Autora: Stelah
Beta: Nelloba Jones

Introdução




Eu tinha o estranho costume de levantar da cama para beber água, fui lentamente em direção a porta e, ainda com sono, tentei abri-la sem sucesso.
Finalmente minhas vistas clarearam e o sono foi desaparecendo, só então percebi que havia algo de errado: aquele não era o meu quarto.
Sentei-me sobre a cama, ainda confusa, e olhei a minha volta, tentando reconhecer o lugar.
- Impossível! - pensei alto.

Sem nenhum cara nu sobre a cama, ou garrafas e roupas espalhadas pelo chão. Eu estava sóbria, o que eliminava todas as minhas hipóteses.
A minha esquerda uma janela, talvez a vista do lado de fora pudesse me fazer lembrar de algo, ou ao menos me localizar, mas ela estava trancada.
De repente as luzes se apagaram, e a escuridão tomou conta do quarto. Alguns segundos depois, um flash surgiu da parede, a TV havia sido ligada.
- Olá, . – disse uma voz masculina vinda da TV.
- Quem é você? - gritei.
- Você quer realmente saber? - ele usava um tom de sarcasmo.
- Não, estou perguntando só pra passar o tempo. - virei os olhos. - Você deve ser um fã psicopata de jogos mortais!
- Olha, garota, não me olhe assim... Opss, você não pode me ver. - ele soltou uma gargalhada particularmente assustadora. Ele tinha razão, tudo o que eu podia ver era uma foto ridícula de um anjo negro.
- Onde eu estou? Como vim parar aqui? – perguntei ao mesmo tempo que rodeava o quarto, procurando por câmeras.
- Você está num quarto de hotel, e isso é tudo o que precisa saber por enquanto. – ele respondeu friamente.
- Se você quer me matar, dá pra fazer isso logo? Porque eu já estou entediada...
- Por que eu mataria uma garota linda como você? Fique tranqüila, meu amor, eu prometo tirar-lhe todo esse tédio. - a voz sensual finalizou a transmissão.
Quem seria o cara misterioso por trás de tudo isso? A curiosidade ia me matar antes dele, isso era certeza.


***



Algumas horas se passaram, até ele voltar a me chamar:
- Hey, ! Será que podemos conversar?
- Eu acho que não tenho outra opção.
- És uma garota esperta.
- Sabe, cara, mudei de opinião sobre você. - agora eu encarava a tela da TV como se o sequestrador estivesse a minha frente.
- Hum... Diga-me. - ele pareceu curioso.
- Você não quer me matar, mas me acha bonita... Com certeza você é só mais um daqueles tarados...
- Wow, provando mais uma vez que é esperta. – disse entre risadas.
- Por favor, me diga que você não é mais um daqueles velhos asquerosos ou adolescentes na primavera.Vai ser menos pior se você for razoavelmente bonito.
- Quer saber sobre mim,certo? Bem, você conseguiu me convencer. - ele mudou o tom de voz. - Meu nome é , mas pode me chamar de . Tenho anos, cabelos , olhos ... Isso é atraente pra você?
- É o suficiente para me deixar excitada.
- Está com fome?
- Depende do que vou ter que comer...
- Bem, ainda não é hora de gratinado! Mas se quiser...
- Esse é o prato que eu definitivamente não quero.
- Tudo bem, vou te levar algo decente. - interrompendo a chamada novamente.


***



Minutos depois as luzes se apagaram,e assim que a luz voltou, encontrei um bilhete:

Querida,
Seu lanchinho está no compartimento ao lado da porta. Mas se pensou que seria assim tão fácil, se enganou. Para abrir o compartimento, terá de pegar a chave que está... Opss, me esqueci onde guardei!
Boa sorte.


