counter free

12 - Wouldn't it be nice to live together

Wouldn't it be nice to live together
In the kind of world where we belong?
You know it's gonna make it that much better
When we can say good night and stay together
Wouldn't it be nice if we could wake up
In the morning, when the day is new?
And after having spent the day together
Hold each other close the whole night through
(Wouldn’t It Be Nice – The Beach Boys)



Terça-feira, 04 de janeiro de 2022
Casa dos
Viipuri (Vyborg), província de Leningrado – RU



– Eu não acredito que você guardou essa? – gargalhou e apertou contra si uma foto, impedindo a namorada de ver quando ela se inclinou em sua direção. – Mãe, por que tirar uma foto assim? Que foto mais vergonhosa. – Reclamou, vermelho como as bolas da árvore de natal.
– Qual o problema da foto? – Ema, que estava sentada sobre o tapete da sala, com pernas dobradas, perguntou.
– Que foto é essa? – quis saber, curiosa, tentando roubar a foto do namorado.
– Você não vai ver isso. – Ele negou e em seguida voltou seu olhar para a mãe. – Ninguém avisava que essas fotos eram péssima ideia?
– Eu tenho a foto daquele dia, que você tirou a roupa quando foi ao banheiro, naquele restaurante, e entrou no salão me procurando, com os shorts nas mãos. – Contou Ema e arregalou os olhos, em pânico. – Está bem aqui, em algum lugar. – A mais velha começou a procurar.

se distraiu por alguns instantes, chocado com a revelação da mãe e se aproveitou para roubar a foto das mãos do central. tentou lutar, mas foi em vão.

– Olhe, , que lindo! – sorriu. – Você na banheira. Você tinha quantos anos aqui? Uns quinze? – A inglesa riu alto e o capitão fechou os olhos e suspirou, enfezado.

A chaleira começou a chiar na cozinha.

– A nossa segunda rodada de chá. – Ema ergueu o rosto e o dedo indicador. –Quem quer chá? – Cantarolou ela antes de se levantar e se afastar.

O pai de estava em outro canto qualquer, fazendo qualquer outra coisa, Inessa, Atte e Alicia ainda dormiam no andar de cima, apesar do já adiantar da hora. Estavam os outros três sentados no chão da sala, rodeados de recordações de família, se divertindo com fotos de aniversários, festas e eventos esportivos das crianças .

– Eu vou esconder isso da minha mãe. – se adiantou e catou o álbum que a mãe folheava antes de se levantar e ir para a cozinha. Em seguida ele cruzou as pernas e escorreu, apoiando-se desajeitadamente em uma poltrona. – Eu acho que gostava mais de quando ela não falava com você. – Brincou o jogador e a namorada o acertou na costela.
– Saiba você que eu estou amando ver suas fotos constrangedoras. – sacudiu no ar a foto que tinha em mãos. –Você realmente tinha quinze anos aqui?
– Não. – O jogador riu pelo nariz, olhando a foto com mais cuidado. – Uns treze. Acho que foi quando eu estava entre bonito e popular, para esquisito e detestável.
– Eu gostaria de você, mesmo sendo esquisito e detestável. – suspirou.
– Diz isso porque me conheceu agora. – a olhava com olhar apaixonado, divertindo-se com o momento. – Se eu sentasse do seu lado em um jogo nessa época, você teria me chutado.
– Quem disse que não quis te chutar, quando sentou do meu lado no jogo no ano passado? – arqueou uma sobrancelha e abriu a boca, teatralmente chocado.

, você pode me ajudar com o chá? – A mãe chamou da cozinha e ergueu as sobrancelhas de modo sugestivo.

– Eu vou ali e vou pensar numa resposta pra você. – O central ameaçou, sacudindo um dedo na direção dela, que riu. – E ela vai ser muito boa.

O capitão atravessou a sala e foi até onde a mãe servia três xícaras de chá fumegante. sorriu e apoiou os braços a ilha da cozinha, assistindo a mãe com o rosto apoiado nas mãos.

– Obrigado. – Disse ele, atraindo o olhar da mais velha.
– Você diz como se soubesse fazer chá. – Ema sacudiu a cabeça e riu.
– Não. Não, mama... – O capitão do time de Lahti riu nasalado, inclinando a cabeça. – Estou agradecendo por dar uma chance para a . – A mãe o olhou com doçura. – Estava um pouco preocupado, não imaginei que você fosse agir daquele jeito, estranho, com ela.
– Talvez eu posso ter exagerado um pouquinho. – Concordou a mais velha, apertando um dos olhos.
– Só um pouquinho? – O filho ironizou.
– A verdade sobre isso é que eu vi algo entre vocês, na , que não tinha visto antes e que não esperava ver. – Ela confessou ao se aproximar dele e colocar as duas mãos nos ombros do jogador, que tinha o cenho franzido. – Algo que talvez nem mesmo você tivesse visto ainda.
– Não. – sacudiu a cabeça e riu pelo nariz, sem humor. – Meu pai disse isso, mas é absurdo. Besteira. Eu conheço a , ela é uma boa pessoa. Ela é é doce, cuida de mim, é sincera... – Ele expirou, ainda em negação. – Soube que era ela assim que a vi pela primeira vez. O que você pode ter visto nela, para agir assim? O que você pode ter visto nela que eu não vi?
Uma possibilidade de futuro.

se surpreendeu.

– Quando eu vi vocês, quando eu vi como você olha para ela e como ela te busca, ficou claro. – A mãe afagou a bochecha do filho, que ainda estava perdido. – A esperança, a possibilidade fixa de um futuro é algo poderoso. Você gosta mesmo dela, consigo ver.
– Eu a amo. – declarou em voz baixa. – E ás vezes é estranho, porque a gente vive em confusão. – Ele riu baixinho e inclinou a cabeça. – Ou pelo trabalho, ou porque nós somos diferentes...mas gostar dela é fácil. Eu sempre tenho certeza disso. E mesmo quando eu acho que não, quando acontece algo ruim o suficiente para eu querer ir embora, eu sinto como se bastasse ela dizer que precisa de mim e eu voltaria correndo. Ou nem chego a passar pela porta – ainda estava com os olhos no chão e ria envergonhado, mas enfim o jogador levantou o olhar para a mãe. – E eu sei que ela faria a mesma coisa também.
– O curso do amor verdadeiro nunca fluiu suavemente. – Ema sorriu para o filho. – Não é uma piscina, é um rio. Tem seus percalços e suas dificuldades, mas nem por isso deixa de ser bonito. Às vezes tudo é questão de despertar sua alma, e o amor, quando ele desperta nas nossas, não é possível adormecê-lo outra vez. – A mais velha afagou a bochecha do jogador outra vez e sorriu para ele. – Veja só você... O meu garotinho, agora já tão crescido, um homem formado e grande, em muitos sentidos, e mesmo assim consegue ser atingido por uma coisa tão simples, sutil e suave. – sorriu, sem jeito. – Eu tenho uma intuição sobre essa moça. – A mais velha olhou para a sala, onde podiam ver a distância , sentada no chão, sorrindo e folheando álbuns. – E a minha intuição não costuma falhar. – Ela tornou a olhar para o filho. – Nunca.

❄❄❄


Quarta-feira, 05 de janeiro de 2022
Viipuri (Vyborg), província de Leningrado – RU



Na manhã de quarta, a família ignorou o clima congelante do inverno russo e foram pescar. , ao contrário deles, não conseguia ignorar o frio que era demais, congelante demais. , Atte e Ivan pareciam sequer perceber o vento frio enquanto faziam buracos no gelo para encontrar o melhor ponto para a pescaria. Inessa, Ema e Alicia se dividiam em arrumar as iscas, cadeiras e tirar fotos. não conseguia relaxar e curtir o momento junto a eles, tentava abraçar o corpo e se esfregar, lutando para se aquecer mais.
Depois de conseguirem um bom lugar para a pescaria, o pequeno grupo estava sentado, concentrado no buraco no gelo. Por sorte, havia ali perto uma cabana de caça, que pertencia aos , e fora liberada pela família para buscar abrigo ali. Depois de algum tempo de pescaria sem sucesso, se aproximou da namorada, sentando-se perto dela e a puxando para junto de si, beijando sua testa coberta pela touca.

– Se divertindo? – Ele perguntou.
– Ah, claro. – ironizou e riu abafado, sendo imitada por . – Eu amo pescar em pleno inverno russo em um lago congelado.
– Pense bem, quer fazer parte dessa família no futuro? – falou contra a testa dela, depois de beijá-la outra vez. – Pescar no gelo, fotos de infância humilhantes...
– Isso é um convite? – ergueu o rosto para ele. – Tome cuidado, agora sua mãe gosta de mim. Meu nível de força nesse jogo subiu muito. – Ela piscou e o jogador riu.

Fez-se um breve silêncio.

– Ainda é estranho pra mim, como tudo mudou de repente. – voltou a falar, sentindo o aperto do namorado se intensificar ao seu redor. – Ainda não sei bem como reagir. Em um dia ela implica com tudo sobre mim, no outro ela só diz que está feliz que a gente esteja junto.
– Esse é o charme de Ema . – O capitão sorriu e maneou a cabeça.

Concordava com a namorada, o comportamento da mãe havia sido mesmo repentino e estranho, mas não perderia tempo pensando nisso, preferia aproveitar a onda de bons sentimentos. Além disso, desde o momento com a mãe no dia anterior e a proximidade do final daquele respiro em Viipuri, uma questão despontava no jogador, e a cada segundo se percebia mais incomodado com ela.

– Acho que tem uma coisa que a gente precisa conversar. – A inglesa o olhou confusa. – Aquela conversa. – Ele maneou a cabeça e a olhou, tentando falar com os olhos.
– A conversa que eu estou pensando? – Ela testou.
– É, aquela conversa. – assentiu com a cabeça. – Aquela conversa, específica.
– Quer falar dessa coisa, ter essa conversa específica agora? – A terapeuta ergueu as sobrancelhas.
– Não precisa ser agora. – desviou o olhar para onde o pai lutava com o molinete. – Mas acho que a gente precisa se resolver. Fazer a vida andar, eu quero fazer a minha vida andar com você. – a olhou nos olhos.

respirou fundo e prendeu a respiração sem perceber.

– Tá na nossa hora. – Ele ergueu as sobrancelhas.
– Você se lembra do que está em jogo, não é? – perguntou, estava incerta e naqueles dias havia se esquecido totalmente daquele probleminha prático.
– Eu sei, mas não vejo motivos pra gente ficar se escondendo. – falou com firmeza. – Eu tenho certeza do que eu quero e não preciso ficar pensando, avaliando.
– Mas e se eu ainda não tiver certeza? – o olhou, estava insegura.

Era um passo importante, envolvia abrir mão de muito e por mais que parte sua tivesse total certeza sobre seus sentimentos, tinha medo de tudo um dia acabar e dos resultados disso.

– Por isso que a gente tem que conversar. – apertou os lábios em um sorriso fechado e desprendeu algum tempo olhando para os detalhes do rosto queimado pelo frio da namorada.

o imitou e ficaram ali, no silêncio cúmplice por algum tempo, até serem despertados pelos gritos agitados da família. O casal então prestou atenção na cena. Todos estavam empolgados e afobados ao redor de Alicia, que puxava com dificuldade a vara de pescar. Atte se apressava ao lado dela, tentando ajudar a mais nova dos com o molinete. e se uniram a empolgação e se apressaram em direção ao grupo. Já estavam perto o suficiente quando Alicia conseguiu tirar o peixe da água gelada, revelando um bruto e grande animal que se sacudia como se sua vida dependesse disso – literalmente – e espirrando água gelada para toda parte.

– Puxe com mais força. – Ivan ordenou e se adiantou para ajudar a irmã.

Atte ajudava Alicia a sustentar o peso da vara, Inessa e Ema se agitavam ao lado, segurando suas próprias varas, tentava içar o peixe e liberar o peso que tencionava a linha da irmã. estava achando maravilhoso, fez lembrar das pescarias de sua vida e do livro de Hemingway, ela se divertia. Ivan anunciou que daria um jeito, se aproximou mais de onde o filho estava, tentando suspender o peixe prateado que devia ter cerca de um metro de comprimento.
Em um bater de cílios, Ivan levou a mão atrás das costas e puxou um revolver e atirou uma vez no peixe, que instantaneamente parou de se remexer. O som do tiro foi alto, devido ao silêncio da natureza que os rodeava. Atte arregalou os olhos e empalideceu, congelando no lugar e na posição que estava, gritou de susto, o resto da família se entreolhou, talvez não esperassem aquela reação por parte da nova candidata a membro da família .

– Agora está resolvido, huh? – Ivan sorriu vitorioso.
– Ai meu Deus! Meu Deus! – exclamou, assustada. – Você atirou no peixe? Você... meu Deus!
– Ivan! – Ema repreendeu o esposo.

Atte ainda estava estático, com os nervos aflorados. se aproximou da namorada.

– Você estava segurando o peixe. Bem ali. – Ela falava e tinha os olhos onde antes estava o peixe e o namorado. – Você estava segurando o peixe. Ele atirou no peixe. Ele só puxou a arma e atirou no peixe.
– É o jeito dele. – tentou acalmar a namorada. – Ele tem boa pontaria. –O central tentou amenizar.
– Ele só atirou. Ele atirou no peixe. – ainda estava pasma. – Seu. Pai. Atirou. No peixe.
– Não ligue para ele, . – Ema se aproximou, tentando ajudar. – É só a maneira do Ivan de resolver as coisas. – Ao dizer a última palavra, Ema dirigiu um olhar atravessado para o esposo, que deu de ombros.
– Pense pelo lado bom, vamos ter peixe para o jantar. – ergueu um ombro e riu torto, enquanto a namorada o mirou com incredulidade.

❄❄❄


Quarta-feira, 05 de janeiro de 2022
Casa dos
Viipuri (Vyborg), província de Leningrado – RU



Depois do evento (traumático) da pescaria, lá pelo meio da tarde, estava em seu quarto. O dia era frio como todos os outros ali desde que chegaram. devia estar em algum canto da casa, assim com suas irmãs e seus pais. preferiu ficar um pouco sozinha, tanto para dar espaço para que pudesse ter mais momentos a sós com a família, tanto para recuperar sua bateria social.
Lidar com russos era intenso. Não conseguia explicar de outra forma, era puramente intenso e uma montanha russa – não ironicamente. Parecia um eterno Entrando numa fria, clássico de Ben Stiller e Robert De Niro. Não queria descobrir qual seria o próximo evento catastrófico a enfrentarem em família.
Enquanto divagava sobre o recém adquirido trauma, seu celular tocou. Era a mãe, já fazia algum tempo desde que conversaram pela última vez e talvez, já anestesiada pela pescaria em família, pensou que nada mais a pudesse atingir naquela tarde.

– Oi, mãe. – sorriu fechado.
– Pensei que precisaria mandar uma carta, ou chamar a polícia, ou ir pessoalmente até a Islândia. – A mãe torceu os lábios do outro lado da chamada de vídeo.
– Mãe, eu moro na Finlândia. Finlândia. – corrigiu, esforçando-se para se manter paciente.
– Onde você está? – A mais velha ignorou a filha. – Toda vez que te ligo, está em um lugar diferente.

ponderou por alguns segundos, pensando sobre o que havia dito naquela manhã.

– Estou fazendo uma viagem. – Contou e a mãe arqueou uma sobrancelha. – Com meu namorado. Na verdade, estou fora de casa desde o natal. Ou antes do natal, não sei. – Falou de uma vez, para o espanto da mãe.
– Você tem um namorado? – Ela arregalou os olhos. – Como assim? Quem é ele? De onde é?
– Eu o conheci na Finlândia, é uma boa pessoa e me faz feliz. – Respondeu . – E é isso que precisa saber por enquanto. O resto vai conhecer quando formos para o casamento, juntos.

Fez-se silêncio.

– Você pretende trazer esse namorado ao casamento da sua irmã? – A mãe sondou.
– Sim. – Declarou ela, sem pensar duas vezes, ignorando seus sinais de alerta.
– Ele é apresentável? – A mãe perguntou outra vez. – Porque toda a família do noivo vai estar. Nós queremos causar uma boa impressão, você sabe... – a interrompeu.
– Ele vai me acompanhar, mãe. – Sentenciou de modo firme.
– Ele é de boa família? O que ele faz? – A mãe tornou a perguntar.
– Mãe, eu gosto dele e ele de mim. – a cortou mais uma vez. – É o que devia importar.

❄❄❄


Quarta-feira, 05 de janeiro de 2022
Casa dos
Viipuri (Vyborg), província de Leningrado – RU



Moskau, Moskau. Wirf die Gläser an die Wand. Russland ist ein schönes Land. – cantava enquanto se vestia. – Moskau, Moskau. Deine Seele ist so groß. Nachts, da ist der Teufel los.

O jogador parou quando a namorada entrou em um rompante em seu quarto, sem bater na porta. parecia agitada e segurava o celular na mão. apertou os lábios, pensando se tratar de emoções guardadas ainda do episódio da pescaria.

– Se quer transar, é só avisar, não precisa invadir meu quarto. – O central brincou, tentando fazer a inglesa esquecer do motivo que a tinha trago até seu quarto.
– Minha família já sabe que você vai ao casamento comigo. E que eu tenho um namorado. – começou a falar, nervosa. – Minha mãe me ligou, eu resolvi assumir e, não sei se foi uma boa ideia, mas foi. Olha, se não quiser, tudo bem. Eu vou entender. Você tem uma boa família aqui, boa e feliz, e se não quiser ir até lá comigo. Se não quiser se misturar com a minha família horrível, não tem problema. – Ela sorriu afetada, enquanto inclinou o rosto para olhá-la. – Eu se pudesse não iria também, não de livre e espontânea vontade, pelo menos. Também não trocaria momentos com a sua, pela minha, eu não trocaria, sabe... claro que tem toda essa coisa de tiros em pescaria, mas...

se jogou na cama, assistindo o discurso agitado da namorada e começou a rir.

– O que? – piscou, confusa. – Por que está rindo?
Eu amo você, .

A inglesa congelou, piscou duas vezes e apertou os olhos.

– É sério? – Indagou ela. – Essa era a hora mais romântica para dizer isso? Mesmo tendo tido milhões de outros momentos melhores?

O jogador se pôs de pé e se aproximou, tomando o rosto da inglesa nas mãos.

– Não preciso ficar dizendo que te amo, isso não muda nada. Só dizer não muda. – rolou os olhos e riu outra vez. – E até parece que você não fazia ideia sobre eu te amar. Não finja que é uma surpresa. – baixou o olhar e sorriu. – Qualquer um pode falar que ama, mas fazer, mostrar, não. – beijou a testa da namorada e sorriu. –Acho fofo quando você surta por minha causa, nervosa desse jeito. Fica muito na cara que você realmente se importa comigo.
– É só assim que você vê que me importo com você? – levantou as sobrancelhas.
– Não, mas isso não muda o fato de que eu amo ver você saindo dos trilhos. – confessou e os dois riram. –E eu vou amar ir no casamento inglês chique pra me exibir com você.
❄❄❄


Domingo, 09 de janeiro de 2022
Casa dos
Viipuri (Vyborg), província de Leningrado – RU



Era enfim chegado ao fim as férias com a Família . No fim das contas, a cama que rangia não incomodava tanto, a claridade da janela fora resolvida por uma máscara de dormir, a água fria fora consertada, o rato no quarto e a terapeuta haviam se tornado amigos, e a inglesa não temia mais o fantasma da avó falecida do namorado. Ema não a odiava, agora era afetuosa e se mostrava sempre preocupada com o bem-estar da candidata a nora. Alicia e Inessa eram gentis e agradáveis, e Ivan, mesmo com sua constante insistência em mostrar armas e cabeças de animais empalhados, era uma figura bastante agradável.
A despedida tinha gosto de fim de festa, daquelas de quando se é criança e na hora da melhor brincadeira sua mãe decide que é hora de te buscar. Gosto de terminar o lanche quando ainda se tem fome, ou de deixar cair o sorvete que acabou de comprar em um dia de muito calor. A família os levou até a porta, Felix já estava no carro, aguardando pacientemente e Atte havia ido embora no dia anterior. Precisavam se apresentar no time na segunda-feira, a vida ia voltar ao normal e estavam ansiosos por isso – positiva e negativamente.

– Eu nem consigo acreditar que você já está indo. – Ema lamentou ao se aproximar da inglesa e afagar seu braço. – Agora temos mais alguém para sentir saudades em Lahti.
– Pode nos visitar lá, mama. – sorriu. –Vai encontrar nós dois no mesmo lugar. – O central piscou e se afastou, com intenção de colocar as malas no carro.

Inessa se aproximou do irmã, apoiando o corpo na lateral do carro e cruzando os braços sobre o peito.

– Qual é o seu plano?
– Parar o tempo. – suspirou, captando logo ao que a irmã se referia.
– Não dá para fugir para sempre. – Inessa o olhou. – Se eu e Atte aprendemos algo com isso tudo, é que não dá, nem vale a pena.
– É diferente. – apoiou os braços no carro e olhou sobre o ombro, para onde a mãe e o pai conversavam com sua namorada. – É um de nós dizer adeus a algo que gostamos muito. E é um paradoxo. – O central bufou e negou com a cabeça. – Se eu saio do Pelicans, teria que me mudar de Lahti, se ela quisesse me acompanhar, teria que sair do time, ou viver um relacionamento a distância. Se eu fico no Pelicans, ela sai, ou vamos ter que viver uma mentira, fugindo e escondendo tudo de todos.
– Você não precisa escolher por ela. – Inessa apertou os olhos. – Ela tá nessa relação tanto quanto você. E não é uma criança, ela consegue tomar a decisão e você só precisa saber o que vai fazer com a decisão dela.
– Ela disse que ainda não tem certeza da decisão. – Confidenciou o atleta.
– Bom. – Inessa respirou fundo e sorriu para o namorado. – Deixe para sofrer quando ela decidir, então. Não deve ser uma escolha fácil, tenha paciência. –Disse a irmã ao apertar o ombro de .

– Todos prontos? – se aproximou, abraçando a cintura de .
– Nunca estou pronta para despedidas. – A mãe choramingou.
– Ninguém nunca está. – sorriu e Ema segurou as mãos da inglesa. – Obrigada por me receberem. Esses dias foram muito especiais. – sorriu para o casal e depois para o namorado.
– É como minha mãe teria dito. – Ivan começou a falar. – Se ela não se assustou com as férias da Família , case com ela. – Ele riu, fazendo os outros rirem também.
– É, acho que fui bem persistente. – sorriu sem jeito. – A pescaria foi a parte mais surpreendente, confesso.
– Você se acostuma. – Alicia deu de ombros.
– É, o garoto pode te ensinar a atirar. – Ivan falou sorridente. – Ele atira muito bem, tem ótima pontaria. – olhou rapidamente para o namorado. – Já mostrou aquela pistola dourada que ganhou... – interrompeu o pai.
– É, não é? Está ficando tarde. – começou a empurrar em direção ao carro e acenar para os pais.
– Você tem uma arma? – indagou.
– Ah, uma bem bonita... – Ivan respondeu.
– É melhor a gente se apressar. – lutava para enfiar a namorada no carro.
– É aquela com cano dourado? – Ema perguntou ao marido. – Ela é realmente muito bonita. Você ainda anda com ela, ?
– Adeus, mama. – correu para seu lado do carro, depois de enfiar a força em seu lugar. – Adeus, papa. Alicia, Ness. – Adeus.
– Você tem uma arma? – perguntou, confusa. – Espera, você anda com uma arma?
– Adeus, família. – acenou com pressa e logo deu partida no carro. – Adeus.



13 - Don't blame me

Don't blame me, love made me crazy
If it doesn't, you ain't doing it right
(Don't Blame Me – Taylor Swift)




Segunda-feira, 10 de janeiro de 2022
Casa de
Lahti – Finlândia



– Bom dia.

surpreendeu a namorada, rolando sobre ela e beijando as costas cobertas por um pijama quentinho. Era segunda-feira, dia de se apresentar ao time para retomar os trabalhos na segunda parte da temporada. A voz do jogador era rouca pelo sono, seu corpo quente e grande apertou como um abraço de urso e não parecia ter intenção de se mover. não era contrária a decisão dele.
Ainda não haviam iniciado a mudança para a casa do capitão, mas aos poucos se sentia em casa. Durante a viagem, a inglesa havia pensado compulsoriamente nas palavras de para a mãe, de que encontrariam os dois juntos em casa quando os fosse visitar. Era engraçado, pensava ela, sobre como as coisas só simplesmente aconteceram. Em tempos passados havia se esforçado e lutado, tentando provar para alguns parceiros seu valor, os convencendo a ficar, os convencendo de que podia ser boazinha e uma boa namorada. E então, agora tudo era fácil.
Não foi preciso pedir para ser apresentada, não foi preciso pedir para ser respeitada ou amada, não era preciso que pedisse para que lhe desse atenção ou passasse algum tempo com ela. Ele só estava lá. Ele queria e estava. Tinham seus problemas, mas que casal não tinha? Não sentia em seu coração qualquer peso de dúvidas, a amava.
Era bom ter certeza, ou melhor, era bom não ter que se preocupar.

