Cedro : O cedro é o símbolo da força e da fidelidade. Acreditava-se também que o cedro tinha o poder de revelar os mistérios dos Céus e apresentava poderes mágicos de afastar as malignidades.
22 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamentos do Pelicans
– Não há sobre o que chorar agora, temos que recuperar o resultado desastroso desse jogo e aprender com ele, para que nunca mais se repita. – O treinador finalizou sua bronca, enquanto o time assentia envergonhado.
Os pelicanos haviam levado uma virada monstruosa, quatro a dois. Petri estava soltando fumaça pelas orelhas e o time parecia ter sido atropelado por um ônibus, todos cabisbaixos e frustrados. O único som audível era o dos passos dos atletas e as conversas de outros funcionários em outros andares. Aos poucos, no final, os atletas deixaram a sala de reuniões, alguns sorriam fechado para , outros pareciam tão absortos em seu próprio caos que era impossível nota-la.
– Oi, Otto. – apertou os lábios em um sorriso.
– Segunda-feira. – Otto fez careta, mal-humorado. – Segunda-feira.
– . – Jasper ergueu o punho fechado, cumprimentando a terapeuta com um soquinho.
– Oi, como você está? – sorriu e o jogador maneou a cabeça, torcendo os lábios.
– . – Petri se aproximou da terapeuta.
– Sim, eu. – sorriu, colocando as mãos nos bolsos da calça e levantando os ombros, enquanto sorria.
– Queria falar com você antes de ir. – Disse ele e a inglesa assentiu. – . – Petri chamou o central, que deixava a sala em silêncio, de cabeça baixa. – Por favor. – Chamou o mais velho, flexionando os dedos da mão e se arrastou até os dois, trocando olhares com assim que se aproximou da inglesa.
– Petri, eu...eu posso esperar lá fora. – apontou para trás de si com o polegar, sem jeito.
– Não, fique aí. – Petri sentenciou. – , o que achou do jogo? – Petri quis saber, pegando o central de surpresa, mas manteve a expressão inabalável de sempre, estreitou o olhar e repuxou os lábios antes de responder, adotando a postura sexy e desprezível de sempre, de quem não dá a mínima.
– Estávamos bem no primeiro período, foram boas chances, mas poucas, principalmente porque o goleiro deles é muito bom. No segundo e terceiro as coisas saíram do lugar, não sei o que aconteceu com o time, não estava no gelo. – deu de ombros e o encarava de olhos estreitos, chocada com a forma esperta com que havia escapado daquela.
sempre parecia se manter num modo defensivo nas conversas com o treinador, aos poucos notava isso. Os ombros não estavam relaxados e a mandíbula também não, apesar de não estar totalmente tensionada. As mãos paralelas ao corpo, o pescoço alongado e o queixo erguido, isso, junto à altura do central, fazia com que qualquer pessoa que falasse com ele se sentisse sendo olhada de cima.
Além disso, o olhar estreito, crítico e analítico, passava a ideia de que independente de quem quer que fosse você, não te respeitaria a não ser que merecesse. Talvez, de algum modo, aquilo despertasse nas pessoas ao redor a necessidade de agradá-lo, de merecer a atenção e respeito do capitão. Ponderando sobre isso, pensou no quanto ela mesmo não estava sendo uma dessas pessoas, buscando a aprovação de de modo inconsciente, apenas porque ele a olhara com desdém. Principalmente após a confissão do capitão, sobre a ignorar de propósito para conseguir sua atenção.
– Não estava no gelo, nem na arena. – Petri denunciou e deixou seu raciocínio para acompanhar a conversa dos dois, sentindo que estavam prestes a serem desmascarados.
estreitou um pouco mais os olhos e seu lábios, por uma fração de segundos, quase tremeram em um sorriso fechado. Muito, muito sutilmente.
– Houve uma urgência. – Respondeu, como se de algum modo se divertisse com o questionamento do treinador.
– Urgência? – Petri arqueou uma sobrancelha, desconfiado.
– Não era como se eu pudesse adivinhar o que ia acontecer, ou que pudesse fazer alguma coisa.
O treinador analisou meticulosamente, depois expirou convencido.
– Mesmo fora do gelo, é bom para o time que o capitão esteja presente. Mas acho que não preciso te lembrar dessas coisas.
– Não precisa. – respondeu sem baixar a guarda.
– E você, ? Também resolveu ver o jogo em casa? – Petri mudou seu alvo e engoliu o folego rapidamente, mas fora encorajada pelo olhar de .
– Eu estive aqui. – Respondeu rápido.
– É, eu vi. – Petri cruzou os braços sobre o peito. – Perguntei sobre o jogo?
– Sou uma pessoa muita ansiosa, não consegui terminar de assistir quando as coisas ficaram ruins. – mentiu, sorrindo fraco. Não era uma mentira total.
– Queria ter feito o mesmo, pouparia a vergonha. – Petri relaxou os ombros. – Eles deviam ir para um banho de gelo, para acordarem para o próximo jogo.
– Vamos trabalhar duro. – assentiu com um sorriso otimista e Petri assentiu de volta.
– Vamos trabalhar mesmo. – O treinador bateu duas palmas. – Tenho uma reunião agora e vocês precisam se juntar aos outros. Vão, podem ir. – Ordenou.
– Claro. – sorriu e deu as costas ao finlandês, seguida por . – Até mais.
Os dois deixaram a sala de reunião e tomaram o corredor até os elevadores. Estavam em silêncio, não um silêncio constrangedor, apenas o silêncio de quando não se tem o que dizer.
– Eu não tenho psicológico para ser desmascarada duas vezes em menos de uma semana. – respirou fundo, a caminho do elevador e assentiu sorrindo fechado e arqueando as sobrancelhas, como se dissesse que fora um susto e tanto.
chamou o elevador apertando o botão, enquanto assistia a conversa com o treinador em looping em sua cabeça. Estava envergonhado, Petri tinha toda razão, era o capitão do time e não podia simplesmente deixar o grupo e sair no meio do jogo, mesmo que por causa de . Se orgulhava e fazia o possível e impossível para honrar a posição de capitão do time e deixar um jogo quando o time levava uma virada no primeiro jogo ausente por lesão não parecia ser a postura esperada de um capitão.
não entendia porque estava tão emocionado e entregue a terapeuta inglesa, mas por mais que amasse o que estava acontecendo, não podia permitir que aquilo interferisse em seu trabalho. Sentia vergonha de si mesmo pela postura e ainda mais por ter sua atenção chamada pelo treinador em algo que sempre se dedicara a cumprir, algo que para o capitão era tão fundamental. Estava frustrado e irritado consigo mesmo.
Quando o elevador apareceu e a terapeuta e o jogador enfim entraram na caixa metálica, se permitiu matar o que a estava matando: sua curiosidade. Desde que percebera a postura do central diante o treinador e o silêncio de após a conversa, mil coisas se interligavam em sua cabeça e precisava dar vazão a tudo aquilo.
– O que você acha o Petri? – Perguntou de repente, apertando o botão do andar para qual estavam indo.
– Hã? – murmurou, direcionando a ela um olhar confuso.
– Petri. O que acha dele? – Ela repetiu.
– Ele é bom. – deu de ombros, não queria falar de Petri ou dar qualquer brecha para que a inglesa tocasse no assunto abordado pelo treinador anteriormente. – É um treinador bom, as vezes não concordamos, mas ele tem mais experiência que eu. Sei meu lugar e o respeito, não temos problema.
– Isso é a opinião profissional? – Ela perguntou e o jogador assentiu. – E a pessoal?
– Onde quer chegar? – a encarou, com o olhar analítico e incerto.
– Quero saber sua opinião. É só. – sorriu, tentando não alarmá-lo, mas já notando diferença na postura e humor do capitão, como se repentinamente estivesse na defensiva com ela.
a analisou por alguns instantes, depois voltou seu olhar para frente, para as portas do elevador, que logo se abririam.
– Minha opinião pessoal é a mesma, não sou amigo dele, não convivo. Ele é bom e eu o respeito, é isso.
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22 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamentos do Pelicans
estava nos fundos da sala de musculação, concentrado em algum fortalecimento de inferiores, junto a um dos preparadores físicos. O semblante era duro e firme, como tivera sido em alguns momentos do último final de semana. Ao fazer a conexão entre aqueles pensamentos, riu abafado e sacudiu a cabeça negativamente. Entre as vantagens de usar máscara, uma das maiores era conseguir manter a expressão abobada sem precisar se explicar para qualquer um que lhe cruzasse o caminho.
Estava longe do central, no outro canto da sala, auxiliando Santtu com halteres enquanto o defensor fazia uma série para fortalecimento dos extensores de punho. Em menos de uma hora já havia sido necessário que Santtu a trouxesse de volta à Terra ao menos cinco vezes, era difícil se concentrar quando todas as lembranças do final de semana a invadiam de uma só vez.
No domingo, após repetir com muito empenho o feito da noite anterior, já passava das oito da noite quando fora embora, e não foi possível a terapeuta fazer mais nada além de tomar um banho e dormir feliz. Ainda não havia tido chance de processar os últimos acontecimentos, entender o que estava sentindo ou entender como tudo tinha se modificado tão rapidamente. Em um dia a ignorava sem qualquer demonstração de pena, dias depois estava flertando com ele enquanto cozinhava em sua cozinha. Primeiro, a súbita mudança de , sobre qual ainda não sabia se achava fofo ou patética. Não havia acreditado totalmente no central quando ele lhe dissera se tratar de uma espécie de plano infalível para capturar sua atenção, mas fato era, o capitão parecia outra pessoa, ao menos durante o final de semana e o início da manhã.
Com a conversa com o treinador, notara mudança em , e por ser a primeira vez em que estavam no mesmo espaço após tudo acontecer, não fazia ideia de como agir ou se portar, nem mesmo do que esperar por parte dele.
Segundo, Waltteri parecia mesmo ter razão, era alguém legal, admitia aquilo com alegria. Fora uma feliz descoberta, não só era gentil, doce e atencioso, como inteligente e interessante. De algum modo, a presença do capitão lhe transmitia uma sensação de familiaridade, conforto e segurança, como se já se conhecessem há milênios. Era bom também confirmar que sua intuição não estava quebrada. Tinha razão ao pensar que a forma com que a tratava era pessoal, porque era. Não se tratava de alguém resistente a profissional, tinha suas questões com , a mulher. Mal podia esperar para contar tudo aquilo a Maisie e Louis.
Em terceiro, se era bom ter alguém para enfim perguntar sobre hockey, tirar dúvidas e aprender junto, se arrepiava sempre que se lembrava de que seu segredo estava agora nas mãos grandes e quentes de . O jogador havia dito não contar, mas ainda não sabia o quanto podia ser confiável. Não sabia se por acaso suas outras hipóteses eram verdadeiras, se sabia ou não sobre seu pequeno passado com e o motivo de sua transferência a Finlândia. Caso soubesse, já seria o segundo segredo de nas mãos do capitão moreno e de sorriso arrebatador.
– ! Oi! Alguém! – Santtu chamou, empurrando a terapeuta levemente com um dos pés. – Em que mundo você está hoje? – Indagou ele, franzindo o cenho.
– Oi, estou aqui. Desculpe. – A inglesa pediu, dando as costas para , tentando retomar seu foco, e agachando-se junto a Santtu. – Eu tive um fim de semana agitado, ainda estou processando, sabe como é.
– Sei. – Santtu franziu os lábios, desconfiado. – Ninguém teve um final de semana muito bom por aqui.
– É, eu soube. – mordeu o lábio inferior, compadecendo-se. – Como você está com isso?
– Normal. Frustrado, eu acho. – O defensor deu de ombros.
– Você sabe que eu não sou o Jakkos, não é? Se lembra? – arqueou as sobrancelhas e inclinou a cabeça sobre o ombro. – Vamos, me conte. Como se sente? Temos sigilo profissional, e além disso...– olhou para os lados, para se certificar estarem sozinhos e Santtu a acompanhou. – Estamos só nós dois aqui.
O defensor respirou fundo, e fez uma breve pausa, como se ponderasse bem o que dizer.
– A virada, acho que foi por minha culpa. – Confidenciou ele, após expirar pesadamente. – Quer dizer, não de propósito, mas foi. Em duas oportunidades que o Atte não conseguiu defender.
– Vai ter que ser um pouco mais claro sobre isso. – tentou disfarçar seu pouco conhecimento sobre o esporte e o fato de estar praticando outras atividades com o capitão durante o jogo.
– O primeiro, quando eles empataram. Eu perdi o disco. Dei bobeira. Não sei o que rolou. O segundo, no último deles, causei o power play que deu vantagem. – Narrou chateado, com a cabeça inclinada. – Ninguém falou nada diretamente, mas eu vi os olhares.
– Que olhares?
– Olhares de decepção, olhares que dizem que a culpa foi mesmo minha. – Ele disse apontando para si.
– Foi o que? Quatro a dois? – quis saber e Santtu assentiu.
– Eu sei o que você vai dizer, que só foram dois, mas foram dois decisivos. Acho que a gente ficou meio perdido sem o . – Santtu disse de repente, após um suspiro, e sentiu calor ao ouvir o nome do capitão. – Acho que a gente se acostumou com a liderança dele.
– Bom, você se enganou. – falou após uma pequena pausa, sorrindo com os olhos, por causa da máscara. – Não era isso que eu ia dizer.
– Então o que era? – Santtu a encarou.
– Achei que hockey fosse um esporte coletivo. – Falou a terapeuta, tocando o joelho do defensor.
– Eu sei, mas os erros individuais também...– Santtu começou seu discurso, mas o interrompeu.
– Achei que hockey fosse um esporte coletivo. – Disse outra vez, e ao perceber que Santtu voltaria a falar, tornou a repetir, até que o jogador sorrisse e se desse por vencido.
– Tá, entendo, esporte coletivo. Mas não é...– o interrompeu outra vez.
– Santtu, a não ser que você estivesse sozinho no gelo, o resultado é consequência de um todo. Em esportes coletivos não é possível isolar as ações de apenas um jogador e as analisar como única causa para qualquer desastre. Caso fosse assim, Atte seria o único culpado, já que é o goleiro. Ou os defensores de todas as linhas, ou os centrais e alas, por não terem conseguido manter a posse do disco. Ou do Petri, por ser o técnico, ou do , por ter se lesionado e deixado vocês sem liderança e capitão. – argumentou, agradecendo mentalmente as breves aulas sobre hockey dadas por enquanto estavam deitados em sua cama, enrolados em seus lençóis novos.
– Eu sei. – Concordou ele, mas ainda chateado.
– É frustrante, eu imagino. Mas vocês enquanto equipe tem duas possibilidades, ou ficam nessa inquisição, tentando encontrar culpados, ou se concentram em ajustar os erros para o próximo jogo. – Falou ela, atraindo o olhar de Santtu, que assentiu.
– Você tem razão. – Disse ele ficando de pé e passando as mãos nos cabelos, ajeitando os fios. – E ainda nem sabemos quanto tempo o vai ficar fora, então...– Ele pensou consigo mesmo, mas dizendo em voz alta. – Aliás, você já sabe?
– Não depende de mim. – ergueu os ombros. – Mas talvez vocês voltem a contar com ele antes do imaginado. – Falou a terapeuta, voltando rapidamente seu olhar a .
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22 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamentos do Pelicans
Um breve descuido ao desviar a atenção de seus exercícios e cruzar o olhar com , que acompanhava Santtu Kinnunen no outro canto da sala, fora suficiente para se atrapalhar com sua série e perder a conta. O central sacudiu a cabeça e tentou pensar em números, estatísticas e na fala do técnico, um pouco mais cedo naquele dia, precisava limpar a cabeça e recuperar sua concentração.
Desde a chegada da terapeuta inglesa ao time, a tarefa de se manter concentrado naquelas atividades triviais do cotidiano havia se tornado difícil. Agora, depois de um fim de semana romântico, parecia uma verdadeira missão impossível, sem chances de vitória, a não ser que literalmente fechasse os olhos. Mas mesmo sem vê-la, ainda possuía outros sentidos, e uma excelente memória que lhe brindavam com infinitas cenas com a terapeuta.
– Descanse um pouco agora. – O preparador físico disse, apertando o ombro do distraído capitão e o deixando sozinho.
obedeceu, relaxou os ombros e alcançou uma garrafa de água, tomando quase metade do seu conteúdo de uma vez, enquanto observava cauteloso a aproximação de Waltteri Merelä. Subitamente o jogador foi atingido por um sentimento quase animal, uma súbita vontade de rasgar a camisa, bater no peito e anunciar que havia conseguido a mulher. Achava-se um idiota apenas por pensar algo como aquilo, mas bem fundo, sabia que teria prazer em fazer.
Não entendia porque, mas há tempos se sentia em uma competição com o ala de olhos azuis e jeito de príncipe. Mesmo quando as especulações e comparações com Merelä começaram, quanto ao desempenho dos dois no esporte, não tivera vontade de se colocar dessa maneira. Talvez a raiz do que sentia pela terapeuta, seja lá o que fosse que sentia, o ligava a uma parte animal, um tipo de instinto bizarro, mesmo sem ter certeza sobre qual era a relação entre o ala e a inglesa.
– E aí. – Waltteri acenou com a cabeça e retribuiu, mas nada disse. – Como está o braço?
– Bem, eu acho. Forcei um pouco no fim de semana, sem querer, e fiquei com dor. – Confessou com os olhos sobre o punho imobilizado, girando para que pudesse vê-lo melhor. – Mas hoje já me sinto novo.
– É, sei como é. – Waltteri concordou, sentando-se ao lado do central. – Já sabem por quanto tempo vai ficar fora?
– Não, e se sabem ninguém me diz. – suspirou chateado, apoiando os cotovelos nos joelhos e inclinando o corpo para frente.
– Já esteve com ? Ela também não disse? – Waltteri ergueu as sobrancelhas realmente atento ao assunto, enquanto continha o sorriso presunçoso que insistia em se formar em seus lábios.
– Ela disse que quer conversar melhor com os médicos e com o Jakkos antes de qualquer coisa. – Contou o capitão, tentando disfarçar. – Mas ela achou que seria melhor resolver em cirurgia. Disse alguma coisa sobre não fazer as coisas do mesmo jeito que o Jakkos. – Falou ele e viu Waltteri também inclinar o tronco, o imitando.
– É, acho que onde ela trabalhava antes o tempo não importava, não como aqui. – Merelä concordou afastando o olhar.
Uma ideia pouco inteligente acendeu na cabeça do central com a menção de por Waltteri. Estava curioso sobre uma centena de coisas em relação a terapeuta, e parte das curiosidades envolviam Merelä, talvez fosse uma ótima ocasião para tentar buscar as respostas que queria. E obviamente, seu instinto animal ou o que quer que aquilo fosse, adoraria se vangloriar um pouco.
– Assisti ao jogo do lado dela no sábado. – Se gabou , analisando com cuidado a expressão de Waltteri.
– Parte do jogo. – Waltteri corrigiu e lentamente voltou seu olhar ao capitão. – Ninguém te viu quando terminou. – O ala arqueou uma sobrancelha, encarando-o de modo quase desafiador.
– Tive uma urgência. – respondeu, sustentando o olhar de Merelä e estreitando um pouco seus olhos, surpreso com a fala do loiro.
– Isso não importa agora. – O ala deu de ombros após alguns instantes encarando o central, expirando mais relaxado. – Não ia fazer diferença, você estava fora do gelo, não podia ajudar.
não respondeu, ainda estava perplexo e acuado com a fala de Waltteri. Odiava aquele lugar, o lugar de erro sem o poder de justificativa, e piorava sabendo que outros do time também deviam compartilhar a mesma opinião do técnico. E que principalmente Merelä compartilhava.
– Qual é, meu camarada. – Jasper Patrikainen se juntou a eles, cumprimentando-os com um toque de mãos. – Como vai essa mão? Viu o jogo? – Perguntou de modo acelerado a , sentando-se no chão perto deles.
– Em partes, tive um problema. – respondeu entredentes. – Precisei sair antes, infelizmente.
– Ah, não esquenta. – Jasper sacudiu uma mão no ar. – Você está afastado. Se eu tivesse afastado, nem treinar viria. E ainda digo mais, no primeiro ponto deles eu teria ido embora e no dia seguinte daria a maior briga que esse time já ouviu. – Falou ele, rindo pelo nariz.
– E é por isso que o é o capitão e não você. – Waltteri soprou após rolar os olhos.
– Um não tão bom, aparentemente. – pensou alto, sem querer.
– Sei lá, cara...não pense demais sobre isso também. – Waltteri voltou a encarar . – Não tem nada a ver. – Deu de ombros.
– É, parceiro. – Jasper concordou, deitando-se e inclinando o corpo, apoiando o peso nos cotovelos. – Você não faz mágica, fora do gelo não ia fazer nada. Ver o Petri saindo fumaça pelas orelhas já foi suficiente, não precisávamos ver você também. Não frita com isso.
– É, pode ser. – sorriu franco, endireitando a postura e esticando as pernas, ainda sentado ao lado de Waltteri.
Fez-se silêncio, a não ser pelo barulho irritante que Jasper fazia com a boca, por estar entediado.
– Você disse que viu o jogo com a ? – Waltteri voltou ao assunto, pegando desprevenido, já que agora o central não se sentia mais à vontade para usar aquilo contra o ala.
– É, foi. – Respondeu ele, coçando a nuca com os dedos da mão imobilizada.
– Maneiro, meu irmão. Foram embora juntos até. – Jasper completou desatento e prendeu a respiração. – A não dirige, sempre precisa de carona. – Contou o goleiro, que observava a movimentação ao redor, completamente distraído, e engasgou com sua própria respiração.
– Como você viu a hora que a foi embora? – Waltteri arqueou uma sobrancelha para o amigo.
– Parceiro, eu sempre fico no banco, você não tem noção do quanto de coisa eu vejo de lá. – Jasper sorriu maquiavélico. – Mas aí, na boa, pelo menos temos mais alguém para dividir a transporte dela. Bem-vindo ao time. – Cumprimentou Patrikainen, erguendo a mão e fazendo um
hang loose na direção do central.
– Como é? – indagou confuso.
– É que a não dirige, então a gente as vezes dá carona para ela. Por aí. – Waltteri explicou dando de ombros.
– Santtu é o motorista oficial, mas ela vai gostar de mudar, seu carro é mais maneiro. – Jasper continuou.
– Sabe, Jay, é por isso que a gente leva viradas como a de sábado. – Waltteri, que ainda estava chocado com o fato de Jasper conseguir prestar atenção em quem deixava a arena, começou a falar. – Em vez de se preocupar com o jogo, você estava como uma senhora fofoqueira, vigiando quem saia da arena.
– Qual é? É muito tempo livre para gastar olhando você enfiar o taco no meio das pernas. – Jasper devolveu, chutando levemente o ala.
– Estamos brigando sobre o que? – Aleks se fez presente, surgindo atrás de Waltteri e , junto a Janos Hari, outro ala da segunda linha da equipe.
– Sobre o Jasper ser um babacão. – Waltteri respondeu torcendo os lábios para o amigo.
– Meninos... – Janos reprovou balançando a cabeça devagar, aproximando-se de e apertando os ombros do central. – O que está acontecendo com essa geração?
– É a internet. – respondeu, sentindo-se mais relaxado. – Ah, deixe que eu te explico, internet é uma coisa que...– Antes de continuar, Janos lhe acertou um tapa fraco na nuca, tirando o gorro cor de rosa que o central havia roubado de do lugar e bagunçando os cabelos do capitão.
– Cale a boca. – Janos resmungou enquanto os outros riam e ajeitava o gorro e os cabelos. – Não vou aceitar nada vindo de você enquanto ainda usar gorro de mulher.
– Qual é o seu problema com gorros cor de rosa? – Aleks empurrou o ala com os ombros.
– Não é por ser cor de rosa, é por ter florezinhas bordadas aqui atrás. – Janos apontou para a parte de trás do gorro usado por , e de modo instintivo o central procurou a terapeuta do outro lado da sala, mas parecia concentrada em suas anotações de costas para o grupo.
– Isso é estilo. – falou sorrindo, e teve os ombros balançados por Janos.
– Isso é o que todos dizem quando querem ter licença para se vestir de forma feia. – Jasper disse, também sorrindo.
– Não se dá para ser perfeito em tudo, capitão, galã e estiloso. – Janos tornou a falar, apertando os ombros de como quem faz massagem. – E o terror da cidade. Não passa nada por esse goleiro. – Disse ele de repente, atraindo a atenção do central e dos outros. – É isso que você fica fazendo nos finais de semana, ? – Hari perguntou, apontando para a parte de trás do pescoço de , mostrando algo a Aleks, que desatou a rir, curvando-se para frente.
– Esse é a minha inspiração. – Haatanen riu alto, batendo algumas vezes nos ombros de . – Meu herói.
– Uau! – Waltteri, que havia erguido o corpo para ver o que Janos apontava, riu abafado. – A última vez que vi uma marca assim, foi suspensão de dois jogos.
– Ah, agora eu saquei qual foi o problema que te fez ir embora mais cedo do jogo no sábado. – Jasper sentou-se, rindo do central que a àquela altura já não sabia onde esconder o rosto tamanha era sua vergonha.
– Eu faria o mesmo. Entre ver vocês levando uma virada e isso aqui...seja quem for que tenha feito isso. – Janos zombou, inclinando-se e puxando a gola da camiseta de , para ver melhor a marca arroxeada em seu pescoço.
– Você está bem, amigo? Se alimentou direito? Te achei com semblante cansadinho hoje. – Aleks implicou, aproximando-se outra vez de , tocando seu ombro. – Alguém está te dando muito cansaço. Precisa de um café reforçado.
– Há, há...– fingiu rir. – Não enche, vai.
– Esse foi o esforço do final de semana? – Waltteri perguntou, repetindo a conclusão de Jasper. – Deve ter te dado muito cansaço mesmo.
– Nada que eu não pudesse aguentar. – deu de ombros vaidoso, embora envergonhado.
– E a gente achando que você estava na pior. – Janos sacudiu o central pelos ombros outra vez.
– Você nem faz ideia. – torceu o canto dos lábios em um sorriso que misturava felicidade e orgulho, olhando de soslaio para a razão de toda aquela algazarra, distraída, do outro lado da sala.
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22 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamentos do Pelicans
Enquanto secava os cabelos, recém-saído do banho, Atte Tolvanen avistou e Aleks, que trocavam de roupa após os exercícios do dia. O goleiro se aproximou de sorrateiramente, aproveitando que os outros poucos da equipe que também estavam no vestiário estavam saindo e perguntou:
– Posso fazer a pergunta de um milhão de dólares?
– Pode, mas não tem garantia de que vou saber a resposta. – deu de ombros, ajeitando a gola de seu moletom, como se não tivesse ideia sobre o que o amigo estava curioso. – O inteligente é você, eu não fui para a faculdade.
– Quem é a garota? – O goleiro indagou apoiando o corpo lateralmente, ao lado do amigo, e cruzando os braços sobre o peito.
– Você está falando de? – devolveu, fingindo-se de entediado com os olhos no espelho, se arrumando.
– Qual é? Desde quando você esconde essas coisas de mim? – Atte lançou-se sobre , abraçando-o de lado, pelo ombro. – Qual é!
– Às vezes pode ser sua irmã. – Aleks provocou, atraindo um olhar atravessado de .
– O que? – Atte arregalou os olhos. – Não. Não faria isso, faria? Não você. Do monstrinho do Aleks eu espero tudo, mas você não faria isso. Faria?
respondeu o amigo com um olhar, como se aquela fosse uma resposta óbvia e Atte entendeu.
– É engraçado como você sempre cai nessa e como sempre espera o pior de mim. – Aleks se sentou no espaço debaixo de seu nome, ao lado da baia de . – Assim vou ficar vaidoso.
– É sério, cara. Não vai me dizer? – O goleiro ignorou o mais jovem e indagou , segurando-o pelos ombros e olhando em seus olhos.
– Pare com isso, Atte. É obvio que foi . – Aleks falou entediado e cansado das indagações do goleiro. voltou-se instantaneamente para o mais jovem, repreendendo-o com os olhos por ter dito aquilo de modo tão irresponsável, enquanto Atte encarava o capitão petrificado.
– Não. – Fora só o que Tolvanen conseguiu dizer.
– É só juntar as peças, Cérebro. – O ala rolou os olhos. – E não adianta me olhar assim. – Falou ele se referindo a careta que fazia em sua direção. – Jasper cantou todas as pedras, qualquer um com QI mínimo teria somado dois mais dois.
– Não foi tão óbvio. – rebateu.
– Não? – Hade pôs-se de pé e passou a enumerar nos dedos suas pistas. – Primeiro, magicamente você assiste ao jogo de sábado ao lado dela. Segundo, Jasper disse que vocês foram embora antes do final do jogo e ao mesmo tempo. Terceiro, você ficou ausente o fim de semana todo. Quarto, chegou aqui todo sorrisos, com um gorro cor de rosa e uma marca roxa no pescoço. É só somar.
– Não é tão óbvio. – Atte concordou com o amigo. – Ele podia ter só dado uma carona para ela. Se fosse assim, toda vez que ela vai embora junto com os outros caras, eles ficam juntos. – Ponderou o goleiro.
– E quem disse que não é isso que acontece? – Aleks provocou, arqueando uma sobrancelha.
– Você pode parar de colocar pilha errada? Já basta as que eu mesmo crio. – o repreendeu, não queria pensar naquela possibilidade de ser apenas mais um para a terapeuta.
– É verdade então? – Atte voltou seu olhar ao amigo, sorrindo de lado. – Conseguiu mesmo a mulher?
baixou o olhar e sorriu de canto, timidamente, para em seguida ser sacudido pelo amigo, em comemoração, enquanto Aleks rolava os olhos.
– Eu confesso que achei que não conseguiria. – O goleiro confessou, abraçando de lado outra vez.
– Eu também achei que não, mas com ela tudo flui. Eu parecia saber exatamente o que falar, parece que a gente se conhece tem décadas. – Contou sorrindo o capitão.
– Ela é legal? – Quis saber o goleiro.
– É, engraçada, sincera, inteligente, fofa. Do jeitinho que imaginei, do jeito que eu gosto. – Confessou ele, mordendo o lábio inferior. – É linda também, nossa.
– Ela não tentou te envenenar dessa vez, pelo menos. – Brincou Atte, apoiando-se aos armários.
– Não, nem de longe.
– E você fizeram o que? – Aleks quis saber.
– Passei o final de semana na casa dela. – Contou sorrindo fraco, enquanto os amigos sorriam também. – Só voltei para casa domingo à noite.
– Esse é o meu guerreiro. – Aleks elogiou, batendo nas costas de .
– E como foi? Ela é boa? – Atte perguntou curioso, arqueando as sobrancelhas duas vezes, maliciosamente.
– Vocês estão querendo saber demais. – desconversou ainda sorrindo, e Atte o empurrou pelo ombro.
– Pare com isso. Conta logo. – Pediu Aleks.
– Agora ele está todo vergonhoso. – Atte o sacudiu novamente, sorrindo.
– Tá, tá bem. – ergueu as mãos, rendendo-se e rindo. – Ela é ótima, perfeita. Chocante. Muito boa. Satisfeitos?
– Não. – Aleks abraçou o amigo. – Só se ela tiver uma irmã ou amiga.
– É, eu posso verificar. – sorriu vaidoso.
– Meu garoto! – Atte celebrou outra vez, enquanto apertava junto a Aleks, comemorando a conquista do central. – Invencível.
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22 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamentos
caminhava distraída pelos corredores internos da Isku Arena, cantarolando baixinho uma das canções do seu filme favorito,
Grease,
summer nights. Amava ver o badboy caído pela garota certinha, amava filmes de época e musicais, maratonava por horas, completamente mergulhada. A vibe das canções do filme animava a terapeuta, somando-se ao bom-humor do dia, causado pelo bom fim de semana.
Ainda não sabia exatamente o que sentia sobre os últimos acontecimentos, só sabia que estava feliz, animada. era agradável e a energia inesperada da conquista, do flerte, aqueciam o coração da inglesa. Claro que ainda não era nada demais, não tinham conversado, não sabia se aconteceria de novo ou se seria apenas aquela vez. Não sabia o que pensava também, se a tinha achado fácil demais por tê-lo convidado a sua casa tão rapidamente, ou se não se importava com aquele tradicionalismo sem sentido.
expirou sorrindo e sacudindo a cabeça, incrédula com o que sua mente gastava tempo pensando.
– Olha ela aí, a traidora. – Jasper tinha tom mal-humorado, braços cruzados em frente ao corpo e lábios apertados numa careta de reprovação que não combinava com o gênio do goleiro.
– Está falando comigo? – tocou o peito, surpresa.
– Com quem mais poderia? – Jasper se aproximou. – Não imaginava isso de você, .
– Não imaginava o que? – A inglesa franziu o cenho em uma expressão confusa e retraída, sentindo-se acuada pelo novo amigo.
– Quando vi você assistindo ao jogo com o , não achei que fosse esquecer da gente tão facilmente. – Reclamou ele apontando para si mesmo e sentiu o sangue gelar. – Só porque fez um novo amigo, se esqueceu dos antigos?
– Jay, não sei o que te disseram, mas...– tentou explicar, puxando o goleiro para um canto do corredor. – Eu posso explicar tudo. Juro.
– Explicar o que? – Waltteri surgiu atrás da terapeuta, querendo entrar no assunto. – Do que estamos falando?
– Eu sei que parece ruim, ou sei lá...– A terapeuta sacudiu a cabeça sentindo o desespero a atingir, desejava com todas as forças que o chão se abrisse para desaparecer em um buraco. – É complicado. Eu não previ isso, na verdade sempre achei que uma coisa assim nunca fosse acontecer comigo. Eu não imaginei que...– fechou os olhos e respirou fundo, tomando coragem, e quando abriu os olhos novamente viu os amigos se encararem confusos. – É que foi rápido, em um momento eu estava assistindo ao jogo com o , e no segundo seguinte eu...meu Deus, como digo isso? – tinha a voz entrecortada pela respiração ofegante, e uma das mãos estava na testa.
– Podia só dizer que dormiu o dia todo e se esqueceu. – Jasper sugeriu, inclinando a cabeça sobre o ombro, confuso.
– Espera, o que? – se surpreendeu.
– É, sobre a social na minha casa ontem. Não estava falando sério, tipo, sobre traição. – Jasper explicou.
– Ah. Espera. Você estava falando de...? – desatou a rir, uma crise de risos nervosa que a fazia inclinar-se para frente e perder o ar. – Ai meu Deus. Era disso que vocês estavam falando? A social. Claro. Eu estou sem ar. – A inglesa gargalhava enquanto era observada pelos dois atletas.
– Agora você está começando a me ofender, parceira. – Jasper torceu os lábios em uma careta.
– Desculpe. – tentou recuperar o fôlego, apoiando-se a Waltteri. – Desculpe. É o estresse. Culpa do estresse.
– Tem certeza? Você não parece muito...equilibrada. – Merelä comentou.
– Não, tudo bem. Eu estou. Tudo certo. – Garantiu ela, respirando fundo e tentando controlar o riso. – Eu sinto muito. Sinto muito por não ter ido. Eu me esqueci completamente.
– Essa é a sua desculpa? – Merelä a encarou desconfiado.
– Não é uma desculpa, é a verdade. Eu realmente me esqueci e sinto muito. – Respondeu a inglesa.
– Relaxa, vão ter outras. – Jasper deu de ombros, voltando a seu humor tranquilo de sempre. – Te peguei direitinho, né não? – Ele riu e assentiu, abraçando-o de lado.
– Mas espera aí. – Waltteri chamou a atenção dos dois, cruzando os braços sobre o peito e analisando a terapeuta. – Do que você estava falando? O que estava tentando explicar?
– Eu? É...nada. – Mentiu.
– Essa não vai colar, . – Merelä insistiu.
– É, não tem nada. Estou falando a verdade. – Mentiu outra vez, e assim que as últimas palavras foram ditas, a inglesa se lembrou do comentário de sobre como mentia mal.
– Qual é, mano...desencana. – Jasper deu de ombros, afastando-se dos dois.
– Você não me convenceu, . – O ala insistiu, inclinando-se um pouco na direção da inglesa.
– Não é nada, é sério. – respirou fundo. – Só que o Jasper me assustou e eu pensei que tinha feito qualquer coisa errada. Que vocês tinham se chateado por eu ter ido embora antes do final do jogo. – mentiu aliviada por ter conseguido pensar em uma desculpa boa em tão pouco tempo.
– Por que ficaríamos?
– Ah...não sei. O Petri chamou a atenção do hoje cedo, por ele ter ido embora antes e também me questionou. Achei que tinha um clima ruim por causa disso. – Explicou ela, o que não era uma completa mentira.
– É. – Waltteri deu de ombros. – Isso rolou.
– Mesmo? – encarou o amigo surpresa, enquanto os dois voltavam a caminhar pelo corredor.
– É. – Merelä olhou para os dois lados do corredor, certificando-se que estavam a sós. – Entre nós. – Pediu e a inglesa confirmou com um aceno de cabeça. – Petri perguntou do no sábado. E eu acho que ele devia ter ficado, já que estava aqui. Mas o pessoal tem razão, ele é o capitão, mas não teve culpa do vexame que demos. – Enquanto ouvia o ala, se sentia culpada e começava a supor a razão da mudança de humor de após a conversa com o técnico.
– Ele deve ter tido algum problema, emergência.
– Foi o que ele falou. – Merelä deu de ombros. – Ele falou também que viu o jogo com você. Ou parte dele. – A inglesa engoliu seco quando o atleta a analisou com o olhar. – Achei que vocês não conversavam.
– Pois é, é verdade. – Respondeu ela encarando o chão. – Mas com a lesão nós meio que fomos obrigados a conversar e...você tinha razão, ele é um cara bacana.
– Cara bacana? – Merelä a encarou com uma sobrancelha arqueada.
– É, foi o que eu disse. – deu de ombros, e Waltteri murmurou algo em concordância. – Que foi? Você me disse que ele era legal.
– É, mas...enfim, deixa para lá. – Merelä franziu seu adorável nariz esculpido e deu de ombros.
– É, Waltt, quase poderia apostar que está com ciúmes do . – implicou sorrindo, cutucando a costela do ala.
– Ciúme? – Waltteri riu sarcástico. – É óbvio que não. Por que eu teria ciúmes dele?
– Eu estou me perguntando a mesma coisa. – A terapeuta ergueu as duas sobrancelhas e mordeu a ponta da língua, parando de andar quando alcançaram sua sala de atendimentos.
– Não viaja, . – Merelä rolou os olhos sorrindo fraco. – Não estou com ciúmes. Só que você é minha amiga e não quero você andando com más companhias. – Falou ele em meio a um abraço de despedida.
– Má companhia. Tá bem. – sorriu. – Eu sei me cuidar.
– Veremos. – Merelä colocou as mãos nos bolsos da calça de moletom que usava.
– Relaxe, Waltt. Se algo acontecer, coloco para dar umas voltas no gelo e fazer uns exercícios a mais e ele supera. – Piscou a inglesa, fazendo o ala sorrir e em seguida se despedir com um aceno de cabeça, deixando-a só no corredor.
Se não bastasse a amizade ciumenta de Maisie e Louis, agora tinha novas amizades ciumentas também em Lathi, ela constatou sorrindo, enquanto abria a porta da sala de atendimentos. Waltteri, com ciúmes de ...que engraçado, pesava.
– , olá. – Jakkos sorriu assim que a terapeuta abriu a porta, assustando-a. O fisioterapeuta estava sentado em uma cadeira e em uma das cadeiras reclináveis de atendimento.
– O-oi. Desculpe, não quis incomodar. – gaguejou surpresa com a presença inesperada de , mas o central pareceu se divertir com o nervosismo dela, rindo abafado, deixando que a cabeça pendesse para trás. – Já estava de saída.
– Não, tudo bem. Meio que já terminamos aqui. – Jakkos sorriu dando de ombros.
assentiu nervosa, tentando evitar trocar qualquer olhar com enquanto se dirigia ao armário, recolhendo suas coisas. O jogador pareceu cooperar, concentrando-se em Jakkos e no que quer que eles estivessem conversando. Por alguns minutos, a inglesa se permitiu dissociar, voltando a pensar em seu jantar e na noite de sono que teria logo mais, afastando-se o máximo que pudesse daquela conversa e da presença de , mas não se manteve vitoriosa por muito tempo.
Ainda não havia digerido todo o final de semana, o flerte, , as sensações que ele lhe causara, como era interessante tê-lo por perto, o cheiro dele, a sensação das mãos quentes do central. parecia ser o tipo de cara que você torce para que ligue de volta após o primeiro encontro, principalmente depois do final de semana caloroso. Embora ainda não soubesse bem como se portar diante dele depois de tudo aquilo, não conseguia deixar de pensar e de querer repetir. Junto a isso, a confusão com Jasper e Waltteri havia feito a pressão arterial da terapeuta inglesa despencar, não sabia o que faria se alguém descobrisse sobre a noite com o central e capitão do time. suava frio apenas imaginando o cenário.
– Nem se esforce demais, certo? – O fisioterapeuta falou após uma risada alta que trouxe de volta a conversa dos dois a tempo de ver o central negar com a cabeça e Jakkos ficar de pé.
– Eu não. – respondeu olhando para , que pelo calor que sentiu, imaginou estar tão vermelha quanto um morango maduro e se pôs a remexer e encarar o fundo de sua bolsa como se aquela fosse a coisa mais interessante do mundo.
– Eu sei que deve estar ansioso por prazos e resultados, mas estamos avaliando devagar. Até o final da semana teremos algumas certezas e mais várias hipóteses para você. – Jakkos explicou apontando para a prancheta que segurava e cumprimentado o central com um aperto de mão. – E tenha cuidado nos finais de semana. – O fisioterapeuta piscou. – Sei que as vezes as coisas esquentam e passam dos limites, mas tenha cuidado com seu punho. – Disse ele sorrindo malicioso. – E com seu pescoço. – Jakkos bateu no ombro de ao falar e percebeu as bochechas de adotarem um tom avermelhado.
Felizmente estava de máscara, caso contrário teria sido pega em flagrante instantaneamente pelo fisioterapeuta. A boca da inglesa se abriu, chocada, sentindo um calor nervoso a invadir, tentando imaginar sobre o que é que os dois estavam falando.
– Liberado, . Disse que não íamos demorar. – O fisioterapeuta piscou para o central, que sequer se moveu. – Nos vemos amanhã, pessoal. – Jakkos acenou para . – Você vem agora? – Quis saber olhando para , que apenas negou com a cabeça, para o terror da terapeuta, e Jakkos se foi fechando a porta atrás de si sem qualquer outra pergunta.
– Não acho uma boa ideia ficarmos sozinhos aqui. – Disse ela, esticando-se para olhar pela fresta da porta, em direção ao corredor.
– Que foi? Medo de não resistir e me agarrar aqui na sala? – sorriu malicioso e rapidamente correu os olhos pela sala. – Eu acabo de ter muitas ideias boas.
– Dá para calar a boca. – Ordenou a terapeuta, apressando-se para a porta e a fechando. – Não queremos que todo mundo descubra o que aconteceu. Queremos? – Ela sussurrou nervosa e sorriu, não da forma maliciosa de antes, mas como havia sorrido naquela manhã de domingo, quando estavam a sós, nus, na cama de .
Devagar o central ficou de pé, e enquanto assistia seus movimentos com cautela, caminhou até ela e com cuidado abriu a porta, escancarando-a.
– Tudo bem, . Não precisa se preocupar, só estou brincando com você. – Ele sorriu outra vez, o sorriso mais bonito do mundo na opinião da terapeuta, que não pode conter o sorriso que estampou os próprios lábios com aquela visão.
– Olha, entendo você querer tirar o atraso e conversar sobre tudo que não conversamos nesses meses, mas eu tenho coração fraco. – Ela brincou e repuxou os lábios em uma careta sarcástica.
– Eu ia gostar disso. – Falou ele, voltando a se sentar na cadeira reclinável de antes. – Sobre o que quer falar?
– É por isso que quis ficar? – A inglesa sorriu. – Para conversar comigo?
– Também. – tinha a cabeça apoiada na cadeira e encarava com atenção. – Na verdade, queria saber se tem alguma novidade para mim. – Perguntou o central, erguendo um pouco o punho imobilizado.
apertou os lábios e inclinou a cabeça sobre o ombro, aproximando-se dele em seguida, sorrindo empática.
– Não, ainda não. Não tive tempo de me reunir com o resto do pessoal ainda. –Contou e assentiu desanimado. – Eu sei que deve estar preocupado, angustiado com isso. Mas esse tempo imobilizado é crucial para uma boa recuperação. Não faz nem uma semana que se lesionou, não tenha tanta pressa. – Disse ela, tentando acalentá-lo.
– É, eu sei. – Ele concordou, afastando o olhar.
– É sério, . – falou e a encarou. – Sei que deve se cobrar muito por ser o capitão, e ser cobrado por outras pessoas também, mas não é tão simples. Você deve precisar de pelo menos três semanas imobilizado, o time pode e vai sobreviver sem você, e o seu lugar ficará a sua espera. Tenho certeza.
– Você me chamou de ? – O central sorriu abobado e rolou os olhos.
– Eu te faço um discurso motivacional e você só escuta isso? Que te chamei pelo seu apelido?
– Eu tenho atenção seletiva. – O capitão piscou, tomando uma das mãos da terapeuta e a segurando com delicadeza. – Gostei disso. Pode me chamar sempre assim. Nada de ou para você. Por favor. – Pediu ele, fazendo a inglesa sorrir.
– O que foi aquilo que Jakkos falou? – indagou sem rodeios, fugindo do assunto por não saber o que dizer, ainda estava curiosa com a brincadeira do fisioterapeuta.
– Vai ter que ser um pouco mais específica. – pediu, girando o corpo e se sentando ereto na cadeira para que pudesse enxergar melhor a inglesa.
– O que o Jakkos disse. – enfiou as duas mãos nos bolsos da calça que usava, recolhendo a mão que antes segurava. – O que tem o seu pescoço a ver com o assunto? E o que ele quis dizer sobre as coisas esquentarem?
– Isso é ciúme na sua voz? – sussurrou estreitando os olhos e analisou fixamente a postura de .
– Você deve ter batido a cabeça forte outra vez. – rolou os olhos, tentando disfarçar as pernas bambas e a fraqueza que o olhar do capitão lhe causava.
– Não custa sonhar. – riu abafado, mordendo o lábio inferior. – Não é nada demais. – O capitão deu de ombros após alguns instantes, puxando um pouco a gola do casaco de moletom que vestia, revelando a pele do pescoço. – O pessoal do time só ficou curioso sobre quem teria me atacado dessa forma. Tão selvagem. – Contou enfatizando a última frase de modo teatral.
– Minha nossa. – reagiu surpresa assim que enxergou a marca arroxeada no pescoço do central. – O que aconteceu com você?
– É que foi um fim de semana muito surpreendente. – Respondeu ele após rolar os olhos e sorrir. – Sabe, já ouvi que causo muitas coisas nas mulheres, mais amnésia é a primeira vez. – estalou a língua no céu da boca, olhando para a terapeuta com uma sobrancelha arqueada.
– Desculpe, eu não sabia que tinha deixado...marcas. – sorriu envergonhada, tocando suavemente o local com a ponta dos dedos. – Nem me lembrava de ter feito isso.
– E eu entendo isso como um elogio ou...?
– Não seja bobo. – riu abafado, empurrando o central pelo ombro, que também sorriu.
Os dois ficaram em silêncio por alguns segundo, encarava a marca arroxeada na pele morena do capitão, tocando-a com a ponta dos dedos, sentindo seu calor e textura, enquanto analisava o rosto da terapeuta, ou a parte dele que não estava coberto pelo tecido irritante da máscara.
– Não parei de pensar em você desde que saí da sua casa ontem. – Confessou de repente, sem pensar ou pesar as consequências, e ergueu os olhos, encontrando o olhar ansioso do central.
– Eu também não. – Confessou e sorriu sem se importar em disfarçar sua satisfação.
– Eu...eu pensei...– tentou falar, mas as palavras se perdiam ou não pareciam boas o suficiente.
– Pensou? – Tentou incentivar a inglesa e riu nervoso.
– Será que você quer...não sei, só pensei se você não...se não quer sair e jantar um dia desses. Também podemos fazer outra coisa, na sua casa ou na minha, ou em qualquer lugar que queira. Eu só...não sei, só pensei. – O capitão sorriu envergonhado, coçando a nuca com a mão imobilizada.
– Eu adoraria. – sorriu assentindo com a cabeça. – Jantar seria ótimo. Desde que, é claro, não seja rena. – Brincou fazendo o relaxar.
– Que péssimo gosto você tem, . Sair com alguém que na primeira oportunidade te cozinhou um ajudante de papai Noel. – fez piada consigo mesmo.
– Como você acha que mantenho minhas amigas entretidas? Preciso dessas histórias. – também brincou. – Essa, ou sobre você ter me ignorado por meses.
– Não, essa é vergonhosa demais. Até para mim. – puxou a terapeuta para si, escondendo o rosto da curva de seu pescoço, enquanto riam juntos.
– , pessoas. Aqui. – alertou, ainda sorrindo.
– Que droga. – O capitão ergueu o rosto. – Será que não se pode mais agarrar a terapeuta sem ser julgado neste lugar? – Brincou, afastando-se de com uma careta.
– Bom, eu não quero e nem sei como faria para explicar isso. – A inglesa apontou com o indicador para si e depois para o capitão. – Então sim, é melhor a discrição. Principalmente porque nem eu nem você deveríamos estar aqui agora. Eu não recebo hora extra.
– Tem toda razão. – sorriu, ficando de pé. – Posso ser seu motorista hoje ou você já tem compromisso?
– Você deu sorte, hoje minha agenda está livre. – Fingiu ela, esticando-se para alcançar a bolsa e jogando-a sobre o ombro.
– Bom para mim então. – Ele sorriu, acompanhando-a para fora da sala. – Mas você precisa me chamar só de , nada de . – Pediu sorridente e ela rolou os olhos.
– Não enche.
– é mais fácil. – Insistiu ele, deixando que ela passasse primeiro pela porta.
– Não vou te chamar de só porque quer. – negou, apreciando a brincadeira.
– Vamos. Chame.
– Não.
– Por favor. É só chamar. Vai.
– Não vou. – negou com a cabeça.
– Vai, é mais simples. – Ele insistiu outra vez.
– Você é bem chato, . Sinceramente. – Disse por fim, contendo um sorriso que se formava em seus lábios e o assistindo sorrir grande, vitorioso.
Aveleiras: As aveleiras nos trazem a energia da constância e paciência.
23 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Apartamento de
Terças sempre eram noites de jogo em Lathi.
