vitória de Amber sobre o fortão da equipe Azul, e nós comemoramos loucamente.
- Infelizmente... – Shawn falou. – Mesmo ganhando essa prova, a equipe Laranja ainda está um ponto atrás. Sendo assim, sou obrigado a dar estas medalhas e o prêmio de um delicioso almoço no Jay's Lobster para a equipe Azul.
O público vaiou quando a equipe Azul – Brendan na frente, satisfeito – subiu ao palco para pegar as medalhas e receber a premiação.
- O que vocês tem a dizer, Azuis? – Darren perguntou. Brendan pegou o microfone das mãos dele.
- Bem, que eu sempre soube que isso acabaria assim, não é? – Ele deu um sorriso ofuscante, acenando para a plateia que o vaiava.
- SOLTEM ESSAS MEDALHAS, SEUS BABACAS!
Olhamos para o lado e vimos Emma, Jodi e Brad marchando rumo ao palco. Olhamos uns para os outros e corremos para lá também.
- Qual o problema, meu bem? – Darren quis saber.
- O problema é que esses trapaceiros roubaram em todas as provas! – Jodi revelou.
- E como sabem disso? – Shawn questionou.
- Já tínhamos percebido, mas o Pitt, da produção, se recusou a revisar os resultados! – Brad disse.
- E tudo porque... – Emma deu um sorrisinho, erguendo o celular. – Aquele miserável estava ficando com essa cara de bolacha do time deles! – Ela estendeu o celular para Darren e Shawn, onde era possível ver as fotos que ela tirara há pouco do infeliz casal.
Pitt e a garota da equipe Azul chegaram em seguida, mas era tarde demais.
- Eles passaram no chão da pista de dança a mesma gosma que foi usada na prova de obstáculos, e também usou essa mesma mistura na corda na prova dos garotos. – Jodi explicou.
- E Brendan puxou meu pé na prova de Natação, e aquela garota jogou areia no rosto da nossa corredora na primeira prova. – Brad reforçou.
Darren e Shawn estavam chocados.
- Bem... – Darren ponderou. – Diante dos fatos apresentados, tudo que podemos fazer é tirar esse prêmio dessa equipe medíocre. – Larry apareceu então e foi puxando as medalhas da equipe Azul, que parecia ultrajada. – E oferecê-las aos verdadeiros vencedores da competição, assim como o prêmio do almoço no Jay's Lobster.
O público vibrou com a notícia, assim como nós enquanto recebíamos as medalhas de Larry.
- Eu bem que disse, careca. – Emma sorriu para ele.
- Mandou bem, casca-grossa. – Larry piscou para ela.
- E você, meu jovem... – Shawn se direcionou a Pitt. – Está demitido.
Os integrantes da equipe Azul, ainda sem aceitar o que havia acontecido, deram um passo à frente.
- Isso é ridículo! – Exclamou Brendan. – Vocês todos são!
Então, sem mais nem menos, ele enfiou a mão em um dos bolos inutilizados sobre a mesa e bateu com o pedaço na cara de Darren Mendes.
- Eu não acredito que...
- Ah, isso não vai ficar assim não! – Emma jogou um pedaço de bolo no rosto de Brendan.
- GUERRA DE BOLOS! - Alguém gritou.
Logo, todos jogávamos bolo uns nos outros, dando àquela gincana uma última prova improvisada.
De todo modo, não importava realmente quem ganharia aquela. Aquela já tinha sido uma vitória das mais deliciosas, como já diria Amber Hayley.
[N/a: Podem parar, docinhos!]
Ainda não havíamos conseguido nos livrar completamente do glacê quando os carros da produção do programa vieram nos buscar para nos levar ao Jay's.
- Tem certeza de que quer ir? – Ouvi perguntar a Amber, mal acreditando. – Quer dizer, você aguenta comer qualquer outra coisa?
- , o problema era sair da dieta. – A loira garantiu. – Uma vez fora dela, poderia comer até três bolos como aquele! – Ela comemorou puxando-o pela mão. Eu dei risada.
Os outros estavam em diferentes pontos, tentando se livrar daquela sujeira, quando vi acenar para mim de uma das barraquinhas da feira de artesanato.
- Vicentini! – Ele chamou.
Caminhei até ele e parei.
- Que foi?
- Pedra do sol ou ametista? – Ele perguntou, erguendo dois colares no ar.
- ... Nenhuma coisa nem outra. – Balancei a cabeça, apesar de sorrir.
- Pedra do sol ou ametista, ? Estou perguntando.
Rolei os olhos, mas dei de ombros.
- Pedra do sol. – Respondi.
- Ótimo. – Ele sorriu. – Aqui está o dinheiro, moço.
- , eu não quero nada se... – Tentei protestar, mas em um segundo ele tinha me virado e fechava o colar em meu pescoço.
- Eu queria te dar um presente tem tempo.
Suspirei, medindo a veracidade de suas palavras. O sol estava bem atrás dele, fazendo seu cabelo parecer mais brilhante, e seus olhos, mais .
- Pessoal, vamos?
Olhei para trás e vi Summer acenando animada.
- Já estou indo! – Gritei. – Obrigada. – Sorri para e me afastei.
Logo apareceu também, já praticamente todo limpo.
- Preparada para comer lagosta? – Ele perguntou quando me aproximei.
- Viu só? O dia na praia não foi tão ruim, não é? – Sorri enquanto andávamos rumo ao carro.
- Não. – Deu de ombros, sorrindo. – Mas talvez eu já devesse estar esperando. Quando estamos juntos as coisas geralmente acabam nunca sendo tão ruins, no fim das contas.
19-The weirdo with five colours in her hair
"Everybody wants to know her name…"
[…]
POV
- Aquela era mesmo a melhor comida que eu já comi na vida. – suspirou como se lembrasse de um velho amigo. – Quando vamos ter dinheiro para voltar lá?
- Quando ganharmos na loteria, talvez. – Respondi sonolento enquanto andávamos pelo corredor da Jacksonville High.
- Já falei que você está parecendo um zumbi? – Ele comentou com uma careta.
- Fiquei até tarde no Roger's ontem, Jack não tocava desde semana passada e decidiu fazer isso justo no domingo.
- Pensei que ele te dispensasse dos domingos por causa das aulas da segunda.
- E ele faz isso, é aí que está o problema! – Bufei, deixando um pouco meu sono de lado. – Se eu deixar que ele me trate como uma adolescente mané sempre, o Jack nunca vai conseguir me ver como um músico de verdade. E aí, quando ele fizer uma turnê, não vai querer que eu vá junto porque tenho outras responsabilidades. – Expliquei. – Miguel tinha quatorze anos quando Jack o encontrou. Quatorze! E quando tinha minha idade, já tocava como profissional.
- Não querendo te desanimar, mas tecnicamente falando, você é um adolescente mané. Aos quatorze, Miguel já devia ser procurado em uns dez estados. – Ele ergueu as sobrancelhas. – Como estão sendo as coisas com ele na casa, aliás?
- Nem boas, nem más. Temos tomado cuidado, mas acho que ele desconfia de alguma coisa.
- não é tão boa mentirosa quanto pensa. – Deu de ombros, pensativo. – Falando nisso, onde ela está?
Bastou falar seu nome para que ouvíssemos passos apressados à distância. Me virei para trás e vi correndo em nossa direção, como se tivesse saído de casa atrasada. Jack tinha me dispensado de busca-la na noite anterior, ao perceber que eu estava exausto. Ele disse que a levaria no dia seguinte.
- Um parece estar dormindo, a outra parece ter tomado um litro de energético. Vocês realmente se completam. – sorriu, e eu rolei os olhos. – Alguém perdeu a hora. – Ele disse quando ela finalmente se aproximou.
- Jura? – ergueu as sobrancelhas, depois respirou fundo. – Meu pai, ele tem graves problemas com horários.
- Sei bem disso. – Concordei. – Se eu soubesse teria ido te buscar, mesmo que você fosse correr um grande risco andando de carro comigo hoje.
- Está tudo bem. – deu um sorrisinho. – Eu vim de ônibus.
- E o Jack? – franziu o cenho.
- Não dava tempo de esperar, eu tinha que participar do teste. – Ela contou, então se deu conta. – AI MEU DEUS, O TESTE!
- Que teste? – Ele não entendeu.
- O teste para a peça de Outono. – Me lembrei, pegando o celular para o olhar a hora. – Relaxa, ainda dá tempo.
- É verdade. Foi por pouco. – Ela fechou os olhos e respirou fundo. – Vejo vocês depois!
saiu correndo de novo, e nós ficamos ali, assistindo.
- Verdade que a peça não vai mais ser O Mágico de Oz? – perguntou quando voltamos a andar.
- Estranho, não é? – Dei um breve sorriso. – A parece ter virado mesmo tudo aqui de cabeça para baixo.
Enquanto conversávamos, avistei Rosana e sua amiga Ashley vindo na direção oposta. Já estava preparado para inventar uma desculpa, mas ao me ver, a própria Rosana arregalou os olhos e apressou o passo.
- Ei, meninos! – Ela cumprimentou rapidamente, seguindo seu caminho.
parou por um instante, olhando dela para mim.
- O que você fez com ela? – Quis saber.
- Eu? Nada! – Me defendi, apesar de confuso também. – Mas que bom que ela parece ter voltado ao normal.
- Não acho que tem nada de normal nisso, se quer mesmo saber, . – Ele ponderou. – Mas temos mais o que fazer agora. Ainda nem descobri um jeito de me livrar das comidas ridículas da Amber no almoço, mas talvez possa usar o surto dela do sábado como desculpa. – Se alegrou.
Sem dúvida, Amber Hayley parecia um problema maior que Rosana Wayans agora.
🌴💚🌴
A professora de teatro de adiou o teste para àquela tarde, na tentativa de dar aos alunos a chance de se prepararem. Aparentemente, a nova peça seria um musical, e, portanto, o teste consistia em cantar alguma música. Obviamente, a notícia tinha deixado um tanto quanto deprimida, visto que ela definitivamente não sabia cantar.
- Ela não vai mesmo passar nesse troço. – balançava a cabeça enquanto voltávamos para casa. – É bem humilhante, se parar pra pensar que com certeza é a Jasmine quem vai ganhar o papel principal, como todo ano.
- Se ao menos ela só precisasse atuar. – Suspirei, já com pena de . estava certo, Jasmine cantava incrivelmente bem; não teria chance.
Fomos direto para a casa de Jack, já que eu tinha que dar uma olhada em Stevie, e também leva-lo para dar uma volta. Jack tinha me dito na noite anterior que teria que sair com Miguel naquele dia para resolver uns problemas.
Usei minha chave para abrir a porta e eu e entramos.
- Espero que tenha alguma coisa para comer aqui. – Meu amigo foi logo falando ao largar a mochila no chão.
- Deve ter alguma coisa na geladeira. – Falei já me distanciando.
Stevie veio logo me saudar quando me viu e eu me abaixei para brincar com ele.
- Ei, garoto! – Sorri. – Vou te dar alguma coisa pra comer também.
Busquei o saco de ração e coloquei uma quantidade razoável na tigela. O dálmata logo começou a comer, esfomeado. Depois lavei as mãos e peguei algumas coisas na geladeira, na intenção de preparar um sanduíche.
- Se quiser um, é melhor vir fazer! – Gritei para .
- Eu já vou! – Ele respondeu, mas então a campainha tocou.
Continuei preparando meu sanduíche, imaginando que tinha ido atender a porta, mas como ele não veio logo fui ver o que estava acontecendo.
Ao chegar à sala, percebi que meu amigo estava congelado em frente à porta aberta, olhando alguma coisa lá fora.
- , qual é o problema? – Me aproximei com o cenho franzido.
Do lado de fora, encarando com uma cara que misturava confusão e impaciência, estava uma garota ruiva, usando batom rosa e colete de couro. Seu cabelo tinha várias pontas coloridas. Sua expressão pareceu amenizar quando me viu, e ela esboçou um sorriso.
- ? – Ela perguntou.
- Sim, sou eu mesmo. – Respondi devagar.
- Ótimo, então estou na casa certa! – Ela riu. – Dá licença?
Ainda de boca aberta, deu um passo para o lado, deixando que a garota – puxando uma mala roxa – entrasse em casa. Eu não estava entendendo nada, mas não consegui fazer nada para impedi-la.
- Isso está muito pesado. Talvez eu tenha trazido coisas de mais. – Ela suspirou, olhando para a mala.
- Desculpe, mas... Quem é você? – Finalmente consegui perguntar.
- Ah, é verdade, vocês devem estar confusos. – Ela disse numa voz misteriosa. Então estendeu a mão para mim, e eu a apertei. – Eu sou Sophia, a prima preferida da .
POV PIE
O despertador do celular me deu um tremendo susto. Acordei meio tonta, procurando o aparelho no criado mudo para desliga-lo. O mais estranho, no entanto, era o fato de que eu nunca era acordada pelo despertador, pois este sempre estava programado para tocar trinta minutos após meu horário de sair de casa, no caso de por algum motivo desconhecido eu dormir demais e...
ESPERA AÍ.
- Merda! – Pulei da cama, xingando em português. – Merda, merda!
Eu corria de um lado para o outro, sem saber nem por onde começar. Tinha me atrasado, e teria uma reunião do clube de teatro naquela manhã.
- Onde diabos está o ?! – Eu reclamava em voz alta já descendo as escadas, amarrando o nó do coletinho jeans que tinha colocado às pressas.
- , que barulho é esse?
Era meu pai, saindo do quarto com cara de quem tinha dormido mais que a cama.
- Perdi a hora, e não veio me buscar! – Expliquei as pressas.
- Ah, não! – Papai bateu na testa. – Eu disse pra ele que ia te levar. Desculpe, Rainbow.
- O senhor o quê? Pai, só... Não, ok?
- Vou pegar as chaves do carro... – Ele começou a voltar para dentro.
- Não precisa, Jack. – Dispensei, mal-humorada. – Vou de ônibus, dá tempo de chegar.
- Mas, querida...
Antes que ele tivesse tempo de dizer qualquer coisa, eu já estava do lado de fora.
Ajeitei o rabo de cavalo pela décima vez, parada naquele ponto de ônibus. Era incrível como eles passavam aos montes quando eu não precisava deles.
Para melhorar a situação, ouvi minha barriga roncar de repente, me dando conta de que não tinha comido nada. Aquele dia não estava indo nada bem, e o pior é que eu não podia perder a concentração. Tinha que ganhar o papel de Ebony Purplewood ou Jasmine ia tornar minha vida um grande pesadelo. Eu não ia ficar pintando cenários para aquela garota ridícula brilhar. Não ia mesmo!
Depois de uns bons quinze minutos, estava prestes a voltar para casa e pedir a Jack que me levasse, quando um carro se aproximou do meio-fio. No começo pensei que, levando em conta a minha sorte, fosse ser assaltada, mas então reconheci o automóvel.
- Vicentini. – se curvou para olhar para mim. – Quer uma carona?
- Sim, por favor! – Aliviada, fui logo abrindo a porta do carro.
Minha alegria genuína não teve mesmo nada a ver com o fato de poder passar mais tempo com , mas sim por finalmente de estar me movendo de algum modo em direção ao meu objetivo. Ganhar aquele papel era um plano muito mais importante naquele momento.
- Graças a Deus você apareceu. – Suspirei aliviada. – Pensei que não fosse conseguir chegar a tempo.
- Algum compromisso importante? – Ele me olhou de soslaio.
- Um teste no clube de teatro.
- Clube de teatro, han? Fui forçado a fazer parte dele no primeiro ano. A professora era uma velha maluca.
- Mudamos de professora esse ano.
- Jasmine comentou sobre isso. – assentiu. – O pessoal costuma ir às peças, porque ela sempre é a protagonista.
- O pessoal... Você não vai com eles? – Questionei.
- Eu fujo sempre que posso. – Olhou para fora do carro. – Mas acho que vou mudar meus hábitos esse ano. – Voltou a me olhar, dando um sorriso torto. – Tenho vontade de te ver em cena desde que me contou de quando fez a Chapeuzinho Vermelho.
Senti meu coração dar um pulo. Eu me sentia um pouquinho mais importante para cada vez que ele se lembrava de algo que eu tinha dito a ele no passado.
- Bom, acho que esse ano a Jasmine vai mesmo ter uma concorrente à altura. – Dei de ombros, me sentindo um tantinho mais segura.
- Eu concordo plenamente. – Ele riu. – E digo novamente: adoro sua autoestima perigosamente elevada.
Sorri, levantando os ombros inocentemente.
- O que mesmo estava fazendo no ponto de ônibus do meu bairro?
- Hoje só preciso chegar mais tarde por causa do treino, e não tomei café em casa, então parei na padaria ali perto para comprar donuts.
- Nada apropriado para um jogador de futebol, han? – Ergui a sobrancelha, olhando de soslaio a caixinha. Minha barriga roncou alto no exato instante, e quase morri de vergonha.
- Para uma líder de torcida também não, mas parece que você está com fome. – sorriu. – Pode comer. Já peguei um.
- Vou ficar te devendo pela carona e pela comida. – Abri a caixinha, dando um longo suspiro ao ver aquela delícia açucarada.
- E eu vou cobrar, pode ter certeza.
- ... – Eu disse em tom de repreensão.
- Sabe que estou brincando. É melhor comer isso logo, já estamos chegando.
Quando parou o carro no estacionamento da escola, desci rapidamente. Não que tivéssemos feito nada de errado, mas eu tinha cisma de meus encontros com ele por dois motivos: O primeiro era Jasmine com suas teorias bem fundadas e perigosas, e o segundo era , para quem eu tinha prometido que não andaria sozinha por aí com Junior.
- Por que tanta pressa? – desceu do carro logo depois de mim.
- Nada, eu só... Estou atrasada lembra.
- Claro. – Ele assentiu sem parecer acreditar muito naquela desculpa. – Só espera um segundo.
deu a volta no carro e se aproximou mais de mim do que eu esperava, o perfume de loção pós-barba mexendo com meus sentidos. Então ele ergueu a mão e tocou meu rosto, passando o polegar no canto da minha boca.
- Açúcar. – Explicou com uma expressão marota, colocando o dedo na própria boca e experimentando os grãozinhos cristalizados. – Boa sorte no teste. – Me deu um beijo rápido na bochecha.
Engoli em seco, atordoada, mas assenti. O teste era o mais importante agora.
- Vou me sair bem. Nos vemos depois.
Corri feito uma maluca tentando tirar o ocorrido da cabeça. Se estivesse pensando em , era certo que meu teste seria terrível.
Ao avistar conversando com à distância, fui invadida por uma onda de culpa. Mas por qual razão? Eu não tinha feito nada de errado. Fora só uma carona.
– Alguém perdeu a hora. – disse quando os alcancei.
- Jura? – Ergui as sobrancelhas, ofegante. – Meu pai, ele tem graves problemas com horários.
- Sei bem disso. – meneou a cabeça. – Se eu soubesse teria ido te buscar, mesmo que você fosse correr um grande risco andando de carro comigo hoje.
- Está tudo bem. – Respondi. – Eu vim de ônibus.
Nunca, nem em um bilhão de anos acreditaria que tinha sido coincidência Junior passar no ponto de ônibus na hora exata em que eu estava lá, então era melhor não contar nada.
- E o Jack? – franziu o cenho.
- Não dava tempo de esperar, eu tinha que participar do teste. – Expliquei a parte verdadeira. – AI MEU DEUS, O TESTE!
- Que teste? – Ele não entendeu.
- O teste para a peça de Outono. – lembrou. – Relaxa, ainda dá tempo.
- É verdade. Foi por pouco. – Fechei os olhos e respirei fundo. – Vejo vocês depois!
E então saí correndo antes que perguntasse mais.
🌴💚🌴
- Eis que eis que surge tua doce presença, com o esplendor de um anjo! E me envolvendo como uma suave brisa...
Franklin Bertie estava ensaiando o trecho de Shakespeare em voz alta quando entrei no auditório. Havia outros membros do grupo praticando coisas aleatórias por todos os lados, se preparando para o teste. Ashley fazia uma coisa engraçada com a boca, Ed praticava um sapateado desastrado. A única que parecia calma era Jasmine, sentada de pernas cruzadas, observando todos, calada. O que será que ela estava preparando? Com certeza devia estar se sentindo bem segura, visto que sempre ganhava o papel principal. Mas esse ano era comigo que ela teria que competir.
Eu tinha me preparado o domingo inteiro – ok, e talvez por alguns dias antes disso – para interpretar o belo monologo que Yvaine faz em Stardust, quando Tristan é transformado em um rato e ela declara seu amor por ele.
- Eu sei bem que o amor é incondicional, mas também sei que pode ser imprevisível, inesperado, incontrolável, incontido e estranhamente fácil de ser confundido com uma aversão... – Eu recitava em voz baixa o que tinha praticado em casa. – O que estou tentando dizer é... Que acho que amo você.
- Bom dia, monstrinhos! – Era Elizabeth entrando no auditório de repente.
Dei fim a minha encenação, me juntando aos outros que iam atrás dela, esperando que ela desse as orientações.
- Senhorita Elizabeth, vamos poder usar instrumentos? – Alguém perguntou.
- E objetos, com certeza objetos. – Um garoto apoiou.
- Eu posso fazer meu truque dos copos? – Uma garota ruiva de aparelho freio de burro queria saber.
- Meninos, se acalmem! – Senhorita Elizabeth, sufocada pela multidão, fez sinal para que nos afastássemos e parássemos de perguntar.
Quando finalmente nos afastamos, ela deu alguns passos atrás – obviamente aliviada.
- Fico feliz de ver que vocês têm diversos talentos, e afirmo desde já que todos serão muito bem aproveitados na nossa Peça de Outono. – Sorriu. – Entretanto, para o teste de hoje decidi usar um critério mais preciso.
Todos olharam uns para os outros em busca de uma resposta, começando a murmurar. Alguns já estavam reclamando antes de saber do que se tratava.
- Desde que nossa peça será um musical – A senhorita Elizabeth continuou. –, decidi que o teste elenco será feito da maneira mais óbvia: cantando!
Ah não.
De todas as coisas, ela tinha que querer que cantássemos?!
Todos começaram a falar ao mesmo tempo de novo, alguns parecendo já ter desistido de imediato. Eu também poderia fazer isso, visto que cantava pior que um gato engasgado. Olhei para o lado e vi Jasmine dar um sorriso de satisfação.
- Sei que peguei alguns de vocês de surpresa e sinto por isso. – Elizabeth continuou. – Para compensar, adiei o teste para esta tarde, depois da aula. Assim vocês têm tempo para escolherem uma bela canção para apresentar para mim. – Sorriu alegremente. – Agora vão, monstrinhos! Estão dispensados. Podem ir para suas aulas.
Jasmine parecia o retrato da vitória, e eu estava quase fugindo de volta para Denver. Se eu cantasse, seria a humilhação do século, mas a coisa não seria melhor se eu desistisse. Por Deus, o que eu ia fazer?
🌴💚🌴
- Não é de todo ruim. – Emma deu de ombros. – Quer dizer, você não pode ser tão ruim assim, pode?
– eu estava com a cabeça deitada em seu colo – ergueu as sobrancelhas. Ele sabia que podia, sim.
- Eu nem consigo pensar em algo que faria minha voz parecer melhor. – Choraminguei.
- Ora, então vá lá e cante mal. – opinou. – Ninguém fica de fora dessas peças; o pior que pode acontecer é você não ganhar o papel principal. O que não pode deixar é que Jasmine fique achando que conseguiu te intimidar.
- Tem razão. – Dei um longo suspiro. – Só não sei o que fazer.
segurou meus ombros, fazendo com que eu me sentasse.
- Rain, é só ir até lá e cantar algo que você goste de verdade, que tenha a ver com você. Sei que pode fazer isso.
- Eu posso? – Perguntei a mim mesma, mas assentiu. – Tudo bem, eu posso.
- Eu tenho que ir embora dar comida ao Stevie agora. – Ele avisou. – Nos vemos mais tarde, ok?
- Ok.
- Boa sorte, Pie! – acenou.
Os dois foram embora e fiquei ali sentada no banco do pátio ao lado de Emma. Faltavam cerca de quinze minutos para o início das audições.
- Vamos lá, . – Ela suspirou. – Não tem nada que você goste?
Fiquei meditando naquela pergunta por alguns instantes, tentando fazer associações...
- Vamos lá, ? – Ed Miller chamou ao passar por nós. – Está quase na hora.
Reparei, pela primeira vez, na estampa da camisa de Ed. Um enorme polvo negro com seus tentáculos espalhados. De repente, tive uma ideia brilhante.
Definitivamente nada ia fazer minha voz parecer menos pior, mas talvez eu pudesse salvar aquele teste com uma bela interpretação.
A primeira coisa que fiz quando cheguei ao auditório foi procurar por Courtney Smith. Ela quase sempre trabalhava com os figurinos, pelo que tinha me contado, então com certeza poderia me ajudar.
- Ei, Courtney! – Me aproximei.
- ! – Ela abriu um enorme sorriso, parando de se alongar. Desde que eu me tornara uma líder de torcida do clubinho de Summer, as pessoas pareciam sorrir muito mais quando eu as cumprimentava.
- Preciso de um favorzinho seu.
Mesmo sem saber o que esperar, Courtney conseguiu o que eu tanto queria, e então as audições começaram – incrivelmente mal, diga-se de passagem.
O primeiro a subir ao palco foi garoto cantando uma terrível versão de We are the champions. Não demorou para que a senhorita Elizabeth docemente o dispensasse, o que já me deixou um tanto quanto nervosa. Em seguida foi a vez de Ashley, que fez uma versão até bem afinadinha de uma música de O Mágico de Oz. No entanto, Elizabeth não pareceu ter gostado muito da ideia da garota de repetir uma música que já fora cantada ali por anos, e ao ver a cara da professora, Ashley já saiu correndo aos prantos. Pessoas cantaram rap e músicas de grupos pop dos anos 90. Passou pela minha cabeça que alguém tinha que estar gravando aquele festival de apresentações bizarras, mas infelizmente eu estava muito nervosa para tanto. Estava certa de que ia ficar muito chateado comigo.
Chegou a vez de Ed, que foi muito bem cantando Don't stop Believin e sem dúvida estava na cara que ia conseguir o papel do grande amor de Ebony Purplewood, Eric. E então Jasmine subiu no palco.
- O que tem para nós, querida? – Elizabeth perguntou. Havia um sorriso em seu rosto. Ela achava que as apresentações ruins tinham chegado ao fim.
Jasmine deu um sorriso, começando em seguida a cantar uma música que eu não conhecia.
I heard
Church bells ring
I heard
A choir singing
I saw my love
Walk down
The aisle
On her finger
He placed a ring
A voz dela era tão maravilhosa que dava vontade de chorar – tanto de emoção quanto de tristeza, porque era óbvio que eu já tinha perdido qualquer chance.
All I could do
Was cry
All I could do
Was cry
I was
Losing the man
That I love
And all
I could do
Was cry
Jasmine finalizou a música e todos estavam aplaudindo, mas eu estava muito apavorada para fazê-lo. Não desista, , não desista.
- Uau, Jas! – Elizabeth estava encantada. – De onde tirou tanta paixão? De onde tirou essa música?
- É da Beyoncé. – Jasmine deu de ombros, dando um sorrisinho doce falso.
- Maravilhosa. – A professora balançou a cabeça em aprovação. – Pode ir agora, Jas.
Jasmine saiu feliz da vida, me lançando um olhar debochado ao passar por mim.
- Espero que cante tão bem quanto mente, Pie. – Sussurrou.
- Próximo, por favor! – A professora chamou.
Era a hora. Eu não podia ir tão mal assim. Só precisava usar meu talento para interpretação. Interprete a canção, , você pode fazer isso. Talvez se minha interpretação da música fosse maravilhosa, a professora não se prendesse ao detalhe da minha voz ser como era.
- Sou eu! – Falei alto, subindo ao palco.
- Mas que droga é aquela que a Pie está usando? – Ouvi alguém perguntar.
A professora bateu palmas para que fizessem silêncio, e os demais atrás das cortinas se calaram.
- . – Ela sorriu. – O que vai apresentar?
- Vou fazer minha interpretação de uma música de a Pequena Sereia. – Respondi.
- Interessante. – Assentiu. – E que música seria.
Olhei um segundo para os outros zombando da minha capa preta – conseguida por Courtney – e voltei-me para ela:
- Poor Unfortunate Souls. É o tema da Úrsula.
- Então temos uma bruxa, han? – Elizabeth riu alegremente. – Certo, , o palco é seu.
disse para eu escolher algo que tivesse a ver comigo. Eu adorava A Pequena Sereia quando era criança, muito embora tivesse medo da Úrsula na época. Mas foi a primeira coisa que me veio à cabeça quando vi a blusa de polvo do Ed – a bruxa do mar e seus tentáculos. Agora eu só precisava me concentrar em assumir o papel.
Me virei de costas e contei mentalmente em minha cabeça o tempo da introdução da canção da vilã da Pequena Sereia, e então comecei a cantar, me movendo e balançando a capa suavemente.
I admit that in the past I've been a nasty
They weren't kidding when they called me, well, a witch
But you'll find that nowadays
I've mended all my ways
Repented, seen the light and made a switch
True? Yes
Apesar de alguns estarem fazendo uma careta, muitos dos meus colegas do clube de teatro estavam com expressões confusas no rosto. Não pude entender o que isso significava, mas Elizabeth me observava com atenção, então achei que estava tudo bem continuar, me empolgando mais ainda no papel da bruxa:
And I fortunately know a little magic
It's a talent that I always have possessed
And dear lady, please don't laugh
I use it on behalf
Of the miserable, the lonely and depressed
E me virei para Jasmine para acrescentar o tradicional:
Pathetic!
Voltando-me para Elizabeth para cantar o refrão:
Poor unfortunate souls!
In pain
In need
This one longing to be thinner
That one wants to get the girl
And do I help them?
Yes, indeed
Those poor unfortunate souls!
So sad
So true
They come flocking to my cauldron
Crying, "Spells, Ursula, please! "
And I help them?
Yes, I do
Finalizei ajoelhada no chão. Esperei que o silêncio estranho dos outros passasse e olhei para o lado. Ed me encarava indeciso, mas ao concluir que já tinha acabado, começou a bater palmas educadamente. Alguns outros o acompanharam. Elizabeth também aplaudiu.
- Que performance interessante, ! – Ela disse. – E sem dúvida memorável.
- Sério? – Me espantei. – Quer dizer, claro, obrigada, Elizabeth.
Saí do palco satisfeita e a professora foi nos encontrar atrás das cortinas.
- Bem, meninos, já fiz minhas anotações. Encontro vocês amanhã às dez horas para nomear os atores. Estão dispensados.
Jasmine parou em frente a mim sorrindo.
- Do que você chama aquela bizarrice, Pie? – Perguntou. – Não, não responda. O que importa é que amanhã – Ela me empurrou com o dedo indicador. – você vai descobrir seu verdadeiro lugar nessa escola: pintando cenários e batendo martelos para que as pessoas realmente importantes possam brilhar. Estava demorando.
Ela saiu antes que eu tivesse tempo de responder, e eu também não fazia questão. Depois de toda aquela pressão psicológica, tudo que eu queria era uma taça de sorvete Napolitano e um bom filme.
🌴💚🌴
Fiquei tão feliz por finalmente estar em casa que larguei minha mochila ali mesmo, na entrada. Stevie veio correndo me receber, enquanto um cheiro delicioso invadiu minhas narinas.
- Bebezão! – Me abaixei para brincar com o dálmata. – O que tem para comer aqui? – Perguntei a ele, que latiu. – Oh, parece que é... – Segui o cheiro até a cozinha. – Pizza?
Em cima da bancada de madeira estavam duas caixas de pizza – uma delas, já aberta.
- Quem comprou isso? – Falei sozinha. – , você está aí? Pai? – Chamei, sem deixar de encarar a comida.
Me aproximei mais para olhar bem para a pizza, constatando então que era de berinjela. Que horror! Quem faria aquilo comigo?
- Eca, vocês ficaram malucos? – Resmunguei em voz alta, bem na hora que entrou pela porta dos fundos.
O garoto estava com uma cara que eu nunca tinha visto. Primeiro pareceu estar viajando; depois, quando percebeu que eu estava ali, seu rosto tomou um ar ansioso.
- ! – Exclamou. – Que bom que chegou. Você tinha mesmo que chegar.
- Queria ter chegado antes de vocês pedirem esse troço. – Fiz uma careta. – Qual o problema de vocês? Ninguém nesse mundo gosta de pizza de berinjela, a não ser...
- Estava falando mal de mim, sua babaca?
Olhei para trás, sem acreditar na voz que ouvira. Entretanto, era mesmo ela. Sofia, minha prima. O cabelo ruivo da garota estava preso em um rabo de cavalo, ela usava um short jeans e uma camisa larga onde se lia "Pretty good at bad decisions".
- Sofia! – Exclamei correndo para abraça-la. Ela estava cheirando a sabonete. – O que está fazendo aqui? Quando chegou?
- Hoje à tarde. Você estava na escola.
- O papai sabia que você vinha? – Eu estava tão feliz por vê-la. – E a escola?
- O tio Jack não sabia que eu estava vindo. – Ela explicou. – Depois de mil coisas terem dado defeito naquela escola maldita, os professores decidiram que as condições lá não eram favoráveis a um trabalho digno. Entraram de greve hoje. E eu vim tirar umas férias aqui. Achei que seria legal pegar vocês de surpresa.
- Puxa! – Exclamei. – Quer dizer, isso é maravilhoso! – A abracei de novo. – Como achou nossa casa? Pensei que não se lembrasse do endereço.
- Eu não, mas a mamãe o anotou para mim. Vim no meu carro e procurei pela rua. – Ela pegou um pedaço de pizza e se sentou num banco alto. – Por sorte essa foi a primeira porta que bati. Adivinha só quem atendeu. – Ela deu um sorriso malicioso.
apareceu à porta então, trazendo algo nas mãos. Ele olhou rapidamente para mim, e então para Sofia.
- Trouxe o saco de dormir. – Disse a ela. – Está meio velho, mas acho que vai servir.
Então eles já tinham se conhecido. Era maravilhoso! Meu melhor amigo e minha melhor amiga ficando amigos.
- Pra mim está perfeito. – Sofia sorriu. – Você é muito prestativo, .
- Obrigada, eu acho. – Ele sorriu de um jeito pouco comum, passando a mão pelo cabelo. – E então, , como foi o teste pra peça? – Virou-se para mim.
- Ah, acho que bem. A senhorita Elizabeth disse que minha apresentação foi memorável! – Contei alegre.
- O que você fez? – Sofia quis saber.
- Cantei uma música.
Minha prima parou a pizza antes que chegasse a boca. ergueu as sobrancelhas. me encarou.
- Você cantou? – Sofi repetiu. – Teve a audácia de subir num palco e cantar?
- Ah, qual foi? – Rolei os olhos, abrindo a outra caixa de pizza. – A professora disse que gostou.
- Não, ela disse que foi memorável. – corrigiu. – Sabe o que também foi memorável? O live action do Dragon Ball Z.
- Vai ver chamou atenção de um modo positivo. – considerou, e sorri porque pelo menos alguém levava alguma fé em mim.
Sofia se virou para o garoto.
- Você canta também, não é, ? – Perguntou com interesse.
- Hanram. – Ele assentiu um pouco tímido. – Canto, sim. Mas não exatamente de forma profissional... Quer dizer, o Jack me deixa cantar com a banda às vezes, mas não é todo dia.
- Eu adoraria te ouvir cantar. – Ela sorriu.
- Então, pessoal... – deu um passo à frente de repente. – Aposto que a pizza está ótima! – Ele pegou um pedaço da pizza vegetariana.
- Você comendo berinjela? Sério? – Arqueei uma sobrancelha.
- Achei que não aguentava mais ver legumes depois dos últimos dias que passou com Amber. – arqueou uma sobrancelha, se aproximando e pegando uma fatia também.
- Ora, pessoal, não vão ser os conselhos persistentes de uma coleguinha de escola que vão me fazer tomar asco dessa delícia de berinjela.
- Coleguinha de escola? – Eu o encarei. – Sério?
- "Conselhos persistentes". – fez aspas no ar, fazendo Sofia rir.
deu de ombros, mordendo um pedaço da pizza. Sofia o encarou com atenção, e eu já poderia dizer que ela estava pensando que ele era bem estranho.
- Não acredito que finalmente estou aqui no QG de vocês! – Minha prima olhou para mim e para . – A sala de reuniões da farsa mais maluca de todos os tempos.
- Ainda é estranho falar com mais alguém que sabe a verdade. – comentou, indo até a geladeira para pegar uma garrafa de suco e se servindo de um copo.
- É verdade. – Concordei franzindo o nariz. – Temos sido só nós três por tanto tempo!
- Dizem que duas pessoas só podem guardar um segredo se uma delas estiver morta. – observou. – Qual é a regra quando são quatro?
Sofia ergueu uma sobrancelha, sorrindo misteriosamente.
- Acho que três de nós terão que ir pro buraco até o fim disso. – Sugeriu, dando um gole no suco que lhe oferecera.
Lá estava a cara de bocó de de novo, como se tivesse ficado fora do ar. Não saberia dizer se ele tinha ficado com medo da possibilidade ou se apenas tinha achado Sofia muito bonita.
A porta da frente bateu. Deduzi que o resto de minha família tinha chegado.
- Ora, de quem é aquele carro na entrada? – Papai foi logo perguntando. Quando nos encontrou na cozinha, seus olhos se iluminaram. – Ariel! O que está fazendo aqui? – Ele estendeu os braços, para onde minha prima correu. Ele costumava chamá-la assim desde pequena, porque ela era ruiva e morava perto do mar.
- Meus professores entraram em greve. Vim passar uns dias. – Ela explicou. – Minha mãe também queria saber se você está alimentando a .
- Seja bem-querida, pode ficar quanto tempo quiser. E diga a minha prima que eu tenho mais juízo do que ela pensa. – Papai deu um sorriso debochado. – Isso é pizza de berinjela? Que maravilha! – Foi para perto da bancada.
Miguel apareceu à porta, olhando com uma cara um tanto quanto surpresa para cada um de nós.
- Miguel. – Me aproximei dele. – Esta é a Sofia, minha prima. Lembra de como eu te falava dela?
- Lembro, é claro. Você quebrou a boneca dela. – Miguel meneou a cabeça. – É um prazer, Sofia.
- O prazer é literalmente todo meu. – Ela o encarou e depois me lançou um olhar malicioso. Rolei os olhos.
- Bom, acho que está na minha hora. – disse então.
- Sério, ? – o encarou nada feliz.
- Muito sério. Minha mãe quer falar comigo. – Ele empurrou o amigo, mas parou em frente à minha prima. – Foi um prazer te conhecer, Sofia. – Disse.
- Ainda vai ter o prazer de me ver por muitos dias, se tudo correr bem. – Ela apoiou o queixo nas mãos e sorriu.
- Também foi um... – tentou falar para ela. Engoliu em seco. – Foi um...
- Acho que o garoto quer dizer que ficou feliz por conhecê-la. – Miguel completou por ele. o encarou confuso. – Não tem de quê, moleque. A porta da rua é serventia da casa.
parecia indignado, mas ainda tinha medo demais de Miguel para contestar. se despediu novamente e saiu levando o amigo.
- O garoto já me tira do sério falando, não é um bom dia para ouvi-lo gaguejar. – Miguel explicou quando voltou, pegando um pedaço da outra pizza, que eu já tinha aberto. Eu e Sofia rimos do comentário.
- Vamos lá pra cima, temos muito o que conversar! – Corri puxando Sofia pelas mãos.
Arrastei minha prima escada acima, fechando a porta do quarto quando entramos. Fiquei a encarando com um sorriso enorme no rosto.
- O que foi? – Ela quis saber.
- Nada, eu só estou tão feliz por ter você aqui! – A abracei de novo.
- Também estou feliz por estar aqui. – Ela me abraçou de volta. – Você não faz ideia do quanto estava ansiosa para vir. – Se jogou na cama. – Agora, que tal me contar em que fase está o plano do século?
A pergunta me pegou de jeito. Minha alegria por ter Sofi ali tinha me feito esquecer de como andara mentindo para ela sobre o que realmente estava fazendo. E Sofia me conhecia melhor que ninguém, bastava um piscar de olhos suspeito para que ela me descobrisse. Precisava dar um jeito de ser uma ótima atriz até que ela fosse embora, porque ela ia acabar com minha raça se soubesse que eu ainda queria ficar com .
- O plano tem ido bem. – Forcei um sorriso confiante, me sentando ao lado dela. – Eu tenho ajudado a Summer, na verdade. Bancando a amiga do para ajudá-la a voltar com ele.
- E isso não está destroçando seu coração ferido nem um pouco? – Ela ergueu a sobrancelha, incrédula. – Juntar aquele otário com a ex?
- Ah, na verdade não. – Dei de ombros. – Se quer saber, eu já superei o . Só quero dar um desfecho a essa história, sabe? Além disso, eu não faço nada demais, só falo com ele sobre isso às vezes. – Expliquei, mas Sofi continuava me olhando com desconfiança, então emendei outro assunto. – Mas eu não nem tenho tido tanto tempo para essas besteiras. Tenho treinado muito agora que sou líder de torcida.
- Argh, você é ridícula! – Minha prima riu jogando um travesseiro em mim. – Nós combinamos, , que nunca faríamos esse tipo de babaquice!
- Nós tínhamos sete anos! – Me defendi. – Além disso, é um exercício ótimo, pra falar a verdade. Estou toda quebrada. – Caí de costas no colchão.
- Fala sério. – Sofia jogou o travesseiro em mim de novo, rindo.
E mesmo com o risco de ser pega e desmascarada pela pessoa mais crítica e metida a sabichona do mundo, não conseguia não ficar extremamente feliz por tê-la ali comigo.
🌴💚🌴
- Não é terrível que você tenha que ir para a escola enquanto eu fico andando à toa pela cidade? – Sofia perguntou no dia seguinte, enrolando uma mecha cor de rosa do cabelo enquanto eu me vestia.
- Por que não aproveita seu passeio para ver se eu estou na esquina? – Devolvi ácida, embora rindo.
- Não se preocupe, , quando você voltar vamos nos divertir juntas. – Ela sorriu. – Você vai de ônibus ou com o carro do Jack?
- Nenhum dos dois. – Respondi ajeitando o cabelo. – Papai às vezes precisa do carro, então vem me buscar todos os dias.
- Ah, o ! – Se sorriso se tornou maior e malicioso. – Isso me lembra que tenho uma pergunta. – Sofia se aproximou de mim como se fosse contar um segredo. – Por que não me disse que ele era um gato? – Quis saber. Depois, ao ver minha cara, se jogou na cama gargalhando.
- Não entendi. – Fiz um bico, voltando a olhar para o espelho.
- É que... Você sabe, eu tinha visto as escassas fotos dele em redes sociais e você tinha comentado que ele era um doce, mas você foi bem longe de ser justa e deve saber disso. Ele é muito gato. – Ela ergueu as sobrancelhas para mim.
- É o que dizem. – Bufei e me virei para minha prima. – Quer dizer, ele é bonito. Bem bonito, ok. Mas vai ver você só está tão encantada porque acabou de conhecê-lo.
- Você ficou assim quando o conheceu?
- Não, porque eu estava muito ocupada sendo obcecada por encontrar o . – Menti. A verdade era que eu tinha ficado bem impressionada com logo que o conhecera, apesar de estar mesmo obcecada pelo .
- De toda forma, ele não é só bonito. – Ela continuou, sentando-se. – Ele me pareceu bem... Interessante. Gentil, engraçadinho, toca contrabaixo...
Como aquela conversa tinha chegado àquele assunto quando Sofia não estava nem a vinte e quatro horas em Jacksonville Beach?! Fala sério, só o que me faltava era que ela estivesse interessada em . Quer dizer, não que eu fosse ficar chateada com isso, porque eles eram meus dois melhores amigos afinal, mas...
A buzina na rua me fez sair de meus pensamentos. tinha chegado. Sofia me olhou com uma cara sapeca, preparando-se para saltar da cama.
- Sofia, é melhor você se compor...
Mas em um segundo ela tinha pulado como uma gata e saído correndo escada a baixo. Tive que ir atrás dela a toda. Papai e Miguel já estavam acordados e, não estando acostumada com aquele teatro como nós éramos, minha prima poderia dar uma de ela mesma e atacar na frente deles.
- Oi, . – Ela disse docemente abrindo a porta.
arregalou os olhos primeiro, depois sorriu.
- Oi. – Cumprimentou. – Eu vim buscar a . – Informou, ignorando totalmente o fato de que eu estava ali na escada. Rolei os olhos.
- Eu sei. É mesmo um namorado ótimo. – Ela elogiou, e ele riu daquele jeito que deixava Jodi vermelha.
- Como estava o saco de dormir? – Perguntou.
- Ótimo. Sonhei com os anjinhos.
Certo, já era demais para mim, terminei de descer as escadas antes que eu vomitasse.
- Já deu. – Resmunguei passando pela porta e puxando pela alça da mochila. – JÁ ESTAMOS INDO, PAI! – Gritei.
- Até depois, meu bem! – O ouvi responder.
- Até mais tarde, ! – Sofia acenou.
De cara feia, dei a volta no carro e entrei. se sentou ao banco do motorista. Depois de ligar o carro, ele olhou para mim.
- Você está bem?
- Só anda! – Ordenei. – Meu dia vai ser muito cheio. Não estou com tempo para essas coisas.
- Tá bom! – Ele respondeu absorvendo meu mau humor para si.
não deu carona a naquele dia, e seguimos até a Jacksonville High sem conversar quase nada. Me separei dele logo na entrada, porque meu dia realmente seria muito cheio. A primeira parte dele consistia em duas aulas de História, nas quais Summer também estaria presente.
- Bom dia, flor do dia. – Ela se sentou à minha frente.
- Bom dia, Cher. – Provoquei ainda meio mal-humorada. Em minha última visita à sua casa, eu e Summer tínhamos assistido As Patricinhas de Beverly Hills, e eu tinha rido bastante durante o filme ao compará-la à protagonista loira e rica vivida por Alicia Silverstone.
- Não que eu tenha me ofendido – Ela sorriu. – mas o que foi que aconteceu? Parece que acordou com o pé esquerdo.
- Minha prima chegou à cidade ontem, só estou cansada porque ficamos conversando até tarde.
- Sua prima? – Ela arregalou os olhos azuis. – Aquela que mora em Venice Beach?!
- Ela mesma, Sofia.
- Que demais, ! Já estou louca para conhecê-la. – Animou-se.
- Você é mesmo igualzinha ao em tudo. – Dei um sorrisinho infeliz.
- Ahhhhh! Já entendi tudo. – Summer fez uma cara engraçada. – Está com ciúmes do !
- O quê? – Franzi o cenho. – Eu? Com ciúmes do ? Por favor, mas é claro que não. Sofia é minha prima. É minha melhor amiga desde sempre.
- Ah, , não tem nada de mal nisso. – Ela riu. – Uma vez apresentei o Junior a uma colega minha que era modelo. Ela jogava futebol e eles se deram às mil maravilhas, e eu fiquei morrendo de ciúmes, mesmo sabendo que não tinha nada a ver. – Deu de ombros. – é seu namorado e acabou de conhecer a Sofia, é normal que você fique assim se ela é tão descolada quanto os meninos dizem. Mas relaxa, você é a namorada dele por algum motivo.
Sim, e o motivo é que eu o obriguei a isso, pensei. Infelizmente não podia dar aquela informação privilegiada a Olsen.
- Eu vou ficar bem com isso. – Respirei fundo. – É só que eu também estou nervosa porque hoje saem os resultados do teste do grupo de teatro. E ainda temos que ensaiar depois.
- Estou certa de que você vai se sair bem no teste, embora, é claro, sempre haja a Jas. – A loira fez uma careta.
- Por que ninguém me avisou que ela cantava tão bem? – Reclamei.
- Pensei que ela já fizesse o favor de lembrar todos disso a todo momento. – Summer riu, e fui obrigada a rir também. Aquilo era verdade, mas eu nunca pensei que fosse tão sério.
Depois das aulas de História, Summer me desejou boa sorte e tomei o caminho do matadouro – vulgo, o auditório da Jacksonville High. A primeira pessoa que reparei quando entrei foi Jasmine, com o cabelo escuro longo solto e um cachecol de tecido leve azul. Ela já exalava aquele arzinho arrogante de quem conseguira o que queria.
- Ei, . – Ed Miller se aproximou de mim. Seu penteado black power estava especialmente bonito naquele dia. Ele estava acompanhado de Franklin Bertie.
- Oi, meninos. – Cumprimentei.
- E então, preparada para o resultado? – Ed perguntou. Havia um sorriso de ansiedade em seu rosto, bem mais humilde que o de Jasmine, apesar de ele ter arrasado no teste.
- Estou um pouco nervosa. – Admiti. – Sabe como é, não sei como fui.
- Pois eu estou muito seguro esse ano! – Franklin estufou o peito. – Acho que posso até ganhar o papel de Eric.
O sardento Franklin Bert tinha cantado um rap do 50 Cent em sua apresentação, o que havia sido, de longe, algo que eu não tinha nem palavras para descrever – tal qual a senhorita Elizabeth depois da apresentação. Dava para perceber que Ed pensava do mesmo medo que eu, mas, sem querer desanimar o amigo, o garoto apenas deu um sorriso amarelo.
A senhorita Elizabeth saiu de detrás das cortinas do palco. Nós nem sabíamos que ela estava ali aquele tempo todo, mas ela trazia alguns papéis em suas mãos – com toda certeza contendo os resultados.
- Bom dia, meus jovens cheios de talento! – Ela exclamou. Todos se aproximaram do palco. – Chegaram cedo. Devem estar curiosos. – Riu. – Bem, gostaria de dizer que foi muito difícil escolher alguns desses papeis... Outros nem tanto. – Ela fez uma careta. – Se algum de vocês não tiver sido escalado para o papel que queria, sinta-se à vontade para conversar comigo para entender minha decisão. Com certeza ela teve um motivo.
Meu estômago gelou só de ouvir aquilo. Havia motivos de sobra para Elizabeth não me querer em um musical. O primeiro motivo era o fato de ela não ser surda.
- Sei que estão muito ansiosos para saber quem será o que. Então, sem mais delongas, vamos aos resultados.
Elizabeth se sentou na ponta do palco, as pernas pendendo, enquanto lia com atenção – e em silêncio – a primeira folha. Nos sentamos nas cadeiras da primeira fileira, eu ao lado de Ed e Franklin. Jasmine, sentada na ponta oposta, deu um sorrisinho debochado para mim e acenou.
- Edward Miller. – A professora chamou o nome. – Você será Eric Templeton, o grande amor da nossa protagonista, Ebony.
Todos bateram palmas. Apertei a mão de Ed.
- Parabéns, Ed! – Comemorei. – Sabia que você ia conseguir!
- Obrigado! – Ele sorriu para mim, muito alegre. – Obrigado, senhorita Elizabeth!
- O mérito é todo seu, Ed. – A professora sorriu. – Continuando...
Ao contrário do que eu esperava, os papeis nomeados depois do de Ed foram todos secundários. A cada nome chamado meu coração apertava um pouco mais. Cada personagem que ganhava um ator era menos uma chance para mim. Isso porque, depois de um tempo e de ver a decepção que atingia aqueles que eram convocados para serem parte da produção, eu percebi que me contentava com qualquer mínimo pedaço de atuação. Uma pedra, uma árvore, qualquer coisa, Deus, eu rezava em pensamento.
- Tori Hart – A professora chamou a menina, que para variar, também sabia cantar. – Você será Valerie, o verdadeiro amor de Eric, de quem Ebony o rouba.
Os amigos de Tori – todos eles já com uma ocupação definida – comemoraram muito a notícia. Aquele era um dos papéis de destaque. Olhei para os lados e meu coração gelou. Os únicos que haviam sobrado era eu, Jasmine e Franklin Bert. Contei nos dedos discretamente, me dando conta de que só havia mais dois papeis disponíveis. Alguém ia pintar cenários.
- Franklin. – Elizabeth disse, me deixando ainda mais ansiosa. – Você será Castigo, o corvo de estimação de Ebony.
Jasmine deu um longo suspiro, nem se esforçando tanto para esconder o enorme sorriso que tomou seu rosto. Ela tinha certeza de que eu ia ficar na produção.
Meu coração batia descompassado. Se ela não chamasse logo meu nome, eu ia enfartar.
- . – A mulher disse então. – A sua voz é... – Ela fez uma expressão pensativa. – Terrível.
E foi isso. Senti meu corpo inteiro cair de tristeza e frustração. Eu não ganhara nem o papel de uma droga de arbusto, e tudo porque não sabia cantar. Grande coisa!
- Muito ruim mesmo. – Elizabeth continuou. – O que é surpreendente, visto que quando você fala ela soa tão agradável.
Jasmine cobriu a boca para rir, mas não conseguiu se conter.
