We Are Perfect

Finalizada em: 05/10/2021

Essa fanfic é uma continuação de (I Got) No Control.


Capítulo Um

“Does it ever drive you crazy, just how fast the night changes?”
One Direction, Night Changes.

Narrador Avulso


Londres, 05 de agosto de 2020.


— Espera! O que foi que você disse? — esbraveja com os olhos arregalados enquanto suspira e passa os dedos entre seus cabelos. Confuso, Arthur olha de um para o outro algumas vezes.
— Que ainda não consegui ver nada da cidade, mas….
— Não, Arthur! — visivelmente nervosa, o interrompe. — O que você disse antes disso.
— Ah! Que seus pais viriam no mesmo voo que eu, mas não conseguiram lugar, então compraram passagem para um que chega amanhã à noite. — ele dá de ombros e, em um gesto involuntário, os olhos de fitam a tempo de vê-la esfregar a têmpora com a ponta dos dedos.
— Você só pode estar de brincadeira. — a suspira e um riso sem humor salta de seus lábios. — Ou eu enlouqueci e isso… — ela faz uma pausa entre as palavras para gesticular um não na frente de Arthur. — Isso é fruto de um surto psicológico. — dá de ombros e Arthur franze o cenho, lançando um olhar confuso para .
, por sua vez, solta o lábio inferior — que puxava com as pontas de seus dedos polegar e indicador como se fossem uma pinça — e respira fundo, aprumando sua postura contra o mármore gelado da pia.

— Você ouviu o que ele disse, ? — ela questiona, desviando sua atenção para o assim que o ouve chamar pelo seu nome. — Ele acabou de dizer que meus pais vão estar aqui amanhã. Amanhã! Você sabe o que isso significa? — a coloração de sua pele está mais clara do que costuma ser e seus olhos apavorados. Por conseguinte, encolhe os ombros e esconde as mãos dentro dos bolsos de sua calça, soltando um longo suspiro em seguida.
— Significa que eles sentem a sua falta e querem te ver. — ele dá de ombros e enrola os olhos.
— Isso não faz o menor sentido. Eu falei com a minha mãe hoje pela manhã e ela não me disse nada sobre vir para Londres.
— Eles queriam que fosse surpresa. — Arthur profere, atraindo a atenção dos outros dois para si.
— E por que eles fariam isso?
— Porque eles querem salvar o nosso casamento. — o rapaz dá de ombros e, segundos depois, se levanta da cadeira onde está sentado para caminhar em direção à ex-noiva. — Nossos pais sabem que fomos feitos um para o outro, . — diz a poucos passos de distância da garota, e um riso irônico salta pelos lábios dela enquanto desvia o olhar para o chão, incomodado com a fala de Arthur.
— Nem você acredita no que acabou de dizer, Arthur. — a franze o cenho e o outro respira fundo. — Não vai ter casamento algum porque nós dois não estamos mais noivos e eu pensei que tinha deixado isso bem claro na última vez que conversamos.
— Mas
— Não tem “mas”, Arthur! — ela esbraveja, ouvindo sussurrar um “calma”. — Eu não amo você e você não me ama! Qual é, me ajuda aqui! — Arthur se cala, desvia o olhar para o chão e ri. — Isso não pode estar acontecendo. — ela balança a cabeça de um lado para o outro e, assim como o ex, abaixa o rosto, encarando a meia rosa em seus pés.
, por sua vez, respira fundo e arqueia as sobrancelhas quando ouve o barulho da campainha invadir o ambiente.
— Deve ser a… — ele se apressa em sair da cozinha para atender a porta, no entanto, quando cruza a divisão entre um cômodo e outro se surpreende ao encontrar Vitória com um sorriso largo no rosto.
— É a pizza. Eric já foi atender. — profere e suspira brevemente, dando dois passos para trás e abrindo espaço para que sua mãe encontrasse a figura de Arthur a uma distância razoável de . — Eu… não sabia que tínhamos visita. — ela diz com um sorriso confuso no rosto e o olhar passeando de para .
Confusa e assustada com o silêncio ensurdecedor no ambiente, Vitória passa por e caminha até Arthur.
— Como vai? — ela questiona, estendendo uma de suas mãos para o rapaz. — Vitória. Mãe do . — profere, lançando um olhar para o filho enquanto Arthur faz o mesmo com .
— Arthur. — o rapaz rebate, apertando levemente a mão da mulher. — Noivo da .
Noivo? — surpresa, Tori arqueia as sobrancelhas e desvia o olhar de Arthur para a Aupair que tomava conta de seus filhos mais novos. — não me disse que você estava em Londres.
— Eu e os pais dela queríamos fazer uma surpresa. — ele dá de ombros e rola os olhos. Tori, por outro lado, arregala os olhos e desvia a atenção para a ao seu lado.
— Os seus pais também estão na cidade? — ela questiona e imediatamente balança a cabeça na negativa.
— Eles chegam amanhã. — Arthur se manifesta e fecha os olhos, puxando uma boa quantidade de ar para dentro dos seus pulmões.
Amanhã? — a mais velha questiona e a garota dá de ombros enquanto o rapaz balança a cabeça na afirmativa e observa a cena em silêncio. — Isso é ótimo, ! Você deve estar ansiosa para revê-los depois de todos esses meses. — ela sorri, animada, e entorta os cantos de seus lábios em um sorriso sem humor.
— Tori! — de onde está, Eric esbraveja e seu tom de voz invade a cozinha. Vitória respira fundo e dá alguns passos para trás, se afastando do, até então, casal.
— Bom, vamos comer? Arthur se junta a nós essa noite? — ela questiona, animada, e o rapaz chega a espaçar seus lábios para aceitar seu convite, mas se apressa em respondê-la.
— Na verdade, Arthur já está de saída. — profere, atraindo a atenção de Vitória para si. O sorriso no rosto da mãe de desaparece por alguns instantes e ela suspira.
— Tudo bem, mas… Eu faço questão que ele e seus pais venham jantar aqui em casa. — Tori dá de ombros e o ar parece desaparecer dos pulmões de . Sem pensar, ela lança um olhar assustado para . — Que tal domingo? — a mais velha questiona, com as sobrancelhas arqueadas e um sorriso largo no rosto, devolvendo a atenção para Arthur.
— Por mim, tudo bem. — o rapaz dá de ombros, quebrando o silêncio depois de alguns minutos.

[•••]


Quando terminam de comer, ajuda Vitória a arrumar a bagunça causada pelos pratos e copos espalhados pela imensa mesa de seis lugares na sala de jantar. Por mais que tenha sido pego de surpresa, tinha conseguido se distrair junto à Tori e Eric, que conversavam animados sobre a comemoração de seu aniversário de casamento. , por outro lado, no momento em que viu Arthur entrar no Uber, disse à Vitória que estava com uma dor de cabeça quase que insuportável e pediu licença para subir até o seu quarto antes mesmo de comer.
Assim que se despede de sua mãe e Eric, vai em direção ao seu quarto, mas a fresta da porta aberta no quarto de faz com que ele interrompa seus passos. Sentada na cama, vê a menina largar o celular no colchão e soltar um longo suspiro.
esfrega a têmpora com as pontas dos dedos e então limpa os olhos molhados com o dorso das mãos. Quando ouve o barulho de batidas em sua porta, ela dá um pequeno salto da cama e se surpreende ao ver parado no batente de seu quarto. Um sorriso singelo salta pelos lábios dele e a respira fundo, passando as mãos pelos cabelos.
— Eu acabei de falar com a minha mãe. — ela dá de ombros, olhando para o celular sobre o colchão. — Eles acabaram de deixar meu irmão na casa dos meus padrinhos e já estão indo para São Paulo. O voo sai pela manhã.
— Como você está? — o questiona, mordiscando os beiços, e dá de ombros.
— Apavorada. — ela ri, passando as mãos pelos cabelos, e se senta ao seu lado. — Eu sinto falta deles e estou ansiosa para vê-los, mas… Eu não sou a mesma que eu era lá no Brasil, . Você sabe disso. — profere e se apressa para limpar uma lágrima solitária que escorrera por sua bochecha.
— Eles não vão descobrir, . — ele garante, apertando levemente uma das mãos da menina sobre seu colo. sorri.
— Eu sei que não, mas é que… — ela puxa o choro pelo nariz e balança a cabeça de um lado para o outro. — Você não conhece o meu pai. Ele é… Complicado. — a garota franze o cenho e acha graça da careta em seu rosto.
Os dois se calam por alguns minutos e brinca com os dedos do garoto entrelaçados aos seus. respira fundo ao ouvir a garota fungar e, em seguida, se levanta, soltando suas mãos.
Sem entender, acompanha seus movimentos e arqueia as sobrancelhas ao vê-lo se livrar da blusa preta que usava e largar a peça de roupa no chão.
— O que você…? — Ela questiona, confusa, e, em silêncio, engatinha pelo colchão da garota e se deita no canto da cama de solteiro colado à parede cinza. Enojada, rola os olhos. — Sério? Você realmente acha que eu estou no clima para… Isso?
— Que tipo de pessoa você pensa que eu sou, ? — questiona com as sobrancelhas arqueadas e a menina franze o cenho sem entender. — Eu não quero transar com você, bonitinha.
— Não?
— Não agora. — profere, e o semblante em seu rosto faz a menina gargalhar. — Eu só quero dormir aqui. — dá de ombros, acariciando a mão de sobre o colchão, e a menina prende um lábio contra o outro, sentindo suas bochechas queimarem.
Só dormir? — a morde os beiços e rola os olhos, puxando-a para perto de si.
— Eu sei que vai ser difícil para você se controlar com o meu corpo sensual colado ao seu a noite toda, mas… — enojada, revira os olhos enquanto sente os braços de envolverem seu corpo e suas costas batem contra o peito dele. — Eu juro que só quero dormir. — ele dá de ombros e a menina ri, se aconchegando no abraço dele.
sente o peito estremecer ao inalar o perfume doce preso aos cabelos dela e fecha os olhos, acariciando a pele dos braços dele.
— Vai ficar tudo bem. — garante, beijando o topo da cabeça de e, por consequência, ela volta a abrir os olhos.
— É. Meus pais, meus chefes, meu ex-noivo, e o cara com quem eu estou…
— Transando? — a interrompe, erguendo levemente seu tronco para olhá-la e franze o cenho.
— Transando é um pouco feio demais. Eu ia dizer me relacionando. — ela dá de ombros e entorta o canto de seus lábios em um sorriso singelo, deixando um beijo carinhoso sobre seu ombro. — Enfim… Todas essas pessoas na mesma mesa de jantar. O que poderia dar errado? — questiona, virando o rosto de encontro ao dele e um riso frouxo salta pelos lábios de .
Em seguida, ele inclina seu rosto para frente e seus beiços encontram os dela em um beijo suave.

Capítulo Dois

“Pull me close and I'll hold you tight, don't be scared 'cause I'm on your side.”
Jonas Brothers, Hesitate.


Londres, 07 de agosto de 2020.

arruma os cabelos enquanto analisa a combinação entre o suéter de lã laranja e a calça jeans pelo reflexo no espelho em cima do aparador encostado na escada.
Já era pelo menos a terceira vez que ele checava a sua própria imagem. Estava ansioso para esse jantar com os pais de , por um motivo que nem o próprio sabia e essa mesma razão desconhecida fazia com que sentisse a necessidade não de impressioná-los, mas de agradá-los o suficiente para conseguir conquistá-los.
Às vezes, precisava lembrar a si mesmo de que aquele jantar não tinha sido excepcionalmente programado para apresentá-lo aos pais da garota que perdeu a virgindade com ele e com quem, desde então, vem transando ocasionalmente.
O balança a cabeça de um lado para o outro afastando seus devaneios e respira fundo, limpando os cantos da boca com as pontas dos dedos. Quando apruma a sua postura e, consequentemente, ergue o seu olhar, arqueia as sobrancelhas ao encontrar o reflexo de Vitória atrás do seu.
— Vinho tinto ou seco? — ela questiona, mostrando as duas garrafas em suas mãos e vira o seu corpo de frente para o dela. Ele olha de uma garrafa para a outra e então dá de ombros.
— Eu não sei, talvez seja melhor perguntar para a . Ela ainda não desceu?
— Ainda não. Eric disse que deveríamos escolher o tinto, mas você tem razão… — a mulher dá de ombros, mordendo os beiços. — … Eu vou checar com ela.
— Checar o quê com quem? — a voz de chama a atenção de que involuntariamente vira seu corpo em direção ao som e ergue seu rosto, encontrando a figura da garota parada no meio da escada.
Atônito, arqueia as sobrancelhas e os momentos seguintes parecem transcorrer em câmera lenta enquanto desce os últimos degraus da escada.
— Os seus pais preferem vinho tinto ou seco? — Vitória questiona e suspira, estalando os dedos de suas mãos. O rapaz, por outro lado, pinça os lábios com as pontas dos dedos e, em silêncio, admira a garota dos pés à cabeça.
— Eu acho que tinto. Mas não sei se eles vão querer beber hoje.
— E por que não? — Vitória questiona, sem entender.
— Meus pais são conservadores demais. Eles não costumam beber na casa de estranhos. — Envergonhada, morde os beiços e Tori arqueia as sobrancelhas. — Me desculpa.
— Não, imagina! Eu vou deixar essa garrafa na mesa, caso eles mudem de ideia. — A mais velha pisCa um de seus olhos e um sorriso acanhado surge no rosto da aupair.
Em seguida, Vitória dá as costas aos dois e suspira novamente, virando o seu corpo de frente para .
— E então? — Ela abre os braços, mostrando a combinação entre a saia verde de cintura alta, a blusa azul de mangas bufantes e o scarpin salmão.
— Você está… — Estupefato, leva alguns segundos para formular uma frase. Quando consegue voltar à órbita, balança a cabeça de um lado para o outro e passa o indicador pelo nariz, antes de esconder as mãos nos bolsos de sua calça. — Você está linda, .
— Não foi isso que eu perguntei, . — Ela rola os olhos e a olha sem entender. — Eu pareço com alguém que quebrou o voto de castidade?
— Que tipo de estereótipo é esse, bonitinha? — o garoto franze o cenho e a careta em seu rosto faz rir.
— Eu estou falando sério, ! — seu tom de voz sai manhoso e ela faz bico com os lábios. , por sua vez, revira os olhos, entediado.
. — ele profere e, para a surpresa da garota, toca seu rosto, fazendo com que ela feche os olhos involuntariamente. — Você está linda. — diz mais uma vez e a garota pressiona um lábio contra o outro, tentando segurar o riso.
Sem pensar na possibilidade de serem pegos por Vitória, leva a sua mão de encontro a de na sua bochecha e acaricia levemente os dedos dele sobre sua pele. É quando sente o frio do metal em volta do dedo anelar de entrar em contato com a sua pele. Inconscientemente, ele puxa a mão da garota para perto de si.
— Você colocou o anel. — diz e solta um longo suspiro, forçando sua mão de volta para que ele a solte.
— Eu precisei. — ela dá de ombros, mordendo os beiços, e balança a cabeça na afirmativa.
Nos segundos seguintes, os dois são interrompidos pelo som da campainha invadindo o ambiente e desvia o olhar em direção à porta.
— Oh Deus! — resmunga, cobrindo o rosto com as mãos e o rapaz respira fundo, limpando as mãos suadas sobre o tecido de seu suéter.
— Pode deixar que eu atendo! — Vitória profere, animada, caminhando com certa esbeltez sobre os saltos em seus pés.
. — ele a chama e toca um de seus pulsos, forçando-o para baixo. — Relaxa, vai dar tudo certo. — sorri, apertando suavemente a mão de . — Eu vou estar do seu lado o tempo todo. Se precisar, você pode até apertar a minha mão. — ele dá de ombros e um riso leve foge pelos lábios da garota.
Em seguida, a age de maneira inconsciente e envolve o pescoço de em um abraço rápido. Quando sente o aroma opulento do Tom Ford: Tabacco Vanille cruzar o seu olfato, fecha os olhos e acaricia levemente os cabelos presos à nuca de . Ele, por outro lado, é pego de surpresa e demora alguns instantes para pressionar a cintura dela contra a sua.
Quando ouve os passos se aproximarem do lugar onde estão, se afasta e passa as mãos sobre o tecido amarrotado de sua roupa, ao passo que umedece a garganta e tenta se livrar do calafrio que percorre seu peito todas as vezes que ele e têm momentos como o que acabou de acontecer.
— Minha princesa! — uma mulher de cabelos surge na sala de jantar com os braços abertos e sorri, correndo em sua direção.
observa a cena em silêncio e, ao lado da tal mulher, vê um homem de cabelos grisalhos e expressão carrancuda no rosto enquanto Arthur está alguns passos atrás.
— Mamãe! — profere, inclinando o corpo para abraçar a mulher alguns centímetros mais baixa. Em seguida, ela se afasta e sorri para o homem ao seu lado. — Vocês não imaginam a saudade que eu estava sentindo. — diz, envolvendo o pescoço dele e, pela primeira vez, o vê quebrar o semblante rígido e soltar um sorriso breve.
— Você está linda, passarinha. — a mulher diz, acariciando o rosto da garota que, por sua vez, sorri.
— Sua mãe tem razão. — o homem se manifesta, atraindo a atenção de todos para si. — Mas essa saia está curta demais. O que aconteceu com as suas roupas, minha filha? — ele questiona e o sorriso desaparece do rosto de .
Constrangidos com o comentário, Eric e Vitória se entreolham em silêncio, enquanto crava seus olhos em e espera para que ela reaja.
Mas isso não acontece.
— Por Deus, Pedro! Não vamos começar com isso agora. — a mãe de profere em um idioma que não consegue entender e ele vê a garota piscar os olhos algumas vezes, antes de desviar seu olhar para o chão.
— Como vão? — ele questiona, estendendo sua mão direita na direção da mulher. — Eu sou o , filho da Vitória. — diz, com um sorriso largo no rosto, enquanto a mãe de lança um olhar confuso para a filha e, em seguida, para Tori.
— Ângela. — ela profere, apertando a mão do rapaz. Em seguida, umedece a garganta e respira fundo antes de estender a mesma mão na direção do pai de .
— Pedro. — o homem diz, apertando firmemente a mãos de .
— Quando você me disse que seria babá em Londres, eu não pensei que seria de um rapaz feito, passarinha. — o tom de voz de Ângela é brincalhão e engasga, ao mesmo tempo que os outros acham graça do comentário. , por sua vez, desvia a atenção para e ri ao notar suas bochechas coradas.
é meu filho mais velho. — Tori diz, puxando a atenção de Ângela para si. — cuida dos três menores que não estão aqui hoje. Eles foram passar o fim de semana na casa de uma tia e eu devo buscá-los amanhã pela manhã. — ela dá de ombros e a mãe da garota sorri.
— Eu sei como é, eu também tenho um pequeno. Ele inclusive pediu para dizer que está com saudade e que quer que você mande um presente. — diz, voltando sua atenção para a filha, que rola os olhos.
— É claro que ele quer.
— Crianças… Sempre esperando um presente. — Vitória volta a se manifestar e Ângela ri, balançando a cabeça na afirmativa. — Bom, fiquem à vontade. — ela diz, apontando para a mesa posta. — Eu vou servir o jantar. , você pode me ajudar?
— Sim, claro. — a menina sorri e, antes de seguir Tori, lança um olhar rápido para que, por sua vez, entorta os lábios em um sorriso singelo.

[•••]



tinha razão, seus pais eram conservadores demais e não aceitaram o vinho. Pelo menos, não de primeira.
Estavam há pelo menos dez minutos na mesa e os únicos barulhos que conseguiam ouvir eram os de suas respirações em diferentes intensidades e o dos talheres de prata entrando em atrito com a louça francesa dos pratos. Ângela e Pedro estavam sentados lado a lado, de frente para e . Já Vitória e Eric estavam na outra extremidade, de frente para Arthur.
Enquanto a maioria estava calada para saborear o strogonoff preparado com todo carinho por Vitória, mantinha a posição recuada com o rosto e os olhos virados para baixo, e brincava com o pouco de comida em seu prato. Duas garfadas tinham sido suficientes já que algo na presença de Pedro parecia suficientemente intimidadora para fazer o estômago de revirar de nervoso.
O rapaz, no entanto, aproveita o silêncio ensurdecedor e a distração de todos com a comida para analisar o casal a sua frente. Ângela parecia elegante e extremamente educada, assim como Vitória. Ela vestia uma combinação de roupas em tons pastéis e acessórios delicados espalhados pelo corpo. Muitos deles, claro, faziam ligação direta ao catolicismo.
O pai de , por outro lado, demonstrava o oposto. sabia que os dois tinham a mesma profissão, mas a postura curvada sobre a mesa e a agressividade com a qual ele segurava os talheres em suas mãos, indicavam que ele tinha recebido uma criação totalmente diferente de sua esposa. Ele, por sua vez, vestia uma blusa polo vinho, uma calça jeans e, em volta de seu pescoço, um crucifixo de madeira que fazia questão de manter viva na memória de o fato de que, entre todos ali, ele era o mais pecador por ter desvirtuado a filha daquele homem.
Nervoso, o passa a mão pelos cabelos molhados pelo suor em sua nuca. De soslaio, ele percebe o olhar de colado em si, então balança a cabeça de um lado para o outro e bebe em um gole único todo vinho tinto que havia em seu copo numa tentativa desesperada de afastar todo aquele desconforto.
— Então… Vocês são médicos? — Tori quebra o silêncio, atraindo a atenção de todos para si enquanto serve mais uma pequena porção de comida no prato de Eric.
— Sim. Eu sou psiquiatra e meu marido é ortopedista. — Ângela sorri, depois de beber um gole de água e apoiar o copo de vidro sobre a mesa.
nos disse! — Vitória esbraveja, animada, e um tanto quanto aliviada, por ter finalmente conseguido puxar uma conversa. — Vocês se conheceram no trabalho, então?
— Não exatamente. Nós nos conhecemos em uma missão da Igreja. — a outra dá de ombros e Tori arqueia as sobrancelhas, surpresa, limpando os cantos da boca com o guardanapo de tecido. — Algumas paróquias da região se uniram para uma missão na África e foi lá que nos encontramos. Pedro estava trabalhando em um programa para médicos sem fronteiras e eu tinha acabado de passar no vestibular. — ela lança um olhar para o marido e sorri, tocando uma de suas mãos sobre a mesa. Pedro, por sua vez, arqueia as sobrancelhas, mas não esboça nada além disso.
— Quer dizer que vocês são do mesmo país, mas precisaram sair dele para se conhecerem? — Eric questiona com as sobrancelhas arqueadas.
— Nós somos do mesmo estado, na verdade. Cidades vizinhas! — Ângela rebate animada e o outro casal se entreolha. — Mas sim, foi preciso sairmos do conforto de nossas casas para nos conhecermos. — ela dá de ombros, dando mais um gole no líquido gelado em seu copo, e Vitória suspira como se estivesse lendo um livro de romance escrito nos anos sessenta.
— Isso é o amor. Às vezes ele parece estar em lugares óbvios, mas está onde a gente menos espera. — profere e franze o cenho, virando seu rosto de encontro à mãe.
— De que para-choque de caminhão você tirou essa frase, dona Vitória? — ele questiona e levanta as sobrancelhas ao ver que, além de Eric, Ângela e Arthur, Pedro também tinha achado seu comentário engraçado. Tori, por outro lado, revira os olhos teatralmente e aproveita a distração e vira seu rosto para o rapaz ao seu lado.
Por conseguinte, eles emendaram uma conversa curta sobre frases cafonas e piadas ruins e pareceu conseguir relaxar. O semblante em seu rosto era leve e sua postura não estava mais tão rígida como parecia estar nos dez minutos anteriores.
Em silêncio, admira a forma como o garoto passa o indicador pelo nariz e fecha os olhos enquanto ri. Involuntariamente, um sorriso salta pelos lábios avermelhados da menina e de um jeito estranho a frase dita por Vitória a pouco — por mais brega que fosse — começa a fazer sentido dentro de sua cabeça.
— Você disse que é psiquiatra, certo? — Eric pergunta, quando o alvoroço sobre piadas diminui e o assunto parece fugir da mesa novamente. Ângela balança a cabeça na afirmativa. — É por isso que você fez psicologia, ? — ele questiona e a garota suspira, atraindo a atenção dos outros para si.
— Eu acho que sim. — a dá de ombros, brincando com os talheres sobre a mesa. — É lógico que eu queria ter conseguido seguir os passos dos meus pais, mas eu não tenho muita afinidade com agulhas e todas as outras coisas que norteiam a medicina, então… — ela arqueia as sobrancelhas e os outros acham graça do semblante em seu rosto.
— A psicologia é a área ideal para você, passarinha. — Ângela sorri, orgulhosa, e ergue o rosto de encontro ao da mãe. — Além do mais, você sempre quis trabalhar com criança. — a mulher dá de ombros e concorda, balançando a cabeça na afirmativa enquanto um sorriso grato salta por seus lábios. Ângela, por conseguinte, respira fundo e vira seu rosto em direção à Vitória e Érick. — Por falar nisso, ela tem dado muito trabalho para vocês? — ela questiona e, enquanto o casal acha graça, revira os olhos teatralmente.
— Fala sério mãe… — a resmunga com um sorriso envergonhado nos lábios.
— Você não imagina o quanto. — profere quase que ao mesmo tempo que a garota e, em seguida, leva a taça, agora cheia, à boca mais uma vez.
Por impulso, vira o rosto de encontro ao dele e arregala os olhos, surpresa. , por sua vez, arqueia as sobrancelhas ao notar que tinha atraído a atenção de todos para si por conta do comentário que tinha acabado de fazer.
Encurralado, o rapaz coloca a taça sobre a mesa em um movimento de câmera lenta e olha para cada um daqueles rostos, buscando a melhor desculpa possível.
— Quero dizer... — umedece a garganta, apoia as mãos sobre a cintura e, por alguns instantes, encara a louça suja à sua frente. Em seguida, respira fundo e apruma a sua postura sobre a mesa. — é uma pessoa incansável.
O dá de ombros e, enquanto Ângela arregala os olhos, Pedro franze o cenho e lança um olhar confuso para sua filha que, envergonhada, usa as mãos para cobrir seu rosto. , por sua vez, sente suas bochechas queimarem e balança a cabeça de um lado para o outro quando percebe a duplicidade em suas palavras.
— Ela está… Está sempre inventando jogos e atividades novas para as crianças e isso é ótimo. Mas quando chega os finais de semana e ela está de folga, meus irmãos querem que eu acompanhe esse ritmo maluco de passeios ao parque e brincadeiras de pique-esconde. — profere, revirando os olhos e a expressão desarranjada nos rostos dos pais da garota desaparece, dando lugar à risadas leves, junto de Eric e Vitória. — Vocês entendem o que eu quero dizer, não é? — ele questiona, ainda um pouco apreensivo, e Ângela chacoalha a cabeça na afirmativa, levando a taça com água até seus lábios mais uma vez.
, por sua vez, suspira aliviada e um riso leve salta por seus lábios enquanto ela balança a cabeça de um lado para o outro. desvia sua atenção para ela e um sorriso sacana surge em seu rosto quando uma ideia provocativa cruza seus pensamentos.
Nos segundos seguintes, respira fundo, arruma a sua postura sobre a cadeira e — certo de que não era mais o centro das atenções — apoia sua mão esquerda sobre a pele descoberta da perna direita de .
Surpresa, a garota volta a arregalar os olhos e devolve sua atenção para .
— Então sim. Você me dá muito trabalho, boni... ! — um sorriso torto aparece em seus lábios e pisca um de seus olhos, enquanto seus dedos percorrem um caminho até entre as pernas da garota e tenta afastar uma da outra.
Estarrecida, balança a cabeça na negativa, mas o garoto ignora e volta sua atenção para o casal em sua frente.
— Você não mudou nada, passarinha. — Ângela profere, tentando conter o riso e, enquanto a umedece a garganta, arqueia as sobrancelhas.
— Não?
Por mais alto que a racionalidade grite dentro da cabeça de , a menina já se via naquela situação há meses e ela sabia muito bem que o toque de era o suficiente para arruinar qualquer resquício racional agarrado à sua sanidade.
Quase que involuntariamente suas pernas se afastam uma das outras e ela contrai os músculos dos quadris, fechando os olhos ao sentir os dedos do garoto tocarem sua parte mais interna através do tecido da calcinha que ela usava na ocasião.
sempre foi uma menina muito ativa, desde pequena. — Pedro se manifesta, com os olhos cravados na toalha branca de renda sobre a mesa.
A garota, por conseguinte, abre os olhos e quando as pontas dos dedos de começam a acariciar sua intimidade, um grunhido baixo e incontrolável salta por sua boca. O rapaz pressiona um lábio contra o outro e a abraça o punho dele com os dedos de sua mão esquerda, na esperança de que ele pare.
Mas ele não para.
— Isso fez com que ela sempre se destacasse na nossa igreja. — o homem dá de ombros, jogando suas costas contra o encosto da cadeira.
— Eu imagino que sim. — com os olhos cravados nos pais da garota, aumenta os movimentos de seus dedos e respira fundo tentando se manter no controle, por mais que suas pernas já estivessem prendendo a mão de contra sua umidade.
Quando sente as forças de seus músculos esvaírem pelos seus dedos, apoia o cotovelo livre sobre a mesa e, por conseguinte, apoia o rosto sobre sua mão.
é uma boa menina. Ela é, sem dúvida, a melhor AuPair que tivemos. — Vitória diz, com um sorriso largo no rosto e, em seguida, desvia o olhar para a menina. Mas a não esboça nenhuma reação ao elogio de sua host mom.
— Eu proponho um brinde! — Eric esbraveja, levantando sua taça de vinho no ar. — À ! — o homem sorri e faz o mesmo, parando os movimentos de seus dedos. Em seguida, ele aperta levemente a parte interna da coxa de e, estupefata, a garota ergue a cabeça.
— Você está bem, ? — Tori questiona e a garota olha confusa para as pessoas segurando suas taças em suas mãos.
— Me perdoem, eu… eu… — ela engasga com as palavras e, então, balança a cabeça de um lado para o outro, tentando despertar de seus devaneios. — Eu estava um pouco aérea. — confessa, um tanto quanto envergonhada.
— Tire os cotovelos da mesa, . — Pedro ordena com uma expressão carrancuda no rosto, e a menina suspira.
— Desculpe. — seu tom de voz sai mais baixo que o normal e, involuntariamente, lança um olhar de soslaio para . O pressiona um lábio contra o outro tentando conter o riso, e a respiração da garota falha ao vê-lo levar os dois dedos sujos com sua intimidade na direção de seus lábios.
Por favor, não.
Ela suplica mentalmente e quase pode jurar que atingiria o ápice só por vê-lo executar tal obscenidade na frente de seus pais.
Por impulso, vira o rosto para frente e agarra a taça com água a sua frente. No mesmo instante, salta da cadeira e estica seu braço em direção ao porta guardanapo posto sobre a mesa no canto oposto ao que ele estava sentado. Os braços dos dois colidem e o líquido gelado derrama sobre o colo da garota.
! — Vitória esbraveja, repreendendo o filho. , por sua vez, arqueia a cabeça e seus olhos cruzam com o do rapaz.
— Ops! Me perdoe, . Não era a minha intenção te deixar molhada. — ele dá de ombros, pisca um de seus olhos e o queixo da garota cai alguns centímetros, chocada com as palavras que saíram pela boca de .
O volta a se sentar sobre a cadeira e, enquanto resmunga e tenta limpar o molhado em sua roupa, um riso frouxo salta por seus lábios. Ele limpa os dedos úmidos com o guardanapo em suas mãos e, em seguida, ergue a taça como os outros tinham feito segundos antes.
— Onde estávamos? — ele questiona e os outros se entreolham.
Tori respira fundo, ainda envergonhada pelo que tinha acabado de acontecer, mas é a primeira deles a erguer a taça para acompanhar . Eric, Ângela, Arthur e Pedro a seguem, esse último com certo descaso, por sinal.
volta sua atenção para a menina ao seu lado e um sorriso de orelha à orelha surge em seu rosto.
— À ! — ele esbraveja e a menina rola os olhos, enquanto ergue sua taça e tenta conter um sorriso bobo.
— Obrigada. — ela rebate, baixo o suficiente para que só ele a ouça e dá de ombros, virando seu rosto para frente.
— Eu também gostaria de fazer um brinde. — Arthur se manifesta, atraindo a atenção de todos para si. Envergonhado e notavelmente nervoso, o rapaz umedece a garganta e limpa as mãos suadas sobre o tecido jeans de sua calça, antes de se levantar da cadeira. — Ao nosso casamento. — profere com um sorriso largo no rosto e, enquanto os casais mais velhos se entreolham animados, se surpreende e bufa, irritada.
— Arthur…
— E eu também quero aproveitar a oportunidade para dizer que falo por nós dois quando digo que faço questão de ter vocês presentes na cerimônia. — diz com os olhos cravados em Vitória e Éric.
No entanto, não é só o casal que é pego de surpresa com o convite inexplicável e, até então, inviável. olha assustado para em busca de explicações e a menina franze o cenho.
— Como assim? Do que você está falando? — ela questiona com um riso confuso nos lábios e Arthur dá de ombros, lançando um olhar sugestivos para os pais da garota.
— Nós decidimos adiantar o casamento de vocês. — o tom de voz de Pedro atrai a atenção de para si e, surpresa, arqueia as sobrancelhas. O umedece a garganta e então vira o rosto para baixo.
De repente, toda a sua graça e espontaneidade parece desaparecer.
— Nós sabemos como você gosta dessa cidade e pensamos… Por que não? — Ângela dá de ombros, bebendo o último gole de água em sua taça e balança a cabeça na negativa. — Conseguimos alguns meses de férias e vamos tentar organizar para que a cerimônia seja mês que vem e nossas famílias consigam vir. — profere, animada, e a encara com os olhos arregalados e os lábios espaçados.
, por sua vez, fecha os olhos, cerra os punhos e balança a cabeça de um lado para o outro.
— Vocês sabem que isso não vai acontecer, não é? — a menina questiona com um sorriso vago nos lábios e, involuntariamente, ergue o rosto em busca do dela. O sorriso desaparece do rosto de Ângela e, dessa vez, é Pedro quem cerra o punho sobre a mesa. Arthur se cala. — Eu e Arthur, nós… Nós não estamos mais juntos. — ela dá de ombros enquanto Éric e Vitória acompanham a cena em silêncio e constrangidos o suficiente para conseguirem se levantar da mesa sem parecerem mal-educados.
— Isso vai acontecer e você sabe. — Pedro profere entredentes e respira fundo, tentando manter a calma.
— Papai…
— Conversaremos sobre isso em outro momento, ! — ele a repreende e a menina se cala quase que de imediato.
, no entanto, não consegue evitar que uma risada debochada salte de seus lábios. Então, libera um suspiro profundo e limpa os cantos internos dos olhos com a ponta de seu indicador, antes de proferir o seguinte:
— Eu não sabia que tínhamos voltado para 1940.
— O que disse? — o pai de franze o cenho e ergue o olhar de encontro ao seu.
Por milésimo de segundos os dois se encaram e o medo que antes apavorava , desaparece depois que o rapaz percebe que Pedro é só um homem antiquado preso aos costumes de uma década passada.
Apavorada, olha para o garoto ao seu lado com os olhos arregalados. O maxilar trincado de dão a ela a certeza de que ele enfrentaria seu pai sem que aquilo lhe custasse muito.
Ela só não conseguia enxergar os motivos que o levariam a fazer isso.
… — a voz de Vitória desperta o garoto de seus devaneios e ele lança um olhar rápido para a mãe antes de bufar e balançar a cabeça na negativa.
— Nada. Eu não quis dizer nada. — ele rebate, jogando, com tamanha brutalidade, o guardanapo de pano sobre a mesa. — Eu estou com dor de cabeça, então… Se me dão licença. — profere e, em seguida, se levanta da cadeira e segue em direção à cozinha sem dar mais explicações.
Os olhos de o acompanham, preocupada, e quando volta sua atenção para a mesa, os outros cinco se calam. Ela morde os beiços e umedece a garganta, enquanto encara a toalha branca bordada sob suas mãos e Pedro bebe o último gole de água em sua taça.
— Me desculpem por isso, ele… — Tori quebra o silêncio, atraindo a atenção dos pais de para si. — Bom, eu não sei o que houve com ele. — a mulher confessa, soltando o ar de seus pulmões e, em seguida, lança um olhar rápido para Éric.
— Imagina. Nós entendemos. — Ângela força seu melhor sorriso enquanto afaga as costas do marido com uma de suas mãos.
Arthur, por sua vez, estende um de seus braços e alcança a mão de sobre a mesa. O polegar do garoto acaricia levemente a pele da menina e ela ergue o olhar de encontro ao dele. Arthur sorri e ela, mais uma vez, rola os olhos, puxando sua mão de volta para si.
— Com licença, eu já volto. — ela se levanta e, antes que tenham tempo de questioná-la, apressa seus passos, seguindo o mesmo caminho que há alguns minutos.
Na cozinha, está curvado com a cabeça para baixo e os braços apoiados sobre o mármore gelado da pia. Apreensiva, para a alguns metros de distância e o observa em silêncio até encontrar coragem para se aproximar.
Quando sente o toque da menina contra as suas costas, a olha por cima dos ombros e assim que a reconhece, suaviza a expressão em seu rosto.
Ele respira fundo, se vira de frente para e ela morde os beiços enquanto ele escora as costas contra o balcão da pia.
— Me desculpa. — o dá de ombros, com os braços cruzados na frente de seu peito e o olhar baixo. balança a cabeça de um lado para o outro, toca uma das bochechas de e dá um passo à frente, erradicando ainda mais a distância entre seus corpos. — Eu não consegui evitar quando vi a forma que ele falou com você.
— Eu disse que meu pai era complicado. — a garota entorta levemente os lábios e balança a cabeça na negativa, esfregando a têmpora.
— Não, . O seu pai é um babaca. — ele rebate sem pensar e se arrepende quando vê a garota arquear as sobrancelhas. — Me desculpa. De novo.
— Está tudo bem. Você está nervoso. — ela profere e dá de ombros. O semblante carrancudo no rosto do rapaz faz rir.
Os dois se calam e percebe que está envergonhado — e irritado — o suficiente para evitar a qualquer custo olhá-la nos olhos. Ela então morde os lábios e toca seus braços, os forçando para baixo, para que desate o nó entre eles.
— Eu posso te ajudar com isso. — ela dá de ombros, espalmando uma de suas mãos sobre o peito do rapaz. Ele, por consequência, fecha os olhos, respira fundo e só então volta seu rosto de encontro ao dela.

— O quê? — ela arqueia as sobrancelhas e sente o toque dos dedos dela descerem pela extensão de seu tórax. — “Surpreenda” não era uma das suas regras, bonitinho?
A garota morde os beiços e — antes que consiga protestar — sua mão apalpa a região da virilha do rapaz. fecha os olhos, sentindo seus músculos arquearem no instante em que começa a massagear seu pênis coberto pelo tecido de sua calça.
Mentalmente, o rapaz se culpa por ter escolhido um jeans justo.
Um sorriso maroto salta pelos lábios da menina quando ela percebe que o toque da sua pele sobre a dele tinha o mesmo efeito de vulnerabilidade causada pela posição contrária.
Há minutos era ela com os olhos fechados, avulsa à realidade, implorando pelo toque dele, independente da situação em que se encontravam. Agora era quem precisava sentir sem nem se preocupar com seus pais sentados no cômodo ao lado.
A garota se coloca sobre as pontas dos pés e os pelos de arqueiam ao sentir a pele aveludada dos lábios da garota beijarem a região do seu pescoço. Involuntariamente, ele apoia suas mãos sobre a curva da cintura de e um grunhido salta pelos seus lábios quando ela crava suavemente os dentes na sua pele.
... — ele profere quase que em um sussurro e, em seguida, volta a se calar.
— Estou ouvindo, . — ela diz com a voz abafada pela pele do garoto, e umedece a garganta, sentindo seu membro latejar contra a mão da menina.
— Se você não parar agora, eu… — o faz uma breve pausa entre as palavras e se afasta, buscando por seus olhos.
chacoalha a cabeça de um lado para o outro, respira fundo e aperta ainda mais a cintura da garota contra o seu corpo.
— … Eu vou te foder com tanta força que você mal vai conseguir andar amanhã.
Surpresa, arqueia as sobrancelhas e demora alguns instantes para processar o que tinha dito. Quando consegue, um sorriso brota em seus lábios e ela pressiona ainda mais o membro dele contra sua mão, antes de voltar a se colocar sobre as pontas dos pés e alcançar seu ouvido.
— Eu adoraria ver você tentar. — ela sussurra, mordendo o lóbulo da orelha do garoto e ele rola os olhos, impulsiona o corpo dela para o lado, e inverte as posições.
As costas da garota batem contra a pia e ela acha graça. Em sequência, solta a virilha de e ergue os braços, envolvendo-o pelo pescoço. O garoto inclina seu rosto para baixo e ela umedece os lábios com a ponta da língua, se preparando para o que estava por vir.
, você pode me ajudar com…
Quando o tom de voz de Vitória se faz presente na cozinha, salta para trás e se vira de frente para a pia. O abre a geladeira para tentar disfarçar e, de lá, tira uma jarra com água.
— … Com a sobremesa. — Tori profere, olhando desconfiada de um para o outro. , por sua vez, passa uma das mãos pelos cabelos, respira fundo e sorri antes de se virar de encontro à sua host mom e balançar a cabeça na afirmativa.
— Claro.
apoia a jarra sobre a ilha de mármore no meio do cômodo e abaixa a cabeça, enquanto Vitória observa seus movimentos em silêncio. retira do congelador o sorvete caseiro que tinha ajudado a mulher a preparar mais cedo e arqueia as sobrancelhas, passando pelos dois sem proferir mais nada.
— Você está bem? — a mulher morde os lábios com um olhar apreensivo sobre o filho e ergue o rosto de encontro ao seu.
— Eu? — ele questiona, confuso, e Tori balança a cabeça na afirmativa. — Eu… Estou. Estou bem, só um pouco estressado. Nada demais. — garante, forçando um sorriso leve, e a mulher entorta o canto da boca.
Quando retorna à sala, se depara com uma cena bem distinta da que tinha deixado para trás. Pedro e Éric conversavam animados sobre um assunto que ela ainda não tinha conseguido entender e os semblantes nos rostos de Ângela e Arthur pareciam bem mais tranquilos do que antes.
— Vocês vão adorar. Holmes Chapel é um lugar incrível. — Eric profere, jogando suas costas contra o encosto da cadeira.
— Holmes Chapel? — um sorriso curioso salta pelos lábios de enquanto ela apoia a vasilha de vidro sobre a mesa.
— Sim. — É Vitória quem responde, surgindo atrás da garota com pequenos pratos em suas mãos. Involuntariamente, vira seu tronco para encontrá-la. — Eu e Eric convidamos seus pais e o Arthur para a festa do nosso aniversário, em Holmes Chapel. — ela sorri, passando pela garota, e surge logo em seguida.
Estarrecida, arqueia as sobrancelhas e seu olhar cruza com o de . O morde os beiços e a garota respira fundo, coçando a testa com as pontas dos dedos.
— Que ótimo. — profere, forçando o seu melhor sorriso. — Vai ser bom ter vocês por perto durante essa viagem.

[•••]


— Você tem certeza de que não quer vir com a gente? O apartamento que alugamos é enorme, você poderia ficar mais à vontade em um dos quartos que temos lá. — Ângela diz, acariciando os braços da filha.
— Eu prefiro ficar. Amanhã as crianças voltam e eu preciso arrumar algumas coisas antes que elas cheguem. — dá de ombros e a mulher entorta os lábios em um sorriso entristecido. — Essa é a minha casa agora, mãe. — profere depois de um longo suspiro e Ângela sorri, balançando a cabeça na afirmativa.
— Eu sei.
— Boa noite, passarinha. — Pedro envolve a filha com um de seus braços e beija o topo de sua cabeça. — Dorme com Deus. — diz, afagando os seus cabelos, e sorri.
Quando o homem se afasta, Arthur dá alguns passos em direção à menina e — sem pedir permissão — apoia uma de suas mãos sobre a curva da cintura dela. Assustada, arregala os olhos e recua, mas o garoto é mais forte e consegue manter seu corpo colado ao dela por alguns instantes.
abaixa a cabeça, um tanto quanto incomodado com a cena.
— Boa noite, .
Quando percebe o rosto de Arthur cada vez mais próximo do seu, vira o rosto e fecha os olhos quando sente os lábios dele encontrarem a pele de sua bochecha.
— Boa noite, Arthur. — ela profere à contragosto, sentindo seus músculos arquearem em repulsa.
— Obrigada pelo jantar. Estava uma delícia. — Ângela diz, afagando o braço de Vitória, e a outra sorri.
— Imagina, voltem sempre que quiser. Vocês serão sempre bem-vindos aqui. — ela garante e a mãe de agradece em silêncio.
Os pais da garota lançam mais um olhar para a filha e ela entorta o canto dos lábios, balançando a mão de um lado para o outro. Ângela solta um longo suspiro e Pedro apoia uma das mãos sobre a cintura da esposa, a guiando para fora da casa dos Carters enquanto Arthur os segue.
Quando fecha a porta e a imagem dos convidados já não se faz mais presente, Vitória respira fundo e arregala os olhos, voltando sua atenção para os rostos conhecidos que a encaravam.
— A noite de hoje foi… Intensa. — diz, sentindo um peso de mil toneladas sair de cima de seus ombros. Os outros acham graça. — Eu estou exausta, acho melhor nos deitarmos. — profere com os olhos cravados em Éric e o homem balança a cabeça na afirmativa, entrelaçando seus dedos aos dela. — , amanhã eu vou buscar as crianças pela manhã, se você quiser ir comigo… Acho que Helena vai gostar de te ver lá. — ela dá de ombros com um pé sobre o primeiro degrau da escada, e sorri.
— Tudo bem. — a rebate e um sorriso leve surge no rosto de Vitória, antes de Éric puxá-la pelo braço e os dois desaparecem do campo de visão de em questão de instantes.
Em sequência, libera todo o ar de seus pulmões e se senta sobre o penúltimo degrau da escada, ela tira os sapatos de seus pés e encolhe as pernas, apoiando os cotovelos sobre os joelhos e escondendo o rosto em suas mãos.
acompanha seus movimentos em silêncio até que libera um suspiro e se senta ao seu lado na escada.
Como , ele também encolhe as pernas e apoia os cotovelos sobre os joelhos. No entanto, diferente dela, entrelaça os dedos de uma mão à outra e mantém seus olhos fixos na pequena rachadura na lateral da porta de entrada.
— Você não vai se casar com aquele cara, vai? — ele quebra o silêncio e vira seu rosto de encontro ao dele.
— De jeito nenhum. — ela garante, buscando os olhos do garoto. — Eu só preciso encontrar um jeito de dar essa notícia aos meus pais. Ao meu pai, mais especificamente.
Quando percebe que o semblante inexpressivo no rosto de não muda, respira fundo e joga seu braço ao redor de seus ombros, usando a ponta de seus dedos polegar e indicador para acariciar o lóbulo da orelha direita dele.
— Obrigada por estar aqui hoje. — ela sussurra ao pé do ouvido esquerdo dele, com o queixo apoiado em seu ombro, e o rapaz finalmente desvia o olhar de encontro ao dela.
— Onde mais eu estaria? Eu moro aqui. — franze o cenho, confuso, e rola os olhos, afastando o seu tronco e entrelaçando seu braço ao dele.
— Mas você não precisava estar aqui hoje. Você poderia ter ido encontrar os seus amigos, ou sei lá... Alguma garota que você conheceu em um aplicativo de relacionamento. — ela morde os beiços e um sorriso torto salta pelos lábios de .
— Eu não preciso dessas coisas, bonitinha. — ele balança a cabeça na negativa e a menina dá de ombros.
— Eu sei que não. Mas, como eu disse, você não precisava estar aqui.
O sorriso desaparece do rosto de e seu semblante volta a ser sério. Ele inclina o tronco para a frente e fecha os olhos quando sente a respiração quente de bater contra a sua pele. Sua mão livre sobe até o rosto dela e acaricia suavemente sua bochecha, antes de puxar o queixo dela para si e juntar seus lábios em um beijo rápido e doce.
— Você não precisa me agradecer. Eu disse que estaria com você. — profere com a testa colada na dela e se afasta em um movimento brusco.
— Você tem certeza? — ela questiona com as sobrancelhas arqueadas e franze o cenho sem entender. — Porque, se eu bem me lembro, nós deixamos um assunto inacabado lá na cozinha. — a garota dá de ombros, mordendo os beiços, e se surpreende.
— Meu Deus, eu criei um monstro. Você está viciada em mim, ! — ele esbraveja e a garota rola os olhos, soltando seu braço para envolver seu pescoço e puxá-lo para outro beijo. Dessa vez, mais obstinado que o outro.
A mão de desce até a cintura da garota e ele crava os dedos em sua pele. Um grunhido salta pela boca de e o garoto aproveita o espaço entre seus lábios para invadi-la com a língua e intensificar ainda mais o beijo.
No entanto, nos segundos seguintes, sente o celular vibrar no bolso de sua calça e resmunga, frustrado, puxando o beiço da garota com seus dentes e encerrando o beijo com dois selinhos seguidos.
— É o alarme. O voo da Geórgia chega em meia hora, é melhor eu me apressar. — profere, checando o aparelho e voltando a guardá-lo em seguida — Você vem comigo? — ele questiona enquanto se levanta e arruma a roupa amassada com suas mãos.
— Não. Eu estou cansada e meu corpo está implorando por um banho. — dá de ombros e entorta o canto de seus lábios, um tanto quanto decepcionado. — Mas avise à ela que estarei lá na quarta-feira!
— Tudo bem, eu aviso. — diz, sacando as chaves do carro sobre o aparador de cristal. Em seguida, ele dá as costas à garota e caminha até a porta.
— Ah, só mais uma coisa… — ela profere, puxando a atenção de de volta para si. se levanta, dá alguns passos em direção a ele e acompanha seus movimentos, sem entender. — … Eu vou deixar a porta do meu quarto aberta. Se você quiser terminar o que começamos mais cedo, eu estarei te esperando. — diz, mordendo o lábio inferior, e um riso leve escapa pela boca de , ao passo que ele rola os olhos.
— Você realmente vai fazer eu dirigir daqui ao Heathrow com esse pensamento na cabeça? — questiona e a menina dá de ombros, tentando parecer inocente perante às acusações do garoto. — Isso é sádico, . — ele arqueia as sobrancelhas, indignado, e a garota acha graça.
— Agora você tem um motivo voltar mais rápido. — pisca um de seus olhos e gargalha, jogando a cabeça para trás.

Capítulo Três

“I’ll always have you. Just like a tattoo.”
Jordin Sparks, Tattoo.



Londres, 10 de agosto de 2020


Meus dedos tamborilam sobre o tampo da ilha de mármore no meio da cozinha, enquanto encaro a tela preta do meu celular e aguardo esperançosa por uma notificação que parece não querer vir. Frustrada, solto um suspiro longo, coçando minha têmpora com as pontas dos meus dedos e, em seguida, aperto ainda mais o rabo de cavalo que prende os meus fios de cabelo.
Destravo o aparelho e vou direto para a conversa nada amistosa que tive com meu pai há poucos minutos. Para a minha surpresa, ele e minha mãe tinham decidido passar os últimos dias da semana em Paris, na casa de um amigo dos tempos de faculdade que — até então — eu não sabia da existência.
De início, confesso que fiquei aliviada em saber que eles não estariam em Londres pelos próximos cinco dias e eu teria liberdade para aproveitar os primeiros dias de Geórgia na cidade como bem planejamos. No entanto, vi minha felicidade esvair pelos meus dedos quando meu querido pai — com toda a sua ignorância e falta de paciência — me deu duas opções das quais eu não conseguiria fugir.
A primeira delas era acompanhá-los durante essa viagem à França, onde eu teria de voltar a ser a que deixei para trás e fingir ser a filha perfeita de pais exemplares. Descartei essa opção na primeira oportunidade.
Recentemente, assisti a uma comédia da Netflix onde uma jovem empreendedora se muda para Paris e passa por aventuras invejáveis que vão desde infernizar a vida da sua nova chefe com ideias geniais e inovadoras à se apaixonar pelo vizinho do andar de baixo que, óbvio, é comprometido. Se algum dia eu for à França, eu quero que seja exatamente assim. Quero enlouquecer os franceses com meu idioma vasto que se resume à coucou — significa “Olá!”, por sinal — e viver um romance digno da cidade luz.
Por mais atrativa que a capital francesa seja, eu prefiro que nosso encontro aconteça em um momento mais oportuno e não com os meus pais controlando cada um dos meus passos. Porém, quando nego o convite, não me atento à um detalhe um tanto quanto insignificante: Arthur.
Assim que digo não à Paris, meu pai subentende que estou dizendo sim para sua segunda opção, a qual se resume basicamente a mim sendo babá do idiota com quem meus pais insistem para que eu me case. Não consigo pensar em ficar mais de dez minutos olhando para o rosto de Arthur sem lembrar que, enquanto eu estava sendo trouxa o suficiente para me guardar para ele, ele me traia com alguém que cresceu ao meu lado como uma irmã.
Você deve estar se questionando se eu coloquei isso em pauta e a resposta é: sim, coloquei.
Meus pais sabem dos atos ilícitos de Arthur desde o dia em que eu descobri que um par de chifres vinha crescendo na minha cabeça. Confesso, inclusive, que desconfio que eles descobriram bem antes do que eu e acobertaram toda essa farsa com a esperança de que isso não chegasse até mim e eu mantivesse não só o nosso noivado, como também o meu voto de castidade.
Sendo sincera, eu nem me surpreenderia caso essa minha desconfiança estivesse certa. Meu pai preza pela família perfeita e um bom relacionamento entre seus membros, mas isso só vai até a página dois. Então, não me espanta todo esse instinto de proteção em relação à Arthur. Afinal, eles são iguais.
O que me entristece, é saber que minha mãe é condizente com essas atitudes.
Respeito o meu pai pelo homem que ele é e por toda a sua história de conquistas vindas do zero, mas não se engane pelas aparências. A igreja não foi - nem de longe - o principal motivo pelo qual deixei o Brasil sem nem ao menos pensar em olhar para trás.
Fecho a aba de nossa conversa e, em seguida, vejo que os traços das mensagens desesperadas que mandei para a minha mãe recorrendo por sua ajuda estão azuis. Solto um suspiro desapontado, mas não a culpo. Minha mãe já não tinha mais força para enfrentar a ignorância do meu pai e o mínimo que eu podia fazer era lidar com os meus problemas sozinha.
Vejo uma notificação apontar na extremidade da tela e sinto meu peito comprimir quase que instantaneamente.

Arthur: Oi, linda.
Arthur: Você quer que eu te encontre na casa dos seus chefes?

Minha pele ferve de ódio e eu sinto uma vontade quase que incontrolável de gritar o mais alto possível e arremessar meu celular contra parede. No entanto, luto contra os meus próprios instintos e me apresso para responder um solitário “não”. Em seguida, tento ser curta e grossa ao acrescentar que combinaria um lugar para nos encontrarmos assim que soubesse quais eram os planos de para hoje.
Por falar em , talvez essa fosse a pior parte.
Eu não teria como fugir da companhia insuportável de Arthur hoje, mas talvez eu não precisasse aturá-lo sozinha. O problema é que eu não sabia como contar para o que o meu ex — porque, pensando bem, Arthur é meu ex — nos acompanharia pelo passeio turístico que programamos fazer durante a visita de sua irmã à cidade.
— Merda! — Resmungo entredentes, lançando meu celular sobre o balcão em seguida.
! — Assim que ouço o tom de voz inconfundível de uma das minhas crianças, ergo o meu rosto em direção ao som e encontro Oliver andando em minha direção, já com o uniforme de seu time de futebol. Passo as mãos pelo rosto, tentando disfarçar minha ira e, então sorrio sem mostrar os dentes. — Você não vai ao meu jogo hoje?
— Hoje não, príncipe. — Afago levemente seus ombros e o pequeno entorta os lábios, desapontado. Sem entender, viro minha cabeça um pouco para o lado e franzo o cenho. — O que foi?
— É que agora eu sei que meu time vai perder. — Ele dá de ombros, soltando um suspiro leve e um sorriso confuso salta pelos meus lábios.
— Como assim?
— Oliver cismou que você é o amuleto de sorte dele. — Parada na exata divisão entre a cozinha e a sala de jantar, vejo Vitória carregar a mochila de Oliver nas costas e uma Helena sonolenta no colo. Sei que Eric tinha levado Henry para uma consulta ao oftalmologista e, por um tempo, chego a me sentir culpada por ter mudado a minha folga para hoje.
— Isso é verdade? — Questiono com as sobrancelhas arqueadas e o pequeno morde os beiços.
— Vem, filho! Você vai se atrasar! — Tori esbraveja e o menino a olha por alguns instantes. Em seguida, suspira e volta sua atenção para mim.
— Por favor, . — Ele choraminga e eu me derreto, achando a situação um tanto quanto graciosa.
— Eu não posso, príncipe. Prometi ao que o acompanharia hoje e ele está contando com isso.
Dou de ombros, acariciando a bochecha do pequeno, e vejo um bico se formar em seus lábios. Respiro fundo e, em um movimento rápido, o viro em direção à Vitória.
— Mas você sabe que eu não preciso estar lá para ser o seu amuleto, não sabe? — Questiono com as sobrancelhas arqueadas, enquanto levo a criança de encontro à mãe e Oliver ergue o olhar para mim, sem entender. — Você não sabe? — Arregalo os meus olhos, fingindo espanto, e ele solta uma gargalhada graciosa, balançando a cabeça de um lado para o outro.
Quando ficamos há poucos metros de distância de Vitória, interrompo meus passos e viro Oliver de frente para mim. Me abaixo sobre os meus joelhos, ficando a uma altura vulnerável em relação a ele e seguro seus bracinhos.
— Eu prometo que vou estar com você aqui… — Digo, tocando o centro de sua testa com a ponta do meu indicador. —… E aqui. — Em seguida, aponto para a região de seu coração e Oliver gargalha no momento em que começo a fazer cosquinha embaixo do seu braço. — Vai dar tudo certo, campeão. — Profiro por fim, bagunçando seus cabelos e me erguendo do chão.
— Além do mais, a mamãe estará lá na torcida. Então hoje você vai ter dois amuletos da sorte. — Vitória mostra o número dois com os dedos de sua mão livre e eu vejo a criança revirar os olhos, virando o rosto de encontro ao da mulher.
— Você é pé frio, mãe. — Seu tom de voz sai um tanto quanto entediado e eu arqueio as sobrancelhas, surpresa, lançando um olhar para Vitória. Seu queixo tinha caído alguns centímetros e seus olhos estão arregalados. Preciso pressionar um lábio contra o outro para segurar o riso que insiste em sair pelos meus lábios.
— O que foi que você disse? — Ela questiona e o pequeno dá de ombros. — Moleque, você me respeita! — Minha chefe rosna entre dentes, mas percebo pelo seu tom de voz e pelo semblante em seu rosto que aquilo tudo era uma grande brincadeira. — Anda, guarde suas coisas no carro e me espere lá. Eu já estou indo. — Vitória entrega a mochila azul para Oliver e meus olhos acompanham os movimentos do pequeno até a saída de casa.
— Tchau, ! — Ele grita, sem voltar sua atenção para mim, e um sorriso leve surge no meu rosto.
— Tchau, príncipe! Bom jogo!
— Quando foi que meus filhos passaram a gostar mais de você do que de mim? — Tori pergunta, atraindo a minha atenção de volta para si e eu reviro meus olhos teatralmente.
— Isso não é verdade.
— Não? — Ela questiona com as sobrancelhas arqueadas, aninhando ainda mais Helena em seus braços. — Você não viu o escândalo que essa mocinha fez quando eu disse que você não a levaria ao parque hoje. — Profere e eu acho graça, afagando levemente os cabelos da pequena adormecida nos braços da mãe. Vitória suspira. — A verdade é que eu acho que eles ficam um pouco enciumados quando você dá muita atenção para o . — Confessa.
Surpresa, eu elevo minhas sobrancelhas e levo os meus olhos de encontro aos dela.
— Vocês estão falando de mim?

Narrador Avulso


A voz de atrai a atenção de e a se vira, o encontrando apoiado no último batente da escada.
Seus cabelos estavam úmidos e ele vestia um jeans flare e uma blusa branca, além de vans também brancos nos pés, e um colar de pérolas em volta do seu pescoço. Entretanto, o que chama a atenção da garota é o cardigã três vezes maior que ele, jogado sobre as outras peças de roupa.
Tinha quadrados em cores que iam do preto ao amarelo, passando pelo laranja e verde. sabia se vestir como ninguém, isso era inegável, mas algo naquela peça específica fez o peito de tamborilar. Não pela beleza exuberante do de um metro e oitenta parado em sua frente, mas sim pela metáfora agarrada a cada uma das linhas daquela peça de roupa.
A verdade é que , em questão de segundos, não conseguiu ver aquele casaco como um grande emaranhado de lã e sim como um espelho diferente daqueles que todo mundo está acostumado.
Arthur nunca usaria aquele cardigã, por todas as suas cores e extravagância, mas não era em nada parecido com o ex-noivo de . O não só vestiria aquela peça de roupa, como também faria questão de andar com ela pelos lugares mais movimentados da cidade só para que todas as pessoas pudessem admirar sua beleza e excepcionalidade.
era exatamente como aquele cardigã e quando ela se sentiu como uma peça de roupa abandonada e esquecida debaixo da cama de Arthur, a vestiu e fez com que ela se tornasse singular.
— Eu estava dizendo à que seus irmãos têm ciúmes de vocês. — Tóri rebate, chamando a atenção de para si. , por sua vez, arqueia as sobrancelhas surpreso.
— Eles têm? — O questiona, voltando o seu olhar para .
— Eu acho que sim. — A mais velha dá de ombros, puxando uma boa quantidade de ar para dentro de seus pulmões. — Bom, eu preciso ir. Tchau, meu filho.
— Tchau, mãe. — sorri, recebendo um beijo carinhoso da mulher em seu rosto.
— Tchau, . Se divirtam e mande um beijo para a sua irmã! Diga que eu estou ansiosa para conhecê-la. — Profere por fim enquanto caminha até a saída, e balança a cabeça na afirmativa.
Quando a porta se fecha e Vitória já não está mais no campo de visão do casal, volta sua atenção para e ela entorta levemente os lábios.
— Eu gostei do casaco. — Ela profere e suspira, abaixando o rosto para admirar o tecido colorido sobre sua pele.
— Obrigado. É um dos meus favoritos. — O dá de ombros e um sorriso largo e involuntário surge no rosto de quando ela pensa na metáfora que passou por seus pensamentos há pouco.
Em seguida, a balança a cabeça de um lado para o outro para afastar os seus devaneios e esfrega os olhos com o dorso da mão.
— Você já sabe para onde vamos? — Ela questiona, guardando as mãos nos bolsos de sua calça amarela e faz que não com a cabeça.
— Eu estava pensando que você poderia me ajudar com isso. — Confessa e ri.
— Bom, Geórgia me mandou mensagem mais cedo dizendo que ia dar uma volta em Notting Hill. Já são quase meio-dia, eu acho que podemos nos encontrar para almoçar na Piccadilly e depois visitarmos os pontos turísticos tradicionais. A London Eye, o Big Bem e etc, aí terminamos no Buckigham Palace para assistirmos a última troca de guarda. O que acha? — A garota questiona, animada, e arqueia as sobrancelhas.
— Você já tinha esse roteiro todo planejado. Não tinha?
— Talvez. — dá de ombros, com um sorriso infantil nos lábios, e revira os olhos teatralmente. — Você não parece muito animado.
— Você sabe que eu não gosto dessa baboseira turística.
— É, eu sei. Mas eu preciso te contar uma coisa. — A morde os beiços, hesitante, e franze o cenho. — E talvez isso te deixe mais irritado do que um passeio idiota.

Londres, 10 de agosto de 2020.
Piccadilly Circus.


