We Are Perfect

Última atualização: 12/01/2021

Essa fanfic é uma continuação de (I Got) No Control.


Capítulo Um

“Does it ever drive you crazy, just how fast the night changes?”
One Direction, Night Changes.

Narrador Avulso


Londres, 05 de agosto de 2020.


— Espera! O que foi que você disse? — esbraveja com os olhos arregalados enquanto suspira e passa os dedos entre seus cabelos. Confuso, Arthur olha de um para o outro algumas vezes.
— Que ainda não consegui ver nada da cidade, mas….
— Não, Arthur! — visivelmente nervosa, o interrompe. — O que você disse antes disso.
— Ah! Que seus pais viriam no mesmo voo que eu, mas não conseguiram lugar, então compraram passagem para um que chega amanhã à noite. — ele dá de ombros e, em um gesto involuntário, os olhos de fitam a tempo de vê-la esfregar a têmpora com a ponta dos dedos.
— Você só pode estar de brincadeira. — a suspira e um riso sem humor salta de seus lábios. — Ou eu enlouqueci e isso… — ela faz uma pausa entre as palavras para gesticular um não na frente de Arthur. — Isso é fruto de um surto psicológico. — dá de ombros e Arthur franze o cenho, lançando um olhar confuso para .
, por sua vez, solta o lábio inferior — que puxava com as pontas de seus dedos polegar e indicador como se fossem uma pinça — e respira fundo, aprumando sua postura contra o mármore gelado da pia.

— Você ouviu o que ele disse, ? — ela questiona, desviando sua atenção para o assim que o ouve chamar pelo seu nome. — Ele acabou de dizer que meus pais vão estar aqui amanhã. Amanhã! Você sabe o que isso significa? — a coloração de sua pele está mais clara do que costuma ser e seus olhos apavorados. Por conseguinte, encolhe os ombros e esconde as mãos dentro dos bolsos de sua calça, soltando um longo suspiro em seguida.
— Significa que eles sentem a sua falta e querem te ver. — ele dá de ombros e enrola os olhos.
— Isso não faz o menor sentido. Eu falei com a minha mãe hoje pela manhã e ela não me disse nada sobre vir para Londres.
— Eles queriam que fosse surpresa. — Arthur profere, atraindo a atenção dos outros dois para si.
— E por que eles fariam isso?
— Porque eles querem salvar o nosso casamento. — o rapaz dá de ombros e, segundos depois, se levanta da cadeira onde está sentado para caminhar em direção à ex-noiva. — Nossos pais sabem que fomos feitos um para o outro, . — diz a poucos passos de distância da garota, e um riso irônico salta pelos lábios dela enquanto desvia o olhar para o chão, incomodado com a fala de Arthur.
— Nem você acredita no que acabou de dizer, Arthur. — a franze o cenho e o outro respira fundo. — Não vai ter casamento algum porque nós dois não estamos mais noivos e eu pensei que tinha deixado isso bem claro na última vez que conversamos.
— Mas
— Não tem “mas”, Arthur! — ela esbraveja, ouvindo sussurrar um “calma”. — Eu não amo você e você não me ama! Qual é, me ajuda aqui! — Arthur se cala, desvia o olhar para o chão e ri. — Isso não pode estar acontecendo. — ela balança a cabeça de um lado para o outro e, assim como o ex, abaixa o rosto, encarando a meia rosa em seus pés.
, por sua vez, respira fundo e arqueia as sobrancelhas quando ouve o barulho da campainha invadir o ambiente.
— Deve ser a… — ele se apressa em sair da cozinha para atender a porta, no entanto, quando cruza a divisão entre um cômodo e outro se surpreende ao encontrar Vitória com um sorriso largo no rosto.
— É a pizza. Eric já foi atender. — profere e suspira brevemente, dando dois passos para trás e abrindo espaço para que sua mãe encontrasse a figura de Arthur a uma distância razoável de . — Eu… não sabia que tínhamos visita. — ela diz com um sorriso confuso no rosto e o olhar passeando de para .
Confusa e assustada com o silêncio ensurdecedor no ambiente, Vitória passa por e caminha até Arthur.
— Como vai? — ela questiona, estendendo uma de suas mãos para o rapaz. — Vitória. Mãe do . — profere, lançando um olhar para o filho enquanto Arthur faz o mesmo com .
— Arthur. — o rapaz rebate, apertando levemente a mão da mulher. — Noivo da .
Noivo? — surpresa, Tori arqueia as sobrancelhas e desvia o olhar de Arthur para a Aupair que tomava conta de seus filhos mais novos. — não me disse que você estava em Londres.
— Eu e os pais dela queríamos fazer uma surpresa. — ele dá de ombros e rola os olhos. Tori, por outro lado, arregala os olhos e desvia a atenção para a ao seu lado.
— Os seus pais também estão na cidade? — ela questiona e imediatamente balança a cabeça na negativa.
— Eles chegam amanhã. — Arthur se manifesta e fecha os olhos, puxando uma boa quantidade de ar para dentro dos seus pulmões.
Amanhã? — a mais velha questiona e a garota dá de ombros enquanto o rapaz balança a cabeça na afirmativa e observa a cena em silêncio. — Isso é ótimo, ! Você deve estar ansiosa para revê-los depois de todos esses meses. — ela sorri, animada, e entorta os cantos de seus lábios em um sorriso sem humor.
— Tori! — de onde está, Eric esbraveja e seu tom de voz invade a cozinha. Vitória respira fundo e dá alguns passos para trás, se afastando do, até então, casal.
— Bom, vamos comer? Arthur se junta a nós essa noite? — ela questiona, animada, e o rapaz chega a espaçar seus lábios para aceitar seu convite, mas se apressa em respondê-la.
— Na verdade, Arthur já está de saída. — profere, atraindo a atenção de Vitória para si. O sorriso no rosto da mãe de desaparece por alguns instantes e ela suspira.
— Tudo bem, mas… Eu faço questão que ele e seus pais venham jantar aqui em casa. — Tori dá de ombros e o ar parece desaparecer dos pulmões de . Sem pensar, ela lança um olhar assustado para . — Que tal domingo? — a mais velha questiona, com as sobrancelhas arqueadas e um sorriso largo no rosto, devolvendo a atenção para Arthur.
— Por mim, tudo bem. — o rapaz dá de ombros, quebrando o silêncio depois de alguns minutos.

[•••]


Quando terminam de comer, ajuda Vitória a arrumar a bagunça causada pelos pratos e copos espalhados pela imensa mesa de seis lugares na sala de jantar. Por mais que tenha sido pego de surpresa, tinha conseguido se distrair junto à Tori e Eric, que conversavam animados sobre a comemoração de seu aniversário de casamento. , por outro lado, no momento em que viu Arthur entrar no Uber, disse à Vitória que estava com uma dor de cabeça quase que insuportável e pediu licença para subir até o seu quarto antes mesmo de comer.
Assim que se despede de sua mãe e Eric, vai em direção ao seu quarto, mas a fresta da porta aberta no quarto de faz com que ele interrompa seus passos. Sentada na cama, vê a menina largar o celular no colchão e soltar um longo suspiro.
esfrega a têmpora com as pontas dos dedos e então limpa os olhos molhados com o dorso das mãos. Quando ouve o barulho de batidas em sua porta, ela dá um pequeno salto da cama e se surpreende ao ver parado no batente de seu quarto. Um sorriso singelo salta pelos lábios dele e a respira fundo, passando as mãos pelos cabelos.
— Eu acabei de falar com a minha mãe. — ela dá de ombros, olhando para o celular sobre o colchão. — Eles acabaram de deixar meu irmão na casa dos meus padrinhos e já estão indo para São Paulo. O voo sai pela manhã.
— Como você está? — o questiona, mordiscando os beiços, e dá de ombros.
— Apavorada. — ela ri, passando as mãos pelos cabelos, e se senta ao seu lado. — Eu sinto falta deles e estou ansiosa para vê-los, mas… Eu não sou a mesma que eu era lá no Brasil, . Você sabe disso. — profere e se apressa para limpar uma lágrima solitária que escorrera por sua bochecha.
— Eles não vão descobrir, . — ele garante, apertando levemente uma das mãos da menina sobre seu colo. sorri.
— Eu sei que não, mas é que… — ela puxa o choro pelo nariz e balança a cabeça de um lado para o outro. — Você não conhece o meu pai. Ele é… Complicado. — a garota franze o cenho e acha graça da careta em seu rosto.
Os dois se calam por alguns minutos e brinca com os dedos do garoto entrelaçados aos seus. respira fundo ao ouvir a garota fungar e, em seguida, se levanta, soltando suas mãos.
Sem entender, acompanha seus movimentos e arqueia as sobrancelhas ao vê-lo se livrar da blusa preta que usava e largar a peça de roupa no chão.
— O que você…? — Ela questiona, confusa, e, em silêncio, engatinha pelo colchão da garota e se deita no canto da cama de solteiro colado à parede cinza. Enojada, rola os olhos. — Sério? Você realmente acha que eu estou no clima para… Isso?
— Que tipo de pessoa você pensa que eu sou, ? — questiona com as sobrancelhas arqueadas e a menina franze o cenho sem entender. — Eu não quero transar com você, bonitinha.
— Não?
— Não agora. — profere, e o semblante em seu rosto faz a menina gargalhar. — Eu só quero dormir aqui. — dá de ombros, acariciando a mão de sobre o colchão, e a menina prende um lábio contra o outro, sentindo suas bochechas queimarem.
Só dormir? — a morde os beiços e rola os olhos, puxando-a para perto de si.
— Eu sei que vai ser difícil para você se controlar com o meu corpo sensual colado ao seu a noite toda, mas… — enojada, revira os olhos enquanto sente os braços de envolverem seu corpo e suas costas batem contra o peito dele. — Eu juro que só quero dormir. — ele dá de ombros e a menina ri, se aconchegando no abraço dele.
sente o peito estremecer ao inalar o perfume doce preso aos cabelos dela e fecha os olhos, acariciando a pele dos braços dele.
— Vai ficar tudo bem. — garante, beijando o topo da cabeça de e, por consequência, ela volta a abrir os olhos.
— É. Meus pais, meus chefes, meu ex-noivo, e o cara com quem eu estou…
— Transando? — a interrompe, erguendo levemente seu tronco para olhá-la e franze o cenho.
— Transando é um pouco feio demais. Eu ia dizer me relacionando. — ela dá de ombros e entorta o canto de seus lábios em um sorriso singelo, deixando um beijo carinhoso sobre seu ombro. — Enfim… Todas essas pessoas na mesma mesa de jantar. O que poderia dar errado? — questiona, virando o rosto de encontro ao dele e um riso frouxo salta pelos lábios de .
Em seguida, ele inclina seu rosto para frente e seus beiços encontram os dela em um beijo suave.

Capítulo Dois

“Pull me close and I'll hold you tight, don't be scared 'cause I'm on your side.”
Jonas Brothers, Hesitate.


Londres, 07 de agosto de 2020.

arruma os cabelos enquanto analisa a combinação entre o suéter de lã laranja e a calça jeans pelo reflexo no espelho em cima do aparador encostado na escada.
Já era pelo menos a terceira vez que ele checava a sua própria imagem. Estava ansioso para esse jantar com os pais de , por um motivo que nem o próprio sabia e essa mesma razão desconhecida fazia com que sentisse a necessidade não de impressioná-los, mas de agradá-los o suficiente para conseguir conquistá-los.
Às vezes, precisava lembrar a si mesmo de que aquele jantar não tinha sido excepcionalmente programado para apresentá-lo aos pais da garota que perdeu a virgindade com ele e com quem, desde então, vem transando ocasionalmente.
O balança a cabeça de um lado para o outro afastando seus devaneios e respira fundo, limpando os cantos da boca com as pontas dos dedos. Quando apruma a sua postura e, consequentemente, ergue o seu olhar, arqueia as sobrancelhas ao encontrar o reflexo de Vitória atrás do seu.
— Vinho tinto ou seco? — ela questiona, mostrando as duas garrafas em suas mãos e vira o seu corpo de frente para o dela. Ele olha de uma garrafa para a outra e então dá de ombros.
— Eu não sei, talvez seja melhor perguntar para a . Ela ainda não desceu?
— Ainda não. Eric disse que deveríamos escolher o tinto, mas você tem razão… — a mulher dá de ombros, mordendo os beiços. — … Eu vou checar com ela.
— Checar o quê com quem? — a voz de chama a atenção de que involuntariamente vira seu corpo em direção ao som e ergue seu rosto, encontrando a figura da garota parada no meio da escada.
Atônito, arqueia as sobrancelhas e os momentos seguintes parecem transcorrer em câmera lenta enquanto desce os últimos degraus da escada.
— Os seus pais preferem vinho tinto ou seco? — Vitória questiona e suspira, estalando os dedos de suas mãos. O rapaz, por outro lado, pinça os lábios com as pontas dos dedos e, em silêncio, admira a garota dos pés à cabeça.
— Eu acho que tinto. Mas não sei se eles vão querer beber hoje.
— E por que não? — Vitória questiona, sem entender.
— Meus pais são conservadores demais. Eles não costumam beber na casa de estranhos. — Envergonhada, morde os beiços e Tori arqueia as sobrancelhas. — Me desculpa.
— Não, imagina! Eu vou deixar essa garrafa na mesa, caso eles mudem de ideia. — A mais velha pisCa um de seus olhos e um sorriso acanhado surge no rosto da aupair.
Em seguida, Vitória dá as costas aos dois e suspira novamente, virando o seu corpo de frente para .
— E então? — Ela abre os braços, mostrando a combinação entre a saia verde de cintura alta, a blusa azul de mangas bufantes e o scarpin salmão.
— Você está… — Estupefato, leva alguns segundos para formular uma frase. Quando consegue voltar à órbita, balança a cabeça de um lado para o outro e passa o indicador pelo nariz, antes de esconder as mãos nos bolsos de sua calça. — Você está linda, .
— Não foi isso que eu perguntei, . — Ela rola os olhos e a olha sem entender. — Eu pareço com alguém que quebrou o voto de castidade?
— Que tipo de estereótipo é esse, bonitinha? — o garoto franze o cenho e a careta em seu rosto faz rir.
— Eu estou falando sério, ! — seu tom de voz sai manhoso e ela faz bico com os lábios. , por sua vez, revira os olhos, entediado.
. — ele profere e, para a surpresa da garota, toca seu rosto, fazendo com que ela feche os olhos involuntariamente. — Você está linda. — diz mais uma vez e a garota pressiona um lábio contra o outro, tentando segurar o riso.
Sem pensar na possibilidade de serem pegos por Vitória, leva a sua mão de encontro a de na sua bochecha e acaricia levemente os dedos dele sobre sua pele. É quando sente o frio do metal em volta do dedo anelar de entrar em contato com a sua pele. Inconscientemente, ele puxa a mão da garota para perto de si.
— Você colocou o anel. — diz e solta um longo suspiro, forçando sua mão de volta para que ele a solte.
— Eu precisei. — ela dá de ombros, mordendo os beiços, e balança a cabeça na afirmativa.
Nos segundos seguintes, os dois são interrompidos pelo som da campainha invadindo o ambiente e desvia o olhar em direção à porta.
— Oh Deus! — resmunga, cobrindo o rosto com as mãos e o rapaz respira fundo, limpando as mãos suadas sobre o tecido de seu suéter.
— Pode deixar que eu atendo! — Vitória profere, animada, caminhando com certa esbeltez sobre os saltos em seus pés.
. — ele a chama e toca um de seus pulsos, forçando-o para baixo. — Relaxa, vai dar tudo certo. — sorri, apertando suavemente a mão de . — Eu vou estar do seu lado o tempo todo. Se precisar, você pode até apertar a minha mão. — ele dá de ombros e um riso leve foge pelos lábios da garota.
Em seguida, a age de maneira inconsciente e envolve o pescoço de em um abraço rápido. Quando sente o aroma opulento do Tom Ford: Tabacco Vanille cruzar o seu olfato, fecha os olhos e acaricia levemente os cabelos presos à nuca de . Ele, por outro lado, é pego de surpresa e demora alguns instantes para pressionar a cintura dela contra a sua.
Quando ouve os passos se aproximarem do lugar onde estão, se afasta e passa as mãos sobre o tecido amarrotado de sua roupa, ao passo que umedece a garganta e tenta se livrar do calafrio que percorre seu peito todas as vezes que ele e têm momentos como o que acabou de acontecer.
— Minha princesa! — uma mulher de cabelos surge na sala de jantar com os braços abertos e sorri, correndo em sua direção.
observa a cena em silêncio e, ao lado da tal mulher, vê um homem de cabelos grisalhos e expressão carrancuda no rosto enquanto Arthur está alguns passos atrás.
— Mamãe! — profere, inclinando o corpo para abraçar a mulher alguns centímetros mais baixa. Em seguida, ela se afasta e sorri para o homem ao seu lado. — Vocês não imaginam a saudade que eu estava sentindo. — diz, envolvendo o pescoço dele e, pela primeira vez, o vê quebrar o semblante rígido e soltar um sorriso breve.
— Você está linda, passarinha. — a mulher diz, acariciando o rosto da garota que, por sua vez, sorri.
— Sua mãe tem razão. — o homem se manifesta, atraindo a atenção de todos para si. — Mas essa saia está curta demais. O que aconteceu com as suas roupas, minha filha? — ele questiona e o sorriso desaparece do rosto de .
Constrangidos com o comentário, Eric e Vitória se entreolham em silêncio, enquanto crava seus olhos em e espera para que ela reaja.
Mas isso não acontece.
— Por Deus, Pedro! Não vamos começar com isso agora. — a mãe de profere em um idioma que não consegue entender e ele vê a garota piscar os olhos algumas vezes, antes de desviar seu olhar para o chão.
— Como vão? — ele questiona, estendendo sua mão direita na direção da mulher. — Eu sou o , filho da Vitória. — diz, com um sorriso largo no rosto, enquanto a mãe de lança um olhar confuso para a filha e, em seguida, para Tori.
— Ângela. — ela profere, apertando a mão do rapaz. Em seguida, umedece a garganta e respira fundo antes de estender a mesma mão na direção do pai de .
— Pedro. — o homem diz, apertando firmemente a mãos de .
— Quando você me disse que seria babá em Londres, eu não pensei que seria de um rapaz feito, passarinha. — o tom de voz de Ângela é brincalhão e engasga, ao mesmo tempo que os outros acham graça do comentário. , por sua vez, desvia a atenção para e ri ao notar suas bochechas coradas.
é meu filho mais velho. — Tori diz, puxando a atenção de Ângela para si. — cuida dos três menores que não estão aqui hoje. Eles foram passar o fim de semana na casa de uma tia e eu devo buscá-los amanhã pela manhã. — ela dá de ombros e a mãe da garota sorri.
— Eu sei como é, eu também tenho um pequeno. Ele inclusive pediu para dizer que está com saudade e que quer que você mande um presente. — diz, voltando sua atenção para a filha, que rola os olhos.
— É claro que ele quer.
— Crianças… Sempre esperando um presente. — Vitória volta a se manifestar e Ângela ri, balançando a cabeça na afirmativa. — Bom, fiquem à vontade. — ela diz, apontando para a mesa posta. — Eu vou servir o jantar. , você pode me ajudar?
— Sim, claro. — a menina sorri e, antes de seguir Tori, lança um olhar rápido para que, por sua vez, entorta os lábios em um sorriso singelo.

[•••]



