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It Was Meant to Be



Última atualização: 24/06/2018




Capítulo Quinze


"And suddenly I become a part of your past. I'm becoming the part that don't last... I'm losing you and it’s effortless". Over my head – The Fray.



FLASHBACK ON:

Londres – 03 de março de 2009 – 11:12 am.

e toda a sua imaturidade passou a me atingir com palavras e atitudes. Ele não quis conversar, o que os seus olhos viram naquela noite se tornaram verdade em sua cabeça dura, e nada o fazia mudar de ideia, muito menos as minhas súplicas humilhantes.
Quando eu corria atrás dele, ele me ignorava, quando eu lhe dava espaço, fazia questão de se exibir, ora contando os seus casos promíscuos, ora ficando com alguma biscate bem na minha frente. Os dias se seguiram e eu me sentia cada vez mais diminuída, como se eu fosse uma folha de papel que havia amassado e descartado, assim que ficou cego de ciúmes e inseguranças.
Estava sentada sozinha na hora do intervalo, na nossa mesa habitual, quando , , e chegaram. Como sempre, o último citado fez questão de ficar distante de mim e me tratar como se eu fosse invisível, ou portasse alguma doença contagiosa. Eu andava tão sonolenta ultimamente, que todo esse circo estava me cansando ainda mais, e naquele dia eu resolvi me manter o mais quieta possível, aérea as coisas que estavam acontecendo ao meu redor.
- ? – precisou me cutucar pra que eu realmente a notasse. Estreitei os olhos, indicando que não havia lhe escutado e sutilmente ela apontou pra Jason parado ao meu lado.
- Posso falar com você um instante? – O garoto sorriu de lado.
- Claro.
Me levantei e o segui até um local mais distante, onde pudéssemos ter a tal conversa. Não era nada demais e envolvia apenas um exercício de sociologia que "gentilmente" ele havia feito pra mim, mas a maneira como nos encarava, tenso, evocou uma sensação de conforto e confiança, que me incentivaram a ser mais amigável com o garoto a minha frente. Eu estava mordendo o lábio, jogando o cabelo pra o lado e arranjando um jeito de tocar em Jason, fazendo o ficar ainda mais animado com minhas supostas investidas.
Depois de fingir entender os detalhes do trabalho, e de agradecer a Jason com um, desnecessário, beijo na bochecha, eu voltei pra mesa com um sorriso no rosto, que só precisava enxergá-lo, não saber que era falso e forçado.
- Não vai comer, ? – apontou pra o sanduíche sobre a mesa, mas só de exergá-lo ali, me senti enjoada.
- Não estou com muita fome.
Meu irmão não gostou da minha resposta e negou com a cabeça, enquanto me encarava repreendendo. Ele estava me controlando bastante ultimamente, mas eu não conseguia me alimentar, e o que eu comia não parava em meu estômago.
- Mas você não jantou ontem, não tomou café da manhã e...
- Pegaria ela tão forte que precisaríamos de capacetes! – A colocação infantil e nojenta, foi soada tão alto, pelo idiota do meu ex namorado, que foi impossível não ouvir.
- ...Estou falando sério, .
- Eu irei. – Sorri amarelo pra preocupação do meu irmão, e pra qualquer que tenha sido a sua bronca, reprimindo a vontade se rolar os olhos pra ele. – Alguém pode abrir isso aqui? – Pedi, mostrando uma latinha de refrigerante, e logo se prontificou. – Minhas unhas estão tão grandes, que eu acabo não conseguindo abrir nada.
Minha justificativa foi piada para , que gargalhou.
- Mas é sempre fácil em abrir as pernas.
- ! – ficou furioso instantaneamente, saindo em minha defesa. – Ficou maluco?
- Que seja. – Se levantou como se achasse tudo uma grande bobagem, jogou sua mochila nas costas e saiu. Prepotente e imponente, o dono do mundo.
- Deixa ele. – Tentei amenizar a situação, já que estava tão vermelho, a ponto de explodir com o desrespeito de .
- Mas ele não pode falar assim com você!
- Isso nós dois concordamos. – Fiquei em pé, no banco em que estava sentada, peguei de volta a lata das mãos de , e deixei a minha raiva acertar exatamente no meio da cabeça de .
Automaticamente suas mãos foram pra o local e ele se virou, ainda sem entender o que havia acontecido, e lhe atingido, até encontrar os meus olhos, que sorriram como os meus lábios.
- Supere o fato de eu não estar mais abrindo as pernas pra você, sstranho!
Ali eu entendi que eu não era uma criminosa, muito menos promíscua, e no mínimo me devia respeito, mas antes que o meu sorriso vitorioso aumentasse, as imagens se distorceram, tudo ficou escuro, eu apaguei.
FLASHBACK OFF.

Londres – 19 de abril de 2016 – 02:14 am.
Eu ouvi os chamados de , mas não consegui responder. O pouco que tinha restado de mim havia sido sugado, e eu estava fraca, desolada, exausta.
O cenário era o pior, e a expressão assustada de minha amiga era apenas uma afirmação à minha desesperação. Estava vestindo apenas o suéter velho de e sentada em frente à lareira, como se eu pudesse desfazer o gelo que se apoderou de minha alma. Sem dizer nada, ela se juntou a mim e me abraçou, e foi como se eu dissolvesse pra me afogar nas minhas próprias lágrimas.
- Ele disse que eu era a sua música favorita. – Tinha certeza de que não estava fazendo nenhum sentindo pra , mas não importava. – Eu achei que o destino fosse nos juntar, mas como sempre, eu só estava sendo patética.
- Foi a sua decisão, e eu não consigo mais te ver assim. – Notei seu esforço pra conter o choro.
- Só que isso não impede a minha dor.
- Você precisa contar esse segredo e seguir em frente, decidir o que você quer e não deixar que esse passado engula você ainda mais.
- , será que você não percebe? É esse segredo que me mantém nesse mundo, se um dia ficar sabendo disso será o fim da linha. Eu preciso sangrar, preciso sentir essa dor, é ela que torna o que eu tive real, e eu não ia conseguir encarar o olhar dele, não ia não ia... Eu não aguento mais! – Soluçava e tropeçava no meu próprio discurso. – Eu... Eu não queria sentir mais isso, não queria...
Me sentia injustiçada pelo destino, mesmo sabendo que viver isso era mais um pagamento pelo meu crime. Tinha ciúmes de Leah, porque além de poder gerar um filho, ela carregava o do homem que eu amava.
Não havia mais nenhum fio de esperança, só o meu passado secreto me sustentando.
- Você vai ficar bem, vocês irão, sempre irão.
- Não vamos! Você está mentindo, e eu cruzamos uma linha, . Nos perdemos de vez.
- Oh, , chora, eu estou aqui com você. – Me apertou ainda mais em seu abraço fraternal, mas nada podia amenizar o que estava sentindo.
- Ela vai dar um filho a ele. – Tentava retomar o fôlego, mas a dor havia roubado tudo. não trazia nenhuma surpresa consigo, provavelmente já havia lhe dado a notícia.
- Não sabemos.
- É um filho... E é tudo o que eu não posso. – Meu pranto aumentou conforme as imagens de uma cena onde tinha uma família feliz e completa, se formavam na minha cabeça e eu não era a protagonista.
- Nada foi confirmado. – Tentou amenizar a situação, já chorando junto comigo.
- Eu não posso, eu só... – Bati em meu próprio peito, e a dor física não era um terço da dor interna, a dor da alma. – Por favor, faz isso passar. Eu não aguento mais, de quantas maneiras eu preciso ser quebrada? – Ela me embalou no seu colo como se eu fosse um bebê desesperado.
- Eu não sei amiga, eu só sei que por amor a gente pode fazer qualquer coisa.
- Eu sei... E eu fiz. – "E continuaria fazendo” completei mentalmente. Já que iria segurar pra sempre em meu coração. – Eu só não queria... Só não queria que ele tivesse esquecido... Nos esquecido. – Me entreguei de vez ao pranto. – Eu era a sua música favorita...


FLASHBACK ON:

Londres – 10 de março de 2009 – 08:43 pm.
O nervosismo e incerteza embrulhavam ainda mais o meu estômago, e eu me sentia fraca, mas provavelmente, por não ter comido nada nas últimas horas. Entrei na farmácia e olhei para o chão, o teto de madeira, produtos aleatórios, e pra qualquer lugar onde eu não precisasse encarar ninguém. Não que fosse encontrar alguém conhecido, já que havia pegado o carro de e dirigido pra o mais longe possível de nossas casas.
Parei diante da prateleira e pateticamente fingi escolher absorventes, mas meus olhos estavam presos em outro produto, pareciam iguais, mesmo variáveis na cor da embalagem ou no preço. Aquilo era realmente importante? Pagar mais caro ou mais barato mudaria um destino? Revirei os olhos pra mim mesma, respirei ainda mais fundo, e enquanto soltava o ar devagar, deixei minha mente repetir que tudo iria ficar bem, independente do resultado. Uma linha, duas linhas, positivo ou negativo.
Minha barriga inconscientemente ficou tensa e não me permitindo ser tomada ainda mais pela ansiedade, peguei um teste de cada e me dirigir ao caixa. A atendente foi educada o suficiente pra fingir não notar meu nervosismo e me deu o troco agradecendo em seguida.
Me apressei a sair, mas assim que cruzei a porta me esbarrei em uma pessoa. Pessoa essa que eu conhecia muito bem e que agora estava estático olhando todos aqueles testes de gravidez espalhados no chão. MAS QUE DROGA!
me ajudou com toda a compra, mas a minha inquietação denunciou que algo estava errado, e ele acabou dando atenção aos produtos.
- O que é isso? Está fazendo compras pra alguma daquelas garotas do "Teen Mom"?
Apesar da brincadeira boba, estava mais do que explícito a sua apreensão e prejulgamento.
- Eu sei que essa frase é ridícula, mas eu posso explicar.
- Eu tenho aulas de biologia, sei bem como bebês são concebidos.
Agarrei o seu braço e o afastei o máximo que eu pude, antes que mais alguém pudesse nos ver ou nos ouvir.
- Com quem você está?
- Sozinho, eu vim...
- Ótimo! Você não pode contar pra ninguém que me viu, entendido?
- Mas eu não sou bom com esse lance de guardar segredos e daqui a pouco sua barriga fica grand...
- fica quieto e me escuta! – Meu tom soou imperativo e frio, fazendo me olhar atentamente. – Você vai manter a sua boca fechada sim, vai sair daqui, fazer o que quer que você estivesse fazendo e vai simplesmente esquecer que nós tivemos essa conversa.
- Mas...
- Se você contar pra alguém, eu vou contar pra todo mundo que no ano passado você fez xixi na cama.
- Eu estava bêbado! – Tentou se justificar, mas eu não estava com paciência.
- E eu sou convincente e popular. – Os ombros de caíram num gesto claro de derrota, e eu reprimir um sorriso, afinal, minha ameaça não duraria pra sempre. – Eu também te amo, .
Beijei sua bochecha, deixando meu amigo aturdido e indignado e saí dali o mais rápido que pude, não poderia abusar da sorte.

Londres – 11 de março de 2009 – 09:59 am.
Saí da cabine do banheiro do colégio que dividia com . Podia sentir a tensão no ar, que nos deixou consternadas. Intercalados entre olhar nos olhos uma da outra, e para os três testes de farmácia, todos eles anunciando uma nova vida a caminho.
- , vamos ficar calmas. – me pediu, mas eu estava petrificada de medo.
- O que vai ser daqui pra frente?
- Eu não sei, é tudo... – Aquela risada esganiçada e conhecida nos interrompeu. Aconteceu rápido demais, sem nos dar tempo para reação.
- Você está grávida! – Lily pegou os testes de minha mão.
- Não estou!
- , por favor. – me implorou com a fala e os olhos.
O que eu deveria fazer? Sob os olhos atento das duas, em apenas setes segundos, eu tomei a minha decisão.
- Não conte isso pra ninguém, ou seus últimos meses aqui serão um inferno. – Soltei a ameaça, nem um pouco convincente, puxei pela mão e nos livramos daquele lugar, com um contrato assinado com o diabo.
- Você sabe que ela não vai segurar essa informação por muito tempo, não é?
- Que opção eu tenho?
- , eu acho melhor...
- Não acha nada, OK? – Olhei no fundo de seus olhos. – Eu sei que vai dar tudo certo e não me preocupo com nada.
- Só estou com medo por você, não queria isso.
- Eu sei, eu também não, mas faria de novo sem pestanejar, um milhão de vezes. – Ela me abraçou forte e disse com a voz embargada.
- Eu te amo! Muito!
- Eu também, , te amo muito.
- Que reunião é essa? Por que não fui chamada? – quis saber, mas nos recompomos. Sabíamos que não era o momento dela ficar sabendo. – O que está acontecendo?
- Nada, nós só fomos ao banheiro, , que coisa. – desconversou, mas só a verdade era o suficiente pra .
- Acho que passou mal com as novidades. – Lily surgiu com um sorriso maior do que a sua máscara plastificada suportava.
- Quais novidades? – A cor fugiu do meu rosto.
- Lily... – Antes que começasse, Lily piscou pra ela e voltou sua atenção pra mim. Me desafiando.
- Farei a nova coreografia do time. – O ar escapou pesado dos meus pulmões, e por um instante eu agradeci por ela ter dito algo que não envolvesse uma gravidez, mas logo o absurdo do que ela estava propondo abusou dos meus pensamentos.
- O que?! – e eu perguntamos juntas sob o mesmo choque.
- Acredite . Estou certa capitã? – Não havia tempo pra pensar em pros ou contras. Afirmei com a cabeça, ignorando a expressão estarrecida de .
O acordo seria uma bola de neve, onde só a verdade me libertaria, mas até isso acontecer, eu estava presa e fadada. Olhei pra o lado e vi escapando da aula com uma garota aleatória, então a verdade ou a mentira perdeu a importância pra mim, eu estava fazendo o que deveria ser feito, e estava fazendo por amor.
- Sim. – Reafirmei escondendo meu desgosto. – Lily será responsável pela nova coreografia.

Londres – 14 de março de 2009 – 03:13 pm.
- Como você está hoje? Foi ao médico? Está se alimentando?
- Eu estou bem, o médico me passou uma dieta e umas vitaminas.
- E em relação às outras coisas? – As outras coisas, significava o Estranho e a maneira como ele vinha me tratando, mas não havia mais nada a ser dito ou sentido.
- Quanto ao resto, eu estou na mesma? – Repassei a sua pergunta.
- , eu...
- , pode parar com isso, e me diz como você está?
- Na mesma? – Nós duas respiramos fundo e ficamos em silêncio até ela mudar de assunto. – e os meninos foram pra o estúdio do meu pai.
- nem conseguiu dormir de tão nervoso que estava. – Você acha que isso vai dar certo?
- Sim, a música tem tudo pra ser um hit.
- Pelo menos alguém está conseguindo.
- Porque eles têm coragem, diferente de você.
- O que está querendo dizer? – Enquanto eu continuava confusa, se levantou da cama, foi até a minha bolsa, e pegou minha pasta vermelha.
Não sabia que ninguém, além de mim mesma, tinha consciência de que aquilo existia, fiquei ainda aturdida e ansiosa.
- Eu estou falando disso aqui. – Me mostrou um dos meus desenhos. Uma saia com estampa geométrica, e que pra mim, ainda faltava muitos ajustes para terminar. – Isso aqui é incrível, e você deveria vendê-los.
- Está louca?!
- Não, é você quem está sendo burra. – Julgou olhando um por um. – Você poderia confeccionar as peças e vender online.
- Eu não consigo. – Falei insegura, e receosa, fazendo revirar os olhos.
- , você fez um ótimo trabalho com os uniformes, e basta olhar pra esses desenhos pra saber que você nasceu pra fazer isso.
- Pare de ser exagerada!
- Pare de ser medrosa e se arrisque. No mínimo você teria uma boa distração pra esse momento.
- Eu não...
- O que estão fazendo? – chegou como um furacão e se jogou ao meu lado, na cama.
- Tentando animar a senhorita, .
- bateu a cabeça no banheiro. – Entortou a boca em frustração, e depois ergueu meus desenhos pra .
- Olha isso aqui, são lindos. – se sentou pegando os desenhos e os analisou minuciosamente. Ter aquilo exposto me deixava à beira de um ataque, como se eu estivesse completamente nua no meio de uma multidão.
- São mesmo. Quem desenhou? Preciso de um vestido assim. – Apontou pra uma peça verde e decotada, e ergueu o olhar pra mim.
- A nossa amiga aqui, é um verdadeiro gênio da moda. – me olhou perplexa e incrédula.
- , eles são maravilhosos.
- com certeza sabe costurar, basta vermos os nossos uniformes.
- Verdade.
- Ela deveria abrir um site e tentar vender as próprias roupas, aposto que iria fazer sucesso e lhe render um bom dinheiro.
- Ótima ideia! – quase pulou de empolgação.
- está concordando cem porcento comigo e sem pestanejar? – Ela afirmou num manejo de cabeça ainda analisando aqueles desenhos. – Isso é mais do que sinal de sucesso absoluto. – gargalhou e bateu palmas, eu não podia acreditar naquela insanidade.
- Dessa vez você tem razão. – As duas se olharam animadas, mas minha expressão abatida desfez a delas. – Ah , tenta se animar você sempre amou moda e pode encontrar nisso uma carreira, um futuro.
- Eu estou animada, estou até me sentindo Brooke Davis, mas diferente dela eu não sei colocar "as roupas acima de garotos". – Finalmente confessei, o que elas já deveriam saber. Eu estava destruída por causa do término do meu namoro e não conseguia me concentrar em nada.
- Você não é assim e não será agora que vou permitir que seja. – contornou a situação, mas foi direta.
- está magoado, se sentindo traído, mas está pegando todas daquele colégio, nem a Lize O'Brien escapou.
Escancarei a boca. Alguém ficar com Lize O'Brien sem dúvidas era atingir o fundo do poço da carência. A garota era uma repetente, não escondia de ninguém que era prostituta e qualquer um que tivesse cem libras poderia sair com ela. Que idiota! Gritei com ele em minha mente, mas se fosse pra me reerguer e canalizar minhas forças pra outra coisa, aquela era a hora, principalmente porque quando a história da gravidez viesse à tona, tudo iria piorar ainda mais. Me levantei e apontei pra .
- Você é nerd então cria um site, liga também pra o e pede pra ele desenhar uma logomarca única. – Depois me virei pra . – Você vem comigo, vamos comprar tecidos e tudo o que eu preciso pra tornar esses desenhos em peças reais.
- Isso! – Ela deu um pulo e bateu palmas. – Sua marca será um sucesso! Já estou vendo daqui uns anos que a... a... Qual o nome da marca?
Eu não tinha pensado naquilo, queria algo único, mas que retratasse cada coisa que estava vivendo.
- Não sei. – Ao erguer a mão pra passar sob o cabelo, encontrei a resposta em meu braço. – Meant To Be.
- O quê?
- O nome da minha marca é Meant To Be.
FLASHBACK OFF.

Londres – 21 de abril de 2016 – 09:03 am.
Eu passei dois mil oitocentos e setenta minutos, trancada no meu apartamento e trancada pra o mundo. Quando eu não estava chorando, eu estava dormindo porque havia ficado cansada de chorar.
Eu precisava desse momento, se desfazer de nós que há tempos me prendia era difícil pra qualquer um, especialmente pra mim que era tão apegada. Obviamente não saiu do meu apartamento, a preocupação era notória em seus olhos, mas ele permanecia calado, permitindo que eu encarasse toda aquela confusão da maneira que eu havia escolhido, mas sempre cuidando de mim, mostrando que estava lá como o irmão que sempre foi.
O meu sono foi interrompido, quando eu senti pequenas mãos deslizarem carinhosamente pelo meu rosto. Ao abrir os olhos enxerguei Jazzy me olhando como se eu tivesse adquirido duas cabeças.
- Bom dia, Dinda. – Só consegui esboçar um sorriso pra ela, que continuou me analisando. – Aqui está roxo. – Apontou pra parte debaixo dos meus olhos.
- Eu sei. – Minha voz saiu estranha e rouca.
- E seu cabelo está embaraçado.
- Eu sei.
- Você não está bonita. – A careta dela só ia crescendo.
- Eu sei.
- E também não está cheirando muito bem.
- Eu sei.
- Você só sabe dizer isso? – Ri ainda mais de seu bico indignado e segurei a sua mão depositando um beijo.
- O que veio aprontar aqui?
- Vim brincar com você. A mamãe disse que você está triste e que precisava se animar, ah, e ela disse pra eu te dizer que eu te amava.
- E você ama?
- Amo.
- Muito?
- Muuuuitão! – Abriu os bracinhos e sorriu, iluminando instantaneamente, o meu dia.
- Mais do que panqueca de chocolate?
- Muito mais. – Respondeu sem pestanejar, o que fez o meu coração apertar.
- Eu também te amo muito. – Alisei seus cabelos. – Promete nunca esquecer isso?
- Prometo, e agora eu vou arrumar você.
Jazzy me fez tomar banho, e ao sair do banheiro vi sobre a minha cama, roupas e acessórios que ela tinha separado pra mim. Ela me lançou um sorriso arteiro por estar mexendo nas minhas maquiagens, e por já ter feito uma make exagerada, que odiaria, mas que não deixava de ser engraçado.
Segui todas as suas instruções, e como se eu fosse uma de suas bonecas, permiti que ela penteasse meus cabelos e me maquiasse, só saí do quarto quando ela julgou ter feito um bom trabalho.
e estavam na sala de jantar numa conversa acalorada, mas falavam tão baixo que eu não conseguiu entender sobre o que era. - Oi linda, compramos almoço no seu restaurante favorito. – sorriu pra mim tentando me animar. Lhe dei um sorriso fraco e ao me sentar à mesa, o cheiro da comida me lembrou o quanto estava faminta.
- Você está acabada. – Revirei os olhos pra constatação casual de e comecei a me servir. – Enfim, termina de contar .
- Então, ela simplesmente se demitiu e disse que fez tudo isso pra ficar mais perto dele.
- E o babaca acreditou nessa história?
Quando eu comecei a me interessar pela fofoca e ia perguntar sobre quem elas estavam falando...
- O que o podia fazer? A garota chegou ao apartamento de mala e cuia. – completou e a expressão abismada de refletia a minha, mas diferente dela eu preferi ficar calada.
- Ela forçou a morarem juntos? – Agradeci mentalmente a pergunta de e mal respirava pra não perder nenhum detalhe.
- A situação toda está fora de controle, os meninos estão tentando não se envolver, mas não se contiveram quando a garota exigiu uma coletiva de imprensa pra anunciar o noivado.
- Com quem ela acha que vai casar? Alguém da realeza?
- está tentando mostrar a que está bem, mas só está sendo burro.
Eu queria gritar e dizer o quanto aquilo tudo era uma loucura, mas eu não queria parecer intrometida ou possessiva. Nunca havia acreditado nas boas intenções daquela ex professora, e pelo visto, eu estava certa, o que mais me matava era saber que se eu não merecia o amor de , eu não deveria ter perdido ele pra alguém pior do que eu. Mas talvez aquele tivesse que ser o futuro. e eu, era como imãs defeituosos, nos atraíamos pra sermos a pior versão de nós mesmo, e todo aquele amor fosse só lixo afinal de contas. Mas ter uma mulher sínica e grávida dele despertava um monstro que não me perseguia há um bom tempo, eu só precisava me manter quieta.
- ? – Não havia notado o quanto tinha me perdido. E quando encarei minhas amigas, vi arrependimento nos olhos delas. – Desculpa, não devíamos estar falando sobre isso.
- Está tudo bem. – Garanti pra . – “ e Leah” não é um assunto proibido. Está tudo bem.
Voltei a comer, engolindo também mais aquele capítulo.

Londres – 06 de abril de 2016 – 02:01 pm.
Os garotos do One Direction pegaram todas as suas fãs de surpresa esta manhã. Com o fim da parte norte americana da turnê, e depois de terem lançado um novo single que quebrou recordes de vendas em todo o mundo, a boyband anunciou uma pausa na carreira.
Os boatos começaram a surgir há cerca de um ano, mas só foi confirmado hoje, através de uma coletiva de imprensa.
, , , e pareciam alegres e confiantes, durante toda a entrevista, que durou uma hora e meia, e trataram de acalmar as directioners afirmando que existem muitos projetos de sucessos da banda para o futuro.
"Nós temos os melhores fãs do mundo, e eles não precisam ficar preocupados, pois nós iremos voltar sim, e faremos isso por eles". disse, e fez sua tradicional pose de galã, pra ser redundante, fazendo todos os presentes rirem.
“Isso definitivamente não é definitivo".
Além de reafirmar que estão mais unidos do que nunca, explicou as razões que levou a decisão unânime do quinteto.
"Todo mundo precisa de uma pausa, para parar e descansar totalmente, e faremos isso pra ao menos conseguirmos assimilar as experiências fantásticas que vivemos nestes últimos anos".
“E pra alcançarmos isso, precisamos nos afastar um pouco do trabalho, não de nossas vidas, onde somos amigos e fazemos músicas porque amamos".
completou, negando que brigas entre eles, seriam o principal motivo do rompimento.
"Nós vamos sair de férias juntos, viajar sem ter preocupação com absolutamente nada".
“Vai ser ótimo e eu espero que chegue logo”. parecia o mais empolgado, pena que eles não revelaram pra onde seria essa viagem, já que o que eles mais querem é um tempinho longe dos holofotes.
Também pudera, desde sua digressão mundial, a banda trabalhou arduamente para alcançar o sucesso e suas contas bancárias de vários dígitos. Com um trabalho fonográfico longo e diverso, os meninos mereciam mesmo umas férias, agora é torcer pra que isso não se torne permanente.


A resiliência é um conceito psicológico emprestado da física, definido como a capacidade de o indivíduo lidar com problemas, superar obstáculos ou resistir à pressão de situações adversas sem entrar em surto psicológico. Havia finalmente encontrado um termo pra designar o que eu estava passando, a sensação era de estar boiando num enorme lago, deixando que a água me segurasse e me guiasse.
O problema de perder o que não deveria ter, é que você não podia contar pra ninguém o que perdeu, por isso perdoar e reatar não deveriam ser sinônimos, ainda mais quando se é a responsável pelo erro, portanto, era melhor seguir devagar, mas viva. E eu deixaria tudo de lado pra apoiar os meus outros amigos. Sorvendo os meus próprios problemas e mantendo meu segredo a salvo.
Os garotos haviam passado a manhã dando a coletiva de imprensa sobre a decisão deles a partir dali. Obviamente as fãs ficaram arrasadas, e no fundo eu sabia que tudo estava sendo bastante difícil para eles também. Mesmo estando cansados daquela rotina louca, eles amavam o que faziam e sentiriam falta até o instante em que voltassem.
Pensando nisso, eu, e fizemos um almoço no meu apartamento, algo só pra gente e que simbolizasse mais um ciclo que se fechava.
O dia claro e fresco de início de verão nos levou a fazer um churrasco na área gourmet, eu havia ligado o automático e esvaziado a minha mente pra não pensar em nada além do presente, eu iria conseguir fazer aquilo por ao menos uma tarde.
Estávamos mais velhos, consolidados em nossas carreiras, sem tantos medos ou paranoias e rindo ao relembrar a época do colégio, onde não tínhamos nada, mas que pra mim, era quando eu tinha tudo.
Dentro de mim eu reafirmava que as coisas e pessoas ali, eram peças de um jogo de montar, e que estavam justamente onde deveriam, mesmo parecendo distorcido. e , agora com Jazzy enorme e tagarela, e estavam juntos e mais apaixonados do que nunca, continuava a ter seus casos, havia encontrado Elle e parecia extremamente feliz, já pertencia a Leah. E eu, bom... O Andy estava aqui, sentado ao meu lado, mantendo uma calma e superioridade que já estava me irritando. Como se fosse o dono dali ou de mim.
Decidi tirar minha mente dali, e deixar apenas o meu corpo. Era como se assistisse a um programa de TV, onde eu não fazia parte. Ignorei a minha ansiedade e toda a falta de humor que carregava, e fiquei sentada, bebericando o vinho, deixando que o meu garfo brincasse com a comida, até que uma parte da conversa chamou minha atenção.
- Só os loucos ficaram com Lize O'Brien. – Eu havia passado todos aqueles anos sem ouvir a menção daquele nome, e esbocei um sorriso ao me lembrar do quanto foi um idiota ao ficar com ela pra me atingir. A nossa vida mais parecia à série Skins, de um jeito ainda mais bizarro e chato.
- O nome disso não é loucura, é desespero. – gargalhou zombando do amigo.
- Ei, ela era... – tentou se justificar, mas acabou rindo de sua desgraça, até encontrar algo de ruim que fosse coletivo. – Todo mundo ficou com a Lily.
- Não gosto desse assunto. – tentou cortar a conversa, mas foi em vão, o assunto continuou rendendo.
- e eu trabalhamos com ela, há alguns anos. – Revelei, depois que os meninos contaram que ela havia tentado invadir o backstage do primeiro show da banda na O2 Arena, e que aquela havia sido a última vez em que eles ficaram sabendo dela.
- Trabalharam?! – Todos se assustaram e perguntaram quase que ao mesmo tempo, e fez questão de explicar, mantendo uma repudia na voz.
- Ela era aspirante à modelo e foi pedir uma chance a , que foi boa e ingênua demais pra conceder.
- Achei que ela fosse melhorar depois que tivesse um emprego.
- O que ela tinha? – foi o primeiro a querer saber, e fez um bico tentando controlar aquele ciúme antigo.
- Estava envolvida com drogas, mas ninguém pôde fazer mais nada, e os pais finalmente a internaram numa clinica.
- Isso depois dela te roubar.
- Vamos esquecer isso, espero que ela tenha se refeito. – Sorri pra que morreria indignada com aquilo.
- Nem todo mundo pode se refazer. – me encarou, densa e profundamente, me perseguindo e questionando.
- Eu concordo. – Respondi sem consegui lhe encarar de volta, com medo de revelar demais.
- Aposto que hoje ela está pesando quarenta quilos a mais. – cantou uma previsão, que deveria ser mais um desejo, e acabou quebrando aquele olhar desafiador de , o olhar que continuava tentando descobrir o que havia acontecido comigo.
- Seria um desperdício com aquele cor... – só não continuou seu comentário, porque os garotos forçaram uma tosse pra lembra-lo de ficar calado. Era tarde demais, estava claramente furiosa, sorriu tentando disfarçar e colocou uma mão sobre o ombro do marido.
- Sofá, . – Anunciou com uma voz branda, que não condizia com a vontade de seus olhos. Meu amigo tinha comprado uma boa briga pra o resto da semana.
- burro. – lastimou batendo contra a própria testa. E como pra gente, as desgraças sempre nos divertiam, nós acabamos rindo do precoce desespero de .
Quando a campainha soou, fez questão de ir abrir, e estranhei aquele gesto solicito, era como se ela estivesse esperando por aquela visita.
- Olha quem chegou! – gritou anunciando e eu me virei, antes que eu pudesse fazer o meu cérebro processar o que estava vendo, Jazzy desceu da cadeira e correu em direção.
- TIOOO DIIIIIIINDOOOO!
Peter mantinha um sorriso no rosto e pegou Jazzy no colo, a manteve um tempo em seu peito, depois lhe sussurrou alguma coisa que fez a garotinha gargalhar tanto que jogou a cabeça pra trás.
Levantei no ímpeto, e assim que ele colocou Jazzy no chão, eu me atirei em seus braços, completamente incrédula e extasiada.
- Eu não acredito que você está aqui. – O abracei tão forte, sentindo a áurea boa que ele emanava, mas ainda surpresa. – Você odeia os ingleses, odeia a Inglaterra, odeia a Europa!
- Vim pra uma missão. – Indicou que apenas deu de ombros como se não soubesse do que se tratava.
- Aconteceu alguma coisa com a empresa?
- Não, tudo está em ordem, eu só... Senti demais a sua falta e quis fazer uma surpresa.
- Que bom que fez. – O abracei de novo. – Vem, vamos falar com o pessoal.
Quando nos aproximamos da mesa, senti o peso curioso de alguns, mas o de era incomparável.
se levantou cumprimentando Peter, com brincadeira idiotas que os homens fazem e que só eles acham engraçado, mas que fazia Peter se sentir incluído, e eu gostava disso.
- Aquele é o . – Decidi começar pelo mais curioso e por estar mais disposta a eliminá-lo.
- É um prazer. – O cumprimento não foi caloroso por parte de . – A minha sobrinha é uma grande fã.
- Sorte a dela. – respondeu seco e prepotente, que nem o meu olhar repreendedor o fez abaixar a guarda.
- Essa é a... – Apertei mais forte a mão de Peter, que segurava, e ele entendeu que aquela era um desafeto, de imediato. – É a... Leah do .
Peter apenas sorriu na direção da loira falsa.
- Ué? Só foi prazeroso conhecer o ? – A brincadeira de Leah pareceu divertir apenas ela, trazendo um clima ainda mais constrangedor pra mesa.
- Ah me perdoe, foi um prazer também... Desculpe, eu esqueci o seu nome. – Foi à vez de Peter apertar a minha mão, mostrando que concordava comigo à respeito da garota.
- É Leah e...
- Aquela é a Elle. – Fiz questão de cortá-la.
- Oi. – Elle correspondeu com um sorriso, então Peter se voltou pra . – Você é o melhor amigo. – Apertou a mão dele.
- Já sabe quem eu sou, gostei desse cara. – E pra dizer isso, é porque realmente ele havia se afeiçoado, e em meio a uma nova amizade que se iniciava, parecia ainda mais indignado.
- Eu sou o melhor amigo também. – disse fazendo Peter rir.
- já se apresentou, e esse é o . – Indiquei e eles se cumprimentaram.
- Minha filha parece ser sua fã. – brincou.
- Eu que adoro a Jazzy. – Olhou a garotinha com todo o carinho que sentia. – Oi , como você está?
- Muito bem, é ótimo ter você aqui. – Eles se abraçaram rapidamente, como se fossem velhos conhecidos. E quando pensei que havia acabado com as apresentações, lembrei que faltava Andy.
- E esse é o Andrew.
Os olhos de Andrew estavam cravados numa direção, foi então que notei que era pra minha mão e a de Peter entrelaçadas, ignorei qualquer ciúmes e a mantive ali.
Peter era uma parte importante de Nova York, e Nova York havia sido a minha cura, eram dias difíceis, aonde eu vinha me arrastando, e tudo o que eu mais precisava era da lembrança de me manter firme, fria e forte. Andrew Wash que superasse suas paranóias.
- Senta aqui. – Indiquei uma cadeira ao meu lado. – Eu vou servir você. – Peter agradeceu, enquanto eu dava toda a atenção que ele merecia.
- Tio Dindo, você vai brincar comigo muitão? – Jazzy perguntou toda entusiasmada com presença de Peter.
- Vou sim, princesa, te trouxe um presente, mas só vou te dar mais tarde.
- Jazzy, eu que sou o seu Dindo. – tentou parecer casual, mas era explícito seu ciúmes e repreensão.
- Mas ele é meu Tio Dindo porque ele namora a minha Dinda.
- Namorava? – Andy se remexeu incomodado ao meu lado, ao descobrir aquela parte do meu passado.
- Não, ele namora. – A correção da criança fez a maioria rir baixo, deixando outros intrigados.
- Qual o problema dele ser o "Tio Dindo"? Isso te incomoda ? – perguntou como se já soubesse a resposta, mas encarava Leah, que torceu a boca, antes de responder pelo noivo.
- Claro que não.
- Sim. Quer dizer... – Tentou se justificar quando recebeu um olhar repreendedor de Leah. – Eu sou o padrinho dela.
- Pode me chamar do que quiser Jazzy. – Peter falou naturalmente, mas encarou aquilo como uma ofensa, e só não retrucou, porque , felizmente, mudou de assunto.
- , sabia que o Peter se hospedou num hotel?
- Você não vai ficar num hotel, vai ficar aqui, na minha casa! Mais tarde vamos pegar todas as suas coisas!
- O que? – Andy se virou pra poder me encarar, assim como .
- Ele vai ficar aqui.
- Durante todo nosso relacionamento você nunca me deixou dormir com você. – Peter fingiu um assombro.
- Acho que ela está a fim de elevar o nível do relacionamento. – brincou, piscando um olho pra Peter .
- Para de bobagem. – Ri e determinei. – Está decidido, Peter ficará aqui.
- Não! – A negativa de Andrew me fez rir ainda mais.
- Andy, essa é a minha casa, eu tomo as decisões aqui. – Falei com obviedade e bem devagar, como se estivesse explicando as coisas pra um bebê.
- , eu só acho que...
- Vai ser um prazer dormir com você, . – Peter interrompeu o protesto de Andy, usando o seu melhor tom provocativo.
- Pretende ficar muito tempo, cara? – A pergunta de deixou alerta, esperando uma resposta.
- Apenas alguns dias.
- Então você estar mais do que convidado pra nossa festa. – propôs, e adorei o fato deles estarem se dando bem.
- Ótimo! – Disse empolgada. – E eu também preciso te mostrar tudo aqui, cada canto de Londres.
- Não obrigado, passeios eu dispenso . – Fez uma careta engraçada. – Prefiro o conforto de um lar.
- Peter você precisava acabar com esse seu trauma da Inglaterra.
- Por que você tem esse trauma? – Elle perguntou, assim como os outros, achando aquilo peculiar.
- Basicamente aconteceu depois que ele conheceu a , e o resto de nós. – zombou e respondeu por Peter, que entrou na dele e concordou.
- Sem dúvidas, é o diabo na terra.
- Eu que costumava dizer isso. – externou seu pensamento, brigando por ter sido plagiado, mas logo pareceu arrependido.
- Mas é um diabo que só te leva ao paraíso. – brincou, e Elle não pareceu se incomodar, dando continuidade a brincadeira.
- Quantos corações, ganhou nessa mesa?
- O meu foi o primeiro. – disse.
- Segundo. – levantou a mão, depois deu de ombros, voltando a comer.
- Terceiro. – levantou a mão e apontou pra . – foi o quarto.
- Então eu devo ter sido o quinto. – Peter me abraçou de lado.
- Eu acho que isso não importa, já que eu estou aqui pra cuidar do coração dela. – Andy me puxou pra o seu lado, num gesto esforçadamente delicado, e se ele não tivesse dito aquilo com tamanha precisão, e parecendo mais um ditador, poderia até ter soado menos ridículo.
Peter gargalhou, assim como o resto dos meninos, e Jazzy mesmo sem entender, acabou acompanhando, fazendo de Andy uma grande piada.
- Isso tudo é ciúmes por eu ter conseguido? – Andrew aparentou estar ainda mais furioso ao perguntar. Os olhos vermelhos e cravados em Peter, que ainda mantinha sua postura divertida.
- Vai por mim Andy, na vida amorosa da , você e eu representamos a mesma coisa, a diferença é geográfica. – O silêncio foi absoluto, até Jazzy parecia interpretar a colocação explícita de Peter. – Vou buscar mais uma garrafa de vinho.
Peter manteve a entonação divertida, sem se preocupar com a tensão que havia provocado. Então se levantou e foi até a cozinha.
- Esse cara está pensando que é o quem? – Andy empurrou a mesa e depois bateu os talheres no prato, nos assustando e findando com todo o ambiente alegre e amigável.
- Ele é o meu convidado, dá pra você parar com isso, Andrew?
Eu me levantei tão envergonhada e furiosa com o ataque de Andrew, que nem tinha percebido que havia acompanhado Peter. Só ao chegar próximo à cozinha, que os notei lá. Diminuí os passos e passei a ser mais silenciosa tentando ouvir a conversa dos dois.
- O saca rolhas fica aqui. – apontou para a gaveta onde eu guardava o objeto e Peter foi até o local indicado.
- Obrigado. – não permitiu que ele saísse.
- Veio tentar tirar do nerd? – A pergunta deveria ser irônica, mas soou como um grande absurdo.
- Pra isso ela precisava ser dele. – Peter respondeu rindo, mas continuou na defensiva.
- E de quem ela é?
- Nós dois sabemos , só tome cuidado com os sentimentos de , ela é frágil porque é totalmente feita de amor.
ficou mudo e deve ter sido por total confusão, e antes que ele falasse mais uma vez que estava com Leah e blá blá blá, eu resolvi fazer a minha presença ser notada.
- Interrompo? – Fingi não ter ouvido nada e os dois sorriram alquebrado pra mim.
- Não, só estava mostrando ao Peter onde as coisas estão. – Mostrou o saca rolhas nas mãos de Peter.
- Mas estamos num embate, sobre onde às coisas devem ficar.
- Bom, são as minhas coisas, vocês não precisam discutir sobre isso.
Diferente de , Peter voltou a relaxar, e ao me dar um beijo na testa, voltou pra área gourmet, levando os vinhos consigo.
- Agora com a chegada desse ianque, quem você está namorando nesse momento? Ele ou o nerd?
- Isso seria uma piada? Porque eu realmente estou morrendo de rir.
- Assumo que foi bem ruim. – Nós rimos de sua confissão. – É... – Quando encarou os próprios pés e franziu a testa, eu soube que ele estava se preparando pra dizer algo que eu não iria gostar. – Eu vou mandar o Simba pra cá amanhã de manhã.
- Mas ele foi pra sua casa essa manhã.
- É que... O dia vai ser corrido.
- Ok, agora me conta a verdade. – Exigi, buscando a todo custo o seu olhar.
- Leah tem alergia a cachorro e achamos melhor...
- Achamos? Desde quando ela tem essa alergia?
- Surgiu do nada, essas coisas são assim.
- Eu não acredito. – Eu comecei a rir de tamanha descrença pelo que havia acabado de ouvir. – Você está trocando o seu cachorro?
- ...
- É do Simba que estamos falando!
- Isso, é do Simba. O cachorro que você abandonou por seis anos.
- Eu fui embora, me mudei, eu não o tirei da minha vida porque a porra de uma garota fresca inventou a porra de uma alergia.
- Dá pra você se acalmar? – Eu percebi que estava quase gritando e respirei fundo. – Eu não...
- Você está certo. É da saúde da sua noiva grávida que estamos falando. – Não fiz nenhuma questão de esconder o asco em minha voz.
- Mas ela não...
- Eu mesma irei buscá-lo.
Cessei o assunto e qualquer desculpa ridícula que iria sair da boca de e só deixei aquela cozinha, depois de mostrar o quanto ele estava me decepcionando.

