Última atualização: 30/09/2017

Capítulo Único

13 de agosto de 2008

- Lauren, adivinha quem vai estudar na Universidade de Londres? – vi a tia Lisa entrar pela porta, já abraçando minha mãe.
- Ah, eu não acredito! Que maravilha, ! – minha mãe então puxou a garota que se escondia atrás da mãe, a apertando em seus braços.

Vi que estava feliz e sorria para mim, não pude deixar de sorrir de volta, descendo o último degrau da escada correndo ao seu encontro para lhe dar um abraço tão apertado quanto o de minha mãe.

- Você conseguiu, ! Que orgulho! – me afastei dela para dar um abraço na tia Lisa, que olhava para a filha com tanto amor que seria impossível descrever.
- Acabamos de descobrir, eu tinha que correr pra cá! – então me abraçou novamente e ouvimos minha mãe dizer que ia preparar um jantar para comemorarmos.

Eu e subimos as escadas até meu quarto, e antes mesmo de conseguir fechar a porta sabia que a menina já estava esparramada em cima da minha cama.

- Não consigo acreditar que aquela menina chata que eu conheci quando me mudei vai se formar pela consagrada Universidade de Londres! Tõ tão feliz por você, ! – a vi sorrir, e então dar um espaço para eu me sentar e ela poder colocar a cabeça sobre o meu colo.
- Ainda nem tive tempo de pensar em nada, minha mãe tá tão animada! Tenho menos de um mês para arrumar tudo e me preparar psicologicamente. Não estou acreditando que vou ter que me mudar pra Londres, .
- Como assim se mudar? – encarei seus olhos, e notei que sua voz falava aquilo como uma obviedade.

Nós moramos em Canterbury, nasceu aqui e quando tinha eu tinha 09 anos me mudei para sua rua. Nos tornamos amigos, já que nossos pais se conheciam há alguns anos por conta de terem estudado juntos. Canterbury fica há menos de 01 hora de trem de Londres, quando ela decidiu que queria estudar lá, não pensei que ela teria de se mudar, acreditei que ela iria de trem ou de carro já que ela dirigia.

- Eu vou estudar em Londres, não tem como ficar indo e voltando todos os dias, , é muito caro e acima de tudo, cansativo. Eu já estou procurando na internet pessoas que queiram dividir apartamento comigo, para dividir as despesas. Muitos estudantes fazem isso – ela mexia inquieta com meus dedos, enquanto balançava as pernas freneticamente.
- Mas, , e eu? – sabia que isso soaria completamente egoísta, mas não pude inventar de pensar primeiramente em como ficaríamos.
- Toda sexta eu vou voltar pra cá, , vamos passar os fins de semana como sempre – ela segurou minha mão e deixou um carinho ali, antes de se levantar e ir em direção a porta, anunciando que iria até o banheiro.

- , tem alguém aqui que quero que você conheça! – vi uma garota alguns centímetros mais alta que eu vindo da cozinha e parando ao lado da mãe, que eu havia acabado de conhecer e tinha me pedido para ser chamada de tia Lisa. – Esse é o , filho da Lauren! Ele é um pouco mais novo que você, mas vocês vão estudar na mesma escola esse ano, meu amor. – abracei uma das pernas da minha mãe, mas ainda assim a garota se aproximou esticando a mão pra mim.
- Oi, ! Sou a , você quer brincar no balanço comigo? - apertei sua mão e logo estava correndo atrás dela até os fundos da casa onde tinham dois balanços. Antes de passar pela porta que levava ao quintal pude ouvir minha mãe elogiando para a amiga, “que garotinha mais adorável”.

- , tá viajando ai? – me cutucava, me acordando do transe em que estava, lembrando de quando nos conhecemos.
- Quase, , estava pensando que já faz tanto tempo que nos conhecemos. Espero que você não me troque pelos seus amigos crescidos da faculdade só porque seu melhor amigo ainda vai estar aqui terminando o colegial – levantei e derrubei ela em minha cama, me jogando em cima para prendê-la.
- , você tá me esmagando! – ela dizia rindo – Sai de cima!
- Promete que não vai me trocar por um amigo velho, intelectual e o pior de tudo, que já seja barbado! – pressionei mais meu corpo contra o dela, tentando ao máximo controlar meu peso para não esmagá-la. Eu era um ano mais novo, mas com a puberdade, havia ficado uns dois centímetros maiores que a garota e mais pesado também.
- Eu não vou te trocar, , eu prometo! Sai de cima, você vai me matar! – não sabia se gritava comigo ou se ria descontroladamente, já parecendo um porco.

Sai de cima dela e a garota se recuperando facilmente, pegou meu travesseiro e atingiu a lateral do meu corpo. Agindo rapidamente peguei um outro que sempre estava ali no meu quarto, para ela, e iniciamos uma guerra de travesseiros. Consegui tomar o travesseiro de sua mão e vi correr para a porta, rindo como uma criança. Larguei os dois travesseiros no chão e corri atrás dela, que já estava no último degrau da escada, indo em direção à sala e se escondendo atrás de minha mãe, que fazia uma cara de interrogação assim como tia Lisa.

- O que tá acontecendo aqui? – minha mãe perguntou, dividindo seu olhar entre o meu e o de .
- Mãe, a quer me trocar por um velho barbudo da faculdade! – falei sem desviar o olhar de , que soltou mais uma risada escandalosa e tentou passar por trás do sofá. Mexi-me agilmente e cheguei nela antes que conseguisse, a jogando no sofá e atacando a garota com cócegas.
- Ela não é louca de fazer isso, eu faço ela voltar pra casa na hora! – tia Lisa falou rindo muito, assim como minha mãe.
- Viu, ? – parei de fazê-la rir, pois percebi que ela já se encontrava totalmente sem fôlego e vermelha. Nos acalmamos, e ficamos ali sentados durante um tempo, conversando com nossas mães, que pareciam tão felizes quanto nós de ter aquele momento.

Quando as mais velhas saíram da sala em direção a porta para receber nossos pais para o jantar, me puxou antes que eu me levantasse também.

- Eu nunca te trocaria, , você é o melhor amigo que eu poderia ter – sorri para ela, que já sorria para mim também.

10 de julho de 2009

Estava sentado na cadeira enquanto esperava a cerimônia da minha formatura começar, olhei para trás procurando minha família. Encontrei minha mãe e meu pai um pouco afastados da multidão de pais obcecados, mas ainda assim no meu campo de visão, acenando para mim. Acenei de volta, me virando para frente novamente. Ouvi algumas meninas comentando que estavam nervosas, por que já imaginou se quando chamadas, elas tropeçassem no vestido? Eu não posso dizer que me importava com a cerimônia, mas com certeza estava nervoso. Nervoso com o que vai acontecer daqui pra frente.

- – ouvi meu nome ser chamado e me direcionei para a frente do auditório para receber meu diploma.

Cumprimentei o professor e quando me virei para olhar pra minha mãe, notei mais três pessoas com ela e meu pai, lá estavam tia Lisa, tio Henry e . O professor me chamou para a foto e eu simplesmente não tenho ideia de como saí, porque não conseguia tirar meus olhos dela. Dois meses sem ver minha melhor amiga, quase um ano desde que ela tinha se mudado e mais de sete meses que nós nem ao menos nos falávamos direito. Voltei para o meu lugar, e durante todo o final de cerimônia eu dividi meu olhar entre meus pés e olhar para trás para ver se ela realmente estava lá. E ela estava.
A cerimônia acabou e vi todos a minha volta se abraçando, se cumprimentando, como se nunca mais fossem se ver. Eu e meus amigos nos cumprimentamos também, mas sabíamos que não iriamos deixar de nos ver tão cedo, então sem drama. Ainda não sabíamos quem iria para faculdade, nem para onde, ou se até mesmo iria sair de Canterbury, mas não estávamos nos desesperando. Da minha parte, eles não sabiam. Eu estava nervoso, estava ansioso, não tinha ideia de nada. Sempre pensei que me ajudaria quando chegasse nesse ponto, mas aparentemente, nem isso mais eu tinha. E isso estava me consumindo.

- Parabéns! – ouvi várias vozes dizendo misturadas entre “filho, , ” quando me aproximei da minha família e fui recebido com um abraço em grupo.
- Obrigado, gente! Não fiz mais que minha obrigação – ri com o que havia dito, notando que todos estavam tão felizes que riram juntos. Não pude evitar olhar pra ela, que parecia mais animada que todos, como se nada tivesse diferente entre nós.
- , eu tô tão orgulhosa de você! Parabéns – ela se apoiou sobre meus ombros, levantando um pouco os pés, em um meio abraço.
- Obrigado, , fico feliz...
- , vem cá, vamos tirar uma foto! – senti meu braço ser puxado e Lily me levando com ela até um painel. – Sorria – sorri para a foto e logo voltamos pra perto da minha família, de onde ela tinha me puxado. Senti a menina me dar um abraço forte e passar as mãos no meu cabelo – Vou sentir sua falta, baby.
- Eu também, Lil, mas logo nos encontramos! – sorri pra ela, que acenou para meus pais e se distanciou.

Voltei meus olhos para , enquanto ouvia minha mãe falar de Lily para tia Lisa e tio Henry. Percebi que a garota me olhava torto, e logo desviou o olhar para frente continuando a andar ao lado da mãe em direção a saída.

- Vamos comer no Corner House? – minha mãe perguntou.
- Acho que o deveria escolher! – tio Henry respondeu.
- Por mim pode ser, mãe! – ficando um pouco mais pra trás, percebi que se aproximou.
- , tudo bem se eu não for? Eu acabei de chegar e vim direto pra cá. Eu tô super cansada, e tenho que arrumar várias coisas, trouxe tudo do apartamento que divido com o Travis pra não termos que pagar um mês de aluguel à toa.
- Você já está de férias? – fiquei meio chateado em saber que o cansaço não deixaria ela comemorar algo tão importante comigo. Mas não é como se eu não tivesse me acostumado nos últimos meses, afinal, agora tudo era motivo para não termos mais planos juntos.
- Sim! Finalmente! Amanhã nós podíamos tomar café da manhã no Solo? E depois podíamos ir até o parque e jogar alguma coisa! – ela disse toda sorridente e animada, mais uma vez como se nada tivesse acontecido.
- , eu estou trabalhando na Oxfam, há um mês. Eu trabalho amanhã, até às 16h. – sua feição mudou rapidamente para triste.
- E a noite? Posso ir até sua casa e a gente fica conversando até mais tarde, como sempre! – paramos para terminar de conversar enquanto nossos pais buscavam pelos carros. Tio Henry a deixaria em casa e seguiria para comemorar comigo e meus pais.
- Eu provavelmente vou chegar cansado, e tenho algumas coisas pra resolver – desviei meu olhar do seu, procurando por minha mãe, que me chamava.
- Vamos, filho, seu pai já achou o carro - estava pronto para ir até minha mãe quando senti a garota me puxar.
- , tá tudo bem? – ela me olhava, como se estivesse perdida em pensamentos.
- Sim, boa sorte com a organização, até mais – deixei ela ali, e acenei brevemente para tio Henry e tia Lisa, já que nos veríamos em seguida. Entrei no carro e vi se aproximar da mãe cabisbaixa. Vi tia Lisa a abraçar e então elas entrarem no carro também.
- A está tão madura, não está, Ed? – minha mãe falou para meu pai, e pude notar orgulho em sua voz.

Tive vontade de responder pra ela que concordava, mas fiquei com medo de soar ressentido. Afinal, eu disse isso pra ela da última vez em que nos encontramos. E o resultado não foi dos melhores pra mim.

24 de maio de 2008

- Ai, , minhas aulas estão incríveis! Essa semana eu tive uma aula sobre DNA que foi magnífica, minha professora é ótima! – percebi o brilho em seu olhar ao falar sobre a faculdade, percebi que ela se realizava sempre que lembrava que fazia algo que gostava tanto.
- Minhas aulas também estão super legais, a professora de literatura finalmente chegou em Shakespeare, nunca imaginei que seria o último que veríamos! Mas provavelmente vai ser o assunto até o fim do ano letivo. Descobri até mesmo algumas animações das obras dele para assistir – notei que ela encostava-se à parede onde sua cama estava apoiada sobre um travesseiro, e estava bocejando, quase como se quisesse rolar os olhos.
- Ai, , que coisa chata! Shakespeare chega a ser até infantil! Você tinha que ver quando entramos no laboratório! Foi maravilhoso! - ela se levantou novamente, mas antes que pudesse voltar a falar, a interrompi.
- Você está se achando super madura, não é? Como se tivesse evoluído muitos anos! Caso você não se lembre, você saiu de onde estou há menos de um ano, !
- A faculdade muda nossa mente, . Você vai ver quando acabar a escola, você tem que encarar as responsabilidades, a vida não tem animações. Você já devia ter começado a crescer – ela notou que tinha exagerado um pouco em sua fala, e colocou quase imperceptivelmente a mão sobre a boca – Não foi isso que eu quis dizer.
- Foi isso que você quis dizer sim, mas pode deixar, eu vou crescer. Eu vou fazer todas as escolhas certas, e ser tão maduro quanto você acha ser. Mas uma coisa posso te dizer, você não precisava falar dessa maneira comigo. Sei que as coisas mudam, e no nosso caso, não ocorreram da forma que eu esperava, da forma que você prometeu. Eu já estava conformado com isso nos últimos meses, uma parte de mim já sabia que ia acontecer, mas confiei em você. Mas não imaginava minha melhor amiga se mudando e deixando de ser quem era. Não imaginava que suas escolhas te levariam a achar que em menos de um ano, você mudou tanto que eu deveria mudar também para poder me encaixar na sua maturidade. Que aparentemente, só te deixou amarga, como você nunca foi – antes que ela pudesse responder, eu sai e caminhei até minha casa.

No outro dia, minha mãe fez um almoço em casa e ela veio com o tio Henry e a tia Lisa. Agimos como se nada tivesse acontecido, mas qualquer um poderia perceber que as coisas não estavam tão bem. Ela se desculpou antes de ir embora, resmunguei algo como “tudo bem” e ficou por aquilo mesmo. Foi o último dia que nos vimos antes de hoje. E apesar de estar muito feliz em ver que ela estava animada em relação a mim, era difícil não lembrar daquela conversa, não era algo que seria esquecido fácil. Pode até ser exagero de algum ponto, mas ouvir dela que eu deveria crescer não parecia certo. Ainda mais quando poucos meses antes, ela estava me pedindo desesperadamente para ir ao cinema com ela para assistir “Kung Fu Panda”, uma animação infantil.

