El Tango de Roxanne


Escrita por: BJ
Betada por: Adriele Cavalcante




[N/A: coloquem para carregar a música El Tango de Roxanne. Quando começar a cena, é só reproduzir. Boa leitura (:]

Sei, e assumo, que estou fazendo a coisa errada. Este é, contudo, o modo mais apropriado de dizer a verdade. Aqui, agora, tento contar o que ocorreu a mim, o que se apoderou de mim como o demônio do pecado, na forma de um lindo anjo negro, envolto do mais atraente perfume. Nego, renego, e resisto a este pecado.
Mas algo me puxa a ele novamente, com o mais leve toque de porcelana. E cego estou novamente.
E louco fico cada vez mais.
Pois sei que, não importa para onde eu corra, todos os caminhos voltarão a ela:
.
E isso me enlouquece.
Seu nome aqui é Bloody Diamond, pois sempre se apresenta com lábios rubros como a maçã envenenada. Trata-se de uma bela metáfora. É, de fato, o fruto proibido.
E agora, percebo como já é tarde para qualquer novo ato de negação. Pois meu destino está traçado. Não há outro meio de tentar a salvação, pelo menos divina, do que este em que estou. Tento aqui contar a verdade, pelo menos a minha verdade, do que me trouxe ao meu fim.
era o caminho da perdição.
Mas era meu único caminho.

