Before You Heard My Whisper


Escrita por: Ray
Betada por: Isabela H.


O corpo, quando dominado pelo álcool, pode ser perigoso a qualquer ato, por mais ingênuo que pareça. Neste caso, o corpo dominado pelo álcool era o meu. Completamente desinibida juntei-me às outras colegas da faculdade e decidi que queria ser feliz nos braços do moreno musculoso que vez ou outra soltava um sorriso nada inocente para mim. Tudo era alegria. A música boa, o copo cheio, os homens e a leveza do álcool que fazia o salto parecer uma pantufa.
- Eu vou te levar para casa hoje. – o moreno disse perto do meu ouvido, gargalhei e dei a negativa com o dedo indicador, ele sorriu e me beijou. Interrompemos o beijo quando Susy gritou.
- O que foi? – perguntei assustada.
- Aquele cara... Aquele cara levou a Tracy à força!
- Como assim? – fiquei tonta. – Você conhece aquele cara? – o moreno que antes estava pendurado nos meus lábios agora ria da situação e fez pouco caso da minha pergunta. – Eu falei com você! – o empurrei pelo peito e no mesmo instante ele veio para cima de mim, furioso. Depois disso, tudo ficou preto.

***

- Preciso contar de novo?
- Sim, precisa. Eu não acredito que fiz essas coisas.
- Estou sendo generoso com a minha visão masculina sobre os fatos, ok?
- Puta merda...

Acordei e permaneci deitada na cama até acostumar com a claridade do ambiente, até minha cabeça parar de girar, até aquelas pessoas pararem de falar, até... Até perceber que não estava na minha cama. A tontura intensificou quando pulei da cama e então respirei fundo até sentir que podia andar sem cair logo em seguida. Antes de abrir a porta observei rapidamente que estava com a mesma roupa do dia anterior, liguei o modo foda-se e saí do quarto. Andei a procura das vozes que me acordaram e encontrei Susy tomando café da manhã com mais três caras.
- Finalmente! – Susy disse. Ao menos ela também ainda estava com a roupa do dia anterior. Os três caras me olharam e tudo o que fiz foi colocar a mão na cabeça e variar o olhar entre eles.
- Oi.
- Bom dia. – eles responderam sorridentes.
- Ray, esses são nossos colegas: , e . – Susy apontou para cada um.
- Oi. – repeti a fala anterior e todos riram.
- Dormiu bem? – um deles perguntou.
- Sim.
- Quer tomar café?
- Quero.
Apesar da preocupação e ansiedade para saber quem era aquela gente, de onde Susy os conhecia e como paramos ali, eu me juntei a eles para tomar café. Entre uma xícara e outra fui devidamente apresentada aos meninos, descobri que Susy foi vizinha de um deles, descobri que eles estavam no camarote ao lado do nosso e nos salvaram dos idiotas que só queria tirar proveito do nosso estado alcoolizado, descobri também que um deles, , foi atrás de nossa colega e conseguiu tirá-la dos braços do babaca que a levou sem consentimento, descobri que eles eram queridos e gentis, senti no coração que eram homens bons e tal sensação permitiu que uma conversa gostosa rolasse durante a manhã inteira.
- A conversa está ótima, adorei vocês e tal, mas eu preciso ir para casa. – tentei finalizar a conversa, pois apesar da companhia agradável eu sabia – e sentia – que estava fedendo e precisava urgentemente de um banho gelado para lavar todo o pecado da noite anterior.
- Fiquem para o almoço, o é o melhor cheff desse país! – disse com empolgação e me olhou.
- Adoraria, mas precisamos mesmo ir embora, não é, Susy?
- É... Precisamos. – ela concordou desanimada.
- Não tem problema. Fica o convite para voltar outro dia. – falou olhando para mim.
- Claro. – respondi com um sorriso tímido e todos perceberam.
Saímos da casa com os nossos sapatos nas mãos e a promessa de que voltaríamos. Claro. O cara que eu conheci há três horas já queria cozinhar para mim.