Por conta dos atrasos e mudanças de calendários causados pela pandemia, haviam semanas em que o time ia ao gelo mais de três vezes, terças, quintas e sábados. Era um calendário extenuante e como terapeuta do time, sabia que a longo prazo tanto esforço poderia cobrar sua conta. estava afastado, junto a ele um defensor do que agora a inglesa entendia ser a terceira linha e um ala esquerda da segunda. Otto Nieminen ainda preocupava Petri com seu desempenho após afastamento por lesão, e o time ainda parecia lutar para encontrar uma liderança na ausência de .
podia não ser uma expert em hockey, mas entendia de esportes e sabia da importância das lideranças, principalmente em esportes coletivos. Ainda não conhecia ou havia analisado a equipe o suficiente para encontrar substitutos para no time, mas sabia, graças as aulas do capitão, durante a carona para casa no dia anterior, que o time já contava com aquelas referências. Ao contrário do futebol, no hockey o capitão não usava uma braçadeira, mas tinha estampado no uniforme a letra
C de capitão. Em tempos comuns, tinha sobre o peito a letra que indicava se tratar do capitão, enquanto Waltteri Merelä e Janos Hari, um central mais experiente, usavam um
A no mesmo lugar.
Agora, com o afastamento de , além de Hari e Merela, Santtu também estava entre os capitães alternativos. O defensor mal podia se aguentar de orgulho e havia falado durante toda a terça-feira sobre o assunto com . Aos poucos a terapeuta compreendia melhor as regras do esporte e se sentia capaz de opinar, participar mais ativamente das conversas dos novos amigos.
O jogo dos Pelicans havia acabado há alguns instantes e com o pouco que sabia da língua do país, não se sentiu animada para acompanhar as discussões de depois do jogo feita por alguns comentaristas. A terapeuta afastou seu bloco de anotações, que usava para estudar o esporte, e se espreguiçou no sofá, aproveitando para tentar encontrar algo interessante na TV enquanto o sono não chegava. Ainda mudava de um canal para o outro quando o som de notificação em seu celular capturou sua atenção, se tratava de uma solicitação de mensagem no Instagram.
DM INSTAGRAM
Guardei um assento para você no jogo de hoje. 😔😔
Como você encontrou meu Instagram??
Pois é, fiquei em casa estudando...
Não é como se fosse a coisa mais difícil do mundo.🙄
Acompanhei um pouco do jogo pela TV, dessa vez vencemos. É bom, certo?
Óbvio. Foi um jogo ótimo e em casa.
sorriu incrédula, apesar de surpresa com a interação de , as vezes se perguntava quando aquilo aconteceria. Na terça-feira o central não havia ido a arena, a agenda de era com marketing e repetindo alguns exames para melhores avaliações de sua lesão. Não tinham tido qualquer conversa sobre nada, não sabiam como estavam, se aquela noite havia significado algo além de um acontecimento casual e desproposital, mas ambos se faziam aquela pergunta o tempo todo.
A declaração de no dia anterior, sobre ter pensado em tinha feito o coração da inglesa acelerar, embora ainda não entendesse exatamente o porquê.
não respondeu a última mensagem do central, não por não querer continuar a conversa, mas sim por não fazer ideia sobre o que dizer a ele. Perguntar se vencer era bom? Caramba, , você se supera, pensava ela envergonhada com suas palavras.
DM INSTAGRAM
Óbvio. Foi um jogo fácil e em casa.
Você conseguiu entender? Posso te explicar mais se tiver alguma dúvida...😅🤓
Acho que aos poucos estou entendendo, obrigada. Não precisa se incomodar.
Não é incômodo.
Está muito cansada? Pensei em dar uma volta e comer alguma coisa...
Eu tô bem, obrigada. Quero ficar em casa e terminar algumas coisas.
Bom, então okay. Boa noite
se surpreendeu com a proposta do central, mas negou sem pensar muito. Não queria parecer desesperada ou carente, não queria que pensasse tê-la nas mãos ou que pensasse qualquer coisa sobre ela. Mesmo que se sentisse bastante satisfeita com o convite e com o fato do central se oferecer para auxiliá-la com hockey, precisava resistir à tentação.
Droga, a quem estava querendo enganar? A inglesa perguntou a si mesma quando não insistiu. Era claro que queria sair para comer, e não era só por estar com fome, queria vê-lo, perguntar sobre os exames, rir de suas brincadeiras e piadas, se divertir com seus flertes. Queria aproveitar a companhia dele, ver seu sorriso lindo, sentir o cheiro bom do perfume dele. A inglesa sacudiu a cabeça e ajeitou a postura, devia estar mesmo carente, pensou.
Mas fato era, não conseguia parar de sorrir na presença dele, amava o jeito com que a tratava, e já havia muito tempo desde que a inglesa passara por situação igual. Era bom, para variar, estar na presença de um homem interessante, dedicado, bonito e que a fazia rir o tempo todo, e se querer isso era ruim, então já não sabia o que era ser bom.
Decidida, digitou outra vez:
DM INSTAGRAM
Não é incômodo.
Está muito cansada? Pensei em dar uma volta e comer alguma coisa...
Eu tô bem, obrigada. Quero ficar em casa e terminar algumas coisas.
Bom, então okay. Boa noite
Oi, ainda está por aí?
Sempre.
Não quero mesmo sair, mas estou com fome...você pode me contar sobre o jogo enquanto comemos, se quiser
Sabe meu endereço
Dez minutos.
❄❄❄
Quando parou seu carro na frente do prédio de , precisou de alguns minutos para se acalmar e voltar a seu centro. Estava agitado, podia correr dali até Viipuri e voltar pelo menos três vezes, as mãos estavam inquietas, sentia vontade de gritar. Estava animado, feliz, empolgado. Quando disse estar cansada, resolveu não insistir apesar do incentivo de Atte, não queria que inglesa se sentisse pressionada, ou que pensasse que estava emocionado, embora estivesse. Mas a sugestão dela depois de alguns instantes fez o central comemorar como se tivesse marcado em um jogo importante.
apertou as mãos no volante, respirou fundo, balançou os ombros tentando afastar a tensão, passou as mãos no cabelo, ajeitando pela centésima vez os fios escuros, jogou um chiclete na boca e pegou a comida no banco do passageiro. Não fazia ideia de como agradar a inglesa, era uma tarefa mais difícil do que havia pensado, pelo menos nada de carne de rena dessa vez. interfonou, torcendo para que não demorasse, ou congelaria do lado de fora.
– Sim. – Ela respondeu do outro lado.
– Oi, sou eu. – disse rápido, vendo o ar que saía de sua boca se transformar em uma nuvenzinha quente.
– Eu quem? – brincou e o central rolou os olhos, sorrindo.
– Há, engraçadinha. – Ele resmungou. – O seu jogador favorito. – Brincou, incerto da resposta que teria, mas ouviu rir do outro lado. – Agora ande, me deixe entrar ou vou congelar aqui fora.
– Bom, vai ter que ser mais específico. Tem uma lista grande. – Ela provocou, se divertindo com a urgência na voz dele.
– Me deixa entrar, . – Ele falou um pouco mais alto, aproximando-se mais do interfone e esticando o sobrenome da terapeuta o máximo que podia, enquanto gargalhava do outro lado.
O som da entrada sendo destrancada atingiu os ouvidos de e o central pulou para dentro, resolveu subir de escadas, estava com frio e ansioso, não queria perder tempo esperando o elevador. Pulando os degraus de dois em dois, alcançou rapidamente a porta e não levou mais de dois segundos até que a abrisse depois de tocar a campainha. A inglesa usava um moletom azul e calça de moletom da mesma cor, os cabelos estavam presos em um tipo de coque desarrumado, a franja ondulada caía sobre a testa e ela não usava maquiagem. ainda sorria, como se ainda estivesse se divertindo com a pequena brincadeira, enquanto tinha os ombros caídos e os lábios torcidos em uma careta.
– Desculpe, eu não resisti. – Pediu ainda sorrindo e não se conteve, imitando-a, derretido.
– Isso pode ser considerado maus tratos, sabia?
– Que horror. – Ela arqueou as sobrancelhas, esticando-se para puxá-lo para dentro e não tentou oferecer nenhuma resistência. – Mas se serve de consolo, fico feliz que não tenha congelado. Eu gosto de você bem quentinho. – sorriu quando seu corpo se encontrou com o do central, usou a mão livre para mantê-la perto de si, primeiro sentiu o cheiro dos cabelos macios dela e depois do pescoço e então lhe beijou a bochecha.
– Serve, serve sim. – Ele sorriu doce, sentindo o abraçar pela cintura.
– Vem, entre. – o puxou para dentro, empurrando a porta com uma das pernas.
– Trouxe comida. – ergueu as sacolas que tinha na mão e se surpreendeu.
– Isso é uma tentativa de fugir dos meus dotes culinários? – Indagou ela, fingindo-se de ofendida.
– Na verdade...– estalou a língua no céu da boca, aproximando-se junto a inglesa da bancada da cozinha. – É uma compensação. Pelo almoço com carne de rena.
– Ah. – Ela assentiu. – Eu já tinha superado, na verdade. – Falou ela, abraçando-o pelo pescoço assim que se livrou da comida, colocando as sacolas sobre a bancada. – Mas é fofo. Não precisava se incomodar com isso.
– Precisava, claro. – sorriu, abraçando-a apertado, aproveitando a sensação de poderem ficar juntos sem se preocupar. – Não queria arriscar e ser surpreendido com outra pizza de abacaxi. – O central implicou e ficou boquiaberta. – Brincadeira. É brincadeira. – riu, fazendo-a sorrir também.
– Isso é muito vergonhoso. – balançou a cabeça negativamente e ainda sorrindo se afastou do central. – Acho que nunca vou superar. Na verdade, não sei como você superou tão rápido. Quer dizer, eu podia ter te matado. – Disse ela e precisou conter a vontade de abraça-la e apenas ajudar a inglesa com a comida.
– Esquece isso, já passou. Foi um acidente. – Ele deu de ombros. – E também, o que valeu foi sua intenção.
– Mesmo assim, você ficou afastado por dois dias. – parecia realmente sentida, para surpresa de . – Não foi legal. E eu acho que nem me desculpei depois. – Falou ela, apoiando as mãos na bancada e deixando as sacolas de lado por alguns instantes.
– , esquece. É sério. – sorriu e esticou as mãos, segurando as mãos dela. – Não foi nada. Eu tenho essa alergia boba desde criança, e já tive que me afastar várias vezes por comer algo sem saber. Não fique assim por isso, por favor. Não por minha causa. Você não precisa se desculpar. Mesmo.
Ela sorriu inclinando a cabeça sobre o ombro.
– Deixa isso para lá, por favor. E sorria. – Pediu . – Só sorria.
– Realmente nunca sei o que esperar de você. – Ela balançou a cabeça, ainda sorrindo. – Me traz toda essa comida...pizza, hambúrgueres, batata frita...não se importa por eu ter quase te envenenado...
– Fazer o que? É o meu jeitinho. – O capitão sorriu grande, sentindo-se esquentar com o olhar e sorriso da terapeuta, podia apenas assisti-la para sempre.
– Mas...sabe o que eu não entendo? – Ela o olhou com as sobrancelhas unidas e assentiu. – Aquele dia me disseram que todo mundo meio que sabia que você não gostava de pizza com abacaxi. E eu imagino que soubessem da alergia também.
– Sabem, sim. – concordou, roubando uma batata frita.
– Não consigo entender porque Aleks fez essa pegadinha. Não faz sentido nenhum. – falou, imitando o central e também jogando uma batata frita na boca. ainda mastigava quando precisou prestar atenção na fala de , repetindo em sua cabeça o que a inglesa havia acabado de dizer.
– Acho que não entendi. Quem te fez o que? – perguntou.
– O Aleks. – respondeu distraída e se sentou na frente de , servindo-se com um pedaço de pizza. – Vai ver ele quis fazer um trote, uma pegadinha por eu ser nova no time. – Ela pensou em voz alta e uniu as sobrancelhas. – Mas não entendi porque ele fez justamente essa. A da pizza é boa, eu confesso, embora ainda esteja com vergonha, mas a dos bombons...
– Calma aí. – a interrompeu. – Está me dizendo que o Aleks sabia sobre tudo aquilo e não te avisou? – estava chocado, sabia do humor sádico do amigo, mas aquilo era demais, até para Aleks.
– Não, não. – negou enquanto ainda tinha um pedaço de pizza na boca e suspirou um pouco aliviado. – Eu quis dizer que foi o Aleks quem sugeriu. No dia em que você foi rude comigo, na sala de treinamentos, se lembra? Ele foi até onde eu estava, no banheiro feminino, tentou me acalmar e disse que nada no mundo te deixava mais feliz do que pizza de abacaxi e bombons de coco. Como Waltteri também ama pizza de abacaxi, achei que fosse...– a interrompeu outra vez.
– O que? – o encarou, prestando mais atenção no central, que agora estava levemente inclinado sobre a bancada, com uma expressão que misturava decepção e choque. – O Aleks? Hade? Deve estar enganada. Ele não faria isso.
– Não estou não. – endireitou a postura, falando de modo firme. – Ainda não enlouqueci, e sem muito bem quem é Aleks Haatanen. Estou te dizendo, mas se não...
– Aleks não faria isso, ele sabe. Não tem sentido ele te dizer algo assim. – falou de novo, estava tão chocado que mal conseguia pensar com clareza. pareceu perceber, a inglesa expirou pesadamente e apertou os lábios em uma linha fina.
– Desculpe, não devia ter te falado isso assim, de qualquer jeito. Você está bem?
– Não, acho que não. – O capitão apertou os olhos, inclinando a cabeça. – Isso é...por que ele faria algo assim? É demais até para ele. – Se questionou, com uma risada fria. – Quer dizer, um acidente é compreensível, mas porque ele faria isso...comigo?
se compadeceu dele, era nítido que não esperava que a ideia dos bombons viesse de alguém que já o conhecia, principalmente alguém próximo. A inglesa ignorou a breve desconfiança do jogador sobre si e saiu de seu lugar, aproximando-se de , sentado do outro lado da bancada e o abraçou, acariciando os cabelos dele por sobre a touca preta que usava.
– Talvez ele se enganou. Ou pesou demais a mão na brincadeira. – tentou acalentá-lo. – Pode ser que ele pensou que você nem chegaria a comer.
– É, pode ser. – não sabia o que pensar, instantes atrás estava feliz e animado com a ideia de encontrar a terapeuta, mas agora tudo que queria era ir para casa ficar sozinho.
– Me ouça. – chamou a atenção dele, segurando o rosto do central e garantindo que ele a olhasse nos olhos. – Tenho certeza que deve ter sido um acidente. Aleks parece gostar de você, quando ele foi até o banheiro naquele dia, foi para te defender, dizer que não era sua intenção ser grosseiro. Talvez foi tudo um grande mal-entendido. – Argumentou, embora não acreditasse muito nas próprias palavras.
– Me desculpe por aquele dia, aliás. – pediu, fechando os olhos envergonhado e sorriu dando de ombros. – Você deve ter razão.
– Geralmente tenho sim. – Brincou. – Agora é a sua vez de sorrir, vamos. O time venceu, você e eu estamos aqui e tem comida para o país inteiro. Deixe isso para lá, sim?
– Certo, . – assentiu a contragosto, abraçando-a de volta. – Vamos só aproveitar a noite e esquecer do resto.
❄❄❄
23 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Apartamento de
– Calma, você vai ter que me explicar mais devagar. – pediu, fazendo rir abafado. – Eu não entendi nada sobre isso de
Draft. Não entendi nada sobre o que você falou.
A inglesa estava deitada no sofá, com deitado sobre seu peito, enquanto afagava os cabelos espessos e escuros dele. As luzes estavam apagadas e a TV ligada em um episódio qualquer de
The Office escolhido a dedo pelo capitão, que agora de estômago cheio mal prestava atenção. Depois de comer os dois haviam engatado em uma longa conversa sobre costumes finlandeses e ingleses, sobre como a pizza era pizza em qualquer lugar do mundo e sobre hockey, o principal foco de curiosidade de nos últimos dias.
– Qual parte exatamente você não entendeu? – quis saber com a voz abafada, seu rosto estava amassado contra a pele da inglesa, e o capitão já sentia o sono lhe pesar os olhos.
– Isso de ser
draftado. Como assim? Quer dizer que você é de outro time? Não entendi nada. – bufou. – Quando acho que estou entendendo, tudo fica ainda mais confuso.
– Não, você está indo bem. Está mesmo. – Ele falou de modo doce, sorrindo contra a pele da inglesa. – Você conseguiu pegar para que serve o draft?
– Sim, eu acho. Mas não é sobre isso que quero que fale, quero que repita o que disse sobre você. – Ela insistiu um pouco ansiosa e sorriu de novo, divertindo-se com a curiosidade quase obsessiva dela.
– Eu fui draftado em dois mil e treze, tinha uns dezessete para dezoito anos e já estava no Pelicans. Fui escolhido pelo
Toronto Maple Leafs, mas não assinei.
– Certo, agora eu entendi tudo, . – ironizou rolando os olhos. – Por favor, explique como se estivesse falando com uma parede sem neurônios.
– Tá bem, parede, vamos lá. – a provocou, erguendo-se e se sentando frente a terapeuta, depois se espreguiçou lentamente e passou uma mão no cabelo, tentando alinhar os fios. – Já entendeu que o draft é basicamente uma seleção de novos talentos, certo? – Indagou e assentiu concentrada. – Para jogar a
National Hockey League. Okay. Tá legal...basicamente, o que eu disse foi que em dois mil e quinze eu fui draftado. Quer dizer que nesse evento gigante e maluco de seleção, fui para a América do Norte e fui escolhido pelo
Leafs. Eles podem escolher jogadores de ligas menores de lá, ligas universitárias, ou das ligas europeias, o meu caso. Mas ser draftado não é uma certeza de que você vá jogar na
NHL. Às vezes sim, as vezes não. Mas a equipe que te escolheu tem seus direitos, sabe...essa coisa de direitos e tudo mais...
– Tá, pule para a explicação sobre você estar aqui em Lathi e não no outro time. – pediu ansiosa mais uma vez.
– O time tem dois anos para assinar com o jogador para um contrato de entrada, e enquanto isso não aconteceu, me mantive aqui.
– Mas por que não? – estava surpresa, embora não fosse a maior conhecedora do esporte, conseguia entender que as chances no esporte na América do Norte eram muito mais promissoras para alguém como do que em uma liga na Finlândia. – Por que eles não te quiseram?
– Eu. – expirou pesadamente, afastando o olhar. Não era o maior entusiasta daquele assunto, mas tentava ser paciente com , principalmente porque havia dado brecha para que ela perguntasse. Além disso, apesar de sempre ouvir as mesmas coisas e constantemente encarar caretas de reprovação ao mencionar aquele episódio, era muito bem resolvido com sua decisão, completamente seguro. – Eu não quis. Foi...foi uma época difícil. Essa coisa de ficar famoso, ser reconhecido...eu nunca quis isso. Tudo que queria era jogar hockey e ter uma vida tranquila. Se eu fosse para lá seria tudo amplificado, e eu ficaria longe da minha família, dos amigos, de tudo que eu gosto e aprecio. Já sou feliz jogando hockey aqui em Lathi, pelo Pelicans. Para mim era suficiente, ainda é. – Disse dando de ombros, enquanto o ouvia de olhos arregalados.
– Okay, espera...eu não sou muito inteligente quando se trata desse esporte, mas...bom, era uma oportunidade e tanto....e você...– A terapeuta tentou falar com cuidado, mas a interrompeu com um sorriso sem qualquer traço de alegria.
– ...essa foi minha decisão. – Sentenciou ele a olhando com gentileza. – Já tomei essa decisão há anos, não me arrependo. E além do Atte, todo mundo já superou. Não é sobre oportunidade, sobre grana ou qualquer outra coisa...é sobre a minha paz e eu não estou disposto a pagar preço nenhum para perde-la.
– Bom, então okay. Entendi. – Ela assentiu, mesmo a contragosto.
– E eu também não fui o único. – Contou ele, recostando-se de modo mais relaxado ao sofá. – Santtu também foi, só que mais recentemente.
– Ele também não quis ir? – Quis saber curiosa.
– Ele é seu amigo, pergunte. Eu não faço ideia, nunca conversamos sobre isso. – deu de ombros, prestando atenção na TV.
ainda estava deitada, encarando o perfil do capitão, tentando entender porque alguém como ele recusaria uma chance daquelas em nome da paz. Se perguntava o que de tão grave poderia ter acontecido para que tomasse aquela decisão, e aproveitando o momento e a aparente oportunidade, resolveu testar seus limites.
– . – Chamou.
– Hum. – Ele respondeu sem olhá-la, mas pondo-se a afagar o joelho de que estava a seu alcance.
– Você disse que na época...quando tudo aconteceu, disse que foi um período difícil. O que aconteceu nessa época?
– Eu não sei se quero falar disso. – respondeu após um longo silêncio, sem desviar os olhos da TV
– Você...você pode confiar em mim. Eu só estou tentando conhecer você. – disse, ajeitando a postura para olhá-lo melhor, tentando passar algum tipo de confiança.
– É, eu sei disso, mas é que não gosto de falar do passado e nem desses assuntos. – Ele deu de ombros. – É melhor deixar para lá.
– Como eu vou conhecer você se você não me permitir? – indagou frustrada.
– Você realmente precisa saber desse pedaço da história para me conhecer melhor? Justamente desse? – a olhou arqueando uma sobrancelha, não de modo desafiador, parecia uma expressão genuína de alguém claramente desconfortável.
Conhecia aquela expressão por causa de sua prática, ao menos sete entre dez pessoas com aquele olhar ainda sentia dor, e não estavam prontas para falar sobre qualquer que fosse a questão. Não queria que ali, em casa, em um momento tranquilo como aqueles, ficasse analisando como devia analisar no trabalho. Ele não era um paciente, era algo como...era quase seu interesse amoroso, não precisava misturar as coisas, elas já estavam complicadas o suficiente sem que fizesse isso. Mas o que nunca te contam sobre terapeutas é que a partir do momento em que se transforma em um, nunca mais se deixa de ser. Não dá para desligar, virar um chave ao entrar em casa e fingir não enxergar o que está bem diante dos olhos.
Por mais que se irritasse com a negativa de a contar, dividir o assunto, conseguia ver que talvez não fosse mesmo o momento, e que realmente talvez não tivesse nada a ver com a inglesa. Então, resolveu aceitar, tentar abordar de outra forma em outro momento, ou investigar por seus próprios meios. O capitão ainda a encarava, esperando sua resposta, resolveu suspirar e deixar para lá, não valia a luta.
– Tudo bem. Esquece. – assentiu, desviando o olhar para a tela e o capitão fez o mesmo.
Talvez pela esperança sonhadora que tinha enquanto terapeuta, ou por estar encantada pelo capitão, que apesar de não entender a postura de em vários momentos, tinha cega certeza de que aos poucos tudo faria algum sentido.
puxou as duas pernas da terapeuta para seu colo e continuou a acariciar os joelhos de , concentrado na TV, embora não sorrisse quando algum dos personagens fazia qualquer piada. Talvez tivesse sido péssima ideia ignorar seus instintos e não ter ido embora após a revelação sobre os bombons idiotas. ainda continuava sendo o ser mais lindo e precioso do mundo na opinião do capitão, mas suas indagações o incomodavam. Não queria ter conversas profundas sobre sentimentos, sobre como se sentia em relação a seu passado ou todas as coisas juntas. Queria apenas comer, beijá-la e assistir qualquer coisa boba na TV, até que ficasse tarde demais e a inglesa o convidasse para dividir sua cama outra vez. Tinha esperança de que com aquela resposta a curiosidade da terapeuta ficasse controlada, e ela resolvesse acompanha-lo em seu planejamento de noite pacífica.
– Por que você ficou estranho ontem, depois da conversa com o Petri. – Ela indagou outra vez, insistente e pensou se não seria muito rude se apenas se levantasse e fosse embora.
– Você escolhe suas perguntas a dedo, não é? – O capitão expirou, deixando que a cabeça pendesse para trás e fechando os olhos, agora se arrependia amargamente por não ter ido embora.
– Quando foi a última vez que você se relacionou com alguém, ? – o encarou, mantendo-se séria e a dirigiu um olhar pouco amigável, contrariado.
– Eu não fiquei estranho. Conversamos depois, esqueceu? – Ele deu de ombros, fingindo não saber sobre o que ela se referia.
– Não, não é disso que estou falando. – endireitou a coluna, puxando as pernas e sentando-se direito. – Quando conversamos com o Petri sua postura mudou imediatamente. Você era um quando chegamos na arena e depois, quando falamos com ele, você era outro.
– Está exagerando. – Ele desviou o olhar na defensiva, talvez ela tivesse razão, mas não admitiria nunca. Se perguntava porque é que a mulher tinha que insistir justamente nos assuntos que não queria falar.
– Estou? – arqueou uma sobrancelha, visivelmente irritada. – Não sou cega. Pode negar, mas eu e você sabemos que eu não estou errada.
não respondeu, continuou olhando para a televisão, ignorando o olhar incrédulo e irritado de que o queimava. O que ela queria que ele dissesse? Pensava o capitão. Queria que ele chorasse em seu colo expondo a culpa por ter ido embora, por ter sido cobrado por sua postura enquanto capitão? Queria que ficasse falando de tudo que sentiu durante o dia? Sobre o pequeno ataque de Waltteri? Por favor, não ia rolar, dizia a si mesmo. Não falava sobre aquelas coisas nem para Atte, não falaria para ela, não queria que o enxergasse como alguém frágil, sentimental.
Ao mesmo tempo, se lembrara das centenas de conselhos amorosos que havia escutado durante a vida, sobre a importância do diálogo. Não queria estragar sua noite remoendo aqueles assuntos, queria apenas relaxar, mas aparentemente não seria uma missão fácil. Não queria também, correr o risco de estragar o que quer que estivesse acontecendo entre a terapeuta e ele, por isso, apesar de muito contrariado, resolveu cooperar. Não queria que aquilo se transformasse em algo maior, ou que continuasse com aquela expressão irritada, encarando-o como se algo muito grave estivesse acontecendo, por isso cedeu.
– Foi por causa do resultado. – Confessou chateado, encarando o chão da sala.
– Só por isso? – arqueou uma sobrancelha. – Ou tem a ver com o que ele disse sobre seu papel de capitão? – questionou, lembrando-se da conversa com Waltteri e a encarou surpreso.
– Por que está falando disso? Quem te disse isso? Não tem nada a ver. – Ele negou de modo agitando, endireitando a postura e afastando as costas do sofá. – De onde tirou isso? – Questionou.
– Eu estava bem do seu lado quando o Petri falou, lembra?
– Não tem nada a ver. – negou afastando o olhar, sentia-se desmascarado.
– ...Qual é? – sorriu fraco, tocando o ombro do central. – Eu não estou te culpando, só perguntando se esse foi o motivo de ter ficado chateado. – não respondeu, sequer moveu qualquer músculo. – Você não precisa ficar reativo assim. Não é um ataque.
– Não estou. – Ele negou ainda imóvel.
– Tá legal, eu entendi. Falar sobre hockey é um assunto delicado e que você evita. – ergueu as mãos em rendição, expirando um sorriso chateado. – Não vou te incomodar com minhas perguntas.
A terapeuta se levantou, recolhendo algumas embalagens de batata frita espalhadas pela sala e se dirigiu a cozinha. estava absurdamente fora de sua zona de conforto, se sentia perdido. Mas também sabia que precisava dizer alguma coisa, ou na direção de si mesmo, se protegendo e se defendendo, como sempre fizera, ou na direção de , cedendo um pouco a ela, baixando ao menos um pouco seus muros.
– ...– a chamou, ainda sentado no sofá, como se quisesse dizer que ela estava enganada, mas não soubesse como.
– Tudo bem, . Eu entendo. – Ela respondeu com voz fria. – Não vou insistir mais.
– Olha, não é você. – ficou de pé, dirigindo-se até a cozinha. – É que eu...
– Eu sei que não sou eu, até porque não fiz nada. – o interrompeu. – Sei que o problema é com você. – Disse e a encarou surpreso.
– Uau... – Ele expirou surpreso com o tom dela. – É. É isso. – Assentiu incomodado, com um sorriso pasmo e torto, mesmo que soubesse ser verdade, talvez não tivesse maturidade para ouvir ser dito daquela maneira.
– Espera, calma...– pediu após um longo silêncio, quando viu caminhar em direção a porta. – Não precisa ir.
– Não, eu...acho que é melhor. – O central falou ainda de costas.
– , qual é?! Somos adultos, não precisa parecer que estamos em uma série adolescente, se desentendendo por qualquer besteira. – se aproximou dele, por mais irritada que estivesse com a postura do capitão, sabia que nunca era uma boa ideia terminar conversas daquele modo.
– É, eu sei. – assentiu virando-se para a terapeuta. – Eu sinto muito.
– Pelo que?
– Por ser um idiota. – Pediu após um longo suspiro, baixando os ombros. – Eu...eu não...– hesitou, estava se esforçando, se o central estivesse na posição dela provavelmente já o teria expulsado de casa a chutes. Queria falar, mas não sabia se conseguia.
– Quer dizer alguma coisa? – Ela incentivou olhando-o nos olhos.
– Era por isso sim. – Confessou, sentindo os ombros relaxarem e a cabeça pender para o lado, mas pareceu ainda não entender. – Era sobre o lance que o Petri disse, sobre eu ser o capitão e não estar lá.
– Por que não contou isso de primeira? – se aproximou um pouco mais do central.
– Eu não sei fazer isso, . – deixou que a cabeça pendesse para trás, encarando o teto. – Não estou acostumado. Ninguém fica me perguntando o porquê de eu ser assim, ou o porquê de fazer o que faço e do jeito que faço. Eu sou um jogador de hockey, só. Não faço isso de ficar falando sobre meus sentimentos e toda essa coisa.
– Isso foi meio machista, mas vou ignorar por hora. – A terapeuta alfinetou e a encarou. – Agora eu estou no time e também fora dele, então você pode começar a se acostumar.
– Vou pôr na minha lista de coisas para fazer. – respondeu sarcástico.
– Entendo agora porque está solteiro. – implicou e o capitão uniu as sobrancelhas.
– Pois é, tá vendo? – encarou o chão, sorrindo com ironia.
– Olha, eu...eu estou tentando conhecer você melhor, me aproximar...mas você precisa deixar isso acontecer, precisa tentar, se quiser. – A inglesa falou ao abraça-lo pela cintura.
– Eu vou tentar. – Prometeu ele, mesmo sem ter segurança em seus palavras.
– Ótimo. Que bom. – sorriu de modo doce. – Por que a gente não volta para o sofá e conversamos sobre isso? – Propôs ela.
– A gente conversa outro dia, pode ser? Acho melhor ir para casa.
– ...não precisa fazer isso. – apertou os lábios e uniu as sobrancelhas, contrariada.
– Eu não estou fugindo do assunto, juro. – Tentou ser convincente, mas o encarou com olhos estreitos e sorriu de canto. – Okay, talvez eu esteja fugindo, mas hoje não quero falar disso. Amanhã. Ou depois.
– Tudo bem, mas não precisa ir embora, não por isso.
– Eu tenho que dar comida ao meu cachorro, não posso passar a noite fora. – Mentiu apertando os lábios em um sorriso sem graça. – Mas conversamos amanhã ou quando quiser. – Garantiu, beijando-lhe a testa.
– ...– chamou outra vez, derrotada, assistindo-o calçar os tênis e colocar o casaco. – Não precisa ir agora.
– Preciso sim. – sorriu de canto e se aproximou da inglesa outra vez, beijando-lhe rapidamente os lábios. – Tenha uma boa noite.
o assistiu passar pela porta sem qualquer outra manifestação, para alívio de . O central desceu as escadas o mais rápido que pode e entrou no carro como se estivesse fugindo de alguém, para sua felicidade tudo estava calmo e vazio no corredor e no estacionamento. se sentou atrás do volante e respirou fundo, encarando o painel, sentia-se capaz de respirar agora, longe das questões e perguntas de .
O capitão manobrou o carro e acelerou, um rosto havia surgido em sua mente, apenas um. Não sabia o que dizer, mas queria dizer, queria perguntar, validar sua postura ou então voltar atrás. Precisava ouvir alguém em quem confiasse, não queria ir para casa e ter apenas Felix para lhe ouvir as preocupações, precisava de um conselho sério. Por isso dirigia apressado até o prédio cinza e novo, do lado aposto da cidade, onde Atte Tolvanen vivia.
Dirigia desatento, assustando-se vez ou outra com um sinal vermelho ou com outro carro que surgia de repente em um cruzamento. Não estava nervoso ou bravo, talvez um pouco triste pela descoberta sobre Aleks, mas não tinha tempo e energia para gastar pensando sobre aquilo. Se sentia confuso, mas com um grande vazio silencioso e branco em seus pensamentos, como se precisasse que alguém lhe dissesse o que fazer, para que direção seguir. Não se achava o mais inexperiente quando o assunto era relacionamento, ao contrário, tinha certo repertório, embora frustrado. Mas por alguma razão desconhecida, não sabia como reagir em relação a terapeuta. Não devia estar se questionando, se sentindo incomodado por saber que a tinha chateado com a falta de respostas, devia ter só deixado para lá e seguido em frente, como sempre.
Não tinha que pensar, se questionar, contar a ela o motivo de ter ficado um pouco mais sério, era assunto seu e pessoal, ponto final. não precisava se meter, precisava era de dar espaço, sem ficar fazendo perguntas sem cabimento. Assim que devia estar se sentindo, era o que devia ter dito a ela. Mas por que não conseguia? Por que não conseguia apenas ignorá-la? Por que não podia ter apenas fingido que pensaria no assunto, mentido sobre conversar quando estivesse pronto e ter passado a noite com ela, sem culpas?
23 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Apartamento de Atte Tolvanen
Aquelas questões passavam em looping diante os olhos do capitão enquanto subia até o apartamento do goleiro e melhor amigo. Atte não atendeu rápido, foi preciso que batesse cinco vezes até que a porta lhe fosse aberta.
– Mas que droga, . – Atte resmungou coçando os olhos. – Quem morreu?
– Eu preciso conversar. – falou, enfiando-se dentro do apartamento de Tolvanen, sem se importar com um convite.
– São duas da manhã. – Atte bateu a porta e seguiu o outro para a sala. – São duas da manhã, maluco. Não vamos conversar agora. Você bebeu? Vá tomar um banho e amanhã a gente se fala. – O goleiro estava zangado e falava com como quem fala com um filho adolescente.
O capitão não respondeu.
Em silêncio se sentou em um sofá de couro no canto da sala, inclinando o corpo para frente e cobrindo o rosto com as mãos. A luz da lua atravessava uma fresta de cortina, iluminando o central e o goleiro, apenas de cueca, assistindo a cena completamente confuso. Atte respirou fundo, amaldiçoando mentalmente e se amaldiçoando por ser um bom amigo e não conseguir apenas ignorá-lo ali e ir dormir. O goleiro expirou dando-se por vencido e foi até a cozinha, voltando de lá instantes depois com duas garrafas de cerveja em mãos, oferecendo uma ao amigo perturbado.
– Eu acabei de ter um jogo difícil, estou morto. – Falou ao se sentar no sofá ao lado de , inclinando-se para frente também e imitando o amigo, apoiando os cotovelos nos joelhos. – O que aconteceu? Você atropelou alguém? Bateu em alguém? Eu preciso chamar um advogado?
– Não, não é sobre isso. Nada disso. – negou com voz desanimada, sem olhar para o outro.
– Então o que é? Está me preocupando, . Se não é caso de polícia, o que é?
– Eu...– as palavras pareciam simplesmente desaparecer, impossibilitando quase fala do central. – Eu estava com a .
– Ah, claro. – Atte se lembrou, endireitando a postura animado. – Claro. Então deu certo, você levou a comida e tudo mais?
– Deu, deu....– assentiu. – Mas não é isso, cara. É que...ela começou a me fazer umas perguntas, sobre como eu me sentia, sobre por que não fui para Toronto, por que fiquei estranho depois da conversa com Petri...– O central balançou a cabeça negativamente. – E eu quis ter falado qualquer coisa, enrolado ela. Sabe como são essas coisas, você diz que vai pensar...diz que não está pronto e deixa para lá. Enrola até que ela esqueça o assunto.
– Tá, mas e aí? – Atte incentivou, bebendo sua cerveja.
– Eu não consegui. – ficou de pé. – Não deu. Não consegui. Não consegui falar nada. Ela ficou lá olhando para mim, irritada por eu não responder uma pergunta.
– Ela é meio exagerada, não é? Sabe, assuntos profundos demais para um segundo encontro. – Atte comentou, sentando-se no sofá de modo mais confortável.
– É, ela é emocional. – deu de ombros. – Mas eu não entendo porque não dei uma desculpa qualquer e fiquei lá, dormi com ela. Por que eu fiquei incomodado com aquele olhar...porque eu contei e depois fui embora.
– Espera, você contou? Qual parte contou? – Tolvanen quis saber, surpreso. – Nem para mim você contou porque não foi para Toronto.
– Não, isso não. Não se faça de desentendido, você sabe porque não fui. – franziu o cenho, impaciente com o amigo. – Falei para ela sobre outras coisas. Ela quis saber porque eu estava estranho depois de falar com Petri e eu contei.
– Ah, sei lá. – Atte deu ombros. – Quando a gente está apaixonado tem dessas coisas.
–
Eu não estou apaixonado.
– Não, claro que não. – O goleiro rolou os olhos.
– Por que tá falando isso? Não tem nada a ver. – se aproximou do amigo outra vez, confuso e contrariado com sua observação.
– Você está caidinho por ela há tempos, , acho que se emocionou e se apaixonou antes de ficar com ela pela primeira vez. Isso é fato. – Atte ficou de pé. – Quer dizer, vocês transaram pela primeira vez no sábado e hoje é terça e você está aqui. Acho que quebrou mais um recorde. – Atte riu. – Quer saber porque não conseguiu enrolar ela? Dizer qualquer coisa para se calar e aproveitaram a noite? Por que está aqui surtando por ter baixado um pouco esses seus muros? A resposta é a mesma, irmão, está apaixonado pela inglesa. Arriado, caído, de quatro, ela está em power play e seu goleiro é cego.
– Mas eu não...– tentou argumentar, mas Atte sorriu, tocando-lhe o ombro.
– Essas coisas...as vezes é melhor aceitar, lutar contra é perda de tempo. Mas o que vai fazer com isso é opção sua. Eu te disse aquele dia, no lago, que você devia arrumar uma namorada. Não era exatamente o que imaginei, pensei que uma namorada pudesse te convencer a deixar Lathi, mas em vez disso você arrumou uma que veio para Lathi por opção. É meio burro também, isso de namorar alguém do time, mas é você, se você não estiver sendo um pouco burro, não é você em essência. – Atte sorriu e tomou de uma vez o conteúdo restante em sua garrafa de cerveja, depois piscou para o central e se foi para o quarto, deixando com uma nova confusão dentro de si, ainda maior que a primeira.
Cerejeiras: A flor de cerejeira significa beleza, feminilidade, amor, felicidade, renovação e esperança. Depois de florescer, a flor de cerejeira dura no máximo 3 dias e, por isso, também simboliza a importância de desfrutar cada momento da vida.
25 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamentos do Pelicans
Na quinta-feira estava mais uma vez na arena, os atletas voltavam da folga, se preparando para o próximo jogo. aproveitava para atualizar suas anotações, estudar os perfis do time e tentar entender melhor os pontos fortes e fracos do elenco. Estava em um canto da arena, em um pavimento superior de onde se podia acessar escritórios, salas de treino, de atendimento e de reuniões. A porta estava aberta enquanto a terapeuta se debruçava sobre vários papéis, anotando, desenhando esquemas e tentando pensar em estratégias de trabalho.
O hiperfoco no trabalho era bom por várias razões, primeiro para que conseguisse se sentir mais segura em sua atuação, principalmente com o pequeno detalhe sobre não saber muito sobre o esporte. Depois, era bom se sentir ocupada e útil, como se as coisas enfim estivessem voltando ao eixo, sendo a pessoa produtiva e organizada que adorava ser, e por último, mantinha os pensamentos adestrados para que não corressem em direção a a cada segundo.
Desde a noite de terça tudo parecia confuso a inglesa, e também não havia tido chance de encontrar o capitão outra vez para que pudesse solucionar a grande incógnita que pairava sobre sua cabeça. Não pensar sobre era bom, principalmente porque se pensasse demais, surtaria. Não podia contar com Louis e Maisie, os dois estavam em uma semana complicada na clínica, não podiam dar a a escuta e acolhimento necessários. Também não podia contar com os novos amigos, não conseguia imaginar como contaria para qualquer um dos quatro sobre ter ficado com o capitão do time.
Droga, , está fazendo de novo, está pensando no de novo, ela massageou as têmporas, pensando consigo mesma. A terapeuta sacudiu a cabeça e respirou fundo, afugentando todas as lembranças do central, concentrando-se nos papéis. Santtu Kinnunen, ela leu o nome do atleta ao tentar retomar sua concentração, folheou a ficha, exames antigos e relatórios de exames e lesões antigas, avaliações e dados do defensor e mais novo amigo.
- Ainda aqui, ? – Petri enfiou a cabeça para dentro da sala, assustando a terapeuta, fazendo-a se desequilibrar da cadeira. – Desculpe, não queria te assustar. – Ele riu abafado.
- N-não, é que eu estava concentrada...não vi você chegando. – Explicou com um sorriso envergonhado.
- Por que ainda está aqui? – O treinador tornou a perguntar, cruzando os braços em frente ao peito, parado a porta.
- Estou estudando, atualizando minhas anotações, estudando alguns casos...
- Até agora? Você não é paga para isso. – Petri balançou a cabeça negativamente, com um sorriso leve no rosto.
- Como assim? Que horas são? – A inglesa tateou os bolsos e revirou os papéis em busca de seu celular.
- Oito e meia. – Petri se adiantou. – Pelos meus cálculos, você devia ter ido embora há pelo menos umas três horas. Ou mais.
- Caramba. Não vi o tempo passar. – se admirou.
- Olha, eu sei que as vezes sou rígido demais, quase intransigente...também gosto de ter controle sobre tudo e posso ser uma pessoa difícil de lidar. – Petri começou a falar, gerando em uma careta confusa. – Peço desculpas pelos exageros, confesso. Mas não é necessário que faça isso.
- N-não...- Ela gaguejou outra vez, atônita. – Não. É que eu realmente perdi a hora aqui. Mas obrigada. Obrigada pelo que disse...- agradeceu sem jeito. - Eu acho. – Sussurrou ela, guardando suas coisas e organizando os papéis.
- Então agora que já sabe, largue isso tudo aí e vá para a casa. Estou fazendo o mesmo. – Petri anunciou sorrindo e se perguntou sobre o que poderia ter acontecido para que o treinador estivesse de tão bom humor. – Quer uma carona?
- Não, valeu...- negou distraída e por uma ação cruel do destino, se lembrou da última carona, com e de todo o resto. – Ah...Petri. – Chamou e o finlandês a encarou atento. – Será que eu posso te fazer uma pergunta?
- Já está fazendo, mas okay. – Ele brincou e franziu o cenho, estranhando outra vez a reação dele. – O que quer saber?
- Na verdade, eu gostaria de uma opinião sua. – Disse, respirando fundo, tomando coragem e escolhendo bem as palavras. Não podia falar sobre sua relação pessoa com o central, mas podia tentar entender mais sobre porque havia tanta resistência e paredes em volta de e sua carreira, e talvez o treinador pudesse ajudar. – Sobre .
- Algum problema com ele? – Petri se aproximou mais, adotando tom de voz mais cauteloso.
- Não, na verdade não. – mentiu desviando o olhar rapidamente. – É q-que eu...eu...ele é uma incógnita para mim...eu queria saber sua opinião enquanto treinador.
Petri riu abafado e se aproximou mais de , apoiando-se a mesa onde ela estava sentada.
- Ele não é dos mais fáceis no início, não é? – Sorriu. – Atletas como nascem um a cada cem anos. Não estou falando apenas do talento, do dom natural que ele tem sem esforço, se for contar isso, os números crescem. – Petri disse suave. – A grande maioria dos atletas teriam que treinar metade da vida para conseguir fazer o que faz em uma segunda de manhã, despretensiosamente. Mas eu não acho que esse seja o ponto mais forte dele, por mais engraçado que possa parecer. tem um tipo de liderança natural, os outros o seguem, confiam nele, sabem que a leitura dele de qualquer jogo é perfeita, infalível.
- Desculpe, mas... – o interrompeu. – Eu me lembro daquele dia, quando pediu minha opinião. Você discordou dele. Discordou dele sobre a postura do time, sobre a visão de jogo.
- É. – Petri sorriu com a lembrança. – Essa é a diferença entre jogadores como ele e técnicos. Mas o fato de discordar, propondo outro arranjo no jogo, não significa que ele estava errado.
- Claro. – Assentiu a terapeuta, pensativa.
- Acho que ele sabe disso também, e é por isso que digo que homens como ele são tão raros. – Continuou o finlandês. – devia estar em uma liga maior, se fosse como outros com o talento dele, estaria em um lugar diferente. Se colocaria de forma diferente. Mas é o melhor homem do time no trabalho em equipe, é o mais humilde, o mais simples. Ele pode ter um recorde histórico para ser quebrado, basta acertar o disco no fundo da rede, mas se outro jogador tiver mais chances que ele, dá o passe sem pensar duas vezes. Nunca o vi colocando qualquer resultado, conquista ou validação pessoal antes dos resultados do grupo.
- Isso é legal. – sorriu, sentia-se estranhamente orgulhosa. – Mas não entendo algumas coisas que disse. Se é assim, porque cobrá-lo por ter ido embora no jogo de sábado? – cutucou, diante a fala do treinador, não conseguia parar de pensar no gigante desconforto que aquela cobrança havia causado em .
Petri não disse nada, apenas sorriu fechado e encarou a terapeuta por alguns instantes, em silêncio. Então, quando pensou que ele apenas tinha ignorado a questão, Petri a chamou:
- Vem. Vem comigo. Quero que veja uma coisa.
A inglesa uniu as sobrancelhas desconfiada, mas resolveu por segui-lo. Fora da sala, o técnico a guiou por um corredor longo e amplo que os levaria ao rinque onde os atletas treinavam.
- A parte boa de se trabalhar com atletas críticos consigo mesmos, é que eles geralmente se autorregulam sem que seja preciso intervenções maiores e cansativas. – Petri voltou a falar enquanto caminhavam. – Você raramente precisa mostrar a ele onde deve melhorar, ele já sabe e provavelmente percebeu antes de você. A parte ruim é que qualquer crítica que faça a eles tem um peso muito maior do que em outros.
Quando se aproximaram do rinque percebeu que não estavam a sós, alguém treinava no gelo, sozinho. Os dois observavam de longe, enquanto o atleta fazia exercícios de agilidade, percorrendo todo perímetro do rinque, como se quisesse quebrar algum tipo de recorde de tempo.
- Olhe só para ele. – Petri apontou com o queixo, colocando as mãos nos bolsos da calça. – Na maior parte do tempo não há nada que eu diria, nada que ele já não tenha como meta para melhorar. Mas se eu apenas me isentar, se eu não validar, que está no caminho certo, ou mostrar a ele onde ainda é possível melhorar, o que acha que aconteceria?
assistia a cena hipnotizada com o esforço feito por no gelo, com as palavras de Petri dançando em sua cabeça, como um tipo de dança circular maluca e cheia de passos confusos e aleatórios. Imaginava as toneladas que devia colocar sobre si constantemente, almejando ser perfeito ou alcançar o mais próximo disso que fosse humanamente possível. Talvez sua ansiedade pela aprovação do treinador fosse responsável pelas mudanças em seu comportamento quando diante dele, talvez fosse apenas medo de ser tão duramente criticado por Petri, quanto era por si mesmo. O capitão, mesmo afastado de suas atividades, lesionado, treinava solitário e intensamente, após todos já terem ido embora, no silêncio seco do gelo. Onde apenas se podia ouvir o ruído das lâminas dos patins contra o gelo e alguns murmúrios dele, vez ou outra, quando julgava não ter ido bem o suficiente.
- Não sei se isso responde a sua pergunta, mas acho que serve para início de conversa.
- Definitivamente, sim. – assentiu sem desviar os olhos do central.
- Bom, você ainda vai conhece-lo melhor, e aí vai ver tudo isso que disse ao vivo e a cores, mas enquanto isso, esse é o seu capitão. – Petri sorriu outra vez, tocando o ombro de com gentileza. – Ele costuma enlouquecer a todos, mas passa depois que você compreende como ele funciona. – Piscou. – Agora, ao contrário e não imitando o , você devia ir embora, assim como eu.
- Eu vou. Eu vou. – Assentiu distraída. – Logo. Não vou demorar. – Garantiu.
- Ótimo. Então, boa noite, . – Ele se despediu e apenas sorriu, ainda digerindo tudo aquilo.
❄❄❄
25 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamentos do Pelicans
🎵 Dê play na música aqui, e se necessário coloque para repetir – Ed Sheeran – Tenerife Sea 🎵
- Treinar depois do horário estando lesionado pode te render pelo menos mais uma semana de punição, .
Primeiro pensou ser alguma voz em sua cabeça, levou alguns segundos até que seu cérebro percebesse se tratar de um som externo. Em seguida, ao chegar ao fundo do rinque, deslizou devagar, de olhos fechados e semblante cansado. Não conseguia diferenciar a surpresa e excitação por encontrar a figura de bem diante dele, flagrando-o ali, da incerteza e receio de que tudo se tornasse uma bola de sentimentos esquisitos outra vez.
- .
- Pode vir até aqui, por favor? – Ela pediu sem sorrir, expirou todo ar que guardava no peito e deslizou até ela, na saída do rinque, desanimado.
Fazia alguma ideia sobre o que ela devia falar, sobre as questões da outra noite, as perguntas sobre sua vida, sentimentos. Não queria falar disso, não queria falar nada, e também não queria negar a ela qualquer coisa, por isso odiava a ideia de que ela provavelmente retomaria o assunto e que teria que negar e fugir outra vez, chateando-a. Pensar sobre a ideia de estar apaixonado por , criada na mente delirante de Atte, era fora de cogitação, estava reprimindo aqueles pensamentos com tanta força quanto costumava colocar nos roubos de disco durante os jogos.
Quando estava próximo o suficiente da terapeuta, ergueu os olhos para encará-la, preparando-se para o que viria a seguir, mas para seu total espanto, se lançou sobre ele em um abraço confortável e caloroso. não a abraçou de volta a princípio, foram precisos alguns instantes até que entendesse o que estava acontecendo e conseguisse que seu corpo despertasse do choque e a abraçasse de volta. Quando o fez, se permitiu descansar nos braços dela, percebendo que talvez precisasse estar ali, que o abraço quente e seguro de fosse onde queria estar. Apesar dos desconfortos que a presença dela o causava, o sorriso, olhar e abraço de ainda eram as melhores coisas do planeta.
