Capítulo 1
Franklin, Massachusetts – 1998
pulou a janela de seu quarto no segundo andar, aterrissando com desenvoltura na grama que cobria o quintal e agradecendo mentalmente o fato de seu pai gostar de assistir a partidas de futebol americano com a televisão quase no volume máximo, o que garantiria que sua mãe não percebesse sua escapulida. Pulou o muro que separava a casa em que vivia daquela em que moravam os , escalou a árvore que ficava bem na frente da janela do quarto de e pulou para dentro, o que poderia ter assustado o rapaz, se isso já não fosse um hábito.
— Oi, — ele a cumprimentou, sorrindo, mas logo franziu a testa. — Você ainda não se arrumou? Tá quase na hora do Melvin passar pra pegar a gente.
— É. Eu tô sabendo. E você tá um gatinho — falou ela, apertando o nariz dele. — Coloca isso. Vai ficar perfeito!
Ao pegar a caixinha que ela trouxera no bolso do short e abri-la, o garoto encontrou o relógio pelo qual tinha se apaixonado, durante a última ida dos dois ao shopping.
— ! Eu não acredito, cara! — Disse, dando um enorme sorriso e colocando o acessório no pulso. — É muito foda! Eu só não sei se você deveria ter gastado tanto dinheiro comigo.
— Ah, para! Eu tava guardando desde o ano passado. E você merece — afirmou.
— Obrigado — Ele a puxou para um abraço apertado e ela o abraçou de volta, lutando contra o choro que queria vir.
— Só que eu não vou poder ir com vocês hoje — declarou a menina, em tom triste, quando se afastaram. — A minha mãe achou um maço de cigarros numa gaveta, quando tava arrumando o meu quarto, e me colocou de castigo.
— Sua mãe ainda arruma o seu quarto? Será que ela não quer arrumar o meu, não? — Perguntou, forçando um ar brincalhão.
— Você ao menos ouviu a parte em que eu disse que não vou poder sair hoje?
— É claro que eu ouvi — confirmou, torcendo os lábios para a esquerda, como fazia quando ficava chateado. Ela achava aquela mania adorável!
— E?
— E... sei lá. Acho que eu tava tentando fingir que não ouvi...
— Porque talvez, se você ignorasse, deixasse de ser real — completou ela, lembrando da época em que lhe contara que tinha preferido fingir não ouvir, quando seus pais disseram que iam se divorciar e, mais tarde, quando a mãe informara que se casaria novamente, com o antigo chefe dela.
— Ela não podia ter te proibido de sair num outro dia, não? — ele perguntou.
— É claro que podia! Mas ela sabe que o maior castigo vai ser não sair hoje, pra comemorar o seu aniversário. Ela sabe que você é o meu melhor amigo e que a gente tá planejando essa saída há semanas! E não seria a minha mãe, se ela não fizesse o pior possível.
era seu vizinho desde quando ambos usavam fraldas e chupetas. Sempre tinham sido amigos e haviam se aproximado ainda mais ao ir estudar na mesma escola, no primeiro ano do ensino médio dela (e segundo dele).
— Tá tudo bem, . Eu só faço aniversário na segunda, então na verdade a gente nem devia ter marcado pra hoje, e sim pro sábado que vem. A gente sai de novo. É só não deixar escapar isso pra sua mãe — sugeriu o rapaz.
— Tá marcado, ! — concordou ela, tentando não se mostrar abalada, como sempre fazia, e então fez menção de ir em direção à janela, para voltar a seu cárcere.
— Espera! — Ele pediu, um pouco mais alto do que pretendia.
— Hum?
— O meu presente — respondeu, sendo bastante vago, mas isso foi proposital.
— Eu já te dei o seu presente, ué!
— O relógio é maneiríssimo! Mas pra eu te perdoar por esse mole que você deu, de deixar os cigarros no seu quarto e acabar de castigo, logo hoje, eu quero um outro presente — declarou, fazendo um carinho sutil na maçã do rosto dela, que se arrepiou, imaginando o que estava por vir.