- Muito bem humorado você, hein? Espero que essa droga de comida não esteja envenenada! – eu disse , ainda procurando pelas câmeras.
Revirei o quarto todo, mas não encontrei as chaves, foi então que na tela da TV uma mensagem surgiu: “Vamos tornar isso mais divertido?”
- Tá legal, ... O que você quer agora?
A TV imediatamente ligou:
- Sabe, esse negócio de procurar chave é meio infantil. Eu sabia que não iria achar graça nisso, então, não escondi as chaves.
- Engraçadinho você, hein?
- Calma, a brincadeira ainda nem começou. Que tal se fizéssemos uma troca de favores? – propôs em tom de malícia.
- Isso depende...
- Só quero ver como você é debaixo dessas roupas de grife.
- Eu não vou tirar a roupa, não insista!
- Okay, então você vai ficar alguns dias sem comer.
- , eu posso ficar de roupas íntimas, está bom pra você?
- Qual é, ? Eu já te vi de roupas íntimas quando te trouxe pra cá. Devia me agradecer por não ter feito nada com você! – disse ele num tom de revolta.
- Então você já viu o suficiente!
- Depois que você ficar nua a gente conversa sobre limites, ok? - deu uma pausa. - Acho que ainda não notou que sou do tipo que não se contenta com pouco... Nada vai saciar a minha sede por prazer.
- Vai pro inferno! - fiz um gesto obsceno.
- Não seja má educada! - foi a última coisa que ele me disse.


1º Capítulo: Um pouco de diversão


tinha inteligentemente posicionado um relógio na parede do quarto. O barulho do mesmo me deixava ainda mais aflita, o tempo demorava a passar. Ele me chamou novamente:
- !?
- Você vai ter que esperar um pouco mais para me fazer mudar de idéia, sr. . Aliás, como você entrou em minha casa?
- Vejo que está começando a ligar os pontos...
- Eu me lembro de ter me deitado na cama e de ter tido bons sonhos. Mas me diga, nós nos conhecemos?
- Não seja apressada, querida, logo nós chegaremos a essa parte.
A posição dele diante da minha hipótese, fez afirmar que ele me raptou depois que dormi. O que também confirmava o fato dele ter me visto de roupas íntimas, já que eu sempre me deitava assim.
- Olha, eu sou um cara bonzinho, vou deixar você comer algo.
- Eu já disse que não vou me despir!
- Você não vai precisar fazer nada em troca, eu só não quero que você morra de fome.
- Obrigada, .
- Você fica tão mais sexy quando submissa.
- Eu não sou submissa a você!!!
- Tudo bem, sra. nervosinha...
As luzes se apagaram, era o escuro que ele usava para agir. Quando a luz voltou, o compartimento se abriu, e só então pude matar a fome.
Senti um gosto estranho invadir minha boca e uma forte tontura veio. Deitei-me na cama e esta é a última coisa da qual me recordo.


***



- Bom dia, bela adormecida... - a voz me despertou.
- Cala a boca, vai! – resmunguei ainda sonolenta.
- Então, o que achou do lanchinho?
- Não quero nem saber o que você colocou naquilo...
- Nossa, eu caprichei tanto... Encomendei do melhor restaurante da cidade!
- Tô fedendo...
- Tem um chuveiro quentinho logo atrás dessa porta.
- Eu nunca vou tomar banho ali, ok? Deve ter câmeras, sei lá.
- Você devia ter um pingo de consideração por mim. Não abusei de você quando te raptei, te deixo comer, tomar banho, não te agrido. Só quero conversar com você!
- Agora você quer conversar, daqui a pouco quer outras coisas...
- Eu sei que comecei meio agitado, mas eu prometo que vai ficar mais leve pra você.
- Do que você está falando, ?
- Do jogo, oras! Anda logo tomar banho, que eu estou louco pra mais desafios.
- Desafios? Que tipo de coisa você anda vendo na TV? – debochei. – Quer saber, que se foda você ! Eu vou tomar banho.
- Era disso que eu estava falando, gata! - disse num tom de empolgação.
Abri a porta do banheiro e avistei um bilhete:

Querida,
aqui estão suas roupas e uma toalha limpinha.
Com carinho, seu amado .


- Amado o caramba, seu otário! - mostrando o dedo novamente. - VAI PRO INFERNO!
Tirei minha camisola lentamente, fiz questão de provocar o desgraçado.
- , eu te vesti essa camisola com tanto carinho... - parecia sussurrar.
- Isso prova o quão otário você é, eu podia jogar seminua, mas... - tentei zombar dele.
- Não queria que ninguém visse minha deusa assim. - mais uma vez numa gargalhada infantil.
- Sua deusa? Vai sonhando, vai!
Apenas de roupas íntimas, enrolei a toalha em volta de meu corpo. De forma até mesmo circense, tirei minhas roupas íntimas sem mostrar qualquer parte do meu corpo.
- É uma pena não poder ver a água deslizar sobre seu corpo. - faltava implorar.
- Deve ser... - finalizei a conversa.
Abaixei minha cabeça para assegurar que nada estivesse aparecendo. Limitei-me a olhar apenas a parte do meu corpo que não estava coberta pela toalha, a começar pelo meu busto. Pude notar algumas marcas que desciam para debaixo da toalha, em meu seio. começou a gargalhar loucamente, então eu tirei a toalha:
- Desgraçado!