tinha razão, seus pais eram conservadores demais e não aceitaram o vinho. Pelo menos, não de primeira.
Estavam há pelo menos dez minutos na mesa e os únicos barulhos que conseguiam ouvir eram os de suas respirações em diferentes intensidades e o dos talheres de prata entrando em atrito com a louça francesa dos pratos. Ângela e Pedro estavam sentados lado a lado, de frente para e . Já Vitória e Eric estavam na outra extremidade, de frente para Arthur.
Enquanto a maioria estava calada para saborear o strogonoff preparado com todo carinho por Vitória, mantinha a posição recuada com o rosto e os olhos virados para baixo, e brincava com o pouco de comida em seu prato. Duas garfadas tinham sido suficientes já que algo na presença de Pedro parecia suficientemente intimidadora para fazer o estômago de revirar de nervoso.
O rapaz, no entanto, aproveita o silêncio ensurdecedor e a distração de todos com a comida para analisar o casal a sua frente. Ângela parecia elegante e extremamente educada, assim como Vitória. Ela vestia uma combinação de roupas em tons pastéis e acessórios delicados espalhados pelo corpo. Muitos deles, claro, faziam ligação direta ao catolicismo.
O pai de , por outro lado, demonstrava o oposto. sabia que os dois tinham a mesma profissão, mas a postura curvada sobre a mesa e a agressividade com a qual ele segurava os talheres em suas mãos, indicavam que ele tinha recebido uma criação totalmente diferente de sua esposa. Ele, por sua vez, vestia uma blusa polo vinho, uma calça jeans e, em volta de seu pescoço, um crucifixo de madeira que fazia questão de manter viva na memória de o fato de que, entre todos ali, ele era o mais pecador por ter desvirtuado a filha daquele homem.
Nervoso, o passa a mão pelos cabelos molhados pelo suor em sua nuca. De soslaio, ele percebe o olhar de colado em si, então balança a cabeça de um lado para o outro e bebe em um gole único todo vinho tinto que havia em seu copo numa tentativa desesperada de afastar todo aquele desconforto.
— Então… Vocês são médicos? — Tori quebra o silêncio, atraindo a atenção de todos para si enquanto serve mais uma pequena porção de comida no prato de Eric.
— Sim. Eu sou psiquiatra e meu marido é ortopedista. — Ângela sorri, depois de beber um gole de água e apoiar o copo de vidro sobre a mesa.
nos disse! — Vitória esbraveja, animada, e um tanto quanto aliviada, por ter finalmente conseguido puxar uma conversa. — Vocês se conheceram no trabalho, então?
— Não exatamente. Nós nos conhecemos em uma missão da Igreja. — a outra dá de ombros e Tori arqueia as sobrancelhas, surpresa, limpando os cantos da boca com o guardanapo de tecido. — Algumas paróquias da região se uniram para uma missão na África e foi lá que nos encontramos. Pedro estava trabalhando em um programa para médicos sem fronteiras e eu tinha acabado de passar no vestibular. — ela lança um olhar para o marido e sorri, tocando uma de suas mãos sobre a mesa. Pedro, por sua vez, arqueia as sobrancelhas, mas não esboça nada além disso.
— Quer dizer que vocês são do mesmo país, mas precisaram sair dele para se conhecerem? — Eric questiona com as sobrancelhas arqueadas.
— Nós somos do mesmo estado, na verdade. Cidades vizinhas! — Ângela rebate animada e o outro casal se entreolha. — Mas sim, foi preciso sairmos do conforto de nossas casas para nos conhecermos. — ela dá de ombros, dando mais um gole no líquido gelado em seu copo, e Vitória suspira como se estivesse lendo um livro de romance escrito nos anos sessenta.
— Isso é o amor. Às vezes ele parece estar em lugares óbvios, mas está onde a gente menos espera. — profere e franze o cenho, virando seu rosto de encontro à mãe.
— De que para-choque de caminhão você tirou essa frase, dona Vitória? — ele questiona e levanta as sobrancelhas ao ver que, além de Eric, Ângela e Arthur, Pedro também tinha achado seu comentário engraçado. Tori, por outro lado, revira os olhos teatralmente e aproveita a distração e vira seu rosto para o rapaz ao seu lado.
Por conseguinte, eles emendaram uma conversa curta sobre frases cafonas e piadas ruins e pareceu conseguir relaxar. O semblante em seu rosto era leve e sua postura não estava mais tão rígida como parecia estar nos dez minutos anteriores.
Em silêncio, admira a forma como o garoto passa o indicador pelo nariz e fecha os olhos enquanto ri. Involuntariamente, um sorriso salta pelos lábios avermelhados da menina e de um jeito estranho a frase dita por Vitória a pouco — por mais brega que fosse — começa a fazer sentido dentro de sua cabeça.
— Você disse que é psiquiatra, certo? — Eric pergunta, quando o alvoroço sobre piadas diminui e o assunto parece fugir da mesa novamente. Ângela balança a cabeça na afirmativa. — É por isso que você fez psicologia, ? — ele questiona e a garota suspira, atraindo a atenção dos outros para si.
— Eu acho que sim. — a dá de ombros, brincando com os talheres sobre a mesa. — É lógico que eu queria ter conseguido seguir os passos dos meus pais, mas eu não tenho muita afinidade com agulhas e todas as outras coisas que norteiam a medicina, então… — ela arqueia as sobrancelhas e os outros acham graça do semblante em seu rosto.
— A psicologia é a área ideal para você, passarinha. — Ângela sorri, orgulhosa, e ergue o rosto de encontro ao da mãe. — Além do mais, você sempre quis trabalhar com criança. — a mulher dá de ombros e concorda, balançando a cabeça na afirmativa enquanto um sorriso grato salta por seus lábios. Ângela, por conseguinte, respira fundo e vira seu rosto em direção à Vitória e Érick. — Por falar nisso, ela tem dado muito trabalho para vocês? — ela questiona e, enquanto o casal acha graça, revira os olhos teatralmente.
— Fala sério mãe… — a resmunga com um sorriso envergonhado nos lábios.
— Você não imagina o quanto. — profere quase que ao mesmo tempo que a garota e, em seguida, leva a taça, agora cheia, à boca mais uma vez.
Por impulso, vira o rosto de encontro ao dele e arregala os olhos, surpresa. , por sua vez, arqueia as sobrancelhas ao notar que tinha atraído a atenção de todos para si por conta do comentário que tinha acabado de fazer.
Encurralado, o rapaz coloca a taça sobre a mesa em um movimento de câmera lenta e olha para cada um daqueles rostos, buscando a melhor desculpa possível.
— Quero dizer... — umedece a garganta, apoia as mãos sobre a cintura e, por alguns instantes, encara a louça suja à sua frente. Em seguida, respira fundo e apruma a sua postura sobre a mesa. — é uma pessoa incansável.
O dá de ombros e, enquanto Ângela arregala os olhos, Pedro franze o cenho e lança um olhar confuso para sua filha que, envergonhada, usa as mãos para cobrir seu rosto. , por sua vez, sente suas bochechas queimarem e balança a cabeça de um lado para o outro quando percebe a duplicidade em suas palavras.
— Ela está… Está sempre inventando jogos e atividades novas para as crianças e isso é ótimo. Mas quando chega os finais de semana e ela está de folga, meus irmãos querem que eu acompanhe esse ritmo maluco de passeios ao parque e brincadeiras de pique-esconde. — profere, revirando os olhos e a expressão desarranjada nos rostos dos pais da garota desaparece, dando lugar à risadas leves, junto de Eric e Vitória. — Vocês entendem o que eu quero dizer, não é? — ele questiona, ainda um pouco apreensivo, e Ângela chacoalha a cabeça na afirmativa, levando a taça com água até seus lábios mais uma vez.
, por sua vez, suspira aliviada e um riso leve salta por seus lábios enquanto ela balança a cabeça de um lado para o outro. desvia sua atenção para ela e um sorriso sacana surge em seu rosto quando uma ideia provocativa cruza seus pensamentos.
Nos segundos seguintes, respira fundo, arruma a sua postura sobre a cadeira e — certo de que não era mais o centro das atenções — apoia sua mão esquerda sobre a pele descoberta da perna direita de .
Surpresa, a garota volta a arregalar os olhos e devolve sua atenção para .
— Então sim. Você me dá muito trabalho, boni... ! — um sorriso torto aparece em seus lábios e pisca um de seus olhos, enquanto seus dedos percorrem um caminho até entre as pernas da garota e tenta afastar uma da outra.
Estarrecida, balança a cabeça na negativa, mas o garoto ignora e volta sua atenção para o casal em sua frente.
— Você não mudou nada, passarinha. — Ângela profere, tentando conter o riso e, enquanto a umedece a garganta, arqueia as sobrancelhas.
— Não?
Por mais alto que a racionalidade grite dentro da cabeça de , a menina já se via naquela situação há meses e ela sabia muito bem que o toque de era o suficiente para arruinar qualquer resquício racional agarrado à sua sanidade.
Quase que involuntariamente suas pernas se afastam uma das outras e ela contrai os músculos dos quadris, fechando os olhos ao sentir os dedos do garoto tocarem sua parte mais interna através do tecido da calcinha que ela usava na ocasião.
sempre foi uma menina muito ativa, desde pequena. — Pedro se manifesta, com os olhos cravados na toalha branca de renda sobre a mesa.
A garota, por conseguinte, abre os olhos e quando as pontas dos dedos de começam a acariciar sua intimidade, um grunhido baixo e incontrolável salta por sua boca. O rapaz pressiona um lábio contra o outro e a abraça o punho dele com os dedos de sua mão esquerda, na esperança de que ele pare.
Mas ele não para.
— Isso fez com que ela sempre se destacasse na nossa igreja. — o homem dá de ombros, jogando suas costas contra o encosto da cadeira.
— Eu imagino que sim. — com os olhos cravados nos pais da garota, aumenta os movimentos de seus dedos e respira fundo tentando se manter no controle, por mais que suas pernas já estivessem prendendo a mão de contra sua umidade.
Quando sente as forças de seus músculos esvaírem pelos seus dedos, apoia o cotovelo livre sobre a mesa e, por conseguinte, apoia o rosto sobre sua mão.
é uma boa menina. Ela é, sem dúvida, a melhor AuPair que tivemos. — Vitória diz, com um sorriso largo no rosto e, em seguida, desvia o olhar para a menina. Mas a não esboça nenhuma reação ao elogio de sua host mom.
— Eu proponho um brinde! — Eric esbraveja, levantando sua taça de vinho no ar. — À ! — o homem sorri e faz o mesmo, parando os movimentos de seus dedos. Em seguida, ele aperta levemente a parte interna da coxa de e, estupefata, a garota ergue a cabeça.
— Você está bem, ? — Tori questiona e a garota olha confusa para as pessoas segurando suas taças em suas mãos.
— Me perdoem, eu… eu… — ela engasga com as palavras e, então, balança a cabeça de um lado para o outro, tentando despertar de seus devaneios. — Eu estava um pouco aérea. — confessa, um tanto quanto envergonhada.
— Tire os cotovelos da mesa, . — Pedro ordena com uma expressão carrancuda no rosto, e a menina suspira.
— Desculpe. — seu tom de voz sai mais baixo que o normal e, involuntariamente, lança um olhar de soslaio para . O pressiona um lábio contra o outro tentando conter o riso, e a respiração da garota falha ao vê-lo levar os dois dedos sujos com sua intimidade na direção de seus lábios.
Por favor, não.
Ela suplica mentalmente e quase pode jurar que atingiria o ápice só por vê-lo executar tal obscenidade na frente de seus pais.
Por impulso, vira o rosto para frente e agarra a taça com água a sua frente. No mesmo instante, salta da cadeira e estica seu braço em direção ao porta guardanapo posto sobre a mesa no canto oposto ao que ele estava sentado. Os braços dos dois colidem e o líquido gelado derrama sobre o colo da garota.
! — Vitória esbraveja, repreendendo o filho. , por sua vez, arqueia a cabeça e seus olhos cruzam com o do rapaz.
— Ops! Me perdoe, . Não era a minha intenção te deixar molhada. — ele dá de ombros, pisca um de seus olhos e o queixo da garota cai alguns centímetros, chocada com as palavras que saíram pela boca de .
O volta a se sentar sobre a cadeira e, enquanto resmunga e tenta limpar o molhado em sua roupa, um riso frouxo salta por seus lábios. Ele limpa os dedos úmidos com o guardanapo em suas mãos e, em seguida, ergue a taça como os outros tinham feito segundos antes.
— Onde estávamos? — ele questiona e os outros se entreolham.
Tori respira fundo, ainda envergonhada pelo que tinha acabado de acontecer, mas é a primeira deles a erguer a taça para acompanhar . Eric, Ângela, Arthur e Pedro a seguem, esse último com certo descaso, por sinal.
volta sua atenção para a menina ao seu lado e um sorriso de orelha à orelha surge em seu rosto.
— À ! — ele esbraveja e a menina rola os olhos, enquanto ergue sua taça e tenta conter um sorriso bobo.
— Obrigada. — ela rebate, baixo o suficiente para que só ele a ouça e dá de ombros, virando seu rosto para frente.
— Eu também gostaria de fazer um brinde. — Arthur se manifesta, atraindo a atenção de todos para si. Envergonhado e notavelmente nervoso, o rapaz umedece a garganta e limpa as mãos suadas sobre o tecido jeans de sua calça, antes de se levantar da cadeira. — Ao nosso casamento. — profere com um sorriso largo no rosto e, enquanto os casais mais velhos se entreolham animados, se surpreende e bufa, irritada.
— Arthur…
— E eu também quero aproveitar a oportunidade para dizer que falo por nós dois quando digo que faço questão de ter vocês presentes na cerimônia. — diz com os olhos cravados em Vitória e Éric.
No entanto, não é só o casal que é pego de surpresa com o convite inexplicável e, até então, inviável. olha assustado para em busca de explicações e a menina franze o cenho.
— Como assim? Do que você está falando? — ela questiona com um riso confuso nos lábios e Arthur dá de ombros, lançando um olhar sugestivos para os pais da garota.
— Nós decidimos adiantar o casamento de vocês. — o tom de voz de Pedro atrai a atenção de para si e, surpresa, arqueia as sobrancelhas. O umedece a garganta e então vira o rosto para baixo.
De repente, toda a sua graça e espontaneidade parece desaparecer.
— Nós sabemos como você gosta dessa cidade e pensamos… Por que não? — Ângela dá de ombros, bebendo o último gole de água em sua taça e balança a cabeça na negativa. — Conseguimos alguns meses de férias e vamos tentar organizar para que a cerimônia seja mês que vem e nossas famílias consigam vir. — profere, animada, e a encara com os olhos arregalados e os lábios espaçados.
, por sua vez, fecha os olhos, cerra os punhos e balança a cabeça de um lado para o outro.
— Vocês sabem que isso não vai acontecer, não é? — a menina questiona com um sorriso vago nos lábios e, involuntariamente, ergue o rosto em busca do dela. O sorriso desaparece do rosto de Ângela e, dessa vez, é Pedro quem cerra o punho sobre a mesa. Arthur se cala. — Eu e Arthur, nós… Nós não estamos mais juntos. — ela dá de ombros enquanto Éric e Vitória acompanham a cena em silêncio e constrangidos o suficiente para conseguirem se levantar da mesa sem parecerem mal-educados.
— Isso vai acontecer e você sabe. — Pedro profere entredentes e respira fundo, tentando manter a calma.
— Papai…
— Conversaremos sobre isso em outro momento, ! — ele a repreende e a menina se cala quase que de imediato.
, no entanto, não consegue evitar que uma risada debochada salte de seus lábios. Então, libera um suspiro profundo e limpa os cantos internos dos olhos com a ponta de seu indicador, antes de proferir o seguinte:
— Eu não sabia que tínhamos voltado para 1940.
— O que disse? — o pai de franze o cenho e ergue o olhar de encontro ao seu.
Por milésimo de segundos os dois se encaram e o medo que antes apavorava , desaparece depois que o rapaz percebe que Pedro é só um homem antiquado preso aos costumes de uma década passada.
Apavorada, olha para o garoto ao seu lado com os olhos arregalados. O maxilar trincado de dão a ela a certeza de que ele enfrentaria seu pai sem que aquilo lhe custasse muito.
Ela só não conseguia enxergar os motivos que o levariam a fazer isso.
… — a voz de Vitória desperta o garoto de seus devaneios e ele lança um olhar rápido para a mãe antes de bufar e balançar a cabeça na negativa.
— Nada. Eu não quis dizer nada. — ele rebate, jogando, com tamanha brutalidade, o guardanapo de pano sobre a mesa. — Eu estou com dor de cabeça, então… Se me dão licença. — profere e, em seguida, se levanta da cadeira e segue em direção à cozinha sem dar mais explicações.
Os olhos de o acompanham, preocupada, e quando volta sua atenção para a mesa, os outros cinco se calam. Ela morde os beiços e umedece a garganta, enquanto encara a toalha branca bordada sob suas mãos e Pedro bebe o último gole de água em sua taça.
— Me desculpem por isso, ele… — Tori quebra o silêncio, atraindo a atenção dos pais de para si. — Bom, eu não sei o que houve com ele. — a mulher confessa, soltando o ar de seus pulmões e, em seguida, lança um olhar rápido para Éric.
— Imagina. Nós entendemos. — Ângela força seu melhor sorriso enquanto afaga as costas do marido com uma de suas mãos.
Arthur, por sua vez, estende um de seus braços e alcança a mão de sobre a mesa. O polegar do garoto acaricia levemente a pele da menina e ela ergue o olhar de encontro ao dele. Arthur sorri e ela, mais uma vez, rola os olhos, puxando sua mão de volta para si.
— Com licença, eu já volto. — ela se levanta e, antes que tenham tempo de questioná-la, apressa seus passos, seguindo o mesmo caminho que há alguns minutos.
Na cozinha, está curvado com a cabeça para baixo e os braços apoiados sobre o mármore gelado da pia. Apreensiva, para a alguns metros de distância e o observa em silêncio até encontrar coragem para se aproximar.
Quando sente o toque da menina contra as suas costas, a olha por cima dos ombros e assim que a reconhece, suaviza a expressão em seu rosto.
Ele respira fundo, se vira de frente para e ela morde os beiços enquanto ele escora as costas contra o balcão da pia.
— Me desculpa. — o dá de ombros, com os braços cruzados na frente de seu peito e o olhar baixo. balança a cabeça de um lado para o outro, toca uma das bochechas de e dá um passo à frente, erradicando ainda mais a distância entre seus corpos. — Eu não consegui evitar quando vi a forma que ele falou com você.
— Eu disse que meu pai era complicado. — a garota entorta levemente os lábios e balança a cabeça na negativa, esfregando a têmpora.
— Não, . O seu pai é um babaca. — ele rebate sem pensar e se arrepende quando vê a garota arquear as sobrancelhas. — Me desculpa. De novo.
— Está tudo bem. Você está nervoso. — ela profere e dá de ombros. O semblante carrancudo no rosto do rapaz faz rir.
Os dois se calam e percebe que está envergonhado — e irritado — o suficiente para evitar a qualquer custo olhá-la nos olhos. Ela então morde os lábios e toca seus braços, os forçando para baixo, para que desate o nó entre eles.
— Eu posso te ajudar com isso. — ela dá de ombros, espalmando uma de suas mãos sobre o peito do rapaz. Ele, por consequência, fecha os olhos, respira fundo e só então volta seu rosto de encontro ao dela.

— O quê? — ela arqueia as sobrancelhas e sente o toque dos dedos dela descerem pela extensão de seu tórax. — “Surpreenda” não era uma das suas regras, bonitinho?
A garota morde os beiços e — antes que consiga protestar — sua mão apalpa a região da virilha do rapaz. fecha os olhos, sentindo seus músculos arquearem no instante em que começa a massagear seu pênis coberto pelo tecido de sua calça.
Mentalmente, o rapaz se culpa por ter escolhido um jeans justo.
Um sorriso maroto salta pelos lábios da menina quando ela percebe que o toque da sua pele sobre a dele tinha o mesmo efeito de vulnerabilidade causada pela posição contrária.
Há minutos era ela com os olhos fechados, avulsa à realidade, implorando pelo toque dele, independente da situação em que se encontravam. Agora era quem precisava sentir sem nem se preocupar com seus pais sentados no cômodo ao lado.
A garota se coloca sobre as pontas dos pés e os pelos de arqueiam ao sentir a pele aveludada dos lábios da garota beijarem a região do seu pescoço. Involuntariamente, ele apoia suas mãos sobre a curva da cintura de e um grunhido salta pelos seus lábios quando ela crava suavemente os dentes na sua pele.
... — ele profere quase que em um sussurro e, em seguida, volta a se calar.
— Estou ouvindo, . — ela diz com a voz abafada pela pele do garoto, e umedece a garganta, sentindo seu membro latejar contra a mão da menina.
— Se você não parar agora, eu… — o faz uma breve pausa entre as palavras e se afasta, buscando por seus olhos.
chacoalha a cabeça de um lado para o outro, respira fundo e aperta ainda mais a cintura da garota contra o seu corpo.
— … Eu vou te foder com tanta força que você mal vai conseguir andar amanhã.
Surpresa, arqueia as sobrancelhas e demora alguns instantes para processar o que tinha dito. Quando consegue, um sorriso brota em seus lábios e ela pressiona ainda mais o membro dele contra sua mão, antes de voltar a se colocar sobre as pontas dos pés e alcançar seu ouvido.
— Eu adoraria ver você tentar. — ela sussurra, mordendo o lóbulo da orelha do garoto e ele rola os olhos, impulsiona o corpo dela para o lado, e inverte as posições.
As costas da garota batem contra a pia e ela acha graça. Em sequência, solta a virilha de e ergue os braços, envolvendo-o pelo pescoço. O garoto inclina seu rosto para baixo e ela umedece os lábios com a ponta da língua, se preparando para o que estava por vir.
, você pode me ajudar com…
Quando o tom de voz de Vitória se faz presente na cozinha, salta para trás e se vira de frente para a pia. O abre a geladeira para tentar disfarçar e, de lá, tira uma jarra com água.
— … Com a sobremesa. — Tori profere, olhando desconfiada de um para o outro. , por sua vez, passa uma das mãos pelos cabelos, respira fundo e sorri antes de se virar de encontro à sua host mom e balançar a cabeça na afirmativa.
— Claro.
apoia a jarra sobre a ilha de mármore no meio do cômodo e abaixa a cabeça, enquanto Vitória observa seus movimentos em silêncio. retira do congelador o sorvete caseiro que tinha ajudado a mulher a preparar mais cedo e arqueia as sobrancelhas, passando pelos dois sem proferir mais nada.
— Você está bem? — a mulher morde os lábios com um olhar apreensivo sobre o filho e ergue o rosto de encontro ao seu.
— Eu? — ele questiona, confuso, e Tori balança a cabeça na afirmativa. — Eu… Estou. Estou bem, só um pouco estressado. Nada demais. — garante, forçando um sorriso leve, e a mulher entorta o canto da boca.
Quando retorna à sala, se depara com uma cena bem distinta da que tinha deixado para trás. Pedro e Éric conversavam animados sobre um assunto que ela ainda não tinha conseguido entender e os semblantes nos rostos de Ângela e Arthur pareciam bem mais tranquilos do que antes.
— Vocês vão adorar. Holmes Chapel é um lugar incrível. — Eric profere, jogando suas costas contra o encosto da cadeira.
— Holmes Chapel? — um sorriso curioso salta pelos lábios de enquanto ela apoia a vasilha de vidro sobre a mesa.
— Sim. — É Vitória quem responde, surgindo atrás da garota com pequenos pratos em suas mãos. Involuntariamente, vira seu tronco para encontrá-la. — Eu e Eric convidamos seus pais e o Arthur para a festa do nosso aniversário, em Holmes Chapel. — ela sorri, passando pela garota, e surge logo em seguida.
Estarrecida, arqueia as sobrancelhas e seu olhar cruza com o de . O morde os beiços e a garota respira fundo, coçando a testa com as pontas dos dedos.
— Que ótimo. — profere, forçando o seu melhor sorriso. — Vai ser bom ter vocês por perto durante essa viagem.

[•••]


— Você tem certeza de que não quer vir com a gente? O apartamento que alugamos é enorme, você poderia ficar mais à vontade em um dos quartos que temos lá. — Ângela diz, acariciando os braços da filha.
— Eu prefiro ficar. Amanhã as crianças voltam e eu preciso arrumar algumas coisas antes que elas cheguem. — dá de ombros e a mulher entorta os lábios em um sorriso entristecido. — Essa é a minha casa agora, mãe. — profere depois de um longo suspiro e Ângela sorri, balançando a cabeça na afirmativa.
— Eu sei.
— Boa noite, passarinha. — Pedro envolve a filha com um de seus braços e beija o topo de sua cabeça. — Dorme com Deus. — diz, afagando os seus cabelos, e sorri.
Quando o homem se afasta, Arthur dá alguns passos em direção à menina e — sem pedir permissão — apoia uma de suas mãos sobre a curva da cintura dela. Assustada, arregala os olhos e recua, mas o garoto é mais forte e consegue manter seu corpo colado ao dela por alguns instantes.
abaixa a cabeça, um tanto quanto incomodado com a cena.
— Boa noite, .
Quando percebe o rosto de Arthur cada vez mais próximo do seu, vira o rosto e fecha os olhos quando sente os lábios dele encontrarem a pele de sua bochecha.
— Boa noite, Arthur. — ela profere à contragosto, sentindo seus músculos arquearem em repulsa.
— Obrigada pelo jantar. Estava uma delícia. — Ângela diz, afagando o braço de Vitória, e a outra sorri.
— Imagina, voltem sempre que quiser. Vocês serão sempre bem-vindos aqui. — ela garante e a mãe de agradece em silêncio.
Os pais da garota lançam mais um olhar para a filha e ela entorta o canto dos lábios, balançando a mão de um lado para o outro. Ângela solta um longo suspiro e Pedro apoia uma das mãos sobre a cintura da esposa, a guiando para fora da casa dos Carters enquanto Arthur os segue.
Quando fecha a porta e a imagem dos convidados já não se faz mais presente, Vitória respira fundo e arregala os olhos, voltando sua atenção para os rostos conhecidos que a encaravam.
— A noite de hoje foi… Intensa. — diz, sentindo um peso de mil toneladas sair de cima de seus ombros. Os outros acham graça. — Eu estou exausta, acho melhor nos deitarmos. — profere com os olhos cravados em Éric e o homem balança a cabeça na afirmativa, entrelaçando seus dedos aos dela. — , amanhã eu vou buscar as crianças pela manhã, se você quiser ir comigo… Acho que Helena vai gostar de te ver lá. — ela dá de ombros com um pé sobre o primeiro degrau da escada, e sorri.
— Tudo bem. — a rebate e um sorriso leve surge no rosto de Vitória, antes de Éric puxá-la pelo braço e os dois desaparecem do campo de visão de em questão de instantes.
Em sequência, libera todo o ar de seus pulmões e se senta sobre o penúltimo degrau da escada, ela tira os sapatos de seus pés e encolhe as pernas, apoiando os cotovelos sobre os joelhos e escondendo o rosto em suas mãos.
acompanha seus movimentos em silêncio até que libera um suspiro e se senta ao seu lado na escada.
Como , ele também encolhe as pernas e apoia os cotovelos sobre os joelhos. No entanto, diferente dela, entrelaça os dedos de uma mão à outra e mantém seus olhos fixos na pequena rachadura na lateral da porta de entrada.
— Você não vai se casar com aquele cara, vai? — ele quebra o silêncio e vira seu rosto de encontro ao dele.
— De jeito nenhum. — ela garante, buscando os olhos do garoto. — Eu só preciso encontrar um jeito de dar essa notícia aos meus pais. Ao meu pai, mais especificamente.
Quando percebe que o semblante inexpressivo no rosto de não muda, respira fundo e joga seu braço ao redor de seus ombros, usando a ponta de seus dedos polegar e indicador para acariciar o lóbulo da orelha direita dele.
— Obrigada por estar aqui hoje. — ela sussurra ao pé do ouvido esquerdo dele, com o queixo apoiado em seu ombro, e o rapaz finalmente desvia o olhar de encontro ao dela.
— Onde mais eu estaria? Eu moro aqui. — franze o cenho, confuso, e rola os olhos, afastando o seu tronco e entrelaçando seu braço ao dele.
— Mas você não precisava estar aqui hoje. Você poderia ter ido encontrar os seus amigos, ou sei lá... Alguma garota que você conheceu em um aplicativo de relacionamento. — ela morde os beiços e um sorriso torto salta pelos lábios de .
— Eu não preciso dessas coisas, bonitinha. — ele balança a cabeça na negativa e a menina dá de ombros.
— Eu sei que não. Mas, como eu disse, você não precisava estar aqui.
O sorriso desaparece do rosto de e seu semblante volta a ser sério. Ele inclina o tronco para a frente e fecha os olhos quando sente a respiração quente de bater contra a sua pele. Sua mão livre sobe até o rosto dela e acaricia suavemente sua bochecha, antes de puxar o queixo dela para si e juntar seus lábios em um beijo rápido e doce.
— Você não precisa me agradecer. Eu disse que estaria com você. — profere com a testa colada na dela e se afasta em um movimento brusco.
— Você tem certeza? — ela questiona com as sobrancelhas arqueadas e franze o cenho sem entender. — Porque, se eu bem me lembro, nós deixamos um assunto inacabado lá na cozinha. — a garota dá de ombros, mordendo os beiços, e se surpreende.
— Meu Deus, eu criei um monstro. Você está viciada em mim, ! — ele esbraveja e a garota rola os olhos, soltando seu braço para envolver seu pescoço e puxá-lo para outro beijo. Dessa vez, mais obstinado que o outro.
A mão de desce até a cintura da garota e ele crava os dedos em sua pele. Um grunhido salta pela boca de e o garoto aproveita o espaço entre seus lábios para invadi-la com a língua e intensificar ainda mais o beijo.
No entanto, nos segundos seguintes, sente o celular vibrar no bolso de sua calça e resmunga, frustrado, puxando o beiço da garota com seus dentes e encerrando o beijo com dois selinhos seguidos.
— É o alarme. O voo da Geórgia chega em meia hora, é melhor eu me apressar. — profere, checando o aparelho e voltando a guardá-lo em seguida — Você vem comigo? — ele questiona enquanto se levanta e arruma a roupa amassada com suas mãos.
— Não. Eu estou cansada e meu corpo está implorando por um banho. — dá de ombros e entorta o canto de seus lábios, um tanto quanto decepcionado. — Mas avise à ela que estarei lá na quarta-feira!
— Tudo bem, eu aviso. — diz, sacando as chaves do carro sobre o aparador de cristal. Em seguida, ele dá as costas à garota e caminha até a porta.
— Ah, só mais uma coisa… — ela profere, puxando a atenção de de volta para si. se levanta, dá alguns passos em direção a ele e acompanha seus movimentos, sem entender. — … Eu vou deixar a porta do meu quarto aberta. Se você quiser terminar o que começamos mais cedo, eu estarei te esperando. — diz, mordendo o lábio inferior, e um riso leve escapa pela boca de , ao passo que ele rola os olhos.
— Você realmente vai fazer eu dirigir daqui ao Heathrow com esse pensamento na cabeça? — questiona e a menina dá de ombros, tentando parecer inocente perante às acusações do garoto. — Isso é sádico, . — ele arqueia as sobrancelhas, indignado, e a garota acha graça.
— Agora você tem um motivo voltar mais rápido. — pisca um de seus olhos e gargalha, jogando a cabeça para trás.

