Última atualização: 22/02/2025

Prólogo

- Exatamente! Você tem duas opções nesse caso. Você pode usar o “will” em “I will study tomorrow for my text”… - Grifei o escrito no quadro. – Ou você pode usar o “going to”, nesse caso você não necessariamente está trabalhando com o gerúndio, porque você já está colocando o verbo to be antes...
- Então é mais fácil usar o “will”, certo? – A japonesa perguntou.
- Pessoalmente, eu acho que sim, mas são duas opções válidas que vocês verão conforme a localização. – Andei pela sala, checando o relógio acima da porta. – O “will” é mais visto aqui na América do Norte. Canadá e Estados Unidos. Agora o “going to” é mais visto no Reino Unido. E como eu sempre digo...
- Você nunca sabe como vai receber a informação! – Meus seis alunos falaram, me fazendo rir.
- Exatamente! – Ri fracamente. – Vamos tirar uns 20 minutos de intervalo depois voltamos?
- Eba! – Eles falaram se levantando apressadamente e eu ri fracamente, vendo-os combinarem de ir na cafeteria da esquina.
Juntei os materiais acumulados em cima da mesa, vendo a lista de exercícios que eu passaria para eles logo depois e esperei todos os alunos saírem para ir logo atrás deles e puxar a porta. Passei pelos corredores da escola, dando um aceno de cabeça para os alunos e professores de outras salas e entrei na sala dos professores.
Fui direto até a cafeteira, pegando um copo de isopor e enchendo-o. Há quase um ano aqui, é a primeira vez que eu realmente pego o frio de fim de ano, e nunca soube lidar muito bem com isso nem quando estava no Brasil.
Coloquei duas colheres de açúcar e apoiei o quadril um pouco mais para a esquerda para dar espaço para outros professores se servirem. Tirei o celular do bolso, vendo algumas notificações e uma delas era o foguinho do Tinder e só puxei a notificação rapidamente para ver o que era e vi o tal do Eric que eu estava conversando há uns dois dias.
“Quer sair hoje à noite?”
Suspirei fundo. Apesar de estar solteira toda minha vida, eu não estava tão desesperada assim. Os papos eram entediantes e ele só sabia falar de carros, e eu não sou a mais expert no assunto. Bloqueei o celular de novo e voltei-o ao bolso.
- ...Não, Carly. Infelizmente não poderemos te ajudar... – Ouvi Vera na recepção logo ao meu lado. – Não, só trabalhamos com inglês mesmo, nosso trabalho é com estrangeiros...
- Ah, tem certeza? Seria para algo mais básico... Nada fora do comum. – A mulher na frente dela falava com um tom desapontado na voz.
- Sim, Carly. Somente inglês e francês...
- E tem algum lugar que vocês podem me indicar? – A mulher falou.
- Hum... Para italiano é complicado... – Vera disse suspirando. – Você precisa para uma turma particular, né?!
- Sim! Seria para minha chefe e para os outros membros da empresa, é algo meio urgente... – Vera suspirou, pensando.
- Eu posso perguntar aqui, mas não conheço ninguém que dá aulas de italiano por aqui... – Arregalei os olhos.
- Com licença? – Minha voz saiu mais rápida do que eu me mexer. – Desculpe me intrometer, mas vocês estão buscando professor de italiano?
- Sim, você conhece alguém, null? – Vera virou para mim.
- Sim, eu! – Falei rindo.
- Mesmo? – A tal da Carly falou empolgada.
- Sim! – Falei rindo. – Eu não sou fluente porque nunca fui para Itália, mas eu completei todos meus cursos e sou avançado...
- Ah, isso já é o suficiente! Seria para o básico, sabe? E algo mais específico, para reuniões e compreensão em alguns eventos e palestras... – Assenti com a cabeça.
- Nisso eu posso te ajudar, eu tenho material também...
- Perfeito! – A mulher me interrompeu. – Você pode me passar seu contato? Assim conversamos depois.
- Claro! – Peguei uma folha do bloquinho de Vera e anotei meu nome e o telefone. – Estou disponível após as seis.
- Perfeito! – Ela pegou. – Eu sou Carly, falando nisso. – Ela esticou a mão por entre a divisão de vidro.
- null, mas todo mundo me chama de null. – Apertei sua mão.
- Obrigada! Entrarei em contato. – Ela disse saindo animada, me fazendo rir.
- Nunca vi alguém tão animada por aprender italiano... – Brinquei com Vera que riu ao meu lado.
- Ela não está animada por aprender italiano, ela está animada por conseguir alguém para ensinar italiano aos chefes dela... – Vera riu negando com a cabeça.
- Você sabe do que se trata? – Perguntei.
- Ela é assistente de grandes executivos aqui, então é meio que O Diabo Veste Prada, não existe tarefa impossível...
- Entendi... – Falei, pressionando os lábios.
- Ah, null, quando ela entrar em contato contigo, aproveita essa oportunidade, tá?
- Como assim? – Franzi a testa.
- Pode cobrar be-e-e-em caro. – Vera disse e franzi a testa. – Ela trabalha para família Stroll, eles são praticamente donos de Montréal. – Ela deu um sorriso, pegando o telefone que tocava.


Capítulo 1

- Obrigada! – Falei para o motorista quando desci do Uber e dei alguns passos para dentro da calçada.
Olhei para a grande estátua no centro da praça e o edifício logo atrás. Montréal não é conhecida por prédios incrivelmente altos como outras cidades, mas eles possuíam arquiteturas diferentes dentre si que era fácil diferenciá-los no horizonte.
Eu estava na frente do prédio que parecia um triângulo, ou uma caixa de leite se preferir, ele era inteiro espelhado e homens e mulheres com roupas sociais saíam do mesmo após o fim do expediente.
Dei uma olhada novamente para minha roupa e suspirei. Apesar do termômetro começar a atingir os 24 graus alguns dias agora no fim de abril, o fim do dia voltava a esfriar e esperava que eu não gelasse dentro desse blazer e blusa de manga comprida por baixo, além do jeans e do tênis sem cadarço.
Observei algumas mulheres saindo e fiquei feliz pelo mundo corporativo estar um pouco mais despojado. Ajeitei minha mochila nas costas e suspirei, entrando no prédio.
Se eu achava que o lado de fora estava caótico, dentro estava muito mais. Pessoas desciam dos diversos elevadores e a recepção à minha frente estava apinhada de pessoas. Me aproximei lentamente e olhei em volta, em busca de um homem engravatado, em sua maioria seguranças, para me dar uma informação.
- Madame? – Um deles me chamou e respirei fundo ao ser chamada pelo francês. Sei que Montréal tem sua dominância francesa, mas simplesmente não consigo gostar ou aprender a gostar dessa língua. Engoli em seco ao me aproximar com o cartão que Carly havia me entregue.
- Sportswear Holdings, s'il vous plaît? – Perguntei e ele deu um aceno com a cabeça.
- Décimo oitavo andar. – Ele falou em inglês. – Preciso de um documento, por favor. – Assenti com a cabeça e lhe entreguei meu passaporte, vendo-o anotar as informações na minha frente. – Olhe para a câmera, por favor. – Ele indicou a webcam e dei minha melhor cara de paisagem para entrar no registro de um dos prédios comerciais de Montréal. – Pronto, agora só seguir à direita. – Ele disse ao devolver meu passaporte.
Dei um aceno com a cabeça e segui para o local que ele disse, me espremendo entre as pessoas saindo do elevador para poder entrar antes que o mesmo fechasse e apertei o número 18. Pressionei os lábios com a tradicional música de elevador e ri sozinha até chegar ao andar.
O local estava bem mais vazio do que lá embaixo e uma mulher bonita estava na recepção repassando ligação atrás de ligação. Me movimentei para tentar me colocar na linha do olhar dela que anotava os recados no computador.
- Um minuto, por favor! – Ela disse de forma mais despojada e acenei com a cabeça, ouvindo-a mudar do inglês para o francês em algumas ligações, antes de abaixar o fone da cabeça e me dar completa atenção. – Pode falar.
- Eu tenho reunião com... – Chequei o papel novamente. – Claire Stroll. – Falei.
- Ah sim, null null, certo?
- Isso. – Dei um sorriso.
- Venha comigo, por favor. – Ela disse, se levantando e ouvi o telefone tocando.
- Você não vai...
- Não se preocupe. – Ela disse e assenti com a cabeça, andando com ela pela empresa.
O local cheirava empresarial, então vários computadores, salas grandes de reunião tomavam conta do andar, mas muitas estavam vazias pelo horário próximo às oito da noite. Não me preocupei com isso, somente segui a mulher que deveria ter minha idade.
- Com licença, Claire? – A mulher falou em inglês e fiquei relaxada, já que Carly me garantiu que dentro da empresa, eles falavam inglês, não francês.
- Sim... – A loira do lado de dentro falou.
- A professora de italiano.
- Ah, sim, pode deixá-la entrar! – Ela abanou a mão animada enquanto se levantava e a mulher deu um aceno para mim e entrei, vendo-a fechar a porta atrás de mim. – null, que prazer te conhecer! – Ela disse animada e estiquei a mão, vendo-a fazer o mesmo.
- Olá, senhora Stroll, o prazer é meu! – Falei.
- Pode me chamar de Claire. Stroll é do meu ex-marido, não estamos mais juntos, mas é mais difícil tirar o sobrenome do que colocar. – Ela disse brincalhona e dei um aceno com a cabeça. – Pode se sentar, por favor.
- Nesse caso, pode me chamar de null. – Falei e ela se sentou à minha frente.
- É realmente um prazer enorme te conhecer, null. – Ela sorriu. – Acho que você quem vai salvar a minha vida...
- Eu só sou uma professora, senhora... – Falei rindo.
- Bem, pelo que eu vi sobre você, seu foco é ajudar os outros a realizarem os sonhos, certo? – Pressionei os lábios ao descobrir que ela havia pesquisado meu Instagram profissional.
- Sim... – Falei rindo.
- Bom, eu tenho um sonho a realizar e ele está na Itália. – Assenti com a cabeça. – Vou te dar uma explicação geral, null. Eu tenho uma reunião na Itália em setembro, nossa marca está crescendo e vamos precisar de uma equipe lá. Nossa empresa não produz roupas, não fazemos desfiles, nem nada do tipo, mas trazemos marcas famosas para o Canadá e Estados Unidos. Nos tornamos uma distribuidora de confiança para empresas como Pierre Cardin, Ralph Lauren, Michael Kors e Tommy Hilfiger, agora empresas italianas como Versace, Dior, entre outras, querem que nossa empresa, ajude na divulgação da marca mundialmente... – Dei um aceno com a cabeça ao reconhecer as marcas. – E italianos são tradicionais, então falar italiano...
- É primordial. – Falei e ela deu um aceno com a cabeça.
- Exatamente. – Ela suspirou. – Nós temos um grupo de 12 pessoas, inclusive eu, que precisam destravar o italiano em quatro meses. É possível?
- Possível é, senhora, mas serão preciso várias horas de dedicação. – Falei e ela assentiu com a cabeça.
- Eu sei que você tem a escola e, também, dá aulas particulares, mas teria como nos encaixar? Dinheiro não é o problema, como Carly deve ter te dito. – Engoli em seco, sabendo que Carly já havia falado sobre isso comigo e respirei fundo.
Falamos de valores que realmente mudariam minha vida aqui no Canadá, mas eu teria que abrir mão dos meus precisos horários de folga pelos próximos quatro meses. Isso era algo que pesava na balança, já que eu praticamente só trabalhava, mas também poderia ser minha chance de finalmente investir na minha escola ou até realizar meu sonho de trabalhar na Itália.
- Eu tenho alguns horários disponíveis de quinta-feira à noite e sábado à tarde eu tenho livre. – Falei, minhas sextas-feiras acabavam para eu dedicar à preparação das aulas da semana seguinte e domingo é dia de não fazer nada.
- Para gente conseguir destravar em quatro meses, quanto tempo por dia você acha necessário? – Ela perguntou e suspirei.
- O ideal seria quatro horas, mas é impossível alguém ficar completamente focado por esse tempo, então sugiro cinco, com pausa para alguns intervalos. – Falei.
- E você aguenta cinco horas seguidas? Com 12 velhos com a cabeça de uma formiga? – Ri fracamente.
- Acredito que vocês falem francês também...
- A maioria. – Ela disse.
- O cérebro já está bem elástico, então. – Falei e ela confirmou com a cabeça.
- Eu preciso disso com urgência, null, é possível? – Ela perguntou em um tom mais sério e assenti com a cabeça.
- Sim. – Falei. – Eu só preciso de uma semana para preparar o material.
- E o pagamento? Não quero que fique com vergonha de cobrar, null. Sei sua média de valores, mas você trabalha com alunas particulares. Serão 12 alunos particulares ao mesmo tempo. Muitos bem mais velhos do que eu. – Engoli em seco, assentindo com a cabeça.
- Serão quatro meses? Cinco horas por semana? 12 pessoas? – Perguntei e ela assentiu com a cabeça.
- Exatamente. – Ela falou e tirei o celular da bolsa, abrindo a calculadora, digitando os números:
250 dólares a mensalidade por uma hora semanal. Cinco horas mensais. Quatro meses. 12 pessoas. 60 mil dólares. Engoli em seco. Eu tinha problemas com cobrar, era difícil falar que cobrava 250 dólares mensais para uma vez na semana, agora imagina falar esse número? Era alto demais, mas era literalmente o meu preço.
- E então? – Ela disse e olhei para ela, respirando fundo.
- É... 50 mil dólares... O valor completo pelos quatro meses. – Falei, sentindo a garganta doer ao falar isso e ela assentiu com a cabeça, pensando isso.
- Entendo... – Ela disse, se ajeitando na cadeira.
- Posso dar um desconto se...
- Não, não! – Ela disse. – É que não foi esse valor que a Carly me disse sobre você. Esperava por volta de uns 60 mil. – Ela disse e assenti com a cabeça.
- Sim, senhora, mas eu dou desconto para aulas em grupo. – Falei e ela confirmou com a cabeça.
- 10 mil é um belo desconto... – Ela disse em tom de deboche e pressionei os lábios. – Que tal fecharmos em 80 mil, null?
- Senhora? É mais do que meu preço. – Falei.
- É, eu sei, mas tem seu transporte para vir aqui todo sábado, o material que você vai comprar para gente, além de aguentar essa turma toda por quatro meses direto. Talvez eu devesse arredondar para 100 mil para você pagar uma terapeuta muito boa. – Ri fracamente de nervoso.
- Que isso, senhora. – Ela me olhou séria.
- Acredite em mim. – Ela disse suspirando. – O mundo corporativo é uma porcaria... – Ela negou com a cabeça e assenti com a cabeça casualmente. – Então, 100 mil?
- Não, senhora, não precisa de tudo isso...
- Tem uma cota sobrando nesse projeto, e prefiro gastar com alguém que valha a pena. – Ela disse.
- A senhora nem me conhece. – Falei.
- Brasileira, 29 anos, veio para o Canadá porque era um intercâmbio mais barato, acabou ficando ao ser contratada pela escola que veio estudar. Trabalha pela manhã e tarde lá, dá aulas particulares até tarde da noite e está de pé no dia seguinte para começar tudo de novo. E agora está aceitando perder seu sábado quase inteiro para dar aula para um bando de velhos que poderiam ter feito isso bem antes... – Ela disse. – Eu fucei no seu Instagram. – Ela disse e assenti com a cabeça. – Não te conheço, null, mas sei identificar alguém que quer crescer na vida. Não custa nada eu te ajudar.
- Obrigada, senhora. – Falei.
- Meu ex-marido trabalha mais na parte de carros e afins, mas ele tem um programa para jovens talentos, acho que eu posso ter um também, e começar contigo. – Dei um pequeno sorriso.
- Me ajudaria muito, senhora, mas eu não posso aceitar... – Suspirei.
- É minha oferta, null. É pegar ou largar! – Ela disse e dei um pequeno sorriso.

- CEM MIL DÓLARES, AMIGA! CEM MIL DOLARES EM QUATRO MESES! – Gritei a plenos pulmões enquanto saía da empresa com o botão no áudio do WhatsApp. – É 25 MIL DÓLARES POR MÊS, É MUITO MAIS DO QUE EU GANHO NA ESCOLA E NAS AULAS PARTICULARES. – Suspirei, relaxando os ombros, vendo que eu estava do lado da estátua estranha de novo. – Cem mil dólares, Ama. Eu vou conseguir montar minha escola. – Suspirei. – Pequenininha, claro, mas é um começo. – Soltei o botão.
Meu Deus!
Cem mil dólares!
Eu sabia que o trabalho não seria fácil, nunca dei aula para mais do que seis pessoas em uma sala, e em sua maioria são intercambistas muito empolgados com a nova língua ou brasileiros tentando melhorar aqui. Isso sem contar que seria minha primeira experiência como professora de italiano oficialmente.
Merda!
Eu tinha muito o que fazer até a próxima semana. O valor vai compensar, mas vai ser um trabalho bem pesado.
Olhei o horário no celular e era quase nove da noite. Eu não estava tão longe de casa, mas não queria pegar transporte público agora. Vim de Uber para não chegar suada e nem atrasada, mas eu iria pegar para voltar novamente, tinha que estar de pé as sete para ir para a escola.
Observei em volta, vendo diversos letreiros de fast food e fiz um uni duni tê mentalmente antes de ir na escolha mais óbvia: KFC. Peguei um balde pequeno com meu molho de mostarda e mel e Coca-Cola, e pensei por alguns segundos se levava para casa, mas o descarte de todo esse papelão me deixou com preguiça.
Me sentei em uma banqueta alta, devorando meu KFC com a mão direita, enquanto a esquerda tinha dificuldades em contar as novidades para meus pais no Brasil. Menos de 15 minutos depois, eu lambia a ponta dos dedos e limpava no guardanapo. Passei álcool nas mãos e chamei o Uber.
Entrei apressada em minha kitnet, tirando a roupa e fui para um banho quente. O tempo estava esfriando cada vez mais e eu somente com uma cacharréu e o blazer por cima. Esperei somente esquentar meu corpo e saí novamente, colocando meu pijama. Joguei as almofadas no chão e deitei entre as cobertas, encarando o verde do teto.
- Cem mil dólares... – Suspirei, deixando um sorriso se formar em meus lábios.

- Fica calma que vai dar certo, teacher! Você sempre fala que fica nervosa com novos alunos e se dá superbem com todos. Vai dar tudo certo. – Minha aluna Thaís falava pela chamada do Google Meet.
- Ah, tomara que esteja certa! – Falei rindo e ela sorriu. – Bom, Thaís, páginas 25 e 26 do workbook para semana que vem.
- Obrigada, teacher! Até quarta. – Ela disse e esperei que ela fechasse a ligação antes de fechar também.
Empurrei a cadeira rapidamente, abrindo a geladeira e peguei uma lasanha congelada e coloquei no micro-ondas. Aproveitei para tomar banho enquanto ela descongelava e esquentava. Saí do banheiro, vestindo a calça preta que eu comprei com o adiantamento de Claire e da Sportswear Holdings, e comi somente de sutiã à mesa, tomando cuidado para o molho quente não espirrar em meu corpo.
Joguei o pote no lixo e lavei os talheres antes de terminar de me arrumar. Diferente da reunião na semana passada, dessa vez eu coloquei uma camiseta branca com alguns desenhos discretos e minha jaqueta jeans. Escovei os dentes, fiz uma maquiagem bem discreta e coloquei os tênis. Peguei os dois sacos com materiais novos, colocando na mesa, juntei o notebook na mochila e tirei o celular da tomada.
A ansiedade me bateu mais uma vez enquanto eu pedia o Uber, mas respirei fundo. Já tinha passado por esses altos e baixos nesses cinco dias, mas o contrato já estava assinado, o salário de maio já estava na minha conta e Claire contava comigo.
Eu não a conhecia, dei uma pesquisada rapidamente pelo Wikipedia. Ela é belgo-canadense, estilista e dona de uma marca chamada Callens. Devido ao seu casamento com o bilionário canadense Lawrence Stroll, possui ações na empresa dele e hoje cuida da área de divulgação de marcas de roupas famosas. Já Lawrence cuida da parte de carros, inclusive possui até uma equipe de Fórmula Um. Quando falam que Lawrence é dono de Montréal, agora eu entendo o porquê.
Apesar de ambos serem divorciados, aparentemente eles possuem uma boa relação. Talvez pela holding, os dois filhos, ou só sabem viver em harmonia como deveria ser com qualquer casal. Uma rápida pesquisada nos links do Wikipedia, descobri que seu filho é piloto e sua filha uma aspirante a cantora. Acho que não encontraria um professor de inglês na família Stroll.
Desci do Uber e segui para a recepção, lá peguei meu crachá de visitante e fui até o elevador. A empresa não estava totalmente vazia, mas poucas pessoas ocupavam as salas de reunião. Uma recepcionista diferente me guiou até a sala e engoli em seco quando vi a sala com vários engravatados lá dentro. Apertei as mãos nos materiais e respirei fundo quando ela guiou a porta aberta.
- Ciao... – Falei tímida, rindo em seguida.
- Ciao! – Claire disse animada, se levantando do outro lado da mesa. – Reservei a ponta da mesa para você! – Ela indicou o canto em que eu já estava e assenti com a cabeça.
- Obrigada. – Deixei minhas coisas na ponta da mesa, tentando manter um sorriso rosto.
- Precisa de alguma ajuda? – Ela perguntou mais baixo quando se aproximou.
- Não, não, só organizar e já começo. – Sorri e ela assentiu com a cabeça, voltando para seu lugar.
Tirei o notebook da mochila, liguei-o e tirei os livros e os kits de lápis e caderno que eu fiz com o nome da minha escola. Não podia perder a oportunidade de fazer divulgação para pessoas com um pouco mais de dinheiro, né?! Vai que...
Ergui meus olhos para os presentes e suspirei. Tinham 12 pessoas ali. Nove deles eram homens, três mulheres, e a faixa etária da maioria deve passar de 50 anos. Tinha somente uma mulher que deveria regular comigo e era a única que sorria junto de Claire.
Sempre falei que queria uma turma de idosos, mas eu imaginava algo como o grupo de velinhas da igreja que eu frequentava no Brasil, não vários ricaços de uma empresa que manda em Montréal.
- Buongiorno, mi chiamo null e sono la tua insegnante! – Falei, me colocando na frente do pessoal. – Eu sou null, e eu fui convidada pela Claire para ensinar italiano para vocês. – Tentei manter um sorriso amigável. – Nós temos quatro meses para aprender entre o básico e o intermediário, além de deixá-los confortável com o idioma para que possam se comunicar livremente. – Alguns assentiram com a cabeça. – Para quem fala o inglês, ele pode ser um pouco diferente, mas estamos em Montréal, então creio que a maioria de vocês já fala dois idiomas, um terceiro vai ser fácil... – Alguns riram, me fazendo sorrir. – Ok, vamos lá, eu gostaria de saber o nome de todos e, se possível, o que fazem aqui na empresa, para gente fazer amizade. Que tal? Começando por “mi chiamo...” e dizendo seu nome.
Essa pergunta não agradou a maioria dos homens, mas todos se apresentaram entre pronúncias boas e ruins, mas não era o foco agora, então só deixei rolar. Começar é difícil, especialmente quando a maioria não parecia estar animada em passar cinco horas do seu sábado comigo.
- Muito bom! – Sorri. – Eu me chamo null, podem me chamar de null, e estarei com vocês nessa jornada. Vou distribuir os materiais que foi pensado com o foco mais empresarial, ele é de vocês e espero que abusem bastante dele.
Peguei os materiais, dando a volta na larga mesa, deixando um na frente de cada pessoa antes de voltar para meu lugar. Conectei o notebook no data show e abri a apresentação em Power Point, não costumo trabalhar assim, é com as mensagens do chat do Google Meet ou um quadro branco, mas achei que fosse melhor para mostrar para eles.
Quando virei para eles novamente, as caras não eram mais animadas, então só respirei fundo.
- Andiamo? – Falei, vendo o sorriso de Claire e foi nisso que foquei.