– A gente precisa levantar. – sussurrou, virando o corpo e abraçando o namorado.
– Eu não quero ir. – resmungou contra as costas dela. – Quero ficar com você aqui.
– Agora vamos morar juntos, então... – não terminou, ergueu os rosto e sorriu infantilmente, com olhar brilhante e cabelo bagunçando.
– É mesmo. – Ele parecia uma criança surpresa.
– Eu amo você. – falou enquanto afagava o rosto bonito do namorado, que ainda sorria.
– Eu amo você. – respondeu, com um sorriso capaz de iluminar o mundo inteiro.

subiu mais o corpo e beijou a namorada, ignorando o hálito matinal dos dois – que já era algo corriqueiro na relação. Os dois se abraçaram e riam enquanto se beijavam, aproveitando a doçura de se estar com quem se ama, dividindo a vida.


❄❄❄


Segunda-feira, 10 de janeiro de 2022
Centro de Treinamentos do Pelicans
Lahti – Finlândia



A terapeuta inglesa quase literalmente saltitava, andando um pouco mais à frente do capitão, tentando disfarçar que haviam chegado juntos, no mesmo carro, ao mesmo tempo. Enquanto caminhava devagar, olhar baixo, mantendo sua expressão fechada até estarem completamente protegidos pelas paredes do centro de treinamentos. tinha vontade de imitá-la – por dentro – mas não podia, ali era o capitão e precisava manter a postura. Algumas outras pessoas também chegavam e saiam de seus carros, Janos Hari era um deles, o central tinha barba maior depois das festas e acenou um pouco mais empolgado que o de costume, até sorriu para quando a inglesa parou perto dele. Era um comportamento matinal empolgado demais para um finlandês típico.

. – Janos cumprimentou o capitão com uma aceno de cabeça e imitou.
– Está mesmo empolgado pra voltar. – Implicou o capitão e o central fez um barulho com a boca.
– Foram dias puros de sauna, eu não tenho do que reclamar. – Janos sorriu, os três começaram a caminhar rumo a entrada.
– Se eu soubesse que pra acalmar vocês bastava uma sauna... – brincou, sorrindo também.
– Já soube das novidades? – Hari se dirigiu a inglesa, que franziu o cenho.
– Que novidades?
– Parece que vão colocar outra mulher no time. – Contou o central de barba arruivada e arregalou os olhos.
– Outra? – O capitão se surpreendeu.
– É. – Janos deu de ombros, ajeitando a alça da bolsa de treinos nos ombros. – Da primeira vez acharam que a gente não estava ocupado o suficiente, veio ela. Agora o que será?
– Como assim ocupado o suficiente? – indagou e , ao ver a ruga de insatisfação se formar entre as sobrancelhas da namorada, apenas balançou a cabeça em sua direção e sorriu, como quem diz para deixar pra lá.
– Nada contra, . – Janos se justificou, mesmo sem se importar muito.
– Outro presente especial de ? – perguntou com um pouco de azedume e Janos apenas ergueu os ombros.

Os três seguiram para dentro, mas diminuiu os passos, como se quisesse se afastar e – por curiosidade instintiva – fez o mesmo. Quando estavam distantes o suficiente de Janos, a inglesa sussurrou:

– Como assim, presente especial do ?

engoliu e suspirou, rolando os olhos um pouco entediado antes de responder.

– Foi o que o Petri disse quando avisou que você viria. – Contou ele. – Que era um presente especial, enviado pelo , diretamente de fora, para o Pelicans.
– Eu não gostei desse tom. – cruzou os braços, estavam perto do corredor que levava ao vestiário. – É assim que falavam de mim? Pelas minhas costas?
– Relaxa, gatinha. – tentou amenizar e sorrir. – Foi quando ele avisou que seria uma mulher. Ninguém esperava ou estava acostumado com a ideia. Você conhece a gente, sabe como é.

torceu os lábios, mas deu de ombros.

– Espero que ela seja legal, que a gente possa trabalhar juntas. – Começou a falar a inglesa, começando a se empolgar. – Vai ser ótimo ter alguém para trabalhar junto. Unir forças contra o Petri e o Jakkos... – fantasiava como se estivesse sozinha, mas a interrompeu, tossindo para limpar a garganta e chamar sua atenção.
– Mas você não deve trabalhar muito com ela, não é? – Ele a olhou, esperando por sua reação. – Já que deve sair do time em breve.

havia parado de andar, estavam perto da porta de acesso aos vestiários. girou em seus calcanhares para olhar o namorado, riu e girou outra vez, seguindo seu caminho. Na opinião do capitão, não havia sido um sorriso do tipo “claro, amor, logo estarei fora”. Era um daqueles sorrisos estranhos e sem jeito, de quando alguém não sabe o que dizer ou não quer se comprometer. permaneceu no corredor, assistindo a namorada se afastar, confabulando consigo mesmo sobre o quanto aquele comportamento era suspeito.

– Capitão. – Atte esbarrou propositalmente no amigo, chamando sua atenção e tirando o jogador de seu transe.
– Estamos de volta. – respondeu em um suspiro, entrando para a zona barulhenta que já era o vestiário.
– E aí, como está a lua de mel? – Atte provocou inocente, enquanto os dois enfiavam suas coisas nos armários.
– A gente pode não falar sobre isso, aqui? Ou agora? – O capitão se corrigiu e bufou. – Ou esse mês.
– Problemas? – Sondou o goleiro, mas apenas o ignorou, fingindo não ter ouvido sua pergunta.
– Soube que vamos ter outra mulher no time. – Aleks se aproximou dos dois assim que chegou, apoiando-se perto do armário de e falando de repente. – Essa, por favor, deixe pra mim. – Pediu ladino.
– Há. – fingiu um riso irônico.
– O que ela faz? – Atte estava mais interessado. – Terapeuta também?
– Não, nada disso. – Aleks deu de ombros. – Mídia.
– Mídia? – arqueou uma sobrancelha, confuso.
– É, vídeos, fotos, promocionais, mídia. – Aleks explicou. – É o que isso significa, pelo que eu soube.
– Que ótimo. – O capitão rolou os olhos e bufou, afastando-se deles.
– Ele voltou. – Atte sorriu saudoso. – Azedo e nada simpático.
– Vão apresentar os reforços também. – Aleks continuou a contar, ignorando a ausência de . – E a garota.
– Como você sabe de tudo isso primeiro que nós? – Atte indagou e o mais jovem apenas ergueu os ombros e sorriu sapeca.

❄❄❄


Segunda-feira, 10 de janeiro de 2022
Centro de Treinamentos do Pelicans
Lahti – Finlândia



estava empolgada e animada com a ideia de mais uma mulher trabalhando na equipe. Seria ótimo, enfim, fazer uma nova amiga em Lahti. Amava ter amigos, mas sentia falta de companhias femininas, elas eram diferentes. Torcia muito para que a nova colega fosse legal e que pudessem compartilhar alguma coisa juntas.
Claro que havia aquele monstro sob a cama, espreitando: a decisão. Mas preferia não pensar naquela parte no momento.
Quando perto da sala de conferências, onde a primeira reunião do ano aconteceria, viu de longe Santtu, e Atte junto a Petri, parados perto da porta. Os quatro conversavam com alguém que estava do lado de dentro e que apenas conseguiu reconhecer quando estava bem perto deles.

– Mere. – sorriu e o amigo loiro a abraçou, sorrindo também, com aquele jeito e beleza de príncipe.

Waltteri sorriu grande, ele não parecia um finlandês comum, com pânico de interações humanas. Quando se desvencilharam, sentiu o olhar quente de Petri sobre si. Estava de frente para o treinador, com ao lado dele, Santtu entre e , ao lado de , Merelä e entre Merelä e Petri, estava Atte.

– Olá, Petri. – o cumprimentou, um pouco incerta. – Desculpe minha indelicadeza.
– Como foram as férias, ? – Petri foi direto e percebeu de soslaio ficar mais tenso e olhar o treinador com desconfiança.
– Foram... – A inglesa hesitou, lutando contra seu nervosismo para encontrar palavras. – Foram boas.
– É, imagino que sim. – Petri tinha os braços cruzados sobre o peito e seu tom não era exatamente doce ou receptivo. – Eu acompanhei na internet. – perdeu a cor. – Rússia, não é? Vocês três. – O treinador apontou para Atte, e , que prenderam a respiração ao mesmo tempo. – Aliás, Tolvanen, fico feliz que depois de toda confusão que causaram no meu vestiário, você conseguiu a garota. Espero que tenha valido a pena.
– Valeu. – O goleiro respondeu rápido, endireitando a coluna.
– O que me volta a pergunta que me tirou o sono durante minha folga. – Petri coçou o queixo e se inclinou um pouco, parecia irritado. – E é claro, eu queria muito ter tido paz e ter dormido na minha folga. Aproveitado a sauna, minha esposa e os especiais de natal da HBO. – Ele se dirigiu a . – Se lembra o que disse a vocês depois do último jogo?

A terapeuta inglesa correu os olhos pelos outros jogadores, rapidamente, em busca de respostas e socorro, mas não conseguiu nada.

– Que eu ia voltar pra Inglaterra? – perguntou modo infantil, completamente envergonha e sem graça, e ergueu um ombro.
– Quer complementar, ? – O treinador convidou sem olhá-lo, os olhos castanhos e pequenos de Petri estavam sobre a terapeuta, a apavorando.
– Na verdade, não. – respondeu, dando-se por desentendido e riu entredentes, encolhendo-se um pouco.
– Quando eu disse para se resolverem e não trazerem problemas para o time, foi se resolverem. Profissionalmente. – Petri estava irritado, Santtu, Atte e Merelä estavam brancos e frios como mármore. – Não começar um namoro.
– Petri, eu... – tentou dizer.
– Eu posso explicar. – também.
– Explicar? – O treinador riu, parecia que a cada palavra dita pelos dois, mais irritado ele ficava. – Você pode explicar. Pode sim. Mas pode me fazer recuperar o sono perdido, ? – Petri se direcionou para o capitão. – Pode fazer isso? – O capitão inclinou a cabeça. – É, eu achei que não. – Ele se voltou para novamente. – E ainda nem tentaram disfarçar. – O mais velho riu nervoso. – Juntos na Rússia, com o nosso goleiro de cobertura. Quem mais sabia sobre isso?
– Só quem estava na Rússia, Petri. – Waltteri Merelä falou de repente, atraindo a atenção do treinador. o encarou chocado e se viu prestes a desmaiar. – Como eu. Eu estava na Rússia com o Atte, e a .
– Você? – Petri o olhou de olhos estreitos, suspeito, assim como o resto do grupo. Santtu fazia sinais para o amigo, para que parasse.
– Eu sou o namorado da . – Declarou orgulhoso, causando choque em todos, incluindo Petri.
– Não adianta mentir para acobertar...
– Acobertar quem? – Merelä deu de ombros, se aproximou da inglesa e envolveu a cintura de com um dos braços. – Já saí do time, porque eu faria isso?
– Mas isso não explica nada. – Petri esquadrinhou o atleta com os olhos, duvidando dele.
– Bem, eu fui a primeira pessoa a conhecer a , ajudei com a mudança, apresentei Santtu, Otto, Jay... trouxe ela para o centro de treinamentos no primeiro dia. – Merelä olhou para enquanto falava, e a terapeuta também tinha os olhos sobre ele, completamente sem reação. – Já te perguntei sobre relacionamentos entre jogadores e membros da equipe. Aceitei a proposta fora por causa dela.
– Isso até faz algum sentido, mas não explica o que eu vi. – Petri ainda estava incrédulo.

Do outro lado, enquanto era sustentada pelo braço de Waltteri e o olhava falar aquelas coisas, espumava, os outros dois estavam bem atentos ao comportamento do capitão. Atte e Santtu ostentavam expressões igualmente chocadas, só não mais que Petri, que tinha certeza de ter descoberto o maior escândalo do time até momentos antes.

queria conhecer outros lugares, ela é amiga da irmã do . – Mere mentiu, a sua maneira. – Não sei porque ficou tão interessado em investigar o que ela posta.
– Bom, eu... eu... – Petri se perdeu. – Eu não engoli isso. – Sentenciou o treinador, cruzando os braços sobre o peito. – Não faz sentido.
– Que prova você quer? – Merelä tinha voz calma e parecia confiante, até feliz. – Apesar de que, não é nada profissional essa conversa. Aqui, no meio do corredor, com outras pessoas participando. – O central piscou.
– Ela não está com você, está com ele. – Petri apontou para , que estufou o peito.
– Está enganado. – enfim se pronunciou, baixou os ombros, surpreso e um pouco decepcionado. – Sempre foi o Mere. – Mentiu, olhando para o amigo, que agora era um namorado falso. – Desde o primeiro dia em Lahti.

A expressão de Petri denunciava que seu cérebro estava travado. O homem congelou onde estava, completamente pasmo e chocado.

– Acho que vocês têm uma reunião agora. – Merelä lembrou, tentando finalizar aquele momento constrangedor o mais rápido possível. – Já resolvi as pendências que precisava. – Ele sorriu e olhou para . – Vejo você depois.

O loiro beijou a testa da terapeuta inglesa e a abraçou, despediu-se dos outros com um aceno e começou a se afastar. ainda estava em choque, mas também sentia o coração desesperado para sair daquele meio. A inglesa enfiou as mãos nos bolsos, suspirou e ergueu as sobrancelhas.

– É, preciso achar um lugar lá dentro. – Disse e se afastou, deixando os quatro homens ainda chocados, no mesmo lugar.



Dentro da sala de conferências, escorreu o corpo pela cadeira que havia escolhido. Na frente, no canto, praticamente escondida pelas luzes e os equipamentos da sala. Mal podia acreditar no que havia acabado de passar, estava tão chocada que não conseguia raciocinar ou elaborar sobre como se sentia a respeito.
Viu de soslaio os outros quatro entrarem e escolherem um lugar. não conseguiu se sentar ao lado de Atte, o espaço fora rapidamente ocupado por Aleks. O capitão não disfarçou sua expressão de insatisfação enquanto era empurrado para outros lugares. Mas nada superou a careta feita por ao ser empurrado por Janos para se sentar ao lado de , enquanto Petri os encarava com olhos cumpridos. percebeu a expressão de e o olhou com sobrancelhas juntas. Mas tinha aquela expressão, a que ele amava usar tempo antes, a máscara de quem está disposto a ignorar e a se fechar como uma concha.
Mas para seu azar – ou sorte –, era com que ele namorava.

– O que te deu?

sussurrou, mas a ignorou completamente. O central tinha o cotovelo apoiado no apoio para braços e a mão sobre a boca, os dois pés no chão e balançava irritantemente uma das pernas.

. – cutucou o namorado de modo dolorido, era impossível que ele fingisse não a ter ouvido dessa vez. – O que foi?
– O que foi. – Ele riu abafado, sarcástico e inclinou a cabeça. A ruga entre as sobrancelhas da terapeuta ficou mais funda.
– Qual é o problema aqui? – perguntou, um pouco mais incisiva.
– Por que não vai perguntar ao seu namorado? – a olhou pela primeira vez desde que havia se sentado e estreitou o olhar de modo homicida, depois de arregalá-los de surpresa. – Aposto que ele deve estar feliz por aí, contando pra todo mundo de vocês.
– Isso é baixo. – ergueu um dedo na direção do namorado. – Waltteri salvou a minha pele, a nossa pele. Ele foi o único a se pronunciar, se colocou em risco só tirar o Petri de cima de mim. Você devia agradecer o Mere.

expirou um riso incrédulo e se remexeu na cadeira, voltando a olhar para frente.

– É, eu vou. – Disse ele, sorrindo de raiva e passando a mão pela barba por fazer e pelo bigode já crescido. – Pode apostar.
– Você está agindo como um idiota. – se enfureceu. – Waltteri só quis ajudar. Ele ao menos se incomodou em me defender do Petri, enquanto você ficou ouvindo e quando ele perguntou, teve a ousadia de dizer não querer falar nada.

Fora vez de encarar com olhar incrédulo.

– Agora eu sou o vilão? – O capitão se endireitou. – Desculpe não mentir, quando achei que a gente tinha um combinado.
– Não tenta distorcer a situação. – revirou os olhos. Os dois tentavam falar baixo, mas não tinham certeza ou se importavam se estavam conseguindo. – Eu não queria que mentisse, queria que me protegesse e me defendesse do Petri. Mas você deixou aquele pitbull selvagem em atacar sozinha.
– Claro, a culpa é do . – O capitão riu, jogando a cabeça para trás. – A culpa é sempre minha. Eu sou inseguro, idiota, é sempre eu. – O jogador se voltou para novamente e a imitou, apontando para ela com o dedo indicador. – Mas porque não fala de você. Que não quer admitir pra mim que não quer sair do time. Por isso você gostou de ser a namorada do Merelä, porque assim você não teria que sair do time.
– Você... – abriu a boca, indignada. – Você...
– Você tem razão. – completou. – É o que você ia dizer, que eu tenho razão.

não respondeu, continuou a olhar o namorado com incredulidade e indignação, mas não conseguiu responder. Talvez, e só talvez, ele tivesse razão. Em seguida, Petri e os outros figurões do time entraram na sala e a discussão não pôde continuar. se virou, evitando ao máximo qualquer contato com a terapeuta, enquanto remoía em silêncio aquela discussão.

❄❄❄


Segunda-feira, 10 de janeiro de 2022
Centro de Treinamentos do Pelicans
Lahti – Finlândia



Após a longa reunião para apresentação dos reforços e novos membros da equipe além gelo, estava em sua sala, fingindo ajeitar algumas coisas para o início da temporada. Era impressionante como um dia que havia começado de maneira tão agradável, seguia daquele modo. Não imaginava que seriam confrontados por Petri daquele jeito, no corredor, perto de outras pessoas. Para a inglesa, até estavam sendo discretos e ela ainda não entendia como o treinador havia acessado aqueles registros.
Além disso, seus sentimentos eram conflitantes, pensava que podia ter chamado para si a responsabilidade sobre tudo aquilo, ter tirado o foco raivoso do treinador da namorada, mas ele não fez. Dizer que preferia não comentar? estava irritada por isso, e talvez um pouco irritada por ter sido descoberta.
A saída encontrada pelo amigo Merelä aliviou a tensão, não precisou ser escorraçada, lidar com os gritos de Petri no corredor. Mas ela sabia que tinha razão, apesar de que tratar daquele assunto naquele momento seria o mesmo que morrer. Quando imaginou contar o treinador sobre o romance com o capitão, se imaginou em uma sala, sozinha com Petri, onde ninguém a veria chorar por causa dos gritos dele. Na situação, quis se agarrar a qualquer tábua de salvação, apenas queria fugir dos olhos fulminantes de Petri, de seus gritos e dos olhares de pena dos amigos.
Mas verdade era, ainda não tinha certeza se queria sair do time. Amava o Pelicans, sentiria falta do trabalho. Sobretudo, temia muito que sua decisão se mostrasse sem sentido no futuro.

– Olá! – Alguém entrou na sala de repente.

usou as costas das mãos para secar uma lágrima solitária que rolou por sua bochecha, fungou e se virou, tentando exibir o maior sorriso que podia.

– Sim.
– Desculpe te incomodar aqui. – Uma mulher morena, de cabelos presos e saia se pronunciou primeiro. – Jakkos nos orientou a te procurar, ele disse que você conseguiria nos ajudar. – estreitou o olhar, confusa e sorriu fraco. – Para mostrar tudo. – A mulher sorriu. – Disse que você entenderia.

pensou por alguns instantes, tentando desvendar aquela fala.
Eram alguns membros novos para a equipe, além de mais fisioterapeutas, um novo preparador de goleiros e um auxiliar técnico, haviam duas mulheres, outras duas estrangeiras. Uma delas, Brienne Krause era da Alemanha e havia trabalhado com a mídia de equipes de Fórmula Um e outros times de futebol antes de ser transferida para a Finlândia. Quando apresentada, teve a oportunidade de ouvir Aleks e mais alguns comentarem sobre mais presentes de . gostou dela, parecia simpática, mas saber da possível proximidade da alemã com deixava a inglesa mais alerta do que gatos perto de água.
A outra era Isabel Svedin e ela assustou o time. Era morena, alta e estava vindo de Milão. O que o time não sabia até aquela manhã, era que Lauri Pöyhönen, o diretor-gerente, estava pronto para ser promovido a presidente e a vaga de diretor-gerente seria de outra estrangeira. encarou a mudança com curiosidade e expectativa, em sua opinião, tudo podia dar super certou ou muito errado. Svedin era estrangeira, mulher, e ao contrário de e de Krause, ela usava scarpins e saia lápis. Petri não tentava disfarçar sua expressão de desgosto com aquela mudança, e em uma suave vingança, se deleitou disso.

– Claro. – A terapeuta inglesa sorriu, percebendo enfim o que as palavras de Jakkos significavam. – Eu entendi. – lutou bravamente contra o desejo de dizer a nova chefe que, o fisioterapeuta as tinha mandado ali apenas por serem mulheres. Duvidava se Jakkos não estava, naquele momento, fazendo um tour com os outros pelo centro de treinamentos. – Vou mostrar tudo a vocês. A propósito, sou . – A inglesa se aproximou, estendendo a mão. – Não nos apresentamos direito.
– Isabel Svedin. – A morena tomou iniciativa. – Ouvi falar de você. – Disse ela e sorriu.
– Brie Krause, pode me chamar só de Brie. – A outra sorriu também.
– Podemos ir por aqui? – respirou fundo e começou a guiar as duas para fora da sala, pelos corredores.
– Como é trabalhar aqui, sendo mulher? – Isabel quis saber. – Você foi uma das primeiras na comissão técnica, é estrangeira também.
– Bom, sendo sincera, foi um desafio. – expirou e se corrigiu. – Tem sido. Eu sou da Inglaterra, as pessoas fazem muita coisa diferente desse lado do mundo.
– Entendo. – Isabel trocou um rápido olhar com a alemã.
– Mas eles se acostumam. – deu de ombros. – O problema não é exatamente os finlandeses, nesse caso. São os jogadores de hockey, acredito que em qualquer país, em esportes majoritariamente dominados por homens, em todas as esferas, se encontram os mesmos desafios.
– Eles se acostumaram a você? – Brie quis saber dessa vez.
– Eu conquistei meu respeito, indo devagar, mostrando o que estava aqui para fazer, respeitando os limites deles. – Contou a inglesa enquanto andavam. – Acredito que construímos uma relação de respeito e apoio mútuo.
– Sua postura foi elogiada. – Isabel contou a ela. – Isso deixou os acionistas e eu otimistas para essa experiência aqui. – a olhou de canto, pensando por alguns segundos se estava envolvido naquela contratação também. – Estou esperando alguma rigidez, mas acho que eles já foram dessensibilizados o suficiente. – Ela sorriu.

As três seguiram o corredor.

– Você gosta de trabalhar aqui? Com o time? – Isabel tornou a perguntar.

arregalou os olhos e sentiu os ombros ficarem tensos de repente. Não entendia porque alguém como ela se importaria com aqueles detalhes.

– Bom, eu…– Ela hesitou, tentando limpar a garganta. Caminhavam por um corredor longo, azulado e iluminado. – Eu gosto. Me familiarizar em Lathi foi complicado, pela barreira da língua e tudo mais, mas no início foi mais complicado. Hoje já tenho amigos, consigo me virar falando a língua…eu gosto. Gosto da energia do time, dos torcedores, da arena. É um bom emprego e Lathi é um lugar bom de se viver. – Respondeu ela, tentando escolher bem as palavras.
– Fico feliz. – Isabel passou as duas mãos nos cabelos. – Isso é importante, um bom ambiente conta muito para o desempenho profissional. E os atletas como estão de saúde? – A executiva sorriu de lado e piscou. – Sinto que você será a mais honesta aqui ao responder essa pergunta.

riu e pensou sobre como gostaria de dizer que ela estava coberta de razão.