13 de setembro de 2008

- Você é o melhor amigo do mundo, ! – ela me abraçou e deixou um beijo estalado em minha bochecha – Tenho certeza que esse filme vai ser incrível! – ela me tirou da fila dos ingressos, me puxando direto para o balcão de pipoca, já pedindo um balde grande para a atendente.
- Você é louca, , você viu a cara da moça quando me viu pedindo dois ingressos para ver Pets? Ou ela achou que éramos loucos, ou que queríamos aproveitar o canto de uma sessão infantil vazia para nos pegarmos loucamente – ela deu uma gargalhada, que chamou atenção de todos ao redor.
- Ah, eu não tenho culpa que gosto de cachorrinhos! – ela continuava rindo do que eu havia dito, e sem perceber que eu já havia pegado nossos refrigerantes, deu um soco em meu braço como brincadeira, fazendo com que os dois copos caíssem no chão e coca-cola se esparramasse pelo chão do cinema, pela minha roupa, pelo tênis dela e o que mais estivesse por perto.

Achei que ela se assustaria, reclamaria por seu tênis estar molhado, choraria, armaria um escândalo, mas não. começou a rir e a primeiro momento considerei que fosse louca, mas não pude deixar de ser levado junto e começar a gargalhar também. Nós chamamos atenção de todos que passavam por ali, e além do momento já ser constrangedor, quando olhei novamente para a menina, ela tirava seus tênis e pisava com a meia no único ponto seco atrás de toda a meleca e alegava aos gritos, para mim, que não iria andar com aqueles tênis encharcados.

11 de julho de 2009

Meu horário estava no fim, e o senhor Ennot já se preparava para fechar as portas enquanto eu fechava o caixa. Notei então, que antes que ele pudesse fechar a loja, uma garota passou pela porta.

- Oi, senhor Ennot!
- Boa tarde, , quanto tempo não te vejo por aqui! Me trocou pelas livrarias de Londres, não? – ele apertou a mão da menina de modo carinhoso, e vi-a sorrir gentilmente para ele – Está procurando por algo especifico, querida?
- Aquele moço ali! – ela apontou pra mim – fiquei sabendo que está perto do horário de saída dele e decidi vir até aqui pra acompanhar ele até em casa – ela sorriu.

Fiquei sem reação, não queria ser rude com ela e sabia que não adiantaria. Conhecia , sabia que ela continuaria insistindo para que ficássemos juntos. Estou também um pouco surpreso com tanta insistência, achei até mesmo que ela iria passar as férias em Londres e nem se lembraria daqui. A menina se aproximou do caixa e sentou em um banquinho que havia ali perto, me olhando, esperando que eu terminasse minha tarefa e pudesse ir embora. Não disse nada até o momento em que nos despedimos do senhor de cabelos brancos e bigode mal feito e saímos da livraria.

- Você não precisava vir até aqui.
- Mas eu quis, , eu senti sua falta, não vou aceitar que você não queira conversar comigo; Poxa, nós somos melhores amigos! – ela parou e eu me virei de frente para ela.
- Somos? Porque há meses você nem ao menos se importa comigo. O jeito que você me tratou, não é a forma como melhores amigos se tratariam. , nem no meu aniversário você se importou em ligar.
- Eu liguei, !
- No outro dia. Sei que sua vida mudou, e que infelizmente as coisas acontecem e a gente tem que crescer, mas crescer não significa deixar quem sempre esteve com você pra trás.
- Me desculpa, – ela pegou minha mão – eu prometo que as coisas vão voltar a ser como antes.
Não posso negar que senti falta dela durante todo esse tempo, mas também não posso negar o quanto sei que ainda estou magoado. A ocorrência do meu aniversário não sairia tão cedo da minha mente, se ela ao menos tivesse um bom motivo pra não ter ligado.

Não dava pra acreditar que eu tinha ido dormir, depois de quase 10 anos, sem um parabéns dela. Sem ela nem ao menos se importar com esse dia que há anos comemorávamos juntos. Sei que ela pode estar ocupada, sei que ela pode ter ficado presa com alguma coisa, estudando, não sei, mas não vejo motivos pra nem ao menos mandar uma mensagem se explicando.
Entrei no banho para ver se conseguia acordar para ir até uma aula extra que teria hoje na escola. Durante o banho ouvi meu telefone tocar, se eu saísse correndo até o quarto para pegar, minha mãe me mataria, e afinal, quem liga as 7h30 da manhã para alguém?
Sai do banho e quando cheguei até o quarto para me vestir, vi meu telefone acender e me mostrar 12 mensagens de um número desconhecido. Mensagens divididas entre “”, “Me atende”, “To tentando falar com você”, “Ei”. Assim que terminei de ver as mensagens, o telefone chamou novamente.

- Alô?
- ? FINALMENTE!
- ? Eu estava no banho.
- Essas horas? Bom, não importa! Eu liguei pra te dar parabéns! – ouvi algumas risadas ao fundo da conversa.
- Meu aniversário foi ontem.
- Eu sei, , mas eu não tive como te ligar porque – ouvi ela abafar o som e mandar alguém ficar quieta, e então ouvi mais risadas femininas quando ela tirou a mão do microfone – desculpa, então! Eu passei o dia todo organizando uma festa, e ai o tempo passou, passou, passou e eu não consegui ligar! Parabéns, !
- Obrigado... Tá tudo...
- Tenho que desligar! Depois a gente se fala! Beijo.

E então sem nem ao menos me dar a chance de falar algo, ela desligou o telefone e me deixou sentado na cama pensando em como estavam as coisas por lá. Pareciam estar muito bem, mas gostaria de poder conversar.

- Vamos a algum lugar comer? Tô com fome!
- Você sempre tá com fome, ! – ela riu comigo da minha observação enquanto andávamos até uma rua próxima dali.
- A gente pode ir ao McDonald’s? – seus olhos brilharam ao pedir por aquilo e me ver acenar em concordância – Meu carro tá aqui – ela me puxou para um modelo simples, preto, que estava estacionado.

Entrei no banco do carona e coloquei o cinto enquanto assistia ela fazer o mesmo. Fiquei observando tudo que ela fazia, sempre com um sorriso no rosto. Ela parecia alegre, feliz como não via desde que ela se fora.
- E então, tá gostando de trabalhar aqui? – ela olhava de relance para mim entre olhar o retrovisor e em frente.
- Tô sim, tá me ajudando a me encontrar com o que quero – falei olhando para fora.
- Como assim? – ela olhou para mim, deixando claro em sua voz a interrogação.
- Quero fazer literatura. Ainda não tenho certeza de onde, ou o que eu posso fazer com isso, mas sei que é o que quero. Me inscrevi pra várias faculdades, agora vou aproveitar minha férias enquanto não tenho respostas. Algumas já até mesmo chegaram, mas só vou abrir quando tiver todas.

Depois que falei isso, ficamos em silêncio até chegar ao McDonald’s, onde ela estacionou e logo descemos do carro. Andamos lado a lado e pude perceber que o sorriso que eu tanto admirava ainda se encontrava ali. Notei que seu andar parecia mais leve que em todas as vezes que nos encontramos nesse último ano. Seu cabelo havia crescido durante esse tempo também, e aparentemente ela havia retocado apenas a raiz, já que parecia mais escura que as pontas. Isso me lembrou de quando ela teve que pintar seu cabelo todo de preto, pra se livrar do colorido roxo que tinha adquirido nas pontas num momento de loucura no fim do período letivo alguns anos atrás.

14 de maio de 2005


- , ficou lindo! – ouvi minha amiga falar de dentro do banheiro, no qual havia acabado de lavar e secar o cabelo recém pintado no salão.

Os cabelos de eram naturalmente de um tom de castanho, e ela decidiu que tinha enjoado deles. Então optou por se livrar do tom todo marrom, e se deixou levar pela moda e colorir suas pontas. Ela escolheu o roxo, pois disse que foi sempre uma cor que parecia combinar com ela em todos os modos possíveis.
Tia Lisa ficou louca da vida quando contou a ela que queria fazer isso, mas ela me disse depois que só tinha deixado para que pudesse ver a filha se arrepender e nós dois podermos rir juntos. Mas acho que a tia Lisa não esperava, assim como eu, que fosse ficar tão bonito. Afinal, não tinha outro pensamento possível na minha mente que não esse quando a vi abrir a porta.

- E ai? – ela olhava pra mim através do espelho que estava em sua frente, com uma grande expectativa no olhar.

Seus cabelos estavam até a altura do seu busto nos naturais castanhos, e depois seguiam até seu umbigo no tom violeta. Ela sempre gostou dos cabelos longos, mas nunca os tinha visto tão bonitos e com uma aparência tão viva, de modo que até mesmo seus olhos pareciam mudar.

- ? Ficou ruim? – ela parecia impaciente, esperando por uma resposta enquanto passava o pente pelos fios que já pareciam estar desgrenhados de tão penteados.
- Tá ótimo, – apesar de ter muito mais a falar, não acho que seria certo mostrar que reparo de uma forma incomum em tudo relacionado a ela.

sempre havia sido meu modelo. Talvez não seja o melhor modelo do mundo, já que tinha também seus defeitos. Mas como me mudei pra Canterbury aos nove anos e a garota tinha se tornado minha única amiga antes de entrar para a escola, aprendemos a fazer tudo junto. Todos diziam que éramos como carne e unha, que nós podíamos alcançar o mundo, desde que juntos.
Apesar de ter 15 anos, ela parecia tão mais velha. Eu me sentia como sua sombra, e eu era tratado assim também. Meus amigos me admiravam por ter amizade com uma menina mais velha, mesmo que ela não fosse a garota popular da escola. Me admiravam porque achavam que nós tínhamos algum tipo de envolvimento, mesmo sendo novos. Sempre tive muitos amigos feito idiotas de filmes americanos, e não me orgulhava disso. E nesse momento só imaginava como seria a reação deles por ser amigo de uma menina um ano mais velha que nós, com tanta personalidade. Afinal, dizem que apenas pessoas de grande personalidade são corajosas o suficiente para colorir os cabelos. E isso era algo que não faltava nela.

- , achei um lugar! Eu vou sentar pra guardar o lugar! – ela saiu correndo, quase passando por cima das senhoras que haviam acabado de sair da mesa e nos olhavam feio.
- 1 ou 2? – perguntei a ela, que me respondeu usando os dedos, indicando o número dois.

Andei até o balcão e depois de muita fila fiz nossos pedidos. sempre comia a mesma coisa, ela tinha dois pedidos completos entre os quais revezava. E sempre que ela escolhia um deles, eu necessariamente tinha que ficar com o outro, já que ela poderia mudar de ideia e querer comer metade de cada. Isso quando eu não ficava sem a minha metade de qualquer forma.
Esperei pelo pedido, que demorou mais que o esperado, já que não gostava dos molhos, pois todos tinham maionese, então seu lanche era montado na hora, especial. Isso fazia com que sempre esperássemos mais que qualquer um por dois lanches. Levei nossa bandeja até a mesa e vi-a abrir um sorriso gigante, que não soube se era pra mim ou para a comida que tinha acabado de colocar na sua frente.

- Um dia vou ver esse sorriso ser dado pra alguém, ou ele é exclusivo para comida, em especial do McDonald’s? – me sentei na cadeira ao seu lado, mesmo que o costume de todos sempre fosse duas pessoas sentarem frente a frente, preferíamos lado a lado. O motivo? Se precisássemos brigar, discutir, ou fazer uma guerra de ketchup, faria menos bagunça. Claro que tínhamos pensado naquilo com onze anos, mas apesar da vida mudar muito, algumas coisas permanecem as mesmas.
- Esse é só pra comida, e pra você – ela me cutucou com o cotovelo e sorriu novamente.

Coloquei uma batata na boca com a finalidade de esconder o gigante sorriso que queria se abrir em meu rosto. Mas por um segundo notei que ela havia percebido. Talvez ela nem tivesse ideia do quanto aquelas palavras poderiam significar.

- Conseguiu arrumar tudo ontem? – perguntei, tentando puxar assunto enquanto dividíamos um sachê de ketchup que já estava chegando ao fim.
- Consegui, achei que seria difícil colocar tudo no meu quarto, mas minha mãe já tinha passado minhas coisas pra aquele quarto de fora e arrumado ele pra mim.
- É, ela disse pra minha mãe que faria isso. Agora você vai ter a liberdade que sempre quis – ri me lembrando do quanto ela queria mudar para o cômodo que era acoplado à parte principal da casa.

- Queria que a mamãe me deixasse morar ali! – a menina apontava para o cômodo por onde passávamos para chegar aos fundos da casa dela. Um quarto de tamanho grande, que poderia ser alugado como uma casa de tão completo que era.
- , você tem treze anos, fala sério, né! Sua mãe não vai te deixar morar ali, e eu tenho certeza que você não conseguiria dormir sozinha.
- Você poderia dormir comigo! Ai, eu não teria medo, sei que você não deixaria que nada acontecesse comigo.
- Minha mãe também não deixaria – sentamos no balanço que ainda tinha no quintal de sua casa.
- É, a tia Lauren me ama, acho que ela teria dó de mim. Ela com certeza não gostaria que eu aguentasse suas meias com chulé.
- Ei, minhas meias não têm chulé!

Olhei para e ela notou que estava dando um tempo de vantagem pra ela, já que assim que ela se levantou do balanço comecei a persegui-la pelo jardim.