Londres – 07 de abril de 2016 – 08:27 am.
- Bom dia. – A voz rouca me recepcionou assim que entrei em casa. Simba parou na minha frente e latiu pra Peter em minha defesa.
- Está tudo bem. – Disse ao cachorro e me abaixei fazendo carinho em seus pelos, o incentivando a ir cumprimentar o nosso convidado, ainda desconfiado ele foi se aproximando.
- Então, esse é o famoso Simba?
- Sim. – O cachorro latiu, agora de maneira amistosa, e abaixando a cabeça pra receber o carinho de Peter. – Ele gostou de você.
- Ele parece ser bem dócil. – Peter decidiu sentar no chão e brincar com o cachorro.
- Só com quem ele gosta, ele já tentou morder o Andy. – Ri lembrando.
- Então Simba não é o único a sentir desafeto com esse cara.
- Como assim?
- Não gostei desse seu namorado.
- Ele não é meu namorado, é mais como um... Um amigo com benefícios.
- E ele sabe que é só um amigo? ele tem um enorme acesso a sua vida. – Peter se levantou e me encarou. – Você confia nele?
- Eu... – Demorei setenta e nove segundos, e não havia encontrado uma resposta.
- Se você pensou é porque tem dúvidas, só seja cuidadosa, .
Decidi mudar o foco do assunto, pra desviar as minhas desconfianças.
- Está animado pra festa dessa noite? Vai estar repleta de celebridades britânicas. – Comentei forçando presunção.
- Jessie J estará lá?
- Acho que sim.
- Ah, então eu já vou começar a me arrumar.
- Seu traíra! – Ele gargalhou e veio me abraçar. Depois de beijar a minha bochecha, fez um carinho em meu rosto me examinando.
- Você parece cansada. – Sorri pra ele e fechei os olhos, aproveitando a sua carícia.
- Eu estou. Não sei se quero ir a essa festa.
- Ontem você estava tranquila ao me contar sobre o relacionamento de .
- Deve ter sido a vodca. – Ri. – Não consigo pensar muito estando bêbada.
- Aposto que nessa festa terá bastante vodca. Eu também estarei lá pra te dar cobertura. – Entortou o nariz, lembrando-se de algo que não lhe agradou. – Isso se o seu segurança deixar eu me aproximar de você.
- Andrew não é tão ruim assim, ele só estar intimidado com a sua presença.
- Em todo caso, Jessie J. estará lá.
- Sua obsessão já está me incomodando. – O empurrei, fingindo estar chateada.
- O nome disso é ciúmes, senhorita .
- Senhor Mill, você é um convencido. – Gritei pra ele, que já estava indo pra cozinha, gargalhando de mim, obviamente.

Londres – 07 de abril de 2016 – 10:51 pm.
A festa era enorme, cheia de celebridades, mas tinha um ar intimista e familiar. E como uma boa festa de despedida, todos carregavam certa saudade pelo que viria.
Arranquei de minha mente a lembrança da primeira grande festa deles. Foi quando tudo aconteceu. Foi quando tudo acabou.
Deixei que aquela noite acontecesse e que a vodca dominasse os meus movimentos e pensamentos. Deixei também que Peter me conduzisse, mesmo com o ciúme infantil de Andrew nos perseguindo.
Eu mal tinha visto aquela noite, e a distância tornava o peso da realidade, leve o suficiente pra suportar, mesmo assim eu conseguia sentir o seu olhar em minha direção, mas não saberia dizer se estavam voltados pra mim, ou pra Leah, que dançava cercando Peter descaradamente.
Parei no bar, e pedi mais um drink, e consenti à amargura que era analisar Leah. Seu cabelo preso em um rabo de cavalo parecia mais escuro, o vestido, desenhado por mim, disfarçava qualquer sinal de gravidez, e a forma como ela dançava, gesticulava ao falar... Tudo exatamente como eu usava ou fazia. Era como me olhar no espelho e enxergar uma versão barata. Eu havia desenvolvido uma mania de perseguição, ou aquela garota estava tentando ser eu.
- Não sabia que era uma festa a fantasia. – Elle parou ao meu lado e depois de pedir uma bebida, fez um manejo de cabeça indicando a Leah. – Ela parece fantasiada de .
- Você também achou?
Perguntei assustada por Elle ter praticamente lido os meus pensamentos de minutos atrás.
- E não é de agora. – Ela riu e notei que estava mais bêbada do que eu. – Leah está mesmo tentando ser alguém na vida de , talvez ela consiga, mas nunca será você. ALGUÉM AVISA PRA ELA! – Berrou sabendo que não seria ouvida em meio aquela barulheira, mas me fazendo rir.
Mesmo assim eu me sentia uma formiga em terra de elefantes, não saberia explicar, mas Leah tinha esse efeito sobre mim, talvez por ela ter conseguido tudo aquilo que eu desejava, e ainda mais, por ela fazer questão de exibir isso pra mim.
- Uma rodada de tequila pra nós duas. – Pedi ao barman me livrando dos pensamentos ínferos.
Na quarta dose já estávamos rindo a ponto de lacrimejar, o motivo eu não me lembrava, eu não iria me importar com nada naquela noite.
- Elle ficou cinco minutos perto de você e já virou um pudim de cachaça. – abraçou a namorada e eu ri de sua falsa ofensa.
- Eu causo esse efeito nas pessoas. – Me desfiz do rabo de cavalo e deixei que meu cabelo cobrisse as minhas costas e o decote do meu vestido, tentando parecer menos com a cópia fajuta que continuava tentando puxar conversa com Peter.
- E você, . – Elle disse com voz arrastada e se virou pra ele. – Causa esse efeito em mim.
Sem esperar por mais nada, ela o beijou e foi correspondida no ato.
Eu ri e os mandei procurarem um quarto. Ao notar que Andrew estava me procurando, eu segui pra o banheiro, totalmente sem paciência pra ele com suas lamúrias e cobranças. Eu só precisava me recompor e ficar ao menos dois minutos sozinha.
Passei a última camada de batom em meus lábios, e joguei o cabelo pra o lado, precisava elevar um pouco a minha autoestima e batom vermelho sempre ajudava. Quando ia saindo do banheiro, Leah invadiu o cômodo como se estivesse fugindo de um furacão, a pele brilhava a suor, os cabelos estavam desgrenhados e ela parecia não se sustentar em pé, mas ao olhar o que ela trazia em suas mãos, meu sangue ferveu.
- Você não deveria beber nesse estado. – Puxei de sua mão, um copo que continha um destilado qualquer, e Leah gargalhou. Não sei se pelo meu ato impulsivo, ou pelo teor alcoólico.
- Qual estado? O de futura senhora ?
- Não. – Joguei o copo na lixeira, tendo certeza de que o futuro casamento de não me incomodava, e sim o seu futuro como pai. – O de grávida.
- Alarme falso. – Deu de ombros e mordeu o lábio. – Mas eu não queria que ninguém soubesse, já que estamos tentando de novo, e de novo, inclusive vamos tentar daqui a pouco e nesse banheiro.
- Você não está grávida? – Ela negou e assim que senti um refrigério me invadir, e já estava quase sorrindo, Leah deixou que mais verdades escapassem.
- Mas eu consegui isso. – Ergueu a mão direita deixando que o diamante em seu dedo anelar reluzisse ainda mais e quase me cegasse. Depois, se aproximou ainda mais de mim e sussurrou sua provocação. – E ele é meu. Sou eu quem vai dar a ele o que você – apontou o dedo pra minha barriga – é seca e não pode dar.
Por puro impulso, a minha mão acertou o seu rosto, fazendo os seus cabelos caírem pra o lado, seus dedos tocaram a vermelhidão deixada por mim, mas o sorriso de Leah aumentou.
- Bate, isso não vai mudar o fato de que eu irei dar um filho ao , você não passa de um nada, que nunca terá nada. – Eu estava tremendo. Mordi o lábio tentando me controlar, mas Leah continuou. – Nem o amor de um filho você terá nessa sua vida miserável. – Se aproximou ainda mais de mim e sussurrou, como se fosse um elogio. – Infértil!
Perdi todo o controle e avancei nela a ponto de fazer com que nós duas caíssemos no chão.
- Cala a sua boca, sua vadia.
Leah continuava a me xingar, fazendo com que minhas mãos tomassem ainda mais autonomia na tentativa de tirar aquele sorriso de escárnio daquele rosto plastificado. Essas eram as únicas reações dela as minhas agressões: ofensas e sorrisos, tudo o que me instigava.
Cada tapa deferido, cada arranhão e cada puxão de cabelo, era uma tentativa de apagar as palavras que ela dizia, as verdades que agora tumultuavam a minha mente.
Então, meu corpo foi tirado de cima dela.
- , o que você está fazendo?! – Enquanto me segurava, se manteve parado observando Leah se levantar em meio a lágrimas que surgiram como mágica, numa expressão de medo e dor em uma encenação digna de um Oscar.
- Ela me provocou! – Só depois de me ouvir, eu percebi o quanto minha defesa havia sido patética.
- Eu só a convidei pra o nosso casamento. – A vagabunda se aninhou no abraço de e deixou que seu falso descontrole emocional a vitimasse e falasse por ela.
Pelo estado de nós duas, era compreensível um falso julgamento. Ela estava sangrando e com hematomas, seu vestido estava rasgado, já eu só estava descabelada e cansada.
- O que você tem na cabeça, ? – finalmente saiu do estado de torpor e brigou comigo, como se eu fosse uma criança.
- acredite, eu...
- Chega! – Ele não gritou, mas seu tom de voz arrancou silêncio de todos que estavam ali. – Você fez suas escolhas, então me deixe em paz. – Quando pensei em sentir alívio pelo singular, ele se corrigiu. – Nos deixe em paz! – Se virou, olhando pra sua noiva com credulidade e ternura. – Vai ficar tudo bem, Leah.
Meu corpo inteiro formigou em constrangimento, prendi a respiração, e me encolhi na própria vergonha, enquanto o casal saia dali.
Eu havia deixado que aquela sonsa ganhasse de mim. O prêmio foi o Estranho.
- Vou buscar um pouco de gelo pra colocar em sua mão. – A voz de carregava piedade, o que tornou tudo ainda mais lamentável. Eu apenas concordei com a cabeça, agradecendo por ter alguns minutos a sós.
Quando a porta se abriu novamente, meu coração deu um salto, na esperança de ser com sua sanidade de volta, mas era Peter. Em suas mãos havia um guardanapo de linho, com alguns cubos de gelo, e no seu rosto, um sorriso pra remendar meu ego.
Sem dizer nada, ele se sentou ao meu lado, com cuidado segurou a minha mão, e sobre o inchaço colocou o gelo.
- Definitivamente, você sabe lutar, poderia até dizer que fiquei compadecido com o estado daquela garota, mas estamos muito próximos, e eu não quero apanhar. – Peter tentou brincar, e eu esbocei o máximo de sorriso que eu consegui naquele momento.
- Coisas ruins acontecem quando eu estou perto. – Me depreciei.
- Exato. – Ele tocou em meu rosto, num carinho que estava ajudando a dissipar toda a adrenalina que havia se apoderado do meu corpo. – Você deixa uma imensidão de corações apaixonados por você, enquanto o seu é fiel a uma única pessoa.
- Porque eu continuo sendo burra.
- Não, porque você continua sendo a melhor.
- vai casar, um dia terá seus filhos, uma vida ao lado de outra. – Quando Peter começou a tracejar uma compaixão em seus olhos, eu completei. – Está tudo bem, eu mereço isso.
- Do que você está falando?!
- Nada que eu passe vai ser suficiente pra pagar o que eu fiz.
- Isso não tem nenhum sentindo e você parece uma tola falando assim. – Falou mostrando toda a sua aversão. – As coisas passam pra aqueles desapegados do passado, esse desespero de é uma tentativa de esquecer, mas acho que até ele sabe que se tratando da história de vocês, isso vai ser impossível.
- Eu desejei isso, eu o afastei porque ele merece o melhor, e não... – Ter minha memória invadida pela dissimulação de Leah, me fez morder o lábio com força, de tanta raiva que senti. – Essa vadia não o ama.
- Ninguém vai amá-lo como você. – No fundo eu concordava com Peter, mas deveria adicionar, que também não haveria outra pessoa que magoaria , como eu. – Pra estar de verdade com alguém, é preciso estar só, e isso você já fez.
- Voltar pra Londres só me revelou uma coisa, Peter. – Ele piscou os olhos lentamente e suspirou esperando pelo que eu fosse dizer. – Nada nunca será como um dia já foi, é como entrar no rio e esperar se banhar da mesma água.
- Isso não te impede de entrar e aproveitar o banho. – Ele se virou ainda mais pra mim. – Nossas memórias são seletivas e nós decidimos as que guardaremos, assim como nossas dores, quando você passar a se perdoar o mundo será seu novamente.
- Não posso fazer mais nada, estou perdida e no escuro novamente. – Me abraçou com o carinho de sempre.
- , confiança e fé caminham juntas e ambas são cegas.
- Eu pensei que não fosse nunca, mas agora tudo se foi.
- Se é isso que tira a sua paz, é hora de você lutar ou aceitar o incerto.
Peter tinha razão, mas o que eu faria?
O que eu faria?

Londres – 08 de maio de 2016 – 10:36 am.
Eu não planejava levantar da cama, iria passar o dia embaixo das cobertas, curtindo a minha ressaca moral e tentando esquecer tudo o que havia me dito, mesmo parecendo que um rádio dentro da minha cabeça tocava aquela melodia de palavras horrorosas, incessantemente.
Um barulho maior, de alguém mexendo na minha cozinha, me obrigou a levantar. estava ao lado do fogão, cozinhando com a mesma classe que ele tinha pra tudo na vida. Jogava os ingredientes, sem nenhum cuidado, e quando ele se queimou, eu ri da cena.
- Bom dia. – Disse com o dedo na boca, e uma careta de dor.
- Bom dia. – Fui até o armário pegando uma pomada e comecei a cuidar de seu dedo. – Com toda essa habilidade, aposto que irão te chamar pra participar do Masterchef.
- Não me zoa, ou fica sem comer. – Soltou a ameaça, em meio a sua gargalhada. – E falando em habilidades, Dana White quer você como lutadora do UFC.
- HÁ HÁ HÁ, essa não teve graça. – Empurrei sua mão, assim que terminei e não parou de rir.
- Foi melhor do que a do Masterchef. – Dei língua pra ele e me sentei no balcão, voltando a me calar e só observá-lo terminar de fazer o nosso café da manhã. Finalmente ele nos serviu. – Peter saiu com , acho que foram conhecer a loja ou algo assim.
- Tudo bem. – Concordei, e perguntei com a boca cheia de torrada com geléia. – O que achou dele?
- Ele é um cara legal, um homem de verdade, mas não é pra você, porque ele não... – Parou desistindo de continuar. – Ele é um cara legal.
Continuamos comendo em silêncio, acho que nenhum dos dois estavam com coragem pra começar a falar sobre a noite passada.
- está sendo um idiota. – Disse como se comentasse sobre o tempo, mantendo um sorriso no rosto, enquanto me observava.
- Ele só está apaixonado. – A explosão de gargalhadas de me assustou. – O que é tão engraçado? – Ele só me respondeu quando conseguiu encontrar um pouco de ar.
- A sua piada. – limpou as lágrimas que haviam caído depois que riu tanto.
- Não foi uma piada. – Ergui a sobrancelha. – resolveu escolher o lado da noiva dele, não há um mal nisso, mas quando não escolhem o meu lado, pra mim se torna o meu inimigo.
- acha que está fazendo a coisa certa, principalmente depois de você ter enxotado ele da sua vida pela sexta vez.
- Foram três. – Me defendi, mesmo incerta.
- Quem está contando? – Perguntou sínico, me fazendo bufar de raiva.
- Acho que eu preciso de... – Parei pra pensar em minha frustração. – Uma bebida, uma vingança e um orgasmo.
- Posso te dar o terceiro. – Disse novamente com desembaraço e eu joguei um pedaço de fruta em sua direção. – Quem perde é você. – Antes que eu pudesse ralhar com ele, riu e se defendeu, dizendo que aquilo não passava de uma brincadeira. – Acho que a gente podia dar uma lição no , no melhor estilo / .
Meus olhos brilharam em tentação, ao ouvir a ideia de naquele tom maléfico que só ele sabia usar. Qualquer coisa ao estilo / era sinal de encrenca e confusão das boas.
- Você ainda lembra? – Ele afirmou com a cabeça, me deixando mais agitada.


FLASHBACK ON:

Londres – 24 de março de 2009 – 01:23 am.
Contei a tantos segredos que já não eram mais só meus, havia me revelado por inteiro e vê-lo longe, distante de mim e de quem ele era de verdade, me doíam ainda mais. Peguei uma bebida, sem me importar muito em tomá-la, e me afastei daquelas pessoas e de mais uma festa. O cansaço continuava me dominando e não era só físico, mas também mental. Os meus problemas me rondavam o tempo inteiro fazendo meu cérebro trabalhar a todo vapor e sem descanso.
Os dias estavam avançando e mesmo estando concentrada no meu mais novo e louco projeto, estava ficando completamente sem paciência com Lily. Era cada vez mais explorada, e exigi que ela ou guardassem aquele segredo, não era só impensável, como cansativo e impossível.
- Que cara de ânimo é essa? – surgiu no meu campo de visão, me impedindo de ver conversando com mais uma garota qualquer.
- Hoje é segunda, amanhã temos aula, não tem como ficar animada. – Ele me olhou com espanto e escárnio.
- Desde quando isso foi um empecilho pra você?
- Ah, não sei...
- , eu acho que você não precisa se afastar de seus amigos, ou de quem você costumava ser por causa de um relacionamento que não deu certo.
- Eu não me afastei.
- Quando você saiu com a gente? – Abaixei a cabeça constrangida com e sua razão.
- Só estou preocupada com umas coisas. – Tentei me justificar.
- Com o site? – Não.
- Claro, o site. – Torci para que não conseguisse identificar minha mentira. Pra minha sorte, ele já havia bebido o suficiente pra deixar aquilo passar. – Está me rendendo um bom dinheiro, mais um maior trabalho também.
- Tenho uma coisinha que pode te alegrar. – Ele retirou do bolso, um saquinho pequeno e cheio de maconha.
- Oh não ! Como você é uma péssima influência! – Meu falso moralismo fez gargalhar assim como eu.
Finalmente saímos daquela festa, entramos no carro dele e rodamos por toda a cidade. Quando a fumaça dentro do veículo foi grande o suficiente para embaçar nossas visões, nós paramos.
O campo, de grama baixa, era vazio e só cabia um parquinho velho, o céu sem estrelas e nada mais. A minha mente estava vazia, eu sentia os meus pés saírem do chão, e a sensação era de poder tocar nas nuvens.
Estava dançando sobre o capô do carro, deixando as drogas fazer ainda mais efeito e assim extinguir qualquer pensamento que me levasse a . batucava gravetos sobre garrafas de cerveja, fazendo música para nós.
- Já sei do que você precisa. – se levantou e estendeu a mão pra mim, mas além de estar chapada, estava confusa.
- De outro cigarro?
- Talvez mais tarde. – Ele riu junto comigo. – Agora nós vamos numa missão.
- Eu sabia! – Passei a sussurrar em tom conspiratório. – Implantaram chips na gente e agora teremos que fugir pra depois conseguir salvar o mundo?
- Isso, mas vamos logo!
Me levantei empolgada, mas todos os meus movimentos eram tão intensos que não tinha certeza de minha rapidez.
As próximas cenas eram lindas e engraçadas pra mim. Papel higiênico e serpentinas coloridas voavam sobre as árvores, área, jardim e porta da casa de . Demos uma nova decoração ao local, mas devemos ter feito barulho demais, já que as luzes da casa se acenderam, fazendo e eu sair de lá correndo, antes de sermos flagrados.
Coloquei as mãos sobre os joelhos, assim que paramos, olhei pra e voltamos a gargalhar. Naquela noite o mundo pareceu mais leve.

FLASHBACK OFF.

- Seria uma ótima ideia, se eu ainda tivesse 17 anos. – A realidade me fez acordar, mas aquela recordação me fez perceber que eu precisava agir. Só mais um movimento. Mas qual?
- O prédio de é cheio de seguranças, não acho que seria tão engraçado.
- É, acordaríamos os outros moradores, e seriamos notícia no The Sun.
O Celular de apitou, e foi o bastante pra que ele se levantasse e me dissesse que estava atrasado.
- Vou começar a aproveitar as minhas férias, mas logo estarei de volta a Londres. – Eu me levantei e o abracei.
- Aproveite bastante, e faça tudo o que eu não faria.
- Me diz que não está pensando em voltar pra Nova York. – Sorri por sua preocupação.
- Não, Shrek. – Abracei novamente. – Eu aprendi que mesmo fugindo os sentimentos acompanham a gente, meu lugar é aqui em Londres. – Ele investigou o meu olhar e depois suspirou aliviado.
- Ótimo, vamos beber bastante no dia x.
- Dia x?
- Enforcamento do . – Respondeu com tamanha obviedade que só me restou rir.
- Você não vai? – Ele negou. – Mas ele é seu amigo.
- Por isso mesmo. – piscou pra mim. – Você sabe que não o perdeu, certo? E não vai perde-lo, não a uma despedida. – Depois de me dar um beijo na bochecha ele foi embora.
Despedida.
Aceitação.
Eu havia encontrado o ultimo movimento que precisava.

’s POV.
Londres – 08 de maio de 2016 – 04:12 pm.
Quando cheguei em casa, não havia notado que alguém estivera ali, até chegar ao estúdio que havia montado num dos quartos, e vi que os meus CD’s estavam arrumados. A princípio achei que deveria ter sido a minha mãe, Ruth, ou até mesmo minha irmã, mas havia um cheiro ali, doce e bem especifico e inebriante, era o cheiro...
Sob o notebook tinha um envelope branco, e aquela letra cursiva e redonda havia escrito “Estranho". Abri sem pestanejar.

, você sempre foi bastante organizado, mas sabendo o quanto você odeia arrumar os seus preciosos CD’s, eu resolvi te ajudar, e espero que não se incomode.
Não foi um gesto altruísta, eu só precisava pensar no que escrever pra você, mas só consegui me lembrar do garoto com cabelos cobrindo os olhos, calado, que me hipnotizou de primeira. Eu comentei com que seria fácil ter você na minha vida, e uma voz dentro de mim, que eu tentei calar, gritou que você iria permanecer e assim foi. O tempo não conseguiu transformar você, eu olho nos seus olhos e ainda enxergo o mesmo garoto sonhador de sempre. O garoto que me ensinou a ser generosa, independente e corajosa. Você tem um coração enorme, , e eu deixei que o passado me controlasse, achei que poderia ir além das limítrofes, mas tudo foi um engano, e você , merece o melhor.
Não te recrimino por se apaixonar de novo, você está optando por sonhar outra vez, e eu continuaria sentido ciúmes se eu olhasse pra você e soubesse que o seu coração está sendo bem cuidado, com a sorte de receber um bom dia todas as manhã, ter sorrisos roubados no fim de tarde, e uma mão para segurar a sua quando for preciso, o que eu não acredito que acontecerá, e não pense que isso é uma prepotência minha, é só um último gesto de cuidado. Não te recrimino por gostar de outra, amar são para os fortes e corajosos, mas se cuide. Escolha sabiamente.
Eu sempre fugi justamente pra não chegar a este momento, eu não sei me despedir, mesmo sendo o necessário, mesmo sendo o certo, ainda é doloroso, mas eu acredito que sentir dor, é melhor do que não sentir nada.
Não me despeço porque irei partir, ou tão pouco iremos nos privar do convívio um do outro, mas estou me despedindo da nossa história, é necessário nos libertar das amarras que insistiram em nos prender um ao outro. E se despedir dói, porque nossas almas estavam ligadas, e carrego a certeza de que sempre tenham sido, e sempre serão, como se já tivéssemos vivido mil vidas antes dessa, e nos reencontraremos nas muitas que virão.
Com todo o amor que ainda me restou,
Estranha."




Capítulo Dezesseis


"Though there's distanceand there's silence, your words have never left me. They're the prayer that I say everyday." New York – Snow Patrol.


FLASHBACK ON:

Londres – 24 de março de 2009 – 09:10 am.
Eu estava um trapo, minha aventura com durou até quase o raiar do dia, e eu havia dormido apenas poucas horas.
- Entendo a sua cara, . – cheguei atrasada no colégio me esbarrando em que folheava as páginas de um livro como se a vida dependesse daquilo.
- Não dormir muito bem. O que você está fazendo?
- Estudando pra prova de hoje, ainda bem que a minha é só depois do intervalo.
- Prova?
- De química! – minha vida estava ficando cada dia melhor. Trabalhando cada vez mais, eu estava um tanto displicente com o colégio, e minha mente estava sempre me levando pra todos os lugares, mas nunca pra um elemento daquela tabela periódica doida. – Você estudou?
Confirmei pra encurtar a conversa e entrar logo na sala, antes que ficasse ainda mais atrasada. O único lugar vago era numa cadeira em frente a de , e receber seu olhar vago ou sua risada zombeteira me deixavam como uma folha seca balançando sem rumo numa ventania.
Meus olhos vagavam pra todas aquelas questões na folha amarelada, elas pareciam saltar e fugir do meu entendimento, sem saber resolver aqueles cálculos, o meu nome seria tudo o que eu escreveria, quando comecei a fazer isso, num ato rápido a avaliação foi tirada de mim e trocada por uma completamente respondida. Olhei pra trás e vi respondendo sua nova avaliação, tentando ser rápido ele nem olhou pra mim, agindo como se tudo fosse natural, me deixando ainda mais atordoada.
Finalmente escrevi meu nome e entreguei, buscando um pouco de ar ou compreensão, esperando que ele saísse.
- Obrigada pela ajuda lá dentro. – Troquei os pés por puro nervoso, e só recebi um sorriso debochado de .
- Achei que o nerd iria fazer alguma coisa por você. – como se estivesse sem a menor paciência pra mim, ele saiu andando, cortando aquele contato mínimo.
- Ele foi transferido ou algo assim. – Tentei seguir ele e continuar a conversa, mas seguia tão apressado que eu já estava quase correndo pra acompanhá-lo. Consegui ultrapassá-lo e parei na frente da porta do refeitório impedindo sua passagem. – Por favor, vamos conversar, eu preciso te contar umas coisas e esclarecer outras. – Quando ele pensou em responder, minha mão tocou o seu ombro e seus olhos me disseram que ele estava cedendo. – Por favor.
- Não deveria principalmente depois do que fez na porta da minha casa. – pensei em negar, mas não queria mentir.
- Foi uma noite louca na qual eu tentei te esquecer, mas no fim não deu muito certo. – disse me sentindo pateticamente envergonhada por minha confissão, mas um sorriso contido brincou nos lábios dele, trazendo à tona um alívio, até o segundo seguinte quando a porta se abriu e algo chamou a atenção de que olhou por cima da minha cabeça. Seus olhos faiscaram e ele me tirou de seu caminho, entrando no lugar, hoje, mais barulhento que o normal.
Entrei no refeitório, e fui atingida por diversos olhares julgadores, cochichos e risadas. veio correndo na minha direção e entrelaçou nossas mãos. Havia fotos espalhadas por todos os lugares, eu estava naquelas imagens, ao lado de montagens com barriga enorme, bebês ou testes de gravidez, todos com a mesma frase “Jovem e grávida! Bem-vindo baby Johns!”, além de espalharem que estava grávida, colocaram o Ethan como o pai, aquilo não poderia ficar pior...
A expressão de transformou tudo em desastre, a clássica lei da física não poderia estar mais correta. Seu olhar me fuzilava em decepção e raiva. Mais um engano, mais uma confusão que nos manteriam afastados.
- Parabéns por realizar seu sonho. – foi a única coisa que ele me disse, antes de correr para longe daquele circo.
- Isso é verdade?
- ...
- Você está mesmo grávida? E do Hindle? – Neguei com a cabeça, mas não fui capaz de soltar nenhuma palavra. – O que você tem na cabeça?!
- Me deixa falar...
Minha súplica o fez respirar fundo para realmente esperar por uma explicação da minha parte, mas não havia nada a ser dito, não agora.
- De todas as merdas que você já fez, ou considerou fazer, essa sem dúvidas foi a pior.
- Não fala assim. – Me aproximei dele, e o fato dele não me repelir já era um avanço. – Confia em mim, é só isso que te peço.
- Nós conversamos em casa.
beijou a minha testa, mas antes de sair, foi incapaz de me encarar. Sabia que ele iria me apoiar e estaria ao meu lado, mas isso mão mudava fato dele estar magoado, até mesmo decepcionado comigo, e precisava de um tempo pra processar tudo o que estava acontecendo.
Só senti as lágrimas quando elas já estavam transbordando os meus olhos e molhando meu rosto. Eu deveria ter pensado nele, nos meus pais e até mesmo em , mas estava feito.
O abraço de me esmagou, mas não me acalentou. Por que todos os meus amigos estavam me julgando? Sendo verdade ou não eu deveria merecer o benefício da dúvida, ou um apoio. Antes de sair do refeitório, eu segui a passos firmes até parar em frente à Lily, desfiz o sorriso que ela carregava, ao lhe dar um soco no nariz, rezando para que ela precisasse de mais uma cirurgia plástica.
Passei o resto do dia com orientadores e psicopedagogos, todos sem importância, que sorriam para mim e me aconselhavam a manter o bebê vivo. Ridículos! Eu jamais abortaria um filho, ou iria ferir a sua integridade em prol da minha juventude. Meu maior sonho era ser mãe, e isso não havia mudado, então só continuei sentada, revirando meus olhos mentalmente para toda aquela preocupação desnecessária.
Ao chegar em casa, eu esperei por uma ligação dos meus pais que não chegou, isso significava que a conversa ia ser pessoalmente. Maravilha.
Mais tarde naquele mesmo dia, e foram até o apartamento, e me disseram que me apoiariam independente do que, mas aquela confusão bizarra era esmagadora. Sem nenhuma certeza eu tinha que carregar quase que literalmente uma bomba em minha barriga, sem o Estranho pra me abraçar. Ainda tive acalmar o , que se explicava, dizendo que tinha guardado o meu segredo, e eu precisei lhe garanti que acreditava nele e em sua lealdade.
- Oi. – apareceu na porta do meu quarto, incerto se eu o aceitaria ali. Me arrumei na cama e sorri incentivando a entrar. – Como você está?
- Agora que você está aqui, eu estou melhor.
- Me desculpe.
- Não precisa disso. – Segurei a sua mão. – Eu só preciso que você confie em mim pra esperar a verdade.
- Que verdade?
- Você confia? – A contragosto ele concordou, e eu me o abracei. – Obrigada.
- Eu consegui enrolar o papai e a mamãe, disse que tudo havia sido um trote e que eles não precisavam se preocupar.
Suspirei, mais do que aliviada.
- Você é o melhor irmão do mundo.
- Eu sei.

