20- Ops, baby, I love you
"Now I accidentally need you, I don't know what I do…"
[…]
POV
O herói do filme estava desesperado para pegar a mocinha do jipe dos bandidos. Ele olhou para tudo que havia disponível ao seu redor: uma arma com a qual ele poderia atirar no motorista, o cavalo no qual poderia montar e tentar alcançá-los lá na frente. Mas de todas as coisas, ele escolheu justamente a mais impossível: uma corda, que amarrou – na velocidade da luz – numa árvore, e então se jogou de lá igual ao Tarzan. Acredite ou não, ele conseguiu pegar a garota do jipe e cair do outro lado. Os dois se beijaram numa cena ridiculamente melosa de filme de ação.
[N/a: Podem dar play nessa, minhas paixonites]
Mas eu estava sorrindo, ainda que um sorriso de ironia. Aparentemente, tinha conseguido me contaminar com seu gosto cinematográfico estranho.
Olhei para o lado pela primeira vez em algum tempo. Não que eu não quisesse olhar antes, mas as coisas estavam meio esquisitas, e eu não sabia até que ponto tinham mudado entre a e eu.
Ela estava dormindo um sono profundo, a cabeça em cima da minha mão como se fosse um travesseiro. Eu já a tinha acordado sem querer uma hora antes, mas ela parecia tão em paz que não queria fazer de novo.
- Então vai ter que dar seu jeito. – Falei baixinho para mim mesmo.
Me mexi com todo o cuidado possível para não acordá-la, puxando minha mão de leve. Depois me inclinei e passei um braço por trás de seus joelhos e outro nas costas, pegando-a no colo. Rainbow franziu o nariz e respirou fundo, mas não despertou.
Fui andando devagar escada acima, torcendo para que o chão não rangesse ou Stevie decidisse vir pulando feito um doido atrás de nós. A porta do quarto dela estava encostada e eu a empurrei com o pé, entrando no cômodo.
A cama de ainda estava bagunçada da noite anterior – os lençóis desdobrados, o travesseiro torto.
A coloquei ali em cima com todo cuidado, ajeitando seus pés e a cabeça. sorriu de olhos fechados, e eu sorri também, embora ela não pudesse me ver. O que quer que estivesse sonhando, devia ser ótimo.
Fui até a janela dar uma olhada no tempo. Já estava esteando. Talvez eu já pudesse ir embora. É, talvez fosse melhor eu ir embora.
Olhei para uma última vez e saí do quarto.
Desci as escadas, mas quando cheguei à porta da frente, um pensamento surgiu em minha cabeça.
E se ela acordasse de repente? E se acontecesse alguma coisa enquanto Jack estivesse fora? E se ela tivesse um pesadelo?
Era muito bobo da minha parte pensar aquilo. sempre ficava sozinha em casa.
Mas, sei lá, eu não queria deixá-la sozinha ali.
Stevie, muito mais rápido com decisões do que eu, passou à minha frente escada acima. Ele sempre dormia no quarto da , o que não era nenhuma garantia de segurança.
Balançando a cabeça para o quão patético eu era, enviei uma mensagem para Henry avisando que ficaria na casa dos Pie até o Jack voltar, e subi as escadas de novo.
Abri a porta devagar. estava na mesma posição em que eu a tinha deixado.
Com toda a delicadeza possível, me sentei ao seu lado na cama e fiquei ali, totalmente sem jeito, sem saber bem por que tinha voltado e sabendo que era muito provável que ficasse ali por horas até que Jack voltasse.
Olhei para Rainbow, dormindo tão serena. Ela era tão bonita. Provavelmente mais bonita do que pensava. E sem dúvida bonita demais para mim.
Para minha surpresa, me peguei bocejando. Nem tinha percebido que estava com sono, mas me senti cansado de repente.
Cogitei descer e me deitar no sofá, mas antes que o fizesse, a mão de tinha achado a minha por acaso, o que me deu um susto. Por um instante, pensei que ela tivesse acordado, mas não era isso. Ela devia estar só sonhando de novo.
Talvez eu pudesse ficar ali e descansar só um pouco.
Escorreguei na cama até estar deitado de lado, sem puxar minha mão.
Fiquei por alguns instantes olhando o rosto dela, meu coração batendo mais rápido e mais devagar ao mesmo tempo. E eu sabia que não era só por ela ser tão bonita. Era tanta coisa, e eu nem sabia explicar. Mas estava ali desde a primeira vez que eu a vira, naquela mesma cama.
Aos poucos minha respiração foi ficando mais pesada. Eu sabia que Stevie também tinha pegado no sono, em cima do travesseiro que Rainbow havia lhe dado. E a última que vi antes de cair no sono também, foi o rosto dela.
[N/a: Podem parar.]
POV PIE
Acordei como se estivesse bêbada. Senti o tecido fino da colcha da minha cama pressionado contra minha bochecha, mas não me lembrava de ter subido as escadas. A última coisa de que eu me lembrava era o sentado ao meu lado no sofá da sala.
Abri os olhos devagar.
E pisquei.
Engoli em seco e pisquei de novo, acordando completamente, mas sem sair do lugar.
Respirando devagar, dormia feito um anjo bem ali, na minha cama, de frente pra mim.
Meu coração começou a bater descompassado – não sabia dizer se pelo susto ou por aquela situação em si.
Certo. Como isso tinha acontecido?
Uma coisa de cada vez, , minha consciência soou na cabeça.
Noite passada, noite passada... Eu estava cochilando e sonhei com ... E aí fiquei morrendo de vergonha e não olhei mais para o lado direito. E agora ele estava dormindo na minha cama. E ele não tinha tirado nem os tênis – constatei olhando pra baixo. Mas o que tinha acontecido?
Deus, que eu não tenha feito nada sonâmbula, pensei mortificada.
Olhei para de novo, não conseguindo deixar de suspirar baixinho. Ele estava tão bonitinho dormindo. Como podia ser? Ninguém ficava bonito de verdade dormindo.
Epa!
Levei a mão a cabeça, me dando conta de que minha cara devia estar pavorosa. Meu cabelo parecia uma maçaroca embaraçada.
Eu tinha que sair dali antes que ele me visse.
Me arrastei para fora da cama, fazendo uso da delicadeza de líder de torcida que ainda estava absorvendo, e quando finalmente fiquei de pé, meus olhos encontraram a janela. O sol atravessava a fresta das cortinas. A chuva tinha passado e...
MAS O QUÊ? QUE HORAS ERAM?
Não, não, não... Então papai e Miguel tinham chegado e visto ali?
Cobri o rosto com as mãos, minhas orelhas queimando.
Mas será que papai não teria nos acordado se tivesse nos visto ali? Certo, talvez ele não, mas o Miguel teria. Não teria?
Saí do quarto de fininho, deixando ali.
Entrei no banheiro e fiquei ali o mínimo de tempo possível. Depois desci as escadas, um passo de cada vez, me preparando para o que poderia ouvir.
Papai estava na bancada, de costas para a porta. Assim que ouviu o barulho dos meus passos, ele se virou.
- Oh, bom dia, Rainbow. – Sorriu tranquilamente.
- Bom dia, pai. – Retribui, nervosa. – Pai, por algum acaso você foi no meu quarto depois que chegou? – A esperança batia em meu peito quando perguntei.
- Fui, sim, como sempre. – Ele assentiu levando a garrafa de café para mesa e se sentando. – Se está perguntando por causa do , eu o vi. Não se preocupe, filha, não vou te mandar para o convento. – Apontou para a cadeira.
Bem mais aliviada, mas ainda morrendo de vergonha, me sentei de frente para ele.
- Vocês dois estavam dormindo um sono tão bom que fiquei com dó de acordá-los. – Papai me serviu um café. – Ele ainda está lá em cima?
- Está. – Respondi. O jeito despreocupado de papai com tudo me deixava perdida às vezes. Mamãe provavelmente estaria pirando àquela altura.
Miguel entrou na cozinha parecendo sonolento, mas me olhou sério por um instante quando me viu. Prendi a respiração, imaginando se ele me daria um sermão.
- Se ficar grávida antes de terminar a faculdade, eu mato o . – Ele disse apenas, e foi pegar uma xícara de café.
- Ahr. – Grunhi, abaixando a cabeça na mesa, encabulada. – Nós não fizemos nada.
- Sei disso. Conheço minha filha, e conheço o quase melhor ainda. – Papai ergueu as sobrancelhas.
- Garotos de dezoito anos são imprevisíveis, Jack. – Miguel alertou.
- Você com certeza era, mas não os meus garotos. – Papai deu um sorrisinho orgulhoso. – Além disso, eles, graças a Deus, estavam vestidos.
- Meu Senhor, chega dessa conversa. – Implorei, fazendo com que papai risse.
Ouvimos barulhos atrás de nós. Stevie entrou na cozinha e foi direto para a tigelinha de ração, que o próprio papai devia ter enchido ao acordar. Logo atrás dele apareceu , um pouco sonolento.
- Oi. – Ele disse.
- Ora, ora. – Papai o encarou com seriedade fingida. – Pode explicar o que aconteceu noite passada, meu rapaz?
ficou um pouco mais acordado, embora não parecesse necessariamente com medo do meu pai – nenhuma novidade. Ao ver Miguel, no entanto, ele inflou as bochechas.
- A dormiu no sofá. – Ele disse, esclarecendo as dúvidas de todos nós. – Eu a levei lá pra cima e acabei pegando no sono também.
Papai sorriu vitorioso para Miguel.
- O que eu disse? – Abriu os braços.
- Pegue no sono quando já tiver chegado na sua casa da próxima vez. – Miguel avisou.
- Tá. – engoliu em seco.
Balancei a cabeça, imaginando se haveria no mundo família mais constrangedora do que a minha.
- Não vai tomar café aqui? – Perguntei a .
- Ah, não... Minha mãe meio que deve estar surtando a essa hora. – Ele balançou a cabeça. – É melhor eu ir.
- Certo, até depois.
assentiu com um sorriso tímido e foi embora.
E eu não consegui tirar o que havia acontecido da cabeça pelo resto do fim de semana.
🌴💚🌴
Coloquei a mochila nas costas, mas estava cedo demais. Me sentei na cama e fiquei ali, pensando.
As coisas estavam tão... Esquisitas, desde que Sofia fora embora.
Na verdade, não eram bem as coisas. Era eu.
Toda aquela confusão com minha prima e tudo que ela tinha dito quando fizemos as pazes parecia ter tido um efeito maluco em mim. Eu simplesmente não conseguia mais agir do mesmo jeito que antes com , e começava a me preocupar com o motivo disso.
Será que Sofia estava certa desde o início? Eu estava gostando do ?
Não... Seria uma ironia muito grande depois de todo aquele trabalho para ganhar o de volta.
Eu só estava suscetível a pensar isso por causa da Sofi e de todas as mentiras que eu tinha inventado. Era isso.
- ! – Ouvi chamar.
Fui até a janela e vi , acenando de dentro do carro. Respirei fundo, acenando de volta, e desci as escadas decidida a voltar ao normal.
- , você precisa sair dessa bad. – disse algum tempo depois, dentro do carro.
- Não estou no clima pra sair, obrigado. – puxou mais o capuz sobre a cabeça e ficou ali, a cabeça encostada no vidro do carro.
Ele estava assim desde a última vez que vira Sofia. Deprimido como estava, fazia parecer que ela tinha morrido. Dava pena de ver. Para melhorar, ele tinha convidado Amber para o baile quando estava com raiva, e agora ela achava que eles estavam mesmo namorando.
- Você vai ver a Sofi de novo, , podemos ir à Venice um dia desses. – Tentei animá-lo.
- Até lá ela já vai ter arrumado um namorado roqueiro que não gagueja quando ela está perto, nem faz referências em excesso a quadrinhos. Mas obrigada por tentar me ajudar.
- Não se preocupa, vai passar daqui a uns dias. – disse para mim.
Assenti e olhei para ele, que estava concentrado na estrada. E fiquei olhando só mais um pouquinho. Talvez por mais uns dois minutos direto. Até que virou para mim de repente.
- Tá tudo bem? – Perguntou.
- Han?
- Tem alguma coisa errada comigo? Quer dizer, você tá olhando pra mim, não tá? Tive a impressão que sim.
- Ah, não. – Balancei a cabeça rapidamente. – Você cortou o cabelo?
-... Sim. Ontem.
- Ficou bom. – Sorri estranha e na mesma hora me virei para a janela. Depois de um segundo, olhei para trás.
Como eu já imaginava, estava me encarando, e eu sabia que tinha sido pega pelo nerd da matemática de novo.
- A gente se vê no intervalo. – sorriu quando nos separamos no corredor.
- Tá. – Meneei a cabeça, e então me aproximei de e lhe dei um beijo no rosto. – Prometo que vou falar pra Emma ser menos cruel com você hoje.
- Valeu, .
Me afastei dos dois e caminhei rumo à minha primeira aula, pensando no exercício avaliativo que teríamos dali a alguns dias. Estava na metade do caminho quando senti um solavanco. Quando dei por mim, estava dentro do armário de vassouras.
- Qual é o seu problema com este lugar? – Franzi o cenho para no escuro.
Ele sorriu e os olhos brilharam a meia luz.
- Nenhum. – Respondeu. – Ele é discreto, ninguém fica reparando no jeito como eu te olho.
Balancei a cabeça. Ele não perdia o jeito mesmo.
- O que você quer? – Perguntei.
- Quero saber o que deu a história da Sofia. Ela não contou que nos viu pro , contou? Ou pro seu pai?
- Não, ela não contou. – Respondi rapidamente. Depois raciocinei um pouco melhor. – Mas ela poderia ter feito. Meu pai ia ficar muito bravo, e o provavelmente arrebentaria sua cara.
A risada debochada de foi quase ofensiva. Ele devia achar que não podia com ele.
- Olha, sei que me arrisquei um pouco demais lá. Arrisquei a nós dois. Estava preocupado com você. – Ele explicou. – Mas já que já ficamos no limite, podemos nos arriscar só mais um pouquinho agora?
Ele foi tão rápido quanto sempre era, quase sutil demais ao aproximar seu rosto do meu.
O problema é que eu não estava como das outras vezes. Meu coração batia rápido e eu via tudo em câmera lenta, mas quando dei por mim, estava pensando...
Em .
Engoli em seco, nervosa ao perceber que estava perto demais, sabendo que eu devia estar ficando louca. Então dei um passo para trás e ele ficou sem entender.
- O que...
- Eu tenho... Tenho que ir.
Saí dali a toda velocidade, tentando descobrir o que havia dado em mim.
Recusar um beijo de , o promissor artilheiro, por estar pensando em , o babá de cachorros.
Não, eu só podia estar enlouquecendo por completo.
🌴💚🌴
- Respira, . Você só tem que respirar. Isso tudo é psicológico.
Deitada no gramado, eu encarava o céu nublado. Era isso, só podia ser. Eu estava pirando porque tinha perdido a noção de realidade e mentira. Era do que eu gostava. Era ele que eu queria.
- Está deitada aí pensando no ? – Uma vez perguntou.
Me levantei na mesma hora, assustada.
- Nossa, parece que viu o fantasma da Jasmine com uma faca. – Emma riu, e deduzi que o primeiro comentário havia sido de Jodi, que a acompanhava, assim como Summer.
- Eu só estava concentrada. – Balancei a cabeça.
- Pensando no ? – Jodi perguntou, as três se sentando no chão ao meu lado. – Porque eu vivo distraída pensando no Brad. Outro dia queimei a comida por isso. A mamãe ficou uma fera.
Summer riu e balançou a cabeça, tranquila.
- Mas é claro que ela estava pensando no . Eu costumava pensar no Junior o tempo todo quando começamos a namorar.
- E agora não pensa mais? – Perguntei automaticamente, a encarando.
Summer olhou para mim por um instante antes de responder, e me preocupei se não teria parecido interessada demais. Então ela disse:
- Penso. É claro que sim. Só que agora pensar no Junior significa pensar também em toda essa situação em que estamos. É diferente do começo do nosso namoro.
- Por falar nisso, , como vai nosso plano? – Emma perguntou.
- É verdade. – Jodi concordou. – Já tem alguns dias desde que mexemos nossos pauzinhos para trazer o Junior de volta.
Oh, droga, elas estavam certas. Toda aquela história com Sofia tinha me distraído dos meus planos, e se eu não tomasse mais cuidado ia parecer muito óbvio que eu não estava nem um pouco preocupada com o namoro de Summer, a não ser num sentido completamente contrário ao que elas imaginavam.
- Ah, é verdade! – Levei a mão à testa e balancei a cabeça. – Desde que a Sofia chegou eu fiquei tão atrapalhada que não fiz mais nada. Sinto muito, Summer.
- Relaxa, Pie, eu entendo. – Summer dispensou. Depois ela sorriu, pensativa. – De todo modo, vai poder voltar a fazer seu trabalho. Está chegando uma data muito importante, que tenho certeza que será muito útil para nossos planos.
- É mesmo? – Fiquei desconfiada. – Que data?
- O baile de Outono! – Jodi se colocou de pé num salto comemorando. – É simplesmente a coisa mais maravilhosa que você verá aqui, ou pelo menos uma delas.
- Nós vamos colocar lindos vestidos e ficar super gostosas. – Emma ficou de pé também, puxando Jodi e dançando teatralmente. – E sair em fotos e ser adoradas pelos mortais, porque agora andamos com a rainha oficial da Jacksonville High!
- E você sem dúvida será convidada pelo . – Summer riu dela.
Emma fechou a cara no mesmo instante, rolando os olhos.
- Você tinha mesmo que estragar tudo, não é, Olsen?
Nós todas rimos dela, e Summer ficou de pé, olhando para mim.
- De qualquer forma, , você tem muito o que fazer para o plano e para a felicidade de todos nesta escola. Como uma líder de torcida e minha nova amiga, é de se esperar que você participe da organização do baile. E não, você não tem opção. – Ela disse quando abri minha boca. – Agora levante desse chão e esqueça um pouco seu namorado. Temos que treinar para o próximo jogo.
🌴💚🌴
Lá estava eu, sentada no sofá, com meu braço direito todo dolorido, tentando decorar minhas falas para o próximo ensaio da peça, amaldiçoando o dia em que tinha aceitado ser líder de torcida. As meninas disseram que eu deveria me sentir orgulhosa, pois claramente sentia muito menos os impactos dos treinos agora, o que significava que eu estava evoluindo, mas tudo que eu queria era tomar um relaxante muscular e nunca mais sair daquele sofá.
- Então é você que tem se atrevido a roubar as ervas do meu jardim? – Li em voz alta, tentando encontrar o tom de voz adequado para Ebony Purplewood. – Droga, , isso ainda tá muito ruim!
Respirei fundo e fechei os olhos, ficando de pé e me esforçando para entrar no personagem.
- Então é você que tem se atrevido a roubar as ervas do meu jardim?! – Perguntei furiosa.
- Com certeza não. Por favor, não chame a polícia.
Olhei para trás e encontrei , com as mãos para o alto, se fingindo de assustado.
- Haha, muito engraçado. – Eu disse envergonhada, colocando o cabelo atrás da orelha e me sentando no sofá de novo.
- Não deu pra resistir. – Ele se sentou ao meu lado. – Esse é o roteiro da peça? – Pegou as folhas na mesinha de centro.
- É sim. – Respondi. – A professora Elizabeth quer veracidade na peça, então é o que eu estou tentando dar a ela.
- Bom, parecia bem real para mim.
Assenti, satisfeita. E infeliz constatei que por alguns instantes quase tinha conseguido ser normal com de novo, mas logo me peguei observando seu rosto enquanto ele lia os papéis. Era um hábito que estava ficando cada vez mais difícil de controlar.
- O que essa Ebony tem com as ervas afinal? – Ele quis saber. – Ela usa para fazer poções?
- Usa, sim. Ela é uma bruxa, não é? – Dei de ombros. – Mas ela não faz nada de mal até o início do segundo ato, que de fato se chamada "Amor Malvado". Ela faz poções para ajudar antes disso. E também usa as ervas para cozinhar e... DROGA, A COZINHA!
Saí correndo dali, seguida por . Tinha me esquecido por completo do ensopado que estava fazendo para o jantar.
- Deus, ainda bem que não queimou! – Suspirei aliviada ao destampar a panela.
- O cheiro está ótimo. – se aproximou.
- É, mas ainda falta uma coisa. – Saí abrindo os armários. – Orégano. Droga, onde está?
Depois de alguns instantes procurando me lembrei.
- Ah, claro, eu coloquei lá em cima da última vez. – Olhei para o armário mais alto. – Mas que bela notícia. – Bufei.
- Qual o problema?
- O treino da torcida me deixou com o braço doendo, não dá para esticar...
- Ah, tá. – coçou a cabeça. – Deixa, eu te ajudo.
Antes que eu tivesse tempo de dizer qualquer coisa, ele tinha agarrado minha cintura e me levantado à altura do armário. Fiquei paralisada por um instante, meu rosto pegando fogo, mas assim que consegui pensar, estiquei a mão e peguei o pote. me colocou no chão, mas eu ainda estava com o coração na boca.
- , você tá bem? – Ele perguntou, o cenho franzido.
Engoli em seco, olhando para ele. Então dava para ver na minha cara que eu estava quase enfartando.
- Estou, eu... Obrigada, eu preciso...
Depois saí correndo lá para cima e fechei a porta do quarto.
Céus, eu estava perdendo totalmente a sanidade. Eu tinha que fazer alguma coisa urgentemente, antes que...
Meu celular vibrou sobre a cama. Me inclinei para ler a mensagem de .
"Hey, Vicentini. Tem uma festa hoje na casa de um conhecido meu em Atlantic Beach. Tá a fim de ir?"
Isso. Era disso que eu precisava: uma boa dose de realidade!
E por realidade eu queria dizer aquela em que eu ainda estava: num plano obstinado de conseguir de volta de uma vez por todas. Um mundo onde eu ainda gostava dele mais do que tudo e meus planos até então não tinham sido totalmente em vão.
🌴💚🌴
Tinha levado menos tempo para chegar ali do que eu esperava, e agora me sentia meio desconfortável. Não conhecia ninguém e provavelmente ninguém sabia quem eu era também.
não sabia que eu estava ali. Eu não tinha dito, porque, apesar de tudo, não estava certa do que ia fazer. Mas ele tinha me passado o endereço da casa de seu amigo – que estava lotada àquela hora – e depois de ver meu pai sair com Miguel para o Roger's, decidi que eu precisava fazer aquilo.
- E aí, está acompanhada? – Um cara moreno e alto me perguntou.
- Eu... – Engoli em seco. – Na verdade, eu... Estou.
Rapidamente me afastei dali. A música era alta e havia gente por todo lado. Eu tinha ido à festas em Denver, mas nunca sozinha.
- O que eu estou fazendo aqui? – Perguntei a mim mesma, recostando numa parede para tentar pensar com calma.
- Ei, gostei do vestido! – Uma garota claramente bêbada sorriu para mim, com um copo de cerveja na mão.
- Obrigada. – Me forcei a sorrir de volta. – Sabe onde fica o banheiro?
- Lá em cima, segunda porta do corredor.
Subi as escadas com cuidado, quase me arrependendo de ter colocado aquele vestido colado, e entrei no banheiro. Estava até mais limpo do que eu esperava.
- Vamos lá, , é só uma festa. – Encarei o espelho. – São só pessoas.
Respirei fundo e saí dali.
- Ei, aí está você! – Era o cara que tinha falado comigo lá embaixo.
Oh, não, era tudo que eu precisava. Um bêbado interessado em mim num lugar onde eu não conhecia absolutamente ninguém.
- Ah, eu... – Comecei.
- Ela não está sozinha, otário.
Olhei para trás e encontrei , e meu coração se encheu de alívio.
Ele caminhou seguro até mim, se aproximando o suficiente para passar a mão na minha cintura e me abraçar por trás. Prendi a respiração.
- Por que não dá meia volta para a mesa de cerveja? – olhou sério para o cara, que estava completamente sem reação. – Vamos, amor.
Eu não perguntei para onde ele estava me levando. Estava simplesmente tão aliviada por ele ter me salvado daquele embaraço que nem pensei nisso. Quando dei por mim, já estava me empurrando para dentro de um quarto vazio e fechando a porta.
Só então soltei todo o ar que estava prendendo.
- Eu achei que fosse entrar em uma situação horrível.
- Mais um minuto e teria entrado. – respondeu neutro. – Eu não achei que você viesse.
- Eu não queria vir com você. – Falei a verdade.
- Ah, desculpe, devo ter interrompido seu encontro com o bêbado do corredor então. – Ele brincou, um sorriso torto debochado. – Talvez queira voltar pra lá.
Agora que o susto tinha passado, acabei rindo também, pensando no quão ridículo aquilo tinha sido.
- Obrigada por me tirar de lá. – Sorri.
- Sem problemas. Eu te convidei, você tendo aceitado ou não, então não fiz mais do que a minha obrigação. – Deu de ombros, se sentando em um puff. – Olha, eu realmente não pensei que você fosse vir. Então queria muito saber: o que deu em você pra aceitar?
[N/a: Ok, OUÇAM ESSA]
Olhei bem para ele pela primeira vez. As únicas luzes do quarto vinham da rua, entrando por uma janela grande, e de um abajur fraco no criado mudo. Mesmo à baixa luz, os olhos de eram tão quanto eu me lembrava, e seu cabelo parecia tão macio quanto sempre. O perfume, um perfume novo, invadiu minhas narinas. Era exatamente o que eu queria indo ali. Queria recuperar minha memória. Meu propósito.
- Eu precisava ver você. – Admiti baixinho.
ficou calado, olhando para mim por algum tempo. Então se levantou:
- Eu também. – Disse.
se aproximou de mim devagar. Meu coração parou.
Uma das mãos dele se encaixou delicadamente atrás da minha orelha, os dedos no meu cabelo. A outra mão pousou na minha cintura.
- Eu precisava... Eu preciso te ver. – Ele sussurrou. – Às vezes acho que eu estou ficando maluco. Às vezes acho que você quer que eu enlouqueça, mas acho que me importo cada vez menos.
Então me beijou, e eu o beijei de volta, porque ouvir aquilo tinha sido muito para mim. Parecia que aquilo era o que eu queria desde que tudo tinha começado. Queria que ele me quisesse de volta. Queria que ele ficasse maluco por minha causa. Eu queria o meu , o que se importava demais comigo para me perder.
foi me levando para a outra parede, as mãos dançando pelas minhas costas, minhas mãos emaranhadas em seu cabelo. O ar ia acabando pouco a pouco.
- EI, TEM ALGUÉM AÍ? – Bateram à porta.
parou, frustrado.
- Droga. TEM SIM, MERDA! – Gritou.
- OS PAIS DO GEORGE ESTÃO VOLTANDO! TODO MUNDO PRA FORA!
olhou para mim e eu estava rindo.
- Droga, vamos sair logo daqui!
E então ele me puxou pela mão porta afora.
Saímos pela porta dos fundos e corremos juntos pelo gramado da casa do George. Ainda pudemos ouvir os gritos da mãe dele do lado de fora quando encontrou as pessoas e a bagunça.
- Coitado do George! – Eu ria.
- Espero que ele sobreviva. – riu também, abrindo a porta do carro para mim. – Ele sabe dar ótimas festas.
[N/a: Ok, podem abaixar o volume e parar, amores, mas não fechem a aba. Vocês vão usar a música de novo]
Vagamos por algum tempo no carro, ainda rindo do que tinha acontecido. Eu me sentia tão viva. Era como voltar no tempo.
- Lembra quando minha tia quase te pegou no quintal? – Eu dizia.
- Sua tia era o menor dos meus problemas. Eu tinha medo mesmo era do T-Rex! – Ele balançava a cabeça, divertido. – Fala sério, aquilo era um cachorro ou um urso?!
- Ele era mansinho pra quem conhecia.
- Se eu só tivesse conhecido aquele bicho depois que você chegou aqui, iria jurar que Sofia o comprou só pra me atacar.
À menção do assunto um pouco mais pesado quebrou um pouco – só um pouquinho mesmo – minha alegria. De repente, estávamos de volta à realidade. Aquela onde havia partido meu coração e Sofia não gostava mais dele, onde tudo havia mudado.
Não havia quase ninguém na rua onde paramos o carro. Algumas casas, um ponto de ônibus com duas pessoas paradas. desligou o carro e olhou para mim.
- E eu que achava que nada ficaria melhor em você do que o uniforme de torcida. – Sorriu.
- Obrigada, mas não acho que vou usar esse troço de novo. – Virei de lado para olhar para ele. – É apertado e fica subindo.
- Não me incomoda tanto assim. – Ele deu um sorriso desavergonhado e eu bati em seu braço. segurou minha mão.
- Então, onde paramos lá na festa?
se aproximou e me beijou de novo, com menos urgência que antes, como se tivéssemos todo tempo do mundo.
- Nossa, eu senti tanta falta disso. – Ele disse. – De te beijar sem que você me empurrasse longe ou que alguém aparecesse pra estragar tudo. De ficar com você como antes.
Queria responder que também tinha sentido falta disso, mas tudo que fiz foi sorrir. Eu estava contente, mas havia uma sensação esquisita no meu peito. Era como se eu sentisse que a qualquer segundo algo de ruim ia acontecer; uma sensação padrão que eu tinha desenvolvido sobre .
Mesmo assim, eu o beijei de volta. Era aquele meu resquício de esperança, o sinal de que eu estava no caminho certo – mesmo que fosse o errado.
- Sabe, eu estava conversando com o sobre você outro dia. – murmurou no meu cabelo.
- É mesmo? – Ri baixinho, sem poder ver seu rosto.
- Hanram. – Ele riu também. – Nós estávamos falando sobre essa minha obsessão maluca por você.
- Você é maluco por mim? – Me afastei alguns centímetros para encará-lo.
- Eu sempre fui. – Ele falou como se fosse óbvio. – Por isso tudo ficou tão difícil quando você voltou. – Sabiamente ele não falou sobre também sentir algo por Summer.
Eu o abracei, quietinha. Eu não precisava ouvir essa segunda parte. Ficava feliz por ele tê-la omitido.
O que importava afinal era ele gostar de mim, não é? Isso faria tudo funcionar. Era meu objetivo.
- É engraçado. – continuou. – Você está aqui agora, ao contrário do que eu esperava. Acho que isso contesta o que eu falei ao .
- O que você falou? – Perguntei com cautela. Lá estava a coisa ruim. Eu sentia ela vindo.
- Falei que às vezes fico pensando que você não gosta de mim na real, sabe? – Ele disse pensativo. – De vez em quando, quando você dá uma de charmosa e depois some, me pego pensando se tudo isso não faz parte de uma vingança. Se você não fica por perto só pra me castigar pelo que eu fiz, sabendo a cada segundo que eu não posso ficar com você. É como se tudo que você quisesse fosse que eu não conseguisse te esquecer.
[N/a: Podem voltar com a música a partir de 2:24 e ouvir até acabar a cena].
Meu coração parou, meu corpo parou. Engoli em seco, sentindo o sangue fugir do meu rosto.
É claro que não era isso que eu estava fazendo. Não era isso que eu queria.
- É loucura, não é? – sorriu, tocando meu rosto.
Era loucura. Eu não estava me vingando. Eu não queria ele só porque ele tinha escolhido Summer. Isso nem tinha passado pela minha cabeça.
Mas será que teria passado por alguma outra parte de mim? Meu coração partido, talvez?
Será que aquilo era exatamente o que eu estava fazendo, sem sequer dar por mim?
De repente, era como se eu fosse cair. Eu queria vomitar.
Olhei para e não queria olhar. Me afastei dele.
- Qual o problema?
Engoli em seco, perdida.
- Eu tenho... Tenho que ir.
Tirei do cinto e saí do carro, fazendo um esforço muito grande para parecer controlada. saiu atrás, mas não pôde atravessar a rua, porque um carro se pôs entre nós.
- , eu disse alguma coisa? – Ele perguntou assustado. Não estava entendendo nada. – Desculpe se te ofendi!
Balancei a cabeça, me afastando cada vez mais, me aproximando da porta do ônibus que estava parando.
- Você não é o problema! – Gritei para . – Eu sou!
ainda estava completamente atônito quando meu ônibus se afastou. Eu o olhei por alguns segundos, mas então joguei a cabeça para trás no banco. Achava que estava tendo um ataque de pânico, devia ser aquela a sensação.
Era o que eu deveria sentir numa situação dessas, certo?
Porque, se estivesse certo, então isso queria dizer que eu tinha estragado minha vida sem motivo algum. Queria dizer que eu tinha acabado com o namoro de alguém que só tinha demonstrado ser minha amiga, que eu tinha mentido até não saber mais dizer a verdade, e que eu tinha destruído todas as minhas chances com alguém que realmente gostava de mim e de quem eu gostava, tudo isso por nada. Tudo por causa de uma vingança estúpida que eu nem queria de verdade. Não que eu soubesse, até aquele momento.
Não. Ele tinha que estar errado.
tinha que estar errado, porque, se não estivesse, eu não sabia como enfrentaria a realidade.
🌴💚🌴
Já era quase hora do jantar e eu não tinha a menor fome, deitada no sofá enquanto meditava sobre tudo.
Tinha meio que fugido de todo mundo durante o dia, na escola, inventado desculpas para ficar sozinha e pensar, sem ter que lidar com ninguém – e por ninguém eu queria dizer e .
Nenhum dos dois tinha culpa do que eu sentia naquele momento, mas eu não podia ficar perto de nenhum deles quando estava tão confusa. Sabia que devia estar muito confuso pela noite passada, e que talvez desconfiasse de que havia algo errado comigo, mas precisava de um tempo para mim.
- Só pode estar com algum problema. – Miguel se sentou na poltrona, me dando um susto. – Pra deixar seu pai fazer o jantar sem supervisão.
Sorri um pouco e me sentei.
- Decidi dar um voto de confiança a ele. – Dei de ombros.
- Muito nobre. – Ele assentiu. – O que está havendo?
Suspirei, pensando em como poderia conversar com ele e me ajudar sem despejar toda verdade.
- Eu quero te fazer uma pergunta, mas tem que me prometer que não vai querer saber por que eu estou perguntando.
- Tudo bem. – Miguel concordou.
Mordi o lábio, pensando.
- Como foi que soube que estava apaixonado pela sua namorada brasileira?
Miguel ponderou por alguns segundos, não olhando para mim. Então disse:
- Quando pensei em ir embora pela primeira vez, depois de ter conhecido ela, e percebi que mesmo que eu fosse, não conseguiria deixá-la para trás. – Suspirou. – Mesmo que eu deixasse o Brasil, sabia de algum modo que jamais conseguiria esquecê-la.
O rosto dele tinha uma expressão tão honesta que chegava a ser tocante.
Eu já tinha sentido aquilo por alguém? Algo tão verdadeiro e definitivo? Que eu sentisse com cada pedaço de mim que nunca ia mudar?
- Agora eu vou quebrar minha promessa. – Miguel estava me encarando. – Por que me fez essa pergunta?
Eu o olhei de volta por alguns instantes, quase decidindo por fim contar toda a verdade, me livrar daquele fardo e pedir um conselho sobre como resolver aquilo tudo.
- Ah, aí estão vocês.
Nos viramos para a porta, onde papai estava parado, recostado à soleira.
- Pai. – Eu disse. – Como vai o jantar?
- Bem, acho que vai ficar bom. Eu só... – Ele parou e deu um longo suspiro. – Eu fiquei um pouco cansado.
Estaria a idade finalmente alcançando meu pai? E eu que pensava que aquelas corridas de fim de tarde tinham um efeito melhor.
Miguel o olhou de forma indecifrável por um ou dois segundos, depois se pôs de pé.
- Deixa que eu termino. – Disse.
- Não precisa, Miguel. – Papai balançou a cabeça.
- Não, eu vou fazer. – Se encaminhou para a cozinha. – Por que não senta um pouco nesse sofá e vê TV com sua filha? Faz tempo que não faz isso, não acha?
- De fato... – Papai ponderou.
Miguel foi para a cozinha e papai se sentou ao meu lado no sofá.
- E então, o que estamos assistindo? – Perguntou.
- Alguma coisa feliz e fácil de entender, eu espero. – Liguei a TV.
Deixei que algum programa qualquer começasse, me aconchegando ao lado do meu velho e maluco pai, desejando que isso pudesse me afastar de todos os problemas, como quando eu era só uma criança.
🌴💚🌴
- Honestamente, acho que você já se questionou, o que era a etapa mais difícil. – Sofia disse ao telefone, enquanto eu esperava que chegasse de carro naquela manhã. Já tinha pensado o bastante, e, embora não chegasse à conclusão nenhuma, não podia me esconder dele para sempre. Portanto, tinha decidido voltar ao normal.
- Acho que você está certa. – Concordei. – No fundo, acho que me sinto mais leve por ter me questionado. Mas agora a dúvida está me deixando maluca.
- É bom sair do controle da situação às vezes, . – Pude ouvir o sorriso em sua voz.
Sorri de volta, embora ela não pudesse me ver. A campainha tocou.
- Que estranho, ele sempre entra direto. – Observei.
- Bom, vai lá ver o que tem de novo. Nos falamos mais tarde.
- Ok. Um beijo, Ariel.
Desci as escadas imaginando se teria acontecido alguma coisa, mas nada parecia anormal quando cheguei lá.
estava abaixado na entrada, brincando com Stevie. Parei sem terminar de descer, dizendo a mim mesma para agir normalmente.
- Oi. – Eu disse.
levantou a cabeça e olhou para mim. Ele ficou calado um instante e inflou as bochechas.
- Oi. – Sorriu então.
Ficamos ali, parados por alguns instantes. Eu não fazia ideia de por que ele parecia tão nervoso.
- . – Ele disse, me surpreendendo por falar meu nome inteiro. – Eu estive pensando... É que chegou um parque na cidade no final de semana...
- Sim?
- E... Queria saber se você não quer ir lá... Comigo.
Pisquei uma vez, arregalando os olhos. Ele estava me chamando para sair? Um encontro?
- Você diz como num... – Comecei.
- Eu só... Pensei que seria legal. Nós dois. E o também não quer sair mais porque não quer ter que levar a Amber a lugar nenhum, então... – Ele disse rapidamente.
- Ah, claro. É, seria legal sim. – Assenti, tentando parecer natural. – Eu vou adorar.
- Bom. – Ele assentiu. – Amanhã à noite então?
- Perfeito. Pode ser.
- Bom.
Ficamos em silêncio mais alguns instantes, até o ponto que não dava mais.
- Vamos pra escola agora? – Apontei para porta.
- Sem dúvida. – me deu as costas, indo para fora.
Ri baixinho enquanto o seguida. Podia ser estranho, mas de repente eu estava ansiosa para sair com ele. Descobrir o que eu sentia, afinal, fazia parte de me questionar.
POV
- É só um passeio, . – Eu falava sozinho em frente ao espelho, tentando me acalmar. – Ela anda com você desde que chegou aqui, não tem por que ficar ansioso.
Mas não adiantava de nada. A verdade era que eu estava nervoso. Obviamente eu já tinha saído sozinho com a outras vezes. Caramba, eu já tinha beijado a várias vezes. Mas eu nunca tinha convidado ela pra sair até meu ímpeto de coragem no dia anterior. Parecia diferente agora.
- , você está aí dentro? – A voz de Henry veio antes que ele abrisse a porta. Ele adentrou o cômodo, o rosto sujo de alguma coisa escura. – Você vai sair?
- Vou sim. – Assenti. – Com a .
- Ah.
Henry ficou ali parado, a cara toda suja, meditando. Eu fiquei parado também, porque não estava entendendo qual era a dele.
- Se me permite dizer, você parece um pouco nervoso pra quem está saindo pela milésima vez com a própria namorada. – Ele comentou.
- É só que... – Me sentei na cama. – As coisas nos últimos dias ficaram meio confusas entre a e eu. Hoje é a primeira vez que saímos depois que voltamos a nos entender.
Henry meditou por poucos segundos, e então se aproximou.
- Olha, , sei que eu não sou seu pai, mas posso te dar uns conselhos?
Dei de ombros, meneando a cabeça.
- Claro.
- Certo, lá vai. – Ele disse como se fosse revelar o segredo da felicidade. – Seja gentil, dê boa comida a ela e a faça rir.
Fiquei esperando, mas ele não disse mais nada. Então estreitei os olhos:
- Esse é seu conselho paterno?
- Bom, tem funcionado pra mim. – Henry bateu no meu ombro. – Elas ficam ariscas quando estão com fome, e aí reparam cada falta de gentileza que você faz, mesmo que sem querer. E o que você quer, no fim das contas, é mantê-la feliz. Então seja engraçado.
Era tão patético que fazia perfeito sentido. Dava para entender por que minha mãe gostava tanto dele.
- Ah, tem mais uma coisa, . – Henry disse então.
- O quê?
- Seja honesto. Diga a verdade sobre o que sente. Ela vai gostar de ouvir.
Meditei por um instante, assentindo.
- Tá.
- Ótimo, foi bom termos essa conversa. – Ele bateu na minha perna e se levantou. – Agora, onde mesmo está a chave de fenda? Acho que quebrei a pia da cozinha.
POV PIE
[N/A: Meninas, a música tema dessa parte do capítulo, assim como dele como um todo, é “Oops” do Little Mix feat. Charlie Puth. Entretanto, não consegui encaixá-la no capítulo sem que isso interferisse nos diálogos. Por esse motivo, fica a critério de vocês ouvir ou não e encaixar onde vocês quiserem, ok?].
Da última vez que eu tinha vestido aquela roupa eu estava em Denver, observei. Era um short de cintura alta largo que imitava jeans, e uma blusa curta laranja e florida que eu adorava. Me perguntei o que mais eu trouxera de Denver que não me lembrava.
Vi pela janela o carro se aproximando. Respirei fundo e desci.
- Até mais tarde, gente! – Falei para papai e Miguel, que responderam brevemente. Fechei a porta atrás de mim e sorri para , que tinha acabado de parar o carro.
sorriu de volta e acenou, lá de dentro. Depois, parece que se lembrou de algo. Saiu do carro na mesma hora e veio para o outro lado. Me aproximei rindo. abriu a porta do carro.
- Depois de você. – Disse. Pisquei uma vez.
- Tá. – Respondi.
Entramos no carro, e vi papai acenando da janela quando nos afastamos.
🌴💚🌴
Quando chegamos ao parque, o sol estava quase se pondo. A primeira coisa que reparei foi a roda gigante, amarela e enorme. Depois foi a quantidade de pessoas, e então o cheiro de castanhas assadas, porque o outono finalmente tinha chegado.
- E aí? – perguntou olhando para fora.
- Um parquinho, ? Sério? – Forcei uma careta. – Estamos na Flórida. Achei que fossemos a Disney.
- Ah, sinto muito te decepcionar. – sorriu. – Hoje vai ser só o parquinho, castanhas assadas e algodão doce.
- Posso viver com isso. – Sorri.
Descemos do carro e caminhamos até a entrada, onde já ia tirando o dinheiro do bolso para pagar as duas.
- O que pensa que está fazendo? – Arqueei uma sobrancelha.
- Pagando pra nós dois?
- Não mesmo. Nós temos um contrato a seguir, lembra?
- Ah é? – Ele parou e me olhou de um jeito engraçado.
- Hanram. Você disse claramente quando entramos na segunda metade do nosso trato, que se eu quisesse que você participasse de qualquer atividade que não fosse do seu interesse e que exigisse desembolso, tal qual cinema, jantar etc, era eu quem ia pagar, e você disse que essa regra era de extrema importância porque te ensinou a sempre pensar nas eventualidades.
- É um bom ponto. – Ele meneou a cabeça. – Mas eu não vim obrigado hoje, o que quer dizer que a regra não se aplica.
- Bom, eu também quis vir, então é justo que ela se aplique pela metade. – Tirei o dinheiro do bolso e paguei minha entrada.
riu e pagou a entrada dele, balançando a cabeça.
- Então tá.
Entramos juntos no parque. Eu olhava tudo, fascinada. Adorava parques de diversão.
- Quer comer alguma coisa? – perguntou.
- Só depois de ir nos brinquedos que rodam. – Respondi. – Muitos parques vêm aqui?
- Eles vêm mais no verão, pra falar a verdade.
Assenti e continuei andando, mas depois percebi que tinha parado.
- O que foi? – Perguntei voltando.
- Nada, eu só... – Ele olhou para o alto, pensativo. – Eu não queria que isso fosse esquisito. Você sabe, com perguntas sobre o tempo e respostas curtas.
- É. Não. – Concordei rapidamente. – Claro que não. Afinal, nós já saímos juntos antes. Várias vezes.
- É, nós somos...
- Amigos. – Completei.
- Grandes amigos.
- Tá. É.
Ficamos ali por alguns segundos, então decidi quebrar o gelo.
- Conversas de verdade então. – Eu disse.
enfiou as mãos nos bolsos e deu de ombros, concordando.
- Ótimo. – Pensei, e então dei um sorriso perverso. – Então... Quero saber da sua namorada Leslie.
- Ah, fala sério... – riu e saiu andando.
- Mas eu quero mesmo!
Corri atrás dele, sem conseguir segurar o riso. Eu tinha conseguido trazer as coisas de volta para nossa atmosfera, afinal.
O primeiro brinquedo a que fomos foi o Barco Viking. Apesar do medo durante a subida, eu sempre tinha adorado a sensação do frio na barriga quando o brinquedo descia. Gostava quase mais do que da Montanha Russa, que, na minha opinião, era rápida demais.
- Certo, acho que agora posso comer minhas castanhas. – Decretei.
Eu e compramos um pacote de castanhas assadas, e o cheiro me levou diretamente para os Outonos de Denver, com Collie, Ben e minha mãe. Dei um longo suspiro, nostálgica.
- Que houve? – perguntou mordendo uma castanha.
- Eu só... Lembrei da minha casa. – Meneei a cabeça.
- Eu até entendo, mas... Depois de todo esse tempo, ainda não se sente em casa aqui em Jacksonville Beach?
- Há momentos em que sim. – Considerei. – Mas muitas vezes, sinto que sou só uma forasteira no meio de vocês. É a velha história da novata.
- Eu não sinto assim. Para ser bem sincero, sinto como se te conhecesse melhor do que conheço a maioria das pessoas dessa cidade.
- Sem dúvida eu sou muito mais interessante do que as pessoas de Jacksonville Beach, não é? – Brinquei.
- Nem tanto. – deu um sorriso torto. – Tem um maluco que vive embaixo da ponte que jura que a cidade vai ser engolida por um Tsunami.
- Tá, não dá pra competir com isso. – Dei risada. Tinha que admitir minha derrota.
- Veja só, se não é a Casa dos Horrores! – Ele apontou a estrutura.
- Eu é que não vou nesse negócio. – Estaquei.
- Claro que vai. Hoje é um excelente dia para superar essa coisa de se sentir uma estranha em Jacksonville Beach, e, se quer saber, todo mundo nessa cidade adora casas dos horrores.
- Ah é? – Sorri e arqueei uma sobrancelha, sabendo que aquilo era pura palhaçada.
- Eu não mentiria sobre uma tradição, . – disse solene. – Se você ficar com medo, deixo você segurar minha mão. – Prometeu.
Olhei para ele por alguns segundos com ar de riso, até que, por fim, concordei. Segurar a mão dele nem seria tão ruim, afinal.
- Mas se eu tiver um ataque cardíaco, vai ter que explicar ao Miguel que a culpa foi sua.
- Prefiro morrer no seu lugar do que ter que fazer isso. E não é por altruísmo.
Ainda rindo, entramos na fila e, depois, na Casa dos Horrores.
Tudo era sujo e quebrado lá dentro; havia teias de aranha e baixa luz, mas dava para ver que já tinha lâmpadas acesas, porque estava anoitecendo lá fora.
A cada susto que alguém levava com algo estúpido, como esbarrar em uma corda, eu quase morria do coração.
- Eu nunca vou entender que graça vocês veem nisso. – Murmurei.
- O coração acelerado, a adrenalina, talvez? Ou talvez a graça seja só ver os medrosos pulando a cada barulho que ouvem.
Dava para ver seu sorriso debochado para o meu lado, o mesmo sorriso que ele dera em meu primeiro dia na cidade, quando começou a me chamar de Rainbow só por provocação.
Um cara vestido de Fred Krueger entrou na sala correndo como um doido e todos começaram a gritar, tentando escapar. Conseguimos chegar à sala seguinte. Eu ainda podia ver as costas de à minha frente, bem como uma garota morena pirando ao lado.
- Isso é coisa de maluco! – Eu disse nervosa.
Mas antes que respondesse, a luz foi apagada. Ou eles não pagaram a conta de energia. Não dava para saber. A questão é que meu coração parou, e logo depois voltou a bater forte, porque o chão começou a se mexer.
Tateei em volta em busca de apoio, e acabei encontrando a camisa que supus ser de . Minha mão desceu por seu braço até encontrar a dele, que entrelaçou os dedos nos meus. Permaneci daquele jeito até sair daquele maldito brinquedo assassino.
- Isso não vai acontecer de novo. – Eu decidi do lado de fora. – Nunca mais. Nem em um bilhão de anos.
- Ah, não achou nem um pouquinho emocionante? – deu aquele sorriso de novo, me fazendo parar de andar. O encarei por um instante, e só depois percebi que ainda estava segurando a mão dele. Eu a soltei devagar.
- É ridículo. – Cruzei os braços em frente ao corpo só para ter o que fazer com as mãos.
assentiu. Se prestou atenção no que eu tinha feito, não falou nada.
- Vou te compensar pelo que passou. – Disse gentilmente.
- Ah é?
- Hanram. – Ele concordou. – Com algo muito mais cheio de frufru e arco-íris, como uma líder de torcida gosta. – Provocou.
Apesar de saber que ele estava me zoando com aquela história de torcida, acabamos indo parar na barraca de tiro, onde naquele momento tentava ganhar um brinde para mim.
- Então, me conte mais sobre a Leslie. – Pedi, porque ele tinha me enrolado da primeira vez.
- A gente se conheceu através de amigos em comum. – Ele contou enquanto mirava. – Os caras da banda do colégio disseram pra ela que eu tocava contrabaixo.
- Ela era da banda? O que ela tocava?
- Violoncelo. – Ele atirou. – Ela era incrível.
- Incrível, hen? – Ergui uma sobrancelha para ele, que riu e balançou a cabeça. – E por que ela foi embora?
- Justamente por isso. – deu o último tiro, derrubando todas as latas. – Os pais dela queriam que ela tivesse uma preparação melhor para entrar na Julliard. Sabe como é, asiáticos. A escola de Boston tinha um programa de treinamento muito elogiado. Aí a gente terminou.
- E isso partiu seu coração?
- Um pouco. Fazia tempo que eu não levava um relacionamento adiante, e eu realmente tentei fazer as coisas darem certo com a Les. Mas depois de algumas semanas eu me recuperei. E o passou a chamá-la de “A Leslie de Julliard”.
Era uma pena. Talvez ele e A Leslie de Julliard fossem mesmo um casal perfeito. Mas eu não conseguia mentir para mim mesma e dizer que ficava triste pelo término deles.
- Obrigado pelo unicórnio. – Eu ri um pouquinho, abraçando aquele monstro branco. Stevie ia detestar aquele brinquedo, eu já sabia.
- Sem problema. Só vai ter triste quando Stevie estraçalhá-lo. – Comentou. Ele tinha pensado o mesmo que eu.
Já tínhamos ido em vários brinquedos àquela altura, e eu sabia que estávamos perto de ir embora. Até que a coisa mais óbvia e bonita e enorme do lugar chamou minha atenção.
- Vamos na roda gigante? – Chamei. – Antes de irmos embora.
Não tinha tanta fila para o brinquedo, o que foi uma agradável constatação. Deixei meu unicórnio lá embaixo e logo estávamos subindo, subindo, rumo ao topo do parque.
- Eu lembro de uma roda gigante quando eu era pequena, lá em New Orleans. – Contei. – Quando meus pais ainda estavam juntos.
- Você era bem pequena nessa época, não é?
- Sim, mas eu nunca esqueci. Foi uma amiga da minha mãe que subiu comigo, porque a mamãe tinha medo de altura e papai estava tocando no dia. – Lembrei, encantada. – Era tão lindo. Tudo brilhava tanto.
- A vida de vocês devia ser muito boa lá. O Jack fala dessa época comigo às vezes. É como se ele falasse do filme preferido toda vez que lembra daquele tempo.
- Ela era. Me lembro pouco, mas sinto isso em tudo. – Olhei para longe, pensando. – De vez em quando, me pergunto onde eu estaria agora se as coisas tivessem continuado. Se meus pais não tivessem se separado e tivéssemos ficado em New Orleans.
- Sabemos que não estaria aqui agora. – disse bem quando o brinquedo parou, lá no alto.
Olhei para ele, pensando naquilo.
- É, acho que não. – Recostei a cabeça no banco.
- E acha que valeria a pena? – Ele fez o mesmo. – Viver outra vida e abrir mão do que tem agora?
não estava bancando o dramático, como Ben, lá em Denver, teria feito se eu dissesse pensar na minha vida sem ele. Ele só estava pensando sobre aquela possibilidade impossível, como se ele de vez em quando se perguntasse o mesmo sobre a própria vida.
- Acho que não. – Concluí depois de alguns instantes. – Não faz sentido, faz? A cada escolha que fazemos nessa vida, perdemos outra coisa. Eu teria meus pais juntos, mas não teria conhecido a Collie, o Ben, o Stevie e... Você. – Olhei para ele.
olhou de volta para mim, a boca entreaberta. Por um segundo, achei que fosse acontecer alguma coisa, mas então ouvimos o barulho da engrenagem. A roda gigante voltara a se mover, nos levando para baixo.
E enquanto ela descia, eu pensava em como não conseguia imaginar minha vida se eu não tivesse encontrado naquela cidade esquecida da Costa.
Me dei conta do óbvio e me senti patética.
Sofia estava certa o tempo todo. Eu gostava dele. Talvez tivesse gostado desde o primeiro dia, quando ele me salvara do Stevie.
Eu só não sabia dizer como eu não tinha me dado conta disso antes.
Quando descemos do brinquedo, aquela constatação tinha me deixado tão paralisada que eu precisava de alguma coisa para voltar a mim.
- Eu vou comprar um refrigerante. – Falei.
- Eu vou com você. – disse simplesmente.
- Não, só vai demorar mais. – Forcei um sorriso. – Vai ser rápido, quando eu voltar vamos para o carro.
O deixei ali sem dar muita explicação e andei apressadamente até a barraca de refrigerantes mais longe que encontrei. Dizia a mim mesma para me acalmar, mas como? Eu gostava do garoto que tinha feito fingir que era meu namorado aquele tempo todo. Eu gostava dele de verdade e não sabia o que fazer.
Comprei o refrigerante e respirei fundo, me sentando num banco.
Se Sofia estivesse aqui, o que ela diria? Pensei comigo.
A resposta surgiu nítida em minha cabeça. Ela me diria para falar com ele. Para ser honesta. Ela diria que ele gostava de mim também e que eu merecia a chance de ter um relacionamento feliz e normal, com alguém que se importasse comigo.
Era isso que eu tinha que fazer. Tinha mentido sobre tanto, mas não podia mentir sobre aquilo. Me levantei a corri em direção ao lugar onde tinha deixado .
Fui parando devagar quando me aproximei o bastante para vê-lo. não estava sozinho. Para minha surpresa, Summer tinha aparecido, eles conversam alegremente sobre algo.
Só de vê-la ali, a onda de culpa pela noite anterior me atingiu como o Tsunami do velho da ponte, afogando Jacksonville Beach em desgraça.
Eu parei de andar, sem saber ao certo a razão. Talvez só quisesse que aquelas duas pessoas boas tivessem mais tempo para discutir a paz mundial ou para brincarem como quando eram crianças. Me apoiei numa barraca e fiquei observando os dois por alguns instantes. Eles pareciam tão bem, tão à vontade, como se nunca tivessem se afastado na vida. E me veio à cabeça minha conversa com minutos atrás, sobre onde estaríamos se as coisas tivessem sido diferentes antes.
E era aquilo, não é?
De repente, tudo que eu conseguia pensar era em como tudo seria naquele momento se a vida de nunca tivesse virado de cabeça para baixo e ele e Summer Olsen nunca tivessem se afastado.
Summer nunca teria se apaixonado pelo Junior. Porque, àquela altura, ela já teria se apaixonado pelo . E ele... Por Deus, eu nem precisava pensar muito para saber que seria louco por ela. E faria muito sentido. Eles seriam um casal maravilhoso. E a vida dos dois seria melhor do que nas atuais circunstâncias.
Isso era tão óbvio que chegou a doer quando percebi.
Me dei conta de que eu tinha afastado de Rosana porque achava que ele merecia coisa melhor do que uma ladra de namorados cínica, mas isso era exatamente o que eu era. E, sendo assim, nós nunca daríamos certo.
Porque eu tinha ido longe demais. E, na verdade, tinha ido longe demais para voltar atrás, também.
Fechei os olhos e tentei me orientar. Olhe até onde seu plano já chegou, .
Já tinha ido tão longe. Eu estava tão perto. E também, não era como se eu não gostasse do . Eu gostava. Gostava muito.
Era isso. Fazia sentido. Eu ficaria com como tinha planejado, e e Summer poderiam ficar juntos depois. Na verdade, eu só estava devolvendo as coisas ao eixo de onde elas nunca deveriam ter saído.
[…]
POV
O herói do filme estava desesperado para pegar a mocinha do jipe dos bandidos. Ele olhou para tudo que havia disponível ao seu redor: uma arma com a qual ele poderia atirar no motorista, o cavalo no qual poderia montar e tentar alcançá-los lá na frente. Mas de todas as coisas, ele escolheu justamente a mais impossível: uma corda, que amarrou – na velocidade da luz – numa árvore, e então se jogou de lá igual ao Tarzan. Acredite ou não, ele conseguiu pegar a garota do jipe e cair do outro lado. Os dois se beijaram numa cena ridiculamente melosa de filme de ação.
[N/a: Podem dar play nessa, minhas paixonites]
Mas eu estava sorrindo, ainda que um sorriso de ironia. Aparentemente, tinha conseguido me contaminar com seu gosto cinematográfico estranho.
Olhei para o lado pela primeira vez em algum tempo. Não que eu não quisesse olhar antes, mas as coisas estavam meio esquisitas, e eu não sabia até que ponto tinham mudado entre a e eu.
Ela estava dormindo um sono profundo, a cabeça em cima da minha mão como se fosse um travesseiro. Eu já a tinha acordado sem querer uma hora antes, mas ela parecia tão em paz que não queria fazer de novo.
- Então vai ter que dar seu jeito. – Falei baixinho para mim mesmo.
Me mexi com todo o cuidado possível para não acordá-la, puxando minha mão de leve. Depois me inclinei e passei um braço por trás de seus joelhos e outro nas costas, pegando-a no colo. Rainbow franziu o nariz e respirou fundo, mas não despertou.
Fui andando devagar escada acima, torcendo para que o chão não rangesse ou Stevie decidisse vir pulando feito um doido atrás de nós. A porta do quarto dela estava encostada e eu a empurrei com o pé, entrando no cômodo.
A cama de ainda estava bagunçada da noite anterior – os lençóis desdobrados, o travesseiro torto.
A coloquei ali em cima com todo cuidado, ajeitando seus pés e a cabeça. sorriu de olhos fechados, e eu sorri também, embora ela não pudesse me ver. O que quer que estivesse sonhando, devia ser ótimo.
Fui até a janela dar uma olhada no tempo. Já estava esteando. Talvez eu já pudesse ir embora. É, talvez fosse melhor eu ir embora.
Olhei para uma última vez e saí do quarto.
Desci as escadas, mas quando cheguei à porta da frente, um pensamento surgiu em minha cabeça.
E se ela acordasse de repente? E se acontecesse alguma coisa enquanto Jack estivesse fora? E se ela tivesse um pesadelo?
Era muito bobo da minha parte pensar aquilo. sempre ficava sozinha em casa.
Mas, sei lá, eu não queria deixá-la sozinha ali.
Stevie, muito mais rápido com decisões do que eu, passou à minha frente escada acima. Ele sempre dormia no quarto da , o que não era nenhuma garantia de segurança.
Balançando a cabeça para o quão patético eu era, enviei uma mensagem para Henry avisando que ficaria na casa dos Pie até o Jack voltar, e subi as escadas de novo.
Abri a porta devagar. estava na mesma posição em que eu a tinha deixado.
Com toda a delicadeza possível, me sentei ao seu lado na cama e fiquei ali, totalmente sem jeito, sem saber bem por que tinha voltado e sabendo que era muito provável que ficasse ali por horas até que Jack voltasse.
Olhei para Rainbow, dormindo tão serena. Ela era tão bonita. Provavelmente mais bonita do que pensava. E sem dúvida bonita demais para mim.
Para minha surpresa, me peguei bocejando. Nem tinha percebido que estava com sono, mas me senti cansado de repente.
Cogitei descer e me deitar no sofá, mas antes que o fizesse, a mão de tinha achado a minha por acaso, o que me deu um susto. Por um instante, pensei que ela tivesse acordado, mas não era isso. Ela devia estar só sonhando de novo.
Talvez eu pudesse ficar ali e descansar só um pouco.
Escorreguei na cama até estar deitado de lado, sem puxar minha mão.
Fiquei por alguns instantes olhando o rosto dela, meu coração batendo mais rápido e mais devagar ao mesmo tempo. E eu sabia que não era só por ela ser tão bonita. Era tanta coisa, e eu nem sabia explicar. Mas estava ali desde a primeira vez que eu a vira, naquela mesma cama.
Aos poucos minha respiração foi ficando mais pesada. Eu sabia que Stevie também tinha pegado no sono, em cima do travesseiro que Rainbow havia lhe dado. E a última que vi antes de cair no sono também, foi o rosto dela.
[N/a: Podem parar.]
POV PIE
Acordei como se estivesse bêbada. Senti o tecido fino da colcha da minha cama pressionado contra minha bochecha, mas não me lembrava de ter subido as escadas. A última coisa de que eu me lembrava era o sentado ao meu lado no sofá da sala.
Abri os olhos devagar.
E pisquei.
Engoli em seco e pisquei de novo, acordando completamente, mas sem sair do lugar.
Respirando devagar, dormia feito um anjo bem ali, na minha cama, de frente pra mim.
Meu coração começou a bater descompassado – não sabia dizer se pelo susto ou por aquela situação em si.
Certo. Como isso tinha acontecido?
Uma coisa de cada vez, , minha consciência soou na cabeça.
Noite passada, noite passada... Eu estava cochilando e sonhei com ... E aí fiquei morrendo de vergonha e não olhei mais para o lado direito. E agora ele estava dormindo na minha cama. E ele não tinha tirado nem os tênis – constatei olhando pra baixo. Mas o que tinha acontecido?
Deus, que eu não tenha feito nada sonâmbula, pensei mortificada.
Olhei para de novo, não conseguindo deixar de suspirar baixinho. Ele estava tão bonitinho dormindo. Como podia ser? Ninguém ficava bonito de verdade dormindo.
Epa!
Levei a mão a cabeça, me dando conta de que minha cara devia estar pavorosa. Meu cabelo parecia uma maçaroca embaraçada.
Eu tinha que sair dali antes que ele me visse.
Me arrastei para fora da cama, fazendo uso da delicadeza de líder de torcida que ainda estava absorvendo, e quando finalmente fiquei de pé, meus olhos encontraram a janela. O sol atravessava a fresta das cortinas. A chuva tinha passado e...
MAS O QUÊ? QUE HORAS ERAM?
Não, não, não... Então papai e Miguel tinham chegado e visto ali?
Cobri o rosto com as mãos, minhas orelhas queimando.
Mas será que papai não teria nos acordado se tivesse nos visto ali? Certo, talvez ele não, mas o Miguel teria. Não teria?
Saí do quarto de fininho, deixando ali.
Entrei no banheiro e fiquei ali o mínimo de tempo possível. Depois desci as escadas, um passo de cada vez, me preparando para o que poderia ouvir.
Papai estava na bancada, de costas para a porta. Assim que ouviu o barulho dos meus passos, ele se virou.
- Oh, bom dia, Rainbow. – Sorriu tranquilamente.
- Bom dia, pai. – Retribui, nervosa. – Pai, por algum acaso você foi no meu quarto depois que chegou? – A esperança batia em meu peito quando perguntei.
- Fui, sim, como sempre. – Ele assentiu levando a garrafa de café para mesa e se sentando. – Se está perguntando por causa do , eu o vi. Não se preocupe, filha, não vou te mandar para o convento. – Apontou para a cadeira.
Bem mais aliviada, mas ainda morrendo de vergonha, me sentei de frente para ele.
- Vocês dois estavam dormindo um sono tão bom que fiquei com dó de acordá-los. – Papai me serviu um café. – Ele ainda está lá em cima?
- Está. – Respondi. O jeito despreocupado de papai com tudo me deixava perdida às vezes. Mamãe provavelmente estaria pirando àquela altura.
Miguel entrou na cozinha parecendo sonolento, mas me olhou sério por um instante quando me viu. Prendi a respiração, imaginando se ele me daria um sermão.
- Se ficar grávida antes de terminar a faculdade, eu mato o . – Ele disse apenas, e foi pegar uma xícara de café.
- Ahr. – Grunhi, abaixando a cabeça na mesa, encabulada. – Nós não fizemos nada.
- Sei disso. Conheço minha filha, e conheço o quase melhor ainda. – Papai ergueu as sobrancelhas.
- Garotos de dezoito anos são imprevisíveis, Jack. – Miguel alertou.
- Você com certeza era, mas não os meus garotos. – Papai deu um sorrisinho orgulhoso. – Além disso, eles, graças a Deus, estavam vestidos.
- Meu Senhor, chega dessa conversa. – Implorei, fazendo com que papai risse.
Ouvimos barulhos atrás de nós. Stevie entrou na cozinha e foi direto para a tigelinha de ração, que o próprio papai devia ter enchido ao acordar. Logo atrás dele apareceu , um pouco sonolento.
- Oi. – Ele disse.
- Ora, ora. – Papai o encarou com seriedade fingida. – Pode explicar o que aconteceu noite passada, meu rapaz?
ficou um pouco mais acordado, embora não parecesse necessariamente com medo do meu pai – nenhuma novidade. Ao ver Miguel, no entanto, ele inflou as bochechas.
- A dormiu no sofá. – Ele disse, esclarecendo as dúvidas de todos nós. – Eu a levei lá pra cima e acabei pegando no sono também.
Papai sorriu vitorioso para Miguel.
- O que eu disse? – Abriu os braços.
- Pegue no sono quando já tiver chegado na sua casa da próxima vez. – Miguel avisou.
- Tá. – engoliu em seco.
Balancei a cabeça, imaginando se haveria no mundo família mais constrangedora do que a minha.
- Não vai tomar café aqui? – Perguntei a .
- Ah, não... Minha mãe meio que deve estar surtando a essa hora. – Ele balançou a cabeça. – É melhor eu ir.
- Certo, até depois.
assentiu com um sorriso tímido e foi embora.
E eu não consegui tirar o que havia acontecido da cabeça pelo resto do fim de semana.
Coloquei a mochila nas costas, mas estava cedo demais. Me sentei na cama e fiquei ali, pensando.
As coisas estavam tão... Esquisitas, desde que Sofia fora embora.
Na verdade, não eram bem as coisas. Era eu.
Toda aquela confusão com minha prima e tudo que ela tinha dito quando fizemos as pazes parecia ter tido um efeito maluco em mim. Eu simplesmente não conseguia mais agir do mesmo jeito que antes com , e começava a me preocupar com o motivo disso.
Será que Sofia estava certa desde o início? Eu estava gostando do ?
Não... Seria uma ironia muito grande depois de todo aquele trabalho para ganhar o de volta.
Eu só estava suscetível a pensar isso por causa da Sofi e de todas as mentiras que eu tinha inventado. Era isso.
- ! – Ouvi chamar.
Fui até a janela e vi , acenando de dentro do carro. Respirei fundo, acenando de volta, e desci as escadas decidida a voltar ao normal.
- , você precisa sair dessa bad. – disse algum tempo depois, dentro do carro.
- Não estou no clima pra sair, obrigado. – puxou mais o capuz sobre a cabeça e ficou ali, a cabeça encostada no vidro do carro.
Ele estava assim desde a última vez que vira Sofia. Deprimido como estava, fazia parecer que ela tinha morrido. Dava pena de ver. Para melhorar, ele tinha convidado Amber para o baile quando estava com raiva, e agora ela achava que eles estavam mesmo namorando.
- Você vai ver a Sofi de novo, , podemos ir à Venice um dia desses. – Tentei animá-lo.
- Até lá ela já vai ter arrumado um namorado roqueiro que não gagueja quando ela está perto, nem faz referências em excesso a quadrinhos. Mas obrigada por tentar me ajudar.
- Não se preocupa, vai passar daqui a uns dias. – disse para mim.
Assenti e olhei para ele, que estava concentrado na estrada. E fiquei olhando só mais um pouquinho. Talvez por mais uns dois minutos direto. Até que virou para mim de repente.
- Tá tudo bem? – Perguntou.
- Han?
- Tem alguma coisa errada comigo? Quer dizer, você tá olhando pra mim, não tá? Tive a impressão que sim.
- Ah, não. – Balancei a cabeça rapidamente. – Você cortou o cabelo?
-... Sim. Ontem.
- Ficou bom. – Sorri estranha e na mesma hora me virei para a janela. Depois de um segundo, olhei para trás.
Como eu já imaginava, estava me encarando, e eu sabia que tinha sido pega pelo nerd da matemática de novo.
- A gente se vê no intervalo. – sorriu quando nos separamos no corredor.
- Tá. – Meneei a cabeça, e então me aproximei de e lhe dei um beijo no rosto. – Prometo que vou falar pra Emma ser menos cruel com você hoje.
- Valeu, .
Me afastei dos dois e caminhei rumo à minha primeira aula, pensando no exercício avaliativo que teríamos dali a alguns dias. Estava na metade do caminho quando senti um solavanco. Quando dei por mim, estava dentro do armário de vassouras.
- Qual é o seu problema com este lugar? – Franzi o cenho para no escuro.
Ele sorriu e os olhos brilharam a meia luz.
- Nenhum. – Respondeu. – Ele é discreto, ninguém fica reparando no jeito como eu te olho.
Balancei a cabeça. Ele não perdia o jeito mesmo.
- O que você quer? – Perguntei.
- Quero saber o que deu a história da Sofia. Ela não contou que nos viu pro , contou? Ou pro seu pai?
- Não, ela não contou. – Respondi rapidamente. Depois raciocinei um pouco melhor. – Mas ela poderia ter feito. Meu pai ia ficar muito bravo, e o provavelmente arrebentaria sua cara.
A risada debochada de foi quase ofensiva. Ele devia achar que não podia com ele.
- Olha, sei que me arrisquei um pouco demais lá. Arrisquei a nós dois. Estava preocupado com você. – Ele explicou. – Mas já que já ficamos no limite, podemos nos arriscar só mais um pouquinho agora?
Ele foi tão rápido quanto sempre era, quase sutil demais ao aproximar seu rosto do meu.
O problema é que eu não estava como das outras vezes. Meu coração batia rápido e eu via tudo em câmera lenta, mas quando dei por mim, estava pensando...
Em .
Engoli em seco, nervosa ao perceber que estava perto demais, sabendo que eu devia estar ficando louca. Então dei um passo para trás e ele ficou sem entender.
- O que...
- Eu tenho... Tenho que ir.
Saí dali a toda velocidade, tentando descobrir o que havia dado em mim.
Recusar um beijo de , o promissor artilheiro, por estar pensando em , o babá de cachorros.
Não, eu só podia estar enlouquecendo por completo.
- Respira, . Você só tem que respirar. Isso tudo é psicológico.
Deitada no gramado, eu encarava o céu nublado. Era isso, só podia ser. Eu estava pirando porque tinha perdido a noção de realidade e mentira. Era do que eu gostava. Era ele que eu queria.
- Está deitada aí pensando no ? – Uma vez perguntou.
Me levantei na mesma hora, assustada.
- Nossa, parece que viu o fantasma da Jasmine com uma faca. – Emma riu, e deduzi que o primeiro comentário havia sido de Jodi, que a acompanhava, assim como Summer.
- Eu só estava concentrada. – Balancei a cabeça.
- Pensando no ? – Jodi perguntou, as três se sentando no chão ao meu lado. – Porque eu vivo distraída pensando no Brad. Outro dia queimei a comida por isso. A mamãe ficou uma fera.
Summer riu e balançou a cabeça, tranquila.
- Mas é claro que ela estava pensando no . Eu costumava pensar no Junior o tempo todo quando começamos a namorar.
- E agora não pensa mais? – Perguntei automaticamente, a encarando.
Summer olhou para mim por um instante antes de responder, e me preocupei se não teria parecido interessada demais. Então ela disse:
- Penso. É claro que sim. Só que agora pensar no Junior significa pensar também em toda essa situação em que estamos. É diferente do começo do nosso namoro.
- Por falar nisso, , como vai nosso plano? – Emma perguntou.
- É verdade. – Jodi concordou. – Já tem alguns dias desde que mexemos nossos pauzinhos para trazer o Junior de volta.
Oh, droga, elas estavam certas. Toda aquela história com Sofia tinha me distraído dos meus planos, e se eu não tomasse mais cuidado ia parecer muito óbvio que eu não estava nem um pouco preocupada com o namoro de Summer, a não ser num sentido completamente contrário ao que elas imaginavam.
- Ah, é verdade! – Levei a mão à testa e balancei a cabeça. – Desde que a Sofia chegou eu fiquei tão atrapalhada que não fiz mais nada. Sinto muito, Summer.
- Relaxa, Pie, eu entendo. – Summer dispensou. Depois ela sorriu, pensativa. – De todo modo, vai poder voltar a fazer seu trabalho. Está chegando uma data muito importante, que tenho certeza que será muito útil para nossos planos.
- É mesmo? – Fiquei desconfiada. – Que data?
- O baile de Outono! – Jodi se colocou de pé num salto comemorando. – É simplesmente a coisa mais maravilhosa que você verá aqui, ou pelo menos uma delas.
- Nós vamos colocar lindos vestidos e ficar super gostosas. – Emma ficou de pé também, puxando Jodi e dançando teatralmente. – E sair em fotos e ser adoradas pelos mortais, porque agora andamos com a rainha oficial da Jacksonville High!
- E você sem dúvida será convidada pelo . – Summer riu dela.
Emma fechou a cara no mesmo instante, rolando os olhos.
- Você tinha mesmo que estragar tudo, não é, Olsen?
Nós todas rimos dela, e Summer ficou de pé, olhando para mim.
- De qualquer forma, , você tem muito o que fazer para o plano e para a felicidade de todos nesta escola. Como uma líder de torcida e minha nova amiga, é de se esperar que você participe da organização do baile. E não, você não tem opção. – Ela disse quando abri minha boca. – Agora levante desse chão e esqueça um pouco seu namorado. Temos que treinar para o próximo jogo.
Lá estava eu, sentada no sofá, com meu braço direito todo dolorido, tentando decorar minhas falas para o próximo ensaio da peça, amaldiçoando o dia em que tinha aceitado ser líder de torcida. As meninas disseram que eu deveria me sentir orgulhosa, pois claramente sentia muito menos os impactos dos treinos agora, o que significava que eu estava evoluindo, mas tudo que eu queria era tomar um relaxante muscular e nunca mais sair daquele sofá.
- Então é você que tem se atrevido a roubar as ervas do meu jardim? – Li em voz alta, tentando encontrar o tom de voz adequado para Ebony Purplewood. – Droga, , isso ainda tá muito ruim!
Respirei fundo e fechei os olhos, ficando de pé e me esforçando para entrar no personagem.
- Então é você que tem se atrevido a roubar as ervas do meu jardim?! – Perguntei furiosa.
- Com certeza não. Por favor, não chame a polícia.
Olhei para trás e encontrei , com as mãos para o alto, se fingindo de assustado.
- Haha, muito engraçado. – Eu disse envergonhada, colocando o cabelo atrás da orelha e me sentando no sofá de novo.
- Não deu pra resistir. – Ele se sentou ao meu lado. – Esse é o roteiro da peça? – Pegou as folhas na mesinha de centro.
- É sim. – Respondi. – A professora Elizabeth quer veracidade na peça, então é o que eu estou tentando dar a ela.
- Bom, parecia bem real para mim.
Assenti, satisfeita. E infeliz constatei que por alguns instantes quase tinha conseguido ser normal com de novo, mas logo me peguei observando seu rosto enquanto ele lia os papéis. Era um hábito que estava ficando cada vez mais difícil de controlar.
- O que essa Ebony tem com as ervas afinal? – Ele quis saber. – Ela usa para fazer poções?
- Usa, sim. Ela é uma bruxa, não é? – Dei de ombros. – Mas ela não faz nada de mal até o início do segundo ato, que de fato se chamada "Amor Malvado". Ela faz poções para ajudar antes disso. E também usa as ervas para cozinhar e... DROGA, A COZINHA!
Saí correndo dali, seguida por . Tinha me esquecido por completo do ensopado que estava fazendo para o jantar.
- Deus, ainda bem que não queimou! – Suspirei aliviada ao destampar a panela.
- O cheiro está ótimo. – se aproximou.
- É, mas ainda falta uma coisa. – Saí abrindo os armários. – Orégano. Droga, onde está?
Depois de alguns instantes procurando me lembrei.
- Ah, claro, eu coloquei lá em cima da última vez. – Olhei para o armário mais alto. – Mas que bela notícia. – Bufei.
- Qual o problema?
- O treino da torcida me deixou com o braço doendo, não dá para esticar...
- Ah, tá. – coçou a cabeça. – Deixa, eu te ajudo.
Antes que eu tivesse tempo de dizer qualquer coisa, ele tinha agarrado minha cintura e me levantado à altura do armário. Fiquei paralisada por um instante, meu rosto pegando fogo, mas assim que consegui pensar, estiquei a mão e peguei o pote. me colocou no chão, mas eu ainda estava com o coração na boca.
- , você tá bem? – Ele perguntou, o cenho franzido.
Engoli em seco, olhando para ele. Então dava para ver na minha cara que eu estava quase enfartando.
- Estou, eu... Obrigada, eu preciso...
Depois saí correndo lá para cima e fechei a porta do quarto.
Céus, eu estava perdendo totalmente a sanidade. Eu tinha que fazer alguma coisa urgentemente, antes que...
Meu celular vibrou sobre a cama. Me inclinei para ler a mensagem de .
"Hey, Vicentini. Tem uma festa hoje na casa de um conhecido meu em Atlantic Beach. Tá a fim de ir?"
Isso. Era disso que eu precisava: uma boa dose de realidade!
E por realidade eu queria dizer aquela em que eu ainda estava: num plano obstinado de conseguir de volta de uma vez por todas. Um mundo onde eu ainda gostava dele mais do que tudo e meus planos até então não tinham sido totalmente em vão.
Tinha levado menos tempo para chegar ali do que eu esperava, e agora me sentia meio desconfortável. Não conhecia ninguém e provavelmente ninguém sabia quem eu era também.
não sabia que eu estava ali. Eu não tinha dito, porque, apesar de tudo, não estava certa do que ia fazer. Mas ele tinha me passado o endereço da casa de seu amigo – que estava lotada àquela hora – e depois de ver meu pai sair com Miguel para o Roger's, decidi que eu precisava fazer aquilo.
- E aí, está acompanhada? – Um cara moreno e alto me perguntou.
- Eu... – Engoli em seco. – Na verdade, eu... Estou.
Rapidamente me afastei dali. A música era alta e havia gente por todo lado. Eu tinha ido à festas em Denver, mas nunca sozinha.
- O que eu estou fazendo aqui? – Perguntei a mim mesma, recostando numa parede para tentar pensar com calma.
- Ei, gostei do vestido! – Uma garota claramente bêbada sorriu para mim, com um copo de cerveja na mão.
- Obrigada. – Me forcei a sorrir de volta. – Sabe onde fica o banheiro?
- Lá em cima, segunda porta do corredor.
Subi as escadas com cuidado, quase me arrependendo de ter colocado aquele vestido colado, e entrei no banheiro. Estava até mais limpo do que eu esperava.
- Vamos lá, , é só uma festa. – Encarei o espelho. – São só pessoas.
Respirei fundo e saí dali.
- Ei, aí está você! – Era o cara que tinha falado comigo lá embaixo.
Oh, não, era tudo que eu precisava. Um bêbado interessado em mim num lugar onde eu não conhecia absolutamente ninguém.
- Ah, eu... – Comecei.
- Ela não está sozinha, otário.
Olhei para trás e encontrei , e meu coração se encheu de alívio.
Ele caminhou seguro até mim, se aproximando o suficiente para passar a mão na minha cintura e me abraçar por trás. Prendi a respiração.
- Por que não dá meia volta para a mesa de cerveja? – olhou sério para o cara, que estava completamente sem reação. – Vamos, amor.
Eu não perguntei para onde ele estava me levando. Estava simplesmente tão aliviada por ele ter me salvado daquele embaraço que nem pensei nisso. Quando dei por mim, já estava me empurrando para dentro de um quarto vazio e fechando a porta.
Só então soltei todo o ar que estava prendendo.
- Eu achei que fosse entrar em uma situação horrível.
- Mais um minuto e teria entrado. – respondeu neutro. – Eu não achei que você viesse.
- Eu não queria vir com você. – Falei a verdade.
- Ah, desculpe, devo ter interrompido seu encontro com o bêbado do corredor então. – Ele brincou, um sorriso torto debochado. – Talvez queira voltar pra lá.
Agora que o susto tinha passado, acabei rindo também, pensando no quão ridículo aquilo tinha sido.
- Obrigada por me tirar de lá. – Sorri.
- Sem problemas. Eu te convidei, você tendo aceitado ou não, então não fiz mais do que a minha obrigação. – Deu de ombros, se sentando em um puff. – Olha, eu realmente não pensei que você fosse vir. Então queria muito saber: o que deu em você pra aceitar?
[N/a: Ok, OUÇAM ESSA]
Olhei bem para ele pela primeira vez. As únicas luzes do quarto vinham da rua, entrando por uma janela grande, e de um abajur fraco no criado mudo. Mesmo à baixa luz, os olhos de eram tão quanto eu me lembrava, e seu cabelo parecia tão macio quanto sempre. O perfume, um perfume novo, invadiu minhas narinas. Era exatamente o que eu queria indo ali. Queria recuperar minha memória. Meu propósito.
- Eu precisava ver você. – Admiti baixinho.
ficou calado, olhando para mim por algum tempo. Então se levantou:
- Eu também. – Disse.
se aproximou de mim devagar. Meu coração parou.
Uma das mãos dele se encaixou delicadamente atrás da minha orelha, os dedos no meu cabelo. A outra mão pousou na minha cintura.
- Eu precisava... Eu preciso te ver. – Ele sussurrou. – Às vezes acho que eu estou ficando maluco. Às vezes acho que você quer que eu enlouqueça, mas acho que me importo cada vez menos.
Então me beijou, e eu o beijei de volta, porque ouvir aquilo tinha sido muito para mim. Parecia que aquilo era o que eu queria desde que tudo tinha começado. Queria que ele me quisesse de volta. Queria que ele ficasse maluco por minha causa. Eu queria o meu , o que se importava demais comigo para me perder.
foi me levando para a outra parede, as mãos dançando pelas minhas costas, minhas mãos emaranhadas em seu cabelo. O ar ia acabando pouco a pouco.
- EI, TEM ALGUÉM AÍ? – Bateram à porta.
parou, frustrado.
- Droga. TEM SIM, MERDA! – Gritou.
- OS PAIS DO GEORGE ESTÃO VOLTANDO! TODO MUNDO PRA FORA!
olhou para mim e eu estava rindo.
- Droga, vamos sair logo daqui!
E então ele me puxou pela mão porta afora.
Saímos pela porta dos fundos e corremos juntos pelo gramado da casa do George. Ainda pudemos ouvir os gritos da mãe dele do lado de fora quando encontrou as pessoas e a bagunça.
- Coitado do George! – Eu ria.
- Espero que ele sobreviva. – riu também, abrindo a porta do carro para mim. – Ele sabe dar ótimas festas.
[N/a: Ok, podem abaixar o volume e parar, amores, mas não fechem a aba. Vocês vão usar a música de novo]
Vagamos por algum tempo no carro, ainda rindo do que tinha acontecido. Eu me sentia tão viva. Era como voltar no tempo.
- Lembra quando minha tia quase te pegou no quintal? – Eu dizia.
- Sua tia era o menor dos meus problemas. Eu tinha medo mesmo era do T-Rex! – Ele balançava a cabeça, divertido. – Fala sério, aquilo era um cachorro ou um urso?!
- Ele era mansinho pra quem conhecia.
- Se eu só tivesse conhecido aquele bicho depois que você chegou aqui, iria jurar que Sofia o comprou só pra me atacar.
À menção do assunto um pouco mais pesado quebrou um pouco – só um pouquinho mesmo – minha alegria. De repente, estávamos de volta à realidade. Aquela onde havia partido meu coração e Sofia não gostava mais dele, onde tudo havia mudado.
Não havia quase ninguém na rua onde paramos o carro. Algumas casas, um ponto de ônibus com duas pessoas paradas. desligou o carro e olhou para mim.
- E eu que achava que nada ficaria melhor em você do que o uniforme de torcida. – Sorriu.
- Obrigada, mas não acho que vou usar esse troço de novo. – Virei de lado para olhar para ele. – É apertado e fica subindo.
- Não me incomoda tanto assim. – Ele deu um sorriso desavergonhado e eu bati em seu braço. segurou minha mão.
- Então, onde paramos lá na festa?
se aproximou e me beijou de novo, com menos urgência que antes, como se tivéssemos todo tempo do mundo.
- Nossa, eu senti tanta falta disso. – Ele disse. – De te beijar sem que você me empurrasse longe ou que alguém aparecesse pra estragar tudo. De ficar com você como antes.
Queria responder que também tinha sentido falta disso, mas tudo que fiz foi sorrir. Eu estava contente, mas havia uma sensação esquisita no meu peito. Era como se eu sentisse que a qualquer segundo algo de ruim ia acontecer; uma sensação padrão que eu tinha desenvolvido sobre .
Mesmo assim, eu o beijei de volta. Era aquele meu resquício de esperança, o sinal de que eu estava no caminho certo – mesmo que fosse o errado.
- Sabe, eu estava conversando com o sobre você outro dia. – murmurou no meu cabelo.
- É mesmo? – Ri baixinho, sem poder ver seu rosto.
- Hanram. – Ele riu também. – Nós estávamos falando sobre essa minha obsessão maluca por você.
- Você é maluco por mim? – Me afastei alguns centímetros para encará-lo.
- Eu sempre fui. – Ele falou como se fosse óbvio. – Por isso tudo ficou tão difícil quando você voltou. – Sabiamente ele não falou sobre também sentir algo por Summer.
Eu o abracei, quietinha. Eu não precisava ouvir essa segunda parte. Ficava feliz por ele tê-la omitido.
O que importava afinal era ele gostar de mim, não é? Isso faria tudo funcionar. Era meu objetivo.
- É engraçado. – continuou. – Você está aqui agora, ao contrário do que eu esperava. Acho que isso contesta o que eu falei ao .
- O que você falou? – Perguntei com cautela. Lá estava a coisa ruim. Eu sentia ela vindo.
- Falei que às vezes fico pensando que você não gosta de mim na real, sabe? – Ele disse pensativo. – De vez em quando, quando você dá uma de charmosa e depois some, me pego pensando se tudo isso não faz parte de uma vingança. Se você não fica por perto só pra me castigar pelo que eu fiz, sabendo a cada segundo que eu não posso ficar com você. É como se tudo que você quisesse fosse que eu não conseguisse te esquecer.
[N/a: Podem voltar com a música a partir de 2:24 e ouvir até acabar a cena].
Meu coração parou, meu corpo parou. Engoli em seco, sentindo o sangue fugir do meu rosto.
É claro que não era isso que eu estava fazendo. Não era isso que eu queria.
- É loucura, não é? – sorriu, tocando meu rosto.
Era loucura. Eu não estava me vingando. Eu não queria ele só porque ele tinha escolhido Summer. Isso nem tinha passado pela minha cabeça.
Mas será que teria passado por alguma outra parte de mim? Meu coração partido, talvez?
Será que aquilo era exatamente o que eu estava fazendo, sem sequer dar por mim?
De repente, era como se eu fosse cair. Eu queria vomitar.
Olhei para e não queria olhar. Me afastei dele.
- Qual o problema?
Engoli em seco, perdida.
- Eu tenho... Tenho que ir.
Tirei do cinto e saí do carro, fazendo um esforço muito grande para parecer controlada. saiu atrás, mas não pôde atravessar a rua, porque um carro se pôs entre nós.
- , eu disse alguma coisa? – Ele perguntou assustado. Não estava entendendo nada. – Desculpe se te ofendi!
Balancei a cabeça, me afastando cada vez mais, me aproximando da porta do ônibus que estava parando.
- Você não é o problema! – Gritei para . – Eu sou!
ainda estava completamente atônito quando meu ônibus se afastou. Eu o olhei por alguns segundos, mas então joguei a cabeça para trás no banco. Achava que estava tendo um ataque de pânico, devia ser aquela a sensação.
Era o que eu deveria sentir numa situação dessas, certo?
Porque, se estivesse certo, então isso queria dizer que eu tinha estragado minha vida sem motivo algum. Queria dizer que eu tinha acabado com o namoro de alguém que só tinha demonstrado ser minha amiga, que eu tinha mentido até não saber mais dizer a verdade, e que eu tinha destruído todas as minhas chances com alguém que realmente gostava de mim e de quem eu gostava, tudo isso por nada. Tudo por causa de uma vingança estúpida que eu nem queria de verdade. Não que eu soubesse, até aquele momento.
Não. Ele tinha que estar errado.
tinha que estar errado, porque, se não estivesse, eu não sabia como enfrentaria a realidade.
Já era quase hora do jantar e eu não tinha a menor fome, deitada no sofá enquanto meditava sobre tudo.
Tinha meio que fugido de todo mundo durante o dia, na escola, inventado desculpas para ficar sozinha e pensar, sem ter que lidar com ninguém – e por ninguém eu queria dizer e .
Nenhum dos dois tinha culpa do que eu sentia naquele momento, mas eu não podia ficar perto de nenhum deles quando estava tão confusa. Sabia que devia estar muito confuso pela noite passada, e que talvez desconfiasse de que havia algo errado comigo, mas precisava de um tempo para mim.
- Só pode estar com algum problema. – Miguel se sentou na poltrona, me dando um susto. – Pra deixar seu pai fazer o jantar sem supervisão.
Sorri um pouco e me sentei.
- Decidi dar um voto de confiança a ele. – Dei de ombros.
- Muito nobre. – Ele assentiu. – O que está havendo?
Suspirei, pensando em como poderia conversar com ele e me ajudar sem despejar toda verdade.
- Eu quero te fazer uma pergunta, mas tem que me prometer que não vai querer saber por que eu estou perguntando.
- Tudo bem. – Miguel concordou.
Mordi o lábio, pensando.
- Como foi que soube que estava apaixonado pela sua namorada brasileira?
Miguel ponderou por alguns segundos, não olhando para mim. Então disse:
- Quando pensei em ir embora pela primeira vez, depois de ter conhecido ela, e percebi que mesmo que eu fosse, não conseguiria deixá-la para trás. – Suspirou. – Mesmo que eu deixasse o Brasil, sabia de algum modo que jamais conseguiria esquecê-la.
O rosto dele tinha uma expressão tão honesta que chegava a ser tocante.
Eu já tinha sentido aquilo por alguém? Algo tão verdadeiro e definitivo? Que eu sentisse com cada pedaço de mim que nunca ia mudar?
- Agora eu vou quebrar minha promessa. – Miguel estava me encarando. – Por que me fez essa pergunta?
Eu o olhei de volta por alguns instantes, quase decidindo por fim contar toda a verdade, me livrar daquele fardo e pedir um conselho sobre como resolver aquilo tudo.
- Ah, aí estão vocês.
Nos viramos para a porta, onde papai estava parado, recostado à soleira.
- Pai. – Eu disse. – Como vai o jantar?
- Bem, acho que vai ficar bom. Eu só... – Ele parou e deu um longo suspiro. – Eu fiquei um pouco cansado.
Estaria a idade finalmente alcançando meu pai? E eu que pensava que aquelas corridas de fim de tarde tinham um efeito melhor.
Miguel o olhou de forma indecifrável por um ou dois segundos, depois se pôs de pé.
- Deixa que eu termino. – Disse.
- Não precisa, Miguel. – Papai balançou a cabeça.
- Não, eu vou fazer. – Se encaminhou para a cozinha. – Por que não senta um pouco nesse sofá e vê TV com sua filha? Faz tempo que não faz isso, não acha?
- De fato... – Papai ponderou.
Miguel foi para a cozinha e papai se sentou ao meu lado no sofá.
- E então, o que estamos assistindo? – Perguntou.
- Alguma coisa feliz e fácil de entender, eu espero. – Liguei a TV.
Deixei que algum programa qualquer começasse, me aconchegando ao lado do meu velho e maluco pai, desejando que isso pudesse me afastar de todos os problemas, como quando eu era só uma criança.
- Honestamente, acho que você já se questionou, o que era a etapa mais difícil. – Sofia disse ao telefone, enquanto eu esperava que chegasse de carro naquela manhã. Já tinha pensado o bastante, e, embora não chegasse à conclusão nenhuma, não podia me esconder dele para sempre. Portanto, tinha decidido voltar ao normal.
- Acho que você está certa. – Concordei. – No fundo, acho que me sinto mais leve por ter me questionado. Mas agora a dúvida está me deixando maluca.
- É bom sair do controle da situação às vezes, . – Pude ouvir o sorriso em sua voz.
Sorri de volta, embora ela não pudesse me ver. A campainha tocou.
- Que estranho, ele sempre entra direto. – Observei.
- Bom, vai lá ver o que tem de novo. Nos falamos mais tarde.
- Ok. Um beijo, Ariel.
Desci as escadas imaginando se teria acontecido alguma coisa, mas nada parecia anormal quando cheguei lá.
estava abaixado na entrada, brincando com Stevie. Parei sem terminar de descer, dizendo a mim mesma para agir normalmente.
- Oi. – Eu disse.
levantou a cabeça e olhou para mim. Ele ficou calado um instante e inflou as bochechas.
- Oi. – Sorriu então.
Ficamos ali, parados por alguns instantes. Eu não fazia ideia de por que ele parecia tão nervoso.
- . – Ele disse, me surpreendendo por falar meu nome inteiro. – Eu estive pensando... É que chegou um parque na cidade no final de semana...
- Sim?
- E... Queria saber se você não quer ir lá... Comigo.
Pisquei uma vez, arregalando os olhos. Ele estava me chamando para sair? Um encontro?
- Você diz como num... – Comecei.
- Eu só... Pensei que seria legal. Nós dois. E o também não quer sair mais porque não quer ter que levar a Amber a lugar nenhum, então... – Ele disse rapidamente.
- Ah, claro. É, seria legal sim. – Assenti, tentando parecer natural. – Eu vou adorar.
- Bom. – Ele assentiu. – Amanhã à noite então?
- Perfeito. Pode ser.
- Bom.
Ficamos em silêncio mais alguns instantes, até o ponto que não dava mais.
- Vamos pra escola agora? – Apontei para porta.
- Sem dúvida. – me deu as costas, indo para fora.
Ri baixinho enquanto o seguida. Podia ser estranho, mas de repente eu estava ansiosa para sair com ele. Descobrir o que eu sentia, afinal, fazia parte de me questionar.
POV
- É só um passeio, . – Eu falava sozinho em frente ao espelho, tentando me acalmar. – Ela anda com você desde que chegou aqui, não tem por que ficar ansioso.
Mas não adiantava de nada. A verdade era que eu estava nervoso. Obviamente eu já tinha saído sozinho com a outras vezes. Caramba, eu já tinha beijado a várias vezes. Mas eu nunca tinha convidado ela pra sair até meu ímpeto de coragem no dia anterior. Parecia diferente agora.
- , você está aí dentro? – A voz de Henry veio antes que ele abrisse a porta. Ele adentrou o cômodo, o rosto sujo de alguma coisa escura. – Você vai sair?
- Vou sim. – Assenti. – Com a .
- Ah.
Henry ficou ali parado, a cara toda suja, meditando. Eu fiquei parado também, porque não estava entendendo qual era a dele.
- Se me permite dizer, você parece um pouco nervoso pra quem está saindo pela milésima vez com a própria namorada. – Ele comentou.
- É só que... – Me sentei na cama. – As coisas nos últimos dias ficaram meio confusas entre a e eu. Hoje é a primeira vez que saímos depois que voltamos a nos entender.
Henry meditou por poucos segundos, e então se aproximou.
- Olha, , sei que eu não sou seu pai, mas posso te dar uns conselhos?
Dei de ombros, meneando a cabeça.
- Claro.
- Certo, lá vai. – Ele disse como se fosse revelar o segredo da felicidade. – Seja gentil, dê boa comida a ela e a faça rir.
Fiquei esperando, mas ele não disse mais nada. Então estreitei os olhos:
- Esse é seu conselho paterno?
- Bom, tem funcionado pra mim. – Henry bateu no meu ombro. – Elas ficam ariscas quando estão com fome, e aí reparam cada falta de gentileza que você faz, mesmo que sem querer. E o que você quer, no fim das contas, é mantê-la feliz. Então seja engraçado.
Era tão patético que fazia perfeito sentido. Dava para entender por que minha mãe gostava tanto dele.
- Ah, tem mais uma coisa, . – Henry disse então.
- O quê?
- Seja honesto. Diga a verdade sobre o que sente. Ela vai gostar de ouvir.
Meditei por um instante, assentindo.
- Tá.
- Ótimo, foi bom termos essa conversa. – Ele bateu na minha perna e se levantou. – Agora, onde mesmo está a chave de fenda? Acho que quebrei a pia da cozinha.
POV PIE
[N/A: Meninas, a música tema dessa parte do capítulo, assim como dele como um todo, é “Oops” do Little Mix feat. Charlie Puth. Entretanto, não consegui encaixá-la no capítulo sem que isso interferisse nos diálogos. Por esse motivo, fica a critério de vocês ouvir ou não e encaixar onde vocês quiserem, ok?].
Da última vez que eu tinha vestido aquela roupa eu estava em Denver, observei. Era um short de cintura alta largo que imitava jeans, e uma blusa curta laranja e florida que eu adorava. Me perguntei o que mais eu trouxera de Denver que não me lembrava.
Vi pela janela o carro se aproximando. Respirei fundo e desci.
- Até mais tarde, gente! – Falei para papai e Miguel, que responderam brevemente. Fechei a porta atrás de mim e sorri para , que tinha acabado de parar o carro.
sorriu de volta e acenou, lá de dentro. Depois, parece que se lembrou de algo. Saiu do carro na mesma hora e veio para o outro lado. Me aproximei rindo. abriu a porta do carro.
- Depois de você. – Disse. Pisquei uma vez.
- Tá. – Respondi.
Entramos no carro, e vi papai acenando da janela quando nos afastamos.
Quando chegamos ao parque, o sol estava quase se pondo. A primeira coisa que reparei foi a roda gigante, amarela e enorme. Depois foi a quantidade de pessoas, e então o cheiro de castanhas assadas, porque o outono finalmente tinha chegado.
- E aí? – perguntou olhando para fora.
- Um parquinho, ? Sério? – Forcei uma careta. – Estamos na Flórida. Achei que fossemos a Disney.
- Ah, sinto muito te decepcionar. – sorriu. – Hoje vai ser só o parquinho, castanhas assadas e algodão doce.
- Posso viver com isso. – Sorri.
Descemos do carro e caminhamos até a entrada, onde já ia tirando o dinheiro do bolso para pagar as duas.
- O que pensa que está fazendo? – Arqueei uma sobrancelha.
- Pagando pra nós dois?
- Não mesmo. Nós temos um contrato a seguir, lembra?
- Ah é? – Ele parou e me olhou de um jeito engraçado.
- Hanram. Você disse claramente quando entramos na segunda metade do nosso trato, que se eu quisesse que você participasse de qualquer atividade que não fosse do seu interesse e que exigisse desembolso, tal qual cinema, jantar etc, era eu quem ia pagar, e você disse que essa regra era de extrema importância porque te ensinou a sempre pensar nas eventualidades.
- É um bom ponto. – Ele meneou a cabeça. – Mas eu não vim obrigado hoje, o que quer dizer que a regra não se aplica.
- Bom, eu também quis vir, então é justo que ela se aplique pela metade. – Tirei o dinheiro do bolso e paguei minha entrada.
riu e pagou a entrada dele, balançando a cabeça.
- Então tá.
Entramos juntos no parque. Eu olhava tudo, fascinada. Adorava parques de diversão.
- Quer comer alguma coisa? – perguntou.
- Só depois de ir nos brinquedos que rodam. – Respondi. – Muitos parques vêm aqui?
- Eles vêm mais no verão, pra falar a verdade.
Assenti e continuei andando, mas depois percebi que tinha parado.
- O que foi? – Perguntei voltando.
- Nada, eu só... – Ele olhou para o alto, pensativo. – Eu não queria que isso fosse esquisito. Você sabe, com perguntas sobre o tempo e respostas curtas.
- É. Não. – Concordei rapidamente. – Claro que não. Afinal, nós já saímos juntos antes. Várias vezes.
- É, nós somos...
- Amigos. – Completei.
- Grandes amigos.
- Tá. É.
Ficamos ali por alguns segundos, então decidi quebrar o gelo.
- Conversas de verdade então. – Eu disse.
enfiou as mãos nos bolsos e deu de ombros, concordando.
- Ótimo. – Pensei, e então dei um sorriso perverso. – Então... Quero saber da sua namorada Leslie.
- Ah, fala sério... – riu e saiu andando.
- Mas eu quero mesmo!
Corri atrás dele, sem conseguir segurar o riso. Eu tinha conseguido trazer as coisas de volta para nossa atmosfera, afinal.
O primeiro brinquedo a que fomos foi o Barco Viking. Apesar do medo durante a subida, eu sempre tinha adorado a sensação do frio na barriga quando o brinquedo descia. Gostava quase mais do que da Montanha Russa, que, na minha opinião, era rápida demais.
- Certo, acho que agora posso comer minhas castanhas. – Decretei.
Eu e compramos um pacote de castanhas assadas, e o cheiro me levou diretamente para os Outonos de Denver, com Collie, Ben e minha mãe. Dei um longo suspiro, nostálgica.
- Que houve? – perguntou mordendo uma castanha.
- Eu só... Lembrei da minha casa. – Meneei a cabeça.
- Eu até entendo, mas... Depois de todo esse tempo, ainda não se sente em casa aqui em Jacksonville Beach?
- Há momentos em que sim. – Considerei. – Mas muitas vezes, sinto que sou só uma forasteira no meio de vocês. É a velha história da novata.
- Eu não sinto assim. Para ser bem sincero, sinto como se te conhecesse melhor do que conheço a maioria das pessoas dessa cidade.
- Sem dúvida eu sou muito mais interessante do que as pessoas de Jacksonville Beach, não é? – Brinquei.
- Nem tanto. – deu um sorriso torto. – Tem um maluco que vive embaixo da ponte que jura que a cidade vai ser engolida por um Tsunami.
- Tá, não dá pra competir com isso. – Dei risada. Tinha que admitir minha derrota.
- Veja só, se não é a Casa dos Horrores! – Ele apontou a estrutura.
- Eu é que não vou nesse negócio. – Estaquei.
- Claro que vai. Hoje é um excelente dia para superar essa coisa de se sentir uma estranha em Jacksonville Beach, e, se quer saber, todo mundo nessa cidade adora casas dos horrores.
- Ah é? – Sorri e arqueei uma sobrancelha, sabendo que aquilo era pura palhaçada.
- Eu não mentiria sobre uma tradição, . – disse solene. – Se você ficar com medo, deixo você segurar minha mão. – Prometeu.
Olhei para ele por alguns segundos com ar de riso, até que, por fim, concordei. Segurar a mão dele nem seria tão ruim, afinal.
- Mas se eu tiver um ataque cardíaco, vai ter que explicar ao Miguel que a culpa foi sua.
- Prefiro morrer no seu lugar do que ter que fazer isso. E não é por altruísmo.
Ainda rindo, entramos na fila e, depois, na Casa dos Horrores.
Tudo era sujo e quebrado lá dentro; havia teias de aranha e baixa luz, mas dava para ver que já tinha lâmpadas acesas, porque estava anoitecendo lá fora.
A cada susto que alguém levava com algo estúpido, como esbarrar em uma corda, eu quase morria do coração.
- Eu nunca vou entender que graça vocês veem nisso. – Murmurei.
- O coração acelerado, a adrenalina, talvez? Ou talvez a graça seja só ver os medrosos pulando a cada barulho que ouvem.
Dava para ver seu sorriso debochado para o meu lado, o mesmo sorriso que ele dera em meu primeiro dia na cidade, quando começou a me chamar de Rainbow só por provocação.
Um cara vestido de Fred Krueger entrou na sala correndo como um doido e todos começaram a gritar, tentando escapar. Conseguimos chegar à sala seguinte. Eu ainda podia ver as costas de à minha frente, bem como uma garota morena pirando ao lado.
- Isso é coisa de maluco! – Eu disse nervosa.
Mas antes que respondesse, a luz foi apagada. Ou eles não pagaram a conta de energia. Não dava para saber. A questão é que meu coração parou, e logo depois voltou a bater forte, porque o chão começou a se mexer.
Tateei em volta em busca de apoio, e acabei encontrando a camisa que supus ser de . Minha mão desceu por seu braço até encontrar a dele, que entrelaçou os dedos nos meus. Permaneci daquele jeito até sair daquele maldito brinquedo assassino.
- Isso não vai acontecer de novo. – Eu decidi do lado de fora. – Nunca mais. Nem em um bilhão de anos.
- Ah, não achou nem um pouquinho emocionante? – deu aquele sorriso de novo, me fazendo parar de andar. O encarei por um instante, e só depois percebi que ainda estava segurando a mão dele. Eu a soltei devagar.
- É ridículo. – Cruzei os braços em frente ao corpo só para ter o que fazer com as mãos.
assentiu. Se prestou atenção no que eu tinha feito, não falou nada.
- Vou te compensar pelo que passou. – Disse gentilmente.
- Ah é?
- Hanram. – Ele concordou. – Com algo muito mais cheio de frufru e arco-íris, como uma líder de torcida gosta. – Provocou.
Apesar de saber que ele estava me zoando com aquela história de torcida, acabamos indo parar na barraca de tiro, onde naquele momento tentava ganhar um brinde para mim.
- Então, me conte mais sobre a Leslie. – Pedi, porque ele tinha me enrolado da primeira vez.
- A gente se conheceu através de amigos em comum. – Ele contou enquanto mirava. – Os caras da banda do colégio disseram pra ela que eu tocava contrabaixo.
- Ela era da banda? O que ela tocava?
- Violoncelo. – Ele atirou. – Ela era incrível.
- Incrível, hen? – Ergui uma sobrancelha para ele, que riu e balançou a cabeça. – E por que ela foi embora?
- Justamente por isso. – deu o último tiro, derrubando todas as latas. – Os pais dela queriam que ela tivesse uma preparação melhor para entrar na Julliard. Sabe como é, asiáticos. A escola de Boston tinha um programa de treinamento muito elogiado. Aí a gente terminou.
- E isso partiu seu coração?
- Um pouco. Fazia tempo que eu não levava um relacionamento adiante, e eu realmente tentei fazer as coisas darem certo com a Les. Mas depois de algumas semanas eu me recuperei. E o passou a chamá-la de “A Leslie de Julliard”.
Era uma pena. Talvez ele e A Leslie de Julliard fossem mesmo um casal perfeito. Mas eu não conseguia mentir para mim mesma e dizer que ficava triste pelo término deles.
- Obrigado pelo unicórnio. – Eu ri um pouquinho, abraçando aquele monstro branco. Stevie ia detestar aquele brinquedo, eu já sabia.
- Sem problema. Só vai ter triste quando Stevie estraçalhá-lo. – Comentou. Ele tinha pensado o mesmo que eu.
Já tínhamos ido em vários brinquedos àquela altura, e eu sabia que estávamos perto de ir embora. Até que a coisa mais óbvia e bonita e enorme do lugar chamou minha atenção.
- Vamos na roda gigante? – Chamei. – Antes de irmos embora.
Não tinha tanta fila para o brinquedo, o que foi uma agradável constatação. Deixei meu unicórnio lá embaixo e logo estávamos subindo, subindo, rumo ao topo do parque.
- Eu lembro de uma roda gigante quando eu era pequena, lá em New Orleans. – Contei. – Quando meus pais ainda estavam juntos.
- Você era bem pequena nessa época, não é?
- Sim, mas eu nunca esqueci. Foi uma amiga da minha mãe que subiu comigo, porque a mamãe tinha medo de altura e papai estava tocando no dia. – Lembrei, encantada. – Era tão lindo. Tudo brilhava tanto.
- A vida de vocês devia ser muito boa lá. O Jack fala dessa época comigo às vezes. É como se ele falasse do filme preferido toda vez que lembra daquele tempo.
- Ela era. Me lembro pouco, mas sinto isso em tudo. – Olhei para longe, pensando. – De vez em quando, me pergunto onde eu estaria agora se as coisas tivessem continuado. Se meus pais não tivessem se separado e tivéssemos ficado em New Orleans.
- Sabemos que não estaria aqui agora. – disse bem quando o brinquedo parou, lá no alto.
Olhei para ele, pensando naquilo.
- É, acho que não. – Recostei a cabeça no banco.
- E acha que valeria a pena? – Ele fez o mesmo. – Viver outra vida e abrir mão do que tem agora?
não estava bancando o dramático, como Ben, lá em Denver, teria feito se eu dissesse pensar na minha vida sem ele. Ele só estava pensando sobre aquela possibilidade impossível, como se ele de vez em quando se perguntasse o mesmo sobre a própria vida.
- Acho que não. – Concluí depois de alguns instantes. – Não faz sentido, faz? A cada escolha que fazemos nessa vida, perdemos outra coisa. Eu teria meus pais juntos, mas não teria conhecido a Collie, o Ben, o Stevie e... Você. – Olhei para ele.
olhou de volta para mim, a boca entreaberta. Por um segundo, achei que fosse acontecer alguma coisa, mas então ouvimos o barulho da engrenagem. A roda gigante voltara a se mover, nos levando para baixo.
E enquanto ela descia, eu pensava em como não conseguia imaginar minha vida se eu não tivesse encontrado naquela cidade esquecida da Costa.
Me dei conta do óbvio e me senti patética.
Sofia estava certa o tempo todo. Eu gostava dele. Talvez tivesse gostado desde o primeiro dia, quando ele me salvara do Stevie.
Eu só não sabia dizer como eu não tinha me dado conta disso antes.
Quando descemos do brinquedo, aquela constatação tinha me deixado tão paralisada que eu precisava de alguma coisa para voltar a mim.
- Eu vou comprar um refrigerante. – Falei.
- Eu vou com você. – disse simplesmente.
- Não, só vai demorar mais. – Forcei um sorriso. – Vai ser rápido, quando eu voltar vamos para o carro.
O deixei ali sem dar muita explicação e andei apressadamente até a barraca de refrigerantes mais longe que encontrei. Dizia a mim mesma para me acalmar, mas como? Eu gostava do garoto que tinha feito fingir que era meu namorado aquele tempo todo. Eu gostava dele de verdade e não sabia o que fazer.
Comprei o refrigerante e respirei fundo, me sentando num banco.
Se Sofia estivesse aqui, o que ela diria? Pensei comigo.
A resposta surgiu nítida em minha cabeça. Ela me diria para falar com ele. Para ser honesta. Ela diria que ele gostava de mim também e que eu merecia a chance de ter um relacionamento feliz e normal, com alguém que se importasse comigo.