— O que? Não vai dizer que quer que eu arrume essa zona que é o seu quarto, né? — Ironizou, disfarçando.
— É claro que não. Eu quero um... beijo — ele praticamente sussurrou.
— Pirou, né? — Ela riu. No fundo, não porque era engraçado, mas por nervosismo. — Nós somos amigos. Melhores amigos!
— E daí? A gente já se beijou! — Lembrou, dando um sorrisinho safado que poderia tê-la irritado, mas na realidade a deixou com vontade de dar o que ele estava pedindo.
— Nós dois estávamos totalmente bêbados no aniversário da Christa — argumentou, ignorando seus desejos nada racionais.
— Por um momento, eu achei até que você tinha se esquecido, mas então você lembra, né? E, mesmo assim, depois de mais de um mês, não mudou nada entre a gente! — Ele também tinha seus argumentos.
— Tudo beeeeem. Tudo bem! É só um beijo, né? Um beijinho só não vai mudar nada mesmo. Se você faz tanta questão assim... — Ela deu de ombros, se rendendo. Talvez estivesse dando importância demais ao assunto, afinal.
— Pois é! Pode ficar tranquila. O máximo que pode acontecer é você se apaixonar por mim — brincou, acariciando o rosto dela novamente.
— Ah, tá! Nos seus sonhos! — Retrucou ela, com o jeito marrento que ele adorava, e riu, se aproximando e, enfim, encostando seus lábios nos dela e dando início a um beijo longo. Já que seria um só beijo, este foi explorado ao máximo, em movimentos lentos, mas intensos, daqueles que deixam as pernas bambas, o coração disparado...
— Melhor presente de aniversário — ele concluiu, quando enfim se separaram. Ainda segurava o rosto dela e seu semblante não era provocador, era sincero.
— É bom que você saiba mesmo que foi um presente de aniversário, que eu dei pra me redimir da minha ausência na comemoração — ela explicou, se afastando. — Foi a segunda vez, mas não vai ficar acontecendo toda hora!
— Eu não ia achar nem um pouco ruim fazer isso toda hora, não. — O sorriso de satisfação dele quase fez com que ela desmanchasse sua pose, mas foi apenas quase.
— Ridículo! — deu um tapinha no braço de e ele fez uma expressão falsa de dor. — Vai pra sua festinha, que lá você vai beijar várias meninas e nem vai mais lembrar desse beijo — completou, indo para a janela e dando um tchauzinho, antes de pular.
não teve tempo de acrescentar nada e provavelmente não o faria, mas a verdade era que ele duvidava muito que fosse esquecer aquele beijo em algum momento!
Foi por isso que ele adorou quando Devon os desafiou a se beijarem durante uma brincadeira, dias depois, sem saber que os dois já haviam feito isso antes. E foi por isso também que não se surpreendeu quando eles se despediram com um beijo, na porta da casa dela, ao voltar do baile de formatura dele. E nem quando trocaram vários amassos na casa de praia de Beck, durante as férias de verão.
Eles nunca mais falaram sobre os beijos. Apenas se beijavam, de vez em quando, e curtiam o momento.
Nada mudou na vida de nenhum dos dois, que ficavam com quem quisessem, na hora em que bem entendessem, assim como a amizade deles também não mudou e eles continuaram se vendo todos os dias, conversando um com o outro sobre quase tudo, implicando um com o outro por qualquer coisa.
Logo entrou em um período de férias constantes, com o término do ensino médio, e parecia estar igualmente de férias, pois frequentava o colégio na parte da manhã, mas reservava as tardes para ver televisão, jogar vídeo game, comer junk food e, algumas vezes, tomar cerveja na casa do melhor amigo.
— Porra! Eu desisto! — Devon disse, em uma daquelas tardes, colocando o controle do PlayStation sobre a mesa de centro e se jogando no sofá.
O rapaz também passava muito tempo na casa de , quase sempre sendo derrotado nos jogos eletrônicos, e acabara de perder várias corridas seguidas no Ridge Racer, inclusive para Christa, que nem mesmo costumava jogar.
