Última atualização: 25/12/2020

Capítulo Único

Quando avistei o pomo, se dirigindo sutilmente para baixo de onde Ruby, a artilheira do time, sobrevoava, joguei todo meu corpo para frente em uma velocidade absurda atrás dele. O apanhador do time rival ainda não tinha o visto, o que me dava uma vantagem considerável.
Não podia arriscar perdê-lo novamente na mesma partida, os flocos de neve caindo e o vento forte ricocheteando meus cabelos presos dificultavam ainda mais meu trabalho ao atrapalhar minha visão.
Mas nada importava, eu estava cega, era como se nada mais ao meu redor existisse, apenas a rápida e graciosa bolinha dourada, focada como um predador olha para sua presa, sutil e silenciosa para que o adversário não reparasse.
Nós precisávamos daquela vitória para passar para a final do campeonato e para finalizar aquele ano com chave de ouro, o time faria de tudo para isso e aquilo me deixava repleta de determinação.
Quando meus dedos se fecharam agilmente sobre a bolinha, a torcida foi à loucura. O apito soou e então eu sobrevoei todo o campo com o braço erguido com o pomo de ouro em mãos, para que pudesse finalmente aterrissar e comemorar com minhas colegas de time.
As Harpias de Holyhead estavam na final do Campeonato de Quadribol da Grã-Bretanha. Teríamos a chance de vencer o Puddlemere.
— Nós conseguimos! — Gina vibrou ao me abraçar.
— Você foi brilhante! Se na final fizer uma jogada assim contra o Wood, ele vai se contorcer de ódio por não ter tido você no time da escola! — nós rimos.
— Ele já se arrepende, mas você está falando o que, Curie? — Gina sorriu dando-me um tapinhas nas costas — Fez uma captura incrível e emocionante! Achei que Guga ia infartar quando você se apoiou daquele jeito na vassoura… Ah, olha quem vem aí.
Virei curiosa na direção que minha amiga e colega de time apontava e senti minhas bochechas se ruborizarem levemente.
Não só pela endorfina ou qualquer outra substância circulante no meu corpo graças a partida eletrizante de minutos atrás. Mas claramente pela presença inusitada. Harry Potter, marido de Gina, carregava o pequeno James Sirius no colo e era acompanhado pelo irmão dela, Rony Weasley.
Em nossos tempos em Hogwarts acabamos ficando juntos por um tempo no sexto ano, mas obviamente não foi nada importante, visto que ele não voltou para o último ano letivo e apareceu somente na Batalha de Hogwarts, namorando Hermione Granger.
Chocando um total de zero pessoas.

Isso mesmo, nem eu me surpreendi. Fiquei chateada claro, afinal passamos uns bons meses juntos e achei que tínhamos - ou teríamos - algo. Mas quem eu era perto da garota que estava ao lado dele todos esses anos?
— Parabéns mamãe! Alguém aqui não parava de se remexer no meu colo empolgado quando te via. — Harry cumprimentou a esposa e a entregou o bebê de dois anos que segurava. — Parabéns para você também, , foi uma captura brilhante.
— É, nada mal para uma sonserina. — Rony sorriu tentando fazer uma piada e eu só arqueei a sobrancelha. Nós não nos víamos há anos e ele achava que tinha intimidade suficiente para chegar com piadinhas para o meu lado?
— Obrigada, Harry. E é uma pena que depois de tantos anos ainda tenha esse preconceito obsoleto e infundado, Ronald.
O silêncio se instaurou, Gina prendia uma risada e Harry olhava para o amigo constrangido. Sorri simpática brincando com o filho dos Potter e então voltei a olhá-los.
— Foi bom revê-los, agora se me dão licença, vou falar com as outras jogadoras. — balancei a cabeça em um aceno rápido e me retirei indo em direção a Guga Jones, capitã do nosso time.
Depois de mais algum tempo festejando no gramado, fomos todas em direção aos vestiários. Tudo que eu mais precisava era um banho quente e revigorante. Senti a água cair sobre minhas costas, desfazendo ali todos os pontos de tensão presentes.
Logo estava na frente do espelho penteando meus cabelos, devidamente aquecida para ir para casa. Ruby e Gina conversavam animadas ao meu lado sobre qualquer assunto que eu só concordava sorrindo.
— Não está nos ouvindo, né? — Ruby cruzou os braços rolando os olhos e eu levei a mão ao peito em ultraje.
— Claro que estou.
— Então por que só balançou a cabeça quando perguntamos onde vai passar o Natal? — Gina questionou rindo e eu ergui as mãos em rendição.
— Perdão, o cansaço está me deixando desorientada. Mas, ahn… Meus pais vão fazer uma viagem pra dar um jantar beneficente sei lá onde e não dá tempo de ir para Nova York passar com a vovó e voltar antes do próximo jogo, então… Provavelmente sozinha no meu apartamento com um vinho. E vocês?
— Vou para a casa dos meus sogros na França. — Ruby respondeu.
— Vou passar com meus pais. O Natal é uma data delicada para minha mãe… E como esse ano meus irmãos não poderão comparecer ela está bem chateada. — Gina explicou enquanto terminava de calçar as botas. — Espera, você vai passar o Natal sozinha, ?
— E bêbada! — acrescentei sorrindo enquanto as duas mulheres me olharam com descrença. — O que?
— Isso é deprimente, Curie!
— Eu não acho. — tentei passar firmeza, mas Ruby me encarou novamente. Bufei — É, é bem deprimente, mas estou bem com isso. Quando der meia noite estarei feliz com meu pijama quadriculado, bêbada e no décimo sono depois de comer algo congelado.
Foi então que Gina me deu um tapa no ombro e começou a dar alguns pulinhos de alegria.
— Endoidou de vez, Potter? — questionei guardando a escova de cabelo na bolsa.
— Você vai passar o Natal lá em casa! — afirmou fazendo com que eu a olhasse confusa.
— O que?
— Não aceito não como resposta, você vai passar o Natal conosco n'A Toca!
— Gina eu agradeço, mas ficarei bem em casa e…
— Você vai sim. — foi a vez de Ruby dizer. — Vai vestir uma roupa decente e ir para a casa dos Weasleys!
— Anda, . Vai fazer bem pra minha mãe ter visita, ela vai se animar pra te receber. — Gina sorriu fraco. — Fora que tem um bebê que te adora e vai adorar passar a noite brincando e puxando seu cabelo.
Senhorinhas e bebês fofinhos eram meu fraco. Maldita Gina.
— Tá legal, o que eu levo?
Gina me olhou como se estivesse ofendida e então riu.
— Sua barriga, oras.