- Não sei por que eu queria tanta liberdade – ela riu – passei um ano morando sozinha e foram poucas vezes que tive que utilizar toda essa liberdade que tinha. Fico feliz de voltar pra casa e poder ser só uma filha novamente. Senti que eles quiseram me colocar pra fora da casa, confesso que fiquei um pouco chateada com a surpresa – ela disse em um tom de brincadeira, mas de modo que se podia perceber a leveza de verdade que a frase continha.
- Talvez eles só quisessem que você sentisse como se pudesse fazer tudo sem eles, já que agora você está crescida – tomei cuidado com a escolha das palavras, pois não queria soar ressentido com qualquer tipo de discussão que nos tinha ocorrido.
- É, talvez – ela puxou seu refrigerante pelo canudinho enquanto perdia seu olhar na janela, encarando o lado de fora do estabelecimento – e você? Já tem alguma liberdade? Avisou sua mãe que estávamos aqui? – ela olhou novamente para mim.
- Duvido que seja necessário, se eu chegar daqui três semanas avisando que estava com você, ela perguntaria apenas se eu não gostaria de ficar mais tempo fora – rimos do meu comentário, sabendo o quanto era verdade – minha liberdade tem horário de retorno pra casa dependendo do local pra onde estou indo. Mas tirando isso, demorei, mas agora já estou autorizado a dirigir, então a liberdade aumentou. Mesmo que pra isso eu tenha que pegar o carro do velho – senti o telefone vibrar no meu bolso e o peguei – falando em pais – atendi o telefone, logo ouvindo minha mãe perguntando onde estava e relaxando ao ouvir a voz de me perguntando se poderia comer o último nugget que eu tinha deixado.
- , minha mãe disse que está com saudade e quer fazer os biscoitos que você tanto ama, você quer recusar? – tampei o microfone com o dedo e antes que pudesse dizer algo em resposta, ela tomou o telefone da minha mão, falando que logo estaria lá, só precisava pegar algumas coisas em casa e avisar tia Lisa.
Minha mãe ligou no 220, já que ela comeu mais rápido do que nunca para que pudéssemos ir embora logo.
- Vai, , eu quero meus biscoitos! – ela me dava cotoveladas e tentava me acelerar para que comesse meu lanche de uma vez.
- Os biscoitos não vão fugir, , pelo amor de Deus!
- Mas você sabe que gosto deles quentinhos! – ela juntou as mãos como uma forma de implorar pela minha rapidez.
- Você acabou de comer, como já pode estar pensando em comer de novo? – perguntei, inconformado. Mesmo que soubesse que ela não estava brincando, realmente queria chegar a tempo de pegá-los recém-saídos do forno.
- Pensando, vamos! – ela me deu mais uma cotovelada, que me fez perder a paciência. Coloquei meu lanche de volta na caixa e levantei, indicando o caminho para que ela passasse na frente, eu comeria no caminho. Ela beijou minha bochecha como forma singela, e talvez irônica, de agradecimento.

Comi meu lanche enquanto dirigia até a casa dela. Ela passou o caminho todo cantando como uma louca com as janelas abertas, me fazendo pensar o que as pessoas do lado de fora imaginavam que ela tinha na cabeça, e se ela estava bem o suficiente para estar ali, dirigindo.
Quando chegamos em sua casa, ela estacionou de qualquer forma no portão e descendo do carro sem nem ao menos me esperar.

- , minha mãe tá lá dentro, vai indo lá que eu já te encontro - ela disse quando a alcancei e depois correu para dentro de seu novo quarto.

Sentindo-me em casa, como sempre, abri a porta e encontrei tia Lisa no sofá, assistindo um programa qualquer que passava ali. Pude também ouvir que tio Henry provavelmente estava mexendo com algum tipo de máquina de cortar madeira no porão, já que o barulho era perceptível.

- , querido! A disse que ia te encontrar no trabalho - ela levantou e veio ao meu encontro, depositando um beijo em minha bochecha.
- Ela foi sim, tia, nós comemos um lanche e então minha mãe ligou dizendo que faria os biscoitos que a ama. Ela está pegando alguma coisa no quarto para irmos pra lá. Você e o tio não querem ir também?
- Vamos ficar por aqui hoje, mas obrigada pelo convite!

Vi entrar pela porta da cozinha, que ficava mais próxima de seu quarto do que a entrada principal. Ela carregava uma mochila nas costas e havia trocado de roupa. Estava também com o carregador do seu celular em mãos, e um bichinho que ela era apegada há anos, preso entre seu braço e seu corpo. “Xiu” era seu mascote desde antes de a conhecer, e ela carregava ele para todos os lados sempre. Era um pequeno tigre muito amado pela dona.

- Vamos, ? - eu a conhecia, sabia que ela começaria a me acelerar de novo - Mãe, acho que vou ficar lá na tia Lauren hoje, tá?
- Você não tá muito grandinha pra ficar dormindo na casa dos amiguinhos, ? - tia Lisa respondeu, encarando a filha com um sorriso no rosto.
- Mãe, eles são minha família, não é dormir na casa de um amiguinho! Deixa a tia ouvir você falando isso dela! - ela se aproximou da mãe e deixou nela um beijo no rosto. Aproximou-se da porta que levava ao porão e gritou tchau para o pai, que sem entender nada, gritou de volta - Agora vamos!

foi me puxando pela mão, quase sem me dar tempo de dar um abraço de despedida em tia Lisa, que se divertia com a cena.

- Cuida dela, ! - a ouvi falar para mim enquanto saia.
- Pode deixar, tia!

Percebi que já havia guardado o carro na garagem no tempo em que eu estava dentro da casa, já que iríamos andando até a minha. Morávamos no mesmo quarteirão, talvez algo que sempre tenha colaborado em nossa amizade.

- , toma - ela me entregou sua mochila, ficando apenas com o Xiu em sua mão - seja cavalheiro! - ela ria – Sabe que tem uma coisa que a gente não faz há muito tempo? – a garota me encarou desafiadoramente, e eu sabia o que ela faria em seguida.
Quando pude perceber, já estava correndo feito louca pela rua. E eu correndo atrás dela, claro. Nós sempre gostamos muito de apostar corrida quando crianças, e talvez ela estivesse tão bem que se sentia criança de novo. Estava gostando daquilo, mas não posso negar que o medo de tudo voltar a ser como no último ano me assombrava. Não queria que as coisas fossem novamente daquela forma, não queria mais vezes dela indo embora sem nem ao menos se despedir.

- Mãe, acho que vou ir com a até a estação – entrei na cozinha, já preparado para ver minha mãe se oferecer pra nos acompanhar e se despedir da menina.
- , a já foi – ela me olhou, estranhando que eu não soubesse daquilo – ela pegou o trem que partia às três horas.
- Mas ela me disse que pegaria o das quatro! – corri até meu celular e lá encontrei uma mensagem de , se desculpando por ir embora sem me deixar acompanhá-la.

Liguei pra ela na mesma hora, mas ela não me atendeu. Era a segunda semana dela em Londres, o primeiro fim de semana voltando pra casa. Passamos esse fim de semana inteiro juntos, ela me contou todas as novidades de lá, como eram suas aulas, como era estranho ficar longe de todos nós.
Minha mãe percebeu o quanto fiquei chateado, pois passei duas horas sentado no sofá olhando para o teto. Só sai quando me ligou, e em meio a lágrimas me disse que não queria ter que se despedir de mim, porque toda semana seria a mesma coisa, e ela nunca se acostumaria a isso.

Consegui ultrapassar na esquina de casa, e ao chegar, paramos em frente a porta e ficamos com as mãos nos joelhos, cansados como nunca.
- Acho que não temos mais idade pra isso – dei um tapa em sua cabeça.
- Você que tá sedentário, , eu estou ótima! – ela disse com a língua pra fora, quase como um cachorro.
, ? Entrem logo! Acabei de tirar os biscoitos do forno!”

Ao ouvir minha mãe, a garota deixou até mesmo “Xiu” comigo e saiu correndo para dentro da casa. Ri sozinho de sua infantilidade e carreguei Xiu e a mochila para dentro comigo, vendo quase se pendurando em minha mãe em agradecimento.
Deixei as coisas no sofá e me juntei as duas na cozinha, me servindo de um biscoito também. As duas conversavam animadamente sobre muitas coisas, de modo que eu nem ao menos conseguia acompanhar. Fiquei calado, olhando de uma para a outra como se estivesse prestando atenção.
Depois de alguns minutos, minha mãe se levantou e foi em direção a sala, deixando eu e com os últimos biscoitos.

- O que o “Xiu” está fazendo aqui? – ela pegou o bichinho no sofá, onde eu tinha deixado as coisas de .
- Aparentemente alguém está querendo me jogar no colchãozinho, mãe – olhei para , que parecia com vergonha agora.
- Tem problema se eu ficar aqui, tia? Estou com saudades dos roncos do ! – as duas riram.
- Ei! Eu não ronco! – tentei me defender, sendo ignorado.
- Claro que não tem problema, querida! Saudades de ter você sempre por aqui, só ter o para conversar é deprimente – as duas trocaram um olhar cúmplice e sorriram. então se levantou e me abraçou, jogando os braços em minha cintura.

Passamos o resto da noite assistindo tevê, conversando, e até mesmo jogamos Banco Imobiliário, como costumávamos sempre fazer. Na hora de jogar, meu pai se juntou a nós e pediu uma pizza para comemorarmos estar em casa.
Depois de comer, minha mãe e meu pai foram deitar se despedindo de nós e eu e fomos para o quarto, arrumar as coisas. Nunca dormíamos cedo quando juntos, mas gostávamos de ter tudo pronto para dormir assim que o sono nos pegasse.
chegou no quarto e automaticamente jogou suas coisas em cima de minha cama. Tentamos decidir o filme que assistiríamos enquanto ela me ajudava a arrumar o colchão que eu dormiria no chão, mas não tivemos sucesso, claro. No final, sabia que ela me faria assistir Melhor Amigo da Noiva mais uma vez.
Enquanto ela tomava banho, fiquei deitado mexendo em meu celular, olhando minhas redes sociais. Assim que ela saiu, trocamos de lugar. Tomei meu banho e rapidamente já estava deitado com sentada no meio de minhas pernas, encostada em meu peito.

- , a gente podia assistir Melhor Amigo da Noiva, né? – ela virou de frente para mim, implorando com os olhos.
- Eu tinha certeza que isso ia acontecer – ri e liguei a tv, já colocando o filme.
- Obrigada! – ela me deu um meio abraço, já se ajeitando novamente para ver o filme.

Lembro da primeira vez que tínhamos assistido aquele filme, ela tinha treze anos e eu doze. Ela tinha começado a se apaixonar por artistas pop e comédias românticas, e me levava junto por esse caminho.

Estava andando com até a casa dela, já que minha mãe tinha ido até Londres resolver algumas coisas com o meu pai, e tinha pedido para que eu ficasse na casa da tia Lisa.

- , a Sarah disse que assistiu um filme muito legal! A gente podia assistir, né? Ela disse que é de romance, mas não são aqueles bobos e chatos.
- Ah, , a gente não pode assistir alguma outra coisa?
- Por favor – ela pediu colocando súplica em sua voz, o que me fez rir.
- Tudo bem. Mas se eu não gostar, a gente pode tirar?
- Mas e se eu estiver gostando?

Revirei os olhos e encerramos o assunto. Sabia que mesmo que eu não gostasse teria de assistir, era sempre assim.
Depois de almoçar, nos sentamos para assistir o filme, “O Melhor Amigo da Noiva”, o nome já parecia chato o suficiente. Mas o filme se mostrou o contrário, e nos divertimos muito assistindo. E a partir daquele momento, conhecendo minha amiga como conhecia, sabia que ela me faria assistir aquele filme mais um milhão de vezes.

Um pouco antes do filme acabar, notei que havia adormecido. Não a acordaria, então tentei deitá-la de modo certo na cama e sair dali sem despertá-la. Encostei sua cabeça no travesseiro e fui tirando minha perna de debaixo do seu corpo aos poucos. Quando finalmente consegui e me preparava para cobri-la, vi que a menina abriu os olhos, e meio perdida, puxou minha mão.
- ? Dorme aqui comigo? – ela se mexeu um pouco, até alcançar o canto da cama.
- , não. Vai ficar apertado, você não vai dormir direito – me sentei na ponta da cama, no espaço que ela tinha deixado.
- Por favor, eu não quero dormir sozinha – ela apertou minha mão, que ainda estava ligada a sua.
- Eu fico aqui, sentadinho, até você dormir! – tentei convencê-la.
- Pelo menos deita – ela me puxou, me fazendo sorrir com a forma doce que pedia por companhia.

Ajeitei-me ao seu lado, e ela então grudou seu corpo no meu, se aninhando em meu peito e abraçando minha cintura. Comecei a fazer carinho em suas costas, e esperando que ela adormecesse para que pudesse sair e deitar em meu colchão.

- Eu senti tanto a sua falta, bear, eu amo você – ela disse sonolenta, antes de pegar no sono. Estava quase dormindo também, mas pude ouvir o que ela disse, e há muito ela não me chamava por aquele apelido.

Fiquei sorrindo por tanto tempo que nem me lembrei de respondê-la. Mergulhei em pensamentos, como o quanto também havia sentido sua falta, o quanto amava aquela garota e o modo como nossos corpos pareciam pedir por contato quando estávamos tão próximos quanto ali. Era estranho como mesmo depois de tantos anos, ainda podíamos dormir daquela forma, sem nem ao menos nos importar com o espaço que faltava na cama. Enquanto tentava desvendar tudo que sentia estando ali com ela, daquela forma, adormeci. Com uma única certeza, eu queria estar ali quando ela acordasse. E talvez, só talvez, minha cabeça não se referia apenas ao dia seguinte.

08 de agosto de 2009

- , eu tô cansado, eu quero ir pra casa – agarrei sua mão, já a puxando para saída do parque que estávamos.
- Por favor, ! Só mais um pouquinho!

Estávamos em um daqueles parquinhos infantis, que estava vazio naquele fim de tarde. Ficamos durante um bom tempo ali, brincamos com crianças e até mesmo voltamos a ser crianças. Mas parecia não querer deixar aquilo tão cedo, e estava há pelo menos dez minutos querendo ficar mais um “pouquinho”.
Nesse mês que passamos juntos, não nos desgrudamos. esperava que eu saísse do trabalho e então ia me buscar para fazermos algo, nem que fosse ficar em silêncio. A noite em que dormimos juntos, se repetiu por várias vezes, sendo na minha casa ou na dela. Tudo aquilo só me fez notar o quanto não podia perdê-la quando o ano letivo se iniciasse, por isso estava colocando todas as minhas expectativas na carta da Universidade de Londres que chegaria, me dizendo se estava aceito naquele curso e iria para a capital com minha melhor amiga ou se ficaria ali com a escolha entre as outras faculdades nas quais já havia sido aceito.
Peguei a mochila de que estava ali e a deixei sozinha, enquanto ela subia pelas escadas do escorregador. Virei minhas costas e comecei a andar em passos rápidos pra que ela entendesse que eu não estava brincando. Claro que se ela pedisse mais uma vez, eu ficaria, mas era muito bom ver a indignação em seu rosto quando achava que eu não faria algo que ela quisesse.
Quando já estava a uns 200 metros de onde a tinha deixado, senti um peso em minhas costas, me levando para o chão.