Era isso que eu tinha que fazer. Tinha mentido sobre tanto, mas não podia mentir sobre aquilo. Me levantei a corri em direção ao lugar onde tinha deixado .
Fui parando devagar quando me aproximei o bastante para vê-lo. não estava sozinho. Para minha surpresa, Summer tinha aparecido, eles conversam alegremente sobre algo.
Só de vê-la ali, a onda de culpa pela noite anterior me atingiu como o Tsunami do velho da ponte, afogando Jacksonville Beach em desgraça.
Eu parei de andar, sem saber ao certo a razão. Talvez só quisesse que aquelas duas pessoas boas tivessem mais tempo para discutir a paz mundial ou para brincarem como quando eram crianças. Me apoiei numa barraca e fiquei observando os dois por alguns instantes. Eles pareciam tão bem, tão à vontade, como se nunca tivessem se afastado na vida. E me veio à cabeça minha conversa com minutos atrás, sobre onde estaríamos se as coisas tivessem sido diferentes antes.
E era aquilo, não é?
De repente, tudo que eu conseguia pensar era em como tudo seria naquele momento se a vida de nunca tivesse virado de cabeça para baixo e ele e Summer Olsen nunca tivessem se afastado.
Summer nunca teria se apaixonado pelo Junior. Porque, àquela altura, ela já teria se apaixonado pelo . E ele... Por Deus, eu nem precisava pensar muito para saber que seria louco por ela. E faria muito sentido. Eles seriam um casal maravilhoso. E a vida dos dois seria melhor do que nas atuais circunstâncias.
Isso era tão óbvio que chegou a doer quando percebi.
Me dei conta de que eu tinha afastado de Rosana porque achava que ele merecia coisa melhor do que uma ladra de namorados cínica, mas isso era exatamente o que eu era. E, sendo assim, nós nunca daríamos certo.
Porque eu tinha ido longe demais. E, na verdade, tinha ido longe demais para voltar atrás, também.
Fechei os olhos e tentei me orientar. Olhe até onde seu plano já chegou, .
Já tinha ido tão longe. Eu estava tão perto. E também, não era como se eu não gostasse do . Eu gostava. Gostava muito.
Era isso. Fazia sentido. Eu ficaria com como tinha planejado, e e Summer poderiam ficar juntos depois. Na verdade, eu só estava devolvendo as coisas ao eixo de onde elas nunca deveriam ter saído.
21- The new girl in town
"You'd better tell the homecoming queen to hold on to her crown… Or she's gonna loose it to the new girl in town."
[…]
Depois de termos encontrado Summer no parque e das minhas conclusões reveladoras, eu não consegui – ou quis – falar mais muita coisa. Parecia que qualquer coisa que eu dissesse ao depois de como tínhamos nos divertido seria errada, como se qualquer coisa fosse criar uma falsa esperança sobre nós. Assim, falei o mínimo possível quando estávamos com Olsen e fiquei muda no carro, esperando que ele acreditasse que eu só estava cansada.
Quando o carro finalmente parou em frente à minha casa, tentou começar a falar.
- , tem uma coisa que eu preciso te dizer...
E não, eu não podia deixá-lo terminar. Seria doloroso demais, para nós dois. Então eu o cortei:
- Acho melhor deixar para outra hora. – Desatei o cinto. – Eu preciso muito ir ao banheiro agora. Acho que bebi refrigerante demais.
pareceu meio decepcionado, confuso com a minha pressa. Ainda assim, ele assentiu.
- Tá, tudo bem. – E o modo como ele disse aquilo apertou meu coração.
Olhei para ele gentil, mas rapidamente:
- Bom, foi divertido. – Eu disse. – A gente se vê amanhã.
Saí do carro a toda velocidade, entrei em casa e fechei a porta. Miguel e papai deviam estar no Roger's, porque pelo visto não tinha ninguém ali. Fiquei encostada à porta por alguns minutos, até ouvir o carro de – que ficou parado por mais tempo, talvez pensando em como eu era estranha – ir embora. Dei um longo suspiro, fechando os olhos – a testa encostada à porta.
Nunca antes daquele dia eu tinha querido tanto ouvir o que tinha para me dizer.
🌴💚🌴
Sabendo que o resultado seria catastrófico se eu encontrasse com antes de me estabilizar emocionalmente, fiz o impossível para não encontrá-lo pelo resto do fim de semana. E por impossível pode-se entender ir para a casa da Emma e ficar lá ouvindo sobre campeonatos de torcida e deixando que ela falasse pelos cotovelos.
- Esse ano, nós vamos ganhar daquelas vacas. – Emma dizia estalando o pescoço. – Aquela ridícula da Chelsea tem feito mil e uma publicações provocando a gente. Quer dizer, ela é tão presunçosa que acha que vamos perder nosso tempo stalkeando ela!
Ela estava falando de Chelsea Pritchett, a líder das torcedoras dos Blue Eagles. Para minha própria segurança, achei melhor não comentar o fato de que Emma de fato andava stalkeando a garota.
- Ah, mas que droga. – Falei ao me lembrar de algo de repente.
- O que foi? – Emma se virou para mim.
- Esqueci de devolver um livro na biblioteca na sexta. – Expliquei. – Vou ter que pagar dois dólares de multa amanhã.
Emma olhou bem para mim, uma sobrancelha arqueada.
- Sério? – Perguntou.
- É, sério. Um dólar por dia.
- Não, digo tipo... É sério que ainda se preocupa com esse tipo de coisa? Por favor, , você é uma líder de torcida agora. – Ela rolou os olhos e voltou a fuçar as redes sociais de Chelsea Pritchett.
- E isso quer dizer que...? – Eu não estava entendendo o ponto.
Emma deu risada, mal olhando para mim.
- Fala sério. – Balançou a cabeça. – Quem cuida dos registros da biblioteca? Stuart Johnson, o estagiário? Ou ainda é aquela velha da senhora Parker?
- Stuart está cuidando dos registros para a senhora Parker. Mas eu ainda não entendi o que quer dizer.
- O que quero dizer, miss lenta, é que, sendo uma líder de torcida, você não precisa se preocupar com essas coisas. Ninguém vai cobrar nada de você, porque todos te amam e são gratos por você espalhar sua beleza por aí e ganhar campeonatos.
- Isso parece errado. – Franzi o cenho.
- A existência dessa maldita Pritchett também, mas é a vida, não é? Coisas erradas, coisas certas. – Ela deu de ombros e me encarou com severidade. – Você recebeu uma dádiva: as pessoas querem fazer coisas para vocês. Elas se sentem bem quando você está satisfeita. Deixe que elas cumpram seu papel na cadeia social em paz e aproveite.
- Você já usou isso a seu favor? – Eu estava impressionada com a naturalidade com a qual ela falava daquilo.
- Já, ganhei um donnut extra numa lanchonete porque estava usando meu uniforme. E daí? – Ela parecia cansada de explicar. – São só favores, . Você não está pegando a alma ou a dignidade de ninguém.
Fiquei pensando se concordava. Mas para mim parecia muito mais do que algo simples. E também, eu não sabia se era vista como líder de torcida o suficiente para ter vantagens.
- Ah, Deus, você é tão bobinha às vezes. – Emma continuou falando sozinha. – Parece que preciso te ensinar tudo... – Então ela olhou para mim, uma sobrancelha arqueada. – É, talvez precise mesmo.
Emma pegou o celular à sua frente e começou a discar, me fazendo ter um de déjà vu do dia em que Jodi tinha me enfiado de mala e cuia no mundo da torcida.
- O que você tá fazendo? – Perguntei com cautela.
- Ligando para as meninas. – Ela disse como se fosse óbvio. – Está na hora de trazer você para o mundo real.
🌴💚🌴
- A primeira coisa que você tem que ter em mente, é que não está passando a perna em ninguém. – Emma disse puxando uma blusa de uma arara, enquanto andávamos por uma loja do shopping. – Não na maioria das vezes, pelo menos.
- Não quando você tem consciência de que não é a dona do mundo. – Jodi corrigiu Emma. – Você não precisa ser má com ninguém só por ser uma líder de torcida, mas as pessoas gostam de ser gentis com você.
- Aceitar as gentilezas é basicamente sua obrigação. – Emma jogou uma blusa em cima dela.
- E você, o que diz sobre isso? – Me virei para Summer. – Você é a mais experiente nesse assunto.
- Só não deixe a torcida te subir à cabeça. – Summer disse calmamente. – Fazer acrobacias e ser bonita são coisas que podem te render vantagens, mas você ainda tem que ser você no fim do dia.
- Tão inspiradora! – Jodi suspirou.
- Minha eterna musa. – Emma apertou a bochecha de Summer, que sorriu.
- E quanto às vantagens... – A loira fez uma cara engraçada.
Antes que ela terminasse de falar, um rapaz de cabelo platinado veio correndo em nossa direção, como se tivesse visto uma aparição milagrosa.
- Senhorita Olsen! – Ele a cumprimentou e Summer se inclinou (já que ela era maior que todos nós) para lhe dar um beijo no rosto.
- Nico! – Ela sorriu. – Como vai?
- Tão bem! – Ele respondeu. – Depois da sua campanha no semestre passado as vendas subiram mil por cento! – Ele levou o dedo ao alto teatralmente.
- Foi muito divertido fazer a campanha! – Ela assentiu sorrindo. – Fico feliz em saber que foi um sucesso.
- Sucesso? Sucesso é muito pouco, querida. – Ele fez uma careta. – Quer saber? Que tal se vocês fizessem uma propaganda ambulante da nossa nova coleção? – Nos olhou com empolgação. – Será ótimo ter Summer Olsen e suas lindas amigas andando pela cidade com nossas roupas. – Enfiou a mão no bolso. – Aqui estão quatro vale-presentes para as roupas que lançamos essa semana. Elas estão no corredor à direita.
Eu não estava acreditando que estávamos ganhando roupas de graça só para que Summer andasse pela rua dizendo onde as tinha comprado. Emma estava com um sorriso malicioso no rosto e Jodi era o retrato da alegria.
O rapaz se despediu de nós e voltou para onde quer que ele ficasse quando não havia ninguém famoso em sua loja.
Emma pigarreou, fazendo com que Summer olhasse para ela.
- O que mesmo você ia dizendo sobre as vantagens? – Ergueu uma sobrancelha.
Summer riu e mordeu o lábio, olhando então para mim com um sorriso sapeca.
- Aproveite! – Completou.
Pelo resto da tarde, conversamos sobre as vantagens de ser uma líder de torcida e até que ponto eu podia ir. Para Emma, claramente não havia muito limite. Jodi permaneceu com seu ideal de ser uma pessoa boa apesar da popularidade – uma filosofia de vida nitidamente compartilhada por Brad Winter, seu namorado. Summer me disse para aproveitar com sabedoria, mas para ser fiel a mim mesma. E era isso. A fórmula da felicidade em uniformes curtos.
Enquanto ia para casa, me sentia um pouquinho mais feliz por ter pelo menos conseguido tirar os problemas da cabeça por algumas horas.
- Não se esqueça de que amanhã temos a primeira reunião do comitê de baile. – Jodi lembrou quando chegávamos à minha rua.
- Não acredito que finalmente estamos indo a uma! – Emma fez uma careta assustadora de felicidade. Confiante do jeito que ela era, às vezes eu quase me esquecia que ela tinha sido uma desconhecida na Jacksonville High por tanto tempo.
- O que eu tenho que fazer? – Perguntei.
- Só estar presente e opinar sobre o que acha bom ou não. – Summer explicou.
- Tudo bem. – Assenti tirando o cinto. – Nos vemos amanhã.
- Ok. – Ela disse. – Ah, só uma última coisa...
Parei para ouvir o que ela tinha a dizer. Em vez de falar, Summer estendeu a mão para o meu cabelo e, em um movimento rápido, jogou ele todo para o lado direito, amassando e bagunçando-o um pouco. Ela virou meu rosto para as meninas e as encarou.
- E então, o que acham?
Emma estudou meu rosto. Jodi moveu a cabeça em aprovação.
- Muito bom mesmo. – Emma disse. – Quase parece outra pessoa.
Olsen sorriu, satisfeita, e eu desci do carro, meio em dúvida sobre o que elas tinham dito.
Cheguei ao meu quarto um tanto quanto cansada e joguei a bolsa sobre a cama. Ia ao banheiro, mas então me lembrei do espelho no canto. Me aproximei dele, observando a minha figura refletida – o vestido de moletom emprestado de Summer, o cabelo todo jogado de lado, que parecia mais claro do que quando eu chegara à cidade, muito provavelmente por causa do sol. Até meus olhos tinham um brilho diferente.
Emma estava certa. De repente, eu parecia outra pessoa.
🌴💚🌴
A reunião ia acontecer numa sala especial para esse tipo de assunto. Ela ficava perto do auditório onde o grupo de teatro se reunia, mas eu nunca tinha entrado ali.
Reparei algumas pessoas me encarando. Assenti para algumas delas, embora Emma tivesse me dito para não parecer boazinha demais.
- Ei! – Ouvi então.
Respirei fundo, sabendo que era mais que hora de voltar ao normal e esquecer o que havia acontecido nos últimos dias. Questão de sobrevivência.
Sorri ao encontrar vindo em minha direção, muito embora ele parecesse mais sério que de costume.
- Oi. – Eu disse.
- Oi. – Ele disse meio tenso. – Eu queria muito te ver... Desde o que aconteceu na casa do George.
- Olha, , desculpa por aquilo, tá bom? – Pedi tocando seu braço de leve. – Eu meio que surtei naquela noite. Acho que eu tinha bebido um copo na festa e me subiu à cabeça.
Ele me olhou por um instante, mas assentiu.
- Tudo bem, acontece. – Deu um meio sorriso. – Foi um surto e tanto, na verdade, mas quem nunca bebeu demais, não é?
A bem da verdade, eu nunca. Nem naquela noite. Mas não precisava saber disso.
- Então estamos bem? – Ele perguntou.
- Claro que sim. – Sorri. – Olha, tenho que ir para a reunião do comitê de baile agora.
- Tudo bem. – Ele me deu um beijo no rosto. – Nos vemos depois.
se afastou e eu entrei na sala de reuniões. Não havia só líderes de torcida ali, mas também não havia muita gente. Passei pelos rostos desconhecidos que me observavam com curiosidade e fui me sentar junto com Summer e as garotas.
- Vi o Junior lá fora. – Ela foi logo sussurrando. – O que ele queria?
A esperança de Summer me deixava um pouco tensa, mas eu estava ficando cada vez melhor em lidar com isso.
- Ele estava comentando que está muito ansioso para próximo jogo. – Eu disse. – Acho que ele precisa se distrair um pouco, sair e esvaziar a cabeça.
- Acho que eu podia convidá-lo para sair então. – Summer sorriu. – O que você acha?
- Acho que você deve tentar. – Incentivei. A verdade era que por algum motivo eu tinha um palpite muito forte de que Junior não aceitaria sair com ela naquele momento, e eu queria que ela descobrisse isso por si própria. Essa era uma tática nova que eu tinha decidido adotar depois de perceber que funcionava muito bem: deixar que eles se desiludissem sozinhos.
- Tá, vou mandar uma mensagem. – A loira tirou o celular do bolso e começou a digitar.
Fiquei observando o resto das pessoas na sala, conhecidas e desconhecidas por mim. O que eu deveria falar naquela reunião? Deveria realmente me intrometer a dar alguma opinião? Ou eu só estava lá porque era amiga de Summer?
De todo modo, meu pensamento de tudo isso era intensificado pelo olhar direto de um garoto sentado longe de nós. Ele tinha cabelo cor de avelã e olhos no mesmo tom, e me encarava de um jeito um tanto quanto perturbador – como se esperasse algo de mim, como se estivesse tão curioso sobre minha participação quanto eu mesma.
Quando todos já estavam sentados, Summer tocou meu braço, indicando que era hora de começar.
- Bom dia, comitê. – Ela se levantou e disse. – Bem, estamos aqui reunidos hoje para decidir o tema do baile de Outono deste ano, que vai ser muito importante, não só por ser o primeiro baile do ano letivo, mas porque agora boa parte de nós somos oficialmente veteranos. – Ela sorriu de orelha a orelha.
Todos começaram a comentar, animados, sobre o fato de estarem no último ano. Por um segundo, fiquei um pouco triste, porque eu, Collie e Ben sempre tínhamos esperado por esse momento juntos e agora eles estavam longe demais, vivendo tudo sem mim. Ainda assim, não era de todo ruim participar do animado ano sênior da Jacksonville High.
- A mesa agora está aberta a sugestões. – Olsen decretou, sentando-se de novo.
Um garoto ruivo levantou a mão.
- Bem, já que o baile será em outubro, podemos fazer uma festa de Halloween. – Disse.
- Já fizemos isso ano retrasado, Billy. – Teddy Moore rolou os olhos.
- E nem pensem naquela estupidez de personagens de filmes de novo. – Jasmine fez uma careta.
- Lembram da Maya Burnes vestida de Galadriel do Senhor dos Anéis? – Emma começou a rir sua risada de porquinho, mesmo tentando ser discreta. Até Jasmine se uniu ao coro de risos.
- Com aqueles pés, ela mais parecia um Hobbit. – Teddy deu um sorriso maldoso. – Pobre Maya.
Pobre Maya, sua orelha devia queimar o tempo todo, como dizia mamãe. Desde que eu entrara em seu lugar na torcida, tinha ouvido tantas piadas sobre seus pés tortos que poderia fazer um retrato deles.
Mas de fato, para mim, parecia que o baile daquele ano pedia algo a mais do que os temas já usados antes. Tudo estava indo tão bem! Tínhamos vencido os Blue Eagles no primeiro jogo da temporada, éramos veteranos... Algo incrível precisava ser feito, mas eles eram tão ácidos e diretos ali que fiquei com um pouco de receio de levar uma patada assim que abrisse a boca.
Então o garoto, aquele que estava me encarando antes, levantou sutilmente a mão. Todos ainda estava rindo, mas Summer os silenciou ao vê-lo.
- Perry. – Ela disse. – Tem alguma sugestão?
- Eu não. – Ele balançou de leve a cabeça. – Mas acho que sua amiga tem. – Apontou para mim.
Imediatamente todos se viraram em minha direção. Eu não sabia se me sentia agradecida pela gentileza ou se ele tinha feito aquilo por maldade, mas já que tinha a vez agora, decidi arriscar.
- Sem querer puxar a corda para o lado de algo que eu gosto... Mas eu pensei que o tema poderia ser os anos 20. E jazz.
Por um instante todos ficaram em silêncio. Então Teddy assentiu.
- É... Eu gosto dessa ideia. – Deu um sorriso sutil.
- As roupas eram lindas, não é? – Jodi olhou para os outros.
- Até que seria divertido. – Jasmine ponderou.
E então todos começaram a falar ao mesmo tempo sobre as possibilidades, animados com a ideia de música ao vivo – trazida pelo meu pai, já que a ideia fora minha – e bebidas e figurinos maravilhosos.
- , que ideia fantástica! – Summer riu, apertando meu ombro. – Eu sabia que ia ser uma ótima ideia trazê-la.
Quando a reunião finalmente acabou, com o tema do baile definido – Anos 20: A era do Jazz –, eu segui as meninas pelo corredor, porque tínhamos uma aula juntas. Não muito depois de termos saído da sala, no entanto, alguém nos chamou.
- Ei!
Viramos para trás para encontrar aquele garoto, o tal Perry, acenando. Summer e as meninas pararam de andar, o que queria dizer alguma coisa, visto que Emma não tinha muita paciência com ninguém. Eu não me lembrava de ter visto Perry na mesa VIP, nem mesmo nos corredores da escola; mas se ele tinha cara para chamar Summer assim com tanta naturalidade, queria dizer que ele era alguém relevante.
- Algum problema, Perry? – Ela perguntou quando ele se aproximou.
- Nenhum, Olsen, muito pelo contrário. – O rapaz negou. – Só queria dar os parabéns à sua amiga pela excelente sugestão. E os abutres lá dentro não deixam ninguém ser ouvido. – Sorriu.
- Bom, você fez com que eles parassem para me ouvir, não é? – Ergui uma sobrancelha. Perry também, em resposta a minha observação.
- E minha amiga tem nome, só pra constar. – Summer lembrou.
Estendi a mão para o garoto, que a segurou.
- Pie. – Me apresentei.
- . É claro que você é a . – Ele deixou escapar um riso misterioso. – Eu sou Perry Gold. É um prazer.
- Perry é editor chefe do jornal da escola. – Summer explicou então.
- Eu vi seu nome na reportagem sobre o jogo contra os Blue Eagles e sua foto de longe, já que eu não cobri o evento – Perry disse. – Mas sem dúvida pessoalmente sua personalidade é muito mais interessante.
Novamente, eu não sabia se ele estava me criticando ou me elogiando. Parecia que ser ambíguo era uma característica do garoto. E, embora o ar de mistério pudesse ser até um pouco charmoso a seu modo, não era algo de que eu gostasse realmente.
- Obrigada. Ou não. – Olhei para ele de um jeito não tão sério, mas sem dar muita corda. – É melhor irmos, não é? Não quero chegar atrasada.
- Claro. – Gold assentiu. – Tenho certeza de que vamos nos ver de novo em breve, Pie. Até mais, Olsen.
Perry foi embora e voltamos a andar. Emma riu e balançou a cabeça.
- Sempre achei que esse Gold tem uma cara danada de quem não vale nada. – Ela comentou. – Procede, Summer?
- Perry não é fácil. – Ela ponderou. – Mas faz o trabalho dele como ninguém. É do tipo que consegue tecer palha em ouro; fazer o evento mais estúpido ou a pessoa mais simples parecerem invejáveis.
- Aquele olhar me dá arrepios. – Jodi fez uma careta. – Lembro até hoje da matéria que ele fez sobre o pobrezinho do Brad falando sobre como ele frequentou o acampamento de gordinhos na infância.
Emma deu risada da lembrança e levou uma cotovelada de Jodi.
- De todo modo, , não precisa ter medo do Perry. – Summer garantiu. – Ele é só um pouco... Intenso. E curioso.
- Um repórter nato, no fim das contas. – Emma deu de ombros.
Mas sem dúvida não me agradava a ideia de ter alguém tão curioso interessado em mim quando eu tinha tanto a esconder.
🌴💚🌴
Voltei para casa de carona com Jodi e o pai dela na hora do almoço, porque meu único compromisso naquela tarde seria o ensaio da peça, que só aconteceria às 16:00. Assim, preparei e comi uma salada cozida e nuggets assados, tirei um cochilo e adiantei o dever de casa atrasado. Quando me dei conta, já estava na hora de voltar para escola. Estava colocando uma camiseta limpa quando meu celular piscou com a luz azul, o que significava que eu tinha recebido um e-mail.
- Talvez seja a mamãe. – Falei sozinha. Mamãe ainda gostava muito de e-mails, embora um pouco menos que meu pai.
Mas não era da minha mãe. Era da senhorita Elizabeth.
Meus adoráveis monstrinhos,
Devido a compromissos de última hora, estou cancelando os ensaios que teríamos essa semana. Aproveitem a folga para decorar os textos!
Vejo vocês na próxima segunda.
Eu nem sabia que a senhorita Elizabeth tinha meu e-mail até aquele momento. Balancei a cabeça. Estava ansiosa para o ensaio, mas descansar um pouco também não ia doer. Embora, é claro, eu estivesse fazendo de tudo para encher minha cabeça. Talvez dar uma volta por aí com Stevie ajudasse.
É, talvez eu devesse fazer isso!
Troquei a roupa que estava vestindo pela roupa que usava para fazer exercícios – o que acontecia com cada vez mais frequência por conta da torcida – e desci as escadas, encontrando um Stevie feliz e saltitante.
- Que bom que está tão animado, bebezão! – Brinquei com ele, colocando a coleira. – Vamos, hoje somos só eu e você.
Corri em direção à praia com Stevie, que parecia alegre em me acompanhar. Todos que nos viam achavam graça naquele cachorro enorme todo bobão e sempre que parávamos para descansar vinha uma criança querendo brincar com ele. Me lembrei de Rosana Wayans morrendo de medo dele e ri sem explicar o motivo.
De todo modo, meu passeio com Stevie me fez relaxar. Minhas preocupações tinham ficado em segundo plano e eu tinha conseguido focar minha atenção por algum tempo em como aquela cidade era tranquila. Talvez por isso papai estivesse conseguindo sossegar ali. Talvez ele precisasse de paz.
Voltei para casa com as energias renovadas, desejando mais que tudo um banho quente para completar minha paz de espírito.
Deixei Stevie brincando no quintal e subi as escadas, me enfiando debaixo do chuveiro por tempo suficiente para esquecer que o mundo existia.
Estava me vestindo, quando ouvi passos na escada.
Bateram à porta.
- Um segundo. – Eu disse me enfiando na camisa branca. – Pode entrar.
apareceu debaixo da soleira ao empurrar a porta e meu coração parou por um segundo. Eu não tinha falado de verdade com ele depois do sábado. Não sabia o que falar, embora soubesse que tinha que dar um jeito de descobrir.
- Ei. – Ele disse com a calma habitual. – Até que enfim te achei. Você foi de ônibus hoje. Por quê?
- Eu precisava conversar com a Jodi. – Embromei.
- Ah. - Franziu o cenho. – Pensei que Brad Winter levasse ela pra escola agora.
- Não hoje. – Sorri. – Coisas de garota. Você sabe, falar do baile e tal.
- É, eu ouvi falar do tema. – sorriu se aproximando. Eu queria dar um passo para trás, mas a cama estava bem atrás de mim. – Seria um palpite muito arriscado dizer que você teve alguma coisa a ver com isso? – Arqueou uma sobrancelha.
Era o sorriso. Aquele sorriso que fazia as bochechas de Jodi ficarem vermelhas. Será que eu estava vermelha também? Esperava que não.
- Eu tive, na verdade. – Assumi. – Pensei que todo mundo precisava de algo novo.
- Pelo menos eu vou me divertir no baile dessa vez.
Eu sorri um pouco, mas não disse nada, porque não podia me arriscar a isso. deu um passo para trás, enfiando as mãos nos bolsos.
- Eu estou indo ao cinema com uns caras da escola. – Ele disse então. – Você quer ir também? É alguma coisa de terror bem idiota, mas...
- Ah, não. Eu vou ao Roger’s hoje. – Falei. – Estou com vontade de passar um tempo com meu pai.
- Ah, claro. – Assentiu. – Até amanhã então.
Soltei o ar que estava prendendo quando ele se afastou, mas parou ao chegar à porta. Pensou por um instante e olhou para trás de novo.
- Está mesmo tudo bem, não é? – Ele perguntou. – É que... Sei lá, você parece diferente.
Levei a mão ao cabelo, engolindo em seco.
- Eu só mudei o penteado.
assentiu, dando um sorriso fraco.
- Eu notei. – Disse. – Bom, até amanhã então.
foi embora e eu caí na cama. De fato, talvez fosse bom ir ao Roger’s para não ficar com a cabeça vazia. Mas eu via, agora, o quanto as coisas seriam difíceis dali para frente. Mais do que eu queria acreditar.
🌴💚🌴
No sábado, eu decidi fazer um bolo, visto que todos ficariam o dia inteiro em casa. Saí de casa depois do café da manhã e caminhei tranquila e feliz rumo à mercearia. Queria comprar morangos.
Meu telefone tocou no caminho e era mamãe, fui conversando com ela sobre como estavam as coisas.
- Eu não acreditei quando seu pai me contou, achei que ele tinha te trocado por outra garota no estacionamento. – Ela brincou. – Líder de torcida? Você?
- Ora, o mundo dá voltas, não é? – Suspirei, entrando no mercado e olhando os preços das coisas.
- E quanto ao seu namoro com esse tal de ? Quando vai me deixar falar com ele?
- No dia de São Nunca. Mas acho que você ia gostar dele. É um prodígio artístico como você.
- E como seu pai, pelo que entendi. – A voz dela não foi exatamente de aprovação, o que me fez rir.
- Acredite, mãe, o não tem absolutamente NADA a ver com papai. Ele é responsável e lembra de pagar as próprias contas, o que já o torna muito diferente...
Enquanto falava, eu vi, no fim do corredor, mexendo na banca de frutas, a senhorita Elizabeth. Ela escolhia caquis tranquilamente e pensei em dar um alô. Me despedi de mamãe prometendo que qualquer hora dessas deixaria que ela falasse com o e fui até minha professora.
- Oi, senhorita Elizabeth. – Eu disse com um sorriso.
- ! – Ela ficou surpresa ao me ver. – Mas que coincidência. Você mora perto daqui?
- Na verdade, sim. A algumas quadras daqui. E a senhorita?
- Ah, não. Nem tanto. – Ela balançou a cabeça. – Só não consegui achar caquis descentes em outro lugar e tive que andar um pouco mais.
- Bom, fico feliz que tenha encontrado alguns por aqui. – Falei, pronta para me despedir. – E espero que tenha conseguido resolver aqueles assuntos pessoais de última hora.
- É gentil da sua parte, mas eu é quem deveria te dizer isso, não? – Ela riu, fechando o pacote de caquis.
Voltei o passo que já tinha dado, confusa pelo que ouvi.
- Como assim?
- Ora, a infestação de pulgas na sua casa. – Ela disse baixinho. – Não foi por isso que faltou aos ensaios na última semana?
De que raios aquela mulher estava falando? Meu cachorro não tinha pulgas. dava banho nele o tempo todo.
- Não se preocupe, querida, a Jasmine me avisou. – Ela continuou. – Ela te substituiu nos últimos ensaios, mas o papel de Ebony ainda é todo seu.
Mas. O. QUÊ?
AH. MEU. DEUS.
A VACA DESGRAÇADA TINHA ME SABOTADO! ELA TINHA ARMADO PARA MIM!
- Bem, se estiver tudo bem, espero te ver na segunda-feira. – A senhorita Elizabeth disse. – Tchauzinho.
Só saí do estado de raiva paralisante depois de alguns instantes. Então corri atrás dela, porque não ia deixar aquela vaca se safar assim.
- Senhorita Elizabeth! – Gritei já quase chegando à saída do mercado.
A professora já saía com suas bolsas de frutas, mas se virou para me olhar.
- O que foi, querida? – Perguntou confusa.
- Acontece que a Jasmine...
Minha voz sumiu à medida que minha cabeça começou a maquinar.
Afinal de contas, o que aconteceria se eu contasse o que Jasmine tinha feito?
Ela seria expulsa da peça, talvez. Seria delicioso de ver, mas em que isso me beneficiaria?
Em nada, já que eu não sei mesmo cantar.
Além disso, Jasmine se livraria da humilhação de cantar nos bastidores para que eu me destacasse diante de toda escola, e é claro que eu queria vê-la espumando ódio por ter que fazer aquilo na noite da peça, então não seria vantagem colaborar para seu castigo.
O que não queria dizer que ela ficaria impune.
Não mesmo.
E aí estava o último motivo para que eu calasse minha boca: eu tinha que me vingar de Jasvaca e tinha que fazer isso com maestria. Brigar de cara nunca era a solução com ela, por mais tentador que fosse.
- ? – A professora estava esperando.
Balancei a cabeça e sorri.
- Eu só ia dizer que Jasmine foi muito gentil em te avisar. – Completei a frase. – Estou feliz por ter resolvido meus problemas com ela.
A professora sorriu.
- Eu sabia que vocês iam se entender. – Disse. – São tão vivas e talentosas. Seria mesmo um desperdício de tempo ficarem brigando.
- Sim. – Assenti. – Bom, nos vemos na segunda-feira então. – Acenei.
- Até lá, meu bem.
Desperdício.
Sorri, voltando para dentro do supermercado.
Pois eu ia me divertir muito desperdiçando meu tempo para me vingar daquela imbecil. E eu nem ia esperar para comer o prato frio.
POV
- Ah, , desfaz essa cara. – Eu chutei a bola na direção do , numa tentativa obviamente falha de fazê-lo reagir. era uma pessoa difícil de tirar da fossa.
Ele olhou para mim de onde estava, sentado no chão, e empurrou a bola de volta.
- Eu só não quero jogar. – Resmungou.
Rolei os olhos e tentei sem muito sucesso fazer uma embaixadinha.
- Você está ficando paranoico. – Avisei e fui me sentar do lado dele em seguida, para não admitir que tinha parado com as embaixadinhas porque não sabia fazer. Para ser sincero, , a metida a brasileira, sabia fazer aquilo bem melhor do que eu.
- Olha, não é paranoia. – balançou a cabeça de leve. – A tá agindo estranho. Mais do que nas outras vezes. Eu pensei que a gente estava se entendendo, finalmente. Eu não posso ter imaginado tudo, né? Quer dizer, isso seria muita piração.
parecia preocupado de verdade com a possibilidade de estar ficando louco. Achei que seria melhor não fazer uma piada sobre as dezenas de loucuras que ele tinha feito nos últimos meses. Em vez disso, fiz meu papel como bom melhor amigo:
- É claro que você não imaginou tudo. Ela aceitou sair com você. E não foi como quando nós três saímos para comer sanduíche de frango, foi um encontro, amigo. Ela foi com as próprias pernas.
- Então que diabos está acontecendo agora?! – enfiou a mão no cabelo e respirou fundo. Ele estava mesmo ficando doido.
Fiz uma careta.
- Você sabe como é a . Não dá pra saber o que está se passando pela cabeça dela.
- Dá, sim. Eu é que fico tentando fingir que não sei. – Ele se levantou e saiu andando.
- Ei, volta aqui! – Bufei, indo atrás dele.
parou quando eu o alcancei, mas não parecia com muita vontade de conversar – o que não era surpresa, porque ele era daquele jeito mesmo. Por sorte, eu nunca respeitava a vontade dele.
- O que você pensa que ela está pensando, afinal? – Perguntei.
Ele balançou a cabeça. Depois deu de ombros, se rendendo.
- Talvez ela tenha mudado de ideia.
Eu queria mesmo acreditar que só estava exagerando porque não tinha uma boa recordação de situações envolvendo garotas apaixonadas por Junior , mas eu não poderia dizer que um novo surto da me surpreenderia. Ainda assim, minha intuição dizia que tinha algo mais. Eu já conhecia a bem o suficiente para saber que ela gostava do o bastante para não sair com ele só por diversão, sabendo que isso iria magoá-lo. Alguma coisa estava acontecendo.
De todo modo, como eu já tinha avisado a ela antes, era meu melhor amigo. Eu não ia deixar ela sacanear com ele ainda mais, por mais que também fosse amigo dela.
- Quer saber? – Falei, apertando de leve o ombro de . – Talvez você devesse mesmo ir para casa, esfriar a cabeça. Você precisa relaxar com esse negócio da . Sério. Tenta agir como se ela fosse só uma garota normal com quem você saiu e que está esperando para ver o que acontece. Vai ficar muito mais fácil. – Aconselhei. – E enquanto isso, você tem outras coisas pra fazer, não é? Praticar contrabaixo, estudar para ganhar uma bolsa digna na universidade no ano que vem, quem sabe?
respirou fundo, mas assentiu.
- Talvez você esteja certo. – Disse. – Vai ver eu só estou agindo feito um maluco.
- Não me surpreenderia.
- Então a gente se vê depois. – Disse então. – Valeu, .
Dei um sorriso e foi para o seu carro.
Fiquei ali, quicando a bola no chão, e então tentei uma cesta. Errei.
O que estava pensando mesmo era em como ficaria na cola da até tirar a verdade dela, dali pra frente.
POV PIE
Quando meu pai abriu a porta do quarto naquela manhã, eu estava me alongando.
- Você fazendo exercícios, Rainbow? – Ele arqueou uma sobrancelha. – O que foi que houve?
- Ah, pai, eu sou uma atleta agora e hoje tenho uma grande competição. – Sorri para ele, esticando os braços para a esquerda. Voltei à posição normal, me aproximei e lhe dei um beijo no rosto. – A propósito, bom dia.
Tomei meu café-da-manhã leve e delicioso, composto por frutas e linhaça. Brinquei com Stevie. Há alguns dias não me sentia tão bem.
Só quando estava descendo as escadas da varanda com a mochila nas costas, me dei conta de como o ponto de virada da minha vida em Jacksonville Beach tinha sido justamente em uma disputa dos Swordfishes contra o Blue Eagles. A ideia me fez parar por um segundo; tempo suficiente para o carro de estacionar em frente à minha casa. Aí sim, eu parei. Tive que respirar com cuidado, tentar ser normal. Engoli em seco, sorri e entrei no veículo.
🌴💚🌴
- Definitivamente, não podemos perder dessa vez. – Jodi estava nervosa. Seu rosto tinha purpurina, que tinha caído de seu cabelo e agora grudara no suor da pele. Jodi sempre suava bastante quando estava ansiosa.
- Nós não vamos perder. – Emma decretou, alongando os braços. – Eu prefiro a morte.
Summer riu, enquanto ajudava uma garota a ajeitar o cabelo.
- Que coisa horrível de se dizer. – Uma voz masculina surgiu.
Olhamos para porta e lá estava Brad, sorrindo. Jodi deu um longo suspiro, enquanto o garoto olhava de um lado para o outro antes de entrar.
Ele correu e se abaixou perto de Jodi, dando um beijo nela.
- Mas que droga, Winter, esse vestiário é nosso! – Jasmine resmungou.
- Desculpa, Jas. – Ele disse, sempre educado. – Mas é que eu tinha que desejar boa sorte à Jo, e a Emma não deixou a gente se ver ontem.
- Não deixei mesmo! – Hughes fez uma careta, empurrando Brad. – Você e esse seu tanquinho só servem para tirar a concentração da Slaterton. Ela tem que estar focada na competição de hoje, e, aliás, é melhor você ir embora daqui. Não devia nem ter vindo, pelo amor de Deus!
- POR FAVOR, SÓ ME DÊ UM SEGUNDO! – Brad pediu, voltando para perto de Jodi. – Olha, eu trouxe isso. – Ele amarrou uma cordinha amarela no pulso dela. – É para te dar sorte no campo.
Jodi, emocionada, agarrou Brad pelo pescoço e o beijou. Jasmine fez cara de nojo. Emma rolou os olhos.
- Já chega, Winter. – Saiu puxando o rapaz. – Evapora!
- Boa sorte, Jod... – Brad ainda tentou dizer, mas já tinha sido jogado no corredor.
Sorri e apertei o ombro de Jodi, que olhava fixamente para a pulseira, como se fosse uma aliança de noivado. Nunca tinha visto um casal que combinasse mais do que ela e Brad.
- Vocês dois são tão fofos. – Amber olhou para ela, séria. De repente, sua voz ficou embargada. – Isso me faz sentir tanta saudade do meu gatinho !
Amber começou a chorar compulsivamente e foi amparada por outras garotas. Eu imaginava o fim do mundo que seria quando finalmente arranjasse coragem para terminar com a garota, em vez de ficar arrumando desculpas estapafúrdias para fugir dela.
- São o casal mais meloso que já vi, isso sim. – Jasmine amarrou a fita amarela em seu cabelo.
- E o seu namorado, Jas? – Sienna indagou, em tom de provocação. – Não vem te ver?
- É claro que vem. – A morena respondeu mal-humorada. – Charlie não perderia minha vitória por nada.
A resposta – mais especificamente, o tom utilizado para dá-la – pareceu calar Sienna. As outras garotas também não tiveram coragem de fazer outra piada, embora algumas tivessem trocado olhares divertidos.
Uma vez prontas, saímos do vestiário com nossas bolsas rumo ao campo. Aquela seria a primeira etapa da competição das torcidas da Flórida, e das oito equipes da região que estavam ali naquele dia, apenas quatro seguiriam para a fase seguinte, para encontrar as outras.
Todas estavam muito motivadas, porque entre as equipes ali presentes, estavam as Blue Eagles. Emma tinha passado a manhã dizendo como queria ver Chelsea, a capitã delas, caindo do alto da pirâmide.
Meu celular tocou e eu diminui o passo. Na verdade, era só uma mensagem. Do .
Desculpa por não poder ir, Rain. :/
Estou torcendo por vocês à distância :)
Fiquei feliz por não ter tido que falar com ele, mas ao mesmo tempo queria ter ouvido sua voz. Eu quase a ouvi, lendo a mensagem.
Quando olhei para a frente de novo, percebi que tinha ficado para trás. Andando alguns passos, encontrei um celular no chão.
Era da Jasmine.
Ora, ora, mas que surpresa, falei para mim mesma, pegando objeto do chão.
Meditei sobre o que poderia fazer com aquilo. Precisava, afinal, me vingar daquela mau-caráter. Fui pensando sobre o assunto enquanto andava. Uma postagem ridícula no facebook? Uma mensagem vergonhosa?
Foi então que avistei as outras ao longe – Summer mapeando o lugar com os olhos, provavelmente me procurando – e percebi que alguém mais estava faltando.
Jasmine não estava com as garotas. Foi um golpe de sorte eu avistá-la antes de Summer.
Lá estava a bela Jas, atrás da arquibancada com um garoto. Eu tinha a impressão de que já o tinha visto em algum lugar. Finalmente, o identifiquei como um jogador dos Blue Eagles.
Eles estavam conversando – ou será que estariam discutindo? Ele agarrou o pulso de Jasmine, que puxou o braço de volta e disse alguma coisa com o rosto sério, mas ele não parecia nem um pouco preocupado. Por um segundo, pensei que ela poderia estar com problemas, que eu deveria ir tirá-la de lá. Mas então ela riu e o empurrou de leve, como fazemos com um amigo. Por que Jasmine, tão competitiva e importante na cadeia social da Jackson High, seria amiga de um Blue Eagle?
Eu estava me questionando, quando o telefone da garota começou a vibrar. Olhei para a tela e vi a foto de Charlie, que estava ligando.
Meu raciocínio foi rápido. Ali estava minha chance.
Sorri e rejeitei a ligação de Charlie. Depois deslizei meu dedo na tela do celular. Não tinha bloqueio por senha.
Que vacilo, Jasmine.
Abri a câmera do celular e me escondi melhor atrás de uma barraca, para que ninguém me visse.
Jasmine ainda estava rindo. Então o garoto puxou ela para um abraço, que ela aceitou.
- Daria uma modelo tão boa quanto a Olsen. – Eu disse sorrindo. Clique. Uma foto. Clique. Duas.
Abri o WhatsApp dela e encontrei Charlie de cara. Havia uma mensagem dele falando que demoraria, mas ia chegar. Meus dedos foram ágeis ao digitar:
Na verdade, não precisa vir mais.
Encontrei um amigo aqui e vamos sair para colocar o papo em dia depois da competição.
XoXo ;)
Em seguida, enviei a foto com um belo zoom dos dois se abraçando.
Esperei que o sinal de confirmação de recebimento aparecesse, e quando tive certeza de que ele já tinha visto as mensagens, as apaguei do celular dela, então desliguei o aparelho.
Jasmine era tão boa com mensagens, esperava que ela desse conta dessa.
[N/A: Agora podem ouvir essa, girls].
Fui para perto das garotas, satisfeita. Me aproximei da bolsa vermelha de Jas, que alguém tinha levado, e joguei o celular dentro dela.
- Pensei que você tinha sido sequestrada pelas Eagles! – Summer me lançou um olhar aliviado. – Viu a Jasmine?
- Desculpe, me distraí com uma mensagem. – Respondi me alongando. – Sabe que não a vi? Pensei que estivesse com vocês.
- Lá está ela! – Amber apontou quando vimos Jasmine andando, toda sem jeito, rumo a nós.
Ela mudou de expressão assim que chegou.
- Que caras são essas? – Perguntou.
- Cara nenhuma. – Summer sorriu um pouco. – Entramos em alguns minutos. Vamos arrasar, ok?
Não demorou muito para que os apresentadores começassem a falar. Eles descreveram um pouco o perfil de cada equipe, não esquecendo de fazer uma série de elogios a Summer, que estava voltando depois de um bom tempo afastada da torcida.
Então as Blue Eagles foram chamadas. Chelsea – a versão ruiva de Taylor Swift – nos olhou de cima a baixo ao entrar no campo. Emma emitiu um som muito parecido com um rosnado e Summer a acalmou. Jasmine e Amber também xingaram alguma coisa, enquanto as outras garotas da equipe rival pareciam cochichar piadinhas sobre nós.
A apresentação individual das Eagles foi basicamente impecável. Elas estavam mesmo dispostas a passar para a próxima etapa e – especialmente – se saírem melhor do que nós.
Havia uma série de movimentos novos, diferentes dos que eu tinha visto nas minhas aulas sobre nossos adversários – incontáveis horas de vídeos de competições passadas, com pausas a cada dez segundos para os comentários de Jodi. Inclusive, havia um passo claramente feito para nos provocar, um movimento semelhante ao ato de pescar algo e depois jogar fora, como se estivesse estragado.
- Eu vou esfregar a cara dela no asfalto. – Emma decretou. Ninguém teve a audácia de contestar.
Depois das Blue Eagles saírem muito aplaudidas dali, foi a vez das Pirates de Saint Augustine, de quem eu tinha gostado muito ao ver os vídeos, então estava ansiosa pela apresentação, que não me decepcionou, mas me preocupou.
Finalmente, chegou a nossa vez.
Entramos no campo com toda a segurança acumulada em treinos incontáveis e muito esforço. Emma fez uma cara tão feia para as Eagles, que vi Chelsea recuar sutilmente.
Summer fez o sinal e nos posicionamos. Respiramos fundo e estava na hora de começar.
Eu não sabia que queria tanto ganhar até estar ali. Quando a música que selecionamos começou a tocar, era como se eu tivesse passado a vida fazendo aquilo.
Segui os movimentos com perfeição, até mesmo os passos que eu tinha que fazer com Jas. Nenhuma de nós parecia estar ligando, naquele momento, para nosso ódio mútuo. Fiz todas as acrobacias que tinha sido capaz de aprender no tempo que tinha no grupo, e fiquei muito feliz quando vi Summer improvisando – o que ela sabia fazer bem – no chão e puxando o grito de guerra do Swordfish, que respondemos com vontade.
Eu via os olhos de todas nós brilhando e estava tão empolgada que nem sequer olhava para a platéia. Por isso, quando fui para o alto da pirâmide e ouvi os gritos e aplausos, foi uma grata surpresa.
- CARAMBA, NÓS ARRASAMOS! – Emma gritava eufórica.
- FOI, NÃO FOI? – Jodi a abraçou.
Summer foi até mim e também me deu um abraço apertado. E eu ri ao ver a cara de despeito de Chelsea e suas companheiras.
[N/A: ok, podem parar, girls.]
🌴💚🌴
Terminei de enxugar o cabelo no vestiário, com aquele sentimento de missão cumprida transbordando no peito. Tínhamos passado a fase seguinte e eu estava tão feliz; especialmente por Jodi e Emma, que finalmente realizavam seu sonho de participarem de uma competição de torcida.
As outras garotas já estavam lá fora, porque eu tinha tido que atender uma ligação da minha mãe e ficado por ali. Então ouvi a porta ranger.
- Quem diria que você se sairia uma líder de torcida tão boa?
Reconheci a voz de imediato, mas precisei olhar para trás para ter certeza de que se tratava mesmo de .
- Quem diria? – Eu sorria de orelha a orelha.
- Eu só queria te dizer que eu estou super orgulhoso de você e que eu realmente, realmente adoro te ver naquele uniforme.
Algum tempo atrás, eu teria ficado brava com a ousadia de em ir ali para isso, mas eu estava tão feliz. E afinal, eu tinha me decidido sobre aquele assunto do , não é?
- Eu adorei que tenha vindo. – Corri e o abracei.
E quando vi, estava me beijando.
Fiquei um pouco triste em me dar conta de que o beijo não era como antes, quando eu o queria mais do que tudo – quando parecia que o mundo ia acabar se não o tivesse. E senti minha cabeça vagando para longe, para um quarto pequeno com uma poltrona e um contrabaixo, mas fiz o possível para ignorar tudo.
era quem estava me beijando ali, e eu não o impedi.
[…]
Depois de termos encontrado Summer no parque e das minhas conclusões reveladoras, eu não consegui – ou quis – falar mais muita coisa. Parecia que qualquer coisa que eu dissesse ao depois de como tínhamos nos divertido seria errada, como se qualquer coisa fosse criar uma falsa esperança sobre nós. Assim, falei o mínimo possível quando estávamos com Olsen e fiquei muda no carro, esperando que ele acreditasse que eu só estava cansada.
Quando o carro finalmente parou em frente à minha casa, tentou começar a falar.
- , tem uma coisa que eu preciso te dizer...
E não, eu não podia deixá-lo terminar. Seria doloroso demais, para nós dois. Então eu o cortei:
- Acho melhor deixar para outra hora. – Desatei o cinto. – Eu preciso muito ir ao banheiro agora. Acho que bebi refrigerante demais.
pareceu meio decepcionado, confuso com a minha pressa. Ainda assim, ele assentiu.
- Tá, tudo bem. – E o modo como ele disse aquilo apertou meu coração.
Olhei para ele gentil, mas rapidamente:
- Bom, foi divertido. – Eu disse. – A gente se vê amanhã.
Saí do carro a toda velocidade, entrei em casa e fechei a porta. Miguel e papai deviam estar no Roger's, porque pelo visto não tinha ninguém ali. Fiquei encostada à porta por alguns minutos, até ouvir o carro de – que ficou parado por mais tempo, talvez pensando em como eu era estranha – ir embora. Dei um longo suspiro, fechando os olhos – a testa encostada à porta.
Nunca antes daquele dia eu tinha querido tanto ouvir o que tinha para me dizer.
Sabendo que o resultado seria catastrófico se eu encontrasse com antes de me estabilizar emocionalmente, fiz o impossível para não encontrá-lo pelo resto do fim de semana. E por impossível pode-se entender ir para a casa da Emma e ficar lá ouvindo sobre campeonatos de torcida e deixando que ela falasse pelos cotovelos.
- Esse ano, nós vamos ganhar daquelas vacas. – Emma dizia estalando o pescoço. – Aquela ridícula da Chelsea tem feito mil e uma publicações provocando a gente. Quer dizer, ela é tão presunçosa que acha que vamos perder nosso tempo stalkeando ela!
Ela estava falando de Chelsea Pritchett, a líder das torcedoras dos Blue Eagles. Para minha própria segurança, achei melhor não comentar o fato de que Emma de fato andava stalkeando a garota.
- Ah, mas que droga. – Falei ao me lembrar de algo de repente.
- O que foi? – Emma se virou para mim.
- Esqueci de devolver um livro na biblioteca na sexta. – Expliquei. – Vou ter que pagar dois dólares de multa amanhã.
Emma olhou bem para mim, uma sobrancelha arqueada.
- Sério? – Perguntou.
- É, sério. Um dólar por dia.
- Não, digo tipo... É sério que ainda se preocupa com esse tipo de coisa? Por favor, , você é uma líder de torcida agora. – Ela rolou os olhos e voltou a fuçar as redes sociais de Chelsea Pritchett.
- E isso quer dizer que...? – Eu não estava entendendo o ponto.
Emma deu risada, mal olhando para mim.
- Fala sério. – Balançou a cabeça. – Quem cuida dos registros da biblioteca? Stuart Johnson, o estagiário? Ou ainda é aquela velha da senhora Parker?
- Stuart está cuidando dos registros para a senhora Parker. Mas eu ainda não entendi o que quer dizer.
- O que quero dizer, miss lenta, é que, sendo uma líder de torcida, você não precisa se preocupar com essas coisas. Ninguém vai cobrar nada de você, porque todos te amam e são gratos por você espalhar sua beleza por aí e ganhar campeonatos.
- Isso parece errado. – Franzi o cenho.
- A existência dessa maldita Pritchett também, mas é a vida, não é? Coisas erradas, coisas certas. – Ela deu de ombros e me encarou com severidade. – Você recebeu uma dádiva: as pessoas querem fazer coisas para vocês. Elas se sentem bem quando você está satisfeita. Deixe que elas cumpram seu papel na cadeia social em paz e aproveite.
- Você já usou isso a seu favor? – Eu estava impressionada com a naturalidade com a qual ela falava daquilo.
- Já, ganhei um donnut extra numa lanchonete porque estava usando meu uniforme. E daí? – Ela parecia cansada de explicar. – São só favores, . Você não está pegando a alma ou a dignidade de ninguém.
Fiquei pensando se concordava. Mas para mim parecia muito mais do que algo simples. E também, eu não sabia se era vista como líder de torcida o suficiente para ter vantagens.
- Ah, Deus, você é tão bobinha às vezes. – Emma continuou falando sozinha. – Parece que preciso te ensinar tudo... – Então ela olhou para mim, uma sobrancelha arqueada. – É, talvez precise mesmo.
Emma pegou o celular à sua frente e começou a discar, me fazendo ter um de déjà vu do dia em que Jodi tinha me enfiado de mala e cuia no mundo da torcida.
- O que você tá fazendo? – Perguntei com cautela.
- Ligando para as meninas. – Ela disse como se fosse óbvio. – Está na hora de trazer você para o mundo real.
- A primeira coisa que você tem que ter em mente, é que não está passando a perna em ninguém. – Emma disse puxando uma blusa de uma arara, enquanto andávamos por uma loja do shopping. – Não na maioria das vezes, pelo menos.
- Não quando você tem consciência de que não é a dona do mundo. – Jodi corrigiu Emma. – Você não precisa ser má com ninguém só por ser uma líder de torcida, mas as pessoas gostam de ser gentis com você.
- Aceitar as gentilezas é basicamente sua obrigação. – Emma jogou uma blusa em cima dela.
- E você, o que diz sobre isso? – Me virei para Summer. – Você é a mais experiente nesse assunto.
- Só não deixe a torcida te subir à cabeça. – Summer disse calmamente. – Fazer acrobacias e ser bonita são coisas que podem te render vantagens, mas você ainda tem que ser você no fim do dia.
- Tão inspiradora! – Jodi suspirou.
- Minha eterna musa. – Emma apertou a bochecha de Summer, que sorriu.
- E quanto às vantagens... – A loira fez uma cara engraçada.
Antes que ela terminasse de falar, um rapaz de cabelo platinado veio correndo em nossa direção, como se tivesse visto uma aparição milagrosa.
- Senhorita Olsen! – Ele a cumprimentou e Summer se inclinou (já que ela era maior que todos nós) para lhe dar um beijo no rosto.
- Nico! – Ela sorriu. – Como vai?
- Tão bem! – Ele respondeu. – Depois da sua campanha no semestre passado as vendas subiram mil por cento! – Ele levou o dedo ao alto teatralmente.
- Foi muito divertido fazer a campanha! – Ela assentiu sorrindo. – Fico feliz em saber que foi um sucesso.
- Sucesso? Sucesso é muito pouco, querida. – Ele fez uma careta. – Quer saber? Que tal se vocês fizessem uma propaganda ambulante da nossa nova coleção? – Nos olhou com empolgação. – Será ótimo ter Summer Olsen e suas lindas amigas andando pela cidade com nossas roupas. – Enfiou a mão no bolso. – Aqui estão quatro vale-presentes para as roupas que lançamos essa semana. Elas estão no corredor à direita.
Eu não estava acreditando que estávamos ganhando roupas de graça só para que Summer andasse pela rua dizendo onde as tinha comprado. Emma estava com um sorriso malicioso no rosto e Jodi era o retrato da alegria.
O rapaz se despediu de nós e voltou para onde quer que ele ficasse quando não havia ninguém famoso em sua loja.
Emma pigarreou, fazendo com que Summer olhasse para ela.
- O que mesmo você ia dizendo sobre as vantagens? – Ergueu uma sobrancelha.
Summer riu e mordeu o lábio, olhando então para mim com um sorriso sapeca.
- Aproveite! – Completou.
Pelo resto da tarde, conversamos sobre as vantagens de ser uma líder de torcida e até que ponto eu podia ir. Para Emma, claramente não havia muito limite. Jodi permaneceu com seu ideal de ser uma pessoa boa apesar da popularidade – uma filosofia de vida nitidamente compartilhada por Brad Winter, seu namorado. Summer me disse para aproveitar com sabedoria, mas para ser fiel a mim mesma. E era isso. A fórmula da felicidade em uniformes curtos.
Enquanto ia para casa, me sentia um pouquinho mais feliz por ter pelo menos conseguido tirar os problemas da cabeça por algumas horas.
- Não se esqueça de que amanhã temos a primeira reunião do comitê de baile. – Jodi lembrou quando chegávamos à minha rua.
- Não acredito que finalmente estamos indo a uma! – Emma fez uma careta assustadora de felicidade. Confiante do jeito que ela era, às vezes eu quase me esquecia que ela tinha sido uma desconhecida na Jacksonville High por tanto tempo.
- O que eu tenho que fazer? – Perguntei.
- Só estar presente e opinar sobre o que acha bom ou não. – Summer explicou.
- Tudo bem. – Assenti tirando o cinto. – Nos vemos amanhã.
- Ok. – Ela disse. – Ah, só uma última coisa...
Parei para ouvir o que ela tinha a dizer. Em vez de falar, Summer estendeu a mão para o meu cabelo e, em um movimento rápido, jogou ele todo para o lado direito, amassando e bagunçando-o um pouco. Ela virou meu rosto para as meninas e as encarou.
- E então, o que acham?
Emma estudou meu rosto. Jodi moveu a cabeça em aprovação.
- Muito bom mesmo. – Emma disse. – Quase parece outra pessoa.
Olsen sorriu, satisfeita, e eu desci do carro, meio em dúvida sobre o que elas tinham dito.
Cheguei ao meu quarto um tanto quanto cansada e joguei a bolsa sobre a cama. Ia ao banheiro, mas então me lembrei do espelho no canto. Me aproximei dele, observando a minha figura refletida – o vestido de moletom emprestado de Summer, o cabelo todo jogado de lado, que parecia mais claro do que quando eu chegara à cidade, muito provavelmente por causa do sol. Até meus olhos tinham um brilho diferente.
Emma estava certa. De repente, eu parecia outra pessoa.
A reunião ia acontecer numa sala especial para esse tipo de assunto. Ela ficava perto do auditório onde o grupo de teatro se reunia, mas eu nunca tinha entrado ali.
Reparei algumas pessoas me encarando. Assenti para algumas delas, embora Emma tivesse me dito para não parecer boazinha demais.
- Ei! – Ouvi então.
Respirei fundo, sabendo que era mais que hora de voltar ao normal e esquecer o que havia acontecido nos últimos dias. Questão de sobrevivência.
Sorri ao encontrar vindo em minha direção, muito embora ele parecesse mais sério que de costume.
- Oi. – Eu disse.
- Oi. – Ele disse meio tenso. – Eu queria muito te ver... Desde o que aconteceu na casa do George.
- Olha, , desculpa por aquilo, tá bom? – Pedi tocando seu braço de leve. – Eu meio que surtei naquela noite. Acho que eu tinha bebido um copo na festa e me subiu à cabeça.
Ele me olhou por um instante, mas assentiu.
- Tudo bem, acontece. – Deu um meio sorriso. – Foi um surto e tanto, na verdade, mas quem nunca bebeu demais, não é?
A bem da verdade, eu nunca. Nem naquela noite. Mas não precisava saber disso.
- Então estamos bem? – Ele perguntou.
- Claro que sim. – Sorri. – Olha, tenho que ir para a reunião do comitê de baile agora.
- Tudo bem. – Ele me deu um beijo no rosto. – Nos vemos depois.
se afastou e eu entrei na sala de reuniões. Não havia só líderes de torcida ali, mas também não havia muita gente. Passei pelos rostos desconhecidos que me observavam com curiosidade e fui me sentar junto com Summer e as garotas.
- Vi o Junior lá fora. – Ela foi logo sussurrando. – O que ele queria?
A esperança de Summer me deixava um pouco tensa, mas eu estava ficando cada vez melhor em lidar com isso.
- Ele estava comentando que está muito ansioso para próximo jogo. – Eu disse. – Acho que ele precisa se distrair um pouco, sair e esvaziar a cabeça.
- Acho que eu podia convidá-lo para sair então. – Summer sorriu. – O que você acha?
- Acho que você deve tentar. – Incentivei. A verdade era que por algum motivo eu tinha um palpite muito forte de que Junior não aceitaria sair com ela naquele momento, e eu queria que ela descobrisse isso por si própria. Essa era uma tática nova que eu tinha decidido adotar depois de perceber que funcionava muito bem: deixar que eles se desiludissem sozinhos.
- Tá, vou mandar uma mensagem. – A loira tirou o celular do bolso e começou a digitar.
Fiquei observando o resto das pessoas na sala, conhecidas e desconhecidas por mim. O que eu deveria falar naquela reunião? Deveria realmente me intrometer a dar alguma opinião? Ou eu só estava lá porque era amiga de Summer?
De todo modo, meu pensamento de tudo isso era intensificado pelo olhar direto de um garoto sentado longe de nós. Ele tinha cabelo cor de avelã e olhos no mesmo tom, e me encarava de um jeito um tanto quanto perturbador – como se esperasse algo de mim, como se estivesse tão curioso sobre minha participação quanto eu mesma.
Quando todos já estavam sentados, Summer tocou meu braço, indicando que era hora de começar.
- Bom dia, comitê. – Ela se levantou e disse. – Bem, estamos aqui reunidos hoje para decidir o tema do baile de Outono deste ano, que vai ser muito importante, não só por ser o primeiro baile do ano letivo, mas porque agora boa parte de nós somos oficialmente veteranos. – Ela sorriu de orelha a orelha.
Todos começaram a comentar, animados, sobre o fato de estarem no último ano. Por um segundo, fiquei um pouco triste, porque eu, Collie e Ben sempre tínhamos esperado por esse momento juntos e agora eles estavam longe demais, vivendo tudo sem mim. Ainda assim, não era de todo ruim participar do animado ano sênior da Jacksonville High.
- A mesa agora está aberta a sugestões. – Olsen decretou, sentando-se de novo.
Um garoto ruivo levantou a mão.
- Bem, já que o baile será em outubro, podemos fazer uma festa de Halloween. – Disse.
- Já fizemos isso ano retrasado, Billy. – Teddy Moore rolou os olhos.
- E nem pensem naquela estupidez de personagens de filmes de novo. – Jasmine fez uma careta.
- Lembram da Maya Burnes vestida de Galadriel do Senhor dos Anéis? – Emma começou a rir sua risada de porquinho, mesmo tentando ser discreta. Até Jasmine se uniu ao coro de risos.
- Com aqueles pés, ela mais parecia um Hobbit. – Teddy deu um sorriso maldoso. – Pobre Maya.
Pobre Maya, sua orelha devia queimar o tempo todo, como dizia mamãe. Desde que eu entrara em seu lugar na torcida, tinha ouvido tantas piadas sobre seus pés tortos que poderia fazer um retrato deles.
Mas de fato, para mim, parecia que o baile daquele ano pedia algo a mais do que os temas já usados antes. Tudo estava indo tão bem! Tínhamos vencido os Blue Eagles no primeiro jogo da temporada, éramos veteranos... Algo incrível precisava ser feito, mas eles eram tão ácidos e diretos ali que fiquei com um pouco de receio de levar uma patada assim que abrisse a boca.
Então o garoto, aquele que estava me encarando antes, levantou sutilmente a mão. Todos ainda estava rindo, mas Summer os silenciou ao vê-lo.
- Perry. – Ela disse. – Tem alguma sugestão?
- Eu não. – Ele balançou de leve a cabeça. – Mas acho que sua amiga tem. – Apontou para mim.
Imediatamente todos se viraram em minha direção. Eu não sabia se me sentia agradecida pela gentileza ou se ele tinha feito aquilo por maldade, mas já que tinha a vez agora, decidi arriscar.
- Sem querer puxar a corda para o lado de algo que eu gosto... Mas eu pensei que o tema poderia ser os anos 20. E jazz.
Por um instante todos ficaram em silêncio. Então Teddy assentiu.
- É... Eu gosto dessa ideia. – Deu um sorriso sutil.
- As roupas eram lindas, não é? – Jodi olhou para os outros.
- Até que seria divertido. – Jasmine ponderou.
E então todos começaram a falar ao mesmo tempo sobre as possibilidades, animados com a ideia de música ao vivo – trazida pelo meu pai, já que a ideia fora minha – e bebidas e figurinos maravilhosos.
- , que ideia fantástica! – Summer riu, apertando meu ombro. – Eu sabia que ia ser uma ótima ideia trazê-la.
Quando a reunião finalmente acabou, com o tema do baile definido – Anos 20: A era do Jazz –, eu segui as meninas pelo corredor, porque tínhamos uma aula juntas. Não muito depois de termos saído da sala, no entanto, alguém nos chamou.
- Ei!
Viramos para trás para encontrar aquele garoto, o tal Perry, acenando. Summer e as meninas pararam de andar, o que queria dizer alguma coisa, visto que Emma não tinha muita paciência com ninguém. Eu não me lembrava de ter visto Perry na mesa VIP, nem mesmo nos corredores da escola; mas se ele tinha cara para chamar Summer assim com tanta naturalidade, queria dizer que ele era alguém relevante.
- Algum problema, Perry? – Ela perguntou quando ele se aproximou.
- Nenhum, Olsen, muito pelo contrário. – O rapaz negou. – Só queria dar os parabéns à sua amiga pela excelente sugestão. E os abutres lá dentro não deixam ninguém ser ouvido. – Sorriu.
- Bom, você fez com que eles parassem para me ouvir, não é? – Ergui uma sobrancelha. Perry também, em resposta a minha observação.
- E minha amiga tem nome, só pra constar. – Summer lembrou.
Estendi a mão para o garoto, que a segurou.
- Pie. – Me apresentei.
- . É claro que você é a . – Ele deixou escapar um riso misterioso. – Eu sou Perry Gold. É um prazer.
- Perry é editor chefe do jornal da escola. – Summer explicou então.
- Eu vi seu nome na reportagem sobre o jogo contra os Blue Eagles e sua foto de longe, já que eu não cobri o evento – Perry disse. – Mas sem dúvida pessoalmente sua personalidade é muito mais interessante.
Novamente, eu não sabia se ele estava me criticando ou me elogiando. Parecia que ser ambíguo era uma característica do garoto. E, embora o ar de mistério pudesse ser até um pouco charmoso a seu modo, não era algo de que eu gostasse realmente.
- Obrigada. Ou não. – Olhei para ele de um jeito não tão sério, mas sem dar muita corda. – É melhor irmos, não é? Não quero chegar atrasada.
- Claro. – Gold assentiu. – Tenho certeza de que vamos nos ver de novo em breve, Pie. Até mais, Olsen.
Perry foi embora e voltamos a andar. Emma riu e balançou a cabeça.
- Sempre achei que esse Gold tem uma cara danada de quem não vale nada. – Ela comentou. – Procede, Summer?
- Perry não é fácil. – Ela ponderou. – Mas faz o trabalho dele como ninguém. É do tipo que consegue tecer palha em ouro; fazer o evento mais estúpido ou a pessoa mais simples parecerem invejáveis.
- Aquele olhar me dá arrepios. – Jodi fez uma careta. – Lembro até hoje da matéria que ele fez sobre o pobrezinho do Brad falando sobre como ele frequentou o acampamento de gordinhos na infância.
Emma deu risada da lembrança e levou uma cotovelada de Jodi.
- De todo modo, , não precisa ter medo do Perry. – Summer garantiu. – Ele é só um pouco... Intenso. E curioso.
- Um repórter nato, no fim das contas. – Emma deu de ombros.
Mas sem dúvida não me agradava a ideia de ter alguém tão curioso interessado em mim quando eu tinha tanto a esconder.
Voltei para casa de carona com Jodi e o pai dela na hora do almoço, porque meu único compromisso naquela tarde seria o ensaio da peça, que só aconteceria às 16:00. Assim, preparei e comi uma salada cozida e nuggets assados, tirei um cochilo e adiantei o dever de casa atrasado. Quando me dei conta, já estava na hora de voltar para escola. Estava colocando uma camiseta limpa quando meu celular piscou com a luz azul, o que significava que eu tinha recebido um e-mail.
- Talvez seja a mamãe. – Falei sozinha. Mamãe ainda gostava muito de e-mails, embora um pouco menos que meu pai.
Mas não era da minha mãe. Era da senhorita Elizabeth.
Meus adoráveis monstrinhos,
Devido a compromissos de última hora, estou cancelando os ensaios que teríamos essa semana. Aproveitem a folga para decorar os textos!
Vejo vocês na próxima segunda.
Eu nem sabia que a senhorita Elizabeth tinha meu e-mail até aquele momento. Balancei a cabeça. Estava ansiosa para o ensaio, mas descansar um pouco também não ia doer. Embora, é claro, eu estivesse fazendo de tudo para encher minha cabeça. Talvez dar uma volta por aí com Stevie ajudasse.
É, talvez eu devesse fazer isso!
Troquei a roupa que estava vestindo pela roupa que usava para fazer exercícios – o que acontecia com cada vez mais frequência por conta da torcida – e desci as escadas, encontrando um Stevie feliz e saltitante.
- Que bom que está tão animado, bebezão! – Brinquei com ele, colocando a coleira. – Vamos, hoje somos só eu e você.
Corri em direção à praia com Stevie, que parecia alegre em me acompanhar. Todos que nos viam achavam graça naquele cachorro enorme todo bobão e sempre que parávamos para descansar vinha uma criança querendo brincar com ele. Me lembrei de Rosana Wayans morrendo de medo dele e ri sem explicar o motivo.
De todo modo, meu passeio com Stevie me fez relaxar. Minhas preocupações tinham ficado em segundo plano e eu tinha conseguido focar minha atenção por algum tempo em como aquela cidade era tranquila. Talvez por isso papai estivesse conseguindo sossegar ali. Talvez ele precisasse de paz.
Voltei para casa com as energias renovadas, desejando mais que tudo um banho quente para completar minha paz de espírito.
Deixei Stevie brincando no quintal e subi as escadas, me enfiando debaixo do chuveiro por tempo suficiente para esquecer que o mundo existia.
Estava me vestindo, quando ouvi passos na escada.
Bateram à porta.
- Um segundo. – Eu disse me enfiando na camisa branca. – Pode entrar.
apareceu debaixo da soleira ao empurrar a porta e meu coração parou por um segundo. Eu não tinha falado de verdade com ele depois do sábado. Não sabia o que falar, embora soubesse que tinha que dar um jeito de descobrir.
- Ei. – Ele disse com a calma habitual. – Até que enfim te achei. Você foi de ônibus hoje. Por quê?
- Eu precisava conversar com a Jodi. – Embromei.
- Ah. - Franziu o cenho. – Pensei que Brad Winter levasse ela pra escola agora.
- Não hoje. – Sorri. – Coisas de garota. Você sabe, falar do baile e tal.
- É, eu ouvi falar do tema. – sorriu se aproximando. Eu queria dar um passo para trás, mas a cama estava bem atrás de mim. – Seria um palpite muito arriscado dizer que você teve alguma coisa a ver com isso? – Arqueou uma sobrancelha.
Era o sorriso. Aquele sorriso que fazia as bochechas de Jodi ficarem vermelhas. Será que eu estava vermelha também? Esperava que não.
- Eu tive, na verdade. – Assumi. – Pensei que todo mundo precisava de algo novo.
- Pelo menos eu vou me divertir no baile dessa vez.
Eu sorri um pouco, mas não disse nada, porque não podia me arriscar a isso. deu um passo para trás, enfiando as mãos nos bolsos.
- Eu estou indo ao cinema com uns caras da escola. – Ele disse então. – Você quer ir também? É alguma coisa de terror bem idiota, mas...
- Ah, não. Eu vou ao Roger’s hoje. – Falei. – Estou com vontade de passar um tempo com meu pai.
- Ah, claro. – Assentiu. – Até amanhã então.
Soltei o ar que estava prendendo quando ele se afastou, mas parou ao chegar à porta. Pensou por um instante e olhou para trás de novo.
- Está mesmo tudo bem, não é? – Ele perguntou. – É que... Sei lá, você parece diferente.
Levei a mão ao cabelo, engolindo em seco.
- Eu só mudei o penteado.
assentiu, dando um sorriso fraco.
- Eu notei. – Disse. – Bom, até amanhã então.
foi embora e eu caí na cama. De fato, talvez fosse bom ir ao Roger’s para não ficar com a cabeça vazia. Mas eu via, agora, o quanto as coisas seriam difíceis dali para frente. Mais do que eu queria acreditar.
No sábado, eu decidi fazer um bolo, visto que todos ficariam o dia inteiro em casa. Saí de casa depois do café da manhã e caminhei tranquila e feliz rumo à mercearia. Queria comprar morangos.
Meu telefone tocou no caminho e era mamãe, fui conversando com ela sobre como estavam as coisas.
- Eu não acreditei quando seu pai me contou, achei que ele tinha te trocado por outra garota no estacionamento. – Ela brincou. – Líder de torcida? Você?
- Ora, o mundo dá voltas, não é? – Suspirei, entrando no mercado e olhando os preços das coisas.
- E quanto ao seu namoro com esse tal de ? Quando vai me deixar falar com ele?
- No dia de São Nunca. Mas acho que você ia gostar dele. É um prodígio artístico como você.
- E como seu pai, pelo que entendi. – A voz dela não foi exatamente de aprovação, o que me fez rir.
- Acredite, mãe, o não tem absolutamente NADA a ver com papai. Ele é responsável e lembra de pagar as próprias contas, o que já o torna muito diferente...
Enquanto falava, eu vi, no fim do corredor, mexendo na banca de frutas, a senhorita Elizabeth. Ela escolhia caquis tranquilamente e pensei em dar um alô. Me despedi de mamãe prometendo que qualquer hora dessas deixaria que ela falasse com o e fui até minha professora.
- Oi, senhorita Elizabeth. – Eu disse com um sorriso.
- ! – Ela ficou surpresa ao me ver. – Mas que coincidência. Você mora perto daqui?
- Na verdade, sim. A algumas quadras daqui. E a senhorita?
- Ah, não. Nem tanto. – Ela balançou a cabeça. – Só não consegui achar caquis descentes em outro lugar e tive que andar um pouco mais.
- Bom, fico feliz que tenha encontrado alguns por aqui. – Falei, pronta para me despedir. – E espero que tenha conseguido resolver aqueles assuntos pessoais de última hora.
- É gentil da sua parte, mas eu é quem deveria te dizer isso, não? – Ela riu, fechando o pacote de caquis.
Voltei o passo que já tinha dado, confusa pelo que ouvi.
- Como assim?
- Ora, a infestação de pulgas na sua casa. – Ela disse baixinho. – Não foi por isso que faltou aos ensaios na última semana?
De que raios aquela mulher estava falando? Meu cachorro não tinha pulgas. dava banho nele o tempo todo.
- Não se preocupe, querida, a Jasmine me avisou. – Ela continuou. – Ela te substituiu nos últimos ensaios, mas o papel de Ebony ainda é todo seu.
Mas. O. QUÊ?
AH. MEU. DEUS.
A VACA DESGRAÇADA TINHA ME SABOTADO! ELA TINHA ARMADO PARA MIM!
- Bem, se estiver tudo bem, espero te ver na segunda-feira. – A senhorita Elizabeth disse. – Tchauzinho.
Só saí do estado de raiva paralisante depois de alguns instantes. Então corri atrás dela, porque não ia deixar aquela vaca se safar assim.
- Senhorita Elizabeth! – Gritei já quase chegando à saída do mercado.
A professora já saía com suas bolsas de frutas, mas se virou para me olhar.
- O que foi, querida? – Perguntou confusa.
- Acontece que a Jasmine...
Minha voz sumiu à medida que minha cabeça começou a maquinar.
Afinal de contas, o que aconteceria se eu contasse o que Jasmine tinha feito?
Ela seria expulsa da peça, talvez. Seria delicioso de ver, mas em que isso me beneficiaria?
Em nada, já que eu não sei mesmo cantar.
Além disso, Jasmine se livraria da humilhação de cantar nos bastidores para que eu me destacasse diante de toda escola, e é claro que eu queria vê-la espumando ódio por ter que fazer aquilo na noite da peça, então não seria vantagem colaborar para seu castigo.
O que não queria dizer que ela ficaria impune.
Não mesmo.
E aí estava o último motivo para que eu calasse minha boca: eu tinha que me vingar de Jasvaca e tinha que fazer isso com maestria. Brigar de cara nunca era a solução com ela, por mais tentador que fosse.
- ? – A professora estava esperando.
Balancei a cabeça e sorri.
- Eu só ia dizer que Jasmine foi muito gentil em te avisar. – Completei a frase. – Estou feliz por ter resolvido meus problemas com ela.
A professora sorriu.
- Eu sabia que vocês iam se entender. – Disse. – São tão vivas e talentosas. Seria mesmo um desperdício de tempo ficarem brigando.
- Sim. – Assenti. – Bom, nos vemos na segunda-feira então. – Acenei.
- Até lá, meu bem.
Desperdício.
Sorri, voltando para dentro do supermercado.
Pois eu ia me divertir muito desperdiçando meu tempo para me vingar daquela imbecil. E eu nem ia esperar para comer o prato frio.
POV
- Ah, , desfaz essa cara. – Eu chutei a bola na direção do , numa tentativa obviamente falha de fazê-lo reagir. era uma pessoa difícil de tirar da fossa.
Ele olhou para mim de onde estava, sentado no chão, e empurrou a bola de volta.
- Eu só não quero jogar. – Resmungou.
Rolei os olhos e tentei sem muito sucesso fazer uma embaixadinha.
- Você está ficando paranoico. – Avisei e fui me sentar do lado dele em seguida, para não admitir que tinha parado com as embaixadinhas porque não sabia fazer. Para ser sincero, , a metida a brasileira, sabia fazer aquilo bem melhor do que eu.
- Olha, não é paranoia. – balançou a cabeça de leve. – A tá agindo estranho. Mais do que nas outras vezes. Eu pensei que a gente estava se entendendo, finalmente. Eu não posso ter imaginado tudo, né? Quer dizer, isso seria muita piração.
parecia preocupado de verdade com a possibilidade de estar ficando louco. Achei que seria melhor não fazer uma piada sobre as dezenas de loucuras que ele tinha feito nos últimos meses. Em vez disso, fiz meu papel como bom melhor amigo:
- É claro que você não imaginou tudo. Ela aceitou sair com você. E não foi como quando nós três saímos para comer sanduíche de frango, foi um encontro, amigo. Ela foi com as próprias pernas.
- Então que diabos está acontecendo agora?! – enfiou a mão no cabelo e respirou fundo. Ele estava mesmo ficando doido.
Fiz uma careta.
- Você sabe como é a . Não dá pra saber o que está se passando pela cabeça dela.
- Dá, sim. Eu é que fico tentando fingir que não sei. – Ele se levantou e saiu andando.
- Ei, volta aqui! – Bufei, indo atrás dele.
parou quando eu o alcancei, mas não parecia com muita vontade de conversar – o que não era surpresa, porque ele era daquele jeito mesmo. Por sorte, eu nunca respeitava a vontade dele.
- O que você pensa que ela está pensando, afinal? – Perguntei.
Ele balançou a cabeça. Depois deu de ombros, se rendendo.
- Talvez ela tenha mudado de ideia.
Eu queria mesmo acreditar que só estava exagerando porque não tinha uma boa recordação de situações envolvendo garotas apaixonadas por Junior , mas eu não poderia dizer que um novo surto da me surpreenderia. Ainda assim, minha intuição dizia que tinha algo mais. Eu já conhecia a bem o suficiente para saber que ela gostava do o bastante para não sair com ele só por diversão, sabendo que isso iria magoá-lo. Alguma coisa estava acontecendo.
De todo modo, como eu já tinha avisado a ela antes, era meu melhor amigo. Eu não ia deixar ela sacanear com ele ainda mais, por mais que também fosse amigo dela.
- Quer saber? – Falei, apertando de leve o ombro de . – Talvez você devesse mesmo ir para casa, esfriar a cabeça. Você precisa relaxar com esse negócio da . Sério. Tenta agir como se ela fosse só uma garota normal com quem você saiu e que está esperando para ver o que acontece. Vai ficar muito mais fácil. – Aconselhei. – E enquanto isso, você tem outras coisas pra fazer, não é? Praticar contrabaixo, estudar para ganhar uma bolsa digna na universidade no ano que vem, quem sabe?
respirou fundo, mas assentiu.
- Talvez você esteja certo. – Disse. – Vai ver eu só estou agindo feito um maluco.
- Não me surpreenderia.
- Então a gente se vê depois. – Disse então. – Valeu, .
Dei um sorriso e foi para o seu carro.
Fiquei ali, quicando a bola no chão, e então tentei uma cesta. Errei.
O que estava pensando mesmo era em como ficaria na cola da até tirar a verdade dela, dali pra frente.
POV PIE
Quando meu pai abriu a porta do quarto naquela manhã, eu estava me alongando.
- Você fazendo exercícios, Rainbow? – Ele arqueou uma sobrancelha. – O que foi que houve?
- Ah, pai, eu sou uma atleta agora e hoje tenho uma grande competição. – Sorri para ele, esticando os braços para a esquerda. Voltei à posição normal, me aproximei e lhe dei um beijo no rosto. – A propósito, bom dia.
Tomei meu café-da-manhã leve e delicioso, composto por frutas e linhaça. Brinquei com Stevie. Há alguns dias não me sentia tão bem.
Só quando estava descendo as escadas da varanda com a mochila nas costas, me dei conta de como o ponto de virada da minha vida em Jacksonville Beach tinha sido justamente em uma disputa dos Swordfishes contra o Blue Eagles. A ideia me fez parar por um segundo; tempo suficiente para o carro de estacionar em frente à minha casa. Aí sim, eu parei. Tive que respirar com cuidado, tentar ser normal. Engoli em seco, sorri e entrei no veículo.
- Definitivamente, não podemos perder dessa vez. – Jodi estava nervosa. Seu rosto tinha purpurina, que tinha caído de seu cabelo e agora grudara no suor da pele. Jodi sempre suava bastante quando estava ansiosa.
- Nós não vamos perder. – Emma decretou, alongando os braços. – Eu prefiro a morte.
Summer riu, enquanto ajudava uma garota a ajeitar o cabelo.
- Que coisa horrível de se dizer. – Uma voz masculina surgiu.
Olhamos para porta e lá estava Brad, sorrindo. Jodi deu um longo suspiro, enquanto o garoto olhava de um lado para o outro antes de entrar.
Ele correu e se abaixou perto de Jodi, dando um beijo nela.
- Mas que droga, Winter, esse vestiário é nosso! – Jasmine resmungou.
- Desculpa, Jas. – Ele disse, sempre educado. – Mas é que eu tinha que desejar boa sorte à Jo, e a Emma não deixou a gente se ver ontem.
- Não deixei mesmo! – Hughes fez uma careta, empurrando Brad. – Você e esse seu tanquinho só servem para tirar a concentração da Slaterton. Ela tem que estar focada na competição de hoje, e, aliás, é melhor você ir embora daqui. Não devia nem ter vindo, pelo amor de Deus!
- POR FAVOR, SÓ ME DÊ UM SEGUNDO! – Brad pediu, voltando para perto de Jodi. – Olha, eu trouxe isso. – Ele amarrou uma cordinha amarela no pulso dela. – É para te dar sorte no campo.
Jodi, emocionada, agarrou Brad pelo pescoço e o beijou. Jasmine fez cara de nojo. Emma rolou os olhos.
- Já chega, Winter. – Saiu puxando o rapaz. – Evapora!
- Boa sorte, Jod... – Brad ainda tentou dizer, mas já tinha sido jogado no corredor.
Sorri e apertei o ombro de Jodi, que olhava fixamente para a pulseira, como se fosse uma aliança de noivado. Nunca tinha visto um casal que combinasse mais do que ela e Brad.
- Vocês dois são tão fofos. – Amber olhou para ela, séria. De repente, sua voz ficou embargada. – Isso me faz sentir tanta saudade do meu gatinho !
Amber começou a chorar compulsivamente e foi amparada por outras garotas. Eu imaginava o fim do mundo que seria quando finalmente arranjasse coragem para terminar com a garota, em vez de ficar arrumando desculpas estapafúrdias para fugir dela.
- São o casal mais meloso que já vi, isso sim. – Jasmine amarrou a fita amarela em seu cabelo.
- E o seu namorado, Jas? – Sienna indagou, em tom de provocação. – Não vem te ver?
- É claro que vem. – A morena respondeu mal-humorada. – Charlie não perderia minha vitória por nada.
A resposta – mais especificamente, o tom utilizado para dá-la – pareceu calar Sienna. As outras garotas também não tiveram coragem de fazer outra piada, embora algumas tivessem trocado olhares divertidos.
Uma vez prontas, saímos do vestiário com nossas bolsas rumo ao campo. Aquela seria a primeira etapa da competição das torcidas da Flórida, e das oito equipes da região que estavam ali naquele dia, apenas quatro seguiriam para a fase seguinte, para encontrar as outras.
Todas estavam muito motivadas, porque entre as equipes ali presentes, estavam as Blue Eagles. Emma tinha passado a manhã dizendo como queria ver Chelsea, a capitã delas, caindo do alto da pirâmide.
Meu celular tocou e eu diminui o passo. Na verdade, era só uma mensagem. Do .
Desculpa por não poder ir, Rain. :/
Estou torcendo por vocês à distância :)
Fiquei feliz por não ter tido que falar com ele, mas ao mesmo tempo queria ter ouvido sua voz. Eu quase a ouvi, lendo a mensagem.
Quando olhei para a frente de novo, percebi que tinha ficado para trás. Andando alguns passos, encontrei um celular no chão.
Era da Jasmine.
Ora, ora, mas que surpresa, falei para mim mesma, pegando objeto do chão.
Meditei sobre o que poderia fazer com aquilo. Precisava, afinal, me vingar daquela mau-caráter. Fui pensando sobre o assunto enquanto andava. Uma postagem ridícula no facebook? Uma mensagem vergonhosa?
Foi então que avistei as outras ao longe – Summer mapeando o lugar com os olhos, provavelmente me procurando – e percebi que alguém mais estava faltando.
Jasmine não estava com as garotas. Foi um golpe de sorte eu avistá-la antes de Summer.
Lá estava a bela Jas, atrás da arquibancada com um garoto. Eu tinha a impressão de que já o tinha visto em algum lugar. Finalmente, o identifiquei como um jogador dos Blue Eagles.
Eles estavam conversando – ou será que estariam discutindo? Ele agarrou o pulso de Jasmine, que puxou o braço de volta e disse alguma coisa com o rosto sério, mas ele não parecia nem um pouco preocupado. Por um segundo, pensei que ela poderia estar com problemas, que eu deveria ir tirá-la de lá. Mas então ela riu e o empurrou de leve, como fazemos com um amigo. Por que Jasmine, tão competitiva e importante na cadeia social da Jackson High, seria amiga de um Blue Eagle?
Eu estava me questionando, quando o telefone da garota começou a vibrar. Olhei para a tela e vi a foto de Charlie, que estava ligando.
Meu raciocínio foi rápido. Ali estava minha chance.
Sorri e rejeitei a ligação de Charlie. Depois deslizei meu dedo na tela do celular. Não tinha bloqueio por senha.
Que vacilo, Jasmine.
Abri a câmera do celular e me escondi melhor atrás de uma barraca, para que ninguém me visse.
Jasmine ainda estava rindo. Então o garoto puxou ela para um abraço, que ela aceitou.
- Daria uma modelo tão boa quanto a Olsen. – Eu disse sorrindo. Clique. Uma foto. Clique. Duas.
Abri o WhatsApp dela e encontrei Charlie de cara. Havia uma mensagem dele falando que demoraria, mas ia chegar. Meus dedos foram ágeis ao digitar:
Na verdade, não precisa vir mais.
Encontrei um amigo aqui e vamos sair para colocar o papo em dia depois da competição.
XoXo ;)
Em seguida, enviei a foto com um belo zoom dos dois se abraçando.
Esperei que o sinal de confirmação de recebimento aparecesse, e quando tive certeza de que ele já tinha visto as mensagens, as apaguei do celular dela, então desliguei o aparelho.
Jasmine era tão boa com mensagens, esperava que ela desse conta dessa.
[N/A: Agora podem ouvir essa, girls].
Fui para perto das garotas, satisfeita. Me aproximei da bolsa vermelha de Jas, que alguém tinha levado, e joguei o celular dentro dela.
- Pensei que você tinha sido sequestrada pelas Eagles! – Summer me lançou um olhar aliviado. – Viu a Jasmine?
- Desculpe, me distraí com uma mensagem. – Respondi me alongando. – Sabe que não a vi? Pensei que estivesse com vocês.
- Lá está ela! – Amber apontou quando vimos Jasmine andando, toda sem jeito, rumo a nós.
Ela mudou de expressão assim que chegou.
- Que caras são essas? – Perguntou.
- Cara nenhuma. – Summer sorriu um pouco. – Entramos em alguns minutos. Vamos arrasar, ok?
Não demorou muito para que os apresentadores começassem a falar. Eles descreveram um pouco o perfil de cada equipe, não esquecendo de fazer uma série de elogios a Summer, que estava voltando depois de um bom tempo afastada da torcida.
Então as Blue Eagles foram chamadas. Chelsea – a versão ruiva de Taylor Swift – nos olhou de cima a baixo ao entrar no campo. Emma emitiu um som muito parecido com um rosnado e Summer a acalmou. Jasmine e Amber também xingaram alguma coisa, enquanto as outras garotas da equipe rival pareciam cochichar piadinhas sobre nós.
A apresentação individual das Eagles foi basicamente impecável. Elas estavam mesmo dispostas a passar para a próxima etapa e – especialmente – se saírem melhor do que nós.
Havia uma série de movimentos novos, diferentes dos que eu tinha visto nas minhas aulas sobre nossos adversários – incontáveis horas de vídeos de competições passadas, com pausas a cada dez segundos para os comentários de Jodi. Inclusive, havia um passo claramente feito para nos provocar, um movimento semelhante ao ato de pescar algo e depois jogar fora, como se estivesse estragado.
- Eu vou esfregar a cara dela no asfalto. – Emma decretou. Ninguém teve a audácia de contestar.
Depois das Blue Eagles saírem muito aplaudidas dali, foi a vez das Pirates de Saint Augustine, de quem eu tinha gostado muito ao ver os vídeos, então estava ansiosa pela apresentação, que não me decepcionou, mas me preocupou.
Finalmente, chegou a nossa vez.
Entramos no campo com toda a segurança acumulada em treinos incontáveis e muito esforço. Emma fez uma cara tão feia para as Eagles, que vi Chelsea recuar sutilmente.
Summer fez o sinal e nos posicionamos. Respiramos fundo e estava na hora de começar.
Eu não sabia que queria tanto ganhar até estar ali. Quando a música que selecionamos começou a tocar, era como se eu tivesse passado a vida fazendo aquilo.
Segui os movimentos com perfeição, até mesmo os passos que eu tinha que fazer com Jas. Nenhuma de nós parecia estar ligando, naquele momento, para nosso ódio mútuo. Fiz todas as acrobacias que tinha sido capaz de aprender no tempo que tinha no grupo, e fiquei muito feliz quando vi Summer improvisando – o que ela sabia fazer bem – no chão e puxando o grito de guerra do Swordfish, que respondemos com vontade.
Eu via os olhos de todas nós brilhando e estava tão empolgada que nem sequer olhava para a platéia. Por isso, quando fui para o alto da pirâmide e ouvi os gritos e aplausos, foi uma grata surpresa.
- CARAMBA, NÓS ARRASAMOS! – Emma gritava eufórica.
- FOI, NÃO FOI? – Jodi a abraçou.
Summer foi até mim e também me deu um abraço apertado. E eu ri ao ver a cara de despeito de Chelsea e suas companheiras.
[N/A: ok, podem parar, girls.]
Terminei de enxugar o cabelo no vestiário, com aquele sentimento de missão cumprida transbordando no peito. Tínhamos passado a fase seguinte e eu estava tão feliz; especialmente por Jodi e Emma, que finalmente realizavam seu sonho de participarem de uma competição de torcida.
As outras garotas já estavam lá fora, porque eu tinha tido que atender uma ligação da minha mãe e ficado por ali. Então ouvi a porta ranger.
- Quem diria que você se sairia uma líder de torcida tão boa?
Reconheci a voz de imediato, mas precisei olhar para trás para ter certeza de que se tratava mesmo de .
- Quem diria? – Eu sorria de orelha a orelha.
- Eu só queria te dizer que eu estou super orgulhoso de você e que eu realmente, realmente adoro te ver naquele uniforme.
Algum tempo atrás, eu teria ficado brava com a ousadia de em ir ali para isso, mas eu estava tão feliz. E afinal, eu tinha me decidido sobre aquele assunto do , não é?
- Eu adorei que tenha vindo. – Corri e o abracei.
E quando vi, estava me beijando.
Fiquei um pouco triste em me dar conta de que o beijo não era como antes, quando eu o queria mais do que tudo – quando parecia que o mundo ia acabar se não o tivesse. E senti minha cabeça vagando para longe, para um quarto pequeno com uma poltrona e um contrabaixo, mas fiz o possível para ignorar tudo.
era quem estava me beijando ali, e eu não o impedi.
22– Poison Ivy
“She's pretty as a daisy, but look out man: She's crazy…”
[…]
Enfiei meu livro de matemática no armário e comecei a andar depressa. Tinha uma aula de Inglês dali a alguns minutos, mas tinha perdido tempo ouvindo os elogios das pessoas no corredor, recebendo os parabéns pelo meu desempenho na competição. Ainda me incomodava o fato de eu não saber o nome de metade das pessoas que falavam comigo, como se eu tivesse alguma culpa por isso, mas Teddy da torcida tinha me dito pra relaxar. Era impossível lembrar de tudo assim e ele disse que não sabia os nomes nem de seus primos de segundo grau, imagine da escola inteira.
“Você vai aprender as regras da popularidade logo, logo, Pie.”, o garoto tinha me dito.
Entrei na biblioteca, aproveitando que ainda me lembrava disso. Tinha que pagar a bendita multa do livro emprestado e ela tinha aumentado ainda mais agora.
Os olhos de Stuart, o estagiário, se iluminaram a me ver. Ele devia estar sabendo da competição.
- Bom dia! – Ele sorriu.
- Oi. – Dei um sorriso tímido de volta, puxando de dentro da minha mochila o livro. – Eu vim devolver isso. – Falei. Stuart pegou o livro que estendi. – Está com uma multa de atraso. – Avisei antes mesmo que ele checasse.
Stuart me lançou uma olhadela de lado, botando o cabelo ruivo atrás da orelha, e digitou o código do livro no computador, checando.
- É, tem sim... – Meneou a cabeça. – Mas, olha... Você não precisa pagar. Quer dizer, você acabou de trazer um prêmio e tanto para nós. Devia estar com a cabeça cheia.
As palavras dele soaram como um eco do discurso de Emma sobre o prazer das pessoas em fazerem favores para gente popular. Por um segundo, senti a leveza de me livrar daquela multa sem esforço.
Mas aí eu voltei a mim e percebi que aquilo seria muito errado. Stuart poderia se encrencar e eu não era melhor do que ninguém para sair por aí sem pagar minhas dívidas.
Mordi o lábio e balancei a cabeça.
- Eu agradeço muito a gentileza, Stuart, mas quero pagar. – Coloquei o dinheiro sobre a mesa. – Tive tempo suficiente para trazer isso antes.
O semblante de Stuart caiu um pouco com minha recusa, mas ele assentiu e guardou o dinheiro na gaveta. Depois sorriu.
- Você é uma garota legal, . – Disse.
Sorri de volta, me sentindo melhor por não ter aceitado, e saí da biblioteca.
- ! – Ouvi uma voz chamar então.
Olhei para trás, levando alguns instantes para reconhecer a figura pequena. Me dei conta então de que era uma garota das aulas de teatro. Ela não falava muito, mas estava sempre lá.
- Ooi. – Eu disse sorrindo. – Annabeth, não é?
- Você lembrou! – A garota riu, encantada, ajeitando os óculos.
- É claro. Como vai? Tá tudo bem?
- Ah, sim. Bem, obrigada por perguntar. – Ela disse. Era tão pequena e engraçadinha que dava vontade de colocar num potinho. – Eu só queria saber se recebeu o e-mail da senhorita Elizabeth.
- Não me lembro de ter recebido nada.
- É que ela teve um problema na copiadora da escola e pediu para imprimirmos nossas próprias cópias do roteiro da peça.
- Sério? – Fiz uma careta. A casa de papai não tinha uma impressora, então além do gasto eu teria que me deslocar para fazer isso antes do próximo ensaio. – Que droga.
Annabeth deu de ombros, como se sentisse muito.
- Vou ter que arrumar um tempinho para fazer isso até amanhã de manhã então. – Suspirei. – Obrigada por me avisar, Annabeth.
- Olha... – Ela disse quando eu me preparava para ir embora. – Eu... Bom, meu pai tem uma copiadora. Eu posso imprimir o seu script lá, se você quiser.
- Ah, isso seria ótimo. – Voltei. – Quanto eu te pago? E quando eu pego?
Annabeth riu um pouco, balançando a cabeça.
- Não precisa me pagar. Algumas folhas não vão fazer muita diferença lá.
Eu estava prestes a protestar quanto àquela história de coisas de graça, quando fui atacada por uma cabeça loira flutuante.
- AÍ ESTÁ VOCÊ! – Amber agarrou meu braço, escandalosa. – Te procurei pela escola inteira. Nós temos muito o que fazer hoje.
Desde quando eu tinha qualquer coisa para fazer com Amber Hayley? Deus.
- Tipo o quê? – Franzi o cenho.
- , acorda! – Ela balançou os dedos em frente ao meu rosto. – O baile está chegando. Temos que pensar em cores, decoração, roupas. Mas antes disso, tem uma coisa que você PRECISA ver.
Dei um longo suspiro, já me sentindo cansada. Olhei para Annabeth, que balançou de leve a cabeça.
- Não se preocupe, eu vou imprimir tudo. – Ela disse. – Eu levo para o ensaio amanhã.
- Obrigada. – Eu disse com sinceridade.
Odiava a sensação de estar me aproveitando de alguém daquele jeito, mas era uma situação de necessidade.
🌴💚🌴
Amber me arrastou para longe do corredor, para a sala de reuniões do comitê de baile. Quando entrei, as cabeças que ali estavam se viraram para mim.
- Vejam só se não é a estrela da torcida! – Um garoto loiro que eu vira na última reunião disse. – Parabéns pela vitória, Pie.
- Obrigada. – Dei um sorriso tímido. Os outros me lançavam olhares de aprovação.
Amber me arrastou para o lado onde estava outras garotas da torcida, com caras ansiosas.
- Agora, eis o que você tem que ver! – Ela disse empolgada, pegando algo da mão de uma delas. – TCHAN-RAN! OLHA ELA!
Era o jornal esporádico da Jacksonville Beach High. A matéria da primeira página trazia uma enorme foto minha e de Summer no topo da pirâmide, durante a competição regional. “AS DUAS RAINHAS DA JACKSON HIGH: QUEM É PIE?”, era o título.
Fiquei olhando para aquilo estática, enquanto Amber parecia ter ganhado o dia.
- Isso é maravilhoso para a sua reputação! Perry te colocou no mesmo patamar que a Summer! Isso é INACREDITÁVEL!
Me permiti sorrir, pegando o jornal. Me comparar a Summer era um tremendo exagero, mas não poderia deixar de me sentir lisonjeada.
- E, dessa vez, fui eu mesmo quem escrevi a matéria. – Outra voz entrou na conversa.
Olhei para trás e encontrei Perry Gold, entrando na sala. Ele deslizou pelo ambiente até chegar a mim.
- Acho que exagerou um pouquinho. – Arqueei uma sobrancelha, sorrindo.
- Ah, não. – Ele balançou a cabeça. – Eu estava lá dessa vez. Eu vi tudo e você foi incrível.
- Bom, obrigada.
- Tenho que dizer, : eu tenho um ótimo faro para material de destaque. No momento em que vi as fotos da sua primeira competição com as garotas, eu soube que você era exatamente isso.
Havia algo de malicioso e suave em Perry que me deixava com um pé atrás. Mas tudo bem; ele estava sendo gentil comigo, eu não tinha por que não ser também.
- Eu agradeço. Ainda acho um pouco demais, mas agradeço.
Perry sorriu.
- Soube que você também é a estrela da peça de Outono.
- Você anda muito bem informado, não é? – Dei um sorriso esquivo bem no momento em que meu celular tocou.
Tirei o aparelho do bolso e atendi.
- Eu estava pensando, gotas de chocolate prontas são melhores do que pedacinhos cortados à mão?– A voz de perguntou. – E também, vamos ficar na minha ou na sua casa?
Dei um breve sorriso, imaginando andando pela mercearia comprando materiais culinários. Tínhamos um trabalho de Economia Doméstica para fazer – fazer uma receita em casa e escrever um relatório detalhado sobre a experiência. E íamos fazer cookies.
Ainda estava com um pouco apreensiva, mas acreditava que seria divertido. De toda forma, não me sentia segura o bastante para ir a casa dele e olhar para "a família que era amiga da família Olsen", e naquele momento eu precisava passar confiança.
- Na minha. E os pedacinhos cortados são melhores, mas as gotas são mais práticas. – Respondi, me virando um pouco quando notei Perry me observando.
- Vou ficar com a praticidade dessa vez. – Ele decidiu. – Nos vemos mais tarde. Beijo.
Desliguei o telefone, me voltando para Gold novamente.
- Também dá dicas culinárias? – Ele arqueou uma sobrancelha. – Talvez queira uma coluna no jornal da escola.
- Trabalho de Economia Doméstica. – Dei de ombros.
Do outro lado, Amber fazia sinal sem parar.
- , nós precisamos da sua opinião! – Ela chamou.
Fiz uma careta para Perry, que riu da minha reação.
- Vai lá. – Disse. – Suas seguidoras te esperam. Não deixe de me falar se for fazer algo digno de uma capa novamente.
- Pode deixar.
E com isso, fui me juntar a Amber e as outras, que pareciam precisar da minha opinião para absolutamente toda decisão que tomavam.
POV
- Sabe, uma das coisas que eu mais gosto em você, é o fato de ser tão pontual. – Summer veio em minha direção, os cabelos ainda molhados do banho. – Eu já tive graves problemas com o Junior porque ele sempre se atrasava.
Ela se sentou no sofá e olhou para a garotinha do meu lado.
- Pode deixar ele em paz agora, Gwen. – Disse.
- Mas ele estava me ensinando a fazer o truque da moeda! – Ela protestou.
- . – Summer balançou a cabeça. – Não estraga a brincadeira. Se ela souber como se faz, qual é a graça?
- Ah, é. Foi mal, eu não estrago mais. – Prometi. – Vem aqui, Gwen. – Abri os braços. A baixinha se aproximou para me abraçar, então sussurrei em seu ouvido. – É só esconder entre os dedos.
Gwen deu um sorriso travesso, olhando de soslaio para a irmã, e então saiu correndo. Me fez pensar no meu irmãozinho Rob, lá em Atlanta, e no bebê que ainda estava por vir.
- Você contou, não contou? – Summer me lançou um olhar de repreensão, mas estava sorrindo. – Você descobriu o segredo da moeda bem antes de mim.
Sorri para ela, me lembrando que tinha mesmo descoberto logo, mas tinha fingido não saber de nada por anos, só para não estragar a surpresa dela todas as vezes que nosso vizinho senhor Wilson fazia a moeda desaparecer.
- Desculpa a demora. – Ela disse. – Estou pronta para a aula. – Tamborilou os dedos no violão que estava no sofá.
- Vamos lá então. – Peguei o outro. – Ensaiou a música que eu falei?
- Hanram, ensaiei sim. – Summer me olhou de soslaio. – Mas antes... – Ela parou minha mão, que já segurava o braço do instrumento. – Por que não conversamos um pouco?
Olhei para ela. Eu adorava conversar com Summer, mas tinha um pouco de medo do que quer que ela fosse falar, de vez em quando. Provavelmente isso era porque eu estava sempre meio que mentindo para ela.
- Claro. – Coloquei o violão de lado. – Sobre o que quer falar?
Ela ponderou, pensativa.
- É que eu ando pensando em... A faculdade. – Disse devagar. – Já sabe o que quer fazer?
- Já sim. – Sorri. – Vou fazer Música. Quero ir para Nova Iorque.
- Nossa, você já sabe direitinho mesmo. – Engoliu em seco.
- Por que a pergunta, Summer? Você ainda não?
Summer deu de ombros timidamente, balançando a cabeça.
- Eu tenho pensado nisso desde que voltei para cá. – Respondeu. – Nas últimas semanas, tenho pensado cada vez mais. Acho que me aproximar de novo de você, conhecer a , terminar com o Junior... Tudo isso me trouxe muito mais para o chão, sabe? – Ponderou, e eu pensei na conexão entre as três coisas. – A minha mãe não acha que eu devia ir para a faculdade agora. Acha que isso vai atrapalhar minha carreira e que a melhor coisa que pode me acontecer é me livrar do ensino médio, mas...
- Mas é o que você quer? Ser modelo em tempo integral?
- Eu... Não sei. Mas de repente, a faculdade parece ser uma opção muito melhor do que até algum tempo atrás. Talvez fosse bom pra mim.
- Se precisar conversar sobre o assunto, eu estou aqui.
- Legal. Obrigada. – Assentiu sorrindo. – Agora vamos mudar o assunto para outra coisa. Como vai você e a ?
Pensei no motivo por trás da pergunta, mas respondi mesmo assim.
- Bem, por quê?
- Porque a está ficando mais famosa a cada dia... – Summer fez uma cara engraçada. – E é algo merecido, mas sei o quanto toda essa atenção pública sempre incomodou você.
Pensei por um instante e então assenti.
- É um pouco estranho, eu acho.
- E está tudo bem entre vocês?
- Está, eu acho. – Inflei as bochechas, olhando para a lâmpada. – As coisas entre eu e a sempre foram meio... Malucas. Mas não de um jeito ruim. Ela me faz perder o sono, ela me faz ficar pensando... Em mil coisas. Nela, principalmente.
- Isso é o mais importante. No resto dá-se um jeito. Afinal de contas, você está numa banda, tem que lidar bem com a atenção do público. – Summer sorriu e bateu no meu joelho. – E então, vamos ensaiar?
Sorri de volta para ela, feliz por ter alguém normal com quem conversar.
POV PIE
- Acontece que, você sabe, o , pode ser, tipo, complexo. – Amber dizia no carro, enquanto me dava uma carona para casa, naquela tarde.
- Se sei. – Ergui as sobrancelhas. Meu Deus, eu precisava sair dali, mas ao mesmo tempo tinha vontade de ficar só para dizer a Amber para desistir do . Ficava difícil lembrar de tudo que ela tinha feito à Summer quando ela parecia tão tolinha.
Mas a verdade era que eu lembrava, sim, e por isso minha pena oscilava.
- É! Ele é, tipo, como um filme do Harry Potter. Tem algo de mágico e viciante, mas é difícil entender o que tá acontecendo. – Ela continuou, pensativa. – Quer dizer: que diabos aquele velho viu no Espelho? Qual é a lógica do Quadribol?
Por fim tínhamos chegado a minha rua, e agradeci mentalmente por isso.
- Ótimo, pode me deixar aqui! – Tirei o cinto rapidamente.
- Mas sua casa é lá. – Ela apontou confusa.
- Fica mais fácil para você fazer o retorno daqui. – Inventei descendo do carro.
Amber fez cara de quem captou a mensagem, mas antes de sair, se inclinou para me olhar de novo.
- Olha, temos que falar sobre nossos vestidos. – Avisou. – Que cor eu devia usar esse ano?
- Você está... Perguntando pra mim? – Fiz uma careta.
Amber me olhou como se fosse óbvio, assentindo. Bizarro.
- Ah, bem, não sei... – Pensei. – Talvez vermelho?
- Jasmine nunca me deixou usar vermelho. Ela diz que eu fico parecendo uma ajudante de Papai Noel estúpida. – A garota fez um beicinho sem perceber.
Ah, então ela dizia?
- Bom, eu acho que você vai ficar ótima. – Incentivei. – Cá entre nós, Jasmine só deve ter medo de ficar feia perto de você.
Amber estreitou os olhos como se o pensamento lhe exigisse muito. Então assentiu, abrindo um sorriso.
- Ela deve ter mesmo, não é? Eu fico linda de vermelho. – Disse. Então me olhou com profunda devoção. – Eu fico tão feliz por você existir, que no jantar de Ação de Graças eu vou agradecer por você ter vindo pra cá. Tipo, umas cem vezes.
Dei de ombros, me despedi de novo, e então vi ela se afastar. Dei um longo suspiro de alívio e segui, pensando em chegar em casa e preparar tudo para a chegada de . Não teria ninguém em casa naquele horário, o que tornaria tudo mais fácil. Íamos rir e trabalhar em paz, como quase nunca podíamos fazer.
Quando eu estava chegando perto da minha calçada, foi que ouvi.
- VOCÊ!
Olhei para trás assustada e meu susto só aumentou quando vi quem estava ali.
Jasmine tinha o cabelo bem menos arrumado do que de costume. Ela usava uma blusa vermelha, que combinava perfeitamente com seu nariz – o que talvez significasse que tinha andado chorando. Seus olhos, no entanto, tinham uma raiva mortal. Ela parecia um touro prestes a atacar.
Engoli em seco, tentando não demonstrar sentimentos.
- O que está fazendo na minha rua? – Perguntei friamente.
Jasmine veio para cima de mim furiosa, mas não me bateu. Ela agarrou meu braço com força usando uma mão e com a outra mostrou o celular.
- Sua hipócrita desgraçada! Foi você que fez isso, não foi?! – Exigiu saber. – Você mandou aquela mensagem!
- Não sei do que está falando.
- Não se faça de sonsa, sua vaca cínica! – Ela esbravejou. – Você mandou aquela mensagem pro Charlie! Achei que ele tinha esquecido da minha competição, quando na verdade você o dispensou com uma foto minha com outro cara!
- Por que você estava com outro cara, Jasmine? – Me fiz de boba. – O Charlie é bem legal, sabia? Ele não...
Jasmine me empurrou com força e caí no chão. Fiquei assustada de verdade e meu rosto deixou isso claro.
- Agora você pisou no meu calo, . – Ela apontou o indicador para mim, irada. – Você não perde por esperar.
Com isso, Jasmine foi embora. Fiquei ali, muito assustada. Ergui as mãos que tinha posto no chão ao cair, e que agora estavam arranhadas.
Nervosa, olhei para os lados. Preocupada ou não, eu tinha que sair dali antes que alguém chegasse – a caminho da minha casa ou Jodi, do outro lado do parquinho.
Fiquei de pé e limpei as mãos na calça, então tomei o rumo de casa.
Abri a porta e já fui tirando a mochila das costas, quando percebi que não estava sozinha.
- Miguel? – Arregalei os olhos. – O que está fazendo aqui?
- Eu moro aqui. – Ele disse de seu lugar no sofá. – Você me convidou, lembra?
Meu coração começou a bater mais rápido. não podia ir a minha casa enquanto Miguel estivesse ali. Podia ser paranoia, mas eu tinha absoluta certeza de que em dez segundos com ele ia perceber toda a verdade. E aí, tudo iria torneira abaixo.
- Sim, é claro. – Ri nervosamente. – Mas quero dizer, hoje à tarde. Agora.
- Estou de folga. – Ele deu de ombros, voltando-se para a TV. – Por quê? – Perguntou desconfiado.
- Nada, eu só... – Fingi calma. – Um amigo meu vem aqui fazer um trabalho de Economia Doméstica, só isso.
- Pensei que seus únicos amigos fossem os dois patetas e as garotas da torcida.
- Tenho mais alguns, na verdade.
Miguel me olhou, depois voltou para a TV e deu de ombros.
- Tudo bem, vou gostar de conhecê-lo.
Levei as mãos às têmporas, aproveitando que ele não estava olhando para mim, xingando de forma inaudível em Português.
A campainha tocou.