É uma noite fria. As ruas estão vazias. Não se engane! Não é pelo tempo, mas sim pela bela estreia no teatro local. Uma peça sobre uma jovem, jovem esta, bela como as luzes da aurora boreal, que se apaixonara por um homem que a faz usar seu talento de dança para conseguir seu sustento. A jovem então encanta multidões, inclusive um pobre aspirante a músico, que sabe que jamais poderá tê-la.
Estou parado na frente do teatro. Tiro o chapéu, procurando algum conhecido. Não encontro. Então, com um suspiro, vou até a entrada, onde dois cavalheiros aguardam. Eles abrem a porta para mim.
Mal posso esperar para vê-la. É algo que me toma, pois sei que é errado.
E fazer o errado me parece tão atraente...
Sou ator. E estou na peça. Sou, sim, o pobre aspirante a músico. Esperado, não? A maioria das coisas são. Eu sei, por exemplo, que não daria certo o que estou fazendo. Sei também que partirei da cidade a partir de amanhã, pois a companhia de teatro viaja com sua peça.
Mas irá partir sem nós. Conseguiu conhecer um homem rico, que lhe oferecerá uma nova vida.
Preciso vê-la. Uma última vez.
Estar no palco com ela não compensa a verdade.
O palco é uma farsa. No palco, as coisas terminam bem. Tudo sempre termina bem no palco, pois estão pagando. Querem ver finais felizes.
A vida é uma tragédia. E pessoas estão cheias de suas tragédias.
Querem ver finais felizes.
No palco, eu e somos um final feliz.
é uma prodígio. Tem dezessete anos, e muitos a consideram a melhor dançarina do país. Ela é, sim, incrível. Seu corpo acompanha e vive a canção. Cada mínimo movimento seu é perfeito, e não acompanha a canção.
A canção é que a acompanha.
Bloody Diamond é a música. Bloody Diamond é a arte.
Sua vida é regida por notas, e a cada dia, a cortina se ergue mais uma vez.
Corro para os camarins. Ouço meu nome ser chamado quanto mais ando, todavia, não paro.
Primeiramente porque estou atrasado. E depois, porque estou indo ao camarim da estrela principal.
Abro a porta de onde ela está. É a primeira coisa que sinto é seu perfume. É cítrico, e faz meu sangue esquentar.
Ela está de costas. Seus cabelos estão soltos, caídos por seus ombros, e lisos. No momento em que abro a porta, olha para mim, virando a cabeça em minha direção. Tem o olhar ingênuo, o que ouso dizer que me deixa cada vez mais... Mais...
– O que faz aqui? – ela questiona, incrédula. Parece também impaciente – Está atrasado.
Não consigo falar nada. Nem uma única palavra escapa por mim, até porque não consigo formular uma mínima sílaba. Estou perdido em seu vestido azul-marinho, que cobre seu corpo, brilhante, como o céu estrelado da noite em que a vi.
tinha quinze anos. Eu tinha vinte. A companhia fazia apresentações nas pequenas cidades próximas a onde ela vivia, e foi quando está jovem aspirante veio até nós para nos pedir uma chance.
Quando a vi, naquela noite estrelada, soube que sempre a desejaria, e jamais a teria.
– Sabe que será o jovem hoje – ela diz.
Sei. O ator que interpretou o aspirante em todas as outras apresentações não pôde estar aqui esta noite. Eu não era seu substituto, mas por algum motivo, o diretor da peça veio até mim pessoalmente e pediu para eu ser o sonhador aspirante a músico apaixonado por uma dançarina.
Assinto para saber que sei.
Não consigo dizer nada ainda. Ela ri, uma risada fraca, e se levanta.
– Está mudo de novo.
Por algum motivo idiota, ela acha adorável quando fico neste estado ridículo.
– Sabe que, quando subir, vai ter que ter o dom da fala outra vez, não?
– Sei.
Ela sorri.
– Pronto. Mágica feita.
Ela nunca saberá o que fala. Pois tem apenas dezessete anos, e não sabe o efeito de suas palavras. O quão elas me deixam cada vez com mais de desejo, a cada letra. Não saberá como cada vez que move seu corpo, faz todo homem desejar tê-la, e ser dela, como um escravo, para toda a vida.
nunca entenderá o que é isso, pois é jovem demais.
– Decorei as falas a tempo – digo.
– Sim, isso é bom. Será que vai ficar estático novamente e esquecê-las?
Rio, acompanhando seu sorriso. Tento fazê-la sorrir, mas raramente consigo. O contrário é mais verdadeiro.
– Espero que não.
– Seu número de canto. Sabe? Conseguiu ensaiá-lo?
Faço que sim novamente. Ela toca minhas roupas, nos ombros, e acompanha com o olhar suas mãos, enquanto elas descem por meu peito.
O toque de já esteve aqui antes. Tantas noites, tantas vezes, sob a luz do céu estrelado. Eram noites difíceis, em que a estrela principal da peça encontrava um mísero ator em um quarto, o abraçava, o tocava, o despia. Ele a despia também. Tocava sua pele macia como porcelana, e seus lábios vermelhos como um diamante sangrento, quentes como os portões do inferno, que ela provavelmente era responsável por fazê-los abrir.
Cada vez que eu tocava sua pele, era como alcançar o ápice de ser humano. Era como estar no momento mais perfeito de minha existência, em que eu era uma criatura grotesca, primitiva, implorando por ela, tendo-a, e invadindo-a como um animal. Sua voz vinha rouca até mim, em sons tão primitivos quanto meus atos. E ela me arranhava como se me odiasse.
Eu me odiava.
Cada vez que encontrava-a e a tomava em meus braços, cada vez que ela se entregava a mim, eu me odiava um pouco mais, pois via que não iríamos a lugar algum.
Cada vez mais, na calada da noite, como selvagens, eu a desejava mais, eu a consumia mais, eu a esgotava mais, e na manhã seguinte, era como o mais perfeito vazio de uma folha em branco.
Pronta para outra noite.
– Espero que o saiba.