Londres – 27 de março de 2009 – 10:22 pm.
Naquela sexta à noite eu havia resolvido ficar em casa com Simba. insistiu que eu saísse com ele e os meninos, mas receber olhares furtivos e cochichos a meu respeito, sempre que eu passava, já bastavam no colégio. Aquele apartamento minúsculo tinha se tornado um escudo, e era muito melhor me esconder nele e continuaria assistindo uma maratona de One Tree Hill.
Já estava tarde quando a campainha tocou, eu estava tão concentrada no episódio do casamento de Nathan e Haley, que levei um enorme susto. Já que realmente não esperava ninguém, eu tentei ignorar aquele chamado, mas não cessou o que me remeteu a emergência, e o ínfimo pensamento de que alguém poderia estar ferido fez o meu corpo se sobressaltar e correr até a porta.
- Você demorou de atender.... Está tudo bem?
Quando ele ia dando um passo para dentro da casa, com os braços levantados como se fosse me abraçar, eu recuei e fechei a porta na sua cara. Parecia que meu coração havia saltado, eu podia sentir cada batida no exterior do meu corpo, minha boca estava seca e o sangue sumiu de meu rosto. Estava de costas pra porta com a respiração ofegante e segurando firme a maçaneta, essa foi à maneira que encontrei pra não sair, mas eu só precisei me afastar, para que entrasse.
- Você está mesmo grávida? – Ele precisou segurar os meus ombros, e girar o meu corpo inerte para me encarar. – Responde.
Diferente do que eu imaginava como seria aquela conversa, não havia gritos, acusações ou drama. estava calmo e decidido, eu só não sabia ainda do que.
- , eu... – Riu e quando as pontas de seus dedos tocaram o meu rosto, minha fala foi roubada.
- Não.... Não importa! Eu só quero que você me escute. – Respirou fundo, os olhos sem nenhuma hesitação. – eu amo você, e não me importa se está grávida daquele imbecil, ou se está apaixonada por ele. – Neguei com a cabeça completamente surpresa. – Não me importa nada, porque eu quero ter a chance de poder ficar com você, e cuidar de vocês dois.
Eu não sabia o que havia me chocado mais naquela declaração. estar passando por cima do seu orgulho e dizer que ainda me amava, estando disposto a ser pai, ou eu enxergar através de sua íris, que cada coisa dita por ele, ser verdade. Mesmo assim eu ainda precisava de mais, e merecia aquela tortura pra saber que não estava sonhando.
- Estranho, isso nunca vai dá certo, você não confia em mim e...
- Meu amor é maior do que tudo. E eu já não estou conseguindo viver sem você. Eu sei que agi como um verdadeiro idiota esses últimos tempos, até perceber que nada disso importa se eu não estiver com você. Sou eu – bateu em seu próprio peito – que devo ser o pai desse filho, e de todos os outros que teremos no futuro, porque se o seu maior sonho é ser mãe, o meu é de ser o pai de seus filhos, ao seu lado. – se aproximou ainda mais fazendo os nossos narizes deslizarem um no outro, sua voz, seu cheiro, tudo parecia me prender a ele. – Eu sou apaixonado por você e serei por esse bebê, porque é impossível não amar o seu filho, porque ele é seu filho.
Fechei os olhos e o beijei com saudade, paixão, amor e ainda mais admiração. ficaria ao meu lado, não importasse a circunstâncias.
- Eu te amo, eu te amo . – Distribui mais beijos por seu rosto, até alcançar o seu sorriso.
- Eu vou cuidar de vocês. – Quando eu senti passar a mão sobre minha barriga, senti um choque, mas não aguentei e comecei a rir. Ele ficou lá parado, com aquele sorriso bobo no rosto e meu coração estava ainda caído de amores por ele, totalmente derretido.
- Estranho... – Segurei a mão que estava sobre o meu ventre e levei até meu peito, onde meu coração batia acelerado. – Eu não estou grávida. – Sorri amarelo e mordi o lábio, e vi sua expressão se transformar numa careta de dúvidas.
- Como não? – Ele se afastou minimamente para poder me encarar.
- Primeiro, eu não dormi com o Ethan. – não deixei de esconder a mágoa que ainda sentia por sua desconfiança. – E quem está grávida é a , mas ela não sabe como contar pra o , e nem como encarar as outras pessoas, então me viram com o teste, surgiram os rumores e tudo começou a desandar.
- Você não dormiu com o Ethan?
- Claro que não! – Estapeei o seu peito. – E você é ridículo por não acreditar em mim.
- Me desculpe. – ele me tomou em seus braços me apertando contra ele. – Você é perfeita e eu sou um imbecil.
- Concordo com você. – rimos, mas eu me afastei pra poder encará-lo. – Nós precisamos ajudar .
- Nós iremos dar a ela todo o apoio e coragem que precisa. – disse conciso.

Londres – 28 de março de 2009 – 01:23 pm.
Quando abriu a porta de sua casa, imediatamente a abraçou, não houve espaços pra confusão.
- Você sabe. – afirmou e abraçou ainda mais.
- Eu sei.
Assim que desfizeram o abraço, sorriu compreensiva pra mim, e eu me aproximei lhe dando um beijo na bochecha.
Nos sentamos no sofá, eu e lado a lado, encarando uma acuada, seus olhos assustados encaravam os próprios pés.
- Eu não sei se vou contar ao . – Ela começou a dizer, transbordando receio.
- Mas você precisa, .
- E ele vai saber nos próximos meses, ele vai enxergar isso, assim como todo mundo. – Apontei pra barriga de , que já estava ficando aparente, mesmo ela usando roupas mais largas.
- Talvez não. – disse insegura, olhando um ponto fixo a sua frente.
- Você está pensando em interromper a gravidez? – A pergunta de me assustou, mas o silêncio de foi o bastante pra me fazer surtar.
- Você não pode considerar isso! Eu jamais vou permitir que você cometa uma atrocidade dessas.
- Não é você que está grávida, , você não tem que permitir nada.
- Tenho sim! Ontem quando eu toquei a sua barriga, esse bebê mexeu pela primeira vez. Eu segurei o seu cabelo para você vomitar, todas as manhãs, eu deixei que todos achassem que era eu quem estava grávida, e faria pior, faria ainda mais porque eu já amo essa criança. – me sentei novamente ao seu lado. – Ele está vivo aí dentro, enchendo o meu coração de alegria, e você tem razão, ele não é meu, mas é seu, eu tenho certeza absoluta que se eu me sinto assim, você deve se sentir mil vezes mais. , você o ama e deve dar o direito a ele de nascer e te amar também.
- Eu estou com muito medo, eu não ia fazer isso, só estou perdida e... – finalmente se entregou ao choro agudo que vinha guardando naqueles últimos meses. Eu a segurei em meu colo e permitir que ela chorasse, não iria dizer que também estava com medo, mas lhe diria as minha certeza.
- Mesmo se for um idiota e não quiser participar disso, eu não vou abandonar vocês. – Passei minha mão sobre sua barriga e logo fez o mesmo.
- Eu também estou aqui, . Vou babar muito esse garotão. – ela limpou as lágrimas e sorriu brevemente, recuperando a calma.
- E se for menina? – Perguntei a ele.
- Não vou deixar nenhum babaca olhar pra ela. – eu e reviramos os olhos pra o ciúmes de .
- Obrigada. Não sei o que faria sem esse apoio de vocês.
Ela segurou nossas mãos e apertou, agora parecendo mais confiante.
Conosco ao seu lado, passou o resto daquele dia contando aos nossos amigos. Cada um reagiu de uma maneira.
disse que estava feliz, mas ficou chateada por termos escondido isso dela. a princípio ficou confuso achando que estava grávida assim como eu, e tivemos que lhe explicar a verdade. ficou berrando pra barriga de , dizendo que estava conversando com o bebê. ficou paparicando , como se ela fosse quebrar a qualquer instante. Então chegou, e sem entender a tensão que surgiu à sua presença, aceitou ir até o quarto conversar em particular com .
Um enorme silêncio se instaurou na sala, todos compartilhando da mesma apreensão e receio. Aquilo estava demorando, e meu estômago revirava cada vez mais.
Quando o barulho de passos soou no alto da escada, o rosto vermelho de foi a primeira coisa que enxerguei, depois o rosto pálido, mas sereno de . Por instinto todos nós nos levantamos, e eu poderia jurar que ninguém foi capaz de respirar até ouvirmos .
- Eu vou ser pai, caralho! – Gritou animado, enquanto revirava os olhos, mas sorria.

Londres – 23 de maio de 2009 – 09:17 am.
- Você está nervoso?
- Bastante. – disse jogando uma bola pra Simba que correu pra ir buscar. – Se o olheiro gostar do nosso single, podemos fechar contrato com a gravadora do pai de , e ...
- Vocês sairão em turnê pela Europa, podem lançar um CD, gravar clipes, irão virar sensação mundial, e tendo um namorado e um irmão tão famosos assim, voltarei a ser rica. Vai ser perfeito! – Disparei a falar e sentei em seu colo, enchendo seu rosto de beijos.
- Não ia te dar um centavo.
- Mesquinho.
- Interesseira. – me beijou. Sua língua acariciou a minha e suas mãos deslizaram de minha nuca para minhas costas. Os dedos firmes e precisos na minha pele fizeram o meu corpo inteiro formigar e ficar tão quente que parecia pegar fogo.
- ECA! Não quero ver isso! – reclamou e Simba latiu como se concordasse. – Vamos logo, os garotos já estão aí. – pegou sua mochila e jogou nas costas, fazendo um carinho no cachorro e então acenou para mim antes de sair. – Tchau .
- Boa viagem. – sussurrei contra os lábios de . – Vou sentir saudades.
Seriam apenas três dias, mas o que eu poderia fazer?
- Eu também. – me beijou de novo, mas antes que nos perdêssemos no momento, ele se afastou. – Amo você.
- Amo você. – repeti e sai de seu colo. – Se cuida e toma cuidado.

Londres – 23 de maio de 2009 – 06:18 pm
Cheguei do trabalho e chequei novamente o meu celular, nada... não havia me mandado nenhuma mensagem desde que chegara em Manchester, me deixando ainda mais aflita e curiosa sobre o que havia acontecido. Disquei o número dele, levei o aparelho até a orelha, mas quando entrei no quarto, ele estava lá, deitado despreocupadamente, mantendo um sorriso no rosto.
- Quer me matar de susto? – ele apenas riu da minha confusão e se levantou, retirando o celular de minhas mãos e beijando minha bochecha. – O que está fazendo aqui?
- Vim ver minha namorada.
- , o que aconteceu? Você brigou com os meninos?
- Eu nunca brigo com eles. – mexeu os ombros. – Eles que brigam comigo.
- O que aconteceu?
- Pode guardar os discursos, não houve briga. Só não rolou o show.
- Ah, Estranho, eu sinto muito. – O abracei, o mais forte que consegui.
- Está tudo bem, aquele lugar era um lixo mesmo.
Dei um beijo no seu pescoço e então me toquei que mesmo sem ter acontecido o show, não havia como ele estar no meu quarto.
- Como chegou aqui tão rápido?
- Assim que chegamos lá, o Geoff nos dispensou, então nem fiz chek-in no hotel e peguei o próximo trem.
Não consegui conter um sorriso. Ele sentiu mesmo minha falta, a ponto de não querer passar dois dias sem mim.... Ou ficou tão furioso que desistiu até de conhecer a vida noturna de Manchester. Esse pensamento pessimista fez o meu sorriso esmorecer.
- Por que a urgência de chegar aqui?
- Para te agarrar.
- Engraçadinho, fale sério. Não era você que dizia que queria conhecer o mundo inteiro, como foi perder a oportunidade de conhecer Manchester?
- Eu vou conhecer o mundo inteiro, fazendo minha música, junto com aqueles quatro imbecis que tenho como melhores amigos, mas sem você, saiba que tudo vai ficar sem graça.
- Ah, é? – sorri como uma boba. – Fico feliz em saber que você não pretende gastar o seu tempo com alguma biscate siliconada.
- Praque? O que eu amo está aqui. – sorri ainda mais, até ele acrescentar. – Seu corpo.
- Como você é romântico. – ergui a sobrancelha e fiz a melhor cara de indignada. Ele riu e forçou o tom de voz.
- Mesmo se um dia você me virar às costas, eu irei me contentar com essa imagem, e não vou deixar de olhar para você. – parei ao ouvir aquela declaração brega.
- Estranho, isso foi lindo. – não havia sido tanto, mas eu estava mesmo apaixonada.
- Até porque não é nada mal, passar o resto da vida olhando para sua bunda.
- Idiota. – acompanhei a sua gargalhada.
- Linda.
- Eu te amo, seu insuportável.
- Eu amo sua bunda. – levou a sua mão até lá e me deu um tapa estalado.
- Não mais do que eu amo a sua. – retribuí o "carinho".
Mesmo rindo e fazendo piadas bobas, o olhar de mostrava o quanto ele estava chateado por ter perdido aquela oportunidade.
- Converse comigo. – pedi e o puxei para sentar comigo na cama. Ele fingiu não entender o meu pedido. – Como você está se sentindo depois disso tudo?
- Foi horrível receber um não sem nem ao menos nos ouvirem, isso mexeu com nosso ego e nos fez repensar algumas coisas.
- Como o que? Trabalhar pra melhorar?
- Talvez. Ou parar e reconhecer que isso não vai nos levar a nada. – aquele discurso derrotista me assustou.
- Isso não! – contestei. – Vocês são maravilhosos, , e eu tenho certeza que vocês irão conseguir, alguém irá comprar o single e vocês serão contratados.
- Essa era uma ótima oportunidade e perdemos.
- E daí? Outras irão surgir.
- , as coisas não são... – antes que ele completasse, eu o beijei tentado esvaziar sua mente.
- Eu te amo. – disse entre meu beijo. – Você é o melhor, e eu acredito em você e no seu talento.
me olhou como se não acreditasse no que eu havia dito, transformando as minhas palavras em mentira, mas não eram. Eu precisava mostrar a ele, precisava fazer recuperar sua autoconfiança, e perceber o quanto ele era incrível, principalmente pra mim.
Sentei em seu colo e lhe beijei de maneira urgente, o assustando antes de ele retribuir e roubar o meu ar para ele.
Dei mordidas fracas em seu queixo, passando pelo seu maxilar e descendo pelo pescoço, inspirando o seu cheiro. Minhas mãos arranharam o seu abdômen por baixo de sua camisa, a outra acariciava a sua nuca e puxavam levemente os fios de seu cabelo macio.
Me afastei minimamente dele, conectando os nossos olhos, que agora eram chamas de luxúria.
Levantei os seus braços e tirei sua camisa, empurrei delicadamente o seu corpo na cama, e sentei sobre o seu quadril, suas mãos fortes trataram de me manter ali. Beijei sua testa, bochechas, ponta do nariz, queixo e brevemente a sua boca, espantando suas apreensões, lhe devolvendo a sua confiança, enquanto ele sorria pra mim. Através dos meus lábios eu percorri o tronco de , ouvindo seus suspiros a cada beijo.
Retirei a sua calça com a sua ajuda, e atendendo a seu pedido, fiquei apenas de calcinha, e me ajoelhei entre as suas pernas, tê-lo ali, totalmente a mercê dos meus desejos, deixavam o meu corpo em chamas, e a única peça de roupa que usava estava banhada de lascívia.
Umedeci os lábios com a minha língua, admirando o seu corpo e ansiosa pra ter o gosto dele em minha boca. Voltei a beijá-lo, meu inconsistente já sabia aonde eu chegaria, e o meu corpo não se opunha, eu precisava daquilo. Queria sentir por inteiro. Quando eu parei os beijos abaixo do seu umbigo, passei a mão delicadamente sob seu grande volume, escondido por cima da sua boxer, ficando ainda mais excitada quando escutei um gemido de expectativa escapar da garganta de .
Meus dedos invadiram a peça e tocaram seu membro, fazendo a cabeça dele tombar pra trás, enquanto eu acariciava a sua extensão. Me afastei ainda mais pra retirar aquele pano, beijei a sua coxa e quando cheguei na sua virilha, notou a minha intenção, e se ergueu imediatamente pra me olhar.
- O que você está fazendo? – Ele mal conseguiu formar essa frase que saiu entrecortada. Eu apenas sorri e continuei a beijá-lo sem quebrar o contato visual.
Quando passei a língua pela enorme extensão do seu membro, ele deixou seu corpo cair relaxado e senti o tremor que passou por todo o seu corpo, deixando o meu igual. Eu estava mais excitada do que nunca, só em perceber o quanto eu podia dar prazer a ele.
- Você não preci...
- Eu quero. – assim que a minha língua dançou por todo o seu membro, parou em sua cabeça e eu chupei com vontade. O gosto dele era maravilhoso e me deixava com ainda mais vontade e ele realmente se entregou. – Olha pra mim, . – Pedi com a voz arrastada, o colocando em minha boca. – Vê se estou fazendo certo.
havia correspondido a minha súplica com notório esforço, e minhas palavras pareciam ter disparado algo nele, que o deixaram ainda mais louco, com um desejo latente que se espalhava por seu corpo.
Eu gemi, assim que a minha boca se fechou ao seu redor, e me arrastei até consegui suportar, e pelo seu semblante de espanto e prazer, havia conseguido muito. Me apoiei em suas coxas e o enfiei ainda mais em minha boca, fazendo flexionar ainda mais os seus quadris e se movimentar em minha direção, fudendo a minha boca.
Sua mão esquerda passeava nas minhas costas descendo até a minha bunda que se mantinha mais empinada para facilitar seu toque, a mão direita dele se embrenhou nos meus cabelos, me estimulando e determinando a velocidade dos meus movimentos, e eu pude senti-lo em minha garganta e de novo em meus lábios, e eu circulei a língua bem na ponta. Ele era duro, mas macio e delicioso.
- Isso, , não para, gostosa! – gritou, fazendo eu me sentir uma espécie de deusa do sexo por proporcionar isso a ele. Ouvi-lo gemer por mim me provocava ainda mais, me estimulava a chupá-lo com mais força, enfiando-o ainda mais fundo.
De repente puxou mais forte o meu cabelo e me levantou pelo braço.
- Eu não aguento mais, preciso de você agora. – anunciou ofegante e imperativo, me jogando na cama. – Acho que não vai ter tempo para você...
- Eu estou mais do que pronta. – ao tirar a minha calcinha e perceber o quanto eu estava úmida por ele, ele subiu em cima de mim, com um sorriso abrasador e me penetrou sem mais nenhum tipo de aviso. Sua estocadas eram fortes, mas não tão rápidas, ele parecia estar se controlando ao máximo para que eu também aproveitasse o momento. Como se já não estivesse fazendo isso.
segurou a base da minha coxa esquerda e a levantou de modo que ficasse encaixada em sua cintura, seus lábios sugaram o meu mamilo direito, enquanto apertava sem nenhum pudor o esquerdo. Tudo aquilo estava me enlouquecendo, eu não tinha mais noção de absolutamente nada, só queria que aquela sensação nunca acabasse. Ele continuou apertando o meu seio esquerdo, mas levantou de novo seu tronco e com a mão esquerda massageou o meu clitóris.
Então aquele foi o meu ápice e eu sabia que só estava esperando aquilo pra também se render. Depois de gemidos que mais se assemelhavam a urros nos entregamos juntos, e caímos exaustos na cama.
- Isso foi... – ele tentou dizer por cima de sua respiração falha.
- É, eu sei. – concordei com sua opinião não dita, e me arrumei em seus braços.
- Você vai me enlouquecer, menina. – beijou a ponta do meu nariz e se corrigiu. – Não, definitivamente você já me enlouqueceu.
- Ótimo, porque é isso o que você causa em mim. – Segurei seu rosto em minhas mãos e encarei seus olhos. – Você pode não atingir alguns objetivos na vida, mas o meu amor você conquistou, e isso será para sempre.

Londres – 30 de junho de 2009 – 06:15 pm.
- Eu vou super perder em química. Já consigo visualizar todos vocês de beca, se formando e eu presa naquele colégio. – finalizei a minha dramatização batendo a minha cabeça contra o livro, fazendo rir.
- Calma rainha do drama, só falta você aprender ligações químicas e encerramos.
- Só falta você aprender ligações química e encerramos. – forcei meu tom de voz para parecer com o dele, sem esconder o meu desgosto e cansaço.
- Se fizer isso de novo eu paro de te ajudar.
- Se fizer iss... – parei, porque o olhar que ele me lançou dizia o quanto falava sério.
- Está desculpada. – ignorei seu sarcasmo e continuei quieta, tentando manter minha atenção no chato do . – O que você sabe de ligações químicas?
- Nada. – respondi com obviedade.
- Nada? Nada? – confirmei. – Mas nós demos esse assunto no primeiro ano, como você não lembra?
- Ah, então é mais impossível ainda. – ri e minha sobrancelha ergueu sem meu consentimento e soube que havia algo mais.
- Por que impossível?
- No primeiro ano eu namorava James Carter e ele respondia as minhas provas.
- Que coisa feia.
- Você respondeu a minha última prova de química.
- Fazia parte do idiota. – sorriu como se aquilo amenizasse a sua própria culpa.
- Eu não estou te recriminando por me fazer ficar, cinco horas, num quarto trancado com você e estudando! Estudando, ! – mordi o lábio tentando me aproximar dele, mas pela décima sexta vez, ele não cedeu as minhas investidas.
- Nem adianta vir querendo me enrolar, vamos terminar isso e depois diversão.
- Chato!!!!! – Ignorando totalmente o meu insulto, ele apontou a página do livro com a caneta.
- Vão existir dois tipos principais de ligações, as iônicas e os covalentes. Seguindo a regra do octeto todos os elementos, com exceção do hidrogênio, precisam de oito elétrons na camada de valência para adquirirem estabilidade.
- E o hidrogênio está fora porque só possui uma camada e um elétron no estado fundamental, precisando só de mais um elétron para estabilizar.
- Exatamente, semelhante ao gás nobre Hélio. – externou sua empolgação me dando um selinho, que iria virar um beijo de verdade, se ele não se afastasse. – Continuando, nas ligações iônicas um elemento irá ganhar ou perder elétrons para conseguir essa estabilidade.
- Quem ganha?
- Ânio, o íon negativo. E quem perde é o íon positivo cátion.
- Ok, ânio e cátion... Ânio e cátion. – Fiquei repetindo baixo tentando memorizar.
- Nas ligações covalentes as substâncias compartilham os elétrons, não havendo perda e nem ganhos.
- Não entendi.
- Imagine o nosso coração, nós compartilhamos um amor, um mesmo destino, então.... Se você perder eu também perco, se você vencer eu também venço. – meus olhos brilharam e eu comecei a jogar todos os livros no chão. – Não sei de onde veio tanta viadagem, só foi uma...
- Xiii. – Finalmente me joguei nos braços de , deitando por cima dele. – Eu te amo, agora chega de estudar.
- Você precisa passar.
- Eu já aprendi tudo. – Ele me lançou um olhar descrente que eu não levei para o lado pessoal. – É perfeito como comer bolo ouvindo "parabéns pra você".
- Ai senhor, você precisa mesmo estudar, e sobre essa combinação eu não concordo.
- Por quê?
- Digamos que eu não sou fã de festas de aniversários, não tenho boas lembranças.
- Compartilhe comigo.
- Não é importante.
- Estranho, eu amo festa de aniversário, então é importante eu saber o porquê de você não gostar. – Ele suspirou e sabendo que eu não desistiria, parou pra pensar.
- A minha avó morreu uns dias antes do meu aniversário, então não é uma semana muito alegre para minha família...
- Posso imaginar, eu sinto muito.
-... E também, ano passado eu decidi comemorar, dei uma festa, mas como eu não era o cara mais popular do meu antigo colégio, ninguém foi.
- Ah não. – Coloquei a mão sobre a boca e ao imaginar sempre solitário no dia dele me fez sentir certa piedade. – O importante é você criar novas memórias, esse ano vai ser melhor.
- Você vai estar comigo?
- Pode apostar.
- Então vai ser perfeito. – Sorri e passei meus dedos por seus lábios antes de beijá-lo.

Londres – 23 de julho de 2009 – 04:22 pm.
A cerimônia de formatura e entrega de diplomas surpreendentemente não havia sido chata ou cansativa, pelo contrário, foi descontraída e cheia de discursos emocionados e ilusórios sobre o futuro e o mundo real que nos aguardava. Para mim era tudo bobagem, já que era difícil imaginar um futuro quando se tinha medo e nenhum plano.
Depois fomos pra casa de , nos reunimos naquela tarde pra não fazer nada, como sempre, mas diferente das outras, aquela seria a última e tinha um gosto forte de saudade.
Logo iria pra Milão fazer faculdade, teria sua família, e os garotos continuariam tentando viver seus sonhos, enquanto eu não sabia o que fazer atrelada ao medo do desconhecido, do que poderia vir.
O pai de chegou de viagem e nos parabenizou pela formatura, mas tratou de chamar os meninos pra uma conversa a portas fechadas no escritório. Ele estava cuidando da carreira da banda, então nos restou esperar na sala, ansiosas e aflitas.
- Você sabe o que aconteceu? – perguntou novamente a .
- Pela milésima vez, eu já disse que não sei. Você não percebeu que eu também estou nervosa?
- É difícil enxergar o seu rosto com essa barriga cobrindo tudo. – tentou se arrumar no sofá e não parecer que estava encalhada nele, nos fazendo rir.
- Vai à merda,.
- está linda.
- E enorme.
- Eu vou socar a cara dela. – me avisou, como se eu pudesse desfazer o ato.
- Parem vocês duas já têm cinquenta e três minutos que eles estão lá e... – O barulho da porta se abrindo me calou.
não parava de sorrir, parecia entorpecido, estava pálido e eu poderia jurar que e iriam vomitar a qualquer momento.
- O que foi? – Eu, e perguntamos juntas, mas eles não responderam.
- O One Direction acabou de assinar contrato com a minha gravadora, em definitivo, por dois anos e dois álbuns.
O Senhor revelou, enquanto dava tapinhas nas costas dos meninos, mas aquilo era tão incrível que acabou por emudecer nós três também.
- Isso é...
- A realização de um sonho. – conseguiu finalmente falar.
- Do nosso sonho. – corrigiu, e o momento de estupor virou um total caos de alegria.
Nós choramos, nos abraçamos, comemoramos, fazendo aquele momento se congelar, como um instante mágico e repleto de amor, que lhe dão a certeza de que todas as partes dele irão viver com você para sempre.
Fiquei parada observando a alegria e realização estampado no rosto de cada um dos meus amigos, mas tudo que eu conseguia sentir era medo. Eu não queria que aquilo acabasse, não só porque o colégio havia sido maravilhoso, mas porque ali eu me sentia segura, sabia quem eu era, e todas aquelas incertezas do futuro me apavoravam. Ali eu era a única que não sabia o que fazer a seguir, e ter dezessete anos era ser invadida por sentimentos tão fortes que é palpável. E a sensação de que jamais haverá algo assim no mundo.
- Você está bem? – me abraçou por trás e sussurrou sua pergunta em meu ouvido, parecendo realmente preocupado.
- Sim. – me virei tentando lhe dar um sorriso melhor. – E estou muito feliz por vocês também.
- Eu nem comecei a viajar e você está com saudade, é isso? – perguntou rindo, mostrando que aquilo era uma piada até mesmo pra ele.
- É. Definitivamente.
- Por que estou tendo a sensação de que você está me escondendo algo?
- Você sabe que vou sentir mesmo a sua falta não é? – encarei a fundo os seus olhos, que notaram a seriedade dos meus sentimentos.
- Sei, porque do outro lado, eu estarei sentindo o mesmo. – uma lágrima escorreu pelo meu rosto, enquanto os meus dedos percorriam os seus. – Agora, por favor, me conta o que mais está te afligindo.
me conhecia bem demais pra ignorar qualquer comportamento atípico, e mesmo constrangida por ter que lhe dizer o que estava sentindo, não poderia esconder.
- Eu... Não sei o que fazer. – sorri amarga. – Não quero morar com a minha mãe ou com meu pai, não tenho um emprego de verdade, não sei o que esperar desse sonho de ser uma designer... Eu estou perdida, . – Ele me olhava terna e atentamente. – Eu sou um fracasso.
- Claro que não. – me abraçou forte, como se aquilo fosse retirar a bobagem que havia dito. – Vem aqui.
segurou a minha mão e nos afastou ainda mais de nossos amigos. Saímos de casa e acabamos parando num pequeno banco em meio a uma rua quase deserta. Quando nos sentamos, o olhar dele buscou o meu, assim como suas mãos. Não saberia explicar, mas só de tê-lo ali, eu já me sentia mais forte.
- Lembra do nosso primeiro encontro no Hyde Park? – Confirmei com um aceno de cabeça e sorrindo ao lembrar aquele momento. – Pouco tempo pode ter passado, mas ali eu já sabia qual paixão te movia e tendo em vista o quanto o seu site está prosperando eu tinha razão, na verdade eu sempre tenho. –lhe dei um tapa no ombro, rindo daquela falsa confiança. – Depois do dinheiro, dos seus amigos e eu, roupas é sua paixão.
- Não são. – neguei. – Depois do dinheiro, vem às roupas, para depois vir vocês.
Ele fingiu estar chocado e chateado, mas logo riu junto comigo.
- Está vendo? Criar roupas é algo que você nasceu para fazer e você deve fazer.
- Mas...
- Me deixa terminar. – eu apenas dei de ombros e me calei. – Você me disse uma vez que só havia uma direção e eu concordo, mas existem várias maneiras de se chegar ao início dela. Tudo é confuso e assustador pra todos nós e eu não posso te dar nenhuma garantia, porque a vida não nos dá, mas pensando nisso... – se levantou e o brilho nos seus olhos, assim como o seu sorriso pareceram aumentar ainda mais. Ele retirou um envelope pequeno de seu bolso e me entregou. – Abre. – pediu quando notou que eu estava confusa demais pra olhar o conteúdo do envelope. Ergui a sobrancelha para ele e estreitei o olhar, totalmente desconfiada, depois rasguei sem o menor cuidado, lendo a carta que havia dentro, então reli, e de novo, incrédula.
- Isso... – ele riu ainda mais da minha cara de espanto. – Como? Mas...
- Você se muda uma semana antes de começar nossa turnê.
- , como eu fui chamada pra um curso de moda em Milão? Eu não tenho dinheiro e...
- A taxa de inscrição pra eles avaliarem os seus desenhos foi bem cara, mas eu vinha juntando dinheiro há um tempo. Aceite como meu presente de formatura, você vai morar com ... Foi bem difícil pra ela esconder isso.
- Eu não posso aceitar. – olhei da carta para ele mais uma vez. Aquilo era incrível, mas uma insanidade também.
- Eles aceitaram você pelo seu mérito e você vai aceitar sim. – segurou meu rosto entre suas mãos. – Vai aceitar porque eu só fiz isso por acreditar em você e no seu talento, você vai mudar o mundo um dia, assim como mudou e muda o meu a cada dia.
Tudo o que eu fiz além de chorar foi subir em seu colo e lhe beijar, agradecendo ao destino por me dar alguém como .

+++


O verão daquele ano passou como um sopro da própria estação, rápido, mas delicioso e significativo. Eu e não nos desgrudamos, e aproveitamos cada instante juntos.
Entre as nossas festas loucas e compartilhar do ócio de dias calmos ou de ressacas, eu posso garantir que eu e meus amigos dormimos apenas um terço do habitual e necessário. Além disso, resolvemos promover a banda da nossa maneira. Viajamos para algumas cidades próximas, implorávamos aos donos de pubs para deixar a One Direction tocar, e terminávamos as noites nos divertindo como loucos e dormindo nos carros.
Foi perfeito e digno das melhores férias da minha vida. O último dia em que eu ficaria em Londres, seria exatamente no dia do aniversário de , e desde que eu fiquei sabendo de seus traumas, eu estava empenhada em tornar não só o dia dele perfeito, mas a semana também, só que o universo estava contra mim e os meus planos, tudo acabava dando errado.
Primeiro, eu comprei ingressos pra uma única apresentação do The Fray no Reino Unido, que aconteceu em Birmingham, pegamos o carro de emprestado, a viagem de duas horas foi divertida e engraçada, o clima agradável, e por sorte chegamos no horário exato do show, teria sido incrível se eu não tivesse esquecido os ingressos em casa. riu da nossa própria desgraça e disse que aquele era o melhor show que ele não havia assistido.
Numa tarde bastante quente, eu aluguei filmes que não assistiríamos e comprei diversos potes de sorvete pra tomarmos com o outro ou no corpo do outro, e fui lambendo um pouco diretamente do pescoço de , até que eu senti uma falta de ar enorme, parei no hospital, sofrendo da minha alergia a nozes.
Quando o levei a um parque de diversões pra tentar recriar o nosso primeiro encontro, meu medo de altura me fez ficar longe da roda gigante, uma experiência havia sido suficiente, então fomos na xícara, por insistência minha, mas foi o meu chapéu que sobrou. vomitou nele por ter ficado enjoado demais.
Eu estava frustrada, mas ele continuava sendo paciente e fofo por reconhecer o meu esforço, eu queria dar ao Estranho memórias boas, e não mais uma sessão de belos desastres.
foi tão incrível e altruísta me dando uma direção, que eu queria fazer o mesmo por ele. Queria que ele, mesmo distante se lembrasse de mim e do quanto eu estava torcendo por ele e seus sonhos.
e foram péssimas em me ajudar a escolher um presente descente pra . só falava no quanto queria tirar o bebê de sua barriga, que estava enorme, e tudo que pensava envolvia o meu corpo em novas aventuras sexuais. Óbvio que essa parte aconteceria e óbvio que eu havia guardado todas as dicas, só que era tão maravilhoso, havia me dado tanto, que eu só queria lhe dar algo que fosse especial pra ele, pra nós dois. Uma recordação pra ele não conseguir me esquecer, foi então que em mais uma discussão com as meninas, numa caminhada pelo shopping, que eu tive uma ideia, e eu só passei a torcer que o que eu havia programado pra o dia desse certo.

