Fanfic finalizada: 24/10/2019

Capítulo Único

1941

As folhas laranjas, caídas das árvores, estavam todas espalhadas pelo chão do grande Yards Park onde e se encontravam. O outono era a estação preferida dos dois e por isso, sempre durante essa época, eles aproveitavam todo o tempo livre que tinham para sair pra namorar ou para levar a filha Grace para passear. Dessa vez não estava sendo diferente, o casal estava debaixo de uma árvore sem folhas, já que todas estavam no gramado sobre o qual eles estavam sentados, observando a filha que brincava a alguns metros de distância deles, mas ainda assim podendo ser vista e alcançada pelos dois.
― Você sabe que fica mais linda a cada dia, não sabe? ― perguntou à mulher, enquanto a olhava sorrindo com admiração.
cobriu o rosto com as mãos, tímida como sempre sob o olhar intenso dele, que aparecia todas as vezes em que a elogiava.
― Eu não acredito que depois de sete anos casada comigo, você continua sentindo vergonha de mim. ― comentou, rindo.
sentiu o seu corpo ser mais apertado pelo dele no abraço.
― Não é de você, é das coisas que você diz. ― vermelha de vergonha, ela balançava a cabeça em negação.
― Mas eu só disse que você é linda ― repetiu o elogio, fazendo-a sorrir enquanto olhava para ela. ― e cheirosa, engraçada, gostosa e com um beijo que meu Deus do céu!
A mulher riu, repetindo o gesto com as mãos outrora feito por ela. não era bobo, era justamente essa reação que ele queria causar na esposa e ao sentir que ela, inconscientemente, comprimiu o corpo um pouco mais contra o dele devido à vergonha, o homem riu ainda mais.
A risada dele era gostosa de ouvir. não podia negar que a amava.
passou então a distribuir beijos pelo pescoço e face da mulher, que se contorcia ao mesmo passo que sorria ao senti-lo atingir os seus pontos mais sensíveis.
― Papai, olha! ― Grace, gritou, correndo em direção ao pai. Ela segurava uma folha de cor laranja e verde que tinha uma forma engraçada; bom, ao menos era engraçado para ela.
retribui o largo sorriso da menina, voltando o olhar para folha estendida em sua direção, com um olhar de surpresa e interesse pela descoberta da garota.
― Uau, filha! Que linda!
― Eu que achei. ― Ela abriu aquele enorme sorriso que os derretia.
― Vem cá, filha, deixa a mamãe ver. ― pediu, estendendo a mão para pegar a folha. ― Nossa, amor, você tá vendo isso? ― perguntou ao esposo, atiçando a curiosidade da filha.
― O quê? Vendo o quê? ― Grace perguntava curiosa.
― Uau! Claro que tô vendo. ― entrou na onda da mulher. ― Que incrível!
― O que é incrível, papai? ― ela o olhava com ansiedade.
― Vem, tem que chegar mais perto pra ver. ― explicou.
Grace chegou mais perto da mãe, quase encostando os olhos na folha.
― Eu não tô vendo nada. ― disse, desapontada.
― Como não? ― perguntou. ― Você não vê que ela é tão linda quanto você? ― ela sorria para a filha.
― Ah mamãe! ― a pequena menina, tão parecida com a mãe, falou, gargalhando em seguida. a puxou, beijando-a.
Grace pegou a folha da mão da mãe e voltou a brincar, deixando os pais sozinhos novamente.
Depois de algum tempo em silêncio, em que os dois ficaram somente curtindo um ao outro, o ouviu suspirar.
― Você já ouviu?
― O quê? ― ela perguntou, confusa.
Ele suspirou mais uma vez.
― Os rumores de guerra.
― Aqui? ― questionou assustada, reerguendo o corpo para se sentar de frente para ele.
― Sim ― fechou os olhos e respirou fundo. ―, os homens no trabalho disseram que o país está sendo ameaçado.
, estamos em perigo?
― Eu não sei, . Mas não quero que se preocupe, eu vou cuidar de vocês. ― assegurou, olhando diretamente para os olhos dela.
A pequena família passou mais um tempo ali, ainda que o casal estivesse mais absorto nos seus próprios pensamentos, mas ainda assim aproveitando a companhia um do outro, enquanto Grace ainda brincava, ora correndo ora sentada no chão com as folhas e os brinquedos, até que anunciou que era hora de voltarem para casa antes que ficasse muito tarde.
A verdade era que a Segunda Guerra Mundial acontecia a todo vapor bem debaixo dos olhos do povo norte-americano. A Alemanha acabara de invadir a União Soviética, levando tudo para um caos ainda maior e, como se isso não bastasse, a cidade está tomada pelos rumores de um possível ataque do Japão ao país.
Os cidadãos estão desesperados, as famílias estão com medo e as mães não deixam mais as crianças brincarem nas ruas. O pavor tomou conta dos corações sem nem se importar em pedir licença e, enquanto isso, o governo insiste em tentar os convencer de que tudo está bem e que esses rumores são somente invenções do povo.
Palhaçada. O mundo está em guerra e eles sabem muito bem que todos podem estar em perigo.
― Mamãe, já podemos ir pra casa? Tô com soninho. ― Grace perguntou, coçando os olhos.
Já era noite e fazia um bom tempo que a família estava na casa do senhor Ronald aguardando as notícias do dia serem anunciadas no rádio.
Sr. Hall, um dos vizinhos presentes no local, repreendeu Grace com o olhar por conta do barulho.
― É por isso que mulheres e crianças não deveriam participar de momentos sérios como esse. Bastavamos nós homens. ― ele murmurou com uma feição brava.
o lançou um olhar repreendedor e o mandou ficar quieto. Ele nunca permitia que se levantassem contra a sua família. Logo após, todos voltaram a atenção novamente para o aparelho no centro.
Eram cerca de cinquenta pessoas amontoadas dentro de uma pequena sala com um pequeno rádio no meio. Todos se embolavam a espera do momento em que alguém começaria a falar e seriam informados do que estava acontecendo nos países vizinhos, por isso todo silêncio era pouco. Ninguém ousava dizer nada. Mas Grace era uma criança de cinco anos, é claro que ela não conseguiria ficar quieta por muito tempo.
a colocou no colo e afagou os seus cabelos, a menina repousou a pequena cabeça no peito da mãe e na mesma hora soube que dentro de dez minutos ela já estaria dormindo. Não muito tempo depois disso, a luz do aparelho se acendeu e logo uma voz pôde ser ouvida ecoar dele.
― Cidadãos estadunidenses, recebemos a notícia de que a base naval norte-americana de Pearl Harbor, no Havaí, acabou de ser atacada pelos japoneses. ― o locutor gritava e todos se espremiam cada vez mais perto do aparelho de rádio para entender o que ele dizia. Apesar do péssimo sinal, todos conseguiram compreender a última parte, e em menos de cinco segundos o pânico já havia se instalado no local. ― Aquilo que mais temíamos aconteceu, meus caros irmãos. Temo em dizer que estamos em perigo. Deus nos abençoe!
olhou para assustada e pôde perceber que ele não estava muito diferente dela. Com rapidez, ele a alcançou o mais depressa possível, se desvencilhando das pessoas que corriam desesperadas pela sala em direção às suas casas e aos seus familiares. pegou Grace dos braços da esposa, a apertando nos seus quando percebeu que ela iria chorar por ter sido acordada, e começou a conduzi-las apressadamente em direção a saída. Precisavam ir para casa o quanto antes.
A guerra física poderia não ter chegado entre eles ainda, mas já tinha alcançado o coração das pessoas. A rua estava em completa desordem, homens e mulheres corriam para todos os lados enquanto gritavam e choravam de desespero; por sorte, a residência onde moravam não ficava distante da casa dos Ronald.
Assim que chegaram na porta de entrada, a abriu rapidamente e com força, fazendo-a bater contra a parede. o olhou assustada.
― Vem, ! Precisamos entrar.
estendeu sua mão para ela, que não hesitou em pegá-la, sendo puxada para dentro da casa imediatamente.
― O que acontece agora? ― Perguntou com a voz embargada pelo choro, após ele devolver Grace para os seus braços. A pequena se mexeu, inquieta.
― Não sei. ― ele respondeu, mas sem realmente prestar atenção na mulher, já que ele estava se certificando em travar a porta de todas as maneiras que eram possíveis.
Todo mundo estava com medo e, nessas horas, delinquentes se aproveitavam para invadir casas e saquear pessoas.
Diante da agonia que estava sentindo e da própria agonia que estava sobre , ela se pôs a dar pequenos passos para trás com Grace ainda em seus braços. A criança estava com medo e ela podia ver isso em seu olhar, o que a deixava ainda mais em agonia. Como não estava prestando devida atenção por onde andava, ela tropeçou em uma cadeira de madeira que estava próxima a mesa, mas não se importou com a dor que a perna sentiu devido ao impacto, ela só queria se sentar um pouco.
Com Grace ainda agarrada em seus braços, se sentou na cadeira e deixou que as lágrimas de medo rolassem pelo seu rosto, enquanto ela mesma tentava fazer a filha parar de chorar.
“Como dizer a ela que vai ficar tudo bem quando eu mesma temo o amanhã?”, ela se perguntava, olhando para a menina.
Depois de se certificar de eles estavam seguros em casa, varreu seu olhar por toda a sala a procura das mulheres mais importantes da sua vida, até que os seus olhos encontraram os olhos vermelhos de .
― Hey, vai ficar tudo bem, meu amor ― dizia, enquanto andava em direção a ela pronto para consolá-la. ― Eu estou aqui com você. Estamos seguros. ― agachou-se de frente para a esposa, olhando-a nos olhos.
levou a sua mão direita ao rosto dela e começou a enxugar as lágrimas resultantes de um choro silencioso.
― Alguma vez já deixei algum mal acontecer com vocês? ― perguntou com o seu jeito carinhoso de ser.
Em resposta, balançou a cabeça negativamente.
― Amor, você pode confiar em mim. Vou cuidar de vocês. ― inclinou-se para beijá-la na testa ao mesmo tempo em que acenava com a cabeça em confirmação.
O mundo em que eles vivem é difícil. As mulheres ainda sofrem muito em praticamente todas as áreas das suas vidas, mas , mesmo sendo homem, não era igual aos outros. cuidava da esposa e da filha. era homem e não se sobrepunha por isso.
Ele sorriu para ela.
― Vem, vamos para cama. ― ele chamou, pegando Grace, agora mais tranquila, mais uma vez em seus braços.
O desespero permanecia do lado de fora, as pessoas continuavam gritando e chorando com medo, mas não tinha nada que eles pudessem fazer.
colocou a filha na cama do casal e depois de ambos se livrarem das roupas pesadas, deitaram ao lado dela com a barriga voltada para cima.
sabia que ele não dormiria essa noite tamanha era a preocupação com elas e com o que o futuro os reservava e ter consciência disso era uma tortura para a mulher. Ela o conhecia desde sempre. era o seu melhor amigo.
― O que vai acontecer agora? ― perguntou em sussurros, virando o corpo em direção ao marido.
― Vocês vão ficar bem. ― tentou sorrir, buscando passar alguma segurança que tranquilizasse a companheira.
― Você também. ― ela acrescentou com um tom de repreensão por ele não ter se incluído na frase.
sorriu para , um sorriso triste, mas nada disse. Se inclinou por cima de Grace para beijar a esposa, afagando os cabelos dela em seguida.
― Você precisa dormir. Vai ficar tudo bem. ― disse por fim.






