The Truth Untold

Última atualização: 04/08/2024

Prólogo

2013 – Em algum lugar afastado da cidade.
O último raio de Sol atravessava a imensa janela da biblioteca, pintando o céu de um tom alaranjado que lembrava uma obra de arte. Charlottie guardava na bolsa o livro que usava minutos atrás para estudar, a última aula do dia tinha acabado há algumas horas e a garota tinha resolvido passar o dia na biblioteca. No entanto, sua irmã, , já tinha ligado inúmeras vezes dizendo que estava esperando-a com os doces favoritos das duas e uma maratona de filmes de desenho para assistirem e comemorarem o fim das provas e o início das férias.
Seus pensamentos foram interrompidos quando uma nova mensagem apitou no celular, que agora estava em suas mãos. Antes mesmo de ler a mensagem ela revirou os olhos, imaginando que fosse novamente a irmã, mas na barra de notificações estava escrito o nome do namorado e uma mensagem que dizia que ele a estava esperando no campus para levá-la em casa.
Os lábios da garota se curvaram em um sorriso e os passos se apressaram para que chegasse ao portão de saída o mais rápido que conseguisse. Charlottie e Jeon Sun se conheciam a pouco tempo, os dois cursavam direito na renomada faculdade de Busan e desde que seus olhares se encontraram pela primeira vez sabiam que o destino dos dois estava cruzado, e que de fato coincidências não existem, pelo menos não para eles.
Os longos cabelos de Lottie balançavam com o vento e caíam em cascatas por suas costas enquanto caminhava até o namorado, o sorriso nunca abandonando os lábios e o coração sempre palpitando pelas lembranças dos bons momentos. Os olhos se apertaram um pouco quando ao longe ela reconheceu a figura alta de cabelos também longos, e seu inseparável casaco preto, que esperavam-na. Pôs-se a caminhar mais rápido e em poucos segundos deixou seu corpo colidir ao dele num abraço apertado, o cheiro de sândalo e menta invadiu seus sentidos e ela afundou a cabeça nos ombros largos de Sun, deixando que todo o peso do dia se dissipasse naquele abraço. Ele, por sua vez, serpenteou a cintura dela com as mãos, abrindo um largo sorriso ao sentir o coração dos dois batendo no mesmo compasso como se funcionassem melhor juntos. Definitivamente o encontro dos dois não era e nunca tinha sido uma coincidência.
— Oi, Sun. — Sussurrou a garota com os lábios bem próximos ao ouvido dele, deixando um selar em sua clavícula, para finalmente conectar seus olhos aos dele.
— Hey, Lirio. — O brilho nos olhos do garoto se misturava com o brilho das estrelas que decidiram aparecer naquela noite. Jeon passou o braço pelos ombros da menina para que eles pudessem começar o caminho para a casa dela. — Vamos? Meu irmão já me ligou inúmeras vezes me perguntando se eu já cheguei em casa. Mesmo ele estando longe, ainda se preocupa com o horário que eu vou chegar em casa. — Murmurou, trazendo Lottie para mais próximo de seu corpo à medida que cruzavam as ruas de Busan.