***

Coisas que esperamos durante anos, sonhamos diariamente e desejamos da maneira mais intensa possível não acontecem quando queremos, mas sim quando precisamos. Ao longo da adolescência desejei ter um namorado especial, alguém que tivesse um pouco das qualidades mais admiráveis num homem, alguém paciente e que estivesse disposto a abrir o coração para mim. Eu queria muito, mas não precisava e por essa razão não encontrei. É demais imaginar um homem e simplesmente querer que ele se materialize. Alguns namoros e rolos provaram que diante do meu nível de exigência eu ia morrer solteira, até então eu estava bem e já tinha aceitado meu destino. Até então. Até o dia em que conheci , descobri que ele e seus amigos me livraram e minhas amigas de uma situação perigosa e ainda deixou em aberto um convite para jantar. Até esse bendito dia. E, desta vez, eu precisava.
foi adorável em todos os aspectos imagináveis, deu um jeitinho e conseguiu meu número de celular e iniciou uma conversa por sms. Eu estava com o coração aberto e despreocupada demais para sentir medo da aproximação de . Justamente por não esperar nada, me ofereceu uma série de coisas que eu desejei por muito tempo, mas que estavam esquecidas dentro de mim diante da dificuldade de encontrar verdade em uma pessoa.
- Eu sei que você pode fazer isso por mim... – murmurou e eu ri.
- Às vezes eu não suporto esse seu típico drama. – ele devolveu a risada.
- Não custa nada perder um dia de aula e assistir um show comigo.
- Custa muita coisa! Mas tudo bem, eu vou e você para de encher o meu saco, ok?
- Feito.
Duas horas depois de aceitar o convite para sair com um ingresso em meu nome foi deixado na portaria do meu apartamento. Era terrível admitir que eu estava ansiosa para sair sozinha com ele, uma vez que até então tudo se resumiu em mensagens, ligações e algumas festas em comum que inviabilizaram uma aproximação física, mas a verdade era que além da ansiedade eu precisava lidar com a vontade de vê-lo.
- Que show foda! – falou alto em meu ouvido e eu concordei empolgada. A mão direita dele segurou minha cintura e me guiou para fora do camarote, em seguida subiu para a altura dos meus ombros e lá permaneceu até chegarmos ao carro.
- Os caras são ótimos! – peguei o cinto para passar pelo corpo, mas interrompeu meu gesto. Sustentei o contato visual a fim de entender o motivo para não colocar o cinto e explicou assim que puxou meu rosto e, finalmente, me beijou pela primeira vez.

***

- Babe, acho que esqueci o carregador do meu celular no escritório… - girei o corpo para observar a sala mais uma vez à procura do meu carregador. Não encontrei. - Vou usar o seu, onde está?
- Mochila. - ele respondeu simplesmente, vidrado demais na TV à sua frente.
Andei pelo apartamento à procura da mochila e encontrei, no mínimo três delas espalhadas entre os cômodos, avistei mais uma em cima da cama e lembrei que era a queridinha do momento. Abri todos os compartimentos da mochila à procura do carregador e, para minha surpresa, encontrei uma caixa da Tiffany & Co. Olhei para a porta do quarto apenas para confirmar que estava sozinha e então dei pulinhos silenciosos como se retardada fosse. A pequena caixa era, evidentemente, de um anel. Seria esse anel um presente? Para mim? Apenas um presente ou um presente que representava um pedido? Meu corpo estava possuído pela euforia e eu queria gritar de felicidade.
- Encontrou? - a voz de causou um susto tão forte que, sem querer, derrubei a caixa no chão. Ele me olhou com a expressão surpresa e em seguida desceu o olhar para o chão. Ficamos em silêncio por alguns segundos e eu não consegui movimentar um músculo sequer.
- Desculpa, eu estava procurando o… - tentei iniciar uma explicação para aquele momento tão estranho e fui interrompida.
- Tudo bem. - ele disse simplesmente. - Eu estava nervoso demais para fazer isso do jeito tradicional. - ele soltou um sorriso. Meu corpo, apesar do susto, continuava eufórico. Devolvi o sorriso e esperei o próximo passo. - Eu preparei uma surpresa para o final de semana, mas confesso que prefiro a cena que está à minha frente. - recolheu a caixa e se aproximou. Coloquei minhas mãos no peito, pronta para ter um ataque cardíaco. - Eu prefiro a sua naturalidade e sei que você não ia conseguir esperar até confirmar a suspeita, certo?
- Uhum. - respondi automaticamente e sorriu de novo. Ele parecia tão calmo e despreocupado que naquele momento tive medo da situação ser uma piada ou algo do gênero. Não era.
- , você quer casar comigo e ser no papel o que você já é no meu coração? - abri um sorriso que provavelmente mostrou minha arcada dentária inteira e aceitei com um aceno de cabeça desesperado.
- Sim. Sim. Sim. Eu quero. Quero muito. Quero hoje e sempre. Sempre quis. Meu Deus! - vomitei as palavras, enquanto colocava o anel em meu dedo anelar da mão esquerda, em seguida olhou em meus olhos e, mantendo o contato visual, beijou minha mão.
- A surpresa era viajar com você e fazer o pedido em um lugar especial, mas o lugar especial foi esse quarto. – riu. – Vou manter a viagem e lá eu te peço em casamento de novo.