Capítulo Três

“I’ll always have you. Just like a tattoo.”
Jordin Sparks, Tattoo.



Londres, 10 de agosto de 2020


Meus dedos tamborilam sobre o tampo da ilha de mármore no meio da cozinha, enquanto encaro a tela preta do meu celular e aguardo esperançosa por uma notificação que parece não querer vir. Frustrada, solto um suspiro longo, coçando minha têmpora com as pontas dos meus dedos e, em seguida, aperto ainda mais o rabo de cavalo que prende os meus fios de cabelo.
Destravo o aparelho e vou direto para a conversa nada amistosa que tive com meu pai há poucos minutos. Para a minha surpresa, ele e minha mãe tinham decidido passar os últimos dias da semana em Paris, na casa de um amigo dos tempos de faculdade que — até então — eu não sabia da existência.
De início, confesso que fiquei aliviada em saber que eles não estariam em Londres pelos próximos cinco dias e eu teria liberdade para aproveitar os primeiros dias de Geórgia na cidade como bem planejamos. No entanto, vi minha felicidade esvair pelos meus dedos quando meu querido pai — com toda a sua ignorância e falta de paciência — me deu duas opções das quais eu não conseguiria fugir.
A primeira delas era acompanhá-los durante essa viagem à França, onde eu teria de voltar a ser a que deixei para trás e fingir ser a filha perfeita de pais exemplares. Descartei essa opção na primeira oportunidade.
Recentemente, assisti a uma comédia da Netflix onde uma jovem empreendedora se muda para Paris e passa por aventuras invejáveis que vão desde infernizar a vida da sua nova chefe com ideias geniais e inovadoras à se apaixonar pelo vizinho do andar de baixo que, óbvio, é comprometido. Se algum dia eu for à França, eu quero que seja exatamente assim. Quero enlouquecer os franceses com meu idioma vasto que se resume à coucou — significa “Olá!”, por sinal — e viver um romance digno da cidade luz.
Por mais atrativa que a capital francesa seja, eu prefiro que nosso encontro aconteça em um momento mais oportuno e não com os meus pais controlando cada um dos meus passos. Porém, quando nego o convite, não me atento à um detalhe um tanto quanto insignificante: Arthur.
Assim que digo não à Paris, meu pai subentende que estou dizendo sim para sua segunda opção, a qual se resume basicamente a mim sendo babá do idiota com quem meus pais insistem para que eu me case. Não consigo pensar em ficar mais de dez minutos olhando para o rosto de Arthur sem lembrar que, enquanto eu estava sendo trouxa o suficiente para me guardar para ele, ele me traia com alguém que cresceu ao meu lado como uma irmã.
Você deve estar se questionando se eu coloquei isso em pauta e a resposta é: sim, coloquei.
Meus pais sabem dos atos ilícitos de Arthur desde o dia em que eu descobri que um par de chifres vinha crescendo na minha cabeça. Confesso, inclusive, que desconfio que eles descobriram bem antes do que eu e acobertaram toda essa farsa com a esperança de que isso não chegasse até mim e eu mantivesse não só o nosso noivado, como também o meu voto de castidade.
Sendo sincera, eu nem me surpreenderia caso essa minha desconfiança estivesse certa. Meu pai preza pela família perfeita e um bom relacionamento entre seus membros, mas isso só vai até a página dois. Então, não me espanta todo esse instinto de proteção em relação à Arthur. Afinal, eles são iguais.
O que me entristece, é saber que minha mãe é condizente com essas atitudes.
Respeito o meu pai pelo homem que ele é e por toda a sua história de conquistas vindas do zero, mas não se engane pelas aparências. A igreja não foi - nem de longe - o principal motivo pelo qual deixei o Brasil sem nem ao menos pensar em olhar para trás.
Fecho a aba de nossa conversa e, em seguida, vejo que os traços das mensagens desesperadas que mandei para a minha mãe recorrendo por sua ajuda estão azuis. Solto um suspiro desapontado, mas não a culpo. Minha mãe já não tinha mais força para enfrentar a ignorância do meu pai e o mínimo que eu podia fazer era lidar com os meus problemas sozinha.
Vejo uma notificação apontar na extremidade da tela e sinto meu peito comprimir quase que instantaneamente.

Arthur: Oi, linda.
Arthur: Você quer que eu te encontre na casa dos seus chefes?

Minha pele ferve de ódio e eu sinto uma vontade quase que incontrolável de gritar o mais alto possível e arremessar meu celular contra parede. No entanto, luto contra os meus próprios instintos e me apresso para responder um solitário “não”. Em seguida, tento ser curta e grossa ao acrescentar que combinaria um lugar para nos encontrarmos assim que soubesse quais eram os planos de para hoje.
Por falar em , talvez essa fosse a pior parte.
Eu não teria como fugir da companhia insuportável de Arthur hoje, mas talvez eu não precisasse aturá-lo sozinha. O problema é que eu não sabia como contar para o que o meu ex — porque, pensando bem, Arthur é meu ex — nos acompanharia pelo passeio turístico que programamos fazer durante a visita de sua irmã à cidade.
— Merda! — Resmungo entredentes, lançando meu celular sobre o balcão em seguida.
! — Assim que ouço o tom de voz inconfundível de uma das minhas crianças, ergo o meu rosto em direção ao som e encontro Oliver andando em minha direção, já com o uniforme de seu time de futebol. Passo as mãos pelo rosto, tentando disfarçar minha ira e, então sorrio sem mostrar os dentes. — Você não vai ao meu jogo hoje?
— Hoje não, príncipe. — Afago levemente seus ombros e o pequeno entorta os lábios, desapontado. Sem entender, viro minha cabeça um pouco para o lado e franzo o cenho. — O que foi?
— É que agora eu sei que meu time vai perder. — Ele dá de ombros, soltando um suspiro leve e um sorriso confuso salta pelos meus lábios.
— Como assim?
— Oliver cismou que você é o amuleto de sorte dele. — Parada na exata divisão entre a cozinha e a sala de jantar, vejo Vitória carregar a mochila de Oliver nas costas e uma Helena sonolenta no colo. Sei que Eric tinha levado Henry para uma consulta ao oftalmologista e, por um tempo, chego a me sentir culpada por ter mudado a minha folga para hoje.
— Isso é verdade? — Questiono com as sobrancelhas arqueadas e o pequeno morde os beiços.
— Vem, filho! Você vai se atrasar! — Tori esbraveja e o menino a olha por alguns instantes. Em seguida, suspira e volta sua atenção para mim.
— Por favor, . — Ele choraminga e eu me derreto, achando a situação um tanto quanto graciosa.
— Eu não posso, príncipe. Prometi ao que o acompanharia hoje e ele está contando com isso.
Dou de ombros, acariciando a bochecha do pequeno, e vejo um bico se formar em seus lábios. Respiro fundo e, em um movimento rápido, o viro em direção à Vitória.
— Mas você sabe que eu não preciso estar lá para ser o seu amuleto, não sabe? — Questiono com as sobrancelhas arqueadas, enquanto levo a criança de encontro à mãe e Oliver ergue o olhar para mim, sem entender. — Você não sabe? — Arregalo os meus olhos, fingindo espanto, e ele solta uma gargalhada graciosa, balançando a cabeça de um lado para o outro.
Quando ficamos há poucos metros de distância de Vitória, interrompo meus passos e viro Oliver de frente para mim. Me abaixo sobre os meus joelhos, ficando a uma altura vulnerável em relação a ele e seguro seus bracinhos.
— Eu prometo que vou estar com você aqui… — Digo, tocando o centro de sua testa com a ponta do meu indicador. —… E aqui. — Em seguida, aponto para a região de seu coração e Oliver gargalha no momento em que começo a fazer cosquinha embaixo do seu braço. — Vai dar tudo certo, campeão. — Profiro por fim, bagunçando seus cabelos e me erguendo do chão.
— Além do mais, a mamãe estará lá na torcida. Então hoje você vai ter dois amuletos da sorte. — Vitória mostra o número dois com os dedos de sua mão livre e eu vejo a criança revirar os olhos, virando o rosto de encontro ao da mulher.
— Você é pé frio, mãe. — Seu tom de voz sai um tanto quanto entediado e eu arqueio as sobrancelhas, surpresa, lançando um olhar para Vitória. Seu queixo tinha caído alguns centímetros e seus olhos estão arregalados. Preciso pressionar um lábio contra o outro para segurar o riso que insiste em sair pelos meus lábios.
— O que foi que você disse? — Ela questiona e o pequeno dá de ombros. — Moleque, você me respeita! — Minha chefe rosna entre dentes, mas percebo pelo seu tom de voz e pelo semblante em seu rosto que aquilo tudo era uma grande brincadeira. — Anda, guarde suas coisas no carro e me espere lá. Eu já estou indo. — Vitória entrega a mochila azul para Oliver e meus olhos acompanham os movimentos do pequeno até a saída de casa.
— Tchau, ! — Ele grita, sem voltar sua atenção para mim, e um sorriso leve surge no meu rosto.
— Tchau, príncipe! Bom jogo!
— Quando foi que meus filhos passaram a gostar mais de você do que de mim? — Tori pergunta, atraindo a minha atenção de volta para si e eu reviro meus olhos teatralmente.
— Isso não é verdade.
— Não? — Ela questiona com as sobrancelhas arqueadas, aninhando ainda mais Helena em seus braços. — Você não viu o escândalo que essa mocinha fez quando eu disse que você não a levaria ao parque hoje. — Profere e eu acho graça, afagando levemente os cabelos da pequena adormecida nos braços da mãe. Vitória suspira. — A verdade é que eu acho que eles ficam um pouco enciumados quando você dá muita atenção para o . — Confessa.
Surpresa, eu elevo minhas sobrancelhas e levo os meus olhos de encontro aos dela.
— Vocês estão falando de mim?

Narrador Avulso


A voz de atrai a atenção de e a se vira, o encontrando apoiado no último batente da escada.
Seus cabelos estavam úmidos e ele vestia um jeans flare e uma blusa branca, além de vans também brancos nos pés, e um colar de pérolas em volta do seu pescoço. Entretanto, o que chama a atenção da garota é o cardigã três vezes maior que ele, jogado sobre as outras peças de roupa.
Tinha quadrados em cores que iam do preto ao amarelo, passando pelo laranja e verde. sabia se vestir como ninguém, isso era inegável, mas algo naquela peça específica fez o peito de tamborilar. Não pela beleza exuberante do de um metro e oitenta parado em sua frente, mas sim pela metáfora agarrada a cada uma das linhas daquela peça de roupa.
A verdade é que , em questão de segundos, não conseguiu ver aquele casaco como um grande emaranhado de lã e sim como um espelho diferente daqueles que todo mundo está acostumado.
Arthur nunca usaria aquele cardigã, por todas as suas cores e extravagância, mas não era em nada parecido com o ex-noivo de . O não só vestiria aquela peça de roupa, como também faria questão de andar com ela pelos lugares mais movimentados da cidade só para que todas as pessoas pudessem admirar sua beleza e excepcionalidade.
era exatamente como aquele cardigã e quando ela se sentiu como uma peça de roupa abandonada e esquecida debaixo da cama de Arthur, a vestiu e fez com que ela se tornasse singular.
— Eu estava dizendo à que seus irmãos têm ciúmes de vocês. — Tóri rebate, chamando a atenção de para si. , por sua vez, arqueia as sobrancelhas surpreso.
— Eles têm? — O questiona, voltando o seu olhar para .
— Eu acho que sim. — A mais velha dá de ombros, puxando uma boa quantidade de ar para dentro de seus pulmões. — Bom, eu preciso ir. Tchau, meu filho.
— Tchau, mãe. — sorri, recebendo um beijo carinhoso da mulher em seu rosto.
— Tchau, . Se divirtam e mande um beijo para a sua irmã! Diga que eu estou ansiosa para conhecê-la. — Profere por fim enquanto caminha até a saída, e balança a cabeça na afirmativa.
Quando a porta se fecha e Vitória já não está mais no campo de visão do casal, volta sua atenção para e ela entorta levemente os lábios.
— Eu gostei do casaco. — Ela profere e suspira, abaixando o rosto para admirar o tecido colorido sobre sua pele.
— Obrigado. É um dos meus favoritos. — O dá de ombros e um sorriso largo e involuntário surge no rosto de quando ela pensa na metáfora que passou por seus pensamentos há pouco.
Em seguida, a balança a cabeça de um lado para o outro para afastar os seus devaneios e esfrega os olhos com o dorso da mão.
— Você já sabe para onde vamos? — Ela questiona, guardando as mãos nos bolsos de sua calça amarela e faz que não com a cabeça.
— Eu estava pensando que você poderia me ajudar com isso. — Confessa e ri.
— Bom, Geórgia me mandou mensagem mais cedo dizendo que ia dar uma volta em Notting Hill. Já são quase meio-dia, eu acho que podemos nos encontrar para almoçar na Piccadilly e depois visitarmos os pontos turísticos tradicionais. A London Eye, o Big Bem e etc, aí terminamos no Buckigham Palace para assistirmos a última troca de guarda. O que acha? — A garota questiona, animada, e arqueia as sobrancelhas.
— Você já tinha esse roteiro todo planejado. Não tinha?
— Talvez. — dá de ombros, com um sorriso infantil nos lábios, e revira os olhos teatralmente. — Você não parece muito animado.
— Você sabe que eu não gosto dessa baboseira turística.
— É, eu sei. Mas eu preciso te contar uma coisa. — A morde os beiços, hesitante, e franze o cenho. — E talvez isso te deixe mais irritado do que um passeio idiota.

Londres, 10 de agosto de 2020.
Piccadilly Circus.


— Por Deus, ! Melhora esse humor! — esbraveja, lançando o cardápio sobre a mesa.
Os dois estavam sentados, lado a lado, em uma mesa na região externa de um restaurante aconchegante, localizado em um dos pontos mais movimentados da Piccadilly Circus.
— A sua irmã não saiu de Amsterdã para aguentar essa sua cara amarrada aqui em Londres. — Profere, virando o seu rosto para o rapaz, mas ele não esboça nenhuma reação.
tinha trocado poucas palavras durante todo percurso até chegarem a esse restaurante. Quando encontraram uma mesa vaga, o rapaz cordialmente puxou uma das cadeiras para e se sentou ao seu lado. Desde então, ele estava com o maxilar travado, os braços cruzados na frente de seu peito e o olhar fixo na mesa de madeira em sua frente.
Em resumo, estava puto. De um jeito que nunca tinha visto antes.
— Então agora nós não estamos conversando. É isso? — Ela questiona com as sobrancelhas arqueadas e o rapaz se movimenta, levando uma das mãos ao rosto para coçar os olhos. — Eu posso pelo menos saber o motivo?
— Você sabe o motivo. — Sua voz sai mais grave que o normal e precisa se esforçar para conter o riso.
— Eu sei o mot… — Ela arregala os olhos e quando entende o ponto de , se cala. — Você está assim por causa do Arthur? — A questiona e, então, pressiona um lábio contra o outro quando vê se mover incomodado ao escutar o nome do outro rapaz. — Se eu não te conhecesse bem o suficiente, diria que está com ciúmes. — Ela dá de ombros e, por impulso, vira seu rosto de encontro ao dela.
O garoto hesita. Encara por alguns segundos sem dizer nada e grava cada mínimo detalhe em sua memória. Em seguida, volta sua atenção para a frente e solta um riso irônico.
— Do bunda mole do seu ex? Por favor, bonitinha. — Ele rola os olhos teatralmente e acha graça.
A verdade é que não precisava dizer em alto e bom tom para que soubesse que algo o incomodava. Ele estava sim com ciúmes e, meu Deus! sabia dizer o quão difícil era ser do tipo ciumento.
A inclina o seu tronco para frente e apoia o braço no encosto da cadeira em que está sentado.
— Então melhora essa cara, por favor. — Seu tom de voz sai aveludado, enquanto ela roça o nariz contra a pele do rosto dele. se mexe, sentindo seus músculos reagirem ao toque da garota, e ela ri, usando sua mão livre para trazer o rosto dele de encontro ao seu. — Eu prometo que você nem vai notar a presença dele. — Diz, acariciando a nuca do garoto com as pontas de seus dedos e a raiva que parecia consumi-lo segundos atrás desaparece como mágica.
De repente, se pega imerso na imensidão dos olhos de e a única coisa que ele pensa em fazer é erradicar a distância entre seus rostos e selar seus lábios três vezes seguidas.
— Tudo bem. Mas quando Georgia começar a me encher de perguntas sobre o que está acontecendo, é você quem vai explicar. — profere e gargalha, jogando a cabeça para trás.
— E por falar nela… — A menina arqueia as sobrancelhas assim que recupera o fôlego, e seus olhos encontram a figura da irmã de adentrando ao restaurante acompanhada por Léo.
! — Geórgia esbraveja e se levanta da cadeira. A irmã de recebe em um abraço amistoso, enquanto Léo estende a mão esquerda para cumprimentar o cunhado. — Que saudade! — Ela diz, apertando ainda mais o corpo da menina que, por consequência, ri.
— Você diz isso como se não se falassem todos os dias. — O tom de voz de sai entediado e as meninas se afastam para olhá-lo.
— Não é a mesma coisa, tudo bem? Pare de ser implicante! — Geórgia profere e revira os olhos. volta a se sentar ao lado do rapaz, enquanto a outra se aproxima do irmão e Léo se senta em frente a . — Como você está, docinho? — Ela questiona, inclinando seu corpo para frente para depositar um beijo na bochecha dele e receber outro em troca. dá de ombros.
— Bem.
— Você não me parece exatamente bem. — Ela franze o cenho, estranhando o semblante travado no rosto do irmão. Geórgia passa por Léo e se senta em frente a , ao passo que apruma a postura na cadeira e respira fundo.
— Não é nada. Eu só estou um pouco cansado. — Ele dá de ombros e Geórgia arqueia as sobrancelhas. , por sua vez, lança um olhar para o garoto e acaricia sua coxa coberta pelo tecido jeans da calça que usava.
Quando sente o toque de , vira o seu rosto de encontro ao da garota e os dois sorriem quando ele decide apertar levemente a mão dela.
— E então, quais as novidades? — A irmã de morde os beiços, animada, e o casal dá de ombros.
— Boa tarde! — Um tom de voz masculino faz Geórgia desviar a atenção em direção ao som. , por sua vez, quando vê a figura de Arthur parado ao lado da ponta onde e Léo estavam sentados, solta a mão de em um movimento tão abrupto que irrita o rapaz, que rola os olhos, entediado.
— Ah, oi! Você já veio anotar os nossos pedidos? — Geórgia questiona, pegando o cardápio sobre a mesa. Confuso, Arthur franze o cenho e arregala os olhos. , por outro lado, engasga com o riso e acaba fazendo um estranho quando não consegue segurá-lo dentro da boca. — Eu acabei de chegar e ainda nem tive tempo de olhar o cardápio, mas… Vocês já sabem o que querem pedir? — Ela pergunta, erguendo o olhar para e , e a balança a cabeça na negativa.
— Não, Ge. Ele não…
— Eu não trabalho aqui. — Arthur a interrompe e Geórgia o olha, sem entender. — Prazer, Arthur. Noivo da . — Diz, estendendo uma de suas mãos para a irmã de , que deixa o queixo cair um tanto quanto surpresa.
Confusa, a garota olha para o casal em sua frente e, enquanto cobria o rosto com uma das mãos e tentava controlar o riso que insistia em sair, estava com o rosto virado para baixo, os olhos fechados, e balançava a cabeça de um lado para o outro, visivelmente envergonhada.
— Me perdoe, eu não… não…
— Tudo bem. — Arthur dá de ombros, quando nota o nervosismo de Geórgia.
— Bom, é um prazer, Arthur. — A garota força o seu melhor sorriso e, então, se levanta, apertando a mão do rapaz. — Geórgia, irmã do .

Londres, 10 de agosto de 2020
Westminster Bridge Road - County Hall


O London County Hall é um prédio antigo de Londres que há alguns anos chegou a funcionar como conselho do condado de Londres. O edifício fica localizado ao norte da ponte de Westminster e às margens do rio Tâmisa. Hoje em dia, o prédio guarda um dos pontos turísticos mais movimentados da capital britânica, com atrações como Sea Life London e London Dungeon. A London Eye e a famosa torre do relógio Big Ben também se localizam em suas proximidades.
— Eu sabia que ela era alta. Mas eu não imaginei que fosse tão alta assim! — Geórgia profere, olhando para a imensidão da London Eye em sua frente, com a mão na testa para proteger seus olhos dos raios de sol.
— Ela é linda. Confesso que quando vim pela primeira vez, eu senti um pouco de medo porque eu e altura, bom…
— Isso é verdade. — Arthur se manifesta, interrompendo . — Até hoje não sei como ela conseguiu ficar doze horas trancada em um avião. tem pavor de altura.
— Ah, é? — franze o cenho e respira fundo ao ver o semblante sacana em seu rosto. — Você tem medo de avião, ? — Ele cerra os olhos e a umedece os lábios, desviando sua atenção para o rio Tâmisa.
— O quê?! Ela tem pavor! — Arthur gargalha e fecha os olhos com força, enquanto risos sem graça saltam pelos lábios de Geórgia e Léo, e arqueia as sobrancelhas, fingindo surpresa.
— Talvez você deva encontrar algo que te relaxe durante a viagem. — O sugere, encolhendo os ombros e guardando as mãos dentro dos bolsos de sua calça. — Ou alguém
— Certo! — Nervosa, a garota eleva o tom de sua voz para cortar antes que Arthur caia naquela conversa e acabe descobrindo algo.
Por conseguinte, pressiona um lábio contra o outro e cruza os braços na frente de seu peito, sustentando o olhar contra a garota. Já , passa as mãos pelos cabelos bagunçados pelo vento e balança a cabeça de um lado para o outro, afastando toda e qualquer lembrança do voo para Amsterdã que pudesse ter vindo à tona por causa daquele comentário.
— Nós ainda temos algumas horas até a troca de guarda e aqui ainda tem algumas atrações, vocês… Vocês têm alguma preferência? — Ela questiona, passando a mão pela nuca suada e lançando um olhar para que, por sua vez, revira os olhos, entediado, e solta um riso leve.
— Léo tinha dito que queria ir à London Dungeon*. — Geórgia se manifesta, olhando para o noivo, que concorda, balançando a cabeça.
— Ah, por favor! — profere quase que em tom de súplica e o casal acha graça. — Eu sempre quis ir lá, mas as minhas amigas têm medo e eu não tenho coragem de ir sozinha, então….
— Por mim, pode ser. — Arthur dá de ombros e balança a cabeça como se concordasse com as palavras do ex.
— Bom, eu tenho medo e não quero ir. Mas não vou estragar o passeio de vocês.
— E você vai ficar aqui sozinha? — questiona e Geórgia balança a cabeça na afirmativa quase que imediatamente. — Não, de jeito nenhum! Nós podemos ir ao aquário. — A sugere, olhando para os rapazes que não parecem muito felizes com a troca.
— Eu também não faço questão de ir. — profere, atraindo a atenção de todos para si. — Vocês podem ir e eu fico aqui com a Ge.
Atônita, arqueia as sobrancelhas e espaça os lábios alguns centímetros. Entrar na London Dungeon era uma vontade antiga, mas fazer isso sozinha com Arthur — por mais que Leonardo também estivesse junto —-, não era exatamente o plano.
— Ah não. É melhor ficarmos juntos e…
— Vamos, amor! — Arthur esbraveja, enlaçando seus dedos em um movimento rápido. Surpresa, não consegue reagir de imediato. — Vai ser divertido!
— É, . Vai ser divertido. — dá de ombros, atraindo o olhar da menina para si. O sorriso irônico em seus lábios faz o peito tamborilar de leve.
Filho da puta.
Pela forma inquieta como mudava constantemente de posição e pelo comportamento insolente que ele vinha apresentando desde o almoço, podia dizer com toda a certeza que ele ainda estava com raiva pela presença de Arthur. E deixá-la sozinha com ele e o noivo de Geórgia — que mal abria a boca para participar das conversas —, foi a maneira mais infantil que ele encontrou para ”se vingar” dela por ter convidado seu ex-noivo para acompanhá-los durante esse passeio.
, no entanto, não tinha planejado deixar em uma posição desconfortável com Arthur, mas se conhecia o suficiente para saber que precisava de pelo menos uma hora longe dos dois ou poderia acabar perdendo a cabeça e falando mais do que o necessário. Além do mais, por mais calado que o noivo de Geórgia fosse, sabia que não estaria sozinha com aquele idiota.
— Vocês podem ir, . — Geórgia profere, despertando a garota de seus devaneios. — Se divirtam e não se preocupem com a gente. Eu tenho planos para nós dois. — Ela ergue o rosto de encontro ao do irmão e pisca um de seus olhos enquanto franze o cenho, confuso.
— Tudo bem. — A solta um suspiro e puxa sua mão com certa força para que Arthur a solte. — É melhor comprarmos os ingressos de uma vez. — Ela dá de ombros e Arthur balança a cabeça na afirmativa.
abaixa a cabeça e espera para que Léo se despeça de Geórgia. , por sua vez, aproveita os momentos de distração de Arthur com o celular para se aproximar da garota.
— Você vai ficar bem? — Ele questiona, com o tom de voz mais baixo possível.
— Eu não acho que você se importe, . — Ela rebate, surpreendendo o rapaz com sua agressividade e arqueia as sobrancelhas enquanto ela o dá as costas e começa a caminhar em direção à bilheteria da atração. — Vamos, meninos!
— Léo! — esbraveja, chamando a atenção do cunhado para si e gesticulando com a cabeça para que ele se aproximasse. — Não deixa esse cara encostar nela. Por favor. — Pede, umedecendo os lábios, e o noivo de Geórgia ri.
— Fica tranquilo. Eu não vou sair do lado dela. — Garante e um agradecimento silencioso salta pelos lábios de em forma de sorriso.
Os olhos de acompanham os movimentos dos três, até que ele sente a presença de Geórgia um pouco mais perto do que antes. Exausto e um tanto quanto irritado pela situação, ele solta um longo suspiro e vira o rosto de encontro ao da garota.
— Que tipo de planos você tem? — Ele questiona e um sorriso de orelha a orelha salta pelos lábios de Geórgia.

