Capítulo 1
O dia havia sido supercansativo para ambos. Ainda não se conheciam e nunca tinham cruzado seus caminhos – pois, se tivessem, com certeza usariam o outro para aliviar o estresse e relaxar naquele dia esgotante.
Tudo que queriam era chegar em casa e dormir.
não teve nem dúvidas: logo que chegou, jogou-se na própria cama e dormiu da maneira que caiu, sem ao menos trocar de roupa.
, por outro lado, conseguiu pelo menos tirar a roupa de trabalho e colocar um moletom velho da faculdade. Porém não alcançou a cama: deitou-se por alguns segundos no sofá para dar uma descansada e pegou no sono mais pesado que já tivera.
Nem sabiam que aquilo seria o início de uma das coisas mais importantes que tinham acontecido em suas vidas.
Dourado e Azul Piscina
sentiu como se estivesse caindo no buraco do coelho da Alice no País das Maravilhas.
Quando abriu os olhos, percebeu que realmente estava caindo.
Em um infinito de cores e formas cósmicas. Estava perdida no meio do Universo, os cabelos esvoaçando em volta do rosto, o moletom colorido da faculdade se misturando com os tons de rosa, amarelo, roxo e azulão a sua volta. Estrelas brilhavam como lantejoulas, envolvendo-a em uma espiral que se misturava com seus cabelos.
Tudo era tão lindo que ela nem sabia para onde olhar.
Entre tudo isso, começou a distinguir um som no vento que parecia um assovio. Primeiramente, era distante, mal se diferenciando do próprio assovio das estrelas que cintilavam a sua volta e enroscavam em seus dedos. Mas, conforme ela caía, o som ia ficando cada vez mais alto. Ela tentava adivinhar de onde vinha, porém não conseguia.
Até se espatifar em um chão duro, de um tom rosa antigo.
Espalmando a superfície com um baque, ela se jogou para o lado, virando de barriga para cima e respirando com dificuldade, tentando se recuperar de toda aquela viagem.
E, ao abrir os olhos, deparou-se com um céu azul piscina, envolto por uma construção interminada em tons de dourado.
Ao mesmo tempo em que caiu e abriu os olhos, o assovio parou.
- Você está bem? – ouviu uma voz grave perguntando um pouco a frente e passos se aproximando correndo, ecoando pelo cenário como música.
- Estou sim! – Ela levantou uma das mãos, fazendo joinha e provocando risadas do dono da voz.
De repente, sentiu uma grande mão macia segurando a sua. O toque dele era quente contra a pele gélida dela – resultado da queda cósmica.
Com um puxão leve e gentil, ele a ajudou a se sentar, abaixando-se na frente da moça.
- Tem certeza? – Ele perguntou, porém logo que a olhou nos olhos, franziu as sobrancelhas. – Ué. Eu não te conheço.
- Eu também não te conheço. – comentou de volta, erguendo uma sobrancelha. Aquilo era realmente muito estranho. – É a primeira vez que sonho com alguém que não conheço.
- Idem... – Ele respondeu, pendendo a cabeça para um lado e analisando os traços dela com mais cuidado. Porém, não se lembrou de ninguém que parecia com ela. Só sabia que se sentia bem ao observá-la e poderia passar horas somente admirando-a. – Que estranho... Bom, meu nome é .
Dizendo isso, ele estendeu a mão para cumprimentá-la e deu o melhor sorriso simpático que podia no momento.
- . Prazer em conhecê-lo, . – Com isso, ela segurou a mão dele, retribuindo o cumprimento. Assim como , tinha a impressão que poderia passar a vida inteira admirando-o. Havia algo natural em olhar para aqueles olhos. – Acho que vou gostar do fato de que você invadiu meu sonho!
- Eu não invadi o seu sonho! Você invadiu o meu! – comentou rindo enquanto se levantava e a puxava para cima no processo. ficou em pé e se espreguiçou, olhando em volta logo em seguida.
- Então quer dizer que nós estamos tendo um sonho compartilhado? – Ela ergueu uma sobrancelha, apoiando as mãos na cintura e lançando seu melhor olhar de “isso não faz o menor sentido”.
- É, ok. Você tem um ponto. – Ele considerou, concordando. – Quer dizer que você não existe então.
- Ei, espera aí! Quer dizer que você não existe! – Ela respondeu rindo, fazendo-o rir também.
- Mas eu sou real! Então a única que não pode ser real aqui é você!
- E como você sabe que é real? Por um mero acaso já descobriu altas teorias filosóficas sobre realidade e consegue comprovar a realidade e o sentido de existir? – E claro, queria provocar, perguntando tudo isso com um sorriso divertido no rosto.
- E se eu descobri? Algum problema? – cruzou os braços, olhando-a da maneira mais arrogante que conseguiu, porém com um sorriso simpático estampado nos lábios.
O que resultou em um tapa da parte dela e risadas da parte dele.
- Você sempre gosta de provocar desse jeito? – perguntou rindo e começando a caminhar.
- Acho que da mesma maneira como você sempre tenta arranjar uma explicação lógica pra tudo. – deu de ombros, caminhando despreocupadamente ao lado dela.
Nem perceberam que já conversavam como se tivessem se conhecido há anos e fossem melhores amigos de infância.
Mas havia algo natural em tudo aquilo. Em se encontrar, em conversar. Podiam se conhecer há poucos minutos, mas parecia que tinham se passado anos. Que já conheciam o outro e sabiam exatamente o que esperar. Que podiam dar as mãos e se sentir confortáveis, sabendo que nada no mundo poderia ir contra eles.
- Touché. – Ela comentou de volta, sorrindo. Alguns passarinhos coloridos passaram por eles, cantarolando a mesma música que ele assoviava enquanto ela caía. – Essa música é muito bonita, mas eu nunca ouvi... De quem é?
- Ninguém em especial... – Ele deu de ombros, colocando as mãos nos bolsos da calça jeans manchada. – É minha. Tava com ela na cabeça, mas não é nada de mais.
- Ah, então é especial sim... – respondeu com um sorriso plácido no rosto, fazendo-o olhar para ela, um tanto feliz com o comentário. – Duvido que você faria coisas ruins.
- Nós acabamos de nos conhecer. Como você sabe que eu não faria coisas ruins? – E claro, teve que provocá-la de volta.
- Por causa dos seus olhos. – Ela deu de ombros, olhando-o diretamente nos olhos em seguida. – São gentis. E aconchegantes. Não acredito que uma pessoa com os seus olhos possa ser capaz de fazer coisas ruins em geral. Você deve ser bom em tudo.
- Sabe, não sei se você está falando de coração ou de habilidades. – Ele respondeu tentando não corar com os elogios. Mas sorria que nem um tonto.
- Estou falando dos dois. – E ela piscou rapidamente para ele. – Seus olhos me falam isso.
- Então quer dizer que você gostou?
- Eu adorei. – Após comentar isso, chegaram a um ponto em que o chão dourado terminava e iniciava-se um enorme retângulo azul piscina, do mesmo tom que o céu.
Passaram alguns segundos observando o retângulo, sem saber ao certo o que era aquilo.
- Você acha que é chão...? – perguntou silenciosamente, como se aquilo fosse atacá-los se fossem muito bruscos.
- Não sei... – respondeu também achando aquilo muito suspeito. – Será um espelho? É da mesma cor que o céu...
- Bom, só tem um jeito de sabermos! – Ele finalmente decidiu, estufando o peito e rolando as mangas da camisa até os cotovelos. Ela observava com uma sobrancelha erguida.
- O que você vai fazer...?
- Vou pisar. Qualquer coisa, você sai correndo! Certo? – respondeu com um sorriso enorme estampado nos lábios.
Mas ela o segurou pelo braço.
- E se isso aí te engolir vivo?! – Os olhos dela estavam enormes de preocupação, algo que ele admirou bastante.
- Daí você corre pela sua vida. Sem olhar para trás. – Ele comentou de maneira dramática.
E a expressão de horror no rosto dela somente aumentou.
sinceramente sentiu vontade de abraçá-la, de tão linda que a estava achando.
- Não! Eu não vou te deixar pra trás! Poxa, a gente acabou de se conhecer, você tem que ficar aqui comigo no mínimo até o fim desse sonho maluco! – Aqueles argumentos fizeram com que começasse a rir.
- Você vai fazer de tudo para me puxar de volta e me salvar se algo acontecer, não é? – Era mais uma pergunta para afirmar algo do que para checar se aquela seria realmente a reação dela. Ele sabia que ela faria aquilo.
- Yep. Como você sabe?
- Seus olhos. São corajosos e gentis. – Ele comentou batendo de leve com o indicador na ponta do nariz dela, enquanto sorria. – Verdadeiros também. Acho que não posso esperar nada além de sinceridade de você.
começou a sorrir, soltando o braço de . Sabia que podia confiar que ele não faria algo idiota.
Ou, pelo menos, não faria algo muito idiota.
- Agora eu vou! O outro lado parece muito mais interessante e teremos que atravessar isso aqui de alguma maneira! – Dizendo isso, ele não deu muito tempo para que ela pensasse e enfiou o pé na superfície azul.
Os pés de não se afundaram... Muito pelo contrário. Permaneceram na superfície, criando uma série de ondas esféricas, que reverberavam à distância. Conforme ele dava seus passos e mais ondas se criavam, começaram a ouvir uma melodia que se formava a partir das ondas que reverberavam dos pés dele.
- É água! – Ele comentou animadamente, virando-se para ela com um sorriso enorme pintado nos lábios. – E olha que legal! Ela brilha em neon verde quando eu piso!
mal tinha notado aquilo, porém ficou ainda mais maravilhada.
- É seguro de andar? – A moça perguntou, preparando os pés descalços para entrar em contato com a água musicalmente colorida.
- Parece gelatina, você vai adorar! – Ele respondeu prontamente, começando a tirar os próprios sapatos. – Descalço deve ser muito melhor... Ah, nossa, e é! Você tem que vir!
Dizendo isso, jogou os sapatos para algum lugar ao lado dela e estendeu uma das mãos para a moça.
- Confia em mim. Vem!
não era de confiar facilmente nas pessoas. Apesar de maravilhada, estava receosa de que algo desse errado quando ela pisasse no líquido colorido. Porém, quando estava para dizer aquelas coisas a , seus olhos encontraram os dele. Aqueles olhos sinceros e gentis, que ela gostara tanto quando os admirou pela primeira vez. Sabia que podia segurar na mão dele e confiar nas palavras de . Sabia que ele não deixaria que ela afundasse.
- Ok... Me segura!