- Não. – Murmurei.
Fechei os olhos e respirei fundo. Fui atender com o coração na boca, mas então...
- ?
Ele tinha aquele sorriso cara-de-pau no rosto e foi logo entrando em casa.
- Oi, . – Cumprimentou. – Buenas tardes, Miguel! – Acrescentou.
Miguel olhou sobre o ombro com desdém e o ignorou.
- O que está fazendo aqui? – Eu disse, já cansada de todas aquelas novidades.
- Vim te fazer uma visita. É o que amigos fazem. – Ele deu de ombros.
- É, bom, mas agora eu vou sair. – Menti.
- Pensei que ia fazer o trabalho com seu amigo aqui em casa. – Miguel comentou do sofá.
- Que trabalho? – passou direto por mim, indo para a sala. – Que amigo?
Dava para ver aquela mente desconfiada dele trabalhando.
- Economia Doméstica. – Miguel respondeu. – Não conheço o garoto.
Os olhos de se arregalaram e ele olhou para mim com um sorriso malandro. Bufei de raiva e bem na hora a campainha tocou de novo.
Antes que tivesse tempo, corri para a porta e atendi.
Lá estava todo meigo, usando uma camisa azul com estampa de prancha de surfe e carregando uma sacola de compras.
- Espero ter pego tudo que precisava. – Ele sorriu.
Apesar de tudo, sorri de volta.
- Ora, ora, se não é meu colega de time! – A voz irritante de surgiu ao meu lado. – Seja muito bem-vindo à nossa humilde residência, ! Por que não entra?
parecia tão confuso quanto qualquer um estaria, mas entrou mesmo assim.
- A minha residência, você quer dizer. – Fiz uma careta.
- . – fez uma cara confusa. – O que faz aqui?
- Ah, eu passo muito tempo nesta casa, Junior. – lhe lançou um olhar cheio de significado. – Assim como meu grande amigo, , que pode chegar a qualquer momento, por sinal.
Irritada, puxei em direção a cozinha, mas quando passamos em frente à sala Miguel já estava de pé, esperando. Eu gelei.
- Não vai me apresentar ao seu amigo, ? – Ele perguntou.
- Claro. – Assenti. – Miguel, este é . , este é o Miguel.
Mesmo teve que olhar para cima para cumprimentar Miguel. Eles apertaram as mãos.
- Seu sobrenome faz soar um sino para mim. – Miguel observou. – Onde foi que já o ouvi?
- Acontece que ele é namorado da Summer. – entrou na sala e na conversa.
Olhei para a expressão de Miguel. Ele já devia ter ouvido falar bem mal de naquela casa, especialmente da boca de Emma. Mas Miguel só assentiu de leve.
- Ex-namorado, na verdade. – corrigiu.
deu de ombros, como se não fizesse diferença. Achei que aquele silêncio era minha deixa.
- Bom, vamos lá, ? – Segurei seu braço. – Temos muito o que fazer.
assentiu e então olhou para Miguel.
- Foi um prazer.
Arrastei o garoto para dentro da cozinha e encostei a porta, então me afastei dele e apoiei as mãos no balcão, respirando fundo.
- Desculpe por isso. – Falei. – Pensei que não teria mais ninguém em casa.
- E você tinha algum... Plano? – deu aquele sorriso cínico e se aproximou.
Rolei os olhos, indo pegar o leite na geladeira.
- Fazer os biscoitos em paz. Essa era minha única ideia.
- Se era só isso, tá tranquilo. – Ele abriu o pacote de gotas de chocolate e comeu uma. – Mas é uma pena.
Balancei a cabeça para ele. A porta se abriu.
- Algum problema, ? – Perguntei quando o garoto entrou e se sentou no banquinho do balcão.
- Só queria ver o que vão fazer. – Ele respondeu calmamente.
- Cookies. – tirou um livro de receitas de uma das sacolas. – Direto do livro da senhora Turtle.
assentiu com um sorriso falso, mas dava para ver que estava pensativo sobre algo.
- E você e sua dupla, ? – Perguntei. – Não tem uma receita para fazer?
- Bom, não. Eu sou bem ruim cozinhando, então ela decidiu que não me queria na cozinha dela, mas vai agir como se eu tivesse participado, porque tem medo de a senhora Turtle nos forçar a fazer de novo.
- Acho que não sou tão ruim a ponto de ser dispensado então. – piscou para mim e tive vontade de brigar com ele por fazer isso na frente de , mas não o fiz.
Em vez disso continuei arrumando o que precisaríamos para cozinhar e decidi inventar um novo assunto.
- Sabe, falei com a Amber sobre você hoje. – Comentei. – Ela acha que você anda esquisito.
- Demorou a perceber. – disse com desânimo.
- Não é novidade. – falou.
Fiz cara feia diante da falta de empatia dos dois. Garotos.
- O que quer que eu diga? – perguntou com genuína dúvida. – Você sabe que ela é capaz de deixar qualquer um exausto. Tem convivido com ela.
- Nisso aí o tem razão. – assentiu. – Até eu que não sou tão próximo fico cansado.
Bem, não dava para dizer que eu discordava dos argumentos, mas ainda assim, a frivolidade com que falava me deixava um pouco irritada. pelo menos estava tendo que lidar com a situação de verdade.
Bem naquele momento, o telefone do meu amigo tocou.
- Droga, é ela. – Ele murmurou.
Me aproximei e toquei seu ombro.
- É melhor atender. – Aconselhei. – Ela quer resolver assuntos do baile, e se não conseguir falar com você por telefone, pode acabar indo à sua casa e ficando amiga da sua mãe.
arregalou os olhos pensando naquilo, e menos de dois segundos depois já estava saindo da cozinha.
- Alô, Amber?
Dei risada, balançando a cabeça. riu também. Depois ele ficou me olhando, sorrindo.
- Enfim sós. – Ele disse.
Engoli em seco, nervosa de repente, e comecei a andar pela cozinha mexendo em tudo.
- Bom, não totalmente, não é? – Falei. – Porque vai voltar, e Miguel está na sala. Acredite em mim, você não quer que o Miguel desconfie de você... – Ri nervosamente.
O garoto continuou me olhando e sorrindo. Então deu de ombros.
- Sem problema. – Disse calmamente. – Vamos trabalhar por hoje. Vamos ter mais chances de ficarmos sozinhos.
Olhei rapidamente para ele e sorri, voltando para a bancada.
De muitas maneiras, eu fiquei aliviada, de repente, por ter Miguel e ali naquela tarde.
🌴💚🌴
- OH-AH! OH-AH!
O berro em meu ouvido me fez pular. Olhei para trás e encontrei Franklin Bert enrolado em um manto preto.
- Mas que droga é essa? – Ashley, a amiga de Rosana Wayans, perguntou de longe.
- Estou praticando os sons que o Castigo faz! – Franklin explicou empolgado. – E aí, parceira de cena, o que achou? – Perguntou para mim.
Olhei para ele tentando pensar em um jeito gentil de responder, mas era difícil.
- Se você pensa que esse é o barulho que os corvos fazem, está muito enganado. – Annabeth chegou, me poupando do trabalho de falar.
Franklin fez uma careta e se afastou, e a menina parou em frente a mim, estendendo um conjunto de papeis.
- Oi! – Disse. – Sua cópia do roteiro.
- Obrigada, Annabeth. – Sorri. – Eu te pago depois.
- Já falei que não precisa. – Ela balançou a cabeça. – Eu estou muito feliz por você ser a protagonista da peça, , de verdade.
- Problemas nos outros anos? – Perguntei, suspeitando da resposta.
- Bem, a Jasmine é talentosa, mas pode ser bem difícil de lidar.
- Entendo. – Assenti em comiseração, imaginando Jasmine torturando a todos nos anos anteriores.
As portas da frente do auditório se abriram e Courtney e Jeremy entraram no lugar. Courtney carregava uma caixa de isopor.
- A senhorita Elizabeth precisou sair por alguns minutos para resolver uma emergência! – Jeremy avisou. – Ela disse que chega daqui a meia hora.
- Mas ela deixou isso para nós. – A garota apontou. – São uns chás para garganta ou sei lá.
Todos ficaram muito animados com as bebidas, e Courtney colocou a caixa no chão do palco. A turma atacou os copinhos esquisitos que a senhorita Elizabeth comprara em uma fração de segundos.
- Morango com gengibre! – Alguém riu.
- Erva doce com limão. – Outro falou, lendo o rótulo também.
Demorei a me aproximar da bagunça, mas antes que eu o fizesse, Annabeth – que, daquele tamanho, tinha conseguido se enfiar entre os outros – estava vindo em minha direção.
- Olha, , esse aqui tem o seu nome! – Ela sorriu, estendendo um copinho tampado verde e amarelo para mim.
Havia um papel adesivo colado nele onde se lia " P.".
- Por que ela separou o meu? – Questionei.
- Vai ver tem alguma coisa especial para protagonistas. – Annabeth brincou. Eu ri e a empurrei de leve.
O rótulo colado dizia "cidreira e melão". Dei de ombros e abri a tampa de alumínio, dando um longo gole. Era refrescante, mas estranhei o gosto. Não me lembrava melão.
- O que foi? – Annabeth perguntou.
- Estranho. Não tem gosto de melão. – Dei mais um gole. – Mas não sei identificar que gosto é esse.
- Posso ver? – Ela pediu. Estendi o copinho para ela.
Antes que Annabeth bebe-se, no entanto, eu senti algo estranho. Que sensação era aquela?
- Ah, mas isso aqui não é mesmo melão! – A garota concluiu. – Isso é abacaxi. Não reconhece o gosto?
Meu coração quase parou. É claro que eu não reconhecia, porque a última vez que tinha comido qualquer coisa com abacaxi tinha sido quando tinha três anos, e a lembrança ainda era ruim.
Me forcei a falar, embora eu já soubesse o que vinha a seguir.
- Annabeth, você precisa me ajudar. – Falei controlando a respiração, que já se tornava difícil. – Eu sou alérgica a abacaxi. Eu acho que estou tendo um choque anafilático.
A cara de pânico de Annabeth foi tudo que eu vi antes de ficar fraca demais para prestar atenção em qualquer coisa.
🌴💚🌴
- Ah, está acordando!
Abri os olhos devagar, piscando várias vezes. Quando minha visão clareou, enxerguei meu pai, Miguel e .
- Filinha... – Papai me abraçou, ansioso. – Eu estava tão preocupado!
Respirei fundo, feliz por poder respirar assim outra vez.
- Como vim parar aqui? – Perguntei, tentando me lembrar dos fatos.
- Pelo visto você bebeu um chá de abacaxi na escola. – Miguel explicou. – Teve um choque anafilático.
- Sua colega Annabeth me chamou e eu te trouxe para o hospital. – falou baixinho.
- Eu vim na velocidade da luz, Rainbow. – Papai enxugou as lágrimas. – Eu e o quase ficamos malucos.
Sorri para papai e olhei para , que estava um pouco encabulado.
- Miguel não? – Brinquei.
- Alguém tinha que manter a ordem. – Ele sorriu. – Por falar nisso, é bom avisar aos médicos que você acordou. – Ele se direcionou a porta. – E você, Jack, vá lavar essa cara.
Nós rimos e papai assentiu, saindo com ele. se aproximou da cama.
- Você estava quase apagada quando te levamos para o carro. – Disse sério.
- Isso explica porque não lembro de muita coisa.
assentiu, ainda sério. Reparei que ele ficava olhando para o soro no meu braço.
- O que foi, ? – Perguntei. – Eu estou viva.
- Desculpa. – Ele balançou a cabeça, sorrindo um pouco. – Sei que vai soar bem idiota, mas enquanto eu dirigia pra cá, só ficava me lembrando daquele filme do Macaulay Culkin e da garotinha loira, quando as abelhas picam ele e parece algo tão estúpido, mas no fim ele morre.
Eu sorri, imaginando tão preocupado a ponto de achar que eu ia morrer.
- Eu estou legal. – Falei, ainda um pouco fraca. – Desculpa se te assustei.
segurou minha mão sobre a cama, dando de ombros. Depois de um minuto, ele falou:
- Você não sabia que era alérgica a abacaxi? Por que bebeu aquilo?
- Porque o rótulo dizia que era de melão. – Falei. – E tinha o meu nome escrito também.
- Como raios isso foi acontecer?
- Eu não faço ideia. Talvez...
Mas de repente, eu fazia sim. Ia supor que talvez fosse só um defeito de fábrica, uma confusão. Mas algo me disse com força que não.
A fábrica de chás não tinha nada a ver com aquilo. Nem a senhorita Elizabeth.
A culpada sim, a única pessoa do grupo de teatro que não estava lá naquela manhã.
🌴💚🌴
- Eu não acredito nisso! Dessa vez a Jasmine passou do limite.
estava tão possesso que nem tocara seu refrigerante.
Depois de ter me recuperado, papai tinha achado que seria melhor eu ficar em casa no dia seguinte. Como faltei à aula de Economia Doméstica, me ligou perguntando o que tinha acontecido, e quando eu falei que tinha ido parar no hospital no dia anterior, ele me convidou para tomar um sorvete.
- Eu não achei que ela fosse chegar tão longe. – Falei baixinho, cutucando meu sorvete de amora.
- Vicentini, ela poderia ter te matado!
- O importante é que não matou. – Toquei de leve minha garganta, lembrando do que acontecera.
Eu não tinha pensado muito se era ou não uma boa ideia contar a que eu acreditava que Jasmine tinha feito aquilo, mas a verdade era que ele a conhecia melhor do que eu. Ele também sabia que ela me detestava, porque aparentemente ela também o detestava. Assim, acabei entregando minha suspeita.
- Aquela garota perdeu o juízo.
Desnecessário dizer que Jasmine só estava se vingando. Eu não sabia se ela tinha feito as pazes com Charlie ou não, mas, de todo modo, provocar um choque anafilático em alguém parecia ser uma reação exagerada. E olha que eu ainda nem tinha pensado no que ela tinha feito para descobrir que eu era alérgica.
- A grande jogada dela é que eu não tenho como provar. – Dei de ombros, conformada. – Ela não estava lá e, até onde se sabe, a senhorita Elizabeth mandou os chás. Posso pressionar a Jasmine, mas ela nunca vai admitir, e eu só vou me estressar mais.
balançou a cabeça, olhando para mim.
- , isso não vai ficar assim. – Disse, e eu nunca tinha visto ele tão sério. – Aquela irresponsável não perde por esperar.
Eu até ficaria feliz em ver tão preocupado em me vingar, mas com tudo que estava acontecendo, eu só conseguia ficar preocupada de as coisas se complicarem mais. Ainda assim, toquei de leve a mão dele sobre a mesa.
- Não precisa se meter nisso. Mas eu agradeço a preocupação.
- Achou mesmo que eu ia agir como se não fosse nada? – Ele perguntou incrédulo. – , eu vou dizer isso mais uma vez: acredite ou não, você é muito importante para mim.
Sorri para ele, lembrando de como as coisas eram no passado – pensando em como as coisas poderiam ser, se ele não tivesse estragado tudo. Se a vida não tivesse feito aquela bagunça. No fundo, era uma boa pessoa.
O garoto sorriu de volta, levando a mão ao meu rosto. A palma quente descansou ali, na minha bochecha.
Foi então que ouvimos à distância.
- Eu sabia!
E quando olhei para o lado, vi, a alguns poucos metros, os olhos castanhos de , que me julgavam como nunca antes.
[…]
Enfiei meu livro de matemática no armário e comecei a andar depressa. Tinha uma aula de Inglês dali a alguns minutos, mas tinha perdido tempo ouvindo os elogios das pessoas no corredor, recebendo os parabéns pelo meu desempenho na competição. Ainda me incomodava o fato de eu não saber o nome de metade das pessoas que falavam comigo, como se eu tivesse alguma culpa por isso, mas Teddy da torcida tinha me dito pra relaxar. Era impossível lembrar de tudo assim e ele disse que não sabia os nomes nem de seus primos de segundo grau, imagine da escola inteira.
“Você vai aprender as regras da popularidade logo, logo, Pie.”, o garoto tinha me dito.
Entrei na biblioteca, aproveitando que ainda me lembrava disso. Tinha que pagar a bendita multa do livro emprestado e ela tinha aumentado ainda mais agora.
Os olhos de Stuart, o estagiário, se iluminaram a me ver. Ele devia estar sabendo da competição.
- Bom dia! – Ele sorriu.
- Oi. – Dei um sorriso tímido de volta, puxando de dentro da minha mochila o livro. – Eu vim devolver isso. – Falei. Stuart pegou o livro que estendi. – Está com uma multa de atraso. – Avisei antes mesmo que ele checasse.
Stuart me lançou uma olhadela de lado, botando o cabelo ruivo atrás da orelha, e digitou o código do livro no computador, checando.
- É, tem sim... – Meneou a cabeça. – Mas, olha... Você não precisa pagar. Quer dizer, você acabou de trazer um prêmio e tanto para nós. Devia estar com a cabeça cheia.
As palavras dele soaram como um eco do discurso de Emma sobre o prazer das pessoas em fazerem favores para gente popular. Por um segundo, senti a leveza de me livrar daquela multa sem esforço.
Mas aí eu voltei a mim e percebi que aquilo seria muito errado. Stuart poderia se encrencar e eu não era melhor do que ninguém para sair por aí sem pagar minhas dívidas.
Mordi o lábio e balancei a cabeça.
- Eu agradeço muito a gentileza, Stuart, mas quero pagar. – Coloquei o dinheiro sobre a mesa. – Tive tempo suficiente para trazer isso antes.
O semblante de Stuart caiu um pouco com minha recusa, mas ele assentiu e guardou o dinheiro na gaveta. Depois sorriu.
- Você é uma garota legal, . – Disse.
Sorri de volta, me sentindo melhor por não ter aceitado, e saí da biblioteca.
- ! – Ouvi uma voz chamar então.
Olhei para trás, levando alguns instantes para reconhecer a figura pequena. Me dei conta então de que era uma garota das aulas de teatro. Ela não falava muito, mas estava sempre lá.
- Ooi. – Eu disse sorrindo. – Annabeth, não é?
- Você lembrou! – A garota riu, encantada, ajeitando os óculos.
- É claro. Como vai? Tá tudo bem?
- Ah, sim. Bem, obrigada por perguntar. – Ela disse. Era tão pequena e engraçadinha que dava vontade de colocar num potinho. – Eu só queria saber se recebeu o e-mail da senhorita Elizabeth.
- Não me lembro de ter recebido nada.
- É que ela teve um problema na copiadora da escola e pediu para imprimirmos nossas próprias cópias do roteiro da peça.
- Sério? – Fiz uma careta. A casa de papai não tinha uma impressora, então além do gasto eu teria que me deslocar para fazer isso antes do próximo ensaio. – Que droga.
Annabeth deu de ombros, como se sentisse muito.
- Vou ter que arrumar um tempinho para fazer isso até amanhã de manhã então. – Suspirei. – Obrigada por me avisar, Annabeth.
- Olha... – Ela disse quando eu me preparava para ir embora. – Eu... Bom, meu pai tem uma copiadora. Eu posso imprimir o seu script lá, se você quiser.
- Ah, isso seria ótimo. – Voltei. – Quanto eu te pago? E quando eu pego?
Annabeth riu um pouco, balançando a cabeça.
- Não precisa me pagar. Algumas folhas não vão fazer muita diferença lá.
Eu estava prestes a protestar quanto àquela história de coisas de graça, quando fui atacada por uma cabeça loira flutuante.
- AÍ ESTÁ VOCÊ! – Amber agarrou meu braço, escandalosa. – Te procurei pela escola inteira. Nós temos muito o que fazer hoje.
Desde quando eu tinha qualquer coisa para fazer com Amber Hayley? Deus.
- Tipo o quê? – Franzi o cenho.
- , acorda! – Ela balançou os dedos em frente ao meu rosto. – O baile está chegando. Temos que pensar em cores, decoração, roupas. Mas antes disso, tem uma coisa que você PRECISA ver.
Dei um longo suspiro, já me sentindo cansada. Olhei para Annabeth, que balançou de leve a cabeça.
- Não se preocupe, eu vou imprimir tudo. – Ela disse. – Eu levo para o ensaio amanhã.
- Obrigada. – Eu disse com sinceridade.
Odiava a sensação de estar me aproveitando de alguém daquele jeito, mas era uma situação de necessidade.
Amber me arrastou para longe do corredor, para a sala de reuniões do comitê de baile. Quando entrei, as cabeças que ali estavam se viraram para mim.
- Vejam só se não é a estrela da torcida! – Um garoto loiro que eu vira na última reunião disse. – Parabéns pela vitória, Pie.
- Obrigada. – Dei um sorriso tímido. Os outros me lançavam olhares de aprovação.
Amber me arrastou para o lado onde estava outras garotas da torcida, com caras ansiosas.
- Agora, eis o que você tem que ver! – Ela disse empolgada, pegando algo da mão de uma delas. – TCHAN-RAN! OLHA ELA!
Era o jornal esporádico da Jacksonville Beach High. A matéria da primeira página trazia uma enorme foto minha e de Summer no topo da pirâmide, durante a competição regional. “AS DUAS RAINHAS DA JACKSON HIGH: QUEM É PIE?”, era o título.
Fiquei olhando para aquilo estática, enquanto Amber parecia ter ganhado o dia.
- Isso é maravilhoso para a sua reputação! Perry te colocou no mesmo patamar que a Summer! Isso é INACREDITÁVEL!
Me permiti sorrir, pegando o jornal. Me comparar a Summer era um tremendo exagero, mas não poderia deixar de me sentir lisonjeada.
- E, dessa vez, fui eu mesmo quem escrevi a matéria. – Outra voz entrou na conversa.
Olhei para trás e encontrei Perry Gold, entrando na sala. Ele deslizou pelo ambiente até chegar a mim.
- Acho que exagerou um pouquinho. – Arqueei uma sobrancelha, sorrindo.
- Ah, não. – Ele balançou a cabeça. – Eu estava lá dessa vez. Eu vi tudo e você foi incrível.
- Bom, obrigada.
- Tenho que dizer, : eu tenho um ótimo faro para material de destaque. No momento em que vi as fotos da sua primeira competição com as garotas, eu soube que você era exatamente isso.
Havia algo de malicioso e suave em Perry que me deixava com um pé atrás. Mas tudo bem; ele estava sendo gentil comigo, eu não tinha por que não ser também.
- Eu agradeço. Ainda acho um pouco demais, mas agradeço.
Perry sorriu.
- Soube que você também é a estrela da peça de Outono.
- Você anda muito bem informado, não é? – Dei um sorriso esquivo bem no momento em que meu celular tocou.
Tirei o aparelho do bolso e atendi.
- Eu estava pensando, gotas de chocolate prontas são melhores do que pedacinhos cortados à mão?– A voz de perguntou. – E também, vamos ficar na minha ou na sua casa?
Dei um breve sorriso, imaginando andando pela mercearia comprando materiais culinários. Tínhamos um trabalho de Economia Doméstica para fazer – fazer uma receita em casa e escrever um relatório detalhado sobre a experiência. E íamos fazer cookies.
Ainda estava com um pouco apreensiva, mas acreditava que seria divertido. De toda forma, não me sentia segura o bastante para ir a casa dele e olhar para "a família que era amiga da família Olsen", e naquele momento eu precisava passar confiança.
- Na minha. E os pedacinhos cortados são melhores, mas as gotas são mais práticas. – Respondi, me virando um pouco quando notei Perry me observando.
- Vou ficar com a praticidade dessa vez. – Ele decidiu. – Nos vemos mais tarde. Beijo.
Desliguei o telefone, me voltando para Gold novamente.
- Também dá dicas culinárias? – Ele arqueou uma sobrancelha. – Talvez queira uma coluna no jornal da escola.
- Trabalho de Economia Doméstica. – Dei de ombros.
Do outro lado, Amber fazia sinal sem parar.
- , nós precisamos da sua opinião! – Ela chamou.
Fiz uma careta para Perry, que riu da minha reação.
- Vai lá. – Disse. – Suas seguidoras te esperam. Não deixe de me falar se for fazer algo digno de uma capa novamente.
- Pode deixar.
E com isso, fui me juntar a Amber e as outras, que pareciam precisar da minha opinião para absolutamente toda decisão que tomavam.
POV
- Sabe, uma das coisas que eu mais gosto em você, é o fato de ser tão pontual. – Summer veio em minha direção, os cabelos ainda molhados do banho. – Eu já tive graves problemas com o Junior porque ele sempre se atrasava.
Ela se sentou no sofá e olhou para a garotinha do meu lado.
- Pode deixar ele em paz agora, Gwen. – Disse.
- Mas ele estava me ensinando a fazer o truque da moeda! – Ela protestou.
- . – Summer balançou a cabeça. – Não estraga a brincadeira. Se ela souber como se faz, qual é a graça?
- Ah, é. Foi mal, eu não estrago mais. – Prometi. – Vem aqui, Gwen. – Abri os braços. A baixinha se aproximou para me abraçar, então sussurrei em seu ouvido. – É só esconder entre os dedos.
Gwen deu um sorriso travesso, olhando de soslaio para a irmã, e então saiu correndo. Me fez pensar no meu irmãozinho Rob, lá em Atlanta, e no bebê que ainda estava por vir.
- Você contou, não contou? – Summer me lançou um olhar de repreensão, mas estava sorrindo. – Você descobriu o segredo da moeda bem antes de mim.
Sorri para ela, me lembrando que tinha mesmo descoberto logo, mas tinha fingido não saber de nada por anos, só para não estragar a surpresa dela todas as vezes que nosso vizinho senhor Wilson fazia a moeda desaparecer.
- Desculpa a demora. – Ela disse. – Estou pronta para a aula. – Tamborilou os dedos no violão que estava no sofá.
- Vamos lá então. – Peguei o outro. – Ensaiou a música que eu falei?
- Hanram, ensaiei sim. – Summer me olhou de soslaio. – Mas antes... – Ela parou minha mão, que já segurava o braço do instrumento. – Por que não conversamos um pouco?
Olhei para ela. Eu adorava conversar com Summer, mas tinha um pouco de medo do que quer que ela fosse falar, de vez em quando. Provavelmente isso era porque eu estava sempre meio que mentindo para ela.
- Claro. – Coloquei o violão de lado. – Sobre o que quer falar?
Ela ponderou, pensativa.
- É que eu ando pensando em... A faculdade. – Disse devagar. – Já sabe o que quer fazer?
- Já sim. – Sorri. – Vou fazer Música. Quero ir para Nova Iorque.
- Nossa, você já sabe direitinho mesmo. – Engoliu em seco.
- Por que a pergunta, Summer? Você ainda não?
Summer deu de ombros timidamente, balançando a cabeça.
- Eu tenho pensado nisso desde que voltei para cá. – Respondeu. – Nas últimas semanas, tenho pensado cada vez mais. Acho que me aproximar de novo de você, conhecer a , terminar com o Junior... Tudo isso me trouxe muito mais para o chão, sabe? – Ponderou, e eu pensei na conexão entre as três coisas. – A minha mãe não acha que eu devia ir para a faculdade agora. Acha que isso vai atrapalhar minha carreira e que a melhor coisa que pode me acontecer é me livrar do ensino médio, mas...
- Mas é o que você quer? Ser modelo em tempo integral?
- Eu... Não sei. Mas de repente, a faculdade parece ser uma opção muito melhor do que até algum tempo atrás. Talvez fosse bom pra mim.
- Se precisar conversar sobre o assunto, eu estou aqui.
- Legal. Obrigada. – Assentiu sorrindo. – Agora vamos mudar o assunto para outra coisa. Como vai você e a ?
Pensei no motivo por trás da pergunta, mas respondi mesmo assim.
- Bem, por quê?
- Porque a está ficando mais famosa a cada dia... – Summer fez uma cara engraçada. – E é algo merecido, mas sei o quanto toda essa atenção pública sempre incomodou você.
Pensei por um instante e então assenti.
- É um pouco estranho, eu acho.
- E está tudo bem entre vocês?
- Está, eu acho. – Inflei as bochechas, olhando para a lâmpada. – As coisas entre eu e a sempre foram meio... Malucas. Mas não de um jeito ruim. Ela me faz perder o sono, ela me faz ficar pensando... Em mil coisas. Nela, principalmente.
- Isso é o mais importante. No resto dá-se um jeito. Afinal de contas, você está numa banda, tem que lidar bem com a atenção do público. – Summer sorriu e bateu no meu joelho. – E então, vamos ensaiar?
Sorri de volta para ela, feliz por ter alguém normal com quem conversar.
POV PIE
- Acontece que, você sabe, o , pode ser, tipo, complexo. – Amber dizia no carro, enquanto me dava uma carona para casa, naquela tarde.
- Se sei. – Ergui as sobrancelhas. Meu Deus, eu precisava sair dali, mas ao mesmo tempo tinha vontade de ficar só para dizer a Amber para desistir do . Ficava difícil lembrar de tudo que ela tinha feito à Summer quando ela parecia tão tolinha.
Mas a verdade era que eu lembrava, sim, e por isso minha pena oscilava.
- É! Ele é, tipo, como um filme do Harry Potter. Tem algo de mágico e viciante, mas é difícil entender o que tá acontecendo. – Ela continuou, pensativa. – Quer dizer: que diabos aquele velho viu no Espelho? Qual é a lógica do Quadribol?
Por fim tínhamos chegado a minha rua, e agradeci mentalmente por isso.
- Ótimo, pode me deixar aqui! – Tirei o cinto rapidamente.
- Mas sua casa é lá. – Ela apontou confusa.
- Fica mais fácil para você fazer o retorno daqui. – Inventei descendo do carro.
Amber fez cara de quem captou a mensagem, mas antes de sair, se inclinou para me olhar de novo.
- Olha, temos que falar sobre nossos vestidos. – Avisou. – Que cor eu devia usar esse ano?
- Você está... Perguntando pra mim? – Fiz uma careta.
Amber me olhou como se fosse óbvio, assentindo. Bizarro.
- Ah, bem, não sei... – Pensei. – Talvez vermelho?
- Jasmine nunca me deixou usar vermelho. Ela diz que eu fico parecendo uma ajudante de Papai Noel estúpida. – A garota fez um beicinho sem perceber.
Ah, então ela dizia?
- Bom, eu acho que você vai ficar ótima. – Incentivei. – Cá entre nós, Jasmine só deve ter medo de ficar feia perto de você.
Amber estreitou os olhos como se o pensamento lhe exigisse muito. Então assentiu, abrindo um sorriso.
- Ela deve ter mesmo, não é? Eu fico linda de vermelho. – Disse. Então me olhou com profunda devoção. – Eu fico tão feliz por você existir, que no jantar de Ação de Graças eu vou agradecer por você ter vindo pra cá. Tipo, umas cem vezes.
Dei de ombros, me despedi de novo, e então vi ela se afastar. Dei um longo suspiro de alívio e segui, pensando em chegar em casa e preparar tudo para a chegada de . Não teria ninguém em casa naquele horário, o que tornaria tudo mais fácil. Íamos rir e trabalhar em paz, como quase nunca podíamos fazer.
Quando eu estava chegando perto da minha calçada, foi que ouvi.
- VOCÊ!
Olhei para trás assustada e meu susto só aumentou quando vi quem estava ali.
Jasmine tinha o cabelo bem menos arrumado do que de costume. Ela usava uma blusa vermelha, que combinava perfeitamente com seu nariz – o que talvez significasse que tinha andado chorando. Seus olhos, no entanto, tinham uma raiva mortal. Ela parecia um touro prestes a atacar.
Engoli em seco, tentando não demonstrar sentimentos.
- O que está fazendo na minha rua? – Perguntei friamente.
Jasmine veio para cima de mim furiosa, mas não me bateu. Ela agarrou meu braço com força usando uma mão e com a outra mostrou o celular.
- Sua hipócrita desgraçada! Foi você que fez isso, não foi?! – Exigiu saber. – Você mandou aquela mensagem!
- Não sei do que está falando.
- Não se faça de sonsa, sua vaca cínica! – Ela esbravejou. – Você mandou aquela mensagem pro Charlie! Achei que ele tinha esquecido da minha competição, quando na verdade você o dispensou com uma foto minha com outro cara!
- Por que você estava com outro cara, Jasmine? – Me fiz de boba. – O Charlie é bem legal, sabia? Ele não...
Jasmine me empurrou com força e caí no chão. Fiquei assustada de verdade e meu rosto deixou isso claro.
- Agora você pisou no meu calo, . – Ela apontou o indicador para mim, irada. – Você não perde por esperar.
Com isso, Jasmine foi embora. Fiquei ali, muito assustada. Ergui as mãos que tinha posto no chão ao cair, e que agora estavam arranhadas.
Nervosa, olhei para os lados. Preocupada ou não, eu tinha que sair dali antes que alguém chegasse – a caminho da minha casa ou Jodi, do outro lado do parquinho.
Fiquei de pé e limpei as mãos na calça, então tomei o rumo de casa.
Abri a porta e já fui tirando a mochila das costas, quando percebi que não estava sozinha.
- Miguel? – Arregalei os olhos. – O que está fazendo aqui?
- Eu moro aqui. – Ele disse de seu lugar no sofá. – Você me convidou, lembra?
Meu coração começou a bater mais rápido. não podia ir a minha casa enquanto Miguel estivesse ali. Podia ser paranoia, mas eu tinha absoluta certeza de que em dez segundos com ele ia perceber toda a verdade. E aí, tudo iria torneira abaixo.
- Sim, é claro. – Ri nervosamente. – Mas quero dizer, hoje à tarde. Agora.
- Estou de folga. – Ele deu de ombros, voltando-se para a TV. – Por quê? – Perguntou desconfiado.
- Nada, eu só... – Fingi calma. – Um amigo meu vem aqui fazer um trabalho de Economia Doméstica, só isso.
- Pensei que seus únicos amigos fossem os dois patetas e as garotas da torcida.
- Tenho mais alguns, na verdade.
Miguel me olhou, depois voltou para a TV e deu de ombros.
- Tudo bem, vou gostar de conhecê-lo.
Levei as mãos às têmporas, aproveitando que ele não estava olhando para mim, xingando de forma inaudível em Português.
A campainha tocou.
- Não. – Murmurei.
Fechei os olhos e respirei fundo. Fui atender com o coração na boca, mas então...
- ?
Ele tinha aquele sorriso cara-de-pau no rosto e foi logo entrando em casa.
- Oi, . – Cumprimentou. – Buenas tardes, Miguel! – Acrescentou.
Miguel olhou sobre o ombro com desdém e o ignorou.
- O que está fazendo aqui? – Eu disse, já cansada de todas aquelas novidades.
- Vim te fazer uma visita. É o que amigos fazem. – Ele deu de ombros.
- É, bom, mas agora eu vou sair. – Menti.
- Pensei que ia fazer o trabalho com seu amigo aqui em casa. – Miguel comentou do sofá.
- Que trabalho? – passou direto por mim, indo para a sala. – Que amigo?
Dava para ver aquela mente desconfiada dele trabalhando.
- Economia Doméstica. – Miguel respondeu. – Não conheço o garoto.
Os olhos de se arregalaram e ele olhou para mim com um sorriso malandro. Bufei de raiva e bem na hora a campainha tocou de novo.
Antes que tivesse tempo, corri para a porta e atendi.
Lá estava todo meigo, usando uma camisa azul com estampa de prancha de surfe e carregando uma sacola de compras.
- Espero ter pego tudo que precisava. – Ele sorriu.
Apesar de tudo, sorri de volta.
- Ora, ora, se não é meu colega de time! – A voz irritante de surgiu ao meu lado. – Seja muito bem-vindo à nossa humilde residência, ! Por que não entra?
parecia tão confuso quanto qualquer um estaria, mas entrou mesmo assim.
- A minha residência, você quer dizer. – Fiz uma careta.
- . – fez uma cara confusa. – O que faz aqui?
- Ah, eu passo muito tempo nesta casa, Junior. – lhe lançou um olhar cheio de significado. – Assim como meu grande amigo, , que pode chegar a qualquer momento, por sinal.
Irritada, puxei em direção a cozinha, mas quando passamos em frente à sala Miguel já estava de pé, esperando. Eu gelei.
- Não vai me apresentar ao seu amigo, ? – Ele perguntou.
- Claro. – Assenti. – Miguel, este é . , este é o Miguel.
Mesmo teve que olhar para cima para cumprimentar Miguel. Eles apertaram as mãos.
- Seu sobrenome faz soar um sino para mim. – Miguel observou. – Onde foi que já o ouvi?
- Acontece que ele é namorado da Summer. – entrou na sala e na conversa.
Olhei para a expressão de Miguel. Ele já devia ter ouvido falar bem mal de naquela casa, especialmente da boca de Emma. Mas Miguel só assentiu de leve.
- Ex-namorado, na verdade. – corrigiu.
deu de ombros, como se não fizesse diferença. Achei que aquele silêncio era minha deixa.
- Bom, vamos lá, ? – Segurei seu braço. – Temos muito o que fazer.
assentiu e então olhou para Miguel.
- Foi um prazer.
Arrastei o garoto para dentro da cozinha e encostei a porta, então me afastei dele e apoiei as mãos no balcão, respirando fundo.
- Desculpe por isso. – Falei. – Pensei que não teria mais ninguém em casa.
- E você tinha algum... Plano? – deu aquele sorriso cínico e se aproximou.
Rolei os olhos, indo pegar o leite na geladeira.
- Fazer os biscoitos em paz. Essa era minha única ideia.
- Se era só isso, tá tranquilo. – Ele abriu o pacote de gotas de chocolate e comeu uma. – Mas é uma pena.
Balancei a cabeça para ele. A porta se abriu.
- Algum problema, ? – Perguntei quando o garoto entrou e se sentou no banquinho do balcão.
- Só queria ver o que vão fazer. – Ele respondeu calmamente.
- Cookies. – tirou um livro de receitas de uma das sacolas. – Direto do livro da senhora Turtle.
assentiu com um sorriso falso, mas dava para ver que estava pensativo sobre algo.
- E você e sua dupla, ? – Perguntei. – Não tem uma receita para fazer?
- Bom, não. Eu sou bem ruim cozinhando, então ela decidiu que não me queria na cozinha dela, mas vai agir como se eu tivesse participado, porque tem medo de a senhora Turtle nos forçar a fazer de novo.
- Acho que não sou tão ruim a ponto de ser dispensado então. – piscou para mim e tive vontade de brigar com ele por fazer isso na frente de , mas não o fiz.
Em vez disso continuei arrumando o que precisaríamos para cozinhar e decidi inventar um novo assunto.
- Sabe, falei com a Amber sobre você hoje. – Comentei. – Ela acha que você anda esquisito.
- Demorou a perceber. – disse com desânimo.
- Não é novidade. – falou.
Fiz cara feia diante da falta de empatia dos dois. Garotos.
- O que quer que eu diga? – perguntou com genuína dúvida. – Você sabe que ela é capaz de deixar qualquer um exausto. Tem convivido com ela.
- Nisso aí o tem razão. – assentiu. – Até eu que não sou tão próximo fico cansado.
Bem, não dava para dizer que eu discordava dos argumentos, mas ainda assim, a frivolidade com que falava me deixava um pouco irritada. pelo menos estava tendo que lidar com a situação de verdade.
Bem naquele momento, o telefone do meu amigo tocou.
- Droga, é ela. – Ele murmurou.
Me aproximei e toquei seu ombro.
- É melhor atender. – Aconselhei. – Ela quer resolver assuntos do baile, e se não conseguir falar com você por telefone, pode acabar indo à sua casa e ficando amiga da sua mãe.
arregalou os olhos pensando naquilo, e menos de dois segundos depois já estava saindo da cozinha.
- Alô, Amber?
Dei risada, balançando a cabeça. riu também. Depois ele ficou me olhando, sorrindo.
- Enfim sós. – Ele disse.
Engoli em seco, nervosa de repente, e comecei a andar pela cozinha mexendo em tudo.
- Bom, não totalmente, não é? – Falei. – Porque vai voltar, e Miguel está na sala. Acredite em mim, você não quer que o Miguel desconfie de você... – Ri nervosamente.
O garoto continuou me olhando e sorrindo. Então deu de ombros.
- Sem problema. – Disse calmamente. – Vamos trabalhar por hoje. Vamos ter mais chances de ficarmos sozinhos.
Olhei rapidamente para ele e sorri, voltando para a bancada.
De muitas maneiras, eu fiquei aliviada, de repente, por ter Miguel e ali naquela tarde.
- OH-AH! OH-AH!
O berro em meu ouvido me fez pular. Olhei para trás e encontrei Franklin Bert enrolado em um manto preto.
- Mas que droga é essa? – Ashley, a amiga de Rosana Wayans, perguntou de longe.
- Estou praticando os sons que o Castigo faz! – Franklin explicou empolgado. – E aí, parceira de cena, o que achou? – Perguntou para mim.
Olhei para ele tentando pensar em um jeito gentil de responder, mas era difícil.
- Se você pensa que esse é o barulho que os corvos fazem, está muito enganado. – Annabeth chegou, me poupando do trabalho de falar.
Franklin fez uma careta e se afastou, e a menina parou em frente a mim, estendendo um conjunto de papeis.
- Oi! – Disse. – Sua cópia do roteiro.
- Obrigada, Annabeth. – Sorri. – Eu te pago depois.
- Já falei que não precisa. – Ela balançou a cabeça. – Eu estou muito feliz por você ser a protagonista da peça, , de verdade.
- Problemas nos outros anos? – Perguntei, suspeitando da resposta.
- Bem, a Jasmine é talentosa, mas pode ser bem difícil de lidar.
- Entendo. – Assenti em comiseração, imaginando Jasmine torturando a todos nos anos anteriores.
As portas da frente do auditório se abriram e Courtney e Jeremy entraram no lugar. Courtney carregava uma caixa de isopor.
- A senhorita Elizabeth precisou sair por alguns minutos para resolver uma emergência! – Jeremy avisou. – Ela disse que chega daqui a meia hora.
- Mas ela deixou isso para nós. – A garota apontou. – São uns chás para garganta ou sei lá.
Todos ficaram muito animados com as bebidas, e Courtney colocou a caixa no chão do palco. A turma atacou os copinhos esquisitos que a senhorita Elizabeth comprara em uma fração de segundos.
- Morango com gengibre! – Alguém riu.
- Erva doce com limão. – Outro falou, lendo o rótulo também.
Demorei a me aproximar da bagunça, mas antes que eu o fizesse, Annabeth – que, daquele tamanho, tinha conseguido se enfiar entre os outros – estava vindo em minha direção.
- Olha, , esse aqui tem o seu nome! – Ela sorriu, estendendo um copinho tampado verde e amarelo para mim.
Havia um papel adesivo colado nele onde se lia " P.".
- Por que ela separou o meu? – Questionei.
- Vai ver tem alguma coisa especial para protagonistas. – Annabeth brincou. Eu ri e a empurrei de leve.
O rótulo colado dizia "cidreira e melão". Dei de ombros e abri a tampa de alumínio, dando um longo gole. Era refrescante, mas estranhei o gosto. Não me lembrava melão.
- O que foi? – Annabeth perguntou.
- Estranho. Não tem gosto de melão. – Dei mais um gole. – Mas não sei identificar que gosto é esse.
- Posso ver? – Ela pediu. Estendi o copinho para ela.
Antes que Annabeth bebe-se, no entanto, eu senti algo estranho. Que sensação era aquela?
- Ah, mas isso aqui não é mesmo melão! – A garota concluiu. – Isso é abacaxi. Não reconhece o gosto?
Meu coração quase parou. É claro que eu não reconhecia, porque a última vez que tinha comido qualquer coisa com abacaxi tinha sido quando tinha três anos, e a lembrança ainda era ruim.
Me forcei a falar, embora eu já soubesse o que vinha a seguir.
- Annabeth, você precisa me ajudar. – Falei controlando a respiração, que já se tornava difícil. – Eu sou alérgica a abacaxi. Eu acho que estou tendo um choque anafilático.
A cara de pânico de Annabeth foi tudo que eu vi antes de ficar fraca demais para prestar atenção em qualquer coisa.
- Ah, está acordando!
Abri os olhos devagar, piscando várias vezes. Quando minha visão clareou, enxerguei meu pai, Miguel e .
- Filinha... – Papai me abraçou, ansioso. – Eu estava tão preocupado!
Respirei fundo, feliz por poder respirar assim outra vez.
- Como vim parar aqui? – Perguntei, tentando me lembrar dos fatos.
- Pelo visto você bebeu um chá de abacaxi na escola. – Miguel explicou. – Teve um choque anafilático.
- Sua colega Annabeth me chamou e eu te trouxe para o hospital. – falou baixinho.
- Eu vim na velocidade da luz, Rainbow. – Papai enxugou as lágrimas. – Eu e o quase ficamos malucos.
Sorri para papai e olhei para , que estava um pouco encabulado.
- Miguel não? – Brinquei.
- Alguém tinha que manter a ordem. – Ele sorriu. – Por falar nisso, é bom avisar aos médicos que você acordou. – Ele se direcionou a porta. – E você, Jack, vá lavar essa cara.
Nós rimos e papai assentiu, saindo com ele. se aproximou da cama.
- Você estava quase apagada quando te levamos para o carro. – Disse sério.
- Isso explica porque não lembro de muita coisa.
assentiu, ainda sério. Reparei que ele ficava olhando para o soro no meu braço.
- O que foi, ? – Perguntei. – Eu estou viva.
- Desculpa. – Ele balançou a cabeça, sorrindo um pouco. – Sei que vai soar bem idiota, mas enquanto eu dirigia pra cá, só ficava me lembrando daquele filme do Macaulay Culkin e da garotinha loira, quando as abelhas picam ele e parece algo tão estúpido, mas no fim ele morre.
Eu sorri, imaginando tão preocupado a ponto de achar que eu ia morrer.
- Eu estou legal. – Falei, ainda um pouco fraca. – Desculpa se te assustei.
segurou minha mão sobre a cama, dando de ombros. Depois de um minuto, ele falou:
- Você não sabia que era alérgica a abacaxi? Por que bebeu aquilo?
- Porque o rótulo dizia que era de melão. – Falei. – E tinha o meu nome escrito também.
- Como raios isso foi acontecer?
- Eu não faço ideia. Talvez...
Mas de repente, eu fazia sim. Ia supor que talvez fosse só um defeito de fábrica, uma confusão. Mas algo me disse com força que não.
A fábrica de chás não tinha nada a ver com aquilo. Nem a senhorita Elizabeth.
A culpada sim, a única pessoa do grupo de teatro que não estava lá naquela manhã.
- Eu não acredito nisso! Dessa vez a Jasmine passou do limite.
estava tão possesso que nem tocara seu refrigerante.
Depois de ter me recuperado, papai tinha achado que seria melhor eu ficar em casa no dia seguinte. Como faltei à aula de Economia Doméstica, me ligou perguntando o que tinha acontecido, e quando eu falei que tinha ido parar no hospital no dia anterior, ele me convidou para tomar um sorvete.
- Eu não achei que ela fosse chegar tão longe. – Falei baixinho, cutucando meu sorvete de amora.
- Vicentini, ela poderia ter te matado!
- O importante é que não matou. – Toquei de leve minha garganta, lembrando do que acontecera.
Eu não tinha pensado muito se era ou não uma boa ideia contar a que eu acreditava que Jasmine tinha feito aquilo, mas a verdade era que ele a conhecia melhor do que eu. Ele também sabia que ela me detestava, porque aparentemente ela também o detestava. Assim, acabei entregando minha suspeita.
- Aquela garota perdeu o juízo.
Desnecessário dizer que Jasmine só estava se vingando. Eu não sabia se ela tinha feito as pazes com Charlie ou não, mas, de todo modo, provocar um choque anafilático em alguém parecia ser uma reação exagerada. E olha que eu ainda nem tinha pensado no que ela tinha feito para descobrir que eu era alérgica.
- A grande jogada dela é que eu não tenho como provar. – Dei de ombros, conformada. – Ela não estava lá e, até onde se sabe, a senhorita Elizabeth mandou os chás. Posso pressionar a Jasmine, mas ela nunca vai admitir, e eu só vou me estressar mais.
balançou a cabeça, olhando para mim.
- , isso não vai ficar assim. – Disse, e eu nunca tinha visto ele tão sério. – Aquela irresponsável não perde por esperar.
Eu até ficaria feliz em ver tão preocupado em me vingar, mas com tudo que estava acontecendo, eu só conseguia ficar preocupada de as coisas se complicarem mais. Ainda assim, toquei de leve a mão dele sobre a mesa.
- Não precisa se meter nisso. Mas eu agradeço a preocupação.
- Achou mesmo que eu ia agir como se não fosse nada? – Ele perguntou incrédulo. – , eu vou dizer isso mais uma vez: acredite ou não, você é muito importante para mim.
Sorri para ele, lembrando de como as coisas eram no passado – pensando em como as coisas poderiam ser, se ele não tivesse estragado tudo. Se a vida não tivesse feito aquela bagunça. No fundo, era uma boa pessoa.
O garoto sorriu de volta, levando a mão ao meu rosto. A palma quente descansou ali, na minha bochecha.
Foi então que ouvimos à distância.
- Eu sabia!
E quando olhei para o lado, vi, a alguns poucos metros, os olhos castanhos de , que me julgavam como nunca antes.
23- Damn, you’re such a...
“Are you joking? Are you joking? I can't!”
[…]
- Eu sabia!
Lá estava , olhando para mim. Levei uns cinco segundos para conseguir reagir.
- Ah, mas que droga! – Exclamei. – , me deixa explicar.
O garoto balançou a cabeça e me deu as costas, andando furiosamente rua abaixo.
- ! – Gritei.
Saí da sorveteria feito um furacão.
- ! – chamou.
- Não me siga! – Falei em resposta.
Claramente os treinos de futebol estavam fazendo bem às capacidades físicas de , porque em menos de um minuto o garoto já estava dobrando a esquina, e eu corria para alcançá-lo.
De repente ele parou e virou, me fazendo diminuir o ritmo tão depressa que quase tropecei.
- Eu só queria saber o que você pensa que está fazendo, ? – Ele questionou frustrado. – Que MERDA você pensa que está fazendo?
Eu engoli em seco, sem saber direito nem por onde começar.
- Eu posso explicar. – Falei baixinho, mas não podia, na verdade.
- Pode, mas não precisa, não é mesmo? Eu sei bem o que eu vi, .
- Mas não é o que está pensando! – Protestei, sem nem saber o que eu diria a seguir. – Eu e o , nós só estávamos...
- Conversando? Ah, pelo amor de Deus! – gritou com desprezo. Eu nunca tinha o visto tão irritado, e isso estava me deixando perdida. – Deixa eu te falar uma coisa: não é porque eu leio quadrinhos que vou acreditar em qualquer história fantasiosa, especialmente se vem de alguém que só sabe mentir!
Eu estaquei por alguns instantes, meu cérebro embriagado de surpresa demais para processar aquilo. Então pisquei.
Era isso que eu era para ? Alguém que só sabia mentir? Meu coração se quebrou um pouquinho, mas eu reagi.
- Eu não estou mentindo, seu idiota. – Falei entredentes. – Nós estávamos conversando.
- Diz isso pro quando ele for te perguntar. – me deu as costas de novo.
Gelei da cabeça aos pés.
ELE NÃO PODIA CONTAR AO ! NÃO PODIA!
Corri atrás de de novo, dessa vez até alcançá-lo para puxar seu braço.
- , você não pode fazer isso! – Implorei. – Não pode contar para ele!
- Por quê? Você disse que não aconteceu nada! – Ele abriu os braços e deu um sorriso vitorioso. – Eu só queria entender, , como é que tem coragem de fazer isso com o ? Eu pensei que gostasse pelo menos um pouco dele!
- Eu gosto! – Eu estava quase chorando. – Você não entende.
- Entendo sim. É como juntar dois mais dois, e, modéstia à parte, eu sou muito bom em Matemática. – Ele disse com frieza.
Talvez se eu explicasse o que tinha acontecido na noite do parque, e só aquilo, ele entendesse. Talvez...
- E antes que você diga qualquer coisa, quero que saiba que eu sei de tudo. – Ele me encarou.
E dessa vez eu realmente não consegui me mexer. O que exatamente era tudo? Ele sabia?
- Naquela noite, na fogueira, eu vi você e o Junior se beijando. – Ele continuou, fazendo meu chão se abrir. – E eu sei que ele mudou de turma por sua causa. E sei, acima de tudo, que você está fazendo qualquer coisa menos se afastar dele.
Minha voz tinha sumido. Eu não conseguia nem me defender.
- E a única razão para eu não já ter jogado tudo isso na sua cara antes, é que eu achei que você ia perceber a merda que está fazendo com a sua vida, com a do , com a da Summer. – Ele deu uma risada nervosa e cobriu o rosto com as mãos. – Meu Deus, como eu fui estúpido! Naquela noite em que seguimos o e a Sofia, eu realmente achei que...
- Eu me importo com ele. Eu me importo com a Summer. – Engoli o choro. – Mas, , você não entende, é tudo muito complicado...
- Não tem nada de complicado nisso, . – Ele me cortou. – Se você mente, magoa as pessoas. Se você fala a verdade, resolve os problemas. E quanto mais você mente, mais difícil fica falar a verdade.
Ele estava certo, mas não era tão fácil quanto falar. E de todo modo, as coisas tinham chegado a um ponto em que falar a verdade seria como explodir uma bomba atômica.
- Por favor. – Pedi baixinho. Nem sabia mais o que estava pedindo.
- Não me peça nada. Só... – Ele suspirou, parecendo cansado. – Por que não volta para perto do Junior? Vocês se merecem, no fim das contas.
foi embora e eu fiquei ali.
E não, eu não fui atrás do Junior.
Eu não queria ir. Eu não sabia o que queria.
Às vezes eu só queria nunca ter ido para aquela cidade, em primeiro lugar.
🌴💚🌴
Eu fiquei muito mal pelo resto do dia, esperando que a qualquer momento irrompesse pela porta me chamando de mentirosa e nunca mais olhasse na minha cara. Não tinha cabeça nem para fazer um bolo, o que geralmente me acalmava, e passei a maior parte do tempo no meu quarto, sem conseguir fazer nada de útil.
Ignorei todas as ligações de – seis ao todo. Eu não queria ele por perto. Eu não estava com raiva, porque o que acontecera não era culpa dele, mas ainda assim, não tinha vontade nenhuma de lidar com ele naquele momento.
Sofia tinha parado de perguntar com exatidão o que eu estava fazendo depois da nossa briga. Tínhamos feito as pazes e eu contava para ela o que queria, mas ela não me cobrava mais nada. Era melhor assim para que ficássemos bem.
Então, quando a vontade de ligar para ela surgiu, eu respirei fundo e não o fiz. Eu tinha que aguentar as consequências dos meus atos sozinha.
No fim da tarde, quando ouvi os latidos de Stevie no andar de baixo, soube que a hora tinha chegado. Ele tinha ido passar a tarde com , o que queria dizer que o garoto também estava ali, trazendo ele de volta.
Saí do quarto, minha coragem um pouco abalada. Mas sabia que tinha que resolver aquilo, mesmo que significasse perder o carinho do para sempre. Àquela hora eu já tinha perdido mesmo, no fim das contas.
- Ah, oi, Rain. – Ele olhou para cima, de onde estava abaixado, brincando com Stevie. – Vim trazer o monstrinho.
Ele não estava me xingando, criticando ou terminando nosso namoro de mentira? Por quê? Seria possível que...
- Você viu o hoje? – Perguntei confusa, descendo alguns degraus.
- Só de manhã. – ficou de pé. – Por quê?
Balancei a cabeça, sentindo o alívio e a angústia de ainda não ter sido entregue.
- Nada. – Balancei a cabeça.
- Como você está?
subiu dois degraus e ficou perto de mim. Eu estava tão feliz por ele estar falando comigo, mesmo sabendo que não devia.
- Eu estou... Bem. Agora. – Eu disse, sabendo que era verdade, pelo menos naquela noite, antes de tudo ir pelo ralo. – Vai jantar aqui?
- É um convite? – Ele deu um sorriso torto. – Porque, se for, saiba que eu não preciso. – Ele saiu em direção à cozinha, e eu ri, indo atrás dele. – Moro aqui bem antes de você.
- É, mas não é o seu nome que está na escritura da casa. – Brinquei.
- Vamos fazer pizza? – foi tirando as coisas do armário. – Quer ver um filme?
Eu fiquei ali parada por algum tempo, só assistindo ele andar pela cozinha pegando as coisas, testando a boca do fogão que tinha defeito. Eu me sentia tão bem assim... Uma sensação parecida com aquela que tomava conta de mim sempre que eu via as gravações de quando eu era criança, com meus pais.
Casa. tinha cheiro de casa. Gosto de casa. De segurança. De carinho.
- O que foi? – Ele perguntou de repente.
Balancei a cabeça, tentando ignorar o jeito como doía pensar em quando tudo isso acabasse. Nós dois fazendo o jantar no meio da semana, Stevie assistindo reality shows de música na sala e papai se esquecendo do saxofone em casa.
- Não é nada. – Balancei a cabeça, engolindo o bolo na garganta. – Você só pegou o pacote de trigo furado. – Apontei, rindo um pouco.
olhou para baixo e sua camisa estava esbranquiçada do trigo que caíra nele. O garoto rolou os olhos, praguejando, e foi se limpar. Eu continuei rindo e fui pegar as outras coisas. Mas no fundo, não dava para esquecer que no dia seguinte, assim que ele encontrasse seu melhor amigo, tudo acabaria.
🌴💚🌴
Mas não acabou.
No dia seguinte, não foi com a gente de carro, e depois do intervalo, na minha aula de Álgebra, ainda não me odiava.
E eu não conseguia entender.
Para começo de conversa, eu não tinha achado, no dia anterior, que fosse esperar até ver na escola para contar nada. Simplesmente não era do feitio dele. Eu tinha certeza de que ele iria correndo à casa do amigo para falar o que tinha visto, e quando ele não fez isso nem ligou com o mesmo fim, não consegui encontrar a razão.
tinha perdido completamente a confiança em mim, e ele não deixaria que eu mentisse para o , então o que estava acontecendo?
Seria possível que tivesse decidido não contar?
De toda forma, eu voltei para casa ansiosa, e continuei ansiosa na sexta-feira, quando ele também não foi conosco.
- Meu Deus, eu estou tão ansiosa! – Jodi falava a caminho do refeitório, para onde eu seguia com ela, Jodi e Summer. – Esse vai ser o melhor baile de todos.
- Slaterton, você tirou mesmo a sorte grande. – Emma balançou a cabeça em aprovação. – Além de finalmente sermos reconhecidas pelo nosso talento, você ainda vai com o gostoso do Winter. Quer dizer, quando fica de boa fechada ele nem parece tão bobalhão!
- Não fale assim dele! – Jodi beliscou Emma, que deu um pulo. – O Brad só tem um bom coração.
- Que seja. – Ela rolou os olhos. – Já sabe como vai, Olsen?
- Não exatamente. – Summer ponderou. – O tema me pegou de surpresa. Mas vai ser divertido escolher alguma coisa.
- E você, ? – Jodi perguntou então. – A ideia foi sua, e seu pai é um músico de jazz famoso. Você tem que estar fabulosa!
Parei para prestar atenção na conversa enfim. Até então, a verdade era que eu estava fiscalizando os corredores em busca do .
- Ah, ainda não sei também. – Respondi apenas.
- Eu vou estar divina. – Emma sorriu. – Pena que aquela vaca da Jasmine já tem lugar garantido como candidata a rainha.
- Tem é? – Tentei entrar no assunto.
- Sem dúvida. – Jodi assentiu com desânimo. – No baile passado ela quase, quase foi eleita rainha.
- Se a Summer não tivesse voltado a frequentar as aulas de repente, ela teria conseguido. Mas Deus é justo. – Emma ergueu uma sobrancelha. – O triste é que provavelmente só uma de nós vai concorrer. Se bem que você, Pie, pode entrar nessa também.
- Emma está certa, . – Summer sorriu, me empurrando com o ombro. – Mas eu não descartaria vocês, meninas. Estamos todas no mesmo nível.
- Ah, Summer, você é tão generosa! – Jodi sorriu, balançando a cabeça, e Summer a puxou para um abraço.
Tínhamos chegado ao refeitório, e eu tentei decidir de forma rápida onde seria melhor ficar. Como não estava ali ainda, fui me sentar com elas.
olhou bem para mim quando me sentei. Sem dúvida também queria saber o resultado do acontecido de quarta-feira, visto que eu não falava com ele desde então. Mas eu também não estava com cabeça para falar. Assim, ouvi durante os primeiros minutos a falação sobre o baile e a temporada e sobre como logo ficaria bem para jogar.
Foi quando apareceu. Assim que o avistei entrando no refeitório, porém, percebi quem estava atrás dele.
vinha pelo corredor com Amber, e assim que eles entraram e ele me viu, ele parou de andar, fazendo com que a loira fizesse o mesmo.
acenou para mim, sem ver o amigo bem atrás dele. Levantei a mão de um jeito fraco. , atrás dele, puxou delicadamente o braço de Amber, levando ela para fora do refeitório de novo.
Peguei meu suco de laranja de cima da mesa.
- Vejo vocês na aula. – Falei para as meninas, que sorriram e assentiram.
Fui me juntar a , que entrou na fila da cantina assim que eu cheguei.
- A aula demorou um pouco. – Ele explicou, pegando um sanduíche de molho de carne nojento.
- Imaginei. – Meneei a cabeça. – Você por acaso falou com o hoje?
- Sabe que ainda não? – Sorriu de leve. – Mas não deve ter nada de errado. Uma vez ele passou um final de semana inteiro jogando vídeo game sem parar e não me disse uma palavra. Só parou quando literalmente desmaiou de exaustão.
Forcei um sorriso, deixando que ele acreditasse que estava tudo bem. E me permiti sentir um pouquinho de esperança de que tivesse desistido de contar tudo, embora achasse isso difícil de acreditar.
Depois do intervalo, me juntei de novo à Jodi, porque tínhamos aula de Química juntas. Fomos conversando sobre a aula e o namoro dela até termos chegado à sala. Jodi seguiu para nosso lugar habitual, mas eu me detive.
Jasmine estava sentada na primeira carteira, escrevendo em seu caderno. Eu poderia ter ignorado, mas não dava.
- Jasmine. – Eu falei.
Ela levantou os olhos para mim, com a cara de desprezo de sempre.
- Espero que saiba que poderia ter me matado. – Eu disse séria.
- Se está me acusando de alguma coisa, é bom ter provas.
- Eu tive um choque anafilático por causa daquilo, Jasmine. – Continuei. – Eu fui parar no hospital.
Percebi que ela titubeou, o ar esnobe desaparecendo um pouco. Talvez ela não quisesse me matar afinal, só fosse muito idiota.
O professor entrou na sala e ela pigarrou, voltando ao normal.
- Como eu disse, não pode me acusar de nada sem provas. – Disse. – Agora me deixa em paz.
Balancei a cabeça e fui para o meu lugar perto de Jodi, que perguntou o que houve. Não contei e nem iria contar para ela que Jasmine tinha sido responsável por eu ter ido parar no hospital. Até porque, como já havia sido dito, eu não tinha nenhuma prova.
A aula seguiu normalmente, até que, quando faltavam apenas poucos minutos para o fim, um chiado vindo das caixas de som fez com que tampássemos os ouvidos. Depois, uma voz surgiu.
- E aí, pessoal? Aqui é o Trey Harper, seu locutor oficial, mas pouco aproveitado da rádio Jacksonville Beach High. Sem me estender muito, acabei de receber um envelope fresquinho com os nomes das nossas candidatas a rainha do baile deste ano.
Um burburinho irrompeu na sala, cheio de risadinhas e comentários. De onde estava, vi Jasmine sorrir discretamente.
- Ah meu Deus. – Jodi murmurou. – Mal posso esperar para ouvir os nomes de vocês!
O alto falante chiou mais um pouco e Trey voltou a falar.
- E as candidatas à Rainha do Baile de Outono são: Summer Olsen...
Algumas pessoas chegaram a aplaudir, alegres. Eu fiquei feliz também, embora não surpresa. Trey continuou:
- A grande surpresa do ano, nossa estrela da torcida e filha do cara famoso, Pie...
Abri a boca, chocada. Jodi olhou para mim, completamente eufórica.
- EU SABIA! – Ela comemorou. – Eu sabia que você ia conseguir! Ai, eu estou tão feliz!
Jasmine se virou para mim com raiva, mas a verdade é que eu estava tão surpresa quanto ela.
- E por fim, nossa última, mas não menos importante concorrente à realeza... – Trey continuou. – Jodi Slaterton!
Olhei para o lado, alegre e surpresa, mas Jodi estava congelada. Parecia que alguém tinha soltado um raio paralisante na baixinha, que simplesmente não fechava a boca e tinha os olhos arregalados feito um personagem de desenho japonês.
- Jodi! – Eu levantei e a sacudi. – JODI, VOCÊ FOI ESCOLHIDA!
Mas em vez de responder, Jodi caiu para trás feito pedra. Muitos ficaram preocupados, mas eu sabia que estava tudo bem – bem até demais. Ela só estava tendo dificuldades em acreditar.
Enquanto levantava Jodi e assistia sua tontura pós-desmaio se tornar alegria, vi Jasmine pegando suas coisas e saindo da sala, com mais raiva do que eu jamais a vira.
Saímos da sala recebendo elogios e congratulações animadas de todos que encontrávamos. Alguém até sorriu para mim e disse “TEAM !”. Eu ainda não fazia ideia de como tinha ido parar naquela lista, mas então, quando vi os jogadores no fim do corredor e o sorriso descarado no rosto de , eu soube: aquilo era coisa dele. Ele tinha feito alguma coisa, eu não sabia o que, para me colocar no lugar de Jasmine. Ele se vingou dela, como disse que faria.
- AMOR! – Jodi gritou ao meu lado, correndo para abraçar Brad.
- PEQUENININHA, VOCÊ CONSEGUIU! – Brad a abraçou com força.
Os jogadores estavam fazendo festa para nos receber, cantarolando e gritando. apareceu à minha frente assim que os alcancei.
- Quem diria que você se renderia ao nosso mundinho fútil, hen? – Brincou.
- Eu não pedi por nada disso, . – Arqueei uma sobrancelha.
me abraçou rapidamente, e percebi que seu pé já estava bem melhor. Estava chegando a hora de aposentar a camisa de titular. Depois se aproximou.
- Parabéns, nova Rainha. – Ele riu.
Quando ele me abraçou, eu sussurrei.
- Você fez isso, não é? Sabotou a votação. Colocou meu nome do lugar do da Jasmine.
- Eu sabotei a votação. – Ele admitiu. – Mas não foi o seu nome que eu coloquei lá. Foi o da Jodi.
Olhei para ele por um segundo, confusa, então sorri de volta quando ele sorriu, bagunçando meu cabelo.
Então meu nome já estava lá? As pessoas queriam mesmo que eu fosse Rainha?
De todo modo, antes que eu processasse por completo a informação, ouvimos um grito ensurdecedor no fim do corredor. Parecia o rei de Esparta declarando o início da guerra em 300, mas na verdade era só Emma vindo feito um furacão em direção a nós.
- JODI LYN! – Ela veio gritando. – JODI LYN, SUA TAMPINHA DOS INFERNOS, VOCÊ FOI ESCOLHIDA!
Emma abraçou Jodi com tanta força que as duas quase caíram, e atropelaram os jogadores.
Depois ela me viu.
- PIE, SUA FILHA DA MÃE, VEM AQUI! – Ela me abraçou também, e achei que todos os meus ossos fossem se quebrar. – EU SEMPRE SOUBE QUE VOCÊ TINHA POTENCIAL!
Finalmente Summer chegou a nós. Ela ainda estava rindo de Emma quando me abraçou.
- Estou tão feliz! – Disse. – Vamos ser nós três! Finalmente vai ser uma competição saudável. Estou orgulhosa de vocês.
- E nós de você, sempre. – Sorri.
Emma puxou nossos pescoços, juntando nós quatro em um abraço apertado de lado.
- Uma por todas e todas por uma, até o final! – Exclamou da forma mais fofa possível para ela.
E eu não me imaginaria sendo candidata à Rainha com mais ninguém.
[…]
- Eu sabia!
Lá estava , olhando para mim. Levei uns cinco segundos para conseguir reagir.
- Ah, mas que droga! – Exclamei. – , me deixa explicar.
O garoto balançou a cabeça e me deu as costas, andando furiosamente rua abaixo.
- ! – Gritei.
Saí da sorveteria feito um furacão.
- ! – chamou.
- Não me siga! – Falei em resposta.
Claramente os treinos de futebol estavam fazendo bem às capacidades físicas de , porque em menos de um minuto o garoto já estava dobrando a esquina, e eu corria para alcançá-lo.
De repente ele parou e virou, me fazendo diminuir o ritmo tão depressa que quase tropecei.
- Eu só queria saber o que você pensa que está fazendo, ? – Ele questionou frustrado. – Que MERDA você pensa que está fazendo?
Eu engoli em seco, sem saber direito nem por onde começar.
- Eu posso explicar. – Falei baixinho, mas não podia, na verdade.
- Pode, mas não precisa, não é mesmo? Eu sei bem o que eu vi, .
- Mas não é o que está pensando! – Protestei, sem nem saber o que eu diria a seguir. – Eu e o , nós só estávamos...
- Conversando? Ah, pelo amor de Deus! – gritou com desprezo. Eu nunca tinha o visto tão irritado, e isso estava me deixando perdida. – Deixa eu te falar uma coisa: não é porque eu leio quadrinhos que vou acreditar em qualquer história fantasiosa, especialmente se vem de alguém que só sabe mentir!
Eu estaquei por alguns instantes, meu cérebro embriagado de surpresa demais para processar aquilo. Então pisquei.
Era isso que eu era para ? Alguém que só sabia mentir? Meu coração se quebrou um pouquinho, mas eu reagi.
- Eu não estou mentindo, seu idiota. – Falei entredentes. – Nós estávamos conversando.
- Diz isso pro quando ele for te perguntar. – me deu as costas de novo.
Gelei da cabeça aos pés.
ELE NÃO PODIA CONTAR AO ! NÃO PODIA!
Corri atrás de de novo, dessa vez até alcançá-lo para puxar seu braço.
- , você não pode fazer isso! – Implorei. – Não pode contar para ele!
- Por quê? Você disse que não aconteceu nada! – Ele abriu os braços e deu um sorriso vitorioso. – Eu só queria entender, , como é que tem coragem de fazer isso com o ? Eu pensei que gostasse pelo menos um pouco dele!
- Eu gosto! – Eu estava quase chorando. – Você não entende.
- Entendo sim. É como juntar dois mais dois, e, modéstia à parte, eu sou muito bom em Matemática. – Ele disse com frieza.
Talvez se eu explicasse o que tinha acontecido na noite do parque, e só aquilo, ele entendesse. Talvez...
- E antes que você diga qualquer coisa, quero que saiba que eu sei de tudo. – Ele me encarou.
E dessa vez eu realmente não consegui me mexer. O que exatamente era tudo? Ele sabia?
- Naquela noite, na fogueira, eu vi você e o Junior se beijando. – Ele continuou, fazendo meu chão se abrir. – E eu sei que ele mudou de turma por sua causa. E sei, acima de tudo, que você está fazendo qualquer coisa menos se afastar dele.
Minha voz tinha sumido. Eu não conseguia nem me defender.
- E a única razão para eu não já ter jogado tudo isso na sua cara antes, é que eu achei que você ia perceber a merda que está fazendo com a sua vida, com a do , com a da Summer. – Ele deu uma risada nervosa e cobriu o rosto com as mãos. – Meu Deus, como eu fui estúpido! Naquela noite em que seguimos o e a Sofia, eu realmente achei que...
- Eu me importo com ele. Eu me importo com a Summer. – Engoli o choro. – Mas, , você não entende, é tudo muito complicado...
- Não tem nada de complicado nisso, . – Ele me cortou. – Se você mente, magoa as pessoas. Se você fala a verdade, resolve os problemas. E quanto mais você mente, mais difícil fica falar a verdade.
Ele estava certo, mas não era tão fácil quanto falar. E de todo modo, as coisas tinham chegado a um ponto em que falar a verdade seria como explodir uma bomba atômica.
- Por favor. – Pedi baixinho. Nem sabia mais o que estava pedindo.
- Não me peça nada. Só... – Ele suspirou, parecendo cansado. – Por que não volta para perto do Junior? Vocês se merecem, no fim das contas.
foi embora e eu fiquei ali.
E não, eu não fui atrás do Junior.
Eu não queria ir. Eu não sabia o que queria.
Às vezes eu só queria nunca ter ido para aquela cidade, em primeiro lugar.
Eu fiquei muito mal pelo resto do dia, esperando que a qualquer momento irrompesse pela porta me chamando de mentirosa e nunca mais olhasse na minha cara. Não tinha cabeça nem para fazer um bolo, o que geralmente me acalmava, e passei a maior parte do tempo no meu quarto, sem conseguir fazer nada de útil.
Ignorei todas as ligações de – seis ao todo. Eu não queria ele por perto. Eu não estava com raiva, porque o que acontecera não era culpa dele, mas ainda assim, não tinha vontade nenhuma de lidar com ele naquele momento.
Sofia tinha parado de perguntar com exatidão o que eu estava fazendo depois da nossa briga. Tínhamos feito as pazes e eu contava para ela o que queria, mas ela não me cobrava mais nada. Era melhor assim para que ficássemos bem.
Então, quando a vontade de ligar para ela surgiu, eu respirei fundo e não o fiz. Eu tinha que aguentar as consequências dos meus atos sozinha.
No fim da tarde, quando ouvi os latidos de Stevie no andar de baixo, soube que a hora tinha chegado. Ele tinha ido passar a tarde com , o que queria dizer que o garoto também estava ali, trazendo ele de volta.
Saí do quarto, minha coragem um pouco abalada. Mas sabia que tinha que resolver aquilo, mesmo que significasse perder o carinho do para sempre. Àquela hora eu já tinha perdido mesmo, no fim das contas.
- Ah, oi, Rain. – Ele olhou para cima, de onde estava abaixado, brincando com Stevie. – Vim trazer o monstrinho.
Ele não estava me xingando, criticando ou terminando nosso namoro de mentira? Por quê? Seria possível que...
- Você viu o hoje? – Perguntei confusa, descendo alguns degraus.
- Só de manhã. – ficou de pé. – Por quê?
Balancei a cabeça, sentindo o alívio e a angústia de ainda não ter sido entregue.
- Nada. – Balancei a cabeça.
- Como você está?
subiu dois degraus e ficou perto de mim. Eu estava tão feliz por ele estar falando comigo, mesmo sabendo que não devia.
- Eu estou... Bem. Agora. – Eu disse, sabendo que era verdade, pelo menos naquela noite, antes de tudo ir pelo ralo. – Vai jantar aqui?
- É um convite? – Ele deu um sorriso torto. – Porque, se for, saiba que eu não preciso. – Ele saiu em direção à cozinha, e eu ri, indo atrás dele. – Moro aqui bem antes de você.
- É, mas não é o seu nome que está na escritura da casa. – Brinquei.
- Vamos fazer pizza? – foi tirando as coisas do armário. – Quer ver um filme?
Eu fiquei ali parada por algum tempo, só assistindo ele andar pela cozinha pegando as coisas, testando a boca do fogão que tinha defeito. Eu me sentia tão bem assim... Uma sensação parecida com aquela que tomava conta de mim sempre que eu via as gravações de quando eu era criança, com meus pais.
Casa. tinha cheiro de casa. Gosto de casa. De segurança. De carinho.
- O que foi? – Ele perguntou de repente.
Balancei a cabeça, tentando ignorar o jeito como doía pensar em quando tudo isso acabasse. Nós dois fazendo o jantar no meio da semana, Stevie assistindo reality shows de música na sala e papai se esquecendo do saxofone em casa.
- Não é nada. – Balancei a cabeça, engolindo o bolo na garganta. – Você só pegou o pacote de trigo furado. – Apontei, rindo um pouco.
olhou para baixo e sua camisa estava esbranquiçada do trigo que caíra nele. O garoto rolou os olhos, praguejando, e foi se limpar. Eu continuei rindo e fui pegar as outras coisas. Mas no fundo, não dava para esquecer que no dia seguinte, assim que ele encontrasse seu melhor amigo, tudo acabaria.
Mas não acabou.
No dia seguinte, não foi com a gente de carro, e depois do intervalo, na minha aula de Álgebra, ainda não me odiava.
E eu não conseguia entender.
Para começo de conversa, eu não tinha achado, no dia anterior, que fosse esperar até ver na escola para contar nada. Simplesmente não era do feitio dele. Eu tinha certeza de que ele iria correndo à casa do amigo para falar o que tinha visto, e quando ele não fez isso nem ligou com o mesmo fim, não consegui encontrar a razão.
tinha perdido completamente a confiança em mim, e ele não deixaria que eu mentisse para o , então o que estava acontecendo?
Seria possível que tivesse decidido não contar?
De toda forma, eu voltei para casa ansiosa, e continuei ansiosa na sexta-feira, quando ele também não foi conosco.
- Meu Deus, eu estou tão ansiosa! – Jodi falava a caminho do refeitório, para onde eu seguia com ela, Jodi e Summer. – Esse vai ser o melhor baile de todos.
- Slaterton, você tirou mesmo a sorte grande. – Emma balançou a cabeça em aprovação. – Além de finalmente sermos reconhecidas pelo nosso talento, você ainda vai com o gostoso do Winter. Quer dizer, quando fica de boa fechada ele nem parece tão bobalhão!
- Não fale assim dele! – Jodi beliscou Emma, que deu um pulo. – O Brad só tem um bom coração.
- Que seja. – Ela rolou os olhos. – Já sabe como vai, Olsen?
- Não exatamente. – Summer ponderou. – O tema me pegou de surpresa. Mas vai ser divertido escolher alguma coisa.
- E você, ? – Jodi perguntou então. – A ideia foi sua, e seu pai é um músico de jazz famoso. Você tem que estar fabulosa!
Parei para prestar atenção na conversa enfim. Até então, a verdade era que eu estava fiscalizando os corredores em busca do .
- Ah, ainda não sei também. – Respondi apenas.
- Eu vou estar divina. – Emma sorriu. – Pena que aquela vaca da Jasmine já tem lugar garantido como candidata a rainha.
- Tem é? – Tentei entrar no assunto.
- Sem dúvida. – Jodi assentiu com desânimo. – No baile passado ela quase, quase foi eleita rainha.
- Se a Summer não tivesse voltado a frequentar as aulas de repente, ela teria conseguido. Mas Deus é justo. – Emma ergueu uma sobrancelha. – O triste é que provavelmente só uma de nós vai concorrer. Se bem que você, Pie, pode entrar nessa também.
- Emma está certa, . – Summer sorriu, me empurrando com o ombro. – Mas eu não descartaria vocês, meninas. Estamos todas no mesmo nível.
- Ah, Summer, você é tão generosa! – Jodi sorriu, balançando a cabeça, e Summer a puxou para um abraço.
Tínhamos chegado ao refeitório, e eu tentei decidir de forma rápida onde seria melhor ficar. Como não estava ali ainda, fui me sentar com elas.
olhou bem para mim quando me sentei. Sem dúvida também queria saber o resultado do acontecido de quarta-feira, visto que eu não falava com ele desde então. Mas eu também não estava com cabeça para falar. Assim, ouvi durante os primeiros minutos a falação sobre o baile e a temporada e sobre como logo ficaria bem para jogar.
Foi quando apareceu. Assim que o avistei entrando no refeitório, porém, percebi quem estava atrás dele.
vinha pelo corredor com Amber, e assim que eles entraram e ele me viu, ele parou de andar, fazendo com que a loira fizesse o mesmo.
acenou para mim, sem ver o amigo bem atrás dele. Levantei a mão de um jeito fraco. , atrás dele, puxou delicadamente o braço de Amber, levando ela para fora do refeitório de novo.
Peguei meu suco de laranja de cima da mesa.
- Vejo vocês na aula. – Falei para as meninas, que sorriram e assentiram.
Fui me juntar a , que entrou na fila da cantina assim que eu cheguei.
- A aula demorou um pouco. – Ele explicou, pegando um sanduíche de molho de carne nojento.
- Imaginei. – Meneei a cabeça. – Você por acaso falou com o hoje?
- Sabe que ainda não? – Sorriu de leve. – Mas não deve ter nada de errado. Uma vez ele passou um final de semana inteiro jogando vídeo game sem parar e não me disse uma palavra. Só parou quando literalmente desmaiou de exaustão.
Forcei um sorriso, deixando que ele acreditasse que estava tudo bem. E me permiti sentir um pouquinho de esperança de que tivesse desistido de contar tudo, embora achasse isso difícil de acreditar.
Depois do intervalo, me juntei de novo à Jodi, porque tínhamos aula de Química juntas. Fomos conversando sobre a aula e o namoro dela até termos chegado à sala. Jodi seguiu para nosso lugar habitual, mas eu me detive.
Jasmine estava sentada na primeira carteira, escrevendo em seu caderno. Eu poderia ter ignorado, mas não dava.
- Jasmine. – Eu falei.
Ela levantou os olhos para mim, com a cara de desprezo de sempre.
- Espero que saiba que poderia ter me matado. – Eu disse séria.
- Se está me acusando de alguma coisa, é bom ter provas.
- Eu tive um choque anafilático por causa daquilo, Jasmine. – Continuei. – Eu fui parar no hospital.
Percebi que ela titubeou, o ar esnobe desaparecendo um pouco. Talvez ela não quisesse me matar afinal, só fosse muito idiota.
O professor entrou na sala e ela pigarrou, voltando ao normal.
- Como eu disse, não pode me acusar de nada sem provas. – Disse. – Agora me deixa em paz.
Balancei a cabeça e fui para o meu lugar perto de Jodi, que perguntou o que houve. Não contei e nem iria contar para ela que Jasmine tinha sido responsável por eu ter ido parar no hospital. Até porque, como já havia sido dito, eu não tinha nenhuma prova.
A aula seguiu normalmente, até que, quando faltavam apenas poucos minutos para o fim, um chiado vindo das caixas de som fez com que tampássemos os ouvidos. Depois, uma voz surgiu.
- E aí, pessoal? Aqui é o Trey Harper, seu locutor oficial, mas pouco aproveitado da rádio Jacksonville Beach High. Sem me estender muito, acabei de receber um envelope fresquinho com os nomes das nossas candidatas a rainha do baile deste ano.
Um burburinho irrompeu na sala, cheio de risadinhas e comentários. De onde estava, vi Jasmine sorrir discretamente.
- Ah meu Deus. – Jodi murmurou. – Mal posso esperar para ouvir os nomes de vocês!
O alto falante chiou mais um pouco e Trey voltou a falar.
- E as candidatas à Rainha do Baile de Outono são: Summer Olsen...
Algumas pessoas chegaram a aplaudir, alegres. Eu fiquei feliz também, embora não surpresa. Trey continuou:
- A grande surpresa do ano, nossa estrela da torcida e filha do cara famoso, Pie...
Abri a boca, chocada. Jodi olhou para mim, completamente eufórica.
- EU SABIA! – Ela comemorou. – Eu sabia que você ia conseguir! Ai, eu estou tão feliz!
Jasmine se virou para mim com raiva, mas a verdade é que eu estava tão surpresa quanto ela.
- E por fim, nossa última, mas não menos importante concorrente à realeza... – Trey continuou. – Jodi Slaterton!
Olhei para o lado, alegre e surpresa, mas Jodi estava congelada. Parecia que alguém tinha soltado um raio paralisante na baixinha, que simplesmente não fechava a boca e tinha os olhos arregalados feito um personagem de desenho japonês.
- Jodi! – Eu levantei e a sacudi. – JODI, VOCÊ FOI ESCOLHIDA!
Mas em vez de responder, Jodi caiu para trás feito pedra. Muitos ficaram preocupados, mas eu sabia que estava tudo bem – bem até demais. Ela só estava tendo dificuldades em acreditar.
Enquanto levantava Jodi e assistia sua tontura pós-desmaio se tornar alegria, vi Jasmine pegando suas coisas e saindo da sala, com mais raiva do que eu jamais a vira.
Saímos da sala recebendo elogios e congratulações animadas de todos que encontrávamos. Alguém até sorriu para mim e disse “TEAM !”. Eu ainda não fazia ideia de como tinha ido parar naquela lista, mas então, quando vi os jogadores no fim do corredor e o sorriso descarado no rosto de , eu soube: aquilo era coisa dele. Ele tinha feito alguma coisa, eu não sabia o que, para me colocar no lugar de Jasmine. Ele se vingou dela, como disse que faria.
- AMOR! – Jodi gritou ao meu lado, correndo para abraçar Brad.
- PEQUENININHA, VOCÊ CONSEGUIU! – Brad a abraçou com força.
Os jogadores estavam fazendo festa para nos receber, cantarolando e gritando. apareceu à minha frente assim que os alcancei.
- Quem diria que você se renderia ao nosso mundinho fútil, hen? – Brincou.
- Eu não pedi por nada disso, . – Arqueei uma sobrancelha.
me abraçou rapidamente, e percebi que seu pé já estava bem melhor. Estava chegando a hora de aposentar a camisa de titular. Depois se aproximou.
- Parabéns, nova Rainha. – Ele riu.
Quando ele me abraçou, eu sussurrei.
- Você fez isso, não é? Sabotou a votação. Colocou meu nome do lugar do da Jasmine.
- Eu sabotei a votação. – Ele admitiu. – Mas não foi o seu nome que eu coloquei lá. Foi o da Jodi.
Olhei para ele por um segundo, confusa, então sorri de volta quando ele sorriu, bagunçando meu cabelo.
Então meu nome já estava lá? As pessoas queriam mesmo que eu fosse Rainha?
De todo modo, antes que eu processasse por completo a informação, ouvimos um grito ensurdecedor no fim do corredor. Parecia o rei de Esparta declarando o início da guerra em 300, mas na verdade era só Emma vindo feito um furacão em direção a nós.
- JODI LYN! – Ela veio gritando. – JODI LYN, SUA TAMPINHA DOS INFERNOS, VOCÊ FOI ESCOLHIDA!
Emma abraçou Jodi com tanta força que as duas quase caíram, e atropelaram os jogadores.
Depois ela me viu.
- PIE, SUA FILHA DA MÃE, VEM AQUI! – Ela me abraçou também, e achei que todos os meus ossos fossem se quebrar. – EU SEMPRE SOUBE QUE VOCÊ TINHA POTENCIAL!
Finalmente Summer chegou a nós. Ela ainda estava rindo de Emma quando me abraçou.
- Estou tão feliz! – Disse. – Vamos ser nós três! Finalmente vai ser uma competição saudável. Estou orgulhosa de vocês.
- E nós de você, sempre. – Sorri.
Emma puxou nossos pescoços, juntando nós quatro em um abraço apertado de lado.
- Uma por todas e todas por uma, até o final! – Exclamou da forma mais fofa possível para ela.
E eu não me imaginaria sendo candidata à Rainha com mais ninguém.
23 Parte 2- Ho-ho-holiday!
“I’m feeling cool!”
- De que mesmo é esse feriado? – Perguntei pelo que devia ser a milésima vez.
- Feriado do Dia da Coragem, querida. – Papai disse de novo. – Quando Nicholas Lion-Heart se amarrou à placa que dizia “Bem-vindos à Jacksonville Beach” e impediu que mudassem o nome da cidade. É uma bonita história. Devia pesquisar sobre ela.
- Por que essa história parecia diferente dez minutos atrás? – Perguntei em tom de reprovação.
- Porque ele acabou de inventar essa. – Miguel respondeu, entrando na sala com sua mochila. – E as últimas cinco também.
- Filha, ninguém faz a mínima ideia de que feriado é esse! – Papai admitiu. – Alguém disse que era um feriado da cidade e todos aceitaram porque todos adoram feriados. Ninguém se importa realmente! O que realmente importa aqui é nosso acampamento. – Ele se aproximou e me deu um beijo na testa.
Eu não poderia dizer que estava animada para aquilo. Um final de semana prolongado inteiro no meio do nada junto com meu pai que não sabia nem acender o fogão direito. Nossa única salvação seria Miguel, que conseguiria nos salvar se algum bicho nos atacasse.
A porta da frente abriu e instantes depois estava na sala. Ele estava arrumadinho, preparado para pegar o avião para Atlanta.
- Eu vim me despedir. – Disse.
Miguel assentiu, e papai bateu nas costas dele, sorrindo.
- Divirta-se com seu pai, . – Falou. – Como eu disse, se conseguir dê uma passada no bar do meu amigo Larry. Uns cantores muito bons cantam lá e eu falei com ele que você estaria por lá.
- Valeu, Jack. – sorriu.
Depois ele se virou para mim.
- Bom, nos vemos semana que vem. – Disse.
Eu o abracei rapidamente.
- De que mesmo é esse feriado? – Perguntei curiosa.
- Ah, bem... – pensou um pouco. – Não. – Deu de ombros. – Na verdade, ninguém sabe mesmo.
Nós dois rimos e, depois de alguns minutos, ele foi embora. Fiquei olhando ele se afastar, certa de que ele se divertiria bem mais do que eu, torcendo para que desse tudo certo com o pai dele.
Subi as escadas então, indo para o meu quarto para fazer a mala. Quando estava colocando o repelente na mochila, meu celular tocou.
- Esqueça tudo o que planejou fazer. Nós estamos indo em uma super top viagem com a nossa super top model preferida.
A voz de Emma chegou até mim claramente, mas eu tive que perguntar:
- Quê?
- Summer chamou a gente para ir viajar durante o feriado. Vai ser tão irado!
- Para onde vocês vão? – Perguntei, sem conseguir esconder a curiosidade.
- Atlanta, baby.
- está indo para Atlanta. – Observei.
- Ah, Pie, pelo amor de Deus, esquece o ! – Emma resmungou. – Vai ser uma viagem das garotas! Nem pense em falar com ele que estamos indo!
- Emma, eu não estou indo para lugar nenhum com vocês. Eu vou acampar com meu pai.
- Você só pode estar de brincadeira.
- Não, eu vou mesmo...
Mas aí me toquei de que papai estava parado à porta, e ele balançou o dedo em negação.
- Vá se divertir com as garotas. – Ele disse. – Eu e Miguel vamos ter um bom tempo para exercitar nossa virilidade na selva.
Abri a boca, mas contive minha piada. Em vez disso ri.
- Valeu, pai.
Voltei ao telefone.
- Certo. Que horas vocês vêm me buscar?
🌴💚🌴
Fiquei surpresa quando o carro que estava mais para uma minivan parou em frente à minha porta. Lá de dentro, Emma e Summer acenaram.
- Vamos lá, Pie! – Emma gritou.
- Só um segundo. – Falei.
Entrei em casa de novo, onde papai estava amarrando os sapatos.
- Estou indo. – Avisei.
- Tomem muito cuidado na estrada. – Papai disse sério.
- Summer já dirigiu em um milhão de países. Ela é boa nisso. – Garanti.
- Não peguem a estrada durante a noite. – Miguel aconselhou. – E não fiquem em qualquer lugar.
- Já temos lugar certo pra ficar. – Expliquei. – E não vamos pegar estrada à noite. Voltamos na segunda-feira de manhã.
- E o mais importante: não conte para sua mãe. – Meu pai me abraçou e beijou o topo da minha cabeça. – Me ligue quando chegarem ao hotel.
Terminei de me despedir e saí de casa com a mochila nas costas. Entrei pela porta de trás e joguei a bolsa de lado.
- Cadê a Jodi? – Quis saber.
- Achei que seria engraçado se déssemos um susto nela e passássemos direto. – Emma sorriu.
- Mas eu achei que seria maldade e gritei da janela que voltaríamos para pegar ela em casa.
Olhei pela janela. Do outro lado do parquinho que nos separava, estava Jodi sentada nas escadas da varanda, com uma mochila lilás ao lado.
- Ah, você é muito molenga! – Emma falou para Summer. – Deixa eu dirigir um pouco.
- Não vai sacanear ela. – A outra desconfiou.
- Claro que não! – Hughes disse ofendida. – O carro é seu, Olsen, por favor.
Desconfiada, Summer tirou o cinto e deixou que Emma fosse para o seu lugar, sentando então no banco do carona.
- Ei, ! – Ela deu um largo sorriso.
- Oi, Sum! – Sorri de volta.
- Fico feliz que você tenha vindo. Não seria a mesma coisa sem uma de nós.
Enquanto Summer falava, Emma acelerava, dando a volta para a rua de Jodi. Ao nos ver, a baixinha ficou de pé, acenando freneticamente. Olhei então para o sorriso maléfico no rosto de Hughes.
- Saca só essa! – Ela disse, passando direto em frente à Jodi.
Eu sabia que iria para o inferno, mas não consegui conter o riso quando olhei pela janela e vi a cara de revolta de Jodi.
- EI, ME ESPEREM! – Ela gritou, correndo atrás do carro.
Summer ria, mas balançou a cabeça.
- Emma, não seja malvada!
- Ah, mas isso é tão engraçado! – Hughes protestou.
- Você está parecendo a Jasmine. – Provoquei.
- Ok, agora me convenceu.
Emma freou o carro bruscamente. Jodi cambaleou até a porta. Quando ela finalmente conseguiu respirar direito, colocou a cara na janela e disse:
- NÃO. TEVE. GRAÇA!
- Pra você não. – Emma riu.
Abri a porta e ela entrou no carro, colocando a mochila sobre a minha.
- Sinto muito, eu tentei evitar. – Summer disse.
- Não se preocupe, eu sei com quem estou lidando. – Jodi dispensou. Eu ri e a abracei de lado.
- Bem, acho que agora podemos finalmente pegar a estrada. – Eu disse.
Emma desceu seus óculos escuros para o rosto.
- Atlanta, baby, aí vamos nós!
POV
- Passagem, por favor.
Estendi minha passagem e a moça com o scanner me liberou. Engraçado como eu afirmava com toda força odiar Atlanta, na primeira vez que papai sugeriu que eu os visitasse lá. Eu nunca nem tinha ido à Atlanta na época.
- Bom dia! – A aeromoça sorriu quando entrei.
- Bom dia. – Sorri de volta e então fui procurar meu lugar.
F 18, F 18... Onde estava?
Desviei de algumas pessoas no corredor, pedindo licença aqui e ali, até que finalmente encontrei. Já havia alguém sentado à janela, e levei um susto quando vi de quem se tratava.
- Rosana?
A garota olhou para mim e seus olhos se arregalaram, mais ou menos como vinha acontecendo o tempo todo nos últimos tempos, na escola.
- . – Ela disse. Então, deu um sorriso sem jeito. – Vai se sentar aqui?
- Parece que sim. – Coloquei minha mochila no bagageiro e me sentei ao lado dela. – Que coincidência. – Observei.
- Eu tenho família em Atlanta. – Ela explicou.
- É, eu também.
O silêncio se instalou por alguns segundos, mas eu senti que precisava fazer alguma coisa. Antes, a presença de Rosana me deixava nervoso, mas desde que ela tinha começado a me evitar, fiquei pensando que minhas crises de pânico perto dela a tinham deixado chateada. E, apesar de a detestá-la, ela era uma garota legal.
- Olha, eu devia ter feito isso antes, mas queria dizer que sinto muito por aquele dia, na sua casa. Eu não queria te ofender nem nada, mas...
- Ah, não. Tudo bem! – Ela disse rápido. – Não se preocupe com isso, eu é que... Bom, a verdade é que você namora a Pie e eu sabia, só achava que...
- O quê?
Rosana arregalou os olhos de novo, como se tivesse falado demais.
- Nada. – Disse, forçando então um sorriso. – Quanto tempo vai ficar em Atlanta?
- Até segunda-feira. Volto no voo do início da noite.
- Que coincidência! – Ela exclamou. – Eu também.
Não era mesmo muito curioso?
POV PIE
- Caramba, dirigir é tão cansativo depois que você já tem a carteira! – Emma resmungava ao volante. – Quer dizer, você espera sua vida inteira por isso, e quando finalmente consegue, descobre que vai passar ¼ da sua vida parado em sinais e xingando idiotas no trânsito. – Bufou. – EI, IDIOTA, SEU FAROL NÃO VAI CAIR SE VOCÊ DER SETA! – Gritou com alguém.
- Eu adoro dirigir. – Summer sorriu, inclinando a cabeça para fora e deixando que o vento jogasse o longo cabelo louro para trás. – Dá uma sensação de... Liberdade.
- Sabe o que também dá essa sensação? – Hughes riu. – Não ter um namorado no seu pé. Ainda assim, você continua nessa saga para voltar com o . Vai entender.
Summer deu um longo suspiro.
- Você está certa, Emma. – Disse então.
Todas nós levamos um susto com aquilo, mas eu de fato fiquei paralisada por um instante.
Ela estava desistindo? Desistindo do e deixando o caminho livre?
- Mas eu gosto do Junior. – Ela continuou, dando de ombros. Recostei no banco de novo, relaxando. Nada tinha mudado. – Só que eu também fico cansada às vezes, sabe? Sei que eu fui uma namorada relapsa várias vezes, mas ele deveria saber que o que sinto por ele é verdadeiro. E, ultimamente, ele tem me tirado do sério com tanta indecisão.
Eu queria poder dizer a Summer que a entendia – consolá-la, conversar sobre o assunto e falar mal do . Mas ela não podia saber o quanto eu a compreendia.
- Não vai desistir então? – Jodi perguntou. – Ninguém te julgaria, sabe? Você não precisa dele para nada. É uma rainha.
Jodi tinha aquela bravura disfarçada num jeito meigo que fazia a gente ter vontade de guardá-la num potinho. Não era de se espantar que Brad a adorasse tanto. E a lealdade dela a Summer, que ultrapassava até mesmo a admiração que ela já tivera por Junior , era louvável.
- Eu não sou rainha, Jodi. – Summer sorriu. – Isso é só uma coisa que alguém inventou porque eu sou bonita. É por isso que viemos nessa viagem.
Era incrível como Summer sempre conseguia falar sobre sua beleza, sua vida e sua carreira sem nunca parecer convencida ou arrogante.
- Por que exatamente? – Perguntei, lamentando de novo que tivéssemos nos conhecido em meio a toda aquela confusão, e não numa situação normal, onde eu poderia ter sido uma amiga muito melhor para ela.
- Porque eu queria ser uma garota normal, um pouquinho que fosse, e eu não tenho como fazer isso em Jacksonville Beach porque todo mundo me conhece.
- Então não vamos usar nenhum dos seus contatinhos de modelo? – Emma fez careta.
Jodi e eu rimos.
- Você é tão folgada! – Estiquei a mão para bater na cabeça dela.
Summer riu também.
- Mas é claro que vamos, eu não sou maluca! – Disse. – A questão é que fora das fronteiras da nossa cidade eu não sou A modelo. Eu sou só uma modelo qualquer.
🌴💚🌴
Nossa primeira parada foi o hotel. Jodi não parava de sorrir quando empurramos as portas de vidro e caminhamos até a recepção.
- É isso que você chama de ser uma pessoa qualquer? – Emma perguntou.
- Nós não vamos ficar na suíte presidencial, obviamente. – Summer deu de ombros. – Mas eu queria que vocês se divertissem enquanto estamos aqui. E... – Ela entregou um papel à moça da recepção. – Eu tinha esses vales-feriado. Boa tarde.
Entramos no elevador com uma senhora de chapéu escandaloso e Emma nos cutucou. Seguramos o riso, mas ainda assim a mulher nos fuzilou com os olhos quando saiu, um andar abaixo do nosso.
- Aqui estamos! – Summer abriu as portas do quarto.
Lá dentro, quatro camas com lençóis brancos e lisos se encontravam uma ao lado da outra. Na parede mais afastada do quarto – que podia não ser gigantesco, mas era lindo – havia uma janela que ia do chão ao teto, de onde dava para ver o jardim do hotel.
Olhamos uma para a outra e então corremos – nós três, não Sum – para pular nas camas.
- Ah, que deliiiícia! – Exclamei sentindo o colchão fofinho nas minhas costas. – Eu poderia usar o final de semana inteiro só para dormir!
- Olhem só a piscina! – Jodi correu para a janela.
- A comida aqui deve ser ótima! – Emma suspirou.
- É boa mesmo. – Summer concordou.
A loira riu de nós e foi se sentar em sua cama, na ponta. Ela jogou a mochila perto do travesseiro e deitou de lado, olhando para nós.
- Eu nunca vim aqui sem a minha mãe, sabe? – Comentou. – Acho que dessa vez eu vou aproveitar tão mais!
- Se você nunca viajou sem sua mãe, por que o Junior ficava tão chateado por você estar fora? – Jodi questionou, sentando na cama. – Quer dizer, não é como se você fosse enganá-lo. Você só estava trabalhando.
Apesar de não dizer nada, meu pensamento foi o mesmo. A mãe de Summer tinha me parecido ser do tipo que não saía do pé dela um segundo, e mesmo que não fosse, Olsen gostava tanto do Junior! Ele não tinha um motivo real para ficar chateado, embora com certeza sentisse saudades.
- É, eu sei. – Ela assentiu. – Da primeira vez que brigamos por isso, eu fiquei muito revoltada. Mas acho que a grande questão é que quando você tem dezesseis anos e começa a namorar, você espera poder passar um bom tempo de verdade com a pessoa, e não só na escola e em alguns finais de semana. E meu trabalho foi aos poucos acabando até com esse tempo.
- É, claro, quando se tem dezesseis anos, mas ele agora já tem dezoito, não é? – Emma disse com seriedade. – Eu acho isso coisa de babaca. Desculpe falar, mas tenho que ser honesta.
- Olha, a pode te aconselhar bem nisso. – Jodi opinou. – Ela entende como é gostar de alguém à distância.
- É verdade, . – Summer me deu um sorriso triste. – E então?
Não era só porque eu queria que Summer desistisse de Junior que eu queria chamá-la para o mundo real. Eu realmente achava que ela devia estar ciente de que ninguém tinha o direito de intervir no trabalho dela, especialmente quando ela só estava começando e precisava se firmar. Qualquer um que realmente gostasse dela se obrigaria a entender isso, mesmo os amigos.
- O jamais faria isso. – Me ouvi dizer, com sinceridade. – Se eu tivesse que ir amanhã para o Brasil e ainda estivéssemos namorando... – Franzi o nariz. – Acho que quando você gosta de verdade de alguém que merece, tudo fica muito pequeno perto do quanto importa ver essa pessoa feliz.
E foi por isso que eu desisti dele, pensei, dando um sorriso triste.
Summer assentiu, respirando fundo então.
- Esse foi um dos... – Ficou de pé. – Um dos motivos de eu querer vir aqui hoje.
Olhamos umas para as outras sem entender direito.
- No outro dia, eu chamei o Junior para sair, como eu disse que faria. – Ela contava, andando de um lado para o outro, nervosa. – E ele aceitou, e fomos comer um cachorro-quente e tomar um milk-shake. E aí, quando estávamos indo para casa, eu o beijei, e ele correspondeu o beijo, e eu fiquei tão feliz, mas aí sabe o que ele disse? – Summer estava mais brava do que nunca agora. – Ele disse “Isso não faz nada ficar mais fácil”. E eu sei que não foi nada demais, mas eu fiquei com tanta.... Raiva!
Ela balançou as mãos, como se desse um "basta". Nem mesmo Emma, a mais intrometida de nós, se atreveu a fazer qualquer comentário. Summer parecia um vulcão em erupção.
- E aí eu disse: “Talvez não seja para ser fácil mesmo, Junior. TALVEZ UMA MALDITA VEZ NA SUA VIDA NÃO SEJA PARA SER TÃO FÁCIL E VOCÊ PRECISE SE ESFORÇAR UM POUCO TAMBÉM!”. E depois eu fui embora sem me despedir. Eu senti uma raiva dele que nunca tinha sentido. – Balançou a cabeça. – Não estamos nos falando direito desde então.
Eu fiquei estarrecida. Por mais que esperasse ver os dois separados, eu nunca pensei que a situação chegaria àquele ponto, que Summer seria tão corajosa.
- Poderia ter terminado com uma bofetada na cara dele. – Emma assentiu em aprovação.
- O que você acha, ? – A loira se virou para mim. – Acha que eu agi feito uma maluca?
Balancei a cabeça em negação.
- Eu acho que você está absolutamente certa. – Garanti. – Talvez ele só esteja acostumado a ter tudo de mão beijada. Por isso a relutância ao seu trabalho, achando que você pode abrir mão de tudo por ele.
- Não pode ficar com ele se ele não te valoriza o suficiente, Sum, por mais que goste dele. – Jodi disse. – Sei que eu costumava ser mais eufórica quanto à romances e também ao Junior, mas Brad tem me mostrado que não vale a pena ficar com alguém que não te veja como a melhor opção. Como a única opção, digna de todo esforço.
Mesmo Emma que adorava zombar de Jodi e Brad não contestou a amiga dessa vez.
Ouvir Jodi falar daquele jeito me fez sentir um aperto no peito, porque eu sabia que estava longe de seguir aquele conselho. Não sou nem a melhor, nem a única, pensei comigo. E Junior, de repente, Junior talvez também não fosse nenhuma das duas coisas para mim.
- Eu fico feliz que vocês me apoiem. – Summer continuou. – Mas, por favor, nada de garotos esse final de semana! Trouxe vocês aqui para nos divertimos. Só as garotas.
- Por mim está ótimo. – Concordei rapidamente. Precisava mesmo tirar toda aquela confusão amorosa da cabeça.
- Nem precisa me perguntar. – Emma se ajeitou no travesseiro.
- Jodi? – Summer ergueu uma sobrancelha para ela.
- Ai... Vai ser difícil. – A baixinha ponderou. – Mas tudo bem, eu concordo!
Nós todas rimos e Emma se sentou.
- Por onde vamos começar, rainha? – Perguntou a Summer.
- Depende. Estão muito cansadas?
- De que mesmo é esse feriado? – Perguntei pelo que devia ser a milésima vez.
- Feriado do Dia da Coragem, querida. – Papai disse de novo. – Quando Nicholas Lion-Heart se amarrou à placa que dizia “Bem-vindos à Jacksonville Beach” e impediu que mudassem o nome da cidade. É uma bonita história. Devia pesquisar sobre ela.
- Por que essa história parecia diferente dez minutos atrás? – Perguntei em tom de reprovação.
- Porque ele acabou de inventar essa. – Miguel respondeu, entrando na sala com sua mochila. – E as últimas cinco também.
- Filha, ninguém faz a mínima ideia de que feriado é esse! – Papai admitiu. – Alguém disse que era um feriado da cidade e todos aceitaram porque todos adoram feriados. Ninguém se importa realmente! O que realmente importa aqui é nosso acampamento. – Ele se aproximou e me deu um beijo na testa.
Eu não poderia dizer que estava animada para aquilo. Um final de semana prolongado inteiro no meio do nada junto com meu pai que não sabia nem acender o fogão direito. Nossa única salvação seria Miguel, que conseguiria nos salvar se algum bicho nos atacasse.
A porta da frente abriu e instantes depois estava na sala. Ele estava arrumadinho, preparado para pegar o avião para Atlanta.
- Eu vim me despedir. – Disse.
Miguel assentiu, e papai bateu nas costas dele, sorrindo.
- Divirta-se com seu pai, . – Falou. – Como eu disse, se conseguir dê uma passada no bar do meu amigo Larry. Uns cantores muito bons cantam lá e eu falei com ele que você estaria por lá.
- Valeu, Jack. – sorriu.
Depois ele se virou para mim.
- Bom, nos vemos semana que vem. – Disse.
Eu o abracei rapidamente.
- De que mesmo é esse feriado? – Perguntei curiosa.
- Ah, bem... – pensou um pouco. – Não. – Deu de ombros. – Na verdade, ninguém sabe mesmo.
Nós dois rimos e, depois de alguns minutos, ele foi embora. Fiquei olhando ele se afastar, certa de que ele se divertiria bem mais do que eu, torcendo para que desse tudo certo com o pai dele.
Subi as escadas então, indo para o meu quarto para fazer a mala. Quando estava colocando o repelente na mochila, meu celular tocou.
- Esqueça tudo o que planejou fazer. Nós estamos indo em uma super top viagem com a nossa super top model preferida.
A voz de Emma chegou até mim claramente, mas eu tive que perguntar:
- Quê?
- Summer chamou a gente para ir viajar durante o feriado. Vai ser tão irado!
- Para onde vocês vão? – Perguntei, sem conseguir esconder a curiosidade.
- Atlanta, baby.
- está indo para Atlanta. – Observei.
- Ah, Pie, pelo amor de Deus, esquece o ! – Emma resmungou. – Vai ser uma viagem das garotas! Nem pense em falar com ele que estamos indo!
- Emma, eu não estou indo para lugar nenhum com vocês. Eu vou acampar com meu pai.
- Você só pode estar de brincadeira.
- Não, eu vou mesmo...
Mas aí me toquei de que papai estava parado à porta, e ele balançou o dedo em negação.
- Vá se divertir com as garotas. – Ele disse. – Eu e Miguel vamos ter um bom tempo para exercitar nossa virilidade na selva.
Abri a boca, mas contive minha piada. Em vez disso ri.
- Valeu, pai.
Voltei ao telefone.
- Certo. Que horas vocês vêm me buscar?
Fiquei surpresa quando o carro que estava mais para uma minivan parou em frente à minha porta. Lá de dentro, Emma e Summer acenaram.
- Vamos lá, Pie! – Emma gritou.
- Só um segundo. – Falei.
Entrei em casa de novo, onde papai estava amarrando os sapatos.
- Estou indo. – Avisei.
- Tomem muito cuidado na estrada. – Papai disse sério.
- Summer já dirigiu em um milhão de países. Ela é boa nisso. – Garanti.
- Não peguem a estrada durante a noite. – Miguel aconselhou. – E não fiquem em qualquer lugar.
- Já temos lugar certo pra ficar. – Expliquei. – E não vamos pegar estrada à noite. Voltamos na segunda-feira de manhã.
- E o mais importante: não conte para sua mãe. – Meu pai me abraçou e beijou o topo da minha cabeça. – Me ligue quando chegarem ao hotel.
Terminei de me despedir e saí de casa com a mochila nas costas. Entrei pela porta de trás e joguei a bolsa de lado.
- Cadê a Jodi? – Quis saber.
- Achei que seria engraçado se déssemos um susto nela e passássemos direto. – Emma sorriu.
- Mas eu achei que seria maldade e gritei da janela que voltaríamos para pegar ela em casa.
Olhei pela janela. Do outro lado do parquinho que nos separava, estava Jodi sentada nas escadas da varanda, com uma mochila lilás ao lado.
- Ah, você é muito molenga! – Emma falou para Summer. – Deixa eu dirigir um pouco.
- Não vai sacanear ela. – A outra desconfiou.
- Claro que não! – Hughes disse ofendida. – O carro é seu, Olsen, por favor.
Desconfiada, Summer tirou o cinto e deixou que Emma fosse para o seu lugar, sentando então no banco do carona.
- Ei, ! – Ela deu um largo sorriso.
- Oi, Sum! – Sorri de volta.
- Fico feliz que você tenha vindo. Não seria a mesma coisa sem uma de nós.
Enquanto Summer falava, Emma acelerava, dando a volta para a rua de Jodi. Ao nos ver, a baixinha ficou de pé, acenando freneticamente. Olhei então para o sorriso maléfico no rosto de Hughes.
- Saca só essa! – Ela disse, passando direto em frente à Jodi.
Eu sabia que iria para o inferno, mas não consegui conter o riso quando olhei pela janela e vi a cara de revolta de Jodi.
- EI, ME ESPEREM! – Ela gritou, correndo atrás do carro.
Summer ria, mas balançou a cabeça.
- Emma, não seja malvada!
- Ah, mas isso é tão engraçado! – Hughes protestou.
- Você está parecendo a Jasmine. – Provoquei.
- Ok, agora me convenceu.