Enquanto Devon tomava um gole de cerveja, Christa e fizeram uma dancinha da vitória, irritando-o ainda mais, e riu, afundado em uma poltrona com sua própria long neck de Budweiser na mão.
— Eu vou indo, cara. Ainda tenho que ir pro bar hoje — Conrad se levantou da poltrona ao lado, depois de esvaziar a própria garrafa. Ele era o mais velho do grupo e, logo que completara vinte e um anos, passara a ajudar o pai a cuidar de um pequeno pub, de onde vinham inclusive as bebidas que eles consumiam quando se reuniam.
— Você me dá uma carona? — Christa perguntou, já pegando a bolsa, e ele assentiu.
— Eu também já vou. Eu fiquei de passar na casa da Jamila — informou Devon, se colocando de pé, enquanto se esforçava para não revirar os olhos e disfarçava seu descontentamento, começando a recolher algumas garrafas da mesa de centro.
Depois que os três foram embora, se juntou a e os dois arrumaram a sala, recolheram o lixo e lavaram toda a louça usada, como sempre faziam, quando ficavam finalmente sozinhos.
O pai de tinha dois empregos e passava em casa, entre um turno e outro, para mudar de uniforme. Discussões intermináveis já haviam acontecido, em várias ocasiões, porque ele encontrara a casa de pernas para o ar, e o filho dormindo ou vendo televisão, além das provas irrefutáveis do consumo de álcool, em plena luz do dia e no meio da semana, por pessoas que sequer tinha permissão para beber.
— O que você achou desse lance do Devon namorar a Jamila? — questionou, quando eles estavam finalmente terminando os afazeres domésticos.
— Ah, sei lá — respondeu, estranhando a pergunta. — Eu não tenho que achar nada, né? Se ele tá a fim...
— Pois eu não consigo deixar de achar totalmente sem sentido! Como alguém pode querer namorar, ainda mais tendo menos de vinte anos? Pra que? Trocar a liberdade por... sei lá! Nem sei direito pelo quê!
— Eu também acho meio esquisito, mas talvez seja porque a gente nunca se apaixonou por ninguém. — Ele deu de ombros.
— Eu não sei se é por isso ou por qualquer outro motivo. Só sei que não entendo e nem quero isso pra mim! — disse enfática. — Eu prefiro dar uns beijos no meu melhor amigo — completou, pendurando o pano de prato, em um gancho na parede, e se virando para entregar o último prato seco para o rapaz.
— É? Mas tem tempo que você não me dá uns beijos — constatou ele, enquanto terminava de guardar a louça.
— Tem, é? Não percebi — ela ironizou, um sorrisinho provocante surgindo em seus lábios.
— Eu sei que você achou melhor a gente parar de ficar porque eu tava ficando com a Gwyn, mas agora eu e ela não tamos ficando mais.
— Tô sabendo.
— E não fazia sentido pra mim você me evitar por causa dela, já que eu já fiquei com outras meninas antes, e a gente nunca deixou de dar uns beijos, mas, na semana passada, eu acho que entendi.
— Você finalmente percebeu? Que espertinho! — riu, apertando a bochecha dele de um jeito debochado. Ele fez uma careta, antes de continuar a falar, em tom preocupado.
— Eu juro pra você que eu nunca dei a entender que poderia se tornar algo sério. Quando ela reclamou porque soube que eu fiquei com a Breeze, eu levei um puta susto! Eu tinha certeza de que ela sabia que a gente tava só curtindo.
— Ela tá apaixonada, . E, infelizmente, muitas garotas ainda acreditam que os caras só não querem nada com as outras, mas que com elas vão querer porque também vão se apaixonar e então vão descobrir que simplesmente precisam delas pra viver! — suspirou, porque achava isso mentalmente exaustivo. Já tinha visto muitas amigas sofrerem por ter alimentado esse tipo de ilusão e se frustrado depois. — Eu gosto da Gwyn e sinceramente não queria que ela achasse que era eu que tava entre vocês, impedindo o conto de fadas dela de acontecer.
— Você fez certo — concordou. — Só que eu senti falta dos seus beijos.