- Você tá bem? – me virei pra ela, que ria sem parar, passando a mão em minha bochecha, de onde notei que saia sangue.
- Ai, ! Eu não acredito que te machuquei! Me desculpa – ela passava a mão desesperada por meu rosto – Eu só queria te assustar, mas você é um banana! Não acredito que você caiu! – ela passou de arrependida para brava em questão de segundos, o que me fez rir por saber o quanto amava aquilo.
- Tá tudo bem, é só um arranhão.
- Não tá tudo bem! – ela sentou em minha frente, de modo que pudesse se escorar em meu colo, e começou a dar beijos carinhosamente no lugar que estava machucado e em volta também.

Ela ficou durante alguns segundos distribuindo beijos pelo meu rosto. Notei que ela se afastou e sussurrou algo, mas foi incompreensível. Antes de poder perguntar o que ela havia dito, ela se aproximou novamente, aos poucos, e quando estava a poucos centímetros do meu rosto, olhou nos meus olhos.
Nós costumávamos ter uma brincadeira quando crianças, nós nos encarávamos e quem fosse o primeiro a rir, perdia. Não sei porque lembrei daquilo no momento, mas acredito que foi porque notei algo que nunca tinha visto naqueles olhos, um brilho com uma diferente intenção. Esperei que ela começasse a rir, e só quando ela me beijou, notei que aquilo não seria como quando crianças. Que na verdade, nós não éramos mais crianças.
Nossas bocas se encostaram primeiramente com um simples selinho. Meu corpo se eletrizou, e uma decepção enorme passou por mim quando vi que ela se afastava. olhou novamente em meus olhos e mordeu seu lábio, um sinal claro de incerteza, acredito que esperava algum tipo de reação de mim, então tive a única que poderia ter. Eu sorri, e ela tomou aquilo como um sim, então juntamos nossas bocas novamente.
A princípio, quando nossas bocas se chocaram, parecia que nunca tínhamos beijado na vida. Minha ansiedade tomou controle, e pedi para que ela desse espaço para aprofundar o beijo. O primeiro toque entre nossas línguas foi quente e calmo, mas logo se tornou algo desesperado. Coloquei uma mão em sua nuca e a outra em sua cintura, a puxando para mais próximo de mim. Ela subiu uma mão para meu cabelo, acariciando de forma agressiva os fios, ditando a intensidade do beijo.
tentou se afastar de mim, mas a puxei novamente para perto. Ela me deu um selinho, e apontou para o lado, no qual um cachorro parecia curioso cheirando sua mochila, o que me fez notar que ainda estávamos no meio da rua. Puxei a mochila, fiz um carinho no pequeno animal que estava ali e vi seu dono vindo logo atrás. Olhei para , que sorriu para mim.
Me levantei e estendi a mão para que ela levantasse também. Coloquei a mochila dela em minhas costas e então começamos a andar em direção a minha casa, onde ficaríamos hoje. Ainda estava meio atordoado com o beijo, quase como se não acreditasse no que tinha acontecido. Eu só sabia que era real, porque ainda conseguia sentir a sensação de calor em minha pele, e todos aqueles hormônios que passavam pelo meu corpo.
Mesmo fazendo todo o caminho em silêncio, fingindo estar distraído, notei que não tirava o sorriso do rosto, era um sorriso tímido, que trazia conforto para minhas emoções. Era um sorriso que trazia consigo um olhar confuso, mas ela parecia estar andando nas nuvens. Senti que ela não estava tão diferente assim de mim, senti paz, e notei que ao seu lado era o único lugar que eu sempre me sentiria assim, como sempre foi.
Assim que entrei em casa fui recepcionado pela voz calorosa da minha mãe, dizendo que finalmente a carta da Universidade de Londres havia chegado, junto com a da Universidade de Dublin. Quando ouviu isso, vi o sorriso que ela mantinha no rosto se expandir, mas se desmanchar assim que não viu a mesma reação de mim.

- Você se inscreveu pra UdL? Não acredito! Abre, abre, abre! Já imaginou, ? A gente poderia ficar junto o tempo todo! A gente podia dividir o apartamento! – ela parecia muito animada com a ideia, o que me deixou ainda mais cético quanto a situação. Eu não queria criar esperanças, sabia que poderia não ser aceito e ela se decepcionaria. Não sei se queria aquilo menos pra mim, ou se tinha mais medo por ela.

Minha mãe observava a cena tentando entender o que estava acontecendo. Eu segurava as duas cartas em minhas mãos, e enquanto estava totalmente eufórica em minha frente, eu estava parado em silêncio, sem ter reação alguma. Minha mãe veio até mim, e me abraçou, dizendo em meu ouvido que tudo ficaria certo e saindo então do cômodo.

- Tá tudo bem, ? – se aproximou, pegando minha mão livre – Eu estou aqui.
- Eu não vou abrir agora aqui. Eu não quero ter motivos pra ficar triste nesse momento – coloquei uma mecha comprida de seu cabelo atrás de sua orelha e acariciei sua bochecha.
Ela então me abraçou, e disse que entendia. Deixei as cartas na mesa de centro, e tomei suas mãos entre as minhas. Ficamos ali durante um incontável tempo. Ali tudo parecia certo, e o amor que sentíamos um pelo outro ficava claro. Era fácil perceber o quanto eu a amava, e só ela podia me acalmar daquela forma, mesmo sendo o motivo da minha turbulência. Era fácil perceber o quanto ela me amava, e que eu era o único capaz de fazê-la sentir tudo que eu tinha certeza que podia ser visto em seu olhar.

Depois de jantar, subimos para o meu quarto. Tudo estava quieto, mesmo que tentássemos dispersar sobre o assunto da faculdade. tentava se mostrar animada, e eu sabia o quanto ela estava ansiosa para que eu abrisse aquele envelope e nós pudéssemos decidir o que fazer. Queria conversar com ela sobre o que aconteceu, mas achei que seria melhor não, talvez depois de abrir o envelope às coisas se acertassem ou desmoronassem de vez.
Ficamos escutando música, deitados na cama. Alguns minutos depois, ela levantou e disse que iria tomar banho. Fiquei deitado, em silêncio, não me mexi nem mesmo para mudar de música, já que tocava uma que não era do meu estilo preferido. Inquieto, me levantei e fui até a sala, tudo estava escuro, mas parecia que as cartas brilhavam na mesa onde eu as tinha deixado mais cedo. Peguei-as e fiz o caminho de volta para o meu quarto.
Eu tinha que fazer isso, não podia deixar como ela estava. Não podia dar esperança do que teríamos ou não. Não sabia se ela esperava que tivéssemos algo, eu esperava. Não podia fazer aquilo com nós dois e prolongar uma chance de felicidade, ou sofrimento. Peguei primeiro a carta da Universidade de Dublin, rasguei a ponta com as mãos, e abri, logo recebendo a surpresa que tinha passado, que estava aceito naquela Universidade. Fiquei orgulhoso de mim, mas nesse momento sabia que aquilo não era o que eu mais queria. Era algo maravilhoso, mas não era o que meu coração mais ansiava.
Ouvi desligar o chuveiro e por um segundo, com a outra carta na mão, pensei em esperar por ela. Mas preferia ter que dar a notícia do que ver seu desapontamento ao ler se o resultado fosse negativo. Rasguei o envelope, e delicadamente, como em um filme, abri o papel. E desejei que nunca o tivesse feito. abriu a porta, já vestida com seu pijama infantil, e viu o papel em minhas mãos. Ela saiu animada, e o tomou de mim, com um sorriso no rosto. Sorriso esse que não durou dez segundos, afinal, eu não estava aceito. Minha vida estava decidida ali, eu não iria para Londres, eu iria para Dublin, que ficava a 680 quilômetros de Canterbury, e 600 quilômetros de Londres. 600 quilômetros dela.

16 de setembro de 2017

Ouvi meu telefone tocar na cozinha e sai correndo para chegar a tempo de atendê-lo.
- Oi, filho! Conseguiu arrumar tudo? – a voz de minha mãe soou do outro lado.
- Oi, mãe! Consegui sim, acabei de tirar as coisas da última caixa, está tudo organizado! Espero que logo você venha aqui pra ver! – falei já deixando transparecer o quanto queria que ela estivesse ali.
- Assim que eu e seu pai conseguirmos, vamos ai te visitar! Boa sorte, meu amor! Boa sorte com o emprego, com os novos amigos, com a nova rotina, com a vizinhança... Qualquer coisa, me liga! Eu amo você.
- Obrigado, mãe, eu também amo você.

Ela desligou o celular me deixando sozinho em meu novo apartamento. Havia acabado de amassar a última caixa da mudança quando ouvi o telefone tocar. Sabia que ela ligaria, preocupada como sempre era. Eu não era mais uma criança, já havia morado sozinho, mas minha mãe ainda assim se preocupava. E mesmo já tendo morado sozinho, ainda sentia falta de estar com meus pais. Algumas coisas nunca mudariam.
Meu apartamento não era pequeno, e o encontrei por um valor relativamente baixo. Apesar de saber que daria conta tranquilamente, minha mãe tinha dado a ideia de que anunciasse o quarto que ficaria vago e encontrasse alguém para o dividir comigo, apenas para não ficar só. Estava pensando na ideia, mas não era uma decisão que precisava ser tomada agora.
Tomei um banho e coloquei uma roupa qualquer, apenas para ir almoçar e na volta comprar as coisas de mercado que precisava para realmente começar a fazer dali meu lar. Precisava de produtos de limpeza e higiene, e claro, comida. Só começaria a trabalhar amanhã, então hoje além de preparar as coisas para a aula, estava livre.
Caminhei pelo meu novo bairro, em Londres, andando em direção a um pequeno restaurante, o único que eu conhecia. Não estava habituado ao local, recebi a proposta para dar aula em uma universidade e decidi encarar. Literatura era o que eu amava, e apesar de gostar de trabalhar em uma biblioteca grande como era antes de me mudar, na sala de aula poderia passar meu conhecimento para frente, e isso me deixava feliz.
Comi sozinho, mexendo em minhas redes sociais pelo celular, acompanhando a vida de alguns amigos de faculdade e família. Perguntei ao garçom se ele poderia me indicar um bom mercado próximo dali para que eu fizesse minhas compras, e ele disse que na mesma rua tinha um, que era o central dali, de onde conseguiam até mesmo fornecimento para o restaurante.
Andei até o mercado, peguei um carrinho e fui diretamente para a seção de higiene. Peguei papel higiênico, pasta de dente, sabonetes, produtos de limpeza e tudo mais que fosse necessário. Andei até a seção de congelados e enchi o carrinho, afinal, comida congelada é uma das coisas que mais amo no mundo, apesar de também amar cozinhar. Comprei coisas básicas para quando quisesse cozinhar, claro, e em seguida fui para o corredor de besteiras, doces e gorduras. Antes que pudesse entrar nele, no entanto, vi alguém que conhecia em frente as barras de chocolate. Apesar de um bom tempo desde que tínhamos nos visto, e como as coisas ficaram, não pude deixar de abrir um sorriso e delicadamente me aproximar.
- Não sei por que você tanto olha, se vai escolher esse aqui – entreguei o chocolate, que sabia ser seu preferido, em sua mão.
riu, e mais animada do que eu jamais pude imaginar, se pendurou em meu pescoço. Ela estava linda, com os cabelos um pouco abaixo dos ombros, no tom natural, e o mesmo olhar que me fascinava desde sempre. Coloquei as mãos em sua cintura e a tirei do chão por alguns segundos.
- O que você tá fazendo aqui, ? Ai, meu Deus, que felicidade te encontrar! Tá passeando por Londres? – ela disse me deixando, mas ainda tinha as mãos em meus ombros, como se não quisesse soltar.
- Na verdade, eu acabei de me mudar pra cá, estou fazendo minha primeira compra pra casa! Vou começar a dar aula em uma universidade, não poderia recusar esse emprego, então deixei Dublin.
- Você mora aqui agora? Aqui perto? – ela disse curiosa, e com um semblante que mostrava sua alegria.
- Algumas ruas pra frente, próximo ao parque – apontei para o lado que indicava o sentido de onde morava, para que ela tivesse ideia de onde me referia. Assustei-me ao ver que ela começava a rir, louca como sempre – Eu disse algo engraçado?
- Não – ela recuperou o fôlego e apoiou a mão em meu peito – é que é muita coincidência a gente se encontrar no mercado, no seu primeiro dia aqui, e ainda descobrir que você é praticamente meu vizinho!
- Seu vizinho? Você mora por aqui também? – perguntei, ansioso por sua resposta.
- Sim! Perto do parque!
- Precisamos fazer alguma coisa! Quero saber tudo que aconteceu, como você tá, como foi a faculdade, com o que você trabalha! Quer ir lá pra casa mais tarde? Posso fazer algo pra gente comer! Estrear minha cozinha – não conseguia parar de falar, e só notei isso quando ela me pareceu receosa com tudo aquilo – Desculpa, , eu não queria te deixar assim – ela parecia tão animada antes.
- , tá tudo bem, desculpa – ela olhou para o chão, e encarou os pés.
- Só fiquei muito feliz em saber que não estava sozinho aqui, mas sei que não posso já querer voltar a ser como antes, desculpa – ela então me abraçou, ternamente, e parecia precisar se aconchegar ali.

Ficamos durante algum tempo naquele corredor, abraçados, até que ela saísse dos meus braços. Continuamos nossas compras separadamente, mas marcamos de nos encontrar na porta do mercado assim que terminássemos para irmos embora juntos.

- , se você quiser, pode vir em casa mais tarde – ela disse parando de frente para mim, quando chegamos na porta do prédio que era realmente próximo do meu. Foi o primeiro momento que ela se pronunciou desde o abraço no corredor de chocolates. Viemos por todo o caminho em um silêncio ensurdecedor. Perguntei-me durante todo o tempo o que poderia ter acontecido para gerar aquela reação, no que sua vida havia se tornado, e se eu não havia me precipitado – Eu cozinho para nós, me dá seu celular pra eu anotar meu número – fiz que sim com a cabeça e entreguei meu celular a ela.