– Estamos bem, os atletas estão bem. Estávamos na pausa das festas, mas terminamos o ano passado com um rendimento satisfatório. Atualmente nenhum atleta afastado por lesão. No início da pausa alguns tiveram Covid, mas estão recuperados. Devem passar por exames de rotina só por garantia. – tentava olhar para as duas mulheres ao responder as perguntas, buscando ser inclusiva. – Não tive oportunidade de avaliar os novos atletas, mas quanto a equipe, estamos todos bem.
– Você acompanha de perto a reabilitação deles? – A alemão perguntou dessa vez. – Quando se afastam?
– Sim. – estava mais relaxada, sentia-se bem falando sobre o time e seu trabalho. – Eu acompanho de perto todos os atletas, mesmo se não estiverem lesionados. É a primeira vez que aqui eles contam com esse tipo de profissional, então estamos aproveitando.

guiou Isabel e Brie por corredores largos, com paredes pintadas de um cinza azulado confortável aos olhos, o chão era coberto por um carpete escuro que ajudava a criar um ambiente acolhedor. Passavam por várias portas duplas de madeira clara, e a terapeuta sempre apontava para cada uma delas e dizia de suas funções, sala de reuniões, sala da equipe de marketing, sala de descanso da equipe. Em determinado ponto do corredor, guiou as visitantes para uma espécie de mezanino, de onde se podia ver os atletas treinando no gelo. Eles faziam exercícios com obstáculos, aquecendo e treinando tiros. Haviam mais de vinte atletas no gelo, vestidos com seus uniformes de treino e seus pesados equipamentos de proteção, também alguns membros da comissão técnica, que se diferenciavam deles por suas vestimentas.

– Aqui é onde eles treinam. É menor do que a arena oficinal, onde os jogos acontecem, mas eles conseguem se divertir. – sorriu, apoiando-se na mureta. – E claro, imagino que você já saiba disso. – Ela sorriu sem jeito, sentindo-se estúpida, mas as duas mulheres sorriram empáticas.
– Eu só estou aqui pra gerar conteúdo, nunca nem pisei no gelo. – Brie riu, apontando para onde os atletas treinavam. – A não ser para patinar no inverno, acho que isso conta. – A alemã fez uma careta e sorriu, invejando a coragem dela.
– Meu irmão e eu jogávamos com meu pai quando erámos crianças. – Isabel contou, cruzando os braços sobre o peito e analisando com olhos de águia o gelo e os atletas. – Joguei na faculdade.
– Você era jogadora de hockey? – arregalou os olhos e Isabel sorriu sem jeito.
– Já faz muito tempo. – Ela balançou a cabeça. – Prefiro a outra parte hoje em dia. – Disse ela e assentiu, apertando os lábios.
– Você quer ver o vestiário? – Sugeriu a inglesa, apontando para a escada que as levariam ao andar de baixo, Isabel assentiu.
– Aproveitando a oportunidade, . – A executiva a olhou enquanto desciam. – Preciso de relatórios sobre os atletas, qualquer informação é relevante.
– Claro. – assentiu, um pouco assustada com a demanda repentina. – Claro.

guiou as duas até o final das escadas, mas Isabel pareceu se interessar por olhar mais de perto o treino. A alemã, Brie, parecia atenta aos movimentos da chefe também, querendo prever o que viria a seguir. Não era uma postura diferente da que sustentava.

– Aonde está o ? – A morena perguntou com olhar estreito e a mirou, desconfiada.
– Ali, no centro. – Apontou a terapeuta inglesa.

– Gostaria de falar com ele. – Falou a executiva, sem desprender o olhar de .

a observou com um vinco entre as sobrancelhas, tentando pensar no que a executiva poderia ter para falar com seu namorado. Até que Isabel a olhou outra vez e ergueu as sobrancelhas, fazendo a inglesa se lembrar de que a morena esperava que ela chamasse . não gritava, odiava isso, e por alguns instantes, pensou que ter uma nova chefe talvez não fosse tão agradável.
Felizmente, e eram magnéticos e assim que a inglesa se aproximou do rinque com as duas mulheres, concentrou toda sua atenção na namorada. Não demorou para que visse o olhar e aceno de , chamando-o para perto da proteção.

. – cumprimentou quando o jogador se aproximou. – Essas são Briene Krause e Isabel Svedin. – Apresentou e o capitão apenas acenou com a cabeça e apertou os lábios.
– Olá, . – Isabel sorriu em cumprimento. – Como vai?

O central assentiu com a cabeça, mantendo uma expressão serena no rosto, mas a analisando sutilmente com o olhar. Briene sorriu para ele, mas logo se distraiu com os outros jogadores, enquanto prestava atenção na nova chefe, com olhos estreitos.

– Só gostaria de me apresentar de modo mais apropriado. – Isabel sorriu de canto. – Você é nossa arma mais potente, sempre ouvi falar sobre seu talento e também vi no gelo. Como membro do time e fã de hockey, não podia deixar de cumprimentar o meu capitão.

deixou o queixo cair, atônita.
arregalou os olhos, recorreu com um olhar rápido para a namorada e depois tentou olhar para o gelo, os patins, o taco e as luvas.

– Obrigado. – Ele respondeu mecanicamente, batendo o taco no chão e olhando para trás, para onde os companheiros treinavam.
– Vamos ter mais conversas em breve. – Isabel continuou a falar, tocando com uma das mãos o muro de proteção e tamborilando os dedos. a viu sorrir e precisou engolir com muito esforço a vontade que sentia se de colocar entre o namorado e a nova chefe. – Se precisar de mim, ou se houver qualquer coisa que eu possa fazer por você, me deixe saber.

assentiu uma vez e começou a se afastar, torcendo para não ser chamado de volta. Não era o silêncio e a armadura que costumava usar com os superiores e treinador, era algo diferente, mais para uma surpresa desconfortável, pensou. E em seu coração, esperou que se tratasse mesmo disso.

– O que mais temos para ver? – Isabel girou em seu próprio eixo, dando as costas para onde o time treinava.
– Não vai querer falar com mais ninguém? – , que ainda estava abalada por ouvir outra mulher chamando de meu capitão, indagou. – Santtu é um ótimo defensor também, e o Atte, Aleks. Quem sabe com o treinador.
– Não, já foi suficiente. – Isabel começou a andar, dando as costas para as outras duas, Brie a olhou e ergueu os ombros, empática. As duas voltaram a seguir Isabel. – Aliás, faça um relatório mais abrangente sobre o capitão.
– Mais abrangente? – parou de andar. – Mas você já disse que toda informação é relevante, o que mais eu poderia dizer?
– Detalhes, . – Isabel agitou uma das mãos, ainda andando e obrigando a se apressar. – Está aqui desde o ano passado, deve ter muito mais a acrescentar do que as informações profissionais que irá colocar nos relatórios técnicos.

olhou rápido para Brie, que parecia fingir não ouvir o assunto.

– Está me pedindo para colocar informações pessoais? – empacou no corredor, obrigando Isabel a parar sua caminhada apressada. – Dos atletas.
– Não, apenas do capitão. – Isabel sorriu e negou com a cabeça uma vez. – Se quer conhecer um grupo, conheça seu líder. – A morena piscou, se virou, batendo os cabelos escovados no rosto de e voltando a caminhar.

❄❄❄


Segunda-feira, 10 de janeiro de 2022
Centro de Treinamentos do Pelicans
Lahti – Finlândia



– Uau! – Topi Jaakola se lançou sobre , sacudindo o central pelos ombros. – Certamente é uma boa hora para ter atenção da chefa, hein?!
– Para. Saí. – O capitão empurrou o defensor, se desvencilhando dele.
– O que ela queria, ? Seu telefone? – Aleks implicou, juntando-se aos outros atletas que se aproximavam do capitão, curiosos com a breve interação com a nova executiva.
– Ela não queria nada. – se irritou, abrindo o fecho do capacete. – E dá pra parar com isso? Ela é diretora-executiva, não uma garota em um bar.
– Se ela fosse uma garota de bar, teria te deixado menos nervoso. – Janos gargalhou, deslizando ao redor de , que dirigiu a ele um olhar atravessado. – É o que acontece quando se fica muito tempo sozinho.
– Dá pra parar? – empurrou Aleks, que tentava se aproximar. – Eu não fiquei nervoso, vocês que me irritam. E eu tenho namorada. – Declarou pela primeira vez ao time. – Ou tinha. – Ele se corrigiu, lembrando-se da briga e de que havia presenciado aquela situação com a nova executiva. – Tenho. Sei lá.
– Você? – Aleks arregalou os olhos.
– Aparentemente vocês só parecem ser os caras legais. – Topi implicou, cutucando com o taco. – Tipo o Merelä, que saiu daqui com a .

O time riu, com exceção de , Atte e Santtu.

– Alguém devia avisar a ele que não era Waltteri que ela chamava a noite? – Willy zombou, fazendo os outros rirem e Atte acertou o jogador com um tapa na nuca. tentou evitar, mas não conseguiu controlar os lábios e sorriu.
– Você fica escutando atrás da porta dela? – Mikko indagou. O treino estava parado e todos faziam um grande círculo para falar do assunto mais constrangedor e proibido para o capitão: sua namorada.
– Não, mas as paredes são mais finas do que o proprietário disse. – Willy deu de ombros. – Mas já faz tempo que não ouço nada. O apartamento estava fechado.
– Já sabemos onde ela estava. – Topi riu malicioso, erguendo as sobrancelhas.
– Chega! – falou alto. – Chega. É sério? Vão falar assim da ? – Questionou o capitão, olhando para os companheiros. – Que nojo.

Alguns jogadores inclinaram a cabeça, mas todos silenciaram. se afastou, deslizando para o canto do gelo, afastando-se de todos. Mas bastou o central se apoiar a proteção, para sentir o impacto dos corpos de Atte e Santtu se chocando contra o muro.

– Ela queria mesmo seu telefone? – Santtu quis saber.
– Não! Que droga. – Xingou , chutando sem muita força o muro de proteção. – Qual é o problema de vocês? Ela só queria se apresentar.
– E por que você ficou tão mexido? – Atte sondou.
– Não acho que foi por causa dela. – Santtu cutucou o goleiro com o cotovelo, depois levantou uma sobrancelha para ele.
– A gente tinha a merda de um combinado. – tinha os cotovelos apoiados ao muro, olhava para baixo e o corpo inclinado, de costas para o gelo. – Tudo devia estar resolvido, a gente vai até morar junto.
– Olha, cara... – Atte se aproximou, tocando o ombro do amigo. – Talvez ela só não quis anunciar isso ali, no corredor, com o Petri gritando com ela na frente de todo mundo.
– Você é muito otimista. – resmungou. – Ela estava toda empolgada com mais mulheres no time, falando sobre como seria bom trabalhar aqui agora.
– Bom, ela não deve pedir demissão em um dia e depois nunca mais voltar, então... – Atte tentou contornar.
– Eu não pediria se fosse ela. – Santtu falou, chamando a atenção dos outros dois.
– O que? – ergueu o tronco e estreitou perigosamente o olhar.
– Eu não pediria. – O defensor ergueu os ombros. – Ela precisa abrir mão da carreira e do trabalho, você vai abrir mão de quê? Vocês vivem brigando, caso você decida dar um gelo nela outra vez, o que ela faria?
– Qual é o seu problema aqui? – questionou, aproximando-se mais de Santtu. – Você e o Merelä estão juntos nessa droga toda?
– Você devia agradecer o Mere. – Santtu manteve a postura calma e pacífica. – Se não fosse por ele, Petri estaria gritando com a até agora. Porque, eu acho que me lembro, quando ele começou, você disse que não queria comentar.
– É, isso foi um pouco de vacilo. – Atte concordou, atraindo outro olhar matador de .
– O Waltteri não tinha que se meter em nada, ele apenas aproveitou a situação pra ter o que sempre quis. – começou a falar. – Eu me resolvo com o Petri do meu jeito, sempre foi assim.
– É, deu pra ver. – Santtu debochou.
– Se a me pedisse pra sair do time, eu sairia, mas mesmo assim a gente ficaria separado. Teríamos o mesmo problema. – Continuou o jogador. – Não preciso de você se metendo no meu namoro.
– Não tô, só tô fazendo o que você não fez. – Santtu ergueu o queixo. – Protegendo a minha amiga.




14 - So in love that you act insane and that's the way I loved you

But I miss screaming and fighting and kissing in the rain
And it's 2AM and I'm cursing your name
So in love that you act insane
And that's the way I loved (love) you
Breakin' down and coming undone
It's a roller coaster kinda rush
And I never knew I could feel that much
And that's the way I loved (love) you
(The way I loved you – Taylor Swift)




Segunda-feira, 10 de janeiro de 2022
Centro de Treinamentos do Pelicans
Lahti – Finlândia



Era um dia terrível.
Completamente terrível.
Se não bastasse o flagrante de Petri – que felizmente por estar envolvido com a nova executiva, não tinha feito mais nenhuma pergunta sobre o namoro falso com Merelä –, a briga com , agora tinha uma chefe, exigente e que queria detalhes abrangente sobre , além de chamá-lo de meu capitão. Mal haviam retornado ao trabalho e fora tomada de caos e problemas, antigos e novos. Uma coisa era certa, não aguentava mais os problemas que namorar escondido um jogador a estavam trazendo. Também já não aguentava a nova executiva, mas não queria ser misógina.
Estava cansada depois de Isabel Svedin a forçar a caminhar por todo centro de treinamentos, depois explicar todos os objetivos do trabalho da terapeuta junto ao time e ainda sorrir para aquela Barbie malévola.
Felizmente podia ir embora mais cedo naquela tarde e mal podia esperar para sentir o abraço confortável de seus lençóis.
Antes de sair, parou perto da porta que dava para o estacionamento, ponderando sobre o que devia fazer. teria atividades até o início da noite e ainda era o início da tarde. estava magoada e irritada com a cena do início da manhã, mas agora moravam juntos, então devia ir para a casa do capitão? Nunca havia estado lá sem a presença dele, percebeu. Não conseguia normalizar ir chorar nos lençóis do homem que a irritava, após uma briga, precisava de distância. Mas ao mesmo tempo, ir para seu apartamento não seria estranho e a declaração de uma crise? O que pensaria se após a briga, voltasse para o apartamento? O que isso dizia sobre o relacionamento dos dois?
Ao mesmo tempo, não queria ir para a casa dele sozinha, ficar lá, esperando até que chegasse, para enfim tratá-lo com desprezo – ou ser tratada assim – até que se reconciliassem. Seu apartamento era mais perto, podia ir andando, era mais um ponto a favor. A terapeuta decidiu que, devia ir ao seu velho apartamento, ficaria lá por um tempo e quando perto da saída de , voltaria a arena, ou mandaria uma mensagem pedindo para que a encontrasse em sua velha casa, como nos velhos tempos, já mais calma e pronta para a reconciliação.

. – Uma voz familiar a chamou e se virou.
– Não. – A terapeuta arregalou os olhos. – Você não.
– Ah, olá, chefe. – debochou, sorrindo de lado. Ele tinha as mãos nos bolsos da calça social. – Muito bom ver você também.
– Não é bom ver você, . – respondeu em um rosnado. – Na verdade, é bem o contrário.
– Que foi? Pisei no seu pé? – O loiro se aproximou um pouco e o encarou incrédula. – Risquei seu carro sem querer?
– Não seja ridículo. – A inglesa rolou os olhos e cruzou os braços sobre o peito. – Você sabe exatamente tudo que fez.
– Eu poderia dizer mil vezes que não, mas você não acreditaria. – Ele a olhou por debaixo das sobrancelhas, inclinando a cabeça um pouco. – Acho que você gosta de me odiar, de algum jeito.

A inglesa negou com a cabeça, suspirou e olhou para o teto, em busca de apoio divino.

– Eu não sei o que fiz para merecer tanta tortura nessa terra.

riu, baixando o olhar.

– Apesar de tentador e de fazer meus dias mais felizes, eu não tenho interesse em seguir com esse jogo de gato e rato.
– Karl Marx tinha um nome diferente para isso. – ergueu o dedo indicador e o agitou, fazendo menção a relação de poder e trabalho que havia entre eles.
– Você é inteligente, isso me pega. – sorriu e rolou os olhos outra vez, tentando ignorar e não se envaidecer com o comentário dele.
– O que você quer aqui? – cruzou os braços sobre o peito outra vez e o encarou. – Me torturar? Me causar mais problemas? Arruinar meu dia de vez?
– Na verdade, vim me reunir com a nova executiva. – respondeu, esticando uma das mãos e afastando uma pequena mecha de cabelo dos ombros da terapeuta inglesa, que se afastou.
– Eu preciso mesmo pedir demissão. – rosnou, afastando-se mais.
– Achei que Svedin e Krause aqui te fariam repensar suas ameaças. – tornou a falar.
– Não são ameaças. – se aproximou novamente. – Foi por isso que mandou as duas? Por minha causa? Você é realmente um maníaco obcecado.
– Svedin não foi indicada só por mim. – Ele riu, divertindo-se das reações dela. – E Krause é muito competente. Parece que temos uma maníaca narcisista aqui também.
– Você me persegue, agora tem suas amigas aqui para te dar mais informações. – riu de modo teatral. – E eu sou a maluca...
– Eu sinto muito. – disse de repente, atraindo um olhar confuso por parte da inglesa.
– Oi?
– Eu sinto muito. – Ele repetiu. – Acho que deixei isso ir longe demais. Depois tentei concertar as coisas e acabei piorando tudo.
– Do que exatamente você está falando? – estreitou o olhar.
– De tudo, desde Mônaco. – Respondeu ele. – Até aqui, agora.
– Se está pedindo desculpas por medo de um processo trabalhista...
, não. – riu fraco. – Ao contrário do que você pensa, nem tudo é premeditado e feito apenas para te fazer mal. O que, nem de longe é o que eu quero. – falou, diminuindo o tom de voz e olhando com intensidade para os olhos da terapeuta.
– E o que você quer? – devolveu a pergunta.
– Nada. – O finlandês sacudiu a cabeça devagar. – Só não ser odiado já me é suficiente.

e se encararam por alguns instantes. Ele com olhar azul e sereno, parecendo uma piscina limpa e convidativa em um verão quente, ela com olhar castanho estreito, desconfiado como as águas turbulentas de um rio em dia de chuva.

– Preciso ir ver Isabel agora. – avisou após conferir as horas em seu relógio. – Bom te ver, .

sorriu e piscou, afastando-se em silêncio.
não respondeu.

❄❄❄


Segunda-feira, 10 de janeiro de 2022
Apartamento de
Lahti – Finlândia



A caminhada da Isku Areena até o aparamento na Kirveskatu fora longa, solitária, fria e silenciosa. não sabia sequer o que pensar, então em sua mente ecoavam gritos como os da Regina George naquela cena de Meninas Malvadas. Se perguntava apenas como aquela virada completa havia acontecido. Se sentia como em uma série, onde a próxima temporada começa com todo caos possível para que se tenha muito assunto a discutir no decorrer dos episódios novos.
Mas, droga, não queria estar em uma série.
Queria paz, aproveitar seu namorado e uma boa vida, sem problemas no trabalho, com chefes e chefas. E por falar em chefe, não havia momento melhor para voltar a assombrar suas vidas. Se é que ele havia ido embora em algum momento.
se arrastava pelos degraus do prédio, tinha se esquecido do cheiro de casa velha e da textura da madeira do corrimão da escada, ou talvez se acostumado rápido demais com a casa luxuosa do namorado. Haviam algumas correspondências sob a porta, mas a terapeuta inglesa ignorou. Era um dia frio, nevava e a casa parecia um mausoléu, correspondia bem ao humor atual da inglesa, pensava ela. ligou o aquecedor, mas não retirou o casaco, só a touca e jogou a bolsa de trabalho no chão. Se apoiou a porta e começou a escorregar até o chão, mas se lembrou que devia conferir o apartamento, a geladeira e todo o resto. A vida de uma mulher adulta não dá tempo para chorar.
Havia um resto de suco de morango na geladeira, que a inglesa abriu e cheirou, fazendo vômito em seguida. Fora a garrafa de líquido apodrecido, o eletrodoméstico estava vazio, assim como o armário e gavetas e potes. Tudo abandonado. ainda contemplava o estado empoeirado de sua tumba, quando ouviu alguém bater na porta.
, pensou ela.
A terapeuta respirou fundo e passou as mãos nos cabelos, tentando organizar os fios. Se tinha fugido do treino para ir atrás dela, ou era porque sabia do aparecimento de , ou porque queria muito pedir desculpas. começou a ensaiar nos pensamentos o que diria a ele, sobre como se sentiu desprotegida e sobre como não fazia ideia de que ainda estava na cidade. abriu a primeira porta, respirou fundo e abriu a segunda.

Surpresa!! – Maisie e Louis gritaram animados.
– O quê? – não conseguiu conter sua expressão chocada.
– Eu esperava minimamente um sorriso, . – Maisie fez um bico e cruzou os braços.
– Eu não... – ainda estava perdida. – O que estão fazendo aqui?
– Bom te ver também, . – Louis fez careta.
– Não, é que... – A inglesa riu nervosa, colocando as mãos nas bochechas. – É que eu realmente... eu não fazia ideia.
– E é por isso que se chama surpresa, idiota. – Maisie rolou os olhos. – E aí, vai deixar a gente mofar aqui fora?

❄❄❄


Segunda-feira, 10 de janeiro de 2022
Centro de Treinamentos do Pelicans
Lahti – Finlândia



– Eu sei que errei, eu fui idiota. – assumiu depois de suspirar. – Não sei como justificar e também não vou. Só posso pedir desculpas. Mas eu achei que a gente tinha um trato, que você tinha concordado com a coisa de deixar o time. Você podia ter me dito que não queria, ou sei lá... – Ele sacudiu a cabeça negativamente e baixou o olhar. – Eu não sei como a gente pode resolver isso, só quero resolver. Você é boa nisso, não eu. Você. E é por isso que eu te amo.

O capitão rodou os ombros e respirou fundo mais uma vez.

– É isso, , você consegue. – Ele parou de andar, ajeitando a alça da bolsa de treino nos ombros e encarando a porta da sala de . – É só dizer. Ela te conhece, sabe que você é um idiota. Mas é só dizer. Só dizer. Não é tão difícil. – O central respirou fundo mais uma vez.

bateu na porta, mas ninguém respondeu. Pensou em abrir, mas não queria invadir o espaço da namorada, se fizesse, ela poderia se irritar e não o perdoar pelo dia desastroso. bateu outra vez.

– Olha, não sei se está me ouvindo... – Ele começou a dizer, mas lembrou-se de que depois das últimas, estariam sendo observados de perto e temeu que houvesse mais alguém na sala, junto a terapeuta. tentou limpar a garganta antes de voltar a falar, diminuindo a emoção. – Eu quero me desculpar por hoje. Não tem justificativa, só...você é a melhor que já tivemos aqui e eu devia ouvir mais você. – O jogador tentou falar em códigos. – Eu sou ansioso, você sabe disso e eu... eu quero apressar as coisas, resolver tudo do meu jeito... eu fui um babaca. Só queria conversar um pouco e pedir desculpas, então... se puder falar comigo, ... – riu fraco. – Eu ia ficar muito, muito aliviado.

O central ergueu o olhar e encarou a porta outra vez.
Depois de alguns instantes em silêncio, ouviu passos e então alguém girou a maçaneta devagar, quase hesitante. umedeceu os lábios e sorriu, mas seu sorriso desapareceu assim que encontrou o nariz pontudo de Jakkos do outro lado.

– Opa. – O fisioterapeuta ergueu as sobrancelhas e apertou os lábios. – Acho que alguém fez uma besteira das grandes.
– Eu... – tentou se recompor. – Eu só...
– Escuta, por que você não me pede desculpas assim quando... – Jakkos cruzou os braços.
– Você não é uma mulher, é? – O capitão o cortou. – Onde está a ?
– Na casa do namorado? – Jakkos deu de ombros e o atingiu com um olhar atravessado e duro, que unidos a postura ofensiva e altura do jogador, fizeram com que Jakkos recuasse um passo e erguesse as mãos em rendição. – Brincadeira, . Só brincando. – O finlandês riu fraco. – Não faço ideia, ela foi embora no início da tarde.
– Ela foi embora? – foi pego de guarda-baixa. – Mas ela...
– Deve ter ido descansar, soube que a Svedin deu muito trabalho a ela. – Jakkos começou a tagarelar. – E para mim também. Aquela mulher é cruel, ela me pediu todas as...
– Eu não quero saber. – interrompeu o fisioterapeuta de modo rude. – Ela disse para aonde ia?
– Não sei se reparou, , mas ninguém aqui costuma me dar muita satisfação. – O fisioterapeuta torceu os lábios em uma careta. – Amanhã ela está de volta e você fala com ela. – Ele deu de ombros.

O jogador balançou a cabeça negativamente e deu as costas ao fisioterapeuta, seguindo o corredor.

– É só falar com ela amanhã. – Jakkos continuou falando, confuso por ser tão ignorado. – Ou manda uma mensagem.