— Por Deus, ! Melhora esse humor! — esbraveja, lançando o cardápio sobre a mesa.
Os dois estavam sentados, lado a lado, em uma mesa na região externa de um restaurante aconchegante, localizado em um dos pontos mais movimentados da Piccadilly Circus.
— A sua irmã não saiu de Amsterdã para aguentar essa sua cara amarrada aqui em Londres. — Profere, virando o seu rosto para o rapaz, mas ele não esboça nenhuma reação.
tinha trocado poucas palavras durante todo percurso até chegarem a esse restaurante. Quando encontraram uma mesa vaga, o rapaz cordialmente puxou uma das cadeiras para e se sentou ao seu lado. Desde então, ele estava com o maxilar travado, os braços cruzados na frente de seu peito e o olhar fixo na mesa de madeira em sua frente.
Em resumo, estava puto. De um jeito que nunca tinha visto antes.
— Então agora nós não estamos conversando. É isso? — Ela questiona com as sobrancelhas arqueadas e o rapaz se movimenta, levando uma das mãos ao rosto para coçar os olhos. — Eu posso pelo menos saber o motivo?
— Você sabe o motivo. — Sua voz sai mais grave que o normal e precisa se esforçar para conter o riso.
— Eu sei o mot… — Ela arregala os olhos e quando entende o ponto de , se cala. — Você está assim por causa do Arthur? — A questiona e, então, pressiona um lábio contra o outro quando vê se mover incomodado ao escutar o nome do outro rapaz. — Se eu não te conhecesse bem o suficiente, diria que está com ciúmes. — Ela dá de ombros e, por impulso, vira seu rosto de encontro ao dela.
O garoto hesita. Encara por alguns segundos sem dizer nada e grava cada mínimo detalhe em sua memória. Em seguida, volta sua atenção para a frente e solta um riso irônico.
— Do bunda mole do seu ex? Por favor, bonitinha. — Ele rola os olhos teatralmente e acha graça.
A verdade é que não precisava dizer em alto e bom tom para que soubesse que algo o incomodava. Ele estava sim com ciúmes e, meu Deus! sabia dizer o quão difícil era ser do tipo ciumento.
A inclina o seu tronco para frente e apoia o braço no encosto da cadeira em que está sentado.
— Então melhora essa cara, por favor. — Seu tom de voz sai aveludado, enquanto ela roça o nariz contra a pele do rosto dele. se mexe, sentindo seus músculos reagirem ao toque da garota, e ela ri, usando sua mão livre para trazer o rosto dele de encontro ao seu. — Eu prometo que você nem vai notar a presença dele. — Diz, acariciando a nuca do garoto com as pontas de seus dedos e a raiva que parecia consumi-lo segundos atrás desaparece como mágica.
De repente, se pega imerso na imensidão dos olhos de e a única coisa que ele pensa em fazer é erradicar a distância entre seus rostos e selar seus lábios três vezes seguidas.
— Tudo bem. Mas quando Georgia começar a me encher de perguntas sobre o que está acontecendo, é você quem vai explicar. — profere e gargalha, jogando a cabeça para trás.
— E por falar nela… — A menina arqueia as sobrancelhas assim que recupera o fôlego, e seus olhos encontram a figura da irmã de adentrando ao restaurante acompanhada por Léo.
! — Geórgia esbraveja e se levanta da cadeira. A irmã de recebe em um abraço amistoso, enquanto Léo estende a mão esquerda para cumprimentar o cunhado. — Que saudade! — Ela diz, apertando ainda mais o corpo da menina que, por consequência, ri.
— Você diz isso como se não se falassem todos os dias. — O tom de voz de sai entediado e as meninas se afastam para olhá-lo.
— Não é a mesma coisa, tudo bem? Pare de ser implicante! — Geórgia profere e revira os olhos. volta a se sentar ao lado do rapaz, enquanto a outra se aproxima do irmão e Léo se senta em frente a . — Como você está, docinho? — Ela questiona, inclinando seu corpo para frente para depositar um beijo na bochecha dele e receber outro em troca. dá de ombros.
— Bem.
— Você não me parece exatamente bem. — Ela franze o cenho, estranhando o semblante travado no rosto do irmão. Geórgia passa por Léo e se senta em frente a , ao passo que apruma a postura na cadeira e respira fundo.
— Não é nada. Eu só estou um pouco cansado. — Ele dá de ombros e Geórgia arqueia as sobrancelhas. , por sua vez, lança um olhar para o garoto e acaricia sua coxa coberta pelo tecido jeans da calça que usava.
Quando sente o toque de , vira o seu rosto de encontro ao da garota e os dois sorriem quando ele decide apertar levemente a mão dela.
— E então, quais as novidades? — A irmã de morde os beiços, animada, e o casal dá de ombros.
— Boa tarde! — Um tom de voz masculino faz Geórgia desviar a atenção em direção ao som. , por sua vez, quando vê a figura de Arthur parado ao lado da ponta onde e Léo estavam sentados, solta a mão de em um movimento tão abrupto que irrita o rapaz, que rola os olhos, entediado.
— Ah, oi! Você já veio anotar os nossos pedidos? — Geórgia questiona, pegando o cardápio sobre a mesa. Confuso, Arthur franze o cenho e arregala os olhos. , por outro lado, engasga com o riso e acaba fazendo um estranho quando não consegue segurá-lo dentro da boca. — Eu acabei de chegar e ainda nem tive tempo de olhar o cardápio, mas… Vocês já sabem o que querem pedir? — Ela pergunta, erguendo o olhar para e , e a balança a cabeça na negativa.
— Não, Ge. Ele não…
— Eu não trabalho aqui. — Arthur a interrompe e Geórgia o olha, sem entender. — Prazer, Arthur. Noivo da . — Diz, estendendo uma de suas mãos para a irmã de , que deixa o queixo cair um tanto quanto surpresa.
Confusa, a garota olha para o casal em sua frente e, enquanto cobria o rosto com uma das mãos e tentava controlar o riso que insistia em sair, estava com o rosto virado para baixo, os olhos fechados, e balançava a cabeça de um lado para o outro, visivelmente envergonhada.
— Me perdoe, eu não… não…
— Tudo bem. — Arthur dá de ombros, quando nota o nervosismo de Geórgia.
— Bom, é um prazer, Arthur. — A garota força o seu melhor sorriso e, então, se levanta, apertando a mão do rapaz. — Geórgia, irmã do .

Londres, 10 de agosto de 2020
Westminster Bridge Road - County Hall


O London County Hall é um prédio antigo de Londres que há alguns anos chegou a funcionar como conselho do condado de Londres. O edifício fica localizado ao norte da ponte de Westminster e às margens do rio Tâmisa. Hoje em dia, o prédio guarda um dos pontos turísticos mais movimentados da capital britânica, com atrações como Sea Life London e London Dungeon. A London Eye e a famosa torre do relógio Big Ben também se localizam em suas proximidades.
— Eu sabia que ela era alta. Mas eu não imaginei que fosse tão alta assim! — Geórgia profere, olhando para a imensidão da London Eye em sua frente, com a mão na testa para proteger seus olhos dos raios de sol.
— Ela é linda. Confesso que quando vim pela primeira vez, eu senti um pouco de medo porque eu e altura, bom…
— Isso é verdade. — Arthur se manifesta, interrompendo . — Até hoje não sei como ela conseguiu ficar doze horas trancada em um avião. tem pavor de altura.
— Ah, é? — franze o cenho e respira fundo ao ver o semblante sacana em seu rosto. — Você tem medo de avião, ? — Ele cerra os olhos e a umedece os lábios, desviando sua atenção para o rio Tâmisa.
— O quê?! Ela tem pavor! — Arthur gargalha e fecha os olhos com força, enquanto risos sem graça saltam pelos lábios de Geórgia e Léo, e arqueia as sobrancelhas, fingindo surpresa.
— Talvez você deva encontrar algo que te relaxe durante a viagem. — O sugere, encolhendo os ombros e guardando as mãos dentro dos bolsos de sua calça. — Ou alguém
— Certo! — Nervosa, a garota eleva o tom de sua voz para cortar antes que Arthur caia naquela conversa e acabe descobrindo algo.
Por conseguinte, pressiona um lábio contra o outro e cruza os braços na frente de seu peito, sustentando o olhar contra a garota. Já , passa as mãos pelos cabelos bagunçados pelo vento e balança a cabeça de um lado para o outro, afastando toda e qualquer lembrança do voo para Amsterdã que pudesse ter vindo à tona por causa daquele comentário.
— Nós ainda temos algumas horas até a troca de guarda e aqui ainda tem algumas atrações, vocês… Vocês têm alguma preferência? — Ela questiona, passando a mão pela nuca suada e lançando um olhar para que, por sua vez, revira os olhos, entediado, e solta um riso leve.
— Léo tinha dito que queria ir à London Dungeon*. — Geórgia se manifesta, olhando para o noivo, que concorda, balançando a cabeça.
— Ah, por favor! — profere quase que em tom de súplica e o casal acha graça. — Eu sempre quis ir lá, mas as minhas amigas têm medo e eu não tenho coragem de ir sozinha, então….
— Por mim, pode ser. — Arthur dá de ombros e balança a cabeça como se concordasse com as palavras do ex.
— Bom, eu tenho medo e não quero ir. Mas não vou estragar o passeio de vocês.
— E você vai ficar aqui sozinha? — questiona e Geórgia balança a cabeça na afirmativa quase que imediatamente. — Não, de jeito nenhum! Nós podemos ir ao aquário. — A sugere, olhando para os rapazes que não parecem muito felizes com a troca.
— Eu também não faço questão de ir. — profere, atraindo a atenção de todos para si. — Vocês podem ir e eu fico aqui com a Ge.
Atônita, arqueia as sobrancelhas e espaça os lábios alguns centímetros. Entrar na London Dungeon era uma vontade antiga, mas fazer isso sozinha com Arthur — por mais que Leonardo também estivesse junto —-, não era exatamente o plano.
— Ah não. É melhor ficarmos juntos e…
— Vamos, amor! — Arthur esbraveja, enlaçando seus dedos em um movimento rápido. Surpresa, não consegue reagir de imediato. — Vai ser divertido!
— É, . Vai ser divertido. — dá de ombros, atraindo o olhar da menina para si. O sorriso irônico em seus lábios faz o peito tamborilar de leve.
Filho da puta.
Pela forma inquieta como mudava constantemente de posição e pelo comportamento insolente que ele vinha apresentando desde o almoço, podia dizer com toda a certeza que ele ainda estava com raiva pela presença de Arthur. E deixá-la sozinha com ele e o noivo de Geórgia — que mal abria a boca para participar das conversas —, foi a maneira mais infantil que ele encontrou para ”se vingar” dela por ter convidado seu ex-noivo para acompanhá-los durante esse passeio.
, no entanto, não tinha planejado deixar em uma posição desconfortável com Arthur, mas se conhecia o suficiente para saber que precisava de pelo menos uma hora longe dos dois ou poderia acabar perdendo a cabeça e falando mais do que o necessário. Além do mais, por mais calado que o noivo de Geórgia fosse, sabia que não estaria sozinha com aquele idiota.
— Vocês podem ir, . — Geórgia profere, despertando a garota de seus devaneios. — Se divirtam e não se preocupem com a gente. Eu tenho planos para nós dois. — Ela ergue o rosto de encontro ao do irmão e pisca um de seus olhos enquanto franze o cenho, confuso.
— Tudo bem. — A solta um suspiro e puxa sua mão com certa força para que Arthur a solte. — É melhor comprarmos os ingressos de uma vez. — Ela dá de ombros e Arthur balança a cabeça na afirmativa.
abaixa a cabeça e espera para que Léo se despeça de Geórgia. , por sua vez, aproveita os momentos de distração de Arthur com o celular para se aproximar da garota.
— Você vai ficar bem? — Ele questiona, com o tom de voz mais baixo possível.
— Eu não acho que você se importe, . — Ela rebate, surpreendendo o rapaz com sua agressividade e arqueia as sobrancelhas enquanto ela o dá as costas e começa a caminhar em direção à bilheteria da atração. — Vamos, meninos!
— Léo! — esbraveja, chamando a atenção do cunhado para si e gesticulando com a cabeça para que ele se aproximasse. — Não deixa esse cara encostar nela. Por favor. — Pede, umedecendo os lábios, e o noivo de Geórgia ri.
— Fica tranquilo. Eu não vou sair do lado dela. — Garante e um agradecimento silencioso salta pelos lábios de em forma de sorriso.
Os olhos de acompanham os movimentos dos três, até que ele sente a presença de Geórgia um pouco mais perto do que antes. Exausto e um tanto quanto irritado pela situação, ele solta um longo suspiro e vira o rosto de encontro ao da garota.
— Que tipo de planos você tem? — Ele questiona e um sorriso de orelha a orelha salta pelos lábios de Geórgia.

*A London Dungeon é uma atração famosa por apresentar os episódios mais trágicos e tenebrosos dos últimos mil anos de Londres e é considerada pelos guias turísticos como “uma viagem ao inferno britânico”.

[•••]


— Você tem certeza de que quer fazer isso?
pergunta, observando a decoração do estúdio de tatuagem que Geórgia tinha encontrado há poucos metros de distância do County Hall. A garota, por sua vez, balança a cabeça na afirmativa com um sorriso animado nos lábios. suspira e vira seu rosto de encontro ao dela.
— Honestamente, Ge, eu sei que nos conhecemos há pouco tempo, mas eu tenho certeza que você é aquela pessoa que no meio da festa decide pular na piscina de roupa e no minuto seguinte se arrepende. — O profere e prende um lábio contra o outro quando vê o queixo de sua irmã cair alguns centímetros.
— Você acabou de me chamar de impulsiva? — Ela questiona, piscando os olhos repetidas vezes, e dá de ombros. — Você tem um cabide tatuado, ! — Geórgia esbraveja, empurrando o corpo do irmão para longe. Ele ri.
— Eu nunca me arrependo de pular na piscina, irmãzinha.
— Nem eu. Pelo menos não hoje. — Ela profere, sem hesitar, e arqueia as sobrancelhas, surpreso. — Eu só preciso que você segure a minha mão, porque eu tenho um certo problema com agulhas. — Geórgia morde os beiços, balançando sua cintura de um lado para o outro, e um riso salta pelos lábios de .
— Tudo bem. Você já sabe o que quer fazer? — O pergunta e, animada, Geórgia balança a cabeça na afirmativa, mostrando a imagem pela tela de seu celular. Sem entender, franze o cenho. — Isso são… Quatro pontos. — Diz, um tanto quanto confuso, e a outra rola os olhos, impaciente.
Isso é a inicial do seu nome em código morse. — Ela dá de ombros, guardando o celular no bolso de sua calça.
— A inicial do meu… — Estupefato, pisca os olhos algumas vezes e chacoalha a cabeça de um lado para o outro. — … Você vai tatuar a inicial do meu nome em código morse? Por quê?
— Eu acho bonito. É delicado, combina mais…
— Não. — Ele a interrompe e Geórgia o olha, sem entender. — Por que você vai tatuar a inicial do meu nome?
— Nós somos irmãos, não somos?
Ela rebate seu questionamento com outra pergunta, mas o semblante desordenado no rosto do rapaz não parecia exatamente satisfeito com aquilo. Por conseguinte, Geórgia respira fundo antes de continuar.
, eu amo você. — Ela confessa e um sorriso leve salta pelos seus lábios. — Pode parecer estranho pelo pouco tempo que nos conhecemos, mas eu amei desde o dia em que soube que tinha um irmão mais velho e eu ainda nem tinha visto a sua fisionomia. — Geórgia dá de ombros e, envergonhada, desvia o olhar para o balcão de madeira em sua frente. — Eu sei que eu não sou a sua única irmã e que talvez você não sinta por mim o que sente pelos seus outros irmãos, ou o que eu sinto por você, mas eu demorei anos para te ter na minha vida e, agora que tenho, eu não pretendo te deixar em paz. — Ela volta a sorrir e, então, devolve seu olhar para . — Essa tatuagem é só uma besteira para te manter perto enquanto estivermos longe.
Surpreso, não reage. Ele encara a figura de sua irmã com os olhos arregalados e demora alguns instantes para processar tudo o que tinha sido dito por ela. No entanto, quando isso acontece, é rápido e envolve os ombros de Geórgia em um abraço firme e carinhoso.
O sente seu peito aquecer e fecha os olhos quando inala o perfume adocicado preso aos cabelos da garota.
Emocionada, Geórgia também fecha os olhos e afunda o seu rosto na blusa branca que usava, agarrando a lã do cardigã dele com a ponta de seus dedos.
— Eu amo você. Mesmo. — Ele profere, quando se afasta e segura o rosto dela entre suas mãos. — É meio estranho dizer isso em voz alta, mas é verdade. E eu estou aqui com você, então avise ao Leonardo que ele ainda precisa da minha aprovação. — dá de ombros e a garota revira os olhos, afastando o corpo dele para longe do seu.
— Idiota.
— Vocês estão prontos? — A voz da tatuadora se faz presente e ambos levam sua atenção de encontro a figura feminina parada do outro lado do balcão.
— Estamos. — responde, jogando seu braço esquerdo sobre os ombros de Geórgia.
— Você ainda não escolheu o que vai fazer. — Ela diz, erguendo o olhar para o rosto de .
— Você prefere um G em letra cursiva ou de forma? — O questiona com as sobrancelhas arqueadas e Geórgia resmunga.
— Você não precisa fazer a inicial do meu nome só porque eu vou fazer a sua. — Profere, cruzando os braços na frente do peito, enquanto balança a cabeça de um lado para o outro. — Eu não quero que se sinta obrigado a isso.
— Ninguém me obriga a pular na piscina de roupa. E eu pulo mesmo assim. — dá de ombros e Geórgia pressiona um lábio contra outro, tentando conter o riso. — Cursiva ou de forma, Geórgia?

[•••]


— Fala sério! Isso não tem como estar doendo tanto assim! — esbraveja, soltando uma gargalhada ao ver a expressão no rosto da garota.
— Eu sou sensível!
— Você está exagerando e eu estou pagando caro por isso. — Ele diz com os olhos cravados em seus dedos esmagados pela mão livre de Geórgia. — Não se esqueça de que eu ainda vou precisar dessa mão, irmãzinha.
— Cale a boca! — Ela resmunga, enrugando ainda mais o semblante em seu rosto.
Geórgia estava sentada à frente de , com o braço direito sobre a mesa, enquanto a tatuadora exercia o seu trabalho, desenhando os quatro pontos enfileirados na horizontal em seu pulso.
— Faça algo para me distrair. — Ela pede, desviando o olhar para . — Me conte alguma coisa.
— Você mandou eu calar a boca.
!
— Tudo bem, tudo bem! — O ri, erguendo o seu braço livre. — O que você quer saber?
— Quem é esse Arthur e por que ele está chamando a sua namorada de noiva? — A garota questiona sem titubear e revira os olhos teatralmente. Não era difícil imaginar que Geórgia já tinha essa pergunta preparada há um bom tempo.
não é minha namorada.
— E eu imagino que isso seja culpa sua. — Ela rebate, levando o seu olhar de encontro ao do garoto e ele arqueia as sobrancelhas.
— E como exatamente isso seria minha culpa?
— Você ainda não fez um pedido.
— Ela é babá dos meus irmãos!
— Primeiro. — Geórgia solta a mão de e estapeia seu braço, arrancando um olhar reprovativo do rosto do garoto. — Nunca mais a reduza a isso, porque nós dois sabemos que é muito mais do que uma AuPair.
A garota o repreende e, momentaneamente, volta seus olhos para o trabalho da tatuadora em sua frente. resmunga e, em seguida, Geórgia devolve a sua atenção para ele.
— Segundo: vocês dois se gostam! — Ela esbraveja e desvia o olhar para as pontas de seus tênis. Ele entrelaça os dedos de uma mão nos da outra e, em seguida, solta um suspiro, exausto.
— Eu não teria tanta certeza disso. Ainda mais agora.
— Por causa desse Arthur? — Georgia insiste em saber e ergue o olhar de encontro ao seu.
— É. Eles são mesmo… Ou pelo menos eram noivos. — Ele dá de ombros, coçando a têmpora com a ponta dos dedos.
— E você sabia disso quando começou a se envolver com ela? — A garota questiona, franzindo levemente o cenho ao sentir a agulha da máquina arranhar sua pele, e balança a cabeça, na afirmativa.
— Sabia. Mas não houve traição, nem nada do tipo, é uma história complicada.
— Eu tenho alguns minutos. — Geórgia dá de ombros, com um sorriso leve nos lábios, e acha graça, lançando um olhar rápido para os quatro pontinhos que começavam a surgir na pele de sua irmã.
— Certo.
Por conseguinte, o garoto joga as costas contra o encosto da cadeira e embola o cardigã — que ele havia tirado minutos antes para poder fazer a tatuagem — em seus braços, conforme os cruza na frente de seu peito.
— Quando se mudou para cá, ela estava noiva desse cara. Mas pouco tempo depois que voltei para casa e a conheci, ela descobriu que ele estava tendo um caso com uma menina que, pelo que eu entendi, era uma das melhores amigas dela.
conta e a primeira reação de Geórgia é arquear as sobrancelhas, surpresa. No entanto, nos minutos seguintes, o semblante em seu rosto relaxa e ela balança a cabeça de um lado para o outro, deixando um riso incrédulo saltar pelos seus lábios.
— Filho da puta.
— Pois é. Mas essa não é nem a pior parte. — profere, passando o indicador por baixo do nariz e, em seguida, enfia os dedos entre seus cabelos. Curiosa, Geórgia arregala os olhos para o irmão. — A família da é muito religiosa e tanto ela, quanto o Arthur, tinham feito um voto de castidade. Você sabe o que é isso, né? Quando o casal não pode…
— Transar antes do casamento, eu sei. — Geórgia o interrompe e balança a cabeça na afirmativa.
— Exatamente. Então, quando soube da traição, ela acabou com o noivado e… Bom, o resto você deve imaginar.
— Espera aí. Então quer dizer que você foi o primeiro…
— Fui. Começou tudo como uma grande brincadeira, eu juro. Ela me pediu para ensinar o que eu sabia sobre sexo e eu ensinei.
dá de ombros com um sorriso torto nos lábios. Em seguida, ele inclina o tronco para frente e apoia os cotovelos sobre seus joelhos. Balança a cabeça de um lado para o outro, enquanto vagueando os cabelos com as pontas e seus dedos e, então, volta a encarar Geórgia.
— O problema agora é que os pais dela também estão em Londres e continuam insistindo nesse casamento como se nada tivesse acontecido.
Um riso breve escapa pelos seus lábios e limpa os cantos de sua boca com as pontas do seu polegar e seu indicador. Era notável para Geórgia o quão inquieto seu irmão estava em relação àquele assunto.
— Eles não sabem sobre mim, lógico, e eu fico realmente aliviado com isso porque o pai dela é… — O arregala os olhos e a garota acha graça no semblante embasbacado em seu rosto. — Enfim, agora eu não sei como agir porque…
— Você está apaixonado. — Geórgia dá de ombros e prontamente se cala.
Surpreso, ele demora alguns instantes para processar as palavras que tinham sido ditas por sua irmã e, quando isso finalmente acontece, volta a jogar suas costas contra o encosto da cadeira de rodinhas e franze o cenho em uma expressão que faz Geórgia rir.
— Eu não diria apaixonado, é só que…
— Eu juro que não acreditei quando recebi a localização e vi que vocês estavam em um estúdio de tatuagem! — Os dois são surpreendidos pelo tom de voz inconfundível de , e imediatamente se cala.
Os irmãos desviam seus olhares em direção ao som e encontram com um sorriso animado, parada do outro lado do balcão de madeira, entre Léo e Arthur.
— Pronto. — A tatuadora sorri, atraindo a atenção de Geórgia para si.
— Pronto? — Ela questiona e a profissional balança a cabeça na afirmativa. — Ah, nem doeu tanto assim. — A irmã de dá de ombros e o garoto revira os olhos, se levantando da cadeira em que estava sentado.
— A minha mão é a prova de que isso é mentira. — Ele profere e agora é Geórgia quem rola os olhos.
— Deixa eu ver! — pede, quando os dois atravessam o balcão.
ergue a manga e sua blusa e mostra para a menina o pequeno G tatuado em seu ombro, enquanto Geórgia mostra os quatro pontos tatuados na lateral de seu pulso. Quando entende os significados dos desenhos, sorri, graciosa.
— E o passeio de vocês? Como foi? — Geórgia questiona, quando sente os braços de Léo envolverem a sua cintura.
— Foi bom. Mas não dá tanto medo quanto parece. — O rapaz entorta os lábios um tanto quanto decepcionado e balança a cabeça na afirmativa.
— É verdade. Acho que nossas expectativas estavam acima da realidade. — A solta um riso breve e então vira seu rosto de encontro a . — Me desculpe pela forma como falei com você mais cedo, eu não… Não quis ser grossa.
Ela morde os beiços, hesitante, e o rapaz se surpreende, lançando um olhar rápido para a sua irmã, que sorri sem mostrar os dentes, afundando o rosto no peito de seu noivo.
— Tudo bem. Me desculpe também por não ter ficado. — Ele entorta um dos cantos de seus lábios, olhando rapidamente para Arthur, distraído com os desenhos de tatuagens espalhados pela parede do estúdio.
— Não tem importância. Foi por algo muito melhor. — Ela dá de ombros, olhando para a tatuagem mais recente em seu ombro e um sorriso bobo salta pelos lábios de quase que involuntariamente.
— São quase quatro e meia. Nós não deveríamos ir? — A voz de Arthur se faz presente e revira os olhos, impaciente.
— Claro. — Ela profere, virando seu corpo de frente para a figura de seu ex-noivo. — É melhor nos apressarmos.

Capítulo Quatro

”It's inevitable, everything that's good comes to an end.”
One Direction, Love You Goodbye.

Narrador Avulso


Londres, 10 de agosto de 2020
Palácio de Buckingham.


Desde 1837, o Buckingham Palace vem sendo a residência oficial da monarquia britânica. O prédio possui mais de setecentos quartos e serve como base para eventos, tais como cerimônias reais e visitas de Estado.
Por esses e outros motivos, o palácio acaba se tornando um atrativo para visitantes vindos de todos os cantos do mundo e suas redondezas estão sempre repletas de turistas. Principalmente durante os horários da troca de guarda*.
Durante o verão, — quando a rainha está na Escócia — algumas visitas às dependências da moradia real são permitidas. Mas os turistas interessados nesse tipo de passeio precisam reservar uma visita guiada com antecedência e só assim terão a oportunidade de conhecer áreas como os Salões do Estado, por exemplo.
Quando pensou em trazer Geórgia e Léo para conhecer um dos mais característicos pontos turísticos da cidade, pensou em todas as possibilidades. Imaginou que, por ser dia de semana em um mês útil onde muitas pessoas trabalham ou estudam, a aglomeração para assistir a troca de guarda não seria tanta. No entanto, a menina esqueceu que diferente das cidades turísticas no Brasil, Londres é atrativa em qualquer época do ano, e encontrar um Palácio de Buckingham livre de visitantes é quase impossível.
Além disso, agosto costumava ser um dos meses mais quentes e abafados do ano. Logo, nada parecia contribuir com o passeio.
— Eu não imaginei que fosse estar tão lotado assim. — diz, prendendo seus cabelos em um coque no topo de sua cabeça.
— E você esperava o que, ? — O tom de voz de sai com certa ironia e a revira os olhos.
— Essa sua aversão a atrações turísticas é um tanto quanto chata, sabe? — Ela cerra os olhos e cruza os braços na frente do corpo enquanto acha graça e deixa um riso leve sair por seus lábios.
— Foi só um comentário. — Ele dá de ombros e a garota resmunga, virando o seu corpo para a direção oposta a que ele estava.
, por conseguinte, morde os lábios e assiste em silêncio passar as mãos para livrar sua nuca dos poucos cabelos rebeldes que não tinham sido presos pelo coque.
— Quando foi que ficou tão quente? — Geórgia se manifesta, usando o panfleto de informações como um leque para espantar o calor.
— Vocês têm certeza de que querem ver isso? — Léo questiona, enrolando os cabelos de Geórgia em um rabo.
— Talvez fosse melhor voltarmos outro dia. — A irmã de sugere e os outros se entreolham.
— Vocês quem sabem. — dá de ombros, lançando um olhar rápido para Arthur, que reage com indiferença à opção.
— Você pelo menos pensou em comprar os ingressos para entrarmos lá? — questiona com os olhos cerrados e franze o cenho.
— Entrar no palácio? Isso é… Impossível. — Ela solta um riso leve e Geórgia olha curiosa para o irmão.
— Na verdade, não. — dá de ombros, descruzando os braços e escondendo as mãos nos bolsos de sua calça. — Até onde eu sei, eles vendem ingressos para as pessoas conseguirem assistir a guarda em um lugar mais privilegiado. — Diz, tentando soar indiferente, enquanto tenta conter o riso ao ver a reação surpresa no rosto de .
— E por que você não disse isso antes?
— Eu pensei que você soubesse, ué! Você passa horas planejando essas visitas. — rebate em sua defesa e a rola os olhos.
— Onde vendem esses ingressos? Ainda faltam alguns minutos, talvez ainda consigamos comprar. — A saca o celular do bolso e abre uma página no Safari. Em seguida, ergue o olhar de encontro ao de e arqueia as sobrancelhas, esperando para que ele diga o site de compra para os ingressos.
— Ah, não. Eles não vendem em site. — Ele diz e a garota franze o cenho. — É uma coisa meio arcaica e, se eu não me engano, a loja fica aqui perto. Nós podemos ir lá, se vocês quiserem. — sugere e os outros se entreolham.
— Pode ser. Nós já estamos aqui mesmo. — dá de ombros e um sorriso sacana surge nos lábios de quando ele vê sua irmã e seu cunhado balançarem a cabeça na afirmativa.
No entanto, quando percebe que Arthur, Geórgia e Leonardo fizeram menção de segui-lo junto à , se apressa para detê-los.
— Não! — Ele esbraveja e os outros se surpreendem. — É melhor irmos dois de nós para não chamar tanta atenção. Imagina se todas essas pessoas resolvem procurar por esses ingressos. — Diz e cerra os olhos, desconfiada, quando o vê passar os dedos entre seus cachos. — Além do mais, é melhor alguém guardar esse lugar, caso a gente não consiga nada.
— Faz sentido. — Léo dá de ombros e sorri, balançando a cabeça na afirmativa.
— Vamos, ? — O a chama e a menina reage com indiferença, seguindo a sua frente pelo caminho que indicava. — Nós não vamos demorar. — Ele profere, piscando um de seus olhos para Geórgia e ela revira o olhar quando entende as reais intenções do irmão.
e caminham lado a lado em silêncio por toda a área cercada pelo palácio. Quando já estão a uma certa distância e longe do alcanço de visão dos outros, a enrola seus dedos na alça transversal de sua bolsa e respira fundo, antes de erguer seu rosto em direção ao do garoto.
— Eu não acredito que deixei essa informação passar. — Ela solta um riso leve e leva o olhar de encontro ao dela. — Eu poderia ter poupado o nosso tempo e teríamos conseguido aproveitar mais lá em Piccadilly. — A garota suspira e entorta os lábios em um sorriso singelo, apertando um de seus ombros.
— Poucas pessoas sabem disso. Não é uma coisa tão divulgada como as outras, acho que justamente para evitar tanta aglomeração. Até porque, é da residência da rainha que estamos falando. — Um riso frouxo salta pelos seus lábios e arqueia as sobrancelhas, entortando levemente seus beiços. — O erro foi meu por ter presumido que você saberia disso. — Ele dá de ombros e balança a cabeça na negativa.
— Não tem problema, o importante é conseguirmos. — Ela rebate com um sorriso nos lábios e se esforça para fazer o mesmo e não rir da inocência ainda presente na essência da garota. — Ainda estamos longe? — A questiona e cerra os olhos, vendo o final do quarteirão há poucos passos de onde estavam.
— Não. É logo ali. — O garoto rebate, apontando para a rua onde se encerrava os portões da residência monárquica.
— Onde? — questiona, arqueando o olhar e ri.



— Aqui. — Digo e então a puxo pela mão para dentro da rua onde sei que ninguém conseguiria nos ver.
Com o susto, arregala os olhos e eu solto um riso, mas não dou chance para que ela consiga questionar o que estava acontecendo. Envolvo seu corpo com o meu braço direito e seguro a sua nuca com a minha mão esquerda, trazendo seu rosto de encontro ao meu.
Junto nossas bocas uma na outra em um beijo um tanto quanto urgente e sinto o corpo de amolecer em meus braços. Imagino que a força em suas pernas tenha desaparecido, então aperto ainda mais a sua cintura contra o meu peito e ela finalmente corresponde ao meu beijo.
Estremeço quando sinto as mãos de tocarem a curva da minha cintura, enquanto adulo seus beiços com a ponta da minha língua e sinto o familiar gosto doce de melancia preso ao seu protetor labial.
, por conseguinte, afasta seus lábios um do outro e permite que eu intensifique o beijo, deixando que nossas línguas se encontrem em um tipo de brincadeira desordenada à qual eu e ela já estamos perfeitamente acostumados.
Quando o ar se faz necessário, desacelero os meus movimentos e encerro o beijo com três rápidos selinhos. Afasto o meu rosto do dela e ainda está com os olhos fechados, o que me faz rir.
— Me desculpa. Eu não estava mais conseguindo segurar isso. — Digo, afastando os fios rebeldes de seu rosto, enquanto olho e tento gravar cada mínimo detalhe dele. suspira.
— Não tem como entrar no palácio, tem? — Ela questiona, finalmente abrindo os olhos de encontro aos meus e eu dou de ombros, deixando um riso infantil saltar pelos meus beiços.
— Até tem. Mas precisa agendar com antecedência. — rola os olhos e usa um de seus braços para empurrar o meu peito para longe, mas eu consigo ser mais forte e a mantenho junto a mim.
Em meio às risadas, sobe seus braços até o meu pescoço e acaricia a minha nuca com a ponta dos dedos.
— Cachorro, . Você é um cachorro. — Ela profere e eu reviro os meus olhos. Inclino o meu rosto de encontro ao dela e vejo umedecer os lábios com a ponta da língua, quando sinto sua respiração quente cortar a minha pele.
— E você adora. — Sussurro com a minha boca rente à dela e arqueia as sobrancelhas quando sente minhas mãos apertarem o seu quadril.
Em seguida, eu mordo seu lábio inferior e a selo rapidamente. ri e finalmente encontra forças para se afastar de mim. Ela começa a caminhar em direção ao caminho que fizemos para chegar aqui e eu mantenho os meus pés cravados no chão.
— Vem, vamos voltar. E boa sorte inventando uma desculpa para essa brincadeira. — vira o seu corpo de frente para o meu mais uma vez e o sorriso em seus lábios faz minhas mãos formigarem.
Em questão de segundos, me pego com uma expressão embasbacada no rosto, pensando nas coisas que Geórgia tinha me dito. E se eu estiver apaixonado?
, espera! — Esbravejo sem pensar e ela interrompe seus passos mais uma vez para me olhar. Não digo nada, então franze o cenho sem entender.
— O que foi? — Ela questiona depois de alguns segundos em silêncio e eu finalmente desperto do transe. Pisco meus olhos algumas vezes e balanço a cabeça de um lado para o outro, tentando afastar meus devaneios.
— Nada. Esquece. — Rebato, tentando soar indiferente, e cerra os olhos, cruzando os braços na frente de seu peito, o que me faz rir.
— Agora fala, .
Eu respiro fundo e rolo meus olhos. Coloco meu braço ao redor do seu pescoço e, com um impulso, viro o seu corpo de volta para a direção que deveríamos seguir.
— Você é muito curiosa, bonitinha. — Profiro e ela resmunga em um tom de voz inaudível.
— E você é um insolente, insuportável. — Ela dá de ombros e eu solto uma gargalhada, passando o indicador por baixo do meu nariz.
Em seguida, paro de andar e seguro seu corpo para que faça o mesmo, ela vira o seu rosto de encontro ao meu e eu aperto suas bochechas com a minha mão.
— Eu nunca disse que não era. — Rebato, depositando um beijo leve e rápido em seus lábios. ri.

[•••]


— E então? — Arthur arqueia as sobrancelhas quando nos vê e desvia o olhar para mim.
— Eles estavam fechados. — Dou de ombros, coçando os cabelos na minha nuca. Geórgia rola os olhos e prende um lábio contra o outro, tentando conter o riso e eu faço o mesmo.
— Vamos ficar aqui mesmo. A troca já vai acontecer. — Minha irmã se manifesta e eu vejo Arthur dar de ombros.
— Tanto faz. — Ele dá de ombros e, então, vira o seu rosto de encontro ao de . — Vem cá, . — Arthur gesticula com a cabeça e a garota lança um olhar para mim.
— Aqui está bom. — Ela diz, forçando um sorriso simpático, mas Arthur balança a cabeça de um lado para o outro.
— Você vai conseguir ver melhor daqui. Vem. — Ele insiste e, antes mesmo que tenha tempo de protestar, envolve os dedos em seu punho, a puxando para perto de si.
Sua atitude me incomoda, mas resolvo ignorar e viro meu rosto de encontro ao chão, enquanto pinço o meu lábio inferior com as pontas dos meus dedos. Sei que atendeu ao pedido de Arthur porque, de repente, sua sombra não está mais na minha frente.
Quando ouço os tambores da banda e os apitos indicando o início da troca de guarda, involuntariamente ergo o meu rosto em direção ao som e sinto Geórgia apertar a minha cintura, animada. As pessoas ao nosso redor comemoram como se estivessem vendo algo extraordinário — e talvez estivessem — e eu acho graça.
Em um movimento irreflexo, levo a minha atenção até . Como uma grande fã da Inglaterra e de todos os seus atrativos turísticos, estava eufórica e batia palmas para o espetáculo que acontecia à sua frente. Sinto meu peito tamborilar e mais uma vez penso na possibilidade de eu estar me apaixonando por aquela menina.
No entanto, essa sensação boba de formigamento logo dá lugar à raiva quando vejo Arthur apoiar a mão em sua cintura e pressionar o corpo dela contra o seu. Minha garganta seca e, de repente, esqueço o que acontecia há metros de distância de mim.
parece estar anestesiada demais para notar o toque dele, mas quando Arthur se inclina para frente e beija a região de sua nuca, ela se movimenta de maneira desconfortável e eu aguardo na esperança de que ele pare e se afaste.
Mas ele não para.
Ao invés disso, Arthur envolve o corpo de com os dois braços e a abraça firmemente por trás. A luz que antes irradiava dos olhos e o sorriso dela, agora já não estava mais ali e eu não precisava de muito para entender que ela não estava se sentindo bem naquela posição. Mas Arthur era notavelmente mais forte e ela não conseguiria se desvencilhar sozinha.
Sinto o sangue ferver dentro das minhas veias e, quando me dou conta, já estou com a mão sobre o ombro do garoto, chamando sua atenção para mim.
— Você não percebe que ela está desconfortável? — Questiono um tanto quanto incrédulo com a situação e ele franze o cenho sem entender. , por outro lado, arregala os olhos, surpresa com a minha atitude.
— Do que você está falando?
— Disso. — Rebato, apontando para os seus braços ainda ao redor da garota.
De soslaio, olho para e ela me parece preocupada, mas continua em silêncio assim como minha irmã e Léo.
— Eu só estou abraçando a minha noiva. Qual o problema nisso? — Ele questiona e seu tom de voz sai afetado.
— Ela não está confortável. — Respondo sem hesitar e Arthur franze o cenho, como se eu fosse algum tipo de idiota.
— E quem te disse isso? — Um riso debochado salta pelos seus lábios e eu respiro fundo.
Em seguida, Arthur vira o seu corpo de frente para mim e consequentemente faz o mesmo. Sinto vontade de fazê-lo engolir o chiclete que ele mascava desde a hora que nos encontramos em Piccadilly, mas eu estaria indo contra as minhas próprias convicções, então me contento em serrar meu punho.
— Por Deus, é minha noiva! — Ele esbraveja e meus olhos reviram em um movimento quase que involuntário.
Não consigo conter o riso irônico que surge em meus lábios, enquanto cruzo os braços na frente do meu peito.
— Você tem prazer em dizer isso, não é? — Estreito o meu olhar contra o dele e Arthur não parece entender a minha pergunta. — Minha noiva.
— É claro que sim. é uma menina linda e eu me sinto muito feliz por poder me referir a ela assim.
Vejo abaixar o rosto e, em seguida, Arthur roça o nariz na pele de sua bochecha em um gesto asqueroso, e a beija, forçando o personagem de noivo carinhoso.
Minha irmã me lança um olhar preocupado e eu balanço a cabeça de um lado para o outro, garantindo a ela que eu não faria nada.
Precisaria de muito mais do que isso para Arthur me tirar do sério.
— Mas ela não é. Sua noiva. — Dou de ombros, puxando a atenção dele de volta para mim.
— O que disse? — Ele questiona com as sobrancelhas arqueadas e eu volto a revirar meus olhos.
— Fala sério, Arthur. Vocês não estão mais noivos e já te disse isso várias vezes. Pombos entenderiam isso mais rápido do que você.
— Sem ofensa, … Certo? — Ele cerra os olhos como se tivesse se esquecido do meu nome e eu acho graça. — Você não me conhece e nem conhece a . Nós estamos juntos há anos e brigamos como qualquer outro casal. Isso é normal, sua irmã deve saber do que eu estou falando. — Dá de ombros, lançando um olhar rápido para Geórgia que, por sua vez, arqueia as sobrancelhas e solta um riso dotado de ironia, deixando claro o gene que temos em comum. — Eu amo a e sei que…
— Você se faz de idiota, não é possível. — Meus pensamentos escapam pelos meus lábios, enquanto eu balanço a cabeça de um lado para o outro e coço a têmpora com a ponta dos meus dedos. — Eu não consigo entender como você pode perder tanto tempo insistindo em algo que nem ao menos faz bem para você!
… — Ouço proferir o meu nome num tom de voz mais baixo possível, mas estou um tanto quanto irritado com o comportamento do imbecil parado na minha frente que mal consigo dar ouvidos à minha racionalidade.
— Você tem razão. Eu não te conheço e francamente, eu nem faço questão de conhecer. Mas eu conheço a e sei que ela não te ama. Muito pelo contrário, ela tem repulsa ao seu toque e qualquer um consegue ver isso. — Profiro por fim e Arthur me encara, estupefato.
Ele parece não ter defesa para todas as minhas acusações, então volto a minha atenção para e me preparo para tirá-la de perto dele. No entanto, Arthur é mais rápido e me surpreende ao quebrar o silêncio.
— Você acha que ela tem repulsa ao meu toque? — Ele questiona, atraindo a minha atenção de volta para si e eu dou de ombros.
— Eu tenho certeza.
— Eu acho que você está errado. — Ele rebate, parecendo indiferente, e eu reviro os meus olhos, entediado. — E eu vou te provar.
Eu franzo o meu cenho sem entender como ele faria aquilo e, quando me dou por mim, vejo seus dedos abraçarem o braço de com certa força e virarem o corpo dela de frente para o seu com um único impulso.
Não consigo acreditar que Arthur teria coragem de fazer o que se passava pela minha cabeça e me surpreendo ao vê-lo juntar seus lábios aos de em um movimento brusco e grosseiro.



Sinto Arthur colar seus beiços aos meus com certa violência e eu mal tenho tempo para reagir. Tento me afastar, mas sinto seus dedos apertarem ainda mais os meus braços conforme eu me mexo.
Sua língua toca os meus lábios e eu os prendo com toda a força que consigo, enquanto sinto um arrepio desagradável percorrer a minha espinha.
De repente, não o sinto mais. Seu peso e seu toque desaparecem de mim e eu tenho medo de abrir os olhos e ter a certeza de que enlouqueci.
!
É quando ouço Geórgia esbravejar o nome do irmão que consigo sair do meu estado de choque. Assim que abro os olhos, no entanto, vejo avançar para cima de Arthur, e Léo entre os dois, tentando evitar uma briga maior.
Me surpreendo ao ver o semblante no rosto de . Seu maxilar estava fortemente travado e seus olhos não brilhavam como de costume. Seu punho estava serrado e o noivo de Geórgia lutava para segurá-lo.
— Qual é a porra do seu problema? — Arthur questiona e, em um movimento irreflexo, viro o meu rosto em direção ao seu.
Meu ex parecia assustado — embora nunca fosse demonstrar isso — e sua mão no rosto tentava aliviar a dor do soco certeiro que tinha acabado de receber.
Em outras circunstâncias, eu confesso que teria adorado essa cena, mas agora me sinto preocupada demais com para dar atenção a isso. Volto minha atenção para ele e toda aquela situação, misturada com a euforia dos turistas e o calor de Londres faz com que eu me sinta tonta.
— Solta ele, cara! Eu não tenho medo. — Arthur se manifesta, encorajando Léo a soltar e eu sinto minha garganta secar.
— Parem. — Digo, mas meu tom de voz é quase inaudível e ninguém me escuta.
Viro o meu rosto para baixo e o chão parece se mover. Sem entender o que estava acontecendo, eu fecho os olhos e balanço a cabeça de um lado para o outro. O que parece piorar a situação.
Quando volto a abrir os olhos, o chão não é mais a única coisa se movendo. Levo uma das minhas mãos a testa e sinto um suor frio molhar a minha pele.
— Mas que porr… — Profiro um tanto quanto confusa e, assim que o cheiro forte da batata frita nas mãos da criança ao meu lado atravessa o meu olfato, sinto uma vontade quase que absurda de vomitar.
? — A voz de Geórgia parece estar presa em outra realidade, então procuro pelo seu rosto, sentindo as minhas pálpebras pesarem. — ? Você está bem? — Ela questiona, tocando o meu ombro.
De repente, o barulho da briga entre os meninos se encerra e, no meu inconsciente, sei que agora sou o centro de suas atenções.
? — É Arthur quem me chama, mas sua voz só faz com que a vontade de vomitar seja maior.
— Eu acho que vou… — São as únicas palavras que eu consigo dizer antes de perder a consciência. Sinto, no entanto, dois braços envolverem a minha cintura e isso me impede de cair no chão.

[•••]


Meus olhos estão cansados, então tenho certa dificuldade em abri-los. Sinto um vento frio refrescar a minha pele e entorto levemente meus lábios.
? — Ouço o tom de Geórgia e sinto sua mão tocar meu braço esquerdo. Minhas pálpebras continuam pesadas, mas dessa vez faço um esforço maior para abri-los.
Quando finalmente consigo abrir os meus olhos, percebo que estou sentada no chão do parque, com as minhas costas contra uma árvore que me protegia do sol. Vejo a irmã de sorrir na minha frente e atrás dela o palácio de Buckingham parece bem menor a essa distância.
Franzo o cenho quando sinto minha boca seca e me esforço para umedecê-la com a ponta da minha língua.
, você consegue me ouvir? — Geórgia pergunta e quase que instantaneamente, balanço a cabeça na afirmativa.
— Sim, eu só estou… — Faço uma breve pausa entre as palavras para aprumar a minha postura e, em seguida, volto o meu olhar para a irmã de . — … Com um pouco de sede. O que aconteceu?
— Você desmaiou. — Ela rebate e eu arqueio as sobrancelhas, o que a faz rir. — Mas não tem muito tempo. te trouxe para a sombra e… — No instante em que Geórgia profere o nome dele, eu deixo de escutar todas as outras coisas que saiam pela sua boca. Ao invés disso, busco pela figura de nas redondezas de onde estamos, mas não o encontro.
— E cadê ele? — Questiono, sem ter ideia do que ela estava falando, e Geórgia se cala. Um sorriso leve salta pelos seus lábios, inclina seu tronco para a frente e leva uma de suas mãos ao meu rosto, afastando alguns fios soltos da minha testa.
— Ele e os meninos foram buscar água e algo para você comer. Ele ficou muito preocupado com você, bonitinha. — Ela aperta uma das minhas mãos e eu solto um riso quando a ouço me chamar da mesma forma que . — O seu noivo, por outro lado… — Geórgia morde os beiços e eu reviro os meus olhos.
— Arthur não é meu noivo, Ge. — Confesso, meio envergonhada. — É bem complicado, mas ele definitivamente não é meu noivo. E eu não me surpreenderia se ele tivesse ido embora e me deixado lá no chão. — Franzo o meu cenho e Geórgia acha graça do semblante em meu rosto.
— Eu sei. me contou. Ele me contou tudo, por sinal. — Ela dá de ombros e eu arqueio as sobrancelhas.
— Tudo? — Questiono, meio embasbacada, e a irmã de balança a cabeça na afirmativa.
— Tudo. — Geórgia rebate e seus olhos se firmam na minha mão esquerda. Mais especificamente, no anel preso ao dedo anelar da minha mão esquerda.
— Oh, Deus! — Esbravejo, envergonhada, e, em um movimento rápido, cubro o meu rosto com as mãos. Geórgia ri.
— Está tudo bem. Você não precisa ter vergonha. — Ela diz, tocando os meus punhos e os forçando para baixo.
não precisava ter te contado exatamente tudo. — Profiro depois de um longo suspiro e a garota acha graça.
— Eu sou um pouco insistente, então acho que eu teria arrancado isso dele de qualquer maneira. — Geórgia dá de ombros e eu não consigo controlar o riso que salta pela minha boca.
Mesmo assim, me sinto como um diário exposto e não consigo erguer o meu rosto para olhá-la. Passo os próximos instantes encarando as minhas mãos enquanto um silêncio um tanto quanto perturbador toma conta da situação.
— Você se lembra de algo? — O tom de voz de Geórgia quebra o silêncio e eu dou de ombros.
— Me lembro de ter me sentido mal quando os meninos começaram a discutir. Eu estava tonta, não sei. Mas aí senti o cheiro da batata frita na mão da criança do meu lado, então me senti enjoada e, enfim. — Digo e ouço Geórgia suspirar, o que me deixa curiosa.
— Eu… Eu preciso te fazer uma pergunta, . Pode ser? — Ela morde os beiços e eu franzo meu cenho, sem entender. No entanto, balanço a minha cabeça, autorizando sua pergunta. — Não me leve a mal, por favor. Mas você se lembra de quando foi a sua última menstruação? — Geórgia questiona e eu me sinto pega de surpresa.
Arqueio as sobrancelhas e levo algum tempo para processar as suas palavras.
— Já faz um tempo, mas o que… — Quando a minha ficha cai e eu entendo o motivo de sua pergunta, arregalo os olhos, assustada, e arrumo ainda mais a minha postura. — Geórgia, você acha que eu passei mal porque…
— As pessoas não desmaiam por nada, . — Ela dá de ombros e eu sinto meu peito comprimir só de pensar nessa possibilidade. — Eu acho que você deveria fazer um exame.
— Eu não estou grávida! — Esbravejo. Passo as mãos pelo rosto em um gesto afobado e Geórgia arregala os olhos, espantada com o meu tom de voz. — Eu tenho certeza de que tomei todos os cuidados e… Isso é impossível. — Balanço a cabeça de um lado para o outro, enquanto um riso nervoso escapa pelos meus lábios.
— Tudo bem, mas você não acha melhor fazer um exame? Por precaução.
— Não, eu não acho. — Rebato, sem hesitar, e Geórgia suspira, impaciente. Em seguida, me levanto do chão em um impulso único e passo as mãos pela minha roupa para limpá-la.
….
— Geórgia, eu já disse que não estou grávida.
— Então me explique o que acabou de acontecer com você! — Ela aumenta o tom de sua voz e meus olhos acompanham os seus movimentos, à medida em que ela também se levanta do chão.
— Eu não sei. Talvez eu não tenha me alimentado direito, — Dou de ombros e ela respira fundo. — Ou talvez tenha sido o calor, eu não sei!
Esbravejo, sentindo minha garganta queimar e meu peito apertar por uma vontade quase que incontrolável de chorar.
— Eu só sei que eu não posso estar grávida. — Minha voz falha e eu vejo Geórgia unir as sobrancelhas, antes de me envolver em um abraço. — Eu não posso estar grávida, Ge. — Choramingo em seu ombro e ela afaga os meus cabelos.
— Você não está. Mas me prometa que vai fazer um exame só para termos certeza disso. — Ela se afasta e arqueia as sobrancelhas, apertando os meus braços.
Por trás dela, vejo Léo, e Arthur caminharem não nossa direção e eu me desespero. Empurro meu corpo para longe do de Geórgia e passo a mão pelo rosto, tentando afastar os resquícios do meu breve choro.
— Os meninos estão vindo. Por favor, não fale sobre isso.
— Me prometa que vai fazer o exame.
— Geórgia…
— Me prometa, ! — Ela esbraveja e eu arregalo os olhos, assustada. Os meninos estão cada vez mais perto e eu sinto meus músculos tremerem.
— Tudo bem. Eu prometo!

Narrador Avulso


Quando vê de pé, apressa seus passos em direção a ela, sem nem ao menos se importar com a presença de Arthur.
— Como você está? — Ele questiona com os olhos esbugalhados, olhando por cada centímetro da menina, como se buscasse por algum machucado ou hematoma. dá de ombros.
— Bem. Obrigada.
— Eu… Eu trouxe água para você e… — Ele mostra o pacote de biscoitos em uma de suas mãos e balança a cabeça de um lado para o outro, com os olhos fechados, sem entender porque estava tão nervoso.
— Eu não estou com fome, mas obrigada pela água. — profere, tomando a garrafa da mão de .
O semblante no rosto da menina preocupa . Ele sabia que ela havia acabado de desmaiar, mas normalmente tinha energia para dar e vender. Um mal estar podia até vir a enfraquecê-la, mas não a deixaria como estava agora.
Ela parecia… Triste?
Sem pensar, dá mais alguns passos à frente, erradicando ainda mais a distância entre seus corpos e se desespera, sentindo seus pelos arquearem por conta da proximidade.
— Você tem certeza de que está bem? — Sua voz saí em um tom quase que inaudível e sente as pontas dos dedos dele tocarem sua mão em um gesto afetuoso. Mas, por instinto, ela se afasta.
— Estou bem, . Só acho melhor eu ir para casa. — força seu melhor sorriso e acompanha seus movimentos de abaixar o tronco para pegar sua bolsa no chão com uma expressão embasbacada no rosto.
— Tudo bem. — Ele profere, chacoalhando a cabeça depois de alguns instantes em silêncio. — Eu vou com você.
— Não, não precisa! — A se apressa em dizer e arregala os olhos, surpreso. — Eu sei chegar em casa sozinha, vocês podem continuar com o passeio. — dá de ombros com um sorriso vago no rosto e lança um olhar rápido e confuso para Geórgia. — Você sabe voltar para o apartamento? — Ela questiona com os olhos firmes em Arthur e ele balança a cabeça na afirmativa.
— Sei, mas acho melhor eu ir com você. — O garoto rebate e se incomoda com sua provocação. Geórgia, por outro lado, se aproxima de e segura firmemente sua mão, tentando mantê-lo calmo.
— Não, ninguém vai comigo! Eu quero ir sozinha e não quero ninguém atrás de mim, pode ser? — A arqueia as sobrancelhas, nervosa, e os outros, com exceção de , balançam a cabeça na afirmativa. — Ótimo. Então eu já… Eu já vou. Bom resto de passeio para vocês. — dá de ombros, lança um sorriso nervoso para Geórgia, e caminha na direção oposta antes que alguém tente impedi-la.
, por sua vez, acompanha os seus movimentos em silêncio, até que a garota sai do seu campo de visão. Ele solta um suspiro, exausto, esfrega o cenho e, em seguida, se vira de frente para Geórgia.
— O que aconteceu? — Ele pergunta e a garota morde os beiços.

As trocas de guarda acontecem no Palácio de Buckingham diariamente, uma vez ao dia, às 11:30 da manhã entre os meses de maio e julho. Seus horários foram alterados de maneira fictícia para essa história.

Londres, 10 de agosto de 2020.
Casa dos Carter.


Quando chega em casa, se depara com um silêncio incomum. Em cima do aparador de cristal ao lado da porta de entrada, ele encontra um bilhete escrito com a letra de sua mãe, informando que ela, Éric e as crianças tinham ido à festa de aniversário de um amiguinho de Oliver, mas não demorariam para voltar.
O aproveita o momento para subir em disparada até o quarto de e saber como — de fato — ela estava. No entanto, encontra a porta do cômodo aberta, a cama feita sem um amarrotado sequer e nenhum sinal de que ela tinha passado por ali.
Sem pensar, ele adentra ao cômodo e começa a se questionar onde ela poderia estar. Pensa em ligar para Maria Luiza — já que ela era a única amiga de que ele conhecia —, mas assim que saca o telefone de seu bolso, desiste da ideia ao olhar pela janela e encontrar a garota deitada no chão da beira da piscina, com as pernas dentro da água. Seus olhos estavam fechados e os dedos das mãos entrelaçados uns aos outros, em cima de sua barriga.
estava visivelmente fora da realidade e sabia que ele tinha uma porcentagem de culpa nisso, então, não hesita em descer as escadas e seguir até a área externa da casa.
Quando atravessa a porta de vidro que separava a cozinha da parte da piscina, tenta ser o mais silencioso possível e isso faz com que nem sequer note sua presença. Ele, por conseguinte, caminha cautelosamente até ela e se deita ao seu lado, mas — por ainda estar de calça — encolhe as pernas para não molhá-las.
não abre os olhos, mas sente a movimentação, bem como o perfume inconfundível que só costumava usar. Os dois imergem em um silêncio até que bastante confortável para a situação e os únicos sons que se faziam presente eram os de suas próprias respirações e dos pés de batendo na água.
— Geórgia te contou, não foi? — Ela questiona, ainda com os olhos fechados, e balança a cabeça na afirmativa.
Em seguida, o garoto levanta o seu tronco e se senta. Ele passa as mãos pelos cachos em se cabelo e coça a barba rala em seu rosto, antes de soltar um longo suspiro e voltar sua atenção para .
— Você já fez o teste?
Quase que instantaneamente, abre os olhos ao ouvir sua pergunta. mordia os lábios com certa ansiedade, e seus dedos da mão esquerda brincavam com os anéis da mão direita em um gesto claro de nervosismo.
Ela, por conseguinte, balança a cabeça na negativa e, assim como , ergue o seu tronco e se senta sobre a pedra gelada do chão.
— Não fiz e, francamente, eu não acho que tenho coragem de fazer. — Ela confessa e um riso triste salta pelos seus lábios.
— E por que não?
— Porque se der positivo… — faz uma pausa entre as palavras, cobre o rosto com as mãos e balança a cabeça de um lado para o outro, sentindo seu coração acelerar com a possibilidade.
. — toca um de seus braços e força seus pulsos para baixo, mas mantém seus olhos fechados com medo de encará-lo. — Se der positivo, nós vamos arcar com as consequências. — Ele dá de ombros, erguendo o queixo dela com seu indicador e a garota volta a abrir os olhos.
— Não diga isso. Faz parecer que eu estou realmente grávida. — A garota pede, afastando a mão de de seu rosto. Ele suspira.
— E o que você quer que eu diga?
— Não sei. — A menina dá de ombros, sentindo seus olhos marejarem. — Nós tomamos todos os cuidados, não tomamos? Por favor, , me diz que sim. — choraminga e se esforça para não rir da expressão graciosa em seu rosto.
— Eu tenho certeza disso. — Ele rebate, afagando os cabelos da garota e, por uns instantes, respira, aliviada. — Mas imprevistos acontecem e…
— Ah meu Deus! — Ela esbraveja, cobrindo o rosto com as mãos mais uma vez e voltando a deitar suas costas no chão. não consegue se conter e acaba deixando um riso nasalado escapar. — Não ria! Não tem graça. — o repreende, aprumando novamente a sua postura, e o semblante em seu rosto faz com que queira rir ainda mais, mas ele se segura. — , se eu estiver grávida… É o fim da minha vida e provavelmente da sua. — Ela profere em um tom de voz bem mais baixo que o normal, e o franze o cenho, recuando o seu corpo para trás.
— Eu não tenho medo do seu pai, bonitinha. E você não deveria ter também. — Ele rebate e revira os olhos, impaciente. — , o seu pai te ama. Eu sei que ele teve uma criação bem diferente e continua preso à costumes do passado, mas ele é o seu pai e ele te ama. Se você estiver esperando um bebê…
faz uma breve pausa e seu olhos vão até a barriga de quase que involuntariamente. Seu coração tamborila e pela primeira vez ele parece entender que se aquela menina estivesse mesmo grávida, ele seria… Pai.
No entanto, balança a cabeça de um lado para o outro tentando afastar seus devaneios e umedece a garganta antes de continuar.
— Se você estiver mesmo grávida, eu tenho certeza de que ele vai amar essa criança tanto quanto ama você. — O garoto dá de ombros, apertando levemente uma das mãos de e ela ri. — Ele pode até ficar meio irritado no início por conta do seu voto e tudo mais… — A garota joga a cabeça para trás, choramingando, e ri, a puxando de volta para si. — Mas ele vai ficar feliz. Confia em mim.
Por conseguinte, leva a mão de à boca e deposita um beijo carinhoso sob sua palma. Seus olhos estão cravados nos dela e isso faz o coração de estremecer.
— Isso não te apavora? — Ela questiona, mordendo os beiços e franze o cenho, sem entender. — A possibilidade de ser pai.
— Porra, demais! — O arregala os olhos e gargalha, mas seus olhos se fixam no gesto involuntário de em entrelaçar seus dedos nos dela.
Aquela era uma ação corriqueira do garoto e adorava. Ela sentia seu coração aquecer todas as vezes que acontecia e fazia parecer que o que existia entre os dois não era algo reduzido à sexo.
— Eu com certeza não estou pronto para ser pai, mas eu amo meus irmãos e… Acho que me sairia bem se fosse necessário. — Ele dá de ombros e um breve sorriso escapa pelos lábios de .
Você se sairia muito bem, . — O inconsciente da garota grita, mas ela engole suas palavras e as guarda para si.
— Além do mais, eu ficaria feliz em ter outro de mim no mundo. Minha espécie é bastante rara. — Profere com certa indiferença e a menina arqueia as sobrancelhas, surpresa, o que o faz rir.
Em seguida, solta um riso e empurra o peito dele para longe do seu novamente, mas é mais forte e a puxa pelo braço, fazendo com que seus peitos colidam e ele consiga a envolver em um abraço.
— Eu não acredito que você disse isso. — A menina balança a cabeça na negativa, prendendo os seus braços ao redor da cintura dele.
— Não é mentira. Mas eu estava tentando aliviar a situação e eu acho que funcionou. — dá de ombros e ergue o rosto de encontro ao dele. Ela balança a cabeça na afirmativa e seus olhos fitam a cor rosa de seus lábios.
entende aquilo como um pedido silencioso e, por conseguinte, aproxima seu rosto do dela e sela seus beiços em um beijo doce, embora rápido.
— Obrigada por isso. — franze levemente o nariz quando o garoto se afasta e ele sorri, passando as pontas de seus dedos pelos traços leves no rosto da garota.
O coração de batendo tão acelerado quanto o seu contra seu peito volta a trazer uma sensação estranha de formigamento em suas mãos, o que faz — mais uma vez — pensar nas coisas que tinham sido ditas por Geórgia.
— Você sabe que precisa fazer esse exame não sabe? — Ele questiona, acariciando a bochecha de com o polegar. Ela pressiona um lábio contra o outro e balança a cabeça na afirmativa. — Eu não vou te pressionar, mas quando você estiver preparada…
— Vamos acabar logo com isso. — Ela o interrompe e prontamente se cala. Surpreso, o se afasta com as sobrancelhas arqueadas e a garota ri.
— O que você disse?
— Vamos acabar logo com isso. — Ela dá de ombros, se afastando de para poder se levantar do chão. — Eu vou fazer esse exame e seja o que Deus quiser, mas que fique claro que se eu estiver mesmo grávida e você me expulsar por aquela porta, eu não vou te dar paz, . — profere por fim e revira os olhos, também se colocando sobre seus pés.
— Isso já não aconteceria mesmo. — Ele rebate, fazendo o queixo de cair alguns centímetros.

