Chapter One — New Year
As luzes de diversas cores brilhavam na minha direção. Todas elas. E o público ali, gritando, sorrindo, pulando, só fazia crescer ainda mais o sorriso no meu rosto. Era o meu sonho. Escutei os primeiros acordes da guitarra e o meu pé batia no chão no ritmo do toque, esperando a hora certa de soltar a voz. Senti-me livre para andar por todo o palco e pela passarela com o microfone na mão, era tão óbvio que eu queria compartilhar a minha felicidade com todos eles, e eu nem conseguia acreditar direito que aquilo podia estar acontecendo mesmo. Fui até o final da passarela e as palavras ficaram mais altas, tanto que eu tive vontade de ir até lá em baixo e dar um abraço em cada um deles. Eles gritavam meu nome em uníssono.
! ! ! !
Mas algo começou me incomodar. Meu ombro balançava sem parar, até eu olhar para o lado, era uma garota que provavelmente havia conseguido invadir o palco e o segurança tentava a tirar de lá. Eu vi os olhos dela brilhando e me fez lembrar em como eu já estive no seu lugar...
— ! ! — balançava sem parar o braço da irmã, mas ela continuava avulsa, perdida em fantasias. — Caralho, , me responde.
— Relaxa, , ela deve estar sonhando acordada de novo sobre ser uma popstar. — disse passando pela sala onde e se encontravam.
abriu os olhos devagar, vendo a TV ligada à sua frente. Ela estava sentada num sofá. Não de pé num palco. Na TV passava a I Am... Tour, da Beyoncé, e tudo não havia passado de uma mera fantasia criada pela sua mente e pelo seu sonho. Desde pequena sempre foi seu maior sonho, ser uma estrela, e ela acreditava na sua voz para isso, já que sempre cantou muitíssimo bem. Era normal ela ver os diversos shows de suas ídolas icônicas e se imaginar no mesmo lugar, isso acontecia na maioria das vezes. Para ela, sonhar era bom. Até para uma garota que morava em Manchester na Inglaterra com o pai e o irmão, ela se permitia acreditar que um dia seu sonho se realizaria.
riu da cara avulsa de , e ela o olhou feio, lhe dando um tapa. Se não fosse seu irmão, ele com certeza seria seu melhor amigo. Os melhores irmãos, principalmente após a morte de sua mãe.
— Um dia eu vou ser tão boa quando a Bey, vamos até fazer um feat juntas, vocês vão ver. — disse, rindo. sentou ao seu lado no sofá.
— Claro que vai, vou ser sua empresária. — disse .
— E eu vou ser seu guitarrista.
sorriu verdadeiramente. Ela amava saber que era apoiada por seus amigos e pela sua família. sempre lhe dizia a quão boa ela era e às vezes ficava chateada por sempre perder para no karaokê. Sempre foram amigas desde muito pequenas, elas se conheceram na escola, assim que se mudou para Manchester, e se tornaram inseparáveis. , como uma pessoa não seletiva, adorava todo mundo, tanto que se tornou muito amiga de e dos outros garotos, fazia graça de tudo, estava sempre de bom humor, era a apassivadora do grupo, fazia de tudo para evitar brigas, queria ver todos unidos por mais impossível que parecesse.
— Dude, você nem sabe tocar guitarra. — e , que estavam na sala, olharam para trás, para a cozinha, onde estava e onde tinha acabado de colocar seus pés. rolou os olhos. — E você — continuou, olhando para . —, fala sério, , melhor que a Beyoncé? É bom sonhar, não é mesmo?
rolou os olhos, era só o que lhe faltava.
e tinham um relacionamento bem complicado. O negócio é que eles não se suportam. sempre a achou muito complexa, paranoica e toda complicada, e, além de ser assim, ela fazia questão de complicar as coisas mais ainda. Mas só achava isso porque a conhecia, até demais.
Já achava um ignorante, impulsivo, difícil de conviver, que se comportava feito uma criança de cinco anos na maioria das vezes.
se mudou para Manchester aos oito anos com a mãe e começar a morar na casa em frente aonde e moravam, o que foi o ponta pé para o início de uma grande amizade com e a Terceira Guerra Mundial com . Eles brigavam por quase tudo e o que deixava tudo mais difícil e insuportável era serem do mesmo grupo de amigos.
— Cala a boca, .
sorriu de novo ao ver o irmão a defendendo. e eram, tipo, sabe aqueles garotos que faziam tudo juntos e que, se não gostassem de garotas, poderiam fazer o casal gay perfeito? Então. , por se considerar filho único, considerava um irmão que ele quase nunca teve e gostava de pensar assim mesmo que viesse de “brinde”. pensava da mesma forma, mas ele amava sua irmã e sabia que às vezes passava dos limites com as provocações.
— Quem foi que te chamou na conversa mesmo, ? — falou . Ela às vezes se via perguntando ao universo porque o não podia odiá-lo? E ter uma daquelas típicas rixas entre garotos por alguma garota ou sei lá. Mas eles tinham que ser melhores amigos.
— Não sei, mas eu também não invoquei o demônio e olha você aqui. — riu, debochado.
— Impressionante como você consegue ser um completo idiota. — retrucou cruzando os braços e voltando sua atenção para a TV para ver Beyoncé performando Sigle Ladies, ela queria um dia poder dançar tão bem.
— Impressionante como você consegue ser tão irritante.
— Desculpa se te ofendi, , mas quem diz o que quer ouve o que não quer.
— Não pedi sua opinião.
Depois dessa, começou a rir.
— Essa foi boa, por que você não cresce?
— A baixinha aqui é você, não eu.
rolou os olhos, ela não se orgulhava muito dos seus 1,64m, mas também não admitia que a colocassem pra baixo — mais do que ela se sentia — por causa disso.
— Olha aqui, ...
— Ah, chega! — interrompeu . — Já cansei de olhar de um lado pro outro como se eu estivesse acompanhando uma partida de tênis, meu pescoço está começando a doer. — começou a rir descontroladamente e acenava com a cabeça concordando. — , acho que o show da Beyonce está bem mais interessante, e, , eu tenho quase certeza que você não veio aqui dentro só pra implicar com a .
deu de costas, realmente o show estava mais interessante.
— Real, deixei o seu namorado esperando lá na churrasqueira, vim só pegar algumas Bud Light. — respondeu , indo até a geladeira.
— Vai se fuder, ! — xingou o amigo, que saiu da cozinha com uma caixa de cerveja, rindo.
, assim como , era um dos melhores amigos de — coisa que nunca foi capaz de entender ou aceitar — e o primeiro não deixava de aproveitar a oportunidade de tirar uma com a cara dela por conta do suposto “namorado” de , que seria .
e encararam , curiosos.
— O que vocês estão olhando?!
— Namorado, é? Quando foi que vocês assumiram? — perguntou .
— É, também quero saber. E nenhum dos dois teve a cara de pau de me contar, vou matar o , ele disse que eu seria a primeira a saber. — murmurou , chateada.
Diferente dos outros, era o seu melhor amigo. O BFF pra todas as horas, chato, retardado, irritante, perturbado e viado do , mas, apesar de tudo, só dela. Sempre teve ciúmes dele, porque sempre achou que nunca poderia encontrar ninguém igual a ele que conseguisse a entender do mesmo jeito. Com toda certeza, era um dos amigos de que ela mais gostava.
— Ah, me poupem, o ano é novo, mas vocês continuam os mesmo e sabem muito bem que somos só amigos. — respondeu revirando os olhos, ela já estava cansada de ter que repetir toda aquela história.
Ela e se conheceram bem antes de todos, e, por esse motivo, só por isso, todos desconfiavam que entre eles sempre rolou algo a mais.
— Quero ver até quando. Mas, mudando de assunto... , você ligou pra ? — perguntou e engoliu em seco ao ouvir o nome da última.
— Achei que você ia ligar, mas mesmo assim eu mandei uma mensagem e ela não respondeu.
— Af, eu ligo. , empresta seu celular? — pediu e a olhou com uma das sobrancelhas arqueadas. O celular dele para ligar para ?
? Sim, a mandona e controladora da . Podia até serem defeitos um tanto quanto ruins, mas talvez fosse o que mais gostasse em uma das suas melhores amigas. chegou depois de e, mesmo sendo uma caloura, conseguiu conquistar a Cuddle High School. Presidia quase todos os clubes e todos os comitês de organização possíveis, era a primeira da turma. até poderia pensar que estaria no comando da coordenação do colégio também, caso isso fosse possível, mas era o braço direito da inspetora. Ela, e acabaram por se tornarem grandes amigas no mesmo momento, mas foi inevitável não ir com a cara de nenhum dos garotos, odiava todos eles. — um em especial, mas, se duvidar, todos os garotos da cidade. O que era uma pena, já que sempre foi muito com a cara dela, até demais. Mas era loucura demais se imaginar ficando com , porque, assim como ela os achava um bando de idiotas, eles a achavam completamente maluca.
— Vai logo, , o meu descarregou.
O garoto jogou o aparelho para a irmã, que o pegou no ar. discou o número de ,que chamou, chamou, mas ela não atendeu.
— E aí? — perguntou . jogou o celular de volta ao irmão.
— Caixa postal.
— Vocês acham que ela vem? — perguntou .
— Não, eu mesma só vim porque foi o que chamou e porque foi na casa dele.
Era dia 2 de janeiro e havia tido a ‘maravilhosa’ ideia de reunir todos os seus amigos mais próximos na sua casa para inaugurar a churrasqueira que seu pai havia comprado e usar a máquina de chocolate quente. Ele e acharam a oportunidade perfeita para reunir todo mundo antes que as aulas recomeçassem. Após duas semanas de férias da escola por conta do Natal e ano novo, eles só queriam relaxar e esquecer por algum tempo que dali dois dias o ano letivo continuaria.
— Vocês são frescas demais. — disse e lhe jogou uma almofada na cara. — Ei!
— Quem não vem? Porque, se for eu, acabei de chegar! — com o tom de voz mais convencido que podia existir, disse, entrando pela porta da sala com várias vestes de casacos de frio, uma touca preta e um cachecol enrolado no pescoço, fechou a porta rapidamente por conta do vento gelado que vinha de fora. rolou os olhos — era só o que lhe faltava — enquanto ele começava a tirar as camadas de casacos como os outros já haviam feito. Aquecedores de ambientes era mesmo uma das melhores coisas já criadas.
— ! — murmurou , animada, dando um abraço no amigo.
— Fala, dude! — o cumprimentou com um high-five. olhou para no sofá.
— . — . — respondeu ela, seca.
e não eram o que poderíamos chamar de melhores amigos, no máximo eles se suportavam. só não chegava a ser mais insuportável que o . basicamente morava sozinho, já que os seus pais passavam a semana toda viajando a trabalho, o que lhe dava liberdade de fazer o que bem entendesse e ter um jeito desleixado de não se importar com nada. No geral, é do tipo de garoto que não presta, mimado e que faz o que quiser, além de ser um total coração de pedra que acha que o amor não leva as pessoas a nada. esperava que nesse ano ele pensasse seriamente em mudar esse tipo de pensamento.
— Mas então, porque vocês falavam tanto de mim? — deu a volta no balcão no qual estava sentada, procurando pelos armários qualquer caixa de fósforo. — Eu sei que a minha presença é indispensável, e, depois de duas semanas longe, vocês deviam estar ansiosos para me ver.
— Não estávamos falando de você, vou te dar uma dica para uma das suas metas de ano novo: ser menos prepotente. — disse . Achava ridícula a forma como achava que o mundo girava ao seu redor. — Era da , aliás, vou ligar pra ela de novo. , me passa seu celular. — jogou o celular para , mas, antes que a última conseguisse pegar, se meteu no meio, pegando o aparelho.
— Ei! — exclamou .
— Eu agradeço o seu conselho, , mas pra que ligar pra ? Tá tudo tão bom sem a maluca descontrolada, deixa ela lá. Acredito que, se não chegou até agora, é porque não quer vir.
— , me dá isso aqui, se você veio, a também tem direito de vir. — disse se levantando do sofá.
— Não.
— Ah, fala sério, me dá logo. — tentou pegar o aparelho das mãos de , mas o garoto desviou.
— Não, , não vou dar. — ele desviou de novo.
— Argh, me dá essa porcaria!
— Ei! Olha como fala do meu celular. — disse e riu.
— Pega, ! — exclamou jogando o celular para o outro lado da cozinha, onde havia aparecido e que, mesmo pego de surpresa, conseguiu pegar o objeto no ar. sorriu com a brincadeira, foi em sua direção.
— Me dá isso, .
— Você quer? Pega, cupcake. — levantou o braço direito com o celular na mão, sabendo que a garota não conseguiria alcançar. deu um pulo em vão. Esbravejou ao vê-lo rir da sua falha tentativa e lhe deu um beliscão. abaixou o braço com o beliscão, mas não foi o suficiente para que conseguisse pegar o celular, ele o jogou de volta para , que ria.
— Nossa, que agressiva.
rolou os olhos.
— Tá, chega de brincar de bobinho com o meu celular.
— Deixa, , a tava gostando. — disse , e riram.
— Vão se foder. — disse a garota, saindo da casa para o jardim fechado que os possuíam, mais precisamente até a churrasqueira, onde encontraria . Não valia mesmo a pena ficar ali servindo de palhaça para o divertimento daqueles três. Ela caminhou olhando para água azulada da enorme piscina aquecida, que eles com certeza usariam muito naquele inverno. A neve caia e cobria os vidros que contornavam o quintal dos , mas não ao ponto de ofuscar a luz do sol. Apesar dos raios solares, não gostaria de pensar no frio que deveria estar lá fora. parecia tranquilo, trocando mensagens com alguém, e o cheiro de pão de alho assando invadiu suas narinas, teve quase certeza que após isso ouviu seu estomago roncar.
— Oi, lindo. — disse sorridente ao amigo.
— Ih, o que você quer.
— Nossa, eu venho aqui na sua casa, te prestigiar com a minha ilustre presença e é assim que você me trata? Que ótimo melhor amigo eu tenho, nem um abraço me deu, isso porque disse que estava com saudades.
riu, dando um abraço na garota.
— Sinto muito, mas você só fala assim comigo quando quer alguma coisa, e não me vá dizer que é mentira. — Ah, zinho, você sabe que é meu Joker.
— E você, minha blackstripe. — riu, ela adorava os apelidos que ela e davam um ao outro, além de ser uma coisa só deles, mas só deles mesmo.
— Eu poderia me apaixonar por você, sabia?
— Sabia, eu sou irresistível.
— E muito presunçoso, mas eu não posso, morreria de ciúmes. — rolou os olhos.
— Como foi lá em Glasgow?
— Tudo ótimo. O natal lá sempre é maravilhoso e a noite da virada nem se fala. Fomos com a minha nana pra rua, , como de costume, arrumou confusão, e eu nunca vi meu pai ser divertir tanto com uns amigos antigos que ele encontrou por lá.
Glasgow ficava a mais ou menos três horas e meia de Manchester, era a cidade natal do pai de , onde sua avó morava. Eles costumavam passar as festas de finais de ano em Manchester, mas naquele ano haviam prometido à nana que passariam aquele recesso com ela, a mulher nunca ficara tão feliz em ter a companhia dos netos.
— Confusão? O que ele fez?
— Ficou com uma garota sem perguntar antes se ela estava solteira. O namorado dela não gostou nem um pouco disso, você tinha que ver o que eu tive que fazer pra livrar ele da briga.
— Ah, , você sabe que não foge de brigas.
— É, mas aquela era inútil, não ia deixar meu irmão apanhar por causa da má conduta da namorada daquele cara. O ficou com ela, mas ele não sabia que ela era comprometida.
— Às vezes eu acho que você é a irmã mais velha. — riu fraco.
— Eu também acho, mas, indo logo ao que interessa, preciso que me empreste o celular pra ligar pra . pelo visto está do lado dos meninos e acho que a não está querendo atender o .
— Claro, .
— É por isso que eu amo você.
pegou o aparelho e discou o número da amiga, que no terceiro toque atendeu.
— Alô. — , FINALMENTE, CADÊ VOCÊ?
— Ah, ! Credo, menina, pra quê esse desespero?
— Por que você não chegou ainda?
— Porque eu não vou.
— O quê? Como assim não vem? Achei que nós tivéssemos a ideia de passar o último fim de semana antes das aulas retornarem juntos.
— Ei, a ideia foi do e eu nunca concordei com isso. Não quero que a presença de estrague o meu fim de semana.
— Ah, não acredito que você vai deixar de vir por causa do idiota do , o tá aqui eu ainda vim.
— Se serve de alguma coisa, eu ia, sim, mas alguns imprevistos me aconteceram.
— Que tipo de imprevistos? — perguntou, desconfiada.
— Por conta da neve, os voos foram cancelados e tive que ir embora de Marselha três dias depois do que estava planejado. Eu ainda estou em Liverpool, em um acampamento com a minha mãe, ela queria ir embora hoje a noite, mas eu sugeri para irmos amanhã de manhã, acho que a tempestade de neve já vai ter melhorado.
— Vocês podiam vir agora de tarde, né. — persistiu .
— Ah, , é que você não vai acreditar.
— No quê?
— Lembra do Elliot? Que eu comecei a conversar um pouco antes de início das férias de natal?
— Sim.
— Então, eu encontrei ele aqui hoje de manhã. Descobri que uma parte da família dele mora aqui, exatamente no mesmo bairro em que a minha tia. Acabamos nos encontrando na praça aqui do bairro.
— E, deixa eu adivinhar, ele te chamou pra uma aventura romântica hoje a noite pelas ruas de Liverpool e é por esse motivo que você pediu a sua mãe pra ir embora amanhã cedo?
— Amo o jeito como você me conhece tão bem. — sorriu satisfeita consigo mesmo ao receber a confirmação de que estava certa.
— Nossa, mas vocês têm que sair logo hoje? Sabe, ainda tem o resto do ano pra vocês se conhecerem melhor.
— Relaxa, , amanhã ainda é domingo. Vamos pegar a no aeroporto e passar o dia juntas, avisa a vaca da , ok? Mando uma mensagem com o horário que vou passar na sua casa, que provavelmente vai ser lá pelas onze, agora eu preciso desligar pra terminar de me arrumar, beijinhos.
— Beijos, sua doida.
encerrou a chamada e entregou o celular para , que a encarava.
— O que foi, ?
— Ela vem? — perguntou.
— Não, não vem. — respondeu , desapontada. Só mesmo para arrumar uma desculpa perfeita e plausível.
— Ah, muito obrigado, forças do além, por atender minhas preces. — e olharam para trás, vendo se ajoelhar na porta da cozinha que dava acesso ao quintal. e os outros, que estavam logo atrás dele, riram. rolou os olhos, ela tinha feito o que pôde, estava com vontade de ir para casa, mas o cheiro daquele pão de alho a fez ficar. Sentou em uma das cadeiras da mesa de madeira que tinha ao lado da churrasqueira. Logo todos se aconchegaram nos lugares. — Nossa, fiquei até mais feliz de saber que não vem.
— Por que ela não vem, ? — perguntou à amiga.
apoiou os braços na mesa.
— Porque achou coisa melhor pra fazer. Elliot.
— Ela achou outro otário pra infernizar a vida?
— Tá com ciúmes, ? — perguntou . Todos olharam para , enquanto o mesmo negava com a cabeça.
— Claro que não, muito longe disso.
— Será que você percebeu que acabou se chamando de otário? — disse , todos riram.
— Fica quieta, .
Com a distração da irmã, pegou uma boia cor de rosa e colocou na sua cabeça.
— Mas o que...
— E aí, vamos ou não entrar nessa piscina? Não é todo dia que o decide nos convidar pra sua piscina aquecida. — disse sorridente, disfarçando ao máximo que ele queria mudar de assunto.
No fim da tarde, decidiu sair da piscina e todos acabaram por sair também. foi para um dos quartos de hóspedes com para que elas pudessem tomar banho e conversar, já que tinha dado a brilhante ideia de pedir pizza e fazer chocolates quentes. Estava louca para ir embora, mas o seu estômago nunca iria lhe perdoar se fosse embora sem comer aquela pizza, e o cabelo cheio de cloro já estava lhe dando agonia.
Saiu do banheiro com os cabelos molhados, estava terminando de se trocar com a toalha ainda na cabeça, vestiu a calça jeans e a blusa de manga branca que tinha trazido na mochila. Do quarto dava para escutar o barulho dos meninos na sala, certamente eles já tinham se arrumado e vestido moletons quentinhos, cabelo com cloro não era problema pra eles.
— Caraca, o que eles tão fazendo lá em baixo?
— Não faço ideia, mas eles beberam e o efeito ainda não deve ter passado.
As duas foram para frente do espelho do banheiro, emprestou um pente à e as duas começaram a pentear os cabelos. A sensação de cabelo limpo e cheiroso era de outro mundo.
— A sorte deles é que amanhã é domingo, se não estariam ferrados com a ressaca.
— disse que o achou uma cerveja norueguesa dos pais deles, e o tá louco pra abrir.
— Mas eles já vão beber de novo?
— Sim, só amanhã, e a gente também vai vir.
— Não vai, não, nós já temos compromisso. — protestou .
— Que compromisso?
— , ela ligou pra , vamos pegar ela no aeroporto.
— Quê?! Achei que só chegava semana que vem.
havia chegado junto a e à Cuddle High School, não muito depois que . E, como já conhecia , não demorou a se enturmar com e , ficando inseparáveis. O grande problema era que nasceu e foi criada até os 9 anos em Washington nos Estados Unidos, quando se mudou para Manchester para morar com a sua tia. Mas, com a morte do seu pai há dois anos, ela havia decidido voltar para Washington para e morar com a mãe. Foi difícil a separação das amigas, já que sempre foi a calma no meio do caos, e uma das pessoas mais inteligentes que já conheceram e ao mesmo tempo engraçada com seu jeito mandão de ser e de não levar desaforo para casa. , e quase enlouqueceram de felicidade ao saberem que a amiga iria finalmente voltar a morar na mesma cidade que as três.
— Também, mas ela salvou o meu domingo.
— Qual é, , ficar com os meninos nem é tão ruim assim.
— Mas conviver com o é, sim, muito ruim, vejo o rosto daquele ser a semana toda na escola, eu mereço um dia de paz.
— Sabe o que eu acho?
— O quê?
— Que vocês podiam até se gostar se não se odiassem tanto. — deu um tapa no braço da amiga, que deixou o pente cair acidentalmente.
— Não fala uma atrocidade dessas.
— Ai! — abaixou para pegar o pente e acabou dando de cara com o pé de e a algo que lhe pertencia. — Ei, você tá com o meu chinelo e eu to aqui descalça?! — e usavam meias, mas ainda assim nenhuma das duas gostavam de andar sem nenhum calçado nos pés.
— E onde é que tá o meu?
— Sei lá, , você não deixou lá fora?
bufou. Largou o pente na pia e os chinelos de no chão, saiu do quarto e desceu a escada, tentou passar pela sala o mais despercebidamente possível e foi até o quintal andando na ponta dos pés, queria sujar o menos possível suas meias azuis. Já devia passar das 18h e o sol já havia se posto, tentou enxergar os chinelos, ainda não havia ligado as luzes do teto de vidro que davam ao jardim a aparência de uma estufa, mas conseguiu os encontrar na borda da piscina aquecida e se lembrou de tê-los deixado lá ao sair furiosa depois que lhe deu um banho de cerveja.
— Achei vocês, danadinhos. — disse a si mesma, segurando o par de chinelos no ar. — Nossa, estão com cheiro de cerveja.
Ela se abaixou para poder limpá-los na piscina.
— Oi, cupcake!
— Que...
escutou a voz de vindo atrás dela, de repente, mas mal deu tempo da garota lhe questionar o que ele queria que SLAFP, caiu com tudo na enorme piscina formando várias ondas, ela só não esperava que a água, ao invés de estar quente como estava à tarde, estivesse gelada mesmo dentro da estufa, certamente havia desligado o aquecedor. deu um pulo para trás pela água jorrada e não se aguentou em começar a rir. submergiu na água, jogando os cabelos para trás batendo os dentes de raiva. Não era possível que tinha que ser a pessoa mais insuportável do mundo inteiro. Lá estava ela, cheia de cloro novamente e morrendo de frio, mas ela com toda certeza não deixaria aquilo barato, de maneira nenhuma.
— Eu não acredito que você fez isso, ! — nem sequer deu o trabalho de responder do tanto que ria. foi até a escadinha para sair da piscina o mais rápido possível. — Imbecil. Eu te odeio. — começou a estapear o menino pelo braço com os chinelos.
— Ei! Para com isso.
— Eu vou te matar, estúpido! — tentava segurar os braços da menina. — A água tá um gelo.
— Ei, que barulho foi esse? — , e chegaram em passos rápidos no quintal.
— Caralho, , você tomou outro banho? — debochou . segurou a irmã pra longe do amigo. Ele percebeu que ela tremia.
— me empurrou. Me larga, .
— Não. — respondeu o irmão. — Dude, você fez isso mesmo?
— Claro que não. — disse .
— Claro que fez! Para de mentir, você me empurrou.
— Tá maluca? Eu mal encostei em você.
— Por que você está gelada desse jeito, ? — perguntou à irmã.
— , você desligou o aquecedor da piscina? — perguntou .
— Desliguei. Achei que ninguém mais fosse entrar — respondeu, percebendo o que estava acontecendo. Pegou uma toalha que estava pendurada em uma das cadeiras e enrolou ao redor de .
— Argh, , vamos embora!
Disse de maneira alterada, ela já tinha passado por poucas e boas suficientes para um dia só e tudo que mais queria era ir para casa nem que fosse encharcada. Não estava nem um pouco a fim de ficar mais um minuto no mesmo lugar que .
A garota ia em direção porta da cozinha, mas era o tipo de cara que não perdia oportunidades, e zoar só mais um pouquinho era uma coisa que ele não ia deixar de fazer. No momento em que ela passou por ele, fez o simples movimento de segurar seu braço direito e cochichar em seu ouvido:
— É hoje que você dorme com os peixes, !
Chapter Two — Drunk
— ! ! Acorda, abre a porta!
Exclamava ao dar leves, porém rápidas, batidas no quarto da irmã.
— Já vai. — respondeu ela, levantando na cama e abrindo a porta. não hesitou em entrar e ir direto para o seu armário. — O que você tá fazendo, ? Sabe que horas são?
— Sim, sei. São quase onze. — respondeu, abrindo as portas do armário de .
— QUASE ONZE? PUTA QUE PARIU. DROGA.
saiu apressadamente em direção ao banheiro, pegando a primeira toalha que viu pela frente jogada no seu quarto. Ela estava atrasada, como sempre. Mas, antes de entrar no banheiro, ainda se perguntava o que estava fazendo ali.
— Pera, o que você tá fazendo vasculhando minhas roupas?
— Porque eu estou procurando as minhas roupas. Você pegou aquela minha blusa branca?
— Que blusa branca?
— Aquela escrito “That girl is a real crowd pleaser”.
— Ah, acho que sim, sei lá, procura ai na parte de cima. Só tente não bagunçar tudo, por favor.
se virou novamente para o armário.
— Você precisa parar de pegar as minhas roupas. — disse, fingindo estar bravo. — Uma hora dessas eu já deveria estar na casa do .
— Mas as suas blusas são bonitas e confortáveis.
— Arruma um namorado e pega as camisas dele, resolvido. — abraçou o irmão pelo pescoço.
— E se eu não achar um com bom gosto?
— Problema seu. — respondeu rindo, se livrando dos braços da irmã.
— Que ótimo irmão eu fui arrumar, viu.
Rolou os olhos, se dirigindo ao banheiro, mas parou assim que ouviu seu celular tocando em cima da cama. Era o toque de . Ela estava ferrada. Antes que pudesse sair do quarto, segurou sua mão.
— Preciso de um favor!!!
— Diz, mas porra, — respondeu, soltando sua mão das unhas afiadas da irmã. —, cuidado com essas unhas. — riu, olhando para as mesmas, já estava na hora de dar uma aparada.
— vai chegar aqui em poucos minutos, preciso que você enrole ela o máximo possível até eu terminar de me arrumar.
— É que eu acho que o já tá me esperando, .
— não vai se importar se você se atrasar um pouco.
— Você acordou meio ranzinza hoje, ou é impressão minha?
— Ah, não consegui dormir direito. ficou a noite toda me passando trotes. — rolou os olhos e fechou a cara, riu. — Tive que bloquear ele.
— Entendi. Mas você quer que eu enrole a ? Ela mal olha na minha cara.
— Não sei, dá um jeito, eu prometo não pegar suas roupas se fizer isso por mim. Agora vai logo. Te amo. — empurrou pelas costas para fora do quarto, não dando a mínima chance do garoto de dizer alguma coisa. Achava engraçado o modo de pedir as coisas de , ela continuava a fazer igualzinho quando era uma criança.
desceu a escada enquanto vestia a camiseta quando sentiu seu celular tocando no bolso esquerdo. Logo atendeu depois de ver o nome de na tela.
— Fala dude.
— Ta onde?
— Em casa, né, já indo pra sua, só esperando a chegar.
— Ah, espera... ?
— É. quer que eu de uma enrolada nela enquanto ela se arruma.
— Elas não vão com a gente, né?
— Não, vão sair, parece.
— Ainda bem, que alívio. De qualquer forma, enrola ela à vontade, Dona Cindy me pediu um favor e vamos atrasar, já avisei pro .
— Ok, me manda uma mensagem quando tiver aí fora.
— Beleza.
guardou o celular no bolso no mesmo instante que a campainha tocou. Afirmou suas desconfianças ao ver do outro lado da porta ao abri-la, plenamente concentrada em seu celular. Ela usava botas e um enorme sobretudo azul marinho sobre as roupas e dois cachecóis enrolados no pescoço. A neve não parecia ter diminuído, mas em compensação a nevasca se fora.
— Hey.
— Oi... . — respondeu meio sem jeito, levantando o rosto do celular.
— Pode entrar.
entrou na casa dos assim que lhe deu passagem. Seus olhos se direcionaram diretamente às escadas que levavam aos quartos, pensando em e em como elas já estavam atrasadas. Enquanto achava estranho o modo como estava tão sem jeito na sua frente, afinal, aquela era a , que nunca se intimidava facilmente, que sempre tinha o controle da situação, que sabia tomar o rumo das coisas, e não ficava com aquela cara de quem não sabia o que fazer.
— Você sabe se a ...
— Ah, ela pediu pra te avisar que já tá descendo, se você quiser, pode esperar na sala.
— Como assim já está descendo? Ela já deveria estar aqui! — resmungou , indo em direção às escadas. tentou impedi-la, não só pelo favor que a irmã lhe pedira, mas também ao ver que a maluca controladora estava de volta.
— Ei, aonde você vai?
— O quê? — perguntou confusa, afinal, desde quando achava que eles tinham aquela intimidade toda? — Vou subir, né.
— Disseram por aí que você era controladora, não achava que estavam certos. — murmurou, cruzando os braços e indo em direção à sala. desceu os dois degraus que havia subido e o seguiu.
— Quem disse isso? Eu não sou controladora!
— Não é o que está parecendo... — se jogou no sofá, cruzando as pernas.
— Você não me conhece, não pode presumir coisas ao meu respeito dessa maneira.
— Então sente aí e me prove o contrário. — bufou, mas acabou fazendo o que o garoto dissera. ficou feliz ao perceber que achara um jeito de enrolar a amiga da irmã.
— Não sou controladora!
— De boas. — riu.
— Do que está rindo?
— Nada. — respondeu, soltando um riso baixo. rolou os olhos, mas prendeu bem os olhos na camisa do garoto pelas palavras em preto que lhe chamaram a atenção.
— Rae Sremmurd? — perguntou , erguendo as sobrancelhas.
— O quê?
— Na sua blusa. — apontou a garota com a cabeça. olhou para a própria blusa.
— Conhece?
— That girl is a real crowd pleaser, small world, all her friends know of me… — cantarolou ela. — É a letra de Black Beatles, uma das minhas preferidas se quer saber.
— Sério mesmo?
— Porque está tão surpreso por eu gostar de Rae?
— Ah, sei lá, você não tem cara de quem gosta de rappers americanos.
— E tenho cara de quem gosta de quê?
— Ah, sei lá... Justin Timberlake?
— Ok, , e qual o problema de gostar do Justin Timberlake?
— Nenhum, é só que... — respondeu ele com as mãos pra cima. — Por que responde todas as minhas perguntas com outra pergunta? — riu, cruzando os braços e levantando o nariz, até que aquilo tudo estava bem engraçado.
— Você realmente não me conhece, .
— ? Vamos? — disse , aparecendo na sala.
“Até que foi bem rápido” Pensou .
— Por que está me olhando desse jeito desde que saímos da sua casa? — perguntou enquanto estacionava na vaga apertada do estacionamento.
— Nada, só estou curiosa. — as duas saíram do carro e caminharam em direção à entrada do aeroporto.
— Sobre o quê, exatamente?
— Sua conversa com o meu irmão.
— O que tem demais?
— Sobre o que vocês conversaram?
— Nada, ué, ele me disse que você já estava descendo e que eu podia esperar na sala. Aliás, achei que tinha ficado bem claro que às onze em ponto era pra você estar me esperando pronta, e não saindo da cama, ! — repreendeu enquanto as duas passavam pelas portas de vidro que davam entrada ao aeroporto. mandava uma mensagem para , perguntando o portão de desembarque em que estaria.
— Ei, eu não estava saindo da cama, na verdade tinha acabado de tomar banho. E dessa vez eu não tive culpa, não consegui dormir por causa do .
— E todas as outras vezes são por causa do ?
— É um mau hábito, sorry.
— Você tem o costume de viver em cima da hora, , lembro que o Austin sempre reclamava de você pra mim sobre isso. — forçou uma risada meio sem jeito. Austin era o seu ex-namorado que era o primo de , não que ela ainda nutrisse qualquer tipo de sentimento ou não tivesse recordações boas, mas certas coisas era melhor deixar no passado. — Vamos, disse que a vai sair no Terminal 1, portão 103.
agradeceu mentalmente a súbita mudança de assunto enquanto acompanhava os passos rápidos de .
Vários passos depois, avistaram de costas e de frente ao portão de desembarque com várias outras pessoas ao redor, ela estava com os braços cruzados e olhava diretamente para a sala onde os passageiros aguardavam para poder pegar sua bagagem.
— ! — chamou . virou de frente para as duas amigas, que se aproximavam.
— Finalmente, hein.
— E a ? — perguntou .
— Vi os passageiros desembarcando, creio eu que ela deve estar esperando para pegar as malas.
Minutos depois, pessoas e mais pessoas rodeadas por malas começaram a sair da sala de desembarque. Umas apressadas, falando ao celular, e outras que abraçavam seus familiares e amigos fortemente. estava na ponta dos pés tentando achar a amiga em meio a tantas cabeças, mas nem sinal de . Droga. Estava com saudade, e louca para fazer o que a maioria das pessoas que chegavam estavam fazendo. Ela mal podia esperar para ver todo seu quarteto reunido novamente, contar todos os acontecimentos recentes, fazer festas do pijama para fofocar, comer e assistir séries. Queria um de seus porto-seguros de volta.
— Ali! — ouviu gritar e apontar para um lado e pode ver a amiga distraída no celular.
— ! — as três gritaram, fazendo prestar atenção e saírem correndo em sua direção.
soltou as malas abrindo os braços para que as três juntassem num único abraço.
— Senti tanta a falta de vocês, não fazem ideia!
— Nós também sentimos. — disse a ajudando com algumas das malas. Elas começaram a andar lado a lado em direção a saída do aeroporto.
— Você vai nos contar as partes obscuras que rolaram por lá. — disse já com as chaves do carro na mão.
— Partes obscuras? , a gente se falava por FaceTime quase todo dia. Foi como se eu nunca tivesse voltado para Washington.
— Nada disso, você vai ter que me dizer como ficou com essas coxas e essa bunda. — riu, dando um tapa na bunda da amiga, que riu também.
— Que nada, estou do mesmo jeito.
— Mas não está mesmo, tá gostosona. — disse . — Olha, se eu soubesse que Washington faz tão bem assim pra gente... — Tá, mais tarde a gente fala dessas partes obscuras. Agora quero saber onde vamos almoçar, eu to morrendo de fome.
— Estou plenamente de acordo. — Concordou , colocando a mala que carregava no porta malas do carro e ajudando Becca com as outras.
47 minutos foi o tempo exato que levaram do aeroporto até o shopping mais próximo. Por conta da neve nas ruas, o trânsito estava lendo, mas foram minutos que mais pareceram segundos quando se juntam quatro melhores amigas, um carro e um rádio que tocava suas músicas preferidas, o tempo passava voando.
— Shopping, ? — disse com certo desânimo assim que estacionou. As quatro saíram do carro e começaram a andar até o elevador que dava acesso ao primeiro piso do shopping.
não achou a melhor das ideias, porque shoppings levavam às lojas para comprar, e isso significava andar, andar muito, e, depois de um voo de 9 horas de duração, tudo que ela queria — depois de comer — era se jogar na cama e dormir por 1 semana.
— Sim, shopping! Não existe lugar mais perfeito. — as outras três se entreolharam e rolaram os olhos. Não tinha nem chance de tentar contrariar. — Além do mais, vamos comer no El Rincon.
foi na frente com para impedir que ela parasse em alguma loja, os casacos de inverno estavam em alta, só olhar era suficiente, agradeceu mentalmente por isso. As quatro passaram pela praça de alimentação até chegar ao restaurante que ficava dentro do shopping. pediu a mesa que tinha reservado e elas se sentaram. O ambiente era agradável, ela sempre escolhia os melhores lugares, as amigas ficaram conversando enquanto os pedidos não chegavam.
— Então, , como tá a sua mãe? — perguntou . Ela queria muito saber, afinal, das quatro ela era quem mais entendia como se sentiu, por também já ter tido uma grande perda. Foi também a mais compreensiva quando teve que voltar para Washington dois anos atrás, era horrível perder alguém, um dos pais então...
— Ela tá bem, quer dizer, melhorou muito. Agora ela sai mais com as amigas, foca no trabalho, e tá até namorando!
— Nossa, muito bom saber, sério, a superação é fundamental. — disse .
— Eu sei mais do que ninguém... — deu um sorriso fraco. segurou a mão da amiga. Elas compartilhavam as mesmas dores.
— É bem difícil no começo, parece que vamos morrer junto, mas a gente acha um jeito de sobreviver, sempre tem um jeito. Me senti um pouco culpada por ir embora desse jeito... senti falta de vocês, de tudo.
— Que nada, não precisava de sentir desse jeito. — falou . — Estamos com você, pra tudo, longe ou perto. Para toda vida.
— Eu vou chorar. — falou , balançando as mãos próximo ao rosto. As garotas riram, às vezes exagerava no drama. — Sério, está ficando emocionante demais.
— Então vamos falar de outra coisa. — disse .
— Como estão os meninos? — perguntou Becca.
— Os mesmos idiotas de sempre se quer saber. — respondeu rolando os olhos, deixando clara a sua falta de interesse.
— Estão bem, um pouco mais retardados desde quando você foi embora, mas essa que é graça. — disse .
— Bom, o continua insuportável, o e o são uns amores, e o , sem comentários. — falou . riu.
— Pelo visto as coisas não mudaram nadinha.
— E por que mudariam? Estão boas do jeito que estão. — murmurou , apoiando os braços na mesa.
— Poderiam mudar pra melhor, se você e o , a e o colaborassem... — proferiu e rolou os olhos.
, alheia à conversa, sentiu seu celular vibrar. Era uma mensagem de seu pai perguntando por , já que o mesmo não atendia o celular. Ela respondeu rapidamente dizendo que ele estava com os meninos e que tentaria entrar em contato com algum deles. Mandou mensagens para , ele não estava online. Decidiu ligar, não atendeu. Tentou até , sem resposta. Sobrando a sua última opção.
— O que foi, ? — perguntou depois de ver a amiga bufar.
— Meu pai quer falar com o , mas ele não atende, nem o , nem o , vou ter que ligar pro .
— E qual o problema? — perguntou . Todas a olharam.
— Você sabe qual o problema, não me agrada, além do que eu tive que bloquear ele hoje cedo, se vier com gracinhas de novo eu não sei o que faço.
procurou o número de na lista de ligações recebidas, e começou a chamar. No quarto toque, atendeu, mas, ao invés de ouvir um simples ‘alô’ que ela esperava, ouviu um barulho insuportável que quase a deixou surda da orelha esquerda, e uma gargalhada depois.
— !
— ?
Respondeu ele, surpreso, não tinha mesmo olhado o visor antes de atender.
— Que barulheira é essa? O tá aí? — O quê?
— O que o quê? Não ouviu o que eu disse?
começou a rir do outro lado da linha e , confusa, não tinha entendido nada.
— Ah, , vocês deviam ter vindo.
— Quantas vezes eu vou ter que te falar que não te dei intimidade pra me chamar de ?! Passa pro .
— ! ! ! HAHAHAHAHA!
— , para de ser idiota!
— Tchau, tchau, princesa.
E desligou.
— E aí, ? O que ele disse? — perguntou .
— Nada com nada, está bêbado, todos devem estar. Parecia um demente falando, um idiota, e ainda me chamou de princesa?! — mandou uma mensagem inventando uma desculpa ao seu pai, que era melhor ele ligar mais tarde e guardou o celular. Os garotos estavam bêbados, não sairia nenhuma coisa boa da boca de qualquer um deles naquele estado, seja lá o que fosse que seu pai queria.
— Own, de princesa? Que fofo! — amassou um guardanapo e o tacou em pelo comentário. riu.
— Que seja, ainda bem que não fomos. Ficar bêbadas, cheirando à bebida, comendo besteiras ao invés desse bufê maravilhoso. — declarou assim que o garçom chegou com os pratos e as bebidas na mesa delas. Elas agradeceram com um sorriso, prontas para atacar a comida. Suas barrigas estavam roncando.
— Falou a que nunca colocou uma gota de álcool na boca.
— Me erra, .
riu baixo, ela gostava daquilo, na verdade amava. As quatro que se conheciam desde de sempre reunidas depois de algum tempo, ela tinha sorte de tê-las por perto, por fazerem parte da sua vida, não trocaria aquela amizade por nada no mundo.
Depois de um longo almoço com direito a sobremesa, havia conseguido convencer a dar algumas voltas pelo shopping, já que a coitada estava exausta da viagem, mas o que queria ela conseguia. esperava que tivessem muitas e muitas tardes assim, onde podiam conversar à vontade, serem elas mesmas, fazer loucuras, se divertirem e terem as mais impossíveis paranoias do que aquele ano poderia trazer, e, pelas ideias de , aquele seria um ano cheio.