A coisa aumentava de proporção.
tinha ido embora sem ele, sem avisar. Será que estava tão aborrecida assim, a ponto de não querer ficar mais com ele? De querer acabar com a ideia de morarem juntos?
começou a sentir falta de ar, parou de andar e se escorou em uma parede. Não, ela não mudaria de ideia assim, mudaria? Ele se perguntava, em desespero. Será que tinha errado tanto assim? E agora, Waltteri Merelä estava na jogada, como namorado falso e talvez isso fosse algum tipo de karma.
Para de surtar, se controla, o central disse a si mesmo, esfregando as mãos nos cabelos, sob a touca. Não é nada disso, repetiu.
Era chocante como, mesmo chateado, a simples possibilidade de perder a inglesa o fazia abrir mão de orgulho, de si mesmo e de estar ou não errado. Num estalo de clareza mental, pegou o celular e desbloqueou o aparelho, queria acessar o sistema de vigilância da casa. Se estivesse lá, ele a veria e então compraria flores e comida e voltaria para casa o mais rápido possível. O central trocava de câmeras ansiosamente, mas tudo que via era Felix e as vezes algum empregado. Nada de , nem sinal de sua garota.

– Pensa, pensa. – ordenou a si mesmo, batendo o celular contra a testa. – Para onde ela iria? Santtu ainda estava aqui, Jay e os outros também... só o Merelä, mas... – O jogador riu nervoso. – Ela não iria até ele. Não iria. – arregalou os olhos, tendo uma ideia. – Em casa, no apartamento. – O jogador se endireitou e começou a correr em direção em ao estacionamento. – Por favor, esteja no apartamento.

❄❄❄


Segunda-feira, 10 de janeiro de 2022
Apartamento de
Lahti – Finlândia



Já haviam horas que Louis, Maisie e estavam sentados no sofá do apartamento falando sobre a vida da terapeuta. Haviam muitas novidades nas últimas doze horas e estava aproveitando a presença de suas figuras parentais para enfim desabar em todos seus medos, inseguranças e problemas desde sua chegada em Lahti. Maisie havia sugerido o término três vezes, Louis uma. Mas não queria seguir por aquela linha e nem mesmo acreditava ser a correta, mas entendia que do ponto de vista recortado dos amigos, aquilo podia parecer o melhor a se fazer.
Na verdade, a situação com Petri a havia chateado, era óbvio, mas tinha mais que a incomodava, algo que talvez nem mesmo a terapeuta quisesse admitir a si mesma.

– Eu só sei que não sei o que fazer. – repetiu pela terceira vez naquela hora.
– Se você tivesse me ouvido no início disso tudo, nós não estaríamos tendo esse problema agora. – Maisie apontou depois de rolar os olhos. – Teríamos comida em casa e um apartamento habitável. – A outra inglesa fez menção ao ambiente ao seu redor, empurrando com a ponta dos dedos uma almofada empoeirada.
– Maisie. – Louis chamou a atenção da amiga. – Que tal tentar, pra variar, não ser egoísta e chata? Já pedimos pizza.

concordou com a cabeça, levando até os lábios um copo de água que o amigo médico havia ofertado antes, quando começara a chorar de saúde de seu país ao imaginar os dois amigos vivendo lá sem ela.

– Obrigada, Lou. – Agradeceu ela, entre um gole e um soluço. – Eu não me arrependi, de nada. Foram férias ótimas e... isso torna tudo pior. – voltou a chorar e os amigos se entreolharam.
– Eu penso que você está sendo um pouco dramática. – Louis comentou.
– É porque passei muito tempo guardando todas as minhas emoções, não tinha meus pais por perto para desabafar. – justificou e Maisie sorriu. – Desde a primeira briga, ou quando eu fiquei perdida na cidade por não saber falar a língua. Ou quando pedi café gelado por engano em um dia que estava de TPM.
– Mas você é uma adulta, precisa resolver isso e parar de chorar. – Maisie foi dura. – É assim que você tem passado sua vida? Chorando em um apartamento velho por causa de um feio?
– O não é feio. – protestou e Louis fez uma careta, concordando com Maisie.
– Eu acho que vou pegar mais lenços. – O médico suspirou depois de um longo bocejo. – Ou um lençol, deve ser mais efetivo.

Louis não chegou a se levantar, alguém bateu na porta antes.

– A pizza, enfim algum alimento. – Maisie reclamou, bufando e apoiando a nuca no sofá. – Não faz cinco horas que cheguei e já odeio esse lugar.
– Eles não interfonam por aqui? – Louis quis saber, ficando de pé e ensaiando ir em direção a porta.
– Eles fazem. – respondeu, secando as lágrimas. – Mas devem achar que eu me mudei, ou morri. O que para o locatário seria um favor. – ficou de pé. – Tudo bem, Lou, eu vou. Eles nem sempre falam inglês. – Ela explicou e em seguida precisou engolir o choro outra vez. – era quem sempre fazia isso por mim. – A inglesa respirou fundo e secou uma lágrima única que escorria por sua bochecha, enquanto a pessoa do outro lado da porta batia incessantemente. – Tudo bem, eu consigo. Eu consigo. – Disse ela a si mesma, sob o olhar empático dos amigos.

se arrastou para a porta, ainda usava as roupas de quando chegou em casa, tinha o rosto vermelho e olhos molhados de chorar, mesmo que não tivesse certeza mais quanto a razão das lágrimas.

🎵 Dê play na música aqui, e se necessário coloque para repetir🎵


A inglesa abriu uma porta, depois a outra, sobressaltando-se quando descobriu quem batia.

?

Não houve tempo para respostas ou reflexão, o jogador se convidou para dentro, tomando o rosto da namorada nas mãos e a beijando sem avisar. não soube como reagir, apenas ficou imóvel e levou a mão que não segurava a porta até uma das mãos do namorado. Não que ela pensasse em recusar o beijo, só estava acostumada a terem uma conversa antes daquela parte.

– Eu preciso de você. – Foi a primeira coisa que disse ao afastar milimetricamente seus lábios, mas mantendo-se com olhos fechados e testas juntas. – Não posso perder você. Eu aceito qualquer coisa, eu aguento qualquer coisa, menos isso.
... – A terapeuta tentou dizer.
– Eu sou um idiota, eu sou. Você sabe. – Ele a interrompeu. – Eu devia ter ficado do seu lado com o Petri. Nem sei porque fiz aquilo, na verdade. Eu sou um idiota. Mas eu amo você.
– Eu não estou brava. – disse a ele em meio ao discurso do capitão.
– Eu topo o que você quiser, até essa coisa com o Merelä... – ainda falava, mas quando as palavras da namorada fizeram sentido em sua cabeça, o jogador parou de falar, afastou um pouco o rosto e abriu os olhos. – Não?
– Não. – ergueu os ombros e negou com a cabeça, com voz embargada. – Eu estou chateada, mas não quero me separar de você por isso.
– Não? – uniu as sobrancelhas, ainda mais perplexo. – Mas você veio pra cá, você não foi pra casa... e o nosso combinado, também aquilo com o Petri, o Santtu...
. – Fora vez de a inglesa segurar o rosto do jogador e o fazer olhar em seus olhos. – Eu só precisava pensar um pouco, ia te mandar uma mensagem e avisar que estava aqui. – Contou ela. – Não ia ficar à vontade na sua casa sem você.
– Na nossa. – a corrigiu, segurando sua cintura e olhando em seus olhos, como para se certificar que aquela parte não havia mudado, mas desviou o olhar. – Nossa casa. , nossa casa.
– Eu...
– Você... Você mudou de ideia? Você... – voltou a falar rápido, nervosamente. – Você não quer...
– Eu não sei, não sei o que eu quero fazer. – A inglesa admitiu, afastando-se um pouco do namorado, apoiando-se ao balcão da cozinha, onde tantas vezes haviam comido juntos.
– Isso... o que isso significa? – se aproximou e riu nervosamente. – Você precisa me ajudar a entender, porque eu... você tá terminando comigo?

Quando ergueu o olhar para responde-lo, encontrou o jogador com olhos molhados e se amaldiçoou, porque odiava vê-lo assim por sua culpa.

– Não. – Respondeu com firmeza, balançou a cabeça e se aproximou dele, tentando abraçá-lo, mas a impediu, recuando.
– Então o que você quer? O que você tá fazendo, ? – Ele inquiriu, perdido.

A inglesa apenas apertou os lábios e negou com a cabeça outra vez.

– O que é que você quer, ? – insistiu, falando de forma mais dura e subindo um pouco o tom de sua voz. – Ou o que você não quer. Eu já nem sei mais como perguntar. – O central riu nervoso e balançou a cabeça. – Eu não tô entendendo você. Você... você diz que não sabe mais o que quer, mas não quer terminar comigo... você... – gesticulava ao falar. – Você ignorou nosso combinado, foi lisa quando eu perguntei... o que é que você não está com coragem pra me dizer? – Enquanto ouvia as indagações em voz alta do namorado, voltou a chorar em silêncio e a negar com a cabeça. – Me diz, . Me fala logo o que você quer.
– Eu não sei se quero sair do time. – Ela enfim declarou em voz alta, surpreendendo o namorado, que recuou de novo. – Eu não sei se quero tudo isso, se quero sair do time e me jogar no escuro com você. Eu não sei o que vai acontecer. Eu não sei se quero deixar uma das poucas coisas estáveis na minha vida, que é o meu trabalho e a minha carreira, e me lançar sem saber o que vai acontecer. Sem saber se daqui um ano você ainda vai me amar. – abriu a boca para responder, mas a inglesa ergueu o dedo indicador. – E não diga que é óbvio que sim. – riu sem humor. – Porque nem mesmo você sabe. Não sabe. Não tem como saber. Não tem como saber se vai me amar, se vai dar certo, se vamos estar juntos e se isso tudo é ou não uma loucura. Eu não sei! Ninguém sabe e eu estou apavorada. Eu tô com medo de deixar o que eu conheço, com medo de não precisar mais fazer tudo sozinha. Tô com medo de precisar de alguém, de ter que contar com alguém, de não ser apenas eu mais.

ouvia tudo, em silêncio.

– Eu não sei como é isso, não sei como é compartilhar a vida assim. – continuou. – O mais perto que cheguei disso foi com meus dois melhores amigos, mas isso não passa nem perto do que você está me pedindo. Eu não sei fazer isso, não sei como é ficar totalmente vulnerável, torcendo para que alguém me ame no final do dia porque apostei todas as minhas fichas em alguém. Eu não sei como é fazer isso, meus pais nunca me ensinaram, ninguém nunca... eu não quero depender de ninguém, precisar de ninguém, eu não quero dar esse passo e sair daqui. – A terapeuta também gesticulava ao falar e a cada palavra, se aproximava mais do capitão do time. – Você pode me odiar, pode me acusar de ser uma babaca egoísta, ou uma covarde que não quer sair da zona de conforto. Mas é isso tudo que tenho. Eu só tenho a minha zona de conforto, porque é ela quem vai estar comigo quando você acordar e perceber que pode arranjar alguém melhor.
– Você tem razão. – respondeu, com a expressão marmorizada que costumava usar as vezes, quando desconfortável ou quando queria esconder seus verdadeiros sentimentos.
– O que? – A inglesa fora pega desprevenida.
– Você tem razão. – Ele repetiu, travava uma batalha muito dura contra si mesmo, evitando demonstrar suas emoções e intenções. – O que queria ouvir? Que você está errada e que eu sempre vou amar você?
– Sim. – Ela respondeu rápido, mas em seguida sacudiu a cabeça. – Quer dizer, eu... eu achei que diria isso, porque...
– E ia adiantar? – tinha voz calma e pouco emocionada, ao contrário da namorada.
– Eu não sei. – cruzou os braços sobre o peito e balançou a cabeça. – Mas você...
– Podia tentar. – Ele completou.
– Sim. – ergueu o queixo, tentando evitar que mais lágrimas molhassem seu rosto.
– Eu não vou te pedir pra fazer o que não quer, . – foi firme. – Isso é parte de amar alguém. – A terapeuta piscou algumas vezes, mas manteve o queixo erguido e mandíbula tensionada. – Eu quero que faça isso, que more comigo, que fique comigo, porque você quer.
– Eu... – começou a falar, cedendo um pouco, mas bastaram dois segundos para que se recompusesse. – Você está distorcendo o que eu disse.
– Eu não quero me esconder, como se estivesse fazendo alguma coisa de errada. – deixou escapar um pouco de sua frustração. – Não quero que você tenha que fingir namorar outra pessoa para encobrir a verdade. E eu achei que você quisesse isso também, mas eu acho que não. Pelo seu discurso sobre não saber fazer isso.

afastou os olhos do namorado.

– Que você nem tentou dissuadir. – Ela alfinetou.
– Não use palavras difíceis para parecer mais certa. – se aproximou. – Eu não tenho que te convencer. Nesse tempo todo eu tentei, dia após dia, mostrar para você que eu podia ser alguém melhor. Te mostrar que eu podia ser o cara que você merece. Você tem medo? Eu não, eu sei o que eu quero. Você precisa de garantias de futuro e isso eu realmente não posso te dar. Só que ninguém mais no mundo pode. Você tem uma escolha para fazer e eu não vou fazer ela por você. – O capitão balançou a cabeça outra vez. – Não vou te convencer, mas se você quiser tentar, mesmo com medo, eu estou aqui. – O capitão respirou fundo e deu um passo na direção da namorada, estendendo a mão para ela. – Mas se me deixar passar pela porta e ir embora, não vai ter muito o que eu possa fazer.

sentenciou com firmeza e voz calma e inspirou todo ar que podia e prendeu a respiração, esperando o momento em que ele diria estar brincando ou, que não falava sério. Mas ele não veio.
Após alguns segundos se encarando, inclinou a cabeça, apertou os lábios em uma linha fina, expirou pesadamente e se virou, caminhando devagar em direção a porta.
Então era isso? Ele não ia mesmo insistir? Ele estava simplesmente indo embora? Fazendo exatamente o que ela havia dito?
A inglesa sentiu o coração se apertar, como se alguém o estivesse fazendo, o ar faltava e a respiração ficava mais pesada a cada passo que dava em direção a porta. Tinham passado tanto tempo juntos, tantos momentos bons e ruins e então, tudo seria jogado fora daquele jeito? Sem nem lutar? Apenas o deixaria ir? Seu . O seu capitão.
Quando o jogador estava perto o suficiente da porta para passar por ela, a inglesa se moveu.

. – Chamou-o e o viu virar em sua direção, antes que ele pudesse raciocinar, jogou-se em seus braços, o abraçando. – Eu quero. Eu quero. – declarou com a voz abafada pelo ombro do jogador. – Eu não sei como fazer isso, mas sei que não quero que passe por essa porta sem mim.
– Graças a Deus. – expirou um riso aliviado. – Por pouco eu achei que você não me chamaria.
– Você... – afastou o rosto, olhando para ele. – Você não...
– Eu só queria que você viesse comigo porque quis. – Ele afirmou. – Precisava tentar.
– Você... – A terapeuta sorriu, afagando o rosto do namorado. – Eu te amo.
– Que bom que sim. – sorriu e suspirou, ainda se recuperando da tensão. – Que bom que sim.

sorriu grande e o beijou, enfim, depois de todo aquele caos. Ninguém costuma dizer sobre como os beijos pós-briga são analgésicos e calmantes.

– Isso foi a coisa mais bizarra que eu já vi. – Maisie, que assistiu toda a cena em silêncio, ao lado de Louis, comentou. – Mas até que foi fofo. Brega e fofo, tipo as sérias da CW.
– Zero a cem em dez segundos. – O médico completou.

interrompeu o beijo e olhou para o dois, surpreso em perceber dois estranhos observadores, enquanto mordeu o lábio e apertou os olhos, tinha se esquecido completamente da presença dos amigos.

– O que é isso? – indagou, pasmado.
– Acredite, foi surpresa pra mim também. – confidenciou baixo, enfim virando o rosto na direção dos amigos.
– Louis. – O médico se apresentou, acenando com uma mão e respondeu com um aceno de cabeça.
– Maisie. – A outra o imitou. – E saiba que, por mim, ela tinha te deixado ir.

abriu a boca, mas não disse nada, desistiu e apertou os lábios, maneando a cabeça como faziam os personagens da versão americana se seu seriado favorito, The Office.




15 - Hey, it’s all me, just don't go

Tell me that you're still mine
Tell me that we'll be just fine
Even when I lose my mind
I need to say
Tell me that it's not my fault
Tell me that I'm all you want
Even when I break your heart
(Taylor Swift – Afterglow)




Segunda-feira, 10 de janeiro de 2022
Casa de
Lahti – Finlândia



– Por que é que a gente estava naquela masmorra, se podíamos estar aqui? – Foi a primeira coisa que Maisie disse assim que deixou os visitantes ingleses entrarem em sua casa.

Depois de uma cena de apresentações constrangedoras, estava resolvido a levar a namorada para casa, e disso, Maisie não discordou. A inglesa mal podia esperar para deixar o apartamento inabitável da amiga. Louis era um pouco mais cauteloso, mas não achou uma ideia totalmente ruim sair do apartamento com cheiro de roupa velha e ir para a mansão de .

– A gente não vê coisa assim na Inglaterra todo dia. – Maisie ainda suspirava, estarrecida e deslumbrada com a casa do jogador. – Entendo agora, porque você escolheu ele. – Sussurrou, cutucando , que apenas rolou os olhos e se afastou, levando para a mesa as caixas de pizza que segurava e que seriam o jantar.

dizia algo para uma das funcionárias enquanto afagava Felix, talvez pedindo para que preparasse quartos para os hóspedes. Era a primeira vez em que estava ali e que algum funcionário também estivesse. Antes disso, pensava que ter pessoas trabalhando na casa fosse apenas lenda urbana. Por mais que tivesse passado vários dias na mansão, foram dias em que o namorado esteve doente e depois, entre as festas, quando todos estavam de folga. Ninguém sequer sabia que aquela era a garota de . Talvez alguém tivesse visto as fotos que ele guardava ou coisa assim, mas se dar conta disso fez pensar.

– Não é estranho que alguém tenha tanto dinheiro? – Louis se aproximou e falou baixo com a amiga. – Tipo, alguém que a gente conheça? Eu nem consigo imaginar. Vi uns três carros na garagem e eram carros bons.
– Tem uma quadra também, piscina e mais um monte de coisa. – contou, abrindo as caixas de pizza de modo despreocupado. – No início foi um pouco chocante pra mim também, mas depois você se acostuma. Eu acho...
– Se acostumar com o quê? – Maisie também chegou junto deles.
– Fale baixo. – Pediu a terapeuta, dando uma bronca na amiga e indicando com o olhar o namorado, que ainda falava com a funcionária. – Louis estava falando sobre o ser, tipo... rico. – Ela explicou. – E eu disse a ele que você se acostuma.
– Se acostuma? – Maisie riu pelo nariz. – Ele está usando um Rolex e tem correntes no pescoço que devem comprar o meu apartamento em Birmingham. – Disse ela, apontando para trás de si. – Fora as marcas mais comuns, tipo os Jordans nos pés ou a Lamborghini que nos trouxe até aqui.

deu de ombros e projetou o lábio inferior, enfatizando o quanto de importância dava para aquele assunto.

– Aquilo? Sei lá, não ligo para essas coisas.

– Dá pra ver. – Maisie torceu os lábios e se sentou despreocupadamente em uma cadeira. – Namora um jogador rico e usa os mesmos tênis que te dei no natal de dois mil e vinte.
– O que tem de errado com os meus tênis? – A terapeuta inclinou a cabeça, afastando o olhar das caixas de pizza que ela arrumava na mesa, prestando atenção nos tênis Nike branco, um pouco surrado, que usava.
– O que tem de errado? – Maisie repetiu. – O que tem de certo?
– O que tem de certo no quê? – perguntou, aproximando-se deles sem jeito, com as mãos nos bolsos da calça de moletom que vestia, tentando se enturmar.
– Com os meus tênis. – repetiu, sorrindo fechado para o namorado. – Maisie está implicando com eles.
– Eu gosto dos seus tênis. – garantiu, chegando mais perto da namorada, como se sua opinião sobre os tênis fosse o ajudar a ganhar pontos com os amigos dela.

dirigiu a Maisie um olhar atravessado e ergueu os ombros, sorrindo vitoriosa.

– Quer pizza? – ofereceu ao jogador e pegou uma fatia, levando-a até a boca e depois de morder, ofereceu seu pedaço ao capitão, deixando que ele mordesse mordesse.
– Não tem abacaxi, tem? – perguntou enquanto mastigava e riu, jogando a cabeça para trás.
– Não, dessa vez não. – A terapeuta sorriu e beijou a bochecha do capitão, sentando-se com ele a mesa em seguida, imitando Maisie e Louis, que já estavam sentados. percebeu de soslaio que Louis e Maisie trocavam olhares confusos. – É por causa daquela ocasião. Quando tentei matar ele com bombons de coco e pizza de abacaxi. – Lembrou a inglesa e a feição dos amigos se iluminou.
– Ele sabe que foi premeditado? – Maisie questionou rindo, depois de se servir de pizza.
– Sei sim. – sorriu, concordando com a cabeça.
– A gente apoiou ela nessa. – Maisie confessou enquanto comia. – Mas nessa época o plano ainda não era assassinato.
– É a graça do relacionamento. Se você nunca tentou matar seu parceiro pelo menos uma vez... – tentou brincar.
– Houve mais? – Louis arregalou os olhos, divertindo-se.
– Um dia a achou que ia me salvar de um suposto afogamento. – sorriu olhando para a namorada.
– Mas a não sabe nadar. – O médico se lembrou, ostentando um olhar confuso.
– Exatamente. – Concordou o capitão e viu a confusão no rosto de Louis sumir quando ele compreendeu.
– Então é isso que você tem feito quando não estamos por perto? – Maisie arqueou uma sobrancelha e dirigiu um olhar irritado para a amiga.
– Foi uma coisa de momento. – tentou justificar, erguendo os ombros. – Qualquer um na minha situação faria o mesmo.
– Vocês são um casal bem... intensos... – Comentou o médico.
– Você devia ter visto a gente na Rússia. – lembrou animada, feliz em estar com seus amigos por perto e enfim podendo dividir todas aquelas coisas. – O roteiro do final de semana daria um excelente filme.
– Um bem ruim. – completou, alcançando um pedaço de pizza.
– Se considerar a pescaria a tiros, o rato no quarto e a cama da bisavó morta, certamente. – A terapeuta gargalhou.
– A cada frase eu fico mais preocupada. – Maisie arregalou os olhos teatralmente enquanto levava um pedaço de pizza a boca. – Que tipo de lavagem fizeram com a minha amiga certinha e medrosa?
– Acho que é o que o leste europeu faz com a gente. – sorriu, empurrando pelo ombro, devagar.
– Talvez seja disso que você precisa, Maisie. – Louis riu abafado enquanto comia. – Ajudaria seu humor infernal.
– Meu humor infernal é causado por você, Louis. – A outra rolou os olhos. – Quando a me abandonou em Birmigham com você, tudo só piorou.
– Bom saber que tudo está como deixei. – suspirou.
– A culpa é sua por se apaixonar e ficar aqui. – Maisie rasgou o queijo de sua fatia com nenhuma delicadeza. – Nesse lugar de frio terrível.
– Então você só ficou porque se apaixonou? – perguntou a namorada em um sussurro, sorrindo apaixonado e achando aquilo engraçado, feliz pelo foco de irritação da outra mulher não ser ele.
– Na verdade o salário no Pelicans é bem bom. – balançou a cabeça e levantou um ombro, fazendo o namorado e Louis rirem.
– Só isso justificaria. – Maisie rolou os olhos.
– Como assim? – quis saber.
– Deixa pra lá, Moscow Mule. – Maisie torceu os lábios. – Não dá pra explicar.

apertou os lábios e maneou a cabeça, fez-se silêncio.

– Alguém quer beber alguma coisa? – O central perguntou após alguns instantes em silêncio.
– Eu, por favor. – Louis ergueu dois dedos. – Foi uma viagem bem longa.

se afastou por um momento, dirigindo-se para a cozinha em busca de copos para a bebida. acompanhou a movimentação do namorado com o olhar.