🎄🎁✨


Dei uma última olhada no espelho, ajeitando meu suéter branco de gola alta e vestindo o sobretudo preto por cima. Jeans, suéter e botas com um pequeno salto, estava devidamente quentinha e confortável. Me sentia bonita e arrumada na medida certa.
Estava feliz por poder passar um Natal confortável sem estar nos jantares chiques dados por meus pais anualmente para esbanjar o status e fortuna da família Curie. E claro, para jogar, direta e indiretamente, na minha cara que eu sou a perdida da família porque não quis continuar na área científica, acadêmica, baboseira e tal como todos os meus antepassados.
Às vezes me pergunto qual o motivo de só minha mãe ser uma megera sem coração, visto que vovó Eve é a senhora mais doce de todo o universo e as histórias contadas por ela sobre minha bisavó não ficam muito atrás, mostrando que, mesmo sendo uma mulher famosa no mundo trouxa e bruxo, que trabalhou muito devido suas descobertas que fizeram história, Marie Curie também era uma mãe espetacular. O que me confortava e fazia eu me perguntar se a diferentona da família era realmente eu.
Caminhei até o sofá, pegando os presentes e depois a sobremesa que havia comprado sob o olhar de Gin, meu gato. Era incrível como, mesmo sem dizer uma palavra, o pequeno meliante parecia debochar dos meus dotes culinários duvidosos.
— Engraçadinho, você sabe tanto quanto eu que essa torta de chocolate está deliciosa.
O felino apenas tombou a cabeça para o lado, ainda me julgando.
— Claro que vai estar, não fui eu quem fiz. Mas o que vale é a intenção, né? — dei de ombros sorrindo derrotada. — Volto mais tarde, Gin.
O gato laranja apenas soltou um miado dengoso, como se quisesse que eu fosse me deitar para que ele se acomodasse nos meus pés enquanto eu me delicio com uma taça de vinho envolta por cobertas quentinhas, lembrando-me da vontade gritante de ficar em casa. Mas balanço a cabeça afastando esses pensamentos.
Havia prometido a Gina que estaria lá, nem gostava de imaginar o que a ruiva faria caso eu não fosse.
Antes que pudesse concretizar meu plano de fuga, equilibrei a travessa e as sacolas como podia e aparatei.