Chapter Three — Your lips have the same color as my red guitar
Na segunda-feira de manhã, olhou-se novamente no espelho, analisando sua aparência, e, depois de longos 15 minutos, conseguiu aprovar o que via, mas sentia que faltava alguma coisa. A camiseta da escola não era das mais bonitas, mas era melhor do que muitas de outros colégio por aí, mas ela conseguia dar um jeito combinando com um jeans azul claro — o inverno lhe obrigava a usar calças — e a mochila holográfica dourada combinava com os detalhes e o brasão também dourados estampados na camiseta branca do uniforme. Seus cabelos sempre soltos e despojados do jeito que ela sempre gostou, mas não estava bom o suficiente para lhe deixar totalmente satisfeita. Olhou todas as suas coisas jogadas em cima da penteadeira, uma verdadeira bagunça, e decidiu passar um gloss vermelho. Ela sempre gostou de cores fortes, mas tirou um pouco do excesso com um pedaço de papel higiênico e seus lábios ficaram mais claros. Se olhou no espelho mais uma vez, pronto, agora estava perfeito. A luz do broche dourado preso a sua blusa reluziu e ela sorriu consigo mesma, ele combinava com qualquer coisa que vestia, era uma das razões para nunca tirá-lo, além de ser uma das coisas da mãe que ela guardava. Tratou de sentar na cama para calçar suas botas pretas, que ela achou mais conveniente pela nevasca que estava por vir a usar qualquer outro tênis. Fechou algumas gavetas da penteadeira e saiu do quarto.
desceu as escadas e foi até a cozinha, achou estranho a mesma estar vazia. Afinal, onde estava a apressando para que andasse logo se não iriam se atrasar? Ela não se lembrava de ver chegando em casa ontem à noite. E o insuportável do , que parecia não ter casa também. e revezavam com as caronas para ir pra escola todos os dias. Já que eram vizinhos, era um desperdício de gasolina ir em dois carros sendo que iam para o mesmo lugar, mesmo que isso não fosse problema algum para ambos.
pegou uma xícara e, após enchê-la de café, foi para a sala. Também fora uma surpresa ver Elsie — a namorada de seu pai — sentada no sofá, com a TV ligada no canal de notícias. Era estranho porque a mulher nunca aparecia tão cedo assim. Ela e Elsie não eram as melhores amigas, mas se davam bem. se apoiou no encosto do sofá bege, o oposto ao qual Elsie estava sentada com as pernas cruzadas num X, enquanto tomava um café.
— Oi, Elsie, bom dia. — falou ela, tentando parecer simpática.
— Bom dia, . — respondeu a mulher com um sorriso.
— Nossa, você nunca vem tão cedo assim.
— Ah, seu pai me pediu para acompanhá-lo hoje ao escritório. Estou esperando ele terminar de se arrumar. Já vai à escola?
— Vou sim, aliás, você viu o descer? — perguntou logo depois de dar uns goles na sua bebida. A mulher redirecionou seu olhar para a garota virada de frente para si. Levantou os olhos, dando um sorriso singelo e simpático.
— , eu acho que ele não dormiu em casa noite passada, seu pai disse que não viu ele chegando da casa do — forçou um sorriso, terminando o conteúdo da sua xícara. — Talvez ele tenha ficado na casa do .
deu meia volta, se direcionando a porta da frente.
— Ah, certo, obrigada, Elsie. — disse, deixando a xícara na pia depois de rolar os olhos. Só de pensar de que teria que ir até a casa de , e o pior seria se não estivesse lá.
“Era só o que me faltava.” pensou enquanto vestia dois de seus casacos pendurados na porta e um gorro branco para se proteger do frio.
Do outro lado da rua, segurava o papel meio amassado, onde leu apenas um verso escrito com uma letra meio bagunçada por uma caneta na cor azul.
I'm not usually the type of guy to call twice
And leave a message everytime, that's quite alright
And most days I just dust them off like that
Girls text me, you're the only one I text back
Cause you know where the party's at
Everything you heard is true
Everybody knows I'm hung up on you
— Nossa, ficou muito boa! — disse sobre a música que passara a noite escrevendo assim que ele e chegaram à sua casa na noite passada.
achava incrível como a inspiração não vinha nas melhores horas, afinal ele tinha que dormir, sua cabeça doía pela quantidade de álcool ingerido, e ainda teria aula na manhã seguinte. Mas não havia conseguido pregar o olho enquanto não escrevesse aquilo. era muito ligado à música, tocava guitarra como ninguém e gostava de escrever músicas que certamente ninguém nunca iria ouvir, era só um hobby, nada que ele acreditasse que tinha futuro, mesmo que seus amigos discordassem disso sempre.
— A letra tá pronta, mas a melodia ainda não rolou.
pendurou a toalha no encosto da cadeira giratória, onde estava sua guitarra. Pegou a mochila para colocar o restante de suas coisas que estavam jogadas em algum canto do quarto.
O sol brilhava no topo de suas cabeças. Os raios de sol que iluminavam o quarto naquela manhã vinham do incrível teto de vidro que havia no quarto de . Essa foi a melhor vantagem em ter transformado o porão da sua casa no próprio quarto.
deixou o papel com a letra em cima da mesa, ele também tinha que terminar de se arrumar, e acabou esbarrando na cadeira quando ia em direção ao banheiro.
— Cuidado com a minha Fender! — disse ao ver que a guitarra quase caíra no chão. colocou as mãos para cima, murmurou um “foi mal, cara” e entrou no banheiro.
pegou a guitarra e a pendurou no lugar onde ela deveria ficar: no gancho parafusado na parede, no meio de todos os pôsteres de seus cantores e bandas preferidos. Ele a pendurou com todo o cuidado, afinal, amava mais aquela guitarra do que a si mesmo. Era uma Fender Stratocaster 1949 vermelha, certamente o único sentimento bom que o fazia lembrar do seu pai, já que havia ganhado de presente dele pouco antes de ele ir embora. Não só pelo valor sentimental, mas cuidava da guitarra como se fosse um filho, por estar autografada pelo próprio Steve Jones, guitarrista do Sex Pistols.
— Mas e aí, pra quem é? — perguntou assim que saiu do banheiro.
— Pra quem é o que?
— A música, né. Quem é a sua garota?
— Pra ninguém. E eu não tenho só uma garota. — deu um sorriso cafajeste. rolou os olhos, mas riu.
— Vai ver ela no colégio hoje? — perguntou , não se dando por vencido. estava escondendo alguma coisa e ele iria descobrir.
— , desiste. — deu dois tapinhas no ombro do amigo. — E as únicas pessoas que eu vou ver naquela escola, além de vocês, são as loucas que me odeiam.
— Você o seu mau hábito de não terminar relacionamentos, isso ainda vai te fuder e muito.
não era do tipo romântico, não mesmo. Seu rosto delicado não escondia seu lado amargo e insensível que sempre aparecia, ele próprio rotulava seu coração como não tão agradável assim. Sempre foi metido a pegador que tem fama de conquistador. Excêntrico, egocêntrico, até presunçoso, mas não era uma coisa que admitia nem para si mesmo. Vivia com a cabeça nas nuvens e não sabia falar sério. Gostava da brincadeira, de brincar, de sair, de beber em bares de esquinas com os melhores amigos. Sem falar que não se apaixona.
Como também não sabe lidar com as coisas, não sabe lidar com nada, pois nunca pensa antes de falar ou fazer alguma coisa. Por essa razão, todas as garotas com quem ele se relacionava no final o odiavam, já que simplesmente, depois de alguns encontros casuais e uns amassos, sumia. Sem ligação, sem mensagem, sem nem dar um tchau. Um verdadeiro filho da puta. Mas o que podia fazer? Não queria se prender, tinha pavor de vida monótona, porque lhe desgastava, consumia, e, para ele, explicar isso para todas elas, era complicado demais. Ele preferia pegar o caminho mais fácil, mesmo que tivesse que conviver com o grupo "Odiamos !". Ao qual era a fundadora e líder.
— Ah, dude, eu não consigo, não tenho paciência para essas coisas e também não sei lidar. Imagina se elas começam a chorar? Eu não saberia o que fazer.
— Você poderia pelo menos mandar uma mensagem.
— Poderia, mas isso não faria o ódio diminuir, então é melhor deixar assim mesmo. — soltou uma risada, o olhou sem entender.
— Na música você citou “hung up”, irônico, não parece estar amarrado a ninguém.
— Dude, é só uma música.
— Está escondendo alguma coisa, , eu te conheço.
— E você também.
— O que quer dizer com isso?
— .
— Não sei do que está falando. — virou a cara para que não percebesse que estava mentindo na cara dura. Ele nunca sabia disfarçar suas expressões quando se tratava de , não poderia entrar em assunto pior, afinal o foco era ele e para quem deveria ser aquela música. — Nem se liga que acabou confirmando que está mesmo escondendo alguma coisa.
desviou seu olhar para a janela, atrás de , conseguiu ver Bud deitado embaixo de uma árvore rodeado de neve, pobre coitado, deveria estar morrendo de fome e sede. costumava encher suas tigelas todos os dias antes de dormir, o que não foi o caso de ontem, já que ele e chegaram à sua casa tão bêbados e cansados que foi impossível.
Bud era o Akita de . Tinha apenas 3 anos, mas parecia um filhote de urso de pelos brancos mesclados com dourado de tão grande. Tanto que era proibido de ficar dentro da casa por fazer muita bagunça e derrubar quase tudo que encostava. A sorte era que cachorros daquela raça se davam muito bem com a neve e todo aquele frio. Foi difícil de conseguí-lo, mas, depois de muito tempo insistindo, Cindy finalmente cedeu e decidiu dar um cachorro a ele. Talvez compensasse a falta de presença do pai.
riu, lhe mandou o dedo médio, prestes a responder, quando ouviu o som da campainha tocando.
— é um cara aberto e sem nada a esconder, diferente de certo alguém, que não consegue nem disfarçar quando está completamente apaixonado. E, se me dá licença, eu vou atender a porta e dar comida ao meu cachorro. Tenha um bom dia.
saiu do quarto rindo, quase levando uma travesseirada de . Desceu as escadas e a campanhia tocou de novo.
— Que caralho, já vai.
Abriu a porta sorridente. Exalar simpatia era o que mais gostava de fazer, ele achava essencial passar sempre uma boa primeira impressão, seja na vida ou no primeiro momento do dia. Menos quando se tratava de .
— Que surpresa. — disse num tom irônico. — , você por aqui.
, que estava parada de frente para ele com os braços cruzados, bufou. Às vezes a fazia passar por cada coisa.
— Você gosta de me chamar de lerda, mas pra atender a porta são uns 500 anos.
— Educação mandou lembrança.
— Ah, tá, e cadê a sua moral pra falar de educação?
— Aqui embaixo, se você quiser eu te mostro. — disse apontando para as calças e rindo da cara que fez.
— , seja menos nojento, pelo amor de Deus. — ela olhou para os lados evitando contato direto com os olhos, coisa que odiava. Ele a odiava. Ela era a única pessoa que nunca o olhava nos olhos.
— E sinceramente? Não deve ter nada demais pra ver aí embaixo. Agora sai do meio, quero passar. — balançou a mão de um lado para o outro para que ele saísse, pois estava com um dos braços apoiados no batente, no meio da porta e atrapalhando a passagem.
— Não. — disse negando com a cabeça, estava se divertindo mesmo. — Poxa, , nos vimos anteontem, tudo isso é saudade? — disse ele num tom provocativo. O de sempre. começou a pensar que, com esse “belo” começo, o dia não ia ser bom.
Em sua opinião, era isso que estragava suas manhãs: .
— ? Para você é , não te dei intimidade, e eu não estou aqui por você e sim pelo . — respondeu, levantando os olhos e tentando enxergar a casa por cima dos ombros de à procura de algum sinal de . Por que ele tinha que ser tão alto?
— Caralho, se eu tivesse adivinhado que era você.... — rolou os olhos, mas ele gostava de um diálogo provocante logo de manhã, mesmo que fosse com a garota mais insuportável da terra, do seu ponto de vista.
— Sinto você não ter nascido vidente, , agora sai do meio. — colocou um sorriso cínico nos lábios enquanto tentava empurrá-lo para que pudesse passar.
— Você pode ir embora, eu não sei onde o está, ele não voltou com a gente ontem, e já to atrasado, se importa? — disse , indicando o outro lado da rua, a casa da garota, com o olhar.
— Eu também tô atrasada, sem tempo para tentar adivinhar qual foi a burrada em que o fez que você está cobrindo, seria mais fácil se você me ajudasse e dissesse logo, caramba!
— Desculpa não poder ajudar, , de verdade. Acho que você devia ir procurar na casa de outra pessoa, tá perdendo tempo demais aqui, e me fazendo perder o meu.
Pá!
A porta fechou-se com tudo atrás de , que se virou se direcionando à escada. O cara de pau, sim, tinha batido a porta na cara dela. O que deixou vermelha de raiva.
— ! Abre essa porcaria. Agora! — disse , batendo na porta e tocando a campainha várias vezes.
simplesmente ignorou. Afinal, qual a moral ela tinha de vir até a sua casa e achar que podia entrar sem o consentimento do dono? Na cabeça de , nenhuma. Então ele não era obrigado.
E a campainha começou a ser tocada. E de novo, de novo e de novo. Várias vezes. encontrou nas escadas, descendo.
— Quem era? — perguntou o outro. — Ou melhor, quem ainda é?
— . — disse , dando de ombros. — Eu vou dar comida pro Bud e chamar a Sra. , se não a gente não sai daqui hoje.
— Sua mãe vai levar a gente hoje?
— Vai, o carro dela tá na oficina e ela pediu o meu emprestado.
andou até a porta, que não era só chamada pela campainha repetidas vezes como recebia batidas e socos não tão fortes.
— Abre essa porta, seu imbecil. — mordia os lábios raivosamente. abriu a porta, recebendo um tapa muito forte no braço vindo da garota irritada no batente da porta. Ouviu-se um “ai” saindo da boca dele.
— Nossa, , achei que eu fosse seu melhor amigo.
— Foi mal, sniper, isso era pro . Me dá um abraço.
— Ei, e é assim? Chega me batendo e já quer um abraço? Não sei se posso confiar.
— Deixa de ser idiota. — os dois riram e se abraçaram.
Em sua opinião, era uma das coisas que melhoravam as suas manhãs: .
— Você viu o ? — perguntou ela.
— Não, eu não faço ideia da onde ele esteja, porque não lembro de nada. — riu.
— Chapou legal, então, ontem. — rolou os olhos. — Certo, e cadê o ? — procurou com os olhos por dentro da casa.
— Já tão brigando? — bufou, rolando os olhos. Não que já não estivesse acostumado com as brigas de e , mas o tempo todo chegava a ser degradante e insuportavelmente chato.
— Ele é um grosso, , esse garoto só pode ter algum tipo de problema. Ele bateu a porta na minha cara simplesmente. — disse com desdém, virando a cara para o lado, ignorando a pergunta de , já que a resposta era óbvia.
— Ama me elogiar, impressionante. — passou por entre , ao lado da garota que ainda se encontrava do lado de fora. Ele riu, num tom irônico, dando as costas e indo até o carro de sua mãe, deixando a mochila no banco da frente. deu o dedo enquanto ele estava de costas e riu. A Sra. viu a garota do lado de fora e fez um gesto para que ela entrasse, ela agradeceu mentalmente já que lá fora estava muito frio. voltou para dentro da casa e fechou a porta. rolou os olhos vendo a garota sentada no balcão enquanto sentava ao seu lado.
— E, sim, eu bati a porta e bateria de novo.
— Viu, tô falando, , eu vim aqui educadamente pedir uma informação, um favor, e olha como ele me trata.
— Ah, claro, tão educada que entra na casa dos outros sem ser convidada. — se irritou um pouco, levantando da cadeira e apoiando as duas mãos no balcão, se curvando um pouco, o encarou, mas sem olhar em seus olhos. Filha da puta. Pensou ele.
— Filho, fui eu que a chamei. Não viu a neve lá fora? — disse a Sra. , passando pela cozinha. sorriu.
— Viu? , se informa primeiro antes de falar besteira. E obrigada, Tia Cindy.
— Que nada, , você é sempre bem-vinda aqui, pode entrar quantas vezes quiser. — deu língua a .
— Mãe — disse , chamando a atenção da mulher -, não sabia que a senhora permitia animais dentro de casa.
— ! — repreendeu Cindy com uma cara de desaprovação. — Isso é coisa que se fale? Não é essa a educação que eu te dei.
— Ah, Cindy, qual foi? Você não deixa o Bud entrar, mas deixa a ? Muito injusto.
Cindy o olhou seriamente e logo depois saiu da cozinha, mas sabia o que aquele olhar de “conversamos depois” significava. olhou para satisfeita, pronta para soltar a próxima alfinetada, quando lhe lançou um olhar intimidador.
— Vocês dois, calem a boca e vamos logo, senão vamos nos atrasar.
— Mas eu ainda não achei o , e certamente meu pai já foi trabalhar.
— Você vai com a gente, então. — respondeu .
— O quê??? — protestou .
— Algum problema, tia? — perguntou à mãe de quando a mesma voltou à cozinha com as chaves na mão.
— Nenhum. — respondeu ela.
— Todos. — respondeu . lhe deu língua.
Cindy passou por eles e saiu pela porta, em direção ao carro, seguida por . e iam atrás se ‘cutucando’ o caminho inteiro até o carro. não entendia como a mãe de podia ser tão legal e educada e ter um ogro como filho. Ou era adotado, ou tinha puxado o pai, o qual nunca viu dar as caras, ou ouviu alguém falando sobre. Mesmo achando estranho, ela não se importava em querer perguntar.
entrou no banco do passageiro e e entraram no banco de trás. Depois de um longo caminho até a escola, Cindy os deixou no estacionamento da Cuddle High School, que, de acordo com , era o mar de atletas, futuras mães, líderes de torcida anoréxicas, respiradores de literatura e tudo que esteja entre isso, ou seja, eles.
saiu do carro num pulo e foi correndo em direção à conversar com ela.
— Bom dia! — disse sorridente assim que viu a amiga.
— Dia.
— Que animação, , o que aconteceu?
— Nada, . Eu só estou destinada a passar estresse logo de manhã, pelo menos por todo período que estudar nessa escola.
— O que o fez agora? — riu.
— O de sempre, né, foi um idiota.
— Por que o fato de ele ser sempre um idiota te incomoda tanto? O é assim mesmo, mas ele tem, sim, um lado bom.
— Nenhum, ele pode continuar sendo um completo imbecil pra sempre, mas que seja longe de mim, por favor! — riu.
— Um pouco difícil, né, vocês moram a 3 metros de distância. — rolou os olhos.
— Vamos mudar de assunto. e , cadê?
— Quando cheguei, a já estava aqui, mas ela foi na coordenação entregar alguns documentos que tavam faltando, e não vi a ainda, mas certamente ela deve estar na quadra com as líderes.
e foram andando lado a lado até a quadra de esportes, onde, no primeiro período da manhã, já estava acontecendo uma reunião das lideres de torcida. Equipe da qual só faziam parte e , antes da última se mudar.
— Meninas! — acenou do outro lado para e . Ela usava seu casaco do uniforme de animadora e estava junto de outras garotas da torcida. As duas foram caminhando em sua direção.
— Oi!! — respondeu .
— Bom dia. — disse .
— Até que enfim, achei iam se atrasar ou nem iam vir hoje. — falou , saindo de dentro da quadra e se aproximando mais da duas amigas.
— Ah, , você que chega cedo demais.
— Ser a mulher crescida no campus me deixou em modo pânico multitarefa, . Ainda mais agora que as festas de final de ano passaram e eu posso dar continuidade ao que eu comecei no início do ano letivo. Eu tenho que começar a montar os treinos dessa equipe pros jogos da temporada de basquete enquanto a do futebol não começa, organizar os eventos escolares como líder da turma, sem falar das gincanas, da semana espiritual, manter a média das minhas notas lá em cima nesses dois últimos semestres que faltam, sem falar das sociais e eventos solidários que vocês sabem que eu participo todo ano, e esse ano ainda eu decidi dar uma força pra minha mãe em uma das lojas. O excesso de informação pode virar excesso de peso, eu preciso começar o mais cedo possível.
— Já eu prefiro dormir o máximo possível mesmo. — disse e Lari riu.
— Mas e então, , quais são as novas?
— Novas? Não tem novas, .
— O quê? está sem fofoca pra contar???
fez um sinal para as garotas da quadra darem uma pausa enquanto ela conversava com as amigas, caminhavam lado a lado devagar.
— Não, não tem novas. — respondeu , enrolando uma mecha de seu cabelo com o dedo. Ela subiu seu olhar para fora da quadra, mais precisamente para o portão por onde os outros alunos que chegavam, entravam. Viu o irmão de , , passar. Logo em seguida, atrás dele, viu Elliot mexendo nas alças da mochila e logo em seguida passando as mãos no cabelo sedutoramente. No mesmo momento, seu coração pareceu que ia sair pela boca com a rápida aceleração, aquele garoto com certeza estava tirando seus pés do chão. O que era muita surpresa, já que nunca foi do tipo cabeça nas nuvens que espera pelo príncipe encantado e que vivia num conto de fadas, era difícil ela se apaixonar facilmente. Ela continuou a observar o rapaz que entrava na escola, se lembrando do encontro que tiveram em Liverpool há dois dias. Perfeito. — Pelo menos por enquanto....
e não puderam evitar se entreolhar depois de perceberem para onde olhava.
— Aaah, o Elliot já chegou. — disse , animada. Ela estava curiosa para conhecer o garoto. e conseguiram avistá-lo antes que ele entrasse na escola.
— E esses olharem pro meu homem? Hunf.
— Relaxa, . — passou o braço pelos ombros da amiga. — A já tem o homem dela. — riu fraco ao ver chegando. riu também e rolou os olhos.
— Af, parem, somos só amigos.
— Sei. Elliot quer que eu vá numa festa com ele no sábado.
— Ótimo, você vai né?
— Não sei, , estou pensando.
— Pensando? Por favor, né, , o cara é o maior gato, você mesma disse que no encontro que vocês tiveram que ele foi super educado, engraçado, generoso... E todas aquelas coisas que a gente teve que ouvir por horas no almoço de ontem, não venha me dizer que ainda está pensando. — riu do comentário de , afinal, era verdade.
— Calma, é claro que eu vou, só não quis ser tão direta assim.
— Aham. Mas e essa festa, de quem é? — perguntou .
— É da fraternidade da faculdade que o irmão dele estuda. — respondeu . — Vocês vão, né? Elliot disse que eu podia chamar quem eu quisesse.
concordou. olhou para .
— Tá, mas vamos chamar os garotos também, né?
— Ah, , pelo amor de Deus, com uma festa infestada de universitários gostosos você tá mesmo preocupada com aquelas pestes?
— Qual o problema, os meninos são legais, nas festas a gente se diverte muito, e eu posso ficar com eles e dar atenção pros universitários gostosos ao mesmo tempo.
— “Legais”. Fale por si só. — resmungou .
— Eu gosto, na verdade amo quando o tá nas festas comigo, além de sempre ter alguém que me leve pra casa quando o não vai.
— Você sempre tem quem te leve pra casa caso o não esteja e essa pessoa se chama . — olhou feio para .
— Estou dizendo uma pessoa agradável e de boa conduta, não aquele arrogante do .
— E a ? Precisamos falar com ela, não vi ela ainda. — perguntou .
— Ela já chegou, mas acho que agora só vamos encontrar com ela no intervalo. — respondeu ouvindo o sinal tocar, que indicava que todos deveriam ir para suas respectivas salas, com exceção daqueles que tivessem treino, como era o caso de . — Falem com ela, eu falo com os meninos.
— Então nos vemos no almoço? — disse , logo em seguida voltando para dentro da quadra. e concordaram e começaram a andar cada uma para sua respectiva aula.
Atrasado. Despreocupado. Intolerante. Mimado. Sem limites. Mal-educado. Ousado. Com os cabelos totalmente bagunçados. usava uma jaqueta de couro por cima de um suéter e coturnos pretos, uma calça jeans azul escura, e óculos escuros, que eram roupas que iam contra o código de vestimenta da escola. Mas foda-se, era o que pensava todo o tempo. Estando atrasado umas três horas, enquanto os alunos já estavam saindo da terceira aula, o dia ainda estava apenas começando para ele. E, em sua opinião, começou muito bem ao ter parado a sua caminhada super-rápida pelo corredor — fugindo da inspetora Hide —, para olhar a garota de cabelos curtos e lisos que pegava suas coisas no armário e tinha lhe chamado a atenção. Muita atenção. Ele a observava de longe, abaixou os óculos para enxergar um pouco melhor, vendo por cima deles. Decidiu caminhar até ela antes que ela decidisse ir embora.
Apaixonado? Não. Amor à primeira vista? Mas é claro que não, o amor nem existia mesmo. não sentia paixão pelas pessoas, ele só sentia desejo. Para ele era só isso que as pessoas deveriam sentir umas pelas outras, evitava dores, sofrimento e possíveis problemas, e todo mundo saía ganhando. Ele pelo menos sempre pensou assim, o problema é que ele não se importava se as garotas com quem ele ficava também pensavam da mesma forma.
Mas, por azar, quando já estava na metade do caminho, grandes braços cruzados intrometeram-se em seu caminho, arrancando os óculos de seu rosto sem pudor algum. Era Senhorita Hide, monitora do corredor e Orientadora Pedagógica, que seguia as regras ao pé da letra e gostava de dar notificações quando não tinha nada melhor para fazer.
— Atrasado de novo, Sr. ? — disse a mulher, pronta para pegar a caneta. — Um ano novo e o senhor não toma mesmo jeito. — Ela balançou a cabeça negativamente enquanto anotava no papel de detenção. se mexia de um lado para o outro, tentando enxergar a garota que estava por trás da mulher, mas Srta. Hide era tão grande, que parecia impossível.
— Bom dia, Josie, como você tá linda hoje, viu. — deu o melhor sorriso cara de pau que conseguiu. A mulher riu sarcasticamente. Ela não era uma mulher ruim, pelo contrário, era muito legal e divertida com os alunos, seu problema mesmo era com . — Que saudades que eu estava de ti, o que andou fazendo no final de semana? ‘Tá mais magra...
— Humf, obrigada — disse ela, irônica. —, mas pare com as bajulações.
— Por quê? Estavam funcionando? Se quer saber, o rosa do seu cachecol realça muito o tom da sua pele.
— No dia em que suas bajulações funcionarem comigo — ela arrancou o pedaço de papel da caderneta —, você vai parar de receber advertências. — entregou o papel ao garoto. — Sala 212, 5 horas, tente não se atrasar dessa vez. — saiu bagunçando o cabelo do garoto.
jogou o papel no lixo, olhou para o lugar onde estava tentando olhar, mas a garota não estava mais lá. Chutou a lata de lixo e saiu andando. Realmente odiava aquele lugar.
Impaciente, continuou andando um pouco mais rápido, e esbarrou justamente em quem precisava para se divertir um pouco. Isso sempre deixava suas manhãs piores, mas naquele dia era uma exceção.
— — a pegou pela cintura com toda força que tinha, tirando a garota do chão. nem teve tempo de expressar alguma reação ou xingar o garoto.
— ! — ela deu um grito. Quase tinha deixado cair os papéis que segurava. Morreria se aqueles papéis saíssem de ordem ou se misturassem.
— JUSTAMENTE QUEM EU ESTAVA PROCURANDO, QUE SAUDADE DE VOCÊ!! — ria enquanto falava da euforia da garota.
— ME COLOCA NO CHÃO, IDIOTA. — se debatia e dava tapas nas costas dele.
— Calma, calma. — ele a colocou no chão, ainda recebendo vários tapas e uns dois chutes. — Sua agressiva.
— Cala a boca, seu imbecil. — rolou os olhos.
— Você não foi no sábado pra casa do , eu quase nem acreditei, agradeci muito.
— Eu tinha coisa melhor pra fazer, lamento. Aliás, sim, foi ótimo, um dia inteiro sem ter que ver essa sua cara.
— Ah, você achou outro carinha pra infernizar a vida? Ei, mas me diz, qual simpatia você faz pros caras não correrem de você? Porque eu sinceramente não entendo como eles aguentam.
— Ah, , me poupe. — revirou os olhos. — Puta que pariu, mas me fala ai por que você se mete tanto no meu caminho? Sério, hoje eu adoraria não fazer contato contigo, vamos nos evitar? É um novo ano e eu estou querendo que coisas boas e positivas prosperem ao meu redor, mas vai ser difícil se eu continuar a ter qualquer tipo de contato com você.
— Sabe de uma coisa, você está absolutamente certa. — tinha mesmo levado a sério o que havia dito. Ele poderia estar com tantas outras garotas mais interessantes e gostosas no tempo que ficava brigando com .
— Ótimo, em alguma coisa concordamos. — disse a garota, arrumando sua roupa de animadora. assentiu colocando a mão na cabeça como se fosse algum soldado. — Agora me dá licença.
— Pera, antes você vai ter que me ajudar.
— Não. — interrompeu . Ela nunca deixava o garoto terminar de falar. — Se é que esse seu cargo de vice presidenta serve pra alguma coisa. — continuou , ignorando-a. — Dá um jeito naquele dragão que vive infernizando o corredor e a minha vida nessa escola. — riu com a mão na barriga.
— Nem em sonho — continuou rindo —, se você está falando da Sra. Hide, ela é a melhor, ainda mais se inferniza a tua vida. — Acabou o trato de te deixar em paz e te evitar, sua vida vai virar um verdadeiro inferno, .
— Não se a sua virar primeiro, . — deu um sorriso cínico, dando dois tapinhas no ombro de . — Tenho que ir pra aula, fica na paz.
— Aproveita e dá um jeito no dragão. — gritou o garoto para a garota, que nem sequer pra trás olhou.
foi até o refeitório, era a hora do almoço. Procurou com os olhos onde os meninos se encontravam, recebendo um murro no braço de , logo depois de se sentar ao seu lado.
— , seu puto. — disse .
— Ei, amigo, você pode me ceder um cigarro? — disse a um dos três garotos. tirou um maço e entregou um ao garoto. Era proibido fumar no colégio, mas ele não se importava. sempre tinha cigarros, mas nunca fumava nenhum deles, quase todos iam parar nos pulmões de .
— Vai mesmo fumar aqui? — perguntou .
— Vou, ué, já recebi advertência mesmo, então foda-se, não to perdendo nada.
— Dude, você é louco. — riu. acendeu o isqueiro.
— Achei que a sua cota de cigarettes não ia acabar nunca. — falou , dando um tapa nas costas do garoto.
— Eu tô duro, aconteceu uma coisa — disse ele, como se fosse a pior coisa que tinha lhe acontecido. Os garotos riram. era muito dramático às vezes. —, uma catástrofe. Eu tô condenado a viver na rua, podem se preparar pra me ver frequentemente na casa de vocês.
— Mais do que você vive?! — disse , fazendo-os rir, com exceção de .
— Diz logo o que aconteceu, dude, e para com esse drama de bicha — falou . — Você tá pior que a .
— Igual a . — corrigiu. tentou ter uma expressão normalizada, afinal sempre teve uma quedinha pela garota, já fazia uns dois anos. Seria uma pena se tivesse percebido. Atento aos detalhes.
— Parem de me comparar com a maluca descontrolada, por favor.
— Dude, é a convivência. — o empurrou de leve pelo braço.
— Você tem que parar de correr atrás dela. — olhou para , vendo se ele se manifestava ou fazia alguma coisa do tipo. Otário.
— Cara, não perco meu tempo correndo atrás dela não, é a ironia do destino nós termos que conviver. — bufou. Odiava piadinhas envolvendo ele e . — Mas agora, vocês querem ou não saber o que aconteceu?
— Claro. — respondeu por todos. É, ele não havia se manifestado, o que foi uma escolha bem inteligente, evitando as zoações dos caras, que não parariam nunca.
— Meus pais disseram que não vão me dar nenhum centavo até que eu comece a “agir com mais responsabilidade e ter mais consciência dos meus atos — tentou fazer uma voz afetada, imitando a voz da mãe —, você é um garoto imaturo que não tem certeza do que faz, e está estragando o seu futuro”. — todos riram. — Até lá, eu to duro, então não inventem de sair para qualquer lugar. — conversava tanto que já tinha até se esquecido de seus cigarros. Fumar era uma das únicas coisas que o ajudava.
— Então você vai ficar duro para sempre — disse —, porque esse dia nunca vai chegar.
— Eu sei, a vida é uma grande... — abriu bem os olhos e deu aquele típico sorriso malicioso, aquele bendito sorriso, lindo, safado e gostoso, ao ver a garota do corredor na fila do almoço, de costas. — MARAVILHA! — gritou ele. Os meninos se assustaram, já estavam acostumados com a outra frase “A vida é uma grande merda”. Como poderia ser uma maravilha? sempre costumava dizer que estava fodido na vida, e isso nunca era uma coisa boa. — Aquela garota, sinônimo de as coisas já melhoraram. — os meninos acompanharam o olhar de para a garota da fila. — Quem é aquela?
— Não sei, não dá para ver o rosto. — disse .
— Quem? A ? — disse .
— Que ? — perguntou , confuso, torcendo para que não fosse quem ele estava imaginando.
— A , dude, você não lembra dela? — respondeu . fez uma cara confusa.
— Ah, a , ela era minha parceira no laboratório de química até se mudar. — disse .
— Ah, também lembro dela. — disse .
— Pera, , ?
— É. — disse e e assentiram, confirmando também.
— ?
— Sim, dude. — respondeu mais uma vez, um pouco sem paciência.
— ... — disse antes que pudesse interrompê-lo, afinal, para ele era meio difícil de acreditar, achava que tinha se livrado, ledo engano o dele.
— Eu juro que seu eu ouvir mais uma vez... — disse amassando uma latinha de refrigerante. riu da cara de , ainda meio chocado com uma cara maliciosa.
— Achei que ela tivesse se mudado para o oeste dos Estados Unidos.
— E ela tinha, lembro de comentarem que ela ia voltar esse ano, acho que foi a .
— O que tem eu? — disse , sentando-se entre e e olhando para .
— não voltou hoje? — respondeu o rapaz. negou com a cabeça, roubando um pedaço do lanche de .
— Minha comida. — disse o último, chateado.
— Perdeu. — disse, olhando para . — Na verdade, ela voltou ontem, fomos buscá-la no aeroporto, por isso não fui ontem pra sua casa. — falou com a boca cheia de comida, voltando a olhar para . lhe deu um tapa de leve no ombro.
— Deixa de ser porca, . — disse , brincando.
— Cala a boca, , você vive soltando arrotos na cara da . — riu com a lembrança — Mas por que a pergunta? — falou , terminando de comer o resto do hambúrguer e recebendo um olhar feio de .
— Nada. — respondeu — Só o aqui, acho que ele se apaixonou. — todos riram.
— Ei, ei, ei — manifestou-se , na tentativa de fazê-los pararem de rir. — Não é nada disso, eu só achei ela... diferente.
— E você queria o quê? Ela voltou pra Washington quando era dois anos mais nova, queria que continuasse do mesmo jeito? Eu estou feliz que ela voltou.
— Pelo visto não é só você, . — disse , olhando para , fazendo todos rirem.
— Calem a boca. E, só pra ficar bem claro, eu não me apaixono.
— Ok, Sr. coração de pedra. — disse com uma voz afetada.
— Falando em ontem, eu não lembro de nada do que aconteceu. — disse . olhou rapidamente para o amigo contendo um sorriso, que imaginaria como ficaria sem saber onde enterrar a cara se contasse o que tinha visto.
— Ah, mas eu lembro. — falou atraindo a atenção de todos. — Lembro que vocês não me esperaram e beberam tudo sozinhos. Quando eu cheguei, não tinha mais nada, só um bando de bêbados desmaiados — ele olhou para . —, ou quase.
— O que foi? — perguntou .
— Nada. — respondeu , voltando a atenção para o seu cigarro, o qual ele nem tinha acendido ainda. olhou de um para outro, mas preferiu ignorar e mudar o assunto.
— Ok, mas falando em bebida e festa, tem uma agora no sábado, vocês querem ir?
— De quem é a festa? — perguntou .
— De uma fraternidade da Metropolitan.
— Metropolitan? Universitárias gostosas e breja de graça. Tô dentro! — exclamou , animado.
— Eu também. — e trocaram um sorriso cúmplice.
— Conte com a minha presença.
— A minha também. — assentiu, rolando os olhos com a troca de olhares cúmplices e os sorrisos maliciosos entre os quatro garotos.
— O que você acha desse?
Disse à , lhe mostrando fotos de vestidos pelo celular enquanto elas iam ao refeitório de encontro com . O da vez era um preto de alcinhas que marcava a cintura. fez uma careta.
— Muito comprido.
— E esse? — passou o dedo pela tela, mostrando o próximo vestido. Um vermelho rendado.
— Muito curto. — rolou os olhos.
— Tá, e esse? — lhe mostrou um amarelo de mangas compridas e um decote em “U”.
— Amarelo? Nem pensar.
— , estão acabando minhas opções, desse jeito vou acabar indo pelada pra essa festa.
— Ótimo, assim o Elliot tem menos trabalho. — riu e lhe deu um tapa. A última guardou o celular ao passarem pela porta do refeitório.
— Ah, vai dizer que não gostou da ideia.
— Até gostei, mas ele não ia gostar muito. — riu. — Se você for de vestido, vai ter que ficar o tempo todo dentro da casa, você sabe disso, não sabe?
— Claro, , não acho que alguém vá querer ficar no jardim, normalmente o pessoal só fica do lado de fora no verão, quando já estão bêbados o suficiente e decidem pular na piscina. E eu imagino que a casa deve ser grande.
— É, você tem razão, mas eu ainda estou pensando seriamente em ir de calça. — viu se aproximando.
— Finalmente vocês apareceram. — disse .
— É que a ficou enrolando lá com a professora de literatura e não saia logo. — disse e abraçou a amiga.
— Ah, desculpa, mas ela estava falando do meu romance preferido, eu tive que ficar pra debater.
— Que seja, vamos pegar nossos lanches. — disse e elas entraram na fila. — Do que vocês estavam falando?
— estava me pedindo ajuda pra escolher uma roupa pra festa no sábado, já que ela e o Elliot vão juntos.
— Festa? Que festa?
— Íamos falar disso com você justamente agora. — respondeu . — A fraternidade da universidade do irmão do Elliot vai dar uma festa no sábado, ele me chamou e eu estou chamando vocês.
— Festa de fraternidade, tô super dentro.
— Ótimo.
— A nossa está de volta, . — deu um sorriso cheio de malícia.
— Eu mal espero, mas, assuntos à parte, queria te perguntar uma coisa, .
— Diga.
— É sobre as aulas de dança, sabe, do clube? Já que você é a que mais participava, ainda dá para entrar?
— Ah, nossa, você nem imagina a confusão que rolou no trimestre passado entre os professores e os alunos de arte cênicas, mas, resumindo, a diretora decidiu juntar os grupos de dança, teatro e canto com a Norma até que ele contratasse outros professores para separar os grupos. Mas a situação não está lá das melhores, já que ano passado não fez muito “sucesso’, se eu não gostasse tanto, já teria até saído.
— Mas não vai mesmo, vai ficar porque eu quero entrar, estou motivada esse ano.
— Você podia pegar essa motivação e voltar para a torcida também, . — disse .
— Sorry, amiga, mas não mesmo, acho que eu não vou ter tempo ‘pra fazer tudo e eu acho que perdi o jeito pra torcer.
— Ah, eu me sinto muito solitária, se querem saber.
— Ah tá. — disse . — Com tanta gente ao seu redor e te bajulando pra conseguir uma posição boa na pirâmide, eu duvido. — tentou disfarçar, mas todas as três sabiam que aquilo era verdade.
— Deixa de drama e vamos pegar nossos lanches, estou com fome. — puxou as duas até a cantina.
Depois que o sinal tocou, indicando o fim do almoço, foi procurar as meninas e os garotos foram para suas respectivas salas. tinha inglês e , e tinham química, mas se dirigiu ao corredor ao lado, alegando que tinha achado injusto a detenção recebida e que iria depois pra sala, porém e sabiam que aquilo era só uma desculpa pra burlar aula. Deram de ombros e seguiram pelo corredor.
— .
— O que foi, dude? — perguntou .
— Onde você estava hoje de manhã? — riu sem olhar para o amigo.
— Fui encontrar uma amiga. Por quê?
— Sua irmã bateu lá em casa atrás de você.
— Eu ainda duvidei se a iria mesmo lá.
— Tem vezes que eu acho que você faz de propósito, seu merda. — empurrou pra dentro da sala, enquanto o mesmo ria.
Após o intervalo, foi até o laboratório de química para sua última aula do dia, que tinha junto com , , e, por coincidência do destino, . geralmente adorava essa aula, porque fazia dupla com uma garota chamada Lena, que era ótima em química, e várias outras coisas também... Além de ser linda, deixava seu dia sempre melhor. Ele se sentou na cadeira onde sempre ficava à espera de sua parceira e do chato do Sr. Collins. em particular não ousava falar com Lena, que sempre a olhou de um jeito desconfiado, depois que , sem querer, atirou uma das partes de um sapo na cara dela, na aula de dissecação de coisas mortas, arrancando gargalhadas da turma, Lena saiu da sala enjoada por tamanho nojo. estranhava os olhos cheios de rancor quando Lena a olhava, mas ela tinha que admitir que foi muito engraçado, principalmente, o grito da menina ao sair da sala.
era ótima em química e adorava não só a aula, mas como também o professor e sua dupla de laboratório. Ele não era um jogador de futebol ou basquete, mas sim o mais engraçado artista que já vira, além de lindo. Sim, adorava fazer dupla com ele, apesar de o garoto ter namorada, caso contrário já tinha pego o doce Jeremy faz muito tempo. Sentou na cadeira com a cabeça deitada na mesa, ela sempre tinha sono nas últimas aulas do dia. , antes de garota ir embora, fazia dupla com . Eles até que se davam bem, então decidiu perguntar se as coisas poderiam continuar como eram, afinal seu parceiro dos últimos dois anos era horrível, não que fosse daquele tipo que deixava todo o trabalho para outra pessoa, mas ter alguém que conseguisse acompanhar a matéria com mais facilidade era gratificante.
— Ei, . — disse , chamando sua atenção.
— , e aí?
— Tudo tranquilo. — disse ele, sorrindo. — Fiquei feliz em saber que a minha parceira voltou. — retribuiu o sorriso.
— Hm, tem certeza que ainda me quer como dupla? Um membro da sua família me disse que você não hesitou em me trocar rapidinho quando eu saí. — riu.
— A mente, sério, você não pode acreditar em tudo que essa garota fala.
— Ei! — protestou ainda com a cabeça abaixada. Eles riram.
— Certo, certo, deixa só eu... — olhou ao redor da mesa procurando algo. — Cadê a droga do meu óculos? — disse , olhando para os lados, embaixo da mesa, procurando os benditos que resolveram sumir. Ela sabia que só podia ser algum tipo de brincadeirinha. — , você os viu?
— Pra quê, ? Vai ser só... — bocejou. — Explicação. — Quase não conseguiu falar com a cabeça deitada na mesa quase babando a ponto de dormir.