já fez o mesmo comigo, me disse que está me esperando com doces e filmes para comemorarmos o fim das provas. — Uma risadinha escapou pelos lábios da loira e ela acomodou sua cabeça no ombro do namorado.
O céu estrelado iluminava o caminho do casal, a brisa suave de uma noite de verão deixava o ar mais fresco, e talvez por estarem tão distraídos não notaram uma figura estranha que os observava com os olhos de águia desde que saíram da biblioteca. Nem mesmo as estrelas no céu forma capazes de avisar ao jovem casal que o perigo estava muito mais próximo do que poderiam imaginar.
O relógio da pequena igreja marcava exatamente meia-noite, o sino soava estridente aos ouvidos dos mais novos, o som abafava perfeitamente o barulho de passos atrás deles, passos apressados e urgentes que buscavam chegar o mais rápido que conseguisse ao casal que caminhava tão despreocupado.
Poucas vezes de fato nos perguntamos: qual é o sentido da vida ou o que nos mantém vivos? Qual o nosso propósito? Por ser complexo demais, apenas seguimos uma rotina e esperamos até que não seja possível mais existir o sopro de vida que nos mantém aqui. Charlottie nunca parou para pensar na morte e costumava até mesmo dizer que não tinha medo de quando sua hora chegasse, mas quando um arrepio correu por sua nuca e acelerou seu coração ela soube que talvez não estivesse tão pronta assim como costumava dizer.
Os olhos esverdeados e assustados da garota buscaram frenéticos o indício de que estavam seguros, mas, contrariando suas expectativas, a garota conseguiu ver a sombra de alguém se esgueirando para mais próximo deles, um grito mudo ficou preso em sua garganta e ela voltou o olhar para Sun, que havia percebido a agitação da menina.
Não havia tempo, não tinha para onde correr, esses pensamentos martelavam insistentemente na cabeça de Charlottie, mas foi quando a figura mascarada se aproximou que ela implorou para que o tempo fosse apenas uma anatomia da linguagem, uma metáfora inclusa de alguém que gostava de brincar de controlar. Mas ele não era e, naquele momento, o tempo mudou a história de um jovem casal.
Não houve gritos, não houve barulho, era como o cair de uma pétala de rosa que abandona o caule, morrendo no chão sem o suprimento que a mantem viva. Assim também foi com Jeon Sun e Charlottie Wheeler.
A história interrompida, sem um final e escrita por linhas tortas terminou para ambos, deixando para trás sonhos e juras de amor sussurradas ao vento, lembranças de um passado longínquo e a dor de um futuro interrompido.
Foi naquele 03.13.2013 que Jeon e Wheeler experimentaram a mais profunda dor, a terrível consequência de uma fatalidade que mudaria para sempre o rumo de suas próprias histórias, mas que traria a eles, em meio a tanto caos, a surpresa de um futuro incerto, mas que poderia curar as feridas que outrora foram abertas com o tempo.
Naquela noite, na cidade Busan, Jeon Sun e Charlottie Wheeler suspiravam pela última vez o sopro da vida, e arrancavam, levando consigo, parte do coração de seus irmãos, mas os deixava uma conexão de almas que nem mesmo os maiores roteiristas de romance seriam capazes de escrever.