***

Mais um show chegava ao fim e como de costume segui até o camarim para esperar e os outros meninos. Fiz um lanche e conversei com pessoas da equipe até ouvir os gritos e agitação já conhecida.
- Vocês são demais! – recebi todos com um abraço e não me importei com o suor e cheiro desagradável.
- Eu sou demais, ! – mandou um beijo. – Todas as garotas da platéia estavam aqui para me ver, ok? Ou você acha que seu marido é tão desejado quanto eu? – revirei os olhos em resposta ao egocentrismo de .
- Na real todas estavam aqui para ver nosso beijo, não é, ? – provocou.
- Vocês são insuportáveis, essa é a verdade! – dei de ombros e Paulou me olhou curioso. – Ok, você não é insuportável.
- Pessoal, desculpa interromper, mas um dos patrocinadores do evento gostaria de conhecê-los, é possível?
- Claro! – respondeu.
- Ok, vou buscá-lo.
Poucos minutos depois um homem alto e com cabelo grisalho entrou no camarim com uma criança de colo e uma garotinha ao lado, as duas usavam camisetas da banda e sorriram ao ver os meninos. Eu não gostava de participar desses encontros para não misturar as coisas. Seja quem for, a pessoa estava ali para ver e falar com meu marido e seus amigos, não comigo, então saí do camarim e fui para a sala ao lado aguardar o término do encontro. Minutos depois bateu na porta e me chamou para ir conhecer as filhas do patrocinador.
- Amor, você sabe que eu não gosto de misturar as coisas.
- Sim, eu sei! – ele disse. – Por favor, só um minuto. – ele implorou com o olhar. Típico. Vencida, acompanhei de volta ao camarim. - A mais velha te adora. – Paulou falou baixinho perto do meu ouvido.
- Sério? – ele apenas concordou.
- Oi, Anne, essa é a que você queria tanto conhecer. – agachou para ficar na altura da menina. Anne subiu o olhar e abriu um sorriso para mim, pega de surpresa apenas devolvi o sorriso. – Ray, a Anne queria te dar um abraço. – falou de um jeito grosso, como se o desejo da menina fosse óbvio. Sem saber direito o que fazer, por fim, agachei e deixei que Anne envolvesse os pequenos braços em meu pescoço.
- Você é muito bonita e quando eu crescer quero ganhar um anel de noivado igual o seu. – ela apontou para, agora, aliança de casamento e sorriu.
- Você vai ganhar um ainda mais lindo! – disse sorrindo e acariciou o cabelo de Anne.
- Filha, vamos?
- Já? – Anne fez bico.
- Sim! Os meninos precisam descansar para fazer mais shows como o de hoje. – o pai explicou de um jeito carinhoso. Anne concordou e junto com o pai e a irmã ainda de colo, se despediu de todos.
- Que crianças adoráveis. – observou.
- Até fico com vontade de ter uma, mas passa. – riu.
saiu do camarim para recolher suas coisas, ele não quis minha ajuda e quando estava pronto preferiu chamar um táxi para não voltar de ônibus com os demais. trocou poucas palavras comigo até chegarmos no hotel e não fez questão de olhar nos meus olhos.
- Ok, agora estamos no quarto e eu espero que você explique o que aconteceu para decidir, de uma hora para outra, me evitar.
- Não estou te evitando. – ele respondeu simplesmente. – Não quero conversar agora. Vou tomar banho e dormir.
- Eu quero conversar agora.
- Não gostei do seu descaso com a Anne. – finalmente olhou em meus olhos e então percebi que ele estava chateado. – Você não foi simpática, não demonstrou o minímo carinho e fez questão de agir de modo que eu percebesse que estava ali por obrigação.
- Eu avisei que não queria ir e você insistiu. – fui sincera e rolou os olhos.
- Eu pedi para você dar um oi, um abraço em uma criança, não pedi para levá-la para nossa casa. Você não pode simplesmente não querer fazer algo que te peço, inclusive quando meu trabalho está envolvido.
- Tudo bem, desculpa.
- Não precisa pedir desculpa. O que eu posso fazer se você tem alergia a crianças? – me olhou pela última vez e foi tomar banho. Deixei que ele se preparasse para dormir e pensei que deveria tentar melhorar o clima quando deitasse na cama, mas naquela noite, pela primeira vez, deitou de costas para mim.