– Por que...por que ainda está aqui? – Ele quis saber após um longo e confortável silêncio, afastando devagar o rosto da curva do pescoço de .
– Eu perdi a noção do tempo. – Ela sorriu com doçura, afagando o rosto dele com o polegar. – Você não devia estar aqui também.
– Eu quis ficar. – respondeu encarando os pés. – Não posso perder o ritmo.
– Pelo que vi, não está nem perto disso. – Ela brincou, aproveitando a proximidade do momento para admirá-lo de perto.
resolveu sair do gelo, passando por com cuidado e se sentou do lado de fora, perto da proteção do rinque, sendo acompanhado pela terapeuta. O central arrancou o capacete e as luvas, deixando as mãos livres para que saciasse o desejo grande de tocar a mulher a seu lado.
– A gente devia sair daqui e comer uma pizza. – começou a falar assim que segurou sua mão e entrelaçou os dedos. – Mas sem abacaxi dessa vez. Uma pizza grande. E podíamos até assistir mais uns episódios de
The Office, amanhã eu não preciso acordar cedo.
Ela estava ali, disponível e serena, como se a noite de terça não tivesse acontecido, ignorando o clima ruim e as perguntas que sabia que ela tinha. Talvez, pelo passo dado por ela em direção à paz, devesse também dar algum passo, ou ao menos tentar, por ela. Se tinha desistido de questionar, cedido ao fato de que falar sobre aquelas coisas não eram de seu interesse, talvez fosse o caso de uma prova do seu lado também.
– Eu queria falar umas coisas. – Anunciou sem jeito, encarando o chão e tentando arrumar o cabelo bagunçado com a mão livre.
– Não, esquece. – Pediu a inglesa com um sorriso. – Não vamos voltar nesse assunto, não precisamos falar disso se você não quiser. Vamos falar da pizza, de como seu gosto para seriados é péssimo. – Ela o provocou, fazendo-o sorrir e abraçando o braço de , se aproximando um pouco mais.
– Eu sei, mas eu quero. Quero te falar. – respirou fundo. – Eu sou um pouco idiota. – Fez uma breve pausa. – Ou muito idiota. – se corrigiu, envergonhado, sorrindo fraco. – Mas não é por mal, ou por desinteresse...ou por não levar a sério. É só que...acho que sou assim.
– Acho que já consegui perceber isso. – sorriu compreensiva.
– Não pensei em mais nada o final de semana inteiro, acho que esqueci que existia um time ou uma vida fora da sua casa. – Confessou com um riso nasalado, e gargalhou. – Quando na segunda, que Petri e o Merelä falaram sobre eu ter saído antes e não ter estado até o final...acho que fiquei culpado por ter me esquecido, culpado por não ter agido como acho que um capitão precisa agir...culpado por um monte de coisas.
– O que Waltteri disse? – sentiu-se inflamar.
– Nada demais, deixe isso de lado. – Ele deu de ombros. – Depois ele e Jasper disseram isso, que eu não podia fazer nada de fora do gelo, e que estava afastado. Mas é que...eu odeio ser cobrado por algo que sei que devia ter feito. – confidenciou receoso. – Eu sei que errei, mas é que mais pessoas falando disso e me apontando isso...acho que eu dei uma surtada.
– Você...– respirou fundo. – Você quer que eu apenas escute, que eu te aconselhe ou que diga minha opinião pessoal?
– O que? Como assim? – Ele a encarou surpreso.
– O que você quer que eu faça diante disso. Quer apenas falar e que eu te escute, ou...
– Nossa. – sorriu estreitando o olhar, voltando o rosto na direção da terapeuta. – Não sabia que tinha essas opções.
– Bem-vindo. – piscou sorrindo de volta. – E então, o que quer para hoje?
– Acho que pode falar, meio que já sei o que vai dizer, mas pode falar. – Ele cedeu, baixando o olhar outra vez.
– Bem, sendo assim...entendo que veja isso como um erro, como algo que podia ter feito diferente, mas para mim não parece um erro. Ter ido embora antes do fim de um jogo por ter tido uma emergência. Claro que nós dois sabemos qual foi a emergência. – disse, tentando fazê-lo sorrir. – Mas eu fico pensando...se o time tivesse vencido, e não levado aquela virada, será que teriam feito a mesma cobrança? Será que
você teria se feito a mesma cobrança?
– Acho que não.
– Então, talvez a sua presença ou não na arena não seja o ponto aqui. – A inglesa fez uma breve pausa, alinhando os pensamentos. – Você não foi o único a se culpar, mas foi o único que não podia ter feito nada que alterasse o resultado a pensar que podia. – sorriu entredentes, culpado. – Quando eu era mais nova tinha medo de carros. Sempre ficava preocupada quando meus pais ou pessoas que eu gostava pegavam estrada, sempre achava que estavam correndo perigo eminente. Na minha cabeça, a única forma deles estarem seguros, sem que o risco fosse tão grande, era se eu estivesse junto, porque podia me manter atenta em toda a viagem, garantindo que não se acidentassem por descuidos. – contou e ouviu sua história com olhos voltados para ela. – Eu descobri depois, que carros batem, eu estando neles ou não. Times levam viradas, você estando neles ou não. Esse controle, ou essa sensação de controle, você não a tem. Ninguém tem.
– Isso foi verdade ou é só uma história motivacional? – quis saber, fazendo rir.
– Não mude o foco. – Pediu ela, empurrando-o pelo ombro enquanto ele ainda sorria. – Mas é verdade, não minto para você. Não mais.
não respondeu, apenas a puxou para junto de si e beijou o topo de sua cabeça. Apesar da brincadeira, as palavras de haviam encontrado terreno fértil em seu coração.
– Acho que isso seja uma coisa de todos vocês. – Ela continuou, ainda pensativa. – E agora eu estou falando como terapeuta do time.
– Terapeuta ocupacional do time. – a corrigiu, lembrando-se do primeiro encontro com ela, e riu pelo nariz enquanto ele a apertava mais junto a si.
– Pois é, como terapeuta ocupacional do time, digo que isso não me parece ser só seu. Acho que eles ainda estão se acostumando e se organizando enquanto time sem você. Talvez também tenham uma falsa sensação de que se você estiver, tudo estará sob controle. Mas é uma expectativa deles, o grupo dá conta disso. Acho que seria até positivo que eles percam essa aparente dependência de você e do seu direcionamento.
– E você dizendo que não entendia de hockey...
– Mas eu não entendo mesmo. – deu de ombros. – Mas entendo de pessoas, eu estudei muito e sou bem boa no que faço. – Ela sorriu orgulhosa, enquanto a encarava com olhar abobado. – Eu agradeço por ter dito isso. Por ter se aberto, imagino que não deve ser uma coisa fácil para você, então...só queria que soubesse que reconheço o esforço.
– Acho que acabo de perceber que sair com uma terapeuta pode ter sido a melhor coisa que fiz na vida. – Brincou, abraçando-a mais forte, de lado e beijando o topo de sua cabeça.
– Teoricamente, ainda não saímos. – implicou.
– Bem lembrado. Bem lembrado. – concordou e os dois riram juntos. – Eu posso fazer uma pergunta? – Falou ele após alguns instantes em silêncio.
– Claro, sempre.
– Longe de mim querer apontar qualquer coisa, mas...– hesitou. – Você sempre me dá pistas muito curtas e escorregadias sobre você. Não é como se eu quisesse te cobrar ou que a gente se sente aqui e fiquemos falando dos nossos sentimentos a noite toda. Mas é que...quando estamos tendo esse tipo de conversa...
– é absurdamente contraditória. – A inglesa ironizou.
– Você quer saber sobre porque me comporto de um jeito, porque me comportei de outro jeito no passado...e eu mal sei porque você saiu do seu país para trabalhar em outro com um esporte que não gosta, e isso é só um exemplo. E não vale a resposta sobre pagar as contas, embora ela seja a minha favorita. – O capitão sorriu, lembrando-se da primeira troca de palavras entre os dois.
– Você tem razão.
– Não acredito que disse isso. – abriu a boca, fingindo-se chocado.
– Não celebre, o jogo só termina quando acaba. – brincou, cortando a celebração de . – Mas tem razão. Eu só não sou muito de falar sobre essas coisas, acho que minha vida não é tão interessante. Não quero entediar ninguém.
– Você não me entediaria nem se se esforçasse muito. – Garantiu ele, fazendo-a sorrir.
– Sabe o mais engraçado disso tudo? – o olhou e arqueou as sobrancelhas. – Quando você não falava comigo, me ignorava, tinha certeza que era porque sabia de tudo sobre minha vinda para cá, e por isso me odiava. – riu nasalado, negando com a cabeça. – É, eu sei que parece idiota agora, mas para mim parecia bem real na época. E também, como eu podia imaginar que toda essa sua marra não passava de uma farsa?
– Farsa é uma palavra muito forte. – Ele rebateu, ainda rindo. – Mas o que achou que eu sabia? Fiquei curioso.
– Bom, eu trabalhava em uma clínica na Inglaterra. Trabalhava junto com meus dois melhores amigos, Maisie e Louis. – contou e enquanto falava, desenhava círculos no dorso da mão quente de , aproveitando para memorizar a textura de sua pele. – Mas eu sempre tive interesse em trabalhar com algo que envolvesse esportes, quando apareceu a oportunidade, me lancei. Saí da clínica e me mudei para Mônaco. – Com a menção do principado estreitou o olhar e franziu o cenho. – Achei que trabalharia com jogadores de tênis ou coisa do tipo, pilotos de automobilismo...quem sabe. Mas quando cheguei em Mônaco, houve uma questão e me enviaram para cá, para trabalhar com um time de hockey. Até pensei em desistir, mas não queria ouvir nenhum comentário do tipo, eu te avise. – sorriu, disfarçando o pequeno desconforto.
– Nossa, é, essa versão é bem mais complicada do que a das contas para pagar. – comentou. – Mas eu não entendi, porque achou que eu sabia disso e que te odiasse por saber?
mordeu o lábio antes de continuar.
– Eu meio que fiz besteira, com meu chefe. – Confessou afastando o olhar, envergonhada. – Na verdade não foi nada demais, mas ele é um babaca. Um grande babaca. E aí, ele não podia conviver comigo e achou que seria uma ótima ideia me exilar aqui. Nada contra. – Ela se justificou.
– Que idiota. – sacudiu a cabeça negativamente e torceu os lábios. – O que ele fez com você?
– Nada, só que se irritou comigo, eu acho. Hoje em dia eu acho que ele também me odeia, isso meio que me deixa em paz. Sabe? É recíproco. É ruim, porque eu achava que ele fosse uma pessoa ótima, mas me decepcionei.
– É impossível te odiar, .
– Eu duvido muito. – Ela sorriu, esticando as pernas. – Quando soube da transferência, Louis, esse meu amigo, me disse que devia voltar para Inglaterra, eu também não queria vir, sendo sincera. Mas hoje, por mais que ainda seja difícil e que me sinta sozinha em vários momentos, não é tão insuportável. Na verdade, eu até gosto.
– Que bom que seu chefe babaca te exilou nessa terra congelada. – a abraçou outra vez, e sorriu.
– Também acho. No final das contas não é tão ruim. – A terapeuta deu de ombros. – Ainda preciso de aulas suas sobre o esporte, mas, quem mais tem o privilégio de aprender com o capitão e melhor jogador do pais? Ainda não falo a língua muito bem e não sei patinar, mas mesmo assim...
– Como assim? Não sabe? – O central arqueou as sobrancelhas, sorrindo surpreso.
– Não faça essa cara. Não sei porque se espanta, não depois do que eu disse no sábado, no jogo. – cruzou os braços sobre o peito, sorrindo, embora enfezada.
– Não posso aceitar isso. – O capitão ficou de pé, e graças aos patins, devia atingir mais de dois metros de altura. – Anda, de pé.
– De pé para que? – Ela arqueou uma sobrancelha.
– Não posso ser visto com você se não souber patinar. – Ele brincou, fingindo falar sério. – Está na Finlândia agora, . Patinar é um pré-requisito básico.
– Você diz como se sempre fosse visto comigo por aí. – Ela rolou os olhos, pondo-se de pé.
– Eu meio que estou sentindo uma pressão aqui. – Ele apontou para si mesmo e para a terapeuta, de modo teatral. – Alguém está irritada com a falta de um encontro?
– Não sei se irritada é a melhor palavra. – cruzou os braços, assistindo se afastar, escolhendo um par de patins e voltando para junto dela.
– Ah, eu acho que é uma boa palavra. Senta aí. – Pediu o capitão e ela obedeceu. – Na verdade, bravinha é uma palavra bem melhor. – Provocou, apoiando um dos joelhos no chão, enquanto trocava os tênis da inglesa pelos patins.
– Bravinha? – arqueou uma sobrancelha e sentada de frente para o capitão.
– Bravinha. Bem bravinha. – sorriu.
🎵 Dê play na música aqui, e se necessário coloque para repetir – Ruth B. – Dandelions 🎵
Enquanto sentia o capitão lhe tirar com todo cuidado o tênis dos pés, e substituí-los por patins para o gelo, não conseguia parar de sorrir. Não pela graciosidade do momento, ou por estar completamente derretida pelo homem a sua frente, que depois de uma conversa sincera, estava calçando cuidadosamente seus pés com patins. Poderiam estas serem ótimas razões, mas não era o motivo por trás do grande sorriso da inglesa. O motivo real era bem mais simples, o sorriso de .
Já havia se apaixonado dezenas de vezes durante a vida, já havia admirado centenas ou milhares de sorrisos, mas nunca, em toda sua existência, se lembrava de ter encontrado algum tão bonito quanto o do homem a sua frente. Os lábios grossos e sempre rosados de margeavam alinhados dentes brancos, mas não brancos demais que fizessem seu sorriso ter aspecto artificial. Em vários momentos o central não abria os lábios para sorrir, na maior parte das vezes mal notavam devido a sutileza de seu sorriso, mas quando resolvia sorrir de verdade, não havia nenhuma outra beleza no mundo que lhe fosse comparada.
sabia que não era o homem mais bonito do planeta, do país ou do time, mas não se importava com esse detalhe, sempre fora o tipo de pessoa a olhar além de atributos físicos. Mas apesar disso, o sorriso de a capturava de modo quase mágico, era como se o mundo parasse de girar e tudo que merecia atenção fosse o sorriso dele. A carne tão rosada que parecia artificial e que se repuxava, permitindo que seus dentes aparecessem, podia iluminar uma cidade inteira, ou o caminho de .
– Por que está me olhando com essa cara? – Ele quis saber, despertando-a de seu devaneio apaixonado.
– Você. – Respondeu sincera.
– Eu? – riu surpreso, enquanto apertava com cuidado os cadarços dos patins da inglesa. – Está se divertindo em me ver aqui de joelhos, ? Não sabia que gostava desse tipo de coisa. – Ele piscou malicioso.
– Estou olhando para você porque não consigo olhar ou pensar em qualquer outra coisa além de você quando sorri assim. – Confessou, pegando-o desprevenido.
congelou sua expressão, e então sorriu de canto, surpreso e em seguida abriu o mais lindo sorriso.
– Você...– O central riu baixo. – Não pense que me deixando bobo vai conseguir fugir do gelo hoje.
– Mas é a verdade. – argumentou, inclinando o corpo para frente, aproximando seu rosto do rosto do capitão e segurando-o com as mãos, com delicadeza. – Eu sinto que seu sorriso é a coisa mais bonita que já vi em toda minha vida.
– , ...– sorriu, sentindo o rosto esquentar. – Não faça isso comigo.
– O que?
– Não posso me apaixonar agora. – Ele sorriu ao dizer.
– Engraçado, eu sempre me disse a mesma coisa. – sorriu de canto, olhando dos lábios do capitão para seus olhos.
– E o que aconteceu depois? – perguntou, aproveitando o toque quente das mãos da inglesa em seu rosto.
– Depois eu não conseguia fazer qualquer coisa sem pensar em um certo metido e irritante capitão de hockey. – sorriu e para sua felicidade, fez a mesma coisa.
– Okay, vamos tentar outra vez. – tentou animá-la.
Não faziam noção das horas, ou do tempo que haviam passado no gelo, entre quedas e mais quedas. Estavam suados, despenteados e com faces vermelhas, tanto pelo esforço quanto pelo tanto que riam daquela situação. Cada vez que tentava fazer com que ficasse de pé, ela escorregava no gelo de uma forma diferente. E por estar gargalhando incessantemente, a terapeuta não tinha forças para concentrar e coordenar a movimentação de seus pés e pernas.
– Se concentre. – pediu, tentando não rir mais. O central segurava a inglesa pela cintura, posicionado atrás dela.
– Eu estou tentando! – Ela cerrou os dentes.
já tinha os olhos úmidos e o abdomen doía de tanto rir, mal conseguia ficar de pé no gelo pelo cansaço também. Por isso, quando as pernas de deslizaram para frente de modo involuntário, ele tentou segurá-la, mas falhou e suas pernas também vacilaram, fazendo com que os dois caíssem juntos no gelo, de costas.
– Definitivamente...– A terapeuta tentou dizer, ainda ofegante e entre uma risada e outra. – Eu preciso procurar um novo emprego.
– Não...– voltou o rosto na direção dela. – O que vou fazer aqui sem você?
– O que você já fazia antes. – piscou, olhando nos olhos do capitão, enquanto ainda riam.
– Nunca mais vai ser a mesma coisa. – Disse ele, com um pouco mais de seriedade.
sentiu o peso daquelas palavras, queria poder dizer tudo que se passava em sua cabeça, mas temia estar sendo precipitada. Acabou por escolher outro caminho.
– Como vai fazer agora? – A terapeuta dirigiu o olhar para o teto de aço. – Disse que não poderia ser visto comigo se eu não soubesse patinar.
– Eu tenho um grande problema pela frente. – , que ainda a observava, falou de modo quase teatral. – Talvez eu seja deserdado. – rolou devagar e com cuidado, encostando seu corpo ao de . – Mas pode ser que valha a pena. – Ele maneou a cabeça e projetou o lábio inferior, como se não se importasse.
– Pode ser que valha a pena? – Os lábios da inglesa se abriram em um sorriso incrédulo.
– É, quem sabe...– Ele continuou, e riu alto quando ela tentou afastá-lo. – Eu... – hesitou.
– Você?
– Não, não é nada. – sacudiu a cabeça, sorrindo de modo tímido, depois de pensar por alguns instantes. – Só estou feliz aqui. Você, eu e o gelo. Apesar da sua notável falta de talento.
– Você tem talento suficiente para nós dois. – sorriu, tomando o rosto dele nas mãos e afagando sua bochecha com o polegar. – E eu também estou feliz. Mas fico me perguntando...
– O que? – quis saber, unindo as sobrancelhas, esperando que talvez o que viesse a seguir não fosse um assunto tão agradável.
– É, sabe...fico me perguntando...– tocava com cuidado o rosto do central, numa lentidão proposital para concluir sua fala. – Me perguntando porque você não cala a boca logo e me beija.
Foi preciso alguns segundos até que os neurônios de fossem capazes de compreender aquela informação, mas quando as sinapses foram feitas, ele sorriu.
Aquele sorriso. E então, antes que pudesse refletir sobre quão bonito era, ele a beijou. Tinha as costas no gelo, aos poucos sentia o frio atravessar os casacos que usava, mas ao mesmo tempo, os lábios grossos, macios e quentes de a aqueciam por inteiro.
– Para um central, você até que é bem lentinho, né? – provocou depois de morder suavemente o lábio inferior do jogador, que sorriu.
– É que eu nunca sei o que esperar de você.
– Eu gosto de imprevisibilidade. – Ela sorriu.
– Eu também, por isso sou imprevisível. – se gabou, fazendo gargalhar.
– Não, não é. – Ela negou.
– Claro que sou. – insistiu.
– Não é nada. No mundo em que você for imprevisível...– ainda dizia quando a intuição de o fez desviar os olhos da terapeuta para algo além do gelo. – O que? O que foi? – percebeu, acompanhando o movimento dos olhos dele.
– ¡Ay, caramba! – sussurrou, ainda paralisado.
Em um movimento súbito, ficou de pé, acompanhada por . A terapeuta lutava para manter os pés firmes no chão, mas agora aquela tarefa parecia mais fácil que antes, apesar disso, as mãos grandes e firmes de ainda estavam posicionadas em sua cintura.
– Santtu. O que faz aqui? – Indagou ela, tentando fingir normalidade diante do atleta de olhos arregalados e expressão congelada que os encarava de fora do gelo.
– Eu...– O defensor parecia catatônico. – Eu...
– Você? – incentivou.
– Vocês estão juntos? – A expressão de Santtu se transformou em uma mistura de confusão e estranheza.
– O que? Não! É só que...não! – tentou disfarçar. – só estava me ajudando com patinação.
– Eu acho que isso não vai colar. – sussurrou, olhando para o outro jogador, que mantinha uma expressão incrédula no rosto.
– Okay. – A inglesa expirou derrotada, baixando os ombros. tinha razão, a situação estava óbvia demais para que negassem. – Meio que sim.
– Cara...– Santtu assoviou. – Isso é muito inesperado.
– Por que? – sentiu um leve golpe em seu orgulho.
– Sempre achei que seria o Merelä. – O defensor foi sincero.
– É, eu também. – concordou, maneando a cabeça e projetando o lábio inferior.
– O que? – o olhou por sobre o ombro, depois olhou de volta para Santtu. – Gente? Não. De onde vocês tiram isso?
– É que era meio óbvio. – ergueu os ombros e viu Santtu concordar com a cabeça.
– Eu nem sabia que vocês conversavam. – Santtu voltou a falar. – Ele não te ignorava?
– É, é uma longa história. – Fora vez de erguer os ombros.
– Para tudo se tem uma boa explicação. – O capitão reforçou. – Embora não pareça.
– Cara...vocês estão juntos...isso é muito doido. – O defensor expirou um riso chocado, passando as mãos pelo cabelo. – Agora tudo faz sentido. Vocês foram embora juntos, do jogo, depois o...– Santtu mantinha a boca aberta, mas não fazia qualquer som. – , foi você a vampira que marcou o pescoço dele? – O jogador arregalou os olhos, enquanto ria e sentia o rosto esquentar de vergonha.
– Outra longa história. – Disse ela.
– Cara, o pessoal vai surtar quando souber disso...
– Santtu, eu...– hesitou. – É que...
– Ninguém sabe. – completou, falando de modo calmo, mas sério. – E nós ainda não pretendemos contar.
– Isso. – confirmou, olhando rapidamente para o capitão, grata pelo apoio.
– Ah, entendi. – Santtu baixou a cabeça por dois segundos, parecendo pensar sobre o que diria, ou escolher melhor as palavras, enquanto o casal o observava, com expectativa e com receio. – Bom, é um segredo nosso então. – O defensor sorriu.
– Obrigada. – A terapeuta sorriu aliviada. – É que isso tudo é muito complicado, e também...
– Não precisa me explicar, . – Santtu se aproximou da proteção do rinque. – Eu fico feliz por vocês. Agora tudo faz sentido.
– Como assim? – indagou, auxiliando a se aproximar da proteção também.
– Bom, primeiro teve o lance de vocês terem visto o jogo juntos, depois irem embora juntos. Depois, você chega aqui com aquele chupão monstro, mas de bom humor. – Santtu listou. – E tem o fato de você estar sem reclamar da postura do há umas duas semanas. – Ele apontou para .
– Você reclamava de mim? – estreitou o olhar, olhando para .
– O que você esperava? Que eu gostasse de você por me ignorar e ser grosseiro? – o encarou de volta.
maneou a cabeça e arqueou uma sobrancelha, como quem diz “mas funcionou”, e a terapeuta o acertou com uma leve cotovelada, contendo o riso.
– Vocês até que fazem um casal bonito. – Santtu comentou, sorrindo com a cena boba dos dois.
– Obrigada por manter isso entre nós. – agradeceu outra vez e reforçou com um aceno e cabeça.
– Disponha. – O defensor piscou. – Mas tem uma condição. – Disse ele e o casal o encarou confuso. – Quero saber de todos os detalhes. – completou sorrindo.
Alecrim: A flor do alecrim está associada à coragem e fidelidade e proteção. De igual forma, significa também bom ânimo, confiança, transmitindo um sentido de bem–estar.
25 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
– Isso é mega óbvio. – rolou os olhos. – Você ama
The Office, não dá para esperar muito de alguém que tem essa série como favorita.
– E quem é você para falar? – cruzou os braços sobre o peito e se recostou a parede, encarando a terapeuta com olhos estreitos. – Qual é a sua favorita?
Friends?
– Claro que não. – deu de ombros, concentrada em devolver as garrafas plásticas para a máquina. –
Game of Thrones. – Disse e rolou os olhos e riu pelo nariz.
– Claro, por que eu ainda me surpreendo?
– Qual é o problema? Não é porque você curte essas séries bobas, que todos também gostam. – o encarou com deboche.
– Acontece, que a série não é boba. – se aproximou, aproveitando o vento frio que começara de repente como justificativa para abraçar por trás, apoiando o queixo em seu ombro. – Ela fica melhor com o passar das temporadas.
– Eu já ouvi essa história antes, você me forçou a ver até a terceira temporada, e não vi nada se tornar mais interessante. – riu, aproveitando o momento e relaxando o corpo nos braços do capitão.
– Bom, podia ser pior. – deu de ombros e maneou a cabeça, projetando o lábio inferior. – Podia ser como seu ex, e te fazer assistir
O Senhor dos Anéis.
– Ei! – A inglesa protestou, rindo incrédula, girando o corpo para encarar o central, mas ainda nos braços dele. – Ele não era meu ex, foi só um casinho. – Desdenhou.
– Você assistiu a quase dez horas de filme só por um casinho? – O jogador fez careta.
– Você é detestável, sabia? Já te disse isso? – resmungou, dando-se por vencida, segurando a gola do casaco de moletom de e olhando em seus olhos, fingindo estar brava.
– Não, quer dizer lá em casa? – Ele respondeu, fingindo desinteresse.
– Você não consegue pensar em qualquer coisa sem que sua mente suja assuma o controle? – riu deixando que sua cabeça caísse para trás, e deu as costas ao capitão, voltando sua atenção a máquina de garrafas, esperando seu ticket.
– Eu não tenho uma mente suja. – protestou, sorrindo. – Você quem sempre pensa mal de mim.
– Claro.
apenas riu baixo, aproveitando para sentir o cheiro dos cabelos da inglesa, aproveitando o momento simples e em paz ao lado dela. Era tarde, algo perto das nove, mas estavam se livrando das garrafas plásticas em uma das máquinas espalhadas pela cidade, em um posto de combustíveis, como um casal comum, e aquilo aquecia o coração do central. Conversas sobre trivialidades, sobre qualquer assunto bobo, presença, era aquilo que precisava.
Depois da noite de quinta, tudo permaneceu bem e era quinta-feira outra vez, e a semana tinha sido boa, produtiva e em paz, sem que sua mente criasse qualquer cenário maluco, gerando mil inseguranças aleatórias e desproporcionais.
– Quer tomar um sorvete? – Propôs.
– , deve estar fazendo uns dez graus. – sorriu.
– E isso significa?
– Que tal fazermos como qualquer casal e irmos para casa, a gente assiste um filme, come algo quente e depois...– hesitou.
– Depois o que? – arqueou uma sobrancelha, curioso e em seguida sorriu malicioso.
– A gente dorme. – Ela riu, enquanto o jogador negava com a cabeça. – Amanhã você tem que ver o médico, pela manhã.
– Não me lembre disso, você devia me distrair, lembra? – O central entrelaçou a mão a da terapeuta, mas não do jeito comum, do jeito de ser, entrelaçando os dedos mínimos, apenas.
– O que você acha que tentei fazer enquanto ouvia você explicar a complexidade por trás do
Dwight Schrute? – arqueou uma sobrancelha, mas fez careta, ofendido. – É brincadeira, estou só brincando, amor. – Ela riu, beijando-o rapidamente e o fazendo sorrir abobado. – Vai dar certo, provavelmente será uma boa notícia.
– Você me chamou de amor? – , ainda sorrindo, quis se certificar enquanto caminhavam em direção a loja de conveniências.
– Chamei? – fingiu-se de desentendida.
– Chamou. – O central riu, acusando-a.
– E o que tem? – se adiantou, abrindo a porta da loja, enquanto andava mais atrás, bobo como um pré-adolescente depois de dar o primeiro beijo.
– Você me chamou de amor. – Ele sorriu.
Talvez Atte tivesse razão, pensou .
Talvez estivesse apaixonado por .
Estava diante dela, a assistindo a trocar seu ticket por dinheiro no caixa da loja de conveniências de um posto de combustíveis numa noite ordinária de quinta-feira, e era o paraíso na Terra. vestia um moletom dos Pelicans e jeans, o mesmo de sempre, exceto pela touca cinza de , que agora ela usava sempre. Embora estivesse vestida como em dias comuns, estava linda, a mais bonita das mulheres do mundo. Talvez, e só talvez, não tivesse problema se abrir um pouco, admitir que realmente estava entregue a ela, tentar de novo. Talvez, valesse mesmo a pena.
– ? – Ela o chamou, balançando uma das mãos na frente do rosto do jogador.
Estava tão entretido a admirando e ponderando sobre ser o emocionado que sempre quis, que não ouviu o funcionário da loja falar com ele, sendo necessário que tentasse o trazer de volta à Terra.
– Desculpe, o que foi?
– Ele quer um autógrafo. – A inglesa falou, apontando com o queixo para o rapaz do outro lado do balcão, que o olhava com expectativa e um grande sorriso.
– Claro. – assentiu, sorrindo fraco.
– Nossa, eu nem acredito que você está aqui, pessoalmente. – O rapaz riu alto. – É uma honra. Eu sou muito seu fã. Demais.
– Obrigada.
autografou uma camiseta e tirou uma foto com o fã, e em seguida, o casal deixou a loja de conveniências. Com os dedos mínimos entrelaçados, entraram no carro em silêncio, e aguardou até que estivessem na rodovia para falar.
– Então esse é o famoso. Poucas palavras, nada emocionado. – Sorriu, afagando a nuca do central, enfiando os dedos por baixo da touca que ele usava.
– Gostou? – a olhou rápido, depois voltou os olhos para a estrada, aproveitando o toque da inglesa.
– Eu sempre gosto de conhecer todos esses seus lados. – Disse ela. – Gosto quando me deixa ver.
não respondeu.
Não sabia o que dizer, apesar de no fundo, saber. Queria dizer coisas, propor coisas, mas ainda se sentia amarrado por suas inseguranças e medos, temendo que aquele castelo desmoronasse assim que entrasse dentro dele. era uma boa pessoa, aparentemente, estava disponível, parecia realmente querer estar ali, ao seu lado. Precisava constantemente se lembrar de que a terapeuta não tinha responsabilidade sobre seus últimos relacionamentos ruins, ou sobre qualquer insegurança que eles lhe haviam causado, por mais que o central odiasse admitir.
Talvez fosse hora de tomar uma atitude.
– Quer ir lá em casa amanhã? – Convidou, e o encarou confusa.
– Na sua casa?
– É. – Ele assentiu, aproveitando a desculpa de estar dirigindo para que não precisasse a olhar nos olhos. – Eu sempre vou para a sua casa, pensei que talvez você...sei lá, quisesse ir a outro lugar. – se engasgou com a própria respiração. – Acho que é uma proposta babaca, na verdade. Devia te levar para jantar, não para a minha casa. Mas eu não quis ser babaca, juro. – Ele se justificou, enquanto assistia a cena com um leve sorriso nos lábios. Secretamente, adorava quando o capitão tão cheio de certezas e marra parecia um adolescente atordoado. – Na verdade, esquece tudo. Vamos sair amanhã. Um jantar. Acho melhor. Estou te devendo aquele primeiro encontro.
– . – o interrompeu, ainda sorrindo.
– O que? – Ele a olhou ansioso.
– A gente não precisa sair para jantar, eu não me importo em onde estejamos, desde que estejamos juntos. – A terapeuta sorriu de modo doce.
– Não, mas...eu quero fazer as coisas direto. – argumentou, sentindo-se mais confiante e aquecido pela resposta dela.
– Não preciso que seja visto comigo em público para isso.
– Não, não. Eu sei que não. – Ele começou a dizer, mas parou quando uma súbita ideia lhe passou pela mente. – A não ser que...se você não quiser ser vista comigo, eu entendo, . Sério. Essa coisa de fama, é muito pesada e é um fardo que odeio dividir com quem convive comigo, então, eu entendo. Na verdade, você tem razão de não querer.
– . – o interrompeu, falando um pouco mais sério. – Você pode esperar que eu termine de falar, para só depois tirar suas conclusões? – Pediu.
– Okay, okay. Tem razão. Desculpe.
– Por que está tão ansioso? – sorriu, voltando a seu humor normal. – Parece que está nervoso.
– Você acha? – coçou uma sobrancelha.
– Está desconfortável comigo?
– O que? Não. Não. – O capitão a olhou surpreso, com as sobrancelhas juntas. – Não, não é isso.
– Quer me dizer o que é então? – incentivou.
– Eu só estou tentando, do jeito mais errado existente, me relacionar com uma mulher bonita. – Confessou, e viu a terapeuta sorrir. – Não quero estragar as coisas.
– Você só precisa ser você mesmo, e tudo vai ficar bem. Você é cativante por si só. – garantiu, e em seguida se inclinou na direção do jogador, beijando-lhe o rosto.
❄❄❄
26 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
– Entendeu o que o eu disse? – O médico perguntou, mas diante a falta de resposta por parte do número trinta e quatro do time, buscou o olhar do fisioterapeuta que o acompanhava.
– . – Jakkos cutucou a cintura do central com o cotovelo.
– Sim. – sacudiu a cabeça, tentando se concentrar e os encarou, perdido. – Desculpe, me distraí.
– Perguntei se entendeu o que disse sobre a recuperação. – O médico repetiu.
– Sim. – Assentiu ele. – Reabilitação e muito cuidado. Pode deixar comigo.
– Ótimo. – O médico assentiu sorrindo fechado. – Vocês têm uma equipe muito boa e uma terapeuta excelente. Li alguns artigos que a senhorita publicou, ela vai saber o que fazer e se tudo correr bem, como tem sido, terá uma recuperação rápida e tranquila. – Garantiu.
– Ela é, é ótima. – Jakkos concordou, apertando a mão do médico, e assentiu com a cabeça.
Os dois se despediram rapidamente do médico e deixaram seu consultório, andando em silêncio. Mais duas ou três semanas e poderia voltar ao gelo, estava feliz por enfim voltar a desempenhar seu papel, e por embora ainda de fora, não precisasse mais utilizar aquela imobilização desconfortável. Agora faria o uso de uma órtese de posicionamento, muita reabilitação para fortalecimento e logo estaria novo.
Nos últimos dias, apesar da lesão, só uma coisa estava em seus pensamentos: Ava .
Estava com a sensação de descer uma montanha russa sem cinto de segurança, empolgado, mas temoroso. Após a noite tranquila fazendo coisas comuns, havia passado mais uma noite com a terapeuta, mas não perderam a noite de sono, pelo contrário, aproveitaram para apenas dormir. Era bom tê-la ao lado, dormindo serenamente. Era bom conversar sobre a cor da parede ou sobre a diferença dos lençóis de boa ou má qualidade, ou falar sobre como seria o dia seguinte e seus planejamentos.
Quando acordou naquela manhã, sentiu o cheiro bom vindo da cozinha, e a encontrou preparando seu café, sorrindo. Era a visão do paraíso, o seu paraíso particular.
E a cada momento comum que dividia com , como uma carona, uma refeição, a espera em uma fila, ou até o trajeto até o trabalho, tudo alimentava seus sentimentos pela inglesa. Não fazia ideia de quais sentimentos aquilo alimentava em , ou se alimentava algum sentimento, preferia não pensar sobre. Mas sabia que a cada dia que passava na presença dela, se envolvia mais, se apaixonava mais, e pela primeira vez desde que a conhecera, talvez não se importasse com isso.
– Olha, eu sei que é muito para processar, mas se quiser voltar ao gelo no mesmo nível de antes, precisa ficar mais atento. – Jakkos falou, atraindo sua atenção.
– Foi mal. – assentiu. – Vou cuidar disso.
– É alguma coisa no time? Está preocupado com a lesão?
– É pessoal. – Respondeu rápido. – Estou feliz que estava errada, só espero que ela não me escute dizendo isso. – O central riu abafado, acompanhado pelo fisioterapeuta.
– Eu vou fazer questão de dizer a ela. – Jakkos piscou. – Vocês vão ter que se encontrar mais, sua reabilitação com ela vai ser mais intensa agora.
– Não tem problema. – deu de ombros, sorrindo fraco e encarando o chão.
– E , sobre o que disse, sobre a questão pessoal. – Jakkos abriu e fechou a boca. – Bom, pela minha experiência, problemas pessoais podem ser mais destrutivos do que jogar com um punho quebrado.
– Eu sei, mas já estou cuidado disso, não vai me atrapalhar. – O central deu de ombros. – Só me distraí, fiquei pensando algumas coisas, foi só isso.
– Tem a ver com a garota? – Jakkos sondou, buscando o olhar do atleta, que o encarou confuso. – Qual, é, ?! Não estou no time, mas somos uma equipe. Eu vi a marca no pescoço, percebi que anda meio distraído também.
– Aonde quer chegar? – adotou a postura defensiva de quase sempre, endireitando as costas e parando de sorrir.
– Em lugar nenhum. – O outro se defendeu. – Não estou te acuando, não é um ataque. Você é jovem, famoso, solteiro, pode e deve aproveitar a vida. Só não se perca por isso.
– Não estou me perdendo.
– Eu sei, devo estar completamente enganado. – Jakkos ironizou. – Só se atente.
– Obrigado pelo conselho. – falou, apressando o passo. – Mesmo sem eu ter pedido. – Disse baixo, para que o fisioterapeuta não pudesse ouvir.
– Eu não estou falando só como membro da equipe. – Jakkos também apressou o passado, tentando acompanhá-lo. – Se precisar conversar, é só falar. – Ofereceu e assentiu.
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26 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Apartamento de
Era dia de folga da terapeuta inglesa, uma sexta-feira preguiçosa, fria e com altas chances de ser passada no sofá, assistindo um seriado qualquer. devia estar em sua consulta médica naquela hora, e estava em casa, ansiosa por qualquer sinal de vida do central, qualquer notícia sobre sua lesão. Na tentativa de se distrair, resolveu ligar para os melhores amigos, Louis e Maisie, e os estava esperando atender a chamada de vídeo.
Haviam se passado alguns bons dias sem que os amigos conseguissem um tempo para conversar com a terapeuta, ao que parecia, por causa do trabalho, e por isso também, que fosse preciso adiar a visita deles. Mas já não se aguentava, precisava compartilhar com alguém sobre os últimos acontecimentos em sua vida, sobre o acontecimento
. Santtu já sabia a respeito, mas não era a mesma coisa, não se sentia à vontade para conversar com o defensor do modo que se sentia à vontade para falar com os dois amigos ingleses.
– . – Louis sorriu assim que entrou na chamada. – Está me ouvindo?
– Alto e claro, doutor. – A terapeuta brincou. – Onde está a Maisie?
– Aqui comigo, estamos na clínica. – Ele explicou. – Ela foi fechar a porta e expulsar Edward e os outros da sala.
– Nossa, sinto tanta falta deles também. – Sorriu saudosa.
Antes que pudessem piscar, o rosto de Maisie invadiu a câmera, impedindo que Louis aparecesse, e enquanto gargalhava, os dois amigos brigavam por um espaço frente a câmera.
– Nem os participantes do
Big Brother brigam tanto por um momento na câmera quanto vocês. – riu.
– Isso é o resultado de conviver com Louis. – Maisie rolou os olhos, sendo empurrada pelo ombro pelo médico. – Ele é insuportável.
– , volte. Vamos fazer uma troca, você volta e Maisie fica isolada na Finlândia. – Pediu ele, unindo as mãos como quem implora.
– Desculpe, amigo. – passou a ponta da língua nos lábios. – Mas não vou querer não.
– Como assim? – Maisie franziu o cenho, saindo da brincadeira e encarando a amiga com surpresa. – Achei que você detestasse estar aí, isolada.
– Detestava. No passado. – deu de ombros, sorrindo de canto. – Acho que me acostumei.
– Eu também me acostumaria se estivesse em casa numa sexta. – Louis comentou. – Você está em casa, não está?
– Cala a boca, pateta. – Maisie o empurrou. – Isso tem cheiro de outra coisa. Olhe só o sorrisinho de bandida no rosto dela.
– Vocês estão viajando. – rolou os olhos, mas não parou de sorrir.
– Eu odeio admitir, mas acho que Maisie tem razão dessa vez. – Louis coçou o queixo.
– Anda, sua vaca. Quem é ele? – Maisie perguntou em tom de ordem.
– Não sei do que está falando, May.
– Não se faça de tonta, . – A outra estreitou o olhar. – Você está com esse sorrisinho, ficou insistindo para uma chamada de vídeo desde a semana passada. Fazendo mistério. Fale, ou eu vou descobrir pelos meus meios, e você sabe o quanto sou maluca.
– E eu vou ser obrigado a ajudar. – Louis reforçou.
– Caramba, vocês são péssimos. – A terapeuta rolou os olhos, fingindo não estar louca para compartilhar a história. – Certo, tem um cara.
– Eu sabia! – Maisie deu um tapa na mesa. – Sabia. Quem é ele?
– Eu aposto no moreno misterioso, a fera. – Louis palpitou.
Diante os olhares de expectativas dos dois amigos, apenas sorriu e assentiu com a cabeça, em silêncio.
– Eu sabia! Sabia! – Maisie gritou vitoriosa. – Você está em outro país, mas não me engana.
– Dá para ficar quieta e deixar a contar? – Louis pediu. – Insuportável.
– Tá, fala. Quero detalhes. – Pediu ela, depois de mostrar a língua para o médico.
– Não tem muito, tudo aconteceu muito rápido. – Começou a dizer. – Teve aquilo dos bombons e da pizza de abacaxi, que já contei. Depois ele fraturou o punho e precisou de mim. Cheguei lá e ele estava me esperando com algumas pessoas, durante a avaliação ele começou a falar como um desesperado, como se estivesse nervoso. – Ela sorriu com a lembrança. – Isso foi em uma sexta, eu acho, ou quarta. Depois, no sábado, teve um jogo e eu fui até a arena assistir. Para minha surpresa, ele que dias antes me ignorava, quis se sentar comigo para assistir. Daí, ele me desmascarou. Não precisou de meia hora comigo para sacar que eu não entendia nada de hockey.
– Mas e depois? Ele contou para alguém sobre você não saber? – Maisie perguntou apreensiva.
– Não. – sorriu. – Ele disse que ia guardar segredo, e se ofereceu para me ajudar, me ensinou várias coisas.
– Legal da parte dele. – Louis comentou.
– É, e aí ele começou a flertar comigo. – Contou a terapeuta. – Na verdade, antes disso, no dia que o avaliei, acho que ele começou a flertar ali. Depois, em um segundo estávamos vendo o jogo, e no segundo seguinte ele estava na minha cama.
– O que?! – Maisie gritou, enquanto Louis arregalou os olhos. – Não acredito!
– Nem eu acredito. – sorriu, dando de ombros. – Mas foi perfeito. Ele é fofo, atencioso, engraçado, inteligente, me faz rir o tempo todo.
– Na cama foi bom? – Maisie quis saber, recebendo um olhar de reprovação de Louis.
– Ele é perfeito. – riu pelo nariz. – É romântico, doce, cuidadoso, do tipo olho no olho, sabe? Mas também tem muita firmeza e...enfim, melhor deixar os detalhes para outro momento. – Ela riu outra vez, enquanto Louis rolava os olhos.
– Ele te contou porque mudou tão rápido? De alguém que te ignorava para alguém que te pegou? – Maisie quis saber.
– Ele disse que queria chamar minha atenção. Foi uma ideia boba e idiota, mas meio que funcionou, né? – A inglesa sorriu, mas os amigos não.
– Bandeira vermelha, não é, amiga? – Louis arqueou uma sobrancelha.
– Ele tem quantos anos? Treze? – Maisie também disse. – Ignorava para chamar atenção? Agora estou com raiva, porque até a nossa atenção ele chamou. Mas que idiota.
– Não, não fale assim. – tentou contornar. – Ele é uma boa pessoa, só precisa aprender a se relacionar. E ele mesmo reconhece o quão idiota isso foi.
– E você é escola? Para ensinar alguém a se relacionar? – Maisie indagou de sobrancelhas erguidas. – , não estou gostando disso. – Falou cruzando os braços sobre o peito.
– Claro, você nem mesmo me deixou contar tudo. – A terapeuta protestou. – Antes de qualquer coisa já o está julgando.
– Termine de contar então, . – Louis pediu, um pouco mais sereno.
– Como eu ia dizendo, no dia seguinte, quando acordamos aqui, ele me explicou tudo. – Narrou . – é sensível, ele tem muitas barreiras, medo de errar, é muito crítico consigo mesmo. Dá para ver que não é fácil fazer com que ele se abra, dá para ver só pelo olhar.
– Balela, . – Maisie a interrompeu.
– Ele cozinhou para mim nesse dia. – a ignorou. – Ficamos juntos o domingo todo, na segunda conversamos, na verdade durante a semana toda. Ele tem sido muito presente, muito atencioso. A gente conversou muito. Só tivemos um momento tenso, mas depois ele admitiu estar errado. foi criado nesse lado do mundo, aqui as coisas são diferentes, ele cresceu achando que ser homem é não demonstrar emoção, não falar sobre sentimentos...
– Tem uma semanas que estão juntos e já tiveram um momento tenso? – Maisie repetiu.
– Maisie, por que não olha todas as outras coisas boas que falei? – se irritou.
– Porque você está apaixonada pelo moreno misterioso, que deve ter mexido com seu bom senso. – Acusou a outra. – Qual, é?! Toda essa intensidade. Esse, ele é machista, mas é boa pessoa. É sério, ? Tudo isso te parece saudável e normal?
– Qual é o seu problema, Maisie? – sentia-se atacada, tinha expectativas de que os amigos reagissem de modo completamente diferente a maneira com que estavam reagindo. – Não consegue me ver feliz com alguém? Vivendo a minha vida aqui?
– Não acredito que você disse isso. – Maisie estreitou o olhar, com raiva.
– Ei, gente. – Louis interveio. – Qual, é? Vamos ficar brigando? Mesmo?
– Ela quem começou. – acusou, afastando o olhar da tela, e empurrando o computador para um pouco mais longe.
– ...acho que a Maisie tem razão. – O médico ponderou, recebendo um olhar incrédulo da amiga. – Eu concordo e também acho que você deve ir devagar com esse cara, mas o que me preocupa não é isso. – rolou os olhos e passou a língua pela bochecha, irritada e chocada com o posicionamento de Louis. – Você é a terapeuta do time, não é ético que se envolva com um deles.
– O que? – A fala do médico a havia desarmado.
– Independente da escolha que faça, sobre ele em sua vida pessoal, não pode desconsiderar o lado profissional. – Louis apertou os lábios, tentando usar de toda sua empatia e calma. – Mesmo que vocês não tivessem contato antes, você sabe que por estarem juntos as coisas entre vocês no trabalho podem e vão ser diferentes.
– Mas é diferente, Louis. – tentou argumentar. – Não estamos falando de uma clínica. É tudo diferente. E além disso, ele se interessou por mim no meu primeiro dia, antes que tivesse qualquer relação para ele se confundir.
– Você sabe que não é assim, tão simples.
– Ela sabe, mas não quer ver. – Maisie interrompeu. – Ela só quer ver o que quer.
– Como você consegue ser tão desagradável, Maisie. – se indignou.
– E como você consegue ser tão cega?
sentia tanta raiva que não se incomodou em responder, apenas fechou o computador e o empurrou para o mais longe possível. Queria gritar, bater em alguém, quebrar alguma coisa, xingar muito. Não acreditava que os amigos realmente tivessem agido daquela forma, sem nem tentar ouvir a história, tirando conclusões precipitadas sobre e seu relacionamento. Não esperava julgamentos, esperava acolhimento, conselhos e apoio, mas isso fora justamente o que não recebeu.
Por hora não queria pensar racionalmente sobre o posicionamento de Louis, não queria pensar, ponderar sobre estarem certos ou não, queria apenas sentir raiva. Não acreditava que os amigos nem mesmo haviam dado chance para que contasse melhor de , contasse das vezes que ele quis saber sobre sua família, ou sobre como ele era gentil, prestativo. Aparentemente, os dois não queriam olhar os dois lados da história. Não conheciam , e pelo jeito, nem tinham interesse.
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26 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamentos do Pelicans
Após a consulta, com seu novo parecer médico, voltou aos treinos, ao menos aos de resistência, equilíbrio e musculação, ou aos que não lhe fosse preciso usar as mãos. Na última semana não havia ido tanto ao centro, nem visto os jogadores, que estavam fora para uma sequência de jogos fora de casa. Apesar das boas notícias quanto a sua lesão, algo ainda o incomodava profundamente. Desde aquela fatídica terça-feira, quando lhe disse sobre a ligação de Aleks e os malditos bombons, não havia visto o amigo.
Aleks e Atte estavam ocupados demais com as coisas do time, e o central agradecia por isso, não se sentia pronto para lidar com aquele assunto. Aleks era como um irmão mais novo, e saber que, de propósito, Haatanen sugerira a sobre os bombons o havia ferido. Durante todos os dias que se passaram entre descobrir sobre Aleks, e estar frente a frente com ele, não houve um dia sequer onde não pensasse sobre como e o que diria ao ala.
Felizmente, o destino parecia concentrado em auxiliar o capitão naquela questão, após sua chegada, depois de cumprimentar todo o dia, enquanto se trocava para o treino, se viu só no vestiário. E o destino lhe surpreendera outra vez, quando Atte e Aleks entraram no espaço, rindo alto de qualquer besteira.
– Aí está ele. – Atte celebrou, aproximando-se de e se sentando perto do central.
– Ele não consegue ficar longe muito tempo, essa é a verdade. – Aleks também se aproximou mais, sorrindo.
– Qual é o seu problema? – questionou, sério, encarando o mais jovem com as sobrancelhas juntas, pegando-o desprevenido.
– Qual é? Do que tá falando, cara? – Aleks recuou, enquanto Atte assistia a cena, atento.
– Do que tô falando? – repetiu, batendo com o dedo indicador no peito de Haatanen, fazendo-o recuar dois passos. – Do que eu tô falando? Deve ter mais coisas de que não sei, não é?!
– Ei, . – Atte colocou-se entre os dois. – Calma aí.
– É melhor não se meter, Atte. – avisou, apertando os dentes.
– Você bateu a cabeça de vez? Foi? – Aleks revidou, apontando para a própria cabeça. – Qual é o seu problema?
– Meu problema é você! – O capitão tentou alcançar o ala, mas Atte o impediu, travando seu caminho.