― Acorda, papai! Acorda! ― Grace não parava de pedir ao pai, enquanto ria e se jogava sobre o corpo dele deitado na cama.
De tanto insistir e cutucá-lo em todos os cantos possíveis do rosto, a menininha conseguiu o que tanto queria: despertar o pai que estava em um sono pesado; finalmente ele começara a abrir os olhos ainda que preguiçosamente. , que estava sentada na ponta da cama, assistia a tudo com um enorme sorriso no rosto.
ainda tentava focar em algo, mas quando conseguiu, viu uma miniatura de gente sentada sobre ele com um sorriso sapeca no rosto. Mesmo que não quisesse, seria impossível não sorrir junto, mas ele nunca lhe negaria um sorriso. Ele puxou a menina para um abraço de urso, ouvindo-a gargalhar em resposta, o que o fez depositar centenas de beijos pelo rosto dela.
― Bom dia, ursinha!
Grace fez bico para que o pai a beijasse, o que ele imediatamente fez.
― A mamãe também está aqui, sabe? ― se pronunciou, acompanhada de um olhar pidão. ― Desse jeito não sobra nada pra mim.
Pai e filha riram ainda deitados na cama.
― Dá beijo na mamãe também, papai.
― Se certa ursinha sair de cima de mim, talvez eu consiga. ― ergueu a sobrancelha, sorrindo.
― Vem, mamãe! ― ela chamou, empolgada, batendo palmas.
colocou a filha sentada sobre a cama e abriu os braços para que a esposa se aconchegasse a ele. Inclinando-se para chegar mais perto dele, a mulher, sorrindo, beijou-lhe os lábios, enquanto Grace já estava distraída demais indo em direção a cozinha.
― Bom dia! ― ele desejou com o seu olhar transbordando carinho.
― Bom dia! ― ela respondeu, sorrindo.
― Pra onde ela foi? ― perguntou a respeito da filha ao ver que ela não estava mais ali com eles.
― Aposta quanto que aquele serzinho está na cozinha?
Ele riu, concordando imediatamente com a hipótese.
― Filha, não come nada até a mamãe chegar aí pra colocar o seu leite. ― falou num tom mais alto para que a filha pudesse ouvir.
― Poxa! ― o casal ouviu a filha murmurar baixo, ou pelo menos ela acreditava que estava falando baixo.
olhou para o marido sorrindo por ter acertado no palpite.
― Eu te disse. ― piscou um olho para ele, levantando-se em seguida para ir alimentar a filha.