2º Capítulo : Hora de jogar!


A risada dele estava realmente me irritando:
- Dá pra parar de rir, seu filho de uma puta?
- Calma, queridinha, aposto que se você estivesse acordada, você iria ter adorado. - ele não parava.
- Cale a boca! – gritei, silenciando-o por alguns instantes.
- Qual é a sua, garota? Ainda não percebeu? - pareceu se exaltar. - Você é apenas uma peça do meu jogo e eu faço o que eu quiser com você!
Algumas lágrimas começaram a surgir. Eu estava com muita raiva e mal podia me segurar, me sentia suja. Sequer queria imaginar as coisas que aquele maldito tinha feito comigo, e aquilo, com certeza, era só o começo:
- Por que você está fazendo isso comigo, ? Eu te fiz algo ruim, é isso?
- Agora é sua vez de calar a maldita boca! - ele gritou e não mais me respondeu.
Tudo era muito estranho, se eu tivesse ao menos uma dica. Mas era muito esperto e dificilmente vazaria grandes informações, talvez eu nunca tivesse as respostas para as minhas perguntas.
As marcas em meu corpo eram incontestáveis, eu realmente era uma peça do jogo sexual de . Aquilo podia ser uma pista sobre a personalidade dele.
Vesti minhas roupas e me deitei na cama, fechei os olhos e desejei estar longe dali. Era impossível, se eu estava num jogo, era para que eu jogasse. Naquele momento, joguei fora toda a emoção e passei a gastar meus pensamentos com a razão, agora eu tinha um propósito: vencer .

Quem realmente é , , ?

e eu tivemos algum contato anterior?

Como ele havia me raptado?

Por que ele havia me escolhido?

Qual era seu objetivo?

Tudo o que eu tinha que fazer era juntar o maior número de pistas. Ele já teria deixado alguma?
Voltando para o início de tudo, e passando o tempo lentamente, eu tinha algumas informações. Algumas fúteis e outras até mesmo aceitáveis:

Anjo negro [a foto dele na TV]

Seu objetivo não era me matar, ao menos foi o que ele disse.

Ele concordou com minha hipótese sobre ele ser um tarado.

Eu sabia seu nome, sua aparência física e podia ouvir sua voz.

A todo o momento ele procurou por prazeres sexuais, pedindo que eu me despisse e abusando sexualmente de mim quando dopada.

Ele me raptou enquanto eu dormia, e me vestiu antes de me trazer para o hotel.

Suas atitudes eram sempre premeditadas, prova disto eram os bilhetes.

se irritava quando sua liderança era ameaçada, o que mostrava uma personalidade narcisista.

Seriam essas poucas informações suficientes para que eu jogasse?

***


Abri os olhos.
A solidão rapidamente substituiu a voz de .
Gargalhei de minha própria desgraça.
Olhei para o relógio e suspirei. Meus olhos seguiam seus ponteiros, sem nenhum resultado.
- Maldito quarto. – voltei a gargalhar.
Eu ainda estava fora de mim.
Por um momento, me vi levantar da cama e puxar todo o edredom que estava sobre ela. Espalhei tudo sobre o chão e fui até um dos cantos do quarto, rasgando de forma animal o papel de parede.
Depois de certo esforço, me joguei no chão do quarto e observei a sujeira que havia feito. Mas nada chamou mais atenção do que eu vi na parede. Sangue.

Mal me recompus do choque de ver tal coisa, voltou:
- Pois é, o item de decoração mais belo do quarto tinha que ficar escondido debaixo do papel de parede...
Não era hora para escândalo, eu tinha que aproveitar o momento para tirar o máximo de informações de :
- Quantos você matou aqui, ?
- Essa pergunta é um tanto complicada, . - ele respondeu calmamente.
- Então você mentiu quando disse que não queria me matar? - foi a única conclusão que eu poderia tomar.
- Eu matei muita gente, mas isso não quer dizer que eu queira te matar... Ou quer? - ele riu.
- Você só vai me matar depois que se sentir saciado de prazer... - completei meu raciocínio.
- Quando você afirmou que eu era um tarado, eu concordei, era a verdade, não é mesmo? Mas eu sequer neguei suas expectativas anteriores. - deu uma pequena pausa na fala. - Eu estou tentando te ajudar, as pistas estão à sua volta!
À minha volta, o que ele queria dizer com isso?