- Desculpe, desculpe! – Ela pediu.
A atenção de Elizabeth foi para a garota então.
- Jasmine. – Ela disse docemente. – Sua voz é maravilhosa, quase como um coro de anjos. E eu adorei a música que cantou em seu teste, já até baixei no meu celular.
Jasmine ergueu a cabeça, um sorrisinho de triunfo brincando no rosto. Ouvi pessoas ao meu redor resmungarem, insatisfeitas por ela estar prestes a conseguir de novo.
- No entanto... – Elizabeth voltou a falar, chamando a atenção de todos. Jasmine pareceu ficar confusa. – No entanto, Jas, a sua performance não me surpreendeu muito.
A cara de Jasmine foi no chão. Muitos de nossos colegas riram discretamente.
- Você não conseguiu me convencer de seu sofrimento, sua interpretação da música foi bonita, mas não muito teatral. A por outro lado... – Elizabeth desceu do palco, olhando para mim. – Sua performance foi absolutamente maravilhosa, ! – Ela gesticulou com as mãos. – Você parecia uma verdadeira bruxa cruel e ardilosa lá em cima. E é exatamente disso que precisamos no papel de Ebony Purplewood. Sendo assim...
Meu coração pulava de felicidade, sabendo o que eu estava prestes a ouvir. Quase tive que morder a língua para conter minha vontade de debochar de Jasmine.
- fará o papel de Ebony Purplewood... – A professora informou.
- SIM! – Comemorei ficando de pé.
- NÃO! – Jasmine se colocou de pé também, uma expressão furiosa em seu rosto.
- E Jasmine... – Elizabeth continuou falando. – Irá cantar as músicas para que ela as duble.
- NÃO! – Eu e Jasmine protestamos ao mesmo tempo.
- Demorei para encontrar essa conciliação, vocês não vão me fazer mudar de ideia meninas. – A professora balançou o dedo. Todos pareciam estupefatos. – , você atua muito bem. E, Jasmine, você canta muito bem. Gostaria de poder jogá-las em um caldeirão e tirar dele uma atriz de musicais perfeita, mas não posso. Sendo assim, atuará normalmente nas falas de Ebony, mas Jasmine é que cantará as canções, dos bastidores. Assim que os ensaios começarem, vamos começar a trabalhar na sincronização. – Antes que Jasmine protestasse mais, a professora bateu palmas. – Isso é tudo, monstrinhos! Entrarei em contato para marcarmos o primeiro ensaio.
Sem saber se tinha ficado ofendida ou grata pela decisão de Elizabeth, me encaminhei para a saída do auditório atrás dos outros. Ed Miller se aproximou de mim e pôs a mão em meu ombro.
- Ei, nós conseguimos! – Ele comemorou, me puxando para um abraço animado. – Somos os protagonistas!
- Sim... Conseguimos. – Abri um sorriso. Olhando rapidamente para trás, percebi que Jasmine tinha ficado e argumentava ferozmente com a professora Elizabeth.
Bom... Pensando bem, no fim das contas, eu tinha conseguido o papel de Ebony Purplewood, e a senhorita voz de anjo tinha ficado mesmo nos bastidores, não é? Olhando por esse lado, as coisas tinham ido muito bem para mim. Eu ia ficar com todo o destaque e as congratulações, enquanto Jasmine espumava de ódio atrás das cortinas.
Pensando muito bem, as coisas tinham saído perfeitamente, incrivelmente bem. Abri um enorme sorriso, acompanhando o animado Ed para fora do auditório. Mal podia esperar para esbarrar com minha querida Jas de novo para parabeniza-la pelo papel que tinha conseguido. Ia ser tão divertido.
POV
Vi à distância quando entrou no auditório acompanhada de Edward Miller, um cara que fazia uma matéria comigo. Chamei o nome dela, esperando desejar boa sorte, mas ela não me ouviu.
De todo modo, não tinha certeza se ela ficaria feliz ou não comigo falando qualquer coisa. Ela estava muito estranha naquela manhã, agindo como se eu tivesse comido o último pedaço da pizza de banana com caramelo dela.
- Oi, ! - Amber apareceu de repente no fim do corredor.
- Ei, Amber. – Cumprimentei.
- Você viu o por aí?
- Na verdade, ainda não o vi hoje.
- Estranho. – A menina fez uma careta. – Mandei tipo, mil mensagens, e ele não respondeu nenhuma. Isso nunca aconteceu.
- Se eu o encontrar por aí, digo a ele que você está procurando por ele.
- Obrigada. – Sorriu. – Em todo caso, ele tem treino com o time hoje, então vamos nos ver de qualquer jeito.
Assenti e sorri quando ela se afastou, tão concentrada no celular que quase empurrou para dentro da lixeira uma garota que passava carregando uma caixa com pedaços de um planetário.
Era mesmo ridículo pensar que minha discreta amizade com Summer nunca tinha feito com que qualquer uma das pessoas da mesa VIP quisesse falar comigo, mas meu namoro fantasioso com – que eles mal conheciam – tinha feito com que eles praticamente me enxergassem como igual. Difícil entender como funcionava a cabeça daquela gente.
Inclusive a da própria .
Por que diabos ela estava com aquele mau humor? Achei que ela fosse ficar alegre pela chegada da prima. Seria TPM talvez? Ou havia algo incomodando ela? Seria estranho, porque ela estava bem até...
- Bom dia, . – Rosana Wayans passou por mim rapidamente.
- Bom dia, Rosana. – Respondi. Foi aí que tive um estalo.
Me lembrando das últimas semanas e todas as ocasiões em que eu tinha deixado de mau humor, uma possibilidade me veio à cabeça.
Não. Não podia ser isso, podia?
Ela não podia estar daquele jeito por que eu estava talvez flertando um pouco com a Sofia? Por eu ter feito isso na frente dela, naquela manhã?
Eu realmente não tinha imaginado que ela fosse ligar para isso. Quero dizer, aquilo não era sério. Sofia era muito bonita e divertida, mas ela prima da minha namorada de mentira. E isso soa mesmo muito ridículo. Nós tínhamos mesmo nos dado muito bem, e sim, eu tinha flertado com ela no dia anterior e naquela manhã também, mas eu não ficaria com a melhor amiga da quando estávamos atolados até o pescoço naquela bagunça de namoro falso. E quando, por sinal, eu estava apaixonado de verdade pela .
- Psiu!
Dei um passo para longe do bebedouro e virei a cabeça para ver de onde vinha o assobio, descobrindo, estupefato, que era a própria Sofia.
- Ei! – Caminhei em sua direção. – O que está fazendo aqui.
A garota levantou os óculos escuros e sorriu.
- Vim conhecer a escola de vocês. – Explicou. – Já descobri que não é muito seguro, deixam qualquer um entrar.
- Não posso questionar isso. – Ri um pouco. – A está tendo aula agora, estou esperando o próximo tempo começar porque meu professor faltou.
- Legal. Por que não me leva para dar uma volta?
- Claro.
Guiei Sofia pelos corredores da Jacksonville Beach High School, e depois pelo lado de fora. Enquanto andávamos, ela perguntava sobre as últimas semanas e nosso namoro de mentira, e narrei para ela alguns dos episódios da nossa farsa.
- Eu nunca pensei que a fosse tão maluca. – Estávamos perto do ginásio e ela balançava a cabeça. – Quero dizer, ela sempre gostou de um teatrinho de vez em quando, desde pequena, mas sempre foi tão centrada. Eu era a peste e ela era a boazinha, sabe? – Riu. – Quando éramos crianças, era ela quem sempre estragava nossos planos, porque não sabia mentir.
- Ela deve ter feito um cursinho em Denver então. – Suspirei, com as mãos nos bolsos. – E com certeza teve um ótimo professor.
- Foi o , . – Sofia disse com tristeza. – O ótimo professor que ela teve. Ele acabou com a capacidade de autocontrole da . Partiu o coração dela, e aí o resto todo foi afetado.
Engoli em seco, me lembrando de quando descobrira o que Junior tinha feito.
- É por isso que eu estou aqui hoje. – A garota disse então, dando um sorriso maléfico.
Olhei para ela sem entender, mas por algum motivo não gostando nada daquela cara.
- Do que está falando?
- Estou falando do tão esperado momento em que vai aprender a não mexer com mais nenhuma garota da família Pie. – Ela bateu de leve na bolsa preta que carregava e olhou no relógio de pulso. – Vamos logo, você vai ter que me ajudar!
Quando dei por mim, Sofia já estava andando rumo ao interior da escola, e eu estava com uma péssima, péssima intuição enquanto a seguia.
- Sofia, o que você vai fazer?! – Perguntei tentando ser o menos barulhento possível, correndo atrás dela no corredor da escola.
- Por acaso te disse qual é minha melhor matéria na escola, ? – Ela perguntou sem olhar para mim. – É Química. – Olhou rapidamente para trás, dando uma risadinha.
Apressei o passo, mas Sofia parou abruptamente de andar e esbarrei nela.
- Agora vamos ver... – Ela bateu o dedo no queixo, estreitando os olhos. – Onde fica o armário do ?
Ela estava mesmo esperando que eu respondesse aquilo quando era óbvio que tinha algum absurdo meticulosamente arquitetado?
- Não vou te dizer! – Exclamei como se fosse óbvio. – Que diabos você quer com o armário dele?
- Quero vingança, ! – Respondeu impaciente. – Mas por hoje vou apenas fazer uma brincadeira malvada.
- Sofia, eu não acho que isso seja boa ideia. – Balancei a cabeça. – Se você quer saber, a nem está mais com raiva dele...
- E QUEM LIGA PARA O QUE A PENSA, TOM? – Ela exclamou indignada. – A minha prima é louca! Ela pensa que achou o caminho da paz interior se martirizando para AJUDAR o a ter uma namorada iludida e bonita, mas sabe o que realmente faria ela se sentir melhor? Explodir uma bomba fedida no armário dele.
Mesmo fazendo o possível para pensar de forma lógica, uma voz interior alta demais me dizia que eu não devia impedir Sofia. Junior merecia qualquer coisa que ela fizesse, e ainda seria pouco. Eu só podia estar ficando louco.
- Sofia... – Ainda tentei falar.
- Me diga, . – Ela insistiu, sem me deixar terminar. – Me diga que você não quer ver esse negócio explodindo na cara do , e aí eu vou embora levando essa mochila. – Disse. – Mas se o seu senso de justiça diz, assim como o meu, que aquele desgraçado merece isso, então você vai me levar agora mesmo ao armário dele, porque temos pouco tempo.
Sofia ficou me encarando com uma sobrancelha erguida, os olhos verdes ameaçadores, enquanto eu questionava até que ponto ia minha preocupação com ser pego por algo do gênero.
Menos de dois minutos depois, já estávamos em frente ao armário de Junior .
- Mas eu não sei a combinação. – Avisei, meu braço apoiado no armário do lado enquanto eu vigiava o corredor.
- Por favor, , não me ofenda. – Ela deu um sorrisinho. – Está falando com uma profissional.
A ruiva se aproximou do armário de Junior, segurando a tranca com cuidado. Ela colou o ouvido à porta e começou a girá-lo, e, para a minha admiração, em poucos segundos ouvimos o clique do destrancar. Meus olhos se arregalaram e Sofia me encarou presunçosa.
- Obrigada, eu sei.
Balancei a cabeça, voltando a me lembrar do tempo curto.
- Tá, agora anda logo.
A menina abriu a mochila, de onde tirou um pote de vidro onde estava enfiada uma bola de soprar roxa, cheia de alguma coisa. A bola parecia apertada ali dentro, pronta para explodir a menor tentativa de abrir o pote. A tampa tinha um laço cor de rosa colado. Um leve fedor entrou pelas minhas narinas, e fiz uma careta.
- Olá, minha bonitinha. – Sofia ria feito uma maluca. – Está sentindo, não está? – Olhou para mim, mordendo o lábio. – Ele também vai sentir. Com sorte, esse perfume vai ficar impregnado nele por uma semana.
- Que porcaria é essa? – Tampei o nariz.
- Uma mistureba química. Não se preocupe, não é mortal nem vai causar alergia. Provavelmente. – Deu de ombros. – Agora nosso bonitão só tem que vir aqui, se perguntar o que é isso e abrir o pote. – Ela colocou o vidro lá dentro.
- Legal. Agora podemos ir. – Concluí nervoso.
- Ah, por favor, temos que ficar para ver! – A garota desdenhou.
- Você ficou doida? Ninguém pode te ver aqui!
- Ah, mas eu só quero ver a cara do . – Choramingou. – Eu viajei quilômetros por esse momento.
Eu até entendia, mas a questão era que – com aquele cabelo e aquele estilo – Sofia seria notada naquele lugar mesmo que estivesse usando a capa da invisibilidade do Potter. E se alguém soubesse que a prima de Pie tinha sido responsável por aquilo, dezenas de fofocas e perguntas perigosas iam começar a se espalhar.
- Se contenta se eu filmar? – Sugeri.
- Dependendo do ângulo, acho que é suficiente para mim... – Ela ponderou. – Tá. – Concluiu. – Mas quero que pegue o exato momento em que a bomba explode. A reação do .
- Tudo bem. – Concordei.
- Ah, tem mais uma coisa! – Lembrou, tirando uma caneta da bolsa. – Me dá um papel.
Com pressa, abri minha mochila e arranquei um pedaço de folha do caderno. Sofia o apoiou no armário ao lado do de Junior e escreveu algo. Me aproximei para ler.
"Você fede, canalha.
XoXo,
Sofia Pie"
Inclinei a cabeça para o lado e ergui uma sobrancelha para ela.
- Não tem problema se ele souber que fui eu. – Ela disse.
- Não, acho que não. – Concordei, e ela colocou o bilhete embaixo do pote, fechando o armário em seguida. – Queria poder assinar também, mas já que não rola, vou me contentar em ver a cara dele.
- Valeu, . – Sofia deu um sorriso malicioso e me beijou na bochecha. – Sabia que você era mais divertido do que a fazia parecer. – Começou a se afastar. – Pode deixar que eu gravei o caminho. Nos vemos mais tarde.
Sofia andou rápido com suas botas de salto grosso até desaparecer no fim do corredor. O que ela queria dizer com aquele comentário? Então me achava chato? Ou só fazia as pessoas acharem que eu era? O que, afinal, ela falava de mim para os outros?
Ainda não estava satisfeito com nenhuma das duas possibilidades quando o sinal do intervalo soou. Estava na hora.
Por sorte, a sala onde tinham aula naquele momento era bem próxima dali. Assim que os outros alunos começaram a sair das salas, corri para alcança-lo.
- . – Ele disse. Parecia mais estranho que de costume. – Eu queria mesmo...
- Deixa a conversa pra depois. – Puxei sua mochila com cuidado, e ele me acompanhou andando para perto do armário de Junior.
- O que está havendo? – Quis saber.
- Você vai ver daqui a pouco. – Olhei por sobre seu ombro, procurando no corredor. – Melhor nos afastarmos um pouco.
Caminhamos para alguns metros mais longe e eu me apoiei de lado em um armário, tendo vista para o local onde a bomba explodiria.
- Seu celular é melhor que o meu. Vamos precisar dele. – Avisei.
- Mas que merda está acontecendo, ?! – estava mais confuso do que nunca agora.
- Lá está ele! – Ergui um pouco o tronco.
vinha pelo corredor acompanhado de alguns de sua corja. Ele conversava despreocupadamente com um cara de cabelo louro lambido.
- Rápido, , pega o celular! – Bati em seu ombro. – Liga a câmera e foca no Junior.
- Tá! – Meio irritado, . – Mas seria bom saber por quê.
- Você já vai entender.
filmou discretamente, enquanto Junior se aproximava do armário. Ele girou a combinação e a porta se abriu. Primeiro, ele demonstrou confusão. Depois, curiosidade. Finalmente pegou o pote, mostrando-o ao amigo e perguntando alguma coisa. O garoto negou com a cabeça. Junior deu de ombros e segurou a tampa. Tive que me segurar para não rir naquele momento mesmo.
Foi uma cena e tanto. Assim que a tampa descobriu o pote, a bola estourou, espirrando tinta azul escura no rosto e em parte da camisa de . O amigo de cabelo lambido dele levou um tremendo susto.
- Mas que... – A boca de estava aberta, mas ele já começava a rir.
Junior parecia furioso, limpando o rosto enquanto praguejava. Todos os alunos tinham parado para ver o que estava havendo. Finalmente, voltou a olhar para o armário e enfiou a mão nele, pegando o pedacinho de papel que até então não tinha notado. A expressão dele ficou ainda mais odiosa depois de lê-lo.
ainda estava rindo histericamente quando o cheiro da bomba chegou a nós. Os alunos começaram a se empurrar para fugir, fazendo caretas de nojo.
- Que droga de cheiro é esse?! – Meu amigo indagou.
- Te explico lá fora. É melhor irmos agora. – Chamei ao perceber que Junior começava a procurar a culpada à sua volta. Ele não podia nos ver ali.
Já do lado de fora, me permiti voltar a rir com vontade. Sofia estava certa. Eu queria ver aquela cena mais do que qualquer um. A cara de Junior tinha sido impagável, e ele merecia aquela humilhação – ah, como merecia! A vingança podia não ser nada nobre, e aquela podia nem ser uma vingança de verdade afinal; mas, francamente, eu estava me divertindo muito naquele momento.
- Tá, que droga foi aquela?! – queria porque queria saber. Ele parecia estar se divertindo bastante também. – Você fez aquilo?
- Não. – Neguei, sorrindo. – Foi a Sofia.
- A Sofia, tipo, a Sofia que estava com a gente ontem? – Ele se atrapalhou. – A Sofia prima da ?
- Ela mesma. – Confirmei. – Ela veio aqui hoje; queria se vingar pelo que o Junior fez com a . Deixou até um bilhete dentro do armário.
abriu a boca e ergueu as sobrancelhas. Depois deu um longo suspiro, indo se sentar num banco de madeira. O acompanhei sem entender a reação. Parecia que ele estava tendo uma queda de pressão.
- , você tá legal? – Me sentei ao seu lado.
, com a cabeça jogada entre as pernas até então a levantou um pouco para olhar para mim.
- Eu acho que estou apaixonado, .
- Você o quê? – Franzi o cenho. – Mas...
- É, eu estou apaixonado, tipo, maluco pela Sofia! – Ele ficou de pé e começou a andar. Eu nem sabia o que dizer, mas ele continuou discursando. – Eu sei que parece loucura, porque eu a conheci ontem, então talvez eu seja mesmo maluco, mas, cara! – Exclamou. – Ela tem aqueles olhos que... E quando ela prende o cabelo no alto e as pontas coloridas ficam caindo é tão... E a risada sarcástica dela é... Ah! – Ele se jogou no chão, deitado de costas na grama. – Que sensação horrível. Eu não tenho a menor chance, não é?
- , não é que seja impossível... – Me abaixei ao seu lado. – Mas e quanto a Amber? Sei que ela é grudenta, mas você sempre foi doido por ela e vocês meio que estão namorando agora.
- Eu sei! Não é uma droga? – Ele se sentou e quase bateu a testa em mim, me obrigando a desviar. – Eu achava que gostava da Amber apesar de tudo, mas agora sei que era só meu ego de nerd invisível falando. E o pior é que gastei cada desejo de aniversário, estrela cadente e o caramba que eu tinha com ela. O que eu vou fazer, ? O QUE EU VOU FAZER?
Honestamente, quase dava para ter pena de naquele momento. Sabia melhor que ninguém como era uma droga gostar de alguém com quem não se podia ficar por algum motivo, por mais que fosse ridículo ele estar apaixonado um único dia depois de conhecer Sofia.
Mas quem era eu para julgar, se não conseguia tirar a da cabeça desde o dia em que a conhecera?
- Você pode terminar com a Amber. – Dei de ombros. – Acho até que seria mais saudável fazer isso, visto que você tem fugido dela igual o diabo foge da cruz.
- Mas e se eu terminar com ela e a Sofia não quiser nem saber de mim? Isso é bem provável, vamos encarar. Ela é muita areia pro meu Batmovel.
- Você já devia estar acostumado a esse tipo de situação, não? – Franzi o cenho. parecia se esquecer às vezes de que nunca tinha sido um galã. – De qualquer jeito, é melhor pensar um pouco mesmo. A Sofia pode ser bem legal e muito bonita, mas, caso não tenha percebido, ela é um pouco maluca.
- Como se todas as outras Pie que conhecemos não fossem... – riu, se deitando na grama de novo, os braços cruzados atrás da cabeça. – Se quer saber, acho que não me importo. Eu até gosto da loucura delas. Talvez tenha pegado isso de você.
- É, talvez. – Ri um pouco. estava certo. Se deixássemos de lado todas as confusões, as loucuras da família Pie podiam ser até mesmo divertidas.
POV PIE
Emma me lançou um olhar de aprovação quando me sentei ao seu lado na mesa VIP, colocando minha bandeja à frente.
- Vejo que está se alimentando direitinho. – Ela cutucou minhas cenouras no prato. – Muito bem, Pie.
- Não havia muitas opções hoje, se quer saber. – Retruquei. Depois sorri, me lembrando da novidade. – Quer saber a parte mais gostosa do dia?
- O que foi?
- Ganhei o papel principal da peça.
- EU NÃO ACREDITO! – Emma levou as mãos à boca, chocada. Depois começou a rir. – Eu queria tanto ver a cara daquela vaca dos infernos!
- A história é longa, mas eu te conto mais tarde. – Falei quando Summer chegou à mesa acompanhada por Jodi.
- Qual é a fofoca? – Jodi quis saber.
- é a protagonista da Peça de Outono! – Emma contou.
- Meu. Deus. – Summer ficou de boca aberta. – Jas deve estar uma fera com você.
- Você vai ficar ainda mais surpresa com o quanto. – Lhe lancei um olhar significativo.
Não pude terminar de falar, no entanto, porque logo os jogadores, com exceção de Junior, chegaram. Brad estava no meio deles, falando sem parar. Seu sorriso se espalhou ainda mais ao ver Jodi Lyn. Ele se abaixou e deu um beijo em seu rosto, sentando-se ao lado dela.
- Ei, meninas! E aí? – Ele perguntou comendo uma batata frita, enquanto alguns dos outros jogadores se espalharam pela mesa.
- Oi, Brad. – Cumprimentei.
- Onde está o Junior? – Summer quis saber.
- Ele saiu mais cedo do treino, tinha dentista ou algo assim. – respondeu.
Logo Amber, Sienna e Teddy se juntaram a nós também. Primeiro Amber olhou o banco perto de Summer, mas não se dispôs a tirar Jodi dali, indo ficar ao meu lado, empurrando mais gente para isso. Sienna foi se sentar perto de Ted na ponta.
- , sabe se está tudo bem com o ? – Amber perguntou isso com tanta seriedade que quase tive pena dela ao me lembrar de como a estava evitando. – Porque parece que ele tem andado com a cabeça no mundo da lua! Sempre se esquecendo de responder minhas ligações. – A garota pegou algumas batatas no prato de Brad. Emma ergueu as sobrancelhas para mim.
- Tem certeza de que é uma boa ideia comer isso, Amber? – Sienna perguntou delicadamente.
- Por quê? O que você tem a ver com isso?
- Eu não comeria, se fosse ela. – Teddy fez uma careta de deboche.
- Está querendo me dizer algo, Teddy? – Amber o encarou irritada. – Está querendo me chamar de gorda?
- e de mim, mas é sempre bom lembrar de que sou eu que vou ter que levantar um bujãozinho se você começar a comer feito louca. – Ele devolveu.
- Será que é por isso que o está agindo assim comigo? – Amber choramingou do nada. – Por que eu estou gorda?
- Mas é claro que não, Amber! – Summer exclamou, olhando feio para Teddy. – Você não está gorda.
- Bom, então por que ele não me responde desde ontem?! – Ela voltou a questionar.
- Ah, Amber, o só deve estar sobrecarregado... Sabe como é, ele agora é um titular. – Tentei animá-la.
- É... Verdade. Isso faz mesmo muito mais sentido. – A loira concluiu. – Pobrezinho do meu gatinho. Ele precisa relaxar! – Exclamou. – , você conhece algum lugar legal onde podemos ir?
- Ah, eu sei um ótimo! – Brad exclamou antes que eu respondesse. – O Roger's, a lanchonete do pai dela! – Ele sorriu. – Puxa, eu e a Jo fomos lá semana passada e o lugar é incrível. A comida é deliciosa e o se apresenta lá! Eu e Jo achamos que ele devia entrar no American Idol, ele é um cara muito talentoso...
- Ah, é verdade! – Amber se lembrou. – Seu pai é músico, não é? Um músico, tipo, meio que famoso?
- As pessoas costumam saber quem ele é pelo nome... – Eu disse modestamente. Todos estavam me encarando naquele momento. – Ele já viajou bastante. E, na verdade, ele é sócio do Roger, que é o verdadeiro dono do lugar.
Mas aparentemente minha explicação modesta sobre as verdadeiras atribuições do meu pai tinha sido absolutamente ignorada. Logo, todos comentavam sobre como ele não só era famoso, como também um empreendedor. E como eu era sua sortuda filha.
- Nós totalmente temos que ir nesse lugar. – Amber decidiu. Não sabia se ela estava falando de todos os seus amigos no geral ou de mim, o que seria terrível. – O gatinho vai adorar uma noite de diversão!
- Eu acho uma ótima ideia. – Summer, para minha surpresa, foi logo falando. – está sempre falando do Roger's, sou louca para conhecer o lugar.
- Perfeito! – Amber exclamou.
- O que é perfeito?
Olhamos para o lado e lá estava Jasmine, uma expressão neutra, nos encarando.
- Vamos, falem. Se não vão mais me incluir no ato de fazer os planos, podem ao menos me inteirar deles depois. – Ela insistiu.
- Jas... – Mesmo Teddy com todo seu sarcasmo ficou intimidado diante da chegada dela. – Só estávamos combinando de ir à lanchonete do pai da .
- É mesmo? Quando?
- Bom... – Brad entrou de novo na conversa, tentando soar mais leve. – Acho mais legal nós irmos no dia em que o se apresenta. , quando é que ele canta?
- Nas quintas-feiras. – Respondi. – É quando tem mais espaço no repertório.
- Quinta-feira pra mim está ótimo. – Jasmine sorriu. Um sorriso quase convincente. – Vou falar com meu namorado.
A garota saiu de perto, tirando o telefone do bolso, e nós ficamos ali, calados demais por alguns segundos.
- Bom, ainda vai ser divertido. E os hambúrgueres são incríveis. – Brad disse então, e isso tirou a tensão de nossos ombros.
- E sua prima também pode ir, ! – Summer sugeriu. Com certeza, Sofia ia adorar aquela ideia.
Emma se inclinou para mim.
- Ela está mesmo cuspindo fogo, não é?
Apesar de também ter ficado sem graça com a chegada repentina de Jasmine, esse sentimento já estava passando. Em lugar dele, surgiu o bom e velho gostinho da vitória.
- E olha que nem começamos a ensaiar para o grande espetáculo. – Sorri.
🌴💚🌴
- Você está certa. – Sofia confessava naquela noite, enquanto empurrávamos o carrinho pelo supermercado. – Eu bem queria te dizer que em hipótese alguma ficaria animada para sair com um bando de acéfalos de torcida e futebol, mas não dá pra negar: estou louca para ir. Depois de tudo que ouvi, é quase como ser convidada para passar um dia no set da minha série preferida. – Riu.
- Você vai ficar bem surpresa em descobrir que eles não são tão burros. – Eu disse. Depois ponderei. – A maioria deles, pelo menos.
se aproximou de nós com uma sacola de batatas e a depositou dentro do carrinho.
- Batatas aqui. – Disse. – O que ainda falta?
- Alho-poró. – Respondi.
- Sofisticada demais. – Sofia balançou a cabeça. – Sabe que antes de você chegar seu pai provavelmente estava vivendo à base de pão velho e água, não sabe? Não precisa ser tão eficiente.
- o alimentava antes de eu chegar. – Expliquei, e o garoto assentiu timidamente, indicando que era verdade. Os pobres foram obrigados a sustentar papai por meses. – Além disso, só quero fazer uma sopa que mamãe me ensinou. Meu pai anda meio abatido. Acho que pegou gripe.
- Eu já volto. – O garoto se afastou, sumindo no fim do corredor.
Sofia riu, balançando a cabeça, ao tempo que pegava uma torta de chocolate congelada no freezer.
- Olha só para vocês, se comportam como uma familinha de verdade.
- é da família. – Respondi sem pensar duas vezes. – Ele praticamente mora na minha casa. Às vezes eu desconfio de que papai o tenha adotado de papel passado.
- Você sabe o que quero dizer. – Ela sorriu. Depois, quando não respondi, ela deu de ombros. – Não acho que deve ser tão ruim tê-lo em casa o tempo todo, também. Você sabe, eu achei um cara muito legal.
E lá íamos nós de novo naquele assunto. Minhas narinas devem ter inflado, porque Sofia obviamente percebeu que havia algo errado com minha cara.
- Olha só pra você. – Ela balançou a cabeça. – Isso te incomoda, não é? Que eu possa me interessar pelo .
- O quê? Mas é claro que não. – Comecei a empurrar o carrinho mais rápido, indo em direção aos biscoitos.
- Ah, claro. – Ela rolou os olhos. – Me lembro que você fazia exatamente essa cara quando sua mãe te forçava a me emprestar sua bicicletinha amarela. Porque você odiava dividir a bendita bicicleta, assim como não quer ter que dividir o . – Concluiu presunçosa. – O que nos leva a conclusão mais óbvia: você está gostando dele.
- Lá vem você de novo com essa história! – Parei de andar estupefata. – Eu já repeti mil vezes que não estou apaixonada pelo . Por Deus, ele é meu amigo e só isso. – Insisti. – E eu decididamente não me importo se você quiser sair com ele. O problema é todo de vocês, desde que não estraguem minha farsa.
- Se você diz...
Sofia me encarou com os olhos verdes por alguns instantes. Depois, deu de ombros. Por dentro, eu estava segurando com unhas e dentes a vontade irracional de decretar que não, ela e não tinham direito de saírem juntos. Proibir isso por escrito se fosse necessário!
Mas eu não poderia fazer isso, porque seria como admitir que ela estava certa e eu estava com ciúmes. O que não era verdade, só para deixar bem claro.
- Não achei o alho-poró em lugar nenhum.
Era voltando. Essa camisa azul fica mesmo muito bonita nele, pensei com meus botões, mas deixei isso para lá assim que percebi Sofia me observando.
- Deixa pra lá. – Falei. – Eu faço sem. Papai não vai mesmo notar.
Ele concordou e nós três começamos a andar para o caixa.
- Ei, ! – Sofia disse então. – Eu estava conversando com a , sabe, e pensando se você não gostaria de, sei lá, sair comigo.
- Sair? – Mesmo sem olhar, pude imaginar franzindo o cenho.
- É, como num encontro. – Minha prima explicou com uma risadinha charmosa. – Eu perguntei a primeiro porque achei que ela poderia se importar. Sabe como é, com essa história de vocês... Mas ela me garantiu que não liga.
Nesse ponto da conversa, tive que parar de andar para ver de verdade a reação de , e também para fuzilar Sofia com os olhos. Uma coisa era ela ficar jogando piadinhas para mim e tentando me fazer dizer que gostava de , outra coisa era ela dizer a ele que achou que eu pudesse me importar. Essa frase poderia leva-lo a pensar muita coisa.
De todo modo, mudei meu foco para . Ele tinha a boca entreaberta – parecia estar processando a informação. Tanto uma quanto a outra.
- Ah... Então ela não se importa? – Ele perguntou calmamente.
- Nem um pouquinho. – Sofia sorriu. – Ela disse que vocês são só amigos. Não haveria mal em sairmos juntos então, não é? Só tem que ser fora da cidade. Acho que pode ser muito divertido.
Vamos lá, , diga que não. Diga que tem dever de casa. Que precisa lavar a louça.
olhou para mim – que tentava conter minha expressão de pânico – por alguns segundos. Me esforcei para continuar impassível, chegando até a dar sutilmente de ombros.
- Claro, eu vou adorar sair com você, Sofia. – Ele disse então, para minha total decepção. – Já sabe aonde quer ir?
- Ah, eu gosto de ser espontânea. – Ela sorriu. – Podemos sair por aí e só achar um lugar...
- Por mim tá ótimo. – sorriu de volta.
Os dois continuaram fazendo planos, me deixando para trás com o maldito carrinho.
Você não se importa de verdade com isso, , era o que eu dizia a mim mesma.
Mas, qual é, quem eu queria enganar?
Eu achava aquela uma péssima ideia, e tinha náuseas só de imaginar e Sofia namorando.
Não, eu nunca tinha pensado que aquilo poderia realmente acontecer, e definitivamente não estava preparada psicologicamente para tal.
Enquanto eles andavam a distância, minha cabeça foi invadida involuntariamente por cenas terríveis dos dois caminhando juntos para um altar, enquanto eu usava um vestido feio de madrinha lá na frente.
Que merda era aquela, pelos céus? Eu teria pesadelos com aquela imagem naquela noite. Estava certa de que sim.
E o pior era que eu não poderia fazer nada, a menos que admitisse o que Sofia tanto queria de mim.
Que eu estava morrendo de ciúmes de .
POV
- Nos vemos amanhã à noite, . – Sofia sorriu para mim da porta de casa, depois que eu tinha deixado as compras lá.
- Até amanhã. – Dei um sorriso de volta, acenando.
apareceu atrás dela, me olhando parada na escada, uma expressão séria, pensativa. Assenti para ela, que não respondeu, e voltei para o meu carro bufando.
Para ser bem sincero, eu estava zangado.
Não era como se eu quisesse ou esperasse vê-la tendo uma crise de ciúmes, mas ela estava agindo como se aquilo não fizesse a mínima diferença, e era óbvio que isso não era verdade. Ela estava de mau humor naquela manhã porque eu estava dando corda para Sofia, eu tinha certeza!
Ou será que não?
Eu estava errado? Ela realmente não se importava?
Ah, para o inferno.
Eu realmente não tinha o plano de aceitar sair com Sofia de verdade, mas não resisti à ideia de provoca-la depois de toda aquela displicência. Podia ser infantil. Podia não dar em nada. Mas eu ia fazê-lo, gostando a ou não. Especialmente se ela não estivesse gostando.
🌴💚🌴
Estava enchendo meu copo de suco de uva quando Jack entrou na cozinha. A única outra pessoa acordada era , mas ela estava lá em cima se arrumando para a aula.
- Ei, rapaz. – Ele me cumprimentou. Parecia mais cansado do que o habitual.
- Bom dia, Jack. – Respondi. – Já dei comida ao Stevie.
- Ótimo, muito bom. Alguém tem mesmo que fazer isso. – Assentiu. – Me serve um copo?
Enchei um copo grande com suco e coloquei a sua frente. Jack segurou-o para leva-lo à boca, mas de repente soltou um gemido e o largou sobre a mesa, me assustando.
- O que foi? – Quis saber.
- Meus dedos... Merda. – Ele xingou. – Só estão um pouco doloridos. É a velhice. Talvez eu esteja ficando velho para tocar sax.
- Não diga isso. Vai desapontar um exército de velhas apaixonadas. – Brinquei.
- Está muito engraçadinho pra quem namora minha filha e come na minha casa todo dia. – Jack deu um sorriso ameaçador, e eu sabia que estava brincado. Depois fez outra tentativa de erguer o copo, e, apesar da cara feia, ele conseguiu levá-lo à boca. – Por falar nisso... Como vai o namoro de vocês?
Parei por um segundo antes de responder. Foi involuntário. Depois abri a geladeira e guardei a caixa de suco.
- Bem. – Menti. Até dois dias atrás estava, pelo menos.
- Não precisa mentir pra mim, . Eu te conheço quase melhor do que conheço a Rainbow.
Olhei para Jack, me perguntando do que exatamente ele estaria falando. Até que ponto ele sabia que eu estava mentindo?
- Olhe, sei que você e gostam muito um do outro. – Jack continuou, mesmo sem minha resposta. – Mas entendo como a relação de vocês é diferente, talvez mais complicada em alguns pontos...
Você não faz ideia, Jack.
- Quero dizer, vocês são só garotos, e passam tanto tempo juntos... Talvez isso acabe tornando tudo mais intenso, exija de vocês mais maturidade do que o normal.
Talvez exigisse mesmo, mas antes que Jack terminasse seu sermão, entrou na cozinha.
- Vamos? – Chamou. – Bom dia, papai. Deixei a torta de frango descongelando. Só precisam colocar no forno para o almoço.
- Bom dia, querida. – Jack respondeu. – Muito obrigada, você é um anjo.
sorriu docemente, depois tomou o rumo da porta da frente.
- Jack... – Comecei.
- Está tudo bem, pode ir. – Ele me dispensou. – Um dia terminamos essa conversa.
- Certo. – Assenti. – Boa sorte com os dedos.
- Obrigado, garoto.
Quando cheguei do lado de fora, estava encostada ao carro, esperando. Ela tinha os braços cruzados e um sorriso no rosto, o que teria me preocupado bastante se eu já não estivesse esperando que ela bancasse a superior.
- Teve uma boa noite, ? – Ela perguntou docemente.
- Sim, tive. E você, Rainbow? – Devolvi a gentileza, indo para o outro lado do carro e a encarando sobre o capo.
- Dormi como a própria Bela Adormecida. Por falar nisso, não vai perguntar pela sua princesa encantada de cabelo colorido?
- Ah é. – Dei um sorriso de provocação. – Como ela está?
- Bem. Muito bem. Acho que está bastante ansiosa para o encontro de vocês.
- Legal. Eu também.
Com isso, entrei no carro. Um segundo depois, fez o mesmo.
- Já sabe onde vai levá-la? – Indagou.
- Ah, na verdade, é uma surpresa. – Dei de ombros com ar de desculpas. – Não posso te contar.
ergueu as sobrancelhas, mas depois balançou a cabeça.
- Tudo bem. Eu entendo. Perfeito.
Quando saí com o carro, sabia que por dentro ela estava se retorcendo de curiosidade. Sorri quando ela não estava reparando. Estava satisfeito o suficiente para dar cambalhotas, mas me contentei em somente colocar para tocar uma boa música do Ray Charles.
Não buscamos naquele dia, porque Amber – por alguma razão achando que estava precisando passar mais tempo com ela – insistiu em fazê-lo, e ele não teve como recusar, mesmo tentando.
Assim que chegamos ao corredor dos armários, no entanto, ele apareceu. Pareceu tão aliviado que senti pena de Amber.
- Vocês chegaram. – Ele disse em um tom quase acusador. – E você. – Apontou para . – Que história é essa de que eu preciso me divertir? Você enlouqueceu? Tinha que falar isso pra Amber justo agora?
- Desculpe, ela estava tentando achar um motivo pra você a estar evitando. – mordeu o lábio. – Fiquei com pena dela.
- Tem vários motivos. – Ergui as sobrancelhas.
- Pobre Amber. – balançou a cabeça. – Deve ser difícil estar apaixonada por alguém como eu.
Não sabia o que ele queria dizer, mas assim como – que fez logo uma careta – preferi nem perguntar.
- De todo modo, – Ele voltou à voz normal e começamos a andar. – Ela inventou que quer sair comigo hoje à noite, então menti dizendo que íamos jogar vídeo game na sua casa. O que vai ser, Halo ou alguma coisa nova? Baixei uns jogos legais ontem...
O-oh. Merda. Eu tinha me esquecido completamente de .
Ele ia me matar quando soubesse que eu ia sair com a Sofia. Literalmente.
- Hoje não vai dar, . – foi logo falando. – tem um encontro.
- Um o quê? – Ele ficou confuso. – Com quem?
Fuzilei com os olhos, mas não sabia se ela tinha feito de propósito – afinal, ela ainda não sabia que estava apaixonado por Sofia.
- ? – Meu amigo insistiu. Dei um longo suspiro.
- Com a Sofia, a prima da .
abriu a boca e fechou. Os olhos grudados em mim.
Eu nunca o tinha visto daquele jeito, nem quando eu tinha deixado que ele fosse a pé para casa, naquela noite semanas atrás. Parecia que eu tinha dado um soco em seu estômago.
- Beleza. – Ele disse baixinho, mas não parecia haver raiva em sua voz. Só mágoa.
- ... – Comecei, pensando em me explicar.
- Não, tá tranquilo, . Vou ficar jogando sozinho. Quase como se eu nunca tivesse tido um melhor amigo. – Deu de ombros com uma risada nervosa, se afastando de nós.
pareceu preocupada com a reação dele, apesar de confusa.
Eu tinha mesmo sido um grande babaca.
POV PIE
- Porcaria de massa. Sova logo de uma vez!
Eu batia repetidamente com a massa de pão em cima da bancada da cozinha. Tinha sido o único jeito que eu encontrara de colocar para fora minha raiva sem agredir mais ninguém. Já tinha dado tantas patadas em papai e em Miguel que ambos tinham decidido sair de casa.
Sofia, aquela sem noção, tinha dito que ia sair para comprar um vestido para seu encontro, o que não tinha ajudado em nada.
- Uh! – Dei um longo suspiro de exaustão, passando as costas da mão cheia de trigo na testa.
Talvez eu estivesse exagerando.
Era só um encontro. E tudo bem, eram as duas pessoas de que eu mais gostava, mas e daí? Talvez aquele encontro nem rendesse nada sério, afinal.
- E agora, com vocês – a tv na sala, ligada em um programa de auditório idiota, anunciou. – Teremos Stephanie Theiler, cantando sua releitura do grande sucesso da bela Sofia ...
Ah, para o diabo! Era palhaçada comigo, não era?
Marchei emburrada até a sala e desliguei a tv. Stevie, que aparentemente estava muito interessado no programa, latiu para mim.
- Você é o meu cachorro dos sonhos! – Repreendi-o. – Não vá mudar de lado agora!
Ele grunhiu e se deitou, me olhando como se eu fosse maluca.
Talvez eu fosse mesmo.
Me joguei no sofá, cansada de sovar a massa do pão e cansada de me sentir daquele jeito. De repente, me tornei muito consciente do quão horrorosa eu devia estar toda suja de trigo. É meu estado emocional refletido, pensei.
Me lembrei de naquela manhã. Ele também não parecia nada bem.
Eu nem sabia por que ele tinha ficado tão chateado com , mas me sentia particularmente empática ao seu sofrimento.
A campainha tocou e fui até a porta sem me importar muito com minha aparência. Stevie me seguiu. Fiquei de fato um pouco surpresa pela pessoa parada ali.
- ? – Franzi o cenho.
tinha as mãos enfiadas nos bolsos da camisa xadrez vermelha. Parecia tão desanimado e ao mesmo tempo estranho que me preocupei instantaneamente. Talvez seu problema com fosse mais sério do que eu imaginara.
- Oi, . Posso entrar?
- Mas é claro. – Me afastei da porta para abrir passagem. entrou em casa, Stevie pulando em suas pernas enquanto ele seguia para a sala.
Fechei a porta e o segui, tirando o avental no caminho, embora isso não adiantasse de nada uma vez que eu continuava imunda.
- O que está havendo? – Indaguei me sentando na poltrona perto dele.
- Cocô. – Ele disse, me deixando muito perplexa por um momento. Depois ele se deitou no sofá, uma expressão de revolta tomando seu rosto. – A vida, ela é um grande cocô!
Ah, claro, então estávamos falando no sentido figurado. Melhor assim.
- Qual é o problema, ? Estou ficando preocupada.
- O problema é seu namorado falso , que marcou um encontro com a Sofia, quando eu um dia antes tinha dito a ele que estava a fim dela!
- Mas o quê?! – Franzi o cenho sem entender nada. – Você está gostando da Sofia?
- Adorando. Venerando. Chame como quiser chamar. Escrevi um poema chamado Ode à Sofia na noite passada, se quer saber.
Aquilo era muito inesperado. Quer dizer, garotos como às vezes acabavam apaixonados pela Sofi, mas ele a conhecia há benditos três dias!
- Sei que vai dizer que eu só a conheço há três dias. – Ele disse, lendo meus pensamentos. – Mas é sério, o que eu sinto por ela... – Suspirou frustrado. – Vamos lá, , você tem que saber o que é isso. Já sofreu por amor. Aposto que se apaixonou de cara quando conheceu o Junior.
"Não de cara, mas..."
De fato, tinha se tornado meu pensamento fixo desde o dia em que nos conhecemos. Então, pensando de forma honesta, era bem aceitável que se encontrasse tão encantado por Sofia mesmo sem conhecê-la há tanto tempo.
E era mesmo uma canalhice do sair com ela sabendo disso!
Mas que cretino!
- Ah, , se você tivesse me dito que estava gostando dela, eu nunca teria deixado que esse encontro idiota acontecesse! – Apertei sem ombro.
- Você também não parece nada feliz com os dois como casal. – me encarou com seu olhar esquisito, abraçado a uma almofada feia de papai.
Sagaz. Sempre sagaz. Mesmo em depressão por ser trocado, ele não perdia um detalhe.
- Eu não estou. – Admiti, tirando a mão de seu ombro. – Mas o motivo é diferente. Os dois manés vão estragar minha farsa.
Me levantei e marchei para a cozinha. me seguiu na hora.
- Acredito em você! – Ele foi dizendo atrás de mim.
Voltei para trás da bancada, onde minha massa de pão esperava.
- Quer dizer, é claro que alguém vai perceber andando por aí com uma garota que não é você. – parou a alguns metros. – E quando descobrirem que é sua prima então...
Irritada contra minha própria vontade, bati a massa com força na bancada, dando um susto daqueles em . Queria mesmo era sovar meu pão na cara daqueles dois idiotas.
- É uma droga, não é? – continuou, pensativo e parecendo infeliz. – E o pior é não tem nada que a gente possa fazer, porque...
", . Sempre tem algo a se fazer", uma vozinha malvada disse em minha cabeça.
E foi aí que eu tive um estalo.
Eu tinha que poder fazer alguma coisa. Não havia problema sem solução – o que havia eram pessoas que eram péssimas em resolver problemas.
E eu não era uma delas.
- – Eu disse com um arzinho de loucura. – Já sei o que vamos fazer.
- Qual é sua ideia? – Ele perguntou esperançoso.
- Vamos atrás daqueles babacas e vamos garantir que eles não façam nada que prejudique qualquer um de nós dois. Meus planos ou seu coração.
- Gostei dessa ideia.
- Mas vamos ter que ser discretos. – Avisei.
- Eu cuido disso. – Garantiu , mais animado.
- Então estamos combinados.
Aqueles dois patetas não perdiam por esperar.
🌴💚🌴
Tomei meu banho mais cedo e vesti um blusão branco velho por cima da minha roupa de fuga. Depois me joguei na cama com um livro e fiquei fazendo hora.
Sofia tinha chegado cerca de meia hora depois de deixar minha casa, com bolsas cheias de coisas que fingi estar cochilando para não ter que ver. Quando acordei, fiz questão de ser muito dócil e parecer ansiosa por ela.
Agora ela estava no banho. Logo chegaria para colocarmos nosso plano em prática.
- E então, o que acha? – Ela perguntou entrando no quarto, e minha careta foi quase automática.
O vestido de Sofia era um tomara-que-caia preto, bonito e colado demais para um simples encontrozinho com . Não chegava a ser vulgar, mas era um exagero.
Graças ao livro em frente ao meu rosto, ela não pode ver minha cara, então eu tratei de dar um sorriso antes de abaixá-lo.
- Você está linda, Sofi. – Elogiei.
- Obrigada. – Ela sorriu, correndo para frente do espelho de corpo inteiro do canto. – Modéstia à parte, estou mesmo.
Rolei os olhos, jogando o livro de lado, e desci da cama. Fui até a janela para ver se já estava chegando, e o que vi foi o carro de se aproximando.
- Olha quem chegou. – Dei um sorriso maléfico.
- Ele já está aí? – Sofia perguntou ansiosa.
- Está sim, mas não se preocupe. Termine de se arrumar, faça aquele atraso charmoso. – Falei. – Vou receber seu pretendente.
Sofia sorriu, assentindo, e eu desci as escadas. Havia uma estranha sensação de paz em meu coração, como se tudo já estivesse resolvido. Minha paz acabou, no entanto, no momento em que abri a porta e avistei .
Ele estava usando uma camisa azul-marinho e calça jeans escura. Os tênis eram all-stars marrons, e o cabelo dele parecia ainda meio molhado. De alguma forma, nunca tinha parecido tão bonito.
E foi aí que eu me senti ridícula.
Como eu esperava que Sofia não o levasse a sério? Não havia a menor possibilidade. Em dois minutos ela ia vê-lo daquele jeito, e aí ele ia dar aquele sorriso, ia dizer uma coisa muito fofa ou engraçada, e ela ia se sentir sortuda por estar saindo com ele, e então nunca mais o deixaria em paz. E ela teria razão em fazê-lo.
- Oi, Rain. – Ele sorriu quando chegou à porta. Seu perfume era tão bom!
- Ei, ! – Sorri de volta feito uma idiota, me esquecendo por um minuto que estava tão brava.
enfiou as mãos nos bolsos, parecendo sem jeito.
- A Sofia... – Começou.
- Ah, claro. – Meneei a cabeça, voltando a mim. – Ela está se arrumando. Pode entrar.
entrou e se sentou no sofá da sala, brincando com Stevie quando ele se aproximou alegre.
- E então, ansioso? – Perguntei me sentando em frente a ele.
- É normal, não é? – Ele riu nervoso, dando de ombros. – Encontros fazem isso. Deixam a gente...
- É. – Completei por ele. – Bom, espero que tenha escolhido bem aonde ir. Sofia costuma ser muito exigente.
- Exigente? – Franziu o cenho.
- Sim, você sabe. Ela só gosta de lugares alternativos, nada que pareça modinha, e Deus te guarde de elogiar qualquer banda que ela ache ruim... Os últimos dois garotos que saíram com ela terminaram com a autoestima bem abalada.
engoliu em seco, assustado com meu comentário. Ótimo, era isso que eu queria.
- Não se preocupe, você vai se sair bem. – Apertei de leve o pulso dele, me levantando para atender a porta, que tinha acabado de ser batida.
deu um sorriso cúmplice a me ver, e eu disse sem emitir som que estava na sala. Ele assentiu e entrou.
- Puxa, ! – Exclamei em voz alta. – Que bom que já chegou!
- Ah, eu estava louco pra chegar logo, ! – O garoto respondeu.
Fomos juntos para a sala, e olhou para o amigo surpreso. Pude jurar que seu rosto até perdeu um pouco a cor.
- . – Ele disse.
- E aí, ? – se jogou no sofá, fingindo tão bem estar de bom humor que me impressionou.
- O que está fazendo aqui? – perguntou confuso.
- Ah, é que você ia sair, então decidi trazer meu jogo novo para jogar com a . Algum problema?
balançou a cabeça de leve, meio desconfiado.
- Não. Claro que não.
- Ótimo, porque eu estou louca pra jogar! – Me joguei na poltrona.
- Ran-ran. – Ouvimos alguém pigarrear.
Olhamos para trás para encontrar a bela Sofia, com o vestido preto exagerado e seu lindo cabelo ruivo de mechas coloridas cheio de cachos de babyliss. A filha da mãe estava mesmo linda.
- Ei, rapazes. – Ela disse.
- Oi, Sofia. – se colocou de pé.
ainda estava embasbacado, então tive que chutar de leve seu pé para que acordasse.
- Oh, desculpe. Oi. – Ele a cumprimentou.
- E então, vamos? – Ela chamou .
- Claro, vamos sim. – olhou para nós ao falar.
Nós os acompanhamos até à porta cheios de sorrisos.
- Até mais tarde, pessoal. – disse do lado de fora.
- Até mais! – Acenei. – Bom encontro!
- , não vá deixar o Jack descobrir. – Sofi pediu.
- Não se preocupe, já sei direitinho que desculpa vou dar. – Falei.
- Não se esqueça, você está falando com a melhor mentirosa da cidade! – acrescentou rindo. Dei uma cotovelada em sua barriga.
Os dois entraram no carro e saíram devagar pela rua. Na mesma hora, tirei a camisa branca, revelando minha camiseta bem mais sociável.
- Vamos, rápido! – Puxei pela mão. O carro deles ainda estava à vista no fim da rua. – Onde está seu carro?
- Bem ali! – me puxou em outra direção. – Vamos sair pela rua de trás e pegá-los lá na frente.
Corri com o garoto até a rua de trás – a de Jodi, mas longe da casa dela – e não acreditei no que vi.
- Você só pode estar brincando comigo! – Exclamei irritada.
Lá estava o veículo de , que era nada mais nada menos que o carro da polícia do pai dele, com sirenes em cima e tudo.
- Era isso ou minha bicicleta. – devolveu. – Não seria muito eficiente.
- Eu te disse pra ser discreto! – Protestei.
- Quer estar mais disfarçada do que com um carro de polícia? – Ele respondeu impaciente. – Se ficarmos com os vidros fechados, eles nunca vão saber que somos nós.