— Eu também.
se aproximou, segurando o rosto de com as duas mãos, e ela o abraçou pela cintura, receptiva. Seus lábios se tocaram sutilmente algumas vezes, antes de suas línguas se procurarem, sedentas pelo contato. Os dois se beijaram por minutos, até que ele interrompesse os beijos para levantar a garota e sentá-la na bancada da cozinha, ficando de pé entre as pernas dela e beijando com ainda mais entusiasmo.
Entre eles, tudo era sempre confortável e familiar, mas ao mesmo tempo excitante como o desconhecido. Podiam ficar dias sem contato físico (até mesmo semanas, como tinha sido dessa vez), mas, quando o toque acontecia, o desejo era cada vez maior, crescia desenfreado.
Depois de um bom tempo, enfiou as mãos dentro da camiseta de e arranhou levemente as costas dele, enquanto o rapaz tocava um de seus seios, deslizando o polegar pelo mamilo. Sentindo a libido a mil, ela empurrou seu quadril para frente e envolveu o dele com as pernas, puxando-o para ainda mais perto e roçando seu sexo no dele.
teve certeza de que, se isso tivesse acontecido quando ele tinha quatorze anos e ainda era virgem, teria explodido na hora. E, mesmo que não tivesse mais quatorze e fosse bastante experiente àquela altura, decidiu que tinha chegado a um limite, o qual seria melhor não cruzar. Com a maior sutileza possível, ele foi se afastando e trocando os beijos profundos por alguns selinhos, até parar, já se sentindo suficientemente no controle.
— Eu peguei Missão: Impossível na locadora. Tá a fim de ver?
— Não — respondeu seca.
— Também tem Pânico. Prefere?
— Por que você sempre faz isso, ? — resolveu perguntar. Não era, afinal, a primeira vez em que ficava frustrada com o comportamento escorregadio dele, e os dois eram amigos demais para que não optasse por uma conversa franca.
— Isso o que? — ele devolveu a pergunta, se sentindo de fato confuso.
— Resolver fazer alguma coisa completamente aleatória ou falar sobre um assunto bizarro, justamente quando a coisa tá esquentando.
— Eu faço isso? — ele franziu a testa de um jeito fofo.
— Você sabe que faz, ! — Ela cruzou os braços, mostrando que não engoliria qualquer desculpa.
— É que... sei lá! Eu acho que, se não vai rolar, é melhor evitar que você tenha que me dar essa cortada. Eu sei que você não faz sexo com qualquer cara e que inclusive já deixou de ficar com alguns porque eles queriam fazer, então... — disse, dando de ombros, e ela teve vontade de bufar.
— Olha só, ... Primeiro que você não é qualquer cara, é o meu melhor amigo! Segundo que os babacas com quem eu deixei de ficar não queriam simplesmente fazer sexo. Eles me pressionaram pra fazer sexo, o que é completamente diferente — explicou. — Sexo tem que rolar naturalmente, o que já teria acontecido com a gente, se você não estivesse fugindo sempre.
— Sério? — Um sorrisinho travesso surgiu nos lábios dele, que voltou a se aproximar, se encaixando de novo entre as pernas da garota.
— É claro que é sério. A não ser que você tenha medo de se apaixonar por mim — provocou ela.
— Nos seus sonhos! — retrucou, também se lembrando muito bem da conversa que haviam tido, poucos meses antes. Segurando-a pela nuca, ele a beijou profundamente outra vez. — É melhor a gente subir pro meu quarto. Eu não tô a fim de ser flagrado pelo meu pai, e com certeza você também não.
— Não mesmo — a menina riu, descendo da bancada. — Quem chegar por último, fica por baixo — declarou, correndo para a escada.
No meio da bagunça que era o quarto de , ele e passaram o restinho da tarde e boa parte da noite aprendendo que sexo podia ser ainda melhor, quando havia uma relação de cumplicidade e afeto.