3º Capítulo : O Quarto


Procurei por toda a parte por pistas, mas nada encontrei além da manchas de sangue. Embora tentasse, não conseguia entender as pistas desconexas de . Talvez já tivesse encontrado a resposta e ele só estivesse querendo se divertir com meu desespero, como ele fez quando me mandou procurar a chave.
Sorri e me fingi de desistente, eu já havia encontrado o suficiente.
- E então...? - ele perguntou, em meio a risadas.
- Você está de brincadeira, né? – irritei-me.
- Oh, . Olhe ao seu redor! – pareceu entusiasmado com a cena. – Olhe para esse quarto! A maior pista está bem diante de seus olhos, mas você não pode ver. -foi assim que ele terminou nosso diálogo.
Olhei ao meu redor mais uma vez.
Agora sabia exatamente do que ele estava falando, aquele quarto de hotel podia ser minha maior pista.

***


Mais uma noite se passou naquela prisão, ainda mais assustadora com as marcas de sangue na parede, e eu mal conseguia entender como ele havia me levado até ali.
- ? - ele chamou-me, logo que acordei.
- Bom dia, Sr. .
- Nós finalmente estamos nos acertando, não? - parecia bem humorado.
- A gente só vai se acertar quando eu estiver fora daqui. - desviei o olhar para outra direção.
- , eu estou fazendo de tudo para você sair, aliás, estou aqui para fazer-lhe uma proposta. - o tom de voz dele mudou.
- Diga... - confesso que ainda tinha alguma esperança de que ele mudaria.
- O jogo poderá acabar quando você quiser, acho que você deve ter o direito de escolher... - ele deu uma pausa. - Mas para sair, você sabe, eu quero ouvi-la gritar!
- Eu sabia que ia ter alguma coisa dessas. - levantei-me e tentei não dar atenção a ele.
- Será que uma tal de gostaria de observar o lado de fora? – disse, numa proposta tentadora. - Ah, e não vai ter nenhuma safadeza, prometo.
Minha mente implorava por uma resposta afirmativa, mas vindo de , nada podia ser bom. Segundos depois, lá estava eu aceitando a proposta:
- O que terei de fazer, ? - admito que naquele momento eu estava submissa ao seu comando.
- Depois que abrir o compartimento, irá saber... - ele respondeu.
Fui em direção ao compartimento e uma música de suspense tocou automaticamente em minha mente. Percebendo-me tensa, não se conteve em rir.
Ao abri-lo, deparei-me com uma gillette, isso mesmo. Peguei-a com cuidado e olhei em volta, para demonstrar que não estava entendendo nada.
- Vamos, comece o trabalho! - gritou.
- Do que está falando, ? – era possível para ver o desespero em meus olhos.
- Ande logo, vadia, antes que eu vá aí e faça o serviço! – ele gritou mais do que alterado.
Segurei a gillette com a mão um pouco acima de meu rosto. Tremia muito e meu corpo todo formigava de anseio.
Fechei os olhos devagar, ao som de gritos apressados de e, finalmente, toquei a lâmina em meu braço. A dor veio devagar, mas foi intensa e logo o sangue estava todo espalhado por sobre minha roupa.
Algumas lágrimas, de teimosas, caíram. Mas era necessário, se o quarto era a pista, como eu pensava, a vista do lado de fora podia ser o maior passo a dar.
Por um momento me vi sorrir, o sequestrador me acompanhou.
Só então tive noção de minha atitude. O ferimento era grave e eu não podia deixá-lo daquele jeito: exposto. Mas pensava em tudo, não é mesmo?
Depois de estacar o sangue e dar um jeito em tudo usando apenas a mão direita, cumpriu sua promessa. Ele deixou a chave da janela no compartimento, peguei-a, sentindo-me vitoriosa.
Segurei a chave com prazer, e fui lentamente em direção à janela. Sorri para mim mesma e a encaixei na fechadura. Rodei-a com ainda mais prazer.
Parei por um instante e suspirei. Só então abri a janela.
- Essa pista é o suficiente? Agora sabe quem eu sou? - perguntou num tom mais que sensual.