- Pode deixar. – Ele abriu um sorriso sincero, o que a fez imediatamente segurar a mão aveludada de . Apesar de delicado, ele a segurou de maneira forte, sem machucá-la, retirando qualquer dúvida do coração dela.
Enquanto ela sorria, os pés de tocaram o líquido levemente gelatinoso pela primeira vez. A água era refrescante e ela planava sobre esta como se não pesasse mais que uma pena. Tons de roxo neon se acendiam gradativamente enquanto ela andava e criava ondas próprias, que reverberavam em um tom diferente do tom das ondas dele. Tons diferentes, porém complementares, extremamente harmoniosos.
- Escuta só... – Ele comentou, andando devagar de braços dados com ela. – Somos melodias maravilhosas!
- Formamos uma bela música. – teve que concordar, sorrindo para ele em seguida.
Se fossem uma música, provavelmente seriam uma das mais gostosas de se ouvir.
Enquanto pensava nisso, sorrindo despreocupadamente, começou a sentir o braço de se desenlaçando do próprio. Franzindo as sobrancelhas e estacando no lugar, ela finalmente voltou o olhar para ele.
Só para encontrá-lo deslizando pela água, fazendo uma dancinha aleatória no ritmo da melodia dos pés deles.
Imediatamente, a moça começou a rir.
Ele parou para observá-la rindo daquela maneira. Alguma coisa no fundo da mente de dizia que aquela era uma cena rara, algo que não acontecia todo momento e ele deveria apreciar como um bom vinho.
Sendo assim, esticou a mão para ela novamente, fazendo-a observar com um par de olhos brilhantes e divertidos.
- Dança comigo, ? – E abriu um enorme sorriso ao fim da frase, ao mesmo momento que uma leve brisa trouxe flocos dourados para cintilar em volta dos dois.
Pela segunda vez naquele sonho, se viu fazendo algo que jamais faria na vida real. Estendeu a mão prontamente e segurou a de , sem receio algum, com força. Empolgado com aquela reação, ele imediatamente a girou, começando a caminhar e conduzindo-a naquela dança levemente desconjuntada, mas certamente coordenada.
Os dois eram complementares, por mais que não se esforçassem para tanto.
- Já tentou dar uma de Dirty Dancing? – Ele perguntou de repente enquanto girava junto com ela, formando duas notas continuas na água que explodia em verde e roxo neon.
- Você tá brincando? – Ela fingiu indignação, fazendo-o rir imediatamente. parou de costas para e ele a segurou pela cintura, os dois dançando enquanto andavam, criando a melodia continuamente. – Não sou nem louca!
- Por quê?! – E agora ele estava genuinamente indignado. – Você dança bem, deveria tentar! Vai me dizer que nunca quis?!
- Claro que sempre quis! – Ela começou a rir enquanto ele deslizava ao lado dela em uma nota continua e dava pequenos passos para completar a melodia que acabara de fazer. – Mas querer não é poder, .
- Essa foi... – E ele segurou a mão dela, girando-a enquanto movia os pés para completar a nota cristalina e continua que gerava. – A frase mais horrível... – Ele a puxou para si, levantando-a brevemente no ar. – Que eu já ouvi!
Com isso, os pés dela voltaram para a água, com notas agudas, curtas e suaves, que pareciam pingos d’água, enquanto ele deslizava os pés em passos perfeitos de gliding para complementar o som. Enquanto faziam isso, jamais soltaram as mãos.
- É horrível, mas é verdade. – deu de ombros enquanto ele a puxava e a fazia deslizar pela água. segurou-a quase em um abraço, percebendo que o corpo da moça ficou imediatamente tenso... Como se ela não estivesse acostumada a ser tratada daquela maneira. – A realidade nem sempre é bela.
- Mas aqui não é a realidade, não é mesmo? – aproximou o próprio rosto do rosto de , falando em um sussurro. – Estamos sonhando.
E, com essa frase, ele deu uma leve batidinha com o dedo indicador na ponta do nariz dela, sorrindo em seguida. Isso fez surgir um dos mais belos sorrisos que ele vira no rosto de alguém.
- Já ouvi muita gente dizendo que a realidade é relativa. Quem não te garante que aqui é a realidade e lá fora é o sonho? – começou a se mover devagar, ainda mantendo-a entre os braços. ainda estava tensa, movimentando-se com receio e de maneira travada, completamente diferente da dança em que estavam antes de se encontrar envolvida pelos braços dele. – Aqui é bem mais interessante do que aquilo que chamamos de realidade... Temos eu, você, esse cenário lindo... E você me diz que a realidade não é bela?
- E quem te garante que aqui não é a realidade? – Ela perguntou de volta, com um pequeno sorriso nos lábios, tentando conter a expectativa que se criava no fundo do estômago que ele daria uma resposta boa. Não queria se desapontar, então tentava ao máximo não esperar muito dele.
- A realidade é relativa. Se eu escolher aqui como a minha realidade, quem pode me dizer que não é? – respondeu com um sorriso sapeca nos lábios, piscando para ela logo em seguida.
E sorriu. Ele não desapontava.
- Espera. Tem algo no seu cabelo... – Ele disse repentinamente e, sem ao menos esperar uma reação dela, passou os dedos pelos cabelos de .
Ela teria ficado na defensiva e se distanciado dele se não fosse pelo que aconteceu em seguida.
Várias estrelas ficaram alojadas entre os cabelos dela enquanto caía pelo Universo até ouvir a música de . Quando ele mexeu nos fios de cabelo da moça, essas estrelas se soltaram no ar, flutuando com as partículas douradas que cintilavam ao redor deles – como pólen no ar de primavera.
Rindo, assoprou o rosto dela, fazendo mais estrelas se soltarem dos cabelos de . Ela franziu as sobrancelhas, rindo daquela reação.
- Você é um dente de leão, só estou fazendo um pedido para as suas estrelas. – Ele comentou piscando para ela antes que perguntasse o motivo do sopro.
- E posso saber o que você pediu?
- É segredo. Só posso contar depois que se realizar. – E, dizendo isso, começou a caminhar para longe dela, ainda dançando e criando uma melodia cada vez mais animada. Parou repentinamente enquanto ainda passava a ponta dos pés pela água para acompanhar a música dele. – Agora... Dirty Dancing?
- O quê? – E ela foi pega de surpresa, rindo como nunca da cara de empolgação dele. – Você não vai sossegar enquanto não fizermos isso, né?!
- Jamais! Vou te perseguir nessa água toda se precisar! – Ele respondeu rindo, abrindo os braços para ela logo em seguida. – Você faz a sua própria realidade, lembra? Querer é poder. Se joga!
não conseguia parar de rir. Ele era a pessoa mais empolgada do planeta Terra – ou do planeta em que eles estavam, pois tinha certeza que aquele não era o mundo que ela conhecia – e simplesmente não tinha como dizer não.
A mente lógica dela queria dizer não. Porém, o coração queria dizer sim.
Ela nunca iria saber o que a influenciou naquele momento: as partículas douradas formando torvelinhos contra o céu azul piscina, as estrelas flutuando como flocos de neve, as ondas roxas e verdes neon, a melodia complementar que os dois formavam... O sorriso de e seus olhos gentis, encarando-a com a maior sinceridade do mundo. Talvez fosse tudo, talvez fosse somente ele... Mas ela respirou fundo e correu.
Viu se preparando para segurá-la, sorrindo mais ainda ao ver que ela tinha aceitado a idéia. Ela tinha certeza que ele a seguraria. Ele tinha certeza que jamais a deixaria cair. Conforme se aproximava, formando uma melodia crescente com cada passada que dava na água de ondas arroxeadas, tinham cada vez mais certeza de que aquilo daria certo.
Quando estava próxima, ela tomou impulso e pulou: sem hesitar ou parar. Simplesmente se jogou nos braços de , desejando com todo seu coração que ele a segurasse e não a desapontasse.
Ao sentir duas mãos fortes em sua cintura dando apoio para que ela pairasse no ar, abriu os olhos, observando aquela bela paisagem de dourado e azul piscina. Começou a sorrir imediatamente.
- Eu estou voando, ! – A moça comentou empolgada, começando a rir. – Você me fez voar!
- Nope. Você voou, ! – Ele respondeu, também rindo. Ficava feliz ao vê-la feliz. – Eu só te dei o suporte!
Permaneceram mais algum tempo na posição até começar a trazê-la de volta para a água. Assim que os pés dela tocaram a superfície – com as notas de gotas d’água, como nos momentos anteriores – olhou para ele, mal percebendo que estava envolvida pelos braços de .
Porém ele percebera que ela não estava tão tensa quanto anteriormente.
E, ao se olharem nos olhos, sentiram que estavam sendo atraído um pelo outro como se algo magnético os influenciasse.
Antes que algo pudesse acontecer, sentiram a água sob seus pés ficando mais fina. Tiveram somente o tempo para olhar para baixo e encontrar os olhos do outro novamente antes de caírem dentro da profunda imensidão aquática na qual se encontravam.
O sonho havia terminado.
Salmão Claro e Laranja
ficou aérea durante o dia inteiro.
Tentava se concentrar na vida normal e nas tarefas do dia, mas tudo parecia fazê-la lembrar daquele ser maravilhoso que tinha conhecido naquele sonho.
, esse era o nome dele – ela pensou enquanto caminhava pela rua, carregando um copo gigante de chá de jasmim com baunilha. Ele se chamava e tinha o sorriso mais lindo que ela já vira; os olhos mais gentis.
começou a sorrir sozinha enquanto passava por entre um corredor de plantas e pequenas flores brancas de jasmim no parque que precisava atravessar para continuar seu dia. Aqueles milhares de flores pareciam às estrelas que voaram dos cabelos dela quando a assoprou como um dente de leão.
Daria de tudo para que ele fosse real. Desejava do fundo do coração que ele fosse real.
Enquanto observava as flores estreladas, mal percebeu que uma pessoa vinha na direção contrária, andando o mais rápido possível, pois já estava atrasado e seus amigos iam esganá-lo por chegar tarde ao ensaio.
mal percebeu que a moça que caminhava com o sorriso no rosto, vindo na direção dele, era a mulher que ele não tinha conseguido tirar da cabeça desde o momento em que acordara.
. Ele se lembrava do nome dela pelo menos. Não queria admitir, mas atrasara para sair de casa, pois resolvera procurá-la em todas as redes sociais possíveis, listas de contatos, fotos no celular... Ela precisava ser real. Ele tinha que ter conhecido aquela moça pelo menos em algum dia da sua vida.