olhava para o teto branco da casa praticamente sem piscar. Grace já estava dormindo havia horas, assim como , que até demorou mais tempo que a filha para pegar no sono, mas já dormia há algum tempo.
O fato era que a mente dele não parava de produzir mais e mais pensamentos, enquanto tudo o que ele queria, e precisava, era dormir, mas não, o seu cérebro resolveu não cooperar. bufou com uma mistura de irritação e frustração, e levantou da cama com cuidado para não acordar as suas meninas. Ele começou a andar em direção a sala onde poderia chorar e quem sabe soltar alguns gritos abafados pela almofada que o permitissem esbravejar a raiva. precisava fazer isso ou senão surtaria mais tarde, porém mais tarde ele iria precisar estar inteiro para elas. Precisaria ser forte por elas.
As mãos estavam fechadas em punho e andava de um lado para o outro murmurando reclamações que eram acompanhadas vez ou outra por puxões de cabelos. Ele caminhou a passos largos até a almofada sobre o sofá, prensando-a contra o rosto para que pudesse gritar em paz sem acordar a vizinhança toda. Desesperado, ele se sentou sobre o pequeno sofá de dois lugares e abaixou a cabeça chorando.
― Por quê? Por quê? Por quê? ― questionava a Deus repetidas vezes.
não ouvia, mas se aproximava dele com pequenos passos acompanhada de uma feição de tristeza, mas também de compreensão. Ela conseguia imaginar o que o marido estava sentindo no momento.
Sem que ele percebesse, se sentou ao seu lado e acariciou as suas costas, o fazendo se sobressaltar devido ao susto. Ele olhou para ela com os olhos vermelhos e marejados pelas lágrimas. Com uma mão repousada sobre a costas e outra sobre a coxa dele, a esposa de permaneceu lhe fazendo carinho enquanto ele mais uma vez abaixava a cabeça em choro.
Aquilo partiu o coração de como se alguém estivesse rasgando o coração dela com uma faca afiada, mas apesar de estar sofrendo por vê-lo assim, e só Deus sabia o quanto estava sendo difícil para ela, não chorou. Por tanto tempo ela viu o marido enfrentar a todos em favor dela e da filha, várias vezes ele a consolou; ela sabia que agora era a vez dela. Ele era quem necessitava dela agora.
― Vai ficar tudo bem, amor! ― ela sussurrou no ouvido dele. beijou o rosto do esposo, sentindo as lágrimas que caiam dos olhos dele molharem a sua bochecha. ― Eu estou aqui.
a abraçou em busca de consolo. Ele a apertava em seus braços como se estivesse com medo de perdê-la; e, na verdade, ele estava com medo, mas medo de não estar mais ali por elas, medo de que não tivessem mais um futuro juntos, medo de não ver Grace crescer e se apaixonar, medo de que em alguns anos, um outro alguém estivesse aqui com elas, fazendo um papel que era dele, porque ele não conseguiu o fazer.
já não conseguia mais segurar as lágrimas, que agora escorriam livremente pelo seu rosto. estava com o rosto escondido em seu pescoço e tudo o que a mulher mais desejava era arrancar a dor que estava no peito dele e colocar em si mesma. Ela preferia sofrer ao vê-lo sofrer, assim como ele muitas vezes sofreu para que ela pudesse estar bem. O sentimento de impotência era o pior que já havia experimentado. Ela o odiava com todas as força.
― Eu te amo! ― fez questão de lembrá-la mesmo em meio ao choro.
― Eu te amo! ― ela respondeu, apertando-o mais forte no abraço.
tomou o rosto dele em suas mãos e o beijou. Ela percebeu que as mãos de tremiam e isso partiu ainda mais o seu coração.
― Você é o amor da minha vida. ― afirmou após partir o beijo para olhá-la.
sorriu, as lágrimas ainda correndo pelas suas bochechas.
voltou a juntar os seus lábios nos dela com selinhos demorados até que estes se estenderam em outro beijo, salgado pelas lágrimas de ambos que se misturavam. Ele voltou a abraçá-la e permaneceram assim por um curto tempo até deitar a cabeça sobre o colo dele. Ela estava toda torta no sofá, mas não estava se importando com isso nem um pouco. Agora era quem lhe fazia carinhos, e de olhos fechados, aproveitava o cafuné que era feito nos seus cabelos.
Um tempo depois, eles já estavam mais calmos e curtiam a presença um do outro. No fim, isso era tudo o que eles precisavam.
― Deve ser umas 3h30 da manhã. ― comentou, levemente assustado ao pensar no quão tarde estava.
― Sim. ― confirmou, , rindo suavemente. ― Acordarei com olheiras. Não se assuste, por favor.
― Depois de todos esses anos, acho que já me acostumei. ― respondeu, sorrindo.
Ele estava mais calmo, assim como ela, apesar de os dois ainda possuírem a coloração vermelha nos rostos.
bateu levemente na perna do marido em resposta ao comentário dele.
― Eu sei que você sabe o que vai acontecer agora e eu preciso que me diga, . ― ela disse, depois de um pequeno silêncio que exalava o medo que eles sentiam.
respirou fundo.
― Existe uma grande chance de eu ser convocado para defender o país na guerra.
também respirou fundo antes de abrir os olhos. No fundo, ela já tinha consciência disso, mas precisava ouvi-lo falar.
― Como você se sente?
― Quero ficar com vocês.
― Uh-hum. ― murmurou em concordância.
― Eu quero defender o país, o povo norte-americano, mas vocês são o meu povo. Se eu não puder defender vocês, significa que eu falhei. ― concluiu, ainda fazendo carinho nos cabelos dela.
― Presumo que não temos escolha.
ficou em silêncio. Não queria ter que dar uma resposta negativa a ela, principalmente porque sabia que isso feriria a ambos.
― Temos escolha, ? ― abriu os olhos, atenta a resposta que receberia.
Ele suspirou.
― Infelizmente não, se eu for convocado, terei que ir.
fechou os olhos, os apertando com certa força, como quem quer fazer tudo de ruim sumir.
― Ficaremos bem. ― ela concluiu por fim.
olhou para as mãos dela repousadas sobre a própria barriga e estendeu as suas até conseguir alcançar as dela. Ele entrelaçou os seus dedos aos dela e reparou pela milésima vez como as mãos se encaixavam tão bem. não sabia o que faria sem ela.
― Ei, olha pra mim. ― pediu, atraindo a atenção dele de volta para si. ― Eu e Grace ficaremos bem, . Vou cuidar dela e você cuidará de nós de onde você estiver. Ficaremos bem. ― ela tentou sorrir para ele, ainda que aquilo a estivesse matando. ― Estaremos aqui quando você voltar.
Os olhos de se encheram de lágrimas mais uma vez e prontamente secou uma lágrima solitária que havia caído.
se sentou ao lado dele para que pudesse vê-lo melhor.
― Como eu vou poder cuidar de vocês, sendo que poderei estar morto? ― questionou, sentindo o pavor começar a tomar conta de si novamente.
Ela fechou os olhos ao sentir o baque que aquelas duras palavras traziam consigo.
― Você não vai morrer. ― ela o repreendeu.
― Como pode ter tanta certeza disso?
― Porque todos os dias você vai se lembrar de mim e da sua filha de cinco anos que precisa de um pai, por isso você vai lutar e vai voltar vivo pra casa, porque eu não tenho como ficar sem você, , por isso. ― o olhar dela transmitia dor e não estava muito diferente do dele.
a beijou quando viu o rosto da mulher ser tomado pelas lágrimas.