4º Capítulo : Poucas respostas, muitas perguntas


Neguei-me a acreditar no que havia visto, dei um pequeno passo para trás e sentei-me ali, no chão daquele que já não era um quarto de hotel.
- Como é saber que por todo esse tempo estava tão perto de casa? - voltou a usar um tom sensual.
Eu estava totalmente confusa sobre aquilo. Todo o tempo eu estava tão perto de casa...
Mas por que ele inventaria uma mentira tão tosca sobre o lugar onde estávamos? Bem, isso só faria sentido se essa fosse uma pista importante, talvez, sobre quem ele era.
Fechei os olhos e ignorei todos os comentários inúteis de meu seqüestrador. Tentei por um instante pensar apenas nas pessoas com quem eu convivia naquele bairro, até chegar no vizinho, dono da casa da frente, que seria o meu seqüestrador. Era o único de quem eu não me lembrava, talvez, porque ele era novo no bairro.
Concentrei-me um pouco mais. Uma memória curta de alguns dias atrás me veio à tona...

Flashback


Enquanto assistia ao meu programa favorito, um barulho estrondoso de caminhão invadiu meus ouvidos.
Fui em direção à janela e vi alguns móveis saírem do caminhão e serem levados até o interior da casa.
Quis sair e reclamar com o novo morador, mas depois de um tempo, ri de minha implicância com tal coisa.
Sentei-me de novo no sofá e tentei voltar minha atenção para a televisão...

Flashback Off


O que eu me lembrara não era o suficiente, eu precisava de um pouco mais.
Eu sabia onde estava e, artificialmente, quem ele era, mas essas não eram as únicas perguntas que eu tinha. Se ele era novo e mal nos conhecíamos, por que ele me sequestraria? Como ele fizera isso? Qual era seu objetivo?
- Sei que está se esforçando, . - tentou ser compreensivo, mas eu podia notar o tom de sarcasmo em sua voz. – Entretanto, precisamos ir logo com isso, sabe? Eu estou ficando entediado...
- Me desculpe se não sou a vítima perfeita, sr. . - devolvi o sarcasmo.
- Seu vizinho aqui está realmente chateado por você não se lembrar dele...
- Eu me lembro muito bem de você, idiota! Você e aquele caminhão de mudanças caindo aos pedaços... - comecei a me irritar.
- Não se lembra de mim naquela noite, querida?
- Do que você está falando?
- Do dia em que eu te sequestrei... Fui até lá pessoalmente. Você é especial, .
Seja lá o que fosse especial para ele, eu não queria ser. Tudo o que eu queria naquele momento era me lembrar daquela cena em que e eu encaramo-nos olhos nos olhos, ou seja lá o que eu tenha esquecido.

Quem realmente é , , ? Meu vizinho, e isto é a única coisa que sei sobre ele.

e eu tivemos algum contato anterior? Não me recordo, mas ele afirma que apenas antes do sequestro, devo acreditar?

Como ele havia me raptado?

Por que motivos ele havia me escolhido?

Qual era seu objetivo?


5º Capítulo: Prova de Sangue


Todas as pistas em que eu acreditava, todas as respostas que eu tinha se revelaram falsas. Eu estava do lado da minha casa, sequestrada pelo meu vizinho, se é que isso pode ser chamado de seqüestro, porque era só eu atravessar a rua e pronto.
O pior era pensar que se tudo isso era mentira, o fato de ele não querer me matar também podia ser.
A cada segundo eu sentia mais medo de . Não pelo que ele dizia, mas pela frieza que ele mostrava em suas ações.
A volta, tudo, cada detalhe tinha sido previamente pensado. A camisola, o quarto, os bilhetes dos desafios... Pistas que passavam facilmente de meu olhar.
Agora tudo, tudo era uma pista. Eu iria descobrir tudo, nem que tivesse de morrer pra isso.
O que poderia ter passado por mim que eu não tinha visto?
Ao fechar os olhos, tudo que me vinha a cabeça era os dizeres de : “Pois é, o item de decoração mais belo do quarto tinha que ficar escondido debaixo do papel de parede...” “Eu matei muita gente, mas isso não quer dizer que eu queira te matar... Ou quer?” “Mas eu sequer neguei suas expectativas anteriores.” “As pistas estão à sua volta!”
O quarto não era a única coisa a minha volta... O sangue era mais uma prova perdida, ele foi esperto ao contornar me dando a oportunidade de ver o lado de fora. Uma prova de sangue afirmaria todas as minhas expectativas anteriores.

