Finalizada em: 11/08/2020

Prólogo


O telão do aeroporto mostrava que faltavam quarenta minutos para o embarque do voo saindo do Rio de Janeiro para Paris. O homem olhava seu celular a cada minuto esperando de forma aflita alguma notificação que pudesse o deixar mais tranquilo.
Ele encarava a passagem e se perguntava se estava fazendo a coisa certa. Seus pais e irmã o acompanhavam e notavam o semblante triste em seu rosto quando era para ser o contrário.
não estava agitado e falante como sempre, ele estava recolhido em seu canto, perdido em seus pensamentos que estavam bastante inquietos. Ele só pensava naquela noite e em como perdeu o amor de sua vida: .

“— Eu nem sei como te contar isso... eu ganhei uma bolsa de estudos. — falou cuidadosamente enquanto segurava a mão de com uma mão e a outra acariciava seu rosto.
— Meu amor, isso é maravilhoso. Você já é um chef de cozinha sensacional, depois você vai abrir seu próprio restaurante. — a mulher disse entusiasmada.
— Essa bolsa é em Paris. Eu vou ficar fora por um bom tempo, .
— Como assim em Paris? Você disse que iria tentar aqui no Rio mesmo e agora me fala isso? , nosso casamento se aproxima, faltam apenas dois meses. Você não pode fazer isso com a gente.
— O Eduardo me inscreveu para concorrer a essa bolsa. Ele me tem como um filho, você sabe disso. Ele quer que eu dê continuidade ao restaurante assim que ele... Eu não posso negar. Ele vai arcar com todos os custos.
— Você sabe que eu apoio tudo o que fizer, toda sua carreira, mas você vai para tão longe e nem pensou em mim. O que vai ser da gente? — ela perguntou.
— A gente pode manter nosso relacionamento à distância. Vários casais fazem isso.
— Relacionamento à distância nunca dá certo, você sabe muito bem. Um exemplo mesmo é a Leila e o Jonas. Você sabe como terminou. Você realmente não pensou em mim, em nenhum momento.
— Claro que eu pensei em você, . Isso tá me matando, não queria jamais ter que fazer essa escolha. Mas é uma oportunidade que acontece uma vez na vida e, quando aparece, a gente tem que agarrar. — a mulher saiu do lado do rapaz e caminhou para a varanda do apartamento que eles dividiam há pouco tempo, fazendo ir atrás dela, enquanto ela parou para observar a orla da praia e respirou fundo.
Lágrimas escorreram pelo rosto de , que não conseguia encarar naquele momento.
— Você pode vir comigo, a gente pode dar um jeito nisso, .
— Eu acabei de entrar na editora, eu não tenho como abandonar minha vida toda aqui, assim como você não pode perder essa oportunidade. — ela disse, sua voz já estremecida pelo choro já estava fraca. — Não sei o que fazer sem você aqui.
— E eu não sei viver sem você. Eu te amo mais que tudo.
— Quando você parte? — ela perguntou.
— Em uma semana. — disse cabisbaixo.
Então retirou o anel de noivado que havia lhe dado no aniversário de quatro anos de namoro no ano passado e o colocou na mão de rapaz, que naquela hora já estava com os olhos marejados.”


— Filho, está na hora. — a mãe do rapaz o despertou do looping de sua mente, o trazendo de volta à realidade.
deu um abraço apertado em seus pais, em Eduardo, o agradecendo mais uma vez, e um beijo na testa de sua irmã caçula. Se despedir da família o matava, mas não mais que saber que não faria mais parte de sua vida.
Ele olhou em sua volta e constatou: ela não vai vir.