Subir no palco nunca fui uma experiência ruim para mim. Na verdade, o personagem costuma me consumir por completo, de modo que não ajo como eu mesmo.
E não foi diferente em toda peça. Em cada ato, não era nada além de um aspirante a músico. Era meu personagem, e contracenava com . A Bloody Diamond com seu vestido azul, que não chegava até seus joelhos e não cobria seus ombros.
Assisto suas cenas em que não apareço. E ela é incrível. Cada vez que pisca os olhos, parece o momento perfeito para fazê-lo. Sou como um amador ao observar a obra-prima. E atua em sua personagem como deve atuar.
Em cena, somos a dançarina e o músico.
A raposa e a serpente.
Não há nada entre nós, além de falas e canções. expõe seu belo corpo, suas belas curvas, a cada dança.
No último ato, pouco antes do final, é a minha única cena de canto. Nesta cena, todos os espectadores estão tensos, pois o músico está prestes a desistir de sua dançarina. Ele, então, a vê com outro homem, e expõe suas emoções ao cantar, enquanto dança com sua amada uma última vez.
Antes dessa canção, as cortinas estão fechadas. já está em sua posição assim que as cortinas começam a se abrir.
O outro ator a abraça, mas ela parece querer fugir. Em movimentos lentos, ela começa, devagar, sua fuga.
A música começa. E ela começa seu tango com outro homem. As pernas se cruzando, o pescoço jogado para trás. O olhar fixo.

We'll drive you
We'll drive you
We'll drive you...


Parece estar chorando, em desespero.
Algo em mim acha que não é atuação.
é segura pelas mais, quando seu parceiro termina a estrofe, e enquanto ela joga seu corpo para trás.

Mad!

Ela volta para ele, festa vez com o olhar firme e séria, as pernas fazendo os passos brutos do tango, a mão do parceiro em sua cintura, e a mão dela em seu ombro.

Roxanne

Ela é segura por ele por uma mão, quando desce seu corpo com um joelho dobrado e o outro rígido, a mão livre caída sobre a testa em tragédia, os olhos fechados, ansiando pela fuga.

You don't have to put on that red light

Ela volta a ele, com o mesmo tom solene. Fica de costas para ele, enquanto o parceiro a segura pelos dois lados da cintura.

Walk the streets for money

Ele apóia o queixo em seu ombro, como que tentando convencê-la. Ela agora possui uma expressão ainda de ânsia por fugir, mas agora mesclada com dúvida.

You don't care if it's wrong or if it's right

Surjo em cena, do outro lado do palco, fitando a cena sem crer. Ambos olham para mim no momento em que digo a mesma palavra que o parceiro de .

Roxanne

A voz dele é rouca e um pouco embriagada. A minha é solene, grave, mas macia.
ergue o joelho da perna voltada para a plateia, agora de lado para esta, deixando sua pele à mostra, assim como boa parte de suas coxas.

You don't have to wear that dress tonight

Ela cai em seus braços, os olhos fechados, o corpo caído para trás, ele a segurando como sempre.
Ela quer cair.
Menos exclamamos ao mesmo tempo. Continuo com meu tom grave, sem acreditar, enquanto ele parece querer formar algo por suas palavras.

Roxanne

Dou passos até próximo deles, mas em outra luz.
Ela se ergue lentamente, voltando para seus braços.

You don't have to sell your body to the night

Neste verso, há uma falta de luz entre mim e eles. Tal falta logo desaparece, pois o parceiro de se vai, enquanto ela se solta e gira, caindo rapidamente em meus braços. Toco sua cintura e a trago para perto de mim, e seguro sua mão livre enquanto ela toca meu ombro.
Não deixo de olhá-la nos olhos porque não quero perder um único detalhe.
Damos passos de tango, firmes, brutos.
Pois somos firmes e brutos.
Minha voz está morta.

His eyes upon your face

A mão que estava em meu ombro acaricia meu rosto. Isso não estava planejado.

His hand upon your hand

Ela vem para mais perto. Fecho os olhos, e estou entregue.

His lips caress your skin

Ela gira e fica de costas para mim, segurando minhas mãos que abraçam sua barriga, e ambos olhamos para a plateia, sob a luz azul do holofote.
E grito, com todo ar que tenho, enquanto meus olhos marejam, e minha garganta pulsa. Ela acaricia meu rosto, como se me consolasse, mas não houvesse nada mais a ser feito.
Era verdade.