***


Com poucos dias morando ali e nenhum sumiço de vizinhas, ficava tudo muito difícil.
Para colocar o papel de parede demoraria um certo tempo, ele teria que chamar alguma companhia. E essa pessoa logicamente desconfiaria dele.
Sangue, sangue, sangue... Eu precisa pensar direito, pensar como pensaria!
- O que faz sair tanta fumaça da sua cabeça? – puxou assunto.
- Quero caneta e papel! – Talvez assim eu conseguisse organizar minhas ideias.
- O que vai fazer você entender que quem manda nesse jogo sou eu? – Ele pareceu se exaltar.
- Vamos, zinho. Proponha mais um de seus desafios... – Usei de uma voz doce para zombá-lo. – Eu topo qualquer coisa!
- Não há mais nada que eu queira fazer com seu corpo ainda quente. – Pude sentir, depois dessa fala, que fiz com que ele deslizasse, afinal, ele não tinha planejado isso.
- Então me mate agora, desgraçado! – Mostrei o dedo do meio para a TV, ainda com a foto do “Anjo Negro”.
Um silêncio atormentador tomou conta do quarto. Aquilo me corroía por dentro, toda aquela coragem falsa não era suficiente.
Meu sangue escorrendo em sua faca, esse seria meu fim. Ao som de risadas sádicas e de pouco valor.
- Faça isso você mesma, eu lavo as minhas mãos. – Era o fim do silêncio, e o início do meu fim. Ouçam as risadas. – Suicídio é mais legal, não há culpa...
Queria voltar no tempo e ficar pra sempre presa naquele lugar. A morte era mais assustadora que qualquer situação, e mais misteriosa do que qualquer cara.
- Não vai ver a surpresinha que acabei de deixar no compartimento? – Ele disse.
Era uma corda. E eu realmente estava disposta a acabar com tudo isto.
Confesso que gelei ao ouvir as palavras finais de :
- Se não o fizer, irei até aí e farei por ti.

Capítulo betado por Abby


6º Capítulo: Anjo Sem Asas, Anjo Sem Lei


Num momento de frieza, subi em cima da cama e amarrei a corda no ventilador desligado. Sorri para a câmera e tive uma gargalhada de como resposta.
Mas até que ponto eu jogaria? Lembrei-me então do sangue e de tudo o que ele me disse outra vez. Se aquele era meu último quarto de hotel, se assim posso dizer, por que não olhar meu assassino olho no olho? Talvez fosse esta a minha última chance.
- É uma pena que não o faça com as próprias mãos, seria uma grande honra. - eu precisava atraí-lo para o quarto.
- Teremos muito tempo para isso, . Sim, eu não acredito em seu suicídio. - ele foi frio, como sempre.
estava voltando ao topo do jogo, e eu não podia deixá-lo sobre o controle das coisas. Precisava dar um jeito de fazê-lo entrar naquele quarto.
- Provarei que está errado, querido. - subi em cima da cama, colocando a corda em meu pescoço. Estava a um salto da morte. Joguei-me.
Enquanto tudo ficava escuro, a porta se abriu e vi um par de olhos surgir. Antes que a morte me levasse, sim, ele mentiu outra vez: “Se não o fizer, irei até aí e farei por ti.”

***


Abri os olhos, ainda tonta. Agora no colo dele, meu sequestrador e salvador: . Dividíamos o mesmo ar, enquanto seu nariz tocava o meu — próximos como num beijo.
- Sou seu anjo. - ele sorriu levemente, apenas com o canto da boca.
- Anjo negro... - sussurrei.
Enquanto eu respirava com dificuldades, ele aproveitou para amarrar-me sobre uma cadeira. Colocando outra diante de mim para que a todo momento nos olhássemos olho no olho. Janelas e portas fechadas.
- Não sabe o quão bom é ter nossos corpos próximos novamente. - ele disse sem demonstrar emoções.
- Por que eu? – questionei-o, deixando que uma lágrima escorresse pelo meu rosto.
- Por que eu teria critérios de escolha? Ou se acha melhor ou pior do que qualquer outra que eu escolhesse? Apenas foi você, . - sequer piscava os olhos, como se o meu temor fosse o seu prazer. - Mas fique tranquila, agora sei que está preparada para saber de tudo... - ele colocou uma fita por sobre minha boca e soltou mais uma de suas risadas sarcásticas. Eu estava a um salto da verdade.