*A London Dungeon é uma atração famosa por apresentar os episódios mais trágicos e tenebrosos dos últimos mil anos de Londres e é considerada pelos guias turísticos como “uma viagem ao inferno britânico”.

[•••]


— Você tem certeza de que quer fazer isso?
pergunta, observando a decoração do estúdio de tatuagem que Geórgia tinha encontrado há poucos metros de distância do County Hall. A garota, por sua vez, balança a cabeça na afirmativa com um sorriso animado nos lábios. suspira e vira seu rosto de encontro ao dela.
— Honestamente, Ge, eu sei que nos conhecemos há pouco tempo, mas eu tenho certeza que você é aquela pessoa que no meio da festa decide pular na piscina de roupa e no minuto seguinte se arrepende. — O profere e prende um lábio contra o outro quando vê o queixo de sua irmã cair alguns centímetros.
— Você acabou de me chamar de impulsiva? — Ela questiona, piscando os olhos repetidas vezes, e dá de ombros. — Você tem um cabide tatuado, ! — Geórgia esbraveja, empurrando o corpo do irmão para longe. Ele ri.
— Eu nunca me arrependo de pular na piscina, irmãzinha.
— Nem eu. Pelo menos não hoje. — Ela profere, sem hesitar, e arqueia as sobrancelhas, surpreso. — Eu só preciso que você segure a minha mão, porque eu tenho um certo problema com agulhas. — Geórgia morde os beiços, balançando sua cintura de um lado para o outro, e um riso salta pelos lábios de .
— Tudo bem. Você já sabe o que quer fazer? — O pergunta e, animada, Geórgia balança a cabeça na afirmativa, mostrando a imagem pela tela de seu celular. Sem entender, franze o cenho. — Isso são… Quatro pontos. — Diz, um tanto quanto confuso, e a outra rola os olhos, impaciente.
Isso é a inicial do seu nome em código morse. — Ela dá de ombros, guardando o celular no bolso de sua calça.
— A inicial do meu… — Estupefato, pisca os olhos algumas vezes e chacoalha a cabeça de um lado para o outro. — … Você vai tatuar a inicial do meu nome em código morse? Por quê?
— Eu acho bonito. É delicado, combina mais…
— Não. — Ele a interrompe e Geórgia o olha, sem entender. — Por que você vai tatuar a inicial do meu nome?
— Nós somos irmãos, não somos?
Ela rebate seu questionamento com outra pergunta, mas o semblante desordenado no rosto do rapaz não parecia exatamente satisfeito com aquilo. Por conseguinte, Geórgia respira fundo antes de continuar.
, eu amo você. — Ela confessa e um sorriso leve salta pelos seus lábios. — Pode parecer estranho pelo pouco tempo que nos conhecemos, mas eu amei desde o dia em que soube que tinha um irmão mais velho e eu ainda nem tinha visto a sua fisionomia. — Geórgia dá de ombros e, envergonhada, desvia o olhar para o balcão de madeira em sua frente. — Eu sei que eu não sou a sua única irmã e que talvez você não sinta por mim o que sente pelos seus outros irmãos, ou o que eu sinto por você, mas eu demorei anos para te ter na minha vida e, agora que tenho, eu não pretendo te deixar em paz. — Ela volta a sorrir e, então, devolve seu olhar para . — Essa tatuagem é só uma besteira para te manter perto enquanto estivermos longe.
Surpreso, não reage. Ele encara a figura de sua irmã com os olhos arregalados e demora alguns instantes para processar tudo o que tinha sido dito por ela. No entanto, quando isso acontece, é rápido e envolve os ombros de Geórgia em um abraço firme e carinhoso.
O sente seu peito aquecer e fecha os olhos quando inala o perfume adocicado preso aos cabelos da garota.
Emocionada, Geórgia também fecha os olhos e afunda o seu rosto na blusa branca que usava, agarrando a lã do cardigã dele com a ponta de seus dedos.
— Eu amo você. Mesmo. — Ele profere, quando se afasta e segura o rosto dela entre suas mãos. — É meio estranho dizer isso em voz alta, mas é verdade. E eu estou aqui com você, então avise ao Leonardo que ele ainda precisa da minha aprovação. — dá de ombros e a garota revira os olhos, afastando o corpo dele para longe do seu.
— Idiota.
— Vocês estão prontos? — A voz da tatuadora se faz presente e ambos levam sua atenção de encontro a figura feminina parada do outro lado do balcão.
— Estamos. — responde, jogando seu braço esquerdo sobre os ombros de Geórgia.
— Você ainda não escolheu o que vai fazer. — Ela diz, erguendo o olhar para o rosto de .
— Você prefere um G em letra cursiva ou de forma? — O questiona com as sobrancelhas arqueadas e Geórgia resmunga.
— Você não precisa fazer a inicial do meu nome só porque eu vou fazer a sua. — Profere, cruzando os braços na frente do peito, enquanto balança a cabeça de um lado para o outro. — Eu não quero que se sinta obrigado a isso.
— Ninguém me obriga a pular na piscina de roupa. E eu pulo mesmo assim. — dá de ombros e Geórgia pressiona um lábio contra outro, tentando conter o riso. — Cursiva ou de forma, Geórgia?

[•••]


— Fala sério! Isso não tem como estar doendo tanto assim! — esbraveja, soltando uma gargalhada ao ver a expressão no rosto da garota.
— Eu sou sensível!
— Você está exagerando e eu estou pagando caro por isso. — Ele diz com os olhos cravados em seus dedos esmagados pela mão livre de Geórgia. — Não se esqueça de que eu ainda vou precisar dessa mão, irmãzinha.
— Cale a boca! — Ela resmunga, enrugando ainda mais o semblante em seu rosto.
Geórgia estava sentada à frente de , com o braço direito sobre a mesa, enquanto a tatuadora exercia o seu trabalho, desenhando os quatro pontos enfileirados na horizontal em seu pulso.
— Faça algo para me distrair. — Ela pede, desviando o olhar para . — Me conte alguma coisa.
— Você mandou eu calar a boca.
!
— Tudo bem, tudo bem! — O ri, erguendo o seu braço livre. — O que você quer saber?
— Quem é esse Arthur e por que ele está chamando a sua namorada de noiva? — A garota questiona sem titubear e revira os olhos teatralmente. Não era difícil imaginar que Geórgia já tinha essa pergunta preparada há um bom tempo.
não é minha namorada.
— E eu imagino que isso seja culpa sua. — Ela rebate, levando o seu olhar de encontro ao do garoto e ele arqueia as sobrancelhas.
— E como exatamente isso seria minha culpa?
— Você ainda não fez um pedido.
— Ela é babá dos meus irmãos!
— Primeiro. — Geórgia solta a mão de e estapeia seu braço, arrancando um olhar reprovativo do rosto do garoto. — Nunca mais a reduza a isso, porque nós dois sabemos que é muito mais do que uma AuPair.
A garota o repreende e, momentaneamente, volta seus olhos para o trabalho da tatuadora em sua frente. resmunga e, em seguida, Geórgia devolve a sua atenção para ele.
— Segundo: vocês dois se gostam! — Ela esbraveja e desvia o olhar para as pontas de seus tênis. Ele entrelaça os dedos de uma mão nos da outra e, em seguida, solta um suspiro, exausto.
— Eu não teria tanta certeza disso. Ainda mais agora.
— Por causa desse Arthur? — Georgia insiste em saber e ergue o olhar de encontro ao seu.
— É. Eles são mesmo… Ou pelo menos eram noivos. — Ele dá de ombros, coçando a têmpora com a ponta dos dedos.
— E você sabia disso quando começou a se envolver com ela? — A garota questiona, franzindo levemente o cenho ao sentir a agulha da máquina arranhar sua pele, e balança a cabeça, na afirmativa.
— Sabia. Mas não houve traição, nem nada do tipo, é uma história complicada.
— Eu tenho alguns minutos. — Geórgia dá de ombros, com um sorriso leve nos lábios, e acha graça, lançando um olhar rápido para os quatro pontinhos que começavam a surgir na pele de sua irmã.
— Certo.
Por conseguinte, o garoto joga as costas contra o encosto da cadeira e embola o cardigã — que ele havia tirado minutos antes para poder fazer a tatuagem — em seus braços, conforme os cruza na frente de seu peito.
— Quando se mudou para cá, ela estava noiva desse cara. Mas pouco tempo depois que voltei para casa e a conheci, ela descobriu que ele estava tendo um caso com uma menina que, pelo que eu entendi, era uma das melhores amigas dela.
conta e a primeira reação de Geórgia é arquear as sobrancelhas, surpresa. No entanto, nos minutos seguintes, o semblante em seu rosto relaxa e ela balança a cabeça de um lado para o outro, deixando um riso incrédulo saltar pelos seus lábios.
— Filho da puta.
— Pois é. Mas essa não é nem a pior parte. — profere, passando o indicador por baixo do nariz e, em seguida, enfia os dedos entre seus cabelos. Curiosa, Geórgia arregala os olhos para o irmão. — A família da é muito religiosa e tanto ela, quanto o Arthur, tinham feito um voto de castidade. Você sabe o que é isso, né? Quando o casal não pode…
— Transar antes do casamento, eu sei. — Geórgia o interrompe e balança a cabeça na afirmativa.
— Exatamente. Então, quando soube da traição, ela acabou com o noivado e… Bom, o resto você deve imaginar.
— Espera aí. Então quer dizer que você foi o primeiro…
— Fui. Começou tudo como uma grande brincadeira, eu juro. Ela me pediu para ensinar o que eu sabia sobre sexo e eu ensinei.
dá de ombros com um sorriso torto nos lábios. Em seguida, ele inclina o tronco para frente e apoia os cotovelos sobre seus joelhos. Balança a cabeça de um lado para o outro, enquanto vagueando os cabelos com as pontas e seus dedos e, então, volta a encarar Geórgia.
— O problema agora é que os pais dela também estão em Londres e continuam insistindo nesse casamento como se nada tivesse acontecido.
Um riso breve escapa pelos seus lábios e limpa os cantos de sua boca com as pontas do seu polegar e seu indicador. Era notável para Geórgia o quão inquieto seu irmão estava em relação àquele assunto.
— Eles não sabem sobre mim, lógico, e eu fico realmente aliviado com isso porque o pai dela é… — O arregala os olhos e a garota acha graça no semblante embasbacado em seu rosto. — Enfim, agora eu não sei como agir porque…
— Você está apaixonado. — Geórgia dá de ombros e prontamente se cala.
Surpreso, ele demora alguns instantes para processar as palavras que tinham sido ditas por sua irmã e, quando isso finalmente acontece, volta a jogar suas costas contra o encosto da cadeira de rodinhas e franze o cenho em uma expressão que faz Geórgia rir.
— Eu não diria apaixonado, é só que…
— Eu juro que não acreditei quando recebi a localização e vi que vocês estavam em um estúdio de tatuagem! — Os dois são surpreendidos pelo tom de voz inconfundível de , e imediatamente se cala.
Os irmãos desviam seus olhares em direção ao som e encontram com um sorriso animado, parada do outro lado do balcão de madeira, entre Léo e Arthur.
— Pronto. — A tatuadora sorri, atraindo a atenção de Geórgia para si.
— Pronto? — Ela questiona e a profissional balança a cabeça na afirmativa. — Ah, nem doeu tanto assim. — A irmã de dá de ombros e o garoto revira os olhos, se levantando da cadeira em que estava sentado.
— A minha mão é a prova de que isso é mentira. — Ele profere e agora é Geórgia quem rola os olhos.
— Deixa eu ver! — pede, quando os dois atravessam o balcão.
ergue a manga e sua blusa e mostra para a menina o pequeno G tatuado em seu ombro, enquanto Geórgia mostra os quatro pontos tatuados na lateral de seu pulso. Quando entende os significados dos desenhos, sorri, graciosa.
— E o passeio de vocês? Como foi? — Geórgia questiona, quando sente os braços de Léo envolverem a sua cintura.
— Foi bom. Mas não dá tanto medo quanto parece. — O rapaz entorta os lábios um tanto quanto decepcionado e balança a cabeça na afirmativa.
— É verdade. Acho que nossas expectativas estavam acima da realidade. — A solta um riso breve e então vira seu rosto de encontro a . — Me desculpe pela forma como falei com você mais cedo, eu não… Não quis ser grossa.
Ela morde os beiços, hesitante, e o rapaz se surpreende, lançando um olhar rápido para a sua irmã, que sorri sem mostrar os dentes, afundando o rosto no peito de seu noivo.
— Tudo bem. Me desculpe também por não ter ficado. — Ele entorta um dos cantos de seus lábios, olhando rapidamente para Arthur, distraído com os desenhos de tatuagens espalhados pela parede do estúdio.
— Não tem importância. Foi por algo muito melhor. — Ela dá de ombros, olhando para a tatuagem mais recente em seu ombro e um sorriso bobo salta pelos lábios de quase que involuntariamente.
— São quase quatro e meia. Nós não deveríamos ir? — A voz de Arthur se faz presente e revira os olhos, impaciente.
— Claro. — Ela profere, virando seu corpo de frente para a figura de seu ex-noivo. — É melhor nos apressarmos.

Capítulo Quatro

”It's inevitable, everything that's good comes to an end.”
One Direction, Love You Goodbye.

Narrador Avulso


Londres, 10 de agosto de 2020
Palácio de Buckingham.


Desde 1837, o Buckingham Palace vem sendo a residência oficial da monarquia britânica. O prédio possui mais de setecentos quartos e serve como base para eventos, tais como cerimônias reais e visitas de Estado.
Por esses e outros motivos, o palácio acaba se tornando um atrativo para visitantes vindos de todos os cantos do mundo e suas redondezas estão sempre repletas de turistas. Principalmente durante os horários da troca de guarda*.
Durante o verão, — quando a rainha está na Escócia — algumas visitas às dependências da moradia real são permitidas. Mas os turistas interessados nesse tipo de passeio precisam reservar uma visita guiada com antecedência e só assim terão a oportunidade de conhecer áreas como os Salões do Estado, por exemplo.
Quando pensou em trazer Geórgia e Léo para conhecer um dos mais característicos pontos turísticos da cidade, pensou em todas as possibilidades. Imaginou que, por ser dia de semana em um mês útil onde muitas pessoas trabalham ou estudam, a aglomeração para assistir a troca de guarda não seria tanta. No entanto, a menina esqueceu que diferente das cidades turísticas no Brasil, Londres é atrativa em qualquer época do ano, e encontrar um Palácio de Buckingham livre de visitantes é quase impossível.
Além disso, agosto costumava ser um dos meses mais quentes e abafados do ano. Logo, nada parecia contribuir com o passeio.
— Eu não imaginei que fosse estar tão lotado assim. — diz, prendendo seus cabelos em um coque no topo de sua cabeça.
— E você esperava o que, ? — O tom de voz de sai com certa ironia e a revira os olhos.
— Essa sua aversão a atrações turísticas é um tanto quanto chata, sabe? — Ela cerra os olhos e cruza os braços na frente do corpo enquanto acha graça e deixa um riso leve sair por seus lábios.
— Foi só um comentário. — Ele dá de ombros e a garota resmunga, virando o seu corpo para a direção oposta a que ele estava.
, por conseguinte, morde os lábios e assiste em silêncio passar as mãos para livrar sua nuca dos poucos cabelos rebeldes que não tinham sido presos pelo coque.
— Quando foi que ficou tão quente? — Geórgia se manifesta, usando o panfleto de informações como um leque para espantar o calor.
— Vocês têm certeza de que querem ver isso? — Léo questiona, enrolando os cabelos de Geórgia em um rabo.
— Talvez fosse melhor voltarmos outro dia. — A irmã de sugere e os outros se entreolham.
— Vocês quem sabem. — dá de ombros, lançando um olhar rápido para Arthur, que reage com indiferença à opção.
— Você pelo menos pensou em comprar os ingressos para entrarmos lá? — questiona com os olhos cerrados e franze o cenho.
— Entrar no palácio? Isso é… Impossível. — Ela solta um riso leve e Geórgia olha curiosa para o irmão.
— Na verdade, não. — dá de ombros, descruzando os braços e escondendo as mãos nos bolsos de sua calça. — Até onde eu sei, eles vendem ingressos para as pessoas conseguirem assistir a guarda em um lugar mais privilegiado. — Diz, tentando soar indiferente, enquanto tenta conter o riso ao ver a reação surpresa no rosto de .
— E por que você não disse isso antes?
— Eu pensei que você soubesse, ué! Você passa horas planejando essas visitas. — rebate em sua defesa e a rola os olhos.
— Onde vendem esses ingressos? Ainda faltam alguns minutos, talvez ainda consigamos comprar. — A saca o celular do bolso e abre uma página no Safari. Em seguida, ergue o olhar de encontro ao de e arqueia as sobrancelhas, esperando para que ele diga o site de compra para os ingressos.
— Ah, não. Eles não vendem em site. — Ele diz e a garota franze o cenho. — É uma coisa meio arcaica e, se eu não me engano, a loja fica aqui perto. Nós podemos ir lá, se vocês quiserem. — sugere e os outros se entreolham.
— Pode ser. Nós já estamos aqui mesmo. — dá de ombros e um sorriso sacana surge nos lábios de quando ele vê sua irmã e seu cunhado balançarem a cabeça na afirmativa.
No entanto, quando percebe que Arthur, Geórgia e Leonardo fizeram menção de segui-lo junto à , se apressa para detê-los.
— Não! — Ele esbraveja e os outros se surpreendem. — É melhor irmos dois de nós para não chamar tanta atenção. Imagina se todas essas pessoas resolvem procurar por esses ingressos. — Diz e cerra os olhos, desconfiada, quando o vê passar os dedos entre seus cachos. — Além do mais, é melhor alguém guardar esse lugar, caso a gente não consiga nada.
— Faz sentido. — Léo dá de ombros e sorri, balançando a cabeça na afirmativa.
— Vamos, ? — O a chama e a menina reage com indiferença, seguindo a sua frente pelo caminho que indicava. — Nós não vamos demorar. — Ele profere, piscando um de seus olhos para Geórgia e ela revira o olhar quando entende as reais intenções do irmão.
e caminham lado a lado em silêncio por toda a área cercada pelo palácio. Quando já estão a uma certa distância e longe do alcanço de visão dos outros, a enrola seus dedos na alça transversal de sua bolsa e respira fundo, antes de erguer seu rosto em direção ao do garoto.
— Eu não acredito que deixei essa informação passar. — Ela solta um riso leve e leva o olhar de encontro ao dela. — Eu poderia ter poupado o nosso tempo e teríamos conseguido aproveitar mais lá em Piccadilly. — A garota suspira e entorta os lábios em um sorriso singelo, apertando um de seus ombros.
— Poucas pessoas sabem disso. Não é uma coisa tão divulgada como as outras, acho que justamente para evitar tanta aglomeração. Até porque, é da residência da rainha que estamos falando. — Um riso frouxo salta pelos seus lábios e arqueia as sobrancelhas, entortando levemente seus beiços. — O erro foi meu por ter presumido que você saberia disso. — Ele dá de ombros e balança a cabeça na negativa.
— Não tem problema, o importante é conseguirmos. — Ela rebate com um sorriso nos lábios e se esforça para fazer o mesmo e não rir da inocência ainda presente na essência da garota. — Ainda estamos longe? — A questiona e cerra os olhos, vendo o final do quarteirão há poucos passos de onde estavam.
— Não. É logo ali. — O garoto rebate, apontando para a rua onde se encerrava os portões da residência monárquica.
— Onde? — questiona, arqueando o olhar e ri.



— Aqui. — Digo e então a puxo pela mão para dentro da rua onde sei que ninguém conseguiria nos ver.
Com o susto, arregala os olhos e eu solto um riso, mas não dou chance para que ela consiga questionar o que estava acontecendo. Envolvo seu corpo com o meu braço direito e seguro a sua nuca com a minha mão esquerda, trazendo seu rosto de encontro ao meu.
Junto nossas bocas uma na outra em um beijo um tanto quanto urgente e sinto o corpo de amolecer em meus braços. Imagino que a força em suas pernas tenha desaparecido, então aperto ainda mais a sua cintura contra o meu peito e ela finalmente corresponde ao meu beijo.
Estremeço quando sinto as mãos de tocarem a curva da minha cintura, enquanto adulo seus beiços com a ponta da minha língua e sinto o familiar gosto doce de melancia preso ao seu protetor labial.
, por conseguinte, afasta seus lábios um do outro e permite que eu intensifique o beijo, deixando que nossas línguas se encontrem em um tipo de brincadeira desordenada à qual eu e ela já estamos perfeitamente acostumados.
Quando o ar se faz necessário, desacelero os meus movimentos e encerro o beijo com três rápidos selinhos. Afasto o meu rosto do dela e ainda está com os olhos fechados, o que me faz rir.
— Me desculpa. Eu não estava mais conseguindo segurar isso. — Digo, afastando os fios rebeldes de seu rosto, enquanto olho e tento gravar cada mínimo detalhe dele. suspira.
— Não tem como entrar no palácio, tem? — Ela questiona, finalmente abrindo os olhos de encontro aos meus e eu dou de ombros, deixando um riso infantil saltar pelos meus beiços.
— Até tem. Mas precisa agendar com antecedência. — rola os olhos e usa um de seus braços para empurrar o meu peito para longe, mas eu consigo ser mais forte e a mantenho junto a mim.
Em meio às risadas, sobe seus braços até o meu pescoço e acaricia a minha nuca com a ponta dos dedos.
— Cachorro, . Você é um cachorro. — Ela profere e eu reviro os meus olhos. Inclino o meu rosto de encontro ao dela e vejo umedecer os lábios com a ponta da língua, quando sinto sua respiração quente cortar a minha pele.
— E você adora. — Sussurro com a minha boca rente à dela e arqueia as sobrancelhas quando sente minhas mãos apertarem o seu quadril.
Em seguida, eu mordo seu lábio inferior e a selo rapidamente. ri e finalmente encontra forças para se afastar de mim. Ela começa a caminhar em direção ao caminho que fizemos para chegar aqui e eu mantenho os meus pés cravados no chão.
— Vem, vamos voltar. E boa sorte inventando uma desculpa para essa brincadeira. — vira o seu corpo de frente para o meu mais uma vez e o sorriso em seus lábios faz minhas mãos formigarem.
Em questão de segundos, me pego com uma expressão embasbacada no rosto, pensando nas coisas que Geórgia tinha me dito. E se eu estiver apaixonado?
, espera! — Esbravejo sem pensar e ela interrompe seus passos mais uma vez para me olhar. Não digo nada, então franze o cenho sem entender.
— O que foi? — Ela questiona depois de alguns segundos em silêncio e eu finalmente desperto do transe. Pisco meus olhos algumas vezes e balanço a cabeça de um lado para o outro, tentando afastar meus devaneios.
— Nada. Esquece. — Rebato, tentando soar indiferente, e cerra os olhos, cruzando os braços na frente de seu peito, o que me faz rir.
— Agora fala, .
Eu respiro fundo e rolo meus olhos. Coloco meu braço ao redor do seu pescoço e, com um impulso, viro o seu corpo de volta para a direção que deveríamos seguir.
— Você é muito curiosa, bonitinha. — Profiro e ela resmunga em um tom de voz inaudível.
— E você é um insolente, insuportável. — Ela dá de ombros e eu solto uma gargalhada, passando o indicador por baixo do meu nariz.
Em seguida, paro de andar e seguro seu corpo para que faça o mesmo, ela vira o seu rosto de encontro ao meu e eu aperto suas bochechas com a minha mão.
— Eu nunca disse que não era. — Rebato, depositando um beijo leve e rápido em seus lábios. ri.