Ela anotou seu número e me disse que às oito estava ótimo, se despedindo com um beijo em meu rosto. Andei mais alguns passos até chegar em casa, e ao entrar, me joguei no sofá me perguntando o quanto coincidências poderiam ser trapalhadas do destino.
Sabia que tínhamos seguido nossos caminhos numa situação desconfortável, sei que sofremos muito e que as circunstâncias fizeram com que nos mantivéssemos separados, e em alguns momentos da minha vida, cheguei a achar que nunca mais nos encontraríamos. Mesmo com toda a distância literal e também emocional, já que prometemos não perder contato e perdemos, eu sempre pensei nela. Sempre que falavam qualquer besteira, eu pensava o quanto gostaria de tê-la pra compartilhar o momento. Sempre falava dela pra todos que conhecia, parecia o chato apaixonado. E talvez, até fosse. Toda vez que contava uma aventura, uma piada, algo triste, algo bom, algo engraçado ou qualquer coisa boba, eu tinha que falar nela, já que ela estava presente em tudo que eu havia vivido em quase dez anos.

Tranquei meu apartamento e andei até o de , a alguns metros do meu. Faltavam alguns bons minutos para o horário marcado, então fiquei em sua porta esperando, para não parecer ansioso. Não é como se eu tivesse chegado cedo porque não sabia quanto tempo levaria no trânsito para chegar até ali. Ouvi música tocando, e risadas altas, então logo percebi que ela não morava sozinha. Uma colega de quarto? Ou um namorado, talvez? Não sei se era algo com que me importava, mas meu coração acelerou com a ideia.
Quando notei que haviam se passado dois minutos do horário combinado, bati duas vezes em sua porta e esperei que ela abrisse. Quando ela abriu apareceu sorrindo para mim apesar de parecer nervosa, e eu sorri de volta enquanto a admirava. Ela vestia uma calça jeans clara, com uma camiseta preta com detalhes em rosa e seu modelo de tênis preferido, simples e bela como sempre.

- Entra - ela me puxou pelo braço, me colocando pra dentro de seu apartamento, que posso dizer, não era dos mais arrumados. Era, aparentemente, um pouco menor que o meu, em tons mais vivos e com móveis mais delicados. Estava um pouco bagunçado, mas posso dizer que isso foi o que menos chamou minha atenção. Comecei a notar que um pouco da "bagunça" dali, envolvia brinquedos, muitos deles.
E então meu olhar chegou ao meio da sala, dormindo encostada ao sofá estava uma pequena garota de cabelos escuros, coberta com uma manta rosa da Minnie.

- Acho que talvez, eu tenha um pouco mais a contar que você - ela mordeu o lábio, demonstrando sua insegurança com minha reação.

Não tive uma reação exatamente, a princípio sorri, pois a garotinha que estava dormindo em um sono profundo era linda, e não tinha como ser diferente, era muito parecida com . Depois passei pela surpresa, me espantando ao perceber que a garotinha não era bem uma garotinha, que não tinha um ou dois anos, ela já estava no mínimo com seus quatro anos de idade. Como eu não sabia disso? Como minha mãe não sabia disso?

- Essa é a Annie, . Ela é minha filha.
- Isso é notável, ela é extremamente parecida com você, mas como, ? Como eu nunca soube disso? Por que você não me procurou mais? O pai dela está aqui? Vocês estão juntos? - falei olhando para o corredor em frente, que provavelmente levava aos quartos, temendo que aparecesse ali o pai da pequena, se perguntando quem era o homem em sua casa. Claro, percebi que isso era besteira, se tivesse um namorado louco, não me chamaria aqui. Na verdade, ela nem é do tipo que aguentaria um louco.

- Vou colocar ela na cama, aí então, nós conversamos – ela pegou Annie e a ajeitou em seus braços, indo em direção ao corredor e entrando por uma das portas. Logo ela estava de volta, e me puxava em direção à cozinha, no qual a mesa estava arrumada e uma panela de macarrão se encontrava no centro.
- Que cheiro bom – elogiei sua comida, para quebrar o clima.
- Pode se servir, não estou com fome, vou te contar o que aconteceu, se você quiser – ela me entregou o pegador de macarrão, e indicou a cadeira, se sentando na outra.

Ficamos um tempo nos olhando, em silêncio, como se tentássemos decifrar o que estava acontecendo ali. Não a pressionaria a contar nada, mas sabia que ela queria, sempre nos entendemos sem palavras, e não é porque anos se passaram que seria diferente.

- Depois que você foi embora, eu vim pra Londres e não consegui mais voltar pra casa. Eu não queria voltar pra lá e aguentar todo mundo falando de você, sabendo que não poderia correr pra sua casa pra te abraçar. Então, eu fiquei por aqui. Construí uma vida aqui, meus pais vinham me visitar, e seus pais também, claro. Tenho certeza que eles te contaram das vezes em que jantaram aqui comigo e meus pais e nós ficamos até tarde jogando cartas – acenei com a cabeça, lembrando que meus pais sempre me contavam isso há alguns anos e o quanto eu sofria apenas em ter notícias dela, mas não estar presente – no penúltimo e no último ano de faculdade, tive que focar completamente nos estudos, então me isolei, não saia muito, nossos pais pararam de me visitar tão frequentemente por entenderem minha situação – ela respirou fundo – mas em um dia, no último ano, eu estava tão cansada e não pude recusar ir em uma festa e relaxar. Eu tinha uma semana de provas em frente, queria espairecer, sabe? – ela procurava desesperadamente por meus olhos, para que eu dissesse que a entendia – Lá eu conheci um cara, e a gente ficou. Estávamos ainda sóbrios quando isso aconteceu, mas a gente se gostou tanto que continuamos conversando e bebendo, até que as coisas pararam em outro lugar. Eu lembro de tudo, eu não estava tão ruim assim, nem ele! Mas aconteceu – ela abaixou a cabeça, como se estivesse envergonhada. Peguei sua mão que estava sobre a mesa, de modo que lhe passasse confiança, para que ela continuasse – O fim do último ano foi bem conturbado, entre alguns poucos enjoos, a pressão psicológica e a minha cobrança em terminar a faculdade sem nenhum problema. O James me ajudou muito, ele esteve presente, foi um ótimo amigo e companheiro, e teria sido um ótimo pai – seus olhos encheram de lágrimas e ela parou por alguns segundos – ele morreu, , uma semana depois da Annie nascer. Ele foi atropelado, e não tiveram como salvar. Eu ainda estava com ela no hospital quando aconteceu, foi horrível. Ele estava sendo incrível pra mim, tínhamos nos apegado e estávamos felizes em dividir aquilo – algumas lágrimas escorriam por seu rosto, as quais nem me atrevi a limpar, ela parecia precisar sentir aquilo, colocar tudo para fora daquele jeito – até isso acontecer, não tínhamos contado nada para os meus pais. Sim, eu passei quase um ano sem ver eles, , eu fui uma péssima filha, eu não deixei minha mãe me acompanhar, e quando a Annie nasceu, eu já tinha terminado a faculdade, então eu inventei que tinha uma viagem para que eles não quisessem ir para a formatura, e inventei um trabalho para que eles não me visitassem – suas lágrimas já rolavam livremente por seu rosto, e eu não sabia como ela ainda estava conseguindo falar sem que tivessem soluços para atrapalhar.
“Foi horrível contar pra eles, eu odeio lembrar disso. Eu pedi pra que eles me visitassem, e apresentei a Annie. Eles ficaram chocados, desolados e completamente perdidos. Não ficaram bravos, meu pai até ficou um pouco a princípio, mas minha mãe o acalmou e tentou manter o controle da situação. Nós choramos muito, e eu nunca me desculpei tanto. Eu implorei pelo perdão deles, implorei pra que eles a aceitassem como neta, porque ela não tinha culpa nenhuma da minha inconsequência, não em tê-la, mas em não contar a eles e deixar com que eles participassem. Eles tentaram me convencer a voltar pra casa, e eu poderia ter feito isso, mas eu não queria, então eles ficaram por uma semana comigo e sempre que podiam me visitavam. Isso tudo aconteceu enquanto seus pais foram fazer aquela viagem, e eles me ligavam sempre, me mandavam cartões postais, e eu simplesmente não podia contar. Minha mãe tentou me convencer, e eu sabia que sua mãe ficaria muito feliz, mas eu não queria que você soubesse por outra pessoa que não eu, . E eu sei que se não fosse essa enorme coincidência de nos encontrarmos hoje, você nem teria ficado sabendo tão cedo, mas eu queria te procurar. Eu sei que nós crescemos e seguimos vidas distantes, mas eu senti sua falta por todo esse tempo. E eu me arrependo de não ter deixado seus pais participarem disso tanto quanto os meus, e tanto quanto queria que você tivesse estado aqui.”

Percebi que ela havia terminado o relato, e notei que precisávamos daquele silêncio que se instalou entre nós. Ela estava de cabeça baixa, e nossas mãos estavam sobrepostas em cima da mesa, suas mãos estavam geladas e pareciam suar, ela ainda aparentava estar nervosa. A garota esperava por uma resposta minha em relação aquilo tudo e eu não tinha certeza ainda do que poderia responder.
Não senti raiva, ou fiquei ressentido em nenhum momento. Cresci o suficiente para entender que não éramos mais como antes, que muitos anos tinham se passado. Toda sua história parecia para mim, absurda. Não conseguia acreditar que tudo aquilo realmente havia acontecido, e que eu não estava presente. E então, por um segundo, se passou pela minha cabeça o que poderia ter sido se eu tivesse passado na Universidade de Londres e viesse para cá com ela. O que teria sido de nós dois, o que teria sido dela e o que teria sido de mim. Afastei aqueles pensamentos, pois foi algo que me torturou cruelmente nos primeiros dois anos de faculdade, no qual até mesmo pensei em largar tudo e começar do zero ao lado dela, sem faculdade, trabalho ou qualquer coisa.

- Fala alguma coisa, por favor – agora ela me encarava, com os olhos ainda brilhantes por conta das lágrimas já derramadas.
- , eu não tenho exatamente o que falar. Posso dizer que estou feliz demais de ter te reencontrado, e espero que agora eu possa fazer parte da sua vida novamente. Não posso te garantir que minha mãe vai ser tão mente aberta assim, porque você sabe que ela vai se sentir traída.
- Eu sei, mas você tá aqui comigo, e se você aceita ainda fazer parte da minha vida, e agora da minha pequena, posso dizer que estou preparada – ela apertou minha mão, devolvendo o carinho que antes eu havia lhe feito.

Ela disse para que nós comêssemos um pouco enquanto conversávamos mais. Ela me contou que estava trabalhando em um laboratório de genética durante o período da manhã, enquanto Annie ficava na escola. Ela trabalhava com o que sempre gostou, e disse que aquilo era o que importava. Ela conseguia sustentar as duas sem apertos, e me contou tudo sobre a garotinha, que parecia o tipo de criança que não lhe dava trabalho nenhum.
Contei a ela sobre meu novo emprego, e vi um sorriso se abrir em seu rosto quando lhe contei novamente que tinha decidido virar professor, pois a garota afirmava que sempre soube que eu havia nascido para algo grande. Naquele momento, nossa pequena diferença de idade não era aparente de nenhuma forma. Riamos como se o tempo tivesse voltado e fossemos crianças novamente, mas sabia que agora éramos adultos formados, com propósitos na vida. Mas quem disse que isso era um motivo para deixar de ver graça nas coisas?
Terminamos de comer e limpar a cozinha, e então ficamos na sala jogados sobre o tapete, brincando com o “Cara a Cara” que pertencia a Annie, até que a mesma aparecesse no corredor segurando um bichinho muito conhecido por mim, com uma feição de sono que não ficaria linda em um adulto, mas em uma criança parecia à coisa mais graciosa do mundo.

- Oi, meu amor! – esticou a mão para que a filha fosse até ela. A garota parecia envergonhada, e me olhava fixamente entre uma abaixada de cabeça e outra – Esse aqui é o , um amigo da mamãe.
- Oi, Annie! Você é muito linda, sabia? Parece muito com a sua mãe – notei que pareceu se envergonhar com o meu comentário, diferente da pequena, que abriu um sorriso tímido.
- Minha mamãe é muito linda mesmo – ela então abraçou a mãe e cochichou algo em sua orelha. levantou e foi em direção a cozinha, dizendo que arrumaria comida para ela, que estava com fome.
- Eu estava jogando com a sua mãe, você quer continuar no lugar dela? – apontei para o jogo, e a vi se sentar onde estava há alguns segundos.
- Você tem cabelo amarelo? – a pequena perguntou, se referindo a cabelos loiros.
- Eu? Não, olha, meu cabelo é castanho – passei a mão por meus cabelos, me abaixando para que ficasse bem em frente a ela.
- Não você, o seu personagem, tio – ela ria e se ajeitava em frente ao jogo, parecendo levar aquilo mais a sério que qualquer outra coisa.
- Ah, tudo bem! Me desculpa! – sorri para ela e também me ajeitei, continuando o jogo e poucos minutos depois sendo vencido.
- Vem, filha, vamos comer – a esperava com um prato na mão, indicando seu banquinho que ficava em cima de uma cadeira normal.
- Espera ai, que eu volto pra gente jogar mais – ela fez um gesto de mãos abertas me indicando para esperar enquanto virava as costas e ia até a mãe, que me chamou para me juntar a elas na cozinha.