— Pelo que eu me lembro, o Collins adora aplicar esses experimentos malucos logo no primeiro dia, eu não duvido que ele vá fazer isso hoje — arregalou os olhos, se arrumando na carteira. e riram. Rolou os olhos imediatamente, já estava ficando impaciente com a demora de Jeremy e também não queria fazer os testes, ainda mais sozinha.
— Esqueceu, , que a é meio lenta nas últimas aulas? — disse . deu o dedo do meio ao irmão e riu.
— Só nas últimas aulas? — disse .
— Ai, , vai se foder. — resmungou a garota.
voltou a revirar suas coisas à procura dos óculos.
— Procurando alguma coisa? — disse , parando em frente à garota, de costas, vasculhando na sua bolsa. se virou, vendo seus óculos girando nos dedos do garoto. Após uma tentativa frustrada de tentar sair da escola sem ser notado — Hide o encontrou no corredor e o acompanhou até a sala de aula —, não achou má ideia ficar para a última aula depois de saber que ele e teriam aquela aula juntos.
— Sim. — olhou profundamente nos olhos de , com aquele velho ar de “já nos conhecemos, mas eu preferia que não fosse desse jeito”. não gostou daquela troca de olhares e fechou a cara. foi para o lado de , observando a cena e rindo. — Obrigada.
— Por nada, linda. — largou os óculos da garota em cima da mesa dela. cruzou os braços com um sorriso de canto meio debochado e, antes que seguisse para seu lugar, ela manifestou-se. Rolou os olhos e ficou sem entender.
— Nossa, , você já foi melhor nisso. — cochichou ela para que só ele conseguisse escutar. , e ficaram confusos por não terem conseguido escutar direito
— Como? — ele se se encostou à mesa ao lado dela, fingindo-se de desentendido. apenas observava, sentado em cima da mesa, ao lado de .
— Você me entendeu. — outro cochicho. — Pensa que eu não vi você pegando meus óculos em cima da minha mesa quando eu tava entrando na sala? — disse agora em um tom mais alto, que os outros puderam escutar. E por essa não esperava. arqueou as sobrancelhas, esperando alguma resposta.
— Se sabia, por que não pegou de volta?
— Queria ver até onde você ia, lindo. E também por que eu faria se você já teve o trabalho de vir me devolver? — ela sorriu sem mostrar os dentes e deu umas 3 piscadelas. e debochavam de longe. de ódio, amou a situação, rindo por dentro.
— E você já foi mais simpática. — foi a vez de cochichar, e logo em seguida o garoto saiu andando de costas, olhando a garota. Quando passou por e , recebeu dois tapas, um em cada braço.
— Se tivesse ficado lá fora, não tinha levado essa. — disse .
— Vão se foder, vocês dois. — virou-se e sentou na primeira cadeira da fileira. O professor entrou na sala, dando bom dia para a classe, e todos foram aos seus devidos lugares. saiu de cima da mesa, sentando-se ao lado de . desafundou a cabeça dos braços, olhando para frente.
— Primeiramente, bom dia a todos, espero que tenham voltado das férias ansiosos para dar continuidade ao nosso ano letivo — pode-se ouvir um resmungo vindo dos alunos e alguns “não!” logo em seguida. — nimo, pessoal! Vou entregar uma lista de substâncias que eu quero que vocês testem e me entreguem o resultado, como aula prática mesmo. — todos assentiram, afinal aquilo não era novidade para ninguém, já que Sr. Collins fazia isso sempre no começo de cada trimestre. O professor subiu o olhar, dos papéis para a turma, percebendo que havia dois alunos sozinhos. — , , por que estão sozinhos? — e tiveram uma rápida troca de olhares, pensando o pior. Sr. Collins lembrara das suas respectivas duplas.
— Acho que a Lena faltou. — comentou .
— O Jeremy também.
— Bom, então suponho que vocês possam fazer juntos?
— Ah, não! — disse .
— Não mesmo. — não entendeu como conseguiu se levantar tão rápido e bater na mesa em advertência. , e riram baixinho.
— Bom, a nota é complementar e não individual, metade de cada. A não ser que não se incomodem com uma nota reduzida, podem fazer sozinhos. — Sr. Collins deu as costas, organizando as folhas na sua mesa.
olhou para trás para , que o ignorava. Ele não queria mesmo pegar recuperação naquela matéria.
, de má vontade, teve que se sentar ao lado de . E ela, de má vontade, aceitou, preferindo não o olhar. Collins entregou as folhas com as reações e os alunos foram passando entre si. olhou o papel de cima a baixo, sem entender absolutamente nada.
— Me dá isso aqui. — arrancou a folha das mãos do garoto.
— Não precisa ser grossa. — deu de ombros e colocou os óculos. Viu pelo canto do olho a observando meio sério, realmente estava a olhando, tão atentamente lendo as explicações da folha.
— O que você tá olhando, ?
— Nada não. — desviou o olhar.
— Não vou fazer tudo sozinha, só pra avisar.
— Jura que você quer a minha ajuda? Eu sou PÉSSIMO em química. — quis rir na ênfase em “péssimo”, mas se conteve.
— Lê as fórmulas pra mim, pelo menos. Isso você sabe fazer, né? Ler?! — pegou o papel, começando a ler, e tentava acompanhar, misturando os líquidos nos recipientes.
— Vai mais devagar, . Se não eu não acompanho, caramba! — exclamou . se aproximou do ouvido da garota, roçando os lábios no próprio. E cochichou:
— Esqueci que você é lenta nas últimas aulas. — debochou.
sentiu um arrepio, mas não deixou que isso transparecesse. Empurrou para o lado.
— Cala a boca. — ele riu.
Depois de meio teste feito, já estava ficando impaciente e entediado E tudo só piorou quando o professor disse que quem terminasse poderia ir embora. Ele não aguentava mais esperar, não conseguia mais ficar vendo misturar todos aqueles líquidos e não dar nada com nada.
— , dá pra andar logo? Eu quero sair logo dessa sala.
— E dá pra você calar a porra da boca? — tentava falar baixo, mas era quase impossível. — Eu to tentando me concentrar aqui. — bufou com a resposta.
— Anda logo, não tem pra quê essa lerdeza. Você tá aí faz um tempão e eu já vi esse vidrinho ficar azul, verde, lilás, e não dá porra de nada. — simplesmente o ignorou. rolou os olhos, pegou um dos líquidos e despejou tudo o que tinha no vidro que estava, que começou a soltar uma fumaça branca.
— Oh, céus, seu idiota! — gritou, chamando a atenção do professor e da sala.
— Algum problema? — perguntou Sr. Collins do birô. simplesmente ignorou.
— O que foi agora? — perguntou , irritado.
— Olha o que você fez! — a substância começou a borbulhar. levantou imediatamente. — Tem que ver se é reagente ou base antes, imbecil! Porque se for reagente...
— O quê? — perguntou ele confuso. não respondeu, olhando meio assustada para a mesa.
— O que está acontecendo aí? — o professor se levantou. — Que bagunça toda é essa? — O que acontece, ?? — eles, como toda a sala, encararam o vidro em cima da mesa, que explodiu. Deixando a mesa chamuscada e preta e vidro voou pelos lados. e ficaram com os rostos relativamente cinza já que estavam mais próximos, e o cheiro de fumaça pairou pelo ar. Seus jalecos antes branquinhos, agora estavam pretos e cinza e o professor não parecia nada feliz com aquilo tudo. Não, isso não iria terminar bem. estava furiosa com , ela sabia que ia se ferrar por causa dele, como sempre acontecia. Toda vez que ficava de castigo ou se dava mal em alguma coisa, sempre estava metido, sempre tinha a ver com ele e isso já estava enchendo a sua paciência.
O professor analisou a sala, olhou para os dois alunos completamente sujos, para o resto da sala, e para a mesa que tinha um buraco enorme no meio. Mas, para piorar toda a situação, a fumaça assoou o alarme de incêndio. E a sala ficou encharcada. Ainda tentando manter a calma, mas já vermelho de raiva, Sr. Collins disse:
— Os dois! — apontou para e . — Diretoria. Agora.
E, com as roupas sujas e encharcadas, seguiram para a sala da diretora.
Com o cabelo duro e usando roupas emprestadas, terminava de pegar suas coisas em seu armário. Depois de ficar algum tempo na sala da diretora, brigar um pouco com , se limpar no vestiário feminino e achar alguma coisa para vestir que não estivesse molhada. E, não, não estava nada feliz. Estava puta com por fazê-la passar por isso. Garoto idiota. E o que a deixava mais puta ainda era de que nada daquilo era culpa dela, e que suas explicações à diretora entravam em uma orelha e saíam pela outra. Ela acabou por castigar os dois, com detenção após a aula e arrumar a bagunça toda do laboratório no dia seguinte. Descontou sua raiva no pobre armário, que foi fechado com força.
Foi andando pisando firme, com os braços cruzados em torno do livro, e de cara emburrada. Odiava a detenção. E não suportava ainda mais a ideia de ter que estar na mesma sala que durante duas horas. Duas horas infernais. E o pior era que tinha deixado a bolsa no armário junto com seu iPod, teria que ficar encarando o teto o tempo que estivesse lá como os outros imbecis que sempre iam para a detenção. Além da Sra. Hide não permitir que ninguém dormisse, com certeza detenção era um dos piores castigos. O tédio. O chato. Porque ela sabia que o tédio era o inimigo número um dos adolescentes. entrou na sala, ela não estava com o iPod, mas pareceu que Hypnotic ecoava nos seus ouvidos enquanto ela caminhava até a mesa da inspetora, marcando a presença. Ela olhou a hora, começando a contar, e não acreditava que, no dia seguinte, ela e teriam que limpar a bagunça do laboratório. Mas o pior era que teriam que fazer isso, juntos.
Tinham poucos alunos na sala ainda, mas, para sua surpresa, era um deles. Não que fosse surpresa ver ele na detenção, lógico que não, isso era uma coisa normal, a surpresa era ele ter chegado tão cedo e nada atrasado, para o campeão em atrasos do colégio. Ela o encarou, e ele lançou um olhar desafiador. virou a cara e sentou num lugar afastado do garoto. Minutos depois, entrou na sala, e, diferente de , ele sorria. Meio sujo como ela, e os cabelos molhados estavam jogados para trás, meio bagunçados. Ele usava outras roupas, assim como ela, teve que trocá-las. Além de cheirarem mal, estavam encharcadas. o viu ir até a mesa da Sra. Hide. Sentiu raiva. Por que diabos ele estava sorrindo? NÃO era para ele estar sorrindo! Ela não estava sorrindo. Não era para ele se sentir assim tão felizinho. Enfiou a cara nos braços e na mesa depois de ver que a encarou com o mesmo sorriso no rosto.
“Sorriso de merda.” Pensou.
Ele se sentou ao lado de e o cumprimentou. A Sra. Hide fechou a porta, e todos sabiam o que aquilo significava: ninguém mais entraria, e só sairia após longas duas horas.
— Podem separar. — ela lançou um olhar para e , apontando para os dois, chamando a atenção de . — , na fileira da parede e , pra não ficar sozinho, fileira do meio.
bufou, dando o dedo quando Sra. Hide se virou de costas. riu. foi se sentar no único lugar disponível da fila da parede, na frente de . se sentou atrás de uma garota, um ano mais nova. o fitou disfarçadamente, e depois virou a cara para frente, dando de cara com a olhando. Ela recuou um pouco para trás xingando-se mentalmente e torcendo para que não tivesse percebido.
— Parceira! — disse o garoto. rolou os olhos, não acreditava.
— Que punição. — arrastou a cadeira para o lado dela.
— Veja pelo lado bom.
— Que lado bom? — perguntou , ríspida, ainda de braços cruzados e encarando a parede à sua frente sem olhar o garoto.
— Eu não sou o . — ela olhou para com uma cara pensativa.
— É... Nisso você tem razão. Você não é o , mas continua sendo uma punição.
— Ah, posso falar com a inspetora pra trocar...
— NÃO! — ela interpretou o menino, que gargalhou. Mil vezes a . — E ele já está bem acompanhado. — disse , olhando passar o braço pelos ombros da tal garota de cara emburrada. riu mais ainda.
— Ciúmes? — ele arqueou a sobrancelha e a garota balançou a cabeça.
— Claro que não, não invente coisas.
— Sentir ciúmes é uma coisa tão idiota e sem sentido, uma bobeira.
— Você que pensa, se gostasse ou amasse uma pessoa de verdade, sentiria ciúmes dela.
— Mas eu não sou assim, , eu não amo ninguém. — cruzou os braços atrás da cabeça. tentava fazer sua perna parar de tremer.
— Falou o frio. — fez cara de deboche. fez uma careta, ela riu. — Certo. Porque você só sabe ser safado. — deu um sorriso malicioso. arqueou as sobrancelhas.
— Mais vale uma safadeza sincera que um romantismo forçado.
— Fala isso porque não teve uma garota que amolecesse esse seu coraçãozinho. — encostou o dedo no peito esquerdo de . — Você vai ver, , sua hora vai chegar.
— Não, porque eu não sou idiota o suficiente pra me apaixonar.
— Mas é um pouquinho idiota, sim. Você e o , dois idiotas. — riu.
— Então esse é o maravilhoso sentimento que você sente por nós?! — disse rindo. — Porra, , não precisava ser tão carinhosa.
se controlava para não rir, mas era quase impossível. Imaginou a reação de ao ver aquela cena, e como seria engraçado, tanto para ela como para . De uma possível cara de nojo e de tais reclamações do tipo, “, me diz que todas as meninas da torcida caíram da pirâmide e quebraram a perna, mas não me diga que você estava conversando com aquela praga!” “Já perdi a , não me faça te perder também! ” “Poxa, só eu virar as costas que esse projeto de capiroto tenta acabar com a sua sanidade mental?” “Puta que pariu, vá à merda, !”. Ela também imaginava se a situação não poderia ser contrária. conversando com . A reação de seria 10 vezes pior, porque tudo era 10 vezes pior quando, para ela, se relacionava a . De ambos os jeitos, seria muito, muito estranho.
— Você também é idiota, mas não mais que o , estou deixando bem claro, viu? Não guarde rancor. — começou a balançar o lápis. Estava ficando estranho demais pro seu gosto.
— Viu, mas... — ela realmente queria saber de onde tinha tirado aquela vontade de conversar com ela. Afinal, eles nunca se bateram. Nunca foi deixado claro que não se gostavam, mas também nunca ficou claro de que eram os melhores amigos. — Por que odeia tanto assim a gente?
— , não odeio você, odeio o . Te acho meio insuportável e irritante, mas você nunca me fez nada para que eu te odiasse.
— Ah, então você não me odeia! Ótimo! Adorei! — disse ele com um sorriso vitorioso.
— Mas isso não significa que eu goste de você.
— Por quê? — e suas perguntas. Mas era melhor que perguntasse aquilo a coisas relacionadas a . percebeu que tinha um jeito que intimidava as pessoas, como se arrancasse a verdade delas.
— Ah, , sei lá. Você tem um jeito repugnante e eu tenho aversão a tudo o que você faz e o que você representa. — deitou a cabeça na mesa, bufando. entendeu aquilo como um “não quero conversar, caralho!”. Mas ele sempre achou divertido perturbar as garotas. Ficou em silêncio por um tempinho, agradeceu mentalmente por poder passar o resto daquele castigo em paz.
— . — pensou cedo demais.
— Oi. — respondeu, seca.
— Se eu não fiz nada para que você tivesse razões pra me odiar, o que o fez?
desviou o olhar para o chão, abrindo a boca, mas não disse nada. Porque ela não sabia o que dizer de verdade, não tinha uma resposta ou uma mera desculpa esfarrapada. não fazia ideia de como responder àquela pergunta, porque não sabia o porquê de odiar tanto . Fazia as pessoas e ela mesma acreditarem que fosse porque ele a odiava também, mas no fundo sabia que aquele não era o real motivo. Talvez nem tivesse um motivo, e só usava o desgosto porque assim parecia mais fácil viver ao lado dele. Só talvez.
Bonecas quebradas, puxões de cabelo, cair de cara no bolo dos parabéns não passavam de coisas bobas da época em que eram mais novos, mesmo que a convivência entre ambos não tenha se alterado muito, apenas cresceu para algo menos infantil. Mas nunca parou para pensar de o porquê de aquilo tudo ter continuado.
— O quê? — perguntou ela sem saber a resposta.
— Por que você odeia ele? — repetiu , já esperando a reação da própria, que não sabia se estalava os dedos ou se mexia nos cabelos.
— An.... eu não sou obrigada a gostar de ninguém.
— Isso não responde a minha pergunta.
podia sentir o olhar curioso e provocante de sobre o perfil de sua face, mas ela estava se obrigando a encarar o quadro branco e os outros alunos na sala que conversavam baixo. Sra. Hide parecia não se importar.
— Ele é repugnante! — olhou de relance para onde se encontrava, logo em seguida encarando .
Ela pode ver claramente a caixa de Marlboro no bolso da frente da calça dele enquanto ele brincava com o isqueiro com uma das mãos.
— E você é infantil. — não, ela não estava sendo chamada de infantil por , não mesmo. Dava até vontade de rir de tão irônico que aquilo soava. Esboçou um sorriso, fingindo espanto e arqueou as sobrancelhas com a tentativa de ao interpretar suas atitudes. — , você não tem razões, por isso age como criança.
— E por acaso ele tem? — os dois olharam rapidamente para . se endireitou na cadeira.
— Não é o caso agora.
— Por que isso te importa tanto? — na verdade não estava entendo o rumo que aquela conversa estava tomando e quais eram as intenções de . Por isso, preferiu agir de uma maneira mais direta.
— Só estou tentando abrir seus olhos. — ele piscou com o olho direito para ela.
— Abrir meus... Da onde você acha que tem tanta moral assim pra falar de mim? Olhe para si mesmo, o jeito que você e a se tratam.
cruzou os braços emburrada, se ele não fazia jus da causa, por que estava tentando impor algum tipo de moral sobre o jeito que ela tratava e as suas razões?
Aquilo não tinha sentido algum.
— É diferente.
— Não acho.
— Claro que é. Olha, se você quer saber, eu e a temos razões absolutas para não gostarmos um do outro, é só o que precisa e o que eu posso falar agora.
— Que razões? — parecia mais interessada, já que o foco tinha passado dela e para ele e , e as coisas ficariam divertidas se ela tomasse o controle da situação. — sempre dizia que queria fazer picadinho de você, se me lembro bem, quase sempre quando estava com raiva, mas nunca dizia o porquê.
riu.
— Se ela não te disse, não sou eu que vou dizer.
— Agora eu fiquei curiosa, conta logo. — se esforçou para não fazer a piedosa voz de dengo que sempre escapava quando queria alguma coisa. Virou-se para ele, descruzando os braços. — Vai!
Eles escutaram o sinal tocando, avisando a todos que a detenção finalmente havia acabado. A turma começou a se levantar imediatamente arrumando suas coisas.
— Não. — levantou da cadeira e se abaixou para pegar a mochila do chão. ficou de pé de frente a ele do outro lado da mesa. — Talvez um dia eu te conte. — ele disse, esboçando um sorriso, com a mochila nas costas. Por trás dele, viu saindo da sala abraçado com a garota e o seguiu com o olhar.
— Quando?
olhou para trás tentando identificar para onde a garota olhava. Virou a cara para voltar a encará-la.
— Quando você abrir os olhos, gatinha. — piscou com um dos olhos e se virou para sair da sala.
Antes que pudesse dizer algo, ou simplesmente questionar, bufou com as perguntas sem respostas que começaram a se formar.
Lhe abrir os olhos? Em relação a que? Ou quem? O que ele queria dizer com isso? E por que não respondia as coisas que ela perguntava? sabia de alguma coisa que a envolvia, e sua única conclusão era que também sabia. Mas por que não lhe dizia? E o que tinha a ver com tudo isso?
Ela precisava de alguém que lhe abrisse os olhos para encontrar essas respostas?
Chapter Four — Life Is Like A University Party
Os faróis brilhantes e amarelos iluminavam as ruas. Quando percebeu que estavam ligados, já estava em casa. Droga, sempre os esquecia ligados. Estacionou o carro em frente de casa, sem guardá-lo na garagem, mesmo que o portão estivesse todo aberto, o que ele estranhou. Será que tinha deixado aberto quando saiu de casa? Ele não se lembrava.
Saiu do carro pisando na neve fofa, do lado de fora dava para ver que lá dentro estava uma bagunça. Se aproximou mais com passos calmos, tranquilo, girando as chaves do Range Rover no dedo indicador. Tinham várias caixas de papelão empilhadas umas em cima das outras, algumas no chão abertas e alguns objetos como ferramentas, revistas e jornais velhos espalhados no chão.
— Mãe? — chamou após passar por algumas das caixas e quase derrubar uma pilha delas.
— Oi, filho. — Cindy apareceu atrás de uma das pilhas, ela usava um avental lilás e luvas amarelas de borracha, nas mãos segurava um espanador.
— Quanta poeira. — colocou a mão no nariz, contendo um espirro. Ele odiava pó, lhe causava uma horrível crise alérgica. — O que tá fazendo aí com o portão aberto? Vai congelar!
— Realmente, nós não limpamos essa garagem tem um tempo. Estou procurando as barras daquele berço antigo que tem no sótão.
— Berço? Pra quê berço? Você não vai ter outro filho não, né?
— Não! — Cindy riu. suspirou. — Donna está vindo pra cá com o Mike na semana que vem, o berço é para ele. Você sabe como aquele garotinho é inquieto, acho que, se colocasse ele na cama do quarto de hóspedes, mesmo com a Donna lá, ele poderia cair.
— O que eles vêm fazer aqui? Problemas com tio Robert de novo?
— Infelizmente, sim.
— E o que foi dessa vez? — perguntou sem muita surpresa. Já estava acostumado com o tio arrumando problemas e mais problemas.
— Dessa vez ele foi preso. — Cindy suspirou.
— Caralho, preso?!
— Olha a boca, !
— Desculpa. — quis rir, mas não o fez.
— Eles tiveram uma discussão, e, bom, o final de sempre é que ele acabou ficando bêbado e hoje de madrugada decidiu vir de Liverpool pra cá dirigindo. Bateu em um poste e quase atropelou uma senhora.
— E, deixa eu adivinhar, sobrou pra tia Donna ir lá ajudar ele? — Cindy assentiu.
— Sim, ela vai vir resolver a situação com a advogada.
— Na boa, mãe, por que você não diz pra ela largar esse cara? Ele não faz bem pra ela, muito menos pro Mike, o maluco só se mete em problema e sobra pra ela consertar as burradas dele, além de ser um péssimo exemplo pro Mike.
— Eu já disse, mas é difícil, , eles têm uns bons anos juntos e um filho. Falei que daria todo o apoio que ela precisasse caso se decidisse, mas Donna sempre foi a mais teimosa de todos os irmãos, e é mais sentimental que racional, prefere ouvir o coração.
— Coitado do meu primo sendo criado por um cara daqueles.
— Vou tentar conversar com ela de novo.
— Seria bom. — quando fez a menção de se virar para entrar em casa, a voz de Cindy o chamou a atenção de volta.
— Ei, rapaz, como foi lá na escola? Está ciente de que me ligaram, não está?
— Sim, fiquei de castigo, por isso cheguei mais tarde, e amanhã vamos ter que limpar o laboratório.
— Você tem que parar de arrumar confusões com a , principalmente na escola. — ele revirou os olhos só de escutar o nome da garota, não estava com paciência para sermões. Cindy arqueou as sobrancelhas. — , estou falando sério, vocês passam muito tempo juntos e essa relação é tóxica demais para ambos, além de só trazer problemas.
— Eu vou tentar, mas não prometo nada.
— Vou confiar.
— Ok, tô subindo.
— É… só mais uma coisa. — olhou para a mãe novamente. De maneira diferente, ela agora estava de cabeça baixa, parecendo estar na defensiva, como se doesse um pouco dizer cada palavra. — O Ethan ligou.
— Ligou, foi?
— Sim. Ele está em Vancouver.
— No Canadá? Onde ele consegue todo esse dinheiro? — fez a pergunta mais pra si mesmo do que para a mãe. nunca perguntava pelo irmão, a não ser que sua mãe tocasse no assunto, para ele, até certo ponto, era irrelevante. — Ele tá bem?
— Sim, me pareceu tranquilo dessa vez, perguntou até de você.
— Ah, que bom.
Normalmente ele ficaria curioso, mas não lhe interessava. Não lhe interessava saber o que o irmão havia perguntado dele. estava bem, Ethan estava bem, era só o que precisavam saber um do outro, era suficiente em uma relação familiar que quase não existia.
— …
— Não, tá tudo bem, ok? Você me disse que podia cuidar disso, eu prometi que não ia me meter e confio em você. Não aprovo, nossas relações com o Ethan podiam ser cortadas totalmente, mas eu entendo como é difícil. E não se preocupe — ele disse, se aproximando da mulher e segurando seus ombros delicadamente. —, eu com toda certeza não vou seguir os exemplos dos homens dessa família, e nem deixar que o Mike faça a mesma coisa. — ela o abraçou, a abraçou de volta. Cindy sentia uma paz interior enorme, nem tudo era perfeito, mas o pouco que restava era suficiente, sempre iria ser suficiente.
Já passava das 14h quando despertou ainda sem abrir os olhos por completo. Seu celular já havia tocado várias vezes, mas ele nem deu tanta importância. Não ter ido à escola naquela terça-feira foi a melhor coisa que fizera, mesmo que Cindy houvesse batido na porta do quarto dele várias vezes pedindo para que ele se levantasse logo, a preguiça falou mais alto. Até as batidas pararem e ele presumir que a mãe devia ter saído para trabalhar. nunca teve problemas para acordar cedo e nunca precisou que a sua mãe lhe acordasse e lhe arrastasse da cama todos os dias para ir para a escola, pelo contrário, sempre foi muito disposto a aproveitar o dia ao máximo, mas daquela vez ele preferiu ficar na cama mesmo. Estar acordado era ótimo, mas dormir era gratificante, e ele achou justo tirar quase um dia de sono. Até porque isso seria menos possível a partir da semana que seguinte, já que recomeçariam os treinos do time de basquete. adorava praticar esportes, não via a hora de setembro chegar logo para que começasse a temporada de futebol, mas, enquanto o outono não chegava, ele aproveitava os lagos congelados dos parques para jogar hóquei.
Abriu os olhos e levantou, o quarto estava claro em razão do teto de vidro. Enquanto ainda tivesse sol, o quarto de ficaria iluminado, afinal, não dava para colocar cortinas no teto. Mas ele gostava da luz. Não gostava de lugares abafados, muito frios ou desorganizados. O sol esquentava, era bom.
Olhou ao redor do próprio quarto, vendo tudo em seu devido lugar, a não ser uma toalha branca estendida na cadeira que ficava frente à sua mesa. Ele tinha que parar com a mania de colocar toalha e roupas ali em cima, Cindy já havia lhe falado várias vezes sobre. Pegou a mesma toalha e se dirigiu ao banheiro para um banho rápido, as notificações em seu celular em cima da cômoda que esperassem.
Saiu do chuveiro em poucos minutos, ao redor de uma onda de vapor que aos poucos se espalhou pelo ar. A toalha amarrada na cintura logo foi substituída pela cueca, uma camiseta e um jeans. rolava o dedo pela tela do celular, vendo as notificações, enquanto passava a toalha pelo cabelo tentando tirar o excesso de água. Tinha várias mensagens, mas o que lhe chamou atenção foram as 10 ligações perdidas de um número que, embora não salvo, ele conhecia muito bem. Bufou ao lembrar o que tinha que fazer agora a tarde. Voltou ao banheiro para escovar os dentes rapidamente e terminar de se arrumar. o havia ligado entre 13h e 14h, não porque se importava, mas sim porque tinha a intenção de perturbá-lo com várias ligações, sabia disso, e felizmente dessa vez ela não havia conseguido.
Ele planejava passar o resto do dia no quintal com Bud ao seu lado enquanto dedilhava qualquer nota na sua Fender, e de noite jogar basquete com , mas seus planos mudaram, pois em 20 minutos já estava de volta à escola.
— Se pretendia começar sem mim, por que me ligou tantas vezes? — disse , roubando o bolo de chaves que estavam na mão da garota distraída no corredor. olhou para ao perceber a presença dele ali. Com certeza ela preferia limpar o laboratório sozinha.
— Puta que pariu, hein, , pra quê você tem celular se não atende? — sorriu de lado e ela bufou. Estava muito irritada com toda essa confusão com o garoto e aquela conversa estranha com na detenção. Ela se sentiu como falando com um dos garotos, como se fosse , foi estranho e ao mesmo tempo divertido. Era meio difícil de acreditar, mas tinha seu lado bom, o lado que nunca tinha visto. Meio perturbado e irritante, mas bom. Por mais que tivesse deixado sua cabeça meio confusa com tantas perguntas e com tanto mistério.
passou por , abrindo a porta da sala e entrando. entrou logo em seguida, acendendo as luzes.
A sala estava do mesmo jeito que foi deixada, e o cheiro estava 10 vezes pior. Ainda meio molhada, papéis jogados para todos os lados e vidro quebrado no chão, o buraco na mesa ainda estava lá, preto e grande. queria saber o que iam fazer com aquilo, se abaixou para catar alguns cacos de vidro dos frascos que ainda tinham ficado por lá. Olhou para , que estava de pé brincando com o esqueleto que ficava ao lado da mesa do Sr. Collins.
— Bem que você podia ajudar, né? E servir pra alguma coisa. — deu língua. — Além de chegar atrasado.
— Não eram necessárias tantas ligações, . — ele começou a juntar algumas folhas jogadas pelo chão e amassá-las. raspava o restante de água com um rodo que tirou de um carrinho que alguma funcionária que cuidava da limpeza tinha deixado ali para que auxiliasse no trabalho deles.
— Você não atendeu nenhuma delas.
— Não sabia que você precisava tanto de mim assim. — franziu a testa. Do que aquele garoto estava falando?
— E eu não preciso. Só não ia deixar você se livrar tão fácil assim, afinal estamos aqui por culpa sua, essa bagunça inteira foi culpa sua, porque você só faz besteira e age como um idiota sempre. — esfregava o chão fortemente até que todo o líquido fosse todo sugado pelo pano, e fazia caretas e revirava os olhos com as palavras dela enquanto levantava algumas cadeiras caídas e arrumava-as na fileira. — Eu não ia mesmo limpar tudo isso sozinha, se bem que, né, quem ia se ferrar mais, caso não aparecesse no castigo, era você, e eu não acredito que tive que ficar até mais tarde nessa escola e...
A garota parou bruscamente quando sentiu seu rosto ser atingido em cheio por uma bolinha de papel.
— , qual o seu problema?
— Você fala demais, , e em minha defesa você estava enrolando muito. Viu como tirei a gente da sala rapidinho?
— Da pior maneira possível. — não queria conversar, estava irritada demais para isso. Colocou todo o vidro quebrado e os papéis que tinha juntado dentro de um saco, e começou a varrer a sala enquanto limpava as mesas.
— Mas tirei.
— Você sabe que foi burrice.
foi até a mesa em que ela e estavam na aula. A madeira estava chamuscada e a parte que era branca estava cinza. A diretora havia pedido para que a tirassem da sala e a deixassem do lado de fora para que outros funcionários demontassem e jogassem no lixo, pois havia ficado desgastada demais depois da pequena explosão. Tentou levantá-la, mas era mais pesada do que aparentava. Decidiu ir empurrando-a até a porta, apesar da dificuldade, tentava não esbarrar nas cadeiras que havia arrumado.
— Quer ajuda aí? — perguntou, jogando o pano que usava para limpar as mesas sobre o ombro.
— Não.
ficou do seu lado, ajudando a empurrar a mesa.
— Disse que não, , eu consigo.
— Ah, claro que consegue.
virou a cara pro lado. Não percebeu, mas ficou bem mais fácil de empurrar. Ou estava fazendo todo o trabalho de empurrar a mesa de chumbo para fora.
Eles voltaram para dentro. aproveitou que a mesa chamuscada estava fora para terminar de limpar os resquícios de sujeira que sobraram, e voltou a brincar com o esqueleto da mesa do Sr. Collins.
— Ed e eu achamos que você deveria ser mais simpática. — disse sem olhar para trás. , que estava ajoelhada no chão, levantou a cabeça.
— Mas quem diabos é Ed?
— Eu sou o Ed. — respondeu, alterando a voz e levantando a mão do esqueleto, como se fosse um fantoche.
— Você e o Ed são dois idiotas.
levantou-se, indo até o lixo jogar fora o que tinha recolhido. Sentiu seu celular vibrando no bolso, decidiu checar. Tinha algumas mensagens de , uma ligação do seu pai e várias outras notificações, mas preferiu ignorá-las e olhar depois.
— ... baby, open up for me, open, keep it open, by the ocean, yeah, lipstick wrapped around my lemonade glass... — olhou para o lado. estava mesmo cantando? —, starin' right at her, but don't know where she's at, tell me, the sun goin' up and shit, purple in the sky, feelin' goo, and now we're here at Miami Dade... — os únicos momentos do dia que se estressava facilmente era quando se intrometia neles, e, na maioria das vezes, ela via um espaço para descontar toda a sua raiva de outras coisas. Sim, descontava tudo em , mas ele também às vezes fazia por merecer. Ela só via tudo como uma forma de troca, porque para ela nada nunca iria mudar, tudo iria continuar do mesmo jeito. Ela não sentia como se qualquer dia pudesse, do nada, começar a gostar dele de um jeito amigável, e ele não parecia demonstrar o contrário. — finally here and I'm finally wasted, all I'm really tryin' to say, is we could cool delas, all the sex in the ocean... — a voz dele era boa, tinha que admitir. Ela apreciava ‘cantores’ iguais a ela, mas era difícil aceitar que tinha algum talento, mesmo que fosse para si própria e o seu subconsciente, mesmo que a voz dele fosse suave e combinasse com a música. Então ela preferiu rir.
— Qual a graça, ?
— Nada, você só desafinou umas três vezes. — rolou os olhos.
— Igual você no coral do primário? — bufou. Ela odiava lembrar daquele dia, em que, na parte do seu solo, ela errou uma nota na frente de todo mundo. sempre fazia questão de lembrá-la daquele pequeno deslize.
— Pergunte ao Ed, ele, mais do que eu, está do seu lado tendo que aguentar sua voz insuportável.
— Não se sinta mal, , nem todo mundo tem o dom de cantar bem.
— Você com certeza não é uma das pessoas com esse dom.
— Se você diz... — riu fraco. — Mas ainda bem que o que você fala não influencia em absolutamente nada. — se dirigiu ao quadro para pode apagar as equações escritas em giz, ignorando o olhar do outro sobre si. Ela pegou os dois apagadores, movendo-os de um lado para o outro no quadro negro. , depois de arrumar novamente as cadeiras e mesas, preenchendo o buraco da mesa que eles tiraram, se apoiou na mesa principal do professor, que ficava na frente da classe.
— Eu juro pra você que não gosto de me meter nas ilusões dos outros ou dar opinião, mas alguém precisa te dizer isso. — ela o olhou de volta assim que percebeu que não havia mais nenhum resquício de giz e caminhou até ele.
— O quê?
— Não é só porque você sai por aí com uma guitarra vermelha fazendo uns solos e se achando o verdadeiro Jimi Hendrix que você vai ser, mas, como dizem por aí: é bom sonhar. — bateu os dois apagadores que segurava e uma poeira de giz voou bem no rosto de , que começou a espirrar imediatamente pela crise alérgica que tinha a pó. Ela havia feito questão de frisar a palavra “sonhar”, já que ele mesmo havia lhe dito a mesma coisa uns dias atrás. saiu pela porta da sala rindo, se certificando que tudo já estivesse em seu devido lugar e arrumado, deixando os apagadores na mesa.
Desceu os lances da escada com mais pressa que o necessário e foi até a sala da diretora para avisar que eles já haviam acabado. Bateu na porta três vezes até escutar um “pode entrar” antes de abri-la.
— Boa tarde, Sra. Parker, eu só vim avisar que eu o já terminamos com a limpeza no laboratório.
— Oh, senhorita , ótimo, eu espero que assim vocês tenham aprendido alguma coisa.
— Com toda certeza. — sorriu em falso. A única certeza era de que tinha aprendido que era insuportável e aquilo fora tudo culpa dele. — Eu já vou indo, então.
— Espere. — a voz da mulher interrompeu seus passos para sair da sala. — As chaves da sala, preciso que devolvam.
— Ah, o tá descendo, ele vai trazê-las.
— Sendo assim, você pode ir. — sorriu novamente sem dizer mais nada e saiu.
Às vezes nós somos obrigados a fazer coisas que não queremos e não gostamos e o alívio de terminá-las é satisfatório, e era esse alívio que estava sentindo assim que colocou os pés para fora do colégio. Ela tinha se livrado da bagunça do laboratório, das broncas e da presença de , e, depois de olhar para os dois lados da rua, ela começou a pensar em um jeito de voltar para casa.
bufou de raiva após a crise de espirros, ele as odiava, mas não mais do que odiava , a garota que conseguia o tirar do sério com tão pouco. Decidiu sair logo daquele lugar. Pegou as chaves que estavam penduradas na fechadura e saiu da sala, fechando porta, e desceu a escada. Preferiu deixar as chaves na secretaria, não queria encarar a diretora, muito menos ouvir qualquer comentário sobre as suas faltas recentemente.
Caminhou devagar pelos corredores da escola completamente vazios e silenciosos. Ele apreciava muito aquele tipo de silêncio, até que chutou algo para longe. Algo pequeno.
— Outch! — falou para si mesmo ao caminhar até onde o objeto estava. Era um broche dourado em forma de microfone, claramente quebrado no fecho. Não estranhava, contudo não lembrava se já havia visto em algum lugar. Não pensou muito para colocá-lo no bolso do jeans e continuar seu percurso.
Saiu da escola para ir em direção ao estacionamento. As chaves do Range Rover balançavam no bolso do jeans, ele tratou de pegá-las e começou a girá-las nos dedos por uma simples mania. Encontrou parada, com os braços cruzados. Ele podia simplesmente ignorá-la, mas era inevitável. tinha que ir até lá.
— O que foi? — perguntou ao ver o garoto a encarando.
— Pra sua informação, eu estou mais pra Slash do que Jimi Hendrix, e não pedi sua opinião, eu posso, sim, ser um grande guitarrista, e com toda certeza não é com as suas críticas sem fundamento que eu vou chegar lá. Eu vou te ensinar uma coisa que eu aprendi com uma lenda da música, que é a de que "você não pode apoiar sua vida na expectativa de outras pessoas." E com certeza, se algum dia eu fosse me apoiar em alguma expectativa, não seria a sua.
— Terminou? — disse sem expressão. Ela não queria demonstrar tamanha raiva que estava sentindo, por isso preferiu se manter indiferente aparentemente. era hipócrita demais para ela pensar em rebater. — Não. Eu até ia te oferecer uma carona, mas você não está merecendo.
— Como se eu quisesse alguma coisa vinda de você. — deu de costas.
— Ok, então aproveite o sol. — finalizou ironicamente ao ver que alguns flocos de neve começavam a cair.
virou e continuou seu caminho até onde tinha estacionado o carro. Ele sempre tentou ignorar todo tipo de coisa má que ouvia a seu respeito. Críticas negativas eram bem recebidas a não ser que fossem construtivas, assim como qualquer tipo de apoio. Mas achava irônico querer ser uma grande cantora e falar daquela maneira do sonho dos outros, ela mesma deveria saber como era difícil. Ela precisava de umas boas lições, mas ele que não seria o professor. O máximo que poderia fazer era enfiar um CD do Stevie Wonder por baixo da porta do quarto dela para ver se assim ela tinha algum bom senso a respeito do assunto, aquele cara, sim, sabia do que falava. E era uma das pessoas que mais admirava.
bufou, porque estava começando a ficar cada vez mais frio, mas antes isso que entrar no carro de e dividir com ele o mesmo ambiente por uma segunda vez no dia, ambiente esse que por acaso tinha um belo aquecedor. Mas deixou seu orgulho vencer e não foi atrás dele, afinal, táxis e Ubers existiam para isso.
A primeira coisa que fez assim que chegou em casa foi trocar de roupa e se jogar no sofá. Relaxando finalmente, agradecendo por já estar em casa e em parte por ter ido ajudá-la a arrumar aquela bagunça toda. Mas a agitação da tarde pareceu ter estragado o resto do seu dia, e esperava estar mais alegre e disposta até a noite seguinte.
Seu celular começou a fazer um barulho insuportável, deveria ser alguém ligando. Mas que diabos de música era aquela? Impossível ter pego seu celular de novo e colocado aquelas músicas escrotas para tocar. Não, não era possível. Ele nem ao menos sabia a senha. Eram músicas com a batida até que boas, mas as letras eram feias e usavam as mulheres como objetos sexuais, daqueles rappers, sabe? Até achava aquilo um horror, só fazia para irritá-la ao máximo mesmo. jogou seu celular no tapete, e ele parou de tocar. Talvez tenha quebrado, mas ela não estava se importando muito, continuou encarando o teto.
Pensou em ligar para e pedir para que ela fosse até a sua casa. Precisava de uma amiga que levantasse seu astral e que a escutasse falar mal de de todos os modos possíveis para que se sentisse melhor. Pensou em , mas infelizmente lembrou que eram melhores amigos e ela diria alguma coisa defendendo-o ou fazendo várias perguntas como o porquê de eles não se darem bem ou por quê tanto ódio. Depois , mas ela não viria, pois, por mais que já tivesse chegado há alguns dias, com certeza ainda tinha caixas e caixas da mudança para organizar.
E, para a sua surpresa, seu pai apareceu vindo da cozinha.
— Ah, minha garota, finalmente chegou hein.
— Oi, pai. — disse , desanimada, ainda jogada no sofá.
— Mas que carinha é essa? — perguntou o homem ao se aproximar mais da filha.
— Ah, eu só tô cansada de limpar a bagunça no laboratório.
— Que tenha aprendido a lição pelo que fez na sala com o .
— Ah, não, já tive muita lição de moral por hoje, Bill. Acho que eu vou subir e deitar. — Bill Chester riu no momento em que se sentou.
— Mas já? Não quer nem ver o que eu trouxe da loja do JJ hoje?
— O quê? — no mesmo instante se levantou animada do sofá, indo até o pai dando pulinhos. — Você ia na loja do JJ e não me chamou pra ir junto???
— Se me lembro bem, você já ia ter planos para agora de tarde com o . — rolou os olhos ao ouvir.
— Argh, não fale assim.
— Por que não?
— Porque ficou parecendo que somos um casal, e me dá ânsia só de imaginar. — Bill riu.
— Certo, quer ver o que te comprei ou não?
— Quero, quero, anda, vamos logo. Onde tá?
— Está lá em cima no seu quarto — começou a subir a escada de dois em dois degraus, animada, certa de que seu pai estaria ao seu encalço. Adorava quando o pai lhe trazia coisas da loja de JJ. Foi lá onde Bill havia comprado seu primeiro violão e onde a mãe de havia comprado seu piano, que acabou sendo passado para filha.