– Dá para você dizer o que está acontecendo? – Atte pediu, aumentando o tom de voz.
– Lembra da droga dos bombons que me deu? – tinha os olhos vermelhos e o rosto começava a ficar mais corado, devido a raiva que sentia. O central empurrou Atte, afastando-se do goleiro. – Se lembra? Sabe de quem foi a ideia?
Por alguns instantes, Atte continuo encarando , como a espera de uma resposta, mas logo percebeu, e virou-se, incrédulo, na direção de Aleks.
– Ele tá enganado, não é? – Perguntou o goleiro.
– É, porque agora, tudo que aquela inglesa diz, ele acredita. – Aleks cuspiu.
– não mente para mim! – a defendeu, avançando na direção de Aleks outra vez, mas sendo impedido por Atte.
– Não que você saiba, não é? – Aleks provocou. – Waltteri também não deve achar que ela mente para ele, nem Santtu, nem qualquer outro.
– Aleks. – Atte o repreendeu.
– Vai usar seu jogo sujo, é? – indagou. – Tentando colocar a culpa nela, tentando jogar suas ideias tortas, mas nem mesmo tentou dizer que não fez.
– Não acredito que você fez isso. – O goleiro sacudiu a cabeça negativamente, falando com Aleks. – Você por acaso se esqueceu? Qual, é, cara!
– Ele não se esqueceu, ele fez de propósito. – O capitão acusou. – Você me traiu. Sabia que eu gostava dela, sabia de tudo e fez isso.
– Ela quem te deu os bombons, você escolheu comer. – Aleks acusou também, apontando para o central. – Você está tão cego por aquela garota que nem mesmo se importou em perguntar.
– O que? Vai dizer que foi um teste? Um tipo de lição de moral para eu me lembrar de não aceitar bombons de estranhos?
– Se você não estivesse tão cego, não teria comido. – Aleks argumentou.
– Eu fiquei afastado dois dias por causa da sua brincadeira idiota! – gritou, tentando diminuir a distância até Aleks, mas dessa vez o ala não recuou.
Atte já não sabia o que mais podia fazer para evitar que os dois amigos viessem a vias de fato, esforçava-se para se colocar entre Aleks e , mas os dois pareciam ter o mesmo objetivo.
– Hey! – Alguém gritou de repente, e então, mais mãos e corpos se colocaram entre e Aleks.
– Mas que droga é essa? O que vocês pensam que estão fazendo? – Petri bradou, colocando-se entre os dois, que eram separados por outros do time. – Perderam o juízo de vez? – Ninguém respondeu. – Alguém vai me dizer?
– Não foi nada. – Atte tentou amenizar. – Coisa de jogador de hockey.
– Não foi o que eu vi. Não foi o que eu ouvi lá debaixo. – Petri negou. – Ninguém vai dizer? Não vão falar nada?
e Aleks tinham o mesmo olhar, o olhar que dizia que se fossem liberados, voltariam a troca de ofensas e partiriam para cima um do outro. Os dois respiravam profundamente, ofegantes, com raiva, embora por motivos diferentes.
– Acabou o circo por aqui. – Petri ainda gritava, apontando para os dois jogadores. – As brigas são dentro do gelo! Não vou aceitar que ninguém dentro do time tenha esse comportamento. Nem mesmo você, ! Vocês dois vão para casa. Não quero ver a cara de vocês tão cedo por aqui. – Declarou o técnico.
negou com a cabeça, incrédulo, e bufou, desvencilhando-se com brutalidade dos companheiros de time, e dando as costas a todos, ainda irado, aproximando-se dos fundos do vestiário.
– O que? Por que eu? Ele quem começou! Surtando. – Aleks acusou o capitão, apontando para ele.
– Não perguntei quem começou, e quando eu perguntei o que estava acontecendo, você não disse. – Petri ainda falava alto. – Para casa, Haatanen. Dois jogos de suspensão.
– Você só pode estar brincando. – Protestou o ala. – Tudo isso porque ele surta por causa de mulher? Isso não é justo!
– E você. – Petri apontou para . – Nós vamos conversar, depois você vai para a casa, e adicione pelo menos uma semana a mais no seu afastamento.
não respondeu, apenas se afastou, aproximando-se dos armários, pegando suas coisas lá e batendo a porta do armário com raiva.
– O resto de você, voltem para o treino. – Ordenou Petri. – Você também, Tolvanen, se não quiser uma suspensão também. , você vem comigo.
Petri chamou, e o seguiu, chocando seu ombro com o de Aleks propositalmente ao sair do vestiário. O treinador o levou até sua sala, caminhando rápido pelo corredor, e quando entraram, Petri trancou a porta. se sentou em uma das cadeiras disponíveis, ainda se sentia irritado, com raiva, decepção, não era um bom momento para sermões.
– De todas as coisas que eu esperava de você, essa era a única que achei que não faria. – O tom de voz de Petri era alto, como um trovão, ou como um pai furioso que dá o maior sermão que um filho poderia ouvir. – Onde você está com a cabeça? Você é o capitão! Você é o capitão, . Brigar com Aleks? Se você não estivesse afastado de suas funções de capitão, eu te afastaria agora! É inacreditável! Inacreditável! Você não vai dizer nada?
– Não tenho nada para dizer. – respondeu de forma seca, sem parecer abalado com as palavras de Petri.
– O que Aleks disse é verdade? – O treinador indagou. – Estavam naquela cena ridícula por causa de uma mulher?
– Aleks. Era por causa do Aleks. – deixou sua postura inabalável e apontou para o técnico, mesmo se referindo ao ala. – Não é sobre qualquer mulher, é sobre o Haatanen.
– Não sei o que é pior. – Petri sacudiu a cabeça negativamente. – Esse não é o que eu conheço. Não é o que é o nosso capitão.
– Não vem com essa...– desviou o olhar, rindo sem humor.
– Não vem com essa? Não vem com essa? – O mais velho retomou sua voz de trovão. – Você está entendendo o que está acontecendo? Você, o capitão, saindo no soco com o ala da sua linha?
– Eu não saí no soco com ninguém. – Protestou o central.
– Mas não faltou muito, não é?
não respondeu.
– Waltteri vai ficar como referência do time até você voltar. – Disse Petri. – Mas você só volta como capitão, se merecer.
– Isso não é...– tentou protestar, mas foi interrompido.
– Não é justo? Bom, você tem várias semanas para refletir sobre, e depois nós conversamos sobre o que é justo ou não. – Petri finalizou. – Agora saia daqui, antes que eu faça algo de que me arrependa.
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26 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamentos do Pelicans
– Aí. – Otto chamou a atenção de Santtu e Waltteri, ao se aproximar junto a Jasper dos amigos, que se aqueciam em um canto isolado do gelo. – Só eu que achei isso tudo muito bizarro? Quer dizer, que o Aleks não é a pessoa mais agradável do time, é verdade, mas o sempre foi próximo dele.
– Amigos próximos também brigam. – Santtu deu de ombros, algo em sua intuição dizia que seguir naquele assunto não seria a coisa mais inteligente a se fazer.
– Mas daquele jeito? – Waltteri arqueou uma sobrancelha para o defensor. – Não me lembro de ver o brigando nem no gelo. Eu concordo com Otto, aquilo foi realmente sério.
– E aquela história de não falarem o motivo de estarem brigando? – Otto lembrou, apoiando o corpo ao taco. – Eu aposto que é algum segredo, alguma coisa fora do time.
– Otto, se esqueceu do que Aleks disse? – Jasper empurrou o ala de leve, pelo ombro. – Aleks disse que era por causa de alguma mulher.
– Ele disse isso? – Santtu se alarmou, enfim dando sentido a sua intuição ansiosa.
– Disse. – Merelä confirmou com um aceno. – Não ouviu?
– Nessa hora eu estava prestando atenção no . – Santtu deu de ombros, fingindo-se de desentendido. – Mas…vocês sabem de alguma coisa? Quer dizer, se ou Aleks tem alguém? – Sondou ele.
– Santtu, meu parceiro, hoje você está mais lento do que uma lesma na neve. – Jasper implicou. – Não se lembra da marca que chegou aqui? Bem no pescoço? – O goleiro apontou.
– Eu não sou fofoqueiro como vocês. – Santtu se defendeu.
– Não pode ser a mesma mulher. – Merelä negou com a cabeça, com um sorriso incrédulo nos lábios. – Lathi é pequena, mas não tanto assim.
– Será que o Aleks roubou a mulher do ? – Otto supôs.
– Quem seria tonta o suficiente para trocar o pelo Aleks? – Waltteri devolveu a questão.
– E se o Aleks tentou, mas não conseguiu? Pode ser coisa assim. – Otto pensou alto. – Porque o estava com raiva, mesmo. Santtu e eu quase não conseguimos o segurar. Talvez o Aleks fez alguma piada idiota, ou tentou alguma coisa com a garota do .
– E com isso, temos uma notícia que pode ser boa. – Jasper abraçou Waltteri pela cintura. – Você já tem sido a referência no lugar do , e com esse tipo de coisa...
– Dá para parar de agourar? – Santtu dirigiu um olhar incrédulo a Jasper, que ergueu os ombros.
– Mas ele tem razão. – Otto concordou. – Acho que Petri devia rever as linhas outra vez.
– Ele vai fazer isso, Aleks está suspenso, esqueceu? – Waltteri lembrou. – O time está desorganizado outra vez. Indiretamente por causa do .
– Diretamente, eu diria. – Otto corrigiu.
– Será que vocês não podem pelo menos fingir um pouco? – Santtu falou arqueando as sobrancelhas, afastando-se dos amigos em seguida.
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26 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Apartamento de
– É, eu sei, estou com saudades também, mãe. – dizia ao telefone, enquanto tentava entrar no apartamento equilibrando as compras e fechando a porta atrás de si. – É, eu sei, mas não posso largar tudo aqui e ir passar férias em casa. – Disse ela.
Quando enfim conseguiu colocar as sacolas de compras sobre a bancada, a campainha tocou estridente.
– Mãe, eu vou precisar desligar. Amo vocês, dê um abraço em todos, okay? – Falou ela. – Nos falamos depois. Um beijo.
A terapeuta respirou aliviada ao desligar o celular, baixando os ombros e sentindo a tensão deixar seu corpo. Nunca era fácil falar com a mãe ou com qualquer outro membro da família, as conversas eram cheias de cobranças e expectativas impossíveis de se alcançar. Mas apesar dos apesares, sentia falta deles.
deixou o celular sobre a bancada e se dirigiu até a porta, abrindo-a em seguida e encontrando , que antes de dizer qualquer coisa, avançou em sua direção, abraçando-a forte.
– Ei, ei...– sussurrou, afagando os cabelos dele. – Tudo bem. Tudo bem. Está tudo bem agora.
– Desculpe vir sem avisar...– A voz do central era abafada por conta do contato do rosto dele com os ombros de . – Eu...
– Tudo bem, . Tudo bem. – Disse ela calmamente. – Você está aqui, está em casa, comigo. Vamos entrar, tá? Quer um pouco de água, ou...
– Não, eu só quero ficar com você. – Respondeu ele, e o trouxe para dentro.
Já não tinha ideia do quanto tempo estavam na mesma posição, sentada no sofá, abraçando o corpo grande , absolutamente calado, apenas respirando profundamente. Em vários momentos, a terapeuta pensara que o capitão estivesse dormindo, mas ele logo a olhava de soslaio ou se mexia, contradizendo a impressão dela.
Depois da última ocasião, resolveu não perguntar a ele o motivo da visita fora de hora, temia que reagisse mal como da última vez. Ao mesmo tempo, se fosse o que pensava que era, sobre sua lesão, não tardaria a descobrir. De qualquer forma, não valia a pena, era melhor ficar com ele, em silêncio se fosse o que ele quisesse fazer, apenas sendo contorno para um dia ruim.
– Falei com Aleks hoje. – disse de repente.
– Falou? – estava confusa.
– Sobre os bombons.
– Ainda? Vocês já não tinham conversado sobre isso? – Ela indagou perdida na linha do tempo.
– Não, não tive tempo e não quis conversar pelo celular. – Contou ele. – Também não quis sair com ele para conversar.
– E como foi? – perguntou, beijando o lado da cabeça de .
– Ruim. – Ele riu friamente, e a inglesa o abraçou com mais força. – Ele é um idiota. Ainda não acredito que fez isso. Que foi capaz de fazer isso.
– O que ele disse? Contou da razão? – Ela quis saber.
– Não. – mentiu. – Mas ele não negou.
– Eu sinto muito por isso. – Disse . – Às vezes, com o tempo, vocês conseguem ter uma conversa mais franca.
– Petri ameaçou me tirar do lugar de capitão. – Contou de modo súbito, fazendo com que a inglesa se sobressaltasse.
– O que? Petri enlouqueceu? Por que?
– As coisas entre Aleks e eu ficaram...feias.
– Espera. – empurrou o tronco de , para que pudesse lhe olhar nos olhos. – Vocês brigaram de verdade? Está em dizendo que brigaram de verdade?
– Quase isso. – Confessou chateado. – Petri e os outros ouviram e...
– Por isso ele quer te cortar?
– Ele suspendeu Aleks por dois jogos, eu acho. – Contou , ajeitando-se no sofá e se sentando. – E disse que posso adicionar mais uma semana no meu afastamento, e que eu só volto capitão se merecer, até lá, Waltteri é a referência do time. – riu abafado, de modo frio outra vez. – Ele disse que não me reconhece mais.
– Que...– se controlou, queria dizer várias coisas, xingar Petri, xingar Aleks e todos os outros, mas sabia que não era o certo. Conhecendo o capitão pelo pouco que conhecia, sabia que aquela situação o estava dilacerando. – Contou ao Petri sobre o motivo do desentendimento de vocês?
– Não, claro que não. – voltou-se para , com sobrancelhas juntas e cenho franzido. – Não ia expor você.
– Tecnicamente, não seria expor. Eles estavam lá, e até aquele dia, não havia acontecido nada além de puras relações de trabalho. – Disse ela, e o central deu de ombros.
– Se eu falasse, Aleks estaria perdido. – falou após alguns segundos em silêncio. – O time perderia a confiança nele, muitos já não simpatizam com Hade, se soubessem disso...
– Você o está protegendo? Sério?
– Ele é meu amigo, . – ficou de pé. – O que queria que eu fizesse? Por mais que esteja com raiva e decepcionado, não vou agir assim. Nunca. – O central suspirou chateado. – Eu...eu nem sei o que tô sentindo agora. Mas você gosta dessas coisas, não é? De saber o que eu sinto, porque eu sinto e todo esse blá, blá, blá. É a sua deixa. – Ele pediu e sorriu, abrindo os braços para ele.
– Vem aqui. – Chamou e o central a obedeceu. – Fico feliz que você tenha tido essa ideia. – Falou, beijando de modo casto os lábios dele. – Por que não vamos por partes? Primeiro me conta melhor sobre a conversa com Petri e depois voltamos ao Aleks? – Sugeriu e assentiu, aninhando-se ao corpo da inglesa.
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massageava devagar o punho de , que assistia a cena como uma criança curiosa, observando os movimentos. O central ainda estava arrasado com a situação de mais cedo naquele dia, e manifestava isso em seu semblante, com o lábio inferior projetado, e os cantos da boca baixos.
– Quando sentir dor, pode colocar compressas quentes como essas que fiz para ajudar a relaxar. – disse com suavidade, apontando com o queixo para o punho do capitão. – Mas é altamente recomendado que não saia por aí dando socos. – Ela piscou, fazendo-o rir levemente, mas ainda entristecido.
– O Petri tem razão. – pensou alto, ainda encarando o movimento das mãos da inglesa. – Eu não devia ter feito aquilo. Aleks foi um idiota, é verdade, mas eu sou o capitão.
– Não seja tão duro consigo mesmo. – Lembrou , puxando a mão do russo em sua direção e beijando-lhe o dorso, sorrindo em seguida.
– Mas é a verdade, . – enfatizou arqueando as sobrancelhas grossas. – Diga como terapeuta. Diz para mim o que diria, ignore que eu tenho sentimentos e que estou aqui, bem na sua frente, me diz o que diria. – Pediu ele, ajeitando-se a cadeira.
maneou a cabeça, incerta, mas a encorajou com o olhar.
– Bem, sendo sincera...– A inglesa tossiu, tentando limpar a voz. – Eu diria que seria preciso entender a raiz disso, que vocês eram amigos e que não iam brigar assim do nada.
– Eu acho que vão fazer isso. – concordou, agitado.
– Também diria que vai ser preciso restabelecer a confiança, a grupalidade da equipe...todos precisam confiar, precisam estar bem. Não é necessário que sejam grandes amigos, mas precisam de respeito e boas relações. Não dá para correr o risco de vocês começarem uma briga entre si no gelo.
– Eu nunca brigo. – Lembrou o capitão.
– É, mas brigou dessa vez. – apertou os lábios, dirigindo a um olhar empático. – Talvez seja por isso que Petri disse não te reconhecer. – Falou e assentiu em silêncio. – E também, tem o fato de Aleks não responder mais a sua liderança depois disso.
riu pelo nariz, causando confusão a terapeuta.
– Hade não me respeitava por eu ser o capitão, ele me respeitava por gostar de mim. – Contou o central. – Ele era um tipo de fã antes de entrar no time.
– Será...será que se Waltteri viesse como capitão...será que Aleks o respeitaria? – começou a pensar.
– Sinceramente? – se inclinou sobre a mesa, apoiando os cotovelos. – Não faço ideia. Ele não se dá muito com o Merelä, se Petri for esperto, colocaria Janos Hari no meu lugar. – Disse, expirando tristemente.
– Ei, não vamos pensar assim, tá legal? – se esticou para lhe tocar o rosto. – As coisas vão se resolver. Não precisam se resolver agora, você é humano, merece esse tempo para entender tudo, mas depois, quando tudo se tranquilizar e a poeira baixar, tudo vai ficar bem. – Ela sorriu, fazendo–o sorrir também.
– Como eu vivi até hoje sem você?
Flor-de-lis: É símbolo de poder e soberania, mas indica também decepção e desengano.
27 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Apartamento de
Era sábado de manhã, um sábado frio e chuvoso que despertou em a necessidade de permanecer na cama até metade do dia. Segundo seus cálculos, a previsão do tempo e o calendário, a grande noite finlandesa se aproximava, com poucas horas de sol durante o primeiro inverno no novo lar da terapeuta. detestava a ideia de um clima ainda mais frio, sair de casa seria uma tortura, ir aos jogos a noite, pior ainda.
Era perto de meio dia quando, enquanto a inglesa comia frutas com iogurte, alguém começou a tocar o interfone. Talvez fosse , pensou, o central tinha ido embora cedo naquela manhã, mas talvez tivesse resolvido voltar e passar o resto do dia na companhia da terapeuta.
– Sim. – atendeu o interfone com um sorriso.
– Oi, é...será que posso subir? – Santtu quis saber, hesitante, e franziu o cenho, liberando sua entrada depressa. – Obrigada. – Ele disse ao ouvir o som da fechadura sendo aberta.
ajeitou os cabelos e o roupão que usava sobre o pijama velho, apressando-se para a porta, curiosa com a visita inesperada do amigo.
– Santtu, tudo bem? – Foi a primeira coisa que disse ao ver o defensor.
– É, estou bem. – Respondeu. – E você?
– Ótima, mas curiosa. – sorriu entredentes. – Aconteceu alguma coisa? Ou eu esqueci que havíamos combinado alguma coisa? – A inglesa coçou a nuca.
– Não, na verdade não aconteceu nada...quer dizer, depende do ponto de vista. – Ele inclinou a cabeça sobre o ombro enquanto indicava o sofá para que se sentassem. – Eu queria conversar com você.
– Comigo? O que aconteceu? Está me deixando nervosa, amigo. – sorriu outra vez, cruzando as pernas sobre o sofá.
– Esteve com ontem? – Santtu arqueou uma sobrancelha.
Até aquela pergunta, por mais que a postura tensa e hesitante de Santtu denunciasse a seriedade e urgência do assunto, não havia ligado a visita a . Talvez por terem conversado muito sobre o incidente na noite anterior, já considerasse o tópico superado.
– Sim. – A terapeuta expirou, baixando os ombros. – É, ele esteve aqui. Eu me esqueci desse incidente, completamente.
– Pois é. – Santtu assentiu.
– Mas me conte, por favor. – Pediu. – não me deu muitos detalhes.
– Eu não sei muito também. – Santtu ergueu os ombros. – Estávamos nos preparando para o treino e começamos a ouvir umas coisas estranhas no vestiário. Quando chegamos lá, Atte estava entre o Aleks e o , e nós tivemos que ajudar a separar os dois. – Narrou e expirou, preocupada. – Ninguém entendeu nada. O Petri quis saber o porquê de estarem brigando, Atte tentou disfarçar falando que era coisa de jogador de hockey, mas eles mesmo não responderam. Só que...– Santtu desviou o olhar e hesitou.
– Só que o que, Santtu? – insistiu.
– Quando o Petri disse que suspenderia o Aleks por dois jogos, ele acusou o de ter começado, de ter surtado por causa de uma mulher.
– Ele disse isso? – A inglesa sentiu um arrepio na coluna. – E o ?
– Não respondeu, logo em seguida o Petri dispensou todo mundo e chamou ele para uma conversa particular. – Santtu a olhou nos olhos. – Mas , o pessoal...no time, estão comentando.
– Como assim? Comentando o que? – A terapeuta endireitou as costas, preocupada.
– Primeiro, estão criando teorias sobre Aleks e , porque...sabe, o nunca brigou nem no gelo, não faz sentido brigar com o amigo no vestiário. – O defensor ergueu os ombros. – E também, sobre que mulher é essa...depois daquela marca no pescoço do ...mas eles acham que Aleks fez alguma coisa, tentou alguma coisa com a garota do . – Justificou ele.
– Eu nem sei o que pensar. – esfregou os olhos e puxou os joelhos para perto do peito, abraçando as pernas.
– O Aleks...ele fez alguma coisa com você? – Santtu fez a pergunta que ressoava em sua cabeça desde o dia anterior.
– O que? Não. – negou rápido. – Ele fez com o .
– Hã? Isso nem faz sentido. – Ele riu abafado.
– Se lembra do afastamento do ? Da alergia, alguns dias antes dele se machucar? – Ela lembrou e ele assentiu. – Pois, eu tentei apaziguar as coisas entre nós, porque havíamos tido um pequeno desentendimento antes, levei para ele duas coisas, pizza de abacaxi e bombons de coco. – Contou a inglesa.
– Nossa...– Santtu expirou. – Mas odeia pizza de abacaxi, e é alérgico a coco, mortalmente. Cortaram nossos bolinhos, nossos chocolates, tudo que tem coco não entra mais naquele centro. – Listou Santtu.
– Pois é, mas eu não sabia disso, nunca me contaram...– hesitou, mordendo o lábio. – Mas agora você consegue imaginar a surpresa do quando descobriu que quem me sugeriu bombom de coco e a pizza foi Aleks Haatanen.
Os olhos de Santtu se arregalaram e ele se sobressaltou no sofá.
– O que? Não é possível! Ele queria matar o ?
– No dia que e eu nos desentendemos, ele veio até mim no banheiro feminino, disse que queria ajudar, mostrar que não era um babaca como parecia. Me disse, com todas as letras, que duas coisas deixavam ele feliz, bombons de coco e pizza de abacaxi.
– Isso...você deve ter se enganado...não é possível que alguém faria isso de propósito...ainda mais...
– Foi por isso que eles brigaram. – completou.
– Por que não falou? Por que ele não disse?
– Ele não quis. – ergueu os ombros. – Disse que todos já tinham uma relação complexa com Aleks, se soubessem disso...
– Mas é claro! Se ele é capaz de fazer isso com o melhor amigo, o que poderia fazer com os outros? – Santtu ficou de pé, injuriado.
– Por favor, você não pode contar para ninguém sobre isso. – pediu, colocando-se de pé também. – Nem para Waltteri, Jay e Otto. Por favor.
– O devia contar. – Ele sentenciou. – Mas tá, pode confiar em mim. – Garantiu depois de um longo suspiro. – Mas, se eles soubessem, amenizaria o lado do .
– Como assim? Do que está falando? – quis saber, sentando-se ao lado o defensor que voltava a ocupar um lugar no sofá.
– Tem comentários, . – Santtu apertou os lábios. – Sobre o time estar desorganizado outra vez e com dois desfalques, graças a ele.
– Mas isso é injusto. – se irritou.
– É, mas é a verdade. – Santtu a olhou. – Ninguém sabe das circunstâncias, se soubessem, ficariam do lado do , até o Petri ficaria. Mas enquanto isso, só estão discutindo sobre as possibilidades que tem.
– Eu também acho que ele devia falar, mas...não é minha escolha. – balançou a cabeça negativamente. – Eles ainda... ainda considera ele um amigo, tem um tipo de lealdade.
– é um cara legal. – Santtu concordou, recostando-se de modo mais relaxado no sofá.
– Você acha que...Aleks sabe sobre e eu?
– Isso você devia perguntar ao , , não a mim. – Santtu a olhou. – Eu só sei que eu sei, e que não contei para mais ninguém. – O defensor dirigiu o olhar para a TV desligada da inglesa. – Mas, talvez fosse bom vocês tomarem mais cuidado. – Disse depois de alguns instantes em silêncio. – Não confio nele, depois disso que me contou...acho que alguém que faz isso com o melhor amigo, não pensaria muito em entregar vocês.
– Não quero nem pensar no que aconteceria se isso acontecesse. – suspirou, e Santtu assentiu, apertando os lábios.
Em súbito, as palavras de Maisie e Louis voltaram a cabeça de , rodando como um espiral, temperadas com as últimas notícias vindas da Isku Arena. olhou para o jogador, sentado ao seu lado, em silêncio, e pensou, se não com ele, com quem falaria? Santtu era um dos que tinha de mais próximo no quesito amigo, e era também o único, além de Maisie e Louis, que sabia de sua situação.
– Posso fazer uma pergunta?
– Manda aí. – Santtu respondeu, sorrindo de lado.
– Acha que estou errada em ficar com ? Por causa do time, nossa relação de trabalho e tudo mais? – Perguntou ansiosa.
Santtu inclinou a cabeça sobre o ombro, hesitante, olhou para a amiga, depois desviou o olhar e permaneceu em silêncio por mais tempo do que podia suportar.
– Eu sei que a resposta vai ser ruim, mas diga logo. – implorou. – Por favor.
– Ah, eu...– Ele hesitou outra vez, ajeitando a postura no sofá. – Eu não sou a melhor pessoa para dizer isso...– Santtu respirou fundo. – É meio estranho...quer dizer...eu não sei se ficaria à vontade com você se estivesse apaixonado por você. Mas você e estão fazendo isso bem, vocês parecem estar dando conta, fazendo funcionar.
– Não é uma boa ideia, não é? – apertou os lábios, Santtu abriu a boca duas vezes, mas não disse nada. – Que droga. Estraguei tudo. – Se lamentou a inglesa.
– Não, não...não fique assim. – O defensor tentou confortá-la. – Pense, você não podia impedir que isso acontecesse...você não tem culpa disso.
– É, mas nós...– maneou a cabeça. – Podíamos ter evitado.
– Tá, mas, quem liga? Vocês estão felizes, parece estar feliz...quem se importa? – Santtu tentou animá-la. – E não se culpe, tá legal? A briga lá não foi por sua causa ou por causa do relacionamento de vocês.
– Está certo sobre a segunda parte, mas quanto a primeira...não é tão fácil assim. – soprou, sendo abraçada de lado pelo amigo e repousando a cabeça em seu peito.
– E se a gente só ignorasse tudo? Vamos só ignorar. – Propôs. – Vamos ignorar os problemas, voltar a fazer fofoca sobre o time e comer alguma coisa doce, hein?
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29 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamentos do Pelicans
Quando retornou ao trabalho naquela segunda, era esperada para uma reunião de equipe na sala de Lauri. Não tinha boas impressões sobre aquele encontro, sabia que tratariam do acontecido da última sexta-feira, de , e já não sabia se conseguiria ser imparcial como deveria ser. Sabia que Louis e Maisie tinham razão, até mesmo Santtu, um leigo no que dizia respeito ao código de ética de sua profissão conseguia enxergar os problemas de se relacionar com o capitão do time. Mas o que podia fazer, agora já era tarde, mesmo se terminasse com , o estrago já estaria feito e nunca conseguiria construir uma relação boa o bastante no trabalho.
Petri e Lauri faziam considerações intermináveis, cansativas e entediantes, enquanto aguardavam a chegada de Jakkos, que por obra do destino estava atrasado.
– Desculpem, peço desculpas. – O fisioterapeuta entrou esbaforido sala a dentro. – Tive um problema com o carro.
– Estávamos só te esperando. – Lauri assentiu, cruzando os dedos sobre a mesa. – Acho que já podemos começar então, certo?
– Claro. – Ava assentiu e Petri não se opôs.
– Bom, sem rodeios, acho que todos sabem dos últimos acontecimentos no time. – Começou o executivo. – Petri me procurou na sexta, preocupado com o andamento das coisas, e eu sugeri que fizéssemos essa reunião para tentar pensar, juntos, em saídas inteligentes para os novos impasses.
– Sim, eu...– Petri hesitou, não por não saber o que dizer, mas sim por parecer querer escolher as palavras certas, exatas, para descrever o que pensava. – Tivemos esse problema na sexta-feira com Haatanen e , e eu estou um pouco preocupado com os impactos disso no time e para os dois jogadores.
– Me impressiona, não costuma ter esse tipo de comportamento. – Jakkos começou a dizer. – Fiquei chocado quando soube, na verdade. Não é comum vê-lo nem em brigas no gelo, no vestiário, com Aleks...
– Sim, de fato. – Lauri assentiu.
– Durante a manhã, quando estávamos com o médico, tratando sobre a lesão, ele pareceu um pouco disperso. – Jakkos contou, coçando o queixo, como se refletisse sobre algo. – Tentei descobrir o motivo e ele disse que eram questões pessoais.
– De que tipo? – Petri arqueou uma sobrancelha.
– Ele não quis dizer, é meio escorregadio quando se trata dessas coisas. – Jakkos deu de ombros.
– Ele não é escorregadio, ele não gosta de deixar que um influencie no outro. – defendeu o capitão, sem perceber o que estava fazendo. – Ele não escorrega, ele não fala e ponto. É diferente.
– Como tem sido...como está sua relação com ele, ? – Lauri a olhou, curioso.
– Boa, eu acho. – tencionou os ombros. – Assim como com os outros do time.
– E o que acha disso tudo? – O executivo quis saber, e recebeu três pares de olhos atentos sobre si.
– Bem, eu...– A terapeuta tossiu, tentando limpar a voz, não queria gaguejar, ou passar vergonha. – Acho que se foi algo realmente fora do comum...digo, se comportar assim, talvez algo fora do comum tenha acontecido. E eu não vejo como um jogador que perca a paciência facilmente, ou que seja...enfim, vocês me entendem. O que eu quero dizer é, que se ele e Aleks...algo importante deve ter acontecido.
– É o que eu acho também. – Petri se recostou a cadeira, pensativo. – Não o reconheci quando entrei no vestiário. Mas depois, enquanto Aleks tentava se justificar, ele ficou em silêncio, como sempre. O que eu acho mais irritante. – O treinador confessou, sorrindo.
– Alguma ideia sobre o que pode ter causado o desentendimento entre eles, ? – Lauri tornou a perguntar.
– Como disse, não fala sobre sua vida pessoal. – Ela sentenciou.
– Aleks mencionou algo, sobre uma mulher. – Petri lembrou. – Acusou de ter começado e que era sobre uma mulher.
– Eu acho que pode ter algo com isso. – Jakkos assentiu. – Quando conversamos na sexta, perguntei se tinha alguma coisa a ver com a pessoa com quem ele estava se relacionando.
– Por que isso teria alguma coisa a ver? – Lauri quis saber, confuso.
– Há algumas semanas o chegou ao treino com uma marca no pescoço, o boato durou uns dois dias. – Jakkos lembrou. – Tentei sondar sobre, aconselhar...falar sobre ele ser jovem, famoso, solteiro, que pode e deve aproveitar a vida, mas não permitir se perder por isso.
– não está se perdendo. – o interrompeu enfática, atraindo o olhar dos três homens.
– Foi exatamente o que ele disse. – Jakkos sorriu de canto.
– Você parece ter uma opinião com bases fortes do , . – Lauri observou.
– Assim como de todos os outros jogadores, Lauri. – Disse ela.
– E o que acha do Aleks? – Petri quis saber, analisando a terapeuta.
– Aleks é...complexo. – Assumiu, enquanto lutava internamente sobre contar ou não o que tinha na cabeça.
– Pode ser mais clara? – Pediu o executivo.
– Ele tem uma personalidade que ainda não desvendei completamente, e pelo que soube, pelos outros jogadores, não tem uma relação muito boa fora do gelo com todos do time. Mas não sei exatamente o que desejam que eu fale. – Assumiu.
– Por que os dois teriam brigado? – Petri formulou a pergunta. – Sendo franco, entre os atletas está correndo um boato sobre os dois e essa garota misteriosa. – Petri deu de ombros. – Os atletas comentam.
– Não sei nada sobre garotas misteriosas. – mentiu, e torceu para que ninguém na sala fosse dotado do mesmo dom que tinha de perceber quando ela mentia. – Mas acho que não perderia a calma com Aleks por algo que não fosse importante ou sério. Atte e sempre protegeram o Haatanen, são amigos dele, não vejo como algo banal pudesse abalar isso. Eu, pessoalmente, diria que seria mais efetivo conversar com os dois do que ficarmos aqui criando teorias.
Nenhum dos três a respondeu.
– Talvez devesse conversar com eles então, . – Lauri indicou, fazendo a terapeuta inglesa arregalar os olhos.
– E-eu? Por que eu?
– Bom, se mesmo depois do incidente com os bombons o continuou tendo uma boa relação com você, suponho que vocês tenham um bom vínculo.
– O incidente...– repetiu, tonta.
– Até hoje é difícil para mim acreditar nisso. – Jakkos riu pelo nariz. – Não sabia mesmo sobre a alergia dele?
– Não. – respondeu num fio de voz.
Adoraria dizer que o responsável por aquela ideia idiota era Aleks, mas o rosto de lhe vinha à mente a todo momento, não podia ser desleal a ele. E se fizesse, talvez não estaria fazendo pela razão certa, mas sim por vingança, assumindo as dores de , e aquilo era justamente o oposto ao que devia fazer.
– Lauri, eu acho que você ou Petri deviam conversar com os dois. – Falou, mesmo sabendo que colocava sua cabeça a prêmio com aquelas palavras. – Vocês têm uma relação muito mais longa com os dois, e uma relação diferente a que eu e Jakkos temos. Eu posso tentar contornar, tentar amenizar o clima com o time, mas acho que deviam tentar entender isso, vocês. Não eu ou Jakkos.
– Eu continuo achando que eles se sentiriam mais à vontade com você. – Lauri devolveu.
– Estou aqui há pouco tempo, mas já aprendi que Aleks não respeita ninguém além das pessoas com quem ele realmente possuí um vínculo, e me reservo o direito de pensar que não sou uma delas; também, aprendi que não se abre ou conta sobre qualquer coisa, a não ser que seja extremamente necessário, e nesse caso, eu também não sou a melhor pessoa.
Lauri assentiu pensativo, em silêncio.
– O que acha que consegue fazer com o time? – Petri quis saber. – Sobre o que você disse.
– Bem, você disse que não reconheceu o ...eu não estou reconhecendo o time. – Assumiu. – Pelo que tenho escutado por aí...não me parece o grupo unido que conheci quando cheguei. Acho que tem algumas coisas que podem ser feitas quanto a isso.
– Eles estão precisando disso, tem razão. – Petri concordou e Lauri e Jakkos assentiram em silêncio.
– A propósito, já sabe como o time será organizado para os jogos da semana? – sondou.
– Já tenho um esquema, devo apresentar para eles hoje. – Assentiu o técnico. – Vamos ter novos tempos aqui, ao menos por enquanto.
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29 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
Estava confortada.
Entre tudo que podia ter dito naquela reunião, todas as falas por impulso e movidas a vingança, ou o afeto por , tudo fora escondido sob a casca de
apenas terapeuta ocupacional do time. Estava feliz, aquilo sinalizava que talvez fosse possível levar aquela espécie de vida dupla, dentro e fora dos muros da Isku Arena. Depois da reunião usaria o tempo para se organizar, pensar no que fazer quanto ao time e o novo problema de união dos jogadores.
Tinha tido várias aulas na faculdade sobre grupos, grupalidade e todo o resto, por isso entendia bem o que estava acontecendo entre os atletas, só não sabia ainda, como exatamente, faria para resolver. Previa muito trabalho pela frente, pois somado a isso, teria toda a recuperação , que agora a veria de forma intensiva. Ainda precisava construir o plano de tratamento do capitão, avalia-lo e cuidar de todos os procedimentos iniciais. Já se sentia cansada.
– , que bom que te encontrei. – Petri surgiu ao seu lado de repente, quase correndo pelo corredor para alcança-la.
– Posso ajudar? – Perguntou, analisando-o com cuidado.
Talvez estivesse, de modo inconsciente, imitando o modo reativo e defensivo de . Temia que o treinador, por alguma razão desconhecida, tivesse capturado qualquer coisa nas entrelinhas das falas de , e estivesse ali para confrontá-la.
– É sobre . – Ele falou e prendeu a respiração. – Sei que ali, com Lauri...enfim, queria saber o que realmente acha, só entre nós. – O treinador segredou.
– Como assim? O que mais quer saber?
– Na verdade, queria sua opinião sobre uma coisa. – Ele assumiu, colocando as mãos nos bolsos, enquanto caminhava ao lado da terapeuta. – Sei que tem mais proximidade com alguns dos atletas.
sentiu o coração disparar.
– Santtu, Merelä, Otto, Patrikainen...– Ele listou. – São amigos e tudo mais. – Petri ergueu os ombros. – E sei também que tem uma relação boa, no geral, com o resto do time, com também.
– Sim. – Assentiu, tentando disfarçar o quão armada estava.
– Eu queria sua opinião sobre o capitão. – Petri parou de andar, obrigando a fazer o mesmo. – Não sobre o capitão , mas sobre o posto de capitão.
– Está pensando em tirar o ? – apertou os dentes.
– Confesso que estou um pouco confuso quanto a isso. – Assumiu. – Não sei como o time vai reagir a essa situação, e somando ao afastamento dele, que está levando mais tempo do que devia...
– Está levando o tempo necessário, Petri. – ergueu o queixo, a mandíbula estava tensionada.
– É, eu sei...parece que agora o tratamento vai andar realmente. – O treinador assentiu. – Mas eu...não sei...a postura dele me pegou de surpresa, e teve aquele jogo que ele foi embora antes do fim.
o interrompeu com uma risada.
– Por favor, Petri, isso é mesmo sério? Está considerando afastar o do lugar de capitão porque ele foi embora mais cedo do primeiro jogo depois de se lesionar?
– São uma soma de fatores, . – O treinador perdeu um pouco de seu novo gracioso bom humor.
– Claro, o fato de ele ter se lesionado, somado a ele ter ido embora mais cedo de um jogo que estava assistindo da arquibancada, e depois, ter brigado com um dos melhores amigos, realmente. – Ironizou. – Petri, ele é um ser humano, e apesar de eu não conseguir enxergar os motivos que você vê nessas coisas, ninguém deve ser punido por reagir a qualquer coisa.
– Você sabe de alguma coisa, não é? – Ele alfinetou, analisando a inglesa, e recuou. – Sabe. Está falando como se soubesse, desde a reunião.
– Eu só conheço Aleks o suficiente para entender que alguém sinta vontade de socar a cara dele. – Respondeu entredentes.
– Conhece bem, aparentemente. – Petri continuou. – Ele já te incomodou alguma vez?
– Petri, não sei se notou, mas eu sou uma estrangeira, mulher, trabalhando no meio de vários homens, em maioria machistas, todos vocês já me incomodaram em algum momento. – Falou sem pensar, e fora vez do técnico de recuar.
– Nossa...eu não... – Ele piscou duas vezes, rápido. – Bem, eu...peço desculpas pela minha parte. – Assumiu o finlandês, tocando o peito.
– Desculpas aceitas. – assentiu, ainda com a expressão dura de antes.
– Vou para o treino...nós nos falamos. – Combinou Petri, assentiu com a cabeça e ele a deixou, em silêncio.
respirou fundo, havia prendido a respiração de modo inconsciente por tanto tempo que sentia o peito doer. Sentia as mãos tremerem também, por causa da adrenalina do momento, encarar Petri daquele jeito, mesmo que para muitos fosse algo simples, era um feito grande para a terapeuta inglesa.
Enquanto tentava se acalmar e lembrar o que estava prestes a fazer, ouviu um assovio. olhou para os lados, buscando a fonte do barulho, mas se percebeu sozinha no corredor.
– Aqui em cima.
Uma voz conhecida chamou e ergueu o olhar, encontrando , que devia ter assistido a toda cena de um dos corredores do andar de cima, com vista para o andar de baixo. assentiu e resolveu ir de encontro ao central.
A Isku Arena, na área do centro de treinamentos, lembrava um grande shopping, com corredores que davam acessos as varandas de onde se podia ver o que acontecia no andar debaixo, ou no de cima. Era confuso, pareciam as escadas encantadas de
Hogwarts, mudando de lugar o tempo todo, formando seu próprio labirinto.
– Oi, jogador. – cumprimentou, sorrindo de canto de modo tímido.
– Jogador? – projetou o lábio inferior. – Gostei desse. – Ele sorriu e a abraçou rapidamente. – Odeio ser a pessoa a fazer isso, mas para quem disse que fico diferente quando falo com Petri, você pareceu bem na defensiva ali. – O jogador apontou, apoiando os antebraços e olhando para baixo, o imitou, permitindo que sua pele tocasse a do jogador.
– Acho que estou convivendo muito com você. – Disse ela e riu abafado. – Ouviu o que a gente falou?
– Não muito, você é muito discreta. – Ele sussurrou próximo ao ouvido de , propositalmente, enfatizando a última palavra.
sorriu, mas não quis dizer mais nada.
– Posso saber do que falavam ou é segredo? – sondou, analisando a postura pensativa e vigilante da terapeuta.
– É segredo. – Brincou. – Eles devem querer conversar com você hoje. – Avisou e assentiu com a cabeça. – Vão perguntar o motivo de tudo aquilo, como eu já disse que iriam. – A inglesa aprumou a coluna e girou o corpo, queria olhar nos olhos do capitão ao falar. – E , seria importante você dizer o que aconteceu, o motivo de tudo...porque vão te perguntar.
– Não sei, não...– Ele desconversou, voltando a olhar para o andar de baixo.
– Eles vão querer saber porque estavam brigando, você não vai poder manter seu tratamento de silêncio. – Alertou .
– Por que não? Posso dizer que não quero falar sobre o assunto, que é pessoal. – Ele negou, unindo as sobrancelhas.
– Por que é melhor para você que fale. – tocou o ombro do central, tentando atrair a atenção dele. – Você vai ter que dizer alguma coisa, e o Aleks provavelmente vai falar.
– É com isso que está preocupada? Com ele falar? – franziu o cenho, um pouco surpreso.
– Não é por isso, eu estou preocupada com você, unicamente. Mas não nego que a possibilidade de ele contar sobre nós me assusta. – assumiu e riu incrédulo. – O que me leva a outra questão importante. Por que o Aleks sabe sobre nós? E por que ele deu a entender que sabia no dia da confusão?
– Do que está falando? Eu não disse nada disso. – se defendeu.
– O fato de você não ter me contado é o próximo tópico dessa conversa, mas primeiro responda as minhas perguntas. – Ordenou, cruzando os braços sobre o peito.
– Não tem nada a ver. – sorriu sem humor, também cruzou os braços sobre o peito e apoiou o quadril a proteção da pequena varanda, dando as costas para o andar de baixo.
– Não acredito que você está fazendo isso. – se irritou.
– Não estou fazendo nada. – Ele respondeu, erguendo os ombros.
– Seu amigo quase te matou, quase contou para todo mundo que estávamos juntos e você ainda vai defende-lo? – A inglesa questionou, chocada. – Ele nem devia estar sabendo sobre isso, em primeiro lugar. Não acredito que está defendendo o Aleks.
– Você está exagerando. – rolou os olhos.
– Eu? Exagerando? – colocou-se à frente de , obrigando-o a olhar em seus olhos e colocou o dedo indicador no peito do central. – Certo, amigo. Continue defendendo Aleks, continue fingindo não ver o que aconteceu, vai acabar como ele, com o time não confiando em você e perdendo seu lugar de capitão. Mas siga assim, pelo menos vai ter seu amigo.
falou sem se importar com os efeitos que sua fala teria no central, e o deixou sem esperar por sua reação. Estava cheia de raiva, irada com aquela solidariedade masculina idiota, com o fato de como os homens pareciam cegos quando se tratava de seus amigos babacas.
Tinha vontade de socar , dizer a ele tudo que estava em jogo por se negar a falar a verdade, e talvez assim ele entendesse o quão absurda sua postura era.
Tulipas rosas: Tulipas rosas estão ligadas a várias situações, uma delas é a ideia de felicidade perfeita. Por isso, elas são usadas em momentos em que as pessoas desejam coisas boas às outras.
29 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
entrou no vestiário a passos firmes, estava afastado e provavelmente não seria uma boa ideia frequentar os treinos físicos depois da última sexta, mas não conseguiu ficar em casa naquela manhã. Precisava ir a arena, precisava conversar com Petri, dizer que ele tinha razão. Parte importante do papel de liderança era assumir erro e voltar atrás, pedir desculpas, e precisava fazer isso com o time, não por Aleks, pelo time. Entendia a situação delicada em que havia se colocado, e não ia esperar por semanas de reflexão, como sugerira Petri, para só depois voltar a Isku Arena.
Mas a tempestade tinha entrado em seu caminho e anuviado seus pensamentos outra vez. Felizmente o vestiário estava livre, só uma pessoa sentada perto dos armários, mexendo em seu celular. estava tão concentrado em sua própria irritação que não reconheceu que era Atte quem estava ali.
– A não. – O goleiro balançou a cabeça, ficando de pé e se aproximando do amigo. – Dá última vez que você estava irritado no vestiário, tive que separar uma briga. Qual é o problema dessa vez?
– Mulheres, Atte. – respondeu irritado, sem nem mesmo olhar para o amigo, jogando suas roupas de qualquer jeito no armário. – Mulheres. Mulheres malucas. Elas são doidas, e a minha, aparentemente, é a líder delas.
– O que? Desde quando
você sabe quem se tornou a
sua mulher? – O goleiro riu, apoiando-se ao armário do lado.
– Não enche, Atte. – rolou os olhos, batendo a porta do armário com força. – Não hoje, não agora, não nunca.
– Qual é? – Atte coçou o queixo, analisando o amigo. – Vai querer brigar comigo também?
não respondeu, apenas olhou para o goleiro com o semblante duro, em completo silêncio por dez segundos, até que Atte ergueu as mãos, se rendendo.
– Tá bem, não está mais aqui quem falou. – Disse, sentando-se perto de onde estava de pé. – Mas, aproveitando que estamos só nós dois aqui...você podia me contar melhor essa história do Aleks.
– Não tem o que contar, é o que eu disse. – bufou. – Ele disse a que seria uma ótima ideia e que eu ia amar. – O capitão deu de ombros, agitando uma das mãos na direção do amigo. – Mas não quero falar disso, eu estou muito, muito estressado para falar do Aleks agora, Atte.
– Estressado com a ? – Sussurrou o loiro.
– Por que mulheres sempre querem que tudo seja feito do jeito delas? – Ele indagou, de modo quase retórico.
– Me faço essa pergunta todos os dias. – Uma voz surgiu de repente entre os dois, atraindo seus olhares para a porta.
– Petri. – expirou derrotado.
– Não achei que fosse ver sua cara por aqui nos próximos dias. – Falou o treinador, entrando no vestiário e se juntando aos dois atletas.
– É, mas eu não aguentaria ficar em casa. – deu de ombros, voltando a seu humor estressado de antes.
– Posso saber a razão de tanto estresse? – Petri cruzou os braços, analisando o central. – Pelo visto o problema com mulher não foi só um blefe do Haatanen.
– Foi sim. Isso é mentira. – O central apontou, corrigindo o técnico. – Meu problema com Aleks é entre ele e eu. Não tem nada a ver com mulher nenhuma. – Garantiu irritado. – O meu problema de hoje, sim, é uma mulher, mas como vê, não estou brigando com ninguém. – abriu os braços, como se mostrasse o espaço livre ao seu redor e sorriu com sarcasmo, fazendo com que o goleiro e o treinador trocassem olhares.
– Foi uma briga feia...– Petri soprou, passando o polegar pelo lábio inferior.
– Não foi uma briga feia, porque eu nem tive chance de falar nada. – começou a falar. – Ela é maluca, é sério, completamente. E tem mais, tudo tem que ser do jeito dela. – Disse enquanto andava de um lado para o outro no vestiário, gesticulando e rindo com incredulidade e nervosismo. – Absolutamente tudo. Eu preciso falar dos meus sentimentos, preciso me abrir sobre como me sinto, preciso ter essas conversas longas e demoradas, intermináveis sobre o relacionamento, preciso fazer o que ela acha certo. Sempre. Sempre o que
ela acha certo. Acha que ela me perguntou sobre o que eu achava correto? – O capitão tocou o próprio peito. – Não, ela não quis saber.
– Mulheres são assim. – Petri ergueu um ombro, se divertindo com a reação do central. – A vida não é tão boa se não tivermos uma mulher para obedecer.
– Eu não quero obedecer.
– Então não tenha uma mulher. – O técnico riu, acompanhado por Atte. – , você é jovem, mas logo vai aprender. Existem muitas mulheres por aí, no seu caso, são realmente muitas, mas o que difere as que realmente se importam com você das que só estão com você por estar, é justamente isso.
– Serem malucas? Controladoras? Irritantes? Porque se for assim, a minha é a chefe delas. – Falou , expirando e sentando-se ao lado de Atte.
– Ela implicou com as roupas, com seu jeito, com seu carro ou com seus amigos? – Sondou o mais velho.
– A última opção. – Respondeu ele.
– Bom, pode ser que ela tenha razão. – Petri começou a dizer, mas Atte o dirigiu um olhar de censura. – Ou pode ser que vocês se casem e daqui há cinquenta anos ela ainda continue implicando com eles. – O técnico riu alto, apertando o ombro de Atte, que também riu, ignorando a careta emburrada do amigo capitão.
– E se talvez ela tiver razão? – perguntou depois de algum tempo em silêncio, seu tom era hesitante, baixo, como se não quisesse admitir considerar aquela possibilidade.
– Bom, e aí que você precisa pensar, ser inteligente e analisar. Mulheres tem faro para algumas coisas, isso é fato.
– Sou obrigado a concordar. – Atte sorriu, esticando as pernas.