Ficamos conversando enquanto Annie comia, e pude conhecer mais da menina, que parecia começar a gostar de mim. Ela me contou um pouco sobre sua escola, suas amigas e sobre como gostava de ficar em casa com a mãe brincando de várias coisas. Ela era simplesmente adorável, e era apaixonada por cada palavra enrolada que saia de sua boca. Minha amiga parecia ser uma mãe e tanto, e isso era algo maravilhoso de ver.
Olhei para o relógio e percebi que já passava das onze e meia, e eu teria que preparar algumas coisas para a minha primeira aula no outro dia. também devia ter muitas coisas a fazer, já que no outro dia era segunda-feira e logo pela manhã tinha que levar a filha para escola e seguir para o trabalho.
- Obrigado pela janta, – beijei sua bochecha – Espero que a gente faça isso mais vezes – a abracei, cobrindo-a por inteiro com meu corpo em um abraço de urso.
- Amanhã eu te ligo, posso?
- Se eu não te ligar primeiro – pisquei para ela, e me abaixei – tchau, Annie, da próxima vez que a gente se encontrar, te devo um sorvete, tá? Porque você ganhou de mim – passei a mão em seu cabelo, e me levantei novamente.
- Tchau, tio – ela acenou, enquanto fechava a porta. Annie então entrou na frente, e falou pelo pedaço da porta que ainda estava aberta – Eu gosto de chocolate tá?
Vi puxá-la e ri com a atitude da menina, enquanto seguia meu caminho até em casa. Tinha muita coisa para fazer ainda. Nem sabia como dar aulas, teria que aprender em uma noite.

“Espero que você se dê bem com a turma! Boa sorte, , e cuidado com as alunas desesperadas por nota, xoxo”

Vi a mensagem quando cheguei em casa, e não pude evitar um sorriso ao ver no que ela pensava. Respondi rapidamente e me atentei a preparar as coisas para o dia seguinte, sendo atrapalhado, felizmente, uma vez ou outra por mensagens de .

24 de Setembro de 2017

- Oi, tio – Annie pulou em meu colo quando abriu a porta.
- Oi, princesa, você tá animada pro piquenique? – notei a mãe da menina me encarar com um olhar mortal enquanto abraçava a pequena.
- A gente vai pra um piquenique? – seus olhos brilharam e ela pediu para ir pro chão para encarar os olhos da mãe.
- Sim, nós vamos, esse tio é um linguarudo, porque não era pra te contar, era surpresa! – entendi o porquê de tanta raiva, e dei um meio sorriso pra ela, como um pedido de desculpas.
- Piquenique? Quem falou em piquenique? – olhei para cima, fazendo descaso das palavras de .
- Você falou, tio! – Annie pulava em volta das minhas pernas freneticamente, parecendo ansiosa agora. Passei a mão em seu cabelo e depois fui até a cozinha para pegar as coisas que tinha preparado para levarmos.

Iriamos para o parque que ficava ali perto mesmo, o dia apesar de um pouco gelado como sempre, estava agradável. Ann sempre quis fazer um piquenique como os que via nos desenhos, principalmente Peppa Pig, o que ela mais amava. Sugeri para e ela aceitou a ideia na hora.
Nos vimos quase todos os dias desde o dia que nos encontramos. Me dei muito bem com Annie, e eu e conseguíamos ser amigos como se nada tivesse acontecido, como se nunca nem tivéssemos nos separado por anos. As aulas estão indo muito bem, e nunca imaginei que teria que me preocupar com as alunas desesperadas, mas tive, assim como previu. Minha vida parecia que nunca tinha ido melhor, mas algumas coisas nunca mudam, e posso ter certeza que uma delas é o que a gente já sentiu e fica martelando no coração.
- Tio , me empurra no balanço enquanto a mamãe arruma as coisas? - Ann já estava a todo vapor quando chegamos em nossa árvore preferida no parque. Olhei para e ela acenou com a cabeça, de modo que compreendi que era para atender ao pedido da filha.
Ann se sentou no balanço, de modo que ficamos de frente para , que parecia sofrer com o vento que batia e não a deixava estender a toalha no chão. Comecei a empurrar a garota enquanto ríamos da atrapalhada que fazia graça para nós. estava linda como sempre, e não se cansava de mostrar isso. Da forma como se vestia, vestia a filha, com algumas diferenças como a preferência da pequena por vermelho, assim como a da Peppa.
Quando finalmente conseguiu arrumar o espaço, ela se sentou e chamou por nós. Annie desceu delicadamente do brinquedo e foi correndo em direção a mãe, enquanto eu fiquei parado admirando as duas. Percebi que esperava por mim e parecia envergonhada notando que eu não deixava de olhá-las, mas ainda assim ela sorria, como se fosse tudo simples e belo da forma como vinha sendo. Como se não tivéssemos nada pendente no passado, que posso confessar, estava me atormentando desde a noite anterior, quando a lembrança da minha partida para Dublin me atingiu.

14 de setembro de 2009

- Filho, – minha mãe me abraçou com lágrimas nos olhos, em frente ao portão de embarque – eu vou sentir tanto a sua falta – senti a primeira gota cair sobre meu ombro e ela me apertar como uma mamãe ursa.
- Eu também vou sentir sua falta, mãe – a abracei, tirando-a do chão por alguns segundos, o que tirou uma risada em meio ao choro.

Meu pai apertou minha mão e me deu um meio abraço, sem dizer nenhuma palavra. Sabia que ele estava orgulhoso, e sabia que ele não falaria muita coisa ali, mas depois ficaria perguntando para minha mãe insistentemente como eu estava, se já tinha chegado, se estava gostando. E sabia que em uma semana ele ligaria, como quem não quer nada, ou talvez até como se tivesse ligado errado.
estava sentada em uma cadeira, de cabeça baixa, ela nem mesmo olhava para nós. Meus pais me abraçaram uma última vez e se distanciaram, indicando a menina com a cabeça, como se dissessem que nos dariam um tempo.
Sentei ao lado dela e ao perceber minha presença ela se moveu até que estivesse encostada no meu peito me abraçando. Senti minha camisa ficar molhada e percebi que suas lágrimas eram muitas. Ela estava na pior situação que se poderia estar. E eu era culpado. Eu me sentia culpado por aquilo. Sei que só estava seguindo meu futuro, mas eu me sentia culpado por fazer aquilo com ela, sentia como se devesse procurar outra alternativa, por ela, só por ela. Quando finalmente algo poderia estar mudando, quando algo novo se revelou, eu me mudo para outro país. Não é assim que as coisas deveriam acontecer, e sei que é isso que se passava pela cabeça dela.

- , – ela soluçou para falar meu nome, enquanto se afastava para olhar em meus olhos – você não vai mais voltar? – as lágrimas não paravam de rolar em seu rosto.
- , a gente ainda vai poder se ver. Você pode me visitar, e eu vou vir pra casa sempre que der – a abracei novamente, a colocando entre meus braços de forma que sua cabeça se encostasse em meu ombro – a gente pode se falar sempre que der, até mandar cartas, se você quiser – notei que seu desespero aumentou, e cada vez mais lhe faltava ar.

Ficamos durante alguns minutos abraçados, eu não sabia como fazê-la parar, nada que eu falasse deixaria aquela situação melhor. Nada mudaria, o avião que sairia em alguns minutos e me levaria para longe.
Esperei que ela se acalmasse, mas ainda que sem lágrimas, ela soluçava ofegante. A abracei cada vez mais forte, como se fosse bloquear aqueles sentimentos que nos invadiam. Beijei o topo de sua cabeça e tentei movê-la pra que ela olhasse em meus olhos. Meus pais apareceram em minha visão periférica, e notei que eles provavelmente queriam me avisar que estava na minha hora. Mesmo com eles ali, como espectadores, sabia que não teria outra chance tão cedo.
tentava manter os olhos abertos e tentava dizer algo para mim, mas me aproximei dela antes que sua voz saísse. Toquei meus lábios nos dela e pude sentir o gosto salgado em seus lábios. Coloquei minha mão em seu rosto ternamente e estendi aquele selinho da forma mais prolongada que pude, enquanto senti mais algumas lágrimas descendo por suas bochechas, de encontro com meus dedos.

- Nós vamos ficar bem, você vai ver – me levantei e a puxei pela mão, para que se levantasse também.
- Não vamos, , – ela me abraçou – você sabe que as coisas não são assim, e essas palavras de conforto não são o que realmente acontece – ela colocou a mão em meus ombros e sussurrou no meu ouvido – eu te amo, independente do que aconteça.
- Eu também amo você, independente do que aconteça – beijei sua testa, e dei um último forte abraço.

Acenei para meus pais, passando a mão pelo rosto de minha mãe, limpando sua última lágrima que escorria. Dei as costas, e ao chegar ao portão de embarque, olhei novamente para trás e vi que minha mãe estava abraçando , e não podia saber quem estava consolando quem. Segui em frente, com toda força do mundo, mas não pude segurar algumas lágrimas que estavam insistindo em ser livres.

- Tio – ouvi Annie gritar de onde estava sentada. Sai de minhas lembranças e fui até as duas, me sentando ao lado de , e de frente para a pequena, que comia animadamente um morango.
- O que você estava pensando? – questionou, enquanto pegava um lanche que havia feito e o mordia.
- Nada – sorri para ela, que negou com a cabeça.
- Eu te conheço, . Aconteceu alguma coisa? Alguém da faculdade?
- Não, na faculdade está tudo até melhor do que imaginava.
- Se quiser contar, eu estou aqui – ela apertou minha mão, que estava sob minha perna. Fiz que sim com um leve aceno de cabeça e sorri para ela, que logo deixou isso para lá.
- Fazer piquenique é muito legal! – Annie mostrava um enorme sorriso vermelho no rosto, devido a quantidade de morangos que havia comido em segundos. Peguei um papel e limpei em volta de sua boca. Ela então pegou o papel da minha mão, e foi de joelhos até a mãe, passando o papel na boca dela, para que as migalhas de pão saíssem. Eu e nos entreolhamos e rimos, abraçando a garotinha em seguida.

Acredito que qualquer um que olhasse em volta pensaríamos que éramos uma família feliz. E então algo me ocorreu. E eu percebi que eu e não tínhamos mais idade para esperar. Eu teria que arriscar, por nós dois.

- Tio, você podia balançar a mamãe no balanço, né? Ela sempre fala que quer que eu a balance, mas eu não consigo – Annie fez uma expressão de tristeza, como se aquilo fosse à coisa mais triste do mundo, e tudo que eu quis fazer foi apertar suas bochechas, exatamente como uma tia chata.
- Isso é verdade – olhou para a filha com um bico no rosto e deu de ombros.

Levantei-me e estendi uma mão para cada uma. Colocamos tudo que fosse possível em cima da toalha para que ela não voasse, e caminhamos até o balanço. Fiz um gesto exagerado para que sentasse, como se ela fosse uma princesa. Ela então, simulou que estivesse puxando o longo vestido da realeza e se sentou, com uma expressão de superioridade.
Eu e Annie nos posicionamos atrás dela, e apesar de fazer toda a força sozinho, a garota me ajudava com a maior sensação de satisfação que poderia ter, como se tivesse alcançado um objetivo muito alto. Era algo muito lindo de se ver, que me lembrava a mãe, a irredutível felicidade nas menores coisas.

- Assim tá bom, mamãe? – ela fazia força, ao mesmo tempo em que tentava se encaixar entre os dois balanços para poder enxergá-la.
- Claro, meu amor, como você é forte!
- O tio tá ajudando bastante!
- A mamãe cansou, você quer trocar? – vi Annie balançar a cabeça freneticamente, enquanto usei meus braços para segurar os dois lados do balanço e parar . Annie sentou no balanço e veio em meu encontro, para que balançássemos a pequena.

Ficamos mais um tempo ali, mas uma garoa repentina fez com que saíssemos correndo para casa. recolheu tudo as pressas, enquanto eu pegava Annie no colo e saia em disparada, com a mulher em nosso encalço. Rimos loucamente durante todo o caminho, e chegamos, não tão molhados, mas ainda com uma pequena chance de pegar uma gripe.
Pisamos na casa das garotas, e eu e Ann esperamos enquanto pegava uma toalha para secar pelo menos o cabelo da filha, que estava mais molhado. Coloquei ela no chão e sequei o cabelo dela tão rapidamente, que ela não conseguia parar de chacoalhar a cabeça depois.

- , você precisa de alguma coisa? Acho que vou indo, preciso preparar algumas coisas – perguntei enquanto víamos Annie correr até a TV para ligar e logo colocar desenho para assistir, se jogando em seu puff preferido.
- Não, por aqui tá tudo bem, pode ir – ela sorriu para mim, pisando para fora do apartamento e deixando a porta encostada, de modo que ainda pudesse acompanhar a filha com os olhos – Obrigada, , a Annie adorou tudo.
- E você? – perguntei, curioso, fazendo com que ela me olhasse com um sorriso brincalhão.
- Ah, eu odiei, na verdade só te tolero, nem gosto de você! – ela deu um tapa em meu ombro, rindo.
- Não mesmo? Que pena, porque eu queria muito te chamar pra sair... - talvez a tenha surpreendido com esse pensamento tão repentinamente, mas apesar de pensar que poderia fazer isso, não era das pessoas mais corajosas do mundo. Ela parecia espantada, mas não triste, ou ofendida - Você não precisa responder agora, sei que você precisa pensar, sei que sua situação talvez te faça querer passar mais tempo sozinha. Sei que você perdeu alguém que foi muito importante pra você, mas eu sinto que devíamos nos dar essa chance, não deixar as coisas do jeito que ficaram.

Ficamos em silêncio durante algum tempo, apenas nos olhando. Até que se aproximou e deu um beijo em minha bochecha, me fazendo levar as mãos até sua cintura ternamente.

- Eu não poderia concordar mais, – ela disse quando se afastou, tirando um sorriso de nós dois.

25 de setembro de 2017

“Bom dia, , estou ansioso, quer escolher o dia?”
“Pode ser na outra semana, ? Desculpa! Fim de mês fica tudo uma loucura”
“Tudo bem, mas que dia? No fim de semana? Sei que pareço desesperado, mas é que na verdade, estou mesmo, você me conhece”
“Sim, eu te conheço, bear! Eu preciso checar, eu não sei com quem deixar a Ann, os avós paternos dela estão viajando, vou ter que procurar uma babá”
“Então depois marcamos, vou deixar você em paz”
“Vou terminar de dar comida pra esfomeada, dar banho e colocar ela pra dormir. Boa noite, <3”
“Boa noite, <3”

Não conseguia tirar o sorriso do rosto e a ansiedade da cabeça, era incrível pensar que depois de tanto tempo, eu teria uma chance com a . Não acreditava que nos daríamos uma chance.