- Mas que droga... – Resmunguei abrindo a porta do carro. – Vamos logo! E cuidado com as sirenes!
- Não se preocupe, já roubei este carro antes. – O garoto piscou para mim.
Como se isso fosse fazer eu me sentir melhor.
POV
- Posso ligar o rádio? – Sofia perguntou, dentro do carro.
Estávamos já a alguma distância de casa, e até aquele momento não tínhamos falado muita coisa. Eu tinha planejado bem o que fazer naquela noite, mas aquele papo da mais cedo tinha me deixado um pouquinho nervoso.
Relaxa, , ela não é nenhum bicho de sete cabeças, tentei me tranquilizar.
- Pode sim. – Respondi, já com medo do que ela iria ouvir. Eu dificilmente conseguia não ser honesto sobre música. E se estivesse tocando uma música que eu gostava e ela detestasse? E se fosse o contrário?
Quando ouvi a letra de Air Guitar me preocupei seriamente. Conhecia uma pá de gente que odiava aquela música, mas eu não era uma delas. Sofia ficou séria por um segundo e eu gelei. Então ela começou a balançar a cabeça para cima e para baixo, sorrindo para mim.
- Gosto dessa música. – Ela disse.
- Sério?
- Hanram. Posso aumentar o volume?
- O quanto quiser. – Sorri.
A garota riu e aumentou o volume, aproximando o rosto da janela aberta. O vento jogava seu cabelo para trás enquanto ela balançava a cabeça. Não consegui resistir a fazer o mesmo.
Pelo visto, a noite ia ser muito mais divertida do que eu tinha previsto.
- Ah, que ótimo! – Ela riu e recostou a cabeça no banco de novo quando a música acabou. – Eu pensava que você era igualzinho ao tio Jack, que só ouve jazz vinte e quatro horas por dia. – Disse, e eu dei de ombros. – Não me leve a mal; sei o quanto vocês gostam disso e sei que é bom. É só que fazer uma viagem de carro com ele e a pode ser uma prova de fogo. Uma garota precisa de um pouco de rock às vezes.
- Eu ouço algumas outras coisas além de jazz. – Comentei. – Acho que, se um dia eu tiver minha própria banda, vou misturar um pouco as coisas.
- É bom saber disso, . Quando tiver sua banda, não se esqueça de me mandar um ingresso especial.
- Não mesmo. – Sorri. – Sua mãe e o Jack meio que cresceram juntos, né?
- Ah sim. São primos, mas são como irmãos. Assim como eu e a somos primas de terceiro grau, mas é como se fôssemos de primeiro.
- Bem legal. Não tenho primos por perto, e só vejo meu irmão de vez em quando.
- Bom, mas você tem a e o . – Ela se virou para olhar para mim. – Você deve passar bastante tempo com eles. Talvez mais ainda com a minha prima, não é?
- Muitas horas do meu dia. – Concordei, pensando naquilo. – Na verdade, eu já passava bastante tempo na casa do Jack antes de ela chegar, cuidando do Stevie e tal, mas parece que eu faço muito mais coisas lá agora. E também nos vemos na escola... É, ficamos juntos grande parte do dia.
- Imaginei isso, porque a sempre inclui seu nome em toda história que conta.
- Ah é? – Indaguei curioso.
- Sim, o tempo todo. – Sofia olhou distraidamente para fora. – Além disso, você sabe, vocês agem no mesmo ritmo às vezes. É fácil perceber que estão acostumados a fazerem as coisas juntos.
- Tipo mentir juntos. É, somos bons nisso agora. – Brinquei.
Sofia riu e balançou a cabeça, voltando a olhar para mim.
- Onde estamos indo?
Na verdade, eu tinha pensado em começar aquela noite indo a outro lugar, mas a conversa com ela e os comentários da tinham me feito ter uma ideia muito melhor.
- É uma surpresa – eu disse misterioso. – mas acho que você vai gostar.
POV PIE
- Parece que estamos dirigindo há séculos. – Resmunguei. – Para onde esses tontos estão indo?
- Tecnicamente falando, só eu estou dirigindo. – fez uma careta. – E eu não faço a menor ideia de pra onde eles estão indo.
Olhei pela janela, aflita, bem quando passamos por uma placa.
- Sério, ? – Falei, mesmo que ele não pudesse me ouvir. – Já estamos em Neptune Beach!
- Foi você quem quis que eles se vissem fora da cidade! – me incriminou. De repente, seus olhos se arregalaram. – Oh meu Deus! Eu já sei para onde eles estão indo! Maldito ! Isso é jogar sujo! – Exclamou parecendo ultrajado.
- Aonde? Pra onde? – Perguntei nervosa, já imaginando algum lugar super romântico.
- O Indians. – disse desgostoso. – É um festival de filmes Indie, acontece todo ano em Neptune Beach. Nos entregaram um panfleto outro dia. – Bufou. – Levando minha garota alternativa para um festival Indie. Muito esperto, .
- Você sabe onde vai ser esse troço? – Perguntei bem mais insatisfeita do que gostaria.
- Sei, sim.
- Então acelera.
Mas que ridículo.
Um festival de filmes? Eu era amiga dele há semanas e ele nem tinha me falado que aquele evento – um evento anual – existia!
estava me saindo mesmo um grandessíssimo cretino. E eu que sempre o tinha considerado um santo!
Estava começando a acreditar naquela história de que os homens eram todos iguais.
- Ali! – apontou tirando uma mão do volante. – É bem ali!
Diminuímos a velocidade ao tempo que o carro de estacionava, mas havia outros carros atrás de nós, e por isso tivemos que ultrapassar o único bom lugar para estacionar ali, e ficar ainda bem depois do carro deles.
- Ah, vão fazer bi-bi pra mãe de vocês! – gritou, ignorando o fato de que obviamente ninguém podia nos ouvir com os vidros fechados.
Acabamos estacionando a viatura perto de uma enorme caçamba de lixo, e fiz uma careta assim que descemos do carro.
- Lá estão eles. – Eu disse, me abaixando atrás do veículo. fez o mesmo.
- Vamos ter que chegar mais perto.
- É melhor esperarmos eles entrarem, não?
- Sim. – Ele concordou. – Ah, mas que merda! – Resmungou quando tocou de leve o ombro de Sofia. Bufei com um humor ainda pior que um minuto atrás.
- Já está de bom tamanho. – Decretei. – Vamos!
Atravessamos a rua tentando agir como dois adolescentes normais indo assistir a um filme. Com a exceção, é claro, de que eu não tinha a menor paciência com filmes Indie. Minha última tentativa tinha sido assistir 500 Dias com Ela. Fracasso total.
- Como vamos saber se eles já entraram na sala? – perguntou.
Olhei para os lados em busca de uma resposta. Realmente não podíamos entrar ali e dar de cara com os dois. Caminhei um pouco à volta e avistei uma janela. No entanto, ela era um pouco alta para nós dois.
- Já sei! – Apontei. – Vem aqui. Me deixa subir em você.
fez uma careta, mas se aproximou e abaixou. Tentando ser delicada – sem muito sucesso – subi em seus ombros.
- Você é meio pesada para uma líder de torcida, não acha? – Ele reclamou. Rolei os olhos.
- E você é meio fracote para um jogador, não?
- Touché.
Meus olhos finalmente alcançaram a janela. Lá dentro, pude ver, havia dois guichês com atendentes estranhos, e algumas pessoas circulando pelo hall. De repente, avistei um pedaço do cabelo colorido de Sofia – eu supunha – entrando no corredor das salas.
- Ali! – Exclamei eufórica.
- Onde?!
- Ali, eles estão entrando al...
então perdeu o equilíbrio, dando um passo vacilante para trás. Nós dois caímos no chão como sacos de batata.
Eu poderia ter quebrado alguma coisa, pensei.
- Posso ajudar vocês? – Uma voz surgiu acima de nós.
Olhamos em direção a ela e vimos um cara grande, com uma enorme barba, usando um chapéu coco verde claro. Ele parecia um hipster, mas eu nunca tinha conhecido um daquele tamanho.
- Não... – fez um esforço enorme para se sentar. – A gente até que tá... A gente tá legal.
Me sentei em um pulo.
- É. Ótimos. Foi só uma quedinha de nada. – Dei um sorriso falso.
- Não estavam tentando entrar de penetras, não é? – O homem nos encarou. – Porque, vocês sabem, eu sou o lanterninha daqui.
O medo de , para o meu azar, pareceu se diluir ao ouvir aquilo. Ele até tentou se segurar, mas de repente, estava rindo.
- Lanterninha? – Repetiu, e eu o fuzilei com o olhar. – Sério mesmo, cara? Desse tamanho?
O homem fez uma cara furiosa e eu rapidamente tratei de ficar de pé e agarrar pelo braço.
- Acho que foi isso mesmo que ele disse, . – Sorri. – Desculpe, não queríamos causar transtorno. Juro que adoramos pagar ingressos. Estamos indo fazer isso agora mesmo, se nos dá licença.
Ainda sob o olhar ameaçador do lanterninha, saímos correndo para dentro do prédio, entrando na fila do guichê.
- Qual é o seu problema? – Dei um soco no braço de .
- Ah, fala sério! Aposto que você também quis rir! – Ele disse seguro, e eu rolei os olhos.
- Vamos pra outra fila, acho que está andando mais rápido.
Eu e nos deslocamos para a outra fila – incrivelmente mais vazia que a primeira. Depois que as duas pessoas à nossa frente foram atendidas, chegou nossa vez. O atendente era um rapaz magricela com uma barba rala, usando camisa xadrez vermelha e óculos quadrados. Ele mal pareceu notar nossa presença.
- Ei! – Bati no vidro. – Boa noite!
Ele levantou os olhos da revista em quadrinhos que lia, parecendo ter sido pego de surpresa por clientes. Fala sério.
- Ah. – Ele nos observou por um instante, sem muita empolgação. – E aí?
- Oi! Por acaso sabe nos dizer uma garota ruiva passou por aqui alguns minutos atrás? Ela estava com um garoto de camisa azul.
- Ruiva, ruiva... – Ele coçou o queixo. – Muitas garotas ruivas vem nesse evento, você sabe. Era uma ruiva de verdade ou uma ruiva falsa?
- De verdade, senhor. – afirmou com devoção. – E era uma ruiva muito, muito gata.
- Ah, claro, acho que sei de quem está falando. – O rapaz estreitou os olhos, pensativo. – Mechas coloridas, né?
- Isso! É ela mesma! – Meu amigo confirmou.
- Nossa, ela era mesmo muito gata. – O cara sorriu assentindo com vontade.
- Tá, enfim... – Cortei o assunto. – Por acaso se lembra de para qual filme ela comprou ingresso?
O cara estreitou os olhos de novo, encarando o nada enquanto pensava a respeito do assunto. Depois olhou para mim como se tivesse acabado de se lembrar.
- Ah, lembro sim! – Garantiu. – Com certeza.
- E qual foi?
- Foi Poultrygeist: Noite das Galinhas Mortas.
- Você tem mesmo certeza disso? – Fiz uma careta. Não conseguia imaginar nem nem Sofia assistindo qualquer coisa com um título daqueles.
- Absoluta. – O rapaz assentiu. – Foi esse mesmo. E então, vão querer os ingressos?
Apesar da minha óbvia infelicidade para entrar na sessão, tirei o dinheiro do bolso e paguei as duas entradas (só custavam três dólares).
- Talvez não seja tão ruim. – tentou me animar. – Tem, tipo, zumbis.
- Galinhas zumbis. – Corrigi mal-humorada.
Mas pelo menos o filme não seria capaz de tirar minha atenção daqueles dois por um segundo que fosse.
POV
- Sabe, acho que foi uma jogada incrível me trazer aqui. – Sofia sorriu, comendo pipoca. – Adoro cinema. Adoro filmes.
- É, eu imaginei. – Concordei. – A também adora filmes. Toda sexta à tarde ela se joga no sofá com um balde de pipoca e assiste um. Mas esse não é bem o estilo dela. – Sorri, me lembrando.
- Ela é toda romântica, não é? – Sofia me encarou, um leve sorriso no rosto.
- É, ela gosta de comédias românticas. – Confirmei. – E tem uma habilidade toda especial para encontrar uma diferente cada semana. Não sei como ela consegue.
- Você acaba assistindo todas, eu suponho.
- Na verdade, sim. – Ri um pouquinho. – Às vezes finjo que estou só sentando no chão fazendo o dever de casa e digo que só vou lá por causa da pipoca, mas na verdade eu vou mais porque me divirto muito com os comentários e as caras que ela faz durante o filme. No fim, eu sei a história de todos.
Sofia deu um sorriso enigmático, assentindo. Ela apertou de leve minha mão.
- Não se preocupe, seu segredo está a salvo comigo.
Sorri de volta para ela, como se agradecesse.
- Ah, já vai começar! – Ela apontou para a tela quando as luzes se apagaram.
Não havia trailers, então, depois de uma música de fundo e dos créditos iniciais, o nome do filme apareceu em grandes letras vermelhas na tela.
Suburban Gothic.
POV PIE
- Dá licença, desculpe. – tentava passar em meio aos pés das pessoas para alcançar os dois lugares vazios na última fileira, de onde poderíamos ver o resto das pessoas.
- Oh, sinto muito! – Exclamei quando pisei no pé de um casal, separando-os de um beijo nojento.
Finalmente desabamos nas duas cadeiras do canto, sãos e salvos.
- Beleza, conseguimos. – disse baixinho.
As luzes já estavam apagadas, mas a sala era relativamente pequena, então dava para ver tudo.
E sabe quem eu não estava vendo ali?
- Eu acho que eles não estão aqui. – Cochichei para depois de alguns minutos.
- É, também não tô vendo eles. – O garoto concordou.
- Não devíamos sair dessa sessão então?
- Não agora. - Ele disse calmamente. – Eles podem só ter ido ao banheiro ou foram comprar um refrigerante. E se dermos de cara com eles no corredor? É melhor esperarmos um tempo.
- É, você tá certo.
E nós esperamos.
Esperamos por quarenta malditos minutos.
Àquela altura, Paco, um dos coadjuvantes, tinha acabado de ser empurrado em um triturador por um frango assassino, e Arbie, o protagonista, estava cantando a música mais bizarra de todos os tempos junto com um velho muito esquisito.
E eu não aguentava mais.
- , já chega, eles não vão vir! – Exclamei puta da vida.
- É, acho que não vão mesmo. – Ele concordou. – Não sei se estou realmente feliz por ter descoberto a existência desse filme. – Comentou encarando a tela com uma expressão de total confusão.
- Vamos logo!
Passamos mais uma vez entre os pés dos outros, pedindo "desculpas" e "com licenças" enquanto tentávamos nos livrar daquele filme terrível. Finalmente, cambaleamos para fora da sala.
- Ah, graças a Deus! – Exclamei aliviada.
- Eu sabia que aquele cara do guichê era estranho. – fez uma careta. – E agora, o que faremos?
- Podemos procurar eles em outras salas. – Falei, porque não tinha ninguém vigiando nada realmente. – Ou esperamos lá fora.
- Tudo bem, mas primeiro eu vou ao banheiro. – Ele avisou.
- Ok.
foi ao banheiro e eu aproveitei para fazer o mesmo. Na verdade, o que queria mesmo era me olhar no espelho.
Lá estava eu, com meu rabo de cavalo e uma cara de perseguidora maluca. E por quê? Por que não queria que minha melhor amiga ficasse com meu melhor amigo? Será que era muito egoísmo da minha parte?
- Talvez, quem sabe?
Lavei as mãos e saí lá de dentro. Estava me encaminhando para o outro corredor quando o vi.
Lá estava o !
Estava passando com um milk-shake de morango em direção às portas das salas. Me escondi rapidamente num canto para que ele não me visse. Depois de um segundo, corri para ver onde ele ia entrar. Era a sala 3. Definitivamente, não era a sessão de Noite das Galinhas Mortas.
- Maldito cara do guichê! – Exclamei.
No mesmo instante, saiu do banheiro masculino.
- Qual o problema?
- Descobri onde eles estão! – Expliquei agarrando sua mão e o puxando. – É a sala 3! Vamos pra lá!
apressou o passo comigo, mas assim que colocamos os pés dentro da sala 3, alguém segurou nossos ombros e nos puxou com uma delicada força – se é que isso existe – para trás.
- Eu poderia saber onde estão indo?
Lá estava o lanterninha gigante de novo, nos olhando desconfiado.
- Só estávamos... – Gaguejei. – Voltando para o nosso filme. – Forcei um sorriso.
- Ótimo. – O cara assentiu. – Posso ver os ingressos de vocês?
Fiz uma careta, querendo xingá-lo, mas tirei os ingressos do bolso e deixei que ele os visse.
- Muito bonito. – Ele meneou a cabeça. – Pensando que podem assistir dois filmes pelo preço de um.
- Moço, não é nada disso. O que acontece é que... – Tentei explicar.
- Nada de conversa, seus trapaceirozinhos.
Eu e nos remexíamos enquanto ele nos levava para o hall – onde o maldito cara do guichê desviou os olhos da revista para acenar para nós – e então para o lado de fora.
- Isso é agressão! – reclamou quando ele finalmente nos soltou do lado de fora.
- Tenham um pouco de vergonha! – O cara disse indignado. – São três benditos dólares. Até vocês estudantes têm dinheiro pra isso!
Depois ele entrou de novo, nos deixando ali no relento.
- Droga! – Exclamei zangada.
- Lanterninha dos infernos. – suspirou. – Agora vamos ter que esperar aqui fora.
- Vamos pra viatura.
E lá fomos eu e de volta para dentro do carro. Abrimos as janelas por um tempo, mas fomos obrigados a fechá-las por causa do cheiro que vinha da caçamba de lixo.
Fixei meus olhos nas portas do prédio e cruzei os braços, minha cabeça pensando contra minha vontade em e Sofia lá dentro.
- Deixa eu te fazer uma pergunta? – disse depois de um tempo.
- O quê? – Olhei para ele.
- Você tem certeza de que está aqui só porque tem medo de que o e a Sofia estraguem sua grande farsa?
- Por que outro motivo eu estaria? – Divaguei, voltando a encarar a porta.
- Não sei. – deu de ombros. – Talvez porque, lá no fundo, você talvez goste um pouco do . Você sabe, mais do que como o cara que cuida do seu cachorro e mais do que como seu amigo.
Fiquei calada por um instante, pensando no que responder. Eu sabia, é claro, que não era nada daquilo.
- É só pela farsa. – Voltei a dizer, mas tive a impressão de que minha voz não pareceu muito segura.
- Tudo bem. Acredito na sua palavra. – O outro garantiu. – Veja, lá estão eles!
e Sofia estavam saindo do prédio do festival às gargalhadas. Com certeza tinham assistido alguma coisa muito melhor do que a porcaria do nosso filme.
- Vamos dar um tempo para saírem e depois voltamos a segui-los. – Falei.
assentiu, e foi isso que nós fizemos.
POV
- Caramba, eu realmente adorei aquele filme! – Sofia ainda elogiava quando saímos do carro e começamos a caminhar em direção à sorveteria.
- Foi mesmo melhor do que eu esperava. – Concordei sorrindo.
- Adoro o Matthew Gray Gubler, sabe? Acho ele um ótimo ator.
- Só tinha visto ele naquela série dos assassinatos.
- Devia assistir mais coisas, ele é muito engraçado. – Ela aconselhou.
- Vou fazer isso, pode deixar.
Entramos pelas portas vermelhas da Royals. A Royals era uma sorveteria maravilhosa em formato de trailer, onde eram vendidos sorvetes especiais inspirados em grandes personalidades da música, como Michael Jackson e Elvis Presley. Eu já tinha ido ali umas duas vezes e sabia que ela ia gostar.
- Nossa, que lugar lindo! – Sofia exclamou.
- Boa noite, queridos. – Uma garçonete loura, parecendo uma versão mais velha da Marilyn Monroe, apareceu. – Vamos, vou leva-los a uma mesa.
Ela nos guiou até uma mesa de madeira com bancos de couro. Nos sentamos frente a frente e ela nos entregou cardápios, prometendo voltar em um minuto.
- Eu te aconselho a pedir o Elvis. Tem muita calda. – Comentei. – Mas o Nina Simone também é muito gostoso.
Sofia me olhou docemente e sorriu, balançando a cabeça.
- Puxa, . – Ela disse.
- O que foi?
- É só que... Nossa, esse é o melhor encontro que eu tenho em muito tempo. De verdade. Os garotos de hoje em dia são todos uns idiotas.
Me senti mal na hora.
Ali estava eu, fazendo de tudo para agradar uma garota, quando na verdade a única coisa que eu realmente queria era fazer ciúmes em outra. Não tinha muito a ver com meu comportamento normal e parecia bem errado.
Depois, me senti mal por . Eu não devia estar fazendo mil coisas para Sofia gostar de mim quando sabia que era ele quem realmente gostava dela. Mas ela era uma garota tão legal... Mesmo que apenas como um amigo em potencial, eu queria que ela se divertisse.
- Olha, nem todos os garotos são idiotas. – Falei, tentando remediar as coisas.
- É mesmo? – Ela arqueou uma sobrancelha.
- É sim! – Movi a cabeça em concordância. – O , por exemplo, não é.
Sofia deu um meio sorriso, desconfiada.
- Ah não? E o que ele faria se fosse ele tendo um encontro comigo? – Desafiou.
- Bom, pra começar, ele ia te contar um monte de piadas ruins no carro, mas você ia acabar rindo de pelo menos metade delas, porque ia perceber que ele só estava tentando ser legal, e porque ele é um cara realmente engraçado. – Supus, e Sofia inclinou a cabeça para o lado, analisando. – Depois, era bem provável que ele te levasse a algum fliperama; ele conhece uns bem maneiros. E então ele terminaria te levando pra comer pizza, ou hambúrguer, porque também não dá pra pedir que ele seja muito sofisticado. É o . – Dei de ombros, rindo um pouco.
Sofia riu também, assentindo.
- Parece bom pra mim. – Ela sorriu.
E então a garçonete voltou para pegar nossos pedidos, e o rumo da conversa foi de encontros para sabores de sorvete.
POV PIE
- Oh, não acredito que ele a trouxe aqui! – Exclamei quando vimos o carro de parando no estacionamento da Royals. – Esse joga mesmo muito baixo!
- Caramba, eu sempre quis vir aqui! – disse infeliz.
Uns dias atrás, e eu tínhamos saído com papai para buscar umas coisas e ele nos levara ali. Agora o babaca estava usando aquela descoberta deliciosa para conquistar garotas.
Uma vez que eles tinham entrado, eu e pegamos uma das mesas do lado de fora. Ela era escondida o suficiente para que eles não pudessem nos ver, mas se esticássemos um pouquinho as cabeças conseguiríamos ver os dois por uma janela de vidro fina que ia do chão ao teto.
- Olá, meus jovens. – Uma garçonete com um belo penteado Black Power apareceu. – Já sabem o que vão pedir? – Ela apontou para o cardápio sobre a mesa.
- Um Madonna pra mim, obrigada. – Lhe devolvi o cardápio sem nem olhar direito.
- Vou querer um Britney Spears. – informou. Olhei bem para a cara dele. – O que foi? Parece ótimo.
A garçonete riu e nos deixou sozinhos. Voltamos ao nosso trabalho como espiões.
- Olhe só praqueles dois. – Estreitei os olhos. – Parecem tão inocentes.
- Vá se saber do que eles estão falando. – fez o mesmo.
- Com certeza alguma coisa bem idiota. – Fiz uma cara de desdém.
- Talvez estejam falando mal de nós.
Abri a boca, chocada com a possibilidade. Mas, de fato, Sofia era a única outra pessoa que sabia que eu era uma mentirosa, então podia mesmo estar falando mal de mim!
Já fiquei irritada só de pensar. Que ridículos eram aqueles dois!
POV
- Fala sério. – Sofia ria, sem acreditar.
- Juro que ele fez isso mesmo. – Eu ri também. – Estava super distraído cantando mal daquele jeito e deixou a tampa em cima da bancada. Quando ele ligou o liquidificador voou vitamina de morango pra todo lado!
- E a ? – Ela perguntou enfiando outra colherada de seu sorvete na boca.
- A ficou toda suja, quase mais do que ele, e acho que xingou um pouco em português na hora, mas a gente não entende muita coisa quando ela faz isso. – Sorri. – Depois ela também não aguentou e começou a rir. Ela tem uma paciência danada com o Jack.
- Mamãe fala que foi difícil pra ela quando a tia Jaqueline e ele se separaram. Eu não lembro realmente, era muito pequena. Mas lembro de que fiquei algum tempo sem vê-la.
- Eu posso imaginar. Ela adora o Jack, sabe? Faz tudo por ele, inclusive manter a ordem naquela casa, o que não é mole. Mas ela faz tudo parecer tão fácil! – Meneei a cabeça, suspirando. – Tudo mudou depois que ela chegou aqui. É por isso que ele é louco por ela. – Baixei os olhos.
Depois de alguns instantes, senti o olhar de Sofia sobre mim. Quando a encarei, ela estava sorrindo.
- O que foi? – Perguntei.
- Nada. – A ruiva balançou a cabeça. – Não é nada. Já acabei meu sorvete.
- É, eu também. Vamos fechar a conta?
Sofia e eu nos levantamos e seguimos para o caixa. Ela ainda me olhava meio de lado e sorria. Pensando em quê, eu não sabia dizer.
POV PIE
- Caramba, esse Britney Spears é bom mesmo! – Exclamei pegando outra colherada do sorvete de .
- Eu sabia que tinha que ser! Tem calda de caramelo e flocos de arroz! – Ele disse convencido. – O Madonna também não é nada mal. – Ele pegou mais do meu sorvete.
Meus olhos por acaso foram parar na mesa de e Sofia. Com espanto, percebi que eles tinham sumido.
- Droga, eles já foram! – Exclamei largando a colher e ficando de pé.
- Merda! – fez o mesmo.
O garoto rapidamente tirou um dinheiro do bolso e colocou sobre a mesa, debaixo do cardápio.
- Fica por minha conta. – Ele disse fazendo sinal para que a garçonete se aproximasse. – O dinheiro está aqui! – Ele avisou antes que ela chegasse até nós. Depois, saímos correndo.
me puxou de volta para a viatura a toda velocidade e destravou o veículo, mas quando fui abrir a porta, ela não abriu.
- Ah, não. – Ele fez uma cara de pânico. – Dessa vez não, sua lata velha! Abra! Abra! – Ele começou a chutar a porta.
De repente, ouvimos as vozes de e Sofia se aproximando.
- Droga, , tenta a porta de trás! – Eu disse desesperada.
A porta de trás do carro abriu com um rangido, e nós dois mergulhamos para dentro do automóvel e nos apertamos para chegar ao banco da frente.
- Ótimo. – disse ofegante, jogando a cabeça para trás. – Estamos salvos.
Fechei os olhos e respirei fundo, mais calma.
Foi aí que ouvimos a voz de bem do lado de fora.
- Ei, é a viatura do pai do ! – Ele comentou.
arregalou os olhos para mim.
- Como você sabe? – Sofia ficou intrigada.
- Eu e fizemos essa marca na porta jogando basquete. – O rapaz contou. – Ei, senhor ! – Bateu no vidro.
Eu estava totalmente petrificada. Não podíamos passar pela humilhação de sermos pegos seguindo eles depois de termos agido como se tudo estivesse ótimo.
- O que vamos fazer? – Movi a boca sem emitir som algum, perguntando a .
O garoto parecia tão em pânico quanto eu, mas de repente, seus olhos ganharam aquele brilho maluco de costume.
girou a chave do carro, ligou as sirenes e saiu a toda.
- AH MEU DEUS, O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO? – Gritei.
- TIRANDO A GENTE DAQUI!
Pelo menos não havia como discutir aquilo.
dirigiu a toda velocidade de volta para casa, conseguindo que vários carros saíssem da nossa frente com o uso das incrivelmente potentes sirenes da viatura.
- SAIAM DA FRENTE, É A POLÍCIA! – Ele gritava de dentro do carro.
Constantemente eu olhava para trás para me certificar de que o carro de não estava logo atrás do nosso. Também estava morta de medo de que algum policial de verdade resolvesse nos parar, mas aparentemente o uso das sirenes fazia todos pensarem que estávamos em uma missão muito importante.
Não que estivessem errados.
Finalmente, chegamos ao meu bairro. foi reduzindo a velocidade cada vez mais enquanto entrávamos naquele lugar tranquilo e silencioso.
- Ufa, sobrevivemos. – Ele disse então.
Primeiro olhei séria para ele, ainda assustada. Depois, comecei a rir. Ria tanto que minha barriga doía, e fazia o mesmo. Talvez estivéssemos só rindo de nervoso.
- , você é completamente doido.
- Você teria feito a mesma coisa se estivesse no volante!
Descemos do carro na rua de Jodi, ainda rindo. Entramos no parquinho em frente à minha casa e, quando ouvimos o barulho de um carro, nos escondemos atrás de uma moita alta cheia de florezinhas azuis.
De fato, eram e Sofia. Era a última parada do encontro deles.
- Escuta, , talvez a gente tenha exagerado. – comentou então. Os dois tinham descido do carro e estavam parados em frente à minha casa, conversando casualmente.
- É o que parece, não é? – Concordei. – Acho que fomos dois bobos.
- É! Quer dizer, tirando a parte do cinema onde não conseguimos vigiá-los, eles não fizeram nada de mais. Até onde sabemos, só viram algum filme ruim e tomaram sorvete.
- Não muito diferente de nós. – Dei de ombros e ele também.
- Acho que eu devia ter confiado mais no . Ele sempre foi um bom amigo.
Percebi que estava certo. não faria uma canalhice daquelas, eu sabia o tempo todo. Sofia também não ficaria com ele, porque, mesmo que eu afirmasse que não, ela acreditava mesmo que nós tínhamos alguma coisa – mesmo que indefinida.
Então, era isso, minha farsa estava a salvo no fim. Era isso que realmente me tranquilizava.
Foi então, que, de repente, Sofi deu um passo à frente.
ficou parado, sem reagir.
E então ela o beijou.
E meu estômago se contorceu, e perdeu o ar ao meu lado, e estávamos certos o tempo todo, mesmo que quiséssemos estar errados.
Então do enjoo veio à raiva, uma raiva que me subiu à cabeça. Bufando, me preparei para ir até lá acabar com aquele show gratuito na porta da minha casa, mas uma mão me segurou.
- Não faça isso. – balançou a cabeça. Parecia estar com raiva, mas também sem reação. – Maldito . – Murmurou.
Respirando fundo, meu corpo todo tenso e meu coração disparado, fiquei ali com ele mais um instante.
Sofia se afastou de e disse mais alguma coisa. Depois se afastou em direção à porta.
acenou e entrou no carro, saindo com ele depois de um minuto. Sofia entrou em casa.
- Eu não acredito. – Arfei, ficando de pé.
- Nem eu. – concordou. Seu rosto estava vermelho.
Fechei os olhos e tentei raciocinar por um segundo.
- Eu preciso entrar agora, ou ela vai descobrir tudo. – Falei. – Você vai ficar bem?
- Não, mas não tem problema. – Ele disse sério. – Nos vemos amanhã.
Assenti e corri para o outro lado da rua, achando melhor entrar pelos fundos. No entanto, quando ouvi a voz de Sofia me procurando, achei melhor ficar no quintal. Comecei a pegar roupas secas do varal, esperando que ela aparecesse.
- Ah, , você está aí! – Ouvi a voz dela atrás de mim.
Tive que respirar muito fundo para não demonstrar nenhuma raiva. Minha vontade verdadeira era puxar seu cabelo comprido com força, como quando éramos pequenas.
Me virei para ela com um sorriso forçado.
- Sim, estou tirando as roupas do varal. – Eu disse casualmente. – A previsão do tempo avisou que vai chover essa madrugada.
- Puxa, é mesmo? O céu parece até limpo. – Ela observou. – De qualquer modo, só queria te avisar que já cheguei. Vou lá pra cima trocar de roupa e dormir. Estou exausta.
- Tudo bem. – Meneei a cabeça.
Depois que Sofia entrou de novo, me joguei no gramado, com as roupas e tudo.
A previsão do tempo não estava errada. A questão era que a única nuvem negra pairando nesse momento era aquela sobre a minha cabeça.
Depois do que acontecera com , eu tinha pensado que nunca mais sentiria tanta raiva na vida, mas pelo visto eu tinha me enganado.
POV
- Que pena que já está acabando. – Sofia disse dentro do carro quando entramos na rua de Jack.
- É, eu me diverti muito. – Concordei.
- Podemos nos divertir de novo quando eu voltar aqui. – Ela sugeriu. – Ou talvez vocês possam me visitar em Venice Beach!
- Seria bem legal. – Sorri.
Parei o carro em frente à casa dos Pie e Sofia desceu primeiro. Eu fiz o mesmo depois, me aproximando dela.
A verdade é que eu estava muito nervoso. Eu tinha feito toda aquela coisa de encontro, mas geralmente encontros terminavam com beijos e eu não me sentia confortável com a ideia, por mais incrível que Sofia fosse. estava ali em cima. A de quem eu gostava, apesar de ser problemática. E meu melhor amigo àquela hora estava em casa, me imaginando com a garota por quem ele estava louco.
- . – Sofia disse então, me tirando de seus pensamentos. – Eu preciso te falar uma coisa, mas não quero que você fique chateado.
Do que ela estava falando? O encontro tinha sido, na verdade, uma droga? Ela tinha namorado? Talvez qualquer uma das duas coisas fizesse eu me sentir melhor.
- Pode falar. Não vou ficar chateado. – Garanti.
- Ai, mas que droga... – Ela fechou os olhos e coçou a cabeça, depois me encarou. – É que esse encontro... Bom, não foi um encontro de verdade.
- O quê? – Franzi o cenho. – Como assim?
- Não me leve a mal, tá? – Ela tocou de leve meu ombro. – Você é um cara maravilhoso e esse essa noite foi realmente ótima, mas eu não poderia ficar com você mesmo que quisesse. E acho que você sabe o motivo. E acho que você pensa do mesmo jeito.
Engoli em seco, mas fiquei mais calmo, começando a entender para onde a conversa ia.
- Apesar de ter flertado um pouquinho com você desde que cheguei aqui, eu só te convidei para sair comigo hoje porque queria provocar a . – Sofi continuou. – E tenho um palpite muito forte de que você aceitou pelo menos motivo. – Sorriu um pouco.
- Como sabe disso? – Ergui uma sobrancelha.
- Porque é óbvio que você é louco por ela! – Ela riu. – Não é que eu não tenha percebido antes, mas também quis sair com você para ter certeza. E você gosta tanto dela! Vocês deveriam estar juntos há muito tempo, mas a é ridícula! – Sofia parecia frustrada. – Foi por isso que quis sair com você, porque, ... Ela gosta de você.
- O quê? – Prendi a respiração meio que involuntariamente.
- É, ela não diz com todas as letras. Pra ser honesta, ela nega até a morte. Mas acredite em mim. – A garota garantiu. – Eu a conheço desde sempre. Sei que ela gosta muito de você, e não só como amigo. Tudo estaria fluindo do jeito certo, se ela não estivesse tão metida com a vida do maldito . – Suspirou. – Mas minha prima te adora, , e você faz tão bem a ela... Foi por isso que te convidei para sair hoje. Eu queria forçá-la a admitir isso, mesmo que por ciúmes.
- Acho que deu errado então, não é? – Fiz uma careta.
- Não, não deu. – Ela deu um sorriso vitorioso. – E a prova disso é que ela e seu amigo estão nesse exato momento escondidos atrás daquela moita no parquinho.
Assustado, movi discretamente os olhos em direção ao parque escuro, mas tudo que vi foi a moita se mexer de um jeito nada normal.
- Eles nos seguiram a noite toda. Descobri quando fui ao banheiro no cinema. estava falando sozinha lá dentro. – Ela deu uma risadinha. – Também acho que eram eles na viatura do pai do seu amigo lá na sorveteria.
- Caramba, ... – Fechei os olhos, tonto com aquilo. Os dois eram mesmo malucos.
Mas, ei, tinha me seguido porque gostava de mim! Aquela ideia me fez sorrir.
- Agora, preste atenção. – Sofia disse. – Você vai passar por uma experiência que vários caras adorariam viver. É em nome desse plano. Precisamos nos certificar que a fique maluca de ciúmes. – Sorriu.
Eu assenti. Sofia deu um passo à frente, e então, me beijou. Levou alguns segundos para que ela se afastasse, e a boca dela ainda tinha o gosto de chocolate do sorvete – o que de modo algum era ruim.
- Pronto. – Ela disse quando se afastou. – Você beija bem, . – Sorriu.
- Você também. – Sorri. – E, Sofia?
- O que foi?
- O gosta de você. – Contei. – É por isso que ele está ali com a .
A menina arregalou os olhos e abriu a boca, surpresa por um instante, depois ela sorriu.
- Certo. – Ela disse. E pude jurar que ela ficou um pouquinho feliz por saber daquilo.
Sofia se aproximou da porta e eu entrei no carro.
Fui embora sorrindo feito um pateta pelo que ela tinha dito, tentando não pensar muito em como ia querer me matar no dia seguinte.
[…]
POV
- Aquela era mesmo a melhor comida que eu já comi na vida. – suspirou como se lembrasse de um velho amigo. – Quando vamos ter dinheiro para voltar lá?
- Quando ganharmos na loteria, talvez. – Respondi sonolento enquanto andávamos pelo corredor da Jacksonville High.
- Já falei que você está parecendo um zumbi? – Ele comentou com uma careta.
- Fiquei até tarde no Roger's ontem, Jack não tocava desde semana passada e decidiu fazer isso justo no domingo.
- Pensei que ele te dispensasse dos domingos por causa das aulas da segunda.
- E ele faz isso, é aí que está o problema! – Bufei, deixando um pouco meu sono de lado. – Se eu deixar que ele me trate como uma adolescente mané sempre, o Jack nunca vai conseguir me ver como um músico de verdade. E aí, quando ele fizer uma turnê, não vai querer que eu vá junto porque tenho outras responsabilidades. – Expliquei. – Miguel tinha quatorze anos quando Jack o encontrou. Quatorze! E quando tinha minha idade, já tocava como profissional.
- Não querendo te desanimar, mas tecnicamente falando, você é um adolescente mané. Aos quatorze, Miguel já devia ser procurado em uns dez estados. – Ele ergueu as sobrancelhas. – Como estão sendo as coisas com ele na casa, aliás?
- Nem boas, nem más. Temos tomado cuidado, mas acho que ele desconfia de alguma coisa.
- não é tão boa mentirosa quanto pensa. – Deu de ombros, pensativo. – Falando nisso, onde ela está?
Bastou falar seu nome para que ouvíssemos passos apressados à distância. Me virei para trás e vi correndo em nossa direção, como se tivesse saído de casa atrasada. Jack tinha me dispensado de busca-la na noite anterior, ao perceber que eu estava exausto. Ele disse que a levaria no dia seguinte.
- Um parece estar dormindo, a outra parece ter tomado um litro de energético. Vocês realmente se completam. – sorriu, e eu rolei os olhos. – Alguém perdeu a hora. – Ele disse quando ela finalmente se aproximou.
- Jura? – ergueu as sobrancelhas, depois respirou fundo. – Meu pai, ele tem graves problemas com horários.
- Sei bem disso. – Concordei. – Se eu soubesse teria ido te buscar, mesmo que você fosse correr um grande risco andando de carro comigo hoje.
- Está tudo bem. – deu um sorrisinho. – Eu vim de ônibus.
- E o Jack? – franziu o cenho.
- Não dava tempo de esperar, eu tinha que participar do teste. – Ela contou, então se deu conta. – AI MEU DEUS, O TESTE!
- Que teste? – Ele não entendeu.
- O teste para a peça de Outono. – Me lembrei, pegando o celular para o olhar a hora. – Relaxa, ainda dá tempo.
- É verdade. Foi por pouco. – Ela fechou os olhos e respirou fundo. – Vejo vocês depois!
saiu correndo de novo, e nós ficamos ali, assistindo.
- Verdade que a peça não vai mais ser O Mágico de Oz? – perguntou quando voltamos a andar.
- Estranho, não é? – Dei um breve sorriso. – A parece ter virado mesmo tudo aqui de cabeça para baixo.
Enquanto conversávamos, avistei Rosana e sua amiga Ashley vindo na direção oposta. Já estava preparado para inventar uma desculpa, mas ao me ver, a própria Rosana arregalou os olhos e apressou o passo.
- Ei, meninos! – Ela cumprimentou rapidamente, seguindo seu caminho.
parou por um instante, olhando dela para mim.
- O que você fez com ela? – Quis saber.
- Eu? Nada! – Me defendi, apesar de confuso também. – Mas que bom que ela parece ter voltado ao normal.
- Não acho que tem nada de normal nisso, se quer mesmo saber, . – Ele ponderou. – Mas temos mais o que fazer agora. Ainda nem descobri um jeito de me livrar das comidas ridículas da Amber no almoço, mas talvez possa usar o surto dela do sábado como desculpa. – Se alegrou.
Sem dúvida, Amber Hayley parecia um problema maior que Rosana Wayans agora.
A professora de teatro de adiou o teste para àquela tarde, na tentativa de dar aos alunos a chance de se prepararem. Aparentemente, a nova peça seria um musical, e, portanto, o teste consistia em cantar alguma música. Obviamente, a notícia tinha deixado um tanto quanto deprimida, visto que ela definitivamente não sabia cantar.
- Ela não vai mesmo passar nesse troço. – balançava a cabeça enquanto voltávamos para casa. – É bem humilhante, se parar pra pensar que com certeza é a Jasmine quem vai ganhar o papel principal, como todo ano.
- Se ao menos ela só precisasse atuar. – Suspirei, já com pena de . estava certo, Jasmine cantava incrivelmente bem; não teria chance.
Fomos direto para a casa de Jack, já que eu tinha que dar uma olhada em Stevie, e também leva-lo para dar uma volta. Jack tinha me dito na noite anterior que teria que sair com Miguel naquele dia para resolver uns problemas.
Usei minha chave para abrir a porta e eu e entramos.
- Espero que tenha alguma coisa para comer aqui. – Meu amigo foi logo falando ao largar a mochila no chão.
- Deve ter alguma coisa na geladeira. – Falei já me distanciando.
Stevie veio logo me saudar quando me viu e eu me abaixei para brincar com ele.
- Ei, garoto! – Sorri. – Vou te dar alguma coisa pra comer também.
Busquei o saco de ração e coloquei uma quantidade razoável na tigela. O dálmata logo começou a comer, esfomeado. Depois lavei as mãos e peguei algumas coisas na geladeira, na intenção de preparar um sanduíche.
- Se quiser um, é melhor vir fazer! – Gritei para .
- Eu já vou! – Ele respondeu, mas então a campainha tocou.
Continuei preparando meu sanduíche, imaginando que tinha ido atender a porta, mas como ele não veio logo fui ver o que estava acontecendo.
Ao chegar à sala, percebi que meu amigo estava congelado em frente à porta aberta, olhando alguma coisa lá fora.
- , qual é o problema? – Me aproximei com o cenho franzido.
Do lado de fora, encarando com uma cara que misturava confusão e impaciência, estava uma garota ruiva, usando batom rosa e colete de couro. Seu cabelo tinha várias pontas coloridas. Sua expressão pareceu amenizar quando me viu, e ela esboçou um sorriso.
- ? – Ela perguntou.
- Sim, sou eu mesmo. – Respondi devagar.
- Ótimo, então estou na casa certa! – Ela riu. – Dá licença?
Ainda de boca aberta, deu um passo para o lado, deixando que a garota – puxando uma mala roxa – entrasse em casa. Eu não estava entendendo nada, mas não consegui fazer nada para impedi-la.
- Isso está muito pesado. Talvez eu tenha trazido coisas de mais. – Ela suspirou, olhando para a mala.
- Desculpe, mas... Quem é você? – Finalmente consegui perguntar.
- Ah, é verdade, vocês devem estar confusos. – Ela disse numa voz misteriosa. Então estendeu a mão para mim, e eu a apertei. – Eu sou Sophia, a prima preferida da .
POV PIE
O despertador do celular me deu um tremendo susto. Acordei meio tonta, procurando o aparelho no criado mudo para desliga-lo. O mais estranho, no entanto, era o fato de que eu nunca era acordada pelo despertador, pois este sempre estava programado para tocar trinta minutos após meu horário de sair de casa, no caso de por algum motivo desconhecido eu dormir demais e...
ESPERA AÍ.
- Merda! – Pulei da cama, xingando em português. – Merda, merda!
Eu corria de um lado para o outro, sem saber nem por onde começar. Tinha me atrasado, e teria uma reunião do clube de teatro naquela manhã.
- Onde diabos está o ?! – Eu reclamava em voz alta já descendo as escadas, amarrando o nó do coletinho jeans que tinha colocado às pressas.
- , que barulho é esse?
Era meu pai, saindo do quarto com cara de quem tinha dormido mais que a cama.
- Perdi a hora, e não veio me buscar! – Expliquei as pressas.
- Ah, não! – Papai bateu na testa. – Eu disse pra ele que ia te levar. Desculpe, Rainbow.
- O senhor o quê? Pai, só... Não, ok?
- Vou pegar as chaves do carro... – Ele começou a voltar para dentro.
- Não precisa, Jack. – Dispensei, mal-humorada. – Vou de ônibus, dá tempo de chegar.
- Mas, querida...
Antes que ele tivesse tempo de dizer qualquer coisa, eu já estava do lado de fora.
Ajeitei o rabo de cavalo pela décima vez, parada naquele ponto de ônibus. Era incrível como eles passavam aos montes quando eu não precisava deles.
Para melhorar a situação, ouvi minha barriga roncar de repente, me dando conta de que não tinha comido nada. Aquele dia não estava indo nada bem, e o pior é que eu não podia perder a concentração. Tinha que ganhar o papel de Ebony Purplewood ou Jasmine ia tornar minha vida um grande pesadelo. Eu não ia ficar pintando cenários para aquela garota ridícula brilhar. Não ia mesmo!
Depois de uns bons quinze minutos, estava prestes a voltar para casa e pedir a Jack que me levasse, quando um carro se aproximou do meio-fio. No começo pensei que, levando em conta a minha sorte, fosse ser assaltada, mas então reconheci o automóvel.
- Vicentini. – se curvou para olhar para mim. – Quer uma carona?
- Sim, por favor! – Aliviada, fui logo abrindo a porta do carro.
Minha alegria genuína não teve mesmo nada a ver com o fato de poder passar mais tempo com , mas sim por finalmente de estar me movendo de algum modo em direção ao meu objetivo. Ganhar aquele papel era um plano muito mais importante naquele momento.
- Graças a Deus você apareceu. – Suspirei aliviada. – Pensei que não fosse conseguir chegar a tempo.
- Algum compromisso importante? – Ele me olhou de soslaio.
- Um teste no clube de teatro.
- Clube de teatro, han? Fui forçado a fazer parte dele no primeiro ano. A professora era uma velha maluca.
- Mudamos de professora esse ano.
- Jasmine comentou sobre isso. – assentiu. – O pessoal costuma ir às peças, porque ela sempre é a protagonista.
- O pessoal... Você não vai com eles? – Questionei.
- Eu fujo sempre que posso. – Olhou para fora do carro. – Mas acho que vou mudar meus hábitos esse ano. – Voltou a me olhar, dando um sorriso torto. – Tenho vontade de te ver em cena desde que me contou de quando fez a Chapeuzinho Vermelho.
Senti meu coração dar um pulo. Eu me sentia um pouquinho mais importante para cada vez que ele se lembrava de algo que eu tinha dito a ele no passado.
- Bom, acho que esse ano a Jasmine vai mesmo ter uma concorrente à altura. – Dei de ombros, me sentindo um tantinho mais segura.
- Eu concordo plenamente. – Ele riu. – E digo novamente: adoro sua autoestima perigosamente elevada.
Sorri, levantando os ombros inocentemente.
- O que mesmo estava fazendo no ponto de ônibus do meu bairro?
- Hoje só preciso chegar mais tarde por causa do treino, e não tomei café em casa, então parei na padaria ali perto para comprar donuts.
- Nada apropriado para um jogador de futebol, han? – Ergui a sobrancelha, olhando de soslaio a caixinha. Minha barriga roncou alto no exato instante, e quase morri de vergonha.
- Para uma líder de torcida também não, mas parece que você está com fome. – sorriu. – Pode comer. Já peguei um.
- Vou ficar te devendo pela carona e pela comida. – Abri a caixinha, dando um longo suspiro ao ver aquela delícia açucarada.
- E eu vou cobrar, pode ter certeza.
- ... – Eu disse em tom de repreensão.
- Sabe que estou brincando. É melhor comer isso logo, já estamos chegando.
Quando parou o carro no estacionamento da escola, desci rapidamente. Não que tivéssemos feito nada de errado, mas eu tinha cisma de meus encontros com ele por dois motivos: O primeiro era Jasmine com suas teorias bem fundadas e perigosas, e o segundo era , para quem eu tinha prometido que não andaria sozinha por aí com Junior.
- Por que tanta pressa? – desceu do carro logo depois de mim.
- Nada, eu só... Estou atrasada lembra.
- Claro. – Ele assentiu sem parecer acreditar muito naquela desculpa. – Só espera um segundo.
deu a volta no carro e se aproximou mais de mim do que eu esperava, o perfume de loção pós-barba mexendo com meus sentidos. Então ele ergueu a mão e tocou meu rosto, passando o polegar no canto da minha boca.
- Açúcar. – Explicou com uma expressão marota, colocando o dedo na própria boca e experimentando os grãozinhos cristalizados. – Boa sorte no teste. – Me deu um beijo rápido na bochecha.
Engoli em seco, atordoada, mas assenti. O teste era o mais importante agora.
- Vou me sair bem. Nos vemos depois.
Corri feito uma maluca tentando tirar o ocorrido da cabeça. Se estivesse pensando em , era certo que meu teste seria terrível.
Ao avistar conversando com à distância, fui invadida por uma onda de culpa. Mas por qual razão? Eu não tinha feito nada de errado. Fora só uma carona.
– Alguém perdeu a hora. – disse quando os alcancei.
- Jura? – Ergui as sobrancelhas, ofegante. – Meu pai, ele tem graves problemas com horários.
- Sei bem disso. – meneou a cabeça. – Se eu soubesse teria ido te buscar, mesmo que você fosse correr um grande risco andando de carro comigo hoje.
- Está tudo bem. – Respondi. – Eu vim de ônibus.
Nunca, nem em um bilhão de anos acreditaria que tinha sido coincidência Junior passar no ponto de ônibus na hora exata em que eu estava lá, então era melhor não contar nada.
- E o Jack? – franziu o cenho.
- Não dava tempo de esperar, eu tinha que participar do teste. – Expliquei a parte verdadeira. – AI MEU DEUS, O TESTE!
- Que teste? – Ele não entendeu.
- O teste para a peça de Outono. – lembrou. – Relaxa, ainda dá tempo.
- É verdade. Foi por pouco. – Fechei os olhos e respirei fundo. – Vejo vocês depois!
E então saí correndo antes que perguntasse mais.
- Eis que eis que surge tua doce presença, com o esplendor de um anjo! E me envolvendo como uma suave brisa...
Franklin Bertie estava ensaiando o trecho de Shakespeare em voz alta quando entrei no auditório. Havia outros membros do grupo praticando coisas aleatórias por todos os lados, se preparando para o teste. Ashley fazia uma coisa engraçada com a boca, Ed praticava um sapateado desastrado. A única que parecia calma era Jasmine, sentada de pernas cruzadas, observando todos, calada. O que será que ela estava preparando? Com certeza devia estar se sentindo bem segura, visto que sempre ganhava o papel principal. Mas esse ano era comigo que ela teria que competir.
Eu tinha me preparado o domingo inteiro – ok, e talvez por alguns dias antes disso – para interpretar o belo monologo que Yvaine faz em Stardust, quando Tristan é transformado em um rato e ela declara seu amor por ele.
- Eu sei bem que o amor é incondicional, mas também sei que pode ser imprevisível, inesperado, incontrolável, incontido e estranhamente fácil de ser confundido com uma aversão... – Eu recitava em voz baixa o que tinha praticado em casa. – O que estou tentando dizer é... Que acho que amo você.
- Bom dia, monstrinhos! – Era Elizabeth entrando no auditório de repente.
Dei fim a minha encenação, me juntando aos outros que iam atrás dela, esperando que ela desse as orientações.
- Senhorita Elizabeth, vamos poder usar instrumentos? – Alguém perguntou.
- E objetos, com certeza objetos. – Um garoto apoiou.
- Eu posso fazer meu truque dos copos? – Uma garota ruiva de aparelho freio de burro queria saber.
- Meninos, se acalmem! – Senhorita Elizabeth, sufocada pela multidão, fez sinal para que nos afastássemos e parássemos de perguntar.
Quando finalmente nos afastamos, ela deu alguns passos atrás – obviamente aliviada.