“Estive prestes a desistir, mas, então, você surgiu. Vejo nova esperança no meu caminho e sinto que o frio não vai mais tomar a minha alma. O calor que trouxe não pode mais ser extinto em mim.”

Capítulo 1 – BUTTERFLY

“will you stay by my side?
If i let you go... you’ll fly and break?
I’m scared”

Resumo: dias de frio, um caso reaberto e sentimentos desconexos
Seul 2023 – dez anos depois do acidente.
Aeroporto internacional de Incheon

Da pequena janela do avião podia observar a imensidão azul do céu, os olhos colados na paisagem que se desenrolava entre as nuvens brancas que mais pareciam algodão, os pensamentos longe demais, presos a uma esperança de que talvez as coisas fossem melhores dali para frente, afinal, já haviam se passado dez anos, nada mais estaria igual, a única coisa que permanecia era a saudade de Charlottie, coisa que nem mesmo o tempo conseguiu apagar.
Dez anos... Em dez anos, tanta coisa havia mudado. Wheeler agora era conhecida como a maior criminalista do estado de Nova York. Havia se formado com êxito na faculdade e liderava a maior equipe de investigação da delegacia, mas carregava consigo a culpa por nunca ter conseguido resolver o mistério do assassinato de sua irmã. Talvez o tempo fosse uma piada, ou ele apenas gostasse de brincar com ela; dez anos e nenhuma pista, nenhum sinal, nada, absolutamente nada.
A voz do piloto anunciou que apertassem os cintos, pois iriam pousar. Um suspiro sôfrego escapou por seus lábios e ela fez o que fora dito, apertando os cintos e recostando a cabeça no assento. Por breves segundos, fechou os olhos e o sorriso de Charlottie inundou sua mente, como o cair de água numa cachoeira ou a visão de um pôr do Sol num dia de primavera. Era assim que ela estaria para sempre marcada em suas lembranças e tinha prometido que faria de tudo para encontrar o culpado; mesmo que demorassem anos, ela o encontraria e o faria pagar por ter tirado de si a sua própria versão de um solstício de primavera.
A garota sentiu o solavanco do avião quando ele finalmente pousou e com as mãos trêmulas ela pegou a bolsa que descansava ao seu lado, colando-a em seu corpo. Demorou mais do que o necessário na passarela que a levaria de volta para a realidade, mas não importava mais, ela estava ali e sabia que já estava esperando há pelo menos uma hora no aeroporto. Sabia também que o humor do melhor amigo não estaria dos melhores, mas que ele colocaria um sorriso no rosto por finalmente tê-la de volta em casa.
Ao longo dos anos, entendeu que lidar com a dor e a culpa era um processo doloroso, e que nem sempre ele teria um final feliz. Por anos, ela entendeu que se trancar para o mundo e fugir de todo e qualquer contato com o passado era o melhor a se fazer. Mas o passado é como um soneto sem final, antigo e esquecido no fundo de um livro, aquele que as palavras se misturam e perdem o sentido e, para a Wheeler, o passado nunca teve um final, se perdeu nas entrelinhas de sua vida, mas nunca deixou de acompanhá-la, nem mesmo quando ela fugiu; ele a seguiu como as folhas que caem de uma árvore e pintam o chão de laranja no outono.
Por isso, Wheeler estava de volta, estava sentindo o coração palpitar como quando voltava de férias da casa de seus avós e reencontrava ou ganhava algum doce de , mas dessa vez ele batia descompassado e não de alegria. Era doloroso estar de volta depois de anos longe, mas tinha dito que precisava de ajuda e ela não negaria, ela nunca negava de qualquer forma, e foi com esse pensamento que finalmente ela colocou os pés no aeroporto de Incheon; ela finalmente estava de volta.