O estômago de dava várias voltas dentro dela, mas ela tinha que disfarçar muito bem, afinal, ninguém poderia desconfiar o que estava acontecendo.
Era hora de comprar leite na venda e, como uma boa dona de casa que ela deveria se tornar, é claro que era obrigação dela ir às compras. A sua mãe ordenava e ela não tinha muita escolha, mas é claro que não poderia ir sozinha, por isso, seu irmão Victor, cinco anos mais novo do que ela, sempre a acompanhava. Uma moça que se preze não pode andar sozinha nas ruas, ainda mais a noite. O que os outros poderiam pensar? Não importava se todas as outras moças saíam sozinhas, sua mãe sempre a lembrava de que ela não era todo mundo.
Embora Victor fosse à venda com ela, estava animada. Se desse muita sorte, encontraria novamente e poderia admirá-lo ainda que por breves segundos.
Com o seu vestido amarelo cheio de flores, se dirigiu até o irmão que já a aguardava na entrada da porta.
― Nada de risinhos na rua. ― Victor ordenou antes de saírem.
A irmã nada disse, limitou-se somente a balançar a cabeça em concordância.
Os dois iam caminhando juntos em direção ao estabelecimento do senhor James, mas dificilmente trocavam palavras um com o outro. Geralmente, Victor se limitava a mandá-la chegar mais para o lado ou a lembrava de abaixar a cabeça e fixar os olhos no chão, o que fazia sem reclamar. Não lhe era permitido contestar, ainda que ela gostaria de o fazer, então mantinha a boca fechada e se limitava a gritar contrariada em sua mente. Entretanto, isso não estava a chateando tanto hoje, o que ansiava mesmo é pelo momento em que passaria em frente a casa de ; esperava o encontrar ali ou próximo ao local, uma vez que era costume do rapaz sair para acompanhar a própria irmã à venda esse mesmo horário.
Esse era um dos poucos momentos em que erguia a cabeça rapidamente e por poucos segundos. Ela gostava de vê-lo e com isso estava ansiosa, pois já estavam próximos à residência do moço.
Percebendo que estavam chegando ao local em que desde que saíra ela estava empolgada para ver, levantou a cabeça, frustrando-se por não encontrar . Novamente ela voltou o olhar para o chão, mas o levantou pouquíssimo tempo depois ao ouvir o irmão saudar os vizinhos.
― Boa noite, ! ― Victor desejou ao rapaz, voltando logo o olhar para a irmã dele que estava ao lado. ― Jasmine! ― inclinou a cabeça em saudação a ela.
aproveitou a deixa para admirar mais uma vez naquela semana. Ele também a olhava e sorriu minimamente para a moça. abaixou a cabeça envergonhada e também sorriu, tornando a feição séria mais uma vez antes que o seu irmão notasse algo de estranho.