***

- Que sutiã é esse? - perguntou quando passou por mim no corredor.
Abri um botão da camisa e observei que era o sutiã de sempre, aquele confortável que toda mulher tem e que usa ao menos 3 vezes na semana. Sorri comigo mesma, por vezes era muito observador. - É o de sempre.
- Seus peitos parecem maiores. - ele aproximou o rosto do meu colo e soltou uma risada safada.
- Estão iguais, meu querido.
- Maiores. - ele provocou.
Saímos para trabalhar e ao longo do dia fiquei com o comentário de na cabeça. Meus seios não estavam maiores, mas era tão estranho ele fazer esse tipo de comentário sem que em seguida a observação virasse piada. Incomodada com a proporção que um comentário bobo criou resolvi olhar eu mesma e tirar minhas conclusões. Fui ao banheiro, abri minha camisa e observei meu tronco em frente ao espelho. O sutiã preto básico, até então meu favorito, moldava meus seios de forma perfeita e era o queridinho para o dia-a-dia de trabalho e estudos. Virei o corpo e observei a lateral do meu tronco, analisei o volume dos seios por esse ângulo e cheguei a conclusão de que tudo estava normal. estava louco ou o comentário foi com a intenção de sugerir que ele queria meus seios maiores? Ou eu estava gorda? Silicone? Nunca conversamos sobre isso e, sinceramente, eu não tinha a menor pretensão de passar por uma intervenção cirúrgica para aumentar meus seios, uma vez que estava muito satisfeita com o tamanho natural. Anotei mentalmente o tópico para conversar com assim que chegasse em casa.

- Eu quero pizza. - anunciou.
- De novo, amor?
- Sim, todos os dias.
- Não é bem assim… Você não quer comer outra coisa? Tem que ser pizza? - tentei negociar.
- Uma pizza para mim e comida natureba para você, que tal? - ele provocou. Sorri vencida.
- Não precisa, pode ligar e pedir pizza para nós. - certo é que eu não posso me dar ao luxo de acompanhar meu marido em todas as refeições que ele faz pelo simples fato da maioria dessas refeições ter origem em fast food. Para nós, jovens casados, era incomparavelmente mais prático ligar e pedir a comida que desse vontade, comer em casa, transar e ir dormir. O problema é que na condição de mulher essa rotina culinária não faz bem e eu precisava estabelecer uma rotina saudável para mim, sem render as provocações de , caso contrário em pouco tempo teria que doar todas as minhas calças. Esperávamos a pizza deitados no sofá vendo TV e lembrei do tópico mental que anotei anteriormente.
- Amor, eu achei estranho o comentário que você fez sobre os meus seios. - iniciei a conversa e sorriu.
- O que teve de estranho?
- Você falou aquilo do nada e eu conferi, está tudo igual. - apontei para meu colo.
- Não está. - ele teimou.
- Eu engordei? - perguntei já em tom de desânimo e riu.
- Mulheres… - ele suspirou com um sorriso nos lábios. - Você não engordou, amor.
- Não sei, eu fiquei com isso na cabeça e quero saber o que originou o seu comentário.
- Tira a blusa. - ele disse simplesmente, olhei sem entender e antes que eu respondesse ele tirou minha blusa. pousou as duas mãos em meus seios e os segurou.
- Eu os conheço bem melhor que você e, sim, eles estão maiores e, não, você não engordou. - rolei os olhos com o argumento. - É sério, eu sei exatamente o espaço que ele ocupam na minha mão. Talvez esteja inchado, eu não sei. - em seguida, beijou cada um dos seios e ajudou-me a colocar a blusa de volta. Fiquei quieta e voltamos a assistir TV até a pizza chegar.