Mas fora tudo em vão. não a encontrou e, agora, estava frustrado e esperando que aquele dia acabasse. A probabilidade de sonhar com ela novamente era quase nula e ele perdera todas as esperanças de vê-la naquele dia.
Até o momento que ouviu um assovio.
A melodia que ela comentara que gostara durante o sonho.
Ninguém além de conhecia aquela melodia.
Ele parou no lugar e começou a procurar a origem do som, desesperado. Não era possível. Ela era real. Tudo que queria naquele momento era olhar para o rosto dela, tocá-la no que ele sabia ser a realidade. Mas não conseguia achá-la de jeito nenhum.
Mas a melodia eventualmente parou. viu uma moça prestes a atravessar a rua, usando um casaco azul piscina, mas achou que era o próprio cérebro brincando com ele. Aquilo seria coincidência demais.
E, antes de atravessar a rua, ajustou a gola do casaco azul piscina, para que o vento deixasse de atingir seu pescoço e ela continuasse com uma voz boa para cantar e assoviar aquela melodia maravilhosa que a apresentara na noite anterior.
Antes de fechar os olhos, já deitado confortavelmente em sua cama, viu aquele casaco azul piscina com a sua própria música ecoando nos ouvidos. Ao cair no sono, sentiu-se repentinamente como se estivesse envolto em um líquido viscoso, porém leve.
Percebeu que podia caminhar, apesar de parecer como se estivesse nadando. Parecia que havia uma película logo à sua frente, revelando uma enorme sala de paredes salmão claro e chão laranja. Espalhadas pela sala havia diversas bolas das mais diversas cores – azul, amarelo, roxo...
Mas o que mais chamou a atenção dele foi um certo casaco azul piscina.
Era diferente do casaco que ele vira na rua: uma versão fofinha e comprida, até a metade das coxas da moça, feito de lã e com desenhos de renas e flocos de neve em branco. Ironicamente, ela usava um pijama branco que era composto por um shorts e uma camiseta um tanto maior do que o real número dela.
Mas aquele cabelo era inconfundível. tinha certeza que estava sonhando com . Novamente.
Afobado, ele caminhou contra a viscosidade do líquido em que se encontrava, estendendo a mão até a película que separava o líquido e o local em que caminhava despreocupadamente.
Quando os dedos dele tocaram a película, percebeu que sua mão começou a atravessar para o outro lado. Ele sorriu, esforçando-se cada vez mais para atingir o outro lado.
- ! – Ele chamou, porém a moça nem notou. – !
Aparentemente, ela não conseguia escutá-lo do outro lado. A mão de já tinha atravessado e agora ele se esforçava em atravessar a cabeça, para que pudesse chamá-la.
Por um acaso, se virou para o líquido em que se encontrava. A única diferença era que, ao invés de enxergá-lo como se estivesse dentro de um aquário, tudo que a moça via era a mão dele e a cabeça sorridente de – contente com o fato de que ela finalmente o tinha visto – enquanto todo o resto era um enorme espelho no qual ela via o próprio reflexo.
- ! – abriu o maior sorriso do mundo ao vê-lo. – Como você se enfiou aí?
- Não sei! – Ele respondeu rindo enquanto ela corria até ele. – Já acordei aqui.
- Deixa eu te ajudar então! Vem cá! – Dizendo isso, segurou a mão de com segurança, entrelaçando os dedos nos dele para ajudar a puxá-lo para o lado dela do espelho. – Nossa, o que tem aí do seu lado? Tá difícil de te puxar!
- Não sei, parece uma água mais densa... Por quê? O que tem do seu?
- Um espelho. – Ela respondeu com uma sobrancelha erguida, começando a puxá-lo por um dos ombros, ainda sem soltar a mão de . – O que eu mais fico impressionada é que você está seco.
- Nossa, verdade, né? – Ele perguntou de volta enquanto balançava levemente os cabelos macios. – Se segura que eu vou dar um impulso!
- Pode deixar, eu sou forte, querido. – brincou, piscando para ele e fazendo-o rir.
Com isso, segurou a mão dela com mais força, enlaçando o outro braço na cintura de e usando os pés para dar o impulso que precisava para sair do espelho.
- Nossa, ...! – Ela exclamou, perdendo o equilíbrio e começando a cambalear.
- Desculpa, ! – Ele respondeu, tentando equilibrar os dois e mantê-la em pé, porém foi uma tarefa em vão.
Os dois acabaram no chão, com em cima de , fazendo várias das bolas que se encontravam próximas a eles rolarem para todos os lados, causando o maior estardalhaço pelo local.
Apesar de tudo, ele se certificou de colocar uma das mãos atrás da cabeça dela, a fim de que não se machucasse. Pelo menos não muito.
Os dois se olharam em silêncio após todo aquele escândalo.
- Muito sutil. – comentou repentinamente.
E aquilo fez com que os dois começassem a rir imediatamente.
- Você falou que era forte! – respondeu, porém claramente não a culpava pelo ocorrido.
- Não estava esperando que você viesse para cima de mim feito uma revoada de hipopótamos! – Ela comentou, fazendo-o rir mais ainda.
até abaixou a cabeça, apoiando a testa em um dos ombros de . Ela ficou imediatamente tensa, finalmente consciente da situação em que se encontravam.
Queria se sentir à vontade com aquele contato, mas não conseguia ficar 100% confortável. Apesar de tudo, sempre tinha aquela vozinha irritante no fundo da mente dizendo a ela que ele podia estar somente se aproveitando da situação.
Mas logo levantou a cabeça para observar o rosto dela, percebendo que tinha ficado tensa. E lá estavam eles: os olhos sinceros e gentis de . Ela se sentiu relaxar aos poucos nos braços dele, como se fosse um cubo de gelo derretendo lentamente.
E, claro, ele percebeu, sorrindo levemente. Em um gesto automático, se atreveu a correr os dedos pela bochecha dela, acariciando-a levemente, como se fosse fugir caso ele fizesse algum movimento brusco. Porém, ela estava tão segura com o olhar dele, que não se incomodou com nada.
O que eles mais estranhavam era como podiam se sentir tão à vontade na presença do outro se somente fazia tão pouco tempo que haviam se conhecido. Era como se alguma outra coisa os conectasse, algo alheio ao tempo.
- ... – A voz de estava levemente mais grave e aveludada, soando como uma nota aconchegante em uma melodia familiar. aguardava em expectativa o que ele ia falar.
Até ser interrompido pelo som de uma explosão.
Ela agarrou os ombros dele enquanto ele a segurou com mais força, ambos imediatamente olhando para a origem do estrondo com os olhos arregalados.
E foi aí que descobriram que as bolas que estavam rolando pelo chão, brilhantes como vidro, não eram feitas de vidro: eram bolas de tinta.
- ... – comentou com os olhos semicerrados. – É minha impressão ou essas bolas são tipo aqueles balões cheios de tinta que usamos para fazer guerrinhas quando estamos acordados?
- Acho que são exatamente isso... – respondeu com o mesmo olhar que ela.
Após alguns segundos de silêncio, ambos trocaram olhares novamente. E, em seguida, sorriram.
- Eu vou te massacrar nessa guerra. – Ela disse e, imediatamente, começou a ajudá-la a se levantar.
- Você acha que vai! – Ele riu e apontou para a roupa dela. – É melhor tirar esse casaco, querida. Ou vai se arrepender amargamente.
- A gente tá sonhando, não? Então. Não é como se fosse ficar sujo de verdade. – piscou para ele e, em seguida, apontou para a roupa que ele usava. – Agora, você tem mania de dormir de roupa de sair, é isso?
olhou para a própria roupa. Usava uma calça de moletom de ficar em casa e uma blusa branca simples, porém uma de suas jaquetas azuis de sair – que era o casaco mais próximo que tinha da cama quando ficou com frio e a preguiça foi maior do que a vontade de procurar uma blusa de manga comprida para se abrigar do vento gélido.
Ele levantou o dedo indicador e abriu a boca para começar toda a explicação, porém logo sentiu um líquido denso escorrendo pelos próprios cabelos, atingindo a lateral do nariz e pingando pelo queixo, achando o caminho até o pescoço.
abriu os olhos e passou a observá-la com um par de olhos incrédulos e uma expressão vazia.
sorriu como uma criança que fez algo muito errado, porém muito divertido.
- Eu disse que ia te massacrar. – A moça comentou e fez joinha com ambas as mãos.
Imediatamente, começou a sorrir enquanto limpava um pouco da tinha azul Royal de seu rosto.
- Ok, mocinha. Você está oficialmente perdida! – Assim, pegando uma bola amarela, passou a persegui-la sem dó nem piedade.
Os dois correram e jogaram tinta para todos os lados. Riram mais do que nunca e em momento algum se sentiu desconfortável quando a agarrava nos braços e a girava no ar, explodindo alguma bola colorida diretamente no corpo dela e manchando tudo que estava em volta.
Quando todas as bolas haviam acabado, as paredes e o chão estavam inteiros manchados como uma grande obra de arte abstrata – sendo que eles eram os elementos principais do quadro. Encontravam-se sentados no chão, cansados e rindo de si mesmos.
- Diga-me, ... – comentou, apoiando os braços nos joelhos. – Você é animado desse jeito na vida real também?
- Em geral, sim. – Ele respondeu com um sorriso, porém parecia um tanto cansado logo em seguida. – Claro que não consigo ser 100% do tempo... A vida é meio estúpida de vez em quando. Mas tento manter o otimismo!
- A vida é realmente estúpida quando quer... – A moça concordou, sem olhar nos olhos dele enquanto comentava. a observou durante alguns momentos.
- O que aconteceu com você?
- Oi? – E ergueu uma sobrancelha. Ou ele estava sendo direto demais ou ela perdera o fio da meada da conversa.
- Já percebi que você não se sente confortável com intimidade demais e tende a ser um pouco amarga em relação à vida. Aposto que fala que é realista, mas uma coisa é ser realista e outra coisa é não ter esperança. Você tem esperança, eu vejo isso nos seus olhos. Mas fica se sabotando com a sua mente lógica. – explicou como se não estivesse falando nada de mais. – O que aconteceu com você?
não sabia se estava boquiaberta com a sinceridade absurda dele ou com o fato de que ele conseguira lê-la tão facilmente enquanto as outras pessoas no mundo real pareciam nem perceber o que ele acabara de falar.
- Uau. Eu nem sei como responder. – Ela estava até um pouco desnorteada.
- Com sinceridade...? – sugeriu com um pequeno sorriso nos lábios e um par de olhos honestos. – Eu realmente quero ouvir a resposta. Você é muito interessante para eu simplesmente deixar isso de lado.