terminava de descarregar mais um saco de trigo que ele carregou em suas costas por um longo caminho, quando ouviu dois dos seus colegas de trabalho murmurando algo um com o outro.
― Soube que Petrus recebeu ontem a carta de convocação para lutar na guerra. ― um deles, com sua voz grossa, assustadora na opinião de , relatou ao companheiro.
― Logo seremos os próximos. ― concluiu o outro aos sussurros.
Os músculos do corpo de se enrijeceram.
― Estamos planejando fugir durante essa madrugada para o mais distante daqui que conseguirmos. Você deveria vir também. ― continuou o primeiro.
― Não é muito perigoso? Se formos pegos, estamos mortos.
― Se ficarmos, morreremos na guerra. ― encerrou a fala ao ver que outros homens se aproximavam deles.
viu quando os dois trocaram um olhar cúmplice entre si e ele tratou logo de voltar para a outra parte do armazém a fim de continuar o trabalho, esperando que eles não tivessem percebido que ele ouvira toda a conversa.
Fugir? Será que essa é realmente uma boa ideia? O que aconteceria com e Grace caso os militares os pegassem fugindo? Ao chegar nesse último questionamento, imediatamente descartou a ideia. Não poderia colocar a vida das suas meninas em risco.
Ele balançou a cabeça para tentar esquecer não só os pensamentos, mas também a angústia que veio acompanhada deles.
permaneceu trabalhando no armazém até o fim do dia ― seu horário normal seria até quase o fim da noite, mas com essa loucura de invasão ao país, estava tudo fora de lugar ― e assim que foi liberado do serviço, ele partiu em direção à sua casa apressadamente. Durante o percurso, viu mulheres se despedindo aos prantos dos seus maridos que partiriam para a guerra, bem como crianças agarrarem as pernas dos pais para tentar impedi-los de partir. O coração de estava sendo despedaçado aos poucos. Ele podia sentir nas suas entranhas que em breve seria ele a vivenciar momentos como aqueles e só a ideia de ter que deixar o amor da sua vida e a sua pequena filha sem poder lhes prometer que voltaria, o fazia sentir uma dor tão intensa e profunda como nunca antes havia sentido. Aos poucos ele sentia que estava perdendo a sua vida.
― Não vai, por favor! ― ouviu uma esposa pedir ao marido no exato momento em que ele passava próximo a eles. A mulher se jogou nos braços do rapaz, escondendo o rosto em seu pescoço, mas, ainda que abafado, conseguia ouvi-la chorar.
Faziam cinco dias desde que Pearl Harbor fora atacada e desde então não era muito difícil de ver cenas como esta acontecendo, pois os Estados Unidos estavam oficialmente na Guerra e as pessoas vinham sendo convocadas a todo vapor para servirem o país. A nação estava um caos e todo esse peso da despedida sufocava de uma forma tão grande que por diversas vezes ele sentia que nunca mais conseguiria respirar novamente.
Alguns quarteirões à frente, ele avistou a sua casa e se apressou para chegar até ela, a porta estava entreaberta e isso o assustou um pouco, já que ela nunca ficava assim. adentrou o ambiente, fechando a porta em seguida e passou a olhar para o lado para ver quem poderia estar ali, mas somente quando voltou os olhos para o lado contrário foi que ele viu Margareth, vizinha do casal.
Ela tentou lhe abrir um sorriso, mas era notório que estava preocupada com algo.
― O que está havendo? ― ele perguntou ao sentir o clima tenso.
, Paul foi convocado para a guerra, e ele e a Mag decidiram fugir. ― começou a falar se aproximando dele a passos apressados. Ela o olhou apreensiva. ― Poderíamos fazer o mesmo.
respirou fundo. Ele queria fazer o mesmo, mas sabia que era uma péssima ideia.
― Sinto muito por estar passando por isso, Meg ― voltando o olhar para a outra mulher sentada à mesa, ele começou a falar. ―, e pelo Paul também, mas não acho que fugir seja uma boa ideia.
Margareth se assustou com a resposta dele bem como , que o olhava sem entender.
― Mas o Paul disse que temos mais chance se fizermos isso. ― explicou, Margareth.
balançou a cabeça em concordância.
― Eu o entendo, mas é muito arriscado.
...― tentou o convencer. Ela não conseguia entender porque aquilo era uma péssima ideia.
― Você poderia nos deixar a sós, Mag? ― pediu educado. ― Ficaremos honrados em te receber numa outra hora.
Margareth alternou o olhar entre ele e a esposa, e por fim, sussurrou um tudo bem. Ela caminhou até a porta que abriu para ela e partiu para a própria casa, cabisbaixa.
― Por que não é uma boa ideia, ? A gente foge daqui antes mesmo de eles cogitarem enviar a carta pra você. Quando eles notarem, já estaremos bem longe.
― Não é assim que funciona, amor. ― suspirou. ― Eu sei que você me quer com vocês, sei que quer que tudo fique bem, eu também quero isso, mas acredite, se fugirmos tudo pode dar errado. ― agora de frente para ela, falava segurando em suas mãos. ― Não posso colocar a sua vida e da Grace em risco. Não posso perder vocês.
o olhava com medo da situação e com lágrimas nos olhos. Se sentia pressionada pela circunstâncias e por si mesma que não conseguia descansar já que a ansiedade estava tomando conta dela, ela podia sentir.
― “Nós vamos ficar aqui e vai dar tudo certo”, repete isso comigo. ― pediu, olhando-a carinhosamente. , porém, não conseguia abrir a boca.
Por fim, ela respirou fundo três vezes antes de começar a falar.
― Nós vamos ficar aqui e vai dar tudo certo. ― eles disseram em conjunto.
― Amo você! ― ele disse.
― Também te amo.
Os dois se abraçaram procurando conforto um no outro, afinal sempre foi assim: um era a fortaleza do outro, mas foram interrompidos pelo som de alguém batendo na porta.
beijou a testa da esposa e olhou em seus olhos antes de se separar dela para ir abrir a porta, porém quando o fez, sentiu o coração gelar e a respiração falhar. Dois soldados do exército estavam parados diante dele.
? ― um deles perguntou.
― Sim. ― respondeu, sem nem mesmo saber de onde tirou forças para isso.
― Somos parte do exército dos Estados Unidos e temos algo para você. ― o soldado continuou, estendendo para um envelope branco.
estendeu a mão para recebê-lo e só então notou que estava tremendo, o soldado entregou o envelope em suas mãos e esperou até que o abrisse. Ao fundo, estava estática. Não conseguia ver os rostos dos homens, mas ouvia a conversa.
abriu o envelope sem acreditar que aquilo estava mesmo acontecendo. Era isso, ele lutaria na Segunda Guerra Mundial e partiria dentro de três dias.