Mesmo que nenhum dos dois tivesse a intenção de se apaixonar ou quisesse que aquela amizade cheia de benefícios se transformasse em um doce romance.
pulou a janela de seu quarto no segundo andar, aterrissando com desenvoltura na grama que cobria o quintal e agradecendo mentalmente o fato de seu pai gostar de assistir a partidas de futebol americano com a televisão quase no volume máximo, o que garantiria que sua mãe não percebesse sua escapulida. Pulou o muro que separava a casa em que vivia daquela em que moravam os , escalou a árvore que ficava bem na frente da janela do quarto de e pulou para dentro, o que poderia ter assustado o rapaz, se isso já não fosse um hábito.
— Oi, — ele a cumprimentou, sorrindo, mas logo franziu a testa. — Você ainda não se arrumou? Tá quase na hora do Melvin passar pra pegar a gente.
— É. Eu tô sabendo. E você tá um gatinho — falou ela, apertando o nariz dele. — Coloca isso. Vai ficar perfeito!
Ao pegar a caixinha que ela trouxera no bolso do short e abri-la, o garoto encontrou o relógio pelo qual tinha se apaixonado, durante a última ida dos dois ao shopping.
— ! Eu não acredito, cara! — Disse, dando um enorme sorriso e colocando o acessório no pulso. — É muito foda! Eu só não sei se você deveria ter gastado tanto dinheiro comigo.
— Ah, para! Eu tava guardando desde o ano passado. E você merece — afirmou.
— Obrigado — Ele a puxou para um abraço apertado e ela o abraçou de volta, lutando contra o choro que queria vir.
— Só que eu não vou poder ir com vocês hoje — declarou a menina, em tom triste, quando se afastaram. — A minha mãe achou um maço de cigarros numa gaveta, quando tava arrumando o meu quarto, e me colocou de castigo.
— Sua mãe ainda arruma o seu quarto? Será que ela não quer arrumar o meu, não? — Perguntou, forçando um ar brincalhão.
— Você ao menos ouviu a parte em que eu disse que não vou poder sair hoje?
— É claro que eu ouvi — confirmou, torcendo os lábios para a esquerda, como fazia quando ficava chateado. Ela achava aquela mania adorável!
— E?
— E... sei lá. Acho que eu tava tentando fingir que não ouvi...
— Porque talvez, se você ignorasse, deixasse de ser real — completou ela, lembrando da época em que lhe contara que tinha preferido fingir não ouvir, quando seus pais disseram que iam se divorciar e, mais tarde, quando a mãe informara que se casaria novamente, com o antigo chefe dela.
— Ela não podia ter te proibido de sair num outro dia, não? — ele perguntou.
— É claro que podia! Mas ela sabe que o maior castigo vai ser não sair hoje, pra comemorar o seu aniversário. Ela sabe que você é o meu melhor amigo e que a gente tá planejando essa saída há semanas! E não seria a minha mãe, se ela não fizesse o pior possível.
era seu vizinho desde quando ambos usavam fraldas e chupetas. Sempre tinham sido amigos e haviam se aproximado ainda mais ao ir estudar na mesma escola, no primeiro ano do ensino médio dela (e segundo dele).
— Tá tudo bem, . Eu só faço aniversário na segunda, então na verdade a gente nem devia ter marcado pra hoje, e sim pro sábado que vem. A gente sai de novo. É só não deixar escapar isso pra sua mãe — sugeriu o rapaz.
— Tá marcado, ! — concordou ela, tentando não se mostrar abalada, como sempre fazia, e então fez menção de ir em direção à janela, para voltar a seu cárcere.
— Espera! — Ele pediu, um pouco mais alto do que pretendia.
— Hum?
— O meu presente — respondeu, sendo bastante vago, mas isso foi proposital.
— Eu já te dei o seu presente, ué!
— O relógio é maneiríssimo! Mas pra eu te perdoar por esse mole que você deu, de deixar os cigarros no seu quarto e acabar de castigo, logo hoje, eu quero um outro presente — declarou, fazendo um carinho sutil na maçã do rosto dela, que se arrepiou, imaginando o que estava por vir.