- Ah, Ama, você sabe que eu não estou acostumada com isso, né?! – Ela riu comigo.
- Eu fico imaginando sua cara, deve ter sido a pior coisa de todas...
- Foram cinco horas, Ama! – Suspirei. – Você não tem noção! Tiveram cinco pessoas que interagiram! Cinco! – Tombei a cabeça para trás.
- Ah, mas vai ver foi só a primeira vez, null... – Ela disse. – Como você mesma diz: começar é difícil...
- Difícil, não impossível! Eu estou acostumada com pessoas que querem aprender um idioma, agora eu estou com dois, talvez três verdadeiros interessados...
- Você está indo para lá agora, certo? – Ela perguntou.
- Sim, acabei de descer do ônibus. – Suspirei, olhando para o prédio. – Respirando fundo antes de voltar para sofrência. – Ela gargalhou alto.
- Ah, miga, só você! – Ela riu.
- Ai, foi péssimo, de verdade...
- Então pensa nos cem mil, miga! Cem mil dólares! Sua escola, sua chance de nunca mais voltar para o Brasil...
- Você sabe que eu não penso assim...
- Eu sei, eu sei, você ainda gosta dessa terra de sofredores... – Ri fracamente.
- Eu gosto... – Suspirei. – Só apareceu a oportunidade...
- Eu sei, também sinto sua falta! – Rimos juntos e chequei o relógio.
- Também sinto, miga... – Suspirei. – Chegou minha hora. Te mando mensagem mais tarde.
- Combinado, miga! Boa sorte! – Ri fracamente.
- Obrigada! Manda um abraço para o Edu.
- OUTRO! – O namorado dela gritou, me fazendo rir.
- Ah, no viva-voz de novo! – Falei rindo. – Tchau!
- TCHAU! – Duas vozes falaram em tons diferentes, me fazendo rir antes de desligar.
Guardei o celular antes de entrar na empresa e foi fácil passar pela segurança agora. Fiz o mesmo caminho das outras duas vezes até estar perto da sala envidraçada novamente, entrando devagar pela porta.
- Buongiorno! – Falei.
- Buongiorno! – Alguns responderam e me coloquei na ponta da mesa, deixando minha mochila e contei nove pessoas ali hoje. – Estamos com alguns atrasos? – Perguntei.
- Alguns... – Claire disse claramente incomodada com isso.
- Bom, eu vou devolver a lição de casa enquanto eles não chegam. – Falei, pegando minha pasta e tirando as folhas soltas. – Para uma primeira aula, gostei que vocês foram muito bem. – Atravessei a sala, distribuindo as tarefas de casa, passando por Claire. – Parabéns! – Falei, vendo-a sorrir e voltei para meu lugar. – Eu vou abrindo as coisas aqui, enquanto eles chegam.
Eu devo dizer que demorei o dobro do tempo para abrir o Power Point e me preparar para a aula, mas pela cara de Claire, eles não iam aparecer, então quando finalizei tudo, eu me virei para eles.
- Bom, vamos começar? – Falei e Claire abriu o livro com calma.

- Péssimo?
- TERRÍVEL! – Falei dramática. – Tiveram três pessoas na última aula, Ama! TRÊS! É a quinta aula! Está ficando ridículo! Eu sinto uma idiota ali na frente.
- Acho que não tem problema, a Claire fez um acordo contigo, ela não vai dar para trás.
- Eu estou com medo de ela desistir! Ela não vai ficar pagando cem mil à toa, Ama. E eu não acho que seja só uma “reunião de negócios” ou viagem para sei lá onde... Isso está ridículo.
- Ah, miga, pior que eu nem sei o que te dizer... – Suspirei, encarando a empresa.
- Hoje é o começo do segundo mês, é para eles me pagarem na segunda-feira, eu tenho planos, eu...
- RELAXA, MULHER! – Ama gritou, me fazendo suspirar. – Olha a ansiedade falando de novo. Relaxa! – Suspirei. – Entra naquela empresa, peito estufado e ensine esses velhos a parlare l’italiano! – Ela forçou o sotaque, me fazendo rir. – Ninguém te falou nada ainda, null. Lida um dia de cada vez, você fica nervosa com coisas que não pode controlar.
- Por isso que eu fico nervosa, se fossem coisas que eu pudesse controlar, eu não ficaria assim... – Ela ficou em silêncio por um tempo.
- Bom ponto! – Rimos juntos.
- Está quase na hora, Ama. A gente se fala mais tarde, ok?!
- Eu estarei aqui. – Ela disse ainda.
- Beijo, Edu! – Falei.
- Beijo-o-o-o! – Ele disse, me fazendo rir e desliguei o celular.
Respirei fundo, tombando a cabeça para trás e segui para dentro do prédio. Tentei manter um sorriso no rosto, mas por dentro eu sentia que estava borbulhando, talvez fossem gases, mas não podia pensar nisso agora.
Acenei para a recepcionista, seguindo o caminho de sempre e nem me surpreendi quando encontrei Claire sozinha na sala, na ponta da mesa. Engoli em seco e entrei devagar.
- Buongiorno, Claire...
- Ciao... – Ela disse desanimada.
- Acho que não deu certo, né?! – Me aproximei dela, puxando a cadeira ao seu lado.
- Pelo visto eu fui empolgada demais com isso... – Ela disse.
- Sinto muito, Claire. Estou acostumada com isso, até quando as pessoas querem, elas desistem pelos mais variados motivos, imagina sem querer... – Ela suspirou.
- Eu odeio isso! Eu nunca pedi nada, eles não podiam ter feito um favor para mim? – Notei sua voz mais irritada e Claire tinha uma figura tão calma que era difícil imaginar ela irritada.
- Sinto muito... – Suspirei, sabendo que as próximas palavras me ferrariam, mas o que é certo, é certo. – Se você quiser rescindir o contrato, podemos...
- NÃO! – Ela falou rapidamente. – Não, não! Nada de rescindir, eu ainda preciso de você. Eles podem não me ajudar, mas eu preciso disso! Eu não vou deixar meu sonho morrer por um bando de velhos. – Ri fracamente.
- Feliz que está animada. – Falei e ela assentiu com a cabeça.
- Creio que a gente só precise mudar nossa tática... – Ela ponderou com a cabeça.
- Claro, o que ficar melhor para você, alguma ideia? – Perguntei e ela deu um curto sorriso.
- Acho que tenho algumas. – Ela disse, me fazendo sorrir com ela.


Capítulo 2

- Tem certeza de que é aqui? – O motorista do Uber perguntou e olhei pela janela.
- Creio que sim... Por quê? – Perguntei.
- Hum... Essa é a casa do Lawrence Stroll... – Ele disse e pressionei os lábios.
- É aqui mesmo. – Suspirei. – Obrigada!
- De nada. – Ele disse rindo e empurrei a porta do carro, ajeitando minha mochila nas costas.
Realmente, entendia a surpresa do cara, quem iria na casa do cara mais rico de Montréal, né?! Pois é! Creio que a separação de Claire e de Lawrence era a mais saudável que eu vi em toda minha vida, eles ainda moram na mesma casa, apesar de ele ficar longe boa parte do ano, e parecem possuir uma relação de respeito. Ao menos nunca ouvi Claire falar mal dele na minha frente.
Depois do primeiro mês de aulas completamente fracassado, Claire decidiu mudar as aulas para casa dela. Ela ainda quer continuar com as aulas, meu pagamento será exatamente o mesmo, ela só pediu se podemos fazer na sua casa, para que nós duas possamos ter conforto.
Confesso que até prefiro, é mais perto de casa do que o lado corporativo de Montréal, mas não esperava ser uma mansão enorme como essa, com grandes e lindos portões de ferro, que de fora parece que era só uma casa normal.
Me aproximei da campainha, respirando fundo antes de apertá-la. Esperei alguns segundos, olhando para o céu azul. Maio estava começando um pouco mais quente e eu agradecia, estava cansada do frio desse país. Às vezes eu penso se não deveria ter ido para Austrália, mas não podia negar que o Canadá estava me dando boas opções.
- Quem é? – Ouvi uma voz masculina.
- null, vim a pedido de Cla…
- Pode entrar! – Disse e o portão duplo se abriu, me deixando surpresa.
Entrei assim que tive espaço o suficiente para uma pessoa passar e segui pelo caminho. Passei pela entrada curva de carros até ver a mansão aparecer em minha frente. Ela é branca com os telhados cinza, chama bastante atenção, devo dizer. A rua seguiu para a direita, mas um homem me esperava em uma porta.
- Seja bem-vinda, senhorita null.
- Oi! – Me aproximei.
- Eu sou Sebastien, responsável pela casa e criadagem... – Assenti com a cabeça.
- Prazer, eu sou null. – Dei um sorriso e o homem confirmou mais uma vez.
- Venha, senhora Claire já está te esperando. – Ele indicou e entrei, notando que estava entrando em uma cozinha. Tudo era claro, com granitos brancos e decoração discreta. Eu gostava de inventar um pouco na cozinha, então aquele local era incrível para mim. – Venha, por favor. – Sebastien disse e o segui.
Saímos da cozinha, descendo alguns degraus e passamos por uma sala de jantar ligada à cozinha e por outros cômodos menores. Tudo era muito claro e bonito, eu estava evitando não parecer surpresa demais.
Descemos mais algumas escadas e chegamos num largo hall com uma sala à frente, uma longa escadaria à esquerda e portas de vidro incrivelmente limpas do lado direito. Notei que havia entrado pela lateral da casa. Talvez a entrada de serviços mesmo.
- A Claire logo estará aqui. Fique à vontade. – Ele disse e assenti com a cabeça.
- Obrigada. – Ele disse, se retirando por baixo da escadaria e dei uma olhada em volta. O pé direito deveria ter uns cinco metros de altura, tudo era muito claro, eu me sentia minúscula aqui, mas não tinha um quê de coisa chique, só grande demais mesmo.
Ouvi um latido fino e virei o rosto, vendo o que parecia ser um filhote um pouco maior de Golden, descer as escadas todo atrapalhado, soltando vários latidos.
- Ah, que coisa linda que você é! – Ele veio direto em meu pé, fazendo seu latido fino ecoar na sala vazia e começou a cheirar os cadarços do meu tênis. – Oi, sua coisa fofa. – Me abaixei, deixando-o me cheirar antes de afagar os pelos brancos deles.
- null, não! – Ergui as mãos, vendo Claire na minha frente. – Ela é pequena, mas ela morde forte.
- Opa! – Olhei para a bolinha de pelos que insistia em me cheirar. – Ela não parece querer me morder.
- Ah, ela é chata, null, se você soubesse. Ela me morde, se quer saber.
A bolinha de pelos continuou cheirando meu All-Star até começar a brincar de cabo de guerra com meu cadarço, continuando a soltar finos latidos, como se meus sapatos fossem atacá-la.
- Ela não parece perigosa, Claire. – Disse, me atrevendo a acariciar a cabeça da cachorra de novo, vendo-a se assustar.
- null... – Claire me avisou e desci o carinho para o pescoço dela, vendo-a começar a se aninhar em mim.
- Acho que ela gosta de mim, Claire! – Falei rindo, parando o carinho segundos depois, ouvindo a cachorrinha latir agora por eu ter parado de fazer carinho. – Ah, folgada, agora gostou?
- Isso é realmente estranho, null. – Claire desceu as escadas. – Ela odeia mulheres no geral.
- Talvez ela saiba de algo que eu não sabia. – Rimos juntas e Claire me deu dois beijos.
- Essa é a Kenya, meu filho deu ela para sua ex-namorada, quando eles terminaram, ele ficou com ela, então ela não gosta de nenhuma mulher, só da Sarah. – Ela disse e imaginei que Sarah fosse a ex-namorada de seu filho.
- Bom, ao menos ela não parece querer me matar. – Falei rindo.
- Talvez seja um bom sinal. – Ela disse e ri fracamente.
- Ela é filhotinha ainda, para que tanto ódio no coração? – Brinquei, sentindo Kenya ainda me cheirar.
- Ela não é filhote, ela é só pequena mesmo. Tem uns três anos. Meu filho e a Sarah terminaram tem um ano, mais ou menos. Como ele viaja muito, ela fica aqui me enchendo o saco. – Claire disse rindo. – Olhe! – Ela indicou os dedos com marcas de dente.
- Kenya? – Ela assentiu com a cabeça. – Se ela não desmontar meu apartamento, posso cuidar dela, se quiser. – Falei.
- Não brinca que eu aceito. – Claire disse, me fazendo rir. – Bom, vamos?
- Claro! Vim preparada, trouxe várias coisas extras para gente trabalhar um pouco mais de conversação. – Falei.
- Ah, perfeito! – Ela disse. – Vamos aqui na sala... – Ela indicou a sala à frente. – Já deixei minhas coisas aqui embaixo, podemos pegar mais claridade do sol.
Segui com ela até a outra sala e tinha uma mesa redonda com umas oito cadeiras, e atrás tinha uma sala de TV com três sofás que pareciam ser muito confortáveis. Tudo mantendo as cores pastéis de branco e bege.
- Fique à vontade. – Ela disse e apoiei minha mochila na mesa, tirando os materiais.
- Como será somente nós duas, não trouxe o note. Podemos fazer algo mais dinâmico.
- O que achar melhor. – Ela disse e tirei os materiais, meu estojo e a pasta com a tarefa dela.
- Vamos começar na tarefa, notei que você ainda está com um pouco de dúvidas na conjugação do futuro no plural. – Abri a pasta, tirando as tarefas dela rabiscadas.
- Muita dificuldade, pelo jeito. – Lhe entreguei.
- Isso é normal, você está tentando absorver muita coisa em pouco tempo, é normal essas confusões. – Peguei outra folha. – Trouxe textos para gente trabalhar, e um livro, se te interessar.
- Ah, eu adoro O Pequeno Príncipe. – Ela disse.
- Imaginei que já tivesse lido, por isso talvez a leitura seja mais fácil para você. – Lhe empurrei o livro usado que tinha achado na Biblioteca Municipal de Montréal.
- Obrigado, vai ser ótimo! – Ela disse.
- Vamos dar uma repassada? – Perguntei.
- Vamos lá! – Ela disse, abrindo seu caderno.