- Obrigada. – respondeu tentando não corar, porém falhando levemente. – Preciso responder agora mesmo...?
- Não. Contanto que você me responda eventualmente, estarei feliz. – E ele segurou uma das mãos dela, em um gesto inconsciente. Como se fosse a coisa mais natural do mundo a se fazer. – Não quero que você fique desconfortável. Só quero que você confie em mim para contar esse tipo de coisa.
- Pode ter certeza que eu vou confiar. – Ela piscou de volta para ele, fazendo-o sorrir radiantemente. Porém, logo trocou a atenção para o espelho que estava por perto. – ... É minha impressão, ou o espelho está chegando mais perto da gente?
- O espelho...? – olhou confuso para trás e, realmente, parecia que o espelho estava mais próximo. Ele olhou para ela. – Será que é para entrarmos?
- Parece que sim. – deu de ombros. – O que você acha?
- Acho que dessa vez tentamos juntos. – E foi a vez de piscar para ela.
Os dois se levantaram e, ainda de mãos dadas, ficaram obsevando o próprio reflexo sujo de tinta no cenário anteriormente salmão e laranja que agora parecia uma mostra de arte moderna. Os dois começaram a sorrir.
- No já? – Ela perguntou esperando que ele fosse começar a contar.
- Ok. – confirmou e segurou a mão dela com mais força. – Já!
Assim, os dois adentraram novamente o líquido em que havia acordado naquele sonho.
Sentiram como se estivessem flutuando, com a visão do local que estavam do outro lado do espelho. Havia todo tipo de cor imaginável, porém o líquido era tão eficiente como água: toda a tinta com a qual haviam se sujado diluíra-se com o primeiro contato com o espelho.
- Você me viu do outro lado quando chegou aqui? – Ela perguntou apontando para a sala abstrata. somente confirmou com a cabeça.
- Flutuar é gostoso, mas esperei o dia inteiro para poder encontrá-la de novo. – Ele respondeu com um sorriso estampado nos lábios. Em seguida, finalmente se lembrou do que precisava perguntar. – Ah, , uma pergunta: você se lembra da melodia que assoviei ontem no sonho?
- Claro! Não conseguia tirar da cabeça. – Ela respondeu enquanto fazia alguns passos de dança aleatórios, que só ficavam mais graciosos com o fato que parecia que ela estava flutuando. – Por quê?
- Hoje eu acho que...
Mas, de repente, a voz de sumiu. abriu a boca para falar que não conseguia escutá-lo, porém a própria voz desapareceu. Os dois franziram as sobrancelhas, estranhando aquela situação e procurando as próprias vozes.
E, quando soltaram as mãos, tudo que estava em volta desapareceu. Cada um acordou em sua cama, sozinho, com o dia nascendo juntamente com o sol.
Torciam para que se conseguissem se encontrar no próximo sonho.
Azul Bic e Rosa Chiclete
não conseguiu deixar de sorrir quando viu balões vermelhos flutuando sobre a própria cabeça.
Tinha combinado de se encontrar em um parque com algumas amigas naquele fim de semana, porém elas estavam atrasadas – isso porque a própria já tinha se atrasado – e lá estava ela aguardando pacientemente.
Foi nesse momento que um senhor vendendo balões vermelho cereja entrou no campo de visão dela.
E tudo que conseguiu ver foi o sorriso de enquanto ele corria atrás dela com um balão cheio de tinta vermelha em mãos, gritando “eu vou te pegar, você não irá escapar de mim”!
Ela suspirou. Repentinamente, sua mão parecia vazia e áspera, como se faltasse algo macio entre seus dedos. Queria segurar a mão de mais uma vez... Porém na realidade, não somente dentro de um sonho.
E se ele não passasse de um sonho?
imediatamente parou de sorrir e o dia parecia mais gélido e cinza. Lá estava a mente dela, novamente dando explicações lógicas para algo bom, fazendo-a substituir esperança por realidade.
- A moça está com cara de quem precisa de um balão. – Ela ouviu repentinamente, saindo de sua espiral depressiva de pensamentos e deparando-se com o senhor vendedor de balões à sua frente.
E não conseguiu deixar de sorrir. O sorriso dele lembrava absurdamente o sorriso aconchegante de .
- Acho que o senhor tem razão. Eu vou querer um, por favor! – Dizendo isso, comprou o primeiro balão após anos sem tocar em um na vida real.
Quando segurou a cordinha branca, não pôde deixar de sorrir. Imediatamente, o senhor começou a rir.
- Agora sim! Uma moça bonita que nem você não deveria ficar com aquela expressão triste!
- Obrigada! – E ela saiu caminhando enquanto um grupo de crianças se aglomerava em volta do homem para comprar balões.
estava mais do que contente com o seu. Caminhava despreocupadamente, sentindo o vento batendo levemente nos cabelos. Era como se estivesse lá com ela. Pelo menos uma coisa física e real que podia acompanhá-la e fazê-la lembrar dele.
Ela tinha certeza que amarraria o balão em uma cadeira e conversaria com ele quando chegasse em casa, por mais estúpido que aquilo parecesse.
Rindo de si mesma, ela mal escutou o próprio celular tocando. Pegando o aparelho às pressas para atender, derrubou-o no chão, fazendo-o escorregar até a beirada da fonte perto da qual ela se encontrava. Com a vibração, o celular logo ia cair na água, dando um prejuízo absurdo.
Na pressa para pegá-lo, porém, o balão se soltou das mãos dela, voando rapidamente para bem longe.
- Não! – E tentou agarrá-lo, mas logo teve que voltar a atenção para o celular, antes que o aparelho mergulhasse na fonte.
Sentada à beirada dessa, a moça voltou a não sorrir, atendendo às amigas que ligavam e fazendo o melhor que podia para que pelo menos sua voz permanecesse animada e alegre – por mais que sua expressão fosse exatamente o contrário.
A alguns metros dali, um grupo de amigos caminhava e conversava alegremente, enquanto somente um deles permanecia aéreo e completamente alheio aos assuntos. Estava pensativo demais, sem vontade de se comunicar com as pessoas a sua volta.
Foi nesse momento que um balão vermelho passou voando rapidamente. Ele enroscou os dedos no fio branco, observando a bola cor de cereja.
Imediatamente, deu seu primeiro sorriso do dia. Todos seus pensamentos aéreos se focaram novamente na realidade e, finalmente, ele estava presente no momento.
- De quem será que é...? – E ele começou a procurar por alguma criança desesperada atrás do balão, mas não achou ninguém.
- Ei, ! Você não vem?! – Um dos amigos dele perguntou repentinamente.
- Ah, desculpa! Estou indo! – respondeu e amarrou o fio em seu pulso, pensando em procurar a pessoa que perdeu seu balão enquanto andassem pelo parque.
Mesmo assim, sentia-se melhor que antes. Não pôde deixar de se lembrar de sorrindo para ele enquanto tentava acertá-lo com os balões de tinta.
Não via a hora de encontrá-la à noite.
POP!
O chiclete estourou e os dois abriram os olhos em um sobressalto.
Não entenderam de onde tinha saído o chiclete rosa que explodira repentinamente, somente sabiam que acordaram em um longo corredor azul Royal com faixas cor de rosa – igual ao chiclete – percorrendo a parede.
- ! – exclamou logo que o viu, acenando alegremente para ele.
- ! – E ele fez o mesmo, começando a correr na direção dela.
Porém, conforme ele chegava mais perto, a velocidade ia diminuindo. Continuou assim até que os dois pararam, ainda distantes, observando-se com as sobrancelhas franzidas.
- O que você tá fazendo no teto? – Ambos perguntaram ao mesmo tempo, começando a rir logo em seguida.
- Eu não estou no teto! É você quem está! – apontou para ele, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.
- Para mim, você está no teto. É tudo uma questão de perspectiva. – respondeu com um sorriso convencido no rosto, certo de que tinha acabado de falar algo muito inteligente.
- Ok, Sr. Perspectiva. Como vamos fazer para nos encontrar então? – Ela perguntou colocando as mãos na cintura e começou a rir da cara de perdido que ele fez em seguida.
- Eu posso te puxar pra cá. – respondeu como se fosse óbvio, dando de ombros.
- E porque eu não posso te puxar? – Ela ergueu uma sobrancelha, achando-o muito petulante.
- Porque aqui tem um acesso para algum outro lugar e não dá pra chegar lá de onde você está. – E ele apontou um feixe na parede que, de fato, só dava para alcançar do lugar onde ele estava. – Você vai ter que vir pra cá.
- Em resumo: eu vou ter que me jogar. – comentou de maneira meio desconfortável.
- Para mim, você estará pulando nos meus braços. Novamente: perspectiva. – piscou para ela, esticando os braços logo em seguida. – Pode vir!
- ... – A moça comentou meio incerta, aproximando-se mais ainda dele. Nem se esticasse os braços e ficasse nas pontas dos pés ia conseguir tocá-lo. E realmente queria tocá-lo.
- Eu vou te segurar. Nunca vou te derrubar. Disso você pode ter certeza. – E ele a assegurava ainda mais com a honestidade que colocava no olhar. – . Pode pular.
- Eu sei que você não vai me deixar cair... – Com essa frase, ela suspirou, passando a mão pelos cabelos. – Mas lembra da conversa que tivemos ontem? Então. Todas as pessoas que me falaram exatamente as mesmas palavras que você me disse agora deram um jeito de me deixar cair. Eu só quebro a cara e me desaponto com as pessoas. Sinceramente, não quero me desapontar com você. Por isso não quero nem tentar, pois se eu não tentar, não irei me desapontar.
E parou de falar quando percebeu que ele estava sorrindo. Radiantemente até.
- Por que raios você tá sorrindo desse jeito? – Ela perguntou com uma sobrancelha erguida, achando que ele tinha enlouquecido de vez.
- Você me contou. – respondeu ainda com o sorriso bobo estampado nos lábios. Com isso, esticou os braços mais uma vez. – Eu não vou te desapontar, . Jamais. Pode vir que eu vou te segurar.
- E se você me deixar cair...? – suspirou, mas já não encontrava tanta força de vontade em si mesma para discutir com ele.
Simplesmente porque os olhos de davam a ela toda a segurança que precisava.
- Eu caio junto com você. – Ele respondeu sorrindo. – Vem. Confia em mim.
Lá estava aquela frase de novo. “Confia em mim”. tinha por standard não confiar, pelos motivos que ela mesma expusera para ele minutos antes. As pessoas desapontavam e ela estava cheia de ser desapontada. Estava cheia de confiar e ser esfaqueada pelas costas. “Não confiar” era o normal dela, a zona de conforto de . Sabia muito bem em como lidar com os relacionamentos sem confiar em ninguém e esperando sempre o pior de cada um.