7º Capítulo: Fatos não ditos, tornam verdade absoluta

ajeitou-se sobre a cadeira diante de mim e suspirou aliviado — talvez porque finalmente revelaria o segredo pelo qual eu lutei durante todo esse tempo. Tempo que sequer pude contar serviu apenas de obstáculo para que tudo se tornasse um pouco mais desesperador.
Durante uma quantidade significativa de tempo — novamente: que mal pude contar — ficamos apenas a nos observar. Lágrimas correndo por minha face e escorregando para dentro da fita, até salgar minha boca. A expressão pensativa dele, como a de quem procurava por um melhor caminho para tudo o que havia de vir.
- Mesmo com lágrimas no rosto, és linda... - disse ele, sem demonstrar qualquer emoção. – Linda, mas solitária. Durante todo o tempo em que estive lhe observando, nenhum parente ou amigo viera te visitar. Conto nos dedos as noites em que não deitaste em sua cama por estas serem escassas, pois tudo em sua vida sempre foi apenas você. – deu uma pausa. - Não seria mais fácil para mim jogar com alguém assim? Pois foi mais fácil e muito mais prazeroso.
levantou-se da cadeira e ajoelhou-se diante de mim, seguindo a direção dos meus olhos:
- Está vendo aquela janela? Sim, era dali que eu a observava, mesmo antes de tê-la como meu objetivo. Nós somos tão íntimos quanto sempre imaginou-nos ser... - ele sorriu, de uma forma que eu já estava acostumada. - Até que um dia eu cansei de jogar sozinho e precisei buscá-la.
O cara dos olhos encostou suas mãos em meu rosto, secando as minhas lágrimas e tocou seu nariz no meu, como quando se tornou meu salvador:
- Às terças-feiras assistia a comédias românticas apenas para passar a dor. Nos sábados fugia de casa, como se buscasse algo ou alguém que a completasse, mas de que adiantava se no domingo voltava ainda mais sozinha e faltando-lhe peças de roupa...? Eu conheço a mais do que ela mesma, não é?
fez uma cara desgostosa e suspirou como se tudo o que tinha dito não fosse o suficiente. Levantou-se e caminhou em círculos diante de mim:
- Se lhe é prazeroso saber, nenhuma jogou como você. Mas antes que disso eu soubesse, foi tudo tão normal, digo, o sequestro. - apoiou as mãos sobre meus ombros, abaixando-se até a altura de meus ouvidos. - É uma grande pena que não se lembre de mim, pois eu lembro-me muito bem quando estive com você... Toquei sua campainha, ainda indeciso quanto o sequestro. Você atendeu de roupas íntimas, sedutora — confesso — como se não se importasse com a minha presença. Apresentamos-nos formalmente como qualquer vizinho e, finalmente, descobri seu nome: .
Por alguns instantes ele desapareceu de minha vista do quarto e o silêncio voltou a marcar presença no local.
- Aqueles poucos minutos entre o fechar da porta e o deitar-se sobre a cama, suficientes para que eu bolasse algo, algo bem simples por sinal. Eu sabia que você beberia da minha água, era isso que sempre fazia, não é mesmo? Desmaiada, não foi tão difícil levá-la até minha casa. Tive de lhe vestir uma camisola para que se alguém nos visse, eu tivesse uma desculpa. - ele franziu a sobrancelha. - E não é que alguém sentiu sua falta? Durante esse tempo eu saí de vez em quando para não causar suspeitas, e não é que me perguntaram se sabia de seu paradeiro? Esses vizinhos, não? Mas fique tranquila, eu os avisei que estava de viagem.
voltou a sentar-se na cadeira a minha frente e outra vez ficamos nisso: olhares e palavras mudas.