- Ai, minha cabeça dói! – Ela disse e ri.
- Ah, Claire... – Parei a caneta antes de erguer o rosto para ela. – Você não tem noção como está sendo guerreira nisso tudo...
- Por que diz isso? – Ela perguntou.
- Porque você está tentando aprender um conteúdo de pelo menos dois anos, em um período de quatro meses. – Falei. – Os alunos dificilmente fazem cinco aulas semanais, quiçá mensais. – Adicionei um pouco de drama na voz. – Você está sendo uma verdadeira guerreira...
- Não é você que diz ajudar a realizar os sonhos?
- Exato! – Dei um curto sorriso. – Você está se esforçando para realizar seus sonhos, fazendo sacrifícios e dificuldades... – Dei de ombros. – E tem ido muito bem com isso... – Lhe estiquei o papel em que corrigia. – Parabéns. – Ela sorriu ao ver o número 10 no papel.
- Ao menos algumas coisas valem à pena. – Ela disse e sorri.
- Exatamente. – Estiquei a mão para ela na mesa. – Vai valer à pena, Claire. Tudo dá certo no final.
- Que você esteja certa. – Sorri.
- Eu não sou a melhor professora do mundo, mas eu sei das dificuldades que eu tive para aprender, então poder passar essas dificuldades para os outros e inspirar eles, é demais!
- Você é uma brasileira, que fala português, morando em um país que fala inglês e francês, dando aula de italiano... Você é meu deus, null... – Ri.
- Não se esqueça que não falo francês. – Disse.
- Ainda... – Ela disse e ri fracamente.
- Talvez eu nunca aprenda essa, eu não consigo gostar...
- Meu filho também não, acredita? E nascido e criado aqui! – Ri fracamente.
- Eu provavelmente vou gostar dele. – Rimos juntas.
- Falando nisso, que horas são? – Cheguei meu relógio.
- Três e quarenta e cinco. – Falei.
- Ah, meu Deus. Podemos fazer um intervalo? Está na hora da classificatória...
- Hum... Claro! – Não entendi muito, mas estava na casa dela, ela que mandava.
- Sebastien! – Ela chamou o homem que me atendeu anteriormente.
- Sim, senhora. – Ele apareceu rápido.
- Poderia providenciar um café para mim e para a null, por favor? – Ela pediu fofa.
- Claro, senhora. Em alguns minutos. – Ele disse. – Ligo a TV para ver o senhor Lance?
- Eu cuido disso, não se preocupe. – Ela disse e ele assentiu com a cabeça.
- Bom, null, você vai conhecer meu filho agora. – Ela disse animada. – Metaforicamente, é claro. – Assenti com a cabeça. – Venha, vamos na televisão um pouco. – Ela disse já se levantando e deixei meus materiais à mesa para segui-la. – Fique à vontade.
Ela começou a ligar a grande televisão e se sentou no sofá bege, colocando os pés para cima. Ela procurou o canal de esportes e logo identifiquei a Fórmula Um. Eu não sou a mais conhecedora de Fórmula Um, mas agora eu entendi a classificatória que ela disse. A que definia o grid da corrida de amanhã.
Me sentei no outro sofá, somente cruzando as pernas e observei a televisão. Agora tudo ficou claro! Todas as informações que procurei sobre a família finalmente fizeram sentido. Lawrence Stroll é dono de uma equipe de Fórmula Um e seu filho mais novo, Lance, é piloto da equipe. E eu dou aula para mãe dele! Que louco!
- Ah, ele aí! – Claire disse como a verdadeira mãe orgulhosa.
Olhei para a televisão e uau! O filho dela é realmente bonito! A foto do Wikipedia com certeza está desatualizada. Os cabelos escuros e as grossas sobrancelhas faziam sua pele clara se destacar mais. Os lábios finos e fechados, junto do seu semblante sério, deixavam-no bem gat...
- Você acompanha Fórmula Um, null?
- Oi?! – Virei rapidamente para Claire.
- Fórmula Um, você acompanha?
- Ah, não! – Olhei para a TV, vendo que a imagem mudou para o circuito. – Meu pai e avô assistem, mas confesso que não presto muito atenção... Seu filho corre?
- Ah, o Larry é fogo, viu?! Ele sempre foi ligado em corridas e carros desde que namorávamos. Quando o Lance nasceu, ele logo foi colocando o menino em corridas, equipes juniores, até que ele decidiu começar a investir em equipes, primeiro com a Williams, depois a Force India, até que veio a oportunidade com a Aston Martin e ele como CEO... – Uau. – E o Lance adora...
- Há quanto tempo na F1? – Perguntei.
- Desde 2017, ele recebe muitas críticas, sabe? Dizem que só pilota porque o Larry é dono da equipe, mas ele tem melhorado bastante, poxa... – Ela disse com um verdadeiro aperto no peito. – E tem tudo para o carro ficar melhor ainda ano que vem, estamos esperançosos que venha ao menos uma vitória...
- Ele não ganhou ainda? – Perguntei, tentando tomar cuidado com as palavras.
- Ainda não, mas já tem pole, pódio, estamos esperançosas pela vitória.
- Legal! Então mesmo que digam alguma coisa, ele tem as glórias dele. – Dei um curto sorriso e ela assentiu com a cabeça, em agradecimento. – E ele está em terceiro! – Indiquei a televisão.
- Ah, é só o começo, tem tempo, ele precisa ficar ao menos entre os 10 primeiros. – Ela disse.
- Com licença... – Sebastien apareceu com uma bandeja com muito mais do que só um café e colocou na mesa de centro.
- Obrigada! – Claire disse e dei um aceno de cabeça.
- Quer que eu sirva? – Ele perguntou.
- Não se preocupe. – Falei, deslizando o corpo para frente para pegar o bule. – Posso?
- Por favor. – Claire disse e servi café para as duas, depois coloquei um pouco de leite em cada um.
- Açúcar?
- Para mim não. – Ela disse e lhe entreguei a xícara com o pires. Peguei o meu, colocando duas colheres de açúcar antes de roubar um biscoitinho.
- Deve ser legal, não? – Comentei, puxando minha xícara para mim.
- O quê? – Ela perguntou.
- Sabe... Viajar o mundo. – Indiquei a televisão novamente.
- Ah, é cansativo, viu?! Além da distância, o Lance mora na Suíça para ficar mais fácil. A Europa acaba sendo mais foco para essas coisas, sabe? Então ele fica lá, e o Larry fica muito na Inglaterra, que é a base da equipe. Eles adoram a vida agitada, mas adoram voltar para casa por um tempo. – Assenti com a cabeça. – Eles precisam abrir mão de muitas coisas por isso, cada semana está em um lugar diferente, cuidar bem da saúde... – Ela negou com a cabeça. – Mas se meu menino está feliz, eu também estou. – Assenti com a cabeça.
- Eu sempre quis viajar o mundo, mas imagino que uma vida corrida dessa não seja tão prazeroso.
- Ah, que nada! Tem todas as vantagens, eles possuem uma ótima estrutura em todo lugar, desde moradia até comida, mas....
- Nem tudo que reluz é ouro. – Falei e ela assentiu com a cabeça.
- Exatamente. Adoro quando o Lance vem e fica um pouco em casa, parece que é criança de novo. – Dei um curto sorriso.
- Parece que está sentindo saudades, Claire. – Falei e ela riu fracamente.
- Ah, estou! Não o vejo desde março quando a temporada começou, mas estou ansiosa pela corrida no Canadá, vai ser no meio de junho e é aqui em Montréal, vou poder passar uma semaninha com ele.
- Que gostoso! – Falei, tomando um gole do café e vi o sobrenome STR em sexto lugar, fora da zona de risco.
Não acompanho Fórmula Um, mas creio que não precisa ser tão expert para entender. A classificatória era dividida em três partes. Nessa primeira parte, Lance acabou se mantendo em sexto lugar. Pilotos como Magnussen, Zhou, Albon, Latifi e Ocon ficaram de fora.
- Ah, que pena, o Estie ficou em último, que droga! – Claire disse.
- Oi? – Virei para ela.
- O Ocon, Esteban, é um grande amigo do Lance. – Ela disse e assenti com a cabeça.
- Ele não teve tempo. – Comentei.
- Algo pode ter acontecido no terceiro treino e ele não conseguiu sair. – Ela disse, pegando seu celular e assenti com a cabeça.
A segunda parte da classificatória começou sem os pilotos anteriores, e voltou com todos eles fazendo voltas rápidas – como o narrador dizia – para ver quem fazia o menor tempo. Lance – ou o filho de Claire – começou mal essa parte, em décimo primeiro, não teve nenhum avanço por quase todo o tempo do relógio, mas em sua última volta ele conseguiu ficar em oitavo.
Ver os pilotos finalizando suas voltas e ver quem ficaria em cima ou embaixo, era realmente empolgante. O tempo finalizado e eles lutando para ver quem ficaria com as últimas vagas.
- Dá um frio na barriga, né?! – Comentei e Claire riu.
- Acho que alguém vai começar a se interessar por Fórmula Um. – Ela disse e ri fracamente.
- Quem sabe? Ainda mais tendo a companhia de quem entenda. – Falei e ela sorriu.
- Ah, é muito gostoso, você vai ver! – Ela disse sorrindo, virando para a televisão novamente. – Vettel em décimo terceiro, coitado... Não está sendo um ano fácil para ele.
- Vettel em Sebastian Vettel? – Perguntei.
- Viu?! Conhece até alguns nomes...
- Tem alguns que é impossível não saber. – Falei rindo.
- Ele é da nossa equipe, boatos que quer se aposentar no fim do ano. É uma pena, ele é uma ótima pessoa e um ótimo piloto, só tem tido azar...
- Não deve ser fácil... – Comentei e ela somente negou com a cabeça.
Além de Vettel em décimo terceiro lugar, Alonso – outro nome que eu conhecia – Russel, Ricciardo e Schumacher, ficaram de fora também.
- Schumacher? – Perguntei confusa para Claire. – Mas ele não...
- Boatos que está vegetando há quase 10 anos. – Ela disse, assentindo com a cabeça. – É o filho dele, Mick, grande amigo do Lance também, mas também não tem tido sorte. – Ela disse.
- Deve ser complicado...
- Ah, bastante. A pessoa pode ser ótima, mas se o carro não está bom, não tem o que faça ser bom... – Assenti com a cabeça. – Esse ano não estamos tão ruins, mas não bons o suficiente para competir por alguma coisa... – Ela disse.
- Sinto muito.
- Sempre tem o próximo ano e sempre tem a próxima corrida. Falo isso para o Lance quando ele está desanimado... – Confirmei com a cabeça.
- Ao menos entre os 10 primeiros ele já está... – Comentei aleatoriamente, para mudar de assunto.
- Sim, ao menos isso! – Ela deu um curto sorriso.
E foi exatamente em décimo lugar que Lance finalizou. Ele até fez algumas voltas que o deixaram em novo e oitavo, mas foi em décimo que ele iria largar amanhã.
- Não é perfeito, mas ele já conseguiu chegar até a Q3, está ótimo. – Claire disse orgulhosa novamente e sorri.
- Sim, ao menos tem 10 atrás dele. – Falei.
- Acompanha a corrida amanhã, null. – Ela disse. – Vai ser as 16:30 da tarde. – Ela disse.
- Ah, eu não... Eu acho que só passa na TV a cabo. – Falei.
- Ah, acompanha pelo app. – Ela disse, se levantando. – Espera aí! – Ela falou, sumindo pela sala e ouvi os latidos serem ouvidos novamente.
- Oi, Kenya. – Falei, vendo a bola de pelos tentando subir no sofá. – Por que você quer ser minha amiga, hein?! – Me abaixei para acariciar sua cabeça, mas não sabia se podia colocar ela no sofá. – Eu sou legal, mas se a Claire disse que você odeia mulheres... – Ela latiu mais uma vez, me fazendo rir.
- Aqui, null. – Claire me esticou um cartão, estilo de crédito, verde, com o nome Aston Martin escrito. – Nós temos algumas cotas do app da Fórmula Um. Só entrar em F1 TV, aí você raspa as informações e faz login. Pode usar à vontade. – Ela disse.
- Ah, obrigada! Vou acompanhar sim. – Falei sorrindo.
- Vou adorar ter com quem conversar. – Ela disse e assenti com a cabeça.
- Bom... Vamos voltar ao italiano? – Ela bufou alto.
- Vamos! – Ela disse rindo.

- Hoje a gente perdeu um tempinho pela Fórmula Um, mas a gente compensa na semana que vem. – Falei, fechando meu livro.
- Ah, nem se preocupe com isso, null! Eu te tenho toda para mim agora, podemos fazer as coisas com mais calma. – Claire disse, imitando minha ação. – E foi por um pedido meu, você não vai ser prejudicada por isso. – Assenti com a cabeça.
- Agradeço, Claire. – Sorri. – Foi um dia divertido e produtivo, eu diria.
- Foi, eu gostei muito! – Ela disse sorrindo. – Melhor ainda por estar finalmente entendendo o que é a “particella ci e ne”. – Rimos juntas.
- Quando você perceber, não vai parar de usar ele. – Ela disse e abri minha pasta plastificada.
- Você pode fazer essas duas folhas de lição de casa... – Puxei as folhas grampeadas. – E como está o livro? – Perguntei e ela riu fracamente.
- Está indo... – Ela disse. – Por saber a história, fica mais fácil, mas ainda tem muita coisa que eu não conheço.
- Que tal um jogo para semana que vem? De soletração?
- Ah, null! – Ela disse em um gemido, me fazendo rir.
- Vamos! Vai ser legal! – Ela suspirou, jogando a cabeça para trás.
- Ai, vamos! Mas não fica brava se eu não souber, hein?! – Rimos juntas.
- Vai dar tudo certo. – Falei, vendo-a sorrir. – Deixa eu organizar minhas coisas e te deixar à vontade.
- Ah, que nada, menina! Ficar sozinha nessa casa enorme é chato. Minha filha disse que apareceria mais tarde, mas acho que ela esqueceu... – Chequei o relógio e vi que passava das seis da tarde.
- Ela vive aqui?
- Chloe? Mais ou menos. Ela namora um snowboarder, ele vive em competições, então eles sempre estão juntos, mas ela está aqui essa semana. – Ela disse.
- O que ela faz? Pilota também? – Perguntei.
- Ela está tentando fazer a vida de cantora, não é fácil também, mas uma hora sai. – Ela disse e assenti com a cabeça.
- Uma hora sempre sai. – Ouvi uma terceira voz e vários latidos de Kenya que estava quieta no sofá.
- Ah, filha! – Claire disse, abraçando-a e a semelhança entre ambas é incrível. Elas são muito parecidas.
- Oi, mamãe! – Chloe a abraçou animada.
- Que bom te ter aqui. – Guardei minhas coisas delicadamente enquanto elas aproveitavam o abraço.
- Deixa eu te apresentar minha salvadora, filha. – Claire disse. – Essa é null, minha professora de italiano.
- Ah, ouvi muito sobre você! – Ela me deu um grande abraço, me fazendo retribuir. – Você está virando uma santa para minha mãe.
- Ah, que isso! Só fazendo o que posso com o que me foi dado. – Falei sorrindo.
- Cada um com seu talento, certo? – Ela disse, me fazendo rir. – A gente nem sempre consegue, mas tentamos sempre. – Sorri.
- Com toda certeza. – Claire disse. – Gostaria de ficar para jantar, null?
- Ah, não, senhora, que isso. Vou deixar vocês aproveitarem. – Falei, guardando o estojo na bolsa. – Aproveite seu momento com ela.
- Que isso! null, certo?
- Isso! – Sorri.
- Quanto mais melhor. – Ela disse.
- Ah, não se preocupem, hoje o dia foi cheio, acho que eu preciso de banho e cama...
- Estou tirando todos os horários livres dela... – Claire brincou, me abraçando de lado.
- É por uma boa causa, só quero ver seu sucesso. – Falei e ela assentiu com a cabeça.
- Eu agradeço muito por isso, esse apoio é incrível. – Claire sorriu.
- É mesmo, fazia tempos que minha mãe não se empolgava com alguma coisa, null. Vê-la animada assim é demais. – Chloe disse, me fazendo sorrir.
- Que bom, fico feliz! – Sorri, colocando a mochila nas costas. – Nos vemos na semana que vem, então?
- Claro, null! Eu te acompanho... – Claire disse.
- Não se preocupe, aproveite sua filha, eu sei o caminho. – Sorri e ela assentiu com a cabeça.
- Então até semana que vem, null! – Ela me abraçou e sorri, retribuindo fortemente. – Obrigada por mais um dia.
- Que isso. – Falei sorrindo. – Bom te conhecer, Chloe.
- Você também, null! – Ela disse sorrindo e dei um aceno. O latido fino foi ouvido de novo e virei o rosto, vendo Kenya vir em minha direção.
- Kenya, não! – Chloe disse.
- Olha só! – Claire disse e acariciei a cabeça de Kenya quando ela chegou em mim.
- O quê? – Chloe falou surpresa para a mãe.
- Pois é! – Claire disse e ri fracamente.
- Acho que o problema são vocês, meninas. – Brinquei, ouvindo elas rirem.
- Não, não, o problema é definitivamente você! Acredite! – Chloe disse dramática. – Endoidou, Kenya. – Rimos juntos.
- Brinquei que ela deve saber algo que eu não sei. – Falei, ouvindo-a rir.
- Talvez... – Chloe riu.
- Bom, gente, eu estou indo! Tchau e até semana que vem! – Acenei, seguindo para fora da sala.
- Tchau, boa semana! – Claire disse.
- Eu vi o que eu acabei de ver? – Ouvi Chloe comentar.
- Pois é! Estou em choque há cinco horas. – Ela disse e sorri, seguindo pela porta da frente, para o sol se pondo da área rica de Montréal.

- E menos um capítulo... – Falei sozinha, feliz por terminar mais um capítulo da minha história.
Podem falar o que quiser, mas é muito bom poder escrever minha fanfic em paz e ninguém para julgar. É uma ótima forma de distrair e ainda ocupa a cabeça. Especialmente nesses momentos sozinha e de saudades de casa.
Suspirei e vi uma notificação subir no WhatsApp do computador.
“A corrida começa em 10 minutos... Vai ver?” Era uma mensagem de Claire.
Virei o rosto para a televisão, vendo o relógio ao lado dela e ponderei com a cabeça. Apoiei o note no sofá / cama e me levantei dele, indo até minha mochila. Abri alguns bolsos laterais e peguei o cartão que Claire havia me dito, virei o mesmo, vendo a área para raspar e peguei a chave para fazer isso, vendo um e-mail e um PIN aparecer, quase como se fosse um cartão de celular.
Voltei para o sofá, colocando o note no colo e digitei “F1 TV” no Google, vendo os resultados e abri o primeiro. Coloquei o login e a senha do cartão, vendo a conta aparecer. Logo apareceu “2022 Grande Prêmio de Miami”. Cliquei no mesmo e cliquei na opção em assistir ao vivo, vendo a imagem carregar e mostrar imagens do circuito igual ontem.
- Vamos ver o que é isso. – Falei, vendo as organizações ainda e me levantei novamente.
Peguei um saco de pipoca, colocando no micro-ondas e coloquei três minutos. Fiquei um olho no computador e outro nas minhas coisas e peguei um pote de pipoca e sal, deixando tudo pronto para a pipoca que logo ficou pronta.
Puxei a mesinha para perto do sofá / cama e coloquei o note ali, vendo que a volta de formação estava rolando já. Enchi a mão de pipoca e coloquei na boca, observando as imagens.
Deve ser louco esse mundo de Fórmula Um. Viajar toda semana, estar em um lugar diferente sempre, além de todo o luxo e caos que se misturava. Loucura!
Pelo que os narradores falavam, é a primeira vez que tem essa corrida em Miami, e tinha tudo para ser eletrizante. Ao menos seria uma boa forma para me entrar nesse mundo.
Os carros chegaram no grid, se alinhando em suas posições e vi o carro verde escuro da Aston Martin e do filho de Claire do lado, fora da pista principal. Não entendi o que o narrador falou, mas imagino que fosse alguma punição por algo, especialmente que os dois carros estavam lá.
- E vamos lá! E vai começar o GP de Miami! – O narrador disse animado. – LIGHTS OUT AND WAY WE GO!


Capítulo 3

- Só os 10 primeiros colocados ganham pontos, e aí tem a diferença equivalente de cada posição. – Clair me explicava...
- Eu já vi algumas corridas antes, então não sou uma completa tonta sobre o assunto... – Bebi um gole da Coca-Cola gelada.
- É fácil, só a parte de tempo entre os carros, quantas voltas demoram para eles ultrapassarem que me deixa um pouco confusa... – Ela sorriu. – Mas eu gosto.
- É seu filho, Claire. Quem não gostaria?! – Dei de ombros e ela riu.
- Você está certa. – Ela suspirou. – Ai, eu sou uma mãe coruja, null.
- Não julgo, se um dia eu tiver filhos, provavelmente serei também. – Ri sozinha. – Ainda mais com as condições que podem oferecer para eles.
- Falando neles, o Lance vai passar essa semana aqui. – Ela disse, se ajeitando na poltrona. – Vamos fazer um churrasco amanhã, por que não vem? O Larry vai estar aqui, a Chloe, seu noivo, aposto que algum dos amigos do Lance...
- Ah, não, Claire, é algo de família...
- Acredite, querida, quando os amigos do Lance estão envolvidos, nada é “de família”. – Ela disse rindo e a acompanhei, suspirando em seguida.
- Sério, eu não quero atrapalhar... – Falei.
- Você não vai. – Ela disse. – Sei que talvez queira um descanso da sua aluna mais necessitada...
- Que isso, Claire, você é ótima. – Ela abanou a mão.
- Mas! – Ela frisou. – Também sei que não tem muitos conhecidos na cidade. E Chloe gostou de você... Vai! Pode ser uma oportunidade para fazer amigos. – Suspirei, pensando na proposta. Não seria nada mal fazer amigos além dos professores da escola e dos alunos que rotacionavam demais.
- Com uma condição! – Falei firme, vendo-a bater palmas animada. – Duas, na verdade.
- Diga! – Ela disse rindo.
- A primeira é você me garantir que eu não vou atrapalhar. – Falei e ela riu.
- Você não vai! – Ela disse rindo. – Confie em mim. – Suspirei, assentindo com a cabeça.
- Ok.
- E a segunda? – Ela disse e ri.
- Você terminar essa lista de exercícios para amanhã e eu corrigir. – Ela riu fracamente, suspirando.
- Combinado! – Ela sorriu. – Vou terminar logo depois daqui e deixo prontinha para amanhã.
- Vou cobrar, hein?! – Rimos juntas e terminei a Coca-Cola.
- Pode cobrar, promessa é dívida. – Ela riu comigo.
- Combinado! – Fechei minha pasta. – Agora deixa eu ir, que eu preciso passar no mercado. – Falei, colocando tudo na mochila.
- Combinado! – Falei rindo. – A gente se vê amanhã, então.
- Meio-dia, combinado? – Ri fracamente.
- Combinado, Claire. Não vou faltar.
- Eu sei onde você mora, null, eu tenho seu contrato. – Rimos juntas.
- Tentarei não dormir tanto. – Ouvi os latidos e Kenya saiu do sofá, vindo para perto de nós novamente. – Te vejo amanhã, sua fofa. – Me abaixei para fazer carinho nela que se aninhou rapidamente ao meu lado.
- Ainda vou entender os motivos de ela gostar de você. – Ela disse.
- Eu já falei, provavelmente ela sabe de algo que eu não sei. – Rimos juntas.
- Bonita do jeito que é, acho muito difícil. – Rimos juntas.
- Nos vemos amanhã?
- Claro! – Ela se levantou.
- Se tiver alguma dúvida, pode me mandar mensagem, ok?!
- Eu te vejo amanhã, posso deixar você descansar ao menos por 18 horas. – Rimos juntas.
- Combinado! Eu peço para o Sebastian abrir para mim. – Coloquei a mochila nas costas. – Até amanhã.
- Até, meu anjo! – Trocamos um rápido beijo. – Se cuida!
- Vocês também! – Acenei e ela acenou enquanto saía da mansão dos Stroll.