Bill parou encostado no batente da porta com os braços cruzados, foi em direção à sua cama. Em cima dela havia uma sacola vermelha que ela conhecia muito bem, com o logo “JJ” estampado em preto no centro. Tratou logo de tirar a caixa de dentro e vira que se tratava de um tripé junto a um microfone vermelho. Bill Chester observava a filha abrir a caixa com o entusiasmo que imaginou que ela fosse ter no momento em que o viu na loja.
— Agora tem o seu próprio para levar para as aulas de música da escola. E aí, gostou?
— Se eu gostei? Eu amei. — foi até o pai, lhe abraçando em forma de agradecimento. — Obrigada.
— De nada, querida.
— Eu vou usar em todos os meus covers.
— Fico feliz com isso.
— Pro você comprou o quê?
— Alguns discos e pôsteres que estavam no catálogo que ele queria.
— Ah, sim.
— Certo, , agora eu preciso voltar pro trabalho, dei uma saidinha para a loja do JJ enquanto os sócios não haviam chegado, já que avisaram que iam atrasar umas 2 horas.
— Ok, jantamos juntos hoje?
— Sim, acho que a Elsie vem também.
— Oh, certo. — respondeu enquanto o pai lhe abraçava de lado e lhe dava um beijo na cabeça. — Espera, pai! — ele reapareceu na porta da garota, lhe estendeu a sacola. — Tem umas coisas aqui dentro ainda, não são suas?
— Oh, JJ estava com uma promoção, você ganha palhetas com compras acima de certo valor. Pode ficar com elas se quiser.
— Ah, que legal. Valeu. — Bill sorriu em resposta. — E, pai, só mais uma coisa.
— Sim, querida?
— Obrigada, sabe, por me apoiar. — olhou do microfone em cima da cama para o pai. — Significa muito pra mim saber que eu posso contar com você.
— É o seu sonho, querida, seja lá o que for, eu vou sempre te apoiar. A não ser que você pire e do nada fuja de casa com algum astro encrenqueiro, aí não, não tem mesmo como eu te apoiar. — riu.
— Não, não mesmo, não se preocupe quanto a isso.
— Acho bom. — Bill riu. — Certo, eu amo você.
— Também amo você. — acenou uma última vez e Bill saiu de seu quarto, descendo a escada.
ficou um tempo no seu quarto admirando seu microfone. Era maravilhoso. Vermelho. A cor da paixão, energia e excitação. A cor que a sua mãe mais gostava. Guardou tudo — ela com certeza o testaria mais tarde — e desceu a escada, Bill não estava mais em casa.
Assim que se jogou no sofá novamente, prestes a ligar a Netflix na televisão apareceu na escada. virou na direção do irmão rapidamente, que certamente vinha do seu quarto, mas logo desviou o rosto. ficou parado com os cotovelos apoiados no encosto do sofá encarando a irmã, que o ignorava e vagava pelo catálogo da Netflix com o controle.
— Por que você hoje tá tão irritada, ? — disse , finalmente cortando o silêncio. — Dia ruim? — o garoto deu a volta do sofá, se sentando onde as pernas de estavam.
— Não, dia difícil. — respondeu ainda sem olhá-lo. — E, se você quer saber, é tudo culpa do .
— Engraçado, tudo sempre é culpa do . — riu, ficou séria. — O que foi agora?
— Nada. Agora cala a boca que eu quero ouvir a voz do Peter. — instintivamente olhou para TV. tinha selecionado Hemlock Grove para assistir e falava sobre o personagem do lobisomem. E, nos cinco primeiros segundos do episódio, ele roubou o controle da mão dela.
— Ei!
— Hemlock Grove? Não, vamos ver Designated Survivor.
bufou, mas não fez nada e observou o irmão mudar a série, mas só porque gostava muito. Achava interessante o suspense político em que um funcionário do baixo escalão se torna presidente dos Estados Unidos após um ataque a Washington.
Assistiram uns 15 minutos em silêncio com suas atenções presas à tela presa na parede, quebrou o silêncio mais uma vez.
— .
— Hm. — murmurou ela sem querer tirar os olhos da TV.
— Você acha que eu daria um bom representante pro Grêmio?
— Você? Presidente do Grêmio Estudantil? — arqueou as sobrancelhas para o irmão. Não que a ideia fosse absurda demais, ela só havia ficado surpresa. assentiu. — Ah... eu acho que sim, sei lá...
— Por que toda essa surpresa? Acha que não combina comigo?
— Não é isso, é só que... Foi muito repentino, você nunca foi interessado por política. Em setembro, quando começaram as aulas e as campanhas pro Grêmio, a Lila te chamou para ser o vice na chapa dela, mas você recusou e a acabou aceitando.
— É, eu me lembro.
— Não conte à que eu te disse isso, ela não gostaria de saber que foi a segunda opção da Lila. — pediu e sorriu de lado, afirmando com a cabeça e imaginando como reagiria. — Então, me diga, o que aconteceu?
— Bem, hoje mais cedo, quando terminou a aula e você ficou pra arrumar o laboratório com o , eu não vim pra casa. Não imediatamente, sabe a Susie? A professora de matemática. — assentiu. Sra. Gamaliel era uma das suas professoras preferidas com toda certeza, mas estranhou porque poucas eram as pessoas que a chamavam pelo apelido. — Ela veio me perguntar se eu não queria fazer um reforço, porque as minhas notas... Você sabe. — riu baixinho, assentindo, ela sabia melhor do que ninguém que e matemática sempre foram duas coisas que não combinavam muito. — E acabei ficando uma aula mais tarde no colégio por causa disso, e nesse tempo eu percebi quanta coisa errada tinha por lá que a Lila em seu segundo mandato não tinha conseguido resolver, e fiquei me perguntando por que os alunos votaram nela? Certamente, a Susie viu que eu não estava me concentrando direito nas equações e conversamos um pouco. E ela meio que sugeriu que eu me candidatasse no próximo ano letivo, que eu poderia fazer o que a Lila não faz. E, sabe, vai ser o nosso último ano no colégio, queria mesmo fazer alguma coisa diferente.
— Acho o máximo quando você pensa nas coisas que aparentemente ninguém dá a mínima. Se você quer saber, tem um bebedouro quebrado perto do banheiro das meninas do primeiro andar, que quase sempre que a gente passa ele jorra água pra todo lado, há meses que a gente pede para que consertem, mas ninguém faz nada. Eu super apoiaria se você tentasse. — sorriu.
— Eu acho bom, porque eu não faço ideia de como fazer uma boa campanha política.
— Eu posso te dar uma forcinha, mas, se você quer ganhar mesmo, você devia pedir ajuda pra .
— ? — perguntou para ver se tinha escutado bem, a última coisa que ele se imaginaria fazendo seria pedir ajuda a . — Por que a ?
— Se você quer saber, esse cargo só é da Lila porque a não quer, ela já considerou muito ser Presidente do Grêmio, mas concluiu que não ia ter tempo suficiente então aceitou ser apenas vice, que o trabalho era menor e ela ainda podia ficar a par das coisas. — explicou , se lembrando do dilema que havia entrado dois anos atrás. — Ela ia te ajudar muito.
— Hm, eu não sei não, , e eu não somos muito próximos.
— Ah, não, você não vai ficar de frescura. Isso só vai acontecer em setembro, ainda faltam 9 meses, e fica tranquilo que até lá eu dou um jeitinho de vocês se aproximarem.
— Não acho que isso vá dar certo, mas se você está tão certa assim...
— Pode deixar comigo. — afirmou com um sorriso sapeca nos lábios, se aproximando do irmão para pegar o controle da mão dele. Despausou o episódio que minutos atrás havia pausado e voltou ao seu lugar inicial com as pernas em cima das do irmão, onde ela passou o resto da tarde maratonando Designated Survivor enquanto esperava a noite chegar para jantar com o pai e a madrasta.
Sábado era um dia de glória para a família . Era um dia de paz, sem trabalho, sem escola, mas o que mais importava para era que ela poderia dormir até tarde sem ser acordada, se todos ali a queriam de bom humor. Já passava das onze quando acordou naquele dia, contente consigo mesma por ter se lembrado de trancar a porta do próprio quarto no dia anterior, só pra não ser acordada, principalmente por , que já havia feito isso algumas vezes. E hoje era um dia de festa, não deixaria que alguém estragasse seu humor tão fácil assim. Se dirigiu ao banheiro, tentando ser o mais breve possível lá dentro, pois descer até a cozinha para ir almoçar era a única coisa que passava pela sua cabeça naquele momento.
estava na cozinha quando Bill entrou e a campainha tocou no mesmo instante. Elsie, que aos sábados sempre almoçava com eles, fez um sinal de que iria abrir a porta, deixando o prato em que se servia em cima da mesa. , que fora o primeiro a começar a se servir, dava as últimas garfadas no frango xadrez quando escutou o som da porta se fechando, e apareceu na cozinha.
— Dude. — disse de boca cheia, riu. — Já to terminando.
— Vocês vão aonde mesmo? — perguntou Elsie, voltando a se servir com Bill ao seu lado.
— Normalmente nós vamos pra pista de skate, mas hoje vamos pro lago, no parque do outro lado do bairro.
— E vocês vão fazer o que naquele lago nesse frio? — Elsie olhou pela janela vendo pequenos flocos de neve cairem. — Deve estar congelado.
— Mas é por isso mesmo. — Disse , animado.
— Vamos aproveitar que está congelado pra jogar Hóquei. — respondeu , mostrando os dois tacos e o disco que havia trazido de casa. Na mochila nas suas costas havia dois pares de patins que ele e Cindy haviam encontrado na garagem de casa enquanto procuravam o berço para Mike.
Segundos depois, uma sorridente apareceu na cozinha
— Bom dia!
— Boa tarde, né, filha. — respondeu Bill, vendo a filha na porta da cozinha. Ele e Elsie haviam acabado de se sentar à mesa para começar a comer. No momento em que viu no aposento, seu sorriso desapareceu, ela andou até o armário à procura de um prato, ignorando-o.
— Vocês vão jogar hóquei naquele lago? É seguro? — perguntou Elsie. , que segurava seu prato em frente ao fogão se servindo, prestava atenção na conversa.
— Claro que é! Quer dizer... Deve ser, né. — murmurou , levantando-se para levar o prato até a pia no mesmo instante que se sentou.
— Não se preocupa não, — disse a irmã, enrolando o garfo no espaguete —, pra você ter certeza, deixa o ir primeiro. Se o gelo rachar e ele cair dentro da água, você pode deixar ele lá e voltar.
— ! — exclamou seu pai, tentando chamar sua atenção. A garota apenas segurou um riso.
— Sabe de uma coisa, ... — começou , mas, antes que pudesse terminar, o interrompeu depois de ter lavado seu prato e puxou o amigo pelo braço em direção a porta.
— Já terminei, , vamos. — deu uma última olhada para o pai e Elsie. — Já já a gente tá de volta.
terminava de mastigar vendo-os sair pela porta, satisfeita. Sentiu o olhar de desaprovação de seu pai sobre si.
— O que foi?
— Você sabe muito bem. — Respondeu Bill.
— Ah, pai, foi só uma brincadeira. O sabe disso.
Fazia -5º C lá fora, e o sol era escondido quase que por completo pelas nuvens. observava várias crianças brincarem na neve ao redor. Felizmente, quando ele e chegaram ali meia hora atrás, o lago estava vazio, seria complicado fazê-las saírem dali para que os dois pudessem jogar. Estava sentado num pequeno tronco de árvore caído no chão enquanto treinava, disparando discos ao gol que eles tinham improvisado com galhos quebrados.
— Qual foi, dude. — disse a poucos metros do amigo, em cima do gelo, prestes a jogar o disco direto no gol, mas parou ao ver complemente avulso em pensamentos e quieto, sendo que o amigo nunca ficava quieto. Já era motivo suficiente para perceber que estava acontecendo alguma coisa.
desviou seu olhos de um grupo de crianças que fazia uma guerra de bolas de neve para olhar o amigo. Levou segundos para pensar antes de responder.
— É o Ethan.
— O que aconteceu? Ele... ele apareceu? — perguntou com certa cautela. “Ethan” era um assunto complicado.
— Não. Ele só liga, mas acho que é só questão de tempo.
— Você acha que, se ele aparecer aqui — abandonou os dois discos e patinou até a margem do lago congelado. —, ele vai fazer alguma coisa?
— Não faço a mínima ideia, faz muito tempo que a gente não se vê, não se fala, e eu não faço questão de perguntar pra minha mãe como ele tá. Mas me dá uma sensação ruim imaginar ele por perto.
— Você não sente falta dele? — decidiu se sentar no espaço que sobrou do tronco em que estava. Era difícil andar na neve com os patins, mas ele fez isso rapidamente.
— Não. Pra ser sincero, eu nem lembro mais como é ter um irmão, só as ligações dele que me preocupam.
— Ele liga com que frequência?
— Uma vez a cada 2 meses.
— Você nunca quis saber o que ele fala?
— Não. Se fosse muito sério, a minha mãe falaria. E, bem, da última vez que eu atendi o telefone, as coisas não foram nada bem, eu te contei. — assentiu, lembrando-se do ocorrido. — Prefiro não me meter.
— Realmente, se houvesse algo preocupante, sua mãe falaria, não?
— É, eu acho que sim. Mas é estranho, ele sempre liga de um lugar diferente.
— Talvez ele não queira ser localizado?!
— Com certeza ele não quer ser localizado. O estranho é ele ir pra esses lugares, tipo, como ele consegue?
— Ele deve trabalhar, não?
— Não, sem chance, a última coisa que Ethan faria seria arrumar um emprego. Na minha opinião, esse dinheiro vem de outro lugar, e o meu medo é que ele venha até aqui com problemas envolvendo isso.
levantou sem dizer mais nada. Sobre Ethan, já tinham debatido o suficiente para um ano inteiro. Caminhou sobre a neve com os patins até a água congelada, decidiu não fazer mais perguntas também e seguiu o amigo.
Quase do outro lado da cidade, gostava que tudo ficasse no seu devido lugar, por isso olhou ao redor daquele escritório pela quarta vez, procurando algo que não estivesse no seu lugar apropriado.
Ela não era de bagunças, não mesmo, mas, após uma exaustiva tarde de estudos, lendo tantos livros e resolvendo tantos exercícios, o escritório do primeiro andar que quase nunca era utilizado havia ficado uma verdadeira baderna. Ela precisava correr atrás dos assuntos que havia perdido no colégio, entrar no fim do segundo trimestre era complicado, mas esperava conseguir recuperar tudo que não conseguiu do segundo trimestre no terceiro e último. Era essencial para que pudesse aproveitar as férias de verão sem preocupações e para começar tranquila seu último ano na escola. Se esforçar bastante durante aquele ano estava nos planos dela, já que queria conseguir uma tão sonhada vaga na UCLA.
Seus olhos vagaram por toda extensão do cômodo. Tapete alinhando à mesa, ok. Lápis e coisas de escritório, ok. Pastas e arquivos, ok. Lixo na lixeira, ok. Coisas da dentro da mochila, ok. Só faltava a prateleira de livros. Deslizou a visão, começando pelo início, mas, antes de chegar no fim, parando ao meio, sua concentração foi repentinamente atrapalhada pelo barulho da porta se abrindo às suas costas. Sua tia May havia entrado sem o menor pudor e já estava aos gritos.
— , vamos, preciso da sua ajuda, o que você ainda está fazendo aqui em cima?
— Estudando, tia, e terminei de organizar todos os papéis do tio Paul naquela gaveta, por data.
— Estudar? Até agora? Anda, vamos. — disse, empurrando a garota para fora da sala. — Você não precisava fazer nada disso para o seu tio, ele já é muito preguiçoso e ainda recebe esse tipo de tratamento... Ele mesmo deveria ter dado um jeito naquele escritório. — Elas desceram a escada até a cozinha.
— Olhe as minhas tortas que estão no fogo enquanto eu dou uns telefonemas a trabalho.
— É sobre a inauguração no novo bar e restaurante dos ?
— É sim.
— Você já tem ideia de quando vai inaugurar?
— No mês que vem, mas estou procurando algo diferente para que fique mais animado no dia que inaugurarmos. Quando confirmar o dia, eu quero que você chame as suas amigas , , ... e os seus outros amigos, pode chamar o Finn também, gosto muito daquele rapaz.
— Ok... — disse , pensativa, lembrando de Finn. Eles costumavam ser amigos, faziam História juntos, e ela se lembrava de como o garoto era divertido, mas, devido a sua mudança, haviam perdido o contato. Nem sequer o encontrou no colégio de tão apressada que estava pra fazer as coisas desde que chegou. — Mas como assim algo diferente?
— Ainda não sei, mas vou pensar em algo. Agora vá e olhe as tortas para mim.
Ela assentiu e May saiu da cozinha, já com o celular apoiado no ombro e falando sem parar. sentou na cadeira, colocando um cronômetro contando 10 minutos. As tortas mal haviam saído do forno e ela já queria atacá-las. Sentou em uma das cadeiras da mesa de vidro que ficava na cozinha e pegou seu celular. Não havia mensagens novas, então ela decidiu olhar a postagens no instagram. Se passaram apenas 2 minutos quando um número desconhecido apareceu na tela, indicando uma ligação. — Ei, a aposta ainda está de pé? — a voz do outro lado da linha disse assim que atendeu.
— Que aposta? — perguntou , assim que reconheceu a voz como sendo a de . — E, vem cá, como você conseguiu o meu número?
— A que eu namoraria com você. — respondeu ele, ignorando a segunda pergunta dela. deu uma risada sarcástica. O único jeito de lidar com , pelo que ela se lembrava, era de nunca entrar no joguinho dele, mas fazer ele entrar no seu.
— Nunca esteve.
— Você falou que eu....
— Ai, ai, , isso já tem anos. Qual o seu problema? Vamos evitar isso.
— O meu problema é que, naquele dia, você sorriu, e eu pude ver que você gostava de mim.
— Um sorriso pode significar muitas coisas.
— Vamo, , não precisa temer, eu não vou fazer nada contra você.
, e se conheciam desde muito antes, antes mesmo de entrarem na Cuddle High School, e, por incrível que pareça, todos eram muito amigos. Até fazer coisas erradas demais ao mesmo tempo que queria ficar com e não aprovar aquilo nem um pouco. Os motivos? Eram coisas que não nunca conseguiu explicar. pensou um pouco antes de falar alguma coisa, pelo celular ela conseguia ouvir o barulho de vento sendo soprado pelos lábios dele, ele estaria fumando com certeza. Talvez ela tivesse pensado na séria possibilidade de ficar com de anos atrás, mas não aquele do presente, nem mesmo o do futuro.
— Eu não temo você, .
— Adoro quando você fala o meu nome.
— Tomei uma decisão.
— Vai ficar comigo na festa de hoje? — arriscou ele, soltando uma risada satisfatória, não poderia ter sido tão fácil assim.
— Não. Eu vou desligar na sua cara.
— ... — foi a última coisa que ouviu antes de tocar o botão vermelho na tela do celular. Rolou os olhos e largou o celular em cima da mesa. O cronômetro estava apitando, avisando que os 10 minutos haviam se passado. Ela pegou as luvas de algodão, desligou o forno e tratou de tirar duas tortas dali de dentro. Assim que o fez e colocou as duas em cima da pia para que pudessem esfriar, seu celular vibrou. Ela olhou, era uma mensagem de .
: “, eu to chegando.”
Como assim chegando? Chegando onde? Pensou . Ela não se lembrava de ter combinado nada com . Minutos depois, a campainha tocou, ela foi atender a porta na falta dos tios. Era .
— O que você está fazendo aqui, sua louca? — perguntou , dando espaço para que pudesse entrar, coberta dos pés a cabeça por conta do frio. Havia alguns poucos flocos de neve no topo da sua cabeça, e suas mãos estavam protegidas por luvas lilás. Ela desenrolou o cachecol do pescoço e respondeu:
— Te fazer companhia, ou qualquer outra coisa, porque lá em casa estava um tédio. Desculpa não ter avisado antes.
— Humf, sem problema.
— E os seus tios? — perguntou enquanto a seguia até a cozinha.
— Tio Paul saiu e Tia May está aí falando com os fornecedores do novo bar.
— Saudades deles, faz tempo que não os vejo.
— Eles também vêm perguntando de vocês, mas pedi pra ter calma, só tem uma semana que eu cheguei. — riu até seus olhos pousarem em duas tortas maravilhosas em cima da pia e não ter água na boca foi quase impossível. Ela se sentiu esfomeada ao ponto de não parecer que havia almoçado há apenas duas horas.
— , me diz por favor que a gente vai poder comer essas tortas. — disse sem ao menos piscar enquando observava as duas formas repleta de massa. riu. — Claro que vai, deixa só esfriar. Vem, vamos esperar no quarto.
32 minutos depois, e permaneciam no quarto se deliciando com as tortas de May, fez questão de repetir cada uma delas de tão boas que eram. As duas decidiram assistir um seriado apenas para passar o tempo até que desse a hora de se arrumar.
Naquela manhã, havia acordado decidida de que aquele ano seria um dos melhores, ela faria isso acontecer, e queria começar por aquele dia. Percebeu que era o dia quando levantou da cama e constatou que dormira muito bem, como se a sua alma tivesse sido renovada, o que a fez até esquecer da pequena extenuação pela qual havia passado durante a semana. Juntou todas as coisas e roupas que seriam necessárias dentro da sua mochila e foi até a casa de depois de almoçar, por puro impulso, queria se arrumar lá para a festa. Pensou na festa. E em como iria se divertir, não esperava que nada mais acontecesse além de se ver dançando como uma louca, enchendo-se de algum drink que fosse bom e que não tivesse álcool, ela evitava beber, por mais que tivesse muitas recaídas nas festas de .
Não estava pensando muito se ficaria com alguém lá, até porque não era muito solta. Bem, antes ela ficava com uns caras, alguns prestavam e desenrolava uma coisa mais séria como um namoro, mas pode-se dizer que ela tinha um dedo podre pra escolher homem, resultando em todos acabados quase que da pior forma possível, e era preferível nem comentar sobre. Desde então ela decidiu dar um tempo e não namorar.
Depois de se perguntar tantas vezes sobre o que fazer com a sua vida, ela decidiu aproveitar mais. Em si, por conta da morte de sua mãe seguida de um abandono. Quando nem sequer ela teve a oportunidade de se despedir direito. Dos tempos que ficou sem tocar o velho piano agora coberto por um pano velho e sendo ameaçado de ser jogado fora por estar praticamente caindo aos pedaços. Mas ela não conseguia nem sequer olhá-lo que já sentia uma dor imensa no peito e um vazio enorme, quanto mais tocá-lo outra vez. Então era melhor embrulhá-lo e deixá-lo jogado. Sempre foi assim, embrulhar suas decepções e jogá-las para debaixo do tapete, esquecê-las dentro do baú velho, rasgá-las como uma carta de mal grado, mas nunca conseguir jogá-las fora, porque de alguma forma sempre estariam presas a você. E com era assim, ela sempre estaria presa de algum jeito a pior coisa que poderia lhe acontecer.
Tentou afastar seus pensamentos negativos, começando algum assunto com , já que a série na televisão não era mais capaz de puxar sua atenção.
— Seu tio vai levar a gente hoje?
— Pra onde? — perguntou com o garfo na boca.
— ! — chamou . — Você esqueceu? A festa hoje.
— Ah, acho que não, vou pedir o carro emprestado. Eu dirijo na ida e você na volta, se não for voltar com o .
— Não, sem chance, eu não vou dirigir.
Se havia uma coisa que se negasse a fazer, era dirigir. Quando completou 16 anos, ela se obrigou a tirar a habilitação por precaução, mas recusou de imediato quando seu pai teve a ideia de lhe dar um carro igual havia feito com um ano atrás. A ideia de que se algum dia alguma coisa ruim acontecesse e precisassem de um motorista, e ela fosse a única disponível, lhe torturava. Era essencial saber dirigir e ter habilitação para isso, mas ela se negava a todo custo, se ela precisasse sair e ou qualquer um dos seus amigos pudesse lhe dar uma carona, ela sempre optava pela carona. Talvez fosse algum tipo de trauma, mas, em frente a um volante, ela se sentia nervosa.
— Okay, então, eu dirijo.
assentiu, agradecida, enquanto olhava pela oitava vez para a tela do celular, apertando o botão vermelho para encerrar chamadas que ela não queria começar. havia notado isso.
— Meu Deus, , mas quem é que te liga tanto?
— . — respondeu a outra de barriga para cima. O prato de torta se encontrava ao lado da mesma na cama, agora já vazio. às vezes tinha uma suavidade na voz que achava difícil de acreditar.
— ? — estranhou, não se lembrava de e terem tanta intimidade desse jeito. — O que é que ele quer?
— Encher a minha paciência, é isso que ele quer, mas ele não sabe que isso não é tão fácil assim, vai ter que fazer bem mais que simples ligações pra eu sequer dar algum tipo de atenção pra ele.
, que estava sentada de borboletinha no tapete, olhou para a amiga com as sobrancelhas arqueadas, surpresa.
— Atenção? Ele quer sua atenção?
— Aparentemente sim, mas relaxa não vai dar em nada.
— Espero que assim seja. — murmurou . Ela podia falar mil coisas, tentar interferir, mas sabia que era bem grandinha, podia lidar muito bem com e conseguir afastá-lo sozinha. Com certeza aquele não era um casal que apoiaria. Lembrou-se da conversa que teve com o garoto na detenção, ela tinha que admitir que ele era uma pessoa até que legal, mesmo perturbando-a alguma vezes, sabia ouvir e era muito engraçado. Talvez era isso que quisesse dizer quando explicava as garotas de o porquê ser tão amiga dos garotos.
— — chamou , para que atenção de , já presa na TV novamente, voltasse para ela. — Não conte nada pra sobre isso, ok?
— Tá, mas por que ela não pode saber?
— Pro bem dela, não quero que ela surte sem necessidade.
— Verdade, ela já tem coisas demais na cabeça. — refletiu por alguns segundos, sim não conseguiria se conter e teria que interferir. Ela ainda pensava bastante sobre aquele conflito interno que e sentiam um pelo outro, o qual nenhum dos dois nunca comentava sobre. — Você já pediu o endereço pra ela da casa da fraternidade? Porque eu mesma não sei nem o nome da universidade.
— Vou mandar uma mensagem. — logo já desbloqueava o celular e começava a digitar.
Três horas se seguiram e, depois de revirar a mochila de e o armário de Rebeca escolhendo roupas, as duas finalmente haviam começado a se arrumar.
vestia uma meia calça preta, optou por uma saia também preta e uma camiseta branca, por cima uma jaqueta vermelha. Enrolou um cachecol no pescoço. Pretendia ficar o tempo todo dentro da casa, para que não passasse tanto frio.
Enquanto terminava de se vestir, procurava impacientemente um brinco na joalheria que tinha em cima da cômoda, de frente para o espelho. Após uns 5 minutos, achou um dourado em formato de pássaro, de porte pequeno, que achou que ficaria legal. Ela os colocou e logo depois olhou seu reflexo no espelho, de início não viu nada errado, mas segundos depois percebeu que faltava alguma coisa. O broche. Ela não havia notado até aquele momento que não fazia ideia da onde estava o pequeno broche dourado que sua mãe havia lhe dado, não se lembrava a última vez que tinha o visto.
Antes que pudesse colocar as mãos na cabeça e começar a se preocupar, ficou ao lado de , dividindo o espelho da penteadeira, arrumando a franja e o cabelo e passando um batom vermelho nos lábios. olhou para a amiga, ela estava linda. Usava uma meia calça preta igual a dela, mas, ao invés de saia, ela usava um short jeans claro, e uma blusa de renda preta de manga comprida com colarinho branco um sapato fechado nos pés, e na cabeça um chapéu Coco que havia acabado de colocar.
— O que foi? — perguntou ao perceber o olhar meio cabisbaixo de .
— O que foi o que?
— Você não parece mais com a mesma animação pra essa festa que hoje de tarde.
— Ah, não é nada. Você já terminou, vamos?
assentiu e, após calçar as botas, as duas saíram.
Não foi difícil para achar um lugar encostado na calçada para estacionar. Havia uma pequena fileira de carros até a casa onde ocorreria a festa, de acordo com o endereço que havia lhe passado, com alguns poucos passos as duas já estariam lá. Daquela distância dava para ouvir a música extremamente alta como também alguns gritos de excitação.
estava irritada e aquele barulho todo só piorava, ela não imaginava que fosse ser surpreendida daquela maneira logo no comecinho da noite. A caminho do bairro onde geralmente ficavam todas as casas de fraternidades e irmandades, ela descobriu que a universidade a que todas elas faziam parte era a Manchester Metropolitan University (MMU), localizada ao norte de Manchester e local de ensino de ninguém menos que seu ex-namorado. Austin.
Qualquer ex-namorado não devia estragar sua noite de forma tão simples, e muito menos deixá-la apreensiva como estava, mas o problema era que Austin não era um qualquer. nunca soube direito o que havia acontecido entre os dois quando terminaram, mas sempre sentiu que as coisas entre eles estavam inacabadas. Começaram a namorar quando Austin ainda estava no último ano do colégio, e com toda certeza nunca tivera nada tão intenso antes. Não seria problema passar por ele, cumprimentá-lo, o problema era ficar sozinha com ele, o que poderia ser quase impossível, já que aquela casa deveria estar lotada de gente. Ela tentou se acalmar, apertando os joelhos com as mãos pensando nisso, se perguntava porquê não havia dito que era a universidade que Austin estudava, ela sabia disso, afinal, os dois eram primos. respirou fundo, era corajosa o suficiente para enfrentar os fantasmas do passado, ela só preferia ter sido avisada antes para que pudesse ter vindo mais preparada.
Foi exatamente isso que vinha debatendo com no carro desde que passaram na frente da universidade.
— Relaxa, , é capaz de vocês nem se encontrarem. A gente nem sabe se é essa a fraternidade dele, vai ver ele nem tá aí. — falou , tirando o cinto de segurança enquanto fazia o mesmo.
— Rá, isso não importa, Austin não perde uma festa sequer. Nem se for uma restrita a garotas apenas, acredite, ele daria um jeito de entrar.
— Você não devia estar se preocupando com isso. — qs duas saíram do carro com grossos casacos, dos quais se livrariam quando entrassem na casa. Segundos depois, ouviu sons de passos não tão longe delas duas, virou o rosto para ver de onde vinham, e não se surpreendeu. — ! ! Aqui.
— O quê? , o que você está fazendo? — perguntou assim que ouviu o nome de , era só o que lhe faltava.
— Chamando seu irmão e o pra entrarem com a gente. — antes que pudesse dizer mais alguma coisa, os dois as alcaçaram.
— Hey. — disse . deu-lhe um abraço rápido e cumprimentou da mesma maneira. fez um gesto para cumprimeitar também, mas a mesma continuou parada com os braços cruzados. — Nossa, , a gente nem entrou ainda e você já tá desse jeito.
— O que foi, ? Acordou de mal humor hoje, baby?
— Quando se trata de você, eu tô sempre de mal humor, . — fez questão de não olhar para ele, descruzou os braços, se abraçando fortemente, ela havia se esquecido como lá fora estava frio.
— Nem tenta. — disse para , vendo que o garoto iria questionar. — Vamos logo, aqui fora está frio.
não esperou nem mais um palavra que viesse dos outros três e partiu na frente em direção à casa.
Quando parou na varanda, em frente à porta vermelha, tocou a campainha, ela duvidou que, com todo aquele barulho, alguém fosse escutar, mas mesmo assim tentou. Não demorou para que , e a alcançassem.
— Nossa, achamos que vocês já estivessem lá dentro há um tempo, mas acabaram de chegar?! — disse uma voz que reconheceu ser a de , e ela estava certa. Assim que se virou e viu a garota não tão longe de onde estava, e a surpresa: estava ao seu lado.
— E por que vocês acharam isso? — perguntou .
— Vocês vieram juntos, foi? — perguntou com um tom de malícia. odiava, mas tinha que admitir que a mesma coisa passou pela cabeça dela, e qualquer tentativa de e negarem aquilo seria ridícula. Ela viu revirar os olhos e, antes que pudesse ouvir a resposta da amiga, a porta da frente se abriu e a música pareceu ficar ainda mais alta. teve que levantar um pouco a cabeça para ver o cara que tinha aberto a porta.
Ele era incrivelmente alto, o cabelo negro caia sobre a testa e seus lindos olhos verdes. Ele usava uma camiseta na cor cinza, com os dizeres “PSIGMA” em branco bordados bem na altura do peito.
— Podem entrar! — exclamou, dando espaço. e os outros não perderam tempo, foi um alívio sentir como lá dentro estava tão quentinho. E tinha muita gente, muita gente mesmo, mas não ao ponto de ser impossível caminhar entre as pessoas, pois a casa era enorme. Depois de tirar o pesado casaco e pendurá-lo junto aos outros, fez questão de puxar para perto dela, fazendo questão de esbarrar em no caminho. Ela havia visto Austin no fundo da sala, cercado por uma variação de pessoas.
— Não desgrude de mim, por favor. — murmurou e assentiu, mais uma vez pedindo para ela não se preocupar.
relaxou. Observando a casa, logo percebeu que algumas pessoas, alguns caras na verdade, usavam a mesma camiseta cinza igual a que o cara que atendeu a porta usava. Com certeza deviam ser os donos da casa. se encontrava no sofá, entregue aos braços de Elliot e não seria que iria interromper os dois.
— É agora que a gente se acaba de tanto beber? — perguntou aos amigos, com um tom mais alto na voz por conta da música.
— Já é — disse , avistando uma mesa de tênis bem no final da enorme sala, onde algumas pessoas jogavam Beer Pong.
— ! — acabara de surgir na frente do amigo e se perguntou de onde foi que o garoto surgiu, com toda certeza já havia chegado lá há algum tempo. — Anda, dude, eu preciso falar com você agora. — pegou um dos copos que segurava sem enrolar e começando a beber, deixando que o guiasse para sabe-se lá onde. — Meninas. — cumprimentou após passar na frente de e , olhando fixamente para . Quando os dois passaram, fez uma careta e riu.
— Vamos buscar algo pra beber, o que vocês querem? — perguntou .
— Um energético tá ótimo pra começar. — disse .
— Qualquer coisa que não tenha álcool. — respondeu .
— Eu vou jogar um pouco, depois a gente se fala. — respondeu , indo em direção à mesa de tênis, já se misturando no meio daquelas pessoas.
— Tentem não sumir, vocês duas. — avisou , já puxando em direção à cozinha.
— E nós vamos ignorar o fato de que ela fez tanta questão assim de ir com o ? — perguntou ao ouvido de para que não precisasse gritar tanto. — Um dia eles ainda se assumem.
Depois de algum tempo, e cansaram de esperar com as bebidas e foram até a cozinha. A amiga, tanto como , não estava ali, ainda se perguntava porquê estaria surpresa. Pegaram duas latinhas de Fusion e decidiram dançar, ali mesmo perto do balcão da cozinha. De início, dançaram sozinhas, uma com a outra, as músicas eram agitadas e o clima estava divertido. Até parecia que todos haviam tomado doses e doses de Fluoxetina, mas nada que chegasse a algo tão sério quanto precisar de um remédio para depressão. Tentavam não exagerar muito, afinal, não queriam ser as donas de toda a atenção, por mais que dançassem bem.
— Você acha que devíamos ir atrás deles? — perguntou .
— Não, deixa eles se divertirem um pouco, depois a gente cobra da cada detalhe do que aconteceu.
— Verdade.
continuou a se movimentar no ritmo da música. Ela e deram as mãos e começaram a mexer os braços numa dança engraçada, porque, pelo menos assim, conseguia ignorar o par de olhos que não parava de encará-la.
Do outro lado da casa, encostados na porta de vidro que levava ao quintal, se encontravam e , os dois com copos de whisky na mão. observava o movimento de dentro da casa esperando que lhe falasse logo o que ele queria. A noite só estava começando, mas ele sentia que já havia perdido tempo demais.
— Preciso da sua ajuda. — apontou o dedo indicador no peito de , que franziu a testa.
— E o que necessariamente eu tenho que fazer e pra quê?
— Na verdade, não só a sua como a do também, já que o já tá ocupado com aquele jogo. — os dois olharam para trás alguns instantes. estava prestes a jogar a bolinha no copo.
— Diz logo. — voltou sua atenção para .
— O caso é que eu quero ficar com a . — abriu a boca, meio surpreso, pela garota ‘da vez’ ser e por precisar da ajuda dele pra ficar com ela, coisa que ele sempre fez por si só, sem precisar da ajuda de ninguém.
— E o que você quer que eu faça? É só você ir lá e ficar.
— Quero que você fique com a . — no mesmo instante, parou de prestar atenção e começou a rir, sabendo que aquilo seria uma coisa impossível e que não aconteceria de maneira alguma. Nem de sua parte, e muito menos da de . — Você não entendeu, seu porra — deu um murro em seu ombro, tentando fazer parar de rir. — Para de rir.
— Então explique, porque essa foi boa demais, viu. — disse , se recompondo do ataque de risos. — Eu, ficar com a ? Foi ótima, viu. — o ignorou, começando a falar.
— Escuta, não é tão fácil quanto parece ser, não dá pra ir lá e “só ficar”. Pra eu poder chegar nela, eu preciso que a fique sozinha. Eu já sei que o arrastou a pra algum lugar pelo o que eu pude ver daqui e a ta com um carinha no sofá. — apontou para a escada onde estava mesmo com um cara, segurando um copo vermelho, sentados. — Mas a não larga dela — apontou para as duas garotas encostadas no balcão, que conversavam sem parar um segundo sequer.
— E você quer que eu tire a de lá? — perguntou , acompanhando o raciocínio.
— Quero que você a mantenha afastada da . — corrigiu . — Vamos, dude, e nem precisa ser a festa toda, só até eu ficar com a .
— E o que você acha que eu vou dizer pra conseguir tirar ela de lá? — perguntou . virou os olhos, como se a resposta não fosse óbvia demais. — Porra, . Eu não sei, tira ela do sério, faz ela vir atrás de você, se vira, você costuma ser tão bom nisso, dá o seu jeito. — tá ai uma coisa que adorava e sabia perfeitamente como fazer.
— Tá. — concordou com a ideia. — Mas só por enquanto que eu não arrumo coisa melhor pra fazer. — assentiu, vendo que seu plano daria plenamente certo. Sorriu convencido ao ver entregando seu copo já vazio e indo em direção a e , que continuavam paradas no mesmo lugar.
, por ele, não estava fazendo aquilo pelo simples fato de ajudar um amigo ou porque ele não tinha nada pra fazer ali naquela festa, acredite, ele conseguia arrumar alguma coisa pra fazer ali facilmente, mas sim pelo simples fato de ver irritada e, de alguma forma ou de outra, acabar com a sua noite. Era muito engraçado como a garota reagia a determinadas coisas que o garoto fazia.
tentava não virar o rosto, pois sabia que não iria gostar do que veria, a sorte dela era que ela tinha para lhe ‘proteger’. Rodou os olhos pela casa, por parte dela, a fim de encontrar e , mas nenhum sinal deles. ainda jogava Beer Pong e no caminho para ver se ainda estava naquele sofá com Elliot seu olhar se cruzou com o de Austin, ela fez o máximo de esforço para não expressar reação nenhuma e desviou o olhar. ainda estava naquele sofá, fazendo um sinal com a mão para que se aproximasse. Indicou para que estava indo falar com , fez um sinal com a mão para que ela prosseguisse e que não iria, pois queria continuar dançando.
— Volto logo, não saia daqui! — gritou ela, assentiu.
andava, tentando abrir espaço entre as pessoas e sair da onde estava. Depois de esbarrar em várias pessoas e quase derramar os copos de outros, ela finalmente conseguiu chegar até onde estava.
— Que sufoco! — disse , sentindo que podia respirar ar fresco novamente. — Oi, Elliot. — cumprimentou o garoto sentando ao lado de .
— E aí — Elliot fez um aceno com a cabeça.
— O que quer? — perguntou , voltando sua atenção para , que saiu dos braços de Elliot e se levantou para ficar mais próxima de .
— Nossa, é assim que você fala comigo? — fingiu aborrecimento. — "O que quer", soou com a mesma ignorância que você usa pra falar com o . — rolou os olhos.
— Para com isso, eu nunca vou falar com você como eu falo com ele.
— Eu sei, sua boba. — deu um tapa em e as duas riram. — Preciso da sua ajuda.
— O que foi?
— Bem, é que eu estou com o pressentimento que aconteceu uma coisa que não era pra acontecer — fez um pausa.
— O quê, ? Fala logo, eu deixei a sozinha.
— Acho que meu útero resolveu me fazer uma surpresa. — colocou a mão na boca, percebendo que talvez tenha falado alto demais, mas a sorte é que a música estava mais alta que o tom de suas palavras, então provavelmente ninguém havia escutado. riu baixo, bufou. — Por favor, me diz que você tem um 'OB'.
— Não — respondeu, rindo. —, mas acho que vi a colocando algum na bolsa dela, tá pendurada junto com os casacos. — Completou ela.
— Você — ela segurou pelos braços. — é a minha heroína.
revirou os olhos, achando graça, enquanto via se afastar. Um dia ela descobriria qual o problema que aquela garota tinha. Girou de costas com o objetivo de encontrar no lugar em que estavam, mas ela não estava mais perto no balcão da cozinha, e, antes que pudesse dar um passo para começar a procurá-la, Austin entrou no seu caminho.
— Oi. — disse ele, sorridente. demorou um pouco para falar alguma coisa, não era para aquele encontro ter acontecido.
— … Oi. — respondeu ela.
— Faz tempo que a gente não se vê, não é?
— Pois é, bastante tempo. — e ela queria que tivesse continuado assim. Ele não havia mudado quase nada. As roupas continuavam no mesmo estilo. O cabelo ainda era incrivelmente penteado. E os olhos, brilhantes como dois topázios.
— Engraçado, olha onde a gente foi se encontrar. — sorriu sem mostrar os dentes, forçando uma risada fraca quando ele ficou um passo mais próximo.
— Muita coincidência.
— Eu acho que não. — disse ele, tocando o braço dela.
— Olha, eu tenho que procurar uma amiga, a gente se fala depois, tá? — não era uma boa desculpa, mas não conseguiu pensar em mais nada naquela hora, e, querendo ou não, era a verdade, ela precisava saber onde havia se metido. Mas, antes que pudesse começar a andar, a mão que tocava seu braço se fechou, a segurando levemente.
— Espera, , a gente não pode conversar? Sabe, acho que a gente precisa.
— Agora não é um bom momento, Austin. — tentou se soltar, mas ele apertou mais um pouco.
— Por favor.
— Olha, você pode soltar o meu braço, por favor? Eu não quero falar com você agora.
— É só um minuto. — insistiu ele mais uma vez e cada vez mais ficava impaciente, e, antes que pudesse dizer ou fazer qualquer coisa, uma das coisas que talvez achasse improvável aconteceu.
— Ela pediu pra soltar, cara. — e no mesmo instante que ouviu a voz de Austin soltou seu braço de imediato.