- Fico feliz de ver que vocês têm diversos talentos, e afirmo desde já que todos serão muito bem aproveitados na nossa Peça de Outono. – Sorriu. – Entretanto, para o teste de hoje decidi usar um critério mais preciso.
Todos olharam uns para os outros em busca de uma resposta, começando a murmurar. Alguns já estavam reclamando antes de saber do que se tratava.
- Desde que nossa peça será um musical – A senhorita Elizabeth continuou. –, decidi que o teste elenco será feito da maneira mais óbvia: cantando!
Ah não.
De todas as coisas, ela tinha que querer que cantássemos?!
Todos começaram a falar ao mesmo tempo de novo, alguns parecendo já ter desistido de imediato. Eu também poderia fazer isso, visto que cantava pior que um gato engasgado. Olhei para o lado e vi Jasmine dar um sorriso de satisfação.
- Sei que peguei alguns de vocês de surpresa e sinto por isso. – Elizabeth continuou. – Para compensar, adiei o teste para esta tarde, depois da aula. Assim vocês têm tempo para escolherem uma bela canção para apresentar para mim. – Sorriu alegremente. – Agora vão, monstrinhos! Estão dispensados. Podem ir para suas aulas.
Jasmine parecia o retrato da vitória, e eu estava quase fugindo de volta para Denver. Se eu cantasse, seria a humilhação do século, mas a coisa não seria melhor se eu desistisse. Por Deus, o que eu ia fazer?
- Não é de todo ruim. – Emma deu de ombros. – Quer dizer, você não pode ser tão ruim assim, pode?
– eu estava com a cabeça deitada em seu colo – ergueu as sobrancelhas. Ele sabia que podia, sim.
- Eu nem consigo pensar em algo que faria minha voz parecer melhor. – Choraminguei.
- Ora, então vá lá e cante mal. – opinou. – Ninguém fica de fora dessas peças; o pior que pode acontecer é você não ganhar o papel principal. O que não pode deixar é que Jasmine fique achando que conseguiu te intimidar.
- Tem razão. – Dei um longo suspiro. – Só não sei o que fazer.
segurou meus ombros, fazendo com que eu me sentasse.
- Rain, é só ir até lá e cantar algo que você goste de verdade, que tenha a ver com você. Sei que pode fazer isso.
- Eu posso? – Perguntei a mim mesma, mas assentiu. – Tudo bem, eu posso.
- Eu tenho que ir embora dar comida ao Stevie agora. – Ele avisou. – Nos vemos mais tarde, ok?
- Ok.
- Boa sorte, Pie! – acenou.
Os dois foram embora e fiquei ali sentada no banco do pátio ao lado de Emma. Faltavam cerca de quinze minutos para o início das audições.
- Vamos lá, . – Ela suspirou. – Não tem nada que você goste?
Fiquei meditando naquela pergunta por alguns instantes, tentando fazer associações...
- Vamos lá, ? – Ed Miller chamou ao passar por nós. – Está quase na hora.
Reparei, pela primeira vez, na estampa da camisa de Ed. Um enorme polvo negro com seus tentáculos espalhados. De repente, tive uma ideia brilhante.
Definitivamente nada ia fazer minha voz parecer menos pior, mas talvez eu pudesse salvar aquele teste com uma bela interpretação.
A primeira coisa que fiz quando cheguei ao auditório foi procurar por Courtney Smith. Ela quase sempre trabalhava com os figurinos, pelo que tinha me contado, então com certeza poderia me ajudar.
- Ei, Courtney! – Me aproximei.
- ! – Ela abriu um enorme sorriso, parando de se alongar. Desde que eu me tornara uma líder de torcida do clubinho de Summer, as pessoas pareciam sorrir muito mais quando eu as cumprimentava.
- Preciso de um favorzinho seu.
Mesmo sem saber o que esperar, Courtney conseguiu o que eu tanto queria, e então as audições começaram – incrivelmente mal, diga-se de passagem.
O primeiro a subir ao palco foi garoto cantando uma terrível versão de We are the champions. Não demorou para que a senhorita Elizabeth docemente o dispensasse, o que já me deixou um tanto quanto nervosa. Em seguida foi a vez de Ashley, que fez uma versão até bem afinadinha de uma música de O Mágico de Oz. No entanto, Elizabeth não pareceu ter gostado muito da ideia da garota de repetir uma música que já fora cantada ali por anos, e ao ver a cara da professora, Ashley já saiu correndo aos prantos. Pessoas cantaram rap e músicas de grupos pop dos anos 90. Passou pela minha cabeça que alguém tinha que estar gravando aquele festival de apresentações bizarras, mas infelizmente eu estava muito nervosa para tanto. Estava certa de que ia ficar muito chateado comigo.
Chegou a vez de Ed, que foi muito bem cantando Don't stop Believin e sem dúvida estava na cara que ia conseguir o papel do grande amor de Ebony Purplewood, Eric. E então Jasmine subiu no palco.
- O que tem para nós, querida? – Elizabeth perguntou. Havia um sorriso em seu rosto. Ela achava que as apresentações ruins tinham chegado ao fim.
Jasmine deu um sorriso, começando em seguida a cantar uma música que eu não conhecia.
I heard
Church bells ring
I heard
A choir singing
I saw my love
Walk down
The aisle
On her finger
He placed a ring
Was cry
All I could do
Was cry
I was
Losing the man
That I love
And all
I could do
Was cry
- Uau, Jas! – Elizabeth estava encantada. – De onde tirou tanta paixão? De onde tirou essa música?
- É da Beyoncé. – Jasmine deu de ombros, dando um sorrisinho doce falso.
- Maravilhosa. – A professora balançou a cabeça em aprovação. – Pode ir agora, Jas.
Jasmine saiu feliz da vida, me lançando um olhar debochado ao passar por mim.
- Espero que cante tão bem quanto mente, Pie. – Sussurrou.
- Próximo, por favor! – A professora chamou.
Era a hora. Eu não podia ir tão mal assim. Só precisava usar meu talento para interpretação. Interprete a canção, , você pode fazer isso. Talvez se minha interpretação da música fosse maravilhosa, a professora não se prendesse ao detalhe da minha voz ser como era.
- Sou eu! – Falei alto, subindo ao palco.
- Mas que droga é aquela que a Pie está usando? – Ouvi alguém perguntar.
A professora bateu palmas para que fizessem silêncio, e os demais atrás das cortinas se calaram.
- . – Ela sorriu. – O que vai apresentar?
- Vou fazer minha interpretação de uma música de a Pequena Sereia. – Respondi.
- Interessante. – Assentiu. – E que música seria.
Olhei um segundo para os outros zombando da minha capa preta – conseguida por Courtney – e voltei-me para ela:
- Poor Unfortunate Souls. É o tema da Úrsula.
- Então temos uma bruxa, han? – Elizabeth riu alegremente. – Certo, , o palco é seu.
disse para eu escolher algo que tivesse a ver comigo. Eu adorava A Pequena Sereia quando era criança, muito embora tivesse medo da Úrsula na época. Mas foi a primeira coisa que me veio à cabeça quando vi a blusa de polvo do Ed – a bruxa do mar e seus tentáculos. Agora eu só precisava me concentrar em assumir o papel.
Me virei de costas e contei mentalmente em minha cabeça o tempo da introdução da canção da vilã da Pequena Sereia, e então comecei a cantar, me movendo e balançando a capa suavemente.
I admit that in the past I've been a nasty
They weren't kidding when they called me, well, a witch
But you'll find that nowadays
I've mended all my ways
Repented, seen the light and made a switch
True? Yes
Apesar de alguns estarem fazendo uma careta, muitos dos meus colegas do clube de teatro estavam com expressões confusas no rosto. Não pude entender o que isso significava, mas Elizabeth me observava com atenção, então achei que estava tudo bem continuar, me empolgando mais ainda no papel da bruxa:
It's a talent that I always have possessed
And dear lady, please don't laugh
I use it on behalf
Of the miserable, the lonely and depressed
Pathetic!
In pain
In need
This one longing to be thinner
That one wants to get the girl
And do I help them?
Yes, indeed
Those poor unfortunate souls!
So sad
So true
They come flocking to my cauldron
Crying, "Spells, Ursula, please! "
And I help them?
Yes, I do
- Que performance interessante, ! – Ela disse. – E sem dúvida memorável.
- Sério? – Me espantei. – Quer dizer, claro, obrigada, Elizabeth.
Saí do palco satisfeita e a professora foi nos encontrar atrás das cortinas.
- Bem, meninos, já fiz minhas anotações. Encontro vocês amanhã às dez horas para nomear os atores. Estão dispensados.
Jasmine parou em frente a mim sorrindo.
- Do que você chama aquela bizarrice, Pie? – Perguntou. – Não, não responda. O que importa é que amanhã – Ela me empurrou com o dedo indicador. – você vai descobrir seu verdadeiro lugar nessa escola: pintando cenários e batendo martelos para que as pessoas realmente importantes possam brilhar. Estava demorando.
Ela saiu antes que eu tivesse tempo de responder, e eu também não fazia questão. Depois de toda aquela pressão psicológica, tudo que eu queria era uma taça de sorvete Napolitano e um bom filme.
Fiquei tão feliz por finalmente estar em casa que larguei minha mochila ali mesmo, na entrada. Stevie veio correndo me receber, enquanto um cheiro delicioso invadiu minhas narinas.
- Bebezão! – Me abaixei para brincar com o dálmata. – O que tem para comer aqui? – Perguntei a ele, que latiu. – Oh, parece que é... – Segui o cheiro até a cozinha. – Pizza?
Em cima da bancada de madeira estavam duas caixas de pizza – uma delas, já aberta.
- Quem comprou isso? – Falei sozinha. – , você está aí? Pai? – Chamei, sem deixar de encarar a comida.
Me aproximei mais para olhar bem para a pizza, constatando então que era de berinjela. Que horror! Quem faria aquilo comigo?
- Eca, vocês ficaram malucos? – Resmunguei em voz alta, bem na hora que entrou pela porta dos fundos.
O garoto estava com uma cara que eu nunca tinha visto. Primeiro pareceu estar viajando; depois, quando percebeu que eu estava ali, seu rosto tomou um ar ansioso.
- ! – Exclamou. – Que bom que chegou. Você tinha mesmo que chegar.
- Queria ter chegado antes de vocês pedirem esse troço. – Fiz uma careta. – Qual o problema de vocês? Ninguém nesse mundo gosta de pizza de berinjela, a não ser...
- Estava falando mal de mim, sua babaca?
Olhei para trás, sem acreditar na voz que ouvira. Entretanto, era mesmo ela. Sofia, minha prima. O cabelo ruivo da garota estava preso em um rabo de cavalo, ela usava um short jeans e uma camisa larga onde se lia "Pretty good at bad decisions".
- Sofia! – Exclamei correndo para abraça-la. Ela estava cheirando a sabonete. – O que está fazendo aqui? Quando chegou?
- Hoje à tarde. Você estava na escola.
- O papai sabia que você vinha? – Eu estava tão feliz por vê-la. – E a escola?
- O tio Jack não sabia que eu estava vindo. – Ela explicou. – Depois de mil coisas terem dado defeito naquela escola maldita, os professores decidiram que as condições lá não eram favoráveis a um trabalho digno. Entraram de greve hoje. E eu vim tirar umas férias aqui. Achei que seria legal pegar vocês de surpresa.
- Puxa! – Exclamei. – Quer dizer, isso é maravilhoso! – A abracei de novo. – Como achou nossa casa? Pensei que não se lembrasse do endereço.
- Eu não, mas a mamãe o anotou para mim. Vim no meu carro e procurei pela rua. – Ela pegou um pedaço de pizza e se sentou num banco alto. – Por sorte essa foi a primeira porta que bati. Adivinha só quem atendeu. – Ela deu um sorriso malicioso.
apareceu à porta então, trazendo algo nas mãos. Ele olhou rapidamente para mim, e então para Sofia.
- Trouxe o saco de dormir. – Disse a ela. – Está meio velho, mas acho que vai servir.
Então eles já tinham se conhecido. Era maravilhoso! Meu melhor amigo e minha melhor amiga ficando amigos.
- Pra mim está perfeito. – Sofia sorriu. – Você é muito prestativo, .
- Obrigada, eu acho. – Ele sorriu de um jeito pouco comum, passando a mão pelo cabelo. – E então, , como foi o teste pra peça? – Virou-se para mim.
- Ah, acho que bem. A senhorita Elizabeth disse que minha apresentação foi memorável! – Contei alegre.
- O que você fez? – Sofia quis saber.
- Cantei uma música.
Minha prima parou a pizza antes que chegasse a boca. ergueu as sobrancelhas. me encarou.
- Você cantou? – Sofi repetiu. – Teve a audácia de subir num palco e cantar?
- Ah, qual foi? – Rolei os olhos, abrindo a outra caixa de pizza. – A professora disse que gostou.
- Não, ela disse que foi memorável. – corrigiu. – Sabe o que também foi memorável? O live action do Dragon Ball Z.
- Vai ver chamou atenção de um modo positivo. – considerou, e sorri porque pelo menos alguém levava alguma fé em mim.
Sofia se virou para o garoto.
- Você canta também, não é, ? – Perguntou com interesse.
- Hanram. – Ele assentiu um pouco tímido. – Canto, sim. Mas não exatamente de forma profissional... Quer dizer, o Jack me deixa cantar com a banda às vezes, mas não é todo dia.
- Eu adoraria te ouvir cantar. – Ela sorriu.
- Então, pessoal... – deu um passo à frente de repente. – Aposto que a pizza está ótima! – Ele pegou um pedaço da pizza vegetariana.
- Você comendo berinjela? Sério? – Arqueei uma sobrancelha.
- Achei que não aguentava mais ver legumes depois dos últimos dias que passou com Amber. – arqueou uma sobrancelha, se aproximando e pegando uma fatia também.
- Ora, pessoal, não vão ser os conselhos persistentes de uma coleguinha de escola que vão me fazer tomar asco dessa delícia de berinjela.
- Coleguinha de escola? – Eu o encarei. – Sério?
- "Conselhos persistentes". – fez aspas no ar, fazendo Sofia rir.
deu de ombros, mordendo um pedaço da pizza. Sofia o encarou com atenção, e eu já poderia dizer que ela estava pensando que ele era bem estranho.
- Não acredito que finalmente estou aqui no QG de vocês! – Minha prima olhou para mim e para . – A sala de reuniões da farsa mais maluca de todos os tempos.
- Ainda é estranho falar com mais alguém que sabe a verdade. – comentou, indo até a geladeira para pegar uma garrafa de suco e se servindo de um copo.
- É verdade. – Concordei franzindo o nariz. – Temos sido só nós três por tanto tempo!
- Dizem que duas pessoas só podem guardar um segredo se uma delas estiver morta. – observou. – Qual é a regra quando são quatro?
Sofia ergueu uma sobrancelha, sorrindo misteriosamente.
- Acho que três de nós terão que ir pro buraco até o fim disso. – Sugeriu, dando um gole no suco que lhe oferecera.
Lá estava a cara de bocó de de novo, como se tivesse ficado fora do ar. Não saberia dizer se ele tinha ficado com medo da possibilidade ou se apenas tinha achado Sofia muito bonita.
A porta da frente bateu. Deduzi que o resto de minha família tinha chegado.
- Ora, de quem é aquele carro na entrada? – Papai foi logo perguntando. Quando nos encontrou na cozinha, seus olhos se iluminaram. – Ariel! O que está fazendo aqui? – Ele estendeu os braços, para onde minha prima correu. Ele costumava chamá-la assim desde pequena, porque ela era ruiva e morava perto do mar.
- Meus professores entraram em greve. Vim passar uns dias. – Ela explicou. – Minha mãe também queria saber se você está alimentando a .
- Seja bem-querida, pode ficar quanto tempo quiser. E diga a minha prima que eu tenho mais juízo do que ela pensa. – Papai deu um sorriso debochado. – Isso é pizza de berinjela? Que maravilha! – Foi para perto da bancada.
Miguel apareceu à porta, olhando com uma cara um tanto quanto surpresa para cada um de nós.
- Miguel. – Me aproximei dele. – Esta é a Sofia, minha prima. Lembra de como eu te falava dela?
- Lembro, é claro. Você quebrou a boneca dela. – Miguel meneou a cabeça. – É um prazer, Sofia.
- O prazer é literalmente todo meu. – Ela o encarou e depois me lançou um olhar malicioso. Rolei os olhos.
- Bom, acho que está na minha hora. – disse então.
- Sério, ? – o encarou nada feliz.
- Muito sério. Minha mãe quer falar comigo. – Ele empurrou o amigo, mas parou em frente à minha prima. – Foi um prazer te conhecer, Sofia. – Disse.
- Ainda vai ter o prazer de me ver por muitos dias, se tudo correr bem. – Ela apoiou o queixo nas mãos e sorriu.
- Também foi um... – tentou falar para ela. Engoliu em seco. – Foi um...
- Acho que o garoto quer dizer que ficou feliz por conhecê-la. – Miguel completou por ele. o encarou confuso. – Não tem de quê, moleque. A porta da rua é serventia da casa.
parecia indignado, mas ainda tinha medo demais de Miguel para contestar. se despediu novamente e saiu levando o amigo.
- O garoto já me tira do sério falando, não é um bom dia para ouvi-lo gaguejar. – Miguel explicou quando voltou, pegando um pedaço da outra pizza, que eu já tinha aberto. Eu e Sofia rimos do comentário.
- Vamos lá pra cima, temos muito o que conversar! – Corri puxando Sofia pelas mãos.
Arrastei minha prima escada acima, fechando a porta do quarto quando entramos. Fiquei a encarando com um sorriso enorme no rosto.
- O que foi? – Ela quis saber.
- Nada, eu só estou tão feliz por ter você aqui! – A abracei de novo.
- Também estou feliz por estar aqui. – Ela me abraçou de volta. – Você não faz ideia do quanto estava ansiosa para vir. – Se jogou na cama. – Agora, que tal me contar em que fase está o plano do século?
A pergunta me pegou de jeito. Minha alegria por ter Sofi ali tinha me feito esquecer de como andara mentindo para ela sobre o que realmente estava fazendo. E Sofia me conhecia melhor que ninguém, bastava um piscar de olhos suspeito para que ela me descobrisse. Precisava dar um jeito de ser uma ótima atriz até que ela fosse embora, porque ela ia acabar com minha raça se soubesse que eu ainda queria ficar com .
- O plano tem ido bem. – Forcei um sorriso confiante, me sentando ao lado dela. – Eu tenho ajudado a Summer, na verdade. Bancando a amiga do para ajudá-la a voltar com ele.
- E isso não está destroçando seu coração ferido nem um pouco? – Ela ergueu a sobrancelha, incrédula. – Juntar aquele otário com a ex?
- Ah, na verdade não. – Dei de ombros. – Se quer saber, eu já superei o . Só quero dar um desfecho a essa história, sabe? Além disso, eu não faço nada demais, só falo com ele sobre isso às vezes. – Expliquei, mas Sofi continuava me olhando com desconfiança, então emendei outro assunto. – Mas eu não nem tenho tido tanto tempo para essas besteiras. Tenho treinado muito agora que sou líder de torcida.
- Argh, você é ridícula! – Minha prima riu jogando um travesseiro em mim. – Nós combinamos, , que nunca faríamos esse tipo de babaquice!
- Nós tínhamos sete anos! – Me defendi. – Além disso, é um exercício ótimo, pra falar a verdade. Estou toda quebrada. – Caí de costas no colchão.
- Fala sério. – Sofia jogou o travesseiro em mim de novo, rindo.
E mesmo com o risco de ser pega e desmascarada pela pessoa mais crítica e metida a sabichona do mundo, não conseguia não ficar extremamente feliz por tê-la ali comigo.
- Não é terrível que você tenha que ir para a escola enquanto eu fico andando à toa pela cidade? – Sofia perguntou no dia seguinte, enrolando uma mecha cor de rosa do cabelo enquanto eu me vestia.
- Por que não aproveita seu passeio para ver se eu estou na esquina? – Devolvi ácida, embora rindo.
- Não se preocupe, , quando você voltar vamos nos divertir juntas. – Ela sorriu. – Você vai de ônibus ou com o carro do Jack?
- Nenhum dos dois. – Respondi ajeitando o cabelo. – Papai às vezes precisa do carro, então vem me buscar todos os dias.
- Ah, o ! – Se sorriso se tornou maior e malicioso. – Isso me lembra que tenho uma pergunta. – Sofia se aproximou de mim como se fosse contar um segredo. – Por que não me disse que ele era um gato? – Quis saber. Depois, ao ver minha cara, se jogou na cama gargalhando.
- Não entendi. – Fiz um bico, voltando a olhar para o espelho.
- É que... Você sabe, eu tinha visto as escassas fotos dele em redes sociais e você tinha comentado que ele era um doce, mas você foi bem longe de ser justa e deve saber disso. Ele é muito gato. – Ela ergueu as sobrancelhas para mim.
- É o que dizem. – Bufei e me virei para minha prima. – Quer dizer, ele é bonito. Bem bonito, ok. Mas vai ver você só está tão encantada porque acabou de conhecê-lo.
- Você ficou assim quando o conheceu?
- Não, porque eu estava muito ocupada sendo obcecada por encontrar o . – Menti. A verdade era que eu tinha ficado bem impressionada com logo que o conhecera, apesar de estar mesmo obcecada pelo .
- De toda forma, ele não é só bonito. – Ela continuou, sentando-se. – Ele me pareceu bem... Interessante. Gentil, engraçadinho, toca contrabaixo...
Como aquela conversa tinha chegado àquele assunto quando Sofia não estava nem a vinte e quatro horas em Jacksonville Beach?! Fala sério, só o que me faltava era que ela estivesse interessada em . Quer dizer, não que eu fosse ficar chateada com isso, porque eles eram meus dois melhores amigos afinal, mas...
A buzina na rua me fez sair de meus pensamentos. tinha chegado. Sofia me olhou com uma cara sapeca, preparando-se para saltar da cama.
- Sofia, é melhor você se compor...
Mas em um segundo ela tinha pulado como uma gata e saído correndo escada a baixo. Tive que ir atrás dela a toda. Papai e Miguel já estavam acordados e, não estando acostumada com aquele teatro como nós éramos, minha prima poderia dar uma de ela mesma e atacar na frente deles.
- Oi, . – Ela disse docemente abrindo a porta.
arregalou os olhos primeiro, depois sorriu.
- Oi. – Cumprimentou. – Eu vim buscar a . – Informou, ignorando totalmente o fato de que eu estava ali na escada. Rolei os olhos.
- Eu sei. É mesmo um namorado ótimo. – Ela elogiou, e ele riu daquele jeito que deixava Jodi vermelha.
- Como estava o saco de dormir? – Perguntou.
- Ótimo. Sonhei com os anjinhos.
Certo, já era demais para mim, terminei de descer as escadas antes que eu vomitasse.
- Já deu. – Resmunguei passando pela porta e puxando pela alça da mochila. – JÁ ESTAMOS INDO, PAI! – Gritei.
- Até depois, meu bem! – O ouvi responder.
- Até mais tarde, ! – Sofia acenou.
De cara feia, dei a volta no carro e entrei. se sentou ao banco do motorista. Depois de ligar o carro, ele olhou para mim.
- Você está bem?
- Só anda! – Ordenei. – Meu dia vai ser muito cheio. Não estou com tempo para essas coisas.
- Tá bom! – Ele respondeu absorvendo meu mau humor para si.
não deu carona a naquele dia, e seguimos até a Jacksonville High sem conversar quase nada. Me separei dele logo na entrada, porque meu dia realmente seria muito cheio. A primeira parte dele consistia em duas aulas de História, nas quais Summer também estaria presente.
- Bom dia, flor do dia. – Ela se sentou à minha frente.
- Bom dia, Cher. – Provoquei ainda meio mal-humorada. Em minha última visita à sua casa, eu e Summer tínhamos assistido As Patricinhas de Beverly Hills, e eu tinha rido bastante durante o filme ao compará-la à protagonista loira e rica vivida por Alicia Silverstone.
- Não que eu tenha me ofendido – Ela sorriu. – mas o que foi que aconteceu? Parece que acordou com o pé esquerdo.
- Minha prima chegou à cidade ontem, só estou cansada porque ficamos conversando até tarde.
- Sua prima? – Ela arregalou os olhos azuis. – Aquela que mora em Venice Beach?!
- Ela mesma, Sofia.
- Que demais, ! Já estou louca para conhecê-la. – Animou-se.
- Você é mesmo igualzinha ao em tudo. – Dei um sorrisinho infeliz.
- Ahhhhh! Já entendi tudo. – Summer fez uma cara engraçada. – Está com ciúmes do !
- O quê? – Franzi o cenho. – Eu? Com ciúmes do ? Por favor, mas é claro que não. Sofia é minha prima. É minha melhor amiga desde sempre.
- Ah, , não tem nada de mal nisso. – Ela riu. – Uma vez apresentei o Junior a uma colega minha que era modelo. Ela jogava futebol e eles se deram às mil maravilhas, e eu fiquei morrendo de ciúmes, mesmo sabendo que não tinha nada a ver. – Deu de ombros. – é seu namorado e acabou de conhecer a Sofia, é normal que você fique assim se ela é tão descolada quanto os meninos dizem. Mas relaxa, você é a namorada dele por algum motivo.
Sim, e o motivo é que eu o obriguei a isso, pensei. Infelizmente não podia dar aquela informação privilegiada a Olsen.
- Eu vou ficar bem com isso. – Respirei fundo. – É só que eu também estou nervosa porque hoje saem os resultados do teste do grupo de teatro. E ainda temos que ensaiar depois.
- Estou certa de que você vai se sair bem no teste, embora, é claro, sempre haja a Jas. – A loira fez uma careta.
- Por que ninguém me avisou que ela cantava tão bem? – Reclamei.
- Pensei que ela já fizesse o favor de lembrar todos disso a todo momento. – Summer riu, e fui obrigada a rir também. Aquilo era verdade, mas eu nunca pensei que fosse tão sério.
Depois das aulas de História, Summer me desejou boa sorte e tomei o caminho do matadouro – vulgo, o auditório da Jacksonville High. A primeira pessoa que reparei quando entrei foi Jasmine, com o cabelo escuro longo solto e um cachecol de tecido leve azul. Ela já exalava aquele arzinho arrogante de quem conseguira o que queria.
- Ei, . – Ed Miller se aproximou de mim. Seu penteado black power estava especialmente bonito naquele dia. Ele estava acompanhado de Franklin Bertie.
- Oi, meninos. – Cumprimentei.
- E então, preparada para o resultado? – Ed perguntou. Havia um sorriso de ansiedade em seu rosto, bem mais humilde que o de Jasmine, apesar de ele ter arrasado no teste.
- Estou um pouco nervosa. – Admiti. – Sabe como é, não sei como fui.
- Pois eu estou muito seguro esse ano! – Franklin estufou o peito. – Acho que posso até ganhar o papel de Eric.
O sardento Franklin Bert tinha cantado um rap do 50 Cent em sua apresentação, o que havia sido, de longe, algo que eu não tinha nem palavras para descrever – tal qual a senhorita Elizabeth depois da apresentação. Dava para perceber que Ed pensava do mesmo medo que eu, mas, sem querer desanimar o amigo, o garoto apenas deu um sorriso amarelo.
A senhorita Elizabeth saiu de detrás das cortinas do palco. Nós nem sabíamos que ela estava ali aquele tempo todo, mas ela trazia alguns papéis em suas mãos – com toda certeza contendo os resultados.
- Bom dia, meus jovens cheios de talento! – Ela exclamou. Todos se aproximaram do palco. – Chegaram cedo. Devem estar curiosos. – Riu. – Bem, gostaria de dizer que foi muito difícil escolher alguns desses papeis... Outros nem tanto. – Ela fez uma careta. – Se algum de vocês não tiver sido escalado para o papel que queria, sinta-se à vontade para conversar comigo para entender minha decisão. Com certeza ela teve um motivo.
Meu estômago gelou só de ouvir aquilo. Havia motivos de sobra para Elizabeth não me querer em um musical. O primeiro motivo era o fato de ela não ser surda.
- Sei que estão muito ansiosos para saber quem será o que. Então, sem mais delongas, vamos aos resultados.
Elizabeth se sentou na ponta do palco, as pernas pendendo, enquanto lia com atenção – e em silêncio – a primeira folha. Nos sentamos nas cadeiras da primeira fileira, eu ao lado de Ed e Franklin. Jasmine, sentada na ponta oposta, deu um sorrisinho debochado para mim e acenou.
- Edward Miller. – A professora chamou o nome. – Você será Eric Templeton, o grande amor da nossa protagonista, Ebony.
Todos bateram palmas. Apertei a mão de Ed.
- Parabéns, Ed! – Comemorei. – Sabia que você ia conseguir!
- Obrigado! – Ele sorriu para mim, muito alegre. – Obrigado, senhorita Elizabeth!
- O mérito é todo seu, Ed. – A professora sorriu. – Continuando...
Ao contrário do que eu esperava, os papeis nomeados depois do de Ed foram todos secundários. A cada nome chamado meu coração apertava um pouco mais. Cada personagem que ganhava um ator era menos uma chance para mim. Isso porque, depois de um tempo e de ver a decepção que atingia aqueles que eram convocados para serem parte da produção, eu percebi que me contentava com qualquer mínimo pedaço de atuação. Uma pedra, uma árvore, qualquer coisa, Deus, eu rezava em pensamento.
- Tori Hart – A professora chamou a menina, que para variar, também sabia cantar. – Você será Valerie, o verdadeiro amor de Eric, de quem Ebony o rouba.
Os amigos de Tori – todos eles já com uma ocupação definida – comemoraram muito a notícia. Aquele era um dos papéis de destaque. Olhei para os lados e meu coração gelou. Os únicos que haviam sobrado era eu, Jasmine e Franklin Bert. Contei nos dedos discretamente, me dando conta de que só havia mais dois papeis disponíveis. Alguém ia pintar cenários.
- Franklin. – Elizabeth disse, me deixando ainda mais ansiosa. – Você será Castigo, o corvo de estimação de Ebony.
Jasmine deu um longo suspiro, nem se esforçando tanto para esconder o enorme sorriso que tomou seu rosto. Ela tinha certeza de que eu ia ficar na produção.
Meu coração batia descompassado. Se ela não chamasse logo meu nome, eu ia enfartar.
- . – A mulher disse então. – A sua voz é... – Ela fez uma expressão pensativa. – Terrível.
E foi isso. Senti meu corpo inteiro cair de tristeza e frustração. Eu não ganhara nem o papel de uma droga de arbusto, e tudo porque não sabia cantar. Grande coisa!
- Muito ruim mesmo. – Elizabeth continuou. – O que é surpreendente, visto que quando você fala ela soa tão agradável.
Jasmine cobriu a boca para rir, mas não conseguiu se conter.
- Desculpe, desculpe! – Ela pediu.
A atenção de Elizabeth foi para a garota então.
- Jasmine. – Ela disse docemente. – Sua voz é maravilhosa, quase como um coro de anjos. E eu adorei a música que cantou em seu teste, já até baixei no meu celular.
Jasmine ergueu a cabeça, um sorrisinho de triunfo brincando no rosto. Ouvi pessoas ao meu redor resmungarem, insatisfeitas por ela estar prestes a conseguir de novo.
- No entanto... – Elizabeth voltou a falar, chamando a atenção de todos. Jasmine pareceu ficar confusa. – No entanto, Jas, a sua performance não me surpreendeu muito.
A cara de Jasmine foi no chão. Muitos de nossos colegas riram discretamente.
- Você não conseguiu me convencer de seu sofrimento, sua interpretação da música foi bonita, mas não muito teatral. A por outro lado... – Elizabeth desceu do palco, olhando para mim. – Sua performance foi absolutamente maravilhosa, ! – Ela gesticulou com as mãos. – Você parecia uma verdadeira bruxa cruel e ardilosa lá em cima. E é exatamente disso que precisamos no papel de Ebony Purplewood. Sendo assim...
Meu coração pulava de felicidade, sabendo o que eu estava prestes a ouvir. Quase tive que morder a língua para conter minha vontade de debochar de Jasmine.
- fará o papel de Ebony Purplewood... – A professora informou.
- SIM! – Comemorei ficando de pé.
- NÃO! – Jasmine se colocou de pé também, uma expressão furiosa em seu rosto.
- E Jasmine... – Elizabeth continuou falando. – Irá cantar as músicas para que ela as duble.
- NÃO! – Eu e Jasmine protestamos ao mesmo tempo.
- Demorei para encontrar essa conciliação, vocês não vão me fazer mudar de ideia meninas. – A professora balançou o dedo. Todos pareciam estupefatos. – , você atua muito bem. E, Jasmine, você canta muito bem. Gostaria de poder jogá-las em um caldeirão e tirar dele uma atriz de musicais perfeita, mas não posso. Sendo assim, atuará normalmente nas falas de Ebony, mas Jasmine é que cantará as canções, dos bastidores. Assim que os ensaios começarem, vamos começar a trabalhar na sincronização. – Antes que Jasmine protestasse mais, a professora bateu palmas. – Isso é tudo, monstrinhos! Entrarei em contato para marcarmos o primeiro ensaio.
Sem saber se tinha ficado ofendida ou grata pela decisão de Elizabeth, me encaminhei para a saída do auditório atrás dos outros. Ed Miller se aproximou de mim e pôs a mão em meu ombro.
- Ei, nós conseguimos! – Ele comemorou, me puxando para um abraço animado. – Somos os protagonistas!
- Sim... Conseguimos. – Abri um sorriso. Olhando rapidamente para trás, percebi que Jasmine tinha ficado e argumentava ferozmente com a professora Elizabeth.
Bom... Pensando bem, no fim das contas, eu tinha conseguido o papel de Ebony Purplewood, e a senhorita voz de anjo tinha ficado mesmo nos bastidores, não é? Olhando por esse lado, as coisas tinham ido muito bem para mim. Eu ia ficar com todo o destaque e as congratulações, enquanto Jasmine espumava de ódio atrás das cortinas.
Pensando muito bem, as coisas tinham saído perfeitamente, incrivelmente bem. Abri um enorme sorriso, acompanhando o animado Ed para fora do auditório. Mal podia esperar para esbarrar com minha querida Jas de novo para parabeniza-la pelo papel que tinha conseguido. Ia ser tão divertido.
POV
Vi à distância quando entrou no auditório acompanhada de Edward Miller, um cara que fazia uma matéria comigo. Chamei o nome dela, esperando desejar boa sorte, mas ela não me ouviu.
De todo modo, não tinha certeza se ela ficaria feliz ou não comigo falando qualquer coisa. Ela estava muito estranha naquela manhã, agindo como se eu tivesse comido o último pedaço da pizza de banana com caramelo dela.
- Oi, ! - Amber apareceu de repente no fim do corredor.
- Ei, Amber. – Cumprimentei.
- Você viu o por aí?
- Na verdade, ainda não o vi hoje.
- Estranho. – A menina fez uma careta. – Mandei tipo, mil mensagens, e ele não respondeu nenhuma. Isso nunca aconteceu.
- Se eu o encontrar por aí, digo a ele que você está procurando por ele.
- Obrigada. – Sorriu. – Em todo caso, ele tem treino com o time hoje, então vamos nos ver de qualquer jeito.
Assenti e sorri quando ela se afastou, tão concentrada no celular que quase empurrou para dentro da lixeira uma garota que passava carregando uma caixa com pedaços de um planetário.
Era mesmo ridículo pensar que minha discreta amizade com Summer nunca tinha feito com que qualquer uma das pessoas da mesa VIP quisesse falar comigo, mas meu namoro fantasioso com – que eles mal conheciam – tinha feito com que eles praticamente me enxergassem como igual. Difícil entender como funcionava a cabeça daquela gente.
Inclusive a da própria .
Por que diabos ela estava com aquele mau humor? Achei que ela fosse ficar alegre pela chegada da prima. Seria TPM talvez? Ou havia algo incomodando ela? Seria estranho, porque ela estava bem até...
- Bom dia, . – Rosana Wayans passou por mim rapidamente.
- Bom dia, Rosana. – Respondi. Foi aí que tive um estalo.
Me lembrando das últimas semanas e todas as ocasiões em que eu tinha deixado de mau humor, uma possibilidade me veio à cabeça.
Não. Não podia ser isso, podia?
Ela não podia estar daquele jeito por que eu estava talvez flertando um pouco com a Sofia? Por eu ter feito isso na frente dela, naquela manhã?
Eu realmente não tinha imaginado que ela fosse ligar para isso. Quero dizer, aquilo não era sério. Sofia era muito bonita e divertida, mas ela prima da minha namorada de mentira. E isso soa mesmo muito ridículo. Nós tínhamos mesmo nos dado muito bem, e sim, eu tinha flertado com ela no dia anterior e naquela manhã também, mas eu não ficaria com a melhor amiga da quando estávamos atolados até o pescoço naquela bagunça de namoro falso. E quando, por sinal, eu estava apaixonado de verdade pela .
- Psiu!
Dei um passo para longe do bebedouro e virei a cabeça para ver de onde vinha o assobio, descobrindo, estupefato, que era a própria Sofia.
- Ei! – Caminhei em sua direção. – O que está fazendo aqui.
A garota levantou os óculos escuros e sorriu.
- Vim conhecer a escola de vocês. – Explicou. – Já descobri que não é muito seguro, deixam qualquer um entrar.
- Não posso questionar isso. – Ri um pouco. – A está tendo aula agora, estou esperando o próximo tempo começar porque meu professor faltou.
- Legal. Por que não me leva para dar uma volta?
- Claro.
Guiei Sofia pelos corredores da Jacksonville Beach High School, e depois pelo lado de fora. Enquanto andávamos, ela perguntava sobre as últimas semanas e nosso namoro de mentira, e narrei para ela alguns dos episódios da nossa farsa.
- Eu nunca pensei que a fosse tão maluca. – Estávamos perto do ginásio e ela balançava a cabeça. – Quero dizer, ela sempre gostou de um teatrinho de vez em quando, desde pequena, mas sempre foi tão centrada. Eu era a peste e ela era a boazinha, sabe? – Riu. – Quando éramos crianças, era ela quem sempre estragava nossos planos, porque não sabia mentir.
- Ela deve ter feito um cursinho em Denver então. – Suspirei, com as mãos nos bolsos. – E com certeza teve um ótimo professor.
- Foi o , . – Sofia disse com tristeza. – O ótimo professor que ela teve. Ele acabou com a capacidade de autocontrole da . Partiu o coração dela, e aí o resto todo foi afetado.
Engoli em seco, me lembrando de quando descobrira o que Junior tinha feito.
- É por isso que eu estou aqui hoje. – A garota disse então, dando um sorriso maléfico.
Olhei para ela sem entender, mas por algum motivo não gostando nada daquela cara.
- Do que está falando?
- Estou falando do tão esperado momento em que vai aprender a não mexer com mais nenhuma garota da família Pie. – Ela bateu de leve na bolsa preta que carregava e olhou no relógio de pulso. – Vamos logo, você vai ter que me ajudar!
Quando dei por mim, Sofia já estava andando rumo ao interior da escola, e eu estava com uma péssima, péssima intuição enquanto a seguia.
- Sofia, o que você vai fazer?! – Perguntei tentando ser o menos barulhento possível, correndo atrás dela no corredor da escola.
- Por acaso te disse qual é minha melhor matéria na escola, ? – Ela perguntou sem olhar para mim. – É Química. – Olhou rapidamente para trás, dando uma risadinha.
Apressei o passo, mas Sofia parou abruptamente de andar e esbarrei nela.
- Agora vamos ver... – Ela bateu o dedo no queixo, estreitando os olhos. – Onde fica o armário do ?
Ela estava mesmo esperando que eu respondesse aquilo quando era óbvio que tinha algum absurdo meticulosamente arquitetado?
- Não vou te dizer! – Exclamei como se fosse óbvio. – Que diabos você quer com o armário dele?
- Quero vingança, ! – Respondeu impaciente. – Mas por hoje vou apenas fazer uma brincadeira malvada.
- Sofia, eu não acho que isso seja boa ideia. – Balancei a cabeça. – Se você quer saber, a nem está mais com raiva dele...
- E QUEM LIGA PARA O QUE A PENSA, TOM? – Ela exclamou indignada. – A minha prima é louca! Ela pensa que achou o caminho da paz interior se martirizando para AJUDAR o a ter uma namorada iludida e bonita, mas sabe o que realmente faria ela se sentir melhor? Explodir uma bomba fedida no armário dele.
Mesmo fazendo o possível para pensar de forma lógica, uma voz interior alta demais me dizia que eu não devia impedir Sofia. Junior merecia qualquer coisa que ela fizesse, e ainda seria pouco. Eu só podia estar ficando louco.
- Sofia... – Ainda tentei falar.
- Me diga, . – Ela insistiu, sem me deixar terminar. – Me diga que você não quer ver esse negócio explodindo na cara do , e aí eu vou embora levando essa mochila. – Disse. – Mas se o seu senso de justiça diz, assim como o meu, que aquele desgraçado merece isso, então você vai me levar agora mesmo ao armário dele, porque temos pouco tempo.
Sofia ficou me encarando com uma sobrancelha erguida, os olhos verdes ameaçadores, enquanto eu questionava até que ponto ia minha preocupação com ser pego por algo do gênero.
Menos de dois minutos depois, já estávamos em frente ao armário de Junior .
- Mas eu não sei a combinação. – Avisei, meu braço apoiado no armário do lado enquanto eu vigiava o corredor.
- Por favor, , não me ofenda. – Ela deu um sorrisinho. – Está falando com uma profissional.
A ruiva se aproximou do armário de Junior, segurando a tranca com cuidado. Ela colou o ouvido à porta e começou a girá-lo, e, para a minha admiração, em poucos segundos ouvimos o clique do destrancar. Meus olhos se arregalaram e Sofia me encarou presunçosa.
- Obrigada, eu sei.
Balancei a cabeça, voltando a me lembrar do tempo curto.
- Tá, agora anda logo.
A menina abriu a mochila, de onde tirou um pote de vidro onde estava enfiada uma bola de soprar roxa, cheia de alguma coisa. A bola parecia apertada ali dentro, pronta para explodir a menor tentativa de abrir o pote. A tampa tinha um laço cor de rosa colado. Um leve fedor entrou pelas minhas narinas, e fiz uma careta.
- Olá, minha bonitinha. – Sofia ria feito uma maluca. – Está sentindo, não está? – Olhou para mim, mordendo o lábio. – Ele também vai sentir. Com sorte, esse perfume vai ficar impregnado nele por uma semana.
- Que porcaria é essa? – Tampei o nariz.
- Uma mistureba química. Não se preocupe, não é mortal nem vai causar alergia. Provavelmente. – Deu de ombros. – Agora nosso bonitão só tem que vir aqui, se perguntar o que é isso e abrir o pote. – Ela colocou o vidro lá dentro.
- Legal. Agora podemos ir. – Concluí nervoso.
- Ah, por favor, temos que ficar para ver! – A garota desdenhou.
- Você ficou doida? Ninguém pode te ver aqui!
- Ah, mas eu só quero ver a cara do . – Choramingou. – Eu viajei quilômetros por esse momento.
Eu até entendia, mas a questão era que – com aquele cabelo e aquele estilo – Sofia seria notada naquele lugar mesmo que estivesse usando a capa da invisibilidade do Potter. E se alguém soubesse que a prima de Pie tinha sido responsável por aquilo, dezenas de fofocas e perguntas perigosas iam começar a se espalhar.
- Se contenta se eu filmar? – Sugeri.
- Dependendo do ângulo, acho que é suficiente para mim... – Ela ponderou. – Tá. – Concluiu. – Mas quero que pegue o exato momento em que a bomba explode. A reação do .
- Tudo bem. – Concordei.
- Ah, tem mais uma coisa! – Lembrou, tirando uma caneta da bolsa. – Me dá um papel.
Com pressa, abri minha mochila e arranquei um pedaço de folha do caderno. Sofia o apoiou no armário ao lado do de Junior e escreveu algo. Me aproximei para ler.
"Você fede, canalha.
XoXo,
Sofia Pie"
Inclinei a cabeça para o lado e ergui uma sobrancelha para ela.
- Não tem problema se ele souber que fui eu. – Ela disse.
- Não, acho que não. – Concordei, e ela colocou o bilhete embaixo do pote, fechando o armário em seguida. – Queria poder assinar também, mas já que não rola, vou me contentar em ver a cara dele.
- Valeu, . – Sofia deu um sorriso malicioso e me beijou na bochecha. – Sabia que você era mais divertido do que a fazia parecer. – Começou a se afastar. – Pode deixar que eu gravei o caminho. Nos vemos mais tarde.
Sofia andou rápido com suas botas de salto grosso até desaparecer no fim do corredor. O que ela queria dizer com aquele comentário? Então me achava chato? Ou só fazia as pessoas acharem que eu era? O que, afinal, ela falava de mim para os outros?
Ainda não estava satisfeito com nenhuma das duas possibilidades quando o sinal do intervalo soou. Estava na hora.
Por sorte, a sala onde tinham aula naquele momento era bem próxima dali. Assim que os outros alunos começaram a sair das salas, corri para alcança-lo.
- . – Ele disse. Parecia mais estranho que de costume. – Eu queria mesmo...
- Deixa a conversa pra depois. – Puxei sua mochila com cuidado, e ele me acompanhou andando para perto do armário de Junior.
- O que está havendo? – Quis saber.
- Você vai ver daqui a pouco. – Olhei por sobre seu ombro, procurando no corredor. – Melhor nos afastarmos um pouco.
Caminhamos para alguns metros mais longe e eu me apoiei de lado em um armário, tendo vista para o local onde a bomba explodiria.
- Seu celular é melhor que o meu. Vamos precisar dele. – Avisei.
- Mas que merda está acontecendo, ?! – estava mais confuso do que nunca agora.
- Lá está ele! – Ergui um pouco o tronco.
vinha pelo corredor acompanhado de alguns de sua corja. Ele conversava despreocupadamente com um cara de cabelo louro lambido.
- Rápido, , pega o celular! – Bati em seu ombro. – Liga a câmera e foca no Junior.
- Tá! – Meio irritado, . – Mas seria bom saber por quê.
- Você já vai entender.
filmou discretamente, enquanto Junior se aproximava do armário. Ele girou a combinação e a porta se abriu. Primeiro, ele demonstrou confusão. Depois, curiosidade. Finalmente pegou o pote, mostrando-o ao amigo e perguntando alguma coisa. O garoto negou com a cabeça. Junior deu de ombros e segurou a tampa. Tive que me segurar para não rir naquele momento mesmo.
Foi uma cena e tanto. Assim que a tampa descobriu o pote, a bola estourou, espirrando tinta azul escura no rosto e em parte da camisa de . O amigo de cabelo lambido dele levou um tremendo susto.
- Mas que... – A boca de estava aberta, mas ele já começava a rir.
Junior parecia furioso, limpando o rosto enquanto praguejava. Todos os alunos tinham parado para ver o que estava havendo. Finalmente, voltou a olhar para o armário e enfiou a mão nele, pegando o pedacinho de papel que até então não tinha notado. A expressão dele ficou ainda mais odiosa depois de lê-lo.
ainda estava rindo histericamente quando o cheiro da bomba chegou a nós. Os alunos começaram a se empurrar para fugir, fazendo caretas de nojo.
- Que droga de cheiro é esse?! – Meu amigo indagou.
- Te explico lá fora. É melhor irmos agora. – Chamei ao perceber que Junior começava a procurar a culpada à sua volta. Ele não podia nos ver ali.
Já do lado de fora, me permiti voltar a rir com vontade. Sofia estava certa. Eu queria ver aquela cena mais do que qualquer um. A cara de Junior tinha sido impagável, e ele merecia aquela humilhação – ah, como merecia! A vingança podia não ser nada nobre, e aquela podia nem ser uma vingança de verdade afinal; mas, francamente, eu estava me divertindo muito naquele momento.
- Tá, que droga foi aquela?! – queria porque queria saber. Ele parecia estar se divertindo bastante também. – Você fez aquilo?
- Não. – Neguei, sorrindo. – Foi a Sofia.
- A Sofia, tipo, a Sofia que estava com a gente ontem? – Ele se atrapalhou. – A Sofia prima da ?
- Ela mesma. – Confirmei. – Ela veio aqui hoje; queria se vingar pelo que o Junior fez com a . Deixou até um bilhete dentro do armário.
abriu a boca e ergueu as sobrancelhas. Depois deu um longo suspiro, indo se sentar num banco de madeira. O acompanhei sem entender a reação. Parecia que ele estava tendo uma queda de pressão.
- , você tá legal? – Me sentei ao seu lado.
, com a cabeça jogada entre as pernas até então a levantou um pouco para olhar para mim.
- Eu acho que estou apaixonado, .
- Você o quê? – Franzi o cenho. – Mas...
- É, eu estou apaixonado, tipo, maluco pela Sofia! – Ele ficou de pé e começou a andar. Eu nem sabia o que dizer, mas ele continuou discursando. – Eu sei que parece loucura, porque eu a conheci ontem, então talvez eu seja mesmo maluco, mas, cara! – Exclamou. – Ela tem aqueles olhos que... E quando ela prende o cabelo no alto e as pontas coloridas ficam caindo é tão... E a risada sarcástica dela é... Ah! – Ele se jogou no chão, deitado de costas na grama. – Que sensação horrível. Eu não tenho a menor chance, não é?
- , não é que seja impossível... – Me abaixei ao seu lado. – Mas e quanto a Amber? Sei que ela é grudenta, mas você sempre foi doido por ela e vocês meio que estão namorando agora.
- Eu sei! Não é uma droga? – Ele se sentou e quase bateu a testa em mim, me obrigando a desviar. – Eu achava que gostava da Amber apesar de tudo, mas agora sei que era só meu ego de nerd invisível falando. E o pior é que gastei cada desejo de aniversário, estrela cadente e o caramba que eu tinha com ela. O que eu vou fazer, ? O QUE EU VOU FAZER?
Honestamente, quase dava para ter pena de naquele momento. Sabia melhor que ninguém como era uma droga gostar de alguém com quem não se podia ficar por algum motivo, por mais que fosse ridículo ele estar apaixonado um único dia depois de conhecer Sofia.
Mas quem era eu para julgar, se não conseguia tirar a da cabeça desde o dia em que a conhecera?
- Você pode terminar com a Amber. – Dei de ombros. – Acho até que seria mais saudável fazer isso, visto que você tem fugido dela igual o diabo foge da cruz.
- Mas e se eu terminar com ela e a Sofia não quiser nem saber de mim? Isso é bem provável, vamos encarar. Ela é muita areia pro meu Batmovel.
- Você já devia estar acostumado a esse tipo de situação, não? – Franzi o cenho. parecia se esquecer às vezes de que nunca tinha sido um galã. – De qualquer jeito, é melhor pensar um pouco mesmo. A Sofia pode ser bem legal e muito bonita, mas, caso não tenha percebido, ela é um pouco maluca.
- Como se todas as outras Pie que conhecemos não fossem... – riu, se deitando na grama de novo, os braços cruzados atrás da cabeça. – Se quer saber, acho que não me importo. Eu até gosto da loucura delas. Talvez tenha pegado isso de você.
- É, talvez. – Ri um pouco. estava certo. Se deixássemos de lado todas as confusões, as loucuras da família Pie podiam ser até mesmo divertidas.
POV PIE
Emma me lançou um olhar de aprovação quando me sentei ao seu lado na mesa VIP, colocando minha bandeja à frente.
- Vejo que está se alimentando direitinho. – Ela cutucou minhas cenouras no prato. – Muito bem, Pie.
- Não havia muitas opções hoje, se quer saber. – Retruquei. Depois sorri, me lembrando da novidade. – Quer saber a parte mais gostosa do dia?
- O que foi?
- Ganhei o papel principal da peça.
- EU NÃO ACREDITO! – Emma levou as mãos à boca, chocada. Depois começou a rir. – Eu queria tanto ver a cara daquela vaca dos infernos!
- A história é longa, mas eu te conto mais tarde. – Falei quando Summer chegou à mesa acompanhada por Jodi.
- Qual é a fofoca? – Jodi quis saber.
- é a protagonista da Peça de Outono! – Emma contou.
- Meu. Deus. – Summer ficou de boca aberta. – Jas deve estar uma fera com você.
- Você vai ficar ainda mais surpresa com o quanto. – Lhe lancei um olhar significativo.
Não pude terminar de falar, no entanto, porque logo os jogadores, com exceção de Junior, chegaram. Brad estava no meio deles, falando sem parar. Seu sorriso se espalhou ainda mais ao ver Jodi Lyn. Ele se abaixou e deu um beijo em seu rosto, sentando-se ao lado dela.
- Ei, meninas! E aí? – Ele perguntou comendo uma batata frita, enquanto alguns dos outros jogadores se espalharam pela mesa.
- Oi, Brad. – Cumprimentei.
- Onde está o Junior? – Summer quis saber.