A ideia de fugir do almoço com a família Stroll ficou martelando literalmente desde o momento em que eu falei para Claire que eu iria. Não me leve a mal, mas eu não estava muito a fim de fazer parte de um momento tão família quanto o encontro deles. Claire estava tão empolgada com a chegada do filho e eu não queria atrapalhar.
Mas quando eu acordei tarde domingo, já tinha várias mensagens dela perguntando o horário que eu chegaria. Eu só consegui respirar fundo, jogar as pernas para o lado e ir direto para o banho.
Já passava das 11, então eu não tinha muito tempo para me arrumar. Tomei banho, sem lavar os cabelos, escovei os dentes e coloquei uma calça jeans, camiseta tradicional, meu All-Star mais limpo e peguei a jaqueta jeans escura. Penteei os cabelos para fazer um rabo de cavalo alto e firme, e passei um lápis de olho e um batom nude.
Enquanto eu lavava as louças de ontem, procurei sobre os horários do ônibus, mas o mais próximo passaria em meia hora, eu chegaria atrasada, mas não poderia chegar tanto. Pedi um Uber e em 15 minutos eu já estava parando nos portões dos Stroll novamente.
Respirei algumas vezes antes de tocar o interfone. Sabe quando você é a última a chegar na festa? Em que você se sente obrigado a cumprimentar todo mundo? Então, era como eu estava me sentindo. E eu odiava ser a última a chegar em festa!
- Sim? – Ouvi Sebastian.
- Oi, Seb, é a null!
- Entre! – Ele disse, liberando minha entrada.
Passei pela fresta quando os portões de metal abriram e andei pelo caminho do carro. Já vi alguns carros distribuídos no gramado. E do outro lado um... Helicóptero? Deus, o que eu estou fazendo aqui?
- Seja bem-vinda, null! – Vi Sebastian na porta e sorri.
- Oi, Seb! Quanto tempo! – Brinquei e ele riu comigo, me cumprimentando com um aceno.
- A senhora é hilária. – Ele disse num tom sério, me fazendo rir. – Venha, vou te levar para o pessoal.
- Seb, poderia me dar uma informação privilegiada? – Perguntei enquanto andava ao seu lado.
- Creio que sim, senhora. O que quer saber? – Ele perguntou.
- Quem tanto está aí?
- A família Stroll completa, o noivo da senhora Chloe, alguns amigos do senhor Lance e alguns colegas de Lawrence. – Respirei fundo. – Senhora Claire está ansiosa em te receber.
- Que bom... – Falei aleatoriamente, não querendo demonstrar meu nervosismo em conhecer várias pessoas novas.
Segui Sebastian pela entrada em que estava acostumada, mas diferente de irmos para a sala aonde eu ia sempre, seguimos pelo outro lado da cozinha, passando por um corredor que parecia de serviço, já que encontrei outros dois funcionários enquanto andava por ali.
Quando saímos pelo outro lado, se abriu um jardim bonito com piscina e algumas mesas espalhadas, e foi lá que eu vi o restante do pessoal. Tentei parecer menos surpresa de quando vi o helicóptero, mas parecia aqueles jardins de filmes, muito verde e muito colorido. Quase como uma Riviera francesa dentro de uma casa.
As mesas estavam num deck com o estilo clássico, depois desciam as escadas para a piscina que ficava coberta pelas árvores, mas não tinha nenhuma folha dentro dela. É assim que vive a outra metade do mundo.
- Senhora Claire! – Sebastian chamou atenção de Claire que falava com Chloe e arregalei os olhos. Não tinha dado tempo de eu analisar o território.
- Ah, null! – Claire se levantou de onde estava e vi os olharem virarem para mim.
Vai, null. Simpática! Você é professora e troca de alunos quase toda semana. Vamos!
Segui por entre o jardim, até encontrar Claire nos primeiros degraus do deck, sentindo-a me abraçar fortemente.
- Que bom que não fugiu! – Ela disse próximo ao meu ouvido.
- Desculpe, eu dormi demais. – Falei e ela riu.
- Não se preocupe, você merece descansar. – Assenti com a cabeça. – Venha, venha conhecer o restante do pessoal. – Ela me abraçou pelos ombros, me puxando escada acima e Chloe já estava lá.
- Oi, null. – Ela disse animada.
- Oi, Chloe! – Nos abraçamos rapidamente.
- Que bom te ver novamente! – Ela disse sorridente.
- Bom te ver também!
- Venha! – Ela disse.
Claire me puxou à frente e fui com ela, vendo-a se aproximar de três homens mais velhos. O mais velho identifiquei ser Lawrence, de várias fotos que eu já havia visto, agora os outros dois deveriam ser seus colegas.
- Larry! – Claire o chamou e ele se levantou, dando alguns passos até ela. – Gostaria de te apresentar a null, ela é quem está me ajudando com o italiano.
- Ah, olá, null! Prazer em te conhecer. – Ele disse em um forte sotaque canadense, enquanto esticava a mão.
- O prazer é meu! – Seu aperto de mão era forte, mas ele tinha um sorriso amigável.
- Claire disse que é brasileira. Acabou gostando daqui de Montréal? – Ele perguntou.
- Sim! Eu vim para fazer um curso, acabaram me contratando e eu fiquei... – Sorri.
- Espero que essa cidade esteja te recepcionando bem.
- Sim, está, agradeço muito. – Sorri.
- O que precisar, null, pode contar conosco. Claire gosta muito de você! – Assenti com a cabeça.
- Pode deixar! Agradeço muito! – Ele assentiu com a cabeça.
- Venha! – Claire me puxou pelo braço e imaginei que os outros dois não eram nada relevantes. Claire me levou mais para perto da piscina, onde tinha cinco homens, incluindo seu filho, em que evitei regalar os olhos. Ele ficava mais bonito sorrindo.
- Filho! – Claire o chamou e ele segurava Kenya em seu colo.
- Ei, mãe! – Ele se aproximou alguns passos.
- Quero te apresentar minha salvadora.
- A famosa null! – Ele disse e ri fracamente.
- Estou com fama demais para o meu gosto. – Brinquei e rimos juntos.
- Eu sou Lance, null. – Ele disse.
- Prazer em te conhecer, sua mãe também disse muito sobre você. – Ele ponderou com a cabeça.
- Medo do que ela disse. – Rimos.
- Só coisas boas! – Falei. – E parabéns pela carreira, estou acompanhando um pouco por causa dela agora.
- Ah, finalmente alguém que não é viciado em Fórmula Um. – Ele disse rindo, então não soube dizer que era brincadeira ou para valer.
- Ainda. Eu não consigo gostar de nada na superfície. – Ele riu.
- Droga! Durou pouco. – Ri e ouvi o latido de Kenya.
- Oi, sua chata. Não estou te ignorando. – Falei para ela.
- Desculpe, null, ela é chata... – Lance disse.
- Não comigo.
- Não com ela. – Claire disse comigo.
- Sério? – Lance achou estranho e levei a mão até a cabeça de Kenya, acariciando devagar, vendo-a tentar se aninhar.
- Viu?! – Falei.
- Estranho! – Lance disse.
- Já me disseram. – Rimos juntos. – Ela sabe de algo que eu não sei. – Cochichei, vendo-o abrir um sorriso.
- Espero que não. – Ele disse, entendendo a piada e sorri.
- Bem, null, aqueles são Stephan, Donato, Kimon e David, amigos de infância do Lance. – Os quatro ergueram as mãos e fiz o mesmo em um aceno.
- Oi! – Sorri.
- Agora que todos se conheceram, vou pedir para Nicka servir o almoço. – Claire disse. – Ah, null, esqueci de te falar, comemos kosher, tudo bem para você? – Ponderei com a cabeça.
- Eu não sei o que é exatamente, mas eu como de tudo. – Falei.
- A refeição kosher segue alguns princípios do judaísmo. – Lance cochichou para mim. – Alimentos permitidos ou não, combinações, forma de preparo, ocasião de consumo, até modo de abate de animais... – Assenti com a cabeça. – Mas o principal é não misturar carne e leite na mesma refeição...
- Ah, creio que já ouvi falar. – Assenti com a cabeça.
- Hoje é peixe assado. – Ele sussurrou.
- Está seguro, então. – Falei rindo.
- Venha! – Ele indicou com a cabeça, colocando Kenya no chão que já queria se aninhar em meus pés.

Me sentei entre Chloe e um dos amigos de Lance, Kinon, Kibon? Não sei. A comida servida era salmão assado e o outro era quase da mesma cor, mas menor, poderia ser truta. A comida visualmente era simples. O salmão estava em uma cama de limão e tinha tomilho em cima. Agora o outro estava em uma cama de tomates e azeitonas. Fora isso, tinha várias opções de saladas cruas e cozidas, inclusive uma caponata de berinjela que estava sorrindo para mim, carpaccio de peixes e alguns bolinhos com um molho levemente amarelado, imaginei ser falafel com homus, mas só por já ter comido vários aqui no Canadá.
Apesar de estar na família dos “donos” de Montréal, era um verdadeiro jantar em família. Lance, seus amigos e o noivo de Chloe, além do próprio Lawrence, eram como quaisquer homens quando se juntavam. Os colegas de Lawrence foram embora assim que o almoço foi servido, então eu era realmente a única de fora do grupo.
Os assuntos passaram de piadas, viagens, carros, passando bem rapidamente pelo trabalho de corredor de Fórmula Um quando Claire perguntou um pouco em particular para Lance, mas no geral eram só familiares conversando. E a comida! Hum, que coisa deliciosa.
Não descobri muito o que os amigos de Lance faziam, mas acho que a maioria trabalhava em trabalhos convencionais em Montréal mesmo. Scotty era um snowboarder profissional, ele até tinha jeito de quem não parou de usar as roupas de skatista do ensino médio, agora Chloe tentava a sorte como cantora.
Na hora da sobremesa, enquanto comia as tortinhas de amora-limão e as peras escaldadas com calda de laranja, eu me senti até confortável em deslizar o corpo um pouco na poltrona e só aproveitar a companhia. Observando eles, eu senti falta da minha família.
- Gostou da comida, null? – Saí de meus devaneios, olhando para Claire.
- Sim, estavam deliciosas. – Falei em um sorriso, sentindo que a atenção tinha sido voltada para mim.
- Então, null, há quanto está no Canadá? – Virei para o lado, notando que a pergunta veio de Lance.
- Quase um ano. – Falei.
- Minha mãe disse que você decidiu ficar... – Assenti com a cabeça.
- É... Foi um misto de coisas, vim passar três meses, mas a escola me ofereceu um emprego, então eu acabei ficando...
- E acabou se adaptando?
- Eu odeio o frio. – Ele riu fracamente. – Mas fora isso, eu gosto da cidade, o pessoal me recepcionou bem...
- Talvez você só não tenha tido experiências boas no frio... Certo, Chloe? – Lance virou para irmã que riu.
- Não começa, Lance! Ela odeia frio. Ela não vai querer esquiar em dezembro! – Chloe disse, fazendo todos rirem.
- Espera... Se você odeia o frio... – Um dos amigos do Lance perguntou. – Por que sair Brasil... Brasil, certo? – Assenti com a cabeça. – E vir para Canadá? – Ri fracamente.
- Eu queria uma experiência internacional, e estava na hora de sair da casa da minha mãe, então vir para o Canadá foi a escolha mais barata... – Dei de ombros. – Eu queria ir para Itália, mas...
- Você ainda vai realizar seus sonhos, querida. – Claire falou do outro lado da mesa e assenti com a cabeça. – E vai colocar todos os italianos no chinelo. Ela fala melhor do que eles, Larry. – Ela cutucou o ex-marido e sorri.
- É... Eu espero por isso... – Dei um curto sorriso.
- Claire tem falado muito bem de você, null. – Larry disse e sorri.
- Eu preciso de alguma companhia, né?! – Claire cutucou Lawrence, se levantando da mesa, o que causou uma debandada dos amigos de Lance.
- Então, quem quer ir para a piscina? – Arregalei os olhos. Não estava frio para que eu colocasse a jaqueta, mas aposto que a água não estaria quente.
- Nada de ir para água depois de comer. – Claire falou séria.

- Ei, null, se aproxime-se! – Chloe falou na beira da piscina – que descobri ser aquecida – e onde os Lance e seus amigos faziam um tipo de polo aquático. A visão era boa, pelo menos.
Me levantei da mesa, onde eu ainda estava, somente com Lawrence e Claire conversando na outra ponta. Quem olhava para os dois assim, poderia jurar que eles estavam juntos ainda como um feliz casal. Fui até Chloe, me sentando na beirada da piscina, mantendo as pernas dobradas.
- Não se isole. – Ela disse e ri fracamente.
- Só aproveitando o momento. Aqui é bem gostoso. – Chloe sorriu.
- É, certo? Eu tenho um apartamento em Laval com o Scotty, mas eu gosto muito daqui.
- Nem parece que está no caos de Montréal, né?! – Comentei e ela assentiu com a cabeça.
- E você? Onde você mora aqui?
- Eu vivo em Petite-Bourgogne... Desculpe meu francês, não é um idioma que eu domino. – Falei e ela riu.
- Acredite, eu também não. – Ela disse rindo. – Devido as viagens dos meus pais, acabamos sendo criados mais no inglês. – Ela deu de ombros. – Minhas notas do francês sempre ficavam em C- ou C+. – Ri com ela.
- Eu nunca gostei muito do idioma, e acabei caindo na área do Canadá que fala francês. – Ouvi algumas risadas mais do que Chloe e vi Lance se aproximar pela piscina.
- Você acaba gostando... Ou suportando. – Ri, concordando com ele.
- Suportar! Essa é a palavra! – Levantei o indicador e eles riram.
- Bem, as pessoas odeiam quando eu dou entrevistas em francês, só sai palavrão... – Eles riram.
- Pardon pour mon français. – Falei e ele riu.
- É isso aí.
- Ei, amor! Pega uma toalha para mim? – Scotty pediu para Chloe que se levantou do meu lado.
- Vamos fazer uma partida de futebol depois, quer participar? – Lance ofereceu.
- Chloe vai participar? – Perguntei.
- Só quando os porcos voarem. – Ele disse, me fazendo rir.
- Seis homens e eu? Acho que eu passo! – Brinquei, vendo-o rir.
- Mas você gosta, certo? Futebol? Brasil? – Ele perguntou.
- Sim, eu adoro! Uma das minhas paixões pela Itália é devido ao futebol. – Sorri.
- Sério? Demais! – Ele abriu um bonito sorriso.
- É... Acho que minha professora não aguentava mais ouvir eu falar de Juventus... – Ele riu.
- Soccer? – Ele perguntou e virei para ele.
- Ah, não! – Tombei a cabeça para trás. – Você está falando de american football?
- Football! – Ele disse firme.
- Não! Football é jogado com os pés. – Ele riu comigo.
- Isso é soccer! – Ele disse firme.
- Ah, não! Achei que só os americanos falassem assim. – Tombei a cabeça para trás.
- É football e não se fala mais isso. – Ele disse.
- Não! Nem vem! – Rimos juntos. – Football, pé, bola. Soccer vem de meiões, qual o sentido?
- O que você usa para proteger a canela? – Ele perguntou ironicamente, fingindo seriedade.
- Caneleira! – Falei, fazendo-o rir.
- Quem é seu jogador favorito de soccer? – Ele perguntou.
- Eu jogador favorito de football é o Buffon da Itália. – Falei, vendo-o sorrir.
- Não o melhor goleiro do mundo.
- Retire o que disse! – Falei rindo de nervoso.
- Não! Por acaso ele tem uma Champions? – Ele disse, me fazendo negar com a cabeça.
- Isso não quer dizer nada. – Falei.
- Ah, quer! Totalmente! – Ele disse rindo.
- Quem é o melhor goleiro do mundo para você? – Perguntei.
- Neuer, com toda certeza. – Ele disse e fingi vomitar, colocando a língua para fora e ele riu. – O melhor.
- E eu ia torcer por você, Lancelot. – Falei, fazendo-o rir.
- É só Lance. – Ele disse.
- Lancelot é mais legal. – Fiz um pequeno bico e ele riu.
- Eu deixo você me chamar assim. – Ele disse e dei um curto sorriso, vendo-o retribuir.

O tal jogo de futebol que eles falaram, era o american football. E não, eu realmente não queria participar disso. A cada dois minutos, Claire gritava para eles tomarem cuidado, já que um derrubava o outro, ou os barulhos dos encontrões eram mais altos do que o esperado. Lawrence por outro lado, só gritava para Lance e Scotty, já que ambos tinham competições vindo por aí. Eu acabei ficando próxima à mesa novamente, somente observando.
- null! – Virei para o lado, vendo Claire aparecer com algumas folhas. – Olhe o que eu fiz!
- Ah, os exercícios! – Virei o corpo na cadeira.
- Eu fiquei a noite toda estudando ontem... – Ri fracamente.
- Fico feliz pela insistência, mas você precisa aproveitar seu dia, Claire. Seus filhos estão aqui!
- Xí! – Ela disse, abanando a mão. – Eu fico feliz por vê-los, eles pegam qualquer oportunidade para ficar com os amigos. – Ri fracamente.
- Ah, Claire. – Neguei com a cabeça. – Deixa eu pegar uma caneta que eu já vejo agora.
- Não, aproveite!
- Deixa disso! Faço isso em dois minutos! – Me levantei, seguindo para área interna da casa, abrindo minha bolsa que estava em cima de um banco e peguei meu estojo, voltando para a larga mesa montada do lado de fora.
Claire falava algo com Chloe, então me sentei à mesa novamente e peguei os exercícios de Claire, colocando vários corretos seguidos ou corrigindo poucas doppias erradas. Não julgo, a letra dupla do italiano sempre me pegou.
- Achei que domingos fossem para descansar. – Virei para o lado, vendo Lance parado ao meu lado, se enxugando com uma toalha.
- Você trabalha aos domingos. – Falei e ele riu, puxando a cadeira ao meu lado.
- Touché! Você não deixa passar uma, né?! – Ri.
- Eu não aceito perder sem lutar. – Dei de ombros.
- Ah, imagina você em um carro de Fórmula Um. – Ele riu, apoiando a toalha na mesa.
- Melhor não... – Ele riu.
- Não gosta de velocidade?
- Só de assistir. – Dei de ombros. – Gosto de ser uma lesminha para dirigir... – Ele riu.
- Depois de andar rápido sempre, a gente acaba preferindo algo mais lento também. – Assenti com a cabeça.
- Mas parece legal! Confesso que nunca tinha acompanhado de verdade antes de semana passada. – Fiz uma careta.
- Sério? Você é brasileira, Senna...
- Eu conheço Senna, e admiro muito sua história, mas eu nasci pouco depois de ele morrer, não acompanhei sua carreira. – Ele ponderou com a cabeça.
- Faz sentido. Qual sua idade? Se eu puder perguntar.
- 29. – Falei e ele assentiu com a cabeça.
- Gosta de mais novos? – Ele disse e senti meu rosto esquentar, me fazendo rir.
- Você diz que meu jogador favorito é ruim, depois flerta comigo? – Ele riu.
- Estou indo bem?
- Nenhum pouco. – Rimos juntos.
- Eu vou melhorar... – Assenti com a cabeça. – Você estava dizendo sobre Fórmula Um...
- Certo! Eu nunca acompanhei 100%, meu pai e avô deixavam a TV ligada no domingo, então a gente acabava assistindo, mas torcer por alguém faz toda diferença.
- Para quem você está torcendo? – Virei para ele.
- Se não for para você, sua mãe me demite! – Rimos juntos.
- E como ela está indo? – Ele indicou o papel.
- Muito bem... – Lhe estendi a primeira folha. – Quase sem erros. – Suspirei. – Ela é esforçada, ela realmente quer isso...
- Eu sei... Fico feliz de ela ter te encontrado, ela está aprendendo e ficando um pouco mais relaxada, porque com os acionistas da empresa... – Ele negou com a cabeça.
- É... Tive uma experiência com eles... – Arregalei os olhos e ele sorriu.
- E você? Seu sonho é Itália? Por quê? – Suspirei.
- Ao contrário de Fórmula Um, sou muito apegada ao futebol, então o amor acabou crescendo por isso. – Dei de ombros. – Apesar dos meus ídolos já terem quase todos se aposentado ou saído do meu time, quero muito ir, ver um jogo, curtir a cultura, comer a pizza... – Ele assentiu com a cabeça.
- A pizza italiana é a melhor do mundo. – Sorri.
- Eu imagino. – Suspirei. – Não penso em morar lá, me satisfaria só com uma viagem calma, sem pressa, para realmente curtir a cultura.
- Quão perto está de realizar? – Ele perguntou e ponderei com a cabeça.
- Por causa da sua mãe... Mais perto. – Ele assentiu com a cabeça.
- Bom saber. – Ele deu um sorriso.
- VAMOS, LANCE! – Viramos o rosto para o campinho, vendo um dos amigos chamá-lo.
- Vai lá, trabalho chama! – Falei e ele riu.
- Você também! – Ele indicou enquanto se levantava.
- Alguns mais legais do que outros. – Falei.
- Vamos trocar, eu corrijo as tarefas e você enfrenta a imprensa... – Ele disse.
- Eu sou boa em falar. – Falei e ele riu.
- Eu sou péssimo em italiano. – Sorri.
- Melhor cada um ficar no que sabe fazer melhor. – Disse e ele assentiu com a cabeça. – Mas também posso te ensinar...
- É, quem sabe? – Ele sorriu e se virou. – Hum, null...
- Sim?! – Virei para ele.
- Minha vida é um pouco louca, semana que vem estarei na Espanha, depois em Mônaco e Baku, e devo voltar para o Canadá só daqui um mês, mas... Poderia me dar seu número? – Sorri. – Assim, se você gostar de novinhos... – Ri fracamente.
- Por que não? – Dei de ombros, escondendo um sorriso no rosto.
Virei as folhas de Claire e rasguei o rodapé de uma delas, anotando meu número e entreguei a ele. Um sorriso dançava em seus lábios, me fazendo corar cada vez mais.
- Não guarda no bolso... Suor mancha tinta. – Ele riu.
- Vou guardar em um lugar bem seguro. – Ele disse, me fazendo sorrir.
- VAMOS, LANCE! CHEGA DE NAMORAR! – Outro amigo gritou, nos fazendo rir.
- Inconveniência... – Lance ralhou, revirando os olhos.
- Não, não, Lance... Isso são amigos! – Falei e ele assentiu com a cabeça.
- Bom ponto. – Ele disse e se afastou de volta para o campinho.
Ouvi um latido alto e vi Kenya correndo em minha direção. Sorri, me abaixando para pegá-la e fiz um carinho em sua cabeça. Ela tentou me escalar e ri fracamente, vendo-a tentar me lamber.
- O que você sabe, hein?! O que sabe? – Falei, tentando me esquivar dela.