E na frente dela, lá estava aquele ser humano sorridente, um pequeno raio de sol que a deixava segura com sua melodia familiar. mal o conhecia, mas sabia que não havia mentira nas palavras de . Sabia que podia confiar nele com a própria vida, se precisasse.
Portanto, não fazia a menor idéia de como lidar com aquilo.
- Ok. – Foi tudo que a moça conseguiu proferir.
Com isso, distanciou-se de , tomou impulso e correu. De olhos abertos, não os desgrudava dos olhos de . Queria achar algum motivo para parar, para diminuir a velocidade e continuar distante dele, no local no qual havia acordado com o estouro do chiclete. Porém, os olhos de não deixavam dúvida, não fraquejavam e nem titubeavam: ela podia confiar nele. Podia ter certeza que ele estaria lá e daria apoio.
Sem conseguir controlar os próprios pés, ela empurrou o chão embaixo de si, esticando os braços para alcançar . Em poucos segundos, fechou-os em volta do pescoço dele, enquanto ele a segurava firmemente pela cintura, trazendo-a ao chão com cuidado.
- Viu? Eu disse que te pegaria. – piscou para ela e, em seguida, segurou uma das mãos de , fazendo-a girar à frente dele. – Posso perguntar o motivo de tê-la tão bem vestida essa noite?
- Ah, isso? – Ela perguntou um tanto envergonhada, apontando para a própria roupa. Usava um vestido roxo escuro, simples e de festa, muito chique para a ocasião. – Fui a um coquetel com uma amiga hoje, por isso a roupa. Voltei tão cansada que pensei em cochilar rapidinho antes de colocar o pijama, daí deu nisso.
- Você está maravilhosa. – Ele piscou novamente para ela, fazendo-a corar de leve. Como logo ia ficar com muita vergonha com aquela conversa, ela resolveu mudar de assunto.
- E você? Qual foi a ocasião de hoje? – apontou para o terno azul petróleo e a camisa branca que usava. – Não que você nunca esteja muito bem vestido para um sonho, mas é que hoje acabou se superando.
- O mesmo motivo que você! – Ele respondeu rindo, ajeitando a gola da camisa. – Estava cansado demais para trocar de roupa.
- Ainda bem. Também acho que está bonito assim. – Ela respondeu com um pequeno sorriso nos lábios, claramente não acostumada a fazer aquele tipo de comentário. – Agora vamos para o lugar que você falou?
O que o deixou realmente impressionado não foi o comentário, mas a atitude de . Ela quem estendeu a mão para ele daquela vez. Ela quem estava oferecendo para que ele a acompanhasse – algo que tinha certeza que ela não fazia com frequência.
- Vamos. – E segurou a mão de , de maneira intensa e gentil.
Caminharam um curto caminho até alcançarem uma sala bem maior, das mesmas cores que a anterior – porém, no teto, haviam diversos balões do tom de rosa chiclete e vermelho cereja, como o que ela tinha comprado naquele dia à tarde.
- Ah, isso me faz lembrar uma coisa...! – A moça exclamou ao observar os balões.
Dizendo isso, entrelaçou os dedos das mãos com os de , sentindo cada espaço da mão dele se moldar à dela. fechou os olhos e sorriu com o sentimento: era exatamente daquilo que precisava para não se sentir áspera e vazia conforme aquele sentimento horrível que a acometeu naquela tarde. A mão de era quente e macia, com um toque aveludado que a fazia sorrir inconscientemente.
- Chocolate quente. – murmurou repentinamente.
- O quê? – E ele não pôde deixar de ser pego de surpresa, franzindo as sobrancelhas, porém com um sorriso nos lábios.
- Você é que nem chocolate quente. – Ela explicou como se fosse a definição mais normal do mundo. – Chocolate quente de pão de mel, para ser mais exata: forte, quentinho, aconchegante, doce e intenso, tudo ao mesmo tempo.
- Só faltou o gostoso, né? – Ele brincou de volta, tentando não corar com o banho de elogios de .
- Ah, mais isso já está meio implícito... – A moça respondeu, voltando os olhos para os balões no teto para não ter que encarar depois de falar uma coisa daquelas. – Sabe, esses balões parecem o do parque.
Esse comentário fez com que algo estalasse na mente dele.
a observou com um par de olhos em choque, sem conseguir acreditar que ela estava realmente falando aquilo. demorou alguns segundos para perceber que ele a encarava daquela maneira – porém, quando notou, era impossível ignorar.
- O que foi? – Até ela ficou um tanto assustada.
- Você estava no parque hoje? – perguntou imediatamente.
- Sim. O parque dos balões vermelho cereja. Eu até comprei um...
- Mas ele escapou de você? – Ele nem conseguia esperar que ela terminasse a frase. Precisava de uma confirmação. Precisava saber que era real.
Porém, quando a moça foi responder, todos os balões no teto estouraram ao mesmo tempo. Em suas respectivas casas, cada um acordou sobressaltado, sentando na cama repentinamente.
Enquanto xingava mentalmente a força do Universo que estava brincando com eles daquela maneira, tudo que conseguiu fazer foi abraçar as próprias pernas e sorrir. Finalmente estava deixando um pouco de esperança adentrar em seu coração – e pensava que, talvez, pudesse ser real.
Tudo que precisava era uma mudança de perspectiva.
Black Holes and Revelations
O Universo é, de fato, um lugar imenso. Infinito – e isso já é dizer muito.
pensava naquilo durante sua visita ao Planetário. Queria ir lá com alguém, porém não conseguia pensar em algum amigo animado o suficiente para tanto. Como seus pais não puderam sair naquele fim de semana por conta de outros compromissos, ela decidira ir sozinha.
Assim, encontrava-se lá, filosofando sobre a própria pequenez no grande mar de galáxias e constelações no qual se encontrava.
De todos os corpos que podiam existir espalhados pelo infinito – fossem estes celestes ou não – o dela teve que encontrar o de .
Se ele realmente existisse, qual era a probabilidade de se encontrarem? Ínfima, no mínimo.
Então nem ela conseguia entender por qual motivo estava sorrindo.
estava com um sentimento diferente, algo que nunca havia sentido antes. Era o sentimento de certeza. Sabia que ia encontrá-lo, cedo ou tarde. Ela ainda sentiria a mão macia de contra seu rosto, ainda veria aquele lindo sorriso ao vivo e ainda ouviria aquela voz melódica reverberando ao ser sussurrada em seu ouvido.
Entre aqueles bilhões e bilhões de Carl Sagan, ela tinha certeza que encontraria um só. Seus caminhos estavam destinados a se cruzar, de uma maneira ou de outra.
E nem sabia de onde ele mesmo tirara tanta esperança.
Observando um dos planetas girando perto de si mesmo, só conseguia pensar em .
Sentia que estavam conectados; que acabariam ficando juntos cedo ou tarde. Encontrá-la em um sonho não fora um mero acaso e ele sabia que ela era real. Podia sentir dentro de seu peito que ela era real.
Suspirando, fechou os olhos na escuridão do Planetário enquanto as estrelas giravam pela sala, dançando como flocos de neve ao vento. Ele tinha a impressão de que, quando abrisse os olhos, ela estaria lá. Perto o suficiente para que ele a tocasse no rosto, trazendo-a para perto de si.
não estava nem com vontade de beijá-la, para ser sincero. Se estivesse ali à sua frente, encarando-o com seus grandes e intensos olhos brilhantes, ele a puxaria para que o corpo dela ficasse o mais próximo possível do dele, envolvendo-a com os braços e não a largando nunca mais.
Queria que o coração dela ficasse perto do dele, sem se distanciar pelo resto da eternidade. Queria sentir os braços de envolvendo-o em um abraço quentinho – pois tinha certeza que o abraço dela seria morno e aconchegante, intenso e revigorante... Seria o abraço de uma estrela.
Ao abrir os olhos novamente, sentiu as pernas formigando e o corpo congelando no lugar. Ele não conseguia ter reação alguma. Simplesmente porque, por entre os milhares de estrelas que o rodeavam, ele tinha certeza que aquele era o rosto de , sentada do outro lado, observando a tudo completamente deslumbrada.
- ... – Ele sussurrou consigo mesmo. Ela estava sozinha e sorria como se tudo fosse um Universo novo.
Quando as luzes acenderam, recobrou o controle do próprio corpo, levantando-se em um pulo.
- Ei, ! Aonde você vai? – Um de seus amigos perguntou, somente para ser completamente ignorado por ele.
praticamente saiu correndo. Nunca tinha visto aquele Planetário tão cheio e parecia que as pessoas faziam questão de se enfiar na frente dele. Após muita luta para chegar ao outro lado e sair do recinto, parou durante um tempo no lotado hall de entrada.
Procurava incessantemente por , porém sabia que não teria como errar: ela estava usando um casaco salmão.
E não demorou muito para que ele achasse o fatídico casaco.
correu entre a multidão, esticando o braço. Não via a hora de tocá-la. Precisava saber que ela era real.
- ...! – Ele chamou logo que a tocou no ombro.
Porém a pessoa que se virou definitivamente não era . a observou um tanto desnorteado no começo, somente para constatar a si mesmo que tinha se enganado. Assim, pediu desculpas à moça, enfiou as mãos nos bolsos da calça e retornou ao seu grupo de amigos, com um pouco menos de esperança no coração.
Mal sabia ele que, segundos antes, havia devolvido o casaco salmão à mulher que fora simpática o suficiente para emprestá-lo enquanto estavam dentro do Planetário por conta do ar condicionado.
se sentiu suspensa no ar, leve como uma pluma. Ao abrir os olhos, encontrou sorrindo – apesar de notar que ela própria estava deitada no ar, observando-o de ponta cabeça.
- Olá, ...! – Ela exclamou preguiçosamente, esticando um dos braços para poder tocá-lo.
- -ssi...! – E ele finalmente segurou a mão dela naquele dia.
Tinha esperado ansiosamente por aquele momento.
- Eu tô tentando descobrir por que tô flutuando desse jeito. – comentou repentinamente, com uma sobrancelha erguida. começou a rir, fazendo-a sorrir. Quando ele menos esperava, a mão dela deixou a dele, pousando na bochecha de . – Você está lindo hoje. Não que não estivesse nos outros dias, mas há algo diferente hoje.
- Estou feliz em te ver. – Ele piscou para ela, tirando alguns cabelos da moça do rosto. – Vem cá, eu te ajudo a descer. Você já está ficando roxa que nem uma batata doce!