Capítulo Único


*03 ANOS DEPOIS*

terminava de arrumar suas malas. Já era de madrugada e havia perdido o sono devido sua ansiedade estar a mil. Seu curso havia acabado há 01 ano e meio atrás, mas, por ser o melhor aluno da turma que pertencia, recebeu um convite para trabalhar pessoalmente com o chefe que havia sido seu professor e que admirava muito.
Desde sua partida, não havia falado mais com , como também foi bloqueado nas redes sociais da mulher. Ele nunca a esqueceu e as poucas notícias que teve dela foi que ela havia proibido qualquer pessoa de tocar em seu nome. Tratava como se tivesse morrido e, se fosse se referir a ele, o chamava de “falecido".
Como prometido por Eduardo, se tornou seu único herdeiro, deixando todos seus bens para seu pupilo através de um testamento, tendo o restaurante Le Boucherie como bem principal.
Seguiu direto para o aeroporto e não conseguia conter um sorriso em seu rosto ao pensar que estaria de volta.
deu uma última olhada nos stories e, através de uma amiga, notou um rosto mais que conhecido. e um grupo de amigos estavam em um barzinho qualquer da Lapa, parecia estar se divertindo. E como ele sentia falta de sua energia, sua companhia, seu corpo e toque. era inesquecível. Todos os dias se perguntava se ela seria capaz de pelo menos conversar com ele mais uma vez.
— ELE CHEGOU! — a mais nova gritava eufórica ao ver o irmão depois de três longos anos. Ela estava acompanhada por seus pais e por um jovem. — Esse é o Arthur, meu namorado. Te falei dele por vídeo chamada.
— Que saudade de você, como você cresceu, Sofia. — o mais velho abraçou a irmã, que é seu xodó, e cumprimentou Arthur. — Ela fala muito de você, é um prazer te conhecer.
O menino o cumprimentou bem tímido e logo foi empurrado pelos pais de . Sua mãe, Dona Vera, chorava de felicidades ao rever o filho e seu pai, José, não conseguiu esconder a emoção.
O caminho de volta foi agitado e animado, todos estavam contando as novidades para o mais recém chegado.
, tem uma coisa que preciso te contar. Por favor, não fica triste. — Sofia disse.
— Pra você falar isso tem que ser alguma coisa grave. Quem morreu?
— Bom, você morreu para . Ela está namorando.
não pode esconder seu descontentamento mas também não ficou surpreso. No fundo, ele já esperava que isso poderia acontecer.




acabara de chegar no trabalho no horário de sempre, mais cedo que os demais para conseguir fazer um planejamento diário e não se enrolar, afinal, ela é bem conhecida por ser desastrada.
Olhou para a sala de sua chefe, Rita, que havia se tornado uma grande amiga, e viu que a mais velha fazia um sinal com a mão, pedindo para ela ir até sua sala.
— Sei que você está no seu ritual diário, mas preciso de um grande favor seu. Sexta vai ter uma feira gastronômica em Botafogo e preciso que você vá para fazer uma matéria para a revista. — Rita disse.
— Logo eu? Você sabe que odeio essa parte da coluna e você me prometeu que nunca iria me botar pra fazer esse tipo de trabalho. — a jovem resmungou.
— Eu não tenho ninguém de confiança para mandar, fora que vai ser um evento privado. Consegui uma entrada através de muito sufoco. Vai render muitos cliques para o site principalmente. Tá todo mundo atrás de um chefe de cozinha que está no Brasil, o apelidaram de “Chef gato", ele tá fazendo sucesso, inclusive existe um boato de que ele fará uma participação no Masterchef. Quebra essa para mim, por favor? — a mulher fez uma cara que não poderia negar.
— Ok, ok. Você venceu. Mas tem uma única condição: você vai pagar meu almoço por um mês. — ela falou rindo.
— Sua malandra, tá muito espertinha. Mas... negócio fechado. Não se esqueça: tente uma entrevista, tire fotos dos pratos e do chef gato.
— A senhora é quem manda. — disse e falou outras coisas com Rita, saindo da sala e voltando para sua mesa com um panfleto do evento, que não fez questão de abrir.

___

chegou em casa e deu de cara com Leo, seu amigo e que morava com ela, fazendo o jantar da noite.
— Esse cheiro está muito bom, o que é? — ela perguntou.
— É só um espaguete com molho branco, nada demais. Chamei o Gui para vir aqui hoje, tem problema?
— Claro que não, inclusive eu shippo muito vocês dois. Fazem um casal lindo. Há quanto tempo vocês estão juntos mesmo?
— Poucos meses, acho que uns cinco. Você sabe que não sou bom com datas. Mas e você, baixou o aplicativo de namoro que te falei?
— Leo, eu não quero saber de homem nunca mais na minha vida. Gostar de homem é punição divina, você sabe disso.
— Errada você não tá, mas você também não pode se privar para sempre de conhecer alguém. Não é porque o...
— Nem complete sua frase. Você ia tocar no nome do falecido que eu sei. Estou bem sozinha, de verdade. Eu tenho meu emprego, minha família, amigos, você... Não preciso de mais ninguém. — disse após interromper Leo.
— Se você diz, eu vou acreditar. Estou aqui para te apoiar em tudo. Ok? — ele disse e deu um beijo no rosto de .
— Obrigada. Eu te amo! Agora, vou tomar um banho bem quente e botar meu pijama, é a melhor parte do dia.
— Te chamo quando a comida estiver pronta.
Antes de tirar sua roupa, pegou seu celular e tinha uma notificação de uma mensagem de sua mãe.

“Oi, minha filha. Como você está? Vou te dizer antes que saiba por outras bocas. Ele voltou.”

não poderia suportar a ideia de que poderia encontrar com ele, já que havia voltado ao Rio, onde jurou em cada esquina de bar o seu ódio a ele.