🎄🎁✨


! Que bom que veio! — Harry foi quem abriu a porta, dando-me passagem para entrar.
— Claro, sua mulher me mataria se eu não viesse. — brinquei ao ver que Gina se aproximava de nós.
— Que bom que valoriza sua vida, Curie. — ela me abraçou rindo. — Seja bem vinda A Toca!
O lugar tinha uma decoração peculiar, mas que era inegavelmente aconchegante. Agora entendia o motivo que levava todos a falarem com tanto carinho daquele lugar que abraçava quem recebia: eu estranhamente me sentia em casa.
— A casa geralmente é mais cheia, mas esse ano Gui e Vic viajaram para o Brasil, na casa dos pais dela, Percy e Carlinhos foram viajar a trabalho. Aqueles são Jorge e Angelina, que você já conhece. E aquele é Fred II, o monstrinho deles.
— Não sou um monstrinho, titia!
— Claro que não, meu amor. Você é um garotinho adorável, é só modo de dizer.
O garotinho, muito parecido com a mãe e que não parecia ter mais que três anos assentiu, embora eu duvidasse que ele havia realmente entendido algo.
Percebendo que havia alguém estranho ali, o pequeno Fred encarou-me com tamanha curiosidade, lhe lancei um sorriso e acenei, recebendo um sorriso com poucos dentes em resposta. Logo ele voltava a brincar com o primo, James Sirius e um brinquedo colorido. Aquela cena aqueceu ligeiramente meu coração.
— Rony você já conhece também. Muito bem, pelo que eu soube. — ela cochichou risonha a última parte, fazendo com que eu arregalasse os olhos constrangida. — E aqueles são meus pais, Molly e Arthur.
— Seja bem vinda, , querida! — a senhora ergueu o olhar até a mim, tentando sorrir. Eu entendia a situação então a fornecia meu melhor sorriso a fim de confortá-la. Passar o Natal com alguns membros da família faltando não era algo bom, muito menos quando um destes não podia voltar. — Ginevra Weasley Potter, eu não acredito que não a avisou para não se preocupar em trazer nada.
Gina arregalou os olhos, parecendo notar só agora a travessa que eu carregava e tentando se explicar pra mãe. Enquanto o senhor Weasley apenas riu, acenando pra mim do sofá.
— Está tudo bem, senhora Weasley. Ela me avisou sim, mas não achei que seria prudente vir com as mãos abanando. — sorri mais uma vez.
— Não precisava ter se preocupado, querida. Isso foi muito gentil da sua parte. E ah, me chame de Molly, por favor!
— Imagina. Onde posso colocar? — questionei, vendo Ronald vir em minha direção. Não sei se a raiva do dia do jogo não havia me permitido observá-lo com mais cautela, mas o tempo definitivamente havia lhe feito bem.
A combinação da jaqueta de couro com a camisa xadrez, da barba por fazer e do inebriante perfume amadeirado quase me fizeram suspirar como a garota de anos atrás, mas me contive.
Ele ergueu a mão, com um sorriso tímido nos lábios.
— Deixa que eu guardo.
— Ah, ok… — entreguei a travessa com o olhar incerto — Obrigada.
Rony apenas meneou a cabeça, ainda com o sorrisinho nos lábios, indo em direção a cozinha.
— Ele está sem graça pela última vez. — Gina deu uma cotovelada leve ao cochichar.
— Deveria mesmo. — murmurei ressentida enquanto a Potter segurava uma risada.
— Dá um desconto, nunca o vi se esforçando tanto. Costuma ser um ogro desligado.
Arqueei a sobrancelha embora estivesse constrangida e, enquanto Gina finalmente ria de minha expressão, pigarreei me direcionando aos demais.
— Eu, ahn… Trouxe presentes.
Entreguei os presentes dos adultos e brinquedos para as crianças, que me agradeceram com abraços e beijinhos. Céus, como eram fofos!
Também recebi um cachecol e touca de Molly, um kit de cuidados para vassouras dos Potter e um perfume de Jorge e Angelina.
— Comprei algo pra você também, . — ouvi assim que me levantei do chão, depois de observar brevemente os meninos felizes com suas vassouras de brinquedo. Rony me estendia uma caixinha branca.
Abri com cuidado a delicada caixa, encontrando ali uma pulseira com alguns berloques, dentre eles um pomo de ouro, uma cobra e uma miniatura d’A Toca.
— Obrigada, Ron. Isso é… — as palavras simplesmente se perderam enquanto meus olhos brilhavam com a delicadeza do presente que claramente tivera cada detalhe bem pensado, dando lugar apenas a um sorriso sincero. — É linda, muito obrigada!
— Não foi nada… Obrigado pela camisa, é realmente minha cara.
— Ir no xadrez é nunca errar com Rony Weasley. — pisquei em sua direção rindo, ele me acompanhou.
— Poderíamos comer agora, né? — sugeriu Molly, um pouco incomodada.
— Mãe, mas ainda são dez horas. — Gina acariciou o ombro da mãe, que deu de ombros.
— Estou cansada, querida. Por favor, vamos adiantar isso…
Depois dos filhos tentarem, de forma falha, argumentar com a mãe sobre esperar mais um pouco, estávamos sentados na mesa. Toda a comida, mesmo que em circunstâncias tristes para a matriarca dos Weasleys, estava divina. Dava pra sentir todo o carinho e amor que se traduzia em alimentos tão simples, mas tão saborosos.
Aquilo fez com que eu me lembrasse de minha vózinha Eve, e de como ela traduzia seu amor por nós da mesma forma. Sentia tanto por passar essa data longe dela, mas estava feliz por estar acolhida e em companhia igualmente boa.
Rony pareceu notar meu momento de introspecção, visto que me olhava atencioso. Quando notou que era correspondido apenas direcionou o olhar para o lado contrário, com as bochechas completamente hiperemiadas, camuflando as adoráveis sardas que ele ostentava ali.