— , quanto tempo. — nada respondeu, apenas fitou Austin sem nem ao menos olhar para e se perguntar o que ela devia estar achando de tudo isso. — Quer saber, eu já to indo. Me liga, , o número ainda é o mesmo. — mesmo que pensasse em responder, Austin saiu dali sem olhar para trás e agradeceu mentalmente, agora ela poderia procurar em paz. Bom, foi o que ela pensou, mas estava parado de frente para ela, o que não fazia sentido algum, afinal o que ele queria? Ele tinha um sorriso idiota na cara. cruzou os braços, tentando desviar dele, não queria brigar e muito menos aguentar as provocações vindas dele, porque isso certamente a faria ficar estressada e a faria querer ir pra casa.
— Você não vai me agradecer? — perguntou ele.
— Não, eu não pedi pra você fazer isso, eu conseguia me livrar dele sozinha.
— Claro que conseguia. — queria encurtar aquele papo o máximo que conseguisse e tentava ir de um lado para o outro, mas impedia a sua passagem. Bufou com raiva.
— Será que dá pra você me deixar passar, inferno! — esbravejou ela, esperando o comentário sarcástico vindo dele, mas isso não ocorreu. continuou com o mesmo sorriso.
— Não. — respondeu ele, ergueu uma sobrancelha.
— Não? Como assim não? Sai logo que eu quero passar. — balançava a cabeça de um lado para o outro, tentando ver, além do corpo de , um sinal da amiga.
— Não posso deixar você passar.
— Não pode? Eu vou passar você querendo ou não, ! — tentou empurrar para fora de seu caminho, mas ele foi mais rápido, segurando seus antebraços.
— Tenho que falar com você. — disse, segurando os antebraços dela firmemente, mas não o suficiente para machucá-la. a odiava, mas isso não era motivo para lhe causar algum ferimento. olhou para ele por um segundo e ignorou o que ele havia dito.
— Preciso achar a . — ela se soltou, cruzando os braços.
— Relaxa, cupcake, está em boas mãos. — o olhou desconfiada.
— Eu não confio em você, e muito menos nessas 'boas mãos' que você citou. — virou o rosto pro outro lado. — E pare de me chamar assim.
— Você devia confiar mais nas pessoas, . — ela o ignorou, tentando passar, mas ele segurou seu braço.
— Me solta!
— Eu já disse que não posso deixar você passar, você não presta atenção nas coisas que te falam?
— E eu já disse que não te dei intimidade pro “”, mas parece que você não presta atenção nas coisas que te falam. — deu um sorriso de lado e o fuzilou com os olhos. Como ele conseguia ser tão calmo assim? A garota ficava estressada tão facilmente quando eles discutiam, mas ele não. Ele conseguia rebater à altura dela e sem perder a calmaria ou ficar nervoso, por mais puto que estivesse, ele demonstrava de outra forma. sempre foi o tipo de cara que não gostava de demonstrar seus sentimentos mais profundos, ele preferia ignorar ou maltratar o problema, seja ele qual fosse.
decidiu desistir e ver logo o que ele queria. Quanto menos tempo passasse ali, melhor.
— Se você tem que falar algo comigo, dá pra agilizar aí? Porque eu tenho uma amiga pra procurar.
— Eu não tenho nada pra te falar. — ele riu, soltando o braço dela. Cínico, pensou . — me pediu pra que eu te tirasse de perto da e te enrolasse pra ele poder falar com ela.
— O que você pensa que tá fazendo, ?
— Ajudando um amigo?! — bufou. — E ainda te livrei de um cara chato.
— A não vai ficar com o , ele não serve pra ela e ela sabe muito bem disso.
— Eu duvido.
— Ela não é burra, . Eu conheço, você conhece, todo mundo conhece a fama que o tem e, acredite, ela vai se deixar envolver.
— Sim, conheço — puxou pelo pulso esquerdo. Ele queria ir até a cozinha, mas sem perder aquela garota de vista. pensava tanto nisso que nem percebeu enquanto ele a puxava. —, mas eu também conheço o o suficientemente para saber que ele não vai desistir. Percebi isso quando ele me pediu pra que eu te tirasse de perto dela. Eu só estou fazendo isso pra ajudá-lo mesmo, porque, acredite, não é nem um pouco agradável passar parte da minha noite com você, . — frisou bem no nome da garota enquanto procurava cerveja na geladeira. Depois de abrir uma garrafa, puxou-a novamente, dessa vez em direção a uma das cadeiras.
— Será que dá pra você parar de me puxar de um lado para o outro feito um cachorrinho, porra!
— É pra eu não te perder de vista e você fugir e acabar estragando tudo. — ele sentou em uma das cadeiras, sentou-se de frente pra ele. Eles ficaram alguns segundos em silêncio.
— Sabe, ele deve gostar muito dela então pra ter toda essa insistência. — começou a rir e quase se engasgou com a bebida que estava tomando.
— ? Gostando de alguém? Conta outra.
— É o que eu acho.
— Rainha das ilusões. — começou a olhar para as garotas que passavam por ali, procurando alguma interessante.
— Quer apostar? — cruzou os braços em cima da mesa, observando-o com um olhar desafiador, mas sem encará-lo nos olhos. Aquilo com certeza havia chamado atenção de . — Aposto que a não fica com ele tão facilmente, não pelo menos até ele demonstrar algum sentimento verdadeiro.
— Vai ser a aposta mais fácil que já ganhei em toda minha vida.
— Eu não aposto pra perder, muito menos pra você .
— Tá, e qual vai ser o meu prêmio?
— Não sei, a gente pode decidir na hora, que tal?
— Cada um escolhe o que quer?
— Exato.
— Apostado. — estendeu a mão para , que titubeou antes de apertá-la.
— Espera, vamos ter algumas regras só pra eu ter certeza que você não vai dar um jeito de roubar. — assentiu sem se preocupar muito, dando mais um gole na cerveja. — Eu disse sentimento verdadeiro, ou seja, se o estiver mentindo, não tá valendo.
— E como você vai saber se ele mentiu ou não?
— Simples, a vai me contar e ela com certeza vai saber se ele tá mentindo ou não.
— Certo. — estendeu a mão novamente.
— Só mais uma coisa, você não pode contar pra ninguém sobre isso. É muito fácil você ir lá e cochichar pro o que ele tem que fazer.
— Assim como também é muito fácil você falar pra .
— Ok, então, isso fica entre nós. Apostado? — dessa vez foi quem estendeu a mão.
— Apostado — estendeu a dele. sentiu um leve calafrio quando a mão gelada dele, que segurava a garrafa de cerveja, encostou na dela e eles as firmaram como se fossem sócios de uma empresa fechando um negócio.
— Mas, como eu já disse, você vai perder feio, .
— Isso é o que nós vamos...
— ! — um grito interrompeu e assustou um pouco os dois. Eles olharam juntos para a direita. Era uma garota, que estava vindo diretamente ao encontro deles. Quando ela se aproximou mais, pode claramente reconhecê-la. Alicia. Não ficou tão feliz em vê-la, era uma das garotas com quem ele teve um rolo e logo depois sumira sem deixar bilhetes. Umas das únicas que aparentemente não se importou nem um pouco em como as coisas haviam acabado entre eles e não o odiava. Como ela o havia encontrado ele não fazia ideia. — Nossa, cara, te procurei por toda parte assim que soube que você tava aqui.
olhou para ela, que já se inclinava na direção dele, e percebeu que ficaria até que entretido demais, achou que era o momento perfeito para se livrar dele de uma vez por todas. Levantou da cadeira devagar e saiu de fininho, pelo menos uma dessas garotas que dão em cima de de cinco em cinco minutos chegou em hora certa. Se afastou mais um pouco, entrando num montinho de gente para que não a encontrasse, olhou o amontoado de pessoas na casa, ela tinha que achar ou qualquer outros dos seus amigos. Decidiu ir até onde estava jogando Beer Pong para ver se o irmão tinha visto , ou circulando por aí.
— E então, ? Qual vai ser? — perguntou pela segunda vez. Assim que saiu de perto dela, ele havia arrastado até o porão da casa, onde a festa continuava. Como era mais escuro lá embaixo, havia várias luzes coloridas iluminando o lugar, muitas pessoas de pé, mas tinham mais lugares para sentar. O espaço era rodeado de poofs e poltronas de várias cores. Os dois estavam em pé, um de frente para o outro em um lugar no canto perto da porta.
— Não vai ser, , apenas isso.
— Você vai recuar se eu for te dar um beijo nesse momento? — balançou a cabeça, afirmando.
— É, eu vou sim.
— E você não vai me dizer por quê?
— Você não parece muito com os caras que eu costumo beijar, . — disse ela, abaixando a gola da jaqueta dele e dando dois tapinhas leves em seu peito. acompanhou cada movimento das mãos dela.
— Por quê? Eu sou muito mais bonito? — riu, virando a cabeça para o lado.
— Não, você é muito abusado.
— Por isso que você está fugindo de mim?
— Talvez. Talvez seja divertido ver você correr atrás.
— Ah, saquei tudo. Você quer jogar, não é? — disse ele, dando um passo para trás e se afastando dela.
— Não, não é isso... — ele estava entendendo tudo errado, mas, antes que ela conseguisse explicar, ele a interrompeu.
— Eu não curto esse tipo de jogo, , a gente tem um passado e é meio ridículo você ficar ignorando isso.
— E você se orgulha desse passado? Faça-me o favor, . — ela rolou os olhos só de lembrar da época em que se conheceram.
— Você esperava mais de mim, não é? Nem tente negar, todo mundo sempre espera, mas esse aqui sou eu, sabe, e sinto muito se não sou do jeito que você esperava.
— ... — murmurou ela por cima da música, mas ele ja tinha saído pela porta em direção às escadas, subindo-as rapidamente.
deu de ombros, ela queria explicar para ele que não era nada daquilo, que acabou deixando que ele pensasse que ela tinha uma visão errada dele, mas não era isso.
e se conheceram bem antes de estudarem juntos na Cuddle High School e muito antes dela voltar para Washington. Na verdade, eles e estudavam juntos em outra escola e pode-se dizer que tinham uma boa relação de amizade. , na maioria das vezes, sempre desconfiava em relação a novas amizades. Não sentiu isso com em um segundo sequer, por outro lado, em relação a , sempre teve um pé atrás. O garoto que vivia dizendo gostar da menina e pedia a para que o ajudasse a ficar com ela. fazia e tentava ajudá-lo ao mesmo tempo em que não confiava muito nas palavras dele por algumas atitudes que tinha às vezes, coisas que ele fazia que ela não concordava nem um pouco. Até que chegou o dia em que ela decidiu que não iria mais compactuar com e que deveria fazer o mesmo.
lembrava-se bem daquele dia e do que aconteceu, a verdadeira razão para ela se afastar de . Até ela e mudarem de escola e irem para a Cuddle, e demorar apenas um dia para que percebessem que era a mesma escola na qual também estudava. Ela não teve que se preocupar muito com o garoto, que a ignorou assim que chegou, pois em poucos meses teve que se mudar para Washington em razão da morte do pai. E dois bons anos depois ela estaria ali, vivendo todo aquele drama de novo.
Na epóca, havia seguido o conselho de , afinal, ela estava certa, não valia a pena, e, pelo que pareceu, pelos poucos dias que o observou desde que voltou, ele ainda não valia a pena.
Mas não era hora para ficar remoendo o passado, ela ainda queria curtir mais a festa. Antes de sair do porão, ela olhou em volta do lugar, muita gente bêbada gritava, muitos dançavam como loucos, outros apenas conversavam em algum canto, mas outra coisa havia lhe chamado a atenção.
— Tenho certeza que isso não choca ninguém. — disse para si mesma antes de dar as costas para a cena de e em um dos poofs, se beijando.
cutucou no ombro enquanto ele virava um copo de cerveja. O outro time do outro lado da mesa de tênis vibrava, pelo que pareceu eles estavam ganhando.
— ! — chamou alto. bateu o copo azul de plástico na mesa, mostrando que havia terminado o conteúdo que havia dentro.
— ! — disse, animado, um pouco alterado. — Vem aqui — e abraçou a irmã pelos ombros.
— Você tá jogando desde que chegamos?
— Sim, e estamos perdendo. Vem cá, deixa eu te apresentar. — arrastou dois passos para o lado e, com o braço que não abraçava , abraçou outro cara pelos ombro. percebeu ser o mesmo cara de olhos verdes que abriu a porta para eles entrarem. — Esse aqui é o Liam, Liam essa é a . — sorriu na direção do rapaz, que estendeu a mão para cumprimentá-la.
— Prazer.
— O prazer é todo meu. — disse ela, apertando a mão dele.
— Então, por que você não joga com a gente? Como seu irmão disse, estamos perdendo.
— Ah, é boa de pontaria. — disse , soltando os dois. Antes que pudesse responder, ela avistou , a garota virou os olhos depois de lembrar-se do que havia lhe dito. " pediu pra que eu te enrolasse pra ele poder falar com a ."
Me enrolasse, como se pudesse me enrolar! Pensou ela, e, quando passou na frente deles, ela o puxou pelo braço.
— ! Onde está a ? — perguntou, séria.
— Eu não sei, , procura. — e se soltou das mãos da garota. — Tô caindo fora.
tentou, mas ela não havia entendido nada. Não havia o usual tom de deboche que usava para falar com ela, na verdade ele parecia com raiva, frustrado. Talvez as coisas com não tivessem sido assim tão boas. sorriu com a possibilidade.
— Ei espera aí, cara. — agarrou o amigo pelos ombros. — Você já vai embora??? — apenas se soltou das mãos do amigo e sumiu entre as pessoas indo em direção à porta da frente. ficou observando até ele desaparecer, seja o que fosse, ela daria um jeito de descobrir o que tinha acontecido naquela noite entre ele e .
— Vem, joga com a gente. — Liam a puxou pela mão, entregando-lhe a bolinha de ping pong branca.
deu de ombros, não tendo escolha e se juntando a eles. Mesmo que preferisse não beber, ela sobreviveria a alguns copos de cerveja.
Certo tempo depois, não havia mais visto a cara de ou . havia sumido com Elliot e havia finalmente aparecido e se juntado a ela, e Liam ao jogo de Beer Pong, que ficava cada vez mais divertido, além de contar-lhes o que havia visto acontecer entre e . estava bêbada demais para pedir explicações para , decidiu deixar para depois.
Ela conseguiu aproveitar o resto da noite, Austin não a procurou mais e havia desaparecido, pensou que todos os dias poderiam ser assim.
Chapter Five — Can You Help Me?
Na quarta-feira o dia parecia estar mais frio que todos os outros. Apesar de a neve ter se esvaído, fazia 3°C lá fora e chovia fortemente. O que era péssimo, pelo menos para . Nos últimos três dias, desde a festa, ela começou a perceber como aquele clima estava afetando a sua saúde. Prejudicou muito a sua garganta, que começara a doer, tanto que naquela manhã, no colégio, ela saiu da aula de História e decidiu ir até a enfermaria para tomar alguma coisa que melhorasse a sua rouquidão. Ela odiava dias de frio assim, parecia que o clima ficava tenso, além de ela ficar doente, o que era horrível. Na verdade, não via a hora de julho chegar e trazer com ele o verão e as férias.
Estava sentada numa das macas da enfermaria esperando Sara voltar com alguma coisa quente para ela beber. Não demorou muito e logo escutou passos vindos do corredor e o barulho da porta rangendo, que estava sendo aberta. Sara entrou segurando uma xícara enrolada num pano branco. Sara era alta, tinha um cabelo loiro pintado para esconder os fios brancos, já que era uma mulher com um pouco mais de idade, e usava uma roupa rosa bebê que fazia parte do uniforme.
— Muito bem, , beba tudo. — disse ela entregando a xícara com o pano, estava realmente quente. pegou a xícara e mesmo assim tentou dar alguns goles. — Tem certeza que não quer ir pra casa? Posso te dar um autorização.
— Não, obrigada, eu vou ficar bem, Sara.
— Certo, então, terminando aí, você já pode sair. — disse a enfermeira, sentando na mesa do outro lado da sala enquanto checava alguns papéis. assentiu, deixou o chá esfriar um pouco até conseguir beber tudo, colocou a xícara em cima da mesa e agradeceu Sara novamente antes de deixar o recinto.
Contudo, assim que saiu da enfermaria, achou que precisaria voltar. No momento que ela ia abrir a porta, a mesma abriu sozinha e bateu fortemente na sua cabeça. Aparentemente alguém do lado de fora abriu-a para entrar na sala no momento em que saia, o choque quase a fez cair. Ela levantou o rosto, vendo dois garotos exatamente iguais. Tudo bem, eram só um, ela que estava meio zonza. Segundos depois a imagem normalizou e ela via apenas um garoto que a olhava preocupado.
— Você está bem? — perguntou ele.
— Estou. — ela disse baixo, sua garganta ainda não estava muito boa.
— Foi mal aí, não vi que você estava saindo.
— Não, tudo bem, eu é que estava olhando pra baixo. — ela riu fraco, ele sorriu.
— Normalmente eu receberia uma resposta do tipo "Você não sabe bater antes de entrar?” seguida de xingamentos. — balançou a cabeça negativamente, nunca pensaria em tal grosseria. Bom... Talvez até pensasse se o garoto em questão fosse um tal de .
— Imagina, nunca diria isso. Você parece ser legal.
— É, mas se tratando de garotas a maioria diria, dependendo do estado hormonal delas, mas o seu parece estar ok. — riu, ele era engraçado. Olhou o rosto dele e foi aí que percebeu que o nariz do garoto sangrava.
— Ah, meu Deus, seu nariz sangrando e a gente aqui conversando. — tocou o rosto dele num impulso, mas logo tirou, achando aquilo estranho.
— Não se preocupe, isso não foi nada. — ela ergueu uma das sobrancelhas e ele também, ela riu. — Tá, tudo bem, vamos dizer que eu tenho que aprender a controlar um pouco a minha raiva e que um soco ou apenas uma cutucada são capazes de danificar os vasos sanguíneos minúsculos do meu nariz.
— Você deveria então ter mais cuidado.
— Finn. — disse ele, se apresentando.
— Me chamo ...
— !! — virou o rosto imediatamente para olhar de onde vinha o grito. Vinha do final do corredor e não poderia ser de outra pessoa. Ela se virou para Finn, dando um sorriso de desculpa.
— Eu acho que estão te chamando. — ele disse olhando pra ela.
— É...
— A gente se vê por aí, .
— Pode me chamar de . — ele piscou pra ela, entrando na enfermaria.
— Claro. — disse baixo sem saber se ela tinha escutado.
foi em direção ao final do corredor onde estava , que fazia um gesto com a mão para que ela andasse mais rápido. Ela apressou seus passos, chegando até onde a garota se encontrava.
— Onde você tava? — disse , sem paciência. rolou os olhos, ela devia ter bebido muito café essa manhã.
— Na enfermaria, sabe, quase morrendo, você me viu saindo da sala. A propósito, eu to muito bem, viu, . — riu.
— Que seja, precisamos ir pro refeitório, quero saber as novidades entre a e o . — começou a puxar pelo braço em direção ao refeitório. — ESPERA! — parou imediatamente, fazendo quase cair por cima dela, a garota parecia tão estática que nem ligou, olhou para e seus olhos começaram a brilhar. — Com quem você tava falando?
— An... Finn. — disse , tendo certeza do nome do garoto. — É, com o Finn. Acho que ele esteve numa briga, o nariz dele estava sangrando.
— Finn? O Finn Flynn? — os olhos dela se arregalaram. E teve que colocar a mão na boca para não rir ao ouvir o sobrenome do garoto, achou engraçado como o som soava.
— Finn Flynn? Esse é o sobrenome dele? — soltou uma risada entre os dentes. — Que engraçado.
— É, usa isso pra puxar assunto com ele na próxima vez que vocês forem conversar.
— Você o conhece? — rolou os olhos, e se sentiu estúpida por ter perguntado. Claro que sabia quem era, conhecia todo mundo daquela escola.
— Conheço. — respondeu obviamente. — Ele joga no time de basquete, e é um dos melhores. — , como líder de torcida, fazia questão de nunca tirar folga entre a temporada de futebol e a basquete. A equipe de torcida dos Hawks torcia para ambos os times e isso fazia com que ela conhecesse bem cada um dos jogadores. — Mas claro que você não sabia disso já que você nunca vai nos jogos de basquete da escola.
— Fico com preguiça, o sempre me chama pra ir, mas quase sempre eles jogam sexta-feira à noite, e nas sextas eu gosto de ficar com o meu pai em casa.
— Tá, que seja, Deus te abriu uma porta, não saia pela janela, . — deu um tapa na cabeça dela. gemeu de dor, a xingando de "vaca". riu e a puxou de novo para o refeitório. — Tudo bem que o papinho que vocês tiveram ali não significa muita coisa, mas vai acontecer mais algumas vezes até ele chamar você pra sair, então não perca essa chance.
— Ok, pare de já sonhar com o nosso casamento e filhos, eu vou apenas deixar rolar.
— Como quiser, mas que o Flynn é um bom partido isso é, e muito.
rolou os olhos, já estava acostumada com lhe empurrando garotos. As duas passaram pelos corredores já vazios, o sinal já havia tocado fazia poucos minutos, mas ninguém gostava de perder tempo quando se tratava de ir até o refeitório comer.
— Sinto muito, , mas eu não posso te aplicar outro teste. Seria injusto com os outros colegas. — lamentou a professora.
estava com as mãos apoiadas no birô esperando que Lauren Downey, a professora de História, tivesse um pouquinho de compaixão para que aumentasse relativamente a sua nota. O segundo trimestre daquele ano letivo estava acabando e as notas dele não estavam lá tão boas. Em março eles teriam somente mais uma prova antes do começo do próximo trimestre, e, mesmo que se esforçasse ao máximo no último trimestre –– que começaria em abril após as férias de páscoa ––, ele não teria a nota necessária para não reprovar. E, porra, o próximo ano seria o último, e ele queria estar junto de todos os amigos.
— Não tem nada que eu possa fazer? Isso tá me preocupando muito, porque, se eu reprovar, talvez a minha capacidade me deixe na mão, e eu preciso porque também posso ser expulso do time. — praticamente estava implorando piedade por parte dela. Reprovar em uma matéria já era ruim, em uma matéria que você nem é bom então... Apesar de ter que admitir o próprio vacilo. Ler, para ele, era chato. História era chato. Não fazia questão de estudar a matéria pois não tinha muita paciência.
Ela olhou para ele e deu um longo suspiro, terminando de guardar suas coisas dentro da bolsa.
— Já que você está mesmo tão interessado desse jeito, eu posso te passar um trabalhinho extra. — agradeceu mentalmente enquanto ela reabria o zíper da bolsa para pegar alguns papéis.
— Muito obrigado. — só faltou abraçá-la.
— Estou lhe avisando que não vai ser fácil...
— Tudo bem, eu enfrento. — interrompeu ele. Ela o entregou três folhas e começou a explicar o que ele tinha que fazer. O sorriso de se desfez no mesmo instante.
— Quero que leve a sério, , você está tendo um privilégio que eu não dou a qualquer um. Achei digno porque você realmente está correndo atrás. — olhou para os papéis, engoliu em seco e olhou para Sra. Downey. — Vai aceitar?
— Vou, pode deixar! — ele afirmou, começando a se afastar.
— Certo, as instruções sobre o que eu quero estão anotadas nesses papéis, quero que entregue na semana que vem. Não me decepcione, , espero ter feito o certo.
Foi a última coisa que escutou antes de sair da sala.
Ele olhou para as folhas em sua mão, tendo vontade de rasgar tudo e jogar no lixo mais próximo. Mas suspirou, tentando ser compreensivo, afinal, ele estava tendo uma segunda chance, não devia desperdiçá-la ou menosprezá-la. Andou pelo corredor, com intenção de ir até seu armário guardar os papéis. Avistou próximo sem surpresa, já que seus armários eram um ao lado do outro. correu, dando uma rasteira no amigo, que estava de costas, mas sem derrubá-lo.
— Filho da puta! — xingou enquanto ria e se concentrava em abrir o armário. — Por que demorou pra sair da sala?
— Fiquei pra pedir misericórdia à Sra. Downey. — respondeu ele, enfiando os papéis que a professora havia lhe dado dentro do livro de história e colocando-o no armário.
— E ela deu?
— Felizmente sim. — fechou o armário e acompanhou até o refeitório. — Vou ter que fazer um trabalho enorme pra quarta que vem.
— Uau, está mesmo preocupado com o colégio, quem diria.
— Dude, se ela não me der uma nota boa e a minha nota não subir, eu não jogo o próximo jogo, o treinador já me avisou. Além de que posso reprovar.
— Pior que eu também tô mal, só que em matemática. Não estou tão pendurado como você, porém, né, é sempre bom ficar na média.
— Fala com Sra. Gamaliel, vai que ela sente dó de você te dá uns extras?
— Já falei, ela me passou umas atividades, já entreguei metade. — já estavam no corredor que levava à porta do refeitório, continuaram andando em linha reta.
— Certo, super gênio. — debochou . apenas riu.
— Mas vamos jogar hóquei no sábado à tarde? Antes que o lago comece a descongelar.
— Acho que não, vou começar esse trabalho o mais cedo possível.
— Hm, tive uma ideia, mas acho que você não vai gostar muito. — disse , desviando o olhar. ergueu as sobrancelhas, imaginando onde o amigo queria chegar.
— Diz logo.
— Por que você não pede ajuda pra ? — parou subitamente após eles terem atravessado a porta do refeitório, ficando de frente para .
— Você ficou louco? Eu prefiro sair do time a pedir ajuda pra sua irmã. — retrucou . Ele mesmo achou a ideia tão absurda que quase teve vontade de rir, tinha certeza que faria o mesmo ao ouvir a proposta.
— Ah, , também não é pra tanto. — duvidava muito que preferisse ficar sem jogar o resto da temporada de basquete a ter ajuda de em alguma coisa. — Ela é ótima nessa matéria, se quiser eu peço pra ela por você. — olhou ao redor do refeitório. Ele e estavam parados em frente à porta. estava sentada em uma das mesas localizadas no meio com o resto das garotas. Imaginou os dois num local fechado, estudando história por certo tempo, sem tentar um agredir o outro com palavras e definitivamente...
— Não. — negou de imediato. — Dude, eu não preciso da ajuda dela, nem de ninguém, eu consigo fazer sozinho.
— Ah, consegue mesmo?
— Consigo. — afirmou Augusto, tentando passar confiança, mesmo que não tivesse toda a convicção que desejava ter ao proferir aquela palavra.
— Tá certo, então, mas, se você não jogar o próximo jogo, eu vou dar um jeito de te tirar do time permanentemente, só pra parar de ser orgulhoso. — deu as costas pra o amigo enquanto ia em direção à fila da cantina.
não jogava futebol com , e , ele era apenas do time de basquete. Cobrava muito de si mesmo, assim como dos outros jogadores, por ser o capitão do time. Por esse motivo, sabia que o amigo falava sério. Mas não iria deixar que aquilo acontecesse, porque, caso acontecesse, ele não teria nem o direito de ficar bravo com .
Fez o mesmo caminho que o amigo, até a fila, que começava a ficar menor, parando bem atrás do rapaz.
— Foi só um beijo, quantas vezes eu vou ter que repetir isso pra vocês? — falou já sem paciência. As quatro amigas estavam sentadas em uma das mesas redondas, localizadas no centro do refeitório. Nos últimos três dias, , e não paravam de falar sobre o assunto de que e podiam estar finalmente juntos, mas fazia questão de negar, afirmando que nem sabia o que estava acontecendo no dia em que se beijaram.
— , pare de colocar a culpa na bebida. — disse .
— Admita logo, vocês se beijaram porque estão apaixonados um pelo outro e é isso. — disse enquanto abria uma garrafa de água. rolou os olhos.
— Quanto tempo será que vai demorar pra vocês perceberem que o e eu não vai rolar?
— Ué, mas por que não? — perguntou . — Vocês combinam, fariam um casal lindo.
— O é um amor, mas ele é muito galinha. — retrucou . Ela conhecia perfeitamente bem, mas nunca se imaginou ao lado dele sendo algo a mais do que uma amiga. Duvidava do que ele queria também. Certo que eles não haviam parado para conversar ainda sobre o assunto, mas com certeza ele diria algo sobre esquecerem, que aquilo não foi nada demais. — Ele mesmo me fala das garotas que ele pega em toda santa festa, odeio quando eles me fazem de escuta pra falar disso.
— Aposto — disse , dando uma breve pausa para beber um gole de água. — que ele só fala dessas garotas pra te irritar e te deixar com ciúmes. — e , que comiam um iogurte, concordaram, e olhava diretamente para o seu hambúrguer sem olhar para as amigas. — Ele já me disse que uma vez foi falar contigo porque ele tava indeciso entre uma loira e uma morena, e você saiu toda brava dizendo que não iria ajudá-lo numa coisa dessas. — riu ao lembrar-se da história.
Honestamente, era o melhor amigo que alguém poderia querer. Era seu melhor amigo e ela não acharia de nada mal juntá-lo com .
— O não gosta de mim, , não existe sentimento algum além de amizade.
— Ah, claro. — falou . — Então por que ele sempre faz questão de te dar um abraço toda vez que vocês se vêem?
— Sem falar daquele selinho que ele te deu antes do Natal quando você tava indo viajar, não pense que eu não reparei nisso! — disse , lembrando da ocasião. a abominou mentalmente por ter citado aquele acontecimento, porque não era mentira. Ele havia mesmo feito aquilo.
— Ele sempre te abraça quando te vê também, . — respondeu em sua defesa.
— Não abraça, não. Ele me carrega e ameaça me jogar no chão caso eu não diga “Eu te amo, . Agora, por favor, me larga!” — corrigiu , e as outras três caíram no riso. — É diferente.
— Vocês já comeram esse hambúrguer da cantina? — disse de boca cheia. — Sério, é maravilhoso.
— Nem pense em mudar de assunto, ! — replicou .
— Droga, o que vocês querem que eu faça? — respondeu , deixando o hambúrguer na bandeja. — Vocês sabem que eu não namoro muito, meus peguinhas não eram nada sério. — justificou-se ela. estava se vendo em uma caixa fechada, onde seus argumentos estavam ficando escassos e logo logo ela se veria tendo que render-se ao sonho das três amigas de ver ela e juntos.
— Mas agora você pode ter, Barbie. — disse com um sorriso, vendo ali uma ótima oportunidade de dar uma de cupido.
— Qual é, , tem que ser o . — falou . — Quem mais poderia ser?
— Quem mais poderia ser o quê? — disse assim que chegou à mesa das garotas acompanhado de . O garoto sentou-se ao lado de e sentou entre e , querendo ficar o mais longe possível de e não se atrevendo a chegar perto de . Mesmo sem nem imaginar que não estava nem aí para ele. rolou os olhos com a chegada do infeliz.
— Olha só quem chegou. — disse . trazia nas mãos um cachorro quente, e uma latinha de refrigerante. — Adivinha no que nós estávamos falando. — queria poder conseguir chutar por baixo da mesa sem acabar encostando em também. ergueu as sobrancelhas, mas, antes que pudesse responder, se adiantou.
— Já saquei tudo.
— Sacou o quê? — perguntou , juntando-se aos amigos, sentando ao lado de , seguido por .
— Elas querem saber o que está rolando entre vocês. — falou , se direcionando a . Todos olharam , esperando o que ele iria responder. até mesmo havia esquecido de ignorar na mesa de tão interessada que ela estava na conversa. Mas apenas sorriu, ele não podia mesmo perder a oportunidade de zoar com os amigos.
— Não é óbvio? Estamos juntos. — afirmou ele. As expressões nos rosto dos amigos foram de surpresa, menos a de . arregalou os olhos, que porra era aquela que ele estava falando, mas, assim que lhe deu um chute de leve por debaixo da mesa, ela entendeu tudo e segurou o riso. — se vestiu de homem aranha no domingo de madrugada, ela sabe como eu gosto da Marvel, e foi até a frente da minha casa com um megafone me pedindo para ser a sua Gwen Stacy, só que sem a parte de morrer, é claro. Colocou uma escada e subiu até a minha varanda, me laçou com uma corda branca, dizendo ser uma teia, e me puxou até conseguir me beijar. Vocês acham que, depois de tudo isso, eu teria recusado? — finalizou , mandando um beijo no ar para , que não esperou nem chegar no final da história para cair na gargalhada. Depois de tentar se recompor, ela pensou no que havia dito minutos atrás, e, realmente, se não fosse , não poderia ser mais ninguém.
— Vai se foder, , seu merda. — xingou , percebendo a brincadeira mas rindo junto. Logo todos começaram a rir também.
— Porra, só porque eu queria ouvir a te xingar indignada. — comentou , decepcionado, eram poucas as vezes que o seu palpite estava errado. lhe mostrou o dedo do meio, e ela e se levantaram batendo as mãos com um hi-five por cima da mesa, demonstrando a cumplicidade. Eram uma boa dupla, pensou ela.
— , eu não admito você brincar com os meus sentimento desse jeito. — falou , cruzando os braços. a abraçou pelos ombros, puxando-a para perto. — É do meu casal que nós estamos falando aqui.
— Eu te fiz rir, então está valendo.
— Idiota. — respondeu ela, se afastando do amigo e lhe dando um tapa no braço.
Por poucos segundos, o único som audível era o barulho de bocas mastigando e as conversas altas no refeitório. , que já havia acabado seu lanche, mexia no celular, junto com , que também não comia mais nada. , , e haviam entrado em uma séria discussão sobre o último jogo do Manchester City contra o Manchester United na Premier League. começou a observar ao seu redor, até seus olhos baterem em , que tinha uma cara nada boa direcionada para o outro lado do refeitório.
— ? — chamou . A voz dela fez levantar os olhos do celular, assim como , enquanto os outros quatros continuavam numa discussão intensa sobre os dois times rivais. — Por que esse olhar furioso pra mesa da Lila? — olhou para onde Lila se encontrava. A ruiva estava de pé de costas para eles, enquanto segurava uma prancheta e falava alguma coisa para as pessoas que estavam sentadas à mesa na frente dela.
— Porque essa garota só faz besteira. — respondeu sem desviar o olhar. — Eu devia ter pensado melhor antes de aceitar entrar na chapa dela como vice. Foi graças ao meu empenho na campanha que ganhamos.
— Quem só faz besteira? — perguntou , se desvencilhando da conversa com os garotos para ouvir o que falaria.
— Lila. — respondeu .
— Mas por quê?
— Porque essa anta reuniu todo o pessoal do conselho do grêmio estudantil pra bolar um jeito de fazer a diretora aprovar o pedido de criação de novos clubes interdisciplinares.
— E onde isso é uma coisa ruim, ? — perguntou , tirando sua atenção do celular, vendo uma perfeita oportunidade para implicar com .
— É ruim se todo o investimento que é dirigido para todos os outros clubes que já existem forem redivididos. — disse enquanto , e prestavam atenção. , e pareciam estar em outro mundo.
— Mas os clubes existentes não vão deixar de ter o devido investimento. — rebateu . — Aliás, não seria ótima a adesão de novos clubes? É um ótimo projeto de inclusão, teria mais opções para os alunos que não se encaixam em nenhum dos clubes que já tem. — respirava fundo a cada palavra que falava e revirava os olhos. Ela simplesmente odiava quando as pessoas começavam a falar, a darem sua opinião sobre qualquer assunto sem saberem nada a respeito, exatamente o que estava fazendo pelo simples prazer de contradizê-la. — Me admira muito você ainda ser vice do grêmio com uma mente tão pequenininha. — disse, fazendo um biquinho e quase encostando o seu dedo indicador com o polegar em direção a .
— Vou ter que concordar com o , amiga — falou . —, o que tem de mal nisso? — , que ficou ainda mais irritada depois de concordar com , bateu com uma das mãos na mesa. O barulho chamou a atenção de , e para ver o que estava acontecendo.
— , por que você não cala a sua boca antes de falar do meu cargo no grêmio? Pelo menos eu faço alguma coisa que presta e não fico fumando pelos corredores contaminando o ar da escola. — e se entreolharam e depois para , preocupadas pelo alto volume da voz da mesma, que olhava fixamente para . — Sim, seria ótimo se as ideias pros novos clubes não fossem completamente idiotas. E, , — olhou para a amiga —, tem que pensar muito antes de concordar com as opiniões estúpidas de , porque esse imbecil, na maioria das vezes, não sabe o que fala, lhe faltam neurônios. — encolheu os ombros e sorriu de escárnio. bufou, e perguntou antes que pudesse rebater.
— Mas quais são as ideias?
— Clube dos Jogos de RPG, Clube dos Animais de Estimação, Clube da Corrida de Tartarugas, Clube de Crochê, Clube das Explosões Cientificas, Clube dos Estudo do Acasalamento Animal, Clube do Sorvete, Clube do Boliche, e vários outros, mas sem deixar de citar o Clube do Celibato. — revirou os olhos após falar o último grupo. Os amigos riram enquanto ela citava cada um deles, com exceção de .
— Ei, o Clube das Explosões Ciêntificas e da Corrida das Tartarugas não é nada mal. — disse já por dentro da conversa. foi forçada a revirar os olhos, lembrando da explosão no laboratório de química.
— Pelo visto não é só o que não tem neurônios por aqui. — alfinetou , sem olhar para .
— . — chamou e a garota acabou por virar o rosto para encará-lo, se arrependendo no minuto seguinte, porque, quando o fez, um pequeno jato de ketchup que havia sobrado no sachê que havia pegado na cantina voou na sua cara. Arrancando risadas de , , , e do próprio . — Foi mal, apertei sem querer.
— É HOJE QUE VOCÊ QUER MORRER, ? — disse raivosamente, ficando de pé e apertando fortemente a garrafinha de água, imaginado o momento que despejaria o resto do líquido em sua cabeça de vento. , vendo a proporção que aquilo poderia tomar, como estava do lado da garota, tratou logo de levantar colocando a mão no braço em que segurava a garrafa, e a outra mão limpava o rosto dela com um guardanapo.
— Ei, ei, , relaxa aí. Vamos, , continue nos contar o plano maligno da Lila e porquê a opinião do é totalmente irrelevante. — bufou de raiva, mas fez o que havia lhe pedido e voltou a se sentar, ignorando o sorriso que carregava na cara, aquilo com certeza teria volta. mostrou o dedo do meio à após ouvir que sua opinião era irrelevante, o amigo só fez rir.
— , em que mundo a diretora vai aprovar essas ideias? — perguntou . , que assistia à cena de e com o cotovelo apoiado na mesa e a cabeça apoiada na mão fechada, levantou os olhos para o irmão da melhor amiga.
— Lila. Ela quer porque quer esse clube ridículo do celibato, mas precisa do apoio do resto do grêmio, e só vai conseguir se acatar as ideias deles. Aquela garota tem um incrível poder de persuasão, vai vir com esse mesmo papo de inclusão que o se referia.
— Por isso essa escola está uma bagunça. — disse , pensando sobre o assunto.
— Se tá uma bagunça, então você também é responsável já que é a vice, não? — disse direcionado a .
— , você calado fala menos besteira, então nos faça esse favor. — falou .
— Ei, sem brigas. — disse , impedindo de rebater. — E desculpa, , mas realmente, são ideias ridículas. — sorriu satisfeita, obtendo novamente o apoio da amiga, e rolou os olhos.
— Mesmo que o Clube do Sorvete fosse tentador. — falou e todos riram, concordando.
— Então quer dizer que, se isso acontecer, os clubes de artes, que incluem canto, dança, teatro e pintura, vão receber um orçamento menor do que recebem?!
— É isso mesmo, , e ainda não acabou. — disse , ela finalmente poderia colocar para fora o porquê daquilo tudo a incomodar tanto. O fato de Lila, uma incompetente, assumir um cargo tão importante. Quisera ela ter tempo suficiente para assumir o comando de tudo, nunca faria algo tão estúpido, pensando nos próprios interesses, como Lila estava fazendo. — Eu duvido muito que o orçamento direcionado aos clubes consiga cobrir todos, certamente uma parte do dinheiro direcionado aos esportes e às líderes também vai ser desviado.
— Mas que caralho! — perguntou , indignado, imaginado vários cortes sendo feitos tanto no time de futebol quanto no de basquete. Ou até que cortassem algum dos esportes. e também não pareciam nada felizes. tentava disfarçar que aquilo não era mesmo nada legal.
— Isso não pode acontecer, sem chance. — falou .
— Se a estivesse no comando dessa porra, isso com certeza nunca aconteceria. — afirmou , e lhe lançou um sorriso cúmplice.
— Certamente que não.
— Não quero nem imaginar quem vai assumir no ano que vem quando a Lila sair. — falou .
— Ah, mas eu posso. — respondeu , olhando para o irmão. queria poder chutar a irmã por debaixo da mesa, porque todos começaram a encará-lo, tentando entender o que queria dizer. arqueou as sobrancelhas, não achando que fosse perfeito para aquele cargo. Ela, assim como os outros, estava surpresa.
— PRA PRESIDENTE. — gritou , se levantando e chamando a atenção de alunos próximos.
— Cala a boca, dude. — disse , puxando para baixo.
— Estou fazendo sua campanha eleitoral antecipada, assim tem mais chances de você ganhar, devia me agradecer. — rolou os olhos.
— Muito obrigada, viu, . — riu, mandando um beijo no ar para o irmão.
— , presidente do grêmio? — perguntou .
— Desde quando, dude? — bateu de leve com as costas da mão no braço do amigo.
— Desde nunca, está inventando coisas.
— Há! Não se faz de sonso! — acusou . — Desde semana passada, quando ele me perguntou se daria um bom representante. — respondeu a todos na mesa, não querendo se direcionar diretamente para , ela ainda não havia esquecido o esguicho de ketchup que tomou na cara.
— Eu só tava pensando se talvez... Sei lá, não acho que daria certo. — disse .
— Eu apoio cem por cento caso você for tentar. — disse ao parceiro de laboratório, concordou.
— Eu também.
— Todos nós. — falou . sorriu com o apoio coletivo, a não ser de , que estava calada desde que tocou no assunto.
— Fico feliz, talvez eu tente mesmo.
— Se você e a não forem rivais, acho que você tem muitas chances de ganhar. — disse . olhou da amiga para , tendo um rápida troca de olhares com o rapaz.
— Ah — disse ela, rindo fraco. — Pode ficar tranquilo, eu não estou interessada na vaga, vai ser nosso último ano, eu com certeza não vou ter tempo. — desviou o olhar da mesa de amigos, olhando ao redor do refeitório procurando por Elliot.
— Você podia mudar de colégio no próximo ano, né, ? — alfinetou . A garota apenas revirou os olhos, se levantando e o ignorando completamente.
— Eu vou procurar o Elliot enquanto ainda temos tempo de intervalo, vejo vocês depois. — deu uma última olhada para as amigas antes de sair em direção à última mesa no fundo do refeitório. seguiu com o olhar até a garota chegar na mesa que Elliot se encontrava, ela também queria um bom motivo para poder sair dali.
— Ei, dude, quando você for fazer campanha você vai me chamar pra ser vice da sua chapa, certo? — olhou de para e gargalhou.