Capítulo 4

Entreabri os olhos quando o despertador tocou e só consegui abrir um bocejo enorme, do qual me deixaria com vergonha se eu estivesse em público. Dei um suspiro, antes de virar o corpo no sofá-cama e deslizei o dedo na tela do aparelho, vendo o horário das sete horas de sempre.
Joguei as pernas para fora da cama, coçando os olhos e tirando os cabelos armados do rosto. Peguei o celular, ligando o Wi-Fi e esperei as notificações carregarem, como eu fazia todas as manhãs. Não demorou cinco segundos para um sorriso aparecer em meu rosto, tinha mensagem de Lance. Da mesma forma que tinha quando fui dormir ontem à noite.
“Bom dia! Você sabe o quão difícil é dar entrevistas depois de ter dormido somente quatro horas essa noite? Você gostaria daqui, o tempo está bom. Tenha um ótimo dia, null!”.
Suspirei, fazendo as contas e era uma da tarde para ele. Fazia duas semanas que estávamos conversando todos os dias por WhatsApp, de manhã até tarde da noite. Os únicos momentos que não conversávamos era quando ele estava em seus compromissos e na fábrica da Aston Martin, ou quando eu estava nas minhas aulas. Mas ele acabava se dando pior do que eu. Ele sempre estava fusos à frente, então enquanto eu dormia as dez da noite, ele dormia as quatro da manhã.
“Bom dia, Lancelot! Acordando agora, inveja das minhas nove horas de sono? Hahahah! Imagino que Mônaco deva ser um lugar lindíssimo. Hoje é quinta, dia cheio, mas tem café na escola, dia de comer bannock e buttertarts*! Tenha um lindo dia e não vá levar multa de velocidade!”
Fui para o banheiro saltitante e respirei fundo. As coisas mudaram muito rápido nessas duas semanas. Eu não sei explicar, mas é uma situação que eu nunca tinha passado antes. Os papos começavam, a gente trocava meia dúzia de palavras e era isso. Agora com Lance o papo simplesmente não acabava. Era como se uma chave tivesse virado na minha cabeça e eu não conseguisse mais parar de pensar nele.
E quando ele perguntou se eu gostava de “novinhos”, minha cabeça imediatamente foi para “não”.
Que loucura! Eu sempre procurei por homens mais velhos do que eu, agora estava caidinha por alguém seis anos mais novo do que eu... E eu quero saber muito o que isso vai dar. Ele ainda tinha uns 20 dias para voltar para Montréal, e eu ansiava cada minuto por isso.
Deus! O que está acontecendo comigo?
Me arrumei para ir para a escola da mesma forma de sempre, somente pulando o café da manhã de hoje. Todas as quintas-feiras tinha uma confraternização na escola, já que muitos alunos finalizavam seus cursos na sexta e terminavam seus intercâmbios. Eu não perderia nenhum aluno, nem com a turma da manhã e nem da tarde, mas eu adorava me esbaldar.
Fiquei de olho no WhatsApp enquanto eu finalizava, vendo outra mensagem aparecer de Lance.
“Há, há, há, muito engraçadinha você! Ainda me faz vontade com bannock e buttertarts, que ultraje!” Ri fracamente, jogando a mochila nas costas e respondi enquanto descia as escadas do prédio de dois andares.
“Eu ainda não te fiz vontade, mas logo estou na escola e faço com todo prazer. Mas aposto que tem algo mais gostoso para comer em Mônaco do que buttertarts, vai!”
“Bem... Eu não sou o maior fã de comida francesa, mas o melhor sorvete que eu tomei na vida vem daqui.”
– Sorri, puxando a porta para sair para a rua e tomando cuidado para não ser atropelada por nenhuma bicicleta.
“Melhor do que Itália?” – Desviei o olhar do celular para ver se o ônibus não estava aparecendo no final da rua.
“Não dá para generalizar, mas das minhas experiências, sim...” – Sorri.
“Ah, meu sonho tomar um gelato e falar que o de Mônaco é melhor, hahaha.”
“Você vai, null, tenho certeza.”
– Dei um sorriso, parando embaixo do ponto de ônibus, me escondendo atrás de duas adolescentes que sempre paravam na frente de uma.
Mordisquei o lábio inferior, suspirando e peguei o bilhete do ônibus no bolso externo da mochila. Apesar da constante vontade de responder Lance, mudei de conversa, mandando a mensagem tradicional de bom dia para minha família no Brasil, já vendo a mensagem de minha mãe ali.
“Bom dia, meu amor. Hoje acordou chovendo muito forte aqui, decidi não ir na academia, está com vários pontos de alagamento na cidade. Tomara que dê para ir no aniversário da Cida mais tarde. Tenha um lindo dia”.
“Bom dia, mãe! Aqui está um pouquinho mais gelado, estou indo de ônibus porque choveu ontem à noite. Nada alagado, mas o tempo gelado não colabora com a respiração. Nada de aniversário se o tempo estiver ruim. Não inventa moda! Amo vocês!”
Ouvi o barulho do ônibus e me coloquei na curta fila para conseguir lugar. Esse é o mesmo ônibus que para em uma escola de ensino médio há alguns quarteirões daqui, então ele já chega cheio, mas esvazia antes de chegar na ponte.
Me ajeitei em um canto perto de uns adolescentes e peguei o celular novamente, mudando para a conversa de Lance novamente.
“Depois de comer gelatos em Mônaco, o que se faz aí?” – Enviei, esperando retorno.
“Depende do seu estilo, festas é o que não falta, pode tentar a sorte em alguns casinos também”. – Sorri.
“Já vi que Mônaco não é para as caseiras!”
“Nesse caso, eu gosto de observar a cidade do topo dos morros ou do iate mesmo. Dá uma sensação de paz”.
“Ainda complicou, não sou esportista e nem tenho um iate”.
– Brinquei, vendo um assento esvaziar, mas vi que era vago por uma senhora.
“Talvez eu possa te ajudar com os dois...” – Sorri.
“Vou comprar minha passagem para Mônaco agora, então”. – Respondi rindo.
“Eu te pego na estação!” – Ele disse e suspirei.
“Quem sabe um dia?” – Enviei alguns emojis de coração junto. – “Nunca pensei nessa possibilidade, ir para Mônaco me parece irreal”.
“Não é, é um lugar como todos, cheio de turistas, coisas caras, acessíveis e bastantes pontos turísticos... Só é mais fácil encontrar carros de luxo”. – Dei um curto sorriso.
“Se tiver ônibus, eu estou feita!” – Me esgueirei para um assento quando os alunos desocuparam o ônibus.
“Tem... Mas você não vai precisar dele”. – Sorri, mordiscando o lábio inferior.
“Talvez um dia...” – Suspirei, emendando outro assunto. – “Sem reuniões hoje?”
“Em breve, Mônaco é um pouco mais caótico”.
“Estou perto da escola, logo começa o meu caos”.
– Respondi.
“Aceito o café da manhã caótico daí”. – Ri fracamente.
“Aposto que encontra melhores aí em Mônaco”. – Respondi.
“Não com você”. – Sorri, mordiscando o lábio inferior.
“É... Não... Isso é exclusivo daqui”. – Respondi.
“É a melhor parte!” – Ele respondeu, me fazendo suspirar.
*Bannock e buttertarts: São duas comidas típicas canadenses. Bannock parece um salgado e buttertarts empadinhas com recheios doces.

“Fique com inveja!” – Enviei para Lance junto da foto da mesa de comidas na escola e vi que só deu um tique. Ele deveria estar em reunião.
- Uh, quem é?! – Me assustei, me virando para o lado e encontrei Carly ali.
- Ei, Carly! – Falei, bloqueando o celular rapidamente.
- É aquela cara ainda? – Ela perguntou.
- Que cara? – Franzi a testa, não tinha falado sobre Lance para ninguém. Por vários motivos: primeiro que eu ainda tinha receio de isso não dar certo, fazendo com que minha ansiedade atacasse um pouco; segundo que ele é Lance Stroll, além de ser piloto de Fórmula Um, sua família é dona de Montréal; e terceiro que... Voltamos para o primeiro motivo, minha ansiedade atacava de vez em quando só de pensar que tudo podia passar de uma brincadeira.
- O do Tinder! – Ela disse.
- Ah, não... – Ri fracamente. – Não deu certo... Eu conheci alguém a estamos conversando...
- Em MTL? – Ela usou o apelido da cidade.
- Sim... Eu estava... – Travei um pouco. – Ah, certo! – Fingi lembrar. – Estava saindo do trabalho lá com Claire Stroll. – Falei. – Ele trabalha na empresa.
- Uh! Parece bom, então! – Ela disse.
- Parece promissor, mas muitos parecem, não? – Falei.
- Ai, null, um pouco de ânimo. – Ela disse.
- Eu estou animada! – Falei rindo. – Mas também não quero parecer mu-u-u-uito animada e não dar nada como das outras vezes.
- Às vezes só precisa de uma vez para dar certo. – Ela disse e assenti com a cabeça.
- É... Talvez você esteja certa. – Suspirei, vendo-a piscar e neguei com a cabeça.
Peguei o celular novamente, desbloqueando e reduzindo a iluminação quase a zero, mas não tinha resposta de Lance ainda. Me desviei de alguns alunos, dando bom dia e tirei algumas moedas do bolso. Contei 60 centavos e coloquei na máquina, selecionando capuccino. Esperei a máquina fazer seu trabalho e tirei a bebida quente dali de dentro.
Passei pela mesa novamente, pegando mais um bannock e coloquei-o na boca antes de entrar na minha sala. Me sentei à mesa, apoiando o café e vi a sala vazia. Peguei o celular novamente, vendo a notificação que me fazia sorrir há duas semanas e deslizei para ver que ela Lance.
“Não é só você que faz inveja!” – E uma foto junto.
Desbloqueei o celular, abrindo a conversa e era uma selfie dele segurando uma casquinha, um sorriso largo sem mostrar os dentes e a boca suja de algum sorvete branco, neguei com a cabeça, colocando os dedos para digitar.
“Você está só se complicando. Eu posso te levar para comer bannocks quando você quiser. E o contrário?” – Enviei.
“Eu posso te trazer para cá também... É só você deixar”. – Suspirei, dando um curto sorriso. Isso fazia meu coração palpitar, não poderia ser só empolgação.
“Um dia eu vou gostar... Mas aposto que tem cooler em Mônaco”. – Escrevi, rindo comigo mesma.
“Ter, até tem, mas ainda temos Baku antes de eu voltar, não acho que vá sobreviver até lá...” – Sorri.
“Achei que você tinha me dito que precisava de uma dieta perfeita!”
“Ah, temos! Kakaka! Mas também podemos perder de três a seis quilos por corrida. Te garanto que perco rapidinho!
– Ri fracamente.
“Que sonho! Acho que eu preciso de umas duas ou três corridas para ficar em forma!” – Ri sozinha, apesar de ser verdade.
“Você é perfeita do jeito que é!” – Ele escreveu e meu peito palpitou, me fazendo suspirar.
“Você me deixa encabulada assim...” – Escrevi.
“Bom!” Foi sua resposta, me fazendo suspirar.
Bom, agora ele sabe o efeito que tem sobre mim...
Droga!
- Teacher? – Virei o rosto, vendo a aluna espanhola ali.
- Oi, Majo! Posso te ajudar?
- Sim, queria tirar uma dúvida, posso voltar depois se preferir...
- Não, não! Puxa uma cadeira e venha! Qual a dúvida? – Falei, bloqueando o celular, ansiando nossa próxima interação.

Cheguei na casa de Claire como todo sábado, mas dessa vez eu estava acompanhada de um lindo sol! Dei a liberdade de colocar short, uma camiseta regata e uma rasteirinha. Espero que Claire não se importe. Antes de tocar a campainha, como todo sábado, dei uma olhada no celular novamente.
“Não tem o que falar, null, o dia foi péssimo. Pior que em Mônaco a gente sabe que a corrida vai ser tão ruim quanto”.
“Tente se distrair um pouco, aposto que isso não falta em Mônaco. Acabei de chegar na casa da sua mãe, devo sumir um pouco”.
– Enviei de volta.
“Baladas é o que não falta, mas não estou com pique para isso. Yey! Passatempo favorito da dona Claire!” – Sorri.
“Achei que fosse mais animado, Lancelot”. – Enviei.
“Eu até sou... No tempo certo e com a companhia certa...” – Suspirei, mordiscando meu lábio inferior.
“Está dizendo que eu sou a companhia certa?” – Engoli em seco.
“Não poderia ser mais claro do que isso”. – Ele disse e suspirei, checando o relógio.
“Eu tenho que ir... Nos falamos depois?” – Perguntei, mordiscando o lábio inferior.
“Levando em conta que sua aula com minha mãe dura umas quatro, cinco horas, talvez eu aproveite esse tempo para dormir mais cedo hoje. Vou fugir de você!” – Ri fracamente.
“Você deveria fazer isso. Amanhã o dia é cheio!” – Suspirei.
“É... Talvez eu faça...” – Esperei mais resposta, mas não veio.
“Se você for, tenha uma boa noite, Lancelot”. – Suspirei.
“Você também, null”. – Bloqueei o celular, apertando o botão da campainha.
- Bem-vinda, senhora null! – Me assustei com a rápida resposta de Sebastian.
- Ei! Você está... – Me calei quando os portões se abriram e olhei o relógio, vendo que passava uns três minutos das duas da tarde. Será que ele me esperava?
Fiz o caminho de sempre para dentro da mansão dos Stroll, encontrando Sebastian na porta com seu semblante sério de sempre. Ele me parecia alguém... Só não conseguia perceber quem... Um dia vai vir.
- Boa tarde, Sebastian! – Falei animada como sempre.
- Boa tarde, senhorita null! – Ele disse sério.
- Você estava me esperando? – Perguntei.
- O celular me parece uma ferramenta bem empolgante, senhorita. – Ele disse, dando a volta para dentro da casa e mordisquei meu lábio inferior.
O segui em silêncio, fazendo o mesmo caminho que eu estava acostumada a fazer todos os sábados. Ouvi alguns burburinhos antes mesmo de chegar à sala onde mim e Claire fazíamos as aulas. Lá encontrei-a com Chloe, além de uma terceira mulher, todas sentadas à mesa, claramente almoçando ainda.
- Acho que cheguei cedo! – Comentei.
- null! Que surpresa! Não, que isso, nós que nos atrasamos mesmo! – Claire limpou sua boca antes de se levantar.
- Posso esperar se quiser...
- Não, não, por favor, venha! – Ela me encontrou, enquanto ia em sua direção e trocamos um rápido abraço. – Como foi sua semana? Tudo bem?
- Sim, feliz porque o calor voltou! – Sorri, seguindo-a e Chloe também já estava em pé.
- Ah, nem fala! Está perfeito! Espero que continue assim até outubro agora! – Ela disse, me fazendo rir, pois sabia que não era be-e-e-em assim que funciona esse país, mas sorri.
- Oi, null! – Chloe disse, me abraçando e eu retribuí.
- Oi, Chloe, tudo bem? – Ela sorriu.
- Tudo ótimo! Adorei seu cabelo! – Ela disse e sorri, colocando uma mecha solta atrás da orelha.
- Obrigada. – Falei, me distraindo para a terceira mulher.
- null, essa é Beatrice, ela é assistente de marketing da empresa, ela ficou sabendo que ainda estávamos tendo aula e perguntou se podia participar. – Claire disse.
- Claro! – Falei animada, vendo que mais alguém havia se interessado. – Você já tem algum conhecimento?
- Pouquíssimo. – Ela disse, se levantando e trocamos dois rápidos beijos. – Meu avô é italiano, então ele fala um pouco em casa, mas nada o suficiente para que eu pegue.
- Não sei se tem algo que possamos fazer. – Claire disse.
- Será um pouco mais complicado, mas não é impossível. – Falei, tirando a mochila das costas e apoiei na cadeira mais perto. – Será quase como nivelar uma sala de aula, eu dedico uns minutos para cada uma de vocês, enquanto passo teoria para uma, a outra faz exercícios e vice-versa! Se tiver tudo bem para você, Claire.
- Claro! Nossa, o que eu mais quero é isso! Você sabe, null, isso é muito importante para mim! Esse projeto é muito importante para mim. – Assenti com a cabeça.
- Vai dar tudo certo, Claire! Confie em si mesma! – Falei, vendo-a sorrir.
- Bom, me dá dois minutinhos, null, já estou finalizando. – Ela disse.
- Sem pressa. – Falei.
- Você gostaria de almoçar? – Ela ofereceu.
- Não, obrigada! Já almocei. – Falei. – Eu faço companhia.
- Mas aposto que vai aceitar um pedaço de torta de chocolate, não? – Claire ofereceu e pressionei meus lábios.
- Ah, Claire! Assim não resisto! – Falei, ouvindo as outras mulheres rirem.

- Então, null, você chegou a ver o treino hoje? – Claire perguntou, durante a pausa das quatro horas.
- Sim, sim, eu vi. Sinto pelo seu filho. – Falei.
- Ah, nem fala. – Ela suspirou. – Mônaco já é difícil, pequena, minúscula, aí eles ficam dando de tudo com o carro e já viu, né?! – Ela negou com a cabeça. – Ao menos ele está bem e o carro conserta até amanhã.
- Ele-eu ouvi falar que é uma pista difícil... – Falei, engolindo em seco quando quase o mencionei.
- Sim, ela é muito estreita e cheia de curvas, é muito difícil a ultrapassagem. – Ela disse e assenti com a cabeça.
- Vamos ver como vai ser amanhã, né?! – Falei e ela assentiu com a cabeça.
- E você? Tem falado com Lance? – Engoli em seco, evitando arregalar os olhos.
- Hum...? – Virei para ela? – Ah, Lance? Não... Não... – Falei.
- Ah, meu filho é lento... – Ela revirou os olhos.
- Senhora? – Franzi a testa.
- Eu vi que ele pediu seu telefone, achei que... Enfim! – Ela abanou a mão e evitei dar um sorriso.
Será que Claire estava dando uma forcinha em um possível relacionamento entre mim e Lancelot?
- Eu vou pedir para Sebastian algo para bebermos, com licença... – Ela disse, se levantando e ouvi Kenya latir para ela quando a mesma passou em sua frente.
- Ah, sua chata! – Falei para Kenya, chamando-a com a mão. – Vem aqui! – Ela veio saltitante até mim e peguei-a com uma mão, acariciando-a. – Sua chata! Chata! Chata! – Ela deu uns latidos, mas sabia que eu estava imune a ela.
- Então, null... – Ergui o rosto, vendo Chloe aparecer por cima do sofá.
- Sim... – Falei.
- Então, você não está mesmo falando com Lance, certo? – Ela disse, dando um sorriso de quem sabia e senti meu rosto esquentar. – Tipo... Não tem nenhum motivo para as noites mal dormidas dele? Tipo... Quatro da manhã?
- Chloe! – Falei e ela gargalhou alto, assim como Beatrice.
- Ele é meu irmãozinho, falamos tudo para o outro. – Ela disse e ri.
- Não fala nada para sua mãe! – Pedi em tom de voz baixo.
- Por que não? Ela está superanimada com um possível relacionamento. – Ela disse e suspirei.
- Exato. Um possível relacionamento! – Falei firme. – Estamos nos falando há somente duas semanas, não quero me empolgar demais...
- Por que não? Ele está animado, null.
- Porque eu... Eu nunca fiz isso antes. – Suspirei.
- O quê? – Ela perguntou.
- Estive em um relacionamento. – Falei, suspirando.
- Não?
- Não... – Dei de ombros. – E é a primeira vez que eu passo do “oi, tudo bem?” – Suspirei. – Tenho medo de dar tudo errado.
- Não, null! Não! Não pensa assim. Meu irmão é meio lento, mas não é babaca! Se ele está indo atrás de você, confia que as intenções dele são as melhores. – Ela disse e assenti com a cabeça.
- Eu tenho ansiedade... Eu...
- Vá atrás de uma psicóloga, então. – Ela disse. – Não tem por que ficar mal por coisas boas... – Suspirei.
- Mas será que são coisas boas mesmo? – Falei.
- Ai, eu vou te bater! – Ela disse, fazendo com que eu e Beatrice ríssemos. – Para de apressar as coisas, aproveite! Curta esse momento! Você o terá por diversos momentos, mas as primeiras vezes só acontecem uma vez... – Ela disse e assenti com a cabeça.
- Eu vou tentar... – Falei, sabendo que minha cabeça só surtaria mais após essa conversa.
- É bom mesmo, porque senão...
- Por que não combinamos uma noite das mulheres? – Claire sugeriu, fazendo Chloe se calar e se esconder atrás do sofá novamente. – Assim, se não se importarem em sair com uma mulher do dobro da idade de vocês... – Ri fracamente.
- Não acho que tenha idade para se divertir. – Falei. – Eu adoraria.
- Eu só não posso hoje, mas super topo. – Chloe disse.
- Hoje eu tenho algumas reuniões após aqui também. – Claire disse. – Mas podemos combinar para semana que vem.
- Para mim está combinadíssimo! – Falei.
- Eu também topo, depois que saí da faculdade, mal tenho amigas. – Beatrice disse.
- Pode me chamar, viu?! – Falei. – Eu trabalho a maior parte do tempo, mas sábado à noite e domingo eu costumo estar entediada.
- Eu também! – Chloe disse. – Eu namoro, mas Scotty viaja muito e eu fico sozinha na maior parte do tempo. – Ela disse.
- Então está combinado! – Claire disse. – Semana que vem, vamos sair nós quatro.
- Combinado! – Falamos quase juntas.

Cheguei em casa chutando a rasteirinha para longe e deixando as coisas na minha mesinha de jantar. Apesar de não termos combinado de fazer algo, acabei saindo de lá quase oito horas da noite. Fazia tempo que não juntava tanta mulher assim. A gente realmente não ficava quieta. Só esperava que Claire pudesse ainda fazer suas reuniões.
Tomei um longo banho enquanto deixava uma lasanha congelada no micro-ondas. Saí do banheiro enrolada na toalha e me troquei no meio da minha sala-quarto-cozinha. Soltei os cabelos, secando-os ao máximo com a toalha e depois penteei. Não estava com pique de secar agora. Até eu jantar, assistir um episódio de alguma série atrasada, ele já teria secado para eu poder dormir.
Peguei minha lasanha um pouco menos pelando, colocando num prato e peguei os talheres, colocando tudo em um canto da mesa e me sentando do mesmo lado. Peguei o celular, desbloqueando e fui direto na conversa de Lance, que eu tinha deixado de lado durante todo tempo na casa de Claire. Confesso que não queria ninguém espiando por cima do meu ombro.
“Durma com Deus, null!” – Logo após a minha mensagem.
“Sabe, tem um problema com Mônaco, o barulho é muito alto, talvez seja difícil dormir”. – Essa última tinha umas duas horas.
“Acho que você vai dormir na minha casa hoje, pena que eu não estou aí!” – Há uma hora.
“Ei, null, a brincadeira acabou, tá tudo bem?” – Há menos de 20 minutos. Me surpreendi com o horário. São seis horas de diferença, são duas da manhã para ele.
“Achei que a ideia fosse dormir, senhor Lancelot!” – Enviei para ele, rindo fracamente.
“Ah, finalmente apareceu!” – Sua resposta foi imediata.
“Lancelot! O que faz acordado?” – Perguntei, encarando o celular.
A resposta demorou um pouco, então apoiei o aparelho em um copo, olhando para ele fixamente enquanto comia pedaços pequenos da minha lasanha. De repente a foto do WhatsApp de Lance apareceu em uma chamada de vídeo e arregalei os olhos.
Meu Deus!
Atender ou não atender?
Fiquei o que pareceu cinco minutos decidindo o que fazer, mas acho que foi coisa de trinta segundos. Eu estou de pijama, com os cabelos totalmente bagunçados e a boca suja de molho de tomate, mas ainda assim eu deslizei o dedo aceitando a chamada.
- Achei que não fosse atender. – Sua voz chegou antes de seu rosto aparecer e somente deu tempo de deixar o decote do pijama menos evidente.
- Não sabia se era para atender... – Falei, ajeitando o decote do pijama, tentando deixar menos em evidência.
- Claro que é! – Ele disse e vi seu rosto aparecer em um ambiente com pouca luz, creio que um abajur.
- O que faz acordado? – Perguntei.
- Acho que me acostumei a dormir tarde... – Ele disse e dei um sorriso. – Conversar contigo virou parte da minha rotina.
- E o que quer conversar? – Perguntei e ele riu.
- O que está comendo aí? – Ele perguntou e ergui meu prato, mostrando a ele.
- Lasanha congelada. – Falei, ouvindo-o rir.
- Que banquete, não?
- Nem sempre dá para correr, né?! – Dei de ombros, cortando mais um pedaço e colocando na boca.
- Não, não dá... – Ele disse rindo. – E como foi na minha mãe?
- Foi bom! – Sorri. – Tem uma nova assistente de marketing que quer participar das aulas, agora são quatro Marias Fifi para ficar fofocando.
- “Maria Fifi”? – Ele perguntou e eu ri.
- Uma expressão para mulheres que gostam de fofocar. – Falei rindo.
- E que tanto fofocaram? – Ele perguntou e ri.
- Uma mulher nunca conta as fofocas. – Falei e ele riu.
- A Chloe pelo visto não passou no teste... – Neguei com a cabeça.
- Ai, vocês dois... – Neguei com a cabeça.
- O quê? Preferia que a gente não compartilhasse? – Ele perguntou e eu ri.
- Não, mas eu fui pega desprevenida mais cedo. Você podia ter me falado que falou de mim para Chloe. – Falei.
- Não achei que fosse segredo. – Ele disse.
- Não é... É só... – Suspirei. – Eu sou ansiosa, Lance. – Falei. – Tenho medo de me empolgar demais e as coisas darem errado.
- E por que as coisas dariam errado? – Ele disse sério, encarando a câmera do celular.
Não soube responder.
Na verdade, não quis responder. Porque falar “porque já deu errado antes” estava na ponta da língua.
- Só preocupação... – Suspirei.
- Não precisa ter, garanto que minhas intenções contigo são as melhores... – Ergui o rosto para ele.
- Quais suas intenções comigo? – Perguntei, vendo-o sorrir.
- Nada menos que tudo, senhorita null. – Ele disse sério e dei um curto sorriso.
- O que seria “tudo”? – Perguntei.
- Tudo que puder imaginar. – Ele disse e assenti com a cabeça, escondendo um sorriso nos lábios.