🎄🎁✨


Já havíamos comido. Agora, Harry, Gina, Arthur e George conversavam animados enquanto Angelina e eu brincávamos com os meninos no tapete felpudo, quando notei que Molly estava um pouco afastada, sozinha no sofá.
Lancei um olhar significativo para Angelina, que apenas assentiu em concordância. Então me levantei indo me sentar ao seu lado.
— Quer companhia? — questionei para a senhora que apenas sorriu fraco.
querida, desculpe não te dar devida atenção, está sendo tão difícil… — Molly disse assim que me sentei ao seu lado no sofá para descansar o estômago do jantar — O Natal não tem a mínima graça quando não podemos ter todos aqueles que amamos por perto, entende?
— Eu entendo sim, senhora Weasley. É a primeira vez que passo essa data longe da minha avó e consigo imaginar, mesmo que em proporção incomparavelmente menor, como se sente…— segurei a mão da mulher, lançando lhe um sorriso compreensivo. Ela abanou a cabeça, tentando afastar as lágrimas que notei brilharem em seu olhar.
— Não vou ficar alugando você com os meus resmungos de velha, vou pegar as sobremesas para comermos e eu poder ir para o quarto. — fiz questão de impedi-la.
— Magina, Molly. Senta e curte as crianças que eu pego a sobremesa, tudo bem?
Sorri para a mulher, que apenas me lançara um sorriso triste como resposta. E levantei indo até a cozinha.
Quando apoiei a torta e o bolo na pia para poder me equilibrar com ambas as coisas em minhas mãos, avistei Rony na varanda, sozinho e encarando o nada.
Era estranho alguém tão falante e animado como Rony contemplando o silêncio. Eu tinha a teoria de que o silêncio, de certa forma, o perturbava. O que explicava o motivo dele sempre ele dar um jeito de quebrá-lo.
Mesmo que com alguma piada sem graça.
Não pensei por nem mais um minuto sequer, deixei os doces na mesa do jantar e saí sem chamar a atenção dos demais.
Assim que o barulho da porta abrindo se fez presente, Rony lançou um olhar assustado em minha direção e tentou, sem sucesso, secar os olhos com as mangas da camisa xadrez.
! — ele começou a dizer, o tom de voz falho e levemente alterado. — Eu vim verificar um barulho que escutei e…
— A menos que esteja emocionado com minha beleza admirável, nada que disser vai me convencer, Ronald. — comecei em tom de brincadeira, a fim de deixá-lo mais confortável. Pareceu funcionar, visto que ele soltou um riso fraco. — Você… Quer conversar?
— Tá tudo bem, . Vamos entrar, está frio aqui fora e…
Quando Weasley fez menção em direcionar-se para a porta, levei a mão até seu braço, afagando o local levemente. Nossos olhos se encontraram e eu pude, mesmo que em poucos segundos, enxergar a tristeza e preocupação estampada na imensidão azul que assistia cada movimento meu com atenção.
— Ela é sua mãe, Rony. Vai notar que está triste assim que colocar os olhos em você e ficará ainda mais triste sabendo que se sente assim por causa dela.
— Não é só por causa dela, sabe? — assenti, incentivando-o a continuar e assistindo-o soltar um riso triste — Minha vida parecia tão certa nos últimos seis meses… Não sei qual foi o ponto exato que as coisas pareceram se desencaixar. De repente, trabalhar no Ministério parou de fazer sentido, me sinto preso naquelas paredes, sufocado com aquela gravata e entediado com aqueles papéis, diferente de Harry e Hermione que se sentem realizados profissionalmente. E aí chegamos em outro ponto… Ela e eu chegamos naquele momento que tudo se encaminha para um casamento ou para um término, como aconteceu. Nos demos conta que éramos mais amigos do que um casal. Eu até comprei um apartamento, mas tenho receio de sair daqui por conta da minha mãe…
— As coisas não deixaram de fazer sentido, Rony. Simplesmente sempre estiveram erradas, mas isso nunca te incomodou tanto quanto agora. Esse foi seu limiar, seu ponto de virada, acredito que todos temos um momento que ciclos se encerram para que coisas novas e infinitamente melhores cheguem… Como se tudo tivesse virado de cabeça para baixo, mas ficado estranhamente certo, entende?
— É exatamente isso que sinto! — ele sorriu verdadeiramente, parecendo finalmente ser compreendido — Mas ao mesmo tempo sinto medo por trocar o certo pelo duvidoso.