Emma freou o carro bruscamente. Jodi cambaleou até a porta. Quando ela finalmente conseguiu respirar direito, colocou a cara na janela e disse:
- NÃO. TEVE. GRAÇA!
- Pra você não. – Emma riu.
Abri a porta e ela entrou no carro, colocando a mochila sobre a minha.
- Sinto muito, eu tentei evitar. – Summer disse.
- Não se preocupe, eu sei com quem estou lidando. – Jodi dispensou. Eu ri e a abracei de lado.
- Bem, acho que agora podemos finalmente pegar a estrada. – Eu disse.
Emma desceu seus óculos escuros para o rosto.
- Atlanta, baby, aí vamos nós!
POV
- Passagem, por favor.
Estendi minha passagem e a moça com o scanner me liberou. Engraçado como eu afirmava com toda força odiar Atlanta, na primeira vez que papai sugeriu que eu os visitasse lá. Eu nunca nem tinha ido à Atlanta na época.
- Bom dia! – A aeromoça sorriu quando entrei.
- Bom dia. – Sorri de volta e então fui procurar meu lugar.
F 18, F 18... Onde estava?
Desviei de algumas pessoas no corredor, pedindo licença aqui e ali, até que finalmente encontrei. Já havia alguém sentado à janela, e levei um susto quando vi de quem se tratava.
- Rosana?
A garota olhou para mim e seus olhos se arregalaram, mais ou menos como vinha acontecendo o tempo todo nos últimos tempos, na escola.
- . – Ela disse. Então, deu um sorriso sem jeito. – Vai se sentar aqui?
- Parece que sim. – Coloquei minha mochila no bagageiro e me sentei ao lado dela. – Que coincidência. – Observei.
- Eu tenho família em Atlanta. – Ela explicou.
- É, eu também.
O silêncio se instalou por alguns segundos, mas eu senti que precisava fazer alguma coisa. Antes, a presença de Rosana me deixava nervoso, mas desde que ela tinha começado a me evitar, fiquei pensando que minhas crises de pânico perto dela a tinham deixado chateada. E, apesar de a detestá-la, ela era uma garota legal.
- Olha, eu devia ter feito isso antes, mas queria dizer que sinto muito por aquele dia, na sua casa. Eu não queria te ofender nem nada, mas...
- Ah, não. Tudo bem! – Ela disse rápido. – Não se preocupe com isso, eu é que... Bom, a verdade é que você namora a Pie e eu sabia, só achava que...
- O quê?
Rosana arregalou os olhos de novo, como se tivesse falado demais.
- Nada. – Disse, forçando então um sorriso. – Quanto tempo vai ficar em Atlanta?
- Até segunda-feira. Volto no voo do início da noite.
- Que coincidência! – Ela exclamou. – Eu também.
Não era mesmo muito curioso?
POV PIE
- Caramba, dirigir é tão cansativo depois que você já tem a carteira! – Emma resmungava ao volante. – Quer dizer, você espera sua vida inteira por isso, e quando finalmente consegue, descobre que vai passar ¼ da sua vida parado em sinais e xingando idiotas no trânsito. – Bufou. – EI, IDIOTA, SEU FAROL NÃO VAI CAIR SE VOCÊ DER SETA! – Gritou com alguém.
- Eu adoro dirigir. – Summer sorriu, inclinando a cabeça para fora e deixando que o vento jogasse o longo cabelo louro para trás. – Dá uma sensação de... Liberdade.
- Sabe o que também dá essa sensação? – Hughes riu. – Não ter um namorado no seu pé. Ainda assim, você continua nessa saga para voltar com o . Vai entender.
Summer deu um longo suspiro.
- Você está certa, Emma. – Disse então.
Todas nós levamos um susto com aquilo, mas eu de fato fiquei paralisada por um instante.
Ela estava desistindo? Desistindo do e deixando o caminho livre?
- Mas eu gosto do Junior. – Ela continuou, dando de ombros. Recostei no banco de novo, relaxando. Nada tinha mudado. – Só que eu também fico cansada às vezes, sabe? Sei que eu fui uma namorada relapsa várias vezes, mas ele deveria saber que o que sinto por ele é verdadeiro. E, ultimamente, ele tem me tirado do sério com tanta indecisão.
Eu queria poder dizer a Summer que a entendia – consolá-la, conversar sobre o assunto e falar mal do . Mas ela não podia saber o quanto eu a compreendia.
- Não vai desistir então? – Jodi perguntou. – Ninguém te julgaria, sabe? Você não precisa dele para nada. É uma rainha.
Jodi tinha aquela bravura disfarçada num jeito meigo que fazia a gente ter vontade de guardá-la num potinho. Não era de se espantar que Brad a adorasse tanto. E a lealdade dela a Summer, que ultrapassava até mesmo a admiração que ela já tivera por Junior , era louvável.
- Eu não sou rainha, Jodi. – Summer sorriu. – Isso é só uma coisa que alguém inventou porque eu sou bonita. É por isso que viemos nessa viagem.
Era incrível como Summer sempre conseguia falar sobre sua beleza, sua vida e sua carreira sem nunca parecer convencida ou arrogante.
- Por que exatamente? – Perguntei, lamentando de novo que tivéssemos nos conhecido em meio a toda aquela confusão, e não numa situação normal, onde eu poderia ter sido uma amiga muito melhor para ela.
- Porque eu queria ser uma garota normal, um pouquinho que fosse, e eu não tenho como fazer isso em Jacksonville Beach porque todo mundo me conhece.
- Então não vamos usar nenhum dos seus contatinhos de modelo? – Emma fez careta.
Jodi e eu rimos.
- Você é tão folgada! – Estiquei a mão para bater na cabeça dela.
Summer riu também.
- Mas é claro que vamos, eu não sou maluca! – Disse. – A questão é que fora das fronteiras da nossa cidade eu não sou A modelo. Eu sou só uma modelo qualquer.
Nossa primeira parada foi o hotel. Jodi não parava de sorrir quando empurramos as portas de vidro e caminhamos até a recepção.
- É isso que você chama de ser uma pessoa qualquer? – Emma perguntou.
- Nós não vamos ficar na suíte presidencial, obviamente. – Summer deu de ombros. – Mas eu queria que vocês se divertissem enquanto estamos aqui. E... – Ela entregou um papel à moça da recepção. – Eu tinha esses vales-feriado. Boa tarde.
Entramos no elevador com uma senhora de chapéu escandaloso e Emma nos cutucou. Seguramos o riso, mas ainda assim a mulher nos fuzilou com os olhos quando saiu, um andar abaixo do nosso.
- Aqui estamos! – Summer abriu as portas do quarto.
Lá dentro, quatro camas com lençóis brancos e lisos se encontravam uma ao lado da outra. Na parede mais afastada do quarto – que podia não ser gigantesco, mas era lindo – havia uma janela que ia do chão ao teto, de onde dava para ver o jardim do hotel.
Olhamos uma para a outra e então corremos – nós três, não Sum – para pular nas camas.
- Ah, que deliiiícia! – Exclamei sentindo o colchão fofinho nas minhas costas. – Eu poderia usar o final de semana inteiro só para dormir!
- Olhem só a piscina! – Jodi correu para a janela.
- A comida aqui deve ser ótima! – Emma suspirou.
- É boa mesmo. – Summer concordou.
A loira riu de nós e foi se sentar em sua cama, na ponta. Ela jogou a mochila perto do travesseiro e deitou de lado, olhando para nós.
- Eu nunca vim aqui sem a minha mãe, sabe? – Comentou. – Acho que dessa vez eu vou aproveitar tão mais!
- Se você nunca viajou sem sua mãe, por que o Junior ficava tão chateado por você estar fora? – Jodi questionou, sentando na cama. – Quer dizer, não é como se você fosse enganá-lo. Você só estava trabalhando.
Apesar de não dizer nada, meu pensamento foi o mesmo. A mãe de Summer tinha me parecido ser do tipo que não saía do pé dela um segundo, e mesmo que não fosse, Olsen gostava tanto do Junior! Ele não tinha um motivo real para ficar chateado, embora com certeza sentisse saudades.
- É, eu sei. – Ela assentiu. – Da primeira vez que brigamos por isso, eu fiquei muito revoltada. Mas acho que a grande questão é que quando você tem dezesseis anos e começa a namorar, você espera poder passar um bom tempo de verdade com a pessoa, e não só na escola e em alguns finais de semana. E meu trabalho foi aos poucos acabando até com esse tempo.
- É, claro, quando se tem dezesseis anos, mas ele agora já tem dezoito, não é? – Emma disse com seriedade. – Eu acho isso coisa de babaca. Desculpe falar, mas tenho que ser honesta.
- Olha, a pode te aconselhar bem nisso. – Jodi opinou. – Ela entende como é gostar de alguém à distância.
- É verdade, . – Summer me deu um sorriso triste. – E então?
Não era só porque eu queria que Summer desistisse de Junior que eu queria chamá-la para o mundo real. Eu realmente achava que ela devia estar ciente de que ninguém tinha o direito de intervir no trabalho dela, especialmente quando ela só estava começando e precisava se firmar. Qualquer um que realmente gostasse dela se obrigaria a entender isso, mesmo os amigos.
- O jamais faria isso. – Me ouvi dizer, com sinceridade. – Se eu tivesse que ir amanhã para o Brasil e ainda estivéssemos namorando... – Franzi o nariz. – Acho que quando você gosta de verdade de alguém que merece, tudo fica muito pequeno perto do quanto importa ver essa pessoa feliz.
E foi por isso que eu desisti dele, pensei, dando um sorriso triste.
Summer assentiu, respirando fundo então.
- Esse foi um dos... – Ficou de pé. – Um dos motivos de eu querer vir aqui hoje.
Olhamos umas para as outras sem entender direito.
- No outro dia, eu chamei o Junior para sair, como eu disse que faria. – Ela contava, andando de um lado para o outro, nervosa. – E ele aceitou, e fomos comer um cachorro-quente e tomar um milk-shake. E aí, quando estávamos indo para casa, eu o beijei, e ele correspondeu o beijo, e eu fiquei tão feliz, mas aí sabe o que ele disse? – Summer estava mais brava do que nunca agora. – Ele disse “Isso não faz nada ficar mais fácil”. E eu sei que não foi nada demais, mas eu fiquei com tanta.... Raiva!
Ela balançou as mãos, como se desse um "basta". Nem mesmo Emma, a mais intrometida de nós, se atreveu a fazer qualquer comentário. Summer parecia um vulcão em erupção.
- E aí eu disse: “Talvez não seja para ser fácil mesmo, Junior. TALVEZ UMA MALDITA VEZ NA SUA VIDA NÃO SEJA PARA SER TÃO FÁCIL E VOCÊ PRECISE SE ESFORÇAR UM POUCO TAMBÉM!”. E depois eu fui embora sem me despedir. Eu senti uma raiva dele que nunca tinha sentido. – Balançou a cabeça. – Não estamos nos falando direito desde então.
Eu fiquei estarrecida. Por mais que esperasse ver os dois separados, eu nunca pensei que a situação chegaria àquele ponto, que Summer seria tão corajosa.
- Poderia ter terminado com uma bofetada na cara dele. – Emma assentiu em aprovação.
- O que você acha, ? – A loira se virou para mim. – Acha que eu agi feito uma maluca?
Balancei a cabeça em negação.
- Eu acho que você está absolutamente certa. – Garanti. – Talvez ele só esteja acostumado a ter tudo de mão beijada. Por isso a relutância ao seu trabalho, achando que você pode abrir mão de tudo por ele.
- Não pode ficar com ele se ele não te valoriza o suficiente, Sum, por mais que goste dele. – Jodi disse. – Sei que eu costumava ser mais eufórica quanto à romances e também ao Junior, mas Brad tem me mostrado que não vale a pena ficar com alguém que não te veja como a melhor opção. Como a única opção, digna de todo esforço.
Mesmo Emma que adorava zombar de Jodi e Brad não contestou a amiga dessa vez.
Ouvir Jodi falar daquele jeito me fez sentir um aperto no peito, porque eu sabia que estava longe de seguir aquele conselho. Não sou nem a melhor, nem a única, pensei comigo. E Junior, de repente, Junior talvez também não fosse nenhuma das duas coisas para mim.
- Eu fico feliz que vocês me apoiem. – Summer continuou. – Mas, por favor, nada de garotos esse final de semana! Trouxe vocês aqui para nos divertimos. Só as garotas.
- Por mim está ótimo. – Concordei rapidamente. Precisava mesmo tirar toda aquela confusão amorosa da cabeça.
- Nem precisa me perguntar. – Emma se ajeitou no travesseiro.
- Jodi? – Summer ergueu uma sobrancelha para ela.
- Ai... Vai ser difícil. – A baixinha ponderou. – Mas tudo bem, eu concordo!
Nós todas rimos e Emma se sentou.
- Por onde vamos começar, rainha? – Perguntou a Summer.
- Depende. Estão muito cansadas?
23 Parte 2– Continuação
[…]
Quando Summer parou o carro em frente ao clube, o queixo de Jodi caiu.
- Nós podemos mesmo entrar num lugar desses? – Quis saber. – Porque eu não tenho identidade falsa.
Summer riu da pergunta, descendo do carro.
- Sua idade te impede de beber, Jodi, não de dançar.
Seguimos a garota entre as pessoas até a entrada, passando em frente a uma enorme fila de espera, indo direto ao segurança.
- Ei, Duck! – Ela cumprimentou.
O homem grande de óculos escuros abriu um sorriso ao reconhecê-la.
- Baby Angel. – Disse. – Andou sumida.
- Eu voltei pra escola. – Summer deu um sorriso brincalhão. – Eu e minhas amigas podemos entrar?
- Mas é claro. – Abriu a porta, empurrando os outros para trás para que entrássemos. – Nada de bebidas, hen?
- Pode deixar.
Lá dentro a música tocava a todo volume. As luzes pulsantes poderiam deixar alguém tonto, mas ninguém parecia realmente se importar enquanto dançava.
- Quem é aquele cara? – Emma perguntou.
- Ele fez a segurança de um grupo de modelos em que eu estava, algum tempo atrás. – Olsen respondeu.
- E por que te chamou de Baby Angel?
Summer mordeu o lábio antes de responder.
- Isso não pode sair daqui, porque não sei se é verdade, ok? – Pediu. Nós assentimos. – Quando eu estava no Japão, surgiu esse boato de que os produtores do Victoria's Secret estavam de olho em mim. Não para agora, mas para daqui a algum tempo, talvez um ano ou dois. De todo modo, as outras modelos começaram a brincar sobre isso me chamando de Baby Angel, porque se realmente acontecesse eu seria a mais nova da equipe.
Nós três estávamos de boca aberta, e tão, tão felizes por Summer.
- Isso é incrível! – Exclamei. – Eu aposto que vão entrar em contato com você. Consigo te imaginar perfeitamente lá!
- Obrigada, mas não dá pra ter certeza de nada ainda. – Ela disse timidamente.
- Mas é claro que dá! – Jodi agarrou as mãos dela, animada. – Somos suas amigas, nós sabemos que vai conseguir!
Elas giraram juntas entre a multidão.
- Venham logo vocês! – Jodi chamou.
Em pouco tempo, nos misturamos à bagunça e dançávamos feito loucas.
Quando finalmente paramos para descansar, fomos nos sentar ao bar, eu e Emma.
- Nossa, eu nunca me diverti TANTO! – A garota exclamou, o cabelo grudando na testa de suor.
- Eu não me divertia mesmo assim faz muito tempo! – Admiti. – Quer dizer, não sem ter um monte de coisas na cabeça.
- Tipo o quê?
- Sei lá... – Pensei um pouco. – Escola, namoro. – Dei de ombros então, mudando de assunto. – E você e o ?
- Não existe "eu e o ", pra começo de conversa. – Ela riu. – Existe aquele esquisito dando em cima de mim, mas...
- Mas o quê? – Ergui uma sobrancelha.
- Mas hoje de manhã, antes de Summer me buscar, eu o encontrei por acaso na rua e ele veio com uma conversa bizarra sobre o baile e talvez... Sei lá, eu vá ao baile com ele.
- Hanraaam, parece que a Hughes está dando uma chance ao amor, hen? – Eu ri, cutucando a barriga dela.
- Isso não é dar uma chance ao amor; isso é dar ao uma chance de não me envergonhar em público. – Ela se esquivou. – Aquele cara alto e forte que mora na sua casa? Esse sim me faria dar uma chance ao amor. Por que não nos apresenta?
Eu ainda estava rindo quando Jodi chegou correndo a nós.
- Meninas, meninas! – Ela exclamava eufórica. – Olhem aquilo!
Na pista de dança, Summer dançava uma música agitada com um cara alto de cabelo loiro. Emma moveu a boca para formar a palavra gostoso quando ela olhou para nós. Summer riu e se virou. Quando a música ficou mais lenta, ele a puxou para perto, e alguns instantes depois, a beijou.
Primeiro Summer o empurrou e deu alguns passos em nossa direção. Depois ela parou, voltou lá e beijou o cara, deixando-o absolutamente confuso e deslumbrado. Então ela veio correndo para perto de nós, morrendo de rir.
- Vamos! – Disse. – Temos que sair daqui agora, antes que ele peça meu telefone!
🌴💚🌴
- Fala sério! O que foi aquilo? – Exclamei, comendo uma garfada do bife no prato à minha frente. Depois de tanto dançar e de sair correndo, estávamos mortas de fome, então fomos parar em um bar-restaurante a algumas quadras de distância.
- Eu não sei o que deu em mim! – Summer riu. – Ele era legal, mas me pegou de surpresa, então eu o empurrei e saí, mas aí lembrei de como Junior tinha feito eu me sentir estúpida, e quando dei por mim tinha voltado!
- Você arrasou, garota! – Emma colocou uma batata frita na boca dela.
- Essa noite está sendo TÃO EMOCIONANTE! – Jodi engoliu o refrigerante todo de uma vez. Emma arregalou os olhos. Ela estava eufórica demais desde o clube, como uma criança com excesso de açúcar.
- Certo, qual vai ser nossa próxima parada? – Eu quis saber.
- Bom – Summer disse. –, apesar de o tema do baile ter sido uma surpresa para mim, eu me lembrei essa semana que algum tempo atrás participei de um desfile em que a coleção tinha sido baseada nos anos 20.
- E? – Emma incentivou.
- E acontece que o estilista é meio que um amigo meu. – A garota continuou. – Eu liguei para ele e perguntei se ele não tinha algo... Sobrando. – Sorriu.
- Isso significa o que acho que significa? – Sorri também.
- Próxima parada: o ateliê. – Summer decretou. – Ele vai estar nos esperando.
- Irado! – Jodi enfiou o bombom que tinha comprado na boca. Emma pegou o outro da mesa antes que ela o alcançasse.
- Fecha essa boca, Jodi Lyn, ou então você não vai caber em roupa nenhuma!
O ateliê era um prédio pequeno e charmoso, mesmo visto de fora. Nos aproximamos e Summer deu uma batidinha na porta. Logo apareceu, atrás da porta de vidro, um rapaz alto de cabelo raspado. Ele sorriu e abriu a porta.
- Decidiu lembrar que eu existo, não é, bonitinha? – Ele abraçou Summer com carinho.
- Sinto muito, eu estava... Na escola. – Ela deu de ombros e ele fez uma careta. – Estas são , Emma e Jodi, minhas amigas. Meninas, este é o Javier.
- Oi. – Eu e Emma sorrimos.
- Que lugar liiindo! – Jodi foi logo entrando, sem nem ao menos cumprimentar, e estávamos começando a nos preocupar que alguém tivesse dado alguma balinha a ela na boate, mas Emma garantiu que era só o açúcar. Jodi tinha comido doces durante toda a viagem de carro.
O primeiro andar era reservado para o setor administrativo, enquanto no segundo estavam os cabides e manequins em produção, segundo Javier.
- Eu tenho que cuidar de alguns assuntos chatos de contabilidade aqui embaixo. – Ele rolou os olhos. – Vocês podem subir e ver se encontram algo que gostem. O que estão procurando está na arara da esquerda, lá no fundo. Não rasguem minhas obras de arte.
- Obrigado, Javier! – Summer sorriu.
Seguimos a rainha da Jacksonville High escada acima, quase caindo estateladas diante de todo aquele estoque. Embora parecesse um lugar pequeno quando visto de fora, o ateliê parecia enorme agora.
- AH. MEU. DEUS! – Exclamou Emma.
Olhamos umas para as outras, e então começamos a correr no meio dos vestidos, calças, blusas, echarpes...
- Eu morri e fui para o paraíso das roupas caras! – Jodi ria.
Passei a mão pela seda e pelo cashmere, sentindo sua textura suave. Era como estar em um filme de princesas. Tudo era tão bonito!
- , eu acho que achei! – Summer gritou.
Segui a voz dela até o fundo do salão, onde pendiam de uma arara vestidos finos e delicados, cheio de penduricalhos, pedrinhas e detalhes. Me lembrei das capas dos discos e dos quadros de papai.
- Deus, eu amei o preto... – Summer disse encantada. – Mas você... – Ela passou os dedos pelos cabides. – Acho que devia provar este aqui.
Summer puxou o cabide, onde se exibia um vestido de cor pérola todo bordado, com um brilho suave, que terminava com uma franja enfeitada com pedrinhas, que devia ficar pouco acima do joelho. Meu coração deu um salto. Ele era lindo.
- Ele foi feito para você. – Ela insistiu. – E eu vou com o preto.
Summer segurou os vestidos a nossa frente e me fez olhar para o espelho grande na parede.
- Seremos como Yin e Yang. – Disse contemplativa.
Só que com as almas trocadas, concluí mentalmente.
Ver Summer parada ali ao meu lado, segurando os vestidos, foi de todos os momentos que passáramos juntas, o mais marcante. De repente, vi o que éramos: duas garotas iguais, com seus corações partidos, com uma vida inteira pela frente. E eu queria, como queria, que a dela fosse maravilhosa, mesmo sabendo que ela me odiaria um dia.
- Obrigada, Summer. – Eu disse, tentando conter a voz embargada. – E... Desculpa.
- Pelo quê? – Ela não entendeu.
- Não sei, qualquer coisa que eu tenha feito para te chatear desde que cheguei à cidade. – Tentei forçar um sorriso.
- Tudo que você fez desde que chegou foi me ajudar. – Ela disse séria. – Estou melhor agora do que estive em muito tempo. Você trouxe sorte para Jacksonville Beach.
Summer sorriu e eu a abracei – em parte porque queria, em parte porque não queria que ela me visse chorando. Limpei as lágrimas antes que ela visse.
- Opa! – Ela disse então. – Seu cabelo agarrou no meu colar.
Com cuidado, desatei meu cabelo do fecho do colar, e então me afastei, rindo. Foi quando olhei para o pescoço dela.
A pedra que pendia ali não me era desconhecida, tal qual o trançado que a prendia.
- Pedra do sol ou ametista? – Ele perguntou, erguendo dois colares no ar.
. Eu tinha escolhido a pedra do sol, e então... Ele tinha dado o outro colar a ela.
Engoli em seco, minha visão turvando de raiva.
Qual de nós duas, no fim, era a mais idiota?
POV
- Rob, não coloque a mão para fora do carro!
Meu irmão colocou a mão para dentro, mas, assim que achou que papai não o estava vendo, colocou para fora de novo. Ergui as sobrancelhas para ele, mas não o dedurei.
- Espero que tenha conseguido relaxar um pouco esse fim de semana, . – Meu pai comentou. – Lembro do meu último ano. Tão cansativo. – Fez uma careta.
- Eu consegui descansar, sim, pai. – Sorri. – Valeu.
- Bom, que bom. – Assentiu. – Ah, me diga, como está sendo a gravidez da sua mãe?
- Ela...
- Só um segundo, filho.
Papai entrou estacionamento e encontrou uma vaga no meio de tantos carros. Descemos e eu fui pegar minha mala, enquanto ele soltava o Rob da cadeirinha. Carol não tinha ido junto me levar porque os pais dela tinham chegado de surpresa, mas tinha dito que eu voltasse logo e que sentiria saudades. Ela era uma graça de pessoa.
- Desculpe, pode continuar. – Ele falou enquanto seguíamos para dentro do aeroporto.
- Tudo bem. A gravidez dela está sendo bem tranquila. Mas também, são só dois meses. – Dei de ombros. – Só temos que tomar cuidado porque é um caso um pouco mais delicado, pela idade dela.
Papai sorriu, assentindo.
- Puxa, nunca imaginei que veria a Meg grávida de novo! – Ele riu. – Ela deve estar vibrante, queria poder vê-la para dar os parabéns.
- Você pode, sabe?
Papai inflou as bochechas, do jeito que eu fazia.
- Eu sei, mas... Às vezes acho que poderia ser estranho. Com o Henry e tal.
- Pai, vocês dois são adultos, seguiram em frente. – Apontei o óbvio. – E têm uma coisa em comum que nunca vão poder esquecer: eu. E agora, os dois têm outros filhos – Sorri. – e são casados com boas pessoas, que sem dúvida entendem que vocês tiveram uma vida juntos um dia, e por isso é normal se importarem um com o outro.
Papai sorriu, meneando a cabeça e dando de ombros.
- Tem razão. Talvez passemos lá nas férias de inverno, então. – Passou um braço pelos meus ombros. – Sabe de uma coisa, ? Você é muito maduro. Bem mais do que eu na sua idade. Seu namoro com aquela garota deve ser bem mais equilibrado.
Apertei os lábios, assentindo. – Claro.
- Então por que essa cara? – Ele desconfiou, pegando Rob no colo enquanto meu irmão apontava para um boneco enorme do Incrível Hulk.
- Não tem nada de errado, a gente só... Se desencontrou um pouco essa semana.
- Sei. – Pai me olhou de soslaio, sorrindo. – Você nunca falou muito dela, mas, claro, a gente não se viu desde que começou a namorar. – Ponderou. – Agora, pelo que conheci do Jack...
- Ah, não, pai, ela não é maluca! Ela não tem nada a ver com o Jack. – Ri alto, compreendendo o que papai devia estar pensando. – Se bem que... Na verdade, ela tem um pouco dele, sim. – Meditei. – Ela é imprevisível, péssima mentirosa e canta muito mal... – Dei risada. – Mas também é talentosa, divertida e se preocupa com os outros, até quando não merecem. – Sorri. – É, ela tem muito dele. Só que é bonita também.
Papai sorriu para mim, um sorriso de afeto. Ele estava feliz por me ver gostando tanto de alguém. Relações amorosas eram um campo delicado na nossa vida.
- Papai, eu quero aquele boneco! – Rob exclamou, alheio a nossa conversa.
- Ah, quer? – Papai fez cócegas nele. – Vamos jantar com o primeiro para que ele não se atrase, depois damos uma olhada nos preços.
Depois de jantar com Rob e meu pai, nos despedimos para que eu fosse para a sala de embarque. Os dois acenaram de longe uma última vez – Rob com o boneco nos braços – e eu entrei.
O avião decolaria dali à uma hora. Dentro de poucos minutos já se poderia embarcar. Me sentei em um dos bancos de metal parar esperar e fiquei lendo um livro que tinha comprado no dia anterior.
- Marcamos mesmo os horários, não é? – A voz veio brincalhona.
Olhei para cima e sorri para Rosana, que se sentou ao meu lado.
- Como foi com a família? – Perguntei.
- Você não acreditaria na confusão. – Ela suspirou. – Minha prima metida a certinha simplesmente apareceu grávida. Numa festa de família. Quem faz isso?
- A prima do fez algo parecido uma vez. – Comentei. – Ela casou em Las Vegas sem ninguém saber.
Rosana riu e estendeu a mão para pegar meu bilhete.
- Deixa eu ver isso aqui. – Disse. – Parece que não vamos nos sentar juntos dessa vez.
- Pode me contar sobre a sua prima nos próximos trinta minutos então.
Rosana e eu conversamos pelos minutos seguintes, enquanto esperávamos que chamassem os passageiros do nosso voo. A conversa foi mais simples e engraçada do que eu tinha pensado que um dia seríamos capazes de ter. Percebi que o melhor jeito de se entender com uma pessoa é, às vezes, diminuir seu contato com ela.
- Foi ridículo. – Ela finalizou. – O namorado dela é o cara mais patético que eu já vi.
- Uau. – Balancei a cabeça. – Isso quase me faz sentir triste por não ter primos por perto para parecerem piores que eu.
Rosana riu de novo, me empurrando de leve.
- Você é divertido, sabia, ? – Disse. – Eu queria mesmo ter começado a falar com você antes de...
Nós dois ficamos em silêncio. O que foi bom, porque eu não queria ter que cortá-la.
- A Pie tem sorte. – Ela disse por fim. – Você é um cara legal, que merece uma pessoa legal.
Assenti com um sorriso agradecido, e então a voz no alto-falante chamou os passageiros do nosso voo para o embarque.
- Por favor, passageiros dos assentos 0 a 13, venham para a primeira fila.
Meu assento era o 12.
- Nos vemos na descida. – Eu disse a Rosana, que assentiu com uma expressão estranha.
Ela ficou para trás, na fila dos outros passageiros, e eu tomei meu lugar. Quando estava quase chegando minha vez de passar, ouvi a voz dela atrás de mim.
- , espera!
Rosana saiu correndo de sua fila, me deixando absolutamente perplexo. Ela parou em frente a mim, nervosa.
- Eu tinha decidido deixar para lá e nunca te contar isso... – Disse, engolindo em seco. – Mas tem uma coisa que você precisa saber.
Quando Summer parou o carro em frente ao clube, o queixo de Jodi caiu.
- Nós podemos mesmo entrar num lugar desses? – Quis saber. – Porque eu não tenho identidade falsa.
Summer riu da pergunta, descendo do carro.
- Sua idade te impede de beber, Jodi, não de dançar.
Seguimos a garota entre as pessoas até a entrada, passando em frente a uma enorme fila de espera, indo direto ao segurança.
- Ei, Duck! – Ela cumprimentou.
O homem grande de óculos escuros abriu um sorriso ao reconhecê-la.
- Baby Angel. – Disse. – Andou sumida.
- Eu voltei pra escola. – Summer deu um sorriso brincalhão. – Eu e minhas amigas podemos entrar?
- Mas é claro. – Abriu a porta, empurrando os outros para trás para que entrássemos. – Nada de bebidas, hen?
- Pode deixar.
Lá dentro a música tocava a todo volume. As luzes pulsantes poderiam deixar alguém tonto, mas ninguém parecia realmente se importar enquanto dançava.
- Quem é aquele cara? – Emma perguntou.
- Ele fez a segurança de um grupo de modelos em que eu estava, algum tempo atrás. – Olsen respondeu.
- E por que te chamou de Baby Angel?
Summer mordeu o lábio antes de responder.
- Isso não pode sair daqui, porque não sei se é verdade, ok? – Pediu. Nós assentimos. – Quando eu estava no Japão, surgiu esse boato de que os produtores do Victoria's Secret estavam de olho em mim. Não para agora, mas para daqui a algum tempo, talvez um ano ou dois. De todo modo, as outras modelos começaram a brincar sobre isso me chamando de Baby Angel, porque se realmente acontecesse eu seria a mais nova da equipe.
Nós três estávamos de boca aberta, e tão, tão felizes por Summer.
- Isso é incrível! – Exclamei. – Eu aposto que vão entrar em contato com você. Consigo te imaginar perfeitamente lá!
- Obrigada, mas não dá pra ter certeza de nada ainda. – Ela disse timidamente.
- Mas é claro que dá! – Jodi agarrou as mãos dela, animada. – Somos suas amigas, nós sabemos que vai conseguir!
Elas giraram juntas entre a multidão.
- Venham logo vocês! – Jodi chamou.
Em pouco tempo, nos misturamos à bagunça e dançávamos feito loucas.
Quando finalmente paramos para descansar, fomos nos sentar ao bar, eu e Emma.
- Nossa, eu nunca me diverti TANTO! – A garota exclamou, o cabelo grudando na testa de suor.
- Eu não me divertia mesmo assim faz muito tempo! – Admiti. – Quer dizer, não sem ter um monte de coisas na cabeça.
- Tipo o quê?
- Sei lá... – Pensei um pouco. – Escola, namoro. – Dei de ombros então, mudando de assunto. – E você e o ?
- Não existe "eu e o ", pra começo de conversa. – Ela riu. – Existe aquele esquisito dando em cima de mim, mas...
- Mas o quê? – Ergui uma sobrancelha.
- Mas hoje de manhã, antes de Summer me buscar, eu o encontrei por acaso na rua e ele veio com uma conversa bizarra sobre o baile e talvez... Sei lá, eu vá ao baile com ele.
- Hanraaam, parece que a Hughes está dando uma chance ao amor, hen? – Eu ri, cutucando a barriga dela.
- Isso não é dar uma chance ao amor; isso é dar ao uma chance de não me envergonhar em público. – Ela se esquivou. – Aquele cara alto e forte que mora na sua casa? Esse sim me faria dar uma chance ao amor. Por que não nos apresenta?
Eu ainda estava rindo quando Jodi chegou correndo a nós.
- Meninas, meninas! – Ela exclamava eufórica. – Olhem aquilo!
Na pista de dança, Summer dançava uma música agitada com um cara alto de cabelo loiro. Emma moveu a boca para formar a palavra gostoso quando ela olhou para nós. Summer riu e se virou. Quando a música ficou mais lenta, ele a puxou para perto, e alguns instantes depois, a beijou.
Primeiro Summer o empurrou e deu alguns passos em nossa direção. Depois ela parou, voltou lá e beijou o cara, deixando-o absolutamente confuso e deslumbrado. Então ela veio correndo para perto de nós, morrendo de rir.
- Vamos! – Disse. – Temos que sair daqui agora, antes que ele peça meu telefone!
- Fala sério! O que foi aquilo? – Exclamei, comendo uma garfada do bife no prato à minha frente. Depois de tanto dançar e de sair correndo, estávamos mortas de fome, então fomos parar em um bar-restaurante a algumas quadras de distância.
- Eu não sei o que deu em mim! – Summer riu. – Ele era legal, mas me pegou de surpresa, então eu o empurrei e saí, mas aí lembrei de como Junior tinha feito eu me sentir estúpida, e quando dei por mim tinha voltado!
- Você arrasou, garota! – Emma colocou uma batata frita na boca dela.
- Essa noite está sendo TÃO EMOCIONANTE! – Jodi engoliu o refrigerante todo de uma vez. Emma arregalou os olhos. Ela estava eufórica demais desde o clube, como uma criança com excesso de açúcar.
- Certo, qual vai ser nossa próxima parada? – Eu quis saber.
- Bom – Summer disse. –, apesar de o tema do baile ter sido uma surpresa para mim, eu me lembrei essa semana que algum tempo atrás participei de um desfile em que a coleção tinha sido baseada nos anos 20.
- E? – Emma incentivou.
- E acontece que o estilista é meio que um amigo meu. – A garota continuou. – Eu liguei para ele e perguntei se ele não tinha algo... Sobrando. – Sorriu.
- Isso significa o que acho que significa? – Sorri também.
- Próxima parada: o ateliê. – Summer decretou. – Ele vai estar nos esperando.
- Irado! – Jodi enfiou o bombom que tinha comprado na boca. Emma pegou o outro da mesa antes que ela o alcançasse.
- Fecha essa boca, Jodi Lyn, ou então você não vai caber em roupa nenhuma!
O ateliê era um prédio pequeno e charmoso, mesmo visto de fora. Nos aproximamos e Summer deu uma batidinha na porta. Logo apareceu, atrás da porta de vidro, um rapaz alto de cabelo raspado. Ele sorriu e abriu a porta.
- Decidiu lembrar que eu existo, não é, bonitinha? – Ele abraçou Summer com carinho.
- Sinto muito, eu estava... Na escola. – Ela deu de ombros e ele fez uma careta. – Estas são , Emma e Jodi, minhas amigas. Meninas, este é o Javier.
- Oi. – Eu e Emma sorrimos.
- Que lugar liiindo! – Jodi foi logo entrando, sem nem ao menos cumprimentar, e estávamos começando a nos preocupar que alguém tivesse dado alguma balinha a ela na boate, mas Emma garantiu que era só o açúcar. Jodi tinha comido doces durante toda a viagem de carro.
O primeiro andar era reservado para o setor administrativo, enquanto no segundo estavam os cabides e manequins em produção, segundo Javier.
- Eu tenho que cuidar de alguns assuntos chatos de contabilidade aqui embaixo. – Ele rolou os olhos. – Vocês podem subir e ver se encontram algo que gostem. O que estão procurando está na arara da esquerda, lá no fundo. Não rasguem minhas obras de arte.
- Obrigado, Javier! – Summer sorriu.
Seguimos a rainha da Jacksonville High escada acima, quase caindo estateladas diante de todo aquele estoque. Embora parecesse um lugar pequeno quando visto de fora, o ateliê parecia enorme agora.
- AH. MEU. DEUS! – Exclamou Emma.
Olhamos umas para as outras, e então começamos a correr no meio dos vestidos, calças, blusas, echarpes...
- Eu morri e fui para o paraíso das roupas caras! – Jodi ria.
Passei a mão pela seda e pelo cashmere, sentindo sua textura suave. Era como estar em um filme de princesas. Tudo era tão bonito!
- , eu acho que achei! – Summer gritou.
Segui a voz dela até o fundo do salão, onde pendiam de uma arara vestidos finos e delicados, cheio de penduricalhos, pedrinhas e detalhes. Me lembrei das capas dos discos e dos quadros de papai.
- Deus, eu amei o preto... – Summer disse encantada. – Mas você... – Ela passou os dedos pelos cabides. – Acho que devia provar este aqui.
Summer puxou o cabide, onde se exibia um vestido de cor pérola todo bordado, com um brilho suave, que terminava com uma franja enfeitada com pedrinhas, que devia ficar pouco acima do joelho. Meu coração deu um salto. Ele era lindo.
- Ele foi feito para você. – Ela insistiu. – E eu vou com o preto.
Summer segurou os vestidos a nossa frente e me fez olhar para o espelho grande na parede.
- Seremos como Yin e Yang. – Disse contemplativa.
Só que com as almas trocadas, concluí mentalmente.
Ver Summer parada ali ao meu lado, segurando os vestidos, foi de todos os momentos que passáramos juntas, o mais marcante. De repente, vi o que éramos: duas garotas iguais, com seus corações partidos, com uma vida inteira pela frente. E eu queria, como queria, que a dela fosse maravilhosa, mesmo sabendo que ela me odiaria um dia.
- Obrigada, Summer. – Eu disse, tentando conter a voz embargada. – E... Desculpa.
- Pelo quê? – Ela não entendeu.
- Não sei, qualquer coisa que eu tenha feito para te chatear desde que cheguei à cidade. – Tentei forçar um sorriso.
- Tudo que você fez desde que chegou foi me ajudar. – Ela disse séria. – Estou melhor agora do que estive em muito tempo. Você trouxe sorte para Jacksonville Beach.
Summer sorriu e eu a abracei – em parte porque queria, em parte porque não queria que ela me visse chorando. Limpei as lágrimas antes que ela visse.
- Opa! – Ela disse então. – Seu cabelo agarrou no meu colar.
Com cuidado, desatei meu cabelo do fecho do colar, e então me afastei, rindo. Foi quando olhei para o pescoço dela.
A pedra que pendia ali não me era desconhecida, tal qual o trançado que a prendia.
- Pedra do sol ou ametista? – Ele perguntou, erguendo dois colares no ar.
. Eu tinha escolhido a pedra do sol, e então... Ele tinha dado o outro colar a ela.
Engoli em seco, minha visão turvando de raiva.
Qual de nós duas, no fim, era a mais idiota?
POV
- Rob, não coloque a mão para fora do carro!
Meu irmão colocou a mão para dentro, mas, assim que achou que papai não o estava vendo, colocou para fora de novo. Ergui as sobrancelhas para ele, mas não o dedurei.
- Espero que tenha conseguido relaxar um pouco esse fim de semana, . – Meu pai comentou. – Lembro do meu último ano. Tão cansativo. – Fez uma careta.
- Eu consegui descansar, sim, pai. – Sorri. – Valeu.
- Bom, que bom. – Assentiu. – Ah, me diga, como está sendo a gravidez da sua mãe?
- Ela...
- Só um segundo, filho.
Papai entrou estacionamento e encontrou uma vaga no meio de tantos carros. Descemos e eu fui pegar minha mala, enquanto ele soltava o Rob da cadeirinha. Carol não tinha ido junto me levar porque os pais dela tinham chegado de surpresa, mas tinha dito que eu voltasse logo e que sentiria saudades. Ela era uma graça de pessoa.
- Desculpe, pode continuar. – Ele falou enquanto seguíamos para dentro do aeroporto.
- Tudo bem. A gravidez dela está sendo bem tranquila. Mas também, são só dois meses. – Dei de ombros. – Só temos que tomar cuidado porque é um caso um pouco mais delicado, pela idade dela.
Papai sorriu, assentindo.
- Puxa, nunca imaginei que veria a Meg grávida de novo! – Ele riu. – Ela deve estar vibrante, queria poder vê-la para dar os parabéns.
- Você pode, sabe?
Papai inflou as bochechas, do jeito que eu fazia.
- Eu sei, mas... Às vezes acho que poderia ser estranho. Com o Henry e tal.
- Pai, vocês dois são adultos, seguiram em frente. – Apontei o óbvio. – E têm uma coisa em comum que nunca vão poder esquecer: eu. E agora, os dois têm outros filhos – Sorri. – e são casados com boas pessoas, que sem dúvida entendem que vocês tiveram uma vida juntos um dia, e por isso é normal se importarem um com o outro.
Papai sorriu, meneando a cabeça e dando de ombros.
- Tem razão. Talvez passemos lá nas férias de inverno, então. – Passou um braço pelos meus ombros. – Sabe de uma coisa, ? Você é muito maduro. Bem mais do que eu na sua idade. Seu namoro com aquela garota deve ser bem mais equilibrado.
Apertei os lábios, assentindo. – Claro.
- Então por que essa cara? – Ele desconfiou, pegando Rob no colo enquanto meu irmão apontava para um boneco enorme do Incrível Hulk.
- Não tem nada de errado, a gente só... Se desencontrou um pouco essa semana.
- Sei. – Pai me olhou de soslaio, sorrindo. – Você nunca falou muito dela, mas, claro, a gente não se viu desde que começou a namorar. – Ponderou. – Agora, pelo que conheci do Jack...
- Ah, não, pai, ela não é maluca! Ela não tem nada a ver com o Jack. – Ri alto, compreendendo o que papai devia estar pensando. – Se bem que... Na verdade, ela tem um pouco dele, sim. – Meditei. – Ela é imprevisível, péssima mentirosa e canta muito mal... – Dei risada. – Mas também é talentosa, divertida e se preocupa com os outros, até quando não merecem. – Sorri. – É, ela tem muito dele. Só que é bonita também.
Papai sorriu para mim, um sorriso de afeto. Ele estava feliz por me ver gostando tanto de alguém. Relações amorosas eram um campo delicado na nossa vida.
- Papai, eu quero aquele boneco! – Rob exclamou, alheio a nossa conversa.
- Ah, quer? – Papai fez cócegas nele. – Vamos jantar com o primeiro para que ele não se atrase, depois damos uma olhada nos preços.
Depois de jantar com Rob e meu pai, nos despedimos para que eu fosse para a sala de embarque. Os dois acenaram de longe uma última vez – Rob com o boneco nos braços – e eu entrei.
O avião decolaria dali à uma hora. Dentro de poucos minutos já se poderia embarcar. Me sentei em um dos bancos de metal parar esperar e fiquei lendo um livro que tinha comprado no dia anterior.
- Marcamos mesmo os horários, não é? – A voz veio brincalhona.
Olhei para cima e sorri para Rosana, que se sentou ao meu lado.
- Como foi com a família? – Perguntei.
- Você não acreditaria na confusão. – Ela suspirou. – Minha prima metida a certinha simplesmente apareceu grávida. Numa festa de família. Quem faz isso?
- A prima do fez algo parecido uma vez. – Comentei. – Ela casou em Las Vegas sem ninguém saber.
Rosana riu e estendeu a mão para pegar meu bilhete.
- Deixa eu ver isso aqui. – Disse. – Parece que não vamos nos sentar juntos dessa vez.
- Pode me contar sobre a sua prima nos próximos trinta minutos então.
Rosana e eu conversamos pelos minutos seguintes, enquanto esperávamos que chamassem os passageiros do nosso voo. A conversa foi mais simples e engraçada do que eu tinha pensado que um dia seríamos capazes de ter. Percebi que o melhor jeito de se entender com uma pessoa é, às vezes, diminuir seu contato com ela.
- Foi ridículo. – Ela finalizou. – O namorado dela é o cara mais patético que eu já vi.
- Uau. – Balancei a cabeça. – Isso quase me faz sentir triste por não ter primos por perto para parecerem piores que eu.
Rosana riu de novo, me empurrando de leve.
- Você é divertido, sabia, ? – Disse. – Eu queria mesmo ter começado a falar com você antes de...
Nós dois ficamos em silêncio. O que foi bom, porque eu não queria ter que cortá-la.
- A Pie tem sorte. – Ela disse por fim. – Você é um cara legal, que merece uma pessoa legal.
Assenti com um sorriso agradecido, e então a voz no alto-falante chamou os passageiros do nosso voo para o embarque.
- Por favor, passageiros dos assentos 0 a 13, venham para a primeira fila.
Meu assento era o 12.
- Nos vemos na descida. – Eu disse a Rosana, que assentiu com uma expressão estranha.
Ela ficou para trás, na fila dos outros passageiros, e eu tomei meu lugar. Quando estava quase chegando minha vez de passar, ouvi a voz dela atrás de mim.
- , espera!
Rosana saiu correndo de sua fila, me deixando absolutamente perplexo. Ela parou em frente a mim, nervosa.
- Eu tinha decidido deixar para lá e nunca te contar isso... – Disse, engolindo em seco. – Mas tem uma coisa que você precisa saber.
23 Parte 3 - I'm Mrs. Extra! Extra! This just in!
"I'm Miss Bad Media Karma, another day another drama…"
[…]
- Jodi, acorda! – Emma a cutucou. – Estamos quase chegando.
Summer também acordou do cochilo. Me espreguicei sem tirar as mãos do volante, mesmo sem ter dormido. Com certeza eu apagaria durante toda a tarde.
- Ainda são onze da manhã. Vamos pegar o almoço. – Emma sorriu.
Apesar da minha descoberta do sábado à noite, eu tinha me concentrado em aproveitar o domingo com as meninas, e isso tinha me deixado muito bem. Afinal de contas, tínhamos decidido não deixar os garotos interferirem na nossa diversão, e todas tinham que seguir a regra à risca.
Entrei com o carro na rua de Jodi. A irmã dela estava no quintal, com uma boia de jacaré presa à cintura e aquelas trancinhas no cabelo. A menina estava fazendo um escândalo por alguma coisa, e a senhora Slaterton, usando seu avental florido, tinha uma expressão possessa no rosto.
- MAS EU QUERO IR À PISCINA! – A pequena gritava. – TODO MUNDO VAI. TEMOS QUE IR.
- EU JÁ TE FALEI MIL VEZES, DILLY, SUA AVÓ ESTÁ VINDO E NÓS NÃO VAMOS À LUGAR NENHUM HOJE! – A mãe de Jodi disse enfurecida. – ESPECIALMENTE COM ESSA BÓIA, QUE É DE MUITO MAU GOSTO, UMA VEZ QUE OS CROCODILOS SÃO INIMIGOS NATURAIS DOS HOMENS NO NOSSO ESTADO. NUNCA MAIS VOU DEIXAR VOCÊ COMPRAR NADA SOZINHA!
- ISTO É UM JACARÉ! – Di protestou.
Jodi estremeceu olhando para aquela cena. Tentei lhe lançar um olhar encorajador. Com desanimo, ela abriu a porta e desceu do carro.
- Jodi Lyn! – A mãe exclamou surpresa.
- Oi, mãe.
A senhora Slaterton olhou para o carro então.
- Summer. Emma. . – Disse mal-humorada.
- Bom dia, senhora Slaterton. – Forcei um sorriso.
Di voltou a gritar, Jodi começou a reclamar com sua mãe e nós aproveitamos a deixa para sair dali, acelerando até o fim da rua, onde curvamos e entramos na minha.
- É aqui que trocamos de lugar. – Falei para Summer.
Desafivelamos os cintos e descemos do carro para que ela assumisse o volante.
- Até amanhã, Emms. – Olhei para a janela de trás. Hughes sorriu e acenou.
Summer enfiou as mãos nos bolsos e sorriu.
- Vou manter os vestidos pendurados e passados no closet até o baile. – Ela disse. – Tenho que agradecer muito a vocês por esse fim de semana.
- Ah, foi divertido. – Dei de ombros. – Acho que foi bom para todas nós.
- Bom, nos vemos na escola. – Ela me deu um abraço rápido.
- Até amanhã.
Summer e Emma partiram e eu fiquei ali, por mais alguns instantes, até que finalmente dei as costas para a rua e subi as escadas da varanda. Foi quando ouvi alguém chamar meu nome.
- !
Olhei para trás, estreitando os olhos, e vi Perry Gold, do jornal da escola, se aproximando da minha casa.
- Perry? – Franzi o cenho.
- Que bom que te achei. – Ele sorriu. – As pessoas geralmente viajam no feriado.
- Eu... Acabei de voltar. – Falei confusa. – Como sabe onde eu moro?
- Eu perguntei ao Brad Winter. – Deu de ombros. – Eu precisava muito falar com você. Estou escrevendo uma matéria para o jornal sobre as candidatas a Rainha do baile. Eu queria te fazer algumas perguntas.
- Ah, claro... Mas eu mal cheguei em casa. Não pode ser outra hora?
- É que eu queria que fosse para a edição de amanhã. – Explicou. – Juro que não vai tomar mais que vinte minutos.
Respirei fundo, tentando afugentar o sono.
- Tudo bem. – Concordei. – Só me dá um segundo? Preciso avisar que eu cheguei.
Deixei Perry esperando na varanda e fui levar minha mochila lá para dentro, mas não havia ninguém lá. Procurei pela casa inteira, até que finalmente encontrei um bilhete de papai na porta da geladeira.
Rainbow, se chegar cedo demais, fomos comprar algumas coisas para preparar um delicioso almoço de feriado.
Papai
Voltei para fora e Perry estava sentado nas escadas.
- Meu pai foi ao mercado. – Falei. – Se quiser, pode fazer as perguntas lá na sala.
Gold se sentou no sofá da sala, observando minha casa com uma atenção que me deixou um tantinho incomodada. Quando se deu conta de que eu o estava vigiando, o rapaz sorriu.
- Parece a casa de um artista. – Comentou.
- Sim, ela é... A cara do meu pai. – Concordei. – Podemos começar?
- Ah, claro. – Perry tirou um papel e o celular do bolso. – Se importa se eu gravar? Depois eu transcrevo tudo com mais calma.
- Sem problema.
- Ok... – Ele ligou o gravador. – Então, como se sente tendo acabado de chegar à cidade e à escola e já sendo tão querida? Você mal fez duas aulas de Química e todo mundo te conhece. Esperava por isso quando chegou?
- Definitivamente não. – Ri. – Eu me sinto... Estranha, para ser honesta. Mas é uma sorte, de muitas formas. Embora eu ache que tudo isso se deve mais a Summer.
- Falando na Rainha... – Perry sorriu. – Você rapidamente parece ter se tornado uma das damas de companhia de Summer Olsen, substituindo, junto com Emma Hughes e Jodi Slaterton, o antigo squad da líder de torcida mais famosa da região...
- Não é bem assim... – Fiz uma careta. Por causa daquele tipo de colocação é que algumas pessoas acabavam achando que Summer era metida e fútil.
- Ah não? – Ele levantou os olhos do papel para mim. – Summer é sua dama de companhia então? – Perguntou com malícia.
- Não. O que quis dizer é que Summer não trocou ninguém pela gente. Só ficamos amigas por acaso, por isso andamos juntas.
- E como isso aconteceu? – Perry voltou a olhar para o papel.
- Eu conheci a Summer no meu primeiro dia de aula. Ela foi muito gentil comigo, depois eu acabei ajudando ela com uma situação e ficamos amigas.
- Fofo. – O garoto riu. – E quanto a Jodi Slaterton?
- Eu conheci a Jodi assim que cheguei à cidade. Ficamos amigas de cara. – Sorri.
- E esperava que ela se tornasse candidata à Rainha? – Ergueu uma sobrancelha. – Porque eu, honestamente, fui pego de surpresa. Como grande parte da escola, eu diria.
- Eu realmente não esperava por isso também. – Dei de ombros. – A Jodi é tão delicada e gentil, mas o ensino médio é um lugar competitivo, então muitas vezes as pessoas têm dificuldade para perceber o quão incrível ela é. Acho que a torcida e o namoro de contos de fada dela com o Brad Winter fizeram com que começassem a perceber. Eu acho isso maravilhoso.
Perry assentiu, escrevendo alguma coisa em sua folha que não pude ver.
- Emma Hughes não ficou chateada por ser a única do grupo fora do páreo?
- Ah, não. – Ri. – Emma ficou muito feliz por nós três. Ela pode parecer brigona, mas é muito generosa.
- E como é estar concorrendo com suas duas melhores amigas?
- É confortável, eu diria. – Meneei a cabeça. – Não parece realmente uma competição, sabe? Nós torcemos uma pela outra. Não tem intrigas ou rivalidade. Eu não poderia pensar em concorrentes melhores.
Perry escreveu uma última coisa em sua folha e olhou para mim, um sorriso no rosto.
- Isso é tudo, . – Disse. – Agora só tenho que preparar o resto e editar a reportagem.
Depois de trocar mais algumas palavras, levei Perry até a porta.
- Os jornais estarão disponíveis amanhã no almoço. – Ele me avisou. – Obrigado pelo seu tempo.
- Não tem de quê. – Sorri. – Nos vemos na escola.
Observando Perry ir embora, senti algo esquisito. Não pude dizer do que se tratava, mas levei a mão ao peito no mesmo instante, respirando fundo.
Besteira minha, pensei.
De todo modo, eu logo me distraí, quando ouvi os latidos escandalosos de Stevie vindo com papai e Miguel, numa caminhada despreocupada do fim da rua.
🌴💚🌴
O telefone chamava e chamava, mas continuava caindo na caixa postal.
- Pai. – Perguntei entrando na cozinha. – Sabe se o já voltou de viagem? Eu não estou conseguindo falar com ele.
- Eu pensei que ele voltasse ontem à noite, filha. – Papai disse distraído, lendo o jornal. – Por que não liga para a casa dele?
- Ah, não, posso acordar a mãe dele. – Dispensei a ideia. – Acho que vou de ônibus mesmo. Se ele não for à aula, passo na casa dele depois.
- Então tá.
Voltei lá em cima e peguei meu casaco e minha mochila, depois fui para o ponto esperar. Jodi agora pegava uma carona com Brad de vez em quando, então ela não estava no ponto naquele dia. Dentro do ônibus escolar, porém, havia alguns outros alunos com quem eu falava, a começar por Annabeth, do clube de teatro.
- Puxa, eu fico feliz que esteja bem! – Ela exclamou. – Eu fiquei tão desesperada, me senti super culpada.
- Você não sabia que eu era alérgica. – Tranquilizei-a.
- É, mas sei lá. – Balançou a cabeça. – De todo modo, é bom saber que vai voltar aos ensaios. Só faltam algumas semanas para a peça.
- Não se preocupe. – Sorri. – Depois que nos apresentarmos, ninguém nunca mais vai lembrar o "O Mágico de Oz" que um dia existiu.
Quando cheguei à escola, a primeira coisa que fiz foi dar uma volta pelos corredores e ver se eu encontrava . Apesar de termos feito a promessa – que fora cumprida – de nos divertirmos sem os garotos, a verdade era que eu estava louca para contar a ele sobre a viagem, porque era isso que eu fazia sempre que algo legal acontecia comigo desde que tínhamos nos conhecido.
Mas não estava em lugar algum. Nem nos corredores, nem no pátio, nem na quadra. Comecei a pensar que talvez ele tivesse perdido o voo ou ficado um pouco mais com a família de seu pai por algum outro motivo.
Quando já estava entrando na sala de aula, vi no outro corredor. Cogitei perguntar a ele, mas não estávamos nos falando; o que ficou ainda mais claro quando ele olhou em minha direção e depois saiu andando sem me cumprimentar.
Assim, entrei na sala sem saber o que havia acontecido com . Sem saber nada do que estava prestes a acontecer.
🌴💚🌴
Caminhei sozinha para o refeitório mais tarde naquele dia, e já ia entrar quando ouvi meu nome na voz conhecida:
- !
Respirei fundo, sentindo fluir toda a raiva que eu tinha enterrado no fim de semana, e olhei para trás. sorria como o santo que adorava fingir que era.
Mas eu não podia deixá-lo saber que eu tinha descoberto aquela palhaçada do colar. Dizer a que aquilo tinha me irritado seria o mesmo que dar a ele poder sobre os meus sentimentos. Não era assim que o jogo funcionava.
Além disso, a verdade era que eu não tinha sentido ciúmes, mas sim ficado com raiva da cara-de-pau dele.
- Oi. – Eu disse seca.
- Então você e as meninas viajaram? – Ele riu. – Podia ter me avisado antes. Eu teria seguido vocês.
- Era exatamente o que eu queria evitar. – Dei um sorriso frio.
- Que malvada. – Ele arqueou uma sobrancelha.
Antes que a conversa continuasse, Summer apareceu no fim do corredor. Ela sorriu e acenou, vindo em nossa direção.
- Oi, . – Olhou para ele. – Junior.
Ele a cumprimentou com um aceno de cabeça.
- Estava mesmo perguntando a Pie sobre a viagem de vocês. – Disse.
- Ah, esse assunto é secreto. – Ela riu. – O que acontece em Atlanta, fica em Atlanta.
Junior riu, prestes a contestar, e Summer agarrou minha mão e me puxou para dentro do refeitório. Ele nos seguiu.
Me sentei com eles na mesa VIP, como não fazia há algum tempo.
- Ei, ! – Brad me cumprimentou.
Outras pessoas apertaram minha mão sobre a mesa e fizeram as perguntas habituais. Logo todos falavam sobre os finais de semana e o feriado.
- Nossa, eu dormi feito uma pedra ontem à tarde. – Emma contou.
- Eu até teria feito isso também, mas com minha avó lá em casa aquilo lá só fica ainda mais louco que de costume.
Nós rimos, e Emma fez uma interpretação ridícula da velha senhora Slaterton.
- Jodi Lyn, passe creme nos meus pés!
- Eca! – Jodi exclamou.
Balancei a cabeça, ainda me divertindo com aquilo.
- E você, , já matou a saudade do ? – Olsen quis saber.
- Na verdade, ainda não nos vimos. – Confessei. – E ainda não consegui falar com ele.
- Que estranho. – Ela franziu o cenho.
- Eu estaria muito preocupada se não tivesse conseguido falar com o Brad. – Jodi estremeceu.
- Ah, Jodi Lyn, isso é porque vocês são como... – Emma começou.
- A dama E o vagabundo. – Summer completou rindo.
- A Bela E a Fera. – A outra corrigiu. – Só que nesse caso, Brad é a Bela.
Todas nós rimos e as duas começaram a cantarolar a melodia da música tema de A Bela e a Fera. Jodi tentou não rir, mas não conseguia.
- Não se preocupe. – Apertei de leve seu ombro. – É porque são tão fofos que todo mundo vai achar que seriam um Rei e uma Rainha perfeitos para o baile.
- Você acha? – Ela sorriu, um pouquinho de esperança brilhando.
- Que motivo eu teria para mentir sobre isso, Jodi? – Dei de ombros.
Foi então que as portas do refeitório se abriram e Jasmine apareceu com um sorriso no rosto. Primeiro ela parou por um segundo, observando nossa mesa como se a visão a deliciasse; depois desfilou em nossa direção. Havia algo em suas mãos.
- Eu juro, Pie, juro que não esperava isso de você. – Ela disse para que os outros na mesa ouvissem. – E olha que de você eu espero qualquer coisa.
Olhei para Jasmine confusa e preocupada. Do que ela estava falando?
- Qual o seu problema, Jasmine? – Jodi disse cheia de bravura.
Jasmine jogou em cima da mesa, em frente à Jodi, aquilo que carregava nas mãos.
Era um jornal. O jornal da escola.
E na capa dele, havia uma foto minha com o título: "SEM MEDO DA CONCORRÊNCIA". E a legenda: "Tendo chegado ao topo da pirâmide social tão rápido quanto um piscar de olhos, Pie afirma que competir com Jodi Slaterton – ou mesmo Summer Olsen – não lhe preocupa nem um pouco".
Eu arfei. Que merda era aquela?
- , o que é isso? – Jodi perguntou, várias emoções diferentes passando por seu rosto ao mesmo tempo.
- Jodi, eu... – Comecei.
- DEIXA QUE EU LEIO! – Jasmine pegou o papel de volta.
Àquela altura, todo o refeitório tinha parado para nos ver. Jasmine começou:
- "Não sou dama de companhia de Summer Olsen." – Ela deu uma gargalhada. - "Ela só quis ser minha amiga porque eu a ajudei."
- Jasmine, me dá isso aqui. – disse sério. Ela deu um passo para o lado, sem obedecer.
Jasmine continuava lendo, mas eu estava perdida de revolta. O que Perry tinha feito?
- "Emma Hughes é uma brigona, e Jodi Slaterton é tão invisível que provavelmente só se tornou candidata por causa do namoro dela com Brad Winter!"– Ela se curvou, segurando a barriga que doía de tanto rir. – Uau, Pie, eu não teria feito melhor!
- Me dá essa porcaria! – tomou o jornal das mãos dela de uma vez.
Emma olhava de Jasmine para mim, confusa. Summer encarava a garota de forma crítica.
Então, inesperadamente, Jodi – que estivera estática até o momento – foi até e pegou o jornal. Ele não pôde reagir.
- Não. Não pode ser. – Ela disse com um sorriso, parecendo estar um pouco fora de si. – A não pode ter feito isso. É óbvio que tem alguma coisa errada.
É claro que tem, Jodi, eu nunca faria isso! Quis dizer, sentindo um alívio gigante por ela não acreditar em nada daquilo. Eu jamais falaria mal de Jodi, ou de Emma, ou de Summer. Perry tinha distorcido tudo que falei.
Jodi Lyn continuava passando os olhos pelo jornal, tentando encontrar a falha que denunciaria que aquele era só mais um plano de Jasmine ou algo assim.
Mas então ela parou. Quase pude ouvir seu coraçãozinho parar.
- Não. – Ela murmurou.
- Jodi, o que foi? – Emma perguntou preocupada.
- NÃO, NÃO, NÃO! – Jodi levantou o rosto, os olhos cheios de lágrimas. – ELE SABE! ELE NÃO TINHA COMO SABER!
- JODI, O QUE FOI? – Emma repetiu.
Brad ficou de pé, se colocando ao lado da pequena, e seus olhos foram para o mesmo lugar que os dela. Winter olhou para a namorada e engoliu em seco, virando-se então para Emma.
- Está falando aqui que a senhora Slaterton pegou a gente se beijando e me atacou com a vassoura. – Ele disse em voz baixa.
- Não precisa fazer segredo, Winter! – Jasmine exclamou alegremente. – Está no jornal da escola; em breve TODO MUNDO vai saber!
Jodi levantou os olhos para mim então, a expressão mais devastada do mundo no rosto.
- Eu só contei isso para vocês. – Ela disse. – Como pôde contar isso para ele? Como pôde falar todas essas coisas?
- Jodi, eu não fiz isso! – Dei um passo em sua direção, desesperada.
- Então não deu essa entrevista a Perry Gold? – Perguntou com um pouquinho de esperança.
Não consegui dizer nada, porque a verdade era que eu tinha dito aquelas coisas de outra forma. Mas não a história da senhora Slaterton. Eu nunca tinha contado aquilo para ninguém.
No meio do silêncio, Emma se virou para Brad, que tinha no rosto a expressão de questionamento.
- Qual o problema, Winter? – Ela o beliscou. – Fala de uma vez!
Brad se encolheu, atrás de Jodi, engolindo em seco.
- O Gold... – Ele disse por fim. – Ele me pediu o endereço da ontem.
Jodi olhou dele para mim, respirando fundo.
- Jodi, eu não contei nada sobre vocês para o Perry Gold! – Jurei. – Nada disso é verdade!
- Ele tirou todas essas respostas do nada, por acaso? – Emma questionou.
- Bem... Não. – Admiti. – Mas não foi exatamente assim. Ele manipulou o que eu disse.
Mas Jodi estava destruída, e Emma parecia sem chão também. Eu queria me desculpar com as duas por sequer ter deixado Perry Gold entrar na minha casa. Queria que elas acreditassem em mim desesperadamente. Eu precisava delas.
Jodi respirou fundo, então me encarou ferozmente, me deu as costas e saiu andando em direção à saída.
- Jodi. – Murmurei, chorando também.
- Jodi Lyn! – Emma gritou, indo atrás dela.
Quando ameacei segui-las, a garota me encarou com fúria.
- É melhor não vir atrás se não quer conhecer a origem da minha fama. – Ameaçou.
Fiquei ali, parada, vendo as duas irem embora, seguidas por Brad.
Só então me dei conta da presença de Summer, que me olhou com pena, mas logo saiu correndo atrás de Jodi também.
- Quem diria, Pie. – Jasmine se aproximou com um sorriso. – Estamos no mesmo barco agora. Como se sente sendo a vaca?
Eu me sentia horrível.
🌴💚🌴
- Não precisa ficar assim, sabe? – Amber dizia dentro do carro, na volta para casa. Sem ter coragem de enfrentar o ônibus escolar, eu tinha aceitado a carona dela. Agora estava ali, ignorando 90% do que ouvia.
- Eu acredito que o Perry tenha mexido na sua entrevista. – Ela deu de ombros. – Além disso, mesmo que você tenha dito tudo aquilo, não é como se fossem mentiras.
Queria ter tido força para brigar com Amber e dizer que tudo que Perry dissera era absurdo, mas não queria brigar com ela quando a garota estava tentando ser legal comigo.
- Eu não disse nada daquilo. – Me limitei a dizer.
Amber assentiu com um sorriso compreensivo e voltou a olhar para a estrada. Logo estávamos perto da minha casa.
- Pode me deixar aqui. – Eu disse. – Preciso respirar ar puro antes de entrar.
- Tudo bem. – Ela parou o carro. – Se precisar de qualquer coisa, me liga.
- Obrigada, Amber. – Forcei um sorriso.
Desci do carro e ela foi embora. Ainda estava tendo dificuldade para parar de chorar, mas tinha conseguido na última hora. Ainda assim, caminhei me sentindo exausta e deprimida até minha casa.
Quando eu ainda estava na calçada, a porta se abriu.
olhou em minha direção de um jeito que eu não consegui identificar a princípio, mas também não me importei. Ele desceu as escadas e tudo que eu queria era contar o que tinha acontecido e abraçá-lo, e aí ele me ajudaria a encontrar um jeito de consertar tudo.
- ... – Comecei, aflita. – Aconteceu uma coisa horrível. O Perry Gold...
- Me poupa desse drama, . – Ele disse com o tom duro. – O que quer que tenha acontecido, com certeza a culpa é sua.
- O quê? – Fiquei absolutamente confusa. – Não, você não entende. Foi no jornal, ele... – Continuei, porque a reação dele não fazia sentido para mim.
- Eu não quero saber! – Ele exclamou exasperado.
Engoli o nó na garganta. – Por quê? – Perguntei baixinho.
respirou fundo, passou a mão pelo cabelo, e então me encarou.
- Eu peguei o avião com a Rosana, . – Ele disse. – E ela me contou o que você fez.
Se eu tivesse mais energia, teria levado a mão à boca naquele momento, mas eu só consegui arfar. Meu corpo estava prestes a pender para o chão, mas eu tinha que dizer algo.
- , eu...
- Como você pôde? Você fez uma bagunça na minha vida sem sequer me pedir, e aí eu te dei espaço e achei que tudo bem te ajudar, que eu podia confiar em você! – arfou. – E então você decide determinar quem fala comigo e quem não fala sem que eu faça ideia, apavorar as pessoas que quer longe de mim? Pelo amor de Deus! Quem é você?!
Sou a . A Rainbow.
Eu era. Antes. As duas.
- Eu não quero saber em que foi que você se meteu dessa vez. – Continuou. – Eu estou cansado. Disso tudo.
De mim, completei em pensamento, sem conseguir dizer.
- ! – Chamei quando ele saiu andando, já me desmanchando em lágrimas, mas ele não voltou.
não voltou e eu fiquei ali. E eu chorei.
Entrei em casa sem me importar se alguém me veria, mas ninguém me viu. Subi as escadas, destruída, ignorando os latidos de Stevie no quintal. Entrei no quarto e fechei a porta.
Eu queria os braços de minha velha amiga Collie para me jogar e chorar. De Ben. Da minha mãe. Mas eu não tinha nada disso. Tudo que eu tinha era meu travesseiro, e foi ele que eu abracei. E continuei abraçada até papai aparecer.
- Querida, o que houve?
Eu não consegui me esconder dessa vez. Eu o abracei e continuei chorando.
[…]
- Jodi, acorda! – Emma a cutucou. – Estamos quase chegando.
Summer também acordou do cochilo. Me espreguicei sem tirar as mãos do volante, mesmo sem ter dormido. Com certeza eu apagaria durante toda a tarde.
- Ainda são onze da manhã. Vamos pegar o almoço. – Emma sorriu.
Apesar da minha descoberta do sábado à noite, eu tinha me concentrado em aproveitar o domingo com as meninas, e isso tinha me deixado muito bem. Afinal de contas, tínhamos decidido não deixar os garotos interferirem na nossa diversão, e todas tinham que seguir a regra à risca.
Entrei com o carro na rua de Jodi. A irmã dela estava no quintal, com uma boia de jacaré presa à cintura e aquelas trancinhas no cabelo. A menina estava fazendo um escândalo por alguma coisa, e a senhora Slaterton, usando seu avental florido, tinha uma expressão possessa no rosto.
- MAS EU QUERO IR À PISCINA! – A pequena gritava. – TODO MUNDO VAI. TEMOS QUE IR.
- EU JÁ TE FALEI MIL VEZES, DILLY, SUA AVÓ ESTÁ VINDO E NÓS NÃO VAMOS À LUGAR NENHUM HOJE! – A mãe de Jodi disse enfurecida. – ESPECIALMENTE COM ESSA BÓIA, QUE É DE MUITO MAU GOSTO, UMA VEZ QUE OS CROCODILOS SÃO INIMIGOS NATURAIS DOS HOMENS NO NOSSO ESTADO. NUNCA MAIS VOU DEIXAR VOCÊ COMPRAR NADA SOZINHA!
- ISTO É UM JACARÉ! – Di protestou.
Jodi estremeceu olhando para aquela cena. Tentei lhe lançar um olhar encorajador. Com desanimo, ela abriu a porta e desceu do carro.
- Jodi Lyn! – A mãe exclamou surpresa.
- Oi, mãe.
A senhora Slaterton olhou para o carro então.
- Summer. Emma. . – Disse mal-humorada.
- Bom dia, senhora Slaterton. – Forcei um sorriso.
Di voltou a gritar, Jodi começou a reclamar com sua mãe e nós aproveitamos a deixa para sair dali, acelerando até o fim da rua, onde curvamos e entramos na minha.
- É aqui que trocamos de lugar. – Falei para Summer.
Desafivelamos os cintos e descemos do carro para que ela assumisse o volante.
- Até amanhã, Emms. – Olhei para a janela de trás. Hughes sorriu e acenou.
Summer enfiou as mãos nos bolsos e sorriu.
- Vou manter os vestidos pendurados e passados no closet até o baile. – Ela disse. – Tenho que agradecer muito a vocês por esse fim de semana.
- Ah, foi divertido. – Dei de ombros. – Acho que foi bom para todas nós.
- Bom, nos vemos na escola. – Ela me deu um abraço rápido.
- Até amanhã.
Summer e Emma partiram e eu fiquei ali, por mais alguns instantes, até que finalmente dei as costas para a rua e subi as escadas da varanda. Foi quando ouvi alguém chamar meu nome.
- !
Olhei para trás, estreitando os olhos, e vi Perry Gold, do jornal da escola, se aproximando da minha casa.
- Perry? – Franzi o cenho.
- Que bom que te achei. – Ele sorriu. – As pessoas geralmente viajam no feriado.
- Eu... Acabei de voltar. – Falei confusa. – Como sabe onde eu moro?
- Eu perguntei ao Brad Winter. – Deu de ombros. – Eu precisava muito falar com você. Estou escrevendo uma matéria para o jornal sobre as candidatas a Rainha do baile. Eu queria te fazer algumas perguntas.
- Ah, claro... Mas eu mal cheguei em casa. Não pode ser outra hora?
- É que eu queria que fosse para a edição de amanhã. – Explicou. – Juro que não vai tomar mais que vinte minutos.
Respirei fundo, tentando afugentar o sono.
- Tudo bem. – Concordei. – Só me dá um segundo? Preciso avisar que eu cheguei.
Deixei Perry esperando na varanda e fui levar minha mochila lá para dentro, mas não havia ninguém lá. Procurei pela casa inteira, até que finalmente encontrei um bilhete de papai na porta da geladeira.
Rainbow, se chegar cedo demais, fomos comprar algumas coisas para preparar um delicioso almoço de feriado.
Papai
Voltei para fora e Perry estava sentado nas escadas.
- Meu pai foi ao mercado. – Falei. – Se quiser, pode fazer as perguntas lá na sala.
Gold se sentou no sofá da sala, observando minha casa com uma atenção que me deixou um tantinho incomodada. Quando se deu conta de que eu o estava vigiando, o rapaz sorriu.
- Parece a casa de um artista. – Comentou.
- Sim, ela é... A cara do meu pai. – Concordei. – Podemos começar?
- Ah, claro. – Perry tirou um papel e o celular do bolso. – Se importa se eu gravar? Depois eu transcrevo tudo com mais calma.
- Sem problema.
- Ok... – Ele ligou o gravador. – Então, como se sente tendo acabado de chegar à cidade e à escola e já sendo tão querida? Você mal fez duas aulas de Química e todo mundo te conhece. Esperava por isso quando chegou?
- Definitivamente não. – Ri. – Eu me sinto... Estranha, para ser honesta. Mas é uma sorte, de muitas formas. Embora eu ache que tudo isso se deve mais a Summer.
- Falando na Rainha... – Perry sorriu. – Você rapidamente parece ter se tornado uma das damas de companhia de Summer Olsen, substituindo, junto com Emma Hughes e Jodi Slaterton, o antigo squad da líder de torcida mais famosa da região...
- Não é bem assim... – Fiz uma careta. Por causa daquele tipo de colocação é que algumas pessoas acabavam achando que Summer era metida e fútil.
- Ah não? – Ele levantou os olhos do papel para mim. – Summer é sua dama de companhia então? – Perguntou com malícia.
- Não. O que quis dizer é que Summer não trocou ninguém pela gente. Só ficamos amigas por acaso, por isso andamos juntas.
- E como isso aconteceu? – Perry voltou a olhar para o papel.
- Eu conheci a Summer no meu primeiro dia de aula. Ela foi muito gentil comigo, depois eu acabei ajudando ela com uma situação e ficamos amigas.
- Fofo. – O garoto riu. – E quanto a Jodi Slaterton?
- Eu conheci a Jodi assim que cheguei à cidade. Ficamos amigas de cara. – Sorri.
- E esperava que ela se tornasse candidata à Rainha? – Ergueu uma sobrancelha. – Porque eu, honestamente, fui pego de surpresa. Como grande parte da escola, eu diria.
- Eu realmente não esperava por isso também. – Dei de ombros. – A Jodi é tão delicada e gentil, mas o ensino médio é um lugar competitivo, então muitas vezes as pessoas têm dificuldade para perceber o quão incrível ela é. Acho que a torcida e o namoro de contos de fada dela com o Brad Winter fizeram com que começassem a perceber. Eu acho isso maravilhoso.
Perry assentiu, escrevendo alguma coisa em sua folha que não pude ver.
- Emma Hughes não ficou chateada por ser a única do grupo fora do páreo?
- Ah, não. – Ri. – Emma ficou muito feliz por nós três. Ela pode parecer brigona, mas é muito generosa.
- E como é estar concorrendo com suas duas melhores amigas?
- É confortável, eu diria. – Meneei a cabeça. – Não parece realmente uma competição, sabe? Nós torcemos uma pela outra. Não tem intrigas ou rivalidade. Eu não poderia pensar em concorrentes melhores.
Perry escreveu uma última coisa em sua folha e olhou para mim, um sorriso no rosto.
- Isso é tudo, . – Disse. – Agora só tenho que preparar o resto e editar a reportagem.
Depois de trocar mais algumas palavras, levei Perry até a porta.
- Os jornais estarão disponíveis amanhã no almoço. – Ele me avisou. – Obrigado pelo seu tempo.
- Não tem de quê. – Sorri. – Nos vemos na escola.
Observando Perry ir embora, senti algo esquisito. Não pude dizer do que se tratava, mas levei a mão ao peito no mesmo instante, respirando fundo.
Besteira minha, pensei.
De todo modo, eu logo me distraí, quando ouvi os latidos escandalosos de Stevie vindo com papai e Miguel, numa caminhada despreocupada do fim da rua.
O telefone chamava e chamava, mas continuava caindo na caixa postal.
- Pai. – Perguntei entrando na cozinha. – Sabe se o já voltou de viagem? Eu não estou conseguindo falar com ele.
- Eu pensei que ele voltasse ontem à noite, filha. – Papai disse distraído, lendo o jornal. – Por que não liga para a casa dele?
- Ah, não, posso acordar a mãe dele. – Dispensei a ideia. – Acho que vou de ônibus mesmo. Se ele não for à aula, passo na casa dele depois.
- Então tá.
Voltei lá em cima e peguei meu casaco e minha mochila, depois fui para o ponto esperar. Jodi agora pegava uma carona com Brad de vez em quando, então ela não estava no ponto naquele dia. Dentro do ônibus escolar, porém, havia alguns outros alunos com quem eu falava, a começar por Annabeth, do clube de teatro.
- Puxa, eu fico feliz que esteja bem! – Ela exclamou. – Eu fiquei tão desesperada, me senti super culpada.
- Você não sabia que eu era alérgica. – Tranquilizei-a.
- É, mas sei lá. – Balançou a cabeça. – De todo modo, é bom saber que vai voltar aos ensaios. Só faltam algumas semanas para a peça.
- Não se preocupe. – Sorri. – Depois que nos apresentarmos, ninguém nunca mais vai lembrar o "O Mágico de Oz" que um dia existiu.
Quando cheguei à escola, a primeira coisa que fiz foi dar uma volta pelos corredores e ver se eu encontrava . Apesar de termos feito a promessa – que fora cumprida – de nos divertirmos sem os garotos, a verdade era que eu estava louca para contar a ele sobre a viagem, porque era isso que eu fazia sempre que algo legal acontecia comigo desde que tínhamos nos conhecido.
Mas não estava em lugar algum. Nem nos corredores, nem no pátio, nem na quadra. Comecei a pensar que talvez ele tivesse perdido o voo ou ficado um pouco mais com a família de seu pai por algum outro motivo.
Quando já estava entrando na sala de aula, vi no outro corredor. Cogitei perguntar a ele, mas não estávamos nos falando; o que ficou ainda mais claro quando ele olhou em minha direção e depois saiu andando sem me cumprimentar.
Assim, entrei na sala sem saber o que havia acontecido com . Sem saber nada do que estava prestes a acontecer.
Caminhei sozinha para o refeitório mais tarde naquele dia, e já ia entrar quando ouvi meu nome na voz conhecida:
- !
Respirei fundo, sentindo fluir toda a raiva que eu tinha enterrado no fim de semana, e olhei para trás. sorria como o santo que adorava fingir que era.
Mas eu não podia deixá-lo saber que eu tinha descoberto aquela palhaçada do colar. Dizer a que aquilo tinha me irritado seria o mesmo que dar a ele poder sobre os meus sentimentos. Não era assim que o jogo funcionava.
Além disso, a verdade era que eu não tinha sentido ciúmes, mas sim ficado com raiva da cara-de-pau dele.
- Oi. – Eu disse seca.
- Então você e as meninas viajaram? – Ele riu. – Podia ter me avisado antes. Eu teria seguido vocês.
- Era exatamente o que eu queria evitar. – Dei um sorriso frio.
- Que malvada. – Ele arqueou uma sobrancelha.
Antes que a conversa continuasse, Summer apareceu no fim do corredor. Ela sorriu e acenou, vindo em nossa direção.
- Oi, . – Olhou para ele. – Junior.
Ele a cumprimentou com um aceno de cabeça.
- Estava mesmo perguntando a Pie sobre a viagem de vocês. – Disse.
- Ah, esse assunto é secreto. – Ela riu. – O que acontece em Atlanta, fica em Atlanta.
Junior riu, prestes a contestar, e Summer agarrou minha mão e me puxou para dentro do refeitório. Ele nos seguiu.
Me sentei com eles na mesa VIP, como não fazia há algum tempo.
- Ei, ! – Brad me cumprimentou.
Outras pessoas apertaram minha mão sobre a mesa e fizeram as perguntas habituais. Logo todos falavam sobre os finais de semana e o feriado.
- Nossa, eu dormi feito uma pedra ontem à tarde. – Emma contou.
- Eu até teria feito isso também, mas com minha avó lá em casa aquilo lá só fica ainda mais louco que de costume.
Nós rimos, e Emma fez uma interpretação ridícula da velha senhora Slaterton.
- Jodi Lyn, passe creme nos meus pés!
- Eca! – Jodi exclamou.
Balancei a cabeça, ainda me divertindo com aquilo.
- E você, , já matou a saudade do ? – Olsen quis saber.
- Na verdade, ainda não nos vimos. – Confessei. – E ainda não consegui falar com ele.
- Que estranho. – Ela franziu o cenho.
- Eu estaria muito preocupada se não tivesse conseguido falar com o Brad. – Jodi estremeceu.
- Ah, Jodi Lyn, isso é porque vocês são como... – Emma começou.
- A dama E o vagabundo. – Summer completou rindo.
- A Bela E a Fera. – A outra corrigiu. – Só que nesse caso, Brad é a Bela.
Todas nós rimos e as duas começaram a cantarolar a melodia da música tema de A Bela e a Fera. Jodi tentou não rir, mas não conseguia.
- Não se preocupe. – Apertei de leve seu ombro. – É porque são tão fofos que todo mundo vai achar que seriam um Rei e uma Rainha perfeitos para o baile.
- Você acha? – Ela sorriu, um pouquinho de esperança brilhando.
- Que motivo eu teria para mentir sobre isso, Jodi? – Dei de ombros.
Foi então que as portas do refeitório se abriram e Jasmine apareceu com um sorriso no rosto. Primeiro ela parou por um segundo, observando nossa mesa como se a visão a deliciasse; depois desfilou em nossa direção. Havia algo em suas mãos.
- Eu juro, Pie, juro que não esperava isso de você. – Ela disse para que os outros na mesa ouvissem. – E olha que de você eu espero qualquer coisa.
Olhei para Jasmine confusa e preocupada. Do que ela estava falando?
- Qual o seu problema, Jasmine? – Jodi disse cheia de bravura.
Jasmine jogou em cima da mesa, em frente à Jodi, aquilo que carregava nas mãos.
Era um jornal. O jornal da escola.
E na capa dele, havia uma foto minha com o título: "SEM MEDO DA CONCORRÊNCIA". E a legenda: "Tendo chegado ao topo da pirâmide social tão rápido quanto um piscar de olhos, Pie afirma que competir com Jodi Slaterton – ou mesmo Summer Olsen – não lhe preocupa nem um pouco".
Eu arfei. Que merda era aquela?
- , o que é isso? – Jodi perguntou, várias emoções diferentes passando por seu rosto ao mesmo tempo.
- Jodi, eu... – Comecei.
- DEIXA QUE EU LEIO! – Jasmine pegou o papel de volta.
Àquela altura, todo o refeitório tinha parado para nos ver. Jasmine começou:
- "Não sou dama de companhia de Summer Olsen." – Ela deu uma gargalhada. - "Ela só quis ser minha amiga porque eu a ajudei."
- Jasmine, me dá isso aqui. – disse sério. Ela deu um passo para o lado, sem obedecer.
Jasmine continuava lendo, mas eu estava perdida de revolta. O que Perry tinha feito?
- "Emma Hughes é uma brigona, e Jodi Slaterton é tão invisível que provavelmente só se tornou candidata por causa do namoro dela com Brad Winter!"– Ela se curvou, segurando a barriga que doía de tanto rir. – Uau, Pie, eu não teria feito melhor!
- Me dá essa porcaria! – tomou o jornal das mãos dela de uma vez.
Emma olhava de Jasmine para mim, confusa. Summer encarava a garota de forma crítica.
Então, inesperadamente, Jodi – que estivera estática até o momento – foi até e pegou o jornal. Ele não pôde reagir.
- Não. Não pode ser. – Ela disse com um sorriso, parecendo estar um pouco fora de si. – A não pode ter feito isso. É óbvio que tem alguma coisa errada.
É claro que tem, Jodi, eu nunca faria isso! Quis dizer, sentindo um alívio gigante por ela não acreditar em nada daquilo. Eu jamais falaria mal de Jodi, ou de Emma, ou de Summer. Perry tinha distorcido tudo que falei.
Jodi Lyn continuava passando os olhos pelo jornal, tentando encontrar a falha que denunciaria que aquele era só mais um plano de Jasmine ou algo assim.
Mas então ela parou. Quase pude ouvir seu coraçãozinho parar.
- Não. – Ela murmurou.
- Jodi, o que foi? – Emma perguntou preocupada.
- NÃO, NÃO, NÃO! – Jodi levantou o rosto, os olhos cheios de lágrimas. – ELE SABE! ELE NÃO TINHA COMO SABER!
- JODI, O QUE FOI? – Emma repetiu.
Brad ficou de pé, se colocando ao lado da pequena, e seus olhos foram para o mesmo lugar que os dela. Winter olhou para a namorada e engoliu em seco, virando-se então para Emma.
- Está falando aqui que a senhora Slaterton pegou a gente se beijando e me atacou com a vassoura. – Ele disse em voz baixa.
- Não precisa fazer segredo, Winter! – Jasmine exclamou alegremente. – Está no jornal da escola; em breve TODO MUNDO vai saber!
Jodi levantou os olhos para mim então, a expressão mais devastada do mundo no rosto.
- Eu só contei isso para vocês. – Ela disse. – Como pôde contar isso para ele? Como pôde falar todas essas coisas?
- Jodi, eu não fiz isso! – Dei um passo em sua direção, desesperada.
- Então não deu essa entrevista a Perry Gold? – Perguntou com um pouquinho de esperança.
Não consegui dizer nada, porque a verdade era que eu tinha dito aquelas coisas de outra forma. Mas não a história da senhora Slaterton. Eu nunca tinha contado aquilo para ninguém.
No meio do silêncio, Emma se virou para Brad, que tinha no rosto a expressão de questionamento.
- Qual o problema, Winter? – Ela o beliscou. – Fala de uma vez!
Brad se encolheu, atrás de Jodi, engolindo em seco.
- O Gold... – Ele disse por fim. – Ele me pediu o endereço da ontem.
Jodi olhou dele para mim, respirando fundo.
- Jodi, eu não contei nada sobre vocês para o Perry Gold! – Jurei. – Nada disso é verdade!
- Ele tirou todas essas respostas do nada, por acaso? – Emma questionou.
- Bem... Não. – Admiti. – Mas não foi exatamente assim. Ele manipulou o que eu disse.
Mas Jodi estava destruída, e Emma parecia sem chão também. Eu queria me desculpar com as duas por sequer ter deixado Perry Gold entrar na minha casa. Queria que elas acreditassem em mim desesperadamente. Eu precisava delas.
Jodi respirou fundo, então me encarou ferozmente, me deu as costas e saiu andando em direção à saída.
- Jodi. – Murmurei, chorando também.
- Jodi Lyn! – Emma gritou, indo atrás dela.
Quando ameacei segui-las, a garota me encarou com fúria.
- É melhor não vir atrás se não quer conhecer a origem da minha fama. – Ameaçou.
Fiquei ali, parada, vendo as duas irem embora, seguidas por Brad.
Só então me dei conta da presença de Summer, que me olhou com pena, mas logo saiu correndo atrás de Jodi também.
- Quem diria, Pie. – Jasmine se aproximou com um sorriso. – Estamos no mesmo barco agora. Como se sente sendo a vaca?
Eu me sentia horrível.
- Não precisa ficar assim, sabe? – Amber dizia dentro do carro, na volta para casa. Sem ter coragem de enfrentar o ônibus escolar, eu tinha aceitado a carona dela. Agora estava ali, ignorando 90% do que ouvia.
- Eu acredito que o Perry tenha mexido na sua entrevista. – Ela deu de ombros. – Além disso, mesmo que você tenha dito tudo aquilo, não é como se fossem mentiras.
Queria ter tido força para brigar com Amber e dizer que tudo que Perry dissera era absurdo, mas não queria brigar com ela quando a garota estava tentando ser legal comigo.
- Eu não disse nada daquilo. – Me limitei a dizer.
Amber assentiu com um sorriso compreensivo e voltou a olhar para a estrada. Logo estávamos perto da minha casa.
- Pode me deixar aqui. – Eu disse. – Preciso respirar ar puro antes de entrar.
- Tudo bem. – Ela parou o carro. – Se precisar de qualquer coisa, me liga.
- Obrigada, Amber. – Forcei um sorriso.
Desci do carro e ela foi embora. Ainda estava tendo dificuldade para parar de chorar, mas tinha conseguido na última hora. Ainda assim, caminhei me sentindo exausta e deprimida até minha casa.
Quando eu ainda estava na calçada, a porta se abriu.
olhou em minha direção de um jeito que eu não consegui identificar a princípio, mas também não me importei. Ele desceu as escadas e tudo que eu queria era contar o que tinha acontecido e abraçá-lo, e aí ele me ajudaria a encontrar um jeito de consertar tudo.
- ... – Comecei, aflita. – Aconteceu uma coisa horrível. O Perry Gold...
- Me poupa desse drama, . – Ele disse com o tom duro. – O que quer que tenha acontecido, com certeza a culpa é sua.
- O quê? – Fiquei absolutamente confusa. – Não, você não entende. Foi no jornal, ele... – Continuei, porque a reação dele não fazia sentido para mim.
- Eu não quero saber! – Ele exclamou exasperado.
Engoli o nó na garganta. – Por quê? – Perguntei baixinho.
respirou fundo, passou a mão pelo cabelo, e então me encarou.
- Eu peguei o avião com a Rosana, . – Ele disse. – E ela me contou o que você fez.
Se eu tivesse mais energia, teria levado a mão à boca naquele momento, mas eu só consegui arfar. Meu corpo estava prestes a pender para o chão, mas eu tinha que dizer algo.
- , eu...
- Como você pôde? Você fez uma bagunça na minha vida sem sequer me pedir, e aí eu te dei espaço e achei que tudo bem te ajudar, que eu podia confiar em você! – arfou. – E então você decide determinar quem fala comigo e quem não fala sem que eu faça ideia, apavorar as pessoas que quer longe de mim? Pelo amor de Deus! Quem é você?!
Sou a . A Rainbow.
Eu era. Antes. As duas.
- Eu não quero saber em que foi que você se meteu dessa vez. – Continuou. – Eu estou cansado. Disso tudo.
De mim, completei em pensamento, sem conseguir dizer.
- ! – Chamei quando ele saiu andando, já me desmanchando em lágrimas, mas ele não voltou.
não voltou e eu fiquei ali. E eu chorei.
Entrei em casa sem me importar se alguém me veria, mas ninguém me viu. Subi as escadas, destruída, ignorando os latidos de Stevie no quintal. Entrei no quarto e fechei a porta.
Eu queria os braços de minha velha amiga Collie para me jogar e chorar. De Ben. Da minha mãe. Mas eu não tinha nada disso. Tudo que eu tinha era meu travesseiro, e foi ele que eu abracei. E continuei abraçada até papai aparecer.
- Querida, o que houve?
Eu não consegui me esconder dessa vez. Eu o abracei e continuei chorando.
24- Consequences
"Every siren that I was ignoring… I'm paying for it."
[…]
Acordei com o corpo pesado e olhei para o relógio de ponteiro na parede. Eram duas da manhã.
Logo tudo que tinha acontecido no dia anterior me atingiu como uma avalanche. Jodi e Emma me odiavam. tinha ido embora.
Deixei que minha cabeça caísse de novo no travesseiro e fechei os olhos. Senti o choro vindo. Ele nunca tinha ido embora.
A verdade era que eu estava desesperada. Eu não sabia como remediar toda aquela situação, e não podia nem ao menos contar com as pessoas que mais gostava, porque todas estavam com raiva de mim.
Respirei fundo, limpei as lágrimas com a mão e peguei meu celular. Meus dedos digitaram o número que eu sabia de cor e depois clicaram no ícone verde.
- Alô? – Ela disse do outro lado.
- Mãe?
Senti a vontade de chorar voltando. Ouvir sua voz só me fez sentir mais sozinha. Ela estava tão longe, tão mais longe do que estivera durante toda a minha vida, e não só porque milhas e milhas nos separavam.
- ? – Ela repetiu, a voz mudando de entonação. – , filha, está tudo bem? Aconteceu alguma coisa?
Meu mundo está de cabeça para baixo, mãe. Eu não sei o que tenho que fazer.
Mas não foi isso que eu disse. Eu não podia dizer a ela tudo que tinha feito. Ela voltaria se soubesse. Ela se sentiria horrível, como eu.
- Eu só estou com saudade. – Falei o que era em grande parte verdade, fungando.
- Ah, filha... – Ela suspirou. – Eu estou com saudade também. Tanta.
Deu para perceber que mamãe ia começar a chorar também. Eu precisava desligar antes que ela fizesse mais perguntas, ou decidisse ligar para o papai depois para perguntar sobre mim.
- Já está tarde aqui. – Eu disse então. – Eu tenho que ir.
- Tudo bem. Boa noite, amor.
- Boa noite, mãe.
- E filha?
- Sim?
- Não importa o que esteja acontecendo, vai dar tudo certo.
Fiquei calada por um segundo.
- Obrigada, mãe. Eu te amo. – Respondi então.
Ela disse o mesmo e desliguei o telefone.
Permaneci sentada, pensando no que ela dissera. Mamãe podia não saber o que estava acontecendo, mas me dera o conselho que acreditava que ia ajudar, e tinha funcionado.
Tudo ia dar certo, eu ia resolver aquela situação. Eu tinha que conseguir.
Me deitei de novo, pensando no que poderia fazer. Eu tinha feito tanta coisa. Eu ia dar um jeito.
Mas a verdade era que eu estava tão cansada de planos. Eles tinham saído do controle, e por isso eu estava no fundo do poço agora. E tão cansada.
Por isso, em vez de ter mais uma ideia mirabolante, eu dormi.
🌴💚🌴
Senti as lambidas na minha mão e abri os olhos devagar. Senti a textura da cama, o travesseiro ainda úmido sob meu rosto. O sol já iluminava o quarto.
- Oi, Stevie. – Murmurei.
O cachorro abanou o rabo, cheirando minha mão. Afaguei sua cabeça.
- Desculpe não ter te dado atenção ontem. – Falei. – Não foi um bom dia para mim.
Stevie inclinou a cabeça de lado. Os humanos deviam parecer tão esquisitos para ele.
Me sentei na cama e esfreguei o rosto. Estava na hora de sair e enfrentar as coisas.
Depois de ir ao banheiro, desci as escadas e fui para a cozinha. Papai estava lá, fritando panquecas.
- Docinho. – Ele sorriu torto. – Como se sente?
Suspirei e dei de ombros, indo me sentar. Em meu desespero do dia anterior, eu tinha contado a papai sobre a matéria forjada de Perry Gold e que eu e tínhamos brigado. E, embora não tivesse falado sobre tudo que havia por trás disso, contar pelo menos aquelas coisas a ele já tinha me feito me sentir muito melhor.
- Chateada ainda. – Admiti. – Mas vou resolver tudo hoje, eu espero.
- Sei que vai. – Ele assentiu. – Você é uma Vicentini. As mulheres da sua família não deixam pedra sobre pedra.
Sorri para ele, e então Miguel entrou na cozinha. Sem dizer nada a princípio, ele se aproximou e beijou o topo da minha cabeça. Depois foi até a bancada, colocou duas panquecas em um prato e o entregou a mim.
- Então, você vai falar com esse tal de Gold ou eu vou? – Ele me perguntou, se servindo de uma xícara de café.
- Não se preocupe, Miguel, essa é minha função como pai dela. – Papai disse sério. – Esse garoto vai ter que se retratar publicamente. O que ele fez foi muito errado.
- Vocês não precisam se meter nisso. – Balancei a cabeça. – Do jeito que gostam de uma fofoca, quando as pessoas souberem que vocês fizeram o Gold pedir desculpas, tudo que iam pensar era em como eu sou tão malvada que fiz meu pai famoso e seu capanga latino ameaçarem um pobre repórter adolescente. – Bufei. Eles se entreolharam, sabendo que era verdade. – Eu vou enfrentar o Perry, sim. Mas o que realmente importa para mim é que Jodi, Emma e Summer acreditem em mim. E isso eu posso fazer sozinha.
Depois de alguns instantes, Miguel assentiu.
- Está bem. – Disse. – Mas se mudar de ideia, só precisa me dizer.
Assenti, agradecida.
- E quanto ao ? – Papai quis saber.
Bati o garfo no prato, depois comecei a comer as panquecas.
- Eu vou resolver as coisas com ele também.
🌴💚🌴
A atenção era muito pior agora do que antes. Parecia que havia uma placa vermelha colada na minha testa dizendo TRAIDORA. Eu só continha o impulso de me encolher feito uma criancinha amedrontada porque isso me faria parecer culpada. Então levantava a cabeça e fazia o possível para não olhar para ninguém que não me cumprimentasse.
Quando entrei na aula de Economia Doméstica, já estava sentado à bancada. Ele tamborilava os dedos nela, ansioso. Quando me viu, ele ficou de pé. Ajeitei a mochila nas costas e me juntei a ele.
- Como você está? – Ele perguntou, a voz preocupada.
Dei de ombros, me sentando.
- Nem melhor, nem pior. – Respondi. – Mas mais calma.
bufou, se sentando de novo. Ele se inclinou para mais perto.
- Eu só não peguei o Gold ainda, porque sabia que isso só ia começar novos boatos. – Disse sério. – Mas se você quiser, eu vou atrás dele ainda hoje e faço ele reescrever aquela porcaria do jeito certo.
Honestamente falando, eu fiquei impressionada. sabia que enfrentar Perry Gold geraria um tumulto que podia acabar com as chances dele com Summer. Eu não tinha imaginado que ele arriscaria tanto por mim.
- Não precisa. – Sorri um pouco, balançando a cabeça. – Obrigada. Tudo que eu quero é falar com a Jodi.
assentiu, ficando calado. Olhei para ele de novo, abismada.
- Você faria mesmo isso? – Perguntei. – Se arriscaria a arrumar uma briga com o Gold por minha causa?
ficou olhando para mim em silêncio, mas antes que ele dissesse qualquer coisa, a senhora Turtle entrou na sala e começou a aula. Ele não respondeu, e não tocamos mais no assunto. Acho que, no fundo, Junior estava se questionando tanto quanto eu.
Nos despedimos no fim da aula e eu segui para o meu armário para pegar outro livro. Continuava evitando os olhares, os sussurros. Algumas pessoas, no entanto, continuavam me cumprimentando alegremente, como se, ou não acreditassem no que acontecera, ou realmente não se importassem.
Estava me lembrando de que ainda tinha que falar com Perry Gold sobre o que ele tinha feito, quando alguém falou comigo. Para minha surpresa, era Maya Burnes, dos pés tortos, de quem eu tomara o lugar na torcida.
- Maya? – Falei, achando estranho ela aparecer justo naquele momento.
- Eu te assustei? – Ela riu um pouquinho.
- Não, eu só... Faz tempo que eu não te vejo.
Maya tinha o cabelo quase todo solto, exceto por duas tranças que se encontravam na parte de trás. Reparei que seu pé não estava mais enfaixado, e por alguns instantes me perguntei por que então ela ainda não tinha voltado à equipe, mas não falei nada.
- É, eu andava meio ocupada levando minha vida longe das animadoras. – Ela disse. – Mas a notícia de ontem me fez parar e dizer: UAU.
Mais uma, pensei.
- Olha... – Comecei.
- Relaxa. – Ela sorriu. – Eu só queria te oferecer meu apoio. O que o Perry Gold fez foi horrível. Aposto que ele inventou tudo.
Eu não podia acreditar na gentileza da Maya. Nós nunca nem tínhamos conversado de verdade. Eu estava grata agora por saber que alguém mais acreditava em mim.
Mas então, a garota começou a rir loucamente. De cara, eu fiquei confusa. Maya se curvou, tentando recuperar o ar.
- Ah, meu Deus, quem eu quero enganar? – Ela me olhou através das lágrimas de riso. – Eu estou adorando tudo isso! ADORANDO!
- Eu não estou...
- Nem se preocupe em explicar! Você pensa que eu me importo? – Maya gargalhou.
Eu estava absolutamente embasbacada com aquela cena. Ela continuou:
- Aquela estúpida da Slaterton bem merece o que está acontecendo! Primeiro ela quebrou meu tornozelo; o que provavelmente foi de propósito, só para colocarem você no meu lugar! – Acusou. – Tudo com a ajuda daquela troglodita com quem ela anda.
Estava muito disposta a contestar a acusação, mas Maya não parava mais de falar. Ela estava completamente fora de si.
- E estava tudo bem, porque eu ia voltar, porque a vaga era MINHA. – Berrou. – Mas aí elas me expulsaram! Aquelas duas e a vaca metida da Summer Olsen votaram contra sua saída depois que eu me recuperei e tentei voltar para a equipe!
Eu fiquei estática. Eu não sabia daquilo – nenhuma das três tinha me contado. Eu não fazia ideia de que tinha havido uma votação, de que eu estava oficialmente no lugar de Maya. Dava para entender por que ela estava tão chateada.
- Maya, me desculpe, eu não... – Tentei dizer, mas ela não deixou.
- Corta essa, Pie! – Ela bufou. A essa altura, quase todos no corredor estavam acompanhando a discussão. – É óbvio agora que você sempre teve tudo isso planejado! Você já conhecia o Junior , se aproveitou disso para ficar amiga da Olsen, usando aquelas duas muletas feiosas no caminho, e agora conseguiu chegar ao topo da pirâmide social adolescente! E depois de aquelas garotas patéticas terem feito tanto por você. – Balançou a cabeça, rindo. – Eu me sinto vingada pelo cosmos.
Eu estava me sentindo tão mal, mesmo sabendo que eu não tinha realmente dito todas aquelas coisas para Perry Gold. Então Sienna apareceu, furiosa.
- Maya, o que você está fazendo? – Ela agarrou o braço da prima. – Venha comigo AGORA.
- Me solta! – A menina se sacudiu. – Isso é tudo culpa sua também! Não serviu nem para me defender daquelas idiotas.
Sienna olhou para os lados, envergonhada, e respirou fundo.
- Foi mal, . – Disse. E saiu puxando a prima para longe.
Eu fiquei ali, parada, meu coração acelerado. Olhei em volta. Quase ninguém tinha seguido seu caminho, continuavam ali, olhando para mim. Senti enjoo. E então saí correndo para o banheiro.
Empurrei a porta com força, ofegante. As duas garotas que estavam lá dentro saíram apressadas, talvez pensando que eu era mesmo má e cruel. Abri a torneira e joguei água fria no rosto, esperando que isso melhorasse em alguma coisa. A voz que ouvi chegou a mim antes que eu me desse conta de que alguém tinha entrado.
- Eu só vou perguntar isso uma vez e eu quero que fale a verdade. Disse mesmo tudo aquilo a Perry Gold?
Eu encarava o espelho à minha frente, onde via Summer, parada em uma postura rígida, segura, atrás de mim.
- Não. – Eu disse com firmeza. – Mas é claro que não!
Ela deu um suspiro pesado, mas que me pareceu ser de alívio.
- Como foi que tudo aquilo foi parar no jornal com o seu nome então?
- Perry apareceu logo depois que vocês me deixaram em casa, na segunda-feira. – Me virei para ela, nervosa por querer que ela acreditasse em mim. – Ele disse que estava fazendo uma reportagem com as candidatas à Rainha, pediu para me fazer algumas perguntas. – Balancei a cabeça. – Eu nunca falei mal de vocês, mas ele distorceu todos os elogios que eu fiz para parecer que eu era uma megera!
- É, o Perry é bom nisso. – Ela recostou na parede e encarou o teto, pensativa.
- E por que não disse isso a Jodi?! – Deixei transparecer todo meu desespero.
- Eu a lembrei disso, mas a verdade é que aquilo foi muito estranho! – Ela exclamou. – A reportagem tinha coisas muito pessoais. A história da mãe da Jodi...
- Eu não contei aquilo para ele, eu juro. Não faço ideia de como ele soube.
Summer ficou me encarando, pensativa. Talvez pensando se ia acreditar ou não.
- Eu acredito em você. – Disse por fim. – Mas a Jodi não.
Meus ombros caíram e respirei fundo. Eu podia ter feito muitas coisas, mas tinha gostado verdade da Jodi desde meu primeiro dia na cidade. Me deixava triste saber que ela não acreditava em mim.
- Não fica chateada com ela por isso, ok? – Summer se aproximou, colocando a mão no meu ombro. – A experiência da Jodi na escola não é como a nossa. Ela é o tipo de garota que passou a vida sendo ignorada ou feita de boba pelos outros por ser boazinha demais, e agora que tudo está dando certo, ela só tem a sensação de que foi feita de trouxa de novo. E ela gosta tanto de você.
Pensar por aquele lado me fez sentir menos pior, mas preocupada com Jodi do mesmo jeito. Não queria que ela pensasse que eu era uma babaca. Não queria que ela estivesse passando por nada daquilo.
- Você fez bem em não ir atrás dela ontem. – Ela disse. – A Jodi precisa de um tempo. Acho que hoje ela já está mais calma, mas esses urubus da Jacksonville High não vão deixar nenhuma de nós em paz. Por que não tenta ir a casa dela mais tarde?
Assenti, me sentindo melhor por poder falar com alguém.
- Obrigada, Summer. – E a abracei.
- Amigas são para essas coisas.
E ela estava certa. Éramos amigas. Apesar de tudo que havia por trás.
🌴💚🌴
Sobrevivi melhor aos olhares maldosos depois de minha conversa com Summer. É claro, eu estava mais sozinha do que nunca. não estava falando comigo – a bem da verdade, eu mal tinha visto ele naquele dia –, me odiava, e eu não queria expor Jodi a uma situação ainda pior, de modo que preferi não me sentar à mesa com eles. Também, não estava com fome. Fui me sentar na arquibancada no horário do almoço e fiquei ali até que acabasse, olhando para o nada e pensando.
Quando ele acabou, eu estava de volta aos corredores, rumando para minha sala de aula. Mas quando passei em frente à sala do jornal da escola, senti meu sangue ferver. Dei meia volta e abri a porta. Eu tinha que enfrentar aquela situação.
Perry estava sozinho na sala, lendo alguma coisa em um canto. Seus olhos se levantaram quando entrei.
- Pie. – Ele disse. – Eu soube da comoção que a matéria causou. Esse pessoal é maluco.
- Por que você fez aquilo? – Me aproximei, séria. – Por que mentiu daquele jeito? Eu não disse nada daquilo!
- Quanto a isso, há controvérsias. Você disse basicamente tudo que foi para o jornal. Eu só enfeitei um pouco as coisas.
Minhas mãos estavam tremendo de raiva. Eu podia arrebentar a cara dele ali mesmo.
- Você é um desgraçado. – Insultei-o. – E eu nunca disse nada sobre a mãe da Jodi. Como foi que soube daquilo?
Perry deu de ombros.
- Isso é segredo de estado.
Olhei bem para aquele imbecil, pensando se no fim das contas deveria deixar Miguel ir até a casa dele aterrorizá-lo ou não. Concluí que não. De fato, isso só pioraria as coisas. E o que realmente me importava era o que minha amiga pensava de mim.
- A Jodi não merecia o que você fez. – Eu disse apenas.
Assim, saí dali e bati a porta atrás de mim, dando uma última encarada em Perry Gold através do vidro. Ele me olhava intrigado.
Quando cheguei em casa, não havia ninguém – Papai e Miguel tinham ido ao Roger's. Então larguei minha mochila no chão do corredor mesmo e saí porta afora, com Stevie nos meus calcanhares. Atravessei o parquinho decidida a falar com Jodi e pedir desculpas, mas quando cheguei à rua dela, a casa dos Slaterton estava toda fechada. Talvez fosse um sinal de que eu deveria esperar mais um pouco, mas disse a mim mesma que voltaria mais tarde.
Eu e meu cachorro voltamos para casa, e enquanto ele brincava com um osso de borracha, comecei a fazer o jantar. No dia anterior tinha deixado tudo de lado por conta do meu desespero, mas não queria deixar papai e Miguel preocupados demais comigo, e, além disso, cozinhar me ajudava a esvaziar a cabeça.
Depois de deixar tudo pronto, subi para tomar um banho, e quando desci papai já tinha chegado.
- Oi, querida. – Ele disse. – Como está?
- Bem melhor. – Sorri um pouco. – E o Miguel?
- Já está vindo. Eu só voltei para jantar, mas hoje é a noite de folga dele. – Explicou. – Falou com a Jodi?
- Ainda não, mas vou tentar fazer isso agora. – Respondi calçando os chinelos.
- Não vai jantar?
- Talvez depois. – Fui para a porta. – Para ser sincera, estou ansiosa demais para comer qualquer coisa.
Saí de casa e olhei através do parquinho. As luzes na casa dos Slaterton estavam acesas, então ela devia estar em casa agora. Segura, respirei fundo e caminhei decidida até lá. Toquei a campainha e esperei.
- Vamos, Jodi. – Murmurei para mim mesma.
Tive que tocar de novo, mas, por fim, a porta se abriu. A senhora Slaterton abriu levemente a boca ao me ver.
- Boa noite, senhora Slaterton. – Falei. – Eu posso falar com a Jodi?
O rosto da mãe de Jodi então se transformou. O olhar ficou feroz como de costume. Ela se empertigou toda para dizer:
- A Jodi não pode atender agora. Ela está ocupada.
Senti nas palavras dela que estava mais contrariada com minha presença do que de costume.
- Jodi! – Ouvi a voz de Di, a irmãzinha dela.
Vi a garotinha atrás da mãe, batendo à porta do corredor.
– Jodi, abre essa porta! – Dilly berrava, como sempre. – Quero minha bola. Por que você está trancada feito uma pateta?
A senhora Slaterton virou-se furiosa.
- Dilly, vá para o seu quarto!
- Mas, mãe...
- AGORA.
A pequena Dilly bufou, desaparecendo em outro cômodo. A senhora Slaterton voltou a olhar para mim, sabendo que eu sabia o que estava acontecendo.
- Com licença. – Ela disse antes de fechar a porta na minha cara.
- Tá. – Eu disse baixinho, depois que ela já tinha me deixado ali.
Se ela já me detestava antes, agora devia querer que eu caísse de um penhasco.
Engoli a frustração de não conseguir falar com Jodi porque ela obviamente não queria falar comigo ainda. Tentei levar numa boa. Eu resolveria aquela situação com ela, mesmo que levasse alguns dias.
Respirei fundo e dei meia volta para casa.
O carro estava parado no quintal, e imaginei que Miguel já tivesse chegado. Ia me juntar a eles para o jantar, mesmo sem fome. Tinha que levar as coisas bem.