- Ele saiu mais cedo do treino, tinha dentista ou algo assim. – respondeu.
Logo Amber, Sienna e Teddy se juntaram a nós também. Primeiro Amber olhou o banco perto de Summer, mas não se dispôs a tirar Jodi dali, indo ficar ao meu lado, empurrando mais gente para isso. Sienna foi se sentar perto de Ted na ponta.
- , sabe se está tudo bem com o ? – Amber perguntou isso com tanta seriedade que quase tive pena dela ao me lembrar de como a estava evitando. – Porque parece que ele tem andado com a cabeça no mundo da lua! Sempre se esquecendo de responder minhas ligações. – A garota pegou algumas batatas no prato de Brad. Emma ergueu as sobrancelhas para mim.
- Tem certeza de que é uma boa ideia comer isso, Amber? – Sienna perguntou delicadamente.
- Por quê? O que você tem a ver com isso?
- Eu não comeria, se fosse ela. – Teddy fez uma careta de deboche.
- Está querendo me dizer algo, Teddy? – Amber o encarou irritada. – Está querendo me chamar de gorda?
- e de mim, mas é sempre bom lembrar de que sou eu que vou ter que levantar um bujãozinho se você começar a comer feito louca. – Ele devolveu.
- Será que é por isso que o está agindo assim comigo? – Amber choramingou do nada. – Por que eu estou gorda?
- Mas é claro que não, Amber! – Summer exclamou, olhando feio para Teddy. – Você não está gorda.
- Bom, então por que ele não me responde desde ontem?! – Ela voltou a questionar.
- Ah, Amber, o só deve estar sobrecarregado... Sabe como é, ele agora é um titular. – Tentei animá-la.
- É... Verdade. Isso faz mesmo muito mais sentido. – A loira concluiu. – Pobrezinho do meu gatinho. Ele precisa relaxar! – Exclamou. – , você conhece algum lugar legal onde podemos ir?
- Ah, eu sei um ótimo! – Brad exclamou antes que eu respondesse. – O Roger's, a lanchonete do pai dela! – Ele sorriu. – Puxa, eu e a Jo fomos lá semana passada e o lugar é incrível. A comida é deliciosa e o se apresenta lá! Eu e Jo achamos que ele devia entrar no American Idol, ele é um cara muito talentoso...
- Ah, é verdade! – Amber se lembrou. – Seu pai é músico, não é? Um músico, tipo, meio que famoso?
- As pessoas costumam saber quem ele é pelo nome... – Eu disse modestamente. Todos estavam me encarando naquele momento. – Ele já viajou bastante. E, na verdade, ele é sócio do Roger, que é o verdadeiro dono do lugar.
Mas aparentemente minha explicação modesta sobre as verdadeiras atribuições do meu pai tinha sido absolutamente ignorada. Logo, todos comentavam sobre como ele não só era famoso, como também um empreendedor. E como eu era sua sortuda filha.
- Nós totalmente temos que ir nesse lugar. – Amber decidiu. Não sabia se ela estava falando de todos os seus amigos no geral ou de mim, o que seria terrível. – O gatinho vai adorar uma noite de diversão!
- Eu acho uma ótima ideia. – Summer, para minha surpresa, foi logo falando. – está sempre falando do Roger's, sou louca para conhecer o lugar.
- Perfeito! – Amber exclamou.
- O que é perfeito?
Olhamos para o lado e lá estava Jasmine, uma expressão neutra, nos encarando.
- Vamos, falem. Se não vão mais me incluir no ato de fazer os planos, podem ao menos me inteirar deles depois. – Ela insistiu.
- Jas... – Mesmo Teddy com todo seu sarcasmo ficou intimidado diante da chegada dela. – Só estávamos combinando de ir à lanchonete do pai da .
- É mesmo? Quando?
- Bom... – Brad entrou de novo na conversa, tentando soar mais leve. – Acho mais legal nós irmos no dia em que o se apresenta. , quando é que ele canta?
- Nas quintas-feiras. – Respondi. – É quando tem mais espaço no repertório.
- Quinta-feira pra mim está ótimo. – Jasmine sorriu. Um sorriso quase convincente. – Vou falar com meu namorado.
A garota saiu de perto, tirando o telefone do bolso, e nós ficamos ali, calados demais por alguns segundos.
- Bom, ainda vai ser divertido. E os hambúrgueres são incríveis. – Brad disse então, e isso tirou a tensão de nossos ombros.
- E sua prima também pode ir, ! – Summer sugeriu. Com certeza, Sofia ia adorar aquela ideia.
Emma se inclinou para mim.
- Ela está mesmo cuspindo fogo, não é?
Apesar de também ter ficado sem graça com a chegada repentina de Jasmine, esse sentimento já estava passando. Em lugar dele, surgiu o bom e velho gostinho da vitória.
- E olha que nem começamos a ensaiar para o grande espetáculo. – Sorri.
- Você está certa. – Sofia confessava naquela noite, enquanto empurrávamos o carrinho pelo supermercado. – Eu bem queria te dizer que em hipótese alguma ficaria animada para sair com um bando de acéfalos de torcida e futebol, mas não dá pra negar: estou louca para ir. Depois de tudo que ouvi, é quase como ser convidada para passar um dia no set da minha série preferida. – Riu.
- Você vai ficar bem surpresa em descobrir que eles não são tão burros. – Eu disse. Depois ponderei. – A maioria deles, pelo menos.
se aproximou de nós com uma sacola de batatas e a depositou dentro do carrinho.
- Batatas aqui. – Disse. – O que ainda falta?
- Alho-poró. – Respondi.
- Sofisticada demais. – Sofia balançou a cabeça. – Sabe que antes de você chegar seu pai provavelmente estava vivendo à base de pão velho e água, não sabe? Não precisa ser tão eficiente.
- o alimentava antes de eu chegar. – Expliquei, e o garoto assentiu timidamente, indicando que era verdade. Os pobres foram obrigados a sustentar papai por meses. – Além disso, só quero fazer uma sopa que mamãe me ensinou. Meu pai anda meio abatido. Acho que pegou gripe.
- Eu já volto. – O garoto se afastou, sumindo no fim do corredor.
Sofia riu, balançando a cabeça, ao tempo que pegava uma torta de chocolate congelada no freezer.
- Olha só para vocês, se comportam como uma familinha de verdade.
- é da família. – Respondi sem pensar duas vezes. – Ele praticamente mora na minha casa. Às vezes eu desconfio de que papai o tenha adotado de papel passado.
- Você sabe o que quero dizer. – Ela sorriu. Depois, quando não respondi, ela deu de ombros. – Não acho que deve ser tão ruim tê-lo em casa o tempo todo, também. Você sabe, eu achei um cara muito legal.
E lá íamos nós de novo naquele assunto. Minhas narinas devem ter inflado, porque Sofia obviamente percebeu que havia algo errado com minha cara.
- Olha só pra você. – Ela balançou a cabeça. – Isso te incomoda, não é? Que eu possa me interessar pelo .
- O quê? Mas é claro que não. – Comecei a empurrar o carrinho mais rápido, indo em direção aos biscoitos.
- Ah, claro. – Ela rolou os olhos. – Me lembro que você fazia exatamente essa cara quando sua mãe te forçava a me emprestar sua bicicletinha amarela. Porque você odiava dividir a bendita bicicleta, assim como não quer ter que dividir o . – Concluiu presunçosa. – O que nos leva a conclusão mais óbvia: você está gostando dele.
- Lá vem você de novo com essa história! – Parei de andar estupefata. – Eu já repeti mil vezes que não estou apaixonada pelo . Por Deus, ele é meu amigo e só isso. – Insisti. – E eu decididamente não me importo se você quiser sair com ele. O problema é todo de vocês, desde que não estraguem minha farsa.
- Se você diz...
Sofia me encarou com os olhos verdes por alguns instantes. Depois, deu de ombros. Por dentro, eu estava segurando com unhas e dentes a vontade irracional de decretar que não, ela e não tinham direito de saírem juntos. Proibir isso por escrito se fosse necessário!
Mas eu não poderia fazer isso, porque seria como admitir que ela estava certa e eu estava com ciúmes. O que não era verdade, só para deixar bem claro.
- Não achei o alho-poró em lugar nenhum.
Era voltando. Essa camisa azul fica mesmo muito bonita nele, pensei com meus botões, mas deixei isso para lá assim que percebi Sofia me observando.
- Deixa pra lá. – Falei. – Eu faço sem. Papai não vai mesmo notar.
Ele concordou e nós três começamos a andar para o caixa.
- Ei, ! – Sofia disse então. – Eu estava conversando com a , sabe, e pensando se você não gostaria de, sei lá, sair comigo.
- Sair? – Mesmo sem olhar, pude imaginar franzindo o cenho.
- É, como num encontro. – Minha prima explicou com uma risadinha charmosa. – Eu perguntei a primeiro porque achei que ela poderia se importar. Sabe como é, com essa história de vocês... Mas ela me garantiu que não liga.
Nesse ponto da conversa, tive que parar de andar para ver de verdade a reação de , e também para fuzilar Sofia com os olhos. Uma coisa era ela ficar jogando piadinhas para mim e tentando me fazer dizer que gostava de , outra coisa era ela dizer a ele que achou que eu pudesse me importar. Essa frase poderia leva-lo a pensar muita coisa.
De todo modo, mudei meu foco para . Ele tinha a boca entreaberta – parecia estar processando a informação. Tanto uma quanto a outra.
- Ah... Então ela não se importa? – Ele perguntou calmamente.
- Nem um pouquinho. – Sofia sorriu. – Ela disse que vocês são só amigos. Não haveria mal em sairmos juntos então, não é? Só tem que ser fora da cidade. Acho que pode ser muito divertido.
Vamos lá, , diga que não. Diga que tem dever de casa. Que precisa lavar a louça.
olhou para mim – que tentava conter minha expressão de pânico – por alguns segundos. Me esforcei para continuar impassível, chegando até a dar sutilmente de ombros.
- Claro, eu vou adorar sair com você, Sofia. – Ele disse então, para minha total decepção. – Já sabe aonde quer ir?
- Ah, eu gosto de ser espontânea. – Ela sorriu. – Podemos sair por aí e só achar um lugar...
- Por mim tá ótimo. – sorriu de volta.
Os dois continuaram fazendo planos, me deixando para trás com o maldito carrinho.
Você não se importa de verdade com isso, , era o que eu dizia a mim mesma.
Mas, qual é, quem eu queria enganar?
Eu achava aquela uma péssima ideia, e tinha náuseas só de imaginar e Sofia namorando.
Não, eu nunca tinha pensado que aquilo poderia realmente acontecer, e definitivamente não estava preparada psicologicamente para tal.
Enquanto eles andavam a distância, minha cabeça foi invadida involuntariamente por cenas terríveis dos dois caminhando juntos para um altar, enquanto eu usava um vestido feio de madrinha lá na frente.
Que merda era aquela, pelos céus? Eu teria pesadelos com aquela imagem naquela noite. Estava certa de que sim.
E o pior era que eu não poderia fazer nada, a menos que admitisse o que Sofia tanto queria de mim.
Que eu estava morrendo de ciúmes de .
POV
- Nos vemos amanhã à noite, . – Sofia sorriu para mim da porta de casa, depois que eu tinha deixado as compras lá.
- Até amanhã. – Dei um sorriso de volta, acenando.
apareceu atrás dela, me olhando parada na escada, uma expressão séria, pensativa. Assenti para ela, que não respondeu, e voltei para o meu carro bufando.
Para ser bem sincero, eu estava zangado.
Não era como se eu quisesse ou esperasse vê-la tendo uma crise de ciúmes, mas ela estava agindo como se aquilo não fizesse a mínima diferença, e era óbvio que isso não era verdade. Ela estava de mau humor naquela manhã porque eu estava dando corda para Sofia, eu tinha certeza!
Ou será que não?
Eu estava errado? Ela realmente não se importava?
Ah, para o inferno.
Eu realmente não tinha o plano de aceitar sair com Sofia de verdade, mas não resisti à ideia de provoca-la depois de toda aquela displicência. Podia ser infantil. Podia não dar em nada. Mas eu ia fazê-lo, gostando a ou não. Especialmente se ela não estivesse gostando.
Estava enchendo meu copo de suco de uva quando Jack entrou na cozinha. A única outra pessoa acordada era , mas ela estava lá em cima se arrumando para a aula.
- Ei, rapaz. – Ele me cumprimentou. Parecia mais cansado do que o habitual.
- Bom dia, Jack. – Respondi. – Já dei comida ao Stevie.
- Ótimo, muito bom. Alguém tem mesmo que fazer isso. – Assentiu. – Me serve um copo?
Enchei um copo grande com suco e coloquei a sua frente. Jack segurou-o para leva-lo à boca, mas de repente soltou um gemido e o largou sobre a mesa, me assustando.
- O que foi? – Quis saber.
- Meus dedos... Merda. – Ele xingou. – Só estão um pouco doloridos. É a velhice. Talvez eu esteja ficando velho para tocar sax.
- Não diga isso. Vai desapontar um exército de velhas apaixonadas. – Brinquei.
- Está muito engraçadinho pra quem namora minha filha e come na minha casa todo dia. – Jack deu um sorriso ameaçador, e eu sabia que estava brincado. Depois fez outra tentativa de erguer o copo, e, apesar da cara feia, ele conseguiu levá-lo à boca. – Por falar nisso... Como vai o namoro de vocês?
Parei por um segundo antes de responder. Foi involuntário. Depois abri a geladeira e guardei a caixa de suco.
- Bem. – Menti. Até dois dias atrás estava, pelo menos.
- Não precisa mentir pra mim, . Eu te conheço quase melhor do que conheço a Rainbow.
Olhei para Jack, me perguntando do que exatamente ele estaria falando. Até que ponto ele sabia que eu estava mentindo?
- Olhe, sei que você e gostam muito um do outro. – Jack continuou, mesmo sem minha resposta. – Mas entendo como a relação de vocês é diferente, talvez mais complicada em alguns pontos...
Você não faz ideia, Jack.
- Quero dizer, vocês são só garotos, e passam tanto tempo juntos... Talvez isso acabe tornando tudo mais intenso, exija de vocês mais maturidade do que o normal.
Talvez exigisse mesmo, mas antes que Jack terminasse seu sermão, entrou na cozinha.
- Vamos? – Chamou. – Bom dia, papai. Deixei a torta de frango descongelando. Só precisam colocar no forno para o almoço.
- Bom dia, querida. – Jack respondeu. – Muito obrigada, você é um anjo.
sorriu docemente, depois tomou o rumo da porta da frente.
- Jack... – Comecei.
- Está tudo bem, pode ir. – Ele me dispensou. – Um dia terminamos essa conversa.
- Certo. – Assenti. – Boa sorte com os dedos.
- Obrigado, garoto.
Quando cheguei do lado de fora, estava encostada ao carro, esperando. Ela tinha os braços cruzados e um sorriso no rosto, o que teria me preocupado bastante se eu já não estivesse esperando que ela bancasse a superior.
- Teve uma boa noite, ? – Ela perguntou docemente.
- Sim, tive. E você, Rainbow? – Devolvi a gentileza, indo para o outro lado do carro e a encarando sobre o capo.
- Dormi como a própria Bela Adormecida. Por falar nisso, não vai perguntar pela sua princesa encantada de cabelo colorido?
- Ah é. – Dei um sorriso de provocação. – Como ela está?
- Bem. Muito bem. Acho que está bastante ansiosa para o encontro de vocês.
- Legal. Eu também.
Com isso, entrei no carro. Um segundo depois, fez o mesmo.
- Já sabe onde vai levá-la? – Indagou.
- Ah, na verdade, é uma surpresa. – Dei de ombros com ar de desculpas. – Não posso te contar.
ergueu as sobrancelhas, mas depois balançou a cabeça.
- Tudo bem. Eu entendo. Perfeito.
Quando saí com o carro, sabia que por dentro ela estava se retorcendo de curiosidade. Sorri quando ela não estava reparando. Estava satisfeito o suficiente para dar cambalhotas, mas me contentei em somente colocar para tocar uma boa música do Ray Charles.
Não buscamos naquele dia, porque Amber – por alguma razão achando que estava precisando passar mais tempo com ela – insistiu em fazê-lo, e ele não teve como recusar, mesmo tentando.
Assim que chegamos ao corredor dos armários, no entanto, ele apareceu. Pareceu tão aliviado que senti pena de Amber.
- Vocês chegaram. – Ele disse em um tom quase acusador. – E você. – Apontou para . – Que história é essa de que eu preciso me divertir? Você enlouqueceu? Tinha que falar isso pra Amber justo agora?
- Desculpe, ela estava tentando achar um motivo pra você a estar evitando. – mordeu o lábio. – Fiquei com pena dela.
- Tem vários motivos. – Ergui as sobrancelhas.
- Pobre Amber. – balançou a cabeça. – Deve ser difícil estar apaixonada por alguém como eu.
Não sabia o que ele queria dizer, mas assim como – que fez logo uma careta – preferi nem perguntar.
- De todo modo, – Ele voltou à voz normal e começamos a andar. – Ela inventou que quer sair comigo hoje à noite, então menti dizendo que íamos jogar vídeo game na sua casa. O que vai ser, Halo ou alguma coisa nova? Baixei uns jogos legais ontem...
O-oh. Merda. Eu tinha me esquecido completamente de .
Ele ia me matar quando soubesse que eu ia sair com a Sofia. Literalmente.
- Hoje não vai dar, . – foi logo falando. – tem um encontro.
- Um o quê? – Ele ficou confuso. – Com quem?
Fuzilei com os olhos, mas não sabia se ela tinha feito de propósito – afinal, ela ainda não sabia que estava apaixonado por Sofia.
- ? – Meu amigo insistiu. Dei um longo suspiro.
- Com a Sofia, a prima da .
abriu a boca e fechou. Os olhos grudados em mim.
Eu nunca o tinha visto daquele jeito, nem quando eu tinha deixado que ele fosse a pé para casa, naquela noite semanas atrás. Parecia que eu tinha dado um soco em seu estômago.
- Beleza. – Ele disse baixinho, mas não parecia haver raiva em sua voz. Só mágoa.
- ... – Comecei, pensando em me explicar.
- Não, tá tranquilo, . Vou ficar jogando sozinho. Quase como se eu nunca tivesse tido um melhor amigo. – Deu de ombros com uma risada nervosa, se afastando de nós.
pareceu preocupada com a reação dele, apesar de confusa.
Eu tinha mesmo sido um grande babaca.
POV PIE
- Porcaria de massa. Sova logo de uma vez!
Eu batia repetidamente com a massa de pão em cima da bancada da cozinha. Tinha sido o único jeito que eu encontrara de colocar para fora minha raiva sem agredir mais ninguém. Já tinha dado tantas patadas em papai e em Miguel que ambos tinham decidido sair de casa.
Sofia, aquela sem noção, tinha dito que ia sair para comprar um vestido para seu encontro, o que não tinha ajudado em nada.
- Uh! – Dei um longo suspiro de exaustão, passando as costas da mão cheia de trigo na testa.
Talvez eu estivesse exagerando.
Era só um encontro. E tudo bem, eram as duas pessoas de que eu mais gostava, mas e daí? Talvez aquele encontro nem rendesse nada sério, afinal.
- E agora, com vocês – a tv na sala, ligada em um programa de auditório idiota, anunciou. – Teremos Stephanie Theiler, cantando sua releitura do grande sucesso da bela Sofia ...
Ah, para o diabo! Era palhaçada comigo, não era?
Marchei emburrada até a sala e desliguei a tv. Stevie, que aparentemente estava muito interessado no programa, latiu para mim.
- Você é o meu cachorro dos sonhos! – Repreendi-o. – Não vá mudar de lado agora!
Ele grunhiu e se deitou, me olhando como se eu fosse maluca.
Talvez eu fosse mesmo.
Me joguei no sofá, cansada de sovar a massa do pão e cansada de me sentir daquele jeito. De repente, me tornei muito consciente do quão horrorosa eu devia estar toda suja de trigo. É meu estado emocional refletido, pensei.
Me lembrei de naquela manhã. Ele também não parecia nada bem.
Eu nem sabia por que ele tinha ficado tão chateado com , mas me sentia particularmente empática ao seu sofrimento.
A campainha tocou e fui até a porta sem me importar muito com minha aparência. Stevie me seguiu. Fiquei de fato um pouco surpresa pela pessoa parada ali.
- ? – Franzi o cenho.
tinha as mãos enfiadas nos bolsos da camisa xadrez vermelha. Parecia tão desanimado e ao mesmo tempo estranho que me preocupei instantaneamente. Talvez seu problema com fosse mais sério do que eu imaginara.
- Oi, . Posso entrar?
- Mas é claro. – Me afastei da porta para abrir passagem. entrou em casa, Stevie pulando em suas pernas enquanto ele seguia para a sala.
Fechei a porta e o segui, tirando o avental no caminho, embora isso não adiantasse de nada uma vez que eu continuava imunda.
- O que está havendo? – Indaguei me sentando na poltrona perto dele.
- Cocô. – Ele disse, me deixando muito perplexa por um momento. Depois ele se deitou no sofá, uma expressão de revolta tomando seu rosto. – A vida, ela é um grande cocô!
Ah, claro, então estávamos falando no sentido figurado. Melhor assim.
- Qual é o problema, ? Estou ficando preocupada.
- O problema é seu namorado falso , que marcou um encontro com a Sofia, quando eu um dia antes tinha dito a ele que estava a fim dela!
- Mas o quê?! – Franzi o cenho sem entender nada. – Você está gostando da Sofia?
- Adorando. Venerando. Chame como quiser chamar. Escrevi um poema chamado Ode à Sofia na noite passada, se quer saber.
Aquilo era muito inesperado. Quer dizer, garotos como às vezes acabavam apaixonados pela Sofi, mas ele a conhecia há benditos três dias!
- Sei que vai dizer que eu só a conheço há três dias. – Ele disse, lendo meus pensamentos. – Mas é sério, o que eu sinto por ela... – Suspirou frustrado. – Vamos lá, , você tem que saber o que é isso. Já sofreu por amor. Aposto que se apaixonou de cara quando conheceu o Junior.
"Não de cara, mas..."
De fato, tinha se tornado meu pensamento fixo desde o dia em que nos conhecemos. Então, pensando de forma honesta, era bem aceitável que se encontrasse tão encantado por Sofia mesmo sem conhecê-la há tanto tempo.
E era mesmo uma canalhice do sair com ela sabendo disso!
Mas que cretino!
- Ah, , se você tivesse me dito que estava gostando dela, eu nunca teria deixado que esse encontro idiota acontecesse! – Apertei sem ombro.
- Você também não parece nada feliz com os dois como casal. – me encarou com seu olhar esquisito, abraçado a uma almofada feia de papai.
Sagaz. Sempre sagaz. Mesmo em depressão por ser trocado, ele não perdia um detalhe.
- Eu não estou. – Admiti, tirando a mão de seu ombro. – Mas o motivo é diferente. Os dois manés vão estragar minha farsa.
Me levantei e marchei para a cozinha. me seguiu na hora.
- Acredito em você! – Ele foi dizendo atrás de mim.
Voltei para trás da bancada, onde minha massa de pão esperava.
- Quer dizer, é claro que alguém vai perceber andando por aí com uma garota que não é você. – parou a alguns metros. – E quando descobrirem que é sua prima então...
Irritada contra minha própria vontade, bati a massa com força na bancada, dando um susto daqueles em . Queria mesmo era sovar meu pão na cara daqueles dois idiotas.
- É uma droga, não é? – continuou, pensativo e parecendo infeliz. – E o pior é não tem nada que a gente possa fazer, porque...
", . Sempre tem algo a se fazer", uma vozinha malvada disse em minha cabeça.
E foi aí que eu tive um estalo.
Eu tinha que poder fazer alguma coisa. Não havia problema sem solução – o que havia eram pessoas que eram péssimas em resolver problemas.
E eu não era uma delas.
- – Eu disse com um arzinho de loucura. – Já sei o que vamos fazer.
- Qual é sua ideia? – Ele perguntou esperançoso.
- Vamos atrás daqueles babacas e vamos garantir que eles não façam nada que prejudique qualquer um de nós dois. Meus planos ou seu coração.
- Gostei dessa ideia.
- Mas vamos ter que ser discretos. – Avisei.
- Eu cuido disso. – Garantiu , mais animado.
- Então estamos combinados.
Aqueles dois patetas não perdiam por esperar.
Tomei meu banho mais cedo e vesti um blusão branco velho por cima da minha roupa de fuga. Depois me joguei na cama com um livro e fiquei fazendo hora.
Sofia tinha chegado cerca de meia hora depois de deixar minha casa, com bolsas cheias de coisas que fingi estar cochilando para não ter que ver. Quando acordei, fiz questão de ser muito dócil e parecer ansiosa por ela.
Agora ela estava no banho. Logo chegaria para colocarmos nosso plano em prática.
- E então, o que acha? – Ela perguntou entrando no quarto, e minha careta foi quase automática.
O vestido de Sofia era um tomara-que-caia preto, bonito e colado demais para um simples encontrozinho com . Não chegava a ser vulgar, mas era um exagero.
Graças ao livro em frente ao meu rosto, ela não pode ver minha cara, então eu tratei de dar um sorriso antes de abaixá-lo.
- Você está linda, Sofi. – Elogiei.
- Obrigada. – Ela sorriu, correndo para frente do espelho de corpo inteiro do canto. – Modéstia à parte, estou mesmo.
Rolei os olhos, jogando o livro de lado, e desci da cama. Fui até a janela para ver se já estava chegando, e o que vi foi o carro de se aproximando.
- Olha quem chegou. – Dei um sorriso maléfico.
- Ele já está aí? – Sofia perguntou ansiosa.
- Está sim, mas não se preocupe. Termine de se arrumar, faça aquele atraso charmoso. – Falei. – Vou receber seu pretendente.
Sofia sorriu, assentindo, e eu desci as escadas. Havia uma estranha sensação de paz em meu coração, como se tudo já estivesse resolvido. Minha paz acabou, no entanto, no momento em que abri a porta e avistei .
Ele estava usando uma camisa azul-marinho e calça jeans escura. Os tênis eram all-stars marrons, e o cabelo dele parecia ainda meio molhado. De alguma forma, nunca tinha parecido tão bonito.
E foi aí que eu me senti ridícula.
Como eu esperava que Sofia não o levasse a sério? Não havia a menor possibilidade. Em dois minutos ela ia vê-lo daquele jeito, e aí ele ia dar aquele sorriso, ia dizer uma coisa muito fofa ou engraçada, e ela ia se sentir sortuda por estar saindo com ele, e então nunca mais o deixaria em paz. E ela teria razão em fazê-lo.
- Oi, Rain. – Ele sorriu quando chegou à porta. Seu perfume era tão bom!
- Ei, ! – Sorri de volta feito uma idiota, me esquecendo por um minuto que estava tão brava.
enfiou as mãos nos bolsos, parecendo sem jeito.
- A Sofia... – Começou.
- Ah, claro. – Meneei a cabeça, voltando a mim. – Ela está se arrumando. Pode entrar.
entrou e se sentou no sofá da sala, brincando com Stevie quando ele se aproximou alegre.
- E então, ansioso? – Perguntei me sentando em frente a ele.
- É normal, não é? – Ele riu nervoso, dando de ombros. – Encontros fazem isso. Deixam a gente...
- É. – Completei por ele. – Bom, espero que tenha escolhido bem aonde ir. Sofia costuma ser muito exigente.
- Exigente? – Franziu o cenho.
- Sim, você sabe. Ela só gosta de lugares alternativos, nada que pareça modinha, e Deus te guarde de elogiar qualquer banda que ela ache ruim... Os últimos dois garotos que saíram com ela terminaram com a autoestima bem abalada.
engoliu em seco, assustado com meu comentário. Ótimo, era isso que eu queria.
- Não se preocupe, você vai se sair bem. – Apertei de leve o pulso dele, me levantando para atender a porta, que tinha acabado de ser batida.
deu um sorriso cúmplice a me ver, e eu disse sem emitir som que estava na sala. Ele assentiu e entrou.
- Puxa, ! – Exclamei em voz alta. – Que bom que já chegou!
- Ah, eu estava louco pra chegar logo, ! – O garoto respondeu.
Fomos juntos para a sala, e olhou para o amigo surpreso. Pude jurar que seu rosto até perdeu um pouco a cor.
- . – Ele disse.
- E aí, ? – se jogou no sofá, fingindo tão bem estar de bom humor que me impressionou.
- O que está fazendo aqui? – perguntou confuso.
- Ah, é que você ia sair, então decidi trazer meu jogo novo para jogar com a . Algum problema?
balançou a cabeça de leve, meio desconfiado.
- Não. Claro que não.
- Ótimo, porque eu estou louca pra jogar! – Me joguei na poltrona.
- Ran-ran. – Ouvimos alguém pigarrear.
Olhamos para trás para encontrar a bela Sofia, com o vestido preto exagerado e seu lindo cabelo ruivo de mechas coloridas cheio de cachos de babyliss. A filha da mãe estava mesmo linda.
- Ei, rapazes. – Ela disse.
- Oi, Sofia. – se colocou de pé.
ainda estava embasbacado, então tive que chutar de leve seu pé para que acordasse.
- Oh, desculpe. Oi. – Ele a cumprimentou.
- E então, vamos? – Ela chamou .
- Claro, vamos sim. – olhou para nós ao falar.
Nós os acompanhamos até à porta cheios de sorrisos.
- Até mais tarde, pessoal. – disse do lado de fora.
- Até mais! – Acenei. – Bom encontro!
- , não vá deixar o Jack descobrir. – Sofi pediu.
- Não se preocupe, já sei direitinho que desculpa vou dar. – Falei.
- Não se esqueça, você está falando com a melhor mentirosa da cidade! – acrescentou rindo. Dei uma cotovelada em sua barriga.
Os dois entraram no carro e saíram devagar pela rua. Na mesma hora, tirei a camisa branca, revelando minha camiseta bem mais sociável.
- Vamos, rápido! – Puxei pela mão. O carro deles ainda estava à vista no fim da rua. – Onde está seu carro?
- Bem ali! – me puxou em outra direção. – Vamos sair pela rua de trás e pegá-los lá na frente.
Corri com o garoto até a rua de trás – a de Jodi, mas longe da casa dela – e não acreditei no que vi.
- Você só pode estar brincando comigo! – Exclamei irritada.
Lá estava o veículo de , que era nada mais nada menos que o carro da polícia do pai dele, com sirenes em cima e tudo.
- Era isso ou minha bicicleta. – devolveu. – Não seria muito eficiente.
- Eu te disse pra ser discreto! – Protestei.
- Quer estar mais disfarçada do que com um carro de polícia? – Ele respondeu impaciente. – Se ficarmos com os vidros fechados, eles nunca vão saber que somos nós.
- Mas que droga... – Resmunguei abrindo a porta do carro. – Vamos logo! E cuidado com as sirenes!
- Não se preocupe, já roubei este carro antes. – O garoto piscou para mim.
Como se isso fosse fazer eu me sentir melhor.
POV
- Posso ligar o rádio? – Sofia perguntou, dentro do carro.
Estávamos já a alguma distância de casa, e até aquele momento não tínhamos falado muita coisa. Eu tinha planejado bem o que fazer naquela noite, mas aquele papo da mais cedo tinha me deixado um pouquinho nervoso.
Relaxa, , ela não é nenhum bicho de sete cabeças, tentei me tranquilizar.
- Pode sim. – Respondi, já com medo do que ela iria ouvir. Eu dificilmente conseguia não ser honesto sobre música. E se estivesse tocando uma música que eu gostava e ela detestasse? E se fosse o contrário?
Quando ouvi a letra de Air Guitar me preocupei seriamente. Conhecia uma pá de gente que odiava aquela música, mas eu não era uma delas. Sofia ficou séria por um segundo e eu gelei. Então ela começou a balançar a cabeça para cima e para baixo, sorrindo para mim.
- Gosto dessa música. – Ela disse.
- Sério?
- Hanram. Posso aumentar o volume?
- O quanto quiser. – Sorri.
A garota riu e aumentou o volume, aproximando o rosto da janela aberta. O vento jogava seu cabelo para trás enquanto ela balançava a cabeça. Não consegui resistir a fazer o mesmo.
Pelo visto, a noite ia ser muito mais divertida do que eu tinha previsto.
- Ah, que ótimo! – Ela riu e recostou a cabeça no banco de novo quando a música acabou. – Eu pensava que você era igualzinho ao tio Jack, que só ouve jazz vinte e quatro horas por dia. – Disse, e eu dei de ombros. – Não me leve a mal; sei o quanto vocês gostam disso e sei que é bom. É só que fazer uma viagem de carro com ele e a pode ser uma prova de fogo. Uma garota precisa de um pouco de rock às vezes.
- Eu ouço algumas outras coisas além de jazz. – Comentei. – Acho que, se um dia eu tiver minha própria banda, vou misturar um pouco as coisas.
- É bom saber disso, . Quando tiver sua banda, não se esqueça de me mandar um ingresso especial.
- Não mesmo. – Sorri. – Sua mãe e o Jack meio que cresceram juntos, né?
- Ah sim. São primos, mas são como irmãos. Assim como eu e a somos primas de terceiro grau, mas é como se fôssemos de primeiro.
- Bem legal. Não tenho primos por perto, e só vejo meu irmão de vez em quando.
- Bom, mas você tem a e o . – Ela se virou para olhar para mim. – Você deve passar bastante tempo com eles. Talvez mais ainda com a minha prima, não é?
- Muitas horas do meu dia. – Concordei, pensando naquilo. – Na verdade, eu já passava bastante tempo na casa do Jack antes de ela chegar, cuidando do Stevie e tal, mas parece que eu faço muito mais coisas lá agora. E também nos vemos na escola... É, ficamos juntos grande parte do dia.
- Imaginei isso, porque a sempre inclui seu nome em toda história que conta.
- Ah é? – Indaguei curioso.
- Sim, o tempo todo. – Sofia olhou distraidamente para fora. – Além disso, você sabe, vocês agem no mesmo ritmo às vezes. É fácil perceber que estão acostumados a fazerem as coisas juntos.
- Tipo mentir juntos. É, somos bons nisso agora. – Brinquei.
Sofia riu e balançou a cabeça, voltando a olhar para mim.
- Onde estamos indo?
Na verdade, eu tinha pensado em começar aquela noite indo a outro lugar, mas a conversa com ela e os comentários da tinham me feito ter uma ideia muito melhor.
- É uma surpresa – eu disse misterioso. – mas acho que você vai gostar.
POV PIE
- Parece que estamos dirigindo há séculos. – Resmunguei. – Para onde esses tontos estão indo?
- Tecnicamente falando, só eu estou dirigindo. – fez uma careta. – E eu não faço a menor ideia de pra onde eles estão indo.
Olhei pela janela, aflita, bem quando passamos por uma placa.
- Sério, ? – Falei, mesmo que ele não pudesse me ouvir. – Já estamos em Neptune Beach!
- Foi você quem quis que eles se vissem fora da cidade! – me incriminou. De repente, seus olhos se arregalaram. – Oh meu Deus! Eu já sei para onde eles estão indo! Maldito ! Isso é jogar sujo! – Exclamou parecendo ultrajado.
- Aonde? Pra onde? – Perguntei nervosa, já imaginando algum lugar super romântico.
- O Indians. – disse desgostoso. – É um festival de filmes Indie, acontece todo ano em Neptune Beach. Nos entregaram um panfleto outro dia. – Bufou. – Levando minha garota alternativa para um festival Indie. Muito esperto, .
- Você sabe onde vai ser esse troço? – Perguntei bem mais insatisfeita do que gostaria.
- Sei, sim.
- Então acelera.
Mas que ridículo.
Um festival de filmes? Eu era amiga dele há semanas e ele nem tinha me falado que aquele evento – um evento anual – existia!
estava me saindo mesmo um grandessíssimo cretino. E eu que sempre o tinha considerado um santo!
Estava começando a acreditar naquela história de que os homens eram todos iguais.
- Ali! – apontou tirando uma mão do volante. – É bem ali!
Diminuímos a velocidade ao tempo que o carro de estacionava, mas havia outros carros atrás de nós, e por isso tivemos que ultrapassar o único bom lugar para estacionar ali, e ficar ainda bem depois do carro deles.
- Ah, vão fazer bi-bi pra mãe de vocês! – gritou, ignorando o fato de que obviamente ninguém podia nos ouvir com os vidros fechados.
Acabamos estacionando a viatura perto de uma enorme caçamba de lixo, e fiz uma careta assim que descemos do carro.
- Lá estão eles. – Eu disse, me abaixando atrás do veículo. fez o mesmo.
- Vamos ter que chegar mais perto.
- É melhor esperarmos eles entrarem, não?
- Sim. – Ele concordou. – Ah, mas que merda! – Resmungou quando tocou de leve o ombro de Sofia. Bufei com um humor ainda pior que um minuto atrás.
- Já está de bom tamanho. – Decretei. – Vamos!
Atravessamos a rua tentando agir como dois adolescentes normais indo assistir a um filme. Com a exceção, é claro, de que eu não tinha a menor paciência com filmes Indie. Minha última tentativa tinha sido assistir 500 Dias com Ela. Fracasso total.
- Como vamos saber se eles já entraram na sala? – perguntou.
Olhei para os lados em busca de uma resposta. Realmente não podíamos entrar ali e dar de cara com os dois. Caminhei um pouco à volta e avistei uma janela. No entanto, ela era um pouco alta para nós dois.
- Já sei! – Apontei. – Vem aqui. Me deixa subir em você.
fez uma careta, mas se aproximou e abaixou. Tentando ser delicada – sem muito sucesso – subi em seus ombros.
- Você é meio pesada para uma líder de torcida, não acha? – Ele reclamou. Rolei os olhos.
- E você é meio fracote para um jogador, não?
- Touché.
Meus olhos finalmente alcançaram a janela. Lá dentro, pude ver, havia dois guichês com atendentes estranhos, e algumas pessoas circulando pelo hall. De repente, avistei um pedaço do cabelo colorido de Sofia – eu supunha – entrando no corredor das salas.
- Ali! – Exclamei eufórica.
- Onde?!
- Ali, eles estão entrando al...
então perdeu o equilíbrio, dando um passo vacilante para trás. Nós dois caímos no chão como sacos de batata.
Eu poderia ter quebrado alguma coisa, pensei.
- Posso ajudar vocês? – Uma voz surgiu acima de nós.
Olhamos em direção a ela e vimos um cara grande, com uma enorme barba, usando um chapéu coco verde claro. Ele parecia um hipster, mas eu nunca tinha conhecido um daquele tamanho.
- Não... – fez um esforço enorme para se sentar. – A gente até que tá... A gente tá legal.
Me sentei em um pulo.
- É. Ótimos. Foi só uma quedinha de nada. – Dei um sorriso falso.
- Não estavam tentando entrar de penetras, não é? – O homem nos encarou. – Porque, vocês sabem, eu sou o lanterninha daqui.
O medo de , para o meu azar, pareceu se diluir ao ouvir aquilo. Ele até tentou se segurar, mas de repente, estava rindo.
- Lanterninha? – Repetiu, e eu o fuzilei com o olhar. – Sério mesmo, cara? Desse tamanho?
O homem fez uma cara furiosa e eu rapidamente tratei de ficar de pé e agarrar pelo braço.
- Acho que foi isso mesmo que ele disse, . – Sorri. – Desculpe, não queríamos causar transtorno. Juro que adoramos pagar ingressos. Estamos indo fazer isso agora mesmo, se nos dá licença.
Ainda sob o olhar ameaçador do lanterninha, saímos correndo para dentro do prédio, entrando na fila do guichê.
- Qual é o seu problema? – Dei um soco no braço de .
- Ah, fala sério! Aposto que você também quis rir! – Ele disse seguro, e eu rolei os olhos.
- Vamos pra outra fila, acho que está andando mais rápido.
Eu e nos deslocamos para a outra fila – incrivelmente mais vazia que a primeira. Depois que as duas pessoas à nossa frente foram atendidas, chegou nossa vez. O atendente era um rapaz magricela com uma barba rala, usando camisa xadrez vermelha e óculos quadrados. Ele mal pareceu notar nossa presença.
- Ei! – Bati no vidro. – Boa noite!
Ele levantou os olhos da revista em quadrinhos que lia, parecendo ter sido pego de surpresa por clientes. Fala sério.
- Ah. – Ele nos observou por um instante, sem muita empolgação. – E aí?
- Oi! Por acaso sabe nos dizer uma garota ruiva passou por aqui alguns minutos atrás? Ela estava com um garoto de camisa azul.
- Ruiva, ruiva... – Ele coçou o queixo. – Muitas garotas ruivas vem nesse evento, você sabe. Era uma ruiva de verdade ou uma ruiva falsa?
- De verdade, senhor. – afirmou com devoção. – E era uma ruiva muito, muito gata.
- Ah, claro, acho que sei de quem está falando. – O rapaz estreitou os olhos, pensativo. – Mechas coloridas, né?
- Isso! É ela mesma! – Meu amigo confirmou.
- Nossa, ela era mesmo muito gata. – O cara sorriu assentindo com vontade.
- Tá, enfim... – Cortei o assunto. – Por acaso se lembra de para qual filme ela comprou ingresso?
O cara estreitou os olhos de novo, encarando o nada enquanto pensava a respeito do assunto. Depois olhou para mim como se tivesse acabado de se lembrar.
- Ah, lembro sim! – Garantiu. – Com certeza.
- E qual foi?
- Foi Poultrygeist: Noite das Galinhas Mortas.
- Você tem mesmo certeza disso? – Fiz uma careta. Não conseguia imaginar nem nem Sofia assistindo qualquer coisa com um título daqueles.
- Absoluta. – O rapaz assentiu. – Foi esse mesmo. E então, vão querer os ingressos?
Apesar da minha óbvia infelicidade para entrar na sessão, tirei o dinheiro do bolso e paguei as duas entradas (só custavam três dólares).
- Talvez não seja tão ruim. – tentou me animar. – Tem, tipo, zumbis.
- Galinhas zumbis. – Corrigi mal-humorada.
Mas pelo menos o filme não seria capaz de tirar minha atenção daqueles dois por um segundo que fosse.
POV
- Sabe, acho que foi uma jogada incrível me trazer aqui. – Sofia sorriu, comendo pipoca. – Adoro cinema. Adoro filmes.
- É, eu imaginei. – Concordei. – A também adora filmes. Toda sexta à tarde ela se joga no sofá com um balde de pipoca e assiste um. Mas esse não é bem o estilo dela. – Sorri, me lembrando.
- Ela é toda romântica, não é? – Sofia me encarou, um leve sorriso no rosto.
- É, ela gosta de comédias românticas. – Confirmei. – E tem uma habilidade toda especial para encontrar uma diferente cada semana. Não sei como ela consegue.
- Você acaba assistindo todas, eu suponho.
- Na verdade, sim. – Ri um pouquinho. – Às vezes finjo que estou só sentando no chão fazendo o dever de casa e digo que só vou lá por causa da pipoca, mas na verdade eu vou mais porque me divirto muito com os comentários e as caras que ela faz durante o filme. No fim, eu sei a história de todos.
Sofia deu um sorriso enigmático, assentindo. Ela apertou de leve minha mão.
- Não se preocupe, seu segredo está a salvo comigo.
Sorri de volta para ela, como se agradecesse.
- Ah, já vai começar! – Ela apontou para a tela quando as luzes se apagaram.
Não havia trailers, então, depois de uma música de fundo e dos créditos iniciais, o nome do filme apareceu em grandes letras vermelhas na tela.
Suburban Gothic.
POV PIE
- Dá licença, desculpe. – tentava passar em meio aos pés das pessoas para alcançar os dois lugares vazios na última fileira, de onde poderíamos ver o resto das pessoas.
- Oh, sinto muito! – Exclamei quando pisei no pé de um casal, separando-os de um beijo nojento.
Finalmente desabamos nas duas cadeiras do canto, sãos e salvos.
- Beleza, conseguimos. – disse baixinho.
As luzes já estavam apagadas, mas a sala era relativamente pequena, então dava para ver tudo.
E sabe quem eu não estava vendo ali?
- Eu acho que eles não estão aqui. – Cochichei para depois de alguns minutos.
- É, também não tô vendo eles. – O garoto concordou.
- Não devíamos sair dessa sessão então?
- Não agora. - Ele disse calmamente. – Eles podem só ter ido ao banheiro ou foram comprar um refrigerante. E se dermos de cara com eles no corredor? É melhor esperarmos um tempo.
- É, você tá certo.
E nós esperamos.
Esperamos por quarenta malditos minutos.
Àquela altura, Paco, um dos coadjuvantes, tinha acabado de ser empurrado em um triturador por um frango assassino, e Arbie, o protagonista, estava cantando a música mais bizarra de todos os tempos junto com um velho muito esquisito.
E eu não aguentava mais.
- , já chega, eles não vão vir! – Exclamei puta da vida.
- É, acho que não vão mesmo. – Ele concordou. – Não sei se estou realmente feliz por ter descoberto a existência desse filme. – Comentou encarando a tela com uma expressão de total confusão.
- Vamos logo!
Passamos mais uma vez entre os pés dos outros, pedindo "desculpas" e "com licenças" enquanto tentávamos nos livrar daquele filme terrível. Finalmente, cambaleamos para fora da sala.
- Ah, graças a Deus! – Exclamei aliviada.
- Eu sabia que aquele cara do guichê era estranho. – fez uma careta. – E agora, o que faremos?
- Podemos procurar eles em outras salas. – Falei, porque não tinha ninguém vigiando nada realmente. – Ou esperamos lá fora.
- Tudo bem, mas primeiro eu vou ao banheiro. – Ele avisou.
- Ok.
foi ao banheiro e eu aproveitei para fazer o mesmo. Na verdade, o que queria mesmo era me olhar no espelho.
Lá estava eu, com meu rabo de cavalo e uma cara de perseguidora maluca. E por quê? Por que não queria que minha melhor amiga ficasse com meu melhor amigo? Será que era muito egoísmo da minha parte?
- Talvez, quem sabe?
Lavei as mãos e saí lá de dentro. Estava me encaminhando para o outro corredor quando o vi.
Lá estava o !
Estava passando com um milk-shake de morango em direção às portas das salas. Me escondi rapidamente num canto para que ele não me visse. Depois de um segundo, corri para ver onde ele ia entrar. Era a sala 3. Definitivamente, não era a sessão de Noite das Galinhas Mortas.
- Maldito cara do guichê! – Exclamei.
No mesmo instante, saiu do banheiro masculino.
- Qual o problema?
- Descobri onde eles estão! – Expliquei agarrando sua mão e o puxando. – É a sala 3! Vamos pra lá!
apressou o passo comigo, mas assim que colocamos os pés dentro da sala 3, alguém segurou nossos ombros e nos puxou com uma delicada força – se é que isso existe – para trás.
- Eu poderia saber onde estão indo?
Lá estava o lanterninha gigante de novo, nos olhando desconfiado.
- Só estávamos... – Gaguejei. – Voltando para o nosso filme. – Forcei um sorriso.
- Ótimo. – O cara assentiu. – Posso ver os ingressos de vocês?
Fiz uma careta, querendo xingá-lo, mas tirei os ingressos do bolso e deixei que ele os visse.
- Muito bonito. – Ele meneou a cabeça. – Pensando que podem assistir dois filmes pelo preço de um.
- Moço, não é nada disso. O que acontece é que... – Tentei explicar.
- Nada de conversa, seus trapaceirozinhos.
Eu e nos remexíamos enquanto ele nos levava para o hall – onde o maldito cara do guichê desviou os olhos da revista para acenar para nós – e então para o lado de fora.
- Isso é agressão! – reclamou quando ele finalmente nos soltou do lado de fora.
- Tenham um pouco de vergonha! – O cara disse indignado. – São três benditos dólares. Até vocês estudantes têm dinheiro pra isso!
Depois ele entrou de novo, nos deixando ali no relento.
- Droga! – Exclamei zangada.
- Lanterninha dos infernos. – suspirou. – Agora vamos ter que esperar aqui fora.
- Vamos pra viatura.
E lá fomos eu e de volta para dentro do carro. Abrimos as janelas por um tempo, mas fomos obrigados a fechá-las por causa do cheiro que vinha da caçamba de lixo.
Fixei meus olhos nas portas do prédio e cruzei os braços, minha cabeça pensando contra minha vontade em e Sofia lá dentro.
- Deixa eu te fazer uma pergunta? – disse depois de um tempo.
- O quê? – Olhei para ele.
- Você tem certeza de que está aqui só porque tem medo de que o e a Sofia estraguem sua grande farsa?
- Por que outro motivo eu estaria? – Divaguei, voltando a encarar a porta.
- Não sei. – deu de ombros. – Talvez porque, lá no fundo, você talvez goste um pouco do . Você sabe, mais do que como o cara que cuida do seu cachorro e mais do que como seu amigo.
Fiquei calada por um instante, pensando no que responder. Eu sabia, é claro, que não era nada daquilo.
- É só pela farsa. – Voltei a dizer, mas tive a impressão de que minha voz não pareceu muito segura.
- Tudo bem. Acredito na sua palavra. – O outro garantiu. – Veja, lá estão eles!
e Sofia estavam saindo do prédio do festival às gargalhadas. Com certeza tinham assistido alguma coisa muito melhor do que a porcaria do nosso filme.
- Vamos dar um tempo para saírem e depois voltamos a segui-los. – Falei.
assentiu, e foi isso que nós fizemos.
POV
- Caramba, eu realmente adorei aquele filme! – Sofia ainda elogiava quando saímos do carro e começamos a caminhar em direção à sorveteria.
- Foi mesmo melhor do que eu esperava. – Concordei sorrindo.
- Adoro o Matthew Gray Gubler, sabe? Acho ele um ótimo ator.
- Só tinha visto ele naquela série dos assassinatos.
- Devia assistir mais coisas, ele é muito engraçado. – Ela aconselhou.
- Vou fazer isso, pode deixar.
Entramos pelas portas vermelhas da Royals. A Royals era uma sorveteria maravilhosa em formato de trailer, onde eram vendidos sorvetes especiais inspirados em grandes personalidades da música, como Michael Jackson e Elvis Presley. Eu já tinha ido ali umas duas vezes e sabia que ela ia gostar.
- Nossa, que lugar lindo! – Sofia exclamou.
- Boa noite, queridos. – Uma garçonete loura, parecendo uma versão mais velha da Marilyn Monroe, apareceu. – Vamos, vou leva-los a uma mesa.
Ela nos guiou até uma mesa de madeira com bancos de couro. Nos sentamos frente a frente e ela nos entregou cardápios, prometendo voltar em um minuto.
- Eu te aconselho a pedir o Elvis. Tem muita calda. – Comentei. – Mas o Nina Simone também é muito gostoso.
Sofia me olhou docemente e sorriu, balançando a cabeça.
- Puxa, . – Ela disse.
- O que foi?
- É só que... Nossa, esse é o melhor encontro que eu tenho em muito tempo. De verdade. Os garotos de hoje em dia são todos uns idiotas.
Me senti mal na hora.
Ali estava eu, fazendo de tudo para agradar uma garota, quando na verdade a única coisa que eu realmente queria era fazer ciúmes em outra. Não tinha muito a ver com meu comportamento normal e parecia bem errado.
Depois, me senti mal por . Eu não devia estar fazendo mil coisas para Sofia gostar de mim quando sabia que era ele quem realmente gostava dela. Mas ela era uma garota tão legal... Mesmo que apenas como um amigo em potencial, eu queria que ela se divertisse.
- Olha, nem todos os garotos são idiotas. – Falei, tentando remediar as coisas.
- É mesmo? – Ela arqueou uma sobrancelha.
- É sim! – Movi a cabeça em concordância. – O , por exemplo, não é.
Sofia deu um meio sorriso, desconfiada.
- Ah não? E o que ele faria se fosse ele tendo um encontro comigo? – Desafiou.
- Bom, pra começar, ele ia te contar um monte de piadas ruins no carro, mas você ia acabar rindo de pelo menos metade delas, porque ia perceber que ele só estava tentando ser legal, e porque ele é um cara realmente engraçado. – Supus, e Sofia inclinou a cabeça para o lado, analisando. – Depois, era bem provável que ele te levasse a algum fliperama; ele conhece uns bem maneiros. E então ele terminaria te levando pra comer pizza, ou hambúrguer, porque também não dá pra pedir que ele seja muito sofisticado. É o . – Dei de ombros, rindo um pouco.
Sofia riu também, assentindo.
- Parece bom pra mim. – Ela sorriu.
E então a garçonete voltou para pegar nossos pedidos, e o rumo da conversa foi de encontros para sabores de sorvete.
POV PIE
- Oh, não acredito que ele a trouxe aqui! – Exclamei quando vimos o carro de parando no estacionamento da Royals. – Esse joga mesmo muito baixo!
- Caramba, eu sempre quis vir aqui! – disse infeliz.