[•••]


Sentado na beira da cama de , a espera um tanto quanto ansioso. Ela está no banheiro há aproximadamente seis minutos que mais se parecem seis horas e nada parece suficientemente capaz de prender a atenção de . Nada com exceção da foto no porta-retrato sobre a escrivaninha da garota.
Por impulso, ele salta da cama e caminha até o imóvel, tomando a imagem em suas mãos. Nela, consegue ver entre seus pais, com o corpo inclinado para baixo e os braços jogados sobre os ombros de seu irmão mais novo. A menina vestia uma beca de formatura com ombreira e faixa azuis e a criança segurava o canudo de camurça, também azul.
Ângela e Pedro pareciam bastante orgulhosos da filha e o sorriso de orelha a orelha no rosto de garantem a que ela estava mais do que feliz por ter conseguido isso.
De repente, ele se pega pensando no que aconteceria caso aquele resultado desse positivo. Seu primeiro contato com Pedro não tinha sido muito amistoso e ele não tem ideia de como aquele homem reagiria ao saber que engravidou sua doce passarinha.
No entanto, por mais apavorante que o pai de pudesse parecer, não se sentia intimidado. No fundo, ele já estava tão ligado à que pouco se importava quem teria de enfrentar para ficar com ela.
Porque era isso que ele queria, ficar com ela.
, por outro lado, se tranca no banheiro e hesita em fazer o teste por alguns segundos. Entretanto, sua racionalidade tenta ser mais alta que o medo de desapontar seus pais e ela acaba seguindo cada um dos passos para a realização do exame.
Com tudo pronto, se senta sobre a louça do vaso sanitário e tranca sua respiração, até que o teste apita e ela solta um longo suspiro de alívio quando seus olhos foram as palavras Não Grávida no visor daquilo que poderia facilmente ser confundido com um termômetro.
Um riso largo salta pelos lábios dela e a garota comemora em silêncio, antes de saltar do vaso e correr em direção à porta do banheiro.
Quando ouve destrancar a porta, pode jurar que seu coração erra as batidas. Ele mais do que depressa devolve o porta-retrato para a escrivaninha e aguarda ansioso pelo resultado no momento em que vê com os olhos esbugalhados para si.
— E… Então? — umedece a garganta, visivelmente nervoso, e gargalha.
— Pode respirar, . Você não vai ser pai! — Ela diz, animada, e, antes que o garoto consiga processar a informação, avança sobre seu corpo e o envolve em um abraço caloroso.
Quando se afasta, se joga sobre o colchão e suspira, desafogada. Embasbacado, se senta ao seu lado e se mantém em silêncio por alguns minutos.
— Eu estou tão aliviada! — A menina profere, virando o seu rosto de encontro a e ele parece finalmente acordar do transe.
— Eu… Acho que eu também. — Ele umedece a garganta e franze o cenho, ainda meio confuso. — Mas confesso que a ideia de ter um bonitinho correndo pela casa não me parecia tão ruim assim. — arqueia as sobrancelhas, surpresa.
— O que você disse? — Ela questiona, erguendo o seu tronco em um movimento um tanto quanto abrupto. , por sua vez, respira fundo e se xinga mentalmente por ter deixado seus pensamentos saírem em voz alta.
— Nada, . Eu não disse nada. — Profere, notavelmente exausto, e, em seguida, se levanta da cama.
— Espera aí. Você ficou triste com o resultado? — A pergunta, franzindo a testa. — , isso são boas notícias! — Ela sorri e por conseguinte se levanta, dando alguns passos em direção a ele.
— Eu sei, não é isso. — rebate, coçando a têmpora com a ponta dos dedos, e o olha, sem entender.
— Então o que é? — Ela insiste em saber e, de repente, um riso sem humor salta pelos lábios do garoto.
— Não é nada, . — Ele balança a cabeça de um lado para o outro e dá as costas à garota. , por sua vez, não se dá por satisfeita e se apressa para alcançá-lo.
— Não, é alguma coisa sim. — A profere, puxando o pulso de e ele volta a olhá-la. — Me conta. Conversa comigo. — Seu tom de voz sai aveludado e fecha os olhos, puxando todo o ar que consegue para dentro de seus pulmões.
— Eu só… Só não consigo entender como ter um filho comigo poderia ser algo tão ruim. — O dá de ombros e se surpreende.
Em seguida, a balança a cabeça na negativa e dá dois passos à frente, se aproximando de . Ele, no entanto, dá dois passos atrás, o que faz estremecer.
, não é ter um filho com você. É ter um filho no geral. Os meus pais eles…
— … Eles acham que você ainda é virgem e se descobrissem que não, blá, blá, blá. Eu já estou cansado dessa história, bonitinha. — Ele revira os olhos e a ironia em seu tom de voz surpreende .
— O que deu em você hoje? — A questiona mais para si mesma do que para , que, por sua vez, acha graça.
— Absolutamente nada. Eu continuo o mesmo arrogante de sempre. — O dá de ombros e balança a cabeça de um lado para o outro. — E continuo achando que você precisa parar de ter medo do seu pai.
— Eu não tenho medo do meu pai, . — rebate, tentando parecer calma, já que parece suficientemente nervoso pelos dois.
— Ah, não? — Ele arqueia as sobrancelhas e a garota não hesita em balançar a cabeça de um lado para o outro. — Então você pode me explicar por que parece que, desde que seus pais chegaram, eu e você estamos andando por um fio que está prestes a arrebentar? — questiona e arqueia as sobrancelhas, em choque.
— Não é nada disso. Você não entende.
— Não, eu entendo. Eu entendo perfeitamente que seus pais não podem saber sobre mim, entendo que você precisa manter as aparências de um noivado que não existe só para não bater de frente com eles. Eu entendo tudo isso e entendo também que é a hora de me afastar. — Seu tom de voz diminui conforme as palavras saem pela sua boca e a última frase parece arranhar sua garganta.
encolhe os ombros e esconde as mãos nos bolsos de sua calça, enquanto o queixo de despenca alguns centímetros e ela tenta processar o que estava acontecendo.
— Eu não… — faz uma pausa entre as palavras, fecha os olhos e balança a cabeça na negativa para afastar seus devaneios antes de continuar. — Eu não estou entendendo.
A garota morde os lábios com força e ergue seu olhar em busca do de com a certeza de que tinha entendido perfeitamente o que ele falara, mas se agarrou até o último fio com a esperança de estar errada.
Ela não queria se afastar de .
E muito menos queria que ele se afastasse dela.
Mas as lágrimas que se acumulavam em seus olhos insistiam em pensar o contrário.
— Eu quero terminar, bonitinha. — Ele profere com certa arrogância e fecha os olhos, deixando uma única lágrima escorrer por sua bochecha. Rapidamente ela se apressa para limpá-la e torce para que não tenha visto.
— Pare de me chamar assim. — range os dentes e respira fundo, criando coragem para olhá-lo. Ele, por conseguinte, dá de ombros, indiferente ao pedido da garota. — Por quê? — Ela questiona, puxando o choro pelo nariz e franze o cenho, sem entender.
— Por que, o quê?
— Por que você quer se afastar de mim, ? — A morde os beiços e o garoto sente seu peito estremecer. Por alguns instantes, precisa desviar o seu olhar de e implora para que seu lado emocional não fale mais alto que o racional.
Obviamente não queria se afastar de , muito pelo contrário. Ele queria mantê-la o mais perto possível. Mas talvez, esse fosse o principal motivo para afastá-la.
— Eu não quero guardar segredos só para manter o que temos, . — O confessa e um riso sem humor salta pelos lábios da garota quase que instantaneamente.
— Mas o que temos já era segredo, ! — Ela esbraveja, visivelmente confusa, e o menino puxa todo o ar que consegue para dentro de seus pulmões. — Qual é a diferença agora? — insiste em saber e sente um calafrio percorrer toda extensão da sua espinha.
Um silêncio ensurdecedor toma conta do ambiente e os olhos da garota aguardam ansiosos pela resposta do rapaz. Ele, no entanto, desvia o olhar para o chão, passa os dedos pelos cantos internos dos olhos e em seguida pelos cabelos, até que encontra coragem para olhá-la.
— Não sei. — Ele solta um breve riso e cerra os olhos, se esforçando para entendê-lo. — Talvez eu estivesse disposto a mudar isso. dá de ombros e arregala os olhos, boquiaberta.
Por conseguinte, se vira de costas para ela e se apressa para sair do quarto, sem dar à a chance de entender o que ele queria dizer com aquilo.

Capítulo Cinco

“There’s a lot of things that I may not know, but missing you baby is the only thing I know.
The Vamps, Paper Hearts.




Londres, 20 de agosto de 2020.
Casa da Sarah.


Existem duas datas festivas pelas quais eu sempre estou ansioso. A primeira delas é o Natal, pelo motivo óbvio de ser uma festa linda e significativa onde as pessoas parecem estar mais abertas, as famílias se reúnem e tudo parece estar bem — por mais que não esteja.
A segunda delas é o meu aniversário. Não que o dia 20 de agosto tenha uma importância proporcional ao dia 25 de dezembro, mas eu sempre gostei da ideia de poder juntar meus amigos e familiares em um mesmo lugar para celebrar o meu nascimento. Isso faz com que eu me sinta querido, e talvez eu goste de ser o centro das atenções por um dia — não sei exatamente porquê, mas se eu acreditasse nesse negócio de signo, com certeza culparia o meu por essa minha condição de histrionismo* leve.
No entanto, todas as vezes que pensei em como comemoraria meus vinte e sete anos, imaginei que estaria aqui. Mas ela não está.
A festa é perfeita e eu preciso admitir que Sarah e Mitch fizeram um excelente trabalho, mas essa sensação bizarra de que algo está faltando não parece querer ir embora. Por isso, involuntariamente acabei me isolando dos convidados e sentei em um banco acolchoado encostado na parede de vidro que me proporcionava uma visão bastante privilegiada da cidade onde moro.
Saquei o meu celular do bolso lateral da calça que estava vestindo e de repente nem a voz de Joni Mitchell cantando Big Yellow Taxi eu conseguia ouvir mais. Abri o meu aplicativo de mensagens e transcorri o dedo por todos aqueles desejos de felicitações até encontrar uma aba específica. Minha última conversa com tinha sido no dia em que saímos com Geórgia e Léo — e Arthur, mas eu me recusava a mencionar esse aí —, quando eu enviei a ela a localização do estúdio de tatuagem onde estávamos.
Daquele dia até hoje, absolutamente tudo mudara.
Entretanto, confesso que torci para que ela fosse ser a primeira a quebrar esse voto de silêncio e me mandasse algo pela data de hoje. Mas ela não fez. E talvez eu nem merecesse que fizesse.
Inconscientemente, me peguei com o polegar sobre sua foto de perfil. Cliquei no círculo para ampliar a imagem e um sorriso involuntário saltou pelos meus lábios. Eu tinha tirado aquela foto durante um dos passeios de barco que fizemos em Amsterdã.
Estou registrando o momento, eu disse quando ela me perguntou e um sorriso de orelha a orelha surgiu em seu rosto. Naquele momento, fez meu coração tamborilar pela primeira vez e eu nem sequer percebi, mas tive certeza de que o mundo pararia para admirá-la se fosse possível.

— Ei, você pode me ajudar com… — A voz de Sarah me tirou dos meus devaneios e, em um ato irreflexo, bloqueei a tela do aparelho. Em seguida, ergui o meu rosto em direção ao som e vi minha melhor amiga com as sobrancelhas arqueadas, esperando a minha resposta para uma pergunta que eu nem sequer tinha ouvido.
— Me desculpa. O que você disse? — Questionei, meio envergonhado, enquanto devolvia o celular para o bolso da minha calça. Ela suspirou e então se sentou ao meu lado.
— Música antiga, jogos de tabuleiro, karaokê, a sua cerveja favorita… — Sarah começou a enumerar coisas aleatórias e eu franzi o cenho, confuso. — … Sobremesa daquele restaurante árabe que você ama, seus primos estão aqui, sua irmã também. — Ela continuou e o semblante em meu rosto relaxou quando finalmente entendi o seu ponto. — Eu devo ter esquecido algo…
— Sarah…
— É sério! Eu devo ter deixado algum detalhe passar. Caso contrário, você não estaria tão tristinho assim. — Ela franziu o cenho com um sorriso entristecido nos lábios e eu achei graça, balançando a cabeça de um lado para o outro.
— Eu não estou triste. Talvez só um pouco desanimado. — Dei de ombros e entortei os cantos dos meus lábios em um sorriso breve.
— E o que falta para você se animar? — Sarah questionou com as sobrancelhas arqueadas. — É sério. Diga e eu peço para Adam buscar!
— Eu acho que você sabe o que falta, Sarinha. — Rebati, umedecendo a minha garganta e entrelaçando os dedos de uma mão à outra, enquanto apoiava os cotovelos sobre os joelhos. — E não é exatamente algo que Adam consiga buscar. — Finalizei com um riso breve e minha melhor amiga fez o mesmo.
— É, eu sei. — Ela disse, afagando minhas costas por cima do colete de lã amarelo com bolas pretas que estava usando. — Mas acho que eu tinha esperança de que você fosse responder algo material como uma garrafa de tequila. Ou duas. — Proferiu, me fazendo rir.
— Não seria uma má ideia. — Dei de ombros e um riso breve saltou pelos lábios de Sarah.
— Eu juro que ainda não consigo entender o que aconteceu. — Ela mordeu os beiços e, envergonhado, eu mudei a direção do meu olhar. — Depois do que você me contou, vocês chegaram a brigar?
Assim que ouvi sua pergunta, fechei os meus olhos e flashbacks da última vez em que eu e nos falamos começaram a passar pela minha mente. Chacoalhei a cabeça de um lado para o outro, tentando afastar essas lembranças, e voltei minha atenção para Sarah.
— Mais ou menos. Sim.

Histrionismo é a necessidade/desejo que uma pessoa tem de ser o centro das atenções.

Londres, 12 de agosto de 2020.
Casa dos Carter.

Narrador Avulso


Já eram quase dez da noite e estava jogada no sofá da sala, tentando concentrar toda a sua atenção no livro em suas mãos. No entanto, a cada barulho de trovão, a erguia seu olhar de encontro à janela, a tempo de ver o raio iluminar boa parte do seu alcance.
Por causa da chuva, Éric e Vitória ficaram presos em Brighton. As crianças já estavam em seus quartos, e … Bom, o barulho de passos descendo as escadas fez com que , por impulso, virasse o seu rosto de encontro ao som e encontrasse vestindo um traje que ele comumente usava para dormir. Seus cabelos estavam úmidos e ele andava distraído até a cozinha, com os olhos presos na tela do celular em suas mãos.
mordeu os beiços e acompanhou os movimentos do rapaz em silêncio. largou o telefone sobre a ilha de granizo no meio do cômodo e abriu a geladeira, de onde retirou uma garrafa de vidro com água. Quando ele virou seu corpo, e consequentemente ficou de frente para , a desviou o olhar e fingiu prestar atenção no que lia.
, no entanto, assim que notou a presença da menina na sala, não conseguiu impedir que seus olhos se cravassem nela por alguns segundos. Em circunstâncias normais, ele zombaria o título do livro que ela lia e tentaria rebater com alguma ofensa que o faria rir. Em seguida, se deitaria ao lado dela e os dois aproveitariam a ausência de Éric e Vitória juntos. Com ou sem sexo, isso já não fazia diferença entre os dois.
Mas essa não era uma circunstância normal, já que desde a última quarta, vinha tentando diminuir — gradativamente — o contato com , e ela ainda não conseguia entender direito quais motivos o levaram a fazer isso.
A verdade é que só estava tentando fazer com que a presença dos pais dela em Londres fosse algo fácil de lidar, por mais que isso parecesse impossível. No entanto, ele sabia que manter o que tinham em segredo como vinham fazendo desde que voltaram de Amsterdã, seria estressante demais e colocaria em risco.
A , por sua vez, colocou o livro bem na frente de seu rosto e fechou os olhos com força, implorando para que voltasse para o quarto o mais rápido possível. Entretanto, quando despertou de seus devaneios, balançava a cabeça de um lado para o outro, e ela encontrou Helena parada ao lado do sofá, com a mão na boca, segurando um pequeno cobertor rosa e com um olhar de choro no rosto.
— O que você ainda está fazendo acordada, Helena? — Seu tom de voz saiu brincalhão, e, quando o ouviu, franziu o cenho, abaixando o livro e buscando pela criança.
— Eu tive um pesadelo. — A pequena choramingou, esfregando os olhinhos com o dorso da mão, e os dois se entreolharam. Em seguida, saltou do sofá e caminhou em direção à ela.
— Não foi nada demais, princesa. — a mais velha sorriu, se abaixou sobre seus joelhos e afagou os cachos no cabelo de Helena enquanto se aproximava das duas. — Deve ter sido por causa do barulho da chuva.
— Eu quero os meus pais. — Helena voltou a choramingar e soltou um suspiro.
— Mamãe e Éric não estão em casa, pequena. — Foi quem respondeu, atraindo o olhar de para si.
O casal se entreolhou em silêncio por poucos segundos e, quando perceberam que Helena fazia menção de chorar, voltou sua atenção para ela.
— Mas eu estou. Não serve? — Ele questionou, fazendo um bico com seus beiços, e um riso involuntário saltou pelos lábios de , enquanto ela balançava a cabeça de um lado para o outro e virava o rosto de encontro ao da garotinha mais uma vez.
Helena, por sua vez, hesitou e olhou para como se esperasse a sua opinião. A , por conseguinte, arqueou as sobrancelhas, animada, e balançou a cabeça na afirmativa. Em seguida, a pequena volta sua atenção para o irmão mais velho e fez o mesmo, ao passo que puxou o seu bracinho para que ela tirasse a mão da boca. riu.
— Você pode me contar uma história? — Ela perguntou e o arregalou os olhos enquanto caminhava até ela.
— Eu? Lógico que sim! Eu conto histórias mil vezes melhor que o seu pai, Helena. — deu de ombros e achou graça. Quando o se aproximou da irmã e estendeu a mão para ela, se levantou do chão e se preparou para voltar para seu livro. — Vamos, pequena. — Ele proferiu no instante que sentiu a pequena envolver dois de seus dedos com a mão.
— Vem, . — Helena disse, chamando com a mãozinha livre. A arqueou as sobrancelhas, surpresa, enquanto fechou os olhos e umedeceu a garganta.
— Não, linda, eu vou… Eu já estou cansada. Acho que vou para o meu quarto dormir. Mas tenho certeza de que seu irmão vai te contar uma história linda cheia de princesas. — A mais velha sorriu e seus olhos se fixaram em . Ele, por outro lado, desviou sua atenção para o chão e passou o indicador pela parte de baixo do nariz.
— Mas você tem que vir! Tem que ser vocês dois! — Helena voltou a choramingar e respirou fundo.
— E por que isso, princesa? — questionou, depois de limpar a garganta e passar a mão pelos cabelos úmidos.
— Porque todas as vezes que eu tenho um pesadelo, papai e mamãe ficam comigo até eu conseguir dormir. — Ela abriu um bocejo e esfregou os olhinhos com o dorso da mão, ao passo que se surpreendeu e mordeu os lábios. Em seguida, soltou um suspiro e voltou a abaixar o seu corpo na altura de Helena.
— Vamos fazer o seguinte: você vai com o agora e daqui a pouco eu subo para te dar um beijo. Que tal? — A arqueou as sobrancelhas, afagando os braços de Helena.
— Não, . Você tem que vir junto! — A pequena bateu os pézinhos e respirou fundo, inclinando o seu tronco para baixo para pegar Helena em seu colo. — Os monstros só vão embora se vocês me protegerem juntos. Por favor. — Ela se debateu e colocou mais peso que o normal sobre os braços do irmão.

, no entanto, sorri e — sem se importar com a reação de — dá um passo à frente, diminuindo a distância entre os três. Ela acaricia os cabelos da garotinha que, vencida pelo cansaço, apoia a cabeça no ombro do irmão mais velho.

— Princesa, monstros não…

— É melhor você vir. — a interrompeu e, surpresa, prontamente se calou. Seus olhos correram em busca dos dele e entortou levemente os lábios. — Pelo menos só até ela dormir. Ela não vai sossegar se você não for. — Ele deu de ombros e a demorou poucos segundos até balançar a cabeça na afirmativa.
— Tudo bem. Eu vou. — Ela rebateu e um sorriso involuntário surgiu em seu rosto quando ela viu Helena comemorar.
Quando subiram até o quarto de Helena, dividiu o pequeno espaço da cama montessoriana com a irmã de , enquanto ele se sentou no chão com as pernas cruzadas uma sobre a outra. A se deitou de lado, apoiando boa parte do peso de seu corpo sobre um braço, e Helena apoiou as mãozinhas sobre o abdômen, entrelaçando os dedos de uma nos da outra.
— Então… Você quer uma história sobre o quê? — prendeu um lábio contra o outro e arqueou as sobrancelhas.
— Princesas e dragões!! — Eufórica, a criança balançou as perninhas e achou graça.
— É claro que sim. — revirou os olhos e inclinou seu tronco para frente, para arrumar o lençol sobre o corpo de Helena. Em um gesto involuntário, o ajudou. — E como vai ser a princesa dessa história?
— Eu não sei. A história é sua. — A criança rebateu com indiferença, e se surpreendeu. levou seu olhar de encontro ao rapaz e o semblante em seu rosto a fez rir.
— Quem é que você está puxando, menina? — Ele questionou com as sobrancelhas arqueadas e Helena deu de ombros. , por outro lado, revirou os olhos e deitou a cabeça sobre seu próprio braço.
— Eu me pergunto a mesma coisa. — Seu tom de voz saiu irônico e baixo, no entanto, alto o suficiente para que conseguisse ouvi-la.
Em um gesto inconsciente, o rapaz a olhou e — mesmo sabendo que os olhos dele estavam cravados sobre si — mordeu os cantos internos das bochechas e lutou para prender sua atenção no rostinho de Helena, tocando a ponta do nariz da menina com seu indicador. tinha plena consciência que sua irmã mais nova era a sua cópia perfeita — assim como Geórgia —, e essa personalidade genuína de Helena não podia ter uma influência mais óbvia que não fosse ele. E ele sabia que sabia disso.
Um riso involuntário saltou pelos seus lábios e balançou a cabeça de um lado para o outro, voltando sua atenção para a criança. No mesmo instante, voltou sua atenção para ele e sentiu seu peito apertar, entristecida por saber que — mais uma vez — em circunstâncias normais, a reação de ao seu comentário teria sido diferente.
E só Deus sabe como preferia ouvir um comentário debochado ao invés do silêncio que recebeu.
— Tudo bem. Na minha história, a princesa vai ser…
— … Como a ! — Helena esbravejou, balançando as perninhas, e o casal se surpreendeu. arregalou os olhos e prontamente se calou, enquanto engasgou e, por impulso, ergueu seu tronco, buscando pelos olhos da criança.
Nem , nem conseguiram proferir algo nos instantes seguintes. E, por mais que as vozes na cabeça de implorassem que ela perguntasse a Helena o porquê ela tinha dito aquilo, ela não o fez. Em contrapartida, respirou fundo e passou os dedos pelos cachos — agora secos e perfeitamente modelados — de seus cabelos, antes de fingir indiferença e voltar sua atenção para a pequena mais uma vez.
— Ué… Mas você acabou de dizer que a história era minha, Helena! — Ele forçou o seu melhor riso e franziu o cenho, desviando o foco de sua atenção para . Por conseguinte, ele a olhou e implorou mentalmente para que ela não levasse o comentário da criança à sério.
— Eu sei. Mas a mamãe um dia disse que queria muito que você encontrasse uma princesa. — A pequena deu de ombros, brincando com o tecido do lençol entre seus dedos. — E depois ela disse que queria que essa princesa fosse a , porque ela é linda como a Bela e ela acha que vocês se gostam. — Proferiu por fim.
Helena com toda certeza não sabia o peso de suas palavras, nem muito menos a influência que elas teriam. No entanto, era nítido o tanto que a fala da criança tinha mexido com os dois. Mas mexido de uma forma boa, pelo menos com . , em contrapartida, fechou os olhos com força e abaixou o rosto, sentindo suas bochechas queimarem.
— Ela disse? — O tom de voz da AuPair saiu aveludado e ela mal conseguiu conter o sorriso em seus lábios. De soslaio, o olhou para a irmã e a viu balançar a cabeça na afirmativa.
— Mas olha como você é fofoqueira, pirralha! — Ele brincou, colocando sua mão sobre o corpo de Helena e apertando o tórax dela com as pontas de seus dedos, fazendo a criança soltar uma gargalhada estridente e contagiante.
achou a cena graciosa e entendeu aquilo como uma tentativa desesperada de para contornar o assunto.
— Será que eu posso contar a minha história agora? — O questionou, apoiando as mãos na cintura, e, ofegante, Helena fez que sim com a cabeça.
No entanto, quando viu o mais velho tomar fôlego e espaçar os lábios para começar a falar, a pequena conseguiu ser mais rápida e outra vez surpreendeu o casal com mais uma daquelas perguntas que só crianças teriam coragem de fazer em uma situação como essa.
— Vocês são namorado e namorada?
voltou a se calar e um silêncio ensurdecedor invadiu o quarto de Helena. Dessa vez, o casal se entreolhou e o questionamento da menina intrigou . Ela franziu o cenho e viu nos olhos de um pedido ansiado — e um tanto quanto exaustivo — para que ela ignorasse e o ajudasse a mudar o foco da conversa mais uma vez.
Por isso, ao invés de esperar que ele intervisse como das outras vezes, repuxou os lábios em um sorriso um tanto quanto irônico, deixando mais do que clara a sua chateação em relação à essa decisão apurada — e um tanto quanto egoísta — de em afastá-la de si sem se preocupar em colocar sobre a mesa todos os motivos que o levaram a isso e, enquanto ele fechou os olhos e tentou ignorar a pergunta de Helena, ela voltou sua atenção para a pequena, que aguardava ansiosa pela resposta dos dois.
— Não. Não somos não, pequena. — entortou os lábios em um riso sem humor e, quando sentiu que um “por que?” poderia saltar a qualquer momento pela boca da criança, ela se apressou em cortá-la. — Agora deixe o seu irmão começar, porque já está tarde e você já deveria estar dormindo, mocinha! — Sua voz saiu em tom de brincadeira e apertou com leveza o nariz de Helena, fazendo a pequena rir.
Em seguida, a garotinha balançou a cabeça na afirmativa e a voltou sua atenção para . Ela deu de ombros, deitou sua cabeça sobre o seu próprio braço e entendeu aquilo como sendo a sua deixa para que ele engatasse de vez na tal história.
— Certo, então… — O fez uma breve pausa para umedecer sua garganta e lançou mais um olhar para . A não retribuiu e isso pesou sobre os ombros de como se fossem mil toneladas.
Por conseguinte, ele chacoalhou a cabeça e tentou ignorar aquilo por hora, afinal, não tinha tomado a decisão de se afastar à toa e sabia que mais cedo ou mais tarde, entenderia seus motivos. então voltou a sua atenção para a pequena, puxou todo o ar que conseguiu para os seus pulmões e abriu um sorriso largo antes de proferir as três palavras seguintes:
— Era um vez...

[•••]


ficou cerca de dez minutos contando uma história cheia de princesas, dragões e muitas outras criaturas místicas que ele mesmo tirou da sua imaginação. Por mais que Helena parecesse extremamente engajada no conto criado por ele, conseguia notar que a menina estava cada vez mais longe e mais entregue ao sono. Logo quando viu a pequena bocejar e percebeu a luta de suas pálpebras em se manterem abertas, diminuiu gradativamente o tom e a intensidade de sua voz e acariciou suavemente a mão da pequena até que ela, de fato, se deixasse vencer pela vontade de dormir.
Assim que isso aconteceu, esperou pelo menos alguns minutos só para ter certeza de que a pequena não acordaria pelas próximas horas. Por isso, ele inclinou o tronco para o lado e apoiou a cabeça sobre o corpo da irmã adormecida, ao passo que mantinha o carinho em suas mãos. — que até então observava a cena calada — se deixou levar pelo silêncio de vozes misturado com o barulho da chuva e acabou adormecendo junto de Helena.
No momento em que se certificou de que a criança estava, de fato, imersa em um sono profundo, aprumou a sua postura e arrumou o lençol sobre o corpo da irmã. A pequena chegou a se mexer, mas não acordou, e agradeceu por isso.
Em seguida, o rapaz deitou seu corpo para frente e seus lábios alcançaram a testa da criança em um beijo doce. Quando sua postura voltou para a posição ereta, encontrou na mesma situação que sua irmã mais nova só que, diferente de Helena, a parecia muito mais desconfortável, toda encolhida no espaço minúsculo daquela cama.
tinha plena consciência de que o certo a se fazer seria acordar para que ela pudesse voltar a dormir no seu quarto, em uma cama bem maior que a de Helena. Mas ele não conseguiu. Até porque, se a acordasse, ele seria obrigado a fingir indiferença, e por mais que só tivessem se passado dois dias desde que tomara essa decisão, ele já conseguia se sentir exausto disso.
Então, ao invés de fazer o que seria considerado certo, se esforçou para cobri-la com a folga do lençol de Helena, acariciou seu rosto com a maior leveza e cuidado do mundo para não acordá-la, e — assim como fez com a pequena — inclinou o seu tronco para frente, até alcançar a testa de , onde deixou um beijo suave. O rapaz fechou os olhos e chegou a manter seu rosto perto do dela por alguns instantes, sentindo a respiração quente de cortar a sua pele e as borboletas baterem as asas contra as paredes de seu estômago.
No entanto, tentou ser mais forte que todas essas sensações — por mais prazerosas que elas pudessem parecer — e se afastou da garota em um gesto um tanto quanto brusco. Ele se levantou do chão, chacoalhou a cabeça de um lado para o outro e passou a mão pelos cabelos, antes de lançar um último olhar para as duas e sair de uma vez do quarto.
Minutos depois, a posição desconfortável fez despertar. A abriu os olhos meio desordenada e levou alguns instantes para entender a situação na qual se encontrava, até que se lembrou de Helena e , e todas as circunstâncias que a fizeram pegar no sono ao lado da sua kid — como ela mesma costumava chamar.
Com todo cuidado para não acordar a criança, se levantou e tentou ignorar a sensação dolorosa de falta de circulação em seu braço. Em seguida, ela — assim como — arrumou o cobertor sobre o corpo de Helena e finalmente se levantou, decidida a ir para o seu próprio quarto.
No entanto, assim que fechou a porta do quarto da caçula, se deparou com saindo do banheiro de visitas. Diferente de antes, agora ele vestia uma blusa cinza com a estampa de uma “smile face” amarela, uma calça marrom, tênis nos pés e o clássico colar de pérolas ao redor do pescoço. Seus cabelos estavam arrumados e ele parecia pronto para sair.
Quando ergueu a cabeça e seus olhos cruzaram com a figura de , ele se surpreendeu e imediatamente interrompeu seus passos. A , por sua vez, cruzou os braços na frente de seu corpo e passou as mãos pela pele descoberta, tentando afastar o frio.
— Você conseguiu. Ela dormiu como um anjo. — deu de ombros, entortando seus lábios em um sorriso leve, sem mostrar os dentes.
— Que bom. — coçou os cabelos presos à sua nuca e virou seu rosto de encontro ao chão.
Sem proferir mais nada, ele passou por e os olhos da menina acompanharam os seus movimentos. Intrigada, ela não conseguiu conter sua curiosidade e acabou se deixando levar por impulso.
— Você... Vai sair? — Ela mordeu os beiços e fechou os olhos com certa força. Em seguida, ele respirou fundo e virou seu corpo em direção ao dela mais uma vez.
— Vou dormir na Sarah hoje. — Disse, e a se surpreendeu. Ela franziu o cenho e deixou um riso saltar pela sua boca.
, está caindo o mundo lá fora. Você não acha melhor…
— A casa dela não é muito longe daqui. — a interrompeu e prontamente se calou. — Eu vou ficar bem. — Ele garantiu e a menina levou alguns segundos para processar a informação. Quando isso aconteceu, não conseguiu controlar a sua falta de paciência e acabou revirando os olhos no instante em que viu dar as costas à ela mais uma vez.
— Por favor, me explique o que está acontecendo. Eu realmente quero entender.— Ela proferiu, esfregando os olhos com o dorso da mão para afastar o sono. , por sua vez, voltou sua atenção para ela e franziu o cenho, sem entender.
— Do que você está falando?
— Disso, . — deu de ombros, com um sorriso vago no rosto. — De você me dar um gelo, de mal conseguir olhar na minha cara. De você preferir enfrentar um dilúvio do que passar uma noite sozinho comigo nessa casa. — Proferiu e balançou a cabeça de um lado para o outro, coçando a têmpora com a ponta dos dedos.
— Eu não quero ter essa conversa, . — Ele encolheu os ombros e a garota riu.
— E eu não quero me afastar de você, ! — Ela esbravejou, dando um passo longo em direção ao garoto. — Mas você não está me dando muita escolha, então pelo menos seja homem o suficiente e tenha essa conversa. — rangeu os dentes e o rapaz a encarou, assustado com o semblante em seu rosto.
parecia irritada, exausta e um tanto quanto desesperada para entender o que estava acontecendo. não sabia exatamente como descrevê-la.
— É por causa dos meus pais? Por causa do Arthur? Me dá um motivo, pelo amor de Deus. — Ela implorou, passando uma das mãos pelo rosto, e sentiu suas costas pesarem pela culpa de ter causado este comportamento em uma menina tão calma e leve como .
O não respondeu e, por alguns instantes, o silêncio tomou conta da situação. Até que puxou todo o ar que conseguiu pelo nariz e tentou controlar seu nervosismo, bem como a vontade de chorar, que a essa altura, já estava começando a incomodá-la.
Mas ela não ficaria tão exposta na frente de . Não hoje.
— O que você quis dizer com “talvez eu estivesse disposto a mudar isso”? Mudar o que, ? — Ela questionou, fazendo aspas com os dedos, e umedeceu a garganta quando se lembrou da conversa que tiveram dois dias atrás. — Me responde! — aumentou o tom de sua voz e bateu um dos pés com certa força no chão enquanto arregalou os olhos.
— Pare de gritar, você vai acordar meus irmãos. — Ele pediu, tentando se manter sob controle.
— Então responda a porra da minha pergunta.
A rangeu os dentes mais uma vez, mas não se sentiu capaz de dar o que ela queria. Nem ele mesmo sabia explicar quais motivos o tinham levado a querer se manter longe de . Dentro da sua cabeça, fazia sentido ele querer proteger a menina de uma situação desagradável com a sua família, mas talvez ela não entendesse da mesma forma.
Por conseguinte, ao invés de respondê-la e resolver a situação de uma vez por todas, acabou seguindo por um caminho que viria a piorar seu relacionamento com e, então, abaixou o rosto, envergonhado demais para olhá-la.
— Eu preciso ir. — Disse, e um riso debochado saiu pelos lábios da garota. — Se as crianças precisarem de algo, você pode me ligar.
— Tudo bem. — Ela rebateu com desdém e, por impulso, ergueu o rosto de encontro ao seu. — Você quer ir, vai. Você quer ficar sem falar comigo, fique. Eu realmente não ligo, . Mas eu não merecia essa e você sabe disso. — deu de ombros com os beiços repuxados em um sorriso entristecido e, enquanto sentia seu peito apertar, a menina deu as costas a ele e se apressou em sair dali, sem dar a chance para que consertasse o que tinha acabado de acontecer.

Londres, 20 de agosto de 2020.
Casa da Sarah.



— Por favor, tente me explicar o que você quis fazer com isso antes que eu te dê um soco e estrague todo o trabalho que a tia Vitória fez no seu rostinho lindo. — Vi Sarah morder os beiços e um riso involuntário saltou pelos meus lábios.
Desviei o olhar da minha melhor amiga e passei a encarar o chão envernizado de seu apartamento. Passei a ponta do meu indicador pelo canto interno dos meus olhos e dei de ombros, puxando todo o ar que conseguia para dentro dos meus pulmões.
— Não era como se estivéssemos nos escondendo. Eu e , sabe? Nós saíamos na rua e ficávamos juntos, vocês sabiam que estávamos juntos. — Arqueei as sobrancelhas e lancei um olhar rápido para Sarah que, por sua vez, balançou a cabeça na afirmativa, ainda com os dentes cravados em seu lábio inferior. — As únicas pessoas que com certeza não sabiam, eram a minha mãe e Éric, e eu nem me importaria em contar, mas ela é babá das crianças e enfim. — Dei de ombros e esfreguei a têmpora, parando brevemente meu raciocínio.
Em sequência, voltei a respirar fundo e liberei mais um sorriso sem humor quando lembrei de Arthur, Pedro e Ângela, e da forma que ficou na presença dos três. Então, esfreguei os meus olhos e voltei minha atenção para Sarah.
— O problema é que agora existem correntes puxando para trás e eu não sei, talvez continuar como estávamos não fosse a melhor opção. — Acrescentei com certa indiferença, um tanto quanto confuso dentro da minha própria linha de raciocínio, e observei minha melhor amiga franzir o cenho, sem entender. — Se você tivesse visto o quão aliviada ela ficou com aquele teste negativo… Foi ali que a minha ficha caiu.
— Você ficou chateado com isso?
— Não, não com isso. — Rebati prontamente, balançando a minha cabeça na negativa. — Se o resultado fosse outro, teria sido um puta susto, mas eu me acostumaria com a ideia fácil. Ela não. — Entortei levemente os meus lábios em um sorriso sem humor e vi Sarah fazer o mesmo. — A tem medo dos pais dela. Ela diz que não, mas eu sei que tem. Sei que ela tem medo de que eles descubram o que aconteceu, ou descubram sobre mim. E eu não quero isso, sabe? Não quero que ela sinta medo por ficar comigo, e eu estaria sendo muito egoísta se estivesse colocando ela nessa posição.
— Mas você não acha que se precipitou um pouco? — Sarah estreitou o olhar contra o meu e, envergonhado, desviei minha atenção quase que em um reflexo involuntário. — , você afastou ela sem ouvir o que ela queria.
Suas palavras têm um efeito sobre mim bem maior do que eu gostaria. Tinha plena consciência de que me precipitei ao decidir por mim e por o que era melhor para ela. Mas na hora, no meio de todo aquele estresse com o Arthur sendo um pé no meu saco e uma suposta gravidez, eu entrei em pânico, e por milésimos de segundos, tive certeza de que o certo seria me afastar. Me arrependi no segundo seguinte, mas depois da última conversa que tivemos, eu já não sabia — e nem sei se tinha — como voltar atrás.
Ainda com os olhos cravados nos meus dedos entrelaçados uns aos outros, percebi que Sarah se aproximara ainda mais de mim e apertava meu ombro direito em um gesto que me trazia certo conforto.
— Você não sabe, mas eu e Mitch temos conversado muito com ela esses dias.... — Ela proferiu e eu não consegui conter o riso que escapou pela minha boca.
— Bem que eu senti a minha orelha queimar. — Minha voz saiu em tom de brincadeira e finalmente consegui voltar minha atenção para o rosto de Sarah. Ela, por sua vez, inclinou o tronco para trás e revirou os olhos, um tanto quanto enojada, o que me fez rir ainda mais.
— Você não é o sol, senhor . O mundo não gira ao redor dos seus belos olhos . — Ela apertou as minhas bochechas com uma de suas mãos e balançou meu rosto de um lado para o outro. Em minha defesa, agarrei seu pulso com o mínimo de força possível e o puxei para baixo para que ela me soltasse.
Os segundos seguintes foram preenchidos pelo som das nossas risadas que acabaram fazendo a minha barriga doer. Por conseguinte, joguei as minhas costas contra o encosto do sofá onde estava sentado e tentei recuperar o ritmo normal da minha respiração, enquanto Sarah assistia meus movimentos em silêncio. Até que, pouco tempo depois, a ouvi suspirar e apoiar o cotovelo no mesmo encosto que eu.
Minha melhor amiga mordeu os lábios e eu arqueei as sobrancelhas, curioso.
é uma menina doce, . — Ela proferiu e eu levei alguns segundos para raciocinar. Quando consegui, voltei a desviar minha atenção para outro lugar. — Não acho que ela mereça que você tome essa decisão sozinho. Qual o problema em cortar os sexos, cortar os beijos, mas manter a amizade? — Sarah questionou e, de soslaio, vi que seus olhos buscaram os meus.
— Eu... Eu não sei se consigo manter uma amizade com a . — Disse depois de poucos segundos em silêncio.
— E por que não? — Ela me perguntou quase que instantaneamente e eu a olhei. Não disse nada, mas dei de ombros e arqueei minhas sobrancelhas como se a resposta fosse óbvia o suficiente. Por causa disso, vi o semblante no rosto de Sarah mudar de uma expressão confusa para algo mais leve. — Não era só sexo para você, era?
— No começo, sim. — Garanti, mas o olhar desconfiado da menina em minha frente fez com que eu repensasse a minha resposta. Então respirei fundo antes de continuar. — Na verdade, não sei. Eu acho que ironicamente deixou de ser só sexo na noite em que transamos pela primeira vez. — Dei de ombros e minha melhor amiga arqueou as sobrancelhas, visivelmente surpresa.
— Você gosta dela tanto assim? — Ela questionou e, dessa vez, fui eu quem me surpreendi.
Elevei as minhas sobrancelhas e afastei os meus lábios um do outro, sentindo as palavras se acumularem na ponta da minha língua. No entanto, por algum motivo desconhecido, eu não consegui sequer formar uma simples frase e acabei desistindo de tentar. Por conseguinte, balancei a cabeça de um lado para o outro e deixei que um sorriso nervoso escapasse pela minha boca.
— Eu não sei, Sarah. Eu, francamente não sei. — Rebati com certa indiferença e respirei fundo, passando a mão pelos meus cabelos em um gesto quase que inconsciente. — Quando foi a última vez que você me viu gostar de verdade de alguém? — Estreitei o meu olhar contra o dela e a vi sorrir.
Em seguida, Sarah levou a mão até meu rosto e eu senti seu polegar acariciar levemente minha bochecha.
— Eu acho que estou vendo agora. — Ela deu de ombros e eu me surpreendi mais uma vez. Não sabia exatamente o que responder, então voltei a abaixar minha vista e soltei um riso, passando o meu dedo indicador pela parte de baixo do meu nariz.
Para a minha sorte, no entanto, fomos interrompidos pelo barulho da campainha invadindo o apartamento e isso fez com que eu voltasse a erguer o meu rosto. Vi Sarah respirar fundo e se levantar do sofá, enquanto eu assistia os seus movimentos em silêncio.
— Eu preciso terminar de preparar algumas coisas lá na cozinha, você pode atender a porta? — Ela questionou e eu franzi o cenho.
— A casa é sua, Sarah. — Tentei soar o mais engraçado possível e minha melhor amiga revirou os olhos teatralmente.
— E o aniversário é seu. Então, levante esse traseiro do sofá e vá aproveitar. — Ela deferiu leves tapas no meu braço e eu achei graça, arqueando as minhas sobrancelhas.
— Traseiro? Você pareceu a minha mãe.
— Anda logo, ! — Sarah esbravejou, puxando o meu braço, e eu soltei uma gargalhada quando percebi a expressão entediada em seu rosto.

Narrador Avulso


A campainha soou mais uma vez e apressou seus passos até a entrada do apartamento. Seus olhos, no entanto, varreram o ambiente e — entre alguns convidados — ele viu Geórgia distraída em uma conversa com Leonardo, enquanto Sarah sussurrou algo no ouvido de Mitch, que fez o rapaz erguer o rosto e arquear as sobrancelhas na direção de .
Curioso, o franziu o cenho e lançou um olhar sugestivo para o casal de amigos, mas ambos deram de ombros, o que o fez rir.
— Vocês estão falando de mim? — Seu tom de voz saiu um pouco mais alto para que os dois pudessem ouvi-lo de onde estavam. Mitch reagiu com indiferença e Sarah rolou os olhos.
— Abre a porta, .
— É bom que isso seja o meu presente, Jones. — resmungou, apoiando sua mão sobre o metal da maçaneta, e uma gargalhada fina escapou pelos seus lábios quando ele notou a careta no rosto da amiga.
— ainda com os olhos cravados em seus amigos — abriu a porta e, de repente, as atenções de Sarah e Mitch se desvincularam dele. Ele ignorou o fato, ciente de que aquela tinha sido só mais uma das implicâncias amigáveis as quais todos eles já estavam acostumados e, então, virou o seu rosto para frente, a fim de recepcionar quem quer que fosse o convidado que tinha acabado de chegar à sua festa.
E lá estava ela.
Parada no batente do hall de entrada do apartamento de Sarah, mordia o lábio inferior e segurava — com as duas mãos — a pequena bolsa preta na frente de seu corpo. O sorriso no rosto de desapareceu quase que instantaneamente e — em um movimento involuntário — ele observou a da cabeça aos pés, como se quisesse ter certeza do que estava vendo.
usava uma combinação entre uma saia marrom quadriculada e um suéter de tricô azul — com o bordado de um pintinho amarelo tentando escapar do ovo, onde se era possível ler a expressão francesa mon petit — por cima de uma blusa social branca com listras vermelhas. Seus cabelos estavam presos em um coque alinhado no topo de sua cabeça, seus lábios destacados pelo batom vermelho — que, por sinal, era um dos favoritos de — e, em seus pés, um scarpin salmão.
Os dois passaram longos segundos em silêncio, se encarando. Enquanto se mantinha estático e tentava processar o que estava acontecendo, o coração de beirava os cem batimentos por minuto à espera de uma reação dele.
Mas ele não reagiu.
Com isso, o lado racional de tentou falar mais alto que o emocional e ela fechou os olhos, balançou a cabeça de um lado para o outro e soltou um suspiro antes de proferir o seguinte:
— Eu sei que você não quer me ver, eu já entendi isso. — Ela passou as mãos pelo rosto em um gesto evidente de nervosismo e cruzou os braços na frente do corpo, ao passo que pareceu finalmente voltar à órbita. — Sei que você está com raiva de mim e que me quer o mais longe possível, mas... Droga, ! É o seu aniversário!
Involuntariamente, aumentou o tom de sua voz e um sorriso aflito pulou pelos seus lábios.
— As circunstâncias não deixaram eu te acordar com um bolo de chocolate e uma centena de brigadeiros como eu tinha planejado, mas eu não queria reduzir o dia de hoje à uma mensagem de texto, porque você merece mais do que isso.
A deu de ombros e, quando sentiu seus olhos marejarem, ela os fechou e chacoalhou a cabeça de um lado para o outro. , por sua vez, respirou fundo e escondeu as mãos nos bolsos laterais de sua calça.
— Então, eu criei coragem e vim até aqui, mesmo sabendo que as chances de você me colocar para correr eram altas. — Ela proferiu, com um sorriso vago nos beiços. — Eu juro que só queria te ver e quem sabe te dar um abraço, mas eu entendo se você não quiser. — Disse por fim e seus olhos se fixaram nos de mais uma vez.
continuou em silêncio por um bom tempo e sentiu um frio cortar seu peito de ponta à ponta. Por isso, a menina mordeu os beiços com certa força e suspirou antes de continuar.
— É isso, você... Você pode me mandar ir embora agora. — entortou o canto dos beiços em um sorriso sem humor e piscou os olhos algumas vezes.
O esfregou a têmpora com a ponta dos dedos e apoiou as mãos na cintura, sustentando o olhar contra o de que, por sua vez, pressionou seus dedos ao redor da alça de sua bolsa.
— Eu gostei da roupa. — Ele deu de ombros, apontando para o suéter azul, e se surpreendeu, virando o rosto de encontro à peça sobre o seu corpo. Em seguida, ela revirou os olhos e prendeu um lábio contra o outro, tentando conter um sorriso.
— É. Eu acho que tem um pedaço de você na forma como eu me visto, . — Dessa vez, foi quem deu de ombros, e arqueou as sobrancelhas. — Receba isso como um elogio. — Ela piscou um de seus olhos e o riu, passando o indicador pela parte debaixo do nariz.
Em seguida, sem pedir permissão, erradicou de vez a distância entre seus corpos e inclinou seu tronco para frente, a envolvendo em um abraço aconchegante.
custou reagir à sua ação, mas quando sentiu o aroma característico do perfume que ele costumava usar, suas pernas bambearam e ela enfim conseguiu responder ao seu abraço.
apertou a curva da cintura da garota com uma de suas mãos e, com a outra, acariciou sua nuca, causando à a sensação de que seus corpos se encaixavam tão perfeitamente como as roupas que estavam vestindo.
— Feliz aniversário. — Ela se colocou sobre a ponta de seus pés e sussurrou ao pé do ouvido dele. sorriu, fechando os olhos por poucos instantes.
— Obrigado por ter vindo. — Ele fez o mesmo e, então, afastou o rosto do dela e buscou por seus olhos. — Mesmo. — Proferiu, acariciando levemente a bochecha de , e ela sorriu, fechando os olhos quase que involuntariamente.
— Obrigada por não ter me mandado embora. — Ela disse, afagando a mão de , e ele balançou a cabeça de um lado para o outro. Em seguida, se afastou por completo e voltou a esconder suas mãos no bolso da calça.
— Como você está? — Ele se interessou em saber e soltou um suspiro exausto, enquanto seus olhos assistiam os movimentos de ao fechar a porta do apartamento.
— Bem, eu estou... Bem. — Ela rebateu, forçando um sorriso em seus lábios, e fez o mesmo. — E você?
— Eu estou... Melhor. — O suspirou, guardando as mãos nos bolsos de sua calça. sorriu com leveza.
Nos segundos seguintes, virou o rosto para baixo e assistiu em silêncio enquanto ela procurava por algo dentro da sua bolsa.
— Eu trouxe um presente para você! — Disse, animada, estendendo uma pequena caixa preta na direção de .
Surpreso, ele franziu o cenho e tomou o objeto das mãos da menina que, por sua vez, mordeu os beiços em um semblante sacana.
Quando abriu a caixinha e fitou o objeto dentro dela, arregalou os olhos e ergueu seu rosto em direção ao de mais uma vez.
— Eu achei a sua cara. — A deu de ombros e sorriu, pegando em suas mãos o anel prateado com o design de uma rosa no topo.
— Isso é a minha cara. — Ele proferiu, animado, encaixando o anel no dedo anelar de sua mão direita. — Obrigado, . — Disse, e a balançou a cabeça de um lado para o outro.
! — O casal foi então interrompido pela voz de Sarah e, em um movimento involuntário, se virou em direção ao som e encontrou não só ela, como também Mitch, Geórgia e Léo com semblantes animados em seus rostos.
, por sua vez, sorriu, e antes mesmo que tivesse tempo de dizer algo, a sentiu Sarah envolvê-la em um abraço carinhoso.
— Fico feliz que tenha vindo. — A melhor amiga de proferiu, acariciando o rosto de e depois voltando o seu corpo de frente para o amigo que, por sua vez, estreitou o olhar contra o dela.
Sarah, no entanto, deu de ombro e — ao passo que se afastou de para que os outros pudessem cumprimentá-la — se aproximou de em passos leves.
— Por que é que eu tenho a impressão de que você sabia que isso ia acontecer? — Ele questionou, visivelmente desconfiado, e Sarah entortou os lábios, parecendo em dúvida.
— Gostou do seu presente, ? — A rebateu com outra pergunta e uma expressão marota nasceu em seu rosto enquanto o rapaz revirava os olhos.
Em um movimento involuntário, a atenção de se voltou para e ele a viu sorrir de orelha a orelha enquanto era abraçada por Mitch e Adam ao mesmo tempo. De repente, sentiu aquela sensação dolorosamente prazerosa bater contra as paredes de seu estômago e um riso involuntário saltou pelos seus lábios.
— Ela é o meu melhor presente. — Ele confessou, voltando seu olhar para Sarah, que sorriu, animada, antes de envolvê-lo em um abraço.

Capítulo Seis

“Now that we are over as the loving kind, we'll be dreaming ways to keep the good alive”
John Mayer, Friends, Lovers or Nothing

Narrador Avulso


— Você tem mil e um talentos, , mas desenhista não é um deles.— Sarah proferiu com os olhos cravados no desenho do amigo, feito na lousa em sua frente.
Foi bastante perceptível para os convidados que, depois da chegada de , havia conseguido de fato “se soltar”. Sua expressão corporal parecia bem mais aliviada e confortável, enquanto o sorriso largo que atenuava ainda mais suas covinhas parecia não querer sair dali.
Depois da metade da festa — quando boa parte dos conhecidos de já tinham ido embora —, o pequeno grupo de amigos decidiu se reunir no aconchegante espaço da sala de estar de Sarah e se subdividiu em outros dois grupos menores, com uma única intenção competitiva: jogar imagem e ação. já tinha tido uma experiência fracassada contra e Geórgia em Amsterdã e, por isso, tomou a decisão de se juntar aos irmãos, enquanto Adam, Mitch e Sarah formavam a outra equipe, e Léo assumia o papel de juiz do jogo.
— Fala sério! Não está tão ruim. — riu, olhando para o desenho que ele mesmo tinha tentado fazer de um stormtrooper*.
— Não, claro que não. — Sarah se manifestou, atraindo a atenção de todos para si. — Eu diria inclusive que a Monalisa precisa ficar esperta. Essa sua versão abstrata de um stormtrooper é realmente uma ameaça. — Ela deu de ombros, fazendo os outros rirem, enquanto revirava os olhos teatralmente.
— Se vocês não conseguem compreender a minha arte, eu não posso fazer nada. — Ele proferiu, lançando o pincel azul sobre a mesa de centro e se sentando ao lado de em seguida.
se aconchegou no sofá, e em um gesto corriqueiro, apoiou sua mão esquerda sobre a coxa da menina e seus dedos deslizaram por entre as pernas dela em um movimento um tanto quanto inconsciente. , no entanto, observou suas ações em silêncio e mordeu o beiço, tentando conter o sorriso quando sentiu o polegar de acariciar sua pele.
Só ela saberia dizer o quanto tinha sentido falta desses pequenos sinais de afeto vindos dele.
— Ah, tudo bem, senhor “artista incompreendido”, — Adam fez aspas com os dedos e voltou a rolar seus olhos. Porém, dessa vez, o não conseguiu se conter, e um riso frouxo acabou saltando por seus lábios. — Por que você não canta para a gente? — Ele questionou com as sobrancelhas arqueadas e desviou o olhar para o chão.
Sem pensar, retirou sua mão de cima da perna de e entrelaçou seus dedos uns nos outros antes de balançar a cabeça na negativa.
— Eu não acho que seria uma boa ideia. — Ele deu de ombros, mordendo os cantos internos de sua boca, e seu amigo franziu o cenho, sem entender.
— E por que não? — Foi Mitch quem perguntou, atraindo a atenção dos outros para si.
— Porque eu já tomei algumas cervejas e…
— Ah, fala sério! — Sarah esbravejou, jogando a cabeça para trás. — Você tomou duas cervejas, . E isso nunca te impediu antes. — Ela proferiu e reagiu com indiferença.
— Só uma música! — Geórgia se manifestou, puxando a atenção do irmão para si. — Nós já estamos todos um pouco bêbados, nem vai fazer diferença. — Ela deu de ombros e, enquanto os outros concordaram com sua fala, balançando a cabeça na afirmativa, achou graça.
— Não. Eu não…
— Eu acho que você deveria. — o interrompeu e, em um ato involuntário, virou o seu rosto em direção ao da menina. Sem entender, ele franziu o cenho. — Eu parei para pensar e eu nunca te ouvi cantar. — A deu de ombros e sorriu, envergonhado, desviando o olhar do dela. — Já te vi fotografar, escrever e até compor! Mas nunca te ouvi cantar e eu acho que já está mais do que na hora de mudar isso. — Proferiu, cutucando a região da cintura do rapaz, onde sabia que ele sentiria cócegas.
reagiu ao seu toque imobilizando o pulso de com os seus dedos, e então voltou o seu olhar de encontro ao dela.
— Por favor? — Seu tom de voz saiu aveludado e seus beiços formaram um bico em um semblante bastante infantil. , por conseguinte, a soltou e respirou fundo, esfregando os olhos com o dorso das mãos.
— Agora ele vai. — Adam proferiu em um tom de voz quase que inaudível e arqueou as sobrancelhas, lançando um olhar assustador para o amigo, que deu de ombros.
— Cale a boca, Adam! — Sarah o repreendeu, desferindo um tapa na nuca do amigo, que resmungou de dor.
— Se você não cantar, eu vou. E eu tenho certeza de que esse é um dos poucos talentos que não temos em comum, irmãozinho. — Geórgia voltou a se manifestar enquanto Leonardo a aconchegava sobre seu colo e os outros achavam graça.
— Tá certo. Uma música. — se deu por vencido e gesticulou para que Mitch o entregasse o violão estrategicamente deixado no canto da sala. mordeu os lábios, animada, e arrumou a sua postura sobre o sofá, a fim de ficar de frente para o rapaz.
apoiou o instrumento sobre suas pernas e fixou o seu olhar na bagunça espalhada em cima da mesa de centro, enquanto dedilhava algumas notas e os olhos o observavam em silêncio absoluto. O tentou pensar em uma música fácil e sem importância, que pudesse dar aos seus amigos o que eles queriam, no entanto, todo o seu vasto catálogo musical pareceu propositalmente desaparecer e uma única opção surgiu em sua mente.
— Eu… Eu fui pego um pouco desprevenido. Obrigado por isso. — Ele lançou um olhar para Adam, que sorriu e, em seguida, ergueu a garrafa de cerveja em suas mãos em direção ao amigo. riu e balançou a cabeça de um lado para o outro, passando o indicador pelo nariz antes de continuar. — Eu não tenho nada preparado, mas tem uma música que eu particularmente gosto muito e, ultimamente, ela tem dito mais sobre mim do que eu gostaria que dissesse. — Ele riu, esfregando os olhos com o dorso da mão e a passando pelos cabelos logo depois. — Enfim, eu… Eu espero que gostem. — disse antes de começar a dedilhar as primeiras notas da tal música.

I gotta a girl crush
(Eu tenho uma queda por uma garota)
Hate to admit it but
(Odeio admitir isso, mas)
I gotta a heart rush
(Eu tenho um coração acelerado)
Ain’t slowin’ down
(que não se acalma)


Durante o primeiro verso, a voz de saiu aveludada e ele fixou o seu olhar em um ponto qualquer, tentando fingir que aquela era só mais uma das vezes que ele se trancava no quarto e perdia noção do tempo tocando uma de suas músicas favoritas.
Por mais que estivesse acostumado a tocar e cantar na frente de boa parte das pessoas ali, a escolha que tinha feito em relação à música tornava isso um pouco mais difícil, sabendo que a razão para isso estava sentada ao seu lado.

I gotta it real bad
(Eu tenho uma queda muito séria)
Want everything she has
(Eu quero tudo que ela tem)
That smile and that midnight laugh
(Aquele sorriso, aquela risada da meia-noite)
She’s giving you now
(Que ela está dando a você agora)


Dois dias depois da sua última conversa com , foi — mais uma vez — pego de surpresa por Arthur parado na porta de sua casa.
Como da primeira vez, ouviu a campainha e, crente de que seria Geórgia e Léo chegando para conhecer sua mãe e Éric, ele não hesitou antes de atender a porta. No entanto, foi quase que impossível não se aturdir com a presença do (ex) noivo de ali.
Até então, não fazia ideia de que os dois estavam conversando, quem dirá combinando de se encontrar em horários propícios para um jantar de casal. não soube reagir ao que estava acontecendo e, quando perguntado sobre , se embaralhou com suas palavras até ser interrompido pela própria vestindo um vestido preto básico, mas suficientemente capaz de causar um arrepio assombroso na nuca de .
Ela, no entanto, tentou se manter indiferente à situação e as únicas palavras que trocou com antes de ir ao encontro de Arthur foram pedindo para ele avisar à Vitória sobre sua saída. O garoto, por sua vez, concordou com o seu pedido e aproveitou a oportunidade para se desculpar com o outro por conta do desentendimento naquele dia no palácio.
Não que ele achasse que Arthur não tenha merecido aquele soco. Para , ele merecia muito mais. Mas agir por impulso e partir para a violência não era algo comum em , e ele acabou se sentindo na obrigação de deixar isso claro.
Em seguida, os dois deram às costas a e os olhos do rapaz viram os dedos de se entrelaçarem aos de Arthur. Ela não parecia tão desconfortável como das outras vezes, e isso fez o peito de comprimir ao mínimo.
Talvez ela tivesse desistido de lutar contra a vontade de seus pais e decidido dar outra chance a Arthur. E isso vinha a ser muito provável, já que os dois estiveram juntos por tantos anos.
Naquele momento, estupidamente quis ser Arthur.
E é justamente sobre isso que ele estava cantando agora.

I don’t get no sleep
(Eu não durmo)
I don’t get no peace
(Eu não tenho paz)
Thinking about her
(Pensando nela)
Under your bed sheets
(Sob os seus lençóis)


Girl crush não é exatamente um tipo de música que se dedica à alguém que gosta. Muito pelo contrário. Em cada verso da letra, a pessoa canta sobre desejar estar no lugar de outro alguém. Porque esse alguém possui a pessoa que você realmente gosta.
E depois daquele dia, para , esse alguém passou a ser Arthur.

The way that she’s whispering
(A maneira que ela está sussurrando)
The way that she’s pulling you in
(A maneira que ela está puxando você)
Lord knows I’ve tried
(Deus sabe que eu tentei)
I can’t get her of my mind
(Eu não consigo tirar ela da minha mente)


odiava invejar uma pessoa, ainda mais alguém tão baixo como Arthur, e por muitas vezes ele lutou para que isso não acontecesse. Mas era quase que impossível afastar esse sentimento ruim todas as vezes que desaparecia e ele imaginava mil e uma coisas. Entre elas, a risada cativante que ela soltava todas as vezes que achava algo engraçado ou até mesmo o beijo doce, seguido de um carinho leve na ponta do nariz.
Coisas essas que ela costumava fazer quando estava com ele.

I want her long blond hair
(Eu quero seu longo cabelo loiro)
I want her magic touch
(Eu quero o seu toque mágico)
Yeah, cause maybe then
(Sim, porque talvez então)
You’d want me just as much
(Você me queira o mesmo tanto)
I gotta a girl crush
(Eu tenho uma queda por uma garota)


Enquanto parecia avulso à realidade, emergido em cada uma das notas da canção. não conseguia desgrudar sua atenção dele e, de certa forma, cada pequena parte da letra fez tanto sentido para ela, quanto fazia para ele.
não precisou dizer nada além daquilo para que ela entendesse os motivos que o levaram a escolher justo aquela música naquele momento e isso, misturado com toda a confusão de sentimentos que vinha sentindo nos últimos dias, fizeram os seus olhos marejarem.
Em um movimento rápido, ela limpou uma lágrima teimosa que escorrera pela sua bochecha e Geórgia percebeu. A irmã lançou um olhar sugestivo para Sarah, que entortou os lábios em um sorriso leve, entendendo perfeitamente o que ela queria dizer e, em seguida, se soltou de Leonardo para se aproximar de .
Assim que sentiu os braços de Geórgia a envolverem em um abraço por trás, se sentiu um tanto quanto idiota por ter se emocionado, então sorriu e balançou a cabeça de um lado para o outro, enquanto assistia terminar sua apresentação improvisada.

Os Stormtroopers são a tropa de base do Império Galáctico no universo Star Wars.

[•••]


Depois que parou de cantar e todos entraram em uma conversa sobre músicas e artistas que gostariam de ver ao vivo um dia, usou a desculpa de que precisava ligar para uma amiga e se afastou do grupo.
Assim como fizera pouco antes dela aparecer na festa, se sentou no banco acolchoado colado à janela e abraçou as pernas. Ela apoiou o queixo sobre seus joelhos e observou a paisagem londrina enquanto sua mente viajava por tudo que vinha acontecendo em sua vida.
, por outro lado, tinha notado a mudança de comportamento de logo que terminou de cantar. A menina não brincava mais, seus sorrisos eram vagos e ela parecia bastante aérea ao assunto. Por isso, quando a viu quietinha e longe de seus amigos, não hesitou em encontrar um motivo qualquer para se aproximar.
— A Sarah não vai deixar você sair daqui sem provar esse bolo que ela comprou. — Ele proferiu, atraindo a atenção da menina para si, e arqueou as sobrancelhas. segurava um prato de plástico vermelho, com uma fatia razoável do bolo, e a menina riu, tomando o prato para si.
arruma a sua postura sobre o banco e apoiou seus pés no chão para que tivesse espaço suficiente para se sentar ao seu lado. E é exatamente o que ele fez.
A abaixou o rosto e, com o talher de plástico, começou a brincar com a massa do bolo enquanto entrelaçava os dedos de uma mão à outra e apoiava seus cotovelos sobre os joelhos, pensando na melhor maneira de quebrar aquele silêncio.
— Eu não estou com raiva de você.
Ele deu de ombros e virou seu rosto de encontro ao dele quase que instantaneamente. Sem entender, a franziu o cenho.
— Quando você chegou, você disse que eu estava com raiva de você. Mas isso não é verdade, . Muito pelo contrário. — Disse, voltando sua atenção para ela, e um riso leve escapou pelos lábios da menina.
Por conseguinte, aprumou a sua postura, passou a mão pelos cabelos e respirou fundo antes de continuar.
— Depois de toda aquela loucura de gravidez, eu percebi que se continuássemos como estávamos, eu estaria te colocando em risco. — Ele deu de ombros e balançou a cabeça de um lado para o outro.