Londres – 29 de agosto de 2009 – 02:21 pm.
Passamos toda a manhã com John, e eu ainda havia conseguido que ele cantasse empolgado "parabéns pra você", e tentou esconder, mas tinha chorado de emoção. Karen havia feito um verdadeiro banquete em comemoração ao aniversário de , no meio da tarde, eu menti pra ele e disse que estava dando a luz, e que precisávamos buscar ela em casa, já que estava sozinha e nós saímos às pressas. Olhei pra enquanto ele dirigia e mesmo nervoso, ele se mantinha firme, como se soubesse exatamente como agir naquele momento de crise, me deixando ainda mais admirada, e inspirada a criar em minha mente uma cena onde aquilo aconteceria conosco no futuro. Eu estaria prestes a dar à luz a um filho nosso, tentaria me acalmar segurando a minha mão e dizendo que tudo iria ficar bem. Me peguei sorrindo feito boba e mal havia notado que já havíamos chegado.
desceu do carro apressado de verdade, enquanto eu mantinha a minha encenação. O incentivei a abrir a porta da casa, e assim que entramos, os nossos amigos surgiram estourando balões e jogando papéis coloridos sobre ele.
- SURPREEEESA! – Gritaram em uníssono, e o Estranho parou estático, ainda sem entender o que estava acontecendo.
- Supressa, meu Estranho. – o abracei por trás apreensiva e mordi o lábio. – Gostou?
- Amei. – Virou me encarando. – Você é foda. – selou rapidamente os nossos lábios e depois apontou pra nossos amigos, rindo como uma criança. – Vocês são fodas!
- Precisamos fazer um brinde! – Assim que se virou pra pegar as bebidas, ele caiu. Um movimento e pernas pra cima, bunda no chão, um enorme tombo. Não sei que estava rindo mais, todos incapazes de sequer ajuda-lo, ou de perguntar se ele estava bem. – De onde veio essa água? – perguntou mais irritado por ainda estarmos rindo dele.
- Veio de mim. – disse com uma expressão assustada.
- Você fez xixi?
- Não, a minha bolsa estourou, e agora é de verdade. – Mordeu o lábio e olhou diretamente pra , que se levantou prontamente.
Quando todos se deram conta do que estava acontecendo, corremos atrapalhados, cada um tentando ajudar de um jeito, nenhum de nós fazendo algo realmente útil. tomou frente da situação e segurou a mão dela, sussurrando coisas para acalmá-la, e se manteve abraçado à namorada até o momento em que chegamos ao hospital.
Algumas horas depois apareceu com um sorriso enorme no rosto e os olhos molhados de emoção, berrando que finalmente era pai.
Nós todos rimos e comemoramos empolgados, fazendo uma verdadeira bagunça, até sermos lembrados de que estávamos no hospital.
Eu e entramos no quarto e meus olhos foram direto pra o bebê no colo de .
- Oi papais. – brincou e foi falar com . – Como você está se sentindo?
- Estou cansada, mas muito feliz. – Ele beijou sua testa.
- Ela foi ótima. – preconizou, olhando pra com ainda mais afeto e admiração.
- Eu posso segurá-la?
- Oi pra você também, . – Não me atentei a ironia de , já que havia colocado a bebê em meus braços.
Arfei e senti os meus olhos inundarem. Jazzy era linda, e tudo nela era perfeito. O cheirinho dela roubou o meu olfato, me deixando ainda mais apaixonada. se aproximou de mim pra conhece-la e tocou a mãozinha.
- Ela é perfeita. – Comentou como um verdadeiro tio babão. – Ainda bem que ela se parece com você, .
- Fica quieto, seu bicha. – reclamou mantendo a descontração, mas eu só continuava ali parada, segurando toda aquela inocência, totalmente derretida de amor.
- Ela é perfeita. – Reafirmei e beijei sua testa. – A Tia te ama muito, Jasmyn.
- Você não é a tia dela. – me corrigiu e eu a olhei feio. Ela sorriu ainda mais e trocou um breve olhar pra , que concordou com a pergunta silenciosa de seus olhos. – e eu gostaríamos que além de tia, você fosse a madrinha dela.
- O.…O que? – Abri a boca totalmente surpresa com aquele pedido.
- Você é a pessoa mais indicada para isso. – Ela sorriu e me olhou com tanto carinho, trazendo ainda mais comoção para nós. – Porque até quando eu fui fraca, você lutou por mim, pra que esse momento chegasse, pra que Jazmyn estivesse aqui, e isso , isso eu nunca vou esquecer.
- Eu... – Ri, deixando que as lágrimas de felicidade corressem livres. – Aceito. Vai ser uma honra.
Daquele momento em diante, eu me senti uma mãe, mas de uma maneira ainda mais especial, já que o único laço que me unia a Jazmyn era o amor puro.
Novamente e Mel se olharam, e mais uma vez concordou com a cabeça, agora ainda mais empolgado, tanto que não deixou que falasse, se apressando em dizer.
- Queríamos que você fosse o padrinho, .
- Hã? – Instantaneamente ficou pálido e ainda mais abobalhado, enquanto processava aquele pedido, fazendo a gente rir com sua reação. – Claro! – Berrou esganiçado.
- Xiiii! – Reclamei quando a bebê se assustou e se remexeu em meu colo. – Seu dindo é meio doido. – Fingi cochichar pra Jazmyn, e mordeu, de leve, a minha bochecha.
- E a sua Dinda é uma chata.
- Não sou. Prometo ser a melhor madrinha desse mundo, e vou cuidar de você pra sempre. Vou te olhar e te compreender, mesmo quando os seus pais forem caretas. – Disse a última parte baixinho.
- Seremos os padrinhos mais fodas do mundo.
- Não tenho dúvidas. – riu, mas logo deu um olhar repreendedor pra , e apontou o dedo pra ele. – Só não repita mais essa palavra perto dela, principalmente quando ela começar a falar.
- Desculpa. – cobriu a própria boca, se sentindo culpado.
- Primeira foto oficial dos padrinhos.
apontou a câmera do celular pra gente e eu arrumei o cabelo e fiz uma pose hollywoodiana. fez o mesmo ao meu lado, e ergui um pouco Jazmyn.
- , cuidado. – alertou. – está com cara de quem quer uma dessas.
Nós acabamos nos olhando e sorrindo um pra o outro, no exato instante que capturou o momento. Enquanto eu notei a mudança de meu maior sonho. Eu continuava querendo ser mãe, mas agora, eu queria ter essa família ao lado de e só com ele.

FLASHBACK OFF.

’s POV

Londres – 12 de maio de 2016 – 10:41 am.
- Confesso que foi a minha curiosidade que permitiu que você subisse – falei pra Peter, enquanto ele adentrava o meu apartamento, numa postura séria, mas nada ameaçadora.
- Estou indo embora, mas antes eu precisava fazer uma última coisa.
- Veio me pedir um autógrafo para sua sobrinha? – talvez eu devesse, mas eu não conseguia ser nem um pouco educado com o cara. Peter riu, como se eu estivesse usando um tom zombeteiro.
- Isso seria bem gentil da sua parte, mas eu espero essa gentileza direcionada a outra pessoa. – Uma tensão surgiu quando as palavras e postura de Peter se endureceram. – Eu não quero saber se você é burro o suficiente para estar com quem não gosta e com quem não gosta de você.
- Quem você pensa que...
- EU ME IMPORTO COM . – Me cortou aumentando o seu tom de voz, mas eu só me calei ao ouvir o nome dela. – Seja gentil, educado, até mesmo amigo. Você já estragou a vida dela uma vez, e se eu souber que continua a magoando fazendo showzinhos como aquele da festa, eu mesmo me encarrego de acertar as contas dela.
Diferente da ameaça do nerd, a de Peter tinha um fundamento. Ele amava e estava mesmo disposto a vê-la feliz, mesmo que não fosse com ele, e ali eu entendi o porquê do meu ódio gratuito por Peter, ali eu reconheci, pra mim mesmo, que o filho da puta era o homem digno de ter .
- Já deu o seu recadinho ao Andrew? Ao Louis? Isso é uma espécie de viagem ao passado amoroso de ? – Usei pateticamente da ironia, para tentar esconder a minha intimidação.
- Não banque a criança, já passou da hora de você assumir o controle de sua vida. Espero que você tenha entendido tudo, . – Ele soou como um pai repreendendo a sua cria, e eu me odiei por me sentir exatamente assim. Peter se virou para ir embora, logo depois que o meu silêncio, ou algo em minha expressão, foi suficiente como resposta satisfatória. Num movimento brusco, como se estivesse esquecido de algo ainda mais importante, o punho de Peter acertou em cheio o meu rosto. A força do golpe e a surpresa me fizeram cair no chão, sem nenhuma reação. – Desculpe, eu sempre quis fazer isso.
Mantendo um sorriso amistoso, o desgraçado foi embora.

’s POV

Londres – 12 de maio de 2016 – 12:17 pm.
- Olá, senhorita . – Peter finalmente apareceu, com um sorriso no rosto e sua calma habitual, enquanto eu estava correndo de um lado pra o outro, terminando de ajeitar as coisas dele.
- Hey, Senhor Mills, onde você estava? Você está a minutos de perder seu voo, temos que sair agora. – ele se encostou à mesa e me assistiu jogar um último embrulho, presente meu pra sobrinha dele, na sua mala e fechar.
- Fui comprar uma última recordação desse lugar.
- Ah para, você adorou Londres. – me aproximei dele e o encarei, esperando provar minha teoria, mas tudo o que vi foi saudade.
- Adorei ver você. – sorripara ele e encurtei ainda mais a nossa distância com um abraço apertado.
- Vou sentir a sua falta.
- Me promete uma coisa? – concordei com um aceno, ainda dentro de seus braços. – Se o seu destino não se cumprir, você me chama de volta para sua vida?
O destino ao qual ele se referia se chamava Liam Payne, e eu não tinha nenhuma esperança sobre ele, mas Peter era tão maravilhoso que não merecia viver sendo um estepe de alguém como eu. Incapaz de amá-lo de verdade.
- Não. – sussurrei e a minha negativa fez Peter segurar meu rosto entre as suas mãos e buscar o meu olhar. – Não, porque você merece mais do que isso, mais do que alguém que infelizmente não será cem por cento pra você.
- Entenda uma coisa, você é , você com apenas um olhar tem a capacidade de mudar a vida de um homem.
Ri daquele exagero e deixei que os meus dedos dançassem pelo rosto dele, em cada traço eu pude reconhecer sua compaixão, amizade e carinho. Eu pude sentir o seu amor. Foi à primeira vez em que eu pedi e desejei ao meu coração e destino, que eu pudesse amar outro homem que não fosse , mas sim um homem como Peter, que entendia o meu passado doloroso, mas que não fazia parte dele.
Os olhos de Peter se fecharam ao meu carinho, e eu selei os nossos lábios e me entreguei ao seu beijo, me permitindo entregar as reais sensações que ele me causava.
Nessa minha despedida com Peter eu senti que poderia flutuar, estava leve como uma pluma, eu havia tirado o peso que carregava nos ombros por um instante, o instante de um beijo.
O barulho do meu celular fez a gente se afastar, trocamos um sorriso cúmplice, sem nenhuma culpa pelo o que havia acontecido. Peguei o celular sobre a mesa e ouvi o recado que haviam deixado.
- Era o meu pai. – até eu sorrir Peter pareceu preocupado. – O meu irmão nasceu.

Londres – 12 de maio de 2016 – 02:51 pm.
Ao entrar no quarto, vi segurando com cuidado o nosso irmão, e meu pai bem próximo a eles, babando sua cria. Elena os observava com um sorriso enorme, que cresceu ainda mais a me ver.
- Tem lugar pra mais uma aqui? – Brinquei, e meu pai parecia querer fazer uma festa.
- Chegou minha princesinha! – Me abraçou do mesmo jeito que ele fazia quando eu era criança. Depois eu fui felicitar a minha madrasta. Mesmo com um semblante cansado, ela continuava maravilhosa. – Parabéns mamãe. Como você está se sentindo?
- Completa? – Devolveu a pergunta rindo, olhando brevemente para mim, para então voltar a sua atenção para o bebê. – Eu percebi que não era nada antes desse momento. É surreal como aquela coisinha, tão pequena, me transformou. – Controlei os meus sentimentos de pesar.
- Eu imagino a sensação. – Me virei pra – E você seu babão, posso ver esse príncipe?
Fingindo estar contrariado, me entregou o bebê.Meu coração se apertou de felicidade, enquanto eu admirava cada traço dele, que era idêntico a Elena, mas mesmo tendo apenas poucas horas de vida, algo na forma como ele se mexia em meu colo, ou agarrava o meu dedo, mostravam o quanto ele seria forte e destemido, sua personalidade era uma herança do meu pai.
- Ele é lindo. – Comentei sem conseguir tirar meus olhos do bebê. – Vocês fizeram um bom trabalho.
- disse que está triste porque agora ele é o meu filho mais feio. – O tom de voz do meu pai transbordavam leveza e felicidade, era tão bom vê-lo assim. Olhei pra ele, que bagunçou o cabelo de pra irritá-lo ainda mais.
- Oras, mas ele sempre foi! Eu é que perdi o posto. – Nós rimos, até mesmo .
- Ter meus três filhos aqui comigo. – Meu pai soprou emocionado, me abraçando de um lado, e do outro. – Hoje é um dos melhores dias da minha vida.
- Não vai começar a chorar, meu velho senil. – Foi a vez de cutucar ele, mas àquela altura meu pai já havia derramado algumas lágrimas, e era isso o que eu achava mais sensacional sobre ele. Sua coragem de amar. – Eu estou dizendo, já está velhinho dem...
- Posso entrar? – O som de sua voz revirou o meu estômago e esmagou o meu peito.

’s POV

Enquanto eu entrava no quarto e falava com todo mundo, permaneceu imóvel segurando o bebê em seu colo. Seu peito subia e descia em descompasso, e o que me magoou foi o fato dela não olhar para mim.
- Oi,. – Tentei parecer descontraído, assim que me aproximei dela, com a desculpa de conhecer a criança.
- Oi,.
Não houve um tom subliminar, um jogo, ou até mesmo um sorriso furtivo. Ela estava seca. A culpa era minha e de minha burrice crescente, eu era um cego que tinha voltado a enxergar depois de ser atingido por Peter.
- Robert, ele é um garoto muito bonito.
- Você e sua obsessão pelos meus filhos. – A brincadeira pareceu não agradar , que repreendeu o pai, com apenas um olhar.
- Tem razão, é meu espelho de vida, olha só esse rostinho lindo.
- Ouviu, ? – fez bico e uma pose totalmente afeminada. – Sou o segundo mais bonito.
- A opinião na qual você está embasado não me interessa. – Mesmo as palavras sendo duras, não queria me atingir, só provar um ponto na sua "discussão" com , e eu odiei ainda mais isso. Eu queria que ela tentasse me atingir, eu queria a sua atenção. Que porra de escolha eu estava fazendo? Por que eu havia desistido de ?
Enquanto eu me remoía, os irmãos continuaram naquela disputa boba, e riam de alguns comentários feitos por Robert. O tempo seguiu, o papo fluiu entre todos e permaneceu todo o tempo, de pé, trocando os pés suavemente, numa dança que deixava o bebê ainda mais calmo. Vez ou outra ela o olhava e sorria ao contornar o seu rosto com o dedo. Não sei se a razão era saber que o maior sonho dela era ser mãe, mas aquela cena era tocante pra mim, era quando eu enxergava na felicidade plena.
- fica bem segurando um bebê. – Sem filtro eu externei o meu pensamento, emudecendo todos os presentes, como se eu estivesse dito algo impróprio ou imoral.
- Eu concordo. – Elena sorriu fraco ao concordar comigo, mas eu sabia que aquilo foi por mera educação.
Por sorte, ou não, as coisas não ficaram piores, pois a enfermeira chegou e disse que o bebê precisava mamar, como um timing perfeito de um filme.
Pra dar privacidade a Elena, e disseram que iriam embora, e eu fiz o mesmo. e eu seguimos sozinhos, até o setor B do estacionamento. Ela estava fazendo um esforço enorme pra se manter distante e impessoal comigo, eu não julgava a sua atitude, já que eu mesmo havia pedido por isso, mas eu sentia que essa não era a sua razão. Ela continuava me escondendo alguma coisa, e todas as vezes que eu a encarava, meus olhos lhe perguntavam o que era, e por isso ela fugia.
- O que houve com o seu rosto? – Me perguntou com um receio e formalidade que não combinava conosco.
- Conhece a expressão "soco da vida"? – Assentiu com olhar pesaroso. – Acho que recebi um.
- Cuida disso, põe gelo pra não ficar pior. – Balançou os ombros numa encenação de desdém, mesmo assim eu sorri em agradecimento.
Continuamos andando, mas um terrível, inédito e constrangedor silêncio, surgiram entre a gente, e com as palavras de Peter me assombrando, eu senti uma necessidade de me desculpar e tentar selar mais um acordo de paz entre nós.
- , eu queria te...
- , eu tenho que ir!
- Mas... – Não houve tempo pra mais nada, e sua determinação em me manter longe, já haviam me deixado.

Londres – 13 de maio de 2016 – 12:23 am.
- ? – Assim que entrei no apartamento, aquele chamado me paralisou.
- Que susto! Como você entrou aqui, Andy? – Entortou a boca como se a resposta fosse óbvia. Acendi a luz e pude notar o quanto ele parecia exausto.
Desde a festa do One Direction, eu estava evitando Andy. Eu sempre fazia questão de estar em alguma reunião, ou ocupada demais para ele. Até ali, aquela invasão.
- O segurança me conhece e me autorizou.
- Mas...
- Onde você estava? Passei o dia aqui te esperando. – Ainda tentando me refazer do susto, eu me sentei e comecei a retirar meus saltos.
- Saí com o Peter, então...
- Com aquele cara?! Você passou o dia com ele, por quê?
- Não que essa pergunta, exija uma resposta melhor do que "porque eu quis", mas ele voltou pra Nova York, além do mais meu irmão nasceu hoje.
- E o grande Peter que estava lá com você, bancando o senhor perfeito.
- Qual o seu problema?
- O problema é esse imbecil dando em cima de você o tempo inteiro, você não é burra, muito menos ingênua, então sabe bem do que estou falando.
- Você está com ciúmes à toa. – Disse totalmente despreocupada com aquelas acusações, se havia cabimento ou não eu não me importava, mas parece que minha reação o deixava ainda mais furioso. – Não entendo o porquê de você está assim, não é como se estivéssemos...
Deixei as palavras soltas no ar, sem amarras como de fato eu me sentia sobre Andrew.
- Não estivéssemos o que? Num relacionamento? – Se exaltou, como se eu houvesse lhe ofendido.
- Andy, vai com calma.
- Me diz, !!! – Ele avançou parando bem próximo a mim. Seu lábio tremia e ele moveu o dedo para o meio de sua sobrancelha como se ainda usasse óculos e de repente, Andrew era só o Andy do colégio. – O que eu sou para você?
- Você é um cara incrível, e estamos tendo bons momentos... – O toque, quase rude, de Andrew em meus ombros, barrou as minhas palavras e me fizeram encarar seus olhos azuis, agora ainda mais escuros.
- O.Que.Eu.Sou.Seu.? – Perguntou pausadamente, buscando a todo custo um controle, na esperança de que outra resposta viria, mas eu não iria mentir.
- Um amigo.
Andrew se afastou, me dando as costas e apertando o próprio maxilar.Ao se virar com meu chamado, havia um sorriso triste em seu rosto, mas um tanto irônico.
- Eu sabia! Você nunca quis nada sério comigo...
- Andy...
- O que você pretende? Arruinar o casamento de ? Corre! Continue correndo atrás da sua infelicidade! Você é mesmo patética! – Andrew cuspiu sua ira e não me deu a chance de réplica. – Você vai se arrepender disso! Vai se arrepender de ter sido burra naquela feira de ciências também. – Deixou uma ameaça e saiu mais uma vez da minha vida, e mais uma vez não levou nada.




Capítulo Dezessete


"Sweet dreams till sunbeams find you. Sweet dreams that leave all worries behind you. But in your dreams whatever they be...Dream a little dream of me". Dream A Little Dream Of Me – Ella Fitzgerald


FLASHBACK ON:

Londres – 29 de agosto de 2009 – 11:01 pm.
- Esse sem dúvidas foi o meu melhor aniversário!
- Foi uma bela maneira de encerrar a noite, padrinho. – Ele concordou mantendo o sorriso e abriu a porta do carro pra mim. – Mas eu ainda tenho que te dar um presente.
- Achei que já tivesse me dado.
- Não senhor. – Quando ele entrou no carro, eu me aproximei dele pra sussurrar em seu ouvido. – O melhor ainda está por vir, dirige até a casa do seu avô.
Como se tivesse medo de questionar, me beijou e depois seguiu direto pra casa de John.
O lugar estava iluminado por pequenas velas, alguns balões de corações pendiam do teto, e uma mesa de jantar estava posta. Seguimos por um caminho de pétalas de rosas vermelhas, parecia encantado e genuinamente surpreso.
Ainda segurando a sua mão, eu o conduzi até o quarto e o fiz sentar na cama. Logo as mãos dele acariciaram a minha cintura, enquanto as minhas percorriam os seus cabelos. O beijo que ele depositou entre os meios seios, arrepiou o meu corpo, totalmente submisso ao dele.
- Pronto pra o seu presente?
- Você preparou esse lugar, e ainda tem mais? – A conotação sexual estava explícita em seu olhar e em cada palavra dita. Mordi o meu próprio lábio tentando buscar um controle, antes de me perder em .
- Calma, Estranho, estou falando de outro presente. – Ri, e não pareceu decepcionado por esperar mais alguns minutos pra me ter só pra ele. – Já volto.
Beijei novamente os seus lábios, e ao voltar com uma case preta em mãos, os seus olhos brilharam.
- Eu sei que você tem violão, mas eu não estou te dando esse pra ser funcional. – me olhou intrigado, e abriu o seu presente com ainda mais empolgação. – Quando você sentir a minha falta, toque. Cada nota soada será um beijo meu, um abraço, eu lhe dizendo que te amo e que do outro lado eu também estou com saudades.
- Eu adorei.
Meu peito se encolheu em dor pelo que viria e eu não pude conter o meu choro. Tudo seria diferente a partir dali e eu não queria me afastar de , não queria ter que viver sem seus beijos doces como os que ele estava me dando naquele momento.
Eu havia bebido saudade durante todo aquele verão, mas ali eu não consegui mais conter. Sentiria falta das luzes aos relâmpagos.
- Não vamos falar da distância... Só... Vamos encará-la, eu amo você e nós vamos ficar bem.
- Eu te amo, Estranho.
se levantou e segurou o meu rosto entre as suas mãos, me beijando, me dando certeza. Os seus olhos brilharam pra mim antes dele virar o meu corpo, suas mãos alcançaram os meus cabelos que ele afastou para ter acesso ao meu pescoço e nuca, onde eu senti os seus lábios.
- Linda. – Sussurrou próximo ao meu ouvido, sua respiração ofegante dançava em minha pele, me arrepiando. Fechei os olhos e senti os seus dedos me despirem, das minhas roupas, dos meus medos, das minhas imperfeições, me deixando nua pra ele e seu amor. – Minha.
- Sua e para sempre.
Escutei o seu grunhido de aprovação, e a sua boca indo desde a minha bunda até a minha nuca, me cobrindo de seus beijos numa infinita e prazerosa lentidão.
- Ment to be. – Disse ao me virar pra ele. Suavemente as suas mãos tocaram os meus seios, seus polegares desenhando os círculos dos meus mamilos.
- Eu nasci pra ser sua.
Não me dei conta do momento em que fomos parar na cama, nossos sussurros e juras me embriagavam. Os lábios de encontraram os meus, suas mãos estavam por toda parte me acariciando, contemplando o meu corpo. Não havia pressa, receios ou dúvidas, e o melhor, não havia distância. Apenas o desejo de fazer aquela noite durar pra sempre.

FLASHBACK OFF.


Londres – 23 de junho de 2016 – 06:22 pm.
POV. .
- Você parece muito cansada, mãe. – Tínhamos passado o dia no hospital onde vovô havia sido internado há dez dias, mas o olhar pesaroso da minha mãe escondia uma preocupação a mais.
- Só estou preocupada com o seu avô, com você e com todos. – Ela beijou a minha bochecha e fez um carinho nos meus cabelos, enquanto suspirava fundo. – Vou fazer um chá para nós dois.
- Não precisa, eu deveria estar me arrumando. – Abaixei a cabeça sobre a mesa, procurando coragem pra ir embora, ou só coragem pra seguir a diante com as minhas decisões.
Ao levantar o olhar, vi mamãe sentada a minha frente, ela segurou a minha mão e sorriu ainda mais desassossegada, sem nenhuma intenção de me passar a confiança que eu precisava.
- Eu acho que você e Leah estão ae precipitando. – Revirei os olhos, impaciente por ter que ouvir aquilo mais uma vez.
O final de semana do meu casamento havia chegado, a minha família não estava me apoiando, tão pouco os meus amigos, e ver o meu avô ainda mais doente, só piorava as coisas.
- Não vamos ter essa conversa de novo Senhora .
- Mas ...
- Mãe, não! Chega! – Mamãe se rendeu tão fadigada pra discutir sobre aquilo, quanto eu.
- Sabe, eu achei que você e iriam reatar.
- No fundo eu também achei, mas não aguentei mais insistir.
- não pode lhe dar o que não tem, ou o que ela acha que não tem.
- Ela é teimosa, dificulta tudo pra nós dois. – Ri em desgosto, sendo sincero. – Não existe nós dois. Ela é Estranha. – Eu quis dizer no sentido de esquisita, mas foi impossível dizer aquele adjetivo sem soar cruciante, e minha mãe soltou uma risada baixa, mostrando que ela encarou o adjetivo como ele de fato era pra mim e pra : Um apelido carinhoso, repleto de significado pra nós.
- Só um Estranho reconhece o outro.
- Você tem que parar com a sua predileção por . – Ela segurou ainda mais forte a minha mão e me olhou densamente.
- Querido, eu só preciso saber que você será feliz, se você acha que Leah é garota certa, vá em frente, no fim eu vou lhe apoiar independente da sua decisão, mas saiba que o seu coração às vezes pode ser enganado, por isso é você que tem que guiá-lo.
- Eu só cansei, acho que decidi viver sem rumo.
- Queira alguém que te ame por inteiro, que ame tudo sobre você, e tudo sobre o que você ama também.
- E se a decisão final não for minha?
- Há sempre um espaço para lutar por amor. Você a ama?
- Amo. – Respondi sem pestanejar e minha mãe riu como se estivesse provando uma teoria. - Não perguntei sobre , quis saber se você ama Leah, a sua futura esposa. – Diferente da minha resposta anterior, essa pergunta me deixou confuso. Ou eu só estava lutando pra não assumir a verdade.
Londres – 23 de junho de 2016 – 09:43 pm.
Eu não sentia nada. Se pudesse comparar o meu coração a algo seria com um iceberg. Nunca havia me casado, mas eu nem me sentia nervoso, empolgado, feliz e o mais grave, eu não me sentia apaixonado.
O mais bizarro naquilo tudo, é que quando eu pedi pra casar com , mesmo em meio a uma briga, mesmo cheio de ciúmes, eu estava completamente apaixonado, tudo dentro de mim queimava... Ainda queima, e era impossível não fazer tal comparação.
Por que eu iria me casar?
Por que eu iria me casar com alguém como Leah?
Eu e minha futura esposa, saímos pra jantar com seus pais, alguns tios e primos, não havia ninguém da minha família, ou alguém que eu considerasse amigo, estava realmente sozinho naquilo.
- Ah , eu queria tanto conhecer sua família, pena que isso só vai acontecer no dia da festa.
Nori, minha futura sogra, era extremamente doce e gentil, e aquele excesso me causava enjoos.
- Meu avô não está bem, e talvez tenhamos até que adiar a cerimônia. – Leah e uma prima que estava ao seu lado gargalharam. A princípio eu achei que aquilo havia sido reação de uma conversa entre elas, mas só depois que elas apontaram pra mim como se eu fosse um palhaço, eu soube que a graça havia sido algo que eu disse, mas o que poderia ser? – Do que vocês estão rindo?
- Não vamos adiar o casamento porque seu vovozinho está doente, isso seria impensável e desrespeitoso com nossos convidados.
- Falta de respeito é fazer uma festa enquanto o meu avô luta pra sobreviver.
- . – A prima de Leah, que ainda bem eu não fiz questão de gravar o nome, me chamou, ainda mantendo um sorriso no rosto e um olhar debochado. – Pessoas velhas morrem, é inevitável.
- Achou as palavras que eu procurava, Nath. – Leah segurou a minha mão, os nossos anéis de compromisso se chocaram e parecia lixo. – E não é como se ele fosse lembrar do nosso casamento.
Vadia sem coração! Era isso que eu queria gritar, mas a minha educação surpreendente prevaleceu.
Entre a minha perplexidade e a raiva que passei a sentir, o meu celular tocou, quando vi que era Ruth, o medo me dominou e eu não consegui atender.
- Pessoas velhas morrem, e algumas nem chegam a viver. – Me levantei, joguei dinheiro suficiente na mesa pra pagar a conta, retirei aquele anel ridículo e que não era símbolo de nada pra mim e coloquei na frente de uma Leah que mantinha uma expressão de choque. – Você tem até amanhã de manhã para retirar toda a sua tralha da minha casa. – Passei a mão por seu rosto, sem esconder o asco que estava sentindo. – E a partir de agora, eu não quero ver essa sua cara, nunca mais. – Arrumei a postura, sorri para todos os presentes na mesa. – Tenham todos, uma boa noite, agora eu vou visitar o meu vovozinho.
Eu ignorei todos os chamados estridentes de Leah e entrei no carro. Ignorei também, todas as mensagens e ligações enquanto fazia o trajeto até o hospital, eu precisava de mais tempo com o meu avô. Ele não poderia ter partido.
Quando eu cheguei, a primeira pessoa que eu vi foi . Ela estava sentada com um olhar perdido pra o celular em suas mãos, e nem notou a minha presença.
- O que aconteceu? – Isolei os questionamentos sobre o porquê dela está ali. Assim que me ouviu ela se levantou e me abraçou, algo tão quente e reconfortante, mas que o medo do momento não me deixou retribuir. – Ele ainda está vivo?
- Sim, mas... – Me olhou com acalanto. – É ruim, eu sinto muito.
- Ele vai sair dessa. – Afirmei, mesmo ter real noção do que estava dizendo, e parece que a minha confiança guiada pela minha crença, acabaram convencendo . Foi isso que eu enxerguei quando voltei a encarar os seus olhos: Fé.
- Vai sim. – Sorriu pra mim. – Só pessoas da família foram autorizadas, mas você pode vê-lo, Ruth e seus pais estão lá.
- OK. – Estava respondendo no automático. – Obrigado por ter vindo.
- . – Me virei ao seu chamado e vi a minha dor refletida em . – Por favor, diga a ele o quanto ele é importante pra mim, e o quanto eu o amo.
Duas lágrimas contornaram o seu rosto, e só me restou confirmar com um aceno e um sorriso fraco, incapaz de lhe dizer nada. Eu iria me despedir por nós dois.
POV. .
Já se passavam das três da manhã, e nenhum deles havia saído ainda do quarto. Havia criado uma relação cordial com uma enfermeira, e era ela que me mantinha informada.
Meu corpo doía e implorava por descanso, mas minha apreensão e orações eram o que me mantinha acordada.
- Querida, ainda está aqui? – Lydia pareceu verdadeiramente surpresa ao me ver ali. Ela se sentou ao meu lado, e eu me arrumei na cadeira, totalmente em alerta.
- Não quero ir pra casa, até que tudo esteja bem. – Ela sorriu pra mim e fechou os olhos como se estivesse deixando que boas lembranças lhe invadissem. – Como ele está?
- Nada mais será possível, já começamos a nos despedir. – Segurei a mão trêmula de Lydia.
- Vamos ter fé. – Pedi sabendo que era o que nos restava fazer.
- Sempre. Foi isso que John nos ensinou, afinal.
- Ele é incrível.
- Quando eu visitei a casa dos , pela primeira vez, eu estava tão nervosa, com medo dos pais de Carl não gostarem de mim, já que naquela época eu já estava tão apaixonada por ele.
- E como foi? – Perguntei tentando nos distrair daquela realidade triste.
- Era aniversário de John, ele fez piada com o meu cabelo, Lorraine foi muito gentil, e no final tudo correu bem e eu me diverti bastante. Foi tudo leve, me entende? – Confirmei me lembrando do meu primeiro jantar em sua casa e de como eu me senti, mas não seria adequado fazer comparações quando agora eu não passava de amiga da família. – , meus pais morreram muito cedo, mas o ditado "você se casa com a família fo seu marido" sempre me perseguiu, e instantes antes de me despedir dos ’s naquela noite, eu tive certeza que Carl era o homem certo pra mim. Eu me senti acolhida, parte daquela deles. – Mais uma vez, eu nos comparei. – E John ainda me surpreendeu.
- Qual surpresa ele fez pra você?
- Nenhuma, estávamos saindo e John ficou parado me encarando, quando perguntamos a razão, ele disse que estava guardando o momento no qual descobriu que o filho havia encontrado o amor de sua vida. – Disse entre lágrimas e soluços, MS fazendo acompanhar o seu choro saudosista e doloroso.
- Você fez tudo o que podia por ele.
- John tinha essa sensibilidade de compreender o amor, e identificar almas gêmeas, e quando ele te conheceu, ele falou o mesmo a seu respeito, e , você sempre foi tão cuidadosa e carinhosa com ele e... Ele te amava muito, como uma neta, você sabe disso?
- Eu sei.
Perdidas em nosso abraço, só fomos interrompidas por Ruth, nos avisando que John havia partido com sua fé inabalável no amor, finalmente e novamente, para os braços de Lorraine.
Londres – 26 de junho de 2016 – 02:55 pm.
POV. .
Quando o seu herói se vai, passa a ser impossível se olhar no espelho, já que o seu próprio reflexo fica embaçado e indistinto. Você passa a questionar as razões pra permanecer, quando o outro já não está. Era desamparo, e eu parecia ter nascido pra isso, ser abandonado.
A igreja era pequena, a mesma onde meu avô costumava dizer ter começado a sua vida, porque fora ali que ele e minha avó se casaram. O caixão, entalhado em madeira preta, estava aberto e repousava a dor de todas as poucas pessoas que estavam ali e que haviam sido cativadas pelo homem que John foi.
Minha mãe e minha irmã fizeram um breve discurso, eu e meu pai não conseguimos. Os dois homens da família que sobraram, eram uns covardes, ou só mais reservados emocionalmente. A verdade é que eu estava fraco, cansado até pra me mover, ou agradecer as condolências de quem quer que fosse, estava tão no automático que não fazia real noção do que estava acontecendo no decorrer daquele dia.
Quando achei que aquele velório havia terminado, levantou e se dirigiu até o púlpito, eu não havia notado a sua presença ali até aquele momento. Não sabia se ela já havia vindo falar comigo ou não, culpa de minha confusão. Mas ela estava ali, iria falar sobre o meu avô, como parte da minha família, e era exatamente o que ela era. Família.
Os lábios crispados, e os olhos negros marejados foram incapazes de me encarar, depois de um longo suspiro, encontrou forças pra falar, e sua voz estava mais rouca que o usual, e só depois de testá-la por duas vezes e pigarrear, começou.
- John, em poucas palavras me ensinou tanto sobre amar, viver a vida e se deleitar dela, porque disso ele nunca esqueceu, que acabou me tornando alguém melhor. O que difere pessoas comuns das grandes é a sensibilidade, a incrível capacidade de sentir e não ter medo. Assim era John. Ele nos tocava, nos orientava e sem ao menos nos darmos conta, estávamos sentindo como ele, enxergando o mundo sob uma nova perspectiva e sensação. – Ela mais uma vez olhou pra todos os presentes, exceto pra mim. – Sei que por falta do meu grau de parentesco, muitos estão se perguntando o que eu estou fazendo aqui, mas estou pelo meu profundo carinho e respeito pelo homem que John foi, e meu amor por ele e sua família. – Finalmente os nossos olhares se encontraram, e se fixaram. – Um sopro de vida parou o coração de John, mas nem por uma ventania, os nossos corações podem deixar de amar, de acreditar. O que me conforta é saber que ele, finalmente, encontrou o fim de seu arco-íris. Essa é a minha homenagem.
, segurando um violão, se posicionou ao lado da irmã. Eu não tinha ideia do que pretendia, ela não iria cantar a música do meu avô, não tivemos tempo pra colocar uma melodia nela, será que ela... Quando eu ouvi os primeiros acordes eu soube, ela tinha feito aquilo sozinha, e por todos nós.
Para ouvir a música, clique aqui!
Hold my hand
Segure a minha mão
And tell me a have travel whith me
E diga que quer viajar comigo
I have ticket of your favorite band
Eu tenho ingressos para a sua banda favorita
They will play this song and I will come back to you
Eles tocaram a essa música e eu voltarei para você
My sweet passion
Minha doce paixão
Drink that love with me
Beba esse amor comigo
And make me forget the world,
E me faça esquecer o mundo,
for lose myself in you.
pra me perder em você
Sing the words of that song and I will come back to you.
Cante as palavras dessa canção e eu voltarei para você.
Don’t worry about the distance.
Não se preocupe com a distância.
This song will always be our treasure.
Esta canção sempre será o nosso tesouro.
Through it we will always be together.
Através dela nós estaremos sempre juntos.
'cause somethings are Meant to be
Por que algumas coisas estão destinadas a ser
And this song is one of them
E essa música é um delas
Sing the words of that song
Cante as palavras dessa canção
And I will come back to you
E eu vou voltar para você
And I will come back to you.
E eu vou voltar para você.