Uns dias atrás, e eu tínhamos saído com papai para buscar umas coisas e ele nos levara ali. Agora o babaca estava usando aquela descoberta deliciosa para conquistar garotas.
Uma vez que eles tinham entrado, eu e pegamos uma das mesas do lado de fora. Ela era escondida o suficiente para que eles não pudessem nos ver, mas se esticássemos um pouquinho as cabeças conseguiríamos ver os dois por uma janela de vidro fina que ia do chão ao teto.
- Olá, meus jovens. – Uma garçonete com um belo penteado Black Power apareceu. – Já sabem o que vão pedir? – Ela apontou para o cardápio sobre a mesa.
- Um Madonna pra mim, obrigada. – Lhe devolvi o cardápio sem nem olhar direito.
- Vou querer um Britney Spears. – informou. Olhei bem para a cara dele. – O que foi? Parece ótimo.
A garçonete riu e nos deixou sozinhos. Voltamos ao nosso trabalho como espiões.
- Olhe só praqueles dois. – Estreitei os olhos. – Parecem tão inocentes.
- Vá se saber do que eles estão falando. – fez o mesmo.
- Com certeza alguma coisa bem idiota. – Fiz uma cara de desdém.
- Talvez estejam falando mal de nós.
Abri a boca, chocada com a possibilidade. Mas, de fato, Sofia era a única outra pessoa que sabia que eu era uma mentirosa, então podia mesmo estar falando mal de mim!
Já fiquei irritada só de pensar. Que ridículos eram aqueles dois!
POV
- Fala sério. – Sofia ria, sem acreditar.
- Juro que ele fez isso mesmo. – Eu ri também. – Estava super distraído cantando mal daquele jeito e deixou a tampa em cima da bancada. Quando ele ligou o liquidificador voou vitamina de morango pra todo lado!
- E a ? – Ela perguntou enfiando outra colherada de seu sorvete na boca.
- A ficou toda suja, quase mais do que ele, e acho que xingou um pouco em português na hora, mas a gente não entende muita coisa quando ela faz isso. – Sorri. – Depois ela também não aguentou e começou a rir. Ela tem uma paciência danada com o Jack.
- Mamãe fala que foi difícil pra ela quando a tia Jaqueline e ele se separaram. Eu não lembro realmente, era muito pequena. Mas lembro de que fiquei algum tempo sem vê-la.
- Eu posso imaginar. Ela adora o Jack, sabe? Faz tudo por ele, inclusive manter a ordem naquela casa, o que não é mole. Mas ela faz tudo parecer tão fácil! – Meneei a cabeça, suspirando. – Tudo mudou depois que ela chegou aqui. É por isso que ele é louco por ela. – Baixei os olhos.
Depois de alguns instantes, senti o olhar de Sofia sobre mim. Quando a encarei, ela estava sorrindo.
- O que foi? – Perguntei.
- Nada. – A ruiva balançou a cabeça. – Não é nada. Já acabei meu sorvete.
- É, eu também. Vamos fechar a conta?
Sofia e eu nos levantamos e seguimos para o caixa. Ela ainda me olhava meio de lado e sorria. Pensando em quê, eu não sabia dizer.
POV PIE
- Caramba, esse Britney Spears é bom mesmo! – Exclamei pegando outra colherada do sorvete de .
- Eu sabia que tinha que ser! Tem calda de caramelo e flocos de arroz! – Ele disse convencido. – O Madonna também não é nada mal. – Ele pegou mais do meu sorvete.
Meus olhos por acaso foram parar na mesa de e Sofia. Com espanto, percebi que eles tinham sumido.
- Droga, eles já foram! – Exclamei largando a colher e ficando de pé.
- Merda! – fez o mesmo.
O garoto rapidamente tirou um dinheiro do bolso e colocou sobre a mesa, debaixo do cardápio.
- Fica por minha conta. – Ele disse fazendo sinal para que a garçonete se aproximasse. – O dinheiro está aqui! – Ele avisou antes que ela chegasse até nós. Depois, saímos correndo.
me puxou de volta para a viatura a toda velocidade e destravou o veículo, mas quando fui abrir a porta, ela não abriu.
- Ah, não. – Ele fez uma cara de pânico. – Dessa vez não, sua lata velha! Abra! Abra! – Ele começou a chutar a porta.
De repente, ouvimos as vozes de e Sofia se aproximando.
- Droga, , tenta a porta de trás! – Eu disse desesperada.
A porta de trás do carro abriu com um rangido, e nós dois mergulhamos para dentro do automóvel e nos apertamos para chegar ao banco da frente.
- Ótimo. – disse ofegante, jogando a cabeça para trás. – Estamos salvos.
Fechei os olhos e respirei fundo, mais calma.
Foi aí que ouvimos a voz de bem do lado de fora.
- Ei, é a viatura do pai do ! – Ele comentou.
arregalou os olhos para mim.
- Como você sabe? – Sofia ficou intrigada.
- Eu e fizemos essa marca na porta jogando basquete. – O rapaz contou. – Ei, senhor ! – Bateu no vidro.
Eu estava totalmente petrificada. Não podíamos passar pela humilhação de sermos pegos seguindo eles depois de termos agido como se tudo estivesse ótimo.
- O que vamos fazer? – Movi a boca sem emitir som algum, perguntando a .
O garoto parecia tão em pânico quanto eu, mas de repente, seus olhos ganharam aquele brilho maluco de costume.
girou a chave do carro, ligou as sirenes e saiu a toda.
- AH MEU DEUS, O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO? – Gritei.
- TIRANDO A GENTE DAQUI!
Pelo menos não havia como discutir aquilo.
dirigiu a toda velocidade de volta para casa, conseguindo que vários carros saíssem da nossa frente com o uso das incrivelmente potentes sirenes da viatura.
- SAIAM DA FRENTE, É A POLÍCIA! – Ele gritava de dentro do carro.
Constantemente eu olhava para trás para me certificar de que o carro de não estava logo atrás do nosso. Também estava morta de medo de que algum policial de verdade resolvesse nos parar, mas aparentemente o uso das sirenes fazia todos pensarem que estávamos em uma missão muito importante.
Não que estivessem errados.
Finalmente, chegamos ao meu bairro. foi reduzindo a velocidade cada vez mais enquanto entrávamos naquele lugar tranquilo e silencioso.
- Ufa, sobrevivemos. – Ele disse então.
Primeiro olhei séria para ele, ainda assustada. Depois, comecei a rir. Ria tanto que minha barriga doía, e fazia o mesmo. Talvez estivéssemos só rindo de nervoso.
- , você é completamente doido.
- Você teria feito a mesma coisa se estivesse no volante!
Descemos do carro na rua de Jodi, ainda rindo. Entramos no parquinho em frente à minha casa e, quando ouvimos o barulho de um carro, nos escondemos atrás de uma moita alta cheia de florezinhas azuis.
De fato, eram e Sofia. Era a última parada do encontro deles.
- Escuta, , talvez a gente tenha exagerado. – comentou então. Os dois tinham descido do carro e estavam parados em frente à minha casa, conversando casualmente.
- É o que parece, não é? – Concordei. – Acho que fomos dois bobos.
- É! Quer dizer, tirando a parte do cinema onde não conseguimos vigiá-los, eles não fizeram nada de mais. Até onde sabemos, só viram algum filme ruim e tomaram sorvete.
- Não muito diferente de nós. – Dei de ombros e ele também.
- Acho que eu devia ter confiado mais no . Ele sempre foi um bom amigo.
Percebi que estava certo. não faria uma canalhice daquelas, eu sabia o tempo todo. Sofia também não ficaria com ele, porque, mesmo que eu afirmasse que não, ela acreditava mesmo que nós tínhamos alguma coisa – mesmo que indefinida.
Então, era isso, minha farsa estava a salvo no fim. Era isso que realmente me tranquilizava.
Foi então, que, de repente, Sofi deu um passo à frente.
ficou parado, sem reagir.
E então ela o beijou.
E meu estômago se contorceu, e perdeu o ar ao meu lado, e estávamos certos o tempo todo, mesmo que quiséssemos estar errados.
Então do enjoo veio à raiva, uma raiva que me subiu à cabeça. Bufando, me preparei para ir até lá acabar com aquele show gratuito na porta da minha casa, mas uma mão me segurou.
- Não faça isso. – balançou a cabeça. Parecia estar com raiva, mas também sem reação. – Maldito . – Murmurou.
Respirando fundo, meu corpo todo tenso e meu coração disparado, fiquei ali com ele mais um instante.
Sofia se afastou de e disse mais alguma coisa. Depois se afastou em direção à porta.
acenou e entrou no carro, saindo com ele depois de um minuto. Sofia entrou em casa.
- Eu não acredito. – Arfei, ficando de pé.
- Nem eu. – concordou. Seu rosto estava vermelho.
Fechei os olhos e tentei raciocinar por um segundo.
- Eu preciso entrar agora, ou ela vai descobrir tudo. – Falei. – Você vai ficar bem?
- Não, mas não tem problema. – Ele disse sério. – Nos vemos amanhã.
Assenti e corri para o outro lado da rua, achando melhor entrar pelos fundos. No entanto, quando ouvi a voz de Sofia me procurando, achei melhor ficar no quintal. Comecei a pegar roupas secas do varal, esperando que ela aparecesse.
- Ah, , você está aí! – Ouvi a voz dela atrás de mim.
Tive que respirar muito fundo para não demonstrar nenhuma raiva. Minha vontade verdadeira era puxar seu cabelo comprido com força, como quando éramos pequenas.
Me virei para ela com um sorriso forçado.
- Sim, estou tirando as roupas do varal. – Eu disse casualmente. – A previsão do tempo avisou que vai chover essa madrugada.
- Puxa, é mesmo? O céu parece até limpo. – Ela observou. – De qualquer modo, só queria te avisar que já cheguei. Vou lá pra cima trocar de roupa e dormir. Estou exausta.
- Tudo bem. – Meneei a cabeça.
Depois que Sofia entrou de novo, me joguei no gramado, com as roupas e tudo.
A previsão do tempo não estava errada. A questão era que a única nuvem negra pairando nesse momento era aquela sobre a minha cabeça.
Depois do que acontecera com , eu tinha pensado que nunca mais sentiria tanta raiva na vida, mas pelo visto eu tinha me enganado.
POV
- Que pena que já está acabando. – Sofia disse dentro do carro quando entramos na rua de Jack.
- É, eu me diverti muito. – Concordei.
- Podemos nos divertir de novo quando eu voltar aqui. – Ela sugeriu. – Ou talvez vocês possam me visitar em Venice Beach!
- Seria bem legal. – Sorri.
Parei o carro em frente à casa dos Pie e Sofia desceu primeiro. Eu fiz o mesmo depois, me aproximando dela.
A verdade é que eu estava muito nervoso. Eu tinha feito toda aquela coisa de encontro, mas geralmente encontros terminavam com beijos e eu não me sentia confortável com a ideia, por mais incrível que Sofia fosse. estava ali em cima. A de quem eu gostava, apesar de ser problemática. E meu melhor amigo àquela hora estava em casa, me imaginando com a garota por quem ele estava louco.
- . – Sofia disse então, me tirando de seus pensamentos. – Eu preciso te falar uma coisa, mas não quero que você fique chateado.
Do que ela estava falando? O encontro tinha sido, na verdade, uma droga? Ela tinha namorado? Talvez qualquer uma das duas coisas fizesse eu me sentir melhor.
- Pode falar. Não vou ficar chateado. – Garanti.
- Ai, mas que droga... – Ela fechou os olhos e coçou a cabeça, depois me encarou. – É que esse encontro... Bom, não foi um encontro de verdade.
- O quê? – Franzi o cenho. – Como assim?
- Não me leve a mal, tá? – Ela tocou de leve meu ombro. – Você é um cara maravilhoso e esse essa noite foi realmente ótima, mas eu não poderia ficar com você mesmo que quisesse. E acho que você sabe o motivo. E acho que você pensa do mesmo jeito.
Engoli em seco, mas fiquei mais calmo, começando a entender para onde a conversa ia.
- Apesar de ter flertado um pouquinho com você desde que cheguei aqui, eu só te convidei para sair comigo hoje porque queria provocar a . – Sofi continuou. – E tenho um palpite muito forte de que você aceitou pelo menos motivo. – Sorriu um pouco.
- Como sabe disso? – Ergui uma sobrancelha.
- Porque é óbvio que você é louco por ela! – Ela riu. – Não é que eu não tenha percebido antes, mas também quis sair com você para ter certeza. E você gosta tanto dela! Vocês deveriam estar juntos há muito tempo, mas a é ridícula! – Sofia parecia frustrada. – Foi por isso que quis sair com você, porque, ... Ela gosta de você.
- O quê? – Prendi a respiração meio que involuntariamente.
- É, ela não diz com todas as letras. Pra ser honesta, ela nega até a morte. Mas acredite em mim. – A garota garantiu. – Eu a conheço desde sempre. Sei que ela gosta muito de você, e não só como amigo. Tudo estaria fluindo do jeito certo, se ela não estivesse tão metida com a vida do maldito . – Suspirou. – Mas minha prima te adora, , e você faz tão bem a ela... Foi por isso que te convidei para sair hoje. Eu queria forçá-la a admitir isso, mesmo que por ciúmes.
- Acho que deu errado então, não é? – Fiz uma careta.
- Não, não deu. – Ela deu um sorriso vitorioso. – E a prova disso é que ela e seu amigo estão nesse exato momento escondidos atrás daquela moita no parquinho.
Assustado, movi discretamente os olhos em direção ao parque escuro, mas tudo que vi foi a moita se mexer de um jeito nada normal.
- Eles nos seguiram a noite toda. Descobri quando fui ao banheiro no cinema. estava falando sozinha lá dentro. – Ela deu uma risadinha. – Também acho que eram eles na viatura do pai do seu amigo lá na sorveteria.
- Caramba, ... – Fechei os olhos, tonto com aquilo. Os dois eram mesmo malucos.
Mas, ei, tinha me seguido porque gostava de mim! Aquela ideia me fez sorrir.
- Agora, preste atenção. – Sofia disse. – Você vai passar por uma experiência que vários caras adorariam viver. É em nome desse plano. Precisamos nos certificar que a fique maluca de ciúmes. – Sorriu.
Eu assenti. Sofia deu um passo à frente, e então, me beijou. Levou alguns segundos para que ela se afastasse, e a boca dela ainda tinha o gosto de chocolate do sorvete – o que de modo algum era ruim.
- Pronto. – Ela disse quando se afastou. – Você beija bem, . – Sorriu.
- Você também. – Sorri. – E, Sofia?
- O que foi?
- O gosta de você. – Contei. – É por isso que ele está ali com a .
A menina arregalou os olhos e abriu a boca, surpresa por um instante, depois ela sorriu.
- Certo. – Ela disse. E pude jurar que ela ficou um pouquinho feliz por saber daquilo.
Sofia se aproximou da porta e eu entrei no carro.
Fui embora sorrindo feito um pateta pelo que ela tinha dito, tentando não pensar muito em como ia querer me matar no dia seguinte.
19 Parte 2 - Let’s Marvin Gaye and get it on
"It's so subtle, I'm in trouble. But I'd love to be in trouble with you…"
[…]
POV
Quando abri os olhos na manhã seguinte, ainda deitado em minha cama me perguntei se devia ou não ir buscar em casa. Ela devia estar muito brava naquele momento, o que eu não sabia se era bom ou ruim, mas de algum jeito eu até gostava. Sorri pensando nela escondida atrás da moita no dia anterior.
- Rainbow, você é mesmo muito maluca... – Balancei a cabeça descendo da cama.
Meu celular começou a tocar. Para minha surpresa, era ela mesma.
Esperei alguns segundos e então atendi, tentando soar o mais despreocupado possível.
- Bom dia, Rain. – Falei.
- . – Ela respondeu. Ficou calada por um minuto, depois voltou. – Eu só queria dizer que não precisa vir me buscar hoje. Eu vou com a Jodi de ônibus.
Até pensei em questionar, mas depois achei que seria melhor não dizer nada.
- Tudo bem. Nos vemos na aula. – Respondi. grunhiu alguma coisa incompreensível.
- Tchau. – Disse então.
Não dava pra acreditar. Ela estava mesmo uma fera. Me joguei na cama de novo, rindo à toa.
🌴💚🌴
Passei na casa de para lhe dar carona, mas a mãe dele disse que ele já tinha ido. Me preocupei porque aquilo com certeza queria dizer que ele estava muito chateado comigo – não dispensava uma boa carona sem motivo.
Mas, no fim das contas, tinha sido tudo em nome do plano. E era ótimo com planos. Só precisava me ouvir para entender o que estava acontecendo realmente.
Cheguei à Jacksonville Beach High com um sorriso no rosto.
- Bom dia, ! – Alguns rapazes do time de basquete me cumprimentaram ao passar por mim.
- E aí? – Acenei.
Depois parei para pensar que eu nunca tinha visto àqueles caras antes. As coisas estavam mesmo muito diferentes esse ano.
Avistei perto dos nossos armários. Ele estava sério, pegando um livro lá de dentro.
- Decidiu estudar de verdade hoje, ? – Brinquei.
- Decidiu ser comediante em vez de um péssimo músico? – Ele devolveu azedo. – Uma dica: ideia ruim. – Então ele saiu andando.
- ... – Rolei os olhos e o segui. – Olha, eu tenho que te falar sobre ontem...
- Não precisa falar nada, .
- Preciso, sim. – Insisti. – Você precisa me ouvir...
- Ouvir o que, ? – O garoto parou de andar, frustrado. – Que sente muito por que Sofia quis sair com você e não comigo? Que não é sua culpa ser mais bonito do que eu? Ou que foi ela que te convidou e as coisas simplesmente aconteceram?
- ... – Me assustei com a reação. Não estava esperando tanto.
- Ah, não, eu tenho uma ideia melhor! – Ele exclamou. – Por que não começa se desculpando por ter passado os últimos dois anos e meio fingindo que era a porcaria do meu melhor amigo e que se importava só um pouquinho pelo menos comigo? – Antes que eu respondesse, ele bateu na testa. – Ah, claro, me esqueci. É porque você não se arrepende disso.
- , você não entendeu nada... – Ainda me esforcei.
- Não, , quem não entendeu nada foi você. – balançou a cabeça. – Eu gostava de verdade dela. Agora vê se me deixa em paz.
saiu andando e eu fiquei ali, sem reação.
Droga, mas que droga! Ele não tinha nem ao menos me deixado explicar...
Não era minha intenção magoá-lo daquele jeito.
Eu devia ter explicado a ele o que realmente estava acontecendo no momento em que aceitei sair com Sofia. Por que não o tinha feito?
- ?
Olhei para trás e encontrei Summer, meio sem jeito.
- Ah, oi, Sum. – Eu disse.
- Oi. – Ela sorriu um pouco. – Desculpe, eu queria falar com você, mas se for um mau momento...
Olhei para trás, para se afastando. Summer também tinha visto o garoto marchando para longe, mas eu não sabia o quanto ela tinha ouvido da conversa.
- Não, está tudo bem. – Balancei a cabeça, suspirando. – Sobre o que queria falar?
Summer pareceu se animar um pouco ao se lembrar.
- Bem, é que eu tive uma ideia...
E ela passou os trinta minutos seguintes explicando a excelente ideia que tinha tido.
POV PIE
Quando acordei na manhã seguinte, minha cabeça estava doendo. Era o que sempre acontecia quando eu dormia mal, e, diga-se de passagem, aquela tinha sido uma péssima noite para mim. Rolei na cama sem parar, e toda vez que acidentalmente meus olhos encontravam Sofia, dormindo tranquilamente em um colchão no chão, sentia vontade de jogar um balde de água fria em cima dela. A raiva não era mesmo o melhor sonífero.
Claro que eu levantei da cama bem antes da Bela Adormecida, já que minha vida não era um mar de rosas sem aula. Desci as escadas e preparei um café forte horroroso, mas que por algum motivo me ajudou a ficar mais calma. Tentei ligar para Jodi para avisar que também ia de ônibus – afinal, não havia a menor possibilidade de eu entrar no carro com naquele dia – mas o telefone só dava caixa postal.
- Maldito sinal ruim! – Xinguei irritada.
Para completar meu mau humor, logo Sofia apareceu. Quase nunca acordava cedo, mas tinha que fazê-lo justo naquele dia, não tinha?
- Bom dia, priminha. – Ela disse com um enorme bocejo.
- Só se for pra você. – Resmunguei indo lavar meu prato na pia.
- Cruzes! Que bicho te mordeu? – Ela franziu o cenho, indo pegar uma xícara de café.
- Nenhum. – Respondi de má vontade.
Sofia deu de ombros, fazendo uma careta, e eu peguei o celular de novo. Dessa vez estava ligando para para avisar que não iria com ele. Logo que disquei começou a chamar.
Claro, porque para ligar para aquele imbecil o sinal funcionava.
O telefone tocou umas três vezes até que ele atendesse. Como se aquele tonto estivesse muito ocupado com alguma coisa!
- Bom dia, Rain. – Ele disse tranquilamente. Argh.
- . – Eu disse. Depois fiquei calada, porque falar com ele me deixou meio sem saber o que dizer. – Eu só queria dizer que não precisa vir me buscar hoje. Eu vou com a Jodi de ônibus.
Fiquei esperando que dissesse alguma coisa – qualquer coisa! Que perguntasse o motivo da minha mudança de planos, pelo menos, ou perguntasse estava tudo bem. Mas o filho da mãe simplesmente respondeu:
- Tudo bem. Nos vemos na aula.
Mas que desgraçado!
- Tchau. – Eu disse então.
Não dava pra acreditar. Ela não estava mesmo nem aí!
Minha cara de ultraje foi tão grande que nem consegui esconder. Comecei a rir de raiva descontroladamente enquanto arrumava a cozinha de forma frenética.
- Você não parece nada bem, sério. – Sofia comentou.
- Ah, então você acha que eu não pareço nada bem? – Parei de limpar e me virei para aquela cínica. – Por acaso eu teria algum motivo pra não parecer bem, Sofi? Hen? Hen?
- Bom... – Sofia ficou de pé também e me encarou, mas depois foi para a pia com sua xícara. – Não sei, talvez você tenha visto algo de que não gostou. Meu beijo com o , por exemplo. – Ela se virou para mim.
Não dava para acreditar que ela estivesse mesmo tocando naquele assunto comigo! Que cara de pau!
- Está falando do beijo que vocês deram bem na porta da minha casa? – Sorri irritada. – É, talvez eu tenha visto, assim como todas as outras pessoas dessa porcaria de cidade! – Berrei. – Que parte de não atrapalhar minha farsa vocês não entenderam?
- Ah, você exagera. – Sofia deu de ombros e foi para sala, me deixando falar sozinha.
Era o cúmulo! Saí andando atrás dela, toda a raiva da noite anterior voltando a me arrebatar.
- Eu exagero? – Continuei falando. – Chama de exagero porque não foi você que passou as últimas semanas se matando pra fazer essa droga de plano funcionar! – Minha cara devia estar mesmo muito feia, porque Sofia pareceu um pouquinho surpresa com minha reação. – Você chega aqui e faz tudo parecer muito fácil, como se eu só estivesse brincando de casinha com e você pudesse tirá-lo da maldita casa da Barbie e colocá-lo no conversível como fazia com o Ken dos meus brinquedos! Mas quer saber, Sofia? Você não pode! Porque isso aqui não é uma brincadeira. A saúde mental de várias pessoas depende da mentira que eu inventei, e você não pode brincar com algo assim.
Sofia ficou me olhando com os olhos estreitados e a boca aberta por alguns segundos. Depois, começou a rir. Fiquei tão puta que poderia bater nela. Então ela parou de rir e sorriu para mim.
- , você é a pessoa mais doida que eu conheço. Por acaso prestou atenção no quão maluco soa tudo que você acabou de dizer? – Ela balançou a cabeça, depois se jogou no sofá e pegou uma revista sobre a mesinha de centro. – Não preciso nem te dizer isso, mas não é um brinquedo seu. Ele já é bem grandinho e sabe o que faz. E sinto muito se arrisquei sua nobre farsa, mas eu o achei mesmo um cara muito interessante e sem dúvida não pretendo deixar de vê-lo. – Ela baixou a revista para me encarar. – A menos, é claro, que você tenha um motivo mais forte pra me impedir.
Fiquei olhando para Sofia, que esperava uma resposta. Lá estava de novo em seus olhos – aquele brilho de obsessão pela vitória. Ela ia mesmo adorar me ver admitindo que estava com ciúmes, mas eu não daria a ela aquele gostinho.
- Não seria capaz de pensar em nenhum outro motivo, Sofia. – Dei um sorriso irônico.
- Ótimo então. – Ela sorriu e voltou a ler. – E não se preocupe, nosso próximo encontro sem dúvida vai ser um lugar mais discreto. O quarto, talvez.
Meu rosto com certeza ficou vermelho de raiva, mas em vez de dizer qualquer outra coisa, preferi pegar minha mochila e ir embora. Já estava atrasada mesmo, de qualquer forma.
🌴💚🌴
Talvez eu fosse uma péssima solucionadora de problemas, afinal. Tinha saído com certa de que conseguiria impedir qualquer demonstração de romantismo de verdade entre e Sofi, e o resultado tinha sido aquela catástrofe.
Acho que, no fim das contas, não havia nada que eu realmente pudesse fazer. Nenhum deles tinha realmente compromisso com nada e era quase previsível que fossem se dar bem um com o outro, por mais que a ideia me perturbasse. Ainda assim, eu não conseguia parar de suspirar de desgosto a cada segundo da maldita aula.
Um papelzinho azul claro caiu sobre minha mesa então.
Está tudo bem?
Summer estava sentada à minha frente, mas eu quase tinha me esquecido de sua presença ali. Rabisquei o verso do papel:
O que mesmo você tem contra mensagens de celular?
Passei o papel pela fresta entre nossas cadeiras e a parede e ela o pegou nas pontas dos dedos. Suas unhas estavam pintadas da cor do bilhete. A ouvi rir baixinho e percebi quando destacou outro post-it azul para escrever outra coisa, que caiu sobre minha mesa também segundos depois.
Você pode ignorar mensagens, mas não pode fingir que não viu meu bilhete :D Tecnologia vs Praticidade.
Bem, ela tinha um ponto. Os bilhetes de Summer sempre me obrigavam a responder de imediato, o que nem sempre era bom. Mas a verdade era que eu gostava de conversar com ela. Só ia gostar mais se pudesse falar a verdade sempre.
Só estou super cansada. Visitas, você sabe.
Summer leu minha resposta e levou um instante pensando. Nesse meio tempo, até respondeu em voz alta a pergunta que o professor tinha feito. Claramente, sua capacidade de prestar atenção em várias coisas ao mesmo tempo era bem melhor que a minha, porque eu não fazia ideia de sobre o que aquela aula era.
E acha que estará bem pra ir hoje à noite? :S
Sua pergunta me pegou um pouco desprevenida. Eu nem me lembrava daquela história do pessoal ir ao Roger's naquela noite!
Esfreguei os olhos, cansada, e meditei por alguns segundos.
Meu celular vibrou sobre a mesa alertando que eu havia recebido uma mensagem. Com certeza não se tratava de Summer, eu sabia. Abri o ícone. Era Sofia.
Hey,
A maldita greve dos professores acabou! Mamãe disse que eu tenho que voltar para casa amanhã mesmo :@
Quase me senti culpada pelo sorriso que se espalhou pelo meu rosto. Aquele seria o último dia daquela novela sórdida na minha vida! Nada mais daquele clima estranho. Eu poderia ter minha paz de volta.
Rabisquei logo minha resposta para Summer:
Quer saber de uma coisa? Agora que você me lembrou, até me animei. Com toda certeza, eu estarei lá! ;)
🌴💚🌴
Coloquei uma bela calça jeans e uma blusa de botões e alças finas preta e branca. Ajeitei meu cabelo tentando fazer a franja lateral parecer cortada direito. Às vezes aquela franja realmente me irritava.
Pronto, eu estava bem bonita. Novamente, uma reflexão do meu estado emocional.
Minha tragédia grega estava acabando! Era o último dia dela!
A prova disso era que Sofia parecia estar com um humor tão ruim quanto eu dias antes.
- Queria saber por que eles voltaram. – Ela reclamava enquanto fazia os cachos no cabelo com babyliss. – O diretor é um ridículo, aposto que ele não vai atender exigência nenhuma!
- Vai ver eles se entenderam com ele. – Dei de ombros indo pegar o rímel.
- Algumas brigas nunca acabam, . – Sofi fez uma careta para mim pelo espelho.
- Um pensamento um tanto radical para uma futura estudante de Psicologia. – Observei. – Por falar em coisas que acabam ou não... Já falou para o que vai embora amanhã?
Sofia levou um tempinho para responder. Sorri, de costas para ela, e sabia instintivamente que ela tinha olhado para mim por cima do ombro.
- Eu troquei mensagens com ele sobre isso, sim. – Respondeu então. – Mas não acho que vai fazer muita diferença.
- Como assim? – Me virei para ela mais rápido do que deveria. Sofia sorriu.
- Você sabe. – Ela largou o babyliss e saiu andando pelo quarto. – Eu e o não vamos realmente terminar o que acabamos de começar só porque eu vou voltar para casa. São só algumas horas de distância, afinal.
- Bem, sem querer soar pessimista, Sofi, mas a distância é muito mais perigosa do que parece. – Fiz cara de pena. – Veja só minha situação com o .
- Ah, mas são situações muito diferentes. – Ela riu. – As coisas deram erradas porque é um filho da puta e a Summer era namorada dele de verdade. é um garoto honesto, e minha única rival aqui seria você. E você... Bem, não é realmente uma ameaça.
Com isso, ela sorriu e saiu do quarto. Ouvi os rangidos dos degraus da escada de madeira enquanto ela os pisoteava com suas botas vermelhas.
Eu não estava acreditando que ela tinha mesmo dito aquilo.
Brava, desci a escada marchando atrás dela, mas quando cheguei lá embaixo papai e Miguel estavam perto da miserável, terminando de pegar as coisas para irmos.
- Ah, aí está meu raio de sol! – Papai apontou para mim, orgulhoso. – Roger está muito feliz que tenha convidado o pessoal do colégio para lá esta noite, . E eu também.
- Vai ser divertido. – Segurei as mãos de papai e sorri. – Eles acham que você é famoso.
Ele olhou para Miguel – que fez uma cara engraçada – e deu de ombros, convencido.
- Bem, eu sou mesmo, não é? Já contei pra vocês de quando jantei com o Stevie Wonder?
Papai saiu andando para fora e Sofia o seguiu, rindo. Papai sempre tinha alguma história sobre um encontro dele com alguém famoso.
- Stevie, você fica! – Miguel ordenou ao dálmata, que tinha vindo correndo à menção de seu nome.
Stevie obedeceu de imediato, correndo de volta lá para o quintal dos fundos. Ele respeitava Miguel como nunca tinha me respeitado, o que era vergonhoso para mim como dona dele.
- Está mesmo tão animada assim? – Miguel colocou as mãos na cintura e me encarou então. Ele sempre era tão desconfiado, e sua desconfiança sempre era tão sensata!
- Estou, é claro. – Menti.
- Aquele garoto vai estar lá, não é? – Ele questionou. Assenti, mas só depois de alguns segundos percebi do que ele estava falando.
MALDIÇÃO! A MENTIRA!
A droga da mentira sobre ser o garoto com quem eu fiquei em Venice Beach. Meu Deus. Miguel ia triturar o pobre !
- Bom. – Miguel continuou, ameaçador. – Se esse garoto tentar aprontar alguma esta noite, não deixe de me avisar. Vou dar um jeito nele.
Engoli em seco. estava certo. Miguel podia ser mesmo assustador.
- Tá bom. – Assenti, forçando um sorriso. – Vamos?
Miguel – um tanto quanto mal-humorado – concordou e nos juntamos aos outros no carro.
Por Deus, eu tinha mesmo um talento para arrumar confusão.
🌴💚🌴
- Ca-ramba. – Falei pausadamente quando entramos no Roger's. Eu nunca tinha visto o lugar tão cheio, e não estava falando só do pessoal do futebol e da torcida.
Havia tantos adolescentes ali dentro que parecia uma versão reduzida da Jacksonville Beach High. Ainda havia espaço para se mexer, mas francamente, dava a impressão de que a lanchonete tinha sido alugada para algum evento escolar.
- Querida, não sabia que você tinha tantos amigos assim. – Papai disse surpreso.
- Não tenho. – Garanti.
Olhei em volta, procurando por pessoas que realmente conhecia. Depois de um tempo, encontrei uma mesa no canto, onde estavam Summer e os outros.
- Lá estão eles! – Apontei. – Venham!
Os três me seguiram para a mesa. Lá estava Summer, , Brad, Jodi, Emma, , Teddy, Sienna, Amber, e por fim Jasmine, abraçada a um garoto que eu não conhecia.
- Oi, todo mundo! – Cumprimentei sorridente.
- . – Summer ficou de pé e me abraçou. – Oi, Jack. Miguel.
- Summer. – Papai sorriu para ela. Miguel fez o mesmo.
- Pessoal, minha prima Sofia e meu pai, Jack Pie. – Apresentei. – E este é o Miguel. É um amigo muito importante da família.
Houve um longo momento de atrapalhados apertos de mão e empurrões. Todo mundo queria poder dizer depois que conhecia papai. Quando se colocou de pé – com dificuldade por causa da bota ortopédica – e os cumprimentou, Miguel se demorou segurando a mão do garoto.
- Então você é o . – Ele disse sério.
Arregalei os olhos, pensando que aquilo seria um problema logo, logo. parecia assustado.
- Oi, pessoal.
Para meu alívio, tinha acabado de chegar, o que finalizou a sessão de vingança de Miguel.
se sentou abrindo e fechando a mão que fora apertada, enquanto os outros cumprimentavam .
- Aí está nosso próximo vencedor do American Idol! – Brad sorriu.
- Como vai, Winter? – riu.
- Sabe como é, sempre fico bem quando estou com a Jo. – Brad cutucou Jodi, que se derreteu toda. Emma rolou os olhos.
- E então, , o que tem preparado para hoje? – Ela quis saber.
- Ah, juro que é algo muito interessante. – olhou de forma suspeita para Summer, e fiquei desconfiada. – Mas tenho que ir lá pra cima agora. Vou ter que tocar com os caras por algumas músicas antes de me deixarem cantar.
- Nos vemos depois, ! – Jodi acenou.
deu um sorriso para Sofia e outro para mim, e então se afastou de nós. O pessoal chegou para o lado para que nos sentássemos.
- Mas esse seu namorado é mesmo um pedaço de mau caminho, . – Teddy comentou. – Tem certeza de que ele não é gay?
- Teddy... – Sienna balançou a cabeça.
- Infelizmente pra você, eu tenho sim, Teddy. – Sorri. – Agora, caramba, quantas pessoas vocês chamaram pra cá essa noite? – Olhei em volta.
- Não é que chamamos, querida. – Amber comentou como se eu fosse muito tola. – Somos populares. Nossos encontros particulares vão de boca em boca rapidamente. Os outros só nos seguiram.
- Percebo como seguiram. – Ergui as sobrancelhas.
- E então, Sofi, como está sua estadia? – perguntou. – E como estão as coisas em Venice? Está cuidando da minha casa?
- Ah, você sabe, . – Sofia o encarou. – Depois da terceira vez que uma casa é assaltada, não resta muita coisa para roubar. Os ladrões já nem vão mais até lá. – Ela brincou. Seus olhos se desviaram para o lado então. – Oi, .
encarou Sofia com uma expressão indecifrável para mim. Talvez ele estivesse com um pé atrás com ela porque desconfiava de que ela o odiasse pelo que fizera.
- Oi, Sofia.
O silêncio se tornou tão pesado enquanto os dois se encaravam como velhos inimigos, que achei melhor falar.
- E então... – Pensei na primeira coisa que me veio à cabeça. – Jasmine, eu ainda não conhecia seu namorado.
- Eu preferia que continuasse sem conhecê-lo. – Ela fez uma careta.
- Amor, não seja grossa. – O rapaz loiro de olhos castanhos disse docemente para ela. – Desculpe, eu sou Charlie. – Se apresentou. – Acontece que não estudo na escola de vocês.
- É um prazer, Charlie. – Sorri. Ele parecia educado demais para estar com Jas, mas talvez fosse uma fachada. – Sou . Onde você estuda?
- Na verdade, já terminei o ensino médio. Estudo na Universidade da Flórida. – Respondeu. Isso explicava porque era tão civilizado.
- Que interessante! – Assenti sorrindo. Pobre Charlie. Ia torcer para que ele arrumasse uma namorada melhor.
- Vejam, lá está o meu lindinho! – Amber exclamou de repente.
Olhei para porta e vi entrando na lanchonete. Estava até bonito o meu pobre amigo, usando uma camisa preta sem estampa e calça jeans.
- Vou falar com ele! – A loira avisou, e saiu desabalada atrás de .
- Bom, eu vou dar uma volta. – Sofia informou.
- Já volto aqui. – Também me levantei.
Onde aquela engraçadinha estaria indo?
Enquanto a seguia, no entanto, alguém agarrou meu pulso. Olhei para trás e encontrei me encarando com seus intensos olhos .
Ele estava bem bonito, para falar a verdade.
- Onde pensa que vai, Vicentini?
- Ver se a Sofia precisa de ajuda. – Respondi sorrindo um pouco.
- Sua prima sabe se virar bem melhor do que você pensa. – Ele ergueu as sobrancelhas.
- Mesmo assim. – Dei de ombros.
- Só não suma de uma vez.
- Não, não vou. – Sorri mesmo depois de perceber Jasmine observando à distância.
Me soltei da mão de e fui atrás de Sofia.
A encontrei no bar, conversando com Miguel.
- Sabe que não pode enganar este barman com uma identidade falsa, não é? – Alfinetei.
- Ah, eu jamais tentaria enganar o Miguel, . – Ela se virou e sorriu, erguendo um refrigerante para que eu visse. – Não sou eu a melhor mentirosa da cidade, lembra?
Fuzilei-a com os olhos. Miguel balançou a cabeça, acenando para alguém em uma mesa.
- Não deveria estar tocando? – Perguntei a ele.
- É, mas o novo garçom faltou. Vou cobrir umas mesas e toco mais tarde. – Miguel explicou, já se afastando para atender os clientes.
Fiquei olhando para Sofia com um sorriso cínico. Ela olhava para mim do mesmo modo.
- O está bonito, não acha? – Ela indagou. – Mas sabe quem eu descobri que é muito mais bonito do que ele?
- Não diga. Acho que tenho poderes mediúnicos, porque já sei o que vai falar.
Sofi riu. Um riso de verdade.
- E lá vem ele. – Ela disse.
Olhei para trás e vi se aproximando de nós.
- Esse lugar está quente como o inferno hoje, não acham? – Ele perguntou entrando no bar e pegando uma lata no freezer.
- É só o efeito da minha presença. – Sofi deu de ombros e ele riu.
Argh! ARGH!
- E então, o que vai tocar hoje à noite, ? – Me forcei a sorrir.
- Repertório surpresa. – Ele me lançou um olhar enigmático.
- Ah, claro. Nos últimos dias você vem mesmo sendo muito surpreendente pra mim. – Falei sem conseguir esconder muito bem minha raiva.
- De um jeito positivo, eu espero. – Ele piscou.
Mas que maldição! Ele estava igualzinho àquela semana quando nos conhecemos, todo cheio de charme e piadinhas. Estava me tirando do sério.
- Estava falando com a mais cedo sobre a minha triste partida, . – Sofia comentou quando ele recostou no balcão ao lado dela.
- Ah é?
- É sim. – Minha prima concordou. – Ela estava preocupada que não fossemos mais nos ver.
- Ah, com certeza isso não vai acontecer. – Ele riu e Sofia o abraçou carinhosamente.
- É verdade. Somos, tipo, as almas gêmeas do rock.
Toda aquela melação estava de dar ânsia de vômito, mas não durou muito tempo. De repente, arregalou os olhos, se afastando do balcão.
- Merda. – Ele murmurou. Os olhos de Sofia também se arregalaram.
Olhei para trás e encontrei , parado a alguns metros. Ele tinha a boca levemente aberta, mas logo a fechou numa linha reta. Irritado, ele saiu andando pela multidão.
Saí correndo atrás dele, preocupada de verdade com meu amigo. Aqueles dois eram patéticos, mas era ainda pior. Até eu conseguia ter mais consideração por , mesmo o conhecendo há muito menos tempo.
- ! – Chamei quando o encontrei em um canto, isolado.
- Ele me ligou o maldito dia inteiro. – falou quando me aproximei. – Eu não atendi nem respondi nenhuma vez, mas depois pensei bem e achei que talvez devesse vir aqui e deixar que ele se explicasse.
- Que droga, . – Suspirei.
- Se você soubesse como eu estou com raiva do agora. – Ele confessou. – Eu poderia arrebentar a cara dele.
- E por que não faz isso, ? – Perguntei. merecia mesmo.
- Porque isso estragaria as coisas para você também. – Ele deu de ombros.
Então era culpa minha que não pudesse levar uma surra por ser um péssimo amigo. Me senti terrível.
- Sinto tanto. – Recostei na parede ao seu lado. – Mas não fique triste. Você ia mesmo machucar sua mão de jogar vídeo game batendo nele.
riu um pouquinho, assentindo.
- Você é legal, . – Disse honestamente.
- Você também é. – Sorri um pouco. – Por isso sei que vai conhecer outra garota alternativa maravilhosa um dia.
Levou um minuto de silêncio, mas então se afastou da parede.
- Quer saber? – Ele disse. – Não vou esperar tanto tempo assim.
- Não? – Fiquei confusa.
- Não. – Ele confirmou decidido. – EI, AMBER! – Gritou.
A loira – que estava no meio da multidão fazendo sabe-se lá o que – olhou para nós. Ao perceber que era seu querido chamando, ela veio a toda velocidade para perto de nós.
- Me chamou, amorzinho? – Perguntou preocupada. nunca a procurava por livre e espontânea vontade, afinal.
- Chamei sim. – Ele assentiu com firmeza. – Amber, quer ir ao baile comigo?
Primeiro ela pareceu chocada. Sua boca se abriu e ela arregalou aqueles belos olhos azuis. Depois ela começou a sorrir. Parecia que tinha ganhado na loteria.
- Mas é claro que quero, gatinho! – Ela o agarrou, começando a beijá-lo ali mesmo.
ficou levemente assustado a princípio, mas depois passou os braços em volta da cintura de Amber. Quando saí dali, ainda parecia que ela estava tentando engoli-lo. Eu sabia que ele ia se arrepender amargamente daquilo quando percebesse o que tinha feito, mas o garoto precisava mesmo tirar Sofia da cabeça naquele momento.
- Onde ele está? – perguntou preocupado quando voltei.
- Como se você se importasse com isso. – Respondi, irritada só de olhar para a cara dele.
se preparou para responder, mas Sofia tocou seu ombro e balançou a cabeça. No mesmo instante, papai fez sinal para ele do palco. Ele tinha que voltar ao trabalho.
- Não foi tia Jaque que te ensinou a ser tão mal-educada, eu tenho certeza. – Sofia disse para mim quando ele se afastou.
- Ah, não. Isso eu aprendi com o lado da família do meu pai. – Sorri sugestivamente. Sofia bufou.
- Onde está o ? – Ela quis saber.
- Isso também não é da sua conta! – Exclamei incrédula. – Ou está pensando em me roubar o amigo que ainda não conseguiu?
- Está sendo ridícula. – Sofia me encarou severamente.
- Talvez, mas não ligo. – Dei um longo e cansado suspiro, me sentando no banquinho alto do bar e deitando a cabeça no balcão. – E, se quer saber, está em algum lugar se agarrando com a namorada. Alguém tinha que se divertir hoje, além de você e . Agora me deixa em paz.
Sofia abriu a boca, mas depois balançou a cabeça. Ela foi de volta para a mesa e eu fiquei ali.
Mas que grande noite estava sendo aquela. Naquela manhã, achava que tudo estava bem e resolvido, e agora ali estava eu, me sentindo um trapo.
- Noite difícil, senhorita?
Olhei para cima e encontrei Miguel, já atrás do balcão. Nem sabia como ele tinha chegado ali.
- Se eu disser que sim, vai me deixar beber? – Perguntei.
- Óbvio que não. – Ele sorriu. – Mas posso preparar alguma coisa enquanto você me conta por que está com essa cara.
Dei um sorrisinho, mais ou menos como eu fazia quando era criança e Miguel tentava me animar.
- E então? – Ele me incentivou a falar, já pegando os líquidos para misturar.
- Minha noite está uma droga. Os últimos dias também não foram bons.
- E por quê?
- Porque... – Pensei em mentir, mas estava cansada demais. – Porque talvez eu esteja me sentindo um pouquinho incomodada com a forma como a Sofia e o estão se dando tão bem.
- Está com ciúmes então. – Miguel concluiu, colocando uma bebida vermelha no copo.
- Eu não gosto muito dessa palavra, mas talvez seja. – Admiti. – Um pouquinho só.
- Olha, , sei o que é sentir ciúmes. Acredite, eu sei. A Ângela é uma mulher maravilhosa e eu tive que deixa-la no Brasil pra vir pra cá, e eu quase fiquei maluco no começo pensando em todos aqueles caras atrás dela. – Miguel se lembrou, e eu sorri. – Mas tem que confiar no seu namorado, ou então não faz sentido estar com ele. E se quer meu conselho, acho que está sendo muito boba. – Opinou. – Sofia jamais aprontaria uma dessas com você, e é um bom rapaz.
Ah, Miguel! Como eu gostaria de poder dizer toda a verdade e explicar que não podia fazer nada, e que na verdade e Sofia não estariam fazendo nada de errado ficando juntos e a maluca era eu! Ele poderia me aconselhar tão bem, se soubesse de tudo.
Mas acho que esse era o meu medo. Que ele me fizesse perceber como estava errada sobre tudo que andava fazendo e de repente eu mudasse de ideia sobre meus planos. Era por isso, no fundo, que eu não contava toda a verdade a Miguel.
- Sua bebida. – Ele empurrou o copo em minha direção, com guarda-chuvinha e tudo.
- Obrigada. – Sorri.
- Pense no que eu disse, ok? Agora vamos, vou atender o pessoal da sua mesa.
Segurando minha bebida – que estava deliciosa – segui Miguel para a mesa dos meus amigos.
estava sentado lá, com Amber pendurada em seu pescoço. Sofia não estava ali. Todos os outros ficaram felizes por me ver de novo, mas reparei a falta de alguém.
- Onde está a Summer? – Perguntei.
- Foi ao banheiro e nunca mais voltou. – Teddy respondeu comendo uma batata de seu prato.
- Vim ver se estão precisando de alguma coisa. – Miguel informou.
- Eu quero outro hambúrguer, o número 20 do cardápio! – Brad falou desesperado, e Jodi o acalmou. Por um segundo, tive um vislumbre do garoto gordinho que ele um dia fora.
- Meu pedido já está encaminhado. – Emma sorriu. – Talvez depois eu queira alguma outra coisa, se eu ainda tiver dinheiro.
- Sabe, eu posso pagar outra coisa pra você. – jogou um braço sobre os ombros dela.
Emma fez uma careta de pura repulsa e tirou o braço dele.
- Eu prefiro pedir esmola, .
Miguel anotou o pedido de Brad.
- Vai chegar bem rápido. – Avisou. – E você, garoto – apontou para – é melhor deixar a menina em paz. Conheço bem seu tipo.
arregalou os olhos, apavorado, mas Emma pareceu bem satisfeita. Eu teria rido, se não fosse totalmente culpa minha. Miguel apertou de leve meu ombro e foi embora.
- Ei, acho que seu namorado vai cantar, ! – Charlie apontou.
- Namorado. – Jasmine repetiu com deboche.
Olhei para o palco. estava perto do microfone, afinando o contrabaixo. Os outros se levantaram e foram para perto do palco – o máximo possível, considerando os outros alunos da Jacksonville High no caminho. Dei mais um gole em minha bebida e os acompanhei.
De onde estávamos, avistei Sofia. Ela estava sentada no canto do palco, assistindo com um sorriso. Respirei fundo e desviei os olhos dela.
- Boa noite, pessoal. – disse no microfone, recebendo um agradável coro em resposta. – Sei que muitos dos que estão aqui esta noite estudam na Jacksonville Beach High School, assim como eu. Para quem não me conhece, eu sou .
- Lindo! – Teddy gritou. Olhamos para ele. – O que foi? Winter estava certo, ele parece mesmo um excelente candidato ao American Idol!
- Manda a ver, ! – Brad gritou, feliz por ter sua ideia apoiada.
riu e agradeceu, depois voltou a falar:
- Tenho uma surpresa muito especial para vocês hoje, e espero que gostem.
A música começou ao fundo, e percebi que Miguel tinha subido ao palco e estava sentado ao piano agora.
olhou bem na minha direção, mas depois desviou o olhar, começando a cantar:
[N/A: Acho que a maioria de vocês já conhece essa música, mas pra quem não conhece e quer ouvir, é só clicar]
Let’s Marvin Gaye and get it on
You got the healing that I want
Just like they say it in the song
Until the dawn, let’s Marvin Gaye and get it on
Então ele sorriu, e eu acabei sorrindo também. Ouvi-lo cantar sempre fazia isso comigo. era um cantor maravilhoso, e todo mundo parecia encantado, dançando com a música.
We got this king size to ourselves
Don't have to share with no one else
Don't keep your secrets to yourself
It's karma sutra show and tell
Woah, there's loving in your eyes
That pulls me closer
It's so subtle, I'm in trouble
But I'd love to be in trouble with you
E foi aí que, para a surpresa de todos, uma segunda voz entrou na música. Não era Miguel, nem nenhum dos outros membros da banda. Era uma voz de garota.
Quando Summer apareceu ao lado do piano, todo mundo quase caiu para trás. Talvez eu mais do que os outros.
- Não acredito! – Teddy estava estupefato.
- Eu nem sabia que ela cantava! – Charlie comentou impressionado.
- E não cantava! A cantora sempre fui eu! – Jasmine disse enciumada.
- Ela sempre soube cantar. – disse.
- Ela é tão talentosa! – Jodi exclamou encantada.
Summer continuava no palco, desenvolta como só ela.
You got to give it up to me
I'm screaming mercy, mercy please
O quanto será que eles ensaiaram para isso?, me perguntei. E por que eu não sabia de nada, se era tão amiga de Summer?
Claro, já se via aí os efeitos da volta triunfal da amizade deles. Todo aquele papo de que eu era a santa por trás daquele milagre era uma piada. Agora eles iam começar a fazer projetinhos me excluindo.
Summer continuava cantando, pertinho de :
And when you leave me all alone
I'm like a stray without a home
I'm like a dog without a bone
I just want you for my own
I got to have you, babe
devia se achar mesmo uma graça, se exibindo por aí de todo jeito possível com cada garota que encontrava – coincidentemente, sempre as mais bonitas –, e todos pareciam estar maravilhados com aquela apresentação. Honestamente, eu não via nada demais. Já tinha visto cantando um zilhão de vezes. Por que pareceria melhor só por que ele estava com Summer Olsen?
Olhei para minha prima de novo. Ela assistia ao show tão empolgada quanto os outros. Mas de repente, seus olhos se desviaram do casal no palco para mim. Sofia me encarou com tamanha intensidade, e parecia tão despreocupada e segura ao mesmo tempo, que me dei conta então do que eu devia parecer para ela naquele momento, de cara amarrada, desdenhando mentalmente daqueles dois.
E foi então que percebi, com uma onda de desassossego surgindo por dentro, que Sofia estava certa.
Eu estava com ciúmes de .
Estava morrendo de ciúmes de .
- Não, , você só pode estar ficando doida. – Eu disse a mim mesma, feliz por ninguém me ouvir com a música alta. Quando olhei para Sofia de novo, ela já tinha voltado sua atenção para o show.
Olhei para cima de novo, mas não conseguia mais encarar por mais de um segundo. Me sentia ridícula e boba, sem contar que decididamente desequilibrada. Eu não podia estar sentindo ciúmes de , por Deus!
Mas a coisa era tão séria que, mesmo depois de perceber quão louca eu era, eu ainda não conseguia me livrar daquele sentimento. Parecia que vê-lo lá em cima com Summer era ainda mais irritante do que vê-lo com Rosana Wayans.
- Não, não! – Exclamei, falando sozinha como a maluca que eu era. – Isso não pode estar acontecendo!
Fora de mim, saí a toda daquele lugar. Passei pela porta perto da cozinha correndo, e fui sair nos fundos da lanchonete.
O ar incomunmente frio me atingiu em cheio, contrariando totalmente a temperatura morna e gostosa que pairava até o momento que chegáramos ali. Pelo visto, uma chuva estava a caminho de Jacksonville Beach.
- O que está acontecendo comigo?! – Enfiei as mãos em meu cabelo; nervosa.