Uma forte enxaqueca tomou conta da cabeça de , que havia dormido pessimamente desde quando soube que o falecido havia voltado. E agora, tem pensado em mudar o nome para “zumbi", já que ele havia retornado do mundo dos mortos.
Durante o café da manhã, se lembrou que era sexta feira e que era o dia do evento que Rita pediu para ela comparecer e assim o fez, chegando no local na hora exata que iria começar.
Haviam alguns chefes de cozinha famosos presentes, o que deixou empolgada, mas todos eram bem velhos e não tinha batido os olhos em nenhum “chef gato" presente.
— Rita deve estar brincando com a minha cara. — disse sozinha.
Olhou para o canto e viu uma garçonete, que talvez poderia dar a resposta que precisava no momento.
— Olá, desculpe te interromper. — falou com a menina, fato que chamou sua atenção e a fez olhar para . — Não sei nem como falar isso, mas eu vim aqui para tirar umas fotos de um chef de cozinha, dizem que ele tem uma beleza que chama atenção. Sabe onde ele está?
— Ah, o chefe gato. Ele é bonito mesmo, que pedaço de mau caminho. Ele está preparando o menu do evento, no outro lado do salão. — respondeu a menina.
— E como ele é? Só para eu ter uma idéia.
— Ele é o mais gato de todos os homens daqui, você vai saber quem é assim que olhar. Você não viu o panfleto? Tem tudo sobre ele.
— Ainda não, mas obrigada pela ajuda. — disse e saiu de perto.
A mulher segurou seu celular com a boca e puxou sua bolsa para frente, seguindo em direção ao lado oposto. Mexia na bolsa para tentar achar o panfleto que Rita havia dado no início da semana. Sem prestar atenção, ela esbarrou em alguém e seu celular caiu, deslizando no chão para longe.
Ela seguiu o caminho feito pelo celular e notou alguém o pegar. Seus olhos acompanhavam em câmera lenta os movimentos do homem até encarar seu rosto.
Não poderia ser. Ela não queria acreditar.
, quanto tempo!? — falou surpreso ao ver a ex na sua frente.
— Seu... Seu... desgraçado. Me dá meu celular. — ela tomou o objeto da mão dele.
— Eu não parei de pensar em você esses anos todos. Podemos conversar depois?
A mulher nunca imaginou que o famoso chefe gato era seu ex noivo, que a deixou poucos meses antes do altar, o que deixou seu coração em pedaços. Ela finalmente abriu o panfleto em sua mão e viu a foto do homem.

“Chef . Apesar da pouca idade, possui um vasto currículo e grande experiência quando se trata de cozinha francesa, mas não significa que seja limitado a essa especialidade. É um dos nomes promissores da nossa geração.”

olhou para incrédula e saiu de sua frente, mas o homem não se contentou e a seguiu.
, por favor, fala comigo. Não entendo o motivo de você me tratar desse jeito! — ele a puxou e falou olhando em seus olhos.
— Não me chame assim. Não seja cínico, você sabe muito bem. Estava tudo tão ótimo, por que você teve que voltar?
— Quando eu parti, eu prometi a mim mesmo que iria voltar. Apesar de ter bastante sucesso na minha vida profissional, o resto nada fez sentido sem você. Nunca te esqueci, .
— Eu não quero saber ou ouvir o que você tem a dizer. Se eu soubesse que era você, jamais teria vindo. Eu teria me mudado pra Marte só pra não ter que te olhar. Eu te odeio, , eu te odeio. — uma lágrima rolou pelo rosto da mulher, que secou com a mão.
não conseguiu esconder a tristeza em sua cara, afinal, sempre se lembrou da amada com os melhores momentos e ouvir palavras tão duras o quebrou por dentro.
— Me perdoe por todo mal que te fiz, jamais foi minha intenção. Você sabe disso.
— Não quero saber de nada que venha de você. Vá para o inferno! Infelizmente vou ter que cobrir esse evento, mas, depois daqui, nunca mais me procure.