Londres – 28 de junho de 2016 – 11:48 pm.
POV. .
Ruth me telefonou novamente pra saber se havia aparecido em minha casa, ou dado notícias. Não quis lhe dizer, mas aquele sumiço já estava me deixando preocupada a ponto de ter lhe prometido que eu o acharia.
Quando eu entrei no carro, eu só esperava ainda conhecer o suficiente, pra saber exatamente onde encontrá-lo.
A casa estava escura, mas eu sentia que ele estava lá. Os degraus de entrada ainda rangiam, e quando eu abri a porta meu olfato foi invadido pelo cheiro de mofo, mas que pra mim era o mesmo cheiro de boas lembranças. Entrei e meu coração acelerou com tantas recordações, lembrei quando estive ali pela primeira vez, quando eu passei a me revelar pra , quando o beijei com o meu coração. Senti que era uma cápsula do tempo, agora, era como invadir o relicário do amor que tive com .
A porta do quarto estava entreaberta, a luz amarelada do abajur iluminava o semblante desolado de .
- Sabia que iria te encontrar aqui.
- Talvez eu precisasse ser encontrado. – Confidenciou num sussurro. – Mas você não precisava ter vindo.
Me aproximei dele e sentei ao seu lado na cama, segurando sua mão. Seu olhar continuava voltado pra o chão, então beijei sua cabeça e o abracei de lado, acariciando seus cabelos desgrenhados.
- Claro que precisava, estavam preocupados. – Sua respiração acelerou, mas ele se manteve ali, silencioso. – Como está lidando com tudo isso?
- Eu não sei. – Negou desapontado. – Está tudo confuso, perdido, e eu sinto raiva de mim, do tempo, da passagem.
- Irá melhorar, nós vamos passar por isso juntos. – se afastou minimamente de mim, numa luta pra controlar seu choro, e as poucas lágrimas que escaparam, ele limpou instantaneamente. Mesmo relutante eu o abracei novamente, colocando o em meu peito, lhe dando carinho e conforto. – Chora.
- Eu não...
- Um Estranho me disse uma vez que chorar não é sinal de fraqueza.
- Que conselho péssimo.
- Eu também achei, mas ele estava certo. – Segurei sua cabeça colando nossas testas. – Encare sua dor, eu estarei com você. – Ele apenas assentiu liberando seu choro.
O abracei com o máximo de força que eu consegui. Tudo que eu queria naquele momento era confortá-lo, fazer se sentir bem, transmitir paz, assim como ele fez comigo. Nosso passado não importava. Nada mais importava, eu só queria arrancar aquela dor que sentia, eu também chorava, não só por ele, mas porque iria sentir falta de John, havia me apegado tanto a ele que aquela era uma perda minha também.
Depois de um tempo, quando percebi que ele havia se acalmado, julguei que era a hora de ir embora. Me remexi e então saiu do meu abraço.
- Acho melhor eu ir, você não quer que eu te deixe em casa?
- Passe essa noite aqui comigo.
- Não sei...
- Por favor, eu só preciso segurar algo importante e esquecer esse dia horrível, e tudo isso que eu estou sentindo.
Era um pedido irrecusável, então eu puxei o lençol da cama, deixando ela arrumada pra gente dormir. Assim que nos deitamos, procurou o meu colo e se aconchegou como uma criança assustada.
- Eu estou com medo. – Confidenciou. – Eu não sei o que fazer daqui pra frente.
- Uma coisa de cada vez, um dia após o outro. John iria querer te ver bem. Você teve uma coisa que eu... – Me corrigi o mais rápido que pude, torcendo pra que não percebesse que eu iria falar de mim mesma. Até de nós dois. – Que muitas pessoas não têm.
- O que?
- Despedida.
- A vida é mesmo irônica. Essa é a segunda vez que estou deitado nessa mesma cama, com você e com a certeza de que quando amanhecer tudo estará diferente.
Foi a minha vez de me aninhar entre os braços de , inalei o seu perfume e desejei imensamente poder lhe dizer que estaríamos juntos dali em diante, mas eu sabia que não seria possível, e não tinha mais a mesma capacidade de sonhar que eu tive quando me despedir de pela primeira vez, naquele mesmo quarto, naquela mesma cama.
FLASHBACK ON:

Para ouvir a música, clique aqui!
... worry about the distance
...se preocupe com a distância
I'm right there if you get lonely
Eu estou bem aí, se você se sentir sozinha
Give this song another listen
Ouça esta canção novamente
Close your eyes
Feche seus olhos
Listen to my voice it's my disguise
Escute minha voz, ela é o meu disfarce
I'm by your side
Eu estou ao seu lado

Um som doce e uma voz melancólica acariciaram os meus ouvidos e eu acordei. Sentei na cama e reparei pela janela de vidro, que o sol começava a nascer tímido, no céu sem nuvens daquele dia.

Oh it's what you do to me
Oh é o que você faz comigo
Oh it's what you do to me
Oh é o que você faz comigo
What you do to me
O que você faz comigo

O cheiro de estava presente em tudo ali, mas ele não estava ao meu lado, e uma necessidade, maior que tudo, me fez levantar e procurar por ele. Vesti a sua camisa, e o tecido de algodão percorreu o meu corpo que ainda estava dolorido e arrepiado pelos carinhos dele, trazendo um sorriso bobo aos meus lábios, ao me recordar de cada toque, beijo ou promessa.

Hey there Delilah
Olá Delilah
I know times are getting hard
Eu sei que os tempos estão ficando difíceis
But just believe me girl
Mas apenas acredite em mim, menina
Someday I'll pay the bills with this guitar
Um dia eu pagarei as contas com este violão
We'll have it good
Nós vamos ter tudo de bom
We'll have the life we knew we would
Nós vamos ter a vida que sabíamos que teríamos
My word is good
Minha palavra é boa

A sua voz junto à melodia suave dos acordes do violão foi o meu guia. Ele estava sentado na varanda lateral da casa, vestindo somente sua calça de moletom. Parei e o observei, tinha uma expressão vaga e triste assim como a música que cantava, estava tão perdido em pensamentos que não percebeu a minha presença. Distante assim como ficaríamos daquele dia em dia, e meu coração pesou assim que me lembrei de nossa nova realidade.

Hey there Delilah
Olá Delilah
I've got so much left to say
Eu ainda tenho tanto pra dizer
If every simple song I wrote to you
Se cada simples canção que eu escrevi para você
Would take your breath away
Pudesse tirar seu fôlego
I'd write it all
Eu ia escrever tudo
Even more in love with me you'd fall
Ainda mais apaixonada por mim você ficaria
We'd have it all
Nós teríamos tudo

finalmente me viu, sorriu pra mim, mas não parou de tocar, cheguei até ele, e lhe abracei por trás, dando um beijo em seu pescoço, só então eu reparei que aquele violão fora o meu presente pra ele.

Oh it's what you do to me
Oh é o que você faz comigo
Oh it's what you do to me
Oh é o que você faz comigo
What you do to me
O que você faz comigo...

Quando a música encerrou, ele colocou o violão no chão e continuou aproveitando do meu carinho, sua respiração parecia se acelerar a cada passeio de minha mão por seu corpo, e nós dois não conseguíamos parar de olhar para o nascer do sol.

- Senti sua falta lá em cima. – Sussurrei pra ele.
- E eu estou usando o seu presente, porque já estou sentindo a sua.
A confissão em tom embargado, me pegou de surpresa. Durante todos aqueles dias ele se manteve firme, me passando toda a segurança. Dei a volta e me sentei em seu colo, ao segurar o seu rosto, vi as lágrimas escorrendo e beijei cada uma delas, até ele segurar as minhas pernas me puxando mais pra cima e me aconchegado em seu abraço.
Não conseguimos conter o choro e permanecemos assim por um bom tempo. Tempo esse que agora estava passando rápido demais. O vento nos rondava, e mais lágrimas de saudades se misturavam.
- Linda, eu estou esse tempo todo me fazendo de forte, mas eu estou sofrendo tanto ou mais do que você. Eu sei que você deve ir, porque sei o quanto vai ser bem sucedida, sei o quanto é talentosa e eu acredito e confio em você. Eu também sei que eu e os meninos vamos enfrentar uma nova vida, mas... Eu tenho medo de te perder.
- Você não vai. – Olhei pra cima e o encarei. – Mesmo se um dia eu me perder, o seu amor vai me encontrar. Não importa o quão longe estivermos, nós sempre encontraremos o caminho de volta, o caminho que vai nos levar um ao outro.
- Meant To be? – Ergui o pulso onde estava a minha pulseira e a beijei, em seguida fez o mesmo.
- Meant To be. – Confirmei.
- Eu te prometo , mesmo sem precisar eu vou sempre lutar por você, lutar pela gente.
- Amo você, Estranho .
- Eu te amo, Linda . – se aproximou e sussurrou um pedido em meu ouvido.
Seu olhar esperançoso carregava todos os nossos sentimentos, e uma lágrima diferente escorreu de meu olho. Aquela era de esperança, felicidade.
- Sim, eu prometo!
O nosso beijo era o nosso amor. Se eu pudesse eu faria o sol dormir novamente, só pra ter o meu amor comigo por mais algum tempo. Ou uma eternidade.

FLASHBACK OFF.

Londres – 17 de agosto de 2016 – 03:55 pm.
havia me arrastado de alguns compromissos, e me obrigado a fazer supermercado com ela. Eu odiava aquilo, mas era sempre bom passar um tempo com as duas.
Jazzy corria na nossa frente, segurando uma de suas bonecas e colocando dentro do carrinho produtos açucarados que retirava depois.
- Como ele está lidando com tudo isso?
Pensei nas últimas semanas ao lado de , e como a perda de seu avô nos reaproximou. Depois que ele viajou sozinho por alguns dias, ele retornou pra Londres e pra sua vida, e foi impossível não ficar perto dele. Passávamos longas tardes conversando, em outras enquanto eu desenhava alguma peça para a próxima coleção, ele escrevia alguma música, como se aquele processo criativo aflorasse quando, por diversas vezes, os nossos olhos se conectavam. Saímos pra jantar algumas vezes, visitamos o meu irmão mais novo, e eu vi dá o seu primeiro sorriso desde tudo.
- Agora ele está melhor, finalmente entendeu que aproveitar a sua vida é a melhor maneira de fazer John feliz, onde quer que ele esteja.
- E como vocês estão?
- Não existe "nós" num contexto romântico. – Ela revirou os olhos, incrédula com minha afirmação. – Mas está sendo ótimo essa reaproximação, eu achei que estava dando forças a , só que acho que está sendo contrário.
- É reciproco. Vocês são mais fortes juntos, como uma rocha.
- Olha Dinda, é você e o Dindo! – Jazzy gritou apontando pra uma sessão de revistas. Eu e rimos sem entender o que se tratava.
- O que? Eu e seu Dindo onde... – Paralisei em choque ao ver meu rosto e o de estampando capas de revistas e jornais. A manchete era clara e objetiva.

"Onde estará o filho de - ?"





Capítulo Dezoito

"Funny you're the broken one, but I'm the only one who needed saving ‘Cause when you never see the light, it's hard to know which one of us is caving". Stay – Rihanna.


Ralph Waldo Emerson uma vez escreveu: "Não existe privacidade que não possa ser penetrada. Nenhum segredo pode ser mantido num mundo civilizado”. Por isso depois de quase oito anos descobrimos um dos maiores segredos envolvendo duas grandes personalidades de todo o mundo.
, o grande ídolo teen, parece gostar de quebrar corações. Todos sabemos que a sua última namorada, Leah Grant, professora e agora também modelo, ainda sofre por ele ter rompido o noivado, sem nenhum motivo aparente, e apenas três dias antes do casamento. Mas no passado, fez muito pior.
(Sim, você não leu errado!), a diva da moda britânica, revelou a um amigo próximo que engravidou alguns anos atrás, e que esse seria o motivo que a tirou de Londres. A criança era fruto de um relacionamento com o astro pop, com quem ela namorou por dois anos. (A garota pegou mesmo todos da banda?)
Se você já está chocado com essa notícia, ficará ainda mais, em instantes!!!
afirmou que sua gravidez sempre foi de risco e que ela nunca recebeu o apoio devido do namorado, que ao alçar o sucesso fechou os olhos pra tudo e todos.
Emocionada, mas tentando ser forte, ainda contou como foi viver todos aqueles anos, sem contar com o suporte de . "Achei melhor tomar as decisões que me cabiam, não iria fazer diferença já que havia sido abandonada. Ele foi cruel, e, portanto, excluir ele de minha vida foi uma decisão saudável".
Mas vocês, assim como eu devem estar se perguntando... Onde está essa criança?
Resta a nós perguntar aos grandes queridos da Inglaterra. O que vocês fizeram com o filho de vocês?
Respondam a enquete abaixo. Eu votei em doação!
Por: Diana Shaw



Alguém havia me delatado, corri meus olhos pra o final daquela reportagem, pra poder descobrir quem era o autor daquela história, mais uma vez se tratava de Diana Shaw. Uma luz se ascendeu em meu cérebro e aquele sobrenome, deixou de ser um anagrama. Era simples e fácil... Shaw era Wash, e Andrew Wash havia acabado de comprar a maior de suas brigas.

FLASHBACK ON:

Qualquer tempo de ausência, onde o que você sente é aprimorado, é a prova mais contundente de que se estar no caminho certo. Eu tinha mais do que certeza de que amar e estar num relacionamento a distância era apenas uma fase pra algo maior à acontecer pra nós dois, pra o nosso amor.
Havia dias que eu me sentia tão quebrada de saudades, que parecia que eu tinha morrido. Só que havia também as expectativas de cada ligação, a contagem de tempo pra um reencontro, e a alegria em cada surpresa feita, por ele ou por mim.
e os meninos estavam focados em alavancar a carreira, e eu estava dedicada ao meu curso. Foi imperceptível, mas aos poucos uma parede ia se construindo e nos afastando. Mas se tinha algo maior do que tudo isso, era o nosso sentimento e a nossa vontade de fazer dar certo. Quando a gente finalmente se encontrava tudo se desfazia, como se tivéssemos nos visto há minutos atrás.
Um dos pesos de se viver tão distante, é a convivência com outras pessoas, fazer novos amigos, ter novas experiências, e se renovar, tudo isso sozinho. E mesmo sem admitir, eu e nos passamos a nos sentir excluídos da vida um do outro.
Quando eu saí com ele e o pessoal da turnê, eu detestei desde o fato dele estar bebendo, até as dançarinas biscates que o rondavam, resultando sempre em brigas. Eu gritava com ele, me explicava com paciência que eu não deveria me preocupar, eu confiava nele e acabava acreditando, então ele passava a noite me beijando pra se redimir.

Watford – 19 de Dezembro de 2009 – 07:49 pm.
- ELE É UM IMBECIL! – Finalmente pude gritar, assim que entrei no quarto do hotel, onde ele estava hospedado.
continuou em silêncio, e entrou no quarto arrastando a minha mala, instantes depois. Quando ele fechou a porta e notou que estávamos seguros, tentou me acalmar, mas foi da pior maneira possível.
- Linda, se acalma, também não foi pra tanto.
- NÃO FOI PRA TANTO?! – Perguntei, mas minha raiva não ia permitir ouvir sua resposta. – VOCÊ ESTÁ DEFENDENDO O ?!
Eu provavelmente estava espumando pela boca, e devo ter lançado um olhar tão mortal pra o Estranho, que sua primeira reação foi se encolher, depois como se estivesse prestes a lidar com um animal feroz, ele foi se aproximando aos poucos, até fazer eu me sentar ao seu lado na cama. Sustentei a minha cara de brava e esperei sua resposta.
- sempre deixou claro que eles não estavam num relacionamento.
- Mas, isso é uma mentira e você sabe. – , mantendo toda a sua paciência, segurou o meu dedo acusatório e deixou um beijo ali.
- Eu sei linda, é só que ele deve... – Quando ele parou, pensando nas palavras certas a dizer, soube que o que ele diria, viria com um pouco de sua própria verdade. – É um novo mundo, onde existem várias pessoas novas, garotas fáceis, tudo é acessível.
Meus olhos vacilaram e minha postura rígida se desfez, e um medo me dominou, já que vivia a mesma vida de , e assim como , eu estava bem longe dele.
- E você acha isso um motivo contundente pra trair? – Só notei que meu lábio tremia, quando o polegar de deslizou por ele.
- Não, não é um motivo, nada justifica isso. Só que ele não considerou uma traição, porque não acreditava estar em um relacionamento. é um imbecil!
- Ele é. – Trocamos um sorriso breve, e quando eu finalmente iria beijá-lo e acabar com um pouco da saudade que eu estava sentindo, batidas na porta de seu quarto nos despertou.
Ele se levantou pra atender, e depois de uma conversa rápida, com alguns risinhos e uma olhada empolgada e significativa pra mim, ele se despediu e fechou a porta.
- Quem era?
- Amber. – Automaticamente eu cruzei os braços, esperando por mais. – Uma das dançarinas.
- E o que ela queria? Ela tem o hábito de vir até o seu quarto? – achou graça de mim e minhas perguntas, e se deitou na cama, me trazendo junto a ele. Toda sua calma trouxe minha irritação de volta, e eu me afastei quando ele fez menção de me beijar. – Responde o que te perguntei !
- Ela é uma das dançarinas, e não tem esse hábito, ela só queria saber se a gente queria sair pra jantar, eu falo tanto de você que ela queria te conhecer.
- E por que não conheceu?
- Porque eu disse que essa noite estaríamos ocupados, só você e eu.
- Não estou gostando dessa história.
Fechei os olhos e me lembrei do olhar nublado de , ao chegarmos ao hotel pra fazer surpresa pra os meninos e ela viu o imbecil do meu irmão com uma garota. A dor que ela sentiu ali foi tão forte, que era quase palpável, mas como um ser evoluído, jogou os cabelos pra o lado, cumprimentou a todos, dispensou qualquer conversa fiada que queria inutilmente ter, e só desabou de verdade quando chegamos ao aeroporto, pra embarcá-la de volta pra Milão.
Senti um beijo na minha testa, outro na minha bochecha, e um último em meus lábios, que desfizeram a invasão daquela memória ruim e das minhas preocupações com o estado de minha amiga.
- Olha pra mim. – Bastou o seu pedido soprar em meus ouvidos, pra meu corpo corresponder de imediato. Ficamos um tempo assim, nos encarando, respondendo as perguntas mudas, nos reconectando. – Você sabe que eu não seria capaz de fazer algo assim, certo?
- Essas garotas são lindas e... Droga Estranho, eu não sou insegura, o que está acontecendo comigo?
- Essas garotas até poderiam ser mais bonitas do que você, mas não são. Só que independente disso. – Ele segurou o meu pulso, passando os dedos por minha pulseira, que há tanto tempo estava ali, depois pousou a minha mão sobre o seu peito. – Você é a única que consegue isso de mim. – Sentir o seu coração acelerado, fez o meu igualar ao seu ritmo. – É a única que tem tudo de mim, principalmente o meu amor incondicional.
Sorri, mordendo o meu próprio lábio e passei minhas pernas por seu quadril, ficando por cima dele, me abaixando apenas pra sussurrar.
- Eu te amo, meu Estranho. – Me afastei e ao sentar em seu colo novamente, encarei o seu corpo deitado, agora relaxado, abaixo de mim. – Se elas tiverem o seu corpo eu te castro.
gargalhou de minha ameaça, e eu estapeei o seu peito, acompanhando a sua risada, entrando no clima leve, que só existia entre nós dois, dentro de nossa bolha.
- Adoro quando você está selvagem e possessiva. – Descontou o tapa em minha bunda, e logo estava por cima de mim de novo, me beijando, me fazendo rir, me fazendo sua e me provando que ele era só meu.

Madri – 17 de janeiro de 2010 – 11:39 am.
- Te amo. – Disse beijando todo o seu rosto e tentando conter as minhas lágrimas. – Queria que você pudesse ficar mais.
Todas as vezes que eu tinha que me separar de , eu achava a vida bastante injusta. Ontem ele havia vindo de surpresa pra comemorar nosso primeiro ano de namoro – que parecia ser muito mais – e aquelas dezenove horas e trinta e seis minutos, não foram suficientes pra suprir a sua ausência.
- Era tudo o que eu queria. – me abraçou ainda mais forte.
Dar aquele abraço carregado de saudades, senti os beijos salgados por lágrimas, e o cheiro que se tornaria recordação para as próximas semanas, era uma cena que estava se tornando recorrente pra nós dois.
- Se cuida, aproveita tudo e pensa em mim. – Beijei várias vezes os seus lábios. – Não deixa aquelas fãs malucas e aquelas dançarinas se aproveitarem se você.
- Não deixa aquele vizinho se aproveitar de você, não deixa ele entrar no apartamento e bancar o herói. – Fez um bico fofo, pra depois me beijar urgentemente. Gastando cada segundo restante um com o outro, com nossos carinhos e com ainda mais juras. – Não chora, vou tentar voltar logo. – Concordei com a cabeça, mas sem conseguir parar de chorar. – Eu te amo, linda.
- Eu te amo, Estranho.

~*~*~*~*~*~


Eu não havia feito tantos amigos em Milão, além de Blaine e Mário. O primeiro era um gay bastante afetado e estudava comigo, então até que gostava dele, mas o segundo, era um estudante de economia e ele detestava. Mesmo o meu vizinho tendo uma estatura física muito maior do que a dele, eu lia nos olhos de o desejo lascivo de encher Mário de porrada.
Mário era o tipo de pessoa prestativa e cativante. Eu e conhecemos ele uma semana depois de nossa mudança. Morando num apartamento em frente ao nosso, ele nos ouviu gritando feito loucas, porque havia um rato passeando pela sala, se não fosse por ele e sua intromissão provavelmente o roedor ainda estaria lá. Depois disso Mário sempre salvava a gente, seja instalando a nossa TV, ou nos emprestando alguma coisa, passando a participar mais ativamente de nossas vidas, estando sempre por perto, então das poucas vezes que estava lá, ele se sentia diminuído e ameaçado pelo nosso amigo e salva-vidas diário.
Eu acreditava que não havia motivos pra isso, mesmo Mário tendo uma pele naturalmente bronzeada, olhos verdes, viver na academia e ser um poço de educação e gentileza, pra mim não passava disso. Estava apaixonada demais por pra sequer pensar em outra pessoa, e por outro lado, Mário nunca demonstrou um interesse claro por mim, até aquele dia... A porra daquele dia.
Ao receber um ótimo estágio, Mário havia me chamado para um bar onde ele e outros amigos comemoravam. havia viajado com a mãe, então não pode ir, e depois de uma semana estressante de estudos e trabalho, eu achei que merecia aquela folga. Mário acabou bebendo demais e ao invés de me divertir, tive que cuidar dele e levá-lo pra casa.
Tudo ia bem, e quando decemos do táxi, Mário já conseguia sustentar o próprio corpo. Saímos do elevador e enquanto eu abria a porta do seu apartamento, ele começou a dizer coisas indistintas que até me faria rir, se ele não tivesse tentado me beijar em seguida.
estava chegando no meu apartamento pra me fazer uma surpresa e viu tudo. Receita para um desastre digno de uma comédia romântica ruim. Bateu no cara até quando eu, um outro vizinho e o porteiro, conseguimos separar os dois.

Madri – 04 de março de 2010 – 09:13 pm.
andava de um lado para o outro, completamente atordoado. Eu estava com medo até de respirar, não sabia como agir e nem como explicar mais um mal entendido entre a gente.
- Estranho, amor, deixa eu te explicar, você entendeu tudo errado.
- HÁ QUANTO TEMPO VOCÊ VEM ME TRAINDO COM ESSE OTÁRIO?
- Eu não estou te traindo, e isso nunca havia acontecido antes, ele é só...
- Seu amigo? Conta outra, ele estava te agarrando. Quer dizer vocês estavam se agarrando!
- Eu não correspondi o beijo. , por favor, me escuta, esfria a cabeça. – Ele socou a parede com força e vê-lo daquele jeito já estava me assustando. – Estranho, você acha que eu seria capaz de te trair, depois de tudo que a gente viveu e superou?
Fui me aproximando do corpo de , trêmulo e dominado pela raiva que aos poucos era sendo vencido pelo cansaço. - Não suporto mais isso.
- Isso o que?
- Essa distância entre nós.
Em todos aqueles meses, era a primeira vez que se mostrava descrente e insatisfeito em viver um relacionamento a distancia, mas o que mais estava me amedrontando, era que o que ele havia presenciado não era o único motivo para seu ceticismo.
O tempo havia desmascarado as aparências, ele ainda me amava, mas claramente estava apaixonado por sua nova e transgressora vida sob os holofotes. Eu não poderia seguí-lo, então eu deveria sair de sua vida? Os olhos de me chamavam de âncora.
- Eu também não. olha pra mim. – Puxei o seu corpo e segurei o seu queixo pra que ele me encarasse. – Eu te amo. Te amo mais que tudo e eu sou sua.
- Então prove.
- Como?
- Quer casar comigo?
- O que?
O seu pedido me deixou atônita, mas antes que um sorriso se formasse, eu percebi que me propôs em casamento, por todos os motivos errados. Eu sabia que havia amor, sabia que aceitar era a única resposta, mas não quando ele estava enxergando tudo vermelho de raiva.
- Casa comigo e vamos construir a nossa família, pra que esperar se a nossa vida é agora?
- Eu aceito. – Minha cabeça estava trabalhando a todo vapor, e uma sombra de dúvidas pairava. – Mas...
- Mas? – Questionou indignado atropelando o meu discurso.
- Não agora, que estamos começando a viver os nossos sonhos.
- E nós podemos fazer isso, juntos.
- Eu concordo, mas não precisamos estar casados. , se você casar comigo agora como vai ficar o seu lance com a banda? E os meus cursos? Onde a gente iria morar?
- Você não quer casar comigo. – Fez a sua constatação rindo em escárnio.
- Claro que eu quero. Só não acho que a gente precise apressar as coisas, casamento é algo grande.
- Eu pensei que o nosso amor também fosse.
- O nosso amor é, por isso não vai ser um pedaço de papel que vai determinar o quanto eu sou sua.
- Você rejeitou o meu pedido, que noite mais patética. – Quase gritou a sua frustração.
- Eu não rejeitei o seu pedido, é só que...
- Você precisa viver antes de se prender, eu já entendi.
- Não só eu, como você também. E eu nunca me sentiria presa casada com você. – pareceu ainda mais enfadado de minhas explicações, pegou a pequena mochila que havia trazido, jogou nas costas e foi saindo. – Eu só acho que... Aonde você vai? – Agora o pavor de perdê-lo me tomou.
- Eu vou embora.
- ...
- Vou te deixar viver, espero que aproveite.
- Está falando como se isso fosse um... – não disse nada, mas a palavra “adeus” surgiu entre nós. – Não fala assim, não vai embora. – Ele passou a me ignorar, enquanto chamava um táxi pelo telefone. – Eu te amo, não me deixa.
- É só pra isso que eu sirvo pra você, não é? – Olhei pra ele sem entender nada. Seus olhos estavam escuros e transtornamos, transbordando raiva, como no momento em que ele viu aquele beijo. – Segurança. – riu sarcástico. – O idiota aqui está se retirando, agora você terá que lidar com o fato de que está sozinha.
As suas mãos empurraram as minhas quando tentaram lhe tocar.
- , eu estou te implorando. – Deixei claro o meu desespero, mas ao respirar fundo, instantaneamente ficou frio, como se tivesse inalado frivolidade. – Pensa em nós, pensa no quanto eu te amo.
- Estou pensando justamente em você e em suas justificativas para o “mas”, por isso estou indo. – Me afastou bruscamente, depois da minha teimosia. – A gente se fala quando der.

Madri – 22 de julho de 2010 – 03:24 pm.
E parecia nunca ser tempo. Nos meses seguintes, e eu nos falamos ao telefone apenas duas vezes, e trocamos raras e espaçadas mensagens, depois de muito empenho meu, foram apenas frases prontas e automáticas, meia dúzia de palavras jogadas sem sentido. A relutância de tomava proporções cada vez maiores, e ele culpava sua rotina inconstante, uma grande mentira, nós dois sabíamos que até aquela fase, distância nenhuma havia de fato nos afastado, eu estava determinada a fazer dar certo, eu precisava e iria lutar até o fim por ele, por nós.
Ficamos setenta e nove dias vivendo assim, e eu achei que a minha falta de apetite, sono excessivo e consecutivos enjoos matinais eram provenientes de toda essa tensão emocional, ou só o meu problema de gastrite que havia voltado, até quando percebi que não era eu continuei a afirmar isso pra mim mesma, na tentativa boba de poder mudar as coisas. Só que isso não passou despercebido por .
Depois de acordar duas noites seguidas, e me encontrar vomitando, me forçou a fazer um teste de farmácia. Não que eu não quisesse estar grávida, só estava apreensiva, num desejo latente de poder está.
Positivo.
Muito choro.
Todas as lagrimas foram de felicisade. Um baile de emoções imensuráveis, eu estava começando a viver o meu sonho na lucidez da minha realidade. Pura magia. Eu queria que estivesse vivendo aquilo comigo, mas como nem tudo era perfeito, aquele momento era o pior de todo o nosso relacionamento, e tudo o que eu poderia fazer era esperar pela oportunidade perfeita para nos encontrarmos, ou ao menos, nos falarmos.
Enquanto isso, eu passei o último mês resolvendo questões burocráticas acerca do meu curso, havia encontrado uma ótima obstetra e estava cuidado ao máximo de mim pra manter o meu bebê saudável.
Tentei falar com naquela manhã. Aquele dia seria importante, o exame que faria naquela tarde poderia revelar o sexo no nosso filho, mas ele não atendeu nenhuma das minhas quatro ligações. O prestígio que ele recebia eatava aumentando a nossa distância.
Minha barriga de dezenove semanas não havia crescido muito, o que de certa forma me frustrava, já que tudo que eu queria era me ver com um enorme barrigão, tanto que em alguns momentos até arrisquei colocar uma almofada por baixo de um vestido e fazia poses em frente ao espelho, imaginando como eu estaria nos próximos meses.
Como uma boa melhor amiga, foi comigo até a clínica, havia muitas gestantes ali, umas com uma felicidade radiante, outras nem tanto. As diversas fotos de bebês e crianças na parede me fizeram pensar no meu, com quem ele ou ela iria parecer, será que seria impulsivo como eu, ou responsável como ? E como o pai do meu filho iria reagir a isso? Ele me apoiaria, ou me chamaria de louca e diria que consegui estragar a carreira dele? Sempre que tinha essa dúvidas eu me lembrava do discurso que havia dado quando achou que eu estava grávida de Ethan. Lembrava de suas promessas quando nos despedimos, as mudanças de nossas vidas não deveriam ter interferido naquilo, então eu voltava a me sentir tranquila. Esperançosa e apaixonada.
O pensamento foi interrompido quando uma enfermeira chamou meu nome, fez questão de entrar no consultório também. Depois de me trocar e deitar numa maca, eu me senti verdadeiramente nervosa.
- Boa tarde Senhorita , você está ainda mais bonita. – Como sempre, a Doutora Zenon me cumprimentou alegremente, me passando a segurança que eu precisava. Desde que a conheci eu a adorei, seu profissionalismo e cuidado comigo eram exímios.
- Boa tarde. – Respondi tentando soar a mais animada possível. A médica foi até uma pia e após lavar suas mãos, calçou um par de luvas de látex e começou a me examinar.
- Você acabou de completar vinte semanas gestacionais e está tudo bem. Agora vamos fazer o ultrassom pra ver o seu bebê e ouvir os batimentos cardíacos.
- Eu já vou poder vê-lo? Quero dizer, com mais precisão? – Perguntei e minha voz denunciou o quanto estava emocionada.
- Sim. Preparada mamãe? – Assenti e ser chamada de mãe pela primeira vez me deixou em êxtase. Dali em diante eu seria uma mãe antes de qualquer coisa, e eu estava mais do que satisfeita com aquilo.
se levantou, prostrando-se ao meu lado e apertou a minha mão num gesto de segurança. Uma lágrima solitária escorreu de meus olhos e eu sibilei um obrigada que ela retribuiu com um sorriso. Era muito bom tê-la ali, mas eu queria que estivesse, queria correr e contar que estava esperando um filho nosso, e compartilhar desse e de tantos outros momentos futuros com ele. Eu deveria ter paciência.
Um gel foi colocado sobre minha barriga, e o frio me fez encolher, alguns instantes depois escutei um som, o melhor do mundo, eram as batidas rápidas do coração do meu bebê. Era a sua vida gritando pr mim.
- Está vendo? – A médica apontou para o monitor, onde uma grande sombra se sobressaia. Eu estava chorando e limpei as lágrimas pra poder enxergar melhor.– Aqui está à cabeça do seu bebê, esses são os braços, pernas, o troco, ele está perfeito, no tamanho ideal e bem saudável.
Sorri como uma pateta, sem perceber nenhum desses membros na imagem, mas imensamente feliz em saber que ele estava ali e era saudável.
- O casal vai querer saber o sexo? – Perguntou fazendo e eu cairmos na gargalhada, até concordamos sem dar maiores explicações.
- Espera! – Pedi num ímpeto, e virei pra e sussurrei. – Não quero saber antes dele. – Falei me referindo a e ela concordou. – Então você fica sabendo e depois que contar a ele que estou grávida, você nos revela.
- Que chique, gostei da ideia. – Riu bobamente e se dirigiu a médica. – Só eu ficará sabendo.
Depois de analisar mais uma vez o monitor, Doutora Zenon riu e pareceu ter um diagnóstico, se levantou, escreveu num papel e entregou a , ela leu, riu e depois guardou o papel em sua bolsa. A minha curiosidade diminuiu quando eu imaginei que saberia junto com .
- Com esse tempo de gestação, não podemos dar um diagnóstico cem por cento preciso, mas com meus anos de experiência eu tenho noventa e nove por cento de certeza.
Brincou e uma excitação devido a vida nova energizou o meu corpo, em alguns meses, com apoio ou não, eu iria realizar o sonho da minha vida, e o amor incondicional que receberia em troca, seria mais do que o suficiente para o resto da minha vida.