Eu ri, ainda sem quebrar o contato visual com ele.
— Isso soa contraditório, Weasley. O mais certo seria: trocar uma vida infeliz e medíocre por uma que você sabe que é o que verdadeiramente quer. Sei como é difícil pedir demissão e começar do zero em outro lugar, mas se sentir bem fazendo o que faz vai ser muito mais recompensador. Você precisa se reencontrar Ronald Weasley, precisa, principalmente querer isso. E eu sei que você quer… — me aproximei ainda afagando seus braços. Seus olhos me acompanhavam com cautela e com um brilho ao qual eu só tinha visto anos atrás, quando ele entrou para o time de quadribol — Vejo isso nos seus olhos.
— Eu quero… Céus, como eu quero! — as palavras escaparam por seus lábios como um sopro, carregando todo o peso e insegurança que ele sentia e dando lugar a um sorriso iluminado, que tornava completamente impossível não sorrir junto. Ele deu mais um passo, fazendo com que a pouca distância entre nós se tornasse ainda menor.
Nossas respirações formavam fumaças visíveis por conta do frio e se misturavam devido a proximidade. Os olhos de Rony só se desviaram dos meus para encarar meus lábios que tremiam pela temperatura e pelo nervoso, eu diria.
Eu adoraria ser beijada por ele mais uma vez. Lembrar de como fizemos bem um ao outro anos atrás durante o período que ficamos juntos era quase como um refúgio, parte do combo de memórias confortáveis para as quais corremos quando nossa sanidade mental está por um fio.
E eu não queria de forma alguma estragar aquelas memórias por um momento de fraqueza em que ele achou que era o certo a se fazer. Não eram sentimentos, eram só a vontade de fugir dos problemas, a sensação de ser compreendido e a vibe natalina que causava esse efeito nele, e, mesmo que fosse difícil demais admitir, em mim também. Sendo essas razões suficientes para que eu me afastasse.
— Eu… É… — sorri amarelo — Quanto a sua mãe, não acho que ela ficará triste com isso, pelo contrário, é te ver crescer e não há uma mãe no mundo que não queira que o filho seja feliz.
— Você tem razão… — ele abaixou a cabeça e soltou o ar, se afastando. — Faz parte da vida, hora ou outra teria que acontecer. Só me preocupo por ela ainda sofrer tanto com a morte do Fred, sabe?
— Perder alguém é uma dor que nunca passa, uma ferida que nunca cicatriza, Rony. Existem épocas que doem mais, épocas que doem menos, mas sempre vai doer não ter quem amamos perto de nós. Uma mãe não esquece de um filho nunca e digo mais, não é como se ficando aqui você fosse “tapar o buraco” do Fred, um filho não substitui o outro, o amor que ela sente por cada um de vocês é diferente e incomparável. Talvez isso a faça enfrentar o luto de uma forma melhor, até.
— Eu sei, é só que nenhum de nós gosta de vê-la como está agora. Dona Molly Weasley foi quem nos ensinou a amar e celebrar o Natal. Vê-la assim torna tudo… Utópico!
Era realmente triste ver a senhora Weasley tão deprimida, a dor nos olhos de Jorge, Rony e Gina por conta disso era perceptível e não precisava ser muito inteligente para saber que, independente de onde estivessem, os outros três também sentiam o mesmo.
Desviei brevemente o olhar até o céu escuro daquela noite gelada, forçando a mente a resgatar as pouquíssimas memórias que eu tinha de Fred Weasley. O gêmeo Weasley que tinha o sorriso estampado no olhar e nos lábios, que sonhava em usar seu talento para fazer os outros felizes. Nunca havíamos trocado mais do que cumprimentos breves, mas o sentimento unânime de saudade que inebriava a Toca era contagiante. Tanto que, foi impossível não me recordar de algo que qualquer pessoa que o conhecesse, pelo menos por nome, sabia que lembrava muito quem Fred costumava ser.
— É isso… — sorri, encarando Rony, que me olhou confuso. — Tive uma ideia de algo que pode animar sua mãe.
Weasley ia abrir a boca para questionar, mas fomos interrompidos pela porta se abrindo e um Jorge constrangido, claramente pela possibilidade de atrapalhar algo.
— Desculpa atrapalhar vocês, casal. — Rony o fuzilou e eu ri, inebriada pela animação do plano e grata por ele aparecer naquele momento. Jorge era parte fundamental do plano também.
— Você apareceu na hora perfeita. Agora vem aqui, precisamos da sua ajuda.