― Pai! ― Grace gritava animada, correndo para os braços do pai que acabara de chegar do trabalho. ― Fizemos bolo de chocolate pra você. ― ela contou empolgada.
A menina olhava para o pai com um sorriso enorme que fazia os olhos dela praticamente sumirem e o pai, completamente encantado por ela, não tinha outra opção a não ser acompanhá-la no sorriso.
― Sério? ― perguntou em um tom exagerado de surpresa.
― Aham! ― A pequena concordava freneticamente com a cabeça. ― E adivinha!
― O quê?
― Mamãe me deixou colocar o leite. ― O pai abriu a boca em surpresa. ― Pois é, papai, é que agora eu já sou grande.
, que até então somente observava a cena com o corpo recostado na porta de madeira, soltou uma risada gostosa com a afirmação da filha sendo acompanhada pelo esposo. a olhou sorrindo, mas logo voltou a atenção para Grace.
― Você já é grande que nem o papai?
― Não né, papai. ― Ela revirou os olhos, copiando a mãe que vez ou outra fazia isso. ― Ainda não sou tão grande assim.
― Ah! Tá bom, princesa. ― beijou a bochecha dela. ― Agora será que o papai já pode falar com a mamãe? É que assim que cheguei você veio correndo e não deu tempo. ― Explicou, fazendo bico.
― Pode. ― Grace permitiu, causando risinhos na mãe.
A menininha desceu do colo do pai e foi até a mesa terminar de comer o tal bolo de chocolate que ela passou a tarde toda se gabando por ter ajudado a fazer.
― Depois que terminar, vai escovar os dentes que já está na hora de dormir, filha. ― a avisou, já abraçada a .
― Ah não, mamãe! ― Grace exclamou, tristonha.
― Ah sim! ― Sorrindo, a respondeu, deixando claro a filha que não teria escapatória daquela vez. Se fizesse vontade, era bem capaz da pequena ir dormir somente de madrugada.
Grace nada respondeu e voltou a comer o bolo, agora lentamente.
― Olá! ― cumprimentou o marido com um sorriso no rosto.
Os braços de estavam ao redor do corpo da esposa, enquanto ela lhe abraçava pelo pescoço.
― Oi! ― Ele respondeu animado por finalmente vê-la depois de um dia cheio no trabalho.
Era uma tortura não poder vê-la ou tocá-la.
beijou-lhe os lábios rapidamente.
― Só isso? ― perguntou frustrado. ― Senti sua falta durante todo o dia e é só isso que eu ganho?
gargalhou com o drama do marido.
― Sim. ― Ela respondeu.
― Por que, mulher? ― Ele perguntou com certo desespero na voz. Verdadeiramente o drama em pessoa. ― O que eu fiz?
A pergunta causou mais risos na mulher que lhe deu mais um selinho, não que fosse isso o que ele queria.
― Um beijo de verdade por favor
, sua filha tá logo ali atenta a tudo e nós dois sabemos o quanto ela é esperta.
Ele tirou os olhos da esposa para olhar a filha e a encontrou encarando os dois com um sorriso sapeca no rosto.
― Grace, vai escovar os dentes ― ele mandou com um olhar de súplica, levando a rir mais uma vez.
A mão de fazia carinho no pescoço dele e ela o olhava sorrindo. Um sentimento muito bom estava sobre ela por perceber o quanto o marido ainda fazia questão de tê-la.
A pequena se levantou, fazendo bico com os lábios e passou a caminhar em direção ao banheiro para fazer o que o pai havia mandado.
― Pronto, ela já foi. ― abriu um sorriso que transbordava esperteza. ― Você não tem mais nenhuma desculpa.
revirou os olhos do mesmo jeitinho feito pela filha minutos atrás, mas sorriu no final, aproximando o rosto para mais perto dele. Ela o olhou nos olhos e percebeu que ele a olhava da mesma forma: com intensidade; quase se perdeu neles, a sensação era como se fosse a primeira vez que os lábios dos dois iriam se encontrar. De repente ela se sentia ansiosa e nervosa, e não sabia explicar porque raios aquilo estava acontecendo, de qualquer forma aquilo era bom, muito bom.
Ela sorriu abertamente antes de finalmente o beijar. jura que sentiu o momento exato em que as borboletas se aquietaram dentro de si como se enfim tivessem encontrado sua casa, e realmente tinham, ela sabia.
— Eu tô vendo vocês. — Grace cantarolou parada ao lado da mesa com a escova de dentes em mãos. Com uma das mãos na cintura, ela ria.
se separou de no mesmo instante, mas permaneceu com os olhos fechados, usando mais força para mantê-los assim.
— É agora que eu digo: eu te disse? — Ao abrir os olhos, ela perguntou ao marido.
abriu um sorriso culpado para ela que apenas revirou os olhos em resposta.
— Você já escovou os dentes, mocinha? — perguntou, voltando a fitar a filha que apenas balançou a cabeça em negação.
— Ótimo! Seu papai vai te ajudar e te colocar pra dormir hoje. — Ela voltou a encarar com um sorriso vingativo no rosto.
riu.
— Será um prazer, madame. — Respondeu a esposa, fazendo uma reverência exagerada para ela. — Vamos, meu amor. — Chamou a filha, estendendo-lhe a mão.
— Papai, por que vocês adultos gostam tanto de beijar? — Grace perguntou inocentemente.
— Isso é algo que você só vai descobrir aos 30. — Os dois já estavam próximos do banheiro, mas não longe o suficiente para que não ouvisse a resposta do marido. se deu conta disso quando a ouviu gargalhar.

— Conta uma história pra mim, papai. — Grace pediu, encarando o pai com os grandes olhos pretos brilhando em empolgação.
Terminando de cobri-la com o lençol para que ela não sentisse frio durante a noite, se sentou na cama ao lado da menininha, que o olhava com um olhar pidão.
— Você sabe que eu não sou tão bom nisso quanto a sua mamãe.
— Sei, mas é melhor do que nada. — Ela encolheu os ombros.
gargalhou.
— Você é igualzinha à sua mãe.
— Isso é bom né? A mamãe é incrível!
— Ela é. — concordou, sorrindo.
— Papai? — Chamou o pai, após míseros minutos de silêncio.
— Ahn. — A encorajou a falar.
— A minha história. — Por um instante achou que ela já tinha desistido disso. — Bem que a mamãe disse que você estava ficando velho.
— Eu estou o quê?
— Ficando velho. — Ela repetiu, demonstrando obviedade, mas foi surpreendida pelo pai que avançou em cima dela lhe fazendo cócegas.
— O que você acha do papai ficar deitado aqui com você até você pegar no sono? — Ele perguntou após ela recuperar o fôlego.
— Tá.
se deitou ao lado da filha e ficaram os dois olhando para o teto.
— Podemos imaginar que o teto é o céu cheio de estrelinhas? — Grace sugeriu.
a olhou, encantado.
— E o que mais ele seria? — Perguntou o óbvio, a fazendo sorrir.