05 de outubro de 2017
Estava jogado no sofá e não conseguia por um segundo tirar da cabeça a ideia de que precisava ouvir a voz de . Nos falávamos por mensagem todos os dias, mas não era possível sempre nos vermos. Almoçamos uma vez juntos nessa semana, mas não consideramos aquilo um encontro como merecíamos. Por outro lado, ainda não havíamos decidido como ou quando esse encontro seria. Sei que não poderia escolher tudo sozinho, queria decidir as coisas com ela.
Peguei meu telefone e decidi ligar para ela, sabia que as 18h ela estaria em casa, sem muita ocupação. Poderia ir até lá, mas se fosse, não voltaria tão cedo, e amanhã preciso apresentar uma palestra no primeiro período de aula.

“Alô” – ela atendeu com uma voz cansada.
? Tudo bem?”
“Tudo sim, posso te ligar em dois minutos?”
“Claro”

Ela desligou o telefone e eu aguardei alguns minutos até que ela pudesse retornar. Mas esses minutos se tornaram 01h e eu já começava a me preocupar quando ela enfim, retornou.

“Oi, ! Tá tudo bem mesmo?”
“Tá sim ! A Ann é doida, ela jogou todos os cobertores do guarda roupa pra fora e fez uma montanha, eu tive que dobrar tudo pra poder guardar! Aí me atrapalhei toda, porque estava tentando conseguir alguma babá pro fim de semana, mas não tem ninguém! Nessas horas seria ótimo ter alguém por perto” – ela disse com um pouco de tristeza na voz. Fiquei alguns segundos em silêncio, quando uma ideia me apareceu.
, por que a gente não vai pra casa? A gente pode ir amanhã a noite, e voltamos no domingo a tarde. Podemos apresentar a Ann pros meus pais, visitar seus pais, e ainda temos com quem deixar ela pra sairmos, garanto que eles vão adorar” – ouvi o silêncio do outro lado da linha, e em alguns segundos ouvi também ela perguntando pra Ann, o que achava de visitar os avós. A garota soou animada, e garanto que estava sorrindo nesse momento.
“Por mim está ótimo, . Estou com saudades de todo mundo, vai ser bom”
“Então amanhã pela manhã combinamos tudo, e partimos a tarde”
“Tudo bem, obrigada por isso, e por tudo” – sua voz soava sentimental.
“Eu que agradeço, . Boa noite, e até amanhã”
“Boa noite, e até amanhã” – ouvi Ann gritar, perguntando se era o “tio ”, e pediu para que eu não desligasse o telefone.
“Boa noite, tio ” – ela disse quando pegou o telefone.
“Boa noite, pequena”

06 de outubro de 2017

- Tio! – Ann saiu correndo até a porta para me abraçar. Ela estava vestida com um moletom não tão grosso, com detalhes amarelos, e sua mochila estava nas costas. Ela carregava “Xiu” em suas mãos e parecia mais que preparada e ansiosa para viajar.

- Oi pequena! – peguei-a no colo e lhe dei um abraço de urso, do jeito que ela gostava.

vinha atrás, preparada com uma mala grande e uma pequena. Mesmo que fosse apenas um fim de semana, ela tinha me explicado, que quando se sai com criança, os incidentes podem ser muitos, fazendo com que você saia com a casa em sua mala.
Ela me cumprimentou rapidamente com um beijo estalado na bochecha, e quando coloquei Ann no chão, estávamos prontos para sair. Eu havia alugado um carro, já que por aqui optei por andar de metrô até sentir a necessidade de comprar um automóvel pra mim. Coloquei as malas no carro e me sentei no lugar do motorista, já que preferiu sentar no banco de trás com a filha. Era uma viagem rápida, de aproximadamente, uma hora e meia.
Passamos todo o caminho cantando, havia me entregado um pen drive com músicas infantis, e até brincando de brincadeiras como “vejo com meus olhinhos”. Annie estava muito feliz e ficava durante todo o tempo falando do quão legal era estar em um carro vermelho, como o da família Pig. Claro, eu optei pela cor porque sabia que ela adoraria.

Chegamos na porta da minha casa às 20h30, e parecia tremer dos pés até a cabeça. Ela tentou tirar Annie, que cochilava na cadeirinha, com todo cuidado possível para que ela não acordasse. Pedi pra que ela deixasse com que eu o fizesse, já que meus pais estariam doidos para abraçá-la por conta da saudade. Teríamos uma bela conversa por ali, já que eles adorariam saber quem era aquela pequena, e porque nunca souberam da existência dela. Eu já havia falado com meus pais no telefone, sobre ter encontrado , e avisei que viríamos para cá, mas preferi deixar com que respondesse suas perguntas.

- ! Mas que saudade! – minha mãe disse quando abriu a porta e deu de cara com a mulher. Meu pai apareceu logo em seguida, fazendo assim um abraço em grupo.
- Tia Lauren, eu estava morrendo de saudades, quanto tempo! – o nervosismo em sua voz era claro, estava ansiosa como nunca.

Percebi que minha mãe sairia rapidamente da frente de e viria me abraçar. Mas antes de se aproximar, ela travou quando viu a criança em meu colo. Não consigo definir qual foi sua reação, mas foi algo entre espanto, surpresa, e acredito que até medo de que eu tivesse escondido um filho. Sorri para minha mãe e sustentei o olhar desesperado de , lhe dando todo o apoio possível, como sempre foi.

- Tia, tio, essa no colo do é minha filha, Annie – meus pais olharam para ela surpresos, mas com uma expressão mais do que satisfeita, como se estivessem felizes – Vou explicar tudo pra vocês, e também vou expressar todas minhas sinceras desculpas.

Minha mãe havia deixado tudo arrumado em meu quarto para que nós dormíssemos. Porém, ao entrar com Annie, a coloquei na cama e disse para minha mãe que dormiria no sofá. obviamente disse que não era certo, que poderia dormir com Ann, mas ela sabia que eu não deixaria.
Nos juntamos no quarto de meus pais para conversar, para podermos ficar de olho quando a pequena acordasse, já que ela não sabia onde estava e poderia se assustar. contou tudo para meus pais, da mesma forma que fez comigo. Ela chorou novamente também, mas tentou se controlar ao máximo. Meus pais ficaram um pouco chateados, mas entenderam a situação, e entenderam que ela não queria que eu soubesse por eles ou que eles tivessem que guardar esse segredo de mim. Tudo parecia muito estranho, e acredito que todos tinham o mesmo pensamento: se eu não a encontrasse, um dia descobriríamos? Era algo que seria melhor não dito, e já que não aconteceu, um pensamento que ficaria melhor afastado.

07 de outubro de 2017

Acordei sentindo um beijo em meu nariz. Abri meus olhos e notei Annie, em seu pijama, parada em minha frente. Olhei em volta e vi que não estava ali, ainda deveria estar dormindo.

- Tio , tô com fome.
- Vou fazer algo pra você comer, pequena. Deixa a mamãe dormir, tá? – beijei sua testa e liguei a tevê para que ela ficasse assistindo deitada onde eu dormi e com minhas cobertas. Aquele momento que todo adulto lembra com saudade.

Quando cheguei na cozinha, vi minha mãe descendo as escadas. Ela acenou para mim e foi até a sala dar bom dia para Annie. A garotinha agiu como se conhecesse minha mãe desde sempre, puxando assunto com ela e mostrando os desenhos que passavam na tv. Annie era um amor, uma criança muito fácil de lidar, minha mãe a tinha adorado desde o momento que ela apareceu na porta do quarto com a maior cara de sono se jogando no colo de ontem à noite.
- Mãe, posso falar com você? – perguntei quando ela entrou na cozinha. Ela gesticulou, pedindo para que eu desse continuidade – eu e a queremos sair – não pude deixar de sentir minhas bochechas esquentarem ao afirmar quando minha expressou um “sair, hmmm?” – Queria saber se você e a tia Lisa não se importariam de ficar com a Annie. Nós vamos falar com a tia, claro, mas eu queria saber se você não queria ficar junto com ela, sei o quanto você adora crianças, e imagino você e a tia cuidando de uma – ri com meu próprio pensamento.
- Eu adoraria, filho. Que horas vocês pretendem ir? Voltam hoje? – ela me olhou com uma expressão indelicada.
- A não passaria a noite longe da Annie. Ainda estou planejando, mas pretendo sair por volta das 17h, para não voltarmos tarde.
- Vou falar com a Lisa, mas podem sair em paz, finalmente – ela piscou pra mim, sorrindo. Sabia que ela não deixaria de cutucar.

- , você está linda!
Vi ela abrir a porta e caminhar em minha direção. Ela usava uma calça que tinha um tom rosado, e uma blusa branca. Usava uma jaqueta por cima, e invés de seus tênis como de costume, usava uma sapatilha. Eu a estava esperando, encostado no carro. Eram 5:30 pm, e precisávamos acelerar para chegar a tempo em meus planejamentos feitos de última hora. A cumprimentei com um beijo em sua mão, e recebi em troca um beijo no rosto. Abri a porta pra que ela entrasse e juntos acenamos para Ann, que estava na porta com minha mãe e tia Lisa, que já tinha chegado ali.
Entrei no carro e dirigi até o local escolhido. Conversamos normalmente no caminho, mas acredito que percebeu que eu estava nervoso. Sei que éramos nós, e que não devíamos ter frescuras, mas isso é um encontro, e eu quero que seja o melhor da vida dela. Nós merecemos fazer valer a pena.
Quando éramos menores e morávamos aqui, sempre vimos o passeio de gôndola, considerado algo muito romântico, mas nunca consideramos ir porque nos sentíamos muito crianças para um romance de filme. Me lembrei disso durante a tarde e me informei se ainda tinham esses passeios, então me decidi por isso. A surpreenderia com algo daquela cidade que nunca havíamos feito. Talvez fosse um clichê romântico, mas era algo novo e significativo entre nós.
Estacionei o carro e não pude me conter de felicidade ao ver a expressão em seu rosto. Ela deu a volta, e se jogou em meu pescoço enquanto eu fechava a porta. Virei-me para abraçá-la e lhe dei um beijo na testa.

- Gostou, ?
- Eu sempre quis fazer esse passeio! Obrigada – ela me abraçou novamente. Quando ela me soltou, levei minha mão até a sua, para que andássemos de mãos dadas. Não que nunca tivéssemos feito isso, mas era diferente, as sensações eram diferentes em proporções inimagináveis.

Caminhamos até a entrada e disse que havia reservado o passeio durante a tarde. Nos indicaram então o caminho e nos levaram até o punt, para que seguíssemos para nosso passeio de 45 minutos. Ele circularia por partes da cidade, e poderíamos curtir juntos, da forma mais romântica possível. Não que isso fosse completamente possível entre nós.

- , você tomou banho? – ela me perguntou, fazendo um olhar engraçado. Levantei meus braços como se cheirasse minhas axilas, tirando risadas dela.
- Eu tô fedido, por acaso? – ela me respondeu colocando sua mão na lateral do barco e respingando água em mim. Não em pouca proporção, e sim em muita, deixando uma grande marca de água em minha camisa branca.

Revidei fazendo o mesmo com ela, e logo, o começo do nosso passeio virou uma farra entre pessoas que sabiam que não eram mais crianças, mas não conseguiam deixar de reviver isso. O senhor que remava para nós nos olhou com uma expressão sombria, e em seguida pediu, educadamente, para que parássemos, pois aquilo poderia afetar a tranquilidade de nosso passeio.
Eu e decidimos apenas apreciar nossa visão, e as histórias contadas pelo guia. Passamos todo o percurso de mão dadas, apenas comentando sobre o que víamos e lembrando de histórias que tínhamos em alguns lugares por onde passamos. Não poderia ser mais agradável, e não consigo dizer o que era melhor. A paisagem, ou a paisagem combinada à companhia.
Quando passamos pela saída do local, para ir em direção ao carro, falava e gesticulava animadamente. Ela parecia maravilhada com tudo aquilo, e eu me sentia satisfeito por tê-la proporcionado isso.

- E agora? – ela perguntou.
- Entra no carro que o passeio continua! Se não tiver comida, não é a gente! – pisquei pra ela como em uma cantada barata. Entramos no carro e dessa vez, dirigi até um pub chamado The Pound, que nunca havia ido, mas tinha visto boas recomendações.

O caminho não foi longo, e logo estacionamos, entre conversas animadas e olhares trocados. Desci do carro e corri para o outro lado antes que abrisse a porta. Ajoelhei em sua frente, como em uma reverência, fazendo com que além dela, as pessoas em volta rissem. Segurei sua mão e a direcionei para dentro do local. Quando entramos pela porta, encontramos um corredor repleto de luzes vermelhas, com uma placa que indicava as “celas da prisão”, e então notamos que naquele corredor realmente tinham entradas como de celas, que eram espaços mais reservados, onde havia apenas uma grande mesa.
Eu e optamos pela parte mais clara do pub, onde estaríamos rodeados por pessoas para que pudéssemos rir delas. Como sempre. Escolhemos lugares de frente um para o outro, na parte mais aberta do bar, onde tínhamos uma bela vista da rua. Tirei sua jaqueta, já que o ambiente estava um tanto quanto quente, e a pendurei em sua cadeira, sentando no meu lugar em seguida.

- Eu quero uma batata frita bem grande! – ela olhou pra mim, pidona.
- Seu gosto por comida nunca vai crescer? – brinquei.
- Não! – ela piscou.

Chamei o garçom e pedi o que ela queria, e também nossas bebidas. Decidimos por não tomar nada alcoólico, para que a noite fosse completamente sóbria, e nada saísse sem querer por ali. Ideia dela, mas acredito que no fundo ela só tinha medo do que eu faria bêbado. Não que eu pudesse beber, afinal, voltaria dirigindo. Mas a ideia me agradou.