***

No trabalho eu não conseguia lidar com a minha própria presença. Eu estava insuportável. estava fora de casa há três dias e ficaria por mais dois, até terminar uma curta sequência de shows no interior. Pedi comida japonesa para comer no escritório só para não estragar o dia de outras pessoas com o meu mau humor. A secretária trouxe a comida até minha sala e aquele foi o ponto de felicidade do meu dia. Arrumei o hashi, shoyo e meus olhos brilharam diante do temaki e porção de uramaki. Indecisa sobre o que comer primeiro optei pelo temaki e logo após a primeira mordida senti meu estomago revirar. Bufei de raiva e continuei comendo. Vencida, empurrei a bandeja para longe e fui ao banheiro jogar fora o pouco que consegui comer.
- Não pode ser…

***

chegou de viagem no final da tarde e foi me buscar no trabalho para jantarmos juntos. Depois de muitos abraços, beijos e mordidas conseguimos iniciar uma conversa para decidir o que comer.
- Estou louco para comer sushi. Fiquei com vontade durante a viagem, mas preferi esperar e comer com você. - murchei com a empolgação do meu marido e ele percebeu. - Você quer outra coisa?
- Não, eu também estou com vontade de sushi. - ele achou estranho, mas não questionou. Seguimos até nosso restaurante favorito e fez nossos pedidos. Conversamos sobre a viagem dele, um pouco do meu trabalho e eu sentia um pequeno desconforto, mas mantive a postura. Até a comida chegar. Fomos servidos e a mesa foi ocupada por variedades da culinária japonesa, involuntariamente coloquei a mão na boca, engoli seco e respirei fundo. começou a comer de um jeito enlouquecido e que eu sempre acompanhei, mas hoje não.
- O que foi? Você está branca! - falou alto e soltou a comida no prato.
- Estou bem, amor. - forcei um sorriso e peguei um sashimi. Enjôo filho da puta. Era demais para mim. Saí da mesa e andei rapidamente até o banheiro. Quando voltei a mesa já estava vazia e me olhava preocupado.
- Vamos continuar comendo. - falei como se fosse óbvio.
- O quê? Nunca vi expressão de nojo igual a sua. - revidou. - Vamos ao médico, você não está bem.
- Médico? - quase gritei. - Estou ótima, não vou a lugar nenhum.
- Vai sim. - disse de forma autoritária e arrastou meu corpo para fora do restaurante.
Já no carro tentei convencer que eu realmente estava bem, não era necessário ir ao médico, expliquei que durante os dias em que ele ficou ausente não me alimentei direito e trabalhei muito, mas agora que ele voltou a minha rotina também voltaria ao normal e com isso consegui convencê-lo a ir para casa.