, tem certeza? – Maisie perguntou a amiga, inclinando-se um pouco sobre a mesa e tentando falar mais baixo. – Ele?
– Qual é o problema? – perguntou com suavidade, como quem fala com uma criança que não quer comer. – Não entendi.
, ele é... – A amiga gesticulou, mexendo as duas mãos juntas e próximas uma da outra, como se abismada com o fato da melhor amiga namorar aquela espécie de pessoa. – Essa coisa esquisita.
– Mas por que está falando assim? – tentou entender e Louis rolou os olhos.
– Maisie sendo a Maisie. – Louis alfinetou, comendo sua pizza.
– É que pessoalmente é mais claro ver o quão absurdo é tudo isso.
– Ei, eu... – apertou os lábios e estreitou o olhar, parado alguns passos atrás de , de pé, com uma garrafa de gin e dois copos nas mãos. – Eu ainda tô bem aqui.
– E isso muda o quê? – Maisie o encarou.
– Maisie. – Louis tocou o braço da amiga. – Desse jeito vai pensar que ingleses são todos como você. – O médico tentou beliscar a amiga por baixo da mesa. – O que seria um crime, já que você é literalmente a pior espécie. Não só de ingleses, mas de ser humano.
– Por que não enfia sua fatia de pizza no... – Maisie começou a falar, dirigindo-se a Louis, mas a interrompeu.
– Não, eu... – tossiu, cobrindo a boca, tentando limpar a voz. – Eu durmo melhor quando penso que são como a . Como ela, pelo menos a maioria.

Louis maneou a cabeça, sem jeito.

– Eu devia ter te deixado no apartamento. – suspirou antes de morder mais um pedaço de pizza, constrangida com a amiga.

❄❄❄


Segunda-feira, 10 de janeiro de 2022
Casa de
Lahti – Finlândia



Depois de um jantar desconfortável e com várias farpas trocadas da parte de Maisie para Louis e , todos estavam em seus quartos. tomava banho, devia estar em algum canto do quarto ou em outro lugar da casa. A inglesa deixava a água cair sobre seu corpo, relaxando das tensões do dia. Louis tinha razão, pensava ela enquanto sorria, eram mesmo intensos. Tanto no amor quanto nos problemas, cem dias em um mês e um mês em menos de doze horas.
Mas o mais importante era que mesmo depois de todo o drama e confusão, estavam juntos, em casa, dormiriam juntos, do modo como acordaram. Era bom amar , estar em um relacionamento com alguém que fazia questão de resolver os problemas, que não a fazia ter dúvidas sobre o que sentia. O geralmente pouco amistoso, seco e resistente a novas amizades havia tolerado por muito tempo todas as implicância e comentários ofensivos da melhor amiga da namorada.
Além disso, a postura do namorado com a resolução daquele pequeno drama a havia surpreendido. tinha colocado um ponto final, um ultimato. era contra ultimatos, mas sabia de suas tendências a remoer demais cada detalhe e transformar algo bobo e pequeno em uma crise global. Ainda precisariam conversar sobre alguns detalhes daquela situação, dos disparadores para aquela pequena crise, mas por hora, estarem bem era o suficiente.

– Posso entrar também? – O jogador se fez ser ouvido, surgindo na porta do banheiro, despertando a namorada de seus pensamentos.

Quando o olhou por sobre o ombro, o central sorriu mostrando os dentes e deixou o corpo pender, apoiando os ombros nus no batente da porta, fazendo a inglesa pensar sobre como ele era lindo.

– Da última vez que você entrou no chuveiro comigo, você sabe o que nós fizemos. – sorriu, inclinando a cabeça sobre o ombro e gargalhou.
– Mas essa é a minha intenção. – Ele se aproximou, apoiando uma mão no box. – Ou você acha que vim aqui só pelo cheiro de sabonete?

A terapeuta se virou, ficando de frente para o namorado e abriu o box, convidando-o com um movimento do dedo indicador. sorriu, arrancou depressa a calça que vestia e se juntou a inglesa, mesmo já tendo tomado banho minutos antes. Beijaram-se um pouco sob a água quente, aproveitando todas as sensações que aquele momento oferecia.

– Posso te fazer uma pergunta? – se pronunciou, interrompendo o beijo molhado que o capitão tinha iniciado.
– Você sempre pode.
– Você ia mesmo embora? Se eu não tivesse te chamado de volta?

o olhava com expectativa, respirou fundo, seu peito subiu e desceu e ele expirou pesadamente, inclinou a cabeça e fechou os olhos e depois abriu, antes de falar a olhou nos olhos outra vez.

– Eu pretendia, só não sabia se ia conseguir. – Admitiu, envolvendo a cintura da namorada em um abraço, enquanto o abraçava pelos ombros. – Mas estava confiando que você ia fazer a escolha certa, por nós. Tive que arriscar, não queria que a gente ficasse brigado, se arrastando em drama...
– Nossa... – expirou surpresa e tocada pela confiança do namorado. – É realmente muita confiança em mim. Acreditar que eu faria a escolha que você queria que eu fizesse.
– Não, não a que eu queria. – uniu as sobrancelhas e balançou a cabeça negativamente. – Mas a que era melhor para você também. Eu amo você, não adianta para mim ter você, se você estiver infeliz. Você disse que não sabia o que queria. Você precisa saber. Eu sei o que eu quero, mas você precisa saber o que você quer também.

mordeu o lábio inferior e encostou a testa no ombro do namorado, sabia que aquele assunto voltaria, só não imaginava que seria naquela noite.

– Sobre isso, eu...
– Sobre isso o quê? – perguntou sem tremer a voz, ou sem parecer confuso com o assunto, era mais como se estivesse a incentivando a continuar.
– Sobre o que você disse, sobre tudo que disse no meu apartamento hoje. – ainda tinha o rosto escondido nos ombros dele. – Sobre o que me perguntou lá no centro de treinamento, de manhã. Você... – Ela hesitou.
– Eu o quê? – insistiu.
– Eu tô me sentindo um pouco pressionada aqui. – A inglesa desabafou, para surpresa do namorado. – Eu entendo a situação e sei que com a gente morando junto, vai ser ainda mais difícil lidar com uma relação escondida. Não mudei de ideia e tenho certeza que você e estar aqui é o que eu quero. Eu só... só não queria ter que sair do time por isso...
– Eu nem sei o que dizer. – expirou um riso amargo.
– Não muda muito pra você, mas eu... pra mim muda tudo. – continuou, mas teve coragem e ergueu o olhar. – Eu vim pra cá para isso. Deixei meu país, meus amigos e tudo que conhecia para vir sozinha para outro lugar, apenas para fazer isso. Para trabalhar nesse aqui. Passei por cima da solidão, de não saber a língua, de não conhecer absolutamente nada, de um chefe babaca com mania de perseguição, da relutância do time... de tudo.
– A gente tinha um combinado. – O capitão lembrou, desapontado.
– Não, Rakkaani. – negou com a cabeça, apertando os lábios e segurando o rosto do capitão. – Eu só disse que ainda não tinha certeza. Entendo que você tem pressa, está ansioso e quer resolver isso logo, mas...
– Do que tá falando? – se afastou, chocado. – Eu perguntei e você não negou. Se era assim e você não negou, o que queria que pensasse exatamente?
– Eu sei, eu sei que posso ter te confundido, mas... – tentou dizer, mas a interrompeu.
– É melhor a gente parar essa conversa por aqui. – Ele sentenciou, saindo do banho. – Não quero brigar hoje. De novo, pelo menos.
. – o chamou, se apressando para alcançar uma toalha e segui-lo. – Conversas difíceis é que tornam um relacionamento calmo, bom e saudável. Eu tô fugindo disso também, mas acho que tá na hora da gente resolver. Pensar junto e encarar o problema.
– Eu não sei o que tem pra pensar. – parou de andar no meio do quarto e se voltou para a namorada. – Eu sei o que eu quero, . Eu não quero me esconder mais. Eu não quero ver outro cara fingindo ser seu namorado. Mas você precisa decidir o que você quer.

O central deu as costas e seguiu a passos pesados para o closet, enquanto engolia aquilo.

– Não faça isso ser sobre você, sobre seus ciúmes. – Acusou ela, o seguindo e riu sem humor. – E se eu estivesse pedindo a mesma coisa? Você deixaria o time por mim?
– Sim, sem pensar duas vezes. – Ele foi firme. – Mas nesse caso, ficaríamos separados de qualquer jeito. Não há outros times de hockey em Lahti.
– Não, mas tem em Tappara. – Ela apontou. – Merelä...
– Sério? – a interrompeu e riu de modo ácido. – Vai usar o exemplo? Ele se sacrificou em nome do namoro falso de vocês. Grande cara, merece todas as honras e a garota. Veja como ele é tão melhor que eu nisso.
– Não acredito que você tá levando isso pro seu lado frágil. – acusou, cruzando os braços sobre o peito.

riu afetado.

– Lado frágil? – O jogador balançou a cabeça e riu. – É sempre assim, sempre sou eu o problema. Não sei porque ainda me surpreendo. Quer que eu te peça desculpas agora? Ou quer fazer mais um pouco de cena antes? – Provocou o capitão.
, não estamos no gelo e não sou um rival para você provocar. – falou mais alto, com firmeza, erguendo o queixo. – Você tá chateado, eu entendo. Você quer parar de se esconder, eu entendo. Você ter criado expectativas, eu entendo. Mas não é sobre você. Você não tá olhando pra mim, não está vendo a situação pelo meu ponto de vista. Só está procurando alguém pra descontar sua frustração, e mesmo sabendo que o motivo sou eu, não vai ser em mim que vai descontar.
– Eu não olho o seu lado. – Ele rolou os olhos sarcástico, arrancando de qualquer jeito um casaco de moletom do armário. – E você parece mesmo bem preocupada com o meu. Tô vendo isso.
– Com qual lado, exatamente? – arqueou uma sobrancelha e se aproximou dele, ainda de braços cruzados. – Com sua frustração e pirraça por não ter o que quer do jeito que quer? Ou com seu ego ferido por ver o Merelä me assumir primeiro que você e na frente das pessoas?

deu dois passos e abriu a boca, pronto para revidar, mas parou, fechou as mãos em punho e apertou os dentes.

– Eu não vou fazer ou falar o que tenho vontade, porque eu amo você. – Ele falou entredentes, em voz baixa, olhando nos olhos da namorada, evidenciando em seu tom de voz sua raiva. – Só por isso.

não respondeu, encarou surpresa a postura do namorado, que passou pela inglesa e saiu do closet e do quarto, nu, com as roupas nas mãos.
A respiração da terapeuta estava descompassada e sua cabeça doía, estava irada. Muito irritada e chateada, mas surpresa positivamente, embora muito irritada. A postura de em deixar o quarto e não responder sua provocação em nome do amor que sentia a deixou culpada e admirada. Culpada porque naquela discussão, não havia pensado naquele ponto, sobre amá-lo. Estava discutindo com uma das pessoas que mais amava no mundo, com alguém por quem havia se exposto a um vírus maluco, pulado em uma piscina sem saber nadar, mas que em uma discussão sobre algo importante para ele, não tivera a consideração de se lembrar desse detalhe.
Porque aquilo também era importante para ele, era muito.
Também admirada, porque era intenso e sensível, esperava que ele devolvesse na mesma moeda ou pior, que se fechasse mais e fizesse como no episódio do natal, que tudo piorasse, mas ele apenas recuou. A decisão de recuar e se afastar havia pegado a terapeuta desprevenida. Como se em uma guerra, depois de ordenar um bombardeio, você recebesse uma cesta de café da manhã. Claro que não era equivalente, mas, vindo de , do mesmo que tinha conhecido, aquilo era muita coisa.
Mas ainda haviam sentimentos ruins, principalmente com a dificuldade que o namorado parecia ter em entender tudo que tinha a perder. Que tomar aquela decisão era abrir mão de todo o resto e parecia injusto. parecia mais focado em como a decisão o impactaria do que em qualquer outra coisa. Não parecia ligar para o fato da inglesa ser feliz ou não fazendo outra coisa, desde que pudesse ter o que queria e que confiava ser a mesma coisa que ela devia querer.
voltou para o quarto e se sentou na cama, onde estava jogado o roupão cinza do namorado. A inglesa o segurou junto ao rosto e respirou fundo, sentindo o cheiro dele. Tudo seria mais fácil se ele fosse um pouco mais compreensivo, se tivesse um ego menos frágil e se não fosse tão mimado, acostumado a ter tudo que quer. Era frustrante. Tudo naquela relação parecia difícil, parecia complicado e complexo, desgastante. Uma conversa, uma decisão, uma mudança, tudo era o fim do mundo.
Devia ser mais fácil, pensava .
❄❄❄


Terça-feira, 11 de janeiro de 2022
Casa de
Lahti – Finlândia



Era madrugada, mas não fazia noção das horas. Sabia disso porque quando checou, antes de tomar banho, passava das onze, e a julgar pelo tempo que estava ali, já devia ser algo perto das duas da manhã. O celular estava no quarto e o jogador preferia a morte a ir buscá-lo. Estava sentado em um canto da casa, perto de uma mesa de tênis, perto da piscina, encarando de longe o movimento das árvores do lado de fora, ouvindo o barulho da noite.
Nem mesmo Felix estava por ali, talvez pelo frio, mas gostava, havia se acostumado desde cedo a suportar climas intensos. Além disso, o frio era o que menos o incomodava naquela madrugada.
Quando deixou o quarto, estava com tanta raiva que só percebeu estar nu e segurando suas roupas quando chegou na cozinha, e só se lembrou de terem visita quando já estava vestido. O capitão estava tão irritado, tão chateado e decepcionado, que sequer pensava, só contemplava a noite escura sem esboçar qualquer sentimento. Não tinha vontade de bater, gritar, falar ou chorar, apenas de ficar em silêncio.
O dia tinha sido muito intenso, depois de férias intensas. Primeiro, Petri e Waltteri, depois, ter que buscar em seu velho apartamento e toda aquela coisa de dar um ultimato. Estava apavorado, fora um golpe no escuro que felizmente dera certo, mas só , em seu coração, sabia como aquilo havia sido. Como cada palavra dita, dizendo estar pronto para ir se ela quisesse o tinha cortado. Felizmente, não foi preciso nada daquilo, mas isso não mudava os sentimentos do jogador durante a situação.
E agora, o acusava de a estar pressionando? De não estar olhando seu lado e percebendo o quanto ela estava perdendo? O acusar de fazer a história ser sobre ele e seu ego frágil? E ainda, sobretudo, dizer que aquilo era apenas por não ter o que queria? Era demais.
A mesma que sempre o cobrou ter diálogo, se comunicar, agora fazia o oposto. E de quebra, o culpava por entender a seu modo, algo que ela não tivera trabalho de explicar. O que ela pensou que entenderia?
O capitão enfiou os dedos nos cabelos e apoiou os cotovelos nos joelhos. Era difícil, era chato, era cansativo, e tudo era só sobre eles, sequer podiam culpar outra pessoa.
Queria culpar Merelä porque tinha odiado sua ideia estúpida de fingir namorar . Detestava o jogador um pouco mais agora e adoraria dar um soco em seu rosto e culpá-lo de todo aquele caos. Mas sabia que não era culpa dele, no fundo até entendia que o quase rival tinha boas intenções e conseguiu tomar uma decisão rápida em nome da amiga. Decisão essa que, por seus motivos inocentes, não havia conseguido.
Talvez, até tivesse razão, parte dele odiava imaginar sua garota com outro, porque sempre sonhara com o momento em que surgiria com a inglesa perante todos. Com o momento em que todos saberiam que ele era o escolhido de , mesmo entre tantas outras opções loiras de olhos azuis. No fundo apenas queria isso. Ser escolhido por ela e que todos soubessem, que não precisasse se esconder por estarem fazendo algo de errado ou ruim.
Waltteri era bom também, convivia com o jogador há anos, sabia bem que muitos ou todos os defeitos que costumava apontar em sua relação, a inglesa não encontraria se se relacionasse com Merelä. Achava mesmo o quase rival melhor, e mesmo que soubesse que a inglesa não queria ou sentia nada por Merelä, aquele fantasma sempre existia e o perseguia. O fantasma do momento em que ela perceberia que qualquer outro seria muito melhor, que o que quer que tivesse enfeitiçado e a feito se apaixonar por , acabaria e ela o veria como verdadeiramente era, como ele mesmo se via.
Talvez, naquela discussão, ela tinha razão e estava vendo esse lado. Talvez ela até estivesse feliz em fingir namorar alguém mais apresentável e normal, alguém com quem ela não brigaria a cada dois dias. Alguém que não cometeria os mesmos erros idiotas que ele cometia todas as vezes.

🎵 Dê play na música aqui, e se necessário coloque para repetir [Taylor Swift - Afterglow]🎵


– Oi. – surgiu onde ele estava.

Ela o havia encontrado, vestia roupas quentes e abraçava o corpo por causa do frio. não a olhou, apenas ergueu o tronco e recostou as costas na parede.

– A gente pode conversar? – Ela quis saber.
– Não tenho nada para falar. – Respondeu o capitão após tempo demais em silêncio.
– Posso ficar aqui com você? – Ela perguntou outra vez.

O jogador ergueu o rosto e a olhou rapidamente, depois tornou a inclinar a cabeça.

– Sim.

se aproximou devagar e se sentou ao lado de , inclinou a cabeça e depositou um beijo suave, mas demorado no ombro do namorado. uniu as sobrancelhas e a olhou de canto, confuso com sua postura.

– Se importa se eu falar ou prefere o silêncio? – tornou a perguntar.
– Pode falar. – Ele permitiu, dando de ombros e se esforçando para parecer indiferente, mas tomado de curiosidade.

A inglesa olhou para frente, para onde se podiam ver as árvores e respirou fundo, tudo sob o olhar atento do capitão – mesmo que de soslaio.

– Você me fez pensar. – Ela começou a falar. – Queria primeiro te pedir desculpa pelo que disse, te chamar de mimado e falar que tinha ego frágil.
– E que eu não olhava pelo seu lado. – Ele completou.
- É, por isso também. – A inglesa assentiu. – Por todas as coisas que eu falei lá em cima. E também queria que me dissesse porque te magoei. Quero entender como você tá se sentindo.

a olhou confuso.

– Como assim?
– Exatamente assim. – A inglesa ergueu os ombros. – Eu acho que não fui justa. – riu fraco, baixando o olhar. – O que você disse lá me pegou. Quer dizer, eu sou capaz de pular na água sem saber nadar só porque achei que estivesse se afogando, mas não sou capaz de ouvir seu lado em uma briga.
– O que eu falei? – ainda estava perdido.
– Sobre não falar o que queria falar porque me amava. – Repetiu a terapeuta.
– Ah, isso.

O capitão assentiu e voltou a olhar para frente, pensativo. Fora uma frase completamente impensada, no calor do momento, só porque sabia que o que queria dizer, em retaliação, poderia magoar de maneiras inimagináveis. Mas ficou feliz por ter um efeito tão positivo.

– Você devia ter me dito. – começou a dizer sem a olhar. – Sempre me cobrou a ter diálogo, a compartilhar o que eu sentia, mas quando é a sua vez, você me deixa no escuro. Me deixa acreditar em qualquer coisa, para depois dizer que te pressionei. Isso não foi certo. – Ele falou com os olhos no chão, sentindo afagar sua nuca. abriu os lábios para começar sua defesa, mas retomou. – E não é fazer tudo ser sobre mim. Não sou mimado, que quer que tudo aconteça do meu jeito. É que é sobre eu e você. Não é sobre você e o seu trabalho apenas, é sobre o que a gente tem. Você só diz não saber, diz estar confusa e não ter certeza, mas nunca diz que sim ou não, então como eu devia saber?
– Mas você também precisa olhar do meu ponto de vista... – o lembrou e riu amargo e recostou a cabeça na parede.
– Sabe o que eu acho? – O jogador perguntou, mas ela não respondeu. – Que não quer bancar isso. Fica pedindo pra eu olhar pelo seu ponto de vista, e espera que eu veja o que? Que seu trabalho é importante? Eu já sei disso, sei que você gosta e é feliz lá. Sei que você é boa e que vai ficar triste por sair. Eu sei que é isso que você quer que eu veja, mas acho que sei o que você quer que eu fale também. – respirou fundo. – Mas eu não vou falar.
– E o que seria?
– Você quer que eu fale que tudo bem. – O central a olhou, enfim. – Que eu lido com isso. Você permanece no time e a gente vai tentando disfarçar. Mas eu não vou. Eu já te disse, eu sei o que eu quero, só falta você tomar coragem e me dizer o que você quer.

o olhava nos olhos.

– É tão ruim ou errado eu querer as duas coisas?
– É a sua vida. – O jogador ergueu os ombros e passou a olhar para o chão. – Você disse, saiu do seu país, deixou tudo para estar aqui, fazendo isso. Não sou eu quem tem que decidir por você. Só posso decidir por mim.
– Eu queria que fosse mais fácil. – A inglesa suspirou, dobrando e abraçando os joelhos.
– Mas é, você quem tá complicando porque não quer abrir mão de nada. – Disse o capitão, com tom desanimado. – Ou porque não quer admitir sobre o que tá disposta a abrir mão.
– Você está me tratando como se eu tivesse escolhido deixar você, e não é o que está acontecendo. – o acusou, sentida. – Eu tô tentando muito pensar em uma solução, um jeito de resolver isso.
– Você sempre disse que só tinha esse jeito. – Lembrou , que falava como quem responde que horas são quando está entediado aguardando o elevador.

Houve um longo silêncio.

– Queria pedir desculpas por não ter deixado claro desde o início. – tornou a falar. – Como você disse, eu não me comuniquei e te deixei pensar coisas. Foi um erro e eu assumo. Não queria te magoar, mas eu só não queria encarar a situação, achei que se deixasse pra lá e evitasse, tudo ia se resolver.

Dizendo isso, a terapeuta se levantou e começou a se afastar, sob o olhar de .
Talvez a maturidade, ou talvez o fato de o problema parecer mesmo sem solução, ou ter vindo o procurar. Mas se levantou e a seguiu, em silêncio, voltando com ela para o quarto.

– Amanhã você vai para a arena? – O jogador perguntou assim que se deitaram, já no quarto, após um longo e desconfortável silêncio.
– Vou, tenho muito trabalho. – Respondeu a inglesa. – Svedin quer relatórios até de quando vocês respiram.
– Ah.

estava deitado com as mãos sobre o peito, se deitou de lado, virada para o namorado e fechou os olhos.

– Aliás, obrigada por ter sido gentil com Maisie e Louis hoje. – falou de repente, atraindo a atenção do companheiro.
– São seus amigos, não tem problema. – respondeu. – Eu...
– O que?
– Tô enganado ou senti um clima pesado da sua amiga Maisie comigo? – Ele perguntou, parecia tímido ou incerto, talvez, na opinião de , estivesse preocupado em não chateá-la ou iniciar outra discussão.
– Não deu pra ter certeza? – A inglesa riu fraco, abrindo os olhos. – Ela te atacou durante todo o tempo que estiveram juntos. E eu realmente te peço desculpas por isso. A Maisie é...
– Complicada? – completou, devia estar sorrindo, pelo tom de sua voz, um pouco mais suave.
– Quase isso. – maneou a cabeça. – Geralmente é direcionado ao Louis, mas agora ela está fazendo com você também. Maisie tem problemas em confiar em homens, e talvez eu tenha um pouco de culpa nisso. – A terapeuta mordeu o lábio inferior, se virando na cama.
– Hein? – estranhou, e virou o rosto, tentando enxergar a namorada no escuro.
– Não sobre ela não confiar em homens... sobre você. – Confessou e ouviu o capitão se remexer mais na cama. – Quando mudei pra cá, Maisie, Louis e eu não conversávamos tanto mais. Meio que... de modo não proposital, a gente se falava quando tinha um problema, quando eu estava triste ou... sei lá, brigados. – deu de ombros, sem jeito.
– Eu te magoava tanto assim? – quis saber, sério.
– Não. – balançou a cabeça, enfatizando seu ponto com a ruga entre suas sobrancelhas, tocando o namorado e afagando o pedaço dele onde a mão alcançava. – Não, não é sobre isso. É que quando estávamos bem eu não me importava muito em conversar com eles. – estalou a língua no céu da boca. – Acho que isso faz de mim uma amiga babaca. – Tentou explicar, aproximando-se mais dele e o abraçando pela cintura, esquecendo-se da briga de antes.
– Não se eles não te procuravam também.
– De qualquer forma – A inglesa expirou. – Eu sei que quando ela te conhecer, vai entender porque eu te amo e que toda essa implicância é infundada.
– É, eu espero... – sorriu fraco e fechou os olhos. – Eu aprendi que não se mexe com isso de melhor amiga. E por azar, a sua me assusta.

O jogador riu e retribuiu o abraço da namorada, fazendo a terapeuta o imitar e se aconchegar mais em seu corpo.
sentiu-se bem em como o namorado parecia estar lidando com aquilo, sem culpá-la ou sem querer expulsar Maisie de sua casa. Queria ter mantido seus pensamentos aí, mas a última frase do capitão a tinha feito lembrar do dia e de coisas que não estava tão feliz em relembrar. Mas, agora as coisas estavam diferentes e já tinha comunicado como se sentia sobre aquele assunto, devia respeitá-lo.
Além disso, horas antes o havia magoado por não se comunicar, não queria repetir. Mesmo que fosse desagradável, não sentia ser correto esconder aquele grande elefante cor de rosa e de olhos azuis na sala.