[•••]


— E então? — Arthur arqueia as sobrancelhas quando nos vê e desvia o olhar para mim.
— Eles estavam fechados. — Dou de ombros, coçando os cabelos na minha nuca. Geórgia rola os olhos e prende um lábio contra o outro, tentando conter o riso e eu faço o mesmo.
— Vamos ficar aqui mesmo. A troca já vai acontecer. — Minha irmã se manifesta e eu vejo Arthur dar de ombros.
— Tanto faz. — Ele dá de ombros e, então, vira o seu rosto de encontro ao de . — Vem cá, . — Arthur gesticula com a cabeça e a garota lança um olhar para mim.
— Aqui está bom. — Ela diz, forçando um sorriso simpático, mas Arthur balança a cabeça de um lado para o outro.
— Você vai conseguir ver melhor daqui. Vem. — Ele insiste e, antes mesmo que tenha tempo de protestar, envolve os dedos em seu punho, a puxando para perto de si.
Sua atitude me incomoda, mas resolvo ignorar e viro meu rosto de encontro ao chão, enquanto pinço o meu lábio inferior com as pontas dos meus dedos. Sei que atendeu ao pedido de Arthur porque, de repente, sua sombra não está mais na minha frente.
Quando ouço os tambores da banda e os apitos indicando o início da troca de guarda, involuntariamente ergo o meu rosto em direção ao som e sinto Geórgia apertar a minha cintura, animada. As pessoas ao nosso redor comemoram como se estivessem vendo algo extraordinário — e talvez estivessem — e eu acho graça.
Em um movimento irreflexo, levo a minha atenção até . Como uma grande fã da Inglaterra e de todos os seus atrativos turísticos, estava eufórica e batia palmas para o espetáculo que acontecia à sua frente. Sinto meu peito tamborilar e mais uma vez penso na possibilidade de eu estar me apaixonando por aquela menina.
No entanto, essa sensação boba de formigamento logo dá lugar à raiva quando vejo Arthur apoiar a mão em sua cintura e pressionar o corpo dela contra o seu. Minha garganta seca e, de repente, esqueço o que acontecia há metros de distância de mim.
parece estar anestesiada demais para notar o toque dele, mas quando Arthur se inclina para frente e beija a região de sua nuca, ela se movimenta de maneira desconfortável e eu aguardo na esperança de que ele pare e se afaste.
Mas ele não para.
Ao invés disso, Arthur envolve o corpo de com os dois braços e a abraça firmemente por trás. A luz que antes irradiava dos olhos e o sorriso dela, agora já não estava mais ali e eu não precisava de muito para entender que ela não estava se sentindo bem naquela posição. Mas Arthur era notavelmente mais forte e ela não conseguiria se desvencilhar sozinha.
Sinto o sangue ferver dentro das minhas veias e, quando me dou conta, já estou com a mão sobre o ombro do garoto, chamando sua atenção para mim.
— Você não percebe que ela está desconfortável? — Questiono um tanto quanto incrédulo com a situação e ele franze o cenho sem entender. , por outro lado, arregala os olhos, surpresa com a minha atitude.
— Do que você está falando?
— Disso. — Rebato, apontando para os seus braços ainda ao redor da garota.
De soslaio, olho para e ela me parece preocupada, mas continua em silêncio assim como minha irmã e Léo.
— Eu só estou abraçando a minha noiva. Qual o problema nisso? — Ele questiona e seu tom de voz sai afetado.
— Ela não está confortável. — Respondo sem hesitar e Arthur franze o cenho, como se eu fosse algum tipo de idiota.
— E quem te disse isso? — Um riso debochado salta pelos seus lábios e eu respiro fundo.
Em seguida, Arthur vira o seu corpo de frente para mim e consequentemente faz o mesmo. Sinto vontade de fazê-lo engolir o chiclete que ele mascava desde a hora que nos encontramos em Piccadilly, mas eu estaria indo contra as minhas próprias convicções, então me contento em serrar meu punho.
— Por Deus, é minha noiva! — Ele esbraveja e meus olhos reviram em um movimento quase que involuntário.
Não consigo conter o riso irônico que surge em meus lábios, enquanto cruzo os braços na frente do meu peito.
— Você tem prazer em dizer isso, não é? — Estreito o meu olhar contra o dele e Arthur não parece entender a minha pergunta. — Minha noiva.
— É claro que sim. é uma menina linda e eu me sinto muito feliz por poder me referir a ela assim.
Vejo abaixar o rosto e, em seguida, Arthur roça o nariz na pele de sua bochecha em um gesto asqueroso, e a beija, forçando o personagem de noivo carinhoso.
Minha irmã me lança um olhar preocupado e eu balanço a cabeça de um lado para o outro, garantindo a ela que eu não faria nada.
Precisaria de muito mais do que isso para Arthur me tirar do sério.
— Mas ela não é. Sua noiva. — Dou de ombros, puxando a atenção dele de volta para mim.
— O que disse? — Ele questiona com as sobrancelhas arqueadas e eu volto a revirar meus olhos.
— Fala sério, Arthur. Vocês não estão mais noivos e já te disse isso várias vezes. Pombos entenderiam isso mais rápido do que você.
— Sem ofensa, … Certo? — Ele cerra os olhos como se tivesse se esquecido do meu nome e eu acho graça. — Você não me conhece e nem conhece a . Nós estamos juntos há anos e brigamos como qualquer outro casal. Isso é normal, sua irmã deve saber do que eu estou falando. — Dá de ombros, lançando um olhar rápido para Geórgia que, por sua vez, arqueia as sobrancelhas e solta um riso dotado de ironia, deixando claro o gene que temos em comum. — Eu amo a e sei que…
— Você se faz de idiota, não é possível. — Meus pensamentos escapam pelos meus lábios, enquanto eu balanço a cabeça de um lado para o outro e coço a têmpora com a ponta dos meus dedos. — Eu não consigo entender como você pode perder tanto tempo insistindo em algo que nem ao menos faz bem para você!
… — Ouço proferir o meu nome num tom de voz mais baixo possível, mas estou um tanto quanto irritado com o comportamento do imbecil parado na minha frente que mal consigo dar ouvidos à minha racionalidade.
— Você tem razão. Eu não te conheço e francamente, eu nem faço questão de conhecer. Mas eu conheço a e sei que ela não te ama. Muito pelo contrário, ela tem repulsa ao seu toque e qualquer um consegue ver isso. — Profiro por fim e Arthur me encara, estupefato.
Ele parece não ter defesa para todas as minhas acusações, então volto a minha atenção para e me preparo para tirá-la de perto dele. No entanto, Arthur é mais rápido e me surpreende ao quebrar o silêncio.
— Você acha que ela tem repulsa ao meu toque? — Ele questiona, atraindo a minha atenção de volta para si e eu dou de ombros.
— Eu tenho certeza.
— Eu acho que você está errado. — Ele rebate, parecendo indiferente, e eu reviro os meus olhos, entediado. — E eu vou te provar.
Eu franzo o meu cenho sem entender como ele faria aquilo e, quando me dou por mim, vejo seus dedos abraçarem o braço de com certa força e virarem o corpo dela de frente para o seu com um único impulso.
Não consigo acreditar que Arthur teria coragem de fazer o que se passava pela minha cabeça e me surpreendo ao vê-lo juntar seus lábios aos de em um movimento brusco e grosseiro.



Sinto Arthur colar seus beiços aos meus com certa violência e eu mal tenho tempo para reagir. Tento me afastar, mas sinto seus dedos apertarem ainda mais os meus braços conforme eu me mexo.
Sua língua toca os meus lábios e eu os prendo com toda a força que consigo, enquanto sinto um arrepio desagradável percorrer a minha espinha.
De repente, não o sinto mais. Seu peso e seu toque desaparecem de mim e eu tenho medo de abrir os olhos e ter a certeza de que enlouqueci.
!
É quando ouço Geórgia esbravejar o nome do irmão que consigo sair do meu estado de choque. Assim que abro os olhos, no entanto, vejo avançar para cima de Arthur, e Léo entre os dois, tentando evitar uma briga maior.
Me surpreendo ao ver o semblante no rosto de . Seu maxilar estava fortemente travado e seus olhos não brilhavam como de costume. Seu punho estava serrado e o noivo de Geórgia lutava para segurá-lo.
— Qual é a porra do seu problema? — Arthur questiona e, em um movimento irreflexo, viro o meu rosto em direção ao seu.
Meu ex parecia assustado — embora nunca fosse demonstrar isso — e sua mão no rosto tentava aliviar a dor do soco certeiro que tinha acabado de receber.
Em outras circunstâncias, eu confesso que teria adorado essa cena, mas agora me sinto preocupada demais com para dar atenção a isso. Volto minha atenção para ele e toda aquela situação, misturada com a euforia dos turistas e o calor de Londres faz com que eu me sinta tonta.
— Solta ele, cara! Eu não tenho medo. — Arthur se manifesta, encorajando Léo a soltar e eu sinto minha garganta secar.
— Parem. — Digo, mas meu tom de voz é quase inaudível e ninguém me escuta.
Viro o meu rosto para baixo e o chão parece se mover. Sem entender o que estava acontecendo, eu fecho os olhos e balanço a cabeça de um lado para o outro. O que parece piorar a situação.
Quando volto a abrir os olhos, o chão não é mais a única coisa se movendo. Levo uma das minhas mãos a testa e sinto um suor frio molhar a minha pele.
— Mas que porr… — Profiro um tanto quanto confusa e, assim que o cheiro forte da batata frita nas mãos da criança ao meu lado atravessa o meu olfato, sinto uma vontade quase que absurda de vomitar.
? — A voz de Geórgia parece estar presa em outra realidade, então procuro pelo seu rosto, sentindo as minhas pálpebras pesarem. — ? Você está bem? — Ela questiona, tocando o meu ombro.
De repente, o barulho da briga entre os meninos se encerra e, no meu inconsciente, sei que agora sou o centro de suas atenções.
? — É Arthur quem me chama, mas sua voz só faz com que a vontade de vomitar seja maior.
— Eu acho que vou… — São as únicas palavras que eu consigo dizer antes de perder a consciência. Sinto, no entanto, dois braços envolverem a minha cintura e isso me impede de cair no chão.

[•••]


Meus olhos estão cansados, então tenho certa dificuldade em abri-los. Sinto um vento frio refrescar a minha pele e entorto levemente meus lábios.
? — Ouço o tom de Geórgia e sinto sua mão tocar meu braço esquerdo. Minhas pálpebras continuam pesadas, mas dessa vez faço um esforço maior para abri-los.
Quando finalmente consigo abrir os meus olhos, percebo que estou sentada no chão do parque, com as minhas costas contra uma árvore que me protegia do sol. Vejo a irmã de sorrir na minha frente e atrás dela o palácio de Buckingham parece bem menor a essa distância.
Franzo o cenho quando sinto minha boca seca e me esforço para umedecê-la com a ponta da minha língua.
, você consegue me ouvir? — Geórgia pergunta e quase que instantaneamente, balanço a cabeça na afirmativa.
— Sim, eu só estou… — Faço uma breve pausa entre as palavras para aprumar a minha postura e, em seguida, volto o meu olhar para a irmã de . — … Com um pouco de sede. O que aconteceu?
— Você desmaiou. — Ela rebate e eu arqueio as sobrancelhas, o que a faz rir. — Mas não tem muito tempo. te trouxe para a sombra e… — No instante em que Geórgia profere o nome dele, eu deixo de escutar todas as outras coisas que saiam pela sua boca. Ao invés disso, busco pela figura de nas redondezas de onde estamos, mas não o encontro.
— E cadê ele? — Questiono, sem ter ideia do que ela estava falando, e Geórgia se cala. Um sorriso leve salta pelos seus lábios, inclina seu tronco para a frente e leva uma de suas mãos ao meu rosto, afastando alguns fios soltos da minha testa.
— Ele e os meninos foram buscar água e algo para você comer. Ele ficou muito preocupado com você, bonitinha. — Ela aperta uma das minhas mãos e eu solto um riso quando a ouço me chamar da mesma forma que . — O seu noivo, por outro lado… — Geórgia morde os beiços e eu reviro os meus olhos.
— Arthur não é meu noivo, Ge. — Confesso, meio envergonhada. — É bem complicado, mas ele definitivamente não é meu noivo. E eu não me surpreenderia se ele tivesse ido embora e me deixado lá no chão. — Franzo o meu cenho e Geórgia acha graça do semblante em meu rosto.
— Eu sei. me contou. Ele me contou tudo, por sinal. — Ela dá de ombros e eu arqueio as sobrancelhas.
— Tudo? — Questiono, meio embasbacada, e a irmã de balança a cabeça na afirmativa.
— Tudo. — Geórgia rebate e seus olhos se firmam na minha mão esquerda. Mais especificamente, no anel preso ao dedo anelar da minha mão esquerda.
— Oh, Deus! — Esbravejo, envergonhada, e, em um movimento rápido, cubro o meu rosto com as mãos. Geórgia ri.
— Está tudo bem. Você não precisa ter vergonha. — Ela diz, tocando os meus punhos e os forçando para baixo.
não precisava ter te contado exatamente tudo. — Profiro depois de um longo suspiro e a garota acha graça.
— Eu sou um pouco insistente, então acho que eu teria arrancado isso dele de qualquer maneira. — Geórgia dá de ombros e eu não consigo controlar o riso que salta pela minha boca.
Mesmo assim, me sinto como um diário exposto e não consigo erguer o meu rosto para olhá-la. Passo os próximos instantes encarando as minhas mãos enquanto um silêncio um tanto quanto perturbador toma conta da situação.
— Você se lembra de algo? — O tom de voz de Geórgia quebra o silêncio e eu dou de ombros.
— Me lembro de ter me sentido mal quando os meninos começaram a discutir. Eu estava tonta, não sei. Mas aí senti o cheiro da batata frita na mão da criança do meu lado, então me senti enjoada e, enfim. — Digo e ouço Geórgia suspirar, o que me deixa curiosa.
— Eu… Eu preciso te fazer uma pergunta, . Pode ser? — Ela morde os beiços e eu franzo meu cenho, sem entender. No entanto, balanço a minha cabeça, autorizando sua pergunta. — Não me leve a mal, por favor. Mas você se lembra de quando foi a sua última menstruação? — Geórgia questiona e eu me sinto pega de surpresa.
Arqueio as sobrancelhas e levo algum tempo para processar as suas palavras.
— Já faz um tempo, mas o que… — Quando a minha ficha cai e eu entendo o motivo de sua pergunta, arregalo os olhos, assustada, e arrumo ainda mais a minha postura. — Geórgia, você acha que eu passei mal porque…
— As pessoas não desmaiam por nada, . — Ela dá de ombros e eu sinto meu peito comprimir só de pensar nessa possibilidade. — Eu acho que você deveria fazer um exame.
— Eu não estou grávida! — Esbravejo. Passo as mãos pelo rosto em um gesto afobado e Geórgia arregala os olhos, espantada com o meu tom de voz. — Eu tenho certeza de que tomei todos os cuidados e… Isso é impossível. — Balanço a cabeça de um lado para o outro, enquanto um riso nervoso escapa pelos meus lábios.
— Tudo bem, mas você não acha melhor fazer um exame? Por precaução.
— Não, eu não acho. — Rebato, sem hesitar, e Geórgia suspira, impaciente. Em seguida, me levanto do chão em um impulso único e passo as mãos pela minha roupa para limpá-la.
….
— Geórgia, eu já disse que não estou grávida.
— Então me explique o que acabou de acontecer com você! — Ela aumenta o tom de sua voz e meus olhos acompanham os seus movimentos, à medida em que ela também se levanta do chão.
— Eu não sei. Talvez eu não tenha me alimentado direito, — Dou de ombros e ela respira fundo. — Ou talvez tenha sido o calor, eu não sei!
Esbravejo, sentindo minha garganta queimar e meu peito apertar por uma vontade quase que incontrolável de chorar.
— Eu só sei que eu não posso estar grávida. — Minha voz falha e eu vejo Geórgia unir as sobrancelhas, antes de me envolver em um abraço. — Eu não posso estar grávida, Ge. — Choramingo em seu ombro e ela afaga os meus cabelos.
— Você não está. Mas me prometa que vai fazer um exame só para termos certeza disso. — Ela se afasta e arqueia as sobrancelhas, apertando os meus braços.
Por trás dela, vejo Léo, e Arthur caminharem não nossa direção e eu me desespero. Empurro meu corpo para longe do de Geórgia e passo a mão pelo rosto, tentando afastar os resquícios do meu breve choro.
— Os meninos estão vindo. Por favor, não fale sobre isso.
— Me prometa que vai fazer o exame.
— Geórgia…
— Me prometa, ! — Ela esbraveja e eu arregalo os olhos, assustada. Os meninos estão cada vez mais perto e eu sinto meus músculos tremerem.
— Tudo bem. Eu prometo!

Narrador Avulso


Quando vê de pé, apressa seus passos em direção a ela, sem nem ao menos se importar com a presença de Arthur.
— Como você está? — Ele questiona com os olhos esbugalhados, olhando por cada centímetro da menina, como se buscasse por algum machucado ou hematoma. dá de ombros.
— Bem. Obrigada.
— Eu… Eu trouxe água para você e… — Ele mostra o pacote de biscoitos em uma de suas mãos e balança a cabeça de um lado para o outro, com os olhos fechados, sem entender porque estava tão nervoso.
— Eu não estou com fome, mas obrigada pela água. — profere, tomando a garrafa da mão de .
O semblante no rosto da menina preocupa . Ele sabia que ela havia acabado de desmaiar, mas normalmente tinha energia para dar e vender. Um mal estar podia até vir a enfraquecê-la, mas não a deixaria como estava agora.
Ela parecia… Triste?
Sem pensar, dá mais alguns passos à frente, erradicando ainda mais a distância entre seus corpos e se desespera, sentindo seus pelos arquearem por conta da proximidade.
— Você tem certeza de que está bem? — Sua voz saí em um tom quase que inaudível e sente as pontas dos dedos dele tocarem sua mão em um gesto afetuoso. Mas, por instinto, ela se afasta.
— Estou bem, . Só acho melhor eu ir para casa. — força seu melhor sorriso e acompanha seus movimentos de abaixar o tronco para pegar sua bolsa no chão com uma expressão embasbacada no rosto.
— Tudo bem. — Ele profere, chacoalhando a cabeça depois de alguns instantes em silêncio. — Eu vou com você.
— Não, não precisa! — A se apressa em dizer e arregala os olhos, surpreso. — Eu sei chegar em casa sozinha, vocês podem continuar com o passeio. — dá de ombros com um sorriso vago no rosto e lança um olhar rápido e confuso para Geórgia. — Você sabe voltar para o apartamento? — Ela questiona com os olhos firmes em Arthur e ele balança a cabeça na afirmativa.
— Sei, mas acho melhor eu ir com você. — O garoto rebate e se incomoda com sua provocação. Geórgia, por outro lado, se aproxima de e segura firmemente sua mão, tentando mantê-lo calmo.
— Não, ninguém vai comigo! Eu quero ir sozinha e não quero ninguém atrás de mim, pode ser? — A arqueia as sobrancelhas, nervosa, e os outros, com exceção de , balançam a cabeça na afirmativa. — Ótimo. Então eu já… Eu já vou. Bom resto de passeio para vocês. — dá de ombros, lança um sorriso nervoso para Geórgia, e caminha na direção oposta antes que alguém tente impedi-la.
, por sua vez, acompanha os seus movimentos em silêncio, até que a garota sai do seu campo de visão. Ele solta um suspiro, exausto, esfrega o cenho e, em seguida, se vira de frente para Geórgia.
— O que aconteceu? — Ele pergunta e a garota morde os beiços.

As trocas de guarda acontecem no Palácio de Buckingham diariamente, uma vez ao dia, às 11:30 da manhã entre os meses de maio e julho. Seus horários foram alterados de maneira fictícia para essa história.

Londres, 10 de agosto de 2020.
Casa dos Carter.


Quando chega em casa, se depara com um silêncio incomum. Em cima do aparador de cristal ao lado da porta de entrada, ele encontra um bilhete escrito com a letra de sua mãe, informando que ela, Éric e as crianças tinham ido à festa de aniversário de um amiguinho de Oliver, mas não demorariam para voltar.
O aproveita o momento para subir em disparada até o quarto de e saber como — de fato — ela estava. No entanto, encontra a porta do cômodo aberta, a cama feita sem um amarrotado sequer e nenhum sinal de que ela tinha passado por ali.
Sem pensar, ele adentra ao cômodo e começa a se questionar onde ela poderia estar. Pensa em ligar para Maria Luiza — já que ela era a única amiga de que ele conhecia —, mas assim que saca o telefone de seu bolso, desiste da ideia ao olhar pela janela e encontrar a garota deitada no chão da beira da piscina, com as pernas dentro da água. Seus olhos estavam fechados e os dedos das mãos entrelaçados uns aos outros, em cima de sua barriga.
estava visivelmente fora da realidade e sabia que ele tinha uma porcentagem de culpa nisso, então, não hesita em descer as escadas e seguir até a área externa da casa.
Quando atravessa a porta de vidro que separava a cozinha da parte da piscina, tenta ser o mais silencioso possível e isso faz com que nem sequer note sua presença. Ele, por conseguinte, caminha cautelosamente até ela e se deita ao seu lado, mas — por ainda estar de calça — encolhe as pernas para não molhá-las.
não abre os olhos, mas sente a movimentação, bem como o perfume inconfundível que só costumava usar. Os dois imergem em um silêncio até que bastante confortável para a situação e os únicos sons que se faziam presente eram os de suas próprias respirações e dos pés de batendo na água.
— Geórgia te contou, não foi? — Ela questiona, ainda com os olhos fechados, e balança a cabeça na afirmativa.
Em seguida, o garoto levanta o seu tronco e se senta. Ele passa as mãos pelos cachos em se cabelo e coça a barba rala em seu rosto, antes de soltar um longo suspiro e voltar sua atenção para .
— Você já fez o teste?
Quase que instantaneamente, abre os olhos ao ouvir sua pergunta. mordia os lábios com certa ansiedade, e seus dedos da mão esquerda brincavam com os anéis da mão direita em um gesto claro de nervosismo.
Ela, por conseguinte, balança a cabeça na negativa e, assim como , ergue o seu tronco e se senta sobre a pedra gelada do chão.
— Não fiz e, francamente, eu não acho que tenho coragem de fazer. — Ela confessa e um riso triste salta pelos seus lábios.
— E por que não?
— Porque se der positivo… — faz uma pausa entre as palavras, cobre o rosto com as mãos e balança a cabeça de um lado para o outro, sentindo seu coração acelerar com a possibilidade.
. — toca um de seus braços e força seus pulsos para baixo, mas mantém seus olhos fechados com medo de encará-lo. — Se der positivo, nós vamos arcar com as consequências. — Ele dá de ombros, erguendo o queixo dela com seu indicador e a garota volta a abrir os olhos.
— Não diga isso. Faz parecer que eu estou realmente grávida. — A garota pede, afastando a mão de de seu rosto. Ele suspira.
— E o que você quer que eu diga?
— Não sei. — A menina dá de ombros, sentindo seus olhos marejarem. — Nós tomamos todos os cuidados, não tomamos? Por favor, , me diz que sim. — choraminga e se esforça para não rir da expressão graciosa em seu rosto.
— Eu tenho certeza disso. — Ele rebate, afagando os cabelos da garota e, por uns instantes, respira, aliviada. — Mas imprevistos acontecem e…
— Ah meu Deus! — Ela esbraveja, cobrindo o rosto com as mãos mais uma vez e voltando a deitar suas costas no chão. não consegue se conter e acaba deixando um riso nasalado escapar. — Não ria! Não tem graça. — o repreende, aprumando novamente a sua postura, e o semblante em seu rosto faz com que queira rir ainda mais, mas ele se segura. — , se eu estiver grávida… É o fim da minha vida e provavelmente da sua. — Ela profere em um tom de voz bem mais baixo que o normal, e o franze o cenho, recuando o seu corpo para trás.
— Eu não tenho medo do seu pai, bonitinha. E você não deveria ter também. — Ele rebate e revira os olhos, impaciente. — , o seu pai te ama. Eu sei que ele teve uma criação bem diferente e continua preso à costumes do passado, mas ele é o seu pai e ele te ama. Se você estiver esperando um bebê…
faz uma breve pausa e seu olhos vão até a barriga de quase que involuntariamente. Seu coração tamborila e pela primeira vez ele parece entender que se aquela menina estivesse mesmo grávida, ele seria… Pai.
No entanto, balança a cabeça de um lado para o outro tentando afastar seus devaneios e umedece a garganta antes de continuar.
— Se você estiver mesmo grávida, eu tenho certeza de que ele vai amar essa criança tanto quanto ama você. — O garoto dá de ombros, apertando levemente uma das mãos de e ela ri. — Ele pode até ficar meio irritado no início por conta do seu voto e tudo mais… — A garota joga a cabeça para trás, choramingando, e ri, a puxando de volta para si. — Mas ele vai ficar feliz. Confia em mim.
Por conseguinte, leva a mão de à boca e deposita um beijo carinhoso sob sua palma. Seus olhos estão cravados nos dela e isso faz o coração de estremecer.
— Isso não te apavora? — Ela questiona, mordendo os beiços e franze o cenho, sem entender. — A possibilidade de ser pai.
— Porra, demais! — O arregala os olhos e gargalha, mas seus olhos se fixam no gesto involuntário de em entrelaçar seus dedos nos dela.
Aquela era uma ação corriqueira do garoto e adorava. Ela sentia seu coração aquecer todas as vezes que acontecia e fazia parecer que o que existia entre os dois não era algo reduzido à sexo.
— Eu com certeza não estou pronto para ser pai, mas eu amo meus irmãos e… Acho que me sairia bem se fosse necessário. — Ele dá de ombros e um breve sorriso escapa pelos lábios de .
Você se sairia muito bem, . — O inconsciente da garota grita, mas ela engole suas palavras e as guarda para si.
— Além do mais, eu ficaria feliz em ter outro de mim no mundo. Minha espécie é bastante rara. — Profere com certa indiferença e a menina arqueia as sobrancelhas, surpresa, o que o faz rir.
Em seguida, solta um riso e empurra o peito dele para longe do seu novamente, mas é mais forte e a puxa pelo braço, fazendo com que seus peitos colidam e ele consiga a envolver em um abraço.
— Eu não acredito que você disse isso. — A menina balança a cabeça na negativa, prendendo os seus braços ao redor da cintura dele.
— Não é mentira. Mas eu estava tentando aliviar a situação e eu acho que funcionou. — dá de ombros e ergue o rosto de encontro ao dele. Ela balança a cabeça na afirmativa e seus olhos fitam a cor rosa de seus lábios.
entende aquilo como um pedido silencioso e, por conseguinte, aproxima seu rosto do dela e sela seus beiços em um beijo doce, embora rápido.
— Obrigada por isso. — franze levemente o nariz quando o garoto se afasta e ele sorri, passando as pontas de seus dedos pelos traços leves no rosto da garota.
O coração de batendo tão acelerado quanto o seu contra seu peito volta a trazer uma sensação estranha de formigamento em suas mãos, o que faz — mais uma vez — pensar nas coisas que tinham sido ditas por Geórgia.
— Você sabe que precisa fazer esse exame não sabe? — Ele questiona, acariciando a bochecha de com o polegar. Ela pressiona um lábio contra o outro e balança a cabeça na afirmativa. — Eu não vou te pressionar, mas quando você estiver preparada…
— Vamos acabar logo com isso. — Ela o interrompe e prontamente se cala. Surpreso, o se afasta com as sobrancelhas arqueadas e a garota ri.
— O que você disse?
— Vamos acabar logo com isso. — Ela dá de ombros, se afastando de para poder se levantar do chão. — Eu vou fazer esse exame e seja o que Deus quiser, mas que fique claro que se eu estiver mesmo grávida e você me expulsar por aquela porta, eu não vou te dar paz, . — profere por fim e revira os olhos, também se colocando sobre seus pés.
— Isso já não aconteceria mesmo. — Ele rebate, fazendo o queixo de cair alguns centímetros.