– Mas, ela estando certa ou não, você, quando sair daqui, vai comprar flores, chocolate, e ir até ela. – O treinador aconselhou, apertando o ombro do central. – Vai dizer que ela tem toda razão, que sente muito e que vai fazer o que ela quer.
– Mas eu não quero fazer.
– Veja...aceite o conselho de alguém casado há tanto tempo quanto você tem de vida...leve as flores. – Petri piscou. – Não vale a pena. Se ela te mandar pular, pergunte de que altura...é assim que funciona. A última palavra sempre será sim, senhora.
– Isso é passividade demais. – sorriu, mas não estava achando graça. – Eu sou...
– Não importa o quão homem você seja, , não é sobre isso. – Tornou a falar o treinador. – Se você quer manter uma mulher só, esse é o segredo.
analisou o mais velho com olhos estreitos, não faria aquilo, podia até tentar conversar com , o que em sua opinião já seria demais. Mas flores, bombons e assumir estar errado? Ser submisso? Não, não seria. Não mesmo.
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29 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
Durante os dias comuns, quando não era véspera de jogo ou coisa do tipo, a arena era o lugar mais silencioso e vazio em Lathi. Vez ou outra algum funcionário da manutenção aparecia para realizar algum conserto ou verificar se tudo estava em ordem, e no resto do tempo, um silêncio quase sepulcral, que causava eco no lugar.
sabia disso, por isso escolheu um dos últimos lugares nas arquibancadas, oposto a área VIP, assentos perdidos, que quase nunca eram utilizados por serem atrás de uma pilastra de sustentação do teto. Lá a inglesa estava escondida o suficiente para que ninguém a encontrasse, pensava, e poderia sentir raiva a vontade. Era melhor ficar ali do que correr o risco de cruzar com Aleks ou , sentia vontade de enforcar os dois naquele momento. Aleks por ser um idiota, e por ser cabeça dura, teimoso e completamente cego e ingênuo. Estava irritada, chateada, preocupada e triste, mas todo aquele embolado de sentimentos se manifestavam através de um mau-humor quase patológico.
– De quem está se escondendo, . – Waltteri Merelä questionou antes mesmo de alcançar o alto das arquibancadas.
– De todo mundo. – Bufou a inglesa. – Você não está ajudando.
Waltteri riu abafado, enfim alcançando a terapeuta.
– Estava te procurando, já faz dias que não nos vemos ou nos falamos direito. – Falou o ala, sentando-se do lado de .
– É, tudo aqui virou uma confusão. – Assentiu ela, olhando para os próprios pés.
– Você soube, né? – O ala expirou, baixando os ombros e relaxando ao lado da terapeuta. – Mas tem uma coisa boa nisso tudo. Quer dizer, eu acho boa, pelo menos. – Ele corrigiu e o olhou, curiosa. – Petri me quer como central na primeira linha. – Waltteri sorriu. – E como referência enquanto o não volta.
– Uau...isso é...– tentou controlar seus verdadeiros sentimentos. – É muito bom, Waltt. E é muito merecido. Era uma questão de tempo até você ter destaque.
– É, eu...eu não queria que fosse desse jeito, mas...– Merelä deu de ombros.
– Quais foram as outras mudanças do Petri? – Sondou a inglesa.
– Ele já tinha mudado o Janos Hari de lugar quando ficou fora, agora Miika e eu estamos na primeira linha, com o resto do pessoal. Ele também colocou o Nordgren e Tukiainen para a segunda linha, nos nossos lugares.
– O que você achou? Vai funcionar? – Perguntou.
– Eu estou animado. – Waltteri sorriu, e se sentiu culpada por não conseguir se sentir alegre pela notícia quanto o amigo merecia. – Vou ficar junto com Santtu e Miika, já tenho entrosamento com eles...estou realmente empolgado. – Merelä sorriu como um príncipe de filme.
– Você vai brilhar. – sorriu também, segurando a mão do jogador. – Vai brilhar muito.
Waltteri não disse nada, apenas a encarou em silêncio, com os bonitos e alegres olhos azuis e com toda sua beleza. O jogador não fez qualquer movimento, apenas olhava nos olhos da inglesa, que depois de algum tempo, sentiu certo desconforto naquele silêncio estranho.
– Central, né...– riu fraco, voltando seu olhar para o rinque, afastando-se um pouco de Waltteri, que riu sem graça e coçou a nuca.
– É, pois é. – Assentiu ele. – Mas você...o que está fazendo aqui sozinha? Estava se escondendo de quem?
– Eu...– suspirou. – Eu estava muito brava, então tentei achar um lugar para ficar escondida, não descontar em ninguém e ficar em paz.
– Desculpa, acabei com seus planos. – O loiro com modos de príncipe sorriu.
– Não, não...eu gosto de ficar com você. – acertou Merelä com um soco leve no ombro, que fez o finlandês sorrir. – Estava fugindo das pessoas, mas não de você.
– O que te chateou? – Ele quis saber, analisando a terapeuta.
– Tudo bem se eu não quiser falar disso? – mordeu o lábio inferior. – É que...eu só não...
– Não esquenta. – Waltteri sorriu e em seguida segurou uma das mãos da inglesa. – Não precisamos falar disso se não quiser, mas se por acaso quiser...quando quiser...é só falar, eu fico feliz em escutar. – Disse e sorriu grata.
Os dois permaneceram por mais algum tempo em silêncio, encarando o vazio e o silêncio confortável.
– Tive uma ideia. – Waltteri anunciou.
Sob o olhar divertido de , o loiro tirou as chaves do bolso e com a ponta de uma delas começou a riscar a pintura da pilastra a frente deles. se inclinou, tentando ver o que Merelä escrevia, mas só conseguiu ler depois que ele soprou o pó de tinta das palavras, anunciando o fim do trabalho.
T O
sorriu, inclinando a cabeça sobre o ombro.
– Agora você tem seu cantinho de ódio, marcado e registrado. – Disse ele, sorrindo grande.
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29 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Apartamento de
🎵 Dê play na música aqui, e se necessário coloque para repetir – Taylor Swift – The Way I Loved You (Taylor's Version)🎵
Não, não seria o submisso que só faz qualquer coisa se a namorada permitir, não seria, de jeito nenhum. Não cederia, não pediria desculpas e se viessem a conversar, não admitira que errou, porque, afinal, não estava errado, não havia erro de sua parte. Seu amigo o havia prejudicado, fato, mas eles resolveriam entre si, no momento oportuno, não era preciso que ou qualquer outra pessoa opinasse ou se metesse.
Era o que o central pensava, mesmo estando na porta de com um buquê de rosas, uma caixa de chocolates e uma pelúcia idiota. Ansioso e nervoso, esperando que a inglesa abrisse de uma vez e viesse conversar com ele. bateu outra vez, de modo ansioso e sem parar, até ouvir o som da fechadura do outro lado.
– Eu. Sinto. Muito. – Disse ele pausadamente, assim que abriu a porta.
– Flores? É sério? – cruzou os braços sobre o peito e analisou o jogador de cima a baixo, torcendo os lábios. – Isso não vai funcionar.
– Eu trouxe chocolate também. – trouxe a caixa dourada ao alcance dos olhos da terapeuta. – Sem coco dessa vez.
– O que você espera exatamente que eu faça diante disso? Me atire em você? Pule no seu colo?
– Sim. – respondeu sem pensar, recebendo um olhar incrédulo de . – Não. Não. Quero dizer, não. Claro que não. – Ele riu nervosamente. – Eu só quero fazer as pazes. Só isso. – Expirou, oferecendo a ela o buquê. – E tem mais. – puxou de dentro do casaco, escondido, um pinguim de pelúcia.
– Quantos anos você tem? Dezesseis? – o encarou com expressão de quem não podia acreditar no que via.
– Eu achei fofo. – Defendeu o capitão, encarando o pinguim. – Só quero ficar bem com você, okay? Você tem razão, sobre tudo. Não quero mais brigar.
– Tenho? – o analisou de olhos estreitos.
– Tem. – assentiu, ouvindo ressoar em sua cabeça todas as vezes que havia jurado a si mesmo, no percurso da floricultura até a casa da terapeuta inglesa, nunca dizer aquelas palavras.
– Entra logo. – Ordenou ela, fazendo-o sorrir internamente, embora, por fora, ainda ostentasse a feição de cachorro abandonado.
, que já segurava as flores, as colocou sobre a bancada e pegou de os chocolates, abrindo a caixa sem cerimônia e comendo um, enquanto segurava o pinguim como quem segura um bebê.
– Então é isso? Estamos bem? – Ele perguntou.
– Ainda não sei. – Fingiu .
– Como assim não sabe? – uniu as sobrancelhas, confuso. – ...eu disse que sinto muito. – Falou baixo, aproximando-se da inglesa, abraçando-a por trás com a mão livre. – O que mais preciso fazer?
– Isso está muito suspeito. – girou o corpo para encará-lo, ainda mastigando um bombom. – Você é teimoso, não é muito de voltar atrás com o que diz, além de não ser nem um pouco flexível. E quer vir aqui com flores, chocolate e dizer que eu estou certa?
– Nossa, você me conhece mesmo. – Comentou surpreso.
– Não sei se caio nesse seu jogo, você com esse pinguim bobo...
– Tá, chega de encenação. – expirou cansado, afastando-se de , que naquela altura tinha uma interrogação na testa. – Eu odeio estar aqui fazendo essa palhaçada toda, e não acho que você esteja totalmente certa, e não acho que eu esteja errado. E quer dizer...você nem perguntou a minha opinião sobre o assunto. – Argumentou do modo impaciente e agitado, como havia feito quando junto a Atte e Petri. – Eu odeio ter vindo aqui para pedir desculpas de uma coisa que não acho que devia pedir desculpas, mas veja só onde eu vim parar. Com esse buquê brega – o capitão apontou para as flores sobre o balcão – esse chocolate e esse pinguim horrível. – trouxe o pinguim para mais perto dos olhos. – Não, ele não é horrível, é só desajeitado. – Disse por fim, como quem pede desculpas a pelúcia, dando de ombros.
riu.
– Por que está rindo? – franziu o cenho.
– Porque você é um idiota, . – Respondeu ela e diminuiu a distância entre eles. – Mas esse sim é o que eu conheço. – Falou, colocando os braços ao redor do pescoço do capitão, que sorriu ainda incerto.
– E isso significa...– estreitou o olhar e virou o rosto para o lado, sutilmente, como quem teme o que vai ouvir.
– Significa que você é um turrão, teimoso, cabeça dura, um idiota...– listou, aproximando os lábios dos do central. – Mas é assim que gosto de você.
Fora vez de sorrir e depois beijá-la.
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29 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Apartamento de
– Qual é o problema aqui? Eles não fazem bichinhos de pelúcia mais bonitinhos na Finlândia? – zombou, trazendo o pinguim de pelúcia para mais perto dos olhos, para que pudesse analisar melhor seus detalhes.
– Você não vai ofender o Niko desse jeito. – protestou com a boca cheia de chocolate, puxando a pelúcia para perto de si e aninhando-o junto a seu peito nu.
– Desde quando você deu um nome para ele? – A inglesa fitou o jogador pasma, apoiando o corpo sobre os cotovelos.
– Acabei de fazer isso. – respondeu sem olhá-la. – Ele é fofo. Tem até um óculos falso. – Ele sorriu, mostrando com o dedo indicador a pequena armação falsa sobre o bico alaranjado do pinguim de quinze centímetros.
– Meu Deus... – A inglesa riu, deixando o peso cair no colchão. – Quantos anos você tem?
– Você não pode ser tão amarga. – se virou na cama, apoiando a cabeça com uma mão e com a outra, ainda parcialmente imobilizada, mostrando a pelúcia a , que a tomou nas mãos, em seguida, colocando-o sobre a mesa de cabeceira. – Toma, coma um bombom. Quem sabe assim você adoça esse humor azedo. – Brincou ele, levando um chocolate a boca da terapeuta.
– Sem coco dessa vez. – riu abafado, mastigando o bombom enquanto também se colocava de lado, abraçando o corpo desnudo de e beijando seu ombro.
– Sem. – sorriu, deixando que seu peso caísse sobre a terapeuta, enquanto a beijava o pescoço.
– Já disse que você é homem mais lindo da Finlândia? – Ela elogiou, passeando as mãos pelas costas largas do central, sentindo a temperatura morna de sua pele, e o peso do corpo dele sobre o seu, e como aquilo lhe causava uma boa sensação.
– Bem que dizem que a paixão cega as pessoas. – Ele respondeu com voz abafada.
– Por baixo dessa casca de durão inatingível e toda essa marra e orgulho...– tornou a falar.
– Eu não sou orgulhoso. – protestou, erguendo o rosto e sorrindo.
não conseguiu continuar seu raciocínio. Sentir o peso de sobre si, ver o capitão desarmado, sendo o que ela tanto amava, um pouco menino, doce e engraçado, os cabelos despenteados, o olhar doce e o sorriso lindo...não conseguia pensar em mais nada.
– O que foi? Por que está me olhando assim? – ainda sorria.
– Só estou... – Sentia uma gigantesca vontade de dizer estar apaixonada. Melhor, de dizer que o amava, que amava aquele momento, que amava o cheiro dele, o calor e tudo sobre ele. Mas as palavras de Maisie, Louis e Santtu a atingiram como um banho de água fria, junto a ideia de que se falasse, podia assustá-lo, apesar de já saber que tanto quanto ela estava apaixonada, ele também estava. – Só estava pensando sobre o porquê da gente se desentender tanto. – Mentiu.
expirou e apertou os lábios num sorriso contido.
– Você já disse tudo mais cedo. – Lembrou. – Eu sou um turrão, teimoso, cabeça dura, um idiota...– Citou, enfiando o rosto na curva do pescoço de outra vez, estava sem jeito demais para encará-la.
– Então eu estou certa? – A inglesa riu, fazendo cócegas no central. – Não, não é assim...a gente...a gente precisa começar a escolher pelo que brigar.
– Nem acho que a gente brigue tanto. – ergueu o rosto outra vez, apoiando o peso do corpo com uma mão, ao lado da cabeça de . – Comparando com meus outros relacionamentos, a gente briga pouco. Na verdade, nem são brigas, são discordâncias.
– Quantos relacionamentos você já teve? – quis saber, curiosa.
estreitou o olhar e riu, deixando-se cair deitado ao lado dela.
– Ah, qual é? Qual é o problema em me contar? – se inclinou sobre ele, o sacudindo levemente, enquanto o central se divertia com a curiosidade dela.
– Você quer mesmo saber? Não vai ficar pilhada, com ciúmes, nem nada disso? – Ele arqueou uma sobrancelha, segurando uma das mãos de junto ao peito. A inglesa assentiu. – Tive uns três. Namoro, oficialmente, um.
– E como foram? – Tornou a perguntar .
– Como foram? – repetiu, sorrindo enquanto fingia se espreguiçar. – Ah...não sei. O meu namoro foi meio estranho...no início era bom, estávamos na escola e tudo mais...sabe, essa coisa de namoro na escola...
– Você devia ser aquele cara popular, a estrela do time que namora a garota mais bonita do colégio. – provocou.
– É, era assim. – Ele concordou e o encarou chocada. – O que? Eu não vou mentir. – riu, beijando a mão da inglesa que segurava junto ao peito. – A gente era assim, até depois, com a formatura, o contrato com o time principal.
– Como acabou?
encarou a terapeuta em silêncio por alguns segundos, pensando se devia ou não abrir aquela porta, contar ou não sobre tudo que havia impactado naquele evento.
– Eu mudei. – Resolveu dizer por fim. – Ela também, eu acho. Não tinha mais muito tempo para dedicar ao relacionamento. Só não deu certo.
– Eu odeio a objetividade de vocês homens. – rolou os olhos.
– Quer uma prova de que tô mesmo disposto a ser um novo homem? – riu, puxando a terapeuta para junto de si, beijando-lhe o topo da cabeça.
– Eu nem sabia que esse processo estava rolando, mas manda a ver. – Ela riu, beijando o peito desnudo do capitão.
– Vou te dizer uma coisa. – Decidiu ele. – Nessa época, muita coisa aconteceu e acabou impactando em tudo na minha vida, inclusive no namoro. Eu realmente era apaixonado por ela, pensava que a gente se casaria até. Mas nada saiu como eu previ e antes de completar dois anos com o time, o namoro acabou. E é só o que eu quero dizer sobre. Assim, você não fica tanto no escuro e eu não fico sendo dissecado por você. – Ele completou, como se aquela fosse a melhor ideia em séculos.
– Primeiro. – ergueu o rosto, encarando-o. – Me incomoda que se sinta assim comigo. Eu não quero ser essa pessoa. Segundo, eu achei fofo a saída que encontrou e como se preocupou em arranjar uma saída que contemplasse você e eu.
– Relaxe. – sorriu, afagando o ombro da terapeuta. – Eu sei que você gosta disso, de falar sobre as coisas, conversar em detalhes sobre tudo. Eu não sou assim. Talvez haja por aí um príncipe encantado de cabelo loiro que ame sentar com você e falar sobre cada detalhe do passado.
– Mas você não é assim. – completou e o viu assentir. – Não me interessam príncipes encantados loiros e que amem falar do passado. – Negou ela, deitando-se sobre o peito do capitão. – Eu já tenho tudo que preciso bem aqui.
Os dois ficaram em silêncio por algum tempo, pensando sobre o diálogo que haviam tido. ponderava e se culpava por ter sido invasiva, colocando em situações desconfortáveis quase sempre, dissecando-o, como ele mesmo dissera. pensava sobre como era bom que ela quisesse ele e apenas ele no momento, e pensava sobre estar com vontade de ir ao banheiro, mas não queria tirá-la de cima de seu peito. Pensava também em formas de quebrar o silêncio, embora não fosse um silêncio desconfortável.
– As outras duas são histórias vergonhosas mais boas, quer ouvir? – Perguntou por fim, fazendo sorrir e depois concordar com a cabeça. – A primeira foi logo depois do término. Não logo depois, mas quando eu enfim resolvi sair com alguém de novo. Tinha um cara no time, Brandon, era um central da segunda linha, bem experiente e bom de briga. – riu. – Eu apresentei ela ao time em uma semana, na semana seguinte o Brandon foi para o
Jukurit e levou minha namorada junto. Só soube quando vi o vídeo da apresentação dele e ela estava do lado.
– Meu Deus. – gargalhou. – Você foi traído em rede nacional?
– Foi. – apertou os lábios, assentindo com a cabeça. – Hoje eu até acho graça nisso, mas na época, quando apareci por isso em todos os jornais e páginas de fofoca, minha mãe teve uma síncope. – Contou sorrindo.
– Deve ter sido péssimo. – riu, compadecendo-se dele.
– Bem-vinda a vida de um jogador de hockey conhecido. – Ele ironizou, maneado a cabeça e erguendo as sobrancelhas. – Pense bem onde está se metendo, .
– E a segunda? – A inglesa ainda ria da primeira situação.
– A segunda foi um pouco mais recente, mas mesmo assim já tem muito tempo. – Contou. – Era uma confusão. Nunca sabia se estávamos bem ou não, se ela ia aparecer em casa surtando por ciúmes de qualquer coisa ou não. Nunca mais a vi depois que terminamos. – Ele narrou, expirando aliviado.
– Mas você se envolveu com outras pessoas, não é? Tipo, lances casuais... no meio disso tudo. – Sondou ela.
– Eu sou na minha, mas não estou morto. – riu, fazendo com que risse também.
– A primeira que me contou, a da época da escola. Foi dela que você mais gostou, não é? – quis saber, acariciando os cabelos de e ele assentiu em silêncio.
– Mas e você?
– Eu o que?
– Seus antigos relacionamentos. Tudo que eu sei é que houve um ex que te fez assistir
O Senhor dos Anéis. – lembrou, afagando as costas de .
– Não tem muito para saber. – Ela deu de ombro, mas torceu o lábio, desconfiado.
– Quantas pessoas já namorou, ? – Insistiu ele, e foi a vez da inglesa de esconder o rosto, voltando a se deitar sobre o peito dele.
– Nunca namorei. Só tive uns envolvimentos com pessoas. – Ela deu de ombros outra vez.
– Para de me enrolar. – apertou a inglesa junto a si, fazendo-a rir.
– É sério, não foram namoros...foi só...– suspirou. – Teve um cara, ele era inteligente e engraçado...esse que você gosta de lembrar. Durou uns cinco meses e ele nunca quis me apresentar para ninguém, dizia que não estava pronto. Antes dele, um professor de história, mas talvez ele fosse compreensivo demais. – Contou e riu nasalado. – E teve um cara da faculdade, mas só ficamos umas vezes. Tinha um que eu realmente achei que fosse dar certo, ele me fazia rir...era bom...– Contou, lembrando-se da situação. – Fico me perguntando como ele deve estar hoje em dia. Às vezes até penso em falar com ele.
– Falar com ele pra quê? – arqueou uma sobrancelha, de cara fechada.
– Para saber como ele está. – Respondeu a inglesa, erguendo o rosto. – Colocar a conversa em dia.
– Não vejo necessidade. – Resmungou.
inclinou a cabeça sobre o ombro, percebendo a expressão não tão alegre do central.
– Está com ciúmes? – se sentou.
– Claro que sim. – Declarou ele, comendo mais um bombom.
– Você não queria falar das suas porque eu sentiria ciúmes, mas na verdade, você é quem está. – A inglesa apontou, surpresa, divertindo-se com a situação e a expressão amarrada de .
– Eu não sou uma pessoa ciumenta, mas...acho que me arrependi de perguntar dos seus exs. – Disse ele, cruzando os braços. – Não quero mais falar disso, nunca mais.
– , que coisa boba. – riu.
– Eu sei que é. – Ele também riu. – Mas eu prefiro não lembrar que você já gostou de outras pessoas. Que já comeu bombons na cama depois de fazer sexo e as pazes com outra pessoa. – tinha um sorriso ladino no rosto e enquanto dizia, se aproximava de , forçando a deitar-se outra vez.
– Mas eu realmente nunca fiz isso. – Contou ela, analisando a própria memória.
– Quer dizer que eu estou em vantagem. – sorriu grande, abraçando a terapeuta e a puxando pra junto de si.
– Eu diria...
power play. – piscou sorrindo.
– Minha garota...– O capitão sorriu grande.
❄❄❄
30 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
A terça-feira havia começado com um bom café da manhã e sexo. Era uma realidade com a qual pensava que podia se acostumar facilmente. Às vezes se flagrava imaginando como seria morar com , acordar ao lado dela todos os dias, tomar café da manhã e fazer todas as coisas comuns e bobas que faziam quando estavam juntos. Mas logo afastava a ideia da cabeça, tudo era muito novo, muito recente, muito incerto, não era hora de ter aquele tipo de pensamento.
Mas mesmo lutando contra, pensava. E por pensar muito, sentia-se extremamente grato a Petri pelo conselho da tarde anterior. Talvez tivesse sido a melhor ideia em anos para resolver conflitos. não estava verdadeiramente chateada, mas o capitão não tinha parâmetros para essa situação, já que dá última vez que haviam se desentendido, acabaram juntos deitados no gelo. Talvez ela fosse o que chamam de compreensiva, e era mesmo, doce, compreensiva, amável, carinhosa e uma outra centena de coisas. E pensar sobre essas coisas fazia questionar se estava sendo o suficiente, se suas atitudes e postura eram o suficiente para merecê-la. Queria ser o homem que merecia ter, e não se envergonhava em admitir isso a si mesmo, não mais.
Se fosse preciso se abrir um pouco mais, ou começar a falar dos seus sentimentos, talvez não fosse tão ruim, na verdade era bem possível. era alguém que valia a pena. Em seus outros relacionamentos costumava adotar uma postura mais inflexível, nunca disposto a mudar, mas por ...pela inglesa inteligente e cheia de personalidade, estava disposto a qualquer coisa. O que o animava e assustava na mesma medida.
– , já aqui? – Petri saudou o central ao vê-lo na sala de espera, perto da sala de Lauri.
– Eu estava perto, acabei chegando mais cedo. – Respondeu o central, ficando de pé para cumprimentar o treinador com um abraço rápido.
– O bom humor, a mesma roupa de ontem, estava mais perto...– Petri torceu os lábios num sorriso enquanto o analisava. – A tática das flores deu certo?
– Mais que certo. – O central riu abafado, voltando a se sentar acompanhado por Petri. – Mas acho que não como você previu.
– Como assim? Ela não gostou das flores?
– Ela gostou... – sorriu, apoiando o cotovelo nos joelhos. – Mas quando cheguei lá pedindo desculpas, dizendo que estava errado e que sentia muito, ela desconfiou. Disse que aquele não era o que conhecia, admitindo tão fácil estar errado.
– E você? – O outro homem sorriu.
– Falei a verdade. – Deu de ombros. – Funcionou, e ela amou a tentativa.
Petri chacoalhou pelo ombro, sorrindo.
– Você gosta mesmo dessa? – O treinador perguntou e respirou fundo, depois sorriu.
– Gosto. – Admitiu, enfim, em voz alta.
– Isso pode fazer bem, dependendo de como levar. – O treinador começou a dizer.
– Petri... – endireitou a coluna, limpando a garganta antes de continuar. – O Jakkos já veio com esse discurso sobre me perder, não é...
– Se você tivesse me deixado terminar, antes de interromper, saberia que o que eu ia dizer não tem nada a ver com as bobagens do Jakkos. – Petri disse sério e assentiu, se calando. – Não acho que você seja do tipo que se perde por causa dessas coisas. Uma vida pessoal estável e equilibrada, com pessoas que gostam e apoiam você...já vi muitos jogadores se reerguerem e reconquistarem carreiras depois de se organizarem na vida pessoal. Mas pode ser o contrário também. Então, seja inteligente, como sei que é.
– Eu acho que comecei a mudar, depois que... você sabe. – Confessou , sorrindo envergonhado.
– É, até demonstrou ter sentimentos. – Petri riu alto, atraindo um olhar confuso do capitão. – Os últimos acontecimentos. – Justificou ele, e em seguida inclinou-se para frente, para que pudesse falar mais baixo. – Cá entre nós, uma conversa que tive com a equipe me levou a perceber isso.
– Isso o que? – imitou o treinador.
– Que você é humano também. – O mais velho apertou os lábios num sorriso contido. – Você consegue separar tão bem o pessoal do profissional, agir com a cabeça e não com emoção, que as vezes me esqueço que você só é um garoto.
– Garoto é um pouco demais, não acha? – maneou a cabeça e Petri sorriu.
– Certo.
– Você tinha razão sobre tudo que falou na sexta. – admitiu, encarando o chão. – Não devia ter reagido daquela maneira. Como capitão, eu... fiquei muito envergonhado. Você tinha razão, só queria que soubesse.
– Bom. – Petri assentiu satisfeito. – Será que eu pelo menos posso saber o motivo de tudo aquilo?
respirou fundo outra vez.
– Não foi nada de trabalho ou no time, foi uma coisa pessoal. – Contou, tomando cuidado em omitir as partes certas. – Aleks é... quer dizer, já não sei mais... mas... Aleks...
– Eu sei da relação de vocês. – Disse Petri, ao notar a hesitação no mais jovem. – Imagino que deve ter sido algo sério para te afetar daquele jeito. É sobre sua garota? Seja sincero. Esse é o momento que você precisar ser. – Petri pediu o olhando nos olhos.
– Não, é só sobre ele e eu. – expirou frustrado e um pouco na defensiva.
– Sabe, como treinador, as vezes é muito mais complicado lidar com o interpessoal do que com táticas de jogo e treinamentos. – O mais velho sorriu, recostando-se relaxado à cadeira. – E é mais difícil porque vocês não escondem de mim a verdade sobre jogadas e passes. Eu tenho um tabuleiro mais complexo do que o de xadrez, com peças que eu acho que conheço, mas que acabo percebendo não saber nada a respeito. Não sei os pontos fortes ou fracos, não sei como explorar, até onde posso ir ou não. – Expirou contemplativo. – Há quanto tempo estamos juntos no time?
– Seis anos. – Respondeu , sentindo o que estava por vir.
– Já foram muitos altos e baixos. – Falou Petri.
– Eu não quero que isso...isso é uma coisa pessoal, entre ele e eu. – começou a dizer, sentindo-se derrotado. – Sabe como é a relação do Aleks com o resto do time, não quero que fique pior.
– Já pensou na sua relação com o resto do time? – O treinador indagou e o central uniu as sobrancelhas. – A liderança tem esse fardo. A coroa é pesada.
– ... – suspirou, encarando o chão, lembrando-se da discussão com a inglesa no dia anterior, quando disse sobre perder a confiança do time.
– O que ela tem a ver? – Petri arqueou uma sobrancelha.
– Não. Nada. – O central negou rápido. – Só me lembrei de uma conversa que tivemos sobre isso.
– Ela me fez ver pontos importantes sobre essa situação, sobre você. – Contou Petri. – Acho que foi uma ótima aquisição para o time.
– Sobre mim?
– É, ela te defendeu. – Petri sorriu. – Me lembrou que você, apesar de ser o capitão de gelo, é uma pessoa com sentimentos. Ela sabe de tudo, não sabe? – Questionou Petri, pegando o central desprevenido. – Ela disse que não quando perguntei, mas se você conversou com ela e ela falou sobre esse assunto com você, devia saber. – Constatou ele. – Tudo faz sentido agora. A postura dela faz sentido agora.
– Petri, não sei do que exatamente você está falando, mas a não tem nada a ver com isso. – se justificou, temeroso.
– Não, não disse que tenha... mas porque está falando isso?
não respondeu, voltou a encarar a pequena sala de espera, vazia.
– Ela tem alguma coisa com isso? Algo que não estão me contando?
respirou fundo, talvez precisasse falar, não podia correr o risco de deixar alguém como Petri com desconfianças a respeito de . E pelo discurso do treinador, não aceitaria menos que a verdade, e se ele resolvesse buscar por mais que a verdade sobre o maldito incidente dos bombons, poderia descobrir outros segredos.
– Se lembra daquele dia, quando a trouxe pizza e bombons de coco? – Quis saber , e o treinador assentiu depois de rolar os olhos. – Recentemente descobri quem sugeriu aquilo a .
– Como assim? Alguém sugeriu? – Petri se ajeitou na cadeira.
– Ela deixou escapar sem querer, eu acho. – Mentiu. – A gente teve uns problemas no início, eu não... não a respeitava muito. – Mentiu outra vez, torcendo para que o outro acreditasse, e quando Petri assentiu e arqueou as sobrancelhas em sinal de concordância, descobriu que sua mentira tinha colado. – Naquela ocasião ela estava tentando, mais uma vez, construir uma relação legal comigo.
– Adiante, sem preliminares. – Ordenou Petri.
– Acontece que ela não sabia sobre minha alergia idiota, e alguém do time disse a ela que eu amava bombons de coco.
– A saga do bombom de coco. – O outro rolou os olhos. – Quem do time? Ela te contou?
– Aleks.
– Não, não faz sentido. – Petri chacoalhou a cabeça, sorrindo incrédulo. – Quando chegou aqui, nem mesmo sabia pronunciar seus nomes, ela deve ter se enganado.
– Não acho. – Negou o capitão. – E é por isso que a sabe, e por isso ela não contou. – suspirou derrotado. – Eu não deixei. Não queria e não quero que o time saiba. Se isso acontecer a situação do Aleks aqui pode ficar muito ruim.
– Continua sem fazer sentido para mim. – O treinador negou com a cabeça, aproximando-se mais do jogador. – Vocês não são amigos? Por que ele faria isso?
– Não tenho essa resposta, ele não quis dizer. – sorriu triste.
– Eu quero ouvir isso da boca dele.
– Será que isso...será que poderíamos manter só entre nós?
– Como você pretende justificar ao time o que aconteceu? – Indagou o mais velho, que não parecia concordar com a ideia de . – Porque vão ter comentários.
– Eu sei. Vou dar um jeito, pensar em alguma coisa. Mas não quero que isso se espalhe, por favor.
– não te incentivou a guardar esse segredo, não é? – Petri o analisou com olhos estreitos.
– Não, ela queria que eu contasse a você.
– Menos mal. – Petri ficou de pé. – É bom que tenha confiança para compartilhar certas coisas com ela, mas existem coisas que são muito maiores. Como essa. – Expirou ele, pesadamente. – Posso dizer que entendo sua reação, mas não justifica. E você pode começar a pensar sobre como vai lidar com isso e com o time.
– É só isso? É só o que vai dizer? – também ficou de pé. – E o Aleks? Vai conversar com ele?
– Por que não vai treinar junto dos outros e me deixa com meu trabalho. – Petri acenou com a cabeça uma vez, em seguida começou a se afastar. – .
– Sim. – respondeu atento.
– Você é um bom amigo. – Disse e se afastou nos corredores.
Rosas amarelas: Populares e amadas, porém, as amarelas podem representar ciúmes.
30 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
Os dias começavam infinitamente melhores quando acordava ao lado de . Uma rotina normal de casal, dormir juntos, enrolar para sair da cama depois de ouvirem o despertador, dividirem o banheiro enquanto um escovava os dentes e o outro tomava banho, tomar café da manhã juntos e depois irem juntos para o trabalho. Era tudo tão perfeito e confortável, cada conversa, cada olhar cúmplice, cada risada e piada interna, cada detalhe do corpo, jeito e personalidade do jogador que ela conhecia. Tudo levava a um caminho, estava completamente apaixonada por , já não era mais possível voltar atrás. Era ele.
Era fácil viver em Lathi se estivesse por perto, poderia passar o resto da vida naquela cidade pacífica e de natureza exuberante, longe do caos da Birmingham, longe de grandes cidades e todo sua loucura. refletia sobre enquanto organizava as evoluções dos atletas que atenderia naquele dia, se dedicando um pouco mais a de , seu mais novo caso prioridade devido a urgência do retorno do capitão ao time.
– Precisamos conversar. – Petri com voz de trovão quando entrou na sala de repente, fechando a porta atrás de si.
– Meu Deus... – se sobressaltou, colocando uma mão sobre o peito, inclinando-se para frente. – Caramba, Petri, você me assustou.
– Quando ia me contar que você e Aleks estavam metidos no incidente dos bombons? – Questionou ele, sem rodeios.
sequer moveu um músculo.
Internamente, seus neurônios tentavam compreender a fala do técnico. Então havia contado? Ou talvez Aleks...ou talvez uma outra terceira pessoa. Mas Petri estava ali indagando sobre ela e Aleks, e não sobre o relacionamento da inglesa com o central, sendo assim, ele possivelmente ainda não sabia sobre. abriu a boca, mas não emitiu nenhum som, em seguida, passou as mãos pelo cabelo, e se apoiou a bancada, tentando organizar os pensamentos.
– quem te contou? – Perguntou tentando fazer com que a voz soasse firme.
– Quero ouvir sua versão dos fatos. – Falou ele em tom de ordem.
– Por favor, , poderia compartilhar comigo o que sabe sobre o caso? – ironizou, cruzando os braços sobre o peito, irritada com a postura do mais velho. – Não vou responder qualquer coisa se continuar usando esse tom comigo, e se não me autorizar.
– Ele já me contou, não precisa de autorização. – Petri se aproximou um pouco mais, ainda usando o mesmo tom firme e severo, olhando a terapeuta de cima.
– Existe uma coisa chamada sigilo, não sei se já ouviu falar disso na vida. – não hesitou, nem se afastou com a proximidade do técnico, erguendo o queixo para encará-lo, sem vacilar.
– Se Aleks sugeriu a você, não está protegido por sigilo e você não tem sigilo comigo.
– E aí voltamos ao primeiro ponto, não vou responder qualquer coisa enquanto estiver usando este tom comigo. – Ela sentenciou com firmeza, sem hesitação.
O treinador a olhou nos olhos, estreitando o olhar, estava a centímetros de distância de , como dois cães raivosos se encarando. Petri, no instante seguinte, expirou derrotado e ergueu as mãos, rendido.
– Certo, tem razão. Tem razão. – Ele cedeu. – Peço desculpas. É que essa revelação me tirou do eixo. – Expirou ele, como uma panela de pressão que tenta liberar a pressão para não explodir.
– Se tirou a você, imagine o que pode ter feito ao . – ergueu o queixo vitoriosa, sorrindo de canto.
– Você tem razão outra vez. – Concordou Petri. – Mas devia ter me dito tudo isso quando conversamos.
– Eu não podia antes, nem posso agora. Isso é um assunto que só diz respeito ao , não posso passar por cima da vontade dele. – se justificou.
Petri a direcionou um olhar que sinalizava que não concordava com nenhuma palavra, mas que sabia que se insistisse em contrariar a terapeuta, perderia.
– O que acha disso tudo? – Petri quis saber, depois de um longo silêncio e de encarar o chão por mais tempo do que seria educado.
– Ainda não sei. – deu de ombros. –Preciso esperar que Aleks volte, talvez conversar com ele, ou ver como o grupo vai reagir. Ainda não sei. Só sei que a vida pessoal dos dois não pode interferir aqui.
– Nisso você tem razão. – Petri concordou com uma risada debochada.
– Não, Petri. – A terapeuta negou, cruzando os braços sobre o peito e se aproximando dele. – Não estou falando o que você acha que estou falando. Os dois não precisam de uma lição sobre separar as coisas, sobre deixarem os problemas pessoais do lado de fora antes de entrarem. Quero dizer que Aleks e não podem ser punidos, além do que já foram, por questões pessoais, da relação deles. Você já os afastou, é suficiente.
– Se isso for verdade, Aleks tentou envenenar o . – Petri enfatizou, aproximando-se mais de .
– Não, Petri, está exagerando. – Discordou a inglesa, incrédula, já que ela mesmo pessoalmente não concordava com o que estava prestes a dizer. – Não sabemos o que levou Aleks a fazer isso, mas isso é entre os dois. O que você quer fazer? Obrigar a chamar a polícia? Demitir Aleks? Expor ele perante o time e depois o amarrar em um poste e queimar numa fogueira? Existem limites que você, enquanto técnico, e eu, enquanto terapeuta ocupacional, não podemos ultrapassar.
– Você não pode estar falando sério...– Petri negou com a cabeça, chocado. –Não está irritada, chocada com isso?
– Estou, e por isso aconselhei o a falar sobre isso quando fossem conversar. – Disse ela. – Mas existem limites. Eu não gosto do que vou falar, mas talvez seja hora de ouvir e observar, não de punir e julgar.
– Está falando isso só pelo Aleks, ou por causa da nossa conversa, sobre o seguir como capitão? – Petri sondou depois de alguns instantes em um silencio revoltado.
– Estou dizendo isso sobre os dois. – A inglesa cruzou os braços sobre o peito. –Você veio aqui querendo minha opinião, estou dando, faça com ela o que quiser. Mas eu espero que a considere antes de tomar qualquer decisão.
– Desde que você passe a ser honesta sobre o que sabe ou não sobre os meus atletas.
– Desde que você me faça perguntas que eu possa responder, e me trate com o mínimo de respeito, eu respondo como prazer. – sentenciou. – Agora, se não tiver mais algum assunto sobre o qual você queira gritar comigo ou tentar me colocar contra a parede...
– Conversamos depois. – Assentiu ele, ainda irritado, e acenou com a cabeça, vendo-o deixar a sala em silêncio.
❄❄❄
30 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
– E aí?! – Fora a primeira coisa que Santtu disse ao encontrar nos corredores, cumprimentando o central com um aperto de mãos e um abraço lateral.
– Hey. – sorriu.
– Vai treinar com a gente hoje? – Quis saber o defensor. – Aleks está aí também.
– É, acho que sim, Petri me mandou treinar. – O capitão deu de ombros, depois ajeitou a postura, apoiando os pés no chão com firmeza e cruzou os braços sobre o peito. – Como estão as coisas no time?
– Indo. – Santtu respondeu, apoiando-se de lado a parede do corredor. – Petri mudou as linhas, no jogo de hoje vamos ver o que vai ser. Waltteri e Miika estão comigo na primeira linha.
– E sobre sexta? – indagou sem rodeios, analisando a reação de Santtu, que olhou para o central um pouco hesitante.
– Ah...– Santtu coçou a nuca, sem saber o que devia dizer. – Sendo sincero? – assentiu. – Tá todo mundo meio desconfiado, tentando supor o que pode ter acontecido, criando teorias. Eu...– Santtu estava prestes a contar sobre a conversa com , perguntar ao capitão sobre o incidente com Aleks e o chocolate, mas achou melhor evitar. – Eu não estou muito por dentro.
– Que droga. – murmurou, relaxando a postura e apoiando as costas a mesma parede em que Santtu se apoiava.
– É uma situação complicada. – O defensor tentou argumentar. – Ninguém entendeu nada. É como se vocês tivessem que separar uma briga entre eu e Waltteri. E para ser sincero, eu ajudei a segurar você, e não foi muito fácil.
– Eu sei, foi mal. – expirou chateado. –Mas isso é uma coisa pessoal também, entre Aleks e eu. Ninguém precisa se meter.
– Pode ser, mas aconteceu no vestiário, não é?
Fez-se silêncio enquanto tentava encontrar uma saída para seu dilema, e Santtu revisitava a conversa no sábado, com , tentando selecionar o que seria bom ou não mencionar.
– Escuta, tem uma coisa que ficou na minha cabeça desde sexta. – O defensor começou a dizer depois de ajeitar a postura e se afastar um pouco da parede, mais alerta. – O que o Aleks disse sobre ser por causa de uma mulher. O time todo está apostando nisso e criando teorias, mas você e eu, e aparentemente o Aleks, e aposto que o Atte também, sabemos do que se trata. – O defensor sussurrou. – Não estou preocupado com você e Aleks, mas não gostei de ver a metida no meio disso.
– Do que está falando? – também ajeitou a coluna, sentindo-se mais tenso.
– Estou falando do Aleks dizendo essas coisas. Quanto tempo vai demorar até mais pessoas descobrirem sobre vocês dois? – Questionou de modo retórico. –Atte, Aleks, eu, quem mais sabe disso?
– Quem te disse que o Atte sabe de qualquer coisa? – devolveu a pergunta, defensivo.
– É sério? – Santtu arqueou uma sobrancelha, mas o capitão não respondeu. –Eu só estou dizendo, como amigo da , que seria bom se você tentasse a proteger também. – Falou e acenou uma vez com a cabeça, dando as costas para o central e se afastando dele.
– Santtu. – chamou, e o defensor girou sobre seus calcanhares para encará-lo. – Não queria que tivesse sido assim. Para falar a verdade, não achei que as coisas entre sua amiga e eu fossem chegar a esse ponto. – acenou com a cabeça, escondendo o nome da terapeuta. – Você está certo, Atte e Aleks sabiam desde o início, desde quando ela chegou aqui. Mas eu nunca, nunca mesmo, quis que ela fosse afetada nisso tudo.
– Eu sei que não. – Santtu assentiu. – Eu acho que você deve mesmo gostar dela, mesmo que não saiba bem o porquê. – Falou e o capitão sorriu fechado.
– Pode confiar em mim. E acredite quando digo, se em algum momento eu perceber que qualquer coisa em relação a mim ou a minha bagunça está afetando ela negativamente, atrapalhando ou magoando, saio de cena. –Garantiu e foi a vez de Santtu sorrir e assentir.
– Acho bom. – O defensor piscou, aproximando-se de outra vez e o abraçando de lado. – Não quero ter que brigar com você.
– Até porque, sabemos quem venceria. – riu pelo nariz.
– Eu sou o jogador de defesa aqui, , se contenha. – Santtu também riu.
Os dois ainda estavam meio abraçados, rindo alto, quando Petri atravessou o corredor como um raio agitado e de mau humor, pisando firme e com uma péssima expressão. Os dois trocaram olhares confusos e depois encararam o técnico que se aproximava deles.
– Dessa vez eu não fiz nada. – se justificou, sorrindo e erguendo as mãos. – Qualquer coisa que tenha escutado, foi culpa do Santtu. – Brincou, empurrando o mais jovem pelo ombro, que sorriu e o empurrou de volta.
– Sem gracinhas, . – O mais velho foi ríspido.
– Algum problema, treinador? – Santtu investigou, após trocar olhares estreitos e confusos com .
– Cá entre nós? – Petri se inclinou para perto deles, e os dois assentiram. – Não devíamos contratar estrangeiros para a equipe. Pessoas com a cabeça muito diferente da nossa, que não foram forjadas para esse esporte, que não entendem...que são sensíveis demais. – Falou agitando as mãos.
Na primeira sentença achou que sabia de quem se tratava, tinha um palpite, na última teve certeza. O capitão sentiu os músculos do rosto tencionarem involuntariamente, cruzou os braços sobre o peito e voltou a sua postura de sempre, mas dessa vez não era a defensiva, muito pelo contrário, era a postura ofensiva. Bem ofensiva.
– Eu também sou estrangeiro, Petri, caso não se lembre. – Provocou o treinador, usando um tom frio.
– Mas não é de você que estou falando. Você é criado nesse rinque, não se abala com qualquer besteira, não é uma garotinha sensível.
– A gente pode perguntar sobre quem estamos falando? – Santtu sondou, ainda confuso.
– . – respondeu de olhos estreitos, como se quisesse dizer ao treinador que sabia do que ele falava, e que Petri devia tomar cuidado com o que estava prestes a dizer.
– Pelo visto mais alguém pensa o mesmo. – O mais velho assentiu desatento, enquanto Santtu o encarava surpreso.
– Não foi o que eu disse. – Negou . – Na verdade, discordo muito.
– Você? – Petri riu. – Você nem mesmo a cumprimentava, antes da sua lesão fingia que era invisível.
– E não foi uma postura madura. –Concordou o central.
– E-eu concordo com . – Santtu começou a falar. – Não acho que seja essa pessoa.
– Desde quando vocês viraram fãs dela? – O treinador analisou os dois com sobrancelhas juntas.
– Você me pareceu fã dela hoje, mais cedo. – apontou a controvérsia do treinador.
– é legal, sempre que converso com ela tenho um novo ponto de vista, uma coisa nova para pensar. – Santtu argumentou. – Tem sido bom para mim. Os outros também concordam, pode perguntar se quiser.
– Não, não tenho interesse em participar de uma reunião do fã clube de . – Resmungou o técnico, ensaiando afastar-se deles.
– Até porque, se tivesse uma, você não seria convidado. – soprou quando Petri ia saindo.
– Você não está em posição de brincadeiras e piadas, . – O mais velho voltou para perto do central, olhando nos olhos. – Vá treinar. Quem sabe se você se lembrar de como é jogar hockey de verdade, e não ficar de papinho nos corredores e briguinhas no vestiário, deixe de agir como uma garotinha defendendo a melhor amiga e volte a agir como um homem.
Petri se afastou pisando firme.
– Talvez eu tenha merecido essa. – maneou a cabeça sorrindo sem graça, fingindo não ter se abalado com a fala do treinador.
– Essa foi pesada. – Santtu expirou. – Não sabia que ele odiava tanto a assim. – Comentou enquanto começavam a andar em direção a sala de musculação.
– Ele não a odeia, só odeia que ele tenha sido o último a saber das coisas entre Aleks e eu. – deu de ombros. – E claro, também odeia o fato dela não abaixar a cabeça para ninguém.
– Acho que a gente devia deixar o número de emergência na discagem rápida, caso ele tenha um treco. – Santtu riu abafado, acompanhado pelo capitão.
– É, hoje me parece um bom dia para se arrepender de não ter trocado de time quando tive chance. – riu baixo depois de um breve silêncio, sacudindo a cabeça negativamente.
– Todo dia é, camarada. Todo dia é. – Concordou o defensor.
❄❄❄
30 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
Quando entrou na sala de musculação atrás de Santtu, a atenção de todos estavam voltadas para o central. A princípio quis dar meia volta, esquecer a ordem de Petri e sair do foco de todos aqueles pares de olhos, mas não podia e sabia disso. Era o capitão do time, e ser o capitão era muito mais do que só ostentar o
C no uniforme, era mais do que apenas liderar. Por isso, respirou fundo e ergueu a cabeça, olhando nos olhos de todos, mas sem presunção ou sem querer se mostrar inabalável, e sim com humildade. Queria que o time visse que estava ali, disponível, e o principal, disposto.
Alguns retribuíam o olhar com acenos de cabeça, piscadelas e sorrisos fechados, outros abaixavam a cabeça quando ele passava, por talvez não saberem como reagir. Merelä correspondeu o olhar firme e humilde do capitão acenando uma vez com a cabeça, Otto Nieminen, outro com quem costumava andar, apenas continuou olhando para , até enfim desviar o olhar, sem esboçar qualquer expressão ou simpatia. Jasper Patrikainen, que fechava o quarteto de Merelä junto com Santtu, sorriu grande e soprou um “e aí?!” quando o central passou por ele.
Nos fundos, junto a Jakkos e um dos preparadores físicos, estavam Atte e Janos Hari, revezando seus exercícios. Atte se aproximou e cumprimentou o amigo com um toque de mãos, Janos piscou e ergueu as sobrancelhas para o capitão, com a mesma postura de sempre.
– Estamos de volta? – Atte quis saber.
– Petri me mandou treinar. – Contou, depois maneou a cabeça, convidando silenciosamente o amigo para se afastar dos outros.
– Espero que não seja um problema dessa vez. – Atte torceu os lábios ao se aproximar do central, juntando-se a ele em um dos cantos, sozinhos. – Fala logo.
– Acha que mais alguém pode desconfiar sobre
você sabe quem e eu?
– Talvez não, porque ninguém liga para quem você está co...– uniu as sobrancelhas e franziu os lábios, numa careta de reprovação. – Ninguém liga para quem você está conhecendo melhor. Era o que eu ia dizer. – Atte sorriu malicioso, erguendo as mãos na frente do corpo, como quem pede desculpas.
– Ouvi dizer que o time está comentando sobre o que Aleks disse, sobre o motivo ser uma mulher. Por que não me disse nada? – fez a pergunta que piscava em sua cabeça desde que ouvira Santtu.
– Você bateu a cabeça de novo? – Atte arqueou uma sobrancelha. – Acha que alguém vai fazer comentários sobre você e Aleks comigo? – expirou, dando razão ao amigo. –Ninguém está muito amoroso comigo também. Eu chamo de terceirização.
– Eu ferrei tudo. – Admitiu com um suspiro chateado.
– Ferrou mesmo. – Atte concordou, atraindo um olhar surpreso do amigo. – O que? Quer que eu minta? Aleks ferrou tudo também, mas sendo sincero, talvez se meter com essa mulher tenha sido uma péssima escolha.
– Qual é o problema, Atte? – se irritou. – Você sempre me encheu sobre arrumar uma namorada.
– É, uma namorada normal, não uma que desse tanto problema. – Respondeu o goleiro, batendo com o dedo indicador no peito do amigo, enquanto sussurrava. – Eu aprendi um ditado,
onde se ganha o pão, não se come a carne. Sabe por que? Porque coisas assim acontecem. Tinha mesmo que se envolver com alguém do time?