— Não. Me deixa falar. — pediu e a prontamente se calou. — Aquele resultado deu negativo, mas e se não desse? E se seu pai tivesse visto o que eu fiz durante aquele jantar? E se ele descobrisse sobre a gente? — Ele enumerou várias possibilidades e insistiu em chacoalhar a cabeça na negativa.
— O resultado deu negativo, e ele não descobriria. — Ela proferiu, e quando percebeu que fazia menção para rebater, se apressou. — Mas eu entendo o que você fez. Eu entendo e agradeço.
disse com um sorriso singelo no rosto e entortou levemente os cantos de seus beiços.
— Só que você não me coloca em risco, . Você me protege da maioria deles. — Disse, e, em um movimento quase que involuntário, apoiou sua mão sobre as do garoto e acariciou suavemente sua pele.
Um silêncio aconchegante tomou conta da situação e entrelaçou seus dedos aos dela.
— Como estão as coisas com os seus pais? — Ele questionou depois de alguns segundos tentando processar o que estava acontecendo. — E com o… Arthur? — umedeceu a garganta assim que proferiu o nome do garoto e achou graça.
— Com os meus pais está tudo bem. Eles pretendem ficar aqui mais do que eu imaginei que ficariam, mas… Isso é uma coisa boa, apesar dos pesares. — Ela deu de ombros e balançou a cabeça na afirmativa. — E sobre o Arthur, nós não estamos juntos. Se é o que você está pensando. — A cerrou os olhos e reagiu na defensiva, o que a fez rir.
O arregalou os olhos e de repente a possibilidade de ter entendido o recado por trás da letra de girl crush pareceu cada vez real. Além do mais, cantar essa música era quase como ler o seu diário pessoal na frente de algumas pessoas, e era uma menina inteligente. Não precisaria de muito para ela ligar uma situação à outra.
— Eu não… não…
— Eu sei que você viu a gente junto naquele dia e eu sei o que pareceu aquilo. Mas não era um encontro. — Ela garantiu com um semblante um tanto quanto engraçado no rosto. — Aquela foi só mais uma das tentativas do meu pai de me reaproximar do Arthur, não importa quantas vezes eu diga que não tenho interesse em fazer isso acontecer. — deu de ombros e coçou a têmpora com a ponta dos dedos.
— E deu certo? — O se interessou em saber e a menina riu, negando com a cabeça.
— Se tivesse dado, eu provavelmente estaria em casa fazendo papel de idiota enquanto ele tentava a sorte com uma inglesa siliconada em um pub qualquer. — Proferiu, surpreendendo que, por sua vez, elevou as sobrancelhas, embasbacado. — Não vai dar certo, . Nunca deu. — Ela deu de ombros mais uma vez e um sorriso sem humor surgiu no rosto do garoto.
— Eu sinto muito por isso, . Mesmo.
— Não sinta, isso não me afeta. — Garantiu e então seu semblante mudou como mágica. ergueu sua postura, mordeu os cantos internos da boca e respirou fundo antes de continuar. — Brigar com você me afeta. — Confessou.
, por sua vez, soltou um longo suspiro, se sentindo culpado pela situação, fechou os olhos por alguns instantes e esfregou a têmpora com a ponta dos dedos. Em seguida, ele passou a mão cheia de anéis pelos cabelos e virou seu corpo, ficando frente a frente com .
— Me desculpa se eu fiz parecer que estava com raiva de você. — Ele mordeu os beiços, visivelmente nervoso, e um riso leve escapou pela boca de .
— Eu não quero me afastar de você, . — Ela deu de ombros, com um sorriso franco nos lábios. — Eu aguento qualquer coisa. Aguento o chato do Arthur e os comentários do meu pai, mas ficar sem você… Isso eu não consigo. Pelo menos não agora. — Disse, balançando a cabeça de um lado para o outro e riu. — Você foi a melhor coisa que me aconteceu nos últimos meses e eu sei que quando voltarmos ao normal, o seu egocentrismo insuportável vai jogar isso na minha cara, mas… — fez uma breve pausa entre as palavras quando ouviu emitir o som esquisito que ele comumente provocava quando tentava segurar o riso, mas não conseguia. — É verdade. — Proferiu por fim.
— Nós podemos continuar sendo amigos. — sugeriu e franziu o cenho.
— Eu pensei que já fôssemos amigos. — Ela rebateu e o garoto revirou os olhos, entediado.
— Sendo amigos, bonitinha.
Era quase impossível conter o sorriso ao ouvir a chamar daquela forma. Durante os últimos dias, umas das poucas coisas que pedia era para ouvir a combinação perfeita entre aquele apelido insolente e o sotaque insuportável do rapaz.
E agora lá estava ele, a chamando de bonitinha como se nada tivesse mudado entre os dois.
— Só amigos está ótimo. — Seu tom de voz saiu suave e praticamente inaudível.
Não que isso fosse exatamente verdade.
não queria ser amiga de e vice versa, mas ambos precisavam aprender a jogar com as cartas sobre a mesa, e se ,amizade fosse a única opção disponível… Que fosse isso.
Por conseguinte, a abaixou o rosto e encarou o prato com o pedaço de bolo em suas mãos enquanto o silêncio voltava a tomar conta da situação. Segundos depois, devolveu sua atenção para e decidiu acabar de vez com a tensão entre eles.
— O seu rosto está sujo. — Ela proferiu simplesmente e, em um ato reflexo, levou uma de suas mãos à sua bochecha.
— Onde?
— Aqui, olha.
Em um movimento rápido, encheu a mão de bolo e o passou por boa parte do rosto de , sem nem que ele tivesse tempo de defesa.
Estupefato, o se manteve estático por alguns instantes e a menina gargalhou ao vê-lo usar o indicador para afastar de sua testa uma mecha suja com um pouco de glacê.
— Eu vou te dar três segundos de vantagem. — Ele disse sem nem sequer olhá-la, e levou a mão ao estômago, tentando controlar o riso.
— Para quê?
— Para correr, bonitinha. — deu de ombros, finalmente erguendo o seu rosto de encontro ao dela outra vez.
— Ah, não, . Nã-não. — choramingou, tentando não rir do semblante inexpressivo no rosto do amigo.
— Um… Dois…
— Que inferno! — Ela resmungou entre risos e, em segundos, se colocou de pé e começou a correr pelo apartamento de Sarah. Sem entender, os outros assistiam a cena, confusos.
— Três! — esbravejou e então apertou os seus passos atrás da garota.
Não demorou muito para alcançá-la, e quando conseguiu, puxou por uma de suas mãos e a virou de frente para si. Ele segurou firmemente seus braços para imobilizá-la e se debateu, tentando ser forte o suficiente para conseguir se soltar.
— Me desculpa, me desculpa. — Ela choramingou, mas ignorou e, antes que conseguisse evitar, o rapaz colou a sua bochecha na dela e passou boa parte do bolo para o rosto da garota. — ! — esbravejou, irritada, e, em sequência, estapeou o peito de , o que o fez rir.
O , no entanto, envolveu a cintura da garota em um abraço amistoso e separou milimetricamente seus rostos um do outro. Com uma das mãos, ele afastou os fios bagunçados do rosto de e os risos de ambos desapareceram gradativamente.
A brasileira agarrou o tecido da blusa de e ele umedeceu os lábios com os olhos cravados na cor vermelha intacta sobre os beiços de . Seus corações dispararam em uma velocidade surreal e, em um movimento inconsciente, segurou o pescoço da garota, apoiando parte de sua mão contra a mandíbula dela.
sentiu um frio percorrer seu peito de uma extremidade à outra e então fechou os olhos, puxando todo ar que conseguia para dentro de seus pulmões.
— Só amigos, não é? — Ela mordeu os beiços e, em seguida, abriu os olhos para encontrar a expressão estupefata no rosto de .
Por impulso, ele a soltou e se afastou, dando poucos passos para trás. Envergonhado, apoiou uma de suas mãos na cintura e passou a outra pelos cabelos antes de voltar a olhá-la.
— Sim, claro. Só amigos.

Capítulo Sete

“Yes, there’s a chance that I’ve fallen quite hard over you.”

Landon Pigg, Falling in Love at a Coffee Shop


Holmes Chapel, 30 de agosto de 2020.

Chácara de Éric.



Holmes Chapel é um pequeno vilarejo localizado no noroeste da Inglaterra, a poucos quilômetros da famosa cidade de Manchester. Éric é dono de uma espécie de chácara gigantesca localizada na área rural da vila e eu — do jeito mais louco possível — não poderia estar me sentindo mais em casa.
Vivi pelo menos metade dos meus anos no interior de São Paulo, em uma daquelas cidades bem pequenas onde as pessoas têm o sotaque carregado e costumam se reunir no final da tarde para conversar sobre o dia que havia passado junto de uma xícara de café e uma fatia de bolo. Meus avós maternos eram donos de uma chácara bem menor do que essa aonde estava, mas quando observei a vista da varanda e me deparei com um imenso verde do campo, não consegui notar diferença alguma entre Holmes Chapel e a cidade onde eu — de certa forma — cresci. Além, é claro, do frio quase que insuportável que me obrigava a bater os dentes de maneira involuntária.
— E então... — A voz da minha host mom me tirou dos meus devaneios e, em um gesto inconsciente, virei meu tronco em direção ao som. Vitória mordia o lábio inferior e tinha as sobrancelhas arqueadas, em um semblante bastante animado, que me faz rir. — O que achou? — Ela questionou quando parou ao meu lado e apoiou suas mãos na proteção de madeira a nossa frente. Por conseguinte, me virei de volta à direção que prendia a minha atenção segundos antes e respirei fundo, passando as mãos pelos meus braços.
— É linda. Me lembra a casa dos meus avós. — Dei de ombros e Vitória sorriu, surpresa. — Eu só não imaginava que fosse tão grande. — Torci o meu nariz em uma expressão engraçada e a mulher ao meu lado riu.
— Imagine como eu me senti quando pisei nesse lugar pela primeira vez. — Ela suspirou e seu tom de voz me pareceu um tanto quanto nostálgico. Por isso, voltei o meu olhar para ela e franzi o cenho na esperança de que ela me contasse algo. — A realidade do Eric sempre foi muito diferente da minha, . — Proferiu e eu notei um sorriso torto em seus lábios.
— Vocês se conheceram aqui? — Questionei, curiosa, e Vitória balançou a cabeça na afirmativa.
— Na padaria onde eu trabalhei por muitos anos. Ele era cliente e, bom… Todo mundo começou a estranhar quando um jovem de posses começou a frequentar o estabelecimento todos os dias no mesmo horário. — Vitória torceu o nariz e eu achei graça. — Até que um dia ele criou coragem e me chamou para sair.
— E como foi? — Perguntei, apoiando a mão sob meu queixo bem como uma romântica assumida, assistindo a um clássico do cinema.
— Eu fui um pouco difícil demais, não nego. — Ela deu de ombros e um riso leve saltou pelos meus lábios. — O último relacionamento sério que eu tive foi com o pai do e você sabe como terminou. — Minha host mom suspirou e eu entortei levemente o canto esquerdo da minha boca. — Mas o Éric se mostrou totalmente diferente do John desde o primeiro segundo. Ele foi paciente, me deu todo o tempo que eu precisava e me respeitou em cada passo que demos.
— Um verdadeiro gentleman! — Esbravejei, arqueando minhas sobrancelhas.
— Ele é. — Vitória suspirou e eu vi um sorriso singelo brotar em seu rosto enquanto ela desviava momentaneamente o olhar do meu. — O se encantou por ele no momento em que conheceu esse lugar. Ele tinha um jeitão meio filho protetor, sabe? — Ela estreitou os olhos e eu achei graça. — Fomos só eu e ele por dezesseis anos, mas no instante em que ele veio à essa chácara, foi quase que impossível tirá-lo daqui.
Eu arqueei as minhas sobrancelhas e, em um gesto involuntário, virei o meu rosto de encontro à imensidão verde bem na minha frente. Não era difícil de se imaginar quais eram os motivos que faziam não querer sair desse lugar.
— Ele tinha uma amiguinha da escola e eles adoravam vir aqui, brincar com as ovelhas e montar nos cavalos como se estivessem presos em um…
— Filme antigo. — somos interrompidas pela voz inconfundível de e, por impulso, nos viramos de encontro à ele. — Eu me lembro.
Diferente das extravagâncias que ele costuma vestir em Londres, agora usava uma bandana vermelha ao redor de sua cabeça para prender seus cabelos cada vez maiores, um moletom básico preto e uma bermuda também preta, o que me fez questionar como era possível ele não estar sentindo frio, enquanto eu estava congelando.
— Mas alguém pode me explicar por que eu sou o assunto dessa conversa? — Ele estreitou os olhos da mesma forma que Vitória e escondeu as mãos dentro do bolso frontal do moletom.
— Sua mãe estava me contando como você é vendido. — Dou de ombros e arqueou as sobrancelhas enquanto minha host mom soltou uma leve gargalhada.
— Eu estava contando para como você gosta desse lugar e como isso influenciou no meu relacionamento com o Éric.
— É claro que sim. Eu precisava de algo para impressionar as garotas e essa chácara me pareceu perfeita para isso. Até porque, que menina não gosta de um cara que ama e respeita os animaizinhos? Principalmente se forem pequenos como as mini cabras que eles costumavam ter naquela época. — deu de ombros e eu me surpreendi.
Meu queixo caiu alguns centímetros e, em um movimento involuntário, deferi um tapa em seu braço, que o fez rir.
— O quê? — Ele questionou e eu revirei os meus olhos, cruzando os braços na frente do meu peito enquanto Vitória assistia a cena em silêncio. — Eu não era muito bonito na época. Precisei jogar com as cartas que me foram oferecidas.
— Então quer dizer que você usou a sua própria mãe para conseguir namorar, mocinho? — Minha host mom arqueou as sobrancelhas e respirou fundo.
— O importante é que deu tudo certo no final, dona Vitória. Eu consegui dar alguns beijinhos lá no celeiro e você conseguiu um marido perfeito. Todo mundo saiu ganhando. — Ele deu de ombros mais uma vez.
— Você é inexplicável, . — Proferoi atraindo sua atenção para mim.
— O que tem de inexplicável em um menino de 16 anos querendo beijar alguém, ? Eu estava no auge da minha puberdade! — O rebateu em sua defesa e eu achei graça, balançando minha cabeça de um lado para o outro.
Um silêncio breve tomou conta do ambiente e — de soslaio — vi me estudar dos pés à cabeça enquanto seus lábios estavam presos em uma linha tênue, um contra o outro. Isso fez com que um arrepio corresse por toda a extremidade da minha espinha e eu passei a mão pelo rosto, tentando disfarçar os efeitos que me causara.
— Que horas os seus pais chegam? — Ele questionou, me obrigando a olhá-lo.
— Só a noite. — Rebati, esfregando um de meus olhos. — Eles conseguiram um ingresso para The Lion King hoje, então devem pegar o último trem.
— E você não quis ir com eles? — Vitória atraiu minha atenção de volta para si e eu vi suas sobrancelhas arqueadas.
A proposta poderia até soar irrecusável, mas me trancar em um teatro por horas com meus pais e o insuportável do meu ex que parecia mais querido por eles do que eu mesma?
Não, obrigada.
Já bastava todos os encontros arranjados aos quais eu me submeti por raiva no período em que mal olhava na minha cara.
— Eu imaginei que você pudesse precisar de mim. — Menti, encolhendo os meu ombros e guardando minhas mãos no bolso traseiro da minha calça.

— Você podia ter me avisado, . poderia ter me ajudado com as crianças. — Vitória deu de ombros e, por impulso, me virei para . Seu rosto estava baixo, mas seus olhos cravados nos meus. Ele não esboçou nenhuma reação, então suspirei e voltei minha atenção para a minha host mom.
— Eu sei, mas…
— Tudo bem, querida. Eu entendo. — Ela me interrompeu, tocando gentilmente meu braço. — Mas da próxima vez, não se preocupe com isso, por favor. É da sua família que estamos falando. — Vitória sorriu e eu respirei fundo, balançando a minha cabeça na afirmativa.
A mulher, por conseguinte, desviou o olhar para o filho mais velho — que continuava parado e em silêncio ao nosso lado — e então voltou para mim, repetindo o ato algumas vezes.
— Você tem planos para hoje, meu filho? — Ela questionou, analisando de uma ponta à outra, e ele prendeu os lábios, negando com a cabeça.
— Nada além de compor e buscar Geórgia na estação em algumas horas. Por quê?
— Por que você não leva para conhecer a vila? — Vitória arqueou as sobrancelhas, animada, e eu me surpreendi. De soslaio, senti o olhar de queimar sobre mim como se esperasse a minha resposta. — Vocês poderiam dar um pulo na padaria. Tenho certeza de que Chelsea vai adorar ver você. — Proferiu e um sorriso torto surgiu no rosto de .
— Não acho que conhecer uma padaria esteja nos planos de para esse fim de semana, mãe. — Ele rebateu, coçando o canto interno do olho com a ponta de seu dedo.
— E por que não? — Arqueei as minhas sobrancelhas, atraindo a atenção dele para mim. — Se Vitória não precisa de ajuda com os pequenos, eu… Não tenho nada melhor programado para hoje. — Dei de ombros e um riso leve escapou pelos lábios de .
— Se você realmente não se importa…
— Ótimo! Vou ligar e avisar que vocês estão indo. — Tori o interrompeu com um semblante animado no rosto. — E vou aproveitar para fazer alguns pedidos, estou morrendo de saudade do pão de leite que a Chel faz. Você vai adorar, . — Ela proferiu por fim, piscando um de seus olhos para mim, e eu achei graça.
Involuntariamente, voltei minha atenção para , e seus olhos me fitaram com certa ansiedade. Mordi meus beiços em um gesto inconsciente e ele arqueou as sobrancelhas, escondendo suas mãos no bolso frontal de seu moletom.
— Vamos?
— Vamos.

Holmes Chapel, 30 de agosto de 2020.

W Mandeville Bakery.


Há alguns dias, eu e concordamos em sermos só amigos. Não sei ao certo como isso estava indo para ele, mas eu definitivamente estava me esforçando para não colocar tudo a perder. Precisava confessar que as coisas ficaram um pouco mais difíceis depois disso, acho que me acostumei com o que tínhamos — ainda que fosse um relacionamento torto e sem rótulos, nós tínhamos algo.
No entanto, em toda a minha vida, poucas pessoas me fizeram tão bem quanto . Sei que por diversas vezes chamei ele de arrogante, mas a sua arrogância era apenas um pequeno detalhe na imensidão de elogios que eu poderia fazer a . Então, entre todas as suas qualidades, eu me contento em mergulhar naquela que me mostra que é um excelente amigo desde que isso seja o suficiente para mantê-lo perto de mim.
Eu abriria mão dos beijos, dos encontros secretos e até mesmo dos passeios noturnos com as janelas do carro abertas. Mas dele não. Dele nunca.
— É estranho eu estar ansiosa para conhecer esse lugar? — Questionei no instante em que saltei do carro e me deparei com a fachada amarelada e detalhes na cor bordô da W Mandeville. , por sua vez, enrugou o cenho e me lançou um olhar confuso, tirando uma das mãos do bolso de seu moletom para conseguir abrir a porta do estabelecimento.
— É uma padaria, .
— Eu sei, mas não é uma padaria qualquer. — Dei de ombros, guardando minhas mãos dentro dos bolsos do sobretudo marrom que estava usando. — Esse lugar é importante para vocês e eu já ouvi muitas histórias sobre a rosquinha de canela que vende aí. Então, sim. Eu estou curiosa. — Disse por fim e riu.
Com a cabeça, o indicou o caminho que deveria seguir e eu passei a sua frente. O estabelecimento não era em nada diferente das padarias de bairro as quais eu estava acostumada. Existia uma vitrine de vidro e algumas prateleiras de madeira expondo tipos diversos de pães, seu chão quadriculado seguia a mesma paleta de cores presente na fachada, e poucas mesas estavam espalhadas pelo salão para aqueles clientes que desejassem saborear os seus pedidos ali mesmo.
O aroma, no entanto, é o que mais atraiu a minha atenção. Senti o cheiro forte de café misturado com o do pão recém saído do forno e isso mais uma vez me transportou para a casa dos meus avós lá no interior de São Paulo.
— Boa tarde. Como posso ajudá-los? — Um tom de voz feminino me despertou dos meus devaneios e eu abri os olhos sem nem ao menos perceber que estavam fechados.
Em minha frente, me deparei com uma mulher de trinta e poucos anos, cabelos pretos presos em um coque perfeitamente alinhado no topo de sua cabeça, óculos de grau no rosto e um avental listrado protegendo boa parte do seu uniforme. Sua cabeça estava baixa, voltada para o pedaço de papel e a caneta em suas mãos.
— Oi! — se manifestou e fui assustadoramente pega de surpresa quando senti suas duas mãos pressionarem minha cintura e me puxarem para trás. Seu toque fez com que eu perdesse o ar por alguns segundos, mas me esforcei para que meu desespero não parecesse tão evidente. — A Chelsea está?
— A Chel… — antes de completar sua frase, a mulher ergueu o rosto para onde estávamos e arqueou as sobrancelhas no momento em que seus olhos focaram na figura de . — ?! Meu Deus, quanto tempo!
Ela esbravejou, guardando os objetos de suas mãos dentro do bolso de seu avental e o rapaz ao meu lado sorriu. Em silêncio, vi os dois se entregarem a um abraço carinhoso.
— Você está enorme, rapaz! O que aconteceu com os seus cachinhos? — Ela questionou, fixando seu olhar nos cabelos de presos pelo tecido da bandana vermelha. riu.
— Ainda estão aqui. Só um pouco mais tímidos do que você está acostumada. — Ele deu de ombros, guardando as mãos no bolso frontal de seu moletom e um sorriso torto escapou pelos meus lábios.
— A Chelsea vai enlouquecer quando descobrir que você está aqui. — A mulher sorriu, balançando a cabeça de um lado para o outro, e eu vi puxar todo o ar que conseguia para dentro de seus pulmões.
— Quando eu descobrir que quem está aqui?
Os dois foram interrompidos por uma voz doce e, por instinto, a mulher em nossa frente se deslocou para o lado, e nos fundos da padaria encontrei uma senhora de aproximadamente setenta anos, parada no batente da porta que separava o salão da cozinha.
? — Seu tom de voz saiu ainda mais alto e riu. Por conseguinte, o ao meu lado caminhou até a senhora em passos largos e com os braços abertos, pronto para recebê-la em um abraço.
Continuei em silêncio, mas não consegui evitar o sorriso que surgiu em meus lábios ao assistir a cena. se curvou sobre a mulher — que deveria ter no máximo um e cinquenta e cinco de altura —, envolveu seus braços ao redor dos dela e balançou seus corpos de um lado para o outro, como um pêndulo de relógio.
De soslaio, vi que a mulher de antes estava com os olhos cravados em mim. Por consequência, virei meu rosto de encontro ao dela e, com a cabeça, ela gesticulou para que eu me aproximasse de e da outra senhora. Não sabia ao certo se isso é exatamente o que eu deveria fazer, então mordi o meu lábio inferior e hesitei, dando pequenos passos tímidos em direção aos dois.
— Você quer me matar do coração? — A mulher resmungou no instante que se afastou. — Eu já estou velha para esse tipo de surpresa, garoto! — Ela deferiu um tapa sobre o braço do rapaz e eu vi um riso frouxo saltar pelos seus lábios.
— Foi ideia da dona Vitória! — O rebateu em sua defesa. — Eu pretendia ligar para informá-la que o homem mais bonito que você conhece está em Holmes Chapel. — Ele deu de ombros e a senhora em sua frente revirou os olhos, enojada, o que me fez rir. — Mas minha mãe não podia esperar para comer os benditos pães de leite.
— Tori sempre foi a maior fã dos meus quitutes… — A senhora suspirou, arrumando os óculos em seu rosto enquanto afagava um de seus braços em um gesto de carinho e cuidado.
Involuntariamente, os cantos dos meus lábios se entortaram em um sorriso singelo e eu senti borboletas darem cambalhotas contra a parede do meu estômago quando notei o semblante leve e repleto de ternura no rosto do rapaz em minha frente.
— Eu já deixei tudo separado do jeito que ela gosta. Mas você não quer sentar e tomar um chocolate quente? Faz tempo que não conversamos. — Ela entortou levemente os lábios e suspirou.
— Talvez outro dia. Eu ainda quero mostrar um lugar da vila para . — Ele deu de ombros e pela primeira vez a senhora pareceu notar a minha presença.
? — Ela questionou, confusa, e eu achei graça quando virou o seu rosto de encontro ao meu. — E quem seria você, minha linda? — A mulher caminhou até mim e eu lancei um olhar rápido para .
coçou os poucos cabelos em sua nuca e me pareceu um tanto quanto incerto, além de envergonhado. Então, me preparei para respondê-la, mas fui prontamente interrompida pelo próprio, que atravessou a frente da senhora e se posicionou ao meu lado.
trabalha com a gente. — Sua voz vacilou e eu virei o meu rosto de encontro ao dele. fechou os olhos e balançou a cabeça de um lado para o outro, enquanto umedecia a garganta e passava a ponta do indicador pelo canto interno do olho.
Involuntariamente, voltei minha atenção para a mulher e ela arqueou as sobrancelhas, ao mesmo tempo que eu tentava não me abalar pela forma como tinha acabado de me apresentar.
— Ela é uma amiga. — Ele proferiu por fim e eu não consegui conter a ironia no sorriso que saltou pelos meus lábios.
— Uma amiga? — Chelsea questionou, ainda com as sobrancelhas erguidas, e eu dei de ombros.
— Como vai? — Forcei o meu melhor sorriso e dei um passo à frente, estendendo uma de minhas mãos em sua direção logo em seguida.
— Muito bem, querida. Obrigada. — Ela sorriu, apertando minha mão, e eu fiz o mesmo quando senti sua pele aveludada encostar na minha. — Você é muito bonita!
— Imagina! A senhora que é linda! — Esbravejei, com um sorriso grandioso em meus lábios, e a mulher suspirou, balançando a cabeça de um lado para o outro.
— Eu tento. Mas tenho certeza de que já tive momentos melhores. — Chelsea deu de ombros e eu achei graça. Em seguida, sua atenção voltou para e eu a vi prender os lábios em uma linha fina. — Você realmente vai me fazer essa desfeita e não deixar a sua amiga provar o melhor chocolate quente do Reino Unido? — Ela questionou e revirou os olhos.
— Chel…
— Venha, . Sente-se em um desses bancos, enquanto eu preparo um lanche para você. — A mulher sorriu, empurrando minha cintura em direção aos bancos de madeira posicionados à frente do balcão. Sem saber o que devia fazer, lancei um olhar para e ele respirou fundo, guardando suas mãos no bolso de seu moletom. — E você, rapazinho, se quiser se juntar a ela, ficarei feliz em preparar algo para você também. Caso contrário, vá dar uma volta e volte em trinta minutos. — Chel piscou um de seus olhos e um riso frouxo saltou pelos lábios de .
— Você sempre me ganha pelo cansaço, Chelsea. É impressionante.
Ele proferiu e a mulher achou graça. Em seguida, ela virou seu rosto de encontro ao meu e tornou a piscar um de seus olhos, o que me fez rir, enquanto apoiava parte do meu quadril sobre o banco de madeira.
— Acho que podemos ficar alguns minutos. — deu de ombros com os olhos cravados em mim e eu balancei a cabeça na afirmativa. — Mas, por favor… O que quer que você for fazer, faça para a viagem. O que eu quero mostrar para ela significa muito e é importante que façamos isso antes do anoitecer.
— E o que é? — Franzi o meu cenho, curiosa, e respirou fundo, se sentando no banco ao meu lado.
— Você vai ver quando chegarmos lá, bonitinha. — Ele deu de ombros e eu rolei os meus olhos com certa impaciência.
— Tudo bem, eu me contento com isso. — Chelsea se manifestou, puxando nossas atenções de volta para si. — Fiquem à vontade. Eu já volto. — A senhora proferiu por fim e um sorriso simpático surgiu em meus beiços ao passo que a vi desaparecer pela porta que ligava a área onde estávamos à cozinha.

[•••]

Narrador Avulso


Fazia quase dez minutos que Chelsea havia deixado os dois sozinhos para preparar algo com todo o capricho e simplicidade aos quais já estava acostumado. Enquanto isso, se forçou a manter toda sua atenção presa no aparelho celular sobre o balcão de madeira, ao passo que evitava a qualquer custo erguer seu rosto de encontro a .
Era inegável para que tinha se chateado pela maneira estúpida que ele escolheu apresentá-la à Chelsea. Agora — com um braço apoiado sobre o balcão e parte do peso de seu corpo apoiado sobre ele — o garoto tentava entender por quais motivos a palavra amiga pareceu lutar tanto para não sair por seus lábios em um primeiro momento.
Quando sentiu o olhar do rapaz queimar sobre sua pele, se remexe sobre o banco e limpou a garganta, ao mesmo tempo que agarrou o celular com suas mãos e começou a tamborilar os dedos sobre a tela. , por outro lado, deixou um riso frouxo surgir em seu rosto e desviou a atenção dela por alguns segundos.
— Me desculpe. Eu sou um idiota. — Ele suspirou.
— Você é um idiota. — balançou a cabeça na afirmativa, com os olhos arregalados, e achou graça.
Em seguida, a ergueu o olhar de encontro ao dele e voltou a largar o celular sobre a bancada enquanto o semblante no rosto de mudava por completo.
— Mas por que diz isso agora? — Ela questionou, com os olhos cerrados, e o a encarou com uma expressão de tédio no rosto. — O quê?
— Você sabe por quê.
— Não. Eu não… Não consigo pensar em nada que…
Assim que viu rolar os olhos, se viu obrigada a prender os lábios em uma linha fina para que um sorriso sacana não conseguisse saltar pela sua boca e acabar com toda aquela encenação barata.
— Por você ter me apresentado para Chelsea como alguém que trabalha para a sua família? — A jovem arqueou as sobrancelhas e os olhos de voltaram a fitar a entrada do estabelecimento. — Não tem problema, eu sou mesmo. Alguém que trabalha para a sua família.
— Não, você não é. — proferiu, quase que atropelando as palavras da menina.
Em um movimento rápido, saltou do banco onde estava sentado e deu um passo largo para frente, se aproximando ainda mais de . Embasbacada, a menina arregalou os olhos e umedeceu sua garganta assim que sentiu os músculos de seu corpo arquearem e um calafrio cortar seu peito de uma ponta a outra por conta da ação brusca de .
— Você não é isso. Não para mim. E eu sei que você sabe do que eu estou falando. — Disse, tomando a mão da garota para si e a envolvendo entre seus dedos. — Eu deveria ter dito que você é minha amiga.
— Você disse isso. — Um sorriso sem humor surgiu no rosto de e ela desviou o olhar do de por alguns instantes.
— Eu deveria ter dito isso logo de cara. — O deu de ombros e então mordeu os beiços, enquanto observava a figura envergonhada da garota a sua frente.
— Não tem importância, . Mesmo. — rebateu, levando o seu olhar de encontro ao dele mais uma vez, e suspirou.
Em um movimento inconsciente, o rapaz acariciou a mão da menina com o seu polegar e a levou até seus lábios, depositando um beijo carinhoso sobre a pele aveludada de . Ela, por conseguinte, sentiu seu peito palpitar com aquele movimento inesperado e, por impulso, puxou sua mão de volta para si.
— Por que não deixamos isso de lado e você me conta mais sobre a Chelsea? — A questionou, umedecendo a garganta e passando as mãos pelos cabelos emaranhados, em um gesto notável de nervosismo. ri.
— Certo. A Chelsea… — o fez uma breve pausa, enquanto varria o ambiente com os olhos e deixava que as lembranças viessem à tona em sua cabeça. — Ela é o mais perto que eu tive de uma avó até conhecer Sophia.
deu de ombros, voltando sua atenção para , e ela ergueu as sobrancelhas.
— Meus avós maternos morreram quando eu ainda era muito pequeno, então eu tenho poucas lembranças deles. Mas desde sempre me lembro do cuidado e do carinho que Chelsea tem por mim. Acho que acabei projetando nela essa imagem. — Ele sorriu, entrelaçando os dedos de uma mão nos da outra. — E, fala sério, olhe para ela! Essa mulher tem cara de avó! — esbravejou, fazendo gargalhar.
— Ela tem.
— Mas ela não é. — proferiu e soltou um riso leve assim que viu o semblante desconecto no rosto da menina. — Chelsea não é avó. Ela não tem netos, ou filhos. Então, da mesma forma que ela fez esse papel na minha vida, eu também fui o mais perto de um neto que ela já chegou a ter. Bom, eu e aqueles três pestinhas que você conhece muito bem. — deu de ombros, passando a ponta do indicador pelo canto interno do olho, e achou graça.
— Vitória sempre me contou sobre ela como uma mãe mesmo. — A suspirou, desviando momentaneamente a atenção de . — Ela me disse que costumava te trazer para o trabalho, até que você fez dezesseis anos e começou a ajudar no caixa. — sorriu e arqueou as sobrancelhas.
— E eu era ótimo nisso! — Ele esbravejou, fazendo a garota rir. — Eu dava trocos como mais ninguém nessa padaria. Talvez esse seja mais um dos meus dons. — Seu tom de voz saiu carregado de modéstia e revirou os olhos, enojada. riu. — Essa era a nossa família.
O deu de ombros com um sorriso nostálgico no rosto e os lábios de se curvaram levemente.
— Nós passávamos o dia inteiro aqui, mesmo se não tivesse movimento. Era aconchegante, sabe? — cerrou os olhos e balançou a cabeça quase que instantaneamente. — E a Chel realmente me tratava como um neto. Ela me mimava na maior parte do tempo, mas puxava a minha orelha sempre que necessário e me envergonhava muitas vezes beliscando a minha bunda na frente das pessoas.
— Ela o quê? — questionou com os olhos arregalados e um riso frouxo saltou pelos lábios de .
— Beliscava a minha bunda na frente das pessoas, em sua maioria clientes? Sim. — Ele rebateu e deixou um riso escapar quando viu o semblante embasbacado no rosto da garota.
— Eu beliscava mesmo. E ainda belisco. — A voz de Chelsea se fez presente e, em seguida, sentiu uma leve pressão em seu quadril.
— Ah, meu Deus!
Envergonhado, o garoto sorriu e saltou para frente, erradicando a distância entre o seu corpo e o de . Involuntariamente, apoiou sua mão sobre a perna da menina para tentar manter o equilíbrio e ela tocou seu braço. Chelsea achou graça.
— Que tipo de avó não faz isso? — Ela questionou e lançou um sorriso para , que entendeu aquilo como um “eu não disse?” — Aqui está, querida.
Chelsea estendeu o copo em suas mãos para e a sorriu sem mostrar os dentes, em um agradecimento silencioso. , por sua vez, se afastou de e suspirou, voltando sua atenção para a senhora ao seu lado.
— As coisas de vocês já estão prontas e eu acrescentei dois muffins de baunilha porque sei que são seus favoritos. — A mais velha proferiu, com os olhos fincados no rapaz.
— Você é a melhor, Chel. — Em seguida, inclinou seu corpo para frente, tocou o braço de Chelsea em gesto de afeto e depositou um beijo carinhoso na bochecha da mulher. A mulher, por consequência, fechou os olhos quando sentiu o cheiro do perfume preso a pele de e levou uma de suas mãos ao rosto do garoto.
— Eu senti tanto a sua falta, meu filho. — Chelsea proferiu assim que se afastou.— Quando você vai conseguir uma folga dessa sua caça ao tesouro para passar alguns dias aqui com a gente? — Ela questionou com os olhos semicerrados, apertando as bochechas de entre suas mãos e balançando o rosto do rapaz de um lado para o outro. Ele, por sua vez, soltou um sorriso e deixou um suspiro escapar, tocando os punhos da adorável senhora e os forçando para baixo.
Nos instantes seguintes, puxou uma boa porção de ar para dentro de seus pulmões e lançou um olhar divertido para que, por consequência, riu.
— Eu acho que isso está mais perto de acontecer do que você imagina, Chel. — O deu de ombros e, sem entender, a mulher revezou seu olhar entre e a menina ao seu lado. — Eu tenho algumas coisas para resolver até o fim de setembro e, infelizmente, não poderei ficar na vila depois da festa, mas garanto que estarei de volta antes mesmo que você sinta a minha falta. — pressionou um lábio contra o outro em uma linha fina e Chelsea franziu o cenho.
— Do que você está falando?
— Eu estou falando, querida Chelsea… — o fez uma pausa entre suas palavras, voltou sua atenção para e estendeu uma de suas mãos para ela. O olhar sugestivo em seu rosto fez com que a garota entrelaçasse seus dedos aos dele e saltasse do banco onde estava sentada. — Que a minha caça ao tesouro chegou ao fim. — Ele proferiu, por fim, encolhendo os seus ombros.
— Então quer dizer que…
— Que eu conheci o meu pai? Sim. E ele é um babaca. — A leveza com que proferiu aquelas palavras fizeram revirar os olhos de maneira divertida e deixar um riso esvair por seus beiços. — Mas o que importa é que eu ganhei mais uma avó e uma irmã que é assustadoramente a minha cara. Acho que você vai gostar de conhecê-las. — Ele deu de ombros e Chelsea arqueou as sobrancelhas, surpresa. — Só que isso vai ter que ser assunto para um próximo encontro, porque eu e já estamos atrasados. — Em seguida, voltou a se curvar sobre a figura embasbacada da senhora em sua frente e deferiu outro beijo carinhoso em sua bochecha.
Logo depois, puxou pela mão e os dois passaram por Chelsea, seguindo o caminho que os levaria a saída da padaria. A mulher, por sua vez, levou breves instantes para processar o que tinha acabado de ouvir — até porque, por muitos anos, ela acompanhou de perto essa aventura de em busca da família paterna — e, quando conseguiu, piscou os olhos diversas vezes seguidas e virou seu corpo em direção ao casal.
— O quê? Não, espera. , volte aqui agora! — Ela esbravejou no momento em que pareceu recobrar a consciência, e o garoto riu, tomando em sua mão livre a sacola com todas as encomendas que tinham sido feitas por Vitória.
— Em outro momento, Chel! Eu prometo! — Ele rebateu, empurrando a porta de vidro com a lateral de seu corpo, e Chelsea suspirou, frustrada. , por sua vez, virou seu tronco em direção a senhora e achou graça do semblante em seu rosto.
— Foi um prazer conhecê-la, Chelsea! Obrigada pelo chocolate.

[•••]



— Chelsea tinha razão. Esse é mesmo o melhor chocolate quente que eu já tomei aqui. — proferiu, atraindo a minha atenção.
Por impulso, desviei os olhos da estrada em minha frente e a vi passar a língua pelos lábios sujos, enquanto a ponta dos dedos limpavam os pontos inalcançáveis. Sem perceber, um sorriso saltou pelos meus beiços e virou o rosto de encontro ao meu.
— Ela é um amor. — Disse e automaticamente balancei a minha cabeça na afirmativa, concordando com sua frase. Por conseguinte, suspirou e voltou a sua atenção para o caminho em nossa frente. — Parabéns, . Você está cercado por mulheres incríveis. — Ela deu de ombros e um riso frouxo saltou pela minha boca quase que instantaneamente.
Por mais que parecesse indiferente àquilo, sabia exatamente o que esperava ouvir de mim. Então, voltei o meu olhar para a estrada e revirei os olhos, balançando a cabeça de um lado para o outro, e, em seguida, devolvi minha atenção para a ao meu lado.
— Eu sei disso.
Em um movimento rápido, soltei uma de minhas mãos do volante e apoiei sobre a coxa de . Seus olhos acompanharam os meus dedos, que escorregaram por entre suas pernas e apertaram — com uma força quase nula — seu músculo, enquanto meu polegar acariciava sua pele coberta pelo tecido da calça que usava.
Pelo sorriso que saltou de seus lábios, tenho certeza de que entendia o que estava tentando dizer sem que nenhuma palavra escapasse pela minha boca. Assim como minha irmã, minhas avós, minha mãe e Sarah, também fazia parte do vasto grupo de mulheres incríveis as quais eu tinha sorte de ter na minha vida.
Como amiga…. É claro.
Quando esse pensamento me recorreu, no entanto, senti meus lábios ressecarem e voltei minha atenção para a estrada quase que instantaneamente. Umedeci a minha garganta e um frio prazerosamente incômodo — o qual eu já deveria estar acostumado a essa altura do campeonato — cortou o meu peito de uma extremidade à outra no momento em que senti as pontas dos dedos dela tocarem os meus com certa delicadeza.
— Não acredito que você realmente está usando esse anel. — Ela proferiu, brincando com o anel de rosa preso ao meu dedo anelar, e franzi o meu cenho.
— Você pensou que eu não fosse usar? Por quê? — Questionei, lançando um olhar rápido para ela, e deu de ombros.
Em seguida, senti o seu toque esvair da minha pele e de soslaio a vi suspirar, enquanto apoiava parte do braço sobre a janela do carro. Me questionei quais eram as coisas que estavam passando pela sua cabeça naquele exato momento, mas tentei ignorar boa parte dos meus pensamentos e puxei minha mão de volta para mim.
De repente, um silêncio de vozes tomou conta da situação e a única coisa que consegui ouvir foi o barulho causado pela velocidade das rodas do carro em atrito com o asfalto, misturado com o ruído do vento que atravessava a janela e, é claro, o ritmo leve da música que tocava no rádio em um volume não muito alto.
Relaxei a minha postura sobre o banco e apertei as minhas mãos ao redor do volante, enquanto meus pensamentos viajavam sem rumo dentro da minha cabeça. Por um segundo, cheguei até a esquecer que estava ao meu lado, mas fui logo resgatado dos meus devaneios quando senti sua mão deferir um tapa leve em meu colo.
— Ei! Para que isso? — Esbravejei com os olhos arregalados, virando o meu rosto de encontro ao dela.
, no entanto, não parecia se importar com a minha reação. Sua atenção estava voltada para uma outra área da estrada e meus olhos seguiram os seus. fitava — com certo encantamento — o imenso campo a alguns metros de distância de onde estávamos, tingido de uma ponta a outra pela cor amarela.
— O que é aquilo? — Ela me olhou de soslaio e imediatamente me lembrei de quando eu era mais novo e precisava passar por essa estrada para ir da escola à chácara e essa mesma infinitude amarela chamava a minha atenção.
— É uma fazenda de girassol. — Disse, fitando o lugar que segundos depois desapareceu atrás das pedras que surgiam ao passarmos por uma curva.
— Eu não… Não sabia que existia isso aqui.
— Existe. E é bem antiga na verdade. Se eu não me engano, pertence à uma das primeiras famílias de Holmes Chapel.
Lancei um olhar rápido para e o semblante embasbacado em seu rosto me fez rir.
— Dizem que pertencia a um casal de canadenses que se mudou para o Reino Unido e, pelo que parece, a mulher não estava muito feliz com isso. — Enruguei o meu nariz e interrompi momentaneamente as minhas palavras quando ouvi rir. — E, como os girassóis são uma flor muito comum no noroeste do Canadá, o homem decidiu espalhar sementes por todos os terrenos possíveis, para que elas pudessem florescer e a mulher que ele amava pudesse se sentir em casa. Parece meio história brega de cidade pequena, mas… Faz sentido. Plantações como essas não são muito comuns por aqui.
Em um movimento inconsciente, voltei minha atenção para e a encontrei com as sobrancelhas arqueadas.
— Imagina alguém te amar tanto ao ponto de plantar hectares e mais hectares da sua flor favorita só para te deixar feliz.
Seu olhar me pareceu distante e eu a vi balançar a cabeça de um lado para o outro como se estivesse envolvida em algum tipo de conversa inconsciente.
— Você sabe o que girassóis significam, ?
Ela me questionou, voltando — abruptamente — sua atenção para mim. Em resposta, balancei a cabeça na negativa.
Felicidade, basicamente. Suas cores podem significar coisas como lealdade e entusiasmo, mas no geral se trata da felicidade puramente dita. — deu de ombros, com os olhos cravados na estrada, e um sorriso bobo entortou levemente meus lábios.
— Também é a sua flor favorita, não é? — Um riso breve saltou pela sua boca ao mesmo tempo que a sua testa se franziu, formando uma linha tênue entre as suas sobrancelhas.
— É óbvio que sim. Qual a graça da rosa vermelha quando comparada à um girassol? — Ela arqueou as sobrancelhas, levando os seus olhos de encontro aos meus, e eu achei graça do semblante em seu rosto.
— Nenhuma, bonitinha. — Rebati, balançando minha cabeça de um lado para o outro enquanto apertava ainda mais meus dedos em volta do volante.
— Exatamente. Nenhuma. — Ela encolheu os ombros, apoiando novamente parte do seu braço sobre a janela do carro.
— Vamos fazer o seguinte… Se tivermos tempo antes de voltarmos para Londres, eu posso te trazer para visitar a fazenda. Acho que Éric conhece alguns dos funcionários e entrar lá não seria um problema.
— Você está falando sério? — questionou com os olhos arregalados sobre mim.
— É claro que sim, .
— Você teria dificuldades em me tirar de lá. — Ela riu, balançando o rosto de um lado para o outro e, sem entender, franzi o cenho. — Eu sou curiosa, ! Você sabe disso. Se nós visitarmos esse lugar, eu vou querer conhecer cada canto dele, entender como ele funciona, tirar todas as minhas dúvidas, descobrir se a história que você tentou me contar realmente aconteceu e, de quebra, ainda abusaria do seu talento como fotógrafo. Mas eu não acho que você estaria disposto a perder uma tarde inteira tirando fotos minhas e me ouvindo tagarelar sobre a heliotropia* dos girassóis. — deu de ombros, mordendo o canto interno de suas bochechas, ao passo que encolhia suas pernas sobre o banco do carro.
Involuntariamente, sorri como um idiota preso à um filme de romance daqueles que costumam passar na televisão depois do almoço, e pensei que — nesse exato momento — passar uma tarde inteira tirando fotos de e ouvindo-a falar sobre as coisas que gosta é exatamente o que eu mais queria fazer.
— Não tem problema, bonitinha. Você sabe que eu amo fotografar e, quanto à sua mania de falar frivolamente, não se preocupe. Eu já estou acostumado, depois dos cinco primeiros minutos eu desligo e não ouço mais uma palavra sequer.
Dei de ombros e virei o meu rosto de encontro ao dela. Vi o queixo de cair alguns centímetros e — segundos depois — ela ergueu uma de suas mãos, me mostrando o dedo do meio, o que me fez gargalhar.
— Idiota. — A ao meu lado rolou os olhos enquanto balançava a cabeça de um lado para o outro, e eu voltei a minha atenção para a estrada. — Ei! Essa música me lembra você! — Ela proferiu um tanto quanto animada e eu franzi o meu cenho, olhando de soslaio para o rádio acoplado ao carro.
Vi os dedos de girarem o botão na intenção de aumentar o volume e levei alguns segundos para reconhecer a música. No entanto, assim que ouvi as primeiras batidas, me recordei das noites em claro que eu e meus amigos viramos em algum karaokê. Classic por MKTO era uma das favoritas de Adam.
Sem entender, enruguei a minha testa — deixando que uma linha tênue surgisse entre as minhas sobrancelhas — e um sorriso confuso surgiu nos meus lábios, ao passo que eu voltei a arrumar a minha postura sobre o banco.
— Por que, exatamente? — Lancei um olhar rápido para e ela deu de ombros.
— Você vai ver. — Seguindo o ritmo da melodia, os dedos de tamborilavam sobre seus joelhos e, em seguida, ouvi sua voz cantar cada uma daquelas palavras, seguindo a fio a letra da canção.
Soltei um riso quando a vi mexer ambas as mãos em círculos perfeitos e arqueei as sobrancelhas no instante em que voltou sua atenção para mim, proferiu a frase you´re never going out of style (você nunca vai sair de moda) e piscou um de seus olhos. A partir desse momento, o que até agora era uma viagem simples de carro, se tornou um show simples e privado da personalidade excêntrica e carismática de .
Seu corpo remexeu de um jeito desengonçado sobre a poltrona do carro enquanto ela fingia segurar um microfone com uma de suas mãos. Os dedos da mão livre voltaram a batucar sobre sua perna e vez ou outra olhava para mim, indicando partes específicas da música. A leveza no semblante em seu rosto me fazia rir como um bobo incurável e, por mais desafinado que seu tom de voz soasse, eu poderia jurar que nada era mais agradável aos meus ouvidos do que aquilo.
Nesse instante, notei que meus dedos também estavam tamborilando as batidas da bendita música sobre o volante do carro, e, involuntariamente, meu corpo entrou no compasso daquela dança ridícula. Passei a mão pelos meus cabelos assim que senti borboletas baterem freneticamente as asas contra as paredes do meu estômago e me dei por vencido, balançando a cabeça de um lado para o outro.
É quando permiti admitir para mim mesmo que estava apaixonado pela , e nada do mundo parecia ser maior do que isso.

*Heliotropia trata-se da capacidade que os girassóis apresentam de girar o caule, posicionando a flor na direção do sol durante a fase de amadurecimento. Quando o talo da planta deixa de crescer, esse processo é interrompido e o girassol fica parado em direção ao oriente até morrer.

Capítulo Oito

“If we’re not friends, someone else might love you too.”

Ed Sheeran, Friends.


Holmes Chapel, 30 de agosto de 2020.
Twemlow Viaduct

Narrador Avulso


— Estou começando a achar que você me trouxe a um galpão abandonado e pretende me matar. — mordeu os beiços enquanto cobria seus olhos com as mãos e a guiava em direção ao seu destino.
Por consequência, rolou os olhos, inclinou seu corpo para frente — permitindo que as costas da garota batessem contra o seu corpo — e deixando seus lábios rentes ao ouvido de .
— Eu já tive oportunidades melhores para isso, bonitinha. — Seu tom de voz sacana arqueou os pelos de e ela umedeceu a garganta em um gesto notável de nervosismo, que acabou fazendo rir. — Fique tranquila. Chegamos.
Em seguida, descobriu a vista da garota e afagou seus braços em um gesto carinhoso. Desconfiada, hesitou em abrir os olhos.
— Seja bem-vinda ao meu lugar favorito em Holmes Chapel! — Ele esbravejou, abrindo os braços para o alto. Nesse momento, a curiosidade de acabou falando mais alto e a decidiu, por fim, abrir os olhos.
Quando o fez, franziu o cenho e uma linha tênue surgiu entre suas sobrancelhas ao encontrar nada além de um imenso campo verde, cortado de uma ponta a outra por uma construção visivelmente antiga.
— Um… Viaduto?
Notavelmente confusa, virou o seu rosto de encontro a . Por consequência, o balançou a cabeça na afirmativa, com um sorriso de orelha a orelha nos lábios.
— O seu lugar favorito é um viaduto desativado? — A questionou com as sobrancelhas arqueadas e rolou os olhos.
— Não é um viaduto desativado, bonitinha. Vem, me deixe te mostrar uma coisa. — Proferiu e, antes que tivesse tempo de reagir, a puxou pela mão e os dois começaram a correr pelo campo, diminuindo gradativamente a distância até a imensa construção de concreto.
gargalhava como uma criança, sentindo seus pés correrem quase que por impulso, e parou de puxá-la no momento em que os dois alcançaram o viaduto, ficando sob um de seus arcos.
Ofegante, curvou seu tronco para frente e apoiou os braços sobre seus joelhos, tentando recuperar o ritmo normal de sua respiração.
— Eu definitivamente não tenho preparo físico para esse tipo de brincadeira. — A riu e, quando voltou a erguer sua postura, encontrou sentado na grama, com as costas e a cabeça apoiadas contra uma das pilastras da construção. — O que você…? — Absorta, não chegou a completar sua pergunta.
Por impulso, a seguiu o olhar de e se surpreendeu ao ver a parede de tijolos completamente rabiscada por diversas palavras, entre elas, o nome de bem no topo.
— Você quem fez isso? — Ela questionou com as sobrancelhas arqueadas.
— O meu nome sim. — O rebateu, com os olhos fixos na marca de pedra que ele mesmo tinha deixado ali.
Involuntariamente, sorriu e, nos segundos seguintes, se sentou ao lado de . Os dois permaneceram calados por um bom tempo, até que a mordeu o lábio inferior e virou o seu rosto de encontro a .
No entanto, ele quem quebrou o silêncio primeiro.
— Quando eu ainda era pequeno, eu soube que queria entreter as pessoas. Eu era meio exibido… — Ele fez uma pausa entre as palavras, deixando um riso torto saltar por seus lábios, e rolou os olhos, fazendo o mesmo, ao mesmo tempo que voltou sua atenção para a parede em sua frente. — E tinha o costume de ouvir as músicas das minhas primas no segundo andar e fingir tocar guitarra de frente para o espelho do meu quarto.
proferiu, soltando um longo suspiro enquanto seus dedos brincavam com a grama no chão. , por sua vez, apoiou a cabeça contra os tijolos da pilastra e fechou os olhos, tentando visualizar a cena descrita pelo garoto. Um riso escapou pela sua boca assim que ela lembrou do semblante sapeca no rosto de em boa parte das fotos antigas que Vitória tinha separado para a sua festa de casamento.
— Tudo começou aqui, . — O se manifestou, resgatando a garota de seus devaneios. Por impulso, voltou o seu olhar de encontro a . — Foi nessa cidade que eu me descobri como artista e decidi que era exatamente isso o que eu queria fazer pelo resto da minha vida.
deu de ombros e a menina ao seu lado entortou os cantos dos lábios em um sorriso singelo, ao mesmo tempo que uma de suas mãos envolveu a de sobre a grama, em um movimento irreflexo. O rapaz sorriu e seus dedos começaram a brincar com os de quase que instantaneamente.
— Não sei dizer o que eu tinha na cabeça quando escrevi o meu nome ali, mas acho que foi o jeito que encontrei de me lembrar que essa vila é o meu lugar no mundo e não importa o quanto a minha vida mude… Em Holmes Chapel eu sempre vou ser o que costumava trabalhar em uma padaria. — proferiu, voltando sua atenção para .
O silêncio de vozes voltou a se fazer presente e retardou alguns segundos para absorver a história de , presa a cor dos olhos e ao perfume adocicado do rapaz. Assim que se deu conta, voltou a sua atenção para frente e desfez o sorriso em seus lábios, balançando a cabeça de um lado para o outro.
— Por que você me trouxe aqui, ? — O seu tom de voz saiu praticamente inaudível e enrugou o cenho, confuso. voltou a rir. — Eu já te conheço o suficiente para saber que você não começa com esses papos nostálgicos sem motivo. O que aconteceu? — olhou para de soslaio e o suspirou, deixando um riso breve saltar por seus lábios.
— Eu quero te dizer uma coisa. — rebateu, sem olhar para .
Com essas seis palavras, sentiu seu peito comprimir gradativamente e, de repente, o ar pareceu ter certa dificuldade para alcançar seus pulmões. Uma sensação desagradável invadiu seu corpo através do frio gelado que lhe cortou a espinha e a garota mordeu os beiços, tentando disfarçar a ansiedade que lhe afligia.
Não existiam motivos plausíveis que pudessem explicar a forma que seu corpo reagiu àquela simples frase, mas desde a última vez que decidira por si só se afastar sem uma razão concreta, temia que isso pudesse vir a acontecer novamente.
Por favor, não seja isso. — A conversava consigo mesmo, enquanto umedecia a garganta e pensava que não existia uma cena mais clichê do que essa: quando dois personagens do filme se encontram em um lugar aberto, com uma paisagem magnífica durante o pôr do sol e ali conversam sobre o seu futuro. Juntos ou separados.
— Você se lembra do Jeff? Ele estava no meu aniversário e…— A voz de resgatou de seus devaneios.
Com o susto, voltou o seu rosto de encontro a em um movimento abrupto e o franziu o cenho, sem entender. Segundos depois, ela balançou a cabeça na afirmativa e confirmou se lembrar de Jeff, mesmo sem ter tido um contato direto com ele.
— Bom, ele é meio que… Meu empresário? — O semblante desordenado no rosto do rapaz fez rir involuntariamente e, de repente, o nervosismo que parecia assombrá-la minutos atrás, desapareceu. — Enfim, ele conseguiu um show para mim em Manchester. Não é muita coisa, mas…
! — esbravejou e prontamente se calou, arregalando os olhos em direção à menina. — Você está de brincadeira? — Ela questionou e negou com a cabeça enquanto pressionava um lábio contra o outro para conter o riso ao ver o semblante embasbacado no rosto da garota. — Quando?
— Em um mês, mais ou menos. — encolheu os ombros e voltou sua atenção para a parede rabiscada em sua frente. — Eu não acho que muitas pessoas vão aparecer. — Confessou e um sorriso leve surgiu nos lábios de .
Por impulso, a voltou a tocar a mão de e seus dedos apertaram a pele do rapaz com certa pressão. Atônito, olhou para as suas mãos conectadas e, em seguida, ergueu o seu rosto de encontro a .
— Eu com certeza vou estar lá. Na primeira fila. Mesmo se mais ninguém for. — Ela garantiu, sem hesitar, e demorou a reagir.
Seus olhos se prenderam na cor dos dela e suas mãos formigaram quase que na mesma intensidade que as batidas descompassadas de seu coração. De repente, o brilho que reluzia o gloss sobre os lábios da garota se tornou a coisa mais atrativa ali e a vontade de beijá-la parecera incontrolável.
, no entanto, umedeceu a garganta e lutou fortemente para conseguir ser mais forte que os desejos de seu corpo. Por conseguinte, desviou o olhar de e balançou a cabeça de um lado para, enquanto deixava um riso frouxo escapar e afastava sua mão da dela em um movimento brusco que a surpreendeu.
— É uma merda que tenhamos feito esse acordo de amizade. — Confessou, fazendo o coração da garota tamborilar em seu peito. — Nós estamos quebrando uma tradição muito antiga. — Ele encolheu os ombros e entrelaçou os dedos de uma mão em outra.
— Do que… Do que você está falando? — Um sorriso confuso surgiu no rosto de e ela olhou em volta, como se isso pudesse lhe dar alguma resposta.
— Você sabe… Dois amigos, sentados embaixo de uma árvore… — instigou, olhando para a menina de soslaio, e arqueou as sobrancelhas.
— Eu tenho quase certeza de que estamos sentados embaixo de concreto puro. — Ela rebateu, enrugando o semblante em seu rosto, e riu. Dessa vez, foi ele quem envolveu a mão da menina com seus dedos.
— Eu sei. — O tom aveludado na voz de fez com que um calafrio cortasse o peito de , e ela respirou fundo enquanto tentava controlar as borboletas em seu estômago.
— A ideia foi sua, garotão. — tentou soar o mais brincalhona possível, empurrando levemente o braço de , e um riso breve surgiu no rosto do rapaz.
— É. E eu vou tentar não estragar isso. — Proferiu por fim, passando a ponta de seu indicador pelo canto interno de seu olho e voltando sua atenção para logo em seguida. Por consequência, sentiu seu peito comprimir como se algo estivesse apertando o seu coração e reduzindo-o ao mínimo.
No entanto, a chacoalhou a cabeça e se recusou a ceder para a aflição de um sentimento ruim. Assim, em um movimento rápido e impensável, envolveu o ombro de com um de seus braços, o puxou ainda mais para perto de si e o surpreendeu, depositando um beijo estalado em sua bochecha.
— Não é exatamente uma tradição, então não precisa necessariamente ser um beijo. — Ela balbuciou, mordendo levemente a pele de com a ponta de seus dentes, e o achou graça, apoiando sua mão sobre as pernas da garota.

Holmes Chapel, 30 de agosto de 2020.

Chácara de Éric.


— Agora eu sei por que Vitória fala tanto nessas rosquinhas. Eu vou precisar encomendar uma centena antes de voltarmos para Londres. — disse, rasgando mais um pedaço da massa doce e enfiando-o na boca em seguida.
— Por Deus, ! Se controle! — esbravejou, atraindo a atenção da garota para si e, imediatamente, se virou para olhá-lo. — Eu tenho medo do efeito que o açúcar pode causar no seu sangue. Nem os meus irmãos comem tanto doce assim e eles são… Crianças.
O deu de ombros, interrompeu os seus passos e guardou as mãos no bolso frontal de seu moletom. , por outro lado, cerrou os olhos e mais uma vez mostrou o dedo do meio para , que jogou a cabeça para trás enquanto a caminhava de costas em direção à casa.
— Engraçadi…
— Thor, não! — Uma voz feminina esbravejou, atraindo a atenção dos dois, e quando virou o seu rosto em direção ao som, sentiu um peso de mais de trinta quilos empurrá-la para o lado.
A sentiu seu quadril bater contra o chão de grama e, sem entender o que tinha acontecido, olhou para as suas mãos raladas por tentarem amortecer a queda.
— Meu Deus, ! Você está bem? — questionou com as sobrancelhas arqueadas e a levou a sua atenção de encontro a ele. , por conseguinte, estendeu uma de suas mãos para ajudar a menina a se levantar.
— Eu acho que sim. Eu só… — Ainda atônita, passou as mãos pela calça suja e chacoalhou a cabeça de um lado para o outro. — O que aconteceu? — Ela questionou e riu, arrumando uma mecha do cabelo dela para trás de sua orelha.
— Pelo visto, não é só você e minha mãe que gostam dessas rosquinhas. — Ele deu de ombros e o olhar sugestivo em seu rosto fez com que virasse o seu tronco quase que instantaneamente.
Há uma distância mínima de onde estavam, encontra um labrador de pelagem clara devorando o resto de sua rosquinha. Surpresa, a arqueou as sobrancelhas e achou graça.
— Thor! — A mesma voz feminina de antes voltou a chamar a atenção do casal e, dessa vez, a figura de uma jovem de cabelos curtos e loiros surgiu dentro do campo de visão dos dois. — Me desculpem, é um pouco difícil controlá-lo quando se trata de comida. — Ela afagou a cabeça do animal e virou o seu corpo de frente para e , levando os seus olhos azuis de encontro aos da brasileira. — Você se machucou?
— Não, foi só um…
— Allie? — se manifestou e prontamente se calou.
A virou o seu rosto em direção ao de e o encontrou com as sobrancelhas arqueadas. Sua atenção voltou para a menina quase que instantaneamente e ela sorriu, estreitando os olhos. Foi quando os pensamentos de a levaram de volta para a noite em que ela ouviu aquele nome pela primeira vez.

Londres, 19 de julho de 2020.

Casa dos Carter.


— Eu posso te fazer uma pergunta? — questionou, apoiando o queixo sobre o peito nu de enquanto ele acariciava suas costas com a ponta dos dedos.
— Se for sobre tentarmos novas posições, eu acho que você ainda não está preparada. — Ele deu de ombros, abaixando o olhar em busca do dela, e revirou os olhos, enojada.
— Idiota.
— Isso não foi um não, bonitinha. Nós ainda vamos transar enlouquecidamente em todas as posições possíveis, por todos os cantos dessa casa. Eu prometo.
Proferiu, arrancando um riso involuntário do rosto de enquanto os seus dedos apertavam a curva de sua cintura.
— Eu só acho que você ainda precisa se acostumar com o sexo e se exercitar um pouco. Não sei se você teria fôlego o suficiente para uma cama Cleópatra* deu de ombros mais uma vez e arqueou as sobrancelhas.
! — Ela esbravejou, desferindo um tapa sobre o braço do rapaz, e ele gargalhou.
— Pergunta, linda. — Disse, depois de poucos segundos rindo da reação de , e a sentiu suas bochechas ruborizarem.
Envergonhada, desviou o olhar do dele e começou a contornar os traços da mariposa sobre o seu tórax, usando a ponta de seu dedo indicador.
…? — a chamou, um tanto quanto desconfiado, e a garota respirou fundo, voltando sua atenção para ele.
— Como foi a sua primeira vez? — Ela mordeu os beiços e se surpreendeu, erguendo as sobrancelhas.
— Você quer saber como eu… Como eu perdi a minha virgindade? — pareceu embasbacado e deu de ombros, balançando a cabeça na afirmativa logo em seguida.
— Se você quiser me contar… Eu ainda me sinto meio boba pela forma que reagi naquela noite lá em Amsterdã, mas acho que pode ser porque eu nunca cheguei a conversar com ninguém sobre isso. Talvez ajude ouvir de você. — Ela entortou o nariz e riu, passando a mão pelo cabelo da garota para afastar alguns fios rebeldes de seu rosto.
— Primeiro: você não foi nenhum pouco boba naquele dia. — O proferiu, aprumando sua postura sobre a cama enquanto puxava o corpo de junto de si. — Você era e ainda é bastante inexperiente, bonitinha. E isso é normal. Mas eu te garanto que mesmo assim, eu dificilmente trocaria o sexo que temos, e tenho certeza de que qualquer homem no meu lugar faria o mesmo.
— Não o Arthur. — Ela se manifestou e, dessa vez, foi quem revirou os olhos.
— Eu estou falando de homem de verdade. Esse aí é um imbecil. — rebateu e o semblante enrijecido em seu rosto fez rir. — Enfim, você não precisa e nem eu quero que você fique se preocupando com isso. — Disse, voltando a afagar os cabelos da garota, e, envergonhada, ela suspirou, mordendo o canto interno de suas bochechas.
— Eu sei. — Ela proferiu com os olhos cravados nos desenhos das tatuagens do rapaz.
— Então, olha para mim. — ordenou, tentando puxar o queixo de para si.

— Olha para mim, . — O insistiu e a garota revirou os olhos, virando o seu rosto de encontro ao dele a contragosto. — Você não tem motivos para se sentir insegura perto de mim, bonitinha. Eu já te disse isso algumas vezes e eu não me importo em dizer outras mais. — Ele deu de ombros e pressionou um lábio contra o outro enquanto tentava impedir um sorriso bobo.
— Eu sei disso. — Seu tom de voz aveludado fez sorrir, e, por consequência, o inclinou seu rosto em direção ao dela e selou seus lábios três vezes seguidas.
— Mas se mesmo assim você quiser que eu te conte sobre a minha primeira vez…
Ele cerrou os olhos , encolhendo os ombros, e balançou a cabeça na afirmativa, com um sorriso animado no rosto. então respirou fundo, colocou uma de suas mãos sob sua cabeça e encarou o teto, enquanto lembranças de alguns anos atrás cortavam seus pensamentos.
— Eu acho que eu tinha uns dezesseis anos e digamos que eu não estava na minha melhor fase. A puberdade não foi exatamente minha melhor amiga e o meu cabelo… Meu Deus do céu. — cobriu seus olhos com a mão e as covinhas surgiram em suas bochechas quando um riso envergonhado saltou pela sua boca.
— Com quem foi? — questionou, achando graça da reação do garoto, e tirou a mão de seu rosto, soltando um suspiro antes de continuar.
— Com uma namoradinha que eu tive lá em Holmes Chapel, a Allie. Ela foi o meu primeiro tudo: primeira namorada, primeiro beijo, primeira transa… — Proferiu, apertando ainda mais o corpo de contra o seu em um gesto inconsciente.
— Você também foi o primeiro…
— Fui. Por aí você já consegue imaginar o tesão que foi a minha primeira vez, eu mal sabia o que fazer! — Ele esbravejou, fazendo rir. — Mas não foi tão ruim. Eu estava apaixonado pela Allie, e acho que ela também estava por mim. Isso acabou falando mais alto.
— Você ainda tem contato com ela? — mordeu os beiços, sentindo seu coração estremecer com tal informação.
— Não. Nem ao menos me lembro da última vez que a vi. — Ele suspirou, voltando seu olhar para o teto.
— Você ainda sente alguma coisa por ela? — A voz da garota saiu quase que um sussurro e franziu o cenho.
— Por que a pergunta? — Ele questionou, baixando o seu rosto de encontro ao dela. deu de ombros e desviou o olhar do dele, voltando a contornar os traços de suas tatuagens com a ponta de seus dedos.
Um sorrisinho infantil dançou pelos lábios de e ele aconchegou ainda mais em seus braços, com a certeza de que ela estava fazendo um esforço sobre humano para parecer indiferente.
— De qualquer forma, a resposta é não. Ou eu, pelo menos, acho que não. — Disse, acariciando as costas de com a ponta de seus dedos. — Eu também era apaixonado pela Jennifer Aniston na época e isso não quer dizer muita coisa hoje.
O deu de ombros e a garota rolou os olhos, aninhando o seu corpo entre os braços dele.
— Você não precisa se preocupar com a Allie. Sabe disso, não é? — questionou, depois de alguns breves segundos em silêncio.
Surpresa, ergueu o seu rosto de encontro ao dele em um movimento um tanto quanto brusco e a careta em seu rosto o fez rir.
— E o que te faz pensar que eu me preocuparia com ela? Eu nem a conheço.
— Não sei. A possibilidade pode ter passado pela minha cabeça. — O deu de ombros, tentando conter o sorriso sacana em seus lábios, e rolou os olhos.
— Pois saiba que essa possibilidade não existe. — Ela rebateu e o semblante enrijecido em seu rosto fez rir.
— Tudo bem. Se você diz que não… — o fez uma breve pausa entre suas palavras, apertou ainda mais a curva da cintura de e, com um único impulso, colocou o seu corpo sobre o dela, apoiando todo o seu peso em seus joelhos. — … Eu acredito em você. — proferiu com certa indiferença e, em seguida, envolveu os punhos da menina em suas mãos e os imobilizou em cima da cabeça dela.
— O que você está fazendo? — Ela questionou, sem entender.
— Encerrando esse assunto e indo ao que realmente interessa: novas posições. piscou um de seus olhos e gargalhou, sentindo-o debruçar sobre si.