Agora, o caminhar da garota era um pouco mais apressado, as mensagens carregavam rapidamente em seu celular e já tinha deixado claro que estava esperando por ela há algum tempo. Corria os olhos por toda a extensão do enorme aeroporto para ver se avistava o amigo, e quando o encontrou, ela deixou um sorriso verdadeiro moldar seus lábios.
segurava um cartaz com glitter rosa, escrito “bem-vinda de volta, e se sentiu feliz pela primeira vez em muito tempo. Sabia que o passado ainda a assombraria, ainda mais estando na cidade onde tudo aconteceu, mas ter o melhor amigo de volta era um sacrifício que valia a pena passar.
Tirada de seus pensamentos por dois braços que rodearam sua cintura e a tiraram do chão, a garota deixou escapar um gritinho, mas logo rodeou seus próprios braços no pescoço de , o abraçando com toda a saudade dos anos longe.
— É bom ver você, . — O mais alto sussurrou, a colocando no chão novamente. — Senti sua falta, tampinha. — Umas das mãos dele encontrou a bochecha macia da amiga e ele deslizou o polegar num carinho tranquilo pela região.
— Eu também senti sua falta, . — Ela respondeu no mesmo tom, sentindo o carinho em sua bochecha, os olhos fechados e a sensação de finalmente estar em casa.
Os dois caminharam em direção ao carro do mais velho, e mesmo que anos tivessem se passado, Amélia sentia como se nunca tivesse deixado para trás.
— OK, OK, agora que passamos o momento de melação, me conta: por que precisam de mim pra resolver um caso que era seu? — A garota se acomodou no banco do carona e colocou o cinto ao se sentar, recebendo um sorriso gengival do amigo em resposta.
, eu não queria ter te dito por telefone, e por isso pedi que viesse. — O tom de hesitação na voz do melhor amigo, assustou Amélia.
— Sem enrolações, , eu já estou aqui... dez anos depois, não é como se eu fosse uma bonequinha de porcelana. — Ela voltou o olhar para o mais velho e sentiu o coração palpitar. Talvez ela fosse uma bonequinha de porcelana.
As ruas passavam lentamente pelos olhos de Amélia, o coração tamborilava no peito desenfreado, qualquer coisa que saísse dos lábios de não seriam apenas palavras. Segundos depois, foi como se o mundo tivesse parado ao ouvir claramente a voz do outro sussurrar.
— Reabriram o caso da Charlottie.
Os olhos da loira se fecharam e ela levou as mãos ao peito, sentindo as pontadas firmes do coração.
— Como? ¬— Sua voz soou baixa até mesmo para seus ouvidos. — Por que agora? — Voltou o olhar para o amigo e deixou que ele entrelaçasse sua mão à sua.
— Nós ainda não sabemos, por isso queria que estivesse aqui, você tem a chance de fazer diferente, mas vou entender se não quiser se envolver. — Ele murmurou apreensivo.
— Vamos fazer isso, afinal, eu esperei dez anos para ter essa chance. — Respondeu ela com convicção.
— Certo, eu vou estar ao seu lado, . — deslizou o polegar suavemente pela mão macia da garota. — Descansa um pouco, estamos indo até a delegacia de Busan, eu te acordo quando chegar.
Amélia fechou os olhos e se deixou embalar pela escuridão, trancou a fundo seus sonhos e pediu para que tivesse forças para conseguir enfrentar seu maior pesadelo novamente. A destra alcançou seu coração que doía como se estivesse escutando novamente a notícia da morte de sua irmã, algumas lágrimas caíam de seus olhos e antes de adormecer por completo, ela apertou com força o peito desejando que aquela dor fosse embora.

