Última atualização: 03/10/2017

Capítulo Único

Por mais que o outono oferecesse uma temperatura agradável, eu podia sentir a brisa fria tomar conta de meu corpo, fazendo-me encolher entre as roupas que vestia enquanto eu observava o cenário que presenciava. Devo dizer que não apreciava nem um pouco aquele lugar e nem me via confortável ali. O silêncio ensurdecer, as poucas árvores, porém as várias criptas que havia ali emanavam os piores sentimentos que podiam existir em um cemitério, a tristeza e o luto. Meus passos nunca foram tão lentos como naquele momento, mas quanto mais me aproximava da cripta que me chamava a atenção mais a dor se espalhava sobre mim, aquele sentimento era tão imenso que podia sentir meu corpo fraquejar junto às batidas do meu coração despedaçado. Assim que cheguei à cripta desejada, senti um peso tomar conta de meu corpo fazendo-me cair de joelhos perante aquele nome que mexia tanto comigo " ". Sentia uma onda de sentimentos, uma mistura entre amor, luto, tristeza, culpa principalmente, e ódio. Ódio de mim mesmo, por existir, por ter causado a morte da mulher que mais amo e que daria a vida por ela. Deixei-me desabar sobre meus sentimentos, já sentindo as lágrimas quentes caírem insistemente sobre meu rosto e, como sempre, a cena do acidente se repetia pela milionésima vez em minha cabeça.

- Tem certeza de que estamos na rota certa? - perguntava enquanto eu escorria meus olhos por aquele mapa imenso à procura da rodovia que estávamos seguindo. Tinha nenhuma noção do que estava fazendo, nunca na minha vida tive um bom senso de direção e aquele mapa estava parecendo um quebra cabeça de mil peças que ninguém conseguia resolver.
- Claro! - afirmei, tentando a convencer mais a mim mesmo do que à minha esposa de que estávamos no caminho certo. Olhou-me de canto, soltando uma risadinha.
- Você não aparenta estar tão convencido! - disse ainda rindo, olhando-me rapidamente e voltando sua atenção ao volante. Bufei, olhando atentamente à estrada, pousando meu olhar sobre a placa que havia ali, provando que eu estava mais que perdido no mapa. Estressado, coloquei o mesmo de lado e encarei , que me lançava um olhar divertido.
- Por que simplesmente não podemos usar o GPS? - indaguei frustrado, já sabendo de cor a resposta que iria receber.
- , você sabe muito bem que não confio muito bem nessas coisas.
- E você prefere confiar no meu senso de direção do que na alta tecnologia? - deixei-me levar pelo stress e me olhou assustada. Raramente ela me via estressado e isso a assustava, por mais que estávamos juntos há anos ela nunca se acostumava com a minha mudança de humor.
- Você sabe que sim... Mas deixe-me dar uma olhada - disse soltando uma das mãos do volante e estendendo a mim, para que eu pudesse lhe entregar o maldito mapa. Assim que obteve o mapa em sua mão, se certificou de que a estrada continuava na reta e olhou rapidamente para o mapa, a segui com o olhar, mas mantendo meu olhar à estrada. De repente vi algo pular para a estrada, um veado para ser exato, e estava a poucos metros de distância do carro.
- , CUIDADO! - gritei, chamando sua atenção. Quando percebeu que não daria tempo de frear, ela simplesmente virou à contra mão, mas sem sucesso, o carro cambaleou e seguiu pra fora da estrada.


Funguei, tentando cessar o choro e esfreguei minha mão livre sobre meu rosto, limpando as lágrimas que escorriam. Mesmo com a visão embaçada que as lágrimas ofereciam, fitei a cripta novamente e a frase que estava gravada ali me despedaçou ainda mais "As pessoas amadas nunca morrem, elas apenas partem antes de nós". Desviei meu olhar sobre a minha mão que segurava um buquê de orquídeas, que sempre foram as preferidas de e o dia que eu a pedira em casamento veio à tona.