- Não tem nada pra me contar dos seus anos fora? Tirando sobre as festas, as mulheres lindas, os pubs maravilhosos, e as aulas interessantíssimas que você já mencionou e fez questão de deixar claro? – ela mordia um canudinho que havia pegado em cima da mesa, me fazendo rir.
- Qual parte você quer saber? A que eu passei todos esses anos me matando de estudar, ou a que eu passei todos esses anos me matando de estudar enquanto pensava em como você estava por aqui? – ela ruborizou ao ouvir o fim da minha frase, e não respondeu, me dando uma brecha para que continuasse – Ou a parte em que quis desesperadamente te ligar todos os dias, mas você preferiu que não acontecesse? – falei isso com um sorriso no rosto, pra que ela soubesse que não era nenhum tipo de rancor, estava apenas lhe contando como as coisas ficaram pra mim.
- Não fala assim, – ela deu uma risada nasalada – você sabe que as coisas nunca seriam as mesmas, aposto que podem ser bem melhores a gente tendo se reencontrado agora – ela piscou para mim, e segurou minha mão por cima da mesa, deixando o canudinho mordido de lado – estou muito feliz de estar aqui, obrigada.
- Eu que devo agradecer, – apertei sua mão carinhosamente.
- Então... Você trabalhou durante seu tempo em Dublin? – percebi que ela tentava puxar algum assunto. Por mais que não estivéssemos em um silêncio constrangedor, estávamos ansiosos.
- Trabalhei em uma biblioteca. Era maravilhoso, mas as vezes quieto demais, e cada vez tinha menos gente, pois os e-books estão tomando o mundo, né? Mas era divertido auxiliar, em maior parte, alunos que precisavam fazer trabalhos com fontes confiáveis. Internet é um paraíso, mas em questão de confiabilidade, é um pecado – o garçom apareceu para nos servir, e logo vi já atacando suas amadas batatas-fritas.
- Eu era a aluna desesperada atrás de um bibliotecário que me ajudasse, confesso. Adorava pesquisar tudo na internet e pronto. Mas meus professores, em maioria, eram muito criteriosos. Na área da saúde, com tanta gente que se acha especialista hoje em dia, nada é confiável.
- Pois é. Aposto que você não tinha um bibliotecário bom como eu – pisquei para ela, enquanto colocava uma batata na boca.
- Infelizmente, minha bibliotecária era um mau humor em pessoa, ela não amava trabalhar, como imagino eu, você fazia. Ela era idosa, bem aquelas de filme, sabe? Era bem engraçado. Aposto que ela furava bolas de crianças que caiam no quintal dela.
- Hoje em dia não é muita gente que tem apreço pelo que faz – ri para ela, que ria de sua própria frase também – No fim, você realmente se deu bem no que escolheu, não? Digo, você é feliz nisso?
- Completamente. Quando a Ann completou um ano e meio, eu comecei a trabalhar. Consegui em uma farmácia primeiramente, onde eu gostei de ficar, mas sabia que não era o que eu realmente queria, então continuei procurando. Fiquei por sete meses lá, e enfim encontrei em um laboratório, esse no qual ainda trabalho. Eu amo o que faço, não poderia me sentir melhor – ela mantinha um sorriso no rosto, com orgulho sobre o que estava falando. Seus olhos brilhavam, e ela era a personificação de felicidade em relação à grande decisão de vida que todos temos, de quando escolhemos o que vai ser levado para vida toda. Confesso que entendi o que ela me disse sobre amadurecer quando brigamos. Não que justifique o modo como ela me tratou, mas entendo o que quis dizer.

Conversamos sobre os mais variados assuntos, e relembramos momentos como vínhamos fazendo desde nosso encontro no mercado. Acredito que nunca deixaríamos de ter momentos pra lembrar, pois eram tantos. Me sentia bem com , e nada mudaria meus pensamentos em relação a ela parecer sentir o mesmo.
Paguei a conta e a acompanhei até a porta do carro, abrindo-a para que ela entrasse. Fui até o banco do motorista e após colocarmos devidamente os cintos de segurança, dei partida no carro. Estava na hora de ir para casa, mas fazendo o caminho, notei que havia algo que eu ainda podia fazer.
- , pra quê fazer o caminho mais longo? Vai me sequestrar? Me matar? – ela me perguntou, fingindo que estava apreensiva.
- Fica quieta e aprecia o caminho – dei uma risada e toquei gentilmente seu nariz enquanto parava no semáforo.
Depois de alguns minutos, estacionei meu carro em uma rua que não estava tão iluminada, mas ainda assim podia-se ver algumas pessoas transitando. Famílias indo para casa, cachorros passeando com seus donos e até mesmo um sorveteiro passava por ali. Olhei para o lado e vi corar sutilmente. Ela abaixou a cabeça e sorriu, envergonhada.
- Vamos – apertei sua mão e depois sai do carro, indo para o lado dela para incentivá-la a descer. Abri sua porta e a puxei pelas mãos, direcionando-a até o parquinho infantil.

- , eu tô cansado, eu quero ir pra casa – agarrei sua mão, já a puxando para saída do parque que estávamos.
- Por favor, ! Só mais um pouquinho!
Estávamos em um daqueles parquinhos infantis, que estava vazio naquele fim de tarde. Ficamos durante um bom tempo ali, brincamos com crianças e até mesmo voltamos a ser crianças. Mas parecia não querer deixar aquilo tão cedo, e estava há pelo menos dez minutos querendo ficar mais um “pouquinho”.

- Não acredito que você me trouxe aqui! – ela saiu correndo até o escorregador, brinquedo qual era seu preferido desde que a conhecia.
- Não foi planejado, sinto muito, pensei nisso agora. Notei que parecia o momento perfeito pra compartilharmos mais uma lembrança – ajudei ela a se levantar do escorregador, tomando suas duas mãos entre as minhas e me posicionando em frente a ela.

Parecia que estávamos sozinhos ali, como se do nada, todos tivessem ido embora para nos dar privacidade. Como se o mundo conspirasse a favor daquele momento, para que finalmente pudéssemos conversar a respeito de tudo que já havia se passado.

- Posso te fazer uma pergunta? – ela foi a primeira a se pronunciar, então afirmei para que ela continuasse – O que você acha que poderia ter acontecido com a gente, se você tivesse ido para Londres. Sei que é algo delicado, mas eu preciso saber o que você sentia naquela época – ela parecia séria, como se precisasse daquela resposta há anos. Afinal, depois que nós abrimos aquela carta, não tivemos nem ao menos tempo de conversar sobre o que tinha acontecido, tudo mudou rapidamente. Pensei por muito tempo antes de responder. Não tivemos nem mesmo tempo de descobrir nossos sentimentos, como eu poderia lhe dizer claramente o que sentia?
- , eu não sei se posso afirmar o que sentia. Nós não tivemos como descobrir, como deixar aparecer. Imagino que você se sinta da mesma forma, afinal, acredito que não foi tudo da minha cabeça – ela olhava para nossos pés, então decidi levantar sua cabeça, para que finalmente pudéssemos conversar olhos nos olhos, e esclarecer nossa vida. Não éramos mais crianças, e poderíamos encarar aquilo.
“Aquele mês esclareceu muita coisa pra mim. O que tivemos, nunca foi normal, e qualquer um podia notar isso, só acho que demorou para que nós notássemos também. Sentir que você precisava de mim, tornou as coisas diferentes. Perceber o quanto você sentiu minha falta, apesar de tudo, aliviou meus pensamentos. O que posso dizer, é que minha única certeza sempre foi que não nascemos para ficar separados. As armadilhas do tempo sempre tornam tudo complicado, mas ouvi de um palestrante, Anthony Robbins, que é nos momentos de decisão que o seu destino é traçado. Tudo que decidimos até hoje, apesar de nos distanciarem, nos trouxeram até aqui. ”
- Eu não posso te afirmar o que eu sentia naquela época, mas posso dizer que é muito próximo do que sinto agora – toquei sua bochecha suavemente com minha mão, e posicionei a outra sob sua cintura – ainda penso em tudo que pensava naquele mês. Quero a chance de acordar do seu lado todos os dias, quero só seguir um dia atrás do outro te amando, mesmo que no final nada dê realmente certo. Quero realizar sonhos ao seu lado, sejam eles meus, ou seus. Sei que tudo pode parecer precipitado, mas já foram tantos anos, . Eu não quero deixar tudo passar novamente.
- – ela sorria, mas parecia apreensiva em relação a tudo que falei. Suas mãos tremiam apoiadas em meus ombros, e preferi acreditar que tudo era apenas um nervosismo, uma ansiedade, mas nos melhores sentidos que poderiam ser – eu não consigo acreditar. Depois de todo esse tempo, sabe? Tanta coisa já passou, é surreal pra mim. Eu tenho uma filha, . Por mais que pareça exagero, nos dias de hoje, uma mulher que é mãe solteira tem mínimas chances de encontrar alguém, e eu entendo isso. Você é tão maravilhoso, você pode encontrar uma mulher linda, ter filhos com ela – vi seus olhos marejarem, mas sabia que ela não choraria.
- Isso tudo foi dito por sua autoestima? Ela está nesse nível? – passei a mão por seus cabelos que balançavam de acordo com a brisa leve que passava por ali – Quem você acha que eu sou? Um homem qualquer do mundo que pertence à frase “homem é tudo igual”? Porque eu pensei que eu era seu melhor amigo. Pensei que você me conhecesse o suficiente por termos crescido juntos e aprendido sobre caráter juntos – ela queria me interromper, mas não permiti – aparentemente, vou ter que te contar algumas coisas. Eu não me importo, . Eu não quero ter uma mulher linda qualquer, porque ela não seria você, não seria linda como você é pra mim. Eu não preciso de filhos com outras. A Ann é adorável, e se você me permitir participar da vida dela, como eu quero participar da sua, eu vou ser a pessoa mais feliz do mundo.
“Eu sempre quis ter filhos. E durante os primeiros anos que fui embora, eu não podia evitar em ver crianças e me imaginar com um filho nosso. Sei que parece exagerado, já que nem ao menos tivemos a chance de ficar juntos por muito tempo, mas eu não podia evitar. Eu imaginava uma menininha ou menininho que poderia vir parecido comigo ou com você, mas que tivesse seus olhos. Eu sempre quis uma criança que tivesse seus olhos, e eu realmente preciso te dizer, que eu não me importo se essa criança é minha e sua, ou apenas sua. Não digo que quero virar o pai da Annie, nunca quero ocupar o lugar de alguém que infelizmente foi tirado da vida dela, ela deve saber tudo sobre o pai como tenho certeza que você já conta, mas eu posso te ajudar, é só você permitir. ”

não conseguiu segurar as lágrimas, então a abracei para lhe dar apoio. Ficamos por alguns segundos assim, até que ela se afastou e apenas balançou a cabeça afirmativamente para mim. Sorri de forma que minhas bochechas doeram. Sorri como talvez nunca tivesse sorrido na vida. Talvez um balançar de cabeça não fosse nada, mas eu preferia acreditar que era um sim para toda nossa história. Finalmente, teríamos nossa chance.

- Sei que você tem medo, , entendo suas inseguranças, e apesar de meio louco inconsequente, eu também pensei em tudo. Mas o que eu sinto se sobrepõe a tudo que você possa questionar, e eu sei que você também sente o mesmo. São anos guardados de sentimento, e algo que posso te contar, é que meu coração bate ainda mais forte que antes, como um adolescente apaixonado.

Percebi que ela não falaria mais nada, então diferente da última vez em que estivemos ali, tomei a iniciativa. Segurei seu rosto entre as mãos e lhe dei um selinho. Coloquei minhas mãos em sua cintura, e senti ela passar seus braços por meu pescoço. Parecia nosso primeiro beijo novamente, mas ainda mais forte. Era um beijo delicado, suave e doce. Eram duas bocas se reencontrando, mas também se conhecendo. Sabia que entre nós nada seria acelerado, levaríamos as coisas aos poucos, e isso começaria a partir desse contato. Nossas línguas se dividiam entre cada espaço possível, e minhas mãos acariciavam sua cintura no mesmo ritmo do beijo. Tudo novo, tudo diferente. A partir dali, eu sabia que tudo passaria a fazer sentido.
Quando nos afastamos, preferimos manter o silêncio. Mas como em filmes de romance, mantivemos nossos rostos próximos, e os sorrisos eram evidentes a quilômetros de distância.

07 de julho de 2018

- , vem cá! – ouvi me chamando de dentro do quarto de Ann e andei rapidamente até lá, deixando a louça na pia – a Ann quer que você leia pra ela e a coloque pra dormir, eu lavo a louça – ela disse se afastando da cama e sorrindo para mim. Sorri de volta e enquanto ela deixava o quarto, me sentei na ponta da cama da garotinha.
- Qual você quer, Ann? – ela apontou para um livro de lombada vermelha que estava na prateleira, o puxei e abri, mas antes que pudesse começar a ler, a senti puxando meu braço.
- Tio , você vai dormir aqui hoje? Você pode dormir comigo e com a mamãe? – eu já havia dormido algumas vezes na casa de , mas não era um grande costume nosso, por conta de não decidirmos morar juntos ainda e não querermos confundir a cabeça da pequena.
- Se a mamãe deixar, eu durmo com vocês. Você só tem que me prometer que vai me deixar te acordar amanhã! – fiz cócegas em sua barriga, mas sem muito alarde, já que ela estava sonolenta.
- Obrigada, tio. Agora lê pra mim que eu vou dormir rapidinho, tá? Quero que amanhã chegue logo pra gente brincar mais – ela bocejou e me puxou para um abraço – Eu amo você, tio .

Não sabia como reagir, não esperava por aquilo. Eu passava dias inteiros com Ann, cuidava dela quando tinha algo pra fazer, e mesmo contra os gostos da mãe, fazia tudo que a criança pedia. Mas talvez ainda não estivesse esperando por isso.

- Eu também amo você, princesa – beijei sua testa e me posicionei para ler o livro, mas não tive que ler muito, já que ela adormeceu rapidamente.





Fim!




Nota da autora: Olá, muito obrigada por ler! Essa é minha primeira fic, to tão emocionada que quando ler essa N/A no site vou chorar hahahah Acompanho o ffobs há anos, sempre gostei de escrever mas nunca havia finalizado uma fic, realmente tomado coragem de escrever e publicar, mas agora tô aqui. E estou muito feliz! Foi difícil, mas acredito que consegui um bom resultado, espero que vocês achem o mesmo hahahaha Quero deixar um obrigada especial pras meninas que tiraram todas as minhas dúvidas existenciais de como enviar uma fic, a Jess por ter feito minha capa que eu tanto amei, meu namorado que me aguentou e puxou meu saco enquanto eu escrevia e principalmente minha melhor amiga Mariana, que tá nessa comigo há anos e me incentivou e ajudou em tudo <3




Nota da beta: Que fanfic mais fofa, Lala! Parabéns, de verdade, me dá uma Annie pra mim? Que criança mais lindinha, gente! Ah, espero que seja a primeira de muitas fanfics suas <3

Lembrando que qualquer erro nessa atualização e reclamações somente no e-mail.




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