Com isso, ajudou a se endireitar e tocar o chão com os pés de maneira mais leve que uma pena.
- Uau... É a primeira vez que a gente vem parar num lugar tão...
- Estranho? – perguntou e ela imediatamente começou a rir. O chão parecia uma mistura de tinta cor de maravilha e amarela, enquanto conseguiam ver todo o Universo em diversos tons de azul salpicados com estrelas cintilantes que nem cristais ao redor deles. – É, também acho.
- Mas é interessante... Você percebeu a única coisa que não encaixa aqui? – perguntou com um pequeno sorriso sagaz no rosto. respondeu com o mesmo sorriso e apontou para um lugar logo à frente deles. – Exatamente.
O lugar era nada mais nada menos que uma bola negra.
À distância, parecia um buraco. Nada de luz entrava, nada de luz saía. Era como se nada existisse lá... Como se somente estivesse esperando por algo que quisesse começar a acontecer lá dentro.
Apesar de um tanto assustador, não podiam negar que era muito interessante.
- Aonde a senhorita pensa que está indo? – Ele perguntou curiosamente quando ela começou a andar na direção do buraco.
- Onde você acha, -ssi? – perguntou de volta com uma breve risada, piscando para ele em seguida. – Nunca vamos descobrir o que é isso se não formos até lá.
Com essas palavras, ela segurou a mão de decididamente e começou a caminhar na frente dele, liderando o caminho até o misterioso buraco negro. Não sabiam dizer o motivo, mas havia algo de magnético puxando-os para lá. Como se algo muito importante os aguardasse dentro daquele vazio.
- Para alguém que nunca tinha imitado Dirty Dancing, você melhorou bastante, -ssi! – Ele comentou com uma pontada de orgulho na voz, fazendo-a sorrir entre as bochechas avermelhadas.
- Ah, você sabe como é, né... Eu te conheci! – Ela respondeu aventurando-se a lançar um breve olhar para ele. Mal percebeu que o próprio ficou em choque com aquela resposta sincera. Quando chegaram próximos ao buraco negro, ambos pararam e ficou de frente para ele, sem olhá-lo diretamente nos olhos enquanto falava. – E eu não sei o motivo... Mas confio em você, . Sinto alguma coisa quando olho nos seus olhos que não sei explicar...
- Como se a gente ter se conhecido não fosse só um mero acaso? – Ele completou prontamente, fazendo-a lançar um olhar confuso, porém maravilhado para . – Como se a gente tivesse que se conhecer, como se já nos conhecêssemos a vida toda?
- Exatamente isso! – E abriu um sorriso enorme, contente que ele a entendia. – Então não tenho medo quando estou com você. Sei que nada de ruim vai acontecer!
- E não vai mesmo, linda. – Apesar do elogio e do momento perfeito para deixar tudo um tanto mais sensual, tudo que fez foi sorrir enquanto segurava levemente as mãos de .
- Por isso acho que quando a gente se jogar lá dentro, tudo vai ficar bem. – Ela comentou repentinamente, com um sorriso besta imenso nos lábios.
E ficou a encará-la durante alguns segundos, em choque.
- Espera. O quê? Você quer se tacar lá dentro?
- A gente já fez coisas muito mais doidas juntos, se você parar pra pensar. – considerou rapidamente antes que ele pudesse argumentar mais alguma coisa.
E ela tinha razão. Ele tinha que admitir aquilo.
- Ok. Quando você comandar, estou à disposição. – respondeu com um olhar destemido e segurando a mão dela com mais força.
- Então vamos!
Dizendo isso, saiu correndo, levando junto com ela, os dois sempre de mãos dadas. Com um impulso rápido, conseguiram adentrar o buraco negro.
O lugar não era nada mais nada menos que uma imensidão vazia e sem cor, na qual os dois flutuavam como se a gravidade não existisse. Não havia som, luz, nada. Era simplesmente vazio.
- Muito estranho... – comentou, sem soltar dele. – Esse lugar realmente destoa de todo o resto...
Enquanto ela falava, achava que aquele lugar não era tão estranho assim. Simplesmente a observava enquanto sorria, esperando que analisasse todo o lugar com sua curiosidade inquisitiva quase infantil.
De repente, quando ela se virou, somente se deparou com a observando com um sorriso carinhoso nos lábios.
- Ué. Por que você está me encarando assim? – perguntou, porém também sorria. Não queria admitir, mas secretamente gostava de ser admirada.
- Esse lugar não é tão estranho... É que nem você. – Ele respondeu prontamente, deixando-a confusa. voltou a segurar as duas mãos da moça, tomando cuidado para não fazer nenhum movimento brusco. – É diferente, possuí uma beleza incomparável e uma infinidade de qualidades e coisas lindas para descobrir e explorar. Mas existe um buraco negro, vazio, que destoa de todo o resto. Igualzinho a você, coisa linda.
Com isso, a moça o observou durante alguns segundos, suspirando em seguida. era extremamente sincero e gentil – duas características que ela simplesmente adorara nele. Não tinha motivo para continuar escondendo o próprio coração – parecia que ele já sabia de tudo. podia lê-la como se fosse feita de vidro transparente.
- Todos os caras que eu conheci que se disseram interessados em mim me sacanearam em algum momento. Você pode escolher como: desistindo de mim porque eu sou “muito difícil”, ficando com as minhas amigas na minha cara, me tratando como se eu fosse um homem, me cobrando para que eu seja alguém que eu não sou... A lista é grande. – colocou as mãos na cintura, parecendo cansada. – Além disso, todos os amigos que tenho, sem exceção, deram algum jeito de me fazer recuar quando eu achava que podia contar com eles. Eu sempre estou lá para todo mundo, porém quando eu preciso... Não tem ninguém. Eu não confio nas pessoas, -ssi. Mas, por algum motivo, eu confio em você. E isso é algo totalmente novo pra mim.
- Sinceramente? Estou me sentindo lisonjeado. – Ele aumentou mais ainda o sorriso que tinha estampado nos lábios. – E outra: todas essas pessoas são estúpidas. Você tem um brilho natural que nunca vi antes em alguém. E você precisa ter plena consciência disso. As pessoas vão tentar te apagar, enfiar dentro de uma caixa e fazer de tudo para você parar de brilhar... Mas você tem que brilhar ainda mais forte. Você não é uma garotinha envergonhada e assustada, . Você é uma mulher forte que não deixa ninguém passar por cima. Então não deixe nunca que as pessoas te sufoquem e apaguem o seu brilho. Você não merece isso.
Dizendo isso, puxou mais para perto de si, abaixando-se um pouco para olhá-la diretamente nos olhos.
- Entendeu, minha estrela?
- Entendi.
Outra coisa que ambos também finalmente entenderam era que palavras possuem efeito. Capazes de fazer e quebrar feitiços, de terminar e iniciar. A última palavra que proferiu desencadeou o inevitável: os lábios dos dois se aproximaram, finalmente se unindo para um beijo.
Era absolutamente correto fazer o que estavam fazendo. Era o que precisavam, algo que estava escrito para acontecer muito antes de nascerem. tinha as mãos entrelaçadas nos cabelos sedosos de , enquanto uma das mãos dele a segurava fortemente pela cintura e a outra não desgrudava da pele macia da bochecha quente da moça. Podiam jurar que seus lábios tinham gosto de mel e desejavam que aquele momento durasse toda a eternidade.
Mal perceberam que, no momento em que seus lábios tocaram, uma explosão de cores – como tinta em pó sendo jogada com alegria pelo vento – se originou no buraco negro. O que antes era somente vazio, agora tomava cor e forma, dançando em volta deles enquanto uma música leve começava a ecoar por todos os cantos, ficando cada vez mais forte.
Somente quando seus lábios se partiram é que perceberam que tinham dado causa à criação de algo. Só precisavam descobrir o que era.
- Será que isso quer dizer que seu vazio também está deixando de existir...? – perguntou de maneira sapeca, olhando-a com o canto dos olhos.
começou a rir.
- Quem sabe, -ssi? – E ela piscou para ele. – Sinceramente, eu espero que sim.
- Eu também. – Com isso, puxou-a para perto, dando um beijo no topo da cabeça de e abraçando-a com força, como quis fazer desde aquela tarde no Planetário.
Foi aí que ele se lembrou.
- -ssi, me responde uma coisa? – Ele perguntou enquanto acariciava os cabelos aveludados dela.
- Qualquer coisa. – Ela respondeu de maneira plácida. Olhando para ela, sorriu. Podia até dizer que brilhava como uma estrela.
- Era você quem estava com o casaco salmão no Planetário hoje?
- No Planetário...? – E ela abriu os olhos, achando aquela pergunta muito específica. Distanciou-se um pouco dele, para que pudesse ver . – Sim, eu estava com o casaco salmão. Peguei emprestado de uma moça, pois estava com frio... Como você sabe disso?
- Não é possível... – comentou para si mesmo. Ela o observava com um par de grandes olhos chocados.
Os dois mal perceberam que algo estava acontecendo.
- Eu tenho certeza, ... – Ele respondeu, tentando se recompor. – Eu te vi hoje.
- Na vida real?! – Ela sentia como se não fosse mais conseguir respirar. – Foi falar comigo?
- Sim, mas você já tinha devolvido o casaco!
- Não acredito... – E estava indignada. – A gente podia marcar de se encontrar. Aí não vai ter erro.
- Concordo! Onde podemos nos ver? Eu vou para qualquer lugar que você estiver!
- Podemos... – Mas ela logo parou de falar ao ver a expressão séria no rosto de .
- ? Tá tudo bem?
- Segura minha mão. – Ele disse imediatamente e ela nem discutiu: segurou as mãos dele com força. – Você está sumindo.
- O quê?! – Quando olhou para baixo, seus joelhos e pés pareciam de fantasmas. Aos poucos, ela ficava cada vez mais transparente. – Não me solta, !
- Eu não vou soltar! Confia em mim!
Apesar de todos os esforços dos dois, as mãos de ganharam aquele tom de transparência, atravessando as mãos de . Os dois não conseguiam mais encostar no outro. Estavam realmente sumindo.
- ! – chamou, mas era em vão. Ele tentou segurar as mãos dela mais uma vez, porém sempre as atravessava.
- , vem cá...! – chamou, tentando aninhá-la nos próprios braços e não soltá-la nunca mais, conforme havia prometido a si mesmo. Porém, suas mãos atravessavam o corpo dela, não lhe dando outra opção: logo parariam de sonhar. – Não! Não!