Horas antes – Lotte Hotel, quarto 216
O quarto estava escuro, coberto por uma atmosfera melancólica exatamente igual à dos últimos dez anos em que essa data se repetia. Sob a cama, um corpo adormecido repousava, um sono agitado e coberto de angústia.
O relógio ao lado da cama marcava exatamente seis da manhã, o tempo exatamente igual ao do fatídico dia, mas uma diferença era gritante: o corpo repousando sob a cama revivia as memórias, não tinha sido ele. Por mais que nas incansáveis noites de terror ele tivesse implorado para que fosse.
Uma batida na porta fez com que o garoto de cabelos negros se remexesse na cama e um muxoxo descontente escapou por seus lábios. Outra batida o fez despertar assustado, despertar de mais um, dos inúmeros pesadelos. Com os pés descalços, ele tocou o chão e se apoiou na parede ao lado da cama para se levantar, sentiu o mundo girar embaixo de seus pés e se amaldiçoou lentamente por ter bebido demais na noite anterior. Levou uma das mãos ao estômago, tentando segurar o pouco que tinha comido ali e, tateando as paredes, caminhou até a porta do quarto, abrindo-a em seguida.
— OOF — O som escapou dos lábios pouco carnudos do rapaz de cabelos platinados, que segurou o corpo centímetros menor que o seu que acabara por cair em seus braços quando a porta abriu. — Hey, . — Ele sussurrou, rodeando os braços na cintura alheia.
— Oi, hyung. — O mais baixo respondeu, levantando o olhar e assustando o mais velho.
— O quanto você bebeu? — Perguntou com a voz firme, o ajudando a chegar novamente até a cama. — Isso não pode continuar assim, cara, é a terceira noite seguida. — Acomodou o mais novo na cama e se ajoelhou à sua frente segurando as mãos geladas e trêmulas do outro.
— Aparentemente não bebi o suficiente pra esquecer que dia é hoje, hyung. — Os olhos pequenos e agora carregados de lágrimas se voltaram para figura à sua frente. era sempre a única pessoa que permitia que o visse tão vulnerável.
, eu sei, mas olha só pra você, nós temos uma entrevista daqui a pouco e você mal se aguenta em pé. — murmurou, massageando as mãos do mais novo com o polegar. Ainda que a represália tivesse sido feita por conta do trabalho, o mais velho se preocupava muito mais em como estava seu maknae do que com qualquer entrevista que fosse.
— Eu... eu só vou tomar um banho e um café e já vou estar pronto para essa entrevista. — Disse o garoto se levantando da cama.
Ainda um pouco zonzo, caminhou até o banheiro, encostando a porta e deixando para trás um com o coração aflito por vê-lo naquele estado novamente. , por sua vez, se acomodou na cama e esperou até que o outro saísse do banheiro.
engoliu em seco ao ver sua imagem no espelho. Mesmo após o banho as olheiras ainda estavam visíveis, os lábios um tanto pálidos e era nítido que ele tinha perdido peso, sua maquiadora teria trabalho, e com esse pensamento, saiu do banheiro, se assustando quando viu que seu amigo ainda estava ali.
— Hyung, eu não vou passar mal, pode ir pro seu quarto nos encontramos na mesa do café. — Murmurou vestindo uma camisa preta que estava perdida no canto do quarto.
— Eu sei que não, mas precisamos conversar. — O mais velho respondeu guardando o celular no bolso. Um suspiro escapou por seus lábios, ele sabia que a mensagem que tinha acabado de receber deixaria ainda mais abalado.
Os olhos em formato de jabuticaba de repousaram sob a figura alta de que caminhava até si, um aperto no peito lhe dizia que o que quer ele fosse ouvir não seria nada bom. Vestiu rapidamente a calça de moletom que segurava nas mãos e sustentou o olhar do outro, esperando ansioso para que ele falasse.
levou as mãos aos olhos e se colocou à frente do mais novo, a destra alcançou o ombro de e ele a repousou ali.
Antes que qualquer notícia pudesse ser dada, levou a destra até o peito, apertando-o com força, sentiu as pernas fraquejarem e se apoiou na figura à sua frente para que não caísse. O peito latejava de maneira incessante, um pulsar agonizante e desesperado, fazendo com que um gemido de dor escapasse por seus lábios; os dedos estavam brancos de apertar os braços de e a respiração entrecortada demonstrava seu desconforto.