– Não, não vem querer bancar o dono da razão aqui. – Protestou , balançando a cabeça negativamente e se afastando do amigo, para em seguida voltar para junto dele. – Não você.
– Você sabe que ela não podia ter se envolvido com você, e quando isso vazar, e acredite, vai vazar, porque vocês não são os mais discretos, alguém vai ser demitido.
– Você abriu a boca hoje e tudo que saiu foi besteira. – deu as costas a Atte.
– O papel do melhor amigo é falar a verdade também, , você queira ouvir ou não. – Tolvanen se aproximou do central outra vez, colocando-se à frente dele. – Pense com a cabeça de cima, vai ver que tenho razão. E se der, talvez seja melhor terminar isso antes que cause mais problemas.
❄❄❄
30 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
– Alguém em casa? – Santtu brincou ao abrir a porta da sala de devagar, colocando-se para dentro sem esperar pela resposta dela.
– Não, todos foram embora, estamos fechando. – Sorriu , fingindo-se séria e se aproximando para abraçar o amigo com mais força do que de costume.
– Como estão as coisas? – O defensor perguntou, sentando-se em uma das cadeiras, cruzando os braços e encarando a terapeuta, que se apoiava a bancada.
– Seja mais especifico na sua pergunta. – Pediu ela, mas sem sorrir.
– Como estão as coisas entre você e o
assunto que não deve ser mencionado?
–
Assunto que não deve ser mencionado? – franziu o cenho, depois riu. – É assim que estamos chamando agora?
– Estou em busca de um apelido melhor, aguarde. – Piscou o defensor.
– Tudo muito bem. – sorriu maneando a cabeça. – Eu acho que realmente gosto dele, sabe? E ele parece gostar de mim. É fofo como ele se esforça para fazer dar certo, como passa por cima das barreiras dele, como ele tem tentado.
– Dá para ver. – Santtu sorriu. – Ele parece legal nisso.
– Mas isso também meio que me deixa em crise. – Confessou ela depois de expirar profundamente, sentando-se ao lado de Santtu – Pensei sobre nossa conversa, lá em casa. Eu odeio o fato de que me apaixonei justamente por ele. Acho que seria certo que eu mudasse de emprego, sabe? Não é certo que eu fique aqui e com ele.
– Não. O que a gente vai fazer sem você? – Protestou o finlandês, sorrindo e jogando-se sobre .
– O que vocês já faziam antes. – Ela sorriu o abraçando. – Eu estou me sentindo péssima com tudo que aconteceu, e com a coisa com o Aleks. Briguei com meus dois melhores amigos por causa disso, não nos falamos há dias. –Desabafou.
– Por que? – Santtu franziu o cenho, ajeitando a postura para encarar a amiga.
– Eles não ficaram tão felizes com a ideia de eu estar com
o assunto que não deve ser nomeado. – sorriu ao chamar o central do modo com que Santtu antes havia chamado. – Acho que quando me disseram, não quis aceitar, mas eles tinham razão. Você tem razão.
– Você já conversou com
aquela pessoa sobre isso? – Quis saber o defensor.
– Não. – Era a primeira vez que aquela ideia passava pela cabeça da terapeuta. – Não. Acha que devia?
– Achei que relacionamentos fossem sobre isso, sobre falar sobre os problemas. – Santtu deu de ombros.
– Mas eu ainda não sei o que fazer. – mordeu o lábio, pensativa. – Não seria melhor me resolver na minha decisão e depois conversar?
– É, mas aí não seria uma conversa, seria você comunicando a ele o que decidiu sozinha fazer com o relacionamento que é dos dois. – Santtu disse, erguendo as sobrancelhas no final da frase.
– Caramba. – uniu as sobrancelhas e inclinou a cabeça sobre o ombro. – Você é realmente muito bom em dar conselhos, Santtu Kinnunen.
– Fazer o quê? – Ele ergueu os ombros, sorrindo orgulhoso. – Eu não tenho namorada, mas eu observo os meus amigos.
sorriu mordendo a ponta da língua, depois empurrou o jogador levemente pelo ombro e ficou de pé. Se espreguiçou e voltou a ajeitar os papeis na bancada, se preparando para o primeiro atendimento do dia.
– Escuta...– Santtu voltou a falar depois de um tempo, encarando as costas da inglesa.
– Estou ouvindo. – Respondeu ela, sem se virar.
– O que aconteceu entre você e Petri hoje?
– Por que a pergunta? – enfim girou sobre os calcanhares para o olhar, curiosa com o que viria a seguir.
– Estava no corredor com nosso amigo , e Petri passou por nós de mal humor.
– Agora me conte uma novidade. – rolou os olhos e cruzou os braços.
– Ele estava irritado com você. – Contou Santtu. – Dizendo que o time não devia contratar estrangeiros para a equipe, pessoas com a cabeça muito diferente da nossa, que se abalam por pouca coisa, sensíveis demais.
– É óbvio que ele falaria algo assim. – rolou os olhos outra vez e sorriu com incredulidade. – É bem o tipo dele. O que mais?
– disse que ele também era estrangeiro, e o Petri respondeu que era diferente, que ele não se abalava por qualquer coisinha. – Continuou Santtu, tentando imitar o tom do treinador. – E aí nós dois discordamos dele, falamos que gostávamos de ter você na equipe, que fazia diferença e ele falou que não sabia sobre o seu fã clube.
– Vocês não precisavam se posiciona nisso, não precisam de indispor com Petri por minha causa. – se aproximou do amigo, tocando-lhe o ombro.
– Mas também não íamos ficar ali ouvindo o Petri falar mal de você calados, não é? – Santtu ergueu uma sobrancelha e sorriu.
– O que mais conversaram?
– Nada, na verdade foi rápido. – O defensor deu de ombros. – Ele falou do seu fã clube, e eu disse que se ele falasse com o resto do time, provavelmente todos diriam o mesmo. E então, Petri disse que não tinha interesse em participar do clube e o respondeu que ele não tinha sido convidado. – Contou, sorrindo com a reação de surpresa de . – Depois ele falou umas coisas com e nos mandou treinar.
– Que coisas? Não acredito que o enfrentou desse jeito. – A inglesa balançou a cabeça negativamente.
– Não foi uma resposta gentil, mas acho melhor você perguntar ao sobre isso. – Respondeu ele. – Eu não quero roubar o posto de maior fofoqueiro do Otto. – Sorriu ele.
– Está certo. – assentiu, sorrindo de volta. – Eu sinto falta dele, de todos eles. – Suspirou a inglesa. – Acho que desde que comecei a ficar mais perto do , quase não vejo vocês.
– Isso é verdade. – Concordou Santtu.
– Devíamos fazer alguma coisa no final de semana, você, eu, Waltteri, Otto e Jay. – Sugeriu .
– Aí eu vi vantagem. – Santtu riu, ficando de pé. – Vou espalhar a notícia. Alguma sugestão de programação?
– Você é o nativo, me surpreenda. – Pediu a inglesa, sorrindo e erguendo as sobrancelhas, enquanto abraçava o defensor com carinho.
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30 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamentos do Pelicans
O time ainda estava fazendo seu treino físico, todos absolutamente concentrados em suas séries de exercícios, focados na próxima partida da semana, que aconteceria no dia seguinte. estava em um dos cantos, na esteira, e por coincidência, Atte estava ao seu lado, na esteira a sua esquerda. Desde o posicionamento do amigo no início dos treinos, não havia dirigido olhar ou a palavra a Atte. Estava chateado com a forma com que o goleiro tinha se referido a , desconsiderando todo caminho árduo até ali.
Atte havia participado de todo processo, e nunca se manifestou daquele jeito. E então quando as coisas davam certo, quando estavam bem, quando enfim cogitava e queria contar ao amigo sobre como não parava de pensar sobre apresentar a sua família, Tolvanen jogava aquele balde de água fria. E além disso, tinha todos aqueles olhares direcionados em sua direção, com sussurros e comentários que certamente eram a seu respeito. Era, pela primeira vez, desconfortável estar ali, como se aquele não fosse mais seu lugar.
Aquela terça-feira havia começado de modo tão bom, tão confortável, e de repente, se transformou em um pesadelo com todas aquelas coisas. A gota d’água foi a chegada de Aleks Haatanen no lugar. tencionou de modo involuntário a mandíbula e, rapidamente, trocou olhares com Atte, que também tinha percebido a chegada do mais novo. Os olhares do time se voltaram a Haatanen, que caminhava devagar e de cabeça erguida entre os companheiros. Quando Aleks parou frente a Atte e , todo o time, fisioterapeutas e preparadores físicos encararam o capitão, esperando por uma reação de . ergueu o olhar para eles, os encarando de volta, e assim, cada um, pouco a pouco, voltaram a suas atividades, disfarçando sua curiosidade.
– Achei que estava afastado. – disse sem emoção.
– Você também. – Aleks respondeu no mesmo tom.
– Como foi a conversa com Petri? – Atte interveio, chamando a atenção de Aleks para si, mas não levou mais de meio segundo para que o ala voltasse seu olhar para o central outra vez.
– Não falei sobre a sua garota, se é o que quer saber. – Respondeu Aleks, e franziu o cenho.
– Por que não? – Quis saber o central, desligando a esteira e descendo, aproximando-se de Aleks.
– Porque aparentemente, apesar de sempre esperarem o pior de mim, eu não sou o monstro que gostariam que eu fosse. – Cuspiu o mais jovem.
– Ninguém aqui acha isso de você, Hade. – interveio, olhando nos olhos dele. – Você quem fez o que fez.
– A culpa é sempre minha, não é? – Ele sorriu irônico.
– Por que não falou a verdade para o Petri? – perguntou outra vez.
– Pelo mesmo motivo que não contei quando você começou a dormir com ela.
– Não faz sentido. – balançou a cabeça negativamente.
– Bem-vindo ao mundo, bebê. – Aleks ironizou outra vez, colocando as mãos na cintura, encarando o chão e depois o central.
– Você não pode ser verdadeiro e falar sério nem uma vez? – O capitão o olhou incrédulo, unindo as sobrancelhas.
– Não faz sentido, não depois do que você fez.
– tem razão. – Atte se colocou perto deles de repente. – Seria bom uma explicação, pelo menos. – Aleks encarou o goleiro com deboche. – Você não pode tentar envenenar seu melhor amigo e nem dizer a ele o porquê.
– Não tentei envenenar meu melhor amigo. – Aleks falou. – tentou.
– É sério? – arqueou as sobrancelhas.
– Qual é? Eu tentei te fazer ver a verdade, só isso, e não funcionou. – Se justificou o ala, pela primeira vez.
– Que verdade? – franziu o cenho.
– Que vocês não podem ficar juntos. – Respondeu Aleks. – Você é do time, ela também. Você é russo, mas é de Lathi, ela é estrangeira. Ela é diferente de você. Não vai dar certo. Já tem uma lista de problemas que sua paixonite por ela causaram. Eu só quis te defender enquanto ainda dava tempo.
– Isso é definitivamente a coisa mais absurda que já ouvi na vida. – disse devagar, chocado.
– Pode criticar meus métodos, talvez eu tenha extrapolado um pouco, mas a efetividade seria garantida. – Se explicou ele.
– Isso virou um complô de novela mexicana? É isso? – olhou pasmo para os dois amigos. – Qual é a de vocês? Você tá me dizendo que fez a me dar bombons com coco, mesmo sabendo da minha alergia horrível, porque não achava que devíamos ficar juntos?
– É uma forma simplória de explicar, mas sim. – Aleks deu de ombros.
– Tá aí. – sorriu sem humor, analisando o ala. – Acho que no final das contas, todo mundo tinha razão sobre você, Aleks. Você é um babaca egoísta.
– ...– Atte tentou intervir, mas o central o interrompeu.
– Não, Atte, você também não. Não preciso ouvir nada de você sobre isso agora, nem de você nem de ninguém. – Disse o central, afastando-se dos dois em completa decepção.
Astromélia: As astromélias são flores exóticas muito bonitas que se apresentam em várias cores e tonalidades. Representam um vínculo forte entre duas pessoas.
30 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
– O quanto você curte caminhadas? – Santtu perguntou a enquanto os dois caminhavam devagar nos corredores, ao encontro do time, que treinava naquele fim de manhã. –Podíamos fazer uma trilha, depois ver o pôr do sol no lago.
– Não sou uma pessoa muito atlética, amigo. – riu, jogando a cabeça para trás.
– Você é a pior pessoa do mundo para pensar em um programa. – Santtu reclamou. – Não gosta de caminhadas, não gosta de ficar fora até tarde, não gosta de gelo, não sabe patinar, não sabe dirigir, não pratica nenhum esporte, nem mesmo cartas. – Listou o defensor, frustrado.
– Se com isso você pretendia me ofender, conseguiu. – fingiu, empurrando o finlandês.
– , você só quer sair para comer. – Disse derrotado. – Não tem como variar com você.
– Não tenho culpa se tudo que você pensa envolve caminhadas no frio, esportes radicais ou esportes de qualquer espécie. – deu de ombros. – Não ouvi nenhuma sugestão que envolvesse passeios culturais, cinema, cafés, piqueniques. Compras. Você não falou de fazer compras. – Sugeriu ela, animada, mas Santtu rolou os olhos no mesmo instante em que empurrava as portas da sala.
– Garotas. – Resmungou o defensor, enquanto a terapeuta se divertia com o azedume dele.
Ao contrário de sempre, os jogadores pareciam trancados em seu próprio mundo. A maioria falava com o atleta mais próximo, sussurrando e olhando ao redor, como se falassem segredos. Alguns poucos pareciam realmente concentrados em suas séries, e poucos ainda eram os que sorriam para a inglesa ou a cumprimentavam.
Waltteri, Otto e Jay estavam fazendo flexões perto das esteiras, no fundo, e seguiu Santtu até eles. Tento socializar com os atletas que via pelo caminho, mas todos pareciam ocupados demais em seus assuntos.
– O que há com vocês hoje? – A terapeuta perguntou depois de abraçar Jay, Otto e por último Waltteri, que a beijou o topo da cabeça.
– Digamos que a coisa meio que azedou. – Otto respondeu, falando baixo, e indicando com a cabeça duas figuras atrás de , Aleks e Atte.
– Do que tá falando? – Santtu indagou.
– O trio sensação estava conversando ali, mas acho que não deu muito certo. – Otto contou.
– O saiu daqui chateadão, cara...– Jay completou, com seu jeito manso e relaxado de sempre.
– Pelo menos não tivemos que separar dessa vez. – Otto riu, cutucando com o cotovelo Waltteri, que apenas ouvia tudo.
– Isso não é legal, Otto. – o repreendeu. – ainda é seu capitão. Ele merece respeito.
– Waltteri é meu capitão, . – Otto discordou. – Talvez, quando voltar, e se ele voltar, talvez nem volte como capitão.
– Não é assim também, Otto. – Waltteri apertou os lábios. – Ainda tem muito para acontecer.
– Qual é? Vocês nem se parecem com o mesmo grupo que conheci quando cheguei. – afastou-se um pouco, olhando para os quatro. – O que aconteceu com o lance de trabalho em equipe, jogar junto? – A terapeuta desviou o olhar dos amigos e lhes deu as costas, encarando o resto do time. – O que aconteceu com todos vocês. Por que estão com tantos segredos? Sussurrando pelos cantos?
– Aí está alguém que entende de segredos, não é? – Aleks se fez ser notado, respondendo a terapeuta.
– Não sei se entendi você, Haatanen. – sentiu o sangue gelar nas veias, e viu uma série de olhos confusos se direcionarem a ela e Aleks.
– Quer que eu explique? – Aleks sorriu de canto.
Ele estava jogando, um jogo baixo e sujo, mas não era o tipo de pessoa que baixa a cabeça para qualquer homem, nem mais velhos, nem mais novos que ela. Independentemente de sua origem, patente, poder que tinham sobre ela. Se Aleks quisesse jogar aquele jogo, eles iriam até o final.
– Seria ótimo se pudesse, por gentileza. – Pediu, aproximando-se dele de cabeça erguida, sob olhar atento de todo time.
– Você até que tem coragem. – Aleks disse baixo, para que apenas os dois pudessem ouvir assim que se aproximou mais de .
– Você não viu nada. – Falou ela, sem perder o contato visual.
Aleks não respondeu, apenas sorriu, analisando a terapeuta e depois se afastou em silêncio, mas mantendo um sorriso sarcástico nos lábios.
– Eu não sei o que está acontecendo com vocês. – voltou a falar, dirigindo-se depois ao resto do time novamente. – Não parecem o mesmo Pelicans que eu conheci. Estão divididos, murmurando, alguns parecem que nem mais respeitam seu capitão, e foi aqui, no Pelicans que entendi sobre isso. Sobre seguir seu capitão, sobre respeito e lealdade. E agora, na primeira oportunidade, vocês querem crucificar o por algo que nem mesmo sabem do que se trata.
Alguns jogadores a olhavam, outros tinham as cabeças baixas e alguns a ignoravam totalmente.
– Um amigo me lembrou hoje que quando se há algum problema, em qualquer tipo de relação, se deve conversar sobre. – Disse, olhando rapidamente para Santtu e piscando para o defensor. – Mas a única coisa que estou vendo aqui, é uma polarização, uma divisão, como se fossem dois times diferentes. – A inglesa respirou fundo antes de continuar. – Entendo que as coisas estejam confusas, entendo também que as vezes não se é possível adorar o capitão. Mas os objetivos do time não são individuais, são coletivos, e enquanto a equipe se comportar assim, o Pelicans vai jogar individualmente um esporte coletivo, e eu não preciso adivinha o futuro para contar a vocês o que vai acontecer.
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30 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
Talvez Atte e Aleks tivessem razão, pensava o capitão.
Talvez se envolver com tivesse sido sua pior escolha, o maior erro da carreira de . A carreira tão priorizada, construída com bases firmes e práticas, sem interferências de relacionamentos, de sentimentos. De repente tudo parecia um castelo de cartas desmontado e confuso, como se o central estivesse em um embolado de linhas sem saber para onde ir, amarrado a algumas contra vontade, e se amarrando a outras propositalmente. Queria poder ir para casa da família naquele momento, aproveitar o colo da mãe e contar a ela sobre tudo que sentia e que estava acontecendo. Queria ouvir os conselhos do pai, porque ele certamente saberia o que fazer, e obedeceria sem pensar ou questionar, como sempre fizera.
Às vezes odiava não ser mais uma criança e ter que tomar as próprias decisões. Seria muito mais fácil se pudesse apenas erguer os olhos para os pais e esperar que eles decidissem o que seria melhor.
Mas os pais estavam distantes, e não estava de folga para ir até eles e ignorar o resto do mundo, embora ponderasse seriamente aquela possibilidade. Também não tinha opções próximas para se abrir sobre o assunto, ou
os assuntos. Aleks o tinha decepcionado de uma das piores formas, Atte parecia ter sua opinião formada e não estar aberto a ouvi-lo. não era uma opção, não quando o assunto era a terapeuta. Os outros caras do time com quem tinha alguma relação não sabiam e não podiam saber sobre a verdade dos fatos, nem Petri, nem Jakkos, nem ninguém.
Por isso, enquanto estava sentado no fundo da sala de equipamentos, entre tacos e capacetes, com o rosto inclinado, tentando dar vazão a pressão forte que sentia na cabeça, encarava o carpete cinza do chão em silêncio. Sozinho. As vezes ficava só por opção, e amava isso; outras vezes, ficava só por opção, mas odiava.
– Atrapalho? – Alguém quis saber, invadindo o espaço mental e físico de ao abrir a porta da sala de equipamentos.
O central, que tinha os cotovelos apoiados aos joelhos e o corpo curvado para frente, levantou os olhos a fim de descobrir quem o incomodava.
– Merelä. – se admirou. – Não, não atrapalha. – Respondeu, torcendo para que o ala encontrasse rápido o que procurava e lhe deixasse sozinho outra vez.
– Te procurei por aí. – Confessou Merelä, sentando-se perto do central e imitando sua postura, enquanto se amaldiçoava por dentro por não ter dito que queria ficar sozinho. – Você não é um cara fácil de achar.
– É, eu escuto muito isso. – Respondeu ele, sem ânimo.
– Eu sei que a gente não tem... que não somos tão próximos. – Começou a se justificar Waltteri. – Mas queria dizer que você pode contar comigo para o que precisar.
– Do que tá falando? – uniu as sobrancelhas, desconfiado, tentando analisar o ala, buscando descobrir suas verdadeiras intenções.
– Nem eu sei, para ser sincero. – Waltteri riu abafado. – Acho que... – O finlandês hesitou. – Quando Petri me colocou, me deu destaque nessa nova organização do time, sem você e depois sem o Aleks, eu gostei. Não vou mentir. Gostei muito, e acho que posso me acostumar a isso.
– E aí resolveu vir aqui me contar? – indagou arqueando uma sobrancelha com sarcasmo.
– Não, não exatamente. Me deixe terminar. – Pediu Waltteri. – Mas apesar disso, apesar de toda essa confusão esquisita com Aleks, você é o capitão. Sempre foi, desde que eu cheguei aqui. Você quem unia o time, que mediava essas confusões, que colocava a gente nos trilhos. Acho que... de alguma forma, com seu afastamento, algumas pessoas esqueceram disso. Eu esqueci. – Waltteri confessou, erguendo os olhos para o central. – Mas acho que está na hora da gente lembrar.
– Obrigado. – assentiu, ainda absorvendo as palavras de Waltteri.
– Talvez você também precise se lembrar.
– Talvez. – assentiu. – Ou talvez Petri esteja certo e meu tempo aqui como capitão já tenha passado. – Foi sincero, voltando a encarar o carpete cinza.
– Isso é só você quem sabe. – Waltteri ergueu os ombros. – O que sei, é que você é meu capitão, e embora eu não negue gostar desse lugar, ele pertence a você agora. – Falou Merelä, olhando nos olhos.
– Acho que o resto do time não pensa como você.
– Ninguém do time nunca pensou, e mesmo assim você conseguia fazer um bando de ogros teimosos e cheios de ego jogarem como uma família. – O ala lembrou, sorrindo de canto. – Você precisa voltar, sem liderança, sem você, esse time está indo de mal a pior. – Falou, batendo duas vezes no joelho do central, sorrindo de modo gentil. – Precisa voltar logo.
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30 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Apartamento de
Dias ruins começam exatamente como dias comuns. Sempre é assim.
Dias ruins sempre acontecem quando você está desprevenido, quando a guarda está baixa, quando não pensa que algo ruim possa estar vindo. Aquela terça-feira era como um daqueles dias.
Depois do tensionamento com a equipe, se retirou para sua sala, onde ficou até o fim do dia, se culpando pelo modo com que lidara com os atletas, sobre sua relação com e como aquilo o estava prejudicando no time. Se torturando pessoalmente, com cada escolha até ali, cada momento e decisão tomada que tivesse colocado os dois naquela situação. Tinha que se apaixonar justo pelo capitão do time? Precisava, entre tantos homens naquele país, ser ?
A inglesa conseguiu disfarçar seu péssimo humor durante o retorno a casa, de carona com Waltteri Merelä, que falava animado sobre lugares que podiam ir juntos no final de semana, e sobre as expectativas para o próximo jogo.
Já em casa, podia deixar de lá o falso bom humor e simpatia, adotando o
humor Grinch tão característico da inglesa em seus momentos ruins. Não quis jantar, mas se lembrou dos chocolates de emergência que guardava no fundo do armário, e depois de um banho longo e quente, se sentou para come-los, até que dormisse ou se sentisse cheia o bastante para não aguentar comer mais nenhum pedaço.
Estava empenhada na missão, até sentir o vibrar de seu celular, anunciando uma notificação nova. A inglesa desbloqueou o aparelho e, mais que depressa, de modo ansioso, abriu a notificação ao perceber se tratar de .
WHATSAPP
Brad 💙
Online
Ocupada?
Não
Preciso conversar
Claro, claro
Venha para cá.
Janela
Levou algum tempo até que a inglesa entendesse o que o central quis dizer em sua última mensagem, mas quando o fez, pulou depressa do sofá, correndo para a janela com vista para o estacionamento. Ao puxar a cortina, o viu lá embaixo, usando um moletom preto, touca cinza, com as mãos nos bolsos do moletom, com um sorriso fechado e não muito animado, olhando para sua janela. A inglesa voltou a digitar.
WHATSAPP
Brad 💙
Online
Ocupada?
Não
Preciso conversar
Claro, claro
Venha para cá.
Janela
O que está esperando? Suba logo
Não, não vou subir hoje.
Você tá me assustando, Brad
Desce, vamos dar uma volta
❄❄❄
30 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Apartamento de
🎵 Dê play na música aqui, e se necessário coloque para repetir Seafret - Atlantis🎵
desceu o mais rápido que pôde, e assim que colocou os pés do lado de fora, uma lufada de ar frio a atingiu, fazendo-a abraçar o próprio corpo. sorriu fechado e de modo sofrido, como se se compadecesse com ela, ou que quisesse se aproximar mais, abraçá-la, mas não pudesse.
– Você não quer mesmo subir? – Perguntou ela, apontando com o polegar para trás, em direção a entrada do prédio. – Está um gelo aqui fora.
– Se eu subir não vou conseguir fazer o que vim fazer. – sorriu triste, e sentiu o coração apertar. – Vem, vamos dar uma volta. – Chamou o central, com um movimento de cabeça.
A inglesa começou a caminhar ao lado do central, o imitando e colocando as mãos nos bolsos do moletom do Pelicans que usava, enquanto puxava mais a touca, protegendo as orelhas do frio cortante. As ruas de seu quarteirão eram silenciosas e vazias a noite, poucos carros passavam por eles, e o caminho escolhido por , tinha um dos lados coberto de árvores, sem vizinhos ou movimentação de pessoas.
– Não é comum, mas hoje você está me assustando. – rompeu o silêncio, tentando sorrir e fazê-lo sorrir.
– Foi mal, é que tô tentando escolher bem as palavras. – Admitiu sem olhá-la e sem sorrir.
– Diz de uma vez, eu prefiro uma morte rápida do que uma lenta e torturante. – pediu, parando de andar e atraindo a atenção dele.
– Acho que você sabe do que se trata. – falou depois de baixar a cabeça e expirar profundamente.
– Talvez. – assentiu, aproximando-se dele. – Mas você precisa me falar. – tocou com suavidade o braço do central, atraindo seu olhar rapidamente, mas desviou no instante seguinte.
– A gente... talvez seja melhor parar por aqui. – mantinha a cabeça baixa e as mãos nos bolsos.
– Pelo que aconteceu com Aleks e o time. – completou sem se chocar, e enfim ergueu os olhos para ela.
– Também.
Fez-se silêncio.
– Pensei sobre isso. – Admitiu ela, afastando-se dele e se dirigindo a um banco de ferro, perto de uma árvore, em um dos lados da rua. – Acho que isso está te atrapalhando. Claro que não diretamente por minha culpa, mas... se não tivesse eu, Aleks provavelmente não teria feito o que fez...– Pensou ela. – Apesar de que, o que aconteceu foi bem antes de tudo.
– Foi por minha causa, não sua. – disse, sentando-se ao lado dela. – Ele fez porque queria acabar com meu interesse por você.
o encarou chocada, surpresa com a revelação, mas apenas ergueu os ombros, como quem diz que também não sabe o que pensar.
– No final das contas, ele talvez tivesse razão. – deu de ombros, por fim. – Me desentendi com meus dois melhores amigos por causa disso também.
– Por minha causa? – Foi a vez do central se surpreender.
– Porque eles me mostraram o quão antiético isso tudo é, e eu não quis ver. – Explicou a inglesa. – Talvez isso esteja atrapalhando muito mais a você do que eu imaginei que poderia. – disse em voz alta o que estava pensando desde a conversa com o time, horas antes.
– Acho que a gente... as vezes só não é para ser. – expirou sem emoção, encarando o chão, com o corpo inclinado para frente, evitando olhar para a terapeuta.
– Momento errado, talvez. Pessoa certa, hora errada. – pensou alto, atraindo a atenção de .
– Pessoa certa. – Ele sorriu fraco erguendo o canto dos lábios.
voltou a encarar o chão e o tênis branco que usava. Se olhasse para ela, não teria coragem de falar o que precisava, e se continuasse falando, não conseguiria segurar a pressão na garganta por muito tempo. Não se importava em chorar, mas não gostaria de chorar na frente de , por isso tentava se obrigar a pensar em coisas aleatórias, tentando se dissociar do que estava sentindo. Não queria fazer aquilo, definitivamente, mas era a única saída para resolver toda aquela confusão.
Internamente agradecia aos céus por não o questionar, não aceitar ou chorar, não sabia o que faria se ela reagisse assim. Embora parte sua se sentisse ferida pela reação prática e até um pouco fria da inglesa, outra parte era grata.
– Você devia ter aceitado o convite para o Maple Leafs. – sorriu fechado, empurrando-o sem usar muita força. – Ou para qualquer outro time da Liiga.
– Aí eu não teria conhecido você. – riu abafado, com voz embargada e antes de erguer o tronco, se recostando no banco, limpou os olhos molhados com as costas das mãos, olhando a terapeuta em seguida. – É aí que quer chegar, ? – Ele a provocou, tentando fazer graça.
sentiu o coração se partir em pedaços quando percebeu que ele chorava, mesmo que de forma contida. Conhecia a voz de , e a poderia reconhecer em qualquer lugar, de qualquer jeito, por isso sabia que o tom embargado, somado ao nariz vermelho e olhos molhados, só significavam uma coisa. Odiava aquela ideia, mesmo sendo o certo, odiava ter que se separar de , mas não podia pedir a ele que tomasse uma decisão que afetasse de forma negativa sua carreira, era egoísta.
Mas queria muito que ele ficasse, e principalmente, queria que ele pudesse ficar.
– Eu sinto, bem no fundo, que independentemente de onde estivéssemos, nós teríamos nos encontrado de qualquer jeito. – respondeu depois de alguns instantes em silêncio, olhando para o rosto perfeito de .
– Acha mesmo isso?
– Você não? – devolveu a pergunta, inclinando a cabeça sobre o ombro.
– Não sou esse tipo de cara. – Ele sorriu fechado, erguendo as sobrancelhas. – Eu acredito no que vejo e sinto agora. – Respondeu. – Mas talvez você tenha razão, só talvez. – Brincou, piscando um dos olhos.
– Talvez algum dia...– Disse a terapeuta com esperança, tentando se acolher em seu próprio sofrimento.
– Eu esperaria esse dia, sem reclamar. – prometeu, levando uma das mãos ao rosto de , afagando sua bochecha com o polegar.
– Espero que você seja um bom cumpridor de promessas. – sorriu fechando os olhos, aproveitando o carinho do capitão.
não soube o que dizer, havia tanto em sua cabeça que era difícil transformar todo aquele embolado de sentimentos em palavras. Adorava , era feliz com ela, e apesar de todo o caos no time, estar com ela era o que dava sentido a sua vida nos últimos tempos. Ela o acalmava, também o irritava, mas era uma irritação diferente. Era o rosto de que queria ver pela manhã, a voz dela que queria ouvir, era para ela que queria contar as novidades, as piadas ruins, seus gostos e obsessões tão particulares. Era sobre ela que ele queria saber tudo, era a presença dela que o deixava com as mãos suadas, e que ao mesmo tempo, o desarmava completamente.
Talvez devesse ter dito o que tinha para dizer e ido embora, não devia ter cedido e ficado nem mais um segundo na presença da sua mulher favorita no mundo. Porque naquele momento, sentindo a pele dela, sentindo o cheiro, observando a expressão calma, mas triste da terapeuta inglesa, todo seu discurso e sua decisão já não faziam mais sentido.
– Que se dane, eu não vou fazer isso. – declarou de repente, atraindo um olhar confuso de para si. – Não vou fazer isso. Esquece o que eu disse, tudo.
– O quê? – se endireitou, afastando-se um pouco dele. – Do que está falando?
– Eu não vou...eu não vou ficar longe de você. – Sentenciou olhando nos olhos da inglesa. – Não posso fazer isso, e não ia conseguir mesmo.
– Mas você acabou de dizer que...– A terapeuta tentou falar, mas a interrompeu.
– Eu sei o que disse, eu sei que deve ser a melhor escolha e o que é certo. – Falou, segurando o rosto da inglesa com as duas mãos e sorrindo de canto. – Mas você já me conhece o suficiente para saber que eu não sou a pessoa mais inteligente. Atte costuma dizer que se eu não estiver sendo um pouco burro, não sou eu em essência. – Lembrou . – Eu não vou abrir mão da melhor coisa que me aconteceu nos últimos anos. Não pode ser errado, isso, entre nós, não tem como ser errado. – disse com firmeza, talvez mais para si mesmo do que para a terapeuta. – Não vou abrir mão de você.
– Mas e todo o resto? – colocou suas mãos sobre as do central, tentando entender e acompanhar seu raciocínio, enquanto se derretia com as palavras dele. – Eu ainda sou a terapeuta do time, é uma questão ética complicada... e tem o Aleks, o Petri, o time e seu lugar de capitão...
– A gente supera. – Garantiu o central. – Junto. Eu vou pensar em alguma coisa.
– , as coisas não são tão simples. – tentou alertá-lo. – E você já tem coisas demais para pensar.
– Você é a terapeuta do time, tem razão, isso não dá para remediar, mas se a gente se separasse, seria uma relação bem pior do que a tínhamos antes de começar isso tudo. E é como dizem, o que não tem remédio, remediado está. – argumentou tentando ser otimista. – Aleks é um problema meu, ele tentar interferir na minha vida e ser um babaca egoísta não é culpa sua ou causado por você, é culpa só dele. E quanto ao time, Petri me disse uma vez que jogadores com vida pessoal organizada conseguiam organizar a vida profissional também.
– Espera aí, isso está muito rápido. – ficou de pé, pedindo uma pausa. – Não faz dez minutos desde que você me disse que era melhor acabar por aqui. Eu estou um pouco perdida.
– É eu sei, eu disse, mas eu não consigo, não ia conseguir ficar longe de você. – também ficou de pé. – Eu ia morrer de ciúmes, ia ficar mal-humorado, tudo seria péssimo. – Ele sorriu, feliz em se dar conta daquela verdade. – Eu não ia conseguir ficar longe de você. – Garantiu o capitão, olhando nos olhos da terapeuta. – Mas eu entendo que as coisas não sejam simples, então... se você quiser manter e acabar aqui, eu também entendo. – Mentiu o capitão. – É só dizer.
– Você deve ser bipolar. – balançou a cabeça negativamente, depois suspirou e sorriu incrédula.
– Provavelmente, e mais um monte de coisas, mas tem uma que não sou.
– E que é? – Ela quis saber, aproximando–se um pouco mais dele.
– Cego. Maluco. – Ele também se aproximava mais da inglesa enquanto listava. – E se para você estiver tudo bem, não vou te deixar livre por aí, não depois de tudo. – se declarou, abraçando o corpo da terapeuta e unindo suas testas, enquanto os dois se mantinham de olhos fechados. – Não posso correr o risco de você não querer uma guarda compartilhada do Niko. – sorriu, puxando para mais perto, como se a proximidade ainda não fosse suficiente.
– Você tem razão, eu não aceitaria a guarda compartilhada do nosso pinguim de pelúcia. – A inglesa entrou na brincadeira, sentindo-se mais relaxada nos braços de , abraçando seu pescoço e acariciando sua nuca.
Quando se afastou um pouco, voltou a tomar o rosto dela com as duas mãos, admirando cada detalhe em silêncio por alguns instantes, sem parar de sorrir.
– Eu gosto mesmo de você, . – Declarou o capitão.
– ... – sorriu grande. –
Eu nunca sei o que esperar de você.
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29 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Apartamento de
🎵 Dê play na música aqui, e se necessário coloque para repetir – Michal Leah – The Way I Love You 🎵
Ao contrário da primeira vez em que entraram naquele mesmo apartamento com a mesma ideia em mente, naquela noite e haviam decidido ter calma e paciência. A inglesa guiou o central para dentro pela mão, ignorando que já tinha decorado a planta daquele apartamento. o fez sentar na cama e sentiu, diferente das outras vezes, o estômago gelar, como se fosse sua primeira vez com uma garota. tentou se sentar de modo confortável e não bobo, mas julgava ter falhado. Os olhos serenos da terapeuta sobre si o deixavam muito mais nervoso do que gostaria de admitir a si mesmo.
– Eu fiquei pensando sobre por que ser você. – contou a ele.
Estava distante da terapeuta cerca de cinco passos, e mantinha o contato visual sem vacilar, ou sem parecer tão tocada quanto ele.
– O que? – Perguntou confuso, piscando uma vez e afastando o olhar, nervoso como um adolescente.
– Sobre porque você, entre tantos. – Explicou e inspirou, surpreso, apertou os olhos e maneou a cabeça, confuso. – Seria mais fácil se fosse diferente. – Disse ela, aproximando–se dele e tocando a bochecha de com a ponta dos dedos.
– É agora que eu te convenço ou...– Quis saber ele, perdido e ainda mais nervoso, sentia as mãos suando e a testa também.
– Não preciso ser convencida. – riu com graciosidade, como quem ri de uma criança que diz algo engraçado. – Eu já sei a resposta.
– Sabe é? – se remexeu na cama, ansioso.
– Sei.
levou as mãos até a cintura do central, puxando o moletom que ele usava para cima, com ajuda de . Quando a peça de roupa estava fora do corpo do jogador, foi atirada em um canto qualquer do quarto.
– Acho que estou gostando desse jogo. – sorriu, preparando–se para tirar o resto de roupa que usava.
– Não é um jogo. – o impediu. – Não é só um jogo. – Sussurrou ela, aproximando–se dele e depois se afastando, para retirar também o seu próprio moletom. – É um campeonato inteiro.
respirou fundo.
– Acho que entre todos e todas as opções, tinha que ser você. – Ela voltou a dizer, enquanto se juntava a ele na cama, fazendo com que arrastasse o corpo para cima, devagar. – Gosto de como você parece muito mais duro do que realmente é.
– Eu sou bem duro. Você sabe. – Garantiu, sorrindo de canto, apoiando nos cotovelos, olhando nos olhos de .
A inglesa riu baixo.
– Mas não quando estamos a sós. – negou, se divertindo com a expressão incrédula e injuriada de . – Não se ofenda, jogador, me refiro apenas a sua personalidade. – Explicou e voltou a sorrir. – Gosto de quem você é quando estamos sozinhos.
– Gosto quando você fica flertando e sendo inteligente. – Disse ele, segurando a cintura de e ficando por cima num movimento rápido. – Equilibra a relação. Você entra com a inteligência e a beleza, e eu entro.
– Você é realmente bom nisso. – sorriu, enlaçando a cintura do jogador com as pernas.
– Você merece o esforço. – Falou ele, mantendo o contato visual, mas adotando mais seriedade na voz. – Você.
Enquanto falava, entrelaçou os dedos da mão em recuperação aos dedos de .
– Você. – repetiu.
–
Nós caí melhor. – corrigiu, enfim a beijando com todo afeto, amor e desejo que tinha.
Jasmim : É símbolo de sorte, doçura e alegria.
01 de dezembro de 2021, Mônaco
Questionar o homem no espelho. Era isso que fazia, em silêncio, observando com atenção o homem do outro lado do vidro com seus olhos questionadores, sem que tivesse qualquer sombra de resposta. Alguns dias eram assim, as coisas aconteciam, eram frustrantes e não havia uma explicação, uma razão ou um porquê. Ainda preferia, de todo modo, buscar suas respostas em si mesmo. Claro que vez ou outra conversava e pedia auxílio para pessoas que o rodeavam, mas sabia que a maior parte de suas questões deviam ser resolvidas dentro, sozinho, e até preferia assim.
Nos últimos tempos a pressão por resultados havia aumentado, e por mais que tentasse, algo sempre dava errado. Um erro no carro, um erro de alguém que o prejudicava, erro de estratégia, erro no pitstop, algum erro seu. Algo aparentemente parecia disposto a complicar sua vida o máximo possível. Gostava de pensar se tratar de uma fase ruim, que logo passaria, esperava que passasse pelo menos.
– Oi. – Tiffany sorriu quando entrou no quarto, terminando de arrancar a roupa de treino.
– Oi. – O piloto sorriu fechado e também com o olhar, girando o rosto para acompanhar a movimentação da companheira. – Como foi o treino?
– Intenso e incrível. – Contou ela, se dirigindo ao banheiro. – E o que você ficou fazendo?
– Pensando, eu acho que preciso intensificar meus treinos no simulador, talvez ajude a evitar alguns erros pequenos que andei cometendo. Acho que preciso melhorar na chuva também...
– Pode pegar uma toalha para mim? Eu esqueci. – Ela gritou do banheiro, interrompendo o assunto.
– Então, como eu estava dizendo. – Continuou ele, enquanto buscava uma das toalhas brancas e a entregava, no chuveiro. – Acho que talvez se eu melhorar nisso, na pista molhada, já vai fazer uma diferença enorme. O que acha?
– Acho que sim, vai ser bom. – Tiffany respondeu distraída. – Treinar nunca é demais. Fale com Antti, ele vai ajudar. Hoje ele quase me matou com o treino, você precisava ver. – Ela contou rindo.
– É, posso imaginar. – concordou sorrindo fechado, escorando-se ao batente, para ouvi-la.
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01 de dezembro de 2021, Lathi - Finlândia
Isku Areena
Quarta-feira, dia de jogo.
O time estava agitado, saindo de uma série de jogos com resultados mais que inconsistentes. O número de vitórias era inferior ao de derrotas, não era uma fase boa para o Pelicans. Aparentemente a ausência do capitão, a divisão do time em duas equipes diferentes e a rotatividade de liderança surtia maior efeito do que o esperado no gelo. Para aquele jogo contra o
Red Bull München, o time da casa não era o favorito, as apostas eram em maioria para o time alemão, mas mesmo assim a torcida azul e preta abarrotava a Isku Areena.
Do interior, dos corredores por onde os jogadores passavam, se podia, literalmente, sentir a vibração da multidão que enchia as arquibancadas. Do lado de fora a fila gigante fazia parecer que o clima era ameno e a brisa fresca, ao contrário do clima de iglu e do vento cortante de Lathi naquela noite.
estava junto com o técnico e alguns outros membros a equipe técnica no vestiário, enquanto os atletas se aprontavam para o jogo. O central assistiria a partida do camarote que geralmente era ocupado por Lauri, mas antes, decidiu passar algum tempo com o time depois do aquecimento. Um pouco mais relaxado depois da conversa com , mantinha as palavras de Waltteri Merelä na cabeça, piscando como um farol. Merelä era o mais interessado no assunto, o maior beneficiado caso Petri resolvesse destituir de seu lugar de capitão, e mesmo assim fora o único a verbalizar seu apoio. Entendia porque todos adoravam Waltteri, inclusive , embora nunca tivessem tocado no nome do ala em nenhuma de suas conversas.
Ser capitão não era apenas trajar um uniforme com detalhes especiais, ou ter alguns benefícios ou obrigações diferentes das dos outros no time. Envolvia liderar um grupo distinto, tentando unir a todos no mesmo objetivo, com a mesma meta. Envolvia lidar com os problemas que surgissem, com as relações muitas vezes difíceis entre os atletas, para que no fim, todos se comportassem como uma família. Mas não era comum que o pivô das crises fosse o próprio capitão, era um problema novo e diferente, sobre o qual não tinha qualquer experiência em lidar. Por isso resolveu tentar algo novo, lidar com a questão como se fosse uma segunda pessoa, e não ele mesmo, não . Como se saísse de si e enxergasse a situação pelos olhos de outra pessoa, não envolvida em toda aquela bagunça.
O time estava reunido no vestiário depois do aquecimento, terminando os últimos ajustes antes do início da partida. Aleks, ainda suspenso, não estava com eles.
– É isso aí! – Petri bateu palmas, chamando a atenção dos jogadores. – Hoje temos mais um desafio, uma organização nova. Vamos com tudo. Estamos em casa e a casa está cheia, não vamos deixar ninguém sair daqui desapontado hoje. – Motivou o treinador.
Alguns atletas assentiram com a cabeça, outros concordaram com urros e gritos, outros se mantinham em silêncio, concentrando-se. sentia tanta falta daquela energia que a saudade se tornava dor física. Enquanto Petri prestava atenção nos dados apresentados por um de seus assistentes, cruzou seus olhos com Waltteri. Merelä manteve o olhar firme na direção do central e depois assentiu com um movimento de cabeça. expirou mais devagar, enquanto pensava na ideia que o olhar de Waltteri o havia sugerido, já era algo de seu desejo, mas a postura de Merelä o deixou mais confortável para enfim fazê-lo.
🎵 Dê play na música aqui, e se necessário coloque para repetir – Foo Fighters - My Hero 🎵
– Pessoal. – O central chamou a atenção do time para si, tirando as mãos dos bolsos e se colocando no centro do vestiário, capturando olhares curiosos de todo time e comissão técnica. – Eu sei que não tem sido um tempo fácil, mas tempos fáceis também nunca foram comuns por aqui. Desde sempre no Pelicans nós nos acostumamos a fazer o que fazemos por amor, apesar das dificuldades, com resiliência, porque na maioria das vezes, era só isso o que tínhamos.
Força de vontade. Não vamos para o gelo por prestígio, ou por dinheiro, mas sim porque nós somos jogadores de hockey, e isso é o que fazemos de melhor. – tentava olhar nos olhos de todos enquanto falava. – Sei também que tem muita coisa no ar e que hoje provavelmente eu não seja a pessoa que queriam ouvir. Mas ser o capitão não me livra de me lesionar, de ter problemas, ou de errar. E isso são coisas que todos nós temos, porque somos pessoas e não máquinas, e por isso também que o Pelicans sempre foi o que é. Os caras do Pelicans jogam com a alma, mesmo se ela estiver um pouco ferida.
A atenção de todos se mantinha fixas no central, sem nem mesmo desvios rápidos de olhares. Até Petri ouvia com atenção ao discurso de preleção do capitão.
– Passamos por crises, por rebaixamentos, e nem sempre concordamos uns com os outros. Muitas vezes brigamos, nos desentendemos, e tudo bem, famílias são assim. – Continuou o central. – E é disso que precisamos lembrar hoje. De que apesar das diferenças, das discordâncias, nós somos um time, somos a alma dessa cidade que está enfrentando o frio e a neve para estar aqui hoje e nos ver jogar. Nós não nos abalamos. Nós não cedemos. Nós não desistimos. Isso é o Pelicans, isso somos nós. – Falou agitado, de modo mais eloquente. – Nós não cedemos com uma briga, e se brigarmos, estaremos de pé no momento seguinte, porque somos jogadores de hockey e é preciso de muito mais que alguns socos e perder alguns dentes para nos parar.
Parte do time fez barulho batendo nos armários, outros com gritos, urros e assobios, em concordância com o central.
– Falta pouco para eu voltar para o gelo e quero voltar para o mesmo time que deixei. Um time forte, que faz os adversários terem pesadelos, porque não importa o quanto porrada a gente leve, a gente se levanta e marca no segundo seguinte. É para esse time que eu quero voltar. Um time que está pronto para enfrentar qualquer coisa junto. Um time que só tem uma meta, vencer. – quase se sentia como quando estava prestes a entrar em campo. – Não dá tempo para lamentações, para intrigas ou para conversa. Somos jogadores de hockey, ir para o gelo com tudo é o que fazemos. Sem papo, sem pensar, sem frescura. – A voz de era mais uma entre os gritos dos companheiros de equipe. – Somos só um time, não dois, não três. Um.
Somos Pelicans, e hoje vamos fazer os alemães voltaram para Munique tentando pesadelo com o nosso rosto.
Ao final de seu discurso, o time parecia transformado, animado como se se tratasse de um jogo dos playoffs, como se aquele fosse o jogo mais decisivos de suas vidas. Alguns abraçavam , enquanto outros batiam seus capacetes uns nos outros, saudando os companheiros e agitando o time.
– É hora do show! – Waltteri gritou, chamando o time para fora, como costumava fazer. – É isso aí, capitão. – O ala saudou ao passar por ele, batendo em seu ombro.
– Vamos acabar com eles. – Santtu cumprimentou antes de sair do vestiário.
– Bom te ter de volta, irmão. – Atte disse quando passou por .
– É disso que estou falando. É disso que estou falando. – Petri se aproximou, dizendo enquanto olhava nos olhos de e o segurava pelo ombro. – É disso que precisamos.
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01 de dezembro de 2021, Lathi - Finlândia
Isku Areena
estava nervosa. Sentada no camarote especial de Lauri, a terapeuta assistia ao aquecimento, mas seus pensamentos não estavam verdadeiramente ali. Se fosse escolha sua, teria assistido ao jogo junto à torcida, mas Petri a olhou como se a inglesa tivesse ofendido a mãe do finlandês quando contou de seu plano. Preferia ficar mais distante, de onde conseguiria pensar, ser ela mesma e não precisaria se conter, vigiar cada movimento. também devia assistir à partida dali, mas o central ainda não havia sido visto por , ao contrário de Aleks, que fez questão de se sentar ao lado de quando a viu no camarote.
O ala parecia distraído em seu celular, mas apenas a presença dele era suficiente para deixar a inglesa tensionada. Mesmo sabendo que ele era alguém do time, e que cedo ou tarde teria que tentar construir uma relação boa com Haatanen, naquele momento só conseguia pensar no tipo de provocação que o loiro poderia fazer. Talvez, se tentasse mostrar estar com a guarda baixa, ou tentar pedir por paz, Aleks não fizesse nenhuma piada de duplo sentido que podia despertar uma reação exagerada em ou a curiosidade de Lauri ou alguém do time.
– Então. – A inglesa hesitou, tossindo, na tentativa de deixar a voz mais limpa. – Como você está, Aleks?
– Que gracinha, tentando conquistar o inimigo via empatia, ? – Aleks sorriu irônico e arqueou uma sobrancelha, sem afastar os olhos do celular.
– Você não é meu inimigo, Aleks. – Negou a inglesa.
– Alguém precisa te avisar que ser a personagem boazinha não tá com nada hoje em dia. – Disse ele, sem parecer levar a sério.
– Eu só estou tentando ser civilizada com você, mesmo que você não seja o maior merecedor. – devolveu entredentes.
– Por que não? Você ainda está me acusando de tentar matar seu namorado? – Aleks enfim ergueu os olhos para ela, mas continuou sorrindo com deboche.
– Ele não é meu namorado.
– Coitado, e você já disse isso a ele? – Haatanen projetou o lábio inferior.
– Qual é o seu problema, Aleks? O que eu fiz a você? Por acaso te ofendi? E o ? Por que fazer isso com ele? Com o seu amigo?
– Vocês são dramáticos demais. – Aleks rolou os olhos e bufou, cansado daquele assunto.
– Dramáticos? É sério? – o encarou chocada. – Você não tem nenhum tipo de noção da confusão que criou aqui, não é? Do quanto sua pegadinha cruel ferrou as coisas.