8º Capítulo: Uma luz para lugar nenhum

E quando ele finalmente se cansou do silêncio, já passados alguns instantes, interrompeu-o sem escrúpulos.
- Mas a viagem está no fim, não é mesmo? - esperou minha resposta, um ato de sarcasmo diante das minhas péssimas condições devido à fita que ele próprio havia colocado para tapar minha boca. - Finalmente senti-me saciado, acho que atingi o meu objetivo...
Então seus olhos adquiriram um brilho intenso, como se toda a luz do lado de fora do quarto refletisse, de alguma forma, diante daquele globo azul.
- Chegou a se perguntar o motivo de todo instante referir-me a este local como um quarto de hotel? - sorriu com o canto da boca, em um gesto dominador. - Afinal, o que isto mudaria se de qualquer maneira não poderia sair? - ele insistiu, ansioso, como se de alguma forma eu pudesse respondê-lo.
A expressão facial de foi de dominante a dominado — por certa revolta — misturada com excitação.
- Este lugar é como um quarto de hotel. É um lugar de passagem... - tornou a ficar em silêncio, como uma pausa para meu entendimento.
Numa conversa sem palavras, ele ajoelhou-se diante de mim mais uma vez e numa compaixão até então desconhecida, arrancou a fita de minha boca. Respirei ofegante e aliviada, terminando o ato com um sorriso forçado. Fomos da água para o vinho, ou vice-versa.
tirou o cabelo de meu rosto, dessa vez sem mostrar os dentes, e encostou sua testa na minha, de forma que eu sentisse sua respiração. Vi-me obrigada — por mim mesma — a tocar seus cabelos, adentrando meus dedos um a um nos fios negros do garoto, que sorriu com um simples olhar após uma leve piscadela com ambos os olhos.
- Meu anjo negro... – finalmente pude dizer algo, enquanto meu sequestrador e anjo, respondeu com apenas um passar de língua por sobre os lábios, como um tique.
Num momento inconsequente, como se nada mais importasse, vi minhas mãos — quase que inconscientemente — tocarem a sua cintura e em seguida puxá-lo em minha direção.
No início o senti evitar, mas depois de mais um olhar de desejo, ele encostou — levemente — seus lábios nos meus. E antes que eu ao menos fechasse os olhos, ele recolocou a fita em minha boca, dando mais uma de suas gargalhas sarcásticas e insuportáveis. A última coisa que eu iria ouvir vindo dele.

Tiro.


Epílogo


O quarto fechado em um cenário claustrofóbico.
O barulho constante da dor.
A sede por prazer dada como saciada...


Os olhos da garota foram se fechando lentamente com a ajuda de seu seqüestrador e anjo. Enquanto ele, numa cena confusa de compaixão, lamentava o que havia causado.
Numa mistura inconsistente de dor e prazer, ele finalmente havia deixado-a partir.
- Sim, , eu sou seu anjo negro. - ele sussurrou no ouvido da vítima e amante, agora morta. - E nunca poderia levá-la para a luz...
ficou de pé. Arrumou a jaqueta de couro e em seguida alisou os longos fios de seus cabelos , num ato de tranquilidade.
Sorriu para si mesmo, provando mais uma vez que nada havia fugido de seus sádicos planos. Sacou uma chave do bolso da calça e abriu a porta, saindo do quarto e indo direto para um novo começo de jogo que nunca acaba.
Caminhou lentamente até a porta de entrada do seu lar — para os demais, prisão. Passo a passo no que para alguns foi, mesmo que não soubessem, o corredor da morte.

Finalmente, abriu a porta.
pagaria para ver a cena na qual o sedutor rosto de fora tomado pela surpresa. Em que seus olhos eram reflexos de alguns policiais e seus devidos carros de polícia.
Paralisado diante da porta de entrada, ele apenas levou suas mãos sujas em direção à cabeça e em seguida foi rendido pelos policiais.
Agora, enquanto o colocavam as algemas, era ele quem estava submisso.
foi guiado até o carro da polícia:
- Não vão me dizer por que estou sendo preso? - perguntou.
- Você sabe... Sonegação fiscal. - responderam-no.
Ao mesmo tempo em que um dos carros da polícia levava à delegacia e o rosto do seqüestrador estampava mais um de seus sorrisos com o canto da boca, ouviu-se um dos policiais gritar ao fundo:
- Há um corpo aqui!


FIM




N/A: The Last Hotel Room foi a fic que escrevi de forma mais intensa, foi como se eu realmente vivesse os personagens. Mas se foi como um tiro, ou tão rápido quanto, sinto muita falta de me sentar e compor isso, de amar o meu sequestrador. Fico muito feliz por aquelas que acompanharam e toda energia positiva que me mandaram em comentários, perguntas no ask e mensagens no twitter. Agora é realmente o fim, ou talvez o começo de uma continuação. E como sempre deixo-lhes uma última frase, para que possam saborear como quiserem e viajar tão longe quanto eu para o futuro do nosso garoto malvado agora nas mãos dos policiais... XOXO



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Nota de Beta: Se virem algum erro de português/script/HTML, não usem a caixinha de comentários, me avisem por aqui: nellotcher@hotmail.com


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