🎄🎁✨


— Foi muito bom conversar com vocês sobre expectativas para o próximo jogo, produtos novos da loja de logros e como o Ministério anda corrido, mas estou realmente querendo ir me deitar, posso? — Molly reclamou, estávamos tentando ao máximo distraí-la até que fosse meia noite para que o plano fosse devidamente executado.
— Espera só mais esses minutinhos antes da meia noite, mãe. Não faça desfeita com a presença da , ela não voltará mais aqui e o Rony ficará profundamente magoado. — Jorge caçoou, causando risos nos demais.
— Ei! — Rony grunhiu, desconfortável pela exposição gratuita. Senti a vergonha me inundar, fazendo com que a vontade de aparatar dali surgisse.
— Se for por isso eu fico. — ela sorriu pequeno, olhando para mim — Me desculpe , não foi a intenção expulsá-la. Vocês podem ficar aqui, eu só não me sinto disposta, estou ficando velha e…
— Magina, está em perfeita forma, Molly. — sorri — Não se preocupe, só estamos tentando te manter aqui até a meia noite porque temos um presente para você.
A mais velha juntou os ombros, olhando para os filhos, marido e netos e soltou um longo suspiro.
— Tudo bem, eu espero.
Os minutos restantes se passaram, quando os fogos começaram a surgir pelo vilarejo trouxa, comemorando a chegada do dia vinte e cinco, saímos d’A Toca para assistir e eu comecei a agir como o planejado.
Troquei olhares cúmplices com Rony, que assentiu sorrindo e indicando que a mãe estava distraída o suficiente para perceber o que fazíamos logo atrás. Tirei a varinha do bolso interno do casaco e conjurei as lâmpadas chinesas com um movimento em W no ar.
Seres lumina.
Logo os outros também pegaram suas varinhas enquanto a senhora Weasley nos encarava confusa.
— O que… Mas por Merlin… O que é isso?
— A nos deu essa ideia, mãe. — Jorge sorriu, com os olhos marejados pela menção ao irmão. — Queríamos trazer um pouquinho do Fred para sua noite.
— E não há nada mais Fred do que luz, fazer os outros felizes e tornar momentos inesquecíveis com apenas a menção de seu nome. — Rony disse, trocando olhares comigo brevemente. — Só faremos isso se a senhora nos ajudar, topa?
As lágrimas já caíam copiosamente pelo rosto de Molly, que deu o sorriso mais repleto de significados daquela noite, tirando a varinha das vestes.
— Todos prontos? — questionei com a voz embargada pela emoção, posicionando-me entre Rony e sua mãe. Um coro de afirmação pode ser ouvido e então erguemos as varinhas. — Em memória ao bruxo mais iluminado que já existiu. A Fred Weasley!
— A Fred Weasley!

— Que essas luzes possam alcançar todos que as virem, aquecendo seus corações, como fez comigo. E que possa alcançá-lo também, onde quer que esteja. — Molly suspirou, apontando a varinha para a lâmpada mais próxima de si.
Wingardium Leviosa. — bradamos juntos, assistindo as inúmeras lâmpadas subindo para alcançarem o céu e se camuflarem na imensidão azul a caminho de onde precisassem ser vistas. Quando não restava uma lâmpada sequer no chão, senti os braços de Molly me apertarem em um abraço que fez com que todo o choro que eu segurasse viesse a tona.
— Eu não sei expressar em palavras o quanto isso foi especial para mim, querida… — ela afagou meus cabelos — Fred se foi, mas deixou alguém tão iluminado quanto para nos presentear esse ano.
— Estar com vocês foi um presente, eu que agradeço. — ri ao me separar do abraço.
— Minha intuição diz que sua presença será recorrente por aqui, . Agora, com licença, querida, vou abraçar outras pessoas especiais pra mim. Acho que você deveria ir fazer o mesmo. — a mais velha sorriu, apontando Rony com a cabeça, que nos assistia atento.
Ela foi em direção ao filho, o abraçando com carinho.
— Eu te amo querido, muito obrigada... — ela segurou o rosto dele com as mãos, dando-lhe um beijo carinhoso na testa seguido de um tapa no braço — Mas se deixar ela escapar te coloco de castigo!
A senhora saiu em direção a Jorge e Angelina, fazendo com que nós dois caíssemos na risada.
— Você a escutou, Curie. — Rony caminhou até mim, se aproximando até que a distância entre nós fosse menor que mais cedo, na varanda, acariciando a maçã do meu rosto. — Não quero ficar de castigo…
— E eu não quero escapar… — murmurei antes que ele selasse nossos lábios em um beijo calmo sob o som dos fogos de artifício que iluminavam aquela noite. Dando-me a certeza que tornar momentos inesquecíveis não era algo particular de Fred, mas sim uma qualidade comum aos Weasleys.