– Não, não diga isso, inglesinha. – Aleks ergueu um dedo, de forma sarcástica. – Foi você quem deu o bombom e outras coisas pro .
– Porque você me disse para fazer. – Acusou a terapeuta, irritada com a postura do ala.
– Certeza que usei essas palavras? – Aleks fingiu conferir algo nas unhas.
– Não sei como Atte e conseguiram conviver com você por tanto tempo. – negou com a cabeça. – E entendo agora porque o time não gosta de você. Você é detestável, Aleks, mas é inseguro, pequeno, e isso é nítido. E eu acho que você sabe disso e até concorda, por isso reage assim, porque quer disfarçar o tanto que se odeia, e que não consegue conviver consigo mesmo.
– Ótimo, virou psicóloga agora, é? – Aleks debochou outra vez.
– É por isso, não é? Por isso que me detesta. – As peças começaram a se encaixar no quebra-cabeça mental da terapeuta. – Por isso implica comigo desde o início, não é? Porque sabe como é, e sabe que as duas únicas pessoas a suportar você são e Atte. Só que Atte não me parece o tipo de pessoa compreensiva que tolera tudo, mas é. Do que você tinha medo? De que se conhecesse outra pessoa deixasse de dar atenção a você? Ou que percebesse quem você realmente é?
– Esse lugar está cada vez mais mal frequentado. – Aleks negou com a cabeça. – Se contratam alguém como você, qual é o próximo? Um urso para animar a torcida no intervalo?
– Você não precisava ter feito nada disso, só para que saiba, você afastou e Atte de você sozinho. – continuou a falar, arriscando seguir sua intuição. – E agora eles também sabem o tipo de coisa baixa que você é capaz de fazer, e é uma questão de tempo até eles perceberem que só fez isso por ciúmes e insegurança.
– Acho que você ficar com o tonto do te fez pensar que é mais do que realmente é. – Aleks girou o corpo na direção da inglesa, a pele do rosto estava avermelhada, e apesar de seu tom ser calmo, seu olhar e músculos tensionados diziam o contrário. – Você não acha que vai ser só questão de tempo até o enjoar de brincar com você? – Aleks sorriu. – É só alguém de fora chegar. A única razão para o ficar interessado em você é o fato de você ser estrangeira, porque ele já namorou com todo o resto da cidade. No instante em que outra estrangeira chegar, você perde seu posto. – Haatanen sorriu com a reação de , que apertou os lábios e uniu as sobrancelhas. – Surpresa, inglesinha? É tão inteligente, mas não tinha percebido essa ainda? Jogadores de hockey são assim, a gente pode brigar, mas no final do jogo somos amigos de novo, só não dá para dizer o mesmo sobre as nossas garotas. – Aleks piscou, sorrindo de lado, como quem faz um elogio, e em seguida ficou de pé, afastando-se de .
respirou fundo, encarando o gelo vazio por alguns instantes. Seguindo sua intuição, mesmo através de métodos nada ortodoxos, sabia que a cada provocação a Aleks, tocando em sua ferida, mais ele a tentaria atacar de volta, e fora o que Haatanen fez. Mesmo sabendo que aquilo não passava de uma resposta emocional, a fala do jogador sobre havia ressoado de alguma forma dentro da terapeuta, talvez alimentando suas inseguranças já existentes.
Mas precisava abstrair e pensar no que fazer com sua recém descoberta. Não podia levar aquilo para sua relação com , não seria nem justo.
O time enfim voltou ao gelo, prontos para a execução dos hinos, ao mesmo tempo em que um sorridente e animado entrava no camarote.
cumprimentou Lauri com um abraço, e Aleks com um aceno de cabeça, sorriu fechado para e se manteve afastado da terapeuta, como combinado anteriormente entre eles. E mesmo que a inglesa quisesse muito conversar com , fazer perguntas, saber de onde havia brotado tanta animação e bom humor, não podia, então se contentou em assistir à partida sozinha, ao lado da esposa de Petri e seus filhos. Enquanto assistia do outro canto, com Lauri e mais alguns da comissão técnica, só restando aos dois, contatos visuais distantes.
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01 de dezembro de 2021, Lathi - Finlândia
Apartamento de
mal tinha colocado as chaves sobre o aparador quando ouviu alguém na porta. Depois do fim do jogo, com vitória para os Pelicans com diferença de dois gols, a inglesa tinha saído sozinha, parado em uma lanchonete e comido um grande hambúrguer, sem pressa, e depois caminhado até em casa, aproveitando que a ventania congelante havia cessado. O time provavelmente comemoraria até tarde, então a terapeuta não se importou de esperar por uma carona.
Mas quando abriu a porta, depois de conferir as horas no celular, se questionando sobre quem podia a estar perturbando tão tarde, foi surpreendida pela montanha .
não esperou por um convite, assim que a porta foi aberta, avançou sobre a inglesa, erguendo-a do chão enquanto gargalhava cheirando a cerveja e suor. tentou se segurar os ombros do central, mas pela primeira vez talvez estivesse experienciando a real brutalidade de um jogador de hockey. ria alto e a abraçava apertado, enquanto se concentrava em não cair dos ombros dele.
– Vencemos,
rakkaani. Dá para acreditar? A gente venceu! – comemorou. – Uma vitória e tanto. Você precisava ver. Foi incrível!
– , eu estava lá. – o lembrou, sorrindo. – Eu assisti ao jogo.
– E depois, no vestiário, foi tão legal! Eu acho que as coisas estão voltando ao normal. – Ele ainda gargalhava. – Foi muito bom. Aquele lance do Waltteri...foi a melhor jogada da temporada.
– , será que você pode me colocar no chão? E aí depois me contar sobre o quão animado está? – Pediu ela, e o central enfim pareceu se dar conta de que ela ainda estava em seus ombros, pondo-a no chão. – Obrigada. Melhor assim. – Agradeceu, ajeitando a roupa que usava.
– Foi mal, eu me empolguei. – Ele sorriu grande, e tentou se apoiar a parede com uma mão, mas falhou e quase caiu, apoiando o ombro no lugar.
– Você está bêbado? – sorriu, tirando as botas sujas de neve.
– Eu não. – Ele negou, fazendo careta. – Só estou feliz.
– Ah, claro. Feliz. – A inglesa fingiu acreditar, deixando um beijo rápido nos lábios do central quando passou por ele para pendurar seu casaco. – Por que não ficou comemorando com os rapazes?
– Porque eu queria comemorar... – começou a responder, mas foi impedido por um soluço. – Com você.
sorriu derretida, inclinando a cabeça sobre o ombro e se aproximou dele, abraçando a cintura do central e o beijando outra vez.
– Se alguém acender um fósforo no apartamento do lado, o prédio explode. – brincou, fazendo careta ao sentir o hálito alcoólico dele.
– Mas eu não estou bêbado. – sorriu como uma criança. – Se eu estivesse bêbado eu não ia conseguir fazer isso.
se afastou alguns passos de e tentou ficar de pé sobre um pé só, dobrando um dos joelhos, mas foi preciso que o jogador se apoiasse a parede para não cair.
– Pare com isso antes que você se machuque. – pediu, rindo do central, que no segundo seguinte se sentou sobre a bancada da cozinha. – . – A terapeuta o repreendeu, mas o central deu de ombros. – O quanto você bebeu?
– Eu não faço ideia. – gargalhou, inclinando-se na direção de , e soluçando outra vez.
– Você está feliz mesmo. – sorriu satisfeita, afagando um dos joelhos de . – Foi só a vitória ou algo mais?
– Eu fiz um discurso. – Contou . – Fiz o discurso na preleção.
– Que ótimo. – A terapeuta vibrou. – Fico muito feliz. As coisas estão voltando para os eixos, não é?
– Acho que sim. – Assentiu o central. – Você tem alguma coisa para beber aqui? – Perguntou, vasculhando a cozinha de com o olhar.
– Você sabe que eu não bebo nada alcoólico. – o lembrou, sorrindo, e assentiu franzindo o nariz.
– O seu amigo Waltteri é muito mais legal do que eu pensei. – disse de repente.
– Como assim?
– Ele me apoiou, ontem. Falou comigo que eu era o capitão e que tinha que voltar. – Contou . – Seus amigos são legais, mas o Nieminen não gosta de mim, eu acho.
– Eu sei que eles são legais, por isso são meus amigos. – piscou.
– Obrigado. – falou, descendo da bancada.
– Pelo quê? – quis saber.
– Por ficar comigo. – Respondeu , erguendo outra vez, sem dar a ela tempo de resposta.
– Será que a gente não vai conseguir ter uma conversa normal hoje, que seja realizada por inteiro com nós dois no chão?
– Eu não quero conversar, quero comemorar. – Falou ele, levando-a para o quarto.
– Comemorar como?
– Espera aí, já vou te mostrar. – gargalhou outra vez ao se desequilibrar e quase cair com sobre os ombros. – Se eu conseguir.
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02 de dezembro de 2021, Lathi - Finlândia
Apartamento de
Os primeiros raios de sol que tocaram os olhos de fizeram com que a terapeuta cobrisse os olhos com o antebraço e puxasse o cobertor mais para cima. Depois de alguns minutos, vendo que dificilmente conseguiria pegar no sono outra vez, esticou a mão até a mesa de cabeceira, tateando em busca do celular. Depois de desbloquear a tela, descobriu que ainda era cedo, perto de oito e meia, e voltou a cobrir o rosto, remexendo-se na cama em busca de uma posição melhor.
– Onde tá a playlist despertador? – perguntou com voz de sono, rolando propositalmente sobre , deitando sua cabeça no peito da inglesa.
– Eu não uso despertador quando não preciso acordar cedo. – Ela respondeu, falando baixinho, acariciando a cabeça de .
– Que horas são?
– Ainda não são nem oito e meia.
🎵 Dê play na música aqui, e se necessário coloque para repetir – Céline Dion – How Does A Moment Last Forever 🎵
não respondeu, e pelo seu ritmo de respiração e a falta de movimentos, percebeu que o central estava dormindo outra vez. Era boa a sensação de tê-lo ali, só para ela, respirando serenamente, enquanto o ar que expirava se chocava contra o peito nu de , e o cheiro dos cabelos escuros de invadiam seu nariz. Era uma pessoa sensorial e amava memorizar sensações, toques, contatos, gostava de pensar nisso quando estava sozinha. Amava se lembrar do peso do
seu capitão sobre si, do toque firme e delicado dele, da textura de seu cabelo, do jeito que ele a abraçava ou da forma única com que segurava sua mão.
Devia dizer a ele que estava apaixonada, pensou. Na noite passada e na anterior declarou gostar dela, não usou a palavra apaixonado, mas em certos contextos, palavras não importam muito. Mas talvez fosse a hora de dizer, de se declarar a ele, fazer um jantar romântico e dizer tudo que sentia, o tanto que adorava a presença dele.
Nunca pensou que depois de tudo, precisaria que sua vida profissional e pessoal tivesse uma virada tão grande para encontrar lar em alguém. Claro que as questões éticas ainda a preocupavam, sabia que muito ou tudo em seu modo de lidar com Aleks era afetado por seus sentimentos pessoais, assim como quando defendia a posição de capitão de . Mas teria que aprender a separar as coisas, lidar com praticidade e imparcialidade, como era justo. Sabia que a única coisa que não estava em discussão era se separar de um dos seres humanos mais dóceis que já havia conhecido na vida.
Tinha conhecido muitas pessoas na vida, mas não se lembrava de nenhum outro homem que se dispusesse a fazer por ela o que fazia. Admirava o central mais a cada dia, por sua postura, sua generosidade, o bom coração, a doçura quase infantil escondida atrás da expressão fechada, mas que quase sempre se revelava no sorriso iluminado dele.
Não era uma máxima para todos, afinal, cada vida e destino tem seu curso próprio, mas em algumas vezes, não adianta perseguir o que se quer, basta viver. Enquanto estava em seu país durante toda sua vida, dando duro na faculdade e no trabalho, depois de formada, podia ter feito tudo a seu alcance para se apaixonar por alguém, ou para ter alguém apaixonado por si. Mas não funcionaria.
Bastou seguir seu destino, caminhando pelos caminhos traçados para si, para que enfim, do modo mais inesperado, no lugar mais inimaginável, pelo tipo de homem mais incomum, estivesse perdidamente apaixonada.
se remexeu, mudando a posição de sua cabeça, mas permanecendo sereno, enquanto afagava seus cabelos como se aquele fosse o ser mais precioso do mundo. Era assim que se sentia estando com ela, numa manhã comum, dividindo a cama, com o rosto sobre o peito de , ouvindo seu coração bater.
Tudo que o capitão conseguia pensar era no quanto estava feliz, no quão apaixonado estava. Não sabia se devia dizer, ainda tinha medo, embora tudo que envolvesse a terapeuta inglesa lhe causasse uma gostosa sensação de segurança. Carregava muita bagagem da vida, não seria fácil abrir mão de tudo tão rapidamente, por mais que se esforçasse para isso. Temia mostrar mais do que devia e que ao se revelar, lhe desses as costas. Também ficava ansioso quase sempre, pensando sobre a terapeuta, preocupado se sua hesitação por acaso a poderia afastar, criando dúvidas sobre seus sentimentos por ela.
Queria que soubesse do que sentia, queria que todos soubessem, mas ainda existiam barreiras altas demais para simplesmente transpor. Apesar disso, em vários momentos, tomado por intensa alegria ou uma certeza quase cega, tinha utilizado de outros meios, torcendo para que entendesse a mensagem. Não havia usado a palavra amor ou paixão ainda, e mesmo que elas estivessem sempre lutando para pular de sua boca quando na presença dela, buscava incessantemente outros modos para dizer. Fosse levando comida quando ia vê-la a noite, fosse tentando ficar perto da inglesa o máximo de tempo que conseguia, se oferecendo para ensinar o que sabia sobre hockey para ela, ou até o mais extremo, abrindo-se devagar.
era a pessoa.
Lembrava-se de pensar sobre a inglesa e sobre ela ser
sua concha especial. Agora, depois de algum tempo, admitia feliz que sua versão do passado tinha razão em pensar daquela maneira. era sim sua
sua concha especial, era sua pessoa favorita, era sua garota, sua inglesa, sua terapeuta, sua
amor.
Se apaixonar por ela era fácil e sem justificativa. Obviamente poderia listar centenas de coisas pelas quais fariam qualquer um se apaixonar por , mas desde o princípio, seu sentimento pela terapeuta inglesa tinha tido origem pura e natural. Não sabia dizer exatamente quando se apaixonou, o que ligou o interruptor cheio de teias de aranha que tinha dentro si. Mas sabia que quando a viu pela primeira vez, se colocando com firmeza no meio de um bando de jogadores de hockey brutos e sem noção, só sabia que ela era diferente. Algo talvez o tivesse dito que não seria só mais uma pessoa comum no cotidiano do central.
Talvez fosse o jeito com que ela se concentrava e parecia a mais inteligente das pessoas quando estava trabalhando. Ou talvez fossem as expressões faciais dela, quando contrariada, ou quando pega em flagrante mentindo sobre gostar de hockey. riu abafado ao se lembrar naquela noite, ajeitando-se melhor sobre o corpo da inglesa, aproveitando seu calor macio. Podia ser também sobre como ela sempre tinha interesse em , sem nunca desistir de tentar atravessar seus muros. Ou pelo fato de o defender sempre que podia, ou de não ter medo de ninguém e nunca se calar quando acreditava que precisava falar.
não precisava merecer, embora merecesse, não precisava corresponder, embora também o fizesse, não era necessário nenhum retorno por parte dela. a amava por puramente amar, sem explicações ou justificativas, era simples, a resposta era
porque sim. Estava apaixonado porque sim, faria o que fosse preciso por ela porque sim. Se tornaria uma pessoa melhor porque sim. No final das contas, era bom amar de novo, pensou ele, aproveitando o toque tão precioso dela.
Não fazia ideia de quanto tempo estavam ali, deitados, contemplativos, quando decidiu ergue a cabeça para conferir se ainda dormia. Quando o fez, o jogador encontrou o sorriso doce da terapeuta, bem acordada.
– Você acordou. – Ela disse, voltando a afagar os cabelos dele.
– Estava aproveitando você. – Ele sorriu, depositando um beijo delicado entre os seios de , subindo devagar com uma trilha de beijos até os lábios dela. – A gente devia pedir demissão e ficar aqui para sempre. – Sugeriu ele, abraçando a terapeuta.
– Você ficaria entediado antes de completar um mês. – sorriu contra os lábios de , envolvendo o pescoço do central com os braços.
– Claro que não. – Ele negou, forçando um tom ofendido, fazendo-a sorrir.
– Eu estou muito feliz. – declarou, e afastou seu rosto alguns centímetros, sorrindo também. – Estou muito feliz.
– Eu disse ontem que a gente ia comemorar. – Ele brincou com a lembrança da noite anterior, não por não ter entendido ou por não querer se comprometer dizendo estar transbordando de felicidade, mas sim porque se começasse a falar, provavelmente diria mais do que estava preparado para admitir. – Você não me levou a sério.
– Ah, desculpe se não achei que você daria conta quando chegou bêbado na minha casa. – embarcou na brincadeira dele, rolando sobre o central e ficando por cima, fazendo o sorrir mais.
– Você me subestima assim, ? Depois de tudo? – Ele franziu o cenho. – Nada no mundo me impediria de funcionar com você.
– Você sempre foi convencido assim, ou é só reflexo da vitória de ontem? – o beijou rapidamente, e depois projetou o lábio inferior, com quem pondera sobre o assunto. – Como eu ainda suporto você? – gargalhou, e tomou de volta sua posição, ficando sobre a terapeuta.
– Até parece. – O central negou com a cabeça. – Segundos atrás você quase estava me pedindo em casamento.
– Que horror, eu nunca me casaria com alguém como você. Que castigo. – uniu as sobrancelhas, fingindo falar sério.
a olhou nos olhos, sendo atingido por um saudosismo confortável e quente, e então sorriu.
–
Você mente muito mal, .
Os dois se olharam por alguns instantes, sorrindo, até que tomou a iniciativa de unir seus lábios em um beijo apaixonado.
– Eu tô começando a achar que foi uma péssima ideia a nossa ideia. – sussurrou, enfiando o rosto na curva do pescoço de . – Você é péssima mentirosa e eu não vou conseguir ficar longe.
– Mas a ideia de fingir que não temos mais nada foi sua. – A inglesa riu abafado. – Claro que essa entra para o grupo das suas ideias mais idiotas...
– Há, há. – fingiu uma risada, trancando a expressão no momento seguinte.
– O quê? Não me olhe assim, você sabe que tenho razão. – continuou implicando. – Mas dessa vez, talvez seja a melhor saída. – Disse, mas interrompeu sua fala para beijá-lo rapidamente. – Talvez se esse holofote sair de nós, a gente tenha alguma paz.
– E ela ainda tem coragem de dizer que é uma ideia idiota. – rolou os olhos, acariciando o braço da terapeuta. – Como eu disse antes, vai dar uma despistada em todo mundo. Ninguém mais vai saber.
– Você tem razão. – assentiu, expirando pensativa. – Talvez seja melhor assim, não resolve nossos problemas, mas pelo menos nos dá tempo para pensar.
– Você confia em mim? – sorriu sem mostrar os dentes, olhando para ela.
– O que disse?
– Você confia em mim? – Ele repetiu.
– Sim. – estreitou o olhar, desconfiada e curiosa com o que viria a seguir.
– Vai ficar tudo bem. – sussurrou, unindo suas testas. – Eu prometo.
❄❄❄
02 de dezembro de 2021, Lathi - Finlândia
Apartamento de
e só precisariam estar na arena mais tarde, tinham tempo de sobra para um café da manhã demorado e preguiçoso, mesmo depois de ficarem na cama por mais tempo do que deviam. Enquanto , usando o uniforme do time com o número trinta e quatro estampado sob o nome de
fazia panquecas, se entretinha no celular, com um jogo qualquer, sentado sem camisa. O central aguardava a refeição que era preparada pela inglesa, aproveitando o momento relaxado, sem que mil coisas se passassem em sua cabeça. também estava em silêncio, concentrada na preparação das panquecas, mas ao contrário do central, sua mente não estava tão limpa.
– . – A inglesa chamou, tentando atrair a atenção do outro.
O central murmurou um som ininteligível, sem erguer os olhos da tela.
– Eu estava pensando... nos meus amigos, Louis e Maisie. – começou a contar, vigiando a panqueca. – Não sei se quero mentir para eles e dizer que não estamos mais juntos. Já estou incomodada por não estar falando com eles, não queria mentir. Acho que tudo bem se eles souberem, não tem como ninguém daqui ficar sabendo por eles. E também, eu gostaria muito de ter uma conversa franca, sabe? Resolver as coisas. Eles tinham razão, ainda tem, mas sinto que preciso me desculpar pelo modo com que reagi a quando eles me falaram sobre isso. O que acha? – Quis saber ela, e quando o capitão demorou a responder, afastou os olhos da frigideira e o encontrou ainda concentrado em seu celular. – Eu não acredito que você não prestou atenção no que eu falei. – Zangou-se ela, arremessando uma toalha no rosto de .
– O que? Eu o que? – ficou de pé, assustado com a toalha que o atingiu no rosto.
– Eu estou tendo uma conversa com você, ou pelo menos tentando, e você sequer pode prestar atenção.
– Eu estava prestando atenção. – Ele se defendeu.
– Estava é? Então o que eu disse? – Indagou , cruzando os braços sobre o peito.
– Sobre... – hesitou, coçando a nuca. – Sobre... sobre a gente?
– Você é inacreditável. – se afastou depois de desligar fogão. – De um jeito negativo. – Falou, saindo da cozinha, mas foi interceptada por , que a segurou pela cintura.
– Desculpe, eu vacilei.
– O quê? Só consegue prestar atenção em mim quando a gente está transando? – tentou se desvencilhar de .
– Isso não é verdade. – Ele protestou, unindo as sobrancelhas – Não é verdade e você sabe.
– O que eu sei é que você não conseguiu prestar atenção no que eu estava falando porque seu celular era mais interessante. – enfim se afastou de , sentando-se no sofá sem delicadeza.
– Eu não ouvi você falar, estava concentrado. – se justificou, seguindo-a até a sala. – E já pedi desculpas também.
– Pediu.
– Qual é, ? Não foi tão sério assim. – sorriu nervosamente, sentando-se de frente para a terapeuta. – Só não ouvi você falar comigo, mas parece que fiz a pior coisa do mundo pelo jeito com que você está reagindo.
ergueu os olhos para o central, ainda chateada, talvez ele tivesse razão. Talvez não fosse sobre , talvez fosse sobre como toda vez em que algo daquele jeito acontecia, ela se lembrasse das vezes em que sua família a ignorou por qualquer outra coisa mais importante.
– Tá bem? Não foi nada. – continuou a falar, como quem fala com uma criança, olhando nos olhos de . – Eu tô aqui agora, prestando atenção, pode falar.
– Não quero mais falar nada. – Negou a inglesa, afastando os olhos dele outra vez.
fechou os olhos e respirou fundo duas vezes, depois contou de zero a dez mentalmente, devagar.
– Eu realmente sinto muito. – Disse ele enquanto se levantava e se sentava ao lado da inglesa no sofá, puxando-a para um abraço, aninhando junto a si. – Você sabe que eu sempre quero saber tudo que quiser falar, tudo sobre você e seus assuntos. Sempre é assim. Foi só um momento de desatenção.
não respondeu, mas também não se opôs ao abraço de , encolhendo-se junto ao corpo dele. No fundo reconhecia estar tendo uma postura infantil, embora não quisesse ter outra postura naquele momento. Mas a paciência de a pegara de guarda baixa, esperava, de alguma forma, que ele se irritasse e uma briga começasse, mas ao contrário disso, teve paciência e cedeu. Era uma postura inesperada, que havia pego completamente desprevenida, mas de um jeito bom.
– Não quero mentir sobre nós para Maisie e Louis. – disse enfim, depois de algum tempo em silêncio.
– Seus amigos de Birmingham? – perguntou quase que de modo retórico. – Tudo bem, não precisa. Isso é só para o pessoal do time. – Completou o central antes que dissesse qualquer coisa. – Era isso que tinha falado comigo antes? – Ele quis saber.
– Sim. – assentiu, permitindo-se abraçar .
– Desculpe outra vez, prometo que vou ficar longe do celular quando estiver com você. – O central beijou o topo da cabeça de , abraçando-a mais forte.
– Me desculpe também, me chateou, mas eu fui infantil.
– O quê? Tá brincando? – riu. – Agora eu pelo menos posso usar isso para me vangloriar. O dia em que eu não estava tão errado assim. – Ele brincou sorrindo.
– Babaca. – A inglesa riu fraco, acompanhando o jogador.
– Mas...– hesitou pensativo, depois de suspirar. – Posso perguntar o porquê?
– O porquê de que? – ergueu os olhos para ele.
– Por que você se chateou com uma coisa simples. Quer dizer, eu sei que é chato, mas foi uma reação um pouco exagerada, e você não é do tipo emocionada, eu sou.
– Que bom que hoje em dia você já se aceita. – sorriu, implicando com ele e sorriu de volta.
– E então? – Ele incentivou.
– Vai ver que as vezes eu sou emocionada também, quando o assunto é você. – deu de ombros, sorrindo fraco. – É meio bobo, na verdade. – A inglesa voltou a dizer depois de um tempo em silêncio. – Quando eu era criança esse tipo de coisa era normal, meus pais sempre me interrompiam para falar de outra coisa, ou nunca estavam escutando quando eu falava. Acho que esse tipo de situação me ativa algum gatilho hoje em dia. É idiota, eu sei...– sorriu outra vez, envergonhada, mas negou com a cabeça, ele tinha as sobrancelhas baixas, boca em uma linha fina, a expressão séria de .
– Não é idiota se te faz ficar mal. – inclinou um pouco a cabeça, para que pudesse olhar nos olhos de . – Você quase nunca fala da sua família, ou de quando morava lá.
– Você também não. – acusou.
– É, mas porque ultimamente eu só tenho tido dois assuntos, você e o time. – sorriu.
– Acho que não tenho muito o que falar também. – deu de ombros. – Não é que eles tenham sido péssimos pais e que a gente se odeie hoje em dia. Acho que é só que, quando eu fico longe, eu fico melhor. Não lido com as expectativas, nem com as cobranças.
– Você sente falta deles? Da sua família?
– Sim, claro que sim. Eles ainda são a minha família, é claro que eu sinto falta. – sorriu. – Mas fico melhor se não tiver que lidar com os olhares de reprovação ou com as perguntas nos encontros de família. – Contou e assentiu. – Podemos mudar de assunto?
– Hoje as coisas estão invertidas. – riu alto. – Vamos comer, quero ver o que você é capaz de fazer na cozinha. – O central brincou, ficando de pé e esticando uma mão para .
– Você vai querer sair daqui correndo depois de comer. – brincou, abraçando-o de lado enquanto iam até a cozinha.
Flor do campo: Essas plantas carregam um intenso simbolismo festivo e representam sentimentos como energia, felicidade, equilíbrio e ponderação.
02 de dezembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
Estava levando tempo demais para que Louis e Maisie atendessem a chamada de vídeo. estava em sua sala de sempre, era algo perto das duas da tarde, depois de decidir recusar a carona de para o centro de treinamentos e caminhar até lá, estava a postos para o trabalho. Logo veria o capitão outra vez, tinha o nome de em sua agenda com letras maiúsculas. Também queria tentar conversar com Aleks, explorar a última conversa que tivera com o ala, mas antes, precisava curar o gatilho de sua agitação, se resolvendo com os amigos ingleses.
Depois de mais tempo que o habitual, tempo esse que imaginava Louis convencendo Maisie a aparecer no vídeo, os dois surgiram do outro lado da tela.
– . – Louis sorriu, mas Maisie apenas arqueou as sobrancelhas, como se aquilo significasse algum tipo de cumprimento.
– Oi, gente. – sorriu de volta, um pouco mais aliviada. – Que bom que me atenderam.
– Claro. – Louis assentiu. – O que aconteceu? Pareceu urgente quando mandou mensagem hoje de manhã.
– E é mesmo. – respirou fundo, ajeitando os ombros. – Queria pedir desculpas. Primeiro pela forma que reagi quando conversamos pela última vez, segundo por não ter me desculpado antes.
– É sério? – Maisie estreitou os olhos. – Está mesmo pedindo desculpas?
– Estou, de coração. – Disse a terapeuta tocando o peito. – Pensei muito, conversei com outro amigo que me disse o mesmo que vocês. – Quando mencionou o terceiro amigo, pôde ver a careta de insatisfação que Maisie vestiu, mesmo que por alguns segundos. – O que estou tentando dizer é, antes de vocês falarem, não tinha pensado sobre a questão ética que envolvia minha relação mais íntima com . Mas vocês falaram e eu pensei, conversei com outra pessoa que confio e ele disse que vocês tinham razão. Eu só queria dizer que sinto muito, que reagi mal e que sei que vocês tinham razão. Queria pedir para que me perdoem, se puderem. – A terapeuta projetou o lábio inferior de modo inconsciente.
Louis e Maisie se olharam por algum tempo, como se conversassem por pensamento sobre o que fazer.
– Claro, , não se preocupe. – Louis sorriu sereno. – Está tudo bem. Você é nossa amiga, a gente se preocupa. E também, não é como se eu suportasse ficar só com a Maisie aqui. – Brincou o médico, sendo empurrado por Maisie pelo ombro.
– Infelizmente esse é o papel da melhor amiga, . – Maisie resmungou, fingindo ainda estar zangada. – Dizer o que você não quer ouvir.
– É, eu tô sabendo. – sorriu, sentindo-se mais aliviada.
– Como você está com isso? – Maisie perguntou, inclinando a cabeça e apoiando-a em uma das mãos.
– Com isso o quê?
– Você e o seu jogador, vocês terminaram, não é?
uniu os dentes e respirou fundo, enquanto Maisie estreitava o olhar.
– Não acredito nisso! – A inglesa se irritou outra vez.
– É complicado, bem complicado. – tentou se justificar. – Nós conversamos sobre o assunto, ele e eu. Ele quis romper, mas não durou dez minutos. Não seria possível. – Explicou se esforçando para soar convincente, mas não inconsequente. – No ponto em que estamos, se nos separarmos agora, não seria um fim muito amigável, e mesmo que fosse, prejudicaria mais nossa relação profissional do que estando juntos.
– , isso continua sendo um problema. – Louis pontuou apertando os lábios.
– Eu sei, eu sei e ele também sabe. – Expirou cansada a terapeuta, esfregando as têmporas. – Também é uma coisa que me preocupa e chateia, mas agora não é possível voltar atrás. Na verdade, desde meu primeiro dia aqui isso já interfere na nossa vida profissional. Ele acha que se a gente conseguir ficar bem, pode funcionar melhor do que se separados.
– O que ele entende sobre o assunto? – Maisie ainda estava incrédula e injuriada.
– Parece ruim, mas não é tão ruim assim. – tentou explicar outra vez. – As coisas aqui estão entrando nos eixos, no time. É incorreto, precisa ser mantido em segredo por ser errado e todas as outras coisas que vocês vão dizer, mas agora já é tarde demais. Certas coisas na vida estão além da escolha, da minha escolha agora.
– Não sei o que dizer, sinceramente. – Maisie cruzou os braços sobre o peito, bufando irritada.
– Você pode dizer que mesmo não concordando me apoia, e que quando vier para cá me visitar, não se opõe em conhecê-lo. – falou, tentando despertar a empatia dos amigos, que se entreolharam outra vez.
– tem razão. – Louis concordou depois de algum tempo e disse olhando para Maisie. – Existem coisas que na teoria são mais fáceis de resolver do que na prática. – O médico sorriu com doçura.
– Eu odeio fazer isso, mas tudo bem, se você quer ficar com esse finlandês problemático e cheio de bandeiras vermelhas, não serei eu a impedir. – Falou a outra, ainda a contragosto. – E é bom que no fim isso tudo valha a pena.
– Ele é russo. – Corrigiu a terapeuta, com um sorriso aliviado. – Não posso garantir, mas posso tentar. – sorriu. – Obrigada, gente. Tenho certeza que quando vierem para cá e o conhecerem, vão entender.
– Ou não, ou vamos querer te amarrar e trazer de volta para Birmingham. – Maisie discordou.
– Podem, é uma hipótese de bases fortes. – A terapeuta sorriu mostrando os dentes e estreitando os olhos. – É bom estar bem com vocês.
– Idem. – Louis piscou, apoiando um dos braços ao redor de Maisie. – Idem.
❄❄❄
02 de dezembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
– Aí está o capitão. – foi pego desprevenido quando Atte se lançou sobre ele, no vestiário. – Bebi demais e perdi a noção do tempo ou você foi embora cedo da comemoração? – Perguntou o goleiro quando o central conseguiu se livrar do abraço sufocante de Atte.
– Uma mistura dos dois. – respondeu, ainda sorrindo, ajeitando a velocidade da esteira depois de quase ser derrubado pelo melhor amigo. – Queria ficar bem para hoje.
– Não me lembro de o time ficar tão animado depois de uma vitória como ontem. – Comentou o goleiro, imitando o central.
– Acho que estávamos precisando disso, uma noite como nos velhos tempos. – assentiu. – Aleks demorou muito a ir embora?
– Não, ele foi logo depois de você, eu acho. – Atte respondeu pensativo. – Ou antes. Não faço ideia da ordem dos acontecimentos da noite passada. – O goleiro deu de ombros.
– Isso é o resultado de não saber beber. – implicou, aumentando a velocidade da esteira.
– Cala a boca. – Atte torceu os lábios. – E você? Quando vai voltar ao trabalho para fazer jus ao seu salário milionário? Ou a gente deve preparar a papelada para a aposentadoria?
O central riu abafado e negou com a cabeça, enquanto corria na esteira.
– Estou fazendo a reabilitação, me dedicando. Talvez nas próximas semanas. – Contou. – Não vejo a hora de voltar para o gelo. Ficar de fora está me matando.
– Aleks volta no jogo de sábado. – Contou Atte. – A situação ficou resolvida? Com Petri, você e ele? – Quis saber o outro, baixando o tom de voz.
– Não sei. – deu de ombros. – Se Petri falou com ele, eu não soube.
– Mas você contou ao Petri?
– Tive que contar. – ergueu os ombros, se justificando. – Ou isso, ou Petri no meu pé. Quando conversei com ele, Petri disse sobre o respeito do time, fiquei de mãos atadas.
– Que droga. – Atte torceu os lábios, entendia a decisão do melhor amigo, mas também entendia as consequências disso.
– Pedi para deixar só entre nós, como ninguém mais falou disso, acho que ele topou. – Contou .
– Não falou mais com ele depois? – Quis saber Atte.
– Não muito. – maneou a cabeça. – Ontem ele ficou perto de mim durante o jogo, a gente meio que assistiu junto, mas não dá para dizer que rolou uma conversa. Só convivência.
– A turma da alegria estava inspirada ontem. – Atte apontou com o queixo para o canto, onde Jasper, Waltteri, Otto e Santtu faziam flexões. – Acho que Merelä não vai ficar muito tempo aqui.
– Não, não vai. – assentiu. – Mas ele é bom, muito. Acho que com isso de ficar de fora está dando para enxergar algumas coisas que não via antes.
– Tipo?
– Merelä veio falar comigo que apesar de ter gostado dessa liderança que o Petri deu a ele enquanto estou fora, que eu sou o capitão e preciso assumir o posto.
– Ele disse isso? – Atte se admirou, apontando para o grupo com o polegar. – Você acreditou?
– Por que não acreditaria? – O central deu de ombros. – A gente nunca competiu dentro do time, ele sempre foi legal. Acho que foi sincero. Me aproximei um pouco mais do Santtu e dele também, de alguma forma, eles são caras legais.
– Ah tá. – Atte rolou os olhos.
– Ciúmes, Atte Tolvanen? – sorriu, sentindo o suor escorrer pela testa.
– Não, só estou assistindo você fazendo novas amizades.
– Santtu é um cara legal, de verdade. Waltteri era neutro, mas também parece legal, não tenho nada para falar do Jasper. – maneou a cabeça. – Mas o Nieminen, acho que não gosta muito de mim.
– Você acha? – Atte riu. – Você é meio tapado.
– Eu sou o capitão, Atte. – lembrou, parando a esteira. – Pelo menos por enquanto. Não dá para ficar criando inimizade e rixa com pessoas do time. Não é aquele filme que você gosta. Como é mesmo o nome?
– As apimentadas. – Respondeu Atte, também parando a esteira. – Eu sei que você precisa de boas relações, só estou dizendo para ficar esperto. – Piscou o goleiro.
– Eu sou esperto. – O central uniu os lábios e inclinou a cabeça numa careta confusa.
– É, que nem uma porta. – Disse Atte e balançou a cabeça negativamente a cabeça e franziu o lábio.
– , está se lembrando que tem que ver a daqui a pouco, não é? – Jakkos perguntou ao se aproximar dos dois.
– Estou. – Assentiu o capitão.
– Só mais umas semanas, no máximo. – Sorriu o fisioterapeuta apertando o ombro suado de . – Logo vai estar no gelo.
– Não vejo a hora. – Sorriu fechado o central, e depois assistiu o fisioterapeuta se afastar.
– Uma pergunta. Quando vocês se encontram aqui vocês realmente fazem exercícios, ou só se pegam? Sempre tive essa curiosidade. – Atte sussurrou sorrindo malicioso.
suspirou antes de responder.
– Tenho que te contar uma coisa. – Anunciou sob olhar atento do amigo. – A gente não está mais junto. – Falou, reproduzindo a mentira combinada com a terapeuta inglesa.
– O quê? – Atte arregalou os olhos. – Como não?
– Por que o espanto? Você mesmo me disse para terminar.
– É, mas você nunca escuta ninguém, não achei que ia escutar justo dessa vez.
– O mundo dá voltas, Atte Tolvanen. – levantou as sobrancelhas, depois expirou.
– Não me diga que terminaram só por causa daquela nossa conversa. – O goleiro se colocou à frente do central, tocando seu ombro e olhando em seus olhos.
– Não, não foi. – Respondeu , sentando-se enquanto enxugava o suor do rosto na camisa. – A situação do Aleks, minha posição no time, e tem essa coisa ética também.
– Vocês conversaram? – Atte quis saber e assentiu. – E como ela reagiu?
– Bem. Foi uma conversa rápida, a gente terminou bem. – Mentiu, se odiando mais a cada palavra dita.
– E você está bem com isso? – Atte estranhou. – Estava tão apaixonado, empolgado. Tudo acabou do nada e você está okay? Quer dizer, você está com essa cara estranha, incomodada, foi embora mais cedo da festa ontem, está concentrado nos treinos. Quando você está mal, quem sofre são os equipamentos.
– Tem que ter um equilíbrio, vida pessoal ruim, vida profissional ótima. – Falou . – Eu tô ótimo, não está vendo como estou feliz? Sorrindo por aí? – Ironizou.
– Já vi que vou ter que aturar sua fase mais ranzinza e irônico pós-término outra vez. – Atte rolou os olhos. – Só vê se não se isola como da última.
– Do que tá falando? – ergueu o olhar confuso. – Aquela vez foi diferente, foi mais tempo de relacionamento.
– É, mas dessa vez foi pior. – Disse Atte, sentando-se ao lado do amigo.
– Por que diz isso? – estava verdadeiramente curioso.
– Porque nem naquela época você se distanciou um pouco de casa, e com a
você sabe quem, você mal ia para Viipuri. Nada de passar as folgas lá, ou passeando com Felix, ou jogando tênis, ou explorando seus hobbies de obsessão. – Listou Atte. – Era só ela. Acho que devagar ela foi preenchendo sua vida. – Constatou pensativo o goleiro. – Não acho ruim, acho que em algum momento você ia encontrar uma mulher que te fizesse sair um pouco do colo dos seus pais, se distanciar um pouco disso e do seu universo particular e solitário. Pena que não foi dessa vez. Mas a gente pode sair para beber e você chorar e falar mal dela, se quiser. – Sorriu, tentando acalentar o amigo, que agora lhe encarava assustado.
– Acho que eu realmente fui longe demais dessa vez. – Expirou, prestando atenção pela primeira vez nos sinais que o amigo levantava.
– Relaxa. Isso é saudável. Minha esperança era que esse natal você não usasse um daqueles pijamas de família, mas fosse a uma festa de natal normal. – Brincou Atte, balançando o central pelo ombro. – Mas sonhos são sonhos, não é?
– O que aconteceu comigo, Atte? Quando isso tudo aconteceu que eu nem percebi? – indagou perdido.
– Quando ela entrou aqui no primeiro dia, foi aí que tudo saiu do controle. – Tolvanen sorriu e se espreguiçou, depois ficou de pé. – Mas relaxa, isso faz parte quando a gente se apaixona. A tendência é sair da vida individual e criar uma vida a dois. Mas se te acalma, agora você pode voltar para o seu
incrível mundo de .
❄❄❄
02 de dezembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
– . – chamou pela terceira vez. estava distraído, não como sempre, com piadas e brincadeiras. O central parecia mesmo estar em um mundo diferente. – . – A terapeuta apertou o antebraço do jogador, enfim conseguindo um pouco da sua atenção.
– Sim. – Ele sacudiu a cabeça, tentando retomar a concentração.
– Eu pedi para você repetir a flexão de punho. – sorriu gentil.
– Ah, tá. Desculpa, não ouvi. – Respondeu ele, olhando para o punho enquanto voltava aos exercícios.
– Tudo bem? Você parece estar em outro universo hoje.
– Tudo. – Ele respondeu com um aceno de cabeça. – Tudo bem.
o analisou com cuidado, sabia que era mentira, mas preferiu não o pressionar. Conhecia o suficiente para saber que se havia algo o incomodando, o deixando fora de órbita daquele jeito, pressioná-lo só serviria para que o central se sentisse acuado e fugisse.
não era uma pessoa desatenta, principalmente quando se tratava de sua reabilitação. Desde que dera início ao processo, o jogador mal tirava os olhos do punho, realizando todos os exercícios sem reclamar. Durante os encontros com a terapeuta no centro de treinamento, era extremamente profissional, não por respeitar o ambiente e ser discreto, mas por estar tão concentrado em sua recuperação que nem tinha interesse em conversas paralelas.
Mas naquela tarde era o contrário. tinha feito musculação e outros treinos físicos antes de chegar a , mas assim que o central passou pela porta, algo sinalizou a inglesa de que ele estava diferente. A curiosidade e preocupação de estavam mais que aguçadas, mas a inglesa preferiu se conter.
– Como está sentindo? Dor? Alguma dificuldade? – Quis saber enquanto assistia a movimentação de .
– Não.
– Vou aumentar a carga, vai sentir mais pesado. – Avisou, analisando o desempenho de . – Me deixe saber como você se sente. – Pediu.
– Já disse que não é nada, está tudo bem. – Ele falou depois de expirar impaciente, fazendo a inglesa unir as sobrancelhas confusa. – Só estou pensando sobre quando vou voltar paro o gelo. Só isso. E eu nem quero conversar sobre agora. – Expôs de modo ríspido.
– . – o chamou, colocando mais firmeza na voz. – Me deixe saber como você se sente sobre eu ter aumentado o peso.
ergueu os olhos para , depois baixou a cabeça e fechou os olhos, expirou pesadamente outra vez.
– Eu não tô tendo dificuldade. – Respondeu chateado, mas sem a rispidez no tom. – Desculpa de novo.
podia insistir, dizer que era nítido que ele não estava bem e que queria saber o que o estava incomodando, que estava ali por ele e que queria ajudar, mas de novo, achou melhor não.
– Agora vamos fazer a mesma coisa, só que estenda seu punho. – Pediu, fingindo ignorar o rompante dele.
– Pode aumentar o peso. É o máximo que você tem? – Ele perguntou.
– É o máximo por enquanto. – Respondeu a terapeuta. – Você precisa voltar aos poucos, não adianta querer a carga máxima de repente. São degraus.
– Degraus demais. – bufou cansado.
– É, mas pode parar de reclamar quanto ao tempo, você já está no fim da escada.
– O que quer dizer? – O central ergueu os olhos para a terapeuta outra vez.
– Quero te reavaliar, mas acho que estamos perto da alta. Da minha pelo menos. – Contou com um sorriso leve nos lábios, olhando para os olhos do central.
– É sério? Jakkos falou de algumas semanas. – Uma luzinha brilhou nos olhos do central.
– Não sei se vamos precisar de tudo isso. – ergueu os ombros. – Pode parar agora. – Pediu, fazendo menção ao exercício que ainda realizava. – Acho que não temos muitos ganhos além do que já conseguimos. Você vai ter que ir com calma no retorno, mas não vejo porque te manter mais tempo fora.
– Petri e Lauri falaram alguma coisa? – quis saber.
– Se eles me pressionaram pelo tempo? – ergueu uma sobrancelha, depois sorriu. – Acredito que nesse ponto da história eles já entenderam que não funciona assim. Você é novo, recuperação geralmente não é demorada.
– É um alívio. – suspirou, enquanto massageava a musculatura utilizada durante os exercícios e usava compressas mornas.
– Eu sei.
Depois de finalizar a massagem, a terapeuta voltou a falar:
– É isso, . Liberado. – sorriu e assentiu.
– Tá. – Disse ele ao se levantar. – Acho que já vou para a casa.
pensou no que podia fazer, porque dificilmente teria paz se o central fosse embora daquele jeito, sem que ela soubesse o que estava acontecendo. Então, resolveu seguir seu coração e aproximou-se dele, o abraçando com força. Nos primeiros segundos não reagiu, talvez pela surpresa, depois, a abraçou de volta, como se também precisasse daquilo. Quando tentou se afastar, o capitão a puxou para mais perto, prolongando o abraço.
– Eu estou aqui para o que você quiser. – Falou ela e assentiu. – Para você.
– Eu não tô muito bem. – Admitiu , ainda com rosto afundado nos ombros de , enquanto a terapeuta acariciava sua nuca. – Me sinto péssimo por ter mentido para o Atte.
– Eu sei, também não sei como vou contar para o Santtu. – beijou o rosto de . – Será que vale a pena? A gente mentir para eles?
– Talvez não. Atte não contaria nada.
– Nem o Santtu, eu acredito. – Continuou . – Mas também, isso precisa ser convincente.
– E é só por um tempo. – Concluiu o central. – Tá, é isso. Melhor assim. Eles vão entender quando chegar a hora.
– Vão, eu espero. – concordou, afastando o rosto para olhar o jogador nos olhos. – É só isso que está te incomodando?
– Eu só quero ficar na minha. – Respondeu depois de alguns instantes em silêncio.
– , eu não quero ser invasiva nem nada. Mas me preocupo com você, é nítido que você não está bem, que tem alguma coisa te incomodando muito. – A inglesa disse, segurando o rosto do central entre as mãos e o olhando nos olhos. – Eu sei que não quer falar sobre, mas eu só preciso saber se está tudo bem com você. Se está tudo bem com a gente.
baixou o olhar.
Entendia a reação dela, se estivesse no lugar de , estaria surtando e insistindo para que ela contasse o que a incomodava. Mas depois da conversa com Atte, percebendo como as coisas estavam diferentes, como tinha mudado sua perspectiva, queria e precisava de um tempo consigo mesmo. Precisava colocar a cabeça no lugar.
– Eu vou ficar bem. Vou para a casa dos meus pais nesse fim de semana, eu acho. – Falou ele. – A gente se fala. Não precisa se preocupar.
– Não vem amanhã? Ou para o jogo de sábado? – franziu o cenho.
– Vou estar em Viipuri, assisto de lá. – deu de ombros. – A gente se fala.
beijou rapidamente a bochecha de e deixou a sala, com o olhar confuso de preso as costas.
❄❄❄
02 de dezembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
Depois do despertar gostoso daquela quinta, a breve
DR, oportunidade de mais uma vez surpreender a inglesa, a havia deixado preocupada e confusa. O central estava bem durante a manhã, e bem quando saiu do apartamento, mas no reencontro, tudo era diferente. Talvez fosse ansiedade ou qualquer coisa do tipo que fazia com que a inglesa se perguntasse se havia feito alguma coisa de errada, ou se aquilo era o capitão perdendo interesse ou dando início ao afastamento.
Que isso, ? Ficou maluca? a inglesa disse a si mesma, chacoalhando a cabeça, tentando se livrar daqueles pensamentos enquanto assistia ao treino no gelo do time. Ainda tinha trabalho pela frente, e não podia deixar que sua vida pessoal dominasse seus pensamentos.
Quando o treinador apitou o fim do treino do dia, cumprimentou os jogadores que passavam por ela, até a vez de Atte.
– Atte. – cumprimentou com um aceno de cabeça. – Como está? Será que podemos conversar um pouco? – Perguntou e viu o goleiro hesitar. – Se estiver muito cansado, eu entendo, deixamos para depois. Mas é breve.
Atte baixou a cabeça, parecia pensar sobre a proposta, enquanto isso os outros atletas deixavam o gelo, um por um, em direção ao vestiário.
– Tudo bem, podemos. Se for breve.
– Serei. – sorriu. – Eu gostaria de uma opinião sua. Não quero envolver qualquer pessoa do time nesse assunto, mas talvez não seja necessário, até porque, você já sabe de tudo.
– , se for sobre o , foi mal, mas não vou poder ajudar. – O goleiro a interrompeu, fazendo unir as sobrancelhas confusa e alarmada. – Eu sei de tudo, tem razão, e se quer saber, acho que é melhor assim, juntos não estava dando certo. Mas não vou ficar no meio, é melhor você deixar para lá, e eu sei que o vai fazer a mesma coisa. Isso já deixou ele bem perdido nos últimos tempos, e eu vou proteger o meu melhor amigo. Sempre.
– O quê? – Foi só o que conseguiu dizer.
– Ele me contou sobre vocês, que terminaram. E é como eu disse, acho que foi melhor assim, já estava mal por ficar fora do time, depois aconteceu aquilo entre ele e Aleks... claro que eu não queria que agora ele estivesse sofrendo por você também, mas que bom acabou antes de um desastre maior.
– É, obrigada, Atte, por compartilhar seu carinho e as dóceis palavras sobre o quanto torcia pela relação. – ironizou quando enfim entendeu sobre o que se tratava o discurso do goleiro. – Mas para sua informação, quando disse que queria sua opinião, não era sobre o .
– Não? – Atte devolveu o tom irônico.
– Claro, certamente a primeira coisa que eu faria seria vir pedir opinião para o melhor amigo do meu ex. Vocês aqui parecem ter parado no tempo. Eternamente com dezesseis anos. – rolou os olhos. – A única razão... – fechou a boca e respirou fundo antes de continuar a falar, lembrando-se de sua posição e de que não podia criar mais uma inimizade no time por causa de sua relação com . – Atte, eu gostaria da sua opinião sobre o Aleks. – Falou depois de expirar. – Não quero perguntar ao Petri ou ao time, porque sei o tipo de coisa que eles vão dizer. Não posso perguntar ao porque ele já foi embora, então só me resta você.