Foi então que ele reconheceu aquela sensação. Dez anos haviam se passado, mas ele se lembraria dela como se fosse a primeira vez que estivesse sentindo. Uma pequena lágrima deslizou por sua bochecha e ele fechou os olhos, se sentindo tonto. Ele só poderia estar sonhando, não era possível, nada, ele não tinha sentido nada até agora e como num passe de mágica é como se nunca tivesse parado de sentir.
O mais velho o observava em choque, sentiu o mais novo amolecer em seus braços e pensou que ele poderia desmaiar a qualquer momento, rodeou os braços na cintura alheia e tentou chamar algumas vez o garoto, sem sucesso. Seu próprio coração parecia disparado; de todas as vezes que o outro tinha exagerado na bebida, em nenhuma delas ele chegou a de fato desmaiar em seus braços no dia seguinte.
, cara você tá me assustando, o que você tá sentindo? — Perguntou num tom urgente, enquanto o colocava sentado na cadeira.
Alguns agonizantes minutos se passaram até que conseguisse se recuperar para então falar com seu hyung.
— Eu tô bem, hyung, não se preocupa. — Murmurou encostando sua testa no ombro do mais velho.
— Como não me preocupar você praticamente desmaiou nos meus braços sem mais nem menos? Fica aí, eu vou pegar seus sapatos e nós vamos ao médico. — O de cabelos platinados andava pelo quarto um tanto desesperado, enquanto achava o tênis e as meias do mais novo.
— Hyung, não precisa de médico. — sorriu com a preocupação do amigo e se levantou, caminhando até ele. — Foi só um mal-estar, eu não comi muito ontem. Vamos comer, você ainda precisa me falar o que está acontecendo. — Pegou as meias, vestindo-as e calçando os sapatos em seguida.
Ele sabia que não era um mal-estar, mas não podia verbalizar o que tinha sentido, não quando o mais velho já estava mais do que preocupado com sua saúde.
— Um dia você ainda vai me matar do coração. — Resmungou, mas suspirou aliviado ao constatar que a cor das bochechas de tinha voltado ao normal. — Vamos tomar café e a gente conversa, não quero correr o risco de você desmaiar aqui.
Uma pequena risadinha pôde ser ouvida de e ele passou a caminhar lado a lado com o mais velho, um silencio confortável se instalou entre os dois.
Os dois caminharam até o restaurante do hotel onde estavam hospedados e fez questão que o mais novo comesse tudo antes de dar a notícia que ele sabia que seria um balde água fria para .
— Tudo bem, hyung, agora que você já me encheu de comida e já viu que eu não vou passar dessa pra melhor, o que é que você tinha pra me contar? — Perguntou ele, ajeitando um fio teimoso que caía em seus olhos.
respirou fundo algumas vezes, mordeu o lábio brincando com a pele que soltava até encontrar a coragem para encarar os olhos do mais novo, que mais lembravam uma jabuticaba.
— Não tem como ser leve, então aí vai: reabriram o caso do Sun, . — O de cabelos platinados crispou os lábios ao encarar e notar que a pouca cor de seu rosto desaparecia lentamente.
O barulho ao redor parecia alto demais, o tintilar dos talheres se misturava com os pensamentos pulsantes do Jeon. Dez anos, fazia dez anos que ele queria um ponto final ou um final diferente, fazia dez anos que ele almejava finalmente entender o que tinha acontecido naquele dia, mas fazia dez anos que ele desejava que nada daquilo tivesse passado apenas de histórias que cobriam as páginas de um livro. E agora, quando a ferida estava reaberta novamente, eles decidiram que queriam cumprir o papel que deveria ter sido cumprido há dez anos.
Uma risada sarcástica escapou pelos lábios do Jeon, quase como se ele não pudesse acreditar que teria de reviver aquele dia mais uma vez.
— E por que agora, hyung? — A voz saiu entrecortada.
— Alguém decidiu brincar de detetive na madrugada passada e eles encontram uma nova pista. Eles estão esperando por nós na delegacia, o detetive será o responsável pelo caso, e tem mais. — Um suspiro pesaroso escapou pelo lábios, agora secos, de . — A irmã da segunda vítima também está aqui.
— Eu vou realmente precisar entrar em coma alcoólico depois de hoje. — Os olhos de não mentiam, brilhavam com as lágrimas que ele tentava em vão conter, e mostravam a decepção e o desespero de ter que viver o trauma. — Vamos para essa entrevista logo, e vamos para a delegacia assim que ela acabar.
suspirou novamente enquanto eles se dirigiam até o carro. Ele, mais do que ninguém, sabia o quão difícil tinha sido tirar da escuridão que os dias após a morte de seu irmão o trouxeram e ele não sabia se seria possível salvá-lo novamente. Contava com os deuses que sim.