— O que? Não vai dizer que quer que eu arrume essa zona que é o seu quarto, né? — Ironizou, disfarçando.
— É claro que não. Eu quero um... beijo — ele praticamente sussurrou.
— Pirou, né? — Ela riu. No fundo, não porque era engraçado, mas por nervosismo. — Nós somos amigos. Melhores amigos!
— E daí? A gente já se beijou! — Lembrou, dando um sorrisinho safado que poderia tê-la irritado, mas na realidade a deixou com vontade de dar o que ele estava pedindo.
— Nós dois estávamos totalmente bêbados no aniversário da Christa — argumentou, ignorando seus desejos nada racionais.
— Por um momento, eu achei até que você tinha se esquecido, mas então você lembra, né? E, mesmo assim, depois de mais de um mês, não mudou nada entre a gente! — Ele também tinha seus argumentos.
— Tudo beeeeem. Tudo bem! É só um beijo, né? Um beijinho só não vai mudar nada mesmo. Se você faz tanta questão assim... — Ela deu de ombros, se rendendo. Talvez estivesse dando importância demais ao assunto, afinal.
— Pois é! Pode ficar tranquila. O máximo que pode acontecer é você se apaixonar por mim — brincou, acariciando o rosto dela novamente.
— Ah, tá! Nos seus sonhos! — Retrucou ela, com o jeito marrento que ele adorava, e riu, se aproximando e, enfim, encostando seus lábios nos dela e dando início a um beijo longo. Já que seria um só beijo, este foi explorado ao máximo, em movimentos lentos, mas intensos, daqueles que deixam as pernas bambas, o coração disparado...
— Melhor presente de aniversário — ele concluiu, quando enfim se separaram. Ainda segurava o rosto dela e seu semblante não era provocador, era sincero.
— É bom que você saiba mesmo que foi um presente de aniversário, que eu dei pra me redimir da minha ausência na comemoração — ela explicou, se afastando. — Foi a segunda vez, mas não vai ficar acontecendo toda hora!
— Eu não ia achar nem um pouco ruim fazer isso toda hora, não. — O sorriso de satisfação dele quase fez com que ela desmanchasse sua pose, mas foi apenas quase.
— Ridículo! — deu um tapinha no braço de e ele fez uma expressão falsa de dor. — Vai pra sua festinha, que lá você vai beijar várias meninas e nem vai mais lembrar desse beijo — completou, indo para a janela e dando um tchauzinho, antes de pular.
não teve tempo de acrescentar nada e provavelmente não o faria, mas a verdade era que ele duvidava muito que fosse esquecer aquele beijo em algum momento!
Foi por isso que ele adorou quando Devon os desafiou a se beijarem durante uma brincadeira, dias depois, sem saber que os dois já haviam feito isso antes. E foi por isso também que não se surpreendeu quando eles se despediram com um beijo, na porta da casa dela, ao voltar do baile de formatura dele. E nem quando trocaram vários amassos na casa de praia de Beck, durante as férias de verão.
Eles nunca mais falaram sobre os beijos. Apenas se beijavam, de vez em quando, e curtiam o momento.
Nada mudou na vida de nenhum dos dois, que ficavam com quem quisessem, na hora em que bem entendessem, assim como a amizade deles também não mudou e eles continuaram se vendo todos os dias, conversando um com o outro sobre quase tudo, implicando um com o outro por qualquer coisa.
Logo entrou em um período de férias constantes, com o término do ensino médio, e parecia estar igualmente de férias, pois frequentava o colégio na parte da manhã, mas reservava as tardes para ver televisão, jogar vídeo game, comer junk food e, algumas vezes, tomar cerveja na casa do melhor amigo.
— Porra! Eu desisto! — Devon disse, em uma daquelas tardes, colocando o controle do PlayStation sobre a mesa de centro e se jogando no sofá.
O rapaz também passava muito tempo na casa de , quase sempre sendo derrotado nos jogos eletrônicos, e acabara de perder várias corridas seguidas no Ridge Racer, inclusive para Christa, que nem mesmo costumava jogar.