***

- Eu gostei dessa, pode pegar no número quarenta, por favor?
- Claro, já volto. - Aguardei poucos minutos e logo estava no provador. A calça entrou perfeitamente até o meu quadril, ao chegar nessa região tive dificuldade em subir a calça. Respirei fundo e balancei a cabeça em negação. Encolhi a barriga e tentei novamente. Consegui. Ficou horrível, péssimo e o zíper podia estourar a qualquer momento. Saí do provador completamente frustrada e a vendedora perguntou se eu tinha gostado, neguei e entreguei a peça de roupa, ela perguntou se eu queria em outra numeração, eu disse que não e sai da loja.
A caminho de casa parei na padaria para comprar algo para comer mais tarde com . Estava tão desgostosa da vida que peguei apenas o necessário e fui para casa. Guardei o que havia comprado, coloquei pijama e deitei na cama para assistir qualquer coisa que pudesse tirar da minha cabeça a cena horrível que foi provar uma calça e a mesma não entrar. Eu nem estava fazendo drama. A verdade é que eu fui comprar calça porque as minhas estavam apertadas e tudo isso era tão frustrante. Estava tão frustrada que descontei o sentimento em um pacote de cookies e acreditei que isso faria eu me sentir melhor. O pacote estava quase no final e antes de termina-lo senti repulsa. Rolei os olhos e respirei fundo. Tentei segurar o enjoo, mas não tive sucesso. Corri até o banheiro, joguei tudo para fora e fiquei tonta. Deixei algumas lágrimas caírem, respirei fundo e quando terminei ouvi um barulho próximo. Era parado na porta do banheiro. Droga. Ele tinha o olhar assustado e antes que eu falasse qualquer coisa ele se aproximou para segurar meu cabelo, alcançou uma toalha para limpar minha boca e ajudou-me a levantar.
- Vou te ajudar aqui e nós vamos até a farmácia comprar um teste de gravidez.
- Não. Não. Não, por favor. - choraminguei igual criança e olhou em meus olhos.
- Eu sei que você não quer, mas sabemos que está acontecendo. - colocou meu cabelo atrás da orelha. - Seu corpo está dando sinais todos os dias e nós precisamos confirmar.
saiu do banheiro, me deixou sozinha com meus pensamentos e medos. Eu estava completamente atrasada e apesar do esforço não consegui lembrar quando fora minha última menstruação, meus seios estavam inchados, minhas calças não entravam e além de tudo eu sentia enjoos ao ver comidas que costumava amar. Todos os sinais estavam ali. Quem eu queria enganar? Quando criei coragem para sair do banheiro entrou no quarto e entregou um teste de farmácia.
- Você foi e já voltou? - perguntei incrédula.
- Sim. - ele respondeu com um leve sorriso. - Vai lá. - apontou o banheiro. Concordei e tranquei a porta atrás de mim. Fechei meus olhos e contei até dez. Duas vezes. Li o rótulo com atenção e ri da minha inexperiência. Repassei as orientações mentalmente, rasguei a embalagem e fiz o que precisava. Esperei.
- E aí? - a voz de me despertou.
- Calma. - olhei o relógio e faltava um minuto para o resultado.
Sei la.
Um minuto era o tempo que me separava da notícia que eu já sabia: estou grávida. Gravidissíma. Nunca estive mais grávida. Quão assustador isso pode ser? Eu nem quero estar grávida, ser uma mulher grávida. Eu nem...
- Amor?
- Oi?
- Pronto?
Abri a porta do banheiro e sentei sob a tampa do vaso sanitário. entrou rapidamente e procurou meu olhar.
- E aí?
- Não sei, primeiro você olha e me conta. – abaixei a cabeça e esperei. Um silêncio constrangedor tomou conta do ambiente e olhando de canto percebi que nem se mexeu.
- Tudo bem amor, eu sei que você não quer saber, mas isso é muito importante para mim. Será que você pode fazer um mínimo esforço para não demonstrar tanta infelicidade? Ter um filho não é o fim do mundo. – ele aumentou o tom de voz, nervoso. – A gente se ama tanto... Imagina um bebê com um pouquinho de nós dois... – diminuiu o tom de voz. Meu coração doeu. – Você não quer ter uma menina para brincar com ela, enfeitar e fazer dela a sua bonequinha? Ou até mesmo um menino para você encher de roupas estilosas e ensina-lo a tratar bem as mulheres. Você não sonha com isso? – fiquei quieta. respirou fundo. – Eu nunca te pedi para abrir mão do que você queria, nunca te forcei a fazer nada, mas hoje... – ele agachou e ficou de frente para mim, levantou meu rosto e segurou minhas mãos. – Hoje eu vou pedir para você abrir a mente e independente do resultado aceitar a realidade. Você, muito mais do que eu, sabe que um dia isso vai acontecer e eu juro que não importa o tempo que demore, vai ser o melhor presente que um dia você pensou em me dar. – beijou minhas mãos. – Mas se esse dia for hoje... Melhor ainda. - Ficamos em silêncio e dessa vez não foi constrangedor.
- Tudo bem. – quebrei o silêncio, sorriu. Tateei a pia até alcançar o teste, quando consegui o fechei na mão e coloquei entre nós dois. Trocamos um olhar carinhoso, então, abri minha mão e visualizamos o positivo.
- Parabéns, papai. – disse entre lágrimas.
não falou, apenas respondeu a frase com um sorriso largo e muito, muito, muito feliz, acompanhado de lágrimas também de felicidades.
Tem gente que parece que nasce só para fazer a gente mais feliz.

FIM



Nota da autora: Oi amadas! Fui convidada pela equipe do FFOBS para escrever uma shortfic para o especial retorno do site. A proposta era escrever uma short 10 anos depois do final de My Whisper, mas... Eu ainda não terminei My Whisper. HÁ! Então pedi para escrever com o período anterior, ou seja, 10 anos antes. O objetivo foi mostrar o relacionamento antes do capítulo 1 de MW, apresentar informações que vocês não tinham e, com isso, entender melhor o relacionamento e os personagens. Gostaram da surpresa? Espero que sim! Obrigada equipe do FFOBS pelo convite, fiquei muito feliz em contribuir um pouquinho para esse especial tão lindo. Sucesso e vida longa ao site!
Contato: twitter (@rhaay)
Fanfic My Whisper: ffobs/m/mywhisper.html
Grupo da My Whisper: https://www.facebook.com/groups/mywhisper



comments powered by Disqus


Qualquer erro nessa atualização e reclamações somente no e-mail.



TODOS OS DIREITOS RESERVADOS AO SITE FANFIC OBSESSION.