It's more than I can stand

As vozes surgem no fundo. A luz cresce, e o palco inteiro toma cor. Uma cor ruim, escura, melancólica.

Roxanne

Nos separamos, mas a seguro por uma das mãos por um breve instante, até nos soltarmos. Não quero que ela vá.
Estamos separados por poucos sentimentos, mas parecem oceanos.

Why does my heart cry?

Ela completa a tragédia, fecha os olhos e vira o rosto. Mas não me solta.
Continuo a recitar minha dor, andando até ela, que está parada. Olho fixamente para ela.
Estou cantando a verdade.

Feelings I can't fight

Chego até ela e, atrás de seu corpo, canto como se fosse um sussurro. Ela tem seu rosto abaixado, como se escolher entre os dois fosse algo terrível para ela.
Não era. A escolha foi facilmente feita.
Canto com dor. E não a toco.

You're free to leave me
But just don't deceive me


Abro os olhos para este trecho. Começo a andar de costas, deixando-a.

And please, believe me when I say I love you

A luz está fraca. Não estou mais na luz, estou nas trevas. se ajoelha ao chão, com as mãos nos olhos, enquanto um grupo de dançarinos a circunda, entoando cantos da mente dela.

Y yo que te quiero tanto, ¿qué voy a hacer?
Me dejaste, me dejaste
El alma se fue, se me fue corazón


Ela ergue a cabeça. E fica de pé. Olha para baixo e aperta os olhos.

Ya no tengo ganas de vivir, porque no te puedo convencer
Que no te vendas, Roxanne


A luz se vai por completo.
Em silêncio, não há ninguém no palco. Só há uma silhueta. Há uma silhueta na fraca luz do fundo do cenário, e é a silhueta de uma jovem dançarina. Ela está de costas, os braços erguidos, que descem desenhando seu corpo enquanto ela se enverga em queda.
Ninguém pode segurá-la.
Ela se ergue quando as luzes voltam lentamente. E fica de frente para a plateia, os braços abertos. Sem dono.

Roxanne

Erguem-na como uma rainha. Há pares de dançarinos por todo o palco, dançando seu tango. E eu, de longe, no canto do palco, grito sozinho minha dor.

Why does my heart cry?

cai nos braços dos dançarinos que a seguram.

You don't have to put on that red light

Carregam-na para o centro do palco, enquanto me ajoelho, a garganta pulsando. Estou sangrando.

Feelings I can't fight

E no centro do palco ela é deixada ao chão como se caísse, de joelhos.

You don't have to wear that dress tonight

Ela tira o cabelo do rosto enquanto os dançarinos a deixam. E ela está sozinha. Está de joelhos.

Roxanne

Ela fica de pé lentamente enquanto cantam o nome. Se ergue como uma fênix. Fraca, débil, mas viva.

You don't have to put on that red light
Roxanne
You don't have to wear that dress tonight


E ela está sozinha. Lança os cabelos para os lados, em uma briga imaginaria, em que ela é puxada pelos lados. Dança como se estivesse sendo esmagada entre duas paredes. Dança como se estivesse sem ar. Gira, os olhos fechados, as luzes piscando.
E só há .
Só existe .

Roxanne!

Exclamo com o que me resta de vitalidade, pois já estou no chão.

Roxanne!

Ela gira, estica as pernas, em seu eixo, e faz seu próprio show.
A loucura reside em seu corpo.
A insanidade veio dela.
E a dúvida, ah, a dúvida... É seu castigo.

Roxanne!

A canção acaba e está de braços abertos novamente. E só há ela.
Sempre haverá só ela.