As horas foram passando e já estava agoniada de permanecer no mesmo lugar que , ou “zumbi", como ela passou a o chamar. Ele a olhava o evento inteiro enquanto ela tentava não o ver.
Os organizadores do evento chamaram os pouquíssimos jornalistas que estavam ali presente para começar a fazer a entrevista e fotos.
, quais são seus planos agora que voltou para o Rio? — um homem que aparentava ter uns cinquenta anos perguntou.
— Bom, primeiro eu quero aproveitar o tempo perdido com a minha família e amigos, tenho uma pendência para resolver com uma pessoa especial também. E claro que tem o Le Boucherie, que em breve vai reabrir e espero que seja um sucesso. — respondeu.
— Você não têm medo de acabar com o legado do antigo chef do Le Boucherie, o chef Eduardo Alves? — dessa vez uma mulher perguntou.
— Eu fico meio inseguro sim, mas eu aprendi muito com o Eduardo, ele é minha maior inspiração. Poucos sabiam, mas ele tinha uma doença terminal e, antes de falecer, ele me deu o maior presente que recebi em toda minha vida: a arte de cozinhar. Ele me ajudou muito e sou muito grato a tudo que ele fez por mim e pretendo seguir com o legado que ele deixou.
— Você foi para Paris e estudou por um bom tempo lá. Não tinha um lugar mais perto ou o Rio de Janeiro não era bom o bastante para você? — perguntou e deixou surpreso.
— Eu amo o Rio, amo minha história aqui, tudo o que construí aqui. Paris era um sonho e perdi quem eu amava para seguir esse sonho. O que é bom para mim eu perdi há 03 anos e não sei como mudar isso.
A jornalista ficou sem reação com o que ouviu.
— Última pergunta: Qual prato original é o seu favorito? — outro jornalista perguntou.
— Com certeza é o Passion. É uma sobremesa de chocolate criada para homenagear uma pessoa especial.
Apesar de sentir bastante ódio do homem, achou isso a coisa mais legal que alguém já fez por ela. Ela se retirou do local e voltou para casa, onde por e-mail mandou a matéria que havia feito sobre o dia.




Após revirar caixas que estavam guardadas, achou uma foto do ano de 2016 em que ela e pareciam felizes, no fundo ela sentia saudades dessa época.
A verdade é que ela nunca deixou de amar . Ela estava sim com o coração partido em mil pedaços. Odiava o que o ex-noivo fez, mas odiava ainda mais o amar.
Para não sofrer, o bloqueou das redes sociais pois não aguentaria saber da possibilidade de o ver com outra pessoa que não fosse ela.
Ela ainda chorava algumas vezes por sentir tanta falta de e de como ele a completava, era o encaixe perfeito de todas as peças pertencentes aos dois.
Não tinha como negar que ambos sofriam, sofriam até demais com a ausência deixada. Chegava a ser uma tortura. não conseguia se envolver com ninguém, como se tivesse alergia a outras pessoas, outros toques.
Ela não conseguia fingir que a volta de não a abalou pois seria uma grande mentira. Então ela fez o que estava fazendo desde quando partiu: bebeu. As bebidas viraram seu novo consolo para o coração partido.
A campainha fez um grande alarde, tirando a mulher de seus pensamentos. estava parado na porta e ela deu espaço para ele entrar. Seu perfume tomou conta do ambiente, ainda era o mesmo de sempre, o que trouxe memórias antigas à tona.
— Eu preciso resolver as coisas com você. Eu sinto sua falta, . Eu sei que você agora tem namorado, mas pelo menos podemos ser amigos.
— Namorado? Quem disse que eu tenho namorado? Estou sozinha desde quando você me deixou. Quem te falou isso? — ela perguntou.
— Foi a Sofia. Foi uma das primeiras coisas que ela me falou assim que cheguei.
— Eu não tenho namorado, mas isso não te interessa. O que você está fazendo aqui? Eu não te mandei para o inferno?
— Eu já vivo num inferno sem você, sem sua risada, sem seu cheiro, sem você por inteira. Você realmente quer que eu vá embora? Você não sente nada por mim além de ódio?
— Eu te odeio sim, . Mas sabe o que eu odeio mais? Odeio não te ter. Isso não quer dizer que eu esqueci tudo, porque não esqueci.
se aproximou e tocou seu rosto, como sempre fazia.
— A gente pode fazer dar certo de novo. Você não quer isso?
— Eu não sei. — disse. — No fundo ainda sinto que tudo vai se repetir e mais uma vez vou sofrer. Não quero sofrer mais uma vez por você.
— Eu prometo que não vou. — ele a puxou para perto e a deu um abraço, que logo foi retribuído. — Como eu senti falta disso.
permaneceu em silêncio e se apegou à lembrança de quando eles dormiram juntos pela primeira vez. O que fizeram havia sido muito bom, mas melhor ainda foi o calor dos braços do rapaz, que a fez sentir segura.
Ela o puxou para seu quarto e deitou na cama chamando o homem parado na sua frente. Ele tirou os sapatos e se sentou na cama, deitando em seguida.
— Só fica comigo. — ela falou e envolveu o braço dele em sua cintura.
E assim, observando cada detalhe um do outro, eles passaram a noite. E essa noite foi a melhor que tiveram desde a despedida.


Fim.



Nota da autora: Olá, pessoal. Espero que estejam bem. Escrevi com muito carinho e espero que vocês gostem. Façam uma boa leitura.

Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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