– Por falar em coisa que assusta...
– Huh? – Ele respondeu um pouco sonolento.
– Se lembra, antes do ano novo, quando você me disse que eu não devia ter contado para você sobre o problema com o só porque fiquei com medo? Que não devia ser assim? Que eu não devia ter medo de te contar? Nem primeiro esconder e mentir e só depois pensar sobre contar?

O capitão apertou os lábios e encarou a namorada, ostentando uma expressão nada convidativa, mas que ela não podia ver por causa das luzes apagadas.

– Eu achei que você ia querer saber, não contei antes porque não deu tempo. – Ela se justificou. – Não queria pesar o clima outra vez, mas...
– O que aconteceu agora? – indagou de forma direta.
esteve no trabalho hoje. – falou de uma vez. – Falou comigo.

fez silêncio, ajeitou os quadris na cama e levou a mão livre ao rosto, coçando as sobrancelhas.

– Como é que é? E ele queria o que com você dessa vez?
– Foi quando eu estava do lado de fora, decidindo se ia para sua casa ou para a minha.
– Nossa. – a corrigiu. – Nossa casa ou o seu apartamento velho. – Completou o capitão, mas o ignorou.

– Eu estava lá e ele veio com aquelas coisas, dizendo que por mais que eu não acreditasse, ele não queria seguir com o jogo de provocações, que não entendia o que tinha feito de errado. – Narrou a terapeuta inglesa, que naquela altura estava feliz pelas luzes estarem apagadas. – Quando falei sobre pedir demissão, ele disse que pensou que a chegada das duas mulheres novas fossem me fazer repensar. – Enquanto ouvia a namorada contar, estreitava o olhar. – Ele disse que não foi uma indicação só dele, mas acho que eles têm alguma proximidade. Depois ele foi simpático e pediu desculpas por tudo, desde Mônaco.
– E você?
– Eu duvidei, claro. – Respondeu ela. – Depois ele começou a falar sobre nem tudo ser premeditado e feito apenas para me fazer mal. E que isso não é nem de longe é o que ele quer. Que só não quer ser odiado por mim.
– Não tô gostando de nada disso. – Resmungou o jogador.
– Nem eu, nem gostando ou entendendo. – ergueu os ombros. – Mas você precisava saber. Eu tô aprendendo.

Por mais irritado e chateado que estivesse, não conseguiu conter o pequeno sorriso que surgiu em sua face com aquelas palavras.

– Você tá certa. – O capitão esticou uma mão, segurando a da namorada e a levando aos lábios. – Mas isso tudo é tão maluco... ele não tem uma carreira? Uma namorada? Sei lá.
– Até onde sei, sim. – assentiu e se achegou para mais junto do namorado, passando a desenhar formas em seu peito. – Ele estava lá para falar com a Svedin.
– Será que eles são mesmo próximos? – pensou alto. – Talvez seja fácil descobrir se...
– Se chegar perto daquela mulher sem que seja absolutamente necessário, você vai dormir com os esquilos, lá fora. – interrompeu os pensamentos de com uma ameaça, apertando as unhas no peito do jogador, conseguindo como resposta um olhar chocado dele, mas que ela não conseguiu ver. – E eu não tô blefando.
– Tá falando da Isabel? – Ele quis se certificar, com uma pontada de divertimento na voz.
– Sim, exatamente, essa. – Respondeu a inglesa, ranzinza. – Meu capitão. – imitou com desprezo o tom da executiva.
– Que visão... – falou abobado e franziu o cenho, confusa. – Você... você tá com ciúmes?
– Jura? – rolou os olhos e tentou se afastar, mas a segurou com força, puxando-a para junto de sim.
– Eu nunca tinha visto esse seu lado. – Ele riu. – Achei que nem existia. Pelo menos agora existe uma coisa boa... duas na verdade, que o fez.
– Duas? – A inglesa perguntou confusa.
– Trazer você, e trazer alguém que te faz sentir ciúmes de mim. – riu alto, depois roubou um beijo da namorada, que ainda estava irritada.
– Não tem graça. – Reclamou ela, tentando se livrar do aperto dele.
– Tem, tem sim. – riu abafado. – Adorei o sabor.

riu alto, rolou por cima da namorada e a fez deitar, assumindo o controle.

– Ela chegou muito tarde. – Garantiu o capitão, falando baixo, perto do ouvido da namorada. – Não tem ninguém mais, não vejo mais ninguém.
– Você viu ela, te chamando de meu capitão. – acusou, evidenciando seu desprezo na voz. – E ficou todo sem jeito.
– Chocado, é verdade. Surpreso, sei lá. – Ele riu pelo nariz. – Mas é disso que eu gosto. – Ele afirmou enquanto passeava uma das mãos no corpo da namorada, enquanto com a outra mão segurava os punhos de . – Eu já tenho uma dona.
– Dona? – falou mais baixo, apenas assentiu com a cabeça, tocando com a ponta do nariz o pescoço da namorada. – Isso quer dizer que só é meu, certo?
– Sim.
– Quero deixar isso bem claro, então. – sorriu. – Para ela, ou para qualquer outra que tente se aproximar.
– Eu tô aberto a ideias. – respondeu, roçando os lábios na pele do pescoço da terapeuta inglesa.
– Eu tenho algumas...



16 - I just want you to know who I am

And I'd give up forever to touch you
'Cause I know that you feel me somehow
You're the closest to heaven that I'll ever be
And I don't wanna go home right now
And all I can taste is this moment
And all I can breathe is your life
And sooner or later it's over
I just don't wanna miss you tonight
(Iris - The Goo Goo Dolls)




Terça-feira, 11 de janeiro de 2022
Casa de
Lahti – Finlândia



Depois de uma noite intensa demais para aquela época do ano, e terminavam seu café da manhã em silêncio. Pela primeira vez, não fora a preparar a refeição, mas sim os funcionários especializados em cuidar do cardápio e dieta do jogador. Era estranho e um tanto desconfortável saber que estavam com mais pessoas ali, dividindo aquele momento que costumava ser sempre só deles.
Estavam em silêncio, não só por isso, mas porque ainda era muito confortável estarem juntos em silêncio. e conferiam coisas em seus celulares, enquanto seguravam a mão um do outro por cima da mesa.

– Tenho que ir agora. – O capitão avisou, guardando o celular no bolso do casaco e sorrindo fechado para a namorada. – Tem certeza que não quer carona?
– Tudo bem, só entro mais tarde hoje. – Ela assentiu sorrindo. – Obrigo Louis a me levar depois. Vai ser bom estar aqui quando acordarem também. – olhou sugestivamente para onde um dos funcionários responsáveis pela limpeza da casa tinha passado. – É muito pra se acostumar.
– Está tudo bem? – uniu as sobrancelhas, ainda estavam sentados na mesa, o jogador desenhava círculos sobre a mão da namorada com o polegar.
– Sim, eu só... – ergueu os ombros. – Só me acostumei a ser só nós dois. E o Felix.

assentiu.

– Acho que era por isso que gostava do seu apartamento. – Confessou o jogador, sorrindo e a inglesa o imitou.
– Sabe, sobre o outro assunto... – começou a falar, mas o capitão balançou a cabeça negativamente.
– Não acho que a gente precisa discutir isso agora. – Ele colocou. – Eu não tenho nem energia pra pensar em um problema sem solução.
– Você tem razão. – assentiu, mesmo sabendo que ignorar o problema não era uma boa saída, imaginava que também soubesse disso, mas concordava com ele, não tinha energia. – Você precisa ficar bem focado, tem jogo no final de semana.
– E o Petri no meu pé. – bufou, ficando de pé e beijando o topo da cabeça de , abraçando-a.
– Por minha causa? – Ela estranhou.
– Não, ele disse que eu engordei. – fez careta. – Claro que não.

A terapeuta riu abafado e inclinou a cabeça.

– Por que você riu? – O capitão a cutucou na costela.
– Amor... – A inglesa ergueu os ombros e torceu os lábios em um sorriso, enquanto balançava a cabeça negativamente. – Meio que foi, né? Ele não está tão errado.
– Você acha mesmo? – O central inclinou a cabeça, olhando para seu abdômen, um pouco preocupado.
– Nunca esteve tão gostoso, mas tem um pouco de verdade aí. – sorriu, escorrendo os dedos pela barriga dele, até tocar um pouco mais abaixo do cós da calça que vestia.
– Se controla, eu tenho que ir trabalhar. – gargalhou, afastando-se como reflexo. – Zero a cem em dez segundos, .
– Desculpe. – Ela ergueu as mãos em rendição. – Lembranças da noite passada.
– Eu gostei dessa nova versão da gente. – sorriu apaixonado, roubando um morango da mesa. – A gente briga e faz sexo depois. Muito melhor do que a gente brigar e eu voltar pra casa e ficar remoendo por dois dias.
– Faz parte de morar junto. – piscou e o central sorriu apaixonado. – Eu amo você.
– Também amo você. – Ele disse e respondeu ao ser abraçada pelo namorado outra vez.
– A gente vai conseguir resolver esse problema. – A inglesa garantiu.
– É, a gente sempre resolve. – deu de ombros e começou a se afastar. – Aliás, se quiser uma carona amanhã ou na hora de voltar hoje, eu tive uma ideia para aproveitar melhor o tempo.
– Como assim? Que ideia? – A terapeuta o olhou confusa.

se movimentou para responder, mas então se lembrou de que não estavam sozinhos, rolou os olhos e foi até a namorada. Apoiou uma mão na mesa e outra na cadeira que ocupava, e sussurrou em seu ouvido:

– Sexo no carro. – Sussurrou rápido e a beijou.
– Que pervertido. – riu alto. – Veio aqui outra vez só para falar isso ou por que queria mais um beijo?
– É que eu me lembrei de que tem mais gente na casa. – Ele maneou a cabeça e piscou. – Mas qualquer desculpa é boa se for pra beijar você.

roubou outro beijo e saiu rápido, deixando a namorada com um grande sorriso nos lábios, o assistindo partir.

Não demorou para Maisie e Louis surgirem nas escadas, vestiam roupas grossas e pesadas, abraçavam o próprio corpo, provavelmente estranhando o frio absoluto de Lahti. Não tinham feições convidativas, mas qual inglês parece simpático em manhãs frias de inverno além de Lewis Hamilton?

– Oi, vocês. – sorriu e acenou, Maisie fez careta e Louis sorriu fechado.
– Bom dia, miss Finlândia. – Louis cumprimentou, sentando-se perto da amiga, evitando o lugar que havia sido ocupado por .
– Dormiram bem? – perguntou depois de sorrir. – Minha primeira manhã em Lahti foi terrível, mas não estávamos tão no inverno como agora.
– Me xinguei vinte vezes por ter decidido vir pra cá, e isso foi apenas desde o momento em que abri os olhos, até chegar aqui e me sentar. – Maisie resmungou, servindo-se de café.
– É, eu confesso que subestimei o inverno. – Louis torceu os lábios.
– Você se acostuma, é sério. – A inglesa riu, aproveitando a sensação de ter os amigos como companhia para o café.
– Onde está sua fera? – Louis perguntou, retomando o apelido que dera a no início de tudo. riu.
– Acabou de sair, eu entro mais tarde.
– Nossa, ele trabalha mesmo. – Maisie debochou.
– Sim, e muito duro. – empurrou a amiga levemente. – Estavam em uma pausa para as festas, ele se apresentou ontem e tem jogo no final de semana. Tem que voltar a forma.
– E vai ser aí que vamos ver os lindos e loiros jogadores do time? – Maisie ergueu as sobrancelhas.

O café da manhã era um pouco diferente do habitual, a pedido de , tinham preparado coisas mais comuns para os britânicos, quase nada típico ou comum ao país, além do mingau de aveia.

– Não precisa esperar até o final de semana, posso apresentar vocês antes disso. – deu de ombros, comendo uma torrada. – Podemos sair à noite, coisa assim.
– Nesse inferno congelante? – Louis arregalou os olhos.
– Não finja que nunca saiu no inverno, Lou. – riu e negou com a cabeça.
– Sua fera encantada vai também? – Maisie sondou.
– É provável. – uniu as sobrancelhas, confusa. – Por que? Quer pensar com antecedência no repertório de ofensas que vai dirigir a ele?
– Você é ridícula. – Maisie rolou os olhos. – Ele cria meu repertório, não preciso pensar.
não fez nada além de te tratar bem. – acusou a melhor amiga. – Muito melhor do que você o tratou, mesmo estando na casa dele.
– Do mesmo jeito que te tratou ontem? – Maisie devolveu em tom ácido e viu a amiga franzir o cenho, perdida.
– Vocês ouviram. – A terapeuta se deu conta, apertando os lábios.
– Eu disse a ela para não comentar nada. – Louis tentou se defender.
e eu estamos com um problema grande, é só isso. – começou a contar. – Um que não estamos sabendo resolver.
– Pelas minhas contas, desde que começaram a sair, esse é o centésimo problema que enfrentam. – Maisie levantou as sobrancelhas, sarcástica.
– Não é verdade. – se defendeu, apontando para a amiga com o dedo indicador. – Mas se for, tudo bem. Significa que quando temos um problema, resolvemos e ficamos bem.
– Essa parte a gente ouviu também. – Louis confessou, tomando um gole de café e afastando o olhar.
– Desculpe, é que a gente se acostumou a ficar completamente sozinhos aqui. – A inglesa respondeu, sentindo as bochechas esquentarem.
– Numa escala de zero a dez, o quanto devo me preocupar em ver um dos dois pelados pela casa? – Louis arregalou os olhos.
– Zero. – riu. – Talvez três. – Maisie e Louis se olharam e depois para a amiga, assustados. – Sabia que aqui eles tem uma visão diferente sobre a nudez?
– Péssima, péssima ideia ter vindo te visitar. – Maisie resmungou. – Eu devia ter ido para Florença, ou pra Austrália.

riu e mostrou a língua.

– Okay, ignorando o potencial constrangedor que esse lugar tem. – Louis tossiu, cruzou as mãos e apoiou os cotovelos sobre a mesa, ajeitou os óculos no rosto, como o médico certinho que era. – O que é exatamente esse grande problema que estão tendo?
– Eu. – riu fraco. – Eu sou o problema. quer seguir em frente, quer que a gente more junto e eu também quero. Mas nossa situação no time já está insustentável, morando juntos só vai dificultar mais as coisas.
– Que situação? – Maisie quis saber.
– Ética. – A terapeuta respondeu depois de um longo gole em seu chá. – Não sabem que temos um relacionamento. Apenas algumas pessoas, alguns jogadores que são nossos amigos mais próximos. Umas três pessoas e a família dele. A gente tem esse elefante azul, piscando, usando patins no meio de uma sala de guardar cristais. – Enquanto contava, os amigos a olhavam com empatia. – Ontem tivemos aquela briga porque eu não disse a ele que não queria sair do time, mas também não disse que não sairia. Quando voltamos das férias com a família dele, o treinador ligou os pontos e me confrontou na frente dos nossos amigos e dele, sobre estarmos juntos.
– Que merda. – Maisie xingou.
– Nem me diga. – maneou a cabeça. – ficou esperando eu admitir, eu acho, e anunciar que ia sair do time para ficar com ele, mas eu travei. Sei lá, fiquei em pânico. – Ela ergueu os ombros. – Não quero sair e me senti muito acuada pelo treinador. Mas um dos jogadores, que saiu do time recentemente e que sabe da nossa situação, mentiu e disse que ele tinha se enganado, e que ele sim era meu namorado.
– Espera, ele quem? – Louis sacudiu a cabeça, confuso.
– Lembra do Waltteri Merelä?
– O bonito, príncipe de olhos azuis e beleza colossal. – Maisie sorriu, lembrando-se.
– O que te beijou. – Louis completou, direcionando a Maisie um olhar repreensivo.
– Justamente. – expirou pesadamente. – O cara de quem mais sente ciúmes no mundo. Ele me abraçou e falou que era o meu namorado, que tinha saído do time só por minha causa. No momento, entrei na onda e confirmei, dizendo que sempre tinha sido ele. – Narrou . – Esse foi o motivo dele ter ido ao meu apartamento ontem, eu disse isso a vocês.
– Se ele estava esperando você contar para todos que estava com ele, e você fez justamente o contrário, assumindo o maior rival... – Louis assoviou. – O ego dele deve estar sangrando até agora.
– Acho que sim. – concordou chateada.
– Ele precisa de terapia. – Maisie sentenciou. – Por que ele não sai do time? Por que tem que ser você? Isso é ridículo.
– O time mais próximo fica distante demais, não conseguiríamos morar juntos. – explicou racionalmente.
– E aí, você precisa escolher entre um barbudo mimado, que faz tudo ser sobre ele, com ego frágil e o seu trabalho e carreira? – Maisie expirou e balançou a cabeça. – Se lembra daquela frase da Lady Gaga, não é? Sobre sua carreira não acordar em um dia qualquer no futuro dizendo que não te ama mais?
– Esse é o problema. – escorreu pela cadeira. – Eu tô travada, insegura e a gente não sai do lugar.
– Mas não pode. – Louis trouxe a atenção das amigas para si. – Não escute a Maisie, ela é solteira e egoísta. Amor é arriscar. não pode garantir que o sentimento dele nunca vá mudar, assim como você também não pode. Por isso existe aquele ditado, que seja eterno enquanto dure. Você pode aproveitar o hoje e viver, ser feliz e ter memórias boas, ou pode evitar e nem isso ter, com medo do que as possibilidades do futuro te reservam. É burrice.

suspirou, digerindo o que o amigo lhe dissera.

– É muito mais complicado do que parece, Lou. – tentou justificar.
– É, mas nós te avisamos isso no começo de tudo. – Ele lembrou.
– Isso é verdade. – Maisie completou.
– Você não entrou nisso sem saber, enganada, sem ter noção das consequências. – O médico foi firme. – Você sabia. talvez não entendesse as implicações disso, ele não tinha obrigação também, porque você quem devia saber. Meus pacientes não precisam dominar a ética médica, eu sim. Não adianta fingir pra si mesma que não sabia onde essa história ia dar, porque você sabia.
– E se não estou enganada, já até tentaram terminar por isso. – Maisie mencionou, satisfeita.
– Okay, saber é diferente de aceitar. – tentou se defender. – E eu não domino meus sentimentos. O que queria que eu fizesse?
– Bom, para começar, impor limites na relação de vocês. – Louis começou a listar, contando nos dedos. – Não flertar de volta, não levar o jogador apaixonado para sua cama, não ter um relacionamento, não conhecer a família dele, nem se mudar para a casa dele.
– Claro, eu sou a vilã. – bufou, sentindo-se atacada.
– É, nesse contexto, de certa forma, é. – Maisie se pronunciou. – Olha, eu acho a relação de vocês meio problemática em vários sentidos, e esse é um deles. É uma relação de poder, por mais que não seja tão clara ou que você tente fingir que não, por não serem exatamente paciente e terapeuta. Mas isso que vocês têm impactou seu trabalho, o dele... já ouvi você dizer de brigas até. – Lembrou a inglesa. – Você sabe disso, não era nem preciso que a gente viesse da Inglaterra para cá, apenas para te dizer.
– Então, o quê? – A terapeuta se sentou ereta, irritada. – Concordam com ele? Que eu tenho que abrir mão do meu trabalho?
– Você não vai gostar, mas... – Louis hesitou. – Você já fez essa escolha, . Se você quisesse mesmo focar na sua carreira, se essa fosse sua prioridade, você nunca teria se envolvido com um atleta. Você já fez essa escolha, só que agora não quer lidar com as consequências dela.
– Vocês não entendem, estão reduzindo tudo. – protestou. – Ninguém parece olhar pelo meu ponto de vista.
– Claro, você quer tudo, sem abrir mão de nada. – Maisie respondeu a amiga, perdendo a paciência com ela. – Quer mesmo seu trabalho no time? Quer mesmo fazer o que veio da Inglaterra para fazer? Quer se tornar a terapeuta ocupacional referência no trabalho com times de hockey ou sei lá? Saia da casa do . – Maisie foi dura e recuou, unindo as sobrancelhas. – Saia. Volte para o seu apartamento, termine o namoro. O estrago já está feito, mas talvez dê pra recuperar alguma coisa. Quem sabe daqui a pouco ele muda de time e você recomeça.
– Eu não costumo, mas vou concordar com ela. – Louis estreitou o olhar, incerto.
– E eu não acredito que vou dizer isso, mas o tá certo. – Maisie era firme e dura, não se importava com o efeito de suas palavras, ao contrário, conhecia a amiga e sabia que ela precisava de broncas assim de vez em quando. – Você não sabe o que quer. E quem não sabe o que quer, acaba perdendo o que já tem. Você tem que assumir a consequência dos seus atos, não é uma criança, . Não dá pra fugir e se esconder em uma bolha de zona de conforto, vivendo de qualquer jeito para sempre.
– Eu amo vocês. – expirou pesadamente, tinha a cabeça inclinada e encarava sua xícara de chá. – Mas vocês não sabem do que estão falando. Chegaram ontem, não... só... – se levantou. – Só tentem se manter onde sabem.

❄❄❄


Terça-feira, 11 de janeiro de 2022
Centro de Treinamentos do Pelicans
Lahti – Finlândia



O dia no centro de treinamos havia começado cedo, todo o grupo estava reunido e se paramentando. Petri tinha feito uma breve reunião sobre posições e usar as novas peças junto das antigas para criar mais chances. Agora Merelä estava fora, não poderiam contar com ele para garantir pontos na segunda linha. Fora muito confortável enquanto durou, o time havia se acostumado a saber que Waltteri faria a retaguarda e que era difícil o finlandês perder uma chance de pontuar.
Tinham Willy Mankinen como ala direta na segunda linha, mas Willy não era tão rápido quanto Merelä. Dois novos reforços prometiam ajudar o time a equilibrar as forças e cobrir a ausência sofrida de Merelä. Ryan Lasch, ala e Leevi Tukiainen, central. havia memorizado a escalação de Petri e refletia sobre ela enquanto amarrava seus patins.


1ª Linha


Aleks Haatanen/ AE (Capitão) / Central Ryan Lasch/AD

Topi Jaakola/ Defensor (Capitão Alternativo)Santtu Kinnunen/ Defensor


2ª Linha


Miika Roine/ AE (Capitão Alternativo)Janos Hari / Central Willy Mankinen / AD

Matias Rajaniemi/ Defensor Mikko Kousa/ Defensor


3ª Linha


Jesse Kiiskinen/ AE Leevi Tukiainen/ Central Otto Nieminen/ AD

(Capitão Alternativo)Filip Král/ Defensor Saku Salminen/ Defensor


Goleiros


(Capitão Alternativo)Atte Tolvanen
Jasper Patrikainen
Niklas Nikkilä



Os novos moldes não haviam deixado todos felizes, mas o capitão concordava. As mudanças teriam um impacto grande no modo como estavam acostumados a jogar e precisavam ser cautelosos. Era a reta final da temporada, mais alguns jogos e estariam nos playoffs, quem sabe levantando a taça no final. Seria um presente e tanto, principalmente depois de uma temporada tão conturbada em tantos sentidos.
E também tinha a nova executiva e ninguém do time fazia ideia de que tipo de hockey ela estava acostumada a ver. Existia um ideal mais moderno e progressista, que as vezes funcionava com times de outras ligas, onde os jogadores evitavam contato, evitavam as batidas e brigas. Não era assim que faziam na Liiga. O Pelicans, por algum tempo, em suas fases ruins, havia perdido essa capacidade, não por decisão ou estilo de jogo, mas por dificuldades em fazer o que era certo e esperado para dentro do gelo.
Assim como qualquer jogador forjado na Rússia ou Finlândia, era um daqueles que não evitavam ou fugiam quando eram imprensados contra a proteção. Não fugia de uma briga, sabia que não era uma característica de sua posição e que era bom manter os punhos a salvo, já que eles eram sua principal arma, mas quando era convidado para uma boa briga, não evitava. Jogar as luvas no gelo era tradição no hockey. Nariz sangrando, cortes no rosto, olho roxo, perder dentes, tudo era esperado e normal.
E o capitão conhecia seu povo, era um time misturado, jovens jogadores e outros mais experientes, que tinham em comum um estilo rígido de pensar e jogar e a formação na escola tradicional. Ninguém fugia em uma dividida, ninguém reclamava depois de um soco, ao contrário, provocavam. Se quisesse uma briga, era só chamar. Nas roubadas de disco, ninguém tinha pena ou medo do contato, era hockey que jogavam, não futebol. Por isso, enxergava com apreensão a chegada na nova executiva.
Logo teriam mais trocas e janelas, sabia que na saída de Merelä, Svedin não estava envolvida. Mas, no fim da temporada regular, com o fim dos contratos, renovações e propostas de outros times, temia o que estava por vir. Imaginava que não seria usado como moeda de troca ou que teria sua posição ameaçada, afinal, se sua carreira tinha lhe ensinado algo, era de que o central e capitão tinha seu valor, e era um valor muito caro. Mas não podia dizer o mesmo quanto a todos no time, e se o estilo de hockey de Svedin e da nova cúpula fosse progressista, moderno, desses com intenção de furar a bolha e mostrar que o hockey não era apenas um esporte agressivo, com brigas e sangue e dentes voando, não daria certo.