Cama Cleópatra é uma posição sexual onde o homem forma uma ponte com o próprio corpo enquanto a mulher se apoia sobre ele, no sentido contrário. Tal posição exige muita força física de ambos os envolvidos.

Holmes Chapel, 30 de agosto de 2020

— Como vai, ? — Allie questionou, tentando conter o sorriso em seus lábios.
— Bem e… Meu Deus!
observou o semblante embasbacado no rosto de dar lugar a um sorriso de orelha a orelha e, inconscientemente, a mordeu os lábios, sentindo suas bochechas queimarem ao ver o rapaz avançar sobre a loira para abraçá-la.
Então essa é a famosa Allie.
A primeira namorada, o primeiro beijo e a primeira transa do .
Que inferno, ela é mesmo bonita.

umedeceu a garganta enquanto estudava Allie dos pés à cabeça em um gesto totalmente impensado.
— Há quanto tempo eu não te vejo? Eu não sabia que estava em Holmes Chapel. — A voz de resgatou a garota de seus devaneios e ela chacoalhou a cabeça de um lado para o outro, tentando voltar a órbita.
Por conseguinte, seus olhos se fixaram à imagem de pressionando os braços de Allie com uma intensidade leve e carinhosa, bem como costumava fazer com ela, e isso faz seu estômago revirar.
— Eu trabalho aqui agora. Sou veterinária e cuido dos animais da chácara. — Allie proferiu e, surpreso, arqueou as sobrancelhas.
, por outro lado, revirou os olhos inconscientemente e cruzou os braços na frente de seu peito, ao passo que seus pensamentos gritaram: linda, inteligente e ama os animais. Que ótimo.
Entretanto, não demorou muito para que ela voltasse a balançar a cabeça na negativa e repreendesse a si mesma, se questionando em que momento de sua vida ela tinha se tornado a versão obsessiva de Taylor Swift no clipe de Blank Space.
— Eu estava treinando o Thor quando vocês chegaram e… Bom, você tem certeza de que está bem? — Allie questionou, desviando sua atenção para . Por impulso, girou o seu tronco em direção à menina e franziu o cenho ao vê-la notavelmente desligada e fora da realidade.
? — Ele a chamou, tocando suavemente seu braço, e a despertou, erguendo o seu rosto em um movimento brusco.
— O quê?
— O Thor machucou você? — A loira insistiu em saber e arregalou os olhos, desviou sua atenção para o animal e, por fim, negou com a cabeça.
— Imagina! Foi só um susto. — Ela rebateu, forçando o seu mais simpático sorriso, ao passo que escondia suas mãos suadas dentro dos bolsos traseiros de sua calça.
Em resposta, um sorriso gracioso surgiu nos lábios de Allie.
— Me deixem apresentar vocês! — esbravejou, animado, e respirou fundo. — Allie, essa é a . , essa é a…
— Allie! — A loira o interrompeu e estendeu uma de suas mãos para . — É um prazer conhecer você, . — Ela sorriu de orelha à orelha e a mordeu os cantos internos de sua boca, com os olhos cravados na mão da garota.
. — Disse, cumprimentando a ex de . — O prazer é todo meu.

Capítulo Nove

“I'm so chill but you make me jealous”
Taylor Swift, So It Goes.

Holmes Chapel, 01 de setembro de 2020.
Chácara dos Carters



— Finalmente! — Abri os meus braços assim que encontrei a figura de Malu do outro lado da porta e ela prendeu o riso, enquanto senti meu corpo envolver o seu em um abraço. — Estava começando a pensar que você me deixaria sozinha nessa. — Suspirei, estranhamente aliviada.
— Me desculpe, foi difícil dobrar os meus chefes nesse fim de semana. As crianças tiveram um campeonato ontem, e hoje é aniversário de um primo deles, mas eu disse que não ficaria e, bom… Se eu perder o meu emprego, a culpa é sua. Talvez exista um espacinho para mim na casa dos Carters. — Malu deu de ombros, me olhando dos pés à cabeça, e eu soltei um breve riso. — E eu sei que minha presença é essencial, mas você não estaria exatamente sozinha se eu não estivesse aqui. O que aconteceu com suas novas melhores amigas? — Ela cerrou os olhos e eu rolei os meus, entediada.
— Sarah e Georgia não são minhas novas melhores amigas, não seja boba. Elas são amigas do…
— Gostosão de sotaque sedutor. Eu sei. — Malu me interrompeu, se jogando sobre a cama, e mais uma vez me peguei revirando os olhos diante de seu comentário. — Onde ele está, por sinal? Confesso que estou curiosa para conhecê-lo de verdade.
— E-eu não sei. — Mordi os meus beiços e dei as costas à . Ela não pareceu se importar com a minha reação.
Segui em direção ao guarda-roupa — de onde retirei o vestido que pretendia usar nessa tarde — e, quando voltei minha atenção para Maria Luiza, a encontrei distraída com algum aplicativo em seu telefone.
— O que você acha? — Questionei e minha amiga demorou alguns segundos até levar seu olhar de encontro ao meu. Ela arqueou as sobrancelhas e seu queixo caiu alguns centímetros, o que me fez rir.
— Quem você pretende matar hoje? — Minha amiga saltou da cama, estupefata, e um riso nasalado escapou pelo meu nariz.
— Não tenho ninguém em mente. Ainda. — Dei de ombros e os lábios de Maria Luiza se curvaram em um sorriso malicioso. — Você acha que está bom?
— Você está brincando? Ele é perfeito! Me lembre de excluir todos os amigos em comuns que temos no Instagram porque, depois de hoje, eu definitivamente vou querer esse vestido emprestado. — Ela rebateu e eu respirei fundo.
Em seguida, virei meu corpo de frente para o espelho e coloquei a peça na minha frente. Para a festa de Éric e Vitória, escolhi um vestido azul Tiffany de cetim, com decote quadrado e comprimento que por poucos centímetros não alcançava os meus joelhos, além de ser sustentado por duas alças da grossura do meu indicador.
— Eu não sei… Você não o acha comprido demais? — Mordi os meus beiços e Malu me olhou com uma careta confusa.
— Você queria curto? — Ela piscou os olhos algumas vezes e eu dei de ombros. — Quem é você e o que aconteceu com a minha amiga?
— Eu não queria que fosse curto. — Retruquei, rolando os olhos. — Eu só queria que ele… Mostrasse um pouco mais. Mas, você sabe, meus pais nunca permitiriam isso. — Soltei um suspiro longo e joguei o vestido sobre a cama, voltando minha atenção para Malu em seguida.
— Entendo. E o tem alguma coisa a ver com esse seu desejo de mostrar um pouco mais de pele? — Minha amiga cerrou os olhos, desconfiada, e eu ergui minhas sobrancelhas.
— O quê? Não! — Um riso nervoso saltou pelos meus lábios enquanto balançava minha cabeça de um lado para o outro. — Isso não tem nada a ver com .
— Que bom. Porque, pelo que você me conta… — Maria Luiza fez uma pausa entre as palavras enquanto caminhava até mim, e eu umedeci minha garganta. —… Eu tenho certeza de que esse homem olharia para você até mesmo se você estivesse coberta por uma burca da cabeça aos pés. — Proferiu, afagando os meus cabelos, e eu achei graça.
— Eu não teria tanta certeza. — Disse, pensando em Allie. Em seguida, voltei minha atenção para Malu e a confusão em seu rosto fez com que eu respirasse fundo e revirasse meus olhos. — Uma ex-namorada dele trabalha aqui. Ela é veterinária e parece passar cada segundo dos dias dela perambulando por essa chácara. Ou usa isso como desculpa para ficar perto do … De qualquer forma, está funcionando. Eles não se desgrudam. — Dei de ombros e minha amiga arqueou uma das sobrancelhas.
— Em quanto disso você está exagerando?
— Eu não estou exagerando! — Esbravejei em minha defesa e ela riu. — Ontem mesmo eles levaram Helena para brincar com os animais. Você precisava ver, parecia cena de comercial de margarina.

Holmes Chapel, um dia antes.
Chácara dos Carters


Saltei da cama por volta das nove e meia, depois de passar bons quinze minutos encarando o teto de madeira do quarto onde estava. Fui até o banheiro, onde terminei de despertar, jogando uma boa quantidade de água gelada no meu rosto, e escovei os meus dentes. Encarei o meu reflexo no espelho e constatei que definitivamente já tive dias melhores, mas não me preocupei em usar maquiagem para esconder as marcas em meu rosto.
Não costumava trabalhar aos fins de semana e nem fui avisada se precisaria abrir mão da minha folga por conta dessa viagem, mas, mesmo assim, decidi checar as crianças e ver se precisam da minha ajuda em relação a algo.
Torci para que sim. Qualquer coisa que me ajudasse a evitar mais de cinco minutos sozinha com os meus pais era o suficiente. Minha família já estava há quase um mês na Inglaterra e eu tinha conseguido driblar o assunto “casamento” com certa maestria, mas sentia que a paciência do meu pai estava mais curta que o pavio de uma bomba prestes a estourar e temi que sua ignorância me amarrasse a Arthur a qualquer momento, sem que eu tivesse voz o suficiente para gritar por socorro.
Soltei um longo suspiro e tentei não pensar nisso… Por hora. Prendi os meus cabelos em um coque emaranhado no topo da minha cabeça e amarrei minha blusa com um nó alguns centímetros abaixo do meu peito. Em seguida, sai do quarto ainda de pijamas, sem me importar com meus pais hospedados no cômodo em frente ao meu, e Arthur no andar de baixo.
Segui em direção à cozinha enquanto protegia meus braços descobertos do vento gelado que cortava a minha pele. No meio do caminho, notei uma fresta na porta do quarto de Helena e acabei me surpreendendo quando não a encontrei lá. Sei que acordei um pouco tarde em relação ao horário que começo a trabalhar quando estamos em Londres, mas conhecia a minha criança e sabia que ela dificilmente despertava com facilidade antes das dez da manhã durante o fim de semana.
Estranhei sua ausência, mas mesmo assim tentei não dar importância. Afinal, estávamos em uma viagem de família e os Carters provavelmente fizeram planos aos quais não estava incluída.
Na cozinha, roubei um pedaço de pão de leite deixado dentro de uma cesta sobre a mesa de madeira e o segurei entre meus dentes enquanto buscava — dentro da geladeira — por algum líquido capaz de saciar a minha sede.
— Bom dia, querida.
No instante em que ouvi a voz de Vitória, me virei quase que por impulso. Arqueei as minhas sobrancelhas, surpresa, e me apressei para retirar parte do pedaço de pão preso à minha boca. Ela riu.
— Bom dia, Tóri. E me desculpe, eu não pensei que vocês estivessem em casa. — Disse, sentindo minhas bochechas corarem, ao passo que servia um pouco de suco de laranja no copo à minha frente. Sem entender, minha host mom franziu o cenho e eu dei de ombros. — Passei pelo quarto da Helena e não a encontrei. Também não estou ouvindo os gritos dos meninos, então imaginei que todos tinham saído.
— E saíram. Éric levou Oliver e Henry para a casa da minha sogra e Helena fez o maior escândalo porque queria ver os animais. — Ela suspirou, esfregando a têmpora, e eu deixei um riso saltar por meus lábios.
— Eu posso levá-la mais tarde. — Dei de ombros, bebericando um pouco do líquido no copo em minhas mãos.
— Não precisa. O já fez isso. — Minha host mom retrucou e eu arqueei minhas sobrancelhas, surpresa.
— O ? So... Sozinho? — Franzi o meu cenho, um tanto quanto confusa, e vi Tori estender um de seus braços, tentando alcançar a garrafa de café no centro da mesa.
— Não. Por coincidência, Allie estava aqui e se ofereceu para ir com eles.
— Ah… A Allie, é claro que sim. — Cruzei os meus braços na frente do meu peito e rolei os meus olhos quase que involuntariamente.
Levei o copo de vidro aos meus lábios mais uma vez e vi um risinho brincar nos lábios da mãe de , o que me fez acreditar que ela notara a repulsa em meu rosto ao ouvir o nome da ex de seu filho.
— Vocês já se conheceram? — Ela questionou e eu arregalei os meus olhos, largando o copo sobre a mesa. — Você e a Allie… — Vi Vitória cerrar os olhos, meio desconfiada, e umedeci minha garganta com o resto de suco que tinha na boca enquanto dava de ombros.
nos apresentou ontem, mas ainda não tive a chance de conhecê-la de verdade. — Forcei o meu melhor sorriso, ao passo que tentava impedir que comentários como “e nem faço questão de que isso aconteça” saíssem pelos meus lábios.
A verdade é que alcancei o auge da minha infantilidade. Eu nem ao menos sabia o sobrenome da Allie e criei uma barreira entre nós duas única e exclusivamente por saber que ela e namoraram. O que era ainda mais ridículo da minha parte.
Eu não tinha motivos para ter ciúmes de . Ainda mais agora que eu e ele éramos só amigos.
— Ela é uma menina adorável e tem um carinho muito grande pelo meu filho. era muito apegado a ela, até mesmo depois que nos mudamos para Londres. — Ela suspirou, fazendo uma breve pausa entre suas palavras. — Há muito tempo eu não via ele tocar no nome dela, espero que com essa viagem eles consigam retomar a amizade. — Vitória proferiu por fim, também pegando um dos pães de dentro da cesta.
Que merda é essa, Tóri? De que lado você está? — Meus pensamentos gritavam, mas eu balancei a minha cabeça de um lado para o outro e me apressei para afastá-los.
— Vamos torcer para que sim. — Retruquei, encolhendo os meus ombros.
— De qualquer forma, eu estou indo me encontrar com o Éric, e, se eu não me engano, seus pais saíram para conhecer a vila…
— Eles me disseram que fariam isso. — A interrompi com um sorriso leve e ela me retribuiu com outro.
— Você não precisa se preocupar com a Helena e acho que seu noivo ainda está dormindo. — Proferiu e, mais uma vez, revirei os olhos sem nem pensar na reação da minha host mom que, por acaso, acabou rindo. — Você está livre por hora, querida. Se quiser voltar a dormir ou se distrair com algo… Eu sei que não temos muitas opções aqui em Holmes Chapel, mas…
— Pode deixar que eu encontro algo para me entreter. — Um sorriso sincero saltou pelos meus lábios e Tóri balançou a cabeça na afirmativa. — Se vocês precisarem de algo, eu vou estar com o meu celular.
— Tudo bem. Obrigada, .
— Imagina. — Lancei mais um sorriso em sua direção e, em seguida, afastei o meu corpo da bancada de mármore onde estava encostada e me preparei para seguir o caminho de volta para o meu quarto.
No entanto, segundos depois ouvi minha host mom esbravejar o meu nome e virei o meu tronco de encontro à ela mais uma vez. Arqueei as minhas sobrancelhas, ansiosa, e a vi cerrar os olhos enquanto mordia os cantos internos de suas bochechas.
— Essa blusa é dele, não é? — Ela questionou, com os olhos cravados no tecido que cobria o meu peito e, num primeiro momento, franzi o meu cenho, sem entender seu comentário. — Do . Essa blusa que você está usando é dele, não é? Tenho a impressão de que já o vi usando algo muito parecido.
Arregalei os meus olhos e senti o meu coração diminuir gradativamente a frequência de seus batimentos. Por instinto, virei o meu rosto para baixo e encarei a estampa adorável de uma abelha rodeada pelos escritos “enjoy health, eat your honey”, ambos na cor azul.
Imediatamente me lembrei do dia em que convenci a me dar aquela blusa. Nós tínhamos acabado de passar mais uma noite juntos em seu quarto e as roupas que eu estava usando antes não eram exatamente confortáveis para dormir. Por mais que tivesse insistido na tese de que eu não precisava de roupa alguma para dormir na mesma cama que ele, eu acabei vencendo pelo cansaço e ele me emprestou a primeira blusa que encontrou em sua gaveta.
Que, no caso, era exatamente essa que estava usando agora.
No dia seguinte, quando acordamos e eu tinha que voltar para o meu quarto para me preparar para mais um dia com as crianças, eu até pensei em devolvê-la. Mas confesso que gostei do cheiro de baunilha impregnado naquele tecido e encontrei ali um jeito de estar sempre com — por mais que, até então, não tivéssemos motivos para estarmos longe um do outro.
Óbvio que soube disso no momento em que pedi para guardar a peça em meu guarda-roupa e seu ego inflado quase me fez desistir da ideia, mas consegui convencê-lo de que ele tinha incontáveis blusas estampadas guardadas em suas gavetas e que essa, em particular, tinha chamado a minha atenção. Então, de certa forma, ele não sentiria falta.
É claro que eu sabia que minha desculpa não era suficiente para convencê-lo do motivo real pelo qual eu queria aquela blusa, mas mentir ainda me parecia melhor do que passar pela humilhação de admitir para o cara com que eu estava transando que sim, eu queria ficar com a blusa, pois queria dormir e acordar sentindo o cheiro do shampoo de baunilha que ele usava nos cabelos.
Fechei os olhos com força e respirei fundo enquanto tentava ganhar tempo e pensar no que devia dizer à Vitória para conseguir escapar dessa armadilha, a qual eu mesma fui capaz de me enfiar.
— Deve ser porque ele tem uma igual. — Dei de ombros e mordi os beiços quando vi minha host mom franzir o cenho. — Eu o vi usando um dia e me encantei por essa estampa. Perguntei onde ele tinha comprado e, enfim, acabei comprando uma para mim. — Menti, aprumando minha postura, e Vitória arqueou as sobrancelhas.
Em seguida, notei um sorriso sacana sambando em seus lábios e senti minhas bochechas corarem.
Ela sabe.
Eu não sei ao certo o que, mas ela sabe.
Ou talvez ela não tenha certeza. Talvez seja só um achismo. E, como bem diz o ditado: sem corpo, sem crime.
— É de fato uma estampa agradável. — Proferiu, pressionando os beiços um contra o outro, e eu umedeci a minha garganta, passando a mão pelo meu rosto.
— Bom, eu vou… Vou voltar para o meu quarto. — Apontei para as escadas e minha host mom balançou a cabeça na afirmativa. — Com licença, Tori.
Disse, por fim, e antes que ela tivesse tempo de me enlaçar em mais uma de suas pegadinhas, me virei e apressei os meus passos enquanto cerrava os meus punhos e me culpava mentalmente por ser idiota ao ponto de usar essa blusa como pijama justamente hoje.

[•••]


Meus dedos tamborilavam sobre a minha perna enquanto pinçava meus lábios usando o indicador e o polegar de minha mão livre e chacoalhava a cabeça, tentando afastar qualquer ideia que me levasse a pensar no que e Allie poderiam estar fazendo há tanto tempo juntos.
Tentei me agarrar em Helena com a convicção de que jamais faria algo na frente de sua irmã mais nova, mas me preocupei com os flertes e as insinuações — armas que ele tanto gostava de usar e passariam facilmente despercebidas pela inocência de uma criança de quatro anos.
Depois da vergonha passada com Vitória, me escondi dentro do quarto e esperei por volta de quinze minutos até ter coragem de descer as escadas novamente. Substituí a maldita blusa por outra sem qualquer tipo de ligação com algum assunto proibido e me certifiquei de que Tori já havia saído.
Com a certeza de que estava sozinha — com exceção dos funcionários da chácara —, me sentei em uma das cadeiras de madeira, com almofadas vermelhas e estampa de flores brancas, e mais uma vez me peguei admirando a paisagem.
Pelo menos é o que qualquer pessoa que me visse pensaria.
Mas, na verdade, minha cabeça estava longe, e por algum motivo que ainda não conseguia entender, eu não conseguia tirar aqueles dois da cabeça. Mas que merda! Passei uma de minhas mãos pelo meu rosto, nervosa comigo mesma, e tentei me lembrar se algum dia cheguei a ficar nesse estado por causa de Arthur.
A resposta era não. Até porque, eu não o amava. Mesmo com os cinco incansáveis anos juntos e todos os eu te amo ditos da boca para fora. Eu não o amava.
Mas com o , tudo parecia diferente.
E talvez eu devesse começar pelo fato de que nem meu namorado ele era.
Frustrada, resmunguei algo inaudível e estiquei o meu braço, alcançando o aparelho celular sobre a mesinha de vidro entre as duas cadeiras. Abri o aplicativo do instagram e, sem titubear, busquei pelo perfil de .
Diferente de muitas pessoas da nossa idade, não costumava usar muito o instagram. Suas fotos eram sempre aleatórias, com alguma legenda sem noção e um único filtro: preto e branco. Um tanto quanto contraditório para uma pessoa que adorava tirar fotos e tinha talento para isso, mas cada um com as suas manias, não é mesmo?
Me dirigi então ao que realmente me interessava: seus seguidores. Na barra de busca, digitei o nome de Allie e me surpreendi ao encontrar no mínimo oito pessoas com o mesmo nome. No entanto, reconheci de cara a bola de pelos graciosa e responsável pela apresentação desastrosa de ontem ao lado da loira de olhos azuis, vítima do meu stalk.
E não, eu não me orgulhava disso. Mas que atirasse a primeira pedra quem nunca fuçou o instagram alheio em busca de algumas informações.
O perfil de Allie, diferente do de , era bem mais interessante. Esbanjando simpatia, amor aos animais e, é claro, beleza em praticamente todos os posts, era quase impossível não invejar a leveza nos traços em seu rosto, e isso fazia com que eu sentisse que minha situação estava cada vez pior.
Mas foi quando encontro uma publicação feita em setembro de dois mil e treze que cheguei à conclusão de que nunca conseguiria competir com aquilo. Na foto — ou melhor: fotos, porque era um compilado de dez — vi ela e , deitados em uma cama elástica localizada em algum canto dessa chácara, com sorrisos largos nos rostos e genuinamente felizes pelo dia que provavelmente passaram juntos.
vestia uma bermuda branca e uma faixa em volta da cabeça, impedindo que seus cabelos caíssem em seu rosto. Seu peito estava descoberto e muitas de suas tatuagens ainda nem estavam ali, enquanto Allie usava um vestido vermelho de alças finas, com os cabelos amarrados em um rabo de cavalo.
A legenda feita de uma só palavra, Lucky, e a imagem de apertando as bochechas e mordiscando o pescoço da garota fizeram o meu coração estremecer. Era quase impossível não pensar que ainda existia uma ponta de sentimento entre os dois.
Por Deus! Ele foi o primeiro dela e ela a primeira dele, isso devia significar alguma coisa. Não devia?
— Esse lugar me lembra a casa dos seus avós.
Saltei de meus devaneios quando ouvi um tom de voz rouco chamar a minha atenção. Me virei em direção ao som com os olhos arregalados e me deparei com a figura de Arthur vestindo uma blusa de malha cinza e uma calça de moletom preta. Seus cabelos estavam emaranhados e cada uma suas mãos segurava uma xícara de porcelana azul.
Ele estendeu para mim uma das xícaras e eu respirei fundo, bloqueando o meu celular e o lançando sobre a mesinha de vidro mais uma vez.
— Eu costumava fazer isso para você quando estávamos lá. — Ele deu de ombros e meus lábios se curvaram em um agradecimento silencioso no momento em que peguei em minhas mãos a xícara com chocolate quente e marshmallows.
Misturei todo o conteúdo do recipiente com o auxílio de uma colher prata enquanto minha cabeça se mantinha atada ao mesmo assunto de segundo atrás. De soslaio, vi Arthur se sentar na cadeira ao meu lado depois de soltar um longo suspiro.
— Eu pensei a mesma coisa quando cheguei aqui. — Confessei, quebrando o silêncio, e meu ex me olhou com as sobrancelhas arqueadas. — Não que você costumava fazer chocolates quentes, mas que essa chácara me lembra a casa dos meus avós. — Dei de ombros e ele riu.
Em seguida, meu ex virou seu rosto para a paisagem à nossa frente e eu fiz o mesmo. Um silêncio de vozes se fez presente e o único som que conseguia ouvir era o do irrigador molhando a grama do jardim. Me prendi nas voltas que o aparelho dava, ao passo que umedecia meus lábios com o líquido quente na xícara em minhas mãos.
— Eu estava pensando que poderíamos conversar nesse fim de semana. — Arthur se manifestou, atraindo a minha atenção para si. — Sem a pressão dos seus pais ou qualquer outra coisa. — Um sorriso envergonhado surgiu em seus beiços e eu respirei fundo, apoiando a caneca sobre a mesa.
— Arthur, eu não sei se… Não sei se quero ter essa conversa. — Disse, encolhendo os meus ombros e afagando os meus braços para espantar o frio. — Para ser sincera, eu já imagino o que você vai dizer e nem acho que preciso ouvir. — Dei de ombros e ele riu, sem humor.
— Eu não vou falar sobre o nosso casamento, . — Meu ex balançou a cabeça de um lado para o outro e um refluxo maltratou o meu estômago no momento em que o ouvi tocar naquele assunto. — Nem pedir para que você aceite ou dê uma chance a ele.
— Não? — Arqueei as minhas sobrancelhas um tanto quanto surpresa e o rapaz ao meu lado achou graça.
— Esse mês foi meio maluco, sabe? Quando os nossos pais me convenceram à loucura de aparecer na porta do seu trabalho sem que você soubesse, eu pensei que aquilo era exatamente o que eu queria. E talvez fosse mesmo naquela primeira semana. — Ele fez uma breve pausa entre suas palavras e respirou fundo, entrelaçando os dedos de uma mão nos da outra. — Mas não é mais.
Estarrecida, arregalei os meus olhos e Arthur virou o seu rosto em direção ao meu. Não consegui encontrar nenhum daqueles mecanismos de defesa escancarados em seu semblante e isso fez com que eu me surpreendesse ainda mais.
— Você é uma menina linda, . Com toda certeza uma das mais bonitas que eu já conheci. — Proferiu, me olhando de cima a baixo, e eu não consegui controlar o riso envergonhado que saltou pelos meus lábios. — E não existe um dia que eu não me culpe por não estar apaixonado por você.
— Você não precisa se culpar por isso, Arthur. A gente não escolhe por quem vai se apaixonar. — Voltei a pegar a xícara sobre a mesa e meu coração estremeceu, imediatamente pensando em .
— Mas eu teria escolhido você, se pudesse. E eu acho que você sabe disso.
— Eu não sei se tenho tanta certeza assim. — Confessei, deixando um riso irônico saltar pelos meus lábios.
Nos segundos seguintes, me surpreendi quando Arthur inclinou o seu corpo para a frente e alcançou uma das minhas mãos em um movimento rápido.
— Eu sei que errei muito com você. E feio.
Ele proferiu e eu respirei fundo, desviando o meu olhar do dele enquanto tentava puxar minha mão de volta para mim. Mas Arthur era obviamente mais forte. Ele envolveu os meus dedos com certa pressão, não a ponto de me machucar, no entanto era suficiente para impedir que eu me desvencilhasse de seu toque.
— Também sei que nunca cheguei a pedir desculpas pelo que aconteceu, então quero aproveitar esse momento agora para fazer isso. Me desculpe, . De verdade. — Meu ex diminuiu a intensidade da força em seus dedos e acariciou a minha pele em um gesto de ternura. — Eu tenho certeza de que você se manteve fiel ao nosso compromisso até o último segundo e eu sinto muito por toda a merda que fiz você passar.
— Está tudo bem, Arthur. — Disse, esfregando a minha têmpora. — O que aconteceu foi um desastre e eu realmente te odiei por um tempo, mas… — Interrompi minhas palavras e deixei um sorriso leve escapar quando o vi rir. — … Passou. E você sabe muito bem que uma das coisas mais valiosas que nos ensinaram na igreja é a arte do perdão. A arte do perdão e a capacidade de deixar algo que te fez mal para trás. E eu te perdoo, de coração.
Um sorriso singelo surgiu no rosto do meu ex-namorado e ele ergueu o olhar de encontro ao meu. Por um segundo, reconheci o Arthur pelo qual acreditei estar apaixonada durante cinco anos da minha vida.
— Eu não quero me casar, . E sei que você também não. Mas os nossos pais, eles…
— Eles não podem obrigar a gente, Arthur. Pelo amor de Deus, estamos no século vinte e um! — Esbravejei, um tanto quanto inconformada, e ele achou graça.
— Mas eles vão. — Ele deu de ombros e eu franzi o cenho sem entender. — Eles vão forçar esse casamento, . Você sabe disso. — Proferiu e eu balancei a cabeça na negativa.
Sem pensar, fiz o mesmo que ele. Impulsionei levemente o meu corpo para frente e envolvi as nossas mãos já atadas com a minha mão livre, surpreendendo Arthur, que me olhava com as sobrancelhas arqueadas.
— Não se estivermos juntos nessa. — Dei de ombros e um riso leve saltou pelos lábios do meu ex.
— E o que nós vamos fazer? Fugir? — Ele perguntou com os olhos arregalados e eu respirei fundo.
— Eu estava pensando em uma solução menos dramática, mas… — Fiz uma pausa entre as palavras quando ouvi Arthur rir mais uma vez. Sem perceber, me peguei sorrindo por conta do som anasalado que escapou pelo seu nariz. — … Eu estou disposta a qualquer coisa.
Quando conseguiu controlar o riso, Arthur ergueu o olhar de encontro ao meu. A mudança no semblante em seu rosto era perceptível e, estranhamente, senti meu coração palpitar.
— Eu tinha esquecido que o seu senso de humor é uma das minhas coisas favoritas em você. — Confessou com um tom de voz aveludado e eu elevei as minhas sobrancelhas, um tanto quanto surpresa.
Envergonhada, no entanto, deixei um sorrisinho saltar pelos meus lábios enquanto as minhas bochechas queimavam e eu sentia a pele áspera da mão do meu ex acariciar a minha.
Mas o que está acontecendo? Eu nunca me senti assim em relação ao Arthur e agora meia dúzia de palavras reconfortantes parecem suficientes para eu perder toda a minha postura em relação ao cara que me traiu?
Algo de errado não pode estar certo.
! — Soltei o ar dos meus pulmões quando ouvi a voz estridente de Helena me acordar dos meus devaneios.
Extasiada, virei o meu rosto em direção ao som e vi a pequena correr na minha direção. Logo atrás, encontrei seguido por Allie e notei os olhos do rapaz grudados às minhas mãos atadas à mão do meu ex. Por impulso, me afastei de Arthur e umedeci os lábios, um tanto quanto desconcertada pela situação.
— Princesa! — Forcei o meu melhor sorriso, abrindo os braços para receber a pequena em um abraço. Helena, por sua vez, se jogou entre as minhas pernas e apoiou a cabeça sobre o meu colo, me fazendo gargalhar.
— Você nem sabe! — Ela apoiou as mãozinhas nas minhas pernas e ergueu o rosto de encontro ao meu. — Eu andei em um pónei! — Helena esbravejou, animada, e eu arqueei as minhas sobrancelhas.
Por impulso, levei a minha atenção até , e o sorriso largo em seu rosto, observando o entusiasmo da irmã, fez o meu coração derreter como o de uma idiota apaixonada.
Espera ai!
Eu disse apaí
— Allie até me deixou dar um nome para ele! — Novamente, fui puxada de volta à órbita por Helena.
Por conseguinte, balancei a minha cabeça de um lado para o outro e voltei minha atenção para a pequena, que aguardava por algum comentário meu com certa ansiedade.
— É mesmo? — Arqueei as minhas sobrancelhas e, enquanto Helena fazia que sim com a cabeça, eu lancei um olhar rápido para Allie. A loira sorriu. — E que nome você escolheu?
— Charlie, como o menino do livro que o me deu de presente. — A pequena deu de ombros e um sorriso leve surgiu em meus lábios.
— Foi uma ótima escolha, pequena. — Disse, afastando a franja de seu rosto suado.
— Eu queria ter te chamado para ir com a gente. — se manifestou, puxando a minha atenção para si. — Mas a minha mãe disse que você ficou até tarde esperando pelos seus pais e eu não quis te acordar.
O encolheu os ombros, escondendo as mãos no bolso frontal de seu moletom, e eu balancei a cabeça na negativa, ao mesmo tempo que virei o corpo de Helena de frente para o irmão.
— Não tem problema. Fico feliz que tenham se divertido. — Entortei os meus lábios em um sorriso simpático e fez o mesmo.
Em seguida, voltei minha atenção para a pequena entre as minhas pernas e comecei a mexer em seus cabelos enquanto a ouvia bocejar. De soslaio, senti o olhar de Arthur sobre mim e umedeci a garganta.
— Acho melhor entrarmos, mocinha. Você precisa tomar um banho e se arrumar para o almoço, seus pais já devem estar chegando. — Proferi, enrolando os cabelos da menina em um coque, e Helena resmungou, jogando a cabeça para trás.
— Eu posso ajudar vocês com isso. — Allie se manifestou pela primeira vez e, por impulso, levei o meu olhar de encontro ao dela.
— Não precisa! — Me apressei em dizer e só então percebi que meu tom de voz saiu mais alto do que o desejável. — Você já ajudou bastante. — Forcei o meu melhor sorriso, mas não consegui evitar a ironia descarada agarrada nas minhas palavras. A loira, por sua vez, me encarou, sem entender. — Com os animais, é claro. Você já ajudou levando Helena para ver os animais.
— Imagina, não foi nada demais. — Ela retrucou e o sorriso que surgiu em seus lábios me causou certo refluxo, o qual lutei para esconder. — precisava de companhia e eu não tinha muito para fazer. — Allie deu de ombros, lançando um olhar rápido para . Involuntariamente eu fiz o mesmo e, envergonhado, o à minha frente abaixou a cabeça enquanto pinçava o lábio inferior com os dedos.
— De qualquer forma, esse é o meu trabalho. Então, tudo bem. Eu não preciso de ajuda. — Retruquei com certa indiferença e Allie se calou, assentindo com a cabeça. Em seguida, me levantei de onde estava sentada e puxei Helena comigo. — Vamos, pequena. — Entortei os meus lábios com certa leveza enquanto envolvia a mão da criança e ela resmungava, preguiçosa.
— Ah, vocês já chegaram! — Fomos surpreendidos pela voz da minha host mom e, logo depois, ouvi o grito dos garotos e senti Helena se desvencilhar de mim.
Soltei o ar pela boca, um tanto quanto impaciente, conforme vi a minha desculpa para escapar dali se afastar cada vez mais e rapidamente entrar em uma brincadeira de pique e pega com os outros irmãos.
Ouvi o riso leve de e, involuntariamente, virei o meu rosto de encontro ao dele. Ele deu de ombros com as sobrancelhas erguidas e eu cerrei os meus olhos, irritada. Filho da puta.
— Eu estava mesmo pensando em falar com você, meu filho. — Tori proferiu, subindo os degraus da varanda e parando em frente a , com os braços cruzados na frente do peito.
— E sobre o que seria?
— Você sabe que eu e Éric vamos dançar uma valsa amanhã, não é? Dançaremos uma juntos e depois ele vai dançar uma com a Clarice, você se lembra dela? — Minha host mom cerrou os olhos e balançou a cabeça na afirmativa. — Então, eu gostaria de saber se você aceita ser o meu par nessa segunda dança… — A mulher mordeu os beiços e um sorriso involuntário saltou pelos meus lábios. Sem pensar, levei a minha atenção até e ele respirou fundo, jogando a cabeça para o lado.
— Você sabe que eu não danço, mãe. Por favor, não me faça passar essa vergonha na frente de todos os meus primos que com certeza usarão isso contra mim num futuro próximo. — Retrucou e Vitória rolou os olhos, deixando um riso escapar.
— Que bobeira, ! Você dança como qualquer outra pessoa. — Allie deu de ombros, atraindo a atenção de todos para si. — Se lembra de quando me convidou para o baile do colégio e nós dois dançamos na cozinha do porão? — A loira abriu um sorriso nostálgico de orelha a orelha e o brilho em seus olhos claros fez o meu peito comprimir. — Você me veio com essa mesma desculpa e eu disse que poderíamos dançar ali, onde ninguém nos veria e a única luz iluminando era a do refrigerador. — Incomodada, abaixei a cabeça e senti o olhar de queimar sobre mim.
— Eu… Eu me lembro bem disso. Mas já faz alguns anos.
— Eu não acho que você tenha mudado tanto assim. — Por impulso, levantei o meu rosto e desejei não ter feito. Vi Allie sorrir e afagar o braço de em um gesto de carinho.
Envergonhado, o entortou os lábios e inconscientemente me peguei mais uma vez pensando na possibilidade de ainda existir um sentimento entre os dois.
— Tori, eu… Eu estava pensando em levar Helena para tomar banho e prepará-la para o almoço, mas eu não acho que vou conseguir fazer isso tão cedo. — Forcei um sorriso, assistindo as crianças correrem a alguns metros de onde estávamos, e minha host mom acompanhou o meu olhar. — Tudo bem se eu voltar para o meu quarto? — Questionei, voltando a minha atenção para a mulher ao lado de .
— Claro. Mas você está bem? — Ela questionou e, sem pensar, desviei o meu olhar para . Ele me encarou com certa preocupação e eu respirei fundo, mordendo os beiços antes de balançar a cabeça de um lado para o outro.
— É só uma enxaqueca. Nada demais. — Disse, por fim, e a minha host mom sorriu.
Quando sai dali, torci para que minha desculpa tivesse sido convincente e que ninguém — além de mim mesma — soubesse que a enxaqueca que eu dizia sentir, na verdade se tratava de ciúmes.
Ciúmes do amigo com quem eu não tinha absolutamente nada, mas por quem estava perdidamente apaixonada.
É, apaixonada.
Droga.


Holmes Chapel, 01 de setembro de 2020.
Chácara dos Carters


— Eu entendo o porque eles eram… Eles são amigos desde a infância. — Disse, andando de um lado para o outro enquanto estalava os meus dedos das mãos. — Mas a Helena? Ela é a minha criança. — Interrompi os meus passos e lancei um olhar para Maria Luiza que, por sua vez, parecia muito mais entretida com o copinho de amendoins em sua mão do que nas coisas que eu estava falando há horas.
— Sim, claro. — Ela deu de ombros, rolando os olhos. Frustrada, resmunguei algo inaudível e voltei a caminhar pelo cômodo.
— Sem contar que depois ela ficou lá falando como eles costumavam dançar na cozinha e…
— A Allie e a Helena? — Malu me interrompeu, franzindo o cenho, e eu revirei os olhos, impaciente.
— A Allie e o , ! — Bati um de meus pés no chão e minha amiga saltou da cama, assustada. — Presta atenção!
— É que você falou que entende a proximidade dela com o e eu achei que…
— Eu só estava comentando, Maria Luiza. — Retruquei, rolando os olhos mais uma vez.
— Entendi. Você está com ciúmes. — Malu deu de ombros e eu elevei as minhas sobrancelhas, sentindo minhas bochechas corarem levemente.
Porra! Está tão óbvio assim?
— O quê? De quem? Do ? Claro que não! — Esbravejei, mentindo em minha defesa. — Eu e ele somos amigos e…
— … E agora que a amiga de infância dele também está aqui, você está se sentindo deixada de lado. — Minha amiga proferiu. Imediatamente me calei.
Demorei alguns segundos para processar as palavras de Maria Luiza e até tentei pensar em alguma desculpa esfarrapada que a levasse a crer que sua suposição estava errada.
Mas ela não estava e eu acabei deixando um suspiro derrotado escapar. Encolhi os meus ombros e me sentei na cama, beliscando as pontas dos meus dedos.
— Não é isso. É só que… Ele olha diferente para ela, sabe? — Enruguei o meu nariz, erguendo o olhar de encontro à . — Eu adoro a Sarah por exemplo, e o é apaixonado por ela. Mas eles são quase irmãos. Com a Allie não é a mesma coisa. — Esfreguei a têmpora e entortei levemente os meus lábios. Maria Luiza riu.
— Porque ela é a ex-namorada dele e isso te ameaça. — Ela disse, afagando os meus cabelos em um gesto de carinho e, envergonhada, desviei o meu olhar do dela. — É normal, . Como você acha que ele se sente na presença do Arthur?
Imediatamente voltei a minha atenção para o seu rosto e a encarei, estupefata. , por outro lado, arqueou as sobrancelhas enquanto aguardava, ansiosa, pela minha resposta.
Por conseguinte, rolei os meus olhos e deixei um riso leve saltar pelos meus lábios.
— Por favor, não tem motivos para ter ciúmes do Arthur. — Retruquei, cruzando os meus braços.
— Então você admite que está com ciúmes? — Um sorriso sacana dançou nos lábios da minha melhor amiga e eu me surpreendi.
— Eu não disse isso. Eu disse que… — Interrompi as minhas palavras quando percebi que nada do que eu dissesse agora seria suficiente para convencer Maria Luiza do contrário. — Quer saber? Chega dessa conversa ou não vamos terminar de nos arrumar nunca.
— Como quiser, princesa. — Ela prendeu os lábios, tentando conter o riso, e eu bufei, me levantando da cama. — Algum pedido especial?
Passei as mãos pelos meus braços, tentando me livrar dos arrepios, e mordisquei os meus beiços enquanto encarava o meu reflexo no espelho.
— Só… Só me deixa bonita. — Disse, virando o meu corpo de frente para .
Maria Luiza cerrou os olhos, e quando notei o espaçamento entre seus lábios, prontos para retrucar o meu pedido, me apressei para interrompê-la.
Mais bonita, . Por favor. — Apertei ainda mais os dentes contra a pele aveludada dos meus lábios e minha melhor amiga sorriu.
— Pode deixar.

Capítulo Dez

“So many things that you wish I knew, but the story of us might be ending soon.”
Taylor Swift, The Story Of Us

Narrador Avulso


Depois de pouco mais de uma hora tentando convencer Helena a usar a roupa que Vitória havia separado para que a pequena usasse na ocasião, finalmente chegou à festa.
A comemoração de dez anos da união de Tori e Éric tinha sido preparada nos mínimos detalhes e com um capricho que deixaria qualquer um admirado. Uma tenda enorme havia sido montada nos fundos da casa, bem próximo da piscina. A decoração com pequenas luzes, tecidos dourados e flores azuladas deixavam o ambiente muito aconchegante, além de extremamente elegante.
Na área externa à tenda, havia algumas outras mesas onde os convidados poderiam se aconchegar, além daquelas largas — cobertas por cetim azul — dispondo um vasto buffet, com um cardápio de opções variadas.
Quando chegou, varreu o ambiente com os olhos e, de onde estava, conseguiu ver o celeiro também enfeitado com algumas luzes douradas, ornando com o evento. Seus olhos buscaram seus pais, mas a não os encontrou. Supôs, por isso, que os dois estivessem dentro da tenda. Assim como Maria Luiza e Arthur.
Uma brisa fria cortou a sua pele no momento que a garota se aproximou de uma das mesas do buffet. passou a mão pelo rosto, tentando arrumar seus cabelos desalinhados e, de repente, no meio de todas aquelas pessoas desconhecidas, seus olhos encontraram ele. A alguns metros de distância, conversava de maneira despojada com três outros rapazes e um homem alguns anos mais velho.
O tinha suas mãos escondidas dentro dos bolsos de sua calça e vestia uma blusa social azul bebê por dentro de um casaco esverdeado com detalhes quadriculados que seguiam a mesma paleta de cores, uma calça de alfaiataria marrom e um par de vans brancos — totalmente encardidos — nos pés, fazendo se questionar se teria se arrumado demais para a ocasião.
Alguns dos cachos de seus cabelos caiam sobre o seu rosto e, com os olhos cerrados, conseguiu avistar as pérolas do colar comumente envoltas em seu pescoço. É, no entanto, o sorriso largo que surgiu em seus lábios, formando as covinhas em suas bochechas, que fez o coração de tamborilar e as borboletas baterem as asas contra as paredes de seu estômago.
— Ele é ainda mais bonito pessoalmente.
Quando ouviu a voz doce de , saltou, despertando de seus devaneios. A outra sorriu, arqueando as sobrancelhas, e respirou fundo, balançando a cabeça de um lado para o outro.
— Se você acha… — A deu de ombros e Maria Luiza rolou os olhos, entediada.
— Você não precisa esconder de mim o tesão que sente pelo filho da sua chefe, . Mas…
A melhor amiga de fez uma pausa entre suas palavras quando viu um garçom se aproximar do lugar onde estavam. Da bandeja nas mãos do rapaz, Malu retirou duas taças de champanhe e sorriu, estendendo uma para que, por sua vez, a encarava com os olhos arregalados.
!
— … Se você quer jogar com essas cartas, por mim tudo bem. — Ela deu de ombros, insistindo para que a amiga aceitasse a taça em sua mão.
A contragosto, aceitou a bebida e Maria Luiza sorriu. A expressão sapeca no rosto da menina, no entanto, fez revirar os olhos.
— Eu quero te fazer uma pergunta.
— Eu tenho medo dessa frase. — A retrucou, bebericando a champanhe, e, dessa vez, foi Malu quem rolou os olhos. — Faça, minha princesa.
— Você sabe se aquele amigo do é solteiro? — Envergonhada, Maria Luiza mordeu os beiços e arqueou as sobrancelhas.
— Amigo? Que ami… — Antes mesmo de completar seu questionamento, os olhos de seguiram os de sua amiga e, a uma certa distância, a AuPair viu Jonah conversando tranquilamente com Georgia e Leo. — O Jonah?! — Seu tom de voz saiu mais alto do que o planejado e Maria Luiza a repreendeu com o olhar.
— Você precisa que eu peça emprestado o microfone? Tenho a impressão de que a rainha Elizabeth não conseguiu ouvir por conta das paredes do palácio.
— Me desculpe. É só que… O Jonah? — franziu o cenho e Maria Luiza deu de ombros — Eu não imaginei que ele fizesse o seu estilo.
— Você não me conhece tão bem quanto pensa, . Eu achei esse Jonah bonito, ele me parece mais velho, deve ter certa experiência e…
— Eles são primos e eu o encontrei umas duas vezes no máximo. Mas, até onde eu sei, ele tem dois filhos. Um casal. — interrompeu a amiga, que prontamente se calou.
— É casado?
— Divorciado, eu acho.
— O currículo dele fica cada vez mais interessante. — Maria Luiza pressionou os lábios com a ponta dos dentes e achou graça, rolando levemente os olhos.
— Eu posso apresentar vocês. — A deu de ombros, bebendo mais um gole de champanhe.
— Não precisa, eu me viro sozinha. E você precisa parar de arrumar desculpa para evitar certa pessoa. — Malu torceu o nariz, afagando o braço da amiga, e franziu o cenho.
Por conseguinte, Maria Luiza indicou com a cabeça a região oposta a que elas estavam. acompanhou os movimentos da amiga e se deparou com percorrendo o caminho que o levaria até elas.
Nervosa, a lançou um olhar para , respirou fundo, arqueou as sobrancelhas e bebeu — em um único gole — todo conteúdo restante dentro de sua taça. Maria Luiza riu.



Inventei uma desculpa imbecil e consegui me desvencilhar da conversa constrangedora com o marido de uma das minhas tias que insistia em criticar toda e qualquer decisão que eu tomasse na minha vida, como se tivesse algum direito sobre mim.
Era apaixonado por todas as pessoas da minha família e entregava muito de mim a eles, mas não conseguia manter uma conversa agradável com quem não tentasse ser — de fato — agradável. Tenho certeza de que a tia Elisa questionaria minha mãe sobre o meu comportamento mais tarde, mas acreditava que me afastar de um ignorante preso na era das cavernas era uma decisão muito mais sábia do que mandá-lo à merda na frente de todos esses convidados.
Hoje era um dia importante para minha mãe e Éric, e eu não pretendia estragar.
Me afastei da mesa onde estávamos e puxei da bandeja de um dos garçons um copo com uma dose considerável de whiskey. Virei-me para frente e, quando levei o líquido à boca, encontrei a alguns passos de distância. Ela sorriu para a menina ao seu lado — que eu supus ser Maria Luiza — e, em seguida, caminhou na minha direção.
andava com uma maestria invejável sobre os saltos finos de suas sandálias e eu tinha certeza absoluta de que estava parecendo um bobalhão, admirando cada um de seus passos. O vestido azul se moldava ainda mais conforme o movimento de seu corpo, e eu a admirava da cabeça aos pés, sem nem me preocupar em disfarçar isso.
Ela, por sua vez, notou a minha falta de discrição e sorriu, abrindo os braços e girando em torno dos próprios pés. Eu passei as pontas do indicador e do polegar pelo canto dos meus lábios e arqueei as sobrancelhas quando a distância entre nós se tornou mínima.
— Eu pensei que você estava me evitando. — Proferi, guardando minha mão livre dentro do bolso da calça que estava vestindo, e franziu o cenho.
— E por que eu faria isso?
— Não sei. Você nem mesmo quis jogar family fortunes com a gente ontem. — Dei de ombros e respirou fundo.
— Eu não estava me sentindo muito bem e… Imaginei que você não quisesse passar a vergonha de perder para mim na frente de todos os seus primos. — Um sorrisinho sacana dançou em seus lábios e eu rolei os meus olhos, tentando conter o riso.
— Você sabe que eu não tenho problemas em perder um fair game, . — Retruquei, a fazendo rir. Envergonhada, desviou o olhar do meu e eu voltei a observá-la.
Que merda, bonitinha.
— Você está linda. — Disse, puxando sua atenção de volta para mim. O canto esquerdo de seus lábios se entortou em um sorriso singelo e levou uma de suas mãos ao colarinho do meu casaco.
— Obrigada. Você está… Okay. — Ela deu de ombros, tentando parecer indiferente, e eu rolei os olhos. — Eu gostei do colar. É diferente do que eu estou acostumada. — mordeu os beiços com certa força, envolvendo as pérolas do meu cordão com seu indicador.
Meus músculos arquearam quando senti o seu toque contra a pele do meu pescoço, e umedeci a garganta, tentando disfarçar. sorriu com leveza e se afastou segundos depois.
— Você já tirou muitas fotos? — Ela questionou, apontando para a câmera analógica presa transversalmente no meu peito.
— Algumas. — Dei de ombros, tomando o objeto com a minha mão livre. — Se você quiser, eu posso…
— Ei, ! — Fui interrompido por um tom de voz masculino, o qual já estava começando a me familiarizar.
se virou em direção ao som, me dando o espaço que precisava para encontrar a figura de Arthur a alguns passos de distância de nós. Ele sorria de orelha a orelha e, quando dei por mim, seus braços já estavam ao redor da cintura de , a envolvendo em um abraço aconchegante.
— Você está linda — Ele proferiu, ainda com a mão sobre a curva da cintura de , e ela sorriu.
Tentei desviar minha atenção e não dar bola para o que estava acontecendo bem na minha frente, mas não consegui conter o calor que queimou as minhas bochechas no instante em que vi alinhar a gravata borboleta que Arthur usava e apoiar uma de suas mãos sobre o peito dele.
Imediatamente me lembrei da cena que encontrei ontem, assim que voltamos do passeio com Helena: e Arthur de mãos dadas, esbanjando alegria e certo carinho um pelo outro.
Comecei então a me questionar o que me manteve tão ocupado durante esses dois dias que eu nem sequer percebi que a menina pela qual eu estava assustadoramente apaixonado estava se reaproximando do ex.
? — Despertei dos meus devaneios quando a ouvi chamar meu nome, e ergui meu rosto de encontro ao seu. Confusa, me encarou com os olhos cerrados.
— Me desculpa, eu estava longe. Você disse alguma coisa?
— Eu perguntei se você poderia tirar uma foto nossa. — Foi Arthur quem se manifestou e eu arqueei as sobrancelhas, surpreso. Lancei um olhar para e ela desviou, um tanto quanto envergonhada. Soltei um suspiro cansado e forcei o meu melhor sorriso, balançando a cabeça na afirmativa.
— É claro.
Saquei a câmera e dei dois passos para trás. Arthur sorriu, em um agradecimento silencioso, e voltou a envolver a cintura de , a puxando para perto de si. Ela, por sua vez, umedeceu os lábios e arrumou o caimento do vestido sobre o seu corpo antes de erguer seu rosto para mim.
Estarrecido, tirei a foto e mais uma para garantir. Quando terminei, retirei a câmera da frente da minha vista e vi Arthur brincar com a ponta do nariz de , fazendo um riso bobo escapar pelos seus lábios.
Meu estômago embrulhou, mas tentei esconder minha reação instantânea olhando para baixo, checando alguma coisa qualquer na câmera ainda em minhas mãos.
— Talvez nós devêssemos tirar uma também. — A voz de puxou a minha atenção de volta para si e ela deu de ombros. — Uma foto. Arthur, você pode…
Antes de terminar sua frase, se soltou do ex e eu arqueei as minhas sobrancelhas ao vê-la se aproximar de mim. apontou para o objeto na minha mão e Arthur balançou a cabeça na afirmativa enquanto sentia um dos braços da garota envolver a minha cintura.
Mas eu não me movi.
Por que infernos eu não estava me movendo?
, Arthur! Venham aqui! — Despertei quando ouvi alguém chamar por e seu ex.
Arthur saiu do meu campo de visão e, a alguns metros, encontrei os pais de sentados em uma das mesas dispostas no jardim. Ainda não tinha tido o (des)prazer de encontrá-los nessa viagem, mas sabia que isso aconteceria a qualquer momento dessa festa.
Me obriguei a sorrir e balancei levemente minha cabeça em um cumprimento silencioso. Ângela acenou para mim, com um sorriso gracioso nos lábios, e Pedro simplesmente me ignorou. Imaginava que ele ainda não tinha me perdoado pelos comentários feitos durante aquele jantar.
— Um minuto, papai! — A ao meu lado retrucou, apertando ainda mais minha cintura.
Levei minha atenção de volta ao seu rosto e sorriu de um jeito que me faz crer que ela tinha noção da minha falta de compatibilidade com seu pai e tudo bem, porque ela não se importava com isso.
! — Pedro insistiu e o sorriso desapareceu do rosto da menina ao meu lado.
Frustrado, puxei uma boa quantidade de ar para dentro dos meus pulmões e envolvi sua cintura com um de meus braços, da mesma forma que ela fazia comigo. Assustada, ela arregalou os olhos de encontro aos meus.
— Vai lá. Nós podemos tirar uma foto depois. — Disse e, antes que conseguisse reagir, encostei meus lábios em sua bochecha e depositei um beijo carinhoso sobre a sua pele.
Ela desviou o olhar do meu e um sorrisinho envergonhado escapou pelos seus lábios. afagou as minhas costas, balançou a cabeça na afirmativa e, em seguida, caminhou em direção aos seus pais junto de Arthur.
Observei os seus passos enquanto degustava do último gole de whiskey no meu copo e via Pedro gargalhar, batendo nas costas de Arthur com certo orgulho. Segundos depois, vi Helena correr e envolver as pernas de com seus bracinhos.
Surpresa, sorriu, afagando os cabelos da minha irmã, e Arthur ergueu as sobrancelhas. Em seguida, ele se abaixou na altura de Helena e, envergonhada, a pequena escondeu o rostinho entre o corpo de .
Por conseguinte, Arthur cutucou a região da cintura da pequena e ela riu, se soltando aos poucos. Quando dei por mim, minha irmã já estava nos braços do ex de , gargalhando e brincando de aviãozinho, voando de um lado para o outro.
entrelaçou os dedos de uma mão aos da outra e as levou ao rosto, cobrindo o sorriso que saltou pelos seus lábios. Seus pais, por outro lado, se abraçavam e observavam o ex casal brincar com a minha irmã como se todos fizessem parte de uma mesma família feliz.
Revirei os olhos um tanto quanto enojado com a cena, mas no fundo, tinha plena consciência de que estava invejando aquilo como nada antes.
Conheço minha irmã mais nova e sabia que — como muitas crianças da mesma idade — ela se dava fácil para as pessoas, mesmo que desconhecidas. Mas confesso que preferia ver Helena fazendo mais uma de suas brigas à cena que eu estava vendo agora.
Se Thor aparecesse correndo — como um bom Golden Retriever — entre as pernas dos convidados, eu teria certeza de que estava assistindo a um comercial de ração.
— Eu estou começando a me irritar com essa situação, sabia? — Saltei quando ouvi uma voz conhecida proferir rente à minha nuca. Me virei em direção ao som e encontrei Georgia com os braços cruzados e as sobrancelhas levemente arqueadas.
Irritado, lancei um olhar rápido para ela e soltei o copo sobre a mesa do buffet ao nosso lado.
— Do que você está falando?
— Você e ! Vocês dois se gostam e ficam nessa enrolação, pelo amor de Deus! — Minha irmã esbravejou, batendo um de seus pés contra a grama.
— Como você pode ter tanta certeza?
— Você gosta dela. Não gosta? — Georgia cerrou os olhos, os sustentando contra os meus, e eu respirei fundo, desviando momentaneamente a minha atenção.
— Isso não significa que ela gosta de mim. — Dei de ombros, voltando a olhá-la.
Para a minha surpresa, minha irmã prendeu os lábios um contra o outro, desviou o olhar do meu e passou o indicador pelo nariz — do mesmo jeito que eu costumava fazer quando tentava conter uma risada.
— O que foi? — Questionei, um tanto quanto desconfiado.
— Você acabou de admitir que gosta dela. E essa foi a primeira vez. — Georgia deu de ombros e eu achei graça, rolando os meus olhos.
— Talvez eu goste, eu não sei. Mas, de qualquer forma, isso não significa que a recíproca é verdadeira. — Retruquei e, dessa vez, foi minha irmã quem revirou os olhos.
— Ah, pelo amor de Deus, ! Você já se olhou no espelho?
— Georgia…
— Não, Georgia nada! Você precisa fazer algo ou vai acabar perdendo para o Arthur. — Minha irmã proferiu e eu senti um frio percorrer a minha espinha. Involuntariamente, meu olhar acompanhou o dela e me deparei, mais uma vez, com a cena da família de a uma certa distância. — Querendo ou não, eles têm um noivado e…
não vai se casar com esse cara. — A interrompi e Georgia imediatamente virou o seu rosto de encontro ao meu.
— Quem te garante?
Ela perguntou com as sobrancelhas arqueadas e, quando pensei em responder, Georgia se apressou para me ultrapassar.
— Eu não conheço os pais dela, mas sentei por dois minutos com eles hoje no café. O pai dela está preso nos anos cinquenta, . Tudo o que ele fala parece ter sido dito por um coronel na época da borracha!
Minha irmã esbravejou e eu achei graça da careta desenhada em seu rosto.
— E eu acho que você conhece a suficientemente bem para ter certeza de que ela não passaria por cima de uma ordem do pai dela.
— Eu não acho que…
, me escuta. — Me calei no instante em que senti Georgia envolver meu pulso com seus dedos. — Você não vai correr o risco de perder a sua bonitinha por conta de um achismo, vai? — Ela questionou e eu respirei fundo, levando minha atenção de encontro a .
Ela sorriu, pegando Helena em seus braços e, mais uma vez, senti o meu coração tamborilar dentro do peito.
— O que você sugere que eu faça? — Perguntei, voltando o meu olhar para a Georgia. Ela riu.
— Conversa com ela. Diz como você se sente, seja honesto! — Proferiu, afagando o meu braço. — O máximo que pode acontecer é ela não sentir o mesmo. Mas você já recebeu um não antes, né?
— Na verdade…
! — Minha irmã esbravejou, me repreendendo, e eu achei graça. Em seguida, me virei de frente para ela e segurei levemente seus braços.
— Eu vou… Tentar. — Disse, acariciando sua pele, e Georgia revirou os olhos, impaciente. — Eu prometo, Ge. Vou conversar com ela. — Proferi, por fim, e ela respirou fundo antes de entortar os lábios em um sorriso leve.
— Tudo bem. Eu confio em…
? — Fomos interrompidos por um tom de voz feminino e, por impulso, virei o meu rosto em direção ao som. Encontrei Allie com as mãos atadas atrás de seu corpo e um sorriso leve nos lábios. — Nós podemos conversar?

Narrator Avulso


pinçou os lábios com as pontas dos dedos e levou sua atenção para Georgia. Ela, por sua vez, sorriu, afagando o braço do irmão mais velho.
— Vou deixar você sozinhos. — Disse com um sorriso simpático nos lábios antes de seguir caminho por uma direção oposta a que estavam.
acompanhou os movimentos de Ge com o olhar e, em seguida, se virou de frente para Allie mais uma vez. O passou a mão esquerda pelos cabelos, arrumando os cachos que caiam sobre seu rosto, e depois guardou suas mãos dentro dos bolsos de seu casaco.
Allie, por outro lado, sorriu, ainda com os olhos presos em Georgia, assistindo a irmã de se reencontrar com o noivo a alguns passos de distância.
— Vocês são mesmo muito parecidos. — Ela proferiu, voltando sua atenção para , e ele riu, jogando levemente sua cabeça para trás
— É assustador, não é? — O retrucou, lançando mais um breve olhar para Georgia, que agora ria de algum comentário feito por Adam.
A loira em sua frente concordou, balançando a cabeça na afirmativa, e, em seguida, desviou o olhar para o chão, pinçando as pontas de seus dedos.
— A minha mãe ainda gosta muito de você, sabia? — Questionou, atraindo a atenção de de volta para si. Ele arqueou as sobrancelhas. — Ela não pôde vir hoje, mas estava doida para te ver!
— Ela é uma querida. — proferiu com um sorriso genuíno nos lábios.
— Ela é. — Allie retrucou, balançando a cabeça de um lado para o outro com certa leveza. — Foi até bastante complicado fazer ela desistir da ideia de te convidar para um jantar na nossa casa. — A loira deu de ombros e, sem entender, franziu o cenho.
— E por que você fez isso? Eu teria adorado o convite. — Ele rebateu, encolhendo os ombros e arqueando as sobrancelhas. — Me lembro bem que a macarronada da sua mãe era uma das minhas preferidas na vida.
Allie riu.
— Eu não acho que daria muito certo. — A garota confessou, coçando a têmpora com as pontas dos dedos.
— E por que não?