Capítulo 2 - TURBULENCE

“Maybe I'm still too young Hover the black night sky
Impatience made a turbulence and it distorted us
It's falling, waterfall (It's falling, waterfall)”

Resumo: um encontro não tão agradável na delegacia, sentimentos desconexos e a dor de uma história sem final.
Algumas gotas de chuva batiam incessantes na lataria do carro. Os vidros embaçados carregavam consigo a imagem refletida de Amélia, as mãos descansavam em seu colo, os olhos fixos no caminho a sua frente, enquanto vez ou outra desviava o olhar em sua direção, ela sentia o quanto ele estava preocupado.
estava familiarizada com delegacias, afinal, em sua profissão passava a maior parte do tempo em uma do que em sua própria casa. Sentia as mãos tremerem ao ver os prédios de Busan passarem como vultos enquanto eles iam até a delegacia da cidade, seu peito batia descompassado e ela queria apenas fugir, mas já tinha fugido tempo demais e Charllotie merecia um final digno.
Quando estacionou em frente ao pequeno prédio, mais uma vez lançou um olhar preocupado a Amélia.
— Eu tô bem, , já estive aqui antes, vamos resolver isso logo. — Um pequeno sorriso moldou os lábios dela, mas era um sorriso que não alcançava os olhos, aquele que ela usava apenas quando queria enterrar a fundo o que de fato estava sentido.
Os dois caminharam a passos lentos até a mesa que ocupava. Amélia se sentou em uma das poltronas vazias e olhou em volta.
— Então você finalmente conseguiu sua própria sala, ? — A loira perguntou em um tom de brincadeira.
— Sim, uma sala só minha e um departamento para comandar. Preferia ter ficado sem a sala. — se sentou à frente de Amélia e um sorriso ladino desabrochou no canto de seus lábio. — Mas ser o chefe tem suas vantagens, até porque você está aqui, não é mesmo?
sorriu verdadeiramente com o comentário. Estar com deixava seu humor melhor, não era à toa que ele era seu melhor amigo.
Antes que ela pudesse responder algo, uma batida na porta os tirou do mundinho onde problemas não existiam e a voz aveludada da secretária anunciava que o irmão da outra vítima tinha chegado. Imediatamente buscou pela mão de e trilhou um carinho com o polegar ali, numa pergunta silenciosa se ela estava bem. Ela apenas acenou com a cabeça, se colocando de pé para receber os rapazes.
Um rapaz de cabelos castanho-escuros entrou na sala, e apesar do sorriso estar estampado em seu rosto, notou as olheiras, ainda que claras, embaixo dos olhos, e a forma como ele brincava com os dedos de maneira nervosa... era como se os dois compartilhassem os sentimentos que pairavam no ar.
foi o primeiro a se aproximar do rapaz de cabelos platinados, eles pareciam se conhecer, pelo sorriso amigável que nasceu nos lábios do mais velho.
, que bom que você veio, uma pena nos reencontrarmos nestas circunstâncias. — Murmurou, estendendo a destra na direção de , que prontamente o respondeu.
, bom te ver. — A resposta veio acompanhada de um suspiro quando o mais alto correu os olhos pelo cômodo e parou no garoto que parecia querer se esconder em seu próprio corpo, desejando tanto quanto estar ali. — Esse é , é a primeira vez que ele tem que lidar diretamente com este assunto.
Os olhos de se voltaram para carregados de compreensão e preocupação. Sabia que a garota já tinha lidado com casos difíceis, casos que pareciam até mesmo impossíveis aos olhos de outras pessoas, mas nenhum deles tinha tirado a vida de sua irmã. Ele caminhou até ela e sua destra achou o caminho de suas costas, deslizou suavemente a mão pelas costas de , indicando que ele estava ali, antes de apresentá-la.
— Esta é , ela é irmã da Charlottie, e está aqui não só como parente da vítima, mas como minha assistente neste caso. — Os olhos curiosos de encontraram os de e ela notou um pequeno sorriso, ainda que não alcançasse seus olhos, surgir no cantinho dos lábios dele.
Os quatro se sentaram na sala e ouviram atentamente o que dizia. Ele explicava com detalhes o porquê de terem reaberto o caso, o que deixava e ainda mais intrigados.