Estou no camarim. Falta um único ato.
entra.
– Foi uma linda dança – diz.
– Você estava linda.
Ela comprime os lábios. Estou sentado na frente do espelho.
fecha a porta e posso ouvi-la trancando.
Ela está junta a mim.
Pela última vez.
Minha última chance está aqui.
– Você ouviu os aplausos. Foram para nós todos. Sua voz estava incrível.
Chamo-a para mais perto.
– Podia estar. Mas você era a estrela principal.
Ela ajoelha-se na minha frente, os olhos infantis nos meus. Aproximo-me tentando me conter.
– Algo me pareceu real naquela dança. Algo me pareceu fora do palco.
Ela pareceu engolir em seco. Desviou o olhar.
– Não vamos retratar isso aqui. Não é hora. Temos mais um ato.
Ela se levanta, mas seguro seu pulso.
– Por favor. Eu imploro. Só me diga. Preciso saber.
– Saber o quê?
Aperto os olhos e fico de pé.
– Se aquilo foi encenação.
– Você me conhece. Sou atriz. Minha vida é um filme sem cenas de comédia.
Meu sangue começa a ferver.
– Achei que tivesse percebido isso – ela é solene.
Engulo em seco. Pois sou tomado pela ira. Ela está de costas para mim, mas não soltei sua mão.
– Se foi encenação... Por que... Quando toco sua pele fina... Seu sangue corre apressado?
Toco sua pele nua do ombro. Os cabelos estão presos, e agora seu vestido é vermelho.
No último ato, sua personagem deve ficar com o músico, escolhê-lo, e continua a dançar. Pois ama a dança.
E deve-se ficar com o que se ama, correto?
Cheiro sua pele.
– Por que nega-se a olhar em meus olhos?
Toco seu queixo e viro seu rosto um pouco para mim.
– Se era encenação, os gritos, as súplicas por piedade... Eram fingimento?
Sorrio torto.
– Deste último, eu duvido.
se vira, envolvendo meu pescoço. Seus lábios estão coloridos como o diamante sangrento. Seu rosto está próximo ao meu, os olhos estão fechados, e nossos narizes se tocam. Os lábios, arfando junto a nossas respirações, não tocam os meus.
– Sabe como fazer uma mulher enlouquecer.
– Você me ensinou a levar pessoas à loucura.
Ela me beija. É feroz. Pede por isso, e retribuo, puxando-a pela cintura. E quero explorá-la como sempre exploro. A cada novo beijo, é como se tivesse um novo lugar a descobrir.
– Mostre-me meu gosto amargo – ela pede, cortando o beijo.
Considero uma autorização.
A sento na mesa ao nosso lado. Ela abre suas pernas nuas, e seu vestido vermelho possui espaço para mim. Estou entre suas pernas, e a beijo como se não houvesse mais vida além daquele beijo. Ela agarra meus braços, as unhas em minha pele, e me puxa para si. Ela anseia. Por mim. E farei isso a ela.
Ergo seu vestido e abaixo suas vestes. Ela pula para mais perto de mim, abaixando a mão para meu figurino. As calças são folgadas e sinto-a sorrir por isso. Admito que isso facilita nossa situação.
Estou apenas com minha blusa, as calças caídas no pé, quando a adentro com toda minha força. Ela termina o beijo e tem uma mão no meu pescoço e outra no meu braço, quando saio de seu corpo e adentro-a de novo.
Ela me envolve com suas pernas, quando a adentro mais uma vez. Joga a cabeça para trás na quarta vez, e solta um ruído impossível de ser ouvido na quinta. Em outras as outras vezes, ela continua assim, abraçada a mim, e demoro a cansar.
Quando termino, sabemos que é hora do próximo ato.
– Você deve ir.
Ela concorda.
– Devemos ir.
Nos desvinculamos e nos vestimos devidamente novamente. E morremos para os personagens.