Allie suspirou, sustentando o olhar contra o de , como se a resposta para a pergunta do rapaz fosse extremamente óbvia. Mas ele não entendia.
Por conseguinte, Allie rolou os olhos e respirou fundo, sentindo suas bochechas queimarem.
— A minha mãe é, de fato, muito querida. Mas nós dois sabemos que ela também consegue ser bastante inconveniente quando quer. — Ela deu de ombros, arrancando um riso frouxo dos lábios de . — Em algum momento, ela falaria sobre nós dois e jogaria na mesa todos os motivos pelos quais deveríamos voltar a ser o que éramos há alguns anos.
— Isso seria… Interessante? — O tom de dúvida na voz de fez Allie rir.
— Não. Não seria.
A loira retrucou, balançando a cabeça de um lado para o outro.
— Você ficou ainda mais bonito, . Mesmo.
Ela arregalou os olhos, avaliando o da cabeça aos pés, e achou graça.
— Mas eu… Bom, eu já estou comprometida. — Confessou, encolhendo os ombros, e o arqueou as sobrancelhas, surpreso. — É um pouco recente e minha mãe ainda não sabe, mas…
— Ele está aqui? — a interrompeu, buscando pela figura do possível namorado de Allie. Ela riu.
Ela. — A loira proferiu, sentindo suas bochechas corarem, e o queixo de caiu alguns centímetros.
Envergonhada, Allie sorriu, mordendo o lábio inferior, e, em seguida, balançou a cabeça de um lado para o outro, arrumando os cabelos emaranhados pelo vento.
— E não. Ela não está aqui. Na verdade, ela está arrumando os últimos detalhes para a nossa…
— Era isso o que você queria me contar? — a interrompeu mais uma vez e Allie prontamente se calou. — Que você está namorando uma mulher? — Ele insistiu em saber e um risinho correu pelos lábios de sua ex.
— Eu imagino que deve ser estranho ser pego de surpresa com uma notícia dessas.
— Não é nada estranho, na verdade. — O deu de ombros, enrugando o nariz em uma careta que fez Allie rir. — Se existe amor entre vocês duas, não tem por que ser estranho. E, se você está feliz, tem todo o meu apoio. — sorriu, apertando levemente um dos braços da garota.
Por conseguinte, Allie desviou o olhar do dele e suspirou, aliviada.
— Você não tem ideia de como é bom ouvir isso de você. — Ela mordeu os lábios, um tanto quanto emocionada, e respirou fundo.
Nos segundos seguintes, o apoiou sua mão direita na nuca de Allie e a puxou para perto de si. Ele encostou a testa da loira sobre o seu peito e afagou carinhosamente seus cabelos enquanto ela o abraçava pela cintura.
— Você não precisa ter medo de falar sobre o que te faz feliz, Allie. Não para mim, nem para ninguém.
O proferiu, beijando o topo da cabeça da garota logo em seguida. Ela, por outro lado, rolou os olhos, se afastando de .
— Nem todas as pessoas pensam como você, .
— A sua mãe…?
— A minha mãe é uma pessoa incrível, você se lembra.
Proferiu, vendo concordar com a cabeça.
— Mas ela nunca saiu dessa vila. Nós tivemos uma criação totalmente diferente, meus avós eram extremamente rígidos e eu tenho certeza de que me ver apaixonada por outra mulher não é algo que ela idealizou para o meu futuro. — Allie sorriu sem humor e balançou a cabeça na negativa, segurando uma de suas mãos por impulso.
— Ela é a sua mãe e, se você está feliz…
— Nós dois sabemos que não é bem assim que funciona. Você teve a sorte de nascer em uma família como a sua, mas nem todos os pais são como a Tori. Ou até mesmo o Éric. Muitos ainda estão presos em um passado com uma realidade completamente diferente da nossa. — Disse, entortando levemente os cantos de seus lábios.
imediatamente pensou nos pais de . A situação não era exatamente igual a de Allie, mas a ideia de uma criação baseada em premissas antigas era a mesma.
Sem pensar, ele virou o rosto para o chão e, quando deu por si, erguia os olhos na direção onde , seus pais e Arthur ainda se divertiam com Helena.
Allie percebeu o olhar atento do amigo, preso na figura radiante da brasileira a alguns metros de distância, e sorriu, tocando levemente o braço de .
— Eu não sou a única escondendo o que sinto, sou?
Ela questionou, resgatando de seus devaneios, e o a olhou, ainda atônito. Allie riu e, por consequência — quando a sua ficha cai e ele entende que a garota estava olhando para a mesma direção que ele —, fez o mesmo.
— É tão óbvio assim? — Ele franziu o cenho e a loira deu de ombros.
— Eu vi o jeito que você olha para ela e eu conheço esse olhar, . Você costumava olhar para mim da mesma forma. — Proferiu, arrancando um riso leve dos lábios de .
— Eu… Não sei o que fazer. — O rapaz confessou, encolhendo os ombros, e Allie sorriu. Sem pedir permissão, a loira entrelaçou seus dedos nos cachos dos cabelos de e os afastou para longe de seu rosto.
— Eu acho que você sabe sim, mas tem alguma coisa te impedindo. — Proferiu com os olhos cravados nos dele, buscando entender quais motivos ainda o seguravam. — O que é? Você tem medo também?
— Não por mim. — Ele rebateu, envolvendo o punho do Allie e o forçando para baixo. — Por ela.
indicou com a cabeça e, sem hesitar, Allie a olhou. O respirou fundo antes de seguir.
— Os pais dela idealizaram um relacionamento perfeito, sabe? Com o cara ideal que preenche todos os requisitos.
— E você não acha que esse cara é você? — A loira questionou, arqueando uma sobrancelha, e um riso sem humor saltou pelos lábios de .
— Eu não sou perfeito, Allie. — O rolou os olhos e Allie fez o mesmo.
— Talvez não para os pais dela. Mas você já parou para pensar na possibilidade de ser perfeito para ela? O que os pais dela pensam ou deixam de pensar sobre você, não importa. — Allie deu de ombros e respirou fundo, voltando sua atenção para . — O que você está esperando, ? Vai buscar a sua mulher! — Ela esbravejou, abrindo um sorriso de orelha a orelha, e achou graça.
— Você tem razão. Eu acho que vou…
— Ah, espera! — Quando deu os primeiros passos, Allie segurou uma de suas mãos e ele a olhou, assustado. — Eu ainda preciso te contar uma coisa.
— Mas você já não…
— Eu vou me mudar! — A loira o interrompeu e, de confuso, o semblante no rosto de muda para surpreso. O voltou a se virar de frente para ela e Allie sorriu, segurando seus braços. — É por isso que minha namorada não pôde vir. Ela está arrumando os últimos detalhes da nossa mudança.
— Para onde vocês vão? — questionou, ainda meio extasiado.
— Para a Itália! Não é incrível? — Proferiu, animada, e o rapaz arqueou as sobrancelhas. — Recebi uma proposta de emprego praticamente irrecusável e Aya decidiu ir comigo.
— Aya é a sua…
— Namorada, sim. Ela é a minha namorada. — Ela retrucou com um sorriso nos lábios e fez o mesmo.
— Allie, isso é ótimo! — Esbravejou, acariciando os braços descobertos da amiga. — Eu fico verdadeiramente feliz em saber disso.
— Eu sei. Eu também. — Allie retrucou, entrelaçando seus dedos aos de . — Mas, enfim… Eu não posso demorar aqui, Aya está me esperando. Eu só vim mesmo para conversar com você e me despedir. — Ela suspirou para acariciar o rosto do rapaz e sorriu, beijando a palma de sua mão.
Do outro lado, se virou por impulso — em busca de Helena — e acabou se deparando com a cena de e Allie a alguns metros de distância. O sorriso que machucava os músculos de suas bochechas segundos atrás desapareceu como mágica e, repentinamente, sentiu seu peito comprimir no mínimo.
O ar parecia não alcançar os seus pulmões e a sentiu sua cabeça girar sem que seus pés se movessem sobre o chão.
? — Ela despertou quando ouviu alguém chamar seu nome e seus olhos focalizaram a figura de Arthur em sua frente. — Você está bem? — Ele questionou, verdadeiramente preocupado, e umedeceu a garganta, lutando para voltar à órbita.
— Sim, é só que… — seu dedo indicador envolveu o colar em torno do seu pescoço, o mesmo que tinha dado a ela depois daquela noite em Amsterdã, e, sem pensar, voltou sua atenção para e sua ex.
Dessa vez, os dois se abraçavam com certa ternura e — de onde estava — conseguiu ver o sorriso que se formou no rosto de Allie enquanto ela acariciava os poucos cabelos presos à nuca de .
— Pessoal, Tori e Éric já estão se preparando para os votos!
Uma voz masculina chamou a atenção de todos, incluindo , que se virou em direção ao som, encontrando um homem de trinta e poucos anos, responsável por toda a organização da festa.
— Por favor, entrem. — Ele sorriu, indicando a entrada da tenda e a maioria dos convidados atendeu ao seu pedido.
— Você tem certeza de que está bem? — Arthur insistiu em saber e levou alguns segundos até respondê-lo. Quando o fez, balança a cabeça na afirmativa e ele sorriu.
— Vamos? — Pedro olhou para a filha, puxando Ângela pela mão. Arthur concordou com a cabeça e os três gargalharam quando viram Helena correr através das pernas de muitos dos convidados.
fez que sim com a cabeça, observando seus pais e seu ex seguirem até a tenda. Assim que os três ficam a uma distância considerável e percebeu que poderia facilmente passar despercebida por todas aquelas outras pessoas, a menina aproveitou a oportunidade para desaparecer pelo menos até que Vitória e Éric terminassem seus votos.
As pessoas provavelmente ficariam distraídas demais com as declarações de amor e dificilmente estranhariam sua ausência.
Tendo isso em mente, a soltou um longo suspiro, tentando aliviar a pressão contra os seus pulmões, e apressou seus passos para conseguir sair do meio daquela festa o mais rápido possível.
Entretanto, diferente do planejado, não conseguiu sair tão despercebida assim. No instante em que afastou Allie de si e a soltou de seu abraço, se virou, decidido a brindar a união entre sua mãe e seu padrasto, mas se surpreendeu ao ver a garota seguir por um caminho totalmente divergente ao que os convidados estavam indo.
Preocupado e um tanto quanto curioso, se despediu por fim de Allie e seguiu os passos de , rezando para que ninguém estranhasse a sua ausência em um momento tão peculiar quanto o que estava prestes a acontecer.

[•••]


O celeiro foi o primeiro lugar para onde pensou em ir. Um pouco longe do movimento, vazio, e ninguém pensaria em procurá-la ali depois que notassem o seu súbito desaparecimento. Isso daria a ela pelo menos dez minutos para respirar, chorar, gritar e socar um pedaço de madeira imaginando o rostinho de perfeitamente esculpido sobre ele.
— Droga! — Ela esbravejou, apoiando os braços sobre a mesa onde estavam dispostos alguns materiais e ferramentas essenciais para a chácara. — Que ódio, que ódio! — Seus olhos ardiam e levou as mãos até eles, para secá-los antes mesmo que as lágrimas pensassem em cair.
— Está perdida, bonitinha?
No momento em que ouviu a voz de , saltou, assustada, e pressionou os olhos, bem como os lábios, resmungando mentalmente.
— Eu tenho quase certeza de que a festa não está acontecendo aqui. — Ele riu depois de enrugar o nariz e a menina respirou fundo, se virando de frente para .
— Eu precisava de um pouco de ar. — deu de ombros, encostando o quadril contra a mesa e puxando o choro pelo nariz.
Preocupado, franziu o cenho.
— Um pouco de ar? — Ele questionou, dando dois passos à frente, e os músculos de se contraíram de maneira involuntária. — Você está bem?
O insistiu em saber e um riso sem humor saltou pelos lábios da garota. Em seguida, tentou tocar seu braço descoberto, mas conseguiu ser mais rápida e se desvencilhou antes mesmo que ele a tocasse.
, não. — Ela proferiu com certa rispidez e se surpreendeu. — Não se preocupe, eu estou bem. Você pode voltar para o seu… Entretenimento.
Entretenimento? — O franziu o cenho, sem entender. — Do que você…
Antes que conseguisse terminar seu pensamento, bufou, visivelmente frustrada, e passou pelo rapaz, esbarrando seus ombros um contra o outro.
Ainda bastante confuso, acompanhou os seus movimentos em silêncio até que algo pareceu falar mais alto e um riso debochado escapou pelos lábios de , antes dela virar seu corpo de frente para o dele mais uma vez.
— Ela é muito bonita, por sinal. — A deu de ombros e a observou, ainda sem entender. — A Allie. Acho que ainda não tive a oportunidade de dizer isso.
Surpreso, o rapaz arqueou as sobrancelhas e respirou fundo, cruzando os braços na frente de seu peito.
— E vocês dois formam um casal adorável, sabe? É como abrir um daqueles livros de adolescentes, onde dois melhores amigos se gostam desde sempre, mas que por algum motivo precisa se afastar e depois de anos se reencontram para admitir o amor que sentem um pelo outro.
Ela deu de ombros mais uma vez, falando de maneira ininterrupta e, por mais que se esforçasse, ele não conseguiu impedir que um risinho sacana dançasse pelos seus beiços.
— Aposto que esse é o seu gênero favorito, não é? — Ele questionou, pressionando os beiços, e algo em seu tom de voz acabou irritando ainda mais .
— Não é muito original. Mas eu acho interessante. — Retrucou, tentando soar o mais indiferente possível.
— Ela é realmente muito bonita. A Allie. — Dessa vez, foi o quem deu de ombros, e o encarou, um tanto quanto estarrecida.
Mais uma vez, se esforçou para não rir. Mas o conhecia o suficiente para saber que ele estava fazendo um esforço sobre-humano para não gargalhar bem alto para que todos na festa o ouvissem.
estava adorando a situação e tinha certeza disso.
— Fico feliz que concordamos com isso. — A forçou o seu melhor sorriso e balançou a cabeça na afirmativa. — Agora, se me dá licença. — Proferiu por fim, dando as costas ao rapaz.
— Você está com ciúmes. — proferiu, sem hesitar, apoiando o quadril sobre a mesa da mesma maneira que estava há minutos.
A menina, por sua vez, interrompeu seus passos e seus músculos congelaram. Ela fechou os olhos com força e imaginou o sorriso sacana no rosto de . Que merda.
Exausta desses joguinhos que não a levariam a lugar algum, balançou a cabeça de um lado para o outro, tentando afastar seus pensamentos, e respirou fundo antes de voltar seu corpo de frente para uma outra vez.
Que se dane.
Se você não pode contra o seu inimigo, se junte a ele.

— E se eu estiver? — questionou, surpreendendo .
O sorrisinho sacana nos lábios do rapaz desapareceu e ele levou segundos para processar o que havia dito.
Quando conseguiu, voltou a sorrir de lado, se afastou da mesa e caminhou sutilmente em direção à garota. , por conseguinte, sentiu seus músculos travarem e umedeceu a garganta, tentando disfarçar seu nervosismo.
Se você estiver, eu me sinto na obrigação de dizer que ela é sim uma das meninas mais bonitas que eu conheço. — Ele deu de ombros, parando rente ao corpo de .
A , por sua vez, arqueou levemente as sobrancelhas e seu queixo caiu alguns centímetros, um tanto quanto estarrecida.
Mas existem dois problemas. Que eu não percebi antes, mas hoje me levam a crer que um relacionamento entre nós não daria certo. — Confessou, se aproximando ainda mais de .
Atônita, a piscou os olhos diversas vezes, sentindo um calafrio percorrer sua espinha no momento em que a mão esquerda de tocou a curva de sua cintura.
— E esses problemas seriam…? — Sua voz saiu por um fio, quase inaudível, e achou graça. Ele tocou o rosto dela com sua mão livre, afastando os fios soltos de sua testa, e fechou os olhos, tentando se controlar.
— O primeiro deles é o fato de que ela não se sente exatamente atraída por homens. — Ele deu de ombros e, surpresa, abriu os olhos subitamente.
— Espera aí. O quê? — Ela questionou com os olhos arregalados e se esforçou para não rir da expressão em seu rosto.
— Não que isso chegue a ser um problema. Mas eu não acho que teria alguma chance contra o sexo feminino. Vocês estão anos à minha frente. — Confessou, enrugando o nariz. riu, espalmando uma de suas mãos sobre o peito dele.
— E o segundo? — A perguntou, erguendo os olhos de encontro aos dele.
respirou fundo e envolveu o seu braço ao redor da cintura de , a prendendo ainda mais perto de si. Seus corações dispararam em uma batida descompensada e era difícil dizer qual dos dois estava mais ansioso com a situação.
O , em seguida, levou sua mão livre à linha da mandíbula de e, enquanto quatro de seus dedos suportavam a nuca da garota, seu polegar acariciava levemente a bochecha dela.
— Ela não é você.
Por mais que sentisse uma vontade quase incontrolável de sorrir e avançar sobre para beijá-lo até que suas bocas caíssem, hesitou.
… — Proferiu, tentando afastá-lo de si quando se lembrou do motivo pelo qual os dois tinham decidido seguir como amigos.
Tudo bem, estava praticamente se assumindo para ela. Mas isso não era suficiente, era?
, por sua vez, conseguiu ser mais rápido e segurou o pulso de com a força necessária para mantê-la perto.
— Eu não consigo mais, .
Ele deu de ombros, com um sorriso bobo nos lábios, e a franziu o cenho, sem entender.
— Eu não consigo mais fingir que somos só amigos. Isso não existe entre a gente, eu… Eu penso em você o tempo todo. — Confessou e desviou o olhar do dele, pressionando um lábio contra o outro, para tentar conter o riso.
Em seguida, soltou o pulso da menina e voltou a segurar seu rosto, emaranhando seus dedos nos cabelos dela.
— Você pensa em mim? — Ele questionou, com os olhos cravados nos dela.
, no entanto, virou o seu rosto para o chão e estranhou. Por segundos, ele chegou a acreditar que a resposta dela não era exatamente o que ele queria ouvir.
— Naquele dia…
A se interrompeu, mordeu os beiços e balançou a cabeça de um lado para o outro, criando coragem para erguer seu rosto de encontro ao dele. Curioso, franziu o cenho e a observou, como se tentasse guardar cada um de seus traços na memória.
— …Quando você disse que queria se afastar de mim…
… — Ele a chamou, mas fez que não com a cabeça. Em seguida, ela abraçou o pulso dele com seus dedos e o empurrou para baixo, dando alguns passos para trás em seguida.
— Naquele dia, você disse que talvez estivesse disposto a mudar o que tínhamos. — Ela mordeu os lábios e respirou fundo, coçando os cantos internos de seus olhos com a ponta do indicador. — Do que você estava falando, ? — Insistiu em saber e ele voltou a olhá-la.
Em silêncio, o filho de Tori deu alguns passos à frente, erradicando a distância entre e ele. Ela se manteve parada, sentindo um frio percorrer o seu peito de uma extremidade à outra, bem como as borboletas baterem asas contra a parede do seu estômago.
Por favor, diga o que eu quero ouvir. — Ela implorou mentalmente e um sorriso torto surgiu no rosto de , como se ele pudesse ouvi-la de fato.
— Eu acho que você sabe muito bem do que eu estava falando, bonitinha.
E ele disse. Não com as mesmas palavras, mas exatamente o que precisava ouvir.
Um sorrisinho sapeca sambou pelos lábios de e, sem pedir permissão, ela avançou sobre , juntando sua boca à dele.
O tropeçou sobre os seus pés e deu alguns passos para trás, fazendo rir entre o beijo.
Quando finalmente conseguiu raciocinar e entender o que estava acontecendo, envolveu a cintura da menina com um de seus braços enquanto sua mão livre subiu até a nuca da garota, puxando levemente seus cabelos, a forçando a erguer sua cabeça.
A língua de adulou os lábios de , sentindo o gosto de cereja preso ao seu batom, e ela soltou um grunhido, dando a ele passagem completa para dentro de sua boca.
a abraçou firmemente com os dois braços e os dois caminharam cegamente pelo celeiro até que as pernas de batessem contra a madeira da mesa. Sem interromper o beijo, passou a mão por uma das pernas de e ela saltou, prendendo o seu corpo ao dele.
O afastou todo e qualquer material que pudesse atrapalhá-los de cima da mesa e apoiou o corpo de sobre o tampo de madeira. Quando o ar se fez necessário, a garota se afastou, ofegante.
tentou recuperar o fôlego, enquanto empurrava o casaco de para longe. Ele, por sua vez, traçou um caminho de beijos da boca de , passando pelo seu pescoço até alcançar seu ombro, onde ele cravou levemente os dentes, a fazendo revirar os olhos.
abaixou a alça do vestido de e ela riu, ao passo que tentava desabotoar a blusa que ele usava.
— Que droga, . — Ela mordeu os beiços e interrompeu o que estava fazendo para olhá-la. — Você está arruinando a nossa amizade. — Brincou, com um sorriso sacana nos lábios. Ele, por outro lado, rolou os olhos, sentindo entrelaçar os braços em volta do seu pescoço.
Em seguida, levantou a barra do vestido de até onde conseguiu e apoiou uma de suas mãos sobre a sua perna esquerda, a apertando com certa intensidade. Sua mão livre, ele levou de volta até a nuca da garota, onde emaranhou seus dedos aos fios soltos de seu cabelo.
Por fim, aproximou o rosto do ouvido de e ela fechou os olhos, sentindo a respiração quente dele bater contra a sua pele.
— O seu corpo está me dando todos os sinais, bonitinha.
Proferiu, mordiscando o lóbulo de sua orelha. soltou um grunhido e, por impulso, entrelaçou seus dedos aos cachos do cabelo de .
— Eu não preciso ler os seus pensamentos para saber que isso é exatamente o que você quer que eu faça. — Ele deu de ombros, se afastando em busca dos olhos de , e ela o encarou, estarrecida.
Um riso leve surgiu no rosto de enquanto ele passava o polegar pelo lábio inferior de e, em seguida, o avançou sobre a garota unindo duas bocas em um beijo alvoroçado, quente e cheio de malícia.
A garota apertou suas pernas em torno da cintura de e ele puxou levemente os cabelos em sua nuca, fazendo-a grunhir com seus beiços rentes ao dele. Seus braços também se entrelaçaram ao redor do pescoço do garoto e suas unhas cravaram em seus ombros, ainda que por cima do tecido da roupa que ele usava.
, no entanto, deixou um riso escapar entre o beijo e o interrompeu, puxando levemente o lábio de com a ponta dos dentes. Sem entender, a franziu o cenho ao passo que virou o rosto para baixo e jogou o peso de seu corpo sobre seus braços, com as mãos apoiadas na mesa, uma de cada lado do corpo de .
— O que foi? — Ela questionou, tentando erguer o rosto de , e ele deu de ombros.
— Eu não acredito que você estava com ciúmes da Allie! — Retrucou, soltando um riso nasalado, e revirou os olhos, acariciando as bochechas de com a ponta dos dedos.
Em seguida, ele inclinou o tronco para frente e beijou o pescoço de , causando certa sensação de cócegas quando sua barba rala roçou contra a pele sensível dela.
— Ah, por favor! Como se você também não estivesse morrendo de ciúmes do Arthur. — A garota rebateu, atraindo a atenção de de volta para o seu rosto.
— Talvez eu estivesse. — O confessou, fitando os beiços avermelhados da garota, e ela, por sua vez, pressionou um contra o outro, tentando impedir que um sorrisinho bobo dançasse sobre eles.
Antes de prosseguir, debruçou o seu corpo sobre o de , selando sua boca com um beijo doce. Ela sorriu, sentindo suas bochechas queimarem, e ele roçou seu nariz ao dela por alguns segundos.
— Você não precisa ter ciúmes da Allie, .
Ele proferiu, com o olhar baixo, e respirou fundo, sentindo seu coração palpitar e as mesmas borboletas de sempre maltratarem o seu estômago.
— Só existe uma bonitinha capaz de me… Enlouquecer. deu de ombros e rolou os olhos, mas o semblante engraçado no rosto de a fez gargalhar, jogando a cabeça para trás como uma criança de oito anos.
Ele riu com a cena à sua frente e entrelaçou os dedos de uma de suas mãos aos da dela, levando-a até seus lábios, onde depositou um beijo carinhoso e cheio de cuidado.
— E ela é você, caso não tenha entendido ainda. — Disse, por fim, e entortou seus beiços em um sorriso leve.
Por conseguinte, ela acariciou o rosto de , passando os dedos nos pelos ásperos de sua barba, e sorriu. Em seguida, inclinou seu corpo para frente e alcançou os lábios do garoto em um beijo suave, lento e cheio daquilo que ela vinha nutrindo por há bons meses — mas que só recentemente tinha sido apresentado à ela: amor.
— Eu senti tanto a sua falta. — Disse, sentindo seu peito comprimir um pouco, enquanto roçava o nariz ao dele, e acariciou sua perna. — Do seu beijo, do seu cheiro, do seu… — fez uma pausa entre as palavras, umedeceu a garganta e apoiou a sua testa contra a de , soltando um riso leve. — … Toque.
Ela suspirou, pressionando os lábios com as pontas dos dentes, e achou graça, segurando o rosto dela entre suas mãos, o puxando para cima.
— Por que você não me mostra onde sentiu falta do meu toque, ?
Sua voz saiu meio arrastada e, em seguida, ele segurou uma das mãos de e a posicionou sobre sua coxa. A se surpreendeu, deixando seu queixo cair alguns centímetros, e riu.
Por conseguinte, a cerrou os olhos e balançou a cabeça de um lado para o outro, voltando a cruzar seus braços ao redor do pescoço do rapaz.
— Você sabe muito bem onde, . — Retrucou e um sorriso sacana saltou pelos lábios de antes de sentir colar os dela aos seus.
O intensificou o beijo naturalmente e, enquanto estava suficientemente entretida, os dedos de traçaram um caminho lento — embora preciso — por toda extensão da perna da garota, passando por baixo do cetim de seu vestido, até alcançar a parte mais interna de .
Quando sentiu os dedos de alcançarem sua intimidade, soltou um grunhido e o riu entre o beijo, antes de voltar a intensificá-lo.
!
Por impulso, no momento em que ouve uma voz bastante conhecida gritar seu nome, empurrou o corpo de para longe do seu. Assustado, se virou em direção ao som e abriu um espaço para que visse seus pais e Arthur parados a alguns passos de distância.
Fudeu.
Em um movimento rápido, a saltou da mesa e umedeceu a garganta enquanto arrumava o tecido do vestido sobre seu corpo.
— Papai…
— O que você pensa que está fazendo com a minha filha?
Antes que conseguisse terminar, Pedro avançou sobre com certa fúria e o punho cerrado. O deu dois passos para trás, batendo o quadril contra a mesa, e arregalou os olhos, se colocando à frente de para protegê-lo.
— Nada! — Ela esbravejou, assustando Pedro. — Ele não estava… Não estava fazendo nada. — Proferiu, ofegante, desviando o olhar do homem à sua frente.
Sem entender, Pedro franziu o cenho e olhou de para algumas vezes. A fechou os olhos com força, implorando para que aquilo não passasse de um sonho ruim e, quando a ficha de seu pai caiu, o ouviu puxar todo o ar que conseguia para dentro de seus pulmões.
Ele agarrou um de seus pulsos e a puxou para a saída do celeiro, sem que ela tivesse tempo ou força para se defender.
— Se recomponha. Vamos terminar logo com isso. — O mais velho rangeu os dentes e arregalou os olhos, cravando seus pés no chão.
— Do que o senhor está falando? — A questionou e Pedro interrompeu seus passos. Ele apoiou uma de suas mãos na cintura e a outra coçou sua têmpora enquanto Ângela e Arthur assistiam a cena em silêncio.
— Nós estamos em uma festa de renovação de votos, não estamos? — Ele deu de ombros e olhou para a mãe, sem entender. — Existe um padre, um juíz de paz… Eu, sei lá! Em algum lugar dessa chácara, e eu vou pessoalmente pedi-lo para que ele case vocês. — Proferiu, apontando para Arthur com certa raiva. — Aqui e agora. — Disse, por fim, tentando alcançar o braço de mais uma vez.
A , no entanto, conseguiu ser mais rápida e deu dois passos para trás, se distanciando do alcance de seu pai.
— O senhor enlouqueceu? — Ela questionou com os olhos esbugalhados, e um sorriso irônico saltou pelos lábios de Pedro.
— Querido... As coisas não são assim. — Ângela deu alguns passos em direção aos dois, com certo receio, e o homem a olhou.
— Realmente não são. — Ele deu de ombros, abrindo os braços, e a mulher lançou um olhar preocupado para a filha. — Mas não nos deu muita escolha. — Proferiu, voltando sua atenção para . — Prefiro mil vezes que esse casamento ocorra às pressas do que adiar ainda mais e voltar para o Brasil sabendo que sou pai de uma adúltera.
— Pedro! — Ângela esbravejou, repreendendo-o.
— Do que o senhor me chamou? — perguntou, estarrecida.
— Você ouviu muito bem, . — O mais velho retrucou, rolando os olhos. — Agora, ande! Eu não quero perder mais um segundo do meu tempo olhando para esse... Rapaz. — Disse, olhando da cabeça aos pés com certo desdém.
O , no entanto, se limitou a rir com deboche pela atitude patética do mais velho.
— Não. — A proferiu, balançando a cabeça na negativa, e Pedro se surpreendeu.
— O que disse?
— Eu disse que não, papai. — Ela deu de ombros, com um sorriso cansado nos lábios, e o homem franziu o cenho, a vendo dar alguns passos na sua direção. — Eu não vou com o senhor, eu não vou me casar com o Arthur, e eu também não admito que me chame de adúltera. — Proferiu entredentes, sentindo seus olhos arderem pela vontade de chorar.
Mas ela não choraria. Não agora. Não na frente de seu pai.
— Ainda mais o senhor, que viaja por meses jurando estar em uma cidade, quando todos nós sabemos que está em outra com a porra da sua amante! — bateu o pé no chão, mordendo o beiço com força, e Pedro arqueou as sobrancelhas.
As palavras de demoraram a serem processadas pelo seu pai, mas quando isso finalmente aconteceu, o mais velho voltou a avançar sobre a menina com a mão esquerda espalmada no ar.
Quando percebeu as intenções de Pedro, se jogou na frente da garota e empurrou o homem para trás, usando a força de seus dois braços.
— O que é isso? Para que isso? — O questionou com os olhos arregalados, olhando de Pedro para Ângela algumas vezes. — Você enlouqueceu, porra?! — Ele gritou e, dessa vez, foi quem partiu para cima do mais velho, com os punhos cerrados.
! — gritou, colocando as mãos sobre seus lábios em seguida. Pedro deu alguns passos para trás, por impulso.
— Por causa de um casamento? O senhor vai bater na sua filha por causa da porra de um casamento que não vai fazê-la feliz? — Ele perguntou, enfurecido, sentindo as mãos de puxarem um de seus braços.
O pai da garota riu, exausto.
— Eu realmente não tenho tempo para perder discutindo com você, garoto. — Pedro retrucou, esfregando o cenho. — Você não é ninguém. — Ele deu de ombros e gargalhou.
— Se o senhor acha que não, problema seu. Eu realmente não me importo com o que um velho antiquado pensa sobre mim. — O rebateu, cheio de indiferença, e o pai de elevou as sobrancelhas, surpreso. — Mas não espere que eu fique quieto enquanto vejo você fazer o que está fazendo com ela. — Proferiu, lançando um olhar rápido para . O homem riu.
— Sabe que eu tive a sensação de que você não era uma boa pessoa no momento em que te vi pela primeira vez naquele jantar? — Ele questionou, cerrando o olhar, e rolou os olhos, entediado. — Com todas essas tatuagens e anéis, eu sempre soube que você seria uma má influência para .
— Má influência é esse otário ao seu lado. — retrucou, visivelmente irritado, apontando para Arthur que, envergonhado, desviou o olhar para o chão. — Ele quebrou o voto de castidade muito antes da , por que o senhor não está dando chilique por causa disso? — Proferiu, sem pensar, e arqueou as sobrancelhas.
Ângela levou as mãos à boca para abafar a surpresa; Arthur olhou para , assustado, e Pedro franziu o cenho, sem entender.
! — A esbravejou e a olhou, notando no semblante de o seu erro. Frustrado, fechou os olhos e balançou a cabeça de um lado para o outro.
— O que você disse? — Pedro questionou, estarrecido.
— Eu... Eu não...
— Você... Você quebrou o seu voto, ? — O mais velho questionou, ignorando . , por sua vez, suspirou e criou coragem para dar um passo à frente.
— Pai...
— Responda a minha pergunta! — Pedro esbravejou, fazendo a filha saltar com o susto. — Quando? Com quem?
Ele insistiu em saber e umedeceu a garganta, desviando o olhar para o chão. a olhou, apreensivo, e Pedro notou a preocupação no rosto do rapaz.
Com ele? — Questionou com desdém e a atenção de voltou para si.
Enquanto o mordiscou os cantos internos de suas bochechas, fechou os olhos com força, sentindo seu peito apertar ainda mais. Pedro riu, girando o seu tronco em busca de sua mulher.
— Você está ouvindo, Ângela? — Ele perguntou, voltando seu olhar para a menina. — Está vendo o que a decisão de mandar a sua filha para essa cidade nos causou?
— Nossa filha, Pedro. — A mulher fechou os olhos, o corrigindo, e Pedro virou o seu rosto de encontro ao dela outra vez.
— Não. — Ele se apressou em dizer e a mãe de respirou fundo, tentando manter o equilíbrio. — A minha filha não teria me decepcionado a esse ponto. — Pedro deu de ombros e ergueu a cabeça em um movimento abrupto.
— Por Deus, o senhor está agindo como se eu estivesse morta! — Ela esbravejou, atraindo a atenção de seu pai de volta para si.
— E não está? — Ele questionou, a olhando da cabeça aos pés, e se surpreendeu, deixando seu queixo cair alguns centímetros.
— Não diga isso, Pedro! — Ângela o repreendeu, batendo o pé no chão.
— E por que não? Eu nem sequer reconheço essa pessoa na minha frente. — Retrucou, ainda com os olhos agarrados à . — A minha passarinha era perfeita. — Ele deu de ombros e um riso sem humor saltou pelos lábios da .
— Você não sabe o que está falando. — Ângela se manifestou, dando alguns passos em direção aos dois e alcançando o braço de Pedro com suas mãos. — Vem, vamos sair daqui, você precisa esfriar essa cabeça. — Disse, puxando o marido para a direção oposta à filha.
— O senhor tem razão…
— Chega, ! — Sua mãe gritou, nervosa, a repreendendo, mas a ignorou.
— ... Eu não sou perfeita. — A deu de ombros, sem pensar nas consequências que aquilo poderia causá-la.— Mas eu sou a sua filha, e se o senhor me amasse tanto quanto se orgulha em dizer, entenderia que a única pessoa errada nessa situação toda é você mesmo. — Proferiu por fim, sustentando o seu olhos contra os de Pedro, e ele se surpreendeu com a frieza no seu tom de voz.
Um silêncio ensurdecedor tomou conta do ambiente e, embora estivesse tremendo, tentou se manter firme e centrada perante a situação. , por outro lado, mantinha seus olhos cravados nela, pronto para reagir em sua defesa caso fosse preciso.
Pedro, no entanto, parecia exausto demais para continuar com aquela discussão que — querendo ou não — não os levaria a nenhum tipo de denominador comum.
— Vamos embora, Ângela. — Disse, deixando sua mulher o puxar para longe de e, em questão de segundos, tanto eles quanto Arthur desapareceram do campo de visão de e .
— Finalmente. — O comemorou, se aproximando de . — Eu estava a um passo de dizer que me casaria com você só para encerrar de vez essa discussão. — Ele brincou, apoiando uma de suas mãos sobre a curva da cintura da garota.
Furiosa, virou o seu corpo de frente para em um movimento brusco.
— O que você disse? — Ela franziu o cenho, confusa. — Isso tudo é uma grande piada para você, não é, ?
— O quê? — O questionou, sem entender. — Claro que não.
— Você realmente acha que propor casamento em meio a esse caos ajudaria em algo? — perguntou, visivelmente irritada, e suspirou, rolando os olhos — Isso não é a porra de uma música da Taylor Swift! — Ela esbravejou, batendo o pé no chão com força.
, eu estava brincando.
— Você também estava brincando quando falou sobre o meu voto? — A insistiu em saber, sentindo seus olhos arderem ainda mais, e respirou fundo, esfregando a têmpora.
— Me desculpe por isso. Eu estava puto e quando vi... Escapou. — Confessou, encolhendo os ombros, e um riso irônico saltou pelos lábios de .
— Claro. Porque as coisas com você são sempre assim, não é? — Ela questionou, cruzando os braços na frente do seu peito. — Você age sem pensar e quando se dá conta... Escapou. Simples assim. — deu de ombros, completamente indiferente.
, por outro lado, cerrou os olhos contra os dela e, embora tentasse disfarçar, a conhecia suficientemente bem para saber que ela estava fazendo uma força sobre humana para não chorar, e muito menos desabar na sua frente.
E, para que isso não acontecesse, estava fazendo uso de um mecanismo de defesa comum para : a transferência.
— Eu não vou entrar nessa discussão agora, . — O disse, balançando a cabeça de um lado para o outro enquanto passava pela e seguia em direção à saída do celeiro. — Você está nervosa e está começando a falar coisas das quais eu sei que você vai se arrepender depois. É melhor pararmos e...
— Me arrepender depois? — o interrompeu com as sobrancelhas arqueadas. — A única coisa que eu me arrependo agora é de ter confiado em você, . Porque, se você tivesse o mínimo de consideração por mim, não teria deixado isso escapar. — se surpreendeu, parando de andar para olhá-la.
— Você acha que eu não tenho consideração por você? — Ele questionou, arqueando as sobrancelhas. deu de ombros, como se a resposta fosse óbvia o suficiente.
Desacreditado, balançou a cabeça na negativa e seguiu alguns passos até a garota.
— Você acha que eu não gosto de você, ? — insistiu em saber, a poucos metros de distância de .
A o encarou em silêncio por alguns segundos, com os braços cruzados na frente de seu peito. Em seguida, ela desviou o olhar do de , fechou os olhos e coçou a têmpora com a ponta dos dedos.
— Eu acho… Que isso foi um erro. — Confessou, relaxando os ombros.
— O que exatamente? — perguntou, buscando pelos olhos de , e ela suspirou, voltando sua atenção para ele.
Isso, . Nós dois. Tudo o que aconteceu desde que eu pedi para que você me ensinasse… — A fez uma pausa, mordeu os lábios, e ergueu as sobrancelhas, entendendo o seu ponto. — … Você sabe.
— Então eu fui um erro?
— Não foi o que eu disse.
— Não, . Foi exatamente o que você disse. Você está de palhaçada, porra?
O perguntou, com o tom de voz mais alto que o normal, e a garota umedeceu a garganta, assustada com a reação de .
— Olhe para você agora e olhe para você um ano atrás. Você realmente se arrepende das escolhas que tomou durante esses meses? — O insistiu em saber, mas se manteve em silêncio e ele riu.
Exausto, respirou fundo e pinçou os lábios antes de continuar.
— Você realmente não percebe, não é, ? — cerrou os olhos, apoiando as mãos na cintura, e a garota franziu o cenho, sem entender.
— Não percebo o quê?
Um sorriso debochado escorreu pelos beiços de e se irritou, partindo para cima do rapaz em passos largos.
— Eu não percebo o que, ? Pare de insinuar as coisas e seja homem para me dizer de uma vez! — Esbravejou, empurrando o peito do rapaz. — Eu não percebo o quê?
queria um motivo. Ela queria um único motivo que justificasse toda essa merda. Que justificasse o surto no dia em que cogitaram uma possível gravidez; que justificasse o afastamento repentino, a decisão de estabelecerem uma relação de amizade sem qualquer tipo de benefício; que justificasse o fato dele quase ter voado em cima de Pedro como um louco só para defendê-la.
Existia um motivo singular para explicar cada uma dessas ações impensadas e, no fundo, sabia qual era. E sabia, porque em uma possível troca de papéis, ela teria se comportado da mesma forma por ele.
A diferença é que, se se encontrasse em uma situação de fragilidade como a dela agora, não pensaria duas vezes em dizer exatamente o que ele queria ouvir.
E, por Deus! Como ela queria ouvir.
Ela precisava ouvir, e só assim teria certeza de que não, não foi um erro. Não foi um desperdício de tempo e, principalmente, teria certeza de que a briga com seus pais não teria sido em vão.
Afinal, nada acontece em vão por causa do amor.
Diga , diga de uma vez! Com todas as letras!
Mas ele não disse.
E, se ele não disse, não é ela a pessoa que iria dizer.
Exausta, balançou a cabeça de um lado para o outro, deu dois passos para trás, se afastando de e, em seguida, contornou o corpo do rapaz. Sem proferir mais uma palavra sequer, a brasileira começou a seguir pelo caminho que a levaria de volta à festa.
, por sua vez, fechou os olhos com força e se repreendeu mentalmente. Arrependido por ter dito aos pais de algo que não dizia respeito a ele, por ter gritado com ela e, principalmente, por não ter dito o que ele sabia que queria ouvir.
Talvez ainda não fosse tarde demais.
! — Ele esbravejou, mas a garota pareceu não ouvir. — ! — tentou mais uma vez e, como resposta, a brasileira balançou a cabeça de um lado para o outro, sem parar de andar.
Nervoso, correu para alcançá-la e, quando ficou a uma distância razoável, a puxou pelo pulso, forçando o seu corpo de frente para o dele.
— Me escuta. Eu…
— Não!
gritou, puxando o seu braço de volta com toda a força que lhe foi concedida no momento, e sentiu seu peito apertar ao notar, pela primeira vez, seus olhos molhados pelo choro.
— Eu não quero ouvir, . Mais uma vez eu te dei a chance para dizer e você não disse. — Ela riu, sem humor, dando alguns passos para trás.
Quando os lábios de se espessaram e ele pensou em dizer algo, se apressou para cortá-lo.
— Eu cansei de esperar que as pessoas façam por mim exatamente a mesma coisa que eu faria por elas. E eu definitivamente não tenho mais forças para implorar que elas façam. — Confessou, puxando o choro pelo nariz e aprumando a postura.
, e-eu não… — O abriu os braços, gaguejando, sem saber exatamente o que dizer.
Ou como dizer.
Cansada, rolou os olhos, deixando mais uma lágrima cair, e se virou, voltando a seguir o mesmo caminho de antes e deixando para trás, puto com suas próprias atitudes.
A logo começou a correr em direção à tenda, esbarrando em alguns convidados por conta de sua vista embaçada, completamente perdida em seu espaço tempo, até que sentiu duas mãos apertarem cada um de seus braços com certa intensidade.
? — reconheceu a voz de Maria Luiza e, atônita, ergueu a cabeça, encontrando um semblante preocupado no rosto da amiga. — O que aconteceu? — Malu insistiu em saber e varreu o ambiente com os olhos, secando o rosto molhado com as mãos.
— Você viu a Vitória? — Ela questionou, puxando o choro pelo nariz. Sem entender, Malu balançou a cabeça de um lado para o outro. — Eu preciso falar com ela.

Capítulo Onze

“I won’t ask you to hold, me ‘cause that won’t mend what’s helpless”
Alessia Cara, Out Of Love.

Narrador Avulso


Londres, 03 de setembro de 2020
Casa dos Carters



Saltei da cama por volta das dez da manhã. Fui para o banheiro, onde substitui a calça de moletom azul por uma bermuda esportiva preta e uma regata cinza. Encarei o meu reflexo no espelho sobre a pia e as marcas em meu rosto deixaram evidente as últimas duas noites mal dormidas.
Depois da discussão com em Holmes Chapel, tentei fazer com que minha mãe e Éric acreditassem na história de que eu precisava voltar para Londres o mais rápido possível, para uma reunião inadiável com Jeff e os responsáveis pelo meu show em Manchester.
Não achava que eles, Geórgia, meus amigos ou qualquer um dos outros convidados acreditaram nisso, mas eu também não me importava. Eu queria sair de lá e procurei a maneira mais rápida de fazer isso.
E sim, eu estava fugindo.
Eu não queria dormir na mesma casa que e seus pais e no dia seguinte precisar tomar café sentado na mesma mesa que eles, como se nada tivesse acontecido no dia anterior. Porque aconteceu, e eu tive uma boa parcela de culpa nisso.
Mas a verdade é que eu fui covarde.
Covarde por ter estupidamente deixado escapar a história sobre a quebra do voto de castidade e por não ter dito à o que ela queria ouvir e o que eu queria dizer. Posso jurar que senti as palavras se formarem na minha garganta, mas por algum motivo não consegui fazer com que elas saíssem pela minha boca.
Não me lembro de já ter dito eu te amo a alguém. Mas não deve ser tão difícil assim, qual é!
Eu sou um idiota.
Ou será que eu não estou tão apaixonado pela quanto imaginei estar?
Não. Continuo com a tese de que sou um idiota. O maior de todos, com certeza. E talvez o meu medo de não ser o cara perfeito para a bonitinha fosse justamente a razão pela qual eu não consegui ser sincero com ela.
Merda.

Resmunguei, chacoalhando a cabeça de um lado para o outro, e decidi jorrar um pouco de água gelada no meu rosto para me tirar daquele devaneio. Sabia que em algumas horas teria de enfrentar e seria melhor se nenhum pensamento estúpido me atrapalhasse.
Desci as escadas com certa velocidade, enquanto prendia o boné azul em volta da minha cabeça e seguia para a cozinha, onde pretendia preparar algo que me desse energia o suficiente para correr por bons quilômetros.
Lá, encontrei minha mãe distraída com uma revista enquanto tomava café. Me aproximei, ela me recebeu com um sorriso no rosto e apoiou a xícara sobre balcão enquanto depositava um beijo carinhoso no topo de sua cabeça.
— Bom dia, meu amor. Como foi a sua reunião? — Ela questionou e eu a olhei, sem entender, ao mesmo tempo que roubava duas bananas de dentro da fruteira no centro da ilha de mármore.
— Reuni…
— É. Com o Jeffrey e tudo mais. — Minha mãe deu de ombros, voltando sua atenção para a matéria à sua frente, e eu arqueei minhas sobrancelhas.
— Ah sim, claro. Foi ótima. — Dei de ombros, tentando disfarçar a mentira, e minha mãe sorriu, me olhando de soslaio. — Está tudo certo. — Garanti, forçando o meu melhor sorriso.
— Que bom. Estou ansiosa para isso.
Ela proferiu, bebericando o café em sua xícara, e eu respirei fundo, me sentindo subitamente nervoso.
— Hmm, você pode me fazer um favor?
Vitória questionou, deixando de lado o objeto em sua mão, e eu dei de ombros mais uma vez, dando a primeira mordida na banana, ao passo que vi minha mãe limpar os cantos dos lábios com um guardanapo de pano.
— Você pode buscar os gêmeos na escola hoje? Oliver vai dormir na casa de um amiguinho, mas eu e Éric teremos uma reunião daquelas com alguns servidores e, bom... Não devemos chegar antes das sete. — Ela suspirou, exausta, e eu franzi o meu cenho.
— Isso não é trabalho da ? — Questionei, olhando para os lados, um tanto quanto confuso. — Ela não pode ir?
Minha mãe, por conseguinte, desviou o olhar do meu e remexeu o corpo sobre o banco de madeira como se estivesse desconfortável. Sem entender, larguei a fruta da minha mão sobre o balcão e me aproximei de Vitória, desconfiado de sua reação.
— Mãe…?
pediu demissão ainda lá em Holmes Chapel.
Proferiu, voltando sua atenção para mim, e eu arqueei as sobrancelhas, surpreso, dando dois passos para trás. Minha mãe suspirou, arrumando sua postura.
— Eu não entendi muito bem o porquê e, óbvio, não aceitei o pedido, mas ela parecia bem decidida e um tanto quanto desnorteada. — Ela fez uma pausa, respirou fundo e coçou a têmpora antes de continuar. — Enfim, estou dando esse tempo para ela pensar.
— Espera... — Disse, balançando minha cabeça de um lado para o outro. — ...Ela o quê?
Cerrei os meus olhos, de encontro aos da minha mãe, e vi o canto esquerdo dos seus lábios se curvarem em um sorriso leve. Em seguida, minha mãe se levantou e deu alguns passos até mim enquanto apoiava um de meus braços sobre o balcão de mármore, meio desnorteado com a notícia.
— Eu não sei o que aconteceu. Mas eu sei que aconteceu algo. — Vitória sorriu, tocando levemente o meu rosto e puxando minha atenção para si. — Assim como eu também sei que vinha acontecendo algo entre vocês há alguns meses.
Ela deu de ombros com um sorriso nos lábios e eu arregalei os meus olhos. Minha mãe achou graça e eu balbuciei algo inaudível, como o perfeito idiota que sou.
— Você não precisa negar, eu não vou ficar com raiva, nem muito menos prejudicar por isso. Muito pelo contrário, eu fiquei muito feliz quando vocês começaram a dar os primeiros sinais de que algo estava acontecendo entre vocês. — Ela deu de ombros, me surpreendendo ainda mais.
Em seguida, Tori deu alguns passos para trás e eu senti os músculos do meu rosto relaxarem. Meu semblante mudou por completo, senti minhas bochechas corarem e, envergonhado, desviei meu olhar para o chão, passando a ponta do polegar pelo canto interno do olho. Minha mãe riu.
— Isso explica o comportamento da Helena e toda aquela história sobre ser a minha princesa. — Voltei a erguer o meu rosto de encontro ao dela e ela gargalhou, cobrindo a boca.
Culpada! — Esbravejou, me fazendo rir por alguns instantes.
Vitória me observou em silêncio, ao passo que recuperava o meu fôlego e virava o meu rosto para baixo mais uma vez.
— Vocês brigaram? — Sua voz saiu por um fio e imediatamente voltei a olhá-la. Minha mãe mordeu os beiços, ansiosa pela minha resposta, e eu respirei fundo, torcendo o meu nariz.
— Os pais dela descobriram sobre… A gente. — Vi Vitória arregalar os olhos, surpresa, e um riso leve escapou pelos meus lábios. — É, você deve imaginar. Eles discutiram, eu acabei me metendo por impulso, e agora acha que eu não gosto, ou não me preocupo com ela.
— E você gosta? — Minha mãe arqueou as sobrancelhas com o semblante animado no rosto como o de uma adolescente de quinze anos assistindo a um episódio de The Vampire Diaries, o que me fez rir.
— A senhora precisa mesmo que eu diga? Porque pelo jeito que você está me olhando, eu tenho certeza de que isso está escrito na minha testa. — Retruquei, apoiando minha mão sobre o mármore gelado.
— E está. — Ela deu de ombros e eu rolei os meus olhos, ouvindo a sua risada. — Mas eu ainda não entendi. Se acha que você não gosta dela, por que você não disse o contrário?
Vitória franziu o cenho, confusa, puxando minha atenção de volta para si, e eu respirei fundo, mordendo os cantos internos da minha bochecha.
— Porque, pelo visto, a senhora deu à luz a um covarde. — Soltei um longo suspiro, passando o indicador pela ponta do meu nariz. — Eu devo ter puxado isso do meu pai. — Disse, fazendo minha mãe revirar os olhos.
— Você não se parece em nada com o seu pai, .
— Então por que eu não consigo ser sincero com a , mãe?
Minha voz saiu estremecida e eu chacoalhei a cabeça, me sentindo um tanto quanto bobo por estar falando sobre isso com a minha mãe. Ela, por outro lado, suspirou e, mais uma vez, se aproximou de mim.
— Tudo no seu tempo, bonitinho.
Deixei um riso escapar quando a ouvi me chamar pelo mesmo apelido que e os lábios de Tori se entortaram em um sorriso singelo enquanto uma de suas mãos se apoiou contra o meu peito.
— O que você pretende fazer agora?
— Eu não sei. — Confessei, esfregando os olhos com o dorso da mão. — A única coisa que eu sei, é que eu não posso deixar a menina sem emprego por minha causa. — Proferi, cruzando os meus braços na frente do peito, e Vitória concordou, balançando a cabeça na afirmativa.
— De jeito nenhum. Ainda mais sabendo que os seus irmãos vão me enlouquecer no momento em que souberem que ela não está mais aqui.
Ela arregalou os olhos e eu achei graça, desviando momentaneamente o meu rosto para o chão enquanto chacoalhava a cabeça na negativa. Ouvi minha mãe soltar um longo suspiro, mas não voltei a olhá-la.
— E em relação a vocês? — Vitória perguntou como se pudesse ouvir os meus pensamentos, e um riso involuntário saltou pelos meus lábios. — Já sabe o que vai fazer?
— Também não, mas…
Quando voltei a erguer o meu rosto, meus olhos fitaram o cartão postal de Amsterdã preso à geladeira com um imã. Pensei poucas vezes antes de tomar uma decisão e voltei minha atenção para a mulher à minha frente, um tanto quanto atônito.
— Eu vou resolver isso. — Disse, alcançando as chaves do carro sobre o balcão, e Vitória acompanhou os meus passos apressados sem se mover.
— Aonde você vai?
— Eu acho que sei onde está. — Proferi, virando o meu corpo de frente para o da minha mãe enquanto continuei caminhando de costas. — Também sei como convencer ela a desistir dessa ideia de demissão.

Londres, 03 de setembro de 2020
Casa dos Thompkins



Senti o celular vibrar debaixo do travesseiro e isso roubou a minha atenção do episódio de Brooklyn Nine Nine que rodava na televisão há pelo menos dez minutos. Ergui levemente o meu tronco e saquei o aparelho, vendo a mensagem de minha mãe brilhar na tela.
Os meus olhos marejaram e a angústia comprimiu a minha traqueia, estava oficialmente sozinha nessa cidade.
?
Ouvi a voz de Maria Luiza chamar por mim e, em um movimento irreflexo, virei o meu rosto em direção ao som. A encontrei, a alguns passos de distância, parada no batente da porta com um pote de sorvete nas mãos e um sorriso pequeno nos lábios.
— Estou me sentindo a pior amiga do mundo por deixar você sozinha aqui. — Proferiu, caminhando até mim.
Entortei levemente os meus beiços e agradeci em silêncio quando tomei o pote de sorvete em minhas mãos. Ela, por conseguinte, se sentou ao meu lado no sofá e observou com atenção cada um dos meus movimentos.
Há alguns dias, pedi demissão e sai da casa dos Carters com todas as minhas coisas. Eu tinha algum dinheiro guardado por conta dos meses em que trabalhei cuidando das crianças e isso já era suficiente para me garantir o aluguel de um quarto qualquer em um Airbnb. Mas eu precisaria restringir a minha alimentação ao mínimo e me deslocar por Londres a pé, em busca de um novo emprego.
E eu faria, por Deus que faria.
Mas Maria Luiza não deixou que meu orgulho chegasse ao extremo.
No momento em que soube o que tinha acontecido e a decisão que eu tinha tomado em relação ao meu antigo trabalho, Malu me convidou para passar o tempo que fosse necessário no apartamento conjugado à casa de seus chefes. O que foi um alívio e algo pelo qual devia ser grata pelo resto da minha vida.
— Você precisa fazer o seu trabalho. — Respondi, pesando minha cabeça para o lado.
— O meu trabalho não inclui dar voltas e voltas pelo parque, acompanhada de um escocês de olhos claros, viciado em arte. Eu estou usando as crianças como desculpa. — Ela deu de ombros, me obrigando a soltar um riso leve.
— Jonah é uma boa pessoa. Vocês vão se dar bem. — Retruquei, lançando um olhar rápido para , que sorriu, balançando a cabeça na afirmativa.
Outra vez, senti o celular vibrar sobre a minha perna e isso roubou a minha atenção quase que abruptamente. Agora, minha mãe tentava se certificar de que estava bem, mas decidi ignorar sua mensagem novamente e bloqueei a tela do aparelho sem nem pensar duas vezes.
Desviei a minha atenção para o pote de sorvete sobre o meu colo, mas senti o olhar ansioso de Maria Luiza pairar sobre a minha pele.
— É a minha mãe. — Disse, sem erguer o meu rosto para olhá-la. — Eles acabaram de chegar no Brasil. — Forcei o meu melhor sorriso e ouvi Malu suspirar enquanto afagava as minhas costas em um gesto de carinho.
— E como você está?
— Bem. Eu estou… Bem.
Suspirei, tentando tirar um peso de mil toneladas da minha coluna e, em seguida, aprumei minha postura para encarar Maria Luiza.
— Eu tinha medo de que meus pais me obrigassem a voltar para o Brasil, ou me forçassem a casar com Arthur. Ou os dois.
Um riso leve e sem humor fez com que eu interrompesse brevemente as minhas palavras.
— Mas isso não aconteceu, então eu estou bem. Dadas as circunstâncias. — Dei de ombros, desviando o meu olhar para a guloseima em cima das minhas pernas.
— Vocês chegaram a conversar? — Malu atraiu a minha atenção de volta para si e eu franzi o cenho, sem saber a quem ela se referia exatamente. — Você e seus pais? — Ela questionou e, mais uma vez, virei o meu rosto para o chão.
Esfreguei os meus olhos com o dorso da mão e respirei fundo antes de continuar.

Holmes Chapel, dois dias antes.
Chácara de Éric


Puxei o choro pelo nariz e fechei os meus olhos com força, me livrando da vista embaçada e deixando que as lágrimas escorressem pelo meu rosto. Enxuguei minha bochecha molhada usando a manga da minha camisa e balancei a cabeça de um lado para o outro, tentando afastar aquela angústia para conseguir terminar de arrumar a minha mala o mais rápido possível.
O vestido que eu usava mais cedo havia sido substituído por uma calça de moletom preta e um cropped da mesma cor, enquanto meus cabelos, antes arrumados e perfeitamente alinhados, agora estavam presos em um coque despenteado no topo da minha cabeça. Respirei fundo, apertando todos os meus pertences dentro da pequena mala, e olhei para o tecido de cetim azul amarrotado sobre o colchão.
Me senti estúpida por motivos que nem sei explicar, mas consegui sentir — mesmo de longe — o perfume de preso em cada centímetro daquela roupa, e isso fez com que eu quisesse pôr fogo nela por inteiro. Mas isso seria radical demais e eu não conseguiria explicar o motivo da minha raiva sem chorar pelo menos três vezes mais do que eu já vinha chorando nas últimas horas. Então, por fim, acabei embolando o tecido entre os meus braços e soltei sobre as outras roupas, já dentro da mala.
Apoiei os meus braços sobre esse monte de tecido e joguei boa parte do meu peso sobre eles. Fechei os olhos e respirei fundo, tentando acalmar os meus nervos. Nesse momento, ouvi batidas na porta e dei um pequeno salto, assustada com o barulho.
Caminhei até a entrada do quarto e hesitei em abri-la, temendo quem quer que fosse a pessoa por trás daquele pedaço de madeira.
, sou eu. Abre essa porta. — Reconheci a voz da minha mãe e vi a maçaneta balançar, como se ela tentasse abrir mesmo sabendo que estava trancada.
Por mais que eu não quisesse, não conseguia desobedecer a um pedido dela. Se fosse o meu pai, talvez eu preferisse descer pelo parapeito da janela a abrir essa porta e dar de cara com ele, mas minha mãe era diferente.
Destranquei a fechadura e abri uma fresta na porta. Não esperei que a figura de minha mãe aparecesse dentro do quarto e logo dei as costas à entrada, caminhando de volta para onde eu estava.
— O que você quer, mamãe? Veio buscar informações sobre a filha desonrada para o seu marido? — Não consegui evitar a ironia que escapou pelos meus lábios e, sem pensar, girei o meu tronco, deixando o meu rosto de frente para o dela.
Em resposta, minha mãe suspirou, cansada, e fechou os olhos por alguns instantes. Por conseguinte, voltei a minha atenção para as minhas roupas e deixei um riso sem humor saltar dos meus beiços.
— Não. Eu vim dizer que seu pai já comprou as nossas passagens de volta para o Brasil. — Proferiu.
Nesse momento, senti o meu coração desacelerar e, não importava o quanto eu me esforçasse, meu cérebro parecia simplesmente não conseguir mandar todos os comandos necessários para que meus músculos se movimentassem.
Nossas? — Minha voz saiu por um sopro e, em um movimento irreflexo, virei o meu corpo de frente para o de minha mãe.
Não sabia dizer se meu emocional estava suficientemente abalado para mexer com os meus sentidos, mas podia jurar que vi um sorriso surgir em seus lábios, mas me neguei a acreditar que minha mãe seria sádica ao ponto de rir da minha tristeza.
— Nossas. — Ela deu de ombros, caminhando até mim. — Minha, dele e do Arthur. — Proferiu, tocando os meus braços em um gesto de carinho.
Arqueei as minhas sobrancelhas, um tanto quanto surpresa, e levei o meu olhar de encontro ao dela. Ela sorriu.
— Ele não vai me obrigar a casar com o Arthur? — Questionei, bem mais atordoada do que deveria.
— Não. E você também pode continuar em Londres. — Ela garantiu, afagando os meus cabelos. — Está tudo bem, passarinha. — Proferiu, acariciando levemente minhas pálpebras inchadas com seus polegares.
Entretanto, existia algo ali que não fazia sentido. Uma peça do quebra-cabeça simplesmente não encaixava nessa conversa. Por isso, abracei os pulsos de minha mãe com os meus dedos e forcei os seus braços para baixo. Me afastei dela, dando dois passos para trás, e bati minhas canelas contra a cama enquanto encarava minha mãe com certa desconfiança.
— E por que meu pai não veio me dar essa notícia junto da senhora? — Questionei com os olhos semicerrados e ela respirou fundo, desviando o olhar do meu.— Não está tudo bem. — Soltei um riso sem humor enquanto balançava a cabeça de um lado para o outro e coçava a têmpora, usando as pontas dos meus dedos. — Qual foi o preço disso, mamãe?

— Tudo bem, a senhora pode falar. Eu o conheço o suficiente para saber que ele não toma as melhores decisões de graça. — Dei de ombros, erradicando a distância entre os nossos corpos, e dona Ângela suspirou, esfregando os olhos com o dorso das mãos.
— Ele disse que não ajudaria financeiramente, caso você decidisse ficar. — Proferi, apoiando as mãos sobre sua cintura, e eu arqueei as sobrancelhas.
Clássico.
— Mas, passarinha, isso pouco importa. — Minha mãe elevou o tom de sua voz e disparou até mim, segurando os meus braços. — Você tem um emprego que te sustentou até agora e… — Deixei um riso involuntário escapar e ela interrompeu suas palavras, me encarando, sem entender. — O que foi?
— Nada. Você tem razão, eu não preciso do dinheiro dele. — Menti, escondendo dela a parte da história em que eu acabara de pedir demissão para a minha chefe. Ela sorriu.
— E mesmo que algum dia precise, você ainda tem a sua mãe! — Ela esbravejou, afagando os meus braços, o que me fez rir sem nem perceber.
Achei bonitinha a sua reação, mas isso não mudava o fato de que ela ainda era casada com o meu pai e ele nunca deixaria que ela me ajudasse. Por consequência, segurei o seu rosto entre as minhas mãos e acariciei as suas bochechas usando os meus polegares.
— Está tudo bem, mamãe. Eu consigo me virar. Você sabe que ele jamais deixaria você me ajudar. — Dei de ombros e ela suspirou, segurando as minhas mãos.
— O seu pai já tirou muito de mim, . Mas eu não vou deixar que ele tire os meus filhos.
— Eu não consigo entender por que a senhora continua casada com ele. — Disse, esfregando os meus olhos enquanto caminhava até a cama, onde me sentei.
— Por amor, passarinha. Não é óbvio? — Ela riu e o barulho fez com que eu levasse a minha atenção de volta para o seu rosto.
— Mamãe…
, o seu pai pode ser muitas coisas e eu concordo com você, mas ele é apaixonado por essa família. E eu não falo de mim, de você e do seu irmão. Eu falo da família como um todo e eu o amo por isso. — Ela proferiu e, sem entender, ergui minha cabeça para olhá-la. Minha mãe sorriu, soltou um suspiro breve e puxou a saia de seu vestido para conseguir se sentar ao meu lado. — Eu sei que por muitas vezes me calei diante da criação que ele decidiu dar a vocês, mas ele não errou, passarinha. Olhe para você! — Ela esbravejou, apertando os meus ombros, e um riso irônico saltou pelos meus lábios.
— Você não ouviu as coisas que ele disse mais cedo, mamãe? — Questionei e minha mãe rolou os olhos, jogando o corpo para trás.
— Você não pode levar a sério as coisas ditas por ele na hora da raiva, meu amor. Eu sei que elas são árduas e difíceis de ouvir, mas o seu pai ele… — Ela fez uma pausa entre as palavras para enxugar a lágrima solitária que escorreu pela minha bochecha e aproveitou para prender um pedaço da minha franja atrás da minha orelha. — … Ele ainda via em você aquela garotinha de cachinhos nos cabelos e tamanquinho nos pés. E o casamento com o Arthur foi uma maneira antiquada que ele encontrou de garantir que homem nenhum quebraria o seu coração.
— E não foi isso o que ele fez? — Questionei, puxando o choro pelo nariz, e minha mãe dobrou o pescoço, sem entender. — O Arthur, mamãe. Não foi isso que ele fez? Quebrou o meu coração?
— Você era apaixonada por ele? — Ela arqueou as sobrancelhas e eu me surpreendi. — Porque me parece que você é apaixonada por outro. — Um sorriso sapeca dançou pelos seus lábios e eu franzi o cenho, confusa.
— Do que você está falando?
— Do . Você está apaixonada por ele, não está? — Minha mãe me encarou, ansiosa pela resposta, e eu desviei o olhar do dela, balançando minha cabeça de um lado para o outro. — , eu sou sua mãe. Você não consegue mentir para mim, até o seu tom de voz fica diferente quando você fala nesse rapaz.
— Isso não faz mais diferença. — Minha voz saiu por um fio, tão baixa que nem cheguei a acreditar que minha mãe tinha conseguido ouvir.
— Como não? É claro que faz, passarinha! — Ela esbravejou, abraçando os meus ombros e me puxando para perto de seu colo. — Você não precisa mais se preocupar com o seu pai ou com quem quer que seja. Você é uma mulher livre para amar a quem você quiser. — Proferiu, apertando meu braço com leveza.
— Eu sei, mas o , ele…
— Ele também é apaixonado por você. — Minha mãe me interrompeu e, por impulso, ergui o meu rosto de encontro ao dela. Ela me encarou com as sobrancelhas arqueadas e um sorriso genuíno nos lábios, e eu cerrei os meus olhos, atônita. — Por favor, minha filha. Você não viu a forma como ele estava disposto a enfrentar a fúria do seu pai para te defender?
— E vocês pensam que eu sou do tipo de mulher que precisa de defesa? — Questionei, erguendo as minhas sobrancelhas, e minha mãe rolou os olhos, deixando um riso escapar.
— É claro que não, . Nenhuma mulher precisa. Mas não dói deixar que os homens façam esse trabalho no nosso lugar, vez ou outra. — Ela deu de ombros e eu achei graça da expressão em seu rosto. — Qual o problema? — Minha mãe questionou com a voz serena enquanto afagava os meus cabelos e eu respirava fundo.
— O problema é que eu não vou lutar por amor se ele não me encontrar no meio do caminho, mãe.