— Há uma semana nós recebemos um bilhete misterioso, alguém dizia ter estado no mesmo local que Charlottie e Sun, uma testemunha ocular concluímos, e ele foi além, ele nos levou a uma outra cena de crime, o que indica que os dois foram atingidos em frente à igreja, mas não foram mortos lá. — analisou a expressão de e antes que pudesse perguntar algo ele continuou. — Nossos laudos periciais se mostraram um tanto insatisfatórios a respeito da causa da morte, quase como se alguém estivesse tentando esconder o que tinha acontecido. Nós queremos fazer uma reanálise nos corpos, mas é aí que vocês, como família, entram em cena, precisamos de autorização para que possamos realizar a exumação e proceder com a investigação.
apertou as laterais da cadeia, tentando manter a compostura. Quem quer que estivesse por trás disso, estava brincando de detetive ou poderia ser alguém que estivesse envolvido no crime, mas que não apareceu em cena ainda, como um fantasma que caminhava pelas sombras, sem deixar rastros aparentes, mas pequenos e fragmentados vestígios num enorme quebra-cabeças.
— Certo, eu aceito, com uma condição. — respondeu. — Desde que eu esteja presente quando a nova perícia for realizada.
Os olhos dos três homens se arregalaram e foi o primeiro a se recuperar do choque, encarou a amiga, agora parceira, com um semblante nublado que demonstrava o quanto ele estava preocupado.
, você não precisa fazer isso, nós temos uma equipe preparada para esse tipo de situação. — Ele tentou argumentar, mesmo sabendo que era em vão.
— Eu sei que sim, mas eu estou aqui para colocar finalmente um ponto final nessa história e é isso que eu vou fazer.
, que até então estava sentado em sua cadeira, apenas observando a conversa, decidiu que aquele seria o momento perfeito para falar. Ele tinha prometido a si mesmo que se manteria em silêncio, já que não se sentia pronto para falar qualquer coisa que fosse, mas ele sabia que estava certa, e ainda que a tivesse visto pela primeira vez minutos atrás, ele sabia que podia confiar nela, não que ele pudesse explicar tal certeza, mas ele sabia que podia.
— Eu concordo e aceitarei que seja feita a exumação do corpo do meu irmão, apenas se a detetive estiver presente. — Sua voz saiu um tanto quanto baixa até mesmo para seus ouvidos, mas pelos olhares que recebeu em troca ele sabia que tinha se feito entender.
e trocaram olhares um tanto preocupados, por saber que seu garoto não era tão forte como aparentava ser, mas que ele iria até o fim por respostas. Já estava orgulhoso de , ainda que estivesse receoso pelo que o futuro reservava aos dois.
— Se é assim, então temos um acordo, aviso vocês quando tiver a confirmação da liberação e aí a detetive seguirá como responsável por esta parte do caso.
Os quatro saíram da sala de com os semblantes cansados, mas uma chama de esperança crescia no peito de . Ainda que o caminho fosse difícil agora, ela teria uma direção pelo menos.
olhava de soslaio para . O mais novo caminhava à frente com os ombros baixos e uma expressão cansada no rosto, e sabia que teria um caminho periculoso pela frente. A morte do irmão de , ainda que dez anos depois, mexia demais e o deixava abalado, e tinha medo do que eles teriam que enfrentar.
Os sons do vento cortando as árvores inibia o som mudo dos pensamentos de . Era como se um vendável borbulhasse dentro dela, mas um vendaval que a deixava confusa, ainda que esperançosa. E se eles fossem novamente um pião num jogo sádico, um brinquedo nas mãos de alguém? E se tudo que ela tivesse feito ainda não fosse suficiente para que a histórica trágica, que escapou das letras finais de uma folha de livro do seu próprio destino ainda não tivesse fim?
, vendo o quão tenso estavam seus ombros, a abraçou, trazendo-a para mais perto de si. A loira lançou um sorriso na direção de e e seguiu caminho até o carro de , esperando que a mesma maré que a trouxera de volta ao ponto de partida trouxesse mais do que grãos de areia desta vez.




Continua...



Nota da autora: oii, amores! Eu espero que vocês gostem de acompanhar essa fic tanto quanto eu gostei de escrevê-la.
Beijinho, até o próximo capítulo 💙



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