Enquanto Devon tomava um gole de cerveja, Christa e fizeram uma dancinha da vitória, irritando-o ainda mais, e riu, afundado em uma poltrona com sua própria long neck de Budweiser na mão.
— Eu vou indo, cara. Ainda tenho que ir pro bar hoje — Conrad se levantou da poltrona ao lado, depois de esvaziar a própria garrafa. Ele era o mais velho do grupo e, logo que completara vinte e um anos, passara a ajudar o pai a cuidar de um pequeno pub, de onde vinham inclusive as bebidas que eles consumiam quando se reuniam.
— Você me dá uma carona? — Christa perguntou, já pegando a bolsa, e ele assentiu.
— Eu também já vou. Eu fiquei de passar na casa da Jamila — informou Devon, se colocando de pé, enquanto se esforçava para não revirar os olhos e disfarçava seu descontentamento, começando a recolher algumas garrafas da mesa de centro.
Depois que os três foram embora, se juntou a e os dois arrumaram a sala, recolheram o lixo e lavaram toda a louça usada, como sempre faziam, quando ficavam finalmente sozinhos.
O pai de tinha dois empregos e passava em casa, entre um turno e outro, para mudar de uniforme. Discussões intermináveis já haviam acontecido, em várias ocasiões, porque ele encontrara a casa de pernas para o ar, e o filho dormindo ou vendo televisão, além das provas irrefutáveis do consumo de álcool, em plena luz do dia e no meio da semana, por pessoas que sequer tinha permissão para beber.
— O que você achou desse lance do Devon namorar a Jamila? — questionou, quando eles estavam finalmente terminando os afazeres domésticos.
— Ah, sei lá — respondeu, estranhando a pergunta. — Eu não tenho que achar nada, né? Se ele tá a fim...
— Pois eu não consigo deixar de achar totalmente sem sentido! Como alguém pode querer namorar, ainda mais tendo menos de vinte anos? Pra que? Trocar a liberdade por... sei lá! Nem sei direito pelo quê!
— Eu também acho meio esquisito, mas talvez seja porque a gente nunca se apaixonou por ninguém. — Ele deu de ombros.
— Eu não sei se é por isso ou por qualquer outro motivo. Só sei que não entendo e nem quero isso pra mim! — disse enfática. — Eu prefiro dar uns beijos no meu melhor amigo — completou, pendurando o pano de prato, em um gancho na parede, e se virando para entregar o último prato seco para o rapaz.
— É? Mas tem tempo que você não me dá uns beijos — constatou ele, enquanto terminava de guardar a louça.
— Tem, é? Não percebi — ela ironizou, um sorrisinho provocante surgindo em seus lábios.
— Eu sei que você achou melhor a gente parar de ficar porque eu tava ficando com a Gwyn, mas agora eu e ela não tamos ficando mais.
— Tô sabendo.
— E não fazia sentido pra mim você me evitar por causa dela, já que eu já fiquei com outras meninas antes, e a gente nunca deixou de dar uns beijos, mas, na semana passada, eu acho que entendi.
— Você finalmente percebeu? Que espertinho! — riu, apertando a bochecha dele de um jeito debochado. Ele fez uma careta, antes de continuar a falar, em tom preocupado.
— Eu juro pra você que eu nunca dei a entender que poderia se tornar algo sério. Quando ela reclamou porque soube que eu fiquei com a Breeze, eu levei um puta susto! Eu tinha certeza de que ela sabia que a gente tava só curtindo.
— Ela tá apaixonada, . E, infelizmente, muitas garotas ainda acreditam que os caras só não querem nada com as outras, mas que com elas vão querer porque também vão se apaixonar e então vão descobrir que simplesmente precisam delas pra viver! — suspirou, porque achava isso mentalmente exaustivo. Já tinha visto muitas amigas sofrerem por ter alimentado esse tipo de ilusão e se frustrado depois. — Eu gosto da Gwyn e sinceramente não queria que ela achasse que era eu que tava entre vocês, impedindo o conto de fadas dela de acontecer.
— Você fez certo — concordou. — Só que eu senti falta dos seus beijos.