— Eu já dei ao todas as chances do mundo de ser claro comigo. De dizer o que sente, ou até mesmo o que não sente. Mas ele não faz e eu preciso que ele faça. — Dei de ombros com um sorriso sem humor nos lábios, e a mulher à minha frente respirou fundo.
— Atitudes dizem muito mais do que palavras, passarinha. E se você não enxergar isso, talvez quem precise encontrar com alguém no meio do caminho seja você, e não o contrário.
Ela retrucou, me surpreendendo. Deixei o meu queixo cair alguns centímetros e minha mãe achou graça.
— Você ainda é muito inexperiente em relação ao amor, . E eu tenho uma porcentagem de culpa nisso. — Ela deu de ombros e eu rolei os meus olhos, balançando a cabeça de um lado para o outro.
— Mãe…
— Eu tenho, minha filha. Eu deveria ter conversado mais com você, ter te explicado que a vida não é em nada parecida com aqueles livros que você costumava ler quando mais nova. — Proferiu, arrancando um riso dos meus lábios. — Não dá para ser a mulher que jura não precisar da defesa de um homem e ao mesmo tempo exigir que ele dê o primeiro passo em relação ao que vocês visivelmente sentem um pelo outro.
— Eu não estou exigindo nada do , é só que…
— Então por que você não disse? — Ela me interrompeu e eu prontamente me calei. Sem entender, franzi o meu cenho. — Por que não disse a ele como se sente? — Minha mãe questionou e eu respirei fundo, afastando o meu corpo do dela.
Envergonhada, desviei o meu olhar para o chão e passei a encarar o esmalte esverdeado que coloria as minhas unhas. Ela estava certa. Eu não tinha o direito de estar chateada com o por não ter feito algo que eu mesma poderia ter feito, mas não fiz.
— Por medo, eu acho. — Confessei, apoiando os meus cotovelos sobre os meus joelhos e erguendo o meu rosto de encontro ao quadro abstrato pendurado na parede.
— Medo de quê? — Minha mãe insistiu em saber, mas eu ignorei a sua pergunta. — Medo de quê, passarinha? — Ela questionou mais uma vez e eu respirei fundo, fechando os meus olhos por alguns instantes.
— De não ser suficiente. — Dei de ombros, levando o meu olhar de encontro ao dela, e minha mãe arqueou as sobrancelhas, surpresa.
, você é linda. — Ela retrucou, meio estupefata, e um riso fraco pulou pela minha boca.
— Não é isso. Por mais que eu não consiga acreditar, sempre fez com que eu me sentisse a pessoa mais bonita do mundo. — Proferi, fazendo dona Ângela sorrir sem mostrar os dentes. — Mas eu não tenho muita experiência com… — Interrompi minhas palavras quando senti minhas bochechas queimarem. — … Enfim, você sabe.
— Sexo? — Minha mãe questionou, elevando as sobrancelhas. — Você está falando de sexo? — Ela insistiu em saber e eu umedeci a garganta, balançando a cabeça na afirmativa. —
— Eu não tenho, mãe. Eu ainda sou bem inocente com algumas coisas e até mesmo um pouco boba. O completo oposto do . — Soltei o ar pela boca e escondi meu rosto entre as minhas mãos, embrenhando os meus dedos nos meus fios de cabelo.
Meus olhos marejaram e mais uma vez me senti uma completa idiota. Não queria chorar na frente da minha mãe, muito menos por isso, mas cada vez que pensava em como toda essa história com o poderia acabar com ele cansado de mim, caso não sentisse o mesmo que eu sentia por ele, a rachadura no meu coração aumentava.
Senti minha mãe aproximar o seu corpo do meu e, em seguida, sua mão tocou o dorso da minha cabeça, acariciando-a com leveza.
— Quando vocês se relacionaram, o , ele… — Ela fez uma pausa entre as palavras, para umedecer a garganta e eu mordi os beiços com certa força. — Ele respeitou as suas vontades? O seu tempo? — Minha mãe questionou e eu achei graça, virando o meu rosto de encontro ao dela quase que involuntariamente
— Ele foi um príncipe.
— Então você não tem com o que se preocupar, passarinha. — Ela sorriu, aliviada, enquanto afagava os meus cabelos. — Ninguém se apaixona por nível de experiência, as pessoas se apaixonam por… Pessoas. — Minha mãe deu de ombros com um sorriso leve nos lábios e eu respirei fundo.
— Eu não sei não, mãe. — Mordi os meus beiços, insegura, e ela revirou os olhos, impaciente.
— Me escuta, menina. Uma vez na vida pelo menos. — Proferiu, me fazendo rir. — O jeito que esse rapaz te olha, minha filha. Como você pode não perceber? — Ela questionou e eu soltei o ar pela boca, desviando a minha atenção.
— Eu só queria que ele dissesse. — Minha voz saiu como um sopro e minha mãe suspirou.
— Você sabe que fui eu quem me declarei para o seu pai na primeira vez?
Surpresa, voltei minha atenção para o seu rosto quase que abruptamente. Ela me encarou com as sobrancelhas arqueadas e então riu.
— Eu sei que o nosso casamento não é perfeito e talvez não deva servir de exemplo. Mas me declarar para o seu pai deu início a um novo ciclo, no qual eu ganhei duas das melhores coisas na minha vida. — Proferiu, acariciando minha bochecha.
Um sorriso singelo brota nos meus lábios e, sem pensar, virei o meu rosto e depositei um beijo de carinho na palma de sua mão.
— Sua avó, Nena, vivia dizendo que o futuro a Deus pertence. Mas não custa nada dar um empurrãozinho. — Ela deu de ombros, piscando um dos olhos.
Me calei por alguns segundos e um silêncio tomou conta do ambiente enquanto minha mãe olhava para o meu rosto como se quisesse gravar cada mínimo detalhe dele. Seus olhos refletiam a luz da lâmpada por conta das poucas lágrimas acumuladas e eu tentei me manter firme pela primeira vez desde que tudo aconteceu.
Eu nunca tinha falado sobre amor com a minha mãe, porque ele nunca tinha se feito presente na minha vida até hoje. Senti que perdi a chance de chorar no seu colo por conta de um coração partido durante a minha adolescência e isso me frustrava.
É quando entendi que minha vida teria sido diferente se eu não tivesse vivido por tantos anos essa mentira de que o casamento perfeito começa com um voto de castidade, em respeito à igreja. O casamento perfeito acontece onde há amor; onde duas pessoas seguem se amando apesar dos seus erros e de suas imperfeições.
E eu tenho certeza de que Deus concorda comigo nessa. Não é, Big Guy?
Dona Ângela desviou o olhar do meu quando sentiu o celular vibrar no bolso de sua calça. Ela sacou o aparelho em suas mãos e checou a mensagem na tela, soltando um breve suspiro em seguida.
— Eu preciso ir. Seu pai contratou um carro para nos levar de volta à Londres e ele já deve estar chegando. — Um sorriso sem humor surgiu em seus beiços e eu olhei do celular em suas mãos para o seu rosto algumas vezes.
Uma angústia comprimiu o meu peito e — pela primeira vez em nove meses — eu senti medo. Senti medo porque agora que consegui me abrir para a minha mãe, tinha a sensação de que estava vulnerável ao sentimento que sentia por . E esse seria o momento ideal para uma adolescente de quinze anos deitar a cabeça no colo da mãe e chorar.
Mas eu não era mais uma adolescente de quinze anos e talvez eu precisasse lidar com essa sozinha.
— Você está bem? — Ela questionou, me despertando do transe, e eu a encarei com os olhos arregalados por alguns instantes.
— Eu… — estou apavorada, mãe. — … Vou ficar. — Forcei o meu melhor sorriso e ela sorriu, acariciando o meu rosto uma última vez antes de se levantar.
— Arthur me disse que te ligaria mais tarde, ou talvez amanhã. Não seja tão dura com ele. — Ela pediu e eu rolei os meus olhos, deixando um riso leve escapar. — Eu sei que ele errou, mas você não foi a única que sofreu com essa história toda, passarinha.
— Eu sei que não. — Retruquei, soltando o ar pela boca. — Nós conversamos ontem e está tudo bem.
— Que bom, filha. Fico feliz. — Disse, por fim, antes de se virar e seguir em direção à porta.
— Mãe! — Esbravejei, fazendo-a se virar de frente para mim quase que involuntariamente. Ela arqueou as sobrancelhas e me olhou com certa ansiedade. — E o meu pai? — Mordi os meus beiços, visivelmente nervosa, e ela suspirou.
— Vem cá. — Dona Ângela abriu os braços e minhas pernas estremeceram, mas ainda assim me forcei a correr para o seu abraço.
Senti os braços de minha mãe me envolverem em um dos meus lugares mais seguros do mundo e por um momento me permiti desabar enquanto as mãos dela afagavam os meus cabelos.
— Tudo no seu tempo, meu amor. — Proferiu, depositando um beijo no topo da minha cabeça. — Vocês dois precisam desse tempo para absorver tudo o que aconteceu, sabe? Mas nada muda o fato de que ele é o seu pai… — Ela fez uma breve pausa entre as suas palavras, segurando o meu rosto entre as suas mãos e o forçou para cima, me obrigando a olhá-la. — … E ele te ama mais do que tudo nesse mundo.
Rolei os meus olhos quase que involuntariamente e algumas lágrimas escorreram pelo meu rosto.
, olhe para mim. — Dona Ângela ordenou e, por mais que eu hesitasse, acabei levando o meu olhar de encontro ao seu mais uma vez. — Você sabe que o que eu estou falando é verdade, não sabe?
Hesitei em responder por alguns segundos, mas acabei balançando a cabeça na afirmativa, mesmo que a contragosto. Ela riu.
— Então dê tempo ao tempo e se permita perdoar todas as decisões erradas tomadas pelo seu pai. — Proferiu e, mais uma vez, eu apoiei o meu rosto contra o seu peito e senti suas mãos acariciarem os meus cabelos. — Você é mais forte do que pensa, . E eu morro de orgulho da mulher que você se tornou.
Um riso involuntário saltou pelos meus lábios e, sem pensar, fechei os meus olhos, inalando o perfume cítrico preso à sua pele.
— Eu sei, mamãe. Eu sei.

Londres, 03 de setembro de 2020
Casa dos Tompkins.


— Ele não me ligou ainda. — Dei de ombros, voltando a minha atenção para . — O meu pai.
— Ele vai ligar. — Ela sorriu, afagando a minha perna com uma de suas mãos, e eu entortei os meus lábios em um agradecimento silencioso.
Em seguida, Malu se calou e eu virei o meu rosto para baixo. Não estava exatamente com fome, mas comecei a brincar com o sorvete dentro do pote para ver se isso causava algum tipo de estímulo ao meu organismo.
— E… O ? — Maria Luiza sussurrou como se estivesse tocando em algum tipo de assunto proibido.
E de certa forma, era.
No momento em que ouvi o nome de , senti que todos os meus músculos perderam a força, com exceção do coração. Meu peito palpitou e, de repente, tive a sensação de que não estava mais no comando do meu próprio corpo.
Temi estar dependente dele, mas no fundo sabia que a questão não era essa. Sentia um bolo se formar no meio da minha garganta e meu olhos marejaram, me obrigando a chacoalhar a cabeça de um lado para o outro, permitindo que algumas lágrimas caíssem pelas minhas bochechas.
A verdade era que metade de mim, me culpava pelo que aconteceu. Por ter sido egoísta e cobrado de algo que ele não podia — ou não queria — me dar naquele momento. E a outra, continuava colocando a culpa sobre ; enxergando nele a pessoa egoísta por não ter me dito justamente o que eu queria ouvir naquela situação.
Tudo bem, talvez 70% da culpa estivesse sobre mim.
Mas 30% estavam sobre ele. Com certeza.
Afinal, vocês já viram o jeito que as covinhas se formam nas bochechas dele todas as vezes que ele sorri? Eu não tinha culpa de ter me apaixonado por ele, não mesmo.
Talvez eu tivesse por ter confundido as coisas.
Mas isso não importava, então puxei o choro pelo nariz e aprumei a minha postura, voltando a atenção para .
— Eu ainda não o vi depois do que aconteceu. — Enxuguei o meu rosto molhado usando o dorso da minha mão e entortei levemente os meus lábios, forçando o meu melhor sorriso. , por sua vez, soltou um breve suspiro e me puxou para um abraço acolhedor.
— Tudo no seu tempo, . — Ela proferiu e eu não consegui evitar que um riso saltasse pela minha boca, afastando o meu corpo do dela em seguida.
— Minha mãe disse a mesma coisa.
Retruquei, passando as mãos pelos meus cabelos despenteados, e minha amiga achou graça. Depois, me calei e observei o esmalte descascando das minhas unhas.
— Eu fui egoísta com ele, . — O peso dessas palavras fez com que eu enrugasse a minha face e Maria Luiza me olhasse com certa curiosidade. — Com o . Eu exigi dele algo que eu não sei se ele tinha a intenção de me dar e, quando ele não me deu, eu me comportei como uma menina mimada.
— Eu não acho isso não, . — Retrucou e eu rolei os meus olhos, levantando o meu rosto de encontro ao seu. — Eu acho que talvez você tenha forçado a situação, mas…
Levei as minhas mãos ao rosto e fechei os olhos com força, me sentindo uma completa idiota por ter estragado tudo. Senti Malu se aproximar de mim e seus dedos abraçaram os meus punhos, forçando os meus braços para baixo.
— Mas isso não significa que o não goste de você na mesma proporção. Ou que ele não queira confessar isso a você. — Ela deu de ombros e eu balancei a cabeça na negativa, esfregando a ponta do meu nariz. — Você já parou para pensar que todas essas coisas que vêm tirando o seu sono, também podem estar tirando o sono dele? — Maria Luiza arqueou as sobrancelhas e eu rolei os meus olhos.

— O quê? Não é porque ele é que ele não é inseguro. — Ela rebateu e eu me calei, pressionando os meus lábios um contra o outro, me dando ao luxo de pensar naquela possibilidade pela primeira vez. — Talvez esse tempo longe um do outro seja o que vocês precisam para entender tudo o que está acontecendo. Mas eu tenho certeza de que não vai demorar muito até ele aparecer aqui segurando um violão em uma mão e um buquê das suas flores favoritas na outra.
Maria Luiza deu de ombros e eu achei graça. Em seguida, ela acariciou o meu rosto e secou as minhas bochechas molhadas usando o seu polegar.
— Vocês dois se gostam, . Mais do que isso! Vocês dois se amam e eu não tenho dúvida alguma em relação a isso. — Proferiu por fim e eu respirei fundo, arqueando a minha postura.
— Eu espero que sim. — Minha voz falhou e um sorriso bobo escapou pelos meus lábios. Malu achou graça e mais uma vez acariciou o meu rosto.
Em seguida, ela se afastou e checou alguma coisa em seu celular. Maria Luiza soltou o ar pela boca, guardou o aparelho no bolso de sua calça e então se levantou.
— Eu vou cancelar com o Jonah e inventar alguma desculpa para as crianças. — Sem entender, acompanhei os seus movimentos com certa curiosidade.
— Por quê?
— Eu não vou deixar você nessa fossa sozinha, . — Ela deu de ombros e eu rolei os olhos, achando graça. — Vou passar no mercado, comprar algumas coisas nada saudáveis e aí passamos o resto do dia assistindo This Is Us, o que acha?
— Você está tentando me ajudar ou piorar a situação? — Arqueei as minhas sobrancelhas e Malu franziu o cenho, sem entender. — This Is Us, sério?
— Eu ainda não terminei a quarta temporada e pensei que você pudesse me fazer companhia. — Ela fez bico com os lábios e eu achei graça.
Em seguida, me levantei e dei alguns passos até ela. Foi a minha vez de acariciar o seu rosto com uma das minhas mãos.
— Vá encontrar com o Jonah.

— Eu vou ficar bem, . E, além do mais, eu também preciso levantar desse sofá e procurar um emprego novo. — Dei de ombros e Maria Luiza suspirou, deixando a cabeça cair para o lado.
— Você acha que pedir demissão dos Carters foi uma boa ideia? — Ela questionou, mordendo os beiços.
— É claro que não! — Retruquei, enrugando a minha face, e Malu arqueou as sobrancelhas, o que me fez rir. — Mas eu não tinha como evitar o se continuasse trabalhando onde ele mora. — Dei de ombros e minha amiga suspirou, preocupada. — , está tudo bem! Mesmo. Eu preciso disso.
— Você tem certeza?
— Tenho. Agora vai, fique linda, aproveite a tarde no parque e beije muito a boca daquele homem! — Proferi, empurrando o seu corpo em direção ao quarto e Maria Luiza gargalhou, jogando a cabeça para trás.
— Idiota! — Ela retrucou, por fim.

[•••]

Narrador Avulso


Embora tivesse recusado a ideia de sua amiga mais cedo, acabou mergulhando no universo dos Pearson minutos depois da saída de . Precisava se distrair com algo que realmente tomasse toda a sua atenção, então desligou o celular e se permitiu chorar por um motivo condizente.
E, minha gente, não há motivo mais adequado para colocar um choro para fora do que Jack Pearson e Super Bowl Sunday.
No entanto, assim que o décimo quinto episódio da segunda temporada se iniciou, o som da campainha ecoou pela sala, fazendo saltar do sofá.
Assustada, a levou a mão ao peito e arregalou os olhos, buscando pelo controle da televisão para pausar a série. Quando o fez, seguiu em direção à porta, parando em frente ao espelho de corpo pendurado em uma das paredes no meio do caminho.
Nossa, ela estava derrotada! Suas olheiras estavam assustadoras, seus olhos empapuçados, seus cabelos bagunçados e suas roupas absurdamente amarrotadas.
O barulho se tornou cada vez mais insistente e resmungou, desviando sua atenção do espelho por alguns segundos.
— Já vai! — Esbravejou, encarando o seu reflexo no espelho mais uma vez.
Temendo ser os chefes de Maria Luiza, a se esforçou para consertar sua aparência. passou as mãos pelo rosto, tentando disfarçar o sono e as noites mal dormidas; soltou os cabelos do coque, voltando a prendê-los em um rabo bem mais apresentável e, por fim, sacodiu sua roupa, se livrando dos farelos de pão presos ao tecido de seu moletom preto.
Ela checou mais uma vez a imagem à sua frente e entortou os lábios em um sorriso entristecido. odiaria aparecer para desconhecidos nessas circunstâncias, mas ela não tinha muita opção no momento.
Com sorte, a pessoa atrás da porta era a própria Maria Luiza sem chave para entrar no seu próprio apartamento.
O som agudo voltou a roubar a sua atenção e resmungou, soltando um breve suspiro. Ela seguiu até a entrada e, sem se dar ao trabalho de checar pelo olho mágico, abriu a porta.
A forçou o seu melhor sorriso e ergueu o rosto de encontro à pessoa do outro lado. No entanto, assim que seus olhos cruzaram com os da frente, os músculos da sua face relaxaram e o sorriso desapareceu.
Era ele.
estava parado bem na sua frente. Vestindo trajes de academia, com um boné na cabeça e sem um violão na mão, muito menos um buquê com as suas flores favoritas.
Nada.
Só ele.
Mas, talvez isso fosse suficiente.
Nenhum dos dois disse absolutamente nada, mas seus olhos se comunicaram em um silêncio ensurdecedor. Parte por tentar entender e decifrar o que ele estava fazendo ali e parte por procurar as melhores palavras para dizer a ela o que tinha feito ele ir até ali.
sentiu seu coração dar um salto de sessenta para noventa batimentos cardíacos por minuto e seus lábios secaram no momento em que ela pensou em se manifestar, mas conseguiu ser mais rápido.
Ainda em silêncio, o puxou um dos braços da garota e depositou algo na mão dela. Sem entender, acompanhou os seus movimentos com curiosidade e se surpreendeu quando viu uma chave sobre a palma de sua mão.
— O que… O que é isso? — Ela franziu o cenho, voltando a sua atenção para , e ele deu dois passos para trás, se afastando dela.
— É a sua chave. Lá de casa. — encolheu os ombros e arqueou as sobrancelhas, relaxando a expressão nos segundos seguintes.

— Minha mãe me disse que você pediu demissão e eu imagino que tenha sido por minha causa. Pelo… Pelo que aconteceu. — Ele chacoalhou a cabeça, coçando os olhos em um movimento de nervosismo. — Eu não posso mudar isso, . Mas eu também não posso deixar que você desista desse emprego.
— Eu consigo encontrar outro. — A retrucou sem nem pensar e um sorriso torto surgiu no rosto de .
— Eu sei que sim. Mas os meus irmãos te amam, , e eu não quero machucar eles também. — Confessou, surpreendendo . — Eu… Eu vou viajar por alguns dias, então se esse seu pedido de demissão realmente tiver algo a ver com a minha presença naquela casa, você não tem com o que se preocupar.
fez uma pausa entre as palavras para umedecer a garganta e desviou momentaneamente o olhar para o chão.
— Quando eu voltar, posso passar alguns dias na Sarah e, enfim… — Ele se interrompeu mais uma vez, esfregou o rosto com o dorso das mãos e retirou o boné da cabeça, embrenhando os dedos nos cabelos em um movimento assustadoramente rápido. — Helena gosta muito de você e eu não acho justo que vocês se afastem por uma besteira minha.
deu de ombros, atraindo o olhar de de volta para si. O silêncio de vozes se fez presente e o único barulho audível era o de suas respirações entrecortadas, embora pudesse jurar que conseguia ouvir seus batimentos descompensados no segundo em que um riso leve saltou pelos seus lábios.
— Eu também não acho justo você se afastar da sua irmã por minha causa. — Proferiu, fazendo o rapaz rir.
— Acredite, ela gosta mais de você do que de mim. — Ele rebateu e a garota revirou os olhos, sem conseguir evitar que um riso escapasse.
a observou, embasbacado e com um sorriso bobo nos beiços. E foi nesse momento que ele entendeu que, embora já tivesse viajado por vários lugares e admirado incontáveis vistas deslumbrantes, nenhuma delas era mais admirável do que a de parada bem à sua frente.
Mesmo sem esforço, com os olhos inchados, os cabelos bagunçados e as roupas em um tamanho três vezes maior que o dela, ainda era a pessoa mais bonita na vida de . E a única capaz de fazer com que o seu coração cumprisse com o seu papel de bombear o sangue para o resto do corpo em uma frequência cardíaca vergonhosa.
— E eu não a culpo por isso. — Seus pensamentos escaparam sem que ele percebesse e o semblante no rosto de mudou por completo.
Ela mergulhou na imensidão de seus olhos por alguns segundos e então respirou fundo, aprumando a sua postura, mantendo o seu rosto rente ao dele.
No entanto, quando os seus lábios se afastaram e pensou em se manifestar, se apressou para cortá-la.
— Fica bem, . Eu preciso ir. — Disse, e antes que a tivesse tempo de processar a situação, deu as costas à ela, desceu os degraus da varanda e seguiu em direção ao seu carro, estacionado do outro lado da rua.
acompanhou os movimentos dele em silêncio, mas o seu peito comprimiu em um raio sufocante, enquanto o seu coração disparava em um pedido desesperado: faça algo!
! — Ela esbravejou, quase que involuntariamente.
se surpreendeu e, por impulso, virou o seu corpo de frente para o dela mais uma vez. Ele arqueou as sobrancelhas e arregalou os olhos sem saber o que — ou como — falar.
Exausta, a garota fechou os olhos e se repreendeu mentalmente. Ela virou o rosto para baixo e, agora com os olhos abertos, encarou o molho de chaves presos por um chaveiro com a miniatura do letreiro I <3 Amsterdã.
Pela primeira vez em alguns dias, sentiu o seu peito aquecer e um sentimento de alívio se fez presente. Ela então puxou o ar pela boca e voltou a sua atenção para .
— Obrigada. — deu de ombros com o arco do chaveiro girando em seu indicador, enquanto os seus lábios se curvaram em um sorriso sincero. riu.
— Sempre, . — Ele acenou com a cabeça, por fim, e então deu as costas à garota uma última vez.

Capítulo Doze

“I went to Amsterdam without you and all I could do was think about you.”

Louis Tomlinson, Always You.


Amsterdã, Holanda. 17 de setembro.
De Dam

Narrador Avulso


Em poucos meses, Amsterdã tinha se tornado o segundo lugar favorito de no mundo, além da sua segunda casa. Trazia sossego saber que uma metade da sua própria história morava ali, naquelas casinhas de boneca levemente inclinadas para o lado.
A praça Dam é a mais importante da capital da Holanda, também um dos lugares queridinhos de Sophia para desfrutar de um bom café, admirando a vista e o movimento das pessoas vindas de todo o canto do mundo em sua cidade natal.
Agora, acompanhando a avó em um desses passeios costumeiros, aproveitava para admirar o ambiente cheio de prédios e monumentos históricos, sem se lembrar em qual de suas viagens à Amsterdã ele já tinha visitado essa praça.
Os óculos escuros de haste branca e arredondada protegiam os seus olhos do sol, enquanto observava o Monumento Nacional em destaque, bem no centro da praça. Um obelisco que servia de ponto de encontro para os cidadãos de Amsterdã, além de um lugar de descanso para os turistas.
Mais à frente, a alguns metros de distância, o avistou o Palácio Real, usado como prefeitura da cidade em sua origem, mas que atualmente abrigava a sede de diversos atos oficiais.
A arquitetura neoclássica deixaria qualquer amante de arte boquiaberto, bem como estava agora. E o tom alaranjado do sol que se punha na cidade tornava cada detalhe ainda mais exuberante.
— Eu ainda não acredito que você preferiu gastar uma tarde de sábado com uma velha do que sair para se divertir com os seus primos. — Sophia se manifestou, atraindo a atenção do rapaz para si, e um sorriso torto surgiu no rosto de .
— Primeiro: — Ele parou de andar e, por consequência, Sophia fez o mesmo. — Você não é chata. — deu de ombros e a mulher sorriu. — Segundo, eu ainda tenho alguns dias na cidade para sair com Charlotte. Então, tudo bem. — Proferiu por fim, voltando a caminhar em seguida.
— Existe uma chance de você estar se tornando o meu neto favorito, . — A mulher disse, com o rosto virado para baixo e as mãos escondidas dentro dos bolsos de seu sobretudo. lançou um olhar de soslaio para ela e riu.
— Isso aconteceria mais cedo ou mais tarde. — Ele retrucou, surpreendendo a mais velha com o seu ar de prepotência. — Mas, por favor, não vamos contar essa verdade para Geórgia. — Acrescentou, por fim, e Sophia gargalhou, jogando a cabeça para trás.
— Eu acho que consigo viver tendo dois netos favoritos! Mas vamos manter isso em segredo pela harmonia da família. — Proferiu, afagando o braço de , e ele concordou, balançando a cabeça na afirmativa. — Eu vou comprar os nossos cafés, por que você não me espera por aqui? — Ela questionou, apontando para as mesas dispostas pela calçada.
— Você não quer que eu faça isso? — O cerrou os olhos e Sophia negou, balançando a cabeça de um lado para o outro.
— Um amigo meu é dono desse lugar. Vou aproveitar para cumprimentá-lo.
— Um amigo, dona Sophia? — Ele questionou com as sobrancelhas arqueadas, fingindo surpresa, e Sophia rolou os olhos.
— Me respeita, moleque! — A mais velha retrucou em tom de brincadeira, usando sua bolsa para bater no braço do neto. Ele riu. — Eu não demoro. — Ela proferiu por fim, antes de dar as costas a e desaparecer por dentro do estabelecimento.
acabou escolhendo uma das mesas mais afastadas do movimento da cafeteria, dispostas na lateral da calçada. Ele se sentou em uma das cadeiras e largou o pequeno caderno preto sobre o tampo de madeira. tinha a mania de carregar consigo essa espécie de diário, onde ele costumava escrever todo o tipo de coisa; desde letras de suas próprias composições, até os seus sentimentos ou algo que momentaneamente acabou despertando a sua inspiração.
O abriu o caderno na página marcada e suspirou, relaxando a sua postura e largando as costas contra o encosto da cadeira. Ele voltou a admirar o privilégio da paisagem à sua frente, mas dessa vez, um pequeno detalhe estacionado há poucos passos do Monumento Nacional — um lugar bastante estratégico, não pôde deixar de perceber.
Por conseguinte, se repreendeu, retirou os óculos do rosto — os prendendo no topo de sua cabeça —, cobriu os olhos com a mão e chacoalhou a cabeça de um lado para o outro. Estar em Amsterdã era ótimo, de verdade. Exceto a parte em que tudo nessa cidade fazia com que lembrasse de . E essa era a parte mais difícil.
Há duas semanas, decidiu deixar de lado qualquer que fossem as coisas que o prendiam em Londres e embarcou junto de Geórgia para a cidade de sua família materna. Ele sabia que em Amsterdã seria acolhido com todo o amor que precisava no momento e pensou que, talvez com sua irmã, seus primos e até mesmo Sophia contando mais sobre esse lado da sua história e dividindo com ele acontecimentos da família, a sua cabeça ficaria suficientemente ocupada para se lembrar de pensar em .
Mas era impossível.
Amsterdã gritava o nome da bonitinha. Nas casas inclinadas, nos barcos trafegando pelos canais, nas flores, nas bicicletas e até mesmo nesse carrinho de brownies que encarava há alguns minutos.

Três meses antes


Amsterdã, Holanda. 20 de junho de 2020.
De Nieuwmarkt


— Ela é tão linda. E o show foi incrível. Obrigada pelos ingressos, Char. — lançou um olhar e um sorriso simpático para a prima de . A menina de cabelos alaranjados balançou a cabeça na afirmativa e os três casais seguiram caminhando pelas ruas movimentadas da De Niewmarkt.
Geórgia e Léo seguiam alguns passos à frente, enquanto Char e o noivo iam lado a lado de e que, por sinal, não tinham se desgrudado desde o primeiro beijo dado durante o show da Kacey. Os dois agora caminhavam abraçados, com o braço esquerdo de ao redor da cintura de e o braço direito do rapaz jogado sobre os ombros dela, permitindo que os dedos de sua mão se entrelaçassem aos da mão direita dela.
Qualquer um que não os conhecesse e os encontrasse naquela circunstância, teria a certeza de que eram um casal de verdade.
— Eu preciso de um doce. Vocês se importam se pararmos aqui por dois minutos? — Geogia questionou, virando o seu corpo de frente para os outros quatro. e se entreolharam e ambos deram de ombros, balançando a cabeça na negativa.
A irmã de celebrou com um sorriso largo no rosto e, em seguida, os seis adentraram à loja de chocolates, localizada em um dos pontos mais altos da praça. Os casais se separaram e se soltou de enquanto avaliava os produtos dispostos pelas enormes prateleiras.
— Ei, olha! — Ela esbravejou, chamando a atenção de para si. — Brownies! Eu não me lembro quando foi a última vez que comi um desses. — Disse, tomando um dos pequenos bolinhos em suas mãos.
Geórgia — que estava mais perto — a olhou e, em seguida, trocou um olhar rápido com o irmão. Ele prendeu os lábios, tentando prender o riso, e envolveu os seus braços na cintura de , a abraçando por trás.
— Eu acho que isso não são brownies comuns, .
Sem entender, virou o seu rosto de encontro ao da irmã de e franziu o cenho. O , por sua vez, soltou um risinho leve e beijou a bochecha da menina, em um gesto carinhoso que a fez rir sem pensar.
— Como assim? — Ela questionou, balançando a cabeça para se afastar do toque de , mas acariciando os braços do rapaz com sua mão livre.
— É o famoso bolinho espacial, bonitinha. — Ele disse, apoiando o seu queixo sobre o ombro dela, e franziu ainda mais a testa.
— Bolinho… O quê? — A insistiu em saber e riu, virando o rosto para baixo.
— Quer dizer que tem maconha, . — Geórgia deu de ombros e, surpresa, arqueou as sobrancelhas enquanto o seu queixo despencava alguns centímetros de encontro ao chão. — Sabe aquela cena dos filmes, onde um desavisado acha uma bandeja de brownies, come vários e sem saber que os bolinhos estavam batizados, apronta várias confusões? Então, exatamente isso.
observava a expressão embasbacada se formar no rosto de e gargalhou. Em seguida, ele roçou o nariz na bochecha dela e a beijou mais uma vez.
— Enfim, são brownies tradicionais com um tempero especial. — Geórgia proferiu por fim, brincando com um dos pequenos bolinhos.
— Que é a maconha. Caso você não tenha entendido ainda. — enrugou o nariz em uma careta infantil e virou o seu rosto de encontro ao dele.
A rolou os olhos, entediada, e um riso agudo escapou pelos lábios de . Por conseguinte, ele segurou o rosto dela entre suas mãos e selou os seus lábios em um beijo rápido. espalmou uma de suas mãos sobre o peito dele e o empurrou para longe, mas foi obviamente mais rápido e conseguiu envolver a cintura dela, a mantendo perto de si.
— Eu já tinha ouvido falar sobre o uso da maconha na Holanda, mas eu não sabia que era em coisas tão óbvias assim. — A brasileira deu de ombros, voltando sua atenção para Geórgia.
— É. Na verdade, ela não é legalizada aqui, e sim, tolerada. Existem regras e condições específicas para que isso aconteça e os brownies estão cem por cento liberados. — A irmã de piscou um dos olhos, agarrando dois bolinhos com as mãos e caminhando de encontro ao noivo logo em seguida.
voltou a encarar o pacotinho quadrado em suas mãos e a observou em silêncio, achando a situação um tanto quanto cômica. era inocente demais, não só para o sexo. Mas para a vida. E coisas que para ele pareciam banais, como um brownie batizado com maconha, para ela pareciam ter vindo de outro mundo.
— Você não quer escolher nada? — Ele questionou, prendendo uma mecha do cabelo dela por trás de sua orelha e ergueu o rosto de encontro ao seu.
— Isso realmente deixa as pessoas…
Altas? — arqueou as sobrancelhas e a mordeu os beiços, balançando a cabeça na afirmativa. Ele deu de ombros em seguida. — Depende da quantidade e da pessoa.
— Você já provou? — A questionou em um tom de voz mais baixo que o normal, como se os dois estivessem fazendo algo estritamente proibido. Desconfiado, franziu o cenho e olhou do rosto de para o doce em suas mãos.
— Algumas vezes… Por quê? — Ele estreitou o olhar, buscando pelo dela, e deu de ombros. — … Você não está pensando em experimentar, está?
— E qual o problema? — Ela voltou a olhá-lo e se surpreendeu. — Eu fiquei curiosa, ué.
— Você não quis ir ao museu do sexo, mas quer terminar a noite chapada de maconha? — retrucou e a rolou os olhos, deixando um riso escapar.
— Eu não vou ficar chapada! — esbravejou em sua defesa, empurrando para longe de si. O gargalhou, tropeçando sobre os seus próprios pés. — Eu só quero experimentar. E não se preocupe, eu vou comprar um para você também. — Ela piscou um de seus olhos e sacou mais um brownie da prateleira.
Em seguida, deu as costas ao rapaz e seguiu em direção à Geórgia e Léo, enquanto acompanhava os seus movimentos com o olhar.

Amsterdã, Holanda. 21 de junho de 2020.
North Holland Hotel, 00:37.


caminhou na frente de , tropeçando sobre os seus próprios pés e, de repente, surpreendeu o , soltando uma gargalhada alta. Ele arqueou as sobrancelhas e, em seguida, prendeu um lábio contra o outro, tentando esconder o riso quando ela se virou para olhá-lo.
A garota interrompeu os seus passos e o semblante em seu rosto mudou por completo. O sorriso desapareceu e franziu o cenho, deixando a cabeça cair um pouco para o seu lado direito.
— O que foi? — questionou, sem entender a mudança repentina.
— Como eu posso estar assim e você… Assim? — Ela analisou da cabeça aos pés com certo desdém e o achou graça. — Nós comemos a mesma quantidade, não foi?
— Foi. Mas eu já tinha experimentado antes. — Rebateu, dando alguns passos à frente. Erradicando a distância entre os seus corpos. , por sua vez, suspirou, mordiscando os beiços em seguida.
— Pelo menos agora eu posso riscar “experimentar maconha” da minha lista de primeiras vezes. — deu de ombros e gargalhou, jogando a cabeça para trás.
— Você tem uma lista de primeiras vezes? — questionou, envolvendo a cintura de com os seus braços. Ela balançou a cabeça na afirmativa.
— Tenho. E meu pai provavelmente vai ficar furioso quando descobrir. — Retrucou, brincando com o tecido amarelo do suéter de .
Logo depois, a arregalou os olhos e puxou o ar pela boca, afastando o seu corpo do de . Assustado, o tentou se aproximar, mas foi prontamente impedido pelo grito de .
— Papai vai ficar furioso quando descobrir! — Ela esbravejou, levando as mãos à boca em seguida. Sem entender, franziu o cenho. — Ele vai ficar como muita raiva, . — Proferiu por fim e então curvou o seu tronco para frente em uma gargalhada alta.
— Tudo bem. Mas ele não precisa saber. — ponderou, tentando, mais uma vez, se aproximar.
Por sua vez, aprumou a postura e deixou o seu rosto rente ao dele. Confuso, o não sabia se estava autorizado a rir ou não, mas acabou deixando um sorriso escapar quando sentiu envolver os braços em seu pescoço.
— Talvez eu conte. — Ela deu de ombros e o filho de Vitória arqueou as sobrancelhas. — Eu não ligo se ele ficar furioso.
— Não? — questionou, visivelmente surpreso, e achou graça.
— Nem um pouco. — A retrucou, quase que em um sussurro, com os olhos cravados nos lábios de .
Como mágica, acabou esquecendo a pauta da conversa e o silêncio invadiu o corredor dos quartos por alguns instantes. A umedeceu os lábios, vidrada nos dele, e sentiu o seu peito palpitar pela milésima vez na mesma noite.
Sem proferir nada, a garota entortou os beiços em um sorrisinho infantil e se colocou sobre as pontas de seus pés, alcançando os lábios de em um beijo leve — que tentou intensificar, mas foi rapidamente interrompida pelo rapaz.
Não que ele não quisesse beijá-la, vai por mim. beijaria a noite toda, até seus lábios se deslocarem de suas faces, se fosse possível. Mas aquela não era a , não naquele estado. E de forma alguma ele se aproveitaria dessa situação.
— É melhor você dormir.
Seu tom de voz era baixo e, enquanto prendia algumas mechas soltas atrás da orelha da menina, um sorriso escapou pela sua boca, vendo o bico formado pelos lábios dela.
— Você poderia me chamar para dormir com você. — Ela mordeu os beiços, brincando com os poucos cabelos na nuca de e ele liberou um sorriso torto.
— Hoje não, bonitinha. — Proferiu e a rolou os olhos, impaciente, se afastando dele.
— Eu vou acabar te trocando pelo aupair italiano que eu conheci no parque um dia desses, sabia? — cruzou os braços na frente de seu corpo e elevou as sobrancelhas.
Aupair italiano?
— Uhum. O Matteo, ele é bem bonito na verdade. — Ela retrucou com indiferença, checando o esmalte em suas unhas, e achou graça.
— Por favor, . Nós dois sabemos que esse Matteo não deve chegar nem aos meus pés. — O rolou os olhos com certa prepotência e ergueu o rosto para olhá-lo.
— Não sei não. O sotaque dele é muito mais sexy do que esse seu aí. — Ela deu de ombros, fazendo gargalhar.
— Eu duvido que seja. — retrucou, agarrando a cintura de novamente. — Mas de qualquer forma, parlo anche italiano. — O proferiu com certa indiferença e arregalou os olhos, surpresa.
— O que você disse?
— Que eu também sei falar italiano. — Ele deu de ombros, a abraçando ainda mais. — Eu já morei na Itália, bonitinha. Eu não te contei isso? — Questionou por fim e resmungou, soltando o ar pela boca.
— Que ódio! Você é irritantemente perfeito. — Ela choramingou, mordendo os beiços, e achou graça, levando uma de suas mãos ao rosto dela.
— E você é linda. Mas precisa dormir, ou vai acordar com uma dor de cabeça terrível amanhã e nós já temos um compromisso. — Retrucou, acariciando a bochecha de com o polegar.
De soslaio, a menina olhou para a porta de seu quarto, ao lado de onde estavam, e soltou um suspiro, voltando a envolver o pescoço de com os seus braços.
— Então tá. Mas antes de você me deixar aqui sozinha, eu preciso aproveitar que estou alta o suficiente e provavelmente não vou lembrar disso amanhã, para te confessar uma coisa. — Proferiu, mordendo os beiços, e franziu o cenho, sem entender. — Se lembra daquele dia no carro, quando você disse que acabaria se apaixonando por mim?
Ela questionou, acariciando os poucos cabelos presos à nuca de , e ele sorriu, balançando a cabeça na afirmativa. , por consequência, puxou uma boa quantidade de ar para dentro de seus pulmões e arqueou a sua postura, deixando o seu rosto rente ao dele.
— Eu acho que eu posso acabar me apaixonando primeiro. — Confessou e arqueou as sobrancelhas, pressionando um lábio contra o outro.
— Você acha? — Ele questionou e riu, balançando a cabeça na afirmativa.
— Acho. E você?
— O que tem eu? — O franziu o cenho e deu de ombros, aproximando o rosto do dele.
— Você ainda acha que vai se apaixonar por mim, ? — Questionou, com os olhos fixos à boca de . Ele riu.
— Vamos fazer o seguinte. — Proferiu, se afastando gradativamente — Vai dormir e deixa isso sair do seu organismo.
Ele disse, soltando a cintura de e dando mais dois passos para trás. Frustrada, a garota bufou, revirando os olhos.
— Amanhã, se você conseguir se lembrar dessa pergunta, eu te respondo. — Deu de ombros por fim e respirou fundo, virando o seu corpo de frente para a porta de seu quarto.
— Tudo bem. Boa noite.
— Boa noite, . — Ele rebateu, tentando conter o riso.
A garota, no entanto, assim que alcançou a maçaneta da porta, decidiu virar o seu corpo de frente para mais uma vez. Ela mordeu os beiços e o encarou dos pés à cabeça, enquanto ele revirava os olhos, impaciente.
— O que foi agora, bonitinha?
— Nada. — Retrucou, dando de ombros. — Mas, para a sua informação, eu sei que isso foi um sim. — Disse por fim, antes de passar a chave pelo sensor da maçaneta e deixar sozinho, com um semblante estupefato no rosto.

Dias Atuais


Amsterdã, Holanda. 17 de setembro.
De Dam


E realmente era um sim.
Mas não se lembrou dessa pergunta no dia seguinte e decidiu não tocar no assunto. De qualquer forma, ele acabou se apaixonando por ela. Naquele mesmo dia, inclusive. Quando eles dormiram juntos pela primeira vez.
? — O despertou de seus devaneios quando ouviu a voz de Sophia chamar o seu nome.
Em um movimento involuntário, o virou o seu rosto em direção ao som, encontrando sua avó paterna com um sorriso no rosto e dois copos de café na mão.
— Obrigado. — Ele sorriu, tomando um copo para si.
bebericou o líquido quente pela primeira vez, ainda bastante aéreo à realidade, enquanto Sophia se sentava ao seu lado e observava os seus movimentos, desconfiada.
— Você me parecia um pouco aéreo. Está tudo bem? — Ela questionou, derramando todo o conteúdo do sachê de adoçante dentro do seu copo.
O rapaz virou o seu rosto em direção ao da mulher e ela arqueou as sobrancelhas, ansiosa por sua resposta.
— A minha cabeça está um pouco longe. — Confessou, esfregando os olhos com o dorso da mão. — Mas eu estou bem. — Ele sorriu, alcançando a mão de Sophia sobre o tampo da mesa.
A mulher entortou levemente os lábios, acariciando a mão dele sobre a sua.
— Que bom. — Proferiu, voltando o seu corpo para a paisagem à sua frente.
Ela levou o líquido quente aos lábios pela primeira vez, limpou o excesso preso aos cantos de sua boca com o guardanapo e, em seguida, voltou a sua atenção para .
— E onde está agora?
Quando ouviu o nome da menina, engasgou e deu um breve salto da cadeira. A mulher mais velha achou graça e ele a olhou, com os olhos esbugalhados, meio confuso, meio assustado com a sua pergunta.
— O quê?
— Você disse que sua cabeça está longe e eu imagino que esteja pensando na . — Sophia deu de ombros, largando suas costas contra o encosto da cadeira. se surpreendeu. — Então, onde ela está? — Ela prendeu os lábios um contra o outro, tentando conter o riso, e cerrou os olhos, desconfiado.
— E por que você acha que eu estou pensando nela?
— Porque eu posso não te conhecer há muito tempo, mas você é meu neto.
Ela deu de ombros, mas o semblante no rosto de não parecia exatamente convencido com essa resposta. Por consequência, Sophia rolou os olhos e deixou um suspiro escapar.
— E Geórgia pode ter mencionado algo sobre o que aconteceu na festa dos seus pais. — Confessou, fazendo revirar os olhos.
— É claro que sim.
— Não fique com raiva da sua irmã. — Sophia pediu, alcançando a mão de sobre o seu colo. — Eu posso ser bem insistente quando quero. E quando eu vi que você tinha vindo sem ela, não descansei até descobrir o que tinha acontecido. Além do mais, você não é muito bom em tentar esconder os seus sentimentos. — Ela deu de ombros, fazendo rir.
Em seguida, o puxou uma boa quantidade de ar para os seus pulmões e expirou, soltando-o pela boca. Ele passou a mão cheia de anéis pelos cabelos e abaixou os óculos de sol, voltando a encarar o movimento de pessoas à sua frente.
— Eu sinto falta dela. O tempo todo. — Confessou depois de alguns segundos em silêncio. — E estar aqui… — Ele fez uma breve pausa entre as suas palavras e um sorriso involuntário surgiu nos seus lábios. — Eu fico assustado com a forma como essa cidade grita o nome dela. — Proferiu, fazendo Sophia rir ao acariciar a sua mão.
— Você já tentou conversar com ela? — A mais velha questionou e balançou a cabeça de um lado para o outro quase que instantaneamente.
— Eu estive com ela alguns dias antes de vir para cá, mas eu só pedi para que ela não largasse o trabalho lá em casa. Pelas crianças. Eu não disse o que eu realmente precisava dizer porque, por algum motivo, parece que eu nunca consigo dizer à o que eu realmente preciso e quero dizer. — Retrucou, dando de ombros.
— Por que você não tenta fazer isso agora? — Sophia ergueu as sobrancelhas e a olhou, sem entender. — Você pode me usar como isca, eu não me importo. — Ela deu de ombros e um sorriso confuso surgiu no rosto do rapaz.
— O que você quer dizer?
— Pegue o seu celular, mande aquela foto que tiramos mais cedo para ela. — Proferiu, assistindo o neto balançar a cabeça de um lado para o outro em negação. — Vamos lá, ! Diga a ela que eu estou com saudades e aproveite para dizer que você também. Seja honesto, meu filho.
— Eu não consigo fazer isso. E nem posso, não por telefone.
— Não acho que vá se importar se você decidir dar esse primeiro passo a muitos quilômetros de distância. — Sophia deu de ombros com um sorriso largo no rosto e respirou fundo.
— Eu não sei. Não me parece… Certo? — O enrugou o nariz com os olhos cravados no copo sobre a mesa.
, me escute. Olhe para mim.
A mais velha pediu, tocando suavemente o queixo do neto. E assim ele fez.
— Você está machucado e eu imagino que também esteja. Mas uma das músicas que eu mais gosto me ensinou que não existe antídoto melhor para essa dor que vocês estão sentindo do que o amor. E isso vocês têm de sobra, meu bem. Qualquer cego perceberia.
Ela sorriu, acariciando o rosto do rapaz. sorriu, sem pensar.
— Eu tenho certeza de que todas as pessoas que te amam e conhecem a , estão ansiosas para ver vocês juntos. Mas nós não podemos dar esse primeiro passo, você pode.
— E se eu não for suficiente? — Sua voz saiu embargada e Sophia se surpreendeu.
— Para ? — A mulher ergueu as sobrancelhas, espantada, e balançou a cabeça na afirmativa. — Nós estamos falando da mesma que esteve ao seu lado durante um dos dias mais importantes da sua vida? — Ela questionou e a expressão em seu rosto fez rir. — Você acha que a teria vindo até Amsterdã te ajudar a conhecer parte da sua história se você não fosse suficiente?
— Não. — negou com a cabeça e Sophia curvou os lábios em um sorriso singelo.
— Então, o que você está esperando, meu amor? — Ela perguntou, olhando de soslaio para o aparelho celular jogado sobre a mesa. Os olhos de acompanharam os seus e ele respirou fundo.
— Sophia! — Um tom de voz masculino roubou a atenção dos dois e ambos viraram os seus rostos em direção ao som.
Parado em cima do batente da porta de entrada da cafeteria, viu um senhor de setenta e poucos anos, cabelos grisalhos e óculos de grau na ponta do nariz. Ele acenou com a cabeça e gesticulou para que Sophia fosse até ele. Ela, por sua vez, balançou a cabeça na afirmativa e voltou a sua atenção para o neto.
— Eu vou te dar um tempo para pensar no que eu te falei. — A mais velha sorriu, apertando um dos ombros de . — E seja qual for a sua decisão, eu vou estar aqui para te apoiar. — Proferiu por fim, acariciando a bochecha dela. sorriu e virou levemente o rosto, beijando a palma da mão de sua avó.
— Eu sei que sim. Obrigado. — Disse e, nos segundos seguintes, viu Sophia caminhar de encontro ao tal homem na entrada do café.
Quando voltou a sua atenção para frente, soltou o ar pela boca e franziu levemente o cenho, observando as pessoas caminharem de um lado para o outro por toda extensão da praça. Ele mordeu os cantos internos de sua boca e — pensando em tudo que tinha sido dito por Sophia — se pegou encarando o telefone sobre a mesa.
No começo, ele hesitou. A ideia de ligar para sobre tais circunstâncias parecia prematura demais e ele não estava verdadeiramente preparado.
Afinal, o que ele poderia dizer?
Que a amava
, talvez?
Não, não parecia justo fazer isso pelo telefone. Essas três palavrinhas em específico não exigiam uma vista bonita, ou um esforço exagerado. Mas elas sem dúvida exigiam uma conversa franca, olho no olho, onde ambas as partes se mostrassem vulneráveis.
E devia isso à . Ele queria fazer o certo com ela.
Mas a saudade e o nervosismo juntos faziam seu estômago revirar e seu coração palpitar em desespero. Ele precisava falar com ela.
Sem pensar e sem se dar tempo para desistir, sacou o celular em suas mãos. Decidiu não ligar, mas foi direto à janela de conversa com ela no WhatsApp e não hesitou, nem por um segundo sequer, antes de enviar a tal foto que tinha tirado com Sophia horas mais cedo.
A palavra “on-line” embaixo do apelido que ele costumava usar em relação à fez com que o seu peito apertasse por alguns instantes, mas ele não podia voltar atrás, nem muito menos tinha tempo para se arrepender.
Decidido, pressionou o botão de gravar e aproximou o telefone de seus lábios.
— Oi. Errmmm. — Ele balbuciou e levou a mão aos olhos, chacoalhando a cabeça de um lado para o outro. — Eu sei que provavelmente sou a última pessoa com quem você quer falar. E eu entendo.
Um sorriso sem humor escapou pelos seus lábios quando ele tirou a mão de frente do seu campo de visão e a apoiou sobre o seu colo.
— Mas... Eu estou aqui em Amsterdã e Sophia pediu para que eu enviasse essa foto. Ela disse que você está fazendo uma falta maluca aqui e eu estou começando a achar que Helena não é a única que gosta mais de você do que de mim.
riu, balançando a cabeça, e fez uma pequena pausa entre as palavras, encarando aquele carrinho de doces mais uma vez.
Ele puxou o ar pela boca, piscou os olhos algumas vezes e continuou.
— É impressionante como tudo nessa cidade grita o seu nome, .

Londres, Inglaterra. 17 de setembro de 2020
Casa dos Carters.

— Enfim, eu acho que... Acho que só estou tentando saber se você está bem. Porque, sendo sincero, eu não estou.
confessou.
Sua voz embargada e o som de um riso sem graça fizeram o peito de comprimir ao mínimo aceitável.
Deve ser porque eu penso em você o tempo todo. riu mais uma vez, agora com uma certa gota de humor e fez o mesmo, sem nem perceber. — Em Amsterdã, em Londres, em qualquer lugar, . Eu estou sempre pensando em você porque sinto a sua falta mais do que qualquer outra coisa nesse mundo.
O fez mais uma breve pausa para respirar e mordeu os beiços, esperando ansiosamente para que ele continuasse.
Eu vi a última foto que Malu postou de vocês e preciso dizer que fico feliz em ver o seu sorriso de novo. Ele combina tanto com você.
Proferiu e enrugou os músculos de sua face, sentindo necessidade de chorar enquanto as bolsas de seus olhos guardavam o maior volume de lágrimas que conseguiam.
Você é linda, bonitinha. A mais linda de todas, com toda certeza. proferiu, fazendo a garota sorrir de um canto ao outro de seu rosto.
Involuntariamente, ela fechou os olhos e as lágrimas escaparam, molhando suas bochechas.
E eu espero que você saiba que eu ainda estou aqui, para o que você precisar.
— Eu sei. — Sua voz falhou e a brasileira balançou a cabeça na afirmativa, puxando o choro pelo nariz enquanto limpava o rosto molhado com o dorso das mãos.
É isso, eu preciso ir e descobrir quem é esse cara que tá dando em cima da minha avó na minha frente. — Ele proferiu e a garota achou graça, visualizando perfeitamente a expressão confusa no rosto de . — Fica bem, . Você não precisa responder esse áudio se não quiser.
Mas ela queria.
Meu Deus! Como ela queria.
— Vem brincar, ! — Helena esbravejou e ergueu a cabeça por impulso, buscando pela pequena.
A alguns passos de distância, na exata divisão entre a sala de estar e a cozinha, a brasileira encontrou a caçula dos Carters tratada como a princesa Ana, do filme Frozen, da cabeça aos pés, e era quase impossível não sorrir ao se deparar com aquela cena.
— Eu já estou indo, princesa. Prometo! — Ela rebateu e a pequena deu de ombros, a deixando sozinha outra vez.
Suas mãos tremiam e encarou, vidrada, a foto de e Sophia brilhando na tela.

: Vocês dois estão lindos nessa foto.
: Espero que esteja aproveitando a viagem, inclusive.
: E eu também |


As duas primeiras mensagens foram surpreendentemente fáceis de enviar, mas acabou hesitando na terceira. Ela mordeu o canto de seus lábios e repensou as suas palavras.
Seus pensamentos soaram mais alto que os gritos das dez crianças brincando na área externa da casa e balançou a cabeça de um lado para o outro, apagando a mensagem.

: E eu também sinto a sua falta |

Seu coração estava batendo em um ritmo tão acelerado que conseguia senti-lo em sua garganta. Ela queria dizer a ele que sentia saudades, mas não sabia exatamente como, já que a ansiedade era a única voz que ela conseguia escutar naquele momento.
Talvez o certo seria ir direto ao ponto.
Ou será que isso soaria precipitado demais?
Frustrada, resmungou, chacoalhando a cabeça de um lado para o outro. Ela nunca tinha ouvido um silêncio soar tão alto quanto o de agora, enquanto encarava a tela de seu celular.
Os risquinhos ao lado da mensagem se tornaram azuis e entendeu aquilo como um sinal de que estava com o celular nas mãos, naquele exato momento, possivelmente encarando a sua janela de mensagens. E ela se questionou: será se isso estaria matando ele, da mesma forma que estava matando ela?

Amsterdã, Holanda. 17 de setembro.
De Dam

Bonitinha: Diga à Sophia que estou com saudades dela.


encarou a mensagem de , estarrecido e um tanto quanto triste. Não sabia dizer ao certo o que estava esperando, mas definitivamente não era aquilo.
Ou, pelo menos, não só aquilo.
Até porque, porra! Ele tinha acabado de jogar as cartas na mesa, tinha aberto o coração dizendo que estava sentindo falta dela, não era isso o que ela queria? Que ele desse um passo em relação aos dois.
Pois bem. Esse era o passo, .
Desapontado, ele jogou o celular sobre a mesa e apertou os olhos com os dedos, desistindo da ideia prematura de puxar conversa depois dela ter dito que esperava que ele estivesse aproveitando a viagem. Talvez esse fosse o sinal que precisava para deixar essa história para trás de uma vez por todas.
No entanto, o som do aparelho vibrando fez com que ele erguesse a cabeça novamente e o pegasse em suas mãos em um movimento vergonhosamente abrupto.

Bonitinha: E de você também.

Capítulo Treze

“It's not perfect, but maybe that's what we need”

Sabrina Carpenter, prfct.


Londres, Inglaterra. 24 de setembro de 2020.

Casa da Sarah

Sarah


Levei a caneca de porcelana aos meus lábios e saboreei o chá dentro do recipiente enquanto assistia caminhar de um lado para o outro na minha frente. Tinha certeza de que ele já estava fazendo isso há pelo menos vinte minutos e comecei a me preocupar com a possibilidade de seus pés abrirem um buraco no meio da minha sala de estar.
Há uma semana, apareceu na minha porta de mala e tudo, perguntando se eu me importaria em deixar ele passar alguns dias com a gente. O “claro que não” que saltou pela minha boca como resposta veio rápido e sem hesitação, mas confesso que estranhei o fato de ter o meu melhor amigo me pedindo abrigo com a sua família morando a quinze minutos da minha casa.
A explicação, no entanto, veio horas depois. não queria encontrar , ainda que isso fosse mentira. De acordo com ele, esse desejo era mais de do que qualquer outra coisa e ele não queria que a sua presença na casa de sua mãe fosse um ponto decisivo para que a menina desistisse de trabalhar como babá de seus irmãos.
O que, para mim, era idiotice. Mas se tinha algo que eu aprendi sendo amiga de por todos esses anos, é que não se deveria argumentar com ele depois que ele tomava uma decisão.
— Você pode parar? Estou ficando tonta. — Disparei, atraindo a sua atenção para mim. Ele me olhou, meio confuso e então apoiou o peso de seu corpo sobre os braços, em cima do balcão da cozinha, soltando uma boa quantidade de ar pela boca.
— Desculpa, eu estou uma pilha. — Rebateu ele, passando o dorso da mão pelos olhos enquanto eu bebericava um pouco do chá quente na xícara em minhas mãos.
— Vai dar tudo certo, . Tenho certeza disso. — Disse, limpando os lábios com a ponta da língua, ao passo que estiquei o meu braço e soltei a xícara sobre o mesmo balcão onde meu amigo estava apoiado.
— Eu torço por isso.
— Vai sim. — Dei de ombros, me aconchegando na cadeira outra vez. — Pode confiar, você sabe que eu não minto.
Acrescentei uma piscadela e meu melhor amigo encheu as bochechas de ar, soltando-o em seguida, junto de um riso.
— Vitória já está lá? — Perguntei, encolhendo as minhas pernas sobre a cadeira, ao passo que checava as minhas unhas da mão e respirava fundo, se afastando do balcão.
— Sim. Ela, Éric e as crianças chegaram ontem à noite, acho que foram passar o dia em Holmes Chapel e devem voltar para Manchester hoje ainda. Ou amanhã de manhã.
— Certo. E a ?
Disparei, sem nem pensar, e o sorriso no rosto de desapareceu instantaneamente. Em seguida, ele ergueu o rosto para me fitar, um tanto quanto assustado, e eu arregalei os meus olhos, sem entender.
— O que tem ela? — Ele perguntou e eu olhei para os lados, confusa, antes de voltar a minha atenção para .
— Ué. Você falou sobre a sua mãe, seu padrasto e as crianças, mas não disse nada sobre a . — Dei de ombros, em minha defesa, e desviou o olhar do meu, coçando o canto interno dos olhos com a ponta do indicador.
— Ela não… Ela não vai. — Meu melhor amigo rebateu depois de limpar a garganta e eu arqueei as sobrancelhas, assistindo-o coçar a ponta do nariz em um movimento nervoso.
— E por que não? — Questionei e deu de ombros, esforçando-se para manter o seu olhar distante do meu. — Eu pensei que vocês estivessem conversando.
— E estamos. — Ele murmurou, quase que por cima de mim, e eu franzi o cenho, sem entender. — Eu só não quis comentar com ela sobre o show e pedi para que ninguém lá em casa comentasse também. Não quero que ela sinta como se fosse obrigada a ir.
Meu queixo caiu alguns centímetros e eu fitei meu amigo, embasbacado. Murmurei coisas inaudíveis como uma tonta, tentando processar a informação idiota que ele tinha acabado de me passar e franziu o cenho, provavelmente preocupado com o funcionamento das minhas faculdades mentais.
— Você está bem?
— Você é tonto? — Questionei, quase que por cima dele, e me fitou, confuso, recuando dois passos para trás.
— O que você…
— Por que você não disse à sobre o show? — Perguntei, dando ao meu melhor amigo uma segunda chance de fazer a coisa certa e dizer exatamente o que eu gostaria de ouvir dessa vez, e fechou os olhos, soltando o ar pelo nariz.
— Eu já disse, Sarah. Não quero que ela se sinta na obrigação de fazer algo que não quer.
— Mas ela quer estar lá, . Pelo amor de Deus! — Esbravejei, me colocando de pé com um único salto e o na minha frente respirou fundo, enchendo as bochechas de ar. — Ela vai ficar triste quando souber.
fechou os olhos mais uma vez e soltou o ar pela boca, apoiando uma das mãos na curva da cintura enquanto coçava o canto interno do olho com o indicador da mão livre.
— Ela vai entender.
— Não, ela não vai e você sabe disso. Pegue o telefone e ligue para ela, agora.
Ordenei, apontando para o aparelho sobre a ilha de mármore entre nós. mordeu o beiço inferior, com as duas mãos na cintura, ao passo que fitava o telefone.
— Essa sua ideia não faz o menor sentido. faria de tudo para assistir ao seu primeiro show e você quer que ela esteja lá. Deixa de ser burro! — Bati o meu pé firmemente no chão e cerrei os meus punhos, como uma criança mimada que conseguia tudo o que queria depois de um belo chilique.
— Sem sermão, Sarinha. — Ele pediu, pressionando a têmpora com as pontas dos dedos. — Por favor.
O tom de voz de saiu bem mais baixo que o normal e ele voltou a abrir as pálpebras para me fitar. Cruzei os braços para tentar manter a pose de durona, mas me quebrei ao ver meu melhor amigo curvar os beiços em um sorrisinho nitidamente entristecido.
— Vocês precisam conversar, . Cara a cara. — Disse, em um tom de voz tão baixo quanto o dele, e respirou fundo, batucando os dedos no mármore à sua frente uma única vez.
— Eu sei. E nós vamos, só não hoje.
— Quando, então? — Perguntei, mordiscando os cantos internos das minhas bochechas, e deu de ombros, passando a mão pelos cabelos antes de cruzar os braços.
— Eu não sei, Sarah. De verdade, eu não sei e eu nem tenho como pensar nisso agora. — Ele rebateu, soltando o ar pela boca, e eu respirei fundo, balançando a cabeça na afirmativa como se as palavras dele fizessem algum sentido para mim.
Embora não fizessem.
— Tudo bem. É melhor você dormir agora. — Disparei depois de umedecer a minha garganta, e franziu o cenho, desconfiado.
— Está tentando se livrar de mim, Jones? —Meu melhor amigo questionou, erguendo uma das sobrancelhas em um arco insolente, e eu revirei os olhos, empurrando-o pelo ombro.
— Você tem um dia longo amanhã, . — Rebati, bagunçando os seus cabelos, e resmungou, jogando o corpo para trás.
— Boa noite, Sarinha. — Disse ele, aproximando-se de mim para desferir um beijo sobre a minha testa. Um sorriso involuntário escorreu pelos meus lábios.
— Boa noite. E qualquer coisa… Nem pense em me chamar. O sono do Mitchy é bem mais leve que o meu. — Dei de ombros, como uma criancinha sapeca, e achou graça.
— Seria muito mais divertido se eu pudesse dormir no meio de vocês. — Ele disparou, me olhando por cima dos ombros, parado na exata divisão entre a cozinha e o corredor dos quartos.
— Você já fez isso, . Ou se esqueceu daquela viagem para a Jamaica quando você…
— Boa noite, Jones! — O disparou, desaparecendo do meu campo de visão segundos antes que eu tivesse a oportunidade de trazer à tona uma lembrança engraçada, porém, vergonhosa, do seu passado, três anos atrás. Achei graça.
Quando ouvi o barulho da porta batendo e tive a certeza de que não estava mais por perto, levei uma das minhas mãos ao pingente de lua preso na corrente ao redor do meu pescoço e virei o meu rosto na direção do telefone sobre o mármore da bancada à minha frente.
Lancei mais um olhar temeroso na direção do apartamento onde o meu amigo desapareceu e respirei fundo, antes de tomar o celular em minhas mãos e jogar o meu corpo de volta sobre a cadeira onde eu estava sentada minutos atrás.

Londres, Inglaterra. 25 de setembro de 2020.