Vesti minhas roupas e no final da consulta ela me entregou uma foto da ultrassom. Era a primeira foto do meu bebê. Lindo, perfeito, o meu sonho. Saí saltitante do consultório com rindo de mim.
- Estou tão curiosa pra saber.
- Ah, mas agora não vai.
- Eu vou gostar?
- , eu acho que você nasceu tanto pra ser mãe, que se descobrisse que estava gerando um cachorrinho você ficaria feliz.
- Isso é verdade. – Gargalhei daquele exagero, junto com ela.
- Quando você vai pra Londres?
- Hoje mesmo, só vou passar em casa e pegar as minhas coisas. me disse que eles chegavam essa manhã e eu já adiei bastante essa conversa, e eu também estou morrendo de saudades do meu amor.
- Amor? – Ela estranhou e achou graça daquele novo apelido. – Seus hormônios estão mesmo alterados, você está toda romântica.
- Vou fazer uma surpresa pra o Estranho, vou aparecer na festa de lançamento do álbum deles e vou gritar o quanto estou apaixonada. – Abri os braços e berrei aos quatro ventos, sem me importar com os olhares que me eram lançados, rodopiei, e dancei junto à minha felicidade, mas o que eu havia sentido pela primeira vez me fez paralisar.
- Faz essa dancinha de novo pra eu filmar e mostrar pra esse bebê o quanto a mãe dele é boboca. – brincou, mas eu continuava sem reação, com as mãos segurando minha barriga, o sopro de vida era constante, num diálogo empolgado. – Você está bem?
Peguei a mão de e coloquei sobre meu ventre, e quando ela sentiu o meu bebê mexer, lágrimas surgiram em seus olhos, assim como nos meus.
- É o meu bebê. – Sussurrei, atrelada a dualidade de minhas expressões: Choro e riso.
- E ele está dizendo que te ama.
Ali no centro de Madri, numa tarde cinza e nublada, rodeada por pessoas estranhas, eu finalmente enxerguei o fim do meu arco íris, e faltava pouco pra chegar até ele.


FLASHBACK OFF.

Londres – 17 de agosto de 2016 – 05:01 pm.
Não usei educação, modos ou paciência, apenas invadi a redação daquele jornal sensacionalista sem me importar com os chamados, ou todos os olhares voltados pra mim. Como era previsto Andrew estava ali, parecia me esperar bem no centro da repartição de trabalho.
- Seu grande mentiroso de merda! – Dei um tapa em sua cara e gritei me controlando pra não avançar ainda mais sobre ele.
Andrew me olhou escandalizado, mas sua boca estava aberta demais, assim como seus olhos, deixando tudo ainda mais falso pra mim. Até que ele cansou de fingir e explodiu em gargalhadas.
- querida, o fato de você vir aqui desse jeito, só prova o tanto de verdade escrita em cada linha.
- Eu vou te matar! – Tentei avançar nele, totalmente descontrolada, mas mãos me impediram, deixando Andrew ainda mais a vontade em sua zona de conforto.
- Ah , por favor, eu nem contei a história toda, deixei que as pessoas dessem um final.
- Quer saber Andrew? Daqui a no máximo um mês, ninguém se lembrará de nada do que você escreveu, eu e seguiremos com nossas vidas e carreiras de sucesso, enquanto você. – Apontei um dedo acusatório que só serviu pra ele rir ainda mais, até ouvir minhas próximas palavras. – Você vai continuar sendo o mesmo nerd do colégio, incapaz de despertar amizade, afeto ou amor das pessoas, o mesmo cara insignificante que passou despercebido por mim e por todos. Você não é nada e continuará não sendo nada.
Cansada demais pra me preocupar com ele naquele momento, eu acabei rindo antes de sair. Pra sempre, eu dei as costas aquele verme, desejando que a vida lhe desse o que ele merecia, mas eu era e um dia, também lhe mandaria uma lembrança.

’s POV
Londres – 17 de agosto de 2016 – 09:31 pm.
Tinha passado o dia em meu estúdio, perdido em músicas e completamente alheio às coisas que aconteciam fora do meu mundo, era bom sair de mim e de minha realidade. Ainda estava sendo difícil aceitar a partida de meu avô, mesmo tendo passado todo aquele tempo ao meu lado.
Ela estava sendo incrível e paciente, como uma verdadeira parceira de vida deveria ser, e eu sentia medo de avançar e perdê-la uma outra vez. Eu a queria de qualquer jeito em minha vida.
Entre uma música e outra, o toque insistente do meu celular me alertou que havia outro mundo lá fora.
Ao pegar o aparelho, existiam milhares de notificações, mensagens e ligações, sem dar muita importância eu cliquei num link. Uma foto minha e de , quando fomos conhecer Jazzy no hospital, estampava a reportagem, me deixando ainda mais curioso. Eu li a matéria que estava abaixo, rápido demais. Não acreditei e reli, e de novo. Aquela pergunta ia de bizarra a escandalosa, e berravam na minha cabeça, me atormentando e revirando o meu estômago.
Um filho? Um filho meu e de ? Algo me aqueceu ao imaginar, mas foi congelado pela pergunta. Onde ele estava? O que havia feito com ele? E foi aí que um único sentimento se apoderou de mim. Raiva! Muita raiva!
Eu senti um punhal cravado em minhas costas, estava cego, mas ainda incrédulo, até ver e em minha casa, trazendo consigo piedade e apreensão. Era verdade! Tudo o que eu li era verdade!
- Vocês sabiam!
Os dois não precisaram responder a minha acusação com palavras, os olhares firmes eram uma afirmação mais do que contundente. E de repente a minha mente foi bombardeada de fatos. e defendendo , sendo ainda mais protetor, Peter pedindo pra eu cuidar bem dela, Anne sentindo ainda mais repulsa de mim, os meus pais... Todos sabiam. se afastou, mas conseguiu fazer todos mentirem pra mim. Maldita!
- Maldita!!! – Gritei.
- , ela teve as suas razões. – defendeu a irmã, parando em minha frente na tentativa de atrapalhar o meu caminho.
- Que se foda as razões dela! – Passei por eles, sem me importar com mais nada, só precisava confrontar .
- . – me chamou de forma tão dura que roubou minha atenção pra ela. – De uma maneira bizarra esse segredo é o que mantém presa não só a você, mas a esse mundo, então seja ao menos paciente, porque depois que ela te contar tudo, eu tenho medo do que ela possa fazer.
- O que ela pode fazer? Fugir de novo?
- Fugir sim! Mas da dor. – Sua voz vacilou em meio a suas lágrimas. – Indo embora de uma vez por todas.
Nada se fixaria em minha cabeça naquele momento, mandei pra o inferno todos os argumentos que eles usaram e finalmente saí de casa, descontando um pouco da minha raiva, na porta atrás de mim.
Quando eu invadi sem cerimônias o apartamento de , ignorei as saudações de Simba e como se soubesse que aquela era uma conversa de adultos, o cachorro pegou um brinquedo com a boca e saiu dali.
estava sentada no sofá, de costas pra uma cidade que trazia a única luz ao cômodo e ao seu rosto.
Por alguns instantes nos mantemos parados, nos encarando. Nossos corpos se conversavam sem palavras, mas começando a gritar a beira de um conflito que chegaria ao fim, a beira do nosso precipício.
- Isso é verdade? – Ergui o celular que estava em minhas mãos.
- Em partes sim.
- Era assim que você queria que eu descobrisse?
- Eu não queria que você soubesse de nada. Nunca. – Por puro impulso e fúria, eu atirei o celular na parede, o barulho estridente que fez quando ele se espatifou, não fez se mover nem um milímetro sequer. – Esse segredo, esse silêncio dentro de mim era tão ensurdecedor que me mantinha acordada. Lúcida.
- Você não tinha o direito...
- Não tinha?! – Seu riso atingiu o sarcasmo, mas parecia tão cansada que estava inexpressiva. – Eu perdi tudo, a começar por você.

FLASHBACK ON:

’s POV
Londres – 24 de julho de 2010 – 08:24 pm.
A festa era enorme, digna de celebridades internacionais, e mesmo impressionado com todo aquele luxo e glamour, eu não estava surpresa por meus amigos terem alcançado o sucesso. Fiquei mais do que feliz pela escolha da minha roupa, um vestido roxo, simples e sofisticado, feito por mim, e propositalmente folgado na cintura, disfarçando minha barriga, já um decote generoso, valorizava os meus seios que também haviam crescido e faziam eu me senti feminina e sexy. Definitivamente eu não parecia estar grávida, e isso era bom pra não assustar tanto o Estranho.
Assim que eu e papai entramos na festa, eu o deixei pra ir procurar , como ele já sabia da minha gravidez, mais do que entendia a minha urgência em encontrar o Estranho pra esclarecer as coisas.
Os garotos subiram ao palco para cantar algumas músicas, e quando a voz de se sobressaiu a dos outros, uma festa aconteceu na minha barriga, me fazendo sorrir sozinha e abobalhada. O nosso bebê já estava reconhecendo o pai.
Depois que eles saíram do palco, e deram algumas entrevista, eu respirei fundo e sabia que aquele era o momento, o bebê concordava ainda se agitando dentro de mim.
estava numa varanda, fumando e admirando a vista, eu parei pra observá-lo e pela primeira vez me senti nervosa, apreensiva com a reação que ele teria assim que soubesse da novidade que trazia em minha barriga.
Foi então que uma garota se aproximou dele, antes mesmo que eu fizesse isso. Seu cabelo cacheado e volumoso me fizeram identificar na hora que se tratava de uma das dançarinas que eu odiava, a tal Amber. As mãos dela pareciam conhecer bastante o corpo dele e quando eles se beijaram, eu arfei pela supressa dolorosa que se desenrolava na minha frente, mas foi a raiva que me moveu.
Tudo aconteceu rápido e eu já estava agarrada nos cabelos da garota, chutando , num total acesso de fúria.
- , para! – Ele tentou me segurar, mas eu fiquei me debatendo em seus braços.
A garota tomada pela surpresa, não foi capaz de esboçar nenhuma defesa, e sua única reação foi a de tentar livrar os seus cabelos de minhas mãos e saí dali apressada.
Quando achou que já havia acabado e afrouxou os seus braços, eu me virei e dei um tapa em sua cara, desejando ferir a sua alma, assim como ele havia feito comigo.
Sua expressão foi adotando uma mágoa e indignação. A minha respiração ainda resfolegava, tamanho havia sido o meu desregramento, e não estava muito diferente da de , que teve que me segurar.
- Porque você me bateu? Você está agindo feito uma louca!
- Por que eu te bati? – Mordi ainda mais o meu lábio trêmulo, ao ouvir aquela pergunta sínica. – Eu deveria te matar, !
- Não é como se você tivesse ficado chateada pelo que viu.
- Você só pode está brincando! Está drogado?
- Não, só feliz. Quer dizer, eu estava até você agir feito uma psicopata e me interromper.
- Ah, eu te interrompi? – Ri me sentindo patética e precisei encarar os próprios pés pra retomar o equilíbrio.
- Sim, e ainda não entendi o por que.
- Eu vim aqui por você, eu estive sofrendo durante essas últimas semanas, enquanto você ignorava as minhas ligações e se divertia com uma vadia qualquer.
- Você sofrendo? Por mim? – Perguntou sárcastico, desacreditado de tudo o que eu havia dito. – Conta outra que essa eu não engulo mais.
- Você fala como se me odiasse. Na verdade deve mesmo, estava me... – Segurei ao máximo aquela palavra, pra adiar o enfrentamento da verdades. –Traindo.
- Traindo? Você age como se ainda tivéssemos alguma coisa. Você deixou bem claro pra mim que não.
- Eu só disse que não era o momento certo pra casar, não disse que não te amava. Só estava tentando fazer o melhor pra nós.
- Claro que estava! Nos afastar foi realmente a melhor coisa.
- Pra você claramente foi.
- Não venha me julgar, aposto que seu amiguinho deve ter te consolado.
- Ele bem que tentou, mas eu não permitir, e quer saber essa foi a maior estupidez da minha vida. – Eu sabia que o que tinha dito era ridículo, mas eu não queria me sentir mais humilhada.
- Volta pra ele.
- Antes eu só preciso te dizer mais uma coisa, e então eu te juro que você não vai me ver nunca mais.
- Estou ouvido, "Linda".
- Acabou.
- Desculpe, o que?
- Acabou. – Ele começou a gargalhar e tudo que eu queria era voar nele, mas me sentia tão estúpida com aquela situação que nem brigar eu conseguia mais.
- Eu achei que você já soubesse disso. Foi você quem quis assim.
- Não, eu não sabia. Vim até aqui na esperança de me reconciliar com você por uma briga, não por um término. Até porque, eu achei que depois de tudo que enfrentamos, já havíamos passado dessa fase de desconfiança.
- Você provou que não.
- Agora, eu que digo... Não me julgue "Estranho". – Antes que ele pudesse falar, eu continuei. – Quando eu digo que acabou, estou falando de toda e qualquer relação entre nós. E esse sentimento que eu nutri por tanto tempo, também irá acabar.
- Era só isso? – Usou a sua última dose de sarcasmo.
- É... É só isso. Adeus .
- ? – Me virei pra encará-lo uma última vez, trazendo comigo a crença boba que ele iria buscar o meu perdão. Um último engano. – Tenha uma boa vida. – Senti o meu bebê e voltei a sorrir, agora de verdade.
- Eu irei.
Eu saí daquele cenário de caos, onde minha vida havia ficado disforme. Fui embora levando o filho de , e o seu sorriso sarcástico e frio, mas com a plenitude dentro de mim. Completa.


FLASHBACK OFF.

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’s POV
- Então foi por isso que você me afastou, ? Por orgulho? Por ser covarde o suficiente pra conversar comigo? Por ciúmes?!
- Sim.
- Você é um monstro. – Quando riu fraco, o seu lábio tremeu, num esforço de conter as lágrimas.
- Eu sou muito pior. – Confirmou com destreza e pesar.
Avancei sobre ela, deixando que uma linha ínfima de paciência me controlasse, segurei os seus ombros e a fiz levantar. Em nenhum momento pareceu assustada, ou fugaz.
- O que você fez? – Nosso contato visual foi mantido. – O que você fez com o nosso filho? Você o deu pra alguém? Por que eu posso encontrá-lo em qualquer lugar desse mundo e...
- NÃO! – gritou e deixou um soluço alto escapar.
Suas mãos foram até sua cabeça, onde os fios de seus cabelos foram puxados. Ela se afastou de mim e parou do outro lado da sala, virou e me encarou com os olhos secos de emoção, mas inundados de culpa. Ali, a uma distância de poucos passos, ela pareceu segura e determinada a me contar o que havia feito.
- Ele não está por aí. Eu o matei, . Eu matei o nosso filho.
Tudo se desfez. Mesmo as palavras tendo sido jogadas no ar pra ficarem dançando naquele cômodo, berrando sobre a minha consciência, eu ainda não acreditava. Não que seria capaz de algo assim.
Ela estava parada na minha frente, olhando no fundo dos meus olhos, afirmando aquela insanidade, mas a minha fé cega na garota pareciam maiores do que tudo. Automaticamente diversas teorias de como ela havia feito aquilo, foram criadas na minha cabeça, justificativas irrisórias, mas ainda assim, eu não acreditava.
- Eu não acredito em você. – A simplicidade e verdade na minha afirmação, fizeram se assustar pela primeira vez naquela noite. – Você seria incapaz disso.
- e a sua incrível capacidade de acreditar em quem não merece. – Debochou.
- Eu acredito em quem eu conheço, e eu conheço você.
- EU SOU UM MONSTRO! – Falou dela mesma com asco e rigidez. – EU O MATEI! EU O MATEI! EU O MATEI! – continuou dizendo aquilo até ganhar o meu silêncio. Totalmente controlada.
- O que aconteceu, ?
- Eu estava decepcionada com você e com o quanto você havia sido um moleque, mas não tinha mais ódio ou raiva me dominando. Tudo continuava sendo sobre o amor que eu carregava, sobre o amor que você havia me dado. Meu único plano até ali, era sair daquela festa, recomeçar a minha vida, e eu... Me sentia segura, pela primeira vez, eu me sentia destemida. – Sorriu com enorme amargura. – O estacionamento era pouco iluminado e estava vazio, exceto pelas sombras. A minha, a da lua, e uma terceira, que passou despercebida por mim em meio ao abalo emocional. Foram quarenta e um passos, até que mãos seguraram o meu ombro. Foram dois segundos até que eu entendesse o que aconteceria. Foram quatro segundos de desespero, até que eu tentasse correr. – fechou os olhos sendo engolida por sua própria dor. Ao abri-los, tudo havia ido embora. Nada. Vazio. – Ele tentou me beijar, depois me forçou a abrir as minhas pernas e... E... Ficou se esfregando em mim. O cheiro dele era horrível, eu estava enojada, sentia que podia vomitar. Eu comecei a gritar e recebi o primeiro tapa no rosto, um som agudo, uma dor que atingiu o meu ego, mas eu não parei, gritei por socorro até mesmo quando um de suas mãos cobriram minha boca. "Vou adorar comer essa piranha", foi à primeira coisa que ouvi sair da boca do segundo homem, mais baixo, mais asqueroso. Uma quarta sombra. Ele foi se aproximando com um sorriso nauseabundo, e o que já me prendia contra um dos carros, segurou os meus braços pra trás, passou a língua fétida em meu pescoço, e deu ao amigo, total acesso ao meu corpo. “Vou deixar você comê-la primeiro”, zombou voltando a colocar sua língua sobre mim. Gritei ainda mais, sobre a mão que me calava, quando eu o vi abrir sua calça. Tudo era rápido, como um borrão trágico que me fez cometer o meu crime.
- Você não...
- Uma mão rasgou a parte de cima do meu vestido, a outra expôs o seu membro. Quando a mão sobre a minha boca, foi ajudar a abrir ainda mais a minha perna, eu consegui uma súplica! Uma única chance pra falar e... Eu disse que estava grávida. Pedi que não fizessem nada comigo, porque eu estava grávida. – Seus olhos ficaram ainda mais negros e imersos numa escuridão tempestuosa. – Dilaceraram o resto da minha roupa, a minha barriga ficou exposta confirmando o que estava dizendo. Foram nove segundos de uma conversa silenciosa entre eles. Foram três segundos pra eles começarem a executar minha sentença. Recebi o primeiro chute justamente lá, onde o nosso bebê estava protegido. A dor foi tamanha que caí no chão. Foram três, cinco, nove chutes deferidos por quatro pés, contra duas mãos que tentavam se defender. Treze, dezesseis, dezessete. "Agradeça a esse bebê, se você não estivesse grávida só ia receber uma surra do meu pau". Dezenove. Enquanto eu pedia a consciência eu sentia o meu bebê começar a dormir. Vinte. O sofrimento não era mais físico. Vinte e um. Meu milagre ia se desfazendo, o sonho acabando. Vinte e dois. Ele dormiu pra sempre, então eu parei de contar.
Diferente de mim que chorava, me contou tudo aquilo aos soluços, corpo trêmulo, mas nenhuma lágrima. O seu esforço parecia tanto, que vez ou outra ela mordia o lábio até a cor fugir deles, assim como a minha vida que ia desbotando a cada detalhe revelado.
- Você não teve culpa, só tentou se defender de um estupro. – Num sussurro eu tentei justificar.
- Aquele não era mais o meu corpo ! Era a casa do meu filho, e eu o usei como barganha! Usei nosso filho, inocente, puro, pra me salvar. Eu não sou digna de nada. Eu era a sua mãe, eu deveria protegê-lo, mas... Eu o matei. Matei o meu sonho, matei o meu milagre. A melhor parte que já esteve em mim foi sacrificada, e por mim mesma.
Ela se abraçou por pura necessidade, mas não estava se vitimando ou buscando minha piedade, tão pouco o meu perdão. A verdade é que a garota a minha frente parecia ter partido antes mesmo que saísse porta a fora. Assisti aquilo totalmente imóvel, meu âmago ferido por descobri um passado tão meu, tão perdido, um amor tão permanente em mim, mas que agora vagava junto a , pra onde quer que ela tivesse ido.
Tudo pareceu ainda mais escuro desde que havia ficado sozinho naquele apartamento, até eu perceber que me faltava tempo. O amor fazia parte de tudo que havia guiado e eu até ali, e eu precisava encontrá-la, recuperá-la de si mesma. Eu só queria ter a oportunidade de espantar os seus fantasmas, e lhe tirar a culpa que ela não precisava carregar.
A maior tempestade do ano estava caindo em Londres, uma garoa comparada a tormenta que estava me devastando. Estava cruzando a Tower Bridge, enquanto lá fora, o grito da chuva continuava ensurdecedor, e então eu a vi e desci do carro. Sentada no parapeito daquele lugar, o seu olhar estava voltado para o rio abaixo de nós, mas ela não parecia de fato encará-lo. ignorou meus chamados e súplicas, enquanto eu corria para alcançá-la. Ela não tinha brilho, não parecia ela, estava molhada pela chuva, mas completamente seca. Era sua alma que não tinha nada mais a perder, e agora ela ia se despedir de sua vida, fazendo o mundo perdê-la.



Capítulo Dezenove


" That these arms are made for holding you. I wanna love like you made me feel when we were 18". 18 – One Direction.



’s POV

FLASHBACK ON:

Londres – 25 de julho de 2010 – 07:02 am.
Ouvi algumas vozes falando baixo e não fazia ideia de onde estava. Uma luz forte e branca incomodou os meus olhos, assim que com grande esforço eu consegui abri-los. Alguém segurava a minha mão, isso era indicativo de que ainda estava viva. Até que o sussurro sôfrego de provou o contrário.
"Ela perdeu o bebê, ele não resistiu."
"Como ela vai sobreviver a isso?" – perguntou no mesmo tom.
Assim como meu filho, eu também não havia sobrevivido.

FLASHBACK OFF.

Londres – 17 de agosto de 2016 – 11:22 pm.
Eu nunca conheci a minha mãe de sangue, mas eu a amava mais do que qualquer outro. Ela deu a vida a mim e por mim, literalmente. Quantas mães renunciam de uma nova tentativa por uma que lhe aniquilaria? Ela era incrível, já eu não passava de um nada. Minha mãe deveria sentir desgosto de quem eu, a pessoa que ela abdicou sua vida, me tornei.
Encarei mais uma vez aquela água turva e negra, balançando através do vento, a escuridão dançava clamando por mim, a chuva caia pesada sobre as minhas costas me incentivando, eu deveria ir.

’s POV
A morte estava a alguns passos de mim e o pânico me fez correr pra impedir, fui o mais rápido que pude, quando cheguei até ela, segurei os seus ombros, e num movimento ágil e desesperado a segurei em meus braços.
me abraçou forte, enterrando as suas mãos em meu peito, balançando a cabeça e dizendo baixinho “não, não, não”. Ela negava e me pedia pra deixá-la ir permitindo que ela partisse, e não sei o que me doía mais... Imaginar viver sem ela pra sempre, ou ouvir dela a sua desistência pela vida.
A chuva caía sobre nós dois, e se misturavam as lágrimas que eu derramava por medo de perdê-la, mas parecia gelada, inerte, morta. Estava de pé, respirava, negava, seu coração ainda batia e cuidava do meu, mas seu olhar era inexpressivo. Morto.
Meu abraço ficou mais cuidadoso enquanto eu a colocava no carro, em segurança da chuva, do tráfego e de si mesma.
sempre foi a mais forte de nós dois, que de certa forma eu me açoitava em pensamentos, por ter tirado vantagem disso, e ter feito ela encarar tudo sozinha. Já eu, sempre fui o espectro de um homem que nunca deixou de amar a mesma mulher. Agora as consequências estavam caindo sobre a minha cabeça como meteoros.
e já estavam esperando por nós no apartamento de , quando Simba nos viu ele começou a fazer sua costumeira festa até sentir que havia algo errado, abaixou sua enorme cabeça e não saiu do lado de , lhe confortando. Como se não fosse a dona de nenhum de seus movimentos, conduziu para o seu quarto, pra lhe dar um banho quente, mesmo preocupado eu disse a que estava fisicamente bem e não precisava ir a um hospital, e quando estávamos sozinhos eu lhe contei o que havia acontecido, e que as feridas de sua irmã estavam em seu coração.
Com relutância eu fui tomar um banho e tentar não ganhar um resfriado, não que eu me importasse com isso, estava assustado e atormentado demais pra pensar na minha própria saúde. Depois de vestir uma roupa quente e confortável, fui até o quarto de pra ver como ela estava.
Como um fiel e melhor amigo, Simba estava deitado ao seu lado, com a cabeça apoiada em sua perna, e um olhar direto e preocupado. estava deitada encarando o teto, e estava totalmente diferente da única imagem dela que penetrava e permanecia em minha mente. A garota de dezessete anos, com os olhos escuros e envoltos por uma chama abrasadora de amor, intensidade, mágica, sexo e sonhos; tinha sumido. Uma mulher frágil e pequena havia assumido o seu lugar, e não havia mais nada, nem mesmo dor. Oco.
Ao notar minha presença, ela fechou os olhos fortemente, num esforço claro para tentar dormir, e não sei se foi o cansaço ou os remédios, mas ela logo conseguiu.
Continuei parado ali, incapaz de me mover, até que apareceu na porta e me chamou. Assim que desci as escadas vi que e Robert me esperavam. O olhar pesaroso do pai de me inundou ainda mais de culpa, mesmo não recebendo tal julgamento.
Me juntei a eles e recebi um abraço de Robert, e uma xícara de chá das mãos de , depois contei a eles o que eu tinha visto, e a falta de vontade de viver de .
- Amanhã eu ligarei pra um médico, ela precisa ser examinada. – Robert disse nos assegurando, e eu não poderia concordar mais.
- Já liguei pra mamãe e amanhã cedo ela estará aqui. – jogou o celular sobre a mesa e bagunçou os cabelos como se não soubesse o que fazer. Ninguém sabia.
Imaginar a mãe de ali fez um arrepio ruim passar por mim como um sopro de vento gelado no inverno, mas eu ignorei como mais uma coisa irrelevante a se pensar. Deixei um suspiro pesaroso passar por mim, aos poucos a adrenalina daquele dia ia se dissipando, e a realidade me consumido. Cobri meu rosto com o antebraço buscando alguma orientação e um mínimo de descanso.
- , minha filha vai ficar bem. – Ironicamente era Robert que estava me consolando. Pela primeira vez naquela noite eu não me acovardei e encarei o homem que parecia ter envelhecido alguns anos, em poucas horas.
- Eu realmente sinto muito, por tudo o que aconteceu no passado, por tudo o que aconteceu agora.
- Você não precisa, só vamos ajudá-la a passar por isso.

Fechei novamente os olhos e o passado parecia um grande circo, onde as minhas palhaçadas reorganizaram o espetáculo pra os trágicos acontecimentos. Senti um asco de mim mesmo, e de quem eu havia sido. A mão de afagou fraternalmente os meus cabelos, e ela pareceu ter lido o conflito de minha mente.
- Não se culpe por quem você foi no passado, lembre-se que as circunstâncias eram outras, e você só estava tentando se adequar a elas.
- Eu achei mimada. Quando soube que ela havia saído do hospital e dias depois estava se mudando pra Nova York, eu ri. Não sabia que estava rindo de uma desgraça, achei que fosse só um capricho, ou o jeito birrento dela de me provocar, então eu... – Conforme aquelas imagens passavam pela minha mente, a minha respiração ia se comprimindo em minha vergonha, e lutei para manter a compostura. – Não me importei, com ela ou seu bem estar, eu só... Estava magoado achando que estava perdendo uma ex-namorada, não poderia imaginar que havia perdido uma parte de seu coração.
- Não faz isso com você. – me interrompeu. – Você não sabia de nada, e continuou assim por uma decisão de , vamos nos focar em ajuda-la.

Concordei com um aceno, e o ambiente ficou mudo, pra que nós tentássemos ouvir a vida.
Voltei para o quarto e sentei ao lado de e fiquei acompanhando o seu sono inquieto, até ver a luz de um novo dia e até ela acordar e me pedir pra sair de perto dela. Sem grito ou briga, ela não parecia ter força pra nada, então cumpri sua vontade.

Londres – 18 de agosto de 2016 – 08:49 pm.
O médico que examinou , explicou sobre os estágios da dor, e que os distúrbios pós-traumáticos podem surgir pouco tempo depois do trauma, ou como no caso de , anos depois, desencadeado por outra situação exacerbadamente estressante. Eu não parava de me culpar, mas decidir ignorar os meus próprios julgamentos pra me preocupar exclusivamente na recuperação de . Haviam sugerido terapia, e eu não me opunha, mas eu sabia que ela precisava de mais, um choque, mas dessa vez positivo. Eu lhe daria isso.
O quarto de estava em absoluto silêncio, mas eu poderia jurar que ouvia os seus gritos, implorando ajuda.
- Eu não acredito que foi capaz disso. Minha filha sempre foi tão forte, eu sabia que esse retorno a Londres seria um erro. – Anne passava a mão no enorme colar que carregava no pescoço, e desfilava sua imponência pela sala.
- Isso iria acontecer um dia, mãe, talvez se demorasse mais pudesse ser pior.
- Ser pior? Ela tentou se matar ! – Antes que o filho respondesse, Robert totalmente calmo, numa postura oposta da histérica da ex-mulher disse por ele.
- Mas ela poderia não ter mais chance de voltar pra nós. ainda está aqui conosco, ela só precisa recuperar a vontade de viver. – Agitou a mão, como se pedisse pra Robert parar de falar bobagens.
- Eu falei com um médico que me indicou uma ótima clínica em Berlim e...
- Jamais! – interrompeu a mãe, sem se incomodar em estar sendo grosseiro. – Você não vai internar a minha irmã. Será que você acha que isso traria algum benefício pra ela?
- É a melhor da Europa! Têm os melhores profissionais e é bem cara.
- Que se dane a porra do dinheiro, mãe! É da que estamos conversando!
- se acalme. – Robert tentou suprimir os ânimos. – Eu acho que deve conversar com um profissional, vai fazer bem pra ela, e eu já encontrei um e marquei uma consulta.
- Pra conversar? – Anne riu irônica. – Ela precisa de muito mais do que isso, uma intervenção medicamentosa seria excelente!
Eu permanecia calado, assistindo a tudo, e ignorando o olhar repulsivo e indignado de Anne, que gritava o quanto eu não deveria estar ali, o quanto eu era o culpado por tudo. Enquanto isso, a maior parte da minha mente buscava uma solução. Transformei em uma grande metáfora: Se ela fosse à letra e melodia de uma música, o que eu faria para consertá-la? Como eu poderia reescrever toda uma história de anos atrás? Remontar arranjos quebrados que foram feitos por mim?
Eu escrevia músicas, desde os seus acordes, batidas, letras, versos, pontes e ganchos. Era assim que eu me enchia de adrenalina, de um amor que aliviava tudo, mas sem só me restaria um furacão, e eu soube que eu não teria respostas pra nenhum dos meus recentes questionamentos, não havia metáfora, era a própria música.
- Esse moleque nem deveria estar aqui! – Finalmente ela denunciou o seu ódio. – Ele fez tudo isso.
- Não fez Anne, pelo amor de Deus, para com isso. – Robert pediu num nítido cansaço de anos.
- Você é um burro apaixonado como é! – Acusou.
- As pessoas se apaixonam e se entregam Anne, assim como eu fiz e nunca vou me arrepender disso.
Os olhos sinceros de Robert me deram uma resposta.
- Eu sei do que precisa! – Me levantei do sofá e os três pararam pra me encarar. e Robert esperançosos, Anne incrédula e enojada. O plano deslizou de minha boca como se o tivesse pensado há muito, muito tempo. Como esperado, eu recebi apenas apoio de dois.
Meu desejo era que ela conseguisse amar de novo, sentir, por ela, e se no meio disso ela conseguisse me ver ao seu lado, que soubesse que eu iria estar lá, com o meu coração circular, que sonhava por ela, e desaguava todo o meu amor no mesmo lugar.
Me apavorava imaginar que teria que viver o resto da vida, só com minha história e a de até ali. Nós merecíamos mais, o nosso amor merecia tudo.

~*~*~*~*~*~


havia me cortado completamente. Não me evitava como tinha feito diante do meu erro com Jazzy, dessa vez a diferença estava em sua inaptidão. Não havia nenhum sentimento regendo as suas decisões, só uma vontade enorme de se livrar de suas memórias dolorosas, se livrar de mim.
Estava cansado de planejar, cansado de prometer, o que eu queria ser pra eu seria, mostraria nem que fosse a força, pra que o vento não levasse e minhas atitudes fossem fincadas como raízes no nosso amor.
Aproveitei aqueles dias de afastamento imposto, pra organizar tudo meticulosamente, ao mesmo tempo em que eu queria não ter um roteiro e que a espontaneidade nos rendesse boas surpresas, sabia que um mínimo de planejamento era importante, e deixaria que o destino se encarregasse do resto, como de fato sempre faz. Em busca de cada detalhe perfeito, eu comprei o objeto crucial de nossa jornada. O carro era uma réplica perfeita do carro da minha mãe que eu sempre usava anos atrás, e que foi cenário de tantos momentos bons em nosso relacionamento, assim eu esperava que ela se sentisse acolhida. Queria que ela se lembrasse do que foi bom, e deixasse que a alegria dessas memórias se fixasse no lugar de suas mágoas.

Londres – 20 de agosto de 2016 – 04:01 pm.
’s POV
Eu não sentia tristeza. Depressão era a própria dor, tamanha, que me deixava anestesiada, sem nenhuma emoção, nada pra incomodar ou se acomodar. Nada.
Nos últimos dias eu estava sendo conduzida. Falavam que eu deveria acordar, então eu despertava. Me mostravam a comida e diziam que eu precisava me alimentar, e eu obedecia. Essa manhã haviam me dito que eu deveria falar com um especialista, e eu acatei mais uma ordem soada com preocupação.
Talvez eu não quisesse nada disso, ou só poderia estar enganada, mas a minha proposital inaptidão tinha a ver com a facilidade que era viver a direção de outros. Afinal, eu me sentia constantemente cansada, meu corpo desejava apagar a cada hora, e nada me despertava, ou me desafiava a ficar acordada.
Depois de bocejar pela décima segunda vez, e ver os ponteiros do relógio darem meia volta, o meu nome finalmente foi chamado.
O consultório parecia mais a sala de estar de um jovem solteiro, exatamente como era o médico que me esperava. Ele não parecia muito mais velho do que eu, e tinha uma aparecia tão relaxada que parecia mais um boêmio do que terapeuta. Ele indicou que eu me sentasse num sofá confortável e colorido e eu assim fiz. Não sei se foi o ambiente, o sorriso caloroso, mas eu senti uma espécie de segurança estando ali pra provavelmente dividir algo intimo da minha vida.
- Faça a sua mágica. – Decidi usar a ironia e irritação como um escudo.
- Você não parece empolgada por estar aqui.
- Nem um pouco. – Ele sorriu depois de fingir ter estado magoado, mesmo assim me pareceu natural e sincero.
- Quem é ? – A pergunta empregada naquele tempo me pegou de surpresa, e mesmo ele tendo me dito que eu não deveria ter pressa e poderia pensar, só uma resposta me definia.
- Ninguém. – Num manejo simples de cabeça, eu soube que deveria continuar. – Eu sou inapta e incapaz, apesar de parecer o contrário, eu não posso fazer nada por mim ou pra mudar isso.
- Por que você está aqui?
- Bom. Você deve saber.
- Eu gostaria que você dissesse. – Ele continuou sorrindo, e estranhamente eu não notei piedade ou escárnio. – Por favor.
- Eu tentei me... – Parei e suspirei sem realmente conseguir dizer, em parte por não acreditar, a outra por ter experimentado o peso do ato. Encarei as minhas unhas com o esmalte vermelho já descascando em desleixo, e quis ser honesta. – Eu tentei me matar. Quando se descobre que o seu mundo não tem mais nenhum significado ou conserto, não faz mais sentindo continuar, só que... Eu percebi que ainda existo apesar de não ser ninguém. Eu não queria deixar de viver, eu queria entender porque ainda estou aqui, porque todas essas pessoas que eu fiz sofrer ainda me querem aqui.
- Você pensou que a morte era a melhor forma de punição?
- Sim.
- E como se sentiu por quase ter conseguido?
- Eu continuo não sentindo nada, mas agora eu passei a querer sentir. – Seu olhar me pediu para prosseguir, e assim eu fiz, desatei a falar.