. – Petri enfiou a cabeça dentro do vestiário, alguns já saiam, se dirigindo ao treino do dia. – Me espere aqui, quero conversar.

O capitão expirou e inclinou a cabeça, apoiando os cotovelos nos joelhos.

– Nunca diga nada comprometedor sem a presença de um advogado. – Atte, que estava ao lado do amigo, aconselhou e ergueu o rosto e expirou um riso fraco, balançando a cabeça. – Olha, eu sei que você odeia isso, mas talvez a coisa de fingir que o Merelä... – O goleiro começou a dizer.
– Se você sabe que eu odeio, pode me ajudar fechando a boca. – O capitão respondeu duro, cortando o amigo e apoiando as costas. – Vai lá, eu lido com Petri.

Atte apertou os lábios, respirou e assentiu, deixando o amigo sozinho no vestiário, mesmo inseguro, enquanto contemplava sua existência vazia.

– Quer dividir o que está pensando? – Petri passou por Atte na porta, fechando-a atrás de si e se aproximou do jogador, ele tinha as mãos nos bolsos da calça e balançava o corpo para frente e trás.
– Sobre que tipo de coisa essa executiva vai fazer. – respondeu erguendo o queixo e adotando a postura de sempre ao falar com o treinador, frio, impassível, jeito de quem não liga. – Não sei de onde ela veio, de que tipo de hockey ela gosta. – Ele deu de ombros.
– Até que isso me preocupa também. – Petri suspirou. – Não gosto da ideia de estrangeiros por aqui. Tivemos uma só, e olhe no que deu. – O treinador apontou para o capitão, que apenas ergueu as duas sobrancelhas.
– Eu devia ter entendido isso? – fingiu, para irritação de Petri.
– Sem rodeios, .

O treinador agitou uma das mãos, respirou e se sentou ao lado do capitão, coçou a testa, apoiou os cotovelos nos joelhos e inclinou o corpo. Parecia tenso, era muito óbvio, só não conseguia entender a razão de seu desconforto, ao menos não exatamente.

– Veja, eu sei como isso funciona, já fui um jogador e já fui jovem. – Petri começou a falar, ainda sem olhar para o jogador. – Talvez até já estive no mesmo lugar. Não é uma conversa de ataque, só quero saber de você. – Petri o olhou por sobre o ombro. – A gente pode dar um jeito nisso.
– Nisso o quê? – tinha as sobrancelhas juntas, mas tentou soar o mais neutro possível.
– Você sabe bem no quê. – O treinador ergueu o tronco e o olhou, tinha certeza de que estava certo e não acreditava que o capitão seguiria mentindo. – Você é um jogador novo, é o principal jogador do time. Ninguém vai ameaçar isso, independente do que aconteça. Uma mulher aqui, disponível, atenciosa e acolhedora, vocês podem ter confundido as coisas, invertido as relações... – Petri começou a induzir. – Faz parte, já vi acontecer. Dá para dar um jeito nessa bagunça, você só precisa me dizer.
– Não tenho verdade nenhuma pra te dizer. – continuou sustentando sua postura inabalável.
– Vamos lá, . – Petri ficou de pé. – Eu não sou cego. Talvez ignorei muitos sinais por muito tempo, mas agora, não é o Lauri que está sentado na nossa cabeça.

olhou para o treinador, apertou os lábios e olhou para os pés. Queria, mas não faria, não trairia . Tinha que partir dos dois, não colocaria a coisa mais preciosa para a namorada em risco, não daquele jeito. Até pensou em perguntar sobre o que aconteceria com , mas já tinha certo conhecimento e malícia para entender o que as palavras de Petri significavam: salve sua pele, antes que algo que eu não possa interferir aconteça.
Mas já sabia disso, sabia que não seria demitido ou teria seu contrato alterado por ter um caso com alguém da comissão médica. Não faria qualquer diferença, talvez nem mesmo para os companheiros de time, já que era parte do DNA finlandês não ligar para o que acontece na vida pessoal dos outros. apertou os lábios outra vez, levantou o olhar e maneou a cabeça.

– Quer detalhes sobre o ano novo? – se escondeu sob um manto de sarcasmo. – Que eu te conte que roupa o Merelä usou? Ou que música tocou quando eles se beijaram meia-noite?

Petri negou com a cabeça e expirou decepcionado.

– Essa é a sua última palavra? – Ele indagou e não respondeu, seguiu o encarando com firmeza, evitando piscar. O treinador assentiu. – Certo. Tire sua bunda daqui e vá para o gelo.

obedeceu de pronto, não queria que ele tivesse tempo para pensar em mais perguntas ou voltar atrás em sua ordem.
O percurso curto até o gelo fora de martirização, mas de paz de espírito. Sentia ter tomado a decisão certa, mesmo que fosse a última que queria tomar. Durante aquela caminhada silenciosa, batendo o taco no chão a cada passo dado, as palavras de Inessa enchiam sua cabeça. Não podia escolher por , mas podia decidir o que fazer com sua decisão. Uma resposta lhe veio à cabeça, mas o capitão sacudiu e apertou os olhos, pensando que talvez, só por um tempo, podiam evitar aquele assunto e aquela decisão.
Quando pisou no gelo, deslizando para junto dos outros, perto dos preparadores, Atte de pronto se aproximou. O goleiro ficou em silêncio, analisando a postura séria de . Conhecia o melhor amigo bem demais para entender o que a expressão marmorizada e olhar vazio significavam, mas não sabia se era boa ideia puxar conversa. Sabia que costumava ter certa dificuldade de falar sobre seus sentimentos, se eram negativos, a dificuldade aumentava.
Mas Atte não conseguiu poupar o amigo por muito tempo, Santtu deslizou rápido para junto deles, apoiando o quadril na proteção.

– Qual foi a do Petri? – O defensor quis saber.

dirigiu um olhar entediado para Atte, que apenas deu de ombros. Depois o capitão inspirou e expirou profundamente e inclinou a cabeça.

– Seus amigos e o relacionamento deles. – respondeu sem rodeios.
– Você... – Atte tentou sondar a posição do melhor amigo.
– Eu perguntei se ele queria saber qual música estava tocando quando eles se beijaram, meia-noite. – respondeu, apoiando-se na proteção, com olhar na movimentação dos companheiros do outro lado, mas viu de soslaio Santtu e Atte se entreolharem. – O quê? Acharam que eu ia fazer o quê? – riu fraco.
– Era uma incógnita. – Santtu ergueu um ombro. – Mas o Mere está esperando um soco, desde aquele dia. – lançou um olhar atravessado para o defensor.
– Ele parece estar procurando mesmo. – respondeu, ajeitando as luvas nas mãos.
– Vamos com calma aqui. – Atte interveio antes de Santtu responder. – A minha única pergunta é, se o Petri comprou mesmo essa história?
– Não. – Respondeu o capitão. – Mas ele queria que eu entregasse, falou que eu ficaria bem e que ele poderia ajudar. Disse que não é mais o Lauri lá em cima.
– Que jogo baixo. – Atte concordou. – Mas ele meio que está fazendo o trabalho dele.
– E se não for? – Santtu atraiu a atenção dos dois. – É, e se não for só isso? Claro que ele vai preferir apoiar você a ela, mas, se você admitisse que insistiu, que tentou muito e que...sabe... se ela não tivesse tanta culpa assim...
– Acho que entendi. – Atte falou e percebeu que Santtu podia ter razão, talvez aquela era uma chance de proteger também.
– Vou confiar na minha intuição. – O capitão sentenciou, sacudindo a cabeça e afastando aqueles pensamentos, enquanto fechava o cordão do capacete. – Se a quisesse contar para o Petri, ela teria feito isso. – Respondeu, colocando a proteção de boca e afastando-se dos dois.

❄❄❄


Terça-feira, 11 de janeiro de 2022
Centro de Treinamentos do Pelicans
Lahti – Finlândia



– Ainda usam essa sala para trabalhar? – Otto implicou, entrando sem bater, despertando de suas atividades e relatórios intermináveis. – Achei que nem tivesse mais uma terapeuta aqui.
– Muito engraçado. – cruzou os braços sobre o peito. – Até parece que eu não trabalho.
– Depende do ponto de vista. – Otto seguiu implicando e atirou no amigo uma caneta.

O ala riu, fechou a porta atrás de si e se sentou em uma cadeira vazia, perto de onde a inglesa trabalhava.

– Está fazendo...
– Relatórios que a Svedin pediu. – rolou os olhos. – Ou ela me quer ocupada para me tirar da jogada, ou ela está obcecada em cada ponto da vida de vocês aqui dentro.
– É só uma chefe exigente. – Otto deu de ombros, brincando com a caneta que a inglesa tinha atirado.
– É, eu sei. – A terapeuta torceu os lábios. – Se eu fosse uma executiva estrangeira, chegando aqui, assim como ela, faria o mesmo. Ia querer ter tudo sob controle e dominar cada aspecto de tudo. – Otto assentiu. – O problema é que eu não sou, e além disso, amo reclamar.

Otto riu, jogando a cabeça para trás.
Os dois fizeram silêncio, o ala começou a brincar, inclinando sua cadeira para trás, enquanto digitava informações sobre Janos Hari em seu relato.

– Por que está mentindo para todo mundo sobre você e o Mere? – Otto questionou repentinamente, fazendo a amiga congelar.
– Não estou mentindo. – Respondeu rápido a terapeuta.
, não adianta. – Otto apoiou os braços na mesa, aproximando-se mais da amiga e negou com a cabeça. – É meio óbvio que você e o Waltteri não tem nada. Vocês me subestimam e esquecem que eu sou o único noivo aqui. – Otto rolou os olhos com desdém. – Eu sei reconhecer um casal quando eu vejo um.
– Ottis, você está enganado. – ficou de pé, tensa e agitada. – Era sigiloso e...
, você nunca deu qualquer chance para o Waltt. – Otto apontou como se fosse a constatação mais óbvia de todas. – Você nunca olhou pra ele, e mesmo se tivessem tentado muito esconder, o que eu não acho possível vindo do Mere, não teria sido assim.

A inglesa encarou o amigo, vendo-se acuada. Tinha duas opções, mentir para mais uma pessoa importante, ou encarar as consequências de seus atos, como as palavras de Maisie e Louis martelavam em sua cabeça para fazer.

– É complicado. – Admitiu a inglesa, sentando em seu lugar.
– Soube que o errou muitos tiros hoje. – Blefou ele depois de um tempo em silêncio, analisando a postura cabisbaixa da amiga.
– Por que está me contando isso? – Indagou desconfiada.
– Por que eu gosto de falar dos outros? – Otto arqueou uma sobrancelha. – Qual é o problema, Tommy Shelby?
– Meu único problema é com seus apelidos horríveis. – Desconversou a inglesa, baixando a cabeça, lembrando-se da pequena rixa que o amigo tinha com o namorado.

tentou disfarçar, mas Otto a observou em silêncio por algum tempo.

– Sabe a diferença entre os caras e eu? – Otto perguntou e ela ergueu o olhar. – Eu tenho um longo relacionamento.
– O que eu devo dizer? Parabéns?
– Aprendi muitas coisas com a Juuli, principalmente a perceber quando ela está irritada ou triste com alguma coisa que fiz. – Falou e a inglesa endireitou a coluna. Aproveitando o movimento dela, Otto arrastou sua cadeira, sentando-se mais perto de . – Está estranha desde que voltou da pausa, e isso só tem dois dias.
– É complicado, como eu disse. – riu fraco, baixando a cabeça e colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha. – Mas acho que vou ficar bem.
– Eu sigo você no Spotify, hoje você ouviu I Knew You Were Trouble da Taylor Swift em looping por horas. – Denunciou ele. – E antes disso, estava ouvindo uma playlist chamada Heartbreaker.
– Você está me espionando? – riu, empurrando-o de lado, queria fugir do assunto.
– Sim, estou. Sou membro da KGB, e além disso, é o que amigos fazem. – Disse ele a olhando com ternura. – Sabe, se vamos ser melhores amigas, não quero ficar só com a parte chata, quero saber das fofocas também.
– Não tem fofoca. – A inglesa levantou os ombros, encarando o gelo.
– Mentir para o time todo para esconder o que é verdade de fato não é uma fofoca para você? – Otto fez careta. – E eu nem estou reclamando do fato de parecer ser o último a saber. Vamos, Kate Midleton. – Otto balançou o joelho da terapeuta. – Não tenho a tarde toda.
– Não é assim também...– expirou pesadamente, balançando a cabeça negativamente. – É só que eu ferrei tudo, o trabalho, a vida de outra pessoa...
– Ahá! A outra pessoa, eu sinto que não estamos falando do Waltt – Ele acusou com um olhar estreito. – Quem é? Apesar de eu ter meus palpites, claro.
– Palpites? – uniu as sobrancelhas.
– Acho que você acreditava mesmo que sabe mentir e disfarçar bem. – O jogador sorriu empático. – E o que está esperando para me contar a história toda?



– Espera. – Otto pediu, tinha os olhos arregalados e as mãos espalmadas sobre as pernas. – Você está me contando que ...
– Olha, eu sei que você tem suas questões com o e provavelmente... – começou a falar, mas o ala a interrompeu.
– O quê? Se eu acho burrice você ficar justo com ele? Sim. – Otto assentiu. – Se também acho que você é bem emocionada e caiu na lábia do capitão? Sim também. – Otto fez aspas com os dedos ao se referir ao título de . – Mas agora não adianta eu listar todos os duzentos e setenta e oito motivos que fazem de um péssimo partido.
– Isso foi bem específico. – balançou a cabeça, estranhando.
– Mas e então? – Otto sacudiu os ombros.
– Então o quê?
– Como vai ser? – Ele fez outra pergunta. – O time comprou essa história, é certo. – Otto sacudiu uma das mãos. – Ninguém está nem aí para quem dorme com você ou não. Mas eu sinto, lá no fundinho, que o Petri não é um desses. – Falou, cruzando as pernas, apoiando o tornozelo sobre o joelho.
– Do que está falando?
– Petri chamou seu namorado para conversar hoje, antes do treino. – Contou o jogador. – Pela cara do antes e depois da conversa, não deve ter sido boa coisa.
– Talvez ele quisesse colocar contra a parede, para descobrir se a história é mesmo verdadeira. – pensou alto, ficando de pé e andando pela sala. – Naquele dia, ele disse não ter acreditado.
– É como eu disse, só mesmo alguém cego para acreditar que seria o Merelä. – Otto rolou os olhos e riu. – Podia ser até o Santtu, mas o Mere... pouco provável.
– Por que é tão absurdo assim? – A terapeuta encarou o amigo com as mãos na cintura.
– Porque você não era tão apegada assim ao Waltt, não mais do que era a mim ou ao Jay. – Otto começou a justificar. – Além disso, o Santtu e você sempre estavam de conversinhas por aí. Falando baixo pelos cantos. Só tem mais uma pessoa com quem você fica de conversinha, chega e sai junto, fica sorrindo e tem o humor pareado.
– Hein? – fez careta, sem entender o que o amigo queria dizer.
– Humor pareado. – Otto repetiu como se fosse óbvio e ao perceber pela expressão da amiga de que não havia compreendido, sacudiu a cabeça. – Você chega de mal humor, ele chega de mal humor, você chega feliz, ele chega feliz. Você fica péssima, cabelo sujo e olheiras, ele parece ter sido atropelado por um caminhão e ainda pega Covid.
– Não é tão óbvio assim. – negou com um movimento de cabeça. – Se fosse, todos saberiam.
– É que ninguém está ligando muito, faz parte de ser finlandês. – Otto ergueu os ombros. – Você já devia ter se acostumado. – A inglesa ergueu uma sobrancelha e maneou a cabeça, voltando a se sentar. – E eu sou um eterno apaixonado, vou me casar. Eu sei reconhecer isso quando vejo.
– E você, eterno apaixonado, pode me dar uma luz no meu dilema? – A terapeuta riu fraco, apoiando a testa sobre a mesa.
– Não. – Otto respondeu rápido e ergueu o rosto para olhá-lo, surpresa. – Porque a princípio, eu jamais me colocaria nessa situação. Misturar trabalho e prazer nunca deu certo antes. Mas, se posso dizer uma coisa é, logo você terá problemas maiores.
– Otto! – o repreendeu.
– É só a verdade. – Ele se justificou, abrindo os braços. – Waltt já saiu, até o final da temporada regular a Svedin deve fazer mais uma limpeza na casa.
– Não gosto quando você fala assim. – A terapeuta sacudiu a cabeça negativamente.
– É a realidade, Harry Styles. – Otto deu de ombros. – E eu duvido que quando todos saírem, Atte, Santtu... duvido muito que seu namorado vá querer ficar. Então, seu problema não vai mais ser o Pelicans, mas... você vai seguir para onde ele for? Pense nisso. – Otto piscou.



17 - It's you

I'm so scared to fall in love, but if it's you, then I'll try
It's you, it's always you
If I'm ever gonna fall in love, I know it's gon' be you
It's you, it's always you
Met a lot of people, but nobody feels like you
(It's You – Ali Gatie)




Quinta-feira, 13 de janeiro de 2022
Centro de Treinamentos do Pelicans
Lahti – Finlândia



Era quinta-feira, o time jogaria no final de semana e todos estavam mais que agitados. Ao contrário de sempre, aquela havia sido uma semana muito atípica para . Primeiro, não estava habituada a ser tão cobrada e acompanhada de tão perto. Isabel Svedin parecia mesmo querer se inteirar sobre todo e qualquer assunto relacionado ao time, sempre passando na sala da terapeuta inglesa, tirando dúvidas quanto aos relatórios e fazendo perguntas que quase sempre não sabia responder. Segundo, Maisie e Louis estavam na cidade e apesar do inverno finlandês, todos os dias eram ocupados por programações, desde passeio pelo centro, pista de boliche, restaurantes e bares, ou sentar no sofá para jogar uno e assistir a nova temporada de algum seriado novo.
Era bom ter os amigos ali, dava a inglesa outro ar de normalidade. Já estava acostumada com Lahti, seus novos amigos e todo o resto, mas Maisie e Louis na cidade parecia um tipo de sonho. Era como se pudesse juntar todos os seus personagens favoritos em um episódio só, como fizeram com Supernatural e Scooby-doo, ou naquele episódio onde todos os Power Rangers estão reunidos.
Em terceiro – mas em ordem de prioridades talvez aquele viesse em primeiro – . Desde a terça-feira, quando conversaram durante a madrugada e depois, quando Petri convocara o capitão para uma conversa, havia estado estranho. Quando a terapeuta tentou sondar o motivo do distanciamento do namorado, ou o assunto que Petri tinha para tratar com o capitão, ele fora evasivo, liso, dizendo por alto se tratar de coisas da Svedin.
passava mais tempo no gelo do que o normal, era o primeiro a chegar e o último a sair – do centro. Em casa, se tinha tempo, brincava com Felix ou jogava videogames e esse era um dos poucos momentos em que interagia com Louis ou Maisie. A maior parte das refeições eram feitas fora de casa e sempre dizia preferir não acompanhar os passeios do trio, com a desculpa de que eles precisavam passar mais tempo juntos e que não queria atrapalhar. Talvez fosse por causa de Maisie e sua implicância, comentários ácidos e clara critica a tudo que envolvia . Desde suas roupas até a forma com que respirava – o que, para , já beirava o insuportável de aturar da parte da melhor amiga.
Sentia aquele vazio esquisito, aquela sensação de havia algo de muito errado, mas temia perguntar e acabar encontrando a resposta que não queria ter. Geralmente começava com distanciamento, depois com separações. Mas não fazia sentido, como alguém poderia mudar de ideia em tão pouco tempo, como os sentimentos de alguém poderiam mudar tão rápido. preferia não tratar daquele assunto com Maisie ou Louis, sabia bem a posição dos dois a respeito. Resolveu conversar com Atte, afinal, ninguém entendia melhor do que seu melhor amigo.
Na opinião do goleiro, também estava esquisito e o comportamento evitativo atual dele era o capitão tentando não pensar em alguma coisa que não queria pensar. Como se tentasse ocupar a cabeça e assim não pensar ou sentir o que quer que estivesse sentindo ou pensando. O conselho de Atte era deixar as coisas esfriarem, dar um tempo e ter paciência.
não ouviu.

– Jakkos falou que você queria me ver. – enfiou a cabeça dentro da sala de .

Estavam no meio de uma tarde de treinos e a terapeuta se corroía, se não tentasse falar com o namorado, passaria mal. tinha um olhar confuso quando entrou.

– É, sim. – assentiu sorrindo fraco e ficando de pé. – Pode fechar a porta? Trancar?

obedeceu, mesmo estranhando a postura da namorada.

– Algum problema? – Ele quis saber. – Eu tô com algum problema?
– Eu só dei uma desculpa. – confessou, aproximando-se dele, incerta. – Queria falar com você, mas não queria dar bandeira. E também fiquei com medo de você não vir se eu não usasse a desculpa de algo importante.
– Por que eu não viria? – a olhou perdido, não entendia porque a namorada pensaria algo assim.

deu de ombros e apertou os lábios em um sorriso fechado, enquanto via o namorado se sentar em uma das macas.

– O que era? – Ele perguntou e a viu erguer as sobrancelhas, como se perdida. – O que era que queria falar?

A inglesa hesitou, quando idealizou e planejou, tudo pareceu mais fácil. Agora, diante dele, não sabia como falar ou o que falar, tinha medo de ligar o modo defesa de , ou de acabar provocando alguma outra situação igualmente catastrófica.
Então, decidiu pelo que sabia de melhor fazer. Aproximou-se devagar e o beijou com cuidado e delicadeza, como se o namorado fosse a coisa mais preciosa do mundo – e era de fato.

– Me chamou aqui pra me beijar? – indagou confuso, ainda de olhos fechados e rosto colado ao da inglesa.
– Não. – Ela confessou. – Mas eu perdi as palavras que tinha planejado usar, então...
– Qual é o problema? – se afastou da inglesa, segurando os dois braços dela para a afastar e para que a pudesse olhar nos olhos.
– Você vai terminar tudo? – perguntou sem avisos.
– Espera, o quê? – O capitão estreitou o olhar, baixando as sobrancelhas.
– Você vai romper? Terminar? Comigo. – começou a falar de modo disparado, como fazia quando ficava nervosa, ou como gostava de chamar, fora dos trilhos. – Você está se afastando, passa mais tempo no gelo do que comigo, mesmo eu morando na sua casa, você mal fala comigo... eu sei onde isso termina. Ou no caso, quem termina.
– Você é meio maluca. – respondeu negando com a cabeça, sem entender o que estava acontecendo.
– Oi? – se surpreendeu.
– Eu só tô na minha. – O capitão se justificou, afastando-se da namorada ao ficar de pé. – Você está com seus amigos e eu na minha.
– Não, não vai me pintar de maluca. – A inglesa se injuriou. – Não subestime minha inteligência ou me faça sair como maluca, como você fez daquela outra vez, quando...
– É sério? Vai usar uma coisa que aconteceu um milhão de anos atrás? – O capitão riu fraco, não olhava a namorada ao falar, nem tinha seu tom de voz alterado.
– Esse é só mais um sinal, não é? – A terapeuta riu pelo nariz, sem humor, balançando a cabeça negativamente. – Se for o que você quer, pode fazer logo. Não precisa esperar mais.

olhava para o chão, pensando em como sair daquela situação, de mais aquele drama, de mais aquela briga. Talvez ela tivesse razão, mas a culpa era dela, não dele. Só estava se preparando para lidar com as decisões da namorada e era mais fácil sem ela por perto. Sem por perto, colocando toda sua energia no gelo, não precisava pensar sobre o problema, sobre a escolha dela e sobre o que ele deveria fazer com isso. Se se concentrasse o bastante no gelo, não precisava pensar ou encarar os fatos.