🎄🎁✨


A senhora Weasley voltou para a Toca em uma energia completamente diferente da que saira anteriormente, o que resultou em uma segunda ceia, muito mais animada que a anterior, devo ressaltar. Era visível o quanto aquilo havia deixado não só ela, como os filhos, genro, nora e marido felizes também. Aquela era a Molly Weasley a qual todos se referiam com tanto carinho, sem mencionar o alívio que inundou a casa.

Gina e Harry já haviam ido embora, com um James Sirius adormecido nos braços. Assim como Angelina e Jorge com o pequeno Fred II. Já eram quase duas da manhã quando decidi que era hora de ir embora.
— Tem certeza que não quer dormir aqui, querida? Tem o quarto do Rony e o antigo quarto da Gina, caso se sinta desconfortável. — ela cochichou a última parte, fazendo-me rir.
— Muito obrigada, Molly. Mas preciso voltar, Gin está sozinho e tem grandes chances de ele destruir minhas cortinas, revoltado por isso.
— Ah eu entendo. Mas só te deixo ir se levar uma marmitinha pra casa... — Molly riu — E você Ronald, o que quer dizer? Está com essa cara de quem viu um fantasma por quê?

— É que eu… Estava pensando de ir dormir no meu apartamento e bem… Começar a mudança definitiva pra lá. — ele soltou, incerto. A mãe apenas riu e o envolveu em um abraço.
— Fico feliz que finalmente esteja crescendo e florescendo, querido. Eu e seu pai tínhamos receio que fosse criar raízes por aqui e não ter sua própria vida nunca.
— Sim Rony, seus pais precisam de um tempo à sós depois de tantos anos com a casa cheia… — Arthur sorriu para a esposa, recebendo um tapa da mesma enquanto Rony os encarava espantado. Fora impossível conter a risada.
— Bom , esperamos que volte aqui mais vezes. — a matriarca me abraçou empurrando-me a marmita que dissera.
— Garanto que sim. — sorri em resposta ao me separar. Me despedi devidamente de Arthur e Rony e então aparatei no início da rua que morava.
Às vezes eu gostava de lembrar que além de ser bruxa eu era humana, me dando o prazer de caminhar e aproveitar a brisa gélida da noite ao invés de aparecer num canto e outro.
Gostava de observar a iluminação da noite, ver as flores que enfeitavam o parapeito de algumas janelas, — mesmo que fossem artificiais ou enfeitiçadas, já que as verdadeiras não aguentariam o clima de inverno — e também dar boa noite para o porteiro Alfred, que era um senhor muito simpático mesmo com todas as armações que a vida lhe tramara.
— Boa noite senhor Alfred, feliz Natal!
O senhor me lançou um sorriso significativo, era mais uma pessoa que não tinha mais família para comemorar o Natal. Havia me contado ter sido abandonado pelos pais muito cedo, quando eles descobriram que ele era um aborto. Desde então, se virava sozinho, mas não deixava que nada disso afetasse seu humor, sempre estava com um sorriso receptivo e com um carinho explícito no olhar para quem quer que fosse.
— Feliz Natal, senhorita !
— Trouxe algo para animá-lo. — entreguei-lhe a marmita que segurava, assistindo os olhos do senhorzinho brilharem.
— Só de ter parado aqui para conversar comigo e ser uma moça tão boa, já me anima, menina . — ele sorriu sincero, atrás do balcão. — Muito obrigado.
— Não há de que. Espero que goste das costeletas, foi inevitável não lembrar do senhor. — rimos juntos.
— Boa noite, querida.
Subi os quatro lances de escada mais rápido do que imaginei, deparando-me com uma presença inusitada no hall do andar.
— Rony?
O ruivo parou de olhar para o molho de chaves que segurava e então me olhou confuso.
? O que faz aqui?
— Eu… Moro aqui? — apontei para a porta de número 404, onde morava.
— E eu… Aqui. — ele riu, apontando para o apartamento 402. Agora tudo fazia sentido, e fora impossível não conter uma risada.
— Então você é o idiota do 402 que comprou o apartamento e nunca sequer entrou… Sua história é famosa na vizinhança. — debochei.
— Pelo visto o idiota vai passar mais uma noite sem entrar, já que não sabe qual é a chave. — resmungou, colocando as mãos no bolso da calça. — Eu até te convidaria para entrar comigo se pudesse. Talvez...
— Eu agradeço o convite, Rony… — o interrompi, aproximando-me até que ele pudesse encaixar nossos lábios em um beijo calmo. Suas mãos foram de encontro com minha cintura, aproximando ainda mais nossos corpos, seus dedos ameaçavam adentrar meu suéter, o simples contato trazendo a tona as mais variadas lembranças dos amassos em vários cantos de Hogwarts, mas eu cessei o beijo. — Mas acho que não devemos apressar tanto assim as coisas.
Caminhei de volta para a minha porta e pisquei para ele.
— Deveria tentar a chave dourada, aliás.