[•••]


Sentado na beira da cama de , a espera um tanto quanto ansioso. Ela está no banheiro há aproximadamente seis minutos que mais se parecem seis horas e nada parece suficientemente capaz de prender a atenção de . Nada com exceção da foto no porta-retrato sobre a escrivaninha da garota.
Por impulso, ele salta da cama e caminha até o imóvel, tomando a imagem em suas mãos. Nela, consegue ver entre seus pais, com o corpo inclinado para baixo e os braços jogados sobre os ombros de seu irmão mais novo. A menina vestia uma beca de formatura com ombreira e faixa azuis e a criança segurava o canudo de camurça, também azul.
Ângela e Pedro pareciam bastante orgulhosos da filha e o sorriso de orelha a orelha no rosto de garantem a que ela estava mais do que feliz por ter conseguido isso.
De repente, ele se pega pensando no que aconteceria caso aquele resultado desse positivo. Seu primeiro contato com Pedro não tinha sido muito amistoso e ele não tem ideia de como aquele homem reagiria ao saber que engravidou sua doce passarinha.
No entanto, por mais apavorante que o pai de pudesse parecer, não se sentia intimidado. No fundo, ele já estava tão ligado à que pouco se importava quem teria de enfrentar para ficar com ela.
Porque era isso que ele queria, ficar com ela.
, por outro lado, se tranca no banheiro e hesita em fazer o teste por alguns segundos. Entretanto, sua racionalidade tenta ser mais alta que o medo de desapontar seus pais e ela acaba seguindo cada um dos passos para a realização do exame.
Com tudo pronto, se senta sobre a louça do vaso sanitário e tranca sua respiração, até que o teste apita e ela solta um longo suspiro de alívio quando seus olhos foram as palavras Não Grávida no visor daquilo que poderia facilmente ser confundido com um termômetro.
Um riso largo salta pelos lábios dela e a garota comemora em silêncio, antes de saltar do vaso e correr em direção à porta do banheiro.
Quando ouve destrancar a porta, pode jurar que seu coração erra as batidas. Ele mais do que depressa devolve o porta-retrato para a escrivaninha e aguarda ansioso pelo resultado no momento em que vê com os olhos esbugalhados para si.
— E… Então? — umedece a garganta, visivelmente nervoso, e gargalha.
— Pode respirar, . Você não vai ser pai! — Ela diz, animada, e, antes que o garoto consiga processar a informação, avança sobre seu corpo e o envolve em um abraço caloroso.
Quando se afasta, se joga sobre o colchão e suspira, desafogada. Embasbacado, se senta ao seu lado e se mantém em silêncio por alguns minutos.
— Eu estou tão aliviada! — A menina profere, virando o seu rosto de encontro a e ele parece finalmente acordar do transe.
— Eu… Acho que eu também. — Ele umedece a garganta e franze o cenho, ainda meio confuso. — Mas confesso que a ideia de ter um bonitinho correndo pela casa não me parecia tão ruim assim. — arqueia as sobrancelhas, surpresa.
— O que você disse? — Ela questiona, erguendo o seu tronco em um movimento um tanto quanto abrupto. , por sua vez, respira fundo e se xinga mentalmente por ter deixado seus pensamentos saírem em voz alta.
— Nada, . Eu não disse nada. — Profere, notavelmente exausto, e, em seguida, se levanta da cama.
— Espera aí. Você ficou triste com o resultado? — A pergunta, franzindo a testa. — , isso são boas notícias! — Ela sorri e por conseguinte se levanta, dando alguns passos em direção a ele.
— Eu sei, não é isso. — rebate, coçando a têmpora com a ponta dos dedos, e o olha, sem entender.
— Então o que é? — Ela insiste em saber e, de repente, um riso sem humor salta pelos lábios do garoto.
— Não é nada, . — Ele balança a cabeça de um lado para o outro e dá as costas à garota. , por sua vez, não se dá por satisfeita e se apressa para alcançá-lo.
— Não, é alguma coisa sim. — A profere, puxando o pulso de e ele volta a olhá-la. — Me conta. Conversa comigo. — Seu tom de voz sai aveludado e fecha os olhos, puxando todo o ar que consegue para dentro de seus pulmões.
— Eu só… Só não consigo entender como ter um filho comigo poderia ser algo tão ruim. — O dá de ombros e se surpreende.
Em seguida, a balança a cabeça na negativa e dá dois passos à frente, se aproximando de . Ele, no entanto, dá dois passos atrás, o que faz estremecer.
, não é ter um filho com você. É ter um filho no geral. Os meus pais eles…
— … Eles acham que você ainda é virgem e se descobrissem que não, blá, blá, blá. Eu já estou cansado dessa história, bonitinha. — Ele revira os olhos e a ironia em seu tom de voz surpreende .
— O que deu em você hoje? — A questiona mais para si mesma do que para , que, por sua vez, acha graça.
— Absolutamente nada. Eu continuo o mesmo arrogante de sempre. — O dá de ombros e balança a cabeça de um lado para o outro. — E continuo achando que você precisa parar de ter medo do seu pai.
— Eu não tenho medo do meu pai, . — rebate, tentando parecer calma, já que parece suficientemente nervoso pelos dois.
— Ah, não? — Ele arqueia as sobrancelhas e a garota não hesita em balançar a cabeça de um lado para o outro. — Então você pode me explicar por que parece que, desde que seus pais chegaram, eu e você estamos andando por um fio que está prestes a arrebentar? — questiona e arqueia as sobrancelhas, em choque.
— Não é nada disso. Você não entende.
— Não, eu entendo. Eu entendo perfeitamente que seus pais não podem saber sobre mim, entendo que você precisa manter as aparências de um noivado que não existe só para não bater de frente com eles. Eu entendo tudo isso e entendo também que é a hora de me afastar. — Seu tom de voz diminui conforme as palavras saem pela sua boca e a última frase parece arranhar sua garganta.
encolhe os ombros e esconde as mãos nos bolsos de sua calça, enquanto o queixo de despenca alguns centímetros e ela tenta processar o que estava acontecendo.
— Eu não… — faz uma pausa entre as palavras, fecha os olhos e balança a cabeça na negativa para afastar seus devaneios antes de continuar. — Eu não estou entendendo.
A garota morde os lábios com força e ergue seu olhar em busca do de com a certeza de que tinha entendido perfeitamente o que ele falara, mas se agarrou até o último fio com a esperança de estar errada.
Ela não queria se afastar de .
E muito menos queria que ele se afastasse dela.
Mas as lágrimas que se acumulavam em seus olhos insistiam em pensar o contrário.
— Eu quero terminar, bonitinha. — Ele profere com certa arrogância e fecha os olhos, deixando uma única lágrima escorrer por sua bochecha. Rapidamente ela se apressa para limpá-la e torce para que não tenha visto.
— Pare de me chamar assim. — range os dentes e respira fundo, criando coragem para olhá-lo. Ele, por conseguinte, dá de ombros, indiferente ao pedido da garota. — Por quê? — Ela questiona, puxando o choro pelo nariz e franze o cenho, sem entender.
— Por que, o quê?
— Por que você quer se afastar de mim, ? — A morde os beiços e o garoto sente seu peito estremecer. Por alguns instantes, precisa desviar o seu olhar de e implora para que seu lado emocional não fale mais alto que o racional.
Obviamente não queria se afastar de , muito pelo contrário. Ele queria mantê-la o mais perto possível. Mas talvez, esse fosse o principal motivo para afastá-la.
— Eu não quero guardar segredos só para manter o que temos, . — O confessa e um riso sem humor salta pelos lábios da garota quase que instantaneamente.
— Mas o que temos já era segredo, ! — Ela esbraveja, visivelmente confusa, e o menino puxa todo o ar que consegue para dentro de seus pulmões. — Qual é a diferença agora? — insiste em saber e sente um calafrio percorrer toda extensão da sua espinha.
Um silêncio ensurdecedor toma conta do ambiente e os olhos da garota aguardam ansiosos pela resposta do rapaz. Ele, no entanto, desvia o olhar para o chão, passa os dedos pelos cantos internos dos olhos e em seguida pelos cabelos, até que encontra coragem para olhá-la.
— Não sei. — Ele solta um breve riso e cerra os olhos, se esforçando para entendê-lo. — Talvez eu estivesse disposto a mudar isso. dá de ombros e arregala os olhos, boquiaberta.
Por conseguinte, se vira de costas para ela e se apressa para sair do quarto, sem dar à a chance de entender o que ele queria dizer com aquilo.

Capítulo Cinco

“There’s a lot of things that I may not know, but missing you baby is the only thing I know.
The Vamps, Paper Hearts.




Londres, 20 de agosto de 2020.
Casa da Sarah.


Existem duas datas festivas pelas quais eu sempre estou ansioso. A primeira delas é o Natal, pelo motivo óbvio de ser uma festa linda e significativa onde as pessoas parecem estar mais abertas, as famílias se reúnem e tudo parece estar bem — por mais que não esteja.
A segunda delas é o meu aniversário. Não que o dia 20 de agosto tenha uma importância proporcional ao dia 25 de dezembro, mas eu sempre gostei da ideia de poder juntar meus amigos e familiares em um mesmo lugar para celebrar o meu nascimento. Isso faz com que eu me sinta querido, e talvez eu goste de ser o centro das atenções por um dia — não sei exatamente porquê, mas se eu acreditasse nesse negócio de signo, com certeza culparia o meu por essa minha condição de histrionismo* leve.
No entanto, todas as vezes que pensei em como comemoraria meus vinte e sete anos, imaginei que estaria aqui. Mas ela não está.
A festa é perfeita e eu preciso admitir que Sarah e Mitch fizeram um excelente trabalho, mas essa sensação bizarra de que algo está faltando não parece querer ir embora. Por isso, involuntariamente acabei me isolando dos convidados e sentei em um banco acolchoado encostado na parede de vidro que me proporcionava uma visão bastante privilegiada da cidade onde moro.
Saquei o meu celular do bolso lateral da calça que estava vestindo e de repente nem a voz de Joni Mitchell cantando Big Yellow Taxi eu conseguia ouvir mais. Abri o meu aplicativo de mensagens e transcorri o dedo por todos aqueles desejos de felicitações até encontrar uma aba específica. Minha última conversa com tinha sido no dia em que saímos com Geórgia e Léo — e Arthur, mas eu me recusava a mencionar esse aí —, quando eu enviei a ela a localização do estúdio de tatuagem onde estávamos.
Daquele dia até hoje, absolutamente tudo mudara.
Entretanto, confesso que torci para que ela fosse ser a primeira a quebrar esse voto de silêncio e me mandasse algo pela data de hoje. Mas ela não fez. E talvez eu nem merecesse que fizesse.
Inconscientemente, me peguei com o polegar sobre sua foto de perfil. Cliquei no círculo para ampliar a imagem e um sorriso involuntário saltou pelos meus lábios. Eu tinha tirado aquela foto durante um dos passeios de barco que fizemos em Amsterdã.
Estou registrando o momento, eu disse quando ela me perguntou e um sorriso de orelha a orelha surgiu em seu rosto. Naquele momento, fez meu coração tamborilar pela primeira vez e eu nem sequer percebi, mas tive certeza de que o mundo pararia para admirá-la se fosse possível.

— Ei, você pode me ajudar com… — A voz de Sarah me tirou dos meus devaneios e, em um ato irreflexo, bloqueei a tela do aparelho. Em seguida, ergui o meu rosto em direção ao som e vi minha melhor amiga com as sobrancelhas arqueadas, esperando a minha resposta para uma pergunta que eu nem sequer tinha ouvido.
— Me desculpa. O que você disse? — Questionei, meio envergonhado, enquanto devolvia o celular para o bolso da minha calça. Ela suspirou e então se sentou ao meu lado.
— Música antiga, jogos de tabuleiro, karaokê, a sua cerveja favorita… — Sarah começou a enumerar coisas aleatórias e eu franzi o cenho, confuso. — … Sobremesa daquele restaurante árabe que você ama, seus primos estão aqui, sua irmã também. — Ela continuou e o semblante em meu rosto relaxou quando finalmente entendi o seu ponto. — Eu devo ter esquecido algo…
— Sarah…
— É sério! Eu devo ter deixado algum detalhe passar. Caso contrário, você não estaria tão tristinho assim. — Ela franziu o cenho com um sorriso entristecido nos lábios e eu achei graça, balançando a cabeça de um lado para o outro.
— Eu não estou triste. Talvez só um pouco desanimado. — Dei de ombros e entortei os cantos dos meus lábios em um sorriso breve.
— E o que falta para você se animar? — Sarah questionou com as sobrancelhas arqueadas. — É sério. Diga e eu peço para Adam buscar!
— Eu acho que você sabe o que falta, Sarinha. — Rebati, umedecendo a minha garganta e entrelaçando os dedos de uma mão à outra, enquanto apoiava os cotovelos sobre os joelhos. — E não é exatamente algo que Adam consiga buscar. — Finalizei com um riso breve e minha melhor amiga fez o mesmo.
— É, eu sei. — Ela disse, afagando minhas costas por cima do colete de lã amarelo com bolas pretas que estava usando. — Mas acho que eu tinha esperança de que você fosse responder algo material como uma garrafa de tequila. Ou duas. — Proferiu, me fazendo rir.
— Não seria uma má ideia. — Dei de ombros e um riso breve saltou pelos lábios de Sarah.
— Eu juro que ainda não consigo entender o que aconteceu. — Ela mordeu os beiços e, envergonhado, eu mudei a direção do meu olhar. — Depois do que você me contou, vocês chegaram a brigar?
Assim que ouvi sua pergunta, fechei os meus olhos e flashbacks da última vez em que eu e nos falamos começaram a passar pela minha mente. Chacoalhei a cabeça de um lado para o outro, tentando afastar essas lembranças, e voltei minha atenção para Sarah.
— Mais ou menos. Sim.

Histrionismo é a necessidade/desejo que uma pessoa tem de ser o centro das atenções.

Londres, 12 de agosto de 2020.
Casa dos Carter.

Narrador Avulso


Já eram quase dez da noite e estava jogada no sofá da sala, tentando concentrar toda a sua atenção no livro em suas mãos. No entanto, a cada barulho de trovão, a erguia seu olhar de encontro à janela, a tempo de ver o raio iluminar boa parte do seu alcance.
Por causa da chuva, Éric e Vitória ficaram presos em Brighton. As crianças já estavam em seus quartos, e … Bom, o barulho de passos descendo as escadas fez com que , por impulso, virasse o seu rosto de encontro ao som e encontrasse vestindo um traje que ele comumente usava para dormir. Seus cabelos estavam úmidos e ele andava distraído até a cozinha, com os olhos presos na tela do celular em suas mãos.
mordeu os beiços e acompanhou os movimentos do rapaz em silêncio. largou o telefone sobre a ilha de granizo no meio do cômodo e abriu a geladeira, de onde retirou uma garrafa de vidro com água. Quando ele virou seu corpo, e consequentemente ficou de frente para , a desviou o olhar e fingiu prestar atenção no que lia.
, no entanto, assim que notou a presença da menina na sala, não conseguiu impedir que seus olhos se cravassem nela por alguns segundos. Em circunstâncias normais, ele zombaria o título do livro que ela lia e tentaria rebater com alguma ofensa que o faria rir. Em seguida, se deitaria ao lado dela e os dois aproveitariam a ausência de Éric e Vitória juntos. Com ou sem sexo, isso já não fazia diferença entre os dois.
Mas essa não era uma circunstância normal, já que desde a última quarta, vinha tentando diminuir — gradativamente — o contato com , e ela ainda não conseguia entender direito quais motivos o levaram a fazer isso.
A verdade é que só estava tentando fazer com que a presença dos pais dela em Londres fosse algo fácil de lidar, por mais que isso parecesse impossível. No entanto, ele sabia que manter o que tinham em segredo como vinham fazendo desde que voltaram de Amsterdã, seria estressante demais e colocaria em risco.
A , por sua vez, colocou o livro bem na frente de seu rosto e fechou os olhos com força, implorando para que voltasse para o quarto o mais rápido possível. Entretanto, quando despertou de seus devaneios, balançava a cabeça de um lado para o outro, e ela encontrou Helena parada ao lado do sofá, com a mão na boca, segurando um pequeno cobertor rosa e com um olhar de choro no rosto.
— O que você ainda está fazendo acordada, Helena? — Seu tom de voz saiu brincalhão, e, quando o ouviu, franziu o cenho, abaixando o livro e buscando pela criança.
— Eu tive um pesadelo. — A pequena choramingou, esfregando os olhinhos com o dorso da mão, e os dois se entreolharam. Em seguida, saltou do sofá e caminhou em direção à ela.
— Não foi nada demais, princesa. — a mais velha sorriu, se abaixou sobre seus joelhos e afagou os cachos no cabelo de Helena enquanto se aproximava das duas. — Deve ter sido por causa do barulho da chuva.
— Eu quero os meus pais. — Helena voltou a choramingar e soltou um suspiro.
— Mamãe e Éric não estão em casa, pequena. — Foi quem respondeu, atraindo o olhar de para si.
O casal se entreolhou em silêncio por poucos segundos e, quando perceberam que Helena fazia menção de chorar, voltou sua atenção para ela.
— Mas eu estou. Não serve? — Ele questionou, fazendo um bico com seus beiços, e um riso involuntário saltou pelos lábios de , enquanto ela balançava a cabeça de um lado para o outro e virava o rosto de encontro ao da garotinha mais uma vez.
Helena, por sua vez, hesitou e olhou para como se esperasse a sua opinião. A , por conseguinte, arqueou as sobrancelhas, animada, e balançou a cabeça na afirmativa. Em seguida, a pequena volta sua atenção para o irmão mais velho e fez o mesmo, ao passo que puxou o seu bracinho para que ela tirasse a mão da boca. riu.
— Você pode me contar uma história? — Ela perguntou e o arregalou os olhos enquanto caminhava até ela.
— Eu? Lógico que sim! Eu conto histórias mil vezes melhor que o seu pai, Helena. — deu de ombros e achou graça. Quando o se aproximou da irmã e estendeu a mão para ela, se levantou do chão e se preparou para voltar para seu livro. — Vamos, pequena. — Ele proferiu no instante que sentiu a pequena envolver dois de seus dedos com a mão.
— Vem, . — Helena disse, chamando com a mãozinha livre. A arqueou as sobrancelhas, surpresa, enquanto fechou os olhos e umedeceu a garganta.
— Não, linda, eu vou… Eu já estou cansada. Acho que vou para o meu quarto dormir. Mas tenho certeza de que seu irmão vai te contar uma história linda cheia de princesas. — A mais velha sorriu e seus olhos se fixaram em . Ele, por outro lado, desviou sua atenção para o chão e passou o indicador pela parte de baixo do nariz.
— Mas você tem que vir! Tem que ser vocês dois! — Helena voltou a choramingar e respirou fundo.
— E por que isso, princesa? — questionou, depois de limpar a garganta e passar a mão pelos cabelos úmidos.
— Porque todas as vezes que eu tenho um pesadelo, papai e mamãe ficam comigo até eu conseguir dormir. — Ela abriu um bocejo e esfregou os olhinhos com o dorso da mão, ao passo que se surpreendeu e mordeu os lábios. Em seguida, soltou um suspiro e voltou a abaixar o seu corpo na altura de Helena.
— Vamos fazer o seguinte: você vai com o agora e daqui a pouco eu subo para te dar um beijo. Que tal? — A arqueou as sobrancelhas, afagando os braços de Helena.
— Não, . Você tem que vir junto! — A pequena bateu os pézinhos e respirou fundo, inclinando o seu tronco para baixo para pegar Helena em seu colo. — Os monstros só vão embora se vocês me protegerem juntos. Por favor. — Ela se debateu e colocou mais peso que o normal sobre os braços do irmão.

, no entanto, sorri e — sem se importar com a reação de — dá um passo à frente, diminuindo a distância entre os três. Ela acaricia os cabelos da garotinha que, vencida pelo cansaço, apoia a cabeça no ombro do irmão mais velho.