Casa da Sarah

Narrador Avulso


Às oito e quinze em ponto, deixou o quarto de hóspedes e partiu em direção à cozinha vestindo uma calça jeans de lavagem clara e rasgos no joelho, os vans brancos surrados de sempre, uma blusa também branca, com mais uma estampa divertida como de costume. Óculos escuros cobrindo os olhos inchados pela noite mal dormida, um colar colorido em torno do pescoço, uma mochila preta presa em apenas um de seus braços e uma presilha de cabelo marrom, presa ao tecido da blusa.
— Você não vai tirar esse tufo de cabelo do seu rosto antes do show? — Sarah perguntou, referindo-se ao bigode, não tão cheio, do amigo, enquanto bebericava um pouco de café preto. rolou os olhos, abrindo a geladeira em busca de um suco.
— De jeito nenhum, Sarinha.
O retrucou, girando os calcanhares de frente para a amiga ao passo que apoiava a jarra com suco de melancia sobre a ilha de mármore da cozinha e, dessa vez, foi Sarah quem revirou o olhar em meio aos risos.
— Você não vai se arrumar? — perguntou, constatando que a amiga ainda vestia o seu camisolão de mangas compridas e listras cor de rosa, além de pantufas nos pés.
— Eu não vou com vocês. — A mais velha disparou, correndo a vista pelo jornal em suas mãos, e engasgou, arqueando as sobrancelhas.
— Você não… Não vai?
O tom de voz do amigo chamou a atenção de Sarah para si e a garota achou graça, sorvendo o resto do café antes de deixar a cabeça de lado e se virar de frente para .
— Eu vou. Só não com vocês. — Ela deu de ombros e o outro franziu o cenho, sem entender.
— E por que não?
— Preciso resolver algumas coisas no centro da cidade. É um pouco urgente. — É Jones quem deu de ombros dessa vez, caminhando alguns breves passos até o amigo que, em silêncio, a observou como se soubesse que Sarah estava escondendo algo naquele exato momento. — Mas não se preocupe, eu estarei lá.
— Você está pronto, ? — A voz de Mitch se fez presente e ergueu o rosto de encontro ao amigo enquanto Sarah sorriu e girou os calcanhares, seguindo em direção ao namorado.
Nervoso, passou as mãos suadas pela roupa e balançou a cabeça na afirmativa.
— Então podemos ir. O ônibus já está esperando a gente. — Disparou o mais velho, recebendo Sarah em seus braços para um abraço rápido.
— Certo. Eu só vou… Buscar o meu celular. Dois minutos. — O ergueu dois de seus dedos na altura do seu rosto e, em seguida, desapareceu, correndo em disparada pelo corredor dos quartos, o que fez o casal de amigos rir.
— Esse menino precisa relaxar. — Mitchy murmurou, atraindo a atenção da namorada para si. — Quais as chances de você conseguir chegar com a uns… Trinta minutos antes do show? — O rapaz estreitou o olhar, arqueando uma das sobrancelhas, e Sarah esbugalhou os olhos, estupefata, no segundo em que entendeu as verdadeiras intenções de Rowland por trás daquele questionamento.
— Mitchy! — Ela repreendeu o namorado, empurrando-o pelo ombro.
Rowland deu risada, abafando a região atingida com a mão livre.
— Ué, ajudaria. — O melhor amigo de deu de ombros, em sua defesa, e Sarah rolou os olhos.
— Eu juro que às vezes prefiro a sua versão mais calada, sabia?
A garota disparou, voltando para o seu café e jornal enquanto o outro achava graça e disparou alguns passos até ela, envolvendo os braços em sua cintura.
— E você pode ir tirando o cavalinho da chuva, de qualquer forma. Eu só consegui passagem para o trem das cinco.
Sarah deu de ombros, erguendo o rosto de encontro ao do namorado que, por conseguinte, a surpreendeu, selando os seus lábios em um beijo rápido.
— Sem contar que… Eu ainda não sei se ela vai querer ir comigo. — Jones mordeu os beiços, meio nervosa, e Mitchy se afastou o suficiente para conseguir fitar o rosto da garota.
— Você está de brincadeira? — Ele franziu as sobrancelhas e Sarah deu de ombros mais uma vez, com um sorriso amuado nos lábios. — Nós estamos falando da ! É claro que ela…
— Podemos ir? — A voz de se fez presente, calando o namorado de Jones.
Sem jeito, Sarah evitou contato visual com o amigo e estranhou, lançando um olhar confuso para o casal.
— Tá tudo bem? — Ele questionou, visivelmente desconfiado, e a garota forçou o seu melhor sorriso, ao passo que Mitchy puxou uma boa quantidade de ar pelo nariz e balançou a cabeça na afirmativa, concordando com o mais novo. — Então… Vamos? — perguntou, com os olhos esbugalhados, fitando um e em seguida do outro. Rowland soltou o ar pela boca, lançou um olhar rápido para a namorada e só então voltou a sua atenção para .
— Vamos. — Assentiu, afastando-se de Jones.
— Boa viagem, meninos. E até mais tarde. — Sarah sorriu, abraçando os próprios braços e olhou para a amiga por cima dos ombros, ao passo que se abaixava para pegar a mochila e o violão no chão.
— Não se esqueça de comprar um buquê. — disparou e a garota franziu o cenho, sem entender.
— Por que eu faria isso?
— Porque é o meu primeiro show. — Ele deu de ombros e a mais velha rolou os olhos, entediada. — Eu mereço um buquê. — piscou um dos olhos com um sorrisinho petulante nos lábios.
— Certo, certo. Vocês precisam ir agora. — Sarah disse, empurrando em direção à saída do apartamento, e Mitchy achou graça. — E quanto ao buquê, talvez eu leve uma flor. — A garota ergueu os ombros, lançando uma piscadela para o namorado, que prendeu um lábio contra o outro, tentando segurar a risada, e enrugou o cenho.
— Só uma flor?
— Vai ser mais do que suficiente, . Eu garanto para você. — A mais velha rebateu com um sorrisinho infantil nos lábios e lançou um olhar confuso para Mitchy, que, sem mais explicações, jogou o braço em torno dos ombros do amigo e o puxou para fora do apartamento.

Londres, Inglaterra. 25 de setembro de 2020.

Casa dos Carters.



— Nem acredito que estamos em casa. — Maria Luiza murmurou, deixando a mala de lado e soltando o casaco molhado no chão do hall de entrada enquanto se livrava do par de All Star amarelo. — Eu preciso de uma aspirina. — Ela soltou, entrando pela casa, e eu dei risada, esvaziando os meus bolsos e largando alguns dos meus pertences sobre o aparador de madeira ao lado da porta.
— Eu disse que você não deveria ter bebido tanto ontem à noite, nosso ônibus saiu muito cedo do hotel. — Dei de ombros, passando as mãos pelo rosto, e Malu me olhou por cima dos ombros, mostrando a língua como uma criancinha mal-criada.
— Você sabe que eu não gosto quando você banca a minha mãe.
Soltei o ar pela boca e dei de ombros mais uma vez, virando o meu corpo de frente para o dela por completo.
— Alguém precisa fazer o trabalho chato. Sem contar que, eu já sou babá de três criancinhas, não me custa nada ser de mais uma. — Rebati, prendendo os meus lábios para conter o riso, ao passo que vi a expressão no rosto da minha melhor amiga ir de perplexa para entediada em uma questão de dois ou três segundos.
— Por falar neles, onde estão os seus pestinhas? — Ela perguntou, jogando-se despreocupadamente sobre o maior sofá da sala.
— Em Paris, eu acho. Tori me mandou mensagem ontem assim que chegamos no hotel, ela e Éric tinham levado as crianças à Disney e depois me mandou uma foto dos gêmeos com o Pato Donald. Eu tentei te mostrar, mas você estava muito mais interessada na sua conversa com o Jonah. — Finalizei com a voz um pouco afetada e dei risada quando vi a careta no rosto de .
— Por falar nisso, ele não para de insistir para que eu vá encontrar com ele em Camden. — Malu suspirou, como se ir até Camden encontrar Jonah fosse um sacrifício absurdo, e eu franzi o cenho, sem entender.
— E você vai?
— É claro que sim, eu só preciso de um tempo para me recompor. E uma aspirina. E um banho. — Ela rebateu e eu acompanhei os seus movimentos, ao passo que Maria Luiza ergueu um dos braços e cheirou a região da sua axila, fazendo uma careta enojada logo em seguida. — É, definitivamente um banho.
Malu saltou do sofá, inclinou o tronco para frente e, como se tivesse acabado de se lembrar que aquela não era a sua casa, se virou para mim com os olhos arregalados.
— Onde fica o banheiro mesmo?
Dei risada.
— Você pode usar o meu. Lá em cima, terceira porta à esquerda. — Soltei o ar pela boca e minha melhor amiga curvou os lábios em um sorriso adorável, sem mostrar os dentes.
— Obrigada. — Ela agradeceu e o telefone em suas mãos vibrou, chamando a sua atenção.
Não precisei de muito para saber que o nome que brilhava em sua tela era o de Jonah, o sorriso bobo e as bochechas rosadas já me davam essa certeza. Malu ergueu o rosto para mim, mordendo os lábios como uma garotinha apaixonada, e eu rolei os meus olhos, balançando a cabeça de um lado para o outro antes de dar as minhas costas à ela para um pouquinho mais de privacidade.
Há uma semana, as escolas infantis entraram em recesso, e tanto os Carters, quanto os Tompkins, saíram de Londres para uma viagem em família. Com isso, eu e Malu aproveitamos a oportunidade que nos foi dada para usufruir das milhas aéreas que vínhamos acumulando desde que nos mudamos para a Inglaterra. Como destino, escolhemos a capital da Irlanda. Sem motivo nenhum, para ser sincera, apenas porque cabia dentro do nosso orçamento e todo mundo conhecia a fama que os Irlandeses carregavam.
Dublin era uma cidade linda, pequena — quando comparada à Londres —, mas aconchegante e extremamente divertida. Durante os dias que passamos lá, tivemos a chance de conhecer lugares maravilhosos com vistas exuberantes por todo território irlandês e dar boas gargalhadas pela noite, quando nos dávamos a chance de mergulhar de cabeça dentro da cultura irlandesa e passávamos boas horas ouvindo as histórias de Gregory — um senhorzinho adorável de quase setenta anos, dono de um dos pubs mais tradicionais no centro da cidade.
Foi uma boa viagem, melhor do que eu esperava se eu estiver sendo sincera. E eu precisava disso. Precisava me divertir e desligar dos meus sentimentos como se não precisasse lidar com o meu futuro. E eu sabia que, mais cedo ou mais tarde, precisaria enfrentar os dias que estavam por vir, então era melhor que eu aproveitasse até o último gole do Irish Car Bomb* que me era servido.
De repente e sem perceber, me peguei encarando uma das fotos de sobre o móvel de madeira ao lado da escada que conectava o primeiro ao segundo andar. Despertei dos meus devaneios quase que imediatamente, mas passei a, de fato, prestar atenção na foto, e isso fez o meu coração doer como vinha doendo desde aquele dia em Holmes Chapel.
Por mais que a minha cabeça estivesse ocupada e minha mente distraída durante a viagem para Dublin, eu não conseguia não pensar em . Era impossível. À cada coisa que eu fazia, ele estava ali, presente. Em cada drink que eu tomava, cada paisagem que eu visitava, cada foto que eu tirava, cada gargalhada que eu dava, cada história que eu ouvia… estava em tudo.
E sim, nós estávamos tecnicamente bem. Vínhamos trocando mensagens como dois conhecidos distantes que lembravam um do outro ao assistir um filme ou ao ler um livro, desde aquele dia quando ele me mandou uma foto de Sophia e eu admiti que sentia a sua falta. Mas isso, nem de longe, refletia a maneira como costumávamos agir antes de toda aquela confusão acontecer.
Eu queria que ele tivesse ido para Dublin comigo — por mais que eu amasse a companhia de Malu — e, ao mesmo tempo, queria estar com ele em Amsterdã, ou sabe-se lá onde ele estava agora.
Queria estar rindo das suas piadas de tiozão e que o meu coração estivesse derretendo cada vez que as covinhas surgissem em suas bochechas. Queria que ele aparecesse no meu quarto sorrateiramente para que pudéssemos dormir juntos porque, apesar do tamanho e de todas as provocações recheadas de malícia, era apenas uma criancinha que não gostava de dormir sozinha. Queria que ele estivesse aqui, puxando a minha orelha por ser idiota — ou boa — demais para pessoas que não merecem isso e, ao mesmo tempo, queria poder assistir ele tratar cada pessoa que cruza o seu caminho com uma gentileza invejável.
Curvei os meus lábios em um sorriso sem humor e, involuntariamente, levei uma das minhas mãos ao porta retrato com a sua foto.
Eu só… Só queria estar com ele, em qualquer lugar do planeta.
— Eu deveria obrigar você a ir atrás desse homem, sabia?
A voz de Maria Luiza se fez presente e eu dei um salto, puxando o choro — que até então, eu não sabia que estava prestes a soltar — pelo nariz.
— Hoje mesmo. Agora. — Ela deu de ombros com a mandíbula enrijecida e um risinho sem força escapou pelos meus lábios.
— Você sabe que eu não faria isso. — Dei de ombros, passando uma das mãos pelo rosto para me certificar de que nenhuma lágrima tinha molhado a minha pele, e minha amiga rolou os olhos, dando alguns passos até onde eu estava.
— Eu posso te chantagear.
Malu disparou, cruzando os braços na frente de seu corpo, e eu franzi o cenho, inclinando o meu rosto levemente para baixo.
— Existe um vídeo seu maravilhoso salvo na minha galeria. Daquela noite que fomos ao karaokê em Galway e você cantou Story Of Us depois de alguns copos de cerveja. — Minha melhor amiga deu de ombros mostrando a mim a sua melhor impressão da Regina George, e eu cerrei os meus olhos, cruzando os meus braços como os dela.
— Você não faria isso com a sua melhor amiga.
Malu riu.
— Eu não pagaria para ver, bonitinha. — Ela piscou um dos olhos em um gesto insolente e eu revirei os meus, impaciente.
— Eu vou falar com ele, . Juro que vou. — Disparei, depois de soltar o ar pela boca e me afastar de . — Só não hoje. Nem amanhã.
Dei de ombros e, dessa vez, ela quem rolou os olhos de um jeito preguiçoso.
— Nós acabamos de chegar de viagem e ele está em Amsterdã ou… Ou voltou para Londres há pouco tempo, eu não sei! A única coisa que eu sei é que não é o momento certo para termos essa conversa.
— E quando é o momento certo, ? Quando esse assunto esgotar ainda mais vocês? — Ela questionou, sem me dar um tempo mínimo necessário para pensar. — Puta que pariu, eu nunca vi alguém empatar tanto a própria foda quanto você e o . Sério, é bizarro.
Minha melhor amiga arregalou os olhos e eu não consegui conter a risada.
— Você não está atrasada para encontrar com o Jonah?
Ela revirou os olhos como uma criancinha birrenta.
— Eu já disse, preciso de um banho antes de ir. — Malu deu de ombros e eu puxei o ar pelo nariz, relaxando os meus ombros.
— Então faça isso. Acho que a pressurização da cabine não te fez muito bem e você está falando um pouquinho demais. — Enruguei o meu nariz e ergui uma das minhas mãos na altura do seu rosto, mostrando o pequeno espaço de dois centímetros entre o meu indicador e o polegar.
Maria Luiza rolou os olhos de novo e eu achei graça.
— Você sabe que eu estou certa. — Ela disparou, mostrando a língua.
— É claro. Talvez. — Rebati e Malu resmungou coisas inaudíveis, ao mesmo tempo que girou os calcanhares e subiu os degraus da escada em direção ao banheiro no meu quarto.
Balancei a minha cabeça de um lado para o outro e dei risada quando minha melhor amiga já não estava mais dentro do meu campo de visão.
Funguei, coçando a ponta do nariz com o indicador e caminhei até a cozinha. Abri o armário em cima da pia, de onde tirei a minha caneca de porcelana branca e bolinhas coloridas, abri a geladeira e me surpreendi com o som da campainha ecoando pela casa no exato momento em que levei uma das minhas mãos à garrafa com água.
Desisti da ideia de saciar a minha sede e larguei a caneca sobre o balcão, seguindo a direção que me levaria à entrada da casa mais uma vez, logo em seguida.
Não me preocupei em checar o olho mágico e confesso que uma parte de mim se animou com a possibilidade de rever os meus pestinhas favoritos depois de todos esses dias de férias, mas não foram eles quem eu encontrei por trás daquela porta. Nem mesmo Vitória, ou Éric.
Ou .
Quem eu vi ali, parada à minha frente, com um dos sorrisos mais simpáticos que eu já vi na vida, foi a melhor amiga dele, Sarah. E era simplesmente impossível evitar que as minhas sobrancelhas se arqueassem e que meu queixo caísse alguns centímetros, em choque.
— Como vai, ? — Ela sorriu ainda mais, fechando os dedos em torno da alça da bolsa transpassada em seu corpo, num gesto ansioso. — Eu não tinha certeza de que você estava em casa, mas vi os seus stories mais cedo e, bom… Posso entrar?
Sarah mordeu os beiços, inclinando o tronco levemente para frente, provavelmente para se certificar de que eu estava sozinha. Surpresa, acabei demorando certo tempo para acordar do transe e, quando consegui, umedeci a garganta e os lábios, balançando a cabeça na afirmativa antes de abrir espaço para que a melhor amiga de passasse por mim para dentro da casa dos Carters.
Meus olhos seguiram os seus passos e só então percebi minhas mãos tremendo. Vi Sarah se sentar na poltrona favorita de Éric e meu coração estremeceu, desesperado em saber o que tinha acontecido.
Porque tinha acontecido.
Eu não tinha tanto contato com Sarah, por mais que já tivéssemos feito algumas coisas juntas. Acredito que tenhamos trocado umas três ou quatro mensagens durante todos esses meses que a conhecia e, normalmente, quando nos encontrávamos, sempre estava junto.
Arregalei os meus olhos sem perceber.
Será que tinha acontecido algo com ele?
— Como foi a viagem? — A voz dela me acordou dos meus devaneios e só então notei que estava pinçando os meus lábios com o polegar e o indicador, da mesma forma que tinha o costume de fazer.
— Ahmm… Foi… — Balbuciei, com certa dificuldade em montar frases, então chacoalhei a cabeça de um lado para o outro como se tentasse “colocar as coisas no lugar” e umedeci os meus lábios mais uma vez, sentando-me na poltrona em frente à que Sarah estava sentada. — Foi ótima, na verdade. Dublin é um lugar incrível e as pessoas são bem divertidas.
Dei de ombros, balançando a minha cabeça na afirmativa sem motivo nenhum, e a melhor amiga de sorriu, refletindo os mesmos movimentos que eu, como um espelho.
— É, eu já estive lá algumas vezes e… — Sarah parou de falar, desviou o olhar do meu e soltou um risinho, chacoalhando a cabeça na negativa.
Sem entender, franzi o meu cenho.
— Você não deve estar entendendo por que eu estou aqui, né? — Ela enrugou o nariz em um semblante adorável e eu não consegui conter a risada que saltou pela minha boca logo.
— Na verdade não. Aconteceu alguma coisa? — Mordi os meus beiços em um movimento ansioso e Sarah puxou o ar pelo nariz.
Vi a melhor amiga do homem pelo qual eu estava apaixonada se sentar mais para a beirada da poltrona e, em seguida, vasculhar a bolsa sobre o seu colo em busca de algo específico.
— Não aconteceu nada. Pelo menos nada grave, é só… — Jones soltou o ar pela boca e, de dentro da bolsa, puxou um papel pautado bastante amassado e meio amarelado.
Franzi o cenho, sem entender, e em seguida, a vejo estender a folha para mim.
— Eu só precisava entregar isso para você. — Ela disparou e, confusa, olhei do papel em suas mãos para o seu rosto algumas vezes.
— O que é… — Curiosa, tomei a folha pautada em minhas mãos e desfiz os dobrados. Me calei no momento em que reconheci a caligrafia marcada em caneta fina preta como sendo de .
Cortei a minha respiração sem nem perceber e minhas mãos tremeram enquanto passava os meus olhos pelas palavras escritas ali e sentia um calafrio doloroso cortar o meu peito de uma ponta a outra.

I might never be your knight in shining armor
(Talvez eu nunca seja o seu cavaleiro vestindo uma armadura brilhante)
I might never be the one you take home to mother
(Talvez eu nunca seja o cara que você levaria para conhecer a sua mãe)
And I might never be the one who brings you flowers
(E eu posso não ser aquele que te traz flores)
But I can be the one, be the one tonight
(Mas eu posso ser o certo, o certo nessa noite)

When I first saw you
(Quando eu te vi pela primeira vez)
From across the room
(Do outro lado do quarto)
I could tell that you were curious
(Eu sabia que você estava curiosa)


Dou risada, deixando uma lágrima pesada — que eu nem mesmo sabia que estava segurando — cair. Um filme cruzou a minha memória no exato segundo em que comecei a ler cada uma daquelas palavras. Aquilo ali, cautelosamente posto em uma música no pequeno pedaço de papel entre os meus dedos, era a nossa história.
Minha e dele.
Cada partezinha dela. Desde a primeira vez em que nos vimos, quando o peguei dormindo naquela que até então era a minha cama, até a nossa viagem para Amsterdã visitando lugares os quais até hoje eu não sei pronunciar; as voltas que dávamos de carro no meio da madrugada para comer um lanche ou, simplesmente, admirar a beleza da lua. Os nossos pequenos encontros secretos, onde ele esperava Vitória, Éric e as crianças dormirem para escapar sorrateiramente até o meu quarto, seja para mais uma de nossas aulas, ou seja para jogar conversa fora até que caíssemos no sono juntos.
Estava tudo ali. Do detalhe mais banal, ao momento mais importante. não tinha se esquecido de absolutamente nada.
— Isso é sobre vocês, não é? — Ouvi Sarah questionar e só então me recordei da sua presença ali.
Puxei o choro pelo nariz e ergui o meu rosto para olhá-la.

Flashback ON

Narrador Avulso


Londres, Inglaterra. 30 de julho de 2020.

Casa dos Carters.


— O que você tá fazendo? — saiu do banheiro esfregando os olhos com o dorso da mão e girou o tronco sobre a cadeira de rodinhas onde estava sentado para olhá-la por cima dos ombros.
O cabelo da garota estava bagunçado, com metade dele preso na lateral de sua cabeça e a outra solta. Suas pálpebras estavam inchadas pelas boas horas de sono e ela vestia uma samba canção com pequenas estampas da série Friends, além de uma blusa básica preta três vezes maior do que o seu tamanho. Ambas direto do guarda roupa de .
O curvou os lábios em um sorriso ladino e abriu um dos braços em um convite silencioso para que se sentasse sobre uma das suas pernas.
O que ela fez, sem pensar duas vezes, transpassando um de seus braços em torno dos ombros dele para manter seus corpos ainda mais próximos um do outro.
— Não é nada, eu só tive uma ideia e precisei anotar para não esquecer. — Ele disse, pressionando os lábios no ombro da garota em um gesto de carinho e mordiscou os cantos internos de suas bochechas como uma garotinha curiosa.
— É nesse caderno que você escreve as suas músicas? — A perguntou, passando a mão pelo couro marrom envelhecido que envolvia a capa do pequeno caderno.
murmurou na afirmativa, abraçando a cintura de com os dois braços.
— Eu posso ver?
— De jeito nenhum, bonitinha. — Ele disparou, tomando o objeto das mãos de e atirando-o do outro lado do quarto, sobre a sua cama.
o encarou com os olhos esbugalhados e os lábios semiabertos, o que fez rir.
— Por que você fez isso?
— Porque eu não quero que você veja.
— E por que não?
— Porque não. — deu de ombros, depositando outro beijinho sobre o ombro de e cerrou os olhos, cruzando os braços, desconfiada.
— Você escreveu algo sobre mim? — Ela perguntou e engasgou, disfarçando com uma tosse, seguida de um riso.
— Menos, bonitinha. — rolou os olhos, apertando a cintura da garota e a impulsionando para cima, para que ela levantasse do seu colo. — Você ainda não me deu motivos para escrever algo sobre você.
soltou o ar pela boca, fingindo desapontamento, e achou graça do bico em seus lábios.
— Ah, tudo bem então. — Ela suspirou, passando a ponta dos dedos pela bancada de como se estivesse encenando uma cena dramática de qualquer besteirol adolescente e deixou um riso escapar pelo nariz. — Eu queria saber escrever, acho que tenho muita coisa entalada aqui que serviria de inspiração para uma música.
A cruzou os braços, apoiando o quadril contra a bancada, e cerrou os olhos, desconfiado.
— Como o quê?
Ele suspirou outra vez.
— O relacionamento com Arthur, por exemplo. Daria uma excelente breakup song, na minha opinião. — A deu de ombros e ergueu as sobrancelhas.
Breakup song?
A murmurou na afirmativa.
— É. Você nunca ouviu Taylor Swift? — franziu o cenho de um jeito adorável e deu risada, com o rosto virado para baixo e os indicadores pressionando as pálpebras.
— Você não existe, bonitinha. — Ele soltou, dando alguns passos em direção à ela, e rolou os olhos com certa insolência.
— É claro que não, . Eu sou perfeita. — A deu de ombros e o mais velho achou graça, abraçando a cintura dela com um de seus braços.
— Você é, . — A voz dele saiu mais aveludada que o normal e não conseguiu conter o sorriso quando sentiu o braço dele puxá-la para ainda mais perto de si. — Você é. — disse por fim, antes de roçar o nariz no dela e juntar a boca à dela em um de seus beijos.

Flashback OFF


Londres, Inglaterra. 25 de setembro de 2020.

Casa dos Carters.

And if you like cameras flashing
(e se você gosta do flash das câmeras)
Every time we go out,
(todas as vezes que saímos)
And if you're looking for someone
(e se você está procurando por alguém)
To write your breakup songs about
(sobre quem esquecer as suas canções de término)
Baby, I'm perfect
(amor, eu sou perfeito)
Baby, we're perfect
(amor, nós somos perfeitos)


deu risada e apertou as pálpebras molhadas com a ponta dos dedos, para que algumas lágrimas pesadas escorressem, antes de voltar a ditar Sarah.
— É, eu acho que sim. — A rebateu o questionamento da melhor amiga de e Jones soltou o ar pelo nariz, curvando os lábios em um sorriso sem mostrar os dentes.
, ele te ama. E eu não preciso de muito para saber que você sente o mesmo. — A mais velha disparou, esticando um dos braços para alcançar uma das mãos de e a outra sorriu, balançando os joelhos em um gesto ansioso. — Eu não consigo entender por que vocês insistem em adiar algo que está quase sufocando vocês.
Sarah franziu o cenho e respirou fundo, retesando a postura.
— Você sabe onde ele está? — Ela perguntou, limpando o nariz com o dorso da mão, e Jones sorriu, recuando-se sobre a poltrona.
— Em Manchester, o show dele é nessa noite. — A melhor amiga de rebateu e a outra esbugalhou os olhos, surpresa.
— Meu Deus! — esbravejou, se colocando de pé em um salto. — Eu esqueci completamente e… Eu, eu… Meu Deus!
Nervosa, a começou a varrer a sala em busca do seu telefone e Sarah achou graça.
— Ele não me falou nada. Por que… Nós nos falamos ontem! — A choramingou, batendo o pé no chão como uma criancinha mimada no segundo em que encontrou o celular e o tomou em suas mãos. — Por que ele não me falou nada?
perguntou — mais para si mesma do que esperando a resposta de alguém —, enquanto passava a mão livre pelo cabelo de maneira desesperada e Sarah se colocou em pé, parando a alguns passos de distância da mais nova.
— Ele veio com um papo torto de que não queria que você se sentisse obrigada a ir. — A mais velha disparou, atraindo a atenção de para si, e a outra franziu o cenho, sem entender.
— O que… Meu Deus, ! — A resmungou, rangendo os dentes, e a outra curvou os lábios em um sorriso de lado.
— Mas você ainda pode ir, . — Sarah disse, tomando uma das mãos de para si mais uma vez. — É por isso que eu estou aqui, na verdade. Para pedir que você vá comigo.
É quando para e dá ouvidos ao lado racional do seu cérebro, com os olhos esbugalhados de medo.
Ela podia fazer aquilo?
Podia sair correndo de Londres em direção a Manchester sem avisar mais ninguém, mesmo depois de ter escondido a data do seu show por vontade própria? Sem contar que, aquela era uma noite especial e ela não podia, de jeito nenhum, tornar aquilo sobre ela — ou sobre os dois, ainda que fosse.
esperou e trabalhou muito para que aquele show acontecesse, não queria se permitir estragar aquilo. De forma alguma.
Além de que, ela não tinha garantia alguma de que queria vê-la naquele momento. Nem mesmo a letra de música transcrita no papel em suas mãos.
— Eu… err
— Ela vai. — A voz de Maria Luiza se fez presente, puxando a atenção das outras duas para si.
… — choramingou, sentindo o peito comprimir, e a outra balançou a cabeça na negativa, caminhando até a amiga.
— Não, corta essa! Eu esqueci a minha bolsa aqui e acabei ouvindo a conversa de vocês quando voltei para buscar. — Maria Luiza deu de ombros, lançando um olhar rápido para Sarah. — E eu sei o que tá passando dentro dessa sua cabecinha. Você não acha que deve ir, não é? — Ela perguntou, voltando a sua atenção para , e a outra desviou o olhar, mordendo os cantos internos de suas bochechas em um movimento nervoso. — Você não só deve ir, como vai. O precisa que você vá.
não conseguiu conter o risinho irônico que saltou pelos seus lábios enquanto passava o dorso da mão por baixo do nariz para limpá-lo.
— Ele teria me avisado se precisasse mesmo, eu não pensaria duas vezes antes de ir. — A deu de ombros e a outra rolou os olhos, impaciente, fazendo Jones rir.
— Sinceramente? Vocês são dois idiotas que acham que sabem o que é melhor para o outro, quando a verdade é que vocês não sabem de porra nenhuma. — Maria Luiza disparou e arqueou as sobrancelhas ao passo que Sarah engasgou com o riso. — Chega de adiar o inadiável, pelo amor de Deus!
— Eu concordo com ela. — Jones deu de ombros, puxando a atenção das duas para si. — Não que você seja idiota, . Mas o certamente é.
A deu risada.
também. E ela sabe disso. — Malu ergueu os ombros e arregalou os olhos, desferindo um tapa contra o braço da amiga.
!
— Ué? Eu não menti não, . — A outra esbugalhou os olhos, afagando a região atingida com uma das mãos.
Cansada, balançou a cabeça de um lado para o outro, pressionou as pálpebras cansadas com o indicador e respirou fundo antes de erguer o rosto de encontro ao de Sarah.
— Vocês realmente acham que isso é uma boa ideia? — Ela perguntou, mordendo os lábios em um gesto ansioso. — Quero dizer, eu nem sei o que dizer a ele e…
— Você o ama? — Jones a interrompeu e imediatamente se calou, com os olhos bem abertos como um par de jabuticabas.
Por conseguinte, a rangeu os dentes, emitindo um barulho muito similar a um rosnado, ao mesmo tempo que cerrava os punhos e batia os pés no chão como uma garotinha nervosa.
— É claro que sim. — Confessou, apertando as próprias bochechas de um jeito adorável e as outras duas acharam graça.
— Então você sabe perfeitamente o que dizer, . — Sarah proferiu com um sorriso nos lábios e mordeu os lábios, lançando um olhar rápido para .
— Vai dar tudo certo! Eu prometo. — Maria Luiza disse, envolvendo a cintura da amiga em um abraço. — E se não der… Bom, eu estou sempre disposta a arrancar as bolas de alguém fora. — Ela deu de ombros com a cara mais lavada do mundo e as outras duas engasgaram em meio aos risos, ao passo que Sarah afagou um dos braços de para confortá-la.

Irish Car Bomb: famoso drink irlandês, comumente usado como brincadeira de bar.

Manchester, Inglaterra. 25 de setembro de 2020.

Golden One Center.


puxou a cadeira e se sentou em frente à bancada da penteadeira do camarim. Ele respirou fundo e fitou o seu reflexo no grande espero retangular de borda branca, rodeado por várias lâmpadas de intensidade quente. Há pouco mais de cinco minutos, tinha sido deixado ali sozinho pela figurinista, a maquiadora e o cabeleireiro contratados por Jeffrey.
Ele passou a mão pelos cabelos, recentemente aparados — deixando um volume maior no topo de sua cabeça — e, em seguida, alisou a parte do seu rosto onde, até mais cedo, ainda existia uma barba rala, mas agora estava lisa e aveludada, como se tivesse rejuvenescido dois anos no tempo.
Para a sua primeira grande noite, foi orientado a vestir um conjunto de calça e blazer amarelos, com ramos de samambaias — tais quais os de suas tatuagens — e pequeninas flores brancas estampados por cada um de seus cantos, além de uma blusa social preta. Era uma combinação agradável e combinava com de um jeito peculiar que transmitia a ele a sensação de que tudo estava quase perfeito para que aquele show saísse do jeitinho que ele vinha sonhando há alguns anos.
Quase perfeito.
soltou o ar pela boca e inclinou o tronco para frente, alcançando o celular sobre a bancada. Esfregou os olhos com o dorso da mão — esquecendo-se por completo de todo o trabalho que a maquiadora teve para esconder as marcas das últimas noites mal dormidas — e sem pensar muito, abriu o Instagram.
O primeiro post em seu feed, logo de cara, era de . Um photobooth com dez fotos que ela tinha tirado durante a última viagem para a Irlanda e um sorriso acabou surgindo no rosto de instantaneamente.
O deu risada quando a viu vestindo uma peruca ruiva e um chapéu verde, ao lado de Maria Luiza e um senhor tipicamente Irlandês, de estatura mediana e barba longa, segurando uma caneca de cerveja em cada uma das mãos. parecia verdadeiramente feliz e, para , era quase impossível não se sentir no mesmo estado de euforia só em vê-la daquele jeito.
Ele passou as mãos pelos cabelos mais uma vez e coçou os fios ralos presos à sua nuca, até que o som de três batidas na porta chamaram a sua atenção para o lado esquerdo do camarim — aquele que o ligaria à parte de trás do palco e não aos corredores do backstage.
arqueou as sobrancelhas e, sem dizer nada, esperou até que alguém surgisse atrás daquele pedaço de madeira.
— Não estou certa se devo te desejar merda ou que você quebre a perna.
deu risada quando viu sua irmã colocar metade do corpo para dentro do camarim.
— O que for melhor para você. — O deu de ombros, levantando-se da cadeira para recepcionar Georgia com um beijo na bochecha e um abraço carinhoso.
— Como você está se sentindo? — A mais nova perguntou, arrumando o colarinho amarrotado da blusa do irmão.
soltou o ar pela boca.
— Um pouco nervoso. Como estão as coisas lá fora?
A garota abriu um sorriso largo nos lábios e seus olhos brilharam de orgulho.
— A casa está lotada, irmãozinho.
— Ai, meu Deus! — Um riso nervoso saltou pela boca de e ele levou uma das mãos ao rosto, cobrindo os seus olhos com os dedos longos e as unhas pintadas com uma combinação de esmaltes na cor amarelo e cintilante. — Eu acho que vou vomitar!
— Não vai nada! — Georgia se apressou em dizer, apertando os ombros de , e em seguida, segurando o rosto dele entre as suas mãos, forçando-o para cima. — Você é , vai dar tudo certo! Todo mundo que você ama tá atrás daquela porta, torcendo por você! — Ela disparou, apontando pela porta por onde tinha passado minutos antes e pensou em instantaneamente.
Cabisbaixo, ele puxou o ar pelo nariz, umedeceu os lábios com a ponta da língua, coçou a testa e deu alguns passos para trás, afastando-se de Geórgia.
— Nem todo mundo. — Sua voz saiu por um sopro e seus ombros caíram, derrotado.
Georgia inclinou a cabeça levemente para o lado e seus lábios se curvaram em um sorriso entristecido.
— Ela não vem?
balançou a cabeça na negativa.
— Vai ser melhor assim, Ge.
A outra rolou os olhos, pousando as mãos nas curvas de sua cintura.
— Melhor para quem, ? Porque para você claramente não é. — Ela disparou e o respirou fundo, apertando as pálpebras com os indicadores. — E nem para , antes que você pense em dizer. Até porque, a única pessoa que sabe o que é melhor para a , é ela mesma, e não você.
— Eu sei disso, Georgia.
— Ué. E se sabe, porque está agindo como um idiota egoísta? — A mais nova arqueou as sobrancelhas e se surpreendeu, soltando o queixo alguns centímetros.
Arrependida por, talvez, ter pego um pouco pesado, Geórgia respirou fundo, fechou os olhos por alguns segundos e balançou a cabeça de um lado para o outro.
— Privar a garota de assistir o primeiro show de verdade do cara que ela ama, é egoísmo, . — Ela proferiu, soltando os ombros.
não…
— Não se atreva a dizer que ela não te ama! — Geórgia disparou, apontando o indicador para o irmão como uma mãe ao repreender o filho.
achou graça.
— Ela te disse o contrário? — O perguntou, erguendo uma das sobrancelhas em um arco insolente e a garota rolou os olhos, sem paciência.
— Não começa.
gargalhou, dobrando as bochechas de um jeito peculiar que fez com que algumas covinhas surgissem em seu rosto.
— Vamos fazer o seguinte, Ge. Eu não tenho como ligar para agora, ela não chegaria a tempo nem se eu me esforçasse para consertar o meu vacilo.
— Burrice. — A mais nova soltou e o outro franziu o cenho, sem entender. — A palavra certa é burrice. Não vacilo. — Ela deu de ombros, cruzando os braços na frente do peito, e rolou os olhos, prendendo um riso.
— Que seja, eu não tenho tempo para consertar isso agora. Você, Sarah, minha mãe e todas as outras pessoas estão certas, eu deveria ter procurado antes e ter me acertado com ela a tempo suficiente para que ela estivesse aqui hoje ou… Ou não, dependendo da vontade dela. — deu de ombros, coçando o canto interno do olho com a ponta do indicador e Georgia revirou o olhar, impaciente. — Mas sei lá! Me faltou coragem. Nós nos conhecemos há poucos meses, mas você conhece o nosso pai a sua vida inteira, talvez eu tenha herdado isso dele.
O mais velho disparou com a voz pesada e a outra mordeu os beiços, sentindo a dor nas palavras de seu irmão.

O soltou um risinho sem humor.
— Me desculpe, eu não tinha a intenção de chamar o seu pai de covarde.
Geórgia fez que não com a cabeça e deu um passo à frente, segurando o rosto de entre as mãos.
Nosso pai. — Ela corrigiu e respirou fundo, pinçando o nariz entre o polegar e o indicador — E não diga essas coisas sobre você. Você está certo, nosso pai é um covarde por tudo o que fez com vocês. Mas você não, nem um pouquinho.
Ele deu risada outra vez, apoiando um de seus braços sobre a bancada da penteadeira.
— Então por que não está aqui, Ge? Eu quero que ela esteja, eu preciso que ela esteja. Mas ela não está porque… Porque eu fui um covarde. — O soltou um ruído, apertando as pálpebras com o dorso da mão, e Georgia entortou os lábios em um sorriso ladino.
— Você nunca se apaixonou por ninguém, não é? — Ela perguntou, atraindo o olhar confuso de para si. — não está aqui porque você está perdidamente apaixonado por ela e, como qualquer outra pessoa na mesma posição, você está com medo de que ela não sinta o mesmo. — A mais nova deu de ombros e prendeu a respiração, sem nem ao menos perceber. — Mas eu já te disse uma vez e vou dizer quantas vezes for necessário até que essa informação entre nesse seu cabeção: a te ama e, por você, ela viria à pé até Manchester.
achou graça, soltando o ar pela boca com uma risada.
— Ela viria mesmo.
— Você sabe que sim. — Geórgia disse, acompanhando-o com um riso.
Em seguida, os dois irmãos foram interrompidos por batidas na porta vindas na mesma direção pela qual a irmã de tinha passado minutos antes. O esticou o pescoço para conseguir enxergar por cima da menina à sua frente e ela, por sua vez, girou o tronco, encarando a entrada do camarim por cima dos ombros.
? — Jeffrey se fez presente e arqueou as sobrancelhas, ansioso. — Cinco minutos. — Proferiu, adentrando o camarim por completo para se certificar de que tudo estava em ordem, e o músico soltou o ar pela boca, voltando a sua atenção para Georgia.
— Eu vou pegar o primeiro trem, Ge. — Ele disparou e a outra franziu o cenho, sem entender. — Assim que acabar o show, eu vou pegar o primeiro trem para Londres e vou resolver isso. Não me importa a hora que eu vou chegar lá, eu vou conversar com ela. — Disse e os olhos de sua irmã mais nova se iluminaram, ao passo que os seus lábios se curvaram em um sorriso animado.
— Então use isso como uma motivação para subir nesse palco e fazer o melhor show da sua vida. — Geórgia rebateu, apertando os ombros do irmão. — Depois que te perdoar por ter sido um bobão, ela vai querer saber todos os detalhes do que acontecer naquele palco.
prendeu os lábios em uma linha tênue, segurando um sorrisinho insolente.
Geórgia o fitou, nitidamente confusa.
— Se eu e nos acertarmos de verdade, eu duvido que teremos tempo para conversa essa noite. — Ele deu de ombros e a mais nova arqueou as sobrancelhas, com o queixo caindo, entendendo perfeitamente a mensagem encoberta por trás da gracinha do irmão.
! — Georgia o repreendeu, desferindo um tapa em seu ombro esquerdo, e achou graça, comprimindo os espaços de seus olhos .
— Dois minutos, . — Jeffrey se manifestou outra vez, abrindo a porta que levaria o rapaz direto para os fundos do palco, e respirou fundo, lançando um último olhar rápido para a irmã.
— Vai lá. — Ela o encorajou, cruzando os braços na frente do seu peito, e assentiu, com as mãos formigando, antes de girar os calcanhares na direção indicada pelo seu empresário. — E não se esqueça, quebre a perna! — A mais nova esbravejou e o outro achou graça, virando o rosto para fitar Geórgia por cima dos ombros, antes de cruzar aquela porta e desaparecer do campo de visão da sua irmã mais nova.
Por conseguinte, a neta de Sophia precisou sair pela outra porta do camarim para que ela conseguisse contornar o backstage da arena e chegar à área reservada, onde toda família de estava, do lado oposto ao que ele entrou no palco.
Assim que deixou a sala reservada exclusivamente para o artista, Geórgia ouviu o som do atrito entre o chão encerado e a sola do tênis de alguém. Curiosa, ela não conseguiu evitar levantar a cabeça na direção do barulho.
E então, a irmã de a viu.
Correndo como se a sua vida dependesse daquilo, surgiu a alguns metros de distância, seguida por Sarah, que notavelmente se esforçava para acompanhar o ritmo da outra.
— Géogia! — A gritou, ofegante, e a irmã de alargou os olhos, boquiaberta. — Geórgia! — disse mais uma vez, agora a poucos passos da outra, e Georgia acompanhou os seus movimentos assim que ela curvou o tronco para frente e apoiou as mãos sobre os seus joelhos, para recuperar o ritmo normal de sua respiração.
— Você está aqui. — A voz de Geórgia saiu por um sopro, mais como se ela estivesse externando um de seus pensamentos do que realmente relatando algo a alguém.
se manteve curvada para frente, puxando o ar pelo nariz e soltando-o pela boca.
— Onde está o ? — foi Sarah quem perguntou, mas, sem maldade, a irmã de a acabou ignorando para avançar na direção de , apertando os seus braços e erguendo o seu corpo para cima, deixando os seus rostos um rente ao outro.
— Você está aqui, ! — Ela esbravejou, alargando ainda mais o sorriso em seu rosto, e fez que sim, passando o dorso da mão pelos lábios antes de umedecê-los.
— Eu preciso… Preciso falar com o seu irmão. Onde ele está? — A garota repetiu a mesma pergunta de Sarah e só então Geórgia se lembrou de que já tinha subido no palco e provavelmente aguardava o sinal para começar o show.
— Você vai ter que deixar isso para depois do show, . Jeffrey acabou de levá-lo para o palco. — A neta de Sophia mordeu os lábios e franziu o cenho, entristecida, lançando um olhar para Sarah, que soltou o ar pela boca e, mesmo nervosa, disparou:
— É melhor aproveitarmos o show, então.
A namorada de Mitch deu de ombros, sem ter muito o que fazer, e a brasileira respirou fundo, voltando a sua atenção para Geórgia que, por sua vez, a esperava com um sorriso largo e ansioso no rosto.
— Vem, vamos encontrar com os outros.
Geórgia alcançou uma das mãos de , a fim de guiá-la até a área reservada onde a família e os amigos de assistiriam ao show.
— Não.
A soltou, mantendo os pés colados ao chão e, sem entender, a irmã de lançou um olhar confuso para Sarah.
— Eu prometi a ele que estaria na primeira fila desse show. — disse, puxando a atenção de Georgia de volta para si. — Eu preciso estar lá.

[•••]


Para a sorte de , Charlotte, o namorado, Adam, e uma convidada, estavam sentados um ao lado do outro, na primeira fileira, bem em frente ao palco, e, por acaso do destino, havia uma poltrona vazia entre os dois casais. Como se estivesse reservado para alguém especial.
A se despediu das outras duas ao cruzar a vistoria do evento e encontrar os amigos de depois de ser escoltada por um dos seguranças até ali. Tanto a prima de , quanto Adam, se surpreenderam ao encontrá-la ali e se apressou em cumprimentá-lo com um abraço desajeitado e um beijo rápido, segundos antes de ser forçada a se sentar no lugar vazio ao ouvir o primeiro acorde da guitarra de Mitch, anunciando o início do show.
Nervosa, puxou o ar pelo nariz e entrelaçou os dedos de uma mão aos da outra, pousando-os sobre o estômago.
Longe da vista do público, respirou fundo, atento àquele que seria o sinal para que ele surgisse no palco, na frente de todos. E, assim que o produtor do evento ergueu seu braço esquerdo no lado oposto ao que ele estava, umedeceu a garganta, apertou o violão ainda mais firme contra o seu corpo e caminhou em direção à sua banda de cabeça baixa, nitidamente nervoso e temendo todo e qualquer tipo de julgamento que pudesse vir do seu público.
se remexeu sobre a poltrona no momento em que o viu, sentindo o seu coração bater em desespero na goela.
deu as costas à plateia e ergueu a cabeça, fitando a baterista que o encorajava a se virar para encarar todas aquelas pessoas que, querendo ou não, estavam ali para prestigiá-lo.
Por conseguinte, o fechou os olhos, contou todas as notas da música e umedeceu a garganta mais uma vez antes de girar os calcanhares e caminhar em direção ao microfone, no centro do palco. No entanto, no momento em que ergueu o rosto para cantar o primeiro verso da sua primeira música, seus pés congelaram no chão e prendeu a respiração assim que os olhos dele a encontraram.
Ela estava ali.
piscou os olhos, como se tentasse acordar de um sonho, e, embora estivesse nervosa, achou graça, ao passo que os outros integrantes da banda se entreolharam, sem entender o atraso de para começar a cantar.
A garota continuava ali, mesmo depois dele piscar os olhos e balançar a cabeça freneticamente.
Ela estava mesmo ali, na primeira fila do seu show, onde ela prometeu estar logo quando soube que isso aconteceria, e estava embasbacado, completamente alheio aos seus pensamentos e aos burburinhos da plateia, que a essa altura ainda não tinha entendido por qual motivo não tinha dado início à música.
Mas, honestamente? Que se foda. Nada ali importava mais do que ver sentadinha na primeira fila, com as pernas cruzadas, os olhos brilhando e um sorriso gigante nos lábios — por mais que o seu coração estivesse desesperado dentro do peito.
— Vocês estão claramente tendo um momento, mas… — A voz de Adam se fez presente no pé de ouvido de e ela deu um salto, desconcertada. — … Ele precisa começar a cantar. Logo.
Só então percebeu a situação. As pessoas estavam viradas umas para as outras, comentando o pequeno ato falho de , enquanto Mitch e os outros membros da banda trocavam olhares de desespero.
Por conseguinte, ela mordeu os beiços e voltou a sua atenção para — que mantinha o olhar vidrado sobre ela —, assentindo com a cabeça e gesticulando com as mãos para que ele despertasse do transe e percebesse a situação na qual estava enquadrado. Ele, por sua vez, franziu o cenho — sem deixar de dedilhar as notas da canção nem por um segundo sequer — e, ao longe, ouviu Mitch chamar o seu nome, ainda que bem baixinho.
Em um movimento involuntário, virou o rosto de encontro ao amigo que, com um único olhar arregalado e apreensivo, fez com que ele entendesse o que estava acontecendo.
Envergonhado — e até meio idiota por estar tão apaixonado por aquela mulher a ponto de perder o controle de algo pelo qual vinha se preparando há alguns meses —, soltou um risinho nasalar, com algumas covinhas em suas bochechas e a ponta do nariz se mexendo, antes de erguer o rosto e levar os lábios ao microfone, cantando as partes perdidas da música.
O trocou um olhar cúmplice com , que prendeu os beiços e, em seguida, levou as duas mãos à boca para entoar um gritinho eufórico, junto a Adam e Charlotte.

[•••]


Quando a última música se encerrou e reverenciou o público em agradecimento, as cortinas se fecharam diante de si e ele esticou o pescoço, tentando inutilmente não perder contato visual com .
A banda comemorou o sucesso daquele primeiro show com uma euforia implacável, mas, embora tudo aquilo ali fosse sobre ele, não estava tão interessado ou com cabeça o suficiente para pensar em algo que não fosse resolver aquela situação com a sua bonitinha.
Com movimentos desengonçados, conseguiu se soltar dos abraços de seus parceiros de banda e correu em disparada para a área do palco onde sabia que todos os seus amigos e familiares estariam à sua espera.
— Você foi tão incrível, meu filho! Estou tão orgulhosa de você! — Vitória disse, recebendo em seus braços e apertando o seu rosto entre as mãos para depositar um beijo estalado no rosto do filho.
Ele riu, pousando uma das mãos na cintura da mãe enquanto a outra recebia Éric com Helena adormecida em seus braços no mesmo abraço.
— Parabéns, ! — O padrasto dele disse e se afastou com o sorriso nos lábios, afagando os cabelos da pequena que dormia doce e serena como um anjo no colo do pai.
— Então, “quebre a perna!” it is. — Georgia surgiu atrás de Eric ao lado de Léo e achou graça, deixando uma risada nasalada escapar.
— Parece que sim. — Ele deu de ombros e a outra curvou os lábios em um sorriso orgulhoso antes de avançar sobre o irmão para um abraço aconchegante.
— Você é o melhor irmão do mundo e eu te amo de montão. — Disparou a mais nova, enroscada no pescoço do outro, e franziu o cenho, pousando as mãos na cintura de Geórgia para afastá-la minimamente de si.
— Você não está dizendo isso só porque eu vou ser famoso e esgotar os ingressos do Madison Square Garden um dia não, né? — Ele perguntou, com uma das sobrancelhas arqueadas em um arco insolente e a mais nova esbugalhou os olhos com os lábios levemente espaçados.
— Babaca! — Disparou ela, desferindo um tapa no braço do outro, que deu risada, a puxando para perto uma segunda vez, para depositar um beijo cuidadoso no topo de sua testa.
— O plano é esse, então? — a voz de Sarah se fez presente e esticou o pescoço enquanto Geórgia girou o tronco para encontrar a outra a alguns passos de distância. — Lotar o MSG e tudo mais? — Ela deu de ombros e soltou uma risada, coçando os cantos internos de seus olhos com a ponta do indicador.
— E muito mais, Sarinha.
Os olhos de Jones se iluminaram como a galáxia e um sorriso largo cortou o seu rosto de orelha a orelha.
— Vocês foram incríveis. — Disparou ela, enroscando os seus braços no pescoço do amigo. — E você estava tão feliz, . Eu acho que nunca te vi tão feliz em todos esses anos.
O se afastou sem desatar o abraço o suficiente para fitar o rosto da melhor amiga. Sarah tinha os lábios levemente curvados em um sorriso singelo, sem mostrar os dentes, e os olhos de brilharam, refletindo justamente aquilo que ela acabara de dizer.
— Eu estava mesmo. — Ele deu de ombros, umedecendo os lábios, e então soltou um risinho bobo ao lembrar de na plateia. — Eu estou, na verdade. Eu estou muito feliz, Sarinha.
Jones sorriu.
— Eu sei que sim. E eu arrisco dizer que a flor que eu te trouxe tem algo a ver com isso. — Ela cerrou os olhos, sapeca, e franziu o cenho, sem entender.
— Flo… — Ele arregalou os olhos quando viu um sorrisinho sacana brincar nos beiços de sua amiga e, de repente, os pontos se ligaram sem muito esforço. — Foi você que…
— Eu disse que uma flor seria suficiente, não disse? — Sarah rebateu com uma piscadela e soltou um grito abafado, curvando o tronco para trás e agarrando o rosto de Jones entre suas mãos, para beijar-lhe as bochechas algumas vezes.
— Você é a melhor! Puta que pariu. — Disse ele, esmagando o rosto da amiga como aquelas tias avós faziam ao encontrar um sobrinho que mora longe. — Eu te amo demais, mulher! — esbravejou e Sarah deu risada, afastando as mãos dele do seu rosto.
— Eu sei disso, mas você pode deixar para me agradecer depois. Agora eu preciso que você vá atrás da sua mulher.
O umedeceu a garganta e assentiu, esticando o pescoço em uma tentativa falha de encontrar entre os outros.
— Onde ela está?
Antes que Sarah conseguisse respondê-lo, foi Geórgia quem disse:
— Exatamente onde ela disse que estaria.

[•••]


Assim que se livrou do blazer amarelo, correu para a área da arena destinada ao público do show.
Seu coração estava saltando na garganta, sua respiração estava ofegante e a única coisa na qual ele conseguia pensar era em abraçar , de verdade. Depois de todos esses dias em que eles agiram como dois idiotas tentando proteger um ao outro da única coisa no mundo a qual eles não precisavam de proteção alguma: o amor.
E, meu Deus, como a amava. Com toda a sua alma.
O desacelerou os passos no exato momento em que colocou os seus olhos em , com o quadril encostado na base do palco, os braços cruzados, e o rosto virado para o chão, fitando as pontas de seus tênis.
Era bem óbvio que não tinha se preparado para estar ali. A menina vestia uma combinação básica de blusa de manga e gola alta branca, calça jeans de lavagem clara e all star de cano alto preto. Seus cabelos estavam presos, e, além dos brincos em formato de pérolas, ela não parecia usar outro tipo de acessório.
Nem mesmo maquiagem, mas raramente usava alguma.
sorriu como um tonto, sem nem perceber, e levou uma das mãos ao coração, parando a um ou dois metros de distância de .
— Eu não acreditei quando te vi lá de cima. — Ele disparou, atraindo a atenção da garota para si. — Parecia um sonho.
soltou o ar pela boca, afastando o arrepio dos braços. sentiu o coração estremecer dentro do peito.
— Por que você não me disse que era hoje?
O curvou os lábios em um sorriso sem humor e suas bochechas queimaram, o forçando a virar o rosto para o chão por alguns instantes.
— Porque eu não queria que você se sentisse obrigada a estar aqui. — deu de ombros e respirou fundo, apertando as pálpebras.

— Eu sei! — Ele se apressou em dizer, dando um passo largo em direção à ela. — Eu sei, . Eu sei, eu sou um idiota. Mas me escuta…
— Eu prefiro o termo filho da puta e arrogante, mas a sua mãe não merece esse.
A o interrompeu com um dar de ombros e se calou, jogando a cabeça para trás em uma risada.
— Eu teria me arrumado melhor do que isso se soubesse. — Ela suspirou, checando o próprio outfit, e sorriu, balançando a cabeça na afirmativa.
— Você está linda. — Disse , dando mais um passo à frente, e corou, desviando o olhar do dele por alguns segundos. — Eu senti a sua falta, bonitinha. — confessou com um tom de voz sereno, captando a atenção de de volta para si, e a jovem sorriu de leve, sem nem mostrar os dentes.
— Eu também.
A brasileira assentiu uma única vez e curvou os lábios em um sorriso bobo, segundos antes de puxar o ar pela boca e dar um último passo à frente, tomando uma das mãos de para si.
— Eu tenho uma coisa para te dizer. Mas eu preciso que você deixe que eu diga sem me interromper, acha que consegue fazer isso? — O perguntou, erguendo uma das sobrancelhas, e rolou os olhos de um jeito engraçado que o fez rir.
Ela fez que não com a cabeça e puxou a sua mão de volta para si, deixando com uma expressão confusa no rosto.
— Não antes de você me dizer o que é isso. — Disparou ela, sacando do bolso traseiro de sua calça o mesmo papel amassado que Sarah a tinha entregado mais cedo.
Sem entender, franziu o cenho e pegou o pequeno papel entre os seus dedos. Ele leu as palavras com atenção e, quando reconheceu a própria letra, deu risada de um jeito que fazia as covinhas surgirem em seu rosto e o coração de estremecer.
— Há alguns meses, eu conheci uma pessoa. — Ele começou, erguendo o rosto de encontro ao dela mais uma vez e mordeu os beiços em um gesto ansioso. — Ela me deu um banho de água gelada e me bateu com um livro de duzentas páginas. E o mais estranho é que, a partir daquele dia, ela se tornou tudo aquilo que eu penso. — deu de ombros e deu risada, fundando e sentindo os olhos pinicarem pelas lágrimas que já começavam a se acumular em suas pálpebras.
O respirou fundo e, mais uma vez, tomou uma das mãos de para si.
— Mas a verdade é que eu não sabia como contar isso a ela, então eu escrevi essa música e... Bom, eu acho que ela acabou de descobrir. — Ele ergueu os ombros com um sorrisinho tímido nos lábios e a menina puxou o ar para os pulmões, limpando o nariz molhado com o dorso de sua mão livre.
— Eu preciso te perguntar uma coisa. — O tom de voz dela saiu por um sopro e assentiu, levando sua mão aos lábios e beijando-lhe os nós dos dedos em um gesto de carinho e cuidado. — Mas eu preciso que… Eu preciso que você responda com toda a sinceridade do mundo. Acha que consegue fazer isso? — A mordeu os lábios mais uma vez, sustentando os olhos marejados contra os de numa intensidade tão severa que fazia o seu peito comprimir ao mínimo.
Sem pensar, ele levou uma de suas mãos ao rosto de e acariciou sua bochecha, usando o polegar para limpar uma lágrima pesada que escorrera segundos antes.
— É claro que sim.
A balançou a cabeça na afirmativa uma única vez, como quem diz “certo”, e abraçou o punho de com os seus dedos, afastando o carinho dele de si.
— Você me ama? — A voz de estremeceu e suas bochechas coraram, enquanto curvava os lábios em um sorriso bobo, involuntário, e soltava a respiração que até então ele não tinha ideia de que segurava.
— Se não for você, não é ninguém, . — O rebateu com a expressão de um tolo desenhada em seu rosto, e suspirou, emitindo um rugido irritado em reprovação.
Sem entender, franziu o cenho ao passo que ela pressionava as pálpebras com a palma da mão.
— O que foi?
— Isso não responde a minha pergunta. — Ela deu de ombros com um sorriso sem humor nos lábios e achou graça.
— Você vai me deixar dizer o que eu quero dizer, sem me interromper? — Ele perguntou outra vez, com as sobrancelhas arqueadas, e revirou os olhos, impaciente. — ?
— Vai em frente.
— Você já ouviu falar na aurora boreal? Ou… No eclipse da lua com o sol? — ergueu as sobrancelhas como um garotinho e franziu o cenho, sem entender.
— Do que você está falan…
— Pshii! Sem me interromper, bonitinha. — O a repreendeu e se calou de imediato. — Essas duas coisas que eu disse, são raras. Mas existem. Cientificamente comprovado, eles existem, .
A garota mordeu os lábios, nervosa com a pausa dramática entre as palavras de .
— E…
Ele riu, balançando a cabeça de um lado para o outro.
— E eu nunca me apaixonei por ninguém, . Nem mesmo pela Lola, caso você venha a se questionar. — disparou e a menina sentiu suas bochechas queimarem por vergonha. — Assim como a aurora boreal e um eclipse lunar, eu estar apaixonado por alguém é um evento extremamente raro. Mas não é impossível.
deu de ombros e sentiu o seu peito estremecer quando ele levou sua mão aos lábios mais uma vez para beijar-lhe os nós dos dedos.
— Então se você mais uma vez está se perguntando se eu te amo, a resposta é sim. Eu te amo, .
Ele confessou e sentiu uma onda de felicidade invadir-lhe o corpo de um jeito que ela se viu obrigada a pressionar um lábio contra o outro para não interromper mais uma vez.
— Eu te amei em Amsterdã, muito antes da nossa primeira vez, e eu segui te amando por todos os lugares aos quais estivemos juntos e até mesmo separados. Eu estava te amando, . Não. — Ele fez uma pausa, apertando ainda mais a mão da garota. — Eu estou te amando, no presente, e eu vou te amar no futuro.
proferiu por fim, com as mãos trêmulas de nervoso, e levou alguns segundos para reagir, como se quisesse, de fato, torturá-lo. Até que puxou o ar pelo nariz e deu um curto passo à frente, erradicando de vez a distância entre o seu corpo e o dele.
Por conseguinte, ela soltou a mão de para acariciar-lhe os cabelos, seguido do rosto, em um movimento que o fez fechar os olhos.
— Você sabe que todos os dias quando a gente acorda, nós precisamos fazer uma escolha, não é? — Ela arqueou as sobrancelhas e abriu os olhos, avermelhados pelo choro contido. — Algo em relação ao que vamos fazer no dia, o que vamos comer, com quem vamos conversar… — disse, completamente alheia, com os olhos perdidos nos mínimos detalhes esculpidos no rosto do garoto. — Todos os dias quando eu acordo, eu escolho você, . — Ela disparou, voltando sua atenção para os olhos do rapaz.
Ele sorriu, sem perceber, e fez o mesmo, como um espelho.
— Eu escolho a gente.
— Então isso quer dizer que…
A se afastou minimamente dele e cerrou os olhos, sem paciência.
— Se você me perguntar se eu estou apaixonada por você, eu vou embora. — Ela disparou e gargalhou, jogando a cabeça para trás como um garotinho. — Achei que isso já estivesse mais do que óbvio.
fez que sim com a cabeça, envolvendo a cintura dela com os braços.
— Está sim. — O disse, encostando a testa na dela e roçando o nariz um no outro, em um gesto delicado que causava arrepios na espinha de . — Está muito mais que certo, bonitinha.
umedeceu os lábios com a ponta da língua, mas a iniciativa do beijo veio de , que prontamente se colocou na ponta dos pés e alcançou os beiços dele com os seus.
Os lábios de tinham gosto da mistura perfeita entre o salgado das lágrimas e o doce da cereja preso ao protetor labial que tanto amava. E o beijo era quente, ainda que lento e calmo. Cheio de saudade, ternura e, é claro, desejo um pelo outro.
Mas quando o ar se fez necessário, se viu obrigada a afastar o rosto do dele, puxando o lábio inferior de consigo, em um movimento provocativo que ele mesmo a tinha ensinado durante alguma de suas aulas. O riu, encerrando o beijo com um selinho longo e ambos polegares acariciando os cantos da boca de .
— Eu estava quase enlouquecendo de saudade. — confessou, com a testa colada na dela, e mordeu os beiços, segurando um riso.
— Eu tamb…
A se calou no momento em que ouviu o som de uma tosse evidentemente falsa. Por conseguinte, franziu o cenho e esticou o pescoço, buscando pela explicação do barulho em algo/alguém atrás de .
Em uma das portas da arena, ele encontrou um homem e uma mulher na faixa de seus quarenta anos, ambos uniformizados e acompanhados por um carrinho recheado de produtos e utensílios para limpeza.
— Nós precisamos limpar. — O homem disse, meio envergonhado, e achou graça, dando um passo para trás.
Surpresa, girou os calcanhares e esbugalhou os olhos, ao passo que tomou a sua mão para si e entrelaçou os seus dedos uns nos outros.
— É claro, nos desculpem! — Ele disse, puxando em direção ao lado esquerdo do palco. — Nós já estamos indo.
— Eu acho que a sua família está do outro lado. Não? — A sussurrou ao pé do ouvido dele e revirou o olhar, parando de andar por breves instantes.
— Fala sério, bonitinha. Nós acabamos de nos acertar! Você realmente acha que eu prefiro ir comer pizza com a minha mãe e os meus irmãos ao invés de… Bom, você sabe. — Ele deu de ombros depois de checar da cabeça aos pés, e a garota arqueou as sobrancelhas, boquiaberta!
! — Ela esbravejou, desferindo um tapa no braço de que achou graça.
— Vai ser rapidinho, eu prometo!
— Ah, meu Deus! — Envergonhada, cobriu os olhos com a sua mão livre. — Você é um cafajeste, .
— Talvez. Mas você me ama, não ama? — girou os calcanhares, se colocando de frente para , e ela suspirou, soltando os ombros e sustentando os olhos contra os dele.
— É claro que sim.
O sorriu, lutando bravamente contra os próprios instintos e a vontade de avançar sobre aquela mulher e fazer com ela todas as coisas que ele pretendis fazer no camarim, bem ali, no meio daquele palco.
— E você confia em mim? — Ele arqueou uma das sobrancelhas e suspirou, pensativa, umedecendo os lábios antes de dizer:
— Sim.
— Então eu acho que isso basta, . — Disse ele, levando a mão da garota aos lábios para beijar-lhe os nós dos dedos. — Agora vamos antes que algum empata foda da minha família apareça e acabe com a minha festa. — disse por fim, puxando em direção ao camarim, e a menina deu risada, jogando a cabeça para trás, deixando-se ser levada por ele.



Fim!



Nota da autora: E FINALMENTE SAIU A NOTÍCIA QUE O MUNDO NÃO ACREDITOU! Nem acredito que veio aí o fim de WGNC e WAP 🥺 Primeiro, sinto que preciso imensamente me desculpar com todos vocês por essa demora de MESES, infelizmente, eu acabo desenvolvendo muitas outras fanfics e deixo as que eu preciso concluir, sem conclusão. Espero do fundo do meu coração que vocês perdoem essa autora desorganizada com esse último capítulo que pode até parecer meio bobinho, mas significa muito para os dois personagens principais!
Muitíssimo obrigada a todos que me acompanharam até aqui e a todos que se apaixonaram pelo meu casal de bonitinhos, espero ter dado aos dois um final digno para esse amor lindo que um sente pelo outro! E um muito obrigada, mil vezes maior, para a Lari, minha beta INCRÍVEL que não deixou eu desistir dessa história e teve toda a paciência do mundo comigo.
Fui muito feliz aqui, gente. Mesmo!
Um beijão! E quem sabe, nos vemos em uma próxima história?

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Nota da beta: AI! EU QUE TENHO QUE AGRADECER MUUUUUUUUUITO! Sério, que honra em betar essa história que eu amei TANTO, Babi! Você é um amor e eu agradeço por você sempre responder às minhas insistências para não desistir dessa fanfic maravilhosa! Eu não permitiria que esses bonitinhos não tivessem esse final DIGNO DELES! Eu tô simplesmente no céu com esse final, é tudo que eu queria e mais um pouco, juro! Eu amei cada personagem na história, nem que fosse amar odiá-lo (alô, pai da pp), e eu amei cada história, cada linha, cada plot, tudo! Você me fez amar Harry Styles, para você ter ideia da situação! Esse jeito desse pp cativa qualquer um, de coração! Você escreveu uma história perfeita e eu sou muita grata por ter acompanhado toda essa viagem. Espero MUITO que você traga outras histórias para o FFOBS e, POR FAVOR, me procure quando o fizer, vai ser uma honra ser sua beta novamente! 💙

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