— Eu também.
se aproximou, segurando o rosto de com as duas mãos, e ela o abraçou pela cintura, receptiva. Seus lábios se tocaram sutilmente algumas vezes, antes de suas línguas se procurarem, sedentas pelo contato. Os dois se beijaram por minutos, até que ele interrompesse os beijos para levantar a garota e sentá-la na bancada da cozinha, ficando de pé entre as pernas dela e beijando com ainda mais entusiasmo.
Entre eles, tudo era sempre confortável e familiar, mas ao mesmo tempo excitante como o desconhecido. Podiam ficar dias sem contato físico (até mesmo semanas, como tinha sido dessa vez), mas, quando o toque acontecia, o desejo era cada vez maior, crescia desenfreado.
Depois de um bom tempo, enfiou as mãos dentro da camiseta de e arranhou levemente as costas dele, enquanto o rapaz tocava um de seus seios, deslizando o polegar pelo mamilo. Sentindo a libido a mil, ela empurrou seu quadril para frente e envolveu o dele com as pernas, puxando-o para ainda mais perto e roçando seu sexo no dele.
teve certeza de que, se isso tivesse acontecido quando ele tinha quatorze anos e ainda era virgem, teria explodido na hora. E, mesmo que não tivesse mais quatorze e fosse bastante experiente àquela altura, decidiu que tinha chegado a um limite, o qual seria melhor não cruzar. Com a maior sutileza possível, ele foi se afastando e trocando os beijos profundos por alguns selinhos, até parar, já se sentindo suficientemente no controle.
— Eu peguei Missão: Impossível na locadora. Tá a fim de ver?
— Não — respondeu seca.
— Também tem Pânico. Prefere?
— Por que você sempre faz isso, ? — resolveu perguntar. Não era, afinal, a primeira vez em que ficava frustrada com o comportamento escorregadio dele, e os dois eram amigos demais para que não optasse por uma conversa franca.
— Isso o que? — ele devolveu a pergunta, se sentindo de fato confuso.
— Resolver fazer alguma coisa completamente aleatória ou falar sobre um assunto bizarro, justamente quando a coisa tá esquentando.
— Eu faço isso? — ele franziu a testa de um jeito fofo.
— Você sabe que faz, ! — Ela cruzou os braços, mostrando que não engoliria qualquer desculpa.
— É que... sei lá! Eu acho que, se não vai rolar, é melhor evitar que você tenha que me dar essa cortada. Eu sei que você não faz sexo com qualquer cara e que inclusive já deixou de ficar com alguns porque eles queriam fazer, então... — disse, dando de ombros, e ela teve vontade de bufar.
— Olha só, ... Primeiro que você não é qualquer cara, é o meu melhor amigo! Segundo que os babacas com quem eu deixei de ficar não queriam simplesmente fazer sexo. Eles me pressionaram pra fazer sexo, o que é completamente diferente — explicou. — Sexo tem que rolar naturalmente, o que já teria acontecido com a gente, se você não estivesse fugindo sempre.
— Sério? — Um sorrisinho travesso surgiu nos lábios dele, que voltou a se aproximar, se encaixando de novo entre as pernas da garota.
— É claro que é sério. A não ser que você tenha medo de se apaixonar por mim — provocou ela.
— Nos seus sonhos! — retrucou, também se lembrando muito bem da conversa que haviam tido, poucos meses antes. Segurando-a pela nuca, ele a beijou profundamente outra vez. — É melhor a gente subir pro meu quarto. Eu não tô a fim de ser flagrado pelo meu pai, e com certeza você também não.
— Não mesmo — a menina riu, descendo da bancada. — Quem chegar por último, fica por baixo — declarou, correndo para a escada.
No meio da bagunça que era o quarto de , ele e passaram o restinho da tarde e boa parte da noite aprendendo que sexo podia ser ainda melhor, quando havia uma relação de cumplicidade e afeto.
Mesmo que nenhum dos dois tivesse a intenção de se apaixonar ou quisesse que aquela amizade cheia de benefícios se transformasse em um doce romance.