Céus, a vida amorosa de não era da minha conta! Por que eu estava daquele jeito?
Além disso, quem tinha falado em vida amorosa?! Ele não tinha nada com Summer, eles eram amigos!
Amigos como eu e ele, por sinal.
Só podia ser a farsa. A farsa estava me enlouquecendo, me fazendo confundir as coisas. Era a consequência de mentir tanto.
Recostei na parede de tijolos vermelhos do Roger's e respirei fundo, fechando os olhos. Eu precisava voltar a mim.
Ouvi a porta de metal por onde eu tinha passado instantes atrás ranger. Abri os olhos e vi sair por ali. Ele olhava para os lados em busca de alguma coisa que, fui descobrir logo em seguida, era eu.
- . – Ele disse se aproximando. – Que foi que houve? Por que saiu de lá daquele jeito?
- Eu... – Engoli em seco. Era o que me faltava, agora todos iam achar que tinha algo errado comigo. – Só me senti um pouco mal. Precisava tomar um ar.
- Está se sentindo melhor? – perguntou de forma atenciosa, pousando a mão em minha bochecha para ver seu estava gelada ou algo parecido. – Quer ir lá dentro de sentar?
- Já estou bem, sim. Foi só um mal-estar passageiro. – Sorri um pouco. Tinha que admitir que, mesmo naquela ocasião, eu gostava de vê-lo se preocupando comigo.
- Você me deu um susto. – O rapaz falou, a mão ainda em meu rosto.
- É bom saber que você se importa. – Acabei deixando escapar.
- Isso te surpreende? – me encarou com seus olhos . Parecia surpreso. – É mesmo tão difícil assim de acreditar que você é importante pra mim, ?
A voz de era tão sincera que difícil mesmo era duvidar dele, embora eu já tivesse experiência no assunto. Ele aproximou mais seu rosto, de forma tão delicada e sutil que não me afastei. Quando dei por mim, estávamos nos beijando.
As mãos de logo foram parar em minha cintura, e eu aspirei o perfume conhecido, deixando que uma suave languidez tomasse conta de mim.
Talvez fosse bem o que eu precisava naquele momento, para tirar aquela maluquice toda da cabeça.
Foi então que a porta se abriu de novo. Por um segundo, pensei que seria Jodi ou Emma ou mesmo Jasmine, e então tudo iria pelo ralo.
Mas quando me afastei de para olhar sobre seu ombro, era ninguém mais ninguém menos que Sofia.
Minha prima tinha a boca entreaberta, os olhos nos encarando com total espanto. virou-se para trás para vê-la, e pareceu também muito assustado por um instante. Depois sua expressão se suavizou, embora ele ainda estivesse sem jeito.
- Sofia... – Comecei, perdida.
- Vocês dois são inacreditáveis. – Ela disse pausadamente. – Pior do que isso, são ridículos!
- Olha, Sofia... – deu um passo na direção dela. Minha prima ergueu as mãos, como se tivesse nojo de tocá-lo.
- , é melhor você não ousar fazer isso, e sumir da minha frente antes que eu decida colocar uma bomba de verdade no seu armário. – Avisou.
suspirou e meneou a cabeça.
- Vou deixar vocês conversarem. – Me avisou. Eu não consegui nem assentir.
entrou e fiquei ali sozinha encarando minha prima, que me olhava como se eu fosse a verdadeira bruxa Úrsula. Meus olhos, de repente, estavam úmidos.
- Eu não sei nem o que te dizer. – Sofia disse sem muita emoção na voz. – Não sei nem se quero realmente falar com você agora.
- Sofi, eu posso explicar. – Me aproximei alguns passos. – O que você acabou de ver... O que você viu foi...
- O que eu vi foi a prova de que essa montanha de mentiras que você inventou acabou totalmente com seu caráter. – Repreendeu-me com voz dura. – E com a sua dignidade.
Senti ainda mais vontade de chorar.
- só veio ver se eu estava bem. – Me defendi.
- AH, SANTO DANNY! – A garota exclamou com deboche e impaciência. – VAMOS LEVÁ-LO AO VATICANO, TALVEZ QUEIRAM CANONIZÁ-LO! Por que não conta essa história para alguém que realmente acredite nela? – Bufou. – Que diabos você está fazendo com , ?
- É complicado. – Engoli o choro, fazendo um esforço sobrenatural para parecer mais forte e segura do que eu realmente me sentia.
- Deve ser mesmo difícil aconselhar a namorada dele durante o dia e então vir se agarrar com aquele babaca em um beco vazio horas depois.
- Não é o que eu estou fazendo! – Exclamei, me sentindo ofendida.
- É exatamente o que você está fazendo, e está fazendo mesmo depois de tudo de ruim que ele fez pra você. – Sofia passou a mão pelo cabelo comprido e começou a andar de um lado para o outro, evidentemente muito brava. – E eu que tinha vindo aqui para te falar do ...
- Ah, que ótimo! – Dessa vez, fui eu quem me aborreci. – Quer saber, Sofia? Eu também não estava nem um pouco a fim de ouvir falar da sua relação incrível com .
- Eu só ia falar com você pra ajudar vocês, porque queria que vocês ficassem juntos! – Ela explicou ultrajada.
- Claro, porque convidá-lo para sair e se agarrar com ele na porta da minha casa parece um excelente jeito de nos incentivar a ficar juntos! – Rebati. – E com certeza também parece muito inclinado a morrer de amores por mim, aceitando sair com você sem pensar duas vezes...
- Ele só aceitou porque queria te provocar, sua imbecil! – Ela gritou puta da vida, me fazendo calar. Como eu fiquei em total estado de choque, ela continuou falando. – Do mesmo jeito que eu só o convidei para sair e o beijei porque queria que você percebesse o quanto se importa de vê-lo com outra pessoa. Mas você é tão idiota... – Sofia estreitou os olhos e se aproximou, e cheguei a achar que fosse me bater. – Por Deus, estava certo em duvidar de que você se importasse realmente com a vida amorosa dele. Mas eu... Eu nunca estive tão certa quanto agora de que você se importa, e muito. – Se afastou e parou, olhando friamente para mim. – Não que faça diferença, porque, francamente, acabo de perceber que você não o merece.
- O quê? – Pisquei uma vez, ainda atônita.
- Você não merece ficar com alguém tão dedicado quanto o , e é uma pena, porque ele te adora tanto.
Me senti mal, por alguns segundos apenas, ao ouvir aquilo. Depois, uma fúria sem tamanho cresceu dentro de mim.
O que Sofia pensava que estava fazendo? Desde quando ela era a toda-poderosa dona da verdade, digna de me julgar do alto de um pedestal como se eu fosse um monstro?
- Você deve se achar mesmo a voz da razão, não é? – Eu disse estreitando os olhos. – Deve se achar muito melhor do que eu nesse momento.
- O que eu sinto não tem nada a ver com essa história, . Mas se quer mesmo saber, sim. Eu me sinto.
- Deve ser uma sensação e tanto depois de todos esses anos sendo a rebelde da família, não é? De repente ser melhor do que eu, a boazinha. – Falei maldosamente, e Sofia pareceu prestes a voar em mim. – Mas quer saber, Sofi? Pode ficar com o mérito dessa vez, eu não ligo. – Dei de ombros. – Porque o único motivo pra você estar me olhando com essa cara agora é que você é uma bruxa fria e arrogante, que sempre se achou boa demais para gostar de verdade de alguém; você não sabe o que é isso. É por isso que fica querendo dizer o que devo ou não fazer desde o começo dessa história como se tudo fosse muito fácil. Porque, apesar de ter pena de mim, você nunca conseguiu entender de verdade o que eu sentia. – Disse com voz decidida. – Você nunca se apaixonou. E não sabe o que é ter seu coração partido por alguém com quem você se importa tanto.
Sofia estava me encarando em silêncio. O vislumbre de uma lágrima em seus olhos me fez crer que eu já tinha falado o bastante.
- Já terminou seu discurso? – Ela perguntou, a voz trêmula.
- Já. – Respondi dura.
- Muito bem. – Assentiu, indo em direção à porta. – Ah, e quer saber, ? – Ela voltou um passo, e quando olhou para mim seu rosto estava todo molhado. Ela nem estava tentando segurar o choro, mas havia um sorriso triste em seus lábios. – Essa sensação, essa sensação de se decepcionar tanto com alguém que você ama, você está certa: eu nunca tinha sentido. Mas não se preocupe – Sofi balançou a cabeça. – você acabou de me ensinar.
Com isso, ela entrou de volta no Roger's.
A porta bateu às suas costas, e foi como se toda a impetuosidade saísse de mim. Toda a coragem e a aspereza.
Me senti vazia. Triste. Tão triste.
Me encostei à parede de novo e escorreguei até me sentar no chão, chorando e chorando.
POV
No dia seguinte à minha aclamada apresentação com Summer, concluí que já estava na hora de conversar com . Até agora ele não tinha me deixado falar nada, e a situação ia se complicando a cada momento. Eu havia tentado alcança-lo na noite anterior, quando já tinha descido do palco, mas ele tinha ido embora com Amber antes que eu tivesse chance.
Cheguei à Jacksonville High decidido a fazê-lo me ouvir. Conhecia meu melhor amigo bem o bastante para saber que ele me ignoraria por anos a fio se eu não me esforçasse mais para isso.
- Ei, American Idol! – Ouvi a voz de Summer chamar enquanto eu andava.
Parei e me virei. Sum veio correndo em minha direção. Estava radiante.
- E aí, Olsen? – Sorri.
- Nossa apresentação foi um grande sucesso. – Ela disse contente. – Acho que somos uma boa dupla afinal.
- Senhor Wilson ficaria orgulhoso. – Meneei a cabeça, lembrando de nosso vizinho. – Mas da próxima vez você vai tocar violão.
- Espero que sim. – Ela riu. – Você parece ansioso. Onde está ?
- Não vem hoje. Ela foi com o Jack a Fruit Cove comprar umas coisas. – Respondi. – E eu estou um pouco ansioso, sim. Por acaso viu o por aí?
- Por coincidência, eu vi sim. Ele estava lá perto do ginásio agora a pouco.
- Ótimo. – Assenti já voltando a andar. – Nos vemos depois, Sum!
Andei rápido até chegar à parte externa da escola. Lá, jogando em um gameboy, sentado no gramado, estava .
- ! – Chamei, mas seria melhor se tivesse me aproximado calado, pois assim que ouviu minha voz ele se levantou.
me encarou por um instante e depois veio em minha direção. Achei que ele fosse finalmente me deixar falar, mas em vez disso ele passou direto rumo ao interior da escola.
- , volta aqui! – Eu disse alto. – Nós temos que conversar.
- Não temos, não! – Ele devolveu. – Esse é um país livre, não tenho que fazer nada que eu não quero.
Dei alguns passos em sua direção, e então simplesmente saiu correndo.
Bufei, sem paciência. Mas dessa vez ele não ia escapar. Não mesmo.
Saí correndo atrás de , que vez por outro sumia da minha vista, desviando de pessoas e obstáculos no caminho.
Em um determinado momento, fiquei sem fazer ideia de para onde ele teria ido. Então me lembrei do único lugar onde ele poderia realmente se esconder ali.
- Não acredito que me encontrou aqui. – me olhou com total desprezo quando entrei na sala de ensaios da banda da escola.
- Não pode realmente se esconder de mim na antiga sala de ensaios da minha ex-namorada, sabe disso, não é?
bufou, de mau humor, e se sentou no banquinho da bateria.
- Agora, vamos conversar. – Decretei.
- Não sei por que você está insistindo nisso. – Ele cruzou os braços. – Olha, não tem nada a ser conversado! Você saiu com a garota porque ela preferiu você, tudo bem. Só não sou obrigado a ficar te ouvindo falar sobre isso ou sobre qualquer outra coisa. Nem tentei te obrigar a admitir que foi um babaca, caso não tenha notado.
- Eu fui um babaca, . – Falei.
- Foi bom ouvir isso mesmo assim. – Ele ponderou. – Mas isso não muda nada, . Ainda estou puto. Não posso fazer nada.
- Pode ficar quieto por um instante e me deixar falar, o que acha? – Ergui as sobrancelhas.
soltou o ar numa baforada, impaciente, e ficou calado.
- Sei que você está com raiva de mim por ter saído com a Sofia...
- E beijado ela. – Ele acrescentou.
- Como é que sabe? – Desafiei-o a falar, mas ele não o fez. – , o que eu tenho tentado incansavelmente te explicar, é que nada daquele encontro foi verdade.
- O quê? – Ele franziu o cenho.
- Sofia só me convidou pra sair porque queria deixar a com ciúmes, pra forçá-la a admitir que gosta de mim. E eu só aceitei porque fiquei zangado pela dizer que não se importava que eu saísse com a prima dela. – Contei afinal. – No fim, era tudo um plano, embora eu só tenha descoberto o que a Sofi estava fazendo pouco antes de ela entrar em casa no fim da noite.
- Mas e o beijo? – Meu amigo estava atônito.
- O beijo foi só pra finalizar a encenação. Sabíamos que vocês estavam nos seguindo.
cobriu a boca com a mão, em choque. Ele se levantou e ficou ali, parado, pensativo. Depois seus olhos focalizaram meu rosto.
- Por que diabos não me contou isso antes?! – Perguntou indignado.
- Porque você não me deixou falar! – Exclamei incrédulo.
- Então a Sofia não gosta de você? – Ele ainda parecia não estar seguro.
- Não, não gosta.
Primeiro abriu um sorriso, e logo depois começou a gargalhar feito um pateta.
Eu ficava feliz por saber que ele tinha ficado tão satisfeito com a verdade, mas aquela bela cena durou pouco. Não muito depois de seu surto de alegria, meu amigo foi mudando de expressão – de felicidade para tristeza, de tristeza para pânico.
- Não! – Ele exclamou para si mesmo. – Droga! Droga! Não, ! Por quê?!
- Qual é o problema?
- O lance, , é que eu fiquei muito, muito puto mesmo quando achei que você estava ficando com a Sofia. – Ele andava de um lado para o outro. – E aí eu tomei atitudes extremas.
- Do que está falando?
Ele deu um longo e pesado suspiro, os ombros caindo visivelmente.
- Eu convidei a Amber para o baile na noite passada.
- Você o quê? – Apesar de saber que saía com Amber agora, algumas coisas ainda eram muito anormais para aceitar casualmente.
- E ela disse sim! – Ele choramingou. – Que diabos eu vou fazer, ?!
- Agora? – Ergui uma sobrancelha. – Acho que vai ter que ir ao baile com Amber Hayley. Ou então terminar com ela antes.
- Não, não. Ela ia se jogar de uma ponte.
- Então vai ter que esperar até depois do baile.
- Acho que sim.
- Não se preocupe, vai passar rápido. – Apertei seu ombro.
- Talvez. – O garoto ponderou. – Depois vou poder tentar a sorte com a Sofia.
- Vai gostar de saber que ela beija muito bem. – Sorri.
- Nunca mais repita isso. – me devolveu um sorriso assustador. – Sério. Não quero esquecer que te desculpei.
- Não se preocupe, vou deletar essa informação. – Prometi. – É bom ser seu amigo de novo.
- Digo o mesmo, . – Ele meneou a cabeça. – Mas, da próxima vez, me amarre numa árvore e me obrigue a te ouvir antes que eu faça besteira.
POV PIE
- Querida, você está bem? – Papai perguntou. – Está tão absorta.
Afastei a cabeça da janela, percebendo que tinha ficado calada tempo demais.
- Desculpe, pai, eu estou sim. – Respondi. – Eu só... – Suspirei.
- Algum problema? Algo acontecendo com o namoro?
- não é meu problema. – Balancei de leve a cabeça. Não o problema todo.
A verdade era que meu problema era comigo mesma.
Depois de ficar chorando no chão sujo do beco atrás do Roger's por mais algum tempo, na noite anterior, eu tinha me levantado ainda cambaleando e ido embora sem falar com ninguém, de ônibus. Meu pai me ligou assim que cheguei em casa, depois de perceber que eu tinha sumido, e eu inventei que tinha ficado cansada e ido para casa mais cedo. Ele claramente estranhou eu não ter avisado lá mesmo, mas não questionou; só perguntou se Sofia tinha ido comigo. Foi então que eu a vi, dormindo no sofá da sala. Disse a ele que sim.
Fiquei deitada na cama em silêncio, respirando fundo e olhando para a janela.
Não conseguia deixar de pensar em tudo que eu tinha dito, mesmo que tentasse abafar meus próprios pensamentos com o travesseiro – acredite eu tentei.
Por que eu tinha feito aquilo? Por que tinha falado daquele jeito com Sofia, minha melhor amiga, minha irmã?
Porque você queria ser cruel, uma vozinha disse. Porque queria dar o troco.
Eu não podia negar que me chateava às vezes o fato de Sofia julgar minhas atitudes como se tudo fosse muito simples, mas isso não justificava o que eu tinha feito. O ciúme cego que eu estava sentindo de também não.
E o ciúme que eu estava sentindo, aliás, só tornava minha angústia ainda maior.
Sem conseguir entender nada do que estava acontecendo comigo, eu tinha chorado baixinho no travesseiro até cair no sono.
No outro dia, papai fora ver como eu estava e me avisou que estava indo para Fruit Cove. Prontamente me ofereci para acompanha-lo, a cara toda amassada ainda. Meu pai ficou desconfiado de novo, mas diante da minha aparência perigosa, acabou me deixando ir.
Mas minha cabeça ainda estava cheia.
Olhando pela janela do carro, já em Jacksonville Beach, vi uma coisa que me chamou atenção. Na areia da praia, duas garotinhas corriam de um lado para o outro, jogando a água de seus baldinhos uma na outra e rindo.
O sentimento de nostalgia que me invadiu foi tão forte que não aguentei.
- Pai, pode me deixar por aqui? – Pedi. – Quero tomar um sorvete.
- Ah, claro, meu bem. Só não vou te acompanhar, minha garganta está um pouco dolorida hoje.
- Tudo bem. – Falei logo. Graças a Deus.
Papai parou o carro e me deu tchau quando desci. Caminhei desolada até mais perto de onde estavam as crianças e me sentei num banco de madeira, me lembrando de quando eu e Sofi éramos daquele jeito. Pequenas, gordinhas, usando maiôs coloridos. Sem maldade. Sem mentiras. Sem ofensas.
Com certeza fiquei ali por muito mais tempo do que pensara, porque logo as mães das meninas se levantaram de seus lugares e foram contentes buscá-las. As duas seguiram brincando pela orla. Fiquei ali sozinha, encarando o mar.
- O banco está ocupado pela sua amiga depressão ou eu posso me sentar?
Olhei para trás sem muito ânimo. A verdade era que eu estava chorando de novo, e mesmo a visão de Sofia parada ali não foi capaz de mudar isso.
- Você dormiu no sofá. – Eu disse.
- Fiquei com medo de não resistir à tentação de te sufocar com o travesseiro. – Ela se aproximou. – Chega pra lá.
Sofia se sentou ao meu lado no banco, fazendo com que eu me sentisse um pouquinho menos sozinha. Nenhuma de nós duas falou nada por algum tempo.
- Desculpe. – Eu disse então. – Eu não queria ter dito nada daquilo.
- Claro que queria. Se não quisesse, não teria dito. – Sofi deu de ombros. – Tá tudo bem. Sei que eu extrapolo às vezes. Te ouvir dizer aquilo tudo de mim foi... Bem, foi importante pra mim de algum modo. Doeu, mas geralmente verdades doem mesmo.
- Mas eu fui grossa e cruel. – Funguei. – E eu odiei ser essa pessoa. Especialmente com você. Eu sinto tanto, Sofi. Não sei o que deu em mim!
- Todos nós temos nossos momentos ruins. E eu tinha sido bem detestável com você antes, agindo como se você fosse uma bruxa sem salvação. – Suspirou. – Desculpe por isso. Acho que nós fomos duas babacas, no fim das contas.
- Acho que fomos. – Funguei de novo.
- Mas, bem, voltando ao assunto de ontem... Acredito que tenha pensado no que eu disse.
- Sobre eu ser idiota?
- Não, sobre o .
Fiquei calada. Obviamente eu tinha pensado sobre o assunto, mas não sabia se queria falar naquilo.
- Se você não quiser me explicar o que está acontecendo entre você e o , tudo bem. – Sofia disse. – Mas isso não muda o fato de que você gosta do , e que, o quer que esteja fazendo, está colocando em risco sua chance de ficar com esse cara incrível que te adora também.
Eu não sabia por que, mas de repente, quis chorar ainda mais. Eu devia estar com TPM ou algo assim.
- Você disse ontem que eu nunca me apaixonei, e estava certa. – Ela continuou. – Mas eu imagino que deva ser maravilhoso gostar tanto de alguém. Mas deve ser ainda melhor quando essa pessoa vale a pena, eu acho. – Sorriu para mim. – E o vale.
Sorri para ela, sem responder. Eu sabia, com todo meu coração, que ela estava certa sobre ser o tipo de pessoa que valia a pena.
Mas era isso mesmo que eu sentia por ele?
Tinha passado tanto tempo obcecada por que não saberia dizer. Só sabia que meus sentimentos por eram absolutamente diferentes de qualquer um dos que eu vinha nutrindo pelo .
- Obrigada por não me odiar pra sempre. – Murmurei por fim.
- Obrigada por ser sincera. – Ela respondeu. Rimos um pouco.
- Bom, você só vai embora amanhã de manhã. – Constatei. – Então ainda temos hoje para nos divertimos pela cidade.
- Claro. – Ela se colou de pé. – Tem um lugar que eu quero ir por aqui.
Começamos a andar pela orla, o braço dela sobre meus ombros.
- Sabe, eu só tenho mais uma pergunta. – Sofia disse então. – Já falou para alguém que eu sou arrogante?
- Não, porque é mentira. – Sorri. – Você é só um pouquinho presunçosa.
🌴💚🌴
Foi doloroso me despedir de Sofia. Bem mais do que eu imaginava.
As despedidas que vem depois da primeira são sempre piores, pensei comigo. Porque aí você já sabe o quanto vai sentir a falta daquela pessoa quando ela tiver ido. A pequena de três anos – era a primeira lembrança de dizer adeus a Sofia que eu tinha – não sabia o quanto ia sentir saudades de sua priminha nos meses seguintes à sua partida. Mas a de quase dezoito anos sabia muito bem.
tinha passado lá em casa na noite anterior, acompanhado de , para se despedir de Sofia. Era um alívio ver que eles realmente tinham se tornado bons amigos. E apenas isso.
Naquela manhã, eu, papai e Miguel acenamos enquanto Sofia deixava nossa rua, dirigindo de volta para Venice Beach.
- Vou sentir falta da Ariel. – Papai comentou com um sorriso triste.
- Eu também, Jack. – O abracei. – Eu também.
Passei o resto do dia cuidando dos meus deveres da escola e arrumando aquela casa bagunçada. Papai e Miguel tinham me ajudado, o que foi divertido. Mas no fim da tarde e eu fui a única que pude ficar e descansar, uma vez que eles precisavam trabalhar.
- Nos vemos amanhã, filhota. – Papai beijou minha testa.
- Até amanhã, pirralha. – Miguel bagunçou meu cabelo.
- Até amanhã, meninos. – Sorri. – Ou até daqui a algumas horas, caso eu esteja com uma baita insônia.
Os dois foram embora, me deixando sozinha em casa. Já não tinha nada de importante para fazer, então fui até a cozinha e fiz uma quantidade absurda de pipoca, me jogando no sofá em seguida para ver tv.
Assisti a programação normalmente primeiro. A do sábado até que era boa. Um programa sobre famílias estranhas, depois um programa sobre moda e então um reality show culinário. No entanto, eu não tinha estômago para assistir a parte das eliminações, então preferi procurar um filme. Encontrei um filme de aventura qualquer e apertei o play.
Um ronco de trovão lá fora me assustou, fazendo com que eu praticamente pulasse do sofá. Mas que coisa. O dia tinha sido tão ensolarado, e a noite não dava a menor indicação de chuva. Devia ter soado de outro lugar.
Antes que eu me deitasse novamente, no entanto, a campainha tocou. Fui atender pensando que pudesse ser meu pai ou talvez Miguel, tendo esquecido alguma coisa. Mas quando abri...
- ? – A surpresa em minha voz foi inevitável.
- Oi, . – Ele disse e foi logo entrando.
Não que precisasse de convite para entrar na minha casa, mas passou pela minha cabeça porque ele o tinha feito tão rápido, sem nem me olhar direito.
Depois de tudo o que tinha acontecido com Sofia, nós meio que estávamos sem graça um com o outro. Eu não sabia até que ponto ela tinha falado com ele sobre o que eu supostamente sentia, e ele devia ter a mesma dúvida sobre mim. Então a situação era um tanto quanto esquisita.
- Eu vim trazer... Isso. – Ele disse me mostrando uma extensão elétrica. – Seu pai disse que ele e o Miguel iam precisar amanhã cedo. Algo sobre abrir buracos na parede usando a furadeira do Henry que está aqui para mexer na instalação elétrica da casa.
Balancei a cabeça e levei a mão à testa, envergonhada. No mínimo, papai conseguiria apenas acabar com a energia do bairro inteiro. Depois me lembrei que sabia muito bem do que meu pai era capaz, quando percebi que ele estava sorrindo. Ri também e dei de ombros.
- Valeu. – Eu disse pegando a extensão, puxando a mão rapidamente quando nossos dedos se tocaram por acaso.
- E então, o que está fazendo? – quis saber.
- Estava só vendo um filme. – Respondi ansiosa. – Quer pipoca? – Peguei a vasilha desajeitadamente e quase empurrei na cara dele.
abriu a boca, parecendo meio nervoso também, depois empurrou a vasilha delicadamente.
- Não, obrigada. Acho que é melhor eu ir. Não é? – Ele meio que perguntou.
- É, acho que...
Então o ronco de trovão surgiu de novo, assustando a nós dois. Mas, ao contrário de sua aparição solo da primeira vez, dessa vez ele veio acompanhado de outro barulho. Um inconfundível barulho de chuva.
- Não pode ser. – olhou para cima.
- Não mesmo. – Concordei. Era muito irônico. Até para minha vida.
Mas, na verdade, era sim.
E a chuva fez questão de ficar pior em cerca de segundos. Parecia que o mundo ia acabar.
- Você tem um guardachuva aí? – perguntou ao ir até à porta olhar como as coisas estavam. Estavam terríveis.
- A Jodi levou o meu da última vez que choveu. – Expliquei, parada ao seu lado na porta.
De repente, a luz da sala começou a piscar. E viramos para trás para assistir a triunfal morte da lâmpada velha de papai.
- Ah, não! – Corri para o interruptor. – Funciona, vai.
fechou a porta e voltou para a sala, onde a única luz que existia era a da televisão, pausada numa cena cheia de ação.
- Parece que não vai rolar mesmo. – Ele disse com pesar.
Eu estava tão decepcionada, mas na verdade era porque eu estava tão inacreditavelmente nervosa com a ideia de ficar presa com ali, no escuro. E era ridículo, porque eu já tinha ficado sozinha com ele em casa milhares de vezes.
O que havia de errado comigo então? Por que eu não conseguia falar como uma droga de pessoa normal e meu coração batia daquele jeito?
- Eu vou ver se acho outra lâmpada. – O rapaz disse, desaparecendo no quarto de papai.
Certo, respira fundo, .
Me sentei no sofá, minha pulsação acelerada. Soltei o filme, mas não conseguia me concentrar. Pausei de novo depois de um minuto.
Maldita Sofia, tinha mexido com a minha cabeça!
- Você é mesmo uma idiota, ! – Xinguei a mim mesma em voz alta.
- O que disse? – colocou a cara para fora do quarto.
- Nada, estava falando com o protagonista do filme. – Menti.
- Ah tá... – voltou para a sala. – Não tem nada na gaveta de tralhas do seu pai, então, a menos que você tenha uma lâmpada sobressalente...
- Vou ficar no escuro. – Concluí com tristeza.
- Posso pegar uma lâmpada lá em casa quando a chuva parar.
O que queria dizer, implicitamente, que ele ficaria ali até que isso acontecesse.
- Deixa pra lá, Miguel não tem medo de escuro. – Dei de ombros. – Amanhã saio pra comprar outra.
- Ok.
ficou parado em pé ali, olhando do chão para a tela da tv.
- Por que não se senta pra ver o filme comigo? – Sugeri, depois de um tempo sendo mal-educada. – Não fizemos nosso ritual do filme de sexta-feira essa semana.
- É, não fizemos. – concordou. Então, meio sem jeito, se sentou ao meu lado no sofá.
Expliquei rapidamente a história a ele e então soltei o filme.
Juro que tentei me concentrar, mas não dava, simplesmente não dava para ignorar a presença dele ali. Eu acabava sempre tentando olhá-lo de soslaio, querendo descobrir o que estaria pensando.
Mas não dava pistas. Ele parecia mesmo ter se acalmado depois de começar a assistir aquele filme idiota. Minha presença não afetava nem um pouco sua concentração.
- E então, onde você estava antes de vir pra cá? – Perguntei, porque não conseguia me segurar.
me olhou desconfiado.
- Olha, eu não estou te vigiando! – Expliquei rapidamente. – Só achei sua camisa muito bonita pra quem estava fazendo nada em casa.
E era bonita mesmo. Uma camisa jeans de botões e mangas compridas. Combinava com o cabelo dele.
- Tudo bem, tudo bem! – riu. – Eu saí para jantar com minha mãe e o meu padrasto e... Surpresa, vou ter outro irmão.
- ESTÁ BRINCADO? – Perguntei com a animação mais verdadeira do mundo. – Sua mãe está esperando um bebê?!
- Não é loucura? – Ele balançou a cabeça. – Quer dizer, é incrível, mas caramba, eu vou ser irmão mais velho quando tenho quase idade para ser pai dessa criança.
Não consegui conter o riso diante do comentário, sendo obrigada a pausar o filme de novo para falar:
- Faz-me rir, . – Gargalhei. – Você? Pai?
- Qual o problema? – Ele riu. – Várias pessoas da nossa idade têm filhos.
- Só as malucas! – Ergui as sobrancelhas.
riu e meio que meneou a cabeça, pensando sobre aquilo e, por fim, concordando comigo. Depois de alguns instantes de silêncio, ele disse:
- Mas se eu tivesse um filho, ia querer que fosse menina.
- Sério? – Fiquei curiosa. – Por quê?
- Sei lá, sempre me imaginei tendo uma filha. – Ele deu de ombros. – Quando penso nisso em uma situação futura e normal, só pra constar. – Acrescentou para mim sugestivamente, por causa de meu comentário anterior. Eu dei risada.
- Uma menina. – Repeti pensando naquilo.
- É. – sorriu. – Ela ia ser esperta e ia adorar instrumentos desde pequenininha, e ia usar umas camisas maneiras de cantores de jazz.
- Sabe, você acabou de me descrever quando era pequena. – Sorri.
- Sério? – me encarou com curiosidade. Eu assenti. – Bom, e ela ia se chamar Nina.
- Por que Nina?
- Por causa da Nina Simone, a cantora.
- A Nina é a cantora preferida da minha mãe. – Contei.
- É mesmo?
- É, é sim. – Confirmei, tentando ao máximo, mas sem sucesso, conter o suspiro no fim da frase.
Ficamos em silêncio por um minuto. Aquele velho silêncio gostoso e tranquilo que nos acompanhava desde o dia em que nos conhecêramos.
- Bom, vamos voltar ao filme. – Eu decretei então.
O filme se estendeu por algum tempo. Agora o clima parecia muito mais leve que antes. ria e eu também. Comentávamos o que acontecia. Mas ainda havia aquela tensão no ar. A tensão que provinha do fato de nós dois sabermos que algo imprevisto tinha acontecido naquela semana. Nós dois tínhamos feito coisas que não iam nada de encontro a nossos contratos e tratos.
Quando os protagonistas do filme começaram a se agarrar na tela, a situação foi demais para nós dois.
- Bom, eu vou fazer mais pipoca. – se colocou de pé e foi para a cozinha.
[N/A: Podem ouvir essa música, lindezas]
O que há com você, ? Eu continuava me perguntando.
Meu coração na boca, meu pulso acelerado, mal conseguia respirar.
O que há com você?
voltou dois segundos depois, sem a vasilha.
- Não tem mais pipoca. – Informou, se sentando ao meu lado de novo.
- Me pergunto o que mais não tem nessa casa. – Resmunguei.
riu do que eu disse, mas depois ficou sério.
- , sobre o que aconteceu essa semana, com a Sofia... – Ele começou.
- Ah, está tudo bem, . – Eu disse. – Quer dizer, eu agi mesmo feito uma maluca. Acho que estranhei a ideia de vocês dois juntos.
- Não, está tudo bem, eu entendo. – Ele sorriu um pouco. – É que com essa história de namoro falso, às vezes tudo acaba parecendo tão...
- Real? – Completei meio insegura. Quando foi que tínhamos nos aproximado tanto?
assentiu, bem perto do meu rosto, e então, antes que ele se afastasse de novo, eu o beijei.
Não sabia dizer por que tinha feito aquilo. Só sabia que era tarde, e quando a mão de tocou minha nuca, não havia como parar.
Era diferente.
Aquele beijo era diferente de todas as outras vezes.
Era um beijo que me fazia querer mais, que me fazia querer ficar ali o beijando pela vida toda.
O empurrei para trás, caindo em cima dele no sofá. Uma de suas mãos foi parar na minha cintura, a outra permaneceu em meu cabelo.
- Rainbow? – Ele murmurou.
Afastei o rosto para poder olhar para ele, sorrindo, meu cabelo espalhado ao seu redor.
- O que foi? – Perguntei.
- Acho que você pegou no sono.
- Han?
E foi então que percebi que meus olhos estavam fechados e...
Mas o quê?!
- Rainbow, acho que você pegou no sono.
Lá estava , parado à minha frente com a tigela de pipoca cheia.
- Acabei de tirar do micro-ondas, mas se quiser ir lá pra cima dormir, eu fico aqui vendo tv.
Mortificada. Eu estava mortificada.
Não podia acreditar que tinha dormido e meu cérebro sarcástico tinha me pregado aquela peça.
DESDE QUANDO OS SONHOS ERAM TÃO REAIS, POR TUDO QUE É MAIS SAGRADO?
- Não, eu vou tentar assistir o final. – Forcei um sorriso, morta de vergonha.
- Tá bom. – Ele se jogou ao meu lado.
Mas mesmo me entupindo de pipoca para não falar, e me concentrando no filme para esquecer, aquela mesma pergunta não saía da minha cabeça por mais que cinco minutos.
O que há com você, ?
[…]
POV
Quando abri os olhos na manhã seguinte, ainda deitado em minha cama me perguntei se devia ou não ir buscar em casa. Ela devia estar muito brava naquele momento, o que eu não sabia se era bom ou ruim, mas de algum jeito eu até gostava. Sorri pensando nela escondida atrás da moita no dia anterior.
- Rainbow, você é mesmo muito maluca... – Balancei a cabeça descendo da cama.
Meu celular começou a tocar. Para minha surpresa, era ela mesma.
Esperei alguns segundos e então atendi, tentando soar o mais despreocupado possível.
- Bom dia, Rain. – Falei.
- . – Ela respondeu. Ficou calada por um minuto, depois voltou. – Eu só queria dizer que não precisa vir me buscar hoje. Eu vou com a Jodi de ônibus.
Até pensei em questionar, mas depois achei que seria melhor não dizer nada.
- Tudo bem. Nos vemos na aula. – Respondi. grunhiu alguma coisa incompreensível.
- Tchau. – Disse então.
Não dava pra acreditar. Ela estava mesmo uma fera. Me joguei na cama de novo, rindo à toa.
Passei na casa de para lhe dar carona, mas a mãe dele disse que ele já tinha ido. Me preocupei porque aquilo com certeza queria dizer que ele estava muito chateado comigo – não dispensava uma boa carona sem motivo.
Mas, no fim das contas, tinha sido tudo em nome do plano. E era ótimo com planos. Só precisava me ouvir para entender o que estava acontecendo realmente.
Cheguei à Jacksonville Beach High com um sorriso no rosto.
- Bom dia, ! – Alguns rapazes do time de basquete me cumprimentaram ao passar por mim.
- E aí? – Acenei.
Depois parei para pensar que eu nunca tinha visto àqueles caras antes. As coisas estavam mesmo muito diferentes esse ano.
Avistei perto dos nossos armários. Ele estava sério, pegando um livro lá de dentro.
- Decidiu estudar de verdade hoje, ? – Brinquei.
- Decidiu ser comediante em vez de um péssimo músico? – Ele devolveu azedo. – Uma dica: ideia ruim. – Então ele saiu andando.
- ... – Rolei os olhos e o segui. – Olha, eu tenho que te falar sobre ontem...
- Não precisa falar nada, .
- Preciso, sim. – Insisti. – Você precisa me ouvir...
- Ouvir o que, ? – O garoto parou de andar, frustrado. – Que sente muito por que Sofia quis sair com você e não comigo? Que não é sua culpa ser mais bonito do que eu? Ou que foi ela que te convidou e as coisas simplesmente aconteceram?
- ... – Me assustei com a reação. Não estava esperando tanto.
- Ah, não, eu tenho uma ideia melhor! – Ele exclamou. – Por que não começa se desculpando por ter passado os últimos dois anos e meio fingindo que era a porcaria do meu melhor amigo e que se importava só um pouquinho pelo menos comigo? – Antes que eu respondesse, ele bateu na testa. – Ah, claro, me esqueci. É porque você não se arrepende disso.
- , você não entendeu nada... – Ainda me esforcei.
- Não, , quem não entendeu nada foi você. – balançou a cabeça. – Eu gostava de verdade dela. Agora vê se me deixa em paz.
saiu andando e eu fiquei ali, sem reação.
Droga, mas que droga! Ele não tinha nem ao menos me deixado explicar...
Não era minha intenção magoá-lo daquele jeito.
Eu devia ter explicado a ele o que realmente estava acontecendo no momento em que aceitei sair com Sofia. Por que não o tinha feito?
- ?
Olhei para trás e encontrei Summer, meio sem jeito.
- Ah, oi, Sum. – Eu disse.
- Oi. – Ela sorriu um pouco. – Desculpe, eu queria falar com você, mas se for um mau momento...
Olhei para trás, para se afastando. Summer também tinha visto o garoto marchando para longe, mas eu não sabia o quanto ela tinha ouvido da conversa.
- Não, está tudo bem. – Balancei a cabeça, suspirando. – Sobre o que queria falar?
Summer pareceu se animar um pouco ao se lembrar.
- Bem, é que eu tive uma ideia...
E ela passou os trinta minutos seguintes explicando a excelente ideia que tinha tido.
POV PIE
Quando acordei na manhã seguinte, minha cabeça estava doendo. Era o que sempre acontecia quando eu dormia mal, e, diga-se de passagem, aquela tinha sido uma péssima noite para mim. Rolei na cama sem parar, e toda vez que acidentalmente meus olhos encontravam Sofia, dormindo tranquilamente em um colchão no chão, sentia vontade de jogar um balde de água fria em cima dela. A raiva não era mesmo o melhor sonífero.
Claro que eu levantei da cama bem antes da Bela Adormecida, já que minha vida não era um mar de rosas sem aula. Desci as escadas e preparei um café forte horroroso, mas que por algum motivo me ajudou a ficar mais calma. Tentei ligar para Jodi para avisar que também ia de ônibus – afinal, não havia a menor possibilidade de eu entrar no carro com naquele dia – mas o telefone só dava caixa postal.
- Maldito sinal ruim! – Xinguei irritada.
Para completar meu mau humor, logo Sofia apareceu. Quase nunca acordava cedo, mas tinha que fazê-lo justo naquele dia, não tinha?
- Bom dia, priminha. – Ela disse com um enorme bocejo.
- Só se for pra você. – Resmunguei indo lavar meu prato na pia.
- Cruzes! Que bicho te mordeu? – Ela franziu o cenho, indo pegar uma xícara de café.
- Nenhum. – Respondi de má vontade.
Sofia deu de ombros, fazendo uma careta, e eu peguei o celular de novo. Dessa vez estava ligando para para avisar que não iria com ele. Logo que disquei começou a chamar.
Claro, porque para ligar para aquele imbecil o sinal funcionava.
O telefone tocou umas três vezes até que ele atendesse. Como se aquele tonto estivesse muito ocupado com alguma coisa!
- Bom dia, Rain. – Ele disse tranquilamente. Argh.
- . – Eu disse. Depois fiquei calada, porque falar com ele me deixou meio sem saber o que dizer. – Eu só queria dizer que não precisa vir me buscar hoje. Eu vou com a Jodi de ônibus.
Fiquei esperando que dissesse alguma coisa – qualquer coisa! Que perguntasse o motivo da minha mudança de planos, pelo menos, ou perguntasse estava tudo bem. Mas o filho da mãe simplesmente respondeu:
- Tudo bem. Nos vemos na aula.
Mas que desgraçado!
- Tchau. – Eu disse então.
Não dava pra acreditar. Ela não estava mesmo nem aí!
Minha cara de ultraje foi tão grande que nem consegui esconder. Comecei a rir de raiva descontroladamente enquanto arrumava a cozinha de forma frenética.
- Você não parece nada bem, sério. – Sofia comentou.
- Ah, então você acha que eu não pareço nada bem? – Parei de limpar e me virei para aquela cínica. – Por acaso eu teria algum motivo pra não parecer bem, Sofi? Hen? Hen?
- Bom... – Sofia ficou de pé também e me encarou, mas depois foi para a pia com sua xícara. – Não sei, talvez você tenha visto algo de que não gostou. Meu beijo com o , por exemplo. – Ela se virou para mim.
Não dava para acreditar que ela estivesse mesmo tocando naquele assunto comigo! Que cara de pau!
- Está falando do beijo que vocês deram bem na porta da minha casa? – Sorri irritada. – É, talvez eu tenha visto, assim como todas as outras pessoas dessa porcaria de cidade! – Berrei. – Que parte de não atrapalhar minha farsa vocês não entenderam?
- Ah, você exagera. – Sofia deu de ombros e foi para sala, me deixando falar sozinha.
Era o cúmulo! Saí andando atrás dela, toda a raiva da noite anterior voltando a me arrebatar.
- Eu exagero? – Continuei falando. – Chama de exagero porque não foi você que passou as últimas semanas se matando pra fazer essa droga de plano funcionar! – Minha cara devia estar mesmo muito feia, porque Sofia pareceu um pouquinho surpresa com minha reação. – Você chega aqui e faz tudo parecer muito fácil, como se eu só estivesse brincando de casinha com e você pudesse tirá-lo da maldita casa da Barbie e colocá-lo no conversível como fazia com o Ken dos meus brinquedos! Mas quer saber, Sofia? Você não pode! Porque isso aqui não é uma brincadeira. A saúde mental de várias pessoas depende da mentira que eu inventei, e você não pode brincar com algo assim.
Sofia ficou me olhando com os olhos estreitados e a boca aberta por alguns segundos. Depois, começou a rir. Fiquei tão puta que poderia bater nela. Então ela parou de rir e sorriu para mim.
- , você é a pessoa mais doida que eu conheço. Por acaso prestou atenção no quão maluco soa tudo que você acabou de dizer? – Ela balançou a cabeça, depois se jogou no sofá e pegou uma revista sobre a mesinha de centro. – Não preciso nem te dizer isso, mas não é um brinquedo seu. Ele já é bem grandinho e sabe o que faz. E sinto muito se arrisquei sua nobre farsa, mas eu o achei mesmo um cara muito interessante e sem dúvida não pretendo deixar de vê-lo. – Ela baixou a revista para me encarar. – A menos, é claro, que você tenha um motivo mais forte pra me impedir.
Fiquei olhando para Sofia, que esperava uma resposta. Lá estava de novo em seus olhos – aquele brilho de obsessão pela vitória. Ela ia mesmo adorar me ver admitindo que estava com ciúmes, mas eu não daria a ela aquele gostinho.
- Não seria capaz de pensar em nenhum outro motivo, Sofia. – Dei um sorriso irônico.
- Ótimo então. – Ela sorriu e voltou a ler. – E não se preocupe, nosso próximo encontro sem dúvida vai ser um lugar mais discreto. O quarto, talvez.
Meu rosto com certeza ficou vermelho de raiva, mas em vez de dizer qualquer outra coisa, preferi pegar minha mochila e ir embora. Já estava atrasada mesmo, de qualquer forma.
Talvez eu fosse uma péssima solucionadora de problemas, afinal. Tinha saído com certa de que conseguiria impedir qualquer demonstração de romantismo de verdade entre e Sofi, e o resultado tinha sido aquela catástrofe.
Acho que, no fim das contas, não havia nada que eu realmente pudesse fazer. Nenhum deles tinha realmente compromisso com nada e era quase previsível que fossem se dar bem um com o outro, por mais que a ideia me perturbasse. Ainda assim, eu não conseguia parar de suspirar de desgosto a cada segundo da maldita aula.
Um papelzinho azul claro caiu sobre minha mesa então.
Está tudo bem?
Summer estava sentada à minha frente, mas eu quase tinha me esquecido de sua presença ali. Rabisquei o verso do papel:
O que mesmo você tem contra mensagens de celular?
Passei o papel pela fresta entre nossas cadeiras e a parede e ela o pegou nas pontas dos dedos. Suas unhas estavam pintadas da cor do bilhete. A ouvi rir baixinho e percebi quando destacou outro post-it azul para escrever outra coisa, que caiu sobre minha mesa também segundos depois.
Você pode ignorar mensagens, mas não pode fingir que não viu meu bilhete :D Tecnologia vs Praticidade.
Bem, ela tinha um ponto. Os bilhetes de Summer sempre me obrigavam a responder de imediato, o que nem sempre era bom. Mas a verdade era que eu gostava de conversar com ela. Só ia gostar mais se pudesse falar a verdade sempre.
Só estou super cansada. Visitas, você sabe.
Summer leu minha resposta e levou um instante pensando. Nesse meio tempo, até respondeu em voz alta a pergunta que o professor tinha feito. Claramente, sua capacidade de prestar atenção em várias coisas ao mesmo tempo era bem melhor que a minha, porque eu não fazia ideia de sobre o que aquela aula era.
E acha que estará bem pra ir hoje à noite? :S
Sua pergunta me pegou um pouco desprevenida. Eu nem me lembrava daquela história do pessoal ir ao Roger's naquela noite!
Esfreguei os olhos, cansada, e meditei por alguns segundos.
Meu celular vibrou sobre a mesa alertando que eu havia recebido uma mensagem. Com certeza não se tratava de Summer, eu sabia. Abri o ícone. Era Sofia.
Hey,
A maldita greve dos professores acabou! Mamãe disse que eu tenho que voltar para casa amanhã mesmo :@
Quase me senti culpada pelo sorriso que se espalhou pelo meu rosto. Aquele seria o último dia daquela novela sórdida na minha vida! Nada mais daquele clima estranho. Eu poderia ter minha paz de volta.
Rabisquei logo minha resposta para Summer:
Quer saber de uma coisa? Agora que você me lembrou, até me animei. Com toda certeza, eu estarei lá! ;)
Coloquei uma bela calça jeans e uma blusa de botões e alças finas preta e branca. Ajeitei meu cabelo tentando fazer a franja lateral parecer cortada direito. Às vezes aquela franja realmente me irritava.
Pronto, eu estava bem bonita. Novamente, uma reflexão do meu estado emocional.
Minha tragédia grega estava acabando! Era o último dia dela!
A prova disso era que Sofia parecia estar com um humor tão ruim quanto eu dias antes.
- Queria saber por que eles voltaram. – Ela reclamava enquanto fazia os cachos no cabelo com babyliss. – O diretor é um ridículo, aposto que ele não vai atender exigência nenhuma!
- Vai ver eles se entenderam com ele. – Dei de ombros indo pegar o rímel.
- Algumas brigas nunca acabam, . – Sofi fez uma careta para mim pelo espelho.
- Um pensamento um tanto radical para uma futura estudante de Psicologia. – Observei. – Por falar em coisas que acabam ou não... Já falou para o que vai embora amanhã?
Sofia levou um tempinho para responder. Sorri, de costas para ela, e sabia instintivamente que ela tinha olhado para mim por cima do ombro.
- Eu troquei mensagens com ele sobre isso, sim. – Respondeu então. – Mas não acho que vai fazer muita diferença.
- Como assim? – Me virei para ela mais rápido do que deveria. Sofia sorriu.
- Você sabe. – Ela largou o babyliss e saiu andando pelo quarto. – Eu e o não vamos realmente terminar o que acabamos de começar só porque eu vou voltar para casa. São só algumas horas de distância, afinal.
- Bem, sem querer soar pessimista, Sofi, mas a distância é muito mais perigosa do que parece. – Fiz cara de pena. – Veja só minha situação com o .
- Ah, mas são situações muito diferentes. – Ela riu. – As coisas deram erradas porque é um filho da puta e a Summer era namorada dele de verdade. é um garoto honesto, e minha única rival aqui seria você. E você... Bem, não é realmente uma ameaça.
Com isso, ela sorriu e saiu do quarto. Ouvi os rangidos dos degraus da escada de madeira enquanto ela os pisoteava com suas botas vermelhas.
Eu não estava acreditando que ela tinha mesmo dito aquilo.
Brava, desci a escada marchando atrás dela, mas quando cheguei lá embaixo papai e Miguel estavam perto da miserável, terminando de pegar as coisas para irmos.
- Ah, aí está meu raio de sol! – Papai apontou para mim, orgulhoso. – Roger está muito feliz que tenha convidado o pessoal do colégio para lá esta noite, . E eu também.
- Vai ser divertido. – Segurei as mãos de papai e sorri. – Eles acham que você é famoso.
Ele olhou para Miguel – que fez uma cara engraçada – e deu de ombros, convencido.
- Bem, eu sou mesmo, não é? Já contei pra vocês de quando jantei com o Stevie Wonder?
Papai saiu andando para fora e Sofia o seguiu, rindo. Papai sempre tinha alguma história sobre um encontro dele com alguém famoso.
- Stevie, você fica! – Miguel ordenou ao dálmata, que tinha vindo correndo à menção de seu nome.
Stevie obedeceu de imediato, correndo de volta lá para o quintal dos fundos. Ele respeitava Miguel como nunca tinha me respeitado, o que era vergonhoso para mim como dona dele.
- Está mesmo tão animada assim? – Miguel colocou as mãos na cintura e me encarou então. Ele sempre era tão desconfiado, e sua desconfiança sempre era tão sensata!
- Estou, é claro. – Menti.
- Aquele garoto vai estar lá, não é? – Ele questionou. Assenti, mas só depois de alguns segundos percebi do que ele estava falando.
MALDIÇÃO! A MENTIRA!
A droga da mentira sobre ser o garoto com quem eu fiquei em Venice Beach. Meu Deus. Miguel ia triturar o pobre !
- Bom. – Miguel continuou, ameaçador. – Se esse garoto tentar aprontar alguma esta noite, não deixe de me avisar. Vou dar um jeito nele.
Engoli em seco. estava certo. Miguel podia ser mesmo assustador.
- Tá bom. – Assenti, forçando um sorriso. – Vamos?
Miguel – um tanto quanto mal-humorado – concordou e nos juntamos aos outros no carro.
Por Deus, eu tinha mesmo um talento para arrumar confusão.
- Ca-ramba. – Falei pausadamente quando entramos no Roger's. Eu nunca tinha visto o lugar tão cheio, e não estava falando só do pessoal do futebol e da torcida.
Havia tantos adolescentes ali dentro que parecia uma versão reduzida da Jacksonville Beach High. Ainda havia espaço para se mexer, mas francamente, dava a impressão de que a lanchonete tinha sido alugada para algum evento escolar.
- Querida, não sabia que você tinha tantos amigos assim. – Papai disse surpreso.
- Não tenho. – Garanti.
Olhei em volta, procurando por pessoas que realmente conhecia. Depois de um tempo, encontrei uma mesa no canto, onde estavam Summer e os outros.
- Lá estão eles! – Apontei. – Venham!
Os três me seguiram para a mesa. Lá estava Summer, , Brad, Jodi, Emma, , Teddy, Sienna, Amber, e por fim Jasmine, abraçada a um garoto que eu não conhecia.
- Oi, todo mundo! – Cumprimentei sorridente.
- . – Summer ficou de pé e me abraçou. – Oi, Jack. Miguel.
- Summer. – Papai sorriu para ela. Miguel fez o mesmo.
- Pessoal, minha prima Sofia e meu pai, Jack Pie. – Apresentei. – E este é o Miguel. É um amigo muito importante da família.
Houve um longo momento de atrapalhados apertos de mão e empurrões. Todo mundo queria poder dizer depois que conhecia papai. Quando se colocou de pé – com dificuldade por causa da bota ortopédica – e os cumprimentou, Miguel se demorou segurando a mão do garoto.
- Então você é o . – Ele disse sério.
Arregalei os olhos, pensando que aquilo seria um problema logo, logo. parecia assustado.
- Oi, pessoal.