Capítulo 5


Acordar nesta segunda-feira e ir trabalhar foi uma das situações mais difíceis que fiz em muito tempo. Lance estava vindo. Depois da corrida de Baku ontem, sabia que ele estava a caminho.
Não sei exatamente quando ele viria, mas sei que a corrida de Montréal será no próximo fim de semana, então até quinta-feira ele estaria aqui. E a ansiedade começava a falar mais alto.
Assim que me levantei esta manhã, corri para o banheiro. Dor de barriga foi o primeiro sinal, seguida pela falta de apetite e, por fim, o medo do celular. Qualquer notificação me fazia pular, mas ironicamente, nenhuma era de Lance.
O dia foi relativamente tranquilo. As segundas-feiras sempre trazem algo novo, já que recebo alunos iniciantes nas turmas. É a mesma rotina de apresentações: falar sobre suas motivações, por que escolheram Montréal, entre outras coisas. Motivos que, provavelmente, não eram muito diferentes dos meus.
Apesar da falta de apetite, segundas são dias em que não atendo alunos fora da escola. Aproveito para adiantar tarefas domésticas. Depois do expediente, passei no mercado para comprar o básico: temperos, carne, massa fresca e muitos tomates para o molho caseiro. Como recebo semanalmente, minhas compras seguem o mesmo ritmo.
Chegando ao apartamento, fiz o sinal da cruz ao passar pela igreja do bairro e segui até os fundos para guardar a bicicleta e prender o cadeado. Subi as escadas para o segundo andar com a sacola retornável em um ombro e a mochila no outro.
Eu adoro este apartamento, mas ele me faz reclamar duas vezes ao dia que eu preciso voltar para uma academia urgentemente.
– Oi, null!
– AH! – Me assustei, erguendo o rosto. – LANCELOT?!
– Surpresa?
– É claro! – Ri, largando as bolsas no chão antes de abraçá-lo. – Oh, meu Deus! O que está fazendo aqui?
– O próximo GP é aqui. Você sabia que eu viria... – Ele me apertou forte, me fazendo suspirar.
– Eu sabia, mas achei que chegaria mais tarde! — Afastei-me um pouco, segurando seus braços e olhando em seus olhos por baixo da aba do boné.
– Não, eu não perderia a oportunidade de passar mais uns dias contigo. – Sorri nervosa, ainda incrédula.
– Oh... Você é real? – Ele riu fracamente. – Vem, vamos entrar e... Cadê minha bolsa...? – Olhei ao redor.
– Eu pego! Eu pego! – disse Lance, se inclinando para pegar a sacola e mochila.
– Não, deixa que eu pego. – Peguei a mochila, tirei a chave e abri a porta, hesitando. – Ah, espera... – Fiz uma careta. – Não é muito grande, sabe?.
null... – Ele revirou os olhos.
– O quê? É uma quitinete, é... Menor do que a sala da sua casa...
null! – Seu tom foi repreendedor.
– Tá bom, tá bom. Só estou avisando! – Ergui as mãos e finalmente abri a porta, entrando primeiro.
Deixei a mochila no cabideiro e dei alguns passos até minha cozinha-quarto-sala, um espaço compacto que não passa de dez passos de comprimento.
– Bem-vindo ao meu cantinho! – Fiz uma careta enquanto Lance fechava a porta e caminhava na minha direção.
– É fofo! – comentou Lance, e eu tirei a sacola de sua mão, colocando-a sobre a mesa com duas cadeiras. – Bem fofo mesmo. – Ri com ele.
– Eu gosto daqui. É quente no inverno, fresco no verão, e eu me sinto bem.
– Acho que isso é o que importa – disse ele.
– enta aí, Lance, eu só vou organizar as coisas. – Falei, e ele se sentou no meu sofá-cama.
– Onde você dorme? – perguntou Lance.
– Exatamente onde você está! – respondi, rindo, enquanto tirava as coisas da sacola.
– Uh! Então é aqui que a mágica acontece? – ELance abriu os braços no encosto do sofá e cruzou a perna. Lancei-lhe um olhar sério, revirei os olhos e voltei a me concentrar no que fazia. – Ah, eu gosto dessa cara, null! – disse ele, me arrancando uma risada.
– Você é tonto demais! – Guardei as coisas na geladeira e depois no armário. – Quer alguma coisa? Algo para beber ou comer? Você veio direto do aeroporto?
– Eu comi no jatinho, não se preocupe – respondeu Lance. – Você tem algum compromisso agora? Estou atrapalhando?
– Uh, “eu comi no jatinho” – imitei-o, com uma voz fina, fazendo-o rir. – Pois eu não comi no jatinho, então vou fazer molho de tomate para comer com ravioli. – Falei, e ele riu mais.
– Não se incomode comigo. – Lance ergueu as mãos. – Mas posso usar o banheiro? Onde fica?
– Na outra porta que não seja a saída! – respondi, sorrindo, e ele riu. – Tem certeza de que não quer comer? Eu cozinho bem, de verdade.
– Hum... Já que faz tanta questão! – Ri junto com ele.
– Deve ser esfomeado para caramba! – comentei, rindo, enquanto procurava pela tábua de carne.
– Só estou repondo as energias depois da corrida – disse Lance, já na porta do banheiro.
– Falando nisso, como você está?
– Ah, foi ok – respondeu Lance, fechando a porta do banheiro.
– Ei! – Segui até a porta. – Você disse que estava bem.
– E estou, null! Por isso não quero falar sobre isso – sua voz saiu abafada, me fazendo suspirar.
Estávamos conversando há um mês, cada vez mais íntimos mesmo com a distânciaAinda assim, era difícil fazê-lo falar sobre as partes complicadas do esporte. Eu entendia sua frustração. Lance era rotulado como "filho do dono", mas parecia que ninguém dava valor ao seu talento — e eu sabia disso, porque pesquisei. Claire era uma ótima fonte. E o carro não estar nas melhores condições também não ajudava.

– Ok, esse é o melhor molho que eu já comi na minha vida – disse Lance, procurando por um guardanapo na minha mesinha quadrada.
– Uhum, tá! – falei, rindo.
– Não, sério! É delicioso!
– Agradeço, mas não é o melhor molho de tomate do mundo.
– Como não? – perguntou Lance, chocado, enquanto raspava o pão italiano no prato.
– Você tem acesso aos restaurantes mais sensacionais de Montréal e do mundo, e vai dizer que o meu molho de tomate feito em casa é o melhor? – Olhei para ele sugestivamente.
– Exatamente! Eu tenho propriedade para falar. – Ele cruzou os braços, encostando na cadeira. Só consegui assentir com a cabeça.
– Obrigada, então. Apesar de ainda achar que você só está sendo gentil. Aposto que na Itália têm muitos melhores. – Ele riu fracamente.
– Você vai ter que descobrir – disse Lance, e eu assenti.
– Um dia! – falei esperançosa, mas suspirando em seguida.
– Mas temos ótimos restaurantes italianos aqui em MTC. Você está aqui há o quê, um ano?
– Quase...
– Já teve ter ido em alguns... – Lance comentou, e ponderei com a cabeça.
– Mais simples... As coisas começaram a ficar mais fáceis agora com o trabalho com sua mãe, mas eu tenho vontade de ir a alguns.
– Quais?
– Ah, tem vários aqui em volta da baía Rei Edward – falei.
– Fala o nome de um! – Ele pediu.
– Por quê? – Perguntei, cruzando os braços enquanto o encarava.
– Para saber se eu já fui... – Lance deu um sorriso engraçado, e eu revirei os olhos.
– Ok, o que eu mais tenho vontade de ir é no Mangiafoco – falei.
– Já estive, é muito bom! – disse ele. – É perto da Basílica Notre-Dame, não?
– Exatamente! Atrás, se eu não me engano – respondi.
– Eu conheci o dono, supersimpático, toca guitarra em uma banda...
– VOCÊ CONHECEU O JEFF?! – Minha voz saiu mais alta do que eu esperava, e coloquei as mãos na boca rapidamente.
– Não era esse o nome, Jean... Jean-Franç...
– JEFF! – falei, exaltada, me levantando. – Meu Deus, você conheceu o Jeff! – Apertei as mãos no rosto.
– Você o conhece, null?
– É! É só o guitarrista da minha banda favorita! – Falei, animada.
– Ok, então está marcado – disse Lance, se levantando.
– O quê? – Perguntei.
– Vamos no Mangiafoco e em um show da banda. Sabe se eles estão em turnê? – Sacudi a cabeça.
– Eu não tenho essa informação, mas você não precisa fazer isso...
– Por que não? Vamos ter encontros, não?
– Isso é o quê? – Indiquei os pratos, me aproximando da mesa de novo.
– Um encontro. Podemos ter outros – disse ele. – Deixa eu te ajudar.
– Eu lavo! – falei.
– Você cozinhou, eu lavo. E sim, eu sei lavar louças, eu moro sozinho. – Ri fracamente, colocando os pratos na pia.
– Toda sua! – Ergui as mãos, me sentando no meu cama-sofá.
– Prometo não quebrar nada – disse Lance, e eu ri fracamente, sem acreditar que aquele homem bilionário lavando a louça no meu micro apartamento.
– Então, como foi ontem? – Perguntei.
– Ah, você sabe, abandonei no final, nenhum ponto, nada de muito novo.
– Não! Não fala assim. – Ele se virou para mim.
– O quê? Só estou dizendo.
– Se lamentando! – falei. – Não faça isso.
– Ah, qual é. Participar é legal, estar entre os 20 melhores pilotos do mundo é legal, mas não tive sorte este ano. Minha melhor posição foi décimo.
– Mas você comentou que Vettel está indo tão ruim quanto.
– Sim, mas vamos ser honestos, ele é Vettel. Tetracampeão, adorado por todos, senhor "Salve as Abelhas". Ninguém vai falar que ele está tendo um péssimo desempenho porque é filho do dono da empresa. – Suspirei.
– Isso te incomoda muito, né?! – Perguntei, e Lance suspirou.
– Eu sou muito grato por tudo que meu pai fez por mim, e sei do meu talento, antes que você comente isso. – Assenti com a cabeça, vendo-o secar as mãos num pano de prato. – Mas eu gostaria de não ter essa pressão em cima de mim, null.
– Você faria algo diferente se tivesse a chance? Sairia da F1, faria outra coisa? – Perguntei.
– Eu não sei. Eu gosto de esportes, mas... não sei – respondeu Lance. – Independente do que falam, eu sei que lutei muito por isso. Ganhei na Fórmula 4, Fórmula 3, outras categorias quando mais novo. Tenho pódios, poles, mas é difícil ignorar algumas coisas.
– Você é bem quieto fora do âmbito F1 mesmo.
– As pessoas já falam de mim mesmo sem eu dar motivos, imagina se eu abrir a boca... – Lance comentou, sentando-se ao meu lado.
– É, você não está errado... – respondi, virando uma perna para dentro da cama-sofá.
– Mas vamos mudar de assunto – disse ele. – O fim de semana do GP começa quinta. Sei que você tem seus compromissos, suas aulas, mas gostaria que estivesse lá, null. – Ele disse.
– Eu? – perguntei surpresa.
– É claro! – respondeu Lance, rindo. – Não fique surpresa, eu disse que eu quero tudo contigo. – Sorri.
– Eu sei, mas eu tenho meus receios, você sabe...
– Você nunca namorou, null, eu sei. Mas prometo que não vou te machucar, ok?! – disse ele, olhando nos meus olhos. Assenti com a cabeça, dando um pequeno sorriso.
– Ok... – Ele sorriu.
– Quinta é puramente coletiva e visitas. À noite vai ter um evento beneficente, e eu gostaria que fosse. Chloe vai estar lá, meus pais, você não estará sozinha.
– Que tipo de evento beneficente? – perguntei.
– Cuidados com o câncer de mama.
– Uau, eu vou! Eu consigo mudar umas aulas! Pode deixar! – respondi, animada. Lance sorriu satisfeito.
– Perfeito! Vai ser um leilão e tal. Terão outros pilotos, mas é um coquetel, nada muito longo...
– Eu preciso dar um lance? – perguntei.
– Não, é claro que não! Só quero sua companhia. – Sorri.
– Ok... E qual roupa eu vou nesses lugares? – perguntei, um pouco insegura.
– Ah, nada muito chique... – respondeu Lance, mas eu o encarei desconfiada.
– Eu já vi os filmes, Lance! – Ele riu.
– Ok, gala! – Lance suspirou. – Mas posso ver com a Chloe, ela pode te emprestar algo.
– A Chloe é uns 10 centímetros mais baixa do que eu, Lancelot – falei, sacudindo a cabeça. Ele riu. – Eu dou um jeito.
– Eu posso enviar um vestido para você – sugeriu.
– Não, não! Não se preocupe! – Falei, indicando-o. – Sua mãe me deu bastante dinheiro para trabalhar com ela.
– Achei que o dinheiro fosse para sua escola.
– É! Mas seria egoísmo eu não tirar um pouco para eu comprar um vestido e te acompanhar. Um vestido, não gastar tudo. Nem tudo vai para escola, a ideia de trabalhar além de estudar é ter uma vida mais confortável aqui.
– Pretende mudar para um lugar maior? – perguntou Lance.
– Ei, não fale mal do meu apartamento! – Empurrei-o, fazendo rir. – Eu gosto daqui.
– Eu estou brincando! É até legal! – disse ele. – A cama é pequena, mas...
– E você está pensando muito nela! Para! – Rimos juntos.
– Não, sério! É pequena até só para dormir.
– Eu estou acostumada a ela – dei de ombros , vendo-o sorrir.
– Você não tem aula hoje? – perguntou Lance.
– Não, não – respondi. – Segundas são os dias de eu organizar as coisas para a semana.
– E o que você fez para adiantar isso? – Ele deu um sorriso sarcásticos, e eu suspirei, pressionando os lábios.
– Molho de tomate! – falei, rindo.
– Que eu raspei da panela...
– É... – Rimos juntos. – Não se preocupe, eu peço take out essa semana. – Ele riu novamente. – E sempre tem lasanha congelada.
– Não é ravioli com molho caseiro, mas ei... – Rimos juntos.
– Para, seu chato! – Empurrei Lance, fazendo-o rir ainda mais.
– Mas você trabalha amanhã, não? É melhor eu ir! – Olhei o relógio, vendo que passava das dez.
– Você pode ficar. Tem uma ótima cama aqui embaixo – sugeri, chutando a bicama, enquanto Lance ria.
– Há, há, há, engraçadinha!
– Não convido mais, então... – Mostrei a língua para ele.
– Talvez outro dia, na minha cama... – disse Lance, e eu ri fracamente.
– Você é cara de pau mesmo, hein?!
– O que seria isso? – perguntou Lancelot, confuso pela expressão.
– Atrevido, sem-vergonha! – expliquei, fazendo-o rir.
– Só sendo honesto! – Ele ergueu as mãos. – Mas é melhor eu ir. Vim direto do aeroporto, nem fui para casa ainda.
– Você deve estar cansado também. Voo direto? – perguntei.
– Sim, de jato é mais confortável, mas o fuso-horário ainda é chato – Lance ponderou.
– Não, é melhor você ir. Eu não tomei banho ainda, tenho que revisar a aula de manhã e você precisa ver sua mãe. Ela me mata se souber que você passou aqui antes. – Ele riu.
– Contou para ela?
– Claro que não! – Falei, rindo. – Agora não sei se a Chloe falou algo.
– Ah, não, ela provavelmente não vai querer encarar a responsabilidade – disse Lance, rindo. – Eu faço isso... Depois.
– Eu te levo até a porta.
– Porque é mu-u-u-uito longe mesmo – ele brincou, rindo.
– Chato! – Empurrei-o um pouco, vendo-o dar três passos até a porta . Lance deixou espaço para eu abrir. – Eu estarei no WhatsApp.
– Se eu demorar um pouco para aparecer, é o caos de chegar em casa. – Disse ele.
– Não se preocupe. Se eu demorar, é porque eu dormi.
– Tenha uma boa noite, ok?! – disse Lance, dando um beijo em minha testa, me fazendo sorrir.
– Você também! – falei, retribuindo o sorriso. Ele assentiu com a cabeça e se afastou devagar. – Me dá um sinal de vida quando puder.
– Pode deixar, null! – Ele sorriu, afastando alguns passos.
– Até mais.
– Até! – Lance sorriu, acenando.
– Vai logo! – falei, rindo.
– Sabe... Eu não contei para minha mãe, mas meu pai sabe de tudo! – disse Lance, parando no corredor.
– Lance! – falei, vendo-o rir.
– Boa noite! – disse ele, sumindo pelo corredor.


Capítulo 6


– Ai, meu Deus! – bufei, rolando o mouse para baixo.
– Estou atrapalhando? – ergui o rosto para a porta, vendo Carly.
– Oi, Carly. Não, pode entrar – ela se aproximou com algumas folhas nas mãos.
– As provas de nivelamento dos alunos que começam na próxima semana.
– Ah sim, por deixar aí. Te dou um retorno até o fim do dia – disse, e ela assentiu.
– Belo vestido! – ela indicou o vestido verde na tela.
– É... Só que eu não tenho ideia de onde encontrar um parecido, e o prazo é de quatro dias. Preciso para amanhã – respondi com um suspiro.
– Uau, é um vestido chique, não?! – Observou ao notar o valor de quase cinco mil dólares. – E caro também.
– É, mas é para um evento importante... – suspirei novamente.
– Posso perguntar qual? – ela virou-se para mim, olhando sugestivamente.
– É complicado...
– É aquele cara que você tinha falado? – perguntou ela.
– Sim... – Confirmei, virando para ela. – Eu posso confiar em você!? – Falei em um tom confuso.
– Espero que sim...
– Não! Foi uma afirmação! – Ri. – Desculpe... É... Eu não sei como falar isso.
– Conta! O que te aflige? – ela puxou uma cadeira para perto, e eu me inclinei para trás, apoiando na cadeira.
– O cara com quem eu estou saindo é o filho da Claire... – falei, e sua boca entreabriu.
– Espera! Lance? – Ela falou baixo, e eu assenti. – Mentira! – Ela colocou as mãos na boca. – Mentira! – Ri fracamente. – Ele é dono de Montréal... E piloto de Fórmula 1!
– Eu sei, eu sei. Por isso que não falei muita coisa... – Passei as mãos nos cabelos. – Estamos conversando há um mês. Sei que vai acontecer, mas ainda não estou pronta para dividir isso com todo mundo...
– Nem com o mundo, né?! – disse Carly.
– Estou evitando pensar nessa parte – Ri com ela. – E tem o GP aqui neste fim de semana. Ele já me convidou, e vai ter um evento beneficente para o qual ele me chamou...
– É por isso o vestido? – ela indicou.
– Sim. Nunca fui a um evento assim. Tirando algumas formaturas, então pensei em um vestido bonito, mas discreto... – Suspirei. – Só que não chega no prazo e ainda tem chances de não servir... – Suspirei mais uma vez.
– Por que você não compra aqui? – sugeriu Carly.
– Porque eu não tenho a mínima ideia de onde comprar um vestido assim que não seja em lojas de marca. Cinco mil já seria caro, mas cabe no meu orçamento... – respondi.
– Bem... Você não é daqui, mas eu sou – Ela sorriu. – Podemos ir depois do trabalho – Disse ela.
– Droga, vou ter que cancelar algumas aulas... – Suspirei. – E já cancelei as de quinta, sexta e sábado...
– Às vezes, você precisa fazer um investimento se quiser que dê certo – Disse ela. – Então...
– Ok, vou mandar mensagem para os meus alunos... – ela riu.
– E te garanto que vai pagar mais barato do que na internet! – sorri.
– Já vi vantagem, então! – rimos juntos.
– Vou te deixar finalizar aí – Carly se levantou.
– Obrigada! Até mais! – respondi, vendo-a sair com um sorriso.