— Só se ele quiser perder, .
— Quer mais ketchup, ? Dizem que hidrata a pele. — podia sentir o fogo nos olhos ao encarar , que apenas esboçava um sorriso de lado, Infelizmente não havia pensando em nada que pudesse fazer para dar o troco no infeliz.
— Você nem se atreva, . — falou ela, irritada, procurando por todo refeitório com os olhos, até achar algo que fosse lhe servir.
— Ele não vai não, . — a voz de a chamou e ela desviou sua atenção para o irmão. — Relaxa aí.
— está fazendo tempestade em copo d’água. — disse , prendendo a atenção de todos. — As ideias podem ser bestas, mas são bem criativas e divertidas. Não sei pra quê toda essa confusão.
— Porque isso envolve dinheiro, . — para surpresa dele, fora quem se pronunciou. — O dinheiro que, no caso, a gente paga. Não deve ser gasto com coisas inúteis.
— Verdade. — disse . — Os clubes não servem como atividade extracurricular?
— Servem. — respondeu . — Não sei como a participação em um clube de corrida das tartarugas influenciaria na admissão em qualquer universidade.
Todos riram, com exceção de . Ele não se importava nem um pouco com admissão em faculdades, no momento sua cabeça só conseguia pensar em e em como suas atitudes eram confusas.
Já , no momento da distração, mandou despercebidamente uma mensagem para , ele com certeza queria conversar sobre tudo o que havia acontecido de maneira séria, sem piadas ou desvios, como os dois vinham fazendo nos últimos 3 dias.
Logo depois, o sinal tocou, indicando o fim do intervalo. levantou-se da mesa primeiro que todos a fim de conseguir chegar na cantina antes que saísse do refeitório e o tumulto em direção a saída começasse. Andou rapidamente, pegando um frasco de pimenta e apertando um pouco na sua mão esquerda. Virou-se, procurando onde os amigos estavam. se encontrava na frente junto com Elliot quase na porta, , e caminhavam alinhados e um pouco atrás iam , e . Ela andou rapidamente entre alguns alunos, fechando a mão numa concha para que a pimenta não se fosse pelos ares com a pequena correria.
— ! — ela gritou, mas, antes que ele pudesse se virar, o abraçou por trás passando o braço direito em torno da sua cintura. e , que estavam ao lado de , arregalaram os olhos, se perguntando o que diabos estava acontecendo, o que havia dado em . , ao sentir o braço da garota em torno de si, parou de andar repentinamente, sentindo um arrepio lhe subir pelo corpo, um frio na barriga totalmente inesperado e uma leve falta de ar. Mas, no segundo seguinte, sentiu um ardor horrível na boca e no nariz, no momento em que cobriu sua boca com a mão esquerda. Ela tinha lhe lambuzado a cara toda praticamente com pimenta, tudo ardia. E só piorou quando a garota se aproximou mais ainda, sem querer roçou os lábios na sua orelha, sussurrando:
— Pimenta também hidrata a pele.
saiu rapidamente, em direção à sua sala. Deixando para trás um irritado, uma de sobrancelhas erguidas e um que com certeza não esqueceria aquela cena.
Eram 19h daquele mesmo dia quando bateu na porta do quarto de , que se encontrava esparramado na cama, sem camiseta, com os headphones firmes na cabeça. Fazia uma hora que ele havia terminado alguns exercícios complicados de matemática que a professora Susan Gamalieu havia pedido e finalmente poderia relaxar. Ou pelo menos pensou que poderia.
— , é a sua vez de lavar a louça, esqueceu? — disse , que, após bater três vezes na porta, adentrou o quarto do irmão. levantou, suspirando e tirando os headphones. segurava um cesto branco cheio de roupas — Separou as roupas que eu pedi? — ele afirmou, indo até o closet, pegando as peças brancas e jogando-as no cesto que a irmã segurava.
, e o pai dividiam todas as tarefas da casa, revezando-as. Bill achava que aquele jeito era muito mais eficiente para ensinar e a terem responsabilidade e disciplina, ao invés de contratar empregados para aquilo.
Os dois irmãos desceram juntos a escada, na frente, carregando o cesto. Ao chegarem no térreo, foi para a cozinha e para a lavanderia, que ficava ao lado, uma porta separava os cômodos. começou a ensaboar os copos com a bucha, sentindo a falta do pai e de Elsie, que cada vez mais era presente na casa e na vida da família .
— .
— Hm. — respondeu enquanto jogava as roupas na máquina.
— Cadê o pai? E a Elsie?
— Foram no mercado, disseram que, se chegassem muito tarde, nós iriamos ter que pedir pizza.
— Pizza em plena quarta? — sorriu consigo mesmo, pensando na ideia enquanto enxaguava os copos e os colocava no escorredor. , depois de colocar a quantidade de sabão necessária e verificar se não havia nenhuma meia colorida no meio das roupas brancas, fechou a máquina e a ligou.
— Eles vão chegar cansados pra cozinhar, você não acha? — disse a garota, entrando na cozinha e tratando de pegar um pano para secar e guardar o que lavava.
— Acho, mas também acho que podíamos fazer isso toda semana.
— Ah, claro, super saudável. — disse com ironia, secando os pratos que lavava e empilhando-os na ilha, para logo em seguida levá-los até o armário.
— Ah, fala sério, , nossa saúde já é fodida.
— É mesmo, por isso estou querendo adotar um novo estilo de vida. Quem sabe light life? Sabe, cuidar mais da saúde, da pele. — começou a rir.
— Não faz piada, , você é péssima nisso.
— Mas não é piada, eu tô falando sério.
— Desde que você descobriu que ketchup hidrata a pele? — , que guardava a pilha de pratos no armário, virou a cabeça para encarar o irmão seriamente enquanto o mesmo ria. Os dois recordando a cena no refeitório mais cedo, mas com reações completamente diferentes.
— Às vezes eu penso que o tem 12 anos de idade na verdade. — a garota voltou a se aproximar da pia para secar os talheres que já havia lavado. — E você também.
— Eu?! — perguntou o irmão numa falsa indignação.
— Sim, você mesmo, que ri desse tipo idiotice do . Um total inútil.
— Que o não leva nada a sério é verdade, que ele também não é lá muito inteligente também, mas um total inútil, ? — perguntou, mas não lhe deu nenhuma resposta, preocupada em separar as facas dos garfos e colheres. — Ele é esforçado, vamos, admita. — deu de ombros. Se era ou não esforçado, não lhe interessava nada.
— Talvez ele deva ter algum neurônio que funcione. — riu da indiferença de . Era engraçado como ela se esforçava para não dar a mínima.
— O é responsável quando quer, ele foi pedir misericórdia à Sra. Downey para lhe ajudar com as notas.
— E ela deu? — perguntou , assentiu.
— Você podia dar uma forcinha, né? O trabalho é enorme. — começou assobiar descontraidamente enquanto ensaboava alguns potes de plástico. Ele sabia que seria orgulhoso demais para pedir tal coisa à e seria uma péssima perda ter que tirar do time como ele havia dito ao amigo que faria. Ele teria que cumprir com a palavra independente do que acontecesse. Seria uma boa lição de vida a : mostrar que ele precisava acordar pra vida. Era isso que amigos faziam, certo? acreditava que sim.
observou o irmão assobiar como se o que ele tivesse acabado de lhe perguntar não fosse nada demais.
— O quê? Você tá me pedindo pra ajudar o ?
— É. — desligou a torneira e encarou a irmã. — O que custa, ? Ele vai reprovar se não tirar uma nota muito boa.
— Bom, se ele passasse mais tempo prestando atenção na aula do que de gracinha com a Nicki da segunda fileira na aula de história, talvez não estivesse pendurado e quase reprovando. — começou a secar os potes que lavou, enquanto o irmão passava o rodinho na pia, puxando a água.
— Vai dizer que você nunca se distrai, nem por um minuto sequer?
— Sim, me distraio por um minuto, mas não a aula INTEIRA.
— Nós erramos pra aprender, né? — rolou os olhos, odiava quando estava certo.
— , me diz, o que porra eu vou ganhar perdendo quase que uma tarde inteira ajudando o cabeça de vento do ?
— Sei lá. Ele fica te devendo uma?
Por breves segundos, pensou na proposta, era satisfatório pensar que pudesse ficar lhe devendo uma coisa. Duas, caso ela ganhasse a aposta que tinham feito. Mas era orgulhosa demais para dizer sim àquilo.
— Nem que ele ficasse me devendo dez. — disse , dando as costas e saindo da cozinha após o trabalho terminado.
bufou, derrotado.
Às 21h da noite, Bill, Elsie e se encontravam na cozinha, tirando os produtos das sacolas plásticas e os guardando no devido lugar enquanto estava na sala com o celular em mãos, pedindo três pizzas. O casal havia chegado apenas há 10 minutos, exaustos pela tamanha fila que haviam pegado no caixa em plena quarta-feira.
— Todas de pepperoni, certo? — gritou da sala para os outros três na cozinha. , que ficou de guardar os frios na geladeira, a fechou repentinamente.
— O QUÊ? — gritou para o irmão. — Não mesmo, . Eu quero a minha de marguerita.
— É isso mesmo, moça, três de pepperoni. — falou ao celular. saiu correndo em direção ao irmão, tentando pegar o celular dele.
— Não! — disse na tentativa de fazer a pessoa que estivesse do outro lado da linha a ouvisse. A garota tentava se aproximar do irmão, mas ele a empurrava com a mão livre enquanto ria.
— , peça o sabor que a sua irmã quiser também. — falou Bill, passando pela sala com algumas sacolas do mercado, certamente com os produtos higiênicos que ele guardaria no armário do banheiro. Num momento de distração do irmão, aproveitou para lhe dar uma almofadada na cara.
— Ei!
— Não acredito que vou passar fome por sua culpa. — disse , sentando-se no sofá com os braços cruzados. sentou-se ao lado dela, rindo.
— Eu nem sequer disquei o número da pizzaria. — bufou, se levantando.
— Droga, por que você sempre faz isso? — perguntou, chateada consigo mesmo por mais uma vez ter caído na brincadeira do irmão. Foi até a cozinha continuar a ajudar Elsie com o resto das compras enquanto , dessa vez de verdade, discava o número da pizzaria.
— Oh, , deixa que eu termino isso aqui. — falou Elsie assim que viu começar a juntar as sacolas. Segundos depois a campainha tocou, sobrando para ela atender.
Mas quem diabos fazia uma visita 21h da noite de uma quarta-feira sem aviso prévio? Ela bem tinha um nome em mente. . Não era possível. Ela torcia de dedinhos cruzados que não fosse o infeliz ao bater na sua porta. Não seria a primeira vez que aparecia na casa dos de forma inesperada. Na visão de , aquele insuportável metido a guitarrista conseguia ser inconveniente até quando não queria. Mas não foi que encontrou assim que abriu a porta, e sim .
— ! — disse ele entrando, deixando totalmente confusa.
— O que você tá fazendo aqui? — perguntou sem fechar a porta enquanto tirava a jaqueta e a pendurava nos cabides perfurados na parede.
— Dude?! — respondeu , animado com a presença do amigo. foi até a sala cumprimentá-lo e fechou a porta, seguindo-o.
— Desculpa aparecer sem avisar. — disse , surpreendendo . pelo visto sabia pedir desculpas. — Meus pais saíram, e nem se eles quisessem me levar junto eu iria. — explicou ele. — Estava um tédio no apartamento.
— Sem problema. — respondeu . — Senta aí, nós pedimos pizza.
— Vocês salvaram o meu jantar. — respondeu o amigo, sentando-se no sofá maior, observando do outro lado, encolhida na poltrona enquanto mexia no celular.
— Se fosse a Elsie que fosse cozinhar, você com certeza não iria querer ficar pra jantar. — falou em um baixo tom de voz.
— Eu ouvi isso, garoto! — falou a mulher da cozinha. Os três jovens na sala riram. Segundos depois, Elsie apareceu na sala, cumprimentando . — Não tenho culpa se o pai de vocês cozinha melhor que eu.
— Ainda bem que ela sabe disso. — disse Bill, aparecendo na sala. Elsie riu, abraçando o companheiro de lado. — Sabe, seria muito mais difícil se eu tivesse que te dizer isso. — Elsie rolou os olhos, e e riram. alternava o olhar entre eles e o celular. Achava incrível a capacidade que seu pai tinha para lidar com as pessoas. Com ele era tudo fácil, tudo tranquilo. Sentiu uma pontinha de tristeza ao lembrar como as coisas também eram incrivelmente mais fáceis com sua mãe.
— Vamos terminar as compras e colocar a mesa. — murmurou Elsie, puxando Bill pela mão em direção a cozinha.
— Fique à vontade, . — disse o pai de , já sumindo cozinha a dentro com a namorada.
— Ei, dude — chamou , se levantando e, abusado como era, pegando um dos controles do Playstation 4. — Vamos jogar?
— Claro, vai ligando. Joga aí enquanto eu tomo um banho.
— Credo, , você não tomou banho ainda? — falou com uma careta, às vezes quando queria conseguia ser bem porquinho.
— Esqueci. — disse ele, dando de ombros. — , escolhe aí um jogo. — , que já havia ligado o vídeo game, olhou para o amigo já próximo a escada.
— Beleza. A pode ir jogando comigo.
— Obrigada, mas eu passo.
Uma rodada jogando Fortnite foi o bastante para enjoar. Ele agora nem se importava se estava sendo morto no game pois observava pelo canto dos olhos de segundo em segundo. , mesmo centrada na conversa no grupo com as amigas, que estava muito engraçada, percebia os olhares do garoto e de certo modo a incomodavam. Bufou com a ousadia que tinha e também com a falta de educação que aparentemente os pais dele não haviam lhe dado. Nem no mínimo um pouco de limites.
Eles não deveriam ter uma relação muito boa, já que se recusava a ficar na companhia dos pais. Preferiu ‘invadir’ a casa dos a ficar sozinho. Talvez ele fosse bem sozinho mesmo, pensou . Mas a curiosidade não era tão grande ao ponto de fazer ela querer perguntar. Diferentemente dos olhares que ele lhe lançou nos últimos minutos.
— O que você quer? — perguntou , bloqueando o celular. deu pausa no jogo, dando um sorriso sem mostrar os dentes.
— Por que você acha que eu quero alguma coisa?
— Porque você fica me observando, achando que eu não estou percebendo.
— Não quero nada. — o garoto levantou-se de onde estava sentado do outro lado do sofá, ficando mais próximo de onde estava sentada. — É que eu não consigo esquecer da cena de hoje mais cedo.
— Qual? Do seu amigo sofrendo com a boca ardendo de pimenta? — perguntou com a memória fresca. A reação de após o que ela tinha feito foi ainda melhor do que ela acharia que fosse.
— Na verdade eu tava falando da encoxada que você deu no . — arregalou os olhos, mas a face indignada durou poucos segundos, dando espaço para um sorriso singelo. Nunca entre no joguinho de , porque você vai perder, pensou.
— Eu sei o que você tá fazendo, e não vai dar certo.
— Sabe mesmo?
— Sei. Está tentando me deixar sem graça, com a ideia de que eu vou surtar e começar a negar o que você disse. Só pra você poder rir da minha cara.
— Eu estou fazendo o possível pra você começar a gostar de mim, .
— Jura? — disse , apoiando um dos cotovelos na poltrona e a mão na bochecha. — E por que isso agora?
— Porque me sinto ignorado, não precisa me tratar mal. Eu sou legal pra caramba, pergunta pro .
— Mas eu não te trato mal.
— Você, quando me vê nos lugares, passa reto e nem me cumprimenta.
— Se você recebe esse tipo de atitude vindo de mim, foi porque você pediu por isso. — mexeu com os polegares nos analógicos do controle reiniciando o jogo. olhou para a tela da TV, vendo o personagem de fazendo uma dancinha estranha com um “L” na testa.
— Tudo bem, , considere isso como um acordo de paz.
— Se está fazendo isso pra que eu fale bem de você pra , esqueça.
— ? — perguntou ele com total indiferença, o que fez desconfiar.
— Sim, ela me contou o que rolou na festa.
— Contou, foi? Interessante.
o encarou como se pequenas interrogações houvessem brotado no topo da sua cabeça. não havia demonstrado sequer preocupação, como se tudo que houvesse dito para ele fosse totalmente irrelevante. Lembrou-se da aposta que ela e haviam feito. O medo de perder a incomodava e infelizmente ela não poderia interferir. Perder lhe parecia uma opção melhor do que receber lição de moral de , com certeza ele não perderia a oportunidade.
Minutos depois, se juntou a no vídeo game. voltou ao seu celular e viu que havia duas chamadas perdidas de . Decidiu retornar a ligação. Após chamar três vezes, atendeu.
— Oi, .
não saiu da sala sem antes conseguir reparar no rápido desvio de olhar de para ela assim que tocou no nome da amiga. Que a curiosidade não fosse um problema para ele depois que subiu a escada em direção ao seu quarto.
— “O desejo não nos impulsiona apenas para alcançar o outro como objeto. O desejo exige a relação em que se busca sobretudo o reconhecimento do outro. O amante não deseja se apropriar de uma coisa: deseja capturar a consciência do outro. A relação amorosa se funda na reciprocidade, logo, desejamos o outro como ser consciente e também pensante.” — leu o professor enquanto caminhava pela sala. Fechou o livro e olhou para a classe. — Fora Georg Wilhelm Friedrich Hegel quem propôs o que eu acabei de ler agora. Alguém pode me dizer o que significa?
Alguém na sala levantou a mão, mas não se preocupou em saber quem fora. Já fazia alguns minutos que estava dispersa na aula. Olhou para o lado: babava em cima da carteira; mais à frente, copiava a matéria do quadro, mexia no celular e acenava para ela pelo vidro da porta. juntou as sobrancelhas confusa. ? O que estava fazendo ali?
“Vem aqui”. conseguiu ler nos lábios da amiga.
Segundos depois, o sinal tocou. pegou seu material, sendo a primeira a sair da sala enquanto o Sr. Lopez dizia:
— Quero que façam a leitura da página 15 à 27 de “Filosofia: 79 reflexões”, para a próxima aula.
Assim que colocou os pés para fora da sala, a puxou pelo braço e começaram a andar pelo corredor movimentando até o auditório onde a professora de canto e dança falaria sobre o Sarau que aconteceria no fim de julho.
Na noite passada, ligara para para falar exatamente sobre aquilo e por uma novidade. A garota teria descoberto antes de todos da mudança repentina de professora. A antiga professora, Norma, tivera que se ausentar por algum motivo e a substituta atendia pelo nome de Lilith Martinez.
— Muito bem, agora que todos estão aqui, eu posso começar. — disse a professora Martinez, fazendo gestos para todos se aproximassem. e passaram pelas diversas fileiras de assentos do auditório até o palco, onde todos se encontravam ao redor da mulher.
Para , haviam diversos rostos conhecidos por ali dos clubes de canto, teatro e dança, inclusive Finn Flynn. Ele acenou e ela lhe deu um sorriso em resposta, mesmo estranhando porque o garoto não fazia parte de nenhum dos três clubes que haviam se juntado naquele ano.
— Acho que já perceberam que a professora Norma não está aqui hoje. Ela está passando por um problema de saúde. Meu nome é Lilith e vou substituí-la até que possa se recuperar. — falou, esperando que os alunos concordarem, e logo continuou. — Pedi que viessem até aqui para conversarmos um pouco sobre o Sarau que a escola organiza no final de todo ano letivo em julho. O Sarau é aberto para todos os alunos participarem, e imagino que a maioria de vocês ou até mesmo todos vão participar. — um leve “sim” foi proferido da boca dos alunos. A maior porcentagem de alunos que participava do Sarau todos os anos era composta pelos alunos dos clubes das artes e naquele ano não seria diferente. Lilith continuou:
— Como esse ano os três clubes estão juntos, decidi dar a ideia de usarmos nossas aulas para ensaios, pedi que viessem para perguntar se estão de acordo. — a maioria concordou, incluindo e . Uma parte do clube de teatro pigarreou. Uma garota de cabelos encaracolados, representando o grupo, disse:
— Mas, Sra. Martinez, nós do clube de teatro temos que ensaiar para a peça.
— Sim, eu pensei nisso também. Podíamos mudar os horários dos ensaios, pois assim quem for fazer a peça e participar do Sarau tem possibilidade de fazer os dois. Podemos conversar sobre as datas e horários. — os alunos do clube de teatro se entreolharam, mas enfim concordaram. — Sendo assim, dispensados.
Aos poucos, o auditório foi esvaziando. procurou Finn com os olhos, mas pareceu que o garoto havia evaporado como água fervendo em um bule de chá a mais de 100°C de tão rápido que desapareceu.
— Quem você tá procurando? — perguntou enquanto as duas se dirigiam para fora do auditório.
— Finn. A gente se esbarrou ontem na enfermaria.
— O Flynn?
— Você conhece? — perguntou , surpresa.
— Conheço, éramos do clube de marcenaria antes de eu ir para Washington. Se você estiver interessada, pode me contar, .
— Não, . Eu só achei ele bem legal... Queria perguntar o que ele estava fazendo ali, porque fiquei curiosa. — explicou , empurrando uma das portas enquanto empurrava a outra para que as duas chegassem ao corredor que as levaria até o pátio.
— Olá, jovens moças delicadas. — falou , surgindo de repente no meio das duas. , por instinto, se moveu para direita para se afastar um pouco do garoto.
— Virou perseguição agora, ?! — falou . olhou para , mas sem trocar olhares, pois a mesma começou a encarar o chão enquanto andava.
— Eu só vim lhes fazer um convite irrecusável, não precisa me tratar assim. — respondeu ele, bagunçando o cabelo de . A garota afastou a mão dele, rolando os olhos.
— Convite? — perguntou com as sobrancelhas juntas, como se vários pontos de interrogação preenchessem o topo da sua cabeça.
— É, pra tomarmos um sorvete pacífico. Mas já vou logo avisando que vocês que vão pagar, porque dinheiro eu não tenho. — disse ele. imediatamente lembrou da situação que se encontrava em relação aos pais que havia lhe dito.
— Você nos convida e a gente que tem que pagar? — diz , o olhando de relance. O modo normal que falava lhe assustava, como se ele já tivesse esquecido tudo que havia rolado na festa passada. Eles ainda não haviam conversado a sós depois daquilo, e ela desejava que continuasse assim.
— É, você só esqueceu que está frio pra caralho pra tomar sorvete.
— Um chocolate quente ou um cafézinho, então. Com certeza a minha companhia vale o preço de uma xícara de duas libras esterlinas.
— Com certeza não vale. — disse , brincando. Eles haviam chegado no pátio aberto da escola, frio por conta do vento gelado do inverno. Logo avistaram e conversando alegremente em baixo de uma árvore.
— O que será que eles estão conversando? — perguntou .
— Com certeza sobre o nome que vão dar aos filhos. — cotovelou pelo comentário, mas logo riu, acompanhada de . Os três se dirigiram ao casal. ria enquanto negava com a cabeça.
— Não, sem chance, .
— Sem chance o quê? — perguntou assim que se aproximou mais dos amigos.
— quer que eu assista com ele Notorious no cinema sábado.
— Por que não? — perguntou . — É um clássico de Alfred Hitchcock e do cinema antigo.
— É em preto e branco, deve ser chato. Eu me recuso a pagar pra ver isso. — rebateu .
— Se você me deixar pagar, isso não vai ser problema. — continuou de maneira convincente, como se não percebesse a presença dos outros três amigos.
— Espera um pouco — falou . — Vocês vão sair juntos?
— Se a aceitar, vamos sim. — respondeu sem tirar os olhos da garota. olhou para os lados, corada. Ela havia pensado no convite como uma simples saída de amigos, não imaginava que poderia insinuar como algo a mais, e nem que os amigos iriam ficar sabendo tão rápido assim. Mas, antes que a mesma pudesse dizer algo ou pudesse fazer alguma gracinha, apareceu entre e com um humor nada bom. O gorro que ela usava na cabeça estava quase caindo, deslizando pelos cabelos que quase sempre estavam bem penteados.
— Vocês não fazem ideia de onde eu acabo de voltar. — falou ela. ficou imaginando onde a garota poderia estar. Saiu da sala tão rápido para acompanhar até o auditório que nem sequer viu para onde o resto dos amigos, ou até mesmo o irmão, que estavam na sala tinham ido.
— De onde? — perguntou .
— Do veredito final da diretora Parker sobre o pedido da criação dos novos clubes de Lila Saltman.
— E aí??? — falou . Ela, assim como todos, estava muito curiosa.
— E aí que o bom senso hoje em dia ainda existe. — respondeu ela, cruzando os braços. — Ela achou absurda a ideia dos clubes da Lila, que começou um discurso que me deu sono, mas consegui me manter acordada para rebater à altura.
— E o que a diretora decidiu? — perguntou . suspirou. Com certeza a decisão da diretora não lhe agradou tanto, mas ela sabia que era a melhor opção para todos. Não podia reclamar, afinal a ideia fora dela.
— Ela achou boa a ideia da criação dos novos clubes, porém aquelas opções eram péssimas e o orçamento era curto. E eu acabei tendo uma ideia, que não me agrada muito, mas só assim não haveria mais discussões e o grêmio inteiro não ficaria contra mim por ter derrubado as ideia ridículas deles. — ninguém falou nada esperando que continuasse. — Dei a ideia de tirar um pequeno valor do orçamento dos outros clubes e uma parte do das líderes de torcida. Substituir o Clube de Pintura pelo de Artes Plásticas, que abrange até mesmo esculturas ao invés de só a arte pintada. Criar novos clubes como o de Experiências Ciêntificas, coordenado por um professor da área, o Clube de Estudo do Mundo Animal e o Clube da Ciência Humana. E a diretora adorou. Infelizmente o Clube do Celibato da Lila também entrou no pacote, mas fazer o quê.
— Chega a ser assustador como você sempre tem uma solução para tudo. — falou e lhe deu um sorriso de lado.
— E deixa eu adivinhar — disse . — Você está chateada porque cedeu parte do orçamento das líderes? — assentiu.
— É. Sabe, o campeonato de cheers é mais importante para nós e é a escola que paga. Por isso sinto muito, — a garota olhou para , ignorando completamente o fato de também fazer parte do time. —, mas a gente não vai mais com vocês para os jogos fora de casa. Pelo menos os do time de basquete. O orçamento não daria pra pagar as duas coisas.
— Vocês só vão torcer pra gente quando jogarmos aqui? — perguntou o garoto. E assentiu mais uma vez.
— Por outro lado — falou com um tom um pouco mais animado que o anterior. —, eu tive uma ótima ideia pro dia dos namorados desse ano.
— E por que você acha que nós queremos saber sobre essa “incrível” ideia sua nessa comemoração idiota? — murmurou , encostando na árvore e cruzando os braços. — Pelo que sei, todo mundo aqui é solteiro. Ou pelos menos por enquanto. — disse a última frase encarando e , que o ignoraram.
— Se sinta à vontade então para não ir. — respondeu . — Sua presença é totalmente irrelevante e indesejada.
— Certo, , diz qual foi a sua ideia — disse antes que pudesse retrucar, mas o mesmo apenas colocou os fones conectados ao celular para não escutar ou participar da conversa. Ou pelo menos fingir que não escutava.
deu um sorriso travesso, pois ainda não diria uma palavra. Por algum motivo, mesmo que ela e Elliot ainda não tivessem assumido nada sério, tinha a sensação que aquele 14 de fevereiro seria inesquecível.
Depois da última aula, , e se encontraram no estacionamento para poderem voltar juntos. foi no banco de trás com os fones de ouvido, evitando a conversa do irmão com o amigo sobre as músicas horríveis que havia colocado para escutar no rádio. Ela ia passando as músicas uma a uma, analisando e selecionando quais ela poderia cantar no Sarau. Procurava por uma animada e dançante. No ano interior, havia performado Hollaback Girl, da Gwen Stefani, e desejava poder fazer uma apresentação igual ou até melhor.
Quando parou na garagem da casa dos , desceu, indo direto ao seu quarto para que pudesse planejar melhor o que tinha em mente.
desligou o carro, e consequentemente o rádio, e a música parou de tocar. Os dois saíram do carro carregando suas mochilas por apenas uma alça. desligava o bluetooth do celular e, antes de ir para a casa da frente, perguntou a :
— Dude, falei com o e o pra gente ir andar de skate no domingo.
— Ih, não vai dar. Marquei de ver uma pessoa já, sábado e no domingo inclusive.
— Que pessoa? — perguntou , curioso. Ele teria certeza absoluta que seria mulher caso o amigo se recusasse a responder.
— Ninguém. — sorriu, afirmando suas incertezas. — E você não tem um trabalho aí pra fazer? Pendurado pelo pescoço no time e quer andar de skate?
— Tenho, e eu vou fazer. — defendeu-se. — Pensei em ir pra pista de noite, depois que eu já tivesse adiantado bastante o trabalho.
— Falando nisso, eu falei com a ... — disse , fingindo que arrumava o chaveiro da mochila.
— Mas que porra. Eu não disse que não queria ajuda?
— É, mas eu ignorei. De qualquer modo, ela recusou, então não se preocupe.
— Isso não me surpreende nenhum pouco. — falou , dando às costas ao amigo. Assim que saiu da garagem, fechou o portão de ferro.
atravessou a rua em direção à casa da frente, tentando colocar os pensamentos no lugar e esquecer o trabalho que tomaria grande parte do seu final de semana. Quantas coisas ele poderia fazer ao invés de ler mil textos sobre a história da monarquia inglesa. Com certeza veria vídeos que o livrassem de toda aquela leitura. Para ele, na escola o mais fácil é sempre o melhor caminho.
Limpou os pés no tapete da varanda, pegou suas chaves no bolso da calça e entrou em casa. Assim que fechou a porta, sua mãe apareceu na sua frente com um sorriso maior do que a cara. olhou para o lado e entendeu o motivo. Sua tia Donna e o seu priminho Mike estavam sentados na sala. A mãe do garoto tirava alguns brinquedos da mochila enquanto o pequeno entretia-se com os peixes que nadavam dentro do aquário redondo em cima da estante.
— As nossas visitas chegaram. — disse Cindy.
sorriu quando Mike veio correndo na sua direção.
Chapter Six — One Kiss It’s All It Takes
“A monarquia britânica traça as suas origens nos pequenos reinos da Escócia na alta idade média e os da Inglaterra anglo-saxã, que consolidaram os reinos da Inglaterra e Escócia por volta do século X.”
releu pela terceira vez as únicas duas linhas que havia escrito no papel branco.
Às 9 horas daquele sábado já estava de pé determinado a começar aquele trabalho, se começasse cedo talvez tivesse o finalzinho da tarde livre para fazer outras coisa. Mas estava sendo mais difícil do que imaginava. Dos cinco livros — que havia pegado na biblioteca da escola no dia anterior — empilhados do lado do seu notebook, ele só tinha aberto um, e não passara do primeiro capítulo. Tentara diversas vezes voltar a leitura ou ver algum vídeo na internet, mas se cansava rapidamente, perdia rapidamente a concentração. Alguma notificação no celular, as cutículas das unhas e até mesmo uma formiga andando na sua parede o destraiam facilmente e ele imediatamente parava o que estava fazendo. Sem falar da sua fender, pendurada na parede atrás de si, que parecia estar gritando nos ouvidos dele para que largasse tudo e fosse tocar alguma música com ela. E, realmente, era o que ele mais queria fazer, porém uma vozinha na sua cabeça lhe dizia que não, que ele não podia.
Escutava Mike do lado de fora quase que o tempo todo brincando com um carrinho pela parede do corredor, enquanto sua tia chamava sua atenção para fazer silêncio. Vontade não faltava para levar o primo para dar uma volta ao mesmo tempo que passeava com Bud. Pegava o celular várias vezes para tentar ligar para alguém e pedir ajuda, mas o seu orgulho lhe impedia em todas elas. Ele precisava acreditar que conseguiria fazer aquela droga completamente sozinho. Mas fazer algo que ficasse bom. Queria colocar todo empenho naquilo e sentir o orgulho da Professora Downey quando ela o entregasse corrigido. Escrever qualquer coisa sem sentido ou copiar tudo dos livros e da internet era muito fácil.
Contudo, tinha que admitir que não era um aluno exemplar e focado, por mais que se esforçasse sempre e tivesse determinação quando alguém lhe impunha algum desafio. Desistir com certeza não estava no seu vocabulário, mesmo que tivesse se esquecido disso alguns poucos minutos quando foi até a casa dos . Parou de frente à porta e a encarou por 2 minutos. Uma parte de seu cérebro lhe dizia que o motivo de ir até lá fora para ver se tinha algum outro livro de história que pudesse emprestar. Já a outra parte pensava em . Ela era tão boa na matéria, poderia fazer aquilo com os olhos vendados. Mas um choque de realidade o fez desistir de tocar a campainha e voltar à sua casa resolvido que não faria aquilo, não pediria ajuda a ela. Sem chance. Não dava. Ela com certeza nunca toparia.
Havia pelo menos 5 abas abertas no navegador de seu notebook relacionadas a pesquisas do tipo “como se concentrar em alguma coisa por muito tempo” ou “como parar de procrastinar quando se é a única coisa que você sabe fazer?”, mas até ler as dicas e conselhos do site estava lhe dando preguiça e principalmente sono. Quando sentia as pálpebras se fechando e a vontade de voltar para cama, colocava alguma música de que gostasse muito para tocar no Spotify, o que era péssimo pois animava-se para ouvir outras músicas da playlist e mais tempo se perdia sem que ele escrevesse alguma outra palavra no papel. Se Cindy estivesse por ali, com certeza aquele trabalho já estaria no mínimo trinta por cento concluído.
Suspirou, vendo os farelos de borracha voarem sobre a mesa. Havia apagado os desenhos que fez nos cantos da folha quando se tocou de que não deveria estar fazendo desenhos, deveria estar lendo o livro aberto na página cinco. Juntou os lápis e canetas no canto da parede, afastou as folhas de ofício que estavam no meio e centralizou o livro de frente para si. Ele começaria a ler e só pararia quando terminasse o capítulo. Depois escreveria tudo que entendeu nos papéis e finalmente avançaria naquele trabalho.
Mas, antes que pudesse sequer começar a ler o primeiro parágrafo, uma notificação apareceu na tela do seu celular. Era a indicação do Youtube de um novo vídeo que o The Police havia publicado e ele decidiu dar uma checada rápida.
Qual é, são só no máximo três minutos. Porém, quando percebeu, já havia escutado sete músicas do álbum mais recente. Três batidas na porta lhe fizeram levantar imediatamente para atender, deixando a música tocando pela reprodução automática.
Era sua tia, Donna. Ela estava com o cabelo preso num rabo de cavalo baixo, com as mangas da blusa vermelha e a barra da calça, que usava, molhados.
— , acho que tem gente na porta. — disse ela ao sobrinho, secando as mãos na calça. — Estou dando banho no Mike.
— Ah, claro, não escutei a campainha. — respondeu ele. Donna sorriu em agradecimento, voltando ao banheiro do corredor.
foi até a porta e, quando a abriu, passou direto rapidamente. Tão rápido que dessa vez ele não teve nem a chance de bater a porta na cara da garota como fazia de costume. Ela nem esperou que ele fechasse a porta para começar a falar.
— Olha, só pra deixar claro, esse é o último lugar na terra em que eu gostaria de estar, mas analisei toda a situação e confesso que depois que o falou comigo eu até mesmo considerei a proposta, duvidando muito que fosse dar certo. A probabilidade de que eu te suporte por no mínimo duas horas é quase nula, mas eu sempre acreditei nas pequenas possibilidades. — encarou com as sobrancelhas arqueadas enquanto a mesma continuava a falar sem parar e a começar a caminhar pela sala. — Acontece que talvez, só talvez, deixo isso bem claro, eu vá precisar de uma pequena ajuda sua. E nem pense em dar um sorriso convencido com a situação, porque eu sei que você está na berlinda. Então vamos lidar com a situação com a maturidade que eu sei que você não tem e tratar como uma troca de favores e nada mais. E não me venha com orgulho porque eu não vou insistir. Na verdade me interessa muito mais que você não aceite a minha ajuda, assim você reprova o ano e eu me livro de você em parte do tempo pelo menos. Caso você aceite, deixo claro que na primeira piadinha eu vou embora.
— Só me explica uma coisa, , quando foi que eu pedi a sua ajuda?
— Não pediu, mas queria. — disse . abriu a boca para retrucar, mas a garota continuou. — Você foi até a porta da minha casa pra isso, ficou parado encarando a porta e desistiu por ser muito presunçoso. Não foi isso? Não me diga que foi só porque achou nosso enfeite de porta bonito e ficou parado lá porque queria admirá-lo.
bufou, empurrando a porta com a mão para que ela se fechasse. Passou por , começando a subir a escada, aceitando a ajuda. Só esperava que não fosse tão ruim como imaginava. Ela tinha razão, ele estava mesmo na berlinda. Não conseguia mentalizar o que Cindy faria caso visse mais vermelhos no próximo boletim.
— Sobe aí. — ela o seguiu até o andar de cima. estranhou quando puxou uma cordinha presa no teto revelando uma escada. Eles subiram e comentou assim que entrou no cômodo:
— Nossa, então... esse é o teu quarto.
A primeira coisa que chamara a atenção de foi o teto, feito inteiramente por janelas de vidro contornadas por paus de madeira na cor azul formando uma redoma de vidro hexagonal, ao invés de redonda. Afinal, conseguia ver o teto de vidro do lado de fora da casa, mas não imaginava que fosse o quarto de . Na casa dos ela nunca havia passado do piso inferior. A cama ficava no fundo e ia de uma parede à outra. Do lado direito, de frente para a cama, tinha uma escadinha vermelha que levava a um possível terraço. Na parede em que a cama era acoplada, havia prateleiras embutidas com diversas coisas em cima.
Um mapa mundi colado na parede prendeu sua atenção por alguns segundos. Era enorme. A cor azul dos oceanos contrastava bem com a cor da parede. Vários alfinetes de maioria azul e vermelho estavam espalhados por todo o mapa. Na outra parede vários pôsteres estavam colados em torno da guitarra vermelha pendurada. Perfeitamente polida. O sol de começo de tarde refletia no brilho vermelho, demonstrando não ter arranhões.
Mas o que mais lhe chamou a atenção talvez, foi que não havia uma peça sequer de roupa ou objeto fora do lugar. Nem sinais de sujeira ou poeira. sentia um cheiro de incenso de orvalho e limão que o quarto exalava.
Uma música vinda do celular de tocava, que reconheceu por ser Every Breath You Take.
— Muito surpresa? — disse , dando um sorrisinho de escárnio e dando um pause para que a música parasse. — Achou que ia ter caixas de pizzas e camisinhas usadas pelo chão, o lugar todo cheirando a muito sexo, drogas e Rock N’ Roll?
— Não achei nada. — respondeu , omitindo que o achara organizado. Lembrou-se da zona que era o próprio quarto, com roupas, tênis, para todo lado. Cama desarrumada, livros largados por aí. Se tinha arrumado tudo por pelo menos duas vezes na vida ainda era muito.
— Certo. — respondeu ele, desencostando da escrivaninha, onde estava com os braços cruzados. — Vou buscar uma cadeira pra você.
Minutos depois, os dois se encontravam sentados lado a lado. havia explicado a que seu maior problema era ler, pois achava a matéria a maior chatice. sugeriu lhe explicar o que ela já sabia e que ele escrevesse o que entendesse.
— Certo — disse . observava pelo canto do olho enquanto a garota amarrava o cabelo. — Você pelo menos sabe quem foi Henrique VIII, né?
— Foi... Um... — murmurou , procurando na sua mente a imagem de Henrique VIII, mas ele não fazia ideia de quem fosse. — Homem? — respondeu, balançando um lápis. bufou com a resposta. Não seria nada fácil.
— Errado. Quer dizer... — retificou . Realmente, Henrique VIII era um homem. — Está certo, mas... — riu com um sorriso convencido. bufou mais uma vez. — Eu me referia no sentido político.
— Ah, então especifique, .
— E você sabe quem foi ele no sentido político?
— Hã... — sorriu de deboche, já esperando que não soubesse a resposta.
— Foi um rei da Inglaterra, muito importante. — explicou ela. — É conhecido como fundador da Igreja Anglicana. Não é por nada não, mas quase todo mundo que mora na Inglaterra sabe disso.
— Eu sou americano, não sou necessariamente obrigado a saber isso.
— A maioria dos americanos hoje em dia é de religião anglicana, então talvez você devesse saber sim. — falou , cruzando os braços em cima da mesa e o encarando, lembrando que vinha de Boston, nos Estados Unidos. — Pelo visto você não deve nem saber quem foi o primeiro presidente dos EUA.
— Claro que sei. — respondeu ele, colocando a mão no bolso da bermuda e tirando uma nota de lá, deixando-a entre o dedo médio e o indicador e ficando à mostra para . — Ele está na nota de um dólar. — pode ver nitidamente George Washington no dinheiro. Ela suspirou e guardou o papel.
— Tá, onde a gente tava mesmo?
— Henrique VIII.
— Ok. — respirou devagar antes de começar a explicar o que se lembrava de já ter estudado. História era uma matéria que ela adorava de paixão. — As lutas contra Roma ocasionaram a renúncia da Inglaterra à autoridade papal, a Dissolução dos Mosteiros e seu próprio estabelecimento como Chefe Supremo da Igreja da Inglaterra...
— Ei, calma aí. — disse , interrompendo a garota. — Lutas? Renúncia autoridade do Papa? Dissolução dos Mosteiros? Eu não faço a mínima ideia do que você tá falando. — segurou um fraco riso.
— Já vi que vou ter que explicar tudo mesmo. Vou começar pela renúncia da autoridade papal. Se refere à Reforma Inglesa, a gente já estudou sobre isso.
— Talvez eu tenha faltado algumas poucas vezes... — ou muitas. Pensou ele.
— Por que será que isso não me surpreende nem um pouco? — falou ela, olhando para a tela do computador em modo de espera. Segundos depois, continuou. — Henrique era casado com Catarina de Aragão, muito amada pelo povo inglês. Ela engravidou seis vezes...
— Caralho! Seis vezes.
— , para de me interromper, porra. — falou , batendo o livro com o qual estava mexendo para deixar as mãos ocupadas na mesa. respondeu um “tá legal” e ela continuou. — Ela engravidou seis vezes, mas só uma das crianças chegou à idade adulta, que foi Maria I. Eles não tiveram um herdeiro masculino para o trono, e o Henrique achava isso essencial. — ouvia cada palavra que dizia, e, por mais que detestasse admitir, ele estava gostando, estava realmente interessado. Talvez fosse o modo como a garota explicava sem olhar para ele, mexendo com o livro, abrindo-o, fechando-o, empilhando-o juntos aos outros numa pilha perfeita e reta. — Então ele entrou com um pedido de anulação do casamento, mas o papa negou.
— Ele pediu pra anular o casamento com a mulher só porque não teve filho homem? — assentiu.