Para meu alívio, tinha acabado de chegar, o que finalizou a sessão de vingança de Miguel.
se sentou abrindo e fechando a mão que fora apertada, enquanto os outros cumprimentavam .
- Aí está nosso próximo vencedor do American Idol! – Brad sorriu.
- Como vai, Winter? – riu.
- Sabe como é, sempre fico bem quando estou com a Jo. – Brad cutucou Jodi, que se derreteu toda. Emma rolou os olhos.
- E então, , o que tem preparado para hoje? – Ela quis saber.
- Ah, juro que é algo muito interessante. – olhou de forma suspeita para Summer, e fiquei desconfiada. – Mas tenho que ir lá pra cima agora. Vou ter que tocar com os caras por algumas músicas antes de me deixarem cantar.
- Nos vemos depois, ! – Jodi acenou.
deu um sorriso para Sofia e outro para mim, e então se afastou de nós. O pessoal chegou para o lado para que nos sentássemos.
- Mas esse seu namorado é mesmo um pedaço de mau caminho, . – Teddy comentou. – Tem certeza de que ele não é gay?
- Teddy... – Sienna balançou a cabeça.
- Infelizmente pra você, eu tenho sim, Teddy. – Sorri. – Agora, caramba, quantas pessoas vocês chamaram pra cá essa noite? – Olhei em volta.
- Não é que chamamos, querida. – Amber comentou como se eu fosse muito tola. – Somos populares. Nossos encontros particulares vão de boca em boca rapidamente. Os outros só nos seguiram.
- Percebo como seguiram. – Ergui as sobrancelhas.
- E então, Sofi, como está sua estadia? – perguntou. – E como estão as coisas em Venice? Está cuidando da minha casa?
- Ah, você sabe, . – Sofia o encarou. – Depois da terceira vez que uma casa é assaltada, não resta muita coisa para roubar. Os ladrões já nem vão mais até lá. – Ela brincou. Seus olhos se desviaram para o lado então. – Oi, .
encarou Sofia com uma expressão indecifrável para mim. Talvez ele estivesse com um pé atrás com ela porque desconfiava de que ela o odiasse pelo que fizera.
- Oi, Sofia.
O silêncio se tornou tão pesado enquanto os dois se encaravam como velhos inimigos, que achei melhor falar.
- E então... – Pensei na primeira coisa que me veio à cabeça. – Jasmine, eu ainda não conhecia seu namorado.
- Eu preferia que continuasse sem conhecê-lo. – Ela fez uma careta.
- Amor, não seja grossa. – O rapaz loiro de olhos castanhos disse docemente para ela. – Desculpe, eu sou Charlie. – Se apresentou. – Acontece que não estudo na escola de vocês.
- É um prazer, Charlie. – Sorri. Ele parecia educado demais para estar com Jas, mas talvez fosse uma fachada. – Sou . Onde você estuda?
- Na verdade, já terminei o ensino médio. Estudo na Universidade da Flórida. – Respondeu. Isso explicava porque era tão civilizado.
- Que interessante! – Assenti sorrindo. Pobre Charlie. Ia torcer para que ele arrumasse uma namorada melhor.
- Vejam, lá está o meu lindinho! – Amber exclamou de repente.
Olhei para porta e vi entrando na lanchonete. Estava até bonito o meu pobre amigo, usando uma camisa preta sem estampa e calça jeans.
- Vou falar com ele! – A loira avisou, e saiu desabalada atrás de .
- Bom, eu vou dar uma volta. – Sofia informou.
- Já volto aqui. – Também me levantei.
Onde aquela engraçadinha estaria indo?
Enquanto a seguia, no entanto, alguém agarrou meu pulso. Olhei para trás e encontrei me encarando com seus intensos olhos .
Ele estava bem bonito, para falar a verdade.
- Onde pensa que vai, Vicentini?
- Ver se a Sofia precisa de ajuda. – Respondi sorrindo um pouco.
- Sua prima sabe se virar bem melhor do que você pensa. – Ele ergueu as sobrancelhas.
- Mesmo assim. – Dei de ombros.
- Só não suma de uma vez.
- Não, não vou. – Sorri mesmo depois de perceber Jasmine observando à distância.
Me soltei da mão de e fui atrás de Sofia.
A encontrei no bar, conversando com Miguel.
- Sabe que não pode enganar este barman com uma identidade falsa, não é? – Alfinetei.
- Ah, eu jamais tentaria enganar o Miguel, . – Ela se virou e sorriu, erguendo um refrigerante para que eu visse. – Não sou eu a melhor mentirosa da cidade, lembra?
Fuzilei-a com os olhos. Miguel balançou a cabeça, acenando para alguém em uma mesa.
- Não deveria estar tocando? – Perguntei a ele.
- É, mas o novo garçom faltou. Vou cobrir umas mesas e toco mais tarde. – Miguel explicou, já se afastando para atender os clientes.
Fiquei olhando para Sofia com um sorriso cínico. Ela olhava para mim do mesmo modo.
- O está bonito, não acha? – Ela indagou. – Mas sabe quem eu descobri que é muito mais bonito do que ele?
- Não diga. Acho que tenho poderes mediúnicos, porque já sei o que vai falar.
Sofi riu. Um riso de verdade.
- E lá vem ele. – Ela disse.
Olhei para trás e vi se aproximando de nós.
- Esse lugar está quente como o inferno hoje, não acham? – Ele perguntou entrando no bar e pegando uma lata no freezer.
- É só o efeito da minha presença. – Sofi deu de ombros e ele riu.
Argh! ARGH!
- E então, o que vai tocar hoje à noite, ? – Me forcei a sorrir.
- Repertório surpresa. – Ele me lançou um olhar enigmático.
- Ah, claro. Nos últimos dias você vem mesmo sendo muito surpreendente pra mim. – Falei sem conseguir esconder muito bem minha raiva.
- De um jeito positivo, eu espero. – Ele piscou.
Mas que maldição! Ele estava igualzinho àquela semana quando nos conhecemos, todo cheio de charme e piadinhas. Estava me tirando do sério.
- Estava falando com a mais cedo sobre a minha triste partida, . – Sofia comentou quando ele recostou no balcão ao lado dela.
- Ah é?
- É sim. – Minha prima concordou. – Ela estava preocupada que não fossemos mais nos ver.
- Ah, com certeza isso não vai acontecer. – Ele riu e Sofia o abraçou carinhosamente.
- É verdade. Somos, tipo, as almas gêmeas do rock.
Toda aquela melação estava de dar ânsia de vômito, mas não durou muito tempo. De repente, arregalou os olhos, se afastando do balcão.
- Merda. – Ele murmurou. Os olhos de Sofia também se arregalaram.
Olhei para trás e encontrei , parado a alguns metros. Ele tinha a boca levemente aberta, mas logo a fechou numa linha reta. Irritado, ele saiu andando pela multidão.
Saí correndo atrás dele, preocupada de verdade com meu amigo. Aqueles dois eram patéticos, mas era ainda pior. Até eu conseguia ter mais consideração por , mesmo o conhecendo há muito menos tempo.
- ! – Chamei quando o encontrei em um canto, isolado.
- Ele me ligou o maldito dia inteiro. – falou quando me aproximei. – Eu não atendi nem respondi nenhuma vez, mas depois pensei bem e achei que talvez devesse vir aqui e deixar que ele se explicasse.
- Que droga, . – Suspirei.
- Se você soubesse como eu estou com raiva do agora. – Ele confessou. – Eu poderia arrebentar a cara dele.
- E por que não faz isso, ? – Perguntei. merecia mesmo.
- Porque isso estragaria as coisas para você também. – Ele deu de ombros.
Então era culpa minha que não pudesse levar uma surra por ser um péssimo amigo. Me senti terrível.
- Sinto tanto. – Recostei na parede ao seu lado. – Mas não fique triste. Você ia mesmo machucar sua mão de jogar vídeo game batendo nele.
riu um pouquinho, assentindo.
- Você é legal, . – Disse honestamente.
- Você também é. – Sorri um pouco. – Por isso sei que vai conhecer outra garota alternativa maravilhosa um dia.
Levou um minuto de silêncio, mas então se afastou da parede.
- Quer saber? – Ele disse. – Não vou esperar tanto tempo assim.
- Não? – Fiquei confusa.
- Não. – Ele confirmou decidido. – EI, AMBER! – Gritou.
A loira – que estava no meio da multidão fazendo sabe-se lá o que – olhou para nós. Ao perceber que era seu querido chamando, ela veio a toda velocidade para perto de nós.
- Me chamou, amorzinho? – Perguntou preocupada. nunca a procurava por livre e espontânea vontade, afinal.
- Chamei sim. – Ele assentiu com firmeza. – Amber, quer ir ao baile comigo?
Primeiro ela pareceu chocada. Sua boca se abriu e ela arregalou aqueles belos olhos azuis. Depois ela começou a sorrir. Parecia que tinha ganhado na loteria.
- Mas é claro que quero, gatinho! – Ela o agarrou, começando a beijá-lo ali mesmo.
ficou levemente assustado a princípio, mas depois passou os braços em volta da cintura de Amber. Quando saí dali, ainda parecia que ela estava tentando engoli-lo. Eu sabia que ele ia se arrepender amargamente daquilo quando percebesse o que tinha feito, mas o garoto precisava mesmo tirar Sofia da cabeça naquele momento.
- Onde ele está? – perguntou preocupado quando voltei.
- Como se você se importasse com isso. – Respondi, irritada só de olhar para a cara dele.
se preparou para responder, mas Sofia tocou seu ombro e balançou a cabeça. No mesmo instante, papai fez sinal para ele do palco. Ele tinha que voltar ao trabalho.
- Não foi tia Jaque que te ensinou a ser tão mal-educada, eu tenho certeza. – Sofia disse para mim quando ele se afastou.
- Ah, não. Isso eu aprendi com o lado da família do meu pai. – Sorri sugestivamente. Sofia bufou.
- Onde está o ? – Ela quis saber.
- Isso também não é da sua conta! – Exclamei incrédula. – Ou está pensando em me roubar o amigo que ainda não conseguiu?
- Está sendo ridícula. – Sofia me encarou severamente.
- Talvez, mas não ligo. – Dei um longo e cansado suspiro, me sentando no banquinho alto do bar e deitando a cabeça no balcão. – E, se quer saber, está em algum lugar se agarrando com a namorada. Alguém tinha que se divertir hoje, além de você e . Agora me deixa em paz.
Sofia abriu a boca, mas depois balançou a cabeça. Ela foi de volta para a mesa e eu fiquei ali.
Mas que grande noite estava sendo aquela. Naquela manhã, achava que tudo estava bem e resolvido, e agora ali estava eu, me sentindo um trapo.
- Noite difícil, senhorita?
Olhei para cima e encontrei Miguel, já atrás do balcão. Nem sabia como ele tinha chegado ali.
- Se eu disser que sim, vai me deixar beber? – Perguntei.
- Óbvio que não. – Ele sorriu. – Mas posso preparar alguma coisa enquanto você me conta por que está com essa cara.
Dei um sorrisinho, mais ou menos como eu fazia quando era criança e Miguel tentava me animar.
- E então? – Ele me incentivou a falar, já pegando os líquidos para misturar.
- Minha noite está uma droga. Os últimos dias também não foram bons.
- E por quê?
- Porque... – Pensei em mentir, mas estava cansada demais. – Porque talvez eu esteja me sentindo um pouquinho incomodada com a forma como a Sofia e o estão se dando tão bem.
- Está com ciúmes então. – Miguel concluiu, colocando uma bebida vermelha no copo.
- Eu não gosto muito dessa palavra, mas talvez seja. – Admiti. – Um pouquinho só.
- Olha, , sei o que é sentir ciúmes. Acredite, eu sei. A Ângela é uma mulher maravilhosa e eu tive que deixa-la no Brasil pra vir pra cá, e eu quase fiquei maluco no começo pensando em todos aqueles caras atrás dela. – Miguel se lembrou, e eu sorri. – Mas tem que confiar no seu namorado, ou então não faz sentido estar com ele. E se quer meu conselho, acho que está sendo muito boba. – Opinou. – Sofia jamais aprontaria uma dessas com você, e é um bom rapaz.
Ah, Miguel! Como eu gostaria de poder dizer toda a verdade e explicar que não podia fazer nada, e que na verdade e Sofia não estariam fazendo nada de errado ficando juntos e a maluca era eu! Ele poderia me aconselhar tão bem, se soubesse de tudo.
Mas acho que esse era o meu medo. Que ele me fizesse perceber como estava errada sobre tudo que andava fazendo e de repente eu mudasse de ideia sobre meus planos. Era por isso, no fundo, que eu não contava toda a verdade a Miguel.
- Sua bebida. – Ele empurrou o copo em minha direção, com guarda-chuvinha e tudo.
- Obrigada. – Sorri.
- Pense no que eu disse, ok? Agora vamos, vou atender o pessoal da sua mesa.
Segurando minha bebida – que estava deliciosa – segui Miguel para a mesa dos meus amigos.
estava sentado lá, com Amber pendurada em seu pescoço. Sofia não estava ali. Todos os outros ficaram felizes por me ver de novo, mas reparei a falta de alguém.
- Onde está a Summer? – Perguntei.
- Foi ao banheiro e nunca mais voltou. – Teddy respondeu comendo uma batata de seu prato.
- Vim ver se estão precisando de alguma coisa. – Miguel informou.
- Eu quero outro hambúrguer, o número 20 do cardápio! – Brad falou desesperado, e Jodi o acalmou. Por um segundo, tive um vislumbre do garoto gordinho que ele um dia fora.
- Meu pedido já está encaminhado. – Emma sorriu. – Talvez depois eu queira alguma outra coisa, se eu ainda tiver dinheiro.
- Sabe, eu posso pagar outra coisa pra você. – jogou um braço sobre os ombros dela.
Emma fez uma careta de pura repulsa e tirou o braço dele.
- Eu prefiro pedir esmola, .
Miguel anotou o pedido de Brad.
- Vai chegar bem rápido. – Avisou. – E você, garoto – apontou para – é melhor deixar a menina em paz. Conheço bem seu tipo.
arregalou os olhos, apavorado, mas Emma pareceu bem satisfeita. Eu teria rido, se não fosse totalmente culpa minha. Miguel apertou de leve meu ombro e foi embora.
- Ei, acho que seu namorado vai cantar, ! – Charlie apontou.
- Namorado. – Jasmine repetiu com deboche.
Olhei para o palco. estava perto do microfone, afinando o contrabaixo. Os outros se levantaram e foram para perto do palco – o máximo possível, considerando os outros alunos da Jacksonville High no caminho. Dei mais um gole em minha bebida e os acompanhei.
De onde estávamos, avistei Sofia. Ela estava sentada no canto do palco, assistindo com um sorriso. Respirei fundo e desviei os olhos dela.
- Boa noite, pessoal. – disse no microfone, recebendo um agradável coro em resposta. – Sei que muitos dos que estão aqui esta noite estudam na Jacksonville Beach High School, assim como eu. Para quem não me conhece, eu sou .
- Lindo! – Teddy gritou. Olhamos para ele. – O que foi? Winter estava certo, ele parece mesmo um excelente candidato ao American Idol!
- Manda a ver, ! – Brad gritou, feliz por ter sua ideia apoiada.
riu e agradeceu, depois voltou a falar:
- Tenho uma surpresa muito especial para vocês hoje, e espero que gostem.
A música começou ao fundo, e percebi que Miguel tinha subido ao palco e estava sentado ao piano agora.
olhou bem na minha direção, mas depois desviou o olhar, começando a cantar:
[N/A: Acho que a maioria de vocês já conhece essa música, mas pra quem não conhece e quer ouvir, é só clicar]
You got the healing that I want
Just like they say it in the song
Until the dawn, let’s Marvin Gaye and get it on
We got this king size to ourselves
Don't have to share with no one else
Don't keep your secrets to yourself
It's karma sutra show and tell
Woah, there's loving in your eyes
That pulls me closer
It's so subtle, I'm in trouble
But I'd love to be in trouble with you
Quando Summer apareceu ao lado do piano, todo mundo quase caiu para trás. Talvez eu mais do que os outros.
- Não acredito! – Teddy estava estupefato.
- Eu nem sabia que ela cantava! – Charlie comentou impressionado.
- E não cantava! A cantora sempre fui eu! – Jasmine disse enciumada.
- Ela sempre soube cantar. – disse.
- Ela é tão talentosa! – Jodi exclamou encantada.
Summer continuava no palco, desenvolta como só ela.
I'm screaming mercy, mercy please
Claro, já se via aí os efeitos da volta triunfal da amizade deles. Todo aquele papo de que eu era a santa por trás daquele milagre era uma piada. Agora eles iam começar a fazer projetinhos me excluindo.
Summer continuava cantando, pertinho de :
I'm like a stray without a home
I'm like a dog without a bone
I just want you for my own
I got to have you, babe
Olhei para minha prima de novo. Ela assistia ao show tão empolgada quanto os outros. Mas de repente, seus olhos se desviaram do casal no palco para mim. Sofia me encarou com tamanha intensidade, e parecia tão despreocupada e segura ao mesmo tempo, que me dei conta então do que eu devia parecer para ela naquele momento, de cara amarrada, desdenhando mentalmente daqueles dois.
E foi então que percebi, com uma onda de desassossego surgindo por dentro, que Sofia estava certa.
Eu estava com ciúmes de .
Estava morrendo de ciúmes de .
- Não, , você só pode estar ficando doida. – Eu disse a mim mesma, feliz por ninguém me ouvir com a música alta. Quando olhei para Sofia de novo, ela já tinha voltado sua atenção para o show.
Olhei para cima de novo, mas não conseguia mais encarar por mais de um segundo. Me sentia ridícula e boba, sem contar que decididamente desequilibrada. Eu não podia estar sentindo ciúmes de , por Deus!
Mas a coisa era tão séria que, mesmo depois de perceber quão louca eu era, eu ainda não conseguia me livrar daquele sentimento. Parecia que vê-lo lá em cima com Summer era ainda mais irritante do que vê-lo com Rosana Wayans.
- Não, não! – Exclamei, falando sozinha como a maluca que eu era. – Isso não pode estar acontecendo!
Fora de mim, saí a toda daquele lugar. Passei pela porta perto da cozinha correndo, e fui sair nos fundos da lanchonete.
O ar incomunmente frio me atingiu em cheio, contrariando totalmente a temperatura morna e gostosa que pairava até o momento que chegáramos ali. Pelo visto, uma chuva estava a caminho de Jacksonville Beach.
- O que está acontecendo comigo?! – Enfiei as mãos em meu cabelo; nervosa.
Céus, a vida amorosa de não era da minha conta! Por que eu estava daquele jeito?
Além disso, quem tinha falado em vida amorosa?! Ele não tinha nada com Summer, eles eram amigos!
Amigos como eu e ele, por sinal.
Só podia ser a farsa. A farsa estava me enlouquecendo, me fazendo confundir as coisas. Era a consequência de mentir tanto.
Recostei na parede de tijolos vermelhos do Roger's e respirei fundo, fechando os olhos. Eu precisava voltar a mim.
Ouvi a porta de metal por onde eu tinha passado instantes atrás ranger. Abri os olhos e vi sair por ali. Ele olhava para os lados em busca de alguma coisa que, fui descobrir logo em seguida, era eu.
- . – Ele disse se aproximando. – Que foi que houve? Por que saiu de lá daquele jeito?
- Eu... – Engoli em seco. Era o que me faltava, agora todos iam achar que tinha algo errado comigo. – Só me senti um pouco mal. Precisava tomar um ar.
- Está se sentindo melhor? – perguntou de forma atenciosa, pousando a mão em minha bochecha para ver seu estava gelada ou algo parecido. – Quer ir lá dentro de sentar?
- Já estou bem, sim. Foi só um mal-estar passageiro. – Sorri um pouco. Tinha que admitir que, mesmo naquela ocasião, eu gostava de vê-lo se preocupando comigo.
- Você me deu um susto. – O rapaz falou, a mão ainda em meu rosto.
- É bom saber que você se importa. – Acabei deixando escapar.
- Isso te surpreende? – me encarou com seus olhos . Parecia surpreso. – É mesmo tão difícil assim de acreditar que você é importante pra mim, ?
A voz de era tão sincera que difícil mesmo era duvidar dele, embora eu já tivesse experiência no assunto. Ele aproximou mais seu rosto, de forma tão delicada e sutil que não me afastei. Quando dei por mim, estávamos nos beijando.
As mãos de logo foram parar em minha cintura, e eu aspirei o perfume conhecido, deixando que uma suave languidez tomasse conta de mim.
Talvez fosse bem o que eu precisava naquele momento, para tirar aquela maluquice toda da cabeça.
Foi então que a porta se abriu de novo. Por um segundo, pensei que seria Jodi ou Emma ou mesmo Jasmine, e então tudo iria pelo ralo.
Mas quando me afastei de para olhar sobre seu ombro, era ninguém mais ninguém menos que Sofia.
Minha prima tinha a boca entreaberta, os olhos nos encarando com total espanto. virou-se para trás para vê-la, e pareceu também muito assustado por um instante. Depois sua expressão se suavizou, embora ele ainda estivesse sem jeito.
- Sofia... – Comecei, perdida.
- Vocês dois são inacreditáveis. – Ela disse pausadamente. – Pior do que isso, são ridículos!
- Olha, Sofia... – deu um passo na direção dela. Minha prima ergueu as mãos, como se tivesse nojo de tocá-lo.
- , é melhor você não ousar fazer isso, e sumir da minha frente antes que eu decida colocar uma bomba de verdade no seu armário. – Avisou.
suspirou e meneou a cabeça.
- Vou deixar vocês conversarem. – Me avisou. Eu não consegui nem assentir.
entrou e fiquei ali sozinha encarando minha prima, que me olhava como se eu fosse a verdadeira bruxa Úrsula. Meus olhos, de repente, estavam úmidos.
- Eu não sei nem o que te dizer. – Sofia disse sem muita emoção na voz. – Não sei nem se quero realmente falar com você agora.
- Sofi, eu posso explicar. – Me aproximei alguns passos. – O que você acabou de ver... O que você viu foi...
- O que eu vi foi a prova de que essa montanha de mentiras que você inventou acabou totalmente com seu caráter. – Repreendeu-me com voz dura. – E com a sua dignidade.
Senti ainda mais vontade de chorar.
- só veio ver se eu estava bem. – Me defendi.
- AH, SANTO DANNY! – A garota exclamou com deboche e impaciência. – VAMOS LEVÁ-LO AO VATICANO, TALVEZ QUEIRAM CANONIZÁ-LO! Por que não conta essa história para alguém que realmente acredite nela? – Bufou. – Que diabos você está fazendo com , ?
- É complicado. – Engoli o choro, fazendo um esforço sobrenatural para parecer mais forte e segura do que eu realmente me sentia.
- Deve ser mesmo difícil aconselhar a namorada dele durante o dia e então vir se agarrar com aquele babaca em um beco vazio horas depois.
- Não é o que eu estou fazendo! – Exclamei, me sentindo ofendida.
- É exatamente o que você está fazendo, e está fazendo mesmo depois de tudo de ruim que ele fez pra você. – Sofia passou a mão pelo cabelo comprido e começou a andar de um lado para o outro, evidentemente muito brava. – E eu que tinha vindo aqui para te falar do ...
- Ah, que ótimo! – Dessa vez, fui eu quem me aborreci. – Quer saber, Sofia? Eu também não estava nem um pouco a fim de ouvir falar da sua relação incrível com .
- Eu só ia falar com você pra ajudar vocês, porque queria que vocês ficassem juntos! – Ela explicou ultrajada.
- Claro, porque convidá-lo para sair e se agarrar com ele na porta da minha casa parece um excelente jeito de nos incentivar a ficar juntos! – Rebati. – E com certeza também parece muito inclinado a morrer de amores por mim, aceitando sair com você sem pensar duas vezes...
- Ele só aceitou porque queria te provocar, sua imbecil! – Ela gritou puta da vida, me fazendo calar. Como eu fiquei em total estado de choque, ela continuou falando. – Do mesmo jeito que eu só o convidei para sair e o beijei porque queria que você percebesse o quanto se importa de vê-lo com outra pessoa. Mas você é tão idiota... – Sofia estreitou os olhos e se aproximou, e cheguei a achar que fosse me bater. – Por Deus, estava certo em duvidar de que você se importasse realmente com a vida amorosa dele. Mas eu... Eu nunca estive tão certa quanto agora de que você se importa, e muito. – Se afastou e parou, olhando friamente para mim. – Não que faça diferença, porque, francamente, acabo de perceber que você não o merece.
- O quê? – Pisquei uma vez, ainda atônita.
- Você não merece ficar com alguém tão dedicado quanto o , e é uma pena, porque ele te adora tanto.
Me senti mal, por alguns segundos apenas, ao ouvir aquilo. Depois, uma fúria sem tamanho cresceu dentro de mim.
O que Sofia pensava que estava fazendo? Desde quando ela era a toda-poderosa dona da verdade, digna de me julgar do alto de um pedestal como se eu fosse um monstro?
- Você deve se achar mesmo a voz da razão, não é? – Eu disse estreitando os olhos. – Deve se achar muito melhor do que eu nesse momento.
- O que eu sinto não tem nada a ver com essa história, . Mas se quer mesmo saber, sim. Eu me sinto.
- Deve ser uma sensação e tanto depois de todos esses anos sendo a rebelde da família, não é? De repente ser melhor do que eu, a boazinha. – Falei maldosamente, e Sofia pareceu prestes a voar em mim. – Mas quer saber, Sofi? Pode ficar com o mérito dessa vez, eu não ligo. – Dei de ombros. – Porque o único motivo pra você estar me olhando com essa cara agora é que você é uma bruxa fria e arrogante, que sempre se achou boa demais para gostar de verdade de alguém; você não sabe o que é isso. É por isso que fica querendo dizer o que devo ou não fazer desde o começo dessa história como se tudo fosse muito fácil. Porque, apesar de ter pena de mim, você nunca conseguiu entender de verdade o que eu sentia. – Disse com voz decidida. – Você nunca se apaixonou. E não sabe o que é ter seu coração partido por alguém com quem você se importa tanto.
Sofia estava me encarando em silêncio. O vislumbre de uma lágrima em seus olhos me fez crer que eu já tinha falado o bastante.
- Já terminou seu discurso? – Ela perguntou, a voz trêmula.
- Já. – Respondi dura.
- Muito bem. – Assentiu, indo em direção à porta. – Ah, e quer saber, ? – Ela voltou um passo, e quando olhou para mim seu rosto estava todo molhado. Ela nem estava tentando segurar o choro, mas havia um sorriso triste em seus lábios. – Essa sensação, essa sensação de se decepcionar tanto com alguém que você ama, você está certa: eu nunca tinha sentido. Mas não se preocupe – Sofi balançou a cabeça. – você acabou de me ensinar.
Com isso, ela entrou de volta no Roger's.
A porta bateu às suas costas, e foi como se toda a impetuosidade saísse de mim. Toda a coragem e a aspereza.
Me senti vazia. Triste. Tão triste.
Me encostei à parede de novo e escorreguei até me sentar no chão, chorando e chorando.
POV
No dia seguinte à minha aclamada apresentação com Summer, concluí que já estava na hora de conversar com . Até agora ele não tinha me deixado falar nada, e a situação ia se complicando a cada momento. Eu havia tentado alcança-lo na noite anterior, quando já tinha descido do palco, mas ele tinha ido embora com Amber antes que eu tivesse chance.
Cheguei à Jacksonville High decidido a fazê-lo me ouvir. Conhecia meu melhor amigo bem o bastante para saber que ele me ignoraria por anos a fio se eu não me esforçasse mais para isso.
- Ei, American Idol! – Ouvi a voz de Summer chamar enquanto eu andava.
Parei e me virei. Sum veio correndo em minha direção. Estava radiante.
- E aí, Olsen? – Sorri.
- Nossa apresentação foi um grande sucesso. – Ela disse contente. – Acho que somos uma boa dupla afinal.
- Senhor Wilson ficaria orgulhoso. – Meneei a cabeça, lembrando de nosso vizinho. – Mas da próxima vez você vai tocar violão.
- Espero que sim. – Ela riu. – Você parece ansioso. Onde está ?
- Não vem hoje. Ela foi com o Jack a Fruit Cove comprar umas coisas. – Respondi. – E eu estou um pouco ansioso, sim. Por acaso viu o por aí?
- Por coincidência, eu vi sim. Ele estava lá perto do ginásio agora a pouco.
- Ótimo. – Assenti já voltando a andar. – Nos vemos depois, Sum!
Andei rápido até chegar à parte externa da escola. Lá, jogando em um gameboy, sentado no gramado, estava .
- ! – Chamei, mas seria melhor se tivesse me aproximado calado, pois assim que ouviu minha voz ele se levantou.
me encarou por um instante e depois veio em minha direção. Achei que ele fosse finalmente me deixar falar, mas em vez disso ele passou direto rumo ao interior da escola.
- , volta aqui! – Eu disse alto. – Nós temos que conversar.
- Não temos, não! – Ele devolveu. – Esse é um país livre, não tenho que fazer nada que eu não quero.
Dei alguns passos em sua direção, e então simplesmente saiu correndo.
Bufei, sem paciência. Mas dessa vez ele não ia escapar. Não mesmo.
Saí correndo atrás de , que vez por outro sumia da minha vista, desviando de pessoas e obstáculos no caminho.
Em um determinado momento, fiquei sem fazer ideia de para onde ele teria ido. Então me lembrei do único lugar onde ele poderia realmente se esconder ali.
- Não acredito que me encontrou aqui. – me olhou com total desprezo quando entrei na sala de ensaios da banda da escola.
- Não pode realmente se esconder de mim na antiga sala de ensaios da minha ex-namorada, sabe disso, não é?
bufou, de mau humor, e se sentou no banquinho da bateria.
- Agora, vamos conversar. – Decretei.
- Não sei por que você está insistindo nisso. – Ele cruzou os braços. – Olha, não tem nada a ser conversado! Você saiu com a garota porque ela preferiu você, tudo bem. Só não sou obrigado a ficar te ouvindo falar sobre isso ou sobre qualquer outra coisa. Nem tentei te obrigar a admitir que foi um babaca, caso não tenha notado.
- Eu fui um babaca, . – Falei.
- Foi bom ouvir isso mesmo assim. – Ele ponderou. – Mas isso não muda nada, . Ainda estou puto. Não posso fazer nada.
- Pode ficar quieto por um instante e me deixar falar, o que acha? – Ergui as sobrancelhas.
soltou o ar numa baforada, impaciente, e ficou calado.
- Sei que você está com raiva de mim por ter saído com a Sofia...
- E beijado ela. – Ele acrescentou.
- Como é que sabe? – Desafiei-o a falar, mas ele não o fez. – , o que eu tenho tentado incansavelmente te explicar, é que nada daquele encontro foi verdade.
- O quê? – Ele franziu o cenho.
- Sofia só me convidou pra sair porque queria deixar a com ciúmes, pra forçá-la a admitir que gosta de mim. E eu só aceitei porque fiquei zangado pela dizer que não se importava que eu saísse com a prima dela. – Contei afinal. – No fim, era tudo um plano, embora eu só tenha descoberto o que a Sofi estava fazendo pouco antes de ela entrar em casa no fim da noite.
- Mas e o beijo? – Meu amigo estava atônito.
- O beijo foi só pra finalizar a encenação. Sabíamos que vocês estavam nos seguindo.
cobriu a boca com a mão, em choque. Ele se levantou e ficou ali, parado, pensativo. Depois seus olhos focalizaram meu rosto.
- Por que diabos não me contou isso antes?! – Perguntou indignado.
- Porque você não me deixou falar! – Exclamei incrédulo.
- Então a Sofia não gosta de você? – Ele ainda parecia não estar seguro.
- Não, não gosta.
Primeiro abriu um sorriso, e logo depois começou a gargalhar feito um pateta.
Eu ficava feliz por saber que ele tinha ficado tão satisfeito com a verdade, mas aquela bela cena durou pouco. Não muito depois de seu surto de alegria, meu amigo foi mudando de expressão – de felicidade para tristeza, de tristeza para pânico.
- Não! – Ele exclamou para si mesmo. – Droga! Droga! Não, ! Por quê?!
- Qual é o problema?
- O lance, , é que eu fiquei muito, muito puto mesmo quando achei que você estava ficando com a Sofia. – Ele andava de um lado para o outro. – E aí eu tomei atitudes extremas.
- Do que está falando?
Ele deu um longo e pesado suspiro, os ombros caindo visivelmente.
- Eu convidei a Amber para o baile na noite passada.
- Você o quê? – Apesar de saber que saía com Amber agora, algumas coisas ainda eram muito anormais para aceitar casualmente.
- E ela disse sim! – Ele choramingou. – Que diabos eu vou fazer, ?!
- Agora? – Ergui uma sobrancelha. – Acho que vai ter que ir ao baile com Amber Hayley. Ou então terminar com ela antes.
- Não, não. Ela ia se jogar de uma ponte.
- Então vai ter que esperar até depois do baile.
- Acho que sim.
- Não se preocupe, vai passar rápido. – Apertei seu ombro.
- Talvez. – O garoto ponderou. – Depois vou poder tentar a sorte com a Sofia.
- Vai gostar de saber que ela beija muito bem. – Sorri.
- Nunca mais repita isso. – me devolveu um sorriso assustador. – Sério. Não quero esquecer que te desculpei.
- Não se preocupe, vou deletar essa informação. – Prometi. – É bom ser seu amigo de novo.
- Digo o mesmo, . – Ele meneou a cabeça. – Mas, da próxima vez, me amarre numa árvore e me obrigue a te ouvir antes que eu faça besteira.
POV PIE
- Querida, você está bem? – Papai perguntou. – Está tão absorta.
Afastei a cabeça da janela, percebendo que tinha ficado calada tempo demais.
- Desculpe, pai, eu estou sim. – Respondi. – Eu só... – Suspirei.
- Algum problema? Algo acontecendo com o namoro?
- não é meu problema. – Balancei de leve a cabeça. Não o problema todo.
A verdade era que meu problema era comigo mesma.
Depois de ficar chorando no chão sujo do beco atrás do Roger's por mais algum tempo, na noite anterior, eu tinha me levantado ainda cambaleando e ido embora sem falar com ninguém, de ônibus. Meu pai me ligou assim que cheguei em casa, depois de perceber que eu tinha sumido, e eu inventei que tinha ficado cansada e ido para casa mais cedo. Ele claramente estranhou eu não ter avisado lá mesmo, mas não questionou; só perguntou se Sofia tinha ido comigo. Foi então que eu a vi, dormindo no sofá da sala. Disse a ele que sim.
Fiquei deitada na cama em silêncio, respirando fundo e olhando para a janela.
Não conseguia deixar de pensar em tudo que eu tinha dito, mesmo que tentasse abafar meus próprios pensamentos com o travesseiro – acredite eu tentei.
Por que eu tinha feito aquilo? Por que tinha falado daquele jeito com Sofia, minha melhor amiga, minha irmã?
Porque você queria ser cruel, uma vozinha disse. Porque queria dar o troco.
Eu não podia negar que me chateava às vezes o fato de Sofia julgar minhas atitudes como se tudo fosse muito simples, mas isso não justificava o que eu tinha feito. O ciúme cego que eu estava sentindo de também não.
E o ciúme que eu estava sentindo, aliás, só tornava minha angústia ainda maior.
Sem conseguir entender nada do que estava acontecendo comigo, eu tinha chorado baixinho no travesseiro até cair no sono.
No outro dia, papai fora ver como eu estava e me avisou que estava indo para Fruit Cove. Prontamente me ofereci para acompanha-lo, a cara toda amassada ainda. Meu pai ficou desconfiado de novo, mas diante da minha aparência perigosa, acabou me deixando ir.
Mas minha cabeça ainda estava cheia.
Olhando pela janela do carro, já em Jacksonville Beach, vi uma coisa que me chamou atenção. Na areia da praia, duas garotinhas corriam de um lado para o outro, jogando a água de seus baldinhos uma na outra e rindo.
O sentimento de nostalgia que me invadiu foi tão forte que não aguentei.
- Pai, pode me deixar por aqui? – Pedi. – Quero tomar um sorvete.
- Ah, claro, meu bem. Só não vou te acompanhar, minha garganta está um pouco dolorida hoje.
- Tudo bem. – Falei logo. Graças a Deus.
Papai parou o carro e me deu tchau quando desci. Caminhei desolada até mais perto de onde estavam as crianças e me sentei num banco de madeira, me lembrando de quando eu e Sofi éramos daquele jeito. Pequenas, gordinhas, usando maiôs coloridos. Sem maldade. Sem mentiras. Sem ofensas.
Com certeza fiquei ali por muito mais tempo do que pensara, porque logo as mães das meninas se levantaram de seus lugares e foram contentes buscá-las. As duas seguiram brincando pela orla. Fiquei ali sozinha, encarando o mar.
- O banco está ocupado pela sua amiga depressão ou eu posso me sentar?
Olhei para trás sem muito ânimo. A verdade era que eu estava chorando de novo, e mesmo a visão de Sofia parada ali não foi capaz de mudar isso.
- Você dormiu no sofá. – Eu disse.
- Fiquei com medo de não resistir à tentação de te sufocar com o travesseiro. – Ela se aproximou. – Chega pra lá.
Sofia se sentou ao meu lado no banco, fazendo com que eu me sentisse um pouquinho menos sozinha. Nenhuma de nós duas falou nada por algum tempo.
- Desculpe. – Eu disse então. – Eu não queria ter dito nada daquilo.
- Claro que queria. Se não quisesse, não teria dito. – Sofi deu de ombros. – Tá tudo bem. Sei que eu extrapolo às vezes. Te ouvir dizer aquilo tudo de mim foi... Bem, foi importante pra mim de algum modo. Doeu, mas geralmente verdades doem mesmo.
- Mas eu fui grossa e cruel. – Funguei. – E eu odiei ser essa pessoa. Especialmente com você. Eu sinto tanto, Sofi. Não sei o que deu em mim!
- Todos nós temos nossos momentos ruins. E eu tinha sido bem detestável com você antes, agindo como se você fosse uma bruxa sem salvação. – Suspirou. – Desculpe por isso. Acho que nós fomos duas babacas, no fim das contas.
- Acho que fomos. – Funguei de novo.
- Mas, bem, voltando ao assunto de ontem... Acredito que tenha pensado no que eu disse.
- Sobre eu ser idiota?
- Não, sobre o .
Fiquei calada. Obviamente eu tinha pensado sobre o assunto, mas não sabia se queria falar naquilo.
- Se você não quiser me explicar o que está acontecendo entre você e o , tudo bem. – Sofia disse. – Mas isso não muda o fato de que você gosta do , e que, o quer que esteja fazendo, está colocando em risco sua chance de ficar com esse cara incrível que te adora também.
Eu não sabia por que, mas de repente, quis chorar ainda mais. Eu devia estar com TPM ou algo assim.
- Você disse ontem que eu nunca me apaixonei, e estava certa. – Ela continuou. – Mas eu imagino que deva ser maravilhoso gostar tanto de alguém. Mas deve ser ainda melhor quando essa pessoa vale a pena, eu acho. – Sorriu para mim. – E o vale.
Sorri para ela, sem responder. Eu sabia, com todo meu coração, que ela estava certa sobre ser o tipo de pessoa que valia a pena.
Mas era isso mesmo que eu sentia por ele?
Tinha passado tanto tempo obcecada por que não saberia dizer. Só sabia que meus sentimentos por eram absolutamente diferentes de qualquer um dos que eu vinha nutrindo pelo .
- Obrigada por não me odiar pra sempre. – Murmurei por fim.
- Obrigada por ser sincera. – Ela respondeu. Rimos um pouco.
- Bom, você só vai embora amanhã de manhã. – Constatei. – Então ainda temos hoje para nos divertimos pela cidade.
- Claro. – Ela se colou de pé. – Tem um lugar que eu quero ir por aqui.
Começamos a andar pela orla, o braço dela sobre meus ombros.
- Sabe, eu só tenho mais uma pergunta. – Sofia disse então. – Já falou para alguém que eu sou arrogante?
- Não, porque é mentira. – Sorri. – Você é só um pouquinho presunçosa.
Foi doloroso me despedir de Sofia. Bem mais do que eu imaginava.
As despedidas que vem depois da primeira são sempre piores, pensei comigo. Porque aí você já sabe o quanto vai sentir a falta daquela pessoa quando ela tiver ido. A pequena de três anos – era a primeira lembrança de dizer adeus a Sofia que eu tinha – não sabia o quanto ia sentir saudades de sua priminha nos meses seguintes à sua partida. Mas a de quase dezoito anos sabia muito bem.
tinha passado lá em casa na noite anterior, acompanhado de , para se despedir de Sofia. Era um alívio ver que eles realmente tinham se tornado bons amigos. E apenas isso.
Naquela manhã, eu, papai e Miguel acenamos enquanto Sofia deixava nossa rua, dirigindo de volta para Venice Beach.
- Vou sentir falta da Ariel. – Papai comentou com um sorriso triste.
- Eu também, Jack. – O abracei. – Eu também.
Passei o resto do dia cuidando dos meus deveres da escola e arrumando aquela casa bagunçada. Papai e Miguel tinham me ajudado, o que foi divertido. Mas no fim da tarde e eu fui a única que pude ficar e descansar, uma vez que eles precisavam trabalhar.
- Nos vemos amanhã, filhota. – Papai beijou minha testa.
- Até amanhã, pirralha. – Miguel bagunçou meu cabelo.
- Até amanhã, meninos. – Sorri. – Ou até daqui a algumas horas, caso eu esteja com uma baita insônia.
Os dois foram embora, me deixando sozinha em casa. Já não tinha nada de importante para fazer, então fui até a cozinha e fiz uma quantidade absurda de pipoca, me jogando no sofá em seguida para ver tv.
Assisti a programação normalmente primeiro. A do sábado até que era boa. Um programa sobre famílias estranhas, depois um programa sobre moda e então um reality show culinário. No entanto, eu não tinha estômago para assistir a parte das eliminações, então preferi procurar um filme. Encontrei um filme de aventura qualquer e apertei o play.
Um ronco de trovão lá fora me assustou, fazendo com que eu praticamente pulasse do sofá. Mas que coisa. O dia tinha sido tão ensolarado, e a noite não dava a menor indicação de chuva. Devia ter soado de outro lugar.
Antes que eu me deitasse novamente, no entanto, a campainha tocou. Fui atender pensando que pudesse ser meu pai ou talvez Miguel, tendo esquecido alguma coisa. Mas quando abri...
- ? – A surpresa em minha voz foi inevitável.
- Oi, . – Ele disse e foi logo entrando.
Não que precisasse de convite para entrar na minha casa, mas passou pela minha cabeça porque ele o tinha feito tão rápido, sem nem me olhar direito.
Depois de tudo o que tinha acontecido com Sofia, nós meio que estávamos sem graça um com o outro. Eu não sabia até que ponto ela tinha falado com ele sobre o que eu supostamente sentia, e ele devia ter a mesma dúvida sobre mim. Então a situação era um tanto quanto esquisita.
- Eu vim trazer... Isso. – Ele disse me mostrando uma extensão elétrica. – Seu pai disse que ele e o Miguel iam precisar amanhã cedo. Algo sobre abrir buracos na parede usando a furadeira do Henry que está aqui para mexer na instalação elétrica da casa.
Balancei a cabeça e levei a mão à testa, envergonhada. No mínimo, papai conseguiria apenas acabar com a energia do bairro inteiro. Depois me lembrei que sabia muito bem do que meu pai era capaz, quando percebi que ele estava sorrindo. Ri também e dei de ombros.
- Valeu. – Eu disse pegando a extensão, puxando a mão rapidamente quando nossos dedos se tocaram por acaso.
- E então, o que está fazendo? – quis saber.
- Estava só vendo um filme. – Respondi ansiosa. – Quer pipoca? – Peguei a vasilha desajeitadamente e quase empurrei na cara dele.
abriu a boca, parecendo meio nervoso também, depois empurrou a vasilha delicadamente.
- Não, obrigada. Acho que é melhor eu ir. Não é? – Ele meio que perguntou.
- É, acho que...
Então o ronco de trovão surgiu de novo, assustando a nós dois. Mas, ao contrário de sua aparição solo da primeira vez, dessa vez ele veio acompanhado de outro barulho. Um inconfundível barulho de chuva.
- Não pode ser. – olhou para cima.
- Não mesmo. – Concordei. Era muito irônico. Até para minha vida.
Mas, na verdade, era sim.
E a chuva fez questão de ficar pior em cerca de segundos. Parecia que o mundo ia acabar.
- Você tem um guardachuva aí? – perguntou ao ir até à porta olhar como as coisas estavam. Estavam terríveis.
- A Jodi levou o meu da última vez que choveu. – Expliquei, parada ao seu lado na porta.
De repente, a luz da sala começou a piscar. E viramos para trás para assistir a triunfal morte da lâmpada velha de papai.
- Ah, não! – Corri para o interruptor. – Funciona, vai.
fechou a porta e voltou para a sala, onde a única luz que existia era a da televisão, pausada numa cena cheia de ação.
- Parece que não vai rolar mesmo. – Ele disse com pesar.
Eu estava tão decepcionada, mas na verdade era porque eu estava tão inacreditavelmente nervosa com a ideia de ficar presa com ali, no escuro. E era ridículo, porque eu já tinha ficado sozinha com ele em casa milhares de vezes.
O que havia de errado comigo então? Por que eu não conseguia falar como uma droga de pessoa normal e meu coração batia daquele jeito?
- Eu vou ver se acho outra lâmpada. – O rapaz disse, desaparecendo no quarto de papai.
Certo, respira fundo, .
Me sentei no sofá, minha pulsação acelerada. Soltei o filme, mas não conseguia me concentrar. Pausei de novo depois de um minuto.
Maldita Sofia, tinha mexido com a minha cabeça!
- Você é mesmo uma idiota, ! – Xinguei a mim mesma em voz alta.
- O que disse? – colocou a cara para fora do quarto.
- Nada, estava falando com o protagonista do filme. – Menti.
- Ah tá... – voltou para a sala. – Não tem nada na gaveta de tralhas do seu pai, então, a menos que você tenha uma lâmpada sobressalente...
- Vou ficar no escuro. – Concluí com tristeza.
- Posso pegar uma lâmpada lá em casa quando a chuva parar.
O que queria dizer, implicitamente, que ele ficaria ali até que isso acontecesse.
- Deixa pra lá, Miguel não tem medo de escuro. – Dei de ombros. – Amanhã saio pra comprar outra.
- Ok.
ficou parado em pé ali, olhando do chão para a tela da tv.
- Por que não se senta pra ver o filme comigo? – Sugeri, depois de um tempo sendo mal-educada. – Não fizemos nosso ritual do filme de sexta-feira essa semana.
- É, não fizemos. – concordou. Então, meio sem jeito, se sentou ao meu lado no sofá.
Expliquei rapidamente a história a ele e então soltei o filme.
Juro que tentei me concentrar, mas não dava, simplesmente não dava para ignorar a presença dele ali. Eu acabava sempre tentando olhá-lo de soslaio, querendo descobrir o que estaria pensando.
Mas não dava pistas. Ele parecia mesmo ter se acalmado depois de começar a assistir aquele filme idiota. Minha presença não afetava nem um pouco sua concentração.
- E então, onde você estava antes de vir pra cá? – Perguntei, porque não conseguia me segurar.
me olhou desconfiado.
- Olha, eu não estou te vigiando! – Expliquei rapidamente. – Só achei sua camisa muito bonita pra quem estava fazendo nada em casa.
E era bonita mesmo. Uma camisa jeans de botões e mangas compridas. Combinava com o cabelo dele.
- Tudo bem, tudo bem! – riu. – Eu saí para jantar com minha mãe e o meu padrasto e... Surpresa, vou ter outro irmão.
- ESTÁ BRINCADO? – Perguntei com a animação mais verdadeira do mundo. – Sua mãe está esperando um bebê?!
- Não é loucura? – Ele balançou a cabeça. – Quer dizer, é incrível, mas caramba, eu vou ser irmão mais velho quando tenho quase idade para ser pai dessa criança.
Não consegui conter o riso diante do comentário, sendo obrigada a pausar o filme de novo para falar:
- Faz-me rir, . – Gargalhei. – Você? Pai?
- Qual o problema? – Ele riu. – Várias pessoas da nossa idade têm filhos.
- Só as malucas! – Ergui as sobrancelhas.
riu e meio que meneou a cabeça, pensando sobre aquilo e, por fim, concordando comigo. Depois de alguns instantes de silêncio, ele disse:
- Mas se eu tivesse um filho, ia querer que fosse menina.
- Sério? – Fiquei curiosa. – Por quê?
- Sei lá, sempre me imaginei tendo uma filha. – Ele deu de ombros. – Quando penso nisso em uma situação futura e normal, só pra constar. – Acrescentou para mim sugestivamente, por causa de meu comentário anterior. Eu dei risada.
- Uma menina. – Repeti pensando naquilo.
- É. – sorriu. – Ela ia ser esperta e ia adorar instrumentos desde pequenininha, e ia usar umas camisas maneiras de cantores de jazz.
- Sabe, você acabou de me descrever quando era pequena. – Sorri.
- Sério? – me encarou com curiosidade. Eu assenti. – Bom, e ela ia se chamar Nina.
- Por que Nina?
- Por causa da Nina Simone, a cantora.
- A Nina é a cantora preferida da minha mãe. – Contei.
- É mesmo?
- É, é sim. – Confirmei, tentando ao máximo, mas sem sucesso, conter o suspiro no fim da frase.
Ficamos em silêncio por um minuto. Aquele velho silêncio gostoso e tranquilo que nos acompanhava desde o dia em que nos conhecêramos.
- Bom, vamos voltar ao filme. – Eu decretei então.
O filme se estendeu por algum tempo. Agora o clima parecia muito mais leve que antes. ria e eu também. Comentávamos o que acontecia. Mas ainda havia aquela tensão no ar. A tensão que provinha do fato de nós dois sabermos que algo imprevisto tinha acontecido naquela semana. Nós dois tínhamos feito coisas que não iam nada de encontro a nossos contratos e tratos.
Quando os protagonistas do filme começaram a se agarrar na tela, a situação foi demais para nós dois.
- Bom, eu vou fazer mais pipoca. – se colocou de pé e foi para a cozinha.
[N/A: Podem ouvir essa música, lindezas]
O que há com você, ? Eu continuava me perguntando.
Meu coração na boca, meu pulso acelerado, mal conseguia respirar.
O que há com você?
voltou dois segundos depois, sem a vasilha.
- Não tem mais pipoca. – Informou, se sentando ao meu lado de novo.
- Me pergunto o que mais não tem nessa casa. – Resmunguei.
riu do que eu disse, mas depois ficou sério.
- , sobre o que aconteceu essa semana, com a Sofia... – Ele começou.
- Ah, está tudo bem, . – Eu disse. – Quer dizer, eu agi mesmo feito uma maluca. Acho que estranhei a ideia de vocês dois juntos.
- Não, está tudo bem, eu entendo. – Ele sorriu um pouco. – É que com essa história de namoro falso, às vezes tudo acaba parecendo tão...
- Real? – Completei meio insegura. Quando foi que tínhamos nos aproximado tanto?
assentiu, bem perto do meu rosto, e então, antes que ele se afastasse de novo, eu o beijei.
Não sabia dizer por que tinha feito aquilo. Só sabia que era tarde, e quando a mão de tocou minha nuca, não havia como parar.
Era diferente.
Aquele beijo era diferente de todas as outras vezes.
Era um beijo que me fazia querer mais, que me fazia querer ficar ali o beijando pela vida toda.
O empurrei para trás, caindo em cima dele no sofá. Uma de suas mãos foi parar na minha cintura, a outra permaneceu em meu cabelo.
- Rainbow? – Ele murmurou.
Afastei o rosto para poder olhar para ele, sorrindo, meu cabelo espalhado ao seu redor.
- O que foi? – Perguntei.
- Acho que você pegou no sono.
- Han?
E foi então que percebi que meus olhos estavam fechados e...
Mas o quê?!
- Rainbow, acho que você pegou no sono.
Lá estava , parado à minha frente com a tigela de pipoca cheia.
- Acabei de tirar do micro-ondas, mas se quiser ir lá pra cima dormir, eu fico aqui vendo tv.
Mortificada. Eu estava mortificada.
Não podia acreditar que tinha dormido e meu cérebro sarcástico tinha me pregado aquela peça.
DESDE QUANDO OS SONHOS ERAM TÃO REAIS, POR TUDO QUE É MAIS SAGRADO?
- Não, eu vou tentar assistir o final. – Forcei um sorriso, morta de vergonha.
- Tá bom. – Ele se jogou ao meu lado.
Mas mesmo me entupindo de pipoca para não falar, e me concentrando no filme para esquecer, aquela mesma pergunta não saía da minha cabeça por mais que cinco minutos.
O que há com você, ?