- Boa noite, minha flor! - a cumprimentei assim que abriu a porta de sua casa, exibindo as flores que ela tanto amava. Ela abriu um sorriso largo enquanto o segurava.
- Boa noite, meu anjo! - me deu um beijo enquanto tentava me abraçar, retribui o ato, pouco me importando se o abraço estava meio embaraçado. Ri brevemente quando senti sua mão apertar minha bunda sobre a calça. Amava essa mania dela.
- Safadinha - disse em seu ouvido, retribuindo o ato e mordiscando sua orelha. Soltou-se de meus braços enquanto escorria suas mãos por mim, fez uma careta de surpresa ao sentir um volume no bolso de frente da calça e tirou uma caixinha que eu havia guardado lá. "Isso , parabéns pela inteligência", era tudo que meu subconsciente dizia a mim mesmo. me olhou surpresa, carregando um leve sorriso em seu rosto. "Agora age, improvisa", gritava pra mim mesmo, pois não sabia exatamente o que fazer, não fazia parte dos meus planos. Estava completamente nervoso, trêmulo, mas aquela sensação era boa.
- Abra - assim que colocou o buquê delicadamente sobre o aparador que ficava logo ao seu lado, abriu aquela pequena caixa de veludo ao mesmo tempo em que eu me agachava perante a ela. Não sei quem ficou mais chocado com o ato, eu com a expressão de surpresa que ela demonstrava ou ela com o meu nervosismo.
- Casa comigo? - olhei-a esperançoso, que revezava seu olhar sobre o anel e a mim. Fitei-a nos olhos e ela me seguiu com o ato, pude perceber que seus olhos lacrimejavam e isso me deixou mais nervoso ainda. se ajoelhou junto à mim, assim ficando à minha altura e me acariciou com a sua mão livre, escorrendo seus dedos sobre lágrimas que caíam em meu rosto sem que eu percebesse.
- Claro que sim - disse sorrindo de canto a canto, fiz o mesmo. Delicadamente, peguei a caixa de suas mãos e tirei dali o anel, que logo brilhava estonteantemente na mão macia de , assim como seus olhos. Pousei minhas mãos em seu rosto e a beijei. Nossos lábios, nossas línguas brincavam de modo tranquilo e lento, dizendo palavras que nossas bocas não seriam capazes de falar o quanto aquele sentimento era forte e recíproco. Encerrei o beijo puxando seu lábio inferior e dando-lhe um selinho, encostei nossas testas e simplesmente permanecemos ali, ainda ajoelhados e olhando serenamente um para o outro, deixando o silêncio invadir com palavras que nossos olhares trocavam no momento.


Não pude deixar de sorrir ao me lembrar daquele dia, aliás, não foi só um simples dia, foi o dia em que nossa história estava apenas começando. Nunca sentira tão feliz e orgulhoso de mim por ter a mulher mais maravilhosa que existe nesse mundo. Ninguém nunca me conhecera tão bem como me conhecia e por mais que eu tenha minhas manias e defeitos, ela nunca desistira de mim, muito pelo contrário, esteve ao meu lado sempre por mais que tivéssemos nossas brigas, às vezes não nos suportávamos, mas ambos nunca conseguíamos nos manter distantes. Eu a amava mais que tudo e sempre fui capaz de qualquer coisa pra demonstrar todo o sentimento que sentia por ela, que era e ainda é a coisa mais preciosa que tive na minha vida e sempre vou tê-la em mim, por mais que, infelizmente, eu não a tenha fisicamente do meu lado. Mas dói. Dói tanto saber que vou acordar e ela não vai preencher o vazio daquela cama ou tendo o peso de seu corpo sobre mim, que não vou poder ouvir o som calmo da sua voz ou sentir o aconchego que seu sorriso me transmitia. Dói tanto saber que eu mesmo a tirei de mim, que eu tenho a culpa de não a ter mais em meus braços, de não poder sentir mais seu perfume natural de canela. Eu só queria ter a chance de voltar ao tempo e de não ter saído de casa naquele dia, aquele que perdi a mulher que sempre desejei na minha vida.
Não conseguia conter minhas lágrimas, eu podia sentir o peso delas sobre meu rosto e aquele sentimento ruim tomar conta de mim. Não conseguia fazer mais nada a não ser chorar, chorar e chorar, além de relembrar tudo de bom que ela me fazia sentir e o mal que eu fizera deixando-a partir. Tudo isso me doía tanto que eu desejaria sentir nada naquele momento, mas esse desejo me fazia sentir tão péssimo.
Coloquei as flores acima do solo, pousando-as sobre a cripta, selei meus lábios sobre meus dedos e os pressionei contra as letras que formavam o nome da minha amada e levantei-me. Não consegui ousar a me retirar dali, fiquei mais um tempo fitando seu nome até que o dia do acidente se repetiu novamente em minha cabeça e eu chorar mais ainda. Não aguentei e simplesmente saí dali, não conseguia me conformar que aquilo tudo estava acontecendo comigo.