🎄🎁✨


Ainda que o banho ajudasse, não tirava por completo as memórias das mãos de Rony sobre minha cintura nas mais variadas situações no sexto ano, da dança lenta e sincronizada que nossos corpos costumavam ter e das sensações únicas que ele me fizera sentir, mesmo tão nova.
Sentia-me uma perfeita idiota. Como eu havia o dado um fora?
Só podia ser uma louca presa na antítese de ir com calma ou jogar todo meu medo de embarcar nisso e atravessar o corredor.
As chances de aquilo ser só mais um remember das nossas aventuras adolescentes eram bem grandes, mas as chances de tudo aquilo dar certo e evoluir para algo a mais eram assustadoras, mas igualmente possíveis.
Sai do banheiro enrolada em uma toalha, cheguei até a reprimir meus questionamentos internos e vestir um pijama qualquer que, na minha cabeça, fosse um repelente de pensamentos impuros com meu, agora, vizinho.
Bebi uma taça de vinho em menos de um minuto e tive uma conversa silenciosa com Gin, que, tinha a mesma opinião que eu.
Era uma estúpida, uma tremenda idiota, quem eu queria enganar?
Depois de saltar do balcão que dividia minha sala da minha cozinha, decidi abandonar a taça ali mesmo e correr na direção da porta. Aquilo não precisava dar certo, só precisava fazer sentido naquele momento. E eu estaria mais que satisfeita.
O que eu não esperava era que Weasley provavelmente tinha os mesmos questionamentos que eu e, estava prestes a bater na porta quando a abri.
— Nós podemos ir com calma amanhã, eu só preciso te ter hoje à noite. — Ronald murmurou, aproximando-se enquanto sua mão acariciava a maçã de meu rosto, esperando uma resposta.
Que fora apenas acabar com a distância que nos separava em um beijo quente, as mãos dele foram até meu quadril e desceram dando-me o apoio necessário para enlaçar minhas pernas em sua cintura enquanto, com a mão que não puxava seus cabelos ruivos, eu fechava a porta.
Não tinha dúvida de que aquela noite seria inesquecível, assim como todas as coisas simplesmente eram quando se tratava de Rony Weasley.




Fim!



Nota da autora: Olá vocês que chegaram até aqui! <3
Escrever com Rony Weasley foi algo completamente inusitado pra mim. Ele é um personagem tão cativante e humano nos livros que confesso que tinha medo de me perder nisso sabe? Ao mesmo tempo me identifico tanto com o jeito espontâneo e boca suja do Rony ahahahah, creio que na vida real seríamos bons amigos. Espero ter conseguido traduzir todo esse carinho nessa história.
Quero deixar aqui meus agradecimentos para as autoras perfeitas que embarcaram na criação desse universo compartilhado comigo: Zurc, Netuniana e Mthware. Amigas, vocês são autoras incríveis, que eu me inspiro MUITO e que são especiais demais pra mim. Obrigada por me aturarem nos surtos e na empolgação exagerada hahahaha essa experiência foi incrível graças a vocês!
Não posso deixar de agradecer a Thaís Santos e a Elena por lerem e me ajudarem opinando na história, vocês me ajudaram muuuuito quando eu fiquei insegura com essa história, além de serem grande inspiração pra mim.
E também a Diandra Raines que é a dona da porra toda hahahaha não tem como escrever com o Rony e não lembrar do trabalho incrível que ela faz em The Keeper. Me inspirei muito na tua narrativa e na hora de tentar encontrar a essência do Rony miga, muito obrigada!
Espero que tenham gostado dessa história feita com muito carinho, nos vemos em breve com mais de e Rony <3
That’s all folks.
Com amor,
Ju Scairp.




Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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