Ele tentou segurá-la desesperadamente, enquanto gritava o nome de e tentava agarrá-lo de volta. Todo o esforço foi em vão: a moça sumiu gradualmente, até somente sobrar e o buraco negro vazio no mundo dos sonhos.
Enquanto isso, no mundo real, acordara com lágrimas ao redor do travesseiro, escorrendo pelo próprio rosto. Teria dado qualquer coisa para permanecer nos braços de .
Qualquer coisa.
Urin Wanjeon Dalla Baby, Unmyeongeul Chajanaen Durinikka
(We’re completely different, baby, because we’ve found our destiny)
Uma semana.
Eles já estavam ficando desesperados.
Fazia uma semana que não se viam mais.
Nem em sonho. Nem em realidade.
e começaram a se questionar se tudo aquilo que viveram em seus sonhos – durante todos os meses que se encontraram e parecia que havia se passado somente dias – tudo parecia somente flocos de neve se dissipando na água.
Estavam começando a acreditar que nada daquilo havia ocorrido.
Quando a semana acabou e outra se iniciou sem nenhum sonho com o outro, tornou-se frequente acordarem no meio da noite com as palmas das mãos suadas e os rostos manchados de lágrimas.
normalmente ia para a cozinha, preparar um chá de camomila para se acalmar. Ficava encarando o silêncio da madrugada negra, tentando entender o motivo de tanta angústia que apertava em seu coração toda vez em que ela pensava no sorriso gentil de , no toque aveludado e aconchegante das mãos dele.
Não era raro começar a chorar desesperadamente sempre que pensava que nunca mais o veria. Que tudo aquilo não passara de um sonho.
Mal sabia ela que era como se estivesse conectado com a moça, sentindo o mesmo desespero e melancolia toda vez que os olhos determinados e gentis de surgiam em sua mente, olhando para ele como se fosse a única pessoa em todo o Universo.
Ele próprio começava a chorar. Encarava o céu, pedindo para as estrelas, para a Lua e para qualquer força do Destino ou algo do gênero que o levasse para perto dela.
Algo tinha que escutá-lo. Ele tinha que vê-la novamente.
O coração de se apertava toda vez que pensava que ele chegou a ter em seus braços, porém ela se dissipou como um frágil floco de neve.
E, com isso, o tempo passou. O frio se aproximou vagarosamente e a estação do ano mudou. Em mais algumas semanas, o chão das ruas ficou forrado com um carpete branco e fofinho da neve mais pura, as ruas decoradas com inúmeras iluminações coloridas de Natal.
Eles deveriam estar felizes. Eles deveriam sorrir e comemorar, dançar em volta das luzinhas coloridas e rir ao lado dos amigos.
Mas, sempre que viam os pequenos flocos de neve flutuando ao redor, dançando uma pequena valsa ao vento e caindo nas poças de neve derretida, lembravam-se do dia em que ela simplesmente desaparecera.
Passaram muito tempo na esperança de que, quando dormissem, iriam se encontrar novamente. Quando mais nada aconteceu, ambos perderam as esperanças. Mantinham somente um pequeno desejo tolo nos corações, uma leve crença de que um dia podiam se ver novamente e nada daquilo fora somente um sonho.
Porém, o tempo se arrastou. Lentamente. Dia após dia, sem mais nada acontecendo.
Foi quando acordou em uma sala completamente branca, com o Universo negro ao fundo e a Lua prateada erguendo-se no céu, dormente e silenciosa.
A moça suspirou. Tudo era vazio e quieto. Ela começou a caminhar casualmente, tirando as meias e jogando-as em um canto para poder sentir a superfície fria do chão perfeitamente liso sob os pés.
Repentinamente, deu uma risada sem humor. Se estivesse lá, já teria comentado sobre a roupa que ela estava usando – um shorts azul arroxeado desfiado nas pontas, acidentalmente decorado com glitter prateado que ela derrubara naquela noite enquanto fazia decorações de Natal, e uma blusa meia manga raglan com uma estampa do coelho da Lua – e ambos já teriam começado a dançar. Jamais passariam por um chão tão lisinho sem dançar.
Mas ela não tinha vontade de dançar. Não tinha vontade de fazer nada naquele lugar sem ele ao seu lado. Simplesmente porque era quem deixava as situações interessantes, não importava onde se encontravam.
suspirou, enquanto deslizava os pés pelo piso levemente escorregadio. Como era mesmo a música que ele assoviara na primeira vez que se encontraram? Ela tentou uma vez, tentou a segunda...
Até que finalmente conseguiu se lembrar da melodia.
se sentiu caindo pelo vazio até atingir um chão duro e frio. Quando abriu os olhos, encontrou-se em um lugar completamente branco e desprovido de som. Nada acontecia por lá.
Ele fechou os olhos novamente, contendo-se para não começar a chorar. Mas era óbvio que aquilo ia acontecer. Sentia que estava fadado a viver no limbo eterno e nunca mais ver o belo rosto de a sua frente.
queria sumir.
Até começar a ouvir um assovio tentativo.
Alarmado, abriu os olhos. Após algumas tentativas, o assovio tomou forma e se transformou em uma melodia.
A melodia que ele tinha escrito.
E só havia uma pessoa no mundo que conhecia aquelas notas além dele.
se levantou de supetão, escorregando com as meias no chão liso. As calças jeans manchadas de várias cores diferentes de tinta também se enfiavam embaixo dos pés dele, não ajudando muito na situação.
Ele fechou os olhos e respirou fundo, somente escutando, calmamente, tentando achar a origem do som.
E, quando finalmente percebeu de onde vinha, saiu correndo imediatamente, atravessando o que parecia ser um caminho interminável.
Quando alcançou metade da sala, viu, à distância, a silhueta de , assoviando para uma Lua solitária em uma imensidão negra.
O coração de começou a pular de alegria. Ele achou que não teria estrutura o suficiente para aguentar a força de seus sentimentos. Os olhos se encheram de lágrimas com o tanto de emoções que surgiram no peito dele, finalmente sentindo-se completo novamente. Sem saber ao certo como reagir e o que fazer, começou a assoviar a própria melodia, em harmonia com a melodia de .
A moça se virou no mesmo instante, o mais rápido possível. Quando viu parado observando-a – e sorrindo da sua maneira gentil para a moça assim que os olhos dela se encontraram com os dele – imediatamente começou a chorar. Seus sentimentos eram tão fortes, que não tinha como seu corpo conter tudo aquilo dentro de si.
- ...! – aproveitou cada sílaba do nome dele como se fosse o mais belo dos sons que seus lábios poderiam produzir.
- . – sussurrou de volta, sem forças para proferir o nome dela de maneira mais enérgica.
Mesmo assim, fechou os olhos, ouvindo seu nome sendo dito pela voz dele, tendo certeza de que aquela era a melodia mais bonita que iria ouvir.
Ela nem notou como nem quando, porém percebeu que seus pés corriam com destreza e leveza na direção dele. fazia o mesmo, recebendo-a de braços abertos. se encontrou com o corpo dele, sendo retirada do chão logo que fechou os braços em volta da cintura da moça.
No mesmo momento em que eles se tocaram novamente, a sala mais sem graça do mundo tomou outro ar. Iluminada de várias cores – rosa, verde, roxo, azul, vermelho – estrelas começaram a cintilar no véu negro do lado de fora e a própria Lua já não parecia tão triste. Estrelas coloridas, complementando as cores da sala, começaram a surgir e rodopiar do lado de fora, explodindo como mil fogos de artifício. E a música que ele fez começara a tocar, enchendo o ambiente de cor e energia.
Com os pés de volta no chão, permaneceu com a cabeça no peito de , ouvindo o coração dele bater – algo que ela tinha mania de fazer com todo mundo que abraçava. apoiou a cabeça no topo da dela, fazendo escorrer pelos cabelos de todas as lágrimas de alegria que teve ao reencontrá-la.
- Eu senti sua falta... – Ele comentou, abraçando-a com mais força e de olhos fechados. Tinha medo de perdê-la novamente. – As saudades foram quase insuportáveis.
- Eu sei, eu sei... Senti como se tivesse perdido um pedaço de mim. – Ela respondeu, apertando os braços na cintura dele. sorriu ao ouvir aquilo: sabia exatamente como ela se sentia.
- Não vou te soltar nunca mais. – Ele se distanciou um pouco dela, para que pudesse olhá-la nos olhos enquanto fazia sua promessa. Em seguida, beijou cada uma das bochechas dela enquanto falava, fazendo-a rir. – Eu prometo... Você não sumirá mais dos meus braços.
- Nunca mais. – repetiu, segurando o rosto dele com ambas as mãos. – Eu prometo que jamais sumirei. Jamais, -ssi.
Ele sorriu com a promessa. Trazendo-a mais para perto de si, finalmente a beijou novamente, sentindo os lábios macios e açucarados de como se tivessem se beijado pela primeira vez no dia anterior.
Poderia beijá-la pelo resto da vida. Poderia ficar lá pelo resto da vida.
- Não vamos tentar combinar de nos encontrar dessa vez. – comentou prontamente logo que partiram o beijo, cobrindo os lábios de antes que ele pudesse falar qualquer coisa. – Não quero correr o risco de te perder de novo, .
- Pode deixar, . Eu ia sugerir a mesma coisa. – Ele respondeu sorrindo e beijando os dedos dela logo em seguida, segurando a mão de com seu toque aveludado que ela tanto gostava. – Mas agora me conta o que você andou fazendo esse tempo todo! Faz tempo que a gente não se fala.
- Fiquei chorando de saudades de você? – Ela perguntou de volta, rindo levemente em seguida e fazendo-o rir também. ainda segurava a mão dela, massageando-a quase imperceptivelmente, observando-a com nada além de carinho nos olhos. Entendia muito bem o que ela queria dizer. – Ah, a vida foi corrida nesses últimos meses, . Por onde você quer que eu comece?
- Por onde você quiser. Temos todo o tempo do mundo. – Ele sorriu e se sentou no chão, puxando pra que ela viesse junto. A moça se sentou em frente a e em momento algum ele soltou a mão dela. – Que festa foi aquela que você foi com aquele vestido maravilhoso? Sinceramente, estou com ciúmes dos outros homens que chegaram a te ver linda daquele jeito ao vivo. Tenho que me contentar em te ver somente nos sonhos.
- O que já é melhor que nada. Tivemos nossos dias sem nos ver e acho que posso dizer que foi um inferno para nós dois. – Ela comentou enquanto ele concordava com cabeça. – Mas já que você está tão curioso, vou atualizá-lo sobre a minha vida. Começando sobre a minha aventura criando decorações de Natal cheias de glitter e é por isso que eu estou digna de um episódio de Ru Paul hoje.