Fiz um breve resumo sobre como havia sido a minha vida até ali, fazendo uma consideração maior ao meu relacionamento com , tudo saiu de mim facilmente, como uma lufada de vento. Talvez fosse por aquele homem ser um desconhecido até então, ou talvez o seu olhar profissional fosse treinado pra aquilo, mas eu não via julgamentos, e sim uma segurança. O Doutor Turner fez apenas algumas intervenções e considerações, enquanto eu lhe contava a minha história, ouvindo pacientemente e com interesse.
- Às vezes é difícil receber o amor de alguém que está fortemente ligado a lembranças que queremos esquecer, talvez seja isso pra você.
“Ou apenas um grande imbecil!” Apenas pensei, não queria me estender naquele assunto, na verdade eu não queria mais falar sobre nada, e por sorte o meu tempo de consulta havia acabado.

- Estarei te esperando pra próxima consulta. – Apenas esbocei um sorriso que lhe disse que voltaria, e finalmente, ao atravessar a porta do seu consultório, eu respirei a liberdade de estar sozinha novamente. Não durou muito.

’s POV
- Oi. – Qualquer resquício de “boas vindas” que trazia, morreram assim que ela me enxergou, e aquela receptividade, ou melhor, a falta dela, me fez mal, mas não menos determinado. – Serei seu motorista, vou te levar pra casa.
não retribuiu o meu abraço, ou me dirigiu a palavra, apenas saiu a passos firmes, depois de ter me olhado como se o que eu tivesse lhe dito fosse uma insanidade. Dei três passos rápidos e logo estava ao seu lado, coloquei as mãos no bolso e a acompanhei como se ela estivesse de acordo com isso.
- O que achou da consulta? – Silêncio. – Imagino que tenha sido boa, o Doutor Turner é excelente.
Seu caminhar aumentou o ritmo, mas toda distancia buscada por ela, era aniquilada por mim. Antes que pudéssemos de fato sair da clinica, vi um paparazzi se aproximar com a sua câmera, parecendo um artefato de guerra, pronto pra explodir e eu, através de seus flashes e perguntas indelicadas.
Abracei protetoramente, e estendi o meu braço tentando nos colocar a frente, mas já era tarde demais. Como se tivesse matado uma abelha, logo tínhamos despertado um verdadeiro enxame. Ficamos cercados por todo aquele mar de ofensas e luzes, por tempo suficiente pra eu sentir tremer em meus braços. Nossos seguranças nos ajudaram, e conseguimos entrar no carro em segurança, mas eu jamais poderia tirar, aquelas merdas de perguntas e acusações que ela tinha ouvido.
- Me leva pra casa! – Ordenou ao meu segurança que havia assumido a direção do carro.
- A gente podia...
- Me leva pra casa! Me leva pra casa, agora! – Senti que parte do seu descontrole era pra me convencer e não permitir que eu questionasse ou sugerisse nada.
Durante o trajeto ela se afastou de mim, o máximo que o espaço permitia e não ousou sequer me olhar. Sua inquietação acabou me deixando do mesmo jeito, e eu só queria poder abraça-la e acalmar nós dois.
O carro mal havia parado e já estava pronta pra escapar, mas eu segurei o seu pulso e impedi, sendo firme ao menos no ato. Ela me encarou, ainda inexpressiva, mas tentando se livrar do meu toque, eu não permiti.
- Sei uma maneira de te ajudar e...
- Eu não preciso da sua ajuda, nem da ajuda de ninguém.
- É ai que está o problema, você está cética e intolerante, até mesmo pra ouvir a minha proposta.
- A escolha é minha, aceite.
- Como você sabe que fez uma escolha, ou é a escolha que está te fazendo?
- Me deixa sair desse carro, . – Disfarçado de hiperatividade, ali estava um pedido doloroso. – Eu não quero você perto de mim, você ainda não entendeu isso?

Ignorando o que ela havia pedido e dito, meus dedos tocaram o seu rosto, e procurou os seus olhos, tentando enxergar suas faíscas, mas tudo ainda estava cinza.
- Toda beleza se reconhece em você. Consegue enxergar isso também? – A respiração dela havia ficado errática e sua preocupação estava dando lugar a uma redenção, aquilo já era um avanço, mas eu não poderia abusar. – Esteja pronta amanhã cedo, virei te buscar.
Minha afirmação não deixou espaços pra questionar, e ela se manteve inerte. Me aproximei ainda mais, e meus lábios tocaram a sua testa, num beijo respeitoso, transbordando o meu amor, me afastei dando espaço pra sua partida, e ela se foi.

Londres – 21 de agosto de 2016 – 10:10 am.
- O que você está fazendo aqui? – estava sentada à mesa de café da manhã, e como se não tivesse me visto na tarde anterior, me deu um olhar repleto de um vazio que me excruciava, mas que escondi por trás de um sorriso óbvio.
- Eu disse que viria, você está atrasada.
- Eu não... – Interrompi com minha risada.
- Sair de pijama voltou à moda? Posso usar um também. – Brinquei e apenas Robert pareceu se divertir.
- Melhor ir logo, querida. – O incentivo do pai, fez trocar um breve olhar quase ressentido com ele, que apenas riu, se entretendo com tudo aquilo.
Como se eu estivesse lidando com uma máquina, assisti , a contra gosto, se arrumar no automático. Tentei afastar o meu nervosismo, tudo o que eu deveria ser dali em diante era obstinado e otimista.
- Sente e tome uma xicara de chá , você parece nervoso.
- Está tão na cara assim? – Perguntei um tanto sem jeito, já me servindo, e ele afirmou. – Você poderia me dar uma dica, eu não sei como fazer isso.
- Sabe o que é equilíbrio? – Neguei por não saber o que de fato ele queria me ensinar. – É a capacidade de não explodir o que precisa ser uniforme.
- É tudo o que eu preciso? Ter equilíbrio?
- O que está sentindo agora é ingrato, ela não vê mais beleza em nada, espero que você consiga mudar isso.
- Vou tentar, mas...
- . – Me disse com cuidado. – Ela te ama. Por trás desse silêncio, existe a dor de nunca ter sido ouvida, a mágoa é o lado brutal do amor, seja paciente e ela voltará pra você. – Suspirou e notei a esperança queimando suas íris. – Voltará pra todos nós.
Concordei e sorri lhe passando confiança, eu não iria só tentar, eu iria conseguir. Se Robert havia sido obstinado, eu também seria. Qualquer coisa por ela.
Bons minutos depois, desceu as escadas vestindo uma roupa confortável e um all star. Acho que a única vez que vi sem salto foi no nosso primeiro encontro.
- Tirando essa cara de desânimo você está linda. – Robert disse num tom brincalhão e o olhar severo de pra ele cresceu.
- E bem pequena sem os saltos. – Incitei aquela frase antiga, mas o que eu disse pareceu não incomodou ela a ponto de revidar, apenas passou pela porta sem se despedir, e parou ao notar o carro que estava.
Sem dizer nada, eu me apressei e abrir a porta do carro pra ela, que me agradeceu a gentileza, destravando a minha porta enquanto eu dava a volta pra entrar. Me acomodei frente ao volante, até que me finalmente perguntou:
- Pra onde nós vamos?
- Fazer a viagem das nossas vidas.

FLASHBACK ON:
Londres – 29 de outubro de 2008 – 07:33 pm.
- Eu não consigo ficar aqui. – Falou com manha, e antes que eu pudesse pensar em fazer outra coisa, o brinquedo parou, fazendo arregalar os olhos de susto e pavor. – POR QUE PAROU?!
- Calma. Eles pararam pra outras pessoas subirem, não devem demorar.

Ela começou a olhar pra todos os lados, como se estivesse procurando uma maneira de sair daquela situação.
- Eu quero descer, você tem que me tirar daqui! – Puxou os cabelos em frustração, antes de me atingir. – Eu odeio você!
- Tenta se acalmar, olh...– Fui impedido de continuar por sua ameaça.
- Não me mande mais olhar pra você, porque senão eu sou capaz de te jogar daqui.
- Shiii. – Por puro reflexo e falta de um bom argumento que a fizesse se acalmar, eu a abracei, o mais apertado que eu consegui, e senti sua respiração se tornar gradativamente regular. – Me conta uma história. – Propus sussurrando em seu ouvido e sentindo o corpo dela se arrepiar, mas agora eu duvidava que fosse pelo medo. – Assim você esquece onde está.
- Que história? – Sua pergunta soprou no meu pescoço deixando meu corpo tão quente arrepiado quanto o dela.
- Pode ser do Barney. – Decidi brincar pra não me permitir ter pensamentos tão impróprios naquele momento, mas pra mostrar seu desagrado ela mordeu o meu braço, quebrando nosso contato, massageei o local. – Agora que você sabe que eu odeio mordida, vai fazer isso sempre, não é?
- Claro. – Respondeu com obviedade, como se estivesse sentindo algum prazer em me ver sentindo alguma dor.
Ficamos nos encarando como duas crianças birrentas, até eu ceder e abraçá-la de novo.
- Me conta porque você quer tanto dirigir, acho que temos um tempo aqui.
Ela respirou fundo e pareceu mergulhar na história, antes de começar a contar.
- Um pouco antes de minha mãe ficar grávida, meu pai a traiu numa festa estúpida de fraternidade. Quando ele contou a ela, a deixou devastada e então eles terminaram o namoro. – Meus dedos percorriam preguiçosamente desde o seu ombro até a sua mão. – Meu pai como é completamente obstinado praticamente sequestrou minha mãe e eles viajaram um fim de semana inteiro, conhecendo novos lugares, novas pessoas e redescobrindo um ao outro.
O orgulho e admiração que tinha sobre aquela história e aquelas duas pessoas era tão notável quanto as estrelas que brilhavam sobre nossas cabeças.
- Deve ser incrível fazer uma viagem dessas.
- Assim que ela morreu, ele percorreu o mesmo caminho, não teve mais a mesma graça, mas a magia de novos ares, o calor emanando do asfalto, sua música favorita tocando no rádio e uma novidade a cada quilômetro com a promessa de que tudo ia ficar bem, ainda estavam ali. Palavras dele, não minha.
Mesmo com o queixo apoiado em sua cabeça me impossibilitando de ver o seu rosto, eu sabia que agora sorria. Imaginei nós dois fazendo uma viagem como aquela. Era grandioso pensar em algo assim, mas a nossa realidade não me impedia de sonhar.
- Seu pai descobriu uma maneira de trazer vida a eles, de recuperar o amor que não haviam perdido.
- Exatamente. Você mesmo me disse que tudo tinha uma razão pra ser, eu fui concebida durante essa viagem.
- Pra minha sorte.

FLASHBACK OFF.

Como se eu tivesse dito o maior dos absurdos, tirou o cinto de segurança, mas antes que ela pudesse sair eu a impedi.
- Por favor, me escuta antes. – Implorei com o olhar, e milagrosamente ela cedeu. – São por alguns dias.
- Não vou suportar isso, eu mal consigo olhar pra você.
- Mas não precisa olhar, olha pra estrada. – Mais uma vez a minha brincadeira pareceu uma ofensa.
- Tudo que vamos precisar está no banco de trás. – Indiquei com o dedo, mas não fez questão de conferir. O violão que ela havia me dado também estava lá, mas preferi não citá-lo. – Nós podemos usar perucas, nos disfarçar, sermos novas pessoas em cada novo lugar, admita que será bom, e esse é um plano inteligente.
- Inteligente? – Debochou. – Vindo de você?
- Você sabe que eu sempre fui o mais inteligente de nós dois.
- Mas, não o mais esperto. Não vou viajar com você!
- Isso pode parecer radical ou inquisitivo, mas... – Parei por alguns segundos me decidindo se deveria dizer aquilo a ela. Estava numa posição onde qualquer coisa poderia ser extrema, estava andando sobre um enorme campo minado. – Você é a coisa mais importante pra mim, e se precisa se recuperar, eu quero estar ao seu lado a cada pequeno passo que der.
Como eu imaginava, foi de surpresa a ofendida em fração de segundos, qualquer sombra de sentimento passou tão rápido quanto um falcão irrompendo o céu, e ela logo se recuperou. Infelizmente.
- Eu.Não.Vou!
- Prefere ir pra uma clínica em Berlim? – A ameaça era a única arma contra uma criança inteligente.
- Que grande porcaria! – Berrou, e se houvesse emoção seria frustração.
- Eu sabia que você adoraria fazer essa grande tour comigo e...
- Eu já estou aqui. Poupe os seus discursos. – Voltou a colocar o cinto e eu soube que havia conseguido.
- Ótimo. – Não escondi a minha empolgação, mesmo frente à cara entediada dela. – Só tenho uma condição.
- Qual?
- Você terá que fazer tudo o que eu disser. – Ela se virou pra mim, por puro susto. – Calma, serão apenas desafios, você pode jogar também.
- Não. – Falou relutante, mas agora o meu sorriso era quase maquiavélico.
- Você aceitou viajar comigo, preciso que ainda confie em mim.
- , entenda uma coisa, estar aqui ou numa prisão é a mesma coisa pra mim. – Ignorei o seu protesto, na verdade eu adoraria ouvi-la falar mais.
- Prometo não te pedir pra fazer nada perigoso, degradante ou intolerável.
- Posso imaginar. – Jogou sua ironia pra mim.
- Eu trouxe um caderno de desenhos e lápis pra o caso de você querer produzir alguma peça, ou só desenhar uma paisagem. – Ela revirou os olhos, e eu finalmente dei partida no carro, seguindo para a rodovia que nos tiraria de Londres. – E um calendário desse mês, assim você pode marcar um X a cada dia de viagem.
- Pra isso eu tenho relógio de pulso, e eu vou contar cada segundo pra que isso termine.
- Vai ser divertido, Estranha. – Fui ainda mais ousado e dei um pequeno tapa em sua coxa.
Incentivei apenas pra ver se afundar ainda mais no banco fingindo tédio, e antes que eu pudesse disparar a falar mais bobagens, ela decidiu me calar ligando o som do carro.
Se o coração de era um gelo, eu esperava que essa viagem fosse o fogo que o faria queimar. O sol brilhava inflamando o asfalto a nossa frente, eu me virei minimamente e quando eu vi os olhos de reluzirem, eu soube que ela estava excitada com aquela oportunidade de fugir, era um sentimento voltando a personalidade dela. Era um recomeço.


Capítulo Vinte - Dia 1

"So let the music take your mind. Just release and you will find You're gonna fly away, glad you're goin' my way… I love it when we're cruisin' together… Music is played for love, Cruisin' is made for love… I love it when we're cruisin' together.” Cruising Together – Gwyneth Paltrow.


Wolverhampton – 21 de agosto de 2016 – 11:40 am.
- Chegamos à terra do estranho aqui. – Mesmo com uma enorme placa revelando o nome da cidade, fiz questão de lúcidar a que ali era a minha cidade natal.
- Começamos bem, direto para o buraco. – Entortou a boca ainda evitando me encarar, não esmoreci a empolgação.
- Primeiro nós vamos almoçar, depois...
- Você só pensa em comida? – Olhou pra mim como se me medisse, e estivesse com repulsa. – Você deveria parar de comer, já está bem gordo e as pessoas estão comentando.
Fingi me ofender pra deixá-la mais confortável, mas eu estava rindo por dentro, com a sua tentativa de magoar e me afastar.
- Mesmo ferindo o meu ego, eu vou te levar no meu restaurante favorito, o Penn Tandoori, eles fazem o melhor chicken tikka bhuna do mundo.
- E o que seria isso?
- Basicamente é um frango com bastante especiaria.
voltou a ficar muda, observando a cidade que surgia quase como fotografias através da janela do carro.
O pequeno restaurante agora parecia mais luxuoso, mas eu ainda sentia o aconchego que o lugar sempre me trouxe. Estacionei o carro e me virei pegando a mochila onde os disfarces estavam e decidi usar uma peruca de fios platinados, e que iria me deixar ridículo, mas irreconhecível também.
- O que você vai usar? – analisou as suas opções e decidiu usar uma peruca que não era diferente de seu cabelo, exceto pelo comprimento muito menor, depois colocou enormes óculos escuros. Antes que pudesse sair do carro, ela me impediu.
- Nós precisamos de novos nomes. Você está ridículo, a propósito. – Sua birra a impossibilitou até de ri de mim.
- Quero ser Bruce Wayne.
- Sério? – Ela ergueu a sobrancelha. – Por causa do Batman?
- Eu estou sendo criativo, e ele é meu super-herói favorito.
- Então eu serei Selina Kyle. – Se decidiu, e foi a minha vez de impedir a sua saída.
- Sério? Mulher gato?
- Gosto de pensar nela como a melhor inimiga do Batman. – Forçou um sorriso. – Que foi? Estou sendo criativa.
Deu de ombros e desceu do carro, entrando no restaurante sem esperar por mim. Escolheu uma mesa um pouco afastada, mas de frente para as enormes janelas de vidro que mostravam ainda mais a cidade. Me apressei em segui-la, porque sabia que seria reconhecido ali, e se eu estivesse certo, Sue largaria a sua cozinha só para vir me atender.
Acomodei-me numa cadeira em frente a que estava, e não precisei de cinco minutos pra conseguir notar os sussurros vindos dos funcionários que nos encaravam, e não nos atendia. Abaixei a cabeça fingindo que estava analisando o cardápio, como eu previa Sue surgiu com um enorme sorriso.
- Eu sei que é você cabeça de queijo. – Riu e agitou os cabelos da minha peruca. – Meu pequeno . – Diminuiu o tom de voz ao pronunciar o meu nome, e não estragar o péssimo disfarce. Ri no mesmo tom e me levantei para abraçá-la.
- Você sempre me descobre.
- Eu sempre vou conhecer essas bochechas. – Apertou o local por três vezes antes de finalmente me liberar e levar a sua atenção a . – Escolheu bem dessa vez, como vai querida?
sorriu pra ela e também se levantou, mas antes que estendesse a sua mão para cumprimentá-la, a mulher também apertou suas bochechas, e o gesto espontâneo parece tê-la divertido e a distraído de todos os sentimentos ruins.
- Eu sou Sue.
- Muito prazer, eu sou... . – Revelar o nome verdadeiro foi mais como um gesto de confiança.
- É a sua primeira vez em Wolverhampton?
- Sim, estou encantada, é uma cidade linda.
- Eu aprovo essa namorada, Cabeça de queijo.
- Ah não! – a corrigiu de imediato. – Não sou namorada, sou uma... – Procurou as palavras exatas e ao encontrar me olhou provocante. – Uma prisioneira.
Sue riu, mesmo sem entender e continuou a sua análise admirada pra mim e .
- Vou preparar de tudo um pouco, vocês parecem famintos, e estão muito magros.
- me disse isso agora a pouco. – Passei a mão na barriga e lancei à um sorriso de escárnio, que me devolveu um impaciente. – Ela vive dizendo o quanto sou gostoso.
- Isso é apenas amor, Cabeça de queijo.
A mulher robusta, que agora tinha cabelos grisalhos, e fortes linhas de expressão, saiu antes que pudesse contestar alguma coisa, trazendo certa frustração a ela.
Voltei a me sentar, e meu riso foi se desfazendo quando não consegui arrancar nenhuma palavra de , até que o nosso almoço chegasse. Como sempre, Sue havia exagerado na quantidade de comida, e na perfeição na qual fazia o seu trabalho, estava tudo delicioso e pareceu despertar o apetite até então inexistente de . No final ela fez grandes elogios à comida e ao atendimento. Sue mostrou através das janelas, alguns pontos turísticos da cidade, e também lhe ensinou algumas gírias locais, além de me constranger revelando como eu era na infância.
- Trouxe a sobremesa favorita desse mocinho aqui. – Sue apertou minhas bochechas mais uma vez. – A receita inclusive vem da família dele.
- Obrigado, Sue. – Agradeci, e não evitei passar a língua pelos lábios já prevendo a delícia que provaria. olhou pra mesa e se assustou ao ver rice pudim numa taça.
- Achei que sua sobremesa favorita fosse torta de mirtilo. – Me encarou buscando entendimento. – Você sempre pedia torta de mirtilo. – Havia em seu olhar uma sensibilidade palpável, provavelmente assim como eu, ela estava lembrando-se do meu avô, mas o que não sabia é que de nada ele tinha a ver com minha usual mania de pedir a torta.
- Eu sempre pedia porque essa era a sua sobremesa favorita. – me olhou com apresso de quem havia descoberto algo realmente valioso, depois voltou a sua atenção para Sue.
- Você poderia me passar à famosa receita? – Os olhos de Sue brilharam de empolgação com o pedido.
- Farei mais. – Sorriu pra e segurou sua mão. – Vou te ensinar agora mesmo, vamos até a cozinha.
Prontamente se levantou e seguiu a mulher, deixar uma estranha entrar na cozinha do Tandoori era algo tão inédito que nem os outros funcionários podiam acreditar. havia mesmo conquistado Sue.
Eu sabia que não se interessava por gastronomia, tampouco estava fazendo aquilo pra me agradar, mas vê-la se esforçar pra encontrar novas perspectivas era um ótimo exercício, que estava me fazendo sorrir como um grande imbecil.
Comi a sobremesa, conversei com algumas pessoas, e esperei pacientemente para que a “aula” de terminasse. Um tempo depois as duas voltaram conversando como se fossem amigas de infância, retomou o seu lugar na mesa e me entregou outra taça com mais rice pudim.
- Você precisa experimentar esse. – Ordenou empolgada e eu logo obedeci. A sobremesa preparada por estava incrível, e eu poderia continuar provando aquela pequena dose não só de açúcar, mas também das emoções dela que eu estava buscando.
- Um dia você chega lá. – Provoquei e me jogou um guardanapo mostrando certo receio, mas acompanhou a gargalhada de Sue.
- Está tão ruim assim?
- Não, só estou brincando com você. – Quando ela respirou fundo por alivio ao ouvir a minha avaliação eu fui até o céu, tendo certeza de que estava no caminho certo, esperança renovada.
Com um grande esforço, já que por Sue nós deveríamos ficar para o jantar, nós saímos do restaurante, e mesmo fazendo mais calor fora do lugar, eu acabei sentindo uma friagem, e ela vinha de .
- Permitam ser felizes, não sabemos se essa sensação será passageira. – Foi o conselho que Sue nos deu, enquanto abraçava . – Aproveitem a aventura.
- Nós iremos. – Provavelmente mentiu pra não demonstrar sua antipatia à uma pessoa que lhe foi tão carinhosa e agradável.
- Voltaremos em breve.
- Ah, Cabeça de queijo. – Apertou a minha bochecha depois de um rápido abraço. – É bom que esteja falando a verdade, eu sinto muito a sua falta.
- Eu prometo. – Gritei já entrando no carro, e esperei por mais um abraço de despedida entre as duas.
Quando entrou no carro, seu animo foi se desfazendo assim que seus olhos cruzaram com os meus, como se eu a lembrasse da dor. Tentei não me abalar com isso, e me manter positivo, mostrando a onde eu havia estudado, onde eu fazia boxe, e até o lugar onde eu tinha dado meu primeiro beijo, tudo mesmo diante a sua falta de interesse.
Estacionei em frente a enorme instituição que eu havia ajudado a construir, e que me enchia de orgulho. Lhe expliquei suscintamente a proposta do lugar, e que com a correria do meu trabalho, eu ainda não havia tido tempo pra fazer uma visita, então aquela era a minha primeira vez ali também. retirou sua peruca e óculos escuros, e fez o mesmo com os meus.
- Quem você quer ser agora? – Perguntei sem entender o seu gesto.
- Ninguém. – Encarou o prédio, depois os meus olhos, como se a resposta fosse óbvia e estivesse bem diante dela. – Aqui eu quero ser eu mesma.
Deixei estampado o meu sorriso de orgulho, e ela saiu do carro primeiro que eu, mas esperou por mim pra entrar.
Blake nos recepcionou. Ela deveria ter a mesma idade que eu e , e era bastante simpática e comunicativa, fez questão de nos guiar para conhecer cada lugar dali.
Entramos num ginásio enorme, os adolescentes estavam jogando futebol, enquanto outros treinavam basquete. Nenhum deles pareceu se importar com a nossa presença.
- Cerca de cem alunos se inscreveram, nós buscamos atingir o pleno potencial de cada jovem, para que eles alcancem os seus objetivos e sonhos.
- E como isso aqui é mantido? – perguntou a Blake, mas mantendo seu olhar para as atividades das crianças.
- Doações. – Ela sorriu com obviedade. – Principalmente dos locais. Todos tentam ajudar, sejam com donativos ou incentivos.
Assistimos um pouco do jogo dos garotos, e estava realmente impressionado com a habilidade deles. Pareciam profissionais que se divertiam com a bola, em cada truque ou drible. ao meu lado agitava levemente as pernas como se estivesse refazendo os passos de cheerleader.
O apito do professor pausou o jogo, e os garotos foram até nós.
- Olá crianças, vocês devem conhecer. – Apontou pra mim e depois se voltou pra minha acompanhante. – E essa é .
Vi os garotos cumprimentarem e se entreolharem, todos com risinhos que demonstravam o quanto a beleza dela era admirada. Provavelmente eles já a conheciam, mas foram bastante educados e agiram com naturalidade, diminuindo a barreira que estava estabelecendo com as pessoas. Ela estava solta, comunicativa, e brincalhona. Nós conhecemos um por um, falamos um pouco sobre o esporte, o que eles esperavam do futuro, e sobre um campeonato que eles participariam.
- Você vai jogar com a gente? – Um garoto perguntou a , que riu negando.
- Sou um total desastre, a menos que vocês me ensinem. Mesmo assim, eu acho que posso até machucar vocês. – Eles riram, e o garoto mais baixo da turma, mas que corria como um foguete tomou a frente.
- Futebol é muito simples, e pode ter certeza que jogando alguns minutos com nosso time, vai sair daqui quase profissional. – Determinou com autoconfiança, qualidade que eu sabia o quanto admirava.
Ela decidiu encarar a experiência e não se parecia com aqueles artistas que doavam seu tempo e atenção às crianças para ganharem algum tipo de reconhecimento, era totalmente o contrário. buscava apenas um acalanto, e sem seu sapato de salto alto, um coque mal feito prendendo o cabelo, as bordas de suas calças erguidas até os joelhos, rosto corado pelo esforço de aprender a jogar futebol, um sorriso frouxo, e os olhos negros que estavam voltando a brilhar, aquelas crianças que estavam preenchendo espaços em branco do coração dela.
Depois do breve e animado jogo, se recompôs e se despediu de cada um, prometendo lhes fazer uniformes exclusivos. Seguimos nosso tour pela instituição junto a Blake, e entramos numa enorme, vazia e iluminada sala.
- Aqui é a oficina de arte onde as crianças aprendem música, dança ou pintura. – Ela nos indicou uma porta. – As crianças estão esperando por vocês, elas farão uma apresentação.
- Acho que esse é o meu lugar favorito. – Brinquei e antes de continuarmos pra chegar até o auditório, notei que estava parada observando uma garotinha sentada sozinha.
- Aquela é Sara, ela prefere ficar um pouco mais reclusa, enquanto faz vários desenhos de roupas. Vai até lá, você vai gostar dela. – Blake incentivou e sem pestanejar, se aproximou.
- Oi, Sara. Meu nome é , mas pode me chamar de .
- Oi. – A menininha loira, com sardas adoráveis, deveria ser um pouco mais velha do que Jazzy. Ela olhou fixamente, com seus enormes olhos verde, pra , como se soubesse exatamente quem ela era, mas não fez nenhum alarde com isso.
- Posso me sentar? – O sorriso doce brincou no rosto da menina e foi mais do que acolhedor, que o retribuiu. Puxou uma pequena cadeira colorida e se sentou. – Soube que você gosta de desenhar.
- Por que dizem que eu sou boa. – Deu de ombros, e pela primeira vez a garotinha não pareceu tão animada.
- Mas só por isso? – Ela confirmou com um aceno, ainda concentrada em seu trabalho, assim como eu, percebeu que havia mais ali, e instigou a criança. – Bom, eu adoro desenhar, eu trabalho com isso.
- E você consegue ganhar bastante dinheiro?
- Sim, mas acho que essa não é a questão, fazer o que se ama é mais importante.
- Não, agora é importante o dinheiro.
- Por quê?
- Meu irmãozinho está doente, e mamãe me disse que só um milagre poderia salvá-lo, então eu preciso juntar dinheiro pra comprar um milagre pra ele.
- Como o seu irmão se chama?
- , ele tem dois aninhos, e quando eu chego em casa ele sempre quer brincar comigo, mas ele fica logo cansado e quer dormir, ou a mamãe não deixa.
- Ela não deve fazer por mal.
- Eu sei. Toda noite ela parece triste, então eu a abraço bem forte e a ajudo chorar. – Meus olhos brilharam pelas lágrimas que surgiram e eu tentei segurar.
- Você é uma criança incrível, seu irmão tem sorte de ter você na vida dele. – Vi o nó se formar na garganta de , e sua pose desmoronar a cada segundo. – Eu tenho um amigo que se chama .
- E ele é legal?
- Não. – Riu e olhou pra mim, também aguando um choro por dentro. – Ele é um chato. - Mas se ele é seu amigo, você deve gostar dele. E ele deve ser um pouquinho legal.
- Ele é. Muito, muito legal. – olhou rapidamente pra mim, depois abaixou a cabeça. – Eu é que estou com o coração um pouco doente. – Antes que a curiosidade da menina disparasse, ela mudou de assunto. – Você poderia me mostrar àqueles desenhos ali? – apontou pra uma pilha de papéis coloridos, Sara os entregou, e teatralmente os analisou por vários minutos. – Eu adorei a combinação de cores, e o caimento de suas roupas são bem característicos. – falava como uma profissional, e mesmo a criança não entendendo nada, o objetivo era fazê-la se sentir grande e especial, e pelos os olhos de Sara, estava conseguindo exatamente isso. – O que você acha? – Perguntou a mim, mostrando-os e eu mantive a postura construída por ela.
- São realmente ótimos.
- Sara, eu e meu sócio ali, gostamos dos seus desenhos, você poderia vendê-los pra mim?
- Hã? – Abriu sua boca no máximo de seu espanto. – O que?
- Te pago o valor do seu milagre, vamos fechar negócio? – Como se soubesse que aquilo era uma doação, a menina abraçou com uma força desmedida, num agradecimento tão puro quanto a sua inocência. – Você vai voltar a brincar com o seu irmãozinho.
O sussurro de tinha um tom embargado, recheado dos sentimentos que ela estava perdendo.
- Os garotos já vão começar. – O aviso de Blake interrompeu o momento entre as duas.
- Você não quer assistir a apresentação com a gente? – Sara negou.
- Preciso fazer uma coisa, bem rápido! – Garantiu a ainda mantendo um sorriso no rosto.
- Tudo bem. – lhe deu um beijo na bochecha, e só então nós seguimos para o auditório.
Assistimos as apresentações, recebemos o carinho de todos os que ali estavam, mas assim que acabou, seguimos guiados pela ansiedade de , até o setor administrativo. Ela estava mesmo disposta a saber tudo sobre as condições médicas do irmão de Sara, e as maneiras que poderia ajudar.
Fiquei impressionada com o seu empenho e engajamento, ela havia saído do total estado de torpor assim que encontrou um motivo para se movimentar. Esperamos pacientemente pela chegada da Senhora Allen que parecia não acreditar na ajuda que iria receber. Ficamos sabendo que o pequeno , tinha nascido com uma doença rara, mas que com o tratamento adequado poderia viver uma vida longa e tranquila. E assim seria, graças a .
Acertamos tudo, e a partida do sol anunciou que deveríamos fazer o mesmo. Nos despedimos de todos, e prometeu, por nós dois, que voltaríamos. Ela parecia mais leve, ou pelo menos mais motivada. Antes que pudéssemos entrar no carro o chamado estridente de Sara por nos impediu. A garotinha correu com uma folha de papel nas mãos e um sorriso enorme que correspondeu.
- Eu esqueci alguma coisa? – se abaixou ficando na altura de Sara, que lhe entregou a folha com um enorme coração colorido, desenhado nela.
- Você me disse que o seu coração estava doente, então eu estou te entregando o meu, até você se recuperar. – a abraçou, incrédula e grata, então se entregou ao choro, ainda sem lágrimas. Naquele instante, através do sorriso e amor daquela criança, eu assisti, ainda extasiado, a Estranha começar sua metamorfose.
Enquanto eu dirigi, ficou olhando para os desenhos, supostamente comprados, e seu dedo traçou cada um deles, mas foi naquele coração que ela se demorou encarando, como se de fato ele pudesse ajuda-la a se recuperar. Em silêncio eu também torci que sim.
Chegamos à casa onde eu havia crescido, desceu do carro, e enquanto analisou a construção de tijolos vermelhos, vi os questionamentos surgirem através de seus olhos. A sombra da enorme árvore bateu em seu rosto, assim como os últimos raios de sol daquele dia, a agitação de estava sumindo, ao estar sozinha comigo.
- Está impressionada?
- Foi aqui que você cresceu?
- Sim, até o meu avô adoecer e termos que vender tudo e nos mudarmos.
- É uma bela casa, confesso que mesmo você contando, eu não achava que ela seria assim, tão grande.
- E como imaginava?
- Algo mais parecido com uma fazenda, na verdade um curral ou algo assim. – Eu ri e ela esboçou algo parecido.
- Vamos entrar! Mamãe conseguiu deixar a casa exatamente como era na minha infância, mas agora com vários pôsteres meus de papelão espalhados.
- Mais de um ? E em tamanho real? – Confirmei rindo, e ela acabou acompanhando com um sorriso. – Deve ser assustador.
- Acredite, concordo com você.
Enquanto eu lhe mostrava a casa por dentro, ela permanecia em total silêncio, já eu não parava de falar. Em nossa conversa unilateral, eu conseguia ouvir todas as respostas de , ou as suas perguntas, por isso continuava insistindo. Contudo não havia mais um clima hostil, ela só parecia pensativa.
- Você pode ficar no meu quarto, se estiver mais a vontade. – Disse quando notei que aquele foi o cômodo que mais a interessou, e ela examinava cada pequeno espaço, como se pudesse descobrir mais sobre mim.
- E onde você vai dormir?
- No quarto dos meus pais, ou da minha irmã, ou no de hóspedes. – Ri, ela concordou e voltou a se concentrar em alguns objetos que tinham ali. Não fiquei surpreso, muito menos incomodado, eu iria dar a todo o espaço necessário, e não tinha nenhuma intenção de forçar nada. – Vou tomar um banho, depois podemos pedir comida, assistir alguma coisa.
- Tudo bem, desço em alguns minutos.
Decidi pelo quarto de hóspedes, tomei um longo banho e assim que terminei de me vestir, tive que descer correndo ao ouvir o barulho insistente da campainha, poderia ser importante, mas também poderia ser alguns fãs ou imprensa, que descobriram que eu e estávamos na cidade. Quando abri a porta, uma onda de cabelos vermelhos surgiu em meio aquele sorriso sarcástico, mas empolgado.
- Oi vizinho, pode me emprestar uma xícara de açúcar?
- Eu não acredito! – Gargalhei surpreso. – Ophelia! – Abracei a garota com tanta empolgação que tirei seu corpo do chão, esmagando literalmente a saudade.
- Eu sabia que se não aparecesse, você acabaria definhando de saudades de mim! – Me abraçou ainda mais e depois de beijar minha bochecha, se afastou pra me analisar. – Você está um gato, como eu pude te perder?
- Ah, cala a boca, você me dispensou.
- Porque eu era uma idiota. Podemos consertar isso?
Não pude responder sua brincadeira, já que os passos de , descendo as escadas enquanto nos olhava atenta, roubou a nossa atenção.
- Oh meu Deus, ! – Ophelia não se conteve e praticamente gritou, depois de segundos encarando de pra mim, como se não acreditasse que aquilo fosse possível. Antes que eu pudesse apresentá-las, Ophelia venceu a distância e deu um abraço acalorado em , que a princípio permaneceu estática, mas depois retribuiu. – Me desculpa, é que sempre falou tanto de você, que é como se eu te conhecesse. – Elas desfizeram o abraço e lançou um sorriso sem graça.
- Tudo bem. – Olhou pra mim buscando uma explicação.
- E eu adoro as suas roupas. – Acrescentou.
- Parece que toda garota próxima a , gosta de minha grife. – me alfinetou e olhou pra mim, ainda sem entender.
Sorri bobo com aquilo e me aproximei das duas, finalmente as apresentando.
- Essa é Ophelia, minha vizinha e uma grande amiga.
- Grande amiga, é o cassete. – Ophelia brincou, e fingi estar ofendido. – Você é um ingrato, sem coração.
- Gostei de você. – disse em escárnio e segurou no braço de Ophelia seguindo com ela até o sofá, como se fosse melhores amigas.
Pedi comida japonesa, servir vinho em três taças e levei para as garotas que conversavam animadamente. Pelo menos Ophelia estava assim.
- Não precisava se incomodar , eu já estou indo, vocês devem estar cansados, mas amanhã nós poderíamos sair juntos, mostrar a como o interior pode ser selvagem. – Rugiu como um tigre.
- Vamos embora amanhã cedo, foi uma visita curta. – Não detalhei, pois aquilo era tudo que Ophelia precisava saber sobre minha viagem com .
- É uma pena.
- Nós... – começou a falar incerta. – Nós íamos pedir comida pra o jantar, por que você não fica?
- Na verdade eu já pedi o jantar, é comida japonesa. – Apontei o dedo pra Ophelia. – Você costumava ser viciada.
- Não quero incomodar. – Ophelia me olhou e eu sabia que ela estava me perguntando se aquilo era uma boa ideia.
- Fazemos questão, além do mais você e deve ter bastante assunto pra colocar em dia.
Não havia sarcasmo ou nenhum tipo de ciúmes, o convite de foi claro e sincero, e foi impossível uma recusa.
- Se é para o bem de todos, eu fico! – Decidiu jogando os cabelos para o lado, fingindo ser esnobe, depois pegou sua taça de vinho bebericando. O jeito elétrico de Ophelia parecia um motor essencial pra ligar algo em , que observava tudo sorrindo.
O jantar foi tranquilo, Ophelia era uma verdadeira matraca, então o assunto nunca se perdeu, nem o silêncio surgiu pra incomodar. parecia interessada nas histórias constrangedoras que minha amiga contava a meu respeito, e mesmo quando a narração passou pelo meu passado amoroso com Ophelia, ela não pareceu nem um pouco chateada, pelo contrário, vi seus olhos ficarem instigados a cada palavra. Apesar de saber que ela me queria longe de sua vida, e que faria de tudo pra que isso acontecesse, incluindo me jogar pra cima de uma ex-namorada, pareceu ter gostado mesmo de Ophelia.
- A noite foi bem divertida, mas eu estou com dor de cabeça e vou tomar um remédio e dormir. – falou se levantando.
- Está tudo bem? Quer que eu suba também e...
- para. – Me freou. – Eu estarei no andar de cima e não vou me jogar, eu prometo. – Sua brincadeira não foi nem um pouco aceita por mim, e meu maxilar assim como minha expressão se fechou de imediato.
- Acho que agora está realmente na hora de ir... – Ophelia também ia se levantar, mas impediu.
- Fica mais, precisa mesmo de uma companhia, e assim eu consigo uma folga de seus cuidados exagerados. – Revirou os olhos como se estivesse entediada, e abraçou rapidamente Ophelia. – Foi um prazer te conhecer, manteremos contato.
- Com certeza, tenha uma boa noite, .
Assim que saiu eu recostei meu corpo na cadeira, e meu súbito cansaço por toda aquela situação me dominou, e não passou despercebido por minha amiga, que assim como oitenta por cento do resto do mundo, ficou sabendo pela mídia uma história confusa e distorcida de nós dois.
- Vocês irão ficar bem. – Afirmou numa tentativa de me confortar, mas eu não tinha a mesma certeza.
Depois que Ophelia foi embora, tentei dar um jeito na bagunça do jantar e subi. Parei afrontando o final do corredor, reprimindo minha vontade de ver como estaria, mas antes que eu pudesse realmente desistir, a porta do meu quarto se abriu e ela parou recostada no batente, me encarando com seus olhos grandes e pedintes. Meu corpo formigou ao ver que ela vestia apenas uma camisa grande, e implorei uma trégua com aquela luxúria corrosiva.
- ... – Sussurrou o meu nome de maneira sucinta, e manejou a cabeça me chamando.
- Está precisando de alguma coisa?
- Eu acho que não quero dormir sozinha, essa casa é muito grande. – Se esforçou pra parecer indiferente, mas eu enxerguei a sua timidez.
- Ok, eu me acomodo no sofá. – Disse ao seguir ela e entrar no quarto.
- Para de ser bobo, não somos crianças, muito menos desconhecidos. – Ela se deitou e deixou o meu espaço ao seu lado na cama.
Mesmo com medo daquilo ser demais, eu segui suas instruções e depois de desligar a luz, me juntei a ela. Mais uma vez o silêncio reinou, e eu fiquei ouvindo a respiração de ir diminuindo o ritmo, pra assim permitir me entregar ao cansaço.
- Ela me pareceu uma ótima pessoa.
- Quem? – Minha confusão foi inocente, já estava quase dormindo e achei que também estivesse.
- Ophelia. – Se remexeu na cama, e no seu tom de voz eu só notei curiosidade. – Qual a história de vocês?
- Não tem uma história, o pouco que houve entre a gente, você soube por ela.
- Sempre tem mais. – Insistiu impaciente.
- Ela era minha namorada antes de eu me mudar pra Londres, depois continuamos amigos.
- E o que aconteceu?
- Eu me mudei pra Londres. – Repeti com obviedade, sem achar necessário mencionar que depois disso eu a conheci, e tudo de fato mudou. – Já não tinha mais razão de manter nada.
- Entendo acabar por conta da distância, mas pode haver tempo ainda.
- Pra alguns relacionamentos o tempo realmente passa, . – Tentei encontrar seu olhar em meio à penumbra, mas não consegui. – Pra outros é como se ele nem existisse.
- Provavelmente estão perdendo uma grande oportunidade. – Se virou, e eu sabia que a nossa breve conversa estava encerrada.