– Por que ele já foi embora? – Atte foi pego de surpresa. – Ele não viu você hoje?
– Viu, mas depois foi embora. – Respondeu.
– Tá, tá bom. – O goleiro ergueu as mãos em rendição. – Desculpe pela minha reação. Eu cubro o desde que a gente mal sabia falar, foi só uma resposta defensiva.
– Tudo bem, eu entendo. – assentiu. – Aliás, já que abriu essa porta. – não conseguiu conter o impulso. – Apesar do óbvio, sabe se aconteceu alguma coisa com ele hoje? Ele estava disperso nos exercícios, e geralmente é o mais concentrado de todos. Ele nem se animou como eu esperava quando disse que em breve ele receberia alta.
– Se eu tivesse que fazer reabilitação com a minha ex também não seria o cara mais feliz do mundo. – Atte pontuou erguendo as sobrancelhas.
– É, mas a gente tá bem. Não foi um término ruim. – Mentiu, e entendeu o que dissera antes, era horrível mentir daquele jeito para pessoas que realmente se importavam.
– Não sei se aconteceu alguma coisa depois que ele saiu do treino, mas lá ele estava bem. Talvez seja ele se dando conta do quanto a vida dele mudou depois que ele te conheceu. Acho que não tinha caído a ficha ainda.
– Do que tá falando? Ainda sobre a lesão dele? – quis saber.
– Não, . – Atte sorriu balançando a cabeça. – Já assistiu aquele filme novo do
Grinch? Que uma criancinha faz ele deixar o mau humor de lado e aproveitar o natal? Você e ele são meio assim. Ou melhor, foi meio assim. A gente conversou sobre isso, sobre o quanto a vida dele estava diferente, e foi só.
– Faz sentido. – A inglesa assentiu, unindo as peças do quebra-cabeça em sua mente. – Ele disse que ia para a casa dos pais.
– é assim, ele vai se isolar um pouco, ficar mais fechado que o normal, para você vai ser estranho, mas é o normal dele. É só ele lidando com o término.
– Você acha que... que há algo para se preocupar?
– Se tiver, já não é mais com você, . Deixa pra lá e siga em frente. – Atte deu de ombros. – É melhor para vocês e para o time.
Atte assentiu e começou a se afastar, enquanto engolia as palavras dele sem qualquer digestão.
– Atte, espera. – tocou o braço do goleiro. – Eu realmente preciso falar sobre Aleks.
– Olha, não sei se sou a melhor pessoa.
– Você é a única pessoa. – ocupou o espaço à frente do goleiro. – Eu quero ajudá-lo, mas preciso entender um pouco mais sobre como as coisas funcionam. Como ele funciona.
– O que você quer saber? – Perguntou um pouco arisco.
– O que você puder me falar sobre Aleks Haatanen.
Atte passou a língua pela bochecha, baixou o olhar e ergueu outra vez, pensativo.
– Não sei muito o que posso te dizer. Aleks é daqui de Lathi, entrou no time tem uns dois anos, e assim que entrou ficou grudado com o . Mas isso é normal, é um ídolo, o príncipe de Lathi, é normal que os caras novos tenham ele como espelho. – Contou o goleiro. – A família dele é meio complicada, mas acho que não tem nada a ver.
– Sempre tem. – o interrompeu.
– Não sei, na verdade não tenho muito o que falar também. – Atte deu de ombros. – Ele não liga muito para essas coisas, ele mora com uma irmã e a família dela. Essa irmã meio que o criou. Mas de resto, você vai ter que perguntar a ele.
– Por que acha que ele fez aquilo? – indagou e o goleiro a olhou nos olhos e fez silêncio.
– Não sei, . – Atte negou com a cabeça. – Eu sempre achei que ele era o maior protetor do , isso me pegou muito de surpresa. Não sei porque ele faria isso. É só isso? Posso ir? – Quis saber e assentiu.
– Claro, obrigada.
– E , sobre o meu amigo. – O goleiro girou sobre seus calcanhares, já um pouco distante de , para olhá-la. – Eu sinto muito que teve que ser assim. Sei que ele se apaixonou por você de verdade. Talvez no futuro...
não respondeu, apenas assentiu. Parte sua se detestava por estarem mentindo, mas outra parte estava dando pulos de alegria por ouvir do melhor amigo de que ele estava realmente apaixonado.
❄❄❄
03 de dezembro de 2021, Viipuri - Rússia
Casa dos
Era mais um episódio de
The Offfice na TV, Felix deitado sobre sua barriga enquanto tinha a postura mais incorreta do mundo, com a coluna torta, uma perna dobrada sobre o sofá e outra esticada com o pé no chão. Era algo perto das cinco da tarde de sexta, estava sozinho porque todos estavam cuidando de suas vidas, suas irmãs e seus pais. Até que a chegada agitada de Inessa, sua irmã mais velha e a mãe, com compras que seriam o suficiente para abastecer uma cidade inteira tirou a atenção do central da tela.
– Você ainda está nesse sofá? – Inessa provocou o irmão, jogando-se ao lado dele.
– Caso não se lembre, é isso que significa estar de folga. – respondeu sem afastar os olhos da TV.
– Você já viu essa série quantas vezes? Umas vinte? – Perguntou a mais velha, afagando entre as orelhas de Felix, mas não respondeu.
– Querido, você já comeu alguma coisa? – A mãe perguntou, surgindo na sala.
– Não, eu tô bem. – Negou o central.
– Ele está melancólico de novo. – Inessa entregou o irmão, mas sem muita ênfase.
– . – A mãe se aproximou, sentando-se perto do filho com olhar preocupado e lábios torcidos, tomando uma das mãos do capitão entre as suas.
– O quê? Não tô não. – Negou , se ajeitando no sofá e encarando a irmã incrédulo.
– Você está em casa com o Felix, assistindo essa mesma série boba desde ontem à noite, quando chegou. – Acusou a irmã. – Eu te conheço desde que nasceu, cale a boca.
– , se aconteceu algo... – A mãe começou a falar.
– Mas não aconteceu nada. – riu de forma nervosa. – Eu só estou em casa, assistindo minha série, e tentando ficar em paz.
– É o time? – Inessa quis saber, olhando para os olhos do irmão pela primeira vez desde que se sentara ao lado dele. – Vou ligar para o Atte.
– Não, não tem nada a ver com o time. – Negou outra vez. – Está tudo bem no time, eu volto em alguns dias.
– Que notícia ótima, querido. – A mãe sorriu, enquanto a irmã o analisava.
– Então é uma mulher.
– O quê? Inessa? Qual é o seu problema comigo? – uniu as sobrancelhas, olhando para a irmã.
– É uma mulher, não é? Não adianta mentir para mim, . – Inessa estreitou o olhar, se deliciando com a sensação de vitória.
– Vou fazer
tortillas para você. – A mãe anunciou, tocando o rosto do filho com delicadeza. – Você sempre adora
tortillas.
– Obrigada, mãe. – sorriu para a mãe, mas no instante seguinte voltou a encara a irmã injuriado. – Não tem nada a ver com isso.
– Quem é ela? Ela te deu um fora? – Inessa insistiu.
– Não vou falar com você. – cruzou os braços sobre o peito, emburrado. – Já disse que não tem nada a ver com isso.
– Mentiroso.
– Intrometida.
Os dois irmãos permaneceram no sofá, encarando a TV emburrados, como faziam quando eram crianças. Inessa tinha razão parcialmente, mas não era um assunto que tinha planos de compartilhar com a família toda, ao menos não ainda. Pensava sempre em apresentar para eles, mas seus conflitos internos não precisavam participar do encontro. Ao mesmo tempo, a irmã mais velha era uma das pessoas mais próximas que tinha, uma das que melhor o conhecia, talvez ela o entendesse se abrisse a situação. Não que tivesse algo ali a ser resolvido, só que tanto se passava pela mente do capitão, que as vezes queria conseguir tirar todos os seus pensamentos e organizá-los em caixas, lidando com um por vez.
– Talvez tenha uma mulher. – disse enfim.
– Eu sabia. – Inessa gargalhou. – Ela te traiu ou te trocou?
– Não, não tem nada a ver com isso. – Ele negou outra vez e a irmã rolou os olhos. – A gente está bem, sem problemas.
– Então porque você está enchendo o sofá da mamãe com essa sua cara de cachorro abandonado? – Inessa arqueou uma sobrancelha.
– Eu só queria vir para cá, ficar um tempo. Senti saudades de casa. – deu de ombros e a irmã ficou em silêncio.
– Você e essa pessoa, é sério? – Perguntou a mais velha depois de algum tempo em silêncio.
– Acho que sim, entre nós é, pelo menos.
– Agora tudo começou a fazer sentido. – Falou a irmã, esticando as pernas e as apoiando junto as do irmão. – Você parou de vir para cá, parou de sair tanto com Atte, com a gente, deu uma sumida do mapa.
– Como você sabe disso?
– Porque ao contrário de você, eu uso minhas redes sociais. – Inessa rolou os olhos outra vez. – Quem é ela? Por que não trouxe com você?
– Ainda não tivemos essa conversa, sobre apresentar para a família. – Contou . – E eu queria ficar um pouco sozinho.
– Como assim? Está aqui por saudades de casa ou por estar fugindo dela?
– Os dois. – Disse ele. – É complicado.
– Fale logo antes que a mamãe volte. – Inessa estimulou.
– É que eu... sei lá, a gente está bem. Ela é ótima, eu amo ficar com ela, mas acho que... Atte me disse que eu mudei. Antes não tinha um lugar melhor do que minha casa, e quando eu não estava lá, estava aqui. Agora passo mais tempo na casa dela do que na minha. Antes eu fazia minhas coisas, tinha minha vida, quando estava de folga ou tinha tempo livre, passeava com Felix, jogava tênis, saia mais com Atte e Aleks, vinha para Viipuri. Agora tudo que eu faço é ir para os treinos, jogos e para a casa dela.
– Você é muito emocionado, . – A irmã negou com a cabeça, rindo.
– Eu desabafo e a sua reação é rir de mim? Valeu, Inessa. – Reclamou ele, enfezado.
– É que isso é engraçado. Se você estivesse no meu lugar, também acharia. – Ela continuou sorrindo. – Claro que era diferente, antes você não tinha mais nada para fazer, agora tem. Não tem nada de errado em querer ficar mais tempo com sua namorada.
– É, mas e as coisas que eu deixei de fazer? O tanto que isso já me mudou? – se ajeitou no sofá, para que pudesse olhar melhor para a irmã. - É como se eu tivesse deixado de ser eu mesmo, não?
– Você está com medo?
– Medo de que?
– De encarar que mudou sua vida por causa dela. – Falou a irmã, ainda o olhando nos olhos.
– Não sei. – Ele respondeu sincero e pensativo.
– Acho que se você realmente achar que está vivendo mais a vida dela do que a sua, pode frear um pouco. Pode convidar ela para fazer as coisas que você gostava, ou pode tentar voltar a fazer algumas coisas sozinho. Mas não é motivo de surto. – Inessa sorriu. – Acho que é bom tudo isso, você tem uma vida muito introspectiva, é bom alguém para te puxar um pouco.
– Pode ser. – Ele assentiu. – Valeu.
– Disponha. – A irmã mais velha sorriu, ficando de pé no momento em que a mãe voltava a sala.
– Então, do que estamos falando? – A matriarca quis saber, sorrindo.
–
O tem uma namorada. – Inessa contou quando passou pela mãe, rumo a cozinha.
– Inessa! – protestou.
Petúnias: Ao presentear um amigo com petúnias estamos expressando um desejo de esclarecer mal entendidos. Funciona como um pedido sincero de desculpas.
03 de dezembro de 2021, Lathi – Finlândia
Centro de Treinamento do Pelicans
– Acorda, ! – Aleks falou alto ao entrar na sala.
ergueu a cabeça assustada. Estava com uma terrível crise de enxaquecas naquele dia, teria ficado em casa se pudesse, mas não podia. Por isso, enquanto esperava Aleks, tinha baixado a cabeça, apoiando-a nos braços, tentando manter os olhos fechados por um tempo, até a nada sutil entrada do ala.
– Aleks.
– Disseram que você queria me ver. – Falou ele, de pé, braços cruzados frente ao corpo e uma expressão não muito amistosa.
– Sim, queria. – Ela assentiu. – Será que podemos conversar um pouco? Pode sentar.
O jogador a observou de olhos estreitos, incerto.
– Por favor, Aleks. – Insistiu a inglesa.
Depois de analisar a proposta e a cadeira, Aleks cedeu e se sentou, enfatizando no modo com que se jogou na cadeira sua insatisfação em estar ali.
– Então, eu gostaria de primeiro me desculpar. – falou, arrastando a cadeira para se aproximar um pouco mais dele, mas devagar para não assustá-lo.
– Se desculpar? – Aleks arqueou uma sobrancelha.
– É, sobre como falei com você no dia do jogo. – Explicou. – E sobre qualquer outra coisa que posso ter feito e que tenha te magoado ou incomodado. Você poderia me perdoar?
– Tá, tanto faz. – Ele deu de ombros após alguns instantes a analisando. – Mas não vem com essa achando que vou pedir desculpa, porque eu não vou.
– Eu não estava esperando isso. – sorriu de lábios fechados, relaxando os ombros. – Não estou esperando nada, Aleks. Só queria conversar. Resolver as coisas. – Falou com sinceridade.
– Só porque terminou com você. – Ele acusou, recostando-se na cadeira e sorrindo. – É por isso que quer dar uma de boa moça agora?
– Como você sabe que... – começou a perguntar, mas logo sacudiu a cabeça, tentando retomar seu foco. – Deixa para lá, não importa. Aleks, eu não sei do que está falando, nunca quis dar uma de boa moça, nunca quis ser sua inimiga também.
– Você de novo com esse papinho furado. – Haatanen rolou os olhos. – Olhe como eu sou legal, olhe como naturalmente as pessoas gostam de mim. – Ele bufou entediado. – Me poupe, , ninguém é legal na vida real.
– Mas eu não disse que sou. – sorriu de novo, erguendo os ombros e se esforçando para manter o timbre suave e calmo. – Eu tenho vários defeitos, um montão deles. Quem convive comigo sabe disso, e não tenho pretensão de fingir não ter.
– Que fofa.
– Aleks, o que eu quero dizer com tudo isso é que não precisamos ser inimigos. Eu sou parte do time, quero ter uma boa relação com você, do jeito que tenho com o resto dos jogadores. Você me acusa dessas coisas, mas será que podia dizer para mim o que eu fiz que realmente te ofendeu?
Aleks torceu os lábios e ficou de pé, colocando para fora a agitação que sentia.
– Não tenho que te falar nada.
– Tem razão, não tem. – Ela assentiu, cruzando as pernas. – Mas nós estamos aqui, no Pelicans, e acho que nosso objetivo é o mesmo. Não estou pedindo para que você seja meu melhor amigo, você não precisa gostar de mim. Só que precisamos jogar no mesmo lado.
– Isso é porque está com medo que eu conte sobre você e ? Não é? – Ele riu outra vez, girando o corpo para encarar a terapeuta.
– Não é sobre o , Aleks, é sobre você e eu. Por que insiste em mencionar o ?
– Porque é tudo sobre isso. – Ele respondeu dando as costas a ela outra vez, mas sem se afastar.
– Eu entendi que você se sentiu ameaçado com a minha aproximação. Estou certa? – Perguntou , mas usando sua voz mais serena.
– Ameaçado por você? Tá maluca? Acha que eu sou o que? Gay?
– Não, não disse isso. – ergueu os ombros e negou com a cabeça. – Mas acho que o é como um irmão mais velho, um espelho, um mentor. – Falou a terapeuta e Aleks se voltou, olhando-a. – Acho que você o ama e se inspira nele. Pelo que eu soube, isso é comum por aqui, ele é um ídolo. Eu não entendia muito do hockey da Finlândia antes de vir para cá, mas agora sei que ele é inspiração para as crianças daqui. E para você, acho que deve ser uma honra jogar do lado do ídolo de infância.
– Ele não é muito mais velho que eu. – Negou Aleks, menos reativo.
– Mas você devia ainda estar na escola quando ele estreou, não é? E depois, jogar no Pelicans, com ele. E maior que isso, se tornar amigo dele.
– Até você chegar.
– E aí ele não tinha mais tempo para sair com você e Atte, não é? Sempre falava sobre mim, não tinha outro assunto. Só queria chamar a minha atenção. – investiu, escutando seus instintos. – Te trocou.
– É. – Aleks rolou os olhos.
– E eu nem era digna disso. – riu fraco. – Quer dizer, tem outras mulheres mais bonitas. Ou melhor, os três solteiros eram muito melhores. Você, Atte e . Era um trio diferenciado, nem os outros caras do time eram bons o bastante para estarem entre vocês.
– Agora você está começando a entender. – Aleks sorriu, sentando-se na cadeira de frente para a inglesa.
– Quando você o conheceu?
– ? – Aleks riu pelo nariz. – Desde que ele era do time da escola eu ia aos jogos. Quando eu fui para o profissional, rejeitei uma oferta do Saipa e outra do Tappara porque queria jogar com ele aqui.
– Bem devotado. – sorriu com suavidade. – Ele sabe disso?
– Não. Por que ia contar? Que pergunta idiota. – Aleks expirou um riso sem humor.
– E sua família? – perguntou, inclinando um pouco a cabeça sobre o ombro.
– Sou obrigado a falar disso com você?
– Bom, você sabe de segredos meus, por que não?
– O que tem a minha família? Quer dar uma de psicóloga? – Ele riu, apoiando o tornozelo da perna direita sobre o joelho da perna esquerda.
– Não, só estou tentando te conhecer melhor. – Justificou ela.
– E a sua família, ? Se esse é o seu jogo, de nos conhecermos melhor, pode falar da sua também. – Ele provocou.
– Certo. Meus pais ainda são casados, tenho dois irmãos, o mais velho é o Josh, ele é advogado, bem-sucedido, casado. A mais nova é a Emily, ela é uns dois anos mais nova que eu, está noiva de um dos sócios do meu irmão. Ela é bonita, tem um relacionamento perfeito.
– Você detesta eles, não é? – Aleks sorriu, inclinando-se para frente, interessado.
– Não os detesto. – deu de ombros. – São minha família e eu amo a todos. Mas as vezes, para que tudo continue bem, é melhor se afastar um pouco. Não concorda?
– Não sei, meu pai era um bêbado. – O ala se recostou a cadeira. – Às vezes eu ainda encontro com ele por aí, em alguma rua ou em algum bar. Ele saiu de casa quando eu era criança porque se casou de novo.
– E sua mãe?
– Ela morreu quando eu era bebê. – Contou, dando de ombros e deixando o olhar vagar perdido por alguns instantes. – Minha irmã me criou. – Aleks retomou sua atenção rapidamente. – Com quem você era comparada? O mais velho ou a mais nova?
– Com os dois. – sorriu. – Meus pais achavam que minha escolha de carreira era ruim, que devia seguir os passos do meu irmão, ou fazer algo mais conhecido. Depois, a minha irmã, porque eu estou solteira e sou mais velha que ela. Eles acham que sou contra o casamento e a ter filhos por ainda estar solteira.
– Você devia ter contado a eles sobre o . – Aleks riu pelo nariz. – Ia humilhar sua irmã. E com certeza o ganha mais que o seu irmão.
– Pode ser, mas aí seria sobre o e não sobre mim. – piscou. – E sua irmã? É boa com você?
– Ela é, ela tem uma filhinha. Cady. – Disse ele com um sorriso genuíno e inocente nos lábios rosados. – É a única família que eu tenho. O resto é o mesmo que nada.
– Que resto? Seu pai?
– É, ele e a família dele. Tenho uns irmãos por parte de pai. – Enquanto falava, Aleks encarava e analisava a barra da camisa que vestia, ou as unhas.
– Sua família, além da sua irmã e sobrinha, são Atte e . – supôs, percebendo capturar a atenção do jogador outra vez.
– É. – Aleks assentiu.
– Por isso os bombons? Queria afastar ele de mim.
– Não, queria que ele visse que não seria bom se envolver com você. Que ele percebesse. Não era para ele comer. Ele sempre perguntar antes de comer, se tem coco, mas quando você levou o chocolate ele nem quis saber. – Aleks enfim falou. – Ficou cego.
– Era para ele ter perguntado antes, e então, ele acharia que eu fiz de propósito. – continuou.
– Sei lá, ele só devia ter perguntado e percebido. Não queria que ele comesse. Ele sempre pergunta antes de comer. Era só para ele ver que não era uma boa ideia.
– Não pensou em falar com ele sobre? Que achava ser uma ideia ruim? Como amigo. – perguntou.
– Não queria que ele se chateasse comigo, só com você. – Confidenciou Aleks, projetando o lábio inferior.
– Mas foi o contrário. – completou.
– É, porque você contou para ele. – Acusou Aleks.
– Foi porque ele soube, ou porque ele soube que foi você? Por causa da sua ação? Não pode ter sido uma consequência?
– Mas eu falei com ele, disse que vocês não podem ficar juntos. – Respondeu Aleks. – Ele é do time e você também. Você é estrangeira, vocês são diferentes, ele merecia coisa melhor, na minha opinião. Eu só quis defender meu amigo enquanto ainda dava tempo.
– Acha que ele precisa de defesa?
– Acho que ele não enxerga as coisas como elas realmente são. – Disse enfezado.
– Não acha que ele pode ter se sentido traído? – sugeriu. – Como se sentiria na posição dele? Buscando apoio dos amigos e recebendo essa surpresa.
– Talvez eu tenha exagerado, mas de que outra forma ele veria a verdade? – Aleks ficou de pé outra vez.
– Vou perguntar outra vez se não acha que seria uma opção ter conversado com ele e dito o que pensava. – Falou a inglesa.
– Ele não me ouviria.
– Algumas vezes, Aleks, a gente não tem controle sobre as ações das outras pessoas, só podemos controlar como reagimos a elas. – Disse a inglesa depois de um suspiro longo. – E precisamos aceitar que se sequer temos o controle sobre nossa própria vida, imagine sobre a de outra pessoa.
– Você diz isso porque ele ficou do seu lado. Aí é muito fácil. – Ele a olhou por sobre o ombro.
– Será? – ficou de pé também. – Você lembrou que agora estamos separados, e além disso, estamos só nós dois aqui, Aleks. E protegidos pelo sigilo profissional. – Ela arqueou uma sobrancelha quando o ala a olhou.
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04 de dezembro de 2021, Lathi – Finlândia
Apartamento de
Era noite de sábado, estava só em casa. Desde o início de sua relação com , nunca havia passado tanto tempo sem vê-lo. Tinha trabalhado durante todo o dia, pensando sobre o caso de Aleks Haatanen, sobre como poderia trabalhar com os jogadores para que se fortificassem enquanto grupo, e várias outras pendências.
Durante o dia fora fácil manter os pensamentos longe de e de onde quer que ele estivesse, mas agora, com a TV ligada, ouvindo os comentaristas fazerem suas apostas sobre o jogo que começaria em breve, era impossível não pensar nele. O jogo era fora de casa, por isso a inglesa decidiu ficar em vez de acompanhar a equipe na viagem. E agora, em seu sofá, encarava a tela do celular, memorizando o número do capitão, refletindo se devia ligar ou não.
Seria um claro sinal de dependência, pensou ela, ou não. Talvez fosse só preocupação ou saudade, afinal passavam tanto tempo juntos que era comum sentir falta, não é? Seria estranho se fosse o contrário. Se quando voltasse, depois de um longo fim de semana sem que ela sequer mandasse uma mensagem, ele poderia entender que não sentiu falta alguma. Ao mesmo tempo, dizer tantas vezes sobre o término a fazia temer um término de verdade.
Por fim, vencida por seus impulsos, fez a ligação.
Depois de exatos quatro toques, alguém atendeu do outro lado.
– Um segundo, vou para o meu quarto. – disse rápido e ao fundo pôde ouvir a voz alta de duas mulheres conversando. – Oi, . – Falou ele, parecia estar sorrindo.
– Oi, jogador. – Ela também sorriu. – Desculpe te incomodar em seu retiro, mas é que eu percebi que esse apartamento fica muito vazio sem você. – Falou sem se importar com o que ele pensaria, mas sentiu-se aliviada quando ouviu a risada tão confortável e conhecida dele.
– Que bom, achei que você já tinha me esquecido a uma hora dessas. – Ele riu.
– Por favor, , toda vez que entro no meu quarto seu filho pinguim está me esperando. – riu, deitando-se no sofá – Eu lembro de você o tempo todo.
– Essas coisas a gente diz pessoalmente, . – riu aquecido, jogando-se em sua cama.
– Eu posso fazer isso quando você voltar. – Respondeu ela, mordendo o lábio, nervosa como uma adolescente. – Quantas vezes forem necessárias.
Fez-se silêncio enquanto os dois pensavam sobre o que dizer.
– No que está pensando? – quis saber.
– Sinceramente? Pensando que estou com medo. – Confessou a inglesa depois de ponderar um pouco.
– Medo de quê? – se ajeitou na cama, sentindo o corpo um pouco mais tenso.
– Acho que falei tanto sobre estarmos separados nesses dois últimos dias, que estou com medo de que essa mentira repetida tantas vezes se torne verdade.
– Me explica. – Ele se sentou, preocupado.
– Não sei. – hesitou. – É só que... é estranho. E estando longe de você também...
– Escuta. – a interrompeu. – Eu sei que não te disse nada e que isso foi muito de repente, mas não foi por nossa causa. – Explicou ele. – Foi por minha causa. Eu precisava colocar umas coisas no lugar, dentro da minha cabeça, estava com saudades de casa também. Mas isso não vai acontecer. Não vai se tornar realidade. – falou com firmeza. – É horrível ter que mentir, acho que foi uma ideia muito idiota que a gente teve, mas agora já era. Só que isso não muda nada entre a gente. Eu aqui só fico pensando em você também. – Confessou, causando borboletas no estômago da terapeuta.
– Mesmo? – Ela perguntou sorrindo.
– Mesmo. – Assentiu , voltando a se deitar. – Da próxima vez você vem comigo, quero te apresentar para minha família.
– Uau. Isso é sério então. – Brincou a inglesa, controlando a vontade de gritar de animação.
– Você alguma vez duvidou? – riu do outro lado.
– Nunca. – Respondeu ela, sorrindo. – Eu posso saber o que te deixou tão aéreo naquele dia? Que te fez ir para o seu retiro? – não gostava de ser a pessoa a pressionar o capitão, mas estava ansiosa para obter aquela resposta, não por mera curiosidade, estava preocupada e queria ajudá-lo se fosse possível.
O capitão respirou profundamente e ficou em silêncio por alguns segundos, pensando no que diria, no que queria dizer, no que estava se sentido à vontade para dizer. Sabia que dependendo de sua resposta, mais perguntas surgiriam.
– Muita coisa aconteceu nos últimos tempos, só precisava me organizar. Pensar sozinho. Só isso. Não é nada demais. Não precisa ficar preocupada. – Respondeu ele. – Eu estava distraído porque tinha acabado de falar com o Atte sobre terminar com você. Pode relaxar. – Mentiu, mesmo que em partes, e se xingou mentalmente por isso.
– Tudo bem. – Ela se deu por vencida. – Fiquei preocupada, mas se você está dizendo que está tudo bem, vou deixar para lá.
– . – chamou, rindo. – Eu estou aqui, na casa dos meus pais, pensando o tempo todo sobre coisas aqui que quero te mostrar, fazendo planos para quando eu voltar para Lathi, respondendo mil perguntas da minha mãe sobre você. Se tem uma coisa que você não precisa ficar é preocupada.
– Fico preocupada com você, bobo. – riu, amolecida com a confissão dele.
– Eu tô ótimo. – riu outra vez. – Minha terapeuta disse que logo vou estar no gelo de novo, minha mãe está fazendo minha comida favorita todos os dias, eu tenho uma belezinha me esperando em Lathi quando eu voltar. Não podia estar melhor. – Brincou o jogador. – Espera, na verdade podia. Se você estivesse aqui estaria melhor, com certeza.
– Acho que tive sorte. – Declarou a inglesa, deitando-se de modo mais confortável no sofá, sem parar de sorrir.
– Como assim? – também sorria do outro lado.
– Você. – Respondeu ela. – Acho que tive sorte encontrando você aqui.
– Tantas pessoas mais legais no mundo e você considera sorte ter me encontrado? – Ele brincou, fingindo não querer gritar como uma garotinha. – Você precisa rever seus parâmetros, .
– Não preciso rever nada. – rolou os olhos. – E não me chame de , só no trabalho que me chamam assim.
– Como quer que eu te chame? – sentia-se mais relaxado, feliz, e não conseguia parar de sorrir também.
– Não sei, não sou eu quem tem que decidir, isso tem que ser espontâneo. Mas definitivamente, não.
– Você não tem apelido, então isso me complica a vida. – Falou ele, ignorando o fato de alguém estar batendo em sua porta. – Vou pensar em alguma coisa legal.
– Tem uma coisa. – foi atingida subitamente por uma lembrança da última noite juntos, depois da vitória do time. – Na última noite que dormiu aqui você me chamou de uma coisa...
– Eu? De quê? – Quis saber ele, curioso e sem lembranças.
– Estou tentando me lembrar, mas parecia uma palavra na sua língua. Alguma coisa com a letra R, rá sei lá o que. – tentou dizer, divertindo-se com sua dificuldade com o idioma.
No mesmo instante percebeu do que se tratava e enfiou a mão em punho na boca, incrédulo consigo mesmo. Não acreditava que tinha dito o que achava que tinha dito.
Droga, . Se xingou mentalmente enquanto gritava com o rosto afundado no travesseiro para que ela não pudesse ouvir do outro lado.
– Faz ideia do que seja? Ou se lembra, sei lá? – expressou sua curiosidade.
– Eu? – não sabia o que fazer. – Não, não. Não faço ideia na verdade. – Desconversou. – Eu disse? Com a letra R? Não, não me lembro. – Mentiu, tentando soar despretensioso e confuso.
– Ah, que pena. Queria saber o que era. – disse um pouco mais murcha e o capitão se amaldiçoou por sua autopreservação ridícula. – Você estava feliz, acho que podia ser alguma coisa legal.
Okay, , talvez seja hora para avançar um pouco, disse a si mesmo o central, vamos fazer jus a paciência dela. Não faria mal, era algo simples e considerando tudo que acontecia entre os dois, usar daquele apelido não era um exagero. Talvez fosse um caminho sem volta, talvez estivesse sendo emocionado e bobo, mas não era justo mentir e fingir não se lembrar, era?
– É mentira, eu me lembro. – Confessou ele, sem sorrir.
– Não entendi. – riu, mas não parecia alegre, era mais uma risada confusa.
– É
Rakkaani. – Contou após um suspiro.
– E o que isso significa?
expirou pesadamente antes de responder, como se parte sua temesse a resposta de , e outra parte se sentisse bobo por se referir a inglesa daquele jeito, e outra parte ainda tivesse medo de admitir sentir o que sentia.
– Pode traduzir para meu amor ou minha amada. – Contou sem empolgação, com o timbre mais neutro que podia sustentar, e no instante seguinte sentiu o coração acelerar com o silencio da inglesa. – O que foi?
– Isso foi o que disse? – Ela tornou a perguntar, com jeito de falar que não deixou o central capturar exatamente o que a terapeuta sentia. – Naquela noite?
– Foi. – Respondeu. – É idiota, eu sei. Acho que fiquei bêbado demais naquele dia. Não sei porque falei isso. É coisa de empolgação de mente bêbada. – Se justificou, agitado, sentando-se na cama e passando a mão pelo cabelo.
– Que pena.
– Por que? – Indagou o capitão, alarmado.
– Porque eu gostei. – Respondeu com simplicidade.
– Gostou? – endireitou as costas de modo involuntário, surpreso.
– Sim.
– Então... eu então... – Hesitou o central. – E-eu posso te chamar assim então, se quiser.
– Não, tudo bem. – negou com seu tom sereno. – Como eu disse antes, precisa ser uma coisa espontânea. Se foi como você falou, uma coisa de bêbado, então...
– Não, eu...– a interrompeu, se amaldiçoando mentalmente, ficou de pé e começou a andar pelo quarto. – E-eu não quis dizer que não foi espontâneo, é só que... eu...
– Tudo certo, não precisa explicar.
– Não, não. Eu... mas que droga. – O jogador expirou pesadamente outra vez e apertou a ponte do nariz com os dedos indicador e polegar. – Eu fiquei com vergonha. É isso. – Confessou.
– Vergonha? – sorriu fraco. – De quê? Por que?
– De você me achar emocionado, bobo, de ser exagero e você rir de mim. Eu não sei, , eu não penso direito quando é sobre isso, você sabe. – Ele desatou a falar de modo rápido e se atropelando. – Minha cabeça não é uma das melhores quando é esse tipo de assunto. Eu fico nervoso.
– . – sorriu, pensando se devia ou não dar aquele passo. – Poucas coisas me deixaram tão feliz quanto ouvir isso. – Declarou ela, mordendo os lábios com a ansiedade que aqueles assuntos a causavam.
– É sério?
– Claro que não a parte do seu pequeno surto, mas, mesmo assim, eu sempre acho adorável seu nervosismo. – A inglesa sorriu, sentando-se no sofá. – Eu gostei de saber. E se você sentir vontade de continuar, pode me chamar assim sempre que quiser, para mim seria uma honra, um privilégio. – Disse ela e sorriu, surpreso. – Eu gosto de você.
– E eu tô apaixonado por você. – Admitiu o central sem pensar, fazendo com que a inglesa sorrisse e depois mordesse os lábios com mais força, contendo sua reação do outro lado.
– Que ótimo, . – Falou ela sorrindo. – Porque eu também estou apaixonada por você.
– Que bom. – riu pelo nariz. – Que bom, na verdade, muito bom. Você e eu, e sabe... apaixonada.
– Volte para mim logo. – pediu. – Quero ouvir você dizer isso pessoalmente.
– , você é... – hesitou, sorrindo. Não sabia expressar em palavras o que estava sentindo, queria muito estar perto da inglesa para beijá-la naquele momento.
– Acho que a palavra que está procurando é
rakkaani. – Ela brincou e assentiu, esquecendo-se de que ela não podia vê-lo.
– Exatamente. – sorriu, aquecido. –
Rakkaani.
❄❄❄
04 de dezembro de 2021, Viipuri – Rússia
Casa dos
– Até que enfim! – Inessa exclamou, arrastando-se no sofá para dar espaço ao irmão mais novo. – Já perdeu cinco minutos do primeiro período. – Falou ela, mas não respondeu, sentando-se em silêncio e se esticando para alcançar uma lata de cerveja que jazia sobre a mesa de centro.
– Já foram duas chances boas para o Pelicans. – O pai comentou depois de beber um pouco de sua cerveja.
– Do Waltteri Merelä. – Alicia soprou em tom provocativo, sentada no chão, perto da mãe, mas não foi capaz de captar o tom da irmã caçula.
– Ele é muito bom. – Disse o capitão com os olhos presos na TV. – No último jogo fez um trabalho perfeito, talvez tenha sido o melhor jogo da temporada para ele.
A família fez silêncio enquanto assistiam um
faceoff depois de um
icing cometido pelo time adversário.
– Com quem você estava falando? – A mãe perguntou e no mesmo instante todos os olhares se voltaram para o jogador, que respirou fundo e engoliu seco. – Dava para ouvir sua risada daqui.
– Eu? Deu para ouvir? – Estranhou , sentindo-se desconfortável e exposto, como um adolescente em seu primeiro namoro que é flagrado pelos pais.
– Deve ser com a namorada dele. – Inessa cantarolou em tom de provocação, fazendo Alicia rir, mas foi atingida por uma almofada.
– Era com ela? – A mãe insistiu na pergunta.
correu os olhos pelos rostos ansiosos na sala, depois voltou a encarar a TV, mas sem prestar atenção verdadeiramente no jogo.
– É, era sim. – Admitiu tentando não dar ênfase ao assunto ou demonstrar qualquer outro sentimento.
– Uhh, ele estava conversando com a namorada. – Alicia cantarolou. – desencalhou.
– Cala a boca. – Resmungou ele.
– Quando você vai trazê-la aqui? – O pai perguntou, talvez estivesse alheio a onda de provocação e curiosidade que rodeava as três mulheres da família.
– Em breve, talvez da próxima vez que eu vier. – Respondeu o central, com cuidado.
– O que ninguém sabe quando será, já que você quase não vem mais para cá. – A mãe falou, demonstrando a ponta de ciúmes que sentia do filho favorito.
– Eu não vou demorar dessa vez. – se justificou buscando o olhar da mãe. – É que foi tudo muito corrido, com o time, com a lesão.
– Sua namorada acha o quê sobre isso? De você ser um jogador de hockey? Ela é do tipo ciumenta? – Alicia virou-se para olhar para o irmão.
– Não faz diferença. – deu de ombros. – E não, ela não é como as outras, pode relaxar.
– Bom, pelo menos ela é uma boa moça? – A mãe tornou a perguntar de lábios franzidos.
– Mãe. – riu baixo. – É a terceira vez que você me pergunta isso. Você vai gostar dela, todo mundo vai, não dá para não gostar.
– Bom, pelo menos agora eu vou poder ser apresentada devidamente ao Merelä. – Alicia se esticou, sorrindo.
– Não começa, isso não está em discussão. – Negou o central.
– O quê? Qual é! – Protestou a mais nova. – Você já tem a sua namorada, pode parar de atrasar minha vida agora.
– Nem sonha. Não vou te apresentar para ninguém do time. – sentenciou, recostando-se no sofá e esticando um dos braços sobre os ombros de Inessa.
– E ainda vai ameaçar todos do time para nunca falarem com você. – Inessa riu pelo nariz. – Esquece, Alicia, não vai rolar nada no Pelicans para você. – A mais velha estalou a língua no céu da boca. – Já nos times rivais...
– Inessa! – e o pai a repreenderam no mesmo instante.
❄❄❄
05 de dezembro de 2021, Lathi – Finlândia
Apartamento de
Ava se inclinou em direção a janela do carro de Waltteri, acenando mais uma vez para os jogadores que se despediam depois da maravilhosa noite juntos.
– Otto, avise se continuar se sentindo mal por causa do queijo. – Pediu a terapeuta e o jogador assentiu, tendo depois os cabelos bagunçados por Jasper, sentado ao seu lado no banco de trás.
– E você, se cuide. – Santtu pediu, piscando e Ava sorriu para ele.
– Foi uma noite incrível, uma das melhores desde que cheguei aqui. – Confessou ela, endireitando o corpo e sendo observada por Waltteri, que havia saído do carro para abrir a porta para a inglesa. – Muito obrigada, de verdade.
– E para isso que estamos aqui. – Waltteri sorriu. – A gente se vê amanhã?
– A gente sempre se vê amanhã, Walt. – Ela sorriu, abraçando o corpo quando o vento frio atingiu os dois.
Merelä sorriu e em seguida a abraçou apertado. Não era comum aos finlandeses ficarem se abraçando, as vezes entre os rapazes do time, por causa da emoção, ou entre casais, como era seu caso com . O abraço foi caloroso e um pouco demorado demais para um abraço simples de despedida.
– Está com tanto frio assim ou...– brincou, rindo e fazendo o ala sorrir também.
– Não, é só que...– Merelä hesitou, afastando-se um pouco de , mas sem deixar o abraço, olhando nos olhos da inglesa. – É só que eu...
– Você o quê? – Ela o incentivou, confusa.
– Eu só... só...só quero dizer que me diverti muito. – Ele sorriu envergonhado. – Você é uma pessoa... incrível. Suas piadas, as brincadeiras sobre a carne de rena. – Ele riu pelo nariz e o acompanhou.
– Se eu te contar onde eu as ouvi... – Falou, deixando o pensamento viajar até seu capitão.
– Qualquer pessoa teria muita sorte de te ter por perto, . – Waltteri declarou, olhando nos olhos da inglesa.
– Mas eu já estou perto de vocês. Todo dia, no time. – Respondeu, estreitando o olhar rapidamente e sorrindo.
– É, está. – Ele assentiu em silêncio, depois se afastou devagar.
– Obrigada mais uma vez pelo dia, pelo passeio pela cidade e o jantar. – Agradeceu a inglesa, recebendo acenos dos outros jogadores dentro do carro. – A gente se vê na segunda.
– Até amanhã. – Waltteri sorriu, caminhando devagar até o lado do motorista.
– Até amanhã. – Ava piscou, afastando-se do carro.
– Tchau, . – Jasper e Otto acenaram.
– Até,
Tyttö(menina). – Santtu piscou e sorriu, do banco do passageiro
– Boa noite, . – Waltteri disse, ainda de pé fora do carro, com olhos na terapeuta, que apenas sorriu e acenou com uma das mãos.
E então, o ala entrou enfim no carro e os quatro se foram.
Enquanto subia para seu apartamento, escondendo-se da noite fria e de ventos fortes, aproveitava a sensação boa que sentia depois daquela noite. O passeio pelo lago, o mini tour pelo centro da cidade e o jantar no que, até agora, era seu restaurante favorito em Lathi, as risadas até a barriga doer, a companhia. Há tempos não se sentia tão feliz e acolhida, com pessoas por perto com quem pudesse sair um pouco para espairecer, rir, se divertir. Claro que tinha , mas eles não saiam juntos, e era diferente, sair para se divertir com amigos era muito diferente de sair com um quase possível pretendente a namorado.
Estava feliz e energizada.
Enquanto entrava em seu apartamento, a terapeuta inglesa percebeu seu celular tocando. Assim que fechou a porta atrás de si, pendurou a bolsa, arrancou os casacos pesados e acendeu as luzes, retirou a touca e o cachecol, arrancou as botas de qualquer jeito e se jogou no sofá do modo mais preguiçoso que conseguia, atendendo enfim a ligação.
– O que é que você estava fazendo? – Fora a primeira coisa que Maisie disse, do outro lado da linha e riu.
– Está ligando porque viu meu post novo no Instagram?
– Na verdade não. – Maisie negou e fez silêncio. – Sim. Em partes. – A outra parecia impaciente pelo seu tom de voz. – Tentei te ligar várias vezes durante a noite, achei que tinham te sequestrado e te forçado a viver em um iglu. Imagine minha surpresa ao ver você ao lado de diferentes belos exemplares do sexo oposto, curtindo a noite. – riu e mordeu a ponta do polegar, tentando segurar a ansiedade para contar tudo a amiga. – E aí, eu tentei te ligar várias outras vezes e nada aconteceu. Então, voltamos a minha pergunta, o que você estava fazendo? E com quem?
– Lembra dos caras do time que eram mais simpáticos comigo? E aquele outro amigo que mencionei da última vez? – Perguntou a inglesa, e Maisie murmurou algo parecido com um sim. – Depois que as coisas deslancharam com nós paramos de nos ver com muita frequência, senti falta deles. Acho que estava precisando disso, sair para aproveitar a cidade, passeio de melhores amigos. – contou sorrindo. – Foi incrível. Eu ri tanto que quase fiz xixi na roupa várias vezes. Acho que enfim as coisas estão se acertando, sabe? Fazendo bons amigos aqui, tudo certo no time, com .
– Já não era sem tempo. – Maisie adotou um tom mais terno, apesar do ciúme que sentia, sabia que a amiga precisava criar novos laços em sua nova cidade. – Eles parecem legais. São confiáveis?
– Eles são ótimos, quero muito que você e Louis encontrem eles quando vierem aqui. – suspirou, relaxando o corpo. – Me tratam muito bem, são cuidadosos, me apoiam, são ótimos ouvintes. E sabe, acho que tudo que eu precisava era uma noite com amigos.
– O que vocês fizeram? – Perguntou Maisie, curiosa.
– Durante a tarde fizemos uma caminhada perto do lago, ver a natureza, inspirar ar puro. Depois eles quiseram me levar para um tour pela cidade, andamos muito, fomos em várias lojas, experimentando comidas malucas e típicas daqui. – Contou a terapeuta. – Depois, quiseram me apresentar um restaurante e eu
preciso levar vocês até lá quando vierem me ver. É simplesmente o melhor restaurante do país. Tem muitos pratos com carne de rena e com carne de rena escondida, embora eu ainda ache melhor, se quiser comer rena, comer a que faz, porque pelo menos sei como foi feita. Mas apensar disso, é muito bom. Os queijos...ah, Maisie, você nunca mais vai querer sair de lá.
– Você disse carne de rena?
– Eu também não acreditei quando me disseram, mas é verdade. – A terapeuta riu alto, esticando as pernas no sofá. – Eles comem muita rena aqui, e ao que parece, sem qualquer culpa. disse que até tem fazendas de criação de rena. – Contou animada. – A carne é boa, mas eu sempre me sinto culpada quando imagino a rena indo para o abate. Mas existem mais coisas boas, a culinária é melhor que a nossa, bem melhor. – narrava tudo sem sequer parar para respirar ou pensar no que dizia, estava empolgada demais para fazê-lo.
– Tá legal, me deixou curiosa. – Disse a outra. – Quero experimentar. Aposto que Louis vai odiar, mal posso esperar para ver ele comendo. – Riu com maldade. – Mas me conte, quero saber tudo sobre quem anda me substituindo na sua vida, mesmo que sempre mencione o nome do seu namorado
red flag – Resmungou a outra, fingindo que vomitaria e riu.
– Não fale assim do , por favor. – Pediu ainda se divertindo com a implicância da amiga. – E não tem ninguém te substituindo aqui, não seja ciumenta. Sobre os rapazes, eles são legais. Engraçados, uns mais que outros, cada um tem sua personalidade. Uns mais novos que eu, outros mais velhos. Tem o
Waltteri, que é um amor e foi a primeira pessoa que conheci do time, o que me ajudou quando fiquei perdida. Ele é lindo, podia ser ator de algum desses seriados adolescentes.
– Tipo
Euphoria?
– Não, ele é certinho demais. Parece que saiu de um conto de fadas, esses garotos perfeitos que parecem personagens de filmes e fanfics. Doce, cavalheiro, gentil, um príncipe. Procure por ele nas redes sociais, é
Waltteri Merelä. – Sugeriu ela. – E tem o
Otto, ele é fofo, as vezes fica nervoso, se irrita com mais facilidade, eu diria. E isso é o que o torna mais encantador, porque ele parece um porquinho da índia, sabe? É fofo. Mas eu nunca disse isso a ele. – riu alto.
– Instagram? – Maisie quis saber.
–
Otto Nieminen. Tem o Jay,
Jasper Patrikainen, nosso goleiro. – Continuou . – Ele é muito bom, muito divertido, mas as piadas são péssimas. – Contou sorrindo com as lembranças. – E, por último, mas não menos importante,
Santtu Kinnunen. Ele é uma graça, cheio de personalidade, atencioso, fofo. Ele é o amigo que disse, a pessoa com quem conversei sobre o dilema ético entre e eu, e entre eles, só Santtu sabe sobre nosso envolvimento. Olhe nas redes sociais, ele é uma gracinha, posso te apresentar se quiser. – Disse , sentindo-se animada só em pensar na possibilidade de Maisie e Santtu sendo um casal. – Vai achar estranho, mas as redes deles são como de uma pessoa anônima. Poucos seguidores, muitos não são verificados, alguns tem perfil fechado. Eu sempre acho estranho, mas eles são assim. E sabe, até estou gostando desse novo estilo de vida
low profile.
– E o
red flag?
– ? – Ava riu surpresa. – O que tem ele?
– Você falou dele, mas até hoje não vi como ele é. – Respondeu. – Só ouço histórias de como ele é isso, de como ele é aquilo, de que ele disse isso, de que ele cozinha carne de rena. – Maisie provocou, imitando a voz de ao falar.
– Ele não saiu com a gente, os amigos dele no time são outros. – Contou a terapeuta. – E hoje ele não está na cidade, também.
– Ele curtiu seu post novo. – Avisou Maisie, rolando o feed de sua rede social.
– Curtiu? – Ava fora pega de surpresa, apressando-se para abrir o aplicativo e confirmar a informação.
– O que é essa empolgação de quinta série? – Maisie estranhou o tom de voz da amiga.
– Bom, eu não sei também, só sei que desde que tudo aconteceu, esse humor de adolescente tomou posse de mim. – riu e pela primeira vez, quando o assunto era o central, ouviu Maisie rir também.
– Isso é paixão, sua boba.
– Se me dissessem que aconteceria tudo isso, que minha vida mudaria tanto se viesse para Lathi, teria vindo antes. – declarou e as duas riram outra vez.
– Você está mesmo feliz com ele, não é? – Maisie perguntou, menos armada.
– Estou. Sabe, mesmo sendo recente e rápido, com ele tudo é sempre tão natural e leve. É tão tranquilo que quando a gente transa eu nem apago as luzes. – Admitiu com uma risada. – Ele é lindo e o sorriso dele...– suspirou. – Parece que tudo encaixa perfeitamente, sem que seja forçado ou sem que eu imaginasse ou me esforçasse. – A inglesa narrou, esticando as pernas no sofá. – Na primeira vez, eu estava com vergonha por ter acabado de acordar, não sabia como estava meu rosto. sorriu, me ofereceu um chiclete e falou que eu estava linda.
– Certo, eu não estava nem um pouco preparada para essa mudança de enredo. – Maisie gargalhou do outro lado. – Por favor, não me dê mais detalhes das noites calorosas no frio da Finlândia.
– O que mais posso dizer? A gente tem uma vida comum aqui, nada desses relacionamentos de novela, cheios de altos e baixos. – Voltou a contar a terapeuta. – Os problemas são problemas normais, de trabalho, de vida... você precisa ver como ele me trata, como ele me escuta, como me dá atenção, como tem paciência. Ele já até mudou, mudou coisas nele.
– Isso não está muito perfeito? – Maisie indagou desconfiada.
– Quando eu digo que ele mudou, não é como está pensando. É que existiam coisas que ele não fazia, mas assim que conversamos e ele percebeu que eram importantes para mim, começou a fazer. – Explicou. – Está longe de ser perfeito, fabricado. Mas o esforço dele faz tudo ficar leve, entende?
– Eu ainda acho ele com bandeiras vermelhas demais, mas se você está feliz e se ele te trata bem, é o que importa, mas só vou acreditar quando ver.
– Vou te mandar uma foto. – Avisou , enquanto escolhia uma boa foto de para mostrar a amiga. – E então? O que achou, ele não é uma graça? – quis saber após o silêncio da amiga.
– Uma graça, literalmente. – Maisie respondeu com ironia. – Você tem um gosto... rústico, né?
– O quê? Não acredito que achou ele feio. – se admirou.
– Não é aquela coisa... sabe, uma beleza estonteante... ele é meio estranho, mas parece ser simpático. – Maisie disse enquanto tentava analisar a foto por outros ângulos.
– Pior que ele não é tão simpático assim. – deu de ombros. – Mas ele é mais bonito pessoalmente, eu juro.
– Tá, acredito.
– É sério. – Insistiu.
– Tá, e eu acredito.
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