Mas quando entrei na sala, Miguel estava colocando o contrabaixo encapado nas costas, e papai estava vestindo o casaco.
- Miguel? – Eu o encarei sem entender. – Não é sua noite de folga hoje?
Miguel olhou para papai de um jeito indagativo e ele deu de ombros. Depois, virou-se para mim.
- Era sim... Mas vou precisar substituir o .
Olhei para papai, que foi logo se apressando em dizer:
- Sabe que geralmente eu não chamo o para trabalhar no meio da semana, por causa da escola; mas ele mesmo pediu na semana passada, então tínhamos mudado o arranjo do piano para o contrabaixo, e por isso Miguel estava de folga.
- E por que o não vai tocar? – Insisti.
Miguel ergueu as sobrancelhas e coçou a cabeça, depois levantou as mãos para o alto como se passasse a bola para papai.
- É que o decidiu... Se afastar da banda por um tempo.
Se meu queixo pudesse cair de verdade, ele teria caído. Eu não estava acreditando naquilo. Só podia ser brincadeira. Ele não podia me odiar tanto a ponto de largar o trabalho com meu pai daquele jeito.
Papai e Miguel mantiveram uma distância cautelosa enquanto eu processava a informação.
- Rainbow... – Papai deu um passo à frente então.
- Não me chama assim agora, pai. É sério. – Engoli em seco.
- Tudo bem. – Ele recuou. – Olha, sei que vocês vão se entender logo.
- Sabe mesmo? – Ri com sarcasmo. Eu ainda não estava acreditando. E de repente, estava muito irritada também.
Saí a passos firmes rumo ao andar de cima.
- ! – Miguel chamou.
- Eu estou bem! Podem ir! – Gritei de volta.
Fechei a porta atrás de mim e peguei o celular de cima da cômoda. Disquei tão rápido que meus dedos quase tremiam.
O telefone chamou mais do que de costume. Ele devia estar decidindo se me atenderia ou não. No fim, acabou atendendo.
- O que foi? – A voz veio de encontro a mim.
- O que foi? – Repeti. – , eu entendo que esteja com raiva de mim, mas isso já é ridículo!
- Se está falando de eu ter largado a banda, você pode ser tão autocentrada para me ligar achando que eu fiz isso por sua causa!
- Eu sei que foi!
- Primeiro com quem eu falo, e agora isso? – Ele bufou. – Por que não para de tentar controlar minha vida para variar?
- Não é por mim que estou ligando. É pelo meu pai. E por você. Porque essa estupidez não faz sentido algum! – Exclamei. – Não pode largar o seu trabalho só porque me odeia.
- Não é por você. – Ele disse sério. – E agora, se já acabou, eu tenho que ir.
Fiquei encarando o telefone depois de já ter desligado. Depois, irritada, o joguei com força na cama.
Me sentei no chão e fiquei ali, tentando colocar meus sentimentos no lugar, até que meu celular começou a tocar. Por um segundo, imaginei que poderia ser o , disposto a conversar comigo direito. Subi na cama num pulo.
Mas quando olhei o visor, não era ele. Era o .
Frustrada e cansada, atendi a ligação.
- Alô?
- Ei, Vicentini. – Ele disse. – Como estão as coisas?
- Honestamente, , estão péssimas. – Confessei.
- Talvez se distrair ajude. – Ouvi o sorriso em sua voz. – Eu estava ligando para isso mesmo. Queria saber se não quer sair para comer alguma coisa comigo.
- Desculpa, mas não vai dar. – Dispensei. – Eu preciso mesmo descansar. Me preparar para amanhã, um novo dia no lugar onde todo mundo me odeia.
- Nem todo mundo. – Ele riu. Eu sorri. – Mas tá bem. Eu te vejo amanhã então.
- Obrigada por tentar ajudar, . Até amanhã.
Desliguei o telefone e encarei o teto, depois, cobri o rosto com o travesseiro e xinguei.
Uma bagunça fora de controle. Era isso que tudo tinha virado.
POV
- Não é por você. – Eu disse com firmeza. – E agora, se já acabou, eu tenho que ir.
Quando ela não disse nada, eu desliguei. Me levantei da cama e, irritado, joguei o telefone nos travesseiros.
me olhou de um jeito precavido. Ele sabia que talvez não fosse uma boa hora para falar. Mas, como era o , falou mesmo assim:
- Mas, na verdade, meio que é sim, não é?
Olhei bem para ele por alguns instantes, então inflei as bochechas e me joguei na poltrona da varanda.
- , eu estou com muita raiva. – Falei com sinceridade. – Mas não saí do trabalho só por isso. Eu saí porque se estiver trabalhando com o Jack, vou ter que encontrar ela o tempo todo. E agora eu preciso de um tempo.
- Mas e quanto a esse negócio da Jodi e das meninas? – Ele insistiu, ansioso. – Não acha mesmo que foi ela, né?
- Não importa agora, eu não vou me meter nisso. Passei os últimos meses da minha vida vivendo os problemas da , . Desse, ela vai ter que cuidar sozinha. – Disse com firmeza. – E por que raios você está insistindo tanto? Você sempre foi o primeiro a me lembrar que a é maluca. Pensei que ia achar bom eu dar um tempo nisso tudo.
- Eu acho. – Ele disse rápido. Então, coçou o queixo. – Mas...
- , a me colocou nessa mentira absurda sem me pedir, e eu aceitei. Ela decidiu prolongar a farsa sem falar comigo antes, e eu também aceitei. Me fez mentir para minha melhor amiga de infância. Me fez mentir para minha família. Me fez mentir para o Jack. Para a cidade inteira. – Acentuei a palavra. – E eu aceitei tudo, porque eu... Porque eu me apaixonei por ela no segundo em que a vi. – Admiti. – Mas ela me prometeu que não me meteria em mais nenhuma das loucuras dela. Essa era a condição mais importante. E aí ela ameaça uma garota que supostamente está interessada em mim e ainda coage ela a nunca me contar? Pode parecer que não é exatamente o que ela fez, mas na verdade é. Ela interferiu na minha vida sem minha permissão. De novo. – Bufei, irritado. – Eu teria me afastado da Rosana de qualquer jeito. Eu não queria nada com ela. Mas a fez tudo virar uma tragédia grega, porque é isso que ela faz. Porque, depois de tudo que eu fiz, ela ainda consegue desconfiar de mim, mas acha que pode ser amiga de Junior como se nada tivesse acontecido.
ficou calado, pensativo. Ele olhou para mim e passou as mãos pelo queixo.
- Você está certo. – Ele disse então. – O melhor que faz é se afastar um pouco dela. Até porque, nunca se sabe quando outra bomba vai explodir.
Ergui uma sobrancelha, confuso.
- Como assim?
arregalou os olhos.
- Nada, eu não quis dizer nada! – Deu de ombros. – É só que, com a , nunca se sabe. Vocês precisam desse tempo. – Bateu de leve nas minhas costas.
Assenti, como se concordasse. Mas a verdade é que, mesmo depois que mudamos de assunto, continuei com a sensação de que ele estava guardando algo para si.
POV PIE
Acordei de manhã com o despertador fazendo um escândalo ao meu lado, e só por isso, porque a verdade é que eu estava dormindo profundamente. Era bom que eu tivesse dormido bem, na verdade, porque assim meu corpo tinha relaxado da tensão do dia anterior. Agora eu estava melhor e mais bem-disposta a resolver tudo que precisava.
- De hoje não passa. – Falei para mim mesma, levantando da cama.
Me vesti, desci e tomei o café-da-manhã. Papai ainda não tinha levantado, porque ele e Miguel tinham chegado tarde noite passada, e nosso inquilino dormia um sono pesado no sofá.
Quando estava colocando a mochila nas costas, ouvi uma tosse. Meu pai apareceu usando um roupão colorido, a mão na boca.
- Bom dia, pai. – Falei.
- Bom dia, Rain... Filha. – Ele se corrigiu. – Parece... Animada.
- Determinada, pai. De hoje não passa. Vou falar com a Jodi Lyn.
- Bom, boa sorte. – Ele estendeu a mão, que eu apertei com carinho. – Vou comer alguma coisa e voltar para a cama. Estou exausto.
Saí de casa com passos firmes. Dessa vez eu ia conseguir.
E depois... Depois o . Eu resolveria o que quer que estivesse acontecendo entre nós dois... Se eu conseguisse falar com ele.
Preferi pagar passagem do que ser devorada dentro do ônibus escolar. Mesmo sabendo que não dava para fugir eternamente, era bom ter um segundo de paz. Eu pensei com cuidado em como falaria com Jodi. Em como pediria desculpas.
Desci do ônibus a alguns metros da escola e caminhei até a entrada. Pela a sorte que eu nem acreditava mais ter, Jodi estava a poucos metros do portão. Ela conversava com algumas garotas, a mochila verde-água e rosa nas costas. Era minha chance.
- Jodi! – Fui logo chamando enquanto me aproximava do grupo.
As garotas se cutucaram. Jodi olhou para trás, demonstrando primeiro surpresa. Depois, ela fechou a cara.
- Estava demorando. – Ela disse.
- Jodi, a gente precisa conversar. – Falei. – Por favor. Você precisa me ouvir.
Jodi cruzou os braços em frente ao corpo, indecisa. Depois de alguns segundos de agonia, ela meneou a cabeça.
- Tudo bem. – Disse, e olhou para as meninas. – Vejo vocês depois.
Elas se afastaram, com certeza já fofocando. Jodi e eu também saímos dali, andando alguns passos para longe dos outros alunos, mas ainda em um local onde eu estava certa de que a maioria deles estava nos vigiando.
- Você tem dois minutos. – Jodi disse.
- Jodi. – Me apressei. – Eu não falei nada, nada, nada daquilo para o Perry Gold.
- Você está sofrendo de dupla personalidade então? Porque lá no refeitório você disse que tinha falado.
- Mas não foi daquele jeito! – Exclamei frustrada. – É muito diferente do que parece...
- A Maya Burnes disse que você diria isso quando apareceu na minha casa tirando sarro de mim! – Jodi estava nervosa agora.
- A MAYA BURNES É MALUCA! – Tentei fazê-la entender. – Eu não fiz porcaria nenhuma pensando em ser Rainha. Eu nunca quis ser Rainha. Eu ainda não quero.
Jodi olhou para mim, uma expressão de indecisão no rosto. Então ela abriu a boca para dizer alguma coisa, mas antes que ela respondesse, ouvimos um barulho infernal.
- Mas o que é isso? – Ela perguntou.
Apitos, música e uma gritaria para lá de irritante invadiram o terreno da escola, seguindo o grupo de líderes de torcida que dava cambalhotas e carregava letras enormes em cartazes.
- ? – Jodi leu. E eu também, para ter certeza de que ela não tinha lido errado.
Mas era isso mesmo que diziam as letras. .
- Pie para Rainha! – Elas diziam alegremente, acenando para os outros alunos, que assistiam tudo surpresos.
Não mais que eu.
Especialmente quando me dei conta de que à frente do animado grupo iam e Amber, usando os uniformes do time e sorrindo para todos.
Mas que porcaria era aquela?
- Não quer ser Rainha. – Jodi repetiu com escárnio, encarando a cena. – Então por que Junior e Amber Hayley estão fazendo um show de marketing no seu nome?
- Jodi. – Eu disse devagar, totalmente em estado de choque. – Eu não faço ideia de onde isso aí saiu.
- Estou cansada desse argumento! – Ela exclamou enfurecida. – Jasmine pode ser uma bruxa, mas pelo menos ela assume as coisas que faz. Boa sorte na sua campanha.
Jodi saiu marchando dali para o interior do prédio, e eu, depois de uns bons instantes tentando processar aquele circo, também saí. Mas minha direção foi outra: .
O miserável abriu um enorme sorriso ao me ver. Percebi que havia uma faixa em sua testa onde se lia QUEEN PIE.
- Aí está ela! – Ele exclamou.
- MAS QUE PORCARIA É ESSA, ? – Perguntei puta da vida, só me lembrando depois que os outros alunos estavam de olho em nós.
Mas nem ligou para meu mau humor.
- Você estava tão triste com tudo o que tinha acontecido e com como todo mundo te odiava que eu pensei que devia fazer alguma coisa para te fazer se sentir melhor. Falei com a Hayley e aqui estamos nós, fazendo com que todo mundo volte a te amar.
- Minha tristeza real era porque a JODI estava irritada comigo, e agora graças a vocês ela me ODEIA!
Eu estava tão furiosa que poderia matar aqueles dois ali mesmo. Amber saltitou para perto de nós.
- Não fique preocupada com a Slaterton. – Ela disse em tom entediado, acenando para os outros. – O que você acha, que ela vai retirar a candidatura porque vocês estão de mal? Não seja boba. Isso é uma GUERRA.
Soltei o barulho mais parecido com o grunhido parecido com o de um cão prestes a atacar, bufando de raiva, e passei a mão pelo cabelo.
- Eu vou matar vocês! – Exclamei, pensando então em Summer, que àquela hora estava assistindo o ex ou atual namorado, ou o que fosse, fazendo campanha para outra garota. – E a campanha da Summer? Ela é a líder das líderes de torcida!
- Olsen não precisa de campanha. As pessoas já amam ela. – Amber deu de ombros. – Além disso, ela já ganhou antes. Para que precisa de outra coroa?
Cobri o rosto com as mãos. Se tivesse uma parede por perto, teria batido a cabeça nela até desmaiar.
- Ah, para de se preocupar tanto com tudo! – botou as mãos nos meus ombros. – Você não fez realmente nada, e a Slaterton, como sua amiga, deveria saber disso. Além disso, todo mundo sabe que você nem precisava detonar a imagem dela para vencer esse negócio. Ela nunca teve chance contra você e a Summer.
Só de imaginar os efeitos daquele show, eu já estava pirando. Fechei os olhos e respirei fundo, tentando não enlouquecer de uma vez.
- Por que não tira uma foto com a gente? – Amber sugeriu, já me puxando e encostando a bochecha na minha. Junior ficou do outro lado, sorrindo. – É para a campanha.
O flash quase me cegou. Eu não consegui fugir deles até que o sinal finalmente tocou.
🌴💚🌴
Tive que esperar uma vida até que aquele dia acabasse. A escola agora estava dividida entre aqueles que sorriam e bradavam " Pie para Rainha!" quando me viam, e aqueles que torciam o nariz ou pareciam ter medo de mim.
Eu tinha tentado de todas as formas fazer com que – Amber eu sabia que seria impossível – entendesse que eu não estava nada feliz com aquilo, mas ele estava certo de que minha raiva ia passar. Além disso, ele insistia que era muito injusto eu ter minha primeira candidatura arruinada por causa de um boato mentiroso e queria a qualquer custo reverter os efeitos disso. Eu honestamente achava que fazendo campanha para mim só ia aumentar as porcarias dos boatos.
Eu estava escondida atrás de um muro, esperando que a grande maioria dos alunos entrasse no ônibus escolar, no fim daquela tarde, quando vi Summer passando em direção ao estacionamento. A loira estava sozinha, e eu a segui até estarmos quase no lugar certo.
- Summer! – Chamei em um tom reduzido.
A garota olhou para trás e ergueu a mão em aceno. Corri na direção dela e a puxei para o carro de uma vez. Confusa, Sum entrou pela porta do motorista, e eu na do carona.
Apesar de eu não dizer nada a princípio, Summer sem dúvida sabia por que eu estava ali. Ela também não disse nada, mas ergueu uma sobrancelha.
- Eu não tive nada a ver com aquilo. – Eu disse então. – Eu cheguei bem cedo para falar com a Jodi, e aí o pessoal apareceu com cornetas e cambalhotas, mas ninguém me perguntou antes.
- Ah, ... – Summer encostou a cabeça no volante. Depois de um segundo, ela virou para mim e começou a rir.
- Não tem graça nenhuma. Jodi me odeia ainda mais.
- Eu sei. Desculpe. – Ela parou. – Se a situação fosse diferente, eu seria a primeira a propor uma campanha surpresa para você, você gostando ou não. Para você e para Jodi Lyn. – Suspirou. – Mas não foi ideia minha. Foi o Junior, não foi?
Eu me calei, sem saber bem como explicar aquilo. Summer não disse nada. Recostou a cabeça no banco e olhou para frente.
- Tá tudo bem. – Ela disse então, mas estava pensativa. – Não estou chateada, vocês são amigos. Embora isso só tenha piorado as coisas.
- Sim. – Recostei no banco também. – Eu bem que tentei parar ele e a Amber.
- Não perca seu tempo. – Avisou. – E o , como está reagindo?
Dessa vez, fui eu quem deu um longo suspiro.
- e eu não conversamos sobre isso. Nós estamos... Brigados.
- Sério? O que houve? – Summer se surpreendeu.
- Houve... Eu. – Dei de ombros, deprimida. – Um monte de problemas. Quase todos por minha culpa.
Embora, é claro, eu estivesse sendo generosa comigo. Eram todos por minha culpa.
Mas Summer não disse nada sobre o assunto. Era engraçado como as coisas funcionavam entre nós duas. Nós respeitávamos os problemas uma da outra quase de forma solene, ainda que fosse lógico ela se meter, porque era o grande amigo dela, no fim das contas.
- Mas vai ficar tudo bem. – Foi o que ela disse, e não pareceu que falou com o intuito de me consolar, mas porque acreditava realmente nisso. – O que vocês têm é bom. Vocês gostam um do outro de verdade.
E eu não disse mais nada, mas senti que ela estava dizendo tudo aquilo em uma silenciosa comparação ao seu namoro com Junior.
🌴💚🌴
Summer me deixou em casa. Eu acenei enquanto ela se afastava, pensando na forma como tinha falado no estacionamento. Pensando em tudo que estava acontecendo e em como todos nós tínhamos chegado àquele ponto. E eu só estava ali há três meses.
Entrei em casa e coloquei a mochila no chão do corredor.
- Cheguei! – Eu disse em voz alta.
- Querid... – A resposta foi interrompida por uma crise de tosse violenta.
Adentrei a sala seguindo a voz. Apesar do calor da tarde, Jack usava um casaco. Ele sorriu para mim, ainda se recuperando do ataque de tosse.
- Pai? – Falei preocupada. – O que é isso?
- Ah, filha, é só uma... – Ele tornou a tossir, me deixando mais aflita. - Uma tosse. Eu preciso de um copo d'água.
Papai se levantou, mas parou, como se tivesse ficado fraco de repente.
- Deixa, eu pego pra você. – Toquei seu ombro e fiz com que ele se sentasse.
Peguei um copo de água no filtro, pensando em como eu já o tinha ouvido tossir aquela semana, mas pensei que fosse uma alergia casual, como as que eu tinha às vezes. Mas ele estava com frio agora, então podia estar com febre, uma gripe talvez.
Voltei e me sentei ao seu lado, esperando enquanto ele bebia a água toda de uma vez.
- Ah, que delícia. – Ele fechou os olhos e recostou no sofá. – Muito melhor que Vodca.
Dei risada, colocando a mão em sua testa.
- Está com um pouco de febre, pai. – Observei. – Vou lá em cima pegar um remédio para você, e depois o senhor vai tomar um banho enquanto eu faço uma sopa.
- Vocês brasileiros gostam tanto de sopas! – Fez careta. – Não precisa disso, filha. E, aliás, de onde saiu esse remédio?
- Jack, eu sou filha de Jaqueline Vicentini, tem remédios pela casa toda. – Ergui as sobrancelhas e ele riu um pouquinho, voltando a tossir. – Me obedeça. Depois vou pedir ao Miguel para comprar um xarope.
Papai fez uma cara de quem achava exagero, mas assentiu. Afinal de contas, ele sabia que eu estava certa.
- E quanto ao ? Você não tinha que falar com ele? – Questionou, mas eu balancei a cabeça.
- Hoje não. – Falei, sorrindo. – Hoje eu vou ficar com meu pai.
Jack sorriu de volta, carinhosamente, e eu subi as escadas atrás do remédio.
POV
Eu estava lavando os pratos do jantar, quando a campainha tocou. Mamãe já tinha ido dormir. Ela dormia cada vez mais cedo, conforme a gravidez avançava. O bebê na barriga dela devia ser bem preguiçoso.
Fui atender a porta, e engoli em seco quando dei de cara com Miguel.
Depois de um único segundo, no entanto, parei de sentir medo dele. Embora soubesse, é claro, que ele podia socar minha cara por ter brigado com a e largado o emprego. Parece que eu estava muito mais seguro do que estava fazendo do que pensava.
- Oi, . – Ele disse.
- Miguel. – Assenti. – Aconteceu alguma coisa?
Miguel me lançou um olhar sarcástico.
- Talvez você pudesse me dizer isso.
Cruzei os braços em frente ao corpo, já sabendo para onde aquilo ia.
- Se veio aqui para falar sobre a ...
- Eu vim aqui para falar sobre você. – Me cortou.
Isso fez com que eu me calasse. Assim, em vez de responder de volta, esperei Miguel continuar. Ele o fez:
- Eu sempre soube que havia algo de estranho no seu namoro com a . – Disse. – E, embora eu ache ainda mais estranho que tenham terminado, não vou me meter nisso, porque ninguém me chamou nesse assunto.
Eu sempre soube que Miguel desconfiava de nós. Eu só não sabia se ele suspeitava de algo próximo da verdade. Ainda não dava para saber, apesar da presença dele ali.
- Mas estou aqui como um colega de profissão. – Ele continuou. – E como alguém que já ocupou o lugar que você ocupa agora na vida do Jack.
À menção do nome do Jack, eu inflei as bochechas, deixando transparecer como aquilo era importante para mim.
- O Jack sempre foi maluco pela filha. – Ele contou. – Eu me lembro dele carregando ela nos ombros, depois dos shows, quando ela era pequena, e do violãozinho que ela tinha. – Sorriu. – Eu sei que ele teria ensinado tudo o que sabe sobre música a ela. Era o que ele queria... Mas a foi tirada dele muito cedo.
Ficamos calados por um instante. Me lembrei da forma como Jack falava da filha, antes de ela chegar. Como se fosse um milagre tê-la de volta.
- E você apareceu antes que ela voltasse. – Continuou, pensativo. – Então, apesar de eu ter tido o Jack como um pai quando era garoto, de muitas formas foi você, com seu contrabaixo e sua boa vontade em cuidar daquele dálmata barulhento, quem preencheu o lugar que a filha deixou na vida dele.
Engoli em seco. – Eu não acho que...
- Não estou dizendo que você substituiu a . Ela é a filha dele, sempre vai ser. – Disse com firmeza. – Mas você também é muito importante para o Jack. Espero que saiba disso.
- Eu sei. – Falei em voz baixa, sabendo que ele estava sendo honesto, e não só tentando me convencer a voltar com tudo.
- E aproveito o gancho para te dizer que largar o trabalho agora é uma tremenda estupidez. – Miguel voltou a me encarar com severidade. – Você quer fazer música, ; nasceu pra isso. Não devia deixar nada te atrapalhar assim.
O que ele falou bateu forte em mim, mas não quis me estender no assunto.
- Obrigado por se importar, Miguel. – Eu disse, assentindo uma vez. – Mas eu ainda preciso de um tempo.
- Entendo. – Ele deu de ombros. – Bom, sabe que é bem-vindo para voltar quando quiser. Nos vemos por aí, babá de cachorro.
Miguel desceu as escadas e entrou no carro de Jack, e eu voltei para dentro de casa. Aquela conversa não tornava minha vida mais fácil.
- Filho?
Mamãe apareceu à porta, bem quando eu ia subir as escadas para o meu quarto.
- Mãe, o que está fazendo acordada? – Voltei. – Pensei que tivesse apagado enquanto lia.
- Eu me levantei para ir ao banheiro. Ouvi um pouco da sua conversa. – Admitiu. - Você terminou com a , não é?
Rolei os olhos, dando um suspiro.
- Mãe... Não devia se preocupar com isso. Pessoas namoram, pessoas se separam. Você se separou.
Ela fez uma careta.
- Desculpa. – Eu disse. – Eu não quis ser rude.
- Sei que não. – Ela sorriu. – Eu não quero me meter na sua vida, é só que... Eu estava tão feliz por você. – Mamãe enrugou o nariz, fazendo-me rir. – É sério. Eu sei que a separação entre eu e seu pai foi difícil pra você, e aí quando você namorou a Leslie e ela foi embora, achei que você pudesse ficar um pouco... Cético.
-... Eu sei separar as coisas.
- Sei que sim. Você separou bem melhor do que eu teria feito, na sua idade. – Concordou. – Mas mesmo assim, eu nunca tinha visto você gostar de uma menina como gosta dessa . Vocês não vão voltar?
Balancei a cabeça, não em negação, mas querendo que ela parasse, embora eu estivesse rindo.
- Tá, tudo bem. Chega desse assunto por ora. – Ela levantou as mãos. – Agora, estou com desejo de comer pipoca. Não quer nos acompanhar? – Tocou a barriga.
Suspirei e assenti, passando um braço por seus ombros e já caminhando.
- Vai ser ótimo acompanhar vocês.
[…]
Acordei com o corpo pesado e olhei para o relógio de ponteiro na parede. Eram duas da manhã.
Logo tudo que tinha acontecido no dia anterior me atingiu como uma avalanche. Jodi e Emma me odiavam. tinha ido embora.
Deixei que minha cabeça caísse de novo no travesseiro e fechei os olhos. Senti o choro vindo. Ele nunca tinha ido embora.
A verdade era que eu estava desesperada. Eu não sabia como remediar toda aquela situação, e não podia nem ao menos contar com as pessoas que mais gostava, porque todas estavam com raiva de mim.
Respirei fundo, limpei as lágrimas com a mão e peguei meu celular. Meus dedos digitaram o número que eu sabia de cor e depois clicaram no ícone verde.
- Alô? – Ela disse do outro lado.
- Mãe?
Senti a vontade de chorar voltando. Ouvir sua voz só me fez sentir mais sozinha. Ela estava tão longe, tão mais longe do que estivera durante toda a minha vida, e não só porque milhas e milhas nos separavam.
- ? – Ela repetiu, a voz mudando de entonação. – , filha, está tudo bem? Aconteceu alguma coisa?
Meu mundo está de cabeça para baixo, mãe. Eu não sei o que tenho que fazer.
Mas não foi isso que eu disse. Eu não podia dizer a ela tudo que tinha feito. Ela voltaria se soubesse. Ela se sentiria horrível, como eu.
- Eu só estou com saudade. – Falei o que era em grande parte verdade, fungando.
- Ah, filha... – Ela suspirou. – Eu estou com saudade também. Tanta.
Deu para perceber que mamãe ia começar a chorar também. Eu precisava desligar antes que ela fizesse mais perguntas, ou decidisse ligar para o papai depois para perguntar sobre mim.
- Já está tarde aqui. – Eu disse então. – Eu tenho que ir.
- Tudo bem. Boa noite, amor.
- Boa noite, mãe.
- E filha?
- Sim?
- Não importa o que esteja acontecendo, vai dar tudo certo.
Fiquei calada por um segundo.
- Obrigada, mãe. Eu te amo. – Respondi então.
Ela disse o mesmo e desliguei o telefone.
Permaneci sentada, pensando no que ela dissera. Mamãe podia não saber o que estava acontecendo, mas me dera o conselho que acreditava que ia ajudar, e tinha funcionado.
Tudo ia dar certo, eu ia resolver aquela situação. Eu tinha que conseguir.
Me deitei de novo, pensando no que poderia fazer. Eu tinha feito tanta coisa. Eu ia dar um jeito.
Mas a verdade era que eu estava tão cansada de planos. Eles tinham saído do controle, e por isso eu estava no fundo do poço agora. E tão cansada.
Por isso, em vez de ter mais uma ideia mirabolante, eu dormi.
Senti as lambidas na minha mão e abri os olhos devagar. Senti a textura da cama, o travesseiro ainda úmido sob meu rosto. O sol já iluminava o quarto.
- Oi, Stevie. – Murmurei.
O cachorro abanou o rabo, cheirando minha mão. Afaguei sua cabeça.
- Desculpe não ter te dado atenção ontem. – Falei. – Não foi um bom dia para mim.
Stevie inclinou a cabeça de lado. Os humanos deviam parecer tão esquisitos para ele.
Me sentei na cama e esfreguei o rosto. Estava na hora de sair e enfrentar as coisas.
Depois de ir ao banheiro, desci as escadas e fui para a cozinha. Papai estava lá, fritando panquecas.
- Docinho. – Ele sorriu torto. – Como se sente?
Suspirei e dei de ombros, indo me sentar. Em meu desespero do dia anterior, eu tinha contado a papai sobre a matéria forjada de Perry Gold e que eu e tínhamos brigado. E, embora não tivesse falado sobre tudo que havia por trás disso, contar pelo menos aquelas coisas a ele já tinha me feito me sentir muito melhor.
- Chateada ainda. – Admiti. – Mas vou resolver tudo hoje, eu espero.
- Sei que vai. – Ele assentiu. – Você é uma Vicentini. As mulheres da sua família não deixam pedra sobre pedra.
Sorri para ele, e então Miguel entrou na cozinha. Sem dizer nada a princípio, ele se aproximou e beijou o topo da minha cabeça. Depois foi até a bancada, colocou duas panquecas em um prato e o entregou a mim.
- Então, você vai falar com esse tal de Gold ou eu vou? – Ele me perguntou, se servindo de uma xícara de café.
- Não se preocupe, Miguel, essa é minha função como pai dela. – Papai disse sério. – Esse garoto vai ter que se retratar publicamente. O que ele fez foi muito errado.
- Vocês não precisam se meter nisso. – Balancei a cabeça. – Do jeito que gostam de uma fofoca, quando as pessoas souberem que vocês fizeram o Gold pedir desculpas, tudo que iam pensar era em como eu sou tão malvada que fiz meu pai famoso e seu capanga latino ameaçarem um pobre repórter adolescente. – Bufei. Eles se entreolharam, sabendo que era verdade. – Eu vou enfrentar o Perry, sim. Mas o que realmente importa para mim é que Jodi, Emma e Summer acreditem em mim. E isso eu posso fazer sozinha.
Depois de alguns instantes, Miguel assentiu.
- Está bem. – Disse. – Mas se mudar de ideia, só precisa me dizer.
Assenti, agradecida.
- E quanto ao ? – Papai quis saber.
Bati o garfo no prato, depois comecei a comer as panquecas.
- Eu vou resolver as coisas com ele também.
A atenção era muito pior agora do que antes. Parecia que havia uma placa vermelha colada na minha testa dizendo TRAIDORA. Eu só continha o impulso de me encolher feito uma criancinha amedrontada porque isso me faria parecer culpada. Então levantava a cabeça e fazia o possível para não olhar para ninguém que não me cumprimentasse.
Quando entrei na aula de Economia Doméstica, já estava sentado à bancada. Ele tamborilava os dedos nela, ansioso. Quando me viu, ele ficou de pé. Ajeitei a mochila nas costas e me juntei a ele.
- Como você está? – Ele perguntou, a voz preocupada.
Dei de ombros, me sentando.
- Nem melhor, nem pior. – Respondi. – Mas mais calma.
bufou, se sentando de novo. Ele se inclinou para mais perto.
- Eu só não peguei o Gold ainda, porque sabia que isso só ia começar novos boatos. – Disse sério. – Mas se você quiser, eu vou atrás dele ainda hoje e faço ele reescrever aquela porcaria do jeito certo.
Honestamente falando, eu fiquei impressionada. sabia que enfrentar Perry Gold geraria um tumulto que podia acabar com as chances dele com Summer. Eu não tinha imaginado que ele arriscaria tanto por mim.
- Não precisa. – Sorri um pouco, balançando a cabeça. – Obrigada. Tudo que eu quero é falar com a Jodi.
assentiu, ficando calado. Olhei para ele de novo, abismada.
- Você faria mesmo isso? – Perguntei. – Se arriscaria a arrumar uma briga com o Gold por minha causa?
ficou olhando para mim em silêncio, mas antes que ele dissesse qualquer coisa, a senhora Turtle entrou na sala e começou a aula. Ele não respondeu, e não tocamos mais no assunto. Acho que, no fundo, Junior estava se questionando tanto quanto eu.
Nos despedimos no fim da aula e eu segui para o meu armário para pegar outro livro. Continuava evitando os olhares, os sussurros. Algumas pessoas, no entanto, continuavam me cumprimentando alegremente, como se, ou não acreditassem no que acontecera, ou realmente não se importassem.
Estava me lembrando de que ainda tinha que falar com Perry Gold sobre o que ele tinha feito, quando alguém falou comigo. Para minha surpresa, era Maya Burnes, dos pés tortos, de quem eu tomara o lugar na torcida.
- Maya? – Falei, achando estranho ela aparecer justo naquele momento.
- Eu te assustei? – Ela riu um pouquinho.
- Não, eu só... Faz tempo que eu não te vejo.
Maya tinha o cabelo quase todo solto, exceto por duas tranças que se encontravam na parte de trás. Reparei que seu pé não estava mais enfaixado, e por alguns instantes me perguntei por que então ela ainda não tinha voltado à equipe, mas não falei nada.
- É, eu andava meio ocupada levando minha vida longe das animadoras. – Ela disse. – Mas a notícia de ontem me fez parar e dizer: UAU.
Mais uma, pensei.
- Olha... – Comecei.
- Relaxa. – Ela sorriu. – Eu só queria te oferecer meu apoio. O que o Perry Gold fez foi horrível. Aposto que ele inventou tudo.
Eu não podia acreditar na gentileza da Maya. Nós nunca nem tínhamos conversado de verdade. Eu estava grata agora por saber que alguém mais acreditava em mim.
Mas então, a garota começou a rir loucamente. De cara, eu fiquei confusa. Maya se curvou, tentando recuperar o ar.
- Ah, meu Deus, quem eu quero enganar? – Ela me olhou através das lágrimas de riso. – Eu estou adorando tudo isso! ADORANDO!
- Eu não estou...
- Nem se preocupe em explicar! Você pensa que eu me importo? – Maya gargalhou.
Eu estava absolutamente embasbacada com aquela cena. Ela continuou:
- Aquela estúpida da Slaterton bem merece o que está acontecendo! Primeiro ela quebrou meu tornozelo; o que provavelmente foi de propósito, só para colocarem você no meu lugar! – Acusou. – Tudo com a ajuda daquela troglodita com quem ela anda.
Estava muito disposta a contestar a acusação, mas Maya não parava mais de falar. Ela estava completamente fora de si.
- E estava tudo bem, porque eu ia voltar, porque a vaga era MINHA. – Berrou. – Mas aí elas me expulsaram! Aquelas duas e a vaca metida da Summer Olsen votaram contra sua saída depois que eu me recuperei e tentei voltar para a equipe!
Eu fiquei estática. Eu não sabia daquilo – nenhuma das três tinha me contado. Eu não fazia ideia de que tinha havido uma votação, de que eu estava oficialmente no lugar de Maya. Dava para entender por que ela estava tão chateada.
- Maya, me desculpe, eu não... – Tentei dizer, mas ela não deixou.
- Corta essa, Pie! – Ela bufou. A essa altura, quase todos no corredor estavam acompanhando a discussão. – É óbvio agora que você sempre teve tudo isso planejado! Você já conhecia o Junior , se aproveitou disso para ficar amiga da Olsen, usando aquelas duas muletas feiosas no caminho, e agora conseguiu chegar ao topo da pirâmide social adolescente! E depois de aquelas garotas patéticas terem feito tanto por você. – Balançou a cabeça, rindo. – Eu me sinto vingada pelo cosmos.
Eu estava me sentindo tão mal, mesmo sabendo que eu não tinha realmente dito todas aquelas coisas para Perry Gold. Então Sienna apareceu, furiosa.
- Maya, o que você está fazendo? – Ela agarrou o braço da prima. – Venha comigo AGORA.
- Me solta! – A menina se sacudiu. – Isso é tudo culpa sua também! Não serviu nem para me defender daquelas idiotas.
Sienna olhou para os lados, envergonhada, e respirou fundo.
- Foi mal, . – Disse. E saiu puxando a prima para longe.
Eu fiquei ali, parada, meu coração acelerado. Olhei em volta. Quase ninguém tinha seguido seu caminho, continuavam ali, olhando para mim. Senti enjoo. E então saí correndo para o banheiro.
Empurrei a porta com força, ofegante. As duas garotas que estavam lá dentro saíram apressadas, talvez pensando que eu era mesmo má e cruel. Abri a torneira e joguei água fria no rosto, esperando que isso melhorasse em alguma coisa. A voz que ouvi chegou a mim antes que eu me desse conta de que alguém tinha entrado.
- Eu só vou perguntar isso uma vez e eu quero que fale a verdade. Disse mesmo tudo aquilo a Perry Gold?
Eu encarava o espelho à minha frente, onde via Summer, parada em uma postura rígida, segura, atrás de mim.
- Não. – Eu disse com firmeza. – Mas é claro que não!
Ela deu um suspiro pesado, mas que me pareceu ser de alívio.
- Como foi que tudo aquilo foi parar no jornal com o seu nome então?
- Perry apareceu logo depois que vocês me deixaram em casa, na segunda-feira. – Me virei para ela, nervosa por querer que ela acreditasse em mim. – Ele disse que estava fazendo uma reportagem com as candidatas à Rainha, pediu para me fazer algumas perguntas. – Balancei a cabeça. – Eu nunca falei mal de vocês, mas ele distorceu todos os elogios que eu fiz para parecer que eu era uma megera!
- É, o Perry é bom nisso. – Ela recostou na parede e encarou o teto, pensativa.
- E por que não disse isso a Jodi?! – Deixei transparecer todo meu desespero.
- Eu a lembrei disso, mas a verdade é que aquilo foi muito estranho! – Ela exclamou. – A reportagem tinha coisas muito pessoais. A história da mãe da Jodi...
- Eu não contei aquilo para ele, eu juro. Não faço ideia de como ele soube.
Summer ficou me encarando, pensativa. Talvez pensando se ia acreditar ou não.
- Eu acredito em você. – Disse por fim. – Mas a Jodi não.
Meus ombros caíram e respirei fundo. Eu podia ter feito muitas coisas, mas tinha gostado verdade da Jodi desde meu primeiro dia na cidade. Me deixava triste saber que ela não acreditava em mim.
- Não fica chateada com ela por isso, ok? – Summer se aproximou, colocando a mão no meu ombro. – A experiência da Jodi na escola não é como a nossa. Ela é o tipo de garota que passou a vida sendo ignorada ou feita de boba pelos outros por ser boazinha demais, e agora que tudo está dando certo, ela só tem a sensação de que foi feita de trouxa de novo. E ela gosta tanto de você.
Pensar por aquele lado me fez sentir menos pior, mas preocupada com Jodi do mesmo jeito. Não queria que ela pensasse que eu era uma babaca. Não queria que ela estivesse passando por nada daquilo.
- Você fez bem em não ir atrás dela ontem. – Ela disse. – A Jodi precisa de um tempo. Acho que hoje ela já está mais calma, mas esses urubus da Jacksonville High não vão deixar nenhuma de nós em paz. Por que não tenta ir a casa dela mais tarde?
Assenti, me sentindo melhor por poder falar com alguém.
- Obrigada, Summer. – E a abracei.
- Amigas são para essas coisas.
E ela estava certa. Éramos amigas. Apesar de tudo que havia por trás.
Sobrevivi melhor aos olhares maldosos depois de minha conversa com Summer. É claro, eu estava mais sozinha do que nunca. não estava falando comigo – a bem da verdade, eu mal tinha visto ele naquele dia –, me odiava, e eu não queria expor Jodi a uma situação ainda pior, de modo que preferi não me sentar à mesa com eles. Também, não estava com fome. Fui me sentar na arquibancada no horário do almoço e fiquei ali até que acabasse, olhando para o nada e pensando.
Quando ele acabou, eu estava de volta aos corredores, rumando para minha sala de aula. Mas quando passei em frente à sala do jornal da escola, senti meu sangue ferver. Dei meia volta e abri a porta. Eu tinha que enfrentar aquela situação.
Perry estava sozinho na sala, lendo alguma coisa em um canto. Seus olhos se levantaram quando entrei.
- Pie. – Ele disse. – Eu soube da comoção que a matéria causou. Esse pessoal é maluco.
- Por que você fez aquilo? – Me aproximei, séria. – Por que mentiu daquele jeito? Eu não disse nada daquilo!
- Quanto a isso, há controvérsias. Você disse basicamente tudo que foi para o jornal. Eu só enfeitei um pouco as coisas.
Minhas mãos estavam tremendo de raiva. Eu podia arrebentar a cara dele ali mesmo.
- Você é um desgraçado. – Insultei-o. – E eu nunca disse nada sobre a mãe da Jodi. Como foi que soube daquilo?
Perry deu de ombros.
- Isso é segredo de estado.
Olhei bem para aquele imbecil, pensando se no fim das contas deveria deixar Miguel ir até a casa dele aterrorizá-lo ou não. Concluí que não. De fato, isso só pioraria as coisas. E o que realmente me importava era o que minha amiga pensava de mim.
- A Jodi não merecia o que você fez. – Eu disse apenas.
Assim, saí dali e bati a porta atrás de mim, dando uma última encarada em Perry Gold através do vidro. Ele me olhava intrigado.
Quando cheguei em casa, não havia ninguém – Papai e Miguel tinham ido ao Roger's. Então larguei minha mochila no chão do corredor mesmo e saí porta afora, com Stevie nos meus calcanhares. Atravessei o parquinho decidida a falar com Jodi e pedir desculpas, mas quando cheguei à rua dela, a casa dos Slaterton estava toda fechada. Talvez fosse um sinal de que eu deveria esperar mais um pouco, mas disse a mim mesma que voltaria mais tarde.
Eu e meu cachorro voltamos para casa, e enquanto ele brincava com um osso de borracha, comecei a fazer o jantar. No dia anterior tinha deixado tudo de lado por conta do meu desespero, mas não queria deixar papai e Miguel preocupados demais comigo, e, além disso, cozinhar me ajudava a esvaziar a cabeça.
Depois de deixar tudo pronto, subi para tomar um banho, e quando desci papai já tinha chegado.
- Oi, querida. – Ele disse. – Como está?
- Bem melhor. – Sorri um pouco. – E o Miguel?
- Já está vindo. Eu só voltei para jantar, mas hoje é a noite de folga dele. – Explicou. – Falou com a Jodi?
- Ainda não, mas vou tentar fazer isso agora. – Respondi calçando os chinelos.
- Não vai jantar?
- Talvez depois. – Fui para a porta. – Para ser sincera, estou ansiosa demais para comer qualquer coisa.
Saí de casa e olhei através do parquinho. As luzes na casa dos Slaterton estavam acesas, então ela devia estar em casa agora. Segura, respirei fundo e caminhei decidida até lá. Toquei a campainha e esperei.
- Vamos, Jodi. – Murmurei para mim mesma.
Tive que tocar de novo, mas, por fim, a porta se abriu. A senhora Slaterton abriu levemente a boca ao me ver.
- Boa noite, senhora Slaterton. – Falei. – Eu posso falar com a Jodi?
O rosto da mãe de Jodi então se transformou. O olhar ficou feroz como de costume. Ela se empertigou toda para dizer:
- A Jodi não pode atender agora. Ela está ocupada.
Senti nas palavras dela que estava mais contrariada com minha presença do que de costume.
- Jodi! – Ouvi a voz de Di, a irmãzinha dela.
Vi a garotinha atrás da mãe, batendo à porta do corredor.
– Jodi, abre essa porta! – Dilly berrava, como sempre. – Quero minha bola. Por que você está trancada feito uma pateta?
A senhora Slaterton virou-se furiosa.
- Dilly, vá para o seu quarto!
- Mas, mãe...
- AGORA.
A pequena Dilly bufou, desaparecendo em outro cômodo. A senhora Slaterton voltou a olhar para mim, sabendo que eu sabia o que estava acontecendo.
- Com licença. – Ela disse antes de fechar a porta na minha cara.
- Tá. – Eu disse baixinho, depois que ela já tinha me deixado ali.
Se ela já me detestava antes, agora devia querer que eu caísse de um penhasco.
Engoli a frustração de não conseguir falar com Jodi porque ela obviamente não queria falar comigo ainda. Tentei levar numa boa. Eu resolveria aquela situação com ela, mesmo que levasse alguns dias.
Respirei fundo e dei meia volta para casa.
O carro estava parado no quintal, e imaginei que Miguel já tivesse chegado. Ia me juntar a eles para o jantar, mesmo sem fome. Tinha que levar as coisas bem.
Mas quando entrei na sala, Miguel estava colocando o contrabaixo encapado nas costas, e papai estava vestindo o casaco.
- Miguel? – Eu o encarei sem entender. – Não é sua noite de folga hoje?
Miguel olhou para papai de um jeito indagativo e ele deu de ombros. Depois, virou-se para mim.
- Era sim... Mas vou precisar substituir o .
Olhei para papai, que foi logo se apressando em dizer:
- Sabe que geralmente eu não chamo o para trabalhar no meio da semana, por causa da escola; mas ele mesmo pediu na semana passada, então tínhamos mudado o arranjo do piano para o contrabaixo, e por isso Miguel estava de folga.
- E por que o não vai tocar? – Insisti.
Miguel ergueu as sobrancelhas e coçou a cabeça, depois levantou as mãos para o alto como se passasse a bola para papai.
- É que o decidiu... Se afastar da banda por um tempo.
Se meu queixo pudesse cair de verdade, ele teria caído. Eu não estava acreditando naquilo. Só podia ser brincadeira. Ele não podia me odiar tanto a ponto de largar o trabalho com meu pai daquele jeito.
Papai e Miguel mantiveram uma distância cautelosa enquanto eu processava a informação.
- Rainbow... – Papai deu um passo à frente então.
- Não me chama assim agora, pai. É sério. – Engoli em seco.
- Tudo bem. – Ele recuou. – Olha, sei que vocês vão se entender logo.
- Sabe mesmo? – Ri com sarcasmo. Eu ainda não estava acreditando. E de repente, estava muito irritada também.
Saí a passos firmes rumo ao andar de cima.
- ! – Miguel chamou.
- Eu estou bem! Podem ir! – Gritei de volta.
Fechei a porta atrás de mim e peguei o celular de cima da cômoda. Disquei tão rápido que meus dedos quase tremiam.
O telefone chamou mais do que de costume. Ele devia estar decidindo se me atenderia ou não. No fim, acabou atendendo.
- O que foi? – A voz veio de encontro a mim.
- O que foi? – Repeti. – , eu entendo que esteja com raiva de mim, mas isso já é ridículo!
- Se está falando de eu ter largado a banda, você pode ser tão autocentrada para me ligar achando que eu fiz isso por sua causa!
- Eu sei que foi!
- Primeiro com quem eu falo, e agora isso? – Ele bufou. – Por que não para de tentar controlar minha vida para variar?
- Não é por mim que estou ligando. É pelo meu pai. E por você. Porque essa estupidez não faz sentido algum! – Exclamei. – Não pode largar o seu trabalho só porque me odeia.
- Não é por você. – Ele disse sério. – E agora, se já acabou, eu tenho que ir.
Fiquei encarando o telefone depois de já ter desligado. Depois, irritada, o joguei com força na cama.
Me sentei no chão e fiquei ali, tentando colocar meus sentimentos no lugar, até que meu celular começou a tocar. Por um segundo, imaginei que poderia ser o , disposto a conversar comigo direito. Subi na cama num pulo.
Mas quando olhei o visor, não era ele. Era o .
Frustrada e cansada, atendi a ligação.
- Alô?
- Ei, Vicentini. – Ele disse. – Como estão as coisas?
- Honestamente, , estão péssimas. – Confessei.
- Talvez se distrair ajude. – Ouvi o sorriso em sua voz. – Eu estava ligando para isso mesmo. Queria saber se não quer sair para comer alguma coisa comigo.
- Desculpa, mas não vai dar. – Dispensei. – Eu preciso mesmo descansar. Me preparar para amanhã, um novo dia no lugar onde todo mundo me odeia.
- Nem todo mundo. – Ele riu. Eu sorri. – Mas tá bem. Eu te vejo amanhã então.
- Obrigada por tentar ajudar, . Até amanhã.
Desliguei o telefone e encarei o teto, depois, cobri o rosto com o travesseiro e xinguei.
Uma bagunça fora de controle. Era isso que tudo tinha virado.
POV
- Não é por você. – Eu disse com firmeza. – E agora, se já acabou, eu tenho que ir.
Quando ela não disse nada, eu desliguei. Me levantei da cama e, irritado, joguei o telefone nos travesseiros.
me olhou de um jeito precavido. Ele sabia que talvez não fosse uma boa hora para falar. Mas, como era o , falou mesmo assim:
- Mas, na verdade, meio que é sim, não é?
Olhei bem para ele por alguns instantes, então inflei as bochechas e me joguei na poltrona da varanda.
- , eu estou com muita raiva. – Falei com sinceridade. – Mas não saí do trabalho só por isso. Eu saí porque se estiver trabalhando com o Jack, vou ter que encontrar ela o tempo todo. E agora eu preciso de um tempo.
- Mas e quanto a esse negócio da Jodi e das meninas? – Ele insistiu, ansioso. – Não acha mesmo que foi ela, né?
- Não importa agora, eu não vou me meter nisso. Passei os últimos meses da minha vida vivendo os problemas da , . Desse, ela vai ter que cuidar sozinha. – Disse com firmeza. – E por que raios você está insistindo tanto? Você sempre foi o primeiro a me lembrar que a é maluca. Pensei que ia achar bom eu dar um tempo nisso tudo.
- Eu acho. – Ele disse rápido. Então, coçou o queixo. – Mas...
- , a me colocou nessa mentira absurda sem me pedir, e eu aceitei. Ela decidiu prolongar a farsa sem falar comigo antes, e eu também aceitei. Me fez mentir para minha melhor amiga de infância. Me fez mentir para minha família. Me fez mentir para o Jack. Para a cidade inteira. – Acentuei a palavra. – E eu aceitei tudo, porque eu... Porque eu me apaixonei por ela no segundo em que a vi. – Admiti. – Mas ela me prometeu que não me meteria em mais nenhuma das loucuras dela. Essa era a condição mais importante. E aí ela ameaça uma garota que supostamente está interessada em mim e ainda coage ela a nunca me contar? Pode parecer que não é exatamente o que ela fez, mas na verdade é. Ela interferiu na minha vida sem minha permissão. De novo. – Bufei, irritado. – Eu teria me afastado da Rosana de qualquer jeito. Eu não queria nada com ela. Mas a fez tudo virar uma tragédia grega, porque é isso que ela faz. Porque, depois de tudo que eu fiz, ela ainda consegue desconfiar de mim, mas acha que pode ser amiga de Junior como se nada tivesse acontecido.
ficou calado, pensativo. Ele olhou para mim e passou as mãos pelo queixo.
- Você está certo. – Ele disse então. – O melhor que faz é se afastar um pouco dela. Até porque, nunca se sabe quando outra bomba vai explodir.
Ergui uma sobrancelha, confuso.
- Como assim?
arregalou os olhos.
- Nada, eu não quis dizer nada! – Deu de ombros. – É só que, com a , nunca se sabe. Vocês precisam desse tempo. – Bateu de leve nas minhas costas.
Assenti, como se concordasse. Mas a verdade é que, mesmo depois que mudamos de assunto, continuei com a sensação de que ele estava guardando algo para si.
POV PIE
Acordei de manhã com o despertador fazendo um escândalo ao meu lado, e só por isso, porque a verdade é que eu estava dormindo profundamente. Era bom que eu tivesse dormido bem, na verdade, porque assim meu corpo tinha relaxado da tensão do dia anterior. Agora eu estava melhor e mais bem-disposta a resolver tudo que precisava.
- De hoje não passa. – Falei para mim mesma, levantando da cama.
Me vesti, desci e tomei o café-da-manhã. Papai ainda não tinha levantado, porque ele e Miguel tinham chegado tarde noite passada, e nosso inquilino dormia um sono pesado no sofá.
Quando estava colocando a mochila nas costas, ouvi uma tosse. Meu pai apareceu usando um roupão colorido, a mão na boca.
- Bom dia, pai. – Falei.
- Bom dia, Rain... Filha. – Ele se corrigiu. – Parece... Animada.
- Determinada, pai. De hoje não passa. Vou falar com a Jodi Lyn.
- Bom, boa sorte. – Ele estendeu a mão, que eu apertei com carinho. – Vou comer alguma coisa e voltar para a cama. Estou exausto.
Saí de casa com passos firmes. Dessa vez eu ia conseguir.
E depois... Depois o . Eu resolveria o que quer que estivesse acontecendo entre nós dois... Se eu conseguisse falar com ele.
Preferi pagar passagem do que ser devorada dentro do ônibus escolar. Mesmo sabendo que não dava para fugir eternamente, era bom ter um segundo de paz. Eu pensei com cuidado em como falaria com Jodi. Em como pediria desculpas.
Desci do ônibus a alguns metros da escola e caminhei até a entrada. Pela a sorte que eu nem acreditava mais ter, Jodi estava a poucos metros do portão. Ela conversava com algumas garotas, a mochila verde-água e rosa nas costas. Era minha chance.
- Jodi! – Fui logo chamando enquanto me aproximava do grupo.
As garotas se cutucaram. Jodi olhou para trás, demonstrando primeiro surpresa. Depois, ela fechou a cara.
- Estava demorando. – Ela disse.
- Jodi, a gente precisa conversar. – Falei. – Por favor. Você precisa me ouvir.
Jodi cruzou os braços em frente ao corpo, indecisa. Depois de alguns segundos de agonia, ela meneou a cabeça.
- Tudo bem. – Disse, e olhou para as meninas. – Vejo vocês depois.
Elas se afastaram, com certeza já fofocando. Jodi e eu também saímos dali, andando alguns passos para longe dos outros alunos, mas ainda em um local onde eu estava certa de que a maioria deles estava nos vigiando.
- Você tem dois minutos. – Jodi disse.
- Jodi. – Me apressei. – Eu não falei nada, nada, nada daquilo para o Perry Gold.
- Você está sofrendo de dupla personalidade então? Porque lá no refeitório você disse que tinha falado.
- Mas não foi daquele jeito! – Exclamei frustrada. – É muito diferente do que parece...
- A Maya Burnes disse que você diria isso quando apareceu na minha casa tirando sarro de mim! – Jodi estava nervosa agora.
- A MAYA BURNES É MALUCA! – Tentei fazê-la entender. – Eu não fiz porcaria nenhuma pensando em ser Rainha. Eu nunca quis ser Rainha. Eu ainda não quero.
Jodi olhou para mim, uma expressão de indecisão no rosto. Então ela abriu a boca para dizer alguma coisa, mas antes que ela respondesse, ouvimos um barulho infernal.
- Mas o que é isso? – Ela perguntou.
Apitos, música e uma gritaria para lá de irritante invadiram o terreno da escola, seguindo o grupo de líderes de torcida que dava cambalhotas e carregava letras enormes em cartazes.
- ? – Jodi leu. E eu também, para ter certeza de que ela não tinha lido errado.
Mas era isso mesmo que diziam as letras. .
- Pie para Rainha! – Elas diziam alegremente, acenando para os outros alunos, que assistiam tudo surpresos.
Não mais que eu.
Especialmente quando me dei conta de que à frente do animado grupo iam e Amber, usando os uniformes do time e sorrindo para todos.
Mas que porcaria era aquela?
- Não quer ser Rainha. – Jodi repetiu com escárnio, encarando a cena. – Então por que Junior e Amber Hayley estão fazendo um show de marketing no seu nome?
- Jodi. – Eu disse devagar, totalmente em estado de choque. – Eu não faço ideia de onde isso aí saiu.
- Estou cansada desse argumento! – Ela exclamou enfurecida. – Jasmine pode ser uma bruxa, mas pelo menos ela assume as coisas que faz. Boa sorte na sua campanha.
Jodi saiu marchando dali para o interior do prédio, e eu, depois de uns bons instantes tentando processar aquele circo, também saí. Mas minha direção foi outra: .
O miserável abriu um enorme sorriso ao me ver. Percebi que havia uma faixa em sua testa onde se lia QUEEN PIE.
- Aí está ela! – Ele exclamou.
- MAS QUE PORCARIA É ESSA, ? – Perguntei puta da vida, só me lembrando depois que os outros alunos estavam de olho em nós.
Mas nem ligou para meu mau humor.
- Você estava tão triste com tudo o que tinha acontecido e com como todo mundo te odiava que eu pensei que devia fazer alguma coisa para te fazer se sentir melhor. Falei com a Hayley e aqui estamos nós, fazendo com que todo mundo volte a te amar.
- Minha tristeza real era porque a JODI estava irritada comigo, e agora graças a vocês ela me ODEIA!
Eu estava tão furiosa que poderia matar aqueles dois ali mesmo. Amber saltitou para perto de nós.
- Não fique preocupada com a Slaterton. – Ela disse em tom entediado, acenando para os outros. – O que você acha, que ela vai retirar a candidatura porque vocês estão de mal? Não seja boba. Isso é uma GUERRA.
Soltei o barulho mais parecido com o grunhido parecido com o de um cão prestes a atacar, bufando de raiva, e passei a mão pelo cabelo.
- Eu vou matar vocês! – Exclamei, pensando então em Summer, que àquela hora estava assistindo o ex ou atual namorado, ou o que fosse, fazendo campanha para outra garota. – E a campanha da Summer? Ela é a líder das líderes de torcida!
- Olsen não precisa de campanha. As pessoas já amam ela. – Amber deu de ombros. – Além disso, ela já ganhou antes. Para que precisa de outra coroa?
Cobri o rosto com as mãos. Se tivesse uma parede por perto, teria batido a cabeça nela até desmaiar.
- Ah, para de se preocupar tanto com tudo! – botou as mãos nos meus ombros. – Você não fez realmente nada, e a Slaterton, como sua amiga, deveria saber disso. Além disso, todo mundo sabe que você nem precisava detonar a imagem dela para vencer esse negócio. Ela nunca teve chance contra você e a Summer.
Só de imaginar os efeitos daquele show, eu já estava pirando. Fechei os olhos e respirei fundo, tentando não enlouquecer de uma vez.
- Por que não tira uma foto com a gente? – Amber sugeriu, já me puxando e encostando a bochecha na minha. Junior ficou do outro lado, sorrindo. – É para a campanha.
O flash quase me cegou. Eu não consegui fugir deles até que o sinal finalmente tocou.
Tive que esperar uma vida até que aquele dia acabasse. A escola agora estava dividida entre aqueles que sorriam e bradavam " Pie para Rainha!" quando me viam, e aqueles que torciam o nariz ou pareciam ter medo de mim.
Eu tinha tentado de todas as formas fazer com que – Amber eu sabia que seria impossível – entendesse que eu não estava nada feliz com aquilo, mas ele estava certo de que minha raiva ia passar. Além disso, ele insistia que era muito injusto eu ter minha primeira candidatura arruinada por causa de um boato mentiroso e queria a qualquer custo reverter os efeitos disso. Eu honestamente achava que fazendo campanha para mim só ia aumentar as porcarias dos boatos.
Eu estava escondida atrás de um muro, esperando que a grande maioria dos alunos entrasse no ônibus escolar, no fim daquela tarde, quando vi Summer passando em direção ao estacionamento. A loira estava sozinha, e eu a segui até estarmos quase no lugar certo.
- Summer! – Chamei em um tom reduzido.
A garota olhou para trás e ergueu a mão em aceno. Corri na direção dela e a puxei para o carro de uma vez. Confusa, Sum entrou pela porta do motorista, e eu na do carona.
Apesar de eu não dizer nada a princípio, Summer sem dúvida sabia por que eu estava ali. Ela também não disse nada, mas ergueu uma sobrancelha.
- Eu não tive nada a ver com aquilo. – Eu disse então. – Eu cheguei bem cedo para falar com a Jodi, e aí o pessoal apareceu com cornetas e cambalhotas, mas ninguém me perguntou antes.
- Ah, ... – Summer encostou a cabeça no volante. Depois de um segundo, ela virou para mim e começou a rir.
- Não tem graça nenhuma. Jodi me odeia ainda mais.
- Eu sei. Desculpe. – Ela parou. – Se a situação fosse diferente, eu seria a primeira a propor uma campanha surpresa para você, você gostando ou não. Para você e para Jodi Lyn. – Suspirou. – Mas não foi ideia minha. Foi o Junior, não foi?
Eu me calei, sem saber bem como explicar aquilo. Summer não disse nada. Recostou a cabeça no banco e olhou para frente.
- Tá tudo bem. – Ela disse então, mas estava pensativa. – Não estou chateada, vocês são amigos. Embora isso só tenha piorado as coisas.
- Sim. – Recostei no banco também. – Eu bem que tentei parar ele e a Amber.
- Não perca seu tempo. – Avisou. – E o , como está reagindo?
Dessa vez, fui eu quem deu um longo suspiro.
- e eu não conversamos sobre isso. Nós estamos... Brigados.
- Sério? O que houve? – Summer se surpreendeu.
- Houve... Eu. – Dei de ombros, deprimida. – Um monte de problemas. Quase todos por minha culpa.
Embora, é claro, eu estivesse sendo generosa comigo. Eram todos por minha culpa.
Mas Summer não disse nada sobre o assunto. Era engraçado como as coisas funcionavam entre nós duas. Nós respeitávamos os problemas uma da outra quase de forma solene, ainda que fosse lógico ela se meter, porque era o grande amigo dela, no fim das contas.
- Mas vai ficar tudo bem. – Foi o que ela disse, e não pareceu que falou com o intuito de me consolar, mas porque acreditava realmente nisso. – O que vocês têm é bom. Vocês gostam um do outro de verdade.
E eu não disse mais nada, mas senti que ela estava dizendo tudo aquilo em uma silenciosa comparação ao seu namoro com Junior.
Summer me deixou em casa. Eu acenei enquanto ela se afastava, pensando na forma como tinha falado no estacionamento. Pensando em tudo que estava acontecendo e em como todos nós tínhamos chegado àquele ponto. E eu só estava ali há três meses.
Entrei em casa e coloquei a mochila no chão do corredor.
- Cheguei! – Eu disse em voz alta.
- Querid... – A resposta foi interrompida por uma crise de tosse violenta.
Adentrei a sala seguindo a voz. Apesar do calor da tarde, Jack usava um casaco. Ele sorriu para mim, ainda se recuperando do ataque de tosse.
- Pai? – Falei preocupada. – O que é isso?
- Ah, filha, é só uma... – Ele tornou a tossir, me deixando mais aflita. - Uma tosse. Eu preciso de um copo d'água.
Papai se levantou, mas parou, como se tivesse ficado fraco de repente.
- Deixa, eu pego pra você. – Toquei seu ombro e fiz com que ele se sentasse.
Peguei um copo de água no filtro, pensando em como eu já o tinha ouvido tossir aquela semana, mas pensei que fosse uma alergia casual, como as que eu tinha às vezes. Mas ele estava com frio agora, então podia estar com febre, uma gripe talvez.
Voltei e me sentei ao seu lado, esperando enquanto ele bebia a água toda de uma vez.
- Ah, que delícia. – Ele fechou os olhos e recostou no sofá. – Muito melhor que Vodca.
Dei risada, colocando a mão em sua testa.
- Está com um pouco de febre, pai. – Observei. – Vou lá em cima pegar um remédio para você, e depois o senhor vai tomar um banho enquanto eu faço uma sopa.
- Vocês brasileiros gostam tanto de sopas! – Fez careta. – Não precisa disso, filha. E, aliás, de onde saiu esse remédio?
- Jack, eu sou filha de Jaqueline Vicentini, tem remédios pela casa toda. – Ergui as sobrancelhas e ele riu um pouquinho, voltando a tossir. – Me obedeça. Depois vou pedir ao Miguel para comprar um xarope.
Papai fez uma cara de quem achava exagero, mas assentiu. Afinal de contas, ele sabia que eu estava certa.
- E quanto ao ? Você não tinha que falar com ele? – Questionou, mas eu balancei a cabeça.
- Hoje não. – Falei, sorrindo. – Hoje eu vou ficar com meu pai.
Jack sorriu de volta, carinhosamente, e eu subi as escadas atrás do remédio.
POV
Eu estava lavando os pratos do jantar, quando a campainha tocou. Mamãe já tinha ido dormir. Ela dormia cada vez mais cedo, conforme a gravidez avançava. O bebê na barriga dela devia ser bem preguiçoso.
Fui atender a porta, e engoli em seco quando dei de cara com Miguel.
Depois de um único segundo, no entanto, parei de sentir medo dele. Embora soubesse, é claro, que ele podia socar minha cara por ter brigado com a e largado o emprego. Parece que eu estava muito mais seguro do que estava fazendo do que pensava.
- Oi, . – Ele disse.
- Miguel. – Assenti. – Aconteceu alguma coisa?
Miguel me lançou um olhar sarcástico.
- Talvez você pudesse me dizer isso.
Cruzei os braços em frente ao corpo, já sabendo para onde aquilo ia.
- Se veio aqui para falar sobre a ...
- Eu vim aqui para falar sobre você. – Me cortou.
Isso fez com que eu me calasse. Assim, em vez de responder de volta, esperei Miguel continuar. Ele o fez:
- Eu sempre soube que havia algo de estranho no seu namoro com a . – Disse. – E, embora eu ache ainda mais estranho que tenham terminado, não vou me meter nisso, porque ninguém me chamou nesse assunto.
Eu sempre soube que Miguel desconfiava de nós. Eu só não sabia se ele suspeitava de algo próximo da verdade. Ainda não dava para saber, apesar da presença dele ali.
- Mas estou aqui como um colega de profissão. – Ele continuou. – E como alguém que já ocupou o lugar que você ocupa agora na vida do Jack.
À menção do nome do Jack, eu inflei as bochechas, deixando transparecer como aquilo era importante para mim.
- O Jack sempre foi maluco pela filha. – Ele contou. – Eu me lembro dele carregando ela nos ombros, depois dos shows, quando ela era pequena, e do violãozinho que ela tinha. – Sorriu. – Eu sei que ele teria ensinado tudo o que sabe sobre música a ela. Era o que ele queria... Mas a foi tirada dele muito cedo.
Ficamos calados por um instante. Me lembrei da forma como Jack falava da filha, antes de ela chegar. Como se fosse um milagre tê-la de volta.
- E você apareceu antes que ela voltasse. – Continuou, pensativo. – Então, apesar de eu ter tido o Jack como um pai quando era garoto, de muitas formas foi você, com seu contrabaixo e sua boa vontade em cuidar daquele dálmata barulhento, quem preencheu o lugar que a filha deixou na vida dele.
Engoli em seco. – Eu não acho que...
- Não estou dizendo que você substituiu a . Ela é a filha dele, sempre vai ser. – Disse com firmeza. – Mas você também é muito importante para o Jack. Espero que saiba disso.
- Eu sei. – Falei em voz baixa, sabendo que ele estava sendo honesto, e não só tentando me convencer a voltar com tudo.
- E aproveito o gancho para te dizer que largar o trabalho agora é uma tremenda estupidez. – Miguel voltou a me encarar com severidade. – Você quer fazer música, ; nasceu pra isso. Não devia deixar nada te atrapalhar assim.
O que ele falou bateu forte em mim, mas não quis me estender no assunto.
- Obrigado por se importar, Miguel. – Eu disse, assentindo uma vez. – Mas eu ainda preciso de um tempo.
- Entendo. – Ele deu de ombros. – Bom, sabe que é bem-vindo para voltar quando quiser. Nos vemos por aí, babá de cachorro.
Miguel desceu as escadas e entrou no carro de Jack, e eu voltei para dentro de casa. Aquela conversa não tornava minha vida mais fácil.
- Filho?
Mamãe apareceu à porta, bem quando eu ia subir as escadas para o meu quarto.
- Mãe, o que está fazendo acordada? – Voltei. – Pensei que tivesse apagado enquanto lia.
- Eu me levantei para ir ao banheiro. Ouvi um pouco da sua conversa. – Admitiu. - Você terminou com a , não é?
Rolei os olhos, dando um suspiro.
- Mãe... Não devia se preocupar com isso. Pessoas namoram, pessoas se separam. Você se separou.
Ela fez uma careta.
- Desculpa. – Eu disse. – Eu não quis ser rude.
- Sei que não. – Ela sorriu. – Eu não quero me meter na sua vida, é só que... Eu estava tão feliz por você. – Mamãe enrugou o nariz, fazendo-me rir. – É sério. Eu sei que a separação entre eu e seu pai foi difícil pra você, e aí quando você namorou a Leslie e ela foi embora, achei que você pudesse ficar um pouco... Cético.
-... Eu sei separar as coisas.
- Sei que sim. Você separou bem melhor do que eu teria feito, na sua idade. – Concordou. – Mas mesmo assim, eu nunca tinha visto você gostar de uma menina como gosta dessa . Vocês não vão voltar?
Balancei a cabeça, não em negação, mas querendo que ela parasse, embora eu estivesse rindo.
- Tá, tudo bem. Chega desse assunto por ora. – Ela levantou as mãos. – Agora, estou com desejo de comer pipoca. Não quer nos acompanhar? – Tocou a barriga.
Suspirei e assenti, passando um braço por seus ombros e já caminhando.
- Vai ser ótimo acompanhar vocês.
25- I told you I was mean
"You knew what it was."
[…]
Pen. Pen. Pen.
O despertador me fez pular na cama. Levei a mão a testa, sentindo a dor de cabeça me atingir em cheio. Olhei para o relógio. Já eram 7:30 da manhã.
- Droga, eu perdi a hora! – Exclamei pulando da cama.
Sem ter muita consciência de onde estava pisando – sem nem me importar, na verdade – fui cambaleando feito uma bêbada até o quarto de Jack, no andar de baixo.
Ele estava enrolado na coberta roxa, dormindo um sono tão profundo quanto eu, minutos atrás.
- Pai. – Eu o balancei suavemente. – Pai, acorda. Está na hora do remédio.
Jack acordou sobressaltado, mas como já sabia do que se tratava, não demorou a se orientar. Ele se apoiou nos cotovelos, enquanto eu lhe estendia o remédio que tinha tirado de sua gaveta de cabeceira.
- Ah, eu tenho que me lembrar dessa porcaria. – Ele caiu de costas no travesseiro de novo. – Me desculpe, filha.
- Tudo bem, eu tenho que ir para a escola. – Tranquilizei-o com um sorriso cansado. – E eu quero que você melhore.
Depois de dar um beijo na testa do meu pai, saí do quarto e fui para a cozinha, enquanto ele voltou a dormir. Ele precisava mais do que eu, mas eu também daria tudo para ficar mais um pouco na cama.
Alguns dias depois da febre de Jack ter começado, insisti que ele fosse ao médico. Miguel o acompanhou, e agora ele estava tomando um antibiótico porque sua garganta estava inflamada. Eu estava feliz pelo remédio ter diminuído sua tosse, mas tinha que ficar atenta para que ele o tomasse nos horários certos. Não importava que ele me dissesse para não me preocupar: eu tinha colocado alarmes no meu celular para sempre saber quando papai tinha que tomar a medicação.
O café estava quente, então imaginei que Miguel tivesse acordado cedo para fazê-lo e depois ido dormir de novo. Agradecida por isso, me servi de uma xícara cheia, comendo um pedaço de pão dormido. Stevie apareceu e veio cheirar meus pés.
- Você é meu único melhor amigo agora, não é? – Sorri para ele, fazendo carinho em sua cabeça.
Depois de comer, segui meu novo percurso diário, bocejando a caminho do ponto de ônibus.
Meu cansaço, a bem da verdade, não se devia só ao estado do Jack, embora isso fosse grande parte da situação. A verdade é que eu não dormia direito desde que tudo tinha começado a dar errado. Eu acordava no meio da noite ou tinha sonhos malucos com as pessoas a minha volta quase sempre, e no meio disso tudo, ainda ficava, às vezes, acordada, pensando em como tudo estava e em como ia ficar.
Cansada do jeito que eu estava, preferia não pegar o ônibus escolar. Tudo que eu queria era um pouco de sossego, talvez até tirar um cochilo com a cabeça encostada na janela. Assim, eu estava indo no transporte municipal para a escola, onde ninguém me acharia – pelo menos até descobrirem que era o que eu estava fazendo.
Por pouco não perdi o ponto. Meu relógio biológico me acordou no susto quando o ponto a alguns metros da Jacksonville Beach High surgiu à vista.
Desci do ônibus e esfreguei o rosto; depois respirei fundo e segui a passos firmes até a escola.
Vi o carro de no estacionamento, sem conseguir deixar de pensar em onde ele estaria, mas não fiquei encarando. Como as coisas estavam, eu sabia que as pessoas logo iam começar a questionar se estava tudo bem com nosso namoro, e embora eu fosse até outro dia a rainha dos planos, preferi não fazer nenhum para prevenir a fofoca. Eu não queria esquentar a cabeça com aquilo naquele momento.
- Ah, aí está você. – Summer se juntou a mim no corredor, desfilando como se estivesse numa passarela, sem nem se dar conta disso. – Te trouxe um donnut. – Ela me estendeu uma sacola de papel. – E aí? Como estão as coisas?
- Indo. – Dei de ombros. – Obrigada por isso, eu quase não comi nada no café. – Balancei a sacolinha.
- Sem problema. – Ela sorriu. – E o seu pai?
- Está melhor, graças a Deus. O remédio fez efeito.
- Fico feliz. Bom, nos vemos em História. – Disse já tomando outro caminho. – Ah, e eu tomaria cuidado com a Amber, se fosse você.
Rolei os olhos só de pensar em encontrar Amber, mas sabia que não poderia fugir dela o dia inteiro. Ela devia ter colocado um rastreador em mim, porque sempre sabia onde eu estava. Mais do que nunca, eu entendia e suas fugas agora.
- ! – Uma líder de torcida exclamou quando entrei na sala.
- ! – Outra delas olhou para mim. Eu sempre associava elas ao bando de preguiças imitadoras do A Era do Gelo 2.
- Precisamos falar sobre o seu vestido. – A primeira foi logo dizendo.
- E a sua maquiagem. – A outra veio para perto de mim, estudando minha cara.
- Já tenho vestido. – Resmunguei.
- Mas não parece ter maquiagem nenhuma em casa. – Outra líder fez careta.
De repente, me vi salva da multidão por quem eu menos queria ver, o que foi ao mesmo tempo um alívio e uma maldição.
- Finalmente! – Amber exclamou num tom quase irritado quando me viu.
Desde o começo daquela ridícula campanha, Amber tinha transformado a sala do comitê de baile em um QG, de onde ela comandava tudo que dizia respeito à minha candidatura. Às vezes parecia que a Rainha seria ela, e não eu. E, embora ela tivesse me dado uma mini-folga por ficar com Jack nos últimos dias, ainda me mandava mensagens constantemente e não me deixava em paz.
- Por que não me atendeu ontem à noite?
- Eu peguei no sono. – Respondi colocando minha mochila sobre a mesa.
- É mesmo? – Ergueu as sobrancelhas. – Porque não parece. Quer dizer, que olheiras são essas?
Minha cara devia estar mesmo péssima. Eu mal tinha me olhado no espelho antes de sair.
A porta da sala se abriu e Billy Terence – que era parte do comitê de baile – entrou. Ele arregalou os olhos ao ver o que tinha se tornado o lugar. Amber tinha virado tudo de pernas para o ar, com cartazes com meu nome e enfeites coloridos para todo lado, sem contar nas outras líderes de torcida trabalhando.
- Uow. – Foi o que ele conseguiu dizer.
- O que você quer, Billy? – Ela inqueriu.
- Eu vim porque queria fazer uma lista dos materiais que ainda faltavam para decoração... Mas o que você fez com essa sala?!
- O que parece, Terence?
- Olha, Amber, devíamos ser uma equipe neutra. Eu não acho que seja muito adequado...
- Blábláblá. Por que não fala com a minha mão? – Ela debochou com voz infantil. – Ninguém acredita realmente nisso, Billy. Além disso, ninguém acharia estranho se estivéssemos falando da campanha de Summer Olsen, certo?
Billy gaguejou para responder, e Amber colocou o dedo bem na cara dele.
- A-HA! – Ela exclamou. – Sabe que eu estou certa, Billy Terence. Agora dê o fora daqui, estamos trabalhando.
Atordoado com aquilo, Billy gaguejou mais uma vez, mas acabou saindo rapidamente da sala. Até eu estava com medo do quão enérgica Amber parecia. Então ela se virou para mim.
- Quanto a você, querida... Faça um favor a si mesma e vá passar um corretivo.
Amber estava certa, eu sabia, mas o verdadeiro motivo para eu ter acatado sua ordem era que queria me livrar dela. Tinha absoluta certeza de que estava começando a desenvolver alergia à sua voz, e toda vez que ela começava, sentia que ia ter outro choque anafilático.
Entrei no banheiro – que graças aos céus estava vazio – e procurei na mochila o corretivo que tinha comprado em minha viagem com as garotas, mas descobri que não o tinha levado. Ainda assim, meu desespero para me livrar de Amber era tão grande, que continuei revirando a bolsa enquanto praguejava em Português.
- Porcaria, onde você se enfiou? Anda, aparece! Você tem que estar aí!
- Eu não entendi metade do que você disse, mas olha, me pareceu um palavrão.
Olhei para trás, envergonhada.
- Annabeth. – Falei, colocando o cabelo atrás da orelha.
- Está tudo bem. Também xingo quando estou sozinha aqui, às vezes.
Eu sorri.
- Sinto muito pelo que está acontecendo. – Ela disse então.
E, curiosamente, foi a primeira pessoa a dizer, fora a meu pai e Miguel. É claro que Summer tinha se preocupado em saber a verdade e se importava comigo; mas aquelas duas palavrinhas vindo de alguém que nem precisava se dar a esse trabalho, tiveram um peso diferente no meu coração. Me senti menos rejeitada. E grata.
- Talvez seja um pouco culpa minha também. – Admiti apesar disso.
- Por Deus, tentaram te matar outro dia! – A garota exclamou. – Seu carma não pode ser tão ruim assim.
Dei de ombros, pensando que, na real, podia sim.
- O que estava procurando?
- Meu corretivo. Eu vim sem maquiagem hoje e a Amber pirou. Coisas de campanha.
- Hum... – A menina levou a mão ao queixo. – Talvez eu possa ajudar nisso.
A sensação do mexe-mexe no meu rosto acabou tão rápido que eu mal acreditei.
- Bem melhor. – Doug, o maquiador do clube de teatro, observou orgulhoso.
- Você é incrível. – Toquei de leve meu rosto, sem querer estragar tudo. – Já te disseram isso?
- De vez em quando eu digo para mim mesmo na frente do espelho. – Ele ponderou, dando um sorriso tímido. Nós rimos.
- Não sei como te agradecer.
- Agradeça à Annabeth. – Ele dispensou, tocando o ombro dela. – Estou sempre fazendo favores a ela. Mas se quer saber... – Acrescentou, abaixando-se perto do meu rosto. – Eu estou mesmo torcendo por você nessa disputa.
Doug sorriu e agradecemos de novo, então ele foi embora para sua aula.
- Por que ninguém sabe que ele é um gênio? – Perguntei a Annabeth, que tinha se sentado de frente para mim.
- Essa escola está cheia de gênios invisíveis e idiotas visíveis demais. – Ela deu de ombros.
Eu concordei em pensamento, e de repente me lembrei de Collie, minha amiga de Denver. Collie era tão exótica e engraçada, e era exatamente como ela pensava. Como nós pensávamos, na maior parte do tempo.
- O que foi? – A garota quis saber.
- Eu só lembrei de uma amiga minha que dizia mais ou menos isso aí. Eu sinto falta dela. Ela me mataria se visse onde eu estou agora. – Recostei a cabeça no banco.
- Se visse que você virou uma líder de torcida mega popular e candidata a Rainha do Baile? – Ela riu.
- Talvez ela se divertisse com essa última parte. – Sorri. – Mas... É. Esse não era exatamente o meu plano quando cheguei aqui. Se eu tivesse seguido o plano, eu teria entrado só para o grupo de teatro, estaria ensaiando feito uma louca para a peça... Teria ficado sua amiga há muito mais tempo. – Olhei para baixo, pensando em como as coisas podiam ter sido.
- Sabe, ... – Annabeth colocou a mão no meu joelho. – Talvez você faça planos demais.
E eu olhei para ela, e as palavras tinham sido ao mesmo tempo muito simples, ao mesmo tempo reveladoras.
- A gente não pode controlar tudo à nossa volta. – Ela dizia, falando com uma força enorme para alguém tão pequena e engraçadinha. – A gente não controla, mesmo quando pensa que sim.
- Você planeja ir à praia, mas aí amanhece chovendo. – Ela continuou. – Você quer que seu personagem preferido do livro não morra, mas ele morre. Você planeja uma noite do filme com seus amigos e a energia elétrica acaba nos créditos iniciais. Você gosta de alguém, mas essa pessoa não gosta de você. Você. Não. Tem. Controle.
Eu não conseguia falar nada. Eu olhava para Annabeth – tão frágil, tão forte – e me perguntava por que nunca tinha realmente falado com ela antes da semana do choque anafilático. Também pensava na verdade de tudo aquilo que ela dizia e em como eu tinha sido tão boba por todo aquele tempo.
- Se planos funcionassem perfeitamente, eu seria um prodígio na Broadway, em vez de estar presa nesse fim de mundo litorâneo aturando o estrelismo de Jasmine Garcia. – Suspirou. – Mas eu estou aqui agora, sentada de frente para uma pessoa um tanto quanto perdida, usando meus favores com o Doug para melhorar o dia dela porque ela sempre foi legal comigo, apesar de ser bonita e eu ser da produção. E, por hoje, isso me basta, entende? – Sorriu. – Não que eu seja muito astrológica, mas eu acredito que as coisas acontecem como elas têm que acontecer. Então eu faço minha parte na minha vida e, apesar de saber o que eu quero aconteça através disso, entendo que não adianta esquentar minha cabeça, porque eu não controlo o mundo, as pessoas, o destino. – Deu de ombros, como se não tivesse dito nada demais. – Você devia fazer o mesmo, e aí talvez percebesse que não é só culpa sua que todo mundo esteja com raiva, e que tudo que pode fazer agora é ser você, viver sua vida, e se fez algo de errado que tem solução, tentar consertar.
Depois de todo aquele tempo, me senti um bocado mais leve. Não só por achar, agora, que não era a exclusiva culpada do que estava acontecendo, mas por entender que eu não tinha como controlar o que estava havendo. A raiva de Jodi e Emma, as mentiras de Perry Gold, a loucura de Amber e ...
Annabeth estava certa: tudo que eu podia fazer agora era continuar fazendo as coisas e sendo eu. E se eu conseguisse consertar algo, eu o faria, mas no geral, tinha que lidar com que estava acontecendo fazendo a minha parte, sem me torturar com realidades alternativas e planos mirabolantes.
Olhei para ela.
- Obrigada, Annabeth. Você é mesmo um gênio. – Ri um pouco.
- Eu faço o possível. – Ela riu também. – Agora, quer ajuda para decorar as falas da peça? Você me parece bem ocupada com mil coisas, e temos ensaio amanhã. Não queremos que a senhorita Elizabeth surte, né?
- Não. – Me recompus. – Não mesmo. Vamos fazer essa peça, pelo menos, dar certo.
Ensaiar com Annabeth aumentou consideravelmente meu ânimo. Não só o que ela tinha me dito, mas estar na companhia de alguém que não estivesse envolvido naquela loucura toda, pela primeira vez em tanto tempo, era maravilhoso.
O que não me fazia sentir menos falta de , e, para minha surpresa, também de . E quando eu fui fazer compras no mercado naquela tarde, só conseguia pensar em quando fazíamos isso juntos. Doeu um pouquinho andar por aqueles corredores sozinha, mas tentei manter em mente o que Annabeth me dissera, sobre não adiantar ficar me preocupando. Quando tivesse oportunidade, me desculparia de verdade. Era tudo que eu mais queria agora.
Estava pegando uma beterraba para fazer o jantar com Miguel – Jack podia estar melhor, mas queria garantir que ele não comesse nenhuma porcaria até estar 100% bem – quando vi a senhora Slaterton vindo para a mesma banca que eu. Ela, no entanto, só me viu quando já estava de frente para mim, do outro lado da pilha de raízes vermelhas.
- Ora, ora. – A mulher disse com desdém, e uma pitada bem óbvia de insatisfação.
- Boa tarde, senhora Slaterton. – Cumprimentei.
- Era boa até agora. – Ela ergueu uma sobrancelha.
É claro que a mãe de Jodi sabia o que estava acontecendo na escola. Nada passava despercebido pelos olhos de águia da matriarca Slaterton, e se antes ela já não simpatizava comigo, agora provavelmente queria me queimar numa fogueira. Eu sabia, no entanto, que não devia me chatear com isso. Era a filha dela, afinal.
- Bom, sinto muito por ter estragado seu dia. – Falei, sendo sincera mesmo. – Até outra hora.
Já estava empurrando meu carrinho para longe, quando ela voltou a falar, fazendo com que eu me virasse.
- Sabe, . – Disse em uma voz alta e firme, como uma juíza dando sua sentença. – Eu sempre soube que você não era uma boa companhia para Jodi Lyn, apesar de ela insistir no contrário. Mas eu nunca pensei que seria capaz de tamanha falta de caráter. – Se empertigou toda. – Não sei que tipo de criação recebeu de seus pais boêmios nesse mundo artístico irresponsável e competitivo, mas...
- Senhora Slaterton, por que não cala a boca?
As palavras saíram tão rápido que não consegui controlar. Mas também, eu não quis. Eu podia aturar todo tipo de ofensa, mas não deixaria que ela atacasse minha família – não mais do que ela já vinha fazendo há meses.
A mãe de Jodi estava estarrecida com meu corte. Sua boca estava aberta, mas ela não falava nada por completo.
- Mas como pode... – Ela gaguejou, ultrajada.
- Olha, eu não ligo se a senhora quiser me odiar. – Falei com calma, mas firme, voltando até ela. – Mas eu não vou deixar que fale do meu pai de novo, muito menos da minha mãe que, por Deus, a senhora nem conhece! O meu pai não é nenhum vagabundo, como a senhora gosta de insinuar; ele tem um trabalho. Ele é músico, e eu tenho muito orgulho disso. – Afirmei. – Eu entendo que esteja chateada pela sua filha, mas isso não te dá o direito de ofender minha família desse jeito. E, por sinal, também não dá pra dizer que a Jodi tem sido a melhor das amigas, quando ela acreditou no primeiro mentiroso que tentou jogá-la contra mim sem mal questionar.
A mãe de Jodi estava tão chocada. Eu nunca pensei que fosse ver a arrogante senhora Slaterton sem palavras, mas lá estava ela. Eu tinha dito o que precisava dizer.
- Agora sim... – Falei me recompondo. – Até outra hora.
E saí com meu carrinho, deixando-a ali.
Entrei em casa, surpresa comigo mesma. Fiquei recostada na porta por alguns instantes.
- Comprei esse peixe com os pescadores da Praia da Costa. Vamos fazer um assado. – Miguel disse animado ao ver que eu estava ali, exibindo o peixe. Então ele notou minha expressão. – O que houve?
- Eu... Acho que mandei a mãe da Jodi calar a boca. – Contei.
- Por quê? – Ele ergueu uma sobrancelha.
- Porque... Ela falou mal do meu pai. E meu pai é a melhor pessoa do mundo.
Miguel deu de ombros.
- Então você fez bem. A família é o que mais importa.
Sorri para ele, me aproximando quando ele fez sinal para que eu o fizesse. Fomos andando juntos a caminho da cozinha.
- Vou te contar uma coisa. – Miguel dizia. – Da última vez que falaram mal da minha mãe perto de mim, eu acabei indo parar na cadeia...
E eu dei risada, pensando que a paranoia de , na verdade, talvez não fosse tão infundada.
POV
Eu jogava as chaves do carro para o alto, assobiando uma música do Sonny Rollins. Tinha que passar no mercado para comprar um sorvete para mamãe. Estava abrindo a porta, quando alguém me chamou.
- Ei!
Olhei para trás. Summer vinha correndo em seus tênis brancos.
- Se esqueceu da minha aula de violão ontem?
Levei a mão à testa.
- Putz, Sum, é verdade! – Exclamei. – Foi mal, desculpa mesmo.
- Tudo bem, , eu também podia ter te ligado, mas pensei que devia estar com a cabeça cheia com tudo o que está acontecendo.
- E estou. – Admiti.
- Viu só? Que bom que eu não liguei então. Mas podemos fazer a aula agora mesmo, na sua casa, se estiver com tempo livre.
- Na verdade, estou sim. Eu... Larguei o trabalho. – Contei, entrando no carro. – Entra aí. Mas vamos ter que passar no mercado antes.
Summer entrou no carro e saímos do estacionamento da Jacksonville High, pegando a estrada rumo ao meu bairro.
- Largou o trabalho? – Summer questionou. – Por quê? Porque brigou com a ?
- Ah, então você já soube.
- Em partes, é. – Ela assentiu. – , eu entendo que possa estar chateado com ela, mas você adora o trabalho no Roger's.
- Eu precisava de um tempo para pensar. – Falei, curvando.
- Eu acho que está pegando pesado com a . – Ela recostou no banco, olhando pela janela. – Quer dizer, ela não pode ter feito nada tão ruim assim. Devia falar com ela e resolver isso.
Fiquei imaginando o que Summer diria se soubesse realmente de tudo que a tinha feito. Ela acharia mesmo que não era nada demais? Provavelmente não.
- Quer ouvir música? – Falei, em vez de insistir no assunto. – Tenho umas novas bem boas.
Liguei o som do carro e Summer riu, balançando a cabeça.
- , ... – Disse. – Você não muda mesmo.
Summer me acompanhou no mercado, e sabendo que ela estava claramente tentada a tocar no assunto do meu namoro outra vez, aproveitei um momento de distração dela – enquanto escolhíamos um sabor de sorvete para minha mãe – para falar de outra coisa.
- Você não está muito empenhada na sua campanha esse ano, né? – Indaguei, pegando um sorvete de flocos.
- Não estou ligando tanto, para falar a verdade. – Ela tomou o pote das minhas mãos e o trocou pelo sabor torta de limão.
- E por quê?
- Não sei. – Ela deu de ombros. – Acho que estou um pouco cansada dessa loucura toda.
- E quanto ao Junior? Estou bem certo de que ele deve estar esperando ser rei do baile como em todas as outras vezes.
- Bom... Não sei se vou ao baile com o Junior esse ano. – Ela estava pensativa, embora tentasse falar rápido para parecer que não dava tanta importância. – Você sabe como as coisas estão.
- É, eu sei. Sinto muito. – Falei, mas não sentia.
- Eu queria não me sentir tão culpada por como as coisas estão entre nós. Quer dizer, eu sei que o Junior é um idiota às vezes, mas eu ainda me sinto a grande responsável por não estarmos juntos agora. – Suspirou, triste. – Acho que eu sou mesmo a responsável, na verdade.
- Ah, mas não é mesmo. – Não consegui me conter. – Junior sempre foi um idiota. Eu me lembro de ter te dito isso anos atrás, e eu continuo achando a mesma coisa. E a culpa obviamente não é sua.
Summer parou de andar, séria por um instante. Depois, sorriu para mim.
- Eu precisava mesmo de alguém que xingasse ele para eu me sentir melhor.
Dei risada dela. De repente, Summer olhou para o lado e arregalou os olhos.
- A está aqui! – Ela agarrou meu braço. – Olha lá!
Olhei para o ponto distante, a garota na fila do caixa. estava usando um casaco largo e um rabo de cavalo alto. Ela não estava nos vendo. Respirei fundo.
- Você tem que ir lá falar com ela, . – Ela decidiu. – Vai logo.
- Não sei se é uma boa. – Enrolei.
- , você tem que conversar com a . – Summer puxou meu rosto e me forçou a encará-la, aqueles olhos claros insistentes como nunca. – Vocês se gostam, não seja um mané e estrague isso.
Encarei Summer por um segundo – querendo brigar com ela por me chamar de mané, pensando se estava certa. Talvez eu devesse ir até lá falar com a , ainda que fosse para perguntar do Stevie. Mas, quando olhei de novo, já tinha ido. Olhei para Summer e dei de ombros. Ela fez cara feia para mim.
Antes que ela brigasse comigo, porém, avistamos a senhora Slaterton, mãe de Jodi. O rosto dela estava pálido enquanto ela empurrava o carrinho, parecendo muito perplexa. Quando a mulher nos viu, Summer acenou. Ela se recompôs e veio em nossa direção, e eu perdi de vez a chance de falar com minha falsa namorada. Talvez fosse a vida me impedindo de fazer uma loucura, afinal.
Ainda assim, não consegui parar de pensar no que Summer disse quando voltei para casa. E no que Miguel disse. E no que minha mãe disse. E no que meu próprio coração dizia, disparando toda vez que a via.
Talvez eu estivesse agindo errado com a , sendo infantil. Não tinha outro jeito de resolver as coisas – ainda que eu não soubesse o que resolver significava para nós – que não fosse conversando cara a cara. Eu, melhor que ninguém, devia saber disso, visto que minha decisão do passado de esconder da Summer quem Junior realmente era tinha nos levado até a catástrofe atual, e sendo eu próprio filho de duas pessoas que haviam se separado por guardarem tudo para si próprias. Ainda que eu e a fossemos só um casal de mentira, eu gostava dela de verdade.
Decidi que precisava conversar com ela sobre o que tinha acontecido, e sobre o que estava acontecendo. Em pouco tempo teríamos também um baile para ir, afinal.
🌴💚🌴
Enfiei no corpo uma camisa branca que estava dobrada numa cadeira, na manhã seguinte, e joguei a mochila nas costas e saí de casa, prometendo a mamãe que ia dar um jeito na minha vida quando ela perguntou.
- Acho bom. – Ela assentiu com força, sorrindo. – Conversar é fundamental. Hoje mesmo eu vou conversar com Henry sobre comprarmos aquele carrinho de quinhentos dólares com renda amarela.
- Vou dizer a ele que acho uma boa ideia. – Ri. – Tchau, mãe.
Dirigi até a escola pensando no que eu ia dizer e em como não ia me deixar enrolar dessa vez. Por sorte, não dei carona a naquele dia, ou ele teria ficado palpitando no meu discurso. Também não falei a ele o que faria. Aquilo era coisa minha.
Percebi que eu também precisava contar para ela sobre o que tinha acontecido com Junior no nosso ano de calouros. Durante todo aquele tempo, eu tinha deixado que ela alimentasse uma visão incompleta de quem ele realmente era, e se era para falar a verdade, aquilo também tinha que ser dito, visto que tinha sido o princípio de todo o caos em que nos encontrávamos agora. De certa forma, eu tinha mentido também.
- , três anos atrás... – Eu ensaiava, caminhando em direção ao prédio principal. Foi quando eu vi.
Há alguns metros de onde eu estava, estava o secto de líderes de torcida que tinham começado aquela campanha absurda para , dias atrás. Isso não era novidade; Amber Hayley estava migrando para outra vizinhança desde que começara a ganhar destaque. Ela sentia a popularidade fluindo de Summer para a garota nova, e não queria ser deixada de lado. Com elas, estava Junior, que parecia empenhado em fazer com que vencesse Summer – o que talvez fosse uma espécie de vingança. Isso também não era nada novo.
A coisa nova era que ali, no meio deles, naquele dia, estava a própria Vicentini Pie, erguendo um cartaz que tinha seu nome com uma coroa no lugar do pingo do i. Ela gritava e sorria para as pessoas, enquanto do outro lado, um grupo de jogadores uniformizados do Swordfish erguia Jodi nos ombros e gritava em seu favor, guiados por Brad Winter.
Aquela visão poderia ser apenas absurda, mas foi muito mais do que isso. Engoli em seco e apertei com força as mãos, sentindo muita raiva de repente.
Ali estava eu, pronto para falar de verdade com a , preocupado com a briga dela com as meninas, desejando resolver tudo, enquanto ela estava fazendo campanha para ser rainha do baile junto com Junior . Ela estava enfrentando a Jodi, e claramente não estava nem aí para o fato de ter brigado comigo. Como sempre, ela tinha um plano maior.
Joguei meu discurso no lixo, bufei de raiva e passei reto atrás dos seguidores de Jodi, entrando no prédio.
POV PIE
- Como está o café? – Miguel perguntou.
- Por mim poderia ter mais açúcar, mas está ótimo. – Respondi.
- Vai acabar diabética assim.
Ouvimos o rangido da madeira sobre seus pés e então papai entrou na cozinha.
- Ei, pai. – Sorri.
- Rain. – Papai se inclinou e beijou minha cabeça, depois bateu no ombro de Miguel e se jogou um tanto quanto desajeitado na cadeira.
- Tem algo de errado com sua perna, Jack? – Perguntei, porque ele a mantinha esticada.
- Dei um mau jeito enquanto dormia, eu acho. – Ele disse.
- Você tem andado numa maré de azar terrível. – Comentei.
Miguel tossiu e achei que ele tinha engasgado, mas logo em seguida ele olhou para mim e disse:
- O nome disso é velhice, .
- Vá amolar outro. – Papai respondeu.
Me levantei e levei a xícara para a pia.
- Eu falei com outro dia. – Miguel comentou. Olhei para ele, curiosa. – Sobre o trabalho.
- E ele? – Papai perguntou.
- Acho que consegui fazer com que pensasse. – Coçou o queixo. – Também conversamos sobre o Jack. Devia contar para ele que seu pai está melhor, .
Não falei nada, mas assenti. Me lembrei de Annabeth dizendo que tudo que eu podia fazer agora ajeitar as coisas, se tivesse chance. Miguel tinha me dado uma. Eu ia falar com .
Tentei não me preocupar tanto com isso a caminho da escola. Annabeth podia ter se oferecido para me ajudar com as falas da peça, mas eu também não queria abusar. Estava me esforçando para não fazer tudo errado e enlouquecer a senhorita Elizabeth, mas estava sendo difícil. A história de Ebony Purplewood se revelava cada dia mais complexa do que me parecera a princípio.
- Estou certa de que ele gosta de mim, Castigo, mas está enfeitiçado pela tola Valerie, com seus risinhos e vestidos enfeitados. Mas tenho um jeito de resolver isso e colocar tudo no lugar. – Li com entonação forte a fala, ficando um pouco assustada ao perceber o quanto aquilo realmente se parecia comigo. O cara sentado ao meu lado no ônibus também me olhava estranho, e só então percebi que era o meu ponto.
Me levantei e dei sinal. O ônibus parou no lugar de sempre e eu segui a pé para a Jacksonville Beach High.
Lá ia eu, de cabeça baixa lendo meus textos. Amber gritou para mim. Acenei para ela, mas me mantive longe, cuidando da minha vida. A campanha seguia a toda, mas naquela manhã eu tinha outras coisas em mente. Além do mais, não queria irritar mais Jodi do que ela já devia estar irritada. Àquela altura ela já devia saber que eu tinha mandado sua mãe calar a boca. Eu acreditava que todos nós precisávamos de um pouco de paz, e estava focada nisso quando...
- SAI DA FRENTE! – Ouvi logo antes de levar um esbarrão.
Emma passou por mim como um foguete, uma fita amarela amarrada na testa, as bochechas pintadas como em uma guerra.
- Mas o que...
Logo os apitos começaram a soar e gritos altos masculinos se aproximaram. Até meu grupo de seguidoras pareceu assustado diante daquilo.
Alguns segundos depois, um bando de jogadores do Swordfish – mais da metade, na verdade – surgiu vindo dos fundos da escola, carregando uma Jodi Lyn feliz e sorridente nos ombros.
- SÓ HÁ ESPAÇO PARA UMA RAINHA! – Gritavam eles.
- JODI SLATERTON PARA RAINHA!
Eles literalmente fizeram a escola parar, sendo liderados pelo apaixonado Brad Winter, que parecia um general.
- JODI JÁ TEM A VITÓRIA! TRAIDORAS SÃO ESCÓRIA! – Eles cantavam.
Jodi me viu lá de cima e acenou para mim.
Aquilo foi a gota d'água. Deus sabia que eu tinha tentado consertar as coisas com ela, e ela podia estar chateada, mas aquilo era ridículo.
Furiosa, marchei até onde estavam minhas seguidoras – apavoradas, revoltadas – e peguei um dos cartazes.
- Me dá isso aqui! – Berrei, assustando-as mais ainda. – VAMOS, O QUE ESTÃO ESPERANDO? ELES ESTÃO NOS DESAFIANDO!
Amber engoliu em seco, mas logo se recuperou. Ela foi para frente das garotas e começou a entoar.
- QUANDO A FOR RAINHA, VOCÊ VAI CHORAR, BAIXINHA!
As outras faziam coro a Amber, os rostos vermelhos com o fogo da competição.
- EMMA HUGHES É UMA CAFONA, NÃO DAMOS CHANCE PRA BRIGONAS!
A coisa estava realmente pegando fogo. Ultrajada, Emma fez menção de se jogar em cima de Amber, mas foi contida pelos jogadores.
Eu já estava preocupada com o rumo das coisas, quando avistei quem realmente me importava. passou pelo corredor do prédio, e eu o acompanhei pela janela com os olhos.
- Quer saber? – Falei. – Segura isso aqui! – Empurrei o cartaz para uma das garotas e corri para longe dali.
Corri a toda para alcançá-lo. Queria pelo menos começar uma conversa com ele, ainda que fosse só para falar do Jack.
- ! – Chamei às suas costas.
parou e levou um segundo para se virar para mim, sério.
- Ei. – Disse me aproximando.
-... Oi. – Ele respondeu.
- Então... Soube que você andou conversando com Miguel. – Cruzei os braços em frente ao corpo, nervosa, e sorri.
- É, a gente teve uma conversa essa semana.
estava sendo bem frio, mas eu não ia me deixar abalar. Eu tinha que tentar.
- Vocês falaram do meu pai? – Perguntei, sem esperar resposta. – Bom, ele tem sentido sua falta, especialmente agora que está doente. Você bem que podia passar lá para vê-lo, e aí a gente podia conversar...
- Não acho que seja uma boa época para isso. – Ele me cortou. – Afinal de contas, você anda muito ocupada com sua campanha para ser rainha daquele Baile de Outono idiota.
- Não... Não, eu não ligo para o baile. Eu só estava lá porque...
- Não se preocupe em explicar. A vida é sua, se quer se meter nesse circo que Amber e Junior armaram. – Deu de ombros. – Eles querem mesmo que você ganhe, eu acho. Afinal de contas, provavelmente ele pretende que você seja o par dele na festa.
Mas por que ele estava agindo daquele jeito? Será que acreditava mesmo que eu tinha armado para Jodi para ser rainha do baile? Que eu tinha planejado qualquer daquelas coisas?
Meu coração bateu forte de mágoa. Ele devia me conhecer melhor que isso. Como ele podia pensar que eu enfrentaria Jodi por causa de uma coroa idiota? Ela era minha amiga.
Pensei em como eu vinha me sentindo mal pela nossa briga, em como eu vinha me sentindo mal pela briga com Jodi, e então fiz o que Elizabeth me dissera.
Tudo que eu podia fazer era ser eu mesma, e se era a fria e maquiavélica que ele via mesmo agora, eu não podia fazer nada.
[N/A: Podem dar play nessa e ler com calma!]
- Tem razão. Por que estou sequer te explicando? – Abri os braços. – É a minha vida, afinal, e se eu quiser ser a rainha do baile, tenho mais é que apoiar a única campanha que estão fazendo para mim, já que minhas melhores amigas decidiram me odiar, baseadas na palavra de um cara que vive mentindo. – Assenti. estava calado. – E eu não tenho mesmo tempo para estar aqui debatendo isso com você, se quer saber, porque tenho as falas de uma peça para decorar, provas para estudar, e um pai que está doente há dias e com o qual eu tenho ido e voltado do hospital em horários aleatórios. Então não, eu não tenho mesmo espaço na agenda para essa conversa. – Saí andando, mas voltei. – E só para tirar esse peso das suas costas... O prazo estipulado acabou. Ele até excedeu. Não sou mais sua namorada. Está livre disso.
Saí andando com os olhos cheios de lágrimas, mas a cabeça erguida. Eu podia ter errado muito, mas não levaria a culpa pelo que não tinha feito.
Eu vinha tentando consertar as coisas, mas do jeito que as elas estavam, era impossível. Por mais que eu gostasse de ou Jodi, não podia e nem iria obriga-los a acreditarem em mim. E, de repente, parei de me importar.
Entrei no auditório do teatro, que estava vazio, e me deitei no palco. Com as lágrimas já secas, fiquei relendo as falas de Ebony, me encontrando cada vez mais naquele papel da bruxa, que, apesar de arrependida, não deixava de ser quem era. Infelizmente, eu não tinha poderes mágicos para desfazer tudo que tinha feito, mas pelo menos tinha libertado aquela pobre vítima de sua maldição.
Os outros podiam estar certos. Talvez eu fosse um tanto quanto malvada, mas o problema agora era todo meu.
[…]
Pen. Pen. Pen.
O despertador me fez pular na cama. Levei a mão a testa, sentindo a dor de cabeça me atingir em cheio. Olhei para o relógio. Já eram 7:30 da manhã.
- Droga, eu perdi a hora! – Exclamei pulando da cama.
Sem ter muita consciência de onde estava pisando – sem nem me importar, na verdade – fui cambaleando feito uma bêbada até o quarto de Jack, no andar de baixo.
Ele estava enrolado na coberta roxa, dormindo um sono tão profundo quanto eu, minutos atrás.
- Pai. – Eu o balancei suavemente. – Pai, acorda. Está na hora do remédio.
Jack acordou sobressaltado, mas como já sabia do que se tratava, não demorou a se orientar. Ele se apoiou nos cotovelos, enquanto eu lhe estendia o remédio que tinha tirado de sua gaveta de cabeceira.
- Ah, eu tenho que me lembrar dessa porcaria. – Ele caiu de costas no travesseiro de novo. – Me desculpe, filha.
- Tudo bem, eu tenho que ir para a escola. – Tranquilizei-o com um sorriso cansado. – E eu quero que você melhore.
Depois de dar um beijo na testa do meu pai, saí do quarto e fui para a cozinha, enquanto ele voltou a dormir. Ele precisava mais do que eu, mas eu também daria tudo para ficar mais um pouco na cama.
Alguns dias depois da febre de Jack ter começado, insisti que ele fosse ao médico. Miguel o acompanhou, e agora ele estava tomando um antibiótico porque sua garganta estava inflamada. Eu estava feliz pelo remédio ter diminuído sua tosse, mas tinha que ficar atenta para que ele o tomasse nos horários certos. Não importava que ele me dissesse para não me preocupar: eu tinha colocado alarmes no meu celular para sempre saber quando papai tinha que tomar a medicação.
O café estava quente, então imaginei que Miguel tivesse acordado cedo para fazê-lo e depois ido dormir de novo. Agradecida por isso, me servi de uma xícara cheia, comendo um pedaço de pão dormido. Stevie apareceu e veio cheirar meus pés.
- Você é meu único melhor amigo agora, não é? – Sorri para ele, fazendo carinho em sua cabeça.
Depois de comer, segui meu novo percurso diário, bocejando a caminho do ponto de ônibus.
Meu cansaço, a bem da verdade, não se devia só ao estado do Jack, embora isso fosse grande parte da situação. A verdade é que eu não dormia direito desde que tudo tinha começado a dar errado. Eu acordava no meio da noite ou tinha sonhos malucos com as pessoas a minha volta quase sempre, e no meio disso tudo, ainda ficava, às vezes, acordada, pensando em como tudo estava e em como ia ficar.
Cansada do jeito que eu estava, preferia não pegar o ônibus escolar. Tudo que eu queria era um pouco de sossego, talvez até tirar um cochilo com a cabeça encostada na janela. Assim, eu estava indo no transporte municipal para a escola, onde ninguém me acharia – pelo menos até descobrirem que era o que eu estava fazendo.
Por pouco não perdi o ponto. Meu relógio biológico me acordou no susto quando o ponto a alguns metros da Jacksonville Beach High surgiu à vista.
Desci do ônibus e esfreguei o rosto; depois respirei fundo e segui a passos firmes até a escola.
Vi o carro de no estacionamento, sem conseguir deixar de pensar em onde ele estaria, mas não fiquei encarando. Como as coisas estavam, eu sabia que as pessoas logo iam começar a questionar se estava tudo bem com nosso namoro, e embora eu fosse até outro dia a rainha dos planos, preferi não fazer nenhum para prevenir a fofoca. Eu não queria esquentar a cabeça com aquilo naquele momento.
- Ah, aí está você. – Summer se juntou a mim no corredor, desfilando como se estivesse numa passarela, sem nem se dar conta disso. – Te trouxe um donnut. – Ela me estendeu uma sacola de papel. – E aí? Como estão as coisas?
- Indo. – Dei de ombros. – Obrigada por isso, eu quase não comi nada no café. – Balancei a sacolinha.
- Sem problema. – Ela sorriu. – E o seu pai?
- Está melhor, graças a Deus. O remédio fez efeito.
- Fico feliz. Bom, nos vemos em História. – Disse já tomando outro caminho. – Ah, e eu tomaria cuidado com a Amber, se fosse você.
Rolei os olhos só de pensar em encontrar Amber, mas sabia que não poderia fugir dela o dia inteiro. Ela devia ter colocado um rastreador em mim, porque sempre sabia onde eu estava. Mais do que nunca, eu entendia e suas fugas agora.
- ! – Uma líder de torcida exclamou quando entrei na sala.
- ! – Outra delas olhou para mim. Eu sempre associava elas ao bando de preguiças imitadoras do A Era do Gelo 2.
- Precisamos falar sobre o seu vestido. – A primeira foi logo dizendo.
- E a sua maquiagem. – A outra veio para perto de mim, estudando minha cara.
- Já tenho vestido. – Resmunguei.
- Mas não parece ter maquiagem nenhuma em casa. – Outra líder fez careta.
De repente, me vi salva da multidão por quem eu menos queria ver, o que foi ao mesmo tempo um alívio e uma maldição.
- Finalmente! – Amber exclamou num tom quase irritado quando me viu.
Desde o começo daquela ridícula campanha, Amber tinha transformado a sala do comitê de baile em um QG, de onde ela comandava tudo que dizia respeito à minha candidatura. Às vezes parecia que a Rainha seria ela, e não eu. E, embora ela tivesse me dado uma mini-folga por ficar com Jack nos últimos dias, ainda me mandava mensagens constantemente e não me deixava em paz.
- Por que não me atendeu ontem à noite?
- Eu peguei no sono. – Respondi colocando minha mochila sobre a mesa.
- É mesmo? – Ergueu as sobrancelhas. – Porque não parece. Quer dizer, que olheiras são essas?
Minha cara devia estar mesmo péssima. Eu mal tinha me olhado no espelho antes de sair.
A porta da sala se abriu e Billy Terence – que era parte do comitê de baile – entrou. Ele arregalou os olhos ao ver o que tinha se tornado o lugar. Amber tinha virado tudo de pernas para o ar, com cartazes com meu nome e enfeites coloridos para todo lado, sem contar nas outras líderes de torcida trabalhando.
- Uow. – Foi o que ele conseguiu dizer.
- O que você quer, Billy? – Ela inqueriu.
- Eu vim porque queria fazer uma lista dos materiais que ainda faltavam para decoração... Mas o que você fez com essa sala?!
- O que parece, Terence?
- Olha, Amber, devíamos ser uma equipe neutra. Eu não acho que seja muito adequado...
- Blábláblá. Por que não fala com a minha mão? – Ela debochou com voz infantil. – Ninguém acredita realmente nisso, Billy. Além disso, ninguém acharia estranho se estivéssemos falando da campanha de Summer Olsen, certo?
Billy gaguejou para responder, e Amber colocou o dedo bem na cara dele.
- A-HA! – Ela exclamou. – Sabe que eu estou certa, Billy Terence. Agora dê o fora daqui, estamos trabalhando.