— Princesa, monstros não…

— É melhor você vir. — a interrompeu e, surpresa, prontamente se calou. Seus olhos correram em busca dos dele e entortou levemente os lábios. — Pelo menos só até ela dormir. Ela não vai sossegar se você não for. — Ele deu de ombros e a demorou poucos segundos até balançar a cabeça na afirmativa.
— Tudo bem. Eu vou. — Ela rebateu e um sorriso involuntário surgiu em seu rosto quando ela viu Helena comemorar.
Quando subiram até o quarto de Helena, dividiu o pequeno espaço da cama montessoriana com a irmã de , enquanto ele se sentou no chão com as pernas cruzadas uma sobre a outra. A se deitou de lado, apoiando boa parte do peso de seu corpo sobre um braço, e Helena apoiou as mãozinhas sobre o abdômen, entrelaçando os dedos de uma nos da outra.
— Então… Você quer uma história sobre o quê? — prendeu um lábio contra o outro e arqueou as sobrancelhas.
— Princesas e dragões!! — Eufórica, a criança balançou as perninhas e achou graça.
— É claro que sim. — revirou os olhos e inclinou seu tronco para frente, para arrumar o lençol sobre o corpo de Helena. Em um gesto involuntário, o ajudou. — E como vai ser a princesa dessa história?
— Eu não sei. A história é sua. — A criança rebateu com indiferença, e se surpreendeu. levou seu olhar de encontro ao rapaz e o semblante em seu rosto a fez rir.
— Quem é que você está puxando, menina? — Ele questionou com as sobrancelhas arqueadas e Helena deu de ombros. , por outro lado, revirou os olhos e deitou a cabeça sobre seu próprio braço.
— Eu me pergunto a mesma coisa. — Seu tom de voz saiu irônico e baixo, no entanto, alto o suficiente para que conseguisse ouvi-la.
Em um gesto inconsciente, o rapaz a olhou e — mesmo sabendo que os olhos dele estavam cravados sobre si — mordeu os cantos internos das bochechas e lutou para prender sua atenção no rostinho de Helena, tocando a ponta do nariz da menina com seu indicador. tinha plena consciência que sua irmã mais nova era a sua cópia perfeita — assim como Geórgia —, e essa personalidade genuína de Helena não podia ter uma influência mais óbvia que não fosse ele. E ele sabia que sabia disso.
Um riso involuntário saltou pelos seus lábios e balançou a cabeça de um lado para o outro, voltando sua atenção para a criança. No mesmo instante, voltou sua atenção para ele e sentiu seu peito apertar, entristecida por saber que — mais uma vez — em circunstâncias normais, a reação de ao seu comentário teria sido diferente.
E só Deus sabe como preferia ouvir um comentário debochado ao invés do silêncio que recebeu.
— Tudo bem. Na minha história, a princesa vai ser…
— … Como a ! — Helena esbravejou, balançando as perninhas, e o casal se surpreendeu. arregalou os olhos e prontamente se calou, enquanto engasgou e, por impulso, ergueu seu tronco, buscando pelos olhos da criança.
Nem , nem conseguiram proferir algo nos instantes seguintes. E, por mais que as vozes na cabeça de implorassem que ela perguntasse a Helena o porquê ela tinha dito aquilo, ela não o fez. Em contrapartida, respirou fundo e passou os dedos pelos cachos — agora secos e perfeitamente modelados — de seus cabelos, antes de fingir indiferença e voltar sua atenção para a pequena mais uma vez.
— Ué… Mas você acabou de dizer que a história era minha, Helena! — Ele forçou o seu melhor riso e franziu o cenho, desviando o foco de sua atenção para . Por conseguinte, ele a olhou e implorou mentalmente para que ela não levasse o comentário da criança à sério.
— Eu sei. Mas a mamãe um dia disse que queria muito que você encontrasse uma princesa. — A pequena deu de ombros, brincando com o tecido do lençol entre seus dedos. — E depois ela disse que queria que essa princesa fosse a , porque ela é linda como a Bela e ela acha que vocês se gostam. — Proferiu por fim.
Helena com toda certeza não sabia o peso de suas palavras, nem muito menos a influência que elas teriam. No entanto, era nítido o tanto que a fala da criança tinha mexido com os dois. Mas mexido de uma forma boa, pelo menos com . , em contrapartida, fechou os olhos com força e abaixou o rosto, sentindo suas bochechas queimarem.
— Ela disse? — O tom de voz da AuPair saiu aveludado e ela mal conseguiu conter o sorriso em seus lábios. De soslaio, o olhou para a irmã e a viu balançar a cabeça na afirmativa.
— Mas olha como você é fofoqueira, pirralha! — Ele brincou, colocando sua mão sobre o corpo de Helena e apertando o tórax dela com as pontas de seus dedos, fazendo a criança soltar uma gargalhada estridente e contagiante.
achou a cena graciosa e entendeu aquilo como uma tentativa desesperada de para contornar o assunto.
— Será que eu posso contar a minha história agora? — O questionou, apoiando as mãos na cintura, e, ofegante, Helena fez que sim com a cabeça.
No entanto, quando viu o mais velho tomar fôlego e espaçar os lábios para começar a falar, a pequena conseguiu ser mais rápida e outra vez surpreendeu o casal com mais uma daquelas perguntas que só crianças teriam coragem de fazer em uma situação como essa.
— Vocês são namorado e namorada?
voltou a se calar e um silêncio ensurdecedor invadiu o quarto de Helena. Dessa vez, o casal se entreolhou e o questionamento da menina intrigou . Ela franziu o cenho e viu nos olhos de um pedido ansiado — e um tanto quanto exaustivo — para que ela ignorasse e o ajudasse a mudar o foco da conversa mais uma vez.
Por isso, ao invés de esperar que ele intervisse como das outras vezes, repuxou os lábios em um sorriso um tanto quanto irônico, deixando mais do que clara a sua chateação em relação à essa decisão apurada — e um tanto quanto egoísta — de em afastá-la de si sem se preocupar em colocar sobre a mesa todos os motivos que o levaram a isso e, enquanto ele fechou os olhos e tentou ignorar a pergunta de Helena, ela voltou sua atenção para a pequena, que aguardava ansiosa pela resposta dos dois.
— Não. Não somos não, pequena. — entortou os lábios em um riso sem humor e, quando sentiu que um “por que?” poderia saltar a qualquer momento pela boca da criança, ela se apressou em cortá-la. — Agora deixe o seu irmão começar, porque já está tarde e você já deveria estar dormindo, mocinha! — Sua voz saiu em tom de brincadeira e apertou com leveza o nariz de Helena, fazendo a pequena rir.
Em seguida, a garotinha balançou a cabeça na afirmativa e a voltou sua atenção para . Ela deu de ombros, deitou sua cabeça sobre o seu próprio braço e entendeu aquilo como sendo a sua deixa para que ele engatasse de vez na tal história.
— Certo, então… — O fez uma breve pausa para umedecer sua garganta e lançou mais um olhar para . A não retribuiu e isso pesou sobre os ombros de como se fossem mil toneladas.
Por conseguinte, ele chacoalhou a cabeça e tentou ignorar aquilo por hora, afinal, não tinha tomado a decisão de se afastar à toa e sabia que mais cedo ou mais tarde, entenderia seus motivos. então voltou a sua atenção para a pequena, puxou todo o ar que conseguiu para os seus pulmões e abriu um sorriso largo antes de proferir as três palavras seguintes:
— Era um vez...

[•••]


ficou cerca de dez minutos contando uma história cheia de princesas, dragões e muitas outras criaturas místicas que ele mesmo tirou da sua imaginação. Por mais que Helena parecesse extremamente engajada no conto criado por ele, conseguia notar que a menina estava cada vez mais longe e mais entregue ao sono. Logo quando viu a pequena bocejar e percebeu a luta de suas pálpebras em se manterem abertas, diminuiu gradativamente o tom e a intensidade de sua voz e acariciou suavemente a mão da pequena até que ela, de fato, se deixasse vencer pela vontade de dormir.
Assim que isso aconteceu, esperou pelo menos alguns minutos só para ter certeza de que a pequena não acordaria pelas próximas horas. Por isso, ele inclinou o tronco para o lado e apoiou a cabeça sobre o corpo da irmã adormecida, ao passo que mantinha o carinho em suas mãos. — que até então observava a cena calada — se deixou levar pelo silêncio de vozes misturado com o barulho da chuva e acabou adormecendo junto de Helena.
No momento em que se certificou de que a criança estava, de fato, imersa em um sono profundo, aprumou a sua postura e arrumou o lençol sobre o corpo da irmã. A pequena chegou a se mexer, mas não acordou, e agradeceu por isso.
Em seguida, o rapaz deitou seu corpo para frente e seus lábios alcançaram a testa da criança em um beijo doce. Quando sua postura voltou para a posição ereta, encontrou na mesma situação que sua irmã mais nova só que, diferente de Helena, a parecia muito mais desconfortável, toda encolhida no espaço minúsculo daquela cama.
tinha plena consciência de que o certo a se fazer seria acordar para que ela pudesse voltar a dormir no seu quarto, em uma cama bem maior que a de Helena. Mas ele não conseguiu. Até porque, se a acordasse, ele seria obrigado a fingir indiferença, e por mais que só tivessem se passado dois dias desde que tomara essa decisão, ele já conseguia se sentir exausto disso.
Então, ao invés de fazer o que seria considerado certo, se esforçou para cobri-la com a folga do lençol de Helena, acariciou seu rosto com a maior leveza e cuidado do mundo para não acordá-la, e — assim como fez com a pequena — inclinou o seu tronco para frente, até alcançar a testa de , onde deixou um beijo suave. O rapaz fechou os olhos e chegou a manter seu rosto perto do dela por alguns instantes, sentindo a respiração quente de cortar a sua pele e as borboletas baterem as asas contra as paredes de seu estômago.
No entanto, tentou ser mais forte que todas essas sensações — por mais prazerosas que elas pudessem parecer — e se afastou da garota em um gesto um tanto quanto brusco. Ele se levantou do chão, chacoalhou a cabeça de um lado para o outro e passou a mão pelos cabelos, antes de lançar um último olhar para as duas e sair de uma vez do quarto.
Minutos depois, a posição desconfortável fez despertar. A abriu os olhos meio desordenada e levou alguns instantes para entender a situação na qual se encontrava, até que se lembrou de Helena e , e todas as circunstâncias que a fizeram pegar no sono ao lado da sua kid — como ela mesma costumava chamar.
Com todo cuidado para não acordar a criança, se levantou e tentou ignorar a sensação dolorosa de falta de circulação em seu braço. Em seguida, ela — assim como — arrumou o cobertor sobre o corpo de Helena e finalmente se levantou, decidida a ir para o seu próprio quarto.
No entanto, assim que fechou a porta do quarto da caçula, se deparou com saindo do banheiro de visitas. Diferente de antes, agora ele vestia uma blusa cinza com a estampa de uma “smile face” amarela, uma calça marrom, tênis nos pés e o clássico colar de pérolas ao redor do pescoço. Seus cabelos estavam arrumados e ele parecia pronto para sair.
Quando ergueu a cabeça e seus olhos cruzaram com a figura de , ele se surpreendeu e imediatamente interrompeu seus passos. A , por sua vez, cruzou os braços na frente de seu corpo e passou as mãos pela pele descoberta, tentando afastar o frio.
— Você conseguiu. Ela dormiu como um anjo. — deu de ombros, entortando seus lábios em um sorriso leve, sem mostrar os dentes.
— Que bom. — coçou os cabelos presos à sua nuca e virou seu rosto de encontro ao chão.
Sem proferir mais nada, ele passou por e os olhos da menina acompanharam os seus movimentos. Intrigada, ela não conseguiu conter sua curiosidade e acabou se deixando levar por impulso.
— Você... Vai sair? — Ela mordeu os beiços e fechou os olhos com certa força. Em seguida, ele respirou fundo e virou seu corpo em direção ao dela mais uma vez.
— Vou dormir na Sarah hoje. — Disse, e a se surpreendeu. Ela franziu o cenho e deixou um riso saltar pela sua boca.
, está caindo o mundo lá fora. Você não acha melhor…
— A casa dela não é muito longe daqui. — a interrompeu e prontamente se calou. — Eu vou ficar bem. — Ele garantiu e a menina levou alguns segundos para processar a informação. Quando isso aconteceu, não conseguiu controlar a sua falta de paciência e acabou revirando os olhos no instante em que viu dar as costas à ela mais uma vez.
— Por favor, me explique o que está acontecendo. Eu realmente quero entender.— Ela proferiu, esfregando os olhos com o dorso da mão para afastar o sono. , por sua vez, voltou sua atenção para ela e franziu o cenho, sem entender.
— Do que você está falando?
— Disso, . — deu de ombros, com um sorriso vago no rosto. — De você me dar um gelo, de mal conseguir olhar na minha cara. De você preferir enfrentar um dilúvio do que passar uma noite sozinho comigo nessa casa. — Proferiu e balançou a cabeça de um lado para o outro, coçando a têmpora com a ponta dos dedos.
— Eu não quero ter essa conversa, . — Ele encolheu os ombros e a garota riu.
— E eu não quero me afastar de você, ! — Ela esbravejou, dando um passo longo em direção ao garoto. — Mas você não está me dando muita escolha, então pelo menos seja homem o suficiente e tenha essa conversa. — rangeu os dentes e o rapaz a encarou, assustado com o semblante em seu rosto.
parecia irritada, exausta e um tanto quanto desesperada para entender o que estava acontecendo. não sabia exatamente como descrevê-la.
— É por causa dos meus pais? Por causa do Arthur? Me dá um motivo, pelo amor de Deus. — Ela implorou, passando uma das mãos pelo rosto, e sentiu suas costas pesarem pela culpa de ter causado este comportamento em uma menina tão calma e leve como .
O não respondeu e, por alguns instantes, o silêncio tomou conta da situação. Até que puxou todo o ar que conseguiu pelo nariz e tentou controlar seu nervosismo, bem como a vontade de chorar, que a essa altura, já estava começando a incomodá-la.
Mas ela não ficaria tão exposta na frente de . Não hoje.
— O que você quis dizer com “talvez eu estivesse disposto a mudar isso”? Mudar o que, ? — Ela questionou, fazendo aspas com os dedos, e umedeceu a garganta quando se lembrou da conversa que tiveram dois dias atrás. — Me responde! — aumentou o tom de sua voz e bateu um dos pés com certa força no chão enquanto arregalou os olhos.
— Pare de gritar, você vai acordar meus irmãos. — Ele pediu, tentando se manter sob controle.
— Então responda a porra da minha pergunta.
A rangeu os dentes mais uma vez, mas não se sentiu capaz de dar o que ela queria. Nem ele mesmo sabia explicar quais motivos o tinham levado a querer se manter longe de . Dentro da sua cabeça, fazia sentido ele querer proteger a menina de uma situação desagradável com a sua família, mas talvez ela não entendesse da mesma forma.
Por conseguinte, ao invés de respondê-la e resolver a situação de uma vez por todas, acabou seguindo por um caminho que viria a piorar seu relacionamento com e, então, abaixou o rosto, envergonhado demais para olhá-la.
— Eu preciso ir. — Disse, e um riso debochado saiu pelos lábios da garota. — Se as crianças precisarem de algo, você pode me ligar.
— Tudo bem. — Ela rebateu com desdém e, por impulso, ergueu o rosto de encontro ao seu. — Você quer ir, vai. Você quer ficar sem falar comigo, fique. Eu realmente não ligo, . Mas eu não merecia essa e você sabe disso. — deu de ombros com os beiços repuxados em um sorriso entristecido e, enquanto sentia seu peito apertar, a menina deu as costas a ele e se apressou em sair dali, sem dar a chance para que consertasse o que tinha acabado de acontecer.

Londres, 20 de agosto de 2020.
Casa da Sarah.



— Por favor, tente me explicar o que você quis fazer com isso antes que eu te dê um soco e estrague todo o trabalho que a tia Vitória fez no seu rostinho lindo. — Vi Sarah morder os beiços e um riso involuntário saltou pelos meus lábios.
Desviei o olhar da minha melhor amiga e passei a encarar o chão envernizado de seu apartamento. Passei a ponta do meu indicador pelo canto interno dos meus olhos e dei de ombros, puxando todo o ar que conseguia para dentro dos meus pulmões.
— Não era como se estivéssemos nos escondendo. Eu e , sabe? Nós saíamos na rua e ficávamos juntos, vocês sabiam que estávamos juntos. — Arqueei as sobrancelhas e lancei um olhar rápido para Sarah que, por sua vez, balançou a cabeça na afirmativa, ainda com os dentes cravados em seu lábio inferior. — As únicas pessoas que com certeza não sabiam, eram a minha mãe e Éric, e eu nem me importaria em contar, mas ela é babá das crianças e enfim. — Dei de ombros e esfreguei a têmpora, parando brevemente meu raciocínio.
Em sequência, voltei a respirar fundo e liberei mais um sorriso sem humor quando lembrei de Arthur, Pedro e Ângela, e da forma que ficou na presença dos três. Então, esfreguei os meus olhos e voltei minha atenção para Sarah.
— O problema é que agora existem correntes puxando para trás e eu não sei, talvez continuar como estávamos não fosse a melhor opção. — Acrescentei com certa indiferença, um tanto quanto confuso dentro da minha própria linha de raciocínio, e observei minha melhor amiga franzir o cenho, sem entender. — Se você tivesse visto o quão aliviada ela ficou com aquele teste negativo… Foi ali que a minha ficha caiu.
— Você ficou chateado com isso?
— Não, não com isso. — Rebati prontamente, balançando a minha cabeça na negativa. — Se o resultado fosse outro, teria sido um puta susto, mas eu me acostumaria com a ideia fácil. Ela não. — Entortei levemente os meus lábios em um sorriso sem humor e vi Sarah fazer o mesmo. — A tem medo dos pais dela. Ela diz que não, mas eu sei que tem. Sei que ela tem medo de que eles descubram o que aconteceu, ou descubram sobre mim. E eu não quero isso, sabe? Não quero que ela sinta medo por ficar comigo, e eu estaria sendo muito egoísta se estivesse colocando ela nessa posição.
— Mas você não acha que se precipitou um pouco? — Sarah estreitou o olhar contra o meu e, envergonhado, desviei minha atenção quase que em um reflexo involuntário. — , você afastou ela sem ouvir o que ela queria.
Suas palavras têm um efeito sobre mim bem maior do que eu gostaria. Tinha plena consciência de que me precipitei ao decidir por mim e por o que era melhor para ela. Mas na hora, no meio de todo aquele estresse com o Arthur sendo um pé no meu saco e uma suposta gravidez, eu entrei em pânico, e por milésimos de segundos, tive certeza de que o certo seria me afastar. Me arrependi no segundo seguinte, mas depois da última conversa que tivemos, eu já não sabia — e nem sei se tinha — como voltar atrás.
Ainda com os olhos cravados nos meus dedos entrelaçados uns aos outros, percebi que Sarah se aproximara ainda mais de mim e apertava meu ombro direito em um gesto que me trazia certo conforto.
— Você não sabe, mas eu e Mitch temos conversado muito com ela esses dias.... — Ela proferiu e eu não consegui conter o riso que escapou pela minha boca.
— Bem que eu senti a minha orelha queimar. — Minha voz saiu em tom de brincadeira e finalmente consegui voltar minha atenção para o rosto de Sarah. Ela, por sua vez, inclinou o tronco para trás e revirou os olhos, um tanto quanto enojada, o que me fez rir ainda mais.
— Você não é o sol, senhor . O mundo não gira ao redor dos seus belos olhos . — Ela apertou as minhas bochechas com uma de suas mãos e balançou meu rosto de um lado para o outro. Em minha defesa, agarrei seu pulso com o mínimo de força possível e o puxei para baixo para que ela me soltasse.
Os segundos seguintes foram preenchidos pelo som das nossas risadas que acabaram fazendo a minha barriga doer. Por conseguinte, joguei as minhas costas contra o encosto do sofá onde estava sentado e tentei recuperar o ritmo normal da minha respiração, enquanto Sarah assistia meus movimentos em silêncio. Até que, pouco tempo depois, a ouvi suspirar e apoiar o cotovelo no mesmo encosto que eu.
Minha melhor amiga mordeu os lábios e eu arqueei as sobrancelhas, curioso.
é uma menina doce, . — Ela proferiu e eu levei alguns segundos para raciocinar. Quando consegui, voltei a desviar minha atenção para outro lugar. — Não acho que ela mereça que você tome essa decisão sozinho. Qual o problema em cortar os sexos, cortar os beijos, mas manter a amizade? — Sarah questionou e, de soslaio, vi que seus olhos buscaram os meus.
— Eu... Eu não sei se consigo manter uma amizade com a . — Disse depois de poucos segundos em silêncio.
— E por que não? — Ela me perguntou quase que instantaneamente e eu a olhei. Não disse nada, mas dei de ombros e arqueei minhas sobrancelhas como se a resposta fosse óbvia o suficiente. Por causa disso, vi o semblante no rosto de Sarah mudar de uma expressão confusa para algo mais leve. — Não era só sexo para você, era?
— No começo, sim. — Garanti, mas o olhar desconfiado da menina em minha frente fez com que eu repensasse a minha resposta. Então respirei fundo antes de continuar. — Na verdade, não sei. Eu acho que ironicamente deixou de ser só sexo na noite em que transamos pela primeira vez. — Dei de ombros e minha melhor amiga arqueou as sobrancelhas, visivelmente surpresa.
— Você gosta dela tanto assim? — Ela questionou e, dessa vez, fui eu quem me surpreendi.
Elevei as minhas sobrancelhas e afastei os meus lábios um do outro, sentindo as palavras se acumularem na ponta da minha língua. No entanto, por algum motivo desconhecido, eu não consegui sequer formar uma simples frase e acabei desistindo de tentar. Por conseguinte, balancei a cabeça de um lado para o outro e deixei que um sorriso nervoso escapasse pela minha boca.
— Eu não sei, Sarah. Eu, francamente não sei. — Rebati com certa indiferença e respirei fundo, passando a mão pelos meus cabelos em um gesto quase que inconsciente. — Quando foi a última vez que você me viu gostar de verdade de alguém? — Estreitei o meu olhar contra o dela e a vi sorrir.
Em seguida, Sarah levou a mão até meu rosto e eu senti seu polegar acariciar levemente minha bochecha.
— Eu acho que estou vendo agora. — Ela deu de ombros e eu me surpreendi mais uma vez. Não sabia exatamente o que responder, então voltei a abaixar minha vista e soltei um riso, passando o meu dedo indicador pela parte de baixo do meu nariz.
Para a minha sorte, no entanto, fomos interrompidos pelo barulho da campainha invadindo o apartamento e isso fez com que eu voltasse a erguer o meu rosto. Vi Sarah respirar fundo e se levantar do sofá, enquanto eu assistia os seus movimentos em silêncio.
— Eu preciso terminar de preparar algumas coisas lá na cozinha, você pode atender a porta? — Ela questionou e eu franzi o cenho.
— A casa é sua, Sarah. — Tentei soar o mais engraçado possível e minha melhor amiga revirou os olhos teatralmente.
— E o aniversário é seu. Então, levante esse traseiro do sofá e vá aproveitar. — Ela deferiu leves tapas no meu braço e eu achei graça, arqueando as minhas sobrancelhas.
— Traseiro? Você pareceu a minha mãe.
— Anda logo, ! — Sarah esbravejou, puxando o meu braço, e eu soltei uma gargalhada quando percebi a expressão entediada em seu rosto.

Narrador Avulso


A campainha soou mais uma vez e apressou seus passos até a entrada do apartamento. Seus olhos, no entanto, varreram o ambiente e — entre alguns convidados — ele viu Geórgia distraída em uma conversa com Leonardo, enquanto Sarah sussurrou algo no ouvido de Mitch, que fez o rapaz erguer o rosto e arquear as sobrancelhas na direção de .
Curioso, o franziu o cenho e lançou um olhar sugestivo para o casal de amigos, mas ambos deram de ombros, o que o fez rir.
— Vocês estão falando de mim? — Seu tom de voz saiu um pouco mais alto para que os dois pudessem ouvi-lo de onde estavam. Mitch reagiu com indiferença e Sarah rolou os olhos.
— Abre a porta, .
— É bom que isso seja o meu presente, Jones. — resmungou, apoiando sua mão sobre o metal da maçaneta, e uma gargalhada fina escapou pelos seus lábios quando ele notou a careta no rosto da amiga.
— ainda com os olhos cravados em seus amigos — abriu a porta e, de repente, as atenções de Sarah e Mitch se desvincularam dele. Ele ignorou o fato, ciente de que aquela tinha sido só mais uma das implicâncias amigáveis as quais todos eles já estavam acostumados e, então, virou o seu rosto para frente, a fim de recepcionar quem quer que fosse o convidado que tinha acabado de chegar à sua festa.
E lá estava ela.
Parada no batente do hall de entrada do apartamento de Sarah, mordia o lábio inferior e segurava — com as duas mãos — a pequena bolsa preta na frente de seu corpo. O sorriso no rosto de desapareceu quase que instantaneamente e — em um movimento involuntário — ele observou a da cabeça aos pés, como se quisesse ter certeza do que estava vendo.
usava uma combinação entre uma saia marrom quadriculada e um suéter de tricô azul — com o bordado de um pintinho amarelo tentando escapar do ovo, onde se era possível ler a expressão francesa mon petit — por cima de uma blusa social branca com listras vermelhas. Seus cabelos estavam presos em um coque alinhado no topo de sua cabeça, seus lábios destacados pelo batom vermelho — que, por sinal, era um dos favoritos de — e, em seus pés, um scarpin salmão.
Os dois passaram longos segundos em silêncio, se encarando. Enquanto se mantinha estático e tentava processar o que estava acontecendo, o coração de beirava os cem batimentos por minuto à espera de uma reação dele.
Mas ele não reagiu.
Com isso, o lado racional de tentou falar mais alto que o emocional e ela fechou os olhos, balançou a cabeça de um lado para o outro e soltou um suspiro antes de proferir o seguinte:
— Eu sei que você não quer me ver, eu já entendi isso. — Ela passou as mãos pelo rosto em um gesto evidente de nervosismo e cruzou os braços na frente do corpo, ao passo que pareceu finalmente voltar à órbita. — Sei que você está com raiva de mim e que me quer o mais longe possível, mas... Droga, ! É o seu aniversário!
Involuntariamente, aumentou o tom de sua voz e um sorriso aflito pulou pelos seus lábios.
— As circunstâncias não deixaram eu te acordar com um bolo de chocolate e uma centena de brigadeiros como eu tinha planejado, mas eu não queria reduzir o dia de hoje à uma mensagem de texto, porque você merece mais do que isso.
A deu de ombros e, quando sentiu seus olhos marejarem, ela os fechou e chacoalhou a cabeça de um lado para o outro. , por sua vez, respirou fundo e escondeu as mãos nos bolsos laterais de sua calça.
— Então, eu criei coragem e vim até aqui, mesmo sabendo que as chances de você me colocar para correr eram altas. — Ela proferiu, com um sorriso vago nos beiços. — Eu juro que só queria te ver e quem sabe te dar um abraço, mas eu entendo se você não quiser. — Disse por fim e seus olhos se fixaram nos de mais uma vez.
continuou em silêncio por um bom tempo e sentiu um frio cortar seu peito de ponta à ponta. Por isso, a menina mordeu os beiços com certa força e suspirou antes de continuar.
— É isso, você... Você pode me mandar ir embora agora. — entortou o canto dos beiços em um sorriso sem humor e piscou os olhos algumas vezes.
O esfregou a têmpora com a ponta dos dedos e apoiou as mãos na cintura, sustentando o olhar contra o de que, por sua vez, pressionou seus dedos ao redor da alça de sua bolsa.
— Eu gostei da roupa. — Ele deu de ombros, apontando para o suéter azul, e se surpreendeu, virando o rosto de encontro à peça sobre o seu corpo. Em seguida, ela revirou os olhos e prendeu um lábio contra o outro, tentando conter um sorriso.
— É. Eu acho que tem um pedaço de você na forma como eu me visto, . — Dessa vez, foi quem deu de ombros, e arqueou as sobrancelhas. — Receba isso como um elogio. — Ela piscou um de seus olhos e o riu, passando o indicador pela parte debaixo do nariz.
Em seguida, sem pedir permissão, erradicou de vez a distância entre seus corpos e inclinou seu tronco para frente, a envolvendo em um abraço aconchegante.
custou reagir à sua ação, mas quando sentiu o aroma característico do perfume que ele costumava usar, suas pernas bambearam e ela enfim conseguiu responder ao seu abraço.
apertou a curva da cintura da garota com uma de suas mãos e, com a outra, acariciou sua nuca, causando à a sensação de que seus corpos se encaixavam tão perfeitamente como as roupas que estavam vestindo.
— Feliz aniversário. — Ela se colocou sobre a ponta de seus pés e sussurrou ao pé do ouvido dele. sorriu, fechando os olhos por poucos instantes.
— Obrigado por ter vindo. — Ele fez o mesmo e, então, afastou o rosto do dela e buscou por seus olhos. — Mesmo. — Proferiu, acariciando levemente a bochecha de , e ela sorriu, fechando os olhos quase que involuntariamente.
— Obrigada por não ter me mandado embora. — Ela disse, afagando a mão de , e ele balançou a cabeça de um lado para o outro. Em seguida, se afastou por completo e voltou a esconder suas mãos no bolso da calça.
— Como você está? — Ele se interessou em saber e soltou um suspiro exausto, enquanto seus olhos assistiam os movimentos de ao fechar a porta do apartamento.
— Bem, eu estou... Bem. — Ela rebateu, forçando um sorriso em seus lábios, e fez o mesmo. — E você?
— Eu estou... Melhor. — O suspirou, guardando as mãos nos bolsos de sua calça. sorriu com leveza.
Nos segundos seguintes, virou o rosto para baixo e assistiu em silêncio enquanto ela procurava por algo dentro da sua bolsa.
— Eu trouxe um presente para você! — Disse, animada, estendendo uma pequena caixa preta na direção de .
Surpreso, ele franziu o cenho e tomou o objeto das mãos da menina que, por sua vez, mordeu os beiços em um semblante sacana.
Quando abriu a caixinha e fitou o objeto dentro dela, arregalou os olhos e ergueu seu rosto em direção ao de mais uma vez.
— Eu achei a sua cara. — A deu de ombros e sorriu, pegando em suas mãos o anel prateado com o design de uma rosa no topo.
— Isso é a minha cara. — Ele proferiu, animado, encaixando o anel no dedo anelar de sua mão direita. — Obrigado, . — Disse, e a balançou a cabeça de um lado para o outro.
! — O casal foi então interrompido pela voz de Sarah e, em um movimento involuntário, se virou em direção ao som e encontrou não só ela, como também Mitch, Geórgia e Léo com semblantes animados em seus rostos.
, por sua vez, sorriu, e antes mesmo que tivesse tempo de dizer algo, a sentiu Sarah envolvê-la em um abraço carinhoso.
— Fico feliz que tenha vindo. — A melhor amiga de proferiu, acariciando o rosto de e depois voltando o seu corpo de frente para o amigo que, por sua vez, estreitou o olhar contra o dela.
Sarah, no entanto, deu de ombro e — ao passo que se afastou de para que os outros pudessem cumprimentá-la — se aproximou de em passos leves.
— Por que é que eu tenho a impressão de que você sabia que isso ia acontecer? — Ele questionou, visivelmente desconfiado, e Sarah entortou os lábios, parecendo em dúvida.
— Gostou do seu presente, ? — A rebateu com outra pergunta e uma expressão marota nasceu em seu rosto enquanto o rapaz revirava os olhos.
Em um movimento involuntário, a atenção de se voltou para e ele a viu sorrir de orelha a orelha enquanto era abraçada por Mitch e Adam ao mesmo tempo. De repente, sentiu aquela sensação dolorosamente prazerosa bater contra as paredes de seu estômago e um riso involuntário saltou pelos seus lábios.
— Ela é o meu melhor presente. — Ele confessou, voltando seu olhar para Sarah, que sorriu, animada, antes de envolvê-lo em um abraço.