Capítulo Vinte - Dia 2


Stratford-upon-Avon – 22 de agosto de 2016 – 01:44 pm.
havia acordado de péssimo humor, como se toda a experiência vivida no dia anterior a tivessem despertado para a realidade que ela tanto detestava. Enquanto dirigia, toda aquela negatividade me deixou impaciente, fiquei minutos batucando os dedos contra o volante, até que não aguentei mais.
- Você precisa rir, vou contar uma piada.
- Não, por favor! – Revirou os olhos, como se automaticamente tivesse absorvido a minha impaciência.
- Por que não?
- Você só sabe contar uma única piada, e é péssima.
- Só conto a do mexicano, porque ela realmente é boa.
- É péssima.
- Então qual o nome do mexicano que perdeu o carro? – Ela deu de ombros, esquecida da resposta ou indisposta a responder. – CARLOS! – Eu comecei a gargalhar bem além do que a piada ruim merecia, e em segundos começou a rir junto, descendo do seu pedestal. – Entendeu? Car Lost!!!!!!
Não sei se foi a necessidade de agradar, ou o fato de ser realmente um bobo por achar graça de algo tão babaca e antigo, mas eu ri tanto que meus olhos lacrimejaram. Ao menos eu tinha conseguido contagiar .
- Ok, a piada continua ruim, eu só estou rindo da sua risada. – Ela se esgueirou pra o meu lado e limpou meu rosto. Um passo que diminuiu a distância entre dois continentes.
- Isso já é um começo.
- Um começo. – Repetiu minhas palavras de maneira mais contemplativa, mas agitou a cabeça a fim de afastar qualquer reflexão. – As piadas sobre a monarquia são melhores...
Contar, ou tentar lembrar piadas ruins foi um ótimo e divertido exercício pra passar o tempo. Chegamos a Stratford-Upon-Avon um pouco depois do almoço, e fomos recebidos por um enorme abraço abrasador, aquele era um dia atipicamente quente, e o sol brilhando no enorme céu azul e sem nuvens, era ao mesmo tempo lindo e estressante. Calor em excesso me irritava, mas havia um coração dentro do carro que precisava ser aquecido, derretido. A cidade minúscula, provavelmente não estaria no mapa, se não fosse por um importante detalhe, Shakespeare havia nascido, e vivido os seus últimos dias ali. Ele era um dos autores favoritos de e talvez aquela visita a fizesse bem, inspirando de alguma maneira. O lugar ficava as margens do rio Avon, e era charmosa e cheia de personalidade, assim como a garota ao meu lado.
- Bem vinda à terra de Shakespeare! – Li em voz alta as palavras receptivas que estavam escritas numa placa entalhada na madeira, mas aderiu a irritação do começo do dia.
- Nós só estamos de passagem, não é?
- Claro que não. – Eu ri em confusão. – Shakespeare é um dos seus autores favoritos, achei que você gostaria desse lugar.
- Você é um idiota. – Foi tudo o que ela se limitou a dizer, e fiquei tão decepcionado com a ofensa que achei melhor não perguntar as razões por ela ter feito. Ao invés disso eu mais uma vez respirei fundo e busquei a paciência que já havia perdido e continuei a dirigir até o centro da pequena cidade.
optou por usar uma peruca de cachos vermelhos, e resolveu se chamar de Santini, obviamente eu lhe disse que me chamaria Christian. Ela precisava entender que eu seria sempre o seu par, independente de como ou onde.
- Isso é ótimo, Christian. Espero que você lembre que Santini morre no final da história. – Riu como se sua piada mórbida tivesse graça, eu apenas ignorei o que havia escutado e reverti à situação.
- Não tem como esquecer esse filme. Eu vi a primeira vez quando você me levou pra sair, lembra? – Ela não respondeu, mas eu continuei. – Lembra o quanto você era sentimental e chorou mesmo já sabendo o que iria acontecer no final da história? Lembra o quanto você era independente e correu pra chegar a tempo e manter o nosso relacionamento? Lembra o quanto você era enérgica e me obrigou a dançar as músicas do Elvis Presley naquela lanchonete?
Desci do carro e a deixei sozinha. Eu não precisava daquelas respostas, mas ela sim.
Enquanto explorávamos a cidade a pé, segurou os cachos da peruca e os prendeu em um coque alto, passando as mãos pelo pescoço suado, o abanando depois. Enquanto andávamos sobre uma ponte em estilo medieval cheio de arcos, um grupo caracterizado passou encenando uma das cenas de Hamlet, e logo tratou de revirar os olhos.
- A grande pergunta não deveria ser aquela. – Resmungou baixo, mas eu soube que ela estava puxando assunto.
- O que?
- “Ser ou não ser, eis a questão”? – Debochou. – Ser é fácil, é natural. “Como ser” é complicado.
- Por quê?
- Como ser depois de uma separação? Ou depois de você ser demitido? Ou, não sei... Como ainda continuar sorrindo, continuar sendo você se o que você sente não é mais nada daquilo?
- Realmente não é fácil. Mas quando você já conseguiu ser, fica fácil voltar a ser o que era. Talvez Shakespeare quisesse dizer isso. – O que eu falei trouxe alguma coisa de valor pra ela, só que preferiu manter a pose.
- Ou só estivesse bêbado demais. – Deu de ombros e eu a imitei.
- Provavelmente. – Vi a coisa mais bizarra daquela cidade e soube que era exatamente aquele lugar que deveríamos ir. Segurei a mão de , sem me incomodar com seu protesto silencioso, e a arrastei até o lençol colorido que servia de porta pra uma tenda. O seu letreiro iluminado prometia revelar o seu futuro através de um poema de Shakespeare, obviamente. – Quer tentar? – Antes que a usual palavra “Não” se formasse, eu interrompi. – Sabia que você gostaria da ideia!
Forcei a nossa entrada na pequena tenda, que parecia estar às moscas, tirando uma senhora que lá estava. Ela vestia uma roupa ridícula de cigana, e em sua frente havia um enorme baú, ao seu lado um pequeno ventilador servia de ajuda para abrandar o calor, duas vezes maior lá dentro. Tudo era bastante engraçado, mas era também mais uma experiência peculiar que eu queria viver e compartilhar com .
Quando a senhora de cabelos ridiculamente pintados de laranja nos viu, ela sorriu em ganância, deveríamos ser os seus primeiros clientes naquele dia, mas antes que ela pudesse se levantar algo a puxou de volta para a cadeira de plástico na qual estava sentada. Instantaneamente os seus olhos fecharam e a sua boca abriu levemente, assustando tanto eu quanto .
- O amor dá sempre um jeito de nos tocar, pra provar que ele está ali e ainda existe, seja sob qualquer perspectiva, boa ou ruim, o amor continua a existir em tudo. Até os mais céticos continuam desejando encontrar sua outra metade. – A senhora disse num ímpeto, como se fosse uma ordem, só depois ela respirou e abriu os olhos. Parecendo normal de novo. – Desculpe, ele manda recado pra poucos, sintam se gratos. – Ela sorriu e a sua voz estava diferente, menos grave e desesperada.
Eu gargalhei, muito. Uma mão ficou sobre meu peito, a outra no joelho, enquanto a gargalhada explodia de mim, eu havia assistido a cena mais engraçada do mundo. Obviamente aquilo era uma encenação medíocre, apesar das palavras dela terem ficado incutidas como se de fato fizesse sentido pra mim, pra , pra nós. A garota ao meu lado permaneceu calada e eu não consegui entender o por que. Uma charlatã, uma muda e um bobo da corte.
- Do que você está rindo, ? – Bastou ela citar o meu nome para que eu, instantaneamente, perdesse a graça e emudecesse. Como ela sabia daquilo? Idiota! Eu era ! Certo?
- Isso é uma bobagem. – tentou sair, mas eu puxei o seu braço a fazendo permanecer. Minha curiosidade se tornou válida e latente. A senhora, que agora parecia mais com uma bruxa, empurrou o baú em nossa direção.
- Teste a sorte, ele quer falar mais com vocês. – Insistiu. – Primeiro , depois você, .
Se em algum momento eu havia duvidado da veracidade dos nossos disfarces, eu soube ali, quando a velha encarou os olhos negros de e falou o seu nome. Era como se ela pudesse ver as nossas almas, sem truques. Eu estava completamente assustado, mas me esforcei a dar os três passos que me separavam da mesa e estendi a mão pegando o primeiro papel que os meus dedos tocaram. Li mentalmente, depois reli, e então tive certeza que de uma maneira bizarra aquilo era verdade.
- "Em tempo algum teve um tranquilo curso o verdadeiro amor”. – Minha voz saiu um tanto embargada, mas eu dei o primeiro sorriso sincero do dia, era iluminado como o sol, pois trazia a certeza de cada palavra dita. pareceu ainda mais abismada e depois de conferir o papel em minha mão, ela tentou fugir dali, sendo mais uma vez impedida por mim. – É a verdade e você sabe. Por favor, , se esforce. – Implorei deixando evidente um cansaço. – Se esforce pra enxergar. – Depois de quase um minuto brigando com a sua própria consciência, ela decidiu voltar, e de lá retirou um papel.
- Leia. – A senhora pediu empolgada. – Leia pra ele, minha jovem.
ficou encarando o papel por um tempo, e quando começou a falar, também voltou a respirar. O ar preso de seus pulmões saiu emanando uma compreensão que pelo seu olhar, tinha julgado indevida.
- “O amor só é amor, se não se dobra a obstáculos e não se curva à vicissitudes... É uma marca eterna... Que sofre tempestades sem nunca se abalar”.
- O amor está aqui. – Foi à vez de a mulher gargalhar, enquanto abria os braços e os erguia. – Em todos os lugares dessa cidade, em tudo o Shakespeare criou, enxerguem, absorvam.
- Vamos sair daqui. – pediu baixo, mas a mulher ouviu.
- A consulta custou trezentas libras.
- O que? – Aquele era o maior roubo da história, mas pra não deixar procurar uma briga desnecessária, eu retirei a quantia do bolso, paguei e saí arrastando ela que dizia insanidades à gananciosa que contava cada nota do dinheiro, sem se incomodar com as ofensas. – Você não deveria ter pagado! Você é um fraco, !
- Se acalme! Esse dinheiro não vai me fazer falta.
- O problema não está no dinheiro, seu presunçoso ridículo. – Empurrou o indicador no meu peito. – Está na...
- O problema está nas verdades que você ouviu! – Gritei pra ela de volta, sem me incomodar com os olhares curiosos. – Cada palavra que você ouviu ai dentro fez sentido pra você, fez sentido pra nós.
Como se eu tivesse dito a maior das ofensas, se desvencilhou das minhas mãos e saiu me deixando sozinho. Soquei o ar num gesto impossível de conter, e mínimo pra dar vazão a impaciência que tinha me acometido.
Eu a segui, respirando fundo e procurando dentro de mim, o homem que eu vinha sendo. Parei em frente a uma barraca de sorvete, comprei um pra mim e um pra , esperando que aquela dose de açúcar pudesse nos acalmar, e ser uma trégua. Ela aceitou o doce, agradeceu por educação, e depois voltou a se calar.
Ao chegarmos numa baía próxima ao canal, vimos muitas pessoas à beira da água, turistas, como nós, perambulando animados sob aquele fim de tarde quente. Havia barcos amarrados ao lado da água que vendiam de tudo, desde comidas exóticas à pinturas, parecia um verdadeiro carnaval.
Depois de darmos mais uma volta, um garoto magricela parou em nossa frente sorrindo pra nós, e como se já estivesse encenando, apontou de modo dramático para o extremo a nossa esquerda. Olhamos pra o local indicado, mas a movimentação normal, não nos disse absolutamente nada. continuou entediada, e quando eu pensei em chamá-la pra ir embora, batidas de bongo e zumbidos de guitarra surgiram, como num passe de mágica, a multidão praticamente se perfilou para assistir a encenação de uma peça. Tive que seguir os passos de que se aproximou interessada, e vi que se tratava da tragédia Romeu e Julieta.
Os atores encenavam e quando caminhavam, a plateia os seguia, era um teatro vivo e em movimento, onde eu sentia um chacoalhar de sentimentos a cada ato. Só no grande e trágico final eu me lembrei de me permitir olhar pra , examinei cada traço de sua expressão, completamente imersa naquele mundo ilusório. Ela aplaudiu como se buscasse por mais, preferindo aquilo à sua realidade. No fundo eu me sentia da mesma maneira.
- Essa foi a primeira releitura alegre de Romeu e Julieta que eu vi. – escondeu o seu rosto de mim ao evitar me olhar, mas a emoção que havia ali, não me escapou.
- Estou cansada, podemos procurar um hotel?
- Mas são sete da noite!
- Eu estou cansada, ou vamos pra um hotel, ou eu vou dormir na droga do carro! – Rugiu sua exigência.
- Ok, se acalme. – Minha condescendência freou a sua exaltação. – Vamos encontrar um hotel, mas depois de um breve descanso nós vamos sair.
- Não, já disse...
- Sabia que você aprovaria! – Sorri e ela me encarou ultrajada.
Enquanto continuou resmungando, eu andei ao seu lado cantando baixo, e me esforçando pra parecer alegre, vivo, mas estava ficando a cada segundo mais complicado.
pareceu mais convencida com o poder de transformação que a experiência daquela viagem estava lhe trazendo. Por isso sua irritação e impaciência. Por isso a sua vontade imensurável de largar tudo. Sua desistência ainda era maior que sua vontade de lutar.
Achei que não iria fazer isso em pouco mais de vinte quatro horas de viagem, mas se um embate acontecesse, eu teria que ser direto e revelar as minhas reais intenções, não dava mais pra amenizar o que eu sentia, e pela maneira como vinha me tratando ao longo do dia era exatamente isso que ela esperava. Uma mistura de ansiedade e medo havia se apoderado de mim, durante o nosso breve trajeto até o hotel. Dizer a ela que eu a amava lhe afugentaria de vez, ou a faria se cercar, buscando uma oportunidade.
- Um quarto de casal? – A morena perguntou animada.
- Sim!
- Não!
A recepcionista, da pequena pousada em estilo colonial, ficou confusa com a divergência das respostas.
- Pode acreditar em mim, é apenas um quarto. – Disse à atendente que parecia um pouco incerta, e depois me aproximei de pra sussurrar. – Te desafio.
Ela revirou os olhos como resposta e esperou até que fossemos liberados do check-in.
Ainda inconformada em ter que dividir um quarto comigo, jogou sua bolsa sobre a cama e passou a analisar o lugar. Antes que mais comentários raivosos ou desdenhosos surgissem, eu lhe avisei que tomaria um banho, omiti a parte em que desejava que a água lavasse as inseguranças que surgiu a pouco.
- Não precisa fazer essa cara, nós sempre dividimos quarto, inclusive dividimos um ontem. – Disse assim que saí do banheiro, apenas com uma toalha envolta da cintura, que tampouco incomodou .
- Porque eu estava com medo de dormir sozinha naquela casa grande.
- Bobagem, você só não admite, mas adora a minha presença. – Tentei fazer uma piada, mas só agravou a situação.
- Babaca. – Bateu com força a porta do banheiro.
- Linda. – Berrei e ela resmungou algo que não compreendi, me fazendo rir ainda mais de seu esforço em ser antagonista. Mais um resmungo, a porta do banheiro foi aberta mais rudemente do que fora fechada.
- Cadê a chave do banheiro, ?
- Não tem necessidade de se trancar, eu não vou invadir. – Lhe garanti, mas os olhos de reluziram a decepção que ela tentou conter.
- Vou perguntar uma última vez. – Fechou os olhos e respirou fundo. – Cadê a chave?
- Eu não sei, talvez... – Ela não deixou completar a minha mentira.
- Você é um imbecil!
- ...
- Eu achei que o fato de não ter nenhuma chave no quarto e banheiro da sua casa fosse só coincidência. – Mordeu o lábio com força, enquanto encarou seus próprios pés e agitou a cabeça em negação. – Mas agora tudo faz sentido. Você não confia em mim, acha que vou me trancar aí dentro e me matar? – Fez piada do nosso próprio caos, passando a me encarar, me depreciar.
- Estou tentando te manter segura. – Minha justificativa pareceu tão irrelevante a ponto de diverti-la por um breve instante.
- Você é um hipócrita. Acredita que eu posso me refazer nessa viagem, que eu devo confiar em você e nessa sua crença cega no amor, destino e blá, blá, blá, mas não confia em mim pra ficar sozinha!
- , eu...
- Eu não vou mais tentar suicídio, fique tranquilo. Eu já descobri que a morte está na droga dessa vida. – Assim como os lábios dela, os meus também tremeram, e como se quisesse provar o quanto eu era desleal, ela entrou no banheiro e deixou a porta completamente aberta.
Impedi que os meus olhos seguissem a sua roupa encontrando o chão, e de admirar o corpo nu que foi revelado.
Sentei na varanda do quarto e fiquei assistindo a movimentação da cidade, havia fumado dois cigarros e bebido uma cerveja, mas ainda não havia terminado o seu banho. Quando finalmente saiu do banheiro a fumaça do vapor da água quente, pareceu nada, perto da que saiu de sua cabeça.
- O que você está fazendo? Deixou o quarto todo fedendo a cigarro.
- Você nunca se importou. – Dei de ombros sem entender. – Você fuma.
- Eu não fumo! Bom, não no meu quarto! – Eu ri e ficou ainda mais furiosa.
- Para de drama e implicância. Se você está tão incomodada, podemos pedir outro quarto.
- E se eu estiver incomodada com a sua presença? – Colocou as mãos na cintura e me olhou inquisitiva. Seria um mentiroso ainda maior, se não assumisse o quanto aquilo me afetou.
- Não precisa tentar me agredir o tempo inteiro. – Peguei os sapatos e me sentei na cadeira pra calçá-los. Não sei se foi a minha falta de relutância ou o prazer de me ver ir embora, mas simplesmente parou a minha ação, como se precisasse se justificar. Seu olhar encontrou o meu, e endureceu em pura defesa.
- Sempre que eu olho pra você eu me sinto arrasada. – Confessou e instantaneamente eu me levantei e segurei os seus ombros.
- Você não precisa se sentir assim, tudo o que eu quero é mudar isso.
- Por que você está insistindo nisso? Por que você está insistindo nessa droga de viagem?!
- Porque uma vez você me disse que foi assim que o seu pai resolveu o relacionamento dele com a sua mãe e eu só quero salvar o nosso.
- Não existe “nosso”! – Praticamente gritou.
- Eu te amo, e não importa o que você tenha feito, como se sinta ou o quanto o tempo nos afaste, eu vou continuar te amando. – Disse exasperado. – Eu posso continuar sendo esse ciumento egoísta e você essa antipática orgulhosa, que nada do que eu sinto vai mudar. – Senti o seu corpo tremer e achei que ela iria ceder. – Eu te amo, .
- Bom, é uma pena que ame. – Tirou as mãos de mim e depois de pegar uma muda de roupa na mala, voltou para o banheiro para se vestir.
Um funcionário do hotel, quando foi servir o nosso jantar no quarto, nos indicou uma festa que aconteceria a apenas duas quadras do hotel. Era uma boate conhecida e bem procurada pelos turistas, e tudo o que precisávamos pra ao menos abrandar as tensões.
abandonou o tênis e a calça jeans, e apareceu com um vestido verde e perigosamente curto demais, antes que pudesse questionar onde ela havia encontrado tal peça de roupa, eu percebi que aquilo na verdade era uma camisa minha perfeitamente customizada.
andava afastada de mim, mas a passos decididos, a brisa que nos tocava eram resquícios do dia quente, mas parecia que estávamos imersos no olho de um furacão que insistia em nos manter separados. Rompi a distância que ela havia imposto, já que seu cheiro me atraía, a química entre nós dois ainda era palpável, e era um dos ínfimos motivos pra eu querer começar de novo, sempre que ela dissesse que não.
Parecia que todas as pessoas da cidade estavam dentro daquele mesmo pub. Quando eu e adentramos o local, esprememos os nossos corpos em busca de um mínimo de espaço, ela apenas se virou pra mim e me disse que iria até o bar, e assim nos perdemos. Ao menos ela tinha avisado.
Segui relutante, me sentindo um velho ranzinza, que se incomodava com as luzes, o som alto e as garotas fáceis que se aproximaram de mim. Não encontrei no bar, e mesmo assustado com a simples possibilidade dela ter ido embora me assolar, eu decidi pedir uma bebida, tentar me acalmar, e dar a ela o voto de confiança que a pouco havia sido questionado.
Um tempo, mais duas bebidas depois, eu vi uma pequena mesa ficar vaga e me apressei a torná-la minha, se tudo desse errado aquela noite, ao menos as minhas pernas teriam sustento.
- Você parece um velho psicopata, sentado nesse canto escuro. – surgiu sorridente, o corpo brilhando de suor e as bochechas coradas pelo álcool. – Achei que você queria se divertir.
- Eu estou me divertindo. – Menti mais pra mim do que pra ela, que se limitou a mexer o ombro e roubar a minha bebida.
Com um único levantar de dedos, um dos garçons prontamente apareceu com uma bandeja repleta de copinhos de vidro, com uma bebida verde dentro.
- Estranho! – Achei que ela estivesse falando comigo, e por quatro segundos ouvir aquele apelido me paralisou, até perceber que ela só estava respondendo a pergunta que eu iria fazer sobre que bebida era aquela. – Inventei a bebida, então pude nomear ela. Hoje eu quero ver a fada verde!
Quando fomos brindar nossos shorts da tal bebida inventada por , mas que consistia numa mistura de vodca, tequila, whisky e absinto, ela resolveu me alertar.
- Cuidado, você pode sentir muito amanhã. – Falou presunçosa, virando sua bebida.
- Melhor do que não sentir nada. – Enquanto eu bebia, a postura de mudou, ela jogou o cabelo para o lado e minhas palavras pareciam ter lhe dado um tapa na cara.
Como um raio ela se recuperou, do que talvez nem tenha se afetado tanto, e se levantou com a graciosidade e imperiosidade de sempre.
- Onde está indo?
- Estão fazendo body short. – Respondeu com um sorriso de obviedade. – Sem essa, , você fez isso com a minha melhor amiga, e eu nem reclamei.
Se desvencilhou dos meus braços, e ao se aproximar da roda, logo se tornou o centro dela, corriqueiramente roubando toda a atenção pra si.
Eu sabia que meu ciúme ia ser a primeira e principal coisa testada por , infelizmente era algo que eu não conseguia domar com facilidade, mas naquele momento, o movimento das pessoas não me permitiu ver muito do que aconteceu. Apenas só o ato seguinte, onde foi erguida como um verdadeiro troféu.
Em seguida ela começou a dançar, seus saltos finos sustentaram seus movimentos, enquanto deslizavam pelo salão, e pelo meu coração. Prendi meus lábios entre os dentes, e voltei o meu olhar pra meu copo, tentando reprimir a vontade animal de ir até lá e requerê-la só pra mim. A intenção dela era me afastar, testando meus limites, me empurrando pra o meu lado mais obscuro e brutal, mas ela não iria conseguir. Tudo se resumia a algo maior, uma obstinação que era capaz de refrear meus piores instintos, me mantendo sentado, esperando pelo fim de sua diversão.
desistiu de seu jogo, e voltou a se sentar ao meu lado. Sua respiração resfolegava devido a dança, e seus olhos procuraram os meus.
- O que está acontecendo com você? – A pergunta não foi direta, mas eu senti sua resignação. – Não vai levantar daí e tentar aproveitar a noite?
- Não. – Tentei um sorriso que não foi correspondido. – Isso é tudo sobre você.
Como vinha acontecendo por pura facilidade, decidiu e não absorveu a intensidade do que tinha dito, e mais uma vez convocou o garçom, que prontamente serviu outra generosa rodada de bebidas.
- Vamos beber então! Eu ainda pretendo ver a fada. – Me entregou um copo, brindou com o seu e virou todo o conteúdo.
A cena se repetiu por diversas vezes durante aquela noite, mesmo quando eu julguei que já havia ultrapassado o seu limite, só consegui levá-la pra o hotel quando o seu corpo reclamou descanso.
Em meio a uma cantoria grogue, um sorriso ébrio, e meus braços sustentando os seus passos, nós finalmente entramos no quarto. Num rompante, se desvencilhou de mim e foi até o frigobar, abrindo uma garrafa de cerveja, que eu tratei de tirar de suas mãos.
- Chega! Você já bebeu demais.
- Me deixa em paz! – Exigiu tentando pegar a garrafa de volta, mas eu me afastei dela. – Porra, ! Se você não me devolver isso eu vou fazer um escândalo!
- Não! – Repreendi num tom mais firme e paternal. Ergui ainda mais a mão que segurava a garrafa, e quando tentou alcançar, se desequilibrou e caiu sentada no chão.
- Vem levanta daí. – Coloquei a garrafa na pia e estendi a mão que foi recusada com repulsa.
- Eu te odeio! Eu me odeio! – confessou, abaixou à cabeça, e seus movimentos descoordenados me fizeram achar que ela iria vomitar, mas então eu ouvi o seu choro. O que iria sair dela era apenas um jato de verdades e ressentimentos. – Eu queria tanto aquele bebê. – Chorou como uma criança, sua dor se sobressaiu ao discurso arrastado e embolado. – Ele era nosso, eu o senti, falei com ele, e... – Soluçou e me deu um longo olhar, dos que me fazia ouvir toda sua dor através de um amplificador, dez vezes mais potente do que usávamos nos shows. – Ele mexeu na minha barriga quando te ouviu cantar naquela noite. – Foi o fim. Caí ao seu lado e a abracei, antes que eu pudesse desmoronar, ela se deitou no chão, me levando junto. Nossa troca de olhar permaneceu, e aquela imensa escuridão de seus olhos não pareciam me enxergar, iam além. – Ele já nos amava, , e eu nem sei era “ele” mesmo.
Seus dedos se apertaram ao redor do colarinho da minha camisa, nos unindo ainda mais, buscando alguma segurança. Eu a tomei em meus braços lhe dando tudo de bom que tinha, e incapaz de dizer nada, apenas com as palavras dela me sufocando. Aos poucos seu choro foi cessando, até sua respiração diminuir e seu corpo finalmente relaxar. Fiquei deitado, segurando sua inconsciência, sentindo todas as nossas emendas arrebentarem, sem conseguir maquiar mais as cicatrizes do nosso passado.

Stratford-upon-Avon – 23 de agosto de 2016 – 08:59 am.
Acordei sobre o chão duro e meus músculos reclamaram, mas não tanto quanto a minha mente gritou a ausência de ao meu lado. Meus olhos varreram o cômodo, e quando eu achei que ela tivesse partido, a porta se abriu e ela surgiu gloriosa, com uma caixa de papelão na mão, e um ar refrescante, como se nenhuma ressaca pudesse ter lhe atingido, ou como se não tivéssemos tido nenhuma conversa na noite passada.
- Trouxe seu café da manhã. – Disse colocando a caixa sobre a pequena mesa. – Desculpe por ter te feito dormir no chão.
Levantei, e antes que eu pudesse espantar o sono de uma vez, e poder dizer alguma coisa, voltou a falar.
- , nós precisamos conversar. – Aquela frase funcionou como um potente despertador, tencionando todo o meu corpo.
- O que houve? – Minha voz soou amedrontada demais, mas o pequeno sorriso que recebi, conseguiu me tranquilizar um pouco. Ela indicou a cadeira ao seu lado, e movido por minha curiosidade eu logo me sentei, tendo que esperar ainda por seu longo suspiro.
- Confesso que não lembro muito do que te disse, mas eu sei o que estou sentindo. Ontem eu estava confusa, sendo guiada por muito álcool, pelo medo da mudança. Estive tão acostumada a não ter esperança, que a remota possibilidade de me sentir melhor, foi apavorante. – Revelou, em nenhum momento mostrando vergonha. – Você é a maior dualidade da minha vida, eu não posso te oferecer nada, em partes por não ter nada, outras por não querer.
- , quando eu disse que isso é sobre você, eu não estou mentindo, eu também não menti ao dizer que eu esperarei sempre pelo seu amor, mesmo que possa parecer impossível agora.
- Não parece, é impossível. – Sua constatação veio embebida de tristeza, e mesmo sem querer me atingir, eu senti como se uma faca fosse girada constantemente no meu peito. – Eu vou me esforçar a partir de agora, aproveitar toda e qualquer experiência que surgir, eu estou sentindo... – Buscou dentro de si e através da paisagem da janela, uma palavra que pudesse definir aquele momento. – Estou sentindo vontades.
- Isso é um ótimo começo. – Segurei a sua mão e apertei enquanto sorria.
- Mas... – Ela disse e depois engoliu com dificuldade a palavra que eu mais odiava, e continuou. – Quando essa viagem acabar, eu preciso me afastar de você, eu agradeço o que está fazendo por mim, mas eu não posso te ver mais. É muito difícil. – Concordei mais uma vez, mantendo o meu sorriso, fazendo dele um ótimo esconderijo pra os sentimentos funestos.
- Eu entendo. Você terá tudo o que quiser.
- Obrigada, . – Me deu um sorriso sincero, mínimo pra reatar as minhas esperanças. – Até porque, essa não é uma daquelas histórias baratas que suas fãs postam na internet.
- É, e você nem faz o meu tipo. – Fingi desdenho, e rimos.
- Ótimo. – Ela se levantou espantosamente bem humorada. – Se apresse, temos estrada pela frente.
Meus lábios se abriram levemente, assustados com a dicotomia no comportamento de , mas a sua disposição me contagiou.



Continua...



Nota da autora: Oi Estranhas, o que acharam do dia 2??? Comentem e apaziguem o meu coração de autora em processo de finalização da história rs. Até muuuuuuuito breve! xX Love!




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