A verdade é que tanto quanto passaram a noite em claro, o sono simplesmente não vinha; também depois de uma notícia tão difícil de receber e de aceitar como aquela, como eles poderiam dormir? A única que dormia era Grace que ainda não sabia de nada, mas ambos pretendiam contar a verdade para ela em breve, afinal não havia mais tempo, o grande dia havia chegado.
viu o exato momento em que uma fresta de luz do sol invadiu o quarto em que eles dormiam através da cortina branca. Seu olhar era de quem estava cansado e abatido, o que ele de fato estava, mas percebeu que a situação era muito ruim quando se deu conta de que precisava levantar para partir em breve, contudo ele não conseguia, as suas pernas pareciam não obedecer a ordem dada pela sua mente e ele permanecia deitado sobre a cama. Ele sentiu quando a mão de acariciou os seus cabelos e os lábios dela depositaram um pequeno beijo em sua bochecha. Uma lágrima escorreu do seu olho.
― Hey, ― sussurrou, sua voz denunciava a tristeza que sentia. ― tá na hora de levantar.
voltou os olhos vermelhos para e trazendo a mão dela para próximo da sua boca, a beijou. Ele voltou a olhá-la e ambos mantiveram o contato visual por um tempo; era uma das formas deles para se consolarem.
― Não consigo. ― por fim, confessou com o tom de voz baixo.
― Você sabe que eu adoraria te carregar, mas você é muito pesado. ― Ela tentou animá-lo, sorrindo minimamente ao fim da fala, mas por estar tão triste quanto ele, tudo o que conseguiu foi o fazer respirar fundo.
― Obrigado! ― disse, sabia que aquilo também estava sendo difícil para ela.
Ao ouvi-lo, os olhos dela se encheram de lágrimas, mas antes mesmo que elas pudessem cair, respirou fundo.
― Vai indo pra cozinha. Vou acordar a Grace para tomarmos café juntos e aproveitarmos para contá-la o que está acontecendo.
Reunindo todo o resquício de coragem que ainda estava dentro de si, levantou da cama; primeiro pôs os pés para fora, depois levantou o corpo e finalmente ficou de pé para fazer o que a esposa sugeriu.
se ajoelhou sobre a cama e se aproximou da pequena Grace para a acordar do mesmo jeito que tinha acordado o marido minutos atrás.
― Grace, meu amor, hora de acordar. ― Ela tentava despertar a menina com a voz um tanto quanto embargada devido ao choro que queria sair. A criança, no entanto, só se remexeu, continuando a dormir. ― Mamãe preparou um café da manhã delicioso pra você e agora só estamos te esperando. ― Tentou mais uma vez. ― Vamos, filha. ― acariciou mais uma vez o rosto dela, vendo a menina finalmente abrir os pequenos olhos, tão expressivos quanto os do pai.
Grace podia até ter aberto os olhos, mas não parecia estar acordada, por isso resolveu pegar a filha, ainda sonolenta, no colo e levá-la assim até a mesa, depois de beber um pouco de leite ela deveria despertar. Chegando na cozinha com a filha nos braços, encontrou o marido com a cabeça baixa e o café intocado à sua frente. Uma parte dela queria correr para os braços do rapaz e chorar junto com ele, mas a outra parte a lembrava de que ela deveria ser a pessoa a ajudá-los a passar por esse momento.
― Ela ainda está meio sonolenta, mas vai melhorar depois de comer. ― Comentou, atraindo a atenção de para si.
― Uh-hum. ― Ele murmurou em concordância.
― Precisamos melhorar a nossa cara se não quisermos assustá-la. ― Pontuou , colocando a filha sentada na cadeira que estava entre as deles.
Nenhum dos dois falava com tom de voz alto, mas ambos estavam sussurrando, como se falar normalmente fosse furar a bolha em que eles estavam.
― Não sei como contar para ela.
― É só falar a verdade, só que do jeitinho que você sempre explica as coisas difíceis para ela. ― explicou. ― Às vezes você sabe falar com ela melhor do que eu. ― Sorriu minimamente. ― Você consegue, amor.
pegou o copo com leite que ela já havia posto para a filha e tocou no braço da menina, que estava debruçada sobre a mesa com os olhos fechado.
― Grace, olha pra mamãe. Você precisa comer. ― despertou a filha, voltando a falar em um tom normal, e recebeu um murmúrio incompreensível em resposta. ― Toma o seu leite. Você também precisa comer, .
Ele concordou com a cabeça, bebendo um gole do café em seguida.
― Vou sentir saudade desse café. ― comentou.
, é só café.
― Não, é o café que só você sabe fazer. — Ele dizia, sincero. — Vou sentir falta.
Ouvi-lo declarar algo tão profundo e simples foi o bastante para fazê-la sorrir, mas também para quebrar a barreira fortificada que ela insistia em manter, liberando assim as lágrimas outrora presas. Mediante isso, se apressou em se levantar para abraçá-la e, para poder retribuir a ação, também se levantou e se jogou aos braços dele.
acariciava os cabelos da esposa enquanto a mesma o abraçava com força pela cintura, ambos sendo observados atentamente pela filha, agora mais desperta.
— Por que vocês estão chorando? — Grace questionou confusa e preocupada. Raramente via os pais chorarem e vê-los assim a assustava.
— Tá na hora. — falou para a esposa ainda abraçado a ela.
se afastou dele, levando as mãos ao rosto para secar as lágrimas e balançou a cabeça para demonstrar que concordava com o que ele disse. Daqui a pouco teria que partir e a pequena Grace precisava saber a verdade.
— Filha, papai e mamãe têm uma coisa importante para te contar. — iniciou.
Grace os olhava com curiosidade, esperando que o pai continuasse a falar.
— Lembra que a gente te disse que estava acontecendo uma coisa séria de adulto aqui bem pertinho da nossa casa?
— Mas não era tão perto que pudesse me ferir. — Ela completou.
— Isso mesmo, meu amor. — concordou.
se ajoelhou em frente a filha, olhando-a com carinho. Ele sempre achou que as crianças são seres incríveis, mas a sua pequena Grace era especial. Ela era extraordinária.
— Acontece que agora o papai vai ter que ir ajudar os amigos a vencerem essa coisa de adulto.
— É tipo as lutas das historinhas que a mamãe conta?
— Isso, filha, só que maior. — abriu os braços para dar ênfase ao que dizia, fazendo a filha abrir a boca, surpresa.
— Uau, papai! Então você é o herói que vai vencer os vilões?
— Espero que sim. — Ele a respondeu com um meio sorriso nos lábios.
— Que legal, papai! — Exclamou, empolgada. — Traz presente pra mim? — Grace perguntou, inclinando a cabeça para o lado, enquanto abria para o pai um sorriso pidão.
riu tristemente, e precisou enxugar a lágrima que escorria pelo seu rosto.
— Hey, pequena, vem cá. — Ele chamou a filha para os seus braços. — Vou sentir muita saudade de você. Não consigo ficar longe de você, você sabe.
Grace sorriu e pensou que nunca a tinha visto sorrir daquela forma antes. Estonteante.
— Vou sentir sua falta também, papai. — Grace disse, abraçando o pai em seguida.
não queria soltá-la nunca mais, por isso continuou a segurando em seus braços até a menina se mexer incomodada.
— Tô sufocando. — Ela disse, causando risos nos pais.
Não demorou muito para que ouvissem o som de buzina soar duas vezes seguidas e soube que era hora de partir. Ele olhou pesaroso para a esposa, que começou a chorar e caminhou ao encontro dela para se despedir.
— Promete que você vai ficar bem mesmo se eu não voltar. — Ele pediu a olhando firmemente nos olhos.
começou a falar com a voz embargada, mas ele a interrompeu.
— Não quero você sofrendo por minha causa. Nossa filha precisa de você.
— Você vai voltar logo. — Ela rebateu, olhando-o de forma tão intensa quanto ele a olhava.
Sem mais delongas, a beijou como se fosse a última vez que faria aquilo, e o beijo se misturava com as lágrimas que ambos derramavam.
partiu o beijo para poder olhá-la mais uma vez.
— Eu te amo! — Ele declarou.
— Eu também te amo.
Mais uma vez eles ouviram o som da buzina e sabia que deveria ir logo. Ele olhou novamente para e para a pequena Grace, agora ao lado da mãe; a verdade era que não sabia como se despedir delas, por isso ele abriu um pequeno sorriso, que contradizia as lágrimas nos seus olhos, e se virou, partindo porta a fora em direção ao carro.
O choro escapou no momento exato em que o veículo partiu para a estação de trem e ficou pior quando ele finalmente pôde sentar na poltrona do trem que o levaria junto com outros homens para o local do qual ele não sabia se voltaria vivo. Foi durante a viagem que sentiu sede e abriu a mochila em busca da garrafa com água que ele trouxera de casa, mas além do que procurava ele encontrou um envelope branco totalmente liso. Curioso, o abriu, encontrando um papel riscado com a letra daquela que lhe arrancava suspiros todas as vezes em que ele a via.
Com os olhos cheios de lágrimas e já prevendo o que viria a seguir, começou a ler a carta que escrevera:

Querido ,

São quase 4h da manhã e eu sei que você está acordado olhando para
a parede a sua frente sem conseguir pegar no sono. Você está tão
compenetrado na sua dor que nem notou quando me levantei para vir
em direção a cozinha, mas eu entendo, meu amor, sei que ter que
deixar a sua família e submetê-la a um futuro tão incerto como este te
assombra ao ponto de partir o seu coração em milhares de pedacinhos,
mas sei também que não vai conseguir fazer o que precisa fazer se
continuar tão preso a nós como está. Eu te amo, ,
mas preciso que transforme toda essa dor em força, a qual te fará voltar para nós.
Nós vamos ficar bem, meu amor. Vou continuar cuidando das nossas coisas,
Grace vai continuar te amando loucamente, e nós duas ficaremos bem aqui te esperando.
Não enfrentei os meus pais e o meu irmão controlador para te perder agora para uma guerra idiota;
sim, idiota, porque qualquer coisa que tente te tirar de mim não pode ser considerada nem um pouco
menos do que estúpida. Mas esse é o ponto, meu amor, ela não vai conseguir nos separar porque nós
pertencemos um ao outro, . Você sempre será meu e eu sempre
serei sua. Você tem pra quem voltar, , e eu não poderia estar mais
orgulhosa de você que nos ama tanto ao ponto de se recusar a fugir só para não nos pôr em risco.
Você é forte, bondoso, o homem mais carinhoso que eu já conheci e um pai incrível para a nossa filha;
eu não poderia ter escolhido alguém melhor para ser meu marido. Nunca me esquecerei do dia que bateu
na porta da casa dos meus pais disposto a me pedir em casamento. Tão forte e confiante!
Você não é qualquer um, , então não deixe a guerra tomar isso de você.
Nós somos a sua família, meu amor, e estamos aqui por você,
te esperando.

Com amor,
.







Fim.



Nota da autora: Por pouco eu achei que não conseguiria entregar essa história incrível para vocês, mas eu tô tão feliz por escrevê-la. Assim que bati o olho na capa, a história toda simplesmente veio junto, e realmente espero que eu tenha conseguido passar tudo aquilo que eu queria e que esse casal inspiração merecia. Apesar dela ser oneshot, escrevê-la foi intenso e eu tenho a sensação de dever cumprido.
Espero que amem essa família tanto quanto eu e voltem sempre aqui para lembrar deles.

Um beijo
Nos vemos na próxima
xoxo

*Não esquece de dar uma passada lá na minha outra história, Oldest Love (link ali embaixo). Vou amar te encontrar por lá :)






Outras Fanfics:
Oldest Love
Originais – Em Andamento


Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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