Capítulo Seis

“Now that we are over as the loving kind, we'll be dreaming ways to keep the good alive”
John Mayer, Friends, Lovers or Nothing

Narrador Avulso


— Você tem mil e um talentos, , mas desenhista não é um deles.— Sarah proferiu com os olhos cravados no desenho do amigo, feito na lousa em sua frente.
Foi bastante perceptível para os convidados que, depois da chegada de , havia conseguido de fato “se soltar”. Sua expressão corporal parecia bem mais aliviada e confortável, enquanto o sorriso largo que atenuava ainda mais suas covinhas parecia não querer sair dali.
Depois da metade da festa — quando boa parte dos conhecidos de já tinham ido embora —, o pequeno grupo de amigos decidiu se reunir no aconchegante espaço da sala de estar de Sarah e se subdividiu em outros dois grupos menores, com uma única intenção competitiva: jogar imagem e ação. já tinha tido uma experiência fracassada contra e Geórgia em Amsterdã e, por isso, tomou a decisão de se juntar aos irmãos, enquanto Adam, Mitch e Sarah formavam a outra equipe, e Léo assumia o papel de juiz do jogo.
— Fala sério! Não está tão ruim. — riu, olhando para o desenho que ele mesmo tinha tentado fazer de um stormtrooper*.
— Não, claro que não. — Sarah se manifestou, atraindo a atenção de todos para si. — Eu diria inclusive que a Monalisa precisa ficar esperta. Essa sua versão abstrata de um stormtrooper é realmente uma ameaça. — Ela deu de ombros, fazendo os outros rirem, enquanto revirava os olhos teatralmente.
— Se vocês não conseguem compreender a minha arte, eu não posso fazer nada. — Ele proferiu, lançando o pincel azul sobre a mesa de centro e se sentando ao lado de em seguida.
se aconchegou no sofá, e em um gesto corriqueiro, apoiou sua mão esquerda sobre a coxa da menina e seus dedos deslizaram por entre as pernas dela em um movimento um tanto quanto inconsciente. , no entanto, observou suas ações em silêncio e mordeu o beiço, tentando conter o sorriso quando sentiu o polegar de acariciar sua pele.
Só ela saberia dizer o quanto tinha sentido falta desses pequenos sinais de afeto vindos dele.
— Ah, tudo bem, senhor “artista incompreendido”, — Adam fez aspas com os dedos e voltou a rolar seus olhos. Porém, dessa vez, o não conseguiu se conter, e um riso frouxo acabou saltando por seus lábios. — Por que você não canta para a gente? — Ele questionou com as sobrancelhas arqueadas e desviou o olhar para o chão.
Sem pensar, retirou sua mão de cima da perna de e entrelaçou seus dedos uns nos outros antes de balançar a cabeça na negativa.
— Eu não acho que seria uma boa ideia. — Ele deu de ombros, mordendo os cantos internos de sua boca, e seu amigo franziu o cenho, sem entender.
— E por que não? — Foi Mitch quem perguntou, atraindo a atenção dos outros para si.
— Porque eu já tomei algumas cervejas e…
— Ah, fala sério! — Sarah esbravejou, jogando a cabeça para trás. — Você tomou duas cervejas, . E isso nunca te impediu antes. — Ela proferiu e reagiu com indiferença.
— Só uma música! — Geórgia se manifestou, puxando a atenção do irmão para si. — Nós já estamos todos um pouco bêbados, nem vai fazer diferença. — Ela deu de ombros e, enquanto os outros concordaram com sua fala, balançando a cabeça na afirmativa, achou graça.
— Não. Eu não…
— Eu acho que você deveria. — o interrompeu e, em um ato involuntário, virou o seu rosto em direção ao da menina. Sem entender, ele franziu o cenho. — Eu parei para pensar e eu nunca te ouvi cantar. — A deu de ombros e sorriu, envergonhado, desviando o olhar do dela. — Já te vi fotografar, escrever e até compor! Mas nunca te ouvi cantar e eu acho que já está mais do que na hora de mudar isso. — Proferiu, cutucando a região da cintura do rapaz, onde sabia que ele sentiria cócegas.
reagiu ao seu toque imobilizando o pulso de com os seus dedos, e então voltou o seu olhar de encontro ao dela.
— Por favor? — Seu tom de voz saiu aveludado e seus beiços formaram um bico em um semblante bastante infantil. , por conseguinte, a soltou e respirou fundo, esfregando os olhos com o dorso das mãos.
— Agora ele vai. — Adam proferiu em um tom de voz quase que inaudível e arqueou as sobrancelhas, lançando um olhar assustador para o amigo, que deu de ombros.
— Cale a boca, Adam! — Sarah o repreendeu, desferindo um tapa na nuca do amigo, que resmungou de dor.
— Se você não cantar, eu vou. E eu tenho certeza de que esse é um dos poucos talentos que não temos em comum, irmãozinho. — Geórgia voltou a se manifestar enquanto Leonardo a aconchegava sobre seu colo e os outros achavam graça.
— Tá certo. Uma música. — se deu por vencido e gesticulou para que Mitch o entregasse o violão estrategicamente deixado no canto da sala. mordeu os lábios, animada, e arrumou a sua postura sobre o sofá, a fim de ficar de frente para o rapaz.
apoiou o instrumento sobre suas pernas e fixou o seu olhar na bagunça espalhada em cima da mesa de centro, enquanto dedilhava algumas notas e os olhos o observavam em silêncio absoluto. O tentou pensar em uma música fácil e sem importância, que pudesse dar aos seus amigos o que eles queriam, no entanto, todo o seu vasto catálogo musical pareceu propositalmente desaparecer e uma única opção surgiu em sua mente.
— Eu… Eu fui pego um pouco desprevenido. Obrigado por isso. — Ele lançou um olhar para Adam, que sorriu e, em seguida, ergueu a garrafa de cerveja em suas mãos em direção ao amigo. riu e balançou a cabeça de um lado para o outro, passando o indicador pelo nariz antes de continuar. — Eu não tenho nada preparado, mas tem uma música que eu particularmente gosto muito e, ultimamente, ela tem dito mais sobre mim do que eu gostaria que dissesse. — Ele riu, esfregando os olhos com o dorso da mão e a passando pelos cabelos logo depois. — Enfim, eu… Eu espero que gostem. — disse antes de começar a dedilhar as primeiras notas da tal música.

I gotta a girl crush
(Eu tenho uma queda por uma garota)
Hate to admit it but
(Odeio admitir isso, mas)
I gotta a heart rush
(Eu tenho um coração acelerado)
Ain’t slowin’ down
(que não se acalma)


Durante o primeiro verso, a voz de saiu aveludada e ele fixou o seu olhar em um ponto qualquer, tentando fingir que aquela era só mais uma das vezes que ele se trancava no quarto e perdia noção do tempo tocando uma de suas músicas favoritas.
Por mais que estivesse acostumado a tocar e cantar na frente de boa parte das pessoas ali, a escolha que tinha feito em relação à música tornava isso um pouco mais difícil, sabendo que a razão para isso estava sentada ao seu lado.

I gotta it real bad
(Eu tenho uma queda muito séria)
Want everything she has
(Eu quero tudo que ela tem)
That smile and that midnight laugh
(Aquele sorriso, aquela risada da meia-noite)
She’s giving you now
(Que ela está dando a você agora)


Dois dias depois da sua última conversa com , foi — mais uma vez — pego de surpresa por Arthur parado na porta de sua casa.
Como da primeira vez, ouviu a campainha e, crente de que seria Geórgia e Léo chegando para conhecer sua mãe e Éric, ele não hesitou antes de atender a porta. No entanto, foi quase que impossível não se aturdir com a presença do (ex) noivo de ali.
Até então, não fazia ideia de que os dois estavam conversando, quem dirá combinando de se encontrar em horários propícios para um jantar de casal. não soube reagir ao que estava acontecendo e, quando perguntado sobre , se embaralhou com suas palavras até ser interrompido pela própria vestindo um vestido preto básico, mas suficientemente capaz de causar um arrepio assombroso na nuca de .
Ela, no entanto, tentou se manter indiferente à situação e as únicas palavras que trocou com antes de ir ao encontro de Arthur foram pedindo para ele avisar à Vitória sobre sua saída. O garoto, por sua vez, concordou com o seu pedido e aproveitou a oportunidade para se desculpar com o outro por conta do desentendimento naquele dia no palácio.
Não que ele achasse que Arthur não tenha merecido aquele soco. Para , ele merecia muito mais. Mas agir por impulso e partir para a violência não era algo comum em , e ele acabou se sentindo na obrigação de deixar isso claro.
Em seguida, os dois deram às costas a e os olhos do rapaz viram os dedos de se entrelaçarem aos de Arthur. Ela não parecia tão desconfortável como das outras vezes, e isso fez o peito de comprimir ao mínimo.
Talvez ela tivesse desistido de lutar contra a vontade de seus pais e decidido dar outra chance a Arthur. E isso vinha a ser muito provável, já que os dois estiveram juntos por tantos anos.
Naquele momento, estupidamente quis ser Arthur.
E é justamente sobre isso que ele estava cantando agora.

I don’t get no sleep
(Eu não durmo)
I don’t get no peace
(Eu não tenho paz)
Thinking about her
(Pensando nela)
Under your bed sheets
(Sob os seus lençóis)


Girl crush não é exatamente um tipo de música que se dedica à alguém que gosta. Muito pelo contrário. Em cada verso da letra, a pessoa canta sobre desejar estar no lugar de outro alguém. Porque esse alguém possui a pessoa que você realmente gosta.
E depois daquele dia, para , esse alguém passou a ser Arthur.

The way that she’s whispering
(A maneira que ela está sussurrando)
The way that she’s pulling you in
(A maneira que ela está puxando você)
Lord knows I’ve tried
(Deus sabe que eu tentei)
I can’t get her of my mind
(Eu não consigo tirar ela da minha mente)


odiava invejar uma pessoa, ainda mais alguém tão baixo como Arthur, e por muitas vezes ele lutou para que isso não acontecesse. Mas era quase que impossível afastar esse sentimento ruim todas as vezes que desaparecia e ele imaginava mil e uma coisas. Entre elas, a risada cativante que ela soltava todas as vezes que achava algo engraçado ou até mesmo o beijo doce, seguido de um carinho leve na ponta do nariz.
Coisas essas que ela costumava fazer quando estava com ele.

I want her long blond hair
(Eu quero seu longo cabelo loiro)
I want her magic touch
(Eu quero o seu toque mágico)
Yeah, cause maybe then
(Sim, porque talvez então)
You’d want me just as much
(Você me queira o mesmo tanto)
I gotta a girl crush
(Eu tenho uma queda por uma garota)


Enquanto parecia avulso à realidade, emergido em cada uma das notas da canção. não conseguia desgrudar sua atenção dele e, de certa forma, cada pequena parte da letra fez tanto sentido para ela, quanto fazia para ele.
não precisou dizer nada além daquilo para que ela entendesse os motivos que o levaram a escolher justo aquela música naquele momento e isso, misturado com toda a confusão de sentimentos que vinha sentindo nos últimos dias, fizeram os seus olhos marejarem.
Em um movimento rápido, ela limpou uma lágrima teimosa que escorrera pela sua bochecha e Geórgia percebeu. A irmã lançou um olhar sugestivo para Sarah, que entortou os lábios em um sorriso leve, entendendo perfeitamente o que ela queria dizer e, em seguida, se soltou de Leonardo para se aproximar de .
Assim que sentiu os braços de Geórgia a envolverem em um abraço por trás, se sentiu um tanto quanto idiota por ter se emocionado, então sorriu e balançou a cabeça de um lado para o outro, enquanto assistia terminar sua apresentação improvisada.

Os Stormtroopers são a tropa de base do Império Galáctico no universo Star Wars.

[•••]


Depois que parou de cantar e todos entraram em uma conversa sobre músicas e artistas que gostariam de ver ao vivo um dia, usou a desculpa de que precisava ligar para uma amiga e se afastou do grupo.
Assim como fizera pouco antes dela aparecer na festa, se sentou no banco acolchoado colado à janela e abraçou as pernas. Ela apoiou o queixo sobre seus joelhos e observou a paisagem londrina enquanto sua mente viajava por tudo que vinha acontecendo em sua vida.
, por outro lado, tinha notado a mudança de comportamento de logo que terminou de cantar. A menina não brincava mais, seus sorrisos eram vagos e ela parecia bastante aérea ao assunto. Por isso, quando a viu quietinha e longe de seus amigos, não hesitou em encontrar um motivo qualquer para se aproximar.
— A Sarah não vai deixar você sair daqui sem provar esse bolo que ela comprou. — Ele proferiu, atraindo a atenção da menina para si, e arqueou as sobrancelhas. segurava um prato de plástico vermelho, com uma fatia razoável do bolo, e a menina riu, tomando o prato para si.
arruma a sua postura sobre o banco e apoiou seus pés no chão para que tivesse espaço suficiente para se sentar ao seu lado. E é exatamente o que ele fez.
A abaixou o rosto e, com o talher de plástico, começou a brincar com a massa do bolo enquanto entrelaçava os dedos de uma mão à outra e apoiava seus cotovelos sobre os joelhos, pensando na melhor maneira de quebrar aquele silêncio.
— Eu não estou com raiva de você.
Ele deu de ombros e virou seu rosto de encontro ao dele quase que instantaneamente. Sem entender, a franziu o cenho.
— Quando você chegou, você disse que eu estava com raiva de você. Mas isso não é verdade, . Muito pelo contrário. — Disse, voltando sua atenção para ela, e um riso leve escapou pelos lábios da menina.
Por conseguinte, aprumou a sua postura, passou a mão pelos cabelos e respirou fundo antes de continuar.
— Depois de toda aquela loucura de gravidez, eu percebi que se continuássemos como estávamos, eu estaria te colocando em risco. — Ele deu de ombros e balançou a cabeça de um lado para o outro.

— Não. Me deixa falar. — pediu e a prontamente se calou. — Aquele resultado deu negativo, mas e se não desse? E se seu pai tivesse visto o que eu fiz durante aquele jantar? E se ele descobrisse sobre a gente? — Ele enumerou várias possibilidades e insistiu em chacoalhar a cabeça na negativa.
— O resultado deu negativo, e ele não descobriria. — Ela proferiu, e quando percebeu que fazia menção para rebater, se apressou. — Mas eu entendo o que você fez. Eu entendo e agradeço.
disse com um sorriso singelo no rosto e entortou levemente os cantos de seus beiços.
— Só que você não me coloca em risco, . Você me protege da maioria deles. — Disse, e, em um movimento quase que involuntário, apoiou sua mão sobre as do garoto e acariciou suavemente sua pele.
Um silêncio aconchegante tomou conta da situação e entrelaçou seus dedos aos dela.
— Como estão as coisas com os seus pais? — Ele questionou depois de alguns segundos tentando processar o que estava acontecendo. — E com o… Arthur? — umedeceu a garganta assim que proferiu o nome do garoto e achou graça.
— Com os meus pais está tudo bem. Eles pretendem ficar aqui mais do que eu imaginei que ficariam, mas… Isso é uma coisa boa, apesar dos pesares. — Ela deu de ombros e balançou a cabeça na afirmativa. — E sobre o Arthur, nós não estamos juntos. Se é o que você está pensando. — A cerrou os olhos e reagiu na defensiva, o que a fez rir.
O arregalou os olhos e de repente a possibilidade de ter entendido o recado por trás da letra de girl crush pareceu cada vez real. Além do mais, cantar essa música era quase como ler o seu diário pessoal na frente de algumas pessoas, e era uma menina inteligente. Não precisaria de muito para ela ligar uma situação à outra.
— Eu não… não…
— Eu sei que você viu a gente junto naquele dia e eu sei o que pareceu aquilo. Mas não era um encontro. — Ela garantiu com um semblante um tanto quanto engraçado no rosto. — Aquela foi só mais uma das tentativas do meu pai de me reaproximar do Arthur, não importa quantas vezes eu diga que não tenho interesse em fazer isso acontecer. — deu de ombros e coçou a têmpora com a ponta dos dedos.
— E deu certo? — O se interessou em saber e a menina riu, negando com a cabeça.
— Se tivesse dado, eu provavelmente estaria em casa fazendo papel de idiota enquanto ele tentava a sorte com uma inglesa siliconada em um pub qualquer. — Proferiu, surpreendendo que, por sua vez, elevou as sobrancelhas, embasbacado. — Não vai dar certo, . Nunca deu. — Ela deu de ombros mais uma vez e um sorriso sem humor surgiu no rosto do garoto.
— Eu sinto muito por isso, . Mesmo.
— Não sinta, isso não me afeta. — Garantiu e então seu semblante mudou como mágica. ergueu sua postura, mordeu os cantos internos da boca e respirou fundo antes de continuar. — Brigar com você me afeta. — Confessou.
, por sua vez, soltou um longo suspiro, se sentindo culpado pela situação, fechou os olhos por alguns instantes e esfregou a têmpora com a ponta dos dedos. Em seguida, ele passou a mão cheia de anéis pelos cabelos e virou seu corpo, ficando frente a frente com .
— Me desculpa se eu fiz parecer que estava com raiva de você. — Ele mordeu os beiços, visivelmente nervoso, e um riso leve escapou pela boca de .
— Eu não quero me afastar de você, . — Ela deu de ombros, com um sorriso franco nos lábios. — Eu aguento qualquer coisa. Aguento o chato do Arthur e os comentários do meu pai, mas ficar sem você… Isso eu não consigo. Pelo menos não agora. — Disse, balançando a cabeça de um lado para o outro e riu. — Você foi a melhor coisa que me aconteceu nos últimos meses e eu sei que quando voltarmos ao normal, o seu egocentrismo insuportável vai jogar isso na minha cara, mas… — fez uma breve pausa entre as palavras quando ouviu emitir o som esquisito que ele comumente provocava quando tentava segurar o riso, mas não conseguia. — É verdade. — Proferiu por fim.
— Nós podemos continuar sendo amigos. — sugeriu e franziu o cenho.
— Eu pensei que já fôssemos amigos. — Ela rebateu e o garoto revirou os olhos, entediado.
— Sendo amigos, bonitinha.
Era quase impossível conter o sorriso ao ouvir a chamar daquela forma. Durante os últimos dias, umas das poucas coisas que pedia era para ouvir a combinação perfeita entre aquele apelido insolente e o sotaque insuportável do rapaz.
E agora lá estava ele, a chamando de bonitinha como se nada tivesse mudado entre os dois.
— Só amigos está ótimo. — Seu tom de voz saiu suave e praticamente inaudível.
Não que isso fosse exatamente verdade.
não queria ser amiga de e vice versa, mas ambos precisavam aprender a jogar com as cartas sobre a mesa, e se ,amizade fosse a única opção disponível… Que fosse isso.
Por conseguinte, a abaixou o rosto e encarou o prato com o pedaço de bolo em suas mãos enquanto o silêncio voltava a tomar conta da situação. Segundos depois, devolveu sua atenção para e decidiu acabar de vez com a tensão entre eles.
— O seu rosto está sujo. — Ela proferiu simplesmente e, em um ato reflexo, levou uma de suas mãos à sua bochecha.
— Onde?
— Aqui, olha.
Em um movimento rápido, encheu a mão de bolo e o passou por boa parte do rosto de , sem nem que ele tivesse tempo de defesa.
Estupefato, o se manteve estático por alguns instantes e a menina gargalhou ao vê-lo usar o indicador para afastar de sua testa uma mecha suja com um pouco de glacê.
— Eu vou te dar três segundos de vantagem. — Ele disse sem nem sequer olhá-la, e levou a mão ao estômago, tentando controlar o riso.
— Para quê?
— Para correr, bonitinha. — deu de ombros, finalmente erguendo o seu rosto de encontro ao dela outra vez.
— Ah, não, . Nã-não. — choramingou, tentando não rir do semblante inexpressivo no rosto do amigo.
— Um… Dois…
— Que inferno! — Ela resmungou entre risos e, em segundos, se colocou de pé e começou a correr pelo apartamento de Sarah. Sem entender, os outros assistiam a cena, confusos.
— Três! — esbravejou e então apertou os seus passos atrás da garota.
Não demorou muito para alcançá-la, e quando conseguiu, puxou por uma de suas mãos e a virou de frente para si. Ele segurou firmemente seus braços para imobilizá-la e se debateu, tentando ser forte o suficiente para conseguir se soltar.
— Me desculpa, me desculpa. — Ela choramingou, mas ignorou e, antes que conseguisse evitar, o rapaz colou a sua bochecha na dela e passou boa parte do bolo para o rosto da garota. — ! — esbravejou, irritada, e, em sequência, estapeou o peito de , o que o fez rir.
O , no entanto, envolveu a cintura da garota em um abraço amistoso e separou milimetricamente seus rostos um do outro. Com uma das mãos, ele afastou os fios bagunçados do rosto de e os risos de ambos desapareceram gradativamente.
A brasileira agarrou o tecido da blusa de e ele umedeceu os lábios com os olhos cravados na cor vermelha intacta sobre os beiços de . Seus corações dispararam em uma velocidade surreal e, em um movimento inconsciente, segurou o pescoço da garota, apoiando parte de sua mão contra a mandíbula dela.
sentiu um frio percorrer seu peito de uma extremidade à outra e então fechou os olhos, puxando todo ar que conseguia para dentro de seus pulmões.
— Só amigos, não é? — Ela mordeu os beiços e, em seguida, abriu os olhos para encontrar a expressão estupefata no rosto de .
Por impulso, ele a soltou e se afastou, dando poucos passos para trás. Envergonhado, apoiou uma de suas mãos na cintura e passou a outra pelos cabelos antes de voltar a olhá-la.
— Sim, claro. Só amigos.



Continua...



Nota da autora: Sem nota.



Nota da beta: AAAAAAAAAAAAAAAAA eu não tô aguentando esses dois, não faz isso comigo, Babi, poxa! Eu tô amando essa confusão, mas porra, que ódio ASUAHSUAHSUAH os dois são fofos demais, o amor que criei por esse casal não tá escrito! <3

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