— Ele se interessou por Ana Bolena, que era dama de companhia da rainha. Achou que com ela poderia ter um herdeiro pro trono, já que Catarina não podia mais ter filhos.
— Mas por que o papa negou?
— Henrique achou que o seu casamento estava amaldiçoado, ele leu na Bíblia e interpretou como se estivesse dizendo que, se um homem desposasse a mulher de seu irmão, o casal ficaria sem filhos. Catarina já havia sido casada antes, com Artur, o irmão mais velho de Henrique. Mesmo que não fosse consumado, coisa que Catarina insistiu até a morte.
— Consumado...? — perguntou ele, incerto sobre o significado da palavra.
— Tipo, ela negou sempre que, antes do casamento, ela e Artur nunca tiveram...
— Transado?
— É, isso. Para Henrique, de acordo com a Bíblia, um homem que casa com a esposa do irmão falecido era errado aos olhos de Deus, portanto o papa devia conceder a anulação para que ele pudesse se casar com Ana Bolena. — abriu a boca num “Ahh” inaudível. sentiu orgulho da sua capacidade de fazer com que até um cabeça vento feito entendesse sobre certos assuntos. — Mas o papa mesmo assim negou. Ele, como rei da Inglaterra, renunciou à autoridade papal e fundou a Igreja Anglicana. Por conta própria, anulou seu casamento com Catarina e se casou com Ana.
— Essa cara sim foi esperto. — disse ele no final da explicação de .
— É, esperto você também seria se começasse a escrever tudo que eu te expliquei antes que esquecesse.
— Você bem que podia escrever pra mim também, .
— Não abusa, !
— Não custava tentar. — respondeu ele, finalmente voltando a escrever nas folhas em branco. Quando se tinha alguém explicando era muito mais fácil.
— Peguei seu endereço com a . — disse . Ele estava parado na porta da casa dos tios de . — Ela me xingou dizendo que eu estava atrapalhando, mas ainda assim valeu a pena.
— Eu não te chamei pra vir aqui, então peço educadamente que vá embora. — respondeu , sem entender nada. conseguia ser muito involuntário quando queria.
— Vamos, se arruma, ou vai assim mesmo? — perguntou ele, ignorando o que a mesma havia dito anteriormente e entrando na casa. — Me arrumar?
— É. Vamos sair.
— O quê? Não vamos, não. — disse ela, negando com a cabeça. estava com o cabelo amarrado e roupas folgadas e confortáveis, aproveitando o fim de semana para ler. Definitivamente não estava nos seus planos sair de casa naquele dia.
— Peguei o carro do meu pai, ele viajou de novo. — falou ele, girando as chaves no dedo indicador. suspirou. Precisava dar um jeito de se livrar dele.
— E você chega assim, do nada, achando que eu não tenho nada melhor pra fazer?
— É um sábado à tarde, que outra coisa você teria pra fazer de melhor do que sair comigo? — rolou os olhos. Era muita petulância para uma pessoa só.
— Qual é o seu problema? — perguntou ela, lembrando-se do que havia ocorrido na festa da semana passada. Em como ele havia saído chateado – ou pensava que ele estava chateado.
— Como assim?
— Você age como se nada tivesse acontecido. — deu de ombros, colocando a mão no rosto dela.
— Pode subir, te espero aqui em baixo. — falou ele e empurrou a mão dele para longe de seu rosto. Ele estava mesmo agindo como se nada tivesse acontecido.
— Claro, seria ótimo passar o resto da tarde ao lado da sua ilustre companhia. — disse ela em ironia, ficando atrás do rapaz e colocando as mãos nos ombros dele para que pudesse empurrá-lo para fora da casa. — Mas está vindo para cá, temos algumas coisas pra resolver, então eu sugiro que você volte outro dia, ou quem sabe nunca mais. — se desvencilhou das mãos de , indo em direção à sala.
— Claro. Então, quando a chegar, eu vou embora.
bufou enquanto observava o garoto sentar no sofá da sala.
— Sério mesmo?
— Tem wi-fi aqui, ?
havia acabado de sair do que talvez fosse o melhor encontro da sua vida, disso ele não tinha dúvidas. Mas ainda não havia tido vontade de ir para casa, afinal o fim de semana estava apenas começando. Um anúncio no instagram lhe avisou que Tinie Tempah estaria se apresentando do começo da tarde até o fim daquela noite de sábado no Didsbury Park. A bilheteria mais próxima ficava no shopping, que não era tão longe do local que estava, foram apenas 10 minutos de carro até lá.
Fez questão de passar na praça de alimentação e comprar um milk shake de morango. Mas, quando ia andando tranquilamente pelo caminho indicado por um dos seguranças do shopping até a bilheteria para comprar o ingresso para o show, não pode deixar de reconhecer a garota sentada em um dos bancos, sozinha. . E, pelas circunstâncias, ela não parecia bem.
— ? — chamou ele a dois passos de distância de onde ela estava sentada. digitava sem parar mensagens no celular, mas parou para encará-lo. Seu rosto estava vermelho, ela parecia com raiva, mas ao mesmo tempo triste.
— ? Oi, tudo bem? Que coincidência — respondeu ela, guardando o celular e passando uma das mãos na testa. se surpreendeu com a resposta, normalmente ela o trataria com total indiferença, dessa vez até perguntou como ele estava. Com certeza não deveria estar em seu estado normal aquele dia.
— Sim. comentou uma vez que você gostava de milk shake de morango. — disse ele, estendendo o copo de plástico para ela, oferecendo. Queria lhe perguntar o que havia acontecido, mas não sabia como. Oferecer comida talvez fosse um começo. Contudo, recusou, balançando a cabeça para os lados.
— Não, obrigada. Eu tô legal. — deu um sorriso de lado. se deu liberdade para sentar ao lado dela no banco de madeira.
— Você não parece muito bem.
— É só uma coisa... Argh! — respondeu ela, passando as mãos pelo rosto. — Uma coisa idiota. — suspirou.
— Eu entendo bem de coisas idiotas. — respondeu ele, e o sorriso voltou a preencher os lábios de . ficou feliz com a atitude.
— Eu fiquei de encontrar com uma pessoa e ela me deu o bolo.
— Em que mundo será que essa pessoa vive já que ela não sabe que em você não dá bolos? — riu novamente, dando um tapinha no braço do garoto.
— Mas, se for um de chocolate, eu acho que aceito. — respondeu ela entre risos.
imediatamente lembrou do gosto de por rappers americanos, quem sabe ela também não simpatizava com os ingleses?
— Escuta. — falou ele, se levantando com o milk shake ainda em mãos. ergueu um pouco a cabeça para encará-lo. — Tinie Tempah vai tocar no Didsbury Park, daqui uma hora. Eu tava indo comprar os ingressos. Não quer ir junto? — levantou do banco, colocando a bolsa no ombro. Não estava nos seus planos ir a um show de rap naquele instante, mas com certeza era melhor do que ficar sentada, quebrando a cabeça com mil paranoias envolvendo Elliot.
— Tinie? Se eu conheço três músicas dele é muito. Prefiro o Manuva.
— Eu também não conheço muitas, mas é uma oportunidade pra conhecer, não? — perguntou. esperou alguns segundos, pensando, mas logo assentiu concordando. — E então? — estendeu o milk shake para ela novamente e dessa vez não excitou, pegando-o da mão dele e dando alguns goles.
— Sabe, — disse ela enquanto os dois andavam lado a lado até a bilheteria. —, você é muito legal. Por que não somos amigos?
— Ah, não sei. Quando a gente era mais novo, você nunca foi muito com a minha cara.
— Deve ser porque eu achava que você compactuava sempre com as brincadeiras idiotas do . — fez uma careta ao lembrar e riu. Eles chegaram à bilheteria e entraram na fila. Havia 6 pessoas na frente.
— Em algumas, sim, mas só em algumas, eu juro.
O celular de começou a apitar, indicando novas notificações. Entregou o milk shake de volta a para que pudesse dar um jeito no barulho e colocá-lo no silencioso. Daria uma rápida checada para confirmar se era Elliot que finalmente havia dado sinal de vida, e o deixaria esperando por uma resposta até que lhe desse vontade de responde-lo. Mas, assim que viu a tela de notificações, não era Elliot lhe mandando mensagens, mas sim . Ela leu e se dirigiu para , tomando uma atitude que talvez não quisesse. Viu o seu show de rap ir pelos ares.
— , acho que vou ter que deixar o show para outro dia.
Ele a olhou sem entender, com uma pontinha de decepção na face.
[15:06] : “Preciso da sua ajuda. Agora.”
Duas horas depois, já havia explicado a a maior parte do conteúdo. Nos instantes em que ele parava para escrever, mexia no celular distraidamente. Em algum momento checou as horas e se surpreendeu. Não havia percebido que já havia passado tanto tempo. Mas talvez a maior das surpresas fora que não tinha vontade de ir embora durante todo esse tempo como sentia na maioria das vezes em que estava no mesmo lugar que . Às vezes ela observava escrevendo. A letra dele era horrível, meio bagunçada, e ela duvidava que a Sra. Downey fosse entender alguma coisa, mas a sua concentração era admirável. , quando percebia, arqueava as sobrancelhas olhando para ela e imediatamente desviava o olhar e ele voltava a escrever. Ok, aquilo era muito estranho.
soltou o lápis na mesa, aliviado por finalmente ter terminado. Ainda faltava uma pequena parte, mas ele afirmou a . Estralou os dedos enquanto desbloqueava o celular e se levantava.
— Eu já to indo, então.
— Eu não preciso necessariamente te agradecer já que vou ficar te devendo uma? — perguntou , virando a cadeira giratória na direção dela. não respondeu, apenas deu as costas indo até a porta.
A porta branca abria para dentro e, ao abri-la, podia-se ver um pequeno quadrado de madeira com uma corrente presa no meio. encarou o quadrado de madeira e olhou para por alguns segundos.
— É só você bater um dos pés que a escada desce sozinha. — falou ele. mais uma vez não respondeu. Ela ergueu um pouco o joelho direito colocando toda a sua força naquilo. O seu pé bateu na madeira e a escada desceu até o corredor, batendo fortemente no assoalho lá em baixo. — Não precisava ser tão forte.
rolou os olhos. Assim que começou a descer, avistou uma mulher — que não era Cindy — parada no começo da escada, e logo depois um garotinho apareceu.
— Olá, tudo bem? — disse a mulher. — Sou a tia do , pode chamar ele, por favor? — antes que pudesse virar de costas para chamar , o garoto apareceu bem atrás dela.
— Estou aqui. — respondeu ele. sentiu o peito dele encostar nas suas costas e por impulso lhe deu uma cotovelada na barriga pela proximidade exagerada e ele se afastou. murmurou um “desce” e ela começou a descer seguida por ele.
Quando desceu o último degrau, o garotinho veio na sua direção, bloqueando a sua passagem pelo corredor que levava até a escada principal. Ele segurava um dragão vermelho de brinquedo em uma mão e outro amarelo na outra. Sorria. não pode deixar de achar uma das coisas mais fofinhas do mundo.
— Olha o que eu tenho. — disse ele, mostrando os brinquedos. abaixou ficando da altura do menino.
— Estou vendo, são muito legais. — ele começou a explicar cada detalhe a ela. queria voltar para casa, mas ao mesmo tempo não queria deixar o garoto. Enquanto conversava com ele, conseguia ouvir atentamente a conversa de com a mulher que dizia ser sua tia.
— Ia te chamar antes, mas não queria interromper... vocês dois. — sentiu o olhar da mulher sobre si e logo depois encarar . Ela estava mesmo insinuando que eles estavam fazendo qualquer coisa que não fosse estudar? Tirou sua atenção de Mike, pois tinha que negar aquilo de imediato.
— Não! — exclamou ela num tom de voz um pouco alto que ela tratou de diminuir. riu. — Você com certeza não interromperia nada, não é, ? — ele assentiu.
— mora na casa da frente. Ela estava me ajudando com um trabalho.
— Ah, sim. — respondeu Donna. — Então, , vou precisar que olhe o Mike pra mim por um tempo. — fez uma careta com o pedido.
— É que... eu pensei em dar uma volta agora no final da tarde.
— Ah, por favor? — insistiu ela. observava a cena enquanto Mike puxava a barra da sua blusa querendo atenção. — Eu e sua mãe marcamos de encontrar o advogado do seu tio hoje, três dias antes do julgamento. Ela vai sair do trabalho e vai direto pra lá. Vai ser rapidinho.
— An... Tudo bem, então. — respondeu ele, incerto. Cuidar de criança não era uma das coisas que sabia fazer bem.
— Muito obrigada, querido. — Donna lhe deu um abraço inesperado. — Voltamos rápido. — observou enquanto a mulher descia rapidamente a escada principal. Segundos depois, pode-se ouvir o barulho da porta batendo. Viu atender o celular, murmurar um “dude, já estou indo” e desligar logo em seguida. olhou para Mike.
— Espero que você goste de skate. — o olhou, indignada.
— O quê? Você não tá pensando em levar esse garotinho de uns três anos pra uma pista de skate cheia de skatistas descontrolados não, né?
— O Mike não tem três, tem quatro anos. — retificou , segurando o primo pela mão. Mike o seguiu, olhando para trás para ver se a garota o seguia, não queria se afastar dela. Tinha gostado de . — E não são skatistas descontrolados, eles são perfeitamente controlados. Pelo menos a maioria.
— Você não pode levar um garotinho de quatro anos pra uma pista de skate, ainda mais nesse frio sem nem menos um casaco. — olhou para os braços de Mike descobertos.
— Eu não sei cuidar de criança.
— É. — foi até onde estava e pegou Mike pela mão o levando até a sala, onde vários brinquedos estavam esparramados pelo tapete. — Dá pra ver que você não sabe mesmo.
— Você vai ficar? — perguntou , vendo na sala se abaixando para falar com Mike. Mas ela o ignorou.
— Oi, Mike, tudo bem? — o garotinho assentiu. — Eu sou a tia , tudo bem se eu ficar aqui um pouquinho com você? — Mike de imediato sorriu. — Certo, o que você quer fazer?
— Eu quero... leite. E... — saiu correndo em direção à TV, apontando para o aparelho de vídeo. — Quero assistir, o filme do heróis.
— Tudo bem. — levantou, indo até onde estava perto da porta. — Você fica de olho nele e coloca esse filme de heróis que ele pediu enquanto eu faço o leite.
— Qual filme?
— Eu não sei, . Põe qualquer um da DC. — respondeu , impaciente. Deu as costas e foi até a cozinha.
Felizmente não foi difícil para encontrar as coisas necessárias para fazer o leite. Achou até mesmo um copo verde com um bico na tampa. Enquanto o leite fervia, desbloqueou o celular para checar as mensagens que faziam seu celular vibrar tanto. As mais recentes eram de seu pai lhe dizendo que havia saído com Elsie e voltava apenas de noite. avisando que também havia saído e uma de .
[17:12] : “, preciso que você venha aqui na minha casa. Ainda hoje. A hora que você puder, por favor!!!”
digitou a mensagem rapidamente avisando que iria e, assim que enviou, largou o celular em cima da pia para desligar o leite antes que derramasse. Só faltava acrescentar o achocolatado e colocar no copo que estaria pronto.
Na sala, Mike, que estava agitado pulando no tapete, sentou quieto assim que colocou o filme para ele assistir. deu uma última olhada no primo e pegou o celular para avisar a que ele não iria mais para a pista. A resposta veio segundos depois, já que se encontrava online.
[17:12] : “Beleza, vou pra casa da , então.”
[17:12] : “Casa da , é?”
[17:12] : ??
[17:12] : “Fomos no cinema, e ela me pediu pra ir na sua casa depois porque queria ajuda com alguma coisa, mas eu disse que não podia porque ia na pista com você e o . O já tinha furado, então obrigado por me dispensar.”
[17:13] : “Sei bem o tipo de ajuda que ela tá querendo.”
Um sinal de visualizado apareceu na tela, indicando que não responderia mais. De susto, soltou o celular e ele caiu no tapete com o grito de .
— ! Eu não falei pra você ficar de olho no Mike? — perguntou ela, eufórica, com uma mão na cintura enquanto a outra segurava o copo.
— Mas eu tava, ele tava bem aqui, sentado, quietinho... — procurou com os olhos, mas, quando olhou o ponto onde havia visto Mike pela última vez, o garoto não estava lá.
— Onde ele está? — deu de ombros.
— Anda, vamos procurar. — deixou o leite em cima do painel da TV. Mas, antes que pudesse começar a percorrer a casa à procura do garoto, ouviram um grito de risada vindos do quintal.
— Tá vindo lá de fora. — apontou para o quintal pela janela e os dois foram até lá. Quando abriu a porta, encontrou Mike acariciando a cabeça de Bud, que estava deitado com a cabeça em cima das patas dianteiras. se apressou em em tirar o garoto de lá, pelo frio que fazia.
— Como é que você deixa o garoto sair assim e não percebe?
— Ele com certeza saiu pela porta dos fundos, que fica na cozinha, você também deveria ter percebido, não é? — abaixou para acariciar o cachorro extremamente manso enquanto pegava Mike no colo e o levava de volta para dentro.
— Só que a diferença é que eu estava ocupada. Você seria um péssimo pai, sabia disso, ?
— Nisso eu vou ter que concordar com você. — falou ele, seguindo-a até casa. Trancou a porta dos fundos, se certificando de que Mike não tentaria passar por lá de novo. Na sala, pegou o copo e entregou ao garoto.
— Obrigado, tia . — ele deitou no sofá, bebendo o leite e olhando para a tela da TV. sorriu com tamanha fofura.
— De nada, coisa linda.
— Nossa, obrigado pelo elogio. — disse , passando por e sentando ao lado de onde os pés de Mike estavam. Ele pegou o celular do chão antes que pudesse ser pisoteado.
— O elogio não foi pra você, seu prepotente! — retrucou .
— Eu sei, mas Mike e eu somos muito parecidos, então, de certa forma, foi pra mim sim. — olhou de Mike para , ela tinha que concordar. Realmente, eles eram muito parecidos. Mike tinha os mesmos olhos e cabelos que , como se fosse ele numa versão menor.
23 minutos de filme depois, Mike dormia no sofá com o copo de leite totalmente vazio. sugeriu que fosse melhor levá-lo para cama e se prontificou para carregá-lo antes que a mesma o fizesse. pegou o copo vazio e o levou até a pia da cozinha. Quando voltou à sala, estava na metade da escada carregando Mike, que dormia tranquilamente com a cabeça apoiada no ombro de . Deu uma última olhada e saiu da casa de . Sem dar ao menos um ‘tchau’.
Do lado de fora, encostou na porta e suspirou.
O ar estava úmido e álgido. Não havia mais neve, mas o frio era presente. Não tinha saído com nenhum casaco de casa, afinal ela só teria que atravessar a rua, por isso o sentia na pele com intensidade. Passava das 17 horas e sol se escondia atrás das nuvens cinzentas, os trovões indicavam que a qualquer momento a chuva começaria a cair. A imagem de veio à sua mente e lembrou o que ela precisava fazer.
Andou em linha reta até a casa da frente, subiu as três escadinhas da varanda e entrou na própria casa. Tão rápido como se tivesse um motivo para sair dali o mais rápido possível. E de certo modo ela queria, só não sabia porque. Talvez o tempo que havia passado com tivesse dado pane no seu cérebro e ela não conseguisse mais raciocinar direito.
Seu pai e ainda não haviam chegado, a casa estava um silêncio. Pensou em mandar uma mensagem para para avisar que já estava indo, mas, quando colocou a mão no bolso traseiro da calça, percebeu que o celular não estava ali, e ela não se lembrava onde o tinha colocado. Talvez tivesse esquecido na casa de . Pediu um táxi usando um celular reserva que Bill deixava na casa em casos de emergência, seria o tempo de o taxista chegar enquanto ela se arrumava e passava na casa de para pegar o celular.
Não cogitou se arrumar muito, ela só deu um jeito no cabelo, pegou um moletom rosa claro e calçou um tênis. Tirou a carteira da bolsa para poder pagar o taxista e saiu do quarto. Não estava atrasada e também não precisava vê-la urgentemente, mas fez as três coisas de modo apressado. Como se a casa estivesse caindo aos pedaços e ela precisasse pegar apenas o que era necessário.
Desceu os degraus de dois em dois até a sala. Já dava para escutar o barulho de uma fraca chuva, que possivelmente se intensificaria mais tarde. Quando colocou a mão na maçaneta, percebeu como não queria voltar à casa da frente, mas nem precisou porque, quando a porta se abriu, estava ali.
Usava um casaco de camurça azul marfim com o zíper completamente aberto e as mesmas roupas. O capuz do casaco protegeu o cabelo de alguns pingos da chuva que ele pegou na travessia até a casa dela, com exceção da franja que caía sobre a testa. O celular de estava em uma de suas mãos.
— Você esqueceu na pia da minha cozinha.
— Ah, eu já tava indo pegar. — respondeu , segurando o aparelho.
— Escuta, também vim te agradecer. Você saiu tão depressa que nem deu tempo.
— Me agradecer? — falou , ignorando a última parte para não ter que se explicar. — Não foi você que disse que não precisava me agradecer já que ia ficar me devendo uma?
— Isso foi pela ajuda no trabalho. Você não precisava ter ficado pra me ajudar a cuidar do Mike. Então, obrigado.
— Onde a sua educação estava escondida por tanto tempo assim, ? — apenas riu, sem sentir vontade de retrucar. — Sendo assim, de nada, mas aguarde, porque eu ainda vou cobrar aquele favor.
— Tudo bem, pode cobrar. — falou ele, desviando o olhar para um pouco acima da cabeça de . Onde o enfeite de porta dos estava, preso por uma única cordinha pendurada por um prego. viu checar o celular rapidamente sem desbloqueá-lo, a procura de mensagens de . E o silêncio se instalou.
Ele focalizou o rosto da garota por um instante enquanto ela não olhava. E em segundos apreciou cada detalhe e curva. A boca entreaberta, os olhos com os cílios alongados, a pele sem resquícios de maquiagem e as bochechas rosadas. Caralho, é a , SE AFASTA, dizia seu cérebro, mas ele não conseguiu obedecer. Alguma coisa o fazia permanecer ali, alguma coisa o impedia de ir embora antes de fazê-la. Era estranho vê-la daquele ângulo, nunca tiveram os rostos tão próximos assim, e isso, de certa forma, mexeu com ele. não pensava que poderia sentir uma coisa daquelas novamente.
Quando subiu o olhar, se assustou ao ver que lhe encarava. Mas era tarde para falar ou ter qualquer tipo de reação.
estendeu os braços e correu com o polegar em sua nuca. sentiu seu peito sendo pressionado contra o dele, como se seu coração estivesse tentando se alinhar com a caixa torácica dele. O olhar de era o de alguém que queria dizer alguma coisa. prendeu a respiração, esperando, mas ele não falou. Ele não disse nada, ao invés disso, se aproximou o suficiente para lhe dar um beijo. Um beijo rápido de no máximo seis segundos, apenas um encostar de bocas que logo acabou.
Os olhares se fixaram por um instante após a separação. , vendo que não recuou, se aproximou novamente, pressionando ela contra o seu corpo, eliminando qualquer espaço entre os dois. Dessa vez iniciando um beijo intenso. Gentil, suave, forte e doce, tudo ao mesmo tempo. A mãos de viajaram pelos braços de , até chegar no pescoço fazendo um X ao redor do mesmo com os pulsos, já que ainda segurava o celular em uma das mãos.
A buzina de um carro parado na rua assustou , e, quando se afastou, ela sentiu o cheiro de perfume caro, como o de uma loja de departamentos. Conseguiu observar o carro, era o táxi que havia pedido. Ela voltou a olhar para , e os olhares se fixaram novamente. Isso a fez titubear e dar um passo para trás.
— O meu táxi. — falou ela baixinho. assentiu.
— Nossa, o seu enfeite de porta é mesmo bonito. — disse ele, dando passos de costas até chegar à escadinha da varanda onde estava. abriu a boca para responder, mas não saiu nada. O táxi buzinou novamente, entretanto não conseguia tirar os olhos de indo até a casa dele. Quando estava na metade da rua que dividia a casa dos dois, virou de frente para continuando a andar de costas até a sua casa. Os pingos de chuva caindo em cima de si.
— Te vejo segunda! — ele gritou como se tivesse acabado de descobrir os dias da semana. Logo depois, entrou na própria casa. voltou a sua atenção ao carro parado antes que o taxista buzinasse. Trancou a porta da casa e só conseguiu relaxar o peito quando o carro começou a andar.
tinha pedido sua ajuda, mas pelo visto iria precisar mais da dela.
morava a um bairro de distância da casa de . Num sábado a noite, sem trânsito, chegar lá fora rápido. No caminho, mandou uma mensagem ao seu pai avisando que tinha ido à casa de e que dava um jeito de voltar para casa mais tarde. A chuva havia ficado mais forte e o barulho dos trovões se intensificado. Uma bela tempestade ocorreria no restante da noite, pelo visto.
se distraia jogando joguinhos no celular para tentar não pensar no que tinha acontecido minutos antes na varanda da sua casa. Tentar não imaginar como as coisas seriam depois daquilo era a melhor coisa que ela fazia para acalmar a sua mente. Seus pensamentos giravam como um tornado.
Quando abriu a porta, suavizou a expressão, fingindo, como se nada tivesse acontecido, mesmo sabendo que uma hora iria começar a desconfiar. Três cachorros saltitantes começaram a pular nas suas pernas para lhe receber. abaixou para acariciá-los. A mãe de , Christina, tinha uma clínica veterinária e petshop, não era surpresa que a casa de fosse cheia de bichos. Lá havia três cachorros, um gato laranja chamado Cato, dois peixinhos dourados, uma calopsita e uma tartaruga chamada Flora.
— Dexter, Luidi e Hope! — disse , chamando os três cachorros para que parassem de pular em cima de , e eles se aquietaram.
— Vim assim que deu. — Falou vendo colocar os cachorros no quintal dos fundos.
— Ah, tudo bem, eu tava... — a campainha tocou novamente, interrompendo . ficou se perguntando quem poderia ser. Quando abriu a porta, era ninguém menos que .
— . — falou .
observou Cato, o gato laranja de , subir em cima do sofá e não percebeu quando desviou de um possível beijo ao cumprimentar , fazendo os lábios dele encostarem na sua bochecha. De primeira, ficou confuso com o desvio dela, mas logo que viu ele entendeu.
— Hey, e... ?
— Joker! — exclamou , dando um abraço no melhor amigo. Logo em seguida olhou para . — Por que não me disse que tinha chamado o também?
— Achei que tivesse dito. — respondeu , dando um sorriso amarelo.
Naquela tarde e foram ver a sessão especial de clássicos no cinema e havia o convidado para que fosse até a sua casa. Sua mãe havia insistido para que chamasse o garoto para um jantar, mas ele teve que recusar pois já tinha marcado de sair com , ao mesmo tempo que Christina tivera uma emergência na clínica veterinária e tivera que sair. Queria colocar toda a ansiedade para fora, em forma de palavras, tanto que decidiu chamar para ir até a sua casa, para que pudessem fofocar a vontade.
Ela só não esperava que o principal assunto que teria com a amiga decidisse aparecer.
olhou para .
— Você não disse que não ia poder vir?
— Disse, mas o teve um imprevisto e desmarcou. — ficou apreensiva ao ouvir o sobrenome de e segurou um suspiro. Ela ainda podia sentir os lábios dele sobre os seus. Passou as costas da mão na boca como uma criança limpando os restos de comida que ficaram ao redor. Mas não adiantava, não dava para fingir que não aconteceu. — E eu fiquei livre pra você. — as bochechas de coraram no instante em que se aproximou para abraçá-la. Ele por acaso havia esquecido que ainda estava ali?
— Como assim “pra você”? — perguntou , um pouco surpresa apesar de já desconfiar. — É o que eu tô pensando?
— É sim, . — respondeu ele, dando um beijo na bochecha de .
— ! — exclamou , se afastando dele sem acreditar que ele tinha contado. Eles tinham combinado.
— O que foi? Eu disse à que ela seria a primeira a saber. — O rosto de se abriu em um sorriso de um tamanho sem igual. Ela se lembrava do dia em que havia dito aquilo, e ficou feliz por ele ter cumprido a promessa. Deu um leve grito de felicidade, abraçando os dois ao mesmo tempo.
— Fico feliz por vocês.
— Ah, fala sério. — disse . — Demos uns beijinhos e estão agindo como se já estivesse marcada a data do nosso casamento. — ela subiu a escada e e foram atrás, rindo.
particularmente adorava a casa de . Lá tinha uma sala no andar de cima, onde geralmente os amigos sempre ficavam. Havia uma tela de TV, um sofá, um tapete e vários puffs e almofadas espalhados pelo chão. No fundo da sala, havia alguns instrumentos de música clássica: um violino, um piano e uma harpa. Além de um violão.
uma vez havia lhe explicado que seu pai, Alfred, trabalhava demais. Nem ele mesmo gostava de trabalhar tanto assim, mas era preciso. Usava a música para desestressar e enchia a casa com uma melodia harmônica durante todo o fim de semana. Apesar de não saber tocar nenhum deles.
uma vez havia comentado sobre aquilo com a mãe, quando ela ainda era viva. A mãe de e de sempre foram muito amigas, e, em um almoço de aniversário da Sra. , Bill e Alfred compartilharam seu amor pela música e tocaram e cantaram juntos uma versão de Tiny Dancer do Elton John. havia gravado e ainda guardava aquele vídeo.
— Como foi o filme? — perguntou , se jogando em dos puffs. e responderam ao mesmo tempo.
— Incrível!
— Chato.
— A ficou reclamando o tempo todo, eu mal consegui explicar pra ela as partes mais interessantes. — resmungou e rolou os olhos. — A parte legal foi que eu podia calar a boca dela com um beijo, então sinta-se à vontade pra me acompanhar mais vezes, o próximo vai ser o clássico: Laranja Mecânica. — disse dando uma piscadinha para , ela lhe jogou uma almofada na cara. riu, estava gostando muito de toda a situação e do que estava rolando entre os dois amigos.
— Eu não curto coisa de época, vocês sabem disso.
— Não me diga que não gosta disso aqui. — falou ele, indo até o piano e se sentando. e apoiaram os cotovelos no piano, de frente para quando ele começou a tocar Heroes do David Bowie.
— We could be heroes, just for one day... — cantaram e ao mesmo tempo. negou com a cabeça.
— Então essa. — insistiu . Seus dedos recomeçaram a pressionar as teclas do piano com graça, emitindo o som de uma música que reconheceu como Livin’ On a Prayer, do Bon Jovi. Outro sucesso dos anos 80.
— , a minha era está um pouco mais pra frente. A partir dos anos 2000.
— Ah, mas não está mesmo. Nós cantávamos muito essa antigamente. — disse , dando a volta no piano e sentando-se ao lado de enquanto o mesmo parava de tocar para que começasse com Like a Virgin, da Madonna.
— ... touched it for the very first time, like a virgin... — cantou enquanto tocava.
— With your heartbeat, NEXT TO MINE! — completou a parte final do refrão, batendo as duas mãos juntas no peito com a animação. e riram. — Madonna é a minha exceção.
— Minha vez. — falou .
adorava o som do piano. Adorava como músicas agitadas, e em sua maioria tocadas com auxílio de mais de três instrumentos, ficavam em sua versão acústica no piano. começou a tocar outra música e segurou a respiração por alguns segundos. não cantou, mas a letra veio na sua cabeça. Ela havia escutado aquela música naquele mesmo dia. No quarto de .
(Cada suspiro que você der)
Every move you make
(Cada movimento que você fizer)
Every bond you break
(Cada laço que você quebrar)
Every step you take
(Cada passo que você pisar)
I’ll be watching you
(Eu estarei te observando)
— Para. Para de tocar essa música! –– proferiu . parou imediatamente de tocar e a observou, confusa.
— O que foi?
se inclinou lentamente até a sua testa pousasse no material liso do piano. Fechou os olhos e deixou que a sua imaginação ficasse responsável por adivinhar a reação de e para o que ela iria falar.
— O me beijou.
— Hein?
— COMO ASSIM? — no mesmo instante deu a volta no piano sentando-se no banco também, deixando entre ela e . Os dois encararam a amiga, surpresos e um tanto animados. puxou a amiga pelo ombro para que ela voltasse à posição anterior. — Vamos, ! Desembucha.
anelou e no segundo seguinte começou a contar aos dois amigos o que havia acontecido naquele dia. Desde a hora em que colocou os pés na casa de até o momento que ele fora até a sua.
— Porra, finalmente o tomou uma atitude. — comentou .
— Não acredito que e vão ser o casal do ano. Dignos de aparecerem no anuário da escola. — falou , abraçando de lado, tão forte, como se conseguisse transmitir toda a sua felicidade através do contato físico. esbanjava um sorriso do tamanho da falha geológica da Califórnia.
— Finalmente? — disse , olhando para . — Casal? Você ficou louca, ? Pare de agir assim.
— Por quê? — questionou . — Eu só estou agindo da mesma maneira que você agiu quando descobriu sobre e eu, minutos atrás.
— Só que a diferença é que eu e o não somos um casal, e nem nunca vamos ser. — respondeu com convicção. Frisando bem a palavra ‘nunca’ ao pronunciá-la.
— Mas por que não? — perguntou . rolou os olhos. Você ainda pergunta, ? Pensou ela, mas ao invés disso, respondeu:
— Porque... Pra duas pessoas serem um casal elas tem que estar apaixonadas, e vemos claramente que não é o caso.
— Ah, e esse beijo foi o quê? — perguntou com falsa ironia. deu de ombros.
— Hormônios. — disse , lembrando-se de um artigo, sobre o livro de Sheril Kirshenbaum, que ela havia lido no ano anterior. O artigo falava sobre a ciência do beijo. — Liberação excessiva de ocitocina e dopamina combinada com a ação dos neurotransmissores, da parte do , claro. Eu estava apenas esperando o táxi.
— E você quer tentar me convencer que não sentiu alguma coisa? — perguntou . balançou a cabeça para os lados.
— Nada.
— Ah, fala sério, , você não decidiu nos contar isso pra ficar mentindo. — falou sem acreditar na amiga.
lembrou-se do beijo. Lembrou de como as suas bochechas ficaram avermelhadas, da sua pulsação acelerando, da respiração ficando irregular, das pupilas que dilataram a fazendo fechar os olhos. Percebeu que havia ficado do mesmo jeito. Recordou do artigo da revista onde dizia que aquilo indicavam sinais que aconteciam quando o beijo “combinava”. Um arrepio subiu pelo corpo ao pensar nisso.
Aquilo não era possível. Ela não podia ter ficado tão mexida desse jeito. Apesar de repetir isso para si mesma, ela não conseguia parar de pensar naquele momento. Naquele maldito momento em que se aproximou o bastante para que a boca dele fizesse outra coisa que não fosse xingá-la ou provocá-la. No trimestre passado, na aula de biologia, havia aprendido que o hormônio da serotonina causa pensamentos obsessivos sobre determinada coisa ou pessoa. E ela preferia acreditar que estava sob efeito constante do hormônio nas últimas duas horas a crer que havia desenvolvido algum sentimento por .
— Eu não sei. — respondeu, encarando as teclas do piano.
— Tá, o te beijou e você beijou de volta? — perguntou . direcionou um olhar a que nem foi preciso ela responder para a amiga entender. O artigo também dizia que um beijo bom envia uma cascata de sinais para o cérebro, dando às pessoas uma sensação arrebatadora de prazer, o que reforça o comportamento e faz os seres humanos terem vontade de continuar. Era difícil para admitir, mas sabia usar a boca para outras coisas além de dizer tolices. — Há! Eu sabia.
— Beijos servem para criar vínculos entre as pessoas, . Veja eu e . — falou e lhe deu um tapa no braço, mas concordou.
— Ah, pelo amor de Deus. Vocês acham mesmo que isso vai mudar alguma coisa entre eu e o ? — e se entreolharam e logo responderam:
— Achamos.
— Você já tá até chamando ele de ao invés de chamar de . — falou e bufou.
— Isso não significa absolutamente nada.
— Então como vão ser as coisas daqui pra frente, ? — indagou . — E não me venha com essa história de que vão continuar se odiando, porque quem se odeia não dá um beijo desses.
— ‘Um beijo desses’? Você nem viu o beijo, .
— Ah, mas eu acredito que deva ter sido um beijão. Eu nunca fiquei com o , mas eu sei que ele não brinca em serviço. — esclareceu e execrou aquele comentário. De imediato ela se lembrou dos braços de ao redor de si. Queria que houvesse uma maneira de fazer com que seu cérebro esquecesse tudo aquilo. Uma forma que fosse indolor, de preferência. Sentiu suas bochechas enrubescerem levemente.
— Ainda mais com a irmã gostosa do melhor amigo.
— ! — falou , lhe estapeando. — Esse comentário foi improfícuo e indevido.
— Foi mal. — respondeu ele, lhe abraçando de lado.
— Falando em irmão, o sabe? — perguntou .
— Não... Ele não tava em casa na hora.
— Quero ver como ele vai reagir quando souber. — disse .
não havia pensando em como reagiria. Talvez ela nem contasse, afinal era totalmente irrelevante. Foi só um beijo. Ele não iria surtar por aquilo e, se surtasse, qual seria o possível motivo? Ciúmes? duvidava muito.
— Não sei, da última vez que ele tentou dar uma de pai pra cima de mim, eu fiquei sem falar com ele por uma semana. — falou , dando de ombros.
Havia acontecido quando ela ainda namorava Austin. Não recordava mais nenhum outro momento em que havia ficado tanto tempo sem falar com . Sempre foram muito próximos, era difícil vê-los brigando. Mas ele tinha que entender que era livre para tomar as próprias decisões, e não era porque ela é a sua irmã mais nova que ele deveria agir com super proteção. Aquela ideia era ultrapassada.
— Talvez ele fique até feliz. — disse de modo insinuativo, que fez lhe lançar um olhar de reprovação. — Fala sério, , esse é o acontecimento do século! — ficou de pé, os olhos brilhando, encarando a parede como se pudesse enxergar através dela algo brilhante e encantador. , ao lado de , riu. levantou, saindo de onde estava no banco, entre e , e indo até um dos puffs.
— Pra quê que eu fui abrir a minha boca. — e a seguiram até os outros puffs no tapete.
— Somos seus amigos, . — falou . — Como vamos te ajudar a se acertar com o amor da sua vida se você não contar nada pra gente?
— O NÃO é o amor da minha vida! — rebateu , jogando uma almofada na cara do melhor amigo, que gargalhou.
— Quando vocês vão conversar sobre isso?
Estava aí uma pergunta que não sabia responder. Se dependesse dela, nunca mais tocaríam naquele assunto, e as vidas de ambos seguiríam como se nada tivesse acontecido. Mas era impossível para adivinhar se teria ou não algo para dizer para ela. Caso tivesse, fugir não era uma boa opção, porque o problema de fugir é: quando você foge, você assume medo. E covardia não era uma coisa que gostava que as pessoas pensassem que ela tinha, muito menos queria que achasse aquilo dela.
Não entendia ao certo, mas, quando se tratava dos dois, era sempre uma competição de quem estava por cima. Como numa corrida de Fórmula 1, onde os pilotos competem entre si sempre pelo primeiro lugar ou até mesmo quem vai largar primeiro. Essa era a regra de quando se odiava alguém: você tem que estar por cima da pessoa sempre, nunca deixar ela se igualar a você. Afinal, caso se igualasse, como você poderia odiar alguém que é exatamente igual a você? Odiar a si mesmo não era algo coeso.
E o grande problema era que não sentia aquilo. Não sentia necessidade de estar por cima de . Não se achava melhor que ele, nem tinha vontade de ser. Talvez ela não o odiasse tanto assim quanto pensava.
A aversão e inimizade que sentia por talvez estivessem ficando escassas, igual ficaram as almofadas que teve que usar para atirar em e por conta de tantas provocações durante o resto do tempo em que ficou ali.
Do alto da cobertura do prédio, podia se ver tudo. As pessoas, que lá de cima pareciam formigas, os carros dirigidos por motoristas apressados e mal educados, as poucas árvores, os cachorros e gatos de rua perambulando por todos os lugares. Do alto de um prédio de vinte e seis andares, a única coisa que fica acima de uma pessoa é o céu e Deus. gostava de morar ali, nunca reclamou do lugar. Era um prédio bonito e suntuoso localizado no centro da cidade. Porém, era solitário.
Todas as luzes do apartamento estavam desligadas. A única iluminação presente ali era a provinda da Lua, dos outros prédios e da luz azul no fundo que decorava a piscina, quase nunca usada. Estava na varanda sentado em uma das cadeiras brancas de tomar sol com um copo de whisky pela metade. No colo, tinha uma velha picape que costumava tocar até os catorze anos. adorava fazer mixagens e mashups de músicas e até mesmo criar as próprias batidas.
Conforme ia passando a mão sobre a picape, ia percebendo como estava cheia de poeira. Jazia guardada em algum lugar do seu quarto já fazia algum tempo. A mãe, antes de sair, havia lhe avisado que era de sua pretensão dar um fim às coisas velhas que tinham no apartamento e sugeriu que jogasse aquilo fora, já que fazia anos que sequer triscava no instrumento. Ela só não sabia que ele havia parado de fazer o que mais gostava justamente por causa dela. Dela e do pai.
O dia havia sido maçante. Discutiu com os pais naquela manhã, desistiu de fazer qualquer coisa que levantasse o seu humor e ainda havia lhe mandado embora de sua casa. Não que ele estivesse surpreso com aquilo, ele nunca ficava.
Pensar nela não era bom.
Enquanto girava um dos discos sujos de poeira da picape, a tela do celular se acendeu. Sem toque algum. odiava aquele barulho, por isso deixava o aparelho sempre no silencioso. Era uma mensagem.
[20:26] : “Dude, acho que eu ferrei tudo.”
Chapter Seven — You Should Have Opened Your Eyes. I Was Crazy For You
não gostava de ficar sozinha. Apesar de ter quase 15 anos, se tivesse opção, ela sempre preferiria estar acompanhada de alguém. E fora com aquela desculpa que havia pedido à para dormir na casa dela na noite daquela sexta-feira após a mãe avisar que passaria a noite fora. Às vezes Sra. podia ser muito ocupada.
Anos após a morte de sua esposa, Bill Chester finalmente havia decidido sair com outra mulher e comunicou aos filhos que teria um encontro. estava na casa de desde cedo e ainda não havia voltado. A casa seria somente de e por pelo menos algumas horas.
Desde às 19h, quando Bill deixou as garotas, tudo corria bem. havia pedido pizza. Ela e passaram o tempo assistindo dois filmes e logo decidiram assistir House. Estavam numa pequena discussão sobre a beleza do Dr. House, em que insistia que ele tinha olhos lindos enquanto discordava, quando a porta da frente se abriu, avisando que havia chegado, e aparentemente não estava sozinho. Pela voz, reconheceu que estava com ele. Por Deus, era tarde da noite, o que aquele garoto fazia ali?