Carly disse que o local era perto da escola, então pegamos as bicicletas e seguimos pela cidade. O sol começava a se pôr, mas estávamos em maio, então o tempo estava mais fresco, embora o trânsito continuasse caótico.
Chegamos a uma área da cidade que eu não conhecia. Havia muitos galpões grandes e várias placas de outlets, de marcas famosas e desconhecidas. Carly guiou à frente, virando à esquerda, até uma loja de vestidos de festa.
– Vem, isso vai te ajudar! – Ela desceu da bicicleta e foi para o bicicletário. Segui atrás, e prendemos nossas bicicletas antes de entrar na loja. – Minha tia trabalha aqui, ela vai saber te ajudar.
– Oi, Carly! – disse uma moça assim que entramos.
– Oi, Sandy! Minha tia está aqui? – perguntou Carly, enquanto eu me surpreendia com a quantidade de vestidos ao nosso redor, de todos os estilos possíveis.
– Claro, ela está no caixa, deixa eu chamar! – respondeu Sandy, saindo pela loja. Aproveitei para me aproximar dos vestidos ali perto.
Separei um vestido dos outros, examinei a etiqueta e fiquei surpresa ao descobrir que custava 800 dólares... e estava à pronta entrega.
null...
– Eu te amo! – virei para Carly, vendo a moça ao seu lado rir.
– Você me ama! – disse Sandy, divertida. – Eu sou Sandy.
– Oi, Sandy. null! – falei, esticando minha mão, cumprimentando-a.
– Carly disse que precisa de algo meio urgente...
– Sim, preciso – suspirei.
– Conte-me o problema – Sandy cruzou os braços.
– Eu tenho um evento beneficente com... – respirei fundo. – Minha chefe. Ela é Claire Stroll...
– Espera, Stroll de...
– Sim, ex do Lawrence Stroll e tudo mais – Suspirei novamente. – Comecei a trabalhar com eles há pouco tempo, e me chamaram para o evento. Mas eu não tenho nenhum vestido à altura disso... Nem sou daqui, não trouxe um vestido de gala na mala. – Sandy riu.
– Não se preocupe, vamos resolver isso! – disse ela. – O que você tem em mente?
– Uma cor escura, para eu ficar o mais invisível possível – fiz uma careta.
– Vamos por aqui, então... – Sandy indicou uma parte do amplo galpão. — Algum estilo específico?
– Nada vulgar, nem mostrando muita pele.
– Você vai acompanhada ou sozinha? – perguntou ela. Olhei para Carly, que ficou quieta.
– Eu vou com a família... – respondi, sem pensar muito.
– Bom, sendo convidada de convidados, você não precisa chamar muita atenção, mas também não deve passar despercebida
– Vão estar lá vários ricos e famosos. Vai que você não arranja um namorado com um amigo? — Carly sugeriu, me fazendo rir.
– Ela está certa! Não dá para ficar completamente apagada – ponderei com a cabeça.
– Ok... Meu orçamento é cinco mil dólares, mas eu adoraria que fosse metade disso, porque ainda preciso pagar cabelo e maquiagem – fiz uma careta.
– Consigo algo sensacional por até um quinto disso – Sandy garantiu.
– Eu te amo! – falei, ouvindo-a rir.

Olhei-me no espelho, vendo o bob preso na franja, e dei duas batidinhas de blush nas bochechas. Não sou muito fã das bochechas rosadas, mas como dizia minha avó: para dar uma cara de saúde. Deixei o pincel de lado, vendo-o causar um dominó e derrubar todos os outros itens na pia, mas ignorei.
Tirei o bob da franja, ajeitando-a bonitinha e suspirei. Carly foi minha verdadeira fada madrinha, ela e sua tia. Ambas me ajudaram na escolha do vestido preto de uma manga só, com glitter e uma fenda na perna esquerda. Além disso, indicaram uma conhecida de outra vendedora do outlet para fazer meu cabelo. Virei-me na maquiagem. Apesar de já ter feito um curso de automaquiagem, sabia que provavelmente não estava à altura de um evento desse porte, mas...
Me assustei quando ouvi dois toques na porta e me arrependi de não ter um porteiro.
– Espera! – falei um pouco mais alto, enquanto guardava as coisas bagunçadas dentro da nécessaire de maquiagem.
Olhei no espelho novamente, esbarrando no box do banheiro ao me afastar, e suspirei. Corri de volta para o quarto, colocando o sapato preto de salto, que já tinha comprado há algum tempo. Olhei-me novamente no reflexo da TV e suspirei.
Era agora ou nunca.
Fui até a porta, entre uma bufada e outra, e suspirei antes de abri-la. Me surpreendi e, pelo visto, causei surpresa. Lance usava um terno verde-escuro, talvez preto na luz opaca do corredor. Os cabelos estavam bagunçados propositalmente.
– Uau! – falamos juntos, rindo em seguida.
– Você está linda, null! – disse ele rapidamente, me fazendo sorrir.
– Espero que esteja apropriado...
– Está mais do que apropriado. Você está incrível – dei um pequeno sorriso quando ele pegou minha mão.
– Você também está bonito – falei, e ele beijou minha mão, me causando um arrepio.
– Você está pronta? – perguntou ele, e assenti com a cabeça.
– Um pouco nervosa...
– Não se preocupe. Minha família estará lá, Chloe, Scotty... que é um evento à parte... – Rimos juntos. – Vai dar tudo certo... – Assenti novamente.
– Espero que sim... Me dá um segundo... – Voltei para dentro do apartamento, pegando minha bolsa e a chave na bancada e voltei para a porta. – Podemos ir.
– Damas primeiro... – ele indicou, e eu desliguei as luzes antes de puxar a porta, pendurando a alça no ombro.
Segui um pouco à frente, sentindo-o apoiar a mão na base das minhas costas enquanto descíamos os dois lances de escada. Ele passou à minha frente para abrir a porta do prédio. Senti um leve vento, mas minha distração durou dois segundos até eu ver o carro esportivo na minha frente.
– Uau! – saiu no automático.
– Gostou? – perguntou ele.
– Ele é lindo! – falei, rindo.
– Ela! – virei para ele.
– Qual o problema dos homens? Vocês querem “dirigir” a mulher? – Ele gargalhou alto. – Não é fácil assim na prática, tá?!
– Desculpe, é força do hábito! Pensando com clareza, fica um pouco estranho.
– Você sobe em mim e faz “vrum vrum”? – ele gargalhou, e eu o acompanhei nessa.
– A ideia não é ruim... – disse ele, ainda rindo, e bati a mão no rosto.
– Ai, as besteiras que eu falo e você ainda ri! – ele sorriu.
– Estou me divertindo, não posso negar! – rimos juntos.
– Uma coisa é certa, você não vai se entediar nunca! – Dei de ombros.
– É assim que eu quero mesmo! – disse Lance, abrindo o lado do passageiro.
– Então acho que encontrou a pessoa certa – ele me deu um sorriso largo, e eu entrei no carro.

Seguimos por cerca de dez minutos até o local do evento. O carro conversível e o ronco do motor não me permitiam entender a música que tocava no sistema de som, mas não me importei. Analisar Lance dirigindo era muito melhor e muito sexy.
O evento era perto do Cais Rei Edward e da Basílica de Notre-Dame, um local com o qual eu já estava familiarizada. A rua estreita causava um pequeno caos, com carros chegando e alguns fotógrafos posicionados. Instintivamente, levei a mão ao rosto, sem saber exatamente como agir. Estava um tanto perdida.
– Assim que eu parar, você entra pela porta ao seu lado, ok?! – Lance falou, e assenti com a cabeça.
Havia alguns carros à nossa frente, o que tornava o trânsito lento, já que os convidados desciam de seus veículos esportivos. Quando chegou a nossa vez, Lance fez um leve aceno de cabeça, e a porta ao meu lado foi aberta. Um segurança me ofereceu a mão para sair, e eu segui rapidamente para dentro do evento, tentando não tropeçar nos meus pés nem me cegar com os flashes dos fotógrafos.
Assim que entrei no local, notei que a decoração era escura, mas a iluminação era bem clara. Aproximei-me um tanto receosa, tentando sair do caminho da entrada. Observei o espaço: um local para fotos logo ao lado, um palco ao fundo com o logotipo do centro beneficente, algumas mesas altas espalhadas pelo salão e garçons circulando com taças de champanhe.
Será que tem comida? Eu não jantei.
null! – Virei ao ouvir meu nome e vi Chloe se aproximando apressada, com Scotty logo atrás.
– Ei! – falei, sentindo-a me abraçar e retribuí o gesto.
– Como você está? – perguntou ela, soltando-me.
– Um pouco nervosa... – falei rindo, abraçando Scotty rapidamente.
– Você está linda! – disse Chloe, me fazendo sorrir.
– Estou à altura do seu irmão? – perguntei em tom de brincadeira.
– Mais fácil perguntar se ele está à altura de você! – disse Scotty, inclinando a cabeça na direção da entrada. Virei-me e vi os fotógrafos focando suas lentes em Lance, que havia acabado de entrar e se posicionava no espaço reservado para as fotos.
Lance alternava entre sorrisos e poses mais sérias para os fotógrafos, até que seu pai apareceu ao lado dele, dividindo os flashes. Suspirei, sentindo-me um pouco perdida – tanto no espaço físico quanto na situação em que estava me envolvendo. Chloe me abraçou de lado, e eu sorri.
– Ele merece você – disse ela, com sinceridade.
– É... Espero que eu o mereça também – respondi, tentando disfarçar o nervosismo.

– Ah, querida! – sorri ao ver Claire vir em minha direção, de braços abertos.
– Oi, Claire! – Cumprimentei, sentindo-a me abraçar fortemente. – Você está maravilhosa! – Comentei, admirando seu vestido prateado.
– Eu? Olhe você! – ela segurou uma mão, me obrigando a virar, me deixando envergonhada quando outras pessoas olharam para mim.
– Não está? Eu falei! – Chloe se aproximou, me fazendo rir.
– E o que está achando do evento? – perguntou Claire, enquanto eu tentava sorrir educadamente.
– Um pouco fora da minha realidade... – tentei falar da forma mais delicada possível, o que a fez rir.
– Não julgo, pois também acho chato e um pouco entediante – Claire falou ao aproximar o rosto do meu e ri. – Mas acaba sempre surgem umas pérolas.
– A começar pelo nosso amigo Lance, certo? – Um homem se aproximou, e o identifiquei do almoço na casa de Claire no dia em que conheci Lancelot. – Olá, null!
– Stephan, certo? – conferi, e ele piscou em afirmativa.
– Donato também está aqui, mas... Ele é irrelevante – Stephan apoiou o cotovelo no ombro de Claire, que revirou os olhos.
– Nunca dê intimidade a eles, null. Eles não sabem a hora de parar – disse Claire, tirando o braço dele de seu ombro. Eu ri.
– Uma amiga sempre disse que é melhor dar dinheiro do que intimidade – falei, dando de ombros, e todos riram, menos Stephan.
– Ela não está errada – Scotty cochichou.
– Você também, seu inconveniente! – Chloe repreendeu, enquanto ele revirava os olhos, me arrancando um sorriso.
– Vamos dizer que eu sou o único normal nessa família – virei para o lado, vendo Lance se aproximar.
– Você? – Chloe e eu falamos ao mesmo tempo.
– Ei, até você? – ele exclamou, fingindo indignação, me fazendo rir.
– Qualquer pessoa que tenha coragem em andar em um carro há 350 quilômetros por hora, não é normal, Lancelot – respondi.
– Ai! – disse ele.
– Gostei dela. – A voz do pai de Lance surgiu, enquanto ele se posicionava ao lado do filho. – Olá, null!
– Oi, senhor Stroll! – falei.
– Lawrence ou Larry está bom! – ele corrigiu, esticando a mão, e apertei-a.
– Você gostaria de beber algo, null? Champagne, vinho? – Lance ofereceu.
– Água? – Perguntei e ele assentiu com a cabeça, indicando para um garçom que deu um aceno de cabeça. – Para voltar dirigindo a Aston Martin na volta. – Acrescentei, brincando. Ele riu.
– Eu deixo, se quiser! – Lance falou, me deixando assustada.
– Não, não! Está tudo bem – ele riu.
– Saiba que o convite está aberto para quando quiser – ele reforçou, e assenti com a cabeça.
– Aqui está, senhorita – o garçom apareceu com uma taça sozinha em uma bandeja e vi que o líquido não tinha bolhas antes de pegar. Queria minha Coca-Cola, mas não achei que fosse à altura desses lugares.
Mercí. – falei e ele assentiu com a cabeça.
– Lance... – uma mulher o chamou e ele pediu dois segundos a ela.
– Com licença, null, preciso fazer um social – assenti com a cabeça.
– Não se preocupe, eu ficarei bem.
– Eu farei companhia para ela – disse Chloe, me abraçando de lado.
– Me chame qualquer coisa – disse Lance antes de se retirar.
– Não chamo. Assim podemos fofocar em paz – Chloe falou, me fazendo rir.
– De quem vamos falar hoje? – perguntou Scotty, colocando a mão no queixo e piscando os olhos.
– Cai fora! – Chloe retrucou, enquanto ele se afastava com Stephan e Donato, que acabara de chegar.

Lance realmente foi fazer seu social, conversando com outros famosos. Pelo meu recente conhecimento sobre Fórmula 1, reconheci Esteban Ocon e Mick Schumacher, amigos íntimos de Lance, além de George Russell. Além deles, ele também falava com empresários, filhos de grandes magnatas e pessoas mais velhas, cuja aparência transparecia um nível de riqueza muito superior ao meu.
Ele levou quase uma hora nesse "social". Durante esse tempo, fiquei na companhia de Chloe, Scotty e dos amigos de Lance, com Claire aparecendo de tempos em tempos. Chloe aproveitou para me fazer algumas perguntas sobre mim e Lance, mas a conversa não se estendeu muito, já que eu realmente não tinha muito a dizer. Nos encontramos apenas no dia em que ele chegou e hoje. A vida de quem precisa trabalhar não é tão empolgante assim.
Depois de cumprir suas obrigações, Lance voltou a ficar ao meu lado. Apesar de ainda ser abordado por várias pessoas, ele permanecia próximo a mim, o que resultava em flashes frequentes. Não estávamos exatamente em uma pose de casal, mas ele claramente fazia questão de me manter segura ao seu lado. Ainda assim, a quantidade de câmeras me deixava desconfortável; até beber água se tornava um desafio. Eu torcia para que os fotógrafos estivessem apenas focados em Lance, mas minha curiosidade sobre o mundo dos famosos não podia ser ignorada. Afinal, quem não gostaria de saber com quem seu ídolo está namorando?
Com o passar da festa, percebi os preparativos para o leilão. Algumas plataformas começaram a ser montadas no palco, onde colocaram baús ornamentados.
– Como funciona? – perguntei, dando um gole da água, observando os organizadores arrumando o palco.
– Fizemos cestas, cada uma com um tipo de encontro diferente, comida, lugar, diversão... – Lance falou olhando para mim. – As pessoas, em geral mulheres, dão lances nas cestas. Depois, saímos com quem arrematou. Nada romântico, já adianto – Ele piscou para mim e ri fracamente.
– Ah, vai saber quem pode dar um lance na cesta – brinquei.
– Não! Você não vai fazer isso! – ele protestou, parecendo sério.
– Por que não? – franzi a testa.
– Os lances costumam ser muito altos. Não vale a pena, e eu não vou deixar você gastar assim.
– Ah, qual é, o que são mil dólares? Posso usar o dinheiro da sua mãe – dei de ombros.
– Não! – Ele repetiu, sério, e eu revirei os olhos. – É sério!
– Sou mais velha do que você, sabia? Você não manda em mim! – respondi, sorrindo.
– Só você mesmo! – disse ele, me fazendo sorrir.
– Senhoras e senhoras, em nome do Centro de Recuperação Contra o Câncer de Mama, gostaríamos de agradecer à família Stroll pelo seu apoio há 16 anos e por organizar esse evento há sete – Uma mulher falou e todos aplaudiram. – E agora, nosso tão esperado leilão! Hoje temos cestas de 10 dos homens mais cobiçados aqui.
– Uhul! – algumas mulheres gritaram e parabenizaram, nos fazendo rir.
– Como sabem, as cestas são secretas, mas podemos revelar quem são os nossos pretendentes da noite. Por favor, senhores, venham ao palco – a apresentadora anunciou, e os quatro pilotos, junto com outros seis homens, subiram ao palco. Eles se alinharam, recebendo aplausos calorosos. Realmente, havia outros homens tão bonitos quanto Lance ali.
“Vamos lembrar como funciona! Cada cesta é de um desses pretendentes, nelas contém itens para vocês aproveitarem um café da manhã, uma tarde ou uma noite com nossos pretendentes. Esse encontro inclui comida, música, diversão e todo melhor tratamento que nossos meninos podem dar para vocês! Elas foram feitas por eles pessoalmente, com seus gostos e suas personalidades. Mas não pensem que será fácil, nossos pretendentes foram bem minuciosos em esconder!”
– A do Lance é fácil, é só ver o que tem comida italiana – Comentei com Chloe, que riu – Ou hambúrguer!
– Você não está errada! – ela riu.
– Sei que sou convidada igual a todos, mas eu posso dar um lance? – perguntei.
– Sim... Eu só não indicaria...
– É para caridade, qual seria o problema? – questionei, curiosa.
– Primeiro que você pode acabar comprando a cesta de alguém que não é o Lance...
– Você não pode me falar qual é?
– Pior que eu não sei! – ela fez uma careta, me fazendo rir.
– Ok... E o outro problema?
– Lance não gostaria que você gastasse com isso. Ele te leva para qualquer jantar que você queira...
– Eu sei, mas... É só diversão, e é por uma boa causa! Eu ajudava um lugar assim na minha cidade, mas o foco deles era geral, e uma ajuda mais física, transporte, remédios, se a pessoa precisasse de uma cama hospitalar, uma cadeira de rodas, ou até roupas...
– Legal! – Chloe comentou, impressionada, e eu sorri. – Mas eu ainda não indicaria, depois você pode entrar no site deles e doar quanto quiser... – Ponderei com a cabeça.
– É... Vamos ver!
– Vamos começar? – a apresentadora anunciou, causando aplausos do pessoal.

O leilão começou, e finalmente entendi o que Lance quis dizer sobre eu não dar um lance — ba dum tss. O primeiro começou em cinco mil dólares e terminou em inacreditáveis 37 mil. Fiquei em choque. Tá, talvez eu conseguisse dar um lance inicial de cinco mil, mas duvido que o valor parasse por aí. Afinal, tínhamos quatro pilotos de Fórmula 1 no palco. Lance podia não ser o mais popular mundialmente, mas aqui ele definitivamente era uma grande estrela. Quando foi anunciado que a cesta de comidas francesas era de um empresário de 57 anos, foi hilário ver a “tristeza” de uma senhora de uns 60 anos ao descobrir que não havia romance no prêmio.
Mesmo percebendo que minhas chances eram praticamente nulas, decidi prestar atenção nas cestas. As escolhas eram bem elaboradas, e o regulamento exigia que as comidas fossem escolhidas pelos próprios “pretendentes”. Nada de restaurantes: eles podiam encomendar, mas sem levar o encontro ao local.
Minha suspeita sobre a cesta de Lance cresceu quando anunciaram uma com comida italiana, vinho e um jantar à luz de velas. Mas foi o item de diversão que entregou: um passeio de Ferrari pela Toscana. Eu ainda estava começando a entender sobre Fórmula 1, mas ficou óbvio que era do Mick. Essa cesta chegou a impressionantes 60 mil dólares, me deixando boquiaberta com a facilidade com que as pessoas ofereciam valores tão altos.
Ok que vai para caridade, mas ai, doeu.
Lance ficou em penúltimo. Restavam ele e um jovem empresário de uns 30 e poucos anos. Deveria ter imaginado que guardariam o “melhor” para o final, mas sem deixar óbvio demais. Eu não conhecia nada da elite de Montréal, mas o empresário parecia pouco conhecido.
– Agora só faltam dois, hein, senhores?! – A apresentadora anunciou, arrancando risadas. – Temos mais uma cesta mais do que especial. Essa daqui vem recheada com comida italiana! – O pessoal comemorou. – De entrada, temos uma degustação de embutidos e queijos italianos direto da região da Emilia-Romanha... – Dei um curto sorriso, meu maior sonho é comer comida italiana em Parma. – De prato principal, temos Tortelli d’Erbetta, um prato muito famoso na cidade de Parma... – Ergui meu olhar para Lance, vendo-o com um curto sorriso nos lábios, mas sem olhar diretamente para mim. – De sobremesa, só o melhor, Tiramissù.
– Uuh! – as mulheres comemoraram.
– O jantar será servido aqui em Montréal, no Chalet du Mont-Royal, com uma vista linda da cidade ao anoitecer. A chegada até lá é uma caminhada generosa, mas a vista é de tirar o fôlego! – As mulheres riram. – Para diversão, que tal uma patinação no gelo? Precisaremos de coordenação enquanto vão para o Patin Patin. Ao final da diversão, será servido sfogliatelle com chocolate quente do Tim Hortons.
– Uaaau! – as mulheres suspiraram e aplaudiram. Eu senti um calor gostoso no peito.
– É a do Lance – murmurei para Chloe, que me olhou curiosa.
– Tem certeza? – perguntou ela.
– Absoluta – sorri, suspirando
– Os lances começam com 10 mil dólares – a apresentadora anunciou.
– Vai dar um lance? – perguntou Chloe.
– Não... Mas eu gostaria muito – Suspirei. – É o encontro perfeito... – Ela deu um sorriso.
– Como sabe que é dele?
– Acho que ele fez pensando em mim – Suspirei. – Ele sabe que eu morro de vontade de ir para Parma comer... – Chloe riu. – A vista do Mont-Royal é a mais linda e romântica, mas ele sabe que eu odeio fazer exercícios... – Nós duas rimos. – E ele ama hóquei, e a patinação se assemelha a isso, acho que seria mais fácil que futebol. E quem não gosta do chocolate quente do Tim Hortons? É um tesouro nacional, com sfogliatelle, fica perfeito.
– Bingo...
– 30 mil aqui! – falou uma mulher.
– É... Mas eu sou alguém normal, não consigo competir com elas... – mordi meu lábio inferior, voltando a prestar atenção no leilão.
Voltei a prestar atenção nos números que continuaram subindo.
– 159 mil dólares...
– Dou-lhe uma... Dou-lhe duas...? – A mulher esperou. – Vendido para a mulher de vermelho, número 37.
Engoli em seco ao observar a mulher vencedora: linda, elegante, provavelmente na casa dos 35 ou 40 anos. Idade não importa, certo? Essa era a minha nova visão de mundo.
Suspirei ao som dos aplausos e soube que era minha deixa para ir embora.