Mesmo atordoado, consegui dirigir, mas tudo ao meu caminho me fazia lembrar dela e corroer aquela mistura louca de sentimentos que o luto me proporcionava. Liguei o som pra me distrair um pouco, mas sem sucesso, estava logo tocando Since I Don't Have You do Guns 'N Roses, a música preferida da . Exaltei-me e dei um soco no volante, fazendo com que o carro desse uma alavancada. Estacionei em qualquer vaga que encontrei e saí do carro batendo a porta do mesmo sem ao menos importar se meu movimento havia sido brusco o suficiente a ponto de quebrar.
Não andei muito porque não tava nem um pouco animado a fazer algo senão ficar me lamentando pela morte da , pela morte que causei. Sentei-me no primeiro banco que vi na minha frente e fitei o nada, pouco me importando se estava chorando em público.
- Pro quê você tanto olha? - perguntou e continuei fitando aquele lago, pensando em tudo, mas em nada - ? ? - estalou os dedos a minha frente e pisquei os olhos - Terra chamando ! - balançou a mão, me chamando atenção. Olhei-a, sorrindo abobado - Amor... Você tá bem? - indagou, preocupada.
- ? Sim. Sim. Tô bem! - respondi ainda meio distraído. Balancei a cabeça, tentando me recompor dos devaneios.
- Bobinho! - disse, dando uma tapa de leve na minha cabeça, rindo - Seu sorvete já está até derretendo! - comentou, voltando a tomar seu sorvete. Num impulso, tomei uma colher de seu sorvete e me fitou - É o seu sorvete que tá derretendo! E você sabe que odeio dividir comida! - fiz-me de ofendido. Riu e pegou um pouco de seu sorvete e colocou em minha boca, lambi meus lábios em sinal de aprovação. Retribuí o gesto, dando-lhe um pouco do meu sorvete, que realmente já tava derretendo. Ela também lambeu seus lábios, só que de uma forma sexy, que só ela sabia fazer, dei-lhe um selinho e finalizamos nossos sorvetes enquanto assistíamos algumas crianças brincando num parque que havia ali perto. Assim que devoramos os sorvetes, ela me puxou pra fora do banco.
- O quê que é isso, sua louca?
- Só quero entrar no lago, vem - disse, me puxando e deixei-me segui-la, mas olhei para o céu. O tempo estava pra chover a qualquer momento.
- Você tá louca? Tá pra chover a qualquer momento e...
- Que seja! Vem - soltou suas mãos das minhas e deu um pulo de roupa e tudo no lago, dando um mergulho. Quando voltou à superfície, acenou me chamando pra mergulhar junto - Vem, a água tá gostosa!
- Você é louca! - comentei rindo, tirando meus tênis e minha camisa e mergulhei afundo, quando estava perto o suficiente de , me agarrei a ela levando-nos para o fundo. Quando voltamos à superfície pra pegar fôlego, ela jogou água na minha cara, fiz careta a encarando e retribui o gesto, estávamos parecendo duas crianças brincando. Rimos e logo começou a chuviscar. - Tá vendo? - apontei para o céu, afirmando que tinha razão - Vamos embora antes que engrossa.
- O que adianta? Já estamos embaixo da água mesmo - sorriu jogando seus braços sobre meus ombros, me abraçando e elevou sua cabeça sobre seu ombro direito, estalando o pescoço. Retribui o abraço e a beijei. No final do ato, apenas ficamos nos fitando ternamente, como sempre fazemos na maioria dos momentos de silêncio, eu me dizia muito grato por sentir um sentimento recíproco e no quanto ela me fazia feliz, mesmo em momentos simples como aquele, pois sabia que todo esse sentimento se abrangia dessa maneira.


Of all the things I still remember
(De todas as coisas que ainda me lembro)
Summer's never looked the same
(O verão nunca pareceu o mesmo)
The years go by and time just seems to fly
(Os anos se passam e o tempo parece voar)
But the memories remain
(Mas as memórias permanecem)


In the middle of September we'd still play out in the rain
(No meio de Setembro nós ainda brincávamos na chuva)
Nothing to lose but everything to gain
(Nada a perder, mas tudo a ganhar)
Reflecting now on how things could've been
(Pensando agora em como as coisas poderiam ter sido)
It was worth it in the end
(Valeu a pena no final)




Fim



Nota da autora: Primeiramente quero mencionar que essa é minha primeira fic que escrevo depois de um tempo sem escrever, ao certo a última vez foi na época do Orkut kkkkkkkkk. Devo dizer que tô muito empolgada por voltar a escrever e tô muito feliz com o resultado, posso dizer que é meu xodozinho. Como mencionado me inspirei na música September, uma das minhas preferidas da banda Daughtry, que a propósito super recomendo que ouçam. Basta a letra acabar com meu psicológico, também devo dizer que a fic ajudou a acabar com a reputação do meu signo e deixar meu coração de gelo se derreter, chorei pakas. Também quero agradecer a minha mana Aline por me incentivar e inspirar a escrever, pois se não fosse por ela nem teria coragem de estar publicando aqui. Assim como amei essa short, espero muito que tenham gostado tanto da estória quanto da minha escrita.
Não se esqueçam de comentar sobre o que acharam da fic, é muito importante pra mim saber se vocês gostaram ou não e aceito de bom grado críticas construtivas, pois usarei elas pra estar melhorando sempre. Beijos e até a próxima! (03/10/17)





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