Atordoado com aquilo, Billy gaguejou mais uma vez, mas acabou saindo rapidamente da sala. Até eu estava com medo do quão enérgica Amber parecia. Então ela se virou para mim.
- Quanto a você, querida... Faça um favor a si mesma e vá passar um corretivo.
Amber estava certa, eu sabia, mas o verdadeiro motivo para eu ter acatado sua ordem era que queria me livrar dela. Tinha absoluta certeza de que estava começando a desenvolver alergia à sua voz, e toda vez que ela começava, sentia que ia ter outro choque anafilático.
Entrei no banheiro – que graças aos céus estava vazio – e procurei na mochila o corretivo que tinha comprado em minha viagem com as garotas, mas descobri que não o tinha levado. Ainda assim, meu desespero para me livrar de Amber era tão grande, que continuei revirando a bolsa enquanto praguejava em Português.
- Porcaria, onde você se enfiou? Anda, aparece! Você tem que estar aí!
- Eu não entendi metade do que você disse, mas olha, me pareceu um palavrão.
Olhei para trás, envergonhada.
- Annabeth. – Falei, colocando o cabelo atrás da orelha.
- Está tudo bem. Também xingo quando estou sozinha aqui, às vezes.
Eu sorri.
- Sinto muito pelo que está acontecendo. – Ela disse então.
E, curiosamente, foi a primeira pessoa a dizer, fora a meu pai e Miguel. É claro que Summer tinha se preocupado em saber a verdade e se importava comigo; mas aquelas duas palavrinhas vindo de alguém que nem precisava se dar a esse trabalho, tiveram um peso diferente no meu coração. Me senti menos rejeitada. E grata.
- Talvez seja um pouco culpa minha também. – Admiti apesar disso.
- Por Deus, tentaram te matar outro dia! – A garota exclamou. – Seu carma não pode ser tão ruim assim.
Dei de ombros, pensando que, na real, podia sim.
- O que estava procurando?
- Meu corretivo. Eu vim sem maquiagem hoje e a Amber pirou. Coisas de campanha.
- Hum... – A menina levou a mão ao queixo. – Talvez eu possa ajudar nisso.
A sensação do mexe-mexe no meu rosto acabou tão rápido que eu mal acreditei.
- Bem melhor. – Doug, o maquiador do clube de teatro, observou orgulhoso.
- Você é incrível. – Toquei de leve meu rosto, sem querer estragar tudo. – Já te disseram isso?
- De vez em quando eu digo para mim mesmo na frente do espelho. – Ele ponderou, dando um sorriso tímido. Nós rimos.
- Não sei como te agradecer.
- Agradeça à Annabeth. – Ele dispensou, tocando o ombro dela. – Estou sempre fazendo favores a ela. Mas se quer saber... – Acrescentou, abaixando-se perto do meu rosto. – Eu estou mesmo torcendo por você nessa disputa.
Doug sorriu e agradecemos de novo, então ele foi embora para sua aula.
- Por que ninguém sabe que ele é um gênio? – Perguntei a Annabeth, que tinha se sentado de frente para mim.
- Essa escola está cheia de gênios invisíveis e idiotas visíveis demais. – Ela deu de ombros.
Eu concordei em pensamento, e de repente me lembrei de Collie, minha amiga de Denver. Collie era tão exótica e engraçada, e era exatamente como ela pensava. Como nós pensávamos, na maior parte do tempo.
- O que foi? – A garota quis saber.
- Eu só lembrei de uma amiga minha que dizia mais ou menos isso aí. Eu sinto falta dela. Ela me mataria se visse onde eu estou agora. – Recostei a cabeça no banco.
- Se visse que você virou uma líder de torcida mega popular e candidata a Rainha do Baile? – Ela riu.
- Talvez ela se divertisse com essa última parte. – Sorri. – Mas... É. Esse não era exatamente o meu plano quando cheguei aqui. Se eu tivesse seguido o plano, eu teria entrado só para o grupo de teatro, estaria ensaiando feito uma louca para a peça... Teria ficado sua amiga há muito mais tempo. – Olhei para baixo, pensando em como as coisas podiam ter sido.
- Sabe, ... – Annabeth colocou a mão no meu joelho. – Talvez você faça planos demais.
E eu olhei para ela, e as palavras tinham sido ao mesmo tempo muito simples, ao mesmo tempo reveladoras.
- A gente não pode controlar tudo à nossa volta. – Ela dizia, falando com uma força enorme para alguém tão pequena e engraçadinha. – A gente não controla, mesmo quando pensa que sim.
- Você planeja ir à praia, mas aí amanhece chovendo. – Ela continuou. – Você quer que seu personagem preferido do livro não morra, mas ele morre. Você planeja uma noite do filme com seus amigos e a energia elétrica acaba nos créditos iniciais. Você gosta de alguém, mas essa pessoa não gosta de você. Você. Não. Tem. Controle.
Eu não conseguia falar nada. Eu olhava para Annabeth – tão frágil, tão forte – e me perguntava por que nunca tinha realmente falado com ela antes da semana do choque anafilático. Também pensava na verdade de tudo aquilo que ela dizia e em como eu tinha sido tão boba por todo aquele tempo.
- Se planos funcionassem perfeitamente, eu seria um prodígio na Broadway, em vez de estar presa nesse fim de mundo litorâneo aturando o estrelismo de Jasmine Garcia. – Suspirou. – Mas eu estou aqui agora, sentada de frente para uma pessoa um tanto quanto perdida, usando meus favores com o Doug para melhorar o dia dela porque ela sempre foi legal comigo, apesar de ser bonita e eu ser da produção. E, por hoje, isso me basta, entende? – Sorriu. – Não que eu seja muito astrológica, mas eu acredito que as coisas acontecem como elas têm que acontecer. Então eu faço minha parte na minha vida e, apesar de saber o que eu quero aconteça através disso, entendo que não adianta esquentar minha cabeça, porque eu não controlo o mundo, as pessoas, o destino. – Deu de ombros, como se não tivesse dito nada demais. – Você devia fazer o mesmo, e aí talvez percebesse que não é só culpa sua que todo mundo esteja com raiva, e que tudo que pode fazer agora é ser você, viver sua vida, e se fez algo de errado que tem solução, tentar consertar.
Depois de todo aquele tempo, me senti um bocado mais leve. Não só por achar, agora, que não era a exclusiva culpada do que estava acontecendo, mas por entender que eu não tinha como controlar o que estava havendo. A raiva de Jodi e Emma, as mentiras de Perry Gold, a loucura de Amber e ...
Annabeth estava certa: tudo que eu podia fazer agora era continuar fazendo as coisas e sendo eu. E se eu conseguisse consertar algo, eu o faria, mas no geral, tinha que lidar com que estava acontecendo fazendo a minha parte, sem me torturar com realidades alternativas e planos mirabolantes.
Olhei para ela.
- Obrigada, Annabeth. Você é mesmo um gênio. – Ri um pouco.
- Eu faço o possível. – Ela riu também. – Agora, quer ajuda para decorar as falas da peça? Você me parece bem ocupada com mil coisas, e temos ensaio amanhã. Não queremos que a senhorita Elizabeth surte, né?
- Não. – Me recompus. – Não mesmo. Vamos fazer essa peça, pelo menos, dar certo.
Ensaiar com Annabeth aumentou consideravelmente meu ânimo. Não só o que ela tinha me dito, mas estar na companhia de alguém que não estivesse envolvido naquela loucura toda, pela primeira vez em tanto tempo, era maravilhoso.
O que não me fazia sentir menos falta de , e, para minha surpresa, também de . E quando eu fui fazer compras no mercado naquela tarde, só conseguia pensar em quando fazíamos isso juntos. Doeu um pouquinho andar por aqueles corredores sozinha, mas tentei manter em mente o que Annabeth me dissera, sobre não adiantar ficar me preocupando. Quando tivesse oportunidade, me desculparia de verdade. Era tudo que eu mais queria agora.
Estava pegando uma beterraba para fazer o jantar com Miguel – Jack podia estar melhor, mas queria garantir que ele não comesse nenhuma porcaria até estar 100% bem – quando vi a senhora Slaterton vindo para a mesma banca que eu. Ela, no entanto, só me viu quando já estava de frente para mim, do outro lado da pilha de raízes vermelhas.
- Ora, ora. – A mulher disse com desdém, e uma pitada bem óbvia de insatisfação.
- Boa tarde, senhora Slaterton. – Cumprimentei.
- Era boa até agora. – Ela ergueu uma sobrancelha.
É claro que a mãe de Jodi sabia o que estava acontecendo na escola. Nada passava despercebido pelos olhos de águia da matriarca Slaterton, e se antes ela já não simpatizava comigo, agora provavelmente queria me queimar numa fogueira. Eu sabia, no entanto, que não devia me chatear com isso. Era a filha dela, afinal.
- Bom, sinto muito por ter estragado seu dia. – Falei, sendo sincera mesmo. – Até outra hora.
Já estava empurrando meu carrinho para longe, quando ela voltou a falar, fazendo com que eu me virasse.
- Sabe, . – Disse em uma voz alta e firme, como uma juíza dando sua sentença. – Eu sempre soube que você não era uma boa companhia para Jodi Lyn, apesar de ela insistir no contrário. Mas eu nunca pensei que seria capaz de tamanha falta de caráter. – Se empertigou toda. – Não sei que tipo de criação recebeu de seus pais boêmios nesse mundo artístico irresponsável e competitivo, mas...
- Senhora Slaterton, por que não cala a boca?
As palavras saíram tão rápido que não consegui controlar. Mas também, eu não quis. Eu podia aturar todo tipo de ofensa, mas não deixaria que ela atacasse minha família – não mais do que ela já vinha fazendo há meses.
A mãe de Jodi estava estarrecida com meu corte. Sua boca estava aberta, mas ela não falava nada por completo.
- Mas como pode... – Ela gaguejou, ultrajada.
- Olha, eu não ligo se a senhora quiser me odiar. – Falei com calma, mas firme, voltando até ela. – Mas eu não vou deixar que fale do meu pai de novo, muito menos da minha mãe que, por Deus, a senhora nem conhece! O meu pai não é nenhum vagabundo, como a senhora gosta de insinuar; ele tem um trabalho. Ele é músico, e eu tenho muito orgulho disso. – Afirmei. – Eu entendo que esteja chateada pela sua filha, mas isso não te dá o direito de ofender minha família desse jeito. E, por sinal, também não dá pra dizer que a Jodi tem sido a melhor das amigas, quando ela acreditou no primeiro mentiroso que tentou jogá-la contra mim sem mal questionar.
A mãe de Jodi estava tão chocada. Eu nunca pensei que fosse ver a arrogante senhora Slaterton sem palavras, mas lá estava ela. Eu tinha dito o que precisava dizer.
- Agora sim... – Falei me recompondo. – Até outra hora.
E saí com meu carrinho, deixando-a ali.
Entrei em casa, surpresa comigo mesma. Fiquei recostada na porta por alguns instantes.
- Comprei esse peixe com os pescadores da Praia da Costa. Vamos fazer um assado. – Miguel disse animado ao ver que eu estava ali, exibindo o peixe. Então ele notou minha expressão. – O que houve?
- Eu... Acho que mandei a mãe da Jodi calar a boca. – Contei.
- Por quê? – Ele ergueu uma sobrancelha.
- Porque... Ela falou mal do meu pai. E meu pai é a melhor pessoa do mundo.
Miguel deu de ombros.
- Então você fez bem. A família é o que mais importa.
Sorri para ele, me aproximando quando ele fez sinal para que eu o fizesse. Fomos andando juntos a caminho da cozinha.
- Vou te contar uma coisa. – Miguel dizia. – Da última vez que falaram mal da minha mãe perto de mim, eu acabei indo parar na cadeia...
E eu dei risada, pensando que a paranoia de , na verdade, talvez não fosse tão infundada.
POV
Eu jogava as chaves do carro para o alto, assobiando uma música do Sonny Rollins. Tinha que passar no mercado para comprar um sorvete para mamãe. Estava abrindo a porta, quando alguém me chamou.
- Ei!
Olhei para trás. Summer vinha correndo em seus tênis brancos.
- Se esqueceu da minha aula de violão ontem?
Levei a mão à testa.
- Putz, Sum, é verdade! – Exclamei. – Foi mal, desculpa mesmo.
- Tudo bem, , eu também podia ter te ligado, mas pensei que devia estar com a cabeça cheia com tudo o que está acontecendo.
- E estou. – Admiti.
- Viu só? Que bom que eu não liguei então. Mas podemos fazer a aula agora mesmo, na sua casa, se estiver com tempo livre.
- Na verdade, estou sim. Eu... Larguei o trabalho. – Contei, entrando no carro. – Entra aí. Mas vamos ter que passar no mercado antes.
Summer entrou no carro e saímos do estacionamento da Jacksonville High, pegando a estrada rumo ao meu bairro.
- Largou o trabalho? – Summer questionou. – Por quê? Porque brigou com a ?
- Ah, então você já soube.
- Em partes, é. – Ela assentiu. – , eu entendo que possa estar chateado com ela, mas você adora o trabalho no Roger's.
- Eu precisava de um tempo para pensar. – Falei, curvando.
- Eu acho que está pegando pesado com a . – Ela recostou no banco, olhando pela janela. – Quer dizer, ela não pode ter feito nada tão ruim assim. Devia falar com ela e resolver isso.
Fiquei imaginando o que Summer diria se soubesse realmente de tudo que a tinha feito. Ela acharia mesmo que não era nada demais? Provavelmente não.
- Quer ouvir música? – Falei, em vez de insistir no assunto. – Tenho umas novas bem boas.
Liguei o som do carro e Summer riu, balançando a cabeça.
- , ... – Disse. – Você não muda mesmo.
Summer me acompanhou no mercado, e sabendo que ela estava claramente tentada a tocar no assunto do meu namoro outra vez, aproveitei um momento de distração dela – enquanto escolhíamos um sabor de sorvete para minha mãe – para falar de outra coisa.
- Você não está muito empenhada na sua campanha esse ano, né? – Indaguei, pegando um sorvete de flocos.
- Não estou ligando tanto, para falar a verdade. – Ela tomou o pote das minhas mãos e o trocou pelo sabor torta de limão.
- E por quê?
- Não sei. – Ela deu de ombros. – Acho que estou um pouco cansada dessa loucura toda.
- E quanto ao Junior? Estou bem certo de que ele deve estar esperando ser rei do baile como em todas as outras vezes.
- Bom... Não sei se vou ao baile com o Junior esse ano. – Ela estava pensativa, embora tentasse falar rápido para parecer que não dava tanta importância. – Você sabe como as coisas estão.
- É, eu sei. Sinto muito. – Falei, mas não sentia.
- Eu queria não me sentir tão culpada por como as coisas estão entre nós. Quer dizer, eu sei que o Junior é um idiota às vezes, mas eu ainda me sinto a grande responsável por não estarmos juntos agora. – Suspirou, triste. – Acho que eu sou mesmo a responsável, na verdade.
- Ah, mas não é mesmo. – Não consegui me conter. – Junior sempre foi um idiota. Eu me lembro de ter te dito isso anos atrás, e eu continuo achando a mesma coisa. E a culpa obviamente não é sua.
Summer parou de andar, séria por um instante. Depois, sorriu para mim.
- Eu precisava mesmo de alguém que xingasse ele para eu me sentir melhor.
Dei risada dela. De repente, Summer olhou para o lado e arregalou os olhos.
- A está aqui! – Ela agarrou meu braço. – Olha lá!
Olhei para o ponto distante, a garota na fila do caixa. estava usando um casaco largo e um rabo de cavalo alto. Ela não estava nos vendo. Respirei fundo.
- Você tem que ir lá falar com ela, . – Ela decidiu. – Vai logo.
- Não sei se é uma boa. – Enrolei.
- , você tem que conversar com a . – Summer puxou meu rosto e me forçou a encará-la, aqueles olhos claros insistentes como nunca. – Vocês se gostam, não seja um mané e estrague isso.
Encarei Summer por um segundo – querendo brigar com ela por me chamar de mané, pensando se estava certa. Talvez eu devesse ir até lá falar com a , ainda que fosse para perguntar do Stevie. Mas, quando olhei de novo, já tinha ido. Olhei para Summer e dei de ombros. Ela fez cara feia para mim.
Antes que ela brigasse comigo, porém, avistamos a senhora Slaterton, mãe de Jodi. O rosto dela estava pálido enquanto ela empurrava o carrinho, parecendo muito perplexa. Quando a mulher nos viu, Summer acenou. Ela se recompôs e veio em nossa direção, e eu perdi de vez a chance de falar com minha falsa namorada. Talvez fosse a vida me impedindo de fazer uma loucura, afinal.
Ainda assim, não consegui parar de pensar no que Summer disse quando voltei para casa. E no que Miguel disse. E no que minha mãe disse. E no que meu próprio coração dizia, disparando toda vez que a via.
Talvez eu estivesse agindo errado com a , sendo infantil. Não tinha outro jeito de resolver as coisas – ainda que eu não soubesse o que resolver significava para nós – que não fosse conversando cara a cara. Eu, melhor que ninguém, devia saber disso, visto que minha decisão do passado de esconder da Summer quem Junior realmente era tinha nos levado até a catástrofe atual, e sendo eu próprio filho de duas pessoas que haviam se separado por guardarem tudo para si próprias. Ainda que eu e a fossemos só um casal de mentira, eu gostava dela de verdade.
Decidi que precisava conversar com ela sobre o que tinha acontecido, e sobre o que estava acontecendo. Em pouco tempo teríamos também um baile para ir, afinal.
Enfiei no corpo uma camisa branca que estava dobrada numa cadeira, na manhã seguinte, e joguei a mochila nas costas e saí de casa, prometendo a mamãe que ia dar um jeito na minha vida quando ela perguntou.
- Acho bom. – Ela assentiu com força, sorrindo. – Conversar é fundamental. Hoje mesmo eu vou conversar com Henry sobre comprarmos aquele carrinho de quinhentos dólares com renda amarela.
- Vou dizer a ele que acho uma boa ideia. – Ri. – Tchau, mãe.
Dirigi até a escola pensando no que eu ia dizer e em como não ia me deixar enrolar dessa vez. Por sorte, não dei carona a naquele dia, ou ele teria ficado palpitando no meu discurso. Também não falei a ele o que faria. Aquilo era coisa minha.
Percebi que eu também precisava contar para ela sobre o que tinha acontecido com Junior no nosso ano de calouros. Durante todo aquele tempo, eu tinha deixado que ela alimentasse uma visão incompleta de quem ele realmente era, e se era para falar a verdade, aquilo também tinha que ser dito, visto que tinha sido o princípio de todo o caos em que nos encontrávamos agora. De certa forma, eu tinha mentido também.
- , três anos atrás... – Eu ensaiava, caminhando em direção ao prédio principal. Foi quando eu vi.
Há alguns metros de onde eu estava, estava o secto de líderes de torcida que tinham começado aquela campanha absurda para , dias atrás. Isso não era novidade; Amber Hayley estava migrando para outra vizinhança desde que começara a ganhar destaque. Ela sentia a popularidade fluindo de Summer para a garota nova, e não queria ser deixada de lado. Com elas, estava Junior, que parecia empenhado em fazer com que vencesse Summer – o que talvez fosse uma espécie de vingança. Isso também não era nada novo.
A coisa nova era que ali, no meio deles, naquele dia, estava a própria Vicentini Pie, erguendo um cartaz que tinha seu nome com uma coroa no lugar do pingo do i. Ela gritava e sorria para as pessoas, enquanto do outro lado, um grupo de jogadores uniformizados do Swordfish erguia Jodi nos ombros e gritava em seu favor, guiados por Brad Winter.
Aquela visão poderia ser apenas absurda, mas foi muito mais do que isso. Engoli em seco e apertei com força as mãos, sentindo muita raiva de repente.
Ali estava eu, pronto para falar de verdade com a , preocupado com a briga dela com as meninas, desejando resolver tudo, enquanto ela estava fazendo campanha para ser rainha do baile junto com Junior . Ela estava enfrentando a Jodi, e claramente não estava nem aí para o fato de ter brigado comigo. Como sempre, ela tinha um plano maior.
Joguei meu discurso no lixo, bufei de raiva e passei reto atrás dos seguidores de Jodi, entrando no prédio.
POV PIE
- Como está o café? – Miguel perguntou.
- Por mim poderia ter mais açúcar, mas está ótimo. – Respondi.
- Vai acabar diabética assim.
Ouvimos o rangido da madeira sobre seus pés e então papai entrou na cozinha.
- Ei, pai. – Sorri.
- Rain. – Papai se inclinou e beijou minha cabeça, depois bateu no ombro de Miguel e se jogou um tanto quanto desajeitado na cadeira.
- Tem algo de errado com sua perna, Jack? – Perguntei, porque ele a mantinha esticada.
- Dei um mau jeito enquanto dormia, eu acho. – Ele disse.
- Você tem andado numa maré de azar terrível. – Comentei.
Miguel tossiu e achei que ele tinha engasgado, mas logo em seguida ele olhou para mim e disse:
- O nome disso é velhice, .
- Vá amolar outro. – Papai respondeu.
Me levantei e levei a xícara para a pia.
- Eu falei com outro dia. – Miguel comentou. Olhei para ele, curiosa. – Sobre o trabalho.
- E ele? – Papai perguntou.
- Acho que consegui fazer com que pensasse. – Coçou o queixo. – Também conversamos sobre o Jack. Devia contar para ele que seu pai está melhor, .
Não falei nada, mas assenti. Me lembrei de Annabeth dizendo que tudo que eu podia fazer agora ajeitar as coisas, se tivesse chance. Miguel tinha me dado uma. Eu ia falar com .
Tentei não me preocupar tanto com isso a caminho da escola. Annabeth podia ter se oferecido para me ajudar com as falas da peça, mas eu também não queria abusar. Estava me esforçando para não fazer tudo errado e enlouquecer a senhorita Elizabeth, mas estava sendo difícil. A história de Ebony Purplewood se revelava cada dia mais complexa do que me parecera a princípio.
- Estou certa de que ele gosta de mim, Castigo, mas está enfeitiçado pela tola Valerie, com seus risinhos e vestidos enfeitados. Mas tenho um jeito de resolver isso e colocar tudo no lugar. – Li com entonação forte a fala, ficando um pouco assustada ao perceber o quanto aquilo realmente se parecia comigo. O cara sentado ao meu lado no ônibus também me olhava estranho, e só então percebi que era o meu ponto.
Me levantei e dei sinal. O ônibus parou no lugar de sempre e eu segui a pé para a Jacksonville Beach High.
Lá ia eu, de cabeça baixa lendo meus textos. Amber gritou para mim. Acenei para ela, mas me mantive longe, cuidando da minha vida. A campanha seguia a toda, mas naquela manhã eu tinha outras coisas em mente. Além do mais, não queria irritar mais Jodi do que ela já devia estar irritada. Àquela altura ela já devia saber que eu tinha mandado sua mãe calar a boca. Eu acreditava que todos nós precisávamos de um pouco de paz, e estava focada nisso quando...
- SAI DA FRENTE! – Ouvi logo antes de levar um esbarrão.
Emma passou por mim como um foguete, uma fita amarela amarrada na testa, as bochechas pintadas como em uma guerra.
- Mas o que...
Logo os apitos começaram a soar e gritos altos masculinos se aproximaram. Até meu grupo de seguidoras pareceu assustado diante daquilo.
Alguns segundos depois, um bando de jogadores do Swordfish – mais da metade, na verdade – surgiu vindo dos fundos da escola, carregando uma Jodi Lyn feliz e sorridente nos ombros.
- SÓ HÁ ESPAÇO PARA UMA RAINHA! – Gritavam eles.
- JODI SLATERTON PARA RAINHA!
Eles literalmente fizeram a escola parar, sendo liderados pelo apaixonado Brad Winter, que parecia um general.
- JODI JÁ TEM A VITÓRIA! TRAIDORAS SÃO ESCÓRIA! – Eles cantavam.
Jodi me viu lá de cima e acenou para mim.
Aquilo foi a gota d'água. Deus sabia que eu tinha tentado consertar as coisas com ela, e ela podia estar chateada, mas aquilo era ridículo.
Furiosa, marchei até onde estavam minhas seguidoras – apavoradas, revoltadas – e peguei um dos cartazes.
- Me dá isso aqui! – Berrei, assustando-as mais ainda. – VAMOS, O QUE ESTÃO ESPERANDO? ELES ESTÃO NOS DESAFIANDO!
Amber engoliu em seco, mas logo se recuperou. Ela foi para frente das garotas e começou a entoar.
- QUANDO A FOR RAINHA, VOCÊ VAI CHORAR, BAIXINHA!
As outras faziam coro a Amber, os rostos vermelhos com o fogo da competição.
- EMMA HUGHES É UMA CAFONA, NÃO DAMOS CHANCE PRA BRIGONAS!
A coisa estava realmente pegando fogo. Ultrajada, Emma fez menção de se jogar em cima de Amber, mas foi contida pelos jogadores.
Eu já estava preocupada com o rumo das coisas, quando avistei quem realmente me importava. passou pelo corredor do prédio, e eu o acompanhei pela janela com os olhos.
- Quer saber? – Falei. – Segura isso aqui! – Empurrei o cartaz para uma das garotas e corri para longe dali.
Corri a toda para alcançá-lo. Queria pelo menos começar uma conversa com ele, ainda que fosse só para falar do Jack.
- ! – Chamei às suas costas.
parou e levou um segundo para se virar para mim, sério.
- Ei. – Disse me aproximando.
-... Oi. – Ele respondeu.
- Então... Soube que você andou conversando com Miguel. – Cruzei os braços em frente ao corpo, nervosa, e sorri.
- É, a gente teve uma conversa essa semana.
estava sendo bem frio, mas eu não ia me deixar abalar. Eu tinha que tentar.
- Vocês falaram do meu pai? – Perguntei, sem esperar resposta. – Bom, ele tem sentido sua falta, especialmente agora que está doente. Você bem que podia passar lá para vê-lo, e aí a gente podia conversar...
- Não acho que seja uma boa época para isso. – Ele me cortou. – Afinal de contas, você anda muito ocupada com sua campanha para ser rainha daquele Baile de Outono idiota.
- Não... Não, eu não ligo para o baile. Eu só estava lá porque...
- Não se preocupe em explicar. A vida é sua, se quer se meter nesse circo que Amber e Junior armaram. – Deu de ombros. – Eles querem mesmo que você ganhe, eu acho. Afinal de contas, provavelmente ele pretende que você seja o par dele na festa.
Mas por que ele estava agindo daquele jeito? Será que acreditava mesmo que eu tinha armado para Jodi para ser rainha do baile? Que eu tinha planejado qualquer daquelas coisas?
Meu coração bateu forte de mágoa. Ele devia me conhecer melhor que isso. Como ele podia pensar que eu enfrentaria Jodi por causa de uma coroa idiota? Ela era minha amiga.
Pensei em como eu vinha me sentindo mal pela nossa briga, em como eu vinha me sentindo mal pela briga com Jodi, e então fiz o que Elizabeth me dissera.
Tudo que eu podia fazer era ser eu mesma, e se era a fria e maquiavélica que ele via mesmo agora, eu não podia fazer nada.
[N/A: Podem dar play nessa e ler com calma!]
- Tem razão. Por que estou sequer te explicando? – Abri os braços. – É a minha vida, afinal, e se eu quiser ser a rainha do baile, tenho mais é que apoiar a única campanha que estão fazendo para mim, já que minhas melhores amigas decidiram me odiar, baseadas na palavra de um cara que vive mentindo. – Assenti. estava calado. – E eu não tenho mesmo tempo para estar aqui debatendo isso com você, se quer saber, porque tenho as falas de uma peça para decorar, provas para estudar, e um pai que está doente há dias e com o qual eu tenho ido e voltado do hospital em horários aleatórios. Então não, eu não tenho mesmo espaço na agenda para essa conversa. – Saí andando, mas voltei. – E só para tirar esse peso das suas costas... O prazo estipulado acabou. Ele até excedeu. Não sou mais sua namorada. Está livre disso.
Saí andando com os olhos cheios de lágrimas, mas a cabeça erguida. Eu podia ter errado muito, mas não levaria a culpa pelo que não tinha feito.
Eu vinha tentando consertar as coisas, mas do jeito que as elas estavam, era impossível. Por mais que eu gostasse de ou Jodi, não podia e nem iria obriga-los a acreditarem em mim. E, de repente, parei de me importar.
Entrei no auditório do teatro, que estava vazio, e me deitei no palco. Com as lágrimas já secas, fiquei relendo as falas de Ebony, me encontrando cada vez mais naquele papel da bruxa, que, apesar de arrependida, não deixava de ser quem era. Infelizmente, eu não tinha poderes mágicos para desfazer tudo que tinha feito, mas pelo menos tinha libertado aquela pobre vítima de sua maldição.
Os outros podiam estar certos. Talvez eu fosse um tanto quanto malvada, mas o problema agora era todo meu.
26- I feel a little better
"And even a little is still better."
- Ah, não acredito que você finalmente colocou! – Exclamei ao ver o piercing no lóbulo da orelha de Sofia.
- Não acredito que a velha demorou tanto a me deixar colocar. – Ela disse, exibindo a orelha na webcam. – Quer dizer, como se ela não fosse uma rebelde festeira bem pior que eu na adolescência. Ela andava com o Jack, fala sério.
- Ei, meu pai era um bom moço. Não meta ele nessa história.
- Estou certa de que eles usavam todo tipo de alucinógenos. – Ela ergueu as sobrancelhas. – Mas me fala, como está o tio Jack?
- O Jack está melhor. – Respondi. – Os remédios estão funcionando.
- É muito bom ouvir isso. Você tem andando tão cansada.
- É, eu tenho sim. – Concordei. – Mas não posso reclamar do Miguel. Ele tem me ajudado como pode. É só que é o meu pai, entende? Eu me sinto responsável.
- Argh, eu queria tanto ir até aí e te ajudar a resolver tudo de novo! – Ela resmungou. – E dar uma porrada naquele tal de Perry Gold também.
- Eu também queria te ver, mas não se preocupe, as coisas vão ficar bem. – Afirmei, positiva. – Se quer saber, já me sinto melhor hoje, apesar de tudo. Vou começar a dar um jeito.
- E qual vai ser o primeiro passo?
Fiz uma careta, recostando de vez na cadeira.
- Você não vai querer saber.
Quando abri a porta do comitê de baile, as Preguiças Imitadoras olharam para mim ansiosas. Geralmente eu andaria o mais rápido possível para fugir delas, mas dessa vez eu me aproximei e sorri discretamente, antes que elas voassem em mim.
- Já vou falar com vocês.
Elas assentiram em conjunto, felizes, e voltaram a falar do que quer que fosse. Então eu fui até Amber, a Preguiça Chefe, que de preguiçosa na verdade não tinha nada. Ela estava falando ao telefone. Estava tão concentrada que mal percebera minha presença.
- É, e eu preciso disso, tipo, pra ontem! – Ela falava. – Moço, o destino de dezenas de jovens está nas suas mãos, eu não quero saber se está resfriado. – Então ela me viu. – Olha, apenas faça, ok? Ligo mais tarde. – E ela desligou. – Vejam só quem veio dar o ar da graça.
Amber falou isso de um jeito meio ressentido, porque, apesar do meu surto no dia anterior, eu tinha voltado a ignorar as mensagens dela quando voltei para casa. Mas não havia sido nada pessoal, eu só precisava me organizar antes de lidar com ela.
- Ok, se tem que ser feito... Me desculpe por ter fugido ontem, Amber. – Fui logo falando.
Ela arqueou uma sobrancelha, surpresa. Eu continuei:
- E me desculpe por ter fugido por todos esses dias, porque, sim, eu fugi. Eu estava ocupada com o Jack também, mas depois do que aconteceu com a Jodi eu só queria me esconder de tudo que tivesse a ver com a competição. – Admiti, deixando Amber de fato sem reação, além de abrir a boca um pouquinho. – Mas eu estou aqui agora, e eu sei que tem dado o sangue por isso e quero ajudar. Então, me diga o que eu tenho que fazer e eu farei.
Amber agora parecia sinceramente emocionada, como se eu fosse uma espécie de Filho Pródigo. Sem nenhum aviso prévio, ela me puxou para um abraço sufocante.
- Eu sabia que você ia cair em si. – Ela disse. – Ser rainha é a melhor coisa que podia te acontecer. – Se afastou sem soltar meus ombros. – Agora, a primeira coisa a fazer é vestir a camisa.
- Claro, estou pronta para me esforçar.
- Não, eu digo literalmente. – Ela foi até uma caixa de papelão e puxou uma camiseta de dentro dela. Era azul e tinha P gigante como estampa. – Eu mandei fazer. É de "Pie".
Ok, aquilo passava um pouco de qualquer limite de sensatez que eu tivesse, mas se era para entrar chuva...
- Tudo bem. – Peguei a camiseta das mãos dela e vesti por cima da que eu estava usando mesmo. – Vamos trabalhar.
Amber abriu um sorriso de orelha a orelha.
- Eu estou tão feliz que esteja aqui. – Disse com os olhos brilhando. Então a porta se abriu e ela mudou de foco. – GATINHO! – Ela exclamou. – Olha quem está aqui!
Olhei para trás e encontrei , blusa xadrez vermelha, mãos nos bolsos dos jeans.
- Ei, Ambie. – Ele disse. – Oi, . Vim ver como estão as coisas.
Amber foi para perto dele e lhe plantou um beijo na bochecha.
- Estão à toda, mas agora é que vão deslanchar. – Afirmou. – Tenho que fazer uma ligação. Fique com a nossa rainha um pouco.
Amber saiu da sala e eu e ficamos nos olhando meio sem jeito por alguns instantes. Então ele se aproximou.
- E aí, como vai...
- Tudo? – Sugeri. Ele assentiu. – Na medida do possível, estou levando.
- É bom ouvir isso. – Disse. – A verdade é que eu vim aqui porque queria te ver.
- Por quê? – Franzi o cenho.
- Porque eu sei que toda essa história do Perry é mentira e fiquei revoltado com o que aconteceu, especialmente porque tanta gente acreditou. – Balançou a cabeça. – Eu quis saber como você estava. – Coçou o queixo. – Da última vez que nos falamos, eu estava com muita raiva, mas sei que você nunca faria isso com a Jodi e a Emma.
Sorri, sentindo uma gratidão imensa. De todas as pessoas, era a que menos tinha a obrigação de acreditar em mim, e, no entanto, ali estava ele.
- Muito obrigada por isso. De verdade. – Sorri.
- Ok, acho que isso é uma trégua. – Ele sorriu de volta, meio acanhado. – Mas caramba, que história louca foi aquela de ameaçar a Rosana? – Acrescentou em voz baixa.
- Eu estava fora de mim. – Respondi no mesmo tom, puxando-o para mais longe dos outros. – A Rosana me tirou do sério, mas se tem uma coisa de que tenho me arrependido, é de ter feito aquilo. Eu estava no auge da loucura, e estava com ciúmes, eu acho.
- acha que você fez pela mentira de vocês. – arqueou uma sobrancelha.
- Não. Eu também disse isso pra mim mesma na época, mas sei que não era verdade agora. Eu estava com ciúmes porque ela continuava perseguindo o . – Confessei. O garoto olhou para mim intrigado. – , eu... Eu gosto do . Gosto mesmo.
- Tem que falar com ele. – Ele me encarou como se fosse óbvio.
- Eu não posso. E, de todo modo, ele me odeia agora.
- , não te odeia; ele não conseguiria nem que quisesse, e olha que ele tem tentado. Ele só está colocando a cabeça no lugar de um jeito antissocial e mal-humorado, porque é isso que ele faz. – disse com firmeza. – Eu sei que ainda tem toda essa loucura do Junior a ser explicada, mas você tem que contar a verdade a ele.
Balancei a cabeça, dando um sorriso triste, e apertei a mão dele.
- , desde que eu cheguei, tudo que fiz foi falar o que eu achava que devia e o que tinha vontade sem pensar em como isso afetaria o . Eu não vou fazer isso de novo. Ele vai ficar bem melhor longe dessa loucura. Você sabe.
parecia ávido para discordar de mim, mesmo sabendo que eu estava certa. Mas antes que ele tivesse tempo, Amber voltou.
- Certo, gente: precisamos ir buscar umas coisas na cidade. – Ela decretou.
Olhei para e dei de ombros. Não havia o que discutir.
Depois de ter ajudado Amber no que ela precisava, me despedi de e tomei o rumo da biblioteca. Precisava de um livro que me ajudasse a estudar para a prova que tinha perdido. Jack tinha passado mal em uma manhã em que eu tinha uma terrível prova de Química a fazer e Miguel não estava em casa. Agora, eu teria que fazer a prova no dia seguinte; e uma vez que não tinha mais a ajuda de Jodi para estudar, o jeito era revisar tudo sozinha.
A biblioteca estava quase vazia quando entrei, mas havia Teddy Moore, da torcida, sentado à uma das mesas com uma outra animadora e Jasmine. Eles olharam para mim de soslaio e cochicharam quando entrei, e eu me senti um pouco mal, mas ignorei.
- Bom dia, . – Stuart, o estagiário que trabalhava nos registros, sorriu para mim, tirando minha atenção deles.
- Bom dia, Stuart. – Sorri de volta. – Aquele livro de Química que eu reservei já voltou?
- Já, sim. Separei ele para você. – Ele pegou o livro embaixo da bancada. – Dias difíceis, não é? – Ele comentou enquanto passava o livro no scanner.
- É, não tem sido os melhores. – Concordei.
Stuart me entregou um papel para assinar e olhou discretamente sobre seu ombro, voltando-se para mim de novo.
- A propósito, eu não acredito em nada do que aquele Gold disse. – Ele falou baixinho. – Não devia deixar eles te chatearem.
Eu sorri, percebendo cada vez mais que as melhores pessoas daquele lugar, como Annabeth me dissera antes, eram aquelas que passavam despercebidas.
- Obrigada, Stuart. – Devolvi o papel a ele e peguei o livro. – Trago isso depois.
Saí da biblioteca para ir embora, mas mal tinha dado dois passos e a porta se abriu de novo.
- Pie. – Jasmine surgiu, um sorriso no rosto.
- Jasmine. – Falei simplesmente.
Ela se aproximou quase dançando e me encarou.
- Eu só queria saber... Como está sendo ser aquela que todos odeiam? Deve ser uma mudança e tanto depois de ter enganado todo mundo.
Pensei em dar as costas e ir embora, mas voltei atrás. Eu não ia brigar dessa vez, mas tinha que dizer o que queria desde o início.
- Olha, depois de todo esse tempo, eu tenho que dizer... Eu não sei o que raios você tem contra mim. – Dei de ombros. Minha resposta pareceu deixar a garota sem reação. Ela estava esperando uma briga. – Sério. Agora tudo bem, mas antes? Eu nunca tinha te feito nada e você já fazia da minha vida um inferno. Por quê?
Jasmine torceu a boca, irritada.
- Tudo que você fez desde que chegou aqui, Pie, foi atrapalhar minha vida. Por sua causa todo mundo acha que eu sou uma bruxa.
- Todo mundo já achava isso quando eu cheguei, Jasmine, o que quer dizer que a culpa não é minha. – Me isentei. – A culpa é sua. Você é bonita, é talentosa, mas isso não faz diferença nenhuma porque você é má e cruel. Não conseguiu ser amiga nem da Summer, que gostava mesmo de você.
- A Summer é uma tonta. – Ela esbravejou. – A prova disso é que ficou amiga da garota que quer roubar o namorado dela.
- Sabe muito bem que eu não era ameaça para Summer quando cheguei aqui. E, de todo modo, você nunca se importou de verdade com isso, não é? Você só me escolheu para odiar. Talvez ache que eu roubei seu posto, ou que estraguei sua popularidade... No fim das contas, não importa. – Dei de ombros. – Eu já estou cansada, e acredito de verdade que você também.
Eu podia ver Jasmine fechando suas mãos com força, como se quisesse muito falar, mas não conseguisse. E essa era minha deixa.
- Se me dá licença, eu tenho que ir. – Falei me afastando.
Ainda a ouvi murmurar baixinho, a voz meio engasgada.
- Isso não acabou ainda, Pie.
Mas para mim tinha acabado. Percebi que gostaria de ter dito tudo aquilo a ela muito tempo atrás, antes de ter deixado ela me estressar ao ponto que conseguiu, antes de ter tomado qualquer atitude impulsiva por receio de estar sendo vigiada por ela.
Pelo menos agora eu tinha desentalado. Não tinha mais o que dizer a Jasmine. E também não tinha mais medo dela.
🌴💚🌴
Naquela tarde, me sentindo ainda mais leve do que antes, cheguei em casa e constatei que não havia ninguém. Eu bem havia dito ao Jack que ele tinha que repousar, mas teimoso como ele era, achei que devia ter ido para o Roger’s atrás de Miguel.
Mas eu me enganei. Ele era ainda pior do que eu pensava.
- Não dá pra acreditar nisso. – Franzi a testa ao ver o bilhete colado na porta da geladeira.
“Querida ,
Fui correr na praia.
Papai”
Ele devia mesmo achar que já estava absolutamente recuperado, mas a verdade é que ainda tossia um pouco à noite. Nada satisfeita, fui dar uma olhada na caixinha de remédios que estava deixando na sala. Metade deles tinha acabado e eu não tinha me dado conta.
- Droga, . – Me repreendi, procurando dinheiro nas gavetas. Tinha que comprar os medicamentos antes que a noite chegasse e Jack piorasse de novo.
- Certo, não estou esquecendo de nada. – Falei sozinha, colocando um casaco. Embolei o cabelo no alto e já estava saindo quando ouvi um barulho. – Ah, não.
Lá estava Stevie, abanando o rabo e latindo, nervoso. Ele ficava assim quando passava tempo demais em casa, e desde que decidira desaparecer, eu estava me virando para passear com ele, pois o dálmata simplesmente não aceitava sair com Miguel.
Ele olhou bem para mim e latiu de novo.
- Ok, beleza. Você vai comigo. – Falei e o cão se aproximou, alegre. – Mas vai ter que se comportar, tá bom? – Me abaixei e passei a mão em seu pescoço, prendendo o puxador de coleira nele.
Mas Stevie era um cachorro, é claro, e não estava nem aí para o que eu dizia. Ficar em casa o deixava tão agitado, que agora, vendo o mundo lá fora de novo, tudo que ele queria fazer era correr feito um maluco, me puxando junto.
- Stevie! – Eu chamava. – Stevie, para! – Mas ele era muito forte.
Como por milagre, consegui fazer uma breve pausa no mercado, onde já éramos conhecidos, para comprar batatas e cenouras para o jantar, mas assim que saímos ele disparou de novo.
Cheguei na farmácia toda suada e, já prevendo a catástrofe que seria entrar com ele no estabelecimento, o prendi no poste em frente a porta. Stevie latiu, mas era necessário.
- Boa tarde. – Eu disse a moça da farmácia, que me respondeu sorrindo. – Por favor, eu preciso de um de cada desses. – Entreguei a receita.
Esperei enquanto a moça separava os remédios, me falando os preços que eu já tinha noção. Depois de passar no caixa, peguei de novo a coleira de Stevie e saí em minha saga, tentando controlá-lo e segurar a bolsa ao mesmo tempo.
Então ouvi o toque do meu celular e parei.
- Espera, meu telefone está tocando. – Tirei o aparelho do bolso para atender, mas antes que eu visse de quem se tratava, em um breve momento de descuido Stevie se soltou. Ele começou a correr loucamente atrás de um gato ao longe.
- STEVIE, VOLTA AQUI! – Berrei.
E lá fui eu, carregando os remédios, segurando o celular e correndo atrás do meu cachorro maluco pelas ruas de Jacksonville Beach. Corri tanto atrás de Stevie que senti fisgadas no estômago.
Finalmente ele parou, pois o gato tinha sido esperto o bastante para fugir. Puta da vida, me aproximei ofegante.
- Cachorro malvado! – Exclamei. – O que você pensa que eu sou?
Só quando já estava abaixada discutindo com meu cachorro, percebi que ele tinha parado justamente ao lado de um banco de praça, onde por acaso estava sentada Jodi Slaterton junto com outra líder de torcida.
- Ah, oi. – Eu disse.
Jodi ficou calada por um segundo, se empertigando toda, mas então devolveu.
- Oi.
Me levantei, segurando a coleira com firmeza, e então meu celular voltou a tocar. Finalmente consegui atender, dando alguns passos para me afastar das garotas.
- Pie?
- Sim?
- É da secretaria da escola. – A mulher explicou. – Você tinha uma prova de Química de segunda chamada marcada para amanhã, não é?
- Sim, eu tenho. Aconteceu alguma coisa? – Me preocupei.
- Sim, sim. – Concordou. – Seu professor foi convidado para participar de uma convenção representando a escola. Estávamos de fora até agora, mas agora que nos aceitaram, ele vai ter que ir amanhã.
- Mas... E a minha prova?
- Você pode fazê-la quando ele voltar. Semana que vem, na sexta-feira.
- Mas... É o fim de semana do baile. – Pensei em Amber fazendo um escândalo ao ouvir aquilo. – Não dá.
- Bem... – Ela falou com voz arrastada, como se eu fosse fútil. – Ele vai ficar aqui por mais umas duas horas hoje. Se preferir vir hoje, a prova já está pronta, na verdade. Mas é bom se apressar.
- Eu... – Olhei de um lado para o outro, indecisa. Stevie, remédios, legumes, e o tempo que eu não tinha de voltar em casa se quisesse ter tempo para fazer a prova direito. Mas era minha única saída. – Eu vou agora.
- Tem certeza? Devo avisar a ele?
- Sim, pode avisar. – Confirmei. – Obrigada por ligar.
- É sempre um prazer. – Ela bocejou e então desligou o telefone.
Olhei para trás de novo. Jodi me observava com atenção. Me voltei para Stevie, me abaixando à altura dele.
- Escuta, Bebezão, você vai ter que se comportar de verdade agora.
E, para minha sorte, ele até que se comportou. Toda aquela correria parecia ter gastado um pouco das energias de Stevie, de modo que ele ficou quieto dentro do ônibus a caminho da Jacksonville High, e não protestou – tanto – quando o prendi do lado de fora da sala do professor Leroy.
- Obrigada, Stevie. – Encostei minha testa na cabeça dele. – Vou te dar um sanduíche depois.
Entrei na sala com todas aquelas bolsas, e provavelmente parecia que eu precisava de um banho, mas o senhor Leroy não se importou muito.
- . – Ele sorriu.
- Obrigada por me deixar fazer a prova. – Falei, ainda ofegando um pouco. – Parabéns pela convenção.
- Não tem de quê, e obrigada. – Ele se levantou, indicou a cadeira ao lado de sua mesa e me estendeu uma folha. – Por que não se senta? Você tem pouco mais de uma hora.
E eu obedeci.
Quando finalmente acabei a prova, já estava escuro lá fora. Stevie levantou a cabeça, feliz por me ver.
- Vamos para casa. – Falei para ele, desamarrando-o.
Pegamos o ônibus ali perto, e eu já começava a sentir um pouco de sono. Pelo visto eu estava ficando viciada em dormir no transporte público. Mas me mantive alerta para não perder o ponto, brincando com meu cachorro, conversando com ele e pensando no que faria para o jantar, se chegasse em casa e ninguém o tivesse feito. A verdade é que eu queria mesmo tomar um banho e me espalhar na cama com um livro que não fosse de Química.
Abri a porta e soltei Stevie, que correu feliz por aí. Estiquei as costas, respirei fundo e fui para a cozinha com minha bolsa de legumes. Então notei que havia uma coisa em cima da bancada. Uma panelinha verde. Me aproximei e tirei a tampa.
O cheiro de comida quentinha invadiu minhas vias respiratórias e fez meu corpo relaxar na hora. Era macarrão com queijo e parecia delicioso, mas quem tinha feito? Eu ficava grata por não ter que cozinhar, mas não conhecia aquela panela.
Papai entrou na cozinha e foi direto para a geladeira.
- Pai, você fez isso? – Perguntei.
- Eu? – Ele me olhou. – Não, querida, quando cheguei já estava aí.
- E o Miguel?
- Também não. Ele chegou depois de mim. – Papai deu um gole em seu copo d'água.
Miguel surgiu à porta então, encarando Jack.
- E então, vamos? – Chamou.
- Vamos onde? – Arqueei uma sobrancelha.
Ele entrou na cozinha, os braços cruzados em frente ao corpo.
- Um velho que nos conhecemos teve a brilhante ideia de sair para correr no sol da tarde e agora está com dor nas pernas. – Denunciou. – Vou levá-lo ao hospital para tomar uma injeção para dor.
- É mesmo necessário? – Perguntei preocupada. – Dói tanto assim?
- Não. – Papai respondeu, olhando feio para Miguel. – Acontece que Mexicanos são muito dramáticos.
- Se ele tem um plano de saúde, por que não usar? – O outro deu de ombros. – Vamos logo.
Eu ainda parecia um pouco aflita, mas papai se aproximou e me tranquilizou:
- Eu estou bem. – Ele sorriu. – Só vou tirar proveito do que pago todo mês.
Dei um sorriso fraco de volta, decidindo brigar com ele só depois por ter ido correr durante a recuperação da gripe.
- Tá certo. Vou guardar macarrão para vocês. – Olhei para a panela. – Se é que é seguro comer isso.
- Ah, é sim. Eu dei umas garfadas quando cheguei e está ótimo. – Disse e eu arregalei os olhos. – Minha dor começou antes, não se preocupe.
- Tudo bem. – Eu ri.
Levei papai e Miguel à porta e assisti o carro se afastar, acenando para eles. Papai devia ter se cuidado mal por muito tempo antes de eu chegar. Ou estava numa maré de azar terrível.
Voltei para a cozinha para comer, mas levei um baita susto.
Lá estava , parado atrás da bancada, e meu coração bateu mais rápido e mais devagar ao mesmo tempo.
- ?
- Oi, . – Ele disse calmo.
- O que... Como...
- Eu entrei pela porta dos fundos. – Apontou para trás. – Desculpa, ainda tenho as chaves.
Assenti devagar, sem saber muito bem como reagir, mas sabendo que eu tinha que fazer alguma coisa, dizer alguma coisa.
- O que veio fazer aqui? – Perguntei com firmeza, me lembrando então da última vez que nos viramos.
apoiou as mãos na bancada e olhou para baixo por um instante. Então ergueu os olhos para mim.
- Eu vim pedir desculpas.
Minha boca se abriu um pouco. Deixei que ele continuasse.
- Eu fui muito grosso com você no outro dia, e eu estava errado. – Assumiu. – Eu estava misturando a minha raiva de uma coisa com outra situação. Posso não estar tão inteirado assim nessa história de baile, mas sei que você não fez aquilo com a Jodi. Eu só... Precisei de um tempo.
Eu estava me sentindo um tanto quanto emotiva naquele momento, e poderia ter dito qualquer coisa, mas tudo que consegui falar foi:
- Foi você que trouxe o macarrão?
olhou para mim, e em vez de responder, caiu na risada. Eu acabei rindo também, me achando uma pateta.
- Não, eu não trouxe macarrão nenhum. – Garantiu.
Ainda estávamos rindo, quando eu tomei coragem e disse:
- Eu sinto muito pela história da Rosana. Queria não ter feito aquilo, de verdade. Agora eu sei o quanto foi errado.
ficou calado, olhando para mim. Baixei os olhos, continuando:
- Mas o que eu disse sobre você estar livre do nosso trato... Ainda está de pé. – Falei com segurança, escondendo a tristeza. – Nossa farsa oficialmente chegou ao fim. Que alívio, né? – Forcei a risada.
continuou me encarando, sério. Ouvimos um latido então, e Stevie apareceu eufórico pulando em cima do rapaz. Pelo visto ele estava sentindo uma saudade sem tamanho, assim como eu.
- Ei, amigão. – se abaixou, brincando com o cachorro. – Eu vim te ver também. E te buscar.
- Como assim? – Franzi o cenho.
- Sei que você tem andado cansada com o Jack e a campanha e as provas... – Ele explicou. – Tive um palpite de que você precisava dormir um pouco, e sabemos como esse monstrinho gosta de acordar todo mundo cedo e fazer barulho na hora errada. – Sorriu, brincando com Stevie. – Sendo assim, achei que seria justo vir aqui e pegá-lo para dormir lá em casa esse final de semana.
- ... – Comecei.
- Eu já fiz isso antes, você sabe. Ele está acostumado com minha casa. E ele deve estar sentindo minha falta. Eu sinto a dele.
não olhava para mim enquanto falava, mas para o dálmata, que parecia encantado em ver o velho amigo.
- Tudo bem. – Eu disse então, dando um sorriso.
Ele ficou de pé de novo e ficamos nos olhando por alguns instantes. inflou as bochechas e eu engoli em seco.
- Nos vemos na... Escola. – Falei.
- Claro. Nos vemos lá. – Ele deu um sorriso torto.
Ele prendeu a corda que trouxera na coleira de Stevie e saiu pela porta dos fundos. Eu dei um longo suspiro, feliz por vê-lo, mas me policiando para não ficar feliz demais.
Depois de tomar um banho delicioso, desci e comi um prato do macarrão. Sabia que teria que descobrir de onde aquilo tinha saído, mas a fome era tamanha que deixei para depois. Me senti muito grata a quem quer que tivesse feito aquilo. Talvez tivesse sido o Rogers, quem sabe?
Estava sentada no sofá assistindo um seriado qualquer quando a campainha tocou. Imaginei que talvez papai e Miguel tivessem esquecido a chaves.
Mas não eram eles. Era .
- ? – Levei um susto.
- . – Ele sorriu.
- O que faz aqui?
- Não vai me convidar para entrar?
Dei um passo para o lado, indicando o interior da casa, embora ainda não tivesse certa do que ele queria. Fechei a porta atrás de mim e cruzei os braços em frente ao corpo.
deu alguns passos em direção ao interior da casa. Ele usava um casaco azul petróleo e o cabelo estava molhado, como se tivesse saído do banho direto para ali.
- Eu vim para te fazer um convite. – Ele disse misterioso.
- Que convite?
respirou fundo e veio em minha direção. Ele parou a uma distância razoável e deu aquele sorriso que antigamente me fazia perder o ar.
- Vicentini, quer ir ao baile comigo?
E antigamente eu teria ficado eufórica com a proposta – até semanas atrás, teria. Mas agora aquilo só parecia muito... Eu nem sabia o que dizer. Sabia que não achava a melhor ideia do mundo, longe disso.
- , eu... – Atropelei as palavras. – Não acho que seja uma boa ideia. Quero dizer, com tudo o que está acontecendo na escola, e tem a Summer...
- Summer vai ao baile com . – Ele me cortou.
E realmente, aquilo me fez calar por completo. Então eles iam juntos? Eu e tínhamos acabado de terminar...
- Como você... – Eu ia perguntar, mas o rapaz me atropelou de novo.
- Olha, , eu sei que, apesar dos problemas, você namora o . – Agarrou minhas mãos. – Mas é um fato. Vocês se desentenderam e agora ele vai ao baile com a Summer, na frente de todo mundo. Talvez seja só porque ele é amigo dela e não quer que ela vá sozinha, mas quem liga? – Ele deu de ombros. – O que importa é que eu quero ir com você. Quero estar lá e aplaudir quando você subir lá em cima para colocar sua coroa, e dançar com você. É só o que eu estou te pedindo, e eu prometo que vou te fazer se divertir como nunca.
Engoli em seco, tomada por um mix de sentimentos que não sabia controlar. Tristeza, dúvida, afeto.
O que realmente importava, era que meus pensamentos agora não eram motivados por ciúmes ou vingança, mas sim pela situação diante de mim como era: ia ao baile com Summer, e eu não queria fazer nada quanto a isso. Já , olhava para mim como se sua vida dependesse disso. E quando dei por mim, já tinha respondido:
- Eu aceito. Eu aceito ir ao baile com você, .
- Ah, não acredito que você finalmente colocou! – Exclamei ao ver o piercing no lóbulo da orelha de Sofia.
- Não acredito que a velha demorou tanto a me deixar colocar. – Ela disse, exibindo a orelha na webcam. – Quer dizer, como se ela não fosse uma rebelde festeira bem pior que eu na adolescência. Ela andava com o Jack, fala sério.
- Ei, meu pai era um bom moço. Não meta ele nessa história.
- Estou certa de que eles usavam todo tipo de alucinógenos. – Ela ergueu as sobrancelhas. – Mas me fala, como está o tio Jack?
- O Jack está melhor. – Respondi. – Os remédios estão funcionando.
- É muito bom ouvir isso. Você tem andando tão cansada.
- É, eu tenho sim. – Concordei. – Mas não posso reclamar do Miguel. Ele tem me ajudado como pode. É só que é o meu pai, entende? Eu me sinto responsável.
- Argh, eu queria tanto ir até aí e te ajudar a resolver tudo de novo! – Ela resmungou. – E dar uma porrada naquele tal de Perry Gold também.
- Eu também queria te ver, mas não se preocupe, as coisas vão ficar bem. – Afirmei, positiva. – Se quer saber, já me sinto melhor hoje, apesar de tudo. Vou começar a dar um jeito.
- E qual vai ser o primeiro passo?
Fiz uma careta, recostando de vez na cadeira.
- Você não vai querer saber.
Quando abri a porta do comitê de baile, as Preguiças Imitadoras olharam para mim ansiosas. Geralmente eu andaria o mais rápido possível para fugir delas, mas dessa vez eu me aproximei e sorri discretamente, antes que elas voassem em mim.
- Já vou falar com vocês.
Elas assentiram em conjunto, felizes, e voltaram a falar do que quer que fosse. Então eu fui até Amber, a Preguiça Chefe, que de preguiçosa na verdade não tinha nada. Ela estava falando ao telefone. Estava tão concentrada que mal percebera minha presença.
- É, e eu preciso disso, tipo, pra ontem! – Ela falava. – Moço, o destino de dezenas de jovens está nas suas mãos, eu não quero saber se está resfriado. – Então ela me viu. – Olha, apenas faça, ok? Ligo mais tarde. – E ela desligou. – Vejam só quem veio dar o ar da graça.
Amber falou isso de um jeito meio ressentido, porque, apesar do meu surto no dia anterior, eu tinha voltado a ignorar as mensagens dela quando voltei para casa. Mas não havia sido nada pessoal, eu só precisava me organizar antes de lidar com ela.
- Ok, se tem que ser feito... Me desculpe por ter fugido ontem, Amber. – Fui logo falando.
Ela arqueou uma sobrancelha, surpresa. Eu continuei:
- E me desculpe por ter fugido por todos esses dias, porque, sim, eu fugi. Eu estava ocupada com o Jack também, mas depois do que aconteceu com a Jodi eu só queria me esconder de tudo que tivesse a ver com a competição. – Admiti, deixando Amber de fato sem reação, além de abrir a boca um pouquinho. – Mas eu estou aqui agora, e eu sei que tem dado o sangue por isso e quero ajudar. Então, me diga o que eu tenho que fazer e eu farei.
Amber agora parecia sinceramente emocionada, como se eu fosse uma espécie de Filho Pródigo. Sem nenhum aviso prévio, ela me puxou para um abraço sufocante.
- Eu sabia que você ia cair em si. – Ela disse. – Ser rainha é a melhor coisa que podia te acontecer. – Se afastou sem soltar meus ombros. – Agora, a primeira coisa a fazer é vestir a camisa.
- Claro, estou pronta para me esforçar.
- Não, eu digo literalmente. – Ela foi até uma caixa de papelão e puxou uma camiseta de dentro dela. Era azul e tinha P gigante como estampa. – Eu mandei fazer. É de "Pie".
Ok, aquilo passava um pouco de qualquer limite de sensatez que eu tivesse, mas se era para entrar chuva...
- Tudo bem. – Peguei a camiseta das mãos dela e vesti por cima da que eu estava usando mesmo. – Vamos trabalhar.
Amber abriu um sorriso de orelha a orelha.
- Eu estou tão feliz que esteja aqui. – Disse com os olhos brilhando. Então a porta se abriu e ela mudou de foco. – GATINHO! – Ela exclamou. – Olha quem está aqui!
Olhei para trás e encontrei , blusa xadrez vermelha, mãos nos bolsos dos jeans.
- Ei, Ambie. – Ele disse. – Oi, . Vim ver como estão as coisas.
Amber foi para perto dele e lhe plantou um beijo na bochecha.
- Estão à toda, mas agora é que vão deslanchar. – Afirmou. – Tenho que fazer uma ligação. Fique com a nossa rainha um pouco.
Amber saiu da sala e eu e ficamos nos olhando meio sem jeito por alguns instantes. Então ele se aproximou.
- E aí, como vai...
- Tudo? – Sugeri. Ele assentiu. – Na medida do possível, estou levando.
- É bom ouvir isso. – Disse. – A verdade é que eu vim aqui porque queria te ver.
- Por quê? – Franzi o cenho.
- Porque eu sei que toda essa história do Perry é mentira e fiquei revoltado com o que aconteceu, especialmente porque tanta gente acreditou. – Balançou a cabeça. – Eu quis saber como você estava. – Coçou o queixo. – Da última vez que nos falamos, eu estava com muita raiva, mas sei que você nunca faria isso com a Jodi e a Emma.
Sorri, sentindo uma gratidão imensa. De todas as pessoas, era a que menos tinha a obrigação de acreditar em mim, e, no entanto, ali estava ele.
- Muito obrigada por isso. De verdade. – Sorri.
- Ok, acho que isso é uma trégua. – Ele sorriu de volta, meio acanhado. – Mas caramba, que história louca foi aquela de ameaçar a Rosana? – Acrescentou em voz baixa.
- Eu estava fora de mim. – Respondi no mesmo tom, puxando-o para mais longe dos outros. – A Rosana me tirou do sério, mas se tem uma coisa de que tenho me arrependido, é de ter feito aquilo. Eu estava no auge da loucura, e estava com ciúmes, eu acho.
- acha que você fez pela mentira de vocês. – arqueou uma sobrancelha.
- Não. Eu também disse isso pra mim mesma na época, mas sei que não era verdade agora. Eu estava com ciúmes porque ela continuava perseguindo o . – Confessei. O garoto olhou para mim intrigado. – , eu... Eu gosto do . Gosto mesmo.
- Tem que falar com ele. – Ele me encarou como se fosse óbvio.
- Eu não posso. E, de todo modo, ele me odeia agora.
- , não te odeia; ele não conseguiria nem que quisesse, e olha que ele tem tentado. Ele só está colocando a cabeça no lugar de um jeito antissocial e mal-humorado, porque é isso que ele faz. – disse com firmeza. – Eu sei que ainda tem toda essa loucura do Junior a ser explicada, mas você tem que contar a verdade a ele.
Balancei a cabeça, dando um sorriso triste, e apertei a mão dele.
- , desde que eu cheguei, tudo que fiz foi falar o que eu achava que devia e o que tinha vontade sem pensar em como isso afetaria o . Eu não vou fazer isso de novo. Ele vai ficar bem melhor longe dessa loucura. Você sabe.
parecia ávido para discordar de mim, mesmo sabendo que eu estava certa. Mas antes que ele tivesse tempo, Amber voltou.
- Certo, gente: precisamos ir buscar umas coisas na cidade. – Ela decretou.
Olhei para e dei de ombros. Não havia o que discutir.
Depois de ter ajudado Amber no que ela precisava, me despedi de e tomei o rumo da biblioteca. Precisava de um livro que me ajudasse a estudar para a prova que tinha perdido. Jack tinha passado mal em uma manhã em que eu tinha uma terrível prova de Química a fazer e Miguel não estava em casa. Agora, eu teria que fazer a prova no dia seguinte; e uma vez que não tinha mais a ajuda de Jodi para estudar, o jeito era revisar tudo sozinha.
A biblioteca estava quase vazia quando entrei, mas havia Teddy Moore, da torcida, sentado à uma das mesas com uma outra animadora e Jasmine. Eles olharam para mim de soslaio e cochicharam quando entrei, e eu me senti um pouco mal, mas ignorei.
- Bom dia, . – Stuart, o estagiário que trabalhava nos registros, sorriu para mim, tirando minha atenção deles.
- Bom dia, Stuart. – Sorri de volta. – Aquele livro de Química que eu reservei já voltou?
- Já, sim. Separei ele para você. – Ele pegou o livro embaixo da bancada. – Dias difíceis, não é? – Ele comentou enquanto passava o livro no scanner.
- É, não tem sido os melhores. – Concordei.
Stuart me entregou um papel para assinar e olhou discretamente sobre seu ombro, voltando-se para mim de novo.
- A propósito, eu não acredito em nada do que aquele Gold disse. – Ele falou baixinho. – Não devia deixar eles te chatearem.
Eu sorri, percebendo cada vez mais que as melhores pessoas daquele lugar, como Annabeth me dissera antes, eram aquelas que passavam despercebidas.
- Obrigada, Stuart. – Devolvi o papel a ele e peguei o livro. – Trago isso depois.
Saí da biblioteca para ir embora, mas mal tinha dado dois passos e a porta se abriu de novo.
- Pie. – Jasmine surgiu, um sorriso no rosto.
- Jasmine. – Falei simplesmente.
Ela se aproximou quase dançando e me encarou.
- Eu só queria saber... Como está sendo ser aquela que todos odeiam? Deve ser uma mudança e tanto depois de ter enganado todo mundo.
Pensei em dar as costas e ir embora, mas voltei atrás. Eu não ia brigar dessa vez, mas tinha que dizer o que queria desde o início.
- Olha, depois de todo esse tempo, eu tenho que dizer... Eu não sei o que raios você tem contra mim. – Dei de ombros. Minha resposta pareceu deixar a garota sem reação. Ela estava esperando uma briga. – Sério. Agora tudo bem, mas antes? Eu nunca tinha te feito nada e você já fazia da minha vida um inferno. Por quê?
Jasmine torceu a boca, irritada.
- Tudo que você fez desde que chegou aqui, Pie, foi atrapalhar minha vida. Por sua causa todo mundo acha que eu sou uma bruxa.
- Todo mundo já achava isso quando eu cheguei, Jasmine, o que quer dizer que a culpa não é minha. – Me isentei. – A culpa é sua. Você é bonita, é talentosa, mas isso não faz diferença nenhuma porque você é má e cruel. Não conseguiu ser amiga nem da Summer, que gostava mesmo de você.
- A Summer é uma tonta. – Ela esbravejou. – A prova disso é que ficou amiga da garota que quer roubar o namorado dela.
- Sabe muito bem que eu não era ameaça para Summer quando cheguei aqui. E, de todo modo, você nunca se importou de verdade com isso, não é? Você só me escolheu para odiar. Talvez ache que eu roubei seu posto, ou que estraguei sua popularidade... No fim das contas, não importa. – Dei de ombros. – Eu já estou cansada, e acredito de verdade que você também.
Eu podia ver Jasmine fechando suas mãos com força, como se quisesse muito falar, mas não conseguisse. E essa era minha deixa.
- Se me dá licença, eu tenho que ir. – Falei me afastando.
Ainda a ouvi murmurar baixinho, a voz meio engasgada.
- Isso não acabou ainda, Pie.
Mas para mim tinha acabado. Percebi que gostaria de ter dito tudo aquilo a ela muito tempo atrás, antes de ter deixado ela me estressar ao ponto que conseguiu, antes de ter tomado qualquer atitude impulsiva por receio de estar sendo vigiada por ela.
Pelo menos agora eu tinha desentalado. Não tinha mais o que dizer a Jasmine. E também não tinha mais medo dela.
Naquela tarde, me sentindo ainda mais leve do que antes, cheguei em casa e constatei que não havia ninguém. Eu bem havia dito ao Jack que ele tinha que repousar, mas teimoso como ele era, achei que devia ter ido para o Roger’s atrás de Miguel.
Mas eu me enganei. Ele era ainda pior do que eu pensava.
- Não dá pra acreditar nisso. – Franzi a testa ao ver o bilhete colado na porta da geladeira.
“Querida ,
Fui correr na praia.
Papai”
Ele devia mesmo achar que já estava absolutamente recuperado, mas a verdade é que ainda tossia um pouco à noite. Nada satisfeita, fui dar uma olhada na caixinha de remédios que estava deixando na sala. Metade deles tinha acabado e eu não tinha me dado conta.
- Droga, . – Me repreendi, procurando dinheiro nas gavetas. Tinha que comprar os medicamentos antes que a noite chegasse e Jack piorasse de novo.
- Certo, não estou esquecendo de nada. – Falei sozinha, colocando um casaco. Embolei o cabelo no alto e já estava saindo quando ouvi um barulho. – Ah, não.
Lá estava Stevie, abanando o rabo e latindo, nervoso. Ele ficava assim quando passava tempo demais em casa, e desde que decidira desaparecer, eu estava me virando para passear com ele, pois o dálmata simplesmente não aceitava sair com Miguel.
Ele olhou bem para mim e latiu de novo.
- Ok, beleza. Você vai comigo. – Falei e o cão se aproximou, alegre. – Mas vai ter que se comportar, tá bom? – Me abaixei e passei a mão em seu pescoço, prendendo o puxador de coleira nele.
Mas Stevie era um cachorro, é claro, e não estava nem aí para o que eu dizia. Ficar em casa o deixava tão agitado, que agora, vendo o mundo lá fora de novo, tudo que ele queria fazer era correr feito um maluco, me puxando junto.
- Stevie! – Eu chamava. – Stevie, para! – Mas ele era muito forte.
Como por milagre, consegui fazer uma breve pausa no mercado, onde já éramos conhecidos, para comprar batatas e cenouras para o jantar, mas assim que saímos ele disparou de novo.
Cheguei na farmácia toda suada e, já prevendo a catástrofe que seria entrar com ele no estabelecimento, o prendi no poste em frente a porta. Stevie latiu, mas era necessário.
- Boa tarde. – Eu disse a moça da farmácia, que me respondeu sorrindo. – Por favor, eu preciso de um de cada desses. – Entreguei a receita.
Esperei enquanto a moça separava os remédios, me falando os preços que eu já tinha noção. Depois de passar no caixa, peguei de novo a coleira de Stevie e saí em minha saga, tentando controlá-lo e segurar a bolsa ao mesmo tempo.
Então ouvi o toque do meu celular e parei.
- Espera, meu telefone está tocando. – Tirei o aparelho do bolso para atender, mas antes que eu visse de quem se tratava, em um breve momento de descuido Stevie se soltou. Ele começou a correr loucamente atrás de um gato ao longe.
- STEVIE, VOLTA AQUI! – Berrei.
E lá fui eu, carregando os remédios, segurando o celular e correndo atrás do meu cachorro maluco pelas ruas de Jacksonville Beach. Corri tanto atrás de Stevie que senti fisgadas no estômago.
Finalmente ele parou, pois o gato tinha sido esperto o bastante para fugir. Puta da vida, me aproximei ofegante.
- Cachorro malvado! – Exclamei. – O que você pensa que eu sou?
Só quando já estava abaixada discutindo com meu cachorro, percebi que ele tinha parado justamente ao lado de um banco de praça, onde por acaso estava sentada Jodi Slaterton junto com outra líder de torcida.
- Ah, oi. – Eu disse.
Jodi ficou calada por um segundo, se empertigando toda, mas então devolveu.
- Oi.
Me levantei, segurando a coleira com firmeza, e então meu celular voltou a tocar. Finalmente consegui atender, dando alguns passos para me afastar das garotas.
- Pie?
- Sim?
- É da secretaria da escola. – A mulher explicou. – Você tinha uma prova de Química de segunda chamada marcada para amanhã, não é?
- Sim, eu tenho. Aconteceu alguma coisa? – Me preocupei.
- Sim, sim. – Concordou. – Seu professor foi convidado para participar de uma convenção representando a escola. Estávamos de fora até agora, mas agora que nos aceitaram, ele vai ter que ir amanhã.
- Mas... E a minha prova?
- Você pode fazê-la quando ele voltar. Semana que vem, na sexta-feira.
- Mas... É o fim de semana do baile. – Pensei em Amber fazendo um escândalo ao ouvir aquilo. – Não dá.
- Bem... – Ela falou com voz arrastada, como se eu fosse fútil. – Ele vai ficar aqui por mais umas duas horas hoje. Se preferir vir hoje, a prova já está pronta, na verdade. Mas é bom se apressar.
- Eu... – Olhei de um lado para o outro, indecisa. Stevie, remédios, legumes, e o tempo que eu não tinha de voltar em casa se quisesse ter tempo para fazer a prova direito. Mas era minha única saída. – Eu vou agora.
- Tem certeza? Devo avisar a ele?
- Sim, pode avisar. – Confirmei. – Obrigada por ligar.
- É sempre um prazer. – Ela bocejou e então desligou o telefone.
Olhei para trás de novo. Jodi me observava com atenção. Me voltei para Stevie, me abaixando à altura dele.
- Escuta, Bebezão, você vai ter que se comportar de verdade agora.
E, para minha sorte, ele até que se comportou. Toda aquela correria parecia ter gastado um pouco das energias de Stevie, de modo que ele ficou quieto dentro do ônibus a caminho da Jacksonville High, e não protestou – tanto – quando o prendi do lado de fora da sala do professor Leroy.
- Obrigada, Stevie. – Encostei minha testa na cabeça dele. – Vou te dar um sanduíche depois.
Entrei na sala com todas aquelas bolsas, e provavelmente parecia que eu precisava de um banho, mas o senhor Leroy não se importou muito.
- . – Ele sorriu.
- Obrigada por me deixar fazer a prova. – Falei, ainda ofegando um pouco. – Parabéns pela convenção.
- Não tem de quê, e obrigada. – Ele se levantou, indicou a cadeira ao lado de sua mesa e me estendeu uma folha. – Por que não se senta? Você tem pouco mais de uma hora.
E eu obedeci.
Quando finalmente acabei a prova, já estava escuro lá fora. Stevie levantou a cabeça, feliz por me ver.
- Vamos para casa. – Falei para ele, desamarrando-o.
Pegamos o ônibus ali perto, e eu já começava a sentir um pouco de sono. Pelo visto eu estava ficando viciada em dormir no transporte público. Mas me mantive alerta para não perder o ponto, brincando com meu cachorro, conversando com ele e pensando no que faria para o jantar, se chegasse em casa e ninguém o tivesse feito. A verdade é que eu queria mesmo tomar um banho e me espalhar na cama com um livro que não fosse de Química.
Abri a porta e soltei Stevie, que correu feliz por aí. Estiquei as costas, respirei fundo e fui para a cozinha com minha bolsa de legumes. Então notei que havia uma coisa em cima da bancada. Uma panelinha verde. Me aproximei e tirei a tampa.
O cheiro de comida quentinha invadiu minhas vias respiratórias e fez meu corpo relaxar na hora. Era macarrão com queijo e parecia delicioso, mas quem tinha feito? Eu ficava grata por não ter que cozinhar, mas não conhecia aquela panela.
Papai entrou na cozinha e foi direto para a geladeira.
- Pai, você fez isso? – Perguntei.
- Eu? – Ele me olhou. – Não, querida, quando cheguei já estava aí.
- E o Miguel?
- Também não. Ele chegou depois de mim. – Papai deu um gole em seu copo d'água.
Miguel surgiu à porta então, encarando Jack.
- E então, vamos? – Chamou.
- Vamos onde? – Arqueei uma sobrancelha.
Ele entrou na cozinha, os braços cruzados em frente ao corpo.
- Um velho que nos conhecemos teve a brilhante ideia de sair para correr no sol da tarde e agora está com dor nas pernas. – Denunciou. – Vou levá-lo ao hospital para tomar uma injeção para dor.
- É mesmo necessário? – Perguntei preocupada. – Dói tanto assim?
- Não. – Papai respondeu, olhando feio para Miguel. – Acontece que Mexicanos são muito dramáticos.
- Se ele tem um plano de saúde, por que não usar? – O outro deu de ombros. – Vamos logo.
Eu ainda parecia um pouco aflita, mas papai se aproximou e me tranquilizou:
- Eu estou bem. – Ele sorriu. – Só vou tirar proveito do que pago todo mês.
Dei um sorriso fraco de volta, decidindo brigar com ele só depois por ter ido correr durante a recuperação da gripe.
- Tá certo. Vou guardar macarrão para vocês. – Olhei para a panela. – Se é que é seguro comer isso.
- Ah, é sim. Eu dei umas garfadas quando cheguei e está ótimo. – Disse e eu arregalei os olhos. – Minha dor começou antes, não se preocupe.
- Tudo bem. – Eu ri.
Levei papai e Miguel à porta e assisti o carro se afastar, acenando para eles. Papai devia ter se cuidado mal por muito tempo antes de eu chegar. Ou estava numa maré de azar terrível.
Voltei para a cozinha para comer, mas levei um baita susto.
Lá estava , parado atrás da bancada, e meu coração bateu mais rápido e mais devagar ao mesmo tempo.
- ?
- Oi, . – Ele disse calmo.
- O que... Como...
- Eu entrei pela porta dos fundos. – Apontou para trás. – Desculpa, ainda tenho as chaves.
Assenti devagar, sem saber muito bem como reagir, mas sabendo que eu tinha que fazer alguma coisa, dizer alguma coisa.
- O que veio fazer aqui? – Perguntei com firmeza, me lembrando então da última vez que nos viramos.
apoiou as mãos na bancada e olhou para baixo por um instante. Então ergueu os olhos para mim.
- Eu vim pedir desculpas.
Minha boca se abriu um pouco. Deixei que ele continuasse.
- Eu fui muito grosso com você no outro dia, e eu estava errado. – Assumiu. – Eu estava misturando a minha raiva de uma coisa com outra situação. Posso não estar tão inteirado assim nessa história de baile, mas sei que você não fez aquilo com a Jodi. Eu só... Precisei de um tempo.
Eu estava me sentindo um tanto quanto emotiva naquele momento, e poderia ter dito qualquer coisa, mas tudo que consegui falar foi:
- Foi você que trouxe o macarrão?
olhou para mim, e em vez de responder, caiu na risada. Eu acabei rindo também, me achando uma pateta.
- Não, eu não trouxe macarrão nenhum. – Garantiu.
Ainda estávamos rindo, quando eu tomei coragem e disse:
- Eu sinto muito pela história da Rosana. Queria não ter feito aquilo, de verdade. Agora eu sei o quanto foi errado.
ficou calado, olhando para mim. Baixei os olhos, continuando:
- Mas o que eu disse sobre você estar livre do nosso trato... Ainda está de pé. – Falei com segurança, escondendo a tristeza. – Nossa farsa oficialmente chegou ao fim. Que alívio, né? – Forcei a risada.
continuou me encarando, sério. Ouvimos um latido então, e Stevie apareceu eufórico pulando em cima do rapaz. Pelo visto ele estava sentindo uma saudade sem tamanho, assim como eu.
- Ei, amigão. – se abaixou, brincando com o cachorro. – Eu vim te ver também. E te buscar.
- Como assim? – Franzi o cenho.
- Sei que você tem andado cansada com o Jack e a campanha e as provas... – Ele explicou. – Tive um palpite de que você precisava dormir um pouco, e sabemos como esse monstrinho gosta de acordar todo mundo cedo e fazer barulho na hora errada. – Sorriu, brincando com Stevie. – Sendo assim, achei que seria justo vir aqui e pegá-lo para dormir lá em casa esse final de semana.
- ... – Comecei.
- Eu já fiz isso antes, você sabe. Ele está acostumado com minha casa. E ele deve estar sentindo minha falta. Eu sinto a dele.
não olhava para mim enquanto falava, mas para o dálmata, que parecia encantado em ver o velho amigo.
- Tudo bem. – Eu disse então, dando um sorriso.
Ele ficou de pé de novo e ficamos nos olhando por alguns instantes. inflou as bochechas e eu engoli em seco.
- Nos vemos na... Escola. – Falei.
- Claro. Nos vemos lá. – Ele deu um sorriso torto.
Ele prendeu a corda que trouxera na coleira de Stevie e saiu pela porta dos fundos. Eu dei um longo suspiro, feliz por vê-lo, mas me policiando para não ficar feliz demais.
Depois de tomar um banho delicioso, desci e comi um prato do macarrão. Sabia que teria que descobrir de onde aquilo tinha saído, mas a fome era tamanha que deixei para depois. Me senti muito grata a quem quer que tivesse feito aquilo. Talvez tivesse sido o Rogers, quem sabe?
Estava sentada no sofá assistindo um seriado qualquer quando a campainha tocou. Imaginei que talvez papai e Miguel tivessem esquecido a chaves.
Mas não eram eles. Era .
- ? – Levei um susto.
- . – Ele sorriu.
- O que faz aqui?
- Não vai me convidar para entrar?
Dei um passo para o lado, indicando o interior da casa, embora ainda não tivesse certa do que ele queria. Fechei a porta atrás de mim e cruzei os braços em frente ao corpo.
deu alguns passos em direção ao interior da casa. Ele usava um casaco azul petróleo e o cabelo estava molhado, como se tivesse saído do banho direto para ali.
- Eu vim para te fazer um convite. – Ele disse misterioso.
- Que convite?
respirou fundo e veio em minha direção. Ele parou a uma distância razoável e deu aquele sorriso que antigamente me fazia perder o ar.
- Vicentini, quer ir ao baile comigo?
E antigamente eu teria ficado eufórica com a proposta – até semanas atrás, teria. Mas agora aquilo só parecia muito... Eu nem sabia o que dizer. Sabia que não achava a melhor ideia do mundo, longe disso.
- , eu... – Atropelei as palavras. – Não acho que seja uma boa ideia. Quero dizer, com tudo o que está acontecendo na escola, e tem a Summer...
- Summer vai ao baile com . – Ele me cortou.
E realmente, aquilo me fez calar por completo. Então eles iam juntos? Eu e tínhamos acabado de terminar...
- Como você... – Eu ia perguntar, mas o rapaz me atropelou de novo.
- Olha, , eu sei que, apesar dos problemas, você namora o . – Agarrou minhas mãos. – Mas é um fato. Vocês se desentenderam e agora ele vai ao baile com a Summer, na frente de todo mundo. Talvez seja só porque ele é amigo dela e não quer que ela vá sozinha, mas quem liga? – Ele deu de ombros. – O que importa é que eu quero ir com você. Quero estar lá e aplaudir quando você subir lá em cima para colocar sua coroa, e dançar com você. É só o que eu estou te pedindo, e eu prometo que vou te fazer se divertir como nunca.
Engoli em seco, tomada por um mix de sentimentos que não sabia controlar. Tristeza, dúvida, afeto.
O que realmente importava, era que meus pensamentos agora não eram motivados por ciúmes ou vingança, mas sim pela situação diante de mim como era: ia ao baile com Summer, e eu não queria fazer nada quanto a isso. Já , olhava para mim como se sua vida dependesse disso. E quando dei por mim, já tinha respondido:
- Eu aceito. Eu aceito ir ao baile com você, .
27- Is it too late now to say sorry?
"So let me, oh, let me rendeem…"
[…]
POV
Apesar de ter discordado da na nossa última conversa, eu não insisti em fazê-la correr para falar com o naquele momento, e havia dois motivos para isso. O primeiro era que Amber tinha – para variar – nos interrompido. O segundo era que a Pie estava, de muitas formas, agindo certo: precisava mesmo de um descanso. O problema era que ele gostava dela, então o descanso não podia ser para sempre. Eu tinha consciência de que meu amigo precisava saber a verdade, mas não podia ser eu a contar, porque eu já tinha apontado o óbvio para os dois várias vezes. e precisavam se entender sozinhos. O que não queria dizer, é claro, que eu não iria me meter. Mas eu precisava pensar em como.
Estava pensando que o baile seria uma boa hora para isso, com toda aquela música de que os dois gostavam e o ponche batizado, quando minha porta se abriu. Papai botou a cara para dentro, um olhar satisfeito no rosto.
- , sua namorada está aqui! – Ele exclamou com o orgulho de um pai que devia achar que eu nunca teria uma namorada como Amber Hayley.
Na mesma hora peguei uma revista na pilha de quadrinhos e fingi estar lendo, mas papai nem ligou, e menos de meio segundo depois, Amber estava pulando para dentro do quarto com uma camiseta amarela e colete jeans.
- Gatinho! – Ela exclamou, me atacando.
- Vou deixar vocês dois sozinhos. – Papai riu e saiu do quarto, fechando a porta, apesar das minhas caretas para que não o fizesse.
Depois que Amber finalmente acabou de me dar cerca de vinte beijos no rosto e na boca, consegui respirar e me sentar direito.
- Oi, amorzinho. – Ela sorriu. – Sentiu saudades?
Dei um sorriso amarelo, me arrastando um pouco para trás.
- Claro, Amber. Mesmo que a gente tenha se visto... O quê? Ontem à tarde?
- Ah, para mim pareceu uma eternidade! – Ela riu.
Amber podia ser um amor de maluca, mas ainda era maluca. Dias atrás, assistindo Friends, percebi que ficar com ela era como sair com Eddie, o colega de quarto louco do Chandler, que dissecava frutas e vigiava ele dormir. Desde então eu estava muito mais preocupado do que antes, porque um dia eu ia ter que acabar aquilo, e não poderia, como o Chandler, convencê-la de que nunca tinha visto ela na vida, já que todo mundo sabia que saíamos juntos.
- , temos muito o que resolver. – Ela começou, agarrada a mim. – O baile é no próximo sábado, e você nem sabe se aquela mulher do ateliê do shopping já ajustou seu terno. Por isso liguei para a loja e falei que passaríamos lá em mais ou menos uma hora.
- Mas...
- Prioridades, . – Ela colocou o dedo na minha boca. – Prioridades.
- Tá. – Murmurei.
- Pelo menos podemos passar um tempinho agarradinhos! – Ela riu e voltou a me apertar e me beijar. – Tudo já está parcialmente encaminhado, afinal. Nós dois juntinhos. A com certeza sendo rainha do baile, agora que ela vai com o Junior...
- Mas o quê?! – Empurrei ela bruscamente.
Amber se sentou sem entender nada, olhando para mim.
- Você ainda não sabia?
- Sabia o que, Amber? – Tinha ouvido, mas precisava que ela repetisse e explicasse.
- Ontem à noite, eu liguei para a para confirmar se ela já tinha se resolvido com o , porque, por Deus, tínhamos que dar um jeito nisso antes do baile. – Balançou a cabeça. – Daí ela me disse que ia com o Junior, porque ele disse para ela que o ia com a Summer, e eu pensei "uau, que escândalo!", e achei uma pena, porque na verdade o vai ficar um gato de smoking; mas no final das contas, Junior só deve estar querendo garantir que vai ser o rei do baile, então não significa exatamente o fim do namoro de ninguém. – Ela deu de ombros e deu um sorrisinho inocente.
Olhei para a cara dela por alguns segundos, meditando. Então ameacei me levantar.
- Amber, eu preciso fazer uma coisa.
- Nananinanão! – Ela me puxou de volta com uma força impressionante. – O que temos que fazer agora é pegar o carro e ir até a loja ver o seu terno.
Bufei e rolei os olhos.
- Vamos logo! – Ela levantou e saiu me puxando, sem nem se importar.
Enquanto a mulher espetava o terno que eu estava usando em diversos lugares para terminar os ajustes, eu pensava no que Amber tinha me contado.
Eu achava muito estranho que não tivesse me contado que ia ao baile com a Summer. Até aquele momento, na verdade, eu considerava a possibilidade de ele nem ir à festa. Mas ir com a garota mais popular da escola, ainda que fosse sua amiga, e sem conversar com a antes, me parecia um pouco demais. Tinha que haver uma explicação razoável para aquilo.
- AI! – Exclamei quando a moça me espetou com uma agulha.
- Então pare de se mexer! – Ela me avisou ameaçadora.
Murmurei uma reclamação e continuei parado. Amber apareceu à porta da cabine.
- Você não vai acreditar. – Disse empolgada. – Estão fazendo uma superpromoção na loja de maquiagens. Eu vou lá em cima de já volto.
- Tá bom. – Resmunguei.
Amber desapareceu e fechou a cortina. A mulher das agulhas olhou bem para minha cara, provavelmente pensando como eu tinha conseguido uma namorada daquelas. Fiz uma careta e encarei o espelho, enquanto ela voltou a remexer.
Então a cortina se abriu de novo. Um funcionário da loja apareceu.
- Deb, tem uma senhora aí fora que precisa falar com você. – Avisou.
- Já estou indo. – Ela respondeu, e então olhou para mim. – Pode descer daí e descansar. Eu já volto.
A mulher saiu da cabine e eu também. Precisava esticar as pernas depois de ficar tanto tempo parado.
Andei pela pequena loja, olhei para o lado de fora, para as pessoas andando pelo shopping. Foi então que a porta do estabelecimento foi empurrada, e por ela entrou Jasmine Garcia.
Por um segundo, me perguntei o que a garota estaria fazendo ali, mas logo meu pensamento foi substituído por outro.
tinha aceitado ir ao baile com o Junior porque ele disse a ela que estava indo com Summer, mas essa história claramente tinha algo errado, embora eu ainda não tivesse conseguido falar com para descobrir o quê.
Até aquele momento, Jasmine estivera envolvida em basicamente todos os problemas pelos quais tinha passado. Quem mais teria motivação para inventar uma mentira daquelas e causar o caos entre todos?
Tinha que ser ela.
Preparado para enfrentá-la, me encaminhei até a garota, que riu ao me ver.
- Mas que saco de batatas é esse que está usando, ?
- Meu terno para o baile, não que seja da sua conta. – Falei. – Quando é que você vai parar de mentir e infernizar a vida de todo mundo, Jasmine?
Jasmine estreitou os olhos para mim, jogando o peso do corpo de uma perna para outra.
- Do que raios você está falando?
- Inventou que o ia ao baile com a Summer para infernizar a .
- Uau, vocês realmente superestimam meu talento de vilã. – Ela balançou a cabeça, contemplativa. – Não que eu ache isso ruim, mas não faço a mínima ideia do que você está falando.
- Não se faz de inocente. – Insisti, bravo. – Você disse ao Junior que Summer ia com o , e agora ele convidou a para ir com ele.
- Não, eu não disse. – Ela falou pausadamente, me encarando como se eu fosse doido. Então algo a atingiu. Uma conclusão que a fez erguer as sobrancelhas e dar um sorriso de desprezo. – Ah, agora eu entendi. Uau.
Levei um segundo a mais que ela para entender também. Ainda não confiava nela, mas de repente, soube que ela estava falando a verdade. Jasmine não tinha inventado aquilo.
- . – Murmurei.
- Ele é mesmo desprezível. – Ela disse quase para si mesma.
Por alguns instantes ficamos ali parados, sem nenhuma ofensa, pensando em como Junior era um crápula desgraçado. Então Jasmine torceu a boca e levantou o rosto, voltando ao normal.
- Ótimo, já desvendou o mistério, Salsicha. Agora sai da minha frente. – Me empurrou e foi lá para dentro. – Tenho que pegar uma gravata para o meu par.
E eu sabia que tinha que fazer alguma coisa, ainda que isso me custasse o uniforme, ou talvez um soco na cara.
🌴💚🌴
No centro de Jacksonville Beach, havia uma quadra de futsal aberta. Apesar de qualquer um poder jogar nela, era muito comum ver os caras do Swordfish lá nos fins de semana. Ninguém se importava de ceder o espaço para eles porque a cidade se orgulhava do time.
Quando entrei na quadra, naquela tarde – depois de ter tido um trabalho do cão para me livrar de Amber –, esperava encontrar lá, e não me decepcionei. Ele era o único lá, para minha sorte, o que provavelmente significava que estava esperando os outros chegarem. Pelo menos eu teria alguns minutos.
- Junior. – Falei, andando em sua direção.
- ? – Ele parou de chutar a bola na parede, me encarando com expressão confusa.
Só quando cheguei bem perto dele eu disse com firmeza:
- Eu já sei o que você fez.
Junior estreitou os olhos e me encarou. Então ele riu.
- Eu não faço a mínima ideia do que possa estar falando.
- Não vem com essa para cima de mim, . – Ergui as sobrancelhas. – Você mentiu para sobre o ir com a Summer no baile, só pra fazer ela ir com você.
Junior abriu e fechou a boca, então ponderou um pouco e, por fim, deu de ombros.
- Você é maluco, . E também não tem provas. – Me lançou um olhar piedoso. – Mas vou ser um cara legal e fingir que essa conversa nunca rolou.
O rapaz voltou para onde tinha deixado sua bola, e eu, mais puto ainda do que antes, fui atrás dele.
- Eu não vou deixar você enganar todo mundo de novo, ! – Falei bem alto.
Na mesma hora Junior se virou para trás, vindo a passos firmes em minha direção e me fazendo recuar um pouco.
- Você vai fazer o que então, ? – Questionou, uma expressão de desdém no rosto. – Vai sair correndo e contar para o ? Para a ? Para a Summer? Porque você sabe que se fizer isso uma das duas vai sair completamente destruída dessa história. Está disposto a escolher quem vai chorar no fim das contas?
- O que é você, o diabo? – Fiz uma careta. – Isso não é culpa minha, é sua! Você não está nem aí para nenhuma das duas, não é?
- Mas é claro que estou. Por isso estou tentando te convencer a não abrir a boca.
Aquele cara era inacreditável. Anos depois, e ele tinha ficado ainda pior, embora ele agora parecesse muito mais seguro do que fazia. Apesar disso, eu podia estar errado, mas a impressão que tinha era que Junior não estava mais pensando tão bem nas consequências de seus atos, o que era muito estranho.
- Pois quer saber, ? – Falei. – Eu não ligo. E também não tenho mais medo de você, do ou das ameaças. E quer saber do que mais? Eu tô fora daquela droga de time.
- Não precisava nem pedir. – Junior sorriu, bem quando os outros jogadores entraram na quadra. Entre eles, estava , andando perfeitamente e sem a tala no pé.
- Boa sorte contando a Hayley que não é mais titular, . – acrescentou, voltando a jogar sozinho.
Eu não queria nem pensar naquilo.
POV PIE
A segunda-feira começou mais estranha que qualquer outro dia nas últimas semanas. Era a semana do baile. O tão falado baile que tinha virado tudo de cabeça para baixo.
- Eu só tenho que viver minha vida. – Repeti para mim mesma, descendo as escadas com Stevie nos calcanhares.
Papai, parado à porta da cozinha, me deu um abraço de bom dia.
- Está melhor hoje? – Perguntei.
- Novinho em folha, Rainbow.
- Ótimo. Espero que assim aprenda que já está muito velho para certas coisas. – Bati em seu ombro e entrei.
- Na minha época, querida, os velhos escalavam montanhas. – Ele me seguiu, as mãos na cintura.
- Pois na minha eles não aguentam nem correr cem metros sem irem parar no hospital. – Miguel entrou no cômodo e debochou.
- Muito engraçado. – Papai respondeu. – Assim que acabar aqui vou procurar o telefone do serviço de imigração.
Miguel se serviu de um café, e de repente me senti um pouco nostálgica, pensando em como eu, papai e é que costumávamos ter aquelas conversas antes. Obviamente Miguel não era o culpado de não estar mais ali, mas não pude deixar de sentir um pouco de falta dos meus primeiros dias na cidade.
- Ah, , eu já ia me esquecendo. – Miguel disse. – Ontem à noite a Summer passou no Rogers'. Ela pediu que eu te trouxesse uma coisa.
- Uma coisa? – Estranhei. – E por que ela não me entregou hoje na escola ou veio aqui?
- Ela disse que não ia poder.
- O que é?
- Ela disse que é seu vestido.
Terminei de beber meu copo de suco e fui até a sala. Na poltrona, estava o vestido que eu escolhera durante a viagem, encapado.
Tentei ligar para Summer, mas só caía na caixa postal. Decidi falar com ela na escola, mas antes de sair, levei meu vestido para o quarto e o pendurei num cabide, onde ele ficaria até o sábado.
Assisti a aula do primeiro tempo e me mantive atenta a tudo que professor dizia, como não fazia há dias. O senhor Ackles pareceu feliz por ter alguém fazendo perguntas ocasionalmente, mas a verdadeira razão para eu participar tanto é que tinha andado tão perdida nos últimos dias que precisava me atualizar.
Uma vez que meu professor de Química tinha ido para aquela tal convenção, o segundo tempo seria livre, então aproveitei para passar no Q.G. de Amber e ver se ela precisava de alguma coisa.
- Ah, não, estamos à toda, mas estamos bem. – Ela me dispensou. – Mas se quiser fazer alguma coisa, pode jogar mais purpurina naqueles cartazes. Brilho nunca é demais e temos que colá-los depois.
- Vou fazer isso sim. – Sorri.
Me aproximei de uma mesa onde havia três cartazes com meu nome e foto prontos para serem colados, e joguei um pouco mais de purpurina lilás neles, embora achasse que já tinham o bastante. Foi enquanto fazia isso que tive uma ideia.
Depois de ter acabado os outros cartazes, disparei pelo corredor procurando lugares vazios. No percurso, vi os jogadores do time fazendo campanha para Jodi, entregando botons e panfletos. Era admirável, eles conseguiam competir com Amber de igual para igual.
- Aqui vai ficar ótimo! – Falei para mim mesma ao achar um lugar vazio com destaque o suficiente.
Com um pouco de dificuldade, estendi o cartaz na parede e rasguei a fita adesiva com os dentes. Quando finalmente consegui firmá-lo, sorri.
O rosto de Summer parecia mais lindo e natural do que nunca sobre a frase "Vote em Summer Olsen!" escrita com glitter dourado. Ela podia não estar ligando, mas merecia ganhar tanto quanto Jodi, ainda que ela não acreditasse em mim.
Com os outros cartazes nas mãos, voltei a andar em busca de outros pontos. Foi então que vi , no final do corredor. Em alguns passos ele chegou onde eu estava.
- . – Ele disse, um meio sorriso.
- Oi, . – Respondi. – Como estão as coisas?
- Bem. Sua campanha? – Apontou para os cartazes.
- Não... Eu fiz isso para a Summer. – Confessei, mostrando a foto. – Você a viu por aí?
- Summer foi viajar hoje de manhã. Um teste para um trabalho legal. – Ele explicou. –Ela só volta na sexta.
- Ah, entendi. – Assenti. – Aliás... – Baixei a cabeça. – Eu só queria dizer que eu espero de verdade que vocês se divirtam no sábado.
fez uma cara engraçada.
- Tá... Eu também, eu acho. – Disse.
Dei de ombros, um pouco sem jeito, não querendo parecer que sentia o que sentia.
- Eu já vou indo então. A gente se vê.
Eu estava fazendo a coisa certa, não é?
🌴💚🌴
- Mas é óbvio que não. – Sofi me repreendeu, quando conversávamos ao telefone, na quarta-feira. – A coisa certa seria todos ficarem com a pessoa de quem gostam de verdade, o que quer dizer que você estaria com , ele com você, e com ninguém, porque ele é um babaca egoísta.
Coloquei o lixo em seu lugar na rua e ajeitei o telefone na orelha.
- Olha, eu já senti todo tipo de coisa pelo , do amor ao ódio, até pena. O que eu estou fazendo agora não tem nada a ver com uma profusão de sentimentos. Tem a ver com . Tem a ver com Summer. Tem a ver com as coisas como estão.
- Eu entendo, eu acho. – Sofia suspirou. – Só não vou entrar nessa discussão, porque sei que você está se esforçando para consertar as coisas, e o quanto tem andado cansada. Espero que você se divirta nessa festa.
- Obrigada. – Eu disse, voltando para dentro de casa.
Quando entrei, recostei na porta e pensei no que Sofia dissera. Eu andava mesmo cansada, mas me sentia bem melhor do que antes. Papai tinha ido passar a tarde no Rogers' com Miguel, e eu pelo menos tinha a casa vazia. Queria dar uma organizada em tudo. Fechei os olhos e dei um longo suspiro. E então a campainha tocou, me fazendo dar um pulo.
Ajeitei o rabo de cavalo alto e abri a porta. Qualquer coisa teria me surpreendido menos do que o que encontrei.
- Jodi? – Eu disse.
E não só ela. A senhora Slaterton estava ali também, as mãos atrás das costas, uma cara que eu nunca a tinha visto fazer: a de alguém sem jeito.
- . – Jodi disse, e sua voz não tinha raiva nenhuma. – , me desculpe! – E então ela se jogou em cima de mim, me abraçando e chorando.
- Jodi... – Eu não sabia o que dizer.
Levou uns dois minutos até que ela enfim me soltasse.
- Eu sei que você não contou nada ao Perry. – Ela disse devagar. – Me desculpe. – Me abraçou de novo. – Por favor, me perdoe. Eu não sei o que me deu na cabeça.
Compreendendo parcialmente o que estava acontecendo, eu a abracei de volta.
- Tudo bem, Jodi. – Murmurei, sorrindo um pouco em seu cabelo. – Tá tudo bem.
Ela se afastou de novo, sorrindo em meio às lágrimas e segurando minhas mãos.
- Olha, eu e minha mãe viemos ajudar. – Disse. – Sabemos que o seu pai tem andando adoentado e o quanto você tem dado duro. Eu te via na escola e do outro lado do parquinho.
- É, isso mesmo. – Disse a senhora Slaterton, apressada. – Bom, onde ficam os produtos de limpeza?
Ela foi logo entrando e não sabia o que fazer, mas Jodi olhou para mim e riu.
- Não se preocupe, quando acabarmos essa casa vai parecer novinha em folha.
Minutos depois, a senhora Slaterton passava com vontade o esfregão no chão da cozinha, enquanto Jodi me explicava tudo no quintal.
- Eu e o Brad estávamos lanchando na casa dele, quando o irmão dele lembrou que dias atrás, ele foi a uma festa e batizaram o refrigerante dele. Ele me contou quando aconteceu, estava muito chateado. – Disse ela. – O que Brad não sabia e o Bob nos contou, foi que, naquela noite, quem trouxe o Brad para casa não foi um dos amigos dele. Foi o Perry Gold, que também estava na festa.
- Então... – Abri a boca.
- Foi o Brad quem contou ao Perry aquilo tudo quando estava bêbado.
Eu não podia acreditar naquilo. De todas as possibilidades, aquela era a mais surpreendente.
- Oh, eu quase matei o Brad, ! – Jodi disse feroz. – Eu briguei tanto com ele. Mas nem dá para culpá-lo; eu é que não devia ter acreditado... Olha só tudo que eu fiz.
- Jodi, relaxa. – Apertei sua mão. – Estou feliz em fazer as pazes com você.
E estava mesmo. Vinha me sentindo tão sozinha sem ela e Emma, que qualquer ressentimento parecia nada perto daquele momento.
- Obrigada. – Ela disse. – Tem mais uma coisa. MÃE! – Chamou.
A senhora Slaterton colocou a cabeça para fora da cozinha.
- Mãe, lembra do que queria dizer a ? – Jodi incentivou.
A senhora Slaterton fez uma careta, mas disse:
- Me desculpe pelo que falei no supermercado. E por todas as outras vezes em que ofendi você ou seu pai. Foi muito errado e eu sinto muito.
Jodi abriu um enorme sorriso, fazendo um sinal de joia para sua mãe. Eu quase ri, mas me contive.
- Tudo bem, senhora Slaterton. – Falei. – Também fico feliz pela senhora estar aqui.
Ela assentiu e voltou para dentro. Então me lembrei:
- Ei, Jodi... Foi você que deixou aquela panela de sopa na cozinha?
Ela sorriu.
- Fui eu sim. – Disse. – Eu ainda estava com raiva, mas minha raiva era fraquinha e você estava toda atrapalhada.
Sorri de novo e a abracei.
- Obrigada. De verdade.
- Olha, Brad também está chateado pelo que fez, então ele ofereceu uma oferta de paz. – Ela tirou um envelope do bolso do casaco e o estendeu para mim.
- O que é isso?
- É do spa da Costa. – Ela deu de ombros. – A tia do Brad é a dona. É um pacote para você, para o dia do baile, de graça.
- Caramba, não precisava! – Exclamei feliz.
- Claro que precisava. E a melhor parte, é que eu e as meninas estaremos lá também. Temos tanta conversa para colocar em dia! Começando por essa história de você estar afastada do .
- Ah, Jodi, essa é uma longa história. – Suspirei.
- Não se preocupe. – Ela balançou a cabeça. – Vamos ter tempo para conversar enquanto arrumamos essa casa.
[…]
POV
Apesar de ter discordado da na nossa última conversa, eu não insisti em fazê-la correr para falar com o naquele momento, e havia dois motivos para isso. O primeiro era que Amber tinha – para variar – nos interrompido. O segundo era que a Pie estava, de muitas formas, agindo certo: precisava mesmo de um descanso. O problema era que ele gostava dela, então o descanso não podia ser para sempre. Eu tinha consciência de que meu amigo precisava saber a verdade, mas não podia ser eu a contar, porque eu já tinha apontado o óbvio para os dois várias vezes. e precisavam se entender sozinhos. O que não queria dizer, é claro, que eu não iria me meter. Mas eu precisava pensar em como.
Estava pensando que o baile seria uma boa hora para isso, com toda aquela música de que os dois gostavam e o ponche batizado, quando minha porta se abriu. Papai botou a cara para dentro, um olhar satisfeito no rosto.
- , sua namorada está aqui! – Ele exclamou com o orgulho de um pai que devia achar que eu nunca teria uma namorada como Amber Hayley.
Na mesma hora peguei uma revista na pilha de quadrinhos e fingi estar lendo, mas papai nem ligou, e menos de meio segundo depois, Amber estava pulando para dentro do quarto com uma camiseta amarela e colete jeans.
- Gatinho! – Ela exclamou, me atacando.
- Vou deixar vocês dois sozinhos. – Papai riu e saiu do quarto, fechando a porta, apesar das minhas caretas para que não o fizesse.
Depois que Amber finalmente acabou de me dar cerca de vinte beijos no rosto e na boca, consegui respirar e me sentar direito.
- Oi, amorzinho. – Ela sorriu. – Sentiu saudades?
Dei um sorriso amarelo, me arrastando um pouco para trás.
- Claro, Amber. Mesmo que a gente tenha se visto... O quê? Ontem à tarde?
- Ah, para mim pareceu uma eternidade! – Ela riu.
Amber podia ser um amor de maluca, mas ainda era maluca. Dias atrás, assistindo Friends, percebi que ficar com ela era como sair com Eddie, o colega de quarto louco do Chandler, que dissecava frutas e vigiava ele dormir. Desde então eu estava muito mais preocupado do que antes, porque um dia eu ia ter que acabar aquilo, e não poderia, como o Chandler, convencê-la de que nunca tinha visto ela na vida, já que todo mundo sabia que saíamos juntos.
- , temos muito o que resolver. – Ela começou, agarrada a mim. – O baile é no próximo sábado, e você nem sabe se aquela mulher do ateliê do shopping já ajustou seu terno. Por isso liguei para a loja e falei que passaríamos lá em mais ou menos uma hora.
- Mas...
- Prioridades, . – Ela colocou o dedo na minha boca. – Prioridades.
- Tá. – Murmurei.
- Pelo menos podemos passar um tempinho agarradinhos! – Ela riu e voltou a me apertar e me beijar. – Tudo já está parcialmente encaminhado, afinal. Nós dois juntinhos. A com certeza sendo rainha do baile, agora que ela vai com o Junior...
- Mas o quê?! – Empurrei ela bruscamente.
Amber se sentou sem entender nada, olhando para mim.
- Você ainda não sabia?
- Sabia o que, Amber? – Tinha ouvido, mas precisava que ela repetisse e explicasse.
- Ontem à noite, eu liguei para a para confirmar se ela já tinha se resolvido com o , porque, por Deus, tínhamos que dar um jeito nisso antes do baile. – Balançou a cabeça. – Daí ela me disse que ia com o Junior, porque ele disse para ela que o ia com a Summer, e eu pensei "uau, que escândalo!", e achei uma pena, porque na verdade o vai ficar um gato de smoking; mas no final das contas, Junior só deve estar querendo garantir que vai ser o rei do baile, então não significa exatamente o fim do namoro de ninguém. – Ela deu de ombros e deu um sorrisinho inocente.
Olhei para a cara dela por alguns segundos, meditando. Então ameacei me levantar.
- Amber, eu preciso fazer uma coisa.
- Nananinanão! – Ela me puxou de volta com uma força impressionante. – O que temos que fazer agora é pegar o carro e ir até a loja ver o seu terno.
Bufei e rolei os olhos.
- Vamos logo! – Ela levantou e saiu me puxando, sem nem se importar.
Enquanto a mulher espetava o terno que eu estava usando em diversos lugares para terminar os ajustes, eu pensava no que Amber tinha me contado.
Eu achava muito estranho que não tivesse me contado que ia ao baile com a Summer. Até aquele momento, na verdade, eu considerava a possibilidade de ele nem ir à festa. Mas ir com a garota mais popular da escola, ainda que fosse sua amiga, e sem conversar com a antes, me parecia um pouco demais. Tinha que haver uma explicação razoável para aquilo.
- AI! – Exclamei quando a moça me espetou com uma agulha.
- Então pare de se mexer! – Ela me avisou ameaçadora.
Murmurei uma reclamação e continuei parado. Amber apareceu à porta da cabine.
- Você não vai acreditar. – Disse empolgada. – Estão fazendo uma superpromoção na loja de maquiagens. Eu vou lá em cima de já volto.
- Tá bom. – Resmunguei.
Amber desapareceu e fechou a cortina. A mulher das agulhas olhou bem para minha cara, provavelmente pensando como eu tinha conseguido uma namorada daquelas. Fiz uma careta e encarei o espelho, enquanto ela voltou a remexer.
Então a cortina se abriu de novo. Um funcionário da loja apareceu.
- Deb, tem uma senhora aí fora que precisa falar com você. – Avisou.
- Já estou indo. – Ela respondeu, e então olhou para mim. – Pode descer daí e descansar. Eu já volto.
A mulher saiu da cabine e eu também. Precisava esticar as pernas depois de ficar tanto tempo parado.
Andei pela pequena loja, olhei para o lado de fora, para as pessoas andando pelo shopping. Foi então que a porta do estabelecimento foi empurrada, e por ela entrou Jasmine Garcia.
Por um segundo, me perguntei o que a garota estaria fazendo ali, mas logo meu pensamento foi substituído por outro.
tinha aceitado ir ao baile com o Junior porque ele disse a ela que estava indo com Summer, mas essa história claramente tinha algo errado, embora eu ainda não tivesse conseguido falar com para descobrir o quê.
Até aquele momento, Jasmine estivera envolvida em basicamente todos os problemas pelos quais tinha passado. Quem mais teria motivação para inventar uma mentira daquelas e causar o caos entre todos?
Tinha que ser ela.
Preparado para enfrentá-la, me encaminhei até a garota, que riu ao me ver.
- Mas que saco de batatas é esse que está usando, ?
- Meu terno para o baile, não que seja da sua conta. – Falei. – Quando é que você vai parar de mentir e infernizar a vida de todo mundo, Jasmine?
Jasmine estreitou os olhos para mim, jogando o peso do corpo de uma perna para outra.
- Do que raios você está falando?
- Inventou que o ia ao baile com a Summer para infernizar a .
- Uau, vocês realmente superestimam meu talento de vilã. – Ela balançou a cabeça, contemplativa. – Não que eu ache isso ruim, mas não faço a mínima ideia do que você está falando.
- Não se faz de inocente. – Insisti, bravo. – Você disse ao Junior que Summer ia com o , e agora ele convidou a para ir com ele.
- Não, eu não disse. – Ela falou pausadamente, me encarando como se eu fosse doido. Então algo a atingiu. Uma conclusão que a fez erguer as sobrancelhas e dar um sorriso de desprezo. – Ah, agora eu entendi. Uau.
Levei um segundo a mais que ela para entender também. Ainda não confiava nela, mas de repente, soube que ela estava falando a verdade. Jasmine não tinha inventado aquilo.
- . – Murmurei.
- Ele é mesmo desprezível. – Ela disse quase para si mesma.
Por alguns instantes ficamos ali parados, sem nenhuma ofensa, pensando em como Junior era um crápula desgraçado. Então Jasmine torceu a boca e levantou o rosto, voltando ao normal.