- É verdade. Ele estaria orgulhoso de todo esse seu brilho. – piscou para ela e ficou observando-a, esperando que começasse a contar.
- Bom... E depois quero que você me diga o motivo das suas calças e da sua blusa branca sujas de tinta. – Ela sorriu para ele, fazendo-o rir imediatamente.
- Redecorando a casa. – Ele deu de ombros e rolou os olhos, o que a fez sorrir divertidamente.
E, assim, a conversa se estendeu durante horas. e não sabiam mais durante quanto tempo permaneceram lá, somente sabiam que não queriam que aquele momento terminasse. Estavam contentes de finalmente se reencontrarem e, se fosse para ser a última vez, queriam aproveitar ao máximo.
O que não os impediu de ficar em silêncio durante alguns momentos, somente aproveitando a presença do outro.
começou a brincar com as belas mãos de . Absorta em como seus dedos se entrelaçavam, ela mal olhava para ele, focando somente nas mãos. As duas se moviam com destreza, acariciando-se em uma dança leve e com movimentos lentos, como se saboreassem cada momento.
- Você tem mãos muito bonitas... – Ela comentou repentinamente, perdida nos próprios pensamentos. começou a sorrir com o comentário aleatório, somente apreciando cada vez mais como ela era diferente. E notou aquilo. – Não é uma esquisitice minha ou um fetiche estranho. Eu desenho desde pequena. Sempre achei lindo como as mãos podem se expressar, mas nunca consegui desenhar de maneira decente. Passo muito tempo observando e desenhando mãos para me aperfeiçoar, mas sempre acho que falta alguma coisa...
- E você desenha só as mãos ou o resto também? – Ele perguntou com um olhar que ela nunca tinha visto refletido nos olhos de . deu um pequeno sorriso.
- É claro que eu desenho todo o resto também. Sou boa com figuras humanas. – Ela piscou e deu um pequeno sorriso.
Finalmente soltando a mão dela, correu os dedos pelo queixo da moça, passando o dedão cuidadosamente pelo lábio inferior de . Pela primeira vez, ela refletiu o olhar de nos próprios olhos, entendendo-o perfeitamente.
- Seus lábios são lindos e deliciosos... Como morangos. – Ele comentou com um sorriso levemente sapeca ao fim da frase, fazendo-a sorrir genuinamente. – Me ensina a desenhar...?
- Claro que sim... – Ela respondeu enquanto ele se aproximava. Assim que estava prestes a beijá-la, o puxou mais para perto, de maneira forte e impulsiva.
passou os braços em volta da cintura dela, aparando a queda de devido ao puxão que ela dera. Os dedos dela se embrenhavam pelos cabelos sedosos de , massageando a cabeça dele conforme se beijavam. Já acomodados no chão, ela fechou as pernas em volta da cintura dele, fazendo com que segurasse uma das coxas dela para que a ajeitasse no melhor lugar.
Nenhum dos dois conseguia entender como chegaram lá ou processar muito bem o que estava acontecendo – só sabiam que passaram muitos dias sonhando acordados e pensando em quando se sentiriam à vontade para se beijar daquela maneira.
Quando finalmente fizeram uma pausa para respirar, observaram-se durante alguns segundos, como se quisessem gravar os traços do outro na mente.
E foi exatamente nesse momento que notou algo que destoava no teto branco.
- ...
- Hmmm...? – Ele perguntou de volta, ocupando-se em fazer uma trilha de beijos pela mandíbula de até o pescoço da moça. Ela teve que fechar os olhos e contar até cinco para se controlar enquanto puxava a gola da blusa dela para baixo a fim de alcançar a clavícula da moça com os lábios.
- Acho que você deveria olhar para o teto.
- E eu acho que você deveria confiar mais em mim, sem tentar fugir da situação. – Ele respondeu com uma risada divertida na voz, porém pararia se ela quisesse. O problema é que, da maneira como o abraçava e guiava a cabeça de , ele tinha certeza que não queria que ele parasse e provavelmente estava arranjando alguma desculpa para não se entregar aos próprios sentimentos.
somente sorriu de volta. Puxou a cabeça de para cima grudando os próprios lábios nos dele. se entregou imediatamente ao beijo, sem ao menos questionar o que ela fazia. Nesse momento, o segurou fortemente com os braços e as pernas, rolando-o para o lado e parando sobre . Quando conseguiu o que queria, deu um último beijo demorado nos lábios dele e se sentou sobre as coxas de , apontando para o teto.
- Uau. Você quer tanto assim que eu olhe para o teto? – Ele perguntou com uma risada, claramente se divertindo com a situação.
- Por favor. Me divirta. – Ela deu de ombros, segurando uma das mãos de e novamente brincando com os dedos dele.
Foi nesse momento que viu estampado no teto branco um grande “zero” negro. Como se houvesse uma contagem regressiva e aquele fosse o último dia de algo.
A expressão dele ficou imediatamente séria.
- Você acha que...?
- Hoje é a última vez? – Ela completou, fazendo-o olhar assustado para ela.
imediatamente se sentou e a abraçou, apoiando a cabeça no peito de , para ouvir o coração dela batendo como ela fizera anteriormente com ele. Cerrando os olhos, ele a apertou com força contra o próprio corpo, enquanto ela o abraçava como podia, embrenhando as mãos entre os cabelos dele e beijando o topo da cabeça de .
- Eu não quero. – Ele disse como uma criança assustada. – Não quero que você vá embora.
- Também não quero, . – sussurrou de volta, entre beijos. – Quero ficar com você para sempre.
- Eternamente. – concordou, segurando-a com mais força.
Permaneceram abraçados, pedindo para qualquer das forças que regiam o Universo que ficassem juntos. Para sempre.
Não sabiam quanto tempo havia se passado. Não sabiam se haviam dormido nos braços um do outro.
Só sabiam que acordaram sozinhos no dia seguinte.
e tinham plena noção do que significava aquele “zero”. Sabiam que todo o sonho havia chegado ao fim, que tudo que viveram juntos – por mais que não se classificasse como realidade – nunca mais iria acontecer.
Contentaram-se com o fato que talvez nunca fossem se encontrar. Que, talvez, suas almas gêmeas não existissem e o grande amor que tiveram a impressão de viver permanecesse somente no plano surreal.
Junto com todos seus amigos no Ano Novo, saíram na rua para rir, assistir os fogos e participar das promessas e expectativas para o ano que acabara de chegar. Internamente, tudo que conseguiam pensar era no amor que deixaram de viver na vida real. Sorriam e brincavam com todos, porém preferiam permanecer pensativos e distantes de todos. Precisavam de um momento para pensar.
E, enquanto todos os fogos de artifício explodiam em cores no céu negro, e se lembraram da sua última noite juntos. Fechando os olhos, desejaram que se encontrassem novamente.
olhou para o chão, rindo da própria inocência infantil de achar que um desejo de Ano Novo se realizaria. fez o mesmo, balançando a cabeça e observando os amigos – questionando-se se não seria melhor aceitar e viver a realidade como ela se apresentava.
Foi nesse momento que levantou o olhar e observou a pessoa que estava parada à sua frente.
Como se pressentisse o que estava acontecendo, parou para olhar o homem que a observava com tanto interesse.
Os dois ficaram sem palavras.
Quando e finalmente perceberam que era realidade e estavam parados um à frente do outro, seus olhos se encheram de lágrimas e sorriram imediatamente.
Pois algumas vidas estão conectadas por algo mais forte do que o tempo ou as circunstâncias da coincidência – estão conectadas pelo Destino.
Com lágrimas escorrendo pelo rosto, os braços de envolveram a cintura de , enquanto os dela se fecharam em torno do pescoço dele.
- Finalmente. – Eles disseram ao mesmo tempo, enquanto sorriam.
Os sonhos, de fato, chegaram ao fim. Mas a realidade tinha acabado de começar.
Fim
AH! Uma coisa que não coube na fic: quando ele a assopra que nem um dente de leão, pede para que ela seja real, não somente um sonho. Já quase estourei meu número de páginas e não coube essa informação “¬¬
Bom, são duas e trinta e cinco da manhã do dia 30/12/2017 e eu FINALMENTE terminei de escrever. E ainda consegui concluir minha meta de fechar DNA em 2017 – além de estar orgulhosa com a história e o desfecho dela, tô contente de ter concluído o prazo que me estabeleci! Espero não ter matado todo mundo de ansiedade na parte em que eles ficam sem se encontrar!
Basicamente, era isso! Segui duas “guidelines” com essa fic: 1 – a frase do Titanic “Ele me salvou de todas as maneiras que uma pessoa pode ser salva” e 2 – A frase do Príncipe da Pérsia “Existem vidas que estão conectadas por um chamado antigo que ecoa através do tempo... Destino”. Sim, sou fã dos dois filmes, sei praticamente todas as falas de cor e ainda por cima assisto o Titanic desde que tinha cinco anos de idade, então não dava para esperar algo diferente. Queria uma história de amor daquelas marcantes, que emocionam a gente.
Além disso, outro assunto importante é: não importa como somos tratados ou quão fechados a vida nos torna, sempre vai haver uma pessoa que nos lembrará de como sorrir e confiar novamente, servindo de apoio e tornando nossa vida maravilhosa. Basicamente, alguém que não vai ter medo de descascar a cebola que somos até chegar ao nosso centro (sim, sou da teoria de que somos cebolas com várias camadas!)!
Hahaha enfim! Espero que tenham gostado da fic! Escrevi com muito carinho e realmente espero que vocês tenham carinho por ela também. Não tenham medo de deixar comentários, eu sempre respondo o mais rápido que consigo!
Até a próxima!
XX
PS: Ah, e segue meu grupo no facebook pra que vocês fiquem de olho nos meus próximos projetos – tenho mais alguns ficstapes para entregar e sempre atualizo por lá! Tem espaço pra todo mundo, sempre procuro conversar bastante com o pessoal que faz parte e realmente vou ficar feliz de vê-los por lá!
Disclaimer: Essa história é protegida pela Lei de Direitos Autorais e o Marco Civil da Internet. Postar em outro lugar sem a minha permissão é crime.
Não gosto de falar essas coisas, mas como já tive problemas antes, acho bom deixar avisado. Nem tudo que tá na internet é do mundo, minha gente. Quer postar em outro site? Fala comigo! Eu não mordo! Hahaha a gente vê de me dar o crédito e linkar para o original aqui no FFObs! Só me mandar um e-mail ou pedir aí nos comentários!