Capítulo 7


– Você está quieta – foram as palavras de Lance ao estacionar em frente ao meu apartamento após a festa.
– Só cansada... – virei para ele, dando um curto sorriso.
– Eu sei que não é – Ele rebateu, direto. – Você ficou assim logo após o leilão.
– Foi um pouco demorado, bateu o sono... E eu trabalhei hoje, trabalho amanhã... Nada que um sono não resolva... A gente se vê sexta... – falei.
– Eu te acompanho até lá — Ele saiu do carro sem esperar resposta, dando a volta até o meu lado. Enquanto eu me enrolava com a porta que abria para cima, ele já esticava a mão. — Aqui.
Peguei sua mão e, com sua ajuda, saí do carro, segurando os saltos na outra mão. Caminhei descalça para dentro do prédio, sentindo o chão frio sob meus pés, enquanto Lance me seguia de perto, seus passos firmes ecoando pelo corredor.
Subi as escadas do segundo andar com ele logo atrás. Encontrei minha chave dentro da bolsa e destranquei a porta do apartamento. Quando me virei, ele já estava ali, encostado na parede, me observando atentamente.
– Você está chateada por causa do leilão? É porque eu falei para você não dar nenhum lance?
– Não, não é isso. É... – suspirei, desviando o olhar
– O quê? – ele insistiu, a voz baixa, mas carregada de preocupação.
– Eu me senti um peixe fora d' água – Confessei, dando de ombros. – Achando que eu podia dar um lance em você... – Ri sarcasticamente. – Que idiotice minha.
– Não é idiotice, null – respondeu ele com um suspiro.
– É, sim! – Falei firme. – Eu fiquei feliz por sua mãe me pagar 100 mil dólares por um trabalho que eu vou levar quatro meses para fazer, com muito esforço, noites mal dormidas... E aí vejo pessoas gastando isso em uma única noite, como se não fosse nada — Ri de forma amarga, sentindo meus olhos arderem. — Eu não sei o que você viu em mim, Lance. É tão claro que eu não faço parte do seu mundo...
– Eu vivi nesse mundo a minha vida inteira, null – Ele continuou, aproximando-se devagar. – E nesse último mês, você me mostrou uma perspectiva completamente nova. Algo que eu nunca tinha experimentado. Se eu tenho alguma vantagem no meu mundo, quero usá-la para ajudar os outros ou... – Ele fez uma pausa, sorrindo de leve. – Para te dar algumas regalias – Dei um curto sorriso. – Você tem seus sonhos, deixe-me realizar eles...
– O que eu posso fazer pelos seus sonhos, Lance? Eu não posso oferecer muito. Sou uma boa pessoa, venho de uma boa família, tive boas condições, mas... o normal, sabe?
– Eu preciso de um pouco de normalidade na minha vida – Ele sorriu, acariciando meu rosto. – E eu encontrei...
– Em mim? – perguntei rindo e ele assentiu com a cabeça.
– Sim. — Sua resposta foi tão direta que meu coração pareceu parar por um instante.
Lance deu mais um passo à frente, sua mão ainda acariciando meu rosto, e sua voz soou baixa, quase íntima:
– Você, null...
Dei um sorriso ao sentir seus lábios tocarem os meus. Ele inclinou o corpo para mais perto, fazendo com que eu me endireitasse contra a porta. Trocamos alguns selinhos antes de suas mãos envolverem minha cintura. Meus sapatos foram ao chão junto com a bolsa, e levei as mãos até seu pescoço, apoiando os braços nos dele.
O beijo foi lento, mas firme. Sua mão apertava minha cintura, me causando pequenos arrepios. Dentro de mim, tudo estava explodindo. Esperei por isso durante o último mês inteiro, e foi ainda melhor do que eu imaginava.
Nossos lábios se afastaram devagar, fazendo com que nossos narizes se encostassem. Um largo sorriso se espalhou pelo meu rosto. Percebi que Lance também sorria quando abri os olhos e encontrei seu rosto colado ao meu. Rimos juntos e nos abraçamos novamente, me fazendo suspirar.
– Você quer entrar? – Sugeri. – Não com essa intenção, mas...
– Nem daria para fazer algo nessa sua cama... – ele brincou.
– Ai! – brinquei, empurrando-o de leve.
– Você precisa acordar cedo amanhã e eu tenho media day, é um saco – Ri fracamente. – A gente se vê na sexta.
– Ok, me passa as informações para eu ir lá...
– Peço para a Chloe te buscar. Assim, você não precisa sair tão cedo nem pegar o caos da imprensa chegando comigo... – Assenti. – Não que eu não queira que você seja vista, só...
– Eu entendo, Lance, não se preocupe. Eles já estavam em cima de mim hoje. Chegar no GP juntos talvez não seja a melhor ideia tão cedo...
– É... – rimos juntos, e ele segurou minhas mãos.
– Mas eu quero você lá comigo.
Assenti com a cabeça e nossos lábios se tocaram novamente.
– Eu estarei lá – Sorri. – Não vou perder a oportunidade de ir no meu primeiro GP.
– De dentro do paddock...
– No paddock! – rimos juntos, trocamos outro beijo e eu o abracei novamente, suspirando. É muito bom ficar nos braços dele.
– Tenha uma boa noite, ok?! – disse ele quando nos separamos.
– Você também. Dorme bem!
– Vou dormir. – Ele sorriu, colando nossos lábios novamente e, então, se afastou devagar.
Acenei enquanto ele seguia pelo corredor até desaparecer pelas escadas. Fechei a porta, sentindo meu corpo leve, e ri sozinha, dando pequenos pulinhos de animação. Eu não ia parar de sorrir nunca.

Dei um passo para trás e esbarrei no box do banheiro, ouvindo um barulho alto quando bati nele. Suspirei. O banheiro era minúsculo!
Fiquei na ponta dos pés para tentar ver meus tênis brancos, combinados com a calça jeans pantalona e a camiseta de botões branca com corações pretos. Eu estava de null, mas... isso era suficiente para a Fórmula 1?
Passei os últimos dois dias pesquisando fotos, e as mulheres se vestiam de forma muito estilosa. Algumas eram totalmente sem noção, se quer saber. O problema é que eu não sei ser estilosa. Sou tradicional! Uso jeans, regata e tênis. Sou professora, ando de bicicleta, não sou uma Kendall Jenner da vida. Ou sei lá quais famosas esses caras namoram.
null! – ouvi um chamado, seguido de algumas batidas na porta. Suspirei, saí do banheiro e imediatamente a abri.
– Eu preciso de um minuto! – falei, vendo Chloe e Scotty do lado de fora.
– Uau! Você está fofa! – disse ela e suspirei.
– Ah, fofa? – voltei para o quarto, abrindo meu armário.
– O quê? Não é uma forma ruim! – ela me seguiu.
– Ela diz isso para todo mundo – comentou Scotty.
– Ah, que lugar fofo! – disse Chloe, olhando ao redor.
– Viu?! – disse Scotty, me fazendo rir.
– Não está ruim? – virei-me de frente para eles.
– Você está ótima! – Chloe garantiu. – É cansativo, então é melhor ir o mais confortável possível.
Ela vestia um macacão caramelo com um casaco por cima.
– Só acho que você vai passar frio.
– Ah, isso... – peguei minha jaqueta jeans.
– Você tem algum moletom? – perguntou ela.
– Sim, mas não vai ficar legal...
– Vai sim, acredite! – Chloe falou. – Faz muito frio lá.
– Muito! – concordou Scotty.
– Virou ventríloquo agora?
– Desculpe! – ele riu, e eu peguei um moletom rosa escuro da GAP.
– Ah, linda! – ri fracamente.
– Eu estou nervosa.
– Nem dá para notar – comentou Scotty sarcasticamente, e eu revirei os olhos.
– Relaxa, null. Vai dar certo – Disse Chloe. – Não prometo que não vá ser caótico, mas é como criança. Adora o brinquedo novo por dois minutos, depois já larga...
– Bem, não é bem assim...
– Xi! – Disse Chloe e suspirei. – Vai dar certo.
– Por favor, não me deixem sozinha – pedi em um gemido.
– Não vamos – Ela sorriu. – Vamos arrasar, garota. E eu quero saber tudo sobre o beijo.
– Como? – Perguntei, e ela deu de ombros. – Lance! – Eles riram.

O clima estava menos frio do que Chloe havia mencionado, mas meu corpo tremia, provavelmente de nervosismo. Eu não sabia exatamente o que esperar. Lance estava me deixando bem relaxada, mandando fotos como fazia nas últimas corridas que eu não pude ir, mas, ainda assim, algo me deixava inquieta.
Ontem, senti um pouco do que é o caos da Fórmula 1: fotógrafos a cada centímetro quadrado, pessoas com milhões de dólares sobrando na carteira e um ambiente onde tudo respira dinheiro, fama e publicidade. Eu não faço parte disso. Minha escola é pequena, crescendo aos poucos. Meu maior momento de destaque foi no discurso de formatura do terceiro ano.
Afinal, fui a única a tirar 10 em inglês e português... O resto é história!
– Não se preocupe, vai dar tudo certo – disse Chloe.
– Eu não sei por que eu estou nervosa – falei.
– Você está entrando em um mundo totalmente novo. E não estou falando apenas da F1, mas também do Lance – Ela sorriu. – Um relacionamento gostoso, algo saudável...
– Totalmente fora da minha realidade em vários sentidos – suspirei.
– Então, acho que é a oportunidade perfeita para ignorar esse nervosismo e deixar a vida acontecer... – comentou Scotty, e eu o encarei pelo retrovisor do carro.
– O quê? – Ele riu. – Não dá para ficar nervosa com algo que você nem conhece.
– Isso se chama ansiedade, Scotty, e dá sim – respondi, e ele ficou em silêncio por alguns segundos.
– Se eu disser que você vai comer e beber de graça te deixa mais feliz? – ri fracamente.
– Pior que sim! – sorrimos.

Eu confesso que, mesmo vendo fotos e vídeos, não sabia o que esperar. E, na realidade, nada era parecido com o que eu imaginava.
A entrada do paddock nada mais era do que um estacionamento, e os fãs e fotógrafos se espremiam para tirar fotos das pessoas que chegavam. Eu não reconheci ninguém, mas os fãs gritavam animados.
Mas eu sou brasileira, sei que a gente grita até para helicóptero no céu. Acho que a palavra “fã” não tem nacionalidade.
Scotty me entregou um passe, e eu o copiei ao passarmos pela catraca. Fiquei surpresa ao ver minha foto do perfil do Instagram aparecendo na tela. Loucura.
Assim que entramos, nos deparamos com um largo corredor, repleto de tudo que você pode imaginar. Logo na entrada, havia diversas barracas de marcas famosas, mulheres sorridentes posando como modelos e uma quantidade absurda de pessoas. Algumas caminhavam apressadas, outras estavam atrás ou dentro das barracas, e jornalistas e fãs circulavam por todos os lados. A maioria vestia roupas que representavam suas equipes favoritas, e as cores das escuderias dominavam o ambiente.
Alguns fotógrafos se aproximaram para tirar fotos de Scotty e Chloe, e alguns flashes foram disparados em minha direção. Não sei se foi intencional, mas tentei agir como eles, ignorando e apenas continuando a andar. Depois de alguns passos, paramos. Mais alguns passos, e chegamos à área dos motorhomes.
Eu já tinha visto algumas fotos, mas não esperava que fossem tão enormes. Para mim, um motorhome já era grande... Mas esses pareciam seis motorhomes empilhados! Quando chegamos ao da Aston Martin, percebi que provavelmente minha expressão estava incrédula.
null! – foi a primeira coisa que ouvi ao entrar no motorhome, ainda tentando entender como aquilo tinha três andares e viajava entre países.
– Oi, mãe! – desviei o rosto ao ver Claire.
– Oi, Claire! – sorri, abraçando-a.
– Ah, querida! Que bom te ver! Nem tivemos tempo de conversar direito depois de quarta-feira.
– Ah, não se preocupe. Trabalhei normalmente ontem.
– E o que está achando de tudo? – perguntou ela animada.
– É tudo tão grande! – Falei rindo. – Não estou acostumada.
– Você se acostuma com o tempo – Vi o pai de Lance aparecendo atrás dela. – Venha ver quem chegou, Larry.
– Ei, pai! – Chloe deu um abraço no pai.
– Fala, sogrão! – disse Scotty, cumprimentando-o com um abraço.
– Oi, null.
– Oi, senhor Lawrence – trocamos um rápido aperto de mão.
null, essa é Raquel, esposa do Larry – disse Claire, como se estivesse apresentando uma grande amiga, o que tornou difícil disfarçar minha surpresa.
– Oi! – sorri, estendendo a mão.
– Ela é brasileira também!
– Ah, mesmo? – falei, surpresa. Mas, apesar do leve sorriso que ela deu, não houve muita reciprocidade.
– Sim, mas estou fora do Brasil desde os 19 anos – assenti com a cabeça, pensando quanto tempo fazia, pois ela deveria regular com minha idade.
– Então... Pai! Onde está Lance? – perguntou Chloe, quebrando o clima estranho que a nova loira de Lawrence havia trazido.
– Ele está finalizando o briefing com a equipe – Disse Lawrence, e assenti com a cabeça. – Fique à vontade, null. As comidas da cantina são todas gratuitas...
– Obrigada, senhor Lawrence – assenti, e ele logo se afastou com a esposa, que já estava ao telefone.
– Bem, isso foi desconfortável – murmurou Scotty.
– Sempre é... – comentou Claire.
– Mesmo? Achei que vocês se davam bem.
– Ela não é de falar muito, falta um pouco de tato – Explicou Chloe. – O assunto acaba rápido com ela.
– Qual a idade dela? Achei ela bem jovem... – perguntei, tentando não soar rude.
– 36 – Respondeu Chloe. – E não podemos nem ficar bravas com ela, porque meus pais terminaram antes de eles se conhecerem.
– Ela devia ter uns 20 na época – Scotty zoou e Claire deu um tapa nele. – É brincadeira, sogrinha! – Ele riu, e eu também.
– Te cuida, Scotty, vocês não casaram ainda! – eles riram.
null! – virei o rosto ao ouvir a voz de Lance. Ele descia as escadas acompanhado de algumas pessoas, e me contive para não sorrir demais.
– Ah, null! – reconheci Sebastian Vettel ao seu lado e Lance imediatamente ficou vermelho.
– Oi, maninho! – disse Chloe, e ambos vieram até nós.
– Chloe, Scotty, oi! – ele cumprimentou-os.
– Oi, Seb! – Respondeu Chloe, enquanto Lance parava ao meu lado. – Essa é null, a futura namorada.
– Chloe! – falei firme.
– Ah, só agilizando o processo – Lance apertou meu braço de leve.
– Oi... – falei para ele, vendo-o sorrir.
– Oi – Ele sorriu, dando um beijo em minha bochecha e senti meu rosto esquentar. – Oi – Rimos juntos.
– Somos invisíveis – disse Scott, me fazendo rir.
– Seb, essa é a null, a mulher que eu disse – disse Lance.
– Oi, null, eu sou Sebastian – Ele estendeu a mão. – Prazer em te conhecer.
– Prazer em te conhecer também – sorri, apertando sua mão.
– Seja bem-vinda! Se precisar de algo, pode falar comigo – disse Sebastian gentil.
– Obrigada! – sorri.
– Se me dão licença... – disse Sebastian, acenando antes de se afastar.
– Eu tenho alguns minutos, quer subir comigo um pouco? – Lance ofereceu. – Não desse jeito...
– Eu entendi – rimos juntos.
– Mostre o local para ela, filho. Nos encontramos na garagem.
– Combinado! – respondeu Lance, estendendo a mão para mim. Segurei-a e segui atrás dele.

– Venha! – disse ele. Fomos até o último lance de escadas e saímos num balcão aberto, parecendo uma varanda de apartamentos com dois andares.
– Uau! – foi o que falei ao ver tudo de cima. O local parecia um bar, com sofás, cadeiras e até uma piscina. Algumas pessoas estavam andando por ali, todo mundo com a mesma camiseta verde da Aston Martin.
– Gostou?
– É legal! – Falei rindo, me aproximando da beirada e apoiando a mão. – É aqui que você vem para relaxar?
– Ah, não, eu me escondo no meu vestiário – ele abanou a mão.
– Mas ninguém é mal contigo aqui, certo?
– Ah, não. Todo mundo é bem legal, na verdade – Disse ele. – Talvez porque precisem...
– Lance! – suspirei.
– Não, brincando! As equipes, os pilotos, é legal – Disse Lance. – Eu só fujo de comentários online, apareço pouco no Instagram e tudo mais...
– Não acho que esteja errado – Dei de ombros, virando para a vista e olhando para a rua embaixo. – Aqui é legal. Um pouco frio, mas...
– Sim, é legal! – Ele se debruçou ao meu lado. – Obrigado por vir. – Virei para ele.
– Eu disse que eu viria! – sorri.
– Eu sei, mas... – Ele ponderou com a cabeça e me aproximei dele. – Você tem seus compromissos, é isso que eu estou dizendo.
– Não dizendo que eu vou poder viajar o mundo contigo, mas eu posso pedir uma folga – ele riu.
– Como foram suas aulas ontem?
– Foi legal! Fiquei um pouco ansiosa, mas tudo bem – falei.
– Por quê?
– Ah, de vir aqui, ver sua vida de dentro, te ver...
– É um pouco caótico, os fotógrafos são invasivos no começo, mas tudo dá certo – disse ele.
– E quando eu vou te ver mostrando seu talento? – ele riu.
– Eu tenho treino às 13:30, coletiva às 15:30 e depois treino às 17h – Chequei o relógio e era pouco mais de 10:30. – Logo o almoço é servido, e lá pelo meio-dia eu já começo meus protocolos.
– Tudo bem, eu me viro.
– Se você quiser ir para a pista, temos vários outros eventos lá, não é só F1.
– É? – perguntei curiosa.
– É! Tem outras categorias...
– Legal! Vá fazer suas coisas, eu peço para Chloe ou sua mãe ir comigo – falei animada.
– Ei, não se livre de mim tão rápido assim! – Ele me abraçou pela cintura. – Ainda temos um tempo juntos. – Ri fracamente.
– E é seguro você me abraçar assim? – perguntei, e ele riu.
– Só tem fotógrafos da AM aqui, eles não postariam nada – Sorri, vendo-o se aproximar. – Dá até para eu te beijar. – Ri fracamente.
– Então, beija! Faz tempo desde o último. – Sorrimos e ele colou nossos lábios, fazendo-me passar os braços pelos seus ombros, colando nossos corpos mais perto.

– Uau! É alto! – falei, rindo, vendo algumas Ferrari passando pelo circuito.
– Na hora do treino a gente te leva lá na garagem – Disse Chloe. – Tem os fones, mas o legal é o barulho dos carros.
– Estou animada para ouvir! Na televisão é incrível!
– E de pensar que dois meses atrás ela não tinha ideia do que era Fórmula 1! – disse Claire.
– Ei, também não é assim! – Rimos juntas. – Ayrton Senna é brasileiro, não se esqueçam! Eu só nunca prestei atenção. É legal! – Ela riu.
– Eu adoro a adrenalina, mas fico receosa com alguma batida ou algo assim – disse Claire.
– Você poderia não ter me lembrado disso, eu já sou ansiosa de graça – ela riu.
– Bom, há o perigo, eles andam há mais de 300 quilômetros por hora... – Disse ela. – Mas é o sonho, então se a gente conseguiu ajudar a realizar os sonhos, então que vamos.
– E o esporte é muito mais seguro hoje em dia – disse Chloe, acenando para Scotty que falava com outra pessoa.
– Quem é? – perguntei, curiosa.
– Ah, é o Daniel Ricciardo…
– McLaren, certo? – perguntei.
– Isso! Ele é australiano também, grande amigo do Scotty. Eles fazem algumas propagandas juntos... – assenti com a cabeça quando Scotty se aproximou de nós.
– Meus amores, eu cheguei! – disse ele rindo, passando o braço pelos ombros de Chloe.
– E como ela está? – perguntou Chloe.
– Elas estão muito bem! – Ele sorriu. – Acharam melhor ela não vir para cá, mas ela vai estar na Inglaterra. Pelo menos o bebê vai estar com um mês completo.
– Ah, que bom! Eu mandei uma mensagem pelo Instagram, mas acho que ela deve ter recebido milhares e ficou perdido.
– Ele agradeceu o presente. Falou que chegou certinho – disse Scotty.
– Do que estão falando? – Claire tirou minha vontade de perguntar.
– Da Harper, esposa do Daniel...
– Noiva! – disse Scotty.
– Que seja! – Disse ela rindo. – O bebê deles nasceu dia três de junho.
– Sério? Que bênção! – Claire falou sonhadora.
– É um menino! Falaram que um meninão! Ela está com a mãe do Daniel lá em Mônaco. Vai tentar ir em Silverstone.
– Ah, que delícia! E estão bem?
– Sim, mamãe e bebê bem – disse Scotty.
– Ah, que bênção! – ela sorriu.
– Só falta o Daniel amadurecer agora, mas não vamos nos apressar – disse Chloe, fazendo-os rir.
– Não, sem pressa – eles riram.
– Bom, vamos almoçar? Estou com fome! – disse Scotty, me fazendo rir.
– Não é nem novidade! – Claire foi irônica, me fazendo rir.
– Eu não tomei café, então estou faminta! – falei, fazendo as risadas continuarem.
– Você pode se servir à vontade em qualquer lugar dentro do motorhome, tá? No bar, no restaurante, fique à vontade.
– Ah, o senhor Lawrence falou – Afirmei com a cabeça. – Eu vou me soltando aos poucos, não se preocupem. – Eles riram.
– Logo vai se sentir uma verdadeira WAG – disse Scotty.
– Uma o quê? – franzi a testa.
– Deixa quieto! – disse Claire, abanando a mão.




Continua...



Nota da autora: Oi, gente! Demorei, mas cheguei.
Os últimos meses foram caóticos, mas muito produtivos na minha vida profissional, então apesar do caos, compensou! <3
Mais um capítulo de Lance e null, e espero que venham mais durante as férias.
Beijos e até a próxima!

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