– Eu não vou fazer nada. – respondeu em um suspiro cansado, sem ironias ou sem sorrir.
– Você tá mentindo. – Acusou a inglesa, aproximando-se dele outra vez. – A gente tem construído uma relação tão legal, eu não entendo porque você se fecha e não...
– Eu tô triste. – confessou, desarmando-se e ergueu o olhar para a mulher a sua frente. – Tudo isso não era o que eu queria.
– Do que está falando? – A inglesa inquiriu.
– Você sabe o que. – O capitão desviou o olhar depois de revirar os olhos. – Seu dilema. O nosso problema.

pensou por alguns instantes, encarando os tênis, enquanto o namorado fazia o mesmo.

– É direito seu. – assentiu.
– Eu sei. – Concordou ele, com a cabeça. – Então só estou na minha. – Disse e fez menção a se afastar, indo em direção a porta.
... – A inglesa o chamou e o jogador parou aonde estava. – Mas eu ainda tô aqui.
– Eu também. – Ele ergueu um ombro.
– Se você quiser, a gente pode... a gente pode conversar, ou... – Sugeriu ela de forma hesitante.
– Eu sei, só não tenho mais o que falar sobre esse assunto. – Declarou o jogador.
– Eu amo você.
– Eu sei, também te amo. – respondeu e sorriu fechado. – A gente se vê a noite.

Dizendo isso, o central deixou a sala e a namorada.

❄❄❄


Quinta-feira, 13 de janeiro de 2022
May Day Music & Bar
Aleksanterinkatu
Lahti – Finlândia



À noite, grande parte dos amigos de estavam reunidos em um bar em Lahti para conhecer os amigos ingleses da inglesa deles. Atte estava com Inessa, Santtu, Jasper e Otto com sua simpática noiva, Maisie, Louis, e . Merelä era o último convidado a chegar, devido sua mudança para Tappara, as saídas em Lahti eram um pouco mais custosas para o jogador, mas Mere não parecia se importar.
estava jogando sinuca com Santtu, Otto e Atte quando Merelä chegou. O central observou as movimentações a distância, mas não quis se envolver. Não tinha clima sequer para estar em um bar, cumprimentar Merelä era pedir demais. Pensava também na conversa que tivera com naquela tarde, era engraçado como o fato de pensar que a namorada se afastaria dele, o estar fazendo se afastar dela. Era um jogo estúpido e sentia falta de quando era solteiro, de quando não conhecia e não tinha aquelas preocupações e ansiedades. Quando podia viver a vida sozinho, sem treinar até ficar tonto para não sentir vontade ou energia de procurar a namorada.
Por isso ele via tudo de longe, apenas.

Maisie e Waltteri haviam se dado incrivelmente bem, o que não era surpresa para , que já sabia que a amiga se daria bem com qualquer homem bonito e disponível da região. A inglesa tinha se afastado para pegar mais cerveja, um pouco das pessoas jogava sinuca, outro pouco parecia concentrada em seus próprios assuntos e encarava a mesa, sem ânimo.

– Pisaram no seu pé? – Louis cutucou a amiga, percebendo seu estado cabisbaixo.
– Eu acho que sim. – inflou as bochechas teatralmente e o amigo riu, ajeitando os óculos no rosto.
– Então esses são seus novos amigos. – O médico comentou, passando os olhos pelo grupo. – Você até que reuniu muita gente.
– Acho que tive sorte ao vir para Lahti. – mexeu os ombros. – Os meninos do time, a Inessa, irmã do ... o .
– É por causa dele que você está com essa cara?
– Acho que é por minha causa. – Confidenciou a inglesa ao amigo. – Talvez vocês tenham razão. Me coloquei em um furacão e agora não sei como sair dele.
– Não sabe ou não quer? – Louis instigou.
– Não quero. – Concordou a terapeuta. – E na verdade, acho que tenho medo, então é mais confortável ficar.
– Não sei você, mas olhando daqui, você não está com cara de quem está confortável. – Louis implicou, sendo empurrado pela amiga em seguida.
– Como eu poderia? – deu um gole em seu copo de água e ainda segurando o corpo, apontou com o queixo para , que de costas para eles, jogava sinuca. – Ele tá sofrendo. Como eu poderia?
– Você gosta mesmo desse cara, não é? – O médico observou, contemplativo. – Nunca te vi assim por ninguém. Geralmente na primeira dificuldade você foge.
– Ele vale a pena.
– Sabe o que vale a pena? – Maisie se enfiou no meio dos dois sem avisar. – Comprar cerveja na Finlândia. Sabe quanto eu estou pagando nessa?
– Ninguém quer saber, Maisie. – Louis rolou os olhos e cortou a amiga.
– E quem disse que falei com você? – Maisie o empurrou com o quadril. – , por que nunca me disse que seus amigos e seu suposto namorado são tão legais e bonitos? – A inglesa estava um pouco bêbada.
– Eu me lembro de mencionar uma vez. – A terapeuta riu fraco.
– Santtu tem essa coisa, esse olhar de quem não vai me ligar no dia seguinte. – Comentou ela, apontando para trás. – Mas o Waltteri parece que saiu de um filme de comédia romântica. Ele é mais bonito e mais agradável que seu outro namorado. Mas, ele é lindo como poucos homens são, então não é um páreo justo. – Maisie gargalhou, tomando mais cerveja, enquanto Louis e trocaram olhares. – Mas uma coisa é fato, só um tonto acreditaria que vocês namoram. Não tem nenhuma química, não tem nada a ver.

ergueu o olhar, queria que ouvisse aquela última frase. Quando seu olhar se conectou ao do namorado, do outro lado do bar, jogando sinuca, direcionou a namorada um meio sorriso fraco, que muitos talvez nem chamariam de sorriso, mas que respondeu com um sorriso de todos os dentes.

– Ao contrário disso aí. – Maisie falou, olhando por sobre o ombro, buscando para onde a amiga olhava e para quem sorria. – Não gosto muito da ideia, mas com a fera você tem uma química palpável. Tem uma coisa, rosa com glitter, meio que invisível, que liga você a ele.
– Acho que ela tem razão nisso. – Louis empurrou suavemente, pelo ombro.
– Qualquer um que preste um pouco de atenção... – Maisie continuou, mas parou para beber um pouco. – Ele te olha como se você fosse água e ele estivesse preso no deserto. Você olha para ele como os ingleses olham para temperos. – Brincou Maisie, fazendo a amiga rir.
– Quem te vê falando assim, nem percebe que você o odeia. – balançou a cabeça, sorrindo.
– Eu não o odeio, só... só quero saber se ele te merece mesmo, se merece todo o sacrifício.
– A resposta é sim, Mai. – assentiu, ainda com olhos no namorado. – Tô percebendo que sim.



– E aí, bundão. – Inessa se aproximou do irmão com duas garrafas de cerveja, aproveitando a brecha entre as partidas de sinuca.
– Quem te convidou? – fingiu e viu a irmã rolar os olhos e depois entregar uma das garrafas ao central.
– Os amigos ingleses são simpáticos. – Inessa comentou, apontando com a garrafa para uma mesa, onde , Louis e Maisie riam juntos. – O médico é um fofo e educado. A garota é desbocada e sem nenhum bom senso, já está bêbada também.
– Ela me odeia. – O capitão contou, rindo fraco e tomando um pouco de sua cerveja.
– Nunca vi nenhuma melhor amiga amar o namorado da melhor amiga. – Inessa projetou o lábio inferior e ergueu as duas sobrancelhas. – Você é o melhor amigo do meu namorado e não gosta de mim, mesmo eu sendo sua irmã.
– Gosto de você como irmã, não como namorada dele. – Concordou , maneando a cabeça.
– É sobre isso que estou falando. – Inessa ergueu a garrafa, propondo um brinde. – E você e , por que não está lá com o resto das pessoas normais?
– Estamos em Lahti, em um ambiente público. – interrompeu sua fala para dar um longo gole em sua cerveja. – Para todos os efeitos, ela é a namorada do Waltteri Merelä.

Inessa torceu os lábios, dirigindo ao irmão um olhar empático.

– Esse é o veredito final?
– Não, não teve um veredito. – deu de ombros, apoiando o corpo na mesa de sinuca. – Acho que nenhum de nós quer encarar o problema e fazer o movimento que precisa ser feito.
– Já entendi tudo. – A russa sacudiu a cabeça e se aproximou do irmão, apertando seu ombro. – Agora é a hora que você se isola, que veste aquela capa de que não liga e sofre em silêncio. – lançou um olhar de canto para a irmã, como se ela fosse maluca. – Eu te conheço, bundão. E seu melhor amigo é o meu namorado, então, eu tenho acesso a muitas fontes de informação sobre você. – torceu os lábios e balançou a cabeça negativamente. – Uma coisa que estava sendo tão legal não precisa terminar como algo ruim.

Inessa o beijou na testa, apertou os lábios em um sorriso fechado e se concentrou no rótulo de sua cerveja, enquanto a irmã se afastava.

🎵 Dê play na música aqui, e se necessário coloque para repetir [Taylor Swift – The Archer]🎵


estava assistindo ansiosa a conversa entre e Inessa terminar, aguardando a golfista se afastar para se aproximar do namorado.

– Estava procurando uma desculpa para falar com você, mas você nunca ficava sozinho. – sorriu ao chegar perto dele e correspondeu, sorrindo fechado.
– É porque hoje eu não vim para flertar. – respondeu com algum desânimo, levantando um ombro e piscando.
– É uma pena. – A inglesa respondeu depois de rir. – Porque estava te olhando de lá e te achei bonito demais. – A terapeuta entrou na brincadeira, colocou as mãos nos bolsos e se aproximou mais. – Não sou de fazer isso, mas senti que precisava vir aqui e falar alguma coisa. Não queria perder a oportunidade.
– Seu namorado não está bem ali? – apontou com o dedo indicador da mão que segurava a garrafa de cerveja, para onde Waltteri conversava.
– Namorado? – fingiu confusão, olhando para os lados. – Eu?

estava apoiado a mesa de sinuca, estava quase à sua frente. O capitão riu, mexendo os ombros e ergueu o rosto, tomando o resto de sua cerveja.

– Você joga? – Quis saber , pegando dois tacos enquanto fazia a pergunta.
– Eu tentei na faculdade, mas quase furei o olho de alguém. – Contou a inglesa, apoiando uma das mãos na mesa. – E nem é exagero. Meus amigos estão ali para provar.
– A gente pode tentar. – O central respondeu depois de rir, entregando um taco para a inglesa.

olhou para os olhos de , depois para a mão estendida dele, segurando o taco, depois de volta para ele, sorriu e segurou o taco. Queria estar com ele, queria a atenção dele, queria o olhar dele e estava feliz por estar conseguindo.
organizou as bolas na mesa e deu a primeira tacada, as espalhando, conseguindo acertar suas bolas. Na vez de , a inglesa errou a mira e acertou apenas o vento. inclinou o rosto para rir, enquanto apoiava o taco no chão. A inglesa tentou outra vez, conseguiu acertar de modo desajeitado uma bola.

– Ei, essa bola era minha. – percebeu, franzindo o cenho e tirando outra da mesa.
– Quem diria que é realmente péssima nesse jogo. – riu e a imitou, balançando a cabeça.

O jogador circulou a mesa, procurando o lugar mais adequado para fazer sua tacada e quanto encontrou, encaçapou mais duas bolas de uma vez.

– Não se sinta pressionada, é porque eu sou bom. – Ele tentou justificar. – É só mirar bem na branca e na que você quer atingir.
– Tá, legal, eu consigo fazer isso. – se inclinou e quando o capitão viu a forma com que ela segurava o taco, inflou as bochechas e inclinou a cabeça outra vez. – É só mirar, isso eu consigo fazer.

Não conseguiu.
A bola branca atingida por quicou e caiu da mesa.

– Okay, isso foi uma péssima ideia. – Admitiu , apertando os lábios, enquanto ria, resgatando a bola do chão.
– Eu te ensino. – Ele prometeu. – Você segura aqui, com firmeza.

Enquanto falava, se posicionou atrás da namorada, ajudando ela a se inclinar sobre a mesa, segurando sua mão para que conseguisse apoiar o taco do modo correto e regulasse sua mira.

– E aí, escolhe a bola que você quer. – Ele continuou guiando a mira da terapeuta. – Está firme?
– Sim? – Respondeu incerta e riu, apoiando a testa no ombro da inglesa.
– Com a outra mão você acerta, com a força que achar necessária.
– E como eu vou saber que força é necessária?
, é só observar a distância que você quer que a bola branca chegue. – O capitão ria, divertindo-se da situação. – O que é isso... – Ele gargalhou.
– Eu uso minhas mãos para tantas outras coisas melhores. – resmungou depois de tentar outra vez e errar, encaçapando a bola branca.
– Nisso eu tenho que concordar. – Brincou , recebendo um olhar chocado da namorada, que riu alto em seguida.



Do outro lado do bar, Waltteri Merelä disse ter uma ligação para atender e se afastou do grupo depois que as risadas de e ecoaram por todo o ambiente.

– Odeio admitir, mas ela fica tão bem com ele. – Suspirou Maisie, girando o resto de sua cerveja na garrafa.
– Você já disse isso umas quarenta vezes, acho que já pode cortar a parte de não gostar disso. – Louis alfinetou e Maisie rosnou para o amigo.
– É, eu sinto muito pelo meu parceiro. – Santtu, que estava sentado ao lado deles, tomando uma cerveja, comentou. – Mas a é do desde a primeira vez que ela pisou no vestiário.

❄❄❄


Sexta-feira, 14 de janeiro de 2022
Casa de
Lahti – Finlândia



De manhã, acordou mais tarde.
Teria seu último dia de treino antes do primeiro jogo do ano e estava empolgado, mas em paz. Junto a isso, a noite anterior havia sido uma das melhores em anos. De alguma forma o fizera lembrar do porquê estava com , da razão de estarem juntos e de terem passado por todos aqueles problemas e terem resistido. Talvez não precisasse fazer tanta tempestade, talvez não precisassem ficar naquele clima de morte, nem evitar a toda custo.
Inessa talvez tivesse razão, não precisava pesar tudo e tornar aquilo ainda pior e mais difícil. Tinha tendência a pesar as coisas, não era o ser mais otimista que conhecia, mas não custava tentar olhar por outra lente ao menos uma vez.
O jogador pulou da cama e tomou um banho rápido. não estava dormindo, provavelmente já estivesse tomando café com os amigos, então se apressou para fazer o mesmo.
Mas quando desceu as escadas saltitante, já preparado para ir ao treino, encontrou apenas dois dos três ingleses na mesa, e nenhum deles era o que queria realmente encontrar.

– Onde está a terceira inglesa? – sorriu ao chegar junto deles, apoiando as mãos no encosto de uma cadeira.
saiu cedo. – Louis respondeu em tom tranquilo. – Disse que tinha uma coisa importante para resolver.
– Coisa importante? – perguntou confuso, mais para si mesmo do que para os outros dois.
– Ela não disse o que era, desculpe. – Louis ergueu os ombros e sorriu fechado.

assentiu em silêncio, sorriu fechado e bateu duas vezes, devagar no encosto da cadeira. Em seguida acenou com a cabeça e os deu as costas. Só podia ser uma coisa. Só tinha uma coisa que faria sair cedo assim, só uma coisa importante para resolver e decidiu que precisava se apressar.

– Ei, . – Maisie o interpelou, correndo atrás dele. – Espera.
– O que foi? – O central a olhou, estava com pressa.
– Você sabe que eu não sou sua maior fã. – A inglesa começou a falar. – Não sei o que a minha amiga viu em você. Além disso te acho muito complicado e difícil, hábitos ruins e que vocês têm muitas bandeiras vermelhas juntas. Uma quantidade grande demais para ignorar.
– Eu deveria dizer o que agora? – a encarava perdido em seu discurso passivo-agressivo.
– Mas... – Maisie expirou, baixando os ombros. – Com você a minha amiga está feliz de um jeito que nunca vi antes. Mesmo eu não aprovando nada disso, posso me acostumar com você. E se para manter feliz eu preciso fazer isso, então vou fazer. – A inglesa respirou fundo outra vez. – Acho que vocês devem ficar juntos, de verdade. – Assumiu, olhando nos olhos do capitão. – Não sei o que ela foi fazer, ela não me disse, mas provavelmente é a decisão errada. faz coisas estúpidas quando não pensa direito, tipo agora.
– Entendi a dica. – assentiu com a cabeça.
– Não deixe ela ferrar tudo. – Maisie pediu, vendo-o partir para a garagem, apressado.

❄❄❄


Sexta-feira, 14 de janeiro de 2022
Centro de Treinamento do Pelicans
Lahti – Finlândia



Já fazia mais de meia hora que andava de um lado para o outro na frente da porta da sala de Petri, onde lhe disseram que estaria. O capitão não sabia bem o que pensar, depois dos últimos acontecimentos tudo parecia imprevisível demais. não devia se sentir segura em abrir mão de seu trabalho e escolher o que os dois tinham, se já a estava tratando de modo tão diferente e distante, que a inglesa havia até considerado a hipótese de um término. Que idiota, , ele pensava, batendo na própria cabeça.
Talvez na noite passada, devesse ter cedido mais, talvez devesse tê-la levado para o quarto e feito o que faziam de melhor, e não apenas ter se deitado e dormido. Devia ter passado alguma segurança, dito a ela que a amava e que era sua escolha, mesmo em dias complicados como aqueles. Devia ter trabalhado para convencê-la de que era a melhor escolha, não facilitar sua decisão. O ato mais estúpido de sua vida, sendo . Será que não tinha aprendido nada em todo esse tempo?
O que aquela última noite, a brincadeira na sinuca e as risadas no bar significavam? Era uma despedida? Um ato premeditado de quem pretendia ir embora no dia seguinte? Nada fazia sentido. Nada se encaixava. Porque se ela o tivesse escolhido, ele saberia e contariam juntos. Assim, poderia protege-la dos resultados daquele bombardeio. Se a escolhe fosse ele, ele saberia.
Mas claro, em que universo ele seria a escolha?
se sentou e apoiou os cotovelos nos joelhos, enfiando os dedos nos cabelos. Em que mundo ele seria a escolha? Em que mundo alguém como escolheria ele ao invés de sua carreira, de sua vida. Ela disse uma vez, deixou seu país, seus amigos, tudo que conhecia por aquele trabalho. Não por , não por uma paixão, não por um relacionamento. era incrível, encontraria uma fila de s na esquina se quisesse. Era óbvio demais, o que tornava a presença ansiosa e surtada de ali, naquela porta, ainda mais patética. Afinal, só alguém mesmo muito burro para pensar que outra escolha seria possível.

A porta se abriu de repente, capturando a atenção do capitão, que se levantou em um piscar de olhos. A primeira a deixar a sala foi Isabel Svedin, com seu andar firme e sério, a executiva esquadrinhou com os olhos, mas apenas o cumprimentou com um aceno de cabeça. Sua expressão era indecifrável, mas não a de Petri, que apareceu logo após ela. Petri tinha os lábios torcidos e sobrancelhas baixas, parecia impaciente e contrariado. O treinador apareceu apenas para fechar a porta depois que passou por ela. Os dois não trocaram nenhuma palavra, mas Petri, quando viu , dirigiu a ele um olhar atravessado e sabia o que significava. Provavelmente agora, sabendo de toda a verdade – o que ele estava supondo – Petri estivesse um pouco irritado por ter mentido quando questionado pelo treinador. Petri era muito sentimental e sensível as vezes.

🎵 Dê play na música aqui, e se necessário coloque para repetir [Ali Gatie – It's You]🎵


– Oi. – Foi a única coisa que o capitão conseguiu dizer quando se aproximou.
– Oi. – Ela respondeu baixinho, sorrindo fraco.
– O que você... – Ele perdeu a voz e precisou tossir, tentando recuperá-la. – O que você veio fazer aqui?
– Eu tinha que resolver um problema. – baixou o olhar, depois cruzou os braços e ergueu os olhos. – Não era justo o que eu estava fazendo. – Assumiu, negando com a cabeça. – E também, já tinha tomado a decisão há muito tempo, só estava com medo de realmente encarar as consequências dela. – Respondeu , seu tom era suave, tranquilo, mas um pouco pesarosa.

entendeu.
O capitão assentiu, inclinou a cabeça e fungou, coçou a nuca e então ergueu o rosto, mas não a olhou nos olhos.

– Você tem mesmo que fazer o que é mais certo para você. – Começou a dizer o central. – Eu nunca quis te colocar... nunca quis que fosse desse jeito, tipo um ultimato. Como se fosse uma coisa ou outra. – assentiu, projetando o lábio inferior e inclinou a cabeça outra vez. – Você está certa.

Enquanto o ouvia, a inglesa apenas assentia e tentava buscar seu olhar, mas parecia concentrado em evitar que isso acontecesse.

– Eu só não... – O capitão do time expirou um riso fraco e coçou a barba, ainda com rosto baixo. – Eu só não sei como vai ser agora. Não sei o que vai acontecer, mas... você sabe, no que precisar de mim, eu vou sempre estar à disposição...
, do que tá falando? – o interrompeu, fazendo com que ele a olhasse nos olhos pela primeira vez.
– Do trabalho. – Respondeu . – Sobre ficar no time. – O jogador a olhou com confusão. – Eu pensei que... achei que a gente pudesse continuar pelo menos sendo...
– Mas eu não escolhi o time. – contou.

Demorou algum tempo para que as palavras da inglesa fizessem sentido na cabeça do capitão. Não parecia fazer sentido ou significar o que elas significavam normalmente.

– O quê? – sacudiu a cabeça. – Como não?
– Escolhi você. – Ela repetiu com um sorriso suave, de quem se espanta pela reação do outro. – É você.
– Mas... – ainda estava atordoado com a revelação, não achava realmente que aquilo fosse possível.
– Eu já tinha feito essa escolha, lá, quando entrei no vestiário pela primeira vez e vi você. – A terapeuta inglesa lembrou. – Ou quando você veio até mim e tentou puxar conversa pela primeira vez, ou quando fingiu me ignorar... – Ela riu com a lembrança e a imitou. – Eu já tinha escolhido, mas acho que tive medo de assumir para mim essa realidade. Porque aí eu estaria entrando em um nível de vulnerabilidade que desconheço. Eu fiquei com medo de encarar a realidade. – Assumiu ela, erguendo os ombros e aproximando-se do namorado mais dois passos. – Mas acho que ver como esse meu medo estava te afetando me fez rever minhas prioridades.
, mas e o time? Você adora trabalhar aqui. – O central ainda estava incrédulo. – Você disse, abriu mão do seu país, dos seus amigos e de tudo para estar aqui e fazer o que faz. Não é justo que...
– Eu perdi um trabalho, ganhei amigos, encontrei o amor da minha vida e recuperei minha paz. – A inglesa sorriu. – Me parece uma troca justa.
... – tentou falar outra vez.
– Não se preocupe com o time, nem com nada disso. – Ela o acalmou, afagando o rosto do jogador com o polegar. – Petri e Svedin vão decidir o que fazer agora. E a responsabilidade aqui é minha. Louis e Maisie me fizeram enxergar, voltar ao meu centro e ao meu eu responsável e maduro. – fez careta, brincando com o que dizia. – Mas agora já não depende de nós. Só pediram discrição nos próximos dias, até decidirem como vão conduzir essa situação. Acho que a gente consegue, não é?

assentiu.

– Eu não acredito que você fez isso.
– Desculpe por ter vindo seu você. – mordeu os lábios. – É que eu entendi que era responsabilidade minha e eu...
– Não, não isso. – a interrompeu. – Claro, eu queria ter estado aqui, a gente devia ter feito junto, mas... – uniu as sobrancelhas, confusa. – Não acredito que você me escolheu.
, eu amo você. – A inglesa sorriu, como se fosse a constatação mais óbvia do universo. – Você foi a melhor coisa que já me aconteceu. Você me ensinou que eu posso ser amada sem precisar pedir por isso, ou sem precisar mudar quem eu sou. Que pode me amar mesmo quando eu erro ou irrito você. Eu fui capaz de pular na água sem saber nadar, por você. Você achou mesmo que eu não te escolheria? Você era a minha única certeza. Eu queria muito manter o trabalho também, mas...estou em paz com a minha decisão.
, de quem eu nunca sei o que esperar. – O capitão declarou ainda pasmo e a inglesa sorriu grande, lembrando-se de como diziam aquela frase um para o outro o tempo todo no início de tudo. – Vem aqui.

Foi a única coisa que o capitão conseguiu dizer, não conseguia pensar em nada que fosse bom o suficiente, ou que se igualasse ao ato da namorada. Ainda estava em choque e pronto para que, a qualquer momento, o despertador soasse. Por isso, fez a única coisa que conseguiu no momento, a puxou para um abraço muito apertado, tentando eternizar aquele momento em cada célula, querendo que estivessem tão próximos um do outro que ninguém poderia distinguir onde começava ou onde terminava .






| Continue lendo>> |