Ao fim do último ato, somos aplaudidos. Amados. E todos sorriem.
As cortinas se fecham.
E todos têm a ilusão que o músico fica com a dançarina.
Somos parabenizados por nossos colegas. Mas odeio isso.
sorri e vem até mim.
– Foi magnífico. Você estava perfeito.
– Você é perfeita.
A chamam.
– Preciso lhe avisar algo. Logo o encontro no meu camarim.
Assinto e vou até seu camarim vazio.
Assim que chego lá, está um homem. O novo homem de .
Ele está sentado em um sofá no aposento. E a aguarda.
– Em que posso ajudá-lo? – ele pergunta.
Comprimo os lábios. Entro e fecho a porta.
Este é o homem. Ele está roubando de mim. É por ele que ela me deixa.
– É o par de ?
Não respondo. Apenas olho fixo para ele. Não quero me mover. Quero que ele saia, que ele deixe de tornar o ambiente tão desagradável com sua presença repugnante de homem rico, independente.
– O substituto, não?
Ele não é simpático. Seu rosto é quadrado e tão gentil quanto um armário.
– Você é o homem que está sempre com .
Não digo nada, apenas olho para o espelho da penteadeira.
– É o homem que a olha sempre, que nunca a teve próxima.
Seu tom é irônico.
– É um homem apaixonado, posso ver. O modo com que dançaram agora há pouco. A deseja como seu personagem. Bem, tenho pena em dizer que não poderá tê-la.
Seguro uma caixa de joias.
– Ela já fez sua escolha. Desista, meu jovem. Vive no mundo da ilusão. Dos seus sonhos.
Bufo.
– Ela se foi de seus braços como nunca esteve neles antes.
Bato a caixa de joias no espelho e o quebro. O homem abre os olhos em espanto, e logo jogo a caixa em sua direção. Ao tentar desviar o rosto, seguro um pedaço do espelho quebrado e lanço-me contra ele.
E tiro dele tudo que há de . Todo pedaço de sua pele em que ela tocara, todo pedaço dele que teve ou quer ter o corpo de de modo sujo. Todo centímetro dele que a quer de maneira impura.
E não sobra nada dele.
Estou ajoelhado no chão. Olho para minhas mãos. O vidro está ensanguentado e ele não respira.
Olho o espelho.
Bloody Diamond.
Ouço o grito de atrás de mim.
– O que você fez? – ela gritou. Olho para ela, e tem suas mãos na frente da boca, em espanto.
– Eu convenço os roteiristas a escreverem uma história semelhante à nossa... Eu convenço o diretor a colocá-lo no papel principal...
, eu... – digo, esticando a mão para ela e ficando de pé.
– Cale-se! – ela grita, chegando para trás e batendo as costas na parede – Seu monstro! Não sabia que não iria durar? Não sabia que eu só tenho olhos para você, que não importa com quem eu esteja...
Ela se interrompe.
– Eu só tinha olhos para você... – ela parece se lamentar.
Se lamenta por estar comigo.
Porque estava comigo.
Ela se vai, quando outras pessoas chegam. E não posso fazer nada além de aguardar meu destino.
seria minha, apesar de tudo. Eu mesmo pus um fim nisso.
E as cortinas se fecham.

Aguardo minha sentença. Devo ser morto em alguns dias. Ninguém veio me ver, e escrevo agora minha versão dos fatos. Algumas pessoas da justiça dizem que o homem de não falou comigo, que ele estava rouco na época e perdera a voz. Afirmo que não. Mas não me ouvem.
Posso ver a forca de onde estou. Deste quarto frio como aquela noite da apresentação, escuro como a noite em que conheci .
Ao menos me gabo por ter tido-a uma última vez. Ao menos a culpa disso fora minha, não de outra pessoa que não fosse eu ou ela.
E espero que isso, no futuro, quando eu já estiver morto, enterrado e como adubo de narcisos, sirva para me inocentar. Meu maior erro foi amar como todas as minhas forças. Eu a quis até o último pedaço meu, e isso foi minha sentença. Minha certeza foi ser correspondido, minha tragédia foi algo estar entre nós.
E ela continuará como sempre: bela, jovem, tóxica. E tão bela como os narcisos que farei florescer.
A maior tragédia da vida é amar e ser amado em retorno.

Na esperança,





FIM



Nota da autora: 21/11/2014
Outras fics da autora: American Idiot [Restritas/Em andamento]
Jennville [One Direction/Hiatus]
Ocean's Four... Teen? [Outros/Finalizada]
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