- Ótimo, já desvendou o mistério, Salsicha. Agora sai da minha frente. – Me empurrou e foi lá para dentro. – Tenho que pegar uma gravata para o meu par.
E eu sabia que tinha que fazer alguma coisa, ainda que isso me custasse o uniforme, ou talvez um soco na cara.
No centro de Jacksonville Beach, havia uma quadra de futsal aberta. Apesar de qualquer um poder jogar nela, era muito comum ver os caras do Swordfish lá nos fins de semana. Ninguém se importava de ceder o espaço para eles porque a cidade se orgulhava do time.
Quando entrei na quadra, naquela tarde – depois de ter tido um trabalho do cão para me livrar de Amber –, esperava encontrar lá, e não me decepcionei. Ele era o único lá, para minha sorte, o que provavelmente significava que estava esperando os outros chegarem. Pelo menos eu teria alguns minutos.
- Junior. – Falei, andando em sua direção.
- ? – Ele parou de chutar a bola na parede, me encarando com expressão confusa.
Só quando cheguei bem perto dele eu disse com firmeza:
- Eu já sei o que você fez.
Junior estreitou os olhos e me encarou. Então ele riu.
- Eu não faço a mínima ideia do que possa estar falando.
- Não vem com essa para cima de mim, . – Ergui as sobrancelhas. – Você mentiu para sobre o ir com a Summer no baile, só pra fazer ela ir com você.
Junior abriu e fechou a boca, então ponderou um pouco e, por fim, deu de ombros.
- Você é maluco, . E também não tem provas. – Me lançou um olhar piedoso. – Mas vou ser um cara legal e fingir que essa conversa nunca rolou.
O rapaz voltou para onde tinha deixado sua bola, e eu, mais puto ainda do que antes, fui atrás dele.
- Eu não vou deixar você enganar todo mundo de novo, ! – Falei bem alto.
Na mesma hora Junior se virou para trás, vindo a passos firmes em minha direção e me fazendo recuar um pouco.
- Você vai fazer o que então, ? – Questionou, uma expressão de desdém no rosto. – Vai sair correndo e contar para o ? Para a ? Para a Summer? Porque você sabe que se fizer isso uma das duas vai sair completamente destruída dessa história. Está disposto a escolher quem vai chorar no fim das contas?
- O que é você, o diabo? – Fiz uma careta. – Isso não é culpa minha, é sua! Você não está nem aí para nenhuma das duas, não é?
- Mas é claro que estou. Por isso estou tentando te convencer a não abrir a boca.
Aquele cara era inacreditável. Anos depois, e ele tinha ficado ainda pior, embora ele agora parecesse muito mais seguro do que fazia. Apesar disso, eu podia estar errado, mas a impressão que tinha era que Junior não estava mais pensando tão bem nas consequências de seus atos, o que era muito estranho.
- Pois quer saber, ? – Falei. – Eu não ligo. E também não tenho mais medo de você, do ou das ameaças. E quer saber do que mais? Eu tô fora daquela droga de time.
- Não precisava nem pedir. – Junior sorriu, bem quando os outros jogadores entraram na quadra. Entre eles, estava , andando perfeitamente e sem a tala no pé.
- Boa sorte contando a Hayley que não é mais titular, . – acrescentou, voltando a jogar sozinho.
Eu não queria nem pensar naquilo.
POV PIE
A segunda-feira começou mais estranha que qualquer outro dia nas últimas semanas. Era a semana do baile. O tão falado baile que tinha virado tudo de cabeça para baixo.
- Eu só tenho que viver minha vida. – Repeti para mim mesma, descendo as escadas com Stevie nos calcanhares.
Papai, parado à porta da cozinha, me deu um abraço de bom dia.
- Está melhor hoje? – Perguntei.
- Novinho em folha, Rainbow.
- Ótimo. Espero que assim aprenda que já está muito velho para certas coisas. – Bati em seu ombro e entrei.
- Na minha época, querida, os velhos escalavam montanhas. – Ele me seguiu, as mãos na cintura.
- Pois na minha eles não aguentam nem correr cem metros sem irem parar no hospital. – Miguel entrou no cômodo e debochou.
- Muito engraçado. – Papai respondeu. – Assim que acabar aqui vou procurar o telefone do serviço de imigração.
Miguel se serviu de um café, e de repente me senti um pouco nostálgica, pensando em como eu, papai e é que costumávamos ter aquelas conversas antes. Obviamente Miguel não era o culpado de não estar mais ali, mas não pude deixar de sentir um pouco de falta dos meus primeiros dias na cidade.
- Ah, , eu já ia me esquecendo. – Miguel disse. – Ontem à noite a Summer passou no Rogers'. Ela pediu que eu te trouxesse uma coisa.
- Uma coisa? – Estranhei. – E por que ela não me entregou hoje na escola ou veio aqui?
- Ela disse que não ia poder.
- O que é?
- Ela disse que é seu vestido.
Terminei de beber meu copo de suco e fui até a sala. Na poltrona, estava o vestido que eu escolhera durante a viagem, encapado.
Tentei ligar para Summer, mas só caía na caixa postal. Decidi falar com ela na escola, mas antes de sair, levei meu vestido para o quarto e o pendurei num cabide, onde ele ficaria até o sábado.
Assisti a aula do primeiro tempo e me mantive atenta a tudo que professor dizia, como não fazia há dias. O senhor Ackles pareceu feliz por ter alguém fazendo perguntas ocasionalmente, mas a verdadeira razão para eu participar tanto é que tinha andado tão perdida nos últimos dias que precisava me atualizar.
Uma vez que meu professor de Química tinha ido para aquela tal convenção, o segundo tempo seria livre, então aproveitei para passar no Q.G. de Amber e ver se ela precisava de alguma coisa.
- Ah, não, estamos à toda, mas estamos bem. – Ela me dispensou. – Mas se quiser fazer alguma coisa, pode jogar mais purpurina naqueles cartazes. Brilho nunca é demais e temos que colá-los depois.
- Vou fazer isso sim. – Sorri.
Me aproximei de uma mesa onde havia três cartazes com meu nome e foto prontos para serem colados, e joguei um pouco mais de purpurina lilás neles, embora achasse que já tinham o bastante. Foi enquanto fazia isso que tive uma ideia.
Depois de ter acabado os outros cartazes, disparei pelo corredor procurando lugares vazios. No percurso, vi os jogadores do time fazendo campanha para Jodi, entregando botons e panfletos. Era admirável, eles conseguiam competir com Amber de igual para igual.
- Aqui vai ficar ótimo! – Falei para mim mesma ao achar um lugar vazio com destaque o suficiente.
Com um pouco de dificuldade, estendi o cartaz na parede e rasguei a fita adesiva com os dentes. Quando finalmente consegui firmá-lo, sorri.
O rosto de Summer parecia mais lindo e natural do que nunca sobre a frase "Vote em Summer Olsen!" escrita com glitter dourado. Ela podia não estar ligando, mas merecia ganhar tanto quanto Jodi, ainda que ela não acreditasse em mim.
Com os outros cartazes nas mãos, voltei a andar em busca de outros pontos. Foi então que vi , no final do corredor. Em alguns passos ele chegou onde eu estava.
- . – Ele disse, um meio sorriso.
- Oi, . – Respondi. – Como estão as coisas?
- Bem. Sua campanha? – Apontou para os cartazes.
- Não... Eu fiz isso para a Summer. – Confessei, mostrando a foto. – Você a viu por aí?
- Summer foi viajar hoje de manhã. Um teste para um trabalho legal. – Ele explicou. –Ela só volta na sexta.
- Ah, entendi. – Assenti. – Aliás... – Baixei a cabeça. – Eu só queria dizer que eu espero de verdade que vocês se divirtam no sábado.
fez uma cara engraçada.
- Tá... Eu também, eu acho. – Disse.
Dei de ombros, um pouco sem jeito, não querendo parecer que sentia o que sentia.
- Eu já vou indo então. A gente se vê.
Eu estava fazendo a coisa certa, não é?
- Mas é óbvio que não. – Sofi me repreendeu, quando conversávamos ao telefone, na quarta-feira. – A coisa certa seria todos ficarem com a pessoa de quem gostam de verdade, o que quer dizer que você estaria com , ele com você, e com ninguém, porque ele é um babaca egoísta.
Coloquei o lixo em seu lugar na rua e ajeitei o telefone na orelha.
- Olha, eu já senti todo tipo de coisa pelo , do amor ao ódio, até pena. O que eu estou fazendo agora não tem nada a ver com uma profusão de sentimentos. Tem a ver com . Tem a ver com Summer. Tem a ver com as coisas como estão.
- Eu entendo, eu acho. – Sofia suspirou. – Só não vou entrar nessa discussão, porque sei que você está se esforçando para consertar as coisas, e o quanto tem andado cansada. Espero que você se divirta nessa festa.
- Obrigada. – Eu disse, voltando para dentro de casa.
Quando entrei, recostei na porta e pensei no que Sofia dissera. Eu andava mesmo cansada, mas me sentia bem melhor do que antes. Papai tinha ido passar a tarde no Rogers' com Miguel, e eu pelo menos tinha a casa vazia. Queria dar uma organizada em tudo. Fechei os olhos e dei um longo suspiro. E então a campainha tocou, me fazendo dar um pulo.
Ajeitei o rabo de cavalo alto e abri a porta. Qualquer coisa teria me surpreendido menos do que o que encontrei.
- Jodi? – Eu disse.
E não só ela. A senhora Slaterton estava ali também, as mãos atrás das costas, uma cara que eu nunca a tinha visto fazer: a de alguém sem jeito.
- . – Jodi disse, e sua voz não tinha raiva nenhuma. – , me desculpe! – E então ela se jogou em cima de mim, me abraçando e chorando.
- Jodi... – Eu não sabia o que dizer.
Levou uns dois minutos até que ela enfim me soltasse.
- Eu sei que você não contou nada ao Perry. – Ela disse devagar. – Me desculpe. – Me abraçou de novo. – Por favor, me perdoe. Eu não sei o que me deu na cabeça.
Compreendendo parcialmente o que estava acontecendo, eu a abracei de volta.
- Tudo bem, Jodi. – Murmurei, sorrindo um pouco em seu cabelo. – Tá tudo bem.
Ela se afastou de novo, sorrindo em meio às lágrimas e segurando minhas mãos.
- Olha, eu e minha mãe viemos ajudar. – Disse. – Sabemos que o seu pai tem andando adoentado e o quanto você tem dado duro. Eu te via na escola e do outro lado do parquinho.
- É, isso mesmo. – Disse a senhora Slaterton, apressada. – Bom, onde ficam os produtos de limpeza?
Ela foi logo entrando e não sabia o que fazer, mas Jodi olhou para mim e riu.
- Não se preocupe, quando acabarmos essa casa vai parecer novinha em folha.
Minutos depois, a senhora Slaterton passava com vontade o esfregão no chão da cozinha, enquanto Jodi me explicava tudo no quintal.
- Eu e o Brad estávamos lanchando na casa dele, quando o irmão dele lembrou que dias atrás, ele foi a uma festa e batizaram o refrigerante dele. Ele me contou quando aconteceu, estava muito chateado. – Disse ela. – O que Brad não sabia e o Bob nos contou, foi que, naquela noite, quem trouxe o Brad para casa não foi um dos amigos dele. Foi o Perry Gold, que também estava na festa.
- Então... – Abri a boca.
- Foi o Brad quem contou ao Perry aquilo tudo quando estava bêbado.
Eu não podia acreditar naquilo. De todas as possibilidades, aquela era a mais surpreendente.
- Oh, eu quase matei o Brad, ! – Jodi disse feroz. – Eu briguei tanto com ele. Mas nem dá para culpá-lo; eu é que não devia ter acreditado... Olha só tudo que eu fiz.
- Jodi, relaxa. – Apertei sua mão. – Estou feliz em fazer as pazes com você.
E estava mesmo. Vinha me sentindo tão sozinha sem ela e Emma, que qualquer ressentimento parecia nada perto daquele momento.
- Obrigada. – Ela disse. – Tem mais uma coisa. MÃE! – Chamou.
A senhora Slaterton colocou a cabeça para fora da cozinha.
- Mãe, lembra do que queria dizer a ? – Jodi incentivou.
A senhora Slaterton fez uma careta, mas disse:
- Me desculpe pelo que falei no supermercado. E por todas as outras vezes em que ofendi você ou seu pai. Foi muito errado e eu sinto muito.
Jodi abriu um enorme sorriso, fazendo um sinal de joia para sua mãe. Eu quase ri, mas me contive.
- Tudo bem, senhora Slaterton. – Falei. – Também fico feliz pela senhora estar aqui.
Ela assentiu e voltou para dentro. Então me lembrei:
- Ei, Jodi... Foi você que deixou aquela panela de sopa na cozinha?
Ela sorriu.
- Fui eu sim. – Disse. – Eu ainda estava com raiva, mas minha raiva era fraquinha e você estava toda atrapalhada.
Sorri de novo e a abracei.
- Obrigada. De verdade.
- Olha, Brad também está chateado pelo que fez, então ele ofereceu uma oferta de paz. – Ela tirou um envelope do bolso do casaco e o estendeu para mim.
- O que é isso?
- É do spa da Costa. – Ela deu de ombros. – A tia do Brad é a dona. É um pacote para você, para o dia do baile, de graça.
- Caramba, não precisava! – Exclamei feliz.
- Claro que precisava. E a melhor parte, é que eu e as meninas estaremos lá também. Temos tanta conversa para colocar em dia! Começando por essa história de você estar afastada do .
- Ah, Jodi, essa é uma longa história. – Suspirei.
- Não se preocupe. – Ela balançou a cabeça. – Vamos ter tempo para conversar enquanto arrumamos essa casa.
28- God save the prom queen
"She turned her tears to diamonds in her crown."
[…]
Terminei de fechar o vestido branco ao lado do corpo. Se eu estivesse em Denver, como antes, minha mãe estaria me ajudando a fazer isso, ou talvez a Collie. Me olhei no espelho, observando os penduricalhos brilhantes da roupa. As meninas queriam que eu me arrumasse com elas, mas eu tinha preferido fazer isso sozinha. Por algum motivo, aquele era um momento muito pessoal para mim.
Meu telefone tocou. Me aproximei dele já desconfiada de quem poderia ser, e não me enganei. Amber tinha me ligado pelo menos cinco vezes naquele dia, ansiosa para que tudo saísse como tinha planejado.
- Dama de Vermelho para Prom Queen. – Ela disse. – Já está pronta? Tudo em ordem?
- Já sim. – Falei. – Junior deve estar chegando daqui a pouco.
- Ótimo, é bom que ele não se atrase. As pessoas têm que te ver divina para saber em quem votar.
- Eu acho que a maioria das pessoas já decidiu em quem votar a essa altura, Amber.
- Nunca se sabe, a sociedade é muito imagética. – Disse em um tom pretensioso. Depois explicou: – Ouvi essa expressão no Discovery Channel. me obrigou a mudar de canal quando eu estava assistindo Say Yes to the Dress.
- Faz sentido. – Era mesmo difícil imaginá-la assistindo DC por vontade própria.
- Por sinal, eu vou ligar para ele de novo. Nos vemos no baile. Não se atrase.
Amber desligou e eu voltei para perto do espelho. Uma mecha do meu cabelo tinha se soltado e eu peguei outro grampo para prendê-la ao meu penteado de anos 20.
- Uau, você está linda. – Papai apareceu à porta, no reflexo do espelho.
Olhei para trás e sorri.
- Obrigada, pai.
- Só falta uma coisa.
Ele se aproximou de mim e havia um headband branco e brilhante em suas mãos. Abaixei a cabeça e ele o colocou nela como em uma coroação.
- Agora sim. – Sorriu, me virando para o espelho. – Parece ter saído de um filme antigo.
- Onde conseguiu isso? – Me olhei no espelho, encantada.
- Naquelas velharias que guardo lá atrás. – Suspirou. – Sua mãe usou numa festa a fantasia nossa.
- Desculpe por remoer isso. – Franzi o nariz, abraçando ele.
- Nunca é ruim falar da sua mãe. – Ele sorriu. – Eu vou descer para fazer o jantar. Pode terminar de se arrumar em paz.
Papai desceu as escadas e me deixou ali, calçando os sapatos.
De novo, mas mais do que nunca, congelei por um instante ao pensar em como tinha mudado desde minha chegada. Em tudo que tinha mudado.
Meu celular vibrou sobre a escrivaninha. Visualizei a mensagem de Sofia.
Esta noite, seja a rainha que você se tornou.
Eu sorri, embora não soubesse dizer se era um sorriso feliz.
Desci as escadas e ia para a sala esperar até o carro chegar, quando Miguel apareceu. Ele parou, surpreso. Então sorriu.
- Nem parece a garotinha tagarela que vivia atrás de mim. – Disse.
- Por que vocês ficam me elogiando por estar bonita como se eu andasse desarrumada todos os dias? – Brinquei.
- Porque você anda. – Ele deu de ombros. – E quanto ao ?
- vai... Com a Summer.
Miguel me olhou de um jeito indagativo, e então o telefone sobre a mesinha tocou. Ele o atendeu.
- Falando no diabo... – Ele disse, me fazendo entender na hora de quem se tratava. – Nada. Precisa falar com alguém? Ah, sim, sem problema. Pode deixar, eu passo aí e te entrego. Sem problemas. Até mais.
Olhei para ele com uma expressão indagativa.
- Era o . Ele tinha me emprestado o contrabaixo anteontem, e disse que vai precisar. – Explicou. – Eu vou lá levar para ele.
- Eu... – Falei, meu coração disparado. – Posso ir.
- Mas você...
- Não. – Sorri, balançando a cabeça. – Eu vou. – Peguei as chaves do carro na mesa. – Se o chegar, diga que já volto.
Miguel ergueu uma sobrancelha para mim.
- Tem muito que nós ainda precisamos conversar, . – Disse, me fazendo tremer na base. – Mas hoje não é o dia para isso. Vai de uma vez, eu seguro o aqui.
- Obrigada. – Sussurrei, sorrindo.
Antes que Miguel dissesse outra coisa, peguei o contrabaixo na sala e saí de casa.
Talvez fosse a possibilidade de aquele ser o fim de tudo, já que em alguns minutos eu entraria naquele baile com , mas de repente, eu precisava ver o . Vê-lo antes que tudo acabasse de uma vez, antes que ele estivesse apaixonado por Summer de novo e para sempre. Uma última vez, queria que fôssemos só nós – a péssima atriz de Denver, o babá de cachorros tocador de contrabaixo – como no começo.
Parei o carro em frente à casa dos . Respirei fundo, peguei o contrabaixo e caminhei até a porta da frente.
Bati na porta duas vezes em vez de tocar a campainha. E então ele abriu.
Parecia que era a primeira vez que nos víamos em séculos.
estava usando um suspensório azul-marinho sobre a camisa social, e na cabeça tinha um chapéu também azul-marinho antigo, que estava na caixa de velharias que nós encontráramos semanas atrás. Uma eternidade atrás.
- . – Ele disse quase sem voz.
- . – Respondi do mesmo modo. Depois, sorri um pouco. – Eu vim te trazer isso. – Estendi o contrabaixo, que segurou, confuso.
- Pensei que Miguel fosse vir. – Ele inflou as bochechas. – Você está...
Eu sorri, sem jeito, e então Henry, o padrasto dele, apareceu.
- , quem é? – Ele perguntou do fim do corredor.
- Henry! – levou um susto. – É a... . – Olhou para mim de novo.
Eu poderia dizer mil coisas a ele, mas qualquer coisa que eu dissesse poderia estragar aquele momento, e eu queria guardá-lo assim. era o garoto mais bonito que eu já tinha visto, o mais talentoso e o que tinha o maior coração, e sempre seria.
Dei de ombros, sorrindo de novo.
- Nos vemos no baile.
E então voltei para dentro do carro.
Ainda estava sorrindo quando estacionei em casa e desci. Antes que eu entrasse de novo, no entanto, uma limusine preta surgiu, trazendo um incrivelmente encantador vestido de preto, de pé no buraco do teto solar.
- Boa noite, Majestade. – Ele sorriu. – Sua carruagem acaba de chegar.
- . – Falei, pensando em como meu coração teria batido forte ao vê-lo daquele jeito algum tempo atrás. Agora não, embora eu ainda o achasse tão lindo quanto um príncipe da Disney. Agora meus batimentos acelerados denunciavam meu receio por estar indo àquele baile com ele.
- Fantástica. – Ele sorriu, bobo. – Você está fantástica.
- Obrigada. – Sorri. – Vou buscar minha bolsa.
🌴💚🌴
- O que foi? – perguntou dentro do carro.
Só então me toquei de que estivera em silêncio o tempo todo.
- Nada. – Balancei a cabeça.
- Eu prometi que você se divertiria, não é? Então não se preocupe.
Em vez de responder, forcei um sorriso.
Havia tantos carros no estacionamento da Jacksonville Beach High que dava a impressão de que se tratava de um casamento ou alguma coisa do tipo. Me senti nervosa de repente. Parei de andar.
- Tudo bem? – ergueu uma sobrancelha.
- Está sim, eu só... – Balancei a cabeça. – Isso aqui parece o evento do ano. É um pouco intimidador.
Ele deu risada.
- E você ainda nem viu como estão as coisas lá dentro.
Ele segurou minha mão com firmeza, me puxando para o ginásio.
E ele estava absolutamente certo.
Era como estar em um filme dos anos 20. Havia pessoas com roupas de época para todos os lados, e inclusive um palco, cheio de instrumentos e com uma mesa de DJ, de onde vinha a melodia de Fever em um remix. A decoração estava muito mais fantástica do que eu jamais teria esperado.
Eu estava deslumbrada quando ouvi as vozes chamando meu nome.
- ! ! – Jodi veio correndo, enfiada em seu lindo vestido dourado de franjas. Ela me abraçou. – Você está fantástica! – Exclamou.
- Vocês é que estão lindas! – Sorri com toda a honestidade. O vestido verde de Emma também brilhava à luz da festa.
Olhei para alguns metros à distância, de onde Franklin, meu companheiro de elenco da peça, recebia os votos das pessoas.
- Onde está a Amber? – Emma quis saber. – Pensei que a essa altura ela estaria do lado da mesa de votos ameaçando qualquer um que não votasse em você.
- Eu também não sei. – Dei de ombros.
- Ah, tanto faz. Estou tão feliz por termos nos entendido! – Hughes se colocou em nosso meio e puxou nós duas para um abraço, falando com seriedade. – Sério, nunca mais vamos brigar.
- Não mesmo. – Falei. – Onde estão e Brad?
Para a minha total surpresa – e dela também –, Emma tinha acabado por aceitar ir ao baile com . Segundo ela, o motivo era ela não suportar mais a insistência dele.
- Em algum lugar por aí. Fugi dele quando te vi. – Ela explicou. Então olhou para o lado. – Junior. – Disse num tom de desdém.
- Hughes. – Ele assentiu. – Bom, eu vou ver se acho os rapazes. Nos vemos depois. – Apertou minha mão.
Quando Junior estava longe o bastante para não ouvir, Emma fez uma careta.
- Eu não acredito que achei o o cara mais gostoso da Flórida por tanto tempo. Quando olho pra ele agora, tudo que vejo é um otário que eu queria socar.
- Bom, pelo menos ele sempre foi um bom amigo pra . – Jodi ponderou. – E é legal que tenha se oferecido pra vir com ela porque ela brigou com o , embora não seja tão legal assim com a Summer.
Concordando, mas sem me estender no assunto, perguntei algo que era do interesse de todas nós.
- Onde está a Summer, aliás? Conseguiram falar com ela?
Durante todo o tempo em que estávamos no Spa, tínhamos tentado falar com Summer, mas só caía na caixa postal. Ficamos até preocupadas que ela não fosse ao baile, e ainda não tínhamos certeza de que iria. Mas o fato de estar impecavelmente arrumado quando fui à casa dele me fazia crer que sim.
- Eu liguei para a casa dela, mas aquela bruxa da mãe dela não vai muito com a minha cara e disse que ela tinha acabado de chegar e estava ocupada. – Emma contou.
- Pelo menos ela não disse que ela não vem. – Jodi deu de ombros. De repente ela deu um pulo. – Opa!
Alguém a tinha agarrado por trás.
- Brad! – Ela exclamou, rindo.
- Oi, meninas. – Brad sorriu para nós duas. – E então, , aproveitou o dia no Spa?
Brad já tinha me pedido desculpas por toda a confusão com Perry Gold, mas não conseguia deixar de se sentir culpado ainda assim. Apesar de tudo, eu não estava chateada com ele, para falar a verdade. Se alguém tinha a obrigação de entender atitudes equivocadas, esse alguém era eu.
- Foi tudo maravilhoso, Brad. – Sorri de volta. – Muita obrigada pela gentileza.
- Eu não fiz mais do que a minha obrigação. Depois de tudo que eu causei... Bom. – Deu de ombros.
- Esquece essa história. Já está tudo bem agora.
- Não está não. – Emma deu uma cotovelada nele. – Eu nunca vou esquecer, Winter. – Avisou. Brad estremeceu.
Jodi estava meio que concordando com Emma, quando percebi que estava voltando junto com . Eles sorriram a distância, e eu acenei discretamente. Emma me deu um beliscão, rolando os olhos, mas não pude fazer nada – em um segundo eles já haviam chegado.
- Ah, aí está você! – exclamou. – Fui pegar seu ponche e quando voltei você tinha sumido. Passei um tempão te procurando! Agora deve estar quente.
- Ela poderia tomá-lo fervendo para escapar dele por mais tempo. – Jodi cochichou para mim e eu ri.
- , você quer dançar essa? – perguntou então.
Abri e fechei a boca, pensando por um segundo.
- Ah, claro. Vamos. – Forcei um sorriso. Bailes eram para isso, afinal.
Dei de ombros, olhando para elas com ar de desculpas.
- Nos vemos depois.
me puxou para longe, até eu ter perdido as garotas de vista. Enquanto andávamos, eu procurava Summer e com os olhos, no meio da multidão, mas tudo que vi foi Jasmine, mais linda do que nunca, usando um vestido longo azul e brilhante. Ela estava com seu namorado, Charlie.
- Eu vou dizer isso de novo quantas vezes forem necessárias. – disse quando estávamos em um lugar mais alto, montado lá dentro especialmente para fazer com que o ginásio parecesse um bar antigo. – Você está deslumbrante.
- Obrigada. – Eu sorri. – Pensei que íamos dançar.
- Mudei de ideia. Prefiro passar um tempo com você sem ninguém me acotovelando.
Balancei a cabeça e ri. se apoiou no pequeno muro cor de cobre, olhando as pessoas dançando lá embaixo.
- Eu olho para toda essa gente, e fico tão feliz por estar aqui com você. – Comentou. – A garota mais incrível da festa.
- Claro, porque é só isso que importa. – Ergui as sobrancelhas, sem conseguir evitar me lembrar do que dissera sobre Junior querer ir à festa comigo, ainda que eu não achasse que a competitividade era o único motivo para isso.
O rapaz olhou para mim, divertido.
- Essa noite é muito importante para mim.
- Por quê?
- Porque é a primeira vez que saímos juntos de verdade desde que nos reencontramos. E você não é incrível só porque é bonita. – Disse. – Você é divertida, é inteligente... Eu olho para você e tenho tantas lembranças boas, .
Eu senti um aperto no estômago. Queria dizer a Junior que não se podia viver de lembranças. O importante era o que ele via agora. E o que ele sabia sobre mim agora? Porque eu tinha mudado. Eu tinha mudado tanto. E o garoto que eu via agora também não era mais o dos meus devaneios de férias.
- Graças a Deus você já está aqui! – Uma voz infantil me fez virar.
Aquela voz não combinava nada com a Amber de cabelos louros modelados e vestido vermelho, que mais parecia a Jessica Rabbit. Irritante e grudenta ou não, Hayley estava deslumbrante, e eu compreendi então que Jasmine realmente devia reprimi-la quanto a usar vermelho por medo de ser ofuscada.
- Amber! – Eu disse. – Você está tão linda! Mas juro que achei que fosse chegar aqui antes de mim.
- E era o meu plano, mas o cismou que precisava me dizer alguma coisa. – Ela resmungou. – Aí ele ficou andando com o carro em círculos por aí, porque não conseguia falar, até que finalmente desistiu e viemos. Eu achei que ele tinha ficado maluco.
E logo atrás dela apareceu . Ele estava um tanto quanto absorto, com um terno e um chapéu que o faziam parecer um gangster, o que combinava perfeitamente com o visual da Hayley.
- . – Eu me aproximei e lhe dei um abraço rápido, enquanto Amber falava com e outras pessoas ao redor.
- . – Ele disse. – Uau, você está linda.
- Obrigada, você não está mal também.
Ele suspirou, olhando sobre meu ombro. Então se inclinou e disse:
- Eu ia terminar com ela. Eu botei na cabeça que ia dizer a ela que não dava mais, mas não consegui. Isso é terrível.
- Talvez tenha mesmo sido melhor não fazer isso agora. Ela ia enlouquecer.
- Eu sei! – Ele deu um suspiro deprimido.
Meu braço foi puxado e Amber estava de volta em um segundo.
- Deixa eu ver se está tudo certo com você. – Ela me fez girar, puxou meu vestido em um lugar e outro e bateu palmas. – Tudo em ordem. Vestidos brancos nunca falham. E esse vai combinar com a coroa. – Balançou a cabeça positivamente. – Agora venha, temos que ver a quantas anda a votação.
Amber saiu me arrastando pelo salão até a mesa onde eu vira Franklin minutos atrás.
- Bert! – Ela exclamou, deixando-o assustado. Todo mundo na escola sabia que Amber andava meio maluca com a campanha. – Como está a votação?
- Vai... Bem, eu acho. – O garoto disse inseguro.
- E quem está ganhando até agora?
- Eu acho que não posso falar isso, Amber.
- Ah não? – Ela deu um sorriso debochado e foi mexer na caixa. Mas antes que ela abrisse a urna no chão, um pé com sandália amarela pisou no topo da mesma, fazendo Amber pular para trás.
Eu mesma não tinha percebido Annabeth chegar, mas ela estava brilhante, usando um vestido colorido e flores na cabeça, em uma releitura maravilhosa da Frida Kahlo.
- Ouviu o Franklin, Amber. – Ela sorriu com firmeza. – Essa urna não será tocada até a hora do anúncio.
- E quem diabos é você? – Amber perguntou. – Eu nunca sequer te vi nessa escola!
- Acontece que eu levei alguns anos para abrir mão do meu poder de invisibilidade. Agora some daqui antes que eu chame a senhora Turttle!
Amber soltou algo parecido com um rosnado e saiu dali, esquecendo até mesmo de mim. Morri de rir, me aproximei de Annabeth e a abracei.
- Caramba, Annabeth, sua roupa só não é mais incrível do que o que acabou de fazer! – Eu disse. – De onde saiu tanta coragem?
- Ah, acho que de um monte de filmes que eu assisto. – Brincou. – E também... De você.
Não entendi bem o que ela queria dizer.
- Por que diz isso?
- Depois da nossa conversa dias atrás, eu percebi que te dei um ótimo conselho, que você seguiu à risca, mas que eu mesma não estava seguindo. – Riu, coçando a cabeça. – Eu estava fazendo direito a parte de deixar as coisas acontecerem, mas a verdade é que não estava fazendo nada para tentar mexer no que podia. Então, uma das minhas resoluções foi parar de servir de capacho para pessoas como Amber e Jasmine. A outra foi convidar Edward Miller para o baile.
- Edward do teatro, o protagonista?! – Me espantei. – E ele aceitou?
- Bom, eu estou aqui, não estou? – Annabeth piscou para mim. – Aproveite seu baile, mas não se preocupe com isso aqui. – Bateu de leve no meu ombro e apontou para a urna. – Não vou deixar ninguém estragar a surpresa da noite.
- Só tome cuidado com a Amber. – Brinquei. A menina riu.
Me afastei, sem conseguir deixar de observar ao meu redor em busca do . A curiosidade de saber por que ele não estava lá me deixava apreensiva, embora eu soubesse que ele iria. Por fim, vi as meninas acenando do lugar onde eu estivera antes e me juntei a elas.
Emma estava discutindo alguma coisa com , e Amber estava lá também, sentada ao lado dele, a cara emburrada.
- Achei vocês. – Sorri.
- Eu já ia te procurar. – , que estava falando com até então, estendeu um copo de ponche para mim, e eu bebi.
Brad levantou da mesa e se aproximou de nós.
- Que bicho mordeu a Hayley? – Ele perguntou em voz baixa. – Eu ofereci um docinho a ela e ela jogou de volta em cima de mim! – Contou, e Jodi, sentada, segurou a mão dele, com pena.
Foi quando o salão inteiro escureceu, e uma das luzes de foco foi direcionada para a entrada do ginásio.
- Uau. – Ouvi alguém dizer.
Eu reconheci o vestido preto na hora, uma vez que estava lá quando ela o encontrou. Mas o rosto, esse me pegou de surpresa, pois os longos cabelos dourados que um dia o tinham emoldurado, haviam agora sido substituídos por um chanel curto ondulado que faziam com que ela parecesse mais forte do que nunca.
- NÃO, NÃO, NÃO! – Amber se colocou de pé, em pânico, e foi para o muro de cobre falso. – O que ela está fazendo aqui?! Vai estragar tudo!
- Ela está fantástica. – murmurou, embasbacado.
Summer sorriu e acenou para o rapaz da luz, que então a apagou. E, embora isso não tivesse feito a maioria das pessoas deixar de olhar para ela, a garota deu alguns passos, ignorando a atenção.
Quando dei por mim, Emma já estava arrastando Jodi e eu para perto de Olsen, os outros abrindo passagem para a famosa encrenqueira.
- Olha só pra vocês! – Summer exclamou, encantada. – Vocês parecem as rainhas do baile. – Ela disse.
- E você, a rainha da Inglaterra! – Emma disse com sinceridade.
- De todos os bailes em que eu já te vi, esse é onde você está mais linda. – Jodi sorriu. Summer apertou a bochecha dela, como se fosse uma criança fofa.
- Tentamos falar com você várias vezes. – Falei.
- Eu queria me concentrar no trabalho, me desculpem. – Summer explicou. – Eu estava em Nova York. Foi incrível.
- Você parece incrível. – Sorri.
Foi então que Emma pigarreou, e me lembrei do que tinha que falar.
- Eu preciso te dizer uma coisa.
Eu tinha que contar o quanto antes que estava ali com , para não causar uma confusão.
- Claro. – Ela assentiu. – Mas antes me fala: onde está o ?
- O ? – Estranhei. – Eu não sei. Ele veio com você, afinal.
Summer me olhou confusa.
- Comigo? – Repetiu. – e eu não viemos ao baile juntos.
Jodi parecia tão confusa quanto eu. Ela deu um passo à frente.
- Não vieram? – Repetiu. – Mas... O Junior disse que...
- O quê? – Summer franziu o cenho.
Balancei a cabeça, tentando processar aquilo.
- Mas ele já estava pronto quando o vi hoje. – Falei.
- Sim, mas não para ser meu par. – Ela explicou. – Ele está aqui hoje a trabalho; o comitê o contratou. Eu fiz isso.
E enquanto eu ainda sentia minhas pernas balançarem, me dei conta de que as batidas de remix tinham parado. Ouvi a introdução curta da canção conhecida. E quando me virei para trás, estava no palco, usando um par de óculos escuros, com uma banda o acompanhando.
[N/A: Ouçam essa aqui, meninas!]
Birds flying high you know how I feel
Sun in the sky you know how I feel
Breeze driftin' on by you know how I feel
E ao som da voz dele, fui sendo levada por minhas próprias pernas para perto do palco, sem saber bem o que estava fazendo.
And I'm feeling... Good.
Só os gritos ao meu redor me fizeram despertar um pouco. Summer estava ao meu lado de novo.
- Pedi a ele para cantar essa música hoje. – Ela disse.
Mas eu quase não a ouvi, apesar de entender. Estava muito focada no que estava diante de mim naquele momento, naquele palco.
Fish in the sea you know how I feel
River running free you know how I feel
Era como ver outra pessoa, e, ao mesmo tempo, o mesmo garoto que tocava no sofá da minha casa. E aquele palco parecia a casa dele.
Ele tinha nascido para aquilo, isso era mais verdade do que qualquer outra coisa no mundo. E eu senti um orgulho tão grande, que meu coração poderia explodir.
Dragonfly out in the sun,
You know what I mean, don't you know?
Butterflies all havin' fun, you know what I mean
Eu me dei conta então, de que nunca tinha sentido aquilo por ninguém, e que aquela sensação não era só por ele estar tão brilhante naquela noite. Era a sensação que sempre estivera lá, quando ele cantava para mim na varanda, quando estávamos juntos no carro.
E eu me apaixonei. De novo. E de novo. E de novo.
E enquanto a banda tocava a parte instrumental da canção, eu sorri um sorriso tão grande quanto poderia ser, e gritei como todos os outros – uma gritaria que só foi silenciada pela volta da voz de .
Stars when you shine you know how I feel
Scent of the pine you know how I feel
Oh freedom is mine
And I know how I feel!
It's a new dawn…
It's a new day…
It's a new life…
And I'm feeling good.
A multidão de alunos explodiu em aplausos e gritos. Todos estavam muito impressionados. Brad e Jodi deviam estar muito felizes com seu candidato a American Idol. E eu assobiei até não conseguir mais.
- Obrigado! – sorriu, um pouco tímido. – Muito obrigado!
Ele saiu para os fundos do palco e eu disse a mim mesma para ir até lá, mas minhas pernas congelaram quando vi Summer e me dei conta de que algo estranho estava acontecendo, e eu estava totalmente perdida entre correr para ou ficar e ouvir ela.
- ESSE é o que eu sabia que tinha potencial! – Emma exclamou.
- Ahhh, ele estava fantástico! – Jodi bateu palmas, saltitando. – , você tem que falar com ele!
- Vamos lá vê-lo! – Summer agarrou minha mão. Mas logo parou. – Ah, você queria me dizer alguma coisa, não é? O que foi?
Olhei por sobre seu ombro. já tinha alcançado , que descia do palco. Respirei fundo. Eu tinha que descobrir a verdade.
- Summer, presta atenção. – Falei com seriedade, tentando ignorar o barulho ao redor. – Eu achei que você vinha ao baile com o , porque nós tínhamos brigado.
- Claro que não. Eu queria que ele tocasse desde o começo, mas é só. Achei que vocês fossem vir juntos no fim das contas.
- É, mas com essa confusão toda, alguém se ofereceu para acompanhar a . – Jodi explicou, apreensiva.
- Quem?
Então apareceu ao nosso lado, uma expressão indecifrável no rosto.
- Oi, Summer. – Ele disse.
- Junior. – Ela o cumprimentou, entendendo então de quem se tratava. – Ah.
A voz de Summer não soou necessariamente odiosa ou ultrajada. Mas sem dúvida aquilo causou certo impacto nela.
Eu queria desesperadamente lhe explicar o que não tinha como ser explicado, quando , Amber e se aproximaram.
- Consegui um Meet and Greet com a estrela da festa! – Amber riu, segurando um copo de ponche.
olhou para mim e eu olhei para ele, e ele sorriu, mas eu ainda estava preocupada com Summer. Então percebeu a cara dela e a presença de , e, pensando rápido como só ele conseguiria, disse:
- Summer, você está incrível com esse cabelo! – Elogiou. – Por que não vamos todos nos sentar? Fiquei em pé a música toda!
Fomos todos juntos rumo à mesa à esquerda do bar falso onde eu estivera com . Eu dizia a mesma que havia uma explicação razoável para tudo enquanto olhava para , a poucos metros de distância, respondendo as perguntas de Amber.
, muito atento à situação, fez questão de fazer piadinhas e manter a conversa casual durante nosso percurso, de modo a diminuir a tensão palpável que se instalara entre Junior e Summer.
- Caramba, , se eu soubesse que você iria tão bem lá em cima, não teria dito às pessoas que não te conhecia! – Ele brincou.
- Sua fé em mim é digna de um melhor amigo. – deu um sorriso torto.
Quando chegamos à mesa, meus pés quase me traíram de novo, me levando para perto de , onde eu costumava me sentar. Mas antes que isso acontecesse, tocou delicadamente meu braço e puxou uma cadeira para mim. Assenti e me sentei, e ele ficou ao meu lado, na ponta. Do meu outro lado, Amber e pegaram as cadeiras, e ao lado deles, por fim, e Summer. Os outros acabaram por se sentar com os jogadores da campanha de Jodi, lá embaixo.
- Se quer saber, , eu fiz exatamente o contrário. – Amber deu outro gole em seu ponche. – Falei para todo mundo aqui que éramos amigos. Já sabia que você ia arrasar!
- Bom, obrigado. – sorriu.
- Sério, , aquilo foi incrível. – Summer tocou seu braço sobre a mesa. – Uma performance profissional.
deu de ombros, sem jeito, mas claramente feliz. Nossos olhos se encontraram por um segundo então. Eu sabia que tinha que dizer a ele que aquilo tinha sido fantástico, mas não achei que a fala caberia ali, com sentado ao meu lado e tentando manter o clima agradável.
Isso era tão estranho! Até outro dia eu podia falar qualquer coisa com , a hora que eu quisesse. Em que momento tudo tinha ficado tão complicado? Quando as coisas tinham saído tanto do caminho de antes?
- Tem lugar para dois?
Olhei para cima e vi Jasmine, acompanhada de seu namorado, Charlie.
- Jas! – Summer exclamou surpresa. Até eu ficava surpresa por ela querer se sentar conosco, mas imaginava que àquela altura do campeonato não havia tantas outras mesas com disposição para recebê-la. – É claro que podem se sentar.
Charlie puxou duas cadeiras vazias e eles se sentaram ao lado de Summer. Agora a mesa oval estava basicamente fechada, e nós tínhamos que olhar uns para os outros – o que Jasmine, de fato, fez. Ela olhou para e Summer, e então para e eu, e fez uma careta de desprezo. Charlie, que era simpático como eu me lembrava, e pelo visto já tinha perdoado a namorada pela mensagem de celular que eu tinha mandado, quebrou o silêncio.
- Seu nome é , não é? – Perguntou ao . – Você é muito bom, cara! Foi você que tocou na lanchonete aquela noite, não é?
- No Rogers', é. Eu trabalho lá. – respondeu. – Trabalhava, na verdade.
- Parabéns pela apresentação. Foi ótima mesmo. – Elogiou de novo, olhando em volta então. – E isso aqui... Uau. Essa festa toda está fantástica. Meus bailes no ensino médio não eram tão reais assim. Estou me sentindo em um filme de gangster! – Riu.
- Obrigada, Charlie. Deu muito trabalho para fazer. – Amber agradeceu. – E eu adorei as roupas de vocês. Já viu a minha, Jasmine? É vermelha. – Provocou.
Summer riu um pouco, balançando a cabeça.
- Essa festa só ficou tão boa porque tivemos a na organização, Charlie. – Explicou. – Foi ela quem trouxe todas as referências de jazz para nós. O pai dela é músico.
- Ah, mas que bacana! – Ele se virou para mim. – Seu pai canta, então?
- Ele é saxofonista. – Respondi. – O nome dele é Jack Pie.
- Ah, claro! Eu lembro de ter ouvido o nome dele naquela noite. – Assentiu. – Quer saber uma coisa engraçada? Eu tenho esse primo que quer ser músico, e ele me fez acompanhá-lo a um show do seu pai uma vez, no ano passado. Tenho que admitir: eu nunca fui o maior fã de jazz, mas eu gostei bastante do que ouvi.
- Ah, ótimo, Charlie. Por que não pede um autógrafo no guardanapo? – Jasmine disse de repente.
Todos olhamos para ela, mas nenhum olhou tão sério quanto Charlie. Não havia desculpa para tamanha grosseria com alguém que claramente só fazia o possível para se dar bem com os amigos dela, o que claramente nem ela fazia questão.
- Ih, torta de climão! – Amber exclamou. – Vou pegar um morango com chocolate. Vamos, gatinho! – Ela puxou para fora da mesa.
Charlie balançou a cabeça, e Jasmine pareceu, de repente, um pouco arrependida. Ela tocou o braço dele sobre a mesa, mas o rapaz recuou.
- Eu juro que às vezes não te entendo. – Ele disse.
- Eu não quis ser rude. – Ela falou.
- Nunca quer. – Charlie deu de ombros. – Vou pegar uma bebida.
Jasmine ainda levou um segundo petrificada depois que ele se levantou, mas logo se pôs de pé, seguindo a passos rápidos atrás do namorado.
E então nós ficamos ali, num clima ainda pior do que antes. Eu sabia que não tinha muito o que arrumar na situação, mas tentei mesmo assim tornar o ar mais leve.
- Summer, você está tão diferente. – Falei. – Esse cabelo ficou tão bem em você.
- Parece outra pessoa! – Emma sorriu.
- É verdade. – concordou. – Caiu muito bem.
Summer sorriu, mas antes que dissesse qualquer coisa, falou:
- Dizem que quando uma mulher muda de cabelo, é comum ela também mudar de namorado. – Ele alfinetou.
Mas Summer, apesar de erguer as sobrancelhas, fez questão de responder:
- Nesse caso, não há problema, porque eu não tenho nenhum.
balançou a cabeça. bufou.
- Eu preciso ir ao banheiro. – Summer se colocou de pé. – Você vem comigo, ?
- Claro. – Assenti, feliz por fugir.
- Preciso voltar para o palco. – anunciou. – Nos vemos depois.
Como não disse nada, segui com Olsen pela festa.
Summer segurava meu pulso entre a multidão enquanto andávamos. Pela força em seus dedos, dava para ver que ela estava muito nervosa, embora seu rosto de modelo escondesse isso.
- Summer, não fica assim. – Falei.
Summer parou de andar bruscamente e virou-se para mim. A fachada tinha ido embora; agora ela era só a garota de dezoito anos e coração partido que eu tinha ajudado no banheiro, meses atrás.
- Ele é tão... Idiota! – Ela exclamou. – Ele age como se eu não estivesse no baile com ele hoje por minha culpa. , eu passei semanas tentando consertar meu namoro com o Junior. Você viu tudo. Você tentou me ajudar.
Engoli em seco, sabendo bem o que tinha feito.
- Vi sim. – Concordei. – Olha, a culpa definitivamente não é sua. – Falei. É minha, completei em pensamento. – Mas, Summer, honestamente, você parece tão melhor desde que começou a se preocupar mais consigo mesma em vez de lutar pra dar um jeito nesse namoro. Não deixe uma conversa estúpida estragar tudo, tá bem?
- Não vou deixar. – Ela assentiu com veemência. – Obrigada pela sua amizade, . Se não fosse você desde que chegou aqui, não sei o que eu faria.
Meu estômago se retorceu. Dia após dia, eu via aquele túnel se estreitando. Sabia que não conseguiria esconder a verdade de Summer para sempre, e eu realmente a considerava minha amiga agora.
- Meninas! – Ouvimos.
Assim que avistamos Jodi e Emma em sua mesa, acenando freneticamente, seguimos até elas. As duas estavam com seus pares e vários outros jogadores com suas namoradas. estava tentando falar de algo com Emma, mas ela parecia estar discordando dele.
- Já chega, . – A garota ficou de pé, juntando-se a nós.
Jodi deu um beijo na bochecha de Brad e o deixou também.
- Será que falta muito para a contagem dos votos? – Ela perguntou ansiosa.
- Ah, que se dane essa votação! – Emma exclamou. – Olha só para nós, as garotas mais incríveis desse baile! – Ela disse baixinho, nos puxando para um abraço e dando sua risada de porquinho. – Nem o fato de eu ter vindo com aquele traste é capaz de estragar essa sensação!
Todas rimos, mas então Jodi percebeu que havia algo errado.
- O que houve, Sum?
- O Junior, como sempre. – Ela forçou um sorriso.
- Amiga, é só dar a ordem que eu arrebento aquele narizinho reto dele. – Emma se ofereceu.
- Não acho que vai precisar. – Sorri. – Summer já deu uma resposta e tanto no .
- Ah é? – Jodi ficou curiosa. Summer sorriu para mim em agradecimento.
Nós ficamos conversando ali e nos distraímos. Contamos a Summer sobre como tudo tinha sido esclarecido entre Jodi e eu, a confusão de Brad com Perry Gold. Summer contou sobre seu desfile em Nova Iorque e sobre como tinha tido que insistir para que cantasse no baile.
E eles não estavam ali juntos.
Minha cabeça dava voltas na conversa, mas isso não conseguia deixar de me perturbar.
Quem tinha inventado aquela história então?
Em um determinado momento, decidi que precisava tirar aquilo a limpo. Ia perguntar a quem tinha dito aquilo a ele. Pedi licença às meninas para me afastar.
- Preciso resolver uma coisa.
- Quer ajuda? – Jodi perguntou.
- Não, eu só preciso perguntar uma coisa a alguém.
- Não fique lá a vida toda. – Summer disse. – Ainda temos muito que conversar.
Sorri para elas e saí andando empurrando as pessoas pela multidão. Imaginava que ainda estivesse na mesa, ou tivesse encontrado algum amigo do time por aí.
Foi quando alguém segurou meu braço.
Eu me virei e minhas mãos gelaram.
- ?
- Eu estava te procurando. – Ele disse. – A festa está tão linda.
- Está mesmo. – Concordei, o coração aumentando os batimentos.
- Já deu uma olhada na decoração lá atrás? – Ele perguntou. Balancei a cabeça. – Quer... Dar uma volta?
Olhei para as meninas, à distância, e para o que pensei ser a figura de , no lado oposto do salão. Eu ainda tinha o que resolver, mas isso podia esperar, não é? Só um pouquinho. Eu só queria ficar com ele um pouco.
- Claro. – Falei.
me ofereceu o braço, e eu o segurei. Assim, seguimos juntos para fora do ginásio, pelas portas de trás.
Apesar de ter ajudado em algumas escolhas da decoração, devido a minha participação meio clandestina no comitê de baile, eu não fazia ideia do que eles tinham feito do lado de fora – nem sabia que eles fariam qualquer coisa na parte externa. Mas lá atrás, além da lua que estava especialmente bonita naquela noite, havia varais de lâmpadas de cor amarela e rosa, perto dos bancos de madeira onde os alunos geralmente se sentavam no intervalo. Elas pareceriam estrelas, se não estivessem tão baixo. A grama tinha sido cortada no dia anterior, e o cheiro de noite de outono se espalhava pelo ar.
- Minha nossa. – Abri a boca, abobalhada.
- De todos os bailes, esse está sendo meu predileto, em todos os sentidos. – disse, olhando para a lua.
Olhei para ele por alguns segundos, distraído. Sorri da visão. Era engraçado vê-lo daquele jeito, com aquelas roupas. Mas de um jeito bom.
- O que foi? – Ele me pegou observando.
- Nada. Eu gostei da sua roupa. – Soltei uma risadinha.
- Eu também gostei da sua. Era isso que eu ia dizer lá em casa, quando o Henry apareceu. Você está... – Ele coçou a cabeça. – Linda.
Eu assenti, meio sem jeito, mas feliz pelo elogio.
- Obrigada. Por que não... – Indiquei um banco.
- Ah, claro.
esperou que eu me sentasse e fez o mesmo. Por alguns minutos, ficamos só observando a decoração – admirando, em silêncio. Depois de um tempo, eu disse:
- ... Você estava incrível lá no palco.
Olhei para ele, que olhou para mim.
- Foi a primeira vez que cantei em um lugar que não fosse o Rogers'. – Ele admitiu.
Meneei a cabeça.
- Sei que não vai ser a última. – Disse com firmeza. – Você nasceu para isso. Quando eu olho para você, vejo o mesmo que vejo quando olho para o meu pai. Vocês morreriam longe da música como peixes fora d'água. Me promete que nunca vai deixar ninguém tirar isso de você? Por favor.
me encarou sério, depois sorriu.
- Eu prometo. – Disse.
Ficamos calados de novo.
- Antes de você vir para cidade, logo que comecei a passar mais tempo na sua casa, o Jack me cobriu de fotos suas. – Ele disse então, e havia uma sugestão de riso em sua voz.
- Mas o quê? – Olhei indignada. – Meu pai nem tem fotos minhas!
- Tem sim, de quando era pequena e das férias que passou com ele. Estão no computador.
Abri a boca, chocada. Achava que todas as fotos que tirávamos ficavam com mamãe, porque ela não gostava de trocar e-mails com ele, mas pelo visto para isso ela abria uma exceção.
- E sabe o que eu pensei antes de te conhecer, quando o Jack falou que você vinha morar aqui? – Ele perguntou.
- O quê? – Estava curiosa, apesar de ainda pensar nas fotos.
- Que talvez você não gostasse muito de mim porque eu vivia na sua casa.
- É, você me irritou no começo. – Admiti.
- Também pensei que podia ser uma chata, ao contrário do que seu pai pensava.
Arqueei uma sobrancelha para ele. continuou:
- Mas também pensei que, pelo Jack, eu ia me esforçar para ser legal e andar com você, se fosse necessário.
Tentei segurar o riso, balançando a cabeça.
- E o que pensa agora? – Perguntei sem olhar para ele.
- Que o que eu mais queria era ter vindo com você nesse baile hoje.
[N/A: Como estamos musicais hoje! Podem ouvir essa aqui, docinhos.]
Olhei para , meu coração batendo mais rápido e mais devagar ao mesmo tempo, e então ouvimos a melodia vinda de dentro do ginásio. Reconheci de imediato o dedilhar ao piano. Um turbilhão de emoções me invadiu. Tristeza. Nostalgia. Amor.
- Essa é... A música do casamento dos meus pais. – Falei baixinho. – Eu conheço dos vídeos da festa.
- Seu pai sempre escuta ela no trabalho. – sorriu. – Quando escolhi para a playlist do baile, achei que você fosse gostar.
Fechei os olhos, querendo evitar a emoção sem conseguir.
- Quer dançar? – perguntou então. Quando abri os olhos, a mão dele estava estendida.
Segurei sua mão e ficamos de pé. Nos movemos devagar ao som da música ali, debaixo das lâmpadas, de onde dava para ver o campo de futebol. Eu olhei para ele e ele olhou para mim, e então recostei a cabeça em seu ombro.
Dava para ouvir a respiração dele, e meu coração batia tão forte que ele poderia ouvir, se não fosse a música.
Por que você demorou tanto para perceber, ?
Não tinha sido óbvio desde o primeiro segundo? Desde que ele tinha me levado embora daquele jogo no meio da chuva? Desde o primeiro beijo?
A verdade era que eu nunca soube o que queria. Mas agora sim, eu sabia. Mais do que nunca, eu desejava que aquele fosse meu primeiro dia em Jacksonville Beach, que tivéssemos acabado de nos conhecer, sem nenhuma loucura para acabar com tudo.
Dançando com ali, sentia a pontinha de tristeza de uma pessoa que sabia que tinha estragado tudo tantas vezes por ser uma tonta. Mas naquele momento nada podia nos atrapalhar. Éramos só nós dois – como em tantas vezes antes, como nunca antes.
- Rainbow. – Ele disse de repente.
E eu olhei para ele com toda a atenção.
- Eu só queria saber... Por que veio ao baile com o Junior? Ainda gosta dele?
Porque eu pensei que tinha que te deixar ir. Porque eu pensei que você já tinha ido, pensei.
- , a verdade é que...
Mas alguém segurou meu braço de repente, me fazendo pular de susto. encarava com severidade.
- Acho que já roubou meu par por tempo demais. – Disse numa voz bem mais suave que sua expressão.
Senti medo de pela primeira vez. Meu coração batia rápido. Eu não queria ir. E ainda assim, sentia que se não fosse ia trazer problemas para , o que era a última coisa que eu queria.
A essa altura, encarava como se estivesse pronto para enfrentá-lo, e ele de fato disse:
- Não é você quem decide isso.
deu um passo à frente, um olhar irritado. Antes que a situação piorasse, no entanto, olhei para , o desagrado evidente nos meus olhos, e intervi.
- Junior está certo. – Forcei um sorriso. – Nos vemos mais tarde.
me olhou deixando claro que preferia que eu ficasse – não só para que continuássemos a dançar, mas pelo comportamento de – mas eu fui assim mesmo. Ele ficaria mais calmo uma vez que estivéssemos lá dentro.
[N/A: podem abaixar o volume até acabar.]
A música já tinha acabado quando chegamos ao salão, mas outra estava começando, um pouco mais agitada. Alguns casais continuaram dançando na pista. sorriu, me levando ao meio dos outros para dançar também.
- Não é como antigamente, ? – Ele perguntou. – Nós dois juntos.
- É. – Murmurei, vendo e Amber dançando lá em cima, meu amigo com uma cara péssima. – ... – Eu disse, voltando a mim então. – Preciso te perguntar uma coisa.
- O que foi? – Ele me olhou alerta.
- Quem te disse que e Summer vinham juntos hoje?
A pergunta pareceu pegá-lo de surpresa.
- Por que quer saber?
- Porque eles não vieram como um par, e alguém disse que viriam. E você me falou isso.
- Não sei bem, no meio de uma conversa alguém me contou. – Ele disse. – Faz diferença?
- Faz sim. Faz muita diferença, .
Parei de dançar e respirei fundo, de olhos fechados passando as mãos pelo pescoço.
- Vicentini? – se inclinou para ver se eu estava bem.
- Desculpa. – Balancei a cabeça. – Eu preciso ir ao banheiro.
Deixei ali no meio da pista e saí em busca de um pouco de ar, sozinha.
Entrei no banheiro, molhei as mãos na água fria e toquei as bochechas. Estava quente de tão nervosa.
Depois de toda aquela corrida maluca, eu amava quem tinha afastado e estava com quem tinha feito vir atrás de mim. Deus, havia alguma solução para isso?
Olhei no espelho. O baile já estava sendo cheio de emoções demais para tentar resolver qualquer coisa nele.
Enxuguei o rosto com papel toalha e saí do banheiro me perguntando onde estariam as meninas, quando de repente alguém chamou meu nome.
- Pie.
Olhei para trás e encontrei Perry Gold parado. O rapaz me encarava com seus olhos castanhos.
- O que quer comigo, Gold? – O encarei de volta.
- Soube que fez as pazes com a Slaterton.
- Não graças a uma retratação sua.
Perry baixou a cabeça e riu.
- , eu te vi colando aqueles cartazes para a Olsen no outro dia, e te vi andando com a Annabeth. – Disse então. – E eu acho que me enganei sobre você.
- Você não "se enganou". Você mentiu sobre mim sem a mínima vergonha na cara. E para quê? Para causar discórdia? Sinto muito, mas deu errado no fim das contas.
- Não foi por minha causa que eu quis causar discórdia. – Ele revelou. – É por isso que estou aqui. Depois do que tenho visto, acho justo que você saiba por quem eu fiz aquilo.
A curiosidade veio, mas no mesmo segundo se esvaiu. Porque não fazia mais diferença. Tudo estava resolvido, e ficar presa ao passado era o que tinha causado todos os meus problemas até aquele momento.
- Sabe de uma coisa, Perry? – Dei um fraco sorriso. – Eu não quero saber. Isso não vai mudar nada na minha vida. Morra com esse segredo.
Perry ficou ali, a boca entreaberta. Eu fui embora de perto dele, dando por finalizada aquela história e muito feliz por isso.
De repente, senti um solavanco e dei de cara com os olhos azuis de Amber, extasiados.
- Onde se meteu, sua doida?! – Ela perguntou, mas estava alegre. – Vem logo, está na hora do anúncio!
Confusa, deixei que Amber me arrastasse para perto do palco, onde já havia uma movimentação. Vi Franklin e Annabeth carregando a urna de votos.
- . – Olhei para o lado e vi Jodi, seus olhinhos brilhando. – Eu só quero dizer que se estou aqui é graças a você. Eu não ia querer competir com mais ninguém.
Senti um nó na garganta e abracei Jodi com força. Eu amava aquela tampinha.
- Vou para perto do Brad. – Ela disse, e eu soltei sua mão.
Assim que ela se afastou, apareceu ao meu lado.
- Está na hora de colocar sua coroa, Vicentini. – Ele riu, confiante.
Procurei então por Summer, e a encontrei a alguns metros. estava perto dela, falando alguma coisa. Ela olhou para mim e sorriu, assentindo.
- Boa sorte. – Li seus lábios dizerem. Mas se alguém parecia digna de uma coroa, era ela.
[N/A: Meninas, por favor, ouçam de novo, a partir do 2:29 até o final]
- Boa noite. – A voz da senhora Turttle, minha professora de Economia Doméstica, soou no salão.
Lá estava ela, em cima do palco, um vestido prateado cobrindo seu corpo arredondado. Ela tinha um envelope nas mãos.
- Odeio interromper a música, mas está na hora do momento mais glorioso da noite. Eu vou anunciar agora o Rei e a Rainha do baile de Outono!
Olhei para as meninas de novo, lá em cima. Eu conseguia ver o brilho nos olhos delas, e sabia que aquele momento ficaria gravado para sempre em suas memórias, ainda que Summer ganhasse mais uma vez.
A voz da senhora Turttle voltou a soar pelo microfone.
- Sem mais delongas, a rainha do baile de outono é...
Ela fez uma pausa.
- Jodi Slaterton.
Levei as mãos a boca, meu coração pulando de surpresa e a alegria.
Levaram alguns segundos para que Jodi entendesse que tinha ganhado. E então o salão explodiu em aplausos.
- NÃO! – Amber exclamou ao meu lado. – ISSO NÃO ESTÁ ACONTECENDO!
Eu não podia acreditar! A pequena Jodi Slaterton tinha vencido a própria Summer Olsen!
Olhei para Summer, tão estupefata quanto eu, feliz como com certeza não teria ficado se tivesse ela própria ganhado. Ela olhou para mim, sabendo que eu compartilhava do mesmo sentimento, enquanto Jodi seguia tremendo para o palco, debaixo dos aplausos e dos gritos, e recebia a enorme coroa de falsos diamantes.
- Mas como... – resmungou. – Não pode ser!
estava tão chocado quanto Amber, que agora estava na beira do palco gritando com Franklin Bert sobre uma possível falcatrua.
Eu aplaudi com tanta força que minhas mãos quase doeram, e gritei o nome de Jodi, que logo estava acompanhada por Brad, que fora eleito Rei.
De certa maneira, a pirâmide social tinha sido virada do avesso naquele baile. Aquela noite ficaria guardada na memória de todos nós.
🌴💚🌴
Depois da vitória de Jodi, não tínhamos feito outra coisa senão dançar e comemorar. Estávamos explodindo de alegria pela pequena Jodi Lyn, indo contra todas as expectativas daqueles que esperavam ver uma briga feroz entre nós três. Junto de Emma, fizemos o resto da noite se tornar uma continuação da nossa viagem, deixando os problemas de lado por pelo menos uma ou duas horas.
Eles só voltaram a reaparecer, de fato, quando paramos para descansar.
Eu sabia que a hora de ir embora estava acabando, e, na verdade, já estava mesmo um pouco cansada. Talvez ficar cuidando de papai todo aquele tempo tivesse me feito adquirir hábitos de uma pessoa caseira demais para festas de madrugada, ou talvez fosse o sono da noite anterior vindo, porque eu não tinha dormido nada pensando na festa.
De todo modo, me sentei e calcei os sapatos que tinha tirado para dançar ao som da banda. estava no palco, tocando contrabaixo, e sorriu quando olhei para ele. Eu sorri de volta.
- Finalmente sozinha de novo. – Ouvi outra voz dizer.
se sentou na cadeira em frente à minha. Por eu ter passado tanto tempo com as meninas, ele tinha acabado passando grande parte da noite falando com , o que eu sabia que não era seu plano inicial (nem o de , que sem dúvida preferia ter ganhado mais atenção de Emma).
- Eu falei que você ia se divertir, não falei, Vicentini? – disse convencido.
- Falou sim, e estava certo. – Sorri.
- Infelizmente, as meninas roubaram meu papel na sua diversão. – Fez um bico.
- Foi mal. – Dei risada. – Obrigada por me trazer, mesmo assim. E desculpe por ter feito aquele interrogatório mais cedo. Mas eu ainda quero saber.
- Tudo bem. – Ele sorriu. – Sabe o que eu estava pensando? Que poderíamos ir para outro lugar depois daqui. Comer alguma coisa, quem sabe?
Abri a boca, pega despreparada. Olhei para as meninas conversando, e então para o palco de novo, onde estava concentrado em um solo. A verdade era que eu não queria ir a lugar nenhum com depois dali, e não era só porque estava cansada.
- Desculpa, mas eu estou mesmo morrendo de sono. – Tentei não soar rude. – Não vejo a hora de cair na cama.
rolou os olhos e suspirou, mas deu um meio sorriso.
- Brincadeira. Não tem problema. Fica pra próxima.
Meneei a cabeça, e meus sentidos captaram algo então.
- Você andou bebendo? – Perguntei. – Sinto cheiro de bebida.
- Não. – deu de ombros com um olhar inocente, mas eu não estava convencida.
O último acorde do contrabaixo soou no palco.
- Muito obrigado, Jacksonville Beach High. – disse no microfone. – Foi ótimo estar com vocês.
Ele se livrou do instrumento, e pouco depois começou a guardar as coisas junto com o resto da banda. Emma apareceu perto de nós.
- Ei, vocês também já estão indo? – Ela perguntou. – O Winter vai dar uma carona para mim e pro . Jodi Lyn vai ficar lá em casa hoje.
- Ah, eu também já estou indo. – Falei.
- Estamos indo. – corrigiu, sorrindo.
Apesar de irmos para lados diferentes da cidade naquela noite, saímos lá de dentro todos juntos – com exceção de , e Summer, que estavam conversando lá dentro enquanto Amber ia ao banheiro. Dava para vê-los de onde estávamos, entretanto.
- Uau, essa noite foi fantástica! – Emma exclamou, enrolando o cabelo suado no alto.
- Foi mágica! – Jodi sorriu de orelha a orelha, abraçada a Brad. Eles ainda usavam as coroas.
Então alguém passou por nós abrindo caminho à força. Na verdade, eram duas pessoas.
- Charlie! – Jasmine exclamou.
Não fora ele a esbarrar em nós, mas ela. Aparentemente, Charlie havia deixado a festa pouco antes de nós e já estava quase em seu carro. Jasmine possivelmente tinha demorado um pouco a segui-lo.
- Charlie, espera! – Não dava para entender se ela estava irritada ou desesperada.
Charlie estava parado do lado de fora do carro, mas não parecia nada bem. Não deu para ouvir a discussão deles, embora estivéssemos de orelha em pé. Tudo que ouvimos foi quando Jasmine exclamou:
- Que seja então! Eu me viro!
O carro ainda hesitou, mas Jasmine reclamou mais alguma coisa, e então ele foi embora.
Todos ficamos meio sem jeito quando ela enfim notou nossa presença e voltou.
- Qual o problema de vocês, seus idiotas? Nunca me viram?
Brad franziu o cenho, e então coçou a cabeça.
- Jasmine, se quiser uma carona... – Disse.
- Eu não preciso da sua misericórdia, Winter. – Ela cortou. – Vou pegar um táxi.
Observamos Jasmine se afastar, receosos se deveríamos interferir ou não.
- Uau. – balançou a cabeça. – Que noite.
Demos mais alguns passos em direção ao estacionamento, e então paramos.
- Bom, é aqui que nos separamos. – Brad disse.
Emma fez uma careta.
- Acho que devíamos passar pela frente e ver se achamos a babaca da Jasmine. - Opinou. - Posso odiar ela, mas algo pode acontecer com ela sozinha e nervosa daquele jeito.
- Eu sempre soube que tinha um coração gentil, Hughes. - Brad a puxou para um abraço. Depois de três segundos, Emma lhe deu um empurrão.
- Sai fora, Winter! Que seja. - Cruzou os braços. - Nos vemos na aula, . – Disse.
Jodi se aproximou, me olhou por um segundo, e então me deu um demorado abraço.
- Muito obrigada por participar desse momento. – Murmurou.
- Obrigada por me deixar fazer parte dele com você. – Respondi.
Um segundo depois, os quatro estavam indo para onde o carro de Winter estava estacionado, e eu estava com . Dali, ainda estava perto do ginásio o suficiente para ver a luz das portas duplas.
- Nossa. – disse, olhando para mim. – Tem como alguém ser mais linda que você? Você é tão linda que me deixa tonto.
Eu sorri, mas apesar da doçura em sua voz, era certo agora que havia algo de errado com . Não era só o cheiro sutil de bebida. Ele estava um pouco alto.
- , fala sério: você bebeu lá dentro, não é? – Perguntei sem repreendê-lo, mas falando com seriedade.
- Talvez. – Ele riu.
Eu não ia entrar no carro com bêbado, a menos que eu fosse dirigir. Mas por algum motivo achava que teria trabalho para convencê-lo disso.
- Tá, acho que é melhor eu ficar com as chaves do carro então. - Sugeri.
- Ah, fala sério, não é pra tanto. - rolou os olhos.
- É sério, . - Insisti. - Ou eu dirijo ou eu fico.
- Pega de mim então. - riu, erguendo as chaves no alto. Apesar de cansada, tentei sem sucesso alcançar o molho de chaves, enquanto o garoto se divertia.
- Me dá isso aqui. - Falei sério. Não adiantou.
Antes que eu dissesse outra coisa, porém, Summer apareceu.
- Vocês ainda estão aqui? – Ela perguntou casualmente.
- É o que parece. – devolveu, provocando.
Summer franziu o cenho, se aproximando dele.
- Junior, você andou bebendo? – Questionou. – Você está dirigindo.
- Ah, me deixa em paz, Sum. – O rapaz reclamou. – Por que não volta para seu baile sem coroa?
Até eu fiquei chocada, mas Summer não demonstrou nada. Apertou os lábios em uma linha reta e fechou as mãos com força.
- ! – Exclamei então. – Não seja estúpido!
- Você é ridículo, Junior. – Ela disse séria. – Não sei por que ainda perco meu tempo.
Irritada, me aproximei dele.
- Se não me der essa chave, eu vou chamar um táxi pra nós.
Junior fez uma careta, mas antes que dissesse qualquer outra coisa, outra pessoa nos alcançou.
, seguido por , talvez tivesse ouvido a discussão, ou talvez só estivesse indo embora. A questão é que de repente ele estava do nosso lado com .
- Meninas... – Ele disse, olhando para mim e para Summer. – Está tudo bem?
- Óbvio que sim. – resmungou.
- Não, não está. – Summer disse com firmeza. – Porque tem um idiota bêbado querendo levar a para casa.
ficou sério, olhando para , e então para mim, que já estava nervosa.
- Não. – balançou a cabeça. – Não mesmo. Eu vou levar a .
Eu senti um alívio enorme, misturado ao medo da reação que eu sabia que estava a caminho.
- Ninguém pediu sua ajuda, . – protestou.
- Cara, você tá bêbado. – apontou o óbvio. – É melhor eu e Amber te darmos uma carona.
- Eu dou conta da minha vida, ! – Ele disse irritado. – Porra, Olsen, olha o tamanho desse circo! Tinha que fazer isso, não é?
- Deixa de ser imbecil, . – entrou na frente de Summer. me puxou discretamente para o lado.
Amber apareceu então, saltitante, e parou assustada quando nos viu.
- O que está acontecendo? – Perguntou.
Mas ninguém respondeu. A tensão era grande demais.
- Vão todos para o inferno! - Junior xingou irritado, e então segurou meu pulso. - Vamos, .
Mas me puxou de volta no mesmo segundo, me devolvendo para perto de , e empurrou .
- Ela não vai com você. - Decretou.
- Santo , sempre ao resgate! – exclamou rindo, alterado. Ele empurrou de leve. olhou para a mão dele, mas não se moveu. - Fala sério, : você sempre morreu de inveja de mim, não é?
- Você é um babaca, . - balançou a cabeça
- Me acha babaca, então? E quem é que vai me ensinar boas maneiras, ? É você?
deu um breve sorriso, sem sair do lugar.
- Não. Quem deveria ter te ensinado isso é a sua mãe. – Respondeu. – Eu tenho outro método pra lidar com você.
E de repente, mais rápido do que qualquer um de nós poderia esperar, acertou um soco no meio da cara de Junior, fazendo com que ele caísse no chão, com as mãos no nariz.
- Caramba, ! – exclamou assustado.
- Ai meu Deus! – Amber gritou.
Quando afastou um pouco a mão do rosto, encarando furioso, deu para ver o sangue escorrendo.
- Você já estava avisado faz tempo, . – disse firme, mas sem se exaltar. – Eu esperei até demais para fazer isso.
Summer, preocupada, tocou o ombro de . Apesar de séria, dava para ver que ela estava nervosa com o rumo que as coisas estavam tomando.
- Seu desgraçado... – murmurou então. – Eu vou te arrebentar, !
voou em cima de , derrubando-o e acertando um soco em seu rosto.
Começamos a gritar, desesperados por ajuda. , com o rosto sangrando, chutou para longe. Ele se levantou e foi para cima de de novo, mas o segurou – com toda a força que tinha, que não era tanta se comparada a .
- Não, ! – Entrei na frente de , enquanto Summer o segurava com medo de que a briga continuasse.
Amber continuava a gritar, desesperada, até que a senhora Turttle e o professor Ackles – responsáveis por nos vigiar no baile – finalmente apareceram.
- O que está havendo aqui?! – A senhora Turttle perguntou, muito nervosa.
- Foi o Junior quem começou uma confusão, senhora Turttle. – Summer respondeu logo.
- Por que não me espanta que seja um brutamontes do time? – O senhor Ackles fez uma careta de desprezo.
- É melhor pararem com isso agora! – A senhora ordenou. – , ligue para o seu pai!
largou devagar, mas só soltou de uma vez quando teve certeza de que ele não ia atacar ninguém. Meu amigo bufou, irritado e nervoso.
- O velho vai adorar essa. – Disse pegando o celular. – Cada dia uma emoção diferente.
Algum tempo depois, o pai de conversava com os professores enquanto nós esperávamos sentados na calçada. estava ao lado do senhor , e não parecia nada feliz.
- Dói muito? - Perguntei baixinho a , segurando o gelo que conseguira lá dentro em sua bochecha.
- Só um pouco. - Disse. Depois percebeu minha expressão. - Ei, fica tranquila. - Sorriu o pouco que conseguia.
Olhei para Summer, que assistia com atenção a cena entre Junior e o policial.
- Eu sinto tanto, Summer. – Falei baixinho.
Summer deu um sorriso fraco, botando a mão no meu joelho.
- Você não tem nada a ver com isso, . Fica tranquila.
Eu assenti.
O senhor voltou para perto de nós. e Amber, que estavam ao lado de Summer, ficaram de pé.
- Pronto, já está tudo resolvido. – Anunciou o policial.
- Vamos levar suspensão? – quis saber.
- Não, a menos que tenham bebido. – O pai dele o encarou. – Você bebeu, ?
- Não, senhor! – Ele exclamou rápido. Pude ver Amber fechar a boca no mesmo instante. Provavelmente ela tinha tomado alguma coisa.
- Ótimo, então está tudo certo para vocês. – nos tranquilizou. – Quanto a esse camarada aqui, vou levá-lo para casa na viatura.
- Eu e a podemos ir de táxi. - sugeriu.
- Ah, mas não vão mesmo. - O policial deu uma risada sem humor. - Faço questão de falar com sua família.
estava claramente com muita raiva do que estava acontecendo, mas já não tinha como contestar. Ele já devia estar com uma suspensão àquela altura. O treinador ia engoli-lo vivo se piorasse as coisas.
- , meu filho, está em condições de dirigir? – O senhor perguntou.
- Sim.
- Ótimo, então leve a , e vão todos de uma vez. – Aconselhou. – Te vejo em casa, .
- Até mais, pai.
Quando o pai tinha se afastado o bastante, deu um sorrisinho e acenou para .
- Beleza, o drama acabou! – decretou. – Eu vou levar a Amber. Quer uma carona, Summer?
Summer abriu a boca, pensativa, mas depois assentiu, sorrindo um pouco.
- Seria bom, sim, .
- Oh, Deus, que loucura! – Amber ainda estava em choque.
se aproximou de mim e de .
- Vejo vocês amanhã. – Disse. – Vão com cuidado.
Sorri para ele e apertei sua mão de leve. O garoto bateu no ombro de . Summer se aproximou também, me dando um abraço rápido. deu um beijo na testa dela, e então a menina seguiu e Amber para o carro.
- Sobramos nós. – disse, segurando a bolsa de gelo no rosto. Ele olhou para mim. – Pronta para ir?
- Sim, por favor. – Meneei a cabeça.
Nós não falamos nada dentro do carro. Toda a confusão tinha nos deixado nervosos e cansados, mas ao mesmo tempo, toda a pressão do baile de repente estava indo embora. Além disso, eu tinha aquela sensação de que as coisas sempre acabavam bem quando estávamos juntos, mesmo quando eram uma catástrofe.
Joguei a cabeça para trás, recostando no banco, e olhei uma vez para , concentrado na estrada. Eu sorri. Quem diria.
Depois de algum tempo, o carro parou em frente à minha casa. As luzes da sala ainda estavam acesas, dava para ver pela janela que tinha uma brecha na cortina. Saímos do carro e ele me acompanhou.
- Sinto muito por quase ter feito a gente ser preso na sua noite de Rainha. – Ele disse enquanto fazíamos o curto percurso.
- A verdadeira Rainha mora do outro lado da rua. Aqui é a casa da plebeia. – Ri um pouquinho. Ele também. – Não estou chateada com você, pelo contrário. Eu… Obrigada por me salvar. - Engoli em seco.
- Sempre que precisar. - brincou.
Chegamos à porta.
Olhei para ele, a bochecha vermelha, por causa do gelo que estivera ali. Estiquei meus dedos para tocar seu rosto de leve. Dei um sorriso de desculpas.
- Queria que tivéssemos continuado dançando pelo resto da noite.
- Mas o relógio badalou meia-noite. – deu de ombros. - Acontece nas melhores histórias, eu acho.
Ele olhou para a porta.
- Bom, boa noite então. - Sorriu e me deu as costas.
Mas me lembrei que eu ainda tinha algo a dizer. Não podia deixá-lo ir assim depois de tudo.
- ! - Chamei.
Ele voltou.
- A pergunta que me fez no baile… - Olhei em seus olhos. - A resposta é não. Não fui com o porque gosto dele. Fui porque achei que você fosse com a Summer, e eu não queria...
Mas antes eu acabasse de falar, ele estava me beijando.
Meu coração disparou, mais do que em todas as outras vezes. O cheiro do perfume que eu já conhecia me deixou tonta, do melhor jeito possível.
Passei a mão pelo cabelo dele e o chapéu caiu no chão. Nenhum de nós dois ligou. E, por alguns segundos, me esqueci de todas as outras coisas.
Parecia que estávamos ali há uma eternidade, quando enfim ele se afastou um pouco. Eu olhei para – o Babá de Cachorros, com o cabelo todo bagunçado, tão lindo que chegava a doer – e ele parecia tão estático quanto eu, como se algo surreal tivesse acabado de acontecer.
Então ele sorriu, fazendo com que eu voltasse a realidade. E aproximou o rosto do meu:
- Sabe como é, o Jack estava na janela. – Ele disse. – Boa noite, Rainbow.
Olhei para trás imediatamente, sem encontrar nada, e quando me voltei em sua direção, já estava correndo para dentro do carro. Havia um sorriso em seu rosto ainda.
Eu levei alguns segundos ali ainda, até que, atordoada, destranquei a porta e entrei em casa.
- Pai? – Chamei ao tirar os sapatos, esperando encontrá-lo na sala com Miguel. Mas não houve resposta. – Pai! – Falei de novo.
Ainda sem resposta, caminhei até a sala, mas meu pai não estava lá. Miguel era quem dormia tranquilamente no sofá. Sem fazer barulho, fui até o seu quarto.
As luzes estavam apagadas, os lençóis bagunçados, e Jack roncava feliz, em um sono que já devia durar horas.
Saí do quarto e recostei na parede.
Eu me sentei no chão e ri – ainda sem rumo, mas brilhando com uma alegria que não conseguia segurar.
[…]
Terminei de fechar o vestido branco ao lado do corpo. Se eu estivesse em Denver, como antes, minha mãe estaria me ajudando a fazer isso, ou talvez a Collie. Me olhei no espelho, observando os penduricalhos brilhantes da roupa. As meninas queriam que eu me arrumasse com elas, mas eu tinha preferido fazer isso sozinha. Por algum motivo, aquele era um momento muito pessoal para mim.
Meu telefone tocou. Me aproximei dele já desconfiada de quem poderia ser, e não me enganei. Amber tinha me ligado pelo menos cinco vezes naquele dia, ansiosa para que tudo saísse como tinha planejado.
- Dama de Vermelho para Prom Queen. – Ela disse. – Já está pronta? Tudo em ordem?
- Já sim. – Falei. – Junior deve estar chegando daqui a pouco.
- Ótimo, é bom que ele não se atrase. As pessoas têm que te ver divina para saber em quem votar.
- Eu acho que a maioria das pessoas já decidiu em quem votar a essa altura, Amber.
- Nunca se sabe, a sociedade é muito imagética. – Disse em um tom pretensioso. Depois explicou: – Ouvi essa expressão no Discovery Channel. me obrigou a mudar de canal quando eu estava assistindo Say Yes to the Dress.
- Faz sentido. – Era mesmo difícil imaginá-la assistindo DC por vontade própria.
- Por sinal, eu vou ligar para ele de novo. Nos vemos no baile. Não se atrase.
Amber desligou e eu voltei para perto do espelho. Uma mecha do meu cabelo tinha se soltado e eu peguei outro grampo para prendê-la ao meu penteado de anos 20.
- Uau, você está linda. – Papai apareceu à porta, no reflexo do espelho.
Olhei para trás e sorri.
- Obrigada, pai.
- Só falta uma coisa.
Ele se aproximou de mim e havia um headband branco e brilhante em suas mãos. Abaixei a cabeça e ele o colocou nela como em uma coroação.
- Agora sim. – Sorriu, me virando para o espelho. – Parece ter saído de um filme antigo.
- Onde conseguiu isso? – Me olhei no espelho, encantada.
- Naquelas velharias que guardo lá atrás. – Suspirou. – Sua mãe usou numa festa a fantasia nossa.
- Desculpe por remoer isso. – Franzi o nariz, abraçando ele.
- Nunca é ruim falar da sua mãe. – Ele sorriu. – Eu vou descer para fazer o jantar. Pode terminar de se arrumar em paz.
Papai desceu as escadas e me deixou ali, calçando os sapatos.
De novo, mas mais do que nunca, congelei por um instante ao pensar em como tinha mudado desde minha chegada. Em tudo que tinha mudado.
Meu celular vibrou sobre a escrivaninha. Visualizei a mensagem de Sofia.
Esta noite, seja a rainha que você se tornou.
Eu sorri, embora não soubesse dizer se era um sorriso feliz.
Desci as escadas e ia para a sala esperar até o carro chegar, quando Miguel apareceu. Ele parou, surpreso. Então sorriu.
- Nem parece a garotinha tagarela que vivia atrás de mim. – Disse.
- Por que vocês ficam me elogiando por estar bonita como se eu andasse desarrumada todos os dias? – Brinquei.
- Porque você anda. – Ele deu de ombros. – E quanto ao ?
- vai... Com a Summer.
Miguel me olhou de um jeito indagativo, e então o telefone sobre a mesinha tocou. Ele o atendeu.
- Falando no diabo... – Ele disse, me fazendo entender na hora de quem se tratava. – Nada. Precisa falar com alguém? Ah, sim, sem problema. Pode deixar, eu passo aí e te entrego. Sem problemas. Até mais.
Olhei para ele com uma expressão indagativa.
- Era o . Ele tinha me emprestado o contrabaixo anteontem, e disse que vai precisar. – Explicou. – Eu vou lá levar para ele.
- Eu... – Falei, meu coração disparado. – Posso ir.
- Mas você...
- Não. – Sorri, balançando a cabeça. – Eu vou. – Peguei as chaves do carro na mesa. – Se o chegar, diga que já volto.
Miguel ergueu uma sobrancelha para mim.
- Tem muito que nós ainda precisamos conversar, . – Disse, me fazendo tremer na base. – Mas hoje não é o dia para isso. Vai de uma vez, eu seguro o aqui.
- Obrigada. – Sussurrei, sorrindo.
Antes que Miguel dissesse outra coisa, peguei o contrabaixo na sala e saí de casa.
Talvez fosse a possibilidade de aquele ser o fim de tudo, já que em alguns minutos eu entraria naquele baile com , mas de repente, eu precisava ver o . Vê-lo antes que tudo acabasse de uma vez, antes que ele estivesse apaixonado por Summer de novo e para sempre. Uma última vez, queria que fôssemos só nós – a péssima atriz de Denver, o babá de cachorros tocador de contrabaixo – como no começo.
Parei o carro em frente à casa dos . Respirei fundo, peguei o contrabaixo e caminhei até a porta da frente.
Bati na porta duas vezes em vez de tocar a campainha. E então ele abriu.
Parecia que era a primeira vez que nos víamos em séculos.
estava usando um suspensório azul-marinho sobre a camisa social, e na cabeça tinha um chapéu também azul-marinho antigo, que estava na caixa de velharias que nós encontráramos semanas atrás. Uma eternidade atrás.
- . – Ele disse quase sem voz.
- . – Respondi do mesmo modo. Depois, sorri um pouco. – Eu vim te trazer isso. – Estendi o contrabaixo, que segurou, confuso.
- Pensei que Miguel fosse vir. – Ele inflou as bochechas. – Você está...
Eu sorri, sem jeito, e então Henry, o padrasto dele, apareceu.
- , quem é? – Ele perguntou do fim do corredor.
- Henry! – levou um susto. – É a... . – Olhou para mim de novo.
Eu poderia dizer mil coisas a ele, mas qualquer coisa que eu dissesse poderia estragar aquele momento, e eu queria guardá-lo assim. era o garoto mais bonito que eu já tinha visto, o mais talentoso e o que tinha o maior coração, e sempre seria.
Dei de ombros, sorrindo de novo.
- Nos vemos no baile.
E então voltei para dentro do carro.
Ainda estava sorrindo quando estacionei em casa e desci. Antes que eu entrasse de novo, no entanto, uma limusine preta surgiu, trazendo um incrivelmente encantador vestido de preto, de pé no buraco do teto solar.
- Boa noite, Majestade. – Ele sorriu. – Sua carruagem acaba de chegar.
- . – Falei, pensando em como meu coração teria batido forte ao vê-lo daquele jeito algum tempo atrás. Agora não, embora eu ainda o achasse tão lindo quanto um príncipe da Disney. Agora meus batimentos acelerados denunciavam meu receio por estar indo àquele baile com ele.
- Fantástica. – Ele sorriu, bobo. – Você está fantástica.
- Obrigada. – Sorri. – Vou buscar minha bolsa.
- O que foi? – perguntou dentro do carro.
Só então me toquei de que estivera em silêncio o tempo todo.
- Nada. – Balancei a cabeça.
- Eu prometi que você se divertiria, não é? Então não se preocupe.
Em vez de responder, forcei um sorriso.
Havia tantos carros no estacionamento da Jacksonville Beach High que dava a impressão de que se tratava de um casamento ou alguma coisa do tipo. Me senti nervosa de repente. Parei de andar.
- Tudo bem? – ergueu uma sobrancelha.
- Está sim, eu só... – Balancei a cabeça. – Isso aqui parece o evento do ano. É um pouco intimidador.
Ele deu risada.
- E você ainda nem viu como estão as coisas lá dentro.
Ele segurou minha mão com firmeza, me puxando para o ginásio.
E ele estava absolutamente certo.
Era como estar em um filme dos anos 20. Havia pessoas com roupas de época para todos os lados, e inclusive um palco, cheio de instrumentos e com uma mesa de DJ, de onde vinha a melodia de Fever em um remix. A decoração estava muito mais fantástica do que eu jamais teria esperado.
Eu estava deslumbrada quando ouvi as vozes chamando meu nome.
- ! ! – Jodi veio correndo, enfiada em seu lindo vestido dourado de franjas. Ela me abraçou. – Você está fantástica! – Exclamou.
- Vocês é que estão lindas! – Sorri com toda a honestidade. O vestido verde de Emma também brilhava à luz da festa.
Olhei para alguns metros à distância, de onde Franklin, meu companheiro de elenco da peça, recebia os votos das pessoas.
- Onde está a Amber? – Emma quis saber. – Pensei que a essa altura ela estaria do lado da mesa de votos ameaçando qualquer um que não votasse em você.
- Eu também não sei. – Dei de ombros.
- Ah, tanto faz. Estou tão feliz por termos nos entendido! – Hughes se colocou em nosso meio e puxou nós duas para um abraço, falando com seriedade. – Sério, nunca mais vamos brigar.
- Não mesmo. – Falei. – Onde estão e Brad?
Para a minha total surpresa – e dela também –, Emma tinha acabado por aceitar ir ao baile com . Segundo ela, o motivo era ela não suportar mais a insistência dele.
- Em algum lugar por aí. Fugi dele quando te vi. – Ela explicou. Então olhou para o lado. – Junior. – Disse num tom de desdém.
- Hughes. – Ele assentiu. – Bom, eu vou ver se acho os rapazes. Nos vemos depois. – Apertou minha mão.
Quando Junior estava longe o bastante para não ouvir, Emma fez uma careta.
- Eu não acredito que achei o o cara mais gostoso da Flórida por tanto tempo. Quando olho pra ele agora, tudo que vejo é um otário que eu queria socar.
- Bom, pelo menos ele sempre foi um bom amigo pra . – Jodi ponderou. – E é legal que tenha se oferecido pra vir com ela porque ela brigou com o , embora não seja tão legal assim com a Summer.
Concordando, mas sem me estender no assunto, perguntei algo que era do interesse de todas nós.
- Onde está a Summer, aliás? Conseguiram falar com ela?
Durante todo o tempo em que estávamos no Spa, tínhamos tentado falar com Summer, mas só caía na caixa postal. Ficamos até preocupadas que ela não fosse ao baile, e ainda não tínhamos certeza de que iria. Mas o fato de estar impecavelmente arrumado quando fui à casa dele me fazia crer que sim.
- Eu liguei para a casa dela, mas aquela bruxa da mãe dela não vai muito com a minha cara e disse que ela tinha acabado de chegar e estava ocupada. – Emma contou.
- Pelo menos ela não disse que ela não vem. – Jodi deu de ombros. De repente ela deu um pulo. – Opa!
Alguém a tinha agarrado por trás.
- Brad! – Ela exclamou, rindo.
- Oi, meninas. – Brad sorriu para nós duas. – E então, , aproveitou o dia no Spa?
Brad já tinha me pedido desculpas por toda a confusão com Perry Gold, mas não conseguia deixar de se sentir culpado ainda assim. Apesar de tudo, eu não estava chateada com ele, para falar a verdade. Se alguém tinha a obrigação de entender atitudes equivocadas, esse alguém era eu.
- Foi tudo maravilhoso, Brad. – Sorri de volta. – Muita obrigada pela gentileza.
- Eu não fiz mais do que a minha obrigação. Depois de tudo que eu causei... Bom. – Deu de ombros.
- Esquece essa história. Já está tudo bem agora.
- Não está não. – Emma deu uma cotovelada nele. – Eu nunca vou esquecer, Winter. – Avisou. Brad estremeceu.
Jodi estava meio que concordando com Emma, quando percebi que estava voltando junto com . Eles sorriram a distância, e eu acenei discretamente. Emma me deu um beliscão, rolando os olhos, mas não pude fazer nada – em um segundo eles já haviam chegado.
- Ah, aí está você! – exclamou. – Fui pegar seu ponche e quando voltei você tinha sumido. Passei um tempão te procurando! Agora deve estar quente.
- Ela poderia tomá-lo fervendo para escapar dele por mais tempo. – Jodi cochichou para mim e eu ri.
- , você quer dançar essa? – perguntou então.
Abri e fechei a boca, pensando por um segundo.
- Ah, claro. Vamos. – Forcei um sorriso. Bailes eram para isso, afinal.
Dei de ombros, olhando para elas com ar de desculpas.
- Nos vemos depois.
me puxou para longe, até eu ter perdido as garotas de vista. Enquanto andávamos, eu procurava Summer e com os olhos, no meio da multidão, mas tudo que vi foi Jasmine, mais linda do que nunca, usando um vestido longo azul e brilhante. Ela estava com seu namorado, Charlie.
- Eu vou dizer isso de novo quantas vezes forem necessárias. – disse quando estávamos em um lugar mais alto, montado lá dentro especialmente para fazer com que o ginásio parecesse um bar antigo. – Você está deslumbrante.
- Obrigada. – Eu sorri. – Pensei que íamos dançar.
- Mudei de ideia. Prefiro passar um tempo com você sem ninguém me acotovelando.
Balancei a cabeça e ri. se apoiou no pequeno muro cor de cobre, olhando as pessoas dançando lá embaixo.
- Eu olho para toda essa gente, e fico tão feliz por estar aqui com você. – Comentou. – A garota mais incrível da festa.
- Claro, porque é só isso que importa. – Ergui as sobrancelhas, sem conseguir evitar me lembrar do que dissera sobre Junior querer ir à festa comigo, ainda que eu não achasse que a competitividade era o único motivo para isso.
O rapaz olhou para mim, divertido.
- Essa noite é muito importante para mim.
- Por quê?
- Porque é a primeira vez que saímos juntos de verdade desde que nos reencontramos. E você não é incrível só porque é bonita. – Disse. – Você é divertida, é inteligente... Eu olho para você e tenho tantas lembranças boas, .
Eu senti um aperto no estômago. Queria dizer a Junior que não se podia viver de lembranças. O importante era o que ele via agora. E o que ele sabia sobre mim agora? Porque eu tinha mudado. Eu tinha mudado tanto. E o garoto que eu via agora também não era mais o dos meus devaneios de férias.
- Graças a Deus você já está aqui! – Uma voz infantil me fez virar.
Aquela voz não combinava nada com a Amber de cabelos louros modelados e vestido vermelho, que mais parecia a Jessica Rabbit. Irritante e grudenta ou não, Hayley estava deslumbrante, e eu compreendi então que Jasmine realmente devia reprimi-la quanto a usar vermelho por medo de ser ofuscada.
- Amber! – Eu disse. – Você está tão linda! Mas juro que achei que fosse chegar aqui antes de mim.
- E era o meu plano, mas o cismou que precisava me dizer alguma coisa. – Ela resmungou. – Aí ele ficou andando com o carro em círculos por aí, porque não conseguia falar, até que finalmente desistiu e viemos. Eu achei que ele tinha ficado maluco.
E logo atrás dela apareceu . Ele estava um tanto quanto absorto, com um terno e um chapéu que o faziam parecer um gangster, o que combinava perfeitamente com o visual da Hayley.
- . – Eu me aproximei e lhe dei um abraço rápido, enquanto Amber falava com e outras pessoas ao redor.
- . – Ele disse. – Uau, você está linda.
- Obrigada, você não está mal também.
Ele suspirou, olhando sobre meu ombro. Então se inclinou e disse:
- Eu ia terminar com ela. Eu botei na cabeça que ia dizer a ela que não dava mais, mas não consegui. Isso é terrível.
- Talvez tenha mesmo sido melhor não fazer isso agora. Ela ia enlouquecer.
- Eu sei! – Ele deu um suspiro deprimido.
Meu braço foi puxado e Amber estava de volta em um segundo.
- Deixa eu ver se está tudo certo com você. – Ela me fez girar, puxou meu vestido em um lugar e outro e bateu palmas. – Tudo em ordem. Vestidos brancos nunca falham. E esse vai combinar com a coroa. – Balançou a cabeça positivamente. – Agora venha, temos que ver a quantas anda a votação.
Amber saiu me arrastando pelo salão até a mesa onde eu vira Franklin minutos atrás.
- Bert! – Ela exclamou, deixando-o assustado. Todo mundo na escola sabia que Amber andava meio maluca com a campanha. – Como está a votação?
- Vai... Bem, eu acho. – O garoto disse inseguro.
- E quem está ganhando até agora?
- Eu acho que não posso falar isso, Amber.
- Ah não? – Ela deu um sorriso debochado e foi mexer na caixa. Mas antes que ela abrisse a urna no chão, um pé com sandália amarela pisou no topo da mesma, fazendo Amber pular para trás.
Eu mesma não tinha percebido Annabeth chegar, mas ela estava brilhante, usando um vestido colorido e flores na cabeça, em uma releitura maravilhosa da Frida Kahlo.
- Ouviu o Franklin, Amber. – Ela sorriu com firmeza. – Essa urna não será tocada até a hora do anúncio.
- E quem diabos é você? – Amber perguntou. – Eu nunca sequer te vi nessa escola!
- Acontece que eu levei alguns anos para abrir mão do meu poder de invisibilidade. Agora some daqui antes que eu chame a senhora Turttle!
Amber soltou algo parecido com um rosnado e saiu dali, esquecendo até mesmo de mim. Morri de rir, me aproximei de Annabeth e a abracei.
- Caramba, Annabeth, sua roupa só não é mais incrível do que o que acabou de fazer! – Eu disse. – De onde saiu tanta coragem?
- Ah, acho que de um monte de filmes que eu assisto. – Brincou. – E também... De você.
Não entendi bem o que ela queria dizer.
- Por que diz isso?
- Depois da nossa conversa dias atrás, eu percebi que te dei um ótimo conselho, que você seguiu à risca, mas que eu mesma não estava seguindo. – Riu, coçando a cabeça. – Eu estava fazendo direito a parte de deixar as coisas acontecerem, mas a verdade é que não estava fazendo nada para tentar mexer no que podia. Então, uma das minhas resoluções foi parar de servir de capacho para pessoas como Amber e Jasmine. A outra foi convidar Edward Miller para o baile.
- Edward do teatro, o protagonista?! – Me espantei. – E ele aceitou?
- Bom, eu estou aqui, não estou? – Annabeth piscou para mim. – Aproveite seu baile, mas não se preocupe com isso aqui. – Bateu de leve no meu ombro e apontou para a urna. – Não vou deixar ninguém estragar a surpresa da noite.
- Só tome cuidado com a Amber. – Brinquei. A menina riu.
Me afastei, sem conseguir deixar de observar ao meu redor em busca do . A curiosidade de saber por que ele não estava lá me deixava apreensiva, embora eu soubesse que ele iria. Por fim, vi as meninas acenando do lugar onde eu estivera antes e me juntei a elas.
Emma estava discutindo alguma coisa com , e Amber estava lá também, sentada ao lado dele, a cara emburrada.
- Achei vocês. – Sorri.
- Eu já ia te procurar. – , que estava falando com até então, estendeu um copo de ponche para mim, e eu bebi.
Brad levantou da mesa e se aproximou de nós.
- Que bicho mordeu a Hayley? – Ele perguntou em voz baixa. – Eu ofereci um docinho a ela e ela jogou de volta em cima de mim! – Contou, e Jodi, sentada, segurou a mão dele, com pena.
Foi quando o salão inteiro escureceu, e uma das luzes de foco foi direcionada para a entrada do ginásio.
- Uau. – Ouvi alguém dizer.
Eu reconheci o vestido preto na hora, uma vez que estava lá quando ela o encontrou. Mas o rosto, esse me pegou de surpresa, pois os longos cabelos dourados que um dia o tinham emoldurado, haviam agora sido substituídos por um chanel curto ondulado que faziam com que ela parecesse mais forte do que nunca.
- NÃO, NÃO, NÃO! – Amber se colocou de pé, em pânico, e foi para o muro de cobre falso. – O que ela está fazendo aqui?! Vai estragar tudo!
- Ela está fantástica. – murmurou, embasbacado.
Summer sorriu e acenou para o rapaz da luz, que então a apagou. E, embora isso não tivesse feito a maioria das pessoas deixar de olhar para ela, a garota deu alguns passos, ignorando a atenção.
Quando dei por mim, Emma já estava arrastando Jodi e eu para perto de Olsen, os outros abrindo passagem para a famosa encrenqueira.
- Olha só pra vocês! – Summer exclamou, encantada. – Vocês parecem as rainhas do baile. – Ela disse.
- E você, a rainha da Inglaterra! – Emma disse com sinceridade.
- De todos os bailes em que eu já te vi, esse é onde você está mais linda. – Jodi sorriu. Summer apertou a bochecha dela, como se fosse uma criança fofa.
- Tentamos falar com você várias vezes. – Falei.
- Eu queria me concentrar no trabalho, me desculpem. – Summer explicou. – Eu estava em Nova York. Foi incrível.
- Você parece incrível. – Sorri.
Foi então que Emma pigarreou, e me lembrei do que tinha que falar.
- Eu preciso te dizer uma coisa.
Eu tinha que contar o quanto antes que estava ali com , para não causar uma confusão.
- Claro. – Ela assentiu. – Mas antes me fala: onde está o ?
- O ? – Estranhei. – Eu não sei. Ele veio com você, afinal.
Summer me olhou confusa.
- Comigo? – Repetiu. – e eu não viemos ao baile juntos.
Jodi parecia tão confusa quanto eu. Ela deu um passo à frente.
- Não vieram? – Repetiu. – Mas... O Junior disse que...
- O quê? – Summer franziu o cenho.
Balancei a cabeça, tentando processar aquilo.
- Mas ele já estava pronto quando o vi hoje. – Falei.
- Sim, mas não para ser meu par. – Ela explicou. – Ele está aqui hoje a trabalho; o comitê o contratou. Eu fiz isso.
E enquanto eu ainda sentia minhas pernas balançarem, me dei conta de que as batidas de remix tinham parado. Ouvi a introdução curta da canção conhecida. E quando me virei para trás, estava no palco, usando um par de óculos escuros, com uma banda o acompanhando.
[N/A: Ouçam essa aqui, meninas!]
Birds flying high you know how I feel
Sun in the sky you know how I feel
Breeze driftin' on by you know how I feel
E ao som da voz dele, fui sendo levada por minhas próprias pernas para perto do palco, sem saber bem o que estava fazendo.
And I'm feeling... Good.
Só os gritos ao meu redor me fizeram despertar um pouco. Summer estava ao meu lado de novo.
- Pedi a ele para cantar essa música hoje. – Ela disse.
Mas eu quase não a ouvi, apesar de entender. Estava muito focada no que estava diante de mim naquele momento, naquele palco.
Fish in the sea you know how I feel
River running free you know how I feel
Era como ver outra pessoa, e, ao mesmo tempo, o mesmo garoto que tocava no sofá da minha casa. E aquele palco parecia a casa dele.
Ele tinha nascido para aquilo, isso era mais verdade do que qualquer outra coisa no mundo. E eu senti um orgulho tão grande, que meu coração poderia explodir.
Dragonfly out in the sun,
You know what I mean, don't you know?
Butterflies all havin' fun, you know what I mean
Eu me dei conta então, de que nunca tinha sentido aquilo por ninguém, e que aquela sensação não era só por ele estar tão brilhante naquela noite. Era a sensação que sempre estivera lá, quando ele cantava para mim na varanda, quando estávamos juntos no carro.
E eu me apaixonei. De novo. E de novo. E de novo.
E enquanto a banda tocava a parte instrumental da canção, eu sorri um sorriso tão grande quanto poderia ser, e gritei como todos os outros – uma gritaria que só foi silenciada pela volta da voz de .
Stars when you shine you know how I feel
Scent of the pine you know how I feel
Oh freedom is mine
And I know how I feel!
It's a new dawn…
It's a new day…
It's a new life…
And I'm feeling good.
A multidão de alunos explodiu em aplausos e gritos. Todos estavam muito impressionados. Brad e Jodi deviam estar muito felizes com seu candidato a American Idol. E eu assobiei até não conseguir mais.
- Obrigado! – sorriu, um pouco tímido. – Muito obrigado!
Ele saiu para os fundos do palco e eu disse a mim mesma para ir até lá, mas minhas pernas congelaram quando vi Summer e me dei conta de que algo estranho estava acontecendo, e eu estava totalmente perdida entre correr para ou ficar e ouvir ela.
- ESSE é o que eu sabia que tinha potencial! – Emma exclamou.
- Ahhh, ele estava fantástico! – Jodi bateu palmas, saltitando. – , você tem que falar com ele!
- Vamos lá vê-lo! – Summer agarrou minha mão. Mas logo parou. – Ah, você queria me dizer alguma coisa, não é? O que foi?
Olhei por sobre seu ombro. já tinha alcançado , que descia do palco. Respirei fundo. Eu tinha que descobrir a verdade.
- Summer, presta atenção. – Falei com seriedade, tentando ignorar o barulho ao redor. – Eu achei que você vinha ao baile com o , porque nós tínhamos brigado.
- Claro que não. Eu queria que ele tocasse desde o começo, mas é só. Achei que vocês fossem vir juntos no fim das contas.
- É, mas com essa confusão toda, alguém se ofereceu para acompanhar a . – Jodi explicou, apreensiva.
- Quem?
Então apareceu ao nosso lado, uma expressão indecifrável no rosto.
- Oi, Summer. – Ele disse.
- Junior. – Ela o cumprimentou, entendendo então de quem se tratava. – Ah.
A voz de Summer não soou necessariamente odiosa ou ultrajada. Mas sem dúvida aquilo causou certo impacto nela.
Eu queria desesperadamente lhe explicar o que não tinha como ser explicado, quando , Amber e se aproximaram.
- Consegui um Meet and Greet com a estrela da festa! – Amber riu, segurando um copo de ponche.
olhou para mim e eu olhei para ele, e ele sorriu, mas eu ainda estava preocupada com Summer. Então percebeu a cara dela e a presença de , e, pensando rápido como só ele conseguiria, disse:
- Summer, você está incrível com esse cabelo! – Elogiou. – Por que não vamos todos nos sentar? Fiquei em pé a música toda!
Fomos todos juntos rumo à mesa à esquerda do bar falso onde eu estivera com . Eu dizia a mesma que havia uma explicação razoável para tudo enquanto olhava para , a poucos metros de distância, respondendo as perguntas de Amber.
, muito atento à situação, fez questão de fazer piadinhas e manter a conversa casual durante nosso percurso, de modo a diminuir a tensão palpável que se instalara entre Junior e Summer.
- Caramba, , se eu soubesse que você iria tão bem lá em cima, não teria dito às pessoas que não te conhecia! – Ele brincou.
- Sua fé em mim é digna de um melhor amigo. – deu um sorriso torto.
Quando chegamos à mesa, meus pés quase me traíram de novo, me levando para perto de , onde eu costumava me sentar. Mas antes que isso acontecesse, tocou delicadamente meu braço e puxou uma cadeira para mim. Assenti e me sentei, e ele ficou ao meu lado, na ponta. Do meu outro lado, Amber e pegaram as cadeiras, e ao lado deles, por fim, e Summer. Os outros acabaram por se sentar com os jogadores da campanha de Jodi, lá embaixo.
- Se quer saber, , eu fiz exatamente o contrário. – Amber deu outro gole em seu ponche. – Falei para todo mundo aqui que éramos amigos. Já sabia que você ia arrasar!
- Bom, obrigado. – sorriu.
- Sério, , aquilo foi incrível. – Summer tocou seu braço sobre a mesa. – Uma performance profissional.
deu de ombros, sem jeito, mas claramente feliz. Nossos olhos se encontraram por um segundo então. Eu sabia que tinha que dizer a ele que aquilo tinha sido fantástico, mas não achei que a fala caberia ali, com sentado ao meu lado e tentando manter o clima agradável.
Isso era tão estranho! Até outro dia eu podia falar qualquer coisa com , a hora que eu quisesse. Em que momento tudo tinha ficado tão complicado? Quando as coisas tinham saído tanto do caminho de antes?
- Tem lugar para dois?
Olhei para cima e vi Jasmine, acompanhada de seu namorado, Charlie.
- Jas! – Summer exclamou surpresa. Até eu ficava surpresa por ela querer se sentar conosco, mas imaginava que àquela altura do campeonato não havia tantas outras mesas com disposição para recebê-la. – É claro que podem se sentar.
Charlie puxou duas cadeiras vazias e eles se sentaram ao lado de Summer. Agora a mesa oval estava basicamente fechada, e nós tínhamos que olhar uns para os outros – o que Jasmine, de fato, fez. Ela olhou para e Summer, e então para e eu, e fez uma careta de desprezo. Charlie, que era simpático como eu me lembrava, e pelo visto já tinha perdoado a namorada pela mensagem de celular que eu tinha mandado, quebrou o silêncio.
- Seu nome é , não é? – Perguntou ao . – Você é muito bom, cara! Foi você que tocou na lanchonete aquela noite, não é?
- No Rogers', é. Eu trabalho lá. – respondeu. – Trabalhava, na verdade.
- Parabéns pela apresentação. Foi ótima mesmo. – Elogiou de novo, olhando em volta então. – E isso aqui... Uau. Essa festa toda está fantástica. Meus bailes no ensino médio não eram tão reais assim. Estou me sentindo em um filme de gangster! – Riu.
- Obrigada, Charlie. Deu muito trabalho para fazer. – Amber agradeceu. – E eu adorei as roupas de vocês. Já viu a minha, Jasmine? É vermelha. – Provocou.
Summer riu um pouco, balançando a cabeça.
- Essa festa só ficou tão boa porque tivemos a na organização, Charlie. – Explicou. – Foi ela quem trouxe todas as referências de jazz para nós. O pai dela é músico.
- Ah, mas que bacana! – Ele se virou para mim. – Seu pai canta, então?
- Ele é saxofonista. – Respondi. – O nome dele é Jack Pie.
- Ah, claro! Eu lembro de ter ouvido o nome dele naquela noite. – Assentiu. – Quer saber uma coisa engraçada? Eu tenho esse primo que quer ser músico, e ele me fez acompanhá-lo a um show do seu pai uma vez, no ano passado. Tenho que admitir: eu nunca fui o maior fã de jazz, mas eu gostei bastante do que ouvi.
- Ah, ótimo, Charlie. Por que não pede um autógrafo no guardanapo? – Jasmine disse de repente.
Todos olhamos para ela, mas nenhum olhou tão sério quanto Charlie. Não havia desculpa para tamanha grosseria com alguém que claramente só fazia o possível para se dar bem com os amigos dela, o que claramente nem ela fazia questão.
- Ih, torta de climão! – Amber exclamou. – Vou pegar um morango com chocolate. Vamos, gatinho! – Ela puxou para fora da mesa.
Charlie balançou a cabeça, e Jasmine pareceu, de repente, um pouco arrependida. Ela tocou o braço dele sobre a mesa, mas o rapaz recuou.
- Eu juro que às vezes não te entendo. – Ele disse.
- Eu não quis ser rude. – Ela falou.
- Nunca quer. – Charlie deu de ombros. – Vou pegar uma bebida.
Jasmine ainda levou um segundo petrificada depois que ele se levantou, mas logo se pôs de pé, seguindo a passos rápidos atrás do namorado.
E então nós ficamos ali, num clima ainda pior do que antes. Eu sabia que não tinha muito o que arrumar na situação, mas tentei mesmo assim tornar o ar mais leve.
- Summer, você está tão diferente. – Falei. – Esse cabelo ficou tão bem em você.
- Parece outra pessoa! – Emma sorriu.
- É verdade. – concordou. – Caiu muito bem.
Summer sorriu, mas antes que dissesse qualquer coisa, falou:
- Dizem que quando uma mulher muda de cabelo, é comum ela também mudar de namorado. – Ele alfinetou.
Mas Summer, apesar de erguer as sobrancelhas, fez questão de responder:
- Nesse caso, não há problema, porque eu não tenho nenhum.
balançou a cabeça. bufou.
- Eu preciso ir ao banheiro. – Summer se colocou de pé. – Você vem comigo, ?
- Claro. – Assenti, feliz por fugir.
- Preciso voltar para o palco. – anunciou. – Nos vemos depois.
Como não disse nada, segui com Olsen pela festa.