— , sai aí pra eu e o jogar video game? — perguntou . A irmã que apenas disse um ‘não’ seco, sem nem olhar para o garoto. Nem um por favor ele havia pedido, ela não era obrigada. — Ah, qual é, a gente veio pra cá só pra isso.
— Eu e estamos assistindo House. — explicou ela, apontando para a TV.
— Vocês estão aí o dia todo praticamente.
— Por que vocês não jogam lá na casa do ? Já estavam lá mesmo. — deu de ombros e bufou, impaciente.
— A internet caiu na casa dele.
— Vamos, , não seja tão egoísta. — falou . apenas observava.
— Fica quieto, , que você tá na minha casa. — disse , irritada, ela não estava conseguindo ouvir o que os personagens falavam por causa do irmão.
— Vamos, — sentou-se ao lado da irmã. — Por favor, íamos participar de um campeonato online. — bufou enquanto balançava o seu braço.
— Tudo bem, mas espera o episódio terminar.
— Quanto tempo falta?
— Meia hora. — respondeu após checar na TV o tempo restante.
— Caralho, vai demorar.
— É pegar ou largar.
lançou uma face derrotada para , que entendeu o recado e sentou-se no tapete apoiando as costas no sofá. O jeito era esperar.
No episódio em questão, a médica Lisa Cuddy decide adotar uma criança abandonada, que entrou no hospital muito doente, mas que conseguiu ser salva. No entanto, a mãe biológica volta atrás e quer ficar com o bebê. Desfeita, Lisa volta para casa a fim de chorar no quarto que preparou para receber a bebê. A médica já tinha feito um tratamento de fertilidade que não resultou e encontrou no Dr. House um cúmplice, pois era este quem lhe injetava a medicação periodicamente. House então decide ir até a casa da mulher para confortá-la. No início, ela crê que House foi lá para censurá-la por ter se apegado à criança, mas ele conforta-a. Depois de um silêncio confortável, os dois olham-se e ele a beija.
— Pronto, , terminou. Satisfeito? — falou , se levantando.
— Ei, espera. — disse o irmão. — Eu não entendi nada. Por que ele fez isso? — olhou para o amigo, prestando atenção, e , que calçava os chinelos para levantar do sofá, disse:
— Como assim, o que você não entendeu?
— Por que ele beijou ela? — perguntou
— E você queria que ele fizesse o quê? — disse .
— Todo mundo sabe que é exatamente pra isso que existe o silêncio.
— O quê? — perguntou totalmente confuso. Não fazia ideia do que as duas garotas falavam. muito menos.
— Ah, , é óbvio. Se o silêncio prevalece, o cara beija a garota. — esclareceu .
— Todo mundo sabe disso. — disse , seguindo a amiga até a escada.
Minutos de jogos foram o bastante para que esquecesse rapidamente o que havia acontecido. Já ainda processava a informação saída da boca de . Para algo tão singelo, fazia você refletir.
Depois daquele dia, Bill fez questão de colocar uma televisão em cada quarto. Evitar futuras brigas era algo meritório.
Tem coisas que ninguém faz melhor que : maquiagens, planejamento de festas, danças, doces, combinações de roupas, coreografias, caridade, trabalhos, falar boas palavras em pró da comunidade coletiva... Ajudar seus amigos era só mais uma delas. E era exatamente isso que tinha se disposto a fazer na manhã daquela segunda-feira. Ajudar uma amiga cujo problema não deveria sequer existir.
No colégio, era responsável por fazer diversas coisas, não gostava e não conseguia se manter parada. O tempo dos intervalo entre as aulas, apesar de parecer pouco, eram cruciais e ela não desperdiçava nem um minuto sequer. Mas abria exceções quando se referia a um assunto importante. E, naquele dia, era o seu assunto importante relacionado ao quanto conseguia ser insuportável.
Desde o momento que havia saído da casa de naquele sábado, vinha pensando de um modo de ajudar a amiga. Não que tivesse pedido a ajuda dela de forma direta para afastá-lo dela, mas acreditava que era o que ela queria, só não sabia direito como pedir. Abominava os dias em que já chamou de ‘amigo’, ou das vezes em que já teve que ajudá-lo. Ele não merecia.
Andou pelos corredores até finalmente encontrá-lo conversando com três líderes de torcida próximo ao pátio.
— ! — gritou. Os quatro olharam em sua direção. lançou um olhar duro para as três garotas, que se dispersaram enquanto ela se aproximava. Por ser a capitã da equipe de torcida, muitas vezes apresentava uma pose intimidadora.
— Shhh! Fala baixo, , a Hide não pode me ver. — falou . deu um tapa na mão do garoto antes que se aproximasse do seu rosto. — Não posso receber mais advertências, senão eu posso ser suspenso.
— Eu estou pouco me importando se você vai ser suspenso. Isso na verdade me agradaria muito.
— Fala logo o que você quer. — respondeu ele sem um pingo de paciência.
— Só quero que você me responda uma coisa: o que pensa que está fazendo?
— Em relação à...?
— .
bufou ao ouvir o nome da garota. Ele não acreditava que iria se intrometer novamente entre os dois.
— Ah, claro, tava demorando pra você se intrometer.
— Alguém tem que fazer alguma coisa, né? — respondeu , colocando as mãos na cintura.
— Por quê? Para de tratar a como se ela fosse uma criança, ela pode tomar as próprias decisões.
— Eu sei que pode, ela não é ingênua. Mas eu também sei como você consegue ser persuasivo quando quer.
— Foi ela quem pediu pra você vir até aqui e me falar essas coisas? — perguntou ele. jurava que nunca tinha visto com um semblante tão sério. O seu tom de fala se assemelhava ao de um delegado, enquanto interrogava o suspeito de um crime. Ela engoliu em seco. — Pra pedir que eu fique longe dela?
— Não, mas...
— Então, por quê? Por que é um problema pra você se eu ficar com ela?
— Você não consegue se dar conta de que isso não vai ser bom? — perguntou ela. Era difícil fazer com que entendesse certas coisas, mas não custava tentar. Persistência era uma palavra com a qual compactuava. — Sabe quais são as coisas que a mais preza? Fidelidade, honestidade, companheirismo, afeto... E você não é capaz de sentir um pingo de compaixão, .
não falou nada, por uns instantes ficou a encarar o outro lado do corredor, onde poucos alunos passavam. abriu a boca para encerrar aquela desagradável conversa de vez, mas ele a interrompeu. Dando fim ao momento de silêncio.
— Eu gostava dela. — falou. Depois de uma breve pausa, ele continuou. — Eu gostava muito dela, nossa, como gostava. — passou as mãos pelos cabelos, encarando o chão, lembrando-se da época em que havia conhecido as duas garotas. A relação com os pais também não era nada boa, mas naquele tempo ele ainda tinha um fio de esperança no qual se segurar. — Eu tinha com quem conversar, eu me sentia tão bem do lado dela. me fazia esquecer o inferno que era com os meus pais, na minha casa. E você — ergueu a cabeça, fazendo questão de encará-la. —, fez o favor de estragar tudo isso, . Você me tirou o meu único porto seguro por achar que eu não era bom o suficiente pra sua melhor amiga. Eu sei que você não gostava muito de mim, dizíamos ser amigos, mas eu percebia o jeito como você me olhava. Um desprezo disfarçado. E já que você diz me conhecer tão bem, deve saber que eu não costumo desistir sem suar um pouco a camisa. Passar bem, .
finalizou sumindo pelos corredores, deixando para trás.
A garota ficou observando os armários azuis, com cada palavra que havia dito ecoando na sua cabeça. Ela nunca havia imaginado que talvez gostasse tanto da amiga daquele jeito. Em todos aqueles anos em que conhecia o rapaz, nunca o viu entregue a qualquer pessoa, apaixonado, ou até mesmo feliz. Não se sentia culpada, tampouco satisfeita. Não negou quando lhe pediu para que o ajudasse a conquistar e no início ela ajudou. Mas pequenos acontecimentos lhe fizeram mudar de ideia e ter várias dúvidas sobre o caráter do garoto. Ela o via várias vezes de gracinha com outras garotas, pregando peças nos professores, mentindo para os monitores.
A gota d’água foi quando havia desmarcado um encontro com — que havia demorado meses para finalmente acontecer — para sair com outra pessoa. Ou melhor, outra garota, que costumava caçoar dos outros alunos junto de mais um grupinho. mesmo já havia ouvido vários comentários de mal gosto sobre ela e . E decidiu que era melhor se afastar do garoto. De início não acreditou muito, mas conseguiu convencê-la de que era melhor daquele jeito. Deu até um jeito de fazer com fosse para Cuddle com ela no outro ano.
não gostou de saber nenhum pouco da ‘lavagem cerebral’ que havia feito na amiga e eles brigaram feio. Depois de muito ser ignorado por , desistiu. E finalmente se entregou à caverna escura e solitária onde o seu coração fora isolado. Abdicou de acreditar nas pessoas naquele instante, e mesmo que logo depois tivesse feito amigos incríveis como , , e , a escassez de sensibilidade não se foi. Começou a usar o sarcasmo e a ironia como armas, apesar que ficar sempre na defensiva tinha um problema: era exaustante.
nunca deu uma oportunidade para que se explicasse, muito menos. A verdade era que como a sua vida dentro de casa era uma porcaria ele fazia questão fora fosse diferente. Gostava de piadas, brincadeiras e usava isso para divertir as pessoas a sua volta, faze-las rir o fazia se sentir bem, o fazia se esquecer dos problemas. O título de palhaço da escola pegou, interagia com quase todo mundo e isso às vezes poderia ser visto de maneira equivocada.
saiu da sala 17 do segundo andar junto aos outros alunos. Uma mensagem de o avisava que ela já estava na sala para a próxima aula, de biologia. tinha aquela aula com e . Tinha exatos 10 minutos do intervalo entre as aulas para buscar a primeira para que pudessem ir até a sala juntos.
saia da sala onde tinha aula de geografia, meio distraída. Ela tentava colocar um caderno dentro da mochila ao mesmo tempo que andava. se aproximou no momento em que a garota fechava o zíper e olhava para frente. Não era nem um pouco seguro andar por aqueles corredores olhando para baixo.
— Biologia. — falou e assentiu com o seu horário de aulas nítido na mente. Logo começaram a caminhar lado a lado. — Vamos por aqui, .
Falou , desviando do caminho que eles usualmente faziam para ir até a sala. A Cuddle era um verdadeiro labirinto, você podia ir para qualquer lugar com caminhos diferentes. admirava as diversas saídas para o pátio, tirava a sensação de que a escola deveria se parecer com uma prisão.
— E então?
— O quê? — perguntou sem saber sobre o que ele se referia.
— Você falou com o ? — mordeu o lábio ao escutar a pergunta e balançou a cabeça para os lados. Não havia um segundo sequer durante o resto do fim de semana que ela parou de pensar no que tinha acontecido entre ela e . — Então vocês passaram a manhã inteira sem trocar uma palavra? Nem mesmo pra xingar um ao outro?
— Isso mesmo.
, naquela manhã, havia demorado o máximo que pode para levantar da cama. Enrolou ainda mais para se arrumar. Tudo que ela pudesse fazer para tardar o encontro com ela fez. Tanto que, quando desceu até o andar de baixo, não havia ninguém. e já esperavam dentro do carro. Ela simplesmente entrou no banco de trás, recebendo um único ‘bom dia’, que não teve resposta. Na escola eles só tinham uma única aula juntos, química com o Sr. Collins, que costumava ser a última aula, mas uma reorganização no horário dos alunos teve que ser feita naquele dia, já que Sr. Collins teve que se ausentar. Outro professor de química da escola tinha os horários bem abarrotados para poder substituí-lo. Ela e Jeremy, sua dupla de laboratório, sentaram-se o mais longe possível de onde e Lena estavam. não ousou olhar para trás, mas sentia constantes olhares sobre si. Jeremy perguntava a garota o porquê de ela estar tão aflita. Quando a aula terminou, fez questão de sair da sala rapidamente.
— Não me diga que passou a manhã inteira se esquivando. — falou e lhe lançou um sorriso torto, pois era exatamente aquilo que ela tinha feito.
— Ah, , você quer que a gente converse? Eu vou falar o que pro ? Me diz, porque eu não faço a miníma ideia.
— Sei lá, você podia dizer que ele beija bem?! — brincou e o empurrou de lado enquanto o garoto ria.
— Vai se foder.
— Vocês vão se ignorar pro resto da vida?
— É uma boa alternativa. — respondeu , pensativa.
— , isso precisa ser resolvido. Pra começar, você podia parar de evitar ele. — falou enquanto eles viravam em uma curva de um dos corredores entre outros alunos. — O não morde... a não ser que você peça. — sorriu marotamente e lançou um olhar sério para o amigo pela brincadeirinha. Se ela não lhe levasse a lembrar do beijo que ela e trocaram, poderia até rir.
— Sabe, ele não veio até mim diretamente, logo, pode-se dizer que eu não estou evitando-o cem por cento do tempo. — respondeu ela enquanto checava as unhas. costumava fazer isso quando queria fingir que nada estava acontecendo.
— Ótimo, então vamos lá falar com ele, ainda temos 5 minutos antes de a aula começar! — falou empolgadamente.
— O QUÊ? — entrelaçou seu braço com o de para que ela não pudesse fugir.
até tentou frear com os pés repentinamente assim que ouviu aquilo, mas continuou a puxá-la. Olhou para frente e conseguiu enxergar , quase no final do corredor. Ele estava parado próximo ao seu armário juntamente com . Finalmente entendeu o motivo de ter mudado a rota até a aula de biologia. Quando iam por outro caminho, eles nunca trombavam com qualquer outro de seus amigos, com exceção de . E ele havia escolhido logo o que passava na frente do armário de .
Quem precisava de inimigos quando se tinha um amigo igual a .
— ! — chamou , mas ele a ignorou. Já estavam próximos demais. estava de costas e não os viu chegando, diferentemente de , que trocou um rápido olhar com e sorriu da mesma forma que ao fazer as suas piadinhas. Ele sabia. Com certeza devia ter contado para ele o que havia rolado entre os dois. não disse nada até que os dois amigos se aproximassem e entendesse por conta própria o que ocorria.
— Dude. — apesar de se dirigir a , olhava para .
— ? ? — perguntou .
não esperava que fosse falar com ela, se sobressaltou quando ouviu o apelido. Dentro da colégio não era frio, fazendo com que dispensasse a jaqueta e usasse apenas a blusa branca da escola e um jeans rasgado.
juntava forças para dizer um simples ‘oi’, mas não estava conseguindo. O que diabos estava acontecendo com ela? Aquilo não era nem um pouco comum.
— O que vocês tão fazendo aqui? — indagou , mesmo que ele já soubesse a resposta. — Vocês não têm biologia do outro lado do prédio?
— É, temos. — respondeu num tom de voz bem diferente do que ela costumava usar.
— Eu e estamos dando uma voltinha. — falou , colocando um dos braços em cima dos ombros da amiga. — Não podemos?
— Claro que podem. — disse , segurando uma risada. encarava as lâmpadas no teto, não vendo a hora daquela conversa acabar.
— Achei que passassem sempre pelo outro corredor. — disse . Ele falar incomodava de um jeito que ela não sabia explicar. Talvez fosse o costume de querer retrucar tudo que falava, mas naquela hora ela não tinha o que dizer.
— E passamos. — falou . — Mas hoje a gente teve que mudar a rota porque a queria te dizer uma coisa, .
— Queria?
Pela primeira vez no dia, encarou . Estava curioso. olhou de para com vontade de matar o melhor amigo. Ela nunca entendeu tão bem a expressão ‘salvo pelo gongo’, pois no segundo seguinte o segundo sinal tocou, indicando para os alunos que se eles não estivessem na sala, era melhor correr.
— , se você demorar Zacharias vai te deixar do lado de fora. — falou , começando a se afastar para longe dos três garotos, sem olhar para trás.
Andou pelo corredor até descer a rampa para seguir caminho até a sala de biologia relativamente cheia. A maioria dos alunos já se encontrava lá, mesmo que o professor Zacharias não tivesse chegado. Por sorte, ainda havia um lugar vago ao lado de .
— Eu vou matar o seu namorado. — falou , jogando a mochila em cima da mesa ao lado da que se encontrava. guardou o celular no bolso e se acomodou na cadeira de modo que pudesse ficar de frente para .
— Não conversamos sobre isso ainda então, tecnicamente, ele não é meu namorado. — respondeu calmamente. — O que houve?
— Ele queria que eu me declarasse pro no corredor no meio de todo mundo. — respondeu , retirando seus materiais da mochila o os colocando sem delicadeza alguma na mesa e a olhou confusa.
— Isso é uma hipérbole, . — disse recém chegado, sentando na cadeira vaga na frente de . — Só dizer que tinha gostado do beijo estava bom.
— Ah, tá que eu ia dizer uma coisa dessas na sua frente e do .
— Então você quer falar isso pra ele quando estiverem sozinhos, entendi. Por que não disse antes? — brincou e riu. olhou para eles com vontade de dar um soco nos dois melhores amigos.
— Sabe o que eu acho? — falou abrindo o caderno de biologia. — Que os pombinhos deviam cuidar mais da própria vida.
— O que podemos fazer se é divertido ver você e o reprimindo o que sentem um pelo outro?! — disse .
— Eu não sinto nada pelo , será que dá pra vocês...
— ! — falou uma reconhecida voz atrás de , a interrompendo. A garota deu as costas para , surpreendendo-se ao ver Finn Flyn na mesa ao lado da dela.
— Finn? — perguntou ela. — Não lembro de a gente ter essa aula juntos.
— E não temos, bem, até agora. Entrei pra alguns clubes e, pra poder gerenciar com os treinos do time de basquete, pedi pra senhora Parker mudar o meu horário, então acho que vamos nos ver mais durante a semana. — finalizou ele com um sorriso.
— Ah, eu tava mesmo querendo te perguntar sobre isso. — falou , lembrando-se de ter visto o garoto no auditório na quinta-feira passada. Atrás dela, pigarreou. — Finn, essa é a . , Finn. O você já conhece, né? — Finn sorriu, assentindo.
— Prazer. — falou .
— E aí, cara — respondeu acenando com a cabeça ao companheiro de time.
— Bom dia, turma! — o professor Zacharias entrou na sala interrompendo a conversa dos alunos, que logo se mobilizaram para sentar em suas devidas cadeiras.
— Espero que você goste de falar, o Zach cobra muito que os alunos sejam participativos nas aulas, Finn Flynn. — cochichou para o garoto ao lado.
— Você não seria a primeira a zoar o meu nome, — cochichou ele de volta, dando-lhe uma piscadinha.
— Dois em menos de uma semana, ?! Vai com calma. — falou baixo o suficiente para que apenas ela e pudessem escutar.
— O sabe disso? É que ele é um pouco ciumento. — murmurou no mesmo tom. aproveitou que Zach estava de costas escrevendo no quadro e atirou bolinhas de papel nos amigos.
O que ela não daria para saber quando as zoações dos amigos finalmente iriam acabar.
— Parece que vocês tem doze anos e acabaram de perder o BV. — falou enquanto ele e saíram da sala de inglês quando a aula acabou.
Os corredores estavam movimentados em decorrência da saída de vários alunos ao mesmo tempo. Todos loucos para irem para suas devidas casas. e já haviam pego o que precisavam nos seus armários e não seria necessário fazer uma parada até as portas azuis de metal como a maioria dos alunos estava fazendo. O trajeto deles era em linha reta pelo corredor até a porta principal que levaria ao estacionamento. iria para o próprio carro, e teria que esperar , já que estava no dia de o amigo dirigir.
— É, parecemos. — concordou ele.
tinha absoluta razão. Afinal, o que diabos estava acontecendo? nunca teve problemas para falar com uma garota depois que beijava ela. Havia pensando muito naquilo enquanto encarava o céu pelo teto de vidro do seu quarto durante o resto do fim de semana.
— O que o disse?
— Nada. Se a não contou, acho que ele nem sonha.
— , você tá com medo de contar pro que deu uns pegas na irmã dele?
— , vá se foder. — respondeu , arrancando mais risadas de , que teve que apressar o passo para alcançar o amigo.
— Olha eles ali na frente. — falou apontando para e , que andavam lado a lado.
— Se você apressar o passo, , dá tempo de se declarar pro antes que o chegue. — disse . Ela estava adorando tudo aquilo. Não esperava que daquele beijo fosse acontecer algum milagre, mas desejava que um período de paz fosse instalado entre os amigos.
— Por que vocês não vão pra puta que pariu? — murmurou a garota sem olhar para os amigos, que andavam ao seu lado. e estavam a poucos metros de distância. Quase não era possível vê-los por conta dos outros alunos que passaram por ali. havia vestido a jaqueta e caminhava para onde sabia bem. Para o carro de estacionado perto da árvore. Ela só esperava que já estivesse lá quando ela chegasse.
Havia passado a aula inteira de biologia ouvindo as brincadeiras e piadas de e . A cada 10 frases que disseram, em 9 o nome de estava envolvido. Maldita hora em que foi lhe roubar um beijo.
Maldita hora que ela foi retribuir. Malditos hormônios.
— ! — exclamou , aparecendo de repente na frente dela, tampando a sua visão de . — Posso falar com você antes de ir? É sobre o Sarau. — assentiu.
— Claro. — respondeu , que olhou para e , mas o casal já se afastava das duas garotas de mãos dadas.
— A gente se vê mais tarde. — disse .
— Vê se não esquecer de contar o que rolou com o , . — disse , rindo, e antes que pudesse dar as costas totalmente às amigas, lhe mostrou o dedo médio.
— , né? — lhe direcionou um sorriso maroto.
— Quem te contou?
— Tive uma aula com o hoje, ele acabou abrindo o bico.
— Já cansei desse assunto por hoje, então, por favor. — pediu , suspirando.
— Tudo bem. — respondeu , abraçando-a de lado. Lógico que a amiga estava morrendo de curiosidade para saber mais sobre o que tinha acontecido, mas o assunto ‘ ’ podia esperar. Estava mais empolgada para outra coisa.
As duas garotas pararam do lado de fora da escola, próximas à porta.
— Tive uma ideia pro Sarau.
— Qual?
— Queria saber... E se você se apresentasse com a gente? Eu sei que você geralmente se apresenta sozinha, mas eu falei com o clube de dança já e eles concordaram. — de um segundo para o outro, sentiu uma animação que não sentia há algum tempo. A ideia era incrível e ela não via a hora de começar a ensaiar.
— Caralho! Sim, mil vezes sim. — exclamou animada, sorriu satisfeita. — Mas como isso ia funcionar?
— A ideia inicial é que você cantasse a música que a gente vai dançar, sabe? Se você quiser participar da coreografia também... A gente pode decidir tudo hoje à tarde no ensaio.
— E se eu fosse pra sua casa agora pra gente já ir discutindo sobre? Eu ligo pro meu pai rapidinho pra avisar...
— Não mesmo. , você por acaso está tentando fugir do ?! — disse . Dali dava para ver. parado no estacionamento conversando com . bufou, jurando que a amiga não fosse perceber.
— Achei que vocês já tivessem ido embora. — falou , se aproximando. As três começaram a andar lado a lado pelo estacionamento. — , preciso falar com você sobre o dia dos namorados. A minha ideia só vai ser possível com a sua colaboração indiretamente. Já é mês que vem, tenho que me organizar para que saia tudo certo.
— Claro, você tem treino hoje, né? Eu e a temos ensaio do Sarau. A gente pode falar sobre isso quando acabar.
— Logicamente, são muitos detalhes pra acertar agora e... — parou de repente e encarou as duas amigas. — Espera um pouco, por que nós estamos indo na direção do e do ? — lançou um olhar para , que encarava o asfalto segurando as duas alças da mochila. Nenhuma das duas respondeu. — O que que tá rolando?
— A ficou com o .
— VOCÊ FICOU COM O ? — perguntou , se pondo na frente de . levou uma das mãos à boca da amiga. Se o estacionamento todo não tivesse ouvido o grito que deu, a metade pelo menos havia escutado. — E eu sou a ÚLTIMA a saber?
— Não tive oportunidade, você ficou com o Elliot o dia todo praticamente. — respondeu .
— Ah, e o celular não existe mais? — questionou ainda meio chocada com a descoberta.
— O que vocês tanto fofocam? — perguntou ao abraçar a irmã de lado, a pegando totalmente de surpresa. Estava com o óculos escuro que costumava usar quando dirigia de dia. temeu que ele houvesse escutado alguma coisa. Pensou em dizer alguma coisa, mas respondeu por ela.
— Coisa de garota, . — falou ela, trocando um breve olhar com e . suspirou pela centésima vez no dia. Quando chegaram onde e estavam, abraçou a cintura do irmão com um dos braços para que ele não se soltasse dela.
— , vamos. — falou ele. Os três se despediram rapidamente dos amigos e seguiram por poucos passos até onde o Mercedes-Benz ML de estava estacionado, embaixo da árvore.
— , me dá uma carona? — perguntou com um sorriso para assim que , e saíram. — Vamos, ?
— , você acha mesmo que eu vou entrar num carro com... — olhou para o garoto encostado no carro, lembrando-se da conversa que tiveram mais cedo. Se ele tivesse o mínimo de senso, recusaria o pedido de carona da amiga, mas era de de quem estávamos falando. — Vim com o Elliot, vou voltar com ele.
— Ah, claro, então mais tarde a gente conversa sobre a sua ideia. — assentiu, se afastando da amiga e de .
— Vá pela sombra, . — falou o garoto, mas nem sequer deu o trabalho de olhar para trás. Ele riu, logo depois olhou para , que ainda estava parada na frente dele.
— E então? — perguntou ela.
— Espera, você me escorraça da sua casa e depois vem me pedir uma carona? — indagou ele com as sobrancelhas erguidas.
— Isso mesmo.
— Eu adoraria, mas não vai dar não. Não to podendo gastar com gasolina. — falou, batendo na lataria do carro. inclinou um pouco a cabeça para o lado, tentando entender a falsa desculpa, afinal, os pais de eram ricos.
— Então eu vou direto ao ponto. — murmurou, os deixando um passo mais próximos. — O que está acontecendo? Eu tava saindo da sala e acabei ouvindo a sua conversa com a hoje mais cedo.
esperou pela reação dele. Esperou pelo deboche ao perguntar se ela ouvia a conversa dos outros com assiduidade. Mas ele apenas sorriu de lado, dando a volta no carro e destravando-o.
— Entra aí, .
Segundos depois, ele partiu com o carro.
— Impressão minha ou vocês hoje estão quietos demais? — perguntou , soltando-se da irmã para pegar as chaves do carro no bolso.
e trocaram um breve olhar. os olhou, aguardando uma resposta, mas eles não disseram nada. ouviu uma voz não muito longe chamando pelo nome do irmão. O barulho dos saltos batendo no asfalto que dava a ideia de que deveria ser alguma mulher que trabalhava na Cuddle, e ela estava certa. Quando virou-se, viu Sra. Gamaliel vindo na direção deles.
— ! — falou a mulher, ofegando. Ela segurava nas mãos várias folhas brancas e no ombro uma bolsa cor de vinho. — Que bom que consegui alcançá-lo antes que fosse.
— Algum problema? — perguntou o garoto. A mulher assentiu perguntando se ele tinha alguns segundos antes de ir. — Esperem aí. — disse e, ao ver e concordando, foi até onde a professora de matemática estava se afastando alguns centímetros.
Os dois entraram em uma conversa que não fazia questão de saber. Por um instante ela quase esqueceu que estava bem ao seu lado. Encostado na traseira do carro com os braços cruzados.
— Ele podia ter deixado o carro aberto, está frio pra caralho aqui fora.
— Está mesmo. — ela o olhou pelo canto do olho, percebendo que era a primeira vez que tentava puxar algum tipo de assunto. Nem que fossem falar de algo tão bucólico como o clima frio. — Você entregou o trabalho?
— Eu ainda não terminei. — respondeu ele. não sentiu um pingo de grosseria ou descaso na resposta dele como normalmente havia quando ele lhe dirigia a palavra. — Fiquei de finalizar hoje, falta a conclusão, mas é tranquilo. Ainda tenho dois dias pra entregar. olhou por um breve instante para e a professora de matemática, analisou-os por alguns segundos, os saltos deixavam a mulher e o irmão quase da mesma altura. Quando olhou para de volta, ela sorriu, e surpreendentemente o guitarrista sorriu de volta.
— Que bom então.
voltou com algumas das folhas que a professora segurava em mãos. Não demorou para que os três finalmente entrassem no carro e seguissem até as devidas casas.
Naquele momento, se sentiu bem mais leve. Como se grande parte da tensão tivesse ido embora com uma simples troca de palavras e um sorriso.
Lilith Martinez não era o que se poderia chamar de má professora, apesar de ser exigente, era divertida e compreensiva. Naquela tarde havia realizado a primeira tarde de ensaios com sucesso e competência. Havia dividido os três clubes pelo auditório e conseguiu auxiliá-los dividindo o tempo em que havia ficado com cada.
estava animada. Tinha conversado com todo o grupo de dança e estava começando a achar que a ideia de daria muito certo. Tiveram várias ideias sobre a música que iriam escolher e alguns passos da coreografia. Algo que agradasse a todo mundo. Lilith tinha achado a ideia maravilhosa e se responsabilizou em ajudá-los com a organização. ainda estava indecisa sobre participar ou não da coreografia. Caso negasse, era o desafio para a Sra. Martinez ajudá-lo para que todos tivessem a mesma visibilidade e exposição ao mesmo tempo que não acabassem esbarrando uns nos outros.
temia acabar atrapalhando os dançarinos e estragando tudo, mas havia lhe confortado dizendo que tudo daria certo.
Ao final do ensaio, as duas tinham ido até a arquibancada da quadra fechada onde o time de basquete masculino treinava.
— Imagina se eu for pro lado errado na hora errada? — falou , olhando para a quadra. O irmão exercendo a pose de capitão reunia o time ao redor de si para dar instruções incompreendidas para quem via de fora. O treinador estava parado ao lado dele, não tinha uma cara muito boa. — Vou esbarrar em alguém e vai ser um desastre.
— Pare de sofrer com essa insegurança, . — respondeu . As duas olharam para uma que vinha saltitante na direção delas.
— Hey. — disse , sentando-se ao lado de .
— , o que você está fazendo aqui? — perguntou .
— Seu treino do time do vôlei não é amanhã? — indagou e sorriu, assentindo.
— É sim, mas estava um tédio em casa. Sabia que todo mundo iria estar aqui e quis vir pra ver vocês. — respondeu e a encarou, desconfiada.
— Quis vir aqui pra ver a gente ou pra ver o ? — não respondeu, olhando para a quadra no momento em que tinha acabado de passar a bola para , que fez uma cesta de três pontos. — A sua cara de apaixonada não engana ninguém.
— Ah, então quer dizer que e vão finalmente assumir? — perguntou com as mãos na cintura.
— Ih, você nem tá sabendo, mas esses dois — falou , apontando para , que estava começando a ficar vermelha. —, ficaram no maior love o fim de semana inteiro.
— Pra ficar saindo de mãos dadas pela escola alguma coisa tem que ter acontecido mesmo. — disse sem o mínimo de surpresa, lembrando-se da cena naquela manhã quando havia ido falar com sobre o Sarau.
— Muito, foi ótimo. — afirmou com um sorriso. Logo as três amigas se pegaram observando os garotos jogando na quadra fechada. Eles haviam se dividido em dois times, alguns deles usavam coletes brancos sobre a camisa azul para diferenciá-los. conseguiu identificar e de blusa azul. , e Finn faziam parte do outro time.
Uma falta de um garoto de colete branco sobre um dos sem colete fez o treinador apitar, parando o jogo, que recomeçou segundos depois. estava com a bola laranja de um lado da quadra. observou quando ele correu até a metade da quadra e direcionou o passe para , que estava do outro lado mais perto da cesta. Antes que a bola chegasse ao amigo, o arremesso foi interceptado por Finn, que num contra ataque não precisou correr muito, apenas passou a bola para um cara moreno que se viu rodeado pelo time adversário. O moreno passou a bola para , que marcou uma cesta de um ponto. gritou algo para , que soou como uma bronca pelo passe mal elaborado. O treinador apitou novamente indicando que eles fariam um intervalo.
olhava os garotos se dispersarem pela quadra quando falou:
— Eu decidi que vou falar com o . — e se entreolharam curiosas, com uma pitada de entusiasmo.
— Vai? — perguntou .
— Vou.
— E você vai falar o quê? — perguntou .
— Vou dar um jeito nessa situação. — respondeu decidida, procurando com os olhos para onde teria ido.
Desde sábado vinha pensando naquilo. E após os acontecimentos daquela manhã e de toda aquela situação, que não deveria ser constrangedora, ela decidiu que estava certa, aquilo tinha que ser resolvido. Não fazia de sua personalidade aquele jeito em que evitava conversas e até mesmo um simples cumprimento de ‘bom dia’. Aquela não era ela. E não era só porque era a pessoa em questão que a garota iria deixar de agir como sempre agiu.
As coisas com Austin haviam sido bem diferentes. Não que ela achasse que após ter a beijado as coisas evoluíram como aconteceram com o ex-namorado. achava aquilo impossível. Mas, caso ele concordasse, a relação dos dois poderia melhorar para algo que não fosse tão cansativo e estressante. Amigos, quem sabe.
— Hey, girls. — falou . Ela vinha do campo de futebol segurando pompons, um em cada mão nas cores dourado e azul. — Claire, uma das bases da pirâmide, disse que viu vocês aqui.
— Intervalo do treino das líderes? — perguntou e balançou a cabeça para os lados.
— Já terminou, graças a Carly Manning¹. — agradeceu com as mãos para cima.
— Mas já? — perguntou .
— No inverno, quando treinamos no campo aberto, dura uma hora a menos por causa do frio. — Respondeu , colocando os pompons na arquibancada enquanto arrumava o rabo de cavalo.
— Ah, então podemos falar sobre a sua ideia? Estava te esperando. — disse e assentiu, segurando o elástico de cabelo com os dentes.
— Vou aproveitar pra ir falar com o . — falou , se levantando. arqueou as sobrancelhas, alheia aos acontecimentos. também desfez sua borboletinha para ficar de pé.
— E eu com o .
Logo, e saíram, deixando e sozinhas.
A água do bebedouro estava mais gelada do que geralmente era, mas isso não foi um problema para os garotos suados do time de basquete no intervalo do treino. Na verdade, fora ótimo. Apesar de que do lado de fora a temperatura estivesse em torno de 6º, o que eles estavam sentindo — depois de quase uma hora correndo e quicando com a bola de um lado para o outro — era calor.
A maioria já havia enchido duas garrafinhas de água e descansava, sentados no banco onde os reservas do time costumavam ficar durante os jogos. Já e se encontravam de pé, a centímetros do bebedouro.
— Nada mudou. — respondeu . apertou a garrafinha para que a água espirrasse no seu rosto. Passou a mão por toda a fazer para tirar o excesso do líquido incolor. No momento só pensava em tomar um banho bem quente.
Por um segundo olhou para . O garoto havia levado diversas broncas de e do treinador ao decorrer do o jogo de treino e decidiu perguntar o que estava acontecendo. Eles acabaram entrando numa séria conversa sobre e a relação com os pais.
— Você já tentou falar com eles?
— Eles são ignorantes demais para sentar e conversar um pouco comigo. — deu de ombros e o olhou preocupado.
— E quanto aquela história de não te darem mais dinheiro?
— No primeiro dia eu achei isso a coisa mais absurda do mundo, sabe? Por isso tive aquela reação naquele dia na hora do almoço. — assentiu, recordando a cena. — Mas depois eu percebi que, se eles tinham feito aquilo, significava que se importavam comigo, aquela era uma forma de demonstrar. E eu me senti bem com isso. Todavia acho que me enganei.
— Por quê? — perguntou e suspirou antes de começar a explicar.
— Minha mãe pediu pra eu deixar o meu cartão de crédito em cima do armário da cozinha porque ela ia confiscá-lo, mas o cartão tá até hoje lá. Eu poderia muito bem pegar de volta a hora que eu quisesse que eles sequer perceberiam.
— Sinto muito, dude. — lamentou tentando ao máximo não direcioná-lo um olhar de pena. Aquela situação deveria ser péssima. Ele agradecia por ter uma mãe como Cindy. Por mais que seu pai fosse um bosta. A mulher que o havia colocado no mundo com certeza valia pelos dois.
— Não sinta.
Em momento algum havia expressado no rosto emoções, ele apenas olhava para frente como se estivesse observando o pôr do sol no horizonte de um lugar paradisíaco e os problemas não existissem. Só virou o rosto quando se aproximou dos dois.
— , eu posso falar com você?
— An... claro. — respondeu ele, passando a mão atrás da cabeça.
— Eu vou ali me certificar de que nem o nem o Balli vão me expulsar do time. — falou , se afastando e deixando e , de certo modo, sozinhos.
— Ainda tem tempo? — perguntou , incerta de que o treino poderia recomeçar.
— Acho que uns 5 minutos.
— Ótimo, então eu vou direto ao ponto. É sobre sábado, mais precisamente quando você me beijou.
— O quê? Eu te beijei? Não foi o contrário? — perguntou com a testa franzida, exibindo uma falsa cara de indignação. Fora ele mesmo que havia a beijando, mas não pode evitar a brincadeira.
— Não! E você sabe disso. — acusou e lhe direcionou um sorriso brincalhão. — De outra forma esse beijo não aconteceria.
— Então, está me dizendo que não tinha possibilidade nenhuma de você me beijar? — indagou ele, ficando um passo mais próximo dela. prendeu a respiração por um segundo. Teve que erguer um pouco a cabeça para encará-lo, já que era alguns centímetros mais alto.
— Não... quer dizer, sim! — olhou para os lados meio confusa. Droga de nervosismo. — Você está desviando do ponto, .
— E qual é o ponto, então, , que você quer chegar?
— Ao ponto de que foi só um beijo, apenas. E acho que você concorda comigo. — falou , pensando em se afastar, mas não dera um passo. — Não tem pra quê todo esse alvoroço e, de certo modo, constrangimento. Já dei beijos sem significados, muito menos sentimentais e acho que você também. — assentiu.
— De certo que sim.
— Perfeito, fico feliz que concordamos. Agora podemos seguir e fingir que nada aconteceu. — sentiu-se satisfeita consigo mesma por ter resolvido logo aquela situação entre os dois. — Mas acho que, a partir de agora, a gente poderia agir com mais... sabe... respeito e maturidade.
— Está levantando a bandeirinha branca? — assentiu.
— Estou. Talvez seja melhor pra todo mundo você não acha?
— Acho. Quem sabe uma relação menos extenuante seja melhor? — concordou para a surpresa de . — Considere aquele beijo como o estopim para a avença.
— Que bom, então. — disse , coçando o pescoço.
— Você pode me dar um abraço se quiser, . — falou , abrindo os braços.
— Sem chance, você está todo suado. — falou ela dando um passo para trás, o que fez rir. — E... você pode me chamar de .
— Quer dizer que agora você está me dando intimidade?
— Estou. Só não abusa.
— Caralho! — exclamou abrindo a boca, ele parecia surpreso, mas não olhava para . — O quê? — perguntou ela e assim que se virou entendeu o motivo. e estavam juntos na arquibancada num beijo quase pornográfico. — Enfim assumiram, pelo visto.
— Você sabia disso?
— Sabia. — respondeu , cruzando os braços. — Estava meio óbvio.
— É. Eu só não achava que estava mesmo rolando. — os dois continuaram a observar os amigos. podia ver dali o modo como olhava para . A admiração que tinha nos olhos poderia ser vista a quilômetros de distância.
— Sabe porque eu te beijei? — disse . o olhou por instinto, mas ele não a olhava de volta. Ficou um tanto curiosa e surpresa, não esperava que voltassem com aquele assunto de novo.
— Por quê?
— Se o silêncio prevalece, o cara beija a garota.
Por um momento, não encontrou palavras para falar alguma coisa. Pelo visto a memória de era muito boa e ele sabia disfarçar bem quando queria demonstrar que não estava prestando atenção. Quando finalmente olhou para ela com as bochechas e a testa rosadas por conta do exercício de minutos atrás, percebeu que tinha ficado reação. Até aparecer por trás dela a ponto de lhe dar um abraço. A garota se esquivou de imediato.
— , está te chamando.
— Devo me preocupar? — perguntou ele, imaginando o motivo.
— Não, é algo sobre mudar de posição com o Courtois. — assentiu e se afastou. o observou partir até se aproximar do banco em que estava com o treinador. O irmão jogou a enorme bola laranja na direção do amigo, e , por um rápido reflexo conseguiu pegá-la antes que a bola atingisse o seu rosto. Por um instante quase esqueceu que estava do seu lado.
— Estou orgulhoso de você.
— O quê?
— Muito bem, você já abriu seus olhos. Sua visão deve estar um pouco embaçada, por isso você não enxerga direito.
— , do que você tá falando? — perguntou confusa, mas não respondeu.
— Continue assim. — disse ele antes de dar as costas para a garota.
— ! — gritou , mas era tarde. Balli havia apitado, anunciando que o intervalo tinha terminado e que o treino recomeçaria. Todos os jogadores voltaram para a quadra.
tivera que esperar que e finalmente saíssem do vestiário para poder ir para casa.
Ela havia decidido contar a o que estava acontecendo, omitindo alguns detalhes como a parte do beijo. O irmão havia ficado confuso no começo, mas disse que era questão de tempo até se acostumar. Quando despediu-se dos dois e foi até a sua casa, começou a encher de perguntas sobre o assunto.
— Mas foi assim do nada? — perguntou ele pela décima vez. rolou os olhos. Preferiu não responder enquanto girava a chave para destrancar a porta de casa.
Imaginava que quando chegasse em casa seria recebida pelo cheiro da comida deliciosa de seu pai. Tudo o que ela queria era comer e um banho após uma tarde de ensaio. Mas, ao invés disso, seu pai estava sentado na mesa com Elsie ao seu lado, os dois estavam sérios. E não havia sinal de comida no fogo.
— Pai? — chamou e o homem e a mulher sentados na mesa notaram a presença dos mais jovens.
— . . — disse o mais velho. — Venham, sentem. Preciso compartilhar uma novidade com vocês. — e se entreolharam, mas obedeceram. — Juro que achei que seria mais fácil, na minha cabeça parecia bem mais fácil. Pensei até em contar cantando...
— Bill! — falou Elsie, chamando a sua atenção.
— Pai, só vá direto ao ponto. — falou . Odiava quando o pai ficava naquela enrolação.
— Certo, certo. — prendeu a respiração. Uma novidade. Mil coisas passaram na cabeça de naquele momento. Bill fez uma pausa dramática, mas logo continuou:
— Eu e Elsie vamos nos casar.
¹: Americana tetra-campeã mundial de cheerleading.
Continua...
Nota da autora: (16/01/2019) Hi cupcakes! Só vim pedir desculpas pelo spoiler de House e dizer que antes de eu começar a escrever essa fanfic eu sonhei com o que vai acontecer no próximo capitulo, então espero que estejam ansiosas pro capitulo 8, é isso, bjs.
Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.