Summer segurava meu pulso entre a multidão enquanto andávamos. Pela força em seus dedos, dava para ver que ela estava muito nervosa, embora seu rosto de modelo escondesse isso.
- Summer, não fica assim. – Falei.
Summer parou de andar bruscamente e virou-se para mim. A fachada tinha ido embora; agora ela era só a garota de dezoito anos e coração partido que eu tinha ajudado no banheiro, meses atrás.
- Ele é tão... Idiota! – Ela exclamou. – Ele age como se eu não estivesse no baile com ele hoje por minha culpa. , eu passei semanas tentando consertar meu namoro com o Junior. Você viu tudo. Você tentou me ajudar.
Engoli em seco, sabendo bem o que tinha feito.
- Vi sim. – Concordei. – Olha, a culpa definitivamente não é sua. – Falei. É minha, completei em pensamento. – Mas, Summer, honestamente, você parece tão melhor desde que começou a se preocupar mais consigo mesma em vez de lutar pra dar um jeito nesse namoro. Não deixe uma conversa estúpida estragar tudo, tá bem?
- Não vou deixar. – Ela assentiu com veemência. – Obrigada pela sua amizade, . Se não fosse você desde que chegou aqui, não sei o que eu faria.
Meu estômago se retorceu. Dia após dia, eu via aquele túnel se estreitando. Sabia que não conseguiria esconder a verdade de Summer para sempre, e eu realmente a considerava minha amiga agora.
- Meninas! – Ouvimos.
Assim que avistamos Jodi e Emma em sua mesa, acenando freneticamente, seguimos até elas. As duas estavam com seus pares e vários outros jogadores com suas namoradas. estava tentando falar de algo com Emma, mas ela parecia estar discordando dele.
- Já chega, . – A garota ficou de pé, juntando-se a nós.
Jodi deu um beijo na bochecha de Brad e o deixou também.
- Será que falta muito para a contagem dos votos? – Ela perguntou ansiosa.
- Ah, que se dane essa votação! – Emma exclamou. – Olha só para nós, as garotas mais incríveis desse baile! – Ela disse baixinho, nos puxando para um abraço e dando sua risada de porquinho. – Nem o fato de eu ter vindo com aquele traste é capaz de estragar essa sensação!
Todas rimos, mas então Jodi percebeu que havia algo errado.
- O que houve, Sum?
- O Junior, como sempre. – Ela forçou um sorriso.
- Amiga, é só dar a ordem que eu arrebento aquele narizinho reto dele. – Emma se ofereceu.
- Não acho que vai precisar. – Sorri. – Summer já deu uma resposta e tanto no .
- Ah é? – Jodi ficou curiosa. Summer sorriu para mim em agradecimento.
Nós ficamos conversando ali e nos distraímos. Contamos a Summer sobre como tudo tinha sido esclarecido entre Jodi e eu, a confusão de Brad com Perry Gold. Summer contou sobre seu desfile em Nova Iorque e sobre como tinha tido que insistir para que cantasse no baile.
E eles não estavam ali juntos.
Minha cabeça dava voltas na conversa, mas isso não conseguia deixar de me perturbar.
Quem tinha inventado aquela história então?
Em um determinado momento, decidi que precisava tirar aquilo a limpo. Ia perguntar a quem tinha dito aquilo a ele. Pedi licença às meninas para me afastar.
- Preciso resolver uma coisa.
- Quer ajuda? – Jodi perguntou.
- Não, eu só preciso perguntar uma coisa a alguém.
- Não fique lá a vida toda. – Summer disse. – Ainda temos muito que conversar.
Sorri para elas e saí andando empurrando as pessoas pela multidão. Imaginava que ainda estivesse na mesa, ou tivesse encontrado algum amigo do time por aí.
Foi quando alguém segurou meu braço.
Eu me virei e minhas mãos gelaram.
- ?
- Eu estava te procurando. – Ele disse. – A festa está tão linda.
- Está mesmo. – Concordei, o coração aumentando os batimentos.
- Já deu uma olhada na decoração lá atrás? – Ele perguntou. Balancei a cabeça. – Quer... Dar uma volta?
Olhei para as meninas, à distância, e para o que pensei ser a figura de , no lado oposto do salão. Eu ainda tinha o que resolver, mas isso podia esperar, não é? Só um pouquinho. Eu só queria ficar com ele um pouco.
- Claro. – Falei.
me ofereceu o braço, e eu o segurei. Assim, seguimos juntos para fora do ginásio, pelas portas de trás.
Apesar de ter ajudado em algumas escolhas da decoração, devido a minha participação meio clandestina no comitê de baile, eu não fazia ideia do que eles tinham feito do lado de fora – nem sabia que eles fariam qualquer coisa na parte externa. Mas lá atrás, além da lua que estava especialmente bonita naquela noite, havia varais de lâmpadas de cor amarela e rosa, perto dos bancos de madeira onde os alunos geralmente se sentavam no intervalo. Elas pareceriam estrelas, se não estivessem tão baixo. A grama tinha sido cortada no dia anterior, e o cheiro de noite de outono se espalhava pelo ar.
- Minha nossa. – Abri a boca, abobalhada.
- De todos os bailes, esse está sendo meu predileto, em todos os sentidos. – disse, olhando para a lua.
Olhei para ele por alguns segundos, distraído. Sorri da visão. Era engraçado vê-lo daquele jeito, com aquelas roupas. Mas de um jeito bom.
- O que foi? – Ele me pegou observando.
- Nada. Eu gostei da sua roupa. – Soltei uma risadinha.
- Eu também gostei da sua. Era isso que eu ia dizer lá em casa, quando o Henry apareceu. Você está... – Ele coçou a cabeça. – Linda.
Eu assenti, meio sem jeito, mas feliz pelo elogio.
- Obrigada. Por que não... – Indiquei um banco.
- Ah, claro.
esperou que eu me sentasse e fez o mesmo. Por alguns minutos, ficamos só observando a decoração – admirando, em silêncio. Depois de um tempo, eu disse:
- ... Você estava incrível lá no palco.
Olhei para ele, que olhou para mim.
- Foi a primeira vez que cantei em um lugar que não fosse o Rogers'. – Ele admitiu.
Meneei a cabeça.
- Sei que não vai ser a última. – Disse com firmeza. – Você nasceu para isso. Quando eu olho para você, vejo o mesmo que vejo quando olho para o meu pai. Vocês morreriam longe da música como peixes fora d'água. Me promete que nunca vai deixar ninguém tirar isso de você? Por favor.
me encarou sério, depois sorriu.
- Eu prometo. – Disse.
Ficamos calados de novo.
- Antes de você vir para cidade, logo que comecei a passar mais tempo na sua casa, o Jack me cobriu de fotos suas. – Ele disse então, e havia uma sugestão de riso em sua voz.
- Mas o quê? – Olhei indignada. – Meu pai nem tem fotos minhas!
- Tem sim, de quando era pequena e das férias que passou com ele. Estão no computador.
Abri a boca, chocada. Achava que todas as fotos que tirávamos ficavam com mamãe, porque ela não gostava de trocar e-mails com ele, mas pelo visto para isso ela abria uma exceção.
- E sabe o que eu pensei antes de te conhecer, quando o Jack falou que você vinha morar aqui? – Ele perguntou.
- O quê? – Estava curiosa, apesar de ainda pensar nas fotos.
- Que talvez você não gostasse muito de mim porque eu vivia na sua casa.
- É, você me irritou no começo. – Admiti.
- Também pensei que podia ser uma chata, ao contrário do que seu pai pensava.
Arqueei uma sobrancelha para ele. continuou:
- Mas também pensei que, pelo Jack, eu ia me esforçar para ser legal e andar com você, se fosse necessário.
Tentei segurar o riso, balançando a cabeça.
- E o que pensa agora? – Perguntei sem olhar para ele.
- Que o que eu mais queria era ter vindo com você nesse baile hoje.
[N/A: Como estamos musicais hoje! Podem ouvir essa aqui, docinhos.]
Olhei para , meu coração batendo mais rápido e mais devagar ao mesmo tempo, e então ouvimos a melodia vinda de dentro do ginásio. Reconheci de imediato o dedilhar ao piano. Um turbilhão de emoções me invadiu. Tristeza. Nostalgia. Amor.
- Essa é... A música do casamento dos meus pais. – Falei baixinho. – Eu conheço dos vídeos da festa.
- Seu pai sempre escuta ela no trabalho. – sorriu. – Quando escolhi para a playlist do baile, achei que você fosse gostar.
Fechei os olhos, querendo evitar a emoção sem conseguir.
- Quer dançar? – perguntou então. Quando abri os olhos, a mão dele estava estendida.
Segurei sua mão e ficamos de pé. Nos movemos devagar ao som da música ali, debaixo das lâmpadas, de onde dava para ver o campo de futebol. Eu olhei para ele e ele olhou para mim, e então recostei a cabeça em seu ombro.
Dava para ouvir a respiração dele, e meu coração batia tão forte que ele poderia ouvir, se não fosse a música.
Por que você demorou tanto para perceber, ?
Não tinha sido óbvio desde o primeiro segundo? Desde que ele tinha me levado embora daquele jogo no meio da chuva? Desde o primeiro beijo?
A verdade era que eu nunca soube o que queria. Mas agora sim, eu sabia. Mais do que nunca, eu desejava que aquele fosse meu primeiro dia em Jacksonville Beach, que tivéssemos acabado de nos conhecer, sem nenhuma loucura para acabar com tudo.
Dançando com ali, sentia a pontinha de tristeza de uma pessoa que sabia que tinha estragado tudo tantas vezes por ser uma tonta. Mas naquele momento nada podia nos atrapalhar. Éramos só nós dois – como em tantas vezes antes, como nunca antes.
- Rainbow. – Ele disse de repente.
E eu olhei para ele com toda a atenção.
- Eu só queria saber... Por que veio ao baile com o Junior? Ainda gosta dele?
Porque eu pensei que tinha que te deixar ir. Porque eu pensei que você já tinha ido, pensei.
- , a verdade é que...
Mas alguém segurou meu braço de repente, me fazendo pular de susto. encarava com severidade.
- Acho que já roubou meu par por tempo demais. – Disse numa voz bem mais suave que sua expressão.
Senti medo de pela primeira vez. Meu coração batia rápido. Eu não queria ir. E ainda assim, sentia que se não fosse ia trazer problemas para , o que era a última coisa que eu queria.
A essa altura, encarava como se estivesse pronto para enfrentá-lo, e ele de fato disse:
- Não é você quem decide isso.
deu um passo à frente, um olhar irritado. Antes que a situação piorasse, no entanto, olhei para , o desagrado evidente nos meus olhos, e intervi.
- Junior está certo. – Forcei um sorriso. – Nos vemos mais tarde.
me olhou deixando claro que preferia que eu ficasse – não só para que continuássemos a dançar, mas pelo comportamento de – mas eu fui assim mesmo. Ele ficaria mais calmo uma vez que estivéssemos lá dentro.
[N/A: podem abaixar o volume até acabar.]
A música já tinha acabado quando chegamos ao salão, mas outra estava começando, um pouco mais agitada. Alguns casais continuaram dançando na pista. sorriu, me levando ao meio dos outros para dançar também.
- Não é como antigamente, ? – Ele perguntou. – Nós dois juntos.
- É. – Murmurei, vendo e Amber dançando lá em cima, meu amigo com uma cara péssima. – ... – Eu disse, voltando a mim então. – Preciso te perguntar uma coisa.
- O que foi? – Ele me olhou alerta.
- Quem te disse que e Summer vinham juntos hoje?
A pergunta pareceu pegá-lo de surpresa.
- Por que quer saber?
- Porque eles não vieram como um par, e alguém disse que viriam. E você me falou isso.
- Não sei bem, no meio de uma conversa alguém me contou. – Ele disse. – Faz diferença?
- Faz sim. Faz muita diferença, .
Parei de dançar e respirei fundo, de olhos fechados passando as mãos pelo pescoço.
- Vicentini? – se inclinou para ver se eu estava bem.
- Desculpa. – Balancei a cabeça. – Eu preciso ir ao banheiro.
Deixei ali no meio da pista e saí em busca de um pouco de ar, sozinha.
Entrei no banheiro, molhei as mãos na água fria e toquei as bochechas. Estava quente de tão nervosa.
Depois de toda aquela corrida maluca, eu amava quem tinha afastado e estava com quem tinha feito vir atrás de mim. Deus, havia alguma solução para isso?
Olhei no espelho. O baile já estava sendo cheio de emoções demais para tentar resolver qualquer coisa nele.
Enxuguei o rosto com papel toalha e saí do banheiro me perguntando onde estariam as meninas, quando de repente alguém chamou meu nome.
- Pie.
Olhei para trás e encontrei Perry Gold parado. O rapaz me encarava com seus olhos castanhos.
- O que quer comigo, Gold? – O encarei de volta.
- Soube que fez as pazes com a Slaterton.
- Não graças a uma retratação sua.
Perry baixou a cabeça e riu.
- , eu te vi colando aqueles cartazes para a Olsen no outro dia, e te vi andando com a Annabeth. – Disse então. – E eu acho que me enganei sobre você.
- Você não "se enganou". Você mentiu sobre mim sem a mínima vergonha na cara. E para quê? Para causar discórdia? Sinto muito, mas deu errado no fim das contas.
- Não foi por minha causa que eu quis causar discórdia. – Ele revelou. – É por isso que estou aqui. Depois do que tenho visto, acho justo que você saiba por quem eu fiz aquilo.
A curiosidade veio, mas no mesmo segundo se esvaiu. Porque não fazia mais diferença. Tudo estava resolvido, e ficar presa ao passado era o que tinha causado todos os meus problemas até aquele momento.
- Sabe de uma coisa, Perry? – Dei um fraco sorriso. – Eu não quero saber. Isso não vai mudar nada na minha vida. Morra com esse segredo.
Perry ficou ali, a boca entreaberta. Eu fui embora de perto dele, dando por finalizada aquela história e muito feliz por isso.
De repente, senti um solavanco e dei de cara com os olhos azuis de Amber, extasiados.
- Onde se meteu, sua doida?! – Ela perguntou, mas estava alegre. – Vem logo, está na hora do anúncio!
Confusa, deixei que Amber me arrastasse para perto do palco, onde já havia uma movimentação. Vi Franklin e Annabeth carregando a urna de votos.
- . – Olhei para o lado e vi Jodi, seus olhinhos brilhando. – Eu só quero dizer que se estou aqui é graças a você. Eu não ia querer competir com mais ninguém.
Senti um nó na garganta e abracei Jodi com força. Eu amava aquela tampinha.
- Vou para perto do Brad. – Ela disse, e eu soltei sua mão.
Assim que ela se afastou, apareceu ao meu lado.
- Está na hora de colocar sua coroa, Vicentini. – Ele riu, confiante.
Procurei então por Summer, e a encontrei a alguns metros. estava perto dela, falando alguma coisa. Ela olhou para mim e sorriu, assentindo.
- Boa sorte. – Li seus lábios dizerem. Mas se alguém parecia digna de uma coroa, era ela.
[N/A: Meninas, por favor, ouçam de novo, a partir do 2:29 até o final]
- Boa noite. – A voz da senhora Turttle, minha professora de Economia Doméstica, soou no salão.
Lá estava ela, em cima do palco, um vestido prateado cobrindo seu corpo arredondado. Ela tinha um envelope nas mãos.
- Odeio interromper a música, mas está na hora do momento mais glorioso da noite. Eu vou anunciar agora o Rei e a Rainha do baile de Outono!
Olhei para as meninas de novo, lá em cima. Eu conseguia ver o brilho nos olhos delas, e sabia que aquele momento ficaria gravado para sempre em suas memórias, ainda que Summer ganhasse mais uma vez.
A voz da senhora Turttle voltou a soar pelo microfone.
- Sem mais delongas, a rainha do baile de outono é...
Ela fez uma pausa.
- Jodi Slaterton.
Levei as mãos a boca, meu coração pulando de surpresa e a alegria.
Levaram alguns segundos para que Jodi entendesse que tinha ganhado. E então o salão explodiu em aplausos.
- NÃO! – Amber exclamou ao meu lado. – ISSO NÃO ESTÁ ACONTECENDO!
Eu não podia acreditar! A pequena Jodi Slaterton tinha vencido a própria Summer Olsen!
Olhei para Summer, tão estupefata quanto eu, feliz como com certeza não teria ficado se tivesse ela própria ganhado. Ela olhou para mim, sabendo que eu compartilhava do mesmo sentimento, enquanto Jodi seguia tremendo para o palco, debaixo dos aplausos e dos gritos, e recebia a enorme coroa de falsos diamantes.
- Mas como... – resmungou. – Não pode ser!
estava tão chocado quanto Amber, que agora estava na beira do palco gritando com Franklin Bert sobre uma possível falcatrua.
Eu aplaudi com tanta força que minhas mãos quase doeram, e gritei o nome de Jodi, que logo estava acompanhada por Brad, que fora eleito Rei.
De certa maneira, a pirâmide social tinha sido virada do avesso naquele baile. Aquela noite ficaria guardada na memória de todos nós.
Depois da vitória de Jodi, não tínhamos feito outra coisa senão dançar e comemorar. Estávamos explodindo de alegria pela pequena Jodi Lyn, indo contra todas as expectativas daqueles que esperavam ver uma briga feroz entre nós três. Junto de Emma, fizemos o resto da noite se tornar uma continuação da nossa viagem, deixando os problemas de lado por pelo menos uma ou duas horas.
Eles só voltaram a reaparecer, de fato, quando paramos para descansar.
Eu sabia que a hora de ir embora estava acabando, e, na verdade, já estava mesmo um pouco cansada. Talvez ficar cuidando de papai todo aquele tempo tivesse me feito adquirir hábitos de uma pessoa caseira demais para festas de madrugada, ou talvez fosse o sono da noite anterior vindo, porque eu não tinha dormido nada pensando na festa.
De todo modo, me sentei e calcei os sapatos que tinha tirado para dançar ao som da banda. estava no palco, tocando contrabaixo, e sorriu quando olhei para ele. Eu sorri de volta.
- Finalmente sozinha de novo. – Ouvi outra voz dizer.
se sentou na cadeira em frente à minha. Por eu ter passado tanto tempo com as meninas, ele tinha acabado passando grande parte da noite falando com , o que eu sabia que não era seu plano inicial (nem o de , que sem dúvida preferia ter ganhado mais atenção de Emma).
- Eu falei que você ia se divertir, não falei, Vicentini? – disse convencido.
- Falou sim, e estava certo. – Sorri.
- Infelizmente, as meninas roubaram meu papel na sua diversão. – Fez um bico.
- Foi mal. – Dei risada. – Obrigada por me trazer, mesmo assim. E desculpe por ter feito aquele interrogatório mais cedo. Mas eu ainda quero saber.
- Tudo bem. – Ele sorriu. – Sabe o que eu estava pensando? Que poderíamos ir para outro lugar depois daqui. Comer alguma coisa, quem sabe?
Abri a boca, pega despreparada. Olhei para as meninas conversando, e então para o palco de novo, onde estava concentrado em um solo. A verdade era que eu não queria ir a lugar nenhum com depois dali, e não era só porque estava cansada.
- Desculpa, mas eu estou mesmo morrendo de sono. – Tentei não soar rude. – Não vejo a hora de cair na cama.
rolou os olhos e suspirou, mas deu um meio sorriso.
- Brincadeira. Não tem problema. Fica pra próxima.
Meneei a cabeça, e meus sentidos captaram algo então.
- Você andou bebendo? – Perguntei. – Sinto cheiro de bebida.
- Não. – deu de ombros com um olhar inocente, mas eu não estava convencida.
O último acorde do contrabaixo soou no palco.
- Muito obrigado, Jacksonville Beach High. – disse no microfone. – Foi ótimo estar com vocês.
Ele se livrou do instrumento, e pouco depois começou a guardar as coisas junto com o resto da banda. Emma apareceu perto de nós.
- Ei, vocês também já estão indo? – Ela perguntou. – O Winter vai dar uma carona para mim e pro . Jodi Lyn vai ficar lá em casa hoje.
- Ah, eu também já estou indo. – Falei.
- Estamos indo. – corrigiu, sorrindo.
Apesar de irmos para lados diferentes da cidade naquela noite, saímos lá de dentro todos juntos – com exceção de , e Summer, que estavam conversando lá dentro enquanto Amber ia ao banheiro. Dava para vê-los de onde estávamos, entretanto.
- Uau, essa noite foi fantástica! – Emma exclamou, enrolando o cabelo suado no alto.
- Foi mágica! – Jodi sorriu de orelha a orelha, abraçada a Brad. Eles ainda usavam as coroas.
Então alguém passou por nós abrindo caminho à força. Na verdade, eram duas pessoas.
- Charlie! – Jasmine exclamou.
Não fora ele a esbarrar em nós, mas ela. Aparentemente, Charlie havia deixado a festa pouco antes de nós e já estava quase em seu carro. Jasmine possivelmente tinha demorado um pouco a segui-lo.
- Charlie, espera! – Não dava para entender se ela estava irritada ou desesperada.
Charlie estava parado do lado de fora do carro, mas não parecia nada bem. Não deu para ouvir a discussão deles, embora estivéssemos de orelha em pé. Tudo que ouvimos foi quando Jasmine exclamou:
- Que seja então! Eu me viro!
O carro ainda hesitou, mas Jasmine reclamou mais alguma coisa, e então ele foi embora.
Todos ficamos meio sem jeito quando ela enfim notou nossa presença e voltou.
- Qual o problema de vocês, seus idiotas? Nunca me viram?
Brad franziu o cenho, e então coçou a cabeça.
- Jasmine, se quiser uma carona... – Disse.
- Eu não preciso da sua misericórdia, Winter. – Ela cortou. – Vou pegar um táxi.
Observamos Jasmine se afastar, receosos se deveríamos interferir ou não.
- Uau. – balançou a cabeça. – Que noite.
Demos mais alguns passos em direção ao estacionamento, e então paramos.
- Bom, é aqui que nos separamos. – Brad disse.
Emma fez uma careta.
- Acho que devíamos passar pela frente e ver se achamos a babaca da Jasmine. - Opinou. - Posso odiar ela, mas algo pode acontecer com ela sozinha e nervosa daquele jeito.
- Eu sempre soube que tinha um coração gentil, Hughes. - Brad a puxou para um abraço. Depois de três segundos, Emma lhe deu um empurrão.
- Sai fora, Winter! Que seja. - Cruzou os braços. - Nos vemos na aula, . – Disse.
Jodi se aproximou, me olhou por um segundo, e então me deu um demorado abraço.
- Muito obrigada por participar desse momento. – Murmurou.
- Obrigada por me deixar fazer parte dele com você. – Respondi.
Um segundo depois, os quatro estavam indo para onde o carro de Winter estava estacionado, e eu estava com . Dali, ainda estava perto do ginásio o suficiente para ver a luz das portas duplas.
- Nossa. – disse, olhando para mim. – Tem como alguém ser mais linda que você? Você é tão linda que me deixa tonto.
Eu sorri, mas apesar da doçura em sua voz, era certo agora que havia algo de errado com . Não era só o cheiro sutil de bebida. Ele estava um pouco alto.
- , fala sério: você bebeu lá dentro, não é? – Perguntei sem repreendê-lo, mas falando com seriedade.
- Talvez. – Ele riu.
Eu não ia entrar no carro com bêbado, a menos que eu fosse dirigir. Mas por algum motivo achava que teria trabalho para convencê-lo disso.
- Tá, acho que é melhor eu ficar com as chaves do carro então. - Sugeri.
- Ah, fala sério, não é pra tanto. - rolou os olhos.
- É sério, . - Insisti. - Ou eu dirijo ou eu fico.
- Pega de mim então. - riu, erguendo as chaves no alto. Apesar de cansada, tentei sem sucesso alcançar o molho de chaves, enquanto o garoto se divertia.
- Me dá isso aqui. - Falei sério. Não adiantou.
Antes que eu dissesse outra coisa, porém, Summer apareceu.
- Vocês ainda estão aqui? – Ela perguntou casualmente.
- É o que parece. – devolveu, provocando.
Summer franziu o cenho, se aproximando dele.
- Junior, você andou bebendo? – Questionou. – Você está dirigindo.
- Ah, me deixa em paz, Sum. – O rapaz reclamou. – Por que não volta para seu baile sem coroa?
Até eu fiquei chocada, mas Summer não demonstrou nada. Apertou os lábios em uma linha reta e fechou as mãos com força.
- ! – Exclamei então. – Não seja estúpido!
- Você é ridículo, Junior. – Ela disse séria. – Não sei por que ainda perco meu tempo.
Irritada, me aproximei dele.
- Se não me der essa chave, eu vou chamar um táxi pra nós.
Junior fez uma careta, mas antes que dissesse qualquer outra coisa, outra pessoa nos alcançou.
, seguido por , talvez tivesse ouvido a discussão, ou talvez só estivesse indo embora. A questão é que de repente ele estava do nosso lado com .
- Meninas... – Ele disse, olhando para mim e para Summer. – Está tudo bem?
- Óbvio que sim. – resmungou.
- Não, não está. – Summer disse com firmeza. – Porque tem um idiota bêbado querendo levar a para casa.
ficou sério, olhando para , e então para mim, que já estava nervosa.
- Não. – balançou a cabeça. – Não mesmo. Eu vou levar a .
Eu senti um alívio enorme, misturado ao medo da reação que eu sabia que estava a caminho.
- Ninguém pediu sua ajuda, . – protestou.
- Cara, você tá bêbado. – apontou o óbvio. – É melhor eu e Amber te darmos uma carona.
- Eu dou conta da minha vida, ! – Ele disse irritado. – Porra, Olsen, olha o tamanho desse circo! Tinha que fazer isso, não é?
- Deixa de ser imbecil, . – entrou na frente de Summer. me puxou discretamente para o lado.
Amber apareceu então, saltitante, e parou assustada quando nos viu.
- O que está acontecendo? – Perguntou.
Mas ninguém respondeu. A tensão era grande demais.
- Vão todos para o inferno! - Junior xingou irritado, e então segurou meu pulso. - Vamos, .
Mas me puxou de volta no mesmo segundo, me devolvendo para perto de , e empurrou .
- Ela não vai com você. - Decretou.
- Santo , sempre ao resgate! – exclamou rindo, alterado. Ele empurrou de leve. olhou para a mão dele, mas não se moveu. - Fala sério, : você sempre morreu de inveja de mim, não é?
- Você é um babaca, . - balançou a cabeça
- Me acha babaca, então? E quem é que vai me ensinar boas maneiras, ? É você?
deu um breve sorriso, sem sair do lugar.
- Não. Quem deveria ter te ensinado isso é a sua mãe. – Respondeu. – Eu tenho outro método pra lidar com você.
E de repente, mais rápido do que qualquer um de nós poderia esperar, acertou um soco no meio da cara de Junior, fazendo com que ele caísse no chão, com as mãos no nariz.
- Caramba, ! – exclamou assustado.
- Ai meu Deus! – Amber gritou.
Quando afastou um pouco a mão do rosto, encarando furioso, deu para ver o sangue escorrendo.
- Você já estava avisado faz tempo, . – disse firme, mas sem se exaltar. – Eu esperei até demais para fazer isso.
Summer, preocupada, tocou o ombro de . Apesar de séria, dava para ver que ela estava nervosa com o rumo que as coisas estavam tomando.
- Seu desgraçado... – murmurou então. – Eu vou te arrebentar, !
voou em cima de , derrubando-o e acertando um soco em seu rosto.
Começamos a gritar, desesperados por ajuda. , com o rosto sangrando, chutou para longe. Ele se levantou e foi para cima de de novo, mas o segurou – com toda a força que tinha, que não era tanta se comparada a .
- Não, ! – Entrei na frente de , enquanto Summer o segurava com medo de que a briga continuasse.
Amber continuava a gritar, desesperada, até que a senhora Turttle e o professor Ackles – responsáveis por nos vigiar no baile – finalmente apareceram.
- O que está havendo aqui?! – A senhora Turttle perguntou, muito nervosa.
- Foi o Junior quem começou uma confusão, senhora Turttle. – Summer respondeu logo.
- Por que não me espanta que seja um brutamontes do time? – O senhor Ackles fez uma careta de desprezo.
- É melhor pararem com isso agora! – A senhora ordenou. – , ligue para o seu pai!
largou devagar, mas só soltou de uma vez quando teve certeza de que ele não ia atacar ninguém. Meu amigo bufou, irritado e nervoso.
- O velho vai adorar essa. – Disse pegando o celular. – Cada dia uma emoção diferente.
Algum tempo depois, o pai de conversava com os professores enquanto nós esperávamos sentados na calçada. estava ao lado do senhor , e não parecia nada feliz.
- Dói muito? - Perguntei baixinho a , segurando o gelo que conseguira lá dentro em sua bochecha.
- Só um pouco. - Disse. Depois percebeu minha expressão. - Ei, fica tranquila. - Sorriu o pouco que conseguia.
Olhei para Summer, que assistia com atenção a cena entre Junior e o policial.
- Eu sinto tanto, Summer. – Falei baixinho.
Summer deu um sorriso fraco, botando a mão no meu joelho.
- Você não tem nada a ver com isso, . Fica tranquila.
Eu assenti.
O senhor voltou para perto de nós. e Amber, que estavam ao lado de Summer, ficaram de pé.
- Pronto, já está tudo resolvido. – Anunciou o policial.
- Vamos levar suspensão? – quis saber.
- Não, a menos que tenham bebido. – O pai dele o encarou. – Você bebeu, ?
- Não, senhor! – Ele exclamou rápido. Pude ver Amber fechar a boca no mesmo instante. Provavelmente ela tinha tomado alguma coisa.
- Ótimo, então está tudo certo para vocês. – nos tranquilizou. – Quanto a esse camarada aqui, vou levá-lo para casa na viatura.
- Eu e a podemos ir de táxi. - sugeriu.
- Ah, mas não vão mesmo. - O policial deu uma risada sem humor. - Faço questão de falar com sua família.
estava claramente com muita raiva do que estava acontecendo, mas já não tinha como contestar. Ele já devia estar com uma suspensão àquela altura. O treinador ia engoli-lo vivo se piorasse as coisas.
- , meu filho, está em condições de dirigir? – O senhor perguntou.
- Sim.
- Ótimo, então leve a , e vão todos de uma vez. – Aconselhou. – Te vejo em casa, .
- Até mais, pai.
Quando o pai tinha se afastado o bastante, deu um sorrisinho e acenou para .
- Beleza, o drama acabou! – decretou. – Eu vou levar a Amber. Quer uma carona, Summer?
Summer abriu a boca, pensativa, mas depois assentiu, sorrindo um pouco.
- Seria bom, sim, .
- Oh, Deus, que loucura! – Amber ainda estava em choque.
se aproximou de mim e de .
- Vejo vocês amanhã. – Disse. – Vão com cuidado.
Sorri para ele e apertei sua mão de leve. O garoto bateu no ombro de . Summer se aproximou também, me dando um abraço rápido. deu um beijo na testa dela, e então a menina seguiu e Amber para o carro.
- Sobramos nós. – disse, segurando a bolsa de gelo no rosto. Ele olhou para mim. – Pronta para ir?
- Sim, por favor. – Meneei a cabeça.
Nós não falamos nada dentro do carro. Toda a confusão tinha nos deixado nervosos e cansados, mas ao mesmo tempo, toda a pressão do baile de repente estava indo embora. Além disso, eu tinha aquela sensação de que as coisas sempre acabavam bem quando estávamos juntos, mesmo quando eram uma catástrofe.
Joguei a cabeça para trás, recostando no banco, e olhei uma vez para , concentrado na estrada. Eu sorri. Quem diria.
Depois de algum tempo, o carro parou em frente à minha casa. As luzes da sala ainda estavam acesas, dava para ver pela janela que tinha uma brecha na cortina. Saímos do carro e ele me acompanhou.
- Sinto muito por quase ter feito a gente ser preso na sua noite de Rainha. – Ele disse enquanto fazíamos o curto percurso.
- A verdadeira Rainha mora do outro lado da rua. Aqui é a casa da plebeia. – Ri um pouquinho. Ele também. – Não estou chateada com você, pelo contrário. Eu… Obrigada por me salvar. - Engoli em seco.
- Sempre que precisar. - brincou.
Chegamos à porta.
Olhei para ele, a bochecha vermelha, por causa do gelo que estivera ali. Estiquei meus dedos para tocar seu rosto de leve. Dei um sorriso de desculpas.
- Queria que tivéssemos continuado dançando pelo resto da noite.
- Mas o relógio badalou meia-noite. – deu de ombros. - Acontece nas melhores histórias, eu acho.
Ele olhou para a porta.
- Bom, boa noite então. - Sorriu e me deu as costas.
Mas me lembrei que eu ainda tinha algo a dizer. Não podia deixá-lo ir assim depois de tudo.
- ! - Chamei.
Ele voltou.
- A pergunta que me fez no baile… - Olhei em seus olhos. - A resposta é não. Não fui com o porque gosto dele. Fui porque achei que você fosse com a Summer, e eu não queria...
Mas antes eu acabasse de falar, ele estava me beijando.
Meu coração disparou, mais do que em todas as outras vezes. O cheiro do perfume que eu já conhecia me deixou tonta, do melhor jeito possível.
Passei a mão pelo cabelo dele e o chapéu caiu no chão. Nenhum de nós dois ligou. E, por alguns segundos, me esqueci de todas as outras coisas.
Parecia que estávamos ali há uma eternidade, quando enfim ele se afastou um pouco. Eu olhei para – o Babá de Cachorros, com o cabelo todo bagunçado, tão lindo que chegava a doer – e ele parecia tão estático quanto eu, como se algo surreal tivesse acabado de acontecer.
Então ele sorriu, fazendo com que eu voltasse a realidade. E aproximou o rosto do meu:
- Sabe como é, o Jack estava na janela. – Ele disse. – Boa noite, Rainbow.
Olhei para trás imediatamente, sem encontrar nada, e quando me voltei em sua direção, já estava correndo para dentro do carro. Havia um sorriso em seu rosto ainda.
Eu levei alguns segundos ali ainda, até que, atordoada, destranquei a porta e entrei em casa.
- Pai? – Chamei ao tirar os sapatos, esperando encontrá-lo na sala com Miguel. Mas não houve resposta. – Pai! – Falei de novo.
Ainda sem resposta, caminhei até a sala, mas meu pai não estava lá. Miguel era quem dormia tranquilamente no sofá. Sem fazer barulho, fui até o seu quarto.
As luzes estavam apagadas, os lençóis bagunçados, e Jack roncava feliz, em um sono que já devia durar horas.
Saí do quarto e recostei na parede.
Eu me sentei no chão e ri – ainda sem rumo, mas brilhando com uma alegria que não conseguia segurar.
29- Things are looking up
"Funny one thing led to another."
[…]
POV
Eu poderia ter continuado dormindo por mais algumas horas, sonhando como estava. Com ela. Mas aéreo do jeito que estava na noite anterior, me esqueci de fechar as cortinas e quando dei por mim, o sol estava entrando pelas portas de vidro da sacada.
Não que eu me importasse. A realidade no momento era tão boa quanto o sonho. Dei risada feito um idiota, sem levantar da cama.
- Acordado a essa hora? – Minha mãe apareceu na porta.
Me sentei e sorri para ela.
- Não era meu plano, mas sim. – Respondi.
Mamãe me olhou desconfiada, depois entrou no quarto e se sentou na beira da cama.
- E como foi o baile? – Perguntou com um sorriso ansioso.
- A curiosidade matou o gato, sabia? – Devolvi um meio sorriso.
- Não sou eu quem quer saber, é o bebê! – Ela me empurrou.
- Ah, claro. – Eu ri. – O baile foi... Divertido.
- E a ? Henry disse que ela parecia uma princesa ontem. Vocês conversaram? Vocês dançaram?
- Quantas perguntas! – Exclamei, descendo da cama. – Eu conversei com ela. E dancei também.
Mamãe cobriu o rosto com as mãos, rindo de si própria, envergonhada.
- Desculpe, mas eu passei a noite torcendo para que desse tudo certo. Eu só queria ver esse sorriso no seu rosto de novo. E pelo visto eu consegui.
Abri e fechei a boca, mas assenti, sorrindo.
- Você está certa, mãe. – Admiti. – Eu estou feliz.
- Ah, é ótimo saber, ! – Ela se levantou e plantou um beijo na minha bochecha. – Não vou te interrogar mais. Vou fazer waffles para o café. Te vejo lá embaixo.
Mamãe desceu toda alegre para a cozinha, e eu balancei a cabeça e ri, pensando na noite anterior. De um jeito bagunçado, tudo tinha dado certo.
🌴💚🌴
Às vezes na vida, cometemos erros, mas meu pai sempre tinha me dito que o principal era saber reconhecê-los e lidar com as consequências. Ele tinha uma boa dose de experiência própria no assunto. Agora era a minha vez.
Abri as portas do Rogers e senti como se não fosse ali há um milênio, embora na verdade não fizesse nem um mês que eu tinha pedido demissão. De todo modo, eu já tinha tido meu tempo para esfriar a cabeça e pensar direito. E quando fiz isso, concordei com Miguel: eu estava sendo burro. O que eu mais queria era ser um músico profissional – depois da noite anterior, eu estava mais certo do que nunca – e Jack tinha feito tanto por mim e ainda tinha tanto a me ensinar... Era mesmo um erro tremendo abrir mão disso assim.
- Ei. – Eu disse, me aproximando do balcão do bar.
Só aí Miguel percebeu minha presença, virando-se para olhar para mim. Lavando um copo, ele ergueu uma sobrancelha para mim.
- . Como está? Soube que foi um sucesso no baile ontem.
- Ah, eu estou... Muito bem. – Sorri. – O show foi ótimo.
- E o que quer aqui tão cedo? – Miguel me olhou desconfiado.
- Vim para falar com o Jack. Pensei no que você disse e quero tentar conseguir meu emprego de volta.
- Sábia decisão. – Ele assentiu. – Ele está lá em cima.
- Valeu.
Deixei Miguel ali e subi as escadas para o andar aberto de cima, onde ficava a sala do administrativo. Ansioso, bati à porta.
- Pode entrar. – A voz lá dentro respondeu. Assenti para Miguel, lá embaixo, e entrei na sala.
Jack levantou os olhos dos papeis que revisava, e pareceu surpreso ao me ver.
- ? Bom dia, garoto. O que faz aqui? – Perguntou. – A está lá em casa, se...
- Na verdade, eu vim falar com você, Jack.
- Bem, sente-se então. – Indicou a cadeira.
Me sentei de frente para ele, sem jeito, mas decidido. Jack tirou os óculos de grau e coçou os olhos.
- No que posso te ajudar, garoto? – Quis saber.
- Bom, em primeiro lugar... Eu queria que me perdoasse.
- Perdoar você? Não seja bobo, , você não fez nada.
- Fiz sim. – Suspirei. – Há um ano, eu apareci na sua casa com um contrabaixo e sem saber nada de verdade sobre música, e você me ensinou tudo que eu sei agora, você me deu um emprego, um... Um segundo lar! E aí eu larguei tudo em um piscar de olhos por um problema pessoal. Eu fui um idiota.
- Ah, , não diga uma coisa dessas. – Jack balançou a cabeça com veemência. – A vida pessoal é muito importante em qualquer trabalho também, e eu sei como devia estar sendo complicado lidar com a sua situação com a e ainda ter que frequentar esse lugar e a nossa casa o tempo todo.
- É, mas você não tinha nada a ver com isso. – Dei de ombros. – Me desculpa, Jack. Se me aceitar no trabalho e na sua casa de volta, eu juro que não vou jogar tudo no lixo de novo.
- Ah, que isso. – Jack se colocou de pé. – Venha cá.
Me levantei e ele me deu um abraço.
- Você é um bom garoto, . E um grande músico, bem melhor do que você pensa. – Olhou bem para mim, sorrindo.
Sorri de volta para ele, grato.
- O que eu disse sobre você ter me dado um segundo lar é sério, Jack. – Falei. – Eu aprendi a gostar do Henry porque minha mãe o escolheu, mas você é o segundo pai que eu escolhi.
Jack me abraçou de novo, emocionado. Era bom aturar o excesso de sentimentalismo dele de novo depois de todo aquele tempo afastado.
🌴💚🌴
Depois de passar algum tempo tocando e conversando com Jack, eu achei que estava na hora de ter uma conversa com a sobre o dia anterior. Me despedi de todo mundo e saí do bar. Estava quase na esquina quando meu celular vibrou. Não reconheci o número na tela, mas depois da terceira chamada, atendi.
- Alô? – Falei.
- ? Sou eu, Pauline, a mãe da Summer.
Parei de andar, realmente surpreso. Ainda não tinha visto a mãe de Summer desde que voltara a falar com ela, e tinha a impressão que isso não era coincidência - a mulher saía de casa sempre que eu ia lá. Eu não sabia bem em que ponto ela tinha começado a não gostar de mim, porque quando eu era criança ela era perfeitamente normal comigo.
- Oi, senhora Olsen. - respondi. - Como vai?
- Bem, , embora minha vida já tenha sido mais fácil. Agora, sei que não me vê há muito tempo, mas eu gostaria muito de falar com você sobre uma coisa. Será que poderia vir aqui em casa?
- Sim, claro. Eu já vou praí.
- Obrigada. Ficarei esperando.
Menos de dez minutos depois, eu estava estacionando em frente à casa dos Olsen. Ergui a mão, mas antes que eu tocasse a campainha, a senhora Olsen abriu a porta. Ela me olhou de cima a baixo, avaliadora. Então sorriu.
- . – Disse amorosa. – Há quanto tempo não nos vemos! Você ficou muito bonito.
- A senhora não mudou nada. - Tentei soar educado, mas a verdade é que estava muito desconfiado daquele convite.
- Por que não entra? Preparei um chá.
Segui a senhora Olsen até a cozinha. Ela não falava, mas cantarolava como se tudo estivesse bem e fosse um dia corriqueiro de outono.
- Aqui está. – Pauline me entregou uma xícara e sorriu, sentando-se à mesa comigo.
- Obrigado.
- Não tem de quê. – Ela disse. E antes que eu engolisse o primeiro gole, já estava falando: – , eu vou direto ao ponto. Não esperava que a essa altura da vida Summer fosse voltar a andar com você.
- Honestamente, senhora Olsen, nem eu.
- Eu posso imaginar. Já faz muito tempo que as vidas de vocês dois tomaram caminhos completamente diferentes. - Assentiu. – Dito isso, preciso dizer que não sei se fiquei feliz com esse reencontro repentino. Desde que ela voltou a ver você, a vida da Summer parece ter saído um pouco dos planos.
- Dos planos que a senhora fez, não é? – Devolvi. Ela arqueou a sobrancelha. – Olha, senhora Olsen…
- Sinto muito, meu bem, mas essa sua tática idealista não vai funcionar comigo. Eu trabalho com fatos, e a verdade é que quando você parou de falar com a Summer, o potencial dela chegou num nível astronômico. Sem ter que se preocupar com o seu bem-estar, a Sum construiu uma carreira, uma reputação, um relacionamento duradouro!
- Com um idiota que trata ela como um troféu.
- Tudo só começou a desandar – Ela se colocou de pé e bateu na mesa, nervosa. –quando você reapareceu, trazendo de brinde aquela sua namoradinha aspirante a rainha da escola que só fez botar caraminholas na cabeça da minha menina de ouro.
- Senhora Olsen, Summer já é crescida. Só faz o que sabe que é melhor para ela.
- Ela só vai saber o que é melhor para ela quando estiver em paz! - Decretou. – , eu quero que saia da vida da minha filha.
- Foi pra isso que me chamou aqui? - Olhei bem para ela. - Porque se foi, perdeu seu tempo.
- Eu estou te avisando, . Eu…
- O que está havendo aqui?
A porta se abriu de repente e Summer nos encarou séria. A senhora Olsen arregalou os olhos.
- Sum. Eu só estava tomando um chá com o . - Sorriu. – Faz tanto tempo que não o vejo.
Summer não pareceu convencida, talvez por conhecer bem a mãe ou por ter ouvido seu tom de voz elevado. Ela olhou para mim, tentando captar alguma coisa, mas eu preferi não criar problemas. Era a família dela, afinal.
- É, fazia muito tempo. – Eu disse apenas.
Summer rolou os olhos, entrando de uma vez na cozinha.
- Mãe, eu pensei que tivesse uma aula de ginástica marcada. – Lembrou. – Espero que não tenha dito isso só para me enrolar enquanto tentava assustar o .
- O que é isso, filhinha? – Pauline forçou o riso, nervosa. – Por que eu faria isso? Eu só... Perdi a noção do tempo. Acontece, já estou velha. – Olhou para mim, preocupada. – Bom, eu já vou. – Beijou a testa da garota. – Até depois. Nos vemos por aí, ! – Ela acenou já se afastando.
Quando já estávamos sozinhos, Summer se jogou na cadeira à minha frente e passou a mão pelo cabelo – agora – curto.
- Ela te disse alguma coisa, não é? – Quis saber. – O que ela queria?
- Nada.
- Não mente pra mim, . A Gwen disse que viu ela fazer cara feia para você. – Informou. – E ela vem tentando me enlouquecer desde que voltamos a nos falar. O que ela queria?
Não queria mentir para ela, então admiti.
- Ela queria... Me assustar, como você disse. – Dei de ombros. – Ela acha que eu estou acabando com seu sucesso na vida com meu "discurso idealista". – Fiz aspas no ar.
Summer riu, mas cobriu o rosto com as mãos, envergonhada, e balançou a cabeça.
- Não escute nada do que ela diz, , por favor. – Pediu. – A minha mãe... O meu sucesso enlouqueceu ela. Minha carreira de modelo, meu namoro com o , que ela achava ser perfeito para mim... Ela achava que nós seríamos o Brady e a Gisele Bündchen da nossa geração, eu acho. – Suspirou. – E como a volta da nossa amizade coincidiu com o que parece ser meu término definitivo com ele... Você entendeu.
- Não se preocupa com isso, Sum. – Segurei a mão dela sobre a mesa. – Sério. Ela não me assustou de verdade, ela só...
- Eu sei, ela é doida. – Completou. Dei de ombros, sem poder negar.
Summer começou a brincar com a xícara de chá vazia sobre a mesa.
- Como foi ontem depois que fomos embora? – Perguntou.
- Eu levei a para casa. – Respondi por alto. – Deixei ela na porta.
- E só isso? – Arqueou uma sobrancelha, uma sugestão de sorriso na boca.
- Não, não foi só isso. – Sorri. – Eu a beijei.
- Eu sabia! – Summer comemorou. – Até que enfim! – Jogou a cabeça para trás, fingindo exaustão. – Então vocês voltaram?
- Ainda não. Nós precisamos conversar.
- É, conversar é sempre bom. – Ela tocou minha mão sobre a mesa. – É por isso que preciso conversar com você, também.
- Pode falar. – Dei de ombros.
Summer suspirou, claramente pensando em algo. Mas não demorou muito a falar:
- , ontem à noite quando brigou com o Junior... Você disse que ele já estava avisado há muito tempo. Disse, inclusive, que demorou a reagir. – Ficou séria. – Eu quero saber do que estava falando. O que houve com vocês antes que eu não sei?
- Summer, esquece isso. – Fugi. – Eu falei por falar.
- Não mente pra mim, . – Ela exigiu. – Eu ouvi claramente o que você falou, e eu vi a cara do e sei que você nunca gostou dele. Se quer saber, ele também nunca foi seu maior fã. Se tem um motivo, eu quero saber qual.
Não dava para fugir por completo de explicar as coisas daquele jeito, e eu bem achava que ela merecia saber a verdade. Ainda assim, sabia que descobrir sobre a aposta daquele jeito ia acabar com Summer.
- Eu tive sim uns desentendimentos com o Junior no nosso ano de calouros, mas foi coisa de garoto, babaquice. O que eu disse ontem foi porque, quando vocês começaram a namorar, eu avisei que se ele te machucasse eu quebraria a cara dele. Ontem ele passou dos limites e, francamente, eu já perdi a paciência.
Summer me encarou por um segundo, depois sorriu.
- ... – Disse docemente. – Você sempre cuidou de mim, não é? Desde pequeno.
Dei um meio sorriso.
- Eu devia ter feito o mesmo por você quando seus pais se separaram. – Continuou. Uma lágrima rolou por sua bochecha e ela a enxugou. – Mas você se afastou e tudo que eu fiz foi seguir minha vida como se nada estivesse acontecendo. – Balançou cabeça. – Eu devia ter brigado por você. Nunca devíamos ter nos separado. – Deu um longo suspiro. – Minha mãe está tão errada! As coisas começaram a desandar para mim justamente quando me afastei de você.
- Ah, não. Esquece isso. – Fiquei de pé e a puxei para um abraço. – E esquece essa história do . O que importa mesmo é que voltamos a ser amigos. Melhores amigos. Dessa vez para sempre.
- Sim. – Ela disse, a cabeça enterrada no meu ombro. Então se afastou. – Chamou ele de ?
Abri a boca, nervoso de repente.
- É, acho que sim. – Forcei o riso. – Sei lá, é a emoção.
Summer sorriu, assentindo. Não deu muita importância àquilo. Ela me abraçou de novo e ficou assim por um bom tempo.
🌴💚🌴
Minha mãe me fez voltar para casa para o almoço, que seria um assado. Eu convidei Summer, mas ela disse que ela e Gwen iam fazer panquecas vegetarianas. Me despedi das duas e fui embora.
Depois de almoçar e assistir a um episódio do seriado favorito da minha mãe com ela e Henry, pensei em ligar para a de uma vez. Estava ansioso para falar com ela – parecia que finalmente conseguiríamos nos entender. Depois, pensei melhor e concluí que era melhor eu ir lá de uma vez.
- Aonde vai? – Mamãe perguntou do sofá.
- Vou ver a ! – Respondi já saindo.
- Boa sorte! – Henry gritou.
Peguei o carro e em menos de cinco minutos estava na casa dos Pie. Desci e fui até lá bater na porta, o que era estranho para mim, que vivia lá. Apesar disso, achei que seria o mais adequado. Alguns instantes depois ela apareceu.
- ? – Disse surpresa.
O cabelo de ainda tinha vestígios do penteado da noite anterior, apesar de as roupas terem voltado ao habitual – o short jeans e a camiseta azul. Ela sorriu.
- Oi, . – Sorri também.
Então algo passou pelas pernas dela, quase a derrubando.
- Stevie! – repreendeu, mas estava rindo.
- Garoto. – Me abaixei para brincar com ele, que abanava o rabo feliz por me ver.
- Esse cachorro ainda vai me matar. – suspirou.
Olhei para ela e ri. Depois fiquei de pé.
- Vocês querem dar uma volta?
Apesar de eu ter ido de carro, nós preferimos ir a pé até a praia. Stevie estava na coleira, mas lá poderíamos soltá-lo um pouco. Eu sabia que tinha que dizer alguma coisa – já tinha passado da hora.
- , eu sei que tudo foi muito louco, mas... Nós precisamos conversar sobre ontem. – Falei, sem parar de andar.
- Eu sei. – assentiu, dando um suspiro sutil.
Então eu parei e olhei para ela. , ao contrário de em basicamente todo o resto do tempo, parecia não saber o que dizer. Mas parecia ansiosa para que eu o fizesse.
- Aquele beijo, eu fiz aquilo porque eu quis. – Falei. – Eu acho que... Eu queria fazer aquilo já tem tempo.
prendeu o riso, mas o sorriso em seus lábios a entregava. E me dava vontade de beijá-la de novo.
- Eu também sei disso. – Disse. – E, na verdade, acho que eu entendo você.
Sorri para ela, dando um passo para mais perto, enquanto Stevie tentava nos puxar para longe.
- , você q...
- PESSOAL!
O grito nos assustou tanto que nós dois pulamos para trás, nos afastando. Stevie começou a latir, e então vimos aquela figura desengonçada correndo em nossa direção.
- PESSOAL! – gritava.
Ele estava todo suado – não dava para dizer se era de tanto correr ou de nervosismo pelo que quer que tivesse acontecido. O que, pela cara de pânico dele, só podia ser um meteoro vindo para a Terra.
- , o que aconteceu? – perguntou preocupada.
- Está tudo bem? – Indaguei.
- Não. – se apoiou nos joelhos, se abaixando para tomar ar. – É a Amber.
Deus, ela tinha morrido depois que perdera a coroa. Só podia ser isso. Amber ainda não tinha se conformado quando a festa acabou, jurando que desvendaria aquela falcatrua.
- O que aconteceu com ela? – quis saber.
- Eu... – Ele ofegou. – Eu terminei com ela.
POV PIE
- Não! – exclamou.
- ! – Eu estava mais preocupada agora do que com a possibilidade do fim do mundo de quando o vimos correndo. – Você... Ai meu Deus, e como foi que ela reagiu?
- Mal, é claro! – Ele se sentou no meio fio.
Eu e nos sentamos ao lado dele.
- Ela estava lá, fazendo um sanduíche de geleia e falando sobre como ia desmascarar Brad Winter por causa da vitória da Jodi, quando de repente eu não aguentei mais e gritei que queria terminar com ela! – Contou .
- Você gritou? – Perguntei abismada, tentando imaginar a cena.
- Foi tudo muito rápido! – Ele se defendeu. – Quando eu dei por mim, tinha berrado que a gente precisava terminar, e ela estava olhando para minha cara tipo "O quê?", e aí eu falei que não dava mais para continuar.
- Pobre Amber. – disse com sinceridade. Eu concordava. Ela era louca pelo , afinal.
- Claro, pobre Amber, mas pobre também! – exclamou revoltado. – Ela me perseguiu com a faca de geleia por toda a casa, eu achei que fosse morrer!
- E depois?
- Não tem depois. Ela não parava de gritar e aí eu fugi. – Explicou. – O que vocês queriam que eu fizesse? Ela ia acabar me matando!
- Meu Deus. – Falei chocada. – A Amber deve ter pirado.
Então me encarou com os olhos vidrados.
- , você tem que falar com ela. – Decidiu.
- Nem vem com essa! – Me pus de pé e dei um passo para longe. – Foi você quem decidiu namorar aquela maluca.
- É, mas você é amiga dela. Ela adora você. – Ele lembrou. – Alguém precisa convencê-la a seguir em frente e me esquecer.
Muito contrariada, ponderei sobre o assunto. Fazia sentido, mas ao mesmo tempo, a última coisa que eu queria era enfrentar uma Amber louca com uma faca de geleia. Olhei para , que deu de ombros. Meu conflito interno foi gigante, mas por fim, me rendi.
- Tem razão. – Concordei tristemente. – Não que eu seja de fato amiga da Amber, mas ela me considera parte do círculo de pessoas próximas dela. Ter o coração partido é horrível. – Suspirei. – Vou chamar a Summer e ir lá falar com ela.
- Obrigado, . – me abraçou.
- Que seja. – Fiz uma careta. – Se Amber fizer um arranhão sequer em mim com aquela faca, você vai ver só.
- Tá. – Ele assentiu. – Agora liga para a Emma.
- Por que ligar para a Emma? – estranhou.
- Ora, porque alguém pode precisar imobilizar a Amber, e a Hughes é a melhor brigona da cidade! – Exclamou como se fosse óbvio, discando do próprio celular.
Olhei para ele incrédula com sua cara de pau. Mas estava rindo um pouco, o que diminuiu a tensão.
🌴💚🌴
- Pobrezinha da Amber. – Jodi dizia com tristeza, as mãos nos bolsos do moletom lilás.
Estávamos paradas perto de um supermercado, esperando Emma, que era a única que sabia qual era a casa de Amber. Summer tinha ficado presa em uma reunião familiar em casa.
- Quer dizer, mesmo levar um fora do deve ser bem ruim. – Fez uma careta.
- É uma experiência horrível. – Concordei.
Jodi olhou para mim, curiosa.
- Você já levou um fora?
- Você ficaria surpresa. – Ergui as sobrancelhas, pensando no assunto.
- Não sei o que eu faria se o Brad terminasse comigo. – Se sacudiu toda, como se tivesse um arrepio só de pensar. – Ei, olha, lá está ela! – Apontou.
Emma atravessou a rua correndo, seu coque quase desmanchando com o vento.
- Não sei em que furada é essa que quer me meter, Pie. – Ela disse ajeitando o cabelo. – Mas vou logo avisando que se aquela maluca me atacar, eu dou um mata-leão nela.
Seguimos a pé a caminho da casa de Amber, que aparentemente não era longe dali. Enquanto andávamos, Emma fazia caretas, incrédula por aquilo estar acontecendo.
- Quem diabos entra em crise por terminar com o ?! – Ela questionava. – Isso deve ser, tipo, um livramento.
- Olha, sei o que você pensa, mas o é um cara muito mais legal do que parece, e acho que a Amber estava gostando de verdade dele. – Opinei.
- É verdade. – Jodi assentiu. – Honestamente, eu esperava que a Amber terminasse com ele assim que ele deixasse de fazer parte do time titular, mas nem isso a fez desistir.
- Ela é doida também. – Emma deu de ombros. – É aquela casa ali! – Parou de andar e apontou.
A poucos metros de nós, havia uma graciosa casa de cor salmão, com detalhes em gesso branco. Uma bandeira dos EUA estava fincada no quintal. Parecia o tipo de casa em que Amber moraria.
- O que está esperando?! – Emma exclamou, me fazendo dar um pulo. – Vamos logo consolar aquela ridícula que me chamou de brigona.
- Foi mal! Eu não sabia chegar aqui sozinha! – Resmunguei.
Caminhamos juntas até a porta e eu toquei a campainha. Uma mulher loira parecida com Amber abriu a porta. Ela parecia ter andado chorando.
- Boa noite, senhora Hayley. – Cumprimentei. – A Amber está?
A mulher olhou para nós com uma expressão confusa – e talvez um pouco desdenhosa.
- Quem são vocês?
- Ah, estas são Jodi e Emma, e eu sou a . – Nos apresentei. – Somos da torcida.
- ! – O olhar de compreensão da mulher foi instantâneo. Ela me puxou para um abraço de urso, se derramando em lágrimas. Eu queria pedir socorro às meninas, mas não tinha como daquele ângulo.
Logo a senhora Hayley estava nos conduzindo pela casa rumo ao quarto de Amber, enquanto nos contava a tragédia que tinha acontecido mais cedo.
- A minha Amber está com o coração partido! – Balançava a cabeça. – E sempre que ela chora, eu choro também. Aquele moleque ordinário! Abrimos as portas desta casa para ele!
Eu estava entendendo muito bem por que tinha fugido dali, quando ela acrescentou:
- Se ao menos eu soubesse quem foi que trouxe esse monstro para a vida da minha menininha... – A senhora Hayley tinha uma expressão odiosa no rosto.
Jodi me olhou em pânico. Emma prendeu o riso. Dei um cutucão nela.
Finalmente chegamos em frente à porta branca com adesivos de unicórnio. A mãe de Amber sorriu para nós e bateu à porta.
- Querida! – Chamou. – Suas amiguinhas estão aqui!
Um segundo depois a porta se abriu, revelando uma figura que mais parecia ter saído de um filme de terror. Amber tinha o cabelo todo bagunçado e sua roupa, apesar de bonita, parecia amassada. Deduzi que ela não havia a trocado desde a discussão com . Os olhos azuis estavam marejados e dois rios pretos de rímel desciam por suas bochechas. Ela era um panda assassino. Me lembrei do dia em que descobri que era o namorado de Summer.
- ! – Ela exclamou, e então fez exatamente a mesma coisa que a mãe dela, me sufocando em um abraço de urso. – , o terminou comigo!
- É, eu tô sabendo. – Sutilmente, tentei afastá-la. – Foi por isso que eu vim. Queria ver como você estava.
Amber olhou para mim, para Jodi e para Emma, e então exclamou, voltando a chorar loucamente:
- EU ESTOU PÉSSIMA, É CLARO! – E voltou para dentro do quarto, se jogando na cama.
- Minha pobre coelhinha! – A senhora Hayley voltou a chorar e saiu correndo desse jeito.
Eu e as meninas, ainda um pouco receosas, entramos no quarto e nos sentamos na cama.
- Ele terminou comigo absolutamente do nada! – Amber continuou falando, se sentando e abraçando um peixe de pelúcia. – DO NADA! Eu ainda não posso acreditar! Eu achei que ele gostasse de mim.
- Amber... É complicado. – Fiz uma careta.
- Mesmo você devia saber que o é uma besta. – Hughes disse.
Mas Amber mal nos ouviu.
- Por que ele fez isso? Estava tudo tão bem! Eu ia fazer um protesto para que colocassem ele no time de novo!
Emma ergueu as sobrancelhas, e fiquei feliz por ela não fazer qualquer que fosse a piada que estivesse pensando.
- Amber, talvez esse término não seja para mal. – Jodi forçou um sorriso, dando de ombros. – Você pode encontrar um cara bem mais legal, quero dizer, olha só para você!
- É, mas nenhum tão misterioso e interessante quanto o . Ele é tão... Único! – Caiu no choro de novo. – E eu sou tão bonita! Éramos o casal perfeito!
Emma me cutucou. Me aproximei para ouvi-la.
- Você percebe que ela fala do como se ele fosse o Batman? Caramba, isso é loucura!
Ignorei Emma, embora fosse verdade, e voltei minha atenção para Amber de novo.
- Amber, eu sei que é difícil. – Disse docemente. – Mas Jodi está certa, você precisa tentar aceitar esse término. Se tudo parecia bem até ontem e hoje ele terminou com você, é porque, na verdade...
Mas antes que eu terminasse meu discurso de que na verdade alguma coisa não ia bem há tempos, Amber parou de chorar e cobriu minha boca com o dedo. Parei de falar. Ela se sentou concentrada, como se algo lhe tivesse vindo à mente de repente.
- . – Ela me olhou com seriedade. – Está certa: estava tudo bem até ontem. O que quer dizer que qualquer coisa que tenha mudado a cabeça do , aconteceu ontem à noite.
- Amber, não foi isso que eu...
- E o que poderia virar a cabeça dele contra a garota linda com quem estava? – Ela se colocou de pé sem soltar o peixe de pelúcia e ficou andando pelo quarto. Então parou. – Só uma coisa: uma garota ainda mais linda!
- Oh-oh. – Jodi murmurou.
De repente, Amber começou a grunhir e pular no assoalho de madeira como uma criança pirracenta, uma fúria apavorante no rosto.
- AAAAAAARGH! – Ela grunhia. – EU NÃO ACREDITO! FOI ELA! FOI ELA! FOI A SUMMER!
Olhei para as meninas, em pânico.
- Amber, não! – Me coloquei de pé, tomando o cuidado de não me aproximar demais. – A Summer não fez nada...
- FOI ELA SIM! – Amber exclamou, furiosa. – Ontem à noite o me deixou em casa e depois foi levá-la. Eles ficaram sozinhos naquele carro e sabe-se lá por quanto tempo mais! – Fez uma cara de desgosto. – Ela perdeu o namorado dela e agora quer roubar o meu! – Exclamou. – Mas eu vou MATAR ela! – Apertou o peixinho e o jogou com toda força na direção das meninas, que tiveram que se abaixar. Depois, ela saiu correndo do quarto.
Olhamos umas para as outras por um instante, e então saímos atrás dela.
- Amber! – Chamamos, correndo feito loucas.
Era tarde demais. Ouvimos o carro sendo ligado e saindo em seguida.
Foi uma sorte que o senhor Hayley tivesse chegado assim que sua filha saiu. Nem tivemos tempo de explicar direito a situação, mas a senhora Hayley mandou que ele nos emprestasse o carro, temendo que Amber estivesse indo se jogar de um penhasco.
Dirigimos a toda atrás da maluca, mas só a encontramos de fato quando chegamos perto de um semáforo e ela teve que parar.
- Eu não acredito que isso está mesmo acontecendo! – Emma balançava a cabeça. – Se eu não tivesse caído na maluquice do Brad e duvidado da sua amizade, ...
- É surreal. – Jodi estava mais abismada do que tudo. – Quem diria que ela era tão obcecada pelo ?!
Nem eu imaginava todo aquele drama, muito menos aquela teoria absurda de Amber. Dali por diante, foi mais fácil segui-la, embora ela tivesse tentando fugir algumas vezes.
A garota só parou o carro de novo em frente à casa dos Olsen. Ela freou violentamente, e nós fizemos o mesmo, tirando os cintos rápido.
A garota desceu do carro e saiu a passos firmes rumo à porta, e eu imaginei o que a senhora Olsen faria quando ela invadisse seu jantar com convidados.
- Amber, para aí! – Gritei.
Ela parou de andar e se virou para nós, irada.
- Eu não vou parar! – Gritou. – Eu vou desmascarar essa traidora!
- Hayley, para de agir feito uma doida! – Emma exclamou. – Ninguém tentou roubar aquele traste de você, muito menos a Summer!
- Quer que eu pense isso porque é amiga dela, mas não vai conseguir! – Ela devolveu. – Eu vou matar ela!
Amber saiu correndo e achamos que era o fim, até que, num piscar de olhos, ela estava no chão.
- Me solta! – Ela se debatia. – Me solta, sua anã de jardim!
Jodi tinha se jogado em cima dela, e segurava Amber com toda sua força – que, depois da gincana na praia, descobrimos que era muita.
- Você não vai a lugar nenhum, Amber! – Ela avisou.
- Me deixa sair! – A outra se debatia.
Eu e Emma as alcançamos.
- Meu Deus do céu, isso parece uma cena de O Exorcista, só que invertida. – Ela disse chocada.
- Gente, me ajuda! – Jodi pediu.
Emma se jogou no chão, ajudando a segurar Hayley. Eu já estava farta de toda aquela loucura, então decidi falar sério com ela.
- AGORA VÊ SE PRESTA ATENÇÃO EM MIM, AMBER! – Exclamei brava e ela ficou me olhando com aqueles olhos azuis de doida enquanto tentava se soltar. – Você vai parar com essa palhaçada AGORA e vai voltar para dentro daquele carro! O ter terminado com você não é o fim do mundo, e se você quer resolver isso com alguém, que seja com ele! PARA DE AGIR FEITO UMA DOIDA!
Parecia que Amber estava até me dando ouvidos, mas era tarde demais. A porta se abriu e a senhora Olsen – que já me adorava – me encarou furiosa.
- Mas o que é que está acontecendo aqui?!
Primeiro fiquei congelada, depois dei um sorriso amarelo.
- Boa noite, senhora Olsen. – Falei. – Como é que vai?
Pela cara dela, quem ia morrer mesmo era eu.
🌴💚🌴
Cheguei em casa exausta, lá pelas oito da noite. Tinha sido difícil explicar à senhora Olsen o que estava havendo – não que tivéssemos dito que Amber pretendia matar a filha dela – mas tinha sido ainda mais difícil aguentar quando Hayley voltou a chorar compulsivamente.
- Ah, já voltou. – Miguel sorriu quando apareci à porta da cozinha. – Conseguiu consolar sua colega?
- Nem fale comigo sobre isso, por favor. – Me sentei. – Cadê o meu pai?
- No banho. Estou fazendo comida Mexicana.
- Uma coisa boa pelo menos. – Sorri um pouco.
Então a campainha tocou.
- Há essa hora? – Miguel arqueou uma sobrancelha.
- Talvez seja o . – Fiz uma careta, pensando que eu o mataria. – Ou talvez seja o , querendo saber como foi tudo. – A ideia de ver depois daquele pesadelo e comer comida Mexicana com ele soava tão boa que em um instante eu estava indo abrir a porta.
- Só um segundo! – Falei, destrancando-a.
Mas quando abri, não era que estava ali.
- ? – Eu o encarei, sem reação.
- Oi, . – Ele disse. – Será que podemos conversar?
- Não é a melhor hora.
- Eu sei que você ainda está chateada pelo que eu fiz, mas... Por favor. – Pediu.
Olhei bem para ele, que parecia abatido, e para dentro de casa. Por fim, saí e fechei a porta atrás de mim.
- Pode se sentar. – Indiquei o banco de madeira na varanda. Jack tinha colocado ele ali no dia anterior para "observar se algo de interessante acontecia na vizinhança".
se sentou no banco e eu também, a certa distância dele. Esperei que ele dissesse alguma coisa, já que era ele quem queria conversar comigo.
- , ontem eu... Eu não sei o que deu em mim. – Disse com voz arrependida.
- Bebida. Estupidez. – Seca, dei a resposta. – Posso te dar uma lista.
- Olha, eu sei que vacilei. – me olhou, suplicante. – Mas é que eu estava tão feliz por estar com você, e quando o veio se meter na história...
- Quando o se ofereceu para me trazer porque você encheu a cara quando estava dirigindo, só para corrigir, você foi um babaca com ele, e também com a Summer, que só estava tentando ajudar.
- Eu fui um idiota com a Sum também, eu sei. – Mordeu o lábio. – Eu não devia ter bebido; não devia ter feito nada daquilo. Me desculpa, eu...
- Sabe o que eu acho, ? – Me coloquei de pé. – Que você pede desculpas demais e muda seu comportamento de menos. Por que não pensa nisso antes de fazer algo de que se arrependa? – Abri a porta. – A gente se vê na escola.
Entrei em casa. não me chamou. Ele sabia que eu estava certa.
Estava voltando para a cozinha, mas quando passei em frente à sala, Miguel estava no sofá.
- Era só o . – Falei.
Miguel assentiu. Depois me encarou com intensidade.
- , tem alguma coisa que queira me contar? – Perguntou, mas sem pressão nenhuma na voz. – Porque sei que tem guardado coisas demais nos últimos meses, e segredos fazem as pessoas serem presas. Eu sei disso porque já estive na cadeia.
- Pensei que tivesse ido preso por defender a sua mãe. – Observei.
- É, e no processo escondi que meu pai tinha sido um pistoleiro, o que não ajudou em nada. Agora senta aí. – Indicou a poltrona.
Me sentei ali, perto dele, e dei um longo suspiro. Eu já tinha pensado em contar a verdade a Miguel tantas vezes, mas nunca tinha tido coragem. Agora, de repente, eu não tinha mais medo. E ele estava certo: eu vinha guardando tanta coisa. Eu queria mesmo contar tudo a ele.
- O tal não é o garoto com quem saiu nas férias, não é? – Ele perguntou antes mesmo que eu começasse. – O é.
- Como você sabe? – Arregalei os olhos.
- Ah, você é uma péssima atriz. – Miguel sorriu um pouco. – E depois de conhecer o naquela noite no Rogers', concluí que você era esperta demais para ter caído na dele. Aí tinha essa história do namorado da Summer, que você sempre fazia essa mesma cara quando era citado, e as outras coisas que eu ouvia aleatoriamente. Depois de um tempo, só precisei ligar os pontos. – Deu de ombros.
Passei a mão pelo cabelo, impressionada com o quão rápido ele tinha me descoberto. Miguel tinha sido o último a entrar na história.
- Você está certo. – Confessei. – é o garoto com quem eu saí nas férias. Mas a história vai muito além disso.
- Bom, então sugiro que se apresse. – Ele olhou para o relógio. – Seu pai vai sair do banho a qualquer minuto.
- Miguel, não pode contar nada disso a ele, ok? – Pedi. – Por favor.
Miguel me encarou por alguns instantes, e então assentiu, tranquilo.
- Tem minha palavra.
E então eu contei tudo – do momento em que tinha pisado em Venice Beach, até que inventei aquela história absurda do namoro com , e de quando tinha decidido que queria de volta e me tornado uma mentirosa compulsiva.
- E foi isso. – Finalizei. – É nessa bagunça que eu estou metida.
Fiquei esperando que Miguel dissesse alguma coisa, mas ele se absteve. Quando percebeu que eu aguardava, ele falou:
- Se está esperando uma lição de moral, pode esquecer. Você não precisa disso; sabe que o que fez é errado.
- É, eu sei. – Baixei a cabeça.
- E embora a história seja bem mais maluca do que eu pensava... – Ele comentou, meneando a cabeça. – Eu já suspeitava de algumas coisas.
- Tipo o quê?
- Seu namoro com o . – Deu de ombros. – Vocês nunca me enganaram muito. – Riu um pouco. – Ainda assim, eu sempre achei que se gostassem, então preferi esperar para ver onde iam parar.
- No meio da confusão. – Respondi com um sorriso de escárnio. – Mas agora eu descobri que me apaixonei por ele assim que o conheci, e tudo que eu fiz foi sabotar a mim mesma por semanas por causa dessa obsessão maluca! – Joguei o corpo para trás, com raiva de mim mesma.
- Sua sabotagem não funcionou, porque o ainda gosta de você. – Ele deu de ombros. – Mas se quer ficar com ele, tem que dar um fim nisso tudo. Nunca vão conseguir viver em paz no meio de uma mentira.
- Eu sei disso. – Assenti.
- E tenha em mente que, em algum momento, vocês dois precisam contar a verdade a Summer. – Disse. – E você também precisa ser honesta com esse tal de e deixar que ele siga a vida dele.
- Você está certo. Eu só preciso de mais alguns dias para pensar em como fazer isso da melhor forma.
- Leve o tempo que precisar. – Miguel sorriu, colocando a mão no meu joelho. – É sempre tempo de consertar nossos erros.
Sorri de volta para ele, pensando nos conselhos que tinha me dado e me sentindo muito mais leve por ter falado com alguém.
- Estou sentindo cheiro de chili?! – A voz de papai veio lá de cima.
Miguel se colocou de pé.
- Vamos, vamos voltar para a cozinha.
[…]
POV
Eu poderia ter continuado dormindo por mais algumas horas, sonhando como estava. Com ela. Mas aéreo do jeito que estava na noite anterior, me esqueci de fechar as cortinas e quando dei por mim, o sol estava entrando pelas portas de vidro da sacada.
Não que eu me importasse. A realidade no momento era tão boa quanto o sonho. Dei risada feito um idiota, sem levantar da cama.
- Acordado a essa hora? – Minha mãe apareceu na porta.
Me sentei e sorri para ela.
- Não era meu plano, mas sim. – Respondi.
Mamãe me olhou desconfiada, depois entrou no quarto e se sentou na beira da cama.
- E como foi o baile? – Perguntou com um sorriso ansioso.
- A curiosidade matou o gato, sabia? – Devolvi um meio sorriso.
- Não sou eu quem quer saber, é o bebê! – Ela me empurrou.
- Ah, claro. – Eu ri. – O baile foi... Divertido.
- E a ? Henry disse que ela parecia uma princesa ontem. Vocês conversaram? Vocês dançaram?
- Quantas perguntas! – Exclamei, descendo da cama. – Eu conversei com ela. E dancei também.
Mamãe cobriu o rosto com as mãos, rindo de si própria, envergonhada.
- Desculpe, mas eu passei a noite torcendo para que desse tudo certo. Eu só queria ver esse sorriso no seu rosto de novo. E pelo visto eu consegui.
Abri e fechei a boca, mas assenti, sorrindo.
- Você está certa, mãe. – Admiti. – Eu estou feliz.
- Ah, é ótimo saber, ! – Ela se levantou e plantou um beijo na minha bochecha. – Não vou te interrogar mais. Vou fazer waffles para o café. Te vejo lá embaixo.
Mamãe desceu toda alegre para a cozinha, e eu balancei a cabeça e ri, pensando na noite anterior. De um jeito bagunçado, tudo tinha dado certo.
Às vezes na vida, cometemos erros, mas meu pai sempre tinha me dito que o principal era saber reconhecê-los e lidar com as consequências. Ele tinha uma boa dose de experiência própria no assunto. Agora era a minha vez.
Abri as portas do Rogers e senti como se não fosse ali há um milênio, embora na verdade não fizesse nem um mês que eu tinha pedido demissão. De todo modo, eu já tinha tido meu tempo para esfriar a cabeça e pensar direito. E quando fiz isso, concordei com Miguel: eu estava sendo burro. O que eu mais queria era ser um músico profissional – depois da noite anterior, eu estava mais certo do que nunca – e Jack tinha feito tanto por mim e ainda tinha tanto a me ensinar... Era mesmo um erro tremendo abrir mão disso assim.
- Ei. – Eu disse, me aproximando do balcão do bar.
Só aí Miguel percebeu minha presença, virando-se para olhar para mim. Lavando um copo, ele ergueu uma sobrancelha para mim.
- . Como está? Soube que foi um sucesso no baile ontem.
- Ah, eu estou... Muito bem. – Sorri. – O show foi ótimo.
- E o que quer aqui tão cedo? – Miguel me olhou desconfiado.
- Vim para falar com o Jack. Pensei no que você disse e quero tentar conseguir meu emprego de volta.
- Sábia decisão. – Ele assentiu. – Ele está lá em cima.
- Valeu.
Deixei Miguel ali e subi as escadas para o andar aberto de cima, onde ficava a sala do administrativo. Ansioso, bati à porta.
- Pode entrar. – A voz lá dentro respondeu. Assenti para Miguel, lá embaixo, e entrei na sala.
Jack levantou os olhos dos papeis que revisava, e pareceu surpreso ao me ver.
- ? Bom dia, garoto. O que faz aqui? – Perguntou. – A está lá em casa, se...
- Na verdade, eu vim falar com você, Jack.
- Bem, sente-se então. – Indicou a cadeira.
Me sentei de frente para ele, sem jeito, mas decidido. Jack tirou os óculos de grau e coçou os olhos.
- No que posso te ajudar, garoto? – Quis saber.
- Bom, em primeiro lugar... Eu queria que me perdoasse.
- Perdoar você? Não seja bobo, , você não fez nada.
- Fiz sim. – Suspirei. – Há um ano, eu apareci na sua casa com um contrabaixo e sem saber nada de verdade sobre música, e você me ensinou tudo que eu sei agora, você me deu um emprego, um... Um segundo lar! E aí eu larguei tudo em um piscar de olhos por um problema pessoal. Eu fui um idiota.
- Ah, , não diga uma coisa dessas. – Jack balançou a cabeça com veemência. – A vida pessoal é muito importante em qualquer trabalho também, e eu sei como devia estar sendo complicado lidar com a sua situação com a e ainda ter que frequentar esse lugar e a nossa casa o tempo todo.
- É, mas você não tinha nada a ver com isso. – Dei de ombros. – Me desculpa, Jack. Se me aceitar no trabalho e na sua casa de volta, eu juro que não vou jogar tudo no lixo de novo.
- Ah, que isso. – Jack se colocou de pé. – Venha cá.
Me levantei e ele me deu um abraço.
- Você é um bom garoto, . E um grande músico, bem melhor do que você pensa. – Olhou bem para mim, sorrindo.
Sorri de volta para ele, grato.
- O que eu disse sobre você ter me dado um segundo lar é sério, Jack. – Falei. – Eu aprendi a gostar do Henry porque minha mãe o escolheu, mas você é o segundo pai que eu escolhi.
Jack me abraçou de novo, emocionado. Era bom aturar o excesso de sentimentalismo dele de novo depois de todo aquele tempo afastado.
Depois de passar algum tempo tocando e conversando com Jack, eu achei que estava na hora de ter uma conversa com a sobre o dia anterior. Me despedi de todo mundo e saí do bar. Estava quase na esquina quando meu celular vibrou. Não reconheci o número na tela, mas depois da terceira chamada, atendi.
- Alô? – Falei.
- ? Sou eu, Pauline, a mãe da Summer.
Parei de andar, realmente surpreso. Ainda não tinha visto a mãe de Summer desde que voltara a falar com ela, e tinha a impressão que isso não era coincidência - a mulher saía de casa sempre que eu ia lá. Eu não sabia bem em que ponto ela tinha começado a não gostar de mim, porque quando eu era criança ela era perfeitamente normal comigo.
- Oi, senhora Olsen. - respondi. - Como vai?
- Bem, , embora minha vida já tenha sido mais fácil. Agora, sei que não me vê há muito tempo, mas eu gostaria muito de falar com você sobre uma coisa. Será que poderia vir aqui em casa?
- Sim, claro. Eu já vou praí.
- Obrigada. Ficarei esperando.
Menos de dez minutos depois, eu estava estacionando em frente à casa dos Olsen. Ergui a mão, mas antes que eu tocasse a campainha, a senhora Olsen abriu a porta. Ela me olhou de cima a baixo, avaliadora. Então sorriu.
- . – Disse amorosa. – Há quanto tempo não nos vemos! Você ficou muito bonito.
- A senhora não mudou nada. - Tentei soar educado, mas a verdade é que estava muito desconfiado daquele convite.
- Por que não entra? Preparei um chá.
Segui a senhora Olsen até a cozinha. Ela não falava, mas cantarolava como se tudo estivesse bem e fosse um dia corriqueiro de outono.
- Aqui está. – Pauline me entregou uma xícara e sorriu, sentando-se à mesa comigo.
- Obrigado.
- Não tem de quê. – Ela disse. E antes que eu engolisse o primeiro gole, já estava falando: – , eu vou direto ao ponto. Não esperava que a essa altura da vida Summer fosse voltar a andar com você.
- Honestamente, senhora Olsen, nem eu.
- Eu posso imaginar. Já faz muito tempo que as vidas de vocês dois tomaram caminhos completamente diferentes. - Assentiu. – Dito isso, preciso dizer que não sei se fiquei feliz com esse reencontro repentino. Desde que ela voltou a ver você, a vida da Summer parece ter saído um pouco dos planos.
- Dos planos que a senhora fez, não é? – Devolvi. Ela arqueou a sobrancelha. – Olha, senhora Olsen…
- Sinto muito, meu bem, mas essa sua tática idealista não vai funcionar comigo. Eu trabalho com fatos, e a verdade é que quando você parou de falar com a Summer, o potencial dela chegou num nível astronômico. Sem ter que se preocupar com o seu bem-estar, a Sum construiu uma carreira, uma reputação, um relacionamento duradouro!
- Com um idiota que trata ela como um troféu.
- Tudo só começou a desandar – Ela se colocou de pé e bateu na mesa, nervosa. –quando você reapareceu, trazendo de brinde aquela sua namoradinha aspirante a rainha da escola que só fez botar caraminholas na cabeça da minha menina de ouro.
- Senhora Olsen, Summer já é crescida. Só faz o que sabe que é melhor para ela.
- Ela só vai saber o que é melhor para ela quando estiver em paz! - Decretou. – , eu quero que saia da vida da minha filha.
- Foi pra isso que me chamou aqui? - Olhei bem para ela. - Porque se foi, perdeu seu tempo.
- Eu estou te avisando, . Eu…
- O que está havendo aqui?
A porta se abriu de repente e Summer nos encarou séria. A senhora Olsen arregalou os olhos.
- Sum. Eu só estava tomando um chá com o . - Sorriu. – Faz tanto tempo que não o vejo.
Summer não pareceu convencida, talvez por conhecer bem a mãe ou por ter ouvido seu tom de voz elevado. Ela olhou para mim, tentando captar alguma coisa, mas eu preferi não criar problemas. Era a família dela, afinal.
- É, fazia muito tempo. – Eu disse apenas.
Summer rolou os olhos, entrando de uma vez na cozinha.
- Mãe, eu pensei que tivesse uma aula de ginástica marcada. – Lembrou. – Espero que não tenha dito isso só para me enrolar enquanto tentava assustar o .
- O que é isso, filhinha? – Pauline forçou o riso, nervosa. – Por que eu faria isso? Eu só... Perdi a noção do tempo. Acontece, já estou velha. – Olhou para mim, preocupada. – Bom, eu já vou. – Beijou a testa da garota. – Até depois. Nos vemos por aí, ! – Ela acenou já se afastando.
Quando já estávamos sozinhos, Summer se jogou na cadeira à minha frente e passou a mão pelo cabelo – agora – curto.
- Ela te disse alguma coisa, não é? – Quis saber. – O que ela queria?
- Nada.
- Não mente pra mim, . A Gwen disse que viu ela fazer cara feia para você. – Informou. – E ela vem tentando me enlouquecer desde que voltamos a nos falar. O que ela queria?
Não queria mentir para ela, então admiti.
- Ela queria... Me assustar, como você disse. – Dei de ombros. – Ela acha que eu estou acabando com seu sucesso na vida com meu "discurso idealista". – Fiz aspas no ar.
Summer riu, mas cobriu o rosto com as mãos, envergonhada, e balançou a cabeça.
- Não escute nada do que ela diz, , por favor. – Pediu. – A minha mãe... O meu sucesso enlouqueceu ela. Minha carreira de modelo, meu namoro com o , que ela achava ser perfeito para mim... Ela achava que nós seríamos o Brady e a Gisele Bündchen da nossa geração, eu acho. – Suspirou. – E como a volta da nossa amizade coincidiu com o que parece ser meu término definitivo com ele... Você entendeu.
- Não se preocupa com isso, Sum. – Segurei a mão dela sobre a mesa. – Sério. Ela não me assustou de verdade, ela só...
- Eu sei, ela é doida. – Completou. Dei de ombros, sem poder negar.
Summer começou a brincar com a xícara de chá vazia sobre a mesa.
- Como foi ontem depois que fomos embora? – Perguntou.
- Eu levei a para casa. – Respondi por alto. – Deixei ela na porta.
- E só isso? – Arqueou uma sobrancelha, uma sugestão de sorriso na boca.
- Não, não foi só isso. – Sorri. – Eu a beijei.
- Eu sabia! – Summer comemorou. – Até que enfim! – Jogou a cabeça para trás, fingindo exaustão. – Então vocês voltaram?
- Ainda não. Nós precisamos conversar.
- É, conversar é sempre bom. – Ela tocou minha mão sobre a mesa. – É por isso que preciso conversar com você, também.
- Pode falar. – Dei de ombros.
Summer suspirou, claramente pensando em algo. Mas não demorou muito a falar:
- , ontem à noite quando brigou com o Junior... Você disse que ele já estava avisado há muito tempo. Disse, inclusive, que demorou a reagir. – Ficou séria. – Eu quero saber do que estava falando. O que houve com vocês antes que eu não sei?
- Summer, esquece isso. – Fugi. – Eu falei por falar.
- Não mente pra mim, . – Ela exigiu. – Eu ouvi claramente o que você falou, e eu vi a cara do e sei que você nunca gostou dele. Se quer saber, ele também nunca foi seu maior fã. Se tem um motivo, eu quero saber qual.
Não dava para fugir por completo de explicar as coisas daquele jeito, e eu bem achava que ela merecia saber a verdade. Ainda assim, sabia que descobrir sobre a aposta daquele jeito ia acabar com Summer.
- Eu tive sim uns desentendimentos com o Junior no nosso ano de calouros, mas foi coisa de garoto, babaquice. O que eu disse ontem foi porque, quando vocês começaram a namorar, eu avisei que se ele te machucasse eu quebraria a cara dele. Ontem ele passou dos limites e, francamente, eu já perdi a paciência.
Summer me encarou por um segundo, depois sorriu.
- ... – Disse docemente. – Você sempre cuidou de mim, não é? Desde pequeno.
Dei um meio sorriso.
- Eu devia ter feito o mesmo por você quando seus pais se separaram. – Continuou. Uma lágrima rolou por sua bochecha e ela a enxugou. – Mas você se afastou e tudo que eu fiz foi seguir minha vida como se nada estivesse acontecendo. – Balançou cabeça. – Eu devia ter brigado por você. Nunca devíamos ter nos separado. – Deu um longo suspiro. – Minha mãe está tão errada! As coisas começaram a desandar para mim justamente quando me afastei de você.
- Ah, não. Esquece isso. – Fiquei de pé e a puxei para um abraço. – E esquece essa história do . O que importa mesmo é que voltamos a ser amigos. Melhores amigos. Dessa vez para sempre.
- Sim. – Ela disse, a cabeça enterrada no meu ombro. Então se afastou. – Chamou ele de ?
Abri a boca, nervoso de repente.
- É, acho que sim. – Forcei o riso. – Sei lá, é a emoção.
Summer sorriu, assentindo. Não deu muita importância àquilo. Ela me abraçou de novo e ficou assim por um bom tempo.
Minha mãe me fez voltar para casa para o almoço, que seria um assado. Eu convidei Summer, mas ela disse que ela e Gwen iam fazer panquecas vegetarianas. Me despedi das duas e fui embora.
Depois de almoçar e assistir a um episódio do seriado favorito da minha mãe com ela e Henry, pensei em ligar para a de uma vez. Estava ansioso para falar com ela – parecia que finalmente conseguiríamos nos entender. Depois, pensei melhor e concluí que era melhor eu ir lá de uma vez.
- Aonde vai? – Mamãe perguntou do sofá.
- Vou ver a ! – Respondi já saindo.
- Boa sorte! – Henry gritou.
Peguei o carro e em menos de cinco minutos estava na casa dos Pie. Desci e fui até lá bater na porta, o que era estranho para mim, que vivia lá. Apesar disso, achei que seria o mais adequado. Alguns instantes depois ela apareceu.
- ? – Disse surpresa.
O cabelo de ainda tinha vestígios do penteado da noite anterior, apesar de as roupas terem voltado ao habitual – o short jeans e a camiseta azul. Ela sorriu.
- Oi, . – Sorri também.
Então algo passou pelas pernas dela, quase a derrubando.
- Stevie! – repreendeu, mas estava rindo.
- Garoto. – Me abaixei para brincar com ele, que abanava o rabo feliz por me ver.
- Esse cachorro ainda vai me matar. – suspirou.
Olhei para ela e ri. Depois fiquei de pé.
- Vocês querem dar uma volta?
Apesar de eu ter ido de carro, nós preferimos ir a pé até a praia. Stevie estava na coleira, mas lá poderíamos soltá-lo um pouco. Eu sabia que tinha que dizer alguma coisa – já tinha passado da hora.
- , eu sei que tudo foi muito louco, mas... Nós precisamos conversar sobre ontem. – Falei, sem parar de andar.
- Eu sei. – assentiu, dando um suspiro sutil.
Então eu parei e olhei para ela. , ao contrário de em basicamente todo o resto do tempo, parecia não saber o que dizer. Mas parecia ansiosa para que eu o fizesse.
- Aquele beijo, eu fiz aquilo porque eu quis. – Falei. – Eu acho que... Eu queria fazer aquilo já tem tempo.
prendeu o riso, mas o sorriso em seus lábios a entregava. E me dava vontade de beijá-la de novo.
- Eu também sei disso. – Disse. – E, na verdade, acho que eu entendo você.
Sorri para ela, dando um passo para mais perto, enquanto Stevie tentava nos puxar para longe.
- , você q...
- PESSOAL!
O grito nos assustou tanto que nós dois pulamos para trás, nos afastando. Stevie começou a latir, e então vimos aquela figura desengonçada correndo em nossa direção.
- PESSOAL! – gritava.
Ele estava todo suado – não dava para dizer se era de tanto correr ou de nervosismo pelo que quer que tivesse acontecido. O que, pela cara de pânico dele, só podia ser um meteoro vindo para a Terra.
- , o que aconteceu? – perguntou preocupada.
- Está tudo bem? – Indaguei.
- Não. – se apoiou nos joelhos, se abaixando para tomar ar. – É a Amber.
Deus, ela tinha morrido depois que perdera a coroa. Só podia ser isso. Amber ainda não tinha se conformado quando a festa acabou, jurando que desvendaria aquela falcatrua.
- O que aconteceu com ela? – quis saber.
- Eu... – Ele ofegou. – Eu terminei com ela.
POV PIE
- Não! – exclamou.
- ! – Eu estava mais preocupada agora do que com a possibilidade do fim do mundo de quando o vimos correndo. – Você... Ai meu Deus, e como foi que ela reagiu?
- Mal, é claro! – Ele se sentou no meio fio.
Eu e nos sentamos ao lado dele.
- Ela estava lá, fazendo um sanduíche de geleia e falando sobre como ia desmascarar Brad Winter por causa da vitória da Jodi, quando de repente eu não aguentei mais e gritei que queria terminar com ela! – Contou .
- Você gritou? – Perguntei abismada, tentando imaginar a cena.
- Foi tudo muito rápido! – Ele se defendeu. – Quando eu dei por mim, tinha berrado que a gente precisava terminar, e ela estava olhando para minha cara tipo "O quê?", e aí eu falei que não dava mais para continuar.
- Pobre Amber. – disse com sinceridade. Eu concordava. Ela era louca pelo , afinal.
- Claro, pobre Amber, mas pobre também! – exclamou revoltado. – Ela me perseguiu com a faca de geleia por toda a casa, eu achei que fosse morrer!
- E depois?
- Não tem depois. Ela não parava de gritar e aí eu fugi. – Explicou. – O que vocês queriam que eu fizesse? Ela ia acabar me matando!
- Meu Deus. – Falei chocada. – A Amber deve ter pirado.
Então me encarou com os olhos vidrados.
- , você tem que falar com ela. – Decidiu.
- Nem vem com essa! – Me pus de pé e dei um passo para longe. – Foi você quem decidiu namorar aquela maluca.
- É, mas você é amiga dela. Ela adora você. – Ele lembrou. – Alguém precisa convencê-la a seguir em frente e me esquecer.
Muito contrariada, ponderei sobre o assunto. Fazia sentido, mas ao mesmo tempo, a última coisa que eu queria era enfrentar uma Amber louca com uma faca de geleia. Olhei para , que deu de ombros. Meu conflito interno foi gigante, mas por fim, me rendi.
- Tem razão. – Concordei tristemente. – Não que eu seja de fato amiga da Amber, mas ela me considera parte do círculo de pessoas próximas dela. Ter o coração partido é horrível. – Suspirei. – Vou chamar a Summer e ir lá falar com ela.
- Obrigado, . – me abraçou.
- Que seja. – Fiz uma careta. – Se Amber fizer um arranhão sequer em mim com aquela faca, você vai ver só.
- Tá. – Ele assentiu. – Agora liga para a Emma.
- Por que ligar para a Emma? – estranhou.
- Ora, porque alguém pode precisar imobilizar a Amber, e a Hughes é a melhor brigona da cidade! – Exclamou como se fosse óbvio, discando do próprio celular.
Olhei para ele incrédula com sua cara de pau. Mas estava rindo um pouco, o que diminuiu a tensão.
- Pobrezinha da Amber. – Jodi dizia com tristeza, as mãos nos bolsos do moletom lilás.
Estávamos paradas perto de um supermercado, esperando Emma, que era a única que sabia qual era a casa de Amber. Summer tinha ficado presa em uma reunião familiar em casa.
- Quer dizer, mesmo levar um fora do deve ser bem ruim. – Fez uma careta.
- É uma experiência horrível. – Concordei.
Jodi olhou para mim, curiosa.
- Você já levou um fora?
- Você ficaria surpresa. – Ergui as sobrancelhas, pensando no assunto.
- Não sei o que eu faria se o Brad terminasse comigo. – Se sacudiu toda, como se tivesse um arrepio só de pensar. – Ei, olha, lá está ela! – Apontou.
Emma atravessou a rua correndo, seu coque quase desmanchando com o vento.
- Não sei em que furada é essa que quer me meter, Pie. – Ela disse ajeitando o cabelo. – Mas vou logo avisando que se aquela maluca me atacar, eu dou um mata-leão nela.
Seguimos a pé a caminho da casa de Amber, que aparentemente não era longe dali. Enquanto andávamos, Emma fazia caretas, incrédula por aquilo estar acontecendo.
- Quem diabos entra em crise por terminar com o ?! – Ela questionava. – Isso deve ser, tipo, um livramento.
- Olha, sei o que você pensa, mas o é um cara muito mais legal do que parece, e acho que a Amber estava gostando de verdade dele. – Opinei.
- É verdade. – Jodi assentiu. – Honestamente, eu esperava que a Amber terminasse com ele assim que ele deixasse de fazer parte do time titular, mas nem isso a fez desistir.
- Ela é doida também. – Emma deu de ombros. – É aquela casa ali! – Parou de andar e apontou.
A poucos metros de nós, havia uma graciosa casa de cor salmão, com detalhes em gesso branco. Uma bandeira dos EUA estava fincada no quintal. Parecia o tipo de casa em que Amber moraria.
- O que está esperando?! – Emma exclamou, me fazendo dar um pulo. – Vamos logo consolar aquela ridícula que me chamou de brigona.
- Foi mal! Eu não sabia chegar aqui sozinha! – Resmunguei.
Caminhamos juntas até a porta e eu toquei a campainha. Uma mulher loira parecida com Amber abriu a porta. Ela parecia ter andado chorando.
- Boa noite, senhora Hayley. – Cumprimentei. – A Amber está?
A mulher olhou para nós com uma expressão confusa – e talvez um pouco desdenhosa.
- Quem são vocês?
- Ah, estas são Jodi e Emma, e eu sou a . – Nos apresentei. – Somos da torcida.
- ! – O olhar de compreensão da mulher foi instantâneo. Ela me puxou para um abraço de urso, se derramando em lágrimas. Eu queria pedir socorro às meninas, mas não tinha como daquele ângulo.
Logo a senhora Hayley estava nos conduzindo pela casa rumo ao quarto de Amber, enquanto nos contava a tragédia que tinha acontecido mais cedo.
- A minha Amber está com o coração partido! – Balançava a cabeça. – E sempre que ela chora, eu choro também. Aquele moleque ordinário! Abrimos as portas desta casa para ele!
Eu estava entendendo muito bem por que tinha fugido dali, quando ela acrescentou:
- Se ao menos eu soubesse quem foi que trouxe esse monstro para a vida da minha menininha... – A senhora Hayley tinha uma expressão odiosa no rosto.
Jodi me olhou em pânico. Emma prendeu o riso. Dei um cutucão nela.
Finalmente chegamos em frente à porta branca com adesivos de unicórnio. A mãe de Amber sorriu para nós e bateu à porta.
- Querida! – Chamou. – Suas amiguinhas estão aqui!
Um segundo depois a porta se abriu, revelando uma figura que mais parecia ter saído de um filme de terror. Amber tinha o cabelo todo bagunçado e sua roupa, apesar de bonita, parecia amassada. Deduzi que ela não havia a trocado desde a discussão com . Os olhos azuis estavam marejados e dois rios pretos de rímel desciam por suas bochechas. Ela era um panda assassino. Me lembrei do dia em que descobri que era o namorado de Summer.
- ! – Ela exclamou, e então fez exatamente a mesma coisa que a mãe dela, me sufocando em um abraço de urso. – , o terminou comigo!
- É, eu tô sabendo. – Sutilmente, tentei afastá-la. – Foi por isso que eu vim. Queria ver como você estava.
Amber olhou para mim, para Jodi e para Emma, e então exclamou, voltando a chorar loucamente:
- EU ESTOU PÉSSIMA, É CLARO! – E voltou para dentro do quarto, se jogando na cama.
- Minha pobre coelhinha! – A senhora Hayley voltou a chorar e saiu correndo desse jeito.
Eu e as meninas, ainda um pouco receosas, entramos no quarto e nos sentamos na cama.
- Ele terminou comigo absolutamente do nada! – Amber continuou falando, se sentando e abraçando um peixe de pelúcia. – DO NADA! Eu ainda não posso acreditar! Eu achei que ele gostasse de mim.
- Amber... É complicado. – Fiz uma careta.
- Mesmo você devia saber que o é uma besta. – Hughes disse.
Mas Amber mal nos ouviu.
- Por que ele fez isso? Estava tudo tão bem! Eu ia fazer um protesto para que colocassem ele no time de novo!
Emma ergueu as sobrancelhas, e fiquei feliz por ela não fazer qualquer que fosse a piada que estivesse pensando.
- Amber, talvez esse término não seja para mal. – Jodi forçou um sorriso, dando de ombros. – Você pode encontrar um cara bem mais legal, quero dizer, olha só para você!
- É, mas nenhum tão misterioso e interessante quanto o . Ele é tão... Único! – Caiu no choro de novo. – E eu sou tão bonita! Éramos o casal perfeito!
Emma me cutucou. Me aproximei para ouvi-la.
- Você percebe que ela fala do como se ele fosse o Batman? Caramba, isso é loucura!
Ignorei Emma, embora fosse verdade, e voltei minha atenção para Amber de novo.
- Amber, eu sei que é difícil. – Disse docemente. – Mas Jodi está certa, você precisa tentar aceitar esse término. Se tudo parecia bem até ontem e hoje ele terminou com você, é porque, na verdade...
Mas antes que eu terminasse meu discurso de que na verdade alguma coisa não ia bem há tempos, Amber parou de chorar e cobriu minha boca com o dedo. Parei de falar. Ela se sentou concentrada, como se algo lhe tivesse vindo à mente de repente.
- . – Ela me olhou com seriedade. – Está certa: estava tudo bem até ontem. O que quer dizer que qualquer coisa que tenha mudado a cabeça do , aconteceu ontem à noite.
- Amber, não foi isso que eu...
- E o que poderia virar a cabeça dele contra a garota linda com quem estava? – Ela se colocou de pé sem soltar o peixe de pelúcia e ficou andando pelo quarto. Então parou. – Só uma coisa: uma garota ainda mais linda!
- Oh-oh. – Jodi murmurou.
De repente, Amber começou a grunhir e pular no assoalho de madeira como uma criança pirracenta, uma fúria apavorante no rosto.
- AAAAAAARGH! – Ela grunhia. – EU NÃO ACREDITO! FOI ELA! FOI ELA! FOI A SUMMER!
Olhei para as meninas, em pânico.
- Amber, não! – Me coloquei de pé, tomando o cuidado de não me aproximar demais. – A Summer não fez nada...
- FOI ELA SIM! – Amber exclamou, furiosa. – Ontem à noite o me deixou em casa e depois foi levá-la. Eles ficaram sozinhos naquele carro e sabe-se lá por quanto tempo mais! – Fez uma cara de desgosto. – Ela perdeu o namorado dela e agora quer roubar o meu! – Exclamou. – Mas eu vou MATAR ela! – Apertou o peixinho e o jogou com toda força na direção das meninas, que tiveram que se abaixar. Depois, ela saiu correndo do quarto.
Olhamos umas para as outras por um instante, e então saímos atrás dela.
- Amber! – Chamamos, correndo feito loucas.
Era tarde demais. Ouvimos o carro sendo ligado e saindo em seguida.
Foi uma sorte que o senhor Hayley tivesse chegado assim que sua filha saiu. Nem tivemos tempo de explicar direito a situação, mas a senhora Hayley mandou que ele nos emprestasse o carro, temendo que Amber estivesse indo se jogar de um penhasco.
Dirigimos a toda atrás da maluca, mas só a encontramos de fato quando chegamos perto de um semáforo e ela teve que parar.
- Eu não acredito que isso está mesmo acontecendo! – Emma balançava a cabeça. – Se eu não tivesse caído na maluquice do Brad e duvidado da sua amizade, ...
- É surreal. – Jodi estava mais abismada do que tudo. – Quem diria que ela era tão obcecada pelo ?!
Nem eu imaginava todo aquele drama, muito menos aquela teoria absurda de Amber. Dali por diante, foi mais fácil segui-la, embora ela tivesse tentando fugir algumas vezes.
A garota só parou o carro de novo em frente à casa dos Olsen. Ela freou violentamente, e nós fizemos o mesmo, tirando os cintos rápido.
A garota desceu do carro e saiu a passos firmes rumo à porta, e eu imaginei o que a senhora Olsen faria quando ela invadisse seu jantar com convidados.
- Amber, para aí! – Gritei.
Ela parou de andar e se virou para nós, irada.
- Eu não vou parar! – Gritou. – Eu vou desmascarar essa traidora!
- Hayley, para de agir feito uma doida! – Emma exclamou. – Ninguém tentou roubar aquele traste de você, muito menos a Summer!
- Quer que eu pense isso porque é amiga dela, mas não vai conseguir! – Ela devolveu. – Eu vou matar ela!
Amber saiu correndo e achamos que era o fim, até que, num piscar de olhos, ela estava no chão.
- Me solta! – Ela se debatia. – Me solta, sua anã de jardim!
Jodi tinha se jogado em cima dela, e segurava Amber com toda sua força – que, depois da gincana na praia, descobrimos que era muita.
- Você não vai a lugar nenhum, Amber! – Ela avisou.
- Me deixa sair! – A outra se debatia.
Eu e Emma as alcançamos.
- Meu Deus do céu, isso parece uma cena de O Exorcista, só que invertida. – Ela disse chocada.
- Gente, me ajuda! – Jodi pediu.
Emma se jogou no chão, ajudando a segurar Hayley. Eu já estava farta de toda aquela loucura, então decidi falar sério com ela.
- AGORA VÊ SE PRESTA ATENÇÃO EM MIM, AMBER! – Exclamei brava e ela ficou me olhando com aqueles olhos azuis de doida enquanto tentava se soltar. – Você vai parar com essa palhaçada AGORA e vai voltar para dentro daquele carro! O ter terminado com você não é o fim do mundo, e se você quer resolver isso com alguém, que seja com ele! PARA DE AGIR FEITO UMA DOIDA!
Parecia que Amber estava até me dando ouvidos, mas era tarde demais. A porta se abriu e a senhora Olsen – que já me adorava – me encarou furiosa.
- Mas o que é que está acontecendo aqui?!
Primeiro fiquei congelada, depois dei um sorriso amarelo.
- Boa noite, senhora Olsen. – Falei. – Como é que vai?
Pela cara dela, quem ia morrer mesmo era eu.
Cheguei em casa exausta, lá pelas oito da noite. Tinha sido difícil explicar à senhora Olsen o que estava havendo – não que tivéssemos dito que Amber pretendia matar a filha dela – mas tinha sido ainda mais difícil aguentar quando Hayley voltou a chorar compulsivamente.
- Ah, já voltou. – Miguel sorriu quando apareci à porta da cozinha. – Conseguiu consolar sua colega?
- Nem fale comigo sobre isso, por favor. – Me sentei. – Cadê o meu pai?
- No banho. Estou fazendo comida Mexicana.
- Uma coisa boa pelo menos. – Sorri um pouco.
Então a campainha tocou.
- Há essa hora? – Miguel arqueou uma sobrancelha.
- Talvez seja o . – Fiz uma careta, pensando que eu o mataria. – Ou talvez seja o , querendo saber como foi tudo. – A ideia de ver depois daquele pesadelo e comer comida Mexicana com ele soava tão boa que em um instante eu estava indo abrir a porta.
- Só um segundo! – Falei, destrancando-a.
Mas quando abri, não era que estava ali.
- ? – Eu o encarei, sem reação.
- Oi, . – Ele disse. – Será que podemos conversar?
- Não é a melhor hora.
- Eu sei que você ainda está chateada pelo que eu fiz, mas... Por favor. – Pediu.
Olhei bem para ele, que parecia abatido, e para dentro de casa. Por fim, saí e fechei a porta atrás de mim.
- Pode se sentar. – Indiquei o banco de madeira na varanda. Jack tinha colocado ele ali no dia anterior para "observar se algo de interessante acontecia na vizinhança".
se sentou no banco e eu também, a certa distância dele. Esperei que ele dissesse alguma coisa, já que era ele quem queria conversar comigo.
- , ontem eu... Eu não sei o que deu em mim. – Disse com voz arrependida.
- Bebida. Estupidez. – Seca, dei a resposta. – Posso te dar uma lista.
- Olha, eu sei que vacilei. – me olhou, suplicante. – Mas é que eu estava tão feliz por estar com você, e quando o veio se meter na história...
- Quando o se ofereceu para me trazer porque você encheu a cara quando estava dirigindo, só para corrigir, você foi um babaca com ele, e também com a Summer, que só estava tentando ajudar.
- Eu fui um idiota com a Sum também, eu sei. – Mordeu o lábio. – Eu não devia ter bebido; não devia ter feito nada daquilo. Me desculpa, eu...
- Sabe o que eu acho, ? – Me coloquei de pé. – Que você pede desculpas demais e muda seu comportamento de menos. Por que não pensa nisso antes de fazer algo de que se arrependa? – Abri a porta. – A gente se vê na escola.
Entrei em casa. não me chamou. Ele sabia que eu estava certa.
Estava voltando para a cozinha, mas quando passei em frente à sala, Miguel estava no sofá.
- Era só o . – Falei.
Miguel assentiu. Depois me encarou com intensidade.
- , tem alguma coisa que queira me contar? – Perguntou, mas sem pressão nenhuma na voz. – Porque sei que tem guardado coisas demais nos últimos meses, e segredos fazem as pessoas serem presas. Eu sei disso porque já estive na cadeia.
- Pensei que tivesse ido preso por defender a sua mãe. – Observei.
- É, e no processo escondi que meu pai tinha sido um pistoleiro, o que não ajudou em nada. Agora senta aí. – Indicou a poltrona.
Me sentei ali, perto dele, e dei um longo suspiro. Eu já tinha pensado em contar a verdade a Miguel tantas vezes, mas nunca tinha tido coragem. Agora, de repente, eu não tinha mais medo. E ele estava certo: eu vinha guardando tanta coisa. Eu queria mesmo contar tudo a ele.
- O tal não é o garoto com quem saiu nas férias, não é? – Ele perguntou antes mesmo que eu começasse. – O é.
- Como você sabe? – Arregalei os olhos.
- Ah, você é uma péssima atriz. – Miguel sorriu um pouco. – E depois de conhecer o naquela noite no Rogers', concluí que você era esperta demais para ter caído na dele. Aí tinha essa história do namorado da Summer, que você sempre fazia essa mesma cara quando era citado, e as outras coisas que eu ouvia aleatoriamente. Depois de um tempo, só precisei ligar os pontos. – Deu de ombros.
Passei a mão pelo cabelo, impressionada com o quão rápido ele tinha me descoberto. Miguel tinha sido o último a entrar na história.
- Você está certo. – Confessei. – é o garoto com quem eu saí nas férias. Mas a história vai muito além disso.
- Bom, então sugiro que se apresse. – Ele olhou para o relógio. – Seu pai vai sair do banho a qualquer minuto.
- Miguel, não pode contar nada disso a ele, ok? – Pedi. – Por favor.
Miguel me encarou por alguns instantes, e então assentiu, tranquilo.
- Tem minha palavra.
E então eu contei tudo – do momento em que tinha pisado em Venice Beach, até que inventei aquela história absurda do namoro com , e de quando tinha decidido que queria de volta e me tornado uma mentirosa compulsiva.
- E foi isso. – Finalizei. – É nessa bagunça que eu estou metida.
Fiquei esperando que Miguel dissesse alguma coisa, mas ele se absteve. Quando percebeu que eu aguardava, ele falou:
- Se está esperando uma lição de moral, pode esquecer. Você não precisa disso; sabe que o que fez é errado.
- É, eu sei. – Baixei a cabeça.
- E embora a história seja bem mais maluca do que eu pensava... – Ele comentou, meneando a cabeça. – Eu já suspeitava de algumas coisas.
- Tipo o quê?
- Seu namoro com o . – Deu de ombros. – Vocês nunca me enganaram muito. – Riu um pouco. – Ainda assim, eu sempre achei que se gostassem, então preferi esperar para ver onde iam parar.
- No meio da confusão. – Respondi com um sorriso de escárnio. – Mas agora eu descobri que me apaixonei por ele assim que o conheci, e tudo que eu fiz foi sabotar a mim mesma por semanas por causa dessa obsessão maluca! – Joguei o corpo para trás, com raiva de mim mesma.
- Sua sabotagem não funcionou, porque o ainda gosta de você. – Ele deu de ombros. – Mas se quer ficar com ele, tem que dar um fim nisso tudo. Nunca vão conseguir viver em paz no meio de uma mentira.
- Eu sei disso. – Assenti.
- E tenha em mente que, em algum momento, vocês dois precisam contar a verdade a Summer. – Disse. – E você também precisa ser honesta com esse tal de e deixar que ele siga a vida dele.
- Você está certo. Eu só preciso de mais alguns dias para pensar em como fazer isso da melhor forma.
- Leve o tempo que precisar. – Miguel sorriu, colocando a mão no meu joelho. – É sempre tempo de consertar nossos erros.
Sorri de volta para ele, pensando nos conselhos que tinha me dado e me sentindo muito mais leve por ter falado com alguém.
- Estou sentindo cheiro de chili?! – A voz de papai veio lá de cima.
Miguel se colocou de pé.
